CLÍNICA PSICANALÍTICA
D693c
Dor, Clínica psicanalítica Alegre Artes Médicas,
Dor;
Maria Lúcia Homem. — Porto
1996
1. Psicanálise. I. Título. CDU Catalogação na publicação: Mônica Ballejo Canto - CRB 10/1023 ISBN 85-7307-183-4
Joël Dor Psychanalyste. Membre du Centre de formation et de recherches psychanalytiques. Docteur en psychanalyse. Maître de conférences et Directeur de recherches à l'Université
CLÍNICA
Tradução:
Maria Lúcia Homem Coordenação, supervisão e revisão té cnica desta edição:
M. de Souza
Psicanalista
PORTO ALEGRE,1996
Obra srcinalmente publicada em francês sob o título Clinique psychanalytique © Éditions Denoël, 1994
Joaquim da Fonseca Preparação do srcinal: Eunice Revisão da tradução: Patrícia Ramos Supervisão Letícia Bispo de Lima Editoração eletrônica: Artes Médicas Editográfica Claudia Severino Rosa
Reservados todos os direitos para publicação em língua portuguesa à EDITORA ARTES MÉDICAS SUL LTDA. Av. Jerônimo de 670 — Fones (051) 330-2183 e 3303444 Fax (051) 330-2378 — 90040-340 Porto Alegre, RS, Brasil LOJA CENTRO Rua General Vitorino, 277 — Fone (051) 225-8143 90020-171 Porto Alegre, RS, Brasil IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL
À Jean-Paul
de
Sumário
PRIMEIRA PARTE. CLÍNICA PSICANALÍTICA E ENSINO
Introdução 1 2
Ensino da psicanálise e sujeiçã o Apresen tação clínica e psicopatologia
5 13 25
SEGUNDA PARTE. REFLEXÕES SOBRE A CONDUÇÃO DO TRATAMENTO 3 4
A transferência e sua subversão Inter venções e interpreta ções no tratamento
35 43
TERCEIRA PARTE. ESTUDOS CLÍNICOS 5
6
A dinâmica identificatória na histeria desejo do obsessivo em confronto com as mulheres
53 65
mástico
Manifestaçõ es perversas em um cas o de fobia 7 perverso e seu goz o 8 A 9servidã o estét ica dos travestis 10 Condensa ção e deslocame nto na estrut uraçã o das linguagens delirantes Bibliografia remissivo 143
73 81 93 109
PRIMEIRA PARTE Clínica psicanalítica e ensino
Introdução
S
abe-se a tendência natural de todo ensino a se transformar, mais ou menos, no discurso universitário. Todavia, se essa dinâmica do discur so obe de ce, na maior parte do tempo, a disposições de pen samento próprias àquele que ensina, não se deve perder de vista que é também, freqüentemente, senão solicitada, ao menos esperada por aquele que recebe este ensino. Introduzir a referência da clínica psicanalítica sob os auspícios de tal processo de discurso com vocação de ensino permanece, ainda hoje, um projeto comumente criticado, com o Da qualmesma pactuam, no como entanto, mente, alunos e clínicos formadores. forma, se solidaria contentar com o adágio tradicionalmente estipulado pela psicanálise não se ensina, mas se transmite"? Uma coisa é constatar a vitalidade, contudo bastante atual, de tal ensino. E outra seria determinar o mais precisamente possível, não somente a incidência, mas também a articulação que ele mantém com as vias régias da transmissão direta e insubstituível do divã. Mas o costume não é mais o de se sentir obrigado a justificar esse último ponto por um argumento A questão está resolvida: a capacidade tutelar da instituição de ensino não alimenta nenhuma vocação para suprir o protocolo sagrado dessa transmis são. Ao contrário, tal instituição deverá ter por missão provar que é capaz
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de estender sua eficácia de acordo com um ensino compatível com as vicissitudes dessa transmissão. É então sob tal "insígnia" que se colocam os contratantes de um pacto cuja negociação parece, à primeira vista, proble mática: alguns, sob certa reserva, devem ser aprendizes da coisa psica nalítica; e outros, mobilizar, em direção aos primeiros, uma referência transferível do campo de mesmo nome. de tal ensino não Precisemos, desde o início, que o destino conjetural é exclusivo de um estilo de apresentações de discurso unicamente devidas às instituições de tipo universitário. Como prova, seu princípio figura no programa de "formação" de todas as sociedades, associações ou escolas de Quer seja designado pelo próprio nome de ensino, quer encarne a figura do seminário, quer tente a propedêutica corrente da exposição, não faz diferença. Além do mais, não se pode ignorar que a instituição analítica sacrifica-se de bom grado ao uso de prolongamentos didáticos utilizados há muito tempo pela ampliação das próprias disciplinas universi tárias. Eu citaria os "congressos", as "reuniões científicas", os "colóquios", além das "jornadas de Certamente, uma diferença maior convida imediatamente a limitar a dimensão correspondência. Onde a instituição de psicanálise tem por vocaçãodessa integrar esse ensino a um projeto de "formação" do psicanalista, a instituição universitária tem por objetivo sujeitar o diplomando a un gradus que se mede por um "controle" sancionado sob o modo de exercício escrito ou oral. Se a diferença é manifesta a ponto de não deixar de ser assinalada, concordemos, ao menos, que ela não justifica, necessariamente, a expressão do prejuízo constantemente alegado em relação à transmissão analítica, no que concerne à pertinência de um ensino que seguiria as vias do discurso universitário. Talvez haja aí uma renúncia de princípio, radical e apressada, que exigiria certos esclarecimentos. A começar por uma meditação sobre este ensaio de Freud, lamentavelmente desconhecido, cujo título introduzia, desde 1919, a questão nos seguintes termos: "Deve-se ensinar a psicanálise na
Coube a Freud precisar, sem volteios, a perspectiva dessa interrogação: "A oportunidade de um ensino da psicanálise nas universidades pode ser examinada segundo dois do ponto de vista da psicanálise e do ponto de vista da universidade. A inserção da psicanálise no programa universitário seria, sem dúvida, recebida favoravelmente por todo analista. Ao mesmo tempo, é certo que o psicanalista pode, sem qualquer prejuízo a si próprio, abster-se da universidade. Pois o que ele precisa, em nível teórico, pode encontrar na literatura especializada e, indo mais longe, nas reuniões científicas das sociedades de psicanálise, assim como no contato pessoal com seus membros mais experientes. Quanto à expe-
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riência prática, além do que lhe traz sua análise pessoal, ele pode adquiri-la conduzindo tratamentos, desde que tenha uma supervisão e o conselho de psicanalistas confirmados. fato de que tal tipo de organização exista acontece efetivamente, porque a psicanálise é excluída das universidades. Conseqüentemente, é manifesto que essas adapatações continuarão a desempenhar uma função efetiva tanto tempo quanto essa exclusão Esse pont o de vista freudiano tem, até hoj e, pr ovocad o tanto entusiasmo que chegou a suscitar polêmicas. Lembremos, a propósito, um debate relativamente recente a respeito do projeto que visava inserir a psicanálise num corpo de "Pesquisas" amplamente condizente com seu legado De modo mais geral, esse problema foi regularmente debatido e alimentado sob bandeiras que, mesmo defendendo opções diferentes, colocavam entretanto esperanças num ensino da psicanálise de tipo universitário. Assim, a objeção habitualmente formulada pela oposição "ensino-transmissão" encontra-se em grande parte desvirtuada. Ela o é, de fato, no próprio âmbito de uma prática de ensino da psicanálise que até agora obedeceu sem rodeios às virtudes didáticas de um certo perfil de discurso estruturalmente dispensado em instituições analíticas do modo como é consagrado em instituições universitárias. Pontos de vista dentre os mais autorizados promoveram a sustentação de tal ensino sobre o inconsciente, sob a reserva de limites próprios à maneira de se referir a ele. É, por exemplo, a posição defendida explicita mente por Jean Laplanche, não somente quanto ao ensino da psicanálise, mas também quanto a seu destinatário: "Há uma maneira analítica de falar de análise, de tal forma que o discurso, por ele mesmo, tenha um impacto analítico que quero dar a entender é que existe uma comunicação analítica possível porque ela se funda sobre a comunicação virtual de cada um com seu próprio "Renunciar a ensinar a psicanálise aos aos nãonecessariamente analistas como vocês o são (mesmo se, por outro lado, vocês por acaso estivessem de fato "em análise", não o estão necessaria mente em função de sua presença aqui), é renunciar a inventar, ou a reinventar sem cessar um modo de ensino que seja, precisamente, permeável à inspiração da análise permeável ao Em outros termos, como precisará o uma vez que a psicanálise torna-se objeto de enunciados comunicáveis, ela poderá então encontrar, sob a direção do discurso universitário, uma possibilidade de enunciação que seja propícia a seu ensino.
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Sob auspícios bem diversos, da mesma forma Jacques filiou-se solidamente ao princípio de uma possibilidade de ensino semelhante. Ele, aliás, inaugurou e sustentou sua promoção com a assiduidade que se conhece. Sobre esse ponto, Pierre assinala: seminário deseLacan desempenhou um papel na medida em que mostrou como um modelo de muito ensino importante, da psicanálise totalmente srcinal em relação ao modelo da Lacan dizia, a quem bem quisesse ouvir, que a psicanálise não se ensina. Isso não impediu que o seu ensino tivesse sido solidamente instituído e re pres ent ado - por sua própria iniciativa - no â mbito do dispositivo mesmo que ao preço desta declaração paradoxal: o discurso analítico não ensina nada. Nada tem de universal: é por isso que não é matéria de ensino. Como fazer para ensinar o que não se ensina? Eis o caminho de Freud A incompatibilidade entre os discursos, o universitário e analítico, estaria ultrapassada em Vincennes? Certamente não. Ela é aí explorada, ao menos há quatro anos, onde eu supervisiono. Ao se confrontar com seu impossível, o ensino se renova, se Que tal tipo de ensino grasse, de facto, não implica em nada que a coisa seja evidente. Aceitemos "que há uma maneira analítica de falar de análise, de tal forma que o discurso, por ele mesmo, tenha um impacto É no mínimo a adesão implícita a tal postulado que pode justificar o esforço feito no contexto do ensino a fim de comunicar alguma coisa da clínica psicanalítica que não seja algo de aleatório. Entretanto, a oposição obtém os seus mais sólidos recursos persuasivos da verdade de um certo Se o impacto analítico alimenta sua eficácia com uma situação conjuntural, que é antes de tudo solidária ao próprio espaço do tratamento, devemos nos questionar um pouco além, sobre o que pode estar fora da situação propriamente analítica. Todos sabem da esterilidade de um conhecimento puramente didático da teoria do inconsciente, em relação às virtudes analíticas que poderíamos esperar. A prova é a admirável inexistência de qualquer "tratado" de psicanálise, ou a profunda inutilidade de conceber sua elaboração. Em outros termos, a experiência analítica recebe seu autêntico fundamento do fato de que sua eficácia terapêutica está irredutivelmente conjugada à as cendência de um certo tipo de verdade. Aliás, é esse tipo de verdade que confere um perfil singular aos conceitos passíveis de darem conta dessa experiência. Esses conceitos são na verdade desconcertantes. Freqüente mente, eles parecem vazios e especulativos fora da relação analítica da qual extraem sua consistência operatória. E, de fato, esses conceitos somente
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têm virtude operatória porque tiram seu estatuto sui da verdade analítica, que é antes de tudo uma questão de discurso. Da mesma forma, ela se encontra na mesma situação da palavra e das conseqüências aí impli cadas, como explica Lacan em seu estudo sobre mito individual do neurótico": "É devido a isso justamente que implica, a experiência analítica é decisiva mente Ela sempre no seio de si não mesma, a emer gência de uma verdade que não pode ser dita, pois o que a constitui é a palavra, e seria preciso de alguma forma dizer fala, propriamente dita, o que é, a bem dizer, o que não pode ser dito como fala eé justamente por isso que existe no seio da experiência analítica algo que é, propriamente falando, um mito. mito é o que confere uma fórmula discursiva a alguma coisa que não pode ser transmitida na definição da verdade, pois essa defi nição não pode se apoiar senão sobre si mesma, e é à medida que a fala progride que ela a constitui. A fala não pode se apreender a si mesma nem apreender o movimento de acesso à verdade como uma verdade objetiva. Ela pode exprimi-la - e isto de uma forma mítica. É nesse sentido que seintersubjetiva, pode dizer que aquilo que a teoria analítica concretiza a relação e que é o em complexo de Édipo, tem um valor de É esse valor "mítico" da verdade que circunscreve a eficácia do impacto analítico ao espaço intersubjetivo da sessão, arruinando assim todas as esperanças fundadas em um conhecimento de nosso inconsciente que se sustentaria exclusivamente na compreensão racional de sua objetivação teórica. Ora, essa ocorrência já é decisiva, no sentido em que governa os limites da e, a os da exploração introspectiva. Ela o é ainda mais, na medida em que atribui ao processo analítico uma dívida inevitável quanto aos prognósticos engajados que concernem à universalidade dessa objetivação teórica. impacto analítico é, antes de tudo, relegado à dimensão principal que marca a relação intersubjetiva: a saber, a transferência. De modo que se autentica o aforismo freudiano: "sempre que se tratar de transferência, estaremos tratando de psicanálise". Nessas condições, se um ensino da psicanálise é possível, sem dúvida alguma o é devido a tal prescrição, isto é, através do contorno particular que ela assume de transferência de trabalho. Toda instituição de ensino permanece em contradição com o conteúdo de um ensino psicanalítico, fora dessa dimensão da "transferência de traba lho". Convém ainda que esse aspecto específico da transferência possa encontrar, em tal instituição, não somente uma base propícia à ampliação dos múltiplos mecanismos que ela supõe, mas também uma acolhida favo rável aos efeitos imprevisíveis dos quais é a causa. É somente nessas condi-
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ções, embora problemáticas, que parece se conceber o suporte de uma fala passível de subverter o principal argumento que faz objeção ao ensino da psicanálise, qual seja, a de um ensino que se ministraria indulgentemente de acordo com a doutrina, em razão de sua inclinação universitária natural. Parece então imperativo garantir que a "transferência de trabalho" negocie uma dinâmica oportuna à apreensão do objeto que a sustenta. Nesse sentido, pode-se esperar que tal vigilância poderá neutralizar o risco de um ensino que pretende voltar-se à forma mais radical da alienação do sujeito, justa mente onde a instituição de ensino está comumente sujeita a criar, manter e mesmo reforçar todos os sintomas próprios a esse tipo de alienação. Em outras palavras, não poderia existir "transferência de trabalho" eficazmente compatível com ensino da psicanálise sob a égide de estratégias transferen ciais de sujeiçã. Quer se trate do predomínio totalitário do discurso teórico ou da complacência narcísica à logomaquia hermética, tudo isso somente poderia produzir uma adesão ambivalente a efeitos paradoxais de fascinação, tanto estéreis quanto sintomáticos; ou seja, a pulverização de um ensino que, no máximo, é propício a capturar o aluno na armadilha de uma inte riorização neurótica da teoria no que concerne à primeira solicitação de sua aplicação em uma prática. Considerando seu conteúdo e seus efeitos, por vezes inevitavelmente alienantes, o projeto de tal ensino deve, ao contrário, promover uma "transferência de trabalho" que conduzirá o aluno ao limiar dessa disposição, onde ele descobre que se desenvolve, em consonância com aquele que ensina, este desafio subjetivo permanente que cada um, por conta própria, estabelece consigo mesmo, e a despeito de si. impacto analítico de um ensino da psicanálise não parece poder renunciar a tal assimilação que permanece sendo, de qualquer maneira, a dimensão inerente à tomada de consciência do desejo e sua mobilização. Nesse sentido, ela é a ilustração mais fiel do objeto proposto a tal ensino. Mesmo que aquele que ensina tente, no espaço da "transferência de trabalho", manter por si mesmo o princípio vivo dessa questão subjetiva, que aliás o sujeita, como a seu ouvinte, à alienação comum do discurso, ele não pode senão manter perpetuamente um desafio conduzir o aluno a identificar no ensino não somente o que talvez tenha encontrado eco na sua própria subjetividade, mas também o que a tenha "trabalhado", com o único fim de levá-lo a examinar as intuições analíticas capazes de regular a aptidão de sua confrontação com a clínica. NOTAS S. Freud, Az a Psychoanalysist publicação srcinal em húngaro. Texto alemão inexistente. A transcrição, provavelmente feita por S. Ferenczi, foi publicada no periódico médico de 30 de março de 1919, LLX, Retoma do in S.E. pp. 170-173.
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p. Tradução em francês de J. Dor, "Deve-se ensinar a psicanálise na universida in Résultats, idées, problèmes, I. 1890-1920, Paris, col. "Bibliothèque de 1984, p.
3. Convite do ministro da Pesquisa e da Tecnologia com vistas à criação de um Centro de pesquisas em psicanálise dependente do C.N.R.S. ("Centre National de Recherches Scientifiques" - Centro Nacional de Pesquisas Científicas). Uma missão de estudo distribuiu para esse fim, junto a diferentes grupos psicanalíticos, um questionário de base sobre o estado de sua disciplina e sobre o papel da formação e da pesquisa que se desenvolve. Até agora, a maioria dos grupos psicanalíticos tornaram oficiais suas posições, aliás diversas, quanto a esse projeto. De forma previsível, a própria natureza do projeto deveria contribuir amplamente para reativar os problemas endêmicos relativos à oficialização do estatuto da formação e da prática do psicanalista. Sob esse aspecto, a relação da psicanálise com a universidade foi, mais do que nunca, questionada no caso de tomadas de posições ou de debates problemáticos que dão o tom à natureza dos interesses aí envolvidos. Deve-se constatar forçosamente que, se certos clínicos universitários (médicos ou não) optaram firmemente pela manutenção de uma relativa autonomia da psicanálise em relação à univer sidade, outros, nessa ocasião, tornaram-se célebres, além de qualquer circunspecção, fazen do prevalecer uma autoridade universitária de tutela passível de creditar e de certificar, junto às instâncias do Estado, a aptidão de certos analistas ao exercício de sua prática. A respeito desses diferentes problemas, consultar, com proveito, os dossiês de documentos e de informação apresentados por Psychanalystes, Boletim do colégio de psicanalistas, 4 novembro 1981; 2, março 1982; 3-4, junho 1982. Ver 5, maio-junho in "Demain 17, La Psychanalyse danslesla
1982, pp. Ver enfim ainatualização feita por I. psychanalystes: lacaniens? Esquisses psychanalytiques, médecine, primavera de 1992, pp. 111-122. 4. J. Laplanche, "Psychanalyse à l'université", dezembro de 1975, p.
in Psychanalyse à l'université,
5. J. Laplanche, "La référence à l'inconscient",
III,
I,
11, 1978, p. 385.
Laplanche, "La situation psychanalytique: le descriptif et le 24, setembro de 1981, p. 7. P. 38.
"Retour à Lacan, in Passages,
8. Ver J. Lacan, Freudien",
1,
VI,
57, Faut-il haïr
setembro de 1993,
de la psychanalyse, Livro XVII (1969-1970), Paris, Seuil, col. "Champ seminário de 14 de de 1970, p. 46.
J. Lacan, "Lacan pour Vincennes !" (22 de outubro de 1978), vera de 1979, p. 278. 10; J. Laplanche, "Psychanalyse à l'université", op. cit., p. 5.
in
17-18, prima
in Psychanalyse à l'université,
J. Lacan, "Le mythe individuel du névrosé" (Collège philosophique, 1953), 17-18, op cit., p. 292.
I, in
1,
1 Ensino da psicanálise e sujeição
P
or ser uma produção de fala, todo ensino se inscreve nessa propriedade de sujeitar (no sentido imediato de colocar na depe ndê nci a de um sujeito) o que é ensin ado àquele que ensina. Essa sujeição é inerente ao fato corrente da estrutura do discurso do sujeito falante. Essa disposição adquire, no entanto, uma ressonância particular quanto ao ensino da psicanálise, em razão mesma do que é ensinado. De fato,pelo em outros universos de ensino, essa sujeição é normalmente neutralizada efeito imaginário constantemente alimentado em relação à suposta independência do sujeito e do objeto, que é somente a conse qüência do que Lacan designa pelo nome de refenda do Além disso, essa "forclusão do sujeito" (Lacan) está no próprio princípio do conhecimento dos objetos e de sua transmissão didática. Por outro lado, a psicanálise não pode deixar de levar em conta, em seu ensino, essa ocorrência subjetiva com o risco de entrar em contradição flagrante com o que se esforça por transmitir. Sem dúvida, não é fácil libertar-se dessa dificuldade, mas não é possível ignorá-la, fazendo de conta que não existe, o que seria dar provas de um desconhecimento evidente de alguns dos tópicos mais fundamentais da
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psicanálise. A título de exemplo desses pontos fundamentais, evocarei especialmente as articulações entre verdade, saber e inconsciente e as interconexões entre fala, transferência e resistência. ensino psicanalítico implica, efetivamente, dois tipos de conseqüên cias. Por ser em princípio um empreendimento de fala, mobiliza neces sariamente a dimensão da transferência e a resistência, que é seu correlato. Por ser também comunicação de um saber, levanta, então, a questão da verdade em posição do inconsciente, onde ela tem srcem. Desse ponto de vista, Lacan nos fornece alguns esclarecimentos impor tantes. De um lado, lembra-nos o quanto a transferência é fundamentalmente coextensiva ao desenvolvimento da fala, mesmo sendo a fala daquele que ensina: "Na sua essência, a transferência eficaz de que se trata é simplesmente o ato da palavra. Cada vez que um homem fala a outro de maneira autêntica e plena, há, no sentido próprio, transferência, transferência simbólica - passa-se alguma coisa que muda a natureza dos dois seres
Por outro ele é a fala como tal: lado,que antes de tudo falar aos e constitutivo de toda fala:
ainterroga dimensãoLacan. essencial do que constitui "Falar, responde ele, aé outro comporta, assim, o caráter inaugural
"Uma palavra não é palavra a não ser na medida exata em que alguém acredita nela. É nessa dimensão que uma palavra se situa antes de tudo. A palavra é essencialmente o meio de ser reconhecido. Ela está aí antes de qualquer coisa que haja atrás. E, por isso, é ambivalente e absolutamente insondável. que ela diz, será que é verdade? Será que não é verdade? É uma miragem. É essa primeira miragem que lhes assegura que estão no domínio da De um outro ponto de vista, o ensino da psicanálise, indo de encontro à dimensão da transferência, remete-nos igualmente à dimensão da resistência, pela via do saber teórico. No seu estudo sobre Freud, Octave Marinoni observa finamente as implicações que podem existir entre a teoria, a resistência e a transferência. "Num último esforço de resistência - escreve, a propósito de Freud - ele se lança num imenso trabalho Depois continua nos seguintes termos: valor teórico indiscutível de certas elaborações do não impede que ele tenha desempenhado um papel de resistência no seio mesmo da sua relação com Fliess. Inclusive, tem-se a prova pelo fato de que essa resistência se revela abertamente, uma vez abandonado o
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Projeto que a encobria: Freud se encontra num estado que lhe parece "extraordinário". trabalho teórico não está mais à sua disposição Freud deixa vislumbrar a situação transferencial na qual ele está, mas sem poder Tudo se passa como se o desenvolvimento do saber teórico tivesse srcem na resistência, talvez mesmo que se propusesse explicá-la. Mas, por outro lado, isso significa reconhecer a teoria se aesforça em ultrapassar a transferência tentando levá-la em conta, ao mesmo tempo que a srcem do seu desenvolvimento já está incluída na transferência. Pelo fio da resistência, da transferência, do saber teórico e da verdade situados sob a insígnia do inconsciente, podemos então avançar o exame do problema colocado pelo ensino da psicanálise na perspectiva na qual propus introduzi-lo, a saber, a de uma sujeição. Precisemos desde já, a propósito dessa sujeição, que, se ela tem srcem em primeiro lugar naquele que ensina, não deixa de se expandir num envolvimento que abrange também o aluno. Ou melhor, talvez mais que qualquer outro, o ensino da psicanálise não pode deixar de se sentir implicado por esse estatuto particular que a verdade com o inconsciente sujeito falante; dealienação. tal forma Nesse que o saber queentretém será ensinado trará a marcanoindefectível dessa sentido, já se pode colocar em evidência uma sujeição da coisa ensinada àquele que ensina. Essa primeir a prec isão permitiria, a parti r de agora, fundar uma distinção fundamental quanto à acepção do termo "ensino" quando aplicado à psica nálise. As comodidades da linguagem levam-nos, freqüentemente, a discri minar, no ensino da psicanálise, um ensino dito teórico de um ensino dito clínico. Entretanto, se relacionarmos essa distinção consagrada pelo uso ao que precede, ela não se mostra muito coerente. Em princípio, desfaçamos o mal-entendido clássico que existe em torno dessa distinção, ainda muitas vezes alimentada, entre os (analistas) teóricos e os (analistas) clínicos. Essa inépcia não necessita longos comentários. Ela simplesmente existência uma hipótese alarmante mantida em relação à testemunha psicanálise, aque consistedeem desconhecer que o acesso à teoria, tanto seu uso como sua elaboração, estão indissoluvelmente ligados à clínica, via transferência, e vice-versa. Aceitar, por exemplo, a prioridade da clínica em detrimento da teoria, como fazem certos "praticantes", é, no fim das contas, aderir à crença implícita em uma prática que seria puramente empática e iniciática. Inversamente, engajar-se na psicanálise sob o modo da prioridade teórica, é promover, pela via da resistência, a adesão a um tipo de prática governada pelo exercício de prescrições doutrinais que submetem a dimensão psicoterapêutica à retomada sutil de uma direção de consciência que se ignora enquanto tal.
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A incoerência que evoco a propósito da distinção ensino teórico ensino clínico, relaciona-se com outro aspecto. Trata-se, essencialmente, da confusão tácita, freqüentemente mantida no campo da psicanálise, entre o que é notadamente ensino e o que somente pode ser apreendido enquanto transmissão. De fato, o ensino da psicanálise se organiza, enquanto tal, como o desenvolvimento de um processo de saber que só pode ser comu nicação de um saber teórico no lugar em que o sujeito o articula. Desse lugar, o ensino está estruturalmente sujeito a se expor como o questiona mento de um dizer, testemunho proposto do que o acesso à teoria daquele que ensina representa. Assim, a interferência de um certo tipo de transfe rência ligada à análise é irredutível, pois é pela própria análise, pela trans ferência, que se inaugura para cada um o acesso à teoria. Desse lugar específico de discurso, a "clínica" só pode ser introduzida em termos de ilustração. Porque ela toma, assim, a forma de uma mediação referencial, a intrusão da clínica no ensino só se efetua, então, a título de uma exibição (no sentido etimológico). Seu objetivo é apresentar uma justificativa ostentatória em apoio de um saber que é comunicado ao outro, ou que se supõe que esse outro já conheça. De fato, "a questão é menos, hoje em dia, a da (Karl Popper) da psicanálise, do que a da transmissibi lidade de seude discurso. Desde queemosdireção psicanalistas tomaramcultural gosto por comunicação seu pensamento a um público mais ou menos indiferenciado (não exclusivamente "psicanalítico"), os testemunhos clínicos que trazem têm a tendência de se tornar exemplarmente ilustra tivos e assim perder seu valor de pertinência propriamente Por outro lado, se ele é um lugar de inculcação clínica, só poderia definir sua autonomia como lugar de cessão (no sentido de cessio) conquistada no âmbito de uma sessão (no sentido de sessio). Não se trata de uma convenção de estilo, mas da necessidade de circunscrever o espaço de um discurso que não é mais o do ensino, mas o da transmissão. Dito de outra forma, convé m mobilizar um autêntico espa ço de discurso de emis são inauguração adquirido em benefício da análise da transferência, e cuja deliberação se inscreve não mais no registro do discurso universitário daquele que ensina (e do discurso do mestre), mas no donadiscurso analítico.e seu Discurso quemesmo só encontra seu verdadeiro fundamento análise pessoal mais legítimo prolongamento na experiência da supervisão, em razão da transfe rência que ele supõe. Essa distinção necessita, evidentemente, que não se confunda o sentido do "discurso analítico" rigorosamente definido por La com o discurso comum sobre a psicanálise ou ainda com o falatório especulativo dos psicanalistas. Lembremos que a transferência se estabelece intrinsecamente, mas tam bém pelo saber da teoria. Por essa razão, um outro modo de sujeição, diferente do que evocamos, opera igualmente no ensino da psicanálise. A sujeição do saber ensinado à estrutura do sujeito falante que o ensina é, quanto a ela, mobilizada por essa posição interna que a trans-
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ferência ocupa em relação à teoria. Mas, inversamente, o interlocutor ensi nado por esse saber da teoria encontra-se, da mesma forma, implicitamente investido na dimensão externa da transferência que essa teoria supõe, pois, de uma certa forma, o saber teórico é feito para dar conta da transferência. É esse segundo modo de sujeição, delineado por Lacan sob o título de transferência de trabalho, que evoquei da psicanálise não pode, então, da dupla sujeição ensino que apresenta essa propriedade extraordinária de se atualizar segundo uma estrutura de horda. Nesse caso particular, a faixa de Mõbius metaforiza (e não formaliza), de forma eficaz, a interferência dessa dupla vetorização subjetiva, sugerindo sua singularidade de ser ao mesmo tempo interna e externa. Essa propriedade estrutural impõe, por outro lado, algumas conse qüências imediatamente pragmáticas na atualização de tal ensino. Essen cialmente, em razão desse modo de sujeição, o ensino da psicanálise não pode fazer economia de um estilo. Aquele que ensina não pode, com efeito, se subtrair, e ao mesmo tempo subtrair a coisa ensinada e o próprio aluno, aos vestígios transferenciais que perduram - contra sua vontade ou não tais como os certificados do seu próprio acesso à teoria, ou seja, à análise. Mas esse estilo deve critérios ser confundido com oDito que de se poderia designar, por outro lado, não como metodológicos. outra forma, não é com a organização do saber ensinado que o estilo se identifica. Essa orga nização também pode apoiar-se em critérios tão diferentes quanto os que são mobilizados para dispensar um ensino de caráter didático ou, inversa mente, de tipo deliberadamente informal. Essa escolha metodológica de pende, antes de tudo, da adesão "pedagógica" (portanto, aqui, essencial mente imaginária) à qual aquele que ensina irá se filiar prioritariamente em relação ao aspecto formal ou evocador do saber teórico. Como esse saber participa irredutivelmente desses dois aspectos, tal escolha jamais se inscreve para além de uma certa preferência ligada mais a um tipo de apresentação tética do que a estilo, por outro lado, por ser sobretudo ressurgimento do acesso daqueleestigmatiza que ensina inevitavelmente, à teoria, pela dimensão da transferência àpessoal sua análise, a posteriori, a mençãoinerente de sua resistência, própria à verdade do saber inconsciente. Por exemplo, é no surgimento de tal resistência que vem se alimentar, no ensino da psicanálise, a mediação cega - mas - das exegeses do gênero escolástico. corpus da psicanálise somente fala de si mesmo se nos arriscarmos a nos deixar surpreender para ouvir aí falar de si, É o que já lembrava Lacan em 1957: "Todo retorno a Freud que fornece matéria para um ensino digno desse nome somente irá se produzir pela via onde a verdade mais escondida se manifesta nas revoluções da cultura. Essa via é a única
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formação que poderíamos pretender transmitir àqueles que nos seguem. Ela se chama A partir daí, podemos tentar refletir sobre a conjunção do ensino e da formação no campo psicanalítico. Quanto à intenção mais ampla, ensino e formação possuem um território fronteiriço. Masdiscriminação, isso não significa que sejam solidárias. Essa hoje banal, esteve,instâncias entretanto,necessariamente na srcem de um bom número de peripécias ocorridas na história do movimento psica nalítico. Proponho no máximo fazer alusão a elas, expondo alguns argu mentos que me parecem recentrar esse consenso delicado entre ensino e formação, num dos pontos em que ele se organiza. Esse ponto é um campo de interrogação que se relaciona com a concepção do próprio tratamento analítico do qual somente algumas observações. termo "analisando", introduzido por Lacan, parece ter obtido uma popularidade que torna seu uso manifesto na maioria dos universos e horizontes psicanalíticos atuais. Essa propensão natural a se fazer, de agora em diante, de bom grado referência ao "analisante", quando antigamente era suficiente denominá-lo "paciente", fornece entretanto a prova de uma certa Se degeneração atual do conceito. todos os analisandos são pacientes, nem todos os pacientes são necessariamente analisandos. uso indiscriminado do termo tende, com freqüência, a ocultar seu caráter princeps do qual se sabe que procede de uma verdadeira "revolução coperniciana", e também no que concerne à prática do tratamento e ao seu objetivo. E mesmo se um bom número de analistas diria lidar normalmente com analisandos em tratamento, alguns dentre eles enganam-se, na medida em que orientam sua prática a fim de instituir "analisados"; o que se explica por um certo tipo de exercício do tratamento onde o psicanalista, operando ele mesmo na posição de "psicanalisando" sujeita seu paciente à condição de "psicanalisado". A forma gramatical do termo clássico "analisado" (participio passado substantivado) funda-se somente a partir de uma concepção particular do sentidoque da situação analítica. Se o paciente a construção supõe o psicanalista se reconheça comoé um o "analisado", agente suscetível de "fazer" a psicanálise do paciente. sentido da construção gramatical passiva nesse caso particular, inapropriadamente denominada "voz" passiva - estipula bem, nesse ponto, a dimensão específica que governa a ordem da situação analítica: gato come o rato; o rato é comido pelo gato!" Esse preceito da pedagogia gramatical escolar justifica-se, mais que nunca, na medida em que o paciente "analisado" pelo psicanalista pressupõe que tal psicanalista o verdadeiramente. Em outros termos, o ato analítico é instituído por um psicanalista que sabe psicanalisar. Ora, a ordem dessa situação, que atribui ao psicanalista a tarefa de psicanalisar seu paciente, o destitui, ao mesmo tempo, do papel e
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da função aptos a promover um espaço analítico onde esse paciente seria levado a efetuar um percurso que lhe seja próprio. Tal dispositivo contribui para desnaturalizar a pedra de toque do processo analítico, a saber, a signi ficação da transferência e a função que lhe cabe no tratamento, para que o paciente leve em conta seus efeitos a fim de utilizá-los na investigação de seu inconsciente. Teríamos como prova disso a tendência inevitável da prática analítica, uma arte na qual o paciente se entrega à habilidade, previamente adquirida, do savoir-faire psicanalista. Ainda, o paciente vê-se ipso facto, convocado pelo homem da arte a aceitar uma posição de "instituído", em nome das regras de um contrato que conjuga, de agora em diante, a prática analítica à prática das artes liberais, e mesmo, em virtude do caráter relativamente hermético do empreendimento, à da grande arte. E não se vê muito bem como a psicanálise poderia preservar sua prática do exercício de uma arte, na medida em que o savoir-faire daquele que tem por missão psicanalisar quase não pode pretextar a "segura via de uma ciência" (Kant). Ora, a ausência atual de uma criteriologia científica operatória, que garantiria a legitimidade do corpus teórico da psicanálise, é suficientemente manifesta para que não insistamos nesse Nessas condições, como neutralizar essa dependência do analisado em relação ao do homem da arte? A solução deve, bem entendido, ser procurada na própria dimensão do que instaura a situação analítica. A fim de fazê-lo, convém que o ato analítico seja retirado dos limites intrínsecos que o exercício de todo constituído alimenta. Dito de outra forma, é preciso que o ato analítico seja sustentado por uma condição que determine um limite ao que institui a situação analítica. De fato, enquanto o psicanalista for, de antemão, investido na função de saber psicanalisar, tal limite permanece indefinido. paciente, mantido em situação de ser "analisado" pelo homem da arte, questiona necessariamente, em sua análise, os limites desse Está é outra maneira de indicar que os limites de sua investigação analítica permanecem diretamente tributários daqueles que circunscrevem o do psicanalista. Lacan propôs restabelecer a verdadeira ordem da situação analítica, promoven do a dimensão do "psicanalisando" em lu gar da do A condição necessária e suficiente para que o ato analítico não se meça mais pela escala do do homem da arte consiste em aceitar o paciente como aquele que vai colocar em uma certa posição um sujeito que o escuta e, desse modo, instaurar a situação analítica, instituindo-o como psicanalista. Disso resulta que quem psicanalisa é o paciente: ele faz sua análise. É nessa única medida que a situação analítica se encontra em torno do ponto essencial que a constitui, isto é, a dimensão da transfe rência. É a transferência o agente do processo analítico e não o psicanalista. Este somente é designado como tal porque um "analisando", que lhe dirige
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um discurso, sob o efeito de mecanismos inconscientes postos em ato na transferência e pelas demandas que lhe dirige, designa-o a assumir diversos papéis É analisando o jogo transferencial, identificando o que nele se opera da história do sujeito, assim como favorecendo seu pro cesso mas sem se deixar levar por ele, que o analista ocupa sua posição legítima, ou seja, o único lugar no qual ele pode assegurar a condução do tratamento de um modo operatório. Não há outra condição que permita, por outro psicanalisando descobrir a fogueira de ilusões que ele alimenta na transferência, assim como o que o introduz às estratégias de seu próprio inconsciente, isto é, o que o abre à dimensão de "fazer" sua análise. A substituição de "analisado" por "analisando", termina, então, por reconhecer ao paciente o papel principal que ocupa na sua análise, onde ele é, essencialmente, o artesão, enquanto o psicanalista é somente o instrumento. Essa discriminação analisado analisando permite esclarecer vários aspectos da relação comumente mantida entre ensino e formação. Se Lacan habitualmente considerava o projeto de "tornar-se analista" como um sintoma a pôr à prova do tratamento da mesma forma que os outros, era, antes de tudo, para insistir sobre o caráter imprescritível do que é a formação. Pode-se somente atestar a realização de um processo de formação analítica no a posteriori análise e de seus efeitos. Nessa pers pectiva, Lacan formulou sua famosa proposição lapidar: "o psicanalista só se autoriza de si Proposição desde logo elevada ao estatuto de aforisma, mas também freqüentemente expurgada pelos comentadores da conotação rigorosa que Lacan lhe tinha dado. A coerência interna da proposição de Lacan indica que o psicanalista não poderia, de forma alguma, pretextar um campo de saberes que poderiam lhe ser ensinados. Desse ponto de vista, nem a psiquiatria, ou a lingüística, ou a filosofia, são efetivamente aceitáveis a título da formação propriamente dita do psicanalista. Por outro lado, se é da psicanálise o psicanalista deve somente se autorizar, como essa formação é então possível se o psicanalista não se autoriza dele mesmo? Parece-me que uma certa conivência entre ensino e formação pôde ser criada em relação ao caso em que o psicanalista se autorizasse na psicanálise, sem se autorizar em si mesmo. Desde 1953, Lacan já tinha se insurgido, do modo como se contra esse tipo de abordagem, e sua reflexão, constantemente sustentada desde então, sobre o problema da formação, iria levar a elementos de ruptura, no mínimo fundamentais, com a concepção "standard" da análise Après-coupestá consa grad o em duas formas de tradução em português (N. do R.T.)
