1936 pARA-ALÉM DO "PRINCÍO DE EALIDADE
EscRITos Jacques acan CAMPO FREUDIANO NO BRASIL
Para-além do "Princípio de realidade
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EM TORNO DSS PRINCÍPIO FUNDAMNTAL DA DOUTRINA D RUD A SGUNDA GRAÇÃO D SUA SCOLA POD DFINIR SUA DÍVDA SU DVR.
Para o psquatra ou o pscóogo que se inica, em nossos anos 30, no método pscanalítico, já não se trata de uma dessas conversões que rompem um progresso mental e que, como tas, atestam menos uma escolha amadurecda na pesqusa do que a exposão de uma secreta dscordânca afetva. Sedução ética do devotamento a uma causa controvertda, somada à sedução econômca de uma especulação contra os valores estabeecidos, não lastimamos para a anáise esses apelos por demas oferecidos nos subterfúgios da compensação. A nova pscologia não reco nhece à psicanálise apenas o direto de cidadana recortando-a ncessantemente no progresso de discipinas oriundas de outros âmbitos, demonstra seu valor de via pionera. Assm, é, dgamos, sob uma ncdência normal que a pscanálse é abordada pelo que chamaremos, passando por cima da arbtrariedade dessa fórmula, a segunda geração analítca. É essa ncidência que aqui queremos definir, para apontar o camnho em que ela se reete.
I. A PSICOLOGIA CONSTITUI-S COMO CIÊNCA QUANDO A RLATIVIDAD D SU OBJTO É POR RUD POSTULADA AINDA QU RSTRITA AOS FATOS DO DSO
Crítia do assoiaionismo A revolução freudana, como toda revoução, ganha sentido por suas conunturas, isto é, pela psicologia então renante; ora, qualquer juízo sobre esta pressupõe uma exegese dos documentos em que ela se afirmou. Fixamos o contexto deste artigo pedndo 77
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que nos dêem crédito, ao menos provisoriamente, por esse trabalho fundamental, para nele desenvolver o momento da crítica que nos parece o essencial. Com efeito, se tomamos por legítimo fazer prevaecer o método histórico no estudo em si dos fatos do conecimento, não fazemos dee um pretexto para eudir a crítica intrínseca que levanta a questão de seu valor: uma tal crítica, fundamentada na ordem segunda conferida a esses fatos na história pelo papel de reexão que eles comportam, é imanente aos dados reconhecidos pelo método, ou seja, em nosso caso, às formas expressas da doutrina e da técnica, se ela simplesmente requer cada uma das formas em questão por ser o que se apresenta como sendo. Assim, veremos que, à psicoogia que no fim do século XIX apresentavase como cientfica, e que, tanto por seu aparato de objetividade quanto por sua afirmação de materialis mo, impressionava até mesmo seus adversários, faltava simpes mente ser positiva, o que eimina na base a objetividade e o materialismo. Podemos sustentar, com efeito, que essa psicoogia baseiase numa camada concepção associacionista do psiquismo, não tanto por formuála como doutrina, mas por receber dela, e como dados do senso comum, uma sére de postulados que determinam os problemas em sua própria formulação. Sem dúvida, evidencia-se desde o começo que os contextos em que ela cassifica os fenômenos como sensações, percepções, ima gens, crenças, operações lógicas, juízos etc., são tomados de empréstimo, ta e qual, da psicoogia escolástica, que por sua ve os extraiu da elaboração de séculos de filosofia. Convém, pois, reconhecer que esses contextos, onge de terem sido forjados por uma concepção objetiva da realidade psíquica, são apenas o produto de uma espécie de desgaste conceitual, onde se vêem os traços das vicissitudes de um esforço específico que impele o homem a buscar, para seu própro conhecimento, uma garantia de verdade: garantia que, como se percebe, é transcendenta por sua posição e continua a sê-lo, portanto, em sua forma, mesmo quando o filósofo vem a negar sua existência. Qual é o mesmo aspecto de transcendência que os conceitos, resíduos dessa busca, conservam? Isso equivaleria a definir o que o associacionismo introduz de nãopositivo na constituição mesma do objeto da psicologia. Que seja difícil desindálo nesse nível, eis o que compreenderemos ao lembrar que a psicoogia atual conserva
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muitos desses conceitos, e que a purifcação dos princípios é, em toda ciência, o que mas tardiamente se conclui. Mas as petições de princípio orescem na economia geral dos problemas que caracteriza a cada momento o ponto de detenção de uma teora. Assm considerado em conjunto, o que é faciitado pelo recuo do tempo, o associacionismo nos revea suas implicações metafíscas com brihante clareza: para opô-lo, simpesmente, a uma concepção que se define mais ou menos judciosamente nos fundamentos teóricos de diversas escolas contemporâneas sob o nome de função do real, dgamos que a teoria associacionsta é dominada pela função do verdadeiro. Essa teoria fundamenta-se em dois conceitos: um mecanicista, o de engrama, outro faaciosamente tido como dado pela expe rência, o da ligação associativa do fenômeno mental. O prmeiro é uma fórmula de pesqusa, aliás bastante exível, para designar o elemento psicofísco, e que introduz apenas uma hipótese, embora fundamenta: a da produção passiva desse elemento. É notáve que a escoa tenha acrescentado o postulado do caráter atomístico desse elemento. Com efeito, fo esse postulado que imtou o olhar de seus defensores, a ponto de fazê-los "passar ao largo dos fatos expermentais em que se manfesta a atividade do sujeito na organzação da forma fatos, por outro ado, tão compatíves com uma interpretação materialista, que seus inven tores posteriormente não os conceberam de outro modo. O segundo dos conceitos, o de ligação associativa, funda menta-se na experiênca das reações do ser vivo, mas é estendido aos fenômenos mentais, sem que se critiquem de maneira alguma as petições de prncípio que ee retira, precsamente, do dado psíquco, em particular aquela que supõe dada a forma mental da similitude, entretanto, tão delcada, em si, de ser analsada. Assim se introduz no conceto explicatvo o próprio dado do fenômeno que se pretende explcar. Tratase de verdaderos passes de mágica conceituais, cuja nocência não desculpa a grosseria e que, como subinhou um Janet, qual verdadeiro vício menta próprio de uma escola, transformam-se realmente no pau para toda obra das reviravoltas da teoria. É desnecessário dizer que assim se pode desconhecer totamente a necessdade de uma espécie de anáise, que sem dúvida exge sutieza, mas cuja
