SEBENTA
ANATOMIA II
BERNARDO MANUEL DE SOUSA PINTO FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DO PORTO
2010/2011
Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Índice Irrigação arterial do pescoço e da cabeça: Artérias carótidas………………………………………5 Veias da cabeça e do pescoço……………………….……...……….………………...……….………22 Nariz, fossas nasais, seios perinasais e rinofaringe…………….……………………………………32 Língua e cavidade oral……….………………………………….…………………………...…………45 Dentes………………………………………..……………………….………………...………...………50 Glândulas salivares…………………………………………...…………………………………………55 Orofaringe…………….…………………………..……………………………………………...………59 Músculos do palato mole e faringe…………………...…………………………...….………….……62 Glândula tiróide e glândulas paratiróides………………………………….………...………………67 Laringofaringe……………..……………….……...………………………………….…………………70 Laringe…………….…...………………………………..……………………………..…………………71 Traqueia ………….……………………………..………………………………………………………..86 Brônquios………….…………………………………………………………….……………….………88 Pulmões……………………….…………...………………………………………………..…...….……93 Pleura ……………………….……………………………………………………………..……………102 Coração………….………………………………………...………….…………………………...……105 Esqueleto fibroso do coração e sistema de condução………………………...………..….………116 Artérias coronárias…..………………………………………………………………………...………121 Veias cardíacas………………………..……………………………………..………………....………126 Pericárdio …..………………………………………………………………...………………...………128 Grandes vasos do coração……………………...……………………………………….…....………130 Mediastino (e timo)………………………..…………..……………………………………....………137 Esófago………………………..………………………………………..………….…………....………140 Estômago...………………..……………………………………………………………………..……..143 Duodeno…………….………….....…………………………………………………….….…..…….…147 Jejuno e íleo…………….………………………...……………………...………….………….………150 Intestino grosso…………….………………………………………………....…………….……….…152 Canal anal…………….………………………...…………………………...………...…….……….…160
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Fígado...………………..…………………………………………………………………....…………..162 Tronco biliar …………….………….....…………….…………………………………………...….…171 Pâncreas…………….………………………...…………………………………..….………….………175 Baço…………….………………………...……………………………………………………..…….…179 Irrigação das vísceras abdominais…………….……………………………….………..…...………182 Aorta abdominal……………………………………………………..……....………………182 Veia cava inferior...………………..……….……………………………….………………..186 Vascularização do estômago……..……........................................................………………189 Vascularização do duodeno……..……..........................................................………………193 Vascularização do jejuno e íleo……..……........................................................……………195 Vascularização do intestino grosso..…….........................................................……………197 Vascularização do fígado……..……..............................................................………………203 Vascularização do pâncreas e baço..…….........................................................……………207 Sistema ázigos……..…….................................................................................………………210 Anatomia geral do peritoneu…………….……………………………………………………...……211 Rins…………………………………….…………………………………………………...…...………226 Ureteres…………….…………………………………………………….…………….…..…...………231 Bexiga…………….…………….……………………………………………………….…..…...………233 Glândulas supra-renais…………….……………………………………………….…….…...………235 Aparelho genital feminino.…………………………………………………………...…….…...……237 Aparelho genital masculino.…………………………………………………….………….…...……247 Artérias ilíacas internas.…………………………………………………….…………………...……259 Veias ilíacas internas.…………………………………………………….…………….………...……268 Peritoneu pélvico.…………………………………………………….…………………...……...……271 Sistema nervoso autónomo.…………………………………………………….………........….……277 Tronco simpático cervical……………………………….…………..……....………………281 Inervação autónoma do tórax…………..……….……………..………….………………..283 Inervação autónoma do abdómen e pelve.........................................................…..………287 Sistema linfático.………………………………………………………………..………………...……293
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Drenagem linfática do pescoço e da cabeça………………..…………..…………………295 Drenagem linfática da pelve e do períneo…….…………………………….……………..299 Drenagem linfática do abdómen...................................................................………………302 Drenagem linfática do tórax.........................................................……………..……………307 Vasos linfáticos terminais.........................................................……………………..………310 Embriologia.…………………………………………………….………………………………...……316 Embriologia geral…………………………..……....…………………………………...……316 Organogénese das cavidades celómicas e do sistema respiratório………….…………..328 Organogénese do coração.........................................................……………………..………335 Organogénese do sistema digestivo...............................................................………………346 Organogénese do sistema urinário.........................................................………...…………359 Organogénese dos aparelhos genitais...........................................................………………364 Links de apoio.…………………………………………………….……………………………...……375
Estão incluídos nesta sebenta, resumos de Anatomia II da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto acompanhados por ilustrações, esquemas e mnemónicas. Desde já agradeço a quem me ajudou na elaboração da sebenta, através da correcção de eventuais erros inicialmente presentes, ou através de ideias e sugestões. Bom trabalho e votos de sucesso nos exames, Bernardo M. Sousa Pinto
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1. Pescoço e cabeça Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Irrigação arterial do pescoço e da cabeça: Artérias carótidas A vascularização da cabeça e do pescoço é assegurada principalmente pelos ramos das artérias carótidas e subclávia (nomeadamente a artéria vertebral). As artérias carótidas (comum, externa e interna) encontram-se num espaço delimitado posteriormente pelas apófises transversas das vértebras cervicais e músculos que lá se inserem, medialmente, pela traqueia, esófago, tiróide, laringe e constritores da faringe e, anterolateralmente, pelo esternocleidomastoideu e pelo omohióide, esternohióide, digástrico e estilohióide (estes músculos encontram-se em regiões diferentes). As artérias carótidas comum e interna encontram-se todas na bainha carotídea, acompanhadas pela veia jugular interna e pelo nervo vago, sendo que a veia é lateral à artéria e o nervo encontra-se entre e posteriormente a estas.
Artéria carótida comum As artérias carótidas comuns diferem nos lados esquerdo e direito, em termos das suas origens. A artéria carótida comum direita parte da artéria braquiocefálica, quando esta passa posteriormente à articulação esternoclavicular. A artéria carótida comum esquerda parte directamente do arco aórtico no mediastino superior. Dessa forma, enquanto a artéria carótida comum direita apresenta apenas uma parte cervical, a esquerda apresenta uma porção cervical e uma torácica. De resto, ambas as artérias carótidas comuns descrevem um trajecto similar, divergindo lateralmente, a partir da região posterior à articulação esternoclavicular até ao nível superior da cartilagem tiróide da laringe (ao nível da junção entre C3 e C4, ou a 3cm inferiormente ao bordo inferior da mandíbula), onde se divide em artérias carótidas externa e interna, podendo esta bifurcação dar-se mais superiormente. Apesar da artéria carótida comum normalmente não dar ramos, esta pode ocasionalmente originar as artérias vertebral, tiróide superior, laríngea superior, faríngea ascendente, tiróide inferior ou occipital.
Relações Na parte inferior do pescoço, as artérias carótidas comuns estão separadas por um pequeno espaço, que contem a traqueia. Superiormente, as artérias ficam separadas pela tiróide, laringe e pela faringe. Anterolateralmente, ao nível da cartilagem cricóide e de C6, a artéria é cruzada pelo tendão intermédio (e por vezes pelo ventre superior) do omohióide. Inferiormente ao omohióide, a artéria é mais profunda, estando coberta por pele, fáscia superficial, platisma, fáscia cervical profunda, esternocleidomastoideu, esternohióide e esternotiróide. Sobre
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II o omohióide, a artéria é mais superficial, estando apenas coberta por pele, fáscia superficial, platisma, fáscia cervical profunda e bordo medial do esternocleidomastoideu, sendo cruzada obliquamente pelo ramo para o esternocleidomastoideu da artéria tiróide superior. A raiz superior da ansa cervical encontra-se anterior à bainha carotídea, ou mesmo envolvida nesta. Já a veia tiróide superior, normalmente cruza a bainha perto do bordo superior da cartilagem tiróide e a veia tiróide média cruza um pouco inferiormente ao nível da cartilagem cricóide. A veia jugular anterior cruza a artéria carótida comum sobre a clavícula, estando separada desta pelo esternohióide e pelo esternotiróide. Posteriormente à bainha carotídea encontramos as apófises transversas de C4-C6, onde estão fixados o longo do pescoço, o longo da cabeça e fibras tendinosas do escaleno anterior. O tronco simpático (identificável através das suas dilatações) e o ramo cervical ascendente da artéria tiróide inferior encontram-se entre a artéria carotídea comum e os músculos referidos. Inferiormente ao nível de C6, a artéria encontra-se anterior aos vasos vertebrais, às artérias subclávia e tiróide inferior, ao nervo recorrente da laringe. A tiróide sobrepõe-se à bainha, anteromedialmente e a veia jugular interna encontra-se lateral e, na região inferior do pescoço, anterior à artéria, enquanto o nervo vago encontrase posterolateralmente no ângulo entre a artéria e a veia.
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artéria carótida comum pode ser comprimida contra o tubérculo anterior da apófise transversa de C6 (o qual é designado por tubérculo de Chassaignac), sendo que superiormente a este nível ela torna-se superficial e o seu pulso pode ser facilmente sentido.
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Artéria carótida externa A artéria carótida externa inicia-se lateralmente ao bordo superior da cartilagem tiróide, ao nível do disco intervertebral entre C3 e C4. Esta artéria ascende inicialmente, um pouco anteriormente, inclinando-se depois posterolateralmente, passando a meio entre a ponta da apófise mastóide e o ângulo da mandíbula. Nesta região, esta artéria divide-se nos seus ramos terminais – a artéria temporal superficial e a artéria maxilar. A artéria carótida externa dá oito ramos distribuídos pela cabeça e pescoço. As artérias tiróide superior, lingual e faciais partem da sua face anterior, as artérias occipital e auricular posterior partem da sua face posterior e a artéria faríngea ascendente parte da sua face medial. Enquanto ascende, a artéria carótida externa diminui rapidamente o seu calibre, dado dar vários ramos grandes. Aquando da sua origem, no triângulo carotídeo, encontra-se anteromedial à artéria carótida interna, tornando-se depois anterior e finalmente lateral. Na região mandibular, a apófise estilóide e as estruturas que lá se fixam encontram-se entre os vasos referidos - a artéria carótida externa é superficial à apófise estilóide e a artéria carótida interna é profunda. Na região do pescoço, a artéria carótida externa encontra-se sobretudo ao nível do pequeno triângulo de Farabeuf, delimitado pela veia jugular interna, pelo tronco venoso tiro-linguo-faringeo-facial e pelo nervo hipoglosso.
Relações A pele e a fáscia superficial, a ansa entre o nervo facial e o nervo cutâneo transverso, a fáscia cervical profunda e o bordo anterior do esternocleidomastoideu encontram-se superficialmente à artéria carótida externa, no triângulo carotídeo. A artéria é cruzada pelo nervo do hipoglosso, pela sua veia comitante, pelas veias lingual, facial e, por vezes, pelas veias tiróides superiores. Quando abandona o triângulo carotídeo, a artéria carótida externa é cruzada pelo ventre posterior do digástrico e pelo estilohióide e ascende entre esses músculos e a face posteromedial da glândula parótida. A artéria
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II carótida externa entra, então, na glândula parótida, onde se encontra medial ao nervo facial e à junção das veias temporal superficial e maxilar. Inicialmente, a parede faríngea, o nervo laríngeo superior e a artéria faríngea ascendente são mediais à artéria. A um nível superior, a artéria carótida externa encontra-se separada da interna pela apófise estilóide, estiloglosso, músculo estilofaríngeo, nervo glossofaríngeo, ramo faríngeo do nervo vago e parte da glândula parotídea.
☤ Para sentir o pulso da artéria carótida externa, coloca-se um dedo no triângulo carotídeo, onde ocorre a terminação da artéria carótida comum e a origem das artérias carótidas externa e interna, começando a carótida externa a dar os seus ramos iniciais. A artéria carótida externa é menor que a interna nas crianças, mas nos adultos as duas apresentam iguais dimensões.
Artéria tiróide superior A artéria tiróide superior é o primeiro ramo da artéria carótida externa e parte da face anterior desta, inferiormente ao nível do corno maior do osso hióide. Desce ao longo do bordo lateral do tirohióide, atingindo o ápice do lobo da glândula tiróide. Medialmente, encontramos o músculo constritor inferior e o nervo laríngeo externo, que se pode encontrar posteromedialmente. A artéria tiróide superior irriga a tiróide e a pele adjacente. Dá ramos glandulares (um ramo anterior, que se desloca ao longo do bordo medial do pólo superior do lobo lateral, um ramo que se anastomosa com o seu homólogo contralateral e um posterior que desce ao longo do bordo posterior e que se anastomosa com a artéria tiróide inferior), a artéria infrahióide, a artéria laríngea superior, a artéria esternocleidomastoideia e a artéria cricotiróide. Artéria infrahióide A artéria infrahióide é um pequeno ramo que se desloca ao longo do bordo inferior do osso hióide, profundamente ao tirohióide e que se anastomosa com a sua homóloga contralateral, para irrigar os músculos infrahióides. Artéria laríngea superior A artéria laríngea superior acompanha o nervo laríngeo interno. Profundamente ao tirohióide, perfura a porção inferior da membrana do tirohióide para irrigar os tecidos da parte superior da laringe. Anastomosa-se com a sua homóloga contralateral e com o ramo laríngeo inferior da artéria tiróide inferior. Artéria esternocleidomastóide A artéria esternocleidomastóide desce lateralmente, ao longo da bainha carotídea e irriga a região média do esternocleidomastoideu. Artéria cricotiróide Por último, a artéria cricotiróide cruza superiormente no ligamento cricotiróide anterior, anastomosase, com a sua homóloga contralateral e irriga o cricotiróide.
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Artéria faríngea ascendente A artéria faríngea ascendente é o ramo mais pequeno da artéria carótida externa. Este vaso parte da face medial desta artéria, perto da sua origem. Ascende por entre a artéria carótida interna e a faringe, até à base do crânio. A artéria faríngea ascendente é cruzada pelo estiloglosso e pelo estilofaríngeo e o longo da cabeça encontra-se posteriormente a esta. Esta artéria dá pequenos ramos que irrigam o longo da cabeça, o longo do pescoço, o tronco simpático, os nervos do hipoglosso, glossofaríngeo e vago. A artéria faríngea ascendente dá ainda as artérias faríngea, timpânica inferior e meníngeas. Anastomosase com o ramo palatino ascendente da artéria facial e com o ramo cervical ascendente da artéria vertebral. Artéria faríngea A artéria faríngea dá três ou quatro ramos para irrigar os músculos constritores da faringe e o estilofaríngeo. Um ramo variável irriga o palato e pode substituir o ramo palatino ascendente da artéria facial. A artéria desloca-se inferolateralmente, por entre o bordo superior do constritor superior e o elevador do véu do palatino. Artéria timpânica inferior A artéria timpânica inferior é um pequeno ramo que atravessa o canalículo temporal, com o ramo timpânico do nervo glossofaríngeo e irriga a parede medial da cavidade timpânica. Artérias meníngeas Por último, os ramos meníngeos são pequenos vasos que irrigam os nervos que atravessam o buraco lacero, o buraco jugular, o canal do hipoglosso e a dura mater e ossos associados. A artéria meníngea posterior, um dos seus ramos, atinge a fossa cerebelar, através do buraco jugular e é entendida como sendo o ramo terminal da artéria faríngea ascendente.
