CAPÍTULO
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Bases anatômicas da respiração respiração Rodrigo Antônio Brandão Neto / José Alberto Neder / Fabrício Mar t n tns s Valois
1. Introdução O sistema respiratório tem como função principal promover as trocas gasosas, ou seja, captar oxigênio (O 2) do ambiente e eliminar gás carbônico (CO 2). Além disso, envolve uma série de estruturas que coordenam a respiração (desde o centro respiratório no tronco cerebral até os músculos da caixa torácica, passando por quimioceptores no sistema vascular), cujos órgãos principais e, em úl tma análise, responsáveis finais pela função de trocas gasosas, são os pulmões. O ar ambiente, uma mistura de O 2, CO 2, nitrogênio, micróbios, poluentes e toxinas, passa pelas vias aéreas superiores, antes de chegar à membrana de troca alveolar. Há vários mecanismos de defesa na tentativa de purificar esse ar: espirro, tosse, movimentos mucociliares, entre outros. As células epiteliais pseudoestra tficadas fazem parte desse sistema de defesa, criando uma barreira fisiológica, por meio da formação de junções apicais espessas e firmes que são característcas do epitélio do trato respiratório.
2. Estrutura do trato respiratório O trato respiratório é dividido, funcionalmente, em 4 segmentos anatômicos distntos (Figura 1): -
Vias aéreas superiores (nasofaringe e orofaringe);
-
Vias condutoras (laringe, traqueia, brônquios);
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Bronquíolos respiratórios;
-
Alvéolos.
Em cada segmento, estruturas vasculares e neurais complementam a estrutura das vias aéreas. No sentido contrário, capilares linfáticos têm início distalmente e, em uma direção cefálica, terminam nos gânglios linfáticos hilares.
Figura 1 - Anatomia básica do sistema respiratório
3. Nasofaringe e orofaringe A nasofaringe e a orofaringe têm início nas narinas e nos lábios. Uma caracterís tca marcante desse segmento é a presença de uma rica rede vascular logo abaixo da mucosa que reveste a cavidade nasal, os seios da face e a traqueia extratorácica. No nariz, as vibrissas e os cílios são abundantes e importantes para a função de puri ficação do ar. Em geral, grandes par culas culas são retdas nesse segmento (>10 μm de diâmetro). Além disso, o ar é aquecido e umidi ficado antes de chegar à faringe posterior. posterior. Secreções são acumuladas nesse segmento, oriundas das glândulas submucosas e dos seios da face. Também nessas regiões, há uma complexa integração entre a respiração e a deglu tção. A epiglote e a musculatura laríngea direcionam alimentos para o esôfago e o ar, para
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PNEUMOLOGIA a região subgló tca. O mecanismo não é perfeito, e mesmo indivíduos normais podem ter microaspirações, especialmente durante o sono. A mucosa nasal é semelhante à mucosa que reveste o trato respiratório inferior, com relação às funções mucociliares e imunológicas. As característcas do epitélio respiratório, em termos morfológicos, estão descritas na Figura 2.
5. Brônquios e bronquíolos respira respiratórios tórios As vias aéreas intratorácicas compreendem a traqueia, os brônquios e os bronquíolos respiratórios. A traqueia se bifurca (carina) nos brônquios principais, e estes nos brônquios lobares e segmentares. O brônquio principal direito é mais vertcalizado que o esquerdo, e isso tem importância na origem das doenças pulmonares por aspiração, pois a tendência do material par tculado aspirado é a tngir o pulmão direito com mais frequência. Os bronquíolos respiratórios estão localizados na transição entre os segmentos condutores de ar e o local onde haverá a troca gasosa, os alvéolos. O ácino representa a porção pulmonar ventlada pelo ar derivado de um dado bronquíolo respiratório de 1ª ordem. Assim como os segmentos condutores, os bronquíolos respiratórios são importantes na retrada de par culas culas e micro-organismos que, porventura, tenham tdo acesso a esses segmentos distais do trato respiratório (Figura 3).
Figura 2 - Vários t pos de tecido epitelial encontrados encontrados ao longo do sistema sistema respiratório
4. Vias aéreas condutoras con dutoras Grosso modo, as vias aéreas condutoras têm início na traqueia, sendo esta um tubo formado por anéis car tlaginosos incompletos (ou seja, em forma de U). A porção posterior da traqueia está em ín tmo contato com o esôfago e é formada por músculo liso. A traqueia con tnua distalmente até bifurcar-se em 2 grandes brônquios principais. Denomina-se carina o local caudal da bifurcação. A partr dos brônquios principais (ou seja, brônquio-fonte direito e brônquio-fonte esquerdo), ocorre uma sucessiva rede distal de bifurcações, surgindo muitas gerações de segmentos, terminando nos bronquíolos respiratórios. As vias aéreas condutoras acabam nos bronquíolos terminais, que consttuem a 16ª geração de bifurcações (Figura 3). A função do segmento condutor não é só transportar o ar, ar, e algumas característcas são: - Rica rede mucociliar: os cílios, constantemente, apresentam movimentos contrários ao ar, ar, levando par cuculas >0,5μm até a glote, onde são deglu tdas; - O epitélio torna-se menos espesso à medida que as vias aéreas se bifurcam – isso torna os bronquíolos distais mais susce veis veis à lesão tóxica ou infecciosa (bronquiolite); - O sistema de bifurcação progressiva permite redução da velocidade do ar, tornando o fluxo aéreo mais lento e laminar, o que será importante na troca alveolar; - Há um atvo sistema imunológico em toda a submucosa.
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Figura 3 - Divisão do sistema respiratório e componentes do saco alveolar
Os bronquíolos respiratórios podem ser acome tdos em algumas doenças, notavelmente as doenças do tecido conjuntvo (colagenoses), na bronquiolite obliterante com pneumonia em organização (BOOP) ou na rejeição crônica ao transplante de pulmão. As principais mudanças nesse segmento, em relação às vias condutoras, são: - O epitélio cuboidal diferencia-se em células alveolares tpo I, que reves trão os alvéolos; ( globet - As células produtoras de muco desaparecem (globet cells), cells), embora possam permanecer em indivíduos tabagistas devido ao insulto crônico de vias aéreas; - Surge outro tpo de célula secretora denominada célula clara;
BASES ANATÔMICAS DA RESPIRAÇÃO
Forma-se uma rica rede de células dendrí tcas, importantes na função imunológica. Isso permite uma notável mudança nas defesas respiratórias: um paralelo de redução da produção de muco com aumento das funções imunológicas; - Por úl tmo, ocorre uma grande mudança no sistema vascular: os segmentos condutores têm irrigação arterial (artérias brônquicas – ramos da aorta), passando para uma irrigação via artéria pulmonar/capilares pulmonares. -
6. Alvéolo: unidade de troca gasosa A unidade de troca gasosa é composta por uma grande área de super f cie, cie, consttuída por centenas de milhões de alvéolos. Nessa localização, forma-se a membrana alveolocapilar, capilar, separada por um espaço denominado inters cio. cio. O O2 passa do alvéolo para os capilares; em troca, há eliminação do CO2 para os alvéolos, ambos os movimentos dependendo de gradientes pressóricos difusivos (Figura 4).
Os alvéolos estão muito próximos aos capilares derivados da pequena circulação (sistema arterial pulmonar, que traz sangue venoso a par tr do ventrículo direito). A membrana alveolocapilar tem cerca de 120 a 140m 2, com uma espessura média de 0,5 a 0,6 μm, permitndo uma troca extremamente eficiente e rápida de gases. De fato, caso os 300.000.000 de alvéolos dos 2 pulmões fossem abertos e estendidos, ocupariam uma super f cie cie correspondente a 1 quadra de tênis. Uma característca de tal segmento é a presença de um complexo sistema de defesa, essencial à manutenção das funções respiratórias. Embora o alvéolo esteja protegido pelos bronquíolos e segmentos condutores (rico sistema mucociliar), par culas culas <0,5μm podem chegar aos alvéolos. Dois sistemas, nesse segmento, são responsáveis pela eliminação de par culas culas e efeito microbicida: - Resposta inata (imediata): produz (imediata): produz uma resposta in flamatória no local, com apoptose de neutró filos e tentatva de deixar localizado o processo in flamatório; ca: nesse caso, há estmulação de - Resposta especí fica: linfócitos, para gerar uma resposta imune mais específica, via células citotóxicas e produção de imunoglobulinas. Essa é apenas uma descrição simplista, didá tca, embora uma complexa rede de interações intercelulares e de citocinas exista nesse local. Em geral, podem-se descrever 2 extremos: Uma inflamação alveolar (por exemplo, pneumonia bacteriana): bacteriana): com atvação imunológica, destruição parenquimatosa, mas com destruição dos agentes patológicos. Logo após, há um processo regenera tvo, restabelecendo as funções normais; crônico: prolongado, ine- Um processo in flamatório crônico: ficaz, persistndo injúria e destruição tecidual con tnuamente. Nesse caso, podem ocorrer fibrose e cicatriz, desenvolvendo-se uma resposta granulomatosa. Dependendo da intensidade de destruição, podem surgir sintomas. -
Figura 4 - Relação entre o alvéolo pulmonar e o capilar pulmonar
A parede alveolar é cons ttuída dos seguintes tpos celulares: - Célula alveolar tpo I ou pneumócito tpo I: de I: de aspecto escamoso com funções de revestmento; - Célula alveolar tpo II ou pneumócito tpo II: responII: responsável pela síntese, armazenamento e secreção da substância surfactante que reveste a parede alveolar. O surfactante é essencial para a vida, apresentando propriedades tensoatvas, com redução da tensão super ficial, uma força que se desenvolve na transição líquido-gás e que tende a reduzir o tamanho e a patência alveolares. Portanto, o surfactante impede o colabamento alveolar na expiração e facilita a sua expansão na inspiração.
7. Anatomia macroscópica pulmonar Macroscopicamente, os pulmões são órgãos de coloração acinzentada e consistência esponjosa (80% ar, 10% sangue e 10% de tecido no final da inspiração), que ocupam grande parte do interior da caixa torácica, estando separados pela loja cardíaca e pelo medias tno. Os pulmões são revestdos pela pleura, que apresenta 2 finos folhetos (parietal e visceral) separados por um espaço virtual (o espaço pleural) que contém uma pequena quan tdade de fluido seroso com a função de mantê-las unidas. O espaço pleural é fundamental para o ato respiratório e será discutdo posteriormente. O hilo pulmonar, com as grandes vias aéreas e vasos, mantém o pulmão estável dentro da caixa, explicando, por exemplo, por que o pulmão se retrai próximo ao medias tno quando ocorre pneumotórax maciço.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA O pulmão direito é ligeiramente maior do que o esquerdo, apresentando 3 lobos, unidades quase totalmente recobertas por pleura visceral: - Lobo superior, com 3 segmentos, separado dos lobos médio e inferior pela fissura horizontal; - Lobo médio, com 2 segmentos, separado do lobo inferior pela fissura oblíqua; - Lobo inferior, com 5 segmentos. O pulmão esquerdo tem 2 lobos: - Lobo superior, com 5 segmentos, sendo a língula (segmentos lingulares superior e inferior) correspondente ao lobo médio direito; - Lobo inferior, com 4 segmentos (o lobo inferior direito não tem o segmento basal medial). Na inspeção pulmonar, observa-se, ainda, a presença dos lóbulos secundários, que são subdivisões aparentes dos lobos com, aproximadamente, 1cm 3, separados por fino tecido conjun tvo que se estende até a pleura visceral. Embora não apresentem relação com as subdivisões da árvore brônquica, parecem conter cerca de 10 ácinos.
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CAPÍTULO
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1. Introdução O reconhecimento e a análise adequados dos sinais e sintomas respiratórios em Pneumologia – e em toda a Medicina – são fundamentais para a investgação clínica satsfatória. Neste capítulo, serão discu tdos os pontos mais relevantes da propedêu tca respiratória.
2. Tosse A - Introdução Tosse é definida como uma manobra expiratória forçada contra a glote fechada, promovendo um som caracterís tco. Representa o principal mecanismo de defesa das vias aéreas.
B - Classificação Ainda que a tosse possa se manifestar com ou sem secreção, e esta possa ser espessa, mucoide, amarelada, esverdeada, hemátca, a caracterização clínica mais relevante parece relacionar-se ao tempo de duração dos sintomas: - Aguda: até 3 semanas; - Subaguda: tosse persistente por um período entre 3 e 8 semanas; - Crônica: maior que 8 semanas. Alguns autores consideram tosse crônica quando presente por mais de 3 semanas (evitando o termo subagudo), mas a classificação anterior é a mais aceita, e é a adotada pelas Diretrizes Nacionais de Manejo da Tosse. a) Tosse aguda As principais causas de tosse aguda são as infecções virais das vias aéreas superiores, em especial o resfriado comum, e das vias aéreas inferiores, com destaque para as traqueobronquites agudas. Outras causas frequentes são as sinusites agudas, exposição a alérgenos e irritantes, e exacerbações de doenças crônicas, como asma e Doença Pulmonar Obstrutva Crônica (DPOC). O resfriado comum e as traqueobronquites agudas não necessitam de tratamen-
Sinais e sintomas respiratórios José Alberto Neder / Fabrício Mar tn s Valois
to antbiótco, mas, em pacientes com DPOC, pode ser indicada antbiotcoterapia. Em outras circunstâncias, traqueobronquites têm e tologia viral em mais de 90% dos casos. A sinusite aguda é, na maioria das vezes, viral; deve-se suspeitar de etologia bacteriana quando os sintomas de uma virose das vias aéreas superiores pioram após o 5º dia ou persistem por mais de 10 dias. A presença de 2 ou mais sinais maiores ou de 1 sinal maior e 2 menores é altamente sugestva de sinusite aguda. O tratamento recomendado para casos de sinusite bacteriana é a amoxicilina por 7 a 10 dias, e podem ser u tlizados, dependendo da resistência local, evolução e uso prévio de an tbiótcos, amoxicilina com clavulanato, macrolídeos, cefalosporina de 2ª geração e até quinolonas respiratórias. Tabela 1 - Sinais de sinusite aguda Sinais maiores - Cefaleia; - Dor ou pressão facial; - Obstrução ou congestão nasal; - Secreção nasal ou pós-nasal purulenta; - Hiposmia ou anosmia. Sinais menores - Febre; - Halitose; - Odontalgia; - Otalgia; - Pressão nos ouvidos; - Tosse.
b) Tosse subaguda As orientações sobre o manejo da tosse subaguda são controversas, até porque a classificação é recente. Antes, a tosse com mais de 3 semanas de evolução era categorizada como crônica. Na verdade, as e tologias são similares, com a abordagem muito semelhante, com uma exceção (que representa a principal causa de tosse subaguda): a tosse pós-infecciosa. O diagnóstco da tosse pós-infecciosa é de exclusão e baseia-se em 3 critérios: tosse com duração superior a 3 e
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PNEUMOLOGIA inferior a 8 semanas; avaliação clínica detalhada sem identficação de uma causa; história de infecção das vias aéreas nas últmas 3 semanas. Não há tratamento especí fico, mas se pode considerar o uso de brometo de ipratrópio e cortcosteroides por via inalatória. Em alguns casos mais intensos, pode-se considerar o uso de cor tcosteroides sistêmicos como a prednisona ou prednisolona, na dose de 30 a 40mg/dia, por 5 a 7 dias. A abordagem da tosse subaguda exige história clínica cuidadosa que permite o diagnós tco na maioria das vezes, sem a necessidade de inves tgação adicional ou de tenta tvas terapêutcas. c) Tosse crônica A abordagem do paciente com tosse crônica não é simples. Entretanto, com boa inves tgação clínica e adoção de algoritmos especí ficos, pode-se atngir sucesso em mais de 90% dos casos. Ainda que as possibilidades e tológicas se jam inúmeras (Tabela 2), as Diretrizes nacionais e internacionais baseiam o manejo na busca e tratamento das e tologias mais comuns que são, excluindo o tabagismo e o uso de inibidores de ECA, rinossinusite crônica (ou “gotejamento pós-nasal”, em 18 a 87%), asma (29 a 55%) e re fluxo gastroesofágico (20 a 40%). Nem sempre ocorrem isoladamente, sendo comum a associação entre 2, ou mesmo entre as 3 causas. Tabela 2 - Causas de tosse crônica - Gotejamento pós-nasal (rinossinusite); - Hiper-reatvidade brônquica; - Refluxo gastroesofágico; - Tosse pós-infecciosa; - DPOC; - Bronquiectasias; - Inibidores de ECA; - Tuberculose; - Neoplasias pulmonares; - Doenças pulmonares fibrosantes; - Insuficiência cardíaca; - Doenças pleurais ou pericárdicas; - Discinesia de pregas vocais; - Síndromes aspiratvas pulmonares; - Pelos no ouvido (irritando parede posterior); - Psicogênica.
A história de tosse na vigência de terapia com IECA ocorre em até 15% de pacientes usuários dessa medicação e, comumente, acontece logo após o início do uso, resolvendo-se após a retrada do fármaco. Ocorre por inibição da degradação da bradicinina, com seu acúmulo no epitélio brônquico promovendo irritação local e tosse. A presença de rinossinusite é sugerida por história de obstrução ou congestão nasal, espirros, rinorreia e descarga
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posterior (o paciente refere sensação de que “algo desce pela garganta”). A presença de dispneia, opressão torácica, sibilância e cansaço fácil, além da tosse, sugere fortemente o diagnóstco de asma, mas esses sintomas podem estar ausentes. Deve-se suspeitar de doença do re fluxo gastroesofágico quando da presença de sintomas dispép tcos, mas podem ocorrer sintomas a picos, como rouquidão e afonia. O diagnóstco de tosse associada ao re fluxo deve sempre ser bem embasado, com exclusão de outras causas relevantes de tosse, principalmente pelo fato de a resposta terapêu tca poder tardar mais de 4 meses. O Consenso Brasileiro de Tosse sugere abordagem em que, na ausência de sintomas que sugiram o diagnós tco, como gotejamento pós-nasal, sintomas de re fluxo ou outros, realizem-se radiografia de tórax e seios paranasais (embora haja grande controvérsia em relação ao procedimento, que não é recomendado pelo American College of Physicians). Em caso nega tvo, o próximo passo seria a prova de função pulmonar (espirometria) com broncoprovocação se necessário, sendo considerados outros exames posteriormente, como pesquisa de escarro, pHmetria, broncoscopia e tomogra fia. Conforme orientação do Ministério da Saúde, todos os pacientes com tosse crônica devem ser investgados quanto à possibilidade de tuberculose pulmonar.
C - Tratamento O tratamento da tosse deve ser direcionado à sua e tologia (a Tabela 3 enumera recomendações para as principais etologias da tosse crônica). Como a tosse é um dos principais mecanismos de defesa das vias aéreas, a supressão da tosse com fármacos anttussígenos habitualmente é desencorajada, sendo indicados apenas nas situações em que o controle é extremamente necessário, como em crises de tosse que promovam desconforto respiratório importante, em algumas situações de pós-operatório e alguns casos de hemoptse. Mucolí tcos habitualmente têm impacto pequeno na evolução do paciente com tosse, sendo seu uso restrito aos pacientes com fibrose cístca ou bronquiectasias difusas. Tabela 3 - Tratamento especí fi co para as principais et ologias de tosse crônica Gotejamento pós-nasal - Educação ambiental (evitar alérgenos ou irritantes); - Ant-histamínicos e cortcoide nasal; - Antbiótcos se houver sinusite crônica. Hiper-rea tvidade brônquica - Educação ambiental (evitar alérgenos ou irritantes); - Cortcoide inalatório e broncodilatadores.
SINAIS E SINTOMAS RESPIRATÓRIOS
Refluxo gastroesofágico - Medidas comportamentais (perda ponderal, evitar alimentos que geram sintomas, evitar álcool e café, cessação de tabagismo, elevação de cabeceira); - Inibidor de bomba de prótons; se houver plenitude pós-prandial, associar procinétcos.
A - Tipos Algumas característcas da falta de ar referida pelo paciente podem ser úteis na determinação da e tologia, conforme sumariza a Tabela 5. Tabela 5 - Tipos especí fi cos de dispneia Denominação
Característca
Causas
Ortopneia
Piora com o decúbito dorsal. Ocorre por queda da complacência pulmonar (capacidade do pulmão expandir-se) em paciente com congestão, por aumento da pressão hidrostátca intravascular sobre as regiões posteriores do pulmão, abaixo do coração; pode acontecer também por dificuldade mecânica pela mudança da conformação abdominal e por paralisia do diafragma.
Insuficiência cardíaca, paralisia diafragmátca, traqueomalácia, obesidade, e menos comum em DPOC e asma grave.
Platpneia
Piora com o ortostatsmo e melhora com o decúbito dorsal. Ao monitorizar a oximetria, há dessaturação ao ficar de pé, chamada ortodeóxia. Ocorre por aumento do fluxo sanguíneo nas bases pulmonares com o ortostatsmo, local frequente de localização de f stulas pulmonares.
Fístula arteriovenosa pulmonar, síndrome hepatopulmonar.
Trepopneia
Dispneia ao deitar-se de lado. Geralmente, ocorre por redução da complacênDerrame pleucia torácica por um volural maciço. moso derrame pleural contralateral, o que dificulta a expansão do pulmão sadio.
3. Dispneia É a sensação desagradável de di ficuldade para respirar. O termo vem do grego dys, que significa anormal, e pnoia, respiração. A proporção de pacientes que procuram o médico devido a essa queixa aumenta com a idade, com pico de incidência entre os 55 e os 69 anos. A pessoa sadia respira mais rapidamente durante a realização de exercícios e em al ttudes elevadas. Na dispneia, a respiração mais rápida é acompanhada pela sensação de falta de ar e pela incapacidade de respirar de modo su ficientemente profundo, limitando a quan tdade de exercício que pode ser realizado. Outras sensações relacionadas à dispneia são a percepção de aumento do esforço muscular para a expansão do tórax durante a inspiração ou para a sua contração durante a expiração; a sensação desconfortável de urgência de realizar uma inspiração antes de a expiração ser completada; e sensações vagas, frequentemente descritas como uma opressão no peito. A dispneia é considerada crônica quando a queixa tem mais de 1 mês de duração. Apesar de o termo ser usado constantemente, a dispneia aguda não tem uma de finição precisa na literatura médica. Há vários ques tonários para avaliação da dispneia crônica com o obje tvo de facilitar a avaliação diagnóstca e classificar sua intensidade. A classi ficação britânica do MRC (Medical Research Council ) modificada parece ser a mais adequada para a avaliação da intensidade, e a American Thoracic Society também a utliza para graduar a dispneia. Tabela 4 - Classi fi cação MRC modi fi cada da dispneia Grau de dispneia
Esforço f sico
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Tenho falta de ar para realizar exercício intenso.
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Tenho falta de ar quando apresso o passo, ou subo escadas ou ladeira.
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Preciso parar algumas vezes quando ando no meu passo ou ando mais devagar que outras pessoas de minha idade.
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Preciso parar muitas vezes por falta de ar quando ando perto de 100 metros, ou poucos minutos de caminhada no plano.
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Sinto tanta falta de ar que não saio de casa, ou preciso de ajuda para me vestr ou tomar banho sozinho.
Dispneia que surge subitamente durante a noite, após tolerar bem o decúbito inicialmente (o que a diferencia da Insuficiência Dispneia paro- ortopneia); melhora quando ventricular xístca noturna o indivíduo se senta ou se põe esquerda. de pé. Ocorre por reabsorção do edema periférico durante a noite, promovendo hipervolemia sistêmica e pulmonar.
Pode-se analisar também o ritmo respiratório, e 2 padrões têm correlação patológica relevante: ritmo de Cheyne-Stokes e ritmo de Kussmaul. Na respiração de Cheyne-Stokes, há alternância entre períodos de respiração acelerada (hiperpneia) e períodos de respiração lenta (hipopneia) ou de ausência de respiração (apneia). As suas possíveis causas são a insu ficiência cardíaca e a hipoventlação central.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA A acidemia, como na cetoacidose diabé tca, pode produzir um padrão respiratório caracterizado por respirações lentas e profundas (respiração de Kussmaul), mas o indivíduo não apresenta falta de ar. Por outro lado, uma pessoa com insuficiência renal grave pode apresentar dispneia e respiração ofegante e rápida devido a uma combinação de acidose, insuficiência cardíaca e anemia. Uma lesão cerebral súbita, decorrente de uma hemorragia cerebral, de um traumatsmo ou de qualquer outro distúrbio, pode acarretar uma respiração rápida e intensa (hiperven tlação). Muitos indivíduos apresentam episódios de dispneia caracterizados por respirações rápidas e profundas. Esses episódios, denominados síndrome da hiperven tlação, são comumente causados por ansiedade, não por um problema f sico. Muitos que apresentam essa síndrome se assustam, julgando sofrerem um infarto do miocárdio. Os sintomas se devem a alterações das concentrações dos gases sanguíneos (principalmente em função da diminuição do nível de dióxido de carbono, com resultante alcalemia) provocadas pela respiração acelerada. Os pacientes podem apresentar alteração da consciência, comumente descrita como sensação de que as coisas ao redor estão muito distantes. Também apresentam uma sensação de formigamento nas mãos, nos pés e em torno da boca.
B - Abordagem diagnóstca O 1º passo na inves tgação diagnóstca de pacientes com dispneia é a determinação do órgão primariamente envolvido; é uma tarefa que pode ser di f cil, se for considerado que, em até 1/3 dos pacientes, a causa da dispneia é multfatorial. No entanto, em cerca de 80% dos pacientes a história e o exame f sico são suficientes para realizar o diagnóstco. Em alguns pacientes, exames complementares e triagem podem contribuir para o diagnós tco. A seguir, são comentadas as principais etologias envolvidas no quadro de dispneia. - Asma: o diagnós tco de asma, realizado principalmente por meio de dados clínicos, pode ser con firmado por testes de função pulmonar, principalmente com provas de resposta ao broncodilatador ou broncoconstrição com metacolina. O uso de espirometria ou medidores de pico de fluxo ( peak fl ow) em unidades de emergência é de extrema importância; - DPOC: o diagnóstco de DPOC é baseado na demonstração de obstrução de fluxo e pode ser realizado de maneira confiável com base em dados clínicos e funcionais (por exemplo, relação VEF1/CVF <0,7 com VEF1 <80% do predito); - Doenças inters tciais pulmonares: pacientes apresentam padrão restritvo na espirometria, e exames de imagem, como radiografias e tomografia de tórax com cortes finos, evidenciam diversos padrões de in filtrados interstciais; - Doenças vasculares pulmonares: hipertensão pulmonar primária e doença tromboembólica pulmonar são
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causas de dispneia crônica. Ecocardiograma, cin tlografia de ventlação/perfusão e tomografia helicoidal podem ajudar no diagnós tco; - Insuficiência Cardíaca Conges tva (ICC): a radiografia de tórax pode ser ú tl no diagnóstco da ICC. Os pacientes podem apresentar congestão pulmonar e cardiomegalia. A presença de índice cardiotorácico maior que 0,5 é sensível para o diagnós tco, mas, quando este é maior que 0,6, a especi ficidade diagnóstca é maior. O ECG é, quase invariavelmente, alterado em pacientes com ICC, e, caso esteja normal, outros diagnós tcos devem ser considerados. A presença de bloqueio de ramo esquerdo parece ser a alteração eletrocardiográfica de maior u tlidade para o diagnós tco. Em pacientes apresentando dispneia aguda no pronto-socorro, os marcadores hormonais têm demonstrado u tlidade para a sua avaliação. A concentração de pep dio atrial natriurétco e de pep dio natriurétco cerebral (BNP) aumenta nas formas mais avançadas ou crônicas de ICC, e o uso, em par tcular do BNP, foi estudado para diferenciar quadros cardíacos de pulmonares, em unidades de emergência. Valores de BNP maiores que 100pg/mL apresentam sensibilidade, especi ficidade e valor predi tvo positvo de, respectvamente, 90, 76 e 83%. O BNP revelou-se a melhor variável isolada para o diagnós tco de ICC em dados de história, exame f sico e exames complementares. Quanto maiores os valores de BNP, maior a probabilidade do diagnóstco final de ICC; quando maiores que 400pg/mL, têm grande valor predi tvo positvo; se menores que 100pg/ mL, têm bom valor predi tvo negatvo. Um estudo europeu demonstrou que valores menores que 80pg/mL têm valor preditvo negatvo de 98%.
4. Dor torácica A dor torácica pode ser originária da pleura, da parede torácica ou de estruturas internas que não fazem parte do sistema respiratório, esôfago e coração. A dor pleurí tca, uma dor aguda provocada pela irritação pleural, torna-se mais intensa com a respiração profunda e a tosse. Pode ser aliviada com a imobilização da parede torácica, protegendo-se o lado afetado e evitando-se a respiração profunda ou a tosse. Em geral, o local da dor pode ser indicado com precisão, embora, algumas vezes, ela possa mudar de localização com o tempo. O derrame pleural, um acúmulo de líquido no espaço situado entre as 2 camadas da pleura, pode causar, inicialmente, uma dor pleurí tca, mas esta, frequentemente, desaparece quando as 2 camadas são separadas em decorrência do acúmulo de líquido. Normalmente, a dor pleurí tca é mais fácil de ser descrita do que a dor originária de outras estruturas do sistema respiratório. Um abscesso ou um tumor pulmonar, por exemplo, podem causar uma sensação vaga de dor torácica profunda, sem que seja possível determinar precisamente a sua localização.
SINAIS E SINTOMAS RESPIRATÓRIOS
A dor também pode originar-se na parede torácica. A respiração profunda e a tosse aumentam sua intensidade, e, geralmente, ela é limitada a uma área da parede onde também há dor à palpação. As causas mais comuns são lesões da parede torácica, como fraturas de costelas, e lacerações ou lesões de músculos intercostais. Um tumor que cresce na parede torácica pode causar apenas uma dor local ou, quando ele afeta um nervo intercostal, uma dor referida (dor ao longo de toda a zona inervada pelo nervo afetado). Algumas vezes, o herpes-zóster manifesta-se por dor torácica antes do surgimento da erupção cutânea pica.
5. Sibilos
como estrias de sangue (hemoptoicos). Existem classi ficações na literatura para estmar gravidade, geralmente baseada no volume expectorado; uma das mais aceitas considera sangramentos superiores a 100mL como maciços e ameaçadores à vida. A hemoptse deve ser diferenciada, na inves tgação inicial, dos sangramentos oriundos das vias aéreas superiores e do trato gastrintestnal alto. As causas mais comuns de hemop tse são doenças de vias aéreas, traqueobronquite aguda e bronquiectasias; no Brasil, estma-se que a tuberculose pulmonar seja responsável por um grande número de casos. Outras causas são: neoplasia de pulmão, aspergiloma (“bola fúngica”), e abscesso pulmonar.
Sibilos são sons agudos, semelhantes a assobios, produzidos durante a respiração, com mecanismos ainda muito discutdos. O mais aceito é que ocorrem por vibração das paredes de pequenas vias aéreas, principalmente aquelas com alguma redução do fluxo de ar. Podem ser causados por um estreitamento geral das vias respiratórias (como ocorre na asma ou na DPOC), por um estreitamento localizado (como o produzido por um tumor) ou por uma par cula estranha que se aloja nas vias aéreas. A causa mais comum de sibilos recorrentes é a asma, embora muitos indivíduos que nunca tveram a doença apresentem sibilos em algum momento da vida. Para medir a extensão do estreitamento das vias aéreas e avaliar os benef cios do tratamento, são necessárias provas da função pulmonar. Um subtpo de sibilo, chamado de “grasnado”, é um som ultracurto, com a mesma tonalidade, que dura menos de 100m. É característco da pneumonia de hipersensibilidade aguda e pode ocorrer em outras doenças bronquiolares.
A - Principais causas
6. Estridor
A história clínica é fator importante na inves tgação da etologia da hemop tse. Tempo de duração, sintomas sistêmicos associados, história de tabagismo são dados que sempre devem ser verificados. Dentre os exames complementares, a radiografia desempenha papel central: recomenda-se que pacientes jovens, com hemop tse não maciça por menos de 7 dias e com radiogra fia normal, recebam tratamento antmicrobiano por provável traqueobronquite complicada. Casos que não preencham esses critérios, ou aqueles com piora progressiva, indica-se inves tgação adicional. Hematócrito, coagulograma, testes de função renal, sedimento urinário, pesquisa de BAAR no escarro devem ser solicitados. Além destes, tomogra fia de tórax de alta resolução e/ou broncoscopia estão indicadas; atualmente, a maioria dos autores recomenda a priorização da tomogra fia como método diagnós tco em detrimento da broncoscopia, exceção feita aos casos com repercussão hemodinâmica, em que a broncoscopia apresenta papel terapêu tco relevante.
Estridor compreende um som semelhante a um ronco e é predominantemente inspiratório. Deve-se a uma obstrução parcial da faringe, da laringe ou da traqueia. Geralmente, é suficientemente alto para ser ouvido a certa distância, mas pode ser audível apenas durante uma respiração profunda. O som é causado pelo fluxo de ar turbulento pela via aérea superior estreita. Nas crianças, a causa pode ser o crupe espasmódico, viral ou bacteriano, ou a aspiração de um corpo estranho. Nos adultos, pode dever-se à presença de um tumor, de um abscesso, de edema das vias aéreas superiores ou de uma disfunção das pregas vocais. Algumas vezes, o estridor pode ser o sintoma de uma emergência potencialmente letal. Em tais casos, pode ser necessária intubação traqueal ou traqueostomia.
7. Hemoptse Hemoptse consiste na expectoração de sangue originário do trato respiratório, como sangue isoladamente, ou
Infecções do trato respiratório: - Bronquite; - Pneumonia; - Tuberculose; - Infecção por fungo (infecção por Aspergillus, por exemplo); - Abscessos pulmonares; - Bronquiectasias; - Insuficiência cardíaca; - Estenose da válvula mitral; - Síndrome de Goodpasture ; - Outras: malformações arteriovenosas, corpo estranho nas vias aéreas, distúrbios hemorrágicos, trauma, lesão durante um procedimento médico, embolia pulmonar, tumor.
B - Diagnóstco
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PNEUMOLOGIA C - Tratamento A hemoptse leve pode não exigir tratamento ou demandar apenas o uso de an tbiótcos. Em contrapar tda, pacientes com sangramento em volume superior a 100mL em 24 horas necessitam de internação hospitalar para investgação clínica e monitorização terapêu tca. A hemorragia pode produzir coágulos que bloqueiam as vias aéreas e acarretam novos problemas respiratórios. Por essa razão, a tosse é um mecanismo e ficaz para manter as vias aéreas livres e não deve ser suprimida por medicamentos an ttussígenos (exceto quando o sangramento for excessivo). Quando obstrui um brônquio importante, um coágulo grande pode ser removido u tlizando-se um broncoscópio. Geralmente, o sangramento de vasos pequenos cessa espontaneamente. Por outro lado, o sangramento de um vaso importante normalmente requer tratamento. Uma alternatva é a embolização de artéria brônquica, viável quando se consegue localizar o local de sangramento. O sangramento causado por uma infecção ou pela insuficiência cardíaca geralmente cessa logo que a causa bás ica seja solucionada. Algumas vezes, é necessária uma broncoscopia ou uma cirurgia para remover a parte afetada do pulmão. Em situações emergenciais, a broncoscopia pode conter mecanicamente o sangramento, impedindo a inundação do pulmão contralateral, enquanto procedimento terapêutco definitvo é aguardado.
tentar aumentar a afinidade da hemoglobina por oxigênio, mas a liberação tecidual do gás é reduzida. Há redução do conteúdo de oxigênio no sangue. Níveis de até 3% de metemoglobina são considerados normais; em pacientes com a doença crônica, mesmo com níveis próximos de 50%, podem ser assintomátcos, sendo cianose a única queixa. Quando aguda, surgem dispneia, letargia, cefaleia e fadiga, ou quadros mais graves, com convulsões, choque e coma. O grande problema diagnós tco da metemoglobinemia é que a oximetria de pulso é incapaz de detectá-la, e os aparelhos de gasometria convencionais calculam a SO 2 por extrapolação, por meio das medidas diretas da PaO 2 e do pH (que não se modi ficam na metemoglobinemia). Para o diagnóstco, deve-se u tlizar a espectrofotometria, que determina as concentrações de hemoglobina, oxi-hemoglobina, metemoglobina e carboxi-hemoglobina. Pode-se inferir o diagnóstco, também, ao avaliar o sangue coletado, que geralmente é de aspecto marrom-chocolate. A doença pode ser hereditária ou estar associada à exposição a medicamentos (antmaláricos, nitratos, paracetamol, lidocaína), substâncias industriais (naaleno, nitrotolueno etc.), alimentos em conserva (por conter nitrato e nitrito de sódio), entre outros. O tratamento é feito com azul de me tleno na dose de 0,1 a 0,2mL/kg, IV, por 5 minutos.
9. Resumo Quadro-resumo
8. Cianose Cianose é a coloração azulada da pele que ocorre quando o sangue desprovido de oxigênio circula através dos vasos da pele. Entretanto, a redução do fluxo de sangue arterial para alguma região pode promover anormalidade similar – cianose periférica –, como no fenômeno de Raynaud, nas oclusões arteriais tromboembólicas ou exposição ao frio. A cianose central pode ser consequência de vários tpos de doenças pulmonares graves e de determinadas malformações vasculares e cardíacas que desviam o sangue do lado venoso para o lado arterial da circulação ( shunt direito-esquerdo). A pressão parcial de oxigênio no sangue arterial pode ser determinada pela gasometria. Algumas vezes, pode ser necessária a realização de radiogra fias, estudos do fluxo sanguíneo e provas das funções pulmonar e cardíaca, para ser determinada a causa da diminuição do oxigênio no sangue e da consequente cianose. Com frequência, o tratamento inicial insttuído é a administração de oxigênio suplementar. Uma situação interessante, que por vezes intriga o clínico, é a de paciente com cianose, mas sem hipoxemia identficada na gasometria arterial: a metemoglobinemia. O distúrbio acontece por um estado alterado da hemoglobina, com o íon ferroso tornando-se oxidado a íon férrico, que é incapaz de ligar-se a oxigênio. Assim, a curva de dissociação da hemoglobina é desviada para a esquerda, para
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- A tosse é um dos sintomas respiratórios mais comuns. O tempo de duração auxilia na definição da etologia: aguda, com menos de 3 semanas, geralmente deve-se a infecções de vias aéreas; subaguda, entre 3 e 8 semanas, associa-se ao estado pós-infeccioso; crônica, com mais de 8 semanas, tem como causas mais prováveis rinossinusite, hiper-reatvidade brônquica e refluxo gastroesofágico; - A dispneia, outro sintoma comum, pode associar-se a diferentes etologias conforme sua apresentação: aguda, na embolia pulmonar; episódica na asma; crônica na DPOC e doenças fibrosantes. A ortopneia e dispneia paroxís tca noturna são vistas na insuficiência cardíaca, sendo esta úl tma bastante especí fica; a trepopneia ocorre em derrames pleurais volumosos e a platpneia associa-se à síndrome hepatopulmonar; - Sibilância tem como diagnóstco mais comum a asma, mas outras causas como obstrução mecânica das vias aéreas e insu ficiência cardíaca devem fazer parte do diagnós tco diferencial; - A hemoptse tem as doenças de vias aéreas como a principal causa; pode ser de pequeno volume (inferior a 100mL), ou maciça e ameaçadora à vida. Pacientes jovens, com hemop tse discreta e radiografia normal podem receber antmicrobianos empiricamente; outros pacientes podem ter evolução mais grave, necessitando de intubação e de procedimento cirúrgico emergencial.
CAPÍTULO
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Fisiologia respiratória e provas de função pulmonar Rodrigo Antônio Brandão Neto / José Alberto Neder / Fabrício Mar tn s Valois
1. Introdução Os testes de função pulmonar são instrumentos propedêutcos auxiliares no diagnós tco sindrômico de diversas condições que podem comprometer o desempenho funcional das vias aéreas, do parênquima pulmonar e da caixa torácica. O impacto real de uma doença respiratória também pode ser obje tvamente quantficado por um teste fisiológico; isso pode ser ú tl em diferentes circunstâncias, como na avaliação pré-operatória, na análise prognóstca e na seleção de pacientes para intervenções especí ficas. Com a realização de exames seriados, pode-se, ainda, observar a progressão do agravo funcional, além da eventual resposta ao tratamento insttuído. No campo ocupacional, a quantficação da perda funcional é um aspecto importante para o estabelecimento do grau de provável incapacidade (Tabela 1). Tabela 1 - Principais indicações clínicas dos testes de função pulmonar - Auxiliar no diagnóstco diferencial; - Avaliar o impacto da doença pulmonar; - Determinar a progressão da doença pulmonar; - Investgar o efeito do tratamento; - Quantficar o grau de disfunção e incapacidade.
2. Espirometria A - Definições Espirometria é um método que mede os volumes e capacidades pulmonares, exceção feita ao volume residual e à capacidade pulmonar total, que só podem ser mensuradas por meio de ple tsmografia (método mais acurado), método de diluição de hélio e método de lavagem de nitrogênio. A espirometria pode ser realizada durante a respiração lenta ou com manobras forçadas.
Deve ser incluída na avaliação de doentes com sintomas respiratórios e auxilia na prevenção, no diagnós tco, na quantficação e no tratamento das doenças pulmonares. Quatro princípios são importantes na avaliação de uma espirometria: - Equipamento: exato, preciso, validado e calibrado; - Curvas obtdas: aceitáveis e reprodu veis; - Valores de referência: devem ser ob tdos da população local (no caso, do Brasil); - Interpretação: à luz do quadro clínico.
B - Princípios fisiológicos A principal manobra espirométrica é a expiração forçada, que desencadeia um aumento pronunciado das pressões alveolares – que tendem a expulsar o ar – e da pressão pleural que, envolvendo as vias aéreas, tende a fechá-las. Os 2 processos pratcamente se cancelam num determinado segmento das vias aéreas (ponto de igual pressão): assim, a pressão que sobra para eliminar o ar é a de recuo elás tco dos pulmões (Figura 1). A consequência lógica é que, nessa circunstância, tem-se o fluxo máximo possível para um determinado volume pulmonar. Na verdade, ao tentar forçar mais ar para fora, aumentando a pressão pleural, o efeito pode ser contraproducente, isto é, haverá somente mais compressão das vias aéreas e menor fluxo. Obviamente, quanto mais compressível as vias aéreas (por exemplo, na DPOC), maior esse efeito. De fato, em tais pacientes, pode ocorrer substancial aprisionamento de ar nas pequenas vias aéreas, e nem todo ar inspirado consegue ser expirado. Logo, na expiração forçada, a taxa de fluxo aéreo é constante num dado volume pulmonar, o que torna os parâmetros espirométricos reprodu veis e analisáveis. Em contraste, na manobra expiratória lenta não há compressão das vias aéreas, e os fluxos são altamente variáveis. Em compensação, todo ar previamente inspirado consegue ser exalado, fornecendo valores mais acurados de Capacidade Vital (CV) e suas subdivisões.
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PNEUMOLOGIA CVF (Capacidade Vital Forçada): volume máximo de ar exalado com esforço máximo, com início ao final de uma inspiração forçada máxima; - VEF1 (Volume Expiratório Forçado no 1º segundo): volume de ar exalado no 1º segundo durante a manobra de CVF; - VEF1/CVF: Razão entre o volume expiratório forçado no 1º segundo e a capacidade vital forçada; - PFE (Pico de Fluxo Expiratório): representa o fluxo máximo de ar durante a manobra de capacidade vital forçada (também denominada de fluxo expiratório forçado máximo – FEF máx); - Fluxo: expresso em L/min, representando a taxa de variação de um volume; (Fluxo Expiratório Forçado médio) – 25 a - FEF 25 a 75% 75%: fluxo expiratório forçado médio de um determinado período, ob tdo durante a capacidade vital forçada; - TEF (Tempo Expiratório Forçado): mede, em segundos, o tempo do início ao fim da capacidade vital forçada. -
Figura 1 - No fi nal da inspiração (A), a Pressão Alveolar (PA) está em equilíbrio com a pressão de abertura das vias aéreas (boca), portanto não há fl uxo de ar. Numa expiração tranquila (B), a Pressão dentro das Vias Aéreas (PVA) é sempre maior do que a pressão circunjacente (pressão pleural ou Ppl), e o fl uxo de ar é con nuo. Na expiração forçada (Ppl elevada), como realizada na espirometria, a pressão de expulsão do ar (PA) está aumentada, mas, em algum ponto das vias aéreas (ponto de igual pressão ou PIP), a pressão circunjacente (Ppl) será igual ou mesmo maior do que a PVA (PIP), limitando, assim, o fl uxo para aquele volume pulmonar. Assim, a expiração forçada permite a obtenção de valores reprodu veis e con fi áveis dos fl uxos e volumes pulmonares
C - Siglas e definições A nomenclatura usada de acordo com a Sociedade Brasileira de Pneumologia é descrita a seguir (Figura 2):
Figura 2 - Volumes e capacidades pulmonares
VR (Volume Residual): volume de ar que permanece nos pulmões após uma expiração máxima; - CPT (Capacidade Pulmonar Total): volume de ar que permanece nos pulmões ao final de uma inspiração máxima; - CRF (Capacidade Residual Funcional): volume de ar que permanece nos pulmões ao final de uma expiração usual, em volume corrente (volume de reserva expiratório + volume residual); - CV (Capacidade Vital): representa o maior volume de ar mobilizado, medido tanto na inspiração quanto na expiração; -
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D - Dados da espirometria A espirometria permite medir o volume de ar inspirado, o volume expirado e os fluxos respiratórios. Quando se realiza uma inspiração forçada máxima, a quantdade de ar nos pulmões após a manobra é a CPT. Por outro lado, mesmo que haja esforço máximo para expiração, o pulmão não se esvazia, e essa quan tdade de ar que permanece no pulmão após uma expiração máxima é denominada de Volume Residual (VR). A diferença entre a CPT e o VR é denominada de CVF. Pela espirometria, não se conseguem medir nem um nem outro. O VEF1 é uma das medidas mais úteis na prá tca clínica porque é razoavelmente esforço-independente e depende da permeabilidade das vias aéreas e de uma boa retração elástca pulmonar. Os resultados espirométricos devem ser expressos em gráficos de fluxo-volume (Figura 3) e volume-tempo (Figura 4). A curva fluxo-volume mostra que o fluxo é máximo logo ao início da expiração, próximo à CPT, havendo uma queda lenta posteriormente. É importante observar a curva fluxo-volume, pois um esforço respiratório submáximo pode ser evidente nessa curva, o que não ocorre na curva volume-tempo; nesse caso, o paciente deve ser treinado para poder realizar um esforço apropriado, de forma a obter uma curva fiel à sua função respiratória. A CVF é o teste de função pulmonar mais importante, pois, em um dado indivíduo, durante a expiração, existe um limite para o fluxo máximo que pode ser a tngido em qualquer volume pulmonar. Além disso, a CVF é afetada na maioria das doenças pulmonares.
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Deslocamento do parênquima pulmonar: tumores, derrame pleural. Alguns estudos demonstraram, também, o efeito de líquido ascí tco em restrição pulmonar; - Parênquima removido: ressecção pulmonar; - Parede torácica ou músculos: miastenia gravis, cifoescoliose etc.; - Outras: obesidade. -
Figura 3 - Curva fl uxo-volume
Figura 4 - Curva volume-tempo
E - Interpretação dos resultados a) Distúrbio Ven tlatório Restritvo (DVR) A restrição pulmonar é de finida por redução da CPT. Ora, como a espirometria não a mede, não é possível confirmar a presença de tal distúrbio com esse exame (é necessária, por exemplo, a ple tsmografia). Entretanto, com base em dados clínicos suges tvos e alterações especí ficas no exame, é aceitável fornecer o diagnós tco de restrição de forma presuntva. A restrição pulmonar pode ser consequência de várias doenças, afetando a expansibilidade pulmonar ou da caixa torácica. Logo, a entrada e a saída do ar não estão comprometdas (de fato, podem estar até aumentadas): o problema básico é a di ficuldade de distender os tecidos toracopulmonares (enrijecimento pulmonar e/ou torácico). Alguns exemplos são: - Alteração estrutural do parênquima (mais frequente): fibrose pulmonar ou in filtração parenquimatosa (silicose, asbestose, fibrose pulmonar idiopá tca, fibrose associada a doenças autoimunes etc.);
Deve-se suspeitar do padrão restri tvo na espirometria nos casos em que há a redução da CVF (principalmente se inferior a 50% do previsto), com redução proporcional do VEF1, o que faz que a relação VEF1/CVF permaneça normal ou eventualmente se eleve. Se a CVF es tver dentro da normalidade, pode-se deduzir que a CPT também estará, o que exclui restrição. Assim, vale o seguinte conceito: restrição somente se manifesta na espirometria com CVF abaixo do limite inferior esperado para o indivíduo. Em distúrbios restri tvos moderados a graves, a CVF inteira pode ser expirada no 1º segundo, tornando similar o VEF1 e a CVF, ou seja, a relação VEF1/CVF é de 1 ou 100%. Na fibrose idiopátca, a tração dos tecidos pode aumentar a elastância dos pulmões, reduzindo a resistência ao fluxo aéreo e implicando valores supranormais de VEF1 ou de FEF25 a 75%. Nessa situação, o valor do FEF 25 a 75%/CVF pode ser maior que 150%. b) Distúrbio Ven tlatório Obstrutvo (DVO) Um distúrbio obstrutvo é identficado sempre que há limitação ao fluxo de ar, inspiratório ou expiratório. A obstrução de grandes vias aéreas se deve à redução do calibre das vias aéreas superiores (acima das pregas vocais), traqueia e brônquios principais. Esse sistema tubular é formado por suporte car tlaginoso, sendo o fluxo aéreo turbulento. Dois fatores afetam o fluxo em grandes vias aéreas: a permeabilidade e a pressão desenvolvida pela musculatura expiratória. Alguns exemplos são disfunção de prega vocal, estenose de traqueia, traqueomalácia, tumores ou corpo estranho. A obstrução de pequenas vias aéreas refere-se à obstrução em condutos de menos de 2mm de diâmetro. Devese lembrar que essas vias não têm suporte car tlaginoso. Sobretudo, tais condutos são formados por musculatura lisa e pelo parênquima subjacente (que fornece um componente estrutural). O fluxo aéreo nesse segmento é laminar e depende do calibre das vias aéreas e da pressão de retração elástca do próprio pulmão. Devido à grande área de secção transversal das pequenas vias aéreas, mudanças patológicas significatvas podem ocorrer antes que haja limitação ao fluxo aéreo. São exemplos asma, DPOC, bronquiectasias, bronquiolites etc. Indivíduos normais expiram cerca de 80% da CVF no 1º segundo; aqueles com obstrução expiram bem menos que isso. Assim, os distúrbios obstrutvos são caracterizados pela redução da relação VEF1/CVF. Podem-se u tlizar tanto o valor percentual esperado para a idade quanto o valor absoluto da relação, considerado anormal quando inferior a 0,75 (Figura 5).
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PNEUMOLOGIA Outras medidas espirométricas só devem ser avaliadas após ser definida a gravidade do distúrbio obstru tvo com o VEF1 e CVF. Por outro lado, fluxos tele-expiratórios não são recomendados na interpretação de doentes com obstrução.
O ideal é que pacientes com VEF1 e VEF1/CVF baixos, mas também apresentando CVF reduzida após o broncodilatador, sejam submetdos à medida direta da CPT (Figura 7). Diante de um distúrbio obstru tvo com redução de CVF, na impossibilidade de realizar a medida da CPT, recomenda-se a seguinte medida: - Subtrair o valor da CVF do VEF1: CVF = 59% e VEF1 = 26%; diferença de 59 - 26 = 33; -
Diferença >25%: distúrbio obstrutvo;
-
Diferença de 12 a 25%: distúrbio obstru tvo com CVF reduzida;
-
Diferença <12%: distúrbio restritvo e obstru tvo (misto ou combinado).
São exemplos de doenças que podem causar obstrução e restrição concomitantes: sarcoidose, tuberculose, bronquiectasias, insuficiência cardíaca conges tva, silicose, granuloma eosinof lico, linfangioleiomiomatose etc. Tabela 2 - Interpretação de distúrbio obstrut vo com redução de CVF Diferença de porcentagem encontrada >25% Figura 5 - Comparação entre os diferentes t pos de distúrbios
c) Distúrbio ven tlatório misto ou combinado (DVC) Em geral, o diagnós tco de doença obstru tva é facilmente realizado quando há redução do VEF1 e VEF1/CVF, com CVF normal. Entretanto, podem-se ter dúvidas quando há redução associada da CVF antes e depois da broncodilatação. Nesses casos, a CVF pode estar reduzida por restrição associada (DVC) ou, simplesmente, porque a obstrução é tão importante que aumenta o VR mais do que a CPT. Assim, a diferença entre a CPT e o VR (isto é, a CVF), fica menor (Figura 6). Obviamente, em qualquer momento (antes e depois do broncodilatador), uma CVF normal afasta distúrbio restritvo.
12 a 25% <12%
Distúrbio Obstrutvo Obstru tvo com CVF reduzida Restritvo e obstrutvo (misto ou combinado)
d) Distúrbio ven tlatório inespecí fico Tradicionalmente, os distúrbios ventlatórios têm sido classificados como obstrutvos, restritvos ou combinados (mistos). Denomina-se Distúrbio Ven tlatório Inespecí fico (DVI) quando há impossibilidade de a espirometria determinar o distúrbio ventlatório em questão. Ocorre quando há redução leve a moderada da CVF (acima de 50% do previsto), com relação VEF1/CVF normal. Tal fenômeno ocorre porque diversos fatores podem reduzir a CVF, incluindo obstrução (Figura 7). Obviamente, se for possível medir a CPT diretamente, o diagnóstco correto será de finido. Entretanto, quando não se tem essa medida, diante de uma CVF reduzida que lembra restrição, o laudo da espirometria deve ser de DVI na presença de todos os achados a seguir: - Ausência de indícios de doença inters tcial ou suspeita clínica de doença obstru tva; - CVF >50% do previsto; - CVF após broncodilatador ainda persiste baixa (se normaliza, indica doença obstru tva); - FEF /CVF não muito elevada (<150%); 25 a 75% - Teste de difusão normal (difusão reduzida indica doença interstcial).
F - Resposta a broncodilatadores Figura 6 - Diferentes mecanismos de redução da Capacidade Vital (CV)
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A resposta a broncodilatadores é avaliada por meio da variação (pré e pós) do VEF1 e, secundariamente, dos vo-
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lumes pulmonares como CVF, CV e Capacidade Inspiratória (CI). É importante salientar que a ausência de resposta ao broncodilatador não elimina a possibilidade de resposta terapêutca ao uso contnuado da droga. Para o teste, em geral, são fornecidos 400mcg de fenoterol ou salbutamol com espaçador, e a espirometria é repetda após 15 a 20 minutos. Os critérios de resposta são baseados em 2 pontos: indivíduos normais podem ter algum grau de broncodilatação com o uso de broncodilatadores; indivíduos normais podem apresentar mudança do tônus broncomotor mesmo na ausência de uso de medicamentos. As diretrizes nacionais recomendam considerar, como resposta significatva ao broncodilatador, a melhora do VEF1 em 200mL ou de 7% em relação ao valor previsto. Há certa confusão com o recomendado por algumas diretrizes internacionais, que recomendam u tlizar o valor de 10% em relação ao valor basal, e não ao predito (um parâmetro com pouca aceitação hoje em dia por desconsiderar a importância da variação de acordo com a antropometria do paciente). Geralmente, a resposta a um dos critérios preenche os demais; dificilmente há discordância. Veja os exemplos a seguir: - Variação expressa como a diferença absoluta entre VEF1 pré e pós-BD – resposta posi tva se superior a 200mL: Exemplo: 500 - 250 = 250mL (0,25L). - Variação expressa como a variação absoluta do VEF1 em relação ao valor previsto: (VEF1 pós-BD - VEF1 pré-BD) x 100/VEF1 previsto
Exemplo: (500 - 250) x 100 / 300 = 8% (resposta posi tva acima de 7%). - Variação expressa como porcentagem do valor basal – como sugerido por algumas diretrizes internacionais:
(VEF1 pós-BD - VEF1 pré-BD / VEF1 pré-BD) x 100
Exemplo: VEF1 passou de 400 para 500mL. A variação foi de (500 - 400 / 400) x 100, ou seja, 25%. Além disso, variações da CVF também podem indicar resposta ao broncodilatador: variações superiores a 350mL são significatvas. Não é fundamental que exista um distúrbio obstru tvo (relação VEF1/CVF reduzida) para que se caracterize resposta a broncodilatador: se houver melhora de 10% ou mais do VEF1 em relação ao previsto, ela estará caracterizada, descrita no laudo do exame como espirometria normal com aumento do tônus broncomotor.