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ausência oa caduca qualquer expicação em psicologia, e que se chama análise fenomenológica. Por conseguine, convém indagar o que significam essas carências no desenvolvimento de uma discipina que se coloca como objeiva. Será isso obra do maerialismo, como se permiiu que uma certa críica dissesse? Pior ainda, será a própria obje ividade impossve de ser atingida em psicologia? Denuncia-se o vício teórico do associacionismo ao se reco nhecer em sua esrutura a formulação do problema do conheci mento do ponto de vista filosófico. Com efeito, é justamente a formulação radicional desse probema que, por ter sido herdada sob a primeira camuagem das chamadas fórmulas empíricas de Locke, enconra-se nos dois conceios fundamentais da dou trina. A saber, a ambigüidade de uma crítica que, sob a tese do "nihil erit in intellectu quod non prius fuerit in sensu reduz a ação do rea ao pono de conato da mtica sensação pur, iso é, a não ser mais que o ponto cego do conhecimento, já que nada nee é reconhecido reconhecido e que impõe ainda mais fortement fortemente, e, ipse, como a antinomia expliciada ou não no "nisi intellectus ipse, diaética de uma ese incomplea, a primazia do esprio puro, na medida em que, pelo decreto essencial da idenificação, reconhecendo o objeo ao mesmo empo que o afirma, constiui o momento verdadeiro do conhecimento Eis a fone dessa concepção atomística do engrama de onde provêm as cegueiras da doutrina em reação à experiência, ao passo que a ligação associativa por suas implicações não crii cadas, nela veicula uma teoria basicamente ideaista dos fenô menos do conhecimeno Este úlimo ponto, evidenemente paradoxal numa dourina cujas pretensões são as de um materialismo ingênuo, aparece claramente a partir do momeno em que tenamos dele formular uma exposição um pouco sistemática, ou seja, submeida à coerência própria de seus conceios. O de Taine, que é o de um divulgador, porém conseqüente, é precioso nesse aspecto. Nee seguimos uma construção sobre os fenômenos do conhecimento que em por desígnio reduzir as atividades superiores a compexos de reações eementares, e que fica reduzida a buscar no conroe das atividades superiores os critérios diferenciais das reações eementares. Basa nos referirmos, para capar plenamente esse
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paradoxo, à impressionane definição que é fornecida da percep ção como uma "alucinação verdadeira. verdadeira. Tamanho, porano, é o dinamismo de conceios exraídos de uma dialéica ranscendenal ranscendenal que, ·por neles se fundamenar, fundamenar, a psicologia associacionisa fracassa, e o faz ainda mais faalmene na medida em que os recebe esvaziados da reflexão que eles comporam, para consiuir seu objeo em ermos posiivos: com efeio, a parir do momeno em que os fenômenos se definem em função de sua verdade eles ficam submeidos, em sua própria concepção, a uma classificação de valor. Tal hierarquia não apenas vicia, como vimos, o esudo objeivo dos fenômenos, no que ange a sua importância no próprio conhecimeno, como ambém, subordinando à sua perspeciva odo o dado psíquico, falseia a análise e lhe empobrece o senido. Assim é que, assimilando o fenômeno da alucinação à ordem sensorial, a psicologia associacionisa só faz reproduzir o alcance absoluamene míico que a radição filosófica conferia a esse fenômeno na quesão acadêmica referene ao erro dos senidos; sem dúvida, o fascínio próprio desse papel de escândalo eórico explica esses verdadeiros desconhecimenos na análise do fenô meno, que permiem a perpeuação, ainda enaz em mais de um clínico, de uma formulação ão errada de seu problema. Consideremos agora os problemas da imagem. Esse fenômeno, decero o mais imporane da psicologia pela riqueza de seus dados concreos, o é ambém pela complexidade de sua função, complexidade esa que não se pode enar abarcar num único ermo, a não ser o de função funçã o de in i nformação forma ção As diversas acepções desse ermo, que, da vulgar à arcaica, visam à noção de um eveno, à marca de uma impressão ou à organização por uma idéia, efeivamene exprimem basane bem os papéis da imagem como forma inuiiva do objeo, forma plásica do engrama e forma geradora do desenvolvimeno. Esse fenômeno exraordi nário, cujos problemas vão da fenomenologia menal à biologia, e cuja ação repercue desde as condições do espírio aé deer minismos orgânicos de uma profundeza alvez insuspeiada, aparece-nos, no associacionismo, reduzido à sua função de ilusão. Sendo a imagem, segundo o espírio do sisema, considerada uma sensação enfrquecida, na medida em que aesa menos seguramente a realidade, ela é omada por eco e sombra da sensação, e porano, idenificada com seu raço, com o engrama.