, c om o
só depois e a
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didática. analista só se autoriza de si mesmo lembra-nos, em particular, essa "revolução copernicana" onde a análise somente poderia advir como didática no a posteriori e, certamente, não sob a perspectiva de um "cursus". Além disso, parece que os defensores de tal análise didática não podem mais evitar de interrogar, atualmente, algumas das posições inauguradas por Lacan. Em um simpósio sobre A formação do psicanalista, da Associação Internacional observa-se comode análise didáticade e analista didático tendemque a expressões se eclipsarconsagradas em benefício expressões tais como análise de formação e analista de No mesmo contexto, Serge Viderman questiona, aliás de forma perfeitamente radical, essa significante, como testemunha este trecho: "Colar à "psicanálise" um qualificativo, é dar-lhe uma determinação que limita e oculta sua especialidade. Admite-se que a qualificação da análise como "didática" não é feliz. Mas uma nova denominação (que a transformaria numa "psi canálise de formação") não alteraria em nada o problema. Ela deixaria intacta a dificuldade que consiste em conotar a psicanálise de um projeto diferente daquele que o que lhe assegura sua singularidade. de As formação maneiras de dizer,Análise mas de didática ser e de ou fazer. palavrasnão nãosão sãosomente designações neutras, mas, ao mesmo tempo que conotam uma realidade, contribuem para reificá-la. Acrescentem ao psicanalista um qualificativo (clínico, teórico, médico, didático) e se verá que quanto mais a área de extensão lógica do conceito se estende pela junção de qualificativos heterogêneos, mais a área de compreensão de sua função específica diminui. adjetivo não acrescenta um elemento a mais à sua qualificação. Um psicanalista "didático" não é mais exatamente um psicanalista. analisando "didatizado" também não é mais, exatamente, um analisando. A duplicação do objetivo leva à ambiguidade do processo e de sua conclusão. Só existe uma análise. Amalgamando o projeto psicanalítico e o projeto o risco deCorre-se que a confusão dos dois projetos se façadeàsformação, custas do corre-se primeiro. o risco de que, na conivência tácita ou explícita, as resistências transferenciais e contra-transferenciais se conjuguem num projeto de ensino em que as seduções narcísicas se dêem as mãos e limitem a importância da Esses elementos de reflexão de S. Viderman levantam, ao mesmo tempo que o problema da conivência entre ensino e formação que pode infestar o campo psicanalítico. Se sua função não é rigorosamente especificada em extensão e inten sidade, o ensino da psicanálise intervém, efetivamente, como o intercessor
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mais favorável à ocultação da experiência analítica, a qual constitui a pedra angular da formação. Faltando esses pontos de referência, o ensino da psicanálise pode favorecer o enquistamento de certos dispositivos de captura nos quais a função do saber sobre o o risco de neutralizar o acesso a seu saber inconsciente e, conseqüentemente, o acesso ao dos outros. Um ensino que não se surpreendesse na dimensão da dupla sujeição que evoquei, expõe-se a operar tal como uma intervenção catabolizante, porque conformista, acerca do sentido da dialética analítica. Efetivamente, a partir do momento em que a formação permanece ligada à idéia da "progressão de um talvez mais, à admoestação de um "conselheiro pedagógico destinado a ajudar cada candidato em sua o ensino da psicanálise só pode ser ministrado a partir de um lugar de ensino necessariamente "professoral". saber, que se dispensa a título de ingrediente inscrito no "cursus" da formação analítica, está longe de favorecer a transmissão que se efetua na análise. Ele, na realidade, su bordina-a a uma operação imaginária através da qual se concretiza a transubs tanciação do saber teórico-clínico do Magistério professoral em testemunho arrazoado do do analista, petrificando nesse mesmo movimento, ipso jure, o paciente em situação de analisado. Por outro lado, rejeitar analisado em benefício de analisando, e psica nalista sabendo psicanalisar em proveito de sujeito suposto saber, tal como Lacan lhe estabelece o estatuto em relação à formação do é dar espaço a um lugar de ensino da psicanálise extra cursus. Ou seja, um lugar onde o dizer daquele que ensina nunca é proposto de outra forma que como comunicação ao outro de algo de seu próprio acesso ao saber teórico a transferência, e dessa forma, que se autoriza, então, de um dizer que permanece, de uma certa maneira, um dizer de analisante. NOTAS 1. Ver J. Dor, cap . XVI : "La refente du sujet: l'aliénation dans le lang
age" , in Introduction à
la lecture analytique", de Lacan. 1985, Tome pp. 1. 136-145. L'inconscient structuré comme un langage, Paris, Denoël, col. "L'espace Publicado em língua portuguesa sob o título "A refenda do sujeito: a alienação na linguagem", in à leitura de Lacan. inconsciente estruturado como Porto Alegre, Ed. Artes Médicas, Série Discurso Psicanalítico, 1989, 2. J. Lacan, Les écrits techniques de Freud, Livre I (1953-1954), Paris, Seuil, col. "Le champ freudien", 1975, seminário de 17 de março de 1954, p. 127. Publicado em língua portguesa sob o título Seminário, Livro I, "Os escritos técnicos de Freud", Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., seminário de 17 de março de 1954, p. 130. 3. Lacan, Les psychoses, Livre III, (1955-1957), Paris, Seuil, col. "Le champ freudien", 1981, seminário de 30 de novembro de 1955, p. 47. Publicado em língua portguesa sob o título Seminário, Livro III, "As psicoses", Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed.
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4. J. Lacan, Les écrits techniques de Freud, op. cit., seminário de 16 de junho de 1954, p. 264. Publicado em língua sob o título "As psicoses", op. cit., p. 272. Mannoni, "Introite, hic dei sunt", in Freud, Paris, Seuil, col. "Écrivains de toujours", 1968, p. 57 (grifado pelo autor). 6. Trata-se do texto de S. Freud, "Esquisse d'une psychol ogie scientif ique" ( 19 85 ), in La naissance de la psychanalyse, trad. A. Berman, Paris, col. "Bibliothèque de psychanalyse", 1956, pp. 307-396. 7.
Mannoni,
hic dei sunt", in Freud, op. cit., p. 58 (grifado pelo autor).
8. P. cap. XII: "D'une psychopathologie générale à une psychopathologie fonda mentale. Note sur la notion de paradigme", in Crise et contre-transfert, Paris, P.U.F., 1992, p. 294. 9. Para os quatro discursos: do mestre, do Lacan, de la psychanalyse, op. cit Publicado em língua portguesa sob o título psicanálise", Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1992. 10. Ver supra, "Introdução", pp.
do histérico, do analista, ver J. seminário, Livro XVII,
avesso da
19 -21.
11. Nesse sentido, desenvolvi num artigo alguns argumentos suplementares que concernem ao ensino de Lacan. Ver "Le séminaire de Lacan; enseignement charismatique ou enseignement analytique?" in School of Melbourne Australian Psychoanalytic 1992, Hommage to Lacan, pp. 135-144. 12. J. Lacan, "La psychanalyse et son enseignement" (palestra proferida na "Société française de philosophie" na seção de 23 de fevereiro de 1957), in Écrits, Paris, Seuil, col. "Le champ freudien", 1966, p. 458. 13. Retomarei aqui algumas das articulações desenvolvidas anteriormente em uma confe rência publicada sob o título "Epistemologia delia pratica analítica comme arte" (1982), in 4, Milão, edizioni, 1983, pp. 82-88. 14. Desenvolvi, nesse sentido, toda uma argumentação epistemológica na minha obra, L'ascientificité de la psychanalyse. Tome 2. La paradoxalité instauratrice, Paris, Éditions universitaires, col. "Émergences", 1988. 15. J. Lacan, "Proposition du 9 octob re 1967 sur le psychan alyste de l'Éco le", in Scilicet, Paris, Seuil, 1968, p. 14. 16. Ver La scission de 1953 - La communauté psychanalytique en France I, editados por J.-A. Miller, suplemento ao 1976.
7 de
Bibliothèque
1,
documentos Paris,
17. Ver a obra sob direção de S. Lebovici e A.-J. Solnit, La formation du psychanalyste, Symposium de Brodway (Grã-Bretanha, fevereiro de 1980), Paris, P.U.F., 1982. 18. Ver S. Leb ovici , "Sur
formation des
19. S. Viderman, "Préambule à un projet de cursus", 20. S. Lebovici, "Sur "La formation des psychanalystes",
p. 18. ibid, pp. 288-289. ibid, p. 36.
Ibid. 22. to de
Lacan, "Proposition du 9 octobre 1967. Première version", 8, 1978, pp. 10-12.
suplemen
2 Apresentação clínica e psicopatologia
S
e o princípio da apresentação clínica é tão antigo — ou quase - como a própri a clínica, també m foi, desde sempr e, insti tuído e praticado com fins de ensino. Quais são os limites - e mesmo as imposições de tal apresentação no campo psicopatológico? Uma exploração exaustiva ou radical desta questão, além de ser audaciosa, não parece indispensável para situar ao menos certos aspectos essenciais. Esses pontos essenciais podem ser circunscritos segundo as três linhas diretrizes seguintes: • a referência ao inconsciente, • a semiologia e seu correlato, a • o À primeira vista, essas três linhas de força parecem relativamente heterogêneas. Além disso, cada uma delas alimenta em si uma complexidade suficientemente desmesurada para que pareça senão vão, ao menos muito ambicioso, procurar articulá-las no corpo de uma mesma elucidação. Tudo
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se passa, entretanto, como se o centro da apresentação clínica apesar de tudo, sustentado por esses três pilares apoiados entre si. Tal solidariedade já pode ser percebida nesta curta observação de Lacan: "A psicanálise é
prática delirante, mas é o o que se tem de melhor,
atualmente, suportar esta situação todo caso, é para o que Freud encontrou de
de ser homem. Em
Não obstante o gosto refinado de Lacan por expressões provocantes e sua arte consumada da subversão, tal express ão: "A psicanálise é prática delirante" não veicula necessariamente a suspeita de inquietude que se poderia em lhe creditar. Ela não significa de forma alguma que a psicanálise é uma prática que faz delirar. No máximo, lembra-nos que o protocolo de acesso ao inconsciente, tal como Freud progressivamente empregou-se a especificar, comporta algo de suficientemente singular para que todos os mais constituídos da razão sejam subvertidos. Nesse sentido - mas somente nesse sentido - esse dispositivo "prático" de acesso ao inconsciente poderia, com efeito, evocar algo da famosa "má quina de influenciar"dedeinvestigação um certo do inconsciente Lacan, por pressentia nesse procedimento todosseuoslado, estigmas de uma exploração paranóica. Mas, tanto num caso quanto no outro, se o dispositivo analítico é evocativo de tais empreendimentos delirantes, nem por isso ele os induz nem produz. Como prova, Lacan não deixava de acrescentar que se tratava somente de uma paranóia dirigida. Ser ela dirigida é, de alguma forma, dizer sob que insígnia está meta foricamente situada a referência ao inconsciente. No quadro da apresentação clínica, é preciso, apesar de tudo, poder circunscrever a posição lógica dessa referência em relação às outras duas que circundam esse campo: a semiologia e a de um lado; o gozo, de outro. Trata-se então de apreciar, em sua justa medida, a adequação dessa referência ao inconsciente relativamente aos processos psicopatológicos, tal como o aprendiz clínico encontra-se a maior- parte do tempo confrontado;— quer dizer, no quadro de diversas situações não menos determinadas que jamais são, para ele, senão a ocasião de encontros relativamente pontuais; quer se trate de estágios, de atendimentos de urgência ou de encontros audiovisuais, de consultas, ou seja, várias situações que podem como damente ser classificadas como apresentação clínica. Vejamos o que se pode abrigar sob o termo referência ao inconsciente. Além do dispositivo de investigação precedentemente evocado e codificado de modo estrito pelo uso freudiano, essa referência ao inconsciente ultrapassa evidentemente o próprio dispositivo. Com efeito, além do dispositivo prático - e mesmo, quase experimental tal referência encontra igualmente sua consistência em todo o arsenal metapsicológico que não somente baliza,
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mas se esforça para dar conta dessa num discurso que a justifica e, por outro lado, objetiva um perfil específico de intervenção com objetivo terapêutico. Qual pode ser então a incidência do referente psicanalítico nesses diversos modos da apresentação clínica? Esse referente pode somente encontrar sua posição legítima sob duas condições. Em primeiro lugar, mantendo uma relação de "bom entendimento" com o quadro da semiologia psicopatológica e da nosografía proveniente desta. Em segundo lugar, não apresentando a tendência de se transformar em puro e simples instrumento de dominação imperialista colocado favoravelmente a serviço do gozo. bom entendimento institui que o referente psicanalítico deve manter com a semiologia psicopatológica uma relação que se defina essencialmente como uma relação de sinergia, preferivelmente que de concorrência. Essa semiologia agrega-se, historicamente, à investigação progres siva das doenç as mentais e à evolução de seu tratamento. Dispomos, assim, de um ao mesmo tempo descritivo e classificatório, cuja conotação clínica não é de forma alguma equívoca - o que não quer dizer que não seja por vezes ambígua. A verdade é que, como essa codificação é tão insubstituível quanto inevitável para o clínico. Nada pode, com efeito, justificar que ele desconheça tal nomenclatura, que ordena todo o campo psicopatológico. Quer dizer, dessa forma, que tal conhecimento permanece estritamente sujeito ao campo da medicina psiquiátrica e à prática legítima que lhe é característica? Certamente não! Uma coisa é a nomenclatura, outra, a escolha e o desenvolvimento de uma estratégia terapêutica que pode resultar quando a levamos em consideração. Mas, inversamente, quaisquer que sejam as potencialidades das estratégias terapêuticas, essa diversidade não invalida o princípio da nomenclatura. No máximo, ela permite aperfeiçoá-la, completála, ou seja, ajustá-la de acordo com a experiência clínica e seu devir. Devemos levar em conta a existência de um intervalo inevitável entre o princípio de uma nomenclatura psicopatológica e a compreensão da di nâmica dos processos mentais que elaboramos a partir de pontos de refe rência dessa nomenclatura. Esse intervalo irredutível impõe-nos um certo tipo de discernimento clínico que nunca é dado anteriormente, com a no menclatura, assim como o conhecimento terminológico de um dicionário não nos permite qualquer prático da língua. A compreensão da dinâmica dos processos mentais provoca, em si, uma querela de argumentos complexos, cujos prós e contras é bem delicado seriar. Não se pode deixar de apontar algumas das dificuldades características que surgem em relação a essa compreensão. É suficiente focalizar certas atitudes reativas freqüentemente mobilizadas pelos clínicos em formação durante os primeiros tempos de sua confrontação clínica, para se ter uma indicação precisa da natureza das resistências sintomáticas convocadas por essa compreensão dos processos psicopatológicos. As atitudes mais
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estereotipadas manifestam-se freqüentemente tanto pela rejeição caracterizada do discurso psiquiátrico e das iniciativas terapêuticas que daí procedem especificamente, quanto por uma adesão incondicional e cega ao imperialismo interpretativo; e ainda, pelo recalque maciço do tecido institucional e de suas incidências simbólicas e imaginárias. inventário desses estereótipos sintomáticos poderia, sem dúvida, ir além dessesa natureza três casos, os já citados amplamente suficientes para evidenciar dasmas dificuldades e das são confusões comumente mobilizadas no clínico, quanto à sua compreensão da dinâmica dos processos mentais. problema essencial - talvez verdadeiramente o único, que sustenta os demais - reduz-se a esta posição de princípio que sugiro chamar de sectarismo isto é, a tendência natural dos processos da compreensão que se esforça em pulverizar a compreensão da abordagem em procedi mentos mas autárquicos. Mesmo que nada venha a representar um obstáculo, essa tendência culmina rapidamente em pródigas inépcias clínicas, cuja indigência fre qüentemente só encontra paralelo na alienação que a alimenta. De fato, o dogmatismo clínico tem suas fontes em uma disposição totalitária que tende a aprisionar a compreensão no domínio de um saber pré-constituído. Ora, em acorde psicopatologia, nenhum dispositivo de mais saberque merece, que se lhe tal destino privilegiado, ainda as linhasa priori, de partilha instauradas entre um saber e outro têm somente, na maior parte das vezes, uma consistência imaginariamente sustentada para fins de prioridade narcísica ou de estratégias ideológicas. A própria idéia de uma compreensão dos processos psíquicos exige, no mínimo, que se reflita sobre a conotação do vocábulo Desde 1913, Freud fomentava algumas reservas com relação à compreensão, quando ela se punha a serviço do dogmatismo clínico. Como prova, esta advertência que formulou em seu estudo início do "Somos freqüentemente obrigados a nos perguntar, quando lidamos com uma neurose com sintomas histéricos e obsessivos pouco proe minentes ou de curta duração e igualmente, se não estamos lidando com um início de demência precoce se não nos arriscamos a ver surgir, em dado momento, sintomas precisos desta doença. Contesto que seja sempre fácil estabelecer uma discriminação. Sei que certos psiquiatras hesitam menos que eu em fazer um diagnóstico diferencial, mas me convenci de que eles se enganam freqüentemente. Entretanto, é preciso notar que, para o psicanalista, o erro comporta mais conseqüências lamentáveis que para o que se diz psiquiatra clínico. De forma alguma, com efeito, este último realiza, qualquer que seja o caso, algo verdadeiramente eficaz; o único risco que corre é o de cometer um erro teórico e seu diagnóstico só apresenta um interesse acadêmico. Ao contrário, num caso difícil, o psicanalista que comete
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um erro de ordem prática, causando muitos desgastes inúteis, desacredita seu método de Essas reservas formuladas por Freud necessitam, bem entendido, serem ressituadas em seu contexto histórico. Cerca de quarenta anos mais tarde, Lacan retomará o argumento através de várias advertências formuladas em relação a uma compreensão das doenças mentais. Durante seu seminário sobre as psicoses, em 1955, questiona sem rodeio a própria noção de compreensão nos seguintes termos: compreensão] é uma preposição da qual seria exagerado dizer que é bastante ingênua, já que não resta dúvida de que não há uma que seja mais comum progresso maior da psiquiatria, desde a intro dução deste movimento de investigação que se chama psicanálise, consistiu, acredita-se, em restituir o sentido na cadeia dos fenômenos. Isso não é falso em si. Porém, o que é falso, é conceber que o sentido de que se trata é aquele que se compreende. que teríamos aprendido de novo, de acordo com o que se pensa de maneira geral nas salas de plantão, expressão do sensus commune dos psiquiatras, é compreender os doentes. Isto Em seu seminário de 23 de novembro de 1955, Lacan traz alguns complementos de elucidação a essa problemática da compreensão: "Aquela observação que lhes fiz da última vez, segundo a qual o compreensível é um termo sempre fugidio, é surpreen dente que nunca pese como uma lição uma formulação indispensável para aceder à clínica. Comecem por não crer que com preendem. Partam da idéia do mal-entendido fundamental. está uma disposição primeira, na falta da qual não há verdadeiramente nenhuma razão para que vocês não compreendam tudo e qualquer
é preciso, igualmente, proteger-se da tentação de querer compre ender,Mas previamente, as manifestações psicopatológicas, assim como essa obrigação de reserva não deve ser entendida como um discurso em favor do desconhecimento, e mesmo da ignorância. Certos comentadores poucos escrupulosos dedicaram-se, seguindo os passos de Freud e de Lacan, a promover a dicotomia entre "saber" e "verdade" em uma direção tão absurda quanto inadmissível. Como supostamente a verdade fala de si mesma™, essa dicotomia transforma-se para alguns em uma prescrição sagrada. Alguns abandonaram, ipso facto, todo saber sobre a psicopatologia e, ao mesmo tempo, renunciaram a todo esforço de compreensão e assimilação requisitado para ter acesso a ele. Uma oportunidade tão evidente não poderia deixar de
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ser denunciada. Jean abruptas:
a destaca por meio de algumas observações
"Há pessoas fora de si que se permitem dizer besteiras sobre a psicanálise e a suspeito que são preguiçosas. Se dissermos: não há psiquiatria, isso representa cem mil páginas a menos para ler; a gente se tranqüiliza, podeResultado, ir passear,retorna-se pode ir ao não temou mais que quebrar a cabeça. aoscinema, confinamentos então aos campos de concentração. É Em termos mais acadêmicos, Jean Laplanche denuncia igualmente esta alimentada pela oposição do saber e da verdade: "A psicanálise seria o lugar da verdade, enquanto que o saber seria somente a forma de de petrificar essa Se a oposição não é nova certamente encontrou um novo vigor com a psicanálise e com a demonstração precisa, na psicanálise, dos mecanismos de defesa que o saber permite. No entanto, permanece o fato de que toda verdade pode, certamente, ser petrificada num saber, mas não emer gência da verdade sem o ponto de partida de um certo Não é necessário avançar ainda mais nos enigmas desta questão, para perceber os graves extremos a que pode chegar o dogmatismo clínico. Que este se erija em nome da especificidade psiquiátrica ou do imperialismo psicanalítico, nenhuma referência a um saber pré-constituído poderia dar a única e exata medida do que nos é proposto a título da compreensão dos fatos psicopatológicos. Também não devemos concluir apressadamente: "Deus está morto, tudo é Ao contrário, trata-se de conter toda inclinação espontânea à empatia pelo exercício contínuo de certos dispositivos referenciais que deverão ser colocados e recolocados à prova no início de qualquer encontro clínico novo. Mesmo quando esses dispositivos referenciais não são necessariamente congruentes entre si, isto não implica que sejam antitéticos e, respectivamente, promovidos a uma assunção dogmática. Cada apresentação clínica é a ocasião inevitável de uma discriminação que opera sobre a base dessa pluralidade referencial. Não se trata também, de adesão a uma estratégia que possa apoiar-se em tal necessidade discriminativa. No caso inverso, isto é, no caso de uma compreensão pré-determinada dos fatos psicopatológicos, a apresentação ou a confrontação clínica tornamse então o detonador de experiência de goza, o que, aliás, não quer dizer ocasião de uma experiência confortável, na medida em que o gozo nem sempre se confunde com o prazer. Na maior parte do tempo, o gozo toma corpo com a certeza - ou ao menos o pressentimento - de uma
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potencialidade de estratégias manipulatórias, estratégias que jamais se inse rem, elas próprias, no quadro de um dispositivo de controle Ora, por natureza, os fatos psicopatológicos inscrevem-se quase sempre no sentido contrário a toda possibilidade de controle. Isso não invalida o caráter de uma previsão ou de um prognóstico que encontra, seu lugar em razão mesma do objetivo terapêutico que sustenta princípio de qualquer encontro clínico. A assunção do gozo encontra seu ocampo favorável num outro registro. Efetivamente, o gozo surge assim que tal encontro se institui, para o clínico, como a ocasião propícia de fortificar a inscrição do fato psicopatológico na estrutura de um saber que se impõe, em princípio, como devendo lhe dar razão. De certo modo, o paciente é, obrigado a passar pelas forças caudinas do clínico, que finge ignorar, face a ele, esse saber pré-estabelecido no qual o aprisiona. A apresentação clínica permanece presa então, em uma dimensão próxima à do gozo do segredo perverso. De forma mais geral, ela está sujeita a todos os avatares do gozo daquele que sabe. Pouco importa, então, a natureza e a consistência do saber, pois a vetorização do encontro clínico escapa a priori a toda discriminação, exceto a que reforça o clínico em sua posição de examinador. lugar de eleição de tal exame é então o que consiste, para o clínico, em observar no outro, em gozo passivo, o que ele já colocou de si mesmo, sem desejar sabê-lo. Talvez haja sempre um pouco do clínico, como do judeu da anedota? Depois de vários anos de solidão em uma ilha deserta, um judeu náufrago é recolhido por um Antes de deixar sua ilha, o náufrago convida o navegante a dar uma volta pela propriedade. No meio de uma clareira, o navegante imobiliza-se, surpreendido, constatando a presença de duas sinagogas improvisadas, quase idênticas, distantes apenas alguns metros uma da outra. Ele pergunta sobre esta srcinalidade ao náufrago: "Uma sinagoga, eu compreendo, mas por que duas? - Ah! Nem me fale! responde o náufrago mostrando uma delas. Esta aq ui, eu não freqüento nunca!" NOTAS 1. J. "Ouverture de la section clinique" (5 de janeiro de 1977, p. 13. 2. Ver V. Tausk, "De la
in
9, abril
de à influencer" au cours de la schizophrénie", Paris, Payot, 1975, pp. 177-217.
3. S. Freud, "Le début du (1913), in La Paris, P.U.F., "Bibliothèque de psychanalyse", 1953, pp. 81-82. 4. J. Lacan, de op. meu). Publicado em língua portuguesa sob o título
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in
A. Berman,
de novembro de p. 14 (o grifo é As Psicoses, op. cit, p. 14.
JO ËL DOR seminário de 23 de novembro de 1955, p. o título As Psicoses, op. cit., p. 30.
Public ado em língua portugu esa sob
6. "Moi, la vérité, je parle" [Eu, a verdade, falo], aforisma lacaniano. Ver J. Lacan, "La chose freudienne ou sens du retour à Freud en psychanalyse" (ampliação de conferência pronunciada na clínica neuropsiquiátrica de Viena, a 7 de novembro de 1955), in Écrits, op. cit., p. 409; "La science et la vérité" (1 de dezembro de 1965), p. 866 e 867; de 1970, p. 73; etc. de la psychanalyse, op. cit., seminário de 21 de donc, Paris, U.G.E., col. "10 x 18", 1978, p. 40. 8. J. Laplanche, "La référence à op. cit., p. 384.
in Psychanalyse à l'université, tomo III,
11,
SEGUNDA PARTE Reflexões sobre a do tratamento
3
A subversão
e sua
A
fim de situar tudo o que em Lacan se refere à questão da transferência, convém partir da própria reflexão freudiana. Podemos distinguir três etapas significativas das modificações freudianas trazidas à teoria da transferência. Primeira etapa
Freud foi levado a identificar um processo transferencial desde o momento que introduziu as associações livres em primeiro plano no tratamento. De fato, a prescrição das associações livres aos pacientes provoca, paradoxalmente, um certo tipo de imposição que nos lembra que alguma coisa do inconsciente insiste em se fazer ouvir. inconsciente repete até a ocorrência favorável que permitirá à representação recalcada surgir, a despeito do suje ito, atrav és de uma deformação ou de uma formação de comprom isso. Freud vê, aí a própria marca de uma certa transferência, como ele evoca na A interpretação dos sonhos. (N. do T.)
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a representação inconsciente não pode, enquanto tal, penetrar no pré-consciente a não ser que se alie a alguma representação sem que já se à qual ela transfere sua intensidade e que lhe serve de cobertura. Eis aí o fenômeno da Assim, desde o início de sua obra, Freud associa a transferência à repetição e a apresenta como um meio de acesso ao inconsciente. Se a repetição torna-se um processo necessário ao retorno do recalcado, a trans ferência por seu turno permite o deslocamento das representações sobre o analista, facilitando a repetição. Conseqüentemente, a significação de tais representações só será desvendada se a transferência for interpretada. A repetição pode, então, ceder seu lugar à rememoração. Além do mais, a transferência aparece como o próprio lugar da interpretação, enquanto que a repetição se define como o motor do tratamento. Reencontramos em Lacan uma adesão significativa a essa primeira posição freudiana. Sob determinado ponto de vista, podemos considerar a repetição como o móvel do próprio simbólico. Em seu artigo sobre a Michel Silvestre lembra-nos que essa tese é, com efeito, desenvolvida no Seminário sobre "A carta De fato, além da transferência e da repetição significante, destaca-se a idéia de que é o próprio registro simbólico que se torna o motor do tratamento. Segunda etapa
Rapidamente, Freud irá perceber que a transferência pode tornar-se um obstáculo à análise, isto é, um lugar de resistência, notadamente em razão da dimensão de amor que ela suscita®. Com efeito, a ênfase é colocada, de agora em diante, sobre a presença do analista na transferência que se autentica no campo do amor de transferência. Um dos pontos essenciais da resistência de transferência irá assim se definir na própria pessoa do analista. Quando há resistência, por exemplo sob a forma de um obstáculo às associações, é, segundo Freud, porque uma idéia de transferência está associada ao analista. É também reconhecer no amor de transferência o elemento específico da resistência. A genialidade de Freud será pressentir então, em relação à transferência, a incidência do desejo do analista. Mas, evidentemente, interessa antes de tudo ao analista desejar que a análise prossiga, recusando o gozo que lhe é proposto. Certas elaborações de Lacan apoiar-se-ão diretamente, como veremos mais adiante, sobre essa intuição freudiana; em princípio, a importância essencial que deve ser dada, na transferência, à distinção entre a demanda e o desejo; a seguir, a posição central do desejo do analista no próprio seio da dinâmica da transferência.
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Terceira etapa
Na medida em que se pode considerá-la como o último período da modificação da teoria da transferência, trata-se de estimar as últimas contribuições de Freud em seu e A tese da transferência como lugar de resistência encontra-se reforçada a tal ponto que podemos considerar a resistência como isomorfa à transferência negativa. Aliás, é principalmente na pessoa do analista que Freud pressente a razão última das resistências. Mais além do amor de transferência, o analista torna-se um estranho e, como tal, rejeitado em nome de "certas imposições desagradáveis" (Freud), entre as quais figura, em primeiro lugar, a castração. Mais uma vez, Lacan retomará essa idéia freudiana, dando-lhe o compl emen to que lhe c onvém . "Não há outra resistência à análise — precisará - que a do próprio analista." Encontraremos, igualmente, o analista "estranho" quando, a propósito do fim da análise, Lacan sublinhará que o analista nunca é reduzido a outra coisa além de um puro e simples Não podemos, entretanto, contentar-nos em imaginar que Lacan tenha simplesmente explicado o que já estava presente nas elucidações freudianas. Ele levou muito adiante a análise da questão da transferência. Aliás, é nessa evolução que captamos, mais claramente, a evidência do caráter propriamente subversivo da transferência. Já seriam provas disto certas críticas formuladas por Lacan em relação a alguns desenvolvimentos pós-freudianos consideravelmente "impróprios". A precisão levada a cabo por Lacan concerne, antes de tudo, à implicação mais fundamental da descoberta freudiana: embora somente a verdade sempre adere à estrutura do sujeito que a enuncia, ou seja, à de seu desejo. Podemos deplorar esta alienação, mas não poderemos jamais delimitala. Não há nenhuma esperança a alimentar quanto a algum controle da ordem significante. sujeito permanece, contra tudo e todos, um efeito de determinação da ordem simbólica que regra o curso de sua estrutura e das alienações resultantes. A justa medida desta função crucial do simbólico nos é dada pela noção do grande Outro, que intervém de modo preponderante tanto no âmbito da linguagem quanto no da fala. No âmbito da linguagem, Lacan a introduz na própria estrutura do sistema dos significantes. É porque um significante só se especifica em oposição a todos os outros, que não extrai sua denotação e sua conotação senão em relação ao Outro. só existe como significante enquanto remetido a S2, isto é, a um outro que lhe confere seu estatuto na estrutura da linguagem. é assim remetido ao sistema de todos os outros significantes, ou seja, No srcinal
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precisamente, grande Outro "tesouro dos No âmbito da fala, também é o grande Outro que decide o sentido, como testemunha, na articulação do "grafo do desejo", sua posição no lugar do No discurso, a mensagem não se estrutura, então, em referência ao controle da fala. Toda a destituição desse controle é prefigurada pelo "Che Vuoi?" no grafo,E portanto certa Outro forma,sepela estrutura do próprio desejo®. ainda, o de grande apresenta como a garantia do estatuto da fala do sujeito. Não poderíamos melhor significar esta incidência senão lembrando este aforisma lacaniano: "um significante é o que representa um sujeito para outro Feita essa elucidação podemos compreender melhor o eixo principal da concepção lacaniana da transferência. Consideremos que é ao longo da repetição significante que se institui a dimensão própria à transferência e à sua análise. Sob quais condições essa análise pode se efetuar? A propósito dessa questão, a contribuição de Lacan estabelece a condição da interpretação analítica fora do campo de toda possibilidade Por outro lado, permite resolver uma outra dificuldade colocada pela função dasob transferência, notadamente o paradoxo que ela como levanta apresentando-se uma dupla perspectiva: resistência fechamento do inconsciente e abertura, preparando a via para a eficácia da interpretação. Sem entrar no detalhe dos argumentos desenvolvidos por Lacan em seu seminário A vejamos suas conclusões. Como sublinha Lacan retirou a transferência do domínio exclusivamente imaginário ao qual ela foi condenada desde Freud. Por mais que Alcebíades espere um sinal do desejo de Sócrates, mais precisamente da de que ele o investiu, Sócrates não responde. Mas, se ele não dá continuidade à demanda de Alcebíades, sua resposta se formula, entretanto, em outro lugar. Afirmando nada saber do que Alcebíades de manda, especifica, pela própria resposta, um lugar de não-saber no próprio a transferência de Alcebíades assim, instituída espaço dePor um um saberlado, de que Sócrates supostamente seriaé,detentor. Por outro,no a resposta de Sócrates elimina o caráter de dessa transferência. De fato, o que Alcebíades demanda, ele mesmo já não o sabe. Através da transferência, o analisando demanda a agalma ao analista, na ignorância que está de já estar constituído como tal se dirigindo a ele. É aí que reside o engano sobre si mesmo que passa a atuar sobre a pessoa do analista. Entretanto, como lembra ele só pode atuar à medida que o analista é interpelado como suposto saber. saber é, então, sempre saber do Outro e nenhuma análise da transferência seria coerente fora desta atribuição suposta ao lugar do Outro. Mas, se a transferência instala o analista no lugar do sujeito suposto saber, é porque o sujeito que se endereça a ele ignora algo da estrutura do
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desejo. Supondo que a verdade de seu desejo resida num saber que o Outro detém, ele traz a própria prova de que confunde o desejo e a demanda. Somente a análise da transferência permite sair desta situação aparente. Entretanto, o analista não pode dar nenhuma interpretação que permita supor que ele sabe, no lugar do sujeito. saber inconsciente é suscitado pelo analista na transferência, mas ninguém, além do sujeito, é seu detentor. Nessas condições, uma questão coloca-se: como o saber em jogo no trata mento circula entre os dois parceiros? A essa questão, Michel responde que devemos levar em conta tanto o amor associado à transferência, quanto a problemática do desejo do analista, como lembra Lacan: a transferência não é, por natureza, a sombra de algo que tenha sido vivido Muito ao contrário, o sujeito, estando sujeitado ao desejo do analista, deseja enganá-lo dessa sujeição, fazendo-se amar por ele, propondo por si mesmo essa falsidade essencial que é o amor "É por isso que, por trás do amor dito de transferência, podemos dizer que o que há é afirmação do laço do desejo do analista com o desejo do paciente. É o que Freud traduziu numa espécie de rápido escamoteamento dizendo final das contas, é apenas o desejo do - para serenar os colegas. É o desejo do sim, mas no seu encontro com o desejo do Como analisar a transferência nesse dispositivo? É preciso saber que o sujeito suposto um ternário" (Lacan) em relação aos dois sujeitos presentes. apelo ao saber do Outro propõe assim ao analista uma (Lacan), que lhe cabe endossar, instituindo-se assim, ele mesmo, como o Outro do desejo. Todavia, o saber que deve advir somente dependeria dos significantes do paciente. Nesse sentido, o sujeito suposto saber está, então, sempre em posição ternária em relação aos dois protagonistas presentes. Se o saber circula imaginariamente entre os dois, é em razão da suposição inerente à demanda de saber, que é relançada sem cessar. Por esse saber suposto, o sujeito é enviado à impotência de seu discurso em enunciar seu Cabe então ao analista, pela sua enunciação, suspender esta deficiência dos enunciados em relação ao desejo. A análise da transferência é, assim, circunscrita a esse saber que deve ser enunciado, ou seja, ao desejo do qual o analista deve fazer enunciação. Mas o analista só chega a fazê-lo na medida em que é o depositário da significação desse saber - e desse desejo - através da transferência, via constituinte ternário do sujeito suposto saber. Seguindo Lacan, somos assim conduzidos, pela análise da transferência, ao problema do fim do tratamento, isto é, de seu limite
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lógico. Como assinala Michel o limite do fim do tratamento é marcado pelo próprio limite que convém dar a esse saber; limite a partir do qual o sujeito pode pensar em cessar o seu apelo ao saber do Outro. Em outros termos, esse limite parece, então, definir-se, como o limite do próprio Outro, agora que ele não é mais suposto como alguém que sabe mais. Na verdade, quando o sujeito está suficientemente a par do seu inconsciente, o saber não precisa mais ser suposto, e isto ainda mais porque ele se torna acessível ao sujeito. Outro não mais sabe, então, o lugar do sujeito, uma vez que jamais é depositário do significante último. sujeito, ao contrário, tem a experiência de que tal significante último não existe. Somente há significante para representar o sujeito para um outro significante, de tal forma que não pode não existir falta no Outro; daí o algoritmo lacaniano S (A) que metaforiz a o saber sobre a castração. No melhor dos casos, essa simbolização circunscreve a liquidação da transferência, isto é, o reconhecimento da falta que marca o lugar do Outro, ou seja, a beância que o sujeito ignora da dinâmica de seu desejo, mas que o causa. Assim se prepara, segundo Lacan, a destituição do analista. A recusa de saber que sustentaria a resistência do sujeito através da transferência, 9 de outubro Retomando uma expressão da "Proposição de de sobre o psicanalista da Escola", aquele que era suposto saber, agora que não sabe mais, é então rejeitado "como NOTAS Este capítulo foi redigido a partir de uma palestra proferida no "Centre de formation et de recherches psychanalytiques" [Centro de formação e de pesquisas Jornada de estudo de 24 de abril de 1988, Paris. Publicado in Institutions, 9, junho de 5359.