Artéria lingual A artéria lingual vasculariza a língua e o pavimento da boca. Parte anteromedialmente da artéria carótida externa, do lado oposto à ponta do corno maior do osso hióide, por entre as artérias tiróide superior e facial. Ascende medialmente, deslocando-se depois inferior e anteriormente, passando medialmente ao bordo posterior do hioglosso e deslocando-se, depois, horizontalmente e anteriormente, profundamente a este músculo. A artéria lingual ascende novamente verticalmente e desloca-se anteriormente na face inferior da língua, até à sua ponta, onde se anastomosa com a sua homóloga contralateral. Esta artéria pode ser substituída por um ramo da artéria maxilar. A artéria lingual divide-se em três “terços” em relação ao hioglosso. Na sua primeira parte, a artéria lingual encontra-se no triângulo carotídeo. Na primeira parte, a pele, a fáscia superficial e o platisma encontram-se superficiais a esta artéria, enquanto o constritor médio da faringe é medial. Na segunda parte, passa ao longo do bordo superior do osso hióide, profundamente ao hioglosso, aos tendões do digástrico e estilohióide, à porção inferior da glândula submandibular e à porção posterior do milohióide. Nesta porção, o hioglosso separa a artéria lingual do nervo hipoglosso. Por último, a terceira parte é designada por artéria profunda da língua e encontra-se acompanhada pelo nervo lingual e medial ao genioglosso. Lateralmente, encontramos o músculo longitudinal inferior. A artéria lingual dá como ramos, a artéria suprahióide, as linguais dorsais e a sublingual.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Artéria suprahióide A artéria suprahióide é um pequeno ramo que se desloca ao longo do bordo superior do osso hióide, para se anastomosar com a sua artéria contralateral, irrigando estruturas adjacentes. Artérias linguais dorsais As artérias linguais dorsais são dois ou três pequenos ramos, que partem medialmente ao hioglosso e ascendem até à porção posterior do dorso da língua. Estes vasos irrigam a membrana mucosa, o arco palatoglossal, as amígdalas, o palato mole e a epiglote. Elas anastomosam-se com as suas homólogas contralaterais. Artéria sublingual Por último, a artéria sublingual parte no bordo anterior do hioglosso. Passa anteriormente, por entre o genioglosso e o milohóide, até à glândula sublingual, que irriga, juntamente com as membranas mucosas bucal e gengival e com o milohióide. Um dos seus ramos entra no buraco lingual da mandíbula.
Artéria facial A artéria facial parte anteriormente da carótida externa no triângulo carotídeo, sobre a artéria lingual e o corno maior do osso hióide. No pescoço, na sua origem, está coberta apenas por pele, platisma, fáscias e, por vezes, pelo nervo hipoglosso. Desloca-se anterosuperiormente, profundamente ao digástrico e estilohióide, podendo atingir a face lateral do estiloglosso, que a separa da amígdala palatina. Medialmente ao ramo da mandíbula, desloca-se superiormente, sulcando a região posterior da glândula submandibular. Esta artéria desce depois até ao bordo inferior da mandíbula, por entre a glândula submandibular e o músculo pterigóide medial. Ao atingir a face da mandíbula, a artéria facial curva-se anteriormente ao masseter, entrando na cara. Aí, ela é profunda à pele, gordura das bochechas e, perto do ângulo da boca, ao zigomático maior e risório, sendo superficial ao bucinador e ao elevador do ângulo da boca. Pode passar sobre ou atravessar o elevador do lábio superior e segue um percurso tortuoso ao longo do lado do nariz, até à região medial do olho. No final, anastomosa-se com um ramo da artéria oftálmica, que, por sua vez, é um ramo da artéria carótida interna. A veia facial encontra-se posterior à artéria, apresentando um trajecto mais directo na cara. Estes dois vasos estão em contacto ao nível do bordo anterior do masseter, enquanto no pescoço, a veia é superficial à artéria. No pescoço dá como ramos, as artérias palatina ascendente, amigdalina, submentoniana e glandulares, enquanto na cara, os seus ramos são a artéria pré-massetérica, as artérias labiais superior e inferior e a artéria nasal lateral. A parte da artéria distal ao seu ramo terminal é designada por artéria angular.
☤ O pulso da artéria facial pode ser sentido, sobretudo, quando esta cruza a base da mandíbula e perto do canto da boca.
☤ O percurso sinuoso da artéria permite-lhe no pescoço adaptar-se aos movimentos da faringe, durante a deglutição; enquanto na cara, isto confere vantagem, no sentido de se adaptar aos movimentos efectuados pela mandíbula, lábios e bochechas.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Artéria palatina ascendente A artéria palatina ascendente parte junto à origem da artéria facial. Passa superiormente, entre o estiloglosso e o estilofaríngeo, até atingir o bordo da faringe, ao lado do qual ascende, por entre o constritor superior da faringe e o pterigóide medial, até à base do crânio. Bifurca-se perto do elevador do véu do palatino – um ramo segue a direcção desse músculo, irrigando o palato mole e anastomosando-se com o seu homólogo contralateral e com o ramo palatino maior da artéria maxilar, enquanto o outro perfura o músculo constritor superior, irrigando a amígdala e o tubo faringeotimpânico e anastomosando-se com as artérias amigdalina e faríngea ascendente. Artéria amigdalina A artéria amigdalina irriga a amígdala palatina, ascendendo por entre o pterigóide medial e o estiloglosso. Esta artéria perfura o constritor superior da faringe, ao nível do bordo superior do estiloglosso e entra no pólo inferior da amígdala, onde se ramifica. Artéria submentoniana A artéria submentoniana é o maior ramo cervical da artéria facial, separando-se nesta ao nível da glândula submandibular. Desloca-se anteriormente, no milohióide, inferiormente à mandíbula. Esta artéria irriga a pele e músculos que a cobrem e anastomosa-se com um ramo sublingual da artéria alveolar inferior. No queixo, a artéria submentoniana ascende sobre a mandíbula e divide-se em ramos superficial e profundo, que se anastomosam com as artérias labial inferior e mentoniana. Ramos glandulares Os ramos glandulares são três ou quatro e irrigam a glândula salivar submandibular e os gânglios linfáticos associados, os músculos adjacentes e a pele. Artéria pré-massetérica A artéria pré-massetérica é pequena, nem sempre estando presente. Quando existe, passa superiormente ao longo do bordo anterior do masseter, irrigando os tecidos adjacentes. Artéria labial inferior A artéria labial inferior parte perto do ângulo da boca, desloca-se superiormente e anteriormente, inferiormente ao depressor do ângulo da boca. De seguida, perfura o orbicular da boca, para se deslocar sinuosamente, perto do bordo do lábio inferior. Irriga as glândulas labiais inferiores, a membrana mucosa e os músculos adjacentes e anastomosa-se com a sua homóloga contralateral e com o ramo mentoniano da artéria alveolar inferior. Artéria labial superior A artéria labial superior é maior e descreve um percurso mais sinuoso que a artéria labial inferior, embora apresente um trajecto similar, ao longo do bordo do lábio superior, por entre a membrana mucosa e o orbicular da boca, anastomosando-se com a sua homóloga contralateral. Dá um ramo alar e um ramo septal, ao nível do septo nasal. Artéria nasal lateral A artéria nasal lateral é dada ao nível do nariz e irriga o dorso e as asas do nariz e anastomosa-se com a sua homóloga contralateral. Esta artéria pode estar substituída por um ramo da artéria labial superior.
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Artéria occipital A artéria occipital parte posteriormente da artéria carótida externa, a aproximadamente 2cm da sua origem, onde é cruzada superficialmente pelo nervo hipoglosso. De seguida, a artéria passa posteriormente, superiormente e profundamente ao vente posterior do digástrico e cruza a carótida interna, a veia jugular interna e os nervos hipoglosso, vago e acessório. Deslocando-se por entre a apófise transversa do atlas e a apófise mastóide, a artéria occipital atinge o bordo lateral do recto lateral da cabeça. Depois, desloca-se no sulco occipital do osso temporal, medialmente à apófise mastóide e zonas de fixação do esternocleidomastoideu, esplénio da cabeça, longuíssimo da cabeça e digástrico. Finalmente, acompanhada pelo nervo occipital maior, desloca-se superiormente, perfurando a fáscia cervical profunda e deslocando-se tortuosamente na fáscia superficial, onde se divide em vários ramos. A artéria occipital apresenta dois ramos principais – um ramo superior e um inferior – que irrigam a parte superior do esternocleidomastoideu, no pescoço. O ramo inferior parte perto da origem da artéria
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II occipital, descendo posteriormente, sobre o nervo hipoglosso e a veia jugular interna. Entra depois no esternocleidomastoideu e anastomosa-se com o ramo esternocleidomastoideu da artéria tiróide superior. Já o ramo superior é dado, quando a artéria occipital cruza o nervo acessório e desloca-se inferiormente e posteriormente, superficialmente à veia jugular interna, entrando na face profunda do esternocleidomastoideu com o nervo acessório. Para além desses ramos, a artéria occipital dá um ramo descendente, que se anastomosa com a artéria vertebral, com a artéria cervical superficial e com a artéria cervical profunda (ramos da artéria subclávia). A artéria occipital dá ainda ramos meníngeos e ramos para o esternocleidomastoideu.
☤ O pulso da artéria occipital pode ser sentido ao nível da linha nucal superior, embora isto seja muito difícil.
Artéria auricular posterior A artéria auricular posterior é um pequeno vaso, que se ramifica posteriormente da artéria carótida externa, sobre o digástrico e o estilohióide. Ascende por entre a glândula parótida e a apófise estilóide, até ao sulco entre a cartilagem auricular e a apófise mastóide, dividindo-se em ramos auricular e occipital. De referir que, este é o único ramo da artéria carótida externa, que não tem origem no triângulo carotídeo. No pescoço, dá ramos para o digástrico, estilohióide, esternocleidomastoideu e glândula parótida, originando também a artéria estilomastóide, que entra no buraco estilomastóide, para irrigar o nervo facial, a cavidade timpânica, as células aéreas do antro mastóide e os canais semicirculares.
Artéria maxilar A artéria maxilar é o maior ramo terminal da artéria carótida externa, partindo posteriormente ao colo da mandíbula, estando inicialmente coberta pela glândula parótida. De seguida, cruza a fossa infratemporal, entrando na fossa pterigopalatina. Apresenta três partes – mandibular, pterigóide e pterigopalatina. A parte mandibular desloca-se horizontalmente pela face medial do ramo da mandíbula, passando por entre o colo da mandíbula e o ligamento esfenomandibular, paralelamente e um pouco inferiormente ao nervo auriculotemporal, dando ramos que perfuram osso. A porção pterigóide ascende obliquamente, medialmente ao músculo temporal, podendo se deslocar superficialmente, ou profundamente à cabeça inferior do pterigóide lateral, dando apenas ramos musculares. Por último, a porção pterigopalatina passa por entre as duas cabeças do pterigóide lateral, atingindo a fissura pterigomaxilar, de forma a entrar na fossa pterigopalatina, onde termina. Em termos de ramos, a porção maxilar apresenta cinco ramos – a artéria auricular profunda, timpânica anterior, meníngea média, meníngea acessória e alveolar inferior. A porção pterigóide apresenta cinco ramos – a artéria temporal profunda, pterigóides, massetérica e bocal (todos eles, como já foi referido, ramos musculares). Por fim, na porção pterigopalatina, a artéria maxilar dá quatro ramos, nomeadamente a artéria alveolar superior posterior, a artéria infra-orbitária, a artéria esfenopalatina e a artéria palatina descendente. De referir que, a artéria alveolar posterior superior e a artéria infra-
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II orbitária são dadas ainda na fossa infra-temporal, sendo os restantes ramos dados ao nível da fossa pterigopalatina.
Artéria auricular profunda A artéria auricular profunda perfura a parede óssea ou cartilagínea do meato acústico externo, irrigando a pele da região e a membrana timpânica.
Artéria timpânica anterior A artéria timpânica anterior passa através da fissura petrotimpânica, irrigando parte do ouvido médio.
Artéria meníngea média A artéria meníngea média é o primeiro ramo da artéria maxilar, caso esta se encontre superficial ao pterigóide lateral, algo que não acontece, quando a artéria maxilar se encontra profundamente a este músculo. A artéria meníngea média ascende por entre o ligamento esfenomandibular e o pterigóide lateral, passa por entre as duas raízes do nervo auriculotemporal e abandona a fossa infratemporal através do buraco espinhoso, pelo qual entra na fossa craniana média, continuando-se no crânio, onde é a principal artéria.
☤A
ruptura da artéria meníngea média origina um hematoma extra-dural, que deve ser cuidadosamente monitorizado, pois se não for drenado, pode originar uma lesão cerebral. Dessa forma, se o indivíduo que sofra um hematoma se sentir sonolento nas 24 horas a seguir ao acidente, deverá fazer novos exames, pois pode apresentar uma pequena hemorragia.
Artéria meníngea acessória A artéria meníngea acessória atravessa o buraco oval, até à fossa craniana média, podendo ser um ramo da artéria meníngea média. Durante o seu trajecto na fossa infratemporal, esta artéria encontrase profunda ao nervo mandibular.
Artéria alveolar inferior 14
Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A artéria alveolar inferior é um ramo da artéria maxilar, que desce na fossa infratemporal, posteriormente ao nervo alveolar inferior. Aqui, encontra-se entre o osso, lateralmente, e o ligamento esfenomandibular, medialmente. Antes de entrar no buraco mandibular, origina um ramo milohióide, que perfura o ligamento esfenomandibular, descendo com o nervo milohióide, no sulco milohióide, na face interna do ramo da mandíbula. Esta artéria ramifica-se e anastomosa-se com o ramo submentoniano da artéria facial. Já a artéria alveolar inferior, continua o seu percurso, atravessando o canal mandibular com o nervo alveolar inferior, para irrigar os molares e pré-molares, dividindo-se em ramos incisivos e mentonianos, perto do primeiro pré-molar. O ramo incisivo continua-se inferiormente ao dente incisivo, onde se anastomosa-se com o seu homólogo contralateral. Já a artéria mentoniana abandona o buraco mentoniano, irrigando o queixo e anastomosando-se com a artéria labial inferior e com a artéria submentoniana.
Artérias temporais As artérias temporais apresentam ramos anterior, médio e posterior, que passam por entre o temporal e o pericrânio, deixando sulcos nos ossos, anastomosando-se com o ramo temporal médio da artéria temporal superficial.
Artéria massetérica A artéria massetérica é um pequeno vaso, que acompanha o nervo massetérico, enquanto passa posteriormente ao tendão do temporal, através da incisura mandibular. Entra na face profunda do masseter, podendo irrigar a articulação temporomandibular. A artéria massetérica anastomosa-se com os ramos massetéricos da artéria facial e com o ramo facial transverso da artéria temporal superficial.
Artéria bocal A artéria bocal desloca-se obliquamente e anteriormente, por entre o pterigóide medial e a zona de fixação do temporal e irriga a pele e a mucosa sobre o bucinador, acompanhando a porção inferior do ramo bucal do nervo mandibular. Anastomosa-se com ramos das artérias facial e infra-orbitária.
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Artéria alveolar superior posterior A artéria alveolar superior posterior parte na fossa pterigopalatina, deslocando-se através da fissura pterigomaxilar, até à tuberosidade maxilar. Dá ramos que penetram na maxila, de modo a irrigar os dentes molares e pré-molares, bem como o seio maxilar.
Artéria infra-orbitária A artéria infra-orbitária entra na órbita através da fissura orbital inferior. Desloca-se no pavimento da órbita, no sulco e canal infra-orbitário, emergindo ao nível do buraco infra-orbitário, para irrigar a pálpebra inferior, parte da bochecha, do nariz e do lábio superior. Dentro do canal infra-orbitário, dá a artéria alveolar superior anterior, que se desloca inferiormente para irrigar os dentes anteriores e a porção anterior do seio maxilar.
Artéria do canal pterigóide A artéria do canal pterigóide (artéria vidiana) parte como um ramo da parte distal da artéria maxilar ou, mais raramente, do segmento petroso da artéria carótida interna. Atravessa o canal pterigóide e anastomosa-se com as artérias faríngea, etmoidal e esfenopalatina, na fossa pterigopalatina, e com as artérias faríngea ascendente, meníngea acessória, palatina ascendente e palatina descendente em torno do tubo faringeotimpânico, contribuindo assim, para irrigar o tubo faringeotimpânico, a cavidade timpânica e a parte superior da faringe.
Artéria do canal palatovaginal A artéria do canal palatovaginal (ramo faríngeo da artéria maxilar) atravessa o canal palatovaginal, acompanhando o nervo faríngeo, estando distribuída pela mucosa do tecto nasal, nasofaringe, seio aéreo esfenoidal e tubo faringeotimpânico.