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A concepção do espírito como um "polipeiro de imagens, essencial ao associacionismo, foi criticada sobretudo por afirmar um mecanicismo puramente metafísico; assinalou-se menos que seu absurdo essencial reside no empobrecimento intelectualista que ela impõe à imagem. De fato, um imenso número de fenômenos psquicos é tido, nas concepções dessa escola, como não significando nada. Isso os excluiria do âmbito de uma psicologia autêntica, que sabe que uma certa intencionalidade é fenomenologicamente inerente a seu objeto. Para o associacionismo, isso equivale a tomálos por insignificantes, isto é, a rechaçá-los, seja para o nada do desconhecimento, seja para a fatuidade do "epifenômeno. Tal concepção, portanto, distingue duas ordens nos fenômenos psíquicos: de um lado, os que se inserem em algum nível das operações do conhecimento racional, e de outro, todos os demais, sentimentos, crenças, delírios, assentimentos, intuições, sonhos. Os primeiros exigiram a análise associacionista do psiquismo; os últimos devem explicar-se por algum determinismo estranho à sua "aparência e chamado de orgânico", por reduzi-los, quer ao suporte de um objeto sico, quer à relação de um fim biológico. Assim, nos fenômenos psíquicos não se reconhece nenhuma realidade própria: aqueles que não pertencem à realidade verda deira não têm realidade senão ilusória. Essa realidade verdadeira é constituída pelo sistema de refeências que é válido para a ciência já estabelecida isto é, mecanismos tangíveis para as ciên cias físicas, aos quas se juntam motivações utltarstas nas ciências naturais. O papel da psicologia é apenas o de reduzir a esse sistema os fenômenos psíquicos e erficá-lo, determinando através dele os próprios fenômenos que constituem seu conhe cimento. É na medida em que é função dessa verdade que tal psicologia não constitui uma ciência.
Verdade da psioogia e psioogia da erdade
Que se entenda enten da bem nosso no sso pensamento pensamento neste ponto. Não estamos estamos jogando com o paradoxo de negar que a ciência não tenha que conhecer a verdade. Mas não nos esqueçamos que a verdade é
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um valor que corresponde à inceteza com que a expeiência vivida do homem é fenomenologicamente macada, e que a busca da verdade anima historicamente, sob a rubrica do espiritual, os arroubos do místico e as regras do moralista, as sendas do asceta e as descobertas do mistagogo Essa busca, impondo a toda uma cultura a primazia da verdade no testemunho, criou uma atitude mora que foi e continua a ser, paa a ciência, uma condição de existência. Mas a verdade, em seu valor específico, é aleia à ordem da ciência: a ciência pode honrar-se de suas alianças com a verdade; pode proporse como objeto seu fenômeno e seu valor; mas não pode de maneira alguma identificá-la como seu fim pópio. Se parece haver nisso algum articio, detenhamonos por um instante nos critérios vividos da vedade e perguntemo-nos o que, nos vertiginosos elativismos a que chegaram a física e as matemáticas contemporâneas, subsiste dos mais concetos desses citérios: onde estão a certeza pova do conhecimento místico, a eidência fundamento da especulação fiosófica, e a própria não-contradição, mais modesta exigência da constução empí ico-acionalista? Mais ao acance de nosso juzo, podemos dizer que o douto se pergunta se o arco-íris, por exemplo, é verdadei. Impotale apenas que esse fenômeno seja comunicável em aguma linguagem (condição da ordem mental), registrável de alguma forma (condição da ordem experimental) e que consiga inserir-se na cadeia das identificações simbólicas onde sua ciên cia unifica a diversidade de seu objeto pópio (condição da ordem racional). Devese convir que a teoria físico-matemática, no m do século XIX, ainda recorria a fundamentos tão intuitivos, depois elimi nados, que se pôde hipostasia neles sua prodigiosa fecundidade, e assim lhes foi reconhecida a onipotência implicada na idéia da vedade. Por outro ado, os sucessos práticos dessa ciência conferiam-le, perante as massas, o prestgio que cega e que não deixa de se reacionar com o fenômeno da evidência. Assim, a ciência estava bem posicionada para servir de objeto último à paixão pela verdade, despertando no vulgo a prosteação diante do novo dolo que se chamou de cientficismo e, no "letado , esse eteo pedantismo que, por ignoar o quanto sua verdade é elativa às muralhas de sua torre, mutila o que do rea le é dado apreender. Interessando-se apenas pelo ato do saber, por
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sua própria atividade de sábio, é essa a muilação que comete o psicólogo associacionista, e, embora seja especulativa, ela não tem para o ser vivo e para o humano conseqüências menos cruéis. É um ponto de visa semelhante, com efeio, que impõe ao médico esse espantoso desprezo pela realidade psíquica, cuo escândalo, perpetuado em nossos dias pela manutenção de toda uma formação academicista, exprime-se anto na parcialidade da observação quanto na bastardia de concepções como a de pitiatismo. Mas, por ser no médico, iso é, no clínico por excelência da vida ínima, que esse pono de vista aparece da maneira mais agrane, como uma negação sisemática, era ambém de um médico que eria que vir a negação desse próprio ponto de vista. Não a negação puramente crítica que na mesma época floresceu como especulação sobre os "dados imediaos da d a consciência , mas uma negação eficaz, por se afirmar como uma nova posi tividade Freud deu esse passo fecundo, sem dúvida porque, como nos tesemunha em sua auobiografia, foi determinado a isso por sua preocupação de curar, isto é, por uma atividade em que, contrarando os que se comprazem em relegála à caegora secundária de uma "arte , há que reconhecer o entendimento mesmo da realidade humana, na medida em que ela se empenha em ransformála.