G - Classificação de gravidade pelas alterações espirométricas A classificação quanto à gravidade dos distúrbios, tendo em vista o parâmetro espirométrico, está evidenciada na Tabela 3. Tabela 3 - Quant fi cação dos distúrbios vent latórios pela espirometria Distúrbio Leve Moderado Grave
VEF1 (%)
CV(F) (%)
VEF1 /CV (F) (%)
60-LI
60-LI
60-LI
41 a 59
51 a 59
41 a 59
≤40
≤50
≤40
Na presença de FEF25 a 75/CV(F) isoladamente reduzida, o distúrbio é classi fi cado como leve, na presença de sintomas e/ou tabagismo. Observação: a graduação do DVO deve ser feita pelo VEF1 e do DVR pelo CVF.
H - Resumo
Figura 7 - Interpretação geral da espirometria
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PNEUMOLOGIA I - Teste de broncoprovocação Este teste envolve a repe tção seriada das manobras espirométricas forçadas após a inalação de doses progressivamente mais concentradas de substâncias sabidamente broncoconstritoras (histamina, metacolina ou carbacol). A principal variável é a PD20, ou seja, a menor concentração da substância capaz de promover um descenso do VEF1 igual ou superior a 20% em relação ao valor basal. O teste tem maior utlidade em casos suspeitos de asma sem comprovação pela espirometria. Deve-se observar, entretanto, que diversas condições podem tornar posi tvos os testes de broncoprovocação, como rinite, chiado torácico ocasional, infecção recente de vias aéreas superiores, teste cutâneo alérgico recente, tabagismo e DPOC. Os testes de broncoprovocação não permitem uma separação segura de DPOC e asma, notadamente naqueles com espirometria basal já indicando DVO. É um exame de uso ro tneiro incomum, por ser de realização demorada, pela di ficuldade em conseguir a substância broncoconstritora, e por não ser isento de reações adversas.
3. Gasometria arterial A mensuração das tensões gasosas arteriais é o teste respiratório por excelência, já que a manutenção da homeostase gasométrica e ácido-básica é a principal função pulmonar.
A - Variáveis de interesse prátco Podem ser separadas em: - Variáveis que re fletem o nível de oxigenação arterial: PaO2 (pressão parcial de O 2 no sangue arterial), SatO 2 (saturação arterial da oxi-hemoglobina) e P(Aa)O 2 (diferença alveoloarterial das pressões parciais de O 2); - Variáveis relacionadas primariamente ao CO : PaCO , pH 2 2 (potencial hidrogeniônico) e HCO 3- (íon bicarbonato). a) PaO2 É a pressão de oxigênio dissolvido no sangue. A hipoxemia pode ocorrer mesmo com uma PO 2 normal ou elevada: por definição, é a redução do conteúdo de O 2 no sangue, que depende, basicamente, do quanto de O 2 está ligado à hemoglobina, ou seja: CaO2 = (1,34 x Hb x SaO 2) + (PaO2 x 0,0031)
Em um indivíduo jovem e sadio, a PaO 2 deve estar entre 80 e 100mmHg, embora a hiperventlação aguda possa elevá-la até 120mmHg. A PaO 2 declina com a idade e com o excesso de peso para a altura (IMC = Índice de Massa Corpórea – peso/altura2, em kg/m2). PaO2 = 143,6 - (0,39 x idade) - (0,56 x IMC) - 0,57 x PaCO 2
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Sendo o limite inferior do intervalo de con fiança o valor calculado subtraído de 12mmHg (considerar 75 anos como limite, utlizando esse valor para indivíduos mais idosos). b) PaCO2 O CO2 tem difusibilidade melhor que o oxigênio. Disto resulta que sua eliminação é menos afetada nos distúrbios de unidade alveolocapilar. De fato, os níveis de CO 2 dependem fundamentalmente da ven tlação alveolar, de forma que quanto maior a ven tlação, menores serão os níveis de CO2; do contrário, se houver hipoven tlação, os níveis de CO2 ficarão elevados. As anormalidades da unidade alvéolo-capilar apenas promovem elevação de PCO 2 em fases avançadas da lesão. CO2 + H2O ↔ H2CO3 ↔ H+ + HCO3
c) pH É o potencial hidrogeniônico, ou seja, quanto menor o pH de uma solução, mais íons H + existrão e maior será o potencial dessa solução em fornecer H + (normal: 7,35 a 7,45). d) SatO2 Mais de 98,5% do O 2 são carreados pela hemoglobina; logo, a SatO2 é extremamente importante para a oferta periférica de O 2. O aspecto sigmoide da curva de dissociação da oxi-hemoglobina determina que variações da PaO 2 acima de 60mmHg levam a mudanças apenas discretas na SatO2 (SatO2 = 90%); em contrapar tda, pequenas mudanças da PaO2 abaixo de 60mmHg determinam grandes variações na SatO2. Entretanto, deslocamentos para a direita (menor afinidade da Hb pelo O 2, com aumento da pressão necessária para saturar em 50% a hemoglobina – P 50) ou para a esquerda (maior a finidade, ou seja, P 50 <27mmHg) também influenciam o valor final da SatO2 (Tabela 3). Tabela 4 - Fatores que interferem na curva de dissociação da hemoglobina Desviam a curva de dissociação da hemoglobina para direita - Hipertermia; - Acidose; - Hipercapnia; - Aumento do 2,3-difosfoglicerato; - Policitemia. Desviam a curva de dissociação da hemoglobina para esquerda - Hipotermia; - Alcalose; - Hipocapnia; - Redução do 2,3-difosfoglicerato; - Anemia.
B - Bases para a interpretação da gasometria a) PaO2 A redução da PaO 2 pode dever-se à baixa FiO 2 (respiração hipóxica) ou baixa pressão atmosférica e, consequen-
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temente, PiO2 reduzida (al ttude), hipoventlação, desequilíbrio difusivo, distúrbios V/Q e shunt . O cálculo da D(Aa) O2 permite a exclusão de hipoven tlação como causa de hipoxemia, e a respiração de O 2 a 100% ajuda na iden tficação de shunt ; contudo, a separação entre fatores difusivos e distributvos V/Q pode necessitar de testes mais complexos. b) D(A-a)O2 O cálculo da diferença alveoloarterial de O 2 fornece uma indicação mais precisa da homeostase da troca gasosa intrapulmonar do que a simples análise da PaO2. D(A-a)O2 = [(Patm - PH 2O) x FiO2] - [PaO2 + (PaCO2 / R)] / PaO2, ou, de forma simplificada: D(A-a)O2 = 135 - (PaO 2 + PCO2) Em que Patm = pressão atmosférica; PH 2O = pressão de vapor d’água (47mmHg); R = VCO2 / VO2 (0,8).
Em condições ideais, essa diferença deveria ser de, no máximo, 5mmHg, já que os valores capilares finais são bastante semelhantes aos valores alveolares médios. Entretanto, como habitualmente se es tma o valor de pressão alveolar de oxigênio, toleram-se valores até 15mmHg como normais (em indivíduos idosos, até 25mmHg), sempre em ar ambiente, com FiO 2 de 0,21 (os valores normais para outras concentrações de oxigênio são desconhecidos). Na insuficiência respiratória, os distúrbios de difusão (edema pulmonar) e os de ven tlação-perfusão (shunt , efeito shunt e efeito espaço morto) geralmente se apresentam com aumento da diferença alveolocapilar. Por outro lado, a hipoventlação per se não afeta a D(A-a)O 2. Uma importante limitação da D(A-a)O 2 é a de que esta aumenta de forma variável com a elevação da FIO 2. c) PaCO2 A causa mais comum de hipercapnia (PaCO 2 >45mmHg – acidose respiratória) é a hipoven tlação alveolar, por redução da ventlação total ou por aumento pronunciado do espaço-morto. Hipercapnia quase sempre se associa à hipóxia alveolar, já que o O 2 terá menos espaço no alvéolo. Hipocapnia (PaCO2 <35mmHg – alcalose respiratória) é quase sinônimo de hiperven tlação alveolar. Portanto, a PaCO2 é relatvamente insensível à doença pulmonar leve/moderada: variações compensatórias da ven tlação, se possíveis, compensam rapidamente as mudanças na PaCO2. d) pH A acidose caracteriza-se pelo excesso de H + [pH <7,36 ou (H+) >44ηmol/L], e a alcalose, pela depleção dos mesmos [pH >7,44 ou (H +) <36ηmol/L]. As 2 principais variáveis que afetam o pH são: pH= K[HCO3] / αPCO2
Em que K é a constante de dissociação e α (alfa), o coeficiente de solubilidade do CO 2. Logo, quanto mais CO 2 (controle respiratório) e menos HCO 3- (controle metabólico) existrem em uma dada solução, mais acidó tca ela será.
C - Testes relacionados A oximetria de pulso separa a oxi-hemoglobina da hemoglobina reduzida pelas suas diferenças de absorção dos raios vermelho e quasi -infravermelho. Valores elevados de carboxi-hemoglobina (HbCO >3%) e meta-hemoglobina (HbMet >5%) podem invalidar as medidas de saturação pela oximetria (SpO 2). A SatO 2, na gasometria arterial, é estmada a partr da PaO2 e do pH, assumindo uma reação normal entre O 2 e Hb. Entretanto, se a Hb está ocupada pelo monóxido de carbono, por exemplo, a PaO 2 está pouco alterada e a SatO2 é grosseiramente superestmada pela gasometria convencional. Nesse caso, somente a medida direta da SatO2 por espectrofotometria (co-oxímetro) revelará o distúrbio, já que a oximetria de pulso não difere HbO 2 de HbCO. Uma situação semelhante ocorre na meta-hemoglobinemia, em que o oxímetro tende a ler valores fixos de SpO2 de, aproximadamente, 85%. A estmatva do shunt pode ser realizada pela respiração de O2 a 100% por 10 a 15 minutos: tal procedimento elimina todo o N2 alveolar, tornando sabida a pressão alveolar de O2: PAO2 = Pb - PH 2O - PACO2 (±700mmHg ao nível do mar)
Deve-se lembrar, entretanto, que essa equação simplificada somente é válida quando a Hb se acha quase totalmente saturada (PaO2 >150mmHg). Como áreas de shunt , por definição, não têm acesso a esse O2 alveolar aumentado (mas sim algumas áreas de baixo V/Q), o valor esperado de PaO2, para uma dada PAO2, diminui proporcionalmente a magnitude do shunt (5% shunt para cada 100mmHg de redução da PaO2 abaixo de 700mmHg). Logo, pode-se diferenciar shunt de efeito shunt .
4. Outros testes de função pulmonar a) Medida dos volumes pulmonares está tcos Os volumes estátcos, ou absolutos, representam os diferentes compartmentos volumétricos pulmonares. São estabelecidos por manobras que prescindem das condições vigentes do fluxo aéreo. Alguns volumes e capacidades podem ser obtdos pela espirometria, principalmente a partr das manobras lentas: Volume Corrente (VC), Volume de Reserva Inspiratório (VRI), Volume de Reserva Expiratório (VRE), CV e CI. Entretanto, o VR e, portanto, a CRF e a CPT não podem ser determinadas por manobras diretas. Existem, basicamente, 3 tpos de exames: testes que exploram as relações inversas entre volume e pressão (pletsmografia corporal); testes que es tmam o volume de ar intratorácico a par tr da diluição de gases inertes (isto é, gases que não são absorvidos nem produzidos pelo organismo); técnicas radiográ ficas. A maior vantagem da pletsmogra fia corporal é que todo o ar intratorácico é realmente medido.
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Indicações: Para a identficação correta de componente ven tlatório restritvo: como visto, (I) no DVO pela espirometria, a CVF pode estar reduzida devido ao aumento do VR frente a uma CPT inalterada, e (II) o que realmente de fine o DVC é a presença de DVO com CPT diminuída ou normal, ou seja, pouco elevada para o grau de obstrução observada; Para o clareamento diagnóstco dos casos de DVI; No diagnóstco da hiperinsu flação e aprisionamento aéreo; No seguimento longitudinal das doenças pulmonares parenquimatosas, especialmente as doenças fibrosantes; Como auxiliar na determinação da resposta a intervenções terapêutcas clínicas (broncodilatadores, por exemplo) ou cirúrgicas (cirurgia redutora de volume pulmonar, bulectomia); Na avaliação da disfunção e incapacidade.
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Interpretação: Hiperinsuflação: caracterizada por CPT >120% do previsto, geralmente com aumento concomitante da CRF (>130%), do VR (>140%) e das relações CRF/ CPT (>0,55) e VR/CPT (>0,4); Alçaponamento aéreo: caracterizado por VR >140% do previsto e relação VR/CPT >0,4, na presença de DVO; Restrição: caracterizada por CPT <80% do previsto, geralmente com CRF e VR menos reduzidos ou até próximos da normalidade (de 70 a 130% e de 60 a 140%, respectvamente), isto é, as relações CRF/CPT e VR/CPT podem até aumentar no DVR.
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b) Medida da capacidade de difusão pulmonar O teste da capacidade de difusão pulmonar u tliza um gás que tem a finidade alta pela hemoglobina, o monóxido de carbono (CO). Esse gás, quando inalado, tem sua transferência para o capilar pulmonar dependente, basicamente, da difusão pela parede alveolar, inters cio e endotélio vascular. O teste consiste na inalação de quan tdade conhecida do gás e na estmatva do volume que foi absorvido pelos pulmões. Alterações ven tlatórias, hemodinâmicas, das relações ventlação/perfusão e hematológicas podem afetar as medidas de capacidade de difusão pulmonar (DCO). Como diversos fatores podem afetar a DCO, esta, embora seja bastante inespecí fica, é partcularmente sensível ao acometmento, mesmo inicial, da área funcional de troca gasosa pulmonar. A hipoventlação, em contrapartda, como não interfere na difusão dos gases diretamente, pois a membrana alveolocapilar está íntegra, habitualmente não interfere no resultado do teste.
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Interpretação: Redução da DCO: DCO reduzida (leve = de 61 a 75% do previsto, moderada = de 41 a 60%, acentuada = <40%) deve ser analisada em conjunto com os dados clínicos e funcionais associados, especialmente espirométricos; Elevação da DCO: pode ocorrer nas seguintes circunstâncias: obesidade acentuada, asma, policitemia, hemorragia pulmonar recente, shunt esquerdo-direito, ICC leve, exercício ou erro técnico. •
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Indicações: A DCO tem papel importante no diagnós tco precoce e na avaliação da gravidade, prognós tco e resposta terapêutca das doenças interstciais pulmonares; Na avaliação pré-operatória, a DCO, junto com a espirometria, é o teste de repouso com maior poder preditvo para complicações; Em determinadas circunstâncias clínicas, a redução da DCO pode ser importante para a separação entre enfisema pulmonar e asma brônquica persistente com obstrução fixa; Avaliação da disfunção e incapacidade.
c) Mensuração das pressões respiratórias está tcas máximas A redução da força muscular respiratória (pressão máxima gerada na inspiração ou PI máx e na expiração, PE máx) pode ter importantes consequências clínicas, especialmente no desencadeamento de dispneia, e como fenômeno precoce na falência ventlatória hipercápnica. Na prá tca, determina-se a PImáx no nível do VR e a PE máx no nível da CPT. -
Indicações: Na suspeita de fraqueza muscular ven tlatória, especialmente para o diagnós tco diferencial da dispneia de origem incerta; Na avaliação longitudinal ou pós-intervenções terapêutcas ou reabilitadoras em pacientes com doença toracopulmonar ou sistêmica que curse com fraqueza muscular respiratória; Na avaliação pré-operatória de pacientes de risco para complicações pulmonares. •
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Interpretação: A interpretação de valores muito baixos pode ser problemátca, especialmente se não se sabem a CPT ou o VR. Em caso posi tvo, deve-se sempre tentar corrigir para o volume pulmonar. Há queda par tcularmente pronunciada da PI máx e da PEmáx quando a manobra se inicia em valores >70% e <40% da CPT, respectvamente. As manobras dependem crucialmente da cooperação: idosos, pacientes com fraqueza ou paralisia da face ou debilidade muscular •
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dos membros superiores podem ter grande di ficuldade na realização de manobras reprodu veis. d) Teste de exercício cardiopulmonar Também denominado ergoespirometria, adiciona, ao ECG e ao registro da frequência cardíaca, a mensuração do consumo de oxigênio, produção de gás carbônico e pressões expiratórias de oxigênio e CO 2. Tais parâmetros permitem o cálculo de variáveis metabólicas, ventlatórias e cardiovasculares. - Indicações: É indicado como direcionador precoce da linha de investgação da dispneia de origem indeterminada. O teste deve ser a alterna tva imediatamente posterior à avaliação clínica, radiográ fica, espirométrica (incluindo broncoprovocação) e eletrocardiográ fica de repouso. É ú tl para diferenciar dispneia de origem cardiovascular de pulmonar, iden tficar componente circulatório insuspeito, e apontar componente psicogênico ou comportamental; Em qualquer paciente com doença cardiopulmonar com queixas de intolerância ao exercício em que a avaliação de repouso é inconclusiva ou há discordância entre os sintomas e os testes de repouso, incluindo as alterações radiológicas; Para a determinação do fator preponderante de dispneia em um paciente com múl tplas causas possíveis; Na avaliação pré-operatória de pacientes com risco funcional moderado a elevado (por exemplo, VEF1 e/ou DLCO <60% do previsto); Na avaliação prognóstca da ICC e indicação de transplante cardíaco, pulmonar ou cardiopulmonar; Na prescrição de treinamento f sico ou reabilitação; Na avaliação do grau de disfunção e incapacidade. •
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- A espirometria avalia resposta a broncodilatadores. A resposta será dita significatva se houver: · Variação do VEF1 superior a 200mL, ou 7% em relação ao previsto (algumas diretrizes consideram variação superior de 10% em relação ao basal como relevante); · Variação da CVF superior a 350mL. - Os métodos capazes de medir o VR e a CPT são ple tsmografia (mais acurado), lavagem de nitrogênio e diluição de hélio; - A gasometria arterial, nas doenças respiratórias, é um parâmetro fundamental para avaliação das trocas gasosas. Hipoxemia é de finida como pO2 inferior a 60mmHg, já que abaixo desse valor o decréscimo na saturação de oxigênio é relevante; - Alguns fatores podem deslocar a curva de dissociação da hemoglobina: para a direita (hipertermia, hipercapnia, acidose, aumento de 2,3 difosfoglicerato, policitemia) e para a esquerda (hipotermia, hipocapnia, alcalose, redução de 2,3 difosfoglicerato, anemia); - É importante mensurar a diferença alveoloarterial de oxigênio, que pode se alterar antes da presença de hipoxemia propriamente dita, e para avaliar a eventual presença de hipoven tlação (hipoxemia, com hipercapnia e D(A-a)O2 normal). A fórmula simplificada é: D(A-a)O2 = 135 - (PaO 2 + PCO2); considera-se normal até 15mmHg; - A capacidade de difusão de CO avalia a integridade da membrana alveolocapilar, consttuindo um método de excelência na avaliação de trocas gasosas; paradoxalmente, pode estar aumentado em algumas situações patológicas: hemorragia alveolar (o CO2 é captado pelo sangue dentro do alvéolo) e asma (a inflamação aumenta o fluxo sanguíneo local).
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5. Resumo Quadro-resumo - Os testes de função pulmonar são úteis para diagnós tco, avaliação de gravidade e seguimento terapêu tco; - A espirometria mede volumes e capacidades pulmonares, exceção feita ao VR e à CPT. Pode iden tficar os seguintes distúrbios: · Distúrbio ventlatório obstrutvo: caracterizado por VEF1/ CVF reduzido, com graus variados de redução do VEF1 e da CVF; · Distúrbio ventlatório restritvo: não é diagnóstco definitvo, já que a espirometria não mede a CPT, que é a única forma de determinar tal distúrbio. Pela espirometria, o diagnóstco será presuntvo se houver redução da CVF (principalmente se inferior a 50%), com VEF1/CVF normal, associado a quadro clínico sugestvo; não existe restrição com CVF normal; · Distúrbio misto: ocorre com VEF1/CVF reduzido e redução proporcional do VEF1 com a CVF, veri ficando-se diferença dos valores preditos entre estes inferior a 12%; · Distúrbio inespecí fico: ocorre quando a espirometria não é capaz de determinar a presença dos outros distúrbios. Ocorre com CVF reduzida (mas acima de 50%), com VEF1/CVF normal ou elevada, sem es tgmas clínicos de doença restri tva.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA
CAPÍTULO
4
Asma Rodrigo Antônio Brandão Neto / José Alberto Neder / Fabrício Mar tn s Valois
1. Introdução e definições A asma é uma doença in flamatória crônica das vias aéreas, caracterizada por hiper-responsividade das vias aéreas e limitação variável ao fluxo de ar, manifestando-se por sintomas como dispneia, tosse, chiado no peito e opressão torácica, que podem ser reversíveis espontaneamente ou com uso de medicamentos. A asma é uma das principais causas de morbidade crônica e de mortalidade em todo o mundo. A Inicia tva Global para a Asma (GINA) foi criada com a finalidade de aumentar o conhecimento sobre a doença entre pro fissionais de saúde, autoridades da Saúde Pública e público em geral, e melhorar sua prevenção e tratamento por meio de esforço coordenado em todo o mundo. A GINA prepara relatórios cien ficos sobre a doença, encoraja a disseminação e a adoção desses relatórios, além de promover a colaboração internacional na pesquisa em asma. Tanto a incidência como a sua mortalidade têm aumentado no planeta. Cerca de 4 a 5% da população americana apresentam asma. Segundo revisão da Cochrane, 10% dessa população já tveram o que pode ser caracterizado como crise aguda de asma. Nova Zelândia e Austrália apresentam incidência ainda maior: acredita-se que 10% dos adultos tenham a afecção, com número próximo a 20% entre as crianças. Um estudo mul tcêntrico recente (Internat onal Study for Asthma and Allergies in Childhood – ISAAC) demonstrou que a prevalência média mundial da doença foi de 11,6% entre escolares (6 e 7 anos), oscilando entre 2,4 e 37,6%. Entre os adolescentes (13 e 14 anos), a prevalência mundial média foi de 13,7% e oscilou entre 1,5 e 32,6%. No Brasil, embora não existam dados epidemiológicos definitvos, estma-se que entre 5 e 10% da população sofram de asma. Segundo dados do Ministério da Saúde, ocorrem cerca de 350.000 internações hospitalares ao ano devido a quadros de asma, com uma es tmatva de cerca de 2.000 mortes/ano. A doença representou de 3 a 5,3% das internações hospitalares no país em 1996, representando a 4ª maior causa de internação hospitalar com registro de aumento do número de internações entre 1993 e 1999. Em 1996, os custos do Sistema Único de Saúde com internações por asma foram de R$ 96.000.000,00, o que correspondeu a 1,4% do gasto total anual com todas as doenças.
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2. Mecanismos de doença A - Fisiopatogenia O desenvolvimento da asma é complexo e envolve diversos mecanismos. Dentre eles, provavelmente o mais importante é o relacionado à in flamação crônica das vias aéreas, com espessamento da mucosa, hipersecreção de muco e exposição de terminações nervosas, o que promove sensibilidade anormal a diversos es mulos (hiper-responsividade brônquica). Diversas células estão envolvidas, incluindo eosinó filos, monócitos e linfócitos. Os níveis séricos de IgE desses pacientes frequentemente estão aumentados, o que sugere uma a tvação crônica da imunidade humoral. Da mesma forma, durante exacerbações agudas da asma, encontram-se níveis elevados de leucotrienos e seus metabólitos na urina, plasma e no lavado broncoalveolar. A resposta imune associada à asma é, provavelmente, responsável por seu quadro clínico. Assim, aeroalérgenos são processados nas vias aéreas por células apresentadoras de an genos, como as células dendrí tcas e os macrófagos. A forma como tais aeroalérgenos são apresentados à célula T influencia o tpo de in flamação que o paciente apresentará. Há 2 padrões de resposta imune associada aos linfócitos T: o Th1 e o Th2, este úl tmo associado à asma. Uma teoria, a hipótese da higiene, tentou estabelecer um paralelo definitvo entre a asma e os linfócitos Th2: ao nascermos, há certo equilíbrio entre os linfócitos Th1 e Th2. Possivelmente, fatores exógenos in fluenciariam a produção futura destes linfócitos; assim, crianças que tvessem exposição intensa a viroses, parasitoses, ambiente rural, ou seja, aquelas com pouca higiene, teriam predomínio de produção de linfócitos Th1, sendo poupados de fenômenos alérgicos no futuro. Ainda que lógica, nunca ficou estabelecida como verdade absoluta, talvez por interferência de outros fatores, como os gené tcos. A presença de células Th2 na mucosa das vias aéreas implica produção de citocinas como IL-4 e IL-5, que, potencialmente, podem agir de maneira indireta em células efetoras como células B, mastócitos, eosinó filos, e contribuir para o quadro clínico do paciente com asma. A IL-4, por exemplo,
ASMA
tem papel importante no aumento da produção de an tcorpos IgE especí ficos ao alérgeno. Outro achado importante é o padrão de resposta dos asmátcos aos aeroalérgenos: há uma resposta precoce e outra tardia. A 1ª tem início imediato e se resolve em 1 a 2 horas. Em 50% dos pacientes, tal resposta imediata é seguida de uma resposta tardia, de 3 a 12 horas depois, com desenvolvimento de hiper-responsividade e in flamação das vias aéreas. O mecanismo de ambos os tpos de respostas envolve a atvação dos mastócitos induzida pelo alérgeno mediada por IgE, e dos linfócitos T, resultando na contração da musculatura lisa, aumento da permeabilidade vascular e acúmulo de eosinó filos e mastócitos. Estes úl tmos levam à liberação de diversos mediadores in flamatórios, como histamina, leucotrienos, triptase e prostaglandinas. Os eosinófilos, em partcular, parecem ter papel fundamental na fisiopatologia da asma, pois secretam uma variedade de mediadores in flamatórios, incluindo grânulos proteicos, metabólitos de oxidação, proteína básica principal e citocinas. Esses mediadores são capazes de diminuir o calibre das vias aéreas e causar hiper-reatvidade e hipersecreção de muco. Os eosinó filos aumentam nas secreções das vias aéreas em exacerbações de asma induzidas por retrada de cor tcosteroides e estão presentes em grande número nas secreções e na parede das vias aéreas em casos de asma fatal. Acredita-se, ainda, que parte dos efeitos benéficos dos cor tcosteroides no tratamento da asma esteja relacionada aos efeitos eosinopênicos destes. O papel dos neutró filos na fisiopatologia da asma ainda é muito discu tdo; seu papel parece ser mais relevante na fisiopatologia da DPOC. Os neutró filos parecem potencializar as crises de asma, em par tcular as exacerbações agudas destas. Substâncias como a elastase neutro f lica, a catepsina G e a proteinase 3 são secretadas por neutró filos, sendo mediadores inflamatórios e de degranulação das células glandulares da submucosa. A produção de muco encontra-se aumentada nesses pacientes, assim como a permeabilidade broncovascular. O acúmulo de neutró filos nas vias aéreas dos pacientes com exacerbações agudas de asma parece ser mediado por secreção de interleucina-8 pelas células epiteliais das vias aéreas, a tvadas por vírus ou exposição a an genos. Outro mecanismo envolvido na crise asmá tca está relacionado à inervação autonômica das vias aéreas. Dados experimentais sugerem que a a tvação de células in flamatórias e a liberação de mediadores in flamatórios como leucotrienos e bradicininas alteram o limiar de despolarização de neurônios dos brônquios e dos bronquíolos, o que pode causar aumento da irritabilidade das vias aéreas. O termo “in flamação neurogênica” é usado para descrever as respostas in flamatórias causadas pelas citocinas que atvam receptores neurais (adrenérgicos, colinérgicos e outros). A neurocinina A e a substância P são alguns desses mediadores. Com a evolução da doença, pacientes com asma podem sofrer um processo denominado remodelamento das vias
aéreas causado pela inflamação crônica. As consequências são o espessamento das paredes das vias aéreas, o aumento da vascularização e a hiperplasia das células glandulares locais. Isso explica, em parte, o desenvolvimento tardio de uma obstrução fixa das vias aéreas. O grau de remodelamento costuma guardar relação inversa com o nível de controle clínico da doença, entretanto já foi demonstrado que mesmo asmátcos leves intermitentes podem apresentar algum grau de remodelamento de vias aéreas.
B - Fatores desencadeantes A exposição a alérgenos e irritantes inalatórios são os fatores mais associados aos sintomas de asma. Mudanças climátcas, infecções bacterianas ou virais, fármacos (beta-bloqueadores, inibidores de ECA), estresse emocional e exercício f sico também são causas bem descritas de perpetuadores do processo in flamatório e do broncoespasmo.
3. Diagnóstco O diagnóstco de asma pode ser tanto simples, como nas situações em que há falta de ar e chiado no peito em um paciente atópico e que aliviam com broncodilatadores, ou mais complicado, como em pacientes com tosse crônica; além disso, a lista de diagnós tcos diferenciais de asma é extensa (Tabela 1). Assim, o diagnós tco definitvo de asma baseia-se em aspectos clínicos, funcionais e no diagnós tco de alergia. Tabela 1 - Principais diagnóst cos diferenciais de asma - Anel vascular; - Fístula traqueoesofágica; - Apneia obstrutva do sono; - Aspergilose broncopulmonar alérgica; - Bronquiectasias; - Insuficiência cardíaca; - Bronquiolites; - Neoplasias (vias aéreas e pulmonares); - Disfunção de pregas vocais; - Doença pulmonar obstrutva crônica; - Refluxo gastroesofágico; - Síndrome de Loeffl er; - Embolia pulmonar; - Fibrose cístca; - Pneumonite de hipersensibilidade; - Obstrução mecânica de vias aéreas; - Síndrome aspiratva pulmonar; - Doença pulmonar crônica da prematuridade.
A - Diagnóstco clínico O diagnóstco clínico da asma exige a presença de sintomas compa veis, caracteristcamente episódicos, e com
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PNEUMOLOGIA algum grau de resposta ao tratamento padrão. Na exclusão de outras causas para os sintomas, o diagnóstco clínico pode ser definido. Os sintomas habituais da asma são dispneia, tosse, opressão torácica e sibilância. Os pacientes relatam a dispneia como sensação de incapacidade de fazer que o ar entre nas vias aéreas. A tosse é outro sintoma partcularmente comum que acompanha o quadro, em partcular à noite ou nas primeiras horas da manhã, com expectoração esbranquiçada. Eventualmente, pode aparecer de maneira isolada e dominar o quadro por meses, caracterizando o quadro sindrômico de tosse crônica (a asma é considerada a 2ª causa principal de tosse crônica). A presença de sintomas episódicos melhora espontânea ou com medicações especí ficas para asma (broncodilatadores, cortcosteroides), 3 ou mais episódios de sibilância no últmo ano, variabilidade sazonal dos sintomas e história familiar positva para asma ou atopia são sugestvos do diagnóstco. Alguns estudos mostraram que de 50 a 80% das crianças asmátcas desenvolvem sintomas antes do 5º ano de vida, sendo importante veri ficar a existência de antecedente pessoal ou familiar de asma na história clínica. Eventualmente, o paciente percebe o que desencadeia os sintomas: exposição a alérgenos (como mofo) e a irritantes (como produtos de limpeza), sintomas dispép tcos ou rinossinusais, estresse emocional, medicamentos (como beta-bloqueadores), sendo este um dado importante na confecção do diagnóstco. A história clínica também é ú tl para evidenciar alguns achados que indicam um maior risco de evolução desfavorável ou uma crise asmá tca potencialmente mais grave, como antecedente de crise quase fatal ou idas frequentes a serviços de emergência. Ao exame f sico, o achado que valoriza o diagnós tco de asma é a presença de sibilos. Entretanto, em pacientes com manifestação leve da doença, e fora de exacerbações, o exame f sico pode ser normal. Deformidades torácicas, ou estgmas de hiperinsu flação, não são habituais.
B - Diagnóstco funcional a) Espirometria A espirometria é considerada o método de escolha na determinação da limitação do fluxo de ar e no estabelecimento do diagnós tco de asma. A presença de distúrbio ventlatório obstrutvo (relação VEF1/CVF menor que 0,75), com melhora após broncodilatador (aumento do VEF1 de 7% em relação ao valor previsto ou de 200mL em valor absoluto, após inalação de beta-2-agonista de curta duração), é o achado característco de asma. Entretanto, a ausência de obstrução, ou mesmo de resposta ao broncodilatador, não exclui o diagnós tco, já que pacientes com doença leve, ou aqueles com remodelamento brônquico, podem não apresentar tais achados. E ainda: aumentos no VEF1 superiores a 20% e que ultrapassam 250mL de modo espontâneo no decorrer do
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tempo ou após intervenção com medicação controladora (ex.: prednisona, 30 a 40mg/dia, VO, por 2 semanas). b) Teste de broncoprovocação Em alguns casos, em pacientes sintomá tcos, mas com espirometria normal e ausência de reversibilidade demonstrável ao uso de broncodilatador, ou com sintomas a picos e isolados como na avaliação de tosse crônica, o diagnóstco necessita ser con firmado pela demonstração de hiper-responsividade das vias aéreas. As medidas de hiper-responsividade refletem a sensibilidade ou a facilidade com que as vias aéreas reagem aos es mulos externos que podem causar sintomas de asma, e os resultados do teste são usualmente expressos como a concentração (ou dose) provocadora da substância u tlizada para causar uma queda significatva no VEF1 (por convenção ≥20%). Nestes casos, o teste de broncoprovocação é indicado com agentes broncoconstritores (metacolina, histamina, carbacol) apresentando alta sensibilidade e alto valor predi tvo negatvo; teste de broncoprovocação por exercício demonstrando queda do VEF1 (os pontos de corte para determinar um teste positvo variam na literatura entre 10 e 20%). O teste é contraindicado a indivíduos com VEF1 <50% e indivíduos com AVC ou IAM há menos de 3 meses e hipertensão com valores de pressão arterial sistólica acima de 200mmHg. Por ser um teste demorado, não isento de riscos, e pela dificuldade em obter a substância broncoconstritora, tem sido pouco utlizado na prátca diária, quase restrito a protocolos de pesquisa clínica. c) Medidas de fluxo expiratório Com o uso de um medidor de PFE, o diagnós tco de asma pode ser ob tdo se: - PFE aumentar mais que 15% cerca de 15 e 20 minutos após a inalação de um beta-2-agonista de ação rápida; - PFE variar mais que 20% entre a medida da manhã, feita após o despertar, e realizada 12 horas depois em pacientes usando um broncodilatador (mais que 10% em asmátcos que não es tverem usando um broncodilatador); - PFE diminui mais que 15% após 6 minutos de corrida ou de exercício; - Medidas da função pulmonar avaliam a limitação do fluxo aéreo e ajudam a diagnos tcar e monitorizar o curso da asma. A acurácia de todas essas medidas depende do esforço do paciente e da técnica correta; - O controle por longo prazo do PFE é ú tl, além da revisão dos sintomas, para avaliar a resposta do paciente ao tratamento. Monitorizar o PFE também pode auxiliar na detecção de sinais precoces de deterioração antes que os sintomas surjam.
C - Diagnóstco de alergia A história é importante para iden tficar a exposição a alérgenos relacionados com a asma. A sensibilização alér-
ASMA
gica pode ser con firmada por meio de provas in vivo (testes cutâneos) ou in vitro (determinação de concentração sanguínea de IgE especí fica). Os primeiros devem ser realizados com o uso de extratos biologicamente padronizados (a técnica mais u tlizada é a de pintura). Em nosso meio, predomina a sensibilização a an genos inaláveis; os mais frequentes são os ácaros Dermatophagoides pteronyssinus, Dermatophagoides farinae e Blomia tropicalis. Outros alérgenos inaláveis, como pólen, baratas, epitélio de gatos e cães também são importantes, mas sensibilizam um número menor de pacientes; já os alimentos raramente são associados à asma. Poluentes ambientais ou ocupacionais podem ser associados à piora do controle da doença, e a IgE sérica especí fica confirma e complementa os resultados dos testes cutâneos.
4. Manejo do paciente ambulatorial
Persistente
Intermitente Exacerbações VEF1 ou PFE Variação de VEF1 ou PFE
Leve
Raras
Moderada
Grave
Afeta sono Afeta sono Frequene atvida- e atvidates des des
≥80% do
≥80% do
previsto
previsto
<20%
<20 a 30%
60 a 80% ≤60% do do previsto previsto >30%
>30%
A presença de qualquer um dos aspectos de gravidade é su ficiente para colocar o paciente naquela categoria. Indivíduos em qualquer nível de gravidade, mesmo na asma intermitente, podem ter crises graves.
B - Classificação de controle da asma
A principal meta do tratamento da asma é o controle das manifestações clínicas e funcionais. Para a tngir e manter o controle da asma, a abordagem do tratamento farmacológico deve ser feita em etapas (degraus) e levar em conta o tratamento atual, as propriedades farmacológicas e a disponibilidade dos tratamentos especí ficos, bem como as considerações econômicas. Para o início do tratamento, deve-se realizar a classi ficação da gravidade da asma, que é baseada em aspectos clínicos e funcionais.
Atualmente, conforme recomendações das diretrizes nacionais e internacionais, tem-se valorizado muito a noção de controle da doença. Isso decorre de uma constatação prátca: um paciente procura o médico e é classi ficado como asmátco grave; o tratamento é iniciado e, após 2 meses, o paciente retorna assintomá tco: seria ele agora um asmátco leve intermitente? A resposta é não; ele é um asmátco grave com controle da doença. Ficaram estabelecidos 3 níveis de controle: controlado, parcialmente controlado e não controlado (Tabela 3).
A - Classificação da gravidade da asma
Tabela 3 - Níveis de controle de Asma (SBPT, 2006) Controlada
A asma pode ser classi ficada como: - Intermitente; - Persistente leve; - Persistente moderada; - Persistente grave.
Parcialmente controlada
Sintomas diurnos
Nenhum 2 ou mais por ou mínimo semana
Despertares noturnos
Nenhum
Pelo menos 1
A gravidade da asma determina o tratamento necessário. Quando o paciente já está em tratamento, a classificação da gravidade deverá se basear na sintomatologia presente e na etapa do esquema medicamentoso diário em uso.
Necessidade de 2 ou mais por Nenhuma broncodilatador semana Limitação de atvidades
Presente em Nenhuma qualquer momento
Tabela 2 - Classi fi cação de gravidade da asma conforme a SBPT (IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma, 2006)
PFE ou VEF1
Normal ou <80% do previsto próximo ou do melhor do do normal paciente
Exacerbação
Nenhuma
Intermitente Sintomas
Raros
Persistente Leve
Moderada
Grave
Semanais
Diários
Diários ou con nuos
Despertar noturno
Raro
Mensal
Semanal
Quase diário
Necessidade de broncodilatador
Rara
Eventual
Diária
Diária
Nenhuma
Nas exacerbações
Nas exacerbações
Con nua
Limitação de atvidades
Não controlada
1 ou mais por ano
3 ou mais dos parâmetros presentes em qualquer semana
1 em qualquer semana
C - Programação do tratamento da asma O tratamento é baseado na gravidade e no controle da doença, e os obje tvos para o manejo bem-sucedido da asma são: - Ausência de sintomas ou pouca frequência deles, incluindo os noturnos; - Crises mínimas ou episódicas;
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA -
Ausência de necessidade de consultas de emergência ou hospitalização;
-
Menor necessidade possível de medicação de alívio;
-
Ausência de limitações nas a tvidades f sicas e em exercícios;
-
Função pulmonar quase normal;
-
Ausência de efeitos indesejáveis da medicação ou apresentá-los em níveis baixos.
Todos os pacientes asmá tcos, independentemente da gravidade ou do controle da doença, devem ser abordados com ações educacionais sobre a doença (controle ambiental, evitar exposição a fatores de risco, forma correta de uso de medicamentos, automanejo de exacerbações). O cuidado apropriado com a asma pode ajudar o paciente a prevenir a maior parte das crises, a ficar livre de sintomas problemátcos diurnos e noturnos e a mantê-lo fisicamente atvo. Ademais, todos devem ser orientados a u tlizar broncodilatadores inalados de resgate, caso ocorram sintomas no dia a dia. A seleção inicial dos fármacos no tratamento de manutenção depende da gravidade es tmada no atendimento inicial (Tabela 4). Tabela 4 - Seleção inicial do tratamento de manutenção conforme a gravidade da doença Gravidade Intermitente
1ª escolha
Alternatva
Cortcoide sistêmico
Tratamento de manutenção desnecessário
PersistenCI dose baixa te leve
Antleucotrieno ou cromona
Nas exacerbações graves
CI dose modePersistenCI dose baixa a mo- Nas exarada a alta ou CI te modederada + antleuco- cerbações dose baixa a morada trieno ou xantna graves derada + LABA Cursos de CI dose alta + LABA Persisten- CI dose alta ou CI cortcoide + antleucotrieno te grave dose alta + LABA a critério ou xantna do médico CI: Cor tc oide Inalatório; LABA: broncodilatador de ação prolongada. Adaptado de IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma, 2006.
No seguimento clínico dos pacientes, o tratamento deve ser ajustado conforme o controle da doença, com reavaliações a cada 2 a 3 meses, e etapas bem definidas (Tabelas 5 e 6).
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Tabela 5 - Etapas do tratamento de manutenção da asma Etapa 1
Proposta
Manutenção
Etapa 2 Iniciar tratamento de manutenção
Sem tratamenCI dose to de baixa manutenção
Outras opções
Etapa 3
Etapa 4
Etapa 5
Adicionar dose de CI ou fármaco
Adicionar Adidose de cionar CI ou fármaco fármaco
CI dose baixa + LABA
CI dose moderada Cortcoiou alta + de oral LABA
CI dose moderada ou Antleu- CI dose cotrieno baixa + antleucotrieno ou xantna
Associar antleucoAnt-IgE trieno ou xantna
CI: Cor tc oide Inalatório; LABA: broncodilatador de ação prolongada. Todos os pacientes devem ut lizar broncodilatadores de ação curta para alívio dos sintomas. Adaptado de IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma, 2006. Tabela 6 - Proposta terapêut ca conforme o nível de controle da Asma Nível de controle
Conduta
Controlada
Tentar reduzir uma etapa de controle
Parcialmente controlada
Considerar aumento da etapa de controle
Não controlada
Aumentar etapa até atngir controle
Exacerbação
Condutas apropriadas para a ocorrência
Adaptado de IV Diretrizes para o Manejo da Asma, 2006.
As recomendações das diretrizes nacionais e internacionais contemplam os beta-agonistas de ação prolongada como fármaco indispensável nos pacientes com asma grave e, possivelmente, naqueles com a doença moderada; seu uso, geralmente denota a possibilidade de uso de dose mais baixa de cor tcoide inalado. Entretanto, existem evidências crescentes que esses fármacos associam-se, em longo prazo, a desfechos inadequados, como ausência de controle da inflamação (quando comparados aos que u tlizaram cortcoide em dose mais alta), e mais efeitos adversos, principalmente cardiovasculares. De fato, a única de finição que se tem até hoje é que esses fármacos não podem ser u tlizados isoladamente no tratamento da asma; recomenda-se, ainda, que os demais pacientes que os u tlizem em associação aos cortcoides tenham o fármaco re trado tão logo o controle da doença seja a tngido (em detrimento da redução da dose de cor tcoide).
ASMA
D - Fármacos utlizados no tratamento da asma A via inalatória é muito u tlizada para o tratamento da asma. Existem vários dispositvos disponíveis no mercado para a oferta dos fármacos, quer cor tcoides, quer broncodilatadores, e que apresentam peculiaridades em seu uso. Antes de lembrarmos detalhes especí ficos acerca dos fármacos, observe a Tabela 7 que relaciona os principais dispositvos inalatórios. Tabela 7 - Fármacos ut lizados no tratamento da asma Dispositvo
Forma de uso - Retrar a tampa e agitar o nebulímetro;
Nebulímetro
a) Beta-2-adrenérgicos - Curta duração (de 4 a 6 horas): fenoterol, salbutamol e terbutalina; - Longa duração (12 horas): formoterol e salmeterol; - Modo de ação: agonistas, ligam-se ao receptor beta-2-adrenérgico, havendo aumento da produção de adenilciclase e, consequentemente, de AMP cíclico, promovendo a broncodilatação; - Efeitos colaterais: taquicardia, tremores, hipocalemia e midríase (devido à especi ficidade não ser total aos receptores beta-2). Tabela 8 - Principais beta-2-agonistas e vias de administração
- Posicionar o disposi tvo vertcalmente a 5cm da boca;
a g o r D
- Expirar e realizar breve pausa respiratória; - Pressionar o dispositvo e aspirar lentamente; - Promover pausa inspiratória por 10s;
Fenoterol
100 a 200 0,5 a 2
4
5 minutos 4 a 6
- Respirar normalmente;
Salbutamol
100 a 200 2,5 a 5
5
5 minutos 4 a 6
- Repetr os passos em 30s, se indicada nova dose.
Terbutalina
250 a 500 5 a 10
-
5 minutos 4 a 6
- Retrar a tampa e posicionar o disposi tvo vertcalmente; Turbuhaler - Girar a base vermelha até ouvir um click (no 1º uso, é necessário ouvir 3 clicks);
6 a 12
-
-
5 minutos
12
Salmeterol
5 a 100
-
-
30 a 60 minutos
12
- Respirar normalmente. - Retrar a tampa e colocar uma cápsula no interior;
Tabela 9 - Doses comparat vas dos cor tc oides inalatórios em adultos
- Inspirar profundamente com rapidez; - Pausa inspiratória por 10s;
- Pressionar os botões laterais para perfurar as cápsulas;
Medicação
Baixas doses
Doses intermediárias
Altas doses
- Expirar normalmente e colocar o disposi tvo na boca;
Beclometasona
100 a 500μg
500 a 1.000μg
>1.200μg
Budesonida
200 a 400μg
400 a 800μg
>1000μg
Flutcasona
100 a 250μg
250 a 500μg
>750μg
Ciclesonida
80 a 160
160 a 320
>320
- Inspirar profundamente com rapidez; - Pausa inspiratória por 10s; - Respirar normalmente; - Verificar se há pó restante na cápsula; se presente, aspirar novamente. Diskus
Formoterol
b) Cortcoides inalatórios (CIs) São utlizados na redução da sintomatologia e do processo inflamatório. Prefere-se a via inalatória em razão do menor número de efeitos colaterais, em comparação à via sistêmica. Os principais CIs u tlizados são, em ordem crescente de potência:
- Expirar normalmente e colocar o disposi tvo na boca;
Aerolizer
r ) o o e i d r o ) s a ) l ) d o ó z g g a i a t t i o ã r r l i e ç a m O ( m í c a l f o u ( h E a b ( n I n e i ( N
r o d ) a g l μ a ( n I
- Abrir o disco e puxar a alavanca até ouvir um click ; - Expirar normalmente e colocar o disposi tvo na boca; - Inspirar profundamente com rapidez; - Pausa inspiratória por 10s;
-
Efeitos colaterais (via inalatória): rouquidão e candidíase de orofaringe (locais); adelgaçamento da pele, equimose e, raramente, supressão adrenal (altas doses diárias).
Com o intuito de enfa tzar a preferência pelo CI em detrimento sistêmico (comprimidos, xaropes) em longo prazo, citam-se os possíveis efeitos colaterais desses úl tmos com uso con nuo (Tabela 10).
- Respirar normalmente.
Algumas formulações em nebulímetro dosimetrado não necessitam ser administrados à distância de alguns cen metros da boca, e devem ser ofertados como os disposi tvos em pó seco, como a ciclesonida (cor tcoide inalatório).
Tabela 10 - Efeitos colaterais da cor tc oterapia sistêmica em longo prazo - Osteoporose; - Obesidade;
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA - Infecções; - Hipertensão; - Supressão adrenal; - Supressão do crescimento (crianças); - Diabetes; - Friabilidade da pele; - Glaucoma; - Catarata; - Fraqueza muscular; - Monilíase oral; - Rouquidão.
c) Antcolinérgicos -
Curta duração (de 4 a 6 horas): brometo de ipratrópio;
-
Longa duração (24 horas): totrópio (sem evidências suficientes para uso em asma);
-
Modo de ação: atuam, preferencialmente, no antagonismo aos receptores M 1 e M3, impedindo a broncoconstrição desencadeada pela ace tlcolina ao ligar-se a esses receptores;
-
Efeitos colaterais: a xerostomia é o efeito colateral mais significatvo (e mais frequente).
d) Metlxantnas -
Curta duração (8 horas): aminofilina;
-
Longa duração (12 horas): teofilina;
-
Modo de ação: atuam na adenilciclase, mas não têm receptor especí fico. Apresentam menor poder broncodilatador que das outras classes citadas;
-
Efeitos colaterais: náuseas, vômitos, agitação, rebaixamento do nível de consciência, convulsão e arritmias.
As metlxantnas só podem ser u tlizadas por via sistêmica, e seu uso é reservado aos pacientes que não respondem ao uso dos agentes de 1ª escolha (maior poder broncodilatador). e) Medicações associadas Estão disponíveis, no mercado, formulações que combinam fármacos de diferentes classes, com maior pra tcidade (e melhora da adesão): Beta-2-agonistas + CIs: Formoterol (12μg) + budesonida (400 μg); Salmeterol + flutcasona. - Beta-2-agonistas + an tcolinérgicos: Salbutamol + ipratrópio; Fenoterol + ipratrópio. -
•
•
•
•
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E - Outras medicações a) Bambuterol (beta-agonista de ação prolongada por via oral) Trata-se de uma pró-droga da terbutalina oral com ação broncodilatadora prolongada, permi tndo a administração 1 vez ao dia. É ú tl principalmente aos pacientes com asma noturna. A comparação do bambuterol com o salmeterol mostrou equivalência no controle dos sintomas da asma, sendo alternatva para crianças e idosos com di ficuldades no uso de medicações inalatórias. Pode ser administrado a par tr de 2 anos na dose de 10mg (10mL), 1x/dia. Para crianças com idade superior a 6 anos, a dose pode ser aumentada para 20mg/dia. Em crianças orientais, recomenda-se iniciar com metade da dose. Não apresenta efeito bené fico na asma induzida por exercício. Deve-se acrescentar que a via inalatória ainda é a via de escolha em pacientes com asma. b) Omalizumabe O omalizumabe é um an tcorpo monoclonal recombinante humanizado especí fico ant-IgE. Sua principal característca é inibir a ligação da IgE com o seu receptor de alta afinidade (FceRI). Ocasiona inibição da broncoconstrição induzida por alérgeno tanto na fase precoce como tardia da inflamação, levando à diminuição da hiper-responsividade das vias aéreas. O tratamento com a ant-IgE é indicado a pacientes maiores de 12 anos com asma de di f cil controle, componente alérgico comprovado e níveis de IgE sérica total entre 30 e 700UI/mL. A dose empregada (a cada 2 ou 4 semanas por via subcutânea) deve levar em conta o peso e o nível de IgE sérica total. c) Imunoterapia especí fica com alérgenos Consiste na administração de doses progressivamente maiores de alérgenos especí ficos em pacientes sensibilizados, objetvando a indução do estado de tolerância. Tal modalidade terapêutca não pode ser realizada em pacientes com exacerbação aguda; deve ser administrada só por profissional treinado no manejo de reações ana filátcas graves e indicada apenas àqueles que sofrem de asma com evidência importante de alergia, demonstrada pela presença de antcorpos IgE para alérgenos do ambiente, principalmente ácaros, pólens, fungos e insetos. Para pacientes em terapia farmacológica, antes de administrar a injeção, é importante veri ficar VEF1 ou PFE acima de 70% do previsto. Asmá tcos leves ou muito graves devem ser excluídos. Indivíduos que apresentaram boa resposta à pro filaxia ambiental e ao tratamento farmacológico não apresentam indicação desse tpo de tratamento. Está contraindicado a pacientes com outras doenças imunológicas ou que u tlizem drogas beta-bloqueadoras.
ASMA
d) Antleucotrienos Os antleucotrienos são fármacos que bloqueiam a síntese (zileutona) ou a interação dos leucotrienos com seus receptores (montelucaste e za firlucaste). Os leucotrienos são produtoS da degradação do ácido araquidônico, pela via da lipo-oxigenase, sendo os leucotrienos cisteínicos os que causam inflamação brônquica. Estão disponíveis em formulação oral (exceto o zileutona, não disponível no Brasil) e são pratcamente isentos de efeitos adversos graves. Pouco após sua introdução no mercado, entretanto, foram relatados casos de angiite de Churg-Strauss associados ao seu uso; posteriormente, tal fato foi refutado, acreditando-se que a doença ocorreu pelo fato de, ao iniciar-se o fármaco pela melhora clínica, seria possível re trar o cortcoide que o paciente utlizava. Era o cor tcoide, porém, que man tnha a vasculite controlada; sem ele, e agora com o an tleucotrieno, os pacientes manifestavam o quadro clássico da vasculite. Os melhores resultados observados ocorrem em crianças, sendo asma induzida por aspirina (AAS) e asma induzida por exercício.
F - Asma em situações especiais a) Asma induzida por aspirina A asma induzida por AAS é uma en tdade que surge, em geral, entre a 3ª e a 5ª décadas de vida, em sujeitos que não apresentavam, previamente, sensibilidade a an tinflamatórios nem a AAS. Geralmente, concomitantemente à crise de asma, surgem, também, fenômenos comuns às crises anafilactoides (angioedema, ur tcária, fl ushing facial, rinorreia, congestão ocular, sintomas gastrintestnais). Não é incomum a associação entre intolerância a AAS, sintomas asmatformes e polipose rinossinusal, conhecida como tríade de Samter. O tratamento da crise de asma aguda é igual e deve ser guiado pela gravidade da crise. O tratamento da reação anafilactoide é feito de acordo com a gravidade, devendo envolver ant-histamínicos, bloqueadores tanto H1 como H2, cortcosteroides; em alguns casos especí ficos, glucagon; em crises graves, adrenalina IM. O tratamento ambulatorial deve evitar uso de AAS, ant-inflamatórios não hormonais e dipirona, pela possibilidade de reação cruzada. Devem-se usar, como analgésico, paracetamol ou, quando necessário o uso de AINH, os inibidores da COX-2. O tratamento da asma deve ser feito de acordo com a gravidade do caso, e o uso de an tleucotrienos costuma ser bené fico. b) Asma induzida por exercício O exercício é um fator desencadeador de crises de asma bem determinado pela literatura, e as crises tpicamente ocorrem após o exercício, não durante. Os fatores que
determinam o aparecimento de obstrução crônica incluem níveis de ventlação atngida, temperatura e umidade do ar inspirado. A broncoconstrição induzida pelo exercício ocorre, na maioria das vezes, em pacientes portadores de asma (mais de 80% dos casos). Durante o exercício, em geral, acontece broncodilatação; porém, nesses pacientes, provavelmente devido à hiper-responsividade das vias aéreas, há broncoconstrição. O exercício é o único precipitante natural da asma que leva à taqui filaxia. Cerca de 45% dos pacientes com a condição apresentam um período refratário característco, durante o qual a manutenção do exercício não causa broncoespasmo. Quando o exercício é repe tdo após intervalos de 30 a 90 minutos, verifica-se que a broncoconstrição diminui ou não acontece. - Diagnóstco: queda de 10% ou mais da VEF1 cerca de 10 a 15 minutos após o início do exercício (para crianças, queda de 15%); - Tratamento: o obje tvo do tratamento nesses pacientes é a pro filaxia dos episódios, os quais podem ser atenuados com a elaboração de uma escala personalizada de aquecimento antes da realização de um exercício f sico vigoroso. O controle mais efe tvo, no entanto, é obtdo com medicações. O 1º passo deve ser o controle da asma subjacente. A pro filaxia pode ser realizada com beta-agonista 15 minutos antes do exercício, podendo ainda usar cromoglicato de sódio ou antleucotrienos com resultados satsfatórios. A melhora no condicionamento f sico e a realização de exercícios em ambientes com ar úmido e aquecido são medidas adjuvantes que melhoram bastante esse tpo de manifestação. c) Asma na gestante A asma na gestação pode tem um comportamento interessante: 1/3 das pacientes melhora, 1/3 piora e 1/3 permanece com a doença inalterada. Alguns fatores mecânicos e hormonais jus tficam tal interação ainda não bem compreendida. Há segurança para uso dos medicamentos habituais no tratamento de manutenção da asma (cor tcoides inalatórios, broncodilatadores, antleucotrienos) em qualquer fase da gestação e durante a amamentação. d) Asma de di f cil controle A maioria dos pacientes asmá tcos tem o controle da doença obtdo com a adoção das medidas terapêu tcas recomendadas pelas diretrizes nacionais ou internacionais; em cerca de 5% dos pacientes, entretanto, haverá di ficuldades terapêutcas importantes, com manejo di f cil, caracterizando a asma de di f cil controle. Existem critérios sugeridos para a melhor caracterização dessa condição, descritos na Tabela 11, sendo necessários 1 critério maior e 2 menores, além de 6 meses de seguimento, exclusão de outros diagnóstcos, avaliação de fatores agravantes e veri ficar se há boa adesão ao tratamento.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA Tabela 11 - Critérios de fi nidores de asma de di f cil controle (necessário 1 maior e 2 menores) Maiores - Altas doses de cor tcoide inalatório; - Necessidade de cortcoide oral em mais de 50% dos dias do ano. Menores - Necessidade de outro fármaco diário para controle da doença além dos cortcoides inalados; - Necessidade diária ou quase diária de beta-agonistas de curta ação; - Obstrução persistente ao fluxo aéreo (VEF1 <80% do previsto, variação do PFE >20%); - Uma ou mais exacerbações com necessidade de ida à emergência por ano;
apresentado efeito biológico admissível, falharam em demonstrar benef cio. d) Ant-IL-5 Os antcorpos monoclonais humanizados an t-IL-5 têm a finalidade de depletar os eosinó filos dos tecidos. A medicação diminui, signi ficatvamente, o número de eosinó filos na submucosa brônquica, mas o mesmo não acontece com os eosinófilos séricos ou do escarro. Não há evidências, até agora, de que a an t-IL-5 tenha afetado signi ficatvamente os desfechos clínicos em pacientes com asma.