Artéria palatina maior (artéria palatina descendente) A artéria palatina maior abandona a fossa pterigopalatina, através do canal palatino maior, onde dá duas ou três artérias palatinas menores. A artéria palatina maior irriga o meato nasal inferior, atravessando o buraco palatino maior, para passar para o tecto do palato duro. Desloca-se então anteriormente, para irrigar o palato duro e as gengivas dos dentes maxilares. Dá um ramo que se desloca no canal incisivo, para se anastomosar com a artéria esfenopalatina, contribuindo para a irrigação arterial do septo nasal. De referir que as artérias palatinas menores irrigam o palato mole, atravessando os buracos palatinos menores.
Artéria esfenopalatina A artéria esfenopalatina é um ramo da artéria maxilar, atravessando o buraco esfenopalatino e entrando na cavidade nasal, posteriormente ao meato superior. A partir daqui, são dados ramos nasais laterais posteriores, sobre as conchas e meatos, que se vão anastomosar com as artérias etmoidais e com os ramos nasais da artéria palatina maior, de forma a irrigar os seios aéreos frontal, maxilar, etmoidal e esfenoidal. A artéria esfenopalatina termina no septo nasal, numa série de ramos septais, que se anastomosam com as artérias etmoidais. Um ramo anastomosa-se com a artéria palatina maior e com o ramo septal da artéria labial superior.
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Artéria temporal superficial A artéria temporal superficial é o ramo terminal mais pequeno da artéria carótida externa, partindo ao nível da glândula parótida, posteriormente ao colo da mandíbula, onde é cruzada pelos ramos temporal e zigomático do nervo facial. Esta artéria torna-se superficial, à medida que passa sobre a raiz posterior da apófise zigomática do osso temporal, onde o seu pulso pode ser sentido. Desloca-se no escalpe e divide-se em ramos frontal (anterior) e parietal (posterior). A artéria temporal superficial irriga a pele e os músculos do lado da cara e no escalpe, a glândula parótida e a articulação temporomandibular. Apresenta como ramos, as artérias facial transversa, auricular, zigomatico-orbital, temporal média, frontal e parietal. O ramo frontal passa superiormente até à tuberosidade frontal e irriga os músculos, pele e pericrânio adjacentes. Anastomosa-se com a sua homóloga contralateral e com os ramos supraorbital e supratroclear da artéria oftálmica. O ramo parietal é maior que o frontal e curva-se posterosuperiormente, tornando-se superficial à fáscia temporal e anastomosando-se com a sua homóloga contralateral e com as artérias auricular posterior e occipital.
☤O
pulso da artéria temporal superficial pode ser sentido, quando esta cruza a arcada zigomática.
Artéria facial transversa A artéria facial transversa parte antes da artéria temporal superficial emergir da glândula parótida. Atravessa a glândula, cruza o masseter, por entre o canal parotídeo e o arco zigomático e divide-se em
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II numerosos ramos que irrigam a glândula parotídea, o canal parotídeo, o masseter e a pele adjacente. Estes ramos anastomosam-se com as artérias facial, massetérica, bocal, lacrimal e infra-orbitária. Artéria auricular A artéria auricular distribui ramos ao lóbulo e face lateral da orelha e para o meato acústico externo. Artéria zigomatico-orbital A artéria zigomatico-orbital desloca-se próxima ao bordo superior do arco zigomático, por entre as duas camadas da fáscia temporal, até ao ângulo orbital lateral. Irriga o orbicular do olho e anastomosa-se com os ramos palpebral e lacrimal da artéria oftálmica. Artéria temporal média A artéria temporal média parte superiormente ao arco zigomático e perfura a fáscia temporal, irrigando o músculo temporal. Anastomosa-se com os ramos temporais profundos da artéria maxilar.
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Artéria carótida interna A artéria carótida interna irriga a maior parte do hemisfério cerebral ipsilateral, o olho e órgãos acessórios, a testa e, em parte, o nariz. Na sua origem, esta artéria apresenta um seio carotídeo (também designado por bulbo carotídeo), que é sensível a variações de pressão arterial. A artéria carótida interna ascende em frente às apófises transversas de C1-C3, até à abertura inferior do canal carotídeo, na porção petrosa do temporal, entrando na cavidade craniana (a artéria carótida interna não dá ramos antes de entrar no crânio ósseo). Esta artéria desloca-se então anteriormente, através do seio cavernoso, no sulco carotídeo do osso esfenóide, terminando, quando se divide em artérias cerebrais anterior e média, que irrigam o cérebro, sendo a artéria cerebral média a maior. Estes ramos da artéria carótida interna anastomosam-se com ramos da artéria vertebral no círculo de Willis, na cisterna interpeduncular da região ventral do cérebro.
Relações A artéria carótida interna é inicialmente superficial, no triângulo carotídeo, tornando-se depois profunda e medial ao ventre posterior do digástrico. Em todo o seu trajecto, excepto perto do crânio ósseo, a artéria é medial ao nervo vago e à veia jugular interna, na bainha carotídea. Posteriormente à artéria carótida interna, encontramos o longo da cabeça e o gânglio simpático cervical superior. Medialmente, encontramos a parede faríngea e anterolateralmente, a artéria carótida interna está coberta pelo esternocleidomastoideu. Inferiormente ao ventre posterior do digástrico, o nervo hipoglosso, a raiz superior da ansa cervical e as veias lingual e facial são superficiais à artéria. Ao nível do digástrico, a artéria é cruzada pelo estilohióide e pelas artérias occipital e auricular posterior e superiormente ao digástrico, a artéria carótida interna está separada da carótida externa pela apófise estilóide, estiloglosso, estilofaríngeo, nervo glossofaríngeo, ramo faríngeo do nervo vago e parte mais profunda da glândula parótida. Na base do crânio, os nervos glossofaríngeo, vago, acessório e hipoglosso encontram-se entre a artéria carótida interna e a veia jugular interna, que é mais posterior.
☤ Arteriosclerose obstrutiva na carótida comum, ou na carótida interna, podem levar a enfartes, acidentes isquiémicos transitórios ou perturbações visuais no olho ipsilateral, descritas como assemelhando-se a “cortinas caindo sobre o campo visual”.
Seio carotídeo O seio carotídeo é uma dilatação, que está presente frequentemente, na extremidade inferior da artéria carótida interna e que funciona como um baroreceptor – ou seja, um “sensor” da pressão do sangue arterial. Esta estrutura é inervada, sobretudo pelos ramos carotídeos no nervo glossofaríngeo.
☤ Aquando
de condições de taquicardia (aumento do ritmo cardíaco), realizam-se, por vezes massagens no seio carotídeo, de forma a baixar a pressão arterial. A mesma lógica explica
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Corpo carotídeo O corpo carotídeo funciona como um receptor químico, que é sensível às variações do teor químico do sangue. Esta estrutura apresenta uma forma oval, uma cor vermelho-acastanhada, 5-7 mm de altura e 2,5-4 mm de largura. Encontra-se posteriormente à bifurcação carotídea, ou por entre os seus ramos, estando rodeado por uma cápsula fibrosa. Esta estrutura é inervada, sobretudo pelos ramos carotídeos no nervo glossofaríngeo e, em menor extensão, pelo nervo vago.
☤ O corpo carotídeo recebe uma grande quantidade de sangue, proveniente da artéria carótida externa adjacente. Aquando de condições de hipoxia (condição em que existe menor concentração de oxigénio no sangue), hipercapnia (maior concentração de dióxido de carbono no sangue), ou menor pH sanguíneo, esta estrutura permite aumentar a quantidade e velocidade de ventilação, através de ligações aos centros respiratórios do cérebro.
Mnemónicas sobre vascularização do pescoço e da cabeça: - Ramos da artéria carótida externa: TeFLon FOrA – Tiróide superior, Faríngea ascendente, Lingual, Facial, Occipital e Auricular posterior - Ramos da artéria tiróide superior: ILha ECológica – Infrahióide, Laríngea superior, Esternocleidomastóide e Cricotiróide - Ramos da artéria faríngea ascendente: FesTIM – Faríngea, Timpânica Inferior e Meníngeas - Ramos da artéria temporal superficial: Fiz Três Avaliações, Zero Tirei – Facial Transversa, Auricular, Zigomático-orbital e Temporal média.
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Veias da cabeça e do pescoço Seios venosos Os seios venosos cranianos encontram-se em espaços entre a dura mater e o endocrânio, recebendo as veias do cérebro e ossos do crânio. Os seios venosos não apresentam válvulas e as suas paredes não apresentam tecido muscular. Estas estruturas comunicam com as veias meníngeas e com veias externas ao crânio, através de veias emissárias, terminando, directa, ou indirectamente, na veia jugular interna. Alguns seios são ímpares, enquanto outros são pares.
☤ As veias emissárias estabelecem a comunicação entre os seios venosos e as veias do exterior do crânio (nomeadamente a plexos venosos, como o plexo pterigóide). A sua importância clínica reside no facto de serem vias de passagem, para o alastramento de uma infecção até à região interna do crânio. De referir que as veias emissárias atravessam os buracos parietais e mastóide e os canais condilar, carotídeo e do hipoglosso.
Veias meníngeas As veias meníngeas partem do diploë e formam plexos, na região da dura mater. Apesar de algumas terminarem nos seios venosos cranianos, outras deslocam-se com as artérias meníngeas e terminam em veias extracranianas. Estas veias incluem as veias diplóicas e a veia meníngea média.
Veias diplóicas As veias diplóicas são grandes vasos, de pequena espessura, que se encontram no diploë dos ossos chatos do crânio, existindo normalmente, pelo menos quatro vasos diferentes desta categoria, de cada lado do crânio. A veia diplóica frontal passa através de uma pequena abertura no bordo superior da incisura supraorbital, terminando na veia supra-orbital, ou no seio sagital superior. A veia diplóica temporal anterior termina, quer no seio esfeno-parietal, quer na veia temporal profunda anterior, estando principalmente confinada ao osso frontal. A veia diplóica temporal posterior termina, quer no seio transverso, quer na veia emissária mastóide (o que acontece mais frequentemente), encontrando-se, sobretudo ao nível do osso parietal. Por fim, a veia diplóica occipital é a maior das veias diplóicas, terminando quer na veia occipital, quer no seio transverso, ou na confluência dos seios. Esta veia encontra-se confinada ao osso occipital. Existem ainda várias pequenas veias diplóicas inominadas, que perfuram a tábua interna do crânio e drenam para os seios venosos e para os vasos meníngeos.
Veia (seio) meníngea média A veia meníngea média apresenta um ramo anterior (frontal) e um ramo parietal (posterior). O ramo anterior cruza o pavimento da fossa craniana média, desde o buraco oval, ou o buraco espinhoso, até ao ptérion, sob a forma de dois canais paralelos que acompanham a artéria meníngea média. As veias encontram-se mais próximas do osso, relativamente à artéria e, dessa forma, são mais facilmente propensas a lesões, aquando de fracturas cranianas.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Já o tronco posterior (parietal) da veia pode atravessar o buraco espinhoso, ou o buraco oval, terminando no plexo pterigóide. O tronco frontal também pode contribuir para este plexo, através do buraco oval, ou pode terminar do seio cavernoso, ou esfenoparietal. Esta veia recebe como tributárias, veias meníngeas e pequenas veias cerebrais inferiores, conectando-se com veias diplóicas e pequenas veias cerebrais médias superficiais. É frequente encontrarmos granulações aracnóides, ao nível da veia meníngea média.
Veias do escalpe As partes superficiais do escalpe são drenadas pelas veias supratroclear, supra-orbital, temporal superficial, auricular posterior e occipital. Já na parte profunda do escalpe, na região da fossa temporal, a drenagem venosa é assegurada pelas veias temporais profundas, que se deslocam medialmente ao músculo temporal, drenando para o plexo pterigóide.
Veias da órbita As veias oftálmica superior e inferior fazem a comunicação entre a veia facial e as intracranianas, não apresentando válvulas. A veia oftálmica superior forma-se posteromedialmente à pálpebra superior, deslocando-se com a artéria oftálmica e recebendo como tributárias, as veias vortex superior do globo ocular e a veia central da retina, que pode drenar directamente para o seio cavernoso. A veia oftálmica superior atravessa a fissura orbital superior, terminando ao nível do seio cavernoso. A veia oftálmica inferior, por seu turno, inicia-se numa rede venosa, perto da região anterior do pavimento orbital e parede medial da órbita. Desloca-se posteriormente, ao longo da fissura orbital superior, podendo-se juntar à veia oftálmica superior, ou passar através da fissura orbital superior, para drenar para o seio cavernoso. Esta veia comunica com o plexo pterigóide, através de um ramo que passa através da fissura orbital inferior.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Por último, a veia infraorbital desloca-se com o nervo e com a artéria infraorbital, no pavimento da órbita, deslocando-se posteriormente através da fissura orbital inferior, até ao plexo venoso pterigóide. Esta estrutura comunica com a veia oftálmica inferior, podendo também comunicar com a veia facial.
Veias do nariz A drenagem venosa do nariz é assegurada por veias nasais externas e veias nasais internas. A maior parte das veias nasais internas juntam-se formando a veia esfenopalatina, que passa através do buraco esfenopalatino e da fossa pterigopalatina até ao plexo pterigóide. Algumas terminam como tributárias etmoidais da veia oftálmica superior, enquanto as restantes terminam como tributárias septais da veia labial superior, ou das veias nasais externas. De referir que as veias nasais externas terminam como tributárias da veia facial.
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Plexo pterigóide O plexo pterigóide encontra-se na fossa infratemporal, na face lateral do pterigóide medial e em torno do pterigóide lateral, profundamente ao músculo temporal. Este plexo comunica com o seio cavernoso por veias emissárias, que passam através dos buracos oval, emissário e lácero. Comunica ainda com a veia oftálmica inferior, através da fissura orbital inferior e com a veia facial, através da veia facial profunda. Posteriormente, o plexo pterigóide forma a veia maxilar. As suas tributárias correspondem a grande parte dos ramos correspondentes da artéria maxilar, incluindo também as veias temporais profundas, pterigóide, esfenopalatina, alveolar e palatina maior.
Veia maxilar A veia maxilar acompanha a primeira parte da artéria maxilar, sendo um pequeno tronco, formado pela confluência das veias do plexo pterigóide. Esta veia passa posteriormente ao colo da mandíbula e une-se com a veia temporal superficial, dentro da glândula parótida, de modo a formar a veia retromandibular.
Veia temporal superficial A veia temporal superficial desce até ao bordo superior do arco zigomático, até imediatamente anterior à orelha. Aqui, recebe a veia temporal média como tributária (esta veia recebe a veia orbital e perfura a fáscia temporal). Depois, cruza o arco zigomático para entrar na glândula parótida, onde se une com a veia facial transversa e com a veia maxilar, para formar a veia retromandibular. Esta rede venosa recebe como tributárias, as veias parótidas, vasos que drenam a articulação temporomandibular, a veia auricular anterior, a veia facial transversa e a veia temporal média.
Veia retromandibular A veia retromandibular desce através da glândula parótida (sendo superficial à artéria carótida externa), dentro da qual se bifurca numa divisão anterior, que se junta à veia facial e numa divisão posterior que, juntamente com a veia auricular posterior, origina a veia jugular externa.
Veia auricular posterior A veia auricular posterior parte de uma rede parieto-occipital que também drena tributárias das veias temporal superficial e occipital. Desce posteriormente à orelha, juntando-se à divisão posterior da veia retromandibular, na glândula parótida, ou posteriormente a esta, para formar a veia jugular externa. Recebe a veia estilomastóide, como tributária.