Revolução d o método freudiano freudiano O primeiro sinal dessa atitude de submissão ao real em Freud foi reconhecer que, dado que a maioria dos fenômenos psíquicos no homem relaciona-se, aparentemene, com uma função de relação social, não há por que excluir a via que, por isso mesmo, abrelhe o acesso mais comum a saber, o tesemunho do próprio sueito desses fenômenos. Pergunamo-nos, aliás, em que o médico de enão fundamen tava o ostracismo de princípio com que era marcado, para ele, o esemunho do doente, a não ser na irritação de reconhecer neste, por vulgares, seus próprios preconceios. Essa foi, com efeio, a atitude comum a oda uma culura que guiou tanto a absração analisada acima quano a dos douos: para o doene, assim como para o médico, a psicologia era o campo do "ima
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ginário no sentido do ilusório logo, o que tem significação real, o sintoma, por conseguine, só pode ser psicológico "na aparência aparência, e há de se distinguir do registro comum da vida psquica por algum raço discordane onde se mostre bem seu caráer "grave. Freud compreendeu que era essa própria escoha que toava sem vaor o depoimento do doene. Se quisermos reconhecer uma reaidade caractersica das reações psíquicas, não convém começarmos por escoher enre eas: é preciso começar por não escolher. Para aquilatar sua eficiência, há que respeitar sua sucessão. Decerto não se rata de restiuirlhes a cadeia aravés do relato, mas o momento mesmo do depoimeno pode constituir um fragmento significaivo deas, desde que se exija a íntegra de seu texto e que se o iberte dos grilhões do relao. Assim se constitui o que podemos chamar experênca ana ltca: sua primeira condição formulase numa le e não-oms são que promove ao níve do interesse, reservado ao notável, udo aquilo que "se compreende por si, o cotidiano e o comum; mas ela é incompea sem a segunda, ou le e não-sistematza ção que, posuando a incoerência como condição da experiência, atribui uma presunção de significação a qualquer reboalho da vida menal, ou seja, não apenas às representações das quais a psicologia psicologia de de escola vê apenas apenas o absurdo absurdo roteiro roteiro do sonho, pressenimentos, fantasias do devaneio, delírios confusos ou úcidos , mas também aos fenômenos que, por serem total mente negativos, não têm, por assim dizer, estado civi lapsos de linguagem e lapsos da ação. Observese que essas duas eis, ou melhor, regras da experiência, a primeira das quais foi isoada por Pichon, aparecem em Freud em uma só, que ee formuou, segundo o conceio então reinante, como le a assocação lvre.
Desrição fenomenológia da eperinia psianalítia É essa mesma experiência que constiui o eemento da écnica erapêutica, mas o médico pode propor-se, se tiver um pouco de senso eórico, definir o que ela raz à observação. Nesse caso, terá mais de uma oportunidade de se maravihar, se é essa a forma de espanto que corresponde, na pesquisa, ao aparecimeno de uma relação tão simples que parece furtarse ao pensamento.
