CAPÍTULO
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Neuroanatomia Vinícius de Meldau Benites / Rodrigo Antônio Brandão Neto / Maria Aparecida Ferraz / Crist na na Gonçalves Massant / Mauro Augusto de Oliveira
1. Medula A - Conceito A medula faz parte do Sistema Nervoso Central C entral (SNC) segmentar e inicia-se cranialmente no seu limite com o bulbo, sendo um plano horizontal que passa, medialmente, acima do filamento radicular mais superior do 1º nervo cervical, ao nível do forame magno. O limite caudal é variável com a idade, situando-se aproximadamente ao nível da borda inferior de L1, no adulto, podendo alcançar L2, principalmente em indivíduos da raça negra, e L3 no recém-nascido.
A substância branca é dividida em: - Funículo anterior: entre a fissura mediana anterior e o sulco lateral anterior; - Funículo lateral: entre o sulco lateral anterior e o sulco lateral posterior; - Funículo posterior: entre o sulco lateral posterior e o sulco mediano posterior.
B - Anatomia macroscópica A medula possui a forma cilíndrica, sendo achatada no sentdo anteroposterior. Seu calibre é irregular, visto que apresenta as intumescências cervical e lombar, as quais correspondem às áreas de conexão entre a medula e os plexos braquial e lombossacral, respec tvamente. Além disso, termina afilando-se para formar o cone medular, medular, que con tnua com o filamento terminal, ambos revestdos pela pia-máter. Superficialmente, a medula apresenta os seguintes sulcos longitudinais: - Sulco mediano posterior; - Fissura mediana anterior; - Sulco lateral anterior; - Sulco lateral posterior; - Sulco intermédio posterior. Esse últmo existe apenas na medula cervical e situa-se entre os sulcos mediano posterior e lateral posterior; ele penetra o funículo posterior para formar o septo intermédio posterior. Ao corte transversal é possível iden tficar a substância cinzenta, internamente, e a substância branca, externamente. A substância cinzenta tem a forma de um H e possui as colunas ou cornos anterior, anterior, posterior e lateral, sendo que este só aparece na medula torácica. No centro da substância cinzenta encontra-se o canal central da medula (Figura 1), resquício da luz do tubo neural.
Figura 1 - Corte transversal da medula espinal (esquemát co) co)
C - Segmentos medulares Nos sulcos lateral anterior e lateral posterior, posterior, fazem conexão os filamentos radiculares que se unem para formar, respectvamente, as raízes ventral e dorsal dos nervos espinais. Essas raízes se unem distalmente ao gânglio espinal, localizado na raiz dorsal, para formar os nervos espinais. Existem 31 pares de nervos espinais distribuídos em: - 8 cervicais; - 12 torácicos; - 5 lombares; - 5 sacrais; - 1 coccígeo. O 1º par cervical emerge entre o crânio e a 1ª vértebra cervical; já o 8º par cervical emerge abaixo da 7ª vértebra; o mesmo acontece com os outros nervos espinais que emergem abaixo da vértebra correspondente (Figura 2).
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NEUROLOGIA 2. Meninges espinais
Figura 2 - Nervos espinais
D - Topografia vertebromedular O crescimento da medula e da coluna vertebral ocorre no mesmo ritmo até o 4º mês de vida intrauterina. Nesse estágio, os nervos emergem da medula e penetram nos respectvos forames intervertebrais, formando um ângulo de 90°. A partr daí, a coluna passa a crescer mais rapidamente que a medula, causando um alongamento das raízes e diminuição do ângulo que elas fazem com a mesma. Dessa forma, no indivíduo adulto, a medula termina no nível da borda inferior da 1ª vértebra lombar e, abaixo dela, tem-se a cauda equina, a qual é composta apenas de raízes nervosas e filamento terminal. Assim, para que sejam realizados diagnós tco, prognóstco e tratamento de lesões vertebromedulares, deve-se saber a seguinte regra: entre as vértebras C2 e T10, adiciona-se 2 ao número do processo espinhoso da vértebra e tem-se o número do segmento medular subjacente. Aos processos espinhosos das vértebras T11 e T12, correspondem os 5 segmentos lombares e o processo espinhoso de L1 corresponde aos 5 segmentos sacrais.
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Assim como o encéfalo, a medula também se encontra envolvida pelas meninges, que são: dura-máter ou paquimeninge, aracnoide e pia-máter, que cons ttuem a leptomeninge (Figura 3). A meninge mais externa é a dura-máter, dura-máter, a qual é mais resistente e espessa, sendo rica em fibras colágenas. Con tnua cranialmente com o folheto interno da dura-máter craniana e termina inferiormente em fundo de saco no nível da vértebra S2. Forma o epineuro das raízes dos nervos espinais. A aracnoide localiza-se entre a dura-máter e a pia-máter. pia-máter. Está justaposta à dura-máter, dura-máter, formando um espaço virtual e une-se à pia-máter pelas trabéculas aracnoides, sendo que entre ambas está contdo o líquido cerebrospinal (LCE) ou liquor. A pia-máter é mais interna e adere in tmamente à medula, penetrando, inclusive, nos seus sulcos e fissuras. Termina caudalmente no filamento terminal, o qual perfura o fundo do saco dural, recebendo algumas fibras da dura-máter. A partr daí passa a ser chamado de filamento da dura-máter espinal e, ao inserir-se no periósteo da super f cie cie dorsal do cóccix, consttui o ligamento coccígeo. A pia-máter emite de cada lado da medula o ligamento dentculado que se dispõe em um plano frontal ao longo de toda a medula. A margem medial desse ligamento parte da face lateral da medula, dispondo-se entre as raízes dorsais e ventrais. A margem lateral apresenta cerca de 21 processos triangulares, que se inserem na aracnoide e na dura-máter em pontes alternantes com a emergência dos nervos espinais. Entre a dura-máter e o periósteo do canal vertebral está o espaço epidural ou extradural, o qual contém tecido adiposo e o plexo venoso vertebral interno. O espaço subdural é virtual e está entre a dura-máter e a aracnoide. Já o espaço subaracnóideo ocorre entre a aracnoide e a pia-máter, pia-máter, e contém o liquor.
Figura 3 - Meninges espinais
NEUROANATOMIA
3. Tronco encefálico A - Conceito O tronco encefálico localiza-se entre a medula e o diencéfalo, ventralmente ao cerebelo. Sua estrutura interna contém núcleos de substância cinzenta entremeados por
tratos, fascículos ou leminiscos de substância branca. O tronco encefálico par tcipa do SNC segmentar e nele fazem conexão 10, dos 12 pares de nervos cranianos. Pode ser dividido em bulbo (inferiormente), mesencéfalo (superiormente) e ponte (entre ambos). A seguir, seguir, temos o estudo de cada parte separadamente. s eparadamente.
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Figura 4 - Corte sagital através do encéfalo
B - Divisões a) Bulbo
O bulbo ou medula oblonga con tnua-se inferiormente inferiormente como medula espinal, separando-se desta por um plano horizontal imaginário que é traçado acima do filamento radicular mais cranial do 1º nervo cervical, no nível do forame magno. Superiormente separa-se da ponte pelo sulco bulbopontno (Figura 5). A super f cie cie do bulbo é percorrida por sulcos longitudinais, que são con nuos nuos com os da medula, e estruturais, que correspondem a núcleos e agrupamentos de fibras nervosas. A fissura mediana anterior termina no forame cego e, de cada lado, aparecem as pirâmides bulbares, que correspondem ao trato cor tcospinal piramidal. Na parte inferior do bulbo, a maioria das fibras desse trato se cruza e forma a decussação das pirâmides. Entre os sulcos lateral anterior e posterior, localiza-se a oliva, que corres-
ponde ao núcleo olivar inferior. Do sulco lateral anterior, emergem os filamentos radiculares do nervo hipoglosso (XII). Do sulco lateral posterior emergem os filamentos radiculares dos nervos glossofaríngeo (IX) e vago (X), além das fibras craniais do nervo acessório (XI) que irá se unir com a raiz espinhal que tem origem na medula (Figura 5). A metade caudal, ou porção fechada do bulbo, é percorrida por um canal con nuo nuo com o canal central da medula. Esse canal abre-se para formar parte do assoalho do IV ventrículo, ou porção aberta do bulbo; dessa forma, o sulco mediano posterior termina à meia altura do bulbo (Figura 6). Entre esse sulco e o sulco lateral posterior, localiza-se o fascículo grácil e o fascículo cuneiforme, separados pelo sulco intermédio posterior. Esses fascículos são formados por fibras ascendentes que terminam em 2 eminências: o tubérculo do núcleo grácil, medialmente, e o tubérculo do núcleo cuneiforme, lateralmente (Figura 6). Em virtude do aparecimento do IV ventrículo, os tubérculos dos núcleos grácil e cuneiforme separam-se dos correspondentes con-
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NEUROLOGIA tralaterais e contnuam para cima, para formar o pedúnculo cerebelar inferior ou corpo res tforme, que se flete dorsalmente para penetrar no cerebelo (Figura 6).
Figura 5 - Vista frontal do bulbo, ponte e mesencéfalo
Figura 6 - Vista dorsal do bulbo, ponte e mesencéfalo
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NEUROANATOMIA
b) Ponte
Localiza-se entre o bulbo e o mesencéfalo, anteriormente ao cerebelo, e repousa sobre a porção basilar do osso occipital e o dorso da sela túrcica do esfenoide. Sua base possui um sulco longitudinal, que geralmente aloja a artéria basilar, sendo assim chamado de sulco basilar; além disso, é estriada devido aos numerosos feixes de fibras transversais, os quais convergem de cada lado para formar o pedúnculo cerebelar médio ou braço da ponte, que penetra no hemisfério cerebelar correspondente. Considera-se o limite entre ponte e braço da ponte à emergência do nervo trigêmeo (V) (Figura 5). Anteriormente, separa-se do bulbo pelo sulco bulbopontno, onde emergem, a par tr da linha mediana, o VI (abducente), VII (facial) e VIII (ves tbulococlear) nervos cranianos (Figura 5). Essa região é denominada ângulo ponto-cerebelar. A parte dorsal da ponte contribui para a formação do assoalho do IV ventrículo.
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IV ventrículo
É consttuinte do sistema de drenagem liquórica ventricular, sendo delimitado anteriormente pelo bulbo e pela ponte e, posteriormente, pelo cerebelo. Con tnua inferiormente com o canal central do bulbo e, superiormente, com o aqueduto cerebral, também chamado de aqueduto mesencefálico ou de Sylvius, por meio do qual o IV ventrículo comunica-se com o III ventrículo. A cavidade do IV ventrículo se prolonga de cada lado para formar os recessos laterais, localizados na super f cie dorsal do pedúnculo cerebelar inferior, os quais terminam nos forames de Luschka (aberturas laterais do IV ventrículo). Medialmente, existe o forame de Magendie (abertura mediana do IV ventrículo), localizado no meio da metade inferior do ventrículo. Através desses forames, o liquor passa da cavidade ventricular para o espaço subaracnóideo.
Figura 7 - Ventrículos do encéfalo, vista anterior e lateral
O assoalho do IV ventrículo, ou fossa romboide, formado pela parte dorsal da ponte e porção aberta do bulbo, limita-se inferolateralmente pelos pedúnculos cerebelares inferiores e pelos tubérculos do núcleo grácil e do núcleo cuneiforme. Superolateralmente, limita-se pelos pedúnculos cerebelares superiores. O assoalho é percorrido pelo sulco mediano e, de cada lado desse sulco, é possível ver a eminência medial, limitada lateralmente pelo sulco limitante. De cada lado, o sulco se alarga para cons ttuir a fóvea superior e a fóvea inferior. Medialmente à fóvea superior, a eminência medial dilata-se para formar o colículo facial que corresponde às fibras do nervo facial, contornando o núcleo do abducente. Inferiormente à eminência medial, observa-se o trígono do nervo hipoglosso (XII) e do nervo vago (X), respec tvamente. Lateralmente ao sulco limitante, em direção aos recessos laterais, existe a área ves tbular, correspondendo aos núcleos ves tbulares do nervo vestbulococlear (VIII). Cruzando transversalmente o assoalho, para
se perder no sulco mediano, existem finos feixes nervosos, denominados estrias medulares. Acima da fóvea superior e ao lado da eminência medial, encontra-se o lócus ceruleus, que se relaciona ao mecanismo do sono. O teto do IV ventrículo é cons ttuído na sua metade superior pelo véu medular superior, que é uma lâmina de substância branca, localizado entre os 2 pedúnculos cerebelares superiores. A metade inferior é formada pelo nódulo do cerebelo e véu medular inferior, sendo uma lâmina de substância branca que parte lateralmente ao nódulo do cerebelo. Uma estrutura chamada de tela coroide une as 2 formações anteriores às bordas da metade caudal do assoalho do IV ventrículo. c) Mesencéfalo
Localiza-se entre a ponte e o diencéfalo, do qual é separado por um plano que liga os corpos mamilares à comissura posterior. É atravessado pelo aqueduto cerebral (Figura
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NEUROLOGIA 4), que separa o teto (posterior) do pedúnculo cerebral (anterior). Este, por sua vez, é dividido em tegmento, que é dorsal e predominantemente celular, e a base do pedúnculo, que é anterior e formada por fibras longitudinais. O tegmento é separado da base pela substância negra, formada por neurônios ricos em melanina. Essa substância corresponde, na superf cie, ao sulco lateral do mesencéfalo e ao sulco medial do pedúnculo cerebral. Desse úl tmo, parte o nervo oculomotor (III) (Figura 5). O teto apresenta dorsalmente os colículos superiores e inferiores, ou corpos quadrigêmeos, separados por 2 sulcos perpendiculares em forma de cruz. Na parte anterior do ramo longitudinal encontra-se o corpo pineal. Abaixo de cada colículo inferior, emerge o nervo troclear (IV) (Figura 6), o único dos pares cranianos que emerge posteriormente. Esse nervo contorna o mesencéfalo e surge entre a ponte e o mesencéfalo. Os corpos quadrigêmeos ligam-se a estruturas diencefálicas: o colículo inferior se liga ao corpo geniculado medial pelo braço do colículo inferior e par tcipa da via auditva; já o colículo superior se liga ao corpo geniculado lateral pelo braço do colículo superior e par tcipa da via óptca.
Os pedúnculos cerebrais são 2 grandes feixes de fibras, que penetram profundamente no cérebro. Eles delimitam a fossa interpeduncular, limitada anteriormente pelos corpos mamilares (Figura 5). No fundo da fossa, existe a substância perfurada posterior que dá a passagem para vasos. A superf cie do mesencéfalo possui ainda uma área escura denominada substância negra.
4. Cerebelo A - Conceito O cerebelo está alojado na fossa cerebelar do osso occipital, posterior ao bulbo e à ponte, par tcipando da formação do teto do IV ventrículo. Está separado do lobo occipital do cérebro pelo tentório ou tenda do cerebelo. Liga-se à medula e ao bulbo pelo pedúnculo cerebelar inferior, à ponte pelo pedúnculo cerebelar médio e ao mesencéfalo pelo pedúnculo cerebelar superior. É um órgão essencialmente relacionado às funções motoras como o equilíbrio, a coordenação dos movimentos e o tônus muscular.
B - Anatomia macroscópica O cerebelo (Figura 8) possui 2 estruturas dis tntas: o vérmis, que é mediano, e os hemisférios cerebelares, que são 2 massas volumosas que se ligam ao vérmis. Na região superior, o vérmis é pouco separado dos hemisférios, mas na região inferior existem 2 sulcos bem evidentes.
Figura 8 - Cerebelo
A superf cie cerebelar é percorrida por sulcos e fissuras que delimitam as folhas cerebelares e os lóbulos, respec tvamente.
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NEUROANATOMIA
Ao corte sagital, observa-se que o cerebelo é constituído por um centro de substância branca, o corpo medular do cerebelo, de onde irradiam as lâminas brancas do cerebelo, revestdas pelo córtex cerebelar. No interior do corpo medular, é possível ver 4 pares de núcleos de substância cinzenta: denteado, emboliforme, globoso e fas tgial. Do ponto de vista funcional, destaca-se a divisão filogenétca do cerebelo, a qual divide o órgão em 3 partes: arquicerebelo, paleocerebelo e neocerebelo. O arquicerebelo relaciona-se a funções bastante primárias, como o equilíbrio. Como tem conexões ves tbulares, também é denominado cerebelo ves tbular e corresponde ao lobo floculonodular. O paleocerebelo, predominantemente vermiano, relaciona-se a funções controladoras do tônus muscular. Como faz conexões com a medula, também é chamado de cerebelo espinal e corresponde ao lobo anterior, à pirâmide e à úvula. O neocerebelo, cuja maior parte localiza-se nos hemisférios cerebelares, relaciona-se a funções mais elaboradas, como a coordenação para movimentos delicados e assimétricos. Como faz conexões com o córtex cerebral, também é chamado de cerebelo cor tcal e corresponde ao resto do lobo posterior. A divisão do cerebelo em lóbulos não possui importância funcional e, por isso, não será aprofundada.
Observam-se 4 recessos com localizações óbvias na cavidade ventricular: recesso do infundíbulo, recesso óp tco, recesso suprapineal e recesso pineal (Figura 7).
B - Estruturas
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5. Diencéfalo A - Conceito O diencéfalo é único e mediano, sendo encoberto pelo telencéfalo. A essas 2 estruturas, damos o nome de cérebro. O diencéfalo é dividido em: tálamo, hipotálamo, epitálamo e subtálamo, todos em relação com o III ventrículo. -
III ventrículo
É uma cavidade mediana que se comunica inferiormente com o IV ventrículo por intermédio do aqueduto mesencefálico e lateralmente com os ventrículos laterais através dos forames interventriculares ou de Monro (Figura 7). Ao corte sagital mediano podemos iden tficar o sulco hipotalâmico, que liga o aqueduto mesencefálico ao forame de Monro. Esse sulco separa o tálamo superior e o hipotálamo inferior. No assoalho do III ventrículo é possível iden tficar as estruturas hipotalâmicas, que são quiasma óptco (anterior), infundíbulo e túber cinéreo (intermediário), e corpos mamilares (posterior) (Figuras 4 e 5). A parede posterior é formada pelo epitálamo, que está acima do sulco hipotalâmico. A par tr dessa região, irradiam-se lateralmente as estrias medulares do tálamo, que são feixes de fibras nervosas em que se insere a tela coroide que forma o teto do III ventrículo. A parede anterior do III ventrículo é formada pela lâmina terminal, que é uma fina lâmina de tecido nervoso localizado entre o quiasma óp tco e a comissura anterior.
Figura 9 - Cortes do telencéfalo e diencéfalo, evidenciando núcleos da base
a) Tálamo
São 2 massas ovoides e volumosas de substância cinzenta, unidas medialmente pela aderência intertalâmica (ocorre na maioria dos indivíduos) e localizadas uma de cada lado na região laterodorsal do diencéfalo. A extremidade posterior apresenta o pulvinar, que recobre os corpos geniculados lateral e medial. A porção laterossuperior do tálamo partcipa do assoalho do ventrículo lateral e é revestda por epêndima. A face lateral do tálamo é separada do telencéfalo pela cápsula interna, feixe de fibras que liga o córtex cerebral a centros nervosos subcor tcais. A face inferior é con nua com o hipotálamo e subtálamo. As principais funções talâmicas relacionam-se com as sensibilidades (exceto a olfatória). A estrutura talâmica compreende vários núcleos, compostos fundamentalmente por substância cinzenta. Esses núcleos estão envolvidos na transmissão dos impulsos sensi tvos às suas respec tvas áreas no córtex, integrando e modi ficando-os. Motricidade, comportamento emocional e a tvação cortcal são outras funções relacionadas. b) Hipotálamo
Localiza-se abaixo do tálamo (Figura 4) e relaciona-se com funções associadas ao controle visceral. O hipotálamo
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NEUROLOGIA inclui estruturas localizadas nas paredes laterais do III ventrículo, além das formações da base do cérebro, que são (Figura 5): - Corpos mamilares: massas arredondadas de substância cinzenta localizadas na região anterior da fossa interpeduncular; - Quiasma óptco: localiza-se na região anterior do assoalho ventricular e integra a via óp tca; - Túber cinéreo: é mediano e localiza-se atrás do quiasma e dos tratos óptcos, entre estes, os corpos mamilares; - Infundíbulo: fina trave nervosa que liga a hipó fise ao túber cinéreo; aloja-se na região da sela túrcica na base do crânio. c) Epitálamo
Está situado na região posterior do III ventrículo, acima do sulco hipotalâmico, na transição com o mesencéfalo. A estrutura mais evidente é a glândula pineal ou epí fise (Figura 6), que é única e mediana, e pode encontrar-se calcificada nos indivíduos mais velhos. A base da pineal prende-se à comissura posterior, inferiormente, e comissura das habênulas, superiormente. A comissura posterior é o limite entre o mesencéfalo e o diencéfalo. A comissura das habênulas está entre os trígonos das habênulas que, por sua vez, estão entre a pineal e o tálamo. d) Subtálamo
É a zona de transição entre o diencéfalo e o tegmento do mesencéfalo. Localiza-se abaixo do tálamo, entre a cápsula interna (lateral) (Figura 8) e o hipotálamo (medial) (Figura 4). O elemento mais evidente é o núcleo subtalâmico.
6. Telencéfalo A - Conceito O telencéfalo (Figura 4) é formado pelos 2 hemisférios cerebrais, que são incompletamente separados pela fissu-
Figura 10 - Vistas lateral e superior do cérebro
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ra longitudinal do cérebro, cujo assoalho é formado pelo corpo caloso (principal estrutura de união entre os 2 hemisférios) e pela lâmina terminal e comissura anterior, que formam a parede anterior do III ventrículo. Os hemisférios possuem os ventrículos laterais, que são suas cavidades, e apresentam 3 polos (frontal, occipital e temporal) e 3 faces (superolateral, medial e inferior ou base do cérebro).
B - Sulcos e lobos A superf cie cerebral (Figura 10) apresenta os giros ou circunvoluções cerebrais que existem para aumentar a superf cie cortcal. Esses giros, nem sempre constantes, são delimitados por sulcos. Os mais importantes são: - Sulco lateral ou de Sylvius: inicia-se lateralmente à substância perfurada anterior, na face inferior, separando o lobo frontal do lobo temporal, e segue superiormente pela face superolateral, em que termina dividindo-se em 3 ramos: anterior, posterior e ascendente; - Sulco central ou de Rolando: inicia-se na face medial do hemisfério e segue superiormente até a tngir a face superolateral, por onde desce obliquamente em direção ao ramo posterior do sulco lateral, do qual é separada por uma pequena prega cor tcal. Esse sulco separa o lobo frontal do parietal e é margeado pelo giro pré-central (anterior) e pelo giro pós-central (posterior). Os sulcos cerebrais determinam lobos, que são: frontal, temporal, parietal, occipital e o lobo da ínsula que se situa profundamente no sulco lateral e não se relaciona a ossos do crânio. O lobo frontal localiza-se acima do sulco lateral e à frente do sulco central. O lobo occipital separa-se dos lobos temporal e parietal por uma linha imaginária que vai do sulco parieto-occipital à incisura pré-occipital, ambos na face superolateral. O lobo temporal está abaixo do sulco lateral e de uma linha que é con nua com esse sulco e vai até a metade da linha imaginária que separa o lobo occipital. O lobo parietal está entre os outros lobos.
NEUROANATOMIA
C - Estudo das faces cerebrais a) Face superolateral
É a face que se relaciona com os ossos da calota craniana, sendo, portanto, convexa. O lobo frontal apresenta 3 sulcos: - Sulco pré-central: paralelo ao sulco central; - Sulco frontal superior: parte, perpendicularmente, da porção superior do sulco pré-central; - Sulco frontal inferior: parte, perpendicularmente, da porção inferior do sulco pré-central. Entre os sulcos central e pré-central, tem-se o giro pré-central que é a área motora primária. Acima do sulco frontal superior, tem-se o giro frontal superior. Entre os sulcos frontal superior e inferior tem-se o giro frontal médio e, abaixo do sulco frontal inferior, está o giro frontal inferior, que é dividido pelos ramos anterior e ascendente do sulco lateral em: porção orbital, que está abaixo do ramo anterior; porção triangular, entre os 2 ramos; e porção opercular, entre o ramo ascendente e o sulco pré-central. O giro frontal inferior do hemisfério esquerdo é chamado também de giro de Broca, sendo o centro cor tcal da palavra falada. O lobo temporal apresenta 2 sulcos principais: - Sulco temporal superior: corre paralelo ao ramo posterior do sulco lateral, terminando no lobo parietal; - Sulco temporal inferior: é paralelo ao sulco temporal superior, mas nem sempre é con nuo. Entre esses sulcos, tem-se o giro temporal médio; abaixo, o giro temporal inferior, que se limita com o sulco occipitotemporal, localizado na face inferior do cérebro; e a cima, o giro temporal superior, que forma a parte interna do sulco lateral, sendo que na sua porção posterior é atravessado pelos giros temporais transversos, dos quais o anterior é o centro cor tcal da audição (giro de Heschl). O lobo parietal apresenta 2 sulcos principais: - Sulco pós-central: paralelo ao sulco central; - Sulco intraparietal: é variável e perpendicular ao sulco pós-central. Entre os sulcos central e pós-central está o giro pós-central, que é a área sensi tva primária. O sulco intraparietal separa o lóbulo parietal superior do inferior. Nesse úl tmo, visualizamos o giro supramarginal, que se curva na extremidade do ramo posterior do sulco lateral e o giro angular, que se curva em torno do sulco temporal superior. O lobo occipital é pequeno nessa face e apresenta giros variáveis. Já o lobo da ínsula localiza-se profundamente ao sulco lateral, sendo cônico com o ápice voltado inferiormente. b) Face medial
É mais bem vista ao corte sagital mediano (Figura 4) e apresenta, além dos giros, algumas formações telencefálicas inter-hemisféricas, descritas a seguir:
-
Corpo caloso: parte da comissura anterior, como ros-
tro do corpo caloso, dilata-se e passa ao joelho do corpo caloso, segue posteriormente como tronco e alarga-se posteriormente para formar o esplênio do corpo caloso. Abaixo do rostro do corpo caloso e à frente da comissura anterior e da lâmina terminal está a área septal. O corpo caloso é a maior comissura inter-hemisférica formada por fibras mielínicas, que comunicam áreas simétricas do córtex cerebral de cada hemisfério; - Fórnice: surge abaixo do esplênio do corpo caloso e segue em direção à comissura anterior. Não é totalmente visível ao corte sagital, pois se trata de um feixe de fibras distribuído em 2 metades laterais, que se unem medianamente para formar o corpo do fórnice. As extremidades que se estendem até o corpo mamilar, cruzando a parede lateral do III ventrículo, são as colunas do fórnice; já as extremidades que seguem para o corno inferior do ventrículo lateral para se ligar ao hipocampo são chamadas de pernas do fórnice. Na região em que as pernas do fórnice se separam, algumas fibras passam de um lado ao outro, sendo denominado comissura do fórnice; - Septo pelúcido: situa-se entre o corpo caloso e o fórnice, sendo formado por 2 lâminas delgadas de tecido nervoso, que delimitam a cavidade do septo pelúcido. O lobo occipital apresenta 2 sulcos principais: - Sulco calcarino: inicia-se abaixo da glândula pineal e segue num trajeto arqueado em direção ao polo occipital. Nos lábios do sulco calcarino está o centro cor tcal da visão; - Sulco parieto-occipital: surge no 1/3 proximal do sulco calcarino e segue superiormente, separando o lobo occipital do parietal. Entre esses sulcos está o cúneo, que tem forma triangular e abaixo do sulco calcarino situa-se o giro occipitotemporal medial que con tnua anteriormente com o giro para-hipocampal no lobo temporal. Os lobos frontal e parietal apresentam 2 sulcos que passam de um lobo ao outro: •
•
Sulco do corpo caloso: contorna todo o corpo ca-
loso e contnua-se posteriormente com o sulco do hipocampo; Sulco do cíngulo: é paralelo ao sulco do corpo caloso, do qual é separado pelo giro do cíngulo.