Veia jugular externa A veia jugular externa é formada pela união da veia auricular posterior com a divisão posterior da veia retromandibular, ao nível do ângulo da mandíbula, dentro, ou inferiormente à glândula parótida, sendo tributária da veia subclávia. Desce verticalmente, profundamente ao platisma, superficialmente ao esternocleidomastoideu. A veia jugular externa desloca-se paralelamente ao grande nervo auricular,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II perfurando a fáscia cervical profunda, ao atingir o triângulo subclávio, atingindo a veia subclávia, lateralmente, ou anteriormente ao escaleno anterior. A veia jugular externa apresenta duas válvulas – uma na sua extremidade final e outra localizada 4cm superiormente. As tributárias da veia jugular externa são a veia jugular anterior, a veia jugular externa posterior (que se inicia no escalpe occipital e drena a pele e os músculos que se encontram posterosuperiormente no pescoço), a veia cervical transversa e a veia suprascapular (estas duas últimas acompanham o trajecto das respectivas artérias). Por vezes esta veia recebe a veia cefálica como tributária, ou uma comunicação proveniente desta.
☤A
veia jugular externa pode, por vezes, estar ausente, ou ser mais pequena, que o normal. Nestes casos, a veia jugular interna fica alargada.
Veia jugular anterior A veia jugular anterior é formada na região submentoniana, pela junção de veias submandibulares superficiais, sendo tributária da veia jugular externa. Desce ao longo da fáscia superficial, a uma distância variável do plano mediano. Inferiormente, esta veia entra no espaço suprasternal, onde se comunica com a sua homóloga contralateral, atra vés de um canal transverso – o arco venoso jugular. Desloca-se depois
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II lateralmente, profundamente ao esternocleidomastoideu e superficialmente ao esternohióide e esternotiróide, terminando como tributária da veia jugular externa. Recebe como tributárias as veias laríngeas e por vezes uma pequena veia tiróide. Estas veias são desprovidas de válvulas e comunicam com a veia jugular interna.
Veia supratroclear A veia supratroclear inicia-se na testa, a partir de uma rede venosa, com comunicação com as tributárias frontais da veia temporal superficial. As veias desta rede formam um tronco único, que desce até à região do nariz. Aqui, as duas veias supratrocleares contralaterais unem-se, através de um arco nasal. A partir daqui, as veias divergem, juntando-se, cada uma, a uma veia supraorbital, de forma a originar a veia facial, perto da região medial do olho.
Veia supraorbital A veia supraorbital inicia-se perto da apófise zigomática do osso frontal, conectando-se com tributárias das veias temporais superficial e média. Passa medialmente, sobre a órbita, perfura o orbicular do olho e une-se à veia supratroclear, perto do ângulo medial do olho, de forma a originar a veia facial. Um dos seus ramos passa através da incisura supra-orbital, onde comunica com veias do seio frontal e do diploë frontal, comunicando, dessa forma, com a veia oftálmica superior.
Veia facial A veia facial inicia-se no ângulo medial do olho, através da união das veias supra-orbital e supratroclear. Desloca-se posteriormente à artéria facial, passando superficialmente à glândula submandibular, digástrico e estilohióide. Um pouco inferiormente ao ângulo da mandíbula, recebe a divisão anterior da veia retromandibular, continuando o seu trajecto superficialmente às artérias carótidas, interna e externa e ao nervo do hipoglosso, até terminar como tributária da veia jugular interna, perto do corno maior do osso hióide. Esta veia apresenta como tributárias todas as veias com correspondência com os ramos arteriais da artéria facial, com excepção da artéria palatina ascendente, que não tem veias acompanhantes. Em adição, esta veia apresenta também como tributárias as veias paramigdalina, submandibular, faríngea, palpebral inferior, parótida e massetérica. Contudo, a tributária mais importante da veia facial, é a veia facial profunda.
☤A
veia facial comunica com o seio cavernoso, por duas formas. A veia oftálmica superior, proveniente do seio cavernoso, ajuda a formar a veia facial, por via da veia supraorbital, e a veia facial profunda, que passa profundamente ao ramo da mandíbula, sendo proveniente do seio cavernoso, através do plexo pterigóide. Dessa forma, a trombose da veia facial, na região entre o modíolo e o ângulo interno do olho, pode se espalhar até ao seio cavernoso (até à região intracraniana) e daí, essa área ser designada por “área perigosa da face”.
Veias faríngeas As veias faríngeas são duas ou três, sendo tributárias da veia jugular interna. Estas veias asseguram-se da drenagem do plexo venoso faríngeo, recebendo ainda veias meníngeas.
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Veia tiróide superior A veia tiróide superior acompanha a respectiva artéria, recebendo como suas tributárias, a veia laríngea superior e a veia cricotiróide, terminando na veia jugular interna ou na veia facial.
Veia tiróide média A veia tiróide média passa anteriormente à artéria carótida comum e posteriormente ao ventre superior do omohióide, drenando a parte inferior da tiróide, recebendo, igualmente, veias da laringe e traqueia.
Veias linguais As veias linguais seguem duas vias – as veias linguais dorsais drenam o dorso e lados da língua, juntando-se às veias linguais, acompanhando a artéria lingual, por entre o hioglosso e o genioglosso. Já a veia lingual profunda inicia-se perto da ponta da língua, deslocando-se para trás, juntando-se perto do bordo do hioglosso à veia sublingual (proveniente da glândula salivar sublingual), formando a veia comitante do nervo do hipoglosso. Estas veias são tributárias da veia jugular interna.
Veia occipital A veia occipital perfura o trapézio e passa para o triângulo sub-occipital, drenando para as veias cervical profunda e vertebral. Por vezes, continua-se com a artéria occipital, terminando ao nível da veia jugular interna.
Veia jugular interna A veia jugular interna faz o retorno venoso do cérebro, cara e grande parte do pescoço. Cada veia inicia-se no buraco jugular, como continuação do seio sigmóide e termina-se posteriormente à extremidade medial da clavícula, ao juntarem-se com a veia subclávia, de modo a formar a veia braquiocefálica. O seu início encontra-se dilatado, formando o bulbo superior, enquanto a sua extremidade inferior é assinalada pelo bulbo inferior, delimitado superiormente por uma válvula bicúspide. A veia jugular interna encontra-se na bainha carotídea, inicialmente, posterolateralmente à artéria carótida interna, com quem partilha esse percurso, e aos últimos quatro, nervos cranianos. Contudo, mais inferiormente, a veia torna-se totalmente lateral à artéria carótida interna (e depois à artéria carótida comum), encontrando-se o nervo vago entre estas duas estruturas, mas mais posteriormente.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Inferiormente, a veia jugular interna torna-se profunda ao esternocleidomastoideu, sendo que ao longo do seu percurso, superficialmente, encontramos vários nódulos linfáticos. Inferiormente à apófise transversa do atlas, a veia jugular interna é cruzada, lateralmente, pelo nervo acessório. Esta veia é ainda cruzada pela raiz inferior da ansa cervical, a meio do seu percurso e, na sua extremidade inferior, pela veia jugular anterior (da qual está separada pelos músculos infrahióides). Posteriormente à veia jugular interna, encontramos as apófises transversas das vértebras cervicais e os músculos que nelas se fixam (longo da cabeça, longo do pescoço e fibras do escaleno anterior), o nervo frénico e a primeira parte da artéria subclávia. No caso da veia jugular interna esquerda, ainda encontramos, posteriormente, a parte terminal do canal torácico.
☤ Aquando de condições patológicas que afectem os seios venosos cranianos, é possível efectuar a punção da veia jugular interna, com compressão da sua região inferior. Isto resulta no retorno do sangue até à cabeça, preenchendo a veia jugular interna, os seios venosos cranianos e respectivos tributários.
Corpo timpânico O corpo timpânico é ovóide, encontrando-se na túnica adventícia da parte superior do bulbo superior da veia jugular interna, apresentando estrutura similar ao corpo carotídeo e, provavelmente, função similar. Tumores nesta estrutura podem envolver os nervos cranianos adjacentes e o ouvido médio.
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Nariz, fossas nasais, seios perinasais e rinofaringe Nariz O nariz é a primeira parte do tracto respiratório superior, sendo responsável pelo aquecimento, humidificação e filtragem do ar inspirado (sendo o aquecimento do ar inspirado possível, através da enorme vascularização do nariz). Nele está contido o epitélio olfactivo, que contém os neurónios receptores olfactivos, responsáveis pela detecção de moléculas odoríferas. O nariz é uma estrutura piramidal, localizada na linha média da região média da cara, estando ligado ao esqueleto facial. O seu ângulo superior, ou raiz, é contínuo com a testa, e o seu ápice, é formado pela sua ponta livre, que se projecta anteriormente. A base do nariz apresenta duas aberturas elipsóides – as narinas externas, que se abrem para a sua face inferior e estão separadas por um septo nasal e pela columela (a extremidade externa do septo, coberta por pele). O sulco alar encontra-se na pele e delimita as asas do nariz, sobre e na junção com o sulco nasolabial, curvando-se inferiormente até à ponta do nariz, não a atingindo. A pele e o tecido mole que cobrem o dorso do nariz são normalmente finos, especialmente na junção ósteo-cartilagínea, estando fracamente conectadas à aponevrose nasal. Na região proximal e distal do nariz, a pele é mais espessa, pois apresenta glândulas sebáceas.
Esqueleto ósseo e cartilagíneo do nariz No que toca ao seu esqueleto ósseo, a abertura piriforme do nariz externo está delimitada inferiormente e lateralmente pela maxila e superiormente, pelos ossos nasais, sendo que esse septo fornece suporte para o dorso do nariz. Já no que concerne ao esqueleto cartilagíneo, este consiste em cartilagem nasal lateral (superior) e cartilagem alar maior, bem como outras cartilagens nasais alares menores. A cartilagem nasal lateral é triangular e o seu bordo anterior é mais espesso que o posterior. A região superior é contínua com a cartilagem septal, mas anteroinferiormente, pode ser separada desta por uma fissura estreita. O bordo superior desta cartilagem encontra-se ligado ao osso nasal e apófise frontal da maxila, enquanto o bordo inferior está ligado por tecido fibroso ao pilar lateral da cartilagem alar maior.
Relativamente à cartilagem alar maior, esta consiste numa lâmina fina e flexível, que se encontra inferiormente à cartilagem lateral e se curva em torno da porção anterior da respectiva narina. A sua porção medial é o pilar medial da cartilagem alar (ou apófise septal), estando ligada por tecido fibroso à sua homóloga contralateral e à parte anteroinferior da cartilagem septal. O pilar intermédio
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II forma o bordo do ápice da narina e o pilar lateral encontra-se lateral à narina e desloca-se superolateralente. De referir que, o bordo superior do pilar lateral encontra-se ligado ao bordo inferior da cartilagem nasal lateral e o seu bordo lateral está ligado à apófise frontal da maxila, por uma membrana fibrosa, que contêm três ou quatro cartilagens alares menores. Músculos do nariz O grupo dos músculos nasais inclui o prócero, o nasal, o músculo dilatador do nariz, o depressor do septo e o elevador do lábio superior e da asa do nariz. Estes músculos estão envolvidos na respiração, expressão facial e na produção de alguns sons durante o discurso. O prócero é um pequeno músculo piramidal que se encontra perto do lado medial da parte frontal do occipitofrontal, com o qual se encontra parcialmente fundido. Parte de uma aponevrose facial, ligada ao periósseo, cobrindo a parte inferior do osso nasal, do pericôndrio, que cobre a parte superior da cartilagem nasal lateral e da aponevrose da parte transversa do músculo nasal. Insere-se na pele, por entre as sobrancelhas. O músculo nasal apresenta componentes transverso e alar. A parte transversa (compressor do nariz) está fixa à maxila, sobre e lateralmente à fossa incisiva e lateralmente à parte alar. As suas fibras deslocam-se superiormente e medialmente e expandem-se numa fina aponevrose que se mistura com a sua contralateral ao longo da ponte nasal. A parte alar, por sua vez, é também designada por dilatador posterior do nariz e está ligada à maxila, sobre o incisivo lateral e o canino, lateralmente à fixação óssea do depressor do septo e medialmente à parte transversa, com a qual se mistura parcialmente. As suas fibras passam superiormente e anteriormente e estão ligadas à pele da asa sobre o pilar lateral da cartilagem lateral inferior e à parte posterior do septo móvel. O músculo dilatador anterior do nariz é um músculo muito pequeno fixado à cartilagem lateral superior e parte alar do nasal, à margem caudal do pilar lateral e ao pilar alar lateral. O músculo depressor do septo encontra-se imediatamente profundo à membrana mucosa do lábio superior. Está normalmente fixo ao periósseo que cobre a maxila, sobre os incisivos central e lateral e à espinha nasal anterior. Algumas fibras musculares passam entre os pilares mediais até à ponta do nariz. O depressor do septo pode estar ausente ou ser rudimentar. O elevador do lábio superior e da asa do nariz parte da região superior da apófise frontal da maxila e, passando obliquamente, inferiormente e lateralmente, divide-se em fibras mediais e laterais. A porção medial mistura-se no pericôndrio do pilar lateral da cartilagem alar maior do nariz e com a pele sobre este e a lateral prolonga-se na parte lateral do lábio superior, onde se mistura com o elevador do lábio superior e com o orbicular da boca.
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Irrigação arterial, drenagem venosa, inervação e drenagem linfática A pele do nariz é vascularizada por ramos das artérias facial, oftálmica e infra-orbitária. As asas e parte inferior do septo nasal são irrigadas pelos ramos nasal lateral e septal da artéria facial e as regiões laterais do dorso do nariz são irrigadas pelo ramo nasal dorsal da artéria oftálmica e pelo ramo infraorbitário da artéria maxilar. No que toca à drenagem venosa do nariz externo, esta é levada a cabo por tributárias da veia facial, na sua maioria, embora a região da raiz do nariz drene para as veias oftálmicas. No que concerne à inervação esta é assegurada pelos nervos infra-orbitário e pelo ramo nasal externo do nervo etmoidal anterior. Por seu turno, a drenagem linfática é feita para os gânglios submandibulares, com excepção da raiz do nariz, cuja drenagem é para os gânglios parotídeos superficiais.
☤ A ligação entre as veias do nariz, lábio superior e queixo com a área de drenagem das veias oftálmicas têm grande importância clínica dado poder ser uma via para a transmissão de infecções.
Fossas nasais A cavidade nasal é um espaço irregular entre o tecto da boca e a base do crânio. Esta é mais larga inferiormente que superiormente e mais larga e verticalmente profunda na sua região central, onde está dividida por um septo osteocartilagíneo vertical, que é aproximadamente mediano. A cavidade nasal comunica com os seios frontais, etmoidais, maxilares e esfenoidais e abre-se na nasofaringe através de um par de aberturas nasais – as aberturas nasais posteriores (coanas), separadas pelo bordo posterior do vómer e cada uma está limitada superiormente pela apófise vaginal das lâminas pterigóides mediais, lateralmente pela lâmina perpendicular do palatino e pela lâmina pterigóide medial e inferiormente pela lâmina horizontal do osso palatino. Os canais vomerovaginal e palatovaginal encontram-se no tecto desta região.
Vestíbulo nasal O vestíbulo nasal encontra-se dentro da narina. Na sua parede lateral, está limitado superior e posteriormente por uma crista curva, o limen nasi, que se eleva, onde o pilar cartilagíneo lateral da cartilagem alar maior se sobrepõe ao bordo inferior da cartilagem nasal lateral, de cada lado. Do lado septal da cavidade nasal, o bordo superior do pilar medial da cartilagem alar maior (a intumescência
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II medial) marca a fronteira entre o vestíbulo nasal e a cavidade nasal. A parede medial do vestíbulo é formada por um septo móvel, consistindo na columela (que não contém cartilagem) e nos pilares mediais das cartilagens alares. No vestíbulo nasal encontramos pêlos, as vibriças, ajudam a travar a passagem de partículas do ar inspirado. Posterosuperiormente ao limen nasi, já coberto por mucosa, encontramos o antrum do meato médio (ou átrio do meato médio), marcado por uma elevação – o agger nasi.
Tecto O tecto da cavidade é horizontal e desloca-se inferiormente, em direcção anterior e posterior. O declive anterior é formado pela espinha anterior dos ossos frontais e pelos ossos nasais. A região central é formada pela lâmina crivosa do etmóide, que a separa do pavimento da fossa craniana anterior. O declive posterior é formado pela região anterior do corpo do esfenóide, interrompido de cada lado pela abertura de um seio esfenoidal e das conchas esfenoidais.