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O dado dessa experiência é, primeramente, a linguagem, uma linguagem, isto é, um sgno. Quão complexo é o problema do que ea signifca, quando o pscóogo a relaciona com o sujeto do conhecimento, isto é, com o pensamento do sujeito. Que relação há entre este e a lnguagem? Não é ele apenas uma linguagem, porém secreta, ou não é ela apenas a expressão de um pensamento puro, não formulado? Onde encontrar o deno mnador comum aos dos termos desse probema, isto é, a unidade da qual a linguagem é o sgno? Estará contido na paavra o substantivo, o verbo ou tavez o advérbio? Na densdade de sua história? Por que não nos mecanismos que a compõem foneti camente? Como escolher, nesse dédalo para onde nos arrastam flósofos e ingüistas, psicofísicos e fisiologstas? Como escoher uma referência que, à medida que a dzemos mas elementar, parece-nos mais mítica? Mas o psicanaista, por não desvncular a experiência da linguagem da stuação que ela implca, a do interlocutor, toca no fato simples de que a lnguagem, antes de significar aguma cosa, significa para aguém. Pelo smples fato de estar presente e escutar, esse homem que fala dirge-se a ele, e, já que ele impõe a seu discurso não querer dizer nada, resta o que esse homem quer lhe dizer. O que ele diz, com efeito, pode "não ter nenhum sentdo, mas o que ele lhe diz contém um sentido. É no movimento de responder que o ouvnte o sente; é suspendendo esse movimento que ele compreende o sentido do discurso. Então, reconhece neste uma intenção, dentre aqueas que repre sentam uma certa tensão da relação socal: intenção reivindicatóra, ntenção puntva, intenção propicatória, ntenção demons trativa, intenção puramente agressiva. Sendo essa intenção assim compreendda, que se observe como a transmite a inguagem. De duas maneiras, das quais a análise é rica em ensinamentos: ela se exprime, mas sem ser compreendida peo sujeito, naqulo que o discurso relata do vvdo, na medida em que o sujeito assume o anonimato moral da expressão: é a forma do smbo lismo; ea é concebida, mas negada pelo sujeto, no que o discurso afrma do vivido, na medida em que o sujeito sistematiza sua concepção: é a forma da denegação. Assim, a ntenção revela-se, na experência, nconsciente enquanto expressa, consciente en quanto reprmida. Ao passo que a lnguagem, por ser abordada por sua função de expressão socia, revela ao mesmo tempo sua
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unidade sgnificativa na intenção e sua ambgüidade consttutiva como expressão subjetiva, depondo contra o pensamento, sendo mentrosa com ele. Note-se de passagem que essas relações, que a experência oferece aqui ao aprofundamento fenomenológico, são ricas rica s em diretrizes para qualquer teoria da consciência", especiamente a mórbda, vindo seu reconhecmento incompleto toar caduca a maioria dessas teoras. Mas prossigamos na decomposição da experiência O ouvnte entra nela, portanto, na situação de interlocutor. Esse papel, o sujeto lhe solcita que o sustente, a princípio mplictamente, e ogo de manera explícta. Silencioso, porém, e furtando-se até mesmo às reações de seu rosto, além de pouco dsceido em sua pessoa, o pscanalsta recusa-se pacientemente a isso. Não haverá um imite em que essa atitude deva fazer cessar o monólogo? Se o sujeito prossegue nee, é em virtude da le da experiência; mas, acaso continua ee a se drgr ao ouvinte reamente presente, ou antes, agora, a algum outro, magnáro porém mais rea ao fantasma da embrança, à testemunha da soldão, à estátua do dever, ao mensagero do destino? Contudo, em sua própria reação à recusa do ouvinte, o sujeito trai a imagem com que o substitu. Por sua súplca, suas impre cações, suas nsinuações, suas provocações e seus artfícos, pelas osclações da intenção com que o visa e que o analsta registra, imóvel mas não mpassível, ee lhe comunica o desenho dessa imagem. Entretanto, à medida que essas intenções toam-se mas expressas no discurso, elas são entremeadas de testemunhos com que o sujeto as apóa, as reforça, fazendo-as recobrar o fôlego: ele formula aquilo de que sofre e o que quer superar aqui, confia o segredo de seus fracassos e o sucesso de seus projetos, juga seu caráter e suas reações com outrem. Assm, ele informa sobre o conjunto de sua conduta ao analsta, que, ee mesmo testemunho de um momento desta, encontra a uma base para sua crítca. Ora, o que essa conduta mostra ao analsta após ta crítica é que nea atua, permanentemente, a própria imagem que ele vê surgir no atual Mas o anaista não chegou ao cabo de sua descoberta, pos, à medda que a petção assume a forma de um peto, o depoimento se ampia por seus apelos à testemunha; são relatos puros puros e que parecem fora do assunto , hors du sujet", que o sujeto agora joga no fluxo de seu dscurso,
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eventos sem inenção e fagmentos das lembanças que constituem sua história, e, dente os mais disjuntos, aquees que afloram de sua infância. Mas, eis que ente estes o analista eencona a mesma imagem que, com suas jogadas, ee havia suscitado no sujeito, cujo aso econhecea impresso na pessoa dele, essa imagem que ee decerto sabia ser essencialmente humana, já que provoca paixão, já que exece opressão, mas que, como faz ele mesmo para o sujeito, furtava suas feições a seu olha. Essas feições, ele as descobre num retrao de família: imagem do pai ou da mãe, do adulto onipotente, teo ou terríve, benevolente ou puniivo, imagem do irmão, filho rival, reflexo de si ou companheiro Mas essa mesma imagem que o sujeito pesentifica por sua conduta e que nela se eproduz sem cessar, ele a ignor nos dois senidos da palava, ou seja: ignora que aquilo que ele repete em sua conduta, quer o ome ou não por seu, ele não sabe que essa imagem o explica; e ignoa que desconhece essa importância da imagem quando evoca a embrança que ela representa. Pos bem, enquano o analista acaba de reconhecer essa imagem, o sujeito, peo debate que conduz, acaba de lhe impor o papel dea. É dessa posição que o analisa extrai o poder de que irá dispor para sua ação sobre o sujeito. A partir daí, com efeito, o anaista age de maneira a que o sujeito ome consciência da unidade da imagem que nee se refraa em efeitos díspares, conforme ele a represente, a encae ou a conheça. Não desceveremos aqui como procede o analisa em sua intervenção. Ele opea em dois registros, o da eucidação inteectual, pela interpretação e o da manoba afeiva, pela transferência; mas, fixar os empos delas é uma questão de técnica que as define em função das reações do sujeito ajustar sua velocidade é uma quesão de tato, peo qua o anaista é aleado sobre o ritmo dessas reações. Digamos apenas que, à medida que o sujeito prossegue na experiência e no processo vivido onde se reconsttui a imagem, a conduta deixa de imia sua sugestão, as embranças etomam sua densidade ea, e o analista vê o fim de seu pode, doavane inutilizado pelo fim dos sintomas e pelo aemae da personali dade.