1. Freud, cap. (1899), I.
"Psychologie des processus du rêve", in L'interprétation des rêves revisado por D. Berger, Paris, P.U.F., 1967, pp. 478-479 (grifo do
autor). 2. Ver M. Silvestre, "Le transfert", 48 -83.
in Demain la psychanalyse, Paris, Navarin Éd., 1987, pp.
3. J. Lacan, "Le séminaire sur "La lettre volée" San Cusciano, de meados de maio, a meados de agosto de 1956), in Écrits, op. cit., pp. 11-41. 4. S. Freud, a) "La dynamique du transfert" (1912), in La technique psychanalytique, op. cit., pp. 50 -60; b) "Observation sur l'amour de transfert" pp . 116 -130. 5. S. Freud, "L'analyse avec fin et l'analyse sans fin" P. Cotet, A. Rauzy, in Résultats, idées, problèmes. de psychanalyse", 1985, pp. 231-268.
(1937), trad. J. Altounian, A. Bourguignon, 1921-1938, Paris, P.U.F., col. "Bibliothèque
6. Outra forma de dizer que o analista ocupa o lugar do objeto à l'autre (1968- 1969), inédito de 14 de maio de
a. Ver J. Lacan, D'un Autre
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7. J. Lacan, "Subversion du sujet et dialectique du désir dans l'inconscient freudien" (Con gresso de Royaumont, 19 -23 de setembro de in Écrits, op. cit., p. 818. 8. J. Dor, cap. XXI: "Le graphe du désir 1: Du point de capiton au moulin à paroles", in Introduction à la lecture de Lacan. Tome 1. L'inconscient structuré comme un langage, op. cit., pp. 191 SS. Publicado em língua portuguesa sob o título à leitura de Lacan, op. cit., grafo do desejo 1: do ponto-de-estofo à falação", pp. 148 SS. 9.
cap. XXV: "La "génération" du graphe", pp. 233 Publicado em língua portuguesa sob o título "geração do grafo", pp. 179 SS.
SS. ã leitura de Lacan, op. cit.,
10. Lacan não cessará de repeti-lo. É, salvo erro de minha parte, em "Subversion du sujet et dialectique du désir dans l'inconscient freudien", in Écrits, op. 819, que o encontramos pela primeira vez. 11. Ver meu artigo "Interprétation psychanalytique, herméneutique et métalangage", Apertura, 4, 1990, pp. 37-43.
in
12. Ver J. Lacan, Le Transfert Livro VIII (19 60- 196 1) , Paris, Seuil, col . "Champ Freu dien" , e principalmente a análise lacaniana do de Platão, in seminários de 23 e 30 de novembro de 7, 14 e 21 de dezembro de 18 e 25 de de 1961, 1 e 8 de fevereiro de 1961, pp. 27-195. Ver também o conjunto dos artigos dedicados a esse tema por B. Bass, Battistini, Clarín (traduzido por I. Gárate-Martínez), M. David-Ménard, C. Dumézil, M. Fennetaux, L. Gherchanoc, P. P. Julien,de C.1992, Rabant, sob o Ver títuloainda "Socrate, in Esquisses psychanalytiques, 18, outono pp. 5-100. J.-L. Henrion, La cause du désir, Paris, Point hors ligne, Ver M. Safouan, Le transfert et le désir de l'analyste, Paris, Seuil, 1988. 14. Ver ibid, cap. V: "Le transfert selon Lacan et le désir du psychanalyste", p. 201. 15. Ibid. (o grifo é meu). 16. Ibid. 17. M. Silvestre, "Le transfert",
in Demain la psychanalyse, op. cit., p. 72 SS.
18. J. Lacan, Les quatre concepts fondamentaux de la psychanalyse, Livro XI (1964), Paris, Seuil, col. "Le champ freudien", 1973, seminário de 17 de junho de 1964, p. 229 (grifo do autor). Publicado em língua portuguesa sob o título Livro XI, "Os quatro concei tos fundamentais em psicanálise", Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1990, p. 24o. 19. Ver M. Silvestre, "Le transfert", 20.
in Demain la psychanalyse, op. cit., pp. 76-77.
p. 73.
21. J. Lacan, "Proposition du 9 octobre 1967 sur le psychanalyste de l'École", cit., 1, p. 25.
in Scilicet, op.
4
Intervenções e interpretações no tratamento
D
e acordo com a ortodoxia freudiana, a interpretação sempre foi central na investigação analítica do material inconsciente, tanto como mediador técnico integrado à dinâmica do tratamento, quanto como modo maior da ação terapêutica. Essa noção de interpretação começa a surgir claramente desde a análise dos mas suas premissas já se encontram nos Estudos sobre a Todavia, em 1895, a interpretação aparece sobretudo como um
coadjuvante marginal, ou na medida em mediação que se trata da "interpretação comuni cada aos pacientes", seja, uma favorável a fazer com que surjam as recordações patogênicas inconscientes. Por outro lado, desde A interpretação dos sonhos, tal interpretação define-se como uma autêntica intervenção analítica. Ela tem como tarefa colocar em evidência o sentido latente de um material inconsciente. Ao reportar o princípio da interpretação à prevalência da técnica das associações livres, Freud retira da significação dos sonhos qualquer possibilidade de interpretação do tipo "chave dos sonhos". A interpretação tem por objetivo maior liberar a significação do desejo inconsciente e também, além disso, a significação dos fantasmas/fantasias nos quais este se elabora. Geralmente, as outras produções do inconsciente serão objeto de um mesmo tratamento.
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A partir daí, já podemos extrair alguns elementos de reflexão desde o princípio da obra de Freud. De um lado, tudo permite supor que a interpre tação não abrange todo o conjunto das intervenções do analista. Por outro, essa concepção inaugural da interpretação parece exaustivamente circunscrita ao campo da significação. É justamente essa a especificidade mais característica da interpretação freudiana. Além disso, em A interpretação dos sonhos, Freud insiste sobre o seguinte ponto: um sonho" significa indicar seu Tal observação bem poderia ser relacionada à Psicopatologia da vida talvez mesmo à sua obra sobre o A sujeição causal da interpretação à revelação de uma significação não é imediata, na medida em que se encontra indiretamente levantado o problema da verdade. Em razão da prescrição da regra das associações livres, podemos considerar que o paciente tem a última palavra sobre a verdade de seu desejo. Não é menos possível que a interpretação que lhe é proposta constitua uma sequência que revele a significação no momento mesmo em que se consuma. Caso levemos um pouco mais longe as conseqüências dessa interpre tação freudiana, abordaremos o próprio problema da construçã o. Para Freud, a "construção" é uma elaboração genérica mais sistematizada que o conteúdo da interpretação. Todavia, seu objetivo é da mesma ordem: a eficácia terapêutica. Essencialmente, trata-se de dinamizar a supressão do recalque: "Freqüentemente não se chega ao ponto de o paciente lembrar-se do recalcado. No entanto, uma análise corretamente guiada convence-o firmemente da verdade da construção, o que, do ponto de vista tera pêutico, tem o mesmo efeito que o de uma recordação Qual é a verdade de que Freud nos fala aqui? Trata-se da verdade da construção considerada enquanto tal, portanto, de uma verdade que está diretamente associada àdistanciados estruturaçãodasignificativa construção. Estamos, então, suficientemente verdade dodadesejo, da qual Lacan nos diz que supostamente fala por si mesma. Por outro lado, estamos insta lados na lógica de uma construção racional; é por isso que a verdade é, aqui, mantida no campo da significação. Nessas condições, uma questão se impõe. A significação do enunciado, isto é, sob certo aspecto, a construção, é verdadeira ou falsa? De maneira idêntica, podemos colocar a questão relativamente à interpretação. Há uma isomorfia entre a verdade do desejo do sujeito articulada em seu discurso e a verdade da significação do enunciado interpretativo do analista? Nada, a priori, permite supô-lo. Além disso, certas observações de Freud permitem pensar, preferivelmente, em uma certa disparidade deste
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ponto de vista. Se pensamos na noção de elaboração somos confrontados a uma correlação problemática entre a verdade do desejo e a verdade da significação. De forma geral, é a própria questão do sentido do sentido que é colocada. Em relação aos sonhos, Freud observa que a elabo ração secundária constitui, da parte do sonhador, uma primeira interpretação destinada a neutralizar o absurdo e a incoerência imediata do sonho. Tratase, então, de uma alteração significativa destinada a apresentar o sonho sob uma forma compreensível. Ele pensa, inclusive, que aí se insere um segundo tempo do trabalho do sonh o mobilizado pelas imposições da censura. Nessas condições, qual pode ser a verdade da significação dessa primeira interpre tação? Freud faz alusão a esse problema, muito curiosamente, afirmando que não se trata de uma interpretação a ser concebida no sentido analítico do termo. Tratar-se-ia, mais exatamente, de uma auto-interpretação que o so nhador faria. Nesse sentido, ela deveria ser então colocada à disposição da atividade interpretativa do analista. Além disso, Freud explica claramente em A Interpretação dos "Há sonhos que são, à primeira vista, de uma lógica impecável Esses sonhos foram profundamente elaborados pela função psíquica em questão, semelhante ao pensamento da véspera; eles parecem ter um sentido, mas este é extremamente distante do verdadeiro sentido do sonho. São sonhos que, por assim dizer, já foram interpretados uma vez, antes de serem submetidos à nossa interpretação ao Nessas condições, a interpretação analítica não pode deixar de levantar a questão do sentido do sentido. Freud oferecerá uma distinção entre sentido e significação. problema não deixa de existir, na medida em que a signi ficação permanece coextensiva ao problema da verdade. A significação da interpretação é verdadeira? Se é verdadeira, é coerente com a verdade do desejo que supostamente revela? Podemos alegar a prova empírica da dissolução do sintoma para justificar a consistência da interpretação, e assim, a de sua verdade. Mas sabemos que essa prova não é de forma alguma suficiente, ainda menos, pode parecer necessária. A sugestão aspira, às vezes, a efeitos equivalentes. Geralmente, todas as psicoterapias ditas "novas" reivindicam efeitos terapêuticos de mesma ordem. Nesse campo, a experiência ensina-nos que, se o sintoma desaparece, é porque foi, no máximo, estrategicamente deslocado. Em outros termos, a dissolução objetiva do sintoma jamais corroborou a correlação entre a verdade do desejo do sujeito e a da significação de sua interpretação. Em nome dessa disparidade potencial, a atividade interpretativa pode às vezes entusiasmar-se, mas freqüentemente sem correr grandes riscos, e também, convenhamos, sem grandes efeitos. Como prova, evoquemos o frenesi interpretativo de certos analistas kleinianos.
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Igualmente, outra questão se coloca. Qual o limite significativo entre a interpretação e uma pura e simples tradução? Somente esse limite deveria, em princípio, permitir a especificação do campo exato da atividade inter pretativa. Suponhamos que a significação revelada pela interpretação seja estritamente isomorfa à verdade do desejo. Se tal é o caso, situamo-nos, então, num registro em que o estatuto da interpretação é o estrito analogon de uma tradução. Conseqüentemente, o universo da interpretação é quase logicamente inferido do universo da intervenção hermenêutica. Coloca-se então sem falta a questão da categoria do sentido em relação à verdade do desejo que ela supostamente exprime. Toda a dificuldade epistemológica provocada pelo método hermenêutico é aqui interpelada. Sem contest ação possív el, tal método chega a uma solução inconsistente, habitualmente designada pelo termo círculo hermenêutico. Uma linguagem hermenêutica remete sempre à questão de uma auto-compreensão radical, a qual por seu lado, remete à jurisdição das metalinguagens, ou seja, ao processo do sentido do sentido e à regressão indefinida do verdadeiro sobre o A interpretação psicanalítica não pode ser reduzida a tal sujeição. A fim de sairLacan desse indica-nos impasse especulativo, é preciso proceder a uma descen tralização. o caminho notadamente ao distinguir a inter venção analítica da interpretação propriamente A primeira diferença que Lacan faz entre a intervenção e a interpretação situa-se no domínio de seus objetivos respectivos. Em primeiro lugar, pode mos dizer que a interpretação concerne a causa do desejo, isto é, algo que escapa à significação. Por essa razão, Lacan insiste, com razão, sobre o fato de que a interpretação só pode ser equívoca e alusiva, pois essa causa não é além disso, em torno desse ponto preciso que se especifica claramente a natureza da intervenção. Em um do qual retomarei alguns dos argumentos principais, Pommier lembra-nos que, mesmo se o fantasma/fantasia tem como causa o desejo, a intervenção principalmente. Ela se desenvolverá na própria em na quelocalização o se do desdobra. pode ajudardimensão o paciente da construção seu Assim, ela fantasia, assim como na sua progressiva. É sempre preciso tempo para que todas as representações imaginárias que acompanham o dizer do paciente sejam decantadas, de tal forma que a análise permita extrair a fantasmática que as relaciona. Cabe precisamente às intervenções extrair essa infraestrutura, isto é, proceder a um certo modo de redução. Somente a redução pode conduzir progressivamente o paciente à dimensão de se u próprio desconh ecimen to. Como lemb ra Gérard Pommier: "Quando essa redução está suficientemente avançada, o fantasma/fan tasia possui várias apresentações, que entre si uma relação de da alienação separação. Quando o sujeito localiza uma se-
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qüência de seu fantasma/fantasia, uma outra lhe escapa, e reciproca mente. Aliás, é por isso que ele entretém uma relação de desconheci mento com um talvez muito presente, mas que lhe parece A propósito da intervenção, reflitamos, por exemplo, sobre o que Lacan chama de A escansão não é uma interpretação. Antes de tudo, é uma intervenção analítica que pontua certas seqüências dos enunciados do paciente para sublinhar algo que lhe escapa em seu dizer. Em outros termos, põe em evidência a dimensão de dissimulação de seu discurso, isto é, o modo de desconhecimento do qual ele próprio é A escansão não revela, propriamente, nenhuma significação. Ela permite, entretanto, isolar de modo oportuno algumas dessas significações; também a escansão não explica o que quer que seja. É um ato que não desmobiliza em nada o sujeito suposto saber, sustentado pela transferência. Bem ao contrário, a escansão cataliza, na transferência, essa suposição no sujeito. papel es sencial da escansão se deve a uma função de recomeço. Leva progressiva mente o sujeito às possibilidades de fazer advir a verdade de seu desejo, no próprio campo da refenda de seu discurso. Além da escansão, a intervenção bem pode atuar como apoio. Nesse sentido, é necessária em certos momentos da dinâmica do tratamento. Ela não faz, no entanto, o sujeito "avançar". Trata-se mais de uma estase oportuna que permite ao paciente reencontrar um segundo fôlego. Tanto a intervenção é um procedimento que acompanha regularmente o desenrolar do tratamento, quanto, por outro lado, a interpretação somente se produz em certos momentos privilegiados. Segundo Lacan, a interpretação não participa da revelação de uma significação. analista que interpreta não descobre de forma alguma um sentido que deveria ser relacionado ao dizer do paciente. Apoiando-se em Pommier lembra, justamente, que a interpretação intervém sobretudo sob a forma de analista "cita", com efeito, uma seqüência do dizer do analisando num momento em que ele desconhece o seu próprio texto. A interpretação opera, então, ajustando uma seqüência de discurso ao nível de outra se qüência de Ela não se no conteúdo do dizer e, conse qüentemente, não inventa nada. Não traz nenhum sentido suplementar e ainda, ao contrário da intervenção, conclui-se sempre momentaneamente por uma eclipse do sujeito suposto saber, isto é, por uma queda pontual da suposição de saber imputada ao analista que interpreta nada faz além de citar um que já está no paciente, ou seja, uma seqüência significante da qual ele não tinha nenhum saber prévio antes do dizer do paciente que a sustenta. Além disso, conduzindo a interpretação pela via da citação, Lacan situa-a, assim,
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no registro da alusão ou do equívoco. três tipos de equívocos para sustentar a
seu texto L
ele propõe
• o equívoco por homofonia; • o equívoco gramatical; • o equívoco lógico. Se a interpretação pode ter a estrutura de um equívoco, isto ocorre em razão de sua própria função. A interpretação implica, de fato, o ajuste de duas seqüências cujo caráter heterogêneo A homofonia é, sem dúvida, a ilustração mais simples disso. Isto supõe que a interpretação intervém sobre o modo do corte. corte interpretativo consiste, com efeito, em reunir em uma única seqüência componentes habitualmente disjuntos. É por essa razão que podemos compreender o princípio desse corte referindo-o à estrutura topológica da faixa de Möbius, ou seja, uma superfície unilateral de uma única Se fazemos um corte mediano sobre uma faixa de Möbius, transformamos essa superfície unilateral em uma superfície bilateral (duas faces e duas bordas), chamada curva de Podemos assim comparar a interpretação a um corte, na medida em que ela permite colocar em correspondência duas seqüências heterogêneas que se encontram assim distinguidas em sua continuidade. A interpretação se situa, além disso, sempre à frente do que o paciente diz; sua função é designar o que ele vai descobrir. Pode-se supor que o paciente chegaria, por ele mesmo, a este ponto de verdade que a interpretação antecipa para ele. Na realidade, sem o corte interpretativo, ele permaneceria à distância da causa do desejo que lhe escapa, porque é preciso que esqueça o que dizia para atingir esse ponto de Além disso, a interpretação intervém como um corte no tempo, pois ela um tempo que jamais poderia ser recuperado sem suporte topológico da faixa de Möbius permite-nos, mais uma vez, captar essa particularidade. que separará uma face da faixa de Möbius de sua outra faceda(intuitivamente necessário ao imediatamente percurso da superfície faixa em sua suposta) é o tempo Somente o corte põe em relação duas faces que, inicialmente, eram somente uma em sua corte interpretativo atualiza assim, de certa maneira, a divisão do sujeito, demonstrando o surgimento de um no próprio saber. Em último extremo, somente o dizer do paciente constitui, então, o que é próprio da interpretação. Em francês insu dans le savoir, que não é sabido no saber". Insu poderia ser desconhecido, mas assim não haveria o jogo de palavras com o verbo saber
por N. do T.)
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NOTAS Este capítulo foi redigido a partir de uma intervenção feita em uma Jornada de estudos do "Centre de formation et de recherches psychanalytiques" [Centro de formação e de pesqui sas psicanalíticas], a 2 de dezembro de 1989, em Paris. 1. Ver S. Freud, a)
des rêves, op. cit., b) Le rêve et son interprétation (1901),
Paris, Gallimard, col. "Idées", 185, 1975. 2. Ver J. Breuer et S. Freud, Études sur psychanalyse", 1956.
(1895), Paris,
3. S. Freud, cap. II: "La méthode d'interprétation des rêves", cit., 76 (grifo do autor).
col. "Bibliothèque de in
4. Ver S. Freud, Psychapathologie de la vie quotidienne (1904), Payot, col. "Prismes Essai", 11, 1987.
des rêves, op. S. Jankélévitch, Paris,
5. Ver S. Freud, Le mot ses rapports avec l'inconscient (1905), trad. M. Bonaparte et M. Nathan, Paris, Gallimard, col. "Idées", 198, 1981. 6. S. Freud, "Construction dans l'analyse" (1937), trad. E. R. Hawelka, U. Huber, J. Laplanche, in Résultats, idées, problèmes. II. 1921-1938, op. cit., p. 278. 7. S. Freud, cap. VIL "Le travail du rêve",
in L'interprétation des rêves, op. cit., p. 418.
8. Ver J. Dor, cap. IV: "Scientificité de la psychanalyse et psychanalyse-fiction", in L'ade la psychanalyse. Tome 1. L'aliénation de la psychanalyse, op. cit., p. 146-147. 9. Quanto a essa distinção, ver o excelente artigo de Mannoni, "Le divan de Procuste" (conferência proferida no Centro de formação e de pesquisas psicanalíticas, 1987), in Un si vif La honte, le rire, la mort, Paris, Seuil, 1988, pp. 103-118. 10. Ver G. Pommier, Le dénouement d'une analyse, Paris, Point Hors Ligne, 1987, cap. 2a. parte: "Position du fantasme", p. 102 e cap. IV, 2a. parte: "L'interprétation", pp. 166 SS. 11 .
p. 168. Ver
p. 169.
Ver J. Lacan, de lapsychanalyse, op. cit., seminário de 15 de abril de 1970, pp. 156-157. Publicado em língua portuguesa sob o título avesso da psicanálise", op. cit., pp. 126-127. Nesse seminário, a propósito da leitura de um texto, Lacan insere uma definição do Midrach, a saber, "de uma relação com o escrito submetida a certas leis". Trata-se, diz ele, "de se colocar no intervalo de uma certa relação entre o escrito e uma intervenção falada que nele se e a ele se refere". Ele faz uma associação com a experiência do tratamen to: "A análise completa, quero dizer, a técnica analítica pode, de certa maneira, elucidar essa referência, se for considerada como um jogo - entre aspas — de interpretação. termo é usado a torto e a direito quando nos falam, por exemplo, de conflito entre as interpretações - como se pudesse existir conflito entre as No máximo, as interpretações se completam, elas jogam precisamente com essa referência. que importa aqui é o — com a ambigüidade que em torno desta palavra pode se estabelecer a queda do falso, que entendo como o contrário do verdadeiro. Eventualmente, esse falso de interpre tação pode ter até o poder de deslocar o discurso." 14. Ver J. Lacan, seminário de 17 de dezembro de 1969, 40: "À sua maneira, a citação é também um meio-dizer. É um enunciado no qual se indica que ele só é válido na medida
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em que vocês já participam de um certo discurso, estruturado, no nível das estruturas funda Essas estruturas fundamentais não são outras, neste contexto, senão os quatro discursos. Lacan insiste no fato de que a citação é, simultaneamente, algo que lhe importa muito e que apresenta certas dificuldades. Ver ibid. : há outra coisa, na qual não se pensa muito em que toquei de leve, vez ou outra, mas que, para dizer a verdade, me concernia o bastante para que não me fosse fácil falar dela com facilidade. Chama-se a citação." Lacan faz referência à citação em relação à interpretação, e sobretudo, ao enigma. Ver ibid., é a enunciação - e desdobrem-se enunciado. citação é - euexponho oenigma enunciado" (o grifo é meu). Ele continuapara um obter poucoo adiante: "A A interpretação aqueles que a usam se dão conta - é com freqüência estabelecida por um enigma. Enigma colhido, tanto quanto possível, na trama do discurso do psicanalisando, e que você, o intérprete, de modo algum pode completar por si mesmo, nem considerar, sem mentir, como confissão. Citação, por outro lado, às vezes tirada do mesmo texto, tal como foi enunciado" (pp. 40-41, com grifo meu). Publicado em língua portuguesa sob o título"0 avesso da psicanálise", op. cit., pp . A fim de compreender a delicadeza dessas distinções complexas em uma reflexão sobre a interpretação no tratamento, é preciso lembrar-se que elas são sempre sustentadas, em princípio, pela questão da diferença entre a enunciação e o enunciado, isto é, pela questão do meio-dizer da verdade, e, em seguida, pelo duplo valordo enig ma, simultane a mente sinonímico de sintoma e conotado de um elemento mortífero. Quanto ao sintoma, ver La relation d'objet, livro IV (1956-1957), Paris, Seuil, col. "Champ Freudien", 1994, seminário de 9 de de 1957, p. 109 : Não vêem conjugar-se aqui numa espécie de nó [os três estágios de um processo que vai da ao - isso se quiserem realmente tomar o termo sintoma como equivalente a enigma". Publicado em língua portuguesa sob o título Seminário, livro "A relação de objeto", Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1995, p. 110. Quanto à função mortífera, ver de la psychanalyse, op. cit., seminário de 11 de março de 1970, p. 118 : enigma é algo que nos força a responder, na qualidade de perigo mortal." Édipo, que é sujeito à prova do enigma da esfinge, é sua vítima principal. Publicado em língua portuguesa sob o título avesso da psicanálise", op. cit., p. 96. Ver ibid., seminário de 17 de dezembro de 1969, 39, e de 11 de março de 1970, p. 135. Ver G. Pommier, Le dénouement d'une analyse, op. cit., cap. IV, 2a. parte, p.
168.
Ver ibid., p. 169. 17. Ver J. Dor, ca p. X X: "Le signi fiant, la cou pur e et le sujet - Le l'inconscient et l'acte analytique", in Introduction à la lecture de Lacan. Tome 2. La structure du sujet, Paris, Denoël, col. "L'espace analytique", 1992, pp. 200 SS. 16 .
18. Ver J. Lacan, "L'étourdit" (14 de julho de 1972),
in Scilicet,
4, Paris, Seuil, 1973, pp. 5-52.
pp. 48-49. 19 . 20. Ver G. Pommier, Le dénouement d'une analyse, op. cit., cap. IV, 2a. parte, p. 21. Ver J. Dor, cap. VIII: "L'intérieur et l'extérieur. La topologie de la bande de Möbius", Introduction à la lecture de Lacan. Tome 2. La structure du sujet, op. cit., pp. 129 SS.
in
22. Ver pp. 132 SS. Ver G. Pommier, Le dénouement d'une analyse, op. cit., cap. TV, 2a. parte, p. 174. 24. Ver ibid. 25. Ver ibid., pp. 173-174. 26. Ver J. Dor, cap. XX: "Le signifiant, la coupure et le sujet - Le sujet comme coupure", in Introduction à la lecture de Lacan. Tome 2. La structure du sujet, op. cit., p. 184; e, de forma mais geral, no mesmo capítulo "Le parlêtre, l'inconscient et l'acte analytique", pp. 187 SS.
TERCEIRA PARTE Estudos clínicos
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A dinâmica na histeria
A
relação da mulher histérica com seu próprio pai é, freqüentemente, objeto de uma dialética identificatória particularmente marcada pela ambivalência. De fato, no discurso o pai é constantemente significado como um objeto de investimento, alternadamente positivo e negativo. Tanto a histérica pode apresentá-lo como um objeto de amor, quanto como um objeto de amor deposto que desperta comiseração. Numerosas expressões da vida cotidiana evocam essa ambigüidade: "Minha mãe não é a mulher que convinha a meu pai"; "É por causa dela que ele se tornou o que é", etc. Ora, este "o que ele é", é sempre mais ou menos a evocação de um pai impotente, vítima da adversidade feminina, ou seja, um pai insatisfeito que merece ser apoiado. Evidentemente, esse "apoio" é mobilizado pelo reaparecimento de componentes edípicos, nota damente em relação à rivalidade fálica através da qual a menina entra em competição com a mãe com relação ao pai. Uma outra possibilidade de investimento pode levar a mulher histérica a uma atitude diametralmente oposta, isto é, deliberadamente hostil em relação ao pai, que é então tido como responsável pela infelicidade da família. É por sua causa que tudo vai mal, em particular, que a mãe sofre. Somos então, aparentemente, levados a uma configuração inversa da
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cedente. pai é um tirano que prejudica conjuntamente a mãe e a filha; caso em que o apoio à mãe se A filha alia-se à mãe para lhe fazer frente. Validando a queixa da mã e insatisfeita, a histérica pode assim aparecer, pela via de uma identificação inconsciente, como a vítima de um pai - mais geralmente de um homem - que não compreende nada de mulheres. Essas duas vertentes da posição histérica em relação ao pai têm algo em comum. Tanto numlado casoestá quanto economiza o seu próprio desejo: de um sujeitonoaooutro, desejo do outro, o pai, vítima de mulher que não o compreendeu; de outro, ele coloca-se a serviço da causa materna. É a própria prova de uma capitulação através da qual a histérica, renunciando a seu desejo, mobiliza-se prioritariamente sobre a questão do desejo do outro, quer ele seja deposto ou mal tratado. Mais freqüententemente, a histérica encontra-se ela própria "imobilizada" neste lugar, conseqüência de uma captura significante. A histérica é, com efeito, pega na armadilha de uma mensagem paterna que lhe significa um avatar de seu próprio desejo: seu desejo, o do pai, não encontra uma resposta do lado Nada mais é preciso para que tal alusão implícita mobilize a histérica para tentar tomar a seu cargo o desejo paterno insatisfeito. Ela pode assumi-lo de várias maneiras. Umdacaso relativamente em torno deporuma modiatitude paterna emfreqüente relação àorganiza-se sua filha. Evoquemos, exemplo, aquele s pais que ficaram distante s de sua filha, quan do ela era pequen a, e que se interessam bruscamente por ela, depois da puberdade, quando se torna adolescente. Outra forma de sublinhar que a filha encontra-se, então, diretamente interpelada pela dinâmica desejante do pai. É aliás quase sempre nesse momento que o pai se permite algumas confidências sobre seu próprio desejo, a saber, que ele não encontra uma resposta favorável em relação à mãe. Esta atitude reativa imediatamente toda uma via da problemática edipiana. A adolescente é potencialmente posta na situação de ter que reparar a insatisfação paterna. Mas ela só pode fazê-lo tornando-se cúmplice do mal-entendido no qual o pai a aprisiona. Por um lado, a filha é levada a ocupar um lugar de objeto possível do desejo do pai; por outro, a Lei intervindo, este lugar não pode aparecer de outra forma como um lugar de dissimulação. Desde o princípio, o equívoco, compartilhado por ambas as partes, exprimir-se-á por manifestações psíquicas estereotipadas. A filha não deixará de se lamentar por não compreender por qual motivo seu pai se interessa bruscamente por de um artifício psíquico sustentado pelo recalque, na medida em que a adolescente compreendeu perfeitamente o sentido da modificação da atitude paterna relativamente a ela. Todavia, sendo a mudança de comportamento muito ela só pode exprimir-se, na realidade, sob formas travestidas, o mais freqüentemente projetivas. A adolescente reclama, por exemplo, que seu pai se mostra atencioso demais com ela, especialmente em relação a seu corpo. Ela entra de bom grado na interpretação projetiva: um olhar do pai posto
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sobre ela torna-se imediatamente um olhar concupiscente. É também a época de uma produção rica em sonhos e através dos quais o pai aparece freqüentemente em posições exemplo mais freqüente é ainda a fantasia ou o sonho de um estupro. Existe, igualmente, todo um discurso ligado à servidão física. A filha reclama habitualmente da tirania que seu pai parece exercer quanto às imposições indumentárias, esportivas, e mesmo imposições comportamentais diversas. Trata-se aí de um material projetivo bastante claro, pois é o inverso do desejo que se manifesta sob uma forma ainda mais porque uma brecha foi aberta pela posição desejante do pai. De onde a indignação enganosa da moça, que encontra sua melhor medida em toda situação onde o equívoco histérico é consumado em presença de um terceiro. Lembremos o caso comum em que pai e filha compartilham uma cum plicidade de exibição tal, que terceiros são levados a supor que a filha bem poderia ser a namorada do pai. Certas expressões triviais lembram bem o sentido desse equívoco: "É sua filha? Parabéns!" Sabemos que os "parabéns" vêm freqüentemente trair uma outra proposição recalcada: "Que pena para você que seja sua filha!" Uma variante da situação precedente encontra-se, igualmente, na ânsia que têm certos pais em "apresentar" sua filha aos outros em todas as cir cunstâncias. Tal ânsia é sempre a confissão de um desejo inconsciente através do qual eles esperam que se possa imaginar que não se trata de sua filha. Examinemos agora o caso inverso, onde a mãe se permite confidências à filha sobre o seu próprio desejo insatisfeito. Mesmo a filha é solidária da confissão do desejo insatisfeito de sua mãe, o problema não muda em nada, na medida em que ela permanece ainda identificada imaginariamente a uma possível mulher do pai. Todavia, no caso presente, é sob a versão do protesto que o desejo travestido irá se pôr em cena. pai torna-se, então, objeto de um descontentamento radical. Ele aparece assim, aos olhos da filha, como o homem que não compreende nada das mulheres. Ele é um homem que tal mãe não merecia. que quer que ele diga ou faça permanece sempre aquém da questão. A filha é, assim, capturada no desejo histérico da mãe, devendo pena lizar-se pela infelicidade da mãe e sustentar todas suas fragilidades. A soli dariedade neurótica estabelece-se aqui no contexto de uma reparação cujo componente principal é uma homossexualidade inconsciente. Não é então surpreendente ver essa ambigüidade atuar na realidade sob a forma de um discurso de revolta e de repulsa em relação ao pai. discurso de revolta mobiliza-se a respeito de reprovações falocráticas que lhe são endereçadas; o discurso de repulsa recentra-se, ao contrário, sobre o corpo do pai. Proponho ilustrar esses diferentes aspectos da relação da histérica com o pai a partir de um fragmento clínico onde se vê, precisamente, conjugaremse esses dois aspectos ambivalentes com as consequências identificatórias que eles implicam.