Termina posteriormente, dividindo-se em ramo marginal, que segue superiormente, e ramo subparietal, que vai em direção ao sulco do cíngulo. Do sulco do cíngulo parte, quase sempre, o sulco paracentral. Entre o sulco paracentral, o sulco do cíngulo e seu ramo posterior está o lóbulo paracentral, que é onde termina o sulco central. Entre os ramos marginal e subparietal do sulco do cíngulo e o sulco parieto-occipital está o pré-cúneo.
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NEUROLOGIA c) Face inferior
Também chamada de base do cérebro (Figura 11), pode ser dividida em 2 partes: a do lobo frontal, que repousa sobre a fossa anterior do crânio e a outra, muito maior, que pertence quase toda ao lobo temporal e repousa sobre a fossa média e a tenda do cerebelo. O lobo temporal apresenta 3 sulcos principais: -
Sulco occipitotemporal: cone no sen tdo anteroposte-
rior na borda lateral do cérebro; - Sulco colateral: inicia-se próximo ao lobo occipital e segue anteriormente, podendo ser con nuo com o sulco rinal, que separa a região mais anterior do giro para-hipocampal do resto do lobo temporal; - Sulco do hipocampo: origina-se na região do esplênio do corpo caloso, sendo con nuo com o sulco do corpo caloso.
Figura 12 - Sistema límbico
No lobo frontal, o único sulco importante é o sulco olfatório, que tem direção anteroposterior. Medialmente a ele, há o giro reto e o resto da face é preenchida pelos sulcos e giros orbitários. Alojados no sulco olfatório, estão o bulbo olfatório, que é uma dilatação ovoide de substância cinzenta, e o trato olfatório, que é con nuo ao bulbo olfatório, o qual recebe filamentos que formam o nervo olfatório (I). Esses filamentos atravessam a lâmina crivosa do etmoide e formam o trato olfatório. Esse trato bifurca-se posteriormente, formando as estrias olfatórias medial e lateral que delimitam o trígono olfatório. Entre o trígono e o trato óptco (posterior) está a substância perfurada anterior, que dá passagem a inúmeros vasos.
D - Estudo dos ventrículos laterais
Figura 11 - Base do cérebro
Lateralmente ao sulco occipitotemporal, formando a borda do hemisfério, está o giro temporal inferior. Entre os sulcos occipitotemporal e colateral está o giro occipitotemporal lateral. Em meio ao sulco colateral, está o giro occipitotemporal medial, que é con nuo, anteriormente, com o giro para-hipocampal, cuja porção anterior curva-se em torno do sulco do hipocampo para formar o úncus. O giro para-hipocampal liga-se, posteriormente, ao giro do cíngulo pelo istmo do giro do cíngulo. Assim, úncus, giro para-hipocampal, istmo do giro do cíngulo e giro do cíngulo circundam as estruturas inter-hemisféricas, sendo chamada, por muitos, de lobo límbico, parte do sistema límbico (Figura 12), o qual se relaciona com o comportamento emocional e controle do sistema nervoso autônomo.
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Os ventrículos laterais esquerdo e direito (Figura 7) são as cavidades dos hemisférios cerebrais reves tdas por epêndima e que contêm o líquido cerebrospinal. Comunicam-se com o III ventrículo pelo respec tvo forame interventricular ou de Monro, possuem 1 parte central e 3 cornos que se projetam nos lobos frontal, occipital e temporal, denominados respectvamente de cornos anterior, posterior e inferior. a) Paredes ventriculares
O corno anterior situa-se à frente do forame de Monro. Sua parede medial é formada pelo septo pelúcido, que separa o corno anterior de ambos os ventrículos. O assoalho e a parede lateral são cons ttuídos pela cabeça do núcleo caudado; e o teto e a parede anterior são formados pelo corpo caloso. A parte central estende-se do lobo parietal posteriormente ao forame de Monro até o esplênio do corpo caloso, em que a cavidade se bifurca em cornos posterior e inferior na região chamada de trígono colateral. O teto é formado pelo corpo caloso e a parte medial pelo septo pelúcido. O assoalho apresenta o fórnice, plexo coroide, parte do tálamo, estria terminal, veia terminal e núcleo caudado.
NEUROANATOMIA
O corno posterior tem sua parede formada quase que exclusivamente por fibras do corpo caloso. O corno inferior tem seu teto formado pela substância branca do cérebro, e na margem medial a cauda do núcleo caudado e a estria terminal. O assoalho apresenta 2 saliências: a eminência colateral (formada pelo sulco colateral) e o hipocampo (que se liga às pernas do fórnice pela f mbria do hipocampo). O hipocampo se liga lateralmente ao giro para-hipocampal pelo subiculum. b) Plexos coroides
É consttuído pelo epêndima que reveste os ventrículos e a pia-máter (Figura 3). Esse plexo con tnua com o III ventrículo por meio do forame de Monro e a tnge o corno inferior por sobre o fórnice e a f mbria. Os cornos anterior e posterior não possuem plexos coroides.
E - Organização interna dos hemisférios cerebrais Apresenta uma camada super ficial de substância cinzenta, chamada de córtex cerebral, que recobre o centro branco medular do cérebro (substância branca), também chamada de centro semioval, dentro do qual existem os núcleos da base do cérebro. a) Núcleos da base
São massas de substância cinzenta, também chamadas de gânglios da base (Figura 9). São eles: - Núcleo caudado: é alongado e relaciona-se em toda a sua extensão com as paredes dos ventrículos laterais, sendo que possui uma cabeça que forma o assoalho do corno anterior e um corpo que forma o assoalho da parte central do ventrículo lateral. A cauda do núcleo caudado é a filada e segue até a extremidade anterior do corno inferior; - Núcleo lentforme: é arredondado e sua região anterior funde-se com a cabeça do núcleo caudado, e não aparece nas paredes ventriculares. É dividido em putâmen (lateralmente) e globo pálido (medialmente) pela lâmina medular lateral. O globo pálido é subdividido pela lâmina medular medial em partes externa e interna; - Claustro: é uma lâmina situada entre a cápsula extrema (lateralmente), que o separa do córtex da ínsula, e a cápsula externa (medialmente), que o separa do núcleo lentforme; - Corpo amigdaloide: é esférico, situado no polo temporal e relacionado com a cauda do núcleo caudado, fazendo uma saliência no teto da parte terminal do corno inferior. Faz parte do sistema límbico e é um centro regulador do comportamento sexual e da agressividade; - Núcleo accumbens: localiza-se entre o putâmen e a cabeça do núcleo caudado; - Núcleo basal de Meynert: localiza-se entre a substância perfurada anterior e o globo pálido, numa região chamada de substância inominata, que contém neurônios ricos em acetlcolina.
b) Centro branco medular do cérebro
É formado por fibras mielínicas divididas em: - Fibras de projeção (Figura 13): são fibras que ligam o córtex cerebral a centros subcor tcais e se dispõem em 2 feixes: Fórnice: liga o córtex do hipocampo ao corpo mamilar; Cápsula interna: contém a maioria das fibras que entram ou saem do córtex cerebral. Formam um feixe compacto que separa o núcleo len tforme (lateral) do núcleo caudado e tálamo (medial). • •
Acima do nível desses núcleos, as fibras da cápsula interna passam a consttuir a coroa radiada. A cápsula interna possui uma perna anterior (entre o núcleo len tforme e a cabeça do núcleo caudado), uma perna posterior (entre o tálamo e o núcleo len tforme), e o joelho da cápsula interna que une as pernas da cápsula interna. - Fibras de associação: são fibras que unem áreas cor tcais situadas em pontos diferentes do cérebro, e podem ser inter-hemisféricas, como a comissura do fórnice, a comissura anterior e o corpo caloso, ou intra-hemisférica que se unem, na sua maioria, em fascículos como o fascículo do cíngulo, o fascículo longitudinal superior, o fascículo longitudinal inferior e o fascículo unciforme.
Figura 13 - Tipos de tratos de fi bras
7. Meninges do sistema nervoso central A - Conceito Trata-se do envoltório do SNC, cons ttuídas em 3 membranas: dura-máter ou paquimeninge, a aracnoide e a pia-máter, às vezes consideradas como uma formação única, a leptomeninge. a) Dura-máter
É a meninge mais externa, resistente e inelás tca, já que é rica em fibras colágenas, além de vasos e nervos. Essa iner-
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A I G O L O R U E N
NEUROLOGIA vação rica é que confere pra tcamente toda a sensibilidade intracraniana, incluindo a maioria das cefaleias, visto que o encéfalo não possui terminações nervosas. A vascularização ocorre pela artéria meníngea média, ramo da artéria maxilar. A dura-máter do encéfalo, ao contrário da dura-máter espinal, possui 2 folhetos (externo e interno), sendo que só o interno é con nuo com a dura-máter espinal. O folheto externo é muito aderido ao crânio e funciona como um periósteo sem capacidade osteogênica, o que evita a formação de um calo ósseo. -
Pregas da dura-máter do encéfalo
Trata-se de pregas formadas quando o folheto interno se destaca do folheto externo e serve para dividir a cavidade craniana em compar tmentos. São elas: Foice do cérebro: septo ver tcal mediano, que ocupa a comissura longitudinal do cérebro, separando os 2 hemisférios; Tenda do cerebelo: septo transversal que separa os lobos occipitais do cerebelo, ou seja, a fossa média da fossa posterior, determinando o compar tmento supratentorial e o infratentorial. A borda anterior livre da tenda é chamada incisura da tenda e ajusta-se ao mesencéfalo, fato que é importante, pois pode relacionar-se à lesão do mesencéfalo ou dos nervos troclear (IV) e oculomotor (III); Foice do cerebelo: pequeno septo ver tcal mediano partndo da tenda que separa os hemisférios cerebelares; Diafragma da sela: pequena lâmina horizontal que encena a hipó fise na sela túrcica e possui um ori f cio para a passagem da haste hipo fisária. •
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Figura 14 - Seios venosos da dura-máter
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Cavidades da dura-máter
Ocorrem em áreas onde os 2 folhetos da dura-máter se separam. Os principais são o cavo trigeminal, que abriga o gânglio trigeminal, e os seios da dura-máter, que serão abordados a seguir. -
Seios da dura-máter (Figura 14)
Trata-se de túneis venosos revestidos de endotélio, mais rígidos que as veias e onde desemboca o sangue das veias jugulares internas. Os seios comunicam-se com as veias da superfície craniana através das veias emissárias e podem estar relacionados com a abóboda ou com a base do crânio. Assim sendo, os seios da abóboda craniana são: Seio sagital superior: percorre a inserção da foice do cérebro e termina na con fluência dos seios, o qual é formado pela con fluência dos seios sagital superior, reto e occipital, e início dos seios transversos esquerdo e direito; Seio sagital inferior: acompanha a margem livre da foice do cérebro e termina no seio reto; Seio reto: percorre a intersecção entre a foice do cérebro e a tenda do cerebelo, sendo formada pela confluência do seio sagital inferior e pela veia magna. Termina na con fluência dos seios; Seio transverso: é bilateral e parte da con fluência dos seios até a porção petrosa do temporal, em que passa a se chamar seio sigmoide; Seio sigmoide: é a contnuação do seio transverso e drena quase todo o sangue da cavidade craniana para veia jugular interna; Seio occipital: percorre a inserção da foice do cerebelo até a con fluência dos seios. •
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NEUROANATOMIA
Os seios venosos da base craniana são (Figura 14): •
Seio cavernoso: é uma cavidade localizada ao lado
do corpo do esfenoide e sela túrcica, que recebe o sangue proveniente das veias o álmicas superior e central da re tna, e algumas veias cerebrais. Comunica-se com o seio cavernoso contralateral por meio do seio intercavernoso e é atravessado pela artéria caró tda interna e nervos abducente, troclear, oculomotor e ramo o álmico do trigêmeo; •
Seio esfenoparietal: percorre a face interna da asa
menor do esfenoide e vai até o seio cavernoso; •
Seio petroso superior: percorre a inserção da tenda
do cerebelo, na porção petrosa do osso temporal e drena sangue do seio cavernoso até o seio sigmoide; •
Seio petroso inferior: corre entre o seio caverno-
so e o forame jugular, local onde termina drenando para a veia jugular interna; •
Plexo basilar: ocupa a porção basilar do occipital,
comunicando o plexo venoso vertebral interno aos seios petroso inferior e cavernoso. b) Aracnoide
É uma fina membrana virtualmente separada da dura-máter pelo espaço subdural e distanciada da pia-máter pelo espaço subaracnóideo, que é preenchido pelo liquor, além de possuir as trabéculas aracnoides que se prendem à pia-máter. -
Cisternas subaracnóideas (Figura 15)
Correspondem às dilatações do espaço subaracnóideo, preenchidas por liquor, que existem quando há um maior distanciamento entre a aracnoide que se justapõe à dura-máter e à pia-máter, que adere ao encéfalo. As principais são: •
Cisterna magna ou cerebelomedular: corresponde
ao espaço entre a face inferior do cerebelo e a face dorsal do bulbo. É considerada a maior cisterna. Comunica-se com o IV ventrículo por intermédio do forame de Magendie. É u tlizada para a punção liquórica suboccipital; •
Cisterna pontna: localizada anteriormente à ponte;
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Cisterna quiasmátca: localizada à frente do quias-
ma óptco; •
Cisterna interpeduncular: situada na fossa interpe-
duncular; •
Cisterna superior: corresponde à cisterna ambiens
e localiza-se atrás do mesencéfalo, entre o cerebelo e o corpo caloso; •
A I G O L O R U E N
Cisterna da fossa lateral do cérebro: corresponde
ao sulco lateral do cérebro.
Figura 15 - Cisternas subaracnóideas -
Granulações aracnoides
São pequenos diver culos de aracnoide no interior dos seios da dura-máter, principalmente do seio sagital superior, que servem para a absorção do liquor pelo sangue. No adulto, podem estar calci ficadas, sendo chamadas de granulações ou corpúsculo de Pacchioni (Figura 15). c) Pia-máter
A mais interna das meninges é uma membrana delicada que adere à super f cie do encéfalo e da medula, inclusive aos sulcos, às fissuras e aos vasos que penetram no tecido nervoso a par tr do espaço subaracnóideo, formando os espaços perivasculares que contêm liquor e amortecem a pulsação das artérias sobre o tecido adjacente.
B - Liquor O liquor, ou líquido cerebrospinal, é um fluido cristalino que ocupa as cavidades ventriculares e o espaço subaracnóideo. Tem a função de proteção mecânica contra choques, ou seja, amortecimento, além de reduzir o peso do encéfalo que está submerso nesse líquido. O liquor normal do adulto é cristalino, apresenta de 0 a 4 leucócitos/mm3, menor quantdade de proteínas que no sangue e pressão de 5 a 20cmH 2O, obtda na região lombar com o paciente em decúbito lateral. Seu volume total varia de 100 a 150cm3 e sua taxa de renovação é cerca de 30mL/h. O liquor é secretado principalmente pelos plexos coroides, e pequena parte pelo epêndima. Os plexos coroides existem nos cornos inferiores e porção central do ventrículo lateral, além do III e IV ventrículos, sendo que os ventrículos laterais são os principais produtores. Dos ventrículos, o liquor passa ao espaço subaracnóideo pelos forames de Luschka e pelo forame de Magendie, por onde circula até ser reabsorvido pelas granulações aracnoides. A circulação
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NEUROLOGIA liquórica ocorre pelo mecanismo de produção em uma extremidade e absorção em outra.
8. Vascularização do sistema nervoso central
-
- Conceito O SNC requer um suprimento elevado e ininterrupto de glicose e oxigênio, o que exclui totalmente a possibilidade de metabolismo anaeróbico. Dessa maneira, o fluxo sanguíneo cerebral é muito intenso, sendo superado apenas pelo do rim e do coração. A parada da circulação cerebral por 7 segundos leva à perda da consciência; e após 5 minutos iniciam-se as lesões cerebrais, que são irreversíveis. Vale ressaltar que as primeiras áreas a serem lesadas são as filogenetcamente mais recentes, ou seja, o neocórtex será lesado antes do páleo e do arquicórtex, e o sistema nervoso suprassegmentar antes do segmentar, sendo que o centro respiratório no bulbo é o úl tmo a sofrer lesões. O Fluxo Sanguíneo Cerebral (FSC) respeita a seguinte fórmula: FSC = PA - PV RCV uma vez que PV varia pouco, temos: FSC = PA . RCV
Sendo que: FSC (Fluxo Sanguíneo Cerebral), PA (Pressão Arterial), PV (Pressão Venosa) e RCV (resistência cerebrovascular). Sendo assim, a queda na PA afeta diretamente o FSC, assim como o aumento da RCV. A RCV é dependente de 4 fatores: - Pressão intracraniana; - Condição da parede vascular; - Viscosidade sanguínea; - Calibre dos vasos cerebrais. Assim, o calibre dos vasos é regulado por mecanismos humorais e nervosos, sendo o CO 2 o mais importante vasodilatador. Isso explica a diferença entre os fluxos sanguíneos do córtex (onde tem mais sinapse, maior a tvidade metabólica e, portanto, maior fluxo sanguíneo) e da substância branca e entre as diversas áreas cerebrais. a) Vascularização arterial do encéfalo e da medula
O encéfalo é irrigado pelas artérias caró tdas internas e vertebrais, que se anastomosam na base do crânio para formar o polígono de Willis (Figura 16). As paredes das artérias cerebrais são proporcionalmente mais finas, o que as tornam mais sujeitas a hemorragias. A túnica média das artérias cerebrais tem menos fibras musculares e a túnica elástca interna é mais espessa, resultando em uma maior
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capacidade de amortecimento do choque da onda sistólica. Outro dispositvo para amortecer a pulsação é a tortuosidade que as artérias apresentam. É importante lembrar que existem poucas anastomoses entre as circulações intra e extracranianas, o que incapacita a manutenção de circulação colateral útl no caso de obstrução da carótda interna. Artéria caró tda interna
Surge na bifurcação da caró tda comum no nível de C4, sobe pelo pescoço e penetra no crânio pelo canal caro deo do osso temporal, e atravessa o seio cavernoso em que descreve o sifão caro deo. A seguir, perfura a dura-máter e a aracnoide e, no nível da substância perfurada anterior, divide-se nos seus 2 ramos terminais. Os ramos colaterais são: Artéria oálmica: emerge da caró tda abaixo do processo clinoide; Artéria comunicante posterior: partcipa da formação do polígono de Willis; Artéria coróidea anterior: corre ao longo do trato óptco, penetra no corno inferior do ventrículo lateral e irriga os plexos coroides e parte da cápsula interna. •
•
•
Os ramos terminais são: -
Artéria cerebral média: é o principal ramo da caró tda
interna e percorre o sulco lateral em toda a sua extensão, emitndo ramos que vascularizam a maior parte da face superolateral de cada hemisfério cerebral. Esse território inclui a área motora, a área somestésica, o centro da palavra falada e outras; - Artéria cerebral anterior: dirige-se para frente e para cima até a fissura longitudinal do cérebro, curva-se em torno do joelho do corpo caloso e emite ramos na face medial do hemisfério cerebral desde o lobo frontal até o sulco parieto-occipital. -
Artéria vertebral e basilar
As artérias vertebrais direita e esquerda partem das subclávias direita e esquerda correspondentes, sobem no pescoço dentro dos forames transversos das vértebras cervicais, perfuram a membrana atlantoccipital, a dura-máter e a aracnoide, e penetram no crânio pelo forame magno. Percorrem a face ventral do bulbo e, no nível do sulco bulbopontno, unem-se para formar a artéria basilar. Os ramos colaterais das artérias vertebrais são: - Artéria espinal anterior: é um tronco único formado por 2 ramos recorrentes curtos que emergem das vertebrais direita e esquerda e ocupam a região da fissura mediana anterior até o cone medular, emi tndo artérias sulcais que partem perpendicularmente e penetram no tecido nervoso. Elas irrigam as colunas e os funículos anterior e lateral da medula; -
Artérias espinais posteriores direita e esquerda:
partem das vertebrais correspondentes, vão à região
NEUROANATOMIA
posterior do bulbo e percorrem toda a medula, medialmente às radículas das raízes dorsais dos nervos espinais. Vascularizam a coluna e o funículo posterior da medula; - Artérias cerebelares inferiores posteriores: vascularizam a porção inferoposterior do cerebelo, bem como a área lateral do bulbo. Os ramos colaterais da artéria basilar são: Artéria cerebelar superior: nasce atrás das cerebrais posteriores e irriga o mesencéfalo e região superior do cerebelo; Artéria cerebelar inferior anterior: vasculariza a região inferoanterior do cerebelo; Artéria do labirinto: penetra no meato acús tco interno junto com os nervos facial e ves tbulococlear, e irriga estruturas do ouvido interno. •
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A artéria basilar bifurca-se na região proximal do mesencéfalo, formando as cerebrais posteriores direita e esquerda.
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Artéria cerebral posterior: contorna o pedúnculo
cerebral, com direção posterior, percorrendo a face inferior do lobo temporal até o lobo occipital, irrigando toda essa região. -
Polígono de Willis
É uma anastomose arterial de forma poligonal localizada na base do cérebro em torno do quiasma óp tco e túber cinéreo, abaixo da fossa interpeduncular e substância perfurada anterior (Figura 16). É formado pelas porções proximais das artérias cerebrais anterior, média e posterior, artéria comunicante anterior e artérias comunicantes posterior direita e esquerda. Cada comunicante posterior une artéria carótda interna à cerebral posterior, ou seja, unem o sistema caro deo ao vertebral. No entanto, em condições normais, não há passagem de sangue signi ficatva de um sistema para o outro; a passagem ocorre apenas nos casos de obstrução.
Figura 16 - Polígono de Willis
b) Drenagem venosa do encéfalo
As veias encefálicas, em geral, não acompanham as artérias, sendo maiores e mais calibrosas do que elas, com paredes finas e desprovidas de musculatura. Elas drenam para os seios da dura-máter e daí para as veias jugulares internas. A regulação da circulação venosa é feita pela aspiração da cavidade torácica, força da gravidade e pulsação das artérias. Vale lembrar que o leito venoso é muito maior que o arterial, sendo, por esse motvo, mais lenta sua drenagem; além disso, a pressão venosa é muito baixa e varia pouco pela grande capacidade de distensão das veias e dos seios. -
Veias cerebrais
As veias cerebrais podem ser agrupadas em sistema venoso superficial e sistema venoso profundo. Sistema venoso superficial: trata-se das veias cerebrais superficiais que drenam o córtex e a subs•
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tância branca adjacente, sendo que as veias que se localizam na região superior do hemisfério drenam para o seio sagital superior e as da região inferior drenam para os seios da base e no seio transverso; Sistema venoso profundo: trata-se das veias que drenam o sangue de regiões localizadas profundamente no cérebro (como cápsula interna, corpo estriado, diencéfalo) e con fluem para um único tronco venoso, mediano, denominado “veia cerebral magna” ou “veia de Galeno”, logo abaixo do esplênio do corpo caloso, a qual desemboca no seio reto.
9. Barreiras encefálicas - Conceito São mecanismos seletvos para a troca de substâncias entre o tecido nervoso, sangue e liquor. Dessa forma, exis-
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A I G O L O R U E N
NEUROLOGIA tem 3 barreiras, que são a hemoencefálica, a hemoliquórica e a liquor-encefálica. A barreira liquor-encefálica é mais permeável e fornece passagem a mais substâncias, enquanto que as outras 2 barreiras impedem a passagem de agentes tóxicos para o cérebro. No entanto, nem sempre ocorre contenção total de uma determinada substância, podendo ocorrer apenas maior dificuldade. Fica claro que o fenômeno de barreira não é geral para todas as substâncias e varia para cada barreira. a) Barreira hemoencefálica
Essa barreira seria formada basicamente por 2 estruturas, a despeito da divergência entre alguns autores. Tais estruturas seriam o neurópilo e capilar cerebral. O 1º, nada mais é do que o tecido entre os vasos e os corpos celulares, que no encéfalo é muito estreito. Já o capilar cerebral, principalmente o endotélio dos capilares cerebrais, são apontados por alguns autores como o principal contribuinte para a existência da barreira hemoencefálica, visto que no encéfalo as células endoteliais são unidas por junções ín tmas que impedem a passagem de macromoléculas – não possuem fenestrações e não são contráteis –, o que protege o cérebro na situação em que há grande liberação de histamina. Em algumas regiões do encéfalo, essa barreira não existe, como é o caso da área póstuma, pineal, neuro-hipó fise e plexos coroides, que são áreas de função endócrina comprovada ou discu tda. Existem também áreas que são mais permeáveis a determinadas substâncias do que outras, como é o caso de certos fármacos que penetram com mais facilidade no núcleo caudado e no hipocampo.
e composta apenas por membrana celular consequente às várias voltas que a célula de Schwann dá em torno do axônio, sem conter citoplasma entre as voltas. Já o neurilema é externo e composto pelo citoplasma e núcleo, que são as estruturas restantes da célula. Essas bainhas de mielina são interrompidas em intervalos aproximadamente regulares para cada tpo de fibra localizado entre eles e são chamados internódulos. Dessa forma, cada internódulo é ocupado por apenas uma célula de Schwann. No SNC, não há formação do neurilema. A bainha de mielina, por ser originada da membrana plasmátca, é formada por lipídios e proteínas que conferem a ela uma capacidade isolante, permi tndo, assim, que o impulso seja conduzido mais rapidamente. Por ser assim, o impulso é conduzido de forma saltatória e ocorrem potenciais de ação apenas nos nódulos de Ranvier. b) Fibras nervosas amielínicas
No SNP, as fibras pós-ganglionares do sistema nervoso autônomo e algumas fibras sensitvas são envolvidas pelas células de Schwann (neurilema), sem que seja formada a bainha de mielina. No SNC, as fibras amielínicas não apresentam envoltórios verdadeiros. Sendo assim, os prolongamentos dos astrócitos podem apenas tocar os axônios amielínicos. Nessas fibras, não há como o impulso ser conduzido de maneira saltatória; portanto, o impulso é conduzido mais lentamente, já que os potenciais de ação não têm como se distanciar.
b) Barreira hemoliquórica
Localizam-se nos plexos coroides, sendo que seus capilares não partcipam do fenômeno, ou seja, existem substâncias que podem atravessar os capilares fenestrados dos plexos coroides, mas serem barradas no nível da super f cie do epitélio ependimário voltada para a cavidade ventricular. Isso ocorre porque esse epitélio é provido de junções íntmas que impedem a passagem das macromoléculas.