5. Manejo das exacerbações agudas da asma
- 3 ou mais cursos de cor tcoide oral por ano;
A - Exames complementares na exacerbação
- Piora rápida após redução de pelo menos 25% da dose de cortcosteroides orais ou CI;
O diagnóstco de asma no pronto-socorro e mesmo no ambiente ambulatorial é clínico; os exames complementares podem ajudar a classificar a gravidade da doença, sugerir complicações e fatores precipitantes associados e de finir casos duvidosos. - Radiografia de tórax: não necessita ser realizada ro tneiramente em unidades de emergência. Ela raramente modifica a terapêu tca e só deve ser solicitada em caso de indicação (suspeita de pneumonia, pneumotórax, derrame pleural); - Saturação arterial de oxigênio: deve ser veri ficada em todos os pacientes, e, se menor do que 90%, o oxigênio suplementar deve ser prescrito, devendo-se considerar a gasometria arterial. Um ponto interessante na avaliação inicial dos pacientes asmátcos em crise é o comportamento da oximetria com a oferta de oxigênio: em pacientes com broncoespasmo, há distúrbio ven tlação-perfusão, sem shunt completo; assim, a saturação da hemoglobina tende a normalizar-se com oferta de oxigênio suplementar. A ausência de melhora da oximetria com oxigênio suplementar é um indício de shunt , possivelmente associado a diagnós tco associado, como infecção (pneumonia) ou embolia pulmonar; - Gasometria arterial: não é necessária a todos os pacientes, entretanto deve ser colhida em pessoas com hipoventlação, desconforto respiratório importante, VEF1 ou PFR <30% do predito. Os pacientes que apresentam uma PaCO2 >42mmHg têm um potencial de gravidade importante; uma PaCO 2 ≥45mmHg representa indicação de internação hospitalar em unidade de terapia intensiva, devido à gravidade associada; - Hemograma: pode ser necessário a pacientes febris e com expectoração purulenta. Os eletrólitos, indicados aos que necessitam de internação, podem ajudar a monitorizar complicações da terapêu tca, como a hipocalemia, que é possível naqueles em uso constante de beta-2-agonistas e altas doses de cor tcosteroides. O potássio deve ser dosado em todos os pacientes
- História anterior de exacerbação de asma quase fatal.
G - Novas perspectvas terapêutcas a) Agentes ant-TNF-alfa Os inibidores de TNF-alfa atualmente disponíveis são antcorpos monoclonais contra TNF-alfa (in fliximabe e adalimumabe) ou como receptores de TNF solúvel fundido com IgG humana (etanercepte). O in fliximabe ou Remicade® é um antcorpo monoclonal IgG an t-TNF alfa-quimérico (murino e humano), ou seja, a porção Fab variável do an tcorpo é derivada do camundongo, e a porção Fc constante é uma IgG1 humana, sendo desenvolvido, inicialmente, para tratamento da artrite reumatoide, com estudos também para doença de Crohn. A medicação é associada a uma down-regulat on das citocinas pró-inflamatórias tanto em pacientes com doença de Crohn como em artrite reumatoide e poderia ter efeito bené fico também na asma. O etanercepte é mais bem estudado, com pesquisas demonstrando efeito bené fico como tratamento adicional ao cortcoide inalatório em pacientes com asma grave, cujos resultados mostraram melhor controle dos sintomas da função pulmonar e da hiper-responsividade brônquica à metacolina. Ainda são necessárias outras pesquisas para poder recomendar a medicação. b) Roflumilaste Compreende um inibidor sele tvo da fosfodiesterase-4, com atvidade ant-inflamatória. Seu efeito principal é a inibição da degradação do monofosfato cíclico de adenosina (AMPc). Os estudos ainda não demonstram bene f cio claro com a medicação. c) Ant-IL-4 A interleucina-4, que atua por meio do receptor de membrana IL-4R, é importante nas reações imunes mediadas pela IgE. Os estudos com a medicação, apesar de terem
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ASMA
com necessidade de internação e que usem digitálico, em virtude do risco de intoxicação. E pacientes em uso de diurétcos também apresentam risco aumentado de desenvolver hipocalemia; - Eletrocardiograma: não deve ser indicado de ro tna, porém pode ser ú tl para pacientes com doença cardíaca, doença pulmonar obstru tva crônica concomitante e para aqueles com idade maior que 50 anos; - Prova de função pulmonar: sua realização ou, pelo menos, a aferição do pico de fluxo ( peak fl ow) é de enorme benef cio para os portadores de crise aguda de asma monitorizados no serviço de emergência (recomendação grau A). A es tmatva realizada por parâmetros clínicos da gravidade da obstrução clínica pode ser errônea, como demonstrado no estudo de Shim, que veri ficou que pneumologistas experientes, em apenas 44% dos casos, conseguiam estmar PFR de forma apropriada em uma margem de erro de 20%. Por isso, é recomendado determinar o VEF1 ou o PFR em pacientes asmá tcos no pronto-socorro, pois classifica melhor a gravidade da doença, modifica a terapêutca e representa um dos melhores parâmetros para decidir quanto à alta hospitalar. A indicação de outros exames depende das condições associadas e característcas individuais. Tabela 12 - Classi fi cação da gravidade da crise aguda de asma Leve Dispneia
Moderada
Com atviAo falar dade f sica
Grave
Iminência de PCR
Ao repousar
Ao repousar
Palavras
Incapaz de falar
Capacidade Sentenças de falar
Frases
Posição cor- Capaz de poral deitar
Prefere fi- Incapaz de car sentado deitar
Incapaz de deitar
Frequência Aumenrespiratória tada
Aumentada FR >30irpm
FR >30irpm
NormalUso da RespiMusculatuComumenmente não musculatu- ração ra acessória te usa usa ra acessória paradoxal Ausculta
Sibilos Sibilos exexpiratórios piratórios moderados difusos
Sibilos difusos ins- Tórax piratórios e silente expiratórios
Frequência cardíaca
<100
100 a 120
>120irpm
Bradicardia relatva
Pulso paradoxal (mmHg)
<10
10 a 25
>25
Ausente
Estado mental
Agitado ou Agitado normal
Agitado
Confuso ou sonolento
VEF1 (predito para >80% idade, sexo e altura)
50 a 80%
<50%, ou resposta à terapia <50% menor que 2 horas
Leve
Moderada
Grave
Iminência de PCR
SaO2 (%)
>95
91 a 95
<91
<91
PaO2 (mmHg)
Normal
>60
<60
<60
PaCO2 (mmHg)
<42
<42
≥42
≥42
B - Tratamento Seguem comentários sobre as diversas medicações, suas indicações e as evidências para uso em pacientes com crises agudas de asma. a) Beta-2-agonistas O uso de beta-2-agonistas é a terapêu tca imediata mais importante no manejo de broncoespasmo no pronto-socorro e deve ser prescrito assim que o paciente chega à emergência. O uso de beta-agonistas por via sistêmica não é superior à via inalatória e, ademais, associa-se a mais efeitos adversos. Seu uso é restrito aos pacientes com crises graves e refratárias a doses adequadas dos fármacos inalatórios. Podem ser administrados de forma intermitente ou em nebulização con nua, dando-se preferência àquela, pois a aplicação sequencial do fármaco parece fornecer broncodilatação adicional. Recomendam-se inalações a cada 15 ou 20 minutos, totalizando 3 inalações na 1ª hora da chegada ao pronto-socorro. O beta-2-agonista mais disponível no Brasil é o fenoterol, dose de 10 a 20 gotas diluídas em 3 a 5mL de soro fisiológico, embora seja o que mais causa efeitos colaterais. A preferência, entretanto, é pelo salbutamol, de 2,5 a 5mg (de 10 a 20 gotas) em nebulização com 3 a 5mL de soro fisiológico. Após as 3 inalações na 1ª hora, deve-se reavaliar e deixar a frequência de novas inalações de acordo com o paciente. Se ainda houver broncoespasmo, pode-se prescrever de 1/1h e aumentar o espaçamento posteriormente. Os nebulímetros geralmente não estão disponíveis na sala de emergência, mas seu uso é tão e ficaz quanto através de nebulizador. b) Antcolinérgicos As recomendações para o uso de an tcolinérgicos em unidades de emergência para asma não são precisas. A sua combinação com os beta-2-agonistas apresentou resultados positvos e negatvos em diferentes estudos clínicos. O mecanismo de ação dessas medicações baseia-se na diminuição da ação da ace tlcolina nas fibras pós-gangliônicas que terminam no epitélio, glândulas submucosas e musculatura lisa das vias aéreas, diminuindo, assim, o tônus broncoconstritor. - Ademais, como seu início de efeito é tardio (apenas 90 minutos após a inalação), recomenda-se utilizá-los nos casos de ausência de resposta à 1ª oferta de beta-agonistas ou, inicialmente nas crises muito graves;
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PNEUMOLOGIA -
A dose ideal de brometo de ipratrópio no pronto-socorro é de 5mg (40 gotas) adicionada ao beta-2-agonista.
c) Cortcosteroides Pedra-angular no tratamento de manutenção da asma, os cortcoides também têm papel relevante no controle das crises. Na exacerbação, entretanto, os cor tcoides inalatórios geralmente não são indicados, u tlizando-se, preferencialmente, os sistêmicos. Apesar de apresentarem início de ação tardio (6 a 8 horas após o uso), e não serem capazes de aliviar o broncoespasmo agudo, seu uso associa-se à resolução mais rápida da obstrução ao fluxo aéreo, dos sintomas e redução da taxa de recidiva. Nem todos os pacientes com crise, entretanto, necessitarão de uso de cor tcoide. Estma-se que cerca de 70% dos pacientes que chegam ao hospital em crise de asma apresentem resolução clínica após a 1ª oferta de broncodilatador. Nesses casos, o cor tcoide é prescindível; nos demais, deverá ser ofertado, por via oral ou intravenosa. Como a biodisponibilidade e o tempo de início de ação são similares aos das 2 modalidades, a via oral deve ser u tlizada desde que o paciente tenha condições de deglu tr o fármaco. A prednisona é u tlizada em dose de 40 a 60mg/dia por 5 a 14 dias. É importante lembrar que não é necessária a re trada gradual do cor tcoide quando usado por período de tempo inferior a 3 semanas. As doses de cortcosteroides sistêmicos são: - Hidrocortsona: dose inicial IV, de 200 a 300mg, e depois, 100 a 200mg IV, de 6/6h (evitar ultrapassar 800mg/dia); - Metlprednisolona: dose de 40mg IV e, depois, de 6/6h (evitar ultrapassar 160mg/dia); - Prednisona: de 1 a 2mg/kg de peso/dia (de 40 a 80mg). Estudos comparando grandes doses de me tlprednisolona (de 125 a 500mg) com menores doses (de 60 a 100mg) não indicam nenhuma diferença clinicamente signi ficatva, exceto que maiores doses aumentam as chances de efeitos colaterais. Portanto, em geral, devem-se evitar doses maiores que 60mg de me tlprednisolona de 6/6h. O cortcoide inalatório é, frequentemente, prescrito após a alta do pronto-socorro, a pessoas com asma persistente, associado ao cortcoide oral (estes, por 7 a 10 dias). Entretanto, seu uso na sala de emergência já foi avaliado, e com algum benef cio sugerido, principalmente por parecer ter efeito mais precoce que os cor tcoides sistêmicos; para tal, era necessário que se ofertassem doses extremamente elevadas (cerca de 5 vezes mais altas que as habituais), e a ação provavelmente relaciona-se a efeitos imunomodulatórios diretos na mucosa brônquica, sem interagir na transcrição proteica. Entretanto, os desenhos dos estudos que fizeram tal avaliação não forneceram nível de evidência adequada para que tal conduta fosse estabelecida na prá tca diária. Somado a esse fator, há o alto custo dessa classe
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de medicamentos (principalmente considerando as doses sugeridas), a di ficuldade de pacientes com crise grave u tlizar fármacos em nebulímetro e a não avaliação de possíveis efeitos colaterais associados. d) Metlxantnas As metlxantnas não são recomendadas rotneiramente nas primeiras horas de tratamento do broncoespasmo. Vários estudos realizados demonstraram que a medicação não produz broncodilatação signi ficatva, além da proporcionada por doses adequadas de beta-2-agonistas inalatórios. Seu uso é reservado para situações de broncoespasmo refratário a doses adequadas e repe tdas de broncodilatadores inalatórios. e) Sulfato de magnésio O magnésio é cofator em várias reações enzimá tcas, e estudos têm mostrado que células musculares lisas se contraem em ambiente de hipomagnesemia e relaxam quando há hipermagnesemia. Há evidência de que magnésio infundido em asmátcos providencia uma adicional broncodilatação; assim como há evidência de que hipermagnesemia diminui a atvação de polimorfonucleares. Seu efeito broncodilatador é discreto, bem inferior ao atngido com os beta-agonistas inalatórios. Assim, seu uso é restrito aos casos refratários ao tratamento inicial. f) Oxigênio suplementar O uso suplementar de oxigênio em crises de asma é, teoricamente, benéfico, considerando-se o seu papel na fisiopatologia e a experiência médica universal. Deve ser ofertado sempre que a saturação de oxigênio es tver inferior a 92%. O uso da combinação dos gases hélio e oxigênio, o chamado heliox, foi estudado pela literatura. O hélio, devido à sua densidade diminuída em comparação com a do ar, poderia diminuir a resistência das vias aéreas. Outro bene f cio teórico é que esse elemento poderia promover uma retenção maior das par culas aerolisadas no pulmão, podendo, assim, aumentar o benef cio dos beta-2-agonistas inalatórios. Sua disponibilidade prá tca é pequena, e seu uso é reservado aos casos graves e refratários. g) Intubação e ven tlação mecânica Os pacientes que chegam em crise aguda de asma ao serviço de emergência, apresentando alteração do nível de consciência, bradicardia e iminência de parada cardiorrespiratória devem ser submetdos à intubação orotraqueal. Da mesma forma, durante a evolução no pronto-socorro, pode ser necessária a intubação, a qual deve basear-se em parâmetros clínicos e, especialmente, antes que o paciente se encontre em situação crí tca com risco de parada cardiorrespiratória. Caso se escolha a intubação, tal procedimento deve ser realizado de maneira rápida, pois a condição clínica do paciente pode piorar em pouco tempo. Vários agentes podem
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ser utlizados, e a medicação de escolha é a quetamina, devido ao seu efeito broncodilatador. Em nosso meio, ela é pouco disponível, e recomenda-se prescrever o midazolam e o propofol. As medicações e os cuidados na intubação, conforme determinação do American College of Emergency Physicians, em 2004, estão descritos na Tabela 13. A quetamina é um agente seda tvo, que pode causar importante broncodilatação; alguns autores o consideram o agente de escolha para esses pacientes, mas o único estudo randomizado com a medicação falhou ao encontrar bene f cios. Obviamente, não existem estudos que comparam o uso precoce de ven tlação mecânica com o tratamento convencional em ataques agudos de asma. A experiência demonstra que a ven tlação mecânica é uma intervenção que salva vidas e não deve ser adiada quando indicada. Não se pode esquecer que o paciente com asma tem excelente prognóstco e a intubação é temporária. Já uma parada cardiorrespiratória é muito mais grave, e não se pode permi tr que ela aconteça. A intubação deve ser realizada rápida e deliberadamente, de preferência u tlizando o tubo endotraqueal mais largo possível, com 8 ou 9mm, para diminuir a resistência das vias aéreas. Após a intubação o paciente deve ser sedado adequadamente, e os parâmetros bem ajustados, para que se consigam sincronia do paciente com o aparelho e conforto ven tlatório, fundamentais para o adequado controle do broncoespasmo com broncodilatadores (que devem ser ofertados imediatamente e em doses máximas). Quanto aos parâmetros do respirador, pode-se u tlizar modo de controle a volume ou a pressão, com o cuidado de monitorizar a mecânica respiratória, evitando picos de pressão ou volumes correntes muitos baixos (a depender do modo escolhido); o ideal é que a frequência respiratória seja baixa, para aumentar o tempo expiratório e impedir hiperinsuflação dinâmica. A PEEP, inicialmente, deve ser a mais baixa possível, já que, diferentemente dos pacientes com DPOC, os asmátcos podem ter piora da mecânica com PEEP elevada, por causar hiperinsu flação dinâmica – auto-PEEP. Dependendo da evolução (dos parâmetros de troca gasosa e da auto-PEEP), pode-se tentar elevar a PEEP, sempre observando, cautelosamente, se haverá ou não piora da auto-PEEP. A maioria dos pacientes asmá tcos que necessitam de intubação e ventlação mecânica o faz por período curto, podendo ser avaliada a desintubação precocemente, eventualmente dentro de 24 horas. Quanto à ventlação não invasiva, ainda são necessários estudos prospectvos para validá-la, embora, levando em conta os resultados em doença pulmonar obstru tva crônica, haja a probabilidade de ser bené fica também em crises agudas de asma. Tem sido usada com considerável sucesso e é recomendada quando disponível, principalmente quando a equipe tem boa experiência com seu uso.
Tabela 13 - Cuidados e medicações para intubação orotraqueal Midazolam - Seguro, tem an doto (flumazenil) e causa sedação e amnésia; - Dose: de 0,1 a 0,3mg/kg de peso IV; início de 1 a 2 minutos e duração de 30 a 40 minutos. Fentanila - Analgésico, tem an doto (naloxona) e pode causar hipotensão e rigidez torácica; - Especialmente útl para pacientes com isquemia miocárdica, dissecção de aorta e hipertensão intracraniana; - Dose: 3μg/kg de peso IV; início em 1 a 2 minutos e duração de 20 a 30 minutos. Quetamina - Potente broncodilatador que causa aumento de pressão arterial; - Aumenta a secreção de vias aéreas e a pressão intracraniana (PIC); - Dose: de 1 a 2mg/kg de peso IV; início em 1 minuto; duração de 5 minutos. Propofol - Hipnótco-sedatvo, altamente lipof lico, de propriedade antemétca, antconvulsivante e reduz a PIC; - Não é analgésico e pode causar hipotensão; - Dose: de 0,5 a 1,5mg/kg de peso: início em 20 a 40 segundos e duração de 8 a 15 minutos; - Pré-tratamento com soro fisiológico é recomendado para reduzir hipotensão. Bloqueadores neuromusculares - Facilitam a intubação e protegem as vias aéreas de lesões iatrogênicas; - Facilitam a ventlação mecânica e ajudam no controle de HIC; - Despolarizantes: succinilcolina; - Não despolarizantes: vecurônio, atracúrio, pancurônio (este deve ser evitado). Succinilcolina - Dose: de 1 a 1,5mg/kg de peso; início em <1 minuto e duração de 5 a 9 minutos; - Desvantagens: pode levar à bradicardia, hipercalemia, aumento de pressão gástrica e de PIC, liberação de histamina e PCR; - Vantagem: rápido início e curta duração. Vecurônio - Menos efeitos adversos cardiovasculares, não libera histamina e não costuma causar hipotensão; - Dose: de 0,15 a 0,28mg/kg de peso; início em 2 a 4 minutos e duração de 40 a 80 minutos. Atracúrio - Pode liberar histamina, causar broncoespasmo, hipotensão e causar neuroexcitação (devido a metabólito produzido e somente com infusão prolongada); - Vantagens: ideal para IRC e insu ficiência hepátca. Dose: de 0,5mg/kg de peso; início em 2 a 3 minutos e duração de 25 a 45 minutos.
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PNEUMOLOGIA Tabela 14 - Resumo do tratamento da crise aguda de asma Beta-2-agonista Com benef cio estabelecido, deve ser prescrito a todas as crises agudas de asma e ser usado na forma inalatória de maneira sequencial. Deve-se evitar o uso da medicação na forma parenteral, pela maior incidência de efeitos colaterais, sem bene f cio adicional; em casos graves, pode-se usar a medicação via SC ou IM, monitorizando sempre o surgimento de efeitos colaterais graves. Antcolinérgicos As evidências para seu uso não são tão contundentes como aquelas para o uso de beta-2-agonistas, porém são recomendados, também, a todas as crises de asma por via inalatória e em doses sequenciais, sabendo que o maior benef cio é para crises graves de asma. Cortcosteroides Todos os pacientes devem recebê-los no departamento de emergência, embora alguns autores preconizem o cor tcoide apenas para pacientes com VEF1 <60% do predito. A medicação deve ser mantda por 5 a 14 dias. Metlxantnas Não devem ser usadas. Não há benef cio ao utlizá-las, e seu emprego aumenta a ocorrência de efeitos adversos graves, como arritmias e convulsões. Alguns autores preconizam seu uso em crises graves e refratárias ou em pacientes que usam cronicamente essa medicação. Sulfato de magnésio Deve ser usado em pacientes com crise grave ou refratariedade ao tratamento. Seu uso diminuiu a taxa de internação hospitalar em pacientes graves. Oxigênio O objetvo da suplementação é manter a saturação arterial da hemoglobina ≥92%, portanto deve ser ofertado a todos os pacientes com saturação inferior a 92%. Hélio Não deve ser usado.
h) Medidas de benef cio duvidoso Não é recomendada antbiotcoterapia para crise aguda de asma sem pneumonia. A grande maioria das exacerbações de causa infecciosa é de e tologia viral, e não existem evidências na literatura que indiquem bene f cio na evolução do paciente com an tbiotcoterapia. O uso é indicado apenas em caso de pneumonia, sinusite bacteriana aguda ou outra indicação especí fica. Da mesma forma, não há bene f cios comprovados de que a fisioterapia respiratória de ro tna, durante a crise aguda de asma, seja benéfica. Uma exceção é a presença de grande quantdade de secreção; a fisioterapia, nesse caso, pode contribuir para a eliminação daquela. O uso de mucolí tcos pode piorar a tosse, e de broncoespasmo, principalmente na forma inalatória, portanto não é recomendado. Exceto quando é necessária intubação orotraqueal, o uso de benzodiazepínicos, seda tvos e hipnótcos é poten-
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cialmente perigoso e pode levar o paciente à apneia. Caso sejam necessários (paciente muito ansioso), devem-se usá-los em doses bem baixas e com cuidado.
C - Abordagem da crise aguda de asma na emergência Alguns detalhes são importantes: Em crise de broncoespasmo grave, recomendam-se, desde a chegada ao pronto-socorro, beta-2-agonista + ipratrópio, cortcoide e sulfato de magnésio. Conforme detalhado nos respec tvos tópicos, essa terapia acelera a recuperação e diminui a necessidade de internação; - VEF1 ou PEFR (Peak Expiratory Flow Rate) sempre são referidos como predito para idade, sexo e altura. -
Pacientes que apresentam boa resposta à terapêu tca inicial ou melhora relevante durante a internação hospitalar podem ter alta hospitalar. A presença dos seguintes fatores ajuda na decisão correta da alta: - Espirometria com VEF1 >70%; - Capacidade de deambular sem dispneia; - Uso de medicação inalatória em espaços maiores que 3 a 4h; - Ausência de medicações parenterais; - Compreensão do uso das medicações que ele usará em casa; - Acompanhamento ambulatorial breve. - Prognóstco Em média, de 10 a 20% dos pacientes com crise aguda de asma que procuram o pronto-socorro necessitam de hospitalização. Destes, menos de 10% recebem ven tlação mecânica. Uma prévia necessidade de ven tlação mecânica em um asmátco aumenta em 19 vezes a chance de ser necessária, novamente, intubação orotraqueal durante uma crise aguda. Em um estudo com 939 asmá tcos que receberam alta do pronto-socorro, 17% (de 14 a 20%) apresentaram recidiva em 2 semanas. Alguns estudos conseguiram identficar fatores importantes relacionados ao prognós tco em curto prazo dos pacientes que se apresentam com crise aguda de asma no departamento de emergência. Esses fatores são: História prévia de intubação ou necessidade de UTI (consttui o fator em curto prazo mais associado a prognóstco ruim); História de uso crônico de cor tcosteroides; Piora clínica rápida do paciente; Paciente com má percepção dos sintomas (apresenta poucos sintomas, apesar de ter um grave broncoespasmo); Sintomas predominantemente noturnos; Duas ou mais internações hospitalares em período menor que 1 ano; Três ou mais visitas ao pronto-socorro em período inferior a 1 ano; •
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História prévia de exacerbações graves, cujo aparecimento é súbito; Hospitalização ou visita ao departamento de emergência há menos de 1 mês;
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Uso de mais de 2 frascos de beta-2-agonista/mês;
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Comorbidades (cardiovasculares ou DPOC);
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Doença psiquiátrica, problemas psicológicos ou uso de drogas ilícitas; Baixo nível socioeconômico.
Tabela 15 - Avaliação do broncoespasmo e tratamento na 1ª hora*
Tabela 17 - Padrão de resposta após o tratamento inicial e conduta sugerida Boa resposta VEF1 ou PERF ≥70%.
- VEF1 ou PEFR; - Oximetria de pulso; - Gasometria arterial em pacientes com VEF1 <30% ou em crises graves. ↓
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- Inalação com beta-2-agonista de curta duração (10 a 20 gotas de fenoterol a cada 20 minutos na 1ª hora ou de 4 a 8 pu ff s de salbutamol); - Manter O2 suplementar e saturação ≥90%; - Cortcoide sistêmico**: prednisona, de 40 a 60mg VO (caso não haja resposta rápida, história de broncoespasmos graves ou uso recente de cortcoide). * Pacientes bradicárdicos, confusos, rebaixados e em iminência de PCR devem ser imediatamente intubados, colocados no respirador com O2 a 100% e medicados com inalação (beta-2-agonista e ipratrópio em doses duplicadas), cor tc oide IV e sulfato de magnésio. ** Em pacientes com broncoespasmo grave, pode-se prescrever o cor tc oide IV (de 200 a 300mg de hidrocor ts ona ou de 40 a 60mg de met lprednisolona).
VEF1 ou PERF ≥50% e <70%.
Resposta sustentada 1 hora após Persistência de sintomas, a últma inalação, embora sejam leves a exame f sico moderados. normal e ausência de dispneia. Alta hospitalar.
- História; - Exame f sico (ausculta, uso de musculatura acessória, FC, FR, PA);
Resposta incompleta
Conduta na alta: - Beta-2agonista; - Cortcoide oral; - Cortcoide inalatório***; - Retorno ambulatorial; - Breve; - Orientações da doença.
Resposta inadequada VEF1 ou PERF <50%. Sintomas graves, sonolência e confusão: gasometria com PaCO2 ≥45mmHg.
Geralmente, necessitam de internação hospitalar*.
Internar em UTI e avaliar intubação**.
Prescrição: - Beta-2-agonista; - Brometo de ipratrópio; - Cortcosteroides; - Oxigênio; - Monitorizar com PEFR; - Avaliar solicitação de exames (eletrólitos, hemograma) e raio x de tórax.
Prescrição: - Beta-2-agonista; - Brometo de ipratrópio; - Cortcosteroides; - Oxigênio; - Avaliar solicitação de exames (eletrólitos, hemograma e outros). ECG e raio x de tórax.
* Nesse ponto, pode-se prescrever sulfato de magnésio e repe t r inalações com beta-2-agonista e ipratrópio; reavaliar após 2 a 4 horas. Em caso de critérios de boa resposta, deve-se dar alta hospitalar. ** Considerar o uso de vent lação não invasiva, mesmo sem estudos de adequado valor epidemiológico. *** Cor tc oide inalatório deve ser prescrito a pacientes com asma persistente, associado a cor tc oide oral.
6. Resumo Quadro-resumo
Tabela 16 - Avaliação após a 1ª hora e a conduta sugerida Crise moderada - VEF1 ou PEFR 50 a 80%. - Sintomas moderados. - Inalação com beta-2-agonista, de 1/1h. - Cortcoide sistêmico (caso ainda não tenha sido prescrito). - Contnuar tratamento por 1 a 3 horas, desde que haja melhora progressiva. Crise grave - VEF1 ou PEFR <50%. - Sintomas graves em repouso, uso de musculatura acessória, retratação do tórax, antecedentes de alto risco ou não apresentou melhora com o tratamento. - Inalação com beta-2-agonista e ipratrópio, de 1/1h, ou con tnuamente. - Cortcoide sistêmico (caso ainda não tenha sido prescrito). - Sulfato de magnésio a 10% IV = 20mL diluídos em 200mL de soro fisiológico, em 20 a 30 minutos.
- A asma é uma doença in flamatória crônica e intermitente das vias aéreas, caracterizada por sinais e sintomas de dispneia, tosse, sibilos, obstrução variável e hiper-responsividade das vias aéreas, quadro que é reversível espontaneamente ou com o uso de broncodilatadores; - O diagnóstco de asma é baseado em dados clínicos (sintomas compa veis, história familiar e pessoal de asma na infância, resposta aos medicamentos especí ficos) e funcionais (principalmente obstrução com resposta ao broncodilatador) e diagnóstco de alergia; - A asma pode ser classi ficada como intermitente, persistente leve, persistente moderada, persistente grave. Essa classi ficação é fundamental para a escolha terapêutca inicial. Posteriormente, o tratamento é baseado no nível de controle da doença: controlada, parcialmente controlada, não controlada; - Todos os pacientes asmátcos devem receber educação ambiental e orientação para o uso de broncodilatadores de demanda em caso de sintomas. Aqueles com doença persistente devem receber cortcoide inalatórios, em doses variáveis, e associados ou não a outros fármacos;
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PNEUMOLOGIA - O uso de cor tcoide sistêmico deve ser reservado para situações de exacerbação ou doença muito grave, para evitar efeitos colaterais indesejáveis; os paraefeitos dos medicamentos inalatórios são discretos e geralmente bem tolerados; - O principal diagnóstco diferencial de asma é a DPOC. Hoje, em algumas situações, tem sido aceito o diagnós tco das 2 condições associadas; - Pacientes com tríade de Samter – sintomas asma tformes, polipose nasal e intolerância a AAS –, os antleucotrienos são os fármacos com melhor resposta terapêu tca; - As xantnas têm sido recomendadas como terapêu tca de exceção; - No idoso, deve-se ter especial atenção ao diagnóstco diferencial; na gestante, a asma pode piorar (33%), permanecer estável (33%) ou melhorar (33%) – os fármacos habitualmente utlizados no tratamento da asma são seguros na gestação; - A etologia mais comum das exacerbações de asma é a infecção respiratória viral; - Regra geral no atendimento de paciente asmá tco na sala de emergência: sempre ofertar broncodilatadores inalados como terapêutca imediata, exceto em caso de sinais de parada cardíaca iminente, quando a intubação deve ser precoce.
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CAPÍTULO
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Doença pulmonar obstrutva crônica
1. Introdução
2. Prevalência e fisiopatologia
A Doença Pulmonar Obstru tva Crônica (DPOC) caracteriza-se pelo desenvolvimento progressivo de limitação ao fluxo aéreo, que não é totalmente reversível; tal limitação está associada a uma resposta inflamatória anormal dos pulmões à inalação de par culas ou gases nocivos. A síndrome geralmente é descrita como representada por 2 polos, que raramente são observados isoladamente em um mesmo indivíduo: - Enfisema pulmonar: permanente e anormal aumento dos espaços aéreos, distalmente aos bronquíolos terminais, acompanhada de destruição de suas paredes, sem fibrose óbvia; ainda que o termo seja muito u tlizado no dia a dia, é considerado um diagnós tco histopatológico; - Bronquite crônica: tosse produ tva por mais de 3 meses, durante 2 anos consecutvos. A tosse é ocasionada por hipersecreção de muco, não necessariamente com obstrução ao fluxo aéreo.
No mundo, a DPOC acomete mais de 50.000.000 de pessoas, e, no Brasil, estma-se que existam mais de 7.000.000 de pessoas acometdas, com cerca de 275.000 internações ao ano. Em 2003, o gasto com internações secundárias à DPOC foi de R$ 72.000.000,00. Segundo projeções da OMS para 2020, a DPOC será, globalmente, a 5ª causa de morte. Outras projeções acreditam que a doença, na verdade, será a 4ª maior causa de mortalidade mundial. Já nos dias de hoje, é a principal causa de morte nos Estados Unidos. A perda de VEF1 é de 15 a 30mL/ano em pessoas normais. No paciente com DPOC, essa perda anual é aumentada em 2 a 5 vezes. Curiosamente, tal perda excessiva de VEF1 só acontece em torno de 15% dos indivíduos que fumam, indicando que há componentes gené tcos envolvidos (Figura 1). De outra forma, um componente gené tco parece também envolvido devido a casos aglomerados em famílias de DPOC, inclusive em indivíduos com menos idade e diferenças em prevalência de acordo com etnias. Outra evidência vem da de ficiência de alfa-1-an ttripsina, com enfisema grave em pacientes mais jovens.
O termo DPOC denota a presença de limitação ao fluxo aéreo com manifestações clínicas de en fisema e/ou bronquite crônica. Raramente encontra-se paciente com diagnóstco de DPOC e fenó tpo puramente de en fisema pulmonar (“chamado soprador rosado”) ou de bronquite crônica (chamado “azul pletórico”); frequentemente, os pacientes têm os 2 processos patológicos associados. Entretanto, o paciente pode apresentar as caracterís tcas que definem bronquite crônica, ou mesmo ter o diagnós tco histopatológico de en fisema pulmonar, e não ter DPOC, já que para ambas (bronquite e en fisema), não é necessário haver limitação ao fluxo aéreo. Em uma perspec tva unificadora, a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Nat onal Inst tute of Health (NIH) criaram um grupo mul tcêntrico para estudo da DPOC, o Global t ve for Chronic Obstruc t ve Lung Disease (GOLD). Ini ta Segundo o GOLD, a DPOC é de finida como uma redução da relação do Volume Expiratório Forçado de 1º segundo (VEF1) sobre a Capacidade Vital Forçada (CVF) <70% (ou seja, distúrbio obstrutvo). O paciente deve ter história clínica com fatores de risco (especialmente tabagismo tendo mais de 40 anos).
Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Mar tn s Valois
Figura 1 - História natural da perda funcional em pacientes tabagistas, ex-tabagistas e não tabagistas
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PNEUMOLOGIA A maioria dos pacientes com DPOC é iden tficada pela presença de obstrução em prova de função pulmonar, usualmente na 5ª década de vida. Geralmente, VEF1 menor que 40% do predito implica dispneia aos pequenos esforços, e menor que 25%, dispneia em repouso, retenção de CO2 e cor pulmonale. Além da diminuição do VEF1, outras alterações são: - Aumento do volume residual e da capacidade residual funcional; - Progressiva disfunção diafragmá tca devido à re tficação da cúpula, o que pode levar a uma desvantagem mecânica na ventlação; - Aumento da capacidade pulmonar total e, frequentemente, redução da capacidade vital; - Vasoconstrição arterial pulmonar devido à hipoxemia, com aumento na Pressão da Artéria Pulmonar (PAP). O endotélio de pacientes com DPOC apresenta uma diminuída síntese de óxido nítrico (de ficiência da NOsintase); - A hipóxia, junto com a hipercapnia, ocasiona o aumento dos níveis de catecolaminas, renina e aldosterona, o que pode levar à retenção de sal e água; - Hipóxia, aumento do trabalho respiratório e níveis aumentados de citocinas e TNF-beta podem levar à significatva perda de peso (caquexia).
3. Processo inflamatório crônico das vias aéreas O tabagismo (atvo e passivo), de longe, é o maior responsável por DPOC. Estma-se que 90% dos casos de DPOC têm o tabagismo como fator e tológico. Outros fatores envolvidos são: - Inalação de par culas ambientais: dióxido de enxofre, químicos ocupacionais como o cádmio e par culas associadas ao cozimento em locais fechados. Um estudo demonstrou que a exposição ambiental é responsável por cerca de 19% dos casos de DPOC e 31% dos casos em pacientes não fumantes. Também a exposição à fumaça de fogo de lenha apresenta relação de finida com DPOC; - Genétcos: o melhor documentado é a de ficiência de alfa-1-anttripsina (Tabela 1). Os pacientes podem apresentar enfisema precoce, mas, ainda assim, a maioria dos homozigotos para de ficiência não apresenta doença clínica. Deve-se pontuar, no entanto, que, ao realizar provas de função pulmonar em idade acima de 70 anos, quase todos os pacientes apresentam alteração que de fine DPOC. Existe um processo in flamatório crônico nas vias aéreas do paciente com DPOC, mas essa in flamação difere, significatvamente, da vista na asma brônquica. A via final da inflamação na DPOC é o imbalanço entre as proteases (lesivas ao epitélio respiratório) e as an tproteases. Os principais efetores da inflamação são:
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Celularidade: há uma in flamação em vias aéreas periféricas (bronquíolos) e no parênquima pulmonar. Eles são infiltrados com macrófagos, linfócitos citotóxicos CD8+ e neutró filos. No lavado broncoalveolar (LBA), há aumento de polimorfonucleares e macrófagos, diferente da asma, em que há predomínio de eosinó filos. Macrófagos parecem ter um papel crí tco: são de 5 a 10 vezes mais frequentes do que em outros locais, estão localizados nos sí tos de destruição e são a tvados pelas par culas do cigarro; - Papel das proteases: elastase, proteinase 3 e catepsinas são liberadas por polimorfonucleares (PMN) e macrófagos. Eles causam destruição do tecido conec tvo e estão associados à produção de en fisema em animais. A elastase é inibida pela alfa-1-an ttripsina (alfa-1-AT) no parênquima pulmonar, e, certamente, a sua deficiência está associada a en fisema nos humanos. Entretanto, é incerto o papel da elastase em tabagistas sem deficiência de alfa-1-AT; - Metaloproteases: têm altas concentrações LBA. Os macrófagos e PMN são os principais responsáveis pela produção das metaloproteases. Causam destruição dos tecidos, e seus derivados são quimiotá tcos. Há crescente evidência do seu papel em DPOC. As mais envolvidas são metaloproteinase 1 (colagenase), metaloproteinase 9 (gela tnase-B) e metaloproteinase 12 (metaloelastase); - Deficiência de “protetores” endógenos: alfa-1-anttripsina, TIMP1, TIMP2 e TIMP3 (tecidual inibidor das metaloproteinases) são os principais antagonistas das proteases. As TIMPs são secretadas pelo epitélio das vias aéreas. O cigarro leva a um processo in flamatório em vias aéreas com aumento da liberação de proteases e diminuição da secreção das TIMPs. Talvez o polimorfismo genétco possa agir influenciando esse desequilíbrio; - Estresse oxidatvo: causa um aumento na produção de peróxido de hidrogênio e de outras substâncias relacionadas à oxidação; - Efeitos sistêmicos: o processo de destruição pulmonar leva a um aumento nas concentrações séricas de TNF e interleucinas e aumento da expressão de moléculas de adesão. A DPOC, especialmente com o predomínio de enfisema, pode levar à profunda perda de peso, com fraqueza do músculo esquelé tco, inclusive com diminuição da força da musculatura respiratória. -
Tabela 1 - Característ cas da de fi ciência de alfa-1-ant tripsina - A alfa-1-AT, uma proteína com a tvidade antelastase neutrof lica, é produzida pelo f gado (em quantdade muito menor por neutrófilos e monócitos). Concentração sérica maior que 35% é considerada protetora. Há 75 alelos conhecidos da alfa-AT, herdados de maneira autossômica codominante. A classi ficação é normal (MM), deficiente (ZZ), nulo (null ), disfuncional;
DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA
- A forma mais comum associada à de ficiência de alfa-1-anttripsina é o alelo-ZZ (ou PiZZ fenótpo), que resulta de uma única mutação no aminoácido 342 e se transforma em uma polimerização espontânea do polipep dio, impedindo a sua liberação na circulação. Essa forma está associada à cirrose e en fisema pulmonar. Outras possibilidades são o fenó tpo null-null , com níveis indetectáveis de alfa-1-AT, e o fenó tpo null -heterozigoto, que resulta em quantdades intermediárias de alfa 1-AT; - Deve-se suspeitar dela nas seguintes situações: a) Enfisema em paciente com menos de 45 anos. b) Enfisema sem fator de risco evidente. c) Enfisema com predomínio em lobos inferiores. d) Doença hepátca inexplicada. e) Vasculite com ANCA positvo. f) História familiar de enfisema, doença hepátca, paniculite ou bronquiectasia. - Em uma série de 1.129 casos, os pacientes iniciaram com tosse, dispneia, sibilos; tnham uma média de VEF1 menor que 50%. Nessa série, 80% dos indivíduos tnham uma História Familiar (HF) positva para doença pulmonar e 25% para doença hepá tca;
Outro sintoma frequente é a tosse, ainda mais que a dispneia. A 1ª pode ser diária ou intermitente e preceder a 2ª, ou ambas aparecerem concomitantemente. O aparecimento da tosse no fumante é, entretanto, comum, e muitos pacientes não a julgam um sintoma de doença, considerando-a um sintoma esperado em um tabagista. Podem ser encontrados em pacientes com DPOC: - Sibilos, expiração forçada, diminuição do Murmúrio Vesicular (MV), aumento do diâmetro AP do tórax, taquipneia, taquicardia, roncos difusos, crepitações, bulhas cardíacas abafadas; - Achados de cor pulmonale, como edema de membros inferiores, hepatomegalia dolorosa, bulha pulmonar (P2) hiperfonétca e palpável, sopro de insuficiência tricúspide; - Presença do sinal de Kussmaul (ingurgitamento das veias do pescoço com inspiração); - Cianose e pletora podem surgir mais tardiamente.
- O tabagismo é um cofator especial. A perda média do VEF1 na deficiência grave de alfa-1-anttripsina é de 50 a 80mL ao ano, mas, se o indivíduo fuma, essa perda aumenta para 100 a 130mL/ano;
Um detalhe importante na propedêu tca de pacientes com DPOC: baqueteamento digital – não cons ttui sinal de DPOC; quando presente, pode indicar doenças associadas (Tabela 3).
- Além do tratamento especí fico para DPOC, em alguns casos está indicada a reposição da enzima – a depender do nível sérico e do fenótpo do indivíduo.
Tabela 3 - Principais causas de baqueteamento digital
4. Diagnóstco e exames complementares O diagnóstco de DPOC exige dados clínicos (sintomas respiratórios crônicos e progressivos), funcionais (obstrução ao fluxo aéreo) e epidemiológicos (fator de risco como o tabagismo). A história e o exame f sico, isoladamente, têm baixa sensibilidade. Em formas leves a moderadas de DPOC, o exame f sico pode ser absolutamente normal. O principal sintoma associado é a dispneia, que é progressiva com a evolução da doença. Alguns índices de avaliação de dispneia, como a classificação da MRC modi ficada, apresentam correlação com prognóstcos dos pacientes com DPOC. Tal classificação é adotada pela American Thoracic Society para avaliação da dispneia, conforme a Tabela 2. Tabela 2 - Classi fi cação MRC de dispneia Grau de dispneia
Esforço f sico
0
Tenho falta de ar para realizar exercício intenso.
1
Tenho falta de ar quando apresso o passo, ou subo escadas ou ladeira.
2
Preciso parar algumas vezes quando ando no meu passo, ou ando mais devagar que outras pessoas de minha idade.
3
Preciso parar muitas vezes por falta de ar quando ando perto de 100m, ou poucos minutos de caminhada no plano.
4
Sinto tanta falta de ar que não saio de casa, ou preciso de ajuda para me ves tr ou tomar banho sozinho.
- Insuficiência hepátca; - Neoplasia de pulmão (principalmente, adenocarcinoma); - Doenças pulmonares fibrosantes; - Bronquiectasias; - Fibrose cístca; - Abscesso pulmonar; - Fístula arteriovenosa; - Cardiopata congênita cianótca; - Endocardite bacteriana.
O GOLD sugere alguns achados suges tvos do diagnóstco de DPOC, resumidos na Tabela 4. Tabela 4 - Indicadores fundamentais para a consideração do diagnóst co de DPOC Tosse crônica
- Presente de modo intermitente ou diariamente e, com frequência, ao longo do dia; raramente, é apenas noturna.
Produção crônica - Qualquer forma de produção crônica de exde expectoração pectoração pode indicar DPOC. - Progressiva: agrava-se com o passar do tempo; - Persistente: presente diariamente; Dispneia
- Descrita pelo paciente como esforço aumentado para respirar, peso, cansaço ou sufocamento; - Agrava-se com exercício; - Agrava-se durante infecções respiratórias.
História de exposição a fatores de risco
- Fumaça de tabaco; - Poeiras e produtos químicos ocupacionais; - Fumaça proveniente da cozinha domiciliar e da queima de combus veis.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA Tabela 5 - Sensibilidade, especi fi cidade e likelihood rat o (razão de verossimilhança) dos dados da história e exame f sico no diagnóst co de DPOC
doença, mas pode revelar diagnós tcos associados ou diferenciais (neoplasia, pneumonia, doenças fibrosantes etc.). A radiografia de tórax é importante em pacientes com exacerbação, pois modifica a conduta em pouco mais de 20% dos casos, sendo, portanto, obrigatória nessa situação. Na deficiência de A-1-AT, essas zonas de en fisema predominam em lobos inferiores. Re tficação do diafragma, aumento de espaço retroesternal e retrocardíaco, aumento de espaço entre as costelas e sinais de hipertensão pulmonar também podem estabelecer o diagnós tco de DPOC.
Sensibilidade
Especi ficidade
Tabagismo
92%
49%
1,8
0,16
Sibilos
61%
84%
3,3
0,56
Expectoração com >80mL/dia
20%
96%
4
0,84
Tosse
51%
71%
1,6
0,69
Dispneia aos esforços
37%
89%
2,2
0,83
Tórax em tonel
10%
99%
10
0,9
Hipofonese de bulhas
13%
98%
10
0,88
MV diminuído
37%
90%
3,7
0,7
Diafragma D abaixo da 7ª costela
Roncos
8%
89%
5,9
0,95
Achados
Lr (+) Lr (-)
A - Provas de função pulmonar Trata-se de exames fundamentais para o diagnós tco e o estadiamento da DPOC. A presença de relação VEF1/CVF inferior a 0,7, associada aos dados clínicos e epidemiológicos, pratcamente define o diagnóstco. Em fases precoces da doença, o VEF1 pode ser preservado, com seu valor reduzindo conforme a progressão clínica (Tabela 6). A avaliação de reversibilidade ao broncodilatador deve ser feita com o paciente clinicamente estável. A presença de reversibilidade com uso de broncodilatador não afasta o diagnóstco, mas mais provável o diagnós tco de asma isolada ou associada. A classificação da DPOC é feita basicamente com a espirometria; alguns dados clínicos e gasométricos também podem ser associados para caracterizar a gravidade. Anteriormente, ela incluía o estágio zero, que representava pacientes com risco de desenvolver DPOC, como tabagistas e tossidores crônicos, com espirometria normal. Atualmente, essa classe foi suprimida. Os valores considerados para a classificação são os melhores obtdos pelo pacientes, pré ou pós-broncodilatador. Tabela 6 - Classi fi cação da DPOC conforme GOLD 2008 GOLD 2004 I - Leve
Espirometria
Característca adicional
VEF1/CVF <0,7 e VEF1 ≥80%
-
II - Mode- VEF1/CVF 0,7 e 50% ≤VEF1 ≤80% rado III - Grave
VEF1/CVF 0,7 e 30% ≤VEF1 ≤50%
VEF1/CVF 0,7. IV - Muito VEF1 <30% ou um grave VEF1 <50% + falência
Tabela 7 - Estudo que demonstrou os principais achados diagnóst cos de DPOC em radiogra fi a de tórax Achado radiológico
Sensibilidade Especificidade 30 a 40%
87%
Espaço retroesternal >4,4cm
32%
85 a 93%
Diâmetro cardíaco <11,5cm
23 a 29%
89 a 95%
Figura 2 - Radiogra fi a de tórax de paciente com en fi sema de predomínio em lobos inferiores
Dispneia MRC 2 ou 3 ou hipoxemia (PO2 <60mmHg) Dispneia MRC 4, cor pulmonale ou hipercapnia (PCO2 >50mmHg)
B - Radiografia de tórax Pode ser normal em formas leves de DPOC, de maneira que não é ú tl para definir ou afastar o diagnós tco da
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Figura 3 - Radiogra fi as em PA e per fi l de paciente com DPOC evidenciando sinais de hiperinsu fl ação
DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA
C - Eletrocardiograma
E - Gasometria arterial
Pode mostrar sinais de hipertensão pulmonar (onda P apiculada em dII, desvio do eixo para a direita), que pode ser indício de DPOC muito grave. Durante a exacerbação, podem ser observadas arritmias atriais, sendo a taquicardia atrial multfocal a mais característca.
As alterações relevantes de troca gasosa aparecem em fase avançada da DPOC, o que torna a gasometria um exame dispensável na maioria das vezes. É indicada para avaliar a gravidade da doença, em pacientes que tenham a saturação de oxigênio inferior a 92%, com obje tvo de avaliar indicação de oxigênio domiciliar. A hipercapnia habitualmente surge em fase bem mais avançada da doença.
D - Tomografia computadorizada de tórax Habitualmente, é desnecessária para o diagnós tco. O achado de en fisema não define o diagnóstco de DPOC tampouco tem signi ficado patológico. Pela tomogra fia, podem-se caracterizar 3 tpos de enfisema: enfisema parasseptal (observado em região subpleural, sem relação com tabagismo e sem significado patológico), en fisema centrolobular (associado ao hábito de fumar, eventualmente assume o aspecto em “roído de traça”), en fisema panlobular (muito comum em deficiência de alfa-1-anttripsina). Eventualmente, podem-se encontrar bolhas.
5. Diagnóstco diferencial O diagnóstco diferencial é amplo e pode incluir pneumonia, insuficiência cardíaca, arritmias, pneumotórax, derrame pleural, embolia pulmonar, câncer de pulmão, tuberculose, bronquiectasias, bronquiolite obliterante e panbronquiolite difusa. O diagnóstco diferencial com asma é o que gera mais dificuldade, tanto que hoje em dia tem-se aceitado o diagnós tco de associação de DPOC e asma em alguns casos, principalmente naqueles que mesclam caracterís tcas relevantes das 2 doenças (corresponde a menos de 10% dos casos). Tabela 8 - Diagnóst cos diferenciais de DPOC Diagnóstco
Característcas sugestvas - Surgimento na meia idade; - Sintomas paulatnamente progressivos;
DPOC
- Longa história de fumo; - Dispneia durante o exercício; - Limitação de fluxo aéreo amplamente irreversível. - Surgimento no início da vida (frequentemente na infância);
Figura 4 - En fi sema parasseptal
- Sintomas variam de um dia para outro; Asma
- Sintomas à noite/de manhã cedo; - Alergia, rinite e/ou eczema também presentes; - História familiar de asma; - Limitação do fluxo aéreo amplamente reversível. - Estertores crepitantes finos nas bases à ausculta;
Insuficiência cardíaca congestva
- Raio x do tórax revela coração dilatado e edema pulmonar; - Testes de função pulmonar indicam restrição do volume e não limitação do fluxo aéreo. - Grande quantdade de expectoração purulenta;
Figura 5 - En fi sema centrolobular
- Comumente associada à infecção bacteriana; Bronquiectasia - Estertores crepitantes grosseiros/baqueteamento à ausculta; - Raio x do tórax/TC revela dilatação brônquica, espessamento da parede brônquica. - Surgimento em qualquer idade; Tuberculose
- Raio x de tórax revela in filtração pulmonar ou lesões cavitadas; - Confirmação microbiológica;
Figura 6 - En fi sema panlobular
- Alta prevalência local de tuberculose.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA Diagnóstco
Bronquiolite obliterante
Característcas sugestvas - Surgimento em indivíduos mais jovens, não fumantes; - Pode ter história de artrite reumatoide ou colagenose; - TC na expiração apresenta áreas hipodensas.
Essas característ cas tendem a ser picas das respec t vas doenças, mas não ocorrem em todos os casos. Por exemplo, uma pessoa que nunca fumou pode desenvolver DPOC (especialmente, no mundo em desenvolvimento, onde outros fatores de risco podem ser mais relevantes do que o tabagismo); a asma pode desenvolver-se em adultos e mesmo em pacientes de idade avançada.
6. Partcularidades no manejo ambulatorial Três pontos no controle de DPOC estável são muito importantes e não podem ser esquecidos: 1 - O paciente tem de abandonar o tabagismo: a persistência do vício está associada a pior prognós tco, maior queda anual do VEF1, maior número de exacerbações, maior chance de internação e de morte. Devem-se usar todas as medidas farmacológicas (bupropiona, nicotna ou ambos) e não farmacológicas (exercícios, psicoterapia etc.). 2 - Indicar vacinação (anual para in fl uenza e a cada 5 anos para pneumococo). 3 - Indicar reabilitação pulmonar para os pacientes com doença de estágio 2 ou maior.
A - Tratamento farmacológico As medicações disponíveis para o tratamento de DPOC têm como obje tvo principal melhorar a qualidade de vida dos pacientes e compreendem os broncodilatadores, glicocortcoides e metlxantnas. A escolha entre um ou outro broncodilatador depende de cada doente. Em geral, recomenda-se um deles, e é possível associar outros, de acordo com os sintomas. Os broncodilatadores de longa ação (formoterol, salmeterol e totrópio) são mais prátcos, embora sejam mais caros. Deve-se lembrar que os broncodilatadores de curta ação devem ser usados para o alívio imediato de crises de dispneia, e o tratamento para essas crises (para alívio imediato) pode ser feito da seguinte maneira: - Broncodilatadores de curta ação (habitualmente, a associação de beta-agonista e an tcolinérgico), até de 4/4h. Pacientes que apresentem sintomas con nuos devem utlizar algum fármaco além do broncodilatador de curta ação, da seguinte forma: - Iniciar um beta-agonista de longa ação (formoterol ou salmeterol) ou tiotrópio; se não houver melhora, iniciar a associação daquele que foi preterido inicialmente. Se ainda não houver melhora, associar metilxantina.