Trata-se de uma moça que, com a idade de dezoito anos, desenvolveu bruscamente uma série de sintomas e de manifestações histéricas que deveriam l evá-la, alguns an os mais tarde, a seguir um tratamento psicanalítico . Precisemos sem demora o contexto no qual se situou esta eclosão psicopatológica, à luz de um certo número de eventos que pontuaram a adolescência dessa moça. Seu pai e sua mãe são professores que, embora ensinem disciplinas diferentes, trabalham no mesmo colégio onde ela cursou uma parte de sua escolaridade. Mesmo tendo podido evitar as aulas de sua mãe, não pôde deixar de seguir, por um ano, as aulas de seu pai, das quais guardou uma recordação um tanto quanto perturbadora. As aulas de seu pai às quais ela assiste confirmam bem rápido a seus olhos a reputação que ele tinha: a de um professor brilhante que seduzia seus alunos pela qualidade de seu ensino. Este fato só fez confirmar uma suspeita que ela já tinha: seu pai não merecia ter uma mulher como sua mãe, que era triste, caseira, e que não se permitia nenhum prazer. Outra maneira de dizer que ela parecia austera e pouco desejável, não sabendo apreciar as qualidades do homem com o qual tinha casado. Toda a infância e adolescência desta pessoa pareciam marcadas por essa desvalorização de uma mãe apagada, sem desejo e presa na servidão doméstica, ao lado de um pai incessantemente elogiado fora de casa. No final do ano escolar em que ela tinha sido aluna de seu pai, um evento inesperado precipitou os acontecimentos de uma maneira decisiva. Seu pai acabara de ser nomeado professor na única universidade da cidade. Ela não podia se decidir a tê-lo novamente como um de seus professores, pois desejava fazer seus estudos superiores na mesma disciplina que seu pai lecionava. Como reação, ela orientou sua escolha em direção a outros horizontes, notadamente decidindo começar um ciclo de estudos menos acadêmicos, mas cuja especialidade só era lecionada na faculdade de uma outra cidade universitária. Esta iniciativa, bem acolhida por seu pai, deveria, por outro lado, suscitar apreciações muito ambivalentes do lado materno, em particular expressas num lamento de abandono. Significando que ela iria a partir de agora ficar sozinha, essa mãe traduzia não simplesmente algo da posição vacilante de seu desejo, mas também contava com sua filha para sustentar sua própria insatisfação. Apesar deste apelo, a filha não reconsiderou sua decisão e deixou a casa dos pais depois das férias de verão. Seu pai ajudou-a a escolher sua nova casa e, a garantia de um apoio financeiro substancial, aproveitou a ocasião para lhe confiar: "Vai lhe fazer muito bem ficar separada da sua mãe!" Este comentário devia ser acolhido como convém, ou seja, como a confissão de que era preciso proteger-se desta mãe que o pai não desejava. Assim, esta jovem encontra-se capturada tanto de um lado quanto de outro: de um modo culpado em relação à mãe, de um modo cúmplice em relação ao pai. De fato, a sentença paterna não poderia deixar de se abrir sobre
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uma série de conjunturas inconscientes quanto ao desejo do pai e a falta de desejo da mãe. última recomendação materna viria catalisar esse dis positivo já bem carregado. Em uma carta à sua filha, ela faz a seguinte prescrição: "Agora que você está longe, eu não posso mais tomar conta de você, mas a previno que não é para contar comigo para cuidar dos seus filhos, se você os tiver. Você pedirá ao seu pai!" Essa recomendação era inquietante em mais de um aspecto. Significava implicitamente à filha que, se desejasse um homem, ela poderia esperar, naturalmente, que este lhe fizesse filhos, como tinha acontecido com ela mesma quando tinha desejado seu pai. Daí a pensar que seu nascimento não tinha sido desejado, foi um passo. Além disso, uma segunda mensagem estava implicitamente presente na recomendação materna: "Seu pai parece estar de acordo com que você deseje homens contra a minha vontade." É neste contexto que se dá sua partida do domicílio familiar. Seu primeiro ano de estudos universitários transcorre através de um modo de vida bem movimentado. Encontra uma sucessão de homens com os quais entretém relações complicadas e dolorosas. Por um lado, obedece à instrução imaginária da aprovação paterna; de outro, obedece incons cientemente à instrução materna: é frígida e acaba por ficar grávida. Avisa seu pai, que a captura imediatamente num segredo cúmplice: "Sua mãe não pode saber deque nada." Ele envia sua uma médica que conhece, assese encarregará de filha tudoafinanceiramente. A interrupção da gravidez efetua-se em boas condições clínicas. Todavia, certo número de alusões evocadas durante sua estadia no hospital terminam por fazer crer a essa moça que a pessoa que tinha se ocupado dela havia sido provavelmente amante de seu pai. Desde então, ela irá se sentir com pletamente prisioneira de um segredo em relação ao pai. Ela ainda não tinha compreendido que seu pai era, manifestamente, um cujo gozo consistia em agir de tal forma que ela fosse informada do desejo dele. A circunstância do aborto prestava-se muito bem a essa ocorrência perversa; a ligação do pai com essa médica transmitida sob a forma da alusão e do equívoco, ou seja, de uma certa maneira como um segredo. pai, assim, sabe que a filha sabe; mas ele sabe também que o que ela sabe não poderá dizer a ninguém, nem a ele, nem à sua mãe. Em outro âmbito, essa manipulação perversa está na srcem de um inconsciente devastador. De fato, tudo se passa como se o pai tivesse dado a entender à filha que ele tinha direito de olhar seu corpo, e mesmo que tinha acesso a ele. processo é transitivo: o pai tem acesso ao corpo da médica; a médica tem acesso ao corpo da filha; então, ele pode ter acesso ao cor po da filha. Além disso, um véu havi a sido levantado quanto à sexualidade extraconjugal do pai. fantasma de sua impotência, suspeitada por sua filha, caía: a prova disso era o testemunho de uma outra mulher. Todavia, impondo-lhe esta revelação pela via de um equívoco, seu
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pai condenava-a ao silêncio e a capturava, a partir de então, em uma situação sem outra solução além da saída A partir de então essa moça não poderá mais desejar um homem sem se esforçar em pressentir se seu desejo por ele está de acordo com o desejo de seu pai; dito de outra forma, se sua "escolha de objeto" é adequada ao que ela imagin a da aprovaç ão paterna. Ela se esforçará, ent ão, para identificarse, enquanto mulher, às mulheres que supõe que seu pai deseja. Inversa mente, os homens que ela desejará deverão ser identificáveis, mais ou menos, ao homem que é seu pai. Toda a dinâmica do desejo é assim paralisada. Não somente ela jamais poderá identificar-se com um modelo ideal de mulher, correspondente ao desejo de seu pai, como nenhum homem que encontre jamais corresponderá às imposições projetadas sobre o que deveria ser o espécime susceptível de convir idealmente a seu pai. Tanto num caso quanto no outro, observamos este sintoma característico da histérica que se desgasta, pelo jogo das iden tificações, em tender a um ideal de a fim de sempre insatisfeita; insatisfação que evita a realização imaginária do incesto para melhor mantê-lo. Além disso, só resta a essa moça uma solução de compro misso: ficar o mais perto possível do desejo paterno, para tentar desfazer o impasse no qual está engajado seu desejo. Quanto mais for filha de seu pai, mais se adaptará ao ideal de mulheres que supõe que ele deseja e, conse qüentemente, mais se aproximará fantasmaticamente do homem ideal que imagina que seu pai deseja para ela. A complacência perversa do pai não deixará de reforçar essa proble mática histérica na medida em que alimentará o fantasma/fantasia de sua filha, sendo conforme a ele na realidade. Ele irá, efetivamente, introduzi-la de múltiplas formas no campo de sua vida cotidiana pessoal: apresenta-a a todos seus amigos; pede que o acompanhe em seus cursos, ou que o encontre na faculdade; confia-lhe missões e negociações delicadas junto a seus colegas, etc. Tudo em conformidade. Manifestamente, o fantasia do pai é procurar criar em torno de si um certo equívoco quanto à identidade de sua filha. Tanto mais ele goza, quanto mais, em certas ocasiões, o engano se opera: verdadeiramente que ela é sua namorada. Em resposta, sua filha deixa-se levar facilmente por esse equívoco, e seu júbilo consiste, o mais freqüentemente, em levar a dúvida o mais longe possível, antes de revelar sua verdadeira identidade. Não é por acaso que esta estratégia é eletivamente mantida sob o olhar ou cúmplice das alunas de seu pai. Identificamos aí a concretização vingativa de uma rivalidade imaginária em eco com alguns eventos do notadamente com a época em que, ela mesma aluna de seu pai, sofria com a sedução devastadora que ele exercia sobre as moças de seu curso. Esse jogo lamentável durará mais de um ano. Irá até ocorrer que, na presença de terceiros, o pai e a filha se divirtam em destituir a mãe, em
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la pela sua neurose, apresentando-a como mulher radicalmente indesejável, junto à qual não seria bom viver e com a qual eles teriam sofrido. Em um campo tão minado pela posição histérica da filha e pela perver são do pai, um evento irá alterar completamente o equilíbrio do desejo dos dois protagonistas. A filha deixará, violentamente, de ser solidária com a complacência perversa do pai e, como é freqüente no caso da histeria, os investimentos identificatórios irão se inverter de tal forma, que a filha apoiará a partir de então a solidão e a infelicidade da mãe, estabelecendo uma aliança com ela contra o pai. Essa inversão, mais uma vez, é devida às iniciativas perversas do pai, indicando, assim, até onde um pai pode ser conduzido a gozar com sua filha, na medida em que levemos em conta a diferença que existe entre o prazer e o gozo. Neste caso, temos uma ilustração plenamente representativa da maneira como o gozo de um contribui diretamente para induzir algo de mortífero no outro. evento evocado irá se passar em dois atos: um ato precursor durante o qual o pai provará a dimensão incestuosa inconsciente que mantém com sua filha; e um segundo ato, que lhe permitirá sancionar o poder de gozo que acredita possuir em relação a ela. De forma inesperada, esse pai vai, uma noite, à casa de sua filha e pede-lhe hospedagem naquela noite, sob o pretexto de uma missão profis sional a ser executada de forma urgente na manhã seguinte. A de espaço leva a filha a ceder sua cama ao pai e a obriga a arranjar um canto provisório para coabitar com ele durante a noite. Esta situação de promiscuidade não deixa de mobilizar todo um cortejo de fantasias, imediatamente recusados em benefício de longas horas de De manhã cedo, eles são acordados pela intrusão de uma jovem - uma aluna do pai - que a filha identifica imediatamente como uma de suas antigas colegas de classe do final do colégio. Essa confrontação matinal é decisiva por duas razões. De um lado, é insuportável porque a filha vê, imediatamente, essa intrusão como uma verdadeira provocação em relação à complacência erótica imaginária que ela entretém com seu pai. Por outro, é inaugural no sentido de que a natureza desse elemento terceiro irá desmobilizar bruscamente o investimento alienante que ela alimentava em relação a esse pai sedutor. Como ela desconfia que essa intrusa é a amante de seu pai, este, mais contente do que incomodado com essa confrontação, esforça-se em escla recer as coisas junto à sua filha. Através de expressões tanto circunstanciais quanto alusivas, chega a confirmar suas suspeitas. Totalmente subjugada por essa armadilha perversa, a filha identifica-se, num primeiro momento, com sua rival e lhe oferece a casa, convidando-a a partilhar o café da manhã. Todavia, a amenidade da situação irá rapidamente ser quebrada por uma intervenção do pai. Antes de se despedir da filha, ele irá se permitir uma confidência cujos efeitos se mostrarão fatídicos. Como a mãe iria
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telefonar nesse dia, o pai não revelar às investigações maternas tanto a existência dessa visita quanto o objeto de sua "missão", e ele parte logo em seguida acompanhado de sua jovem pupila. Ela não trai o segredo, mas essa solicitação termina por provocar, logo em seguida, um desinvestimento psíquico radical. Seu pai aparece-lhe bruscamente como um adolescente enamorado de uma estudante; operando a destituição fálica, ele é fantasmado como um ser impotente, incapaz de assumir seu lugar de homem junto a uma mulher e, conseqüentemente, desmascarado em suas propensões incestuosas. Ter uma ligação com uma pessoa da mesma idade que sua filha, é, metaforicamente, ter uma ligação potencial com sua própria filha, isto é, uma criança. desinvestimento do pai irá em princípio induzir uma flutuação característica. Essa moça provocará jovens colegiais com os quais só terá relações eróticas decepcionantes. Encontramos, evidentemente, através dessa escolha, um ponto de identificação masculina, isto é, neste caso, com o pai, que mantinha um comércio amoroso com jovens universitárias. Uma nova etapa é atravessada, pouco tempo depois, pela via de uma história de amor tão breve quanto decisiva. Ela subitamente apaixona-se por uma professora da universidade. A relação começa e prossegue, em princípio, de uma forma platônica. Mas, por causa de um convite, os eventos Após uma noite bem "regada", a professora anima-se e "vio lenta", de certa forma, a jovem estudante. As duas parceiras parecem ter, essa noite, compartilhado uma experiência de prazer que era, até então, desco nhecid a para ambas. Mas a escapada h omossex ual deveria f indar muito rapidamente. A professora, apaixonada por sua aluna, mostrava-se cada vez mais exigente no exercício de suas privacidades; a aluna, ao contrário, mostrava disposições cada vez mais contidas, de tal forma que, ao cabo de um mês, os encontros interromperam-se Vários fatores justificam de forma significativa essa passagem ao ato homossexual. De um lado, a decepção erótica inconsciente dessa mulher em relação a seu pai, que a havia preterido por uma antiga colega de classe. Por outro, a identificação masculina como pai encoraja-a a alguns excessos amorosos com adolescentes. Enfim, a identificação com o objeto suposto do gozo materno, que a precipita em uma relação homossexual com uma mulher vinte e cinco anos mais velha do que ela. ciclo é momentaneamente concluído. Ela pode, então, assegurar, junto à mãe, uma posição de reparação em relação à tirania paterna. Naturalmente, a mãe aparece, de imediato, como uma vítima a apoiar em face da traição masculina. À imagem de sua mãe e em solidariedade à infelicidade feminina, esta jovem compraz-se, então, na contrição sacrificai. Na primeira oportunidade, ela retorna ao domicílio dos pais. Interrompe seus estudos e aceita um miserável emprego nas piores condições de exploração para levar triunfalmente um magro salário que oferece à sua
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mãe em sinal de expiação. Assim sela-se entre mãe e filha o pacto de uma existência dolorosa e austera. Todavia, as confidências seguem em bom ritmo. A mãe acentua sua queixa de mulher incompreendida, mas devotada à servidão familiar e conjugal. A filha contribui confiando de bom grado à mãe o quanto sua experiência com os homens mostrou-se decepcionante com a homossexua lidade e filha decidem, de comum acordo, expulsarinconsciente o intruso doajudando, domicílio mãe familiar. Durante um almoço de domingo, o pai é levado a pronunciar-se sobre suas infidelidades. Mas isso foi fazer pouco caso da capacidade do gozo que animava o culpado. Este se torna o mestre de uma magistral reviravolta, chegando mesmo a convencer sua mulher de que ela estava doente. sua ambivalência incestuosa em relação à filha, ele lhe sugere fugir dessa mãe doente que precisa de cuidados. A dialética paterna produz seus efeitos e, na semana seguinte, a filha submete-se e volta para sua própria casa. Quanto à mãe, desidentificada de qualquer lugar, retorna às influências de seu marido, aceitando tentar compreender-se com a ajuda de um psicoterapeuta que ele lhe aconselhou. Alguns meses mais tarde, essa iniciativa terapêutica transforma-se em uma catástrofe, quando ela vem a saber que o terapeuta ao qual se confia éelaum amigo íntimo de seu marido. uma do descompensação volta à servidão doméstica mais Após destruída que nunca. depressiva, A filha, por seu turno, é vítima de somatizações histéricas impressio nantes. Depois de duas hospitalizações provocadas por afecções abdominais sem etiologia aparente, mergulha num estado grave. Seu pai, no entanto, conseguirá desmobilizar este enquistamento neurótico pela via de algumas mediações perversas das quais ele tem o segredo. Entrando completamente nas divagações imaginárias de sua filha, estrategi camente seu discurso de simulação quando ela lamenta achar-se feia e sem interesse para os homens. Solidamente encorajada nesta destituição narcísica alimentada pelo discurso paterno, ela só encontra saída na eclosão de uma fobia que se cristaliza em torno de seu nariz, condenando-se, assim, ao enclausuramento puro e simples. Diante desse pedidoarcar de socorro pai salvadora intervém, intervenção como tem que ser, com os histérico, custos de ouma cirúrgica estética. mal-entendido neurótico é consumado e a filha apressase em operar o nariz com grandes somas de dinheiro. Mas a metáfora da castração mutilante não deixou de produzir seus efeitos. Ao sair do hospital, ela recusou-se, energicamente, a ver seu pai. Muito alarmada com esta cirurgia, a mãe, por seu lado, ocupou-se ativamente de sua filha e, sob pena de represálias assíduas, o pai foi intimado a deixar o domicílio conjugal. Apoiada pelo imaginário da protestação fálica materna, a filha ligou-se no vamente de forma a ela, contra ele. Durante vários meses, as recriminações da filha farão coro às da mãe. Neste clima de lamentação de vítima, a filha, todavia, chegou a encontrar
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um homem. ligação estabelece-se favoravelmente sob os auspícios da bênção materna. Mas, outra vez, o empreendimento amoroso acaba logo. Com a maior surpresa da mãe, sua filha informa-a de sua desilusão senti mental, não somente que esse homem era quase impotente, mas também que ela é totalmente frígida - frigidez, parece, devidamente instalada desde que seu pai, tendo-a visitado, foi procurado em sua casa que ela por suaprópria jovem tinha namorada. sido sempre A mãefrígida. aproveitou Tal confissão a ocasiãonão para fez assegurar-lhe senão reforçar a identificação histérica da filha com a mãe. De agora em diante solidárias em suas decepções sexuais junto aos homens, a frigidez é assim orquestrada, de ambas as partes, como um sintoma endereçado ao pai. Uma nova etapa devastadora será ultrapassada nesta epopéia neurótica familiar. Mais uma vez o pai esforça-se em capturar sua filha nas malhas de uma manipulação perversa; uma vez mais, a complacência histérica inconsciente da filha responde no âmbito imaginário. Na ocasião do aniversário da filha, o pai retoma o contato com ela e a convida para jantar "tête à tête". No decorrer desta noite, ele conduz a conversa para sua mulher, que não via havia um certo tempo. A filha não deixa de contar-lhe as novidades que ele se esforçava por obter. Ela insiste, em particular, sobre os comentários que elas trocaram no que concerne à frigidez de ambas. Não era preciso mais nada para que ele brandisse o espectro das más influências neuróticas que ela sofre por parte da mãe, que, evidentemente, precisa tratar-se. A sugestão perversa segue seu caminho e, em último caso, o pai deixa o nome de um psicoterapeuta com sua filha. Convencida por estas ela fala à sua mãe, sem demora, de suas inquietudes pessoais quanto a seu estado de saúde e a aconselha, expressamente, a consultar o terapeuta indicado. Uma segunda vez, a mãe inicia um tratamento psicoterapêutico do qual ela parece tirar imediatamente grande benefício. Pouco tempo depois, o pai confessa à filha que esse terapeuta é um de seus melhores amigos e que lhe informa regularmente do conteúdo das sessões de psicoterapia de sua mulher. Eles discutem em conjunto e examinam cada uma das intervenções que parecem as mais apropriadas seu caso. Tal confissão exerce um efeito terrivelmente destrutivo sobre a filha, que não pode se impedir de vivenciar esta manobra perversa de seu pai como uma violação tanto mais mortífera por ela ser prisioneira de sua identificação inconsciente com a mãe. Além disso, essa transgressão perversa terá conseqüências temíveis quando essa mulher decidir efetuar um tratamento analítico por conta própria. que dizer do terapeuta e do gozo que o animou a cada instante neste empreendimento mortífero? Bem ou mal, a mãe prossegue, entretanto, sua terapia neste simulacro analítico. As intervenções "terapêuticas" teleguiadas por seu marido provocam
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efeitos consternadores. Ela deprime-se e desenvolve manifestações somáticas cada vez maiores. Ligada por esse segredo perverso do pai, mas cada vez mais identificada à mãe doente, a filha assiste completamente impotente a este cataclisma. Termina, todavia, por imaginar que seu pai quer sua própria morte e que ele irá por procuração, destruindo sua mãe pouco a pouco. Confiante na descoberta desta verdade, ela convoca seu pai a fim de comunicar-lhe. encontro é recalcado". tempestuoso. irrita-se e o trata de "homossexual A reaçãopaido esquiva-se; pai não se afazfilha esperar: bate nela e tenta violentá-la. Ao fim deste episódio surpreendente, a filha romperá definitivamente toda relação com o pai. Não podendo sentir-se mais culpado, o pai tentará desculpar-se do que ele chama um "mal-entendido". A única desculpa aceita pela filha consistirá em lhe impor a compra de seu silêncio, ameaçando denunciá-lo caso ele não lhe desse, doravante, um rendimento mensal confortável. Algumas semanas mais tarde, essa jovem começou uma análise e esta chantagem continuou até o momento em que me informou que pagava suas sessões de análise com esse rendimento paterno. então, de uma maneira muito firme, a fim de que ela pudesse honrar o pagamento de sua análise própria Para esse fim, odeste tratamento foi suspenso durante umcom mêssua e meio, atérenda. a resolução material problema. A partir deste momento, o trabalho analítico continuou e prosseguiu de um modo fecundo, se bem que difícil e doloroso. Em dois anos, essa mulher pôde, todavia, reencontrar um equilíbrio psíquico satisfatório e estabelecer, enfim, uma relação amorosa serena e viva com um homem. Ela soube manter uma prudente distância de sua mãe. Quanto a seu pai, jamais o reviu, ao menos até o fim do tratamento.
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desejo do obsessivo em confronto com as mulheres
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m dos comportamentos mais notáveis que observamos na neurose obsessiva é, sem dúvida nenhuma, a ao menos quanto ao aspecto em que esta manifestação - aliás pouco freqüente melhor a ambivalência específica que o sujeito entretém em relação à lei do pai. Com efeito, o controle onipotente que mantém em relação ao gozo de seu objeto só pode confrontá-lo, cedo ou tarde, à transgressão. Por outro lado, a forte influência da Lei e a necessidade de se referir a ela para escapar à culpabilidade dos impulsos libidinais inconscientes alimentados em relação à induzem, inevitavelmente, uma tensão de conflito. É também a razão que nos leva comumente a observar como os obsessivos investem, freqüentemente, uma energia imensa para tentarem ser perversos, sem jamais É raro que o obsessivo trangrida verdadeiramente alguma coisa na realidade. Essencialmente, seu "flerte" com a transgressão dá-se sobre a cena onde ele pode dar-lhe livre curso, com exceção, às vezes, do terreno sexual e de suas relações amorosas. A figura mais freqüente dessa transgressão apresenta-se à luz de seu contrário, no sentido mesmo de um destino da pulsão que Freud designa precisamente: "transformação em seu Com efeito, o obsessivo
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apresenta-se, normalmente, como um fervoroso adepto do respeito às regras e às leis. Em nome de uma adesão incondicional ao rigor moral de um modo faz-se servo das virtudes e da pertinência das normas estabelecidas. Seu cuidado escrupuloso de honestidade em relação a tudo justifica, assim, toda a interessante tolice de que dá mostras em certas circunstâncias: "Antes morrer que ceder um palmo de terreno!" Eis o domínio onde seus investimentos pactuam sem reserva com o grandiosofavorito e o martirológio. Todavia, essa incondicional posição legalista dos mantém sua grandeza na proporção inversa do desejo inconsciente de transgredi-la. Seu desejo obstinado de proteger a ordem e as virtudes só tem comparação, freqüentemente, com a ausência total de discernimento para tentarem saber o que protegem na realidade. Assim, nascem as manifestações de defesa estereotipadas que lhes são caras. A título de exemplo, evoquemos o isolamento. Essa estratégia defensiva tem por missão essencial desconectar um pensamento, uma atitude, um comportamento, de uma série lógica na qual se inscrevem. Assim, isolado de seu contexto, o elemento psíquico em questão é, ao mesmo tempo, neutralizado afetivamente. Localizam-se, freqüentemente, estes processos de isolamento através pausas, dos devemos estereótipos e dosprocessos rituais cultivados pelos obsessivos. Entredas outras coisas, a esses de isola mento o perfil muito controlado do obsessivo, atitude inepta que o leva a permanecer senhor de si mesmo em qualquer circunstância, inclusive, até principalmente, durante cataclismas. Uma das provas mais significativas permanência ativa desse processo de isolamento no obsessivo quadro do tratamento sob o aspecto quase constante de Ele resiste, mais freqüentemente, ao processo da associação livre, que é o campo por excelência em que o sujeito deve ceder a toda tentativa de controle e domínio de seu dizer, ou seja, ao surgimento inesperado dos afetos que poderiam encontrar-se associados. obsessivo opõe-se a isto, contra tudo e todos, em benefício do relato e das racionalizações. Como observa justamente Pierre "Esses pacientes não suportam a atenção flutuante do analista e não toleram serem escutados para serem ouvidos. A imposição exerce-se sobre a neutralidade sentida como suspeita e que deve, então, ser neutralizada. Tanto quanto a anulação retroativa e o isolamento mental, o discurso obsessivo tende a dissuadir o analista de constituir por suas próprias construções uma memória do Pierre
prossegue assim:
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"Certos pacientes (geralmente nas sessões face a face) podem contar, concretamente e de forma bem minuciosa, o que "aconteceu" nos dias precedentes. Essa fala chama-se "relato", mas ela não chegará a interiorizar para um um tempo narrativo. Ela testemunha uma vigilância descritiva tal, que no limite é insustentável à escuta. Dir-seia que o paciente fala com uma insistência tal, capaz de destruir no analista toda capacidade de dar vida à Essa defesa encontra sua repercussão mais manifesta no culto das ati tudes estereotipadas. obsessivo é, com efeito, um prodigioso inquisidor da ordem do mundo, incluindo ele mesmo, a partir do momento em que cultiva a sábia arte de objetivar-se abstratamente desta ordem das coisas exteriores que o cercam. A minúcia e a acuidade que ele emprega nesta aptidão de observação só pode sustentar-se mediante esta possibilidade de dissociação do registro dos afetos. Observamos as repercussões mais signi ficativas desta atitude no espaço do tratamento: "É como se o paciente negasse ao analista a qualidade de ser um suporte de interlocutor psíquico, ao mesmo tempo em que se mostra extremamente ligado oà presença de de suaque pessoa. Por seu lado, o analista tem freqüentemente sentimento o pensamento obsessivo é não somente uma via de neutralização da transferência no tratamento e de colocação num estado de impotência de sua capacidade interpre tativa, mas também de ser "dublado" por um "controlador" que não é outro senão o raciocínio obsessivo do Quando existe, sua capacidade de humor não se liga a outra coisa que não à profundidade de um acordo, do qual eles sabem que fazem parte, entre o registro dos afetos internos isolados e a necessidade de demonstrálos um pouco, apesar de tudo. Neste sentido, o humor, que freqüentemente participa da ironia, é uma maneira cômoda de descarregar os afetos sem jamais deixar seu posto de supervisão de si mesmo. De fato, o obsessivo só pode falar si mesmo na medida emdeste que fala de que um éposto de observação neutro, de de onde se diverte às custas outro obsessivo mobiliza, igualmente, um outro dispositivo de defesa particularmente eficaz: a anulação processo pelo qual ele recusa pensamentos ou atos a fim de fazer como se eles não houvessem acontecido. Identificamos aí seu cuidado constante de minimização. Além dessa estratégia demonstrar uma alienação prodigiosa, deixa pressentir, por outro lado, a que tipos de ofensas expõe-se o obsessivo. A anulação retroativa é um mecanismo compulsivo de uma eficácia ainda maior porque consiste em pôr em ato um comportamento diretamente oposto àquele que o sujeito busca anular. Várias vezes, Freud insistiu no fato de que esse processo de defesa punha em evidência os elementos
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conflituais permanentes nos quais se dabatia o obsessivo, ou seja, a oposição arcaica entre o amor e o ódio em relação a um mesmo objeto de investimento. Observemos todavia que, mais freqüentemente, é o pólo do ódio que se esforça para anular o do amor, pela via de um duplo mecanismo de inves timento e de desinvestimento que é característico da economia obsessiva: fugir de seu desejo e anulá-lo, na medida do possível, a cada vez que ele se encontra engajado em relação a um objeto. Esta dialética específica do desejo obsessivo manifesta-se melhor nos investimentos de objeto de Nesse campo, o obsessivo dá sempre o melhor de si, isto é, de forma paradoxal, simultaneamente tudo e nada, no sentido em que ele pode sacrificar tudo, ao mesmo tempo em que não pode perder nada. A estratégia do desejo obsessivo gira, continuamente, em torno da questão do gozo do outro. É em relação a esse gozo que ele não pode perder nada e procura, então, controlá-lo e neutralizar todos os seus sinais exteriores. Nada deve alterar-se nesse nível. Assim, para que nada se altere, nada deve gozar. Se nada goza, tudo vai bem, na medida em que o obsessivo, assim, não dá nada, mas também não perde nada. Ao contrário, a partir do momento em que o outro goza, ele está pronto a sacrificar tudo, isto é, a saciar totalmente, para que as coisas voltem a seu estado inicial. Esse insólito dispositivo do desejo é completamente sobredeterminado pela problemática da perda, tão central na lógica obsessiva, porque remete arcaicamente à questão da falta. Não perder nada, isto é, evitar ser confrontado com a dimensão da falta é, antes de tudo, tentar neutralizar o desejo, pois é precisamente a que o constitui e o relança como tal. Além disso, por pouco que a dinâmica do desejo se encontre assim sufocada, mais nada justifica, então, a articulação da demanda. Com essa finalidade, no obsessivo, o objeto desejado deve então ser investido de tal forma que todo este dispositivo de neutralização jamais possa ser posto em dúvida. Para fazê-lo, o objeto em questão é retido em uma posição ideal: o lugar do De fato, a máquina desejante do obsessivo só pode funcionar à toda força - a fim de que nada se mova - à condição sine non de que o objeto amável e amado faça-se de morto. Visto que o desejo é sempre desejo do desejoa do se opois outro deseja,não o obsessivo fica, então, tranqüilizado quanto seuoutro, desejo, ele também deseja. Assim, sela-se o pacto inconsciente que o anima em sua relação amorosa com o outro. Convém, sobretudo, que o outro não demande, pois a partir do mo mento em que ele demanda, significa que deseja. É uma outra forma de dizer que não lhe deve faltar nada, de onde a ordenação totalitária do universo do outro através da qual o obsessivo se esforça para controlar e dominar a morte de sua parceira amorosa desejante: "Não lhe falta nada... Ela tem tudo em Ela não tem necessidade de tudo nos conformes. Locuções estereotipadas que nos lembram que o objeto de amor não tem que pedir nada, que está satisfeito, ao abrigo das necessidades, preso na sua
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obsessivo tem, de fato, um gosto desmedido pela encarceração amo rosa. Ele não mede esforços para que seu objeto de amor tenha os privilégios de uma prisão de primeira classe. e a mumificação não têm preço. Ele não recuaria diante de tal luxo para que o outro fosse honrado em seu preciso lugar de morto. Todavia, sua parceira não se mostrar contente seria algo mal recebido. obsessivo é sempre muito sensível ao reconhe cimento presta seufosse objeto mais nadadas se, homenagens estando assimque morta, ela anão felizdeemamor. sê-lo. Não Esta faltaria seria a mais das ingratidões. Nesse caso, como em outros, o obsessivo tem sempre um grande senso de Geralmente, a estratégia amorosa do obsessivo consiste em apropriarse de um objeto vivo para transformá-lo em objeto morto e velar escrupulo samente para que assim permaneça. É sob esta única condição que ele admite encontrar seu objeto de amor e fomentar o projeto de estabelecer alguma relação com ele. No mais, para dar a exata medida, ele pode esforçarse para enobrec ê-la, tornando-a feia. Eis uma d as homen agen s mais re finadas que ele pode lhe prestar, pois, mesmo sob seus dotes pouco vantajosos, ele ainda a ama, isto é, tanto melhor que o objeto seja cada vez menos desejável. Além disso, quanto mais a parceira mostra-se mais ela prova que está morta; então, a garantia imaginária de uma possessãoa ilimitada do objeto em confirma-se relação a um rival sempre potencial. Evoquemos, esse propósito, o pudor afetado de certos obsessivos que levam de bom grado suas parceiras femininas a se vestirem deselegantemente, com uma indumentária tal qual uma armadura, composta de tal forma que nunca haja algo de comprometedor, em nome de um cortejo de racionalizações concernentes aos princípios mundanos do bom gosto e do alinhamento. Por menos que um homem ainda tenha a audácia de dar uma olhada em tal objeto blindado, é assim comprovado que a mulher é sempre venal. Nem todos os obsessivos tomam a decisão deliberada de deixar sua parceira amorosa não-desejável. Alguns permanecem, apesar de tudo, sensíveis a uma certa dimensão de erotização do corpo do outro, mas com a ressalva de que ele deve, entretanto, ser rebaixado à condição de puro e simples Trata-se, então, do objetodeque mostra, que se exibe, com a única objeto. finalidade de que o essencial seuseesplendor brilhe para fazer reluzir seu Mas então, mais que nunca, é importante que o outro esteja completamente apagado, a saber, radicalmente morto. É a condição exclusiva que o autoriza a pretender existir em relação aos outros. De qualquer forma, o investimento no corpo do outro não ultrapassa o do carro esporte. De fato, bem sabemos que a condição ideal de tal veículo é que ele não se mova, ou quase, a fim de se ter o prazer de admirar o proprietário. Outros obsessivos afetam o mesmo tipo de adesão pela expressão feminina "grande esporte", mas sob a perspectiva de veículo de competição intelectual. No máximo, trata-se de um deslocamento metonímico da
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carroceria ao motor. Nesse caso, é então a erotização do cérebro do "animal de concurso" que interessa, com a reserva de que seja inexoravelmente exorcizada toda veleidade de erotização do corpo. Tanto num caso quanto no outro, nada muda na medida em que a questão do desejo deve permanecer fundamentalmente letra morta. Todavia, cedo ou tarde, o obsessivo não deixa de ter a experiência crucial de um morto que não pode mais fazer-se de morto. Além disso, a especificidade desses mortos é que quanto mais eles estão mortos, melhor eles ressuscitam. Ora, estas ressurreições, por menores que sejam, são sempre anunciadoras de grandes cataclismas, ou seja, de momentos em que o obsessivo fará um pacto com o grandioso da derrota infantil. De fato, assim como nada é mais tranqüilizador e amável que um morto feminino, nada é mais inquietante e odioso que uma mulher viva, isto é, uma mulher que deseja, que demanda e que obsessivo pode suportar tudo, sem medida e sem limite, exceto uma única coisa: que o outro sem mais que o outro feminino possa ter o despudor de gozar sem sem seu quer sem que e l e participe de alguma forma. Não há nada de mais intolerável do que uma mulher que ouse contestar um estatuto de morto tão confortável, em a todas convenções estabelecidas. É o mundo de pernas paradesprezo o ar! Uma mortaasque goza é uma traidora ainda mais odiosa, porque deseja. Com que direito? direito que impõe necessariamente ao desejo de cada um ser submetido à lei do desejo do outro, precisamente o que o obsessivo não quer saber. gozo do outro feminino induz, no obsessivo, uma inevitável agitação, destinada a ter novamente em suas mãos o controle das operações, de tal modo que as coisas fiquem em ordem, isto é, com morte do desejo. Um dos aspectos mais impressionantes desta efusão exprimese habitualmente na tendência ao sacrifício, à qual ele pode aderir sem limites. obsessivo torna-se, assim, pronto a todos os atos, todos os esforços; ele se desgasta em homenagens, as mais audaciosas, e está pronto a assumir os projetos mais inesperados com o único fim de que o outro volte a ser "seu" objeto; um morto que não goza mais. Ele pode, então, testemunhar uma extraordinária generosidade para arecuperar estedomorto reviver, o essencial sendo reconquistar apropriação objetoque quetende escapaa e remete à perda. Singularmente, o obsessivo pode tornar-se, nessas circunstâncias, mais histérico que um autêntico histérico, na medida em que se torna capaz de se identificar caricaturalmente com o que ele imagina ser o objeto do desejo do outro. Evidentemente, o objetivo visado através dessa servidão histérica não somente deixa de ser alcançado, como produz, freqüentemente, um efeito radicalmente inverso, no sentido de que o objeto não é, de forma alguma, reconquistado. Esta alteração levada a cabo sob a forma da agitação servil tem, geralmente, como conseqüência afastar ainda mais "seu" objeto. De
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fato, nessa ocasião, como em várias outras, o obsessivo engana-se tragi camente quanto à estratégia, agindo em sentido inverso ao de seus interesses. Com efeito, a servidão sacrificai não cessa de confirmar aos olhos do outro que é preciso, sobretudo, não perder nada. Assim, quanto mais o obsessivo se esforça em ser tudo para o outro, mais ele lhe aparece como não sendo nada. Ora, o que interessa, antes de tudo, é que um lugar seja concedido à falta, sem a qual o desejo não pode sustentar-se. É nesse sentido que o obsessivo se desqualifica: todas as tentativas de controle, todas as consolações e outros pactos de boa vontade não mudarão nada. A experiência cotidiana mostra, aliás, que a parceira feminina nunca se engana. Exceção feita, todavia, quando o outro encontra, nesta "reabilitação" sintomática do obsessivo, os melhores argumentos para dinamizar sua neurose pessoal. Isso explica, em grande parte, a afinidade "constitutiva" de certas par ceiras femininas histéricas para com a esterilidade devastadora das torpezas obsessivas. Como sempre, em tal encontro, uma desgraça nunca vem sozi Elas atuam melhor em conjunto.
NOTAS Este tema da "transgressão no obsessivo" foi igualmente abordado em minha obra Structure et perversions (Paris, Denoël, col. "L'espace analytique", 1987, cap. XIII: "Le rapport aux femmes. Le défi. La transgression", pp. 186-187), em perspectiva de diagnóstico dife rencial. Publicado em língua portuguesa sob o título Estrutura Porto Alegre, Ed. Artes Médicas, Série Discurso Psicanalítico, 1991, cap. XIII: "A relação com as mulheres. desafio. A transgressão", pp. 130-131. 2. Haveria bastante interesse em consultar o conjunto dos artigos dedicados a esse tema da neurose obsessiva por A. Abelhauser, P. F. D. Lachaud, I. Roublef, R. Tostain, sob o título "A neurose obsessiva e sua clínica", in Esquisses psychanalytiques, 20, março de 1994, pp. 3. Ver notadamente, sobre esse ponto, R. Dorey, "Problématique obsessionnelle et problématique perverse.deParenté et divergences", La B.névrose obsessionnelle. Monographies de la Revue française psychanalyse, sob a direçãoin de e Couvreur, Paris, P.U.F., 1993, pp. 87-105. 4. Ver S. Freud, "Pulsion et destins des pulsions", J.-B. Pontalis, Paris, Gallimard, col . "Idées",
in 154, 1981, pp. 25-26.
J. Laplanche,
5. P. organe psychique hypocondriaque. Traitement psychique autocratique", in La névrose obsessionelle. Monographies de la Revue française de psychanalyse, op. cit., p. 109 (grifo do autor). 6.
nota 2 (grifo do autor).
7.
p. 122 (grifo do autor).
8.
Dor, Structure et perversions, op. cit., cap. XIII, pp.