10. Fibras nervosas A fibra nervosa é consttuída de um axônio e seu revestmento glial, que pode estar ausente. O principal reves tmento é a mielina, que é formada por células de Schwann no Sistema Nervoso Periférico (SNP) e por oligodendrócitos no SNC. Nesses casos, têm-se as fibras mielínicas. Na ausência de mielina, encontram-se as fibras amielínicas. No SNC, a substância branca contém principalmente fibras mielínicas e neuroglia, enquanto a substância cinzenta é composta por fibras amielínicas, corpos de neurônio e neuroglia. No SNC, as fibras nervosas agrupam-se para formar os tratos e fascículos e no SNP também se agrupam para formar os nervos. a) Fibras nervosas mielínicas
No SNP, as células de Schwann formam, em geral, a bainha de mielina e o neurilema. A bainha de mielina é interna
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Figura 17 - Homúnculo de Pen fi eld sensorial
NEUROANATOMIA
A I G O L O R U E N
Figura 18 - Vascularização cerebral
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NEUROLOGIA
CAPÍTULO
2
Semiologia e propedêutca neurológica Maria Aparecida Ferraz / Cris t na Gonçalves Massant / Mauro Augusto de Oliveira
1. Introdução O exame neurológico é ferramenta fundamental para o diagnóstco em Neurologia. Associado a uma boa anamnese, procurando informações sobre patologias pregressas e atuais, e sintomas atuais, são formuladas as hipóteses diagnóstcas sindrômica, topográfica e etológica. Obter informações sobre as medicações em uso é imprescindível para se considerarem algumas hipóteses (por exemplo, associações de an tcoagulantes e acidente vascular encefálico hemorrágico, hipoglicemiantes e coma diabétco). Não podemos deixar de enfatzar que o interrogatório sobre os diversos aparelhos e exame f sico geral sempre devem fazer parte da avaliação inicial em qualquer circunstância neurológica e são de suma importância. Há várias formas de conduzir um exame neurológico. O importante é acostumar-se com um método e seguir uma sequência lógica para que nenhum item relevante seja perdido. Pode-se avaliar um paciente por segmentos corporais: no segmento cefálico, avaliam-se pares cranianos, sensibilidade, motricidade e sinais de irritação meníngea; em membros e tronco, examinam-se motricidade, coordenação, sensibilidade e funções autonômicas. Outra forma de abordar o paciente neurológico seria avaliar cada sistema funcional isoladamente (psiquiátrico, motricidade, coordenação, sensibilidade, sinais de irritação meníngea e pares cranianos). O exame neurológico tem início já quando o paciente atravessa a porta do consultório, sendo possível observar o tpo de marcha, por exemplo, marcha paré tco-espástca (ceifante) e/ou hemiparesia do indivíduo com lesão cerebral, marcha atáxica do cerebelopata e marcha escarvante das lesões de nervos periféricos. Baseando-se nessas informações, chegamos aos diagnóstcos sindrômicos: - Síndromes cogni tvas, dolorosas, convulsivas, de hipertensão intracraniana, de irritação meníngea etc.; - Síndromes motoras: piramidais/neurônio motor superior (hemi, para ou tetraplégica), síndrome da unidade neuromuscular (que inclui miopa tas e neuropa tas periféricas/neurônio motor inferior);
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Síndromes sensitvas superficiais e/ou profundas; - Síndromes motoras extrapiramidais – hipociné tca/rígido-acinétca (parkinsoniana), hiperciné tcas (coreica, coreoatetose, balismo, distonia); - Síndromes cerebelar-atáxicas; - Síndromes de pares cranianos. -
Com estas informações, consideraremos os diagnós tcos diferenciais, solicitando-se exames complementares especí ficos para determinar a e tologia da doença.
2. Exame do estado mental/funções cortcais superiores A avaliação do estado mental do paciente ou consciência é dividida em 2 partes principais: a avaliação do nível de consciência e da qualidade da consciência ou funções cortcais superiores.
I - Nível de consciência O nível de consciência é caracterizado pelo grau de interação que o indivíduo tem com o meio ambiente e a percepção de si, ou seja, o quão acordado ou alerta o paciente está. Este deve sempre ser o passo inicial para o início do exame neurológico e nos dará subsídios à realização de uma avaliação neurológica completa. A preservação do nível neurológico adequado é dependente anatomicamente da substância re tcular atvadora ascendente que se localiza no tronco encefálico e parte do diencéfalo. Para que ocorra comprome tmento são necessários lesões no tronco encefálico (acidentes vasculares encefálicos, romboencefalite, tumores de sistema nervoso central), tálamo bilateral (trombose venosa cerebral, isquemia), hemisférios bilaterais (anóxia, metabólico/medicamentoso, traumatsmo cranioencefálico). Existem diversas formas de classi ficação no nível de consciência, de forma simpli ficada podemos dividir em: - Vígil ou acordado: abertura ocular e interação com o meio espontânea; - Sonolento: abertura ocular e interação após es mulo sonoro;
SEMIOLOGIA E PROPEDÊUTICA NEUROLÓGICA
-
Torporoso: abertura ocular e interação após es mulo
doloroso; -
Comatoso: Não há abertura ocular ou interação mes-
mo após es mulo doloroso. Em alguns casos como no trauma tsmo cranioencefálico escalas são realizadas como obje tvo de medir o nível de consciência de fácil aplicação e reprodu tbilidade como a escala de coma de Glasgow. Tabela 1 - Escala de coma de Glasgow
Abertura ocular
- Espontânea = 4 pontos; - Aos chamados = 3 pontos; - Com es mulo doloroso = 2 pontos;
folha de papel. Os desatentos não conseguem completar a tarefa, e os com heminegligência, só até a metade da folha. Diferente da ex tnção que só é percebida após es mulo bilateral simultaneamente. O estado confusional agudo (ou delirium) é uma patologia pica de déficit de atenção agudo (em casos mais graves, cursa com alucinações como em distúrbio de percepção de patologias metabólicas e infecciosas), e a hipera tvidade pode estar relacionada a um dé ficit de atenção crônico. Ao avaliar a atenção, é importante examinar também a orientação. As perguntas necessárias e importantes a um paciente desorientado no tempo e no espaço são nome, local e data, tentando dar-lhe uma 2ª oportunidade e mais tempo. Nas doenças da atenção, a 1ª a ser comprome tda é a orientação temporal, seguida pelo espaço e, depois, quanto à pessoa.
- Ausente = 1 ponto. Melhor resposta motora
- Obedece à ordem = 6 pontos; - Localiza a dor = 5 pontos; - Retrada especí fica à dor = 3 pontos; - Reage à dor com flexão patológica (decortcação) = 3 pontos; - Reage à dor com extensão (descerebração) = 2 pontos; - Ausente = 1 ponto. Melhor resposta verbal
- Orientado = 5 pontos; - Conversa, mas desorientado = 4 pontos; - Palavras inadequadas = 3 pontos; - Emite ruídos = 2 pontos; - Ausente = 1 ponto. Importante: coma = abaixo de 8 pontos; coma profundo = 3 pontos; consciente = 15 pontos.
II - Qualidade da consciência
A - Orientação e atenção Para que as funções intelectuais possam manifestar-se, é necessário o bom desempenho da atenção, que é dependente de estruturas subcor tcais (formação retcular atvadora ascendente-mesencefálica, núcleos intralaminares do tálamo), exercendo função a tvadora sobre o córtex cerebral, e 2 regiões cor tcais importantes para atenção: a área pré-frontal, que seria responsável pelo planejamento motor e comportamental do indivíduo, giros angular e supramarginal – no lobo parietal direito, responsáveis pela exploração e percepção de ambos os lados do corpo e espaço (o lado esquerdo só responde pela atenção do lado contralateral). Lesões à direita causam heminegligência ou hemi-inatenção. Um exame aplicável é o teste de conexão de números para formar uma figura. Outra forma de avaliar concentração e atenção é pedir ao paciente para fazer um traço, dividindo, ao meio, várias linhas colocadas ao acaso numa
B - Linguagem As afasias são comprometmentos parciais ou totais da capacidade de expressar e compreender pensamentos e emoções por meio de símbolos linguís tcos escritos ou falados, carregados de signi ficado (chamado de semântca = ideia), algumas vezes erroneamente diagnos tcadas como estado confusional. Apenas a área cor tcal relacionada com a linguagem está envolvida e não devem exis tr lesões de vias sensitvas ou motoras relacionadas à fonação e ou audição, bem como alterações afe tvas. As áreas envolvidas na linguagem são principalmente as regiões perissilvianas. Cerca de 95% dos indivíduos destros e 50% dos canhotos têm o hemisfério esquerdo como dominante para a linguagem (surgido evolu tvamente pela aquisição de habilidades manuais no ser humano). A área de Broca, que se localiza no giro frontal superior, relaciona-se com a programação da a tvidade motora da linguagem, enviando as informações para o córtex motor primário, que realiza tal função. Então, liga-se por meio do fascículo longitudinal ou arqueado com a área de Wernicke, que é ligada à percepção e à compreensão da linguagem. Esse feixe íntegro faz a comunicação da área que decodi fica com a que exprime a linguagem. a) Aspectos avaliados na linguagem -
Discurso: a fala espontânea, ou seja, a fluência ou a ve-
locidade de emissão de palavras (de 5 a 6 palavras por segundo) e conteúdo da fala; observando presença de parafasias, que são substtuições ou supressões de fonemas, sílabas ou palavras. Existem as semân tcas, em que se troca uma palavra por outra relacionada (“xícara” por “copo”), e fonêmicas, em que se trocam sílabas de uma palavra (“gata” por “lata”). Se muito intensas, podem criar novas palavras (neologismos); - Prosódia: melodia da linguagem em que a pessoa consegue exercer modulações das expressões (exclamações, interrogações), proporcionando o sen tdo literal de frases e palavras; - Compreensão e repe tção (palavras ou frases): aqui, é importante para localizar a lesão nas áreas cor tcais,
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NEUROLOGIA além de permi tr avaliar os níveis de consciência e memória; - Nomeação de objetos: diferente das agnosias visuais, em que o indivíduo pode reconhecer um objeto por outro es mulo sensorial, como o tato; - Leitura: corresponde à compreensão oral ou em voz alta, que tem o valor da repe tção, escrita. Esse exame identfica afasias e as dis tngue das disfonias e disartrias, já que, nestas, a linguagem está preservada. b) Tipos de afasias -
Afasia de Broca (motora, de expressão, verbal ou motora eferente): déficit da artculação da palavra, nome-
ação, repetção. O uso de regras grama tcais está alterado e há redução do vocabulário. Decorre das lesões na área de Broca (ou área motora); -
Afasia de Wernicke (de compreensão, sensi tva ou gramatcal): afasia denominada sensi tva ou de com-
preensão, decorrente de lesão na área de Wernicke. O paciente não reconhece seu problema e fala de modo fluente, com prosódia normal, mas com poucos substantvos e verbos, havendo, também, parafasias e neologismos. As funções de nomeação e de repe tção costumam estar alteradas; - Afasia de condução: é provocada por lesão do feixe arqueado, este que conecta a área de Broca com a área de Wernicke; característca de lesões do lobo parietal, com lesão do fascículo arqueado. Aqui, há o dé ficit de repetção, com compreensão e fala espontânea menos afetadas; - Afasia global: ocorre por grandes lesões que envolvem área de Broca e Wernicke. Nessa afasia, o paciente pratcamente não compreende nem se expressa; - Afasia nominatva anômica: giro angular esquerdo ou giro temporal medial posterior esquerdo. São afasias parciais motoras, há di ficuldade em nomear, mas o paciente sabe descrever o objeto; - Afasias transcortcais: lesões circunjacentes à região perissilviana de Broca ou de Wernicke motora (lesão na área motora suplementar) e sensi tva (lobo parietal inferior esquerdo), cursando com di ficuldade em narrar ou descrever espontaneamente, tendo como característca a repetção normal; afasia transcor tcal mista ou de isolamento – fala não fluente, compreensão alterada, boa repetção; - Afasia global: ocorre por grandes lesões que envolvem área de Broca e Wernicke. Nessa afasia, o paciente pratcamente não compreende nem se expressa; - Afasia subcortcal: ocorre por lesões, geralmente, vasculares no tálamo, caudado, putâmen e cápsula interna. Tem preservada a função de repe tção e há ainda hemiplegia associada. Quando ocorre no tálamo, assemelha-se à afasia de Wernicke e, quando no núcleo caudado, tem semelhança com afasia de Broca.
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C - Agnosias É a incapacidade de reconhecer objetos e símbolos, apesar da adequada percepção na modalidade (por exemplo, visual, tátl, auditva) na qual o objeto é apresentado. Incapacidade de identficar um objeto oferecido à percepção, não sendo este distúrbio proveniente nem de um dé ficit sensitvo ou sensorial nem de um distúrbio de atenção ou da consciência. Os impulsos sensoriais chegam dos órgãos sensoriais (visão, sensibilidade, audição) até as áreas de aferência cortcal sensitvas, inicialmente primárias, que repassam para áreas secundárias e, posteriormente, terciárias. A primária recebe a informação inicial das fibras sensitvas, sensoriais visual, auditva, somatossensitva; nas secundária e terciária, ocorre progressiva integração de informação de outras áreas. A agnosia ocorre por lesão na área secundária. Na agnosia visual, o paciente vê o objeto, mas não o reconhece por meio da visão; pode reconhecê-lo por meio do tato ou da audição, por exemplo. Na prosopagnosia, o paciente tem incapacidade de reconhecer rostos familiares.
D - Apraxias É a incapacidade de executar um ato motor aprendido e propositado com habilidade, na ausência de um distúrbio primário da atenção; compreensão; mo tvação; força; coordenação ou sensação, que pudesse evitar a consecução do ato espontaneamente. Assim, um indivíduo pode não ser capaz de abanar a mão, quando assim instruído, mas pode acenar, quando ele espontaneamente escolher fazê-lo. Distúrbio da atvidade gestual num indivíduo cujos aparelhos de execução da ação encontram-se intactos (ausência de distúrbios motores) e com plena consciência do ato a cumprir. Ocorrem por lesões em áreas motoras secundárias, que estão próximas da área motora primária. São incapacidades de executar um ato motor aprendido. - Apraxia ideomotora: o indivíduo é incapaz de executar uma ordem motora; porém, pode imitar o examinador ou fazer de modo automá tco (por lesão parietal esquerda inferior); - Apraxia ideatória: o indivíduo não executa nem imita o ato motor (lesão parieto-occipital esquerda); - Apraxia cinétca dos membros: ocorre di ficuldade de realizar pequenos movimentos com as mãos; - Apraxia bucolinguofacial: há lesão próxima à área de Broca, e o indivíduo não consegue executar uma ordem com essas regiões, mas pode fazê-la automa tcamente.
E - Memória A memória é dividida em memória imediata, memória recente e memória remota. A avaliação da memória imediata é feita no exame da atenção, sendo que esse tpo de memória refere-se à memória de ultracurta duração. A memória depende de várias áreas cor tcais e cada informação sensorial é armazenada em sua área especí fica.
SEMIOLOGIA E PROPEDÊUTICA NEUROLÓGICA
O sistema límbico conecta-se com áreas subcor tcais. Um importante local é o núcleo basal de Meynert, predominantemente colinérgico, que emite fibras para todo o córtex. Trata-se de um dos locais acome tdos na doença de Alzheimer. Há conexões do hipotálamo com o sistema límbico, determinando as memórias do sistema autonômico relacionado com estados emocionais. Lesões do sistema límbico, hipocampo e amígdalas ocasionam amnésia anterógrada, em que não há retenção de novas memórias. Quanto às lesões diencefálicas, como na psicose de Korsakoff , causada por abuso de álcool, há de ficiência de tamina que lesa os corpos mamilares no hipotálamo e leva à amnésia anterógrada. Esta úl tma é a situação em que o indivíduo não se lembra do ocorrido antes da lesão. Comumente, ocorre em traumatsmo encefálico. Um exame que serve de triagem para a avaliação de déficits cogni tvos é o miniexame do estado mental. Ele é dependente do nível de escolaridade: em analfabetos, o score limite da demência é 14 a 16 pontos no minimental; para indivíduos com 4 anos de escolaridade, o score é de 18 a 21 pontos; com ensino fundamental completo, 21 pontos; com ensino médio completo, de 22 a 23 pontos; nível universitário completo, de 25 a 26 pontos. -
Miniexame do estado mental total = 30 pontos. Orientação temporal: •
* Dia = 1, ano = 1, mês = 1, estação do ano + 1, hora do dia + 1. •
Orientação espacial:
* Local em que está presente no momento da consulta = 1, andar = 1, endereço = 1, cidade = 1, estado = 1, país = 1. -
Memória imediata: dar 3 palavras não relacionadas
e pedir para repe tr em seguida. Por exemplo: carro, vaso e janela = 3 pontos; - Atenção: soletrar a palavra mundo de trás para frente, ou executar 5 cálculos de subtração = 5 pontos; - Memória de retenção: lembrar as 3 palavras da memória imediata = 3 pontos. •
Linguagem: * Nomear 2 objetos = 2 pontos, repe tr = 1 ponto,
copiar 2 pentágonos que se interseccionam em um vértce = 1 ponto, repetr “nem aqui, nem ali, nem lá” = 1 ponto, compreender ordem “pegue esta folha, dobre-a 1 vez ao meio e coloque-a sobre a mesa” = 3 pontos, ler uma frase e obedecer à ordem de fechar os olhos = 1 ponto.
3. Motricidade A - Algumas definições Paresia: fraqueza com dé ficit parcial de força muscular; - Plegia: perda ou dé ficit total de força muscular; -
Monoparesia: perda parcial de força em um membro; - Hemiparesia: fraqueza em um hemicorpo; - Paraparesia: membros simétricos são comprome tdos; - Tetraplegia: 4 membros comprome tdos com perda -
total de força; - Diplegia: 2 hemicorpos são comprome tdos com perda total de força (duplicidade de lesões/tempos diferentes).
B - As vias motoras A via motora inicia-se no córtex motor (área motora primária no giro pré-central, homúnculo motor). Seus axônios seguem pelo centro, depois cápsula interna, descendo no pedúnculo cerebral (mesencéfalo) e ponte. A via motora cruza a linha média na decussação das pirâmides (bulbo). O trato cortconuclear termina nos núcleos motores dos pares cranianos. O trato cortcoespinal desce pela medula e suas fibras terminam em neurônios motores espinais: alfa e gama, que vão inervar, respec tvamente, fibras musculares e fusos neuromusculares. A lesão do trato cor tcoespinal leva à perda de força muscular voluntária e perda de re flexos cutâneos superficiais (cutâneo-plantar e cutâneo-abdominal), com aparecimento de reflexos exaltados e patológicos (como sinal de Babinski). Lesões que afetam a mímica facial têm peculiaridades: o 1/3 superior da face recebe inervação cor tcal homo e contralateral, preservando-se essa movimentação nas lesões da via motora central, portanto (paralisia facial central – comprome tmento do 1/3 inferior da hemiface contralateral). Já nas lesões do nervo facial, todas as fibras estão agrupadas, comprometendo toda a mímica facial. - Lesões -
No córtex: resultam em hemiparesia de predomínio
braquifacial (cor tcal lateral) ou crural, dependendo do local da lesão; - Na cápsula interna: acomete as fibras todas reunidas. Logo, a hemiparesia é proporcionada e acomete igualmente membros superior, inferior e face; -
No tronco cerebral antes da decussação das pirâmides: gera lesão do tpo alterna (lesão do nervo crania-
no ipsilateral e dos membros, contralateral); - No trato cortcospinal na medula: em geral, há lesão concomitante das fibras sensitvas do trato espinotalâmico que ascende próximo ao funículo lateral da medula. A movimentação automátca e ajustes posturais são regulados pelos chamados extrapiramidais: - Trato rubroespinal (origem no núcleo rubro): responsável pelos músculos distais dos membros; - Trato tetoespinal (origem no teto mesencefálico): responsável pelos músculos da cabeça; -
Trato retculoespinal (origem na formação re tcular):
responsável pelo controle (ritmicidade) da marcha.
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NEUROLOGIA As lesões desses tratos levam à hipertonia e hiper-re-
-
flexia.
Lesões restritas ao corpo do motoneurônio medular geram fraqueza, podendo ocorrer fasciculações (por exemplo, esclerose lateral amiotrófica, amiotrofia espinal progressiva), com perda de re flexos e amiotrofia. Nas lesões medulares, ainda há comprome tmento de fibras que conduzem informações de sensibilidade com distribuição segmentar de importante signi ficado localizatório, da mesma forma na lesão localizada em raízes ou plexos, ou nervos. Em uma lesão aguda de metade medular (Síndrome de Brown-Séquard), há, inicialmente, a fase de choque medular: tônus ausente e arre flexia ipsilateral, associado a um nível sensitvo (com perda da aferência de sensibilidade contralateral, abaixo daquele nível, o que localiza a lesão). Após horas ou dias, aparecem sinais de liberação piramidal, por lesão do trato cor tcospinal. Chama-se de unidade motora o seguinte conjunto: - Neurônio motor inferior (medular); - Seu axônio (que corre pelas raízes nervosas, plexos, nervos periféricos); - Junção neuromuscular; - Placa motora; - Fibra muscular inervada pelo referido axônio. A lesão em locais diferentes da unidade motora geralmente ocasiona perda de tônus muscular, paralisia flácida, diminuição ou abolição dos re flexos tendinosos profundos. Nas doenças musculares (distrofias, miopatas inflamatórias) e da junção neuromuscular (miastenia grave, síndrome paraneoplásica de Lambert-Eaton), os re flexos estão preservados. A pseudo-hipertrofia é uma alteração muscular observada nas distrofias progressivas, em que os grupos musculares são substtuídos por tecido gorduroso em grande quan tdade. Nas miopatas, o déficit predomina onde há maior volume muscular: nas regiões proximais dos membros.
Manobra dos braços estendidos (Mingazzini para os membros superiores): por 2 minutos, estender bra-
ços, antebraços, com dedos estendidos e abertos; - Manobra de Raimiste para pacientes deitados: decúbito dorsal, os antebraços são fletdos sobre os braços em 90° e as mãos são estendidas com os dedos separados. Apenas estender os antebraços e dedos em ângulo de 90° com o plano horizontal, por 2 minutos; -
Manobra de Mingazzini para os membros inferiores:
coxas fletdas sobre a bacia em 90°; pernas dispostas horizontalmente, fletdas sobre as coxas também em 90° mantdas por 2 minutos; - Manobra de Barré: paciente em decúbito ventral, pernas e pés em 90°, avalia déficits distais; -
Manobra de Wartenberg para os membros inferiores (prova de queda do joelho): decúbito dorsal, com as
coxas fletdas discretamente sobre o quadril e as pernas sobre as coxas com os calcanhares sobre super f cie lisa e dura. Importante para avaliar força muscular em membros inferiores de pacientes com hemorragia subaracnóidea (aneurisma), pois evita aumento da pressão intracraniana em consequência do aumento da pressão intra-abdominal.
E - Tônus e trofismo Com a realização de inspeção, palpação, movimentação atva e passiva do músculo examinado é possível avaliar o tônus e o tro fismo. O trofismo pode ser classi ficado como: -N ormotrófico: Hipotrófico: devido lesão SNP ou desuso; Hipertró fico: algumas distrofias musculares. • •
-
Tônus pode ser classi ficado como: Hipotônico: ocorrem lesões do sistema nervoso periférico ou lesões cerebelares; Hipertonia espástca (sinal do canivete): lesão do trato piramidal (exemplo: AVC, mielopa tas); Hipertonia plástca (roda denteada): síndromes extrapiramidais (exemplo: doença de Parkinson); Hipertonias especiais: hipertonia de descerebração/hipertonia de descor tcação/tétano (opistótono), cãibras e psicogênica. •
C - Avaliação da força muscular pedindo para o paciente realizar manobras que permitam graduar a força
•
•
-
Grau V: força contra ação da gravidade e resistência do
examinador; - Grau IV: o músculo vence a força da gravidade, mas não completamente a resistência do examinador; - Grau III: o músculo só vence a força da gravidade; - Grau II: o músculo não vence a gravidade, mas faz alguma contração visível, como mover o membro na lateral sem ação da força da gravidade; - Grau I: exibe contração visível, porém sem movimentá-lo; - Grau 0: movimento e contração ausentes.
D - Manobras deficitárias de auxílio Podem ser usadas em caso de dúvidas sobre a presença ou não de fraqueza.
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•
F - Reflexos -
Reflexos profundos: obtdos pela percussão osteotendí-
nea ou fáscia do músculo avaliado, podem estar normais, ausentes, diminuídos ou vivos (o re flexo é obtdo mais facilmente, amplo e brusco). O re flexo exaltado ocorre com a percussão de área maior do que a habitual em pontos que comumente não desencadeariam o re flexo; - Caracterís tcas fisiológicas: período de latência, período refratário, fadiga, fenômeno de adição, princípio de
SEMIOLOGIA E PROPEDÊUTICA NEUROLÓGICA
inervação recíproca e lei de localização (área re flexógena). Baseados nessas característcas podem definir hiper-re flexia como diminuição do tempo de latência, aumento da amplitude de movimento, obtenção de varias respostas quando da aplicação de es mulo único (reflexo policinétco); pelo aumento da área de obtenção do reflexo e pela impossibilidade de inibir voluntariamente o reflexo. Clônus é um sinal pico de hiper-re flexia, pois, por es tramento muscular, obtém-se repe tdas contrações rítmicas involuntárias esgotáveis ou inesgotáveis (aquileu e patelar são exemplos); - Reflexos da face: os reflexos profundos da face (mentoniano, o orbicular dos olhos e o orbicular dos lábios) dependem dos pares cranianos V e VII, e do nível de integração do re flexo, que se encontra na ponte;
preferência no nível da união do 1/3 superior com o 1/3 médio. Resposta: elevação do tes culo ipsilateral, nos casos de reflexos vivos também resposta contralateral; -
Outros reflexos patológicos: •
dedo médio causa flexão dos outros dedos da mão, significa liberação piramidal em MMSS. Similar ao Watemberg e Trommer. -
Sinais de liberação frontal: •
•
Tabela 2 - Principais re fl exos profundos pesquisados no exame neurológico
Nervo
Inervação
Radial
C5C6
Braquiorradial
Bicipital
Músculo cutâneo
C5C6
Bíceps braquial
Tricipital
Radial
C7C8
Tríceps braquial
Flexores dos dedos
Mediano e ulnar
C8T1
Flexor superficial dos dedos
Aquileu
Tibial
L5 a S2 Gastrocnêmio/sóleo
Patelar
Femoral
L2 a L4
Quadríceps femoral
Adutores da coxa
Obturador
L2 a L4
Adutor magno/longo/curto
Costoabdominais Intercostais
•
Músculos
Estlorradial
T5 a T12 -
-
Ileoinguinais
L1
-
-
Íleo-hipogástricos
L1
-
•
objeto na região palmar ou plantar determina o movimento de preensão; Reflexo de perseguição ( groping re fl ex ): a visão de um objeto nas proximidades da mão afetada determina um movimento de perseguição para aprendê-lo; Reflexo orbicular dos olhos ou glabelar (sinal de Myerson): oclusão da rima palpebral, paciente não
G - Distúrbios do movimento Os distúrbios de movimento ocorrem principalmente por lesão dos chamados núcleos/gânglios da base (dito sistema extrapiramidal). Nesse item são importantes a observação do paciente e os dados de história, pois os exames de imagem não oferecem tanto auxílio. Seguem alguns conceitos: - Tremores: movimentos rítmicos de contração alternada de músculos agonistas e antagonistas (por exemplo, tremor essencial, fisiológico, tremor parkinsoniano);
Reflexos superficiais: cutâneo-abdominal (es mulo da
parede abdominal com espátula leva ao desvio do umbigo para o lado es tmulado); - Cremastérico super ficial: em decúbito dorsal membros inferiores em extensão, há abdução em es tmulação cutânea da face medial da coxa, 1/3 superior) e cutâneo-plantar (estmulação plantar com espátula na região medial leva à flexão dos artelhos e hálux). Em caso de dorsiflexão lenta do hálux e abertura em leque dos artelhos, trata-se de um sinal patológico de liberação piramidal chamado sinal de Babinski. Crianças com até 1 ano de idade terão, ainda, dorsi flexão dos artelhos, pois o sistema piramidal está sofrendo o processo gradual de mielinização; - Cremastérico profundo: obtdos pela pressão digital sobre a musculatura da coxa em sua face medial, de
Reflexo oro-orbicular ou orbicular dos lábios; Reflexo de preensão ( grasping re fl ex ): o contato do
consegue impedir o “piscar”.
-
Reflexo palmomentoniano: es mulo à palma da
mão (eminência tênar) com contração ipsilateral dos músculos mentual e oro-orbicular, com discreta elevação do lábio inferior; •
Tendão dos músculos
Hoff man: es mulo ungueal em falange distal do
Coreia: movimentos involuntários bruscos, breves,
migratórios e errátcos (por exemplo, coreia de Sydenham, doença de Wilson); -
Atetose: movimentos sinuosos lentos em torno de um
eixo longo do membro afetado; -
Balismo: movimentos bruscos, breves, proximais, se-
melhantes a chutes e arremessos; -
Mioclonias: contrações involuntárias súbitas (por exem-
plo, mioclonia pós-anóxia cerebral, doenças neurodegeneratvas) lembram pequenos sustos. São posi tvas quando causadas por contrações musculares súbitas e negatvas (asterixis da hepatopata, encefalopata urêmica) quando há cessação abrupta da contração muscular; -
Tique: movimentos estereotpados, breves, repettvos,
suprimíveis. Podem ser motores e/ou vocais (como síndrome de Gilles e síndrome de La Toure e);
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A I G O L O R U E N
NEUROLOGIA -
Distonia: causada por contração sustentada conco-
mitante de músculos agonista e antagonista. Levam a abalos lentos, movimento artcular mantdo e torção ou postura anormal.