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Os cortcoides inalatórios têm um uso mais restrito no manejo de DPOC. Quando indicados, entretanto, reduzem o número de exacerbações e de reinternações, melhoram a qualidade de vida, aliviam os sintomas e não reduzem a mortalidade. Estão indicados a pacientes com DPOC grave ou muito grave com exacerbações repetdas no últmo ano. A despeito de muita confusão que o termo “exacerbações repetdas” gerou em diretrizes an tgas, a tendência atual é considerar a ocorrência de 2 ou mais exacerbações nestes pacientes como indicação de uso de cor tcoides inalatórios. A descrição das principais medicações u tlizadas para tratamento da DPOC será discutda a seguir. a) Antcolinérgicos Brometo de ipratrópio Diminui a ação da ace tlcolina nas fibras pós-gangliônicas muscarínicas que terminam no epitélio, glândulas submucosas e musculatura lisa das vias aéreas, reduzindo assim o tono broncoconstritor. -
•
•
Aerossol: a dose usual é de 2 a 3 pu ff s (de 400 a 600mcg), com intervalo de 6 a 8 horas; Nebulização: a dose usual é de 20 a 50 gotas diluídas em 3 a 5mL de soro fisiológico, com intervalo de 4 a 6 horas.
Brometo de totrópio O mecanismo é semelhante ao do ipratrópio, mas com efeito prolongado, de cerca de 24 horas. Não tem u tlidade no tratamento dos sintomas agudos, apenas como fármaco de manutenção. Existem 2 formulações no mercado: a) cápsulas para inalação, cominação do conteúdo de 1 cápsula ao dia (18mcg); inalador, com 2 aplicações de 2,5mg sequenciais ao dia; b) Beta-2-agonistas de curta duração. -
Salbutamol Apresenta atuação preferencial nos receptores beta-2, a tvando a adenilciclase e aumentando o AMP cíclico. Esse aumento causa relaxamento da musculatura brônquica e inibição da liberação de mediadores in flamatórios nos mastócitos. -
•
•
Aerossol: dose usual de 200 a 400mcg, com intervalo de 4 a 6 horas. A forma inalatória também pode ser usada no pronto-socorro, na dose de 200 a 400mcg até de 20/20min na 1ª hora; Nebulização: de 10 a 20 gotas diluídas em 3 a 5mL de soro fisiológico, com intervalo de 4 a 6 horas. No Brasil, é a apresentação mais usada.
Fenoterol Tem índice de efeitos adversos um pouco maior que o salbutamol. Aerossol: dose usual de 200 a 400mcg, com intervalo de 4 a 6 horas. A forma inalatória também pode ser usada no pronto-socorro, na dose de 200 a 400mcg até de 20/20min na 1ª hora; -
•
DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA
•
Nebulização: de 10 a 20 gotas diluídas em 3 a 5mL de soro fisiológico, com intervalo de 4 a 6 horas.
b) Beta-2 agonistas de longa duração São o formoterol e o salmeterol, adrenérgicos inalatórios de longa ação e 2 medicamentos de grande importância no controle de pacientes com asma e DPOC. Em linhas gerais, têm semelhanças com o salbutamol, fenoterol ou terbutalina inalatórios, exceto pela maior duração de ação, permitndo o uso em 2 tomadas diárias. c) Cortcoides inalatórios São os mesmos fármacos u tlizados no tratamento da asma, mas que habitualmente têm menor e ficácia nos pacientes com DPOC. Quando indicados, são u tlizados em doses intermediárias. Exemplos são: beclometasona, budesonida, flutcasona e metlxantnas. As xantnas são fármacos cada vez menos u tlizados no tratamento de doenças pulmonares. Seu efeito direto ocorre por inibição da fosfodiesterase, causando o acúmulo de AMP cíclico intracelular e o consequente relaxamento do músculo liso das vias aéreas, embora se acredite que elas tenham um adicional, antagonizando os receptores da adenosina. As xantnas têm índice terapêu tco muito baixo, sendo a dose clinicamente efe tva muito próxima da tóxica. Paraefeitos são extremamente comuns, principalmente náuseas e arritmias. Um detalhe na farmacodinâmica das xantnas ainda vem sendo muito abordado em provas de residência: sua interação com outros fármacos ou condições clínicas, com aumento ou redução de seu nível sérico, ilustrados na Tabela 9. Tabela 9 - Situações clínicas e fármacos que interferem na depuração das xant nas Aumentam o nível sérico das xantnas - Cimetidina; - Alopurinol; - Eritromicina; - Claritromicina; - Ciprofloxacino; - Propranolol; - Insuficiência cardíaca; - Cirrose hepática; - Anticoncepcionais orais. Reduzem o nível sérico das xan tnas - Rifampicina; - Fenitoína; - Barbitúricos; - Tabagismo. -
Aminofilina IV: dose inicial em bolus de 6mg/kg de peso, IV, durante 20 a 30 minutos (manter uma infusão de, no máximo, 25mg/min). A dose de manutenção é
de 0,5mg/kg/h para não fumantes e de 0,8mg/kg/h para tabagistas. É absolutamente importante monitorizar os níveis séricos, devido aos grandes riscos caso a droga atnja altas concentrações séricas (manter entre 10 e 20mcg/mL); - Teofilina: dose inicial de 5mg/kg (infusão <25mg/min) e manutenção com 0,4mg/kg/h; - Via oral: a dose da teo filina é de 100 a 900mg (comprimidos de 100, 200 e 300mg), sempre ofertados a cada 8 horas. É necessária, também nesses pacientes, a monitorização cuidadosa; - Bamifilina: disponível por VO, em comprimidos de 300 ou 600mg, tomados a cada 12 horas.
B - Tratamento de acordo com o estadio A Tabela 10 descreve o tratamento da DPOC estável de acordo com o estadio, conforme recomendado pelo GOLD. Tabela 10 - Tratamento de DPOC estável Estadio de DPOC Recomendação
I
II
III
IV
Evitar fatores de risco
Sim
Sim
Cessar tabagismo
Sim
Sim Sim
Sim
Vacinação
Sim
Sim Sim
Sim
Broncodilatador se dispneia (curta ação)
Sim
Sim Sim
Sim
Sim Sim
Adicionar 1 ou mais broncodilatadores de longa ação
-
Sim
Indicar reabilitação pulmonar
-
Sim Sim
Cortcosteroides inalatórios se exacerbações repetdas
-
-
Sim
Sim
Considerar oxigênio domiciliar
-
-
Sim
Sim
Cortcoide oral de forma con nua
Sim Sim Sim
Não Não Não Não
C - Oxigênio domiciliar Dois estudos apontaram redução da mortalidade e melhora na qualidade de vida com o uso de oxigênio em caso de PaO2 ≤55mmHg. Estudos não têm demonstrado melhora de sobrevida com hipoxemia menos grave. Do mesmo modo, o oxigênio apenas no período noturno não mostrou bene f cio em pacientes com hipoxemia noturna documentada. O benef cio da oxigenoterapia é em longo prazo. Além disso, ela é bastante onerosa, e deve-se esperar um estado relatvamente estável para avaliar se há indicação ou não. No momento, persistem as 2 indicações clássicas para oxigênio domiciliar: 1 - PaO2 ≤55mmHg em repouso, ou SO 2 ≤88% sem sinais de cor pulmonale. 2 - PaO2 ≤59mmHg em repouso, ou SO 2 entre 88 e 90%, com sinais de cor pulmonale.
D - Tratamento cirúrgico Dentre as opções cirúrgicas para o tratamento da DPOC, tem-se, em especial, a cirurgia de redução pulmonar e bu-
41
A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA lectomia, para pacientes com grandes bolhas de en fisema, além do transplante pulmonar. A cirurgia de redução do volume foi avaliada, principalmente, no estudo NETT (Nat onal Emphysema Therapy Trial ), que iden tficando característcas que ajudam a determinar pacientes com maior probabilidade de bene f cio com o procedimento: aqueles com en fisema predominando nos lobos superiores e com baixa capacidade de exercício (através da ergoespirometria). O transplante pulmonar pode ser considerado alternatva a pacientes com doença pulmonar grave sem resposta aos tratamentos disponíveis. Entre os portadores de DPOC, o transplante deve ser reservado aos que apresentam contraindicação à cirurgia redutora do volume pulmonar ou aos pacientes previamente subme tdos ao procedimento sem melhora ou que novamente apresentaram piora funcional. A indicação pode ser considerada a pacientes com VEF1 <35%, principalmente se VEF1 <20%, sem alterna tvas terapêu tcas, clínicas ou cirúrgicas, sem comorbidades, mas com menos de 65 anos e com boas condições psicossocial e familiar. A principal indicação de bulectomia é a presença de dispneia em pacientes com bolhas de en fisema que ocupam, pelo menos, 30% do hemitórax. Outra indicação é a história de pneumotórax. Os resultados cirúrgicos tendem a ser melhores em pacientes com bolhas que ocupam mais de 50% de um hemitórax. O risco cirúrgico aumenta muito em pacientes com VEF 1 <40% do predito, na presença de dispneia severa, hipercapnia ou cor pulmonale: o risco cirúrgico torna proibi tva a cirurgia.
E - Prognóstco O melhor parâmetro disponível hoje para avaliação de prognóstco de pacientes com DPOC é o índice BODE, publicado no início da década de 1970 no New England Journal of Medicine. O escore u tliza parâmetros como índice de massa corpórea, distância que o paciente é capaz de caminhar em 6 minutos, classificação de dispneia da MRC e VEF1 (Tabela 11). Tabela 11 - Classi fi cação de dispneia pelo escore BODE Variáveis
Pontos 0
1
2
3
VEF1
≥65%
50 a 64%
Distância em 6 min (m)
>350 250 a 349 150 a 249 ≤149
IMC
>21
≤21
-
-
Classi ficação MRC
0a1
2
3
4
36 a 49% ≤35%
Os pacientes que apresentaram um escore BODE de 7 a 10 pontos manifestaram mortalidade de 80% em 52 meses; aqueles no quar tl 1 (0 a 2) indicaram mortalidade em torno de 10%; entre os pacientes do 2º quar tl (3 a 4), a mortalidade foi de 20 a 25%; e, no 3º quar tl, um pouco menos que 40%. A correlação com sobrevida foi melhor do que a ob t-
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da pelo VEF1. Apesar desses resultados, essa classi ficação ainda não é universalmente aceita. Dentre as opções terapêu tcas disponíveis para DPOC, as únicas capazes de modi ficar a sobrevida dos pacientes são cessação do tabagismo e oxigenoterapia (quando indicada).
7. Exacerbação A exacerbação é de finida como aumento nos sintomas e piora da função pulmonar, e caracteriza-se por uma piora da dispneia com aumento da produção e/ou mudança na característca do escarro (torna-se purulento). É uma causa comum de internação, e, aparentemente, as infecções têm um papel central. Uma diferença importante durante a exacerbação é que aumentam os eosinó filos nas vias aéreas, o que talvez explique a melhora com cor tcoide nessa agudização. O GOLD utliza 3 critérios cardinais para classi ficar a exacerbação de DPOC. Tabela 12 - Critérios cardinais ut lizados pelo GOLD para classi fi car a exacerbação de DPOC 1 - Piora da dispneia. 2 - Aumento da produção de escarro. 3 - Escarro que se torna purulento.
A exacerbação pode ser classi ficada em: - Leve: 1 dos critérios cardinais + um achado adicional (infecção de vias aéreas superiores, febre sem causa aparente, sibilos, aumento da tosse, aumento na frequência respiratória ou frequência cardíaca em mais de 20% daquela de base); -
Moderada: 2 dos 3 critérios cardinais;
-
Grave: presença dos 3 critérios cardinais.
A avaliação da gravidade deve ser feita por meio dos sintomas e da avaliação dos gases arteriais. A espirometria não parece ser adequada para avaliação da gravidade da crise. A gasometria apresenta uma nuance importante: a presença de hipercapnia, não necessariamente indica gravidade maior. A razão é que alguns pacientes, no seu dia a dia, já apresentam pCO2 elevada pelo estadiamento avançado da doença – nesses casos, o bicarbonato é cronicamente elevado, para manter o pH em níveis normais. Na hipercapnia aguda, esse mecanismo de compensação inexiste, e o pH cai, traduzindo acidemia; assim, em pacientes na sala de emergência que possuam pCO 2 elevada e pH normal, a gasometria não acresce gravidade; entretanto, naqueles com pCO2 elevada e pH baixo, a exacerbação reveste-se de gravidade extrema, e medidas devem ser adotadas para a correção da pCO2, como a ventlação não invasiva. O papel das infecções bacterianas como o principal fator etológico das exacerbações da DPOC ainda é controverso. Um estudo recente procurou avaliar se, antes da exacerba-
DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA
ção, poderia haver uma mudança nas cepas bacterianas. Os autores estudaram, prospectvamente, 81 pacientes com DPOC, com coleta de escarro mensalmente e nova coleta durante uma exacerbação. Em todas as amostras, foi realizada tpagem molecular para vários germes. Os principais resultados foram 374 episódios de exacerbação: em 33% das exacerbações, houve uma mudança na cepa bacteriana. Dos doentes que não tveram nenhuma exacerbação, apenas 15,4% apresentaram mudança na cepa. Isso leva a um risco relatvo = 2,15 (IC95%: 1,83 a 2,53). Nesse estudo, concluiu-se que a aquisição de novas cepas de pneumococo, Haemophilus ou Moraxella pode estar associada a maior chance de exacerbação da DPOC. Entretanto, em grande parte dos pacientes, não foi encontrada uma mudança nas cepas, o que implica a existência de outros fatores envolvidos. Acredita-se que parte das exacerbações se deva a infecções virais (até 1/3 dos pacientes) ou fatores ambientais (poluição e alterações de temperatura). Ainda que a e tologia infecciosa seja a principal, é importante valorizar as e tologias não infecciosas: pneumotórax, infarto agudo do miocárdio, embolia pulmonar, trauma, arritmia etc.
8. Tratamento da exacerbação A - Internação x tratamento ambulatorial A decisão de internar ou não o paciente baseia-se em vários fatores, como gravidade da exacerbação, gravidade da DPOC de base, comorbidades e suporte adequados em casa. Não há regras firmes, e deve-se usar o bom senso. Algumas vezes, o paciente apresenta descompensação grave e pode necessitar de tratamento em unidade de terapia intensiva. O Consenso Brasileiro considera indicações de internação do paciente com DPOC: - Insuficiência respiratória grave: aumento acentuado da dispneia, distúrbios de conduta ou hipersonolência, incapacidade para alimentar-se, dormir ou deambular; - Hipoxemia refratária ou hipercapnia com acidose (comparar com gasometrias prévias do paciente); - Complicações como TEP, pneumonia ou pneumotórax; - ICC descompensada ou descompensação de outra condição clínica associada com o diabetes; - Pode-se considerar, ainda, internação em pacientes estáveis, em caso de: Necessidades de procedimentos invasivos como broncoscopia; Impossibilidade de acompanhamento no ambulatório no momento devido a problemas socioeconômicos; Procedimentos cirúrgicos que necessitem de drogas sedatvas ou hipnó tcas. •
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•
B - Tratamento da exacerbação Os objetvos do tratamento da exacerbação da DPOC são tratar a etologia, manter nível adequado de oximetria, reduzir a resistência das vias aéreas e melhorar a performance muscular. Ferramentas terapêu tcas incluem oxigênio, broncodilatadores, cortcosteroides, antbiótcos, fármacos especí ficos para comorbidades, ventlação não invasiva e, eventualmente, intubação orotraqueal e ven tlação mecânica.
C - Broncodilatadores inalatórios Geralmente, há pouca melhora espirométrica, porém melhora sintomátca importante da dispneia. Estudos têm demonstrado a eficácia de antcolinérgicos e de beta-2-adrenérgico de curta ação. Ao menos 3 grandes estudos controlados e randomizados mostraram que a associação do beta-2-adrenérgico ao an tcolinérgico foi melhor do que ambos isoladamente; houve uma signi ficatva melhora no VEF1 de 25% com a terapia combinada. Os medicamentos e as doses recomendadas são: - Salbutamol ou fenoterol: de 10 a 20 gotas (de 2,5 a 5mg) diluídas em 3 a 5mL de soro fisiológico: 3 inalações a cada 20 minutos ou mesmo con nuas, se o paciente se apresenta muito grave. Depois, aumentar o intervalo entre as doses (1/1h, 2/2h e assim por diante, de acordo com a melhora); - Brometo de ipratrópio: de 20 a 40 gotas na mesma solução da inalação citada; - As Diretrizes Nacionais recomendam u tlizar a combinação de beta-2-adrenérgico e an tcolinérgico inalados no alívio da dispneia. Não há vantagem adicional de uso de beta-agonista sistêmico.
D - Antbiótcos Existe muita controvérsia em relação às indicações de antbiótcos nas exacerbações de DPOC. A recomendação mais aceita é fornecer an tbacterianos nas seguintes situações: - Estgmas inequívocos de infecção bacteriana (exemplo: foco pneumônico em radiogra fia); - Exacerbação com secreção purulenta; - Exacerbação grave de DPOC (de finida como aquela que necessita de admissão em UTI). As bactérias mais associadas são Haemophilus in fl uenzae, Streptococcus pneumoniae e Moraxella catarrhalis. A escolha do antbacteriano, entretanto, é outro ponto de polêmica, pois outros germes podem estar envolvidos, como Pseudomonas ou outros com padrão de resistência relevante. A presunção do germe responsável depende da gravidade da doença e fatores de risco para mau prognós tco (Tabela 13), e as recomendações da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia estão na Tabela 14.
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PNEUMOLOGIA Tabela 13 - Fatores de risco para evolução desfavorável de DPOC - Idade superior a 65 anos; - Dispneia grave; - Comorbidade significatva (cardiopata, diabetes mellitus com uso de insulina, insuficiência renal, insuficiência hepátca); - Mais de 4 exacerbações nos úl tmos 12 meses; - Hospitalização por exacerbação no ano prévio; - Uso de cortcoide sistêmico nos úl tmos 3 meses; - Uso de antbiótcos nos últmos 15 dias; - Desnutrição. Tabela 14 - Seleção de ant bacterianos na exacerbação de DPOC (modi fi cado de SBPT, 2006) Grupo
Antbiótco recomendado
VEF1 >50% sem fatores de risco
Beta-lactâmico/inibidor de beta-lactamase, ou cefuroxima, ou azitromicina ou claritromicina.
VEF1 >50% com fatores de risco
Quaisquer dos anteriores e levofloxacino ou moxifloxacino, ou telitromicina.
VEF1 entre 35 e 50%
Levofloxacino ou moxifloxacino, ou telitromicina, ou beta-lactâmico/inibidor de beta-lactamase.
VEF1 <35%
Levofloxacino ou moxifloxacino, ou beta-lactâmico/inibidor de beta-lactamase, e cipro floxacino se houver suspeita de Pseudomonas.
F - Cortcosteroides O cortcosteroide sistêmico é indicado a qualquer exacerbação de DPOC, independente da e tologia. Seu uso é recomendado por 7 a 10 dias, na dose de 1mg/kg/dia de prednisona ou equivalente, sem necessidade de redução gradual do fármaco. Os cortcoides inalados não têm u tlidade na exacerbação de DPOC.
G - Mucolí tcos O papel dos agentes mucolí tcos na exacerbação de DPOC é limitado e não está indicado. Entretanto, há dezenas de estudos em pacientes com DPOC ambulatoriais, indicando redução do número de exacerbações. Teoricamente, haveria benef cio com a N-ace tlcisteína, pois, na patogênese de DPOC, é importante a par tcipação do estresse oxidatvo, o qual se inicia antes mesmo do processo in flamatório, e a medicação antagonizaria esse efeito. Uma revisão sistemátca demonstrou redução das exacerbações e dias de internação em pacientes com DPOC que u tlizaram N-acetlcisteína. Essa versão, porém, incluiu estudos não randomizados e controlados, e sem comparação com o placebo, de forma que tais resultados não podem ser extrapolados para prátca clínica.
E - Oxigênio
H - Metlxantnas
Pacientes com exacerbação de DPOC e saturação de oxigênio menor que 90% devem receber oxigênio em menor fluxo necessário para manter a oximetria superior a 90%. Especialmente em DPOC grave ou muito grave (GOLD III e IV), há risco de piora da acidose respiratória e da hipercapnia com o uso de oxigênio em altos fluxos. É importante lembrar que esses pacientes mais graves convivem adequadamente com a hipóxia. Por isso, não é necessário manter a saturação de oxigênio desses pacientes muito acima de 90%. De fato, é suficiente manter a oximetria nesses níveis, sendo que valores superiores não trazem bene f cios adicionais. Ademais, fluxos excessivos de oxigênio podem ser deletérios para pacientes com DPOC grave, levando à redução do drive respiratório por acidose grave. Os mecanismos da acidose e hipercapnia induzidas pelo oxigênio são mul tfatoriais e incluem: - Redução no drive respiratório devido à correção da hipoxemia; - Aumento do desequilíbrio ven tlação-perfusão; - Aumento do espaço morto.
Apesar do uso disseminado de me tlxantnas, não há evidência adequada que sustente o uso ro tneiro na exacerbação da DPOC. São u tlizadas em casos refratários, como opção terapêutca final. Metlxantnas não melhoram significatvamente o VEF1 e podem causar graves efeitos adversos.
Durante a avaliação da alta hospitalar, quando ainda houver hipoxemia, a recomendação é que o indivíduo receba alta sem orientação de oxigenoterapia domiciliar, e seja novamente avaliado em 30 a 45 dias, período em que a grande maioria dos pacientes já apresenta correção do distúrbio de trocas gasosas. Caso a hipoxemia persista nessa época, indica-se oxigenoterapia.
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I - Outras terapêutcas Hélio: estudos falharam em apontar qualquer bene f cio do heliox (combinação de gases hélio e oxigênio) no tratamento da exacerbação da DPOC, e, nesse momento, não está indicado; - Fisioterapia respiratória: não há bene f cios comprovados de que a fisioterapia respiratória de ro tna, durante a exacerbação, seja bené fica. -
J - Resumo Broncodilatadores: devem ser usados em todos os pacientes com exacerbação de DPOC. Recomenda-se o uso das medicações em associação; - Cortcosteroides: devem ser usados nos casos de exacerbação, e não se devem u tlizá-los por mais que 2 semanas ou cronicamente, devido ao alto índice de efeitos colaterais; - Antbiótcos: são consensualmente indicados quando há exacerbação com expectoração purulenta, exacer-
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bação grave ou es tgmas inequívocos de infecção bacteriana; - Oxigênio: deve-se fornecê-lo para todos os pacientes com dispneia no departamento de emergência. O ob jetvo é manter uma saturação acima de 90%; - Metlxantnas: não devem ser usadas ro tneiramente. Há grande incidência de efeitos adversos; tcos: não devem ser usados no departamento - Mucolí de emergência.
K - Exames subsidiários Os exames complementares devem ser direcionados à busca da etologia ou da determinação da gravidade da exacerbação: radiografia de tórax (sempre indicada), tomografia de tórax (suspeita de foco pneumônico não visível à radiogra fia, suspeita de embolia pulmonar), eletrocardiograma, enzimas cardíacas, ecocardiograma, gasometria arterial (naqueles com oximetria inferior a 92%), entre outros.
L - Ventlação não invasiva A ventlação não invasiva na forma de BIPAP está indicada a todos os pacientes com exacerbação da doença e insuficiência respiratória aguda, desde que respeitadas as contraindicações (Tabela 15). Seu principal obje tvo é de reduzir o trabalho respiratório através da oferta de 2 níveis de pressão positva, um na inspiração (maior) e outro na expiração (menor) – por exemplo, pressão inspiratória de 14cmH2O e expiratória de 8cmH 2O . O CPAP, que fornece um nível único de pressão na inspiração e na expiração, pode ser problemá tco em pacientes com hipercapnia acentuada ou acidemia importante, pois a pressão fornecida, ú tl na inspiração, pode aumentar o trabalho respiratório na expiração, porque o paciente necessitará gerar mais força muscular para vencer a pressão fornecida pelo aparelho. Tabela 15 - Indicações e contraindicações de vent lação não invasiva durante a exacerbação da DPOC Indicações - Insuficiência respiratória (dispneia que não melhora ou piora, mesmo com o tratamento habitual): · Uso de musculatura acessória e movimento abdominal paradoxal; · Moderada a grave acidose (pH <7,35) e hipercapnia (PaCO2 >45mmHg); · Frequência respiratória >25. Contraindicações - Parada respiratória; - Instabilidade hemodinâmica (hipotensão, infarto do miocárdio e arritmias graves); - Incapacidade de proteger as vias aéreas: vômitos, rebaixamento do nível de consciência, agitação psicomotora; - Secreção excessiva com risco de aspiração.
M - Ventlação invasiva Tabela 16 - Considerações para intubação orotraqueal - Grave dispneia com uso de musculatura acessória e movimento abdominal paradoxal; - Frequência respiratória >35irpm; - Hipoxemia que ameaça a vida: PaO2 <40mmHg ou PaO 2/FiO2 <200; - Acidose grave (pH <7,25) e hipercapnia PaCO2 >60mmHg; - Parada respiratória ou complicações cardiovasculares (instabilidade hemodinâmica); - Confusão, sonolência; - Falência da ventlação não invasiva; - Outras complicações: sepse, embolia pulmonar, pneumonia etc.
As presenças de alteração do nível de consciência, bradicardia ou iminência de parada cardiorrespiratória indicam necessidade de intubação orotraqueal imediata. Da mesma forma, durante a evolução no pronto-socorro, pode ser necessária a intubação, e esta deverá ser baseada em parâmetros clínicos, antes que o doente se encontre em situação crí tca com risco de parada cardiorrespiratória. A ventlação mecânica é uma intervenção que salva vidas e não deve ser adiada quando indicada. Inicialmente, o paciente deve ser man tdo com sedação profunda, evitando-se o uso de bloqueadores neuromusculares. A ventlação mecânica deve ser iniciada no modo assistdo-controlado, e respeitar a mecânica ventlatória do indivíduo: como há obstrução grave, deve-se manter o tempo expiratório o mais prolongado possível para evitar a permanência de volume excessivo ao final da expiração (auto-PEEP); a não observância desse detalhe culminará com risco elevado de barotrauma. Assim, deve-se manter a frequência respiratória baixa (6 a 12irpm), e tempo inspiratório curto (ou fluxo elevado). A ven tlação a pressão ou a volume tem resultados idêntcos, desde que o intensivista realize monitorização adequada da mecânica respiratória. Quando se ven tla a pressão num paciente com DPOC, o volume gerado pode ser demasiadamente pequeno, e piorar a hipercapnia, pois há obstrução das vias aéreas, o que exige pressões mais elevadas para que se atnja um volume sa tsfatório – assim, o volume precisa ser monitorizado. Na ven tlação a volume de pacientes com DPOC, a pressão de pico gerada (aquela que se dirige às vias aéreas, e não se relaciona tanto ao barotrauma) costuma ser bem elevada; se os alarmes do aparelho estverem ajustados para pressões menores, o pico pressórico abortará o ciclo respiratório, e o volume oferecido também será muito baixo. Assim, nesses casos, deve-se ajustar o ventlador para permi tr a ocorrência de picos de pressão inspiratória (45 a 50cmH 2O), mas sempre com atenção à pressão de platô (até 35cmH 2O). Os níveis de PEEP recomendados são de cerca de 80% da auto-PEEP, principalmente quando o indivíduo es tver em ven tlação de suporte.
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PNEUMOLOGIA Outro ponto importante é em relação à hipercapnia. Pacientes que apresentem hipercapnia sem acidemia (por compensação metabólica) não necessitam ter os níveis de pCO2 corrigidos. Entenda a razão: com a redução dos níveis de CO2 em pacientes com compensação, os níveis de bicarbonato voltarão ao normal, já que o distúrbio ven tlatório foi corrigido; ao se re trar o paciente do suporte ven tlatório, o comprometmento da mecânica elevará, novamente, os níveis de CO 2, sem que exista a compensação metabólica: o resultado final é acidose respiratória grave com necessidade de reintubação. Assim, só há necessidade de reduzir a pCO2 se houver acidemia instalada.
N - Algoritmo da exacerbação
- O principal fator de risco para DPOC é o tabagismo, relevante em cerca de 90% dos casos; inalação de outros gases (como fumaça de fogão de lenha) e deficiência de antproteases (como alfa-1-anttripsina) respondem pelos demais; - Deve-se suspeitar da deficiência de alfa-1-anttripsina em pacientes com enfisema que surge em idade inferior a 45 anos, pacientes que nunca fumaram, enfisema com predomínio em lobos inferiores, vasculite com ANCA-c posi tvo, doença hepátca inexplicada, história familiar de cirrose, paniculite, bronquiectasias, ou DPOC em idade precoce. Em alguns casos, é indicada a reposição da enzima; - O exame necessário e su ficiente para o diagnóstco é a espirometria: deve existr relação VEF1/CVF inferior a 0,7, com ou sem redução do VEF1; a presença de resposta ao broncodilatador não exclui DPOC, apesar de ser incomum; os principais sintomas da DPOC são tosse e dispneia; - Exames de imagem não são fundamentais ao diagnós tco, mas têm importância no diagnóstco diferencial; - A gravidade da doença é estmada pelo grau de obstrução visto na espirometria, pela intensidade dos sintomas e pelo comprometmento ou não de trocas gasosas; - As únicas medidas terapêutcas que modificam a sobrevida de pacientes com DPOC são cessação de tabagismo e oxigenoterapia, quando indicada; - Os fármacos habitualmente u tlizados apenas melhoram a qualidade de vida, por um melhor controle dos sintomas; - Os cortcoides inalatórios são indicados a pacientes com doença grave ou muito grave (VEF1 inferior a 50%), com 2 ou mais exacerbações ao ano; - Vacinações ant-in fl uenza (anual) e antpneumocócica (a cada 5 anos) estão indicadas, assim como reabilitação pulmonar (esta, para pacientes com estadio II ou maior); - As indicações de oxigenoterapia domiciliar são pO2 igual ou inferior a 55mmHg, ou SO2 igual ou inferior a 88%; ela também pode ser indicada a pacientes com pO2 entre 55 e 60mmHg, e SO 2 entre 88 e 90, na presença de policitemia ou cor pulmonale; - Pacientes com doença grave ou muito grave podem ser candidatos a tratamento cirúrgico: bulectomia, cirurgia redutora de volume pulmonar ou transplante pulmonar; - Os broncodilatadores são o esteio do tratamento de tais pacientes, e deve ser usada a combinação de an tcolinérgico e beta-2 agonista em pacientes graves; - O uso de cortcosteroide sistêmico está indicado na exacerbação da DPOC, independente da etologia, por um período de 7 a 10 dias;
Figura 7 - Abordagem inicial da exacerbação da DPOC
- Na ausência de pneumonia, os antbiótcos são extremamente discu veis: têm sido indicados em casos de exacerbação de doença muito grave e em pacientes com exacerbação purulenta; - As metlxantnas não apresentam benef cio nas exacerbações; - As indicações de O2 domiciliar são: · PaO2 ≤55mmHg em repouso, sem sinais de cor pulmonale; · PaO2 ≤59mmHg em repouso, com sinais de cor pulmonale.
9. Resumo Quadro-resumo - A DPOC é caracterizada por sintomas respiratórios crônicos e progressivos, associados à limitação ao fluxo aéreo e presença de fator de risco;
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CAPÍTULO
Bronquiectasias
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1. Introdução e fisiopatologia Bronquiectasias representam um distúrbio adquirido dos brônquios, caracterizadas por destruição e dilatação anormal e irreversível de suas paredes (Figura 1). Muitas das manifestações são semelhantes à DPOC, incluindo obstrução ao fluxo aéreo e in flamação das vias aéreas. Historicamente, já era descrito no século XIX, por Laennec, um quadro semelhante; foi por meio da broncogra fia que Sicard, em 1922, demonstrou as imagens compa veis com bronquiectasias (como na Figura 2). A incidência tende a ser maior em países menos desenvolvidos, já que o desenvolvimento das bronquiectasias tem relação próxima com o número e a gravidade de infecções na infância, mais exuberantes em regiões que não oferecem medidas preven tvas ou tratamento precoce às infecções respiratórias. Esses pacientes precisam procurar serviços de emergência e internações por quadros infecciosos pulmonares com maior frequência do que a população geral. As áreas afetadas mostram graus variados de in flamação transmural, edema de mucosa (bronquiectasias cilíndricas), ulceração e depressão com neovascularização de arteríolas brônquicas (bronquiectasias cís tcas) e distorção da arquitetura brônquica devido à obstrução e/ou infecção (bronquiectasias varicosas). A obstrução brônquica pode levar a infecções distais, criando um ciclo de destruição parenquimatosa.
Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Mar tn s Valois
-
Insulto infeccioso e depuração inadequada de secreção de vias aéreas (por obstrução, anormalidade da viscosidade do muco ou disfunção ciliar).
Figura 2 - Broncogra fi a evidenciando dilatação brônquica anormal em região medial e anatomia preservada na porção lateral
Na bronquiectasia, algumas áreas da parede brônquica são destruídas e apresentam in flamação crônica; a produção de muco tende a ser aumentada, e geralmente há drenagem dif cil da secreção, quer por sua viscosidade estar aumentada (como na fibrose cístca), quer por dé ficit na atvidade ciliar (como na discinesia primária). Os pacientes podem apresentar-se de 2 formas, com um processo local ou focal obstru tvo, afetando um segmento ou um lobo pulmonar, geralmente resultado de malformação congênita, ou de lesão residual de processo infeccioso prévio; ou um processo difuso com envolvimento da maior parte de ambos os pulmões, mais comum em doenças sistêmicas como a fibrose cístca e a discinesia primária.
2. Etologia Figura 1 - Brônquio normal x bronquiectasia
Em geral, a indução de bronquiectasias requer 2 condições:
Em todo o mundo, es tma-se que mais de 60% dos casos sejam por infecção, independentemente da e tologia; no Brasil, entretanto, provavelmente a principal causa de bronquiectasias seja a tuberculose. Um estudo realizado no ambulatório de Bronquiectasias da UNIFESP em 1998, que
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PNEUMOLOGIA avaliou 314 pacientes com diagnós tco de bronquiectasias, identficou tuberculose como e tologia de 42,7% dos casos. Contudo, em boa parte dos casos, o diagnós tco etológico não é realizado. A Tabela 1 relaciona as principais causas de bronquiectasias. Tabela 1 - Causas de bronquiectasias Infecções respiratórias - Sarampo; - Coqueluche; - Infecção por adenovírus; - Infecção bacteriana (por exemplo, por Klebsiella, Staphylococcus ou Pseudomonas); - Gripe;
B - Imunodeficiência humoral Doentes com hipogamaglobulinemia podem apresentar quadros de sinusites e pneumonias de repe tção na infância. A deficiência de imunoglobulinas é uma causa tratável de bronquiectasias, haja vista que se dispõe de imunoglobulina humana. Os doentes podem apresentar apenas de ficiência de IgA, de subclasses de IgG ou uma de ficiência global, como na imunodeficiência comum variada. Esses pacientes devem ser vacinados para H. in fl uenzae e pneumococo, e, em pacientes com múl tplas infecções, pode-se considerar a reposição de gamaglobulina.
C - Fibrose cístca
- Tuberculose; - Infecção por fungo; - Infecção por Mycoplasma. Obstrução brônquica - Aspiração de corpo estranho; - Aumento de tamanho de gânglios linfátcos; - Tumor pulmonar; - Tampão de muco. Lesões por inalação - Lesão causada por vapores, gases ou par culas nocivas;
A fibrose cístca inicia-se na infância com sinusites e pneumonias de repetção, levando a extensas bronquiectasias. Deve-se suspeitar da doença na presença de alteração desproporcional de lobos superiores e culturas de escarro contendo P. aeruginosa ou S. aureus. Alguns pacientes podem apresentar o quadro quando adultos, sem manifestações de insuficiência pancreátca exócrina e infecções respiratórias de repetção. O diagnóstco pode ser realizado por elevada concentração de sódio no suor (acima de 55 a 60mmol/L), mas alguns adultos com fibrose cístca genetcamente confirmada apresentam pesquisa no suor nega tvo.
- Aspiração de ácido gástrico; - Par culas de alimento. Distúrbios genétcos - Fibrose cístca; - Discinesia ciliar, inclusive síndrome de Kartagener; - Deficiência de alfa-1-anttripsina. Anormalidades imunológicas - Síndromes de deficiência imunoglobulínica; - Disfunções dos leucócitos; - Deficiências do complemento; - Certos distúrbios autoimunes ou hiperimunes, como a artrite reumatoide e a colite ulceratva.
D - Doenças reumátcas Artrite reumatoide e síndrome de Sjögren podem evoluir com bronquiectasias, que podem preceder ou ocorrer após o diagnóstco da artrite reumatoide. Estudos com tomografia de alta resolução demonstram presença de bronquiectasias em até 30% desses pacientes. Os doentes costumam ter o quadro clínico da doença de base e a presença de bronquiectasias. Além disso, há aumento da taxa de mortalidade associada a infecções respiratórias. O aumento da incidência de bronquiectasias também acontece no lúpus eritematoso sistêmico e na síndrome de Marfan, além das doenças inflamatórias intestnais.
Outros distúrbios - Abuso de drogas como a heroína;
E - Discinesia ciliar
- Infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV);
Embora a descrição original da síndrome dos cílios imóveis tenha incluído a presença de alteração do espermatozoide, acometmento do trato respiratório (bronquiectasias, sinusopatas) e dextrocardia (denominada de síndrome de Kartagener), os pacientes podem ter apenas alterações de motlidade dos cílios prejudicando o clearance mucociliar, infecções respiratórias de repe tção e bronquiectasias. A herança dessas doenças é autossômica recessiva, com frequência entre 1 a cada 15 a 30.000 nascimentos.
- Síndrome de Young (azoospermia obstrutva); - Síndrome de Marfan.
A - Obstrução de vias aéreas Síndromes aspiratvas com evolução para bronquiectasias são mais comuns em segmentos inferiores do pulmão direito ou segmentos posteriores dos lobos superiores, também à direita. Um corpo estranho predispõe a infecções distais criando um ciclo vicioso. Deve-se sempre suspeitar de um corpo estranho porque a sua remoção pode eliminar um componente importante na perpetuação das bronquiectasias.
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F - Infecções pulmonares Infecções respiratórias baixas podem evoluir com bronquiectasias, devido à destruição do parênquima pulmonar,
BRONQUIECTASIAS
com acúmulo importante de secreção e a tvidade ciliar comprometda. No Brasil, a importância da tuberculose como causa de bronquiectasias é maior do que em países desenvolvidos devido às altas taxas de infecção que ainda temos com o bacilo. A tuberculose destrói o parênquima pulmonar, a arquitetura normal, formando cavernas e predispondo a infecções bacterianas de repe tção. Doentes com AIDS podem ter sinusites e pneumonias de repetção, evoluindo com bronquiectasias, um achado que ilustra bem a interação da imunode ficiência e infecções de repetção. Adenovírus, vírus in fl uenza, anaeróbios, S. aureus e Klebsiella são causas adicionais de bronquiectasias. Ainda são descritas em mulheres com mais de 60 anos infecções com complexo Mycobacterium avium. A pista para o diagnóstco é de tosse crônica com envolvimento principal do lobo médio.
G - Aspergilose broncopulmonar alérgica A aspergilose broncopulmonar alérgica (ABPA) representa uma situação clínica em que o fungo do gênero Aspergillus se comporta como um alérgeno (diferindo do aspergiloma ou “bola fúngica”, em que é um mero colonizante do parênquima pulmonar, e da aspergilose invasiva,
em que se comporta como um verdadeiro agente infeccioso, promovendo infecção grave em pacientes imunossuprimidos – Tabela 2), em pacientes com doença estrutural do pulmão, principalmente asma e fibrose cístca. A aspergilose, nesses indivíduos, representa uma resposta hiperimune ao fungo com destruição de vias aéreas, tanto pela produção de micotoxinas quanto da resposta imunológica exacerbada. Uma caracterís tca interessante da ABPA é que as bronquiectasias tendem a ser centrais. Suspeita-se da ABPA em casos de asma de di f cil controle, ou de pacientes com fibrose cístca com supuração muito evidente e arresponsiva a medidas habituais, com necessidade frequente de cor tcosteroides orais, excluídos outros motvos para o descontrole. Pacientes com asma ou fibrose cístca, com 1 dos seguintes critérios, devem ser testados para ABPA: infiltrados recorrentes ou bronquiectasias centrais; refratariedade ao tratamento; prick test positvo para Aspergillus; Aspergillus em cultura de escarro; eosino filia periférica (>1.000/mm3). A con firmação é feita com dosagem de IgE sérica total e IgE ou IgG especí ficos – quando elevados, é confirmado o diagnóstco. O tratamento é feito com cor tcosteroides por via oral, por tempo prolongado (de 0,5 a 1mg/kg/dia de prednisona). Antfúngicos não são muito efe tvos, sendo indicados em casos selecionados, como agentes poupadores de cortcosteroides.
Tabela 2 - Síndromes clínicas associadas ao fungo do gênero Aspergillus Síndrome
Comportamento do fungo
Dados clínicos
Tratamento
Colonizante
O fungo cresce em cavidades pulmonares (sequelas de tuberculose), em bronquiectasias saculares ou promove espessamento pleural associado. Pode É necessária cirurgia. O tracausar hemoptse maciça. tamento antfúngico é inefiO diagnóstco é presuntvo, com a observação em caz. exame de imagem de massa no interior de cavitações, ou espessamento pleural exuberante associado a cavidades ou bronquiectasias (Figura 4).
ABPA
Alérgeno
Controle dif cil de sintomas respiratórios crônicos em pacientes asmátcos ou com fibrose cístca. O diagnóstco é sugerido por critérios que incluem bronquiectasias centrais, dosagem de IgE total e especí fica, testes de sensibilidade cutânea imediata especí fica, infiltrados fixos ou transitórios em radiografia, encontro do fungo em secreções respiratórias.
Aspergilose invasiva
Infecção respiratória grave em pacientes imunossuprimidos, principalmente em transplantados de medula. O diagnóstco definitvo é feito por meio de biópsia O tratamento é feito com anAgente infeccioso mostrando a característca invasiva do fungo. O en- tfúngicos (anfotericina B), e contro do fungo em secreção pulmonar não define o prognóstco é reservado. o diagnóstco. Na tomografia, pode-se visualizar o sinal do halo: consolidação localizada com opacidade em vidro fosco ao redor (Figura 5).
Aspergiloma (bola fúngica)
O tratamento é feito com cortcoide sistêmico por tempo prolongado. Pode-se tentar, após 6 meses de tratamento, o uso de antfúngicos como poupadores de cortcoide.
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PNEUMOLOGIA 3. Quadro clínico A expectoração abundante diária é o sintoma mais habitual das bronquiectasias, com relato de uso prévio de vários antbiótcos. Graus variáveis de dispneia, sibilância e hemoptse podem ocorrer. Classicamente, as bronquiectasias localizadas nos segmentos superiores (mais característcas da tuberculose) são descritas como secas, pela tendência à supuração menos evidente que as demais, uma vez que a drenagem gravitacional já é favorecida naturalmente; entretanto, são as bronquiectasias mais associadas a sangramentos. Algumas vezes, os doentes procuram assistência médica devido à hemoptse maciça, que pode ser fatal. Figura 3 - Tomogra fi a de alta resolução em janela de parênquima, em paciente com diagnóst co de ABPA, mostrando bronquiectasias centrais, com imagem “em anel de sinete”
4. Exames diagnóstcos A - Exames de imagem a) Radiografia de tórax É anormal na maioria dos doentes, embora di ficilmente seja capaz de firmar o diagnóstco, além de não mostrar a verdadeira extensão da doença (Figura 6).
Figura 4 - Tomogra fi a de tórax demonstrando massa no interior de cavidade pulmonar à esquerda: aspergiloma; à direita, há opacidade que corresponde a artefato, sem signi fi cado patológico algum
Figura 5 - Tomogra fi a de tórax mostrando consolidações com vidro fosco ao redor (“sinal do halo”) em paciente com diagnóst co de aspergilose invasiva
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Figura 6 - Radiogra fi a em PA mostrando opacidades heterogêneas nos terços inferiores de ambos os pulmões
BRONQUIECTASIAS
achado clássico é o de anel de sinete, que caracteriza o maior diâmetro do brônquio em relação ao vaso adjacente (Figura 3). O exame ideal é feito com cortes de 1 a 1,5mm a cada 10mm em estudo não contrastado. Os principais achados são: - Dilatação de vias aéreas; - Constrições varicosas; - Espessamento da parede brônquica; - Formação de cilindros em vias aéreas distais. Em casos de bronquiectasia mais destru tvas, pode-se verificar a presença de cistos de paredes brônquicas e de bolhas de enfisema. A tomografia helicoidal pode fornecer informações adicionais, pois reduz a possibilidade de artefatos. Figura 7 - Tomogra fi a de tórax em janela de parênquima do mesmo paciente da Figura 6, caracterizando, com detalhes, a presença de bronquiectasias bilateralmente
b) Tomografia de alta resolução (cortes finos) Além de con firmar, com precisão, a presença de bronquiectasias, permite avaliar a sua extensão (Figura 7). O
B - Identficação da etologia Infelizmente, em menos de 50% dos doentes, uma etologia é encontrada. A própria TC de alta resolução ou a broncoscopia podem diagnos tcar, também, a causa (corpo estranho, obstrução localizada, tuberculose pulmonar). Exames que podem ser úteis na busca e tológica das bronquiectasias estão descritos na Tabela 3.
Tabela 3 - Testes diagnóst cos das bronquiectasias Exame Dosagem de imunoglobulinas.
Resultado anormal
Diagnóstco Deficiência de imunoglobulinas (IgA, IgG, IgM).
Níveis muito diminuídos.
Biópsia de mucosa de vias aéreas. Alteração de cílios à microscopia eletrônica.
Discinesia ciliar.
- IgE; - Testes cutâneos; - Precipitnas; - Cultura de escarro.
- Níveis séricos muito elevados; - Positvos; - Positvas; - Crescimento de Aspergillus.
Aspergilose broncopulmonar alérgica.
- Cloreto no suor; - Cultura de escarro; - Teste genétco.
- >55 a 60mEq/L; - Crescimento de P. aeruginosa; - Detecção da anormalidade gené tca.
Fibrose cístca.
Broncoscopia.
Visualização direta na árvore brônquica de anormalidades.
Corpo estranho ou obstrução.
C - Avaliação da repercussão pulmonar da doença Testes de função pulmonar permitem uma avaliação do comprometmento pulmonar global. Achados mais frequentes são redução do VEF1, da CVF e da relação VEF1/ CVF; portanto, um quadro de distúrbio obstru tvo, e hiper-responsividade brônquica pode ser demonstrada em cerca de 40% dos pacientes. Em doenças mais avançadas, pode haver uma grande redução da CVF.
5. Tratamento clínico A - Exacerbação aguda O diagnóstco de exacerbação aguda baseia-se em critérios clínicos, mais do que qualquer critério laboratorial.
Em geral, uma nova infecção bacteriana é responsável por maior produção de escarro, aumento da purulência, dispneia com ou sem queixas sistêmicas (anorexia, adinamia, febre ou calafrios). Deve-se acrescentar que a de finição de exacerbação aguda nesses pacientes é mais di f cil que em pacientes com DPOC, pois o escarro do portador de bronquiectasias é cronicamente purulento. Existem alguns critérios propostos para auxiliar no diagnós tco de exacerbação, um dos mais u tlizados, mostrado na Tabela 4. Tabela 4 - Critérios diagnóst cos de exacerbação infecciosa de bronquiectasias (presença de 4 dos 9) - Aumento na produção de escarro; - Piora da dispneia; - Piora da tosse;
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PNEUMOLOGIA - Febre (≥38°C); - Aumento dos sibilos; - Adinamia, fadiga ou redução de tolerância ao exercício; - Piora da função pulmonar; - Alterações radiográficas compa veis; - Alterações na ausculta pulmonar.
O tratamento depende do quadro geral do doente, com antbiótco parenteral em formas graves e via oral em doentes com quadro geral estável. Nos casos de tratamento ambulatorial, um macrolídeo ou quinolonas respiratórias (levo floxacino, moxifloxacino ou gemifloxacino) são, em geral, a terapia de escolha inicial. A duração em geral é de 7 a 10 dias. Quanto aos pacientes com doença avançada, principalmente portadores de fibrose cístca, os patógenos mais comuns são S. aureus e H. in fl uenzae nas primeiras infecções, mas posteriormente, a Pseudomonas aeruginosa é a bactéria mais relevante. A infecção por Pseudomonas acelera a deterioração pulmonar e eleva a mortalidade para S. aureus. Ciprofloxacino é a droga de escolha nesses casos. Pacientes que não melhoram ou que pioram após 48 a 72 horas de terapia devem colher escarro para avaliar a flora e seu per fil de resistência. Aos casos mais graves, com indicação de tratamento hospitalar, indicam-se cefalosporinas com a tvidade antpseudomonas (ceazidima, cefpiroma ou cefepima), piperacilina-tazobactam ou um carbapenêmico. Caso se iden tfique S. aureus, deve-se associar oxacilina (ou vancomicina, conforme o per fil de sensibilidade).
B - Terapia crônica preventva O papel do uso crônico de an tbiótcos é menos claro. Dois organismos contribuem para a morbidade em muitos casos e podem representar desa fio terapêutco devido à resistência. Um estudo realizado em 4 centros demonstrou que H. in fl uenzae (29 a 42%), Pseudomonas aeruginosa (13 a 31%), Streptococcus pneumoniae (6 a 13%) e Moraxella catarrhalis são os agentes mais encontrados nesses pacientes. A terapia crônica é limitada pelo desenvolvimento de resistência. Formas alterna tvas, como a inalação com tobramicina, têm sido uma escolha, embora limitada pelo custo. Uma alternatva é a inalação com gentamicina. Estudos têm mostrado uma redução da carga de pseudomonas em vias aéreas com essas formas inalatórias de an tbiotcoterapia. Há 5 estratégias definidas pela literatura para a prevenção de novos quadros infecciosos: - Antbiótco diário. Exemplo: cipro floxacino, 500 a 1.500mg/dia, em 2 ou 3 doses (alterna tvamente, pode-se utlizar por 2 semanas no mês); - Uso de 2 ou 3 vezes semanais de um an tbiótco da classe dos macrolídeos (esta é uma variante da 1ª estratégia); - Uso diário de an tbiótco via oral, em alta dose, como a amoxicilina (3g/dia, em 2 ou 3 doses divididas);
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Antbiótco via aerossol, como a tobramicina (300mg, 2x/dia); - Uso intermitente de an tbiotcoterapia por via oral. -
Ainda assim, apesar de alguns estudos com resultados positvos, não existe evidência em longo prazo da e ficácia em relação a desfechos de maior relevância.
C - Higiene brônquica A bronquiectasia é o protó tpo da doença hipersecretora. Por isso, técnicas de higiene brônquica podem ser úteis no manejo crônico. Algumas formas de higiene brônquica são: a) Hidratação e nebulização Recomenda-se manter o doente bem hidratado e realizar nebulizações com ace tlcisteína. Os broncodilatadores podem ser úteis na coexistência de DPOC ou em asmá tcos, mas ainda não apresentam papel de finido entre os pacientes em questão. b) Fisioterapia Sempre houve grande entusiasmo com as técnicas de mobilização de secreção de vias aéreas, embora meta-análises publicadas não tenham mostrado bene f cio clínico. Alguns autores recomendam fisioterapia respiratória 3 a 4 vezes ao dia.
D - Cortcosteroides O papel dos cor tcosteroides sistêmicos (oral ou intravenoso) nas bronquiectasias é limitado, pois pode causar muito mais efeitos maléficos. Entretanto, em exacerbações agudas, associadas à antbiotcoterapia, a prednisona por, no máximo, 10 a 14 dias pode ser ú tl em acelerar a recuperação (dose inicial de 20 a 30mg/dia com doses decrescentes). Recentemente, tem ocorrido grande interesse no uso crônico dos cortcosteroides inalatórios em bronquiectasias graves. Estudos preliminares têm mostrado melhora na função pulmonar e na redução da produção de escarro. Alguns autores sugerem que os cor tcosteroides inalatórios sejam usados, de preferência, em comparação com o uso sistêmico.
E - Outros tratamentos O tratamento de condições conhecidas deve ser sempre realizado (exemplos: imunoglobulinas nas imunodeficiências humorais; inalação com deoxirribonuclease humana recombinante [rhDNAase] na fibrose cístca etc.). Várias complicações podem acontecer aos doentes com bronquiectasias, como amiloidose secundária, broncoespasmo, hipoxemia com necessidade de oxigênio domiciliar e cor pulmonale. Entretanto, a hemop tse é a maior característca da bronquiectasia. Devido à neovascularização (com circuito arterial), os doentes podem ter hemop tses volumosas, eventualmente que ameacem a vida. O tratamento consiste em suporte hemodinâmico, respiratório (in-
BRONQUIECTASIAS
tubação, se necessário) e tratamento especí fico para o sangramento. A tomogra fia de cortes finos e a broncoscopia podem localizar o segmento ou o lobo sangrante e ajudar a guiar uma eventual lobectomia. Contudo, o melhor tratamento é a embolização por meio da canulação de artérias brônquicas (radiologia intervencionista).
- Infecções de repetção são a principal causa de bronquiectasias em todo o mundo; no Brasil, es tma-se que a tuberculose seja uma das principais etologias. Outras etologias comuns são discinesia ciliar (quando associada a situs inversus, caracteriza a síndrome de Kartagener) e fibrose cístca;
F - Prevenção
- A prova de função pulmonar pode ser u tlizada para avaliar comprometmento funcional nesses indivíduos e usualmente mostra distúrbio obstru tvo;
As bronquiectasias podem ser prevenidas evitando-se doenças infecciosas e aspiração de corpos estranhos, principalmente na infância. As vacinações infants contra o sarampo e a coqueluche têm reduzido o número de indivíduos que desenvolvem bronquiectasia. As vacinações anuais contra a gripe também ajudam a impedir a ação destru tva dos agentes virais causadores da doença. A vacina pneumocócica pode ajudar a evitar determinados tpos de pneumonia pneumocócica e suas graves complicações. O uso de an tbiótcos na fase inicial de infecções, como a pneumonia e a tuberculose, também pode evitar a bronquiectasia ou reduzir sua gravidade. A administração de imunoglobulinas em síndromes de deficiência imunoglobulínica pode evitar infecções recorrentes e complicações derivadas dessas síndromes. O uso adequado de medicamentos an t-inflamatórios, como os cortcosteroides, pode evitar as lesões brônquicas, principalmente nos indivíduos com aspergilose broncopulmonar alérgica. Não há dúvidas, também, de que o adequado tratamento da tuberculose pulmonar, com seu diagnós tco precoce, tenha impacto signi ficatvo no controle de desenvolvimento de bronquiectasias.
- A tomografia de tórax com cortes finos é o método diagnóstco de escolha para a avaliação desses pacientes;
- As exacerbações são frequentemente causadas por infecções bacterianas, que são, por vezes, di f ceis de serem identficadas; a colonização por Pseudomonas aeruginosa é um importante sinal de mau fator prognóstco; - Os pacientes com exacerbação infecciosa aguda devem receber antbiotcoterapia por 7 a 10 dias, preferencialmente com macrolídeos ou quinolonas, ou de acordo com o per fil de sensibilidade do germe; - Há várias estratégias para prevenção de infecção, mas seus efeitos em longo prazo permanecem incertos; - O tratamento cirúrgico pode ser considerado em pacientes especí ficos, quando há insucesso no tratamento clínico; - Em pacientes com bronquiectasias difusas, com comprometmento funcional importante, o transplante pulmonar pode ser indicado, devendo sempre ser bilateral.
6. Tratamento cirúrgico e transplante O tratamento cirúrgico das bronquiectasias é indicado a pacientes com doença localizada, sem melhora clínica com o tratamento convencional ou com hemop tses recorrentes ou maciças; é fundamental, ainda, que o paciente tenha boa reserva funcional, com boa condição de operabilidade. Por outro lado, o transplante de pulmão é indicado àqueles com bronquiectasias extensas e graves, com repercussões funcional e de qualidade de vida signi ficatvas. Quando realizado por essa indicação, o transplante sempre deve ser bilateral. As indicações devem ser sempre individualizadas e decididas por especialista em pacientes com falha do tratamento clínico, que não deve ser interrompido.
