AS PERSPECTIVAS PARA O PRÉ-SAL DE ANGOLAi A imprensa especializada internacional tem veiculado nos últimos tempos notícias recorrentes de enormes e numerosas descobertas de petróleo leve, da ordem de 2 a 8 bilhões de barris recuperáveis por campo, localizadas em camadas pré-sal nas Bacias de Santos, Campos e Espírito Santo no sudeste brasileiro. Se considerarmos que a costa oeste africana é a contra-parte geológica da margem continental leste brasileira e que elas se justapõem em uma reconstrução paleogeográfica (Figura 1), podemos imaginar que o poderoso sistema petrolífero que gerou as grandes reservas do pré-sal brasileiro podem ocorrer em território angolano e essa suspeita merece ser investigada.
Fonte: http://members.fortunecity.com/geology99/paloma/fit.gif
Figura 1 - Reconstrução paleogeográfica do Oceano Atlântico Sul mostrando a justaposição das margens continentais do Brasil e oeste africana.
De fato, embora o gigantismo das novas descobertas no pré-sal brasileiro seja inédito no domínio das águas profundas, na realidade, já se sabe, a muito tempo, da existência de um sistema petrolífero efetivo nesse pacote rochoso identificado em várias bacias sedimentares brasileiras e angolanas. Reservatórios do pré-sal produzem petróleo nas bacias costeiras de SergipeAlagoas e Espírito Santo, no Brasil, e nos Blocos 0, 2 e 3 da Bacia do Baixo Rio Congo, como também na porção emersa da Bacia do Rio Kuanza, em Angola.
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A Camada Pré-Sal Entende-se por “Camada Pré-Sal” aquele conjunto de rochas sedimentares presentes em algumas bacias sedimentares abaixo de uma espessa sequência contínua de rochas salíferas e que compreende rochas criadas a partir de deposição sedimentar nas fases iniciais de formação do atual Oceano Atlântico, iniciada cerca de 180 milhões de anos atrás (Figura 2). Três aspectos geológicos da camada pré-sal valem a pena salientar-se: (1) a presença de rochas geradoras de origem lacustrina com alto conteúdo de carbono orgânico e excelente potencial para geração de petróleo, (2) a ocorrência de uma associação muito íntima entre rochas geradoras e reservatórios clássicos, areníticos e carbonáticos, de boa porosidade e permeabilidade, e (3) a presença da extensa camada de sal sobreposta que representa um selante quase perfeito para o sistema petrolífero presente abaixo dela. Esses três fatores, quando associados a uma adequada história de maturação térmica, garantem a eficiência de um sistema petrolífero bastante produtivo. Esta “fábrica” extremamente eficiente de petróleo tende a ser tão produtiva que apenas fugas pontuais e ocasionais de óleo e gás através de descontinuidades da camada de sal foram suficientes para o acúmulo das grandes reservas que hoje conhecemos no pós-sal em Campos e Baixo Congo. Essas ocorrências de petróleo já conhecidas e quantificadas, juntamente com estudos de diversas naturezas, levaram os geológos a suspeitar da existência desse sistema altamente eficiente de geração, mas o seu desenvolvimento foi impedido durante muitos anos pela baixa qualidade da imagem sísmica geralmente obtida abaixo da camada de sal, que, devido a suas propriedades físicas, absorve grande quantidade da energia acústica utilizada no método sísmico de investigação.
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Nível do mar Pós-sal Sal Pré-sal
Crosta continental
Litosfera
Figura 2 - Perfil esquemático mostrando o contexto geológico no qual a camada pré-sal está inserida.
A título de esclarecimento, em vista da frequente confusão que se faz na divulgação de informações sobre descobertas “pré-sal” e “sub-sal”, a Figura 3 abaixo procura demonstrar a diferença entre esses dois conceitos. Arranjos “sub-sal” são comumente identificados em várias bacias sedimentares, como por exemplo o Golfo do México e águas profundas do Oeste da África, mas não revestem-se necessariamente, dos mesmos aspectos geológicos mencionados anteriormente como característicos de esquemas “pré-sal” e responsáveis pelo tamanho descomunal das descobertas anunciadas.
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Fundo do mar
Camada alóctone de sal
Camada pós-sal
Camada de sal
Camada pré-sal
Figura 3 - Diferença conceitual entre “pré-sal” e “sub-sal”.
O Pré-sal no Brasil O Brasil sempre foi um produtor medíocre de petróleo em relação ao seu consumo interno. Somente nesta década o país se tornou auto-suficiente nesse energético e luta permanentemente para garantir seu suprimento. As reservas brasileiras são hoje da ordem de 14 bilhões de barris e a produção doméstica gira em torno de 1.950.000 barris por dia. Com as descobertas do pré-sal, as expectativas são agora de o país tornar-se um grande produtor, de classe mundial. Somente os recursos petrolíferos localizados em Santos – Campos de Iara, Tupi, Jupiter, Paraty, Guará, Carioca e Caramba - permitem estimar algumas dezenas de bilhões de barris recuperáveis de petróleo de boa qualidade. Além disso, não existem muitos desafios tecnológicos envolvidos no desenvolvimento desses recursos. Os principais desafios estarão provavelmente na gestão de projetos de muito grande porte e no financiamento dos mesmos. Tais descobertas no pré-sal e o potencial que elas encerram permitem traçar um quadro bastante confortável, em termos energéticos, para o Brasil e para as empresas que participarão no desenvolvimento dessa gigantesca fronteira exploratória.