-
Equilíbrio dinâmico: é avaliado através do padrão da
marcha e pode ser classi ficada como na Tabela 4. Tabela 4 - Padrões de marcha
Tipo de marcha
H - Síndromes extrapiramidais Podem ser divididas em rígido-aciné tcas ou hipercinétcas: - Rígido-acinétcas (hipocinétcas): parkinsonismo (idiopátco, induzido por drogas como cinarizina, haloperidol, alfa-metldopa, mult-infarto, pós-trauma de crânio etc.). Há dificuldade em realizar movimento voluntário: acinesia/hipocinesia. De forma análoga, há microgra fia e hipomimia (diminuição da mímica facial, levando a fácies em máscara), festnação (vários passos no mesmo lugar), com redução da amplitude dos movimentos (bradicinesia), hipertonia muscular dita plás tca, em que há uma rigidez homogênea em toda movimentação passiva. O movimento anormal que pode exis tr é o tremor associado, de repouso; - Hiperciné tcas: são as síndromes coreicas, atetósicas, coreoatetósicas, que são basicamente movimentos anormais. O diagnóstco e tológico relaciona-se à idade de instalação da doença, história familiar e presença de doenças sistêmicas.
Síndrome periférica
Síndrome extrapiramidal
Força muscular
Diminuída
Diminuída
Normal
Tônus
Hipertonia espástca
Hipotonia
Hipertonia plástca
Reflexos tendinosos
Exaltados
Hiporreflexia
Normorreflexia
Presente
Presente
Reflexos cutâAbolidos neo-abdominais Reflexo cutâneo-plantar
Flexão ou Extensão (sinal sem resde Babinski) posta
Hemiplégico-espástca (ceifante):
Membro abduzido em relação ao quadril, produzindo um movimento de circundação. Associado as hemiplegias piramidais.
Acidente vascular cerebral, tumores de sistema nervoso central, neurotoxoplasmose
Paraparétca (em tesoura)
Ocorre devido a lesões piramidais bilaterais, comumente no caso de lesões medulares. As 2 pernas em adução fazem um movimento de cruzamento entra as 2.
Mielopata
Ataxia cerebelar
Marcha instável com base alargada, sem grandes mu- Lesões cerebedanças com o fechamento lares dos olhos.
Parkinsoniana (pequenos passos)
É caracterizada pelo encurvamento do tronco para frente, passos curtos que são inicialmente lentos e progridem na velocidade, associado à perda do balanço passivo dos membros.
Doença de Parkinson, parkinsonismos a picos
Magnétca (apraxia de marcha)
O paciente anda com os pés juntos ao chão, não conseguindo executar o movimento do passo.
Hidrocefalia de pressão normal, lesões frontais
Escarvante
Ocorre uma elevação exagerada da perna para Lesão de nervo evitar que o pé toque o periférico solo, e por vezes o bico do pé toca o chão.
Flexão
4. Equilíbrio estátco e dinâmico (marcha) O equilíbrio pode ser dividido em está tco e dinâmico: - Equilíbrio estátco: é avaliado através da prova de Romberg, pede-se ao paciente que com os pés aproximados feche os olhos. À queda imediata ao chão dá-se o nome de sinal de Romberg que signi fica a perda de propriocepção consciente geralmente por lesão do funículo posterior (de ficiência de vitamina B12 ou neurossí filis). A queda após latência para um lado preferencial pode signi ficar um “Romberg vestbular” ou pseudo-Romberg e indica lesão ipsilateral de vias vestbulares;
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Patologia
Base alargada, pisada com energia ao solo com toque Tabes dorsalis, Talonante (ata- inicial do calcanhar, olhar deficiência de xia sensitva) em direção aos pés senvitamina B12 do impossível com olhos fechados.
Tabela 3 - Diferenças entre síndrome piramidal x síndrome extra piramidal
Síndrome piramidal
Caracterís tcas semiológicas
5. Coordenação e provas cerebelares As alterações cerebelares caracterizam-se por incoordenação com dismetria e decomposição do movimento. O paciente erra o alvo, por exemplo, na manobra índex-nariz ou índex (dedo) do paciente, índex do examinador e/ou na prova calcanhar-joelho. Há tendência de desvio para o lado lesado e, ao contrário das lesões sensi tvas, não se altera com olhos abertos ou fechados. A fala pode ser afetada, tornando-se irregular (escandida). Há perda da capacidade de alternar rápidos
SEMIOLOGIA E PROPEDÊUTICA NEUROLÓGICA
movimentos (disdiadococinesia) e pode haver perda do movimento coordenado entre o tronco e os membros, por exemplo, ao levantar-se/sentar-se no leito.
6. Sensibilidade A sensibilidade é dividida em geral – tato, dor, temperatura, propriocepção, sensibilidade visceral – e especial: visão, olfato, audição e paladar. Os conceitos mais usados são: - Hipo ou hiperestesia; - Anestesia (perda total); - Disestesia (sensação distorcida, desagradável); - Alodínia (perceber como doloroso um es mulo não doloroso); - Hiperpata (es mulos de baixa intensidade e sucessivos com dor violenta); - Grafestesia (capacidade de reconhecer símbolos e letras pelo tato); - Estereognosia (reconhecer objetos por sua forma, tamanho e textura; - Artrestesia (localizar posição de uma ar tculação). Conhecer o trajeto das fibras sensitvas permite localizar a lesão. No nervo periférico, as fibras que conduzem dor caminham juntas com as fibras motoras, tato e sensibilidade superficial e profunda. Na medula, separam-se em vias diferentes. Os tratos grácil e cuneiforme estão no cordão posterior da medula e conduzem a sensibilidade profunda (vibratória, artrestesia, tato), seguem ipsilateralmente até os núcleos grácil e cuneiforme no bulbo, onde fazem sinapse para emitr prolongamentos que decussam no fascículo arqueado e ascendem até o tálamo e, deste, até o córtex sensi tvo. As vias que conduzem a dor e a temperatura até o corno posterior da medula fazem sinapse e emitem prolongamentos que cruzam a linha média na comissura anterior da medula, na frente do canal central desta. As pesquisas de sensibilidade tato devem ser feitas com algodão (com o dedo, pode haver pressão e, assim, es mulo de sensibilidade profunda). Objetos pon tagudos causam dor, mas não perfuram o tecido, e devem ser descartáveis. Na sensibilidade profunda vibratória, u tliza-se um diapasão de 64 a 128Hz, colocado sobre eminências ósseas, na posição artcular-artrestesia, alternando a posição dos artelhos e a sensibilidade profunda, com equilíbrio está tco e sinal de Romberg. A sensibilidade térmica pode ser pesquisada com tubo de água quente e fria.
A - Lesões periféricas Nas lesões de nervo periférico ou craniano ocorre alteração sensitva no território de sua distribuição, além de perda de sensibilidade e de motricidade. Quando um único nervo está lesado, temos a:
Mononeuropa ta: apenas 1 nervo está lesado; - Mononeuropa ta múltpla: vários nervos são compro-
metdos em tempos diferentes (por exemplo, diabetes, arterites); - Polineuropa ta: distribuição distal e simétrica, vários nervos comprometdos na mesma relação temporal; - Lesões radiculares: ocorre perda de sensibilidade e é em faixa no dermátomo relacionado à raiz.
B - Lesões centrais Podemos classificar as lesões centrais quanto à sua topografia e o tpo de acometmento: - Secção medular completa: há perda de todos os tpos de sensibilidade abaixo do nível de lesão, com lesão do sistema piramidal concomitante (perda de força). Os reflexos, embora abolidos numa fase inicial (choque medular), tornam-se exaltados, com sinal de Babinski e perda dos re flexos cutâneo-super ficiais; -
Hemissecção medular (síndrome de Brown-Séquard):
ocorre perda da sensibilidade profunda com síndrome piramidal ipsilateral e perda contralateral da sensibilidade térmica e dolorosa abaixo do ponto de lesão; - Lesão do funículo posterior: como na tabes dorsalis (neurossí filis) e lesão por de ficiência de vitamina B12, ocorre perda da sensibilidade profunda em ambos os hemicorpos abaixo do nível acome tdo, além de perda da propriocepção consciente, sensibilidade vibratória e tato fino; - Síndrome seringomiélica: há uma área de cavitação do centro da medula ou crescimento de tumor nesta topografia, destruindo a comissura central. É nesse segmento que decussam as fibras de sensibilidade térmica e dolorosa, originando a anestesia suspensa restrita à área de localização de lesão. Com preservação da sensibilidade profunda do funículo posterior, temos a dissociação seringomiélica; - Lesão das vias sensi tvas no tronco cerebral: leva a alterações contralaterais, pois houve decussação das fibras no bulbo. Dependendo do local da lesão, acontece, também, o envolvimento de nervos cranianos, vias cerebelares e piramidais; - Lesões da via sensi tva no tálamo: causam hipoestesia contralateral, e, 4 a 6 semanas após a lesão, podem aparecer crises espontâneas de dor, disestesia ou alodínia; - Lesões cortcais somatossensoriais: causam perda da sensibilidade na área de representação do segmento do corpo. Se a lesão ocorre em áreas de maior integração sensorial, temos agnosia sensi tva e perda da capacidade de reconhecer o objeto pela palpação. Áreas mais complexas envolvem distúrbios de atenção e comportamento, como área temporoparietal direita, em que o paciente deixa de perceber metade de seu corpo.
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NEUROLOGIA no. São recebidas pela re tna e transmitdas pelo nervo óptco ao córtex visual, com o controle adequado da musculatura ocular extrínseca, permi tndo que as imagens incidam em pontos equivalentes ambas as retnas.
7. Sinais meníngeos Estão presentes quando nos quadros in flamatórios das meninges, decorrentes de infecção (bactérias, fungos, vírus) ou sangramento. Denomina-se meningismo a síndrome com rigidez de nuca sem in flamação meníngea, que ocorre em infecções sistêmicas, principalmente em crianças pequenas. Nas inflamações das meninges, estão presentes sinais e sintomas como dor, rigidez de nuca, cefaleia, fotofobia, náusea, febre e calafrios. - Rigidez de nuca: caracteriza-se por espasmo da musculatura do pescoço com dor à flexão e resistência ao movimento passivo, impossibilitando ao médico colocar o queixo do paciente no próprio peito, embora os movimentos laterais e rotatórios do pescoço estejam preservados (aqui, a dificuldade será em pacientes com artrose cervical). Rigidez extrema leva ao opistótono com a cabeça lançada para trás. No paciente em estado de coma profundo ou com meningite fulminante pode estar ausente. A rigidez de nuca também pode ser encontrada em casos de herniação das tonsilas cerebelares ou por aumento da pressão liquórica. E a restrição ao movimento do pescoço pode acontecer em abscessos retrofaríngeos e linfadenopata cervical; - Sinal de Kernig: com o quadril e os joelhos flexionados, há incapacidade de se estender o joelho bilateralmente (diferente da irritação radicular lombossacra no sinal de Lasègue (elevação da perna estendida, geralmente unilateral); - Sinal do pescoço de Brudzinski: na tentatva de flexionar o pescoço com uma das mãos do examinador segurando o tórax, provoca-se a flexão dos quadris e dos joelhos bilateralmente.
8. Nervos cranianos A síndrome de nervos cranianos pode ocorrer isoladamente ou associada a outras síndromes por lesões em outros sistemas de fibras localizados no tronco cerebral, no cérebro, no cerebelo e na medula. - Nervo olfatório (1º nervo craniano): as alterações de olfação podem ser ocasionadas por lesões no epitélio olfatório na concha nasal superior, ou por alteração no nervo e no trato olfatório ou no córtex entorrinal, e regiões do hipocampo (crises uncinadas olfa tvas com uma percepção desagradável podem ser causadas por tumores de lobo temporal). Pode ocorrer por rinossinusites ou tumores de fossa anterior craniana, como meningiomas, ou mesmo por traumas de crânio. Hiposmia ou anosmia podem ser provocadas por várias drogas, antbiótcos, inclusive meningites; - Nervo óptco (2º nervo craniano): a visão é possível em virtude das informações luminosas que atravessam o sistema óptco da córnea, es f ncter pupilar e cristali-
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Com uma queixa de alteração visual, precisamos de finir se o que se tem é lesão do sistema óp tco ou das vias óptcas, ou lesão da musculatura ou nervos que controlam os movimentos dos olhos. Nesta úl tma, avaliam-se, especialmente, os 2º, 3º, 4º e 6º nervos cranianos. A re tna recebe a luz do ambiente e divide-se em 2 metades, temporal e nasal (que incide, respec tvamente, na metade nasal e na metade temporal da re tna). Da retna saem as fibras do nervo óptco, que decussam parcialmente no quiasma óp tco, e as fibras nasais passam para o lado contralateral e seguem no trato óptco pela radiação até o córtex visual primário. Lesões na re tna causam escotomas (por descolamento de re tna, infecções ou traumas); Lesões no nervo óp tco causam amaurose (quando total) ou escotomas (quando parciais). São exemplos: glaucoma e neurite óp tca associada ou não à esclerose múltpla por desmielinização; Lesão do quiasma óptco medial resulta em hemianopsia bitemporal, em que os tumores de hipó fise são a principal causa. Estes se iniciam inferiormente, cursando com quadrantopsia bitemporal superior; Lesões laterais no quiasma são raras e fornecem a hemianopsia nasal; Lesão do trato óptco leva à hemianopsia homônima direita ou esquerda contralateral ao lado lesado; Lesão no córtex visual e lesões da radiação óp tca completa também resultam em hemianopsia homônima, sendo raras as últmas e, nelas, as quadrantopsias ainda mais comuns. •
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A pesquisa visual é feita por: Avaliação da acuidade visual, com discriminação de detalhes usando a tabela de Snellen, a 6m do paciente, ou o cartão de Jaeger, a 36cm; Campimetria de confrontação, em que se detectam defeitos de campo visual. Nesta, o paciente olha para os olhos do examinador e vice-versa, oclui-se um dos olhos, movimenta-se um alvo a 60cm do paciente, além da mira em cada campo visual, separadamente. •
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III, IV e VI nervos cranianos: • • • •
São avaliados em conjunto; Controle das pupilas: apenas o III nervo; Movimentação ocular extrínseca; III nervo (oculomotor): inerva os músculos reto superior, reto inferior, reto lateral e oblíquo inferior. Sua lesão leva ao desvio ocular complexo, que, na
SEMIOLOGIA E PROPEDÊUTICA NEUROLÓGICA
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maioria, associa-se a um estrabismo divergente e prejuízo da elevação e depressão do olho, além de midríase por perda da inervação parassimpá tca do esf ncter da pupila e ptose palpebral; IV nervo (troclear): inerva o oblíquo superior; VI nervo (abducente): inerva o músculo reto lateral, e sua lesão leva ao estrabismo convergente; No córtex cerebral, há áreas que controlam o movimento conjugado dos olhos, emi tndo fibras que conectam a movimentação do III nervo com o IV nervo contralateral, através do fascículo longitudinal medial (ponte); Lesões cortcais levam ao desvio conjugado do olhar para o lado da lesão e contralateral à hemiparesia, e lesão no centro do olhar conjugado pon tno desvia os olhos para o lado contralateral e para o lado da hemiparesia (Foville inferior); Lesões pontnas comprometendo o fascículo longitudinal medial levam ao dé ficit de adução (di ficuldade de movimento medial) do olho com nistagmo do olho abduzido e preservação da convergência ocular, que é controlada pelo III nervo. O IV nervo é mais dif cil de ser avaliado isoladamente, pois o músculo oblíquo superior, por ele inervado, só abaixa o olho quando este está aduzido por ação do reto medial (inervado pelo III nervo). Os núcleos dos nervos cranianos podem ser afetados por isquemias ou tumores, e, como se encontram na ponte, há fibras sensitvo-motoras e vias cerebelares que podem estar envolvidas dependendo do local da lesão. A musculatura ocular extrínseca pode ser envolvida em patologias como síndromes miastênicas, ou doença de Graves com exo almia; É importante avaliar a presença de anisocoria em ambiente claro e escuro. Pupilas normais têm de 3 a 5mm de diâmetro; acima de 5mm, são ditas midriátcas e, abaixo de 3mm, mió tcas. Pupilas desiguais são anisocóricas (que podem exis tr como fisiológicas em 20% das pessoas normais). Lesão do nervo óptco (II) leva à perda do re flexo fotomotor direto e preserva o consensual, e lesão do III nervo, a midríase paralí tca do lado lesado e perda do re flexo pupilar consensual e direto. Tal alteração é sinal precoce de herniação do úncus hipocampal sobre esse nervo; Possíveis causas de miose são neurossí filis, diabetes, uso de levodopa, álcool e outras drogas, inclusive hematomas pontnos, que podem causar pupilas puntformes. Existem causas oalmológicas de miose, como irritações, corpo estranho, sinéquias.
V nervo trigêmeo (V nervo craniano): responsável
pela inervação sensitva superficial e profunda da face e motricidade mastgatória. Seu núcleo sensi tvo e motor estende-se ao longo do tronco cerebral. Pesquisa-
-se o funcionamento do trigêmeo pedindo ao paciente que abra e feche a boca, e morda uma espátula. Quando há lesão, é mais fácil trá-la do lado lesado. Em lesões bilaterais, a mandíbula cai pela ação da gravidade; em lesões unilaterais, a boca, aberta, desvia para o lado lesado, devido à ação do músculo pterigóideo normal que desvia a boca para o lado oposto. Lesões do trigêmeo causam disartria leve, com fala lenta, sons anasalados e, às vezes, incompreensíveis. O re flexo córneo palpebral é feito por meio de uma es tmulação da córnea com algodão, que leva ao fechamento das pálpebras pelo músculo orbicular dos olhos (integração do reflexo no tronco cerebral, aferência sensi tva pelo V nervo, eferência motora pelo VII nervo); -
VII nervo facial (VII nervo craniano): inerva a muscu-
latura da mímica facial e a parte sensi tva dos 2/3 anteriores da língua. É responsável por ocluir a boca para contenção de alimentos durante a mas tgação. Nas paralisias periféricas, toda a metade facial fica comprometda quanto à motricidade, e, nas lesões ditas centrais (como o 1/3 superior da face recebe inervação bilateral das fibras cortcais), não há perda de sua movimentação. Lesões do nervo facial causam distúrbio de fonação, com di ficuldades com fonemas labiais; -
VIII nervo ves tbulococlear (VIII nervo craniano): é um
nervo sensitvo. A hipoacusia por lesão periférica pode ser de condução ou neurossensorial. Na 1ª, o som não é transmitdo da cóclea para o nervo (perfuração do mpano, cerume, otosclerose); na 2ª, o som que chega até a cóclea e não é percebido ou transmi tdo pelo nervo coclear. Um diapasão com 1.024 ou 512hz pode ser usado para diferenciá-las. Na prova de Rinne, na lesão neurossensorial, o diapasão colocado na mastoide não melhora a percepção do som. Contudo, na hipoacusia de condução, a percepção do som é melhor com o diapasão na mastoide. Na prova de Weber, ele é colocado na linha média; na hipoacusia de condução, o lado lesado funciona como uma caixa de ampli ficação do som, sendo este lateralizado para o lado anormal. Já na hipoacusia neurossensorial, a escuta é melhor no lado normal do que no lado lesado; -
IX e X nervos cranianos: • •
IX nervo (glossofaríngeo) inerva palato e língua; X nervo (vago) inerva cordas vocais e palato.
A pesquisa clínica é feita pelo re flexo nauseoso com estmulação por espátula da parede posterior da orofaringe, e não há sensação de vômito na lesão dos IX e X nervos. O IX nervo também é responsável pela gustação do 1/3 posterior da língua. O re flexo palatno é a elevação do palato com a estmulação da úvula e do palato mole. Nas lesões unilaterais, o palato e a úvula estão desviados para o lado normal (sinal da cor tna);
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NEUROLOGIA -
XI nervo craniano (acessório): inerva a faringe, larin-
ge (parte cranial) e músculo esternocleidomastóideo (parte espinhal); -
XII nervo craniano (hipoglosso): inerva a musculatura
da língua. O músculo genioglosso normal empurra a língua para frente e para o lado contralateral. Numa lesão unilateral, há desvio para o lado lesado à protrusão da língua. Em inspeções está tcas, podem ser vistas atrofias e fasciculações (como na esclerose lateral amiotrófica).
9. Resumo Quadro-resumo
- Exame neurológico: · Avaliação cogni tva: atenção, linguagem, agnosia, apraxia, memória; · Equilíbrio e marcha; · Avaliação motora: força, trofismo, movimentos anormais, tônus; · Reflexos profundos e superficiais; · Avaliação cerebelar: coordenação apendicular, diadococcinesia, nistagmo; · Exame dos nervos cranianos; · Avaliação da sensibilidade; · Sinais de irritação meningorradicular. - Escala de coma de Glasgow: abertura ocular, resposta motora
e resposta verbal: · Coma: abaixo de 8 pontos; · Coma profundo: 3 pontos; · Consciente e orientado: 15 pontos; - Paresia: fraqueza com dé ficit parcial de força muscular; - Plegia: perda ou déficit total de força muscular; - Nervos cranianos:
· Nervo olfatório (I nervo craniano); · Nervo óptco (II nervo craniano). · III (oculomotor), IV (troclear) e VI (abducente) nervos cranianos: * São avaliados em conjunto; * Movimentação ocular extrínseca; * Controle das pupilas: apenas o III nervo. · Trigêmeo (V nervo craniano): * Inervação sensitva superficial e profunda da face; * Motricidade mastgatória (músculos masseter e temporal). · Facial (VII nervo craniano): * Mímica facial; * Sensibilidade dos 2/3 anteriores da língua. - VIII nervo ves tbulococlear (VIII nervo craniano); - IX nervo (glossofaríngeo): inerva palato e língua; - X nervo (vago): inerva cordas vocais e palato; - XI nervo craniano (acessório): inerva a faringe, laringe (parte
cranial) e músculo esternocleidomastóideo (parte espinhal); - XII nervo craniano (hipoglosso): inerva a musculatura da língua.
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CAPÍTULO
3
Cefaleias Marcelo Calderaro / Rodrigo Antônio Brandão Neto / Maria Aparecida Ferraz / Crist na Gonçalves Massant / Mauro Augusto de Oliveira
1. Introdução O termo “cefaleia” se aplica a todo processo doloroso referido no segmento cefálico e que, portanto, pode ter origem tanto nas estruturas faciais quanto nas cranianas. Cefaleia é uma das queixas mais frequentes na prá tca clínica. Estma-se que 97% das mulheres e 94% dos homens apresentam dor no segmento cefálico em algum momento da vida. Avalia-se ainda que 80% dos indivíduos de uma população apresentarão, pelo menos 1 vez ao ano, um episódio de cefaleia, e metade deste número, mais de 2 episódios. É a 3ª queixa mais frequente em ambulatório de clínica médica e a 1ª causa de procura por neurologista. Os mo tvos da procura ao médico variam desde uma simples explicação para o motvo de ocorrência das cefaleias primárias até a presença de cefaleias incapacitantes, primárias ou secundárias. De acordo com estudo realizado, dos pacientes que procuram serviço médico para avaliação de cefaleia, é mais importante descartar uma patologia secundária (como neoplasia) para 70% deles, sendo, para os 30% restantes, o alívio da dor. Em serviços de emergência, cerca de 2 a 4% de todas as consultas devem-se à cefaleia. O mais importante no manejo da cefaleia na emergência é dis tnguir se a mesma é primária ou secundária. Esta, apesar de menos frequente (<10%), geralmente relaciona-se a afecções com grande morbimortalidade (hemorragia subaracnoide, meningite, tumores etc.). Assim, a anamnese e o exame f sico têm importância fundamental em sugerir etologias secundárias e selecionar pacientes para realização de exames de neuroimagem (em geral, TC de crânio sem contraste).
as característcas mais marcantes das cefaleias primárias sejam sua recorrência e a estereo tpia na apresentação clínica, o que em geral não ocorre nas cefaleias secundárias. Em 1998, a Sociedade Internacional de Cefaleia publicou a classificação e os critérios diagnós tcos das cefaleias e algias faciais, com sua 2ª edição em 2004, revisada em 2005. Assim, as cefaleias primárias podem ser dividas em: - Enxaqueca; - Cefaleia tensional; - Cefaleia em salvas e outras cefaleias trigeminoautonômicas; - Outras cefaleias primárias. A implicação prá tca de seguir o que propõe a Sociedade Internacional de Cefaleia é que há validação cien fica para que, caso um paciente relate uma dor que preencha critérios para cefaleia primária, não seja necessária uma investgação complementar. Um dado epidemiológico ú tl nesse momento é que mais de 90% dos pacientes que procuram atendimento médico por cefaleia têm dores primárias, que se reúnem em 3 grandes grupos: enxaqueca (75% dos casos), cefaleia do tpo tensional e cefaleia em salvas. Portanto, saber fazer o diagnóstco clínico adequado dessas 3 afecções é fundamental para qualquer médico. A anamnese deve ser dirigida à confrontação da queixa álgica do paciente com os critérios de cefaleias primárias. É partcularmente útl iniciar uma anamnese de cefaleia observando-se sua distribuição temporal. Existem 4 padrões de distribuição de dor ao longo do tempo, conforme esquematzados na Figura 1 e descritos a seguir.
- Anamnese e diagnóstco O 1º fato a ser entendido é que a cefaleia, assim como a febre, é um sintoma e não um diagnós tco. Embora o tratamento sintomátco seja frequentemente estabelecido, devemos nos esforçar para elucidar o diagnós tco em todos os casos, o que na maioria das vezes é alcançado por meio de uma história clínica detalhada. Genericamente, podem-se dividir as cefaleias em primárias, quando não está evidente uma causa anatômica; ou secundárias, quando se encontra um fator causal. Talvez
Figura 1 - Padrões de distribuição temporal das cefaleias
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NEUROLOGIA a) Cefaleia aguda emergente
O paciente apresenta-se com uma dor nova ou francamente diferente das anteriores. Embora esse padrão possa ser encontrado em um 1º ataque de cefaleia primária, deve-se sempre pensar em um diagnós tco secundário. Na maioria das vezes, caso não haja qualquer outra indicação de investgação, uma mera observação clínica evolu tva pode ser suficiente para esclarecer o diagnós tco. Na dúvida, a investgação deve ser realizada. b) Cefaleia aguda recorrente
Como dito anteriormente, a recorrência e a estereoda apresentação clínica são as caracterís tcas mais marcantes das cefaleias primárias. Embora algumas vezes esse padrão seja encontrado em cefaleias secundárias (uso de vasodilatadores, como nitrato; hipotensão intracraniana; cefaleia secundária a crises de feocromocitoma etc.), a maioria das vezes indica benignidade. Cuidado deve ser tomado com pacientes que relatam mudanças de característcas de suas cefaleias crônicas, pois “mudanças de padrão” nem sempre implicam novo diagnós tco e, portanto, nem sempre são indica tvas de investgação adicional. Na maioria das vezes, os sintomas novos são apenas espectros de apresentação clínica da mesma doença. O algoritmo a seguir demonstra a conduta inicial em pacientes com cefaleia aguda. tpia
Critérios para cefaleia primária?
Não
Sim
Sinais de alerta?
Não
Sim
Conduzir como cefaleia primária Refratário? Sim
Investigação
Figura 2 - Conduta em pacientes com cefaleia aguda
c) Cefaleia crônica progressiva
Embora esse padrão seja mais raro, seu reconhecimento é fundamental, pois em geral não se associa a cefaleias primárias, devendo ser investgado sempre. d) Cefaleia crônica não progressiva
Nesse grupo estão os indivíduos com a chamada cefaleia crônica diária. Caracterizam-se por apresentarem dores por mais de 15 dias no mês, por pelo menos 3 meses ou 180 dias ao ano. Embora possa estar presente em pacientes com cefaleias secundárias (pseudotumor cerebral, meningites crônicas etc.), este padrão é mais comumente encontrado em pacientes com história pregressa de enxaqueca ou cefaleia do tpo tensional episódica, que progressivamente passam a apresentar aumento da frequência de suas crises e redução da resposta a analgésicos. As dores, então, passam a ser diárias ou quase diárias, e nem sempre preservam as característcas anteriores. Dessa forma, em pacientes com enxaqueca transformada ( tpo de cefaleia crônica diária que evolui da enxaqueca), as dores diárias podem ter característcas de cefaleia do tpo tensional. As crises de exacerbação podem perder o caráter pulsá tl e os fenômenos associados (náuseas, vômitos, fono e fotofobia) podem ficar menos marcantes. Esses pacientes, em geral,
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são de dif cil manejo terapêu tco, pois frequentemente são negligenciados no tratamento.