7. Resumo Quadro-resumo - Bronquiectasias são uma desordem adquirida dos brônquios maiores e bronquíolos, caracterizada por dilatação anormal dessas estruturas, em caráter irreversível;
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA
CAPÍTULO
7
1. Etologias e definições O derrame pleural é de finido como acúmulo anormal de líquido no espaço pleural. Normalmente, há de 0,1 a 0,2mL/ kg de líquido entre as pleuras visceral e parietal, com produção e reabsorção con nuas, de forma que toda patologia que modifique essa dinâmica pode promover a formação de derrame pleural. Inúmeras doenças, sistêmicas ou restritas ao aparelho respiratório, podem ter o derrame pleural como manifestação clínica. Os mecanismos não são uniformes, e podem ser citados aumento da pressão hidrostá tca capilar pulmonar (insuficiência cardíaca), redução da pressão coloidosmó tca do plasma (hipoalbuminemia grave, síndrome nefró tca), aumento da permeabilidade vascular pleural (processos inflamatórios), negatvação excessiva da pressão intrapleural (atelectasias grandes), passagem de líquido da cavidade peritoneal (hidrotórax hepá tco), acúmulo de sangue ou quilo no espaço pleural (trauma). São várias as causas de derrame pleural. Não se dispõem de esta stcas nacionais, mas dados dos Estados Unidos creditam a maior incidência de derrame pleural à insuficiência cardíaca (Tabela 1). Entretanto, é importante lembrar que países de 3º mundo, especialmente o Brasil, têm uma grande incidência de tuberculose pleural, o que não é valorizado pelos dados norte-americanos, não sendo possível extrapolar tais números à nossa realidade.
Derrame pleural Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Mar tn s Valois
Em uma visão simplista, a principal diferenciação entre os derrames pleurais é feita avaliando o grau de in flamação do fluido, classificando-os como transudatvos (pouca inflamação) ou exsuda tvos. A Tabela 2 lista as causas mais relevantes de transudatos e exsudatos. Alguns tpos de derrame pleural têm denominação especial: derrame parapneumônico (derrame pleural associado à bronquiectasia, pneumonia bacteriana ou abscesso pulmonar), empiema (pus na cavidade pleural), hemotórax (acúmulo de sangue no espaço pleural, geralmente de origem traumátca), quilotórax (acúmulo de quilo), urinotórax (acúmulo de urina, geralmente por nefropa ta obstrutva), hidrotórax hepátco (acúmulo de líquido proveniente da cavidade peritoneal). Tabela 1 - Causas de derrame pleural Causas* 1ª - Insuficiência cardíaca congestva 2ª - Pneumonia bacteriana 3ª - Câncer
Número de casos/ano 500.000 300.000 200.000
4ª - Embolia pulmonar 150.000 5ª - Doença viral 100.000 6ª - Cirurgia cardíaca 60.000 7ª - Cirrose com ascite 50.000 * Incidência nos EUA; no Brasil, tem-se um grande volume de pacientes com derrame pleural cuja causa é tuberculose (incidência muito maior do que nos países de 1º mundo). Tabela 2 - Causas de derrame pleural transudat vo e exsudat vo Transudatos - Insuficiência cardíaca; - Cirrose hepátca; - Síndrome nefrótca; - Síndrome de veia cava superior; - Mixedema; - Diálise peritoneal; - Embolia pulmonar;
Figura 1 - Derrame pleural moderado à esquerda: observar o as pecto em parábola da opacidade, característ co de derrame pleural
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- Urinotórax; - Hipoalbuminemia grave.
DERRAME PLEURAL
Exsudatos - Pneumonia; - Tuberculose; - Neoplasia (primária ou metastá tca); - Embolia pulmonar; - Colagenoses; - Pancreatte; - Hemotórax;
de líquido na radiogra fia em posteroanterior, e 75 a 100mL em perfil. O aspecto clássico do derrame pleural é de opacidade homogênea em segmentos inferiores, com conformação em parábola, ou curva de Damoiseau, o que caracteriza líquido livre na cavidade pleural (Figura 2). Em situações duvidosas, pode-se solicitar um raio x em decúbito lateral com raios horizontais, em que se espera que o líquido mude de conformação com a mudança de decúbito.
- Quilotórax; - Síndrome de Meigs (fibroma ovariano); - Ruptura esofágica; - Uremia; A I G O L O M U E N P
- Pós-cirurgia; - Asbestose; - Sarcoidose; - Síndrome de Dressler; - Síndrome das unhas amarelas.
2. Quadro clínico e exames radiológicos Dependerá da doença de base e do volume do derrame pleural. Assim, cada morbidade que se associa a derrame pleural apresenta tanto dados clínicos inerentes ao seu processo patológico (edema periférico e dispneia paroxístca noturna na insu ficiência cardíaca, por exemplo) quanto relatvos à presença de líquido no espaço pleural, gerando compressão do parênquima pulmonar adjacente. A presença de derrame pleural gera sintomas como dispneia aos esforços e tosse (seca ou produ tva). Em casos de derrames volumosos, pode ser referida pelo paciente a piora da dispneia conforme o decúbito lateral adotado, o que caracteriza a trepopneia. A dor torácica pode estar presente por inflamação pleural (incomum nos transudatos), habitualmente é bem localizada e piora com a inspiração profunda – dor tpo pleurí tca. Achados ao exame f sico são redução da expansibilidade, macicez à percussão torácica, frêmito toracovocal abolido, redução do murmúrio vesicular. Destes, o achado mais precoce é a macicez à percussão. Esses dados são similares aos encontrados nas atelectasias. Há 2 sinais clínicos que, quando presentes, ajudam a diferenciar derrame de atelectasia pelo exame f sico: sinal de Signorelli (macicez à percussão da coluna torácica, característca de derrames pleurais) e sinal de Lemos Torres (abaulamento do espaço intercostal à expiração, ocorrendo nos derrames pleurais). Por outro lado, o paciente pode não ter nenhum sintoma atribuído à pleura ou mesmo ter uma ausculta pulmonar normal e, ainda assim, ter um derrame pleural. Portanto, propedêu tca pulmonar normal não exclui derrame pleural. Os exames de imagem são fundamentais para o diagnóstco. O exame mais simples e prá tco é a radiogra fia de tórax. Entretanto, para que seja iden tficado o líquido, é necessário acúmulo não desprezível: mínimo de 250 a 500mL
Figura 2 - Radiogra fi a de tórax em decúbito lateral esquerdo com raios horizontais, mostrando líquido livre na cavidade pleural
Há uma situação especial de derrame pleural livre: o derrame subpulmonar, que se caracteriza por acúmulo de líquido abaixo do pulmão, gerando um aspecto semelhante à elevação da hemicúpula, sem velamento do seio costofrênico ou conformação em parábola. A principal caracterís tca que ajuda a suspeitar de derrame pleural é a conformação da curvatura da cúpula diafragmá tca. Em situações normais, a curvatura da cúpula é mais acentuada medialmente; no derrame subpulmonar, ocorre mais lateralmente (Figura 3). Para confirmar o diagnóstco, basta solicitar a radiografia em decúbito lateral com raios horizontais, em que será observada a mudança de conformação do líquido.
Figura 3 - Derrame subpulmonar à direita: há aparente elevação da hemicúpula, mas com conformação a pica, com a maior angulação situada mais lateralmente
55
PNEUMOLOGIA Pela radiografia de tórax, é possível estmar a intensidade do derrame: o derrame pequeno é aquele que apenas vela o seio costofrênico (Figura 4); o derrame moderado, que a tnge o hilo pulmonar; o derrame grande, que ultrapassa o hilo; o derrame maciço, que vela todo o hemitórax e desvia as estruturas mediastnais para o lado oposto (Figura 5).
Figura 4 - Derrame pleural pequeno à direita
Figura 5 - Derrame pleural maciço à direita, desviando estruturas mediast nais para o lado oposto
Eventualmente, o líquido pode não estar livre na cavidade pleural e recebe a denominação de “derrame pleural loculado”. A con firmação diagnóstca usualmente depende de outros métodos de imagem, já que o exame em decúbito lateral não modi fica a conformação desse tpo de derrame (Figura 6).
Figura 6 - Derrame pleural loculado à direita
56
Exames mais sofistcados, ultrassonografia ou tomograde tórax podem ser úteis em casos duvidosos ou para avaliação adicional de massas, pneumopatas, mediastno ou loculação do derrame. fia
3. Indicações de toracocentese A toracocentese pode ser diagnós tca ou de alívio. Independente da modalidade, deve ser reservado um local limpo e des tnado para pequenos procedimentos, exceto em situações emergenciais. O local da punção deve ser delimitado por meio do exame f sico, com percussão e ausculta da voz, e con firmado com uma radiografia de tórax. Em alguns casos, pode ser necessária ultrassonografia para delimitação do local de punção. Quanto ao local da punção: de 2 a 3 espaços intercostais abaixo da escápula, com a agulha tangenciando a borda superior do arco costal, entrando em ângulo reto com a pele de modo a evitar o feixe vasculonervoso, que percorre a margem inferior de cada uma das costelas. Deve ser realizada limpeza apropriada da pele com solução an tsséptca, e deve ser u tlizado campo estéril; anestesia local deve ser realizada antes do procedimento. A tngindo o espaço pleural com saída de líquido, deve-se re trar a agulha e introduzir o jelco com retrada posterior do mandril, mantendo apenas o cateter plástco; pode-se re trar todo o líquido, mas é prudente não mais de 1.500mL de líquido por vez, devido à possibilidade de edema pulmonar de reexpansão. Para a re trada do líquido, podem ser u tlizados frascos comuns ou a vácuo. O uso deste, apesar da preocupação em apresentar maior risco de balanço medias tnal, não parece aumentar a morbidade. A toracocentese diagnós tca é indicada a pacientes com derrame pleural de e tologia desconhecida e clinicamente significatvo (definido como derrame que apresenta espessura maior que 10mm ao ultrassom ou à radiografia em decúbito lateral). Assim, um paciente com diagnós tco prévio de Insu ficiência Cardíaca Conges tva (ICC) e que se apresente com derrame pleural bilateral e simétrico não tem indicação de toracocentese, devendo ter terapia medicamentosa ajustada e reavaliação clínica em 48 a 72 horas, já que o derrame da ICC usualmente melhora após uma oferta adequada de diuré tcos; caso persista, ou seja, francamente assimétrico (principalmente à esquerda), ou ainda, associado à febre ou dor torácica, indica-se o procedimento, já que não é a apresentação clínica habitual do derrame da ICC. A toracocentese de alívio é indicada a pacientes com grande derrame pleural que esteja causando intenso desconforto ou dispneia. A re trada de quantdades inferiores a 1.500mL usualmente não se associa a efeitos adversos; quantdades maiores, partcularmente se a drenagem é rápida, podem causar edema pulmonar de reexpansão, portanto deve ser realizada com extrema cautela, se considerada necessária.
DERRAME PLEURAL
A - Ultrassonografia para guiar a toracocentese Permanece incerto se o uso ro tneiro da ultrassonografia para auxílio da toracocentese diminui a incidência de pneumotórax. Os autores acreditam que o fator mais importante seja a experiência do médico com o procedimento. A ultrassonografia tem maior utlidade no derrame pleural pequeno e em casos de di ficuldade na toracocentese.
B - Radiografia após a toracocentese Em uma série de 506 toracocenteses, apenas 18 pacientes tveram complicações com pneumotórax. Na ausência de tosse, dispneia, dor após punção, saída de ar ou redução do frêmito toracovocal na parte superior do hemitórax puncionado, menos de 1% dos pacientes teve pneumotórax. Por isso, especialistas do assunto não recomendam radiografia de tórax de ro tna após uma toracocentese, exceto na presença de sinais e sintomas já referidos. Por outro lado, quando a toracocentese é de alívio (retrada de 1 a 1,5L), uma radiogra fia após a punção pode mostrar uma lesão parenquimatosa subjacente, embora seja necessária muita cautela na interpretação dos achados, uma vez que são comuns atelectasias decorrentes de compressão extrínseca pelo derrame.
4. Análise do líquido pleural O objetvo principal da análise do líquido pleural é a diferenciação entre exsudato e transudato. Há mais de 30 anos, Richard Light validou critérios aceitos até hoje como extremamente acurados para o diagnós tco diferencial, utlizando, basicamente, dosagem de proteínas e de desidrogenase látca (DHL) no líquido pleural e no sangue do paciente (Tabela 3). Apesar das tenta tvas de utlizar outro marcador diagnóstco, como colesterol, esses parâmetros contnuam a ser aqueles com melhores sensibilidade, especificidade e custo. Tabela 3 - Critérios de Light (presença de qualquer 1 dos 3 a seguir) - Relação proteína do líquido pleural/proteínas séricas >0,5; - Relação DHL do líquido pleural/DHL sérico >0,6; - DHL do líquido superior a 2/3 do valor normal do laboratório.
Tais parâmetros, apesar de serem bastante sensíveis para exsudato, perdem um pouco em especi ficidade (Tabela 4). A tradução disso na prá tca clínica é que, em algumas situações, nas quais se suspeitava de que o líquido fosse um transudato, o resultado da análise é que ele seja, erroneamente, exsudatvo. Esse problema acontece classicamente em pacientes com ICC que receberam diurétco, o que torna o líquido um pouco mais “concentrado”, alterando as concentrações de DHL e proteínas no fluido. A maneira de evitar essa confusão é solicitar a dosagem de albumina, para cálculo do gradiente de albumina soro-líquido pleural; este, quando maior ou igual a 1,2, na situ-
ação citada, define a presença de transudato. É importante ponderar que o uso isolado da albumina pode gerar equívocos diagnóstcos, não sendo indicada a situações diferentes da descrita. Tabela 4 - Sensibilidade e especi fi cidade de parâmetros para caracterização de exsudatos Parâmetro
Sensibilidade %
Especi ficidade %
Critérios de Light (qualquer 1 dos 3)
98
83
Quociente proteína pleural e sérica >0,5
86
84
Quociente DHL pleural e sérica >0,6
90
82
DHL pleural >2/3 do limite de normalidade sérico
82
89
Colesterol pleural >60mg/dL
54
92
Colesterol pleural >43mg/dL
75
80
Quociente colesterol pleural e sérico >0,3
89
81
Gradiente de albumina pleural-sérico ≤1,2
87
92
A análise do líquido não se restringe à sua caracterização como transudatvo ou exsudatvo; deve-se buscar o diagnóstco e tológico. Para tanto, avaliam-se as característcas macroscópicas, bioquímicas e bacteriológicas do líquido.
A - Característcas macroscópicas A aparência e o odor do líquido pleural podem sugerir a etologia. Dessa forma, o aspecto inicial do líquido pleural pode ser: - Hialino: característco dos transudatos; - Amarelo-citrino espumoso: característco dos exsudatos; - Serossanguinolento ou sanguinolento: neoplasia, trauma ou embolia pulmonar. Raramente ocorre em derrame parapneumônico ou tuberculose; - Leitoso: quilotórax ou empiema; - Purulento com odor fé tdo: empiema; - Achocolatado: abscesso amebiano; - Odor de urina: urinotórax.
Figura 7 - Aspectos macroscópicos do líquido pleural de diferentes et ologias
57
A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA Tabela 5 - Diferenciação entre transudato e exsudato Testes indicados para classificar como exsudato um derrame pleural
Tabela 7 - Posi tv idade da citologia oncót ca
Sensibili- Especi fidade cidade (%) (%)
Critérios de Light (presença de 1 deles)
98
83
Proteína líquido pleural/proteína sérica >0,5
86
84
DHL líquido pleural/DHL sérico >0,6
90
82
DHL do líquido pleural >2/3 do limite superior sangue
82
89
Albumina sérica – albumina líquido pleural ≤1,2g/dL
87
92
Tipo de câncer Adenocarcinoma
Positvidade da citologia 70%
Linfoma
25 a 50%
Sarcoma
25%
Espinocelular
20%
Mesotelioma
10%
Na suspeita de derrame exsuda tvo, deve-se solicitar uma bacterioscopia (Gram) e inocular, à beira do leito, o líquido pleural em meios de cultura para aeróbios e anaeróbios. Dependendo do caso, podem-se pedir culturas para fungos e micobactérias; o micológico direto pode mostrar algum fungo, mas a pesquisa de micobactérias no esfregaço tem baixíssimo rendimento, exceto na AIDS ou no empiema tuberculoso.
Tem maior utlidade em derrames com predomínio de linfócitos e monócitos. Em pacientes com suspeita de derrames neoplásico e citológico nega tvos, deve-se realizar uma videotoracoscopia. Na suspeita de linfoma, a citometria de fluxo do líquido pleural pode ser ú tl (mostrar linfócitos monoclonais). As principais neoplasias associadas ao derrame pleural (>75% dos casos) são, em ordem decrescente de frequência, câncer de pulmão, de mama e linfoma. Na presença de derrame sanguinolento, deve ser solicitado o hematócrito do líquido: quando superior a 50% do hematócrito do paciente, de fine-se hemotórax, sendo indicada drenagem torácica (e tologia mais comum é trauma). Quando menor que 1%, não tem signi ficado; quando entre estes valores, define-se o líquido como sero-hemorrágico (observado em neoplasias, embolia etc.).
C - Citologia
D - Bioquímica
B - Bacterioscópico
Mais que a contagem absoluta de células no líquido, é importante a avaliação diferencial (Tabela 6). Tabela 6 - Celularidade no líquido pleural Célula predominante
Principais etologias
Indica um processo agudo na pleura: derrame Predomínio de parapneumônico, embolia, pancreatte (raraPMN (>50%) mente, neoplasia). Mais provavelmente, indica neoplasia ou tuPredomínio de berculose. Também pode ocorrer após a cirurlinfócitos gia cardíaca (bypass).
Eosinófilos (>10%)
Ocorre na presença de sangue ou ar na pleura. Mas também pode ser reação medicamentosa (nitrofurantoína, dantroleno, bromocrip tna), asbestose, paragonimíase e síndrome de Churg-Strauss. Tuberculose ou neoplasia são causas incomuns, exceto após toracocenteses de repetção.
No líquido pleural, usualmente, são encontrados mesoteliócitos, que têm maior importância prá tca quando ausentes, o que é um es tgma de pleurite tuberculosa. A citologia oncó tca pode diagnostcar um derrame pleural neoplásico; a posi tvidade será maior se forem enviados 50mL ou mais de líquido pleural. A sensibilidade é baixa, com sua ausência nunca excluindo o diagnós tco de neoplasia.
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pH: quando menor que 7,2, indica derrame parapneumônico complicado, artrite reumatoide, ruptura esofágica, tuberculose, neoplasia ou urinotórax (este, a única causa de transudato com pH baixo); - Glicose: ú tl quando menor que 60mg/dL. Pode ocorrer no derrame parapneumônico complicado, neoplasia, pleurite lúpica ou reumatoide. Empiema e pleurite reumatoide podem cursar com níveis extremamente baixos de glicose (<20mg/dL); - Adenosina deaminase (ADA): marcador de a tvidade linfocitária, com baixo custo e importante como auxílio diagnóstco a casos suspeitos de tuberculose pleural em regiões com alta incidência da doença. Além da ADA, podem ser solicitados alfa-interferon ou reação em cadeia da polimerase (PCR) no líquido pleural. Em um estudo, a ADA maior que 40U ocorreu em 253 de 254 pacientes (99,6%) com pleurite tuberculosa. A ADA foi menor que 40U em 102 derrames linfocitários de 105 pacientes que não tnham tuberculose (97,1%). Outras causas de ADA elevada são empiema, pleurite reumatoide, mesotelioma e linfoma; - Amilase: a principal causa de elevação de amilase é a neoplasia. Classicamente, entretanto, está aumentada na presença de pancreatte e ruptura esofágica; - Triglicerídeos: quando superiores a 110mg/dL, de finem a presença de quilotórax. Se o aspecto for leitoso, com pH normal e triglicerídeos inferiores a 50mg/dL, com colesterol elevado, de fine-se pseudoquilotórax -
DERRAME PLEURAL
(aspecto de derrame pleural an tgo). Quando entre 50 e 110mg/dL, deve-se solicitar a dosagem de quilomícrons, para tentar caracterizar o quilotórax; - Ureia e crea tnina: seus aumentos no líquido pleural sugerem a presença de urinotórax; - Testes imunológicos: fator reumatoide, fator an tnuclear e células LE podem ser encontrados no líquido pleural de pacientes com derrame associado a colagenoses.
E - Biópsia de pleura A biópsia de pleura é indicada aos derrames exsuda tvos, sem etologia definida pela análise bioquímica ou bacteriológica. Alguns grupos realizam a biópsia transtorácica com agulha de Cope no momento da toracocentese inicial, na presença de es tgmas clínicos de exsudato ou na compatbilidade da aparência macroscópica do líquido. A biópsia transtorácica tem excelente acurácia para o diagnós tco de pleurite tuberculosa, pois o envolvimento pleural é difuso e homogêneo, mas apresenta rendimento baixo para neoplasia, em que, frequentemente, os fragmentos re trados correspondem a áreas de pleura parietal sem in filtração neoplásica. Assim, nos casos a que se indica biópsia, se a transtorácica for negatva, o próximo passo será indicar uma videopleuroscopia, com biópsia dirigida.
5. Causas especí ficas A seguir, são discutdos aspectos importantes dos derrames pleurais associados à tuberculose e a pneumonias.
A - Tuberculose A tuberculose é uma causa comum de derrame pleural em nosso meio e deve sempre entrar no diagnós tco diferencial de exsudatos. Na grande maioria das vezes, o derrame pleural tuberculoso decorre de uma reação de hipersensibilidade da pleura ao bacilo. Por esses mo tvos, tem-se uma positvidade muito baixa da pesquisa de BAAR e da cultura do líquido pleural (crescimento em menos de 30% dos pacientes). Bem mais raramente, pode haver ruptura de cavitação subpleural, provocando o que se chama de empiema tuberculoso, com pesquisa de BAAR e cultura habitualmente posi tvos. Os pacientes costumam procurar o pronto-socorro com tosse seca (eventualmente produ tva), febre e dispneia; o quadro clínico pode ser arrastado (perda de peso, sudorese noturna, febre vesper tna), principalmente se houver envolvimento de outros órgãos na apresentação inicial. O aspecto do líquido pleural é geralmente amarelo-citrino ou turvo. O derrame pleural é unilateral, habitualmente de tamanho pequeno a moderado, mas pode ocupar todo um hemitórax. O líquido é exsuda tvo e com predomínio de linfócitos. Em pacientes com sintomas há menos de 15 dias, podem
predominar neutró filos, caracterizando a fase aguda da inflamação. A porcentagem de células mesoteliais é geralmente inferior a 5% (pela in flamação difusa da pleura), e pacientes com mais de 5% dessas células no derrame pleural tuberculoso sugerem diagnós tco alternatvo. A presença de eosinofilia no líquido pleural maior que 10% usualmente exclui o diagnós tco de tuberculose pleural, a menos que o paciente tenha tdo múltplas punções ou pneumotórax. O PPD é nega tvo em 1/3 dos pacientes; a radiogra fia de tórax é normal na maioria deles, podendo mostrar sinais de tuberculose prévia. Como se trata de reação de hipersensibilidade na pleura, mesmo se não tratada, a tuberculose pleural pode curar-se espontaneamente, embora 50% dos pacientes acabem desenvolvendo tuberculose a tva em outro sí to nos próximos anos. A positvidade da baciloscopia direta do líquido pleural é muito baixa: menor que 5% na maioria das séries. A positvidade da cultura em meio de Löwestein-Jensen varia de 10 a 35% para o líquido pleural e de 39 a 65% em pacientes submetdos à biópsia pleural. Além da pesquisa direta e cultura, as possibilidades diagnós tcas são: a) Reação em cadeia da polimerase (PCR) para M. tuberculosis Ainda com grande variação na acurácia, dependendo do laboratório estudado. A literatura relata grandes variações na sensibilidade e especi ficidade, com estudos com sensibilidade menor que 20% e outros com sensibilidade maior que 90%; em média, a sensibilidade parece ser em torno de 70%. Regra geral: um PCR posi tvo indica tuberculose pleural com mais de 90% de especi ficidade. b) ADA Enzima que há em grande quan tdade em linfócitos e monócitos atvados, sobretudo em linfócitos T. Helper . É proveniente do catabolismo das purinas, que, catalisando a conversão da adenosina em inosina e da desoxiadenosina em desoxiinosina, é importante para a diferenciação de linfócitos, principalmente da população T . A 1ª descrição dessa enzima para uso diagnós tco foi feita em 1970 em pacientes com câncer de pulmão, mas só em 1978 se descreveu o seu uso para o diagnós tco de tuberculose. A sensibilidade e a especificidade da ADA para o diagnós tco de tuberculose no derrame pleural dependem do cut-o ff usado (varia conforme o estudo e a metodologia usada). Atualmente, o cut-o ff recomendado é de 40U/L (sensibilidade de 91 a 100% e especi ficidade de 81 a 94%; valor predi tvo positvo de 84 a 93% e valor predi tvo negatvo de 89 a 100%). Por outro lado, quanto maior a prevalência da tuberculose em uma determinada região, maior o valor predi tvo positvo do exame. Níveis superiores a 60U/L têm valor predi tvo positvo ainda mais superior, raramente sendo encontrado em outras condições. Em algumas situações que não a tuberculose, pode haver elevação da ADA no líquido pleural, especialmente em linfomas e, raramente, em empiema pleural, mesotelioma e artrite reumatoide. Recomenda-se
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PNEUMOLOGIA que em derrames pleurais exsuda tvos com predomínio de linfócitos e ADA elevada, na ausência de es tgmas clínicos de linfoma, empiema e artrite reumatoide, o diagnós tco de tuberculose pleural é bastante provável e o tratamento está indicado. c) Interferon-gama Semelhante à ADA, quando aumentado, sugere tuberculose pleural. Entretanto, no nosso meio, não é facilmente disponível para uso ro tneiro. Utlizando um ponto de corte de 140pg/mL, a sensibilidade pode variar de 86 a 97%, enquanto a especificidade tem sempre valores acima de 90%. Uma meta-análise demonstrou que, devido ao custo, a dosagem da ADA apresenta melhor relação custo-bene f cio para o diagnóstco de tuberculose pleural. d) Biópsia pleural fechada Recomenda-se a coleta de 2 a 3 fragmentos para a realização do exame anatomopatológico e mais 1 para a realização da cultura. A sensibilidade pode chegar a 60%. Múltplas biópsias aumentam o rendimento diagnós tco (busca de granulomas ou cultura da pleura). A formação do granuloma requer imunidade celular bem preservada, a qual é prejudicada na imunodepressão causada pelo HIV, de forma que se perde sensibilidade nesses pacientes. e) Lisozima Exame pouco utlizado, a lisozima é uma enzima bacteriolí tca decorrente principalmente da decomposição dos leucócitos. Níveis elevados dessa enzima são encontrados no líquido pleural por tuberculose e nos empiemas. O valor da relação líquido pleural/sangue acima de 1 pode ser u tlizado no diagnóstco diferencial com exsudatos de outras e tologias. Aumentos significatvos (acima de 50U/L), excluindo empiema, apresentam alta probabilidade de tuberculose. f) Videotoracoscopia com biópsia Método mais sensível que a biópsia pleural “às cegas” (sensibilidade de 95%), possibilita o diagnós tco de outras doenças com manifestações semelhantes, como o câncer. Eventualmente, a tuberculose pleural pode manifestar-se como o denominado empiema tuberculoso (uma forma de derrame pleural decorrente da ruptura) para o espaço pleural, de uma lesão pulmonar ricamente habitada por bacilos, representando uma infecção a tva com a contaminação pleural por material caseoso. Os pacientes apresentam líquido purulento, que pode estar associado à infecção bacteriana secundária, principalmente na presença de f stula broncopleural. Pneumotórax pode ocorrer como complicação de f stulas ou ruptura de cavidades por tuberculose no espaço pleural. O diagnós tco deve ser realizado por meio da pesquisa e/ou cultura de bacilos álcool-ácido resistentes, cultura para bactérias e/ou biópsia de pleura. A ADA pode estar elevada, acima de 40U/L, não podendo, entretanto, ser utlizada como critério diagnós tco diferencial, pois se encontra aumentada no derrame pleural parapneumônico complicado.
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A citologia demonstra grande número de neutró filos, a glicose é baixa, o nível de DHL é elevado, e o pH, inferior a 7,2. Diferentemente do que ocorre na tuberculose pleural habitual, o rendimento da pesquisa de bacilos álcool-ácido resistentes e da cultura para tuberculose no empiema tuberculoso é alto, servindo de parâmetro para monitoramento da efe tvidade do tratamento enquanto há líquido. É necessário realizar drenagem pleural em sistema fechado. Posteriormente, pleurostomia ou drenagem aberta (por dreno ou próteses) podem estar indicadas, e pleuroscopia, para lise de aderências, deve ser realizada em pacientes com espessamento pleural signi ficatvo. O tratamento segue as orientações gerais para casos de tuberculose pulmonar ou extrapulmonar, com uso de rifampicina, isoniazida, pirazinamida e etambutol por 2 meses, seguidos de 4 meses com rifampicina e pirazinamida. Não há indicação de uso de cor tcosteroides, tampouco de drenagem pleural (na inexistência de empiema).
B - Derrame pleural parapneumônico O derrame pleural associado à infecção de trato respiratório inferior (pneumonia, abscesso ou bronquiectasias) é chamado de parapneumônico. Na maioria das vezes, é pequeno, sem necessidade de intervenção especí fica, remitndo com o tratamento da infecção; entretanto, pode haver infecção da cavidade pleural, com in flamação exuberante, que pode culminar com formação de empiema de necessidade, situação em que há uma f stula na parede torácica, que drena espontaneamente o líquido acumulado no espaço pleural. O que dita esse espectro de gravidade é a fase evolutva do derrame, com 3 estágios, sendo eles: a) Estágio exsudatvo O líquido é estéril e formado por aumento de permeabilidade vascular pleural pela infecção associada no parênquima adjacente. É a fase caracterís tca da maioria dos derrames associados à infecção. O líquido revela-se um exsudato neutrof lico com DHL usualmente inferior a 1.000U/L, com pH e glicose normais; não se iden tficam germes. b) Estágio fibropurulento Há germes no espaço pleural. A quan tdade de células é bem maior, com acúmulo de debris celulares, e o líquido pode ter aspecto purulento. O nível de DHL é maior que 1.000U/L, com glicose e pH reduzidos. Pela in flamação excessiva, há tendência à formação de loculações. c) Estágio de organização Estágio mais avançado de in flamação, com intensa atvidade de fibroblastos e formação de empiema. Há espessamento pleural e, em casos mais avançados, formação de uma carapaça que encarcera o pulmão. Pode, ainda, ocorrer drenagem espontânea do líquido pela parede torácica – empiema de necessidade. Atenção: dados clínicos não têm acurácia su ficiente para determinar o estágio da doença pleural e, assim, a necessi-
DERRAME PLEURAL
dade de drenagem. Dessa forma, todos os pacientes com derrame pleural associado à infecção, que seja clinicamente significatvo, devem ser subme tdos à toracocentese. O que determina o estágio e, assim, o prognós tco e a conduta a ser tomada são as análises de volume de líquido, a presença de loculações, o pH, o DHL, a glicose e a presença de germes. De forma prátca, podem-se resumir as recomendações sobre a conduta diante de um derrame parapneumônico conforme a Tabela 8. A antbiotcoterapia segue as orientações de tratamento da pneumonia e deve ser ajustada conforme o germe isolado em culturas. Tabela 8 - Sumário de condutas no derrame parapneumônico Quando realizar toracocentese? - Espessura maior de 10mm no decúbito lateral; - Presença de derrame loculado (toracocentese guiada por ultrassonogra fia). Quando drenar? - Bacterioscopia ou cultura posi tvas; - pH <7 ou glicose <40mg/dL; - pH 7 a 7,2 com aumento progressivo do DHL. Quando indicar toracoscopia ou decor tcação - Presença de loculações; - Piora clínica, apesar da drenagem.
C - Derrame pleural neoplásico O derrame pleural é uma complicação frequente e uma apresentação inicial comum entre os pacientes com neoplasia de pulmão. Nem sempre indica in filtração pleural e, assim, doença em estágio avançado; são e tologias possíveis, associadas à neoplasia: hipoalbuminemia, embolia pulmonar, pneumonia com derrame parapneumônico, insuficiência cardíaca, obstrução de grandes vasos no mediastno, pós-radioterapia. A toracocentese e a biópsia pleural são importantes para a de finição diagnóstca. Dentre as neoplasias, as que mais evoluem com comprometmento pleural, em ordem decrescente de frequência, são neoplasia de pulmão, neoplasia de mama e linfoma. O derrame pleural é de volume variável e pode ter velocidade de acúmulo rápida. É um exsudato, amarelo-citrino ou hemá tco, com predomínio de linfócitos e níveis de glicose e pH reduzidos em cerca de 20% dos casos. Eosinofilia é incomum. Os derrames neoplásicos são a
principal causa de elevação de amilase em líquido pleural, entretanto níveis de amilase estão elevados em apenas 10 a 20% dos casos. A citologia oncó tca tem baixa sensibilidade, que é um pouco maior nos casos de adenocarcinoma; sempre deve ser solicitada, pois, se posi tva, define o diagnóstco. Nos pacientes ainda sem diagnós tco de neoplasia, é importante realizar um exame de imagem logo após a toracocentese, para visualizar por completo o parênquima pulmonar. Confirmado o derrame pleural maligno, está caracterizada doença avançada, com estadio, no mínimo, IIIB, apresentando tratamento paliatvo. Nesse caso, o objetvo do tratamento é a melhora da dispneia. Os derrames pleurais malignos de pequeno volume, minimamente sintomá tcos, não progressivos e não recidivantes, podem ser acompanhados somente com observação clínica. A toracocentese é o procedimento de escolha para o alívio da dispneia em pacientes com sobrevida curta. A taxa de reacúmulo de líquido pleural, após 30 dias da toracocentese, é próxima de 100%, e deve-se evitar a re trada de mais de 1,5L por punção devido ao risco de edema de reexpansão, embora este não pareça ser comum. Outra opção de tratamento, a pacientes em que não ocorre expansão pulmonar após a toracocentese, é a drenagem pleural, usando cateter de fino calibre. A pleurodese representa uma opção para o tratamento de finitvo. O uso de substâncias esclerosantes determina reação in flamatória aguda das super f cies pleurais, que resulta em intensa fibrose e sínfise do espaço pleural. Tal processo pressupõe aposição das pleuras visceral e parietal, mediante a drenagem de todo o líquido acumulado e a reexpansão pulmonar. Algumas condições são necessárias para o sucesso do procedimento: - Melhora clínica com toracocentese com remoção parcial ou total do volume; -
Natureza maligna do derrame bem determinada;
-
Reexpansão pulmonar com a toracocentese, a qual pode não acontecer em pacientes com obstrução brônquica, encarceramento neoplásico do pulmão e linfangite carcinomatosa.
D - Outras causas O derrame pleural em outras doenças está descrito na Tabela 9.
Tabela 9 - Derrame pleural em outras doenças Tromboembolismo pulmonar - Faz parte do diagnós tco diferencial de derrames transudatvos ou exsudatvos. Nos Estados Unidos, 50% dos TEPs cursam com derrame pleural (150.000 derrames/ano devido à TEP). Algumas par tcularidades: em 95% dos pacientes com TEP, o derrame é unilateral; cerca de 80% são exsudatos e 20%, transudatos. O derrame é de volume pequeno a moderado e nem sempre hemorrágico (este ocorre quando há infarto pulmonar). Caso seja puncionado muito precocemente, há predomínio de neutró filos; logo em seguida, o predomínio passa a ser linfomonocitário. O derrame exsuda tvo habitualmente ocorre por pleurite reacional à área de infarto periférica; o transudatvo associa-se a eventos com algum grau de repercussão hemodinâmica, já que resulta de elevação signi ficatva e rápida das pressões em câmaras direitas, que são transmi tdas às vênulas do espaço pleural, que têm sua drenagem prejudicada.
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PNEUMOLOGIA Pleurite reumatoide - Apenas 5% dos pacientes com artrite reumatoide têm derrame pleural; ocorre mais frequentemente em homens, em idosos, e 80% deles têm nódulos subcutâneos e artrite reumatoide de longa data. São comuns febre, tosse e dor torácica. O derrame costuma ser de tamanho pequeno a moderado, bilateral em 25% dos pacientes. Pode haver regressão espontânea do derrame de um lado e surgir, em seguida, do outro. Em 1/3 dos pacientes, há manifestações pulmonares associadas. A pleura costuma tornar-se espessada e apresenta vários nódulos; - Característcas do líquido pleural: ↓ glicose (<30mg/dL), ↓ pH, ↑ DHL e alto tulo de fator reumatoide (> 1:320). No início, a glicose do líquido pleural pode estar normal, mas, com o tempo, diminui. Aumento da concentração de colesterol é comum, assim como a formação de cristais; - Prognóstco: pouco conhecido. Alguns pacientes têm remissão em 3 meses, outros evoluem com espessamento pleural, necessitando de decortcação. Não há estudos do efeito de an t-inflamatórios ou drogas indutoras de remissão na pleurite reumatoide. Curiosamente, não costuma responder a cor tcosteroides. Pleurite lúpica - Os pacientes com lúpus podem ter derrame pleural associado à própria doença ou relacionado a drogas. Es tma-se que 40% dos lúpicos terão um derrame pleural ao longo da vida. Geralmente, artrite e artralgia precedem as manifestações pleurais, mas, em até 30% dos pacientes, as manifestações pleurais podem preceder as manifestações ar tculares. A pleurite lúpica costuma fazer parte de uma exacerbação sistêmica da doença. Geralmente, o derrame pleural é pequeno e bilateral em até 50% dos casos; - A pleurite lúpica deve ser considerada hipótese diagnós tca em todos os derrames pleurais exsuda tvos de causa indeterminada. As característcas do líquido pleural são: exsudatvo, glicose normal ou baixa, possível predomínio de PMN precocemente, evoluindo com predomínio linfomononuclear. O achado de fator an tnúcleo positvo no líquido pleural não costuma fornecer informação adicional pelos testes sorológicos, e essa pesquisa não mais é recomendada de rotna; - Diagnóstco: dados clínicos e marcadores séricos de atvidade lúpica. Sempre se deve destacar uma e tologia infecciosa. Ao contrário da artrite reumatoide, a pleurite lúpica responde bem a cortcosteroides, mas só estão indicados aos casos cujos sintomas são exuberantes. Doenças abdominais - Podem ser oligossintomá tcas e causar derrame pleural, o que pode di ficultar o diagnóstco. Algumas par tcularidades: · Cirrótcos, mesmo sem ascite, podem apresentar derrame pleural (são transudatos), que acontece por passagem do líquido peritoneal para o espaço pleural por fenestras diafragmá tcas, mais comumente unilateral à direita. O diagnós tco é definido comparando as característcas dos líquidos peritoneal e pleural colhidos simultaneamente; · Pancreatte crônica com f stula pleural: exsudato, derrame pleural mais frequente à esquerda; o diagnós tco é confirmado com a dosagem de amilase no líquido pleural; · Infarto esplênico: causa exsudato, pode cursar com dor na base do hemitórax esquerdo ou hipocôndrio esquerdo, e algumas vezes há elevação de cúpula frênica (E). O derrame pleural pode ser rico em PMN. As causas habituais são leucemia mieloide crônica, endocardite, sepse ou hemoglobinopatas; · Abscesso subfrênico: exsudato, muitas vezes, devido à reação diafragmá tca (líquido estéril), podendo ser também uma extensão do processo infeccioso. Normalmente, há predomínio de PMN; os pacientes podem ser oligossintomá tcos. Na suspeita, solicitar uma ultrassonografia e/ou tomografia de abdome; · Amebíase e equinococose: semelhantemente ao abscesso subfrênico, também podem causar derrame pleural. Na amebíase, o líquido pleural pode ser cinza ou achocolatado, e dificilmente se isola o parasita. Na equinococose, podem ser encontrados os escóleces do parasita. Quilotórax - Ocorre por acúmulo de quilo, líquido linfátco rico em gorduras na forma de quilomícrons, recém-absorvidas no trato gastrintes tnal. O fluido é transportado pelo ducto torácico, que tem trajeto abdominal adjacente à aorta até passar pelo hiato aór tco no diafragma e seguir em direção à cava; - Lesões traumá tcas (causa mais comum) ou obstru tvas (neoplasias) podem interromper seu transporte e resultar em extravasamento de líquido para o espaço pleural. A aparência leitosa nem sempre é regra, principalmente se transcorridas mais de 2 horas após a últma refeição, já que as gorduras, que dão o aspecto ao líquido, mesmo no espaço pleural são absorvidas e metabolizadas; a dosagem de triglicerídeos habitualmente é elevada (>110mg/dL), mas pode estar um pouco mais baixa (entre 50 e 110mg/dL), sendo algumas vezes necessária a dosagem de lipoproteínas para de finir o diagnóstco. O tratamento é feito com ligadura do ducto torácico no caso de traumas ou tratamento palia tvo da neoplasia, devendo-se considerar a possibilidade de pleurodese, uma vez que as toracocenteses repe tdas espoliam muitos nutrientes (gordura) desses pacientes. Síndrome das unhas amarelas - Tríade de mudança da coloração das unhas, derrame pleural e linfedema. O derrame é habitualmente pequeno e assintomá tco, mas pode ser grande; é bilateral em 50% dos pacientes, exsuda tvo, rico em linfócitos, com pH e glicose normais. Devem-se excluir outras causas de derrame pleural antes de atribuir a essa síndrome a e tologia do derrame. Acredita-se que a causa subjacente seja uma hipoplasia do sistema linfá tco. As unhas costumam ser pálidas, amareladas ou esverdeadas, encurvadas, e podem estar espessadas ou separadas do leito ungueal (onicólise).
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DERRAME PLEURAL
Reação medicamentosa - Pode ocorrer como parte de uma síndrome lúpus-símile (hidralazina, isoniazida, procainamida, fenitoína, clorpromazina, me tldopa) ou não, podendo ser rico em eosinófilos: nitrofurantoína, amiodarona, dantroleno, bromocrip tna, procarbazina, metsergida. Síndrome de Meigs - A tríade clássica consiste em ascite, derrame pleural e tumor benigno de ovário. A síndrome também tem sido descrita com tumores benignos de útero e mesmo tumores malignos de ovário de baixo grau de agressividade. A ascite origina-se da hiperprodução de fluido pelo tumor, e acredita-se que o derrame pleural decorra de passagem direta do líquido ascí tco para a cavidade torácica. O diagnóstco pode ser sugerido pelo achado de massa pélvica. O derrame pleural é do lado direito em 70% dos pacientes e bilateral em 20%. As característcas do líquido pleural são: exsudatvo, baixa celularidade (<1.000 células); a citologia oncó tca pode sugerir o diagnóstco; a laparoscopia com biópsia confirma a doença. Tanto o derrame pleural quanto a ascite desaparecem após o tratamento da causa-base. Sarcoidose - Apesar de rara, pode ser confundida com tuberculose. O derrame pleural é pequeno e pode ser bilateral em 1/3 dos pacientes; exsudatvo, rico em linfócitos. A biópsia pleural mostra granulomas não caseosos. Os pacientes costumam ter sarcoidose pulmonar extensa, inclusive extratorácica. Costuma responder bem a cor tcosteroides.
6. Resumo Quadro-resumo - O derrame pleural representa diagnóstco sindrômico e corresponde a acúmulo anormal de líquido no espaço pleural; - As principais etologias são insuficiência cardíaca, pneumonia com derrame parapneumônico, tuberculose e neoplasia. Todo derrame pleural de etologia indeterminada e clinicamente significatva (mais de 10mm de espessura em radiogra fia em decúbito lateral) deve ser puncionado; - A propedêutca especí fica do derrame pleural envolve sua caracterização com transudato e exsudato, o que pode limitar as e tologias; - A radiografia de tórax geralmente identfica derrames com volume superior a 200mL (posteroanterior); em casos de dúvida da existência de derrame, ou se este é livre, solicita-se a radiogra fia em decúbito lateral com raios horizontais. Ultrassonogra fia e tomografia computadorizada podem ser úteis; - Os critérios de Light podem de finir a presença de exsudato: proteína do líquido pleural superior a 50% da sérica, DHL pleural superior a 60% da sérica, ou DHL superior a 2/3 do limite de normalidade do laboratório. A especi ficidade dos critérios não é tão boa, e, se houver suspeita importante de transudato (principalmente se o paciente es tver em uso de diurétco), pode-se utlizar critério adicional: gradiente de albumina pleura-sangue – superior a 1,2, indica transudato. - Algumas caracterís tcas sugerem algumas etologias: · Líquido hemorrágico: neoplasia, embolia pulmonar ou hemotórax; · Líquido esbranquiçado: quilotórax ou empiema; · Líquido achocolatado: abscesso hepátco ou derrame antgo; · Transudato com pH reduzido: urinotórax; · Glicose reduzida: artrite reumatoide, pleurite lúpica, tuberculose e empiema; · pH reduzido: artrite reumatoide, ruptura esofágica, empiema, neoplasias; · Amilase elevada: neoplasia (principal causa), ruptura esofágica e pancreatte; · ADA elevada: tuberculose (principalmente se superior a 60), linfoma, empiema, mesotelioma, artrite reumatoide; · Eosinofilia: ar ou sangue no espaço pleural; raramente: reação a drogas, paragonimíase, angiite de Churg-Strauss. - O derrame pleural associado à insu ficiência cardíaca é mais comum à direita, ou bilateralmente, raramente sendo unilateral esquerdo (15%); pode apresentar conformações a picas, como acúmulo na fissura, gerando a imagem conhecida como “tumor fantasma”, por vezes confundido com neoplasia. O tratamento diuré tco fornece boa resposta em 48 horas; - Derrame parapneumônico é aquele que ocorre associado à infecção do parênquima: é um exsudato neutro f lico, podendo coexistr redução de glicose e pH; em fases avançadas, os germes podem a tngir o espaço pleural, caracterizando empiema; a drenagem está indicada em derrames com pH inferior a 7,2 (7 para alguns autores), glicose inferior a 40mg/dL, presença de loculação ou identficação de germes; - O derrame neoplásico indica doença em fase avançada: o tratamento proposto é o palia tvo. Toracocenteses repetdas podem ser necessárias, bem como pleurodese, que é mais efe tva quando realizada por videotoracoscopia; - O derrame pleural tuberculoso pode ocorrer: a) por reação de hipersensibilidade na pleura, com evolução benigna, resolução em 30 a 60 dias, apresentação simulando quadro infeccioso agudo e derrame exsuda tvo, com ADA elevada; a biópsia de pleura tem alto rendimento mostrando granulomas; o tratamento é importante para evitar surgimento de tuberculose em outro órgão na evolução (ocorre em 60% após 1 ano); b) empiema tuberculoso, um quadro insidioso, que resulta de ruptura de um foco caseoso para o espaço pleural, quando a baciloscopia no líquido pode encontrar o germe; o tratamento está indicado e é feito com o esquema RIP; - Tromboembolismo pulmonar pode causar derrame transuda tvo (pequeno volume, em pacientes com TEP maciço ou submaciço) ou exsudatvo (pequeno volume, resultado de pleurite reacional, caracteristcamente sero-hemorrágico).
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PNEUMOLOGIA
CAPÍTULO
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Doenças pulmonares interstciais
1. Introdução
Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Mar tn s Valois
quima pulmonar, ou seja, o alvéolo, a membrana alveolocapilar, o endotélio, estruturas perivasculares e linfá tcos. Apesar da diversidade de e tologias, essas doenças são colocadas no mesmo grupo devido a manifestações fisiopatológicas, clínicas e radiológicas semelhantes. São doenças que acarretam considerável morbimortalidade e em cujo manejo ideal há pouco consenso. Doenças infecciosas, causadas por bactérias (como legionela, micoplasma, clamídia), vírus (in fl uenza, citomegalovírus, vírus do sarampo etc.), fungos (P. jiroveci , Histoplasma) ou micobactérias, apesar de cursarem com manifestações clínicas e radiológicas muito similares, não devem ser classi ficadas como DPIs; o mesmo acontece com a linfangite carcinomatosa. Isso porque, apesar de essas doenças terem quadro clínico semelhante, apresentam evolução diversa e tratamento par tcular quando comparadas às DPIs. Portanto, fazem parte do diagnós tco diferencial.
2. Etologias As DPIs estão associadas, mais comumente, às exposições ambientais, especialmente a poeiras orgânicas e inorgânicas. Podem também estar relacionadas às doenças reumatológicas ou, ainda, ter origem idiopá tca. As Tabelas 1 e 2 reúnem as etologias mais comuns. Tabela 1 - DPIs com alveolite, in fl amação interst cial e fi brose Causas conhecidas Ambientais
- Asbestose; - Gases tóxicos. - Amiodarona;
Medicamentosas
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- Quimioterápicos; - Sais de ouro.
Figura 1 - Doença interst cial fi brosante - faveolamento (honeycombing): (A) raio x e (B) TC
As Doenças Pulmonares Interstciais (DPI) representam um grande número de patologias que envolvem o parên-
- Antbiótcos;
Causas desconhecidas - Pneumonite aspiratva; Sequelares
- Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA).
DOENÇAS PULMONARES INTERSTICIAIS
Pneumonias interstciais idiopátcas
Causas desconhecidas - Fibrose pulmonar idiopátca; - Pneumonia interstcial não especí fica; - Pneumonia interstcial descamatva; - Bronquiolite respiratória; - Pneumonia interstcial aguda; - Bronquiolite obliterante com pneumonia em organização (BOOP). - Dermatopolimiosite;
- Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES); - Esclerodermia; Doenças do tecido conectvo - Artrite reumatoide; - Espondilite anquilosante; - Síndrome de Sjögren. - Síndrome de Goodpasture; Hemorragia - Hemossiderose idiopátca; alveolar - Capilar alveolar (doenças autoimunes, vasculites, leptospirose). - Doença inflamatória intestnal; Trato gastrintes- Hepatte crônica atva; tnal - Cirrose biliar primária. - Esclerose tuberosa; - Neurofibromatose; Hereditárias - Doença de Niemann-Pick; - Doença de Gaucher. - Amiloidose; - Proteinose alveolar; - Pneumonias eosinof licas; Outras - Pneumonias interstciais linfoides; - Linfangioleiomiomatose; - Doença do enxerto contra hospedeiro (pós-transplante). Tabela 2 - DPIs com in fl amação granulomatosa
Ambientais
Vasculites granulomatosas
Outras granulomatoses
Causas conhecidas - Berílio; - Sílica; - Pneumonite de hipersensibilidade. Causas desconhecidas - Granulomatose de Wegener; - Síndrome de Churg-Strauss. - Sarcoidose; - Granulomatose das células de Langerhans (histocitose X); - Granulomatose linfomatoide; - Granulomatose broncocêntrica.
3. Patogênese O mecanismo por meio do qual vários agentes diferentes levam à destruição do inters cio pulmonar não é com-
pletamente conhecido. De maneira geral, após a agressão pulmonar (única ou de repe tção), a resposta biológica pode ocorrer de 2 formas.
A - Processo granulomatoso Ocorre acúmulo de linfócitos T, macrófagos e células epitelioides organizados em estruturas discretas, embora difusamente presentes, denominadas granulomas. Tais lesões granulomatosas podem agravar-se, evoluindo para fibrose pulmonar. Contudo, quando diagnos tcadas a tempo e tratadas adequadamente, possuem excelente prognós tco. A maioria dos doentes permanece pouco sintomá tca até fases avançadas. Dentre os diagnós tcos diferenciais, estão as vasculites sistêmicas, a sarcoidose e a pneumonite de hipersensibilidade.
B - Alveolite, inflamação e fibrose A lesão tem início no epitélio, causando in flamação dos espaços aéreos e alvéolos. Uma vez con tnuado o processo, a inflamação pode estender-se para estruturas adjacentes (inters cio, linfátcos e vasos), culminando em fibrose interstcial. O desenvolvimento da fibrose avançada é uma condição complexa e temida, que pode levar a grave limitação da função respiratória do paciente. Histopatologicamente, tais processos podem ser classificados como: - Pneumonia interstcial usual (cujo protó tpo é a FPI); - Pneumonia interstcial inespecí fica; - Predomínio de bronquiolite respiratória; - BOOP; - Pneumonia interstcial descamatva; - Lesão alveolar difusa; - Infiltração linfocí tca.
4. Anamnese A - Sintomas respiratórios Dispneia costuma ser a principal queixa referida pelo paciente, a qual ocorre de maneira progressiva, iniciando-se aos grandes esforços, chegando aos pequenos esforços (como tomar banho), devido à barreira imposta pela doença interstcial que di ficulta a difusão de oxigênio. Outro sintoma frequente e que causa intenso incômodo ao paciente é a tosse, em geral, não produtva. Com menor frequência, há fadiga, perda de peso e anorexia. O súbito aparecimento de dor tpo pleurí tca deve sugerir pneumotórax, já que dor torácica não é um sintoma comum nessa doença. Escarros hemoptoicos e hemop tse podem ocorrer. Eventualmente, a hemop tse é maciça e de extrema gravidade (Goodpasture). Quando a doença fibrosante ocorre associada a outra morbidade, os sintomas da doença de base podem dominar o quadro.
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PNEUMOLOGIA B - Duração da doença As manifestações clínicas dependem do período de surgimento dos sintomas. Sua duração pode ser classi ficada em: a) Aguda Os sintomas surgem em dias a poucas semanas. Em geral, devem-se à pneumonite de hipersensibilidade, pneumonia eosinof lica, hemorragia alveolar, pneumonia interstcial idiopátca aguda e a reações imunológicas (medicamentos, helmintos, fungos). O diagnós tco diferencial mais importante é a pneumonia bacteriana de apresentação interstcial (micoplasma, legionela, clamídia etc.). b) Subaguda Os sintomas surgem durante várias semanas a meses. Essa forma de apresentação pode ocorrer com todas as DPIs, embora seja mais comum na sarcoidose, pneumonia interstcial induzida por medicamentos, BOOP e formas interstciais associadas a doenças do tecido conec tvo (especialmente, lúpus e polimiosite). c) Crônica É a forma mais comum de apresentação das doenças fibrosantes, e os sintomas surgem em vários meses a anos.
C - Idade e sexo Em geral, há 2 grandes faixas etárias: após os 50 anos (Pneumonia Interstcial Fibrosante Idiopá tca – PIFI) e entre os 20 e os 40 anos (his tocitose, sarcoidose, formas familiares ou doenças gené tcas). A linfangioleiomiomatose é uma doença restrita a mulheres em idade fér tl. Doenças do tecido conec tvo também são mais comuns em mulheres, exceto vasculite reumatoide, que, assim como a maioria das outras doenças, inclusive as ocupacionais, é mais comum em homens.
D - História ambiental e ocupacional Tal pesquisa deve ser exaus tva e detalhada, inclusive com amigos e familiares. Várias formas de exposição crônica podem levar às DPIs (asbesto, sílica, gases, berílio etc.). Outras vezes, a exposição a determinado agente se segue de um quadro clínico de febre, calafrios, tosse, sibilos e dispneia. Novas exposições podem ocasionar quadros semelhantes (agricultor, fazendeiro, criador de pombos etc.).
E - Tabagismo Cerca de 75% dos doentes com PIFI têm história de tabagismo, assim como quase todos os doentes com his tocitose, pneumonia inters tcial descamatva, bronquiolite respiratória, síndrome de Goodpasture e proteinose alveolar. Essa variável, quando presente, prevê um curso mais grave da doença e com pior prognós tco que entre os não tabagistas.
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Entretanto, há relatos na literatura de um possível fator protetor do tabagismo para algumas doenças inters tciais. Todos foram estudos de prevalência, que não tnham como objetvo principal iden tficar a existência dessa associação, tampouco sua natureza; assim, os resultados são bastante questonados. É fato, no entanto, que os pacientes tabagistas, quando apresentam alguma dessas doenças, têm curso mais grave e com pior prognós tco que os não tabagistas. Tabela 3 - Doenças pouco observadas em pacientes tabagistas - Sarcoidose; - Pneumonia de hipersensibilidade; - Pneumonite ac nica; - Retocolite ulceratva.
F - Outros Pneumonia eosinof lica pode ser consequência de infecções parasitárias. Doentes com o vírus HIV podem evoluir com doenças pulmonares inters tciais, como pneumonia interstcial linfoide, BOOP, pneumonia inters tcial difusa idiopátca etc.