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Discussão do valor objetivo da experiência Assim é a descrição fenomenológca que podemos dar do que se passa na sére de experências que compõem uma psicanálse. Trabalho de ilusionsta, podera se dzer, se não tivesse como fruto justamente resolver uma ilusão. Sua ação terapêutca, ao contrário, deve ser essencialmente definida como um duplo movmento pelo qual a magem, a prncpo dfusa e fragmentada, é regressivamente assimilada ao real, para ser progressivamente desassimilada do real, isto é, restaurada em sua realidade própra. Ação que testemunha a efciência dessa realdade. Mas, se não trabalho ilusóro, então simples técnica, drão, e, como experência, a menos propcia à observação cientfica, porque baseada nas condições mais contrárias à objetividade. Pois essa experiênca, acaso não acabamos de descrevê-la como uma constante neção entre o observador e o objeto? Com efeito, é no próprio movmento que o sujeto lhe comunica, através de sua ntenção, que o observador é informado desta, e até nsistimos na primordialidade dessa via; inversamente, pela assimilação que o observador propica entre ele mesmo e a imagem, ele subverte já na origem a função desta no sujeito; ora, ele só identifca a magem no própro progresso dessa subversão, e tampouco encobrimos o caráter constitutvo desse processo. Essa falta de uma referência fixa no sistema observado e esse uso, para a observação, do próprio movimento subjetvo, que em todos os outros lugares é eliminado como fonte de erro, são desafios, ao que parece, ao método sadio. E mas, deixem-nos dizer do desafio que aí se pode ver para bom uso. Na observação mesma que nos relata, o observador pode esconder aquilo que empenha de sua pessoa: as intuições de suas descobertas têm, em outros lugares, o nome de delíro, e sofremos por entrever de que experiêncas provém a insstênca de sua perspicáca. Sem dúvida, as vias por onde a verdade se revela são insondáves, e houve até matemátcos que conessaram tê-la vsto em sonho ou nela esbarrado numa colisão trivial qualquer Mas, é decente expor sua descoberta como oriunda de um processo mas conforme à pureza da déa. A ciência, como a mulher de César, não deve ser alvo de suspeita.
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Aliás, faz muito tempo que o bom renome do sábio já não corre riscos; a natureza não mais poderia desvelarse sob nenhu ma figura humana, e cada progresso da ciência apagou dela um traço antropomórfico. Se acreditamos poder tratar com certa ironia o que essas objeções traem de resistência afetiva, não nos acreditamos dispensados de responder a seu peso ideológico. Sem nos perdermos no terreno epistemológico, diremos desde logo que a ciência física, por mais depurada que pareça, em seus progressos modernos, de qualquer categoria intuitiva, não deixa de trair, e de maneira ainda mais impressionante, a estrutura da inteligência que a construiu. Se um Meyerson pôde demonstrála submetida, em todos os seus processos, à forma da identicação mental, forma tão constitutiva do conhecimento humano que ele a reencontra reflexão nos nos caminhos caminhos comu comuns ns do pensa pensamen mento to se o por reflexão fenômeno da luz, para lhe fornecer o padrão de referência e o átomo de ação, revela nela uma relação mais obscura com o sensório humano , esses pontos, decerto ideais, pelos quais a física se liga ao homem, mas que são os pólos em too dos quais ela gira, porventura não mostram a mais inquietante ho mologia com os eixos que confere ao conhecimento humano, como evocamos acima, uma tradição reexiva sem recurso à experiência? Seja como for, o antropomorfismo que reduziu a física, na noção deforça de força por exemplo, é um antropomorfismo não noético, mas psicológico, ou seja, essencialmente a projeção da intenção humana. Transpor a mesma exigência de redução para uma antropologia nascente, impondo-a até mesmo em seus objetivos mais longínquos, é desconhecer seu objeto e manifestar auten ticamente um antropocentrismo de outra ordem, a do conheci mento. O homem, de fato, mantém com a natureza relações que especificam, de um lado, as propriedades de um pensamento identicatório, e de outro, o uso de instrumentos ou utensílios artificiais Suas relações com seu semelhante procedem por vias bem mais diretas: não estamos designando aqui a linguagem, nem as instituições sociais elementares que, seja qual for sua gênese, são marcadas em sua estrutura pelo artificialismo; esta mos pensando nessa comunicação afetiva, essencial ao grupa
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mento social, que se manifesta de maneira bastante imediata nos fatos de que é seu semehante que o homem explora, de que é nee que se reconhece, e de que é a ele que se liga pelo vnculo psíquico indeléve que perpetua a miséria vital, ealmente espe cfica, de seus pimeiros anos de vida. Essas relações podem ser opostas às que constituem, no sentido estrito, o conhecimento, como relações de co-naturalidade: queremos evocar com esse termo sua homologia com as formas mais imediatas, mais globais e mais adaptadas que caacterizam em seu conjunto as elações psíquicas do animal com seu meio natual, e pelas quais estas se distinguem das mesmas relações no homem. Votaremos a fala do valor desse ensinamento da psicologia anima. De qualque modo, no homem, a idéia de um mundo unido a ele po uma elação harmoniosa deixa adivinha sua base no antropomorfismo do mito da natureza; à medida que se ealiza o esforço que impulsiona essa idéia, a reaidade dessa base evela-se na subversão cada vez mais vasta da natureza que é a hominiação do paneta: a "natueza do homem é sua elação com o homem.