2. Cefaleias primárias A - Enxaqueca sem aura A enxaqueca (ou migrânea) é uma doença crônica, comumente mal iniciada e de alta prevalência – 18% em mulheres e 6% nos homens. A OMS considera a migrânea uma das doenças crônicas mais debilitantes, com uma frequência média de ataques de 1,5/mês e duração média de 24 horas. Aura ocorre somente em 15 a 20% dos casos. Na fisiopatologia da migrânea está implicada uma disfunção das vias de modulação sensitva do tronco cerebral, com aumento da percepção da dor oriunda da dilatação dos vasos cerebrais (evento neurovascular). Este efeito vasodilatador e de nocicepção é mediado pelos receptores de serotonina 5-HT, sendo este o sí to de ação dos fármacos especí ficos para o tratamento agudo da enxaqueca – os triptanos. Antgamente acreditava-se que a dor na enxaqueca era decorrente da vasodilatação que ocorre durante a crise, e a e ficácia do uso de vasoconstritores, como os derivados do “ergot”, era justficada nesse contexto. Sabe-se, atualmente, que essa teoria vascular não corresponde à realidade. Em outras palavras, as alterações vasomotoras da crise de enxaqueca parecem ser epifenômenos e não necessariamente causas da dor. A fisiopatologia mais aceita atualmente leva em consideração a teoria neurovascular proposta por Moskovitz. Esse pesquisador notou que, ao es tmular ramos do nervo trigêmeo que inervam vasos sanguíneos da base do crânio, havia a liberação antdrômica de substâncias inflamatórias e neurotransmissores que provocavam um processo in flamatório perivascular. Havia a perpetuação desse processo por meio de alças nervosas, que causava vasodilatação, aumento da pulsatlidade do vaso e uma maior sensibilidade das terminações trigeminais a es mulos nociceptvos oriundos da periferia. Mais ainda, notou-se que algumas substâncias, classicamente usadas para tratar crises de enxaqueca, como os derivados do “ergot”, bloqueiam o processo de in flamação neurogênica. Durante a crise de migrânea, ocorre uma disfunção das vias de modulação sensitva do tronco cerebral, com aumento da percepção da dor oriunda da dilatação dos vasos cerebrais (evento neurovascular). Este efeito vasodilatador e de nocicepção é mediado pelos receptores de serotonina 5-HT, sendo este o sí to de ação dos fármacos especí ficos para o tratamento agudo da enxaqueca – os triptanos. Critérios diagnóstcos
Os critérios diagnóstcos são apresentados na Tabela 1 e alguns deles serão discu tdos a seguir. -
Critério B
É fundamental a compreensão de que a enxaqueca gera crises de cefaleia autolimitadas. Diante de uma crise que se prolonga por mais de 72 horas, há 2 possibilidades: Estado de mal enxaquecoso: situação frequente na emergência que, em casos extremos, pode levar à desidratação e a distúrbios metabólicos decorrentes de êmese; •
CEFALEIAS
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Cefaleias secundárias: meningite, hemorragia su-
baracnoide ou mesmo hipertensão intracraniana podem se apresentar com dores semelhantes à enxaqueca, mas não têm seu caráter autolimitado. Dessa forma, as crises de cefaleia pouco responsivas ao tratamento adequado devem ser inves tgadas. -
Critérios C e D
As característcas clínicas descritas nos critérios C e D são de conhecimento geral dos médicos, mas nunca é demais dizer que não são patognomônicas, devendo ser analisadas no contexto global. Mais vale o peso do conjunto das característcas clínicas que cada uma delas isoladamente. -
Critério E
Há, no mínimo, 1 dos seguintes: História e exames f sico e neurológico não suges tvos de cefaleias secundárias; História e/ou exame f sico e/ou neurológico sugestvos de tais distúrbios, mas que são afastados por investgação apropriada; Tais distúrbios estão presentes, mas as crises de enxaqueca não ocorreram pela 1ª vez em clara relação temporal com o distúrbio. •
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Esses itens são óbvios. No entanto, devemos lembrar que alguns aspectos do exame clínico frequentemente são negligenciados no atendimento médico, tais como o exame do fundo de olho (sobretudo a procura por papiledema) e a pesquisa de rigidez de nuca. Tabela 1 - Critérios diagnóst cos para enxaqueca
A - Pelo menos 5 crises preenchendo critérios B a D. B - Crises de cefaleia durando de 4 a 72 horas (não tratadas ou tratadas sem sucesso). Em crianças com menos de 15 anos, as crises podem durar 2 a 48 horas. Se o paciente dormir e acordar sem a crise, a duração da mesma é considerada até a hora do despertar. C - A cefaleia tem, no mínimo, 2 das seguintes caracterís tcas: · Localização unilateral (60% dos casos); · Qualidade pulsátl; · Intensidade moderada ou forte (limitando ou impedindo atvidades diárias); · Agravamento por subir degraus ou a tvidade f sica semelhante de rotna. D - Durante a cefaleia há, no mínimo, 1 dos seguintes sintomas: · Náuseas e/ou vômitos; · Fotofobia e fonofobia. E - Não atribuível a outra patologia.
B - Enxaqueca com aura A aura da enxaqueca é um sintoma ou sinal neurológico focal transitório e recorrente que geralmente se associa aos ataques de cefaleia, mas que pode ocorrer independente deles. Qual a diferença entre pródromo e aura? - Pródromos: (fase prodrômica da enxaqueca) são sintomas indefinidos que podem durar várias horas a dias e estão associados a mudanças de humor, de ape tte, de retenção de líquido, fadiga, bocejo, sensibilidade à luz e ao som;
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Aura: é um fenômeno progressivo (não súbito) que se
relaciona anatomicamente a uma disfunção do córtex cerebral ou do tronco encefálico, a qual se espraia gradatvamente por contguidade, sem respeitar limites anatômicos ou vasculares. Interessante notar que é um fenômeno autolimitado, durando de 5 a 60 minutos na maior parte dos casos. Almeida e colaboradores relataram caso de uma família, na qual 4 membros são acometdos por uma forma de migrânea precedida por aura caracterizada por afasia motora. Cerca de 20% dos enxaquecosos apresentam sintomas aurais. Segundo descrito na Classi ficação Internacional das Cefaleias: Aura visual é a mais comum, geralmente como um espectro de for tficação, isto é, uma figura em forma de estrela próxima ao ponto de fixação, que gradualmente se expande para a direita ou para a esquerda, e assume um formato convexo lateralmente com bordas anguladas cintlantes, deixando um grau variável de escotoma rela tvo ou absoluto, em seu trajeto. Pode ocorrer, em outros casos, um escotoma sem fenômenos positvos, que frequentemente é percebido como sendo de início agudo, mas que, num exame minucioso, alarga-se gradualmente; O próximo sintoma que ocorre com frequência é o distúrbio sensitvo na forma de agulhadas e al finetadas, que se movem lentamente a par tr do ponto de origem, e afetam uma área maior ou menor de um lado do corpo e da face. O amortecimento ocorre a seguir, mas também pode ser o único sintoma; Menos frequentes são os distúrbios da fala (geralmente disfásicos, mas muitas vezes di f ceis de serem categorizados) e a fraqueza unilateral; Os sintomas geralmente seguem um ao outro em sucessão, começando pelos visuais, seguido pelos sintomas sensitvos, disfásicos e de fraqueza, mas a ordem reversa ou outras sequências já foram observadas; Alguns pacientes podem apresentar fenômenos aurais relacionados à disfunção de tronco encefálico, como ocorre naqueles indivíduos com migrânea basilar, também denominada enxaqueca de Bickerstaff . Na fase de aura, os pacientes podem apresentar os seguintes sintomas: alteração do campo visual, disartria, diplopia, vertgem, ataxia, parestesias bilaterais, redução do nível de consciência. •
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A fisiopatologia mais aceita para a aura nos dias de hoje é a ocorrência do chamado “fenômeno da depressão alastrante de Leão”, no córtex dos enxaquecosos. Aris tdes de Leão – neurofisiologista brasileiro – notou, na década de 1940 que, ao estmular o córtex de coelhos, observava-se uma onda de depressão da atvidade elétrica cerebral que se espalhava a partr do ponto de es tmulação, como as ondas de um lago, a uma velocidade de 2 a 3mm/min, sem respeitar limites anatômicos ou vasculares. Embora esse fenômeno seja fisiológico e decorrente da excitabilidade tecidual, os pacientes com enxaqueca parecem apresentar manifestações clínicas ligadas a ele com maior frequência. Deve ser dito que até os dias atuais temos apenas evidências indiretas da ocorrência deste fenômeno em seres humanos.
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NEUROLOGIA É importante diferenciar a aura de outros fenômenos que também se caracterizam por disfunções neurológicas focais transitórias, como crises epilép tcas parciais (que são de início mais rápido, em geral duram menos tempo e são estritamente unilaterais antes da generalização) e episódios isquêmicos transitórios (que têm início súbito, duram em média 10 a 15 minutos e são sempre relacionados a um território arterial). Partcularmente no idoso, o diferencial entre aura de enxaqueca e episódio isquêmico transitório pode ser problemátco. Miller-Fisher descreveu o que chamou de equivalentes de enxaqueca que acontecem tardiamente na vida, que são auras de enxaqueca sem cefaleia, e ressaltou sua importância como diferencial de episódios isquêmicos transitórios. Alguns fatores, segundo Fisher, ajudam no diagnóstco diferencial: - Episódios de escotoma cin tlante, espectros de for tficação isolados ou acompanhados de parestesias, afasia, disartria ou paresias; - Expansão gradual do dé ficit visual ou da parestesia; - Progressão sequencial de um fenômeno para o outro, e não sua instalação súbita; - Ocorrência de 2 ou mais episódios idên tcos, muitas vezes com vários anos de intervalo entre eles; - Associação com cefaleia; - Duração entre 15 e 25 minutos; - Curso benigno sem sequelas permanentes; - Investgação negatva para doença cerebrovascular. Dados recentes do estudo de Framingham sugerem que os equivalentes de enxaqueca descritos por Fisher são mais comuns do que se acreditava an tgamente. Devemos lembrar ainda das enxaquecas dos tpos: acompanhada, complicada, oalmoplégica, hemiplégica (familiar) e basilar (da artéria).
Figura 4 - Paciente com parestesias: 2º t po mais comum de aura sensi tv a
C - Cefaleia do tpo tensional As cefaleias tensionais consttuem a forma mais comum de cefaleia, e sua prevalência em adultos varia de 35 a 78%. A cefaleia tensional episódica é a forma mais comum de apresentação. É causada por contração dos músculos pericranianos. O caráter pico da dor é em contração ou aperto, e a intensidade é fraca ou moderada. É bilateral e afeta qualquer região do crânio (algumas vezes, pode ser unilateral). Não há relato de náuseas ou vômitos, não sendo agravada por exercícios f sicos. Menos frequentemente que na migrânea, foto e fonofobia podem ocorrer, mas apenas uma de cada vez. Os critérios de classi ficação da cefaleia do tpo tensional estão sumarizados na Tabela 2. Tabela 2 - Critérios diagnóst cos para cefaleia tensional episódica
A - Pelo menos 10 crises de cefaleia que preenchem os critérios B a D. O número de dias desta cefaleia é menor ou igual a 180/ ano (menor que 15/mês). B - Cefaleia durando 30 minutos a 7 dias. C - Pelo menos 2 das seguintes caracterís tcas da dor: · Qualidade de aperto/pressão (não pulsátl); · Intensidade leve e moderada (pode limitar, mas não impede atvidades); · Localização bilateral; · Não é agravada por subir degraus ou a tvidade f sica semelhante de rotna diária. D - Ambos os seguintes: · Ausência de náusea ou vômitos (anorexia pode ocorrer); · Fotofobia e fonofobia estão ausentes, ou apenas um deles está presente. E - Não atribuível à outra patologia.
D - Cefaleia crônica diária
Figura 3 - Tipos de aura visual
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Denominamos Cefaleia Crônica Diária (CCD) as cefaleias primárias que ocorrem mais de 15 dias/mês durante 6 meses ou 180 dias/ano. Geralmente estamos diante de um paciente com história pregressa de enxaqueca ou cefaleia do tpo tensional episódica que progressivamente passa a apresentar aumento da frequência de suas crises e redução
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da resposta a analgésicos. As crises nem sempre preservam as característcas anteriores. Na unidade de emergência, frequentemente o paciente é medicado agudamente, porém é negligenciada a ocorrência da dor diária de base, que nem sempre é referida pelo próprio paciente. É fundamental orientar o paciente quanto aos fatores que levaram ao aumento da frequência das crises, que na maioria das vezes são: abuso de analgésicos, derivados do “ergot” e cafeína, e diagnóstcos psiquiátricos como ansiedade e/ou depressão associados. Deve-se encaminhá-lo para realização de pro filaxia em regime de tratamento ambulatorial.
C - A cefaleia é associada a pelo menos 1 dos seguintes sinais que deve estar presente com a dor: · Injeção conjuntval e lacrimejamento; · Congestão nasal e/ou rinorreia; · Edema palpebral ipsilateral; · Sudorese da fronte e da face ipsilateral; · Miose e/ou ptose ipsilateral; · Sentmento de inquietude e agitação. D - A frequência das crises varia de 1 dia a dias alternados e até 8 crises/dia. E - Não atribuível à outra patologia.
E - Cefaleia em salvas É uma cefaleia primária de origem neurovascular caracterizada por ser severa, estritamente unilateral, normalmente retro-orbitária, de curta duração, acompanhada por alterações autônomas parassimpátcas crânio facial. A cefaleia em salvas é uma condição rara, com prevalência entre 0,05 e 0,4%; acomete preferencialmente o sexo masculino em proporção es tmada entre 4:1 a 9:1, com idade média de início entre 20 e 40 anos. A cefaleia em salvas tem caráter bastante intenso e suas manifestações são caracterizadas por episódios súbitos de dor unilateral excruciante, com localização periorbital, associada a sintomas autonômicos ipsilaterais. Caracteristcamente, há episódios periódicos (em salvas), com períodos mais sensíveis às crises de dor e períodos de remissão. A ingestão de álcool durante o período de crises quase sempre desencadeia o quadro doloroso. Os critérios diagnós tcos da cefaleia em salvas encontram-se listados na Tabela 3. Oitenta por cento dos pacientes com cefaleia em salva episódica tendem a manter esse tpo de apresentação. Cefaleia em salva episódica, eventualmente, transforma-se em cefaleia em salva crônica (4 a 13%). Formas mistas ou intermediárias podem ocorrer. Remissão espontânea prolongada tem sido descrita em até 12% dos pacientes em algumas séries, especialmente na episódica. Cefaleia em salva crônica é mais implacável e pode persistr dessa forma em até 55% dos casos. Menos frequentemente, a cefaleia em salva crônica pode retornar para a forma episódica. Geralmente, a cefaleia em salva é um problema ao longo da vida. Intervenção farmacológica pode desempenhar um papel na transformação da forma crônica para a episódica, não sendo verdadeiro o contrário. Início tardio da doença, juntamente com o sexo masculino e uma história prévia de cefaleia em salva episódica, prevê um curso menos favorável. Neuroimagem com avaliação da vascularização intracraniana e estudo das regiões cervical e selar e dos seios paranasais é recomendada para todos os pacientes com apresentações de a picas dores de cabeça trigeminais autônomas. Tabela 3 - Critérios diagnóst cos para cefaleia em salvas
A - Pelo menos 5 crises preenchendo B a D. B - Crises intensas de dor unilateral, orbitária, supraorbitária e/ ou temporal, durando 15 a 180 minutos se não tratada.
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Figura 5 - Homem passando por uma cefaleia do lado direito com sintomas autonômicos associados
F - SUNCT (short-last ng unilateral neuralgiform al injec t on headache a acks with conjunc tv and tearing) Trata-se de uma cefaleia rara de prevalência pouco conhecida, acomete mais o sexo masculino sendo seu início entre 40 e 50 anos. É caracterizada como uma cefaleia, de curta duração, unilateral, neuralgiforme com hiperemia con juntval e lacrimejamento. Os surtos são relacionados com território trigeminal (diagnós tco diferencial com neuralgia do trigêmeo 1º ramo – presença de períodos refratários) e os de a tvação extratrigeminais. Por exemplo: es tmulação tátl da face e couro cabeludo, ato e mas tgar, escovar os dentes, certos movimentos do pescoço dentre outros. A dor é de localização predominantemente orbitária, supraorbitária ou temporal, de intensidade moderada a intensa, tpicamente em pontada ou pulsá tl. Usualmente não apresenta períodos de refratariedade, os pacientes são capazes de apresentar um ataque imediatamente após o outro. As crises têm duração de 5 a 240 segundos e frequência de 3 a 200 ataques por dia, 90% dos episódios são diurnos. SUNCT não foi incluída na 1ª edição da Classi ficação Internacional das Cefaleias, pois não satsfazia os critérios de tpos de cefaleia. Na 2ª edição foi incluída no grupo das cefaleias em salvas e outras cefaleias autonômicas trigeminais. SUNCT não apresenta um tratamento padrão reconhecidamente eficaz. Medicamentos e ficazes no tratamento da SUNCT:
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NEUROLOGIA indometacina, carbamazepina, gabapen tna, topiramato, lamotrigina, fenitoína intravenosa e lidocaína intravenosa. Várias tentatvas terapêutcas devem ser u tlizadas para minimizar os surtos.
3. Cefaleias secundárias A - Introdução De uma forma geral, pacientes que preencham critérios para cefaleias primárias e que tenham exames clínico e neurológico normais não neces sitam de inves tgação complementar. Os pacientes que se apresentam com dor de cabeça com caracterís tcas de cefaleias primárias, mas que têm algum sinal de alerta (Tabela 4) ou algum aspecto a pico na apresentação clínica, tais como aura de enxaqueca prolongada (maior que 1 hora) e aura a pica (súbita, estritamente unilateral ou associada a dé ficits motores, de linguagem ou de nervos cranianos), devem ser inves tgados sempre. Tabela 4 - Lista de sinais de alerta (red fl ags)*
- Piora progressiva; - Doenças sistêmicas (neoplasias, HIV); - Interrupção do sono; - Sintomas gerais (febre, perda de peso); - Exame neurológico alterado; - Nova (>50 anos); - Início súbito; - Agravada por Valsalva. * Devem elevar suspeita de cefaleia secundária e recomendam invest gação adicional.
Os exames necessários para investgação variam de acordo com a hipótese considerada. Assim, na suspeita de arterite de células gigantes, o VHS pode ser mais importante que a tomografia computadorizada, pois valores menores do que 40mm/h ocorrem em menos de 4% destes pacientes, sendo, em grande número, de casos maior que 100mm/h. Na maioria das vezes em que a investgação está indicada, um exame de imagem se faz necessário. Com exceção dos casos de suspeita de sangramento intracraniano e traumatsmo de crânio, a ressonância nuclear magné tca é superior à Tomogra fia Computadorizada (TC). No entanto, o menor custo desta, aliado à sua maior facilidade de realização e disponibilidade, a tornam o exame de eleição na maioria dos casos na unidade de emergência. Geralmente a TC sem contraste é su ficiente, sendo que a fase contrastada acrescenta informações em apenas 1% dos casos. Se possível, a administração de contraste deve ser realizada em todos os casos de cefaleia a esclarecer que a suspeita não seja trauma ou hemorragia subaracnoide. Outro exame frequentemente necessário é o do líquido cerebrospinal. Sua punção na unidade de emergência está indicada para a investgação de cefaleias nas seguintes situações: - Cefaleia de início súbito com TC de crânio normal; - Cefaleia acompanhada de sinais de infecção;
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Suspeita de sangramento ou processo in flamatório; Suspeita de hipertensão ou hipotensão intracraniana (para manometria); - Cefaleia associada a dé ficits de nervos cranianos (quando a TC não esclarecer o diagnós tco e não contraindicar a punção); - Cefaleia em pacientes com neoplasia ou HIV posi tvos sem lesão intracraniana que contraindique a punção. -
B - Critérios de investgação Deve-se proceder à inves tgação diagnóstca com exames complementares nos casos citados a seguir. a) A 1ª ou pior cefaleia da vida do paciente ou cefaleia de início súbito
É mandatória a inves tgação complementar em pacientes que se apresentam com queixa de cefaleia de instalação súbita (pico de dor desde seu início). É necessário investgar a possibilidade de hemorragia subaracnoide. Dos pacientes com hemorragia subaracnoide que se apresentam em bom estado geral e sem alterações ao exame clínico ou neurológico, 23 a 51% recebem outros diagnós tcos. Contraditoriamente, sabemos que esses pacientes são aqueles que mais se bene ficiam de um tratamento precoce, quando comparados aos que se apresentam com alterações do status neurológico. O erro diagnós tco em pacientes com hemorragia subaracnoide compromete o prognós tco, uma vez que deixam de ser tomadas medidas que evitem complicações. Outros sinais e sintomas que podem estar presentes são náuseas e vômitos (74%), perda transitória de consciência (53%), rigidez nucal (35%) e outros, como rebaixamento de nível de consciência, sinais piramidais, paresia de nervos cranianos, crise epilép tca e hemorragia sub-hialóidea ao fundo de olho. A investgação nesses casos consiste na realização de uma tomografia computadorizada de crânio sem contraste, que tem alta sensibilidade nas primeiras 24 horas (mais de 90%). Essa sensibilidade cai progressivamente nos dias subsequentes: cerca de 85% no 5º dia e pra tcamente zero de 2 a 3 semanas após o icto. Além de de finir o diagnós tco, a tomografia pode constatar complicações, como hidrocefalia aguda, ressangramento e estmar a gravidade do sangramento, que se relaciona com a incidência de vasoespasmo. Nos casos em que a tomogra fia é normal ou inconclusiva, está indicada a coleta do líquido cerebrospinal (LCE), procurando sinais de sangramento (hemorragia, xantocromia). A diferenciação entre um LCE hemorrágico e um acidente de punção nem sempre é possível, mas se sugere observar o clareamento do sangue em tubos consecu tvos (teste dos 4 tubos), além de veri ficar a presença de xantocromia a olho nu, ou por espectrofotometria, sugerindo a presença de produtos de degradação da hemoglobina. O LCE também fornece subsídios para o diagnós tco de hipertensão intracraniana, além de doenças in flamatórias, infecciosas e neoplásicas do sistema nervoso central. Nos casos confirmados de hemorragia subaracnoide está indicada a realização de angiogra fia cerebral para a pesquisa de aneurismas, que são a causa mais comum de hemorragia subaracnoide não traumá tca. Pacientes portadores de cefaleia súbita com TC de crânio e liquor normais têm a chamada cefaleia em trovoada,
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ou thunderclap headache. Contudo, é descrito que este tpo de cefaleia pode ser secundário à expansão de um aneurisma (sem sangramento) ou a sangramento na sua parede. Devido a esse fato, alguns autores preconizam a realização de angiografia por ressonância magnétca (angiorressonância) ou por tomogra fia (angiotomografia) para rastreamento de aneurismas intracranianos não rotos. A realização de angiografia digital nesses casos não é indicada devido aos riscos do procedimento. Outras condições podem manifestar-se clinicamente com cefaleia súbita, tais como: hemorragias intraparenquimatosas, hidrocefalia aguda, meningoencefalites, apoplexia pituitária, trombose venosa cerebral e mesmo uma síndrome idiopátca de cefaleia “em trovoada” ou thunderclap headache. b) Cefaleias de início recente
A presença de cefaleia nova (há menos de 1 ano), frequentemente está associada ao achado de doenças secundárias. Um estudo prospectvo analisou 100 casos de pacientes com cefaleia de início recente, 80% deles com exame neurológico normal. Todos os pacientes foram subme tdos à TC de crânio e, em casos selecionados, punção de LCE, VHS, angiorressonância e biópsia de artéria temporal super ficial. Tumores intracranianos foram iniciados em 21% dos pacientes (16% daqueles com exame neurológico normal). Em resumo, até 30% dos pacientes com cefaleia de início recente apresentam afecções secundárias, jus tficando-se investgação complementar que deve incluir um exame de imagem e outros, dependendo da suspeita clínica. Devemos nos atentar, também, para outras e tologias de cefaleias secundárias que exigem alto índice de suspeita clínica em seu diagnós tco. Destaca-se, entre elas, a hipertensão intracraniana idiopá tca (ou pseudotumor cerebral), que incide principalmente em mulheres obesas em idade fértl e manifesta-se com uma cefaleia difusa, diária e não pulsá tl. Nessa condição, existe aumento da pressão do LCE sem um distúrbio intracraniano, o que parece estar relacionado a uma diminuição da absorção do LCE. Além da cefaleia, outros sintomas comuns são: amaurose fugaz (geralmente inferior a 30 segundos) mono ou binocular, náuseas e papiledema (quase sempre presente). Punção lombar revela pressão de abertura elevada. Outras condições associadas ao aparecimento da doença são a hipervitaminose A e a suspensão de cor tcoide. O tratamento envolve: perda de peso, dieta hipossódica, acetazolamida VO e, em alguns casos, derivação ventriculoperitoneal. c) Cefaleia nova após os 50 anos de idade
Quando analisamos a incidência das cefaleias em diversas faixas etárias, notamos que as de origem primária raramente se iniciam após os 50 anos. Assim sendo, após essa idade existe um aumento rela tvo do percentual de pacientes com cefaleias secundárias. Alguns autores recomendam que, mesmo que o quadro clínico seja compa vel com o de uma cefaleia primária, seja realizada inves tgação. Edmeades relata que as cefaleias primárias são as formas predominantes em 66% da população idosa, contra cerca de 90% daqueles com menos de 60 anos. As anormalidades ao exame neurológico e a idade acima dos 55 anos foram os 2 maiores preditores de altera-
ções intracranianas em pacientes que procuraram a unidade de emergência por queixa de cefaleia em um estudo prospectvo. As principais condições relacionadas às cefaleias secundárias que se iniciam após os 50 anos são: tumores intracranianos, hematoma subdural, doença cerebrovascular, arterite de células gigantes (arterite temporal) e as neuralgias (principalmente a neuralgia de trigêmeo). - Tumores cerebrais: a cefaleia classicamente descrita para tumores cerebrais (e hipertensão intracraniana) é lentamente progressiva, de predomínio ma tnal e que melhora após o vômito; embora pica, não é frequente. Um estudo sobre prevalência de cefaleias em pacientes com tumores intracranianos assintomá tcos (descobertos em estadiamento de tumores à distância) mostrou perfil diagnóstco semelhante ao da população em geral (cefaleia do tpo tensional era a mais frequente), sugerindo que a algia não é um sinal precoce nessa doença. Em outro estudo, apenas 8,2% dos pacientes com tumores intracranianos apresentaram cefaleia como sintoma inicial isolado, enquanto que crises epiléptcas ocorreram em 9%, e sinais e sintomas neurológicos focais em 57%. Uma duração maior que 10 semanas sugeria outra causa para a cefaleia, que não a tumoral; - Hematoma subdural crônico: um diagnós tco extremamente importante no idoso é o hematoma subdural crônico. A maior incidência nessa faixa etária deve-se à atrofia cerebral própria da idade. Embora trauma de crânio seja a causa mais comum de hematoma subdural crônico, em apenas 50% dos casos consegue-se recuperar esse dado da história com pacientes ou familiares. Cefaleia é o sintoma mais comum, podendo ocorrer isoladamente e sem caracterís tcas que a diferencie de outras e tologias. Assim, esse diagnós tco nunca pode ser descartado clinicamente, devendo ser realizado exame de imagem de ro tna no idoso com cefaleia; - Arterite de células gigantes: outra situação que é pratcamente exclusiva do idoso é a arterite de células gigantes (arterite temporal). Para o diagnós tco da doença, o Colégio Americano de Reumatologia propôs que os pacientes preencham pelo menos 3 dos seguintes critérios: idade igual ou superior a 50 anos; cefaleia localizada de início recente; artéria temporal dolorida à palpação ou diminuição de pulso; velocidade de hemossedimentação (VHS) maior ou igual a 50mm na 1ª hora e biópsia con firmando o diagnós tco. Alguns pacientes podem, ainda, apresentar febre baixa, dor ar tcular, perda ponderal, mialgia e rigidez ar tcular (estes últmos sintomas e sinais estão presentes também na polimialgia reumátca, na qual a ameaça de perda visual é menor). Sintomas isquêmicos podem ocorrer, levando à perda visual, paresias de nervos cranianos ou até mesmo acidente vascular cerebral. O diagnós tco caracteristcamente é sugerido pela elevação do VHS, embora valores normais não o afastem. A Proteína C Reatva (PCR) parece alterar-se mais precocemente no curso da doença. O tratamento geralmente se inicia após o diagnóstco com a introdução de prednisona
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NEUROLOGIA em dose de 1mg/kg de peso até haver retorno da VHS a valores normais. A droga geralmente deve ser man tda por 6 meses a 1 ano (no mínimo). Faz-se necessário um alto nível de suspeição clínica para o diagnós tco de arterite de células gigantes. Recomenda-se, de ro tna, a realização de VHS e PCR em pacientes com cefaleias novas após os 50 anos de idade, mesmo que com característcas que não lembrem arterite de células gigantes;
g) Cefaleias de esforço
Embora seja comum que as cefaleias primárias piorem com o esforço e até mesmo que existam cefaleias benignas relacionadas ao esforço (como a cefaleia benigna da tosse e do orgasmo), a ocorrência de quadros álgicos desencadeados por esforço está associada a um risco de 15% de achado de condição secundária. Neste grupo, devemos lembrar-nos das malformações da transição occipitocervical (Arnold-Chiari) e dos aneurismas intracranianos, cuja ruptura muitas vezes ocorre durante esforço f sico ou ato sexual. Agudamente, esses pacientes merecem inves tgação com TC de crânio sem contraste e punção de LCE (se a TC for normal). É ideal que sejam inves tgados com ressonância nuclear magné tca (com atenção à transição occipitocervical) e angiorressonância. h) Cefaleias progressivas ou refratárias ao tratamento
Figura 6 - Artéria temporal espessada. Fonte: www.uptodate.com -
Neuralgias : as dores neurálgicas são caracterizadas
por seu caráter paroxístco, de curta duração (segundos), intenso, descrito pelos pacientes como choque ou fisgada. Geralmente, apresentam pontos-ga tlho no território do nervo acome tdo; no caso do nervo trigêmeo, inclui: face, asa do nariz, olhos, gengiva e mastgação. As dores neurálgicas devem sempre ser investgadas, pois são indicatvas de uma neuropata. d) Cefaleia associada a alterações do exame neurológico, rebaixamento do nível de consciência, rigidez de nuca ou febre
Esses achados de exame são, até que se prove o contrário, evidências claras de um comprome tmento secundário e, portanto, determinam inves tgação. e) Cefaleia nova em paciente com história de neoplasia, infecção pelo HIV ou coagulopatas
Por consttuir grupo de alto risco para ocorrência de afecções do SNC, é necessário inves tgar com exame de imagem e, eventualmente, punção do LCE. f) Cefaleia após trauma tsmo de crânio
Pacientes com cefaleias novas pós-trauma tsmo craniano, mesmo que este tenha sido leve, devem ser investgados quanto à presença de hematomas intracranianos (como hematoma subdural crônico), ou de fratura de base de crânio que tenha evoluído com f stula liquórica e consequente hipotensão intracraniana.