☤A
lâmina crivosa do etmóide e a lâmina papirácea do etmóide (uma lâmina muito fina na parede lateral do etmóide) representam fracas barreiras à transmissão de infecções para dentro da órbita, devido à sua pequena espessura.
Pavimento O pavimento da cavidade nasal é transversalmente côncavo e desloca-se superiormente até às aberturas posteriores. A maior parte é formada pelas apófises palatinas das maxilas, que se articulam com as lâminas horizontais dos palatinos.
Parede lateral A parede lateral da cavidade nasal é formada anteroinferiormente pela maxila, posteriormente, pela lâmina perpendicular do palatino e superiormente pelo labirinto etmoidal. Contêm três projecções de tamanho variável – as conchas nasais inferior, superior e média. A concha nasal inferior é um osso independente que articula com as cristas conchais da maxila e do etmóide, delimitando o meato inferior, o maior meato, onde é aberto o canal nasolacrimal (o canal nasolacrimal é formado pelo sulco lacrimal da maxila, a apófise descendente do osso lacrimal e a apófise lacrimal da concha nasal inferior). A concha média é uma apófise medial do labirinto etmóide e estende-se posteriormente para se articular com a lâmina perpendicular no palatino. Delimita inferiormente o meato médio, por onde é possível ter acesso ao buraco esfenopalatino, que lhe é posterior e comunica com a fossa pterigopalatina. Este buraco é delimitado pelas apófises orbital e esfenoidal do palatino, anterior e posteriormente, respectivamente, superiormente, pelo corpo da concha nasal média e, inferiormente, pelo bordo superior da lâmina perpendicular do osso palatino. A concha nasal superior é uma apófise medial do labirinto medial e apresenta-se como uma pequena lâmina curva, posterosuperior à concha média. Delimita o meato superior e é a concha mais pequena. Sobre esta, o seio esfenoidal abre-se, separando-a do corpo do esfenóide. Por vezes, existe uma concha nasal suprema, na parede lateral do recesso esfenoetmoidal. A passagem que se encontra inferiormente a esta é denominada de meato nasal supremo, que pode conter uma abertura para o seio etmoidal posterior. O septo nasal pode estar desviado, devido a ferimentos ou a um crescimento desproporcional da cartilagem. Por vezes, esse desvio pode causar a obstrução nasal unilateral. Contudo, para isto
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II contribuem também variações anatómicas na parede nasal lateral, normalmente associadas com variações de dimensões e posição das células etmoidais anteriores. Isto pode obstruir a drenagem dos seios frontais e maxilares.
Parede medial A parede medial é constituída por um septo ósseo, normalmente sem características, formada posterosuperiormente pelo vómer (que também forma o seu bordo posterior) e anterosuperiormente pela lâmina perpendicular do etmóide, contínua, superiormente com a lâmina crivosa do etmóide. Os ossos nasais e a espinha nasal do frontal dão pequenas contribuições para o limite anterosuperior da parede medial. Inferiormente, temos o contributo das cristas nasais da maxila e palatino e posterosuperiormente, da crista e o rostro do esfenóide. De referir que a sua face é sulcada pelos nervos e vasos nasopalatinos. Por entre o vómer e a lâmina perpendicular do etmóide, encontramos uma porção cartilagínea do septo, que apresenta uma forma quadrilateral. O seu bordo anterosuperior está ligado superiormente ao bordo posterior da sutura internasal e o seu bordo anteroinferior está ligado aos pilares mediais da cartilagem alar maior. O bordo posterosuperior juntase à lâmina perpendicular do etmóide, enquanto o bordo posteroinferior está ligado ao vómer. A parte anteroinferior do septo nasal, por entre as narinas está desprovida de cartilagem e é chamado de septo membranoso, sendo contínuo com a columela, anteriormente.
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Mucosa nasal O limite da parte anterior da cavidade e do vestíbulo nasal é contínuo com a pele. Mais posteriormente, no limen nasi, este epitélio torna-se numa mucosa, mais espessa e vascularizada sobre as conchas (nomeadamente sobre as suas extremidades) e entre o septo nasal e as conchas. Por seu turno, a mucosa é particularmente fina, ao nível dos meatos, do pavimento nasal e dos seios peri-nasais.
Mucosa olfactiva A mucosa olfactiva está presente ao nível da região posterosuperior da parede nasal lateral, incluindo na parte superior da porção vertical da concha nasal média, na concha nasal superior, no recesso esfenoetmoidal e na porção superior da lâmina perpendicular do etmóide e porção do tecto nasal, que se arqueia por entre o septo e a parede lateral. Esta região é mais pequena e devido à sua localização posterosuperior, quando se quer, propositadamente, cheirar alguma coisa, tem que se inspirar profundamente. A inervação da mucosa olfactiva é levada a cabo pelos nervos olfactivos, que atravessam a lâmina crivosa do etmóide.
Irrigação arterial Ramos das artérias oftálmica, maxilar e facial irrigam diferentes territórios nas paredes, pavimento e tecto do nariz. Estes ramificam-se formando plexos anastomósicos, dentro e profundamente à mucosa nasal. Os ramos etmoidais anterior e posterior da artéria oftálmica irrigam os seios etmoidal e frontal e o tecto do nariz (incluindo o septo). A artéria etmoidal anterior desloca-se dentro do osso da norma craniana anterior. O ramo esfenopalatino da artéria maxilar irriga a mucosa das conchas nasais, dos meatos e da região posteroinferior do septo nasal, sendo o principal vaso que irriga a mucosa nasal. Esta artéria vem de uma fissura (a fissura esfenopalatina) e normalmente divide-se, antes de entrar na cavidade nasal, posteriormente à crista etmoidal. O ramo palatino maior da artéria maxilar irriga a região do meato inferior. A sua parte terminal ascende através do canal incisivo, anastomosando-se no septo com ramos das artérias esfenopalatina e etmoidal anterior e com o ramo septal da artéria labial superior. A artéria infra-orbitária e os ramos alveolares superior anterior e superior posterior, da artéria maxilar, irrigam a mucosa do seio maxilar.
☤A
maioria dos sangramentos do nariz, particularmente nas crianças, ocorre devido a traumas digitais na anastomose de arteríolas e veias do plexo de Kiesselbach, no septo nasal, dentro do vestíbulo nasal. Em indivíduos mais velhos, esse sangramento pode ocorrer, como resultado da ruptura espontânea de artérias, que se encontram mais posterior no nariz. Esses sangramentos podem ser controlados, através da aplicação de pressão, ou embolização arterial.
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Drenagem venosa Um plexo cavernoso submucoso é especialmente denso na região posterior do septo e nas conchas nasais média e inferior. Várias anastomoses arterio-venosas estão presentes na camada profunda da mucosa e em torno das glândulas mucosas. As veias da região posterior do nariz (veias nasais internas) unem-se na veia esfenopalatina que passa no buraco esfenopalatino, drenando no plexo pterigóide. Já a região anterior do nariz é drenada por veias que acompanham as artérias etmoidais anteriores, drenando para as veias facial ou oftálmica.
Inervação A inervação sensitiva é assegurada pelas divisões oftálmica e maxilar do nervo trigémio, sendo que a mucosa olfactiva é inervada pelo nervo olfactivo.
Drenagem linfática A drenagem linfática é da responsabilidade dos gânglios submandibulares, embora na região mais posterior das fossas nasais, a drenagem linfática possa ser encaminhada para os gânglios cervicais profundos superiores.
Seios perinasais Os seios perinasais são os seios frontal, etmoidal, esfenoidal e maxilar, que se encontram dentro dos ossos com o mesmo nome. Estes abrem-se todos na parede lateral da cavidade nasal, por pequenas aberturas que permitem o equilíbrio entre os vários espaços aéreos e a limpeza do muco, dos seios para o nariz. Estas estruturas são muito variáveis, mas a maior parte é rudimentar ou ausente à nascença, mas aumentam significativamente de dimensões, durante o aparecimento dos dentes permanentes e após a puberdade.
☤ O epitélio respiratório estende-se através das aberturas dos seios perinasais, delimitando as suas cavidades. Isto favorece a propagação de infecções. A infecção do seio maxilar, por exemplo, pode ser propagada a partir de dentes infectados.
☤ Os cílios presentes ao nível do epitélio da mucosa nasal, ao moverem-se, levam a que o muco se dirija para o local de saída. As patologias que afectam os cílios, levam à acumulação de muco nos seios nasais (sinusite).
Seios frontais Os seios frontais são posteriores aos arcos superciliares, encontrando-se por entre as tábuas externa e interna do osso frontal. Os dois seios são raramente simétricos, visto que o septo entre eles, normalmente desvia-os do plano mediano. Cada seio pode ser ainda dividido numa quantidade de recessos comunicantes, por septos ósseos incompletos.
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Cada seio apresenta ainda uma porção frontal que se estende superiormente, sobre a porção medial da sobrancelha, e uma porção orbital, que se estende posteriormente, até à porção medial do tecto da órbita. A abertura de cada seio frontal é feita na parte anterior do correspondente meato médio, pelo infundíbulo etmoidal, ou, em 50% dos casos, pelo canal frontonasal. Esta diferença prende-se com o local de inserção da apófise unciforme – quando a apófise unciforme se insere ao nível da lâmina papirácea do etmóide, as secreções do seio frontal drenam directamente no meato médio, por via do
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II canal frontonasal. Contudo, caso a apófise unciforme se insira na lâmina crivosa do etmóide ou na concha nasal média, as secreções do seio frontal não conseguem entrar directamente no meato médio e, como tal, passam inicialmente para o infundíbulo etmoidal para passar depois para o meato médio (atravessando o hiato semilunar). A sua irrigação é assegurada pelas artérias supra-orbital e etmoidal anterior. Já a drenagem venosa é feita para uma veia que conecta as veias supra-orbital e oftálmica superior. A inervação é assegurada por ramos dos nervos supra-orbitais e ramos orbitais dos gânglios pterigopalatinos.
Seios esfenoidais Os seios esfenoidais são duas cavidades irregulares de grandes dimensões, dentro do corpo do esfenóide e que se encontram posteriores à parte superior da cavidade nasal. Cada seio abre-se no recesso esfenoetmoidal correspondente, através de uma abertura localizada superiormente na parede anterior do seio. Os seios são normalmente separados por um septo, que normalmente, não se encontra na linha média (e daí não serem iguais em tamanho e forma). O seu interior pode ser ainda dividido por lâminas ósseas e septos acessórios, sendo que raramente os seios comunicam. Por vezes, existe um seio etmoidal posterior, que se pode estender posterosuperiormente, até os seios esfenoidais. Em termos de relações, os seios esfenoidais relacionam-se superiormente com o quiasma óptico e com a hipófise e de cada lado, com a artéria carótida interna e com o seio cavernoso. A irrigação destes seios provém dos ramos etmoidais posteriores das artérias oftálmicas e dos ramos nasais da artéria esfenopalatina. A drenagem venosa é assegurada pelas veias etmoidais posteriores, que drenam nas veias oftálmicas superiores. A inervação é levada a cabo pelos ramos etmoidais posteriores dos nervos oftálmicos.
☤ A classificação dos seios esfenoidais, bem como o estudo da sua septação, é importante para cirurgia. Os seios esfenoidais dizem-se se selares, caso se estendam para além do tubérculo selar, pré-selares, caso os seios não se continuem para além do tubérculo, ou conchais, se o seio estiver separado da sela turca, por 10 mm de osso trabecular.
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Seios etmoidais Os seios etmoidais diferem dos restantes, visto serem formados por várias cavidades de paredes finas, no labirinto etmoidal, sendo as cavidades variáveis, em termos de tamanho e número. Os seios etmoidais encontram-se entre a parte superior da cavidade nasal e a órbita, sendo separados desta última estrutura pela lâmina orbital do etmóide. A pneumatização pode se estender para a concha média ou para o corpo e asas do esfenóide. Os seios etmoidais estão divididos em grupos anterior e posterior, separados pela lamela basal da concha média. Do grupo anterior fazem parte os seios peri-infundibulares (células aéreas etmoidais anteriores), que são normalmente 11. Estes drenam para o infundíbulo etmoidal ou para o canal frontonasal. O grupo mais anterior destas células são as células do agger nasi, mediais ao saco e canal lacrimal. Os seios bolhares pertencem também aos seios do grupo anterior, sendo normalmente menos que três. Estes abrem-se no meato médio por um ou mais orifícios, na bolha etmoidal ou superiormente a esta. Já o grupo posterior é composto por até sete células aéreas, que normalmente drenam por um único orifício, para o meato superior. Este grupo encontra-se muito perto do canal e do nervo óptico. A célula de Onodi é a mais posterior célula etmoidal, pneumatizando lateral e superiormente ao seio esfenoidal, em íntima relação com o nervo óptico. Pode por isso apresentar o tubérculo para o nervo óptico.
☤ As células do agger nasi e a célula de Onodi têm importância clínica, na medida em que, caso estejam muito pneumatizadas podem levar à oclusão dos seios frontal e esfenoidal, respectivamente. A vascularização dos seios etmoidais é assegurada por ramos nasais da artéria esfenopalatina e por ramos etmoidais (anteriores e posteriores) da artéria oftálmica. A drenagem venosa é efectuada pelas veias correspondentes. Os seios são inervados pelos ramos etmoidais (anteriores e posteriores) dos nervos oftálmicos e por ramos orbitais dos gânglios pterigopalatinos.
Seio maxilar O seio maxilar é o maior seio peri-nasal, preenchendo o corpo da maxila. Este seio é piramidal, sendo a sua base medial e formando a maior parte da cavidade nasal. O pavimento, que muitas vezes se encontra inferiormente ao pavimento nasal, é formado pela apófise alveolar e parte da apófise palatina da maxila. Já o tecto do seio, forma a maior parte do pavimento da órbita, contendo o canal infraorbitário. O ápice do seio estende-se para a apófise zigomática da maxila, podendo chegar ao osso zigomático, formando assim, o recesso zigomático. A face facial da maxila forma a sua parede anterior, sendo sulcada internamente por um leve canal, o canal sinuoso, que aloja o nervo alveolar superior anterior e os vasos que passam no canal infraorbitário. A parede posterior é formada pela face infratemporal da maxila, contendo canais alveolares, que conduzem os vasos e nervos alveolares superiores posteriores. A parede medial é deficiente, posterosuperiormente, ao nível do hiato maxilar, que se abre na parte inferior do infundíbulo etmoidal, através do hiato semilunar. Ao nível dessa parede ainda podemos observar um hiato acessório (ou óstio de Giraldes, em honra do anatomista portuense Joaquim Giraldes). O seio maxilar pode estar dividido por septos de forma incompleta, sendo que a espessura das suas paredes é clinicamente significante para determinar a propagação de tumores, a partir do seio maxilar. Ramos da artéria alveolar superior posterior e da artéria infra-orbitária formam uma anastomose na parede óssea do seio maxilar, que irriga também a membrana mucosa que delimita as câmaras nasais. A
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II drenagem venosa ocorre sobretudo para o plexo pterigóide, enquanto a inervação é assegurada pelos ramos infra-orbitários, alveolares superiores (anterior, médio e posterior) do nervo maxilar e por ramos nasais dos gânglios pterigopalatinos.
