Direitos Humanos – Precedentes Históricos 1. A Primeira Guerra Mundial
1.1.Cenário Mundial e início da Guerra – breves considerações Em meados do século XIX, a Europa vinha sendo dividida pelas rivalidades imperialistas imperialistas da Grã-Bretanha, França, Rússia e dos Impérios Austro-Húngaro e Otomano. No início do século XX, o nacionalismo tomava formas perigosas: o paneslavismo russo e o plano de criação da Grande Sérvia visavam à união de todos os povos eslavos. O revanchismo francês enraizava-se no desejo de vingança da derrota sofrida contra a Prússia em 1870. Entrava em cena a Alemanha como o país mais poderoso da Europa Continental, após a Guerra franco-prussiana (1870 / 1871) e a arrancada industrial propiciada pela unificação do país, em 1871. A nova potência ameaça os interesses econômicos da Inglaterra e políticomilitares da Rússia e da França. Assim, Assim, o choque dos interesses interesses imperialistas imperialistas das diversas diversas nações européias, européias, aliado aliado ao espírito espírito nacionalista nacionalista emergente, emergente, é o grande fator que desencadeia o conflito. O atentado de Sarajevo, na Bósnia-Herzegóvina, em que o terrorista sérvio Gavrilo Princip mata o herdeiro do trono austrohúngaro, arquiduque Francisco Ferdinando, em 28/06/1914, serve de pretexto para que o Império Austro-Húngaro ataque a Sérvia, foco mais ativo da agitação eslava dos Bálcãs. O conflito assume proporções amplas em conseqüência do sistema das alianças múltiplas: a Tríplice Aliança (Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália, 1882) e a Entente Cordiale ( GrãBretanha e França França , 1904) , base da Tríplice Entente ( Grã-Bretanha, Grã-Bretanha, França e Rússia, 1907) 1907) – formadas como um meio de proteger-se contra a expansão industrial, comercial e militar alemã. 1.2.Conseqüências da Guerra Com o fim da Guerra, ocorre uma reorganização do mapa político europeu. Os Impérios Alemão, Austro-Húngaro Otomano e Russo Russo deixam deixam de existir; existir; Polônia Polônia,, Estônia Estônia,, Letônia, Letônia, Lituânia Lituânia,, Finlândi Finlândia, a, Hungria Hungria e Tcheco-E Tcheco-Eslov slováqu áquia ia tornam-s tornam-se e independentes; a Iugoslávia surge da união da Sérvia com Motenegro. As condições extorsivas impostas pelo Tratado de Versalhes à Alemanha Alemanha (perda de todas as colônias e partes de seu território, pagamento de indenizações gigantescas, proibição de formação do Exército regular, etc. ) foram o germe do regime totalitário nazista e uma das causas da Segunda Guerra Mundial. Em relação às perdas humanas, é preciso ressaltar que dos 65 milhões de homens envolvidos na luta, mais de 8 milhões morreram, 20 milhões ficaram feridos e 5 milhões desapareceram. Além disso, 9 milhões de civis são mortos em conseqüência da fome, epidemias e massacres. É esse o quadro degradante que encontramos ao fim da Primeira Guerra Mundial e que servirá de palco para o desenvolvimento dos precedentes históricos da moderna sistematização dos direitos humanos. 2. Precedentes históricos da moderna sistematização de proteção internacional dos direitos humanos Para a internacionalização dos direitos humanos, era necessária uma redefinição do âmbito e alcance do conceito tradicional de soberania estatal, exigindo ainda uma redefinição do próprio status do indivíduo no cenário mundial, para que fosse alçado à categoria de sujeito de direito internacional. Nesse sentido, o Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho foram marcos do processo de internacionalização dos Direitos Humanos. É isso que nos propomos a analisar nas linhas seguintes, com destaque para a Liga das Nações, de especial enfoque nesse estudo. 2.1.Direito Humanitário O Direito Humanitário ou Direito Internacional da Guerra desenvolveu-se com o objetivo de limitar a atuação do Estado e assegurar a observância dos direitos fundamentais, colocando sob sua tutela militares fora de combate ( por ferimentos, doença, naufrágio ou prisão ) e populações civis. Com aplicação tanto em conflitos internacionais quanto civis, o Direito Humanitário impõe regulamentação jurídica do emprego da violência internacionalmente, referindo-se a questões de extrema necessidade, em que se faz necessário o confronto com um poder exterior. Assim, Assim, o Direito Humanitário Humanitário figurou como a primeira primeira expressão expressão de limites à liberdade e autonomia autonomia dos Estados Estados.[1] .[1]
2.2. Liga das Nações A criação de um organismo internacional de manutenção da paz já vinha sendo pensada por trabalhos jurídicos e filosóficos precedentes, mas a primeira fonte da Liga das Nações foi mesmo a proposta na Conferência de Paz em Paris, em 1919, no Pós-Primeira Guerra. Criada em 1920, a Liga das Nações "tinha como finalidade promover a cooperação, paz e segurança internacional, condenando agressões externas contra a integridade territorial e a independência política de seus membros."