5. Diagnóstco A - Exame f sico a) Sinais respiratórios Os sinais respiratórios são possíveis em todas as DPIs. Porém, não é incomum que o paciente se apresente sem qualquer alteração no exame f sico, exceto por taquipneia (os doentes costumam ter pequeno volume corrente compensado pelo aumento da frequência respiratória, levando a respirações rápidas e superficiais). À ausculta, estão presentes crepitações em ambas as bases, eventualmente difusas, teleinspiratórios, descritos como “ tpo Velcro”. Sibilos são raros, mas podem ocorrer na síndrome de Churg-Strauss, pneumonite de hipersensibilidade, pneumonias eosino f licas, bronquiolite respiratória e sarcoidose. b) Outros achados Sinais de hipertensão pulmonar podem surgir em fases mais avançadas (2ª bulha hiperfoné tca, sopro de insuficiência tricúspide etc.), além de baqueteamento digital e cianose. Dados da doença de base também podem estar presentes (como artrite, rash malar, vasculite de pele, linfonodomegalias, eritema nodoso etc.).
B - Exames laboratoriais Os exames laboratoriais poderão ser necessários de acordo com as hipóteses clínicas. Em geral, são solicitados, no mínimo, hemograma, eletrólitos, função renal, exames de coagulação, urina tpo 1, eletrocardiograma (ECG) e radiogra fia de tórax. A medida da oximetria de pulso e a gasometria arterial costumam ser de grande u tlidade.
DOENÇAS PULMONARES INTERSTICIAIS
A gasometria pode ser normal em repouso, mas apontar hipoxemia após exercício pode revelar hipoxemia em repouso e, sequencialmente, hipoxemia com hipocapnia ( FR) ou até hipoxemia grave com hipercapnia ( ↓ FR, indicando estadio avançado da doença). Vários cenários clínicos podem alterar os exames laboratoriais, como lúpus (aparecendo como anemia, leucopenia, plaquetopenia, lesão renal etc.), vasculites sistêmicas (aparecendo como função renal alterada, hipercalemia etc.). Para evitar equívocos, podem ser solicitados outros exames:
d) Antcorpo antmieloperoxidase (p-ANCA) Também denominado de antcorpo antcitoplasma de neutrófilo padrão perinuclear. Pode ser posi tvo em várias doenças (hepatte crônica atva, poliangiite microscópica), inclusive na síndrome de Churg-Strauss e granulomatose de Wegener. e) Antcorpo antmembrana basal glomerular (domínio não colagenoso do colágeno tpo IV) Indica Goodpasture. f) Enzimas musculares Aumentadas significatvamente, podem sugerir polimiosite.
a) Fator antnúcleo e outros autoan tcorpos
g) Desidrogenase látca
Podem indicar lúpus (FAN posi tvo, ant-Sm, ant-DNA de dupla fita), esclerodermia (an t-Scl 70 ou anttopoisomerase III), polimiosite (an t-Jo 1 ou an t-histdil t-RNA sintetase) etc.
Inespecí fica; costuma aumentar na maioria das DPIs. h) Dosagem da enzima conversora de angiotensina Pode elevar-se na sarcoidose.
b) Fator Reumatoide (FR)
i) Cálcio sérico ou urinário
É positvo em várias doenças. Altos tulos são comuns na vasculite reumatoide, por exemplo. c) Antcorpo antproteinase 3 (c-ANCA) Também denominado de an tcorpo antcitoplasma de neutrófilo padrão citoplasmátco, quando positvo indica granulomatose de Wegener.
Pode estar elevado na sarcoidose.
C - Diagnóstco diferencial Vários medicamentos podem causar in filtrado interstcial. Em caso de suspeita, deve-se suspendê-los imediatamente (Tabela 4).
Tabela 4 - Medicações associadas a in fi ltrado intest nal
Quimioterápicos
Cardiovasculares
Ant-inflamatórios
Antbiótcos
Bleomicina
- Maior causador de lesão pulmonar, que é relacionada à dose. Pode causar pneumonia eosinof lica, BOOP, pneumonite granulomatosa ou dano alveolar difuso.
Bussulfano
- Surge geralmente após 5 anos do uso, causa fibrose pulmonar e pode cursar com proteinose alveolar.
Ciclofosfamida
- Curso muito variável, podendo causar lesão precoce ou tardia.
Nitrosureias
- Início retardado e dose-relacionada; causa fibrose em lobos superiores.
Amiodarona
- A toxicidade é mais comum com doses elevadas (acima de 400mg/dia); o quadro surge após meses de uso do fármaco, como BOOP ou pneumonia inters tcial não especí fica. A resposta a cortcoide é boa em alguns casos; o fármaco deve ser suspenso.
Hidralazina
- Síndrome lúpus-símile.
Metotrexato
- Pode produzir pneumonite granulomatosa, BOOP, dano alveolar difuso, bronquite com hiper-responsividade brônquica ou fibrose pulmonar com evolução rápida. O principal diagnóstco diferencial é com infecções. Existem fatores de risco para lesão pulmonar: idade superior a 60 anos, diabetes, hipoalbuminemia e comprome tmento pulmonar por artrite reumatoide.
Penicilamina
- Síndrome lúpus-símile, pneumonia em organização criptogênica (também conhecida como BOOP).
Nitrofurantoína
- DPI aguda ou crônica; curso clínico variável.
Sulfassalazina
- A lesão ocorre na forma de BOOP ou pneumonite interstcial não especí fica.
D - Testes de função pulmonar O distúrbio funcional caracterís tco das doenças inters tciais é o distúrbio restri tvo: Capacidade Vital Forçada (CVF) diminuída, Volume Expiratório Forçado de 1º segundo (VEF1) com redução proporcional e relação VEF1/CVF normal. A presença de distúrbio obstru tvo, ou a coexistência
de ambos, pode ser evidenciada em alguns casos, como em pacientes com bronquiolites, sarcoidose, silicose. Medidas diretas de volumes pulmonares por meio de pletsmografia confirmam o distúrbio restri tvo, mostrando redução importante da Capacidade Pulmonar Total (CPT). Não é incomum, todavia, que o exame funcional seja normal, principalmente em fases precoces das doenças.
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PNEUMOLOGIA Seu principal papel, na verdade, é acompanhar a evolução do paciente com o tratamento. A medida da capacidade de difusão é o mais importante dos testes funcionais nas doenças inters tciais, o que se altera mais precocemente e o que mais se correlaciona com a gravidade da doença. A redução na capacidade de difusão do monóxido de carbono (D CO) é muito comum, apesar de não ser especí fica de DPI. Embora pareça mais lógico pensar que a redução da difusão seja consequência do “espessamento” do espaço entre o alvéolo e o capilar, o mais importante determinante da redução do D CO é o desequilíbrio ventlação/perfusão (distúrbio V/Q). Isso acontece porque as regiões in filtradas e fibrótcas apresentam redução da ventlação.
trar alterações torácicas adicionais (gânglios hilares, mediastnais, massas, derrame pleural etc.). Os achados mais comuns em doenças fibrosantes são nódulos (centrolobulares, perilinfátcos ou aleatórios), espessamento septal, consolidações, padrão de vidro fosco (qualquer opacidade em que seja possível visualizar vasos ao fundo), cistos e faveolamento (Figura 3).
E - Exames de imagem a) Radiografia de tórax Em geral, a radiografia de tórax é o exame escolhido na suspeita inicial de DPI. Muitas vezes, os achados radiológicos são inespecí ficos e pouco sensíveis. Por isso, doentes com DPI podem ter radiografia de tórax normal. Entretanto, quando alterada, o acome tmento pulmonar pode aparecer com as seguintes formas: - Infiltrado retcular bibasal ou in filtrado retculonodular (mais frequente); - Opacidades nodulares predominantemente em campos pulmonares superiores/ápices: sarcoidose, histocitose, pneumonite de hipersensibilidade, silicose, beriliose, vasculite reumatoide nodular; - Padrão em favo de mel ( honeycomb) indica múl tplos pequenos espaços cístcos com fibrose, correlacionados com doença avançada.
Figura 3 - Tomogra fi a de tórax mostrando áreas de faveolamento com vidro fosco associado, de predomínio em bases, achado clássico da FPI
Algumas doenças interstciais têm padrão característco, podendo-se abrir mão de exame adicional, sendo elas: FPI, sarcoidose, asbestose, pneumonite de hipersensibilidade, histocitose das células de Langerhans e linfangioleiomiomatose. Pode também ser ú tl no seguimento dos doentes (resposta à terapia) e delinear o melhor local para biópsia pulmonar. A Tabela 5 enumera alguns achados radiográ ficos adicionais que podem sugerir diagnós tcos especí ficos. Tabela 5 - Achados de imagem e diagnóst cos especí fi cos Achados
Considerações diagnóstcas
Adenopata hilar*
Sarcoidose, infecções granulomatosas.
Derrame pleural
Doenças do tecido conectvo, asbestose, linfangioleiomiomatose, infecções.
Pneumotórax
Histocitose, linfangioleiomiomatose, infecções.
Predomínio em campos Silicose, sarcoidose, histocitose. pulmonares superiores Predomínio em zonas periféricas Figura 2 - Radiogra fi a de tórax com redução volumétrica dos pulmões e opacidades interst ciais com predomínio em bases e peri feria
b) Tomografia de tórax de alta resolução A tomografia de Tórax de Alta Resolução (TCAR) é muito superior à radiogra fia de tórax ou mesmo à TC de tórax comum. Além de de finir a extensão da doença, pode mos-
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Medicamentosa, pneumonia eosinof lica, BOOP.
* Também pode sugerir diagnóst cos diferenciais: linfomas, carcinomas
F - Broncoscopia e lavado broncoalveolar Em casos selecionados, a análise da celularidade do lavado broncoalveolar pode auxiliar no diagnós tco das DPIs. Os exemplos mais clássicos são: - Sarcoidose;
DOENÇAS PULMONARES INTERSTICIAIS
Pneumonite de hipersensibilidade; - Proteinose alveolar; - Síndromes de hemorragia alveolar. -
G - Anatomopatológico Há 2 maneiras de obter tecido pulmonar para estudo anatomopatológico: a) Biópsia transbrônquica É a mais indicada inicialmente. Durante a broncoscopia, de 4 a 8 fragmentos devem ser ob tdos para análise. A maior vantagem da biópsia transbrônquica é o menor risco para o doente, e a maior desvantagem, a incapacidade de fornecer um diagnós tco definitvo na maioria das vezes. As situações em que pode ser mais ú tl são: - Sarcoidose; - Pneumonite de hipersensibilidade; - Pneumonia eosino f lica; - Proteinose alveolar; - Síndromes de hemorragia alveolar; - Infecções. b) Biópsia a céu aberto Pode ser feita por videotoracoscopia (mais indicada) ou por toracotomia, em geral, após um resultado inespecí fico de uma biópsia transbrônquica. Obviamente, acarreta riscos ao doente (inerentes à anestesia, f stula pleural, infecção, sangramento, óbito). As vantagens da inves tgação mais invasiva (versus tratamento empírico) são: - Permite diagnos tcar doenças de melhor prognós tco: sarcoidose, pneumonite de hipersensibilidade crônica, BOOP, DPI associada à bronquiolite etc.; - Evita confusão e ansiedade, especialmente quando não há resposta terapêu tca; - Evita terapêu tcas potencialmente tóxicas em situações em que ela não é indicada. As principais contraindicações à biópsia a céu aberto são: - Grave doença cardiovascular; - Grave disfunção pulmonar; - Doença pulmonar de estágio final.
H - Diagnóstco diferencial O diagnóstco diferencial sindrômico deve ser realizado com quaisquer das causas de dispneia. Algumas situações comuns são: a) Obesidade Pode cursar com dispneia, espirometria com padrão restritvo e a radiogra fia de tórax sugerindo falso in filtrado interstcial, em razão do aumento de partes moles. Uma radiogra fia com penetração adequada poderá ser ú tl. Caso haja dúvida, uma tomogra fia deve ser realizada a fim de confirmar ou afastar uma DPI.
b) Linfangite carcinomatosa Quadro clínico subagudo (de semanas a poucos meses) com tosse, dispneia, taquipneia, espirometria com padrão restritvo, radiografia com achados variados (pode cursar com infiltrado interstcial bilateral, simétrico ou não, nodulações etc.). A tomogra fia de tórax costuma sugerir o diagnóstco, mostrando um envolvimento pulmonar predominantemente linfá tco. Em geral, cursa com um péssimo prognóstco, podendo ser causada por câncer primário de pulmão ou câncer metastá tco. c) Edema pulmonar cardiogênico Sinais e sintomas de insu ficiência cardíaca, derrame pleural bilateral, área cardíaca aumentada e ecocardiograma podem confirmar doença cardíaca com disfunção ventricular esquerda. As Tabelas 6 e 7 mostram algumas par tcularidades das DPIs.
I - Aspectos gerais do tratamento O curso clínico das DPIs é altamente variável e, em parte, depende da causa de base. Todas as causas potencialmente tratáveis devem ser diagnos tcadas precocemente no intuito de evitar que ocorra fibrose sequelar. Frequentemente, os doentes evoluem com cor pulmonale e hipoxemia, e necessitam de oxigênio domiciliar. Os cortcosteroides costumam ser usados nas DPIs quando há forte componente de alveolite, embora não exista estudo controlado e randomizado mostrando pleno benef cio. As principais doenças que podem bene ficiar-se de cortcosteroides são: - Pneumonias inters tciais idiopá tcas; - Pneumonias eosino f licas; - BOOP; - Sarcoidose; - Doenças do tecido conec tvo; - Pneumonites de hipersensibilidade; - Pneumonite aguda associada à radiação; - Síndromes de hemorragia alveolar; - Pneumonites associadas a medicamentos. Em geral, inicia-se com prednisona (0,5 a 1mg/kg de peso, 1x/dia), durante 4 a 12 semanas. Se houver boa resposta, a dose deverá ser reduzida lentamente, durante 4 a 12 semanas. Se não houver boa resposta, um 2º medicamento poderá ser associado (ciclofosfamida ou aza toprina). As doenças que melhor respondem à imunos supressão, em geral, são doenças do tecido conec tvo, vasculites primárias e, eventualmente, PIFI com forte componente de alveolite.
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PNEUMOLOGIA Tabela 6 - Característ cas de algumas DPIs Sarcoidose
Pneumonia interstcial descama tva
Pneumonia interstcial linfocí tca
Doenças do tecido conectvo
Achados clínicos
- Mulheres negras; poucos sintomas; - Lesões cutâneas.
- Homens de idade média, - Mulheres idosas com tabagistas; doenças associadas. - Dispneia progressiva.
- Assintomátcos; pode evoluir com dispneia progressiva, tosse, dor torácica, hemoptse.
Radiografia de tórax
- Adenopata hilar bilateral; - Predomínio de campos superiores.
- Predomínio bibasal; - Pode ser normal.
- Retculonodular.
- Infiltrados bilaterais, difusos ou focais.
TC de cortes finos
- Adenopata hilar e mediastnal; - Nódulos, distribuição perilinfátca e broncovascular.
- Fibrose com distorção alveolar; - Padrão vidro despolido.
- Padrão vidro despolido, nódulos centrolobulares, espessamento septal e broncovascular.
- Fibrose com ou sem vidro despolido.
- Depende da doença associada (HIV, transplante, autoimune, drogas etc.).
- Exuberante e depende da doença autoimune de base.
Achados extratorácicos
- Exuberantes.
- Nenhum.
Patologia
- Granulomas não caseosos.
- Preenchimento homogê- - Infiltrado das paredes neo peribronquiolar. alveolares com linfócitos.
Terapia
- A maioria não necessita de tratamento; - Parar de fumar e cor t- Boa resposta a cortcoide. coide.
Prognóstco
- Excelente.
- Tratar a doença de base; boa resposta a cortcoides.
- Sobrevida de 12 anos; - Depende da doença de - Mortalidade de 20 a 30%. base.
- Variável: inclui destruição alveolar difusa, bronquiolite etc. - Tratar a doença de base; em geral, necessita de cortcoide e imunossupressor. - Depende da doença de base.
Tabela 7 - Característ cas de algumas DPIs Granuloma eosinófilo
Proteinose alveolar
Pneumonia eosinof lica
Linfangioleiomiomatose
Achados clínicos
- Idade de 20 a 50 anos; - Insidioso com tosse e dispneia; tabagistas.
- Mulher jovem; - Tosse e dispneia progres- Tosse, febre, dispneia, sivas. sibilos.
- Mulher em idade reprodutva; dispneia, hemoptse, pneumotórax, quilotórax.
Radiografia de tórax
- Nódulos, cistos, pneumotórax, derrame pleural.
- Preenchimento alveolar bibasal (semelhante a edema pulmonar, mas sem congestão).
-
TC de cortes finos
- Cistos em formas bizarras, com nódulos disseminados.
- Opacidades em vidro despolido, espessamento - Padrão vidro despolido dos septos interlobulabilateral. res.
- Cistos de paredes finas, tamanhos variados, dilatação do ducto torácico, derrame pericárdico e pleural, pneumotórax.
Achados extratorácicos
- Lesões ósseas e diabetes insipidus.
- Não.
- Eosinofilia.
- Angiomiolipomas renais.
Patologia
- Lesões nodulares - Material alveolar eosicontendo células de nof lico com coloração Langerhans com grânupositva para o PAS. los de Birbeck.
- Intenso infiltrado misto, rico em eosinófilos.
- Proliferação difusa de células musculares lisas com formação de cistos.
Terapia
- Parar de fumar.
- Lavagem pulmonar total.
- Boa resposta a cortcoides.
- Progesterona e/ou ooforectomia.
Prognóstco
- Péssimo; - Sobrevida média de 6 anos.
- Bom prognóstco.
- Bom prognóstco.
- Mortalidade de 25% em 8 anos.
70
- Infiltrado bilateral.
DOENÇAS PULMONARES INTERSTICIAIS
6. Fibrose pulmonar idiopátca (pneumonia interstcial usual) A Fibrose Pulmonar Idiopá tca (FPI) é o protó tpo das doenças pulmonares fibrosantes e a forma mais comum de DPI de e tologia desconhecida, e corresponde ao padrão histológico de Pneumonia Inters tcial Usual (PIU). Há até pouco tempo, muitas das doenças fibrosantes eram classificadas erroneamente como FPI, e a de finição atual isolou pacientes com caracterís tcas mais homogêneas, chamando atenção a sobrevida extremamente limitada, de 3 a 5 anos. A doença é mais comum na 6ª década de vida, raramente ocorrendo em pacientes mais jovens. Dispneia progressiva aos esforços e tosse seca são os sintomas mais comuns, com baqueteamento digital e estertores “tpo Velcro” habitualmente encontrados ao exame f sico. Boa parte dos pacientes é tabagista, hábito que tem sido relacionado à doença, embora não se saiba ainda o grau dessa relação. Testes funcionais não estão alterados precocemente na doença. Baixa capacidade de difusão de CO e hipoxemia ao esforço (teste de degrau) são possíveis ainda com volumes pulmonares preservados. Existem critérios diagnós tcos para a doença: idade >50 anos, exclusão de outra etologia, estertores “em Velcro”, distúrbio funcional restri tvo com difusão baixa, TC com infiltrado retcular, faveolamento nas bases, e sem fibrose peribrônquica, nódulos centrolobulares ou vidro fosco fora das áreas de fibrose. A broncoscopia com lavado broncoalveolar ou biópsia transbrônquica habitualmente não é diagnós tca e pode ser útl para excluir outros diagnós tcos. A biópsia, quando indicada, tem melhor rendimento se realizada cirurgicamente; entretanto, tem sido pouco u tlizada, já que o achado de padrão tomográfico característco, normalmente, permite a definição diagnóstca. Apenas em casos duvidosos o estudo histopatológico pode ser interessante. O tratamento é feito com cor tcosteroides (prednisona, 0,5mg/kg/dia) associados ou não a imunossupressores (azatoprina ou ciclofosfamida), mas boa parte dos pacientes tem resposta insa tsfatória – os que melhoram ou estabilizam após 3 a 6 meses após o início do tratamento são os que têm melhor prognós tco, mas, ainda assim, com sobrevida bem limitada. Algumas outras abordagens têm sido tentadas, como o uso de N-ace tlcisteína, talidomida, antcoagulação, imatbine, etanercepte e bosentana, com mecanismos especí ficos, mas sem nenhuma comprovação de eficácia. Como a resposta às drogas é desanimadora, pacientes com hipoxemia ao esforço, capacidade de difusão com redução acentuada, piora funcional (queda progressiva de CVF) ou muito faveolamento à tomogra fia são candidatos a transplante pulmonar.
7. Pneumonite de hipersensibilidade A - Introdução A pneumonite ou pneumonia de hipersensibilidade engloba um grupo de doenças pulmonares causadas pela inalação de vários materiais an tgênicos que são usualmente orgânicos; portanto, essa doença é frequentemente discu tda em capítulos de doenças ocupacionais. Outro termo u tlizado é alveolite alérgica extrínseca, não adequado porque o envolvimento é, especialmente, bronquiolar. A doença não se associa à atopia nem a elevações da IgE ou eosinofilia sanguínea. Centenas de e tologias surgem a cada ano, e a causa pode ser agentes microbianos, poeiras ou substâncias químicas. Exposições a pombos, periquitos, canários e outros pássaros podem levar à pneumonia de hipersensibilidade por inalação de an genos presentes em suas penas e fezes; o tabagismo costuma apresentar relação de proteção para o desenvolvimento da síndrome. Outros agentes comuns são fungos presentes no mofo e medicações como a nitrofurantoína. Bactérias do grupo termof lico e não termo f lico contaminantes de substratos, como feno, cogumelos, reservatórios de água, bagaço de cana-de-açúcar, umidificadores e sistemas de ar condicionado, podem causar pneumonia de hipersensibilidade, com denominações especí ficas.
B - Mecanismo de ação A doença desenvolve-se pela combinação de mecanismos imunológicos humorais com mecanismo mediado por células, atuando sequencialmente. O mecanismo humoral parece ser importante na fase precoce da alveolite após a exposição antgênica, induzindo, nos indivíduos predispostos, uma resposta aguda in flamatória mediada por imunocomplexos. Quando a exposição an tgênica se prolonga, segue-se uma resposta pica granulomatosa mediada por células. Os macrófagos alveolares encontram-se aumentados, como pode ser observado em lavado broncoalveolar, assim como os linfócitos CD8, com alteração da relação CD4/CD8.
C - Diagnóstco A apresentação clínica pode ser classi ficada como aguda, subaguda ou crônica. A pneumonite de hipersensibilidade aguda segue a exposição a um agente e é a forma mais fácil de ser iden tficada, embora possa ser confundida com quadro de infecções de vias aéreas. Os sintomas iniciam-se 4 a 8 horas após a exposição em indivíduos sensibilizados e incluem febre, mialgias, cefaleia, mal-estar, tosse e dispneia. É possível a recuperação espontânea, mas os episódios podem ser recorrentes sempre que o an geno é inalado. Nesse caso, pode ser confundida com pneumonias de repe tção. Ao exame f sico, podem ser detectados estertores bilaterais. A prova de função pulmonar, usualmente, revela
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA distúrbio restritvo; e a gasometria, hipoxemia arterial. Os achados laboratoriais pouco ajudam, mas o VHS pode estar elevado, assim como PCR e o fator reumatoide posi tvo. E os achados radiológicos podem ser pobres, em comparação com as alterações funcionais. O achado tomográfico mais comum é o de alterações “em vidro fosco”, que aparecem em cerca de 70% dos pacientes. Nódulos centrolobulares mal de finidos, refletndo bronquiolite, são caracterís tcos e devem sugerir o diagnóstco, especialmente se combinados com áreas lobulares de aprisionamento de ar e áreas de vidro despolido. A forma subaguda desenvolve-se mais insidiosamente, com exposição menos intensa, mas con nua, com tosse produtva, dispneia, fadiga, anorexia e perda de peso. A tomografia computadorizada de alta resolução mostra nódulos, opacidades “em vidro fosco”, aprisionamento de ar lobular e alterações fibrótcas leves. Essas opacidades “em vidro fosco” e nódulos usualmente indicam lesões reversíveis. Os pacientes com a forma crônica apresentam dispneia aos esforços e podem não apresentar história de episódios agudos. Pode ocorrer tosse, fadiga e perda de peso. Um sinal do estágio avançado da doença, que acontece com certa frequência, é o baqueteamento digital. Os achados radiológicos podem ser di f ceis de diferenciar a doença da FPI. O diagnóstco da pneumonite de hipersensibilidade depende da associação de diversos achados: - Exposição: identficada pela história, principalmente se o afastamento resulta em melhora clínica, e o contato, em piora ou aparecimento de achados clínicos, radiológicos e funcionais compa veis; - Tomografia computadorizada de alta resolução: é de grande utlidade se revela opacidades “em vidro fosco”, nódulos centrolobulares ou perfusão “em mosaico” (fibrose pode ser, no entanto, a imagem predominante); - Lavado broncoalveolar: pode apresentar linfocitose, usualmente com relação CD4/CD8 baixa e presença de mastócitos e plasmócitos; an genos IgG precipitantes também podem ser iden tficados; - Histopatologia: pode ser compa vel ou conclusiva, com granulomas malformados, não caseosos, pneumonia interstcial com predomínio peribronquiolar, bronquiolite ou fibrose; - Biópsia: com achados caracterís tcos, pode ser conclusiva isoladamente. O afastamento do agente, usualmente, resulta em regressão da doença, especialmente nas formas agudas. Em casos com insuficiência respiratória aguda, o uso de cor tcosteroides por 2 ou 3 semanas pode acelerar a recuperação. Nas formas crônicas, o curso prolongado de cor tcoterapia pode ser necessário, devendo ser bem ponderado, a fim de diminuir, ao máximo, os efeitos adversos desse tpo de tratamento.
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8. Sarcoidose A - Etologia e sintomas A sarcoidose, uma doença sistêmica granulomatosa de origem desconhecida, foi descrita pela 1ª vez no século XIX. Há acometmento pulmonar em 90% dos casos. A maior incidência está entre a 2ª e a 4ª décadas de vida, com leve preponderância no sexo feminino. A doença apresenta sintomas sistêmicos, como fraqueza, astenia e febre baixa. Entretanto, em alguns casos, a temperatura pode superar 39°C, a fadiga e a astenia podem ser extremamente importantes, e pode haver perda de peso de 2 a 6kg algumas semanas antes da apresentação característca inicial. Dispneia, tosse seca e dor torácica ocorrem em cerca de 35 a 50% dos casos, estertores, em 20% dos casos, e hemop tse e baqueteamento digital são raros. O envolvimento pulmonar em 75% dos casos é inicialmente próximo a bronquíolos e subpleural; em seu curso, as alterações podem resolver-se ou deixar alterações fibrótcas. É possível que ocorram acome tmento cutâneo, artcular, renal, ocular, cardíaco e ganglionar. Porém, o mais comum é o acome tmento pulmonar, sendo a doença estadiada de acordo com os achados na radiogra fia de tórax (Figuras 4 e 5): - Estadio 0: ausência de alterações na radiogra fia de tórax; - Estadio I (ocorre em 50% dos casos): adenopa ta hilar e mediastnal sem anormalidades no parênquima pulmonar; - Estadio II (ocorre em 30% dos casos): adenopata hilar e mediastnal com anormalidades no parênquima pulmonar, geralmente com padrão inters tcial difuso; - Estadio III (10% dos casos): doença difusa do parênquima pulmonar sem adenopa ta; - Estadio IV (10% dos casos): fibrose pulmonar com evidência de faveolamento.
Figura 4 - Estadio I da sarcoidose: adenomegalia hilar, sem doença parenquimatosa
DOENÇAS PULMONARES INTERSTICIAIS
Figura 5 - Estadio II da sarcoidose: concomitância de doença parenquimatosa e adenomegalia
Figura 6 - Sarcoidose pulmonar em Estadio III
cificação “em casca de ovo”), e pode ocorrer a formação de cavidades. O sistema linfoide é envolvido em cerca de 15% dos pacientes com envolvimento de linfonodos periféricos que podem ser palpáveis, os locais mais acome tdos são as cadeias cervicais, axilares, epitroclear e inguinal, e é rara a ulceração desses gânglios. A esplenomegalia é mínima e silenciosa, apesar da possibilidade de haver casos de sintomas compressivos e sintomas de hiperesplenismo. Em menos de 5% dos casos, pode ocorrer o envolvimento miocárdico, com manifestações como arritmias com BAV avançado, mas a manifestação mais comum é a disfunção diastólica. O f gado está atngido com granulomas diagnos tcados em biópsia hepátca em 50 a 80% dos pacientes, palpável em cerca de 10% dos casos, e pode, inclusive, ocorrer alteração de função hepátca. Envolvimento cutâneo é possível com eritema nodoso e lúpus pérnio (in filtração da área central da face de cor vermelho-violácea, “asas de borboleta”) na sarcoidose crônica, mas outras lesões, como placas e nódulos subcutâneos, podem aparecer. Lesões oculares aparecem em 11 a 83% dos pacientes, conforme a série de casos; qualquer parte do olho e da órbita pode ser afetada, e a uveíte é a manifestação mais comum. A neurossarcoidose acontece em menos de 5% dos pacientes, com predileção pela base do crânio, com paralisias de nervos cranianos (principalmente nervo facial) e lesões hipotalâmicas e hipo fisárias; lesões ocupadoras de espaço também podem aparecer. A dor ar tcular aparece em 25 a 40% dos pacientes, mas a artrite deformante é rara; as ar tculações mais envolvidas são joelhos, tornozelos, cotovelos, punhos e pequenas ar tculações de mãos e pés, e a miopa ta pela sarcoidose também é rara, mais comum em mulheres. O trato gastrintestnal é acometdo em menos de 1% dos pacientes; o órgão mais envolvido é o estômago, mas também podem ser envolvidos esôfago, apêndice, reto e pâncreas, e a doença pode simular a doença de Crohn. A hipercalcemia é possível de 3 a 10% dos casos, mas a hipercalciúria é descrita em cerca de 15 a 40% dos pacientes. O envolvimento hipo fisário pode causar hipo treoidismo e insuficiência adrenal, além de hipogonadismo; podem ocorrer, ainda, lesões granulomatosas em qualquer parte do sistema reprodutor feminino. Nefrite inters tcial é descrita além de nefrocalcinose, e a sarcoidose renal pode mime tzar tumores.
Figura 7 - Sarcoidose pulmonar em Estadio IV Tabela 8 - Envolvimento sistêmico na sarcoidose
Os pacientes ainda podem apresentar doenças de vias aéreas com envolvimento de laringe, traqueia e brônquios com hiper-reatvidade em 20% dos casos. O envolvimento pleural, embora incomum, pode ocorrer com efusão pleural, quilotórax ou pneumotórax. O envolvimento sistêmico é relevante na sarcoidose (Tabela 8). A presença de linfonodos calci ficados é comum, com aparência semelhante ao observado na silicose (cal-
Órgão Pulmão
Envolvimento 95%
Pele
15,9%
Linfonodos
15,2%
Olho
11,8%
Fígado
11,5%
Eritema nodoso
8,3%
73
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PNEUMOLOGIA Órgão
Envolvimento
Baço
6,7%
Sistema nervoso
4,6%
Parótda, glândulas salivares
3,9%
Medula óssea
3,9%
Hipercalcemia
3,7%
Nariz, ouvido, garganta
3%
Cardíaco
2,3%
Renal
0,7%
Ossos e artculações
0,5%
Músculo
0,4%
B - Diagnóstco O diagnóstco necessita de apresentação clínica compa vel e evidência de in flamação de característca granulomatosa em órgão afetado pela doença. Como a maioria dos pacientes com sarcoidose apresenta quadro pulmonar, o órgão é o foco. Por exemplo, um paciente com adenopa ta hilar bilateral assintomátco pode ter o diagnós tco presuntvo de sarcoidose, porém se torna obrigatório o diagnós tco anatomopatológico para excluir o diagnós tco diferencial de linfoma. Atualmente, o método mais empregado para o diagnóstco da sarcoidose é a biópsia transbrônquica. Outros testes, como a dosagem da Enzima Conversora de Angiotensina (ECA), podem ser empregados, contudo esse exame não se mostrou ú tl no diagnóstco da doença, pois, apesar de estar elevado em até 80% dos doentes, o teste não é especí fico nem sensível.
C - Tratamento Em geral, a doença tem curso de exacerbações-remissões, com melhora espontânea e bom prognós tco. Assim, nem todos os pacientes necessitam de tratamento, realizado, preferencialmente, com cor tcosteroides. A possibilidade de resolução sem tratamento varia conforme o estágio da doença: estágio 1, 55 a 90%; estágio 2, 40 a 70%; estágio 3, 10 a 30%; estágio 4, 0 a 5%. As indicações são bastante controversas, mas diretrizes internacionais sugerem tratar pacientes com envolvimento ocular, cardíaco, hepátco ou do sistema nervoso central, com hipercalcemia persistente (acima de 3 meses), com sintomas respiratórios ou artrite. Aqueles com envolvimento sistêmico avançado, como fibrose pulmonar instalada, raramente beneficiam-se de tratamento. Recomenda-se iniciar o tratamento com prednisona (ou correlato) a 0,5 a 1mg/kg/dia, com reavaliação após 1 a 3 meses. Havendo resposta adequada, a dose deve ser reduzida gradualmente a cada 2 meses, até doses inferiores a 0,25mg/kg, quando passa a ser considerada a suspensão. Nos pacientes com necessidade de tratamento prolongado, por resposta insatsfatória, podem ser utlizados agentes poupadores de cor tcosteroides, como metotrexato, cloroquina, azatoprina ou ciclofosfamida.
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9. Granulomatose de Wegener A - Introdução A granulomatose de Wegener é uma doença sistêmica, caracterizada por vasculite necrosante granulomatosa com acometmento preferencial das vias aéreas superiores e inferiores, pulmões, além de glomerulonefrite e vasculite sistêmica (que acomete pequenas e médias artérias, além de vênulas).
B - Diagnóstco Sintomas consttucionais, como febre e perda de peso, estão presentes em cerca de 40 a 70% dos casos, respectvamente. O envolvimento pulmonar ocorre em cerca de 45% dos casos no início da doença e em mais de 90% dos casos em algum momento da evolução. Os sintomas mais comuns são tosse e hemop tse, seguidos de dispneia. Alterações em vias aéreas inferiores são comuns, como achados incidentais, sendo frequente a estenose subglótca. São relatados dispneia aos esforços, tosse e estridor nas formas mais graves. O acome tmento de vias aéreas superiores é a manifestação clínica mais frequente, presente em cerca de 80% na apresentação e em mais de 90% dos casos na evolução. Podem ocorrer sinusite, rinorreia purulenta, úlceras mucosas, crostas nasais, epistaxe e obstrução nasal. Existe, ainda, predisposição à infecção crônica por Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa. Otte média e otalgia também são comuns, assim como perda da audição. Os achados radiológicos mais comuns são in filtrados pulmonares (67%) e nódulos (58%); estes são geralmente múltplos, bilaterais, e há cavitação em cerca de 50% dos casos (lesões cavitadas podem apresentar resolução rela tvamente rápida). A tomografia computadorizada de tórax pode revelar infiltrado interstcial e nódulos pulmonares. Derrame pleural é possível em 5 a 20% dos casos, e também podem aparecer massas mediastnais e linfonodomegalia. Envolvimento renal ocorre em 70% dos pacientes na apresentação e em cerca de 80% dos pacientes durante a evolução. As manifestações variam desde formas leves, como a glomerulonefrite segmentar e focal a glomerulonefrite rapidamente progressiva, que habitualmente cursa com insuficiência renal dialí tca. Manifestações oculares incluem episclerite e uveíte com manifestações cutâneas. Ocorrem em mais da metade dos casos com úlceras, púrpura palpável e nódulos subcutâneos. Também são relatados pioderma gangrenoso e fenômeno de Raynaud. Envolvimento neurológico é raro na apresentação, mas possível em 1/3 dos casos. A manifestação mais comum é a neuropata periférica, sendo mais frequentes mononeurite múltpla e polineuropa ta distal simétrica sensi tvo-motora. O acometmento do sistema nervoso central é menos co-
DOENÇAS PULMONARES INTERSTICIAIS
mum e pode manifestar-se como infarto cerebral, hematoma subdural e hemorragia subaracnóidea. Os pares cranianos podem ser acome tdos, especialmente II (óp tco), VI (abducente) e VII (facial). O almoplegia é possível de forma independente ou associada ao pseudotumor retro-orbitário. Há alterações no radiograma simples de tórax em até 85% dos casos. Os achados radiológicos mais frequentes são infiltrados pulmonares e nódulos geralmente múltplos, bilaterais e com cavitação em cerca de 50% dos casos. O ANCA (antcorpo antcitoplasma de neutró filo) é de extrema importância no diagnós tco da granulomatose de Wegener. Quando direcionado à proteinase-3, o que con figura o padrão c-ANCA, tem especi ficidade de mais de 90%, suficiente para de finir o diagnóstco quando presente e associado a quadro clínico compa vel. Contudo, se posi tvo em mais de 97% durante a a tvidade da doença, costuma ser negatvo nos períodos de remissão. Tabela 9 - Critérios diagnóst cos de Granulomatose de Wegener (necessários 2 critérios) - Inflamação nasal ou oral (úlceras orais ou corrimento nasal sanguinolento); - Anormalidade em radiografia de tórax (nódulos, infiltrados fixos ou cavidades); - Sedimento urinário anormal (hematúria ou cilindros hemá tcos); - In flamação granulomatosa em biópsia que mostra parede arterial, região perivascular ou extravascular de artérias e arteríolas.
C - Tratamento O tratamento é realizado com cor tcosteroides, como prednisona, na dose de 1mg/kg/dia, por 4 a 6 semanas, com retrada progressiva em período de 6 meses. Deve-se associar ciclofosfamida na dose de 2 a 3mg/kg/dia, que deve ser ajustada de acordo com o número de linfócitos, buscando mantê-los acima de 1.000mm 3. Outras opções incluem metotrexato, gamaglobulina e in fliximabe, ainda considerados terapia experimental. O sulfametoxazol-trimetoprima é associado ao tratamento, uma vez que diminui recidivas e realiza profilaxia contra pneumocistose.
nomediado, já que há forte relação de pacientes com eosinofilia persistente, sintomas asmatformes e elevação de IgE. A doença é considerada sistêmica, mas acomete, principalmente, pulmões, sistema nervoso e pele. Mialgias e artralgias ocorrem entre 35 e 40% dos pacientes. O coração também pode ser a tngido, e, após o pulmão, é a 2ª causa de morte nesses indivíduos, manifestando-se como infarto agudo do miocárdio ou como pericardite (podendo ser constritva).
B - Diagnóstco O sintoma usual de apresentação é dispneia devida a broncoespasmo, com infiltrados pulmonares aparecendo na abertura do quadro em cerca da metade dos pacientes. Parece existr uma relação da vasculite de Churg-Strauss com o uso de medicações an tleucotrienos, o que pode ser um fenômeno associado à diminuição do uso de cor tcosteroides em pacientes que apresentavam Churg-Strauss e não asma. Outra teoria é que o bloqueio dos receptores de leucotrienos pode aumentar células B circulantes e aumentar a chance do desenvolvimento de vasculite. As manifestações radiológicas são muito variáveis, de 27 a 93% dos pacientes. Infiltrados pulmonares antecedem vasculite sistêmica em 40% dos casos; in filtrados picos de consolidação ocorrem em cerca de 65%; outros achados incluem infiltrados interstciais, cavitações e adenopa ta hilar, mas há derrame pleural em menos de 10% dos casos. Nesses pacientes, o líquido é eosino f lico. Tabela 10 - Critérios diagnóst cos de angiite de Churg-Strauss - Sintomas asma tformes; - Eosinofilia em sangue periférico >10%; - Mono ou polineuropata; - Infiltrados pulmonares migratórios; - Alteração dos seios paranasais; - Biópsia com linfonodos extravasculares.
10. Síndrome de Churg-Strauss
A presença de 4 ou mais critérios fecha o diagnós tco com sensibilidade de 85% e especi ficidade que tende a 100%. A doença ainda apresenta um marcador sorológico positvo em 40 a 60% dos pacientes, que é o ANCA. O p-ANCA está presente em 75% desses casos, e o c-ANCA nos restantes.
A - Introdução
C - Tratamento
A síndrome de Churg-Strauss é uma doença autoimune e de e tologia indeterminada. Descrita inicialmente em 1951 por Churg e Strauss, foi de finida como angiite granulomatosa, determinada por 3 critérios maiores: presença de vasculite necrosante, in filtração tecidual eosino f lica e granulomas extravasculares. A etologia da doença ainda não está esclarecida, mas parece haver um importante componente alérgico e imu-
O tratamento baseia-se na gravidade dos sintomas apresentados. Uma abordagem sugerida é atribuir pontos para as principais manifestações, 1 ponto para cada uma destas: - Sintomas no trato gastrintes tnal; - Proteinúria >1g/dL; - Insuficiência renal com crea tnina >1,5mg/dL; - Alterações no sistema nervoso central; - Cardiopata.
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PNEUMOLOGIA Nesses casos, após o início de cor tcoterapia com metlprednisolona (1mg/dia), a ciclofosfamida (4 a 5mg/dia) é introduzida na presença de mais de 1 ponto na escala. A taxa de remissão para tais pacientes é de 80%, com rea tvidade em torno de 25% e sobrevida em 10 anos de 79,4%. Obtda a remissão inicial, mantêm-se prednisona (1mg/kg) por 1 mês, com redução paula tna, e ciclofosfamida (2mg/ kg) por 1 ano.
11. Resumo Quadro-resumo - As etologias das DPIs são inúmeras, sendo as mais comuns aquelas associadas a exposições ambientais, especialmente poeira orgânica ou inorgânica; - As queixas respiratórias di ficilmente são úteis no diagnóstco diferencial. Dispneia costuma ser a principal queixa referida pelo doente; no início, ocorre aos esforços, mas, posteriormente, pode ocorrer ao repouso; crepitações em ambas as bases, com som descrito como “ tpo Velcro”, são comuns e podem ser audíveis, assim como roncos difusos; - Dados epidemiológicos, sintomas sistêmicos, uso de fármacos, hábitos e hobbies podem fornecer indícios importantes sobre a etologia; - Os exames de imagem antes eram considerados insu ficientes para o diagnóstco, e a biópsia quase sempre inevitável; hoje, com o advento da tomografia de tórax de alta resolução, pode-se evitar a biópsia em um bom número de casos. As alterações radiográficas mais frequentes são in filtrados retculonodulares difusos; na tomografia, o padrão de infiltrado pode ser bem caracterizado, bem como a presença de faveolamento, que traduz fibrose estabelecida; - Existe um grupo de doenças inters tciais ditas idiopátcas. Dentre elas, a FPI é a forma mais comum, ocorrendo em indivíduos na 6ª a 7ª década de vida. Presume-se que seja uma doença imunológica, pois muitos pacientes possuem imunocomplexos circulantes, autoantcorpos positvos e crioglobulinas; tem curso dramátco, com sobrevida estmada em 3 a 5 anos, sendo geralmente refratária ao tratamento imunossupressor. O melhor tratamento proposto é o transplante pulmonar; - A pneumonite ou pneumonia de hipersensibilidade engloba um grupo de doenças pulmonares causadas pela inalação de vários materiais antgênicos usualmente orgânicos (principalmente exposição a pássaros e mofo). O afastamento da exposição pode controlar a doença, mas eventualmente é necessário o uso de imunossupressores; - A sarcoidose é uma doença sistêmica granulomatosa que tem o pulmão como órgão mais afetado, apresentando cursos de exacerbação-remissão. O estadiamento da doença é feito com radiografia de tórax, com graus variados de envolvimento pulmonar ou ganglionar. As manifestações sistêmicas são diversas, sendo indicado tratamento em pacientes com envolvimento de órgãos nobres (ocular, hepátco, cardíaco e sistema nervoso central), envolvimento pulmonar sintomátco, hipercalcemia persistente e artrite. O tratamento é feito com cor tcoides e imunossupressores;
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- A granulomatose de Wegener é uma doença sistêmica caracterizada por vasculite necrosante granulomatosa com acometmento preferencial das vias aéreas superiores e inferiores, pulmões, além de glomerulonefrite; - A angiite de Churg-Strauss é vasculite sistêmica, que se manifesta, predominantemente, com sintomas asmatformes, que podem preceder as outras manifestações da doença em até 3 anos.
CAPÍTULO
Pneumoconioses
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Rodrigo Antônio Brandão Neto / José Alberto Neder / Fabrício Mar tn s Valois
1. Introdução e definições
Doença
Ocupação - Trabalhadores da indústria aeroespacial.
O termo pneumoconiose foi criado por Zenker em 1866 para designar um grupo de doenças que se originam da exposição a várias substâncias presentes no ar, por reação tssular à inalação. De finiu-se poeira como um aerossol composto de par culas sólidas inanimadas. As pneumoconioses são doenças fibrótcas crônicas do pulmão ocasionadas por inalação de poeira e várias outras substâncias inertes, inorgânicas ou poeira de sílica (Tabela 1). Em geral, ocorrem após exposição longa e con tnuada ao agente. De acordo com a Portaria do Ministério da Saúde, as pneumoconioses são doenças de no tficação compulsória.
Beriliose
Asma ocupacional
- Indivíduos que trabalham com cereais, madeira de cedro vermelho ocidental, sementes de rícino, corantes, an tbiótcos, resinas de epóxi, chá e enzimas utlizadas na manufatura de detergentes, malte e objetos de couro.
Tabela 1 - Indivíduos com risco de apresentar doenças pulmonares ocupacionais
Bissinose
- Operários que trabalham com algodão, cânhamo, juta e linho.
Doença
Ocupação - Mineiros de chumbo, cobre, prata e ouro; - Determinados mineiros de carvão (peneiradores que trabalham imediatamente sobre os veios de carvão, por exemplo); - Operários de fundição;
Silicose
- Ceramistas, oleiros; - Cortadores de arenito ou de granito; - Operários que trabalham na construção de túneis; - Trabalhadores da indústria de sabões abrasivos; - Trabalhadores que utlizam jato de areia.
Pneumoconiose do trabalhador de carvão
- Mineiros de carvão. - Operários que mineram, moem ou manufaturam amianto;
Asbestose
- Operários da construção civil que instalam ou removem materiais que contêm asbesto.
- Soldadores; Pneumoconiose benigna
- Mineiros de ferro; - Operários que trabalham com bário; - Operários que trabalham com estanho.
Doença do enchedor - Fazendeiros. de silo
2. Fisiopatologia As par culas suspensas no ar (sílica, carvão, asbesto, outras) menores que 3 μm (especialmente, menores que 0,1μm) chegam aos alvéolos e iniciam um processo in flamatório crônico. In flamação e fibrose formam o componente prioritário das pneumoconioses. O preciso mecanismo que faz um indivíduo evoluir com uma doença ocupacional não é conhecido. Sabe-se que os macrófagos alveolares têm função central no processo, sobretudo ao interagir com neutró filos, linfócitos, fibroblastos, além da rede de interação das várias citocinas. Há um forte componente gené tco, embora mecanismos precisos também não sejam conhecidos.
3. Doenças ocupacionais associadas ao asbesto O asbesto (amianto) representa um grupo de silicatos fibrosos com estrutura cristalina, abundantes na natureza, tendo grande resistência ao fogo e à abrasão mecânica ou química; ademais, é um material isolante acús tco e tér-
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PNEUMOLOGIA mico. A exposição costuma ocorrer em trabalhadores de mineradoras ou minas explosivas, material de isolamento, construção civil e construção naval. Os primeiros relatos cien ficos relacionando à exposição ao asbesto e complicações pulmonares foram publicados no início do século passado. O espectro de doenças associadas à exposição ao asbesto é grande, como enumera a Tabela 2. A asbestose será mais bem discu tda em seguida. Tabela 2 - Distúrbios pleuropulmonares associados ao asbesto Atelectasia redonda
Lesão arredondada, de 2 a 5cm, periférica, que corresponde a espessamento pleural focal, com retração associada; é como se a pleura enrolasse em si mesma.
Derrame pleural
É manifestação benigna da doença. O derrame é exsudatvo, por vezes hemorrágico.
Tumor raro, que pode envolver a pleura ou o peritônio. A queixa mais comum é de dor torácica intensa, de dif cil controle. Deve-se ter suspeita em casos de espessamento pleural lobulado, Mesotelioma principalmente se há o envolvimento da pleura mediastnal. Por vezes, no anatomopatológico há dificuldade em sua diferenciação com o adenocarcinoma. O tratamento é palia tvo. Placas pleurais
É a manifestação mais comum da exposição ao asbesto. Representa espessamento pleural focal, por vezes calci ficada. Não parece ser fator de risco para surgimento de mesotelioma.
Espessamento difuso da pleura visceral, geralEspessamento mente sem lobulações. Tem evolução benigna, pleural difuso mas pode associar-se à dispneia aos esforços. Câncer de pulmão
O risco de neoplasia de pulmão é maior em indivíduos expostos, principalmente se há tabagismo associado, quando o risco relatvo é de cerca de 60.
Asbestose
Representa a fibrose pulmonar associada à exposição ao asbesto.
anos de evolução, também são comuns. Quando há presença de expectoração, esta provavelmente é relacionada às doenças associadas das vias aéreas. Dor torácica e baqueteamento digital são sintomas inespecí ficos e infrequentes. b) Diagnóstco O diagnóstco é baseado na história ocupacional em associação aos dados de imagem. A radiogra fia de tórax simples, realizada e classi ficada segundo as recomendações da Organização Internacional do Trabalho de 1980, ainda é o instrumento mais aceito para a inves tgação epidemiológica de populações com história de exposição ocupacional a poeiras. A radiografia mostra opacidades inters tciais, irregulares, com predomínio em bases pulmonares; com a evolução da doença, podem surgir áreas de faveolamento. Ocasionalmente, pode haver derrame pleural e/ou espessamento pleural, o que auxilia no diagnós tco diferencial com as outras doenças pulmonares parenquimatosas. O principal diagnós tco diferencial é a fibrose pulmonar idiopá tca. O resultado da espirometria depende da fase da doença. Em fases precoces, pode ser normal, e posteriormente há redução da CVF e do VEF1, denotando presença de distúrbio restritvo. A capacidade de difusão de monóxido de carbono costuma estar reduzida. A tomografia de cortes finos (alta resolução) pode mostrar o padrão pico da asbestose, de infiltrado retcular com predomínio em bases. Diferindo da radiogra fia, na qual é raro encontrar envolvimento pleural, nesse exame, veri fica-se comprometmento da serosa em cerca de 90% dos casos.
- Asbestose A asbestose é definida como fibrose pulmonar interstcial associada à exposição ao asbesto. O pulmão dos indivíduos com asbestose apresenta fibrose, inicialmente nos ductos alveolares e nas regiões peribrôn quicas. A exposição não necessita ser intensa, exis tndo relato da doença em familiares de indivíduos que trabalhavam com asbesto, possivelmente por inalação das fibras presentes em sua ves tmenta. O período de latência entre a exposição e o início das manifestações da doença costuma ser prolongado, de cerca de 20 a 30 anos. a) Manifestações clínicas O quadro clínico é semelhante ao de outras doenças interstciais crônicas. A dispneia é o sintoma predominante aos esforços e com piora progressiva. O sinal de exame f sico mais descrito são estertores crepitantes nas bases pulmonares. Outros sintomas, como tosse seca com meses a
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Figura 1 - Radiogra fi a de tórax de paciente com asbestose: notar as opacidades lineares principalmente nas bases pulmonares
c) Tratamento e prognós tco Não há tratamento especí fico para a doença. O tratamento é de suporte e exige o afastamento da exposição. Estma-se que 20 a 40% dos pacientes com asbestose apresentam doença de caráter progressivo. Essa forma de evolução parece depender de exposição cumula tva, gravidade da doença à época do diagnós tco e, talvez, do tpo de fibra envolvida.
PNEUMOCONIOSES
4. Silicose A sílica é um composto natural formado pelos 2 elementos químicos mais abundantes na crosta terrestre: o oxigênio e o silício. É encontrada na natureza nas formas amorfa e cristalina, que, combinadas com metais e óxidos, originam silicatos como talco, feldspato, caulim e mica. A exposição à sílica aumenta o risco de o indivíduo desenvolver DPOC e câncer de pulmão; a incidência de tuberculose também é elevada, por esses pacientes apresentarem redução da atvidade de macrófagos e linfócitos; além do mais, há relatos de aumentos de incidências de esclerodermia, artrite reumatoide e granulomatose de Wegener. A silicose é a pneumoconiose mais comum no Brasil, ainda que existam dados epidemiológicos escassos. Em um estudo realizado no Ceará com 687 cavadores de poços, encontrou-se uma prevalência de silicose de 27%. Uma vez inaladas, as par culas de sílica depositam-se nos bronquíolos respiratórios e alvéolos. Se tais par culas não são removidas, ocorre um processo in flamatório, inicialmente como alveolite in flamatória, evoluindo, posteriormente, com fibrose. Conforme a evolução clínica, pode ser classi ficada em: - Silicose crônica: tem evolução lenta, aparece cerca de 10 a 20 anos após a 1ª exposição à sílica, possivelmente até muitos anos após cessada a exposição à sílica, tendo caráter progressivo, na maioria das vezes resultando em fibrose crônica. Os exames de imagem apresentam, nos estágios iniciais, infiltrado micronodular bilateral, com predomínio em ápices e poupando seios costofrênicos. Com a progressão da doença, pode haver coalescência dos nódulos e formação de grandes opacidades, geralmente bilaterais, com fibrose maciça progressiva. O aumento das imagens hilares medias tnais, sugerindo comprometmento ganglionar é frequente; algumas vezes, formam-se calcificações conhecidas como “casca de ovo”. À tomografia, estão presentes micronódulos centrolobulares e subpleurais, predominantes nos lobos superiores, espessamento de inters cio axial, massas conglomeradas com formato irregular, aumento de linfonodos e áreas de en fisema; - Silicose acelerada: o quadro clínico é semelhante ao da silicose crônica, a diferença é a mais lenta, entre 5 e 10 anos após a exposição; - Silicose “aguda”: também denominada proteinose alveolar silicótca, ocorre quando há exposição maciça à sílica, intenso preenchimento alveolar e evolui em meses a poucos anos, podendo haver rápida evolução para óbito. Os pacientes apresentam quadro de dispneia grave, astenia, perda de peso e hipoxemia, e infiltrado alveolar bilateral na radiogra fia, com distribuição difusa e, à tomogra fia de alta resolução, padrão de opacidade em vidro fosco, espessamento septal liso nas áreas alteradas e imagem de condensação com distribuição geográ fica ou regional.
Ademais, a silicose também pode ser classi ficada como simples (pouco sintomátca e mínima alteração espirométrica) ou complicada (formação de grandes conglomerados em segmentos pulmonares superiores e alterações espirométricas marcantes). O risco de desenvolvimento de silicose guarda relação com o tamanho da par cula inalada, o tempo de exposição, a concentração do material, o tpo de sílica e a susce tbilidade individual. Dentre todas as a tvidades de risco, têm maior risco os jateadores de areia e os cavadores de poços.
A - Manifestações clínicas Na silicose crônica, apresentação mais comum, há poucos sintomas, os quais costumam ser exuberantes em pacientes com formas complicada e aguda: tosse e dispneia progressiva aos esforços. Os pacientes podem não apresentar alterações de função pulmonar nas fases iniciais, evoluindo para um padrão obstru tvo, restritvo ou misto. Na forma aguda, predomina o padrão restri tvo e, nas formas crônicas, o obstrutvo, em geral pouco ou não responsivo ao uso de broncodilatadores. A obstrução é atribuída a vários fatores, como irritação brônquica pela poeira, distorção e compressão das vias aéreas pelos nódulos silicó tcos e pela fibrose e, ainda, por existência de en fisema.