Tabela-síntese dos seios perinasais Seios
Abertura
Irrigação arterial
Drenagem Venosa
Inervação
Frontais
Infundíbulo etmoidal/Canal frontonasal
Ramos etmoidais anteriores da artéria oftálmica e artéria supra-orbitária
Veia supra-orbitária e veia oftálmica superior
Nervos supra-orbitais e ramos orbitais dos gânglios pterigopalatinos
Esfenoidais
Recesso esfenotmoidal
Ramos etmoidais posteriores da artéria oftálmica e ramos nasais da artéria esfenopalatina
Veias etmoidais posteriores
Ramos etmoidais posteriores dos nervos oftálmicos
Etmoidais
Recesso esfenotmoidal/ canal frontonasal, bolha etmoidal (c. anteriores) e meato superior (c. posteriores)
Ramos etmoidais da artéria oftálmica e ramos nasais da artéria esfenopalatina
Veias etmoidais e esfenopalatina
Ramos etmoidais dos nervos oftálmicos e ramos orbitais dos gânglios pterigopalatinos
Maxilares
Hiato maxilar e óstio de Giraldes
Artéria infra-orbitária e artéria alveolar superior posterior
Plexo pterigóide
Nervo maxilar e ramos nasais dos gânglios pterigopalatinos
Rinofaringe A rinofaringe (ou nasofaringe) encontra-se sobre o palato mole e posteriormente às narinas posteriores, que permitem a passagem respiratória livre, por entre as cavidades nasais e a rinofaringe. O septo nasal separa as duas narinas posteriores, cada uma das quais mede cerca de 25 mm, verticalmente e 12 mm de diâmetro transverso. Dentro dessas aberturas, encontramos as extremidades posteriores das conchas nasais inferior e média. A parede posterior, as paredes laterais e o tecto da rinofaringe são rígidos (o que impede, que a rinofaringe colapse, contrariamente ao que ocorre com a orofaringe e laringofaringe), mas o seu pavimento não é (pode estar mais elevado ou mais deprimido, pelo palato mole), sendo que a cavidade da rinofaringe nunca se encontra obliterada pela acção muscular (contrariamente às cavidades da orofaringe e laringofaringe). As partes nasal e oral da faringe comunicam através do istmo faríngeo, que se encontra ao nível do pavimento da rinofaringe, por entre o bordo posterior do palato mole e a parede faríngea posterior.
☤ Aquando
da deglutição é necessário fechar o istmo faríngeo, algo que acontece com a formação da crista de Passavant. É discutível se a presença da crista se deve à contracção do constritor superior da faringe e do palatofaríngeo, ou se esta é originad por um músculo palatino independente, lateral ao elevador do véu do palatino. De qualquer forma, os
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II indivíduos com fendas palatinas vão ter esta crista muito desenvolvida, como tentativa de isolar as fossas nasais, aquando da deglutição. Na parede lateral, ao um pouco posterior e inferiormente à concha nasal inferior, encontramos a abertura faríngea da trompa auditiva (também designada por trompa faríngeo-timpânica ou trompa de Eustáquio), uma estrutura triangular delimitada superiormente e posteriormente, pelo tórus tubário, uma projecção arredonda, resultante da cartilagem mais proeminente do tubo. Na região do tórus tubário, encontramos uma quantidade variável de tecido linfático, a amígdala tubal, contínua posteriormente com a amígdala faríngea. Uma dobra vestigial de membrana, a prega salpingofaríngea, desce do tórus tubário, posteriormente à sua abertura, envolvendo o músculo salpingofaríngeo, até desaparecer gradualmente, na parede lateral da faringe. Posteriormente ao tórus tubário, encontramos o recesso faríngeo (também designado por fossa de Rosenmüller), uma depressão variável que se desloca posterolateralmente, inferiormente à porção petrosa do temporal. Inferiormente à abertura faríngea da trompa auditiva, encontramos o tórus elevatório, que cobre o músculo elevador do véu do palatino. Por outro lado, anteriormente a este orifício, encontramos a prega salpingopalatina, que não está associada a nenhum músculo particular. O pavimento e a parede posterior da rinofaringe formam uma face contínua com um declive côncavo, que vai desde o septo nasal até à orofaringe. Este encontra-se superiormente delimitado por mucosa que cobre a porção posterior do corpo do esfenóide e a porção basilar do occipital até ao tubérculo faríngeo. Mais inferiormente, a mucosa sobrepõe-se à fáscia farígeo-basilar, às fibras superiores do constritor superior da faringe e ao arco anterior do atlas. Na parte superior da parede posterior e do tecto adjacente, existe uma proeminência resultante da acumulação de tecido linfático – a amígdala faríngea, ou adenóide. A inervação da mucosa da rinofaringe, posteriormente ao tubo faríngeo-timpânico é assegurada pelo ramo faríngeo do gânglio pterigopalatino, que atravessa o canal palatovaginal com um ramo faríngeo da artéria maxilar.
Amígdala faríngea A amígdala faríngea situa-se na parte superior da parede posterior e do tecto adjacente, sendo constituída por tecido linfático. O seu tamanho aumenta até aos seis anos de idade, atrofiando depois com o tempo. Quando o seu tamanho é máximo, esta estrutura apresenta forma de pirâmide truncada, com o ápice apontado para o septo nasal. A face livre desta amígdala apresenta dobras que irradiam anterior e lateralmente a partir de um recesso, a bolsa faríngea (bolsa de Luschka), que se estende posterosuperiormente. Esta bolsa é importante, na medida em que está associada com a fixação do notocórdio à endoderme da faringe embrionária. A irrigação arterial da amígdala faríngea é proveniente das artérias faríngea ascendente e palatina ascendente, dos ramos amigdalinos da artéria facial, do ramo faríngeo da artéria maxilar e da artéria do canal pterigóide. Em termos de drenagem venosa, esta é assegurada por inúmeras veias que drenam a amígdala faríngea em plexos venosos faríngeos externo e submucoso interno.
☤A
amígdala faríngea pode ser fonte de diversas complicações de saúde. No adulto, pode originar quistos, se ficar infectada e nas crianças, um aumento das suas dimensões é relativamente comum, impedindo parcial ou completamente a respiração nasal e obstruindo as
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II aberturas dos tubos auditivos. A remoção desta amígdala é designada por adenoidectomia, pois a amígdala faríngea, quando hipertrofiada, passa a designar-se por adenóide.
☤ A amígdala faríngea faz parte do anel linfático circunfaríngeo (anel de Waldeyer), por isso, pensa-se que contribua para a defesa do tracto respiratório superior. Este anel é constituído por amígdalas palatinas, linguais, faríngeas e tubais, conferindo protecção contra a entrada de vírus e bactérias nos sistemas digestivo e respiratório.
Trompa faríngeo-timpânica A trompa faríngeo-timpânica une a cavidade timpânica à nasofaringe e permite a passagem de ar entre estes espaços, permitindo que a pressão do ar seja a mesma, dos dois lados da membrana timpânica. Apresenta cerca de 36 mm, sendo formada por uma porção cartilaginosa, com cerca de 24 mm e uma porção óssea com cerca de 12 mm, sendo lateral ao canal carotídeo. Na sua parte inferior, junto à abertura faríngea, insere-se o músculo salpingofaríngeo. Posteromedialmente, encontramos a porção petrosa do osso temporal e o elevador do véu do palatino (que parte da lâmina medial do tubo). Anterolateralmente, encontramos o tensor do véu do palatino, o nervo mandibular e a artéria meníngea média. As artérias para esta estrutura provêm do ramo faríngeo ascendente da artéria carótida externa, da artéria meníngea média e da artéria do canal pterigóide. A drenagem venosa é feita para o plexo pterigóide. Já a inervação provém do plexo timpânico e do ramo faríngeo do gânglio pterigopalatino.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Língua e cavidade oral Vestíbulo e cavidade oral O vestíbulo oral é um espaço situado entre as bochechas ou os lábios (por entre os quais se encontra a fissura labial) e os dentes. Aquando da oclusão dos dentes, o vestíbulo é um espaço fechado que apenas contacta com a cavidade oral propriamente dita, através das regiões retromolares. A região onde a mucosa que cobre os alvéolos da queixada, se encontra reflectida para os lábios ou bochechas, é designada por fórnix do vestíbulo. Um número variável de pregas em forma de foice contendo tecido conjuntivo solto desloca-se ao longo do fórnix do vestíbulo, designando-se as pregas da linha média por freios labiais. Posteriormente ao vestíbulo oral, encontramos a cavidade oral, cujo tecto é constituído pelo palato duro (coberto por mucosa). Aí, na linha média, encontramos uma crista estreita que se desloca anteroposteriormente – a rafe palatina, em cuja extremidade anterior, encontramos a papila incisiva. Esta rafe é cruzada por pregas palatinas transversas, de natureza irregular.
Língua A língua é um órgão altamente musculado, utilizado para deglutição, paladar e fonação. A língua é em parte oral e em parte faríngea, estando ligada ao osso hióide, mandíbula, apófises estilóides, palato mole e parede faríngea, por vários músculos. Apresenta uma raiz, um ápice, um dorso e uma face inferior. A mucosa dorsal está coberta por várias papilas, algumas gustativas. As fibras musculares intrínsecas estão arranjadas num complexo com fascículos longitudinais, transversos, verticais e horizontais, organizados de forma intrínseca, o que permite uma grande
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II mobilidade. Os fascículos estão separados por uma quantidade variável de tecido adiposo, cuja quantidade aumenta posteriormente. A raiz da língua está ligada ao osso hióide e à mandíbula, contactando inferiormente, e entre estes ossos, com o geniohióide e com o milohióide. O dorso da língua (face posterosuperior) é geralmente convexo, estando dividido pelo sulco terminal, que tem forma de V, numa parte oral (ou pré-sulcar), mais anterior, que olha superiormente, formando cerca de 2/3 do comprimento da língua e numa parte faríngea (ou pós-sulcal), que olha posteriormente. Os dois “braços” do sulco terminal partem de um vértice situado numa depressão mediana, o buraco cego (que marca o local da extremidade superior do divertículo tiróide embrionário), deslocando-se anterolateralmente até aos arcos palatoglossais.
Porção oral A porção oral da língua localiza-se no pavimento da cavidade oral. Apresenta o ápice da língua (que contacta com os dentes incisivos), um bordo em contacto com as gengivas e os dentes e um dorso que contacta com os palatos mole e duro. De cada lado, em frente ao arco palatoglossal, existem quatro ou cinco pregas verticais, as papilas foliadas, que representam vestígios de outras papilas. A mucosa dorsal apresenta um sulco longitudinal mediano, estando coberta por papilas filiformes, fungiformes e valadas. As papilas valadas são as de maiores dimensões, encontrando-se na região mais posterior desta porção. As papilas fungiformes e as papilas filiformes, encontram-se dispersas pela região anterior e média do dorso da língua, tendo as fungiformes maiores dimensões que as filiformes. A mucosa na face inferior (ventral) é macia e está ligada ao pavimento oral, anteriormente, pelo freio lingual. A veia lingual profunda, que é visível, encontra-se lateral ao freio, de cada lado. Lateralmente a esta veia, encontramos a prega fimbriada, uma crista mucosa dirigida anteromedialmente, até ao ápice da língua. A inervação desta porção da língua é sensitiva, visto que esta deriva embriologicamente de protuberâncias linguais do arco mandibular e do tubérculo ímpar.
Porção faríngea A porção faríngea da língua constitui a sua base, sendo posterior aos arcos palatoglossais e formando parte da orofaringe. A sua mucosa está reflectida lateralmente, nas amígdalas palatinas e parede faríngea, e, posteriormente, na epiglote, por duas pregas glossoepiglóticas laterais e por uma prega glossoepiglótica mediana, entre as quais encontramos umas fossas designadas por valéculas. Esta porção não apresenta papilas, mas sobrepõe-se a nódulos linfáticos, embebidos em mucosa – as amígdalas linguais. Em termos embriológicos, a porção faríngea da língua desenvolve-se a partir da eminência hipobranquial.
Músculos da língua Os músculos extrínsecos estendem-se fora da língua e permitem o seu movimento, enquanto os intrínsecos estão contidos na língua e alteram a sua forma. Os músculos extrínsecos consistem em quatro pares de músculos – o genioglosso, o hioglosso, o estiloglosso (e condroglosso) e o palatoglosso. Genioglosso O genioglosso é um músculo triangular em corte sagital, encontrando-se próximo e paralelo à linha média. Parte por um tendão pequeno da espinha mentoniana superior, posteriormente à sínfise mandibular, sobre a origem do geniohióide. A partir desse ponto, desloca-se posterior e superiormente. As fibras inferiores do genioglosso estão ligadas por uma fina aponevrose à face anterosuperior do osso
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II hióide, perto da sua linha média. As fibras intermédias passam posteriormente até à região posterior da língua e as fibras superiores ascendem para a frente, para entrar no comprimento total da face ventral da língua, misturando-se com os músculos intrínsecos. Os músculos de lados opostos estão separados posteriormente pelo septo lingual e anteriormente estão variavelmente misturados. O genioglosso é irrigado pelo ramo sublingual da artéria lingual e pelo ramo submentoniano da artéria facial, sendo inervado pelo nervo hipoglosso. Em temos de acções, o genioglosso permite a protracção do ápice da língua. Quando o genioglosso actua unilateralmente, permite que a língua se desloque para o lado oposto e quando os dois genioglossos actuam bilateralmente, estes deprimem a porção central da língua, tornando-a côncava. Hioglosso O hioglosso é um músculo fino e quadrilateral que parte do corno maior e da frente do corpo do osso hióide. Passa verticalmente para entrar no lado da língua, entre o estiloglosso, lateralmente, e o músculo longitudinal inferior, medialmente. As fibras que partem do corpo do osso hióide sobrepõemse às do corno maior. O hioglosso relaciona-se na sua face superficial com o tendão intermédio do digástrico, com o estilohióide, com o estiloglosso, com o milohióide, com o nervo lingual, com o nervo do hipoglosso e com a veia lingual profunda. Na sua face profunda, relaciona-se com o ligamento estilohióide, com o genioglosso, com o músculo longitudinal inferior da língua e com o nervo glossofaríngeo. O hioglosso é um depressor da língua, sendo irrigado pelo ramo sublingual da artéria lingual e pelo ramo submentoniano da artéria facial. A inervação do hioglosso é assegurada pelo nervo hipoglosso.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Condroglosso O condroglosso é por vezes descrito como uma parte do hioglosso, estando por ele separado por algumas fibras do genioglosso. Tem cerca de 2 cm e parte do lado medial e da base do corno menor e da parte adjacente do corpo do hióide. Ascende para se misturar com a musculatura intrínseca entre o hioglosso e o genioglosso. As suas acções, irrigação e inervação são similares às do hioglosso. Estiloglosso O estiloglosso é o mais pequeno e mais curto dos três músculos estilóides. Parte da região anterolateral da apófise estilóide, perto do seu ápice e da extremidade estilóide do ligamento estilomandibular. Passa inferiormente e para a frente e divide-se no lado da língua numa parte longitudinal que entra na língua dorsolateralmente e numa parte oblíqua, que se sobrepõe ao hioglosso. O estiloglosso permite deslocar a língua superior e posteriormente, sendo irrigado pelo ramo sublingual da artéria lingual e inervado pelo nervo hipoglosso. Palatoglosso O palatoglosso está intimamente associado ao palato mole em função e inervação. Músculos intrínsecos Os músculos intrínsecos alteram a forma da língua, sendo que, estes músculos podem actuar sozinhos, ou em pares, em várias combinações (a contracção dos músculos longitudinais, por exemplo, permite encurtar a língua), levando a que a língua seja provida de uma grande e variada mobilidade, importantes ao nível da alimentação e do discurso. Estes músculos são irrigados pela artéria lingual e inervados pelo nervo hipoglosso. Como músculos intrínsecos encontramos os músculos longitudinais superior e inferior, transversos e verticais.