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9. A propósito da relação do desejo do obsessivo com a morte, ver S. "La cité enchantée ou le doute: une question d'amour" (1955), in Rompre les charmes. Recueil pour des enchantés de la Paris, InterÉditions, pp. "La mort dans la vie de l'obsédé" (palestra proferida na sociedade francesa de psicanálise, 28 de maio de 1956), in La psychanalyse, 2, Mélanges cliniques, P.U.F., pp. 111-140, retomado sob o título "Jérôme ou la mort dans la vie de l'obsédé", in Démasquer le réel. essai sur 148, 1971, pp. 121-146; "Philon ou en psychanalyse, Paris, Seuil, col. "Points", l'obsessionel et son désir" (conferência proferida no "Groupe de l'évolution psychanalytique" [Grupo de evolução psicanalítica] em 25 de novembro de 1958), pp. 147-167.
7 Manifestações perversas em um caso de fobia
A
dimensão propriamente complexual do Édipo - isto é, conflitual pode relacionar-se com esta mini-tragédia psíquica no curso da qual a criança irá elaborar a investidura transcendente do pai simbólico a partir do pai real e via figura do pai Dito de outra forma, nenhum pai real poderia receber a investidura de pai simbólico sem a mediação desta entidade fantasmática que é o pai imaginário. A instância do pai simbólico resulta somente do investimento de uma
função, nasemedida em que aem"triangulação tem sentido ralmente a consideramos referência à edípica" unidade só fundadora que aestrutu ordena: o objeto fálico. Como o falo constitui o centro de gravidade da função paterna, um pai real chegará a assumir a representação simbólica na medida em que saberá "dar (Lacan), num dado momento, de que pode atualizar para a criança esta incidência fálica; isto é, fazer valer sua atribuição suposta como o único agente regulador da economia do desejo e de sua circulação em relação à mãe e à criança. Disto resulta que nenhum pai real é detentor ou fundador da Lei. No máximo, ele é o embaixador, a partir do momento em que sabe fazer-se reconhecer como pai simbólico, tornando-se seu depositário legal. Em con-
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seqüência, a dimensão do pai simbólico transcende a contingência do homem real. Sendo seu estatuto o de um puro referente, é suficiente, então, que um terceiro, mediador do desejo da mãe e da criança, venha servir de argumento a esta função, para que seja significada sua incidência legalizante e estrutu rante. Em última análise, a aplicação da função paterna resulta essencial mente da determinação de um lugar terceiro na lógica de uma estrutura, a qual, em retorno, confere uma consistência exclusivamente simbólica ao elemento que o ocupa: ou seja, o referente do significante fálico simbolizado pelo A partir desta breve incursão na dialética da função podemos tirar a propósito da diferença que existe entre a fato, por se situar num nível prioritariamente simbólico, a ê, então, sempre prevalente em relação à paternidade nenhum conluio poderia ser feito entre o pai e o real. genitor. Em razão de seu caráter de pura representação simbólica, a função paterna está potencialmente aberta à qualquer "embaixador" da realidade. Tanto o genitor pode, legitimamente, postular ao título de embaixador privilegiado, quanto este é somente um dos casos possíveis, requisitado pela imposição dessa missão de representação. Servirá como prova a seguinte evocação clínica, que me parece ilustrar de modo singular a atualização da função paterna. A clínica psicanalítica confronta-nos regularmente com o problema levantado pela disparidade dos sintomas em relação à identidade de uma estrutura. De onde a dificuldade - e mesmo impossibilidade - de estabelecer uma avaliação a partir da simples observação de ocorrências sintomáticas. Exemplos não para nos lembrar que nenhuma semiologia é suficiente para classificar uma estrutura e dar-nos a algumas indicações favoráveis à condução do tratamento. No presente caso, o primeiro plano da cena sintomática estava invadido pela evocação de uma eflorescência de comportamentos de caráter perverso, destinados, de fato, a mascarar uma sólida fobia. Uma mulher de trinta e seis anos veio consultar-me no início de Indicada por um ginecologista, ela primeiramente falou de uma frigidez persistente instalada há, aproximadamente, um ano, justificando, assim, a ausência de qualquer contato sexual com seu marido desde essa data. Ela queixava-se, de crises de angústia sobrevindas sobre um fundo depressivo grave e quase permanente. De fato, sendo beneficiária de uma licença médica por "doença prolongada", ela tivera que deixar de exercer sua atividade profissional há alguns meses: professora no ensino secundário, não pôde retomar seu trabalho no último período escolar. Durante várias sessões, essa mulher forneceu-me um longo e minucioso relato dos entediantes dias passados em casa. Mãe de dois garotos de quatorze e dezesseis anos, não se ocupava mais deles, tendo inclusive abandonado completamente toda vida familiar normal. Mergulhada em uma regressão
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infantil notável, deixava-se cuidar por seu marido e seus dois filhos, que gastavam uma energia imensa para gerenciar sua vida cotidiana. Enfim, essa paciente descreveu-me um verdadeiro quadro clínico de neurastenia, segundo meu parecer, perfeito demais para ser autêntico. Embaraçado, para não dizer invadido por esta sinopse equívoca, decidi olhar as coisas de mais perto: convidei-a a falar de sua frigidez. Frigidez muito enigmática, pois sintoma, que parecia constituir a razão principal pelaa primeira qual ela tinha este vindo consultar-me, não tinha sido mais abordado desde entrevista. fato de abordar esse problema traduziu-se imediatamente, ao longo da sessão, pelo surgimento de uma crise de angústia suficientemente im portante para deixar esta mulher muda du rante um momen to bastante lon go. Ela não veio à sessão seguinte. Na semana seguinte, chegou à sessão num estado de grande excitação, evocando um comportamento maníaco. Havia manifestamente bebido, um pouco como aqueles que tentam encontrar coragem no álcool antes de enfrentar uma situação embaraçosa. Sem rodeios, confirmou-me em seguida que tinha enfim se decidido a me falar de sua que ela não contou a ninguém e que era um segredo doloroso que não podia conter por mais tempo. De fato, ela abordou sem questão de sua que apresentou um prática menodemora da tal a"enfermidade" que, na realidade, mostrou-se como ser uma onanista incoercível, cuja srcem datava de uma forma bem precisa. No mês de abril de 1982, durante uma aula que ministrava no colégio, sentiu-se bruscamente tomada por uma espécie de do pensamento, dominada pela vontade obsessiva de se masturbar. Ela descreveu esse dia como um verdadeiro calvário, lutando dolorosamente contra a invasão dessa idéia erótica, que só cessaria na volta para casa, à noite, quando pôde darlhe o seguimento conveniente. Ela confirmou que essa obsessão não parou de torturá-la dia e noite desde esse episódio, e que não havia outra solução de apaziguamento senão abandonar-se à masturbação em proporções fisicamente muito assus tadoras e, ao mesmo tempo, completamente incompatíveis com qualquer vida Na profissional familiar. Mas "a enfermidade" não evolução terminavasintomática aí. época eme que se desenvolvia essa prática cuja não deixava de ser inquietante, ela foi aprisionada, de maneira irresistível, num cortejo de comportamentos insólitos, sem dúvida alguma perversos, ao menos no sentido em que o entendemos clinicamente. De fato, toda sua atividade era sustentada por uma série de produções fantasmáticas, cujas bases ela tirava do seu universo cotidiano. Em uma palavra, o foco dessa atividade maníaca estava exclusivamente circunscrito em torno do da masturbação de "seus homens", isto é, seu marido e seus filhos. Completamente obcecada pela idéia de que esses protagonistas familiares podiam, sem seu conhecimento, exercer essa prática, ela mantinha uma vigilância quase delirante quanto a esses
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hipotéticos eventos. Notadamente, tinha organizado toda sua vida cotidiana e seus investimentos domésticos em torno de estratégias perversas que chamava de "armadilhas de masturbação". Os lençóis eram trocados todos os dias, sendo objeto de um exame microscópico cada manhã. mesmo ocorria com a roupa de banho e as diversas roupas de "seus homens". Ela exercia uma perquisição diária siste mática no da quarto de seus eróticas filhos. Tinha, subrepticiamente, banheiros casa revistas indiscretamente retiradas colocado do fundo nos de uma gaveta da escrivaninha de seu filho de dezesseis anos. Em seguida, cronometrava o tempo médio passado no banheiro para os diferentes ocu pantes da casa. Tudo combinando A evocação dessas múltiplas observações, que eram pontuadas por vinte ou trinta sessões de masturbação cotidianas, deixou-me silencioso um certo tempo. Ao menos até o momento em que algo de bastante paradoxal ocorreu-me no desenvolvimento dessas manifestações sintomáticas, princi palmente entre esse frenesi irresistível e a curiosidade perversa dessa paciente pelo dos outros. Parecia-me que faltava um elo intermediário entre essas duas séries de eventos. Fiz bem em esta observação. De fato, fui rapidamente esclarecido quanto à natureza do sintoma que permitiacontraditórias. compreenderCom a ligação estabelecida entreessa essas condutas apa rentemente grandes dificuldades, mulher terminou por informar-me que sofria, na realidade, de uma violenta fobia do esperma, e isto, desde os primeiros dias da ocorrência de sua mania Obviamente, essa fobia parecia-lhe perfeitamente desarrazoada. Tanto ela podia associá-la ao desenvolvimento insensato de suas suspeitas masturba em relação aos outros, quanto parecia-lhe estranha ao exercício irre sistível de sua própria masturbação. Numerosas sessões foram, então, consagradas à dolorosa descrição de seu calvário cotidiano, que se apresentava essencialmente na medida de suas defesas contrafóbicas. Esta era, provavelmente, a natureza autêntica de sua "enfermidade". Essa fobia do esperma com efeito, uma aupersecutória dos menores fatos e gestos da vida cotidiana. Esse sintoma invasor, à masturbação poupava de nada. Sua existência era,associado assim, programada pelamaníaca, execuçãonão de arituais torturantes. Todos os utensílios domésticos tinham sido personalizados, como numa reclusão. Os objetos de higiene e de uso pessoal eram estocados num armário fechado à chave, chave sempre mantida com ela. Ela dispunha, na mesa, de seus próprios talheres guardados num armário especial. Os instru mentos culinários eram objeto de uma assepsia obstinada. consumo de roupas na casa atingia proporções vertiginosas, porque elas não resistiam muito tempo aos tratamentos purificadores que sofriam. Suas roupas e sua lingerie eram cotidianamente submetidas a um processo de desinfecção digno da esterilização dos blocos operatórios. Ela tinha um "quarto à parte" e dormia completamente vestida. Os diversos locais de higiene eram con-
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denados a longas e pacientes antes da utilização. Era, aliás, das razões que tinham feito cessar sua atividade profissional e a mantinham em uma clausura quase permanente. Não mais podendo utilizar banheiros públicos, ela era levada a não mais programar o menor deslocamento sem munir-se de fraldas para adultos Sem prolongar com mais detalhes este calvário contrafóbico, mencio narei que dessa as sessões durante alguns meses na restituição laboriosa agendaestenderam-se cotidiana dolorosa. Estávamos com um ano de tratamento - e eu continuava a não entender grande coisa — quando uma evocação inesperada veio dar alguma luz à situação. Durante uma sessão, essa paciente contou-me que sua mãe lhe tinha feito uma visita alguns dias antes. Ela descreveu esse evento num tom de casualidade um tanto quanto exemplar, mas até agradável, ou em todo caso suficientemente tranqüilo para que me viesse à idéia de lhe perguntar como ela tinha podido organizar seus impulsos e seus outros rituais de escrutínio asséptico ao longo daquele dia. Por mais que tenha sido minha intervenção, o efeito interpretativo foi imediato. Depois de um profundo momento de perturbação, essa paciente reco nheceu que o problema não se tinha apresentado ao longo daquela visita, durante qual,eualiás, mãe havia-lhe falado bastante de evento seu pai.algo de Sema que tenhasua podido, naquele dia, elaborar de tal explícito, esse foi, sem nenhuma dúvida, um momento analítico fecundo. De maneira incontrolável, isto é, sem razão imediata, exortei, imediatamente essa paciente a conversar seriamente com sua mãe a respeito das condições de seu nascimento. Surpreso comigo mesmo pela audácia intrusiva da minha colocação, terminei a sessão com essa interrogação. A sessão seguinte foi desconcertante. A paciente tinha seguido minha prescrição e interrogado na mesma noite sua mãe sobre o objeto de minha curiosidade. A transferência estando implicada, a questão não foi, segura mente, feita inocentemente: "Meu analista gostaria de saber como eu nasci". Ao que sua mãe replicou-lhe, imediatamente, num tom eloqüente: "Como ele soube?" seqüência denegada estava confessada pelaoutro metade. de minhaA parte, eu parecia nada jásaber, essalá,paciente foi, por lado, Se, escla recida pelas confissões de sua mãe. Por mais que tenha convenientemente assumido sua função paterna, seu pai não era o genitor. Ele havia encontrado sua mãe quando ela estava grávida de três meses e, mesmo assim, havia casado com ela, rapidamente. Quanto à mãe, parece que bastante inconstante, era incapaz, nessa época, de imputar qualquer suposição de paternidade segura a quem quer que fosse. segredo c úmplice entre o pai e a mãe foi aparentemente bem guardado. Se a filha nunca soube de nada oficialmente, é preciso admitir que a coisa lhe foi, entretanto, obscuramente significada pelos protagonistas parentais.
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Essa mulher ficou totalmente estupefata com as revelações maternas, e eu não estava menos, por ter ouvido - embora involuntariamente - o nó significante que havia sido forcluído em sua história. A constituição da fobia pareceu-me, então, de uma incrível simplicidade. Essa mulher havia nascido em 13 de janeiro de 1947. Fora, concebida então, em abril de 1946. Sua fobia do esperma, imediatamente condensada sob forma de umadecompulsão surgia em abril 1982,a ou seja,acom a idade trinta e seis anos menos nove meses, isto é,decom diferença de uma semana, exatamente a idade que tinha sua mãe quando ela foi concebida. A revelação aritmética foi A fobia, seus componentes rituais e desapareceram em alguns Muito angustiada com a idéia de um possível reaparecimento dos sintomas, essa mulher prosseguiu seu tratamento algumas semanas. Nenhuma reincidência se produziu manifestamente desde então. Ao menos, foi o que me confirmou quando lhe pedi recentemente autorização para expor este fragmento clínico que me parece ilustrar o que há de paternidade em relação à função paterna, mesmo no caso em que o genitor estaria escotomizado. NOTAS Este capítulo foi publicado sob a forma de artigo - no qual fiz algumas alterações 5, Perversion, 1991, Springer Verlag, op. cit., pp. 95-100. Apertura,
in
1. Ver J. Lacan, La relation d'objet, seminário de 5 de junho de 1957, p. 365: "Il s'agit de savoir si le père va en effet faire ses preuves" de saber se o pai vai, com efeito, realizar suas provas" 2. Dediquei um desdobramento mais amplo à "função paterna" em minha obra: fonction en psychanalyse, Paris, Point hors ligne,
sa
3. Apresento, igualmente, uma vinheta de manifestações perversas num caso de histeria masculina, cap. V: "La fonction paternelle et ses avatars", pp. 90 SS. 4. No deste trabalho, não pude me impedir de associar "a enfermidade" de minha paciente à "bobagem" do pequeno Hans. Ver S. Freud, "Analyse d'une phobie chez un petit garçon de cinq ans (le petit (1909), in Cinq psychanalyses, M. Bonaparte, R. M. Loewenstein, Paris, P.U.F., col. "Bibliothèque de 1954, p. 111: ; "A bobagem - é que ele chama sua fobia" p. quer vir comigo no Professor que pode livrar você da sua p. 126: tinha então a bobagem? (...) A bobagem era esta idéia de que um cavalo ia mordê-lo" etc. Lacan realiza toda uma análise sobre este significante em seu seminário La relation d'objet, op. cit., e, sobretudo, sobre a idéia de que a fobia-bobagem pega-se uma doença. Ver os seminários de 10 de abril de 1957, p. - é o seu refrão, 296;8 de maio de 1957, p. 317: "Hans diz todo tempo por causa do cavalo, eu peguei a bobagem"; 15 de maio de 1957, p. 319: "Ele o diz a cada vez com tanta convicção - Eu peguei a p. 320, etc. (em cada citação, grifo do autor).
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Esta vinheta clínica ilustra para de forma exemplar o que Lacan não cessa de mostrar La relation explicitando minuciosamente o caso do Hans: a fobia é, antes de tudo, questão de significantes. "significante fóbico" de 22 de de 1957, pp. 346-347) tem "em a propriedade de ser um significante obscuro - ele é, em alguns aspectos, de 8 de de 1957, p. 307, grifo do autor). Obscuro, com efeito, porque tão "necessário" de 23 de de 1957, p. 145), "organizador" de 20 de de 1957, p. 234), quanto "impossí vel" p. 235). Também, "esse significante sintomático" de 10 de abril de 1957, p. 288) é de natureza a conferir qualquer significado a partir de imagem. Essa imagem é o cavalo, para Hans ("cavalo de o esperma, para minha paciente (eu poderia dizer, igualmente, "esperma de o importante é nos dois casos atenuar o real insuportável: a descoberta da falta do falo na tentar reconstruir miticamente este real, portador precisamente de uma angústia incoercível, via medo, portanto via fobia - tal, precisamente, como Lacan a define no seminário de 3 de abril de 1957, p. 278, "a conjunção do imaginário com a angústia" - de forma a torná-lo suportável. Ver S. Freud, "Analyse d'une phobie chez un petit garçon de cinq ans petit in op. pp. 120, 180. J. Lacan retoma este significante para mostrar que, com a entrada em jogo da fobia, apesar do termo, é menos de angústia que se trata do que de medo. Ver La relation d'objet, op. cit, seminário de 20 de março de 1957, p. 245: "Uma coisa é certa, é que, diante dos cavalos de angustia, Angstferde, e apesar do tom que traz essa palavra, não é angústia o que ele (Hans) sente, mas medo A fobia não é de forma alguma angústia" (sublinhado pelo autor). Encontra-se este significante maior: lo de angústia", nos seminários de 10 de abril de 1957, p. 283 e de 5 de junho de 1957, p. 369.
perverso e seu gozo
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s perversões sempre tiveram má fama. Entretanto, contrariamente às aparências e aos lugares-comuns, a questão das perversões apresenta uma implicação duplamente complexa: de um lado, em razão das questões psíquicas que põem em causa; de outro, pelo próprio fato do caráter desconcertante de suas realizações. Não é, portanto, surpreendente constatar quanto os mal-entendidos mais grosseiros acompanham as perversões. Temos como prova todas as malversações midiáticas das quais
são objeto. Essesfundamental comentáriosa elas desencontrados desconhecimento vinculado. traduzem bem o Esse desconhecimento da significação do processo perverso parece sempre adquirir consistência a partir dos mesmos pontos cegos. De um lado, a é constantemente associada à idéia de uma manipulação, que seria estrategicamente desenvolvida pelo perverso com o objetivo de lesar. Por outro, a perversão é quase sempre relegada ao estatuto dos avatares da Tanto num caso quanto no outro, a ênfase é dada à dimensão da transgressão das normas estabelecidas. As perversões não podem ser reduzidas a conotações tão indigentes. As atualizações perversas não obedecem, prioritariamente, à busca de objetivos deliberadamente corrosivos. Na medida em que podemos identificar
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certas condutas estratégicas no curso do processo perverso, essas estratégias exercem-se bem menos com o objetivo de lesar do que de gozar. É esse gozo que exerce incontestavelmente no outro um pólo de atração que ao mesmo tempo seduz e fascina, mas também torna as perversões freqüentemente inaceitáveis. De fato, parece que esse gozo deve ser adquirido somente ao preço da transgressão. perverso tem trazer àa luz do dia Aliás, o que étortura secreta mente todo aquele quea audácia jamais sedeautoriza efetivá-lo. nesse ponto que se situa uma linha de separação radical entre a estrutura dos perversos e a dos neuróticos, ou a diferença que existe entre um ato autenticae a construção de um perverso é mente sucessivamente estrategista, prestidigitador, jogador e de nú meros de magia hipnotizantes que nos deixam sempre estupefatos, ao menos por um instante. De esse poder de sedução encontra seu ponto de interrupção lógica. roteiro perverso decai sempre no mo mento preciso de seu cume, ponto culminante de sua em relação à possibilidade de um ponto sem volta. No apogeu de sua encenação, o perverso descobre, de fato, com horror e angústia, o limite de sua própria montagem imaginária. Ele fracassa justamente seu gozoenfim o leva a crer no contrário, seja,que no ele momento fecundo em onde que imagina controlar o que o agitaou e em se ilude sobre o fato de que vai alcançar seu objetivo ludibriando seu parceiro. lugar desse fracasso é sempre o mesmo: aquele em que é revelada sua na recusa da castração e as que ela supõe acerca da diferença dos sexos. Neste sentido, o roteiro perverso é mais uma paródia trágica do que uma forma de expiação real à possibilidade de um gozo sem limites. Por essa razão, o perverso é, em primeiro lugar, a vítima de sua própria monta gem. Ele é o joguete dessa montagem a título das determinações psíquicas que o condenam a ela. As perversões remetem-nos à lógica singular de uma organização psíquica, isto é, a uma o que refuta a idéia de que os desvios perversos sejam maquiavélicos. Além disso, essa estrutura demonstra mais acerca da captura um sujeito do que prega em favor de sua autonomia. Além de sua inextinguível de gozo" (Lacan), o perverso é prisioneiro de uma economia desejante impossível, ao menos pela escolha das vias de realização passíveis de colocá-la em prática. A questão que o anima leva-o sempre à mesma tentativa de demonstração: tentar provar a de um "além" diferença dns sexos. perverso desgasta-se assim em tentar prová-lo, para descobrir continuamente que ele mesmo permaneceu num "aquém". Todo o gozo do perverso é orquestrado na medida dessa questão. Se quisermos tentar desmontar esta reputação genérica de depravação, de perdição ou de escândalo que acampanha ainda muito freqüentemente
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a representação das perversões, é preciso esforçar-se para compreender todas as implicações psíquicas desta questão. Quer se queira saber ou não, a perversão é problema de todos, ao menos em razão do "cerne perverso" que coexiste com a dimensão srcinária do desejo de cada um. Ela tem seu ponto de enraizamento lógico no processo do desenvolvimento da sexualidade dita normal. É a famosa perversão polimorfa da criança, especificada por Freud leva-nos, assim, a reconhecer que somente há perversões enquanto perversões sexuais. Isto não nos leva a concluir que somos todos necessariamente perversos, mas a compreender como estes componentes "normais" da perversão encontrarão, em alguns sujeitos, determinantes favoráveis que propiciarão uma fixação irreversível: outra maneira de evocar o que Lacan, depois de Freud, designa como ponto de fixação das Quais são então as forças metapsicológicas mobilizadas pelo processo perverso? Quais são seus modos de interações específicos que contribuem a determinar um espaço de configuração particular a que chamamos de Tais são as duas questões preliminares que devem ser estrutura abordadas se quisermos captar o modo de gozo dos perversos. A estrutura perversa caracteriza-se por uma organização psicossexual específica, no sentido de que as vias de realização do desejo que ela induz levam sempre à mesma ordem: a relação ambígua da qual o perverso jamais consegue desprender-se, relativa ao enigma infantil colocado pela diferença dos sexos. Obscuramente atormentado pela ausência do na mãe — e por extensão nas mulheres - o perverso faz-se de bom grado o artesão de seu próprio tormento, lutando contra o horror da Eis aí uma busca incessante em relação à qual só parece existir uma saída: mobilizar seu desejo em complexas estratégias de gozo relativos a diversos objetos sexuais. sem demora a um caso clínico que ilustra diretamente esse componente arcaico em jogo nas perversões. Trata-se de um jovem voyeur de vinte e dois anos, particularmente atormentado pela ausência de pênis nas mulheres. Sua "voyeurista" incessante levou-o a exercer seus talentos em escadas rolantes de grandes lojas e aeroportos. Seu ritual perverso começara de uma forma bem artesanal. Ele havia fixado um pequeno espelho na extremidade de um arame que dissimulava na manga de seu c as ac o. Armad o dess e instrumento óptico, seguia as mulheres nas escadas. Colocado atrás de sua vítima, ele deixava escorregar o arame ao longo de seu braço e observava, à vontade, durante toda a subida da escada rolante. dispositivo não era muito discreto, o que lhe valeu um bom número de problemas com a segurança das grandes lojas e dos aeroportos, que o conduziam regularmente à justiça. importante era sem dúvida ver, mas também correr o risco de ser visto vendo. Ser visto vendo é um dos objetivos constantemente perseguido nas condutas Este componente
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essencial do gozo do voyeur consiste em tentar herdar a vergonha e humilhação imaginadas no outro que é visto. Durante suas obs ervaç ões, esse jove m voyeur mastu rbava-se, fa vorecido pela posição particular de um dos bolsos de sua calça. Entretanto, nem todas essas observações o levavam ao orgasmo, daí a repetição incessante de seu ritual, que o ocupava várias horas por dia. Para que ele gozasse era preciso que ligas váriasexcitava-o condiçõesbastante, estivessem A observação de uma mulher com mas reunidas. jamais o suficiente para levá-lo a uma ejaculação. Por outro lado, a observação de uma mulher sem calcinha deixava-o num estado impressionante. Ele perseguia-a, então, com obstinação, até ejacular. Segundo ele, isto ocorria com muito mais frequência do que se podia imaginar. Assim, ele tinha constatado, igualmente, que as loiras tingidas eram estatisticamente mais numerosas que as morenas tingidas. Todavia, sendo frequentes demais suas prisões pela polícia, esse voyeur rapidamente melhorou seu instrumento de observação. Beneficiando-se dos serviços de um sapateiro ele mandou fazer um "sapato óptico" Imaginem um pequeno espelho articulado e recoberto de couro, que se ajustava exatamente à parte superior da extremidade do sapato. Com uma batida no salto, o espelho girava e as imagens maravilhosas apareciam então maiorinvenção. discrição.Durante numerosas comsessões, os serviços inestimáveis devia na a essa ele me relatou nosque menores detalhes o produto de suas múltiplas observações. Um dia pareceu-me, todavia, que ele via um pouco demais; mais exa tamente, que descrevia muito mais do que via. Eu saí, então, da minha própria alienação e fui confrontado à seguinte experiência crucial. Coloquei um pequeno espelho em meus pés e percebi que, na altura de um homem, a estreiteza do campo óptico não permitia ver quase nada, e sobretudo nada idêntico à riqueza das fantasmagorias visuais que esse paciente me relatava. Não é preciso dizer que eu não estava em uma escada para efetuar minha pequena experiência crucial. Na sessão seguinte, disse-lhe, para sua grande surpresa, o resultado da minha observação. Ele ficou a tal ponto desapontado que suas peregrinações visuais cessaram durante vários meses. Infelizmente, renascimento sua paixão fatal, pois conduziu-o à prisão duranteo algum tempo.de Jamais o revi foi-lhe após seu encarceramento. Este curto fragmento clínico indica-nos claramente que o gozo desse perverso não residia, falando propriamente, na visão das roupas de baixo ou do sexo das mulheres. Ele sustentava-se, essencialmente, em represen tações imaginárias das quais o espelho era o único pretexto. Tratava-se, sem dúvida, de exorcizar a angústia de castração, mobilizada pela diferença dos sexos; ou seja, tentar ver o que não pode ser visto: o famoso pênis que falta à mulher, outra forma de evocar o falo e, mais geralmente, a questão da atribuição fálica do Outro. A atribuição fálica depende de uma construção prove niente das teorias sexuais que a criança desenvolve para responder
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à questão da diferença dos sexos. A atribuição do falo à mãe (e à mulher) é uma dessas respostas elaboradas pela criança. Ela concebe na mãe algo que deveria estar lá: o que falta. Não percebendo imediatamente a bipartição dos sexos no real de sua diferença, a criança inicialmente fantasmatiza-a/fantasia-a em torno da atribuição de um objeto que então suposta mente falta à mãe. Ela institui, assim, a existência de um objeto que deveria estar lá. Neste sentido, a castração, que é a simbolização da diferença dos sexos, torna-se irremediavelmente ligada à dimensão imaginária do falo, e não à ausência ou à presença do órgão: Isto deixa supor toda a mediação da função do pai no curso da dialética edipiana, ou seja, mais precisamente, a dialética que deve operar-se entre o pai real, o pai imaginário e o pai em relação à mãe, à criança e a este quarto elemento que é o falo. Toda a questão da trajetória edipiana contribui assim para levar a criança à simbolização da interdição do incesto, que é, antes de tudo, a lei do pai simbólico, isto é, a lei daquele que supostamente possui o objeto fálico. Nessa dialética edipiana, convém insistir, a propósito das perversões, sobre a articulação delicada que pontua um de seus tempos essenciais: a passagem do ter, ou seja, um dos primeiros grandes momentos estru turantes que intervém para a criança no curso do complexo de Édipo. É em torno dessa passagem do ser ao ter que podemos colocar em evidência o ponto de fixação da perversão evocado precedentemente. Esse ponto não pode ser apreendido fora da lógica fálica, pois ele testemunha, precisamente, um certo modo de adesão à dimensão do desejo e da castração. No início do complexo de Édipo, como a mãe encarna para a criança o Outro todo-poderoso, esta não tem outra saída senão identificar-se, ela própria, com o objeto passível de preencher sua falta. Nessas condições, a diferença dos sexos é recusada, pois a auto-suficiência materna parece ser a única dimensão que legisla a ordem do desejo. Essa crença, contemporânea das teorias sexuais infantis, tende a instaurar uma mãe pois completada imaginariamente pela criança. Nenhum espaço é deixado então à existência de um desejo outro (além do seu) que poderia interferir no desejo da mãe. À presença encarnada pelo pai na realidade não cessará de colocar em questão esta convicção imaginária. Essa presença real do pai, ou sua realidade significada à criança pelo discurso da mãe, introduzirá, cedo ou tarde, uma mediação perturbadora quanto a essa certeza. Assim, a criança percebe progressivamente o desvendamento de um novo universo de gozo e ao mesmo tempo estranho, isto é, interdito. Toda a vacilação do gozo srcinário da criança situa-se aí. Mas, por outro lado, constitui para ela o ponto de fixação de um saber desconhecido sobre o desejo da mãe e, conseqüente mente, sobre seu próprio desejo. Por intermédio do pai, a criança é assim levada a pressentir novas facetas concernentes à questão da diferença dos sexos. E o momento da
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rivalidade fálica tal como a observamos no complexo de Édipo. Em tal campo, os significantes endereçados à criança têm importância decisiva, quer sejam eles maternos ou paternos. Através desses significantes, a criança percebe os pontos de referência que lhe permitirão endereçar seu desejo além desse questionamento, notadamente em direção a este novo horizonte que contitui para ela a dialética do ter. Renunciando à identificação fálica: ser ou não ser o falo do Outro, a criança orienta-se em direção a um novo componente da diferença dos sexos: ter ou não ter o falo que a mãe faltante deseja. Em razão desse momento decisivo e das questões que o sancionam, as mensagens signifi cantes podem muito bem encaminhar a criança em uma direção que está obstruída para ela, por não poder levar mais longe a questão da diferença dos sexos. Deixando em suspenso o questionamento da criança sobre o objeto do d esejo da mãe, o discurso materno permi te-lhe colocar essa ques tão para além do lugar onde a identificação fálica lhe tinha dado um ponto final. Somente essa suspensão pode mobilizar a criança em direção a um local desconhecido que a desprenda da questão desejante imediata que ela negocia com a mãe em concorrência com o pai. Se essa suspensão encontra o menor suporte para se enraizar, se nada incita a criança a produzir o esforço psíquico necessário para interrogar, mais além, a questão colocada pelo desejo da mãe, então a criança se e se fixa num entremeio. Essa suspensão induzida em torno do questio namento de sua identificação fálica pré-determina um modo particular de economia desejante, em relação à Lei e à castração, que funda a organização de uma estrutura perversa. perverso se fixa e se fecha em uma representação de uma falta nãosimbolizável, o que o conduz a manter contra tudo e todos o desmentido da castração da mãe. Ele o faz, aliás, ainda melhor porque o pai não chega a ser completamente desinvestido de sua investidura fálica. No entanto, esse desmentido da castração da mãe somente pode manter-se sob certas condições. É preciso que a criança tenha ao menos percebido a incidência paterna como causa do desejo da mãe. Há, então, no perverso, coexistência de dois conteúdos psíquicos que se sustentam Um leva em conta a falta da mãe e sua dependência desejante em relação ao do pai. outro recusa essa falta e contribui para reforçar o de uma mãe Para manter esse equilíbrio psíquico o perverso recorre a um expe diente preciso. Se a mãe deseja o pai porque ela é faltante, se, além disso, o pai é um intruso, um rival, porque ele possui o objeto que a mãe deseja, então é preciso e suficiente prover a mãe desse objeto faltante que é o falo, para que seja neutralizada a questão da diferença dos sexos. Todos os perversos permanecem assim fixados a essa nesse "entremeio" que constitui a passagem dialética do ser ao ter.
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Conseqüentemente, é também no espaço desse entremeio que eles gozam. desmentido do perverso fixa-se, essencialmente, na questão levantada pelo desejo da mãe em relação ao pai, ou seja, no problema da diferença dos sexos. É nesse sentido que ele se predispõe a suportar a angústia horror da castração. Embora ele saiba alguma coisa da diferença dos sexos, percebida como causa significante do desejo - e isto ainda mais por ser reconhecer a mãe faltante - aceitar alguma ao mesmo tempo, a incidência simbólicacoisa do dessa pai e diferença admitir a é,dependência desejante da mãe em relação a ele. Eis aí a implicação lógica que induz e mantém no perverso o horror da castração. A única expressão que resume judiciosamente o gozo do perverso é a seguinte: sei, mas mesmo Essa proposição ilustra o acordo impossível entre o horror da castração e a construção fantasmática de uma mãe toda-poderosa ao qual o perverso adere. Mesmo que o acordo seja inatingível, o perverso prende-se nele para neutralizar a angústia de castração. Essa pré-determinação fixa um certo tipo de gestão do desejo que se mani festará sob a forma de aspectos característicos na relação com a Lei, e em escolhas de gozo estereotipadas com as mulheres. Podemos, sem demora, ilustrar esse ponto por um fragmento clínico de exibicionismo. exibicionismo traduz sempre uma exorcizar reafirmação fálica faceque à angústia de castração. Um exibicionista procura a angústia suscita nele, imaginariamente, a visão do sexo da mulher e, principalmente, a au sência de pênis. Na medida em que sua vítima encarna o objeto de sua angústia, a exibição desempenhará o papel de um gesto sujeito tenta, assim, afirmar a ligação de sua identidade sexual com a função fálica. perverso do qual falarei era um exibicionista masturbador, especialista em cabines telefônicas, que ele escolhia sempre cuidadosamente em razão de seu isolamento. rito exibicionista era sempre o mesmo. sujeito esperava que sua vítima falasse ao telefone para se apresentar na porta de entrada da cabine com o sexo em ereção. Masturbava-se então, fixando o olhar da mulher. A maioria das vezes, dizia, suas vítimas esperavam, aterrorizadas e sem tentar sair, que ele terminasse o seu procedimento. Segundo ele, as mulheres não podiam deixar de olhar seu sexo. Aliás, era essa fascinação que nele produzia o elemento essencial de sua excitação. Quando sua presa parecia-lhe estar no ponto, isto é, no auge do terror, então ele ejaculava contra o vidro da cabine telefônica. Um dia, entretanto, esse roteiro alterou-se. Uma jovem, sem dúvida menos desconcertada do que as outras, levantou o vestido e se masturbou ao mesmo tempo que ele. Assim, todo o processo de gozo inverteu-se. De triunfante que era, o gozo do masturbador tornou-se imediatamente vergonhoso. A vítima tornava-se, de um só golpe, "fálica", procurando gozar sem pênis, o que era a própria prova do horror da castração.