[2] A Convenção da Liga das Nações ainda estabelecia sanções econômicas e militares a serem impostas pela comunidade internacional contra os Estados que violassem suas obrigações, o que representou uma redefinição do conceito de soberania estatal absoluta. É bem verdade, como afirma Thomas Buergenthal[3], que a noção de proteção internacional dos direitos humanos não tinha ainda ganho efetiva aceitação pela comunidade das nações, nem seriamente sido tratada pela Convenção que instituiu a Liga das Nações, mas podem ser destacadas certas previsões genéricas a respeito do Direito Internacional dos Direitos Humanos, como o sistema de mandatos, o padrão internacional do trabalho e o sistema de minorias. [4] 2.2.1. Sistema de Mandatos Uma das previsões do artigo 22 da Convenção estabelecia o sistema de mandatos a ser aplicado apenas às ex-colônias dos países perdedores da Primeira Guerra Mundial. Sobre esse assunto, manifesta-se Paulo Bonavides[5]: "Suscitou-se (...) após a Primeira Guerra Mundial a questão do destino que se daria às colônias dos Estados vencidos no conflito armado. Transferi-las pura e simplesmente, ainda sob a forma clássica de Protetorado às potências vitoriosas, equivaleria a confirmar as suspeitas de que os largos e generosos princípios apregoados na guerra ficariam deslembrados na paz. Concebeu-se, pois a destinação das colônias aos Estados vencedores, mas sob o regime de "mandatos". A organização política internacional, no caso a antiga Sociedade das Nações, investiria determinados governos na tutela das populações coloniais para regê-las no interesse de sua progressiva emancipação, até que ali as condições materiais, morais e culturais estivessem suficientemente amadurecidas, em ordem a capacitá-las à plena fruição da liberdade e soberania." Como se observa, o sistema de mandatos muito se aproximava do Protetorado, diferindo deste pelo fato de estar vinculado ao organismo jurídico internacional da Liga das Nações e possuir, ao contrário do Protetorado, caráter transitório em sua própria instituição. A administração pelos Estados mandatários (dominantes) deveria visar à subseqüente emancipação das populações coloniais dos Estados sob mandato. 2.2.2. Padrão Internacional do trabalho Uma outra provisão da Convenção da Liga das Nações, em seu artigo 23 era sobre questões relacionadas às "condições justas e humanas de trabalho para homens, mulheres e crianças." Também visava ao estabelecimento de organizações internacionais com o mesmo objetivo. Essa função foi posteriormente assumida pela Organização Internacional do Trabalho, que teve sua fundação quase ao mesmo tempo que a Liga das Nações . A OIT sobreviveu à Liga das Nações e é agora uma das Agências especializadas das Nações Unidas. As atividades legislativas e a supervisão estabelecida pela OIT para promover e monitorar a obediência aos padrões internacionais de trabalho têm, ao longo dos anos, contribuído enormemente para a melhoria das condições de trabalho e para o desenvolvimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos.[6] 2.2.3. Sistema de Minorias A Liga das Nações também teve papel de grande importância no desenvolvimento de uma sistemática internacional para a proteção das minorias. Como sabemos, uma das conseqüências da Primeira Guerra Mundial foi o remapeamento político europeu, com a formação de novos Estados constituídos por uma grande variedade de grupos étnicos, lingüísticos e religiosos. A partir daí, firmava-se a necessidade da conclusão de tratados especiais destinados à proteção das minorias. Nesses tratados, os Estados se comprometiam a não discriminar membros de grupos minoritários e a garantir-lhes direitos especiais necessários à preservação de sua integridade étnica, religiosa ou lingüística. A Liga das Nações passou a ser a guardiã dos compromissos assumidos pelos Estados nos tratados, exercendo essa função a partir de um sistema de petições a ser utilizado por membros dos grupos minoritários quando da violação de seus direitos. Como lembra Thomas Buergenthal, é importante reconhecer que algumas das instituições modernas de Direitos Humanos guardam considerável semelhança com as instituições primeiramente desenvolvidas pela Liga das Nações para a administração do sistema de minorias.[7]
3. OIT (Organização Internacional do Trabalho / International Labour Office, hoje denominada International Labour Organization) A Organização Internacional do Trabalho foi criada após a Primeira Guerra Mundial com o objetivo de promover padrões internacionais de condições de trabalho e bem-estar. A OIT teve importante papel, influenciando a adoção de uma série de novos documentos internacionais no ramo da proteção ao trabalho. Nos sessenta anos posteriores à sua criação, foi promulgada uma centena de Convenções, pelas quais os Estados –partes comprometem-se a assegurar dignas condições de trabalho. CONCLUSÃO A Liga das Nações (juntamente com o Direito Humanitário e a OIT) marca a projeção do Direito Internacional ao alcance de obrigações coletivas por parte dos Estados, visando à defesa dos direitos humanos e, portanto, ultrapassando o âmbito simplesmente governamental. Assim, de um Direito Internacional que tinha no Estado o único sujeito de Direito Internacional, alcança-se o reconhecimento da titularidade e proteção de direitos individuais não mais restritos à esfera nacional. As intervenções possíveis nos territórios desses Estados a partir desses institutos é prova da redefinição do conceito de soberania absoluta e do delineamento de um novo Direito Internacional, marcado também pela consolidação da capacidade processual internacional dos indivíduos.