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Pacientes que se apresentam com queixa de cefaleia inicialmente caracterizada como primária, que não estejam respondendo ao tratamento ins ttuído, devem ser inves tgados. Há diversos relatos na literatura de pacientes com cefaleias secundárias manifestadas clinicamente com característcas de cefaleias primárias, com exceção da ausência de resposta ao tratamento. Neste grupo, encontramos os pacientes com estado de mal enxaquecoso refratário. Define-se estado de mal enxaquecoso como cefaleia com característcas de enxaqueca que perdure por mais que 72 horas, com períodos de acalmia menores que 4 horas, excluído o sono. Devemos ressaltar, contudo, que a presença de cefaleia pulsá tl, intensa, com náuseas e vômitos em paciente com história prévia de enxaqueca e exame neurológico normal, não é exclusiva de enxaqueca, podendo corresponder a episódio de meningite ou mesmo à hipertensão intracraniana.
4. Tratamento das cefaleias primárias A - Tratamento agudo a) Tratamento da crise aguda de enxaqueca
De uma forma geral, podemos dividir os medicamentos usados para tratar as crises de enxaqueca em não específicos e especí ficos, sendo que neste úl tmo grupo estão os medicamentos que agem no sistema trigeminovascular – os derivados do “ergot” (ergotamina e diidroergotamina) e os triptanos. Recentemente, a Sociedade Brasileira de Cefaleia publicou recomendações para o tratamento da crise aguda de migrânea, que devem ser consultadas para maiores detalhes, envolvendo o tratamento dessa cefaleia primária. Muitos esquemas terapêu tcos podem ser administrados, havendo espaço para alta maleabilidade, repe tção e associações de drogas. A escolha deve basear-se em opções individuais, na intensidade da dor, na disponibilidade, na tolerância e nas contraindicações especí ficas para cada paciente, não havendo regras de finitvas. Atualmente, muito se discute se o tratamento sintomá tco deve ser realizado passo a passo, com uso de drogas progressivamente mais potentes, ou se deve ser estra tficado, optando-se pela droga mais adequada em cada paciente, conforme a intensida-
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de e o pico de desenvolvimento da dor. A tendência atual tem sido por esta 2ª opção. Também pode haver exigência de hospitalização para hidratação intravenosa se o paciente estver muito prostrado, como costuma acontecer no estado de mal enxaquecoso. - Derivados do “ergot”: são substâncias puri ficadas a partr da infecção do esporão do centeio pelo fungo Claviceps purpurea. Essas substâncias são agonistas não seletvos de diversos receptores e têm amplo uso na Medicina. O agonismo de receptores dopaminérgicos propiciou o uso dessas substâncias para tratamento de doença de Parkinson e prolac tnomas (bromocriptna). Mas, por outro lado, sua ação no trato gastrintestnal é responsável pela ocorrência de náuseas (efeito colateral). O agonismo de receptores de noradrenalina pode levar à hipertensão e vasoconstrição periférica, que em casos extremos pode até mesmo ocasionar necrose de extremidades, quadro conhecido como ergotsmo. Com relação ao seu efeito terapêutco na enxaqueca, sabe-se que é importante agonista de receptores de serotonina, especi ficamente do tpo 5HT1B/1D. O receptor 5HT1B situa-se no vaso sanguíneo e, quando es tmulado, causa vasoconstrição. Já o receptor 5HT1D encontra-se nos ramos trigeminais e, quando estmulado, bloqueia o processo de in flamação neurogênica, diminuindo a aferência sensi tva por essa via. Apesar da sua boa e ficiência na enxaqueca, atualmente o uso indiscriminado dos ergotamínicos tem sido muito cri tcado pelos seus efeitos adversos, como risco aumentado de cefaleia rebote, abuso de analgésicos e piora dos vômitos. Como o efeito nauseoso é intenso, sempre há necessidade da associação de um antemétco (metoclopramida ou proclorperazina) e, às vezes, dexametasona. A dose total de ergotamínicos não deve exceder 10 a 12mg/semana pelo risco de desenvolvimento de ergo tsmo e estão contraindicados em pacientes com doença vascular periférica, doença coronariana, insu ficiência hepátca ou renal, hipertensão arterial grave, gravidez, hiper treoidismo e porfiria. - Triptanos: são drogas de desenvolvimento recente; especí ficas para o tratamento da dor na enxaqueca, pois atuam como agonistas superseletvos dos receptores serotonérgicos 5-HT1B e 5-HT1D do sistema trigeminovascular, envolvidos na fisiopatogênese da doença. Os triptanos apresentam uma série de vantagens sobre os ergotamínicos, com menor incidência de efeitos adversos; porém, têm custo mais elevado. Os triptanos consttuem, atualmente, o maior avanço no tratamento da enxaqueca, estando disponíveis em nosso meio o sumatriptano, o zolmitriptana, o rizatriptana e o naratriptana. A seguir, estão delineados os esquemas de tratamento, lembrando que os triptanos não devem ser administrados com ergotamínicos no mesmo dia; não devem ser usados concomitantemente com inibidores da MAO (pelo risco da síndrome da serotonina) e que a associação com AINHs parece reduzir a recorrência da cefaleia: Sumatriptana: 6 a 12mg/dia SC ou 50 a 200mg/dia VO ou spray nasal 10 a 40mg/dia; •
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Zolmitriptana: 2,5 a 5mg/dia VO; Rizatriptana: 5 a 10mg/dia VO; Naratriptana: 2,5 a 5mg/dia VO; Eletriptana (ainda não disponível no mercado brasi-
leiro): 40 a 80mg/dia VO. Os efeitos adversos dos triptanos são leves e transitórios e incluem: ver tgens, tonturas, sensação de calor e de fraqueza, náuseas, vômitos, dispneia e aperto no peito. As contraindicações principais são: gravidez, doenças coronarianas, insuficiência vascular periférica e hipertensão arterial grave. - Medicações não especí ficas: a seguir estão relacionados os medicamentos mais comumente u tlizados em nosso meio. Antemétcos: seu uso é de grande valor mesmo nas crises sem vômitos, pois melhora a gastroparesia que acompanha a enxaqueca, aumentando a absorção oral dos analgésicos. Podem ser u tlizadas a metoclopramida 10mg IV/IM ou a domperidona 10mg IM/VO; Analgésicos comuns: neste caso, a preferência é pela dipirona 500mg IV, pois muitos pacientes já fizeram uso domiciliar de analgésicos comuns por VO como a aspirina, o paracetamol e a própria dipirona, inclusive em apresentações associadas a ergotamínicos, isometepteno e cafeína, muito populares em nosso meio; Ant-inflamatórios Não Hormonais (AINHs): a maioria é efetva na enxaqueca, pois reduzem a in flamação neurogênica perivascular. No pronto-socorro, a preferência pelas vias parenteral e intramuscular favorece o uso do diclofenaco 75mg IM, do cetoprofeno 100mg IM e do piroxicam 40mg IM. O tenoxicam tem a vantagem da possibilidade de administração tanto IV como IM na dose de 20 a 40mg. As contraindicações dos AINHs são bem conhecidas, como a úlcera péptca e a insu ficiência renal; Cortcoides: a dexametasona na dose de 4 a 12mg IV também é ú tl na crise aguda da enxaqueca e de uso quase obrigatório no estado de mal enxaquecoso e na cefaleia crônica diária. Entretanto, não deve ser administrada isoladamente, e sim associada a um analgésico, ou AINH, e um an temétco ou neuroléptco; Neurolép tcos: são úteis em crises refratárias e no estado de mal enxaquecoso, par tcularmente quando há presença de vômitos intensos. Em nosso meio, a preferência é pela clorpromazina, que deve ser administrada em dose de 0,1mg/kg em infusão venosa lenta diluída em 250 a 500mL de soro fisiológico. A tolerância costuma ser boa, devendo-se ter cuidado com os efeitos hipotensores e com a sedação. Outra opção que tem sido relatada é o uso do haloperidol em dose de 5mg IV diluído com soro fisiológico; Opiáceos: apesar dos analgésicos narcó tcos promoverem rápido alívio da dor na enxaqueca, seu uso em cefaleias primárias é sujeito a muitas crí t•
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NEUROLOGIA cas. Pacientes com enxaquecas intensas e frequentes são muito susce veis ao desenvolvimento de abuso de analgésicos, levando ao grave problema da cefaleia crônica diária, e não nos parece conveniente “facilitar” esse processo com a administração de opiáceos. Além disso, na fisiopatogenia das cefaleias primárias provavelmente há uma desregulação do sistema supressor de dor e uma disfunção serotoninérgica central; os opiáceos podem acentuar essas alterações. Assim sendo, sua u tlização na crise de enxaqueca reserva-se às situações em que outras medidas falharam, por intolerância ou contraindicação aos medicamentos citados. Na unidade de emergência pode-se u tlizar a meperidina 100mg IM ou IV diluída, o tramadol 50 a 100mg IV ou IM ou VO, e o butorfanol 1 a 2mg IM ou 10mg em spray nasal. Além destes, existem outros opiáceos de uso oral em apresentações isoladas ou em associação com analgésicos comuns como a codeína, o dextropropoxifeno, a hidrocodona e a oxicodona. b) Tratamento da crise de cefaleia do
tpo tensional
Em geral, a crise aguda de cefaleia do tpo tensional não oferece maiores di ficuldades no seu tratamento. Podem-se utlizar analgésicos simples, analgésicos combinados com cafeína, ant-inflamatórios não hormonais e miorrelaxantes. Não está indicada a u tlização dos medicamentos especí ficos para enxaqueca, que têm sua ação mediada por agonismo de receptores serotonérgicos, tais como os derivados do “ergot” e os triptanos. c) Tratamento da crise de cefaleia em salvas
A cefaleia em salvas (cluster headache), apesar de ser bem menos comum que a enxaqueca, tem a caracterís tca de ser uma das dores mais intensas percebidas pelo ser humano, causando grande sofrimento aos seus portadores. Infelizmente, muitas vezes não tem sido iniciada adequadamente no nosso meio, sendo confundida com a neuralgia do trigêmeo, com sinusites, com problemas dentários, oculares e com a própria enxaqueca. De um modo geral, o diagnóstco é fácil, mesmo no 1º episódio, pelo quadro clínico pico, como: intensidade e unilateralidade da dor, curta duração dos ataques (frequentemente noturnos) e presença de alterações autonômicas na crise, como o lacrimejamento, a congestão ocular e nasal, a rinorreia e eventualmente síndrome de Horner parcial, todos ipsilaterais à dor. Devido à curta duração da crise dolorosa (15 a 180 minutos), não é comum pacientes com cefaleia em salvas procurarem a unidade de emergência; a maioria dos que o fazem, geralmente sofre de ataques mais longos que o usual. Os medicamentos usados na crise de cefaleia em salvas apresentam certas partcularidades. Analgésicos comuns e opiáceos não funcionam e não devem ser prescritos. A seguir, são relatados os métodos u tlizados no tratamento abortvo da dor: - Oxigênio a 100%: a inalação com oxigênio cons ttui um método simples, inócuo e deve ser considerada sempre como a 1ª opção na emergência, conseguindo abortar 60 a 70% das crises em 5 a 10 minutos. Utliza-se um fluxo de 5 a 7L/min, de preferência com máscara. O efeito se deve à forte ação vasoconstritora
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do oxigênio puro, pois a vasodilatação craniana é um dos mecanismos fundamentais da dor na cefaleia em salvas; - Ergotamínicos: o tartarato de ergotamina 1 a 2mg/via sublingual costuma dar alívio à dor, embora tenha absorção inconstante. Como a crise é curta, é desejável que as drogas u tlizadas tenham o efeito mais rápido possível e, neste caso, é preferível a diidroergotamina (DHE) 0,5 a 1mg IV, que mostra a mesma e ficácia do oxigênio a 100%. Por via IM ou inalatória, a DHE é menos eficiente; - Sumatriptano: deve ser utlizado pela via SC 6 a 12mg, porque é necessário um efeito rápido que a apresentação oral não confere. Tem alta e ficiência, com alívio da dor em 15 minutos em até 96% dos casos. Em relação à u tlidade dos outros triptanos na cefaleia em salvas, ainda não se tem uma experiência clínica su ficiente. O fato de serem drogas de uso exclusivamente oral não é favorável a eles. Há relatos recentes demonstrando efetvidade do zolmitriptana, com alívio da dor em 30 minutos; o rizatriptana também pode ser promissor, pois tem efeito por VO mais rápido que os outros triptanos; - Lidocaína intranasal: existem relatos de que a ins tlação tópica intranasal de lidocaína a 4% pode ser efetva na crise de cefaleia em salvas, mas outros trabalhos não confirmam tais dados. O efeito se deveria ao bloqueio anestésico do gânglio esfenopala tno, o que reduziria a realimentação aferente sobre o sistema trigeminovascular. A in filtração do gânglio com agulha é mais eficiente, mas requer conhecimento mais especializado. A ins tlação é feita com 1mL da solução na narina ipsilateral à dor, com o paciente em posição supina, mantendo a cabeça virada para trás 30 graus e girada para o lado da dor. O procedimento pode ser repetdo por mais uma vez após 15 minutos; - Outros: há trabalhos mostrando melhora da dor com a instlação intranasal de solução de capsaicina, mas são dados isolados. Em casos refratários podem ser administrados cortcosteroides por IV (dexametasona 8 a 12mg ou metlprednisolona 1g), inclusive com pulso inicial no tratamento pro filátco. d) Tratamento da cefaleia crônica diária
Cerca de 77% dos casos de CCD ocorrem em pacientes portadores do que se denomina enxaqueca transformada, sendo que mais de 80% apresentam problema de abuso de analgésicos e/ou ergotamínicos, e também cafeína. O 1º passo é a desintoxicação da medicação de abuso, com suspensão imediata. Isso pode não ser fácil, pois a maioria dos pacientes tem morbidade psiquiátrica associada, sendo, algumas vezes, necessária a internação. Podemos usar como medicação de resgate os seguintes esquemas: - AINHs: por qualquer via de administração; - Cortcoides: por alguns dias (dexametasona 12 a 16mg/dia IV, IM ou VO); - Sumatriptano: 6 a 12mg/dia SC ou 100 a 200mg/dia VO; - Naratriptana: 2,5mg VO a cada 12 horas;
CEFALEIAS
DHE: 0,5 a 1mg IV 8/8h; - Clorpromazina: 12,5 a 25mg IV 6/6h por 2 dias; - Clonidina: transdérmica em patches de 0,1mg a cada 2 -
a 3 dias em casos de dependência de opiáceos. Ao mesmo tempo, deve ser iniciada rapidamente a medicação profilátca, que pode requerer combinações de drogas, e o suporte psicológico, pois é alta a incidência de comorbidades psiquiátricas, principalmente depressão, histeria e transtorno obsessivo compulsivo.
B - Tratamento preventvo Antes de traçar estratégias para o tratamento preventvo das cefaleias primárias é importante entender os princípios que o regem. Mais que a frequência das crises, na indicação do tratamento preven tvo importa o grau de incapacitação que a crise está causando ao indivíduo, pesando-se prós e contras do tratamento. Dessa forma, um indivíduo que tenha 4 crises leves de enxaqueca ao mês, melhorando com baixa dose de analgésico sem incapacitá-lo, pode não ser candidato a tratamento preven tvo, enquanto outro que tenha apenas 1 crise ao mês, mas que persistentemente precisa perder 1 dia de trabalho para receber medicações parenterais em serviços de emergência, é forte candidato a esse tpo de abordagem. O tratamento preven tvo reduz a incapacidade gerada pelas crises por reduzir sua frequência, intensidade e melhorar sua resposta aos medicamentos abortvos. Deve-se iniciar o tratamento com dose baixa e aumentar lentamente no mínimo a cada 3 ou 4 semanas, na medida necessária. Caso não se consiga sucesso com monoterapia, pode-se trocar ou associar uma 2ª droga. É muito útl reconhecer fatores que levam a insucesso na terapia profilátca, sobretudo o abuso de analgésicos/ergó tcos/ triptanos/cafeína e psicopatologia associada não tratada. De forma geral, o tratamento deve ser prolongado, sobretudo em pacientes com cefaleia crônica diária. a) Tratamento da enxaqueca
As drogas mais utlizadas são os beta-bloqueadores sem ação simpatomimétca intrínseca (propranolol, metoprolol, nadolol, atenolol), os an tdepressivos tricíclicos (amitrip tlina, nortriptlina, imipramina) e os an tconvulsivantes (valproato, divalproato e topiramato). Os an tdepressivos inibidores seletvos de recaptação de serotonina, embora inferiores, são úteis em alguns pacientes e podem ser opção para pacientes que falharam em tratamentos de 1ª linha ou não elegíveis para uso de outras medicações. Pode-se, inicialmente, tratar os pacientes por 4 a 6 meses, mas tempos maiores, de 1 a 2 anos, podem ser necessários, sobretudo em pacientes com cefaleia crônica diária. b) Tratamento da cefaleia em salvas -
Independente do tratamento indicado, a u tlização de cortcoterapia nas primeiras 2 a 3 semanas é ú tl, pois seu efeito é mais precoce que das demais medicações. Entretanto, seu uso deve ser associado a medicações de profilaxia, sendo a 1ª opção o bloqueador de canal de cálcio (verapamil). Outras opções incluem o topiramato, o valproato, o divalproato e a me tsergida, sendo que esta tem seu uso limitado pelo potencial risco
de fibrose cardíaca, pulmonar e retroperitoneal no uso prolongado. Nos casos crônicos (mais de 6 meses de dor com períodos de acalmia inferiores a 2 semanas) uma boa opção é o uso de carbonato de lí to. - Prevenção: paciente deve evitar fatores de ga tlho para dor, distúrbio no ciclo de sono pode induzir ataques, emoções fortes e excesso de a tvidade f sica pode induzir ataques, fumo pode reduzir a resposta a medicamentos, narcótcos podem acelerar a transformação de salvas episódicas e crônicas. c) Tratamento das dores neurálgicas
Diferentemente das demais dores mencionadas, as dores neurálgicas são cefaleias secundárias, pois se relacionam a neuropatas. Após uma adequada inves tgação que se mostre nega tva, pacientes com dor neurálgica (em choque, lancinante, fisgada, com pontos-gatlho) no território do nervo trigêmeo recebem o diagnós tco de neuralgia essencial do trigêmeo. O tratamento das dores neurálgicas tem como 1ª alternatva a utlização de antconvulsivantes (carbamazepina, fenitoína, gabapen tna, topiramato, lamotrigina, oxcarbazepina, valproato, divalproato). Alterna tvas incluem a u tlização de neurolép tcos (clorpromazina, pimozida) e até mesmo opções cirúrgicas (neurólise por balão ou por radiofrequência).
5. Resumo Quadro-resumo
- Cefaleia é uma queixa frequente e a maioria das pessoas apresentará pelo menos 1 episódio álgico durante a vida. Representa entre 2 e 4% das consultas em pronto-socorro; - A maioria dos pacientes que procura assistência médica devido à cefaleia está mais preocupada em descartar distúrbio secundário do que obter alívio da dor; - Os pacientes que preenchem os critérios para cefaleia primária podem ser tratados com analgésicos. Nos casos em que houver sinais de alarme ou não preencherem os critérios diagnóstcos, deverão ser considerados exames complementares; - Das cefaleias primárias, as mais prevalentes são enxaqueca sem aura, enxaqueca com aura e cefaleia tensional; - A investgação da causa da cefaleia depende dos achados da história, exame f sico e hipóteses diagnóstcas a partr desses achados; - Pacientes com cefaleia de início súbito, “a pior da vida”, mesmo com bom estado geral, deverão ser subme tdos à tomografia de crânio. Caso exista suspeita de hemorragia subaracnoide, uma tomografia normal não descarta a hipótese diagnós tca, indicando-se punção do LCE; - Pacientes com suspeita de meningite aguda, sem sinais neurológicos localizatórios, devem ser submetdos imediatamente à punção do LCE, sem necessidade de tomogra fia prévia; - O alívio da cefaleia com analgésicos não exclui causas secundárias; - Os triptanos são medicações importantes no tratamento agudo da migrânea.
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A I G O L O R U E N
NEUROLOGIA
Cefaleia no pronto-socorro
Achados que sugerem que a cefaleia é secundária
Cefaleia aguda: a “pior da vida”
TC de crânio*
Cefaleia aguda: febre, irritação, meníngea e ausência de sinais localizatórios
Punção liquórica
Cefaleia progressiva: vômitos matinais
TC de crânio
Cefaleia e confusão mental
TC de crânio*
Cefaleia e coagulopatia ou plaquetopenia
TC de crânio*
Cefaleia e infecção pelo HIV
TC de crânio*
Cefaleia de início recente no idoso
TC de crânio* VHS Biópsia temporal
* Se a TC de crânio for normal, deve-se coletar liquor
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Anamnese e exame físico sugerem cefaleia primária
Enxaqueca com aura Enxaqueca sem aura Cefaleia tensional Cefaleia em salvas
Tratamento do quadro: principais drogas e tratamentos usados nas cefaleias primárias
CAPÍTULO
4
Acidente vascular cerebral Marcelo Calderaro / Rodrigo Antônio Brandão Neto / Maria Aparecida Ferraz / Crist na Gonçalves Massant / Mauro Augusto de Oliveira
1. Introdução
B - Fisiopatologia
O Acidente Vascular Cerebral (AVC) é uma das principais causas de mortalidade e a 1ª causa de incapacidade no mundo. Em geral, apresenta-se de forma súbita e imprevisível, levando o paciente à emergência. Os AVCs são classificados em isquêmicos e hemorrágicos. O AVC Isquêmico (AVCI) é mais frequente, corresponde a 80% dos casos em algumas esta stcas e é classificado com base nos mecanismos determinantes da lesão isquêmica. Já os Acidentes Vasculares Cerebrais Hemorrágicos (AVCHs) correspondem a até 20% dos casos e podem ser subdivididos, de acordo com o local de sangramento, em hematoma intraparenquimatoso (HIP) e hemorragia subaracnoide (HSA). A pronta identficação dos sinais e dos sintomas, inclusive no ambiente pré-hospitalar, associada à correta interpretação de exames subsidiários e à rápida adoção de medidas terapêutcas, implicam um melhor prognós tco para o paciente.
O AVCI se deve a uma redução parcial ou total do fluxo sanguíneo encefálico. Dependendo da intensidade e do tempo de redução, pode ocorrer disfunção tecidual com perda reversível de função ou ter início uma cascata de eventos metabólicos que levam à morte celular. Assim, mesmo uma redução importante do fluxo sanguíneo regional pode gerar um dé ficit transitório caso seja de curta duração, como na presença de graves estenoses caro deas ou vertebrobasilar, em que pode haver uma trombose transitória.
2. Acidente vascular cerebral isquêmico A - Introdução O AVCI ocorre quando há redução do fluxo sanguíneo cerebral abaixo de limites crí tcos, ocasionando perda de função e, em úl tma instância, morte celular. É de finido, segundo a Organização Mundial de Saúde, por dé ficit neurológico focal (clássica e geralmente), às vezes global de instalação súbita ou com rápida evolução, sem outra causa aparente que não a vascular, com duração maior que 24 horas ou ocasionando morte sem outra causa aparente. O Ataque Isquêmico Transitório (AIT), por sua vez, é um insulto isquêmico transitório e reversível, com regressão total dos sinais e sintomas em menos de 24 horas. A maioria dos ataques dura de alguns minutos a 1 hora: por esse mo tvo, uma definição mais moderna considera que os sintomas devam se reverter em até 1 hora e que não haja evidência de isquemia na investgação por imagem (ressonância). As manifestações clínicas dependem da área encefálica acome tda, sendo útl o conhecimento do quadro clínico resultante da obstrução dos principais territórios arteriais.