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Ele prosseguiu, no entanto, sua exibição mas deixando claro que a "masturbação selvagem" desta mulher tinha arruinado toda a sua excitação. Ele acabou, todavia, por ejacular como sempre; mas, a fim de exorcizar esse gozo "fracassado" (s/c), ele pôs-se a lamber seu esperma que escorria na porta envidraçada da cabine telefônica. Este último gesto era, sem dúvida, destinado a neutralizar a humilhação que tinha sofrido pela inversão situação emà seu detrimento. Tendo passado, contra vontade, da posição deda exibicionista de voyeur, necessário, através de um último ato perverso, reafirmar pelo desafio, a situação de domínio da qual havia sido destituído. Sem dúvida, isso não deixou de ser percebido pela mulher, que imediatamente pôs um término a seus impulsos, diante da conclusão inesperada de seu parceiro. Voltemos agora mais diretamente ao ponto de das perversões. que permanece tributário de certos equívocos significantes provenientes do pai e da mãe. Sem estender-me muito sobre esse lembrarei sobretudo a intervenção de duas séries de fatores de uma parte, a cumplici dade da mãe, de outra, a complacência silenciosa A cumplicidade libidinal da mãe desenvolve-se, antes de tudo, no âmbito da sedução. Trata-se de uma verdadeira sedução erótica mantida na realidade, isto é, um apelo da tem, mãe assim, que mobiliza a criança fazê-la gozar A libidinal criança não outra saída senãopara acolher as mani festações de assédio da mãe como testemunhos de reconhecimento e enco rajamento às atividades eróticas que ela entretém junto à mãe. Isso desen volve-se também no âmbito do dar a ver, a ouvir, a tocar, ou a sentir. A duplicidade inconsciente destas mães consiste em permanecerem ambíguas, e até mesmo mudas, quanto ao sentido da intrusão paterna. Elas não des mentem, mas também não confirmam nada para a criança quanto ao enga jamento de seu próprio desejo em relação ao pai. lugar do pai permanece por isso ainda mais preocupante e enigmático. Essa suspensão significante da questão do desejo da mãe só pode atiçar a atividade libidinal da criança em relação a ela. A criança é assim levada a buscar sempre mais longe o objeto de seu gozo, no mínimo na esperança de tirar as dúvidas acerca do sentido da instância paterna, que a incitação cúmplice da mãe, aliás, convida a desprezar de maneira irônica. No âmbito desse dispositivo, nasce um dos traços mais característicos da estrutura perversa: o desafio. Ele é ainda mais utilizado quanto mais a criança é cativa da sedução materna e do interdito inconseqüente que ela lhe apresenta, freqüentemente, como aparentar. Não é preciso mais nada para que a criança entenda aí um verdadeiro apelo à transgressão. Todavia, essa ambigüidade materna somente tem incidência determinante porque recebe, em eco, o reforço da complacência tácita de um pai que se deixa alienar de suas prerrogativas simbólicas, notadamente delegando sua própria palavra à da mãe, com todo o equívoco implicado nesse Isso não quer dizer que não se faça caso da palavra do pai. A mãe dos perversos não
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comanda o pai. Nesse sentido, ela não é mãe "fora da lei" A criança permanece confrontada à dimensão de um desejo referido à lei do pai, mas a significação que ela recebe dessa lei não é essencialmente trazida pela palavra do pai. A complacência silenciosa do pai reforça assim o equívoco de uma mãe que se faz embaixadora do interdito. De um lado, a saída psicótica é desmontada, mas por outro, de legaçã o paterna significação inte rdito, deixada aos cuidados da mãe, acaptura a criança emda uma alternativadoirredutível. Alternativa entre uma mãe ameaçadora porque mediadora da palavra simbólica do pai, e uma mãe sedutora que encoraja a criança a fazê-la gozar sem limite, desprezando de maneira derrisória a significação estruturante da lei do pai. Essa alienação da criança, presa na intriga da sedução materna e na incúria simbólica do pai, é plena de consequências. Ela contribui para criar, no perverso, um duplo modo de gozo em suas relações com as mulheres, que é diretamente tributário dos vestígios inconscientes de sua sujeição à mãe. Toda representação da mulher reatualizará, assim, uma dupla série de componentes De um lado, a fálica, a mãe toda-poderosa, porque que encontraremos na idealização da mulher todapoderosa e virgem de todo desejo, Mulher objeto puro e perfeito, alcance,no tanto proibida quanto impossível. da qual só se fora podedeesperar, melhor dos casos, bondade e proteção, mesmo que ao preço de suportar a sanção de se ter dado o luxo de querer desejá-la. É aí que se localiza o gozo do masoquista, nos maus-tratos, nas chicotadas, na surra e na tortura que o perverso vai buscar na sua parceira falicizada. Por outro lado, a mulher pode também metaforizar a mãe repulsiva e abjeta, isto é, a prostituta ainda mais repugnante porque se manifesta como desejante e desejável, ou seja, como objeto imundo que se mancomunou com o desejo do outro - o pai — e submetida à castração. Esta encarnação feminina envia ipso facto ao horror da castração e a esta repulsa habitualmente expressa pela abjeção do sexo feminino fantasiado, como uma ferida aberta e repugnante. Por essa razão, a criatura feminina deve expiarUma sua última falta imperdoável. evocação clínica parece-me que esclarecerá melhor esta problemática. Trata-se de um caso de comportamento sádico associado a uma prática ondinista. ato perverso sádico encobre sempre fundamentalmente a mesma significação. Em nome dos vestígios edipianos inconscientes, trata-se de sacrificar a mãe mulher e tirar o máximo proveito deste sacrifício, gozando com ele. De fato, o sádico procura negar, destruir a mãe, identificando-se com um pai violento e excessivo. ato sádico visa reproduzir o coito heterossexual, mas invertendo um dos componentes maiores. Enquanto, normalmente, o homem goza com o gozo que desperta em sua parceira, o sádico goza com o sofrimento e a humilhação que lhe inflige. Como se
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pode imaginar, a crueldade sádica produz-se freqüentemente num espaço restrito: o da intimidade sexual, mesmo que se deva a um roteiro às vezes bastante exterior a esse ponto de consumação. fragmento clínico que evocarei concerne um homem que se tornou autor de um roteiro complexo, na medida em que seu gozo perverso resultava de uma montagem "em etapas". Seu objetivo último era chegar a gozar com sua própria esposa através de Muito cedo atraído por práticas de este paciente tinha fixado seu roteiro perverso da seguinte forma. Quando sua "crise" o tomava - era assim que ele qualificava sua montagem perversa - dirigia-se a prostitutas ou eventuais parceiras complacentes, diante das quais entregava-se sempre ao mesmo rito sexual. Com ajuda de um ele urinava em sua vagina ou reto. Essa prática ondínica deixava-o num estado de excitação tal que ele podia assim retardar seu gozo durante várias horas, à condição, todavia, de que a vítima suscetível de conduzi-lo a isso fosse sua mulher. Então, produzia-se um roteiro em que o menor detalhe era perfeitamente estudado. Ele impunha a sua mulher beber de uma só vez dois a três litros d'água. Seu gozo já começava com a idéia de fazê-la esperar o maior tempo possível antes de autorizá-la a urinar. Em seguida, perambulava com ela, durante várias horas, de carro ou nas ruas, a fim de que ela não pudesse urinar. Essas peregrinações cuidadosamente pensadas conduziam-nos regularmente à frente de seu domicílio, onde a esposa, esgotada, suplicava-lhe que parassem. Ele fazia-a esperar, embora encurtando os trajetos. Isto até o momen to inevi tável em que a esposa, não pod end o mais começava a urinar na lingerie. Então começava a terceira parte do roteiro. Eles entravam em casa. Ele insultava a esposa, cobrindo-a com as piores injúrias obscenas. Proibia-a de urinar enquanto ela não tivesse lambido o fundo de suas roupas de baixo, que deveria em seguida lavar. Enfim, no último extremo, ele dava-lhe autorização de urinar em sua frente. Mas, assim que ela começava, ele interrompia imediatamente a micção, sodomizando-a brutalmente. Somente após essa intromissão selvagem, a esposa, enfim livre de seus castigos torturantes, podia urinar sobre seu sexo em ereção, provocando assim sua ejaculação. Esse caso necessita uma explicação na medida em que adere a uma configuração fantasmática que se encontra em todos os perversos. torturará tanto mais sua criatura enquanto infame, quanto mais lhe for possível gozar com seu caráter Não poderíamos mel hor concluir do q ue meditando s obre estas palavras de Piera Esta citação em francês de nos olha. (N. do R.T.)
Anlaguier produz um equívoco por homofonia entre
nos concerne e
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jamais poderemos dizer que a questão da perversão não nos concerne, pois temos certeza de que ela, de qualquer forma, nos
NOTAS Este capítulo foi redigido a partir de uma conferência pronunciada na faculdade de medicina de Amiens, a 27 de junho de 1. A propó sito desta diferença entre "a to" e "fantasma /fantas ia" perve rso, ve r J. Clavreul, "Le couple pervers", in Le désir et la perversion (1976), Paris, Seuil, col. "Points", 124, 1981, pp. 108-109. 2. Ver a esse propósito S. Freud, La sexualité infantile", cap. IV: "Les manifestations masturbatoires", in Trois essais la théorie de la B. ReverchonJou ve, Paris, Gallimard, col . "Idées", 1974, pp . 86-87. Ver J. Dor, cap. X: "Point d'ancrage des perversions et mise en acte du processus pervers", in Structure et perversions, op. cit., pp. 141-150. Publicado em língua portuguesa sob o título "Ponto de ancoragem das perversões e do processo perverso", in Estrutura e perversões, op. cit., Porto Alegre, Editora Artes Médicas, pp. 99-105. 4. Dor, "Perversion", in 1993, pp. 314-321.
freudien, sob a direção de P. Kaufmann, Paris, Bordas,
5. Ver J. Dor, cap. XI: "L'horreur de la castration et le rapport aux femmes. Le et la transgression" e cap. XII: parentale inductrice du processus pervers et l'horreur de la castration. Fragment pp. 151-172. Publicado em língua portuguesa sob o título horror da castração e a relação com as mulheres. desafio e a transgressão", op. cit., pp. 106-112 A ambigüidade parental indutora do processo perverso e o horror da castração. Fragmento clínico", pp. 113-120, Porto Ale gre, Artes Médicas, 6. Ver G. Bonnet, Voir-être vu, tomo 1 e 2, Paris, P.U.F., 1981. 7. Ver S. Freud, "Les théories sexuelles infantiles" (1908), trad. J.-B. Pontalis, Paris, P.U.F., col. "Bibliothèque de psychanalyse", 1969, pp. 14-27.
La vie sexuelle,
8. Dor, cap. X: "Point d'ancrage des perversions et mise en acte du processus pervers", in Structure et perversions, op. cit., pp. 141-150. Publicado em língua portuguesa sob o título "Ponto de ancoragem das perversões e atualização do processo perverso", op. cit., pp. 99-105, Porto Alegre, Editora Artes Médicas. 9. Dor, IV: "Le père réel, le père imaginaire et le père symbolique: la fonction du père dans la dialectique oedipienne", in Le père sa fonction en psycanalyse, op. cit„ pp. 5165. 10. Ver sobre esse assunto o artigo memorável de Mannoni, "Je sais bien, mais quand même_" (conferência na Sociedade Francesa de Psicanálise, novembro de 1963), in Clefs pour l'imaginaire ou l'Autre scène, Paris, Seuil, col. "Le champ freudien", 1969, pp. 11. Ver supra, neste mesmo capítulo, p. 124, nota 8. 12. P. Aulagnier-Spairani, "Remarques sur la féminité et ses avatars" (8 de fevereiro de 1966), in Le désir et la perversion, op. cit., p. 79 (grifo da autora).
JOËL DOR Publicado em língua portuguesa sob o título "Observações sobre a feminilidade e suas in desejo e a Jean Clavreul e Campinas, Ed., 1990, p. 96.
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A servidão estética dos travestis
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"servidão" dos travestis não representa, em si mesma, nada além, mas também nada aquém, que a de todos os perversos. Todavia, o aspecto "estético" do problema tem sido freqüentemente deixado de lado pelos clínicos. Poucos trabalhos foram consagrados ao travestismo e, quando tais trabalhos existem, o acento é posto, a maior parte das vezes, sobre o erotismo singular desses perversos e o que ele supõe de ambigüidade em nível Neste sentido, por exem plo, faltam observações consagradas ao "desvelamento" da aptidão ao tra vestismo no adolescente. Quando muitas confusões semiológicas e clínicas permanecem ainda entre o "verdadeiro" travestismo e o transexualismo masculino. Certas observações que desejo relatar permitiram-me esclarecer algumas particularidades psíquicas em relação direta com as imposições estéticas do travestismo, notadamente sobre o plano da servidão especular e corporal. Previamente, parece-me oportuno esclarecer uma confusão, ainda muito presente, entre travestismo e transexualismo. Um travesti não é um tran sexual, e da mesma forma que é preciso distinguir o transexualismo mas culino do transexualismo feminino, devemos ter a mesma reserva quanto ao travestismo masculino e feminino. Assim como os "verdadeiros" transe-
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são transexuais masculinos (homem "transformado" em mulher), os verdadeiros "travestis" são homens. Aliás, é por essa identidade sexual mas culina que eles demonstram, no pleno sentido do termo, uma estrutura perversa. Os transexuais são sujeitos vítimas de uma sexual, isto é, um estado psicológico que manifesta um desacordo completo entre o sexo de seu corpo o papel social assumido pessoas de seu sexo. Eles sofrem, assim, pore não terem o corpo quepelas corresponde à sua identidade sexual psíquica. Os sex-shops, por exemplo, exploram generosamente essa confusão com o único fim de excitar a imaginação de todos aqueles cujo erotismo permanece em suspenso. Encontramos aí uma considerável quantidade de material impresso mostrando indivíduos com grandes seios à custa de hormônios e com o em ereção, etiquetados sob a rubrica A população noturna que exerce seu ofício no Bois de Boulogne* se beneficia igualmente dessa mesma nomeação confusa. Entretando, nos autênticos meios transexuais, a exuberância audaciosa - até mesmo atlética — desse erotismo é totalmente minimizada, para não dizer recusada. Quanto ao travesti, ele não sofre, de forma alguma, de disforia sexual; eis um ponto de éradical que o separa transexual. Com efeito, como diferença se a bissexualidade fossedorejeitada pelo transexual, ao menos no sentido em que ela não seria integrada no início da adolescência, o que o levaria a recusar seu próprio sexo. No travestismo, ao contrário, essa bissexualidade é precocemente integrada à adolescência, mas de forma marginal, o que permite sustentar a recusa da castração, como em todos os perversos. Além disso, no adolescente futuro travesti, a supressão das provas da masculinidade está inscrita, em princípio, na ilusão; isto é, como veremos mais adiante, no âmbito de uma paródia da Estabelecida essa precisão, não deixa de existir o fato de que os travestis constituem uma população díspar e complexa, em relação à qual convém saber situar-se. aqui, população de bom grado, a distinção feitagrandes por grupos: tendeRetomarei a dividir essa de travestis em três
que
nos quais o exercício dessa perversão Os travestis limita-se essencialmente ao campo da relação sexual propriamente dita. Nesse sentido, essa conduta apresenta um certo número de pontos em comum com o fetichismo. Os travestis exibicionistas, que desenvolvem prioritariamente seus investimentos perversos no registro do espetáculo e da atuação. Daí a Parque, nos arredo res de Paris, onde se dese nvolve intensa atividade de prostituição.
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importância essencial da função do pois é sobretudo a identificação com a mãe fálica que irá, aqui, governar o gozo. Enfim, os travestis homossexuais, que são freqüentemente associados à prostituição masculina. É nesta última categoria que devemos classificar os "falsos transexuais", ou seja, os travestis transformados genitalmente em mulheres pela cirurgia para facilitar o comércio na prostituição. Nessa pers pectiva, a sedução predomina sobretudo como paródia da sedução feminina. Existe, entretanto, uma particularidade que me foi confirmada pela maioria dos travestis prostituídos com os quais pude ter contato: no clímax de seus jogos emocionais, eles jamais perdem a ocasião de lembrar a seus "clientes" o estado antecedente de sua anatomia sexual. Eis o auge de seu gozo, o instante da revelação, quando o travesti desvenda o que tem de mais precioso e através do que ele consegue seduzir seu parceiro. De uma forma geral, todos os autores concordam em distinguir o travestismo da homossexualidade. De minha parte, quanto às questões que desenvolverei em seguida, farei simultaneamente referência a essas três categorias de travestis que encontrei. Em todos os casos, o perverso é um jogador, cujo jogo principal consiste em subverter a realidade. Como lembra Jean Clavreul, o perverso parece dizer-nos que "a realidade em si mesma não é tão excitante para que nos interessemos por E de fato, ele não cessa de desafiá-la para um outro, em benefício de seu próprio gozo. Como sabemos, essa subversão da realidade inaugura-se, no perverso, com a denegação da ausência do pênis na mãe. Em nome dessa recusa, ele se vê convidado a realizar essa insaciável corrida lúdica através da qual exterioriza-se o fantasma/fantasia de que "a realidade só vale pela forma como a Por não ter percebido que essa ausência do pênis em sua mãe era uma falta de falo, o perverso obedece a esta lógica singular que consiste em acreditar - e em fazer acreditar - que a "falta de falo da mãe pode permanecer não E de fato, a ilusão sustenta-se na medida em que "uma falta, não é algo que se vê: Assim, inicia-se e prossegue a inextrincável confusão no perverso. Essa confusão já pode ser pressentida na Ela encontra em seguida sua participação mais marcante no campo das perversões, para culminar enfim, de uma maneira hipostasiada, nos Por exemplo, a recusa fálica da mulher homossexual indica-nos clara mente que ela permaneceu fixada um pouco mais aquém da castração do que a histérica. Não tendo o falo, a homossexual esforçar-se-á em demonstrar, em relação aos homens, sua superioridade relativamente às mulheres. Uma vez que o que importa é ter o falo, convém subjugar um homem que se pode realizar o que ele não poderia fazer: dar o falo a uma mulher. Sendo castrado, um homem não poderia jamais dar a uma mulher
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senão o que ele não tem. A superioridade amorosa da mulher homossexual apóia-se, assim, na seguinte ilusão: identificar-se, em princípio, com os signos masculinos da atribuição fálica; manter-se, em seguida, nessa posição onde ela própria representa o falo para uma mulher. Nessa situação imaginária, ela poderá, então, como um homem, fazer gozar uma mulher e gozar dela; até mesmo melhor que um homem, pois ela não impõe-nos precisa de um isso. aDesse ponto de vista, a homossexua lidade a conclusãopara de que distinção é um pouco mais obscura do que parecia ser na histeria. fetichista, por sua vez, irá dar um passo a mais na recusa da castração, portanto, na recusa fálica. Se o fetichista recusa seguramente a atribuição fálica do pai, ele chega aí mantendo subjetivamente essa atribuição à mãe (e à mulher), pelo investimento do objeto fetiche, que lhe permite escapar à travesti irá levar ainda mais longe a recusa dessa atribuição fálica. Ele irá constituir-se, ele mesmo, em uma representação fantasmática do que a mãe (e a mulher) deve ter. Contrariamente ao que poderíamos imediata mente pensar, o travesti não identificado com a mãe ou com a mulher. Ele se vale do véu atrás do qual tende a se representar, não como uma mulher, quedesvelamento. ela deveria ter. a questão opera-se, mas aliás,como para oele,falo neste É o Toda próprio elementododegozo sua excitação sexual, que ele assume com o órgão anatômico que é o seu. Em caso algum, poderia prescindir da presença desse órgão, pois seu gozo está adequado à sua colocação em cena na Sob vários pontos de vista, a identidade sexual do travesti sustenta-se somente, portanto, através do olhar do outro, convocado como a garantia ternária da atribuição fálica. Esta estratégia vale ainda mais à medida que a atribuição fálica é assim recusada nos seus últimos limites, isto é, ao preço da mascarada e da enganação quanto à identidade sexual feminina. É assim que a dimensão estética é inevitavelmente trazida para o centro da cena no travesti, até o ponto em que ele termina por torturar-se em uma servidão implacável. Gostaria de de abordar este ponto de um ângulo que concerne diretamente à própria noção feminilidade. Se é de uso corrente convir que é o homem que faz a de uma maneira idêntica poderíamos convir que é a mulher que institui a Em sua obra De la Jean Baudrillard defende a tese da feminilidade como princípio de incerteza. Segundo ele, a feminilidade faria "vacilar os pólos Ela não seria o pólo oposto ao masculino, mas, ao contrário, o que aboliria a própria oposição distintiva. Além do mais, onde a feminilidade é mais incerta, a dúvida é maior. Ora, é precisamente no próprio jogo da feminilidade, isto é, nos travestis, que ela é mais incerta.
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Para Baudrillard, seria principalmente o jogo de indistinção do sexo que animaria o travesti: encanto que eles exercem sobre si próprios vem da vacilação sexual e não, como é costume pensar, da atração de um sexo sobre o E Baudrillard prossegue assim: "Para que haja sexo, é preciso que os signos dupliquem o ser biológico. Aqui, os signos se separam, não há mais, então, sexo propriamente dito, e os travestis são apaixonados é pelo jogo de signos; o que os encanta é seduzir os próprios signos. Tudo, para os travestis, é maquiagem, teatro, sedução. Parecem obcecados pelo jogo do sexo, mas o são, em princípio, pelo jogo, e se a vida deles parece mais investida sexualmente que a nossa, é por que fazem do sexo um jogo total, gestual, sensual, ritual, uma invocação exaltada, mas Que o travesti goze seduzindo os signos da feminilidade, eis um compo nente essencial dessa perversão. De fato, a dimensão da sedução é uma característica fundamental qual devemos relacionar a fas cinação que ela exerce sobredoo travestismo, outro. Comoàobserva igualmente Baudrillard: "Uma mulher que se movimente entre os signos está mais apta a ir ao fim da sedução do que uma verdadeira mulher, já justificada por seu sexo. Somente ela pode exercer uma fascinação pura, porque mais sedutora que Com efeito, é sempre quando o sexo real aparece que somos confron tados ao ponto máximo dessa fascinação ordenada ao gozo. A sedução parece assim mais sublime do que o sexo como tal. No travesti, a sedução duplica-se em uma paródia implacável do feminino. Não é simplesmente uma anexação pelo homem do arsenal de sedução da mulher. É uma paródia da feminilidade tal acentuar como os ohomens imaginam e a põem em somente cena. travesti não cessa de fato deaque a feminilidade reduz-se ao signos com os quais os homens a revestem. É em nome dessa paródia que o travesti se condena, a ser o escravo da estética feminina. Tal servidão pode, aliás, margear a dimensão da própria Estética, no sentido filosófico do termo. Teríamos como prova os tormentos estéticos de um criador como Molinier. Célebre artista de Bordeaux descoberto por André Breton, Pierre Molinier, mais que através da pintura, entregar-se-á ao procedimento foto gráfico como meio mais apropriado para exprimir sua perversão, essencial mente o travestismo.
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Ele gozava tanto quanto observando-se depois, em suas próprias fotos. Em outros termos, gozava do próprio fascínio que exercia sobre si mesmo. De fato, esse gozo orquestrava-se em dois momentos: o da fotografia, quando ele se em mulher fazendo poses eróticas; e o do "desvelamento" dos clichês fotográficos, que retocava para transformar em obra de Seu gozo perverso era uma curiosa mistura em que, não sem um certa genialidade, o erotismo mais provocante aliava-se a emoções estéticas e metafísicas, de que é testemunha o curto trecho a "Nesta fotografia, um pouco à esquerda do ombro esquerdo, meu rosto de "velho reflete-se num espelho, espelho no qual admiro a perspectiva do buraco do meu ânus violado, empalado, de minhas pernas com meias finas e de meus pés calçados de salto alto, espetáculo que me excita incrivelmente. Meu está coberto com uma meia muito fina. Mexendo-me com um movimento de vai-e-vem, o pênis artificial afaga voluptuosa mente o buraco do meu ânus, meu pinto tão suavemente envelopado tem um prazer extremo em agitar-se sobre as almofadas que são "coxas", é-me difícilextraordinária resistir por mais tempo;deassim, o orgasmo surpreende-me com uma avalanche felicidade, de volúpia, capaz de me fazer perder a sensação de existir, o prazer de ser enrabado e enrabador, prazer extraordinário que nos faz atingir a única verdade de nossa razão de existir, resolver o problema da androginia inicial; fenômeno que nos faz perder a noção do espaço e do tempo, que nos precipita, que nos mergulha em "um tempo da morte" que se perde no inexplicável do infinito, um tempo sem limite, sem fim nem À sua maneira, Molinier deixou-nos assim uma verdadeira obra estética dos efeitos de sua própria sedução óptica, à qual ele se sacrifica sem limites. Tentemos recentrar essa problemática da paródia feminina na lógica psíquica do travesti. A função do travestismo é, antes de tudo, uma função de defesa frente à angústia de castração, mobilizada pela percepção da diferença dos sexos, ou seja, nesse caso, a ausência de pênis na mãe. A indumentária virá, assim, metaforizar a recusa dessa ausência. travesti não cessa de sustentar a contradição entre um corpo que tem um pênis e um disfarce feminino que lesa seu corpo de É dessa forma que ele atualiza a clivagem psíquica de que nos fala Freud em seu célebre estudo sobre
Indivíduo desprezível. Termo oriundo das tribos tunisianas da
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Exibir seu sob indumentária feminina traduz, no travesti, a ilusão imaginária à qual ele não pode renunciar. Nesse sentido, há certos pontos em comum entre o travestismo e o Além da problemática fálica que governa habitualmente o curso das perversões sob o modo da recusa, o travesti e o fetichista têm em comum esta relação imaginariamente alienante com o pai idealizado, cujas insígnias de sua atribuição fálica se esforçam em se apropriar, na falta de poder reconhecê-la nele. fetichista alcança isso na ilusão de uma escolha de objeto fálico, com o qual ele dota a mulher. travesti dedica-se a isso por uma adesão inversa, ou seja, uma escolha de indumentária que o desvenda, a seus próprios olhos como para os outros, tal como a deveria ser. Tanto num caso como no outro, se a mulher é posta à distância como objeto ameaçador porque ela não deixa de ser um objeto possível pela intervenção desses artifícios imaginários. De fato, pude certificar-me de que um bom número de travestis mantém relações sexuais com mulheres, da mesma forma que um homem busca aí seu gozo fálico. Nesse sentido, a distinção previamente evocada entre "travestis heterossexuais" e "travestis homossexuais" é Na efervescência libidinal que se segue à "revolução da o adolescente travesti vai primeiramente "buscar seu rumo" acumulando, de uma maneira precária, uma série de experiências tanto homossexuais quanto heterossexuais. Assim, é só posteriormente que esta distinção, travestis "homossexuaisheterossexuais" terá sentido em termos de escolha de objeto. Além disso, um bom número de travestis ditos "homossexuais" são freqüentemente levados a essa prática por razões externas, ligadas principalmente às imposições materiais e sociais que conduzem à prostituição. Outros travestis - mantêm relações ditas "heterossexuais" de um modo masculino, quase num "parecer mulher". Encontrei vários que mantinham relações estáveis com mulheres. Seu gozo fálico não os impedia, entretanto, de sodomizar homens ou mulheres, ou até de serem sodomizados, mas isso na medida em que essas práticas existem nas relações heterossexuais entre homens e mulheres, fora de qualquer estrutura aperversa No fetichista, clivagemprecisa. entre sexo e indumentária termina em uma solução de "fechamento" via objeto-fetiche. Por exemplo, a eleição de lingeriefetiche sutura a beância provocada pela diferença dos sexos. objeto é ainda mais valorizado porque, ao mesmo tempo, dissimula e provê a mulher do que supostamente lhe falta. Nesse sentido, ele só pode pertencer a uma única mulher, escolhida, pois institui, somente a ela, sua atribuição fálica. fetichista pode, então, dar-se ao luxo de um gozo orgástico e tocando-o. Basta a marca feminina interiorizada no objeto (o odor, a forma, o tamanho, etc.) para governar seu gozo fálico. Também aí, esse gozo pode perfeitamente encontrar pontos de assunção sublimatória na dimensão da Estética. Evoquemos, por exemplo, o pintor
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John Kacere, que, há vinte e cinco anos, sublima seu fetichismo na reprodução de roupas femininas. De fato, através da mulher e da lingerie, ele não cessa de perseguir um verdadeiro encantamento destinado a colmatar a falta. Se todo o seu sucesso parece apoiar-se no erotismo que creditamos às suas obras, na realidade, seu trabalho exprime muito diretamente o próprio tipo do gozo do fetichista. A prova seria este feroz esforço de que constitui o essencial de seu talento: reproduzir pela pintura o brilho dos tecidos, a textura da pele, a silhueta dos drapeados, a sutileza das transparências sobre a anatomia dos quadris de mulheres erotizadas. Não poderíamos melhor comentar do que ele, o fetichista colmata sem cessar a clivagem entre a aparência e a realidade: "Mesmo que a moda, a cada ano, imponha à mulher novas obrigações e incômodos, continuo adorando as roupas de baixo que a tornam sexy. Tenho, aliás, uma cômoda cujas gavetas transbordam de calcinhas de todos os tipos, de ligas de todas as formas, de meias coloridas. Tenho uma coleção incontável de roupas de baixo, da simples calcinha de seda ao kimono ricamente decorado. Mas nunca estou satisfeito, nunca tenho o E Kacere prossegue: "Não acho que minhas pinturas sejam eróticas ou sexuais. A sexualidade, o erotismo exprimem-se na ação. Não há nenhuma ação nas minhas pinturas. Somente uma contemplação. A de um desejo persistente, de um desejo sem fim, que me esforço em traduzir. Assim, não há fim à minha busca desse travesti sustentará sua própria clivagem colocando a ênfase essencialmente na aparência. Não se trata, para o fetichista, de mascarar a ausência de pênis na mãe (mulher) sacralizando o que pode esconder seu sexo ou tanto o quetempo aí se encontra metonimicamente ligado. Convém, para ele,o manter quanto possível a ilusão na realidade: dissimular pênis real atrás da aparência da mascarada corporal e indumentária feminina. Na sua totalidade, a estética feminina tem o papel de véu quanto à questão enigmática do sexo da mulher. De qualquer forma, a ostentação do feminino é destinada a neutralizar o feminino sexuado enquanto tal. Por essa razão, a volúpia do parecer feminino paga-se ao preço de imposições tirânicas. Nada deixaria de ser sacrificado para que o travesti rendesse assim homenagem, em seu corpo e sobre seu corpo, às insígnias do feminino. Desse ponto de vista, é interessante distinguir duas séries de fenômenos subjetivos segundo o "parecer feminino" é proposto ao olhar dos outros ou, ao contrário, é oferecido ao próprio olhar do interessado. Distinguirei,
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assim, dois registros de imposições. De um lado, as imposições de outro, as imposições estéticas locais, isto é, essencialmente corporais. No que concerne às imposições especulares, trata-se sobretudo de su blinhar a "servidão" do travesti ligada à sua própria repres enta ção conf rontada a seu olhar, ou seja, este momento de imaginarização subjetiva em que, sucessivamente, ele se seduz e fascina a si próprio na qualidade de mulher. Como veremos, essas "imposições especulares" ordenam, de certa forma, as "imposições locais" que são essencialmente somáticas e indumentárias, a fim de assegurar o substrato do "parecer feminino". No travesti, a função do espelho representa um momento de elaboração subjetiva capital. É o momento mágico em que se realiza a materialização especular da imagem de homem em imagem de mulher. Tal transformação supõe, evidentemente, algo prévio: a inscrição de uma representação psíquica de um feminino. Ou seja, a projeção desse protótipo que vai progressivamente colar-se, superpor-se à imagem masculina percebida no espelho. Assim, a mutação efetua-se simultaneamente no âmbito imaginário e no da realidade. De algum modo, a operação encontra sua saída quando a realidade aparece conforme o imaginário. É o delicioso momento de volúpia em que se constrói a aparência feminina. É também um momento infernalpelos ondevestígios o corposomáticos traz de recalcitrantes volta, impiedosamente, o masculino, ao menos que é preciso mascarar permanentemente. A maioria dos travestis que consultei a esse propósito confessaram mais ou menos a mesma coisa: a maquiagem é sempre uma operação que deve ser executada no mais completo isolamento - ou no máximo, somente entre eles. Tudo se passa como se a sustentação do fantasma/fantasia especular da feminilização não pudesse suportar a intrusão do olhar de um terceiro. Algo parece operar aqui em torno da questão do "estágio do Nessa identificação primordial da criança, onde, ao contrário, o olhar do Outro vem embasar o proc esso é principalmente a sustentação do olhar da mãe que encoraja esse processo de reconhecimento, isto é, a assunção jubilatória de sua verdadeira em função da imagem especular que a criança reconhece como identidade sua. É um acaso se a assunção imaginária da identidade de um outro sexo só pode se efetuar na ausência de todo olhar terceiro? A questão permanece aberta, mas merece toda a nossa atenção. Uma outra observação que pude fazer concerne igualmente à confrontação dos travestis com a sua própria imagem no espelho. Ela não é de forma alguma sem relação com a precedente. Alguns deles confirmaramme que recusavam qualquer relação sexual com um parceiro masculino em frente a um espelho, enquanto que esse mediador erótico cumpria plenamente sua função excitante com parceiras femininas. Com exceção de alguns travestis prostituídos que consentem nisto como é de bom tom em
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todos os locais habituais da prostituição, essa "clivagem" sexual parece ser bem constante em todos os outros. que parece impedir o travesti de poder sustentar sua própria masca rada sexual com um homem na frente do espelho? É como se o olhar de um parceiro masculino no espelho provocasse instantaneamente a queda dessa mascarada feminina, que é precisamente montada com grande ajuda do imaginário pelo travesti, face a esse mesmo espelho. Sem dúvida, essa mascarada da pseudodiferença sexual fracassaria, por uma simples razão: um parceiro masculino não pode deixar de trazer de volta a diferença real dos sexos. Reencontramos, nesse processo, algo da ambivalência dos travestis em relação aos homossexuais masculinos, que pode, aliás, transformar-se facilmente em ódio. Além dessas imposições especulares subjetivas, centremo-nos agora nas imposições estéticas locais que lhe são vinculadas. "parecer feminino" do travesti jamais se coloca na mesma medida que as aspirações estéticas femininas. Trata-se, como evoquei precedente mente, de subverter os signos da feminilidade mais do que se utilizar deles. travesti também se dedica a isso, muito mais sob a forma de um acúmulo de paródia do que de estilo, de inspiração ou de escolha. Mais do que nunca, aqui, a necessidade de iludir tem força de lei. Convém, antes de tudo, neutralizar os signos somáticos que traem a virilidade. A empresa jamais é fácil, pois coloca imposições tão múltiplas quanto os vestígios masculinos são recalcitrantes. Além disso, elas são tanto mais significativas porque sujeitas ao poder aquisitivo dos travestis: a diferença de classes sociais existe igualmente nessa população marginal! Examinemos o problema dos cabelos. É sempre uma imposição difícil de controlar. De fato, muitos homens ficam rapidamente "carecas" ou des tinados a sê-lo. Além disso, os tratamentos hormonais conduzem freqüen temente a efeitos secundários de alopecia, a quedas de cabelos mais ou menos significativas. Um deles disse-me sofrer de calvície no momento de sua transformação, de onde a necessidade de recorrer a um tratamento à base de poleína e minoxydil para frear o processo. Como não existe milagre nessa matéria, eleapresentar teve entãosua que"verdadeira" se resignar cabeça, a usar auma sempre a mesma, a fim de queperuca, ele queria mostrar aos outros permanentemente. De onde sua conclusão resignada: "Preciso de uma bela peruca e, sobretudo, de um bom cabeleireiro!" Outros travestis recorrem igualmente aos "implantes". É uma técnica incerta, além de altamente custosa. As imposições ligadas à depilação são, sob vários aspectos, ainda mais espinhosas. É uma operação que se realiza em dois tempos. Uma primeira ofensiva tem por objetivo eliminar a totalidade dos pêlos supérfluos: os do peito, dos braços, dos antebraços, das mãos e das pernas, e também a barba. A técnica mais eficaz ain da é a depilação elétrica por eletrocoagu lação. método é seguramente longo, pois necessita ser reiterado várias vezes,
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principalmente para a barba. tratamento completo pode durar de dezoito mese s a dois ano s antes de garanti r verdadeiramen te " cam po Parece-me que a amplitude do problema situa-se na medida desta expressão pitoresca mencionada por um desses "Os pêlos são como soldados organizados. Quando uma linha tomba, na frente, uma outra linha apressa-se a colocar-se em seu lugar, na retaguarda." Em todos os casos, os pêlosforma, voltamcrescem a crescernovamente. menos espessos, abundantes, mas, de qualquer Não semenos pode, então, escapar à rotina que é a da "manutenção" corriqueira de todas as mulheres: cremes e loções depilações com cera quente e fria. Quanto ao tratamento hormonal, este é habitualmente prescrito e acom panhado por um médico A base da prescrição é o Esse hormônio age ligeiramente sobre a pilosidade, mas de forma alguma sobr e a barba e a voz. Por fim, provoc a a atrofia dos testículos e a esterilidade. Mas sua ação mais manifesta produz-se em relação aos seios, que começam a se desenvolver depois de alguns meses de tratamento. Segundo um tempo que varia de acordo com os indivíduos, os seios terminam por adquirir um certo volume e uma forma arredondada significativa sob o efeito prolongado do estradiol. Certos destinadas travestis, impacientes, preferem recorrer intervenções cirúrgicas estéticas a obter, rapidamente e "soba medida", um peito de mulher com próteses mamárias em silicone. estradiol age, igualmente, sobre a distribuição das gorduras localizadas que se tornam mais notadamente quanto ao rosto, cujos traços afinam-se, e sobre a pele, que se amacia. Neste último caso, trata-se de um gel estrógeno utilizado em fricção sobre o rosto, os braços, a barriga e as coxas. problema da voz dos travestis constitui igualmente uma imposição crucial. Parece-lhes inaceitável ser "mulher" e se exprimir com uma voz grave demais. Quanto a isso há duas soluções. Uma intervenção cirúrgica pode modificar o estado de tensão das cordas vocais para tornar as vibrações mais agudas. É uma solução tanto delicada quanto custosa e que, de qualquer forma, uma reeducação vocal. Ora, essa reeducação é a segunda solução,necessita à qual nenhum travesti pode escapar. Embora mais laboriosa que a primeira, ela conduz, no entanto, a resultados satisfatórios. Exige a reali zação de exercícios vocais regulares que levam progressivamente os travestis a falarem com uma "voz de falsete". Numerosos travestis confiam esta apren dizagem aos cuidados dos Os mais favorecidos se propiciam igualmente algumas "aulas particulares" com professores de canto, que os fazem trabalhar com exercícios de Freqüentemente tudo isso resulta nesta voz específica, insegura, que lembra, ela também, a mascarada. No mais, as vozes mais bem treinadas terminam sempre por se trair. No início de um diálogo, a voz dos travestis consegue manter-se num registro agudo, conforme eles desejam. Todavia,
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se a conversação se prolonga, as cordas vocais desgastam-se gradualmente. É mesmo curioso constatar que os sons terminam por retomar seu vocal masculino de srcem ao cabo de um certo tempo, e isto contra a vontade do e para seu grande desapontamento, quando enfim o percebe. Resta a abordar um último ponto, menos obstaculizante que os precedentes: a maquiagem e o aparato relação àou maquiagem, um dado constante pode ser registrado em todosCom os travestis, o medo de serem confundidos com prostitutas, ainda mais porque a opinião pública tende a identificar logicamente os travestis com a prostituição. Uma "verdadeira" mulher deve permanecer natural. Todos os travestis gostariam de poder utilizar pouco ou nada de maquiagem. No entanto, os travestis prostituídos identificam-se de bom grado com seus homólogos femininos, e isto de maneira perfeitamente excessiva, para parecer mais mulher que uma mulher. Todavia, prostituídos ou não, os travestis permanecem confrontados a dificuldades obsessivas quanto ao rosto, essencialmente no que concerne aos vestígios refratários da barba e das sobrancelhas. Nesse sentido, a "maquiagem natural" permanece um desejo fervoroso. Se toma dianteira, é sobretudo o da mascarada, pouco compatível como natural o cuidado dea discrição. De uma maneira bem próxima, observamos uma defasagem idêntica entre o cuidado imaginário de discrição indumentária e sua atualização na realidade. De fato, no plano as imposições são igualmente pesadas. Como me dizia um dos travestis com que conversei; "Não é fácil encontrar sapatos de salto alto número 42 ou 44 A seu jeito, um outro me confiou: "Quando se começa a transformação por volta dos cinquenta, como foi o meu caso, torna-se difícil encontrar, para um bom 48 como eu, roupas de baixo que não sejam destinadas à terceira idade." Para além da natureza dessas imposições materiais, é importante aos travestis criar a mais perfeita ilusão. Eles não recuam diante de nada para possuir esseque aparato como as mulheres, mas então como faltar eles imaginam os homens imaginam não as mulheres. Nada poderia ao arsenal Além dos imperativos inconstantes da moda, a exigência de paródia permanece sempre presente. Eis porque o travesti situa seu estilo indumentar nos limites da provocação erótica, ainda mais porque a masculina com freqüência ofende o perfil e o corte de certas indumentárias e roupas de baixo femininas. Quanto a este assunto, um deles me dizia: "Comprar uma calcinha minúscula ou um sutiã meiataça é a consagração da nossa De fato, é freqüentemente no âmbito das roupas de baixo que a paródia conhece sua amplitude máxima. Se os problemas ligados à prova da lingerie
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feminina mostram-se delicados para os travestis, felizmente a venda por correspondência com catálogos resolveu bem essa questão. Entretanto, curiosamente, os travestis permanecem refratários a certas disposições femininas, notadamente no que concerne à mobilidade de escolha e de uso de roupas íntimas. Eles permanecem, a maior parte do tempo, tributários de um capital de lingerie em relação ao qual mostram-se solidariamente cativos, das circunstâncias e dos incô modos eventuais dessesindependentemente objetos. Essa particularidade não deixa de evocar uma certa proximidade com o fetichismo. Para ficar somente um exemplo, lembremos aqui o uso incon dicional, pelos travestis, desta peça de lingerie denominada "liga". Na sua obra Histoire imprévue des dessous Saint Laurent menciona que a invenção da feminina jamais chegou a destronar o uso das ligas e das meias. No entanto, observa, esse uso se modificou completamente nos últimos trinta anos. Hoje, parece que ele se tornou manifestamente deliberado entre as mulheres. A isto, acrescenta, essa atitude somente é adotada na medida em que é investida de uma significação tanto para elas quanto para os outros: "Seu uso não éastão corrente no tempo que servia para segurar meias; mas quanto uma mulher queem a compra hojeunicamente o faz com uma intenção erótica. Algumas somente recorrem à liga numa noite em que esperam emoção. Acontece ainda que elas a utilizem somente para ir ao Quanto a esse objeto de lingerie, é preciso convir que os travestis são totalmente refratários a essa flexibilidade quanto à utilização. Ao contrário, é como se essa da indumentária encarnasse magicamente um dos emblemas da feminilidade à qual eles devem se sujeitar, custe o que custar. Sem insistir ainda mais nesta amostra de imposições, parece que nenhu ma delas poderia dissuadir o travesti de seu empreendimento de paródia de adesão à feminilidade. A captação subjetiva operada pela imagem da mulher é irrecusável. A prova seria este último testemunho com o qual concluirei: "Há uma espécie de cumplicidade e mesmo de fascinação que se instaura com o espelho no qual nos É como se fosse uma espécie de espelho mágico capaz, po r ele mesmo, de nos enviar essa imagem que tanto Aconteceu-me de olhar a mim mesmo e de ter necessidade de tocar meus seios, minhas roupas de baixo, para estar certa de que era realmente eu." NOTAS Este capítulo foi redigido a partir de uma conferência proferida a 8 de março de 1990 no grande anfiteatro de Sainte-Anne no quadro do "Centre des recherches et d'études freudiennes"
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de pesquisas e de estudos freudianos] dirigido por R. Dorey, tendo sido publicado sob forma de artigo in Adolescence, 1990, tomo 8, 2, pp. 217-232. As múltiplas observações de R. J. Stoller, para só citar esse autor, causam freqüentemente essas confusões. Ver, por exemplo, uma de suas últimas obras, Masculin, Paris, P.U.F., 1990. 2. Ver Rosolato, "Perversion", in Encyclopédie médico-chirurgicale, "Étude des perversions sexuelles à partir du fétichisme", in Le désir et la perversion, op. cit., pp. 7-40; Essais sur le symbolique (1969), Paris, Gallimard, col. "Tel", 37, 1985 (e notadamente o cap. "Généalogie des perversions", pp. 264-286). 3. J. Clavreul, "Remarques sur la question de la réalité dans les perversions" (conferência proferida na Sociedade Francesa de Psicanálise, a 7 de maio de Primeira publicação in La psychanalyse, 8, Fantasme-Rêve-Réalité, 1964, pp. 193-218), in Le désir et la loi. Approches psychanalytiques, Paris, col. "L'espace analytique", 1987, p. 196. 4.