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Fonte: http://media.photobucket.com
Figura 4 - Imagem sísmica do pré-sal brasileiro.
O gigantismo das descobertas no pré-sal brasileiro naturalmente deflagrou intensos debates sobre a melhor forma de gerir essa riqueza, cujo risco de sua existência foi grandemente reduzido pelas últimas sondagens realizadas. O efeito adverso que resultou do início desse debate foi a suspensão da prática de leilões oficiais regulares de concessões nas áreas de ocorrência das descobertas no pré-sal e um prolongado debate político sobre o melhor regime contratual para controlar a exploração dessa riqueza. O regime sob o qual as atividades petrolíferas são conduzidas no Brasil (Regime de Concessão) pode sofrer mudança radical com a conclusão desse debate político em andamento, cujo formato final deverá definir a atratividade da actividade para o grande investidor externo e o ritmo com que essas reservas serão exploradas. O aproveitamento em escala comercial desse energético deixou de ser uma questão técnica e passou a ser política. O Pré-sal em Angola As Bacias do Baixo Rio Congo e Kuanza em vários aspectos geológicos são muito similares às bacias portadoras de reservas pré-sal do Brasil. A pergunta que se faz então é: Por que reservas de grande porte no pré-sal angolano ainda não foram anunciadas? A resposta é simples e direta; elas não foram ainda anunciadas porque ainda não foram reveladas por sondagens. O pré-sal angolano, em particular, e do oeste da África, em geral, permanece ainda inexplorado em larga escala.
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Neste exato momento, todas as companhias petrolíferas procuram rever as informações disponíveis do offshore da costa oeste da África em busca da identificação de possíveis alvos exploratórios no pré-sal. Essa corrida faz antever um robusto ciclo de sondagens nas áreas sob contratos de exploração e produção em vigor. Esse ciclo só será retardado ou reduzido caso a crise económica mundial persista por muito tempo. Além disso, espera-se que, na retomada dos concursos para novas áreas em Angola, os valores de bónus de assinatura venham a bater os recordes anteriormente alcançados de classe mundial. Essa defasagem em relação às grandes descobertas brasileiras no pré-sal encontra explicação convincente na qualidade do dado sísmico disponível e no sucesso da exploração do pós-sal. O sucesso das reservas significativas encontradas na sequência marinha póssal, tanto na Bacia de Campos, no Brasil, como também na Bacia do Baixo Congo, em Angola, desviou a atenção de outras áreas promissoras e também da camada pré-sal, em geral localizada a maiores profundidades. Ainda hoje, algumas descobertas anunciadas em Angola como sendo descobertas na camada pré-sal, são, na realidade, acumulações mais rasas, armadilhadas em reservatórios no pós-sal, de idade Terciária, subjacente a camadas alóctones de sal desgarradas de uma camada-mãe mais profunda (vide Figura 3). Os resultados iniciais da pesquisa no pós-sal angolano foram muito interessantes e, temporariamente, satisfizeram as metas de produção e retorno financeiro de governos e empresas de tal maneira, que não permitiram o incentivo necessário para investimentos adicionais na busca de reservas mais profundas e de muito maior risco geológico e económico no pré-sal. Essa descobertas significativas e preambulares no pós-sal, como consequência, retardaram as descobertas no pré-sal de águas profundas. Entretanto, a realidade das últimas descobertas em Angola, tem mostrado volumes recuperáveis por campo cada vez mais reduzidos. Nesse contexto, ocorreu a aplicação do conceito de clusters de produção para viabilizar os novos desenvolvimentos de campos no pós-sal. Entrementes, agora, com o conhecimento geológico acumulado e as melhorias nos métodos de prospecção, passa a fazer sentido económico aceitar maiores riscos para a descoberta de maiores prémios no pré-sal mais profundo. A qualidade do dado sísmico, ferramenta principal na predição de possíveis reservatórios em profundidade, evoluiu muito nos últimos anos e a visibilidade dos horizontes pré-sal de Angola somente agora começa a ser mais confiável.
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Com a sofisticação do método sísmico de pesquisa, a camada pré-sal em Angola passou a ser melhor identificada e mapeada. A Figura 5 exemplifica a identificação de espessa coluna pré-sal no offshore angolano.
Figura 5 - Imagem sísmica do pré-sal em Angola.
Com o avanço da pesquisa em áreas de ocorrência da camada pré-sal em Angola, tudo leva a crer que o resultado não será muito diferente daquilo que prenuncia-se no outro lado do Oceano Atlântico. Nesse contexto, a indústria petrolífera de Angola tem não só uma boa oportunidade de absorver novas tecnologias em franco desenvolvimento no Brasil, como também emprestar sua experiência na gestão de contratos de partilha de produção que eventualmente poderão ser adotados ao final do debate político que se trava neste momento no Brasil. São auspiciosas as expectativas para Angola quando analisamos as possibilidades do pré-sal angolano. A indústria petrolífera tem uma longa e rica contribuição a proporcionar à economia e sociedade angolana ainda por muitas décadas. Renato Pimenta de Azevedo Geólogo, Ph.D. e Gestor de Empresas 20 de Junho de 2009 i
Texto preparado para a Revista O Petróleo
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