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objeto da psiologia define-se em termos essenialmente relatiistas É nessa reaidade específica das relações inter-humanas que uma psicologia pode definir seu objeto próprio e seu método de investigação. Os conceitos que esse objeto e esse método impli cam não são subjetivos, mas relativistas. Por seem antopomór ficos em seu fundamento, esses conceitos, se sua extensão à psicologia anima, indicada acima, demonstra-se válida, podem desenvolver-se em formas genéricas da psicoogia. Aliás, o valor objetivo de uma pesquisa é demonstrado como a ealidade do movimento: pela eficácia de seu pogesso. O que melor confima a excelência da via definida por Freud para a abordagem do fenômeno, com uma pureza que o distingue de todos os outos psicólogos, é o avanço prodigioso que o coocou como "de ponta , em relação a todos os outos, na eaidade psicológica. Demonstaemos esse ponto numa segunda parte deste atigo. Exporemos, ao mesmo tempo, o uso genial que ee soube faze
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da noção de imagem Se, sob o nome de imago, ele não a desvinculou plenamente do estado confuso da intuição comum, foi para usar magistralmente seu alcance concreto, tudo conser vando de sua função informativa na intuição, na memória e no desenvolvimento. Ele demonstrou essa função desvendando na experiência o processo da identicação: bem diferente do da imitação, que distingue sua forma pela aproximação parcial e tateante, a identicação opõe-se a ela não somente como a assimilação global de uma estrutura, mas como a assimilação virtual do desenvolvimento implicado por essa estrutura em estado ainda indiferenciado. Assim, sabese que a criança percebe certas situações afetivas, como, por exemplo, a união particular de dois indivíduos num grupo, com uma perspicácia bem mais imediata que a do adulto; este, com efeito, malgrado sua maior diferenciação psíquica, é inibido, tanto no conhecimento humano quanto na condução de suas relações, pelas categorias convencionais que os censuram Mas a ausência dessas categorias serve menos à criança, ao lhe permitir perceber melhor os sinais (signos), do que o faz a estrutura primária de seu psiquismo, que o leva a ser prontamente penetrado pelo sentido essencial da situação. Mas não está nisso toda a sua superioridade: ele leva ainda a vantagem, com a impressão significativa, do germe, que desenvolverá em toda a sua riqueza, da interação social que ali se exprime. É por isso que o caráter de um homem pode desenvolver uma identcação parenta} que deixou de se exercer desde a idade limite de sua lembrança. O que se transmite por essa via psíquica são os traços que, no indivíduo, dão a forma particular de suas e. relações humanas, ou, dito de outra maneira, sua personalidad sua personalidade. Mas, o que a conduta do homem reflete então não são apenas esses traços, embora eles freqüentemente estejam entre os mais ocultos, porém a situação efetiva em que se encontrava aquele dos pais que foi objeto da identificação quando ela se produziu uma situação situação de conito conito ou de inferioridad inferioridadee no grupo con jugal, por exemplo. Resulta desse processo que o comportamento individual do homem traz a marca de um certo número de relações psíquicas típicas, onde se exprime uma certa estrutura social: no mínimo, a constelação que, nessa estrutura, domina mais especialmente os primeiros anos da infância.