p. 195. Ibid. Ibid. in Esquisses psychanalytiques,
7. Ver meu artigo, "L'identité sexuelle et le 6, outono de 1986, pp.
D. Berger, in La vie sexuelle, op. cit., p. 135.
8. Ver S. Freud, "Le fétichisme" (1927),
Ver J. Dor, cap. XVI: "Sexuation, identité sexuelle et avatars de l'atribution phallique", Structure et perversions, op. cit., p. 232.
in
10. Ver P. Aulagnier-Spairani, "Remarques sur la féminité et ses avatars", op. cit., in Le désir et la perversion, pp. Publicado em língua portuguesa sob o título "Observações sobre a feminilidade e suas
transformações", op. cit., pp. 67-111.
11. Ver J. Lacan, Le savoir du seminário inédito de de junho de 1972: "Afinal, é só mesmo de uma mulher que se diz - ela é viril. Se vocês ouvirem falar de um tipo nessas condições, me mostrem, porque tenho muito interesse no caso. Em compen sação, se o homem é tudo o que vocês quiserem, em forma de qualidade, e se submete a todos os caprichos, o viril está do lado da mulher; e somente ela acredita em virilidade." 12. J. Baudrillard, De la séduction, Paris,
1988.
p. Ibid. p. 26. 16. Ibid. 17. Trata-se de um texto intitulado "L'explication", que Molinier endereçou ao Georges Pompidou acompanhado de uma foto, por ocasião do Ano Novo. 18. Citado por G. Roux e Vincent, "Les clichés de Pierre Molinier: au doigt et à l'oeil", in Psychologie médicale, 17, 9, 1985, p. 1338. 19. Ver G. Bonnet, "Le travestisme", p. 21.
in Encyclopédie médico-chirurgicale, 1985, 37390 A 10,
CLÍNICA PSICANALÍTICA 20. Ver S. Freud, "Le fétichisme", 21. Ver G. Bonnet, "Le
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in La vie sexuelle, op. cit., p. 137. in Encyclopédie médico-chirurgicale, op. cit., p. 21.
22. Ver P. Gutton e A. Birraux, virent qu'ils étaint nus". Différence et complémentarité des sexes à in Psychanalyse à l'université, VII, 28, 1982, p. 672. "Entrevista com Paul
in John Kacere, Paris, Lavignes Bastille, Filipachi, 1989, p.
92. 24.
p.
Ver J. Lacan, "Le stade du miroir comme formateur de la fonction du Je telle qu'elle nous est révélée dans l'expérience psychanalytique" (palestra proferida no Congresso Inter nacional de Psicanálise, em Zurique, em 17 de julho de 1949), in Écrits, op. cit., pp. 93-100. Ver também J. Dor, cap. XII: "Le stade du miroir et in Introduction à la lecture de Lacan. 1. L'inconscient structuré comme un langage, op. cit., pp. 99-104. 26. Ver J. La question transsexuelle, Paris, Lumière et Justice, 1986. Ver p. 34 e p. 78. É preciso cerca de duzentas horas de tratamento para chegar a depilar completamente um rosto. Ora, todas essas sessões são dolorosas e não podem ser prolongadas além de vinte minutos. 27. Ver 28. Ver 29.
p. 36. Saint Laurent, Histoire imprévue des dessous féminins, Paris, Herscher, 1987. pp. 245-246.
10 e deslocamento na estruturação das linguagens delirantes
s mecanismos de "condensação" e apontados por Freud como agentes privilegiados do processo primário no modo de produção das formações do inconsciente, pontuando de ocor rências decisivas o material evocado pelo sujeito no espaço do tratamento, constituem, no quadro da clínica das neuroses, o testemunho primordial do que se sabe em relação à "outra Esses mecanismos, às vezes particularmente fecundos na articulação da expressão, podem também ser considerados como os promotores essenciais em jogo na estruturação de certos discursos delirantes, e isso, tanto sob o aspecto de produções tão pontuais como os neologismos, quanto através de elaborações bem mais organizadas do tipo neolinguagens e glossolalias psicopatológicas. Em todos os casos, a localização desses processos, que significam al guma coisa do desejo inconsciente, não somente funda a possibilidade de uma melhor inteligibilidade de certos discursos delirantes, mas também possibilita por essa mesma via a eventualidade de uma intervenção pertinente em relação a eles. Na literatura psiquiátrica, que comporta relativamente um grande nú mero de observações sobre a psicopatologia da os impressio-
DOR
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nantes trabalhos de J. recensearam de forma judiciosa série impressionante de materiais clínicos ligados aos processos de neoformação lingüística nas linguagens delirantes. Certas observações bastante acuradas evidenciam, assim, com bastante segurança, a intervenção dos mecanismos de "condensação" e de "desloca mento" que constroem a estruturação dos discursos delirantes. Ou seja, várias que na ilustram de forma notável a mobilização das determi nações"amostras" inconscientes elaboração das neoformações lingüísticas. A título introdutório, retomarei algumas dessas observações mais representativas. Em primeiro lugar, o exemplo dos neologismos exclusiva mente construídos por processos de condensação. Em segundo, moda lidades de expressão neolingüísticas bem mais elaboradas, do tipo solalia, onde intervêm conjuntamente condensação e deslocamento, em relação com as questões inconscientes mais complexas. Enfim, um caso de neolinguagem diretamente articulado à situação transferencial no curso de um tratamento. HOMEM
MARCHA E
Desde a Traumdeutung, estamos familiarizados com o fundamento dos processos de neoformação lingüística que vêm pontuar os conteúdos manifestos dos sonhos. De Propylène a localizamos aí o mecanismo de condensação que opera continuamente no empreendimento de deformação do sonho. Em "A injeção feita em Irma" Freud ilustra bem, com efeito, a aplicação da condensação que conduz à elaboração do neologismo: PROPY (AMY)
(LEE) LENE
Esse processo tão habitual do sonho encontra-se igualmente nas linguagens delirantes, onde ele parece vir assumir uma função de mesma ordem, em articulação com os desejos inconscientes. Um exemplo bastante especial nos é dado pela observação trazida por Jaroslav Stuchlik e Jean Localizam-se aí processos de condensação particularmente interessantes no sentido em que concernem diretamente os dois processos descritos por Freud, a propósito do sonho: • a condensação das palavras (do tipo propylène e • a condensação das imagens (do tipo das pessoas
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Essa observação apresenta a vantagem de trazer materiais de conden sação sob uma dupla e solidária forma: resultando de uma correspondência estreita entre linguagem escrita e linguagem dese nhada. paciente observado por Stuchlik e Bobon produziu uma primeira série de Seu caráter particularmente incomum deve-se sobretudo ao fatodedeseres que eessas realizam certas combinações mistas de composições cujográficas agenciamento heteróclito constitui enti dades imaginárias, um pouco à maneira das construções de Max Ernest. Algumas dessas composições são, além disso, cercadas de gerúndios bem inesperados®, dado que esses neografismos desdobram-se em neologismos ou seja: o o o slondal, a o clochodom. Essa série de neologismos-neografismos utiliza exatamente o mesmo mecanismo de condensação do tipo e Restituindo a tradução dos termos tchecos, obtemos os seguintes materiais. ou seja: "o cavalo
(balbuciar)
Kun (cavalo)
ou seja: "o boi-peixe-caranguejo"
(boi )
Ryba (pei xe)
(caranguejo) ou seja: "o
(elefante)
(pedais)
ou seja: "a
(tartaruga)
Vul (boi)
ou seja: "o homem-cabana-em
(homem)
(marchar)
(cabana)
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Ficaríamos tentados a imaginar que se trata de um simples produto de uma atividade lúdica, de um jogo verbal resultante de neoformações construídas ao acaso. Seguiríamos assim uma idéia judiciosamente exposta por que explica como tais neoformações resultam de contaminações verbais que devem ser atribuídas ao encontro fortuito de "representações flutuantes" Essa teoria (bem próxima da concepção do sonho em Bergson) poderia explicar, em certa medida, o caráter pueril desses neologismos-grafismos. A teoria analítica permanece sendo, entretanto, mais apropriada para explicar essas neoformações. Aos encontros fortuitos de "representações flutuantes", parece mais pertinente substituir o termo "associação". Assim como a idéia de "formações ao acaso" deve ceder seu lugar à de "formações de Se a atividade lúdica está incontestavelmente presente (e Freud não deixa de dar o exemplo com a interpretação psicanalítica do chiste), podemos perfeitamente pensar que essa atividade lúdica manifesta-se, aqui, prioritariamente como uma escapatória, como uma forma particularmente sofisticada de deformação das moções libidinais, mais do que como um desígnio lúdico por si só. Além do mais, essas neoformações não deveriam ser dissociadas da dinâmica dos desejos inconscientes, como testemunha a segunda série de dinâmica particularmente insistente, Esta segunda série de neologismos neografismos foi realizada a partir de seis "constituintes gráficos" de base, ou seja: • um "peixe" • uma "virgem" • uma "chupeta" • uma "lagarta" • uma "vaca" • uma "máquina"
poisson
em em francês], (desenho de uma jovem nua); em francês], (desenho de um bico de bebê); em em em francês] , (d esenh o de uma locomotiva).
pucelle
poicelle
suçon
sucelle
poisucelle
chenille
sucenille
sucelile
poisucelille
vache
machine
vachenille
mache
suvachenille sucevachelile
poisucevachelille poisucevamachenille
machenille sumachenille
sucemachenille
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Os mecanismos de condensação operam-se aqui sob a forma de fusão de formas e de estruturas lingüísticas simples, para chegar, segundo um processo de complexificação hierárquico, a "neologismos-neografismos" par ticularmente elaborados que propiciam a construção de um composto final bem insólito. Essas diferentes operações parecem bem menos produto de um efeito do acaso do que o resultado da incidência de desejos inconscientes que operam no sujeito sem que ele se dê conta. No mais, a atitude do sujeito em relação às suas próprias produções é particularmente significativa. Quando ele se interroga sobre a srcem desses materiais, eles surgem em seu espírito bruscamente, conforme explica; ele também permanece perplexo face às suas próprias obras de composição. AS
A C O N D E N S A Ç ÃO E
DESLOCAMENTO
Ao lado das construções neológicas elementares do tipo precedente, certas observações clínicas restituem elaborações neolingüísticas que são tanto mais incoerentes e discordantes quanto mais ricas em materiais e que deixam supor uma organização sintática, mesmo que rudimentar. Essas neoformações lingüísticas constituem verdadeiras neolinguagens e são habitualmente designadas, desde Flournoy, pelo termo termo extraído da psicologia religiosa e introduzido na terminologia psiquiátrica desde seu célebre estudo: Des à la planète estudo das glossolalias é interessante pelo menos por duas razões. Em primeiro lugar, mostra bem a que ponto os processos de condensação e deslocamento estão presentes na formação das linguagens delirantes, indicando assim a importância dos mecanismos inconscientes que intervêm no trabalho do significante no curso dos delírios. Em segundo lugar, as glossolalias enfatizam a preponderância das determinações inconscientes infantis capazes de promover os delírios. a) e o "salisjeur" Um exemplo de glossolalia é dado por Maeder no curso de uma obser vação. F. R. é um demente paranóide internado há 16 anos: "Ele vive isolado como um monge no meio de uma centena de pacientes igualmente crônicos. Jamais dirige espontaneamente a palavra a alguém, nem mesmo ao médico que se ocupa especialmente dele há mais de um ano. Ele pronuncia longos monólogos, entretém-se em voz alta com seus inimigos imaginários; escreve e preenche cadernos, mas não se compreende nada de sua língua, tanto a escrita quanto a falada. Eis um exemplo:
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"In laut Unser Kleinen Interesse der Biographie in Lebzeit! für den Beihalltacodant Ein langer, Reigen Der Ofidend Zeit! im Heimat Statt; u Eigener Schulbildung in Reien, Seeliger! bildung. Durch Unsere Lehrer u Pgfarer u Lehrfach! Meister und Un seriger Fac h Asterfleiss. Der Ipsilong Y. gräcker Litera tur! Klassischen Leitfaden, und mit. Maeder irá se esforçar por decifrar esse sistema de linguagem delirante, utilizando duas técnicas bem conhecidas: a técnica das associações livres e a técnica projetiva. De fato, esses dois métodos permitirão que ele faça surgir nessa lin guagem aparentemente incoerente, um vocabulário bem rico e impressio nantemente fixo. A linguagem de seu paciente é a "Língua das Excelências" Exou "salisjeur" Sua língua materna, o alemão, é somente um dialeto par a o uso das pessoas comun s. ao contrário, é uma linguagem superior, de tal forma que seu vocabulário é inteiramente constituído por um conjunto de denominações melhores das coisas existentes, manifestamente em relação com suas preocupações Assim, surge(sua toda uma materna) terminologia bem rica quetermos faz intervir termos de srcem alemã língua e francesa. Esses são objeto de substituições semânticas pelo jogo conjunto de mecanismos de condensação e deslocamento. Eis alguns exemplos: "horizontal" "parallel" "agradéable"
reta vertical linha horizontal partes maciças, grosseiras dos objetos partes delicadas dos objetos
Nesses exemplos, os termos são utilizados de uma maneira neológica no sentido de que as modificações semânticas fundam-se sobre uma substituição pura e simples dos significados em relação aos significantes. Consideremos agora os seguintes exemplos: "corporation" "proteriat" "agradation" "topotive"
o que tem relação com o corpo humano proletariado agitação movimento de um pistão no cilindro; pulsação; pressão; soco.
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Aqui, as modificações semânticas mais ainda em processos de deslocamento e de condensação um pouco sob a forma da metonimia e da metáfora. Um outro termo, é particularmente interessante, no sentido de que sua elaboração neológica não deixa de evocar um dos processos de deformação semântica que opera freqüentemente no trabalho do sonho. Se brojon significa um grande receitas"sem médicas, o paciente associa regu larmente a essa palavra o livro de"limpo", mancha", ou seja, precisamente o contrário de "rascunho Se levarmos em conta a pronúncia e o fato de que o paciente jamais teve a ocasião de aprender realmente o francês, vemos que há uma conexão semântica entre brojon e brouillon, mas isto de forma indireta, um pouco à maneira do sonho, onde um elemento manifesto como "vestimenta" envia ao elemento latente "nudez". Esses poucos mostram suficientemente bem a influência preponderante que os processos inconscientes exerceram no curso da ela boração do "Salisjeur". Além disso, Maeder observa que, do ponto de vista sintático, os verbos e as conjunções são raros, os pronomes praticamente inexistem, o que não deixa de evocar o caráter claramente regressivo, até mesmo infantil, dessa linguagem. Isto nos faz pensar na dimensão da re gressão Encontramos no "Salisjeur" predominância da afetividade eminfantil. razão do valor emocional de um uma grande número de termos. Por outro lado, é impossível não levar em conta a relação lúdica que o sujeito entretém com a sua neolíngua, que apresenta certos atributos essenciais das linguagens secretas infantis, com o que elas veiculam de preocupações inconscientes. Em relação a isso, a biografia pessoal do paciente corrobora suficientemente bem a natureza da problemática inconsciente que emerge no A "língua das Excelências", ferramenta privilegiada de ela boração de um mundo imaginário, não é senão um instrumento compensa tório que vem suscitar, para além de uma existência real decepcionante e penosa, a ilusão de um agir mais glorioso, traindo assim o desejo de ultra passar uma modesta condição pela magia ilusória do verbo. Todo o interesse desse estudo de Maeder é o de ter tornado possível o acesso a essa dinâmica inconsciente descobrindo a chave dessalivres linguagem possível graças à técnica das associações obtidasdelirante. a partir deExploração cada um dos materiais inconscientemente forjados pelos processos de condensação e de deslocamento. b) Flournoy e a "linguagem marciana No campo das glossolalias, o caso de Smith permanece único tanto por sua riqueza clínica quanto pela qualidade do estudo feito por Th. significa (N. do T.)
o termo
brouillon é sonoramente próximo do neologismo
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Vamos situar um pouco a observação. Durante seis anos (a partir de 1894), Flournoy assistirá regularmente às sessões de espiritismo de uma jovem glossolálica: Smith. Hélène Smith era filha de um pai húngaro poliglota e de uma mãe suíça que apresentou, as que parece, numerosos fenômenos de automatismo mental. Durante sua infância e adolescência, Hélène Smith desenvolveu o que erapor cada vez menos para viver este cotidiano terrestre, esentimento que estavadeligada, natureza, a umfeita outro mundo. Hiperemotiva e hiperimaginativa, ela apresenta bem cedo numerosas manifestações de automa tismo teleológico do tipo pressentimentos e alucinações diversas. Todos esses fenômenos acabam por se estabilizar quando Hélène tem vinte anos. Dez anos mais tarde, o acaso de um convite irá desencadear nela uma efusão de ficções, ilusões, alucinações hipnagógicas e hipnopômpicas que se cristalizam em torno da invenção de línguas inteiramente novas de uma rara fecundidade. Convidada a uma sessão espírita, Hélène Smith apresenta imediatamente manifestações de escrita automática. Vivamente encorajada pela assistência, ela torna-se médium e aos automatismos limitados do princípio sucedem-se estados de sonambulismo espontâneos ou sugeridos que irão em seguida ultrapassar o âmbito das sessões espíritas. Com efeito, fora das sessões, Hélène Smith passa a ser objeto de sugestões exteriores permanentes, de irrupções de fantasias subliminares de caráter alucinatório na consciência e de automatismos teleológicos variados. Esses fenômenos irão se exprimir sob a forma de três epopéias búlicas sucessivas: o ciclo astronômico, o ciclo oriental e o ciclo real. Cada um desses episódios quase alucinatórios irá se fazer acompanhar da invenção de linguagens srcinais, tanto escritas quanto faladas: a linguagem marciana, a ultramarciana, a linguagem uraniana, a linguagem hindu e a linguagem real. No dia 2 de fevereiro de 1896, em estado de sonambúlico completo, Hélène abordou o planeta Marte e repete as palavras que ouviu serem proferidas por uma marciana: "mitchma mitchmou tchouanimen mimatchineg masichinof patelki, abresinad navette naven navette mitchichenid naken Em seu despertar, ainda que não se lembre dessa encarnação da lin guagem marciana, ela se põe bruscamente a responder em uma língua completamente incompreensível e sem dar mostras de percebê-lo. Flournoy obterá então dela que lhe indique a significação de quatro termos marcianos: "metiche": "métaganische": "kin't'ch":
Senhor Senhora Senhorita quatro
CLÍNICA PSICANALÍTICA
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As visões marcianas multiplicam-se, acompanhadas de declarações sempre imediatamente ininteligíveis, das quais Flournoy chega, no entanto, a extrair a significação a ajuda de É assim que ela traduz para ele a seguinte declaração: né
haudan té
métiche astané, ké, dé, mé, vèche."
"Esta é a casa do grande senhor Astané que você Em agosto de 1897, Hélène escreve várias frases marcianas. As letras da escrita marciana lhe vêm no curso de uma alucinação A riqueza dessa linguagem escrita torna possível, em seguida, a transcrição do alfabeto Esse alfabeto é constutuído de signos distintos que correspondem à maioria das letras conhecidas, ainda que as letras "j", "w", "x", "z" não figurem nele. Por outro lado, signos igualmente distintos serão utilizados para exprimir o "s" inicial e o "s" duplo. Outros signos particulares parecem também terem sido criados para exprimir o plural, o ponto (pontuação) e o Depois de um certo tempo, Flournoy, que estudou pacientemente essa língua marciana, observou a Hélène que essa língua não apresenta, em definitivo, muito interesse, uma vez que é somente uma imitação do francês. Algum tempo depois, um novo personagem marciano faz sua aparição: sugere então a Hélène um novo mundo onde se fala uma língua marciana diferente: o ultramarciano. Logo em seguida, Hélène restitui alguns fragmentos dessa nova língua: "Bak, sanak, top anok, Como esperado, essas declarações ultramarcianas exigem uma dupla tradução: do ultramarciano para o marciano e do marciano para o francês. Tem-se então a significação BAK
SANAK
TOP
ANOK
SIK
sirima
nébé
viniâ-ti-mis-métiche
ivré
toué
ramo
verde
nom e de um hom em sagrado dentro
Algum tempo depois, a escrita ultramarciana fez igualmente sua aparição. É uma escrita que Hélène compõe ao longo de visões sucessivas sob a influência dos marcianos que lhe dirigem a mão ou que escrevem para ela caracteres que se esforça em reproduzir. Em seguida, Hélène pressente que falará uma terceira língua extraterrestre: a língua uraniana. De fato, no mesmo dia, durante um estado de sonambulismo profundo, Hélène pronuncia as seguintes palavras: "pa, lalato, nalito, bo... té zototi solota toda pé fâ mâ... nana tatazô ma oto
yoto... mé linoti to
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No que concerne à estrutura desta nova língua, encontrei alguma analogia entre sua transcrição francesa e certos tipos de "linguagens secretas" das crianças que pude observar. Eis um A
B
ao a
bo ba
N
C
D
E
F
ca
do da
eo ea
fo fa
P
Q
R
S
no
o
po
qo
ro
na
oa
pa
qa
ra
G
T
H
I
K
L
M
ho ha
io ia
ko ka
la
ma
U
V
X
Y
Z
J
yo sa
ta
ua
va
wa
xa
ya
za
Alguns dias mais tarde, Hélène enriquece consideravelmente sua linguagem uraniana, que ela transcreve por escrito, o que permite constituir um alfabeto que permance, apesar de tudo, em razão da relativa pobreza do material lingüístico uraniano, ou seja, um conjunto de signos que correspondem às letras A, B, D, E, F, I, M, P, T, Paralelamente ao ciclo marciano, desenvolve-se em Hélène um ciclo oriental cujas peripécias, desta vez, na Terra, mas no século No curso de estados de sonambulismo, Hélène reencontra o uso da linguagem que ela falava na corte de Sivrouka. Eis aqui um dos trechos mais notáveis: "Gâya gaya naia ia gaya, briti_ gaya pritiya briya gayâni i gâya mamata gaya mama nara mama patii si gaya ô gâya ityâmi vasanta_ gaya gayayâmi gaya priti gaya priya gâya Essa última produção é uma melopéia cantada por Hélène. Devemos a Ferdinand de Saussure, convidado a esta célebre sessão, ter coligido não somente as letras, mas também a transcrição musical. Nesse canto, Hélène endereça-se aos participantes e os convida a cantar: "Canta, pássaro, cantemos, Gaya, Adel, Sivrouka cantemos a primavera. Dia e noite eu sou feliz. Cantemos. Primavera, pássaro felicidade, ityiâmi mamanara priti, cantemos, amemos meu rei, Mioussa, Quanto ao ciclo real, ele não se caracteriza pela invenção de uma língua nova. Hélène Smith, completamente identificada com Maria Antonieta, assegura simplesmente pela sua atitude, seu falar, sua escrita e suas lem branças que ela é a encarnação da rainha.
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Um certo número de elementos biográficos pode explicar, ao menos em parte, a srcem desses diversos materiais lingüísticos. Por um lado, o pai de Hélène era de srcem húngara, o que deixa supor que ela deve ter conservado na memória alguns termos magiares. Por outro, seu pai era poliglota; ela deve ter tido, então, a oportunidade de ouvir falar inglês e italiano várias vezes. Além disso, ela aprendeu pessoalmente o alemão entre doze quinze anos. Enfim, ela ter tido nas uma "Gramática práticae da língua quedeve se encontrava no mãos apartamento de um dos membros da Sociedade de Estudos Psíquicos onde fez algumas de suas sessões. A partir dessa localização biográfica, a sagacidade de Flournoy permitiu evidenciar uma primeira série de análises sobre certos processos que puderam precipitar a elaboração das em Hélène Mas foi sobretudo o estudo minucioso de Victor Henry que trouxe à luz as fontes ocultas dos mecanismos de condensação e deslocamento que governaram inconscien temente a produção desses diversos episódios Flournoy estabelece, em primeiro lugar, que a fonética marciana é sempre uma reprodução do sistema fonético francês. Além disso, cada signo marciano (exceto o do plural) remete a um signo francês, de tal forma que se podecom dizer que o sistema de escrita marciano também correspondência direta o sistema de escrita francês. Quantotem à gramática marciana, é a reprodução pura e simples da gramática As análises etimológicas de Victor Henry farão não somente aparecer a srcem da quase totalidade das palavras do corpus marciano, mas também acentuarão a srcem inconsciente de certos mecanismos Enfim, descrevem claramente a sucessão dos processos de condensação e deslocamento que intervêm na elaboração da linguagem marciana. Para Henry, "as palavras marcianas podem ser relacionadas a palavras terrestres verdadeiras" e seu estudo chega às seguintes conclusões gerais: dos trezentos diferentes termos marcianos foi possível pesquisar a etimologia de 248 deles, levando em conta que os outros se repartiam em pronomes, preposições, artigos e nomes próprios. Assim, 190 termos redutíveis: a) ao(8),francês (110), (3). b) ao magiar (55), c) ao alemão (25), d)são a idiomas orientais e) ao inglês Quarenta e cinco termos resultam de contaminações ou derivações de palavras precedentes, ou seja, respectivamente, 29 termos e 16 termos. Restam 5 termos que constituir um resíduo Examinemos algumas das análises de Victor Henry a título de exemplo: semelhante "Metátese possível do francês (metade), pois nada se parece mais que as duas metades de um mesmo "Uri" noite
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"A idéia de "noite" implica "obsc-uri-dade", palavra longa demais em relação ao que queria significar, e que sofre então um violento encur "Midée" feia "Contaminação provável de duas palavras "miséria" e "Manir" escrita Magiar: iromany - escrita. Em metátese, a articulação "ny" foi contraída com o "i" inicial, falta somente o "o" mediano, cuja acentuação é muito "Nazère" (eu) engano verbo "enganar" em francês] evoca o substantivo "tromba" em que sugere a idéia de em alemão Sobra o final "er" que fornece a sílaba Esses poucos exemplos, extraídos da análise de 290 palavras efetuada por V. Henry, levam à conclusão de que os neologismos marcianos parecem ser sempre o produto de associações insólitas efetuadas a partir de palavras reais tomadas ao corpus de várias línguas e trabalhadas por mecanismos de "deformação de sentido" inconscientes, procedendo do modo da conden sação e do deslocamento. Isto não deixa, evidentemente, de evocar os processos de deformação do trabalho do sonho. Nessa mesma linha, não podemos deixar de fazer uma aproximação entre a atitude de Hélène Smith, falando a linguagem marciana sem se dar conta e compreendendo perfeitamente as questões que lhe eram feitas em francês, surpreendendo-se que os outros não a compreendiam, com a atitude de Anna que respondia a seus interlocu tores em inglês às questões que lhe eram formuladas em alemão. Todas as observações precedentes são igualmente confirmadas pela análise das línguas ultramarciana e uraniana. No que concerne à língua hindu, os orientalistas por Flournoy concordaram em reconhecer que ela foi toda constituída por materiais de srcem heterogênea. precisodeadmitir que esta àlinguagem só tem de hindu o nome e, se ela éÉ capaz nos confundir primeira vista, não passa na realidade, de um simples produto imaginário, diretamente sujeito a um conjunto de materiais e de mecanismos de srcem essencialmente inconsciente. Sobre a questão dessas determinações inconscientes, Flournoy cita uma acurada observação formulada por V. após um estudo crítico de F. de sobre a linguagem do ciclo oriental:
Misère e
em francês.
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do fato curioso assinalado por F. de Saussure, que o hindu de Hélène, do qual temos cerca de quarenta palavras, não possui como o verdadeiro V. Henry mostrou que, mantidas todas as ressalvas, essa letra também não é abundante no marciano, pois a encontramos somente sete vezes em trezentas palavras. Ele emitiu a idéia de que, na realidade, esta ausência ou esta raridade do "P seria proveniente fato de a inicial palavra "francês", teria sido rejeitadadocomo umque, somsendo utilizável pelo da subconsciente de Hélène, preocupada, antes de tudo, em não misturar o francês em seu hindu ou seu marciano. Em si, essa explicação seria muito plausível psicologicamente, porque as iniciais possuem normalmente um papel proeminente e representativo em relação à totalidade da palavra e da idéia Esta hipótese é bastante interessante, não somente porque se inscreve na linha da estratégia inconsciente à qual a psicanálise nos habitua em relação ao sujeito e a seu discurso, mas também porque evoca irresistivel mente fenômenos de elisão bem próximos, já identificados em certos casos de glossolalia, como aquele por exemplo, por supressão método das associações livres poderia, sem dúvida, trazer uma multiplicidade de informações, até mesmo confirmações, não somente sobre a intrusão dos materiais inconscientes, mas também sobre os processos de condensação e de deslocamento que intervêm no curso da invenção dessas neoformações lingüísticas. Permanece, entretanto, o fato de que o caso de Hélène Smith não deixa de ser uma experiência crucial quanto à confirmação da tese da inconsciência de certos processos e Victor Henry foi o primeiro a obter a justificativa tão esperada dessa tese que ele tão brilhan temente elaborara em 1896 nas Antinomias "Ainda será estabelecido pela via experimental o que me esforcei em demonstrar com o apoio de argumentos e análises lógicas (nas Antino mias Lingüísticas): que a linguagem é obra espontânea de um sujeito absolutamente inconsciente dos procedimentos que emprega para esse fim. Se o homem não inventa nada, se ele somente se recorda, a linguagem da Smith deve ser um composto analisável de suas diversas recordações auditivas e livrescas; cada uma delas se liga ao sentido que ela lhes atribui pelo fio mais ou menos reto, mais ou menos embaraçado, mais ou menos perceptível, de uma associação de idéias ora direta ora e extravagante, tal como observamos em todos os homens e em nós mesmos durante a imaginação e o As neolinguagens de Hélène nunca deixam de ser, em última análise, a expressão direta de uma profunda regressão a um estágio infantil. Elas
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são ainda mais pueris em seu fundamento quanto mais têm srcem num dinamismo essencialmente inconsciente, o que traz um argumento bastante significativo - se ainda fosse necessário prová-lo - sobre o tipo de conexões significantes que podem existir entre o inconsciente e a elaboração de delírios, e, conseqüentemente, sobre a importância do método psicanalítico para o acesso à sua compreensão. confirmação, demons traçãoTal queprova traz teria, para uma emúltima 1930 decifrando, pelaa técnica das associações livres, um discurso delirante do tipo glossolálico desenvolvido por ocasião de um tratamento analítico e circunscrito por uma magistral interpretação. MÉTODO FREUDIANO E AS
DELIRANTES
Em 1930, o psicanalista norueguês Schjelderup foi confrontado, durante um tratamento, com um fenômeno no mínimo raro, que apareceu num momento particularmente agudo da transferência. Sua paciente põe-se brus camente a "falar em Ela profere sequências de palavras totalmente ininteligíveis sob a influência de um automatismo verbal que não explica. No entanto, ela percebe que "pseudolíngua automática", apesar de seu aspecto incompreensível, estáesta carregada de significações. Schjelderup convida-a, então, a associar livremente a partir de cada um dos neologismos. Essa tarefa, longa e penosa, tanto para a paciente quanto para o analista, é coroada de sucesso. Pouco a pouco, além dos materiais ininteligíveis dessa glossolalia, as associações fazem aparecer, através de um dédal o bastante comple xo de co ndensaçõe s e de deslocamento s inconscientes, um discurso infantil no mínimo rico de sentido e carregado de afeto. Julgá-lo-emos examinando alguns fragmentos extraídos da análise de Schjelderup: "Bosche, bosche, dutta-kaaaada vista As associações livres trarão as seguintes indicações: 1) "Bosche" B remete à própria paciente que era chamada quando pequena "grãozinho" (em norueguês: bitteba), tão pequena ela era. significa longe. "Sche" remete ao silêncio (en norueguês: Hysche psiu). Assim, "Bosche" significa "o retorno à infância distante, seu isolamento no silêncio".