B - Diagnóstco O diagnóstco da silicose baseia-se na história de exposição à sílica e nas alterações radiográ ficas característcas. A radiografia de tórax mostra opacidades inters tciais, irregulares, com predomínio em campos pulmonares superiores. Na forma complicada, tal quadro radiológico é complementado por intensa formação de nódulos em ápices. Calci ficação de nódulos não é comum; mais frequente é a calci ficação de gânglios hilares, formando uma imagem em “casca de ovo” (também vista em sarcoidose e histoplasmose). Ainda que não seja considerada fundamental para o diagnóstco, a tomografia computadorizada permi tu a identficação de alterações mais precoces que o observado com o uso da radiogra fia nos indivíduos expostos à sílica. A iden tficação de micronódulos, a coalescência desses nódulos e a presença de en fisema nas regiões superiores e posteriores dos pulmões são mais bem visualizadas na tomografia computadorizada de tórax de alta resolução, quando comparada à radiogra fia e a tomografia convencionais. Ainda assim, a tomogra fia está indicada apenas como exame complementar em casos duvidosos; nestes, a tomografia de cortes finos (alta resolução) pode indicar o padrão pico da silicose (Figuras 2 e 3). Em casos duvidosos, indica-se biópsia pulmonar. A indicação principal é a presença de alteração radiológica com ausência de dados na história ocupacional que sugiram a associação. A biópsia pode levar ao diagnós tco de outra doença, confirmar uma apresentação a pica (fibrose difusa, não granulomatosa, por exemplo) ou ainda estabelecer diferenciação com a beriliose.
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PNEUMOLOGIA A - Manifestações clínicas São semelhantes a outras pneumoconioses. Os pacientes com a forma simples podem apresentar-se assintomá tcos, embora com maior facilidade para apresentar tosse e, muitas vezes, apresentam enfisema concomitante. Alguns doentes podem ter tosse produ tva, com expectoração escura; eventualmente, os pacientes podem apresentar cavitação das lesões e hemoptse escurecida – melanop tse.
B - Diagnóstco
Figura 2 - In fi ltrado micronodular em paciente com silicose
Figura 3 - Micronódulos de disseminação perilinfát ca, comuns em silicose (também vistos em sarcoidose e linfoma), do mesmo paciente da Figura 2
C - Tratamento e prognóstco Não há tratamento especí fico. O tratamento é de suporte e exige o afastamento da exposição. O prognós tco é ruim para as silicoses aguda e crônica e para a forma complicada (nodular e fibrose maciça) da doença.
5. Pneumoconiose dos trabalhadores de carvão O carvão, quando da sua extração em minas, libera uma série de poeiras, incluindo a sílica, que quando inaladas podem promover a pneumoconiose dos trabalhadores de carvão, silicose, fibrose pulmonar maciça e DPOC. A doença tem diferentes expressões em todo o mundo, devido à ocorrência de vários tpos de carvão: o antracitoso, com mais carbono e maior produção de par culas inaláveis, e o betuminoso, mais comum na região Sul do Brasil, local onde se concentram as minas de carvão do país. O estudo de Algrant e colaboradores demonstrou uma prevalência pontual de pneumoconiose do trabalhador de carvão de 5,6% em uma amostra de 956 mineiros. A doença é denominada simples se todos os nódulos pulmonares são menores que 1cm de diâmetro. Já a presença de nódulos maiores que 1cm de diâmetro marca a pneumoconiose complicada. Existe uma apresentação clássica, resultante da associação de artrite reumatoide e exposição ao carvão, a síndrome de Kaplan.
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Para o diagnóstco, o nexo causal é fundamental, com tempo de latência geralmente longo, de 15 a 20 anos. A radiogra fia de tórax pode indicar opacidades inters tciais, irregulares, nodulares, com predomínio em segmentos pulmonares superiores, eventualmente formando conglomerados, sendo dif cil a distnção com a silicose, embora os nódulos da silicose sejam usualmente maiores. A espirometria pode ser normal ou demonstrar distúrbio restritvo, obstrutvo ou misto. E a tomogra fia de cortes finos (alta resolução) pode mostrar o padrão pico da doença com in filtrado interstcial nodular, de predomínio nos campos pulmonares superiores.
C - Tratamento e prognóstco O tratamento é de suporte, sendo fundamental o afastamento da exposição. Em geral, pacientes com a forma simples da doença não apresentam evolução progressiva, tendo sobrevida próxima à normal. Por outro lado, doentes com a forma fibrótca progressiva (nódulos à radiogra fia >1cm de diâmetro, com predomínio em ápices) têm sobrevida reduzida e prognós tco ruim e podem evoluir com fibrose progressiva, cor pulmonale, necessidade de oxigênio domiciliar, ou com uma neoplasia (câncer de pulmão).
6. Beriliose A beriliose é uma pneumoconiose causada pela inalação de poeira ou gases que contêm berílio. No passado, este era comumente extraído para ser u tlizado nas indústrias eletrônicas e químicas, e serem fabricadas lâmpadas fluorescentes. Atualmente, é usado, principalmente, na indústria aeroespacial. Além dos trabalhadores dessas indústrias, alguns indivíduos que habitam regiões próximas a re finarias de berílio também apresentam beriliose. Essa doença difere das outras pulmonares, pois os problemas pulmonares parecem ocorrer apenas em indivíduos sensíveis a tal elemento químico – cerca de 2% dos que entram em contato com a substância. A doença pode afetar, até mesmo, indivíduos cuja exposição tenha sido relatvamente curta, e os sintomas podem demorar de 10 a 20 anos para se manifestarem. Há apenas 2 relatos de caso de beriliose no Brasil. A fisiopatogenia da doença está associada à reação de hipersensibilidade do tpo tardia, mediada por linfócitos TCD4. Nesse processo, são liberadas linfocinas, que levam à
PNEUMOCONIOSES
formação de granulomas. Do ponto de vista histopatológico, a doença pulmonar crônica pelo berílio é caracterizada por pneumonia inters tcial com granulomas não caseosos, com intensa proliferação his tocitária, linfocitária e plasmocitária, com presença de células gigantes e corpos de Schaumann, com variados graus de fibrose, dependendo do tempo de doença. Muitos dos casos são indis tnguíveis da sarcoidose. A história de exposição ao berílio é critério básico na sua definição diagnóstca.
A - Sintomas e diagnóstco Em alguns indivíduos, a beriliose ocorre de forma súbita (beriliose aguda), principalmente sob a forma de uma inflamação pulmonar (pneumonite). Os indivíduos com beriliose aguda apresentam um quadro caracterizado por tosse, dificuldade respiratória e perda de peso. Olhos e pele também podem ser afetados. Outros apresentam beriliose crônica, na qual ocorrem formação de um tecido anormal nos pulmões e aumento de linfonodos. Nesses indivíduos, a tosse, a di ficuldade respiratória e a perda de peso acontecem de forma gradual. O diagnóstco baseia-se no antecedente de exposição ao berílio, nos sintomas e nas alterações característcas reveladas pela radiogra fia torácica. No entanto, como as radiogra fias da beriliose se assemelham às de outra doença pulmonar – a sarcoidose –, podem ser necessários testes imunológicos adicionais.
B - Prognóstco e tratamento A beriliose aguda pode ser grave ou mesmo fatal. Entretanto, a maioria dos indivíduos recupera-se, apesar de, no início, apresentar-se gravemente doente. Os pulmões perdem a elastcidade, e a função pulmonar é ruim. Com um tratamento adequado, como a ins ttuição de ventlação assistda e o uso de cortcosteroides, os indivíduos geralmente recuperam-se em 7 ou 10 dias, sem apresentar efeitos residuais. Contudo, se os pulmões apresentam um dano muito importante decorrente da beriliose crônica, o coração pode ser sobrecarregado, e, consequentemente, podem ocorrer insuficiência cardíaca e morte. Algumas vezes, cor tcosteroides, como a prednisona oral, são prescritos no tratamento da beriliose crônica, embora, na maioria das vezes, sejam pouco úteis.
7. Bissinose A bissinose é um estreitamento das vias aéreas provocado pela inalação de par culas de algodão, linho ou cânhamo. Nos Estados Unidos e na Inglaterra, ocorre, quase exclusivamente, em indivíduos que trabalham com algodão não processado, embora quem trabalha com linho e cânhamo também possa apresentá-la. Os mais afetados parecem ser as pessoas cuja ocupação é abrir fardos de algodão cru ou aquelas que trabalham nos primeiros estágios do processamento da substância. Aparentemente, algo presente
no algodão cru provoca o estreitamento das vias aéreas em indivíduos susce veis.
A - Sintomas e diagnóstco A bissinose pode causar sibilos e opressão no peito, geralmente no 1º dia de trabalho após uma folga. Ao contrário do que acontece na asma, os sintomas tendem a diminuir após exposições repetdas, e a opressão torácica pode desaparecer no final da semana de trabalho. Entretanto, após um indivíduo ter trabalhado com algodão durante muitos anos, essa opressão pode persis tr por 2 ou 3 dias de trabalho, ou mesmo por toda a semana. A exposição prolongada à poeira do algodão aumenta a frequência dos sibilos, mas não evolui para uma doença pulmonar incapacitante permanente. O diagnóstco é estabelecido por meio de um teste que revela a redução da capacidade pulmonar ao longo de 1 dia de trabalho. Normalmente, tal redução é maior no 1º dia de trabalho.
B - Prevenção e tratamento O controle da poeira é o melhor modo de evitar a bissinose. Os sibilos e a opressão torácica podem ser tratados com as mesmas drogas u tlizadas no tratamento da asma. As drogas que promovem a abertura das vias aéreas (broncodilatadoras) podem ser administradas com o auxílio de um inalador (albuterol/salbutamol, por exemplo) ou sob a forma de comprimido (como a teo filina).
8. Exposição a gases e a substâncias químicas Muitos tpos de gases, como cloro, fosgênio, dióxido de enxofre, sulfato de hidrogênio, dióxido de nitrogênio e amônia, podem ser liberados durante acidentes industriais e irritar gravemente os pulmões. Gases como o cloro e a amônia dissolvem-se facilmente e produzem irritação imediata da boca, do nariz e da garganta. As partes inferiores dos pulmões só são afetadas quando o gás é inalado profundamente. Gases radioatvos, liberados em acidentes de reatores nucleares, podem causar, em longo prazo, câncer de pulmão e de outras regiões do corpo. Alguns gases, como o dióxido de nitrogênio, não se dissolvem com facilidade. Por isso, não produzem sinais precoces da exposição, como irritação do nariz e dos olhos, aumentando a possibilidade de serem inalados profundamente nos pulmões. Tais gases podem causar in flamação das vias aéreas menores (bronquiolite) ou acúmulo de líquido nos pulmões (edema pulmonar). Na doença dos enchedores de silo, resultante da inalação dos vapores que contêm dióxido de nitrogênio liberados pela silagem úmida, o acúmulo de líquido nos pulmões pode demorar até 12 horas após a exposição. O distúrbio pode apresentar uma melhora temporária e, em seguida, recidivar 10 ou 14 dias depois, mesmo que não ocorram novos contatos com o gás.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA A recorrência tende a afetar as pequenas vias aéreas (bronquíolos). Em alguns indivíduos, a exposição a pequenas quantdades de gás ou a outras substâncias químicas durante um período prolongado pode acarretar uma bronquite crônica. Além disso, acredita-se que a exposição a determinadas substâncias químicas, como compostos de arsênico e hidrocarbonetos, seja responsável pelo câncer em alguns indivíduos. O câncer é possível nos pulmões ou em outras partes do corpo, dependendo da substância inalada.
A - Sintomas e diagnóstco
teja em domicílio. O tratamento de manutenção segue as linhas gerais do tratamento da asma, exigindo modi ficação do ambiente de trabalho.
10. Resumo Quadro-resumo - Pneumoconioses são doenças pulmonares originadas por inalação de poeiras; - Independente da etologia, o nexo causal é fundamental para a definição diagnóstca;
Gases solúveis, como o cloro, causam graves queimaduras nos olhos, no nariz, na garganta, na traqueia e nas grandes vias aéreas. Frequentemente, esses gases produzem tosse e hemop tse. Também são frequentes a náusea e a dificuldade respiratória. Gases menos solúveis, como o dióxido de nitrogênio, ocasionam di ficuldade respiratória, algumas vezes grave, após um período de 3 a 4 horas. E a radiogra fia torácica pode revelar edema pulmonar ou bronquiolite.
- As pneumoconioses fibrosantes mais comuns são silicose, asbestose e pneumoconiose do trabalhador de carvão;
B - Prognóstco, prevenção e tratamento
- A exposição ao asbesto, além da asbestose, associa-se a doenças benignas (placas pleurais, espessamento pleural difuso, derrame pleural, atelectasia redonda) e a doenças malignas (neoplasia de pulmão e mesotelioma);
Quase todos os indivíduos apresentam uma recuperação total da exposição acidental a gases. A complicação mais grave é a infecção pulmonar. A melhor maneira para prevenir a exposição é o cuidado rigoroso durante a manipulação de gases e de substâncias químicas. Máscaras de gás com provisão própria de ar devem estar disponíveis para o caso de um vazamento acidental. Os trabalhadores rurais devem ser informados sobre o perigo da exposição acidental a gases tóxicos em silos. A oxigenoterapia é o principal tratamento. Em caso de lesão pulmonar grave, o indivíduo pode precisar de ven tlação mecânica. As drogas que promovem a abertura das vias aéreas, a infusão de líquidos por via intravenosa e a administração de antbiótcos podem ser úteis. E os cor tcosteroides, como a prednisona, são comumente prescritos para reduzir a in flamação pulmonar.
9. Asma relacionada ao trabalho O termo “asma relacionada ao trabalho” refere-se tanto à asma ocupacional quanto à asma agravada pelo trabalho. Enquanto naquela os fatores desencadeantes estão restritos ao ambiente de trabalho, na asma agravada pelo trabalho há relato de asma prévia, e que perdeu o controle por fatores presentes na a tvidade ocupacional. A forma ideal de definir o diagnóstco é através de pesquisa de rea tvidade especí fica aos irritantes presentes no trabalho; entretanto, o método nem sempre está disponível, e um teste negatvo não afasta o diagnós tco de asma ocupacional. Na prátca, uma ferramenta muito u tlizada é a medida seriada do pico de fluxo expiratório, observando-se variação significatva de seus valores quando se compara os períodos em que o indivíduo está trabalhando com aqueles em que es-
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- A silicose pode ter apresentação acelerada (meses a anos desde a exposição), aguda (5 a 10 anos desde a exposição) ou crônica (mais de 10 anos desde a exposição); - Os trabalhadores com maior risco de desenvolver silicose são os jateadores de areia e os cavadores de poços; - A silicose aumenta o risco de o paciente desenvolver tuberculose, esclerodermia, artrite reumatoide, granulomatose de Wegener e neoplasia de pulmão;
- A asbestose é a fibrose pulmonar associada à exposição ao asbesto, tem um período de latência longo (chega a 30 anos) e pode ocorrer em familiares de indivíduos que trabalham com amianto; - A pneumoconiose dos trabalhadores de carvão tem muitas característcas semelhantes à silicose, mas com o tempo de latência habitualmente mais longo; - As pneumoconioses são doenças de no tficação compulsória.
CAPÍTULO
10 1. Introdução e definições
Tromboembolismo pulmonar Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Mar tn s Valois
Em séries clínicas: Após um AVC (membro plégico): de 30 a 60%; Em doentes com IAM: de 5 a 35%; Em doentes com ICC: 12%. - Em séries cirúrgicas: Herniorrafia: 5%; Cirurgia abdominal de grande porte: de 15 a 30%; Cirurgia ortopédica de quadril: de 50 a 70%; Revascularização do miocárdio: de 3 a 9%. �
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O diagnóstco de tromboembolismo pulmonar (TEP), um desafio para qualquer médico, é muito importante, pois, sem tratamento, a mortalidade pode chegar a 30%; com antcoagulação, fica em torno de 2 a 8%. Em estudos de autópsia, o TEP é encontrado em 12 a 15% dos doentes que estavam hospitalizados. Acredita-se que a sua incidência esteja aumentando devido a fatores como envelhecimento global da população e aumento de neoplasias, doenças respiratórias e doentes acamados. Conforme a repercussão clínica, a embolia pulmonar tem sido classificada como: - TEP maciço: caracteriza-se pela presença de instabilidade hemodinâmica (hipotensão ou choque); -
TEP submaciço: caracteriza-se pela presença de disfunção do Ventrículo Direito (VD) ao ecocardiograma, mas sem instabilidade hemodinâmica;
-
TEP não maciço: caracteriza-se pela ausência dos critérios anteriores.
2. Etologia e fatores de risco A maioria dos eventos tromboembólicos é ocasionada por êmbolos provenientes das veias dos membros inferiores, principalmente do território ileofemoral; veias poplíteas ou mais periféricas podem ser responsáveis, mas com menor frequência. Assim, em geral, os fatores de risco para TEP são idêntcos aos associados à Trombose Venosa Profunda (TVP): fatores que inter firam na tríade de Virchow – lesão endotelial, estase venosa e estado de hipercoagulabilidade. São muitos os fatores de risco reconhecidos para TEP. O estudo PIOPED I iden tficou, como mais relevantes, antecedente de TVP/TEP, AVC com membro plégico, neoplasia, cirurgia ortopédica e imobilização. Por outro lado, sabe-se que muitos fatores ainda não sejam conhecidos. Alguns deles são citados nas Tabelas 1 e 2. Alguns dados ilustra tvos da frequência de doença tromboembólica em séries clínicas e cirúrgicas são:
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Há forte associação entre câncer e TVP/TEP: estudos recentes têm mostrado que até 10% dos chamados TEPs idiopátcos apresentam um câncer de base. Entretanto, uma investgação extensa desses doentes tem rendido resultados desapontadores. Recomenda-se inves tgação guiada por sintomas e sinais, conforme determinação das sociedades preventvas de rastreamento e promoção à saúde. Não há utlidade em proceder a múl tplos testes diagnóstcos à procura de um câncer. Tabela 1 - Fatores de risco primários para TVP/TEP - Mutação do fator V de Leiden; - Hiper-homocisteinemia; - Deficiência de proteína C; - Deficiência de proteína S; - Deficiência de anttrombina; - Síndrome do antcorpo antfosfolípide (SAF); - Mutação no gene da protrombina (20210A); - Outros mais raros: de ficiência do plasminogênio, deficiência do fator XII, ↑inibidor do atvador do plasminogênio. Tabela 2 - Fatores de risco secundários para TVP/TEP Maior risco (risco relatvo = 5 a 20) - Cirurgia abdominal de grande porte; - Cirurgia de quadril e joelho; - Pós-operatório em UTI; - Gravidez tardia e puerpério; - Cesárea;
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PNEUMOLOGIA Maior risco (risco relatvo = 5 a 20) - Trauma e fraturas de membros inferiores;
Tabela 3 - Alterações hemodinâmicas/pulmonares da embolia pulmonar
- Câncer abdominal, pélvico e metastá tco;
- ↑ Pressão na artéria pulmonar;
- Internação com doente restrito ao leito (pouca movimentação);
- Hipocinesia de VD;
- TVP prévio.
- ↓ Débito cardíaco de VD; Menor risco (risco relatvo = 2 a 4)
- Abertura de shunts arteriovenosos;
- Doença cardíaca congênita;
- Desequilíbrio V/Q;
- Insuficiência cardíaca;
- Liberação de vários mediadores químicos;
- Uso de antconcepcional oral ou reposição hormonal;
- Atelectasia;
- DPOC;
- Hipoxemia;
- Doença neurológica com desabilidade;
- Taquicardia;
- Cateter venoso central;
- Enchimento do VE (restrição do pericárdio e dilatação de VD com desvio do septo interventricular).
- Doenças trombótcas e estados de hiperviscosidade; - Obesidade; - Outros: síndrome nefrótica, doenças mieloproliferativas, doença inflamatória intestinal, diálise crônica.
A magnitude das alterações é muito variável e pode depender de algumas par tcularidades: - Estados cardiovascular e pulmonar prévios; - Comorbidades; - Tamanho do êmbolo: assim, quanto maior o trombo, maior a probabilidade de causar um grave distúrbio ventlação/perfusão (V/Q), shunt arteriovenoso, hipoxemia e redução do débito cardíaco (Tabela 3). Um paciente com um trombo grande, com ou sem limitação cardiovascular prévia, pode apresentar aumento súbito e signi ficatvo da pressão em artéria pulmonar, que é transmitdo ao VD; este se dilata e pode comprimir o Ventrículo Esquerdo (VE), ocasionando redução do débito cardíaco e, assim, hipotensão e choque. Desta forma, um importante fator de pior prognós tco é a presença de disfunção de Ventrículo Direito (VD), manifestada clinicamente ou através de um ecocardiograma. A insuficiência respiratória, por sua vez, não é originada apenas pela obstrução vascular segmentar, o que ocasiona efeito espaço-morto (área do pulmão bem ven tlada, mas mal perfundida); é a liberação de citocinas in flamatórias que seguem esse evento inicial que desregula a relação ventlação-perfusão do parênquima pulmonar, promovendo o chamado efeito shunt , com distúrbio importante da relação ventlação-perfusão. Quando os pacientes com tal condição apresentam hipoxemia, caracteris tcamente, são necessários altos fluxos de oxigênio para normalizar a saturação de hemoglobina. A história natural do tromboembolismo é a resolução do processo dentro de 3 a 4 semanas em 97% dos casos, com a maioria tendo reabsorção do trombo na 1ª semana. Os 3% restantes, em que a fibrinólise endógena não foi capaz de reabsorver o coágulo, terão organização fibrinosa do trombo, caracterizando o TEP crônico, que se apresenta, na prá tca diária, como uma das principais causas de hipertensão pulmonar.
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Ciclo vicioso: hipertensão pulmonar, ↓ débito cardíaco, hipoxemia e choque.
3. Achados clínicos A apresentação clínica pode variar de formas assintomátcas a formas graves com instabilidade hemodinâmica e morte súbita. Em grandes estudos, 97% dos doentes tveram dispneia, taquipneia ou dor torácica, com as seguintes característcas:
A - Taquipneia e dispneia Mais frequentemente, indicam uma grande embolia e podem vir associados à dor torácica em aperto (o que indica isquemia do VD). Habitualmente, a dispneia é súbita, mas pode piorar e durar de horas a vários dias. A TEP deve sempre fazer parte do diagnós tco diferencial de ICC ou DPOC em pacientes com descompensação no pronto-socorro.
B - Dor torácica (com ou sem dispneia) Um dos sintomas mais frequentes. Os pacientes, usualmente, apresentam embolia em pequenas artérias periféricas subpleurais (o que ocasiona irritação pleurí tca).
C - Síncope e hipotensão Indicam repercussão hemodinâmica importante e implicam maior mortalidade. Há uma série de alterações hemodinâmicas com aumento da resistência da circulação pulmonar, hipoxemia, do débito cardíaco e sinais de hipoperfusão (oligúria e extremidades frias). O dado que mais alerta o médico no dia a dia para a possibilidade de TEP é a instalação súbita de sintomas respiratórios, principalmente em pacientes com fatores de risco associados. Os sinais e os sintomas, entretanto, não autorizam o clínico a de finir o diagnóstco, como demonstrado pelo estudo PIOPED I: os achados mais comuns em pacientes com TEP eram os mesmos dos casos em que exames complementares excluíram a possibilidade dessa condição. De acordo com tal estudo, os sintomas mais comuns foram dispneia (73%), dor pleurí tca (66%), tosse (37%) e hemop-
TROMBOEMBOLISMO PULMONAR
tse (13%); os sinais, taquipneia (70%), crepitações (51%),
taquicardia (30%), 4ª bulha (24%) e hiperfonese da 2ª bulha (13%). Assim, os exames complementares são imprescindíveis para o diagnóstco definitvo.
4. Exames complementares Os exames complementares em tromboembolismo são fundamentais para a de finição diagnóstca. São inúmeros os testes propostos, alguns que auxiliam o diagnós tco e outros de caráter con firmatório ou excludente.
c) Eletrocardiograma Os achados mais comuns ao eletrocardiograma são alterações inespecí ficas do segmento ST-T e taquicardia sinusal. Contudo, o exame pode ser absolutamente normal. Há um achado clássico, mas de baixa acurácia para o diagnós tco, que é a presença de padrão S1Q3T3 (onda S profunda em dL, onda Q em dIII e onda T inver tda em dIII – Figura 2). Dados sugestvos de sobrecarga de câmaras direitas podem ser observados em pacientes com eventos mais graves.
A - Exames que auxiliam o diagnóstco a) Radiografia de tórax A radiografia de tórax tem maior u tlidade para excluir outras causas de dispneia e dor torácica, além de poder ser completamente normal (30% dos casos) ou mostrar: - Atelectasias laminares (achado mais comum); - Derrame pleural; - Elevação de cúpula diafragmá tca; - Achados clássicos de TEP (raros): sinal de Hampton (imagem triangular periférica, suges tva de infarto pulmonar – Figura 1), sinal de Westmark (ou oligoemia focal, representando área do parênquima pulmonar com pobreza vascular focal) e sinal de Fleischner (dilatação anormal dos ramos principais das artérias pulmonares).
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Figura 2 - Padrão S1Q3T3 em ECG de paciente com TEP
d) Ecocardiograma O ecocardiograma é ú tl na identficação de doentes com TEP que têm um pior prognós tco; achados de hipocinesia de VD, hipertensão pulmonar persistente, forame oval patente, trombo livre e flutuante no átrio direito iden tficam pacientes com alto risco de óbito ou de tromboembolismo recorrente. Também é ú tl para o diagnóstco diferencial de doentes que se apresentam com dispneia, dor torácica e colapso cardiovascular. Nessas situações, o ecocardiograma pode indicar um diagnós tco alternatvo, como infarto agudo do miocárdio, endocardite infecciosa, dissecção aguda de aorta, pericardite ou tamponamento pericárdico. e) Troponinas e pep dio natriurétco cerebral As troponinas e o pep dio natriurétco cerebral (BNP) não têm validade para firmar nem excluir o diagnós tco. São úteis para determinar prognós tco de pacientes com TEP, já que estão elevados nas situações de sobrecarga aguda de câmaras direitas. Assim, quando em níveis anormais, indicam a possibilidade de evento submaciço.
B - D-dímero Figura 1 - Corcova de Hampton: opacidade homogênea periférica, de aspecto triangular, com base voltada para a periferia e ápice para o hilo, sendo característ ca de infarto pulmonar secundário a TEP
b) Gasometria arterial A gasometria arterial pode ser normal em 20% dos doentes. Mesmo o gradiente alveoloarterial pode ser normal em alguns casos. Podem ocorrer graus variáveis de hipoxemia e hipocapnia, mas são inespecí ficos.
Os D-dímeros são produtos de degradação da fibrina, detectados no sangue sempre que o processo de coagulação-fibrinólise endógena acontece em dinâmica maior. Habitualmente, está elevado nos casos de TEP, mas inúmeras situações podem elevar os níveis dos D-dímeros, como idade avançada, insuficiência renal, gestação e puerpério, pós-operatório; assim, é dedu vel ser um exame pouco especí fico, nunca útl para con firmar o diagnóstco de TEP (independente de seus tulos), mas que pode auxiliar na exclusão diagnóstca pela sua sensibilidade alta. Há várias
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PNEUMOLOGIA metodologias, e a mais acurada é a ELISA (pode ser u tlizada para excluir embolia até em casos de probabilidade clínica intermediária).
C - Cintlografia de ventlação-perfusão (V/Q) A cintlografia usa como princípio a comparação da viabilidade das vias aéreas com a dos vasos pulmonares, através de administração de um marcador nuclear pelas vias inalatória e venosa (albumina marcada com tecnécio). Espera-se que um paciente com embolia apresente falha de perfusão localizada em segmento pulmonar com ven tlação normal (Figura 3). O laudo do exame geralmente é apresentado em termos de probabilidade diagnós tca: a) Alta probabilidade Implica grandes chances de o doente ter, de fato, um TEP. Com esse resultado, está indicada antcoagulação, não necessitando de exames adicionais (valor predi tvo positvo = 88%). b) Normal Três estudos têm demonstrado que um V/Q normal e uma baixa probabilidade clínica de TEP, juntos, pra tcamente descartam TEP. c) Não diagnóstco (baixa ou intermediária probabilidade) Em estudos em que tais pacientes foram subme tdos à angiografia pulmonar (12 estudos com 1.529 doentes), foi encontrado TEP em 25%. Isso implica que um V/Q não diagnóstco necessita de exames adicionais. A cintlografia deve ser evitada em pacientes que já tenham doença parenquimatosa pulmonar, já que di ficilmente será configurada alta probabilidade pelo exame (a captação do marcador pela via inalatória sempre será anormal). Assim, um paciente com DPOC tem maior chance de ter um V/Q não diagnóstco.
segmentares). Em artérias subsegmentares ou menores, a sensibilidade diminui, e é possível, mesmo com aparelhos mais novos que pequenos coágulos não sejam iden tficados. A TC helicoidal revolucionou o manejo diagnós tco da embolia pulmonar (Figura 4). Hoje, apenas uma pequena porcentagem dos doentes necessita de arteriogra fia. O Consenso Britânico já recomenda o uso da TC helicoidal como 1º exame de imagem, mas somente após uma avaliação de probabilidade pré-teste e uma dosagem de D-dímeros. Outra vantagem da TC é a possibilidade de determinar a presença de outro diagnós tco, principalmente de doenças pulmonares parenquimatosas. A TC helicoidal tem evoluído muito rapidamente, e as imagens e os detalhes são cada vez mais sofistcados, o que proporciona a visualização de vasos cada vez menores. Tem sido recomendado já avaliar a presença de sobrecarga de câmaras direitas pela tomogra fia helicoidal, pela avaliação comparatva dos diâmetros de ventrículos direito e esquerdo; essa relação, geralmente, é de 0,9, e valores superiores a esse (ou seja, VD de diâmetro igual ou maior que o VE) indicam tal sobrecarga, caracterizando o evento como submaciço. Há respaldo na literatura para não restringir seu uso em gestantes, desde que seja baseado em suspeita diagnós tca adequada, não sendo jus tficada a realização intempes tva do exame. Os potenciais riscos devem ser deba tdos com a paciente, que pode, eventualmente, se negar a realizá-lo, indicando-se investgação com outro método. Limitações corriqueiras à realização do exame são alergia ao contraste e insuficiência renal. Outra possibilidade durante a tomogra fia helicoidal é avaliar a presença de trombos veias dos membros inferiores, principalmente quando há êmbolos pulmonares periféricos que não foram iden tficados pela tomografia. O método tem boa correlação com a ultrassonogra fia, não adiciona custos, tampouco é necessária uma dose adicional de contraste.
Figura 3 - Cint logra fi a de vent lação e perfusão de paciente com TEP mostrando área de hipoperfusão com vent lação normal, denotando probabilidade alta de embolia
Figura 4 - TC helicoidal evidenciando falha de enchimento em ramo principal da artéria pulmonar direita (seta)
D - Tomografia helicoidal de tórax
E - Doppler de membros inferiores
O tamanho do êmbolo interfere na sensibilidade. A TC é melhor para TEPs em grandes artérias (lobares ou artérias
A ultrassonografia tem boa acurácia para iden tficação de trombose venosa profunda, principalmente do territó-
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rio íleo-femoral. No contexto de um paciente com sintomas compa veis com embolia, a presença de trombose venosa é extremamente favorável ao diagnós tco de TEP. É um método barato, não invasivo, sem uso de radiação ou contraste, e que pode ser realizado mesmo em pacientes instáveis sem condições de transporte para realização de outro exame. Entretanto, o exame depende do examinador, pode falhar em alguns casos ou, eventualmente, o êmbolo pode ter sido originado de outro segmento. Assim, uma ultrassonografia normal não tem capacidade de afastar o diagnós tco de TEP.
Todos os doentes com suspeita de embolia pulmonar devem ser avaliados com escores de probabilidade antes que sejam solicitados exames complementares (D-dímeros, mapeamento V/Q, tomogra fia, ressonância, Doppler ou arteriogra fia). Isso re finará a probabilidade pós-teste e a razão de verossimilhança ( likelihood rat o). Recomendam-se os escores de Wells ou de Geneva (Tabelas 4 e 5). Tabela 5 - Escore de Geneva para TEP Geneva
Pontos
TVP ou TEP prévios
+2
F - Arteriografia pulmonar
Frequência cardíaca >100bpm
+1
Ainda considerado o padrão-ouro para o diagnós tco de TEP, a arteriogra fia pulmonar compreende um exame invasivo, com taxas de complicações em torno de 3 a 4%, sendo que 10 a 20% dos doentes não conseguem realizá-la, devido a vários fatores, como alergia ao contraste, insuficiência renal, ICC grave, plaquetopenia grave ou estado geral ruim. A tendência é indicá-la cada vez menos, em uma estratégia que incorpore vários métodos diagnós tcos menos invasivos.
Cirurgia recente
+3
Idade de 60 a 79 anos
+1
Idade >80 anos
+2
PaCO2 <36mmHg
+2
PaCO2 de 36 a 38,9mmHg
+1
PaO2 <48,7mmHg
+4
PaO2 de 48,7 a 59,9mmHg
+3
PaO2 de 60 a 71,2mmHg
+2
PaO2 de 71,3 a 82,4mmHg
+1
Atelectasia
+1
Elevação de uma cúpula diafragmá tca
+1
5. Avaliação de probabilidade pré-teste e uso racional dos exames complementares Como são vários os métodos disponíveis, com sensibilidades e especi ficidades diferentes, é importante determinar a probabilidade clínica pré-teste de que o paciente tenha TEP. Existem alguns escores para es tmar tal probabilidade, e um dos mais u tlizados é o de Wells (Tabela 4), que foi validado para uso na sala de emergência, em pacientes recentemente admitdos ao hospital. Tabela 4 - Escore de Wells para probabilidade clínica de TEP Critério
Pontos
Sinais e sintomas de TVP
3
Outro diagnóstco é pouco provável
3
Antecedente de TVP ou TEP
1,5
Taquicardia (FC >100bpm)
1,5
Imobilização ou cirurgia recente (últmas 4 semanas)
1,5
Hemoptse
1
Neoplasia diagnostcada ou em tratamento (úl tmos 6 meses)
1
Probabilidade clínica Baixa Intermediária Alta
<2 pontos 2 a 6 pontos >6 pontos
Baixa probabilidade
0a4
Intermediária probabilidade
5a8
Alta probabilidade
>9
Tabela 6 - Prevalência de TEP de acordo com a probabilidade pré-teste Porcentagem dos doentes que procuram o pronto-socorro
TEPs comprovados (variação em %)
Baixa
53 a 58%
5 a 13%
Intermediária
37 a 41%
38 a 40%
Alta
4 a 10%
67 a 91%
Probabilidade pré-teste
Há inúmeros algoritmos diagnós tcos para avaliar pacientes com suspeita de TEP, mas não se sabe ao certo a forma ideal de proceder à inves tgação. A escolha pelo método inicial de avaliação deve, portanto, ser individualizada, considerando a disponibilidade local, a experiência especí fica com cada exame e a presença de contraindicações. As principais diretrizes internacionais sugerem ordens diferentes de realizações de exames, mas sempre fundamentados na avaliação de probabilidade clínica pré-teste (Figura 5). Independente de como se decide seguir a inves tgação, se houver probabilidade alta de TEP, a an tcoagulação já deverá ser iniciada.
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PNEUMOLOGIA
Probabilidade clínica de TEP Baixa ou intermediária
Alta
D-dímero (ELISA)
Iniciar tratamento
Normal
Elevado
Radiografia de tórax
Anormal
Diagnóstico excluído
Normal
Angiotomografia
Cintilografia
Normal
TEP
Dúvida
Normal
Alta probabilidade diagnóstica
Outro resultado
Diagnóstico excluído
Diagnóstico confirmado
Realizar exame adicional
Diagnóstico excluído
Diagnóstico confirmado
Realizar exame adicional
Alta probabilidade clínica?
Figura 5 - Diagnóst co co para TEP
6. Diagnóstco diferencial O diagnóstco diferencial é amplo e inclui: - Síndromes coronarianas agudas; - Dissecção aguda de aorta; - Pneumotórax; - Pneumonia, asma e DPOC; - Insuficiência cardíaca conges tva; - Pericardite; - Costocondrite, fratura de costela, pleurite e dor osteomuscular; - Hipertensão pulmonar idiopá tca; - Embolia não venosa (gasosa, gordurosa, amnió tca); - Ansiedade. Deve-se dar atenção especial ao diagnós tco de embolia gordurosa, já que acontece em um cenário comum à embolia venosa – pacientes com fraturas ortopédicas e imobilizados. Na Tabela a seguir, estão listadas suas principais característcas. Tabela 7 - Característ cas cas da embolia gordurosa - Ocorre por passagem de corpos gordurosos de ossos longos fraturados (principalmente, em fraturas fechadas) para a circulação sanguínea, causando obstrução microvascular em circulação pulmonar e sistêmica, além de resposta inflamatória sistêmica na forma de vasculite pelos ácidos graxos circulantes; circulantes; - É mais comum nas primeiras 24 a 48 horas após a fratura, pouco provável nas primeiras 12 horas ou após 1 semana;
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- A tríade clássica é composta de dispneia, alteração da consciência e petéquias (estas, mais comuns em conjun tva ocular e segmento superior do tronco); podem ser encontrados corpos gordurosos em exame simples de urina, ou es tgmas de obstrução microvascular microvascular ao exame de fundo de olho; - O diagnóstco é clínico, e não há um método complementar que o confirme; - O tratamento é de suporte; a antcoagulação é inefetva, e o uso de cortcosteroides, controverso; - A principal conduta médica associada à embolia gordurosa é a redução precoce das fraturas.
7. Tratamento A - Doente hemodinamicamente estável e sem disfunção de VD O tratamento de escolha é feito com Heparinas H eparinas de Baixo Peso Molecular (HBPM) (Tabela 8). Após a con firmação do TEP, deve-se prescrever a varfarina sódica e ajustar para manter a Razão Norma tzada Internacional (RNI) entre 2 e 3. Deve-se suspender a heparina apenas quando o RNI está acima de 2. Quando se compara a heparina não fracionada com a HBPM, os estudos mostram resultados semelhantes, isto é, o tratamento tratamento pode acontecer com quaisquer das heparinas; a vantagem da HBPM é que ela não necessita de bomba de infusão intravenosa nem controle com coagulograma.
TR T ROMBOEMBOLISMO PU PULMONAR
Tabela 8 - Tratamento do TEP: ant coagulação coagulação - A antcoagulação tem riscos, é complicada, cara e, por isso, deve-se buscar um diagnóstco de certeza de TEP. Entretanto, enquanto se aguardam os exames auxiliares, e se houver intermediária ou alta probabilidade de TEP, o doente deve ser antcoagulado; - Contraindicações à antcoagulação: sangramento atvo, plaquetopenia, hipertensão grave, trauma importante e cirurgia recente; - TEP não maciço: pode-se usar a HBPM (fracionada) ou a heparina não fracionada; - Heparina não fracionada: fracionada: bolus bolus de 80U/kg IV e manter em bomba de infusão a 18U/kg/h com coleta de coagulograma (TTPA) de 6/6h, e mantê-lo 1,5 a 2,5 vezes o controle. Em média, necessita de 1.000 a 1.250U/h); - HBPM: devido à facilidade, ao menor custo, além de uma mesma eficácia e segurança, a tendência é usá-la 1x/dia: · Dalteparina: 200U/kg Dalteparina: 200U/kg de peso, SC, 1x/dia; · Enoxaparina: 1,5mg/kg Enoxaparina: 1,5mg/kg de peso, SC, 1x/dia; · Nadroparina: 171U/kg de peso, SC, 1x/dia; · Tinzaparina: 175U/kg de peso, SC, 1x/dia. - TEP com uma causa reversível corrigida: an tcoagular por, no mínimo, 3 meses; - TEP idiopátco: antcoagular por, no mínimo, 6 meses; - TEPs/TVPs T EPs/TVPs recorrentes: recorrentes: an tcoagular por, no mínimo, 1 ano e avaliar, liar, individualmente, a manutenção por tempo indefinido.
São complicações da terapia an tcoagulante: -
Sangramento: Sangramento: mesma incidência com quaisquer das heparinas;
-
Eficácia (% de doentes adequadamente tratados ou de recorrência): também recorrência): também semelhante a quaisquer das heparinas.
-
Plaquetopenia induzida pela heparina: heparina: muito mais frequente com heparina não fracionada e raro com HBPM. Com quaisquer das heparinas, é necessária a contagem periódica de plaquetas. Há 2 formas de plaquetopenia associada à heparina: •
•
Forma benigna: benigna: reversível, mais comum, ocorre precocemente, é não imune e reverte com suspensão da heparina; Forma grave: autoimune, grave: autoimune, é mais tardia (de 5 a 15 dias de tratamento) e pode desencadear trombose arterial ou venosa paradoxal. O tratamento é feito com suspensão da heparina e uso de análogos da hirudina (lepirudina ou argatrobana). argatrobana).
Situações especiais Insuficiência renal crônica As heparinas de baixo peso molecular têm eliminação renal, e podem ter seus níveis séricos aumentados em casos de disfunção renal grave. Quando se decide pela sua utlização, é obrigatório monitorizar seu efeito com monitorização da inibição an tfator-Xa, exame que não é disponível -
•
na maioria dos hospitais. Portanto, se não for possível monitorizar, nitorizar, os doentes devem receber heparina não fracionada e monitorização com TTP T TPA. A. Gestação A antcoagulação deve ser feita com heparina não fracionada ou, preferencialmente, HBPM, nas doses habituais; o uso de cumarínicos, entretanto, é proscrito por teratogenicidade e maiores riscos de complicações hemorrágicas da gestação. O tratamento não está associado a riscos maiores de abortamento ou sangramento grave. O parto deverá acontecer por cesárea, e caso a opção tenha sido pela HBPM, esta deve ser trocada por heparina não fracionada subcutânea (em dose suficiente para manter o TTPA 1,5 a 2,5 vezes superior ao controle), que deve ser suspensa 12 horas antes do procedimento. Como o puerpério também representa fator de risco para trombogênese, a antcoagulação deve ser man tda por mais 4 semanas (ou até que sejam totalizados 3 meses de antcoagulação, contados desde o período gestacional), nesta fase com associação de cumarínico, que não é excretado no leite materno; a heparina é suspensa assim que o RNI atnge a faixa de 2,5 a 3,5. •
B - Doente hemodinamicamente instável ou com disfunção de VD O suporte hemodinâmico e respiratório é essencial, e, se necessário, deve-se proceder à intubação, à ven tlação mecânica e ao uso de drogas vasoa tvas. Doentes com TEP que desenvolvem hipotensão e hipoperfusão periférica têm alta mortalidade, em especial nas primeiras horas após o início dos sintomas. A dopamina é a droga vasoatva que mais aumenta a pressão de artéria pulmonar e, se possível, deve-se evitá-la. Tais pacientes com hipotensão hipotensã o e choque podem bene ficiar-se de trombolí tcos. As complicações da trombólise em estudos mais antgos atngiam 14%, principalmente sangramentos em sí tos de punção e hemorragia do SNC (1,9%). Acredita-se que, hoje, esses tais sejam muito inferiores. Como exemplo, em um estudo recente com trombólise com r-tPA em TEP, a incidência de sangramento fatal ou do SNC foi nula. a) TEP maciço Há indicação de trombólise, com janela terapêu tca de até 14 dias, embora o principal bene f cio cio aconteça nas primeiras 72 horas do evento. A trombólise reduz desfechos primários (óbito e/ou recorrência do TEP) em 45% (IC 95%: 4 a 67); com NNT de 14. Os trombolí tcos recomendados são: - Atvador do plasminogênio tecidual (r-tPA): 100mg (r-tPA): 100mg IV, em 2 horas (associado à heparina não fracionada); Estreptoquinase: 1.500.000U IV em 2 horas (dose - Estreptoquinase: sugerida pelo Consenso Europeu); administrar um bolus de bolus de 250.000U IV em 30 minutos e após manter 100.000U/h durante 24 horas (outra opção); Uroquinase: 4.400U/kg/h em 12 a 24 horas. - Uroquinase: 4.400U/kg/h
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PNEUMOLOGIA Há dúvida se indivíduos sem choque ou hipotensão, mas com ecocardiogra fia mostrando disfunção de VD e hipertensão pulmonar aguda, se bene ficiariam da trombólise. Não há definição clara na literatura, sendo sugerida avaliação individualizada pelo médico que assiste o paciente.
Um estudo recente (duplo-cego, randomizado) apontou benef cio cio da trombólise nessa situação, e, hoje, a maioria dos autores a recomenda. b) Filtro de veia cava Há vários tpos de filtros, que podem ser inseridos por via percutânea (femoral ou jugular), o que facilita e diminui a chance de complicações. As principais indicações são: - Doentes com contraindicações à an tcoagulação plena; - TEPs de repe tção em doentes adequadamente an tcoagulados.
8. Prevenção A prevenção, um aspecto muito importante da embolia pulmonar, pulmonar, deve ser sempre ins ttuída caso sejam iden tficados fatores de risco exuberantes; apesar de não eliminar a possibilidade de sua ocorrência, reduz de forma signi ficatva essa probabilidade. Hospitalização prolongada, procedimentos ortopédicos, cirurgias com tempo de anestesia superior a 1 hora, politraumatsmo, uso de contracep tvos orais, neoplasias, insuficiência cardíaca e antecedente de TVP/TEP são os fatores de risco mais importantes. O risco deve ser estratficado, e a modalidade escolhida pode variar da deambulação precoce isoladamente ao uso de an tcoagulantes orais (nos casos de trombofilia e fatores de risco adicionais) – Figura 7.
Figura 6 - Tromboembolismo Tromboembolismo pulmonar com sinais de hipertensão pulmonar: notar aumento aumento do hilo à direita direita
Em um grande banco de dados (estudo observacional, observa cional, não randomizado) com 719 doentes normotensos normo tensos e embolia grave (disfunção moderada à grave ao ecocardiograma), ecocardiograma), a mortalidade em 30 dias foi de: doentes): 4,7%; - Grupo trombólise (169 doentes): 4,7%; - Grupo antcoagulação (550 doentes): 11,1%. doentes): 11,1%. Idade ≥40 anos e mobilidade reduzida
Não
Deambulação e reavaliação em 2 dias
Mais de 50% do dia acamado ou sentado (excluído o sono) Sim Fatores de risco AVC prévio Câncer Cateteres centrais Doen Doença ça infl inflam amat atór ória ia inte intest stin inal al D oe oe nç nç a r es es pi pi ra rat ór ór ia ia g ra rav e Doen Doença ça reum reumat atol ológ ógic icaa aguda aguda Grav id ide z e p ós ós-p aarrto História prévia de TEV IAM ICC classe III ou IV Idade ≥55 anos
Infecção (exceto torácica) Insuficiência arterial Internação em UTI Obes Obesid idad adee P ar ar es esi a/ a/ pa pa ra ral is is ia ia MM IIII Quím Químio io/h /hor ormo mono note tera rapi piaa Reposição hormonal/contraceptiv os os Síndrome nefrótica Trombofilia Varizes/insuficiência venosa crônica
Não
Sim Contraindicações Sangramento ativo Úlcera péptica ativa AVCH com menos de 10 dias de evolução HAS não controlada (>180x110mmHg) Coagulopatia (plaquetopenia ou INR >1,5) Alergia ou plaquetopenia por heparina Insuficiência renal (clearance <30mL/min) Cirurgia craniana ou ocular <2 se manas Coleta de líquido cefalorraquidiano <24h
Sim
Métodos mecânicos Meia elástica de compressão gradual Meia de compressão pneumática (reavaliar em 2 dias)
Não Profilaxia indicada
Preferir HNF
HBPM SC 1 vez ao dia (enoxaparina 40mg ou dalteparina 5.000UI) ou HNF, 5.000UI SC 8/8h Manter por, mais ou menos, 10 a 4 dias ou enquanto persistir o risco
Insuficiência renal crônica (manter TTPA <1,5x), cateter central para nutrição parental Preferir HBPM
Obesidade, varizes, doenças reumatológicas e intestinais inflamatórias, síndrome nefrótica e neoplasias
Figura 7 - Recomendações para pro fi laxia laxia de trombose venosa profunda e embolia pulmonar em pacientes hospitalizados hospitalizados (Adaptado de Projeto Diretrizes – AMB, 2005)
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9. Resumo Quadro-resumo - O diagnóstco de TEP por vezes não é realizado. A mortalidade, quando o tratamento também não é realizado, pode chegar a 30%; com o tratamento, é de até 8%; - A maioria dos casos de TEP é secundária à trombose venosa profunda do território ileofemoral; raramente decorre de trombose poplítea, de veias de membros superiores, trombos intracavitários;
- A cintlografia pode demonstrar áreas de perfusão ruim, com ventlação normal, altamente caracterís tca de TEP; quando normal, exclui o diagnóstco. A principal limitação é para pacientes com doença parenquimatosa prévia, quando o exame apresenta, naturalmente, algumas áreas de déficit de inalação e perfusão; - A ultrassonografia tem vantagem de poder ser realizada à beira do leito; é bem indicada principalmente se há sinais clínicos de TVP, com boa acurácia para trombos em território ileofemoral; - Ecocardiograma, BNP e troponinas são úteis para de finir disfunção de VD, que é característca de mau prognóstco;
- Os fatores de risco são os que interferem na tríade de Virchow (hipercoagulabilidade, estase venosa e lesão endotelial). Podem ser hereditários ou adquiridos. Os principais são TVP ou TEP prévios, cirurgia e imobilização recentes (3 meses), AVC com membro plégico, neoplasia. Dentre os fatores hereditários, o principal é o fator V de Leiden;
- O tratamento é feito com an tcoagulação: heparina (baixo peso ou não fracionada) e an tcoagulante oral; aquela deve ser mantda até o efeito adequado do fármaco oral se estabelecer (RNI entre 2,5 e 3,5). A duração do tratamento depende da e tologia e de recorrência do quadro, variando de 3 meses a inde finidamente;
- Clinicamente, caracteriza-se o evento em maciço (com instabilidade hemodinâmica), submaciço (sem hipotensão ou choque, mas com sinais de disfunção de VD) e não maciço (sem disfunção de VD);
- Os trombolí tcos ainda são ponto de debate intenso: são indicados a casos de instabilidade hemodinâmica; mais recentemente, têm sido propostos em casos selecionados de TEP submaciço;
- O quadro clínico geralmente é representado por sintomas súbitos, como dispneia, tosse, dor torácica e hemop tse. Entretanto, as queixas e os dados do exame f sico são inespecí ficos e podem estar presentes em uma ampla lista de diagnós tcos diferenciais. Os exames complementares são fundamentais;
- O filtro de veia cava está indicado a pacientes com TEP na vigência de antcoagulação ou em casos de contraindicações à antcoagulação;
- A radiografia de tórax está anormal na maioria dos casos, mas com alterações inespecí ficas como pequenas atelectasias. Achados clássicos estão presentes em cerca de 10% dos casos: corcova de Hampton (imagem triangular periférica), sinal de Westmark (oligoemia focal), sinal de Fleischner (alargamento das artérias pulmonares). Exames que podem de finir ou afastar o diagnóstco são D-dímero, cin tlografia pulmonar, ultrassonografia de membros inferiores, angiotomografia de tórax e angiografia pulmonar;
- A profilaxia de TEP deve ser indicada a pacientes com fatores de risco identficados, envolvendo deambulação precoce após cirurgias, métodos mecânicos (meias elástcas e de compressão pneumátca) e heparina subcutânea.
- A angiografia ainda é o padrão-ouro para o diagnóstco, mas é invasivo e tem morbimortalidade de cerca de 1,5%. Assim, os outros exames são preferidos. Para de finir a sequência de exames, é importante classi ficar o paciente conforme o grau de probabilidade clínica de ter TEP. Algumas escalas são propostas, como a de Wells, Pisa e de Genebra. Pacientes com probabilidade alta devem ser antcoagulados enquanto a investgação é realizada; - O método complementar ideal também depende de contraindicações, disponibilidade e experiência local; - Em pacientes com probabilidade baixa ou intermediária, o D-dímero pode ser solicitado (ELISA); se negatvo, exclui o diagnóstco, pois tem alta sensibilidade. Quando posi tvo, indica contnuidade de investgação. Não deve ser utlizado em casos de probabilidade alta; - A angiotomografia tem sido indicada como o melhor exame inicial. Além de poder visualizar o trombo, pode determinar diagnóstcos diferenciais e avaliar disfunção de VD (dilatação de parede). Pode falhar em casos de trombos pequenos e periféricos, e pode ser necessário outro exame em seguida. Sua principal desvantagem é a necessidade de contraste intravenoso;
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PNEUMOLOGIA
CAPÍTULO
11 1. Câncer primário de pulmão O câncer de pulmão é a neoplasia maligna mais frequente (12,3% de todos os casos novos de câncer) e o que ocasiona maior número de óbitos. No Brasil, é a 1ª causa de morte por câncer em homens e a 2ª em mulheres. A faixa etária média é 60 anos, sendo raro antes da 4ª década. Após o diagnós tco, apenas 40% dos pacientes contnuam vivos depois de 1 ano. A sobrevida em 5 anos é de apenas 15%.
Neoplasias pulmonares Rodrigo Antônio Brandão Neto / Fabrício Mar tn s Valois
das à idade de início e ao tempo do tabagismo, ao número de cigarros por dia e o quão profundamente a fumaça é inalada. Deixar de ser fumante reduz dras tcamente o risco de desenvolver câncer de pulmão, em 15 a 20 anos após cessação, apesar de permanecer maior do que em indivíduos não fumantes. b) Charutos e cachimbos Quem fuma charutos ou cachimbos também tem mais riscos de desenvolver câncer. Há uma ligação entre o número de anos que a pessoa fuma, o número de charutos ou cachimbos fumados por dia e o quão profundamente a fumaça é inalada. Mesmo sem inalação, existe o aumento de risco de tumores de cabeça e pescoço entre os usuários de charutos e cachimbos. c) Tabagismo passivo O risco do tabagismo passivo é proporcional ao tempo em que o indivíduo inala o ar com substâncias liberadas pelo cigarro, e ao número de indivíduos no ambiente. Es tma-se que, a cada 3 cigarros fumados por um fumante, o indivíduo que divide o ambiente com ele inala um cigarro inteiro.
Figura 1 - Opacidade com conformação de massa no lobo inferior esquerdo: neoplasia de pulmão
A - Fatores de risco a) Cigarro É o principal fator de risco. Cerca de 90% dos casos de câncer em homens e 80% em mulheres são relacionados ao cigarro. A década de 1990 demonstrou uma queda de casos e de mortes entre homens, com aumento de ambos entre mulheres, implicados, diretamente, no aumento de mulheres tabagistas. Substâncias lesivas, chamadas carcinógenos, presentes no tabaco queimado, lesam as células pulmonares. Com o tempo, as células lesadas podem transformar-se em células tumorais. As chances de aparecimento do câncer estão liga-
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d) Maconha A associação não é tão bem documentada quanto à do cigarro, mas ocorrem lesões no epitélio brônquico. Sabe-se que 3 ou 4 cigarros de maconha equivalem, em média, em termos de material partculado, a 20 cigarros, mas a magnitude de risco ainda não é quan tficada, e, apesar de alguns estudos demonstrarem relação, outros falharam em demonstrar uma associação clara de risco. e) Gás radônio É um gás radioatvo invisível, sem odor ou gosto, emi tdo naturalmente pelo solo e rochas. Pessoas que trabalham em minas podem estar mais expostas, mas existem áreas com maiores índices de radioa tvidade natural. Quando somado a outro fator, como o fumo, pode aumentar ainda mais os riscos. f) Asbestos Ou amianto, são fibras minerais usadas por algumas indústrias. Ao serem inaladas, as par culas de asbestos
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alojam-se nos pulmões sem serem eliminadas, levando à lesão celular e aumento do risco de câncer de pulmão. A exposição prolongada ao asbesto aumenta em 60 a 100 vezes a chance desse câncer. g) Outras exposições A metais (arsênio, cromo, níquel, óxido de ferro) e a carcinógenos industriais (éter clorome tl) também aumentam o risco de câncer. h) Predisposição familiar Apesar de os detalhes ainda não estarem claros, há um forte componente familiar que predispõe a câncer de pulmão. i) Doenças pulmonares crônicas Sarcoidose, doenças que cursam com fibrose pulmonar, tuberculose, doença pulmonar obstru tva crônica etc. j) Câncer de pulmão prévio Mesmo ajustado para covariáveis, pacientes com câncer prévio de pulmão (curados) têm maior risco de um novo câncer.