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Essas relações psíquicas fundamentais revelaram-se à expe riência e foram definidas pea doutrina através do termo com plexos: devese ver aí o conceito mais concreto e mais fecundo introduzido no estudo do comportamento humano, em contraste com o conceito de instinto, que até então se reveara, nesse domínio, tão inadequado quanto estéri. Se a doutrina efetiva mente referiu o compexo ao instinto, a teoria parece escarecer-se mais peo primeiro do que apoiarse no segundo É por intermédio do complexo que se instauram no psiquismo as imagens que dão forma às mais vastas unidades do compor tamento imagens com que o sujeito se identifica alteadamente, para encenar, como ator único, o drama de seus confitos Essa comédia, situada peo espírito da espécie sob o signo do riso e das lágrmas, é uma commedia dell'arte, no sentido de que cada indivíduo a improvisa e a toa medíocre ou sumamente expressiva, conforme seus dons, é claro, mas também segundo uma ei paradoxa que parece mostrar a fecundidade psíquica de toda insuficiência vital Commedia dellarte, além disso, por se encenar segundo um roteiro típico e papéis tradicionais. Ali podemos reconhecer os mesmos personagens que tipificaram o fol clore, clore, os contos contos e o teatr teatro o infanti infanti ou adulto adulto a ogra, ogra, o bicho-papão, o avarento, o pai nobre , que os complexos exprimem por nomes mais eruditos. Reconheceremos, numa imagem para a qual nos evará a outra vertente deste trabaho, a figura do arlequim Com efeito, depois de haver valorzado a realização fenomeno lógica do freudismo, passamos agora à crítica de sua metapsi coogia. Ea começa, muito precisamente, na introdução da noção de libido A psicologia freudiana, de fato, exacerbando sua indução com uma audácia próxima da temeridade, pretende remontar da reação inter-humana, ta como ela a isola como determinada em nossa cutura, à função biológica que seria seu substrato: e aponta essa função no desejo sexual. Convém distinguir, no entanto, dois usos do conceito de libido, aiás incessantemente confundidos na doutrna: como conceito energético regendo a equivalência dos fenômenos, e como hipótese substancialista, referindo-os à matéria Designamos a hipótese de substancialista e não materiaista, porque o recurso à idéia de matéria é apenas uma forma ingênua
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e utrapassada de um autêntico materialismo. Seja como for, é no metabolismo da função sexua no homem que Freud aponta a base das sublimações" infinitamente variadas que seu com portameno manifesta. Não discuiremos aqui essa hipótese, porque ela nos parece extea ao campo próprio da psicologia. Sublinharemos, não obstante, que ela se fundamena numa descobera clínica de vaor essencial: a de uma coeação que se manifesa constantemente entre o exercício, o tipo e as anomalias da função sexual e um grande número de formas e de sintomas" psíquicos. Acrescene-se a isso que os mecanismos em que se desenvolve a hipótese, bem diferentes dos do associacionismo, levam a fatos que se oferecem ao controle da observação. Se a teoria da ibido efetivamente afirma, por exemplo, que a sexualidade infantil passa por uma fase de organização anal, e confere um vaor erótico à função excreória e ao objeo excrementício, esse interesse pode ser observado na criança no próprio lugar que nos é aponado para tal. Como conceito energético, ao conrário, a libido é apenas a noação simbólica da equivaência enre os dinamismos que as imagens investem no comporamento. É a própria condição da identfcação simbólica e a entidade essencial da ordem raciona, sem as quais nenhuma ciência poderia consituirse. Através dessa notação, a eficiência das imagens, sem poder ainda ser relacionada com uma unidade de medida, mas á provida de um sinal posiivo ou negativo, pode exprimir-se pelo equilíbrio que eas poduzem entre si e, de certa maneira, por um méodo de dupla pesagem. A noção de libido, nesse emprego, á não é meapsicoógica: é o instrmento de um progresso da psicologia em direção a um saber positivo. A combinação, por exemplo, dessa noção de invesimento libidinal com uma estrutura ão concreamene definida quano a do supereu representa, anto em relação à definição ideal da consciência moral quanto à abstração funcional das chamadas reações de oposição ou de imitação, um progresso somente comparáve ao razido à ciência física pelo uso da reação peso-volume, quando ela substituiu as categorias quan tiativas do pesado e do eve. Os eementos de uma determinação positiva foram assim introduzidos enre as reaidades psíquicas que uma definição
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relativista permtra objetvar Essa determinação é dinâmica ou relatva aos fatos do desejo. Foi assim que se pôde estabelecer uma escala da constituição no homem dos objetos de seu interesse e especiamente daque les, de prodigiosa dversidade que permanecem como um engma quando a psicologia afirma como prncípo a realidade tal como constituída pelo conhecmento: anomaias da emoção e da pusão, dossincrasias da atração e da repulsa, fobias e pânicos, nostal gias e vontades irracionais curiosdades pessoais coecionamentos eetvos nvenções do conhecmento ou vocações da ativdade Por outro lado, definiuse uma divisão do que podemos chamar personalidade, lugares de lugares imaginários que constituem a personalidade, que se distrbuem e nos quais se compõem conforme seus tipos, as magens anterormente evocadas como formadoras do desen vovimento: são eles o isso e o eu, as nstâncias arcaca e secun dária do supereu. Aqui se coocam duas questões: através das imagens objetos do nteresse, como se constitu essa realidade em que se concla universalmente o conhecimento do homem? Através das dent cações típicas do sujeito como se constitu o [eu], onde é que ee se reconhece? A essas duas questões, Freud novamente responde de passa gem no terreno metapscoógico. Ele ormula um princípio de realidade" cuja crítica em sua doutrna constitu o fnal de nosso trabalho. Mas antes devemos examnar que contribuição trazem no que tange à realidade da imagem e às formas do conhecimento, as pesqusas que com a disciplna reudiana, concorrem para a nova ciênca pscoógica. Essas serão as duas partes de nosso segundo artgo. (Marienbad, Noirmouter agosto-outubro de 1936)
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