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2) M Ai
eu (em norueguês recordação de que atores repetiam "ai", "ai", durante representação teatral, para significar a sua aflição. No remete a idéia de Maino leva-nos então à tristeza da paciente, criança a ser separada de sua mãe e à espera de um 3) "Dutta kaaaada" Du ta você segura. Kaaaada "condensação a partir de "dada", que significa "menina" na linguagem das crianças norueguesas. E ainda: frio Aaaa: indica que se bate a sola dos pés por causa do frio. Isto significa que Deus ou outra pessoa (o analista?) deve criança gelada e aquecê-la. 4) "Vista Mysse" Condensação de duas palavras contraditórias: Vista: comdealguém. Mysse:desejo desejodedeser sermaldoso acariciado, ser beijado. Vista: Vi (velho) s maldoso) ta (segura). Mysse: kysse" (eu - beijar). 5) "Funa "Funa": associa (onomatopéia para a ação de soprar) e também, para a paciente, evoca a idéia de "fazer alguma coisa com alguém" e "na": de nat noite. "Tlisse" significa "urinar na frente de alguém" (en norueguês tisse urinar). Aqui, a proposição é bastante
Todos esse produtos de associação remetem sem ambigüidade a um período muito remoto na vida infantil da paciente. Mais uma vez, observamos que a glossolalia traduz uma regressão incontestável a um estágio arcaico da infância. Com efeito, tanto por seu conteúdo latente quanto por sua natureza rudimentar, a glossolalia, através do jogo de suas múltiplas con densações e deslocamentos, restitui de modo razoavelmente fiel o tom, ao mesmo tempo hesitante e afetivo, das lalias infantis. Parece, geralmente, que a construção dos neologismos, como a com posição de certas linguagens delirantes, sustentam-se em materiais esqueci dos, mas sempre ativamente presentes no inconsciente. Seu aparecimento sob a forma de um retorno do recalcado constitui trilhas significantes que se articulam um pouco como o conteúdo manifesto do sonho, isto é, de uma maneira imediatamente ininteligível, seguida de um trabalho colossal de deformação, em que os mecanismos de condensação
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e de deslocamento, operando sobre materiais elementares, são amplamente utilizados. NOTAS Este texto foi inicialmente publicado de 1982, pp. 281-298.
in Psychanalyse
l'université, tomo VII,
24, março
1. Ver J. Dor, "D ocume ntatio n bibliogr aphiq ue sur les néolo gism es, les glossolalie s et la du in Bulletin du Centre de formation et de recherches psycha nalytiques 3, primavera de 1985, pp. 129-138. 2. J. Bob on, Introduction historique à l'étude des néologismes et des glossolalies Paris, Masson, 1952. Ver também meu artigo sobre o conjunto da obra de J. Bobon: "Jean Bobon et la du langage", in Information psychiatrique, 1980, 6, pp. 739-745. 3. Ver S. Freud, des rêves, op. cit., cap. VI, pp. 255 sq. um estilo verdadeira mente NOREKDAL", sonha Freud a propósito de um trabalho. Ele continua: "Encontrei nessa palavra monstruosa dois nomes, Nora e lembrança de dois dramas conhecidos de Ibsen" (p. 257 sublinhado pelo autor). 4. J. Stuchlik, J. Bobnéomorphismes", on , "Les thogénie de certains p. 529. 5. Ver ibid.,
1 e 2, p. 531.
6. A saber: peixe,
elefante, cabana, caranguejo, cavalo, boi.
7. Ou seja: balbuciando, pedalando, marchando pode significar tanto "andar" quanto "marchar"). 8. E.
60 , pa belgica,blengings):
écrites et dessinées in Acta
"Uber
andando (N. da T: "marcher" em francês
im Traume", in Psycholog. Arbeiten,
5, 1910.
9. Ver J. Stuchlik, J. Bo bo n, "Les druses écrites et dessi nées (Kontaminationen: blengings): pathogénie de certains néomorphismes", in Acta psychiatrica belgica, 60, op. cit., p. 532. 10.
Th. Flournoy,
Des Indes
la planète
un cas de somnambulisme avec
glossolalies, Paris, 1900; reeditado pelas Ed. Seuil. 11. Ver A. Maeder, "La langue d'un aliéné. Analyse d'un cas de glossolalie", psychologie, 9, 1910, pp. 208 sq. 12.
in Archives de
estudo de Maeder compreende muitos outros.
13. Ver ibid., pp. 209-210. 14. Ver Th. Flournoy , Des Indes à la planète Mars - Étude sur un cas de somnambulisme avec glossolalies, op. cit., "Nouvelles observations sur un cas de somnambulisme avec in Archives de psychologie, 9, 1910, pp. 101 SS. 15. Ibid., p. 149 16. Ibid., p. 155. 17. Ibid., fig. 21 e 23, p. 200.
CLÍNICA PSICANALÍTICA 18. Ibid.,
125
24, p. 201.
19. Ibid., p. 218.
20. Ver ibid., pp.
-222.
219
21. Ibid., "Nouvelles observations sur un cas de somnambulisme avec glossolalies", 9, op. cit., p. 155. de psychologie,
Archives
22. Material oriundo de observação pessoal. Ibid., flg. 16, p. 185. 24. Ibid.,
17.
25. Ibid., p. 302. 26. Sr. Seippel (Adel), Sr. Flournoy (Sivrouka), M. de Saussure (Mioussa), reencarnações dos personagens que povoam suas visões. 27. Th. Flournoy, Des à la planète Mars - Étude sur un cas de somnambulisme avec glossolalies, op. cit., pp. 223-244. Ver também "Nouvelles observations sur un cas de som nambulisme avec glossolalies", in Archives de psychologie, 9, op. cit., pp. 143-151. 28. Ver V. Henry, Le langage martien, Paris, Maisonneuve, Para detalhes, consultar ibid., p. 27-55. 30. Ibid., p. 149. 31. Ibid., p. 79. 32. Ibid., p. 91-92.
33. Ibid., p. 83. 34. Ibid., p. 106-107. 35. Ibid., p. 123. 36. Th. Flournoy, "Nouvelles observations sur un cas de somnambulisme avec glossolalies", in Archives de psychologie, 9, op. cit., pp. 203 SS. 37. V. Henry, Le langage martien, op. cit., pp 21 SS. 38. Texto de Saussure citado por Flournoy,
316.
in Des Indes à la planète Mars, op. cit., pp. 315-
Th. Flournoy, "Nouvelles observations sur un cas de somnambulisme avec glossolalies", in Archives de psychologie, 9, op. cit., p. 214. 40. Ver G. Teulié, "Une forme de glossolalie par suppression littérale", psychologiques, 96, 1938, pp. 31 sq. V. Henry, Antinomies Linguistiques, 1896.
in Annales médico-
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42. V. Henry, Le langage martien, op. cit., pp. 5-6. H. K. Schjelderup, "Psychologische Analyse eines Falles von Zungenreden", 122, 1931, pp. 1 SS. 44 . Ibid., p. 5 Ibid.
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CLÍNICA PSICANALÍTICA
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índice Remissivo
A
análise didática, 20-21, 23, análise pessoal, 16-17, 23 9, 11 fim de análise, 37, 39-41 resistência à análise, 37, 40 Analista, 6-7, 10, 18-21, 23, 36-41, 44-47, 49-50, 66-67, 71 analista didático, 21-23
Afeto, 66-67, 71 38, 41 Alienação, 10, 15, 23, 37-38, 41 alienação do sujeito, 10 Alucinação, 115-116 alucinação hipnagógica, 115-116 alucinação hipnopômpica, 115-116 desejo do analista, 36-4139-41 destituição do analista, alucinação visual, 116-117, 124 Analítico Alusão, 46, 49, 50 ato analítico, 18-19, 23 Ambivalência, 53, 65, 71 dialética analítica, 22-23 Amor, 67, 71 espaço analítico, 18-19 objeto de amor, 67-69, 71-72 experiência analítica, 8-9, 21-23 Analisado, 18-20, 22, 23 impacto analítico, Analisando, 18, 23, 19, 23, 19-20, 21-22, intervenção analítica, 43-47, 48-50 23, 22, 23, 38, 47, 49-50, 47, 50 processo analítico, 18-20 Análise, 6-9, 10, 11, 17, 19-23, 28-29, referente analítico, 26-27 31, 36-38, 40, 44, 46, 49 relação analítica, 8-9 análise de formação, 23 situação analítica, 18-20, 23
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JOËL DOR
técnica 47, 49-50 verdade analítica, 8-9 Angústia, 78-79, 81-82, 91 angústia de castração (ver crise de angústia, 74-75, 78 Anulação 66-67,2371 17-18, 20-21, A posteriori,retroativa, Arte, 18-19 Associações livres, 35, 43-44, 49, 66, 71, 112, 114 -116, 121-125 Atenção flutuante, 66, 71 Ausência de pênis (ver Pênis) Automatismo mental, Automatismo teleológico, 115-116, 124 Automatismo verbal, 122, 125 B
Bissexualidade, 94-95, 106
c
testemunho clínico, 16, 23 Clínico, 5, 7, 10, 11, 15-16, 21, 23, 2728, 50 aprendiz clínico, 26-28 Clivagem psíquica, 98-100, 106, 107, Clivagem sexual (ver Sexo) Código, Coito, 8937-38, 41 Complexo de Édipo (ver Édipo) Compreensão, 28-32 Conceito, 8-9, Condensação, 109-116, 119-125 condensação das imagens, 110-111, 124 Consciência direção de consciência, 15-16 Construção, 44, 49 Contaminações verbais, 112, 124 Conteúdo latente do sonho (ver Sonho) Conteúdo manifesto do sonho (ver Sonho) Corte, 48, 50 corte interpretativo, 47-48, 50 Culpabilidade, 65, 71 21-23
Cabelos, 102, 107 Castração, 37, 6l, 84-87, 89, 91, 95-96, 99, 106-107 angústia de castração, 84, 87, 91, 98-99, 106 castração da 86 horror da castração, 83, 86-89, 91 recusa da castração, 82, 94-96, 9899, 106 Censura, 44-45 Cessão, 16, 23 Cessio, Che
23
37-38, 41 Citação, 47-50 Clínica, 5, 8, 10, 11, 15-16, 23, 74, 78, 109, 124 apresentação clínica, 25-27, 31, 50 dogmatismo clínico, 28-30, 32 encontro clínico, 50 experiência clínica, 27 ilustração clínica, 16, 23 inculcação clínica, 16, 23
Curva de Jordan, 47-48, 50 D
Defesa (ver Mecanismo de defesa) Deformação semântica, 114-115 Dejeto, 37, 40 Delírio, 113,36-41, 121-122, 124-125 Demanda, 68, 70-72 Depilação, 107 Depressão, 6l, 74, 78 Desafio, 87-88, 91, 106 Descentralização, 45-46, 49 Descompensação depressiva, 6l Desconhecimento, 46-47, 49-50 Desejo, 10, 36-41, 46, 49, 53-54, 57-58, 67-72, 82-83, 85, 91, 100, 107 avesso do desejo, 55 causa do desejo, 46, 48-50 desejo da mãe, 55-57, 73-74, 78, 85-88, 91,
CLÍNICA PSICANALÍTICA
desejo disfarçado, 55 desejo do analista (ver Analista) desejo do obsessivo, 65, 67-68, 71 desejo do outro (ver Outro) desejo do paciente, 38-39, 41 desejo do pai, 54-58 desejo histérico, 55-56 desejo inconsciente, 43-44, 49, 55, 65-66, 71, 112-113 desejo insatisfeito, 53-55 dinâmica do desejo, 54-55, 57-58, 67-68, 71 economia do desejo, 73-74, 78 estrutura do desejo, 38-39, 41 grafo do desejo, 37-38, 41 morte do desejo, 70 objeto do desejo do outro (ver Outro) verdade do desejo, 38-39, 41, 4447, 49 Deslocamento, 35-36, 40, 112-116, 119-125 Desinvestimento, 67-68, 71 Desvalorização, 56 Desvendamento, 93-95, 98-99, 105-106 Diagnóstico, 28 avaliação 74, 78 diagnóstico diferencial, 28 Dialética do ser e do ter (ver Ser e Ter) Didático, 21-23 Diferença dos sexos (ver Sexo) Discurso, 10, 13, 16-17, 22-23, 37-39, 41, 44-47, 49-50 Discurso de semblante (ver Dissimulação) Discurso delirante, 121-122, 124, 125 Discurso do histérico, 16-17, 23 Discurso do mestre, 16-17, 23 Discurso do universitário, 5-8, 10-11, 16-17, 23 Discurso psicanalítico, 7-8, 16-17, 23 Discurso psiquiátrico, 27-28 Dissimulação, 38-39, 41, 46-47, 49, 5455, 88, 91 discurso de dissimulação, 63
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Divisão do sujeito (ver Sujeito) Dizer, 16, 22-23, 46-50, 66, 71 37-38, 47, 49-50 Doença mental, 27 compreensão das doenças mentais, 28-29, 31 Doutrina,sexual Disforia 10 (ver Sexo) E
Eclipse do sujeito (ver Édipo, 47, 50 complexo de Édipo, 9, 11, 73, 78, 84-85, 91 Edípico componentes edípicos, 53 dialética edípica, 84-85, 91 edípica, 54-55 trajetória edípica, 84-85, triangulação edípica, 73, 91 78 Ejaculação, 83-84, 91, 87-88, 90, 91 Elaboração secundária, 44-45 Empatia, 15-16, 30-31 Encarceramento (amoroso), 68, 71-72 Engano, 38, 41 Enigma, 47, 49-50 Ensino, 5-8, 10-11, 25 ensino clínico, 15-16 ensino da psicanálise, 6-11, 13-18, 21-23 ensino didático, 17, 23 ensino teórico, 15-16 ensino universitário, 7-8, 11 Entremeio, 86-87, 91 Enunciação, 39, 41, 47, 49-50 Enunciado, 39, 41, 44-47, 49, 50 Equívoco, 46-50, 57-58 equívoco gramatical, 47-48, 50 equívoco histérico, 55 equívoco lógico, 47-48, 50 equívoco por homofonia, 47-48, 50 Erótico, 98, 106 Erotização, 69-70 Erotismo, 69-70, 99-100, 107 46-47, 49
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Escolha de objeto (ver Objeto) Escrita automática, 124 Escrita ideográfica, 124-125 Estágio do espelho, 101-107 Estase psíquica, 86-87, 91 Esterilidade, 107 Estilo, 17-18, 23 Estrutura, 73-74, 78, 82 estrutura da linguagem (ver Linguagem)
estrutura das perversões (ver Perversão)
estrutura de borda, 16-17, 23 estrutura do desejo (ver Desejo) estrutura do sujeito (ver Sujeito) Exibição Exibicionismo, 16, 23, 8788, 91 Experiência (psicanalítica) (ver Analítico)
F
Faixa de Móbius, 17, 23, 47-48, 50 Fala, 8-10, 13-14, 22-23, 37-38, 41 Falo Fálico, 73, 78, 84-87, 91, 95-96, 106
atribuição fálica, 73-74, 78, 84-85, 91, 95-96, 98-100, 106 ausência de falo, 78-79 destituição fálica, 59-60 falta de falo, 78-79 função fálica, 87, 91 gozo fálico, 99-100, 107 identificação à mãe fálica, 94-95, 106
identificação fálica, 86 incidência fálica, 73-74, 78 investidura fálica,86 lógica fálica, 85 mãe fálica, 88-89 objeto fálico, 73, 78, 84-85, 99, 106
protesto fálico, 6l reafirmação fálica, 87, 91 recusa fálica, 95-96, 106 rivalidade fálica, 53, 85 significante fálico, 73-74, 78
Falta, 39-41, 67-68, 70-71, 85-87, 91, 95-96, 99-100, 106 falta não simbolizável, 86 falta no Outro (verOutro) Fantasia subliminar, 116, 124 Fantasma/fantasia, construção do fantasma/fantasia, 46, 49 do 46, 49 Fascinação, 97, 100-101, 105-107 (fantasma/fantasia de Feminilidade, 94-97, 105-107 aparência feminina, 101-107 paródia da feminilidade, 98102, 106-107, 104-105, 107 signos da feminilidade, 97, 100-102, 106 Fetichismo, 98-99, 104-107 Fetichista, 96, 98-100, 106-107 Filiação, 78 76-79 Fobia, 61,74,73-74, 76 significante fóbico, 78-79 Forclusão do sujeito (ver Sujeito) Formação, 5- 7, 10-11, 18-23 formação do psicanalista, 5-6, 20-23 Formação de compromisso, 35, 112, 124 Formação do inconsciente (ver
Inconsciente)
Frigidez, 61-62, 74-75, 78 Função paterna (ver Pai)
G
98-
Genitor, 73-74, 77, 78 Glossolalias, 109-110, 112-116, 119, 121-125 Gozo, 25-27, 30-31, 36-37, 40, 50, 5759, 60-62, 65, 67-68, 70, 71, 81-91, 94-100, 106 gozo fálico (ver Falo) gozo interdito, 85 gozo materno, 60 gozo orgástico, 99-100
CLÍNICA PSICANALÍTICA
vontade de gozo, 82 Grafo do desejo (ver H
Hermenêutica, 38, 41 círculo hermenêutico, 45-46, 49 intervenção hermenêutica, 45-46, 49 linguagem hermenêutica, 45-46, 49 método hermenêutico, 45-46, 49 Histeria, 95-96, 106 histeria masculina, 74, 78 Histérico, 53-54, 57-59, 70-71 complacência histérica, 70-71 desejo histérico, 55-56 equívoco histérico, 55 identificação histérica (ver posição histérica, 53-54, 58-59 problemática histérica, servidão histérica, 70-7158 sintoma histérico, 28, 55-56 somatização histérica, 6l 47-48, 50 Homossexual passagem ao ato homossexual, 60 relação homossexual, 60-61 Homossexualidade, 55-56, 60, 63, 9496, 99, 106-107 homossexualidade feminina, 95-96, 106 homossexualidade inconsciente, 60-61 homossexualidade masculina, 101102 Hormônios, 102-103, 107 Humilhação, 83-84, 87-91 Humor, 67, 71 I
Ideal: homem ideal, 58 ideal de perfeição, 57-58 Idealização (da mulher), 88-89
137
Identidade sexual (ver Sexo) Identificação, 53-54, 57-62, 70 ciclo 60-61 dialética 53 identificação fálica (ver Falo) identificação histérica, 61-62 identificação inconsciente, 62 identificação masculina, 60 identificação primordial, 101-107 processo identificatório, 101-107 Ilustração (Clínica) (ver Clínica) Imagem: imagem da mulher, 100-101, 105, 107 imagem especular, 101-107 imagem masculina, 100-101 Impacto (Analítico) (ver Analítico) Imposições corporais, 100-101 Imposições especulares, 100-102 Impotência, 57-62 Incesto, 57-61 interdito do incesto, 84-85, 88-89, 91 Inconsciente, 7-8, 11, 13-15, 18-20, 2223, 25, 35, 39-41, 123-124 abertura ao inconsciente, 38, 41 acesso ao inconsciente, 26, 31, 3536, 40 desejo inconsciente (ver fantasma/fantasia 57 fechamento ao inconsciente, 38, 41 formação do inconsciente, 43-44, 109, 124 material inconsciente, 43, 48-49 referência ao inconsciente, 26-27, 31 inconsciente, 17-18, 21-23, saber 41 teoria do inconsciente, 8, 11 Injúrias Insatisfação, 54-58 Instituição, 5 instituição analítica, 5-7, instituição universitária, 5-7, 11 Interdito do incesto (ver incesto) Interpretação, 35-36, 38-41, 43-50 auto-interpretação, 44-45 interpretação dos sonhos (ver Sonho)
138
DOR
interpretação projetiva, 54-55 significação da interpretação, 49 Interpretativo corte interpretativo (verCorte) imperialismo interpretativo, 27-28 Intersubjetiva (relação), 9, 11 Intervenção Analítica (verAnalítico) Introspecção, 9, 11 Investimento, 67-68, 71 Isolamento, 66, 71 L
Lalias (infantis), 123-124 Lei, 54-55, 65, 73-74, 78, 86-87, 91 "fora da lei", 88-89 lei do desejo do outro, 70 lei do pai, 65, 88-89 99-100, 107 Linguagem, 41 estrutura 37-38, da linguagem, 37-38, 41 linguagem delirante, 109-110, 113116, 124 linguagem secreta das crianças, 115, 117-118, 124-25 psicopatologia da linguagem, 109110, 124 Lingüística: neoformação linguística, 112-113, 121, 124-125
Maníaco (comportamento), 74-75 Maquiagem, 101-107 Máquina de influenciar, 26, 31 Mascarada, 96, 103-104, mascarada feminina, 98-102, 106107 mascarada sexual, 101-102 Masoquismo Masoquista, 89 Masturbação, 75-79, 83-84, 87-88, 91 Mecanismo de defesa, 29-30, 32, 6567, 71 Medicina (psiquiátrica), 27 Medo, 78-79 Meio-dizer (ver Dizer)
Mensagem, 37-38, 41 Metáfora, 114-115 Metalinguagem, 45-46, 49 Metapsicologia, 26-27 Metonimia, 114-115 Mito, 8-9, 68-72 afeto, 66-67, 71 N
Não-sabido, 48, 50 Narcisismo: destituição narcísica, 61 Neoformação lingüística (ver Lingüística)
Neografismo, 110-113, 124
Neolinguagem
Neologismo,
M Mãe desejo da mãe (ver Desejo) mãe ameaçadora, 88-89 mãe fálica (ver Falo) mãe faltante, 86-87, 91 mãe 86-87, 91 mãe 85, 88-89 mãe proibidora, 88-89 mãe repulsiva, 89 mãe sedutora, 88-89, mãe toda-poderosa, 87-89, 91
(ver Linguagem)
120, 122-125 110, 112, 124 Neurastenia, 6l, 74-75 Neurose, 28, 109, 124 neurose obsessiva (ver Obsessivo) Neurótico, 8-9 Nome do pai, 73-74, 78 25-27
Objeto, 13, 22, 69-70 escolha de objeto, 57-58
CLÍNICA PSICANALÍTICA
objeto a, 37, 40 objeto de amor, 67-69, 71-72 objeto faltante, 86-87, 91 objeto fetiche, 96. 99-100, 106 objeto imaginário, 84-85, 91 objeto morto, 68-69 objeto sexual, 83, 91 objeto vivo, 68-69 Obsessivo, 65-72 desejo obsessivo (ver Desejo) lógica obsessiva, 67-68, 71 neutralização obsessiva, 66-67, 71 raciocínio obsessivo, 67, 71 Ódio, 67, 71 (ver Masturbação) 89, 89-90 Órgão, 95-96, 106, 96. 106 Orgasmo, 83-84, 91, 98-100, 106, Outro, 37-41, 85 desejo do desejo do Outro, 68, 7172 desejo Outro,39-41 53-54, 70, 89 falta nodoOutro, gozo do Outro, 67-68, 71 objeto do desejo do Outro, 70 olhar do Outro, 101-107 Outro do desejo, 39, 41 saber do Outro, 38-41
Paciente, 18-19, 23, 35, 38-39, 4344, 46-50, 66-67, 71 desejo do paciente (ver Desejo) Pai, 73-74, 78 desejo do pai (ver função paterna, 73-74, 77-78, 84-85, 91 instância paterna, 88, 91 pai idealizado, 98-99, 106 pai imaginário, 73, 78, 84-85, 91 pai real, 73-74, 78, 84-85, 91 pai sedutor, 59-60 pai simbólico, 73-74, 78, 84-87, 91 palavra do pai, 88-89 Paranóia (dirigida), 26, 31 Paternidade, 73-74, 78
139
Pêlos, 102-103, 107 Pênis, 84-85, 87-88, 91, 96, 98-100, 106-107 ausência de pênis, 82-85, 87, 95-96, 98-100, 106-107 Perda, 67-68, 70, 70-71 Perversão, 58-59, 76, 81-85, 91, 95-99, 106 estrutura das perversões, 81-83, 86, 88, 91, 93-94, 99, 107 perversão polimorfa, 82-83, 91 perversão sexual, 82-83, 91 ponto de fixação das perversões, 82-85, 87-88, 91 Perversidade, 81 Perverso, 57, 65-66, 71, 81-84, 91, 8693-95, 105-106 análise de formação, 21, 23 cerne perverso, 82 ato perverso, 81-82, 87-89, 91 comportamento perverso, 74-76, 78 desmentido do perverso, perverso,86-87, 81-82,91 91 manipulação perversa, 57, 61-62 mediação perversa, 6l processo perverso, 81-83, 91 ritual perverso, 83, 91 roteiro perverso, 81-82, segredo perverso, 50, 62 sugestão perversa, 61-62 transgressão perversa, 62, 81, 88-89 Pesquisa, 7, 10-11 Pessoas coletivas, 110-111, 124 Pilosidade, 102-103, 107 Prática prática da psicanálise
prática delirante, 26, 31 prática do psicanalista, 10, 15-16, 18-19 Prazer, 30-31, 58-59, 60 Pré-consciente, 35-36, 40 Previsão, 30-31 Processo primário, 109, 124 Processos mentais (dinâmica dos), 2728 Prognóstico, 30-31 Prostituição, 95, 99, 104, 106, 107
140
JOËL DOR
Prótese mamária, 102-103, 107 Psicanalisado (ver Analisado) Psicanalisando (ver Analisando) Psicanálise, 5-8, 13-16, 18-19, 22, 26, 121, 125 tratado de psicanálise, 8, 11 Psicanalista (ver Analista) Psicopatologia, 25, 28-29, 31-32 psicopatologia da linguagem (ver Linguagem) Psicopatológico campo psicopatológico, 27 manifestação psicopatológica, 29, 30-32, 50 nomenclatura psicopatológica, 27 processo psicopatológico, 26-28 semiologia psicopatológica, 26-27 Psicose, 28-29, 31, 88-89 Psicoterapeuta, 60-62 Psicoterapêutico, 15-16, 62 Psicoterapia, 45, 49, 62 Psiquiatra, 28 da), 65-66,71 Pulsão (destino Q
Quatro discursos, 47, 49-50 Queixa de abandono, 56-57 R
Recalcado (retorno do), 35-36, 40, 44, 49, 123-124 Recalque, 54-55 supressão do recalque, 44, 49 Recusa da castração (ver Castração) Refenda (do sujeito) (ver Sujeito) Regra fundamental, 66, 71 Regressão, 74-75, 115, 121-122, 125 Rememoração, 35-36, 40 Reparação, 55-56, 60-61 Repetição, 35-36, 40 repetição significante, 35-36, 38, 40-41
Representação, 35-36, 40, 46, 49 representação fantasmática, 96, 106 representação flutuante, representação imaginária, 46, 49 representação inconsciente, 35-36, 40 representação recalcada, 35 Resistência, 21-23, 27-28, 36-41 Ritual, 66, 76-79, 83-84, 89-91 Rivalidade fálica (ver Falo) Roupas de baixo S
Saber, 13-17, 20, 22-23, 19, 28-29, 2932, 38-41, 47-48, 50 saber do Outro (ver Outro) saber inconsciente (ver Inconsciente) saber teórico, Saber fazer, 18-19,14-17, 22-2322-23 Sadismo Sádico, 89-90 Sedução, 59-60, 88, 91, 97-99, 106 sedução feminina, 95, 106 sedução materna, 88-89, 91 sedução sexual, 97, 106 Segredo (perverso) (ver Perverso) Seio, 102-103, 105, 107 Semiologia, 25-27 Ser, 84-86, 91 Sessão, 9, 66-67, 71 Sessão (Session), 16, 23 Sexo Sexual, 97, 106 clivagem sexual, 101-102 diferença dos sexos, 82-87, 98102, 106 disfonia sexual, 93-94 identidade sexual, 87, 93-96, 101-107 mascarada sexual, 101-102 Sexuação, 96, 106 Sexualidade, 100, 107 sexualidade normal, 82-83, 91 Significação, 43-47, 49-50 significação da interpretação (ver Interpretação)
CLÍNICA PSICANALÍTICA 4 l l
verdade da significação, 44-45 Significados, 114-115 Significante, 38-41, 114-115 captura significante, 53-54 ordem significante, 37-38, 41 seqüência significante, 47, 50 significante fálico fóbico (ver (ver Falo) Fobia) significante último, 39-41 sistema significante, 37-38, 41 tesouro dos significantes, 37-38, 41 trabalho do significante, 124 Signo, 97, 106 signo da feminilidade, 97, 106 Simbólico, 35-36, 40 função do simbólico, 37-38, 41 ordem simbólica, 37-38, 41 registro simbólico, 35-36, 40 Sintoma, 19-20, 28, 45, 47, 49-50, 5758, 61-62, 74-76, 78 dissolução do sintoma, 45, 49 sintoma histérico, 28 sintoma obsessivo, 28 Sodomia, 90-91, 98-99, 106-107 Sonambulismo, 113, 115-119, 124-125 Sonho, 43-45, 48-49, 54-55, 115, 124 análise dos sonhos, 43, 48-49 conteúdo latente do sonho, 115, 123-124 conteúdo manifesto do sonho, 110, 115, 123-124 deformação do sonho, 120, 124-125 sentido do sonho, 44-45 trabalho do sonho, 44-45, 114-115 Subconsciente, 10 120-121, 125 Subjetividade, Substituição, 114-115 Sugestão, 45, 49 Sujeição, 10, 13, 15-17, 22-23, 38-39, 41, 45-46, 49 Sujeito, 13, 16, 19, 22-23, 35, 37-41, 46-47, 49, 66, 71, 109, 112-113, 121, 124-125 alienação do sujeito (ver Alienação) divisão do sujeito, 48, 50 eclipse do sujeito, 47, 50 estrutura do sujeito, 37-38, 41
forclusão do sujeito, 13, 22 história do sujeito, 19-20 refenda do sujeito, 13, 22, 46-47, 49 sujeito falante, 13, 15, 22-23 sujeito suposto saber, 22-23, 38-41, 46-47, 49-50 Supervisão, 6-7, 10, 16-17, 23 T
Técnica (psicanalítica) (ver Analítico) Técnica projetiva, 114, 124 Teoria (psicanalítica), 8-9, 14-17, 23 acesso à teoria, 16-17, 22-23 Teoria sexual infantil (ver Sexo) Teóricos, 15-16, 21-23 Ter, 84-85, 91 dialética do ter, 86 Terapêutica ação terapêutica, 43,8-9, 48-49, eficácia terapêutica, 44, 61 49 estratégia terapêutica, 27, 30-31 intervenção terapêutica, 26-27, 6l62
objetivo terapêutico, 30-31 Tradução, 45-46, 49 Transferência, 9, 13-20, 22-23, 3541, 46-47, 49, 66-67, 71, 77, 109110, 121-122, 124-125 amor de 36-41 análise da transferência, 16-17, 23, 38-41 dinâmica da transferência, 36-37, 40 liquidação da da transferência, 39-41 neutralização transferência, 6667, 71 resistência de transferência, 36-37, 40 teoria da transferência, 35-37, 40 transferência de trabalho, 1617, 23 transferência negativa, 37, 40 transferência simbólica, 13-14, 22 Transferencial: processo transferencial, 35 resistências contratransferenciais, 21-23
142
JOËL DOR
resistências transferenciais, 21-23 situação transferencial, 15, 23 Transformação em seu contrário, 6566, 71 Transgressão, 65-66, 81-82, 88-89, 91 transgressão 62 22-23 Transmissão, 5-6,perversa, 8, 11, 15-17, transmissão da psicanálise, 6-7, 1011, 22-23 transmissão didática, 13, 22 Transmissibilidade, 23 Transexual, 93-96, 106 Transexualismo, 93-94, 105, masculino, 93-94 transexualismo feminino, 93-94 Tratamento (analítico), 6-8, 1820, 23, 35-36, 40, 47, 50, 55-56, 63, 66-67, 71, 109-110, 121-122, 124125 condução do tratamento, 19-20, 33, 74, 78 dinâmica do tratamento, 43, 46-49 exercício do tratamento, 18, 23, 47, 49-50 prática do tratamento, 18, 23 Travestis, 93-100, 105-107 travestis exibicionistas, 94-95, 106 travestis heterossexuais, 94-95, 99, 106-107
travestis homossexuais, 94-95, 99, 106-107 travestis prostituídos, 95, 101-102, 104, 106, 93-95, 97-99, 105-106 U
Universidade, 6-7, 10-11 V
da alienação separação, 46, 49 Verdade, 8-9, 11, 13-15, 17-18, 22-23, 29-32, 37-38, 41, 43-45, 47-50 verdade analítica (ver Analítico) verdade da significação (ver Significação) verdade do desejo (ver Desejo) Vergonha, 83-84, 91 Véu, 96, 99-100, 106-107 Virgem, 89 Virilidade, 96, 101-102, 106, 8384, 87-88, 91, ser visto, 83, 91 Voz, 103-104
índice Onomástico
A
Abelhauser Alain, 65, 71 Alas L. dit Clarín, 38, 41 Piera, 81-82, 90-91, 96, 106 Avrane Patrick, 65, 71
Brach Paul, 100, 107 Breton André, 97, 106 Breuer Joseph, 43, 48-49
c Clavreul Jean, 81-82, 91-96, 106
B D
Baas Bernard, 38, 41 Battistini Olivier, 38, 41 Baudrillard Jean, 96-97, 106 Bergson, 112, 124 Françoise, 71 Birraux Annie, 99, 107 109-112, 124 Bonnet Gérard, 83, 91, 98-99, 106
David-Ménard Monique, 38, 41 Dorey Roger, 65-66, 71, 93, 105 Joseph, 102-103, 107 Dumézil Claude, 38, 41 Dor Joël, 7-8, 10, 11, 13, 17-19, 22, 23, 37-38, 41, 45-50, 65, 67-68, 71, 7374, 78, 82-85, 91, 95-96, 101-107
144
DOR
Kaufmann Pierre, 82-83, 91 112, 124
E
Max, 110-111, 124 L F
Fédida Pierre, 7-8, 16, 23, 66-67, 71 Fennetaux Michel, 38, 41 Ferenczi Sândor, 6-7, 10 Flournoy Théodore, 113, 115 -119, 121, 124-125 Freud Sigmund, 6-8, 10-11, 13-14, 2223, 17-18, 23, 26, 28-29, 31-32, 3541, 43-45, 48-49, 65-66, 71, 75, 7879, 82-84, 96, 98-99, 106, 109110, 112, 124 G
Ignacio, 7, 10, 41 Gherchanoc Liliane, 38, 41 Granoff Wladimir, 65, 71 Gutton Philippe, 99, 107 Guyomard Patrick, 38, 41
38,
Lacan Jacques, 11, 35-41, 13-14, 44-47, 16-23, 25-26, 28-29,7-9, 31-32, 49-50, 73, 75, 78-79, 82-83, 88-89, 91, 96, 101-107, 106 Lachaud Denise, 65, 71 Laplanche Jean, 7-8, 11, 29-30, 32 Lebovici 21-23 Leclaire Serge, 68, 71-72 M
Maeder 113-116, 124 Mannoni Octave, 14-15, 23, 45-46, 49, 86-87, 91 Miller Jacques-Alain, 20, 23 Möbius August Ferminand, 17, 23, 4748, 50 Molinier Pierre, 97-99, 106 o
29-32
H
Jean-Louis, 38, 41 Henry Victor, 119-122, 125 J
Jordan, 47-48, 50 Julien Philippe, 38, 41 K
Kacere John, 99-100, 107 Kant Emmanuel, 19, 23
P
Perrier François, 81-82, 91 Platon, 38, 41 Pommier 46-50 Popper Karl, 16, 23 Président Pompidou Georges, 77 R
Rabant Claude, 38, 41 Rondepierre Jean-Paul, 7
CLÍNICA PSICANALÍTICA
Rosolato Guy, 81-82, Roublef Irène, 65, 71 Roux 98, 106
94-95, 106
S
Safouan Moustapha, 38, 41 Saint Laurent 104-105, 107 Saussure Ferdinand de-, Schjelderup H. 121-123, 125 Silvestre Michel, 35-36, 38-41 Socrate, 38, 41 Solnit 21, 23 93, 105 Stuchlik Jaroslav, 110-112, 124
T
Tausk Victor,26, 31 Teulié 121, 125 Tostain René, 65, 71 V
Valabrega Jean-Paul, 81-82, 91 Serge, 21-23 Vincent J.-D, 98, 106
145