B - Tipos histológicos Há 4 tpos histológicos do carcinoma broncogênico, que correspondem a mais de 90% das neoplasias malignas primárias do pulmão. a) Adenocarcinoma (de 35 a 40%) Tumor periférico que se origina de glândulas mucosas. A apresentação mais frequente é a lesão distal, com nódulo(s) ou massa(s) de localização periférica. Seu tempo de mul tplicação é mais lento, em torno de 180 dias, e é a neoplasia com menos relação ao tabagismo, mais comum entre mulheres. Um subtpo do adenocarcinoma, denominado de bronquíolo-alveolar (2% dos casos), origina-se do epitélio distal de vias aéreas. Por isso, algumas vezes, ele se dissemina localmente por via intra-alveolar, podendo manifestar-se como um infiltrado periférico (além do clássico nódulo ou massa periférica). b) Carcinoma de células escamosas (de 25 a 30%) Tumor tpicamente central, que se origina do epitélio brônquico; tpicamente, o tumor é localizado centralmente, formando uma massa endobrônquica séssil ou pediculada. Esse tpo histológico mais comumente se manifesta com hemoptse. O tumor dissemina-se localmente e pode causar adenopata hilar ou mediastnal (radiografia mostrando aumento de medias tno). É o tpo histológico que mais cursa com hipercalcemia e necrose tumoral central (cavitação). Há duplicação, em média, a cada 90 dias.
c) Carcinoma de pequenas células (de 15 a 20%) Tumor central é o que tem maior relação com tabagismo e é altamente maligno, com alta taxa de proliferação. Dissemina-se localmente, ocasionando estreitamento brônquico, atelectasias, aumento de mediastno (adenopata hilar e mediastnal) e tem a capacidade de cursar com síndromes paraneoplásicas, as mais variadas possíveis. A neoplasia apresenta crescimento rápido com tempo de duplicação de, aproximadamente, 30 dias. d) Carcinoma de grandes células (de 5 a 10%) Tumor periférico designa um grupo rela tvamente heterogêneo de tumores pouco diferenciados (células grandes e que não preenchem critérios para os outros tpos histológicos). Costuma ser um tumor altamente prolifera tvo, com curso clínico agressivo.
C - Achados clínicos Cerca de 75 a 90% dos pacientes manifestam sintomas ao diagnóstco. Acredita-se que, na fase sintomá tca, o tumor já tenha percorrido 2/3 de sua vida. Alguns fatores estão relacionados à chance e ao tpo de manifestação clínica: -
Tipo de tumor ( tpo histológico);
-
Localização do tumor primário;
-
Produção de síndromes paraneoplásicas;
-
Sinais e sintomas relacionados a metástases.
Em linhas gerais, deve sugerir câncer de pulmão a presença dos seguintes achados: -
Tosse (de 45 a 75% dos casos);
-
Dispneia (de 35 a 50% dos pacientes);
-
Hemoptse (de 25 a 55% dos casos);
-
Perda de peso;
-
Dor torácica ou em ombros;
-
Rouquidão.
Perda de peso, anorexia e adinamia acontecem em 55 a 88% dos doentes. Até 60% têm nova tosse ou piora do padrão de tosse crônica, e até 1/3 pode manifestar hemop tse (de 3 a 31%). Dor torácica ocorre em 25 a 40%. Também podem ocorrer alterações da fisiologia torácica: dispneia, taquipneia, rouquidão (comprome tmento do nervo laríngeo recorrente) são rela tvamente comuns. Existem algumas síndromes associadas a efeitos locais do tumor: atelectasia (Figura 2), derrame pleural, síndrome de Claude-Bernard-Horner, síndrome de Pancoast e síndrome da veia cava superior.
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PNEUMOLOGIA envolvidos têm resposta variável a modalidades terapêu tcas) e definir o melhor tratamento. Entretanto, em casos de estgmas de obstrução de vias aéreas centrais, com desconforto respiratório evidente, a conduta con tnua a ser radioterapia e cor tcosteroide de imediato (linfoma e carcinoma de células pequenas costumam ter boa resposta). O tumor pode disseminar-se localmente, ocasionando invasão óssea, dor neuropá tca ou manifestações a distância. Assim, os pacientes podem manifestar: - Dor no hipocôndrio direito, icterícia (metástase hepátca); - Cefaleia, vômitos, confusão, convulsões, dé ficits localizatórios (metástase no sistema nervoso central; mais comum com o adenocarcinoma).
D - Síndromes paraneoplásicas
Figura 2 - Atelectasia do pulmão direito: notar desvio da traqueia para o mesmo lado da lesão (seta)
a) Síndrome de Claude-Bernard-Horner (ou síndrome de Horner) Caracteriza-se por miose, eno almia, ptose palpebral e anidrose facial ipsilateral, sinais de denervação simpá tca, que ocorrem por compressão do simpá tco cervical por lesão tumoral localizada no ápice do pulmão, conhecida como tumor de Pancoast (antes chamado tumor do sulco superior, por originar-se no sulco anatômico na super f cie pulmonar por passagem da artéria subclávia). b) Síndrome de Pancoast Caracteriza-se por dor no ombro e membro superior, com sensações parestésicas e dor local, gerados por compressão do plexo braquial. Por vezes, ocorre associada à síndrome de Horner, já que as estruturas nervosas acome tdas nas 2 síndromes têm proximidade regional. c) Síndrome de veia cava superior Caracteriza-se por edema da face e membros superiores, pletora facial, ingurgitamento das veias cervicais, circulação colateral no tronco superior, acrescidos de dispneia e tosse, que pioram com o decúbito dorsal ou ao inclinar o corpo para frente; em alguns casos pode haver estridor. É ocasionada por obstrução ao fluxo sanguíneo venoso na veia cava, em mais de 90% dos casos de e tologia tumoral (neoplasia de pulmão e linfoma); outras causas são mediastnite fibrosante, tuberculose e histoplasmose. Os tumores de pulmão mais associados são aqueles com predileção por áreas centrais do parênquima: carcinoma de células pequenas e carcinoma epidermoide. An tgamente, era considerada uma emergência oncológica, com tratamento imediato com radioterapia e cor tcosteroides; hoje, a conduta preferida é investgar a etologia da síndrome (em alguns casos, pode não ser neoplásica, e os diferentes tpos histológicos
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Correspondem a manifestações clínicas associadas ao tumor, mas por efeito a distância, não por proximidade. São inúmeras, e, ainda hoje, algumas não são completamente conhecidas (Tabela 1). Ocorrem em cerca de 10 a 20% dos doentes, mais comuns com o tpo histológico de pequenas células. Podem preceder e ocorrer durante ou somente após o diagnós tco. Não necessariamente, a presença delas indica doença metastátca. Cerca de 15% dos tumores de pequenas células manifestam secreção inapropriada de ADH, e em torno de 10% dos tumores de células escamosas desenvolvem hipercalcemia. Outras paraneoplasias são anemia, síndrome de Cushing (hipercor tsolismo), hipercoagulabilidade, neuropata periférica e síndrome miastênica de Eaton-Lambert. Ginecomasta é mais comum com o tpo histológico de grandes células, e osteoartropa ta hipertrófica (associação de baqueteamento digital e reação periosteal em ossos longos – Figura 3) ocorre com todos os tpos, mas raramente com os de pequenas células.
Figura 3 - Paciente com baqueteamento digital e unhas “em vidro de relógio”
A maioria das síndromes paraneoplásicas metabólicas ou neurológicas é associada, principalmente, ao carcinoma de pulmão de células pequenas; uma exceção clássica é feita à hipercalcemia (mais comum no carcinoma epidermoide) e osteoartropa ta hipertrófica e ginecomasta (mais comum com adenocarcinoma).
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O adenocarcinoma de pulmão pode apresentar-se com endocardite marântca ou verrucosa, similar à que acontece entre pacientes com lúpus eritematoso sistêmico. Em boa parte das síndromes paraneoplásicas, o tratamento do tumor promove o alívio de seus sinais e sintomas. Tabela 1 - Síndromes paraneoplásicas associadas a neoplasias de pulmão Sistêmicas - Febre; - Anorexia; - Dermatopolimiosite; - Lúpus eritematoso sistêmico; - Endocardite marântca. Cutâneas - Acantose nigricans; - Ictose adquirida; - Acroqueratose; - Prurido; - Síndrome de Sweet; - Sinal de Leser-Trelat; - Pênfigo vulgar. Hematológicas - Anemia ou policitemia; - Hipercoagulabilidade; - Púrpura trombocitopênica; - Eosinofilia. Endocrinológicas - Síndrome de Cushing; - Hipercalcemia; - Hiponatremia; - Hiperglicemia ou hipoglicemia; - Ginecomasta; - Acromegalia; - Hipertreoidismo; - Hipouricemia; - Acidose látca.
(mas tem alta especificidade), tendo maior posi tvidade com tumores centrais; - Se houver derrame pleural, deve ser feita uma toracocentese. Apesar de a pesquisa de células oncó tcas ser raramente positva, sempre deve ser solicitada, pois quando positvo abrevia o diagnós tco; - Na presença de gânglio patológico, especialmente se supraclavicular, indica imediata análise histológica (punção com agulha fina ou biópsia). No momento, marcadores séricos para câncer de pulmão não são sensíveis nem especí ficos. A espirometria deve ser realizada em pacientes com sinais ou sintomas de DPOC e como exame complementar antes de uma eventual cirurgia cura tva. Em geral, indivíduos em bom estado, com VEF1 >2L, têm baixo risco de complicações para lobectomia ou mesmo pneumectomia. Caso o doente tenha um VEF1 <2L, deve-se calcular o VEF1 predito para o pós-operatório. Esse valor é calculado por meio do VEF1 pré-operatório e da porcentagem de parênquima ressecado. Caso a estmatva seja de um VEF1 >800mL (ou >40% do predito), a cirurgia tem baixas taxas de complicações. Doentes de alto risco são iden tficados com um VEF1 <700mL (ou menor que 40% do predito). A estes e àqueles com achados intermediários, são indicados testes ergoespirométricos. Um consumo de oxigênio acima de 20mL/ kg/min identfica doentes com risco aceitável; caso seja <10mL/kg/min, são de al ssimo risco cirúrgico. O interessante é que hipoxemia e/ou hipercapnia não são preditores independentes de prognós tcos. a) Broncoscopia Permite a visualização direta da árvore brônquica e a realização de biópsia. Em tumores de grandes vias aéreas, a sensibilidade pode chegar a 90%. Entretanto, em lesões de pequenas vias aéreas, a sensibilidade pode cair para 10%. Algumas técnicas recentes são promissoras (broncoscopia com fluorescência para detecção de lesões muito pequenas; ultrassonografia endoscópica que permite biópsias com precisão de lesões peribrônquicas). b) Biópsia transtorácica
Neurológicas - Neuropata periférica; - Síndrome miastênica de Eaton-Lambert; - Miastenia gravis; - Mielopata necrosante.
E - Exames complementares A confirmação do diagnós tco de neoplasia de pulmão é feita através da análise histológica. Entretanto, nem sempre o parênquima pulmonar necessita ser acessado: - Análise do escarro pode ser ú tl para diagnós tcos diferenciais (como tuberculose) e para a pesquisa de células neoplásicas. Infelizmente, a sensibilidade é baixa
A punção aspiratva com agulha por via transtorácica tem uma sensibilidade de 50 a 97%, dependendo do operador (médico que faz o procedimento) e da localização da lesão. c) Toracotomia ou toracoscopia Podem ser necessárias quando exames menos invasivos não conseguem estabelecer um diagnós tco. d) Exames de imagem Mais de 90% dos pacientes com câncer de pulmão têm anormalidades radiológicas. Em geral, a tomografia de tórax permite avaliação adicional (gânglios, outras lesões concomitantes, localização e tamanho do tumor), embora raramente seja especí fica para o diagnós tco.
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PNEUMOLOGIA F - Exames especiais: estadiamento Para propósito de estadiamento, os tumores de pulmão são classificados como Tumores de Pequenas Células (TPC) e Tumores Não Pequenas Células (TNPC), que compreendem o escamoso, as grandes células e o adenocarcinoma. A classificação torna prátca a divisão de um tumor com alta capacidade de disseminação hematológica, raramente capaz de ser abordado cirurgicamente e com tempo de sobrevida sem tratamento de 6 a 18 semanas. Os TNPCs têm evolução não tão explosiva. Podem ser curados cirurgicamente (PPC), dos demais. O estadiamento visa fornecer ao médico informações sobre o prognós tco, o planejamento terapêu tco e a padronização para fins de estudos clínicos (possibilitar a comparação de resultados novos). Nesse sentdo, são importantes 2 princípios gerais: - Quanto mais disseminado o tumor, pior o prognós tco; - Em geral, cirurgia é a possibilidade de cura.
classificação (Tabelas 2, 3 e 4). Existe uma proposta nova de classificação, com algumas mudanças em relação à classicamente empregada; entretanto, ainda não foi completamente incorporada à prátca clínica, sendo as condutas ainda baseadas na classificação antga. A maioria dos doentes com estadio I ou II pode ser curada cirurgicamente. Em geral, estadios IIIB e IV não se beneficiam de cirurgia. E doentes com estadio IIIA têm disseminação local e, ocasionalmente, podem bene ficiar-se de cirurgia. Em resumo, pacientes que tenham estadiamento com T4, ou N3 ou M1 não são candidatos à cirurgia. Tabela 2 - Estadiamento do câncer de pulmão não pequenas células – TNM Caracterís tcas do tumor TX
- Tumor primário não pode ser avaliado.
T0
- Tumor primário não é encontrado.
Tis
- Carcinoma in situ.
T1
- Tumor <3cm e sem invasão tumoral de estruturas ad jacentes (descritas em T2, T3 e T4). T1a – tumor ≤2cm T1b – tumor >2cm e ≤3cm.
T2
- Tumor >3cm e ≤7cm, com 1 dos seguintes: · Envolve brônquio principal, ≥2cm da carina; · Invade pleura visceral; · Associada à atelectasia ou pneumonite obstru tva segmentar. - T2a – Tumor >3cm e ≤5cm; - T2b – Tumor >5cm e ≤7cm.
Figura 4 - Imagem de TC (corte em janela de pulmão) da massa pulmonar direita
T3
T4
- Tumor maior que 7cm, ou com 1 dos seguintes: · Invade qualquer dos seguintes: parede torácica, diafragma, nervo frênico, pleura medias tnal, pericárdio parietal, envolve brônquio principal a menos de 2cm da Carina (sem comprome tmento da Carina); · Atelectasia ou pneumonite obstru tva de todo o pulmão; · Nódulos pulmonares no mesmo lobo. - Qualquer tamanho, mas com invasão de medias tno, coração, grandes vasos, nervo laríngeo recorrente, traqueia, esôfago, corpos vertebrais ou carina; - Nódulo tumoral satélite dentro do lobo ipsilateral ao tumor primário.
Tabela 3 - Estadiamento do câncer de pulmão não células pequenas – TNM Caracterís tcas dos linfonodos
Figura 5 - Imagem de TC (corte em janela de mediast no) da massa pulmonar direita
NX
- Linfonodos regionais não podem ser avaliados.
N0
- Nenhum linfonodo detectável acome tdo.
N1
- Acometmento de linfonodos peribrônquicos e/ou hilar ipsilateral.
N2
- Acometmento de linfonodos mediastnais ipsilaterais e/ou subcarinais.
a) Estadiamento do tumor não pequenas células O estadiamento é feito pelo TNM. Nesse sen tdo, a descrição do tumor (tamanho, localização), linfonodos acometdos (local) e metástases (presentes ou não) formam a
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- Acometmento de linfonodos mediastnais contralaterais; N3
- Hilares contralaterais; - Supraclaviculares ou escaleno ipsilateral ou contralateral.
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Avaliação de metástases MX
- Não é possível avaliar presença de metástases.
M0
- Nenhuma metástase distante detectada.
M1
- Metástase presente. · M1a: nódulo pulmonar contralateral ou derrame pleural ou pericárdico; · M1b: metástase a distância.
Tabela 4 - Estadiamento do câncer de pulmão não pequenas células – TNM T1
T2
Tabela 6 - Escala de Karnofsky Pontuação
Definição
100
Paciente sem limitações
T3
T4
M1
90
Desempenha atvidades com limitação mínima
IIA
IIB
IIIA
IV
80
IIA
IIB
IIIA
IIIA
IV
Sinais e sintomas maiores; realiza a tvidades com esforço
IIIA
IIIA
IIIA
IIIA
IIIB
IV
70
Cuida de si mesmo; é incapaz de trabalhar
IIIB
IIIB
IIIB
IIIB
IIIB
IIIB
IV
60
Precisa de assistência ocasional; é capaz de trabalhar
IV
IV
IV
IV
IV
IV
-
50
Necessita de assistência e cuidados médicos frequentes
40
Precisa de cuidados médicos especiais
30
Muito incapacitado, com necessidade de hospitalização. Sem morte iminente
20
Muito doente, necessita de suporte
10
Morte iminente
0
Morte
T1a
T1b
T2a
T2b
N0
IA
IA
IB
N1
IIA
IIA
N2
IIIA
N3 M1
b) Estadiamento do tumor de pequenas células Classicamente, o TNM não é u tlizado. O estadiamento é feito da seguinte maneira: - Doença limitada (30% dos pacientes): tumor limitado a um hemitórax, podendo incluir linfonodos medias tnais e supraclaviculares ipsilaterais, derrame pleural e obstrução da veia cava superior; -
principalmente, do estado geral do paciente. Independente de a modalidade escolhida ser cirurgia, quimioterapia ou radioterapia, o paciente necessita ter condições clínicas mínimas para que possa ser subme tdo ao tratamento. Existem várias escalas propostas para avaliar o estado f sico global do indivíduo, e uma das mais u tlizadas é a escala de Karnofsky (Tabela 6).
Doença extensa (70% dos pacientes): o tumor estende-se além de um hemitórax; inclui derrame pericárdico.
c) Exames para estadiamento Os exames podem ser guiados pela história e pelo exame f sico (exemplos: linfonodos palpáveis, alterações de pele sugestvas de metástases etc.), mas, também, seguindo protocolos (Tabela 5). Tabela 5 - Exames complementares para estadiamento Exames recomendados a todos os pacientes - Hemograma, função renal, sódio, potássio, cálcio, fosfatase alcalina, albumina, ALT, AST, bilirrubinas; - Radiografia de tórax; - Tomografia de tórax com contraste (com cortes até adrenais); - Diagnóstco patológico do câncer; - TC ou RNM de crânio; - Cintlografia óssea ou PET-Scan.
G - Exames especiais: screening Não há, até hoje, recomendação para screening de neoplasias pulmonares em indivíduos assintomá tcos, independentemente dos fatores de risco que existam.
H - Tratamento O tratamento depende de vários fatores, incluindo o tpo de tumor, o tamanho, a localização, a extensão do tumor e,
Muitos tratamentos diferentes e combinações de tratamentos podem ser usados para o controle do câncer de pulmão e/ou a melhora da qualidade de vida, com a redução dos sintomas. Os princípios do tratamento são: - Cirurgia: permite a remoção do tumor e é a melhor opção para os casos iniciais. O tpo de cirurgia depende da localização do tumor no pulmão. Alguns tumores são inoperáveis, devido ao tamanho ou à localização, e alguns pacientes podem não ter condições f sicas de suportar uma cirurgia de grande porte; - Ressecção segmentar (ou segmentectomia): re tra-se uma pequena parte do pulmão; - Lobectomia: retrada de um lobo inteiro do pulmão; - Pneumectomia: retrada de um pulmão inteiro; - Quimioterapia: mesmo que o tumor tenha sido ressecado, algumas células tumorais podem ter permanecido em áreas próximas ou mesmo já terem caído na circulação sanguínea (quimioterapia adjuvante). A quimioterapia também pode ser usada para reduzir o tamanho do tumor e permi tr que possa ser feita cirurgia (quimioterapia neoadjuvante). Quando é feita para controlar o tamanho do tumor ou para aliviar os sintomas, é chamada de quimioterapia palia tva. Novas medicações parecem estar associadas à melhora de prognóstco. Dois estudos compararam esquemas com paclitaxel e carbopla tna com ou sem o bevacizumabe, um antcorpo inibidor do fator humano vascular endotelial de crescimento, com aumento de sobrevida, em média, de 2 a 3 meses. Tal tratamento ainda não é recomendado pela literatura;
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Radioterapia: envolve o uso de raios de alta energia para matar as células tumorais. É direcionada para uma área limitada e afeta as células tumorais somente dessa área.
A radioterapia pode ser realizada antes da cirurgia para tentar reduzir o tamanho do tumor, ou depois, para destruir alguma célula tumoral que, eventualmente, tenha permanecido na área. Muitas vezes, é combinada com a quimioterapia sem cirurgia como tratamento principal contra o câncer de pulmão. Pode ser usada para diminuir sintomas como dispneia, atelectasias, metástases ósseas etc. a) Tumor não pequenas células É improvável haver cura sem cirurgia. Por isso, toda a avaliação clínica e com exames complementares visa selecionar os indivíduos que terão bene f cio com a cirurgia. Em geral, pode-se generalizar: - Estadio I ou II: cirurgia deverá ser indicada (se as condições clínicas permi trem), sendo a lobectomia o procedimento recomendado; quimioterapia adjuvante deve ser ofertada após a ressecção. Se houver comprometmento das margens da lesão, recomenda-se radioterapia; - Estadio IIIA: cirurgia deve ser considerada naqueles que tnham, por exemplo, o estadiamento II e iden tficou-se envolvimento linfonodal N2 no intraoperatório. Entretanto, terapias adjuvantes são necessárias (quimioterapia e radioterapia); - Estadio IIIB: quimioterapia e radioterapia são indicadas, pois melhoram a sobrevida. Alguns doentes selecionados podem bene ficiar-se, adicionalmente, com cirurgia. Devem ter excelente resposta inicial e um tumor passível de ressecção após terapia inicial; - Estadio IV: tratamento palia tvo; é possível haver benef cio de cirurgia quando a metástase representar um nódulo satélite em outro lobo, no mesmo pulmão. - Doença avançada (IIIB e IV) O tratamento é paliatvo na maioria das vezes, e depende muito das condições clínicas do paciente. Caso o doente não esteja em estado geral ruim (Karnofsky >60), indica-se esquema com vários quimioterápicos que incluam cispla tna, o qual melhora a sobrevida (ganho de 6 semanas a 1 ano). b) Tumor de células pequenas A resposta à quimioterapia é excelente: de 80 a 100% em pacientes com doença limitada (com 50 a 70% mostrando resposta completa) e de 60 a 80% com doença extensa (de 15 a 40% de resposta completa). Entretanto, remissões são comuns (em média de 6 a 8 meses), e a sobrevida, após recidiva, é de 3 a 4 meses. A sobrevida global em 2 anos é de 20% em doença limitada e de 5% em doença extensa. Radioterapia (associada à quimioterapia) só tem indicação a pacientes com doença limitada.
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A radiação pro filátca do SNC é controversa e não melhora a sobrevida. Alguns autores a indicam para doentes com doença limitada e resposta completa à quimioterapia.
I - Prognóstco Conforme ressaltado, a sobrevida global do câncer de pulmão é de apenas 15% em 5 anos, o que se deve ao fato de a maioria dos doentes manifestar doença avançada ao diagnóstco. O ponto mais relevante na de finição do prognóstco é o estágio da doença ao ser realizado o diagnós tco. Infelizmente, nenhuma medida de rastreamento se mostrou efetva. Entretanto, não fumar ou cessar o tabagismo é a medida mais ú tl para a prevenção do câncer de pulmão.
2. Metástase pulmonar Qualquer tumor maligno pode metastatzar para o pulmão, tanto por invasão direta como por extensão linfá tca ou vascular (Figura 6). Raramente, a metástase pulmonar é oriunda de embolização arterial (hipernefroma, coriocarcinoma, hepatocarcinoma, por exemplo). Em par tcular, denomina-se linfangite carcinomatosa quando há envolvimento difuso da rede linfátca pulmonar. Nesse caso, tanto pode ocorrer com tumores primários de pulmão quanto devido a tumores metastátcos (câncer de mama, por exemplo). Em estudos de autópsia, cerca de 20 a 55% dos pacientes que morreram de câncer apresentaram achados de metástases parenquimatosas de pulmão. Na maioria dos pacientes, é feito o diagnós tco do câncer de base, e, posteriormente, surgem metástases pulmonares. Todavia, a apresentação inicial pode ser de sinais e sintomas pulmonares (tosse, dispneia, hemop tse, cianose etc.), com radiografia mostrando múltplos nódulos pulmonares periféricos. Nesses casos, o diagnós tco diferencial inclui malformações arteriovenosas pulmonares, esta filococcemia, infecções granulomatosas, sarcoidose, vasculite reumatoide e granulomatose de Wegener.
Figura 6 - Opacidades nodulares de tamanhos variados, com predomínio em lobos inferiores, achado clássico de lesões metastát cas
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A - Abordagem O diagnóstco do câncer primário pode já ter sido realizado e ser sugerido pelo quadro clínico (exemplos: aumento dos tes culos, nódulo na mama etc.), o qual deve guiar a investgação, ou pode não ser claramente evidente. Nesse últmo grupo, devem-se buscar tumores passíveis de tratamento (treoide, próstata, mama, tes culo etc.). O achado radiológico mais pico é a presença de múl tplos nódulos, periféricos, em campos pulmonares inferiores e menores que 5cm. Cavitação sugere câncer primário de pulmão (células escamosas), enquanto calci ficações sugerem osteossarcoma.
B - Tratamento Em geral, deve-se tratar a doença de base e, quando isso não é possível, fornecer cuidados palia tvos. Quando a tomografia mostra poucos nódulos, a ressecção cirúrgica é fac vel; se o paciente tem regular ou bom estado geral, se não há outros locais de metástases (exemplos: osso, f gado etc.) e se o câncer de base está controlado, indica-se a re trada cirúrgica das metástases. Nesse caso, em média, a taxa global de sobrevida em 5 anos é de 20 a 35%. Em algumas situações, a ressecção cirúrgica de metástase pulmonar é rela tvamente contraindicada: - Câncer de base e melanoma; - Necessidade de pneumectomia; - Envolvimento pleural; - Baixa reserva cardíaca e pulmonar.
3. Nódulo pulmonar solitário É definido como lesão <3cm de diâmetro à radiogra fia de tórax, com pulmão normal circundando e na ausência de infiltrados, de atelectasia ou de linfonodomegalia. Na grande maioria das vezes, ocorre em indivíduos assintomá tcos, representando um achado radiológico. A grande importância do achado é a possibilidade de malignidade como a causa do nódulo e o seu bom prognóstco com o tratamento cirúrgico.
A Tabela 7 relaciona as principais e tologias das lesões ditas benignas.
A - Diagnóstco diferencial Em princípio, o manejo ideal deve ser iden tficar e ressecar tumores malignos e evitar procedimentos invasivos em doença benigna. O termo benignidade associado aos nódulos pulmonares não se reveste de ausência de necessidade de tratamento, pois apenas denota ausência de neoplasia maligna, podendo representar doenças graves e fatais, como a granulomatose de Wegener. O 1º passo é buscar elementos que aumentem (ou diminuam), de forma signi ficatva, a probabilidade de câncer (Tabela 8). Os principais são: Tabela 7 - E to logias ditas benignas de nódulo pulmonar - Granuloma: tuberculose, histoplasmose; - Embolia séptca; - Neoplasia benigna: hamartoma, lipoma; - Malformação arteriovenosa; - Cisto broncogênico; - Pseudotumor in flamatório; - Granulomatose de Wegener; - Artrite reumatoide; - Linfonodo intraparenquimatoso; - Infarto pulmonar; - Atelectasia redonda.
a) Sinais e sintomas Pratcamente não ajudam, pois a grande maioria dos indivíduos é assintomátca. b) Idade Quando menor do que 30 anos, em geral, indica benignidade. O risco de câncer aumenta após os 30 anos, e, quanto maior a idade, maior a chance de tumor maligno. c) Tabagismo Aumenta a chance de câncer de forma proporcional ao tamanho da exposição (número de cigarros fumados por dia x tempo). d) História prévia de câncer Aumenta a chance de o nódulo ser maligno. e) Radiografia de tórax Muito útl, especialmente se há radiografias prévias. f) Quanto ao tamanho Mais bem avaliado por tomografia. Um estudo recente mostrou uma relação direta entre o tamanho do nódulo e a chance de câncer: nódulos menores que 5mm têm 1% de chance de serem malignos; os maiores que 2cm, 80%.
Figura 7 - Nódulo pulmonar periférico em tomogra fi a de tórax, periférico, com calci fi cação “em pipoca”, característ co de hamartoma
g) Quanto à velocidade de duplicação Lesões que dupliquem de tamanho em menos de 30 dias ou mais de 1,5 anos sugerem e tologia benigna; caso contrário, a probabilidade de malignidade é maior.
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PNEUMOLOGIA h) Margens Quando lisas, muito bem de finidas, sugerem nódulo benigno. Margens lobuladas ou não tão bem de finidas indicam câncer. i) Cálcio Lesões benignas apresentam calci ficação densa, central ou laminada. Nódulos malignos tendem a ter calci ficação esparsa, tpicamente excêntrica ou pon tlhada (Figuras 8 e 9). j) Número de nódulos A presença de 2 ou mais nódulos em exame de imagem associa-se à presença de malignidade em mais de 70% dos casos. k) Cavitação Em associação à parede espessa (>1,6cm), são, mais provavelmente, malignas. l) Tomografia de tórax de alta resolução (TCAR) Indicada à maioria dos doentes com nódulo pulmonar solitário. Todos os elementos que sugerem malignidade (ou benignidade) são muito mais bem avaliados pela tomografia do que pela radiogra fia simples de tórax. Além disso, a tomografia poderá revelar: - Múltplas lesões; -
Detalhes do medias tno e vias aéreas centrais;
-
Detectar linfonodomegalias;
-
Análise do nódulo após contraste: lesões malignas são mais vascularizadas. Por isso, nódulos malignos são mais densos após contraste intravenoso.
m) Tomografia com emissão de pósitrons (PET) Infelizmente, limitada pelo alto custo e de pouquíssima disponibilidade no Brasil. Entretanto, em indivíduos com TCAR inconclusiva, a PET (tomografia por emissão de pósitrons) está indicada e mostra uma sensibilidade de 85 a 97% e especi ficidade de 70 a 85% para o diagnós tco de câncer.
Figura 9 - Padrões de calci fi cação mais associados a lesões malignas Tabela 8 - Probabilidade de câncer Probabilidade de câncer
Variáveis
Baixa
Intermediária
Alta
Diâmetro
<1,5cm
1,5 a 2,2cm
>2,2cm
Idade
<30
30 a 60
>60
Tabagismo atual
Nunca fumou
≤20 cigarros
>20 cigarros ao dia
Tabagismo prévio
Parou >7 anos Parou <7 anos atrás atrás
ao dia
Bordas não Caracterís t- Bordas lisas e tão bem ca do nódulo bem definidas definidas
Calcificação excêntrica ou pontlhada
B - Manejo de paciente com lesão nodular O exame mais relevante na avaliação de paciente com nódulo pulmonar é a avaliação radiológica (radiogra fia ou tomografia de tórax prévia), principalmente dos úl tmos 2 anos. A presença de lesão com as mesmas característcas há 2 anos é altamente suges tva de benignidade. Na prátca, podem-se delinear 2 grandes grupos, como evidencia a Tabela 9. Tabela 9 - Grupos de risco de câncer de pulmão Grupo 1 Risco de câncer muito baixo (<8%): menos de 30 anos, nódulo estável durante 2 anos, caracterís tca e calcificação não indicatvos de câncer. Nesse caso, recomendam-se radiogra fias periódicas para garantr que o nódulo não irá crescer (radiogra fias de 3/3 meses no 1º ano e de 6/6 meses no 2º ano). Grupo 2 Existe risco de câncer, e devem-se avaliar bene f cios e malef cios de procedimentos invasivos. Indivíduos com alta chance de câncer devido aos fatores clínicos (idade, tabagismo etc.) ou radiológicos devem ser estadiados, e deve ser realizada a ressecção cirúrgica, se indicada (em geral, lobectomia com análise dos linfonodos).
Figura 8 - Padrões de calci fi cação mais associados a lesões benignas
100
Entretanto, uma grande parte dos doentes estará em um grupo não claramente benigno e não obviamente maligno. Nesse caso, existem algumas opções diagnós tcas e terapêutcas, com vantagens e desvantagens.
NEOPLASIAS PULMONARES
a) Citologia oncótca do escarro Com baixa sensibilidade, embora com alta especi ficidade, é raramente ú tl. Técnicas recentes com an tcorpos monoclonais estão em estudo e ainda não estão disponíveis de rotna.
- Síndromes paraneoplásicas são comuns em neoplasia de pulmão, geralmente mais associadas ao carcinoma de células pequenas; fora desse padrão estão a osteoartropata hipertrófica (que tem o baqueteamento digital como manifestação), mais comum no adenocarcinoma, e hipercalcemia, mais comum no epidermoide;
b) Broncoscopia com biópsia Raramente é ú tl e depende muito do tamanho do nódulo e da sua localização (quanto mais distal, pior a acurácia do exame). Por isso, estudos com broncoscopia mostram resultados tão variados (10 a 80% de detecção de câncer).
- O estadiamento é feito com base em caracterís tcas do tumor (T), linfonodos (N) e metástase (M); o envolvimento pleural e de linfonodos deve ser confirmado por análise histológica;
c) Biópsia aspira tva transtorácica Infelizmente, os resultados são dependentes do médico que faz o procedimento (operador-dependente), da localização e do tamanho do nódulo. O rendimento diagnós tco pode ser de 50 a 97%, com taxas de complicações que podem chegar a 30%. Em até 25 a 30% dos doentes, o resultado é falso nega tvo. d) Videotoracoscopia Dentre os citados, é o método mais agressivo para o diagnóstco, bem mais invasivo que broncoscopia e BATT; entretanto, quando comparado com a toracotomia, apresenta menor tempo de estadia hospitalar, recuperação pós-operatória mais breve, com menor incidência de dor e retorno mais precoce. Por isso, a maioria dos grandes centros tem recomendado a videotoracoscopia como procedimento de escolha para nódulos com probabilidade intermediária de câncer. Durante esse método, uma análise preliminar do material (biópsia com congelamento) poderá determinar se há a necessidade de lobectomia com análise ganglionar (se a análise preliminar intraoperatória mostrar malignidade) ou não (benigno).
- O único tratamento cura tvo para as neoplasias pulmonares é a cirurgia; a possibilidade de tratamento depende do estadio e das condições clínicas do paciente: tumores em estadio IIIB e IV são ditos inoperáveis, com tratamento palia tvo sugerido; - A presença de 2 ou mais nódulos no parênquima pulmonar denota neoplasia em mais de 70% dos casos; - Os nódulos pulmonares solitários são lesões com <3cm de diâmetro à radiografia de tórax, com pulmão normal circundando e na ausência de infiltrados, atelectasia ou linfonodomegalia; - A abordagem do paciente com nódulo pulmonar solitário depende da estmatva de risco de neoplasia; - O exame mais importante na avaliação do nódulo pulmonar é exame de imagem prévio, realizado nos úl tmos 2 a 3 anos. Os nódulos malignos tendem a duplicar de tamanho entre 30 dias e 1,5 anos; - As principais caracterís tcas de malignidade de nódulo são hábito de fumar, tamanho superior a 2cm, bordas espiculadas, calcificação excêntrica.
4. Resumo Quadro-resumo - A neoplasia de pulmão é a mais frequente em todo o mundo; no Brasil, é aquela com maior mortalidade no sexo masculino e a 2ª no feminino; - O principal fator de risco para neoplasia de pulmão é o tabagismo, independente do tpo histológico (relação maior com o carcinoma de células pequenas e menor com o adenocarcinoma); - Os principais tpos histológicos, em ordem de prevalência, são adenocarcinoma, carcinoma epidermoide, carcinoma de células pequenas, carcinoma de células grandes. O adenocarcinoma e o de células grandes são considerados tumores periféricos; o epidermoide e células pequenas, centrais; - Queixas como dispneia, tosse e perda ponderal surgem geralmente quando a neoplasia está em fase um tanto avançada; síndromes por efeito direto do tumor são comuns: síndrome de Horner (miose, enoalmia, ptose palpebral, anidrose ipsilateral), síndrome de Pancoast (parestesia em membro superior, com dor e fraqueza muscular associada) e síndrome de compressão de veia cava superior;
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PNEUMOLOGIA
CAPÍTULO
12 1. Introdução A radiografia de tórax, ainda hoje, é o principal método de imagem u tlizado na Pneumologia, por ter baixo custo e grande disponibilidade. Tem limitações quando comparada a métodos como a tomogra fia computadorizada, mas, em número considerável de casos, pode-se prescindir de exames mais sofistcados com a interpretação adequada desse exame. Como método simples e muito disponível, por vezes é utlizada de forma equivocada. O Colégio Americano de Radiologia enumera indicações de realização da radiogra fia de tórax, bem como situações em que ela é desnecessária (Tabelas 1 e 2).
Radiografia de tórax Fabrício Mar tn s Valois
As incidências radiográ ficas mais utlizadas no estudo das doenças torácicas são a posteroanterior (PA) e o per fil (Figuras 1, 2 e 3). A análise das 2 incidências em conjunto permite a visualização completa de todos os seguimentos pulmonares e uma avaliação tridimensional. A incidência PA tem preferência em relação à AP, pelo fato de o coração e os vasos da base terem posição mais anterior: quanto mais próximos da fonte de raio x (como na projeção AP), maior sua sombra no filme, bem como sua deformação, ocultando parte do parênquima pulmonar e gerando falsa impressão de aumento do índice cardiotorácico, limitando a análise.
Tabela 1 - Indicações de realização de radiogra fi a de tórax
- Sintomas ou sinais relatvos ao sistema cardiopulmonar; - Seguimento de doença torácica; - Estadiamento de neoplasias intra ou extratorácicas; - Avaliação pré-operatória de qualquer cirurgia torácica; - Avaliação p ré-operatória de pacientes com sintomas cardiopulmonares; - Acompanhamento de dispositvos implantados (tubo orotraqueal, dreno de tórax etc.). Tabela 2 - Situações em que a radiogra fi a de tórax é desnecessária
- Screening populacional de doenças torácicas; - Exame de rotna para admissão hospitalar; - Exame admissional (a depender da exposição ocupacional); - Rotna pré-natal em pacientes sem es tgmas de doença torácica; - Repetção de exame durante internação prolongada, sem novos sinais ou sintomas.
2. Incidências radiográficas Estas se referem à postura do paciente em relação à ampola de raio x: na anteroposterior (AP), o paciente fica de frente para a ampola, com o dorso voltado ao filme; no perfil, um dos hemitórax (habitualmente o esquerdo) é voltado à fonte de raio x, e o lado oposto direcionado ao filme (Figura 1).
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Figura 1 - Incidências radiográ fi cas: (A) posteroanterior – PA; (B) per fi l; (C) ápico-lordó t ca; (D) anteroposterior – AP e (E) decúbito lateral com raios horizontais – Laurell
RADIOGRAFIA DE TÓRAX
Figura 4 - Radiogra fi a de tórax em AP de paciente em UTI: (T) tubo orotraqueal; (S) sonda enteral; (C) cateter venoso profundo e (E) eletrodo de monitorização
Figura 2 - Radiogra fi a em PA: (T) traqueia; (C) clavícula; (E) escápula; (Diaf) diafragma; (Est) estômago-bolha gástrica; (AD) Átrio Direito; (AE) Átrio Esquerdo; (VE) Ventrículo Esquerdo; (Hd) Hilo direito; (He) Hilo esquerdo; (Ao) aorta; (Apu) Artéria pulmonar e (Pf metastat zar) Pequena fi ssura
Outras incidências não raramente utlizadas são: decúbito lateral com raios horizontais, quando o paciente se deita sobre o hemitórax que se deseja estudar, adotando posição paralela ao filme (Figura 5); e apicolordó tca, quando a ampola de raio x é inclinada 15° em direção à cabeça do paciente, na intenção de re trar a clavícula do campo torácico, facilitando a visualização dos segmentos superiores dos lobos superiores. Ainda existem outras incidências, como as oblíquas e a penetrada de mediastno, com u tlização bem restrita na prátca.
Figura 5 - Radiogra fi a em decúbito lateral esquerdo com raios horizontais evidenciando pequeno derrame pleural à esquerda Figura 3 - Radiogra fi a em per fi l normal: (Ao) aorta; (Pf) Pequena fi ssura; (Cor) coração; (Gf) Grande fi ssura; (Dd) Diafragma direito; e (De) Diafragma esquerdo. Observar o “sinal do dégradê” da coluna torácica – opaca superiormente e transparente inferiormente
A projeção AP tem aplicação especial em pacientes restritos ao leito e é largamente utlizada nas unidades de terapia intensiva. Sua maior u tlidade é a localização de drenos, tubos e outros disposi tvos (Figura 4).
3. Como interpretar a radiografia de tórax A interpretação adequada da radiogra fia de tórax requer o conhecimento de um exame normal. Antes de qualquer análise detalhada, é fundamental avaliar a qualidade da imagem realizada. A Tabela 3 descreve as caracterís tcas de uma radiografia bem executada.
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A I G O L O M U E N P
PNEUMOLOGIA Tabela 3 - Característ cas de uma radiogra fi a bem realizada
4. Sinais radiográficos
Inspiração adequada É esperado que o 6º ou 7º arco costal anterior tenha contato com o hemidiafragma, ou o 9º ou 10º arco posterior. Boa penetração O examinador deve identficar de 3 a 4 vértebras torácicas. Quanto menor o número de vértebras visualizadas, menor a penetração; quanto maior, maior a penetração do exame. Simetria A análise da radiografia é comparatva. Assim, é importante que os 2 hemitórax tenham posição simétrica: as extremidades mediais das clavículas devem estar equidistantes em relação à apófise espinhosa vertebral. Além disso, as partes moles extratorácicas devem ser visualizadas com o mesmo contraste bilateralmente.
A - Hiperinsuflação Sua principal característca é a redução das impressões vasculares pelo parênquima pulmonar. O en fisema pulmonar é a principal causa na prá tca médica. Outros parâmetros úteis na detecção de hiperinsu flação são: aumento dos espaços intercostais com re tficação das costelas, retficação das cúpulas diafragmá tcas, vertcalização do coração, aumento do diâmetro AP do tórax e aumento do espaço retroesternal (Figura 6).
Visualização de todas as estruturas É fundamental que todas as estruturas torácicas sejam visíveis ao filme, dos ápices aos seios costofrênicos. Ausência de estruturas adicionais Na radiografia em PA, as escápulas devem ser re tradas do campo, o que é obtdo com o paciente colocando as mãos na cintura. Joias, fios de monitorização, eletrodos devem ser deslocados para fora do campo torácico.
Alguns detalhes anatômicos importantes (mostrados nas Figuras 1 e 2): - O hilo esquerdo é mais alto que o hilo direito, já que a artéria pulmonar esquerda cavalga sobre o brônquio principal esquerdo; - O hemidiafragma esquerdo é até 2,5cm mais baixo que o direito, devido ao peso do coração; - O arco da artéria pulmonar é habitualmente côncavo: retficação ou convexidade são sinais indiretos de hipertensão pulmonar (em jovens, entretanto, pode não representar achado patológico); - O índice cardiotorácico é o quociente da maior largura da sombra do coração pela largura do hemitórax: quando maior que 1, representa aumento da área cardíaca, que pode ocorrer nas cardiomegalias e no derrame pericárdico, por exemplo; - Na radiografia em per fil, o hemidiafragma esquerdo é interrompido pela sombra do coração; o direito percorre todo o comprimento lateral do tórax; - Na radiografia em per fil, a coluna torácica é mais opaca superiormente, tornando-se mais transparente inferiormente – o sinal do dégradé da coluna torácica; a persistência de transparência opaca em regiões inferiores indica presença de lesão no segmento posterior do lobo inferior de um dos pulmões; - Não há regra na interpretação da radiogra fia de tórax. O ideal é que cada médico crie a sua própria ro tna de visualização, avaliando todas as estruturas torácicas, incluindo o parênquima pulmonar, o medias tno, as partes moles torácicas e extratorácicas, e o arcabouço ósseo.
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Figura 6 - Radiogra fi as de tórax em PA e per fi l evidenciando sinais de hiperinsu fl ação
B - Sinal da silhueta Corresponde ao borramento da borda do coração, de vasos mediastnais ou do diafragma por uma opacidade ad jacente (Tabela 4). Sua presença auxilia na localização da lesão, se anterior ou posterior (Figura 7).
RADIOGRAFIA DE TÓRAX
Tabela 4 - Sinal da silhueta Borramento de cava superior e aorta ascendente Lesão no lobo superior direito. Borramento do arco aór tco
seu redor (Figura 8). O signi ficado desse sinal é que a lesão está no parênquima pulmonar, e não no espaço pleural ou no mediastno. Não é ú tl para diferenciar atelectasias não obstrutvas, neoplasias e infecções.
Lesão no segmento apicoposterior do lobo superior esquerdo. Borramento da borda cardíaca direita Lesão no lobo médio. Borramento da borda cardíaca esquerda Lesão na língula. Borramento do hemidiafragma Lesão no lobo inferior correspondente. A I G O L O M U E N P
Figura 8 - Radiogra fi a de tórax em PA mostrando opacidade heterogênea em pulmão esquerdo com broncograma aéreo: observar o desenho da segmentação brônquica
D - Sinal do crescente Um achado clássico do aspergiloma, o sinal refere-se à imagem habitualmente arredondada, obliterando quase completamente uma cavitação (Figura 9). A imagem pode modificar sua conformação de acordo com o decúbito adotado pelo paciente.
Figura 7 - Sinal da silhueta em radiogra fi a em PA: opacidade heterogênea com apagamento da borda cardíaca direita e preservação da sombra do diafragma, compa vel com lesão no lobo médio; radiogra fi a em per fi l con fi rma localização da lesão
C - Broncograma aéreo O sinal do broncograma aéreo (ou aerobroncograma) corresponde à imagem hipertransparente tubular localizada dentro de área de hipotransparência e representa a passagem de ar por um brônquio segmentar com edema ao
Figura 9 - Sinal do crescente em radiogra fi a de tórax: cavitação com limites precisos preenchida por imagem opaca em seu interior
E - Sinal de Hamptom Também conhecido como corcova de Hamptom, este sinal compreende uma imagem triangular periférica, com
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PNEUMOLOGIA base voltada para as costelas e ápice para o hilo. É achado clássico da embolia pulmonar, mas visto em menos de 15% dos casos: representa infarto pulmonar ou pequena área de hemorragia (Figura 10).
Figura 12 - Opacidade em conformação de massa projetada sobre o terço superior de pulmão esquerdo, com centro virtual (ponto escuro) projetado no parênquima pulmonar, indicando ser a imagem localizada no pulmão, e não no mediast no: neoplasia Figura 10 - Radiogra fi a de tórax em PA mostrando imagem triangular periférica, com base voltada para parede torácica e ápice para hilo – sinal de Hamptom: observar proeminência dos hilos pulmonares
F - Sinal de Westmark Este sinal representa área de hipovascularização segmentar no parênquima pulmonar, também denominada oligoemia focal (Figura 11). É resultado de obstrução vascular em uma área especí fica do parênquima, sendo achado clássico da embolia pulmonar.
5. Padrões de imagem A - As hipertransparências a) Pneumotórax Independentemente da e tologia, o pneumotórax apresenta-se à radiografia de tórax como uma hipertransparência associada a uma linha da pleura visceral (Figura 13). Pequenos pneumotórax podem ser de di f cil visualização à radiografia, podendo-se lançar mão da radiogra fia em expiração, que amplifica a hipertransparência da lesão, tornando-a mais visível. Nos grandes, o parênquima pulmonar aparece totalmente atelectasiado, retraído em volta do hilo.
Figura 11 - Radiogra fi a de tórax em PA evidenciando oligoemia focal: tênue redução de vascularização regional no terço inferior do pulmão esquerdo
G - Centro da lesão A determinação virtual do centro da lesão é ú tl para estabelecer a localização de massas como parenquimatosas ou mediastnais. Diante de uma imagem com o centro pro jetado sobre o parênquima, a maior possibilidade é doença no pulmão; sobre o medias tno, é mais provável lesão desse compartmento (Figura 12).
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Figura 13 - Pneumotórax à esquerda em paciente com in fi ltrado parenquimatoso micronodular: observar ausência de impressão vascular, ou mesmo do in fi ltrado nodular na periferia do pulmão esquerdo, com linha de pleura visceral visível
b) Bolhas, cistos e cavitação Áreas de hipertransparências parenquimatosas bem circunscritas são ocasionadas por bolhas, cistos ou cavitação.
RADIOGRAFIA DE TÓRAX
O que distngue as lesões é a parede: ausente nas bolhas, fina nos cistos (<0,4cm) e espessa nas cavitações (>0,4cm). A radiografia de tórax não é o melhor método para determinar essa diferenciação (e sim a tomogra fia), mas, na maioria dos casos, revela indícios suficientes para o diagnóstco diferencial (Figura 14).
habitualmente à esquerda), a de Morgagni (anterior e mais comumente à direita) e a hiatal, às vezes de fácil iden tficação pela presença de haustrações intes tnais ou nível líquido, mas em outras, necessitando de métodos adicionais, como exame baritado.
B - As hipotransparências a) Atelectasia Trata-se de imagem de opacidade de aspecto retrá tl (Figura 15). O aspecto mais relevante na iden tficação de um segmento pulmonar atelectasiado é a retração que causa em estruturas adjacentes, pela redução volumétrica dos pulmões.
Figura 15 - Atelectasia total do pulmão direito: observar tração de estruturas mediast nais para o mesmo lado da opacidade
São sinais úteis na identficação de atelectasias: - Deslocamento dos hilos;
Figura 14 - Cavitação em segmento superior do lobo inferior direito: observar as paredes espessas, que a dis t nguem de bolhas ou cistos
No diagnóstco diferencial das bolhas, devem ser lembradas a hérnia de Bochdalek (a mais comum, posterior e
-
Deslocamento das fissuras;
-
Elevação de hemicúpula;
-
Tração do mediastno;
-
Redução de espaços intercostais.
b) Derrame pleural A radiografia de tórax não é muito sensível na iden tficação de derrames pleurais: a radiogra fia em PA somente revela derrame quando em volume superior a 300mL; o perfil, superior a 75 a 100mL. Quando o derrame é livre, com o paciente em ortostatsmo, o líquido se acumula inferiormente, respeitando a gravidade e assumindo conformação “em parábola” (curva de Damoiseau). A radiogra fia em decúbito lateral com raios horizontais mobiliza o líquido livre e é capaz de demonstrar sua significância clínica (quando a espessura for maior que 1cm, medida da caixa torácica à linha de pleura visceral – Figura 16).
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PNEUMOLOGIA
Figura 18 - Opacidade homogênea no hemitórax direito, desviando estruturas mediast nais para o lado contrário: derrame pleural maciço
Figura 16 - Radiogra fi a de tórax em PA mostrando opacidade homogênea periférica em conformação “em parábola”; à radiogra fi a em decúbito lateral direito, observa-se mobilização de líquido pleural, separando a parede torácica da pleura visceral
Por vezes, o derrame pode assumir conformação subpulmonar, localizando-se entre o lobo inferior e o hemidiafragma (Figura 19). A suspeita surge ao iden tficar-se aparente elevação de hemicúpula, com desvio de sua maior convexidade lateralmente (habitualmente, a maior convexidade de uma hemicúpula é mais medial); o diagnós tco pode ser confirmado solicitando-se o exame em decúbito lateral.
Derrames septados têm localização fixa e são vistos à radiogra fia como opacidade periférica com ângulo obtuso com a super f cie costal (Figura 17).
Figura 19 - Aparente elevação da hemicúpula direita, com maior convexidade voltada para a periferia, est gma de derrame subpulmonar Figura 17 - Opacidade homogênea periférica, com ângulo obtuso com caixa torácica, con fi gurando imagem pleural: ultrassonogra fi a con fi rmou presença de derrame pleural loculado
Pela radiografia em PA, podem-se classificar os derrames como pequeno (obliteração de seio costofrênico), moderado (além do seio costofrênico e até o hilo), grande (além do hilo) e maciço (velamento de hemitórax – Figura 18).
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O derrame também pode ocorrer restrito às fissuras. O achado clássico é de líquido na pequena fissura, que dá aparência de massa na radiogra fia em PA, recebendo a denominação de tumor fantasma; no per fil, tem aspecto fusiforme, em con tnuidade com a linha da fissura (Figura 20). Exames adicionais como tomogra fia são úteis no diagnóstco diferencial, mas, por vezes, o simples controle da insuficiência cardíaca (etologia principal) é su ficiente para a resolução da lesão.
RADIOGRAFIA DE TÓRAX
Figura 21 - Radiogra fi a de tórax em PA mostrando redução volumétrica de ambos os pulmões, com in fi ltrado interst cial ret cular difuso, com predomínio na periferia: diagnóst co de fi brose pulmonar idiopát ca
Figura 22 - In fi ltrado interst cial ret cular peri-hilar em paciente com edema agudo de pulmão cardiogênico Figura 20 - Derrame na pequena fi ssura: tumor fantasma
c) Infiltrados São opacidades parenquimatosas de limites imprecisos, homogêneas ou heterogêneas, sem caráter retrá tl ou expansivo, e que na maioria das vezes se relacionam a doenças inflamatórias ou infecciosas (pneumonia é a causa mais comum). Podem ser alveolares ou inters tciais. Os primeiros podem ser heterogêneos (vistos na broncopneumonia, hemorragia alveolar etc.) ou homogêneos (observados na pneumonia lobar, por exemplo). Os úl tmos podem ser divididos em retculares (imagens lineares tênues e irregulares – Figuras 21 e 22), nodulares (pequenas lesões arredondadas, variando de 1 a 10mm – Figura 23) e re tculonodulares; o aspecto radiográfico, no entanto, não permite determinar a etologia (Tabela 5).
Figura 23 - In fi ltrado interst cial micronodular difuso em paciente com diagnóst co de silicose
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PNEUMOLOGIA Na presença de in filtrados retculares, podem-se identficar as linhas de Kerley, que traduzem espessamento dos septos interlobulares, com edema perivascular e peribrônquico geralmente associados. Sua causa principal é o edema pulmonar. Iden tficam-se 3 padrões clássicos: as linhas A, encontradas nos lobos superiores (menos característcas de edema cardiogênico e mais encontradas nas doenças pulmonares fibrosantes e na linfangite carcinomatosa); as linhas B, visíveis próximas ao seio costofrênico (por sua localização nas bases, são mais caracterís tcas de edema cardiogênico); e as linhas C, dispersas nas bases, com trajeto oblíquo, sendo menos encontradas (Figura 24).
manho: lesões menores que 3cm são nódulos; as maiores, massas. Estas têm, como e tologia principal, as neoplasias (Figura 12). Já os nódulos têm diagnós tco diferencial amplo, e o obje tvo de sua análise é determinar a sua natureza (benigna ou maligna). Nódulo pulmonar solitário é de finido como lesão menor que 3cm, totalmente circundada por parênquima (Figura 25).
Figura 24 - Cortes de radiogra fi a evidenciando linhas de Kerley em paciente com edema pulmonar cardiogênico Tabela 5 - E to logias de in fi ltrados interst ciais Padrão de infiltrado interstcial
Diagnóstco diferencial
Infiltrado retcular
Edema pulmonar, linfangite carcinomatosa, pneumoconioses, linfoma, infecções bacterianas ou virais, fibrose pulmonar.
Infiltrado nodular
Metástases, sarcoidose, histocitose X, pneumonia de hipersensibilidade, pneumoconioses, linfoma, infecções (tuberculose, micoses profundas, vírus).
d) Massas e nódulos São opacidades homogêneas, únicas ou múl tplas, por vezes, de conformação arredondada, que diferem pelo ta-
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Figura 25 - Radiogra fi as de tórax de paciente com pneumonia bacteriana, sendo evidenciado nódulo pulmonar bem circunscrito em pulmão esquerdo; estudo tomográ fi co mostrou padrão de calci fi cação excêntrico, sendo indicada ressecção: adenocarcinoma
Além dos dados clínicos, extremamente relevantes, alguns aspectos radiológicos sugerem e tologia maligna: bordas espiculadas, tamanho maior que 2cm, presença de 2 ou mais nódulos. Além disso, o padrão de calci ficação (mais bem identficado pela tomografia) pode auxiliar no diagnóstco diferencial.
C - Os hilos pulmonares São estruturas opacas formadas por vasos sanguíneos, linfátcos, linfonodos e brônquios segmentares. A maior