O músculo longitudinal superior é bilateral e constitui um fino estrato de fibras oblíquas e longitudinais, que se encontram profundamente à mucosa do dorso da língua. Estende-se para a frente do tecido fibroso subcutâneo, perto da epiglote e do septo lingual mediano, até aos bordos da língua. A sua contracção permite puxar o ápice da língua inferiormente, tornando o dorso convexo.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O músculo longitudinal inferior é um feixe estreito de músculo perto da face lingual inferior, por entre o genioglosso e o hioglosso. Estende-se da raiz da língua até ao seu ápice, estando algumas das suas fibras posteriores ligadas ao corpo do osso hióide. Anteriormente, mistura-se com o estiloglosso. Quando se contrai, este músculo permite tornar o dorso da língua côncavo, ou puxar o ápice e os lados da língua, superiormente. Os músculos transversos passam lateralmente do septo fibroso mediano até ao tecido fibroso subcutâneo no bordo lingual, misturando-se com o palatofaríngeo. Estes músculos estreitam e fazem elongação da língua Os músculos verticais estendem-se da região dorsal para a região ventral da língua, nos bordos anteriores. A contracção dos músculos verticais permite tornar a língua achatada e mais larga. Músculo
Origem
Acção
Irrigação
Inervação
Genioglosso
Espinha mentoniana superior
Protracção do ápice da língua (contracção bilateral) e deslocação da língua para o lado oposto (contracção unilateral)
Ramo sublingual da artéria lingual e ramo submentoniano da artéria facial
Nervo hipoglosso
Hioglosso
Corno maior e região anterior do o. hióide
Depressão da língua
Ramo sublingual da artéria lingual e ramo submentoniano da artéria facial
Nervo hipoglosso
Condroglosso
Lado medial e base do corno menor e região adjacente do osso hióide
Depressão da língua
Ramo sublingual da artéria lingual e ramo submentoniano da artéria facial
Nervo hipoglosso
Estiloglosso
Região anterolateral da apófise estilóide
Deslocação da língua superior e posteriormente
Ramo sublingual da artéria lingual
Nervo hipoglosso
Longitudinal superior
Puxar inferiormente o dorso da língua (tornando-o convexo)
Artéria lingual
Nervo hipoglosso
Longitudinal inferior
Tornar o dorso da língua côncavo, ou puxar o ápice e lados da língua superiormente
Artéria lingual
Nervo hipoglosso
Músculos transversos
Elongação da língua
Artéria lingual
Nervo hipoglosso
Músculos verticais
Tornar a língua mais achatada e larga
Artéria lingual
Nervo hipoglosso
Mnemónicas sobre língua: - Função do músculo genioglosso: “Os génios são mal-educados” – Isto significa que o genioglosso ajuda a fazer protracção do ápice da língua (colocar a língua de fora).
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Dentes Nos seres humanos, existem duas gerações de dentes – a dentição primária e a dentição secundária (definitiva). A dentição primária começa a aparecer, seis meses após o nascimento, sendo que aos três anos de vida, todos os dentes primários já estão formados. O primeiro molar secundário, por sua vez, aparece por volta dos 6 anos, sendo que, a dentição secundária torna-se completa, quando os terceiros molares aparecem, ou seja, por volta dos 18-21 anos. Na dentição primária existem vinte dentes – cinco em cada quadrante, enquanto na dentição secundária existe um total de 32 dentes, oito em cada quadrante. Os dentes podem ser classificados, de acordo com a sua forma, em incisiformes, caniniformes e molariformes. Os incisiformes (incisivos) são dentes utilizados para cortar, apresentando coroas finas, em forma de lâminas. Os dentes caniniformes (caninos) são dentes usados para perfurar ou rasgar, apresentando uma única coroa robusta e pontiaguda, em forma de cone. Por último, os dentes molariformes (molares e pré-molares) são dentes utilizados para moer, possuindo um número de elevações. Os pré-molares são dentes bicúspides, que apenas estão presentes na dentição secundária, substituindo os molares primários. A região que apresenta os dentes, na queixada, pode ser dividida em quatro quadrantes – maxilar esquerdo, maxilar direito, mandibular esquerdo e mandibular direito, a partir dos quais podemos identificar os dentes. Quer na dentição primária, quer na dentição secundária, os incisivos podem se distinguir, de acordo com a sua relação com a linha média. Dessa forma, o incisivo mais próximo da linha média é o incisivo central (ou primeiro) e ou mais lateral é o incisivo lateral (ou segundo). Os prémolares ou os molares da dentição primária são distinguíveis através das suas relações. O molar mais mesial (mais próximo do meio da queixada) é designado por primeiro molar, estando ladeado pelo segundo molar. Na dentição secundária, o dente mais distalmente posicionado é o terceiro molar, enquanto o pré-molar mesial é o primeiro pré-molar e o pré-molar que se encontra por detrás deste é o segundo. Em termos de terminologia, a face dos dentes voltada para os lábios ou bochechas, é denominada por labial ou bocal, enquanto a que está adjacente à língua, é designada por lingual, ou palatina, na região da maxila. As faces labial e lingual de um incisivo encontram-se medialmente numa face mesial e lateralmente, numa face distal. Dizemos que o ponto de contacto entre os incisivos centrais é o ponto de referência para mesial e distal.
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Morfologia dos dentes Existem dois incisivos, um central e Dentes Nº de cúspides Nº de raízes um lateral, em cada quadrante. 0 1 Numa visão labial, as coroas são Incisivos 1 1 trapezóides, sendo que os incisivos Caninos 2 1;2;3 maxilares, particularmente o central, Primeiro pré-molar maxilar são maiores que os mandibulares. Os Segundo pré-molar maxilar 2 1 dentes incisivos não têm cúspides, Primeiro pré-molar mandibular 2 1 mas sim um bordo incisivo. Numa Segundo pré-molar mandibular 3 1 visão mesial, os perfis labiais são Primeiro molar maxilar 4;5 3 convexos, enquanto as faces linguais Segundo molar maxilar 4 3 são concavo-convexas (a Terceiro molar maxilar 3 1 convexidade perto do bordo 5 2 cervical, o bordo que assinala a Primeiro molar mandibular 4 2 fronteira entre a coroa e a raiz) é Segundo molar mandibular 4;5 1 provocada por uma pequena Terceiro molar mandibular elevação, ou cíngulo, proeminente apenas nos incisivos superiores). As raízes dos incisivos são únicas e arredondadas nos dentes maxilares, mas achatadas mesiodistalmente, nos dentes mandibulares. Por detrás de cada incisivo lateral encontra-se um dente canino, com uma única cúspide. O canino maxilar é mais pontiagudo e robusto que o mandibular, cuja projecção se inclina lingualmente. A raiz canina, dado ser a mais longa, produz uma saliência, a eminência canina, ao nível da maxila. Distalmente aos caninos encontramos os dois pré-molares, dentes bicúspides, com uma cúspide bocal e uma cúspide lingual, separadas por uma fissura mesiodistal. Numa vista bocal, os pré-molares assemelham-se aos caninos, apesar de serem mais pequenos. O primeiro pré-molar maxilar pode apresentar duas raízes (uma bocal e uma palatal), uma, ou, mais raramente, três (duas bocais e uma palatina). O segundo pré-molar maxilar apresenta, normalmente, apenas uma raiz. No primeiro prémolar mandibular, temos uma cúspide bocal maior que a lingual, enquanto no segundo pré-molar mandibular, uma fissura mesiodistal normalmente separa uma cúspide bocal, de duas linguais, mais pequenas. Posteriormente aos pré-molares, encontramos os três molares, cujo tamanho decresce distalmente. Cada um apresenta uma face de oclusão rombóide (na maxila) ou rectangular (na mandíbula), com quatro ou cinco cúspides. O primeiro molar maxilar apresenta uma cúspide de cada lado da sua face oclusiva, para além da cúspide mesiopalatina, ligada à distobocal, por uma crista oblíqua. Um pequeno tubérculo (cúspide de Carabelli), normalmente aparece na cúspide mesiopalatina. Este dente apresenta três raízes separadas, duas bocais, sendo a mesiobocal a maior e mais larga, e uma grande, palatina. O segundo molar maxilar é mais pequeno e tem uma cúspide distopalatina menor, ou por vezes, ausente. As suas três raízes apresentam graus variáveis de fusão. O terceiro molar maxilar é o mais pequeno, apresentando uma forma muito variável. Normalmente, apresenta três cúspides (estando a distopalatina ausente) e, normalmente, as três raízes estão unidas. O primeiro molar mandibular apresenta duas cúspides linguais e três bocais na sua face oclusiva, que é rectangular. Estas cúspides encontram-se todas separadas por fissuras. Apresenta duas raízes amplamente separadas, uma mesial e outra distal. O segundo molar mandibular é mais pequeno, assemelhando-se ao primeiro, embora apresente apenas quatro cúspides (não apresenta a cúspide distal do primeiro molar) e as duas raízes mais próximas. O terceiro dente mandibular é mais pequeno e
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II variável. A sua coroa por vezes assemelha-se à do primeiro ou do segundo molar e as suas raízes estão frequentemente unidas.
☤O
terceiro molar aparece anterosuperiormente, exercendo, por vezes, impacto contra o segundo molar, o que leva a uma acumulação de comida, o que causa, consequentemente, inflamação. O terceiro molar maxilar aparece posteroinferiormente, por isso, este fenómeno raramente ocorre a nível maxilar.
Dentição primária Os dentes incisivos, caninos e pré-molares da dentição secundária substituem os dois incisivos, um canino e dois molares da dentição primária, em cada quadrante. Os incisivos e o canino primários assemelham-se muito aos seus homólogos da dentição definitiva, embora sejam mais pequenos e esbranquiçados. Os segundos molares primários assemelham-se aos primeiros molares secundários. O primeiro molar primário superior apresenta uma face oclusiva triangular e uma fissura separa uma cúspide bocal dupla de uma cúspide palatina. O primeiro molar secundário inferior é longo e estreito, apresentando duas cúspides bocais, separadas das duas cúspides linguais por uma fissura mesiodistal em ziguezague. Ambos os molares primários apresentam grandes protuberâncias bocais na sua face mesial. Os molares primários superiores apresentam três raízes e os inferiores apresentam duas. Essas raízes divergem mais que as dos secundários.
Ligamento periodontal O ligamento periodontal tem como funções o suporte dos dentes, a génese da força para a erupção dos dentes e dar informação sensitiva relativamente à posição dos dentes, de modo a facilitar a actividade de reflexo da queixada. Este ligamento é constituído por tecido conjuntivo denso, com cerca de 0,2 mm de largura, contendo ostoeblastos e osteoclastos, bem como cementoblastos e odontoclastos - células responsáveis pela manutenção do cemento (substância calicificada que cobre a raiz do dente).
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Irrigação e drenagem venosa As principais artérias que irrigam os dentes e as suas estruturas de suporte são ramos da artéria maxilar. Os dentes superiores são irrigados por ramos das artérias alveolares, enquanto os dentes inferiores são irrigados por ramos das artérias alveolares inferiores. A queixada superior é irrigada pelas artérias alveolares superior anterior, posterior e média. A artéria alveolar superior posterior parte normalmente da terceira parte da artéria maxilar, na fossa pterigopalatina, descendo na face infratemporal da maxila e dividindo-se dando ramos que entram nos canais alveolares, irrigando os dentes molares e pré-molares, osso adjacente e o seio maxilar. Esta artéria dá ainda ramos que se continuam pela apófise alveolar, irrigando as gengivas. As artérias alveolares superiores anterior e média partem da artéria infra-orbitária. Esta, por sua vez, parte, por vezes, com a artéria alveolar superior posterior. Entra na órbita, posteriormente através da fissura orbital inferior e desloca-se no sulco infra-orbitário e no respectivo canal com o nervo infraorbitário. Quando a artéria alveolar superior média está presente, este pequeno ramo desloca-se inferiormente, na parede lateral do seio maxilar, formando arcadas anastomósicas com os vasos anterior e posterior e terminando perto do dente canino. A artéria alveolar superior anterior desloca-se através do canal sinuoso, irrigando os dentes incisivos e caninos superiores, bem como a membrana mucosa, no seio maxilar. Termina próxima do septo nasal, onde emerge o seu ramo terminal. A artéria alveolar inferior é um ramo da artéria maxilar. Desce na fossa infratemporal, posteriormente ao nervo alveolar inferior, onde se encontra por entre o osso, lateralmente, e o ligamento esfenomandibular, medialmente. Antes de entrar no buraco mandibular, dá um ramo milohióide, que perfura o ligamento esfenomandibular, para se deslocar com o nervo milohióide, no sulco milohióide da mandíbula. A artéria alveolar inferior atravessa depois o canal mandibular, com o nervo alveolar inferior, irrigando os molares e os pré-molares mandibulares e dividindo-se em ramos incisivos e mentonianos, perto do primeiro pré-molar. O ramo incisivo continua-se inferiormente aos dentes incisivos (que ele vai irrigar), até à linha média, onde se anastomosa com o seu homólogo. A artéria mentoniana abandona o buraco mentoniano e irriga o queixo, anastomosando-se com as artérias labial inferior e submentoniana. Perto da sua origem, a artéria alveolar inferior dá um ramo lingual que desce com o nervo lingual irrigando a membrana mucosa lingual. No que toca à drenagem venosa, as veias que acompanham as artérias alveolares superiores, drenam a região da queixada superior e respectivos dentes, anteriormente, na veia facial ou, posteriormente, no plexo venoso pterigóide. As veias da queixada e dentes inferiores drenam, quer em vasos maiores, presentes ao nível dos septos inter-dentais, quer em plexos, em torno dos ápices das raízes, e consequentemente, em veias alveolares inferiores. Algumas dessas veias drenam para veia facial, atravessando o buraco mentoniano, enquanto outras drenam para o plexo pterigóide, através do buraco mandibular. Os ligamentos periodontais, que suportam os dentes, são irrigados por ramos dentais das artérias alveolares. Um ramo entra pelo ápice do alvéolo e envia dois ou três pequenos ramos na polpa do dente, através do buraco apical e outro ramo pelo ligamento periodontal. As artérias interdentais ascendem no septo interdental, enviando ramos para este ligamento e terminando, através da comunicação com vasos gengivais, que também irrigam a porção cervical do ligmento periodontal.
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Gengivas A gengiva é a membrana mucosa firme que cobre as regiões apicais da apófise alveolares da maxila e porção alveolar da mandíbula, rodeando os colos dos dentes. A gengiva não apresenta submucosa e, como tal, está, na sua porção de gengiva fixa, firmemente ligada, por fibras de colagénio ao periósseo e a cada dente, nas suas cristas alveolares, ligamento periodontal e cemento. Já a gengiva livre não se encontra ligada em torno da região cervical de cada dente. O sulco gengival livre, entre as gengivas livre e fixa, corresponde, de grosso modo, ao pavimento do sulco gengival, que separa a face interna da gengiva fixa do enamel (face mineralizada dura do dente). A papila interdental é a porção das gengivas que preenche o espaço entre dentes adjacentes, situandose na face das gengivas fixas. A linha mucogengival separa as gengivas fixas, na face lingual da queixada inferior, da mucosa alveolar. A irrigação dos tecidos gengivais provém das artérias lingual e maxilar. As gengivas bocais, em torno dos dentes das bochechas maxilares, são irrigadas pela artéria gengival, por ramos perfurantes da artéria alveolar superior posterior e pelos ramos labiais da artéria maxilar. As gengivas labiais dos dentes anteriores são irrigadas por ramos labiais da artéria infra-orbitária e por ramos perfurantes da artéria alveolar superior anterior. As gengivas palatinas são irrigadas, sobretudo, por ramos da artéria palatina maior. As gengivas bocais associadas com os dentes mandibulares das bochechas são irrigadas pelo ramo bocal da artéria maxilar e por ramos perfurantes da artéria alveolar inferior. As gengivas labiais em torno dos dentes anteriores são irrigadas pela artéria mentoniana e por ramos perfurantes da artéria incisiva. As gengivas linguais são irrigadas por ramos perfurantes da artéria alveolar inferior e pelo seu ramo lingual. No que concerne, à drenagem venosa das gengivas, ainda não existe nenhuma descrição correcta, embora se pense que as veias envolvidas são a bocal, lingual, palatina maior e nasopalatina, drenando todas para o plexo pterigóide. A inervação das gengivas é assegurada pelos seus ramos palatino maior, nasopalatino e alveolar superior anterior, médio e posterior. O nervo mandibular inerva as gengivas na queixada inferior, pelos seus ramos lingual, alveolar inferior e bocal.
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Glândulas salivares As glândulas salivares são glândulas exócrinas, tubuloacinares, cujos canais abrem-se na cavidade oral. Estas glândulas segregam saliva, um fluido que permite ajudar na deglutição de alimentos, humidifica a mucosa bocal, é importante para a fala e é um solvente aquoso, necessário para o paladar. Estas glândulas também segregam enzimas digestivas, como a amilase salivares e agentes antimicrobiais.
☤A
xerostomia é uma condição na qual se verifica um decréscimo significativo na produção de saliva. Isto resulta em inflamação periodontal e em cáries dentárias.