Tabela 1 - Relação entre sinais neurológicos e território arterial afetado nos acidentes vasculares cerebrais
Território caro deo Artéria oálmica
Alteração visual monocular Déficit motor
Artéria cerebral média Artéria cerebral anterior
Déficit sensitvo
Predomínio braquifacial
Afasia
Hemisfério dominante
Negligência
Hemisfério não dominante
Déficit motor Déficit sensitvo
Predomínio crural
Sinais de frontalização Território vertebrobasilar
Artéria vertebral
Náuseas, vômitos e tonturas/vertgens Acometmento dos nervos cranianos baixos Alterações cerebelares Alterações de campo visual
Artéria cerebral posterior
Rebaixamento do nível de consciência Déficit sensitvo Alteração de funções nervosas superiores Déficit motor
Artéria basilar
Déficit sensitvo
Frequentemente bilateral
Rebaixamento do nível de consciência Alteração dos nervos cranianos
Devido à presença de circulação colateral, a área afetada pela redução de fluxo sanguíneo não apresenta lesões
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NEUROLOGIA de intensidades uniformes. Em geral, o centro da lesão sofre maior redução de fluxo, sendo circundado por uma área em que essa redução é insu ficiente para comprometer a viabilidade celular, mas su ficiente para comprometer sua função: é a zona de penumbra. Dessa forma, o quadro clínico observado em um determinado momento é o somatório de áreas de necrose e de outras ainda viáveis que poderão recuperar sua função, caso se restabeleça o fluxo sanguíneo. Alguns dados da hemodinâmica cerebral são importantes para sua compreensão: - O fluxo sanguíneo cerebral corresponde a 20% do débito cardíaco e a 50mL/min/100g de tecido cerebral; - O cérebro utliza 25% do consumo total de oxigênio do corpo; - A Pressão de Perfusão Cerebral (PPC) é de 70 a 100mmHg: equivale à diferença entre a Pressão Arterial Média (PAM) e a Pressão Intracraniana Cerebral (PIC) – PPC = PAM - PIC. O esforço no atendimento do AVCI agudo visa preservar a integridade e a capacidade de recuperação funcional da zona de penumbra através do rápido restabelecimento do fluxo sanguíneo cerebral ou da adoção de medidas que favoreçam o metabolismo celular nessa região. Cabe comentar, aqui, que o cérebro consome cerca de 150g de glicose e 72L de oxigênio em 24 horas, ou seja, a manutenção de aporte de glicose adequado, além da oxigenação, também
é fundamental para a manutenção de neurônios aviveis na zona de penumbra. Diversos mecanismos podem levar à redução do fluxo sanguíneo cerebral regional, e sua iden tficação correta poderá ter impacto no direcionamento de exames complementares, na vigilância clínica de eventuais complicações e, sobretudo, na profilaxia secundária. a) Mecanismo aterotrombó tco
Ao longo do tempo, a ação nas artérias dos fatores de risco vascular, como hipertensão arterial, diabetes mellitus, dislipidemia e tabagismo, gera um processo chamado aterosclerose. A placa de ateroma obstrui gradualmente a luz arterial, predispondo à formação de trombose naquele nível, embolização distal de um trombo ali formado ou, mais raramente, hipofluxo distal. Deve-se suspeitar de mecanismo aterotrombó tco quando são identficados fatores de risco cardiovascular, sopro caro deo, ou quando episódios isquêmicos transitórios no mesmo território arterial antecedem o evento isquêmico atual. É importante ressaltar que, em geral, a doença aterosclerótca não é restrita às artérias encefálicas, tornando a investgação de risco coronariano obrigatória para os pacientes com esse tpo de mecanismo. Doença arterial coronariana assintomátca é comum em indivíduos com estenose caro dea.
Figura 1 - Mapa dos territórios arteriais dos hemisférios cerebrais. Fonte: Atlas de inves t gação e tratamento do AVCI
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ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL
b) Cardioembolismo
Até 45% dos AVCs isquêmicos são de causa embólica, sendo 15 a 20% por embolias arterioarteriais e 20% de fonte cardíaca. Diversas condições têm sido implicadas como fatores de risco cardioembólico. Deve-se suspeitar de mecanismo cardioembólico quando se identfica uma cardiopata emboligênica ou quando há evidências tomográ ficas ou clínicas de acidente vascular ou episódio isquêmico transitório em diversos territórios arteriais. São fatores de alto risco para embolia cardiogênica: - Prótese valvar mecânica; - Fibrilação atrial; - Infarto de miocárdio há menos de 4 semanas; - Acinesia de ventrículo esquerdo; - Endocardite infecciosa; - Doença do nó sinusal; - Miocardiopata dilatada; - Trombo de ventrículo esquerdo; - Trombo de auriculeta esquerda ou presença de contraste espontâneo no átrio esquerdo; - Mixoma do átrio esquerdo; - Forame oval patente. c) Trombose de pequenas artérias
O principal fator de risco para a trombose de pequenas artérias é a hipertensão arterial crônica, que gera um processo chamado lipo-hialinose nas pequenas artérias encefálicas. As pequenas artérias estão situadas na profundidade dos hemisférios cerebrais, e, em geral, sua oclusão resulta no quadro clínico das chamadas síndromes lacunares. Devido à localização e à pequena extensão anatômica dos infartos cerebrais nessa situação, não há comprome tmento de funções nervosas superiores (afasia, apraxia, agnosia, heminegligência etc.) nem do nível de consciência. As principais síndromes lacunares descritas são: - Hemiparesia pura; - Hemi-hipoestesia pura; - Hemiparesia-hemi-hipoestesia; - Hemiparesia-hemiataxia; - Disartria-mão incoordenada. Estma-se que cerca de 20% dos AVCs isquêmicos são do clínico de uma síndrome lacunar não anula a necessidade de investgação de outros mecanismos que não a trombose de pequenas artérias, uma vez que uma embolia para pequenos vasos ou mesmo uma pequena hemorragia podem gerar síndromes lacunares sem que o mecanismo de lesão seja a trombose de pequenos vasos. tpo lacunar. O achado
d) Outros mecanismos
Outros mecanismos podem estar implicados na e tologia dos AVCIs, como arterites (lembrar-se da arterite temporal), embolia paradoxal por forame oval patente, dissecção arterial, trombofilias, entre outras. Deve-se suspeitar de mecanismos mais raros principalmente em pacientes jovens, sem fatores de risco aterotrombótco ou cardioembólico. Em até 30% dos casos, não se estabelece o mecanismo preciso do AVCI.
C - Diagnóstco Deve-se suspeitar de AVC quando houver instalação súbita de déficit neurológico focal relacionado à obstrução de uma artéria encefálica, com rápida progressão (minutos a horas). O conhecimento do quadro clínico resultante da obstrução das principais artérias é fundamental não apenas para o diagnóstco, mas também para correlacioná-lo com achados nos exames subsidiários. Tabela 2 - Escala pré-hospitalar para AVC de Cincinna t
Queda facial
Peça para o paciente mostrar os dentes e sorrir.
Normal
Ambos os lados movem-se igualmente.
Anormal
Um lado não se move tão bem quanto o outro.
Peça para o paciente fechar os olhos e Debilidade dos braços estender os braços por 2 segundos. Normal
Ambos os braços se movem igualmente ou não se movem.
Anormal
Um braço não se move ou cai quando comparado ao outro.
Fala
Peça para o paciente dizer: “O rato roeu a roupa do rei de Roma”.
Normal
Pronúncia e sentdos claros.
Anormal
Palavras inteligíveis, incorretas ou é incapaz de falar.
Conclusão
Se qualquer 1 desses 3 sinais se apresentar alterado, há 72% de probabilidade de AVC.
Nem sempre uma lesão observada em estudo de neuroimagem é a responsável pelo quadro clínico do paciente, e pode ser necessária a solicitação de métodos mais sensíveis (Ressonância Nuclear Magné tca – RNM). Quando não pode ser determinado o momento do início do AVC, deve ser considerado o úl tmo horário em que o doente foi visto (presencialmente) em condições normais. Ao exame f sico, além do exame neurológico, devem-se verificar hidratação, oxigenação, frequência, ritmo e ausculta cardíaca, pressão arterial e frequência respiratória. O nível de consciência deve ser observado e periodicamente reavaliado. Alteração importante é suges tva da ocorrência de hemorragias, infartos hemisféricos extensos ou de tronco encefálico, sinalizando a necessidade de medidas de suporte mais agressivas (intubação orotraqueal para proteger as vias aéreas, por exemplo). A escala do NIH para AVC (NIHSS: Nat onal Inst tutes of Health Stroke Scale) é uma ferramenta ú tl, rápida e de fácil aplicação à beira do leito que auxilia na decisão da terapia trombolí tca, além de uniformizar a linguagem para descrição do déficit neurológico do paciente. São avaliados fatores como linguagem, motricidade ocular, paresia em todos os membros, sensibilidade e presença de negligência, entre outros, como segue na Tabela 3. A pontuação na escala é tanto mais elevada quanto mais grave o quadro clínico, sendo estabelecidos 2 pontos de corte em relação ao tratamento trombolí tco: NIHSS <4 (dé ficit muito leve, exceto afasia) e >20 (déficit grave), ambos de contraindicação rela tva ao
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A I G O L O R U E N
NEUROLOGIA r-TPA. A pontuação na escala, somada ao contexto clínico do paciente (fatores de risco para sangramento, idade, tempo de evolução) auxilia na decisão da contraindicação ao trombolí tco. Pode ocorrer variabilidade entre examinadores, sendo considerada piora ou melhora neurológica quando há diferença de 4 ou mais pontos no resultado final. Tabela 3 - Escala de AVC do Na t onal Inst tute of Health
Orientação
Definição da escala
1a. Nível de consciência
0 = alerta
- Escolher uma alterna tva mesmo se avaliação pre judicada por tubo endotraqueal, linguagem ou trauma; - Dar 3, somente se não for obtda resposta aos es mulos dolorosos.
1 = desperta com es mulo verbal
1b. Orientação: idade e mês
0 = ambas corretas
2 = desperta somente com es -
3 = respostas reflexas ou sem
resposta aos es mulos dolorosos
1c. Comandos
0 = ambas incorretas - Abrir e fechar olhos; - Apertar e soltar a mão; 1 = uma tarefa correta - Realizar com a mão não parétca; - Substtuir por outro comando, se as mãos não puderem ser utlizadas; - Crédito se a tentatva for 2 = ambas incorretas realizada, mas não completada, devido ao déficit neurológico; - Se não responder ao comando, devem ser utlizados gestos. 0 = normal
(Voluntária ou olhos de 1 = paresia do olhar conjugado boneca) - Somente olhar horizontal testado; - Se o paciente tem paresia do III, IV ou VI isolada, marcar 1. Testar em pacientes afásicos. Paciente com 2 = desvio conjugado do olhar trauma ocular, ou alteração dos campos visuais deve ser testado com movimentos reflexos; - Todos os pacientes são testados.
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Definição da escala
3. Campos visuais
0 = normal
- Se houver cegueira monocular, os campos visuais do outro olho devem ser considerados; - Se o paci ente for cego por qualquer outra causa, marcar 3; - Extnção, o paciente recebe 1, e os resultados são utlizados para responder à questão 11.
1 = hemianopsia parcial, qua-
drantanopsia, extnção 2 = hemianopsia completa
3 = cegueira cortcal
0 = normal
mulo doloroso
- A resposta tem de ser cor- 1 = uma questão correta reta e não há nota parcial; - Paciente com afasia ou com alteração do nível de consciência, que não compreende as perguntas, recebe 2; 2 = ambas incorretas - Intubação endotraqueal, trauma, disartria grave ou qualquer problema não secundário a afasia, 1.
2. Motricidade ocular
Orientação
4. Paresia facial
1 = paresia mínima (aspecto
- Considerar simetria da contração facial em resposta aos es mulos, dolorosos em paciente com alteração do nível de consciência.
2 = paresia/segmento inferior
normal em repouso, sorriso assimétrico) da face 3 = paresia/segmentos superior
e inferior da face 5. Motor membro superior
- Braços estendidos 90° (sentado) ou 45° (deitado) por 10 segundos; - Iniciar com o lado não parético; - Em paciente afásico, u tlizar gestos e não es mulos dolorosos.
0 = sem queda 1 = queda, mas não a tnge
o leito
E
2 = força contra gravidade,
mas não sustenta 3 = sem força contra gravi-
dade, mas qualquer movimento mínimo conta
D
4 = sem movimento 0 = sem queda 1 = queda, mas não a tnge
o leito 6. Motor membro inferior
2 = força contra gravidade,
- Elevar perna a 30° deitado por 5 segundos.
mas não sustenta
E
3 = sem força contra gravida-
de, mas qualquer movimento mínimo conta
D
4 = sem movimento 7. Ataxia apendicular
0 = sem ataxia (ou afásico, hemi-
- Fazer os testes com os olhos abertos. Índex-nariz e calcanhar-joelho em ambos os lados; - Ataxia deve ser considerada somente se estver presente; - Se o paciente estver afásico ou plégico, não considerar.
plégico)
8. Sensibilidade
0 = normal
- Paciente afásico ou com rebaixamento do nível de consciência recebe 0 ou 1; - AVC de tronco com dé ficit bilateral = 2; - Se o paciente não responder e estver tetraplégico = 2; - Paciente em coma recebe 2.
1 = déficit unilateral, mas reco-
1 = ataxia presente em 1 mem-
bro 2 = ataxia presente em 2 mem-
bros
nhece o es mulo (ou afásico, confuso) 2 = paciente não reconhece o
es mulo ou coma ou déficit bilateral
ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL
Orientação
Definição da escala
Tabela 4 - Avaliação inicial da emergência para casos de AVC
9. Linguagem
0 = normal
- Eletrólitos;
- Descrever o que está acontecendo em uma figura e nomear os objetos em anexo. Também deve ler frases; - O paciente intubado deve ser solicitado para escrever uma frase. O paciente em coma recebe 3; - Mutismo que não consegue realizar nenhum comando = 3.
1 = afasia leve-moderada (com-
- Função renal;
preensível)
- Hemograma;
2 = afasia severa (quase sem
- Coagulograma;
troca de informações)
- Glicemia; - Eletrocardiograma; - Raio x de tórax;
3 = mudo, afasia global, coma
0 = normal - O paciente deve ler as pala- 1 = leve à moderada vras indicadas pelo médico, 2 = severa, ininteligível ou muda como mamãe, tanque, rua X = intubado etc. 10. Disartria
11. Extnção/negligência
0 = normal
- Se houver grave dé ficit visual e os es mulos sensitvos forem normais, deve ser considerado normal; - Se o paciente estver afásico, mas percebe ambos os lados, é considerado normal; - A negligência só é considerada quando estver presente.
1 = negligência ou extnção em
uma modalidade sensorial 2 = negligência em mais de 1
modalidade sensorial <4 = stroke moderado; >20 = prognóstco pobre, apesar
de tratamento. Risco alto para hemorragia intracraniana depois de t-PA
A Pressão Arterial (PA) deve ser periodicamente avaliada, pois seus níveis podem variar de forma rápida e espontânea. A avaliação seriada desse parâmetro clínico pode evitar tratamentos ant-hipertensivos desnecessários (por vezes prejudiciais, já que a viabilidade da área de penumbra é dependente da PAM). Além disso, seu manejo deverá basear-se em objetvos diferenciados para cada forma de AVC (Figura 1). O exame de fundo de olho deve ser sempre realizado, pois pode auxiliar no diagnós tco de quadros hemorrágicos (por exemplo: presença de hemorragia sub-hialoide em casos de HSA). A palidez re tniana pode ser observada em alguns casos de perda visual monocular de causa isquêmica secundária à doença ateroscleró tca caro dea. A palpação de pulsos caro deos, temporais e periféricos e ausculta caro dea podem ajudar no diagnós tco de estenoses arteriais, comumente associadas à doença aterosclerótca. Cerca de 13 a 19% dos pacientes com suspeita clínica de AVC apresentam, na verdade, outro diagnós tco neurológico (não vascular). Com base em tais dados, exames laboratoriais e de imagem devem ser solicitados para a exclusão de diagnóstcos diferenciais, como epilepsia, infecções sistêmicas, tumores cerebrais e distúrbios tóxico-metabólicos. A ocorrência isolada de sintomas como ver tgem, tontura, náusea, síncope, confusão mental, amnésia e convulsão em geral se associa a outro diagnóstco que não AVC. Os exames na Tabela 4 são indicados no manejo de pacientes com acidente vascular cerebral.
- Tomografia de crânio.
Embora a RNM forneça informações mais precisas sobre a natureza e a extensão da lesão, diversos fatores contribuem para que a tomogra fia ainda seja o exame de eleição na fase aguda do acidente vascular. Apesar de a sensibilidade desse método para lesões isquêmicas agudas ser relatvamente baixa nas primeiras horas, seu papel consiste, fundamentalmente, em descartar hemorragia e outros diagnóstcos como tumores. É um exame de menor complexidade, rápida execução e acessível à maioria dos centros de atendimento. Frente a um paciente com instalação aguda de déficit neurológico focal, uma tomogra fia de crânio normal fecha o diagnós tco de AVCI. Não se deve protelar a tomografia de crânio. Em protocolos de atendimento de AVC agudo, recomenda-se que, da admissão do paciente até o laudo da tomogra fia de crânio, não se passem mais de 45 minutos. Não se deve passar de 60 minutos entre a chegada do paciente e o início da infusão do r-TPA. É importante ter em mente que a TC apenas mostrará a área infartada após 24 a 72 horas do evento, sendo útl num momento inicial para: 1 - Afastar AVCH, que aparece precocemente como hiperdenso (“branco”). A sensibilidade é de 100% para hematoma intraparenquimatoso. 2 - Avaliar sinais suts de isquemia, como perda de de finição entre substância branca e cinzenta cor tcal ou subcortcal, apagamento de sulcos e fissuras, sinal da artéria cerebral média hiperdensa que podem estar presentes mesmo precocemente. Esses achados em áreas extensas implicam maior risco de complicações para a trombólise (impacto na decisão terapêutca). Outros exames podem ser necessários em casos específicos ou para determinar o mecanismo do AVC, como: - Ecodoppler de artérias caró tdas e vertebrais, Doppler transcraniano e angiorressonância: podem trazer informações sobre possíveis estenoses arteriais extra e intracranianas. Pacientes com trombose sintomá tca maior que 70% apresentam indicação de tratamento com endarterectomia ou angioplas ta. Em alguns casos, esse procedimento pode ser indicado quando de obstrução a partr de 50%. Em pacientes assintomátcos, o estudo ACAS demonstrou bene f cio da intervenção com obstruções maiores que 60%, desde que o paciente apresente baixo risco de complicações. Ainda assim, grande parte da literatura não recomenda intervenção em pacientes assintomá tcos; - Liquor (quando se suspeita de e tologia infecciosa ou hemorrágica); transtorácico e, par tcularmente, - Ecocardiograma transesofágico: podem revelar alterações signi ficatvas, determinando causa cardioembólica por meio da visualização de trombos, forame oval patente;
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NEUROLOGIA -
Holter : pode demonstrar a presença de arritmias pa-
roxístcas, associadas a maior risco de desenvolver trombos; - Angiografia cerebral digital: pode trazer informações importantes em casos selecionados. É o exame de referência para iden tficar o mecanismo da HSA, permitndo o diagnós tco de aneurismas cerebrais saculares com maior sensibilidade e especi ficidade, fornecendo informações precisas quanto à sua localização, morfologia e tamanho. Nesses casos, o exame deve ser sistematcamente realizado por meio dos 4 vasos cervicais que nutrem a circulação intracraniana, possibilitando o diagnóstco de aneurismas cerebrais múl tplos, que ocorrem em, aproximadamente, 20% dos casos; - Perfil de autoantcorpos, dosagem de an tcorpos antfosfolípides, pesquisa de trombo filias etc., a serem pesquisados em indivíduos jovens ou com fator de risco; - Sorologia para doença de Chagas etc. A escolha de tais exames deve ser criteriosa e direcionada caso a caso, de acordo com a suspeita clínica. Em geral, esses exames têm impacto maior na prevenção secundária do que na conduta durante a fase aguda. Observação:
- A avaliação laboratorial do paciente com AVC isquêmico dever ser baseada nas comorbidades, bem como o potencial para AVC agudo. Testes laboratoriais adicionais são feitos sob medida para o paciente (baseada na história e achados clínicos individuais); - RNI (alvo) intervalo: · Fibrilação atrial mais AVC isquêmico ou AIT: 2,5 (2 a 3); · Trombose de seio venoso: 2,5 (2 a 3). - Duração da terapia: longo prazo. · Fibrilação atrial mais AVC isquêmico ou AIT: longo prazo; · Trombose de seio venoso: 12 meses. - TC é a forma de neuroimagem mais utlizada na avaliação de pacientes na fase aguda do AVC. RNM com ângio-RNM foi um grande avanço na neuroimagem do AVC; RNM não só fornece grandes detalhes estruturais, mas também pode demonstrar áreas onde o metabolismo está alterado; - Doppler de carótdas é um dos testes mais úteis na avaliação dos pacientes com AVC. Cada vez mais, está sendo realizada no início da avaliação, não só para de finir a causa do AVC, mas para estratficar pacientes para qualquer tratamento ou intervenção nas carótdas se houver estenose de caró tdas; - Angiografia por subtração digital é considerada o método definitvo para demonstrar lesões vasculares, incluindo oclusões, estenoses, dissecções e aneurismas.
D - Conduta a) Terapia trombolí tca
Como dito, a conduta na fase aguda do AVCI visa preservar a integridade e a capacidade de recuperação funcional da zona de penumbra. Sabe-se que em pouco tempo o hipofluxo tecidual determina morte neuronal e inviabiliza a recuperação funcional: o ideal seria que pudesse recanalizar a artéria obstruída o mais rapidamente possível. De fato, algumas vezes isso ocorre espontaneamente, como nos episódios isquêmicos transitórios. O 1º estudo que demonstrou algum bene f cio na reca-
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nalização de artérias cerebrais foi publicado em 1995. Nele, pacientes que receberam r-TPA IV dentro de uma janela terapêutca de 180 minutos tveram uma chance 30% maior de ter mínima ou nenhuma sequela funcional ao final de 3 meses quando comparados com o grupo placebo. Em contrapartda, o grupo tratado teve 10 vezes mais sangramento intracraniano sintomátco (6,1% versus 0,6%), algumas vezes fatal. Na análise global, contudo, não houve aumento de mortalidade do grupo tratado. Os critérios de inclusão são detalhados na Tabela 5. Tabela 5 - Critérios de inclusão e contraindicações à terapia an t trombót ca
Critérios de inclusão para terapia an ttrombó tca
- Idade >18; - AVC com déficit neurológico mensurável; - Início dos sintomas há menos de 3 horas; - Contraindicações absolutas para terapia an ttrombótca; - Hemorragia intracraniana: · Suspeita de HSA; · Hemorragia interna atva. - Diátese hemorrágica aguda: · INR >1,7 e TP >15 segundos; · Heparina há <48h e TTPA aumentado; · Plaquetas <100.000/mm 3; · AVC prévio, trauma ou cirurgia intracraniana há <3 meses; · Politrauma ou cirurgia de grande porte nos últmos 14 dias. Contraindicações relatvas para terapia anttrombótca
- AVC com melhora clínica progressiva, exceto afasia; - PAS >185mmHg ou PAD >110mmHg; - Punção lombar há <7 dias; - Punção arterial recente em local não compressível; - Antecedentes de hemorragia intracraniana; - Malformação arteriovenosa, neoplasia ou aneurisma conhecidos; - Convulsão no início dos sintomas; - Hemorragia urinária ou gastrintestnal há <21 dias; - IAM há <21 dias; - Pericardite posterior ao IAM; - Glicemia >400mg/dL ou <50mg/dL.
A terapia trombolí tca, entretanto, só deve ser realizada por pro fissionais capacitados e que estejam atuando em uma estrutura apta a lidar com complicações, incluindo terapia intensiva e suporte neurocirúrgico e hematológico. Os protocolos de conduta do estudo original devem ser seguidos rigorosamente. Há evidências de que quebras de protocolo estão associadas a maior índice de complicações. O esforço tem se concentrado atualmente no aumento da janela terapêu tca e na tenta tva de selecionar o paciente que melhor se bene ficie de trombólise, minimizando o risco do procedimento. Atualmente, a trombólise deve ser realizada (com base nos fatores de inclusão e exclusão) nos pacientes com início dos sintomas: - 0 a 4h30min: r-tPA IV na dose de 0,9mg/kg (dose máxima de 90mg), sendo 10% da dose em bolus lento e o restante em 1 hora (bomba de infusão); - 4h30min a 6h: r-tPA intra-arterial (via angiografia). Score aspects: avalia a extensão do comprome tmento da ACM e risco de sangramento com o tratamento trombolí tco. Subdivide o território da ACM em 10 regiões padro-
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nizadas avaliadas em 2 cortes da TC de crânio: na altura do tálamo e núcleos da base e o próximo corte logo acima dos núcleos da base. Inicie com 10 pontos e re tre 1 ponto para cada região acometda. - 7 a 10: baixo risco de hemorragia; - 5 a 7: risco alto de hemorragia.
mia adequada incluem: craniectomia ampla com duroplasta e sem ressecção ro tneira de tecido cerebral. As complicações mais frequentes são a hidrocefalia, infecções, convulsão, herniação paradoxal e a síndrome do sinking skin fl ap quando a pressão atmosférica ultrapassa a PIC. Tabela 6 - Critérios para hemicraniectomia
Critérios de inclusão
- Diagnóstco de AVCI agudo em território de AVC de ACM, com até 96 horas de sintomas; - NIHSS ≥16 para lesão a direita ou ≥21 para lesão à esquerda; - Diminuição gradual do nível de consciência (Glasgow ≤13 para lesão à direita ou ≤9 com afasia para lesão à esquerda); - Alterações isquêmicas na TC de crânio que afeta 2/3 ou mais do território da ACM e edema com efeito de massa; - Idade entre 18 e 60 anos. Critérios de exclusão Figura 2 - Score aspects
Deve-se acrescentar que não se devem usar AAS e an tcoagulantes nas primeiras 48 horas após a trombólise. Outras drogas, potencialmente mais seguras, também têm sido testadas. O uso de an tagregantes plaquetários foi bastante testado para a pro filaxia secundária, sobretudo nos casos de AVC aterotrombótco. Diversos estudos com AAS, associação de AAS e dipiridamol, tclopidina e clopidogrel mostram benef cio nessa situação. Para a fase aguda do AVCI, contudo, só o AAS foi testado, mostrando um bene f cio modesto quando administrado nas primeiras 48 horas do evento isquêmico. Quando não é indicada outra terapia, deve ser realizada a administração de AAS, na dose de 100 a 300mg. Embora seja amplamente feito para prevenção secundária, sobretudo em casos de acidente vascular cardioembólico, o uso de an tcoagulantes na fase aguda do AVCI deve ser cauteloso, devido ao risco de transformação hemorrágica. Não há nenhum estudo controlado que demonstre benef cio na u tlização de heparina na fase aguda do AVCI. Ainda assim, há especialistas que a recomendam em casos de acidente vascular em progressão e na trombose de artéria basilar. Deve-se atentar que heparina em doses pro filátcas (por exemplo, 5.000U, de 8/8h) está sempre indicada. Nos casos de AVC cardioembólico, deve-se iniciar antcoagulação a partr do 3º dia nos infartos pequenos e a partr do 7º dia nos infartos maiores. Nos casos de transformação hemorrágica, geralmente inicia-se a an tcoagulação após 30 dias. b) Hemicraniectomia descompressiva
A hemicraniectomia descompressiva precoce é uma técnica que vem ganhando espaço no tratamento do AVCI malignos de artéria cerebral média, principalmente quando realizado precocemente dentro das primeiras 48 horas, preferencialmente nas 24 horas iniciais levando a um melhor desfecho em morbimortalidade. Os critérios para realização de craniectomia estão em anexo. As técnicas atualmente aceitas para uma craniecto-
- Diminuição do nível de consciência por outras causas que não formação de edema (distúrbio metabólico); - Pupilas fixas e dilatadas; - Uso de alteplase 12 horas antes; - Distúrbio sanguíneo sistêmico conhecido; - Escala de Rankin pré-AVC >1 ou índice de Barthel <95; - Expectatva de vida menor que 3 anos. c) Medidas gerais
Se, por um lado, a terapia trombolí tca é reservada para poucas situações (apenas cerca de 5% dos pacientes que chegam ao pronto-socorro, mesmo em centros de referência, são elegíveis para a trombólise), por outro, diversas medidas gerais têm impacto no prognós tco do paciente com AVCI, e isso deve ser enfatzado: - Procedimento inicial: o paciente deve ser admi tdo em unidade de terapia intensiva. Recentemente, tem-se discutdo a necessidade de internação em unidade de AVC. Diversos estudos mostram bene f cio na implantação dessas unidades, pois nelas trabalham pro fissionais capacitados para o pronto reconhecimento de sinais e sintomas de complicações do AVC, tornando mais ágil a adoção de medidas terapêutcas; - Controle da glicemia: níveis glicêmicos altos oferecidos a uma área isquêmica aumentam a acidose tecidual e pioram sua recuperação funcional. De forma geral, recomenda-se evitar níveis de glicemia superiores a 150mg/dL; - Temperatura: a correção da hipertermia (T >37°) com anttérmicos tem impacto no prognós tco; - Pressão arterial: há um conceito equivocado de que o pico hipertensivo na fase aguda do acidente vascular deva ser combatdo de modo agressivo, quando todos os dados atuais demonstram exatamente o contrário. Atualmente, admite-se que a elevação da pressão na fase aguda do AVCI seja um mecanismo neuro-humoral fisiológico com o obje tvo de manter a pressão de perfusão cerebral da área isquemiada. Em mais de 90%
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NEUROLOGIA dos casos, a pressão arterial no AVCI cai espontaneamente para níveis aceitáveis, sem qualquer medida a ser adotada. Em algumas situações, contudo, deve-se pensar em reduzir a pressão arterial: •
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Prevenção de aspiração pulmonar: manter cabeceira
do leito elevada a 30°; •
Suspeita clínica de infarto agudo do miocárdio ou dissecção de aorta concomitante ao AVC: a terapia
ant-hipertensiva deve seguir as recomendações para tais patologias; Pacientes candidatos à trombólise IV: devem-se manter os níveis pressóricos abaixo de 185x110mmHg, pois níveis superiores estão associados a uma maior chance de complicações hemorrágicas no sistema nervoso central; Pacientes não trombolizados: níveis pressóricos de até 220x120mmHg ou de pressão arterial média de até 130mmHg não devem ser comba tdos na fase aguda. Quando é necessário reduzir a pressão arterial agudamente, deve-se dar preferência a drogas intravenosas (beta-bloqueadores, nitroprussiato de sódio). Devem ser evitadas drogas que possam causar queda abrupta de pressão arterial, como bloqueadores de canal de cálcio sublingual ou diurétcos de alça.
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Avaliação da deglu tção: deve ser feita antes de ini-
ciar a alimentação oral. Em indivíduos com rebaixamento do nível de consciência ou disfagia grave, deve-se passar sonda nasoenteral para alimentação precoce, a fim de evitar desnutrição; Hidratação: manter adequada com solução salina isotônica; Suplementação de oxigênio: para manter saturação de O2 acima de 92%. Não há bene f cio na u tlização de oxigênio suplementar em pacientes que estejam saturando adequadamente; Profilaxia para trombose venosa profunda: mecânica (meias elás tcas) e química (heparina pro filátca). Em pacientes subme tdos à trombólise IV, o uso de heparina subcutânea deve ser iniciado apenas 24 horas após a administração do trombolí tco, a fim de evitar complicações hemorrágicas no sistema nervoso; Reabilitação precoce do paciente: com suporte de fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional.
Pressão arterial no AVCI
Pacientes internados para trombólise ou que estão em trombólise
Pacientes não candidatos à trombólise
Pré-trombólise: PAS >185mmHg ou PAD >110mmHg
Tratar situações que aumentam a PA (dor, ansiedade, cefaleia, náusea, vômitos, hipóxia, convulsões, hipoglicemia)
1ª opção: labetol – 10 a 20mg IV, em 1 a 2min. A dose pode ser repetida de 10 em 10min (dose máxima de 300mg)
Aceitável: nitroprussiato – bomba de infusão contínua, iniciar com 0,1 a 0,3 μg/ kg/min, aumentar a cada 5min
PA persistentemente elevada em várias aferições Não baixar a PA em mais de 10 a 15% da PAD
Durante ou após trombólise (monitorar a PA)
Manter PAS = 220mmHg ou PAD = 120mmHg
PAD >140mmHg
Nitroprussiato BIC – iniciar com 0,3 a 0,5μg/kg/min, aumentar a cada 5min até o efeito desejado
PAS = 220mmHg ou PAD = 120mmHg
PAS >220mmHg ou PAD >120mmHg
Não usar hipotensores
1ª opção: labetol – 10 a 20mg IV, em 1 a 2min, manter 2 a 8mg/min em BIC
PAS >230mmHg ou 121
1ªopção: labetol – 10 a 20mg IV, em 1 a 2min, manter 2 a 8mg/min em BIC
Aceitável: nitroprussiato – BIC, iniciar com 0,1 a 0,2μg/kg/min, aumentar a cada 5min até o efeito desejado
Aceitável: nitroprussiato – BIC, iniciar com 0,1 a 0,3μg/kg/min, aumentar a cada 5min
PAS entre 180 e 230mmHg ou PAD entre 105 e 120mmHg
Aceitável: nitroprussiato – BIC, iniciar com 0,1 a 0,2μg/kg/min, aumentar a cada 5min até o efeito desejado
Figura 3 - Manejo do paciente com AVC
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1ªopção: labetol – 10 a 20mg IV, em 1 a 2min, manter 2 a 8mg/min em BIC
* É imprescindível monitorar a PA: - Primeiras 2h, 15/15min; - Da 2ª à 6ª hora, 30/30min; - Passando 6h, 1/1h.
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3. Ataque isquêmico transitório Classicamente, definia-se o AIT como o dé ficit neurológico focal de instalação súbita, com duração inferior a 24 horas e presumidamente de origem vascular, limitado a um território cerebral ou ocular e nutrido por uma artéria especí fica. Essa definição traz alguns problemas. O 1º deles é que ela induz a um equivocado conceito de benignidade dos eventos. Sabe-se que 10% dos pacientes com AITs desenvolverão um AVCI nos primeiros 90 dias após o evento, metade nos primeiros 2 dias. Em um período de 5 anos, 30% dos pacientes com AIT desenvolverão um AVCI. Assim, esse episódio é o maior fator de risco para AVCI. Além disso, a presença de um dé ficit revertdo não exclui a necessidade de investgação complementar. Os diagnós tcos diferenciais dos AITs são os mesmos do AVCI, e os pacientes devem ser submetdos à mesma bateria de testes diagnós tcos em ambos os casos. Da mesma forma, não se deve adiar a inves tgação complementar. Um estudo que avaliou a duração dos AITs mostrou que a média de duração dos sintomas era de 8 minutos para os AITs no território vertebrobasilar e de 14 minutos para o AVC caro deo. Mais de 80% dos casos regridem em menos de 1 hora, sendo menor que 15% a chance de um dé ficit neurológico estável há 1 hora regredir antes de completar 24 horas. Por fim, estudos mais modernos de neuroimagem, envolvendo técnicas de RNM de difusão, mostram que parte dos dé ficits neurológicos transitórios apresenta lesões estruturais. Com base nesses estudos, uma nova definição para AIT tem sido proposta: episódio breve de disfunção neurológica provocada por isquemia cerebral focal ou retniana, com sintomas clínicos durando menos de 1 hora e sem evidência de infarto. Preconiza-se que os pacientes com AIT recente sejam internados para que se estabeleça, rapidamente, o provável mecanismo de lesão isquêmica e, por conseguinte, a pro filaxia secundária mais adequada. Observação: - É importante afastar e tologias metabólicas ou induzidas por drogas para os sintomas consistentes com um AIT. Fazer sempre um teste (dextro) para avaliar hipoglicemia. Eletrólitos séricos devem ser realizados para afastar distúrbios hidroeletrolí tcos; - Na emergência realizar os seguintes testes: per fil bioquímico sérico, incluindo estudos de coagulação, creatnina e hemograma completo; - Os seguintes testes podem ser realizados em caráter de urgência: velocidade de hemossedimentação, perfil lipídico e enzimas cardíacas; - Testes laboratoriais adicionais, com bases na história incluem: sorologia para sí filis, antcorpos antfosfolípides, testes toxicológicos, eletroforese de proteínas plasmátcas e hemoglobina, LCR; - Triagem para os estados de hipercoagulabilidade principalmente em pacientes jovens sem fatores de risco incluem os seguintes: proteína C, proteína S, anttrombina III atvada, proteína C atvada, fator V Leiden, fibrinogênio, antcorpo antcardiolipina, homocisteína, fator VIII, fator de von Willebrand, inibidor 1 de atvador de plasminogênio, antcoagulante lúpico e mutação G20210A no gene da protrombina;
- Exames de imagem para IAT incluem: Doppler de carótdas, TC crânio (ângio-TC) e RNM do encéfalo (ângio-RNM). O Doppler de carótdas pode ser usado para identficar pacientes que necessitam de tratamento cirúrgico endovascular de urgência. Doppler transcraniano pode ser um exame complementar para avaliar a permeabilidade dos vasos cerebrais e circulação colateral; - Angiotomografia é de valor cada vez maior na identficação de doença oclusiva na circulação cerebral. A angiorressonância é uma alternatva para avaliar imagens de ambos cérebro e pescoço. A angiografia convencional pode ser realizada quando as outras modalidades não estão disponíveis ou produzem resultados discordantes; - EEG pode estar indicado em casos para avaliar atvidade convulsiva.
4. Acidente vascular cerebral hemorrágico A - Hematoma intraparenquimatoso a) Introdução
O AVCH, também denominado Hemorragia Intracerebral (HI) ou hemorragia cerebral intraparenquimatosa (HIP), apresenta elevada mortalidade: mais de 1/3 dos pacientes morrem em 30 dias, e apenas 20% recuperam a independência funcional após 6 meses. O quadro clínico do HIP é o mesmo dos quadros isquêmicos, a depender da topografia da lesão. A diferença consiste em possíveis sintomas decorrentes da hipertensão intracraniana (HIC), ausente nas fases iniciais do AVCI. Tais sintomas incluem cefaleia intensa, náuseas, vômitos, rebaixamento intenso do nível de consciência e crises epilép tcas. Além disso, em geral os níveis de pressão arterial verificados na fase aguda do AVCH são superiores aos do AVCI. O volume do hematoma se correlaciona diretamente com a intensidade e a gravidade do quadro clínico. Ao contrário do AVCI, em que, habitualmente, o dé ficit neurológico é máximo na sua instalação, no HI é comum a progressão, no curso de algumas horas, dos dé ficits neurológicos focais e da sintomatologia de HIC. Nas hemorragias talâmicas e do núcleo caudado, assim como nos hematomas putaminais e lobares extensos, observa-se, com frequência, extensão do sangramento para o sistema ventricular. Na hemorragia talâmica, deve-se estar atento para a deterioração clínica abrupta causada por hidrocefalia, como resultado da obstrução do aqueduto de Sylvius por coágulo intraventricular. O edema cerebral ao redor do hematoma, do tpo vasogênico, tem seu pico de ocorrência entre 24 e 48 horas após o icto, mas a correlação com a deterioração do quadro neurológico é ques tonável. No HIP associado à hipertensão, a evolução clínica desfavorável está relacionada a maior idade do paciente, condição neurológica à admissão, hematomas volumosos e sua localização. As hemorragias intraventriculares primárias e no núcleo caudado têm melhor prognós tco que as situadas no tálamo e na ponte. Contudo, os sinais e os sintomas associados à HIC não são patognomônicos; portanto, não permitem o diagnóstco diferencial exclusivamente pelo quadro clínico, sendo
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NEUROLOGIA necessária a realização de exames complementares, principalmente a tomografia, que apresenta alta sensibilidade na identficação de HI. b) Fisiopatologia
A hipertensão arterial crônica não controlada está associada a HIs e a achados patológicos de microaneurismas de Charcot-Bouchard, que podem romper-se e ocasionar o extravasamento de sangue para o parênquima cerebral. Localizam-se, de preferência, nas pequenas arteríolas perfurantes do putâmen e do tálamo e menos comumente em tronco, córtex cerebral e cerebelo. Um pico hipertensivo predispõe agudamente ao rompimento desses microaneurismas, gerando hematomas nas regiões descritas. HIs acima de 80mL geralmente são letais, por lesarem estruturas vitais. c) Diagnóstco
A tomografia computadorizada de crânio é o exame de eleição para o diagnós tco de HIP, com quase 100% de sensibilidade diagnós tca na fase aguda, quando se observa uma imagem hiperatenuante e homogênea no parênquima encefálico ou cerebelar. A RNM pouco acrescenta na avaliação dos pacientes. É importante nos casos a picos, como hemorragias lobares e pontnas em jovens, podendo detectar angiomas cavernosos ou malformações arteriovenosas. Tumores intracranianos também podem ser diagnos tcados, partcularmente quando há edema e efeito de massa desproporcional ao sangramento. Exames de função renal, eletrólitos, hemograma, coagulograma e glicemia, além de eletrocardiograma, devem ser realizados em todos os pacientes. Quando o quadro clínico é muito suges tvo de HIP secundário à hipertensão arterial, ou seja, a localização é pica e o paciente apresentou pico hipertensivo à admissã o, em geral nenhum outro exame é necessário para estabelecer a etologia do HIP. Do contrário, deve-se realizar uma angiografia digital ou, em casos selecionados, a angiografia por RNM, visando pesquisar causas mais raras de HIP, como malformações arteriovenosas. A RNM também pode ser útl, sobretudo para a pesquisa de tumores de sistema nervoso que tenham sangrado. Hematomas com mais de 30mL têm pior prognós tco de uma forma geral. O cálculo do volume do hematoma é feito utlizando-se a fórmula (A x B x C) ÷ 2 = volume do hematoma em mL, em que: - A (cm) = maior diâmetro do hematoma; - B (cm) = diâmetro perpendicular a A (u tlizar a escala de cm ao lado da imagem). - C = somar os pontos ob tdos com os cortes de 10mm em que o principal eixo do hematoma tenha: 75 a 100% de A – pontuar cada corte com o valor 1; 25 a 50% de A – pontuar cada corte com 0,5; ≤ 25% de A – pontuar cada corte com 0,0. • • •
d) Conduta
As medidas gerais no HIP são semelhantes às do AVCI, embora, geralmente, não se preconize a administração de profilaxia medicamentosa para trombose venosa profun-
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da. Dá-se preferência para meios f sicos, como compressão pneumátca intermitente de membros inferiores. A conduta especí fica é relacionada a medidas para HIC, condição ausente nas fases iniciais do AVCI, tratamento da hipertensão arterial, pro filaxia de crises epilép tcas e mane jo cirúrgico. e) Tratamento da HIC
Uma partcularidade do quadro clínico do HIP é a súbita elevação da pressão intracraniana. O uso de monitoração da PIC de preferência intraventricular deve ser indicado em pacientes com Glasgow ≤8, e quadro HIC levando à piora neurológica ou em caso de hidrocefalia associada, sempre visando medidas proatvas ao em vez de medidas reatvas. A presença de sinais clínicos ou tomográ ficos de HIC descompensada, sobretudo a presença de hérnias intracranianas, consttui critério de gravidade. Medidas clínicas simples, como intubação orotraqueal com realização de hiperventlação leve a moderada, re tficação do pescoço e elevação do decúbito a 30°, têm impacto na redução imediata da pressão intracraniana. Outras medidas podem ser necessárias, como a administração de agentes osmó tcos, como o manitol IV (de 0,5 a 1g/kg de peso). Não há impacto na administração de cor tcosteroides nessa situação, embora seu uso seja preconizado quando há evidências tomográficas de sangramento intraventricular ou subaracnoide. Caso tais medidas sejam ineficientes, a sedação com diazepínicos, propofol ou barbitúricos pode ser uma alterna tva, e a conduta cirúrgica deve ser considerada. f) Tratamento da hipertensão arterial
Enquanto, no AVCI, os níveis pressóricos elevados observados na fase aguda são reacionais e retornam a valores normais sem qualquer tratamento, no HIP os níveis pressóricos elevados são indesejáveis, pois são, na maioria das vezes, a causa do sangramento, e sua manutenção implica na progressão da extensão da lesão. Diretrizes internacionais recomendam que os níveis pressóricos sejam man tdos abaixo de 180x105mmHg. Em pacientes com pressão intracraniana muito elevada, a redução da pressão arterial deve ser muito cuidadosa, pois se pode reduzir, drastcamente, a pressão de perfusão cerebral. Em pacientes subme tdos à monitorização da pressão intracraniana, deve-se manter a pressão de perfusão cerebral acima de 70mmHg. A droga mais u tlizada, nessa situação, é o nitroprussiato de sódio, devido à sua rápida ação. g) Profilaxia e tratamento das crises epilép tcas
Enquanto, no AVCI, a administração de drogas an tepiléptcas é restrita aos pacientes que tenham apresentado episódio convulsivo, no HIP, sua administração pro filátca deve ser realizada naqueles com hematomas próximos ao córtex cerebral, naqueles com inundação ventricular ou com sangramento subaracnoide. Caso o paciente não apresente crises, pode-se suspender a droga an tepiléptca entre 1 e 3 meses após o AVC. h) Conduta cirúrgica
A drenagem cirúrgica do HIP pode parecer, inicialmente, uma alternatva racional para o alívio da pressão intracraniana, mas ainda não há evidências claras de que pacientes
ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL
efetvamente se beneficiem dessa terapia. De forma geral, tem sido indicada drenagem cirúrgica nas seguintes situações: - Hematomas de fossa posterior maiores que 3cm de diâmetro; - Hematomas de fossa posterior menores que 3cm associados à deterioração clínica; 3 - Hematomas lobares grandes (>80cm ) ou associados à deterioração clínica. Em geral, pacientes com hemorragias pequenas (abaixo de 10cm3), sobretudo se neurologicamente estáveis, bem como indivíduos com grave comprome tmento do nível de consciência, não têm bene f cio com conduta cirúrgica. Porém, na hemorragia cerebelar, a consideração de cirurgia de emergência deve ser colocada em 1º plano. É importante reconhecer sinais incipientes de herniação nas hemorragias cerebelares, pois, nesse caso, a descompressão cirúrgica pode salvar a vida do paciente. Na clínica, deve-se ficar atento a paresias oculares, ataxias, vertgens, náuseas e vômitos. Nos estudos de neuroimagem, devem-se observar desvios do 4º ventrículo, obliteração de cisternas e dilatação ventricular. Apesar de, nos pequenos hematomas, o tratamento conservador ser suficiente para a grande maioria dos pacientes, não raro pode haver piora súbita após vários dias de evolução clínica estabilizada, com consequente evolução para coma e óbito. Em relação à definição de prognóstco na fase aguda, podemos utlizar a escala de AVCH que se segue. Pacientes com pontuação abaixo de 2 têm melhor prognós tco e os com pontuação maior que 3 têm prognós tco pior. Tabela 7 - Escore de AVCH
Componente
Glasgow
Volume (cm³) Inundação ventricular Origem infratentorial Idade (anos) Escore total
Pontos
3a4
2
5 a 12
1
13 a 15
0
≥30
1
<30
0
Sim
1
Não
0
Sim
1
Não
0
≥80
1
<80
0 0a6
O prognóstco do AVC hemorrágico varia dependendo da gravidade do AVC e da localização e do tamanho da hemorragia. Menor pontuação na Escala de Coma de Glasgow (ECG) está associada com pior prognós tco e maior mortalidade, um maior volume de sangue no momento do diagnóstco está associado a um pior prognós tco. Crescimento do volume do hematoma está associado a um pior resultado funcional e aumento da mortalidade. Hemorragia perimesencefálica não aneurismá tca tem um curso clínico menos grave e, em geral, um melhor prognós tco.
A presença de sangue nos ventrículos é associada a uma maior taxa de mortalidade. Em um estudo, a presença de sangue intraventricular foi associado um amento de 2 vezes na mortalidade. Pacientes com an tcoagulação oral associada à HI têm maiores taxas de mortalidade e resultados funcionais limitados. As diretrizes de 2010 para HI espontânea da American Heart Associat on e da American Stroke Associa t on observam que, nos estudos, a re trada de suporte médico ou ordem de não ressuscitação no 1º dia de hospitalização são preditores de mau prognós tco independente de fatores clínicos. Existe uma preocupação de que os métodos atuais de prognóstco inicial não levam em conta os efeitos de limitar cuidados após uma es tmatva de mau prognós tco. Portanto, a terapia inicial deve, provavelmente, ser agressiva e novos pedidos de não ressuscitação provavelmente devem ser adiados pelo menos até o 2º dia de hospitalização. Pacientes com ordem de não ressuscitação devem receber todos os tratamentos médicos e cirúrgicos, a menos que a ordem seja explícita.
B - Hemorragia subaracnoide a) Introdução
A HSA ou hemorragia meníngea é, sem dúvida, uma das situações mais dramátcas que se apresentam na emergência. Corresponde a 5% dos AVCs e tem incidência anual de 1/10.000 habitantes. Cerca de 10% dos pacientes sequer chegam ao hospital, 15% morrem em até 2 semanas e 40% morrem em 3 meses. A maior parte dos pacientes não volta a seu estado neurológico pré-sangramento. A causa mais frequente de HSA é o trauma, e, dentre as causas espontâneas, tem-se a ruptura de aneurisma sacular intracraniano, representando 75 a 80% dos casos. Os aneurismas intracranianos ocorrem com frequência de 2% em adultos. Mais de 90% são menores que 10mm e permanecem assintomátcos durante toda a vida, com risco anual de sangramento de 0,7%. Seu quadro clínico pico envolve a instalação súbita de cefaleia de forte intensidade (presente em 85 a 95% dos pacientes), que costuma irradiar-se para a região occipital ou cervical e ser acompanhada de meningismo, devido à ocupação do espaço subaracnoide por extravasamento de sangue. Frequentemente, a cefaleia é descrita como “a pior dor da vida” do paciente; pode ser acompanhada de náuseas, vômitos, alterações transitórias ou man tdas de consciência, paralisia de nervos cranianos (principalmente, o III nervo), rigidez de nuca e crises epilép tcas. Convulsões ocorrem em 10 a 25% dos casos e podem sinalizar malformação arteriovenosa ou tumor subjacente. Sinais focais são menos comuns, uma vez que o sangramento ocorre no espaço subaracnoide e não no parênquima cerebral, mas são possíveis. Embora o diagnós tco pareça claro quando o quadro se instala em sua plenitude, casos mais su ts de cefaleias de forte intensidade acompanhadas de náuseas são facilmente confundidos com cefaleias primárias, como a enxaqueca. Em algumas casuístcas, o erro diagnós tco em pacientes com HSA chega a quase 40%. Um diagnós tco equivocado compromete o prognós tco do paciente, pois medidas que evitam complicações não são adotadas. Três aspectos são
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A I G O L O R U E N
NEUROLOGIA implicados no erro diagnós tco: falha na compreensão de todo o espectro clínico da doença, no reconhecimento das limitações da tomogra fia de crânio nesse diagnós tco e na realização e na interpretação de exame de liquor. Estudos retrospectvos apontam que até metade do número dos pacientes com HSA relatam cefaleia semelhante, em geral súbita e explosiva, precedendo o quadro; a ela, dá-se o nome de cefaleia sen tnela. Estudos prospec tvos de cefaleias súbitas demonstram que cerca de 60% de tais indivíduos apresentam doenças neurológicas graves, não apenas HSA. Outros diagnóstcos incluem trombose venosa cerebral, hidrocefalia aguda, meningoencefalites, apoplexia pituitária, inclusive aneurismas não rotos. Após um 1º sangramento aneurismá tco, a chance de um ressangramento aumenta, girando em torno de 4% no 1º dia e atngindo de 20 a 30% no 1º mês e 40% em 6 meses. Após esse período, o risco torna-se estável, em torno de 3% ao ano. Se houver um ressangramento, o risco de morte será de 50%. Além daquele, são complicações hidrocefalia (de 15 a 20%), vasoespasmo (70%), convulsões (de 5 a 10%) e edema cerebral. A maior parte dos pacientes apresenta algum grau de hidrocefalia, que é visível aos exames de imagem. No entanto, algumas vezes a par tcipação dessa complicação na HIC do paciente é signi ficatva. A opinião de um especialista é necessária para determinar a necessidade de intervenção cirúrgica nesses casos. Entre o 3º e o 14º dias pós-sangramento, independentemente da clipagem do aneurisma, pode haver uma constrição das artérias intracranianas, gerando o chamado vasoespasmo. O quadro clínico, em geral, está relacionado à instalação de déficit neurológico focal, algumas vezes levando à isquemia cerebral veri ficada por imagem. Cerca de metade dos pacientes com HSA desenvolve vasoespasmo assintomátco e 1/3 sintomátco. Entre 15 e 20% desses pacientes desenvolvem um AVCI ou morrem. A causa mais comum de HSA espontânea (excluído trauma de crânio) é a ruptura de um aneurisma intracraniano, responsável por 80 a 85% dos casos. Na bifurcação dos vasos da base do crânio, podem surgir dilatações aneurismátcas que podem romper, gerando um sangramento subaracnoide. A prevalência de aneurismas não rotos na população varia entre 0,5 e 1%, sendo de 1 a 2% a chance anual de sangramento. Outras causas incluem coagulopa tas, malformações arteriovenosas, trombose venosa cerebral. b) Diagnóstco
O exame de eleição para o diagnós tco da HSA é a tomografia de crânio sem contraste, que mostra a presença de material hiperdenso nos sulcos e cisternas encefálicas em cerca de 90% dos pacientes no 1º dia de sangramento, caindo para zero em 2 a 3 semanas. Além de fazer o diagnós tco, a tomografia pode estmar a quantdade de sangue nas cisternas, o que se correlaciona com o risco de vasoespasmo. Pode, ainda, veri ficar a presença de hidrocefalia aguda e de sinais de infarto cerebral decorrentes de vasoespasmo. Nos casos em que a tomogra fia é normal ou inconclusiva, é necessária a punção liquórica, procurando sinais de sangramento (liquor hemorrágico, xantocromia, presença
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de macrófagos hemátcos). A diferenciação entre um liquor hemorrágico e um acidente de punção nem sempre é possível; porém, sugere-se observar o clareamento do sangue em tubos consecu tvos (teste dos 4 tubos), além de veri ficar a presença de xantocromia (esta, porém, só aparece após 12 horas), a olho nu ou por espectrofotometria, sugerindo a presença de produtos de degradação da hemoglobina. Depois de alguns dias, ocorrem pleocitose rea tva e baixos níveis de glicose como resultado de uma meningite estéril pelo sangue. Para o diagnóstco etológico, o padrão-ouro é a angiogra fia cerebral digital, que evidencia uma causa para o sangramento na maioria dos casos. Quando o exame é negatvo, recomenda-se repe t-lo em 4 semanas, quando se identfica um aneurisma previamente oculto em cerca de 1% dos casos. A angiogra fia pode, também, verificar a presença de outros aneurismas intracranianos e documentar a presença ou não de vasoespasmo. Por fim, a angiografia digital tem sido u tlizada como recurso terapêu tco. A angiografia por RNM, embora seja um método promissor, ainda não tem de finição suficiente para ser método de eleição. E o Doppler transcraniano, por ser um método não invasivo, tem sido um dos mais u tlizados no diagnóstco e no acompanhamento do tratamento do vasoespasmo. Todos os pacientes devem ter um per fil metabólico basal, com eletrólitos, função renal, hemograma e coagulograma, além de um eletrocardiograma, para a detecção de arritmias que mereçam tratamento. A HSA pode ser estadiada clinicamente e por meio de exames de imagem. Essas classi ficações estão nas Tabelas a seguir. Tabela 8 - Gradação de HSA da Federação Mundial de Neurocirurgia
Grau
Glasgow
Déficit focal
1
15
Ausente
2
13 a 14
Ausente
3
13 a 14
Presente
4
7 a 12
Presente ou ausente
5
3a6
Presente ou ausente
Tabela 9 - Sistema de gradação de Fisher
Grau
Sangramento à TC
1
Sem sangramento subaracnóideo
2
Difuso ou em lâmina de até 1mm
3
Coágulo localizado e/ou vertcal >1mm
4
Coágulo intracerebral ou ventricular
Escala de Hunt & Hess: - Grau 1: assintomátco, cefaleia leve, leve rigidez de nuca; - Grau 2: cefaleia moderada a severa, rigidez nucal, sem déficit neurológico, exceto paresia de NC; - Grau 3: sonolência, confusão, dé ficit neurológico focal leve; - Grau 4: torpor, hemiparesia moderada a severa; - Grau 5: coma, postura de descerebração.