Existem glândulas salivares maiores e menores. As menores encontram-se espalhadas ao longo da mucosa e submucosa oral, enquanto as glândulas salivares maiores são pares e são a parótida, a submandibular e a sublingual.
☤ Por dia, são
segregados cerca de 500 mL de saliva por dia. A velocidade de salivação é tipicamente de 0,3 mL/min e, quando as glândulas são estimuladas, a velocidade sobre até aos 2 mL/min! A velocidade de salivação é desprezível durante o sono, sendo que, no estado nãoestimulado, a glândula parótida produz cerca de 20% da saliva, a submandibular, cerca de 65% e as restantes, 15%. No estado estimulado, a contribuição da parótida sobe para os 50%.
Glândula parótida A glândula parótida é a maior glândula salivar, sendo quase inteiramente, serosa. O canal parotídeo desloca-se através da bochecha e drena na boca, do lado oposto ao do segundo dente molar permanente maxilar. A glândula parótida encontra-se situada em frente do ouvido externo. Esta glândula apresenta uma forma de pirâmide invertida, apresentando uma pequena face superior e faces superficial, anteromedial e posteromedial, terminando inferiormente, num ápice pontiagudo. A face superior é côncava e relaciona-se com a parte cartilaginosa do meato acústico externo e com a parte posterior da articulação temporomandibular. O ápice da glândula parótida sobrepõe-se ao ventre posterior do digástrico e ao triângulo carotídeo. Superficialmente à glândula parótida, encontramos pele, fáscia superficial (que contém os ramos faciais do nervo auricular maior), nódulos linfáticos parótidos superficiais e o bordo posterior do platisma. A face superficial da glândula parótida estende-se superiormente até ao arco zigomático, posteriormente, sobrepondo-se ao esternocleidomastoideu e inferiormente até ao seu ápice, posteroinferiormente ao ângulo da mandíbula. A face anteromedial é sulcada pelo bordo posterior do ramo mandibular, cobrindo a parte posteroinferior do masseter, a porção lateral da articulação temporomandibular e a parte adjacente do ramo mandibular. Esta face passa anteriormente, medial ao ramo da mandíbula, até chegar ao
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II pterigóide medial. A região da face anteromedial da mandíbula que se estende posteriormente ao ramo mandibular é designada por “lobo” profundo da glândula parótida. A face posteromedial é moldada pela apófise mastóide, pelo esternocleidomastoideu, ventre posterior do digástrico e pela apófise estilóide e músculos associados. A artéria carótida externa sulca esta face, antes de entrar na glândula e a artéria carótida interna e a veia jugular interna estão separadas da glândula, pela apófise estilóide e músculos associados. Dentro da glândula parótida, encontramos a artéria carótida externa, a veia retromandibular e o nervo facial, quer na totalidade, quer em parte. A artéria carótida externa entra na face posteromedial e divide-se em artéria maxilar, que emerge da face anteromedial, e em artéria temporal superficial, que dá o seu ramo facial transverso na glândula e ascende até ao seu limite superior. A artéria auricular posterior pode também se ramificar a partir da artéria carótida externa, dentro da glândula, abandonando-a, através da sua face posteromedial. A veia retromandibular, formada pela união das veias maxilar e temporal superficial é superficial à artéria carótida externa. Desce na glândula parótida e emerge posteriormente ao ápice da glândula.
Canal parotídeo O canal parotídeo tem cerca de 5 cm de comprimento e 3 mm de diâmetro, iniciando-se na confluência de duas grandes tributárias, dentro da parte anterior da glândula parótida. O canal aparece no bordo anterior da parte superior da glândula e passa horizontalmente, ao longo do masseter, aproximadamente, a meio, por entre o ângulo da boca e o arco zigomático. Cruza o masseter, desloca-se medialmente no seu bordo anterior, fazendo quase um ângulo recto e atravessa a gordura bocal e o bucinador, do lado oposto ao da coroa do terceiro molar superior. O canal desloca-se então obliquamente e anteriormente, por uma distância curta, por entre o bucinador e a mucosa oral, antes de se abrir na papila parotídea, do lado oposto ao da coroa do segundo molar superior. Em termos de relações, a porção acessória da glândula parótida e a artéria facial transversa encontramse sobre o canal parotídeo. O ramo bocal do nervo mandibular, emergindo por entre o temporal e o masseter, encontra-se inferiormente. O canal parotídeo pode ser cruzado por ramos anastomosantes entre os ramos zigomático e bocal do nervo facial.
Cápsula parotídea A glândula parotídea está envolvida por uma cápsula, a cápsula parotídea, derivada da camada investinte da fáscia cervical profunda. A inflamação aguda da glândula parótida pode causar uma dor na região pré-auricular, como resultado do alargamento da cápsula e estimulação do nervo auricular maior.
Irrigação e inervação A glândula parótida é irrigada pela artéria carótida externa e pelos seus ramos. A drenagem venosa é levada a cabo pela veia jugular externa, através das suas tributárias locais. A inervação é assegurada por nervos pré-ganglionares.
Glândula submandibular A glândula submandibular é irregular, tendo o tamanho de uma noz. Consiste numa parte superficial, maior, e numa parte profunda, mais pequena, sendo contínuas, ao nível do bordo posterior do milohióide. É uma glândula seromucosa mas, predominantemente, serosa.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A parte superficial da glândula encontra-se no triângulo digástrico, onde contacta anteriormente com o ventre anterior do digástrico e, posteriormente, com o ligamento estilomandibular, pelo qual está separada da glândula parótida. Superiormente, estende-se medialmente ao corpo da mandíbula. Inferiormente, normalmente encontra-se sobreposta ao tendão intermédio do digástrico e à inserção do estilohióide. Esta parte apresenta faces inferior, lateral e medial. A face inferior está coberta por pele, platisma e fáscia profunda, estando coberta pela veia facial e pelo ramo cervical do nervo facial. A face lateral relaciona-se com a fossa submandibular na face medial do corpo da mandíbula e com a inserção mandibular do pterigóide medial. A artéria facial sulca a sua porção posterosuperior, encontrando-se inicialmente profundamente à glândula e depois, emergindo por entre a sua face lateral e a inserção mandibular do pterigóide medial. Por último, a face medial relaciona-se anteriormente com o milohióide, do qual está separada pelo nervo e vasos milohióides e pelos ramos dos vasos submentonianos. Mais posteriormente, está relacionada com o estiloglosso, com o ligamento estilohióide e com o nervo glossofaríngeo, que a separa da faringe. Na sua porção intermédia, esta face relaciona-se com o hioglosso, do qual está separada pelo estiloglosso, pelo nervo lingual, pelo nervo hipoglosso e pela veia lingual profunda. Já a parte profunda da glândula submandibular estende-se anteriormente até à extremidade posterior da glândula sublingual. Encontra-se entre o milohióide, inferolateralmente e o hioglosso e estiloglosso medialmente. O nervo lingual encontra-se superiormente e o nervo hipoglosso e a veia lingual profunda encontram-se inferiormente. A irrigação é assegurada por ramos das artérias faciais e lingual e a inervação deriva do gânglio submandibular.
Canal submandibular O canal submandibular apresenta cerca de 5 cm de comprimento, iniciando-se a partir de inúmeras tributárias da parte superficial da glândula, e emerge da face medial dessa porção, posteriormente ao bordo posterior do milohióide. Atravessa a porção profunda da glândula e depois passa superior e um
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II pouco posteriormente, sendo que essa dobra, sobre o bordo livre do milohióide é designada por “genu do canal”. O canal desloca-se depois anteriormente, por entre o milohióide e o hioglosso, passando por entre a glândula sublingual e o genioglosso, para se abrir no pavimento da boca, no freio da língua, ao nível da papila sublingual. No hioglosso encontra-se por entre os nervos hipoglosso e lingual, mas, no bordo anterior deste músculo, é cruzado lateralmente pelo nervo lingual.
Glândula sublingual A glândula sublingual é a mais pequena das glândulas salivares principais, sendo estreita, achatada e tendo forma de amêndoa. Esta glândula encontra-se no milohióide, estando coberta por mucosa do pavimento da boca, que se encontra elevada, como uma prega sublingual. A fossa sublingual é lateral a esta glândula, o genioglosso é medial (estando separado desta pelo nervo lingual e pelo canal submandibular). No que toca à natureza desta glândula, esta é seromucosa, mas predominantemente mucosa. A irrigação é assegurada pelo ramo sublingual da artéria lingual e pelo ramo submentoniano da artéria facial. A inervação é assegurada pelo gânglio submandibular.
Canais sublinguais Os canais que partem da glândula sublingual são entre 8 a 20. Os mais pequenos partem, normalmente separadamente, da porção posterior da glândula, até à prega sublingual, ou directamente, no canal submandibular. Por vezes, ocorre a formação de um canal sublingual maior (canal de Bartholin), através da fusão de pequenos ramos da porção anterior da glândula. Este canal, quando presente, abrese no orifício do canal submandibular, ou perto deste.
Glândulas salivares menores As glândulas salivares menores da boca incluem as glândulas labial, bocal, palatoglossal, palatina e lingual. As glândulas palatoglossais encontram-se em torno do istmo faríngeo, sendo glândulas mucosas. As glândulas palatinas são mucosas e encontram-se quer no palato mole, quer no palato duro.
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Orofaringe A orofaringe estende-se inferiormente, do palato mole até ao bordo superior da epiglote. Abre-se na boca, através do istmo orofaríngeo, demarcado pelo arco palatoglossal. A sua parede lateral consiste no arco palatofaríngeo e na amígdala palatina. Posteriormente, está ao nível dos corpos de C2 e porção superior de C3, bem como dos três constritores da faringe.
Palato mole O palato mole encontra-se suspenso a partir do bordo posterior do palato duro, deslocando-se posterioinferiormente, por entre as porções oral e nasal da faringe. A fronteira existente entre o palato mole e o palato duro é palpável e pode ser distinguível através de uma mudança de cor. O palato mole é uma prega espessa de mucosa, envolvendo uma aponevrose, tecido muscular, vasos, nervos, tecido linfático e glândulas mucosas, sendo que metade da espessura está representada por várias glândulas mucosas, que se encontram por entre os músculos e a face oral do palato mole. Na maior parte dos indivíduos, duas pequenas depressões, as fóveas palatinas, conseguem ser observadas, uma de cada lado da linha média, representando orifícios de canais de algumas glândulas mucosas menores. Na sua posição normal (pendente), a face anterior (oral) do palato mole é côncava, apresentando uma rafe mediana e papilas gustativas. A região posterior é convexa e contínua com o pavimento nasal. O bordo anterosuperior está ligado ao bordo posterior do palato duro e os lados misturam-se com a parede faríngea. O bordo inferior é livre e encontra-se por entre a boca e a faringe. Uma apófise cónica mediana, a úvula, projecta-se inferiormente, do seu bordo posterior. A úvula apresenta mucosa recobrindo o músculo uvular. O terço anterior do palato mole contém pouco músculo e consiste sobretudo na aponevrose palatina. Esta região é mais horizontal e menos móvel que o resto do palato mole, sendo a área de actuação principal do tensor do véu do palatino. Já a rafe pterigomandibular é um feixe tendinoso, localizado por entre o bucinador e o constritor superior da faringe passa inferiormente e exteriormente do hâmulo pterigóide, até à extremidade posterior da linha milohióide.
Aponevrose palatina A aponevrose palatina é fina e fibrosa, sendo composta por tendões expandidos do tensor do véu do palatino, fortalecendo o palato mole. Está fixa ao bordo posterior e à face inferior do palato duro, posteriormente às cristas palatinas. É mais espessa nos dois-terços anteriores do palato mole, mas muito menos espessa, na região mais posterior. Perto da linha média, envolve o músculo uvular. Todos os outros músculos palatinos estão fixos a esta aponevrose.
Arcos palatoglossal e palatofaríngeo A parede lateral da orofaringe apresenta dois arcos proeminentes – os arcos palatoglossal e palatofaríngeo (pilares anterior e posterior da fauces, respectivamente). O arco palatoglossal corresponde à prega anterior e desloca-se do palato mole até ao lado da língua e contém o palatoglosso (quando temos um corte sagital, intersectando o arco palatoglossal, este passa a ser denominado por prega palatoglossal).
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O arco palatofaríngeo, corresponde à prega posterior, projecta-se mais medialmente e passa do palato mole para se misturar com a parede lateral da faringe, contendo o palatofaríngeo (quando temos um corte sagital, intersectando o arco palatofaríngeo, este passa a ser denominado por prega palatofaríngea). Uma fossa amigdalina triangular (seio amigdalino) encontra-se de cada lado da orofaringe, por entre os arcos palatofaríngeo e palatoglossal, contendo a amígdala palatina.
Irrigação e inervação A irrigação arterial do palato mole deriva normalmente do ramo palatino ascendente da artéria facial. Por vezes, este ramo encontra-se substituído por um ramo da artéria faríngea ascendente, que desce anteriormente, por entre o bordo superior do constrictor superior da faringe e o elevador do véu do palatino e acompanha este último músculo até ao palato mole. As veias do palato mole normalmente drenam para o plexo pterigóide. No que toca à inervação, a maior parte do palato mole é levada a cabo por ramos do nervo palatino maior (ramo do nervo maxilar), sendo que a região posterior do palato é inervada por ramos faríngeos do nervo glossofaríngeo e do plexo em torno da amígdala.
Amígdala palatina As amígdalas palatinas participam no anel linfóide circunfaríngeo. Cada amígdala é uma massa ovóide de tecido linfático, estando situada na parede lateral da orofaringe. O seu tamanho varia de acordo com a idade e com o estado patológico do indivíduo. As dimensões das amígdalas palatinas aumentam nos primeiros cinco ou seis anos de vida, atingindo o seu tamanho máximo na puberdade. A regressão amigdalina inicia-se na puberdade, onde o tecido linfóide reactivo começa a atrofiar. O maior eixo da amígdala palatina é o vertical, sendo que esta estrutura apresenta uma face medial e uma face lateral. A face medial, livre, apresenta normalmente um aspecto com várias depressões (entre dez e vinte), que levam a um sistema de criptas ramificantes que se estendem por toda a espessura da amígdala, sendo que este sistema atinge a sua máxima complexidade e o seu máximo tamanho durante a infância. Esta face projecta-se para a faringe, enquanto a face lateral está envolvida na parede da faringe, estando coberta por uma camada de tecido fibroso fortemente aderente, a cápsula amigdalina. Anteroinferiormente, a cápsula também está fixa aos lados da língua, recebendo fibras do palatoglosso e palatofaríngeo. Superiormente às criptas amigdalinas, encontramos uma fenda intrapalatina profunda, que pode atingir um tamanho considerável e estender-se para o palato mole. Nas crianças, encontramos uma prega triangular de membrana mucosa, a plica triangular, que se estende do arco palatoglossal, para cobrir a parte antero-inferior da amígdala. Normalmente, esta porção não é identificável nos indivíduos adultos.
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Irrigação e inervação A irrigação arterial da amígdala palatina provém de ramos da artéria carótida externa. Estes ramos entram na amígdala, no seu pólo inferior, sendo o maior, a artéria amigdalina, um ramo da artéria facial, ou, por vezes, da artéria palatina ascendente. Esta artéria ascende por entre o pterigóide medial e o estiloglosso, perfura o constritor superior da faringe, ao nível do bordo superior do estiloglosso e ramifica-se na amígdala e musculatura lingual posterior. As outras artérias encontradas no pólo inferior são os ramos linguais dorsais da artéria lingual, que entram anteriormente, e um ramo da artéria palatina ascendente, que entra posteriormente, irrigando a porção inferior da amígdala palatina. O pólo superior da amígdala também recebe ramos da artéria faríngea ascendente, que entra na amígdala posteriormente e da artéria palatina descendente e respectivos ramos. Todas estas artérias entram na face profunda da amígdala. No que concerne à inervação, esta é assegurada por ramos amigdalinos dos nervos maxilar e glossofaríngeo. As fibras do nervo maxilar passam através do gânglio pterigopalatino, mas não fazem aí sinapses. Estas fibras encontram-se distribuídas através dos nervos palatinos menores e formam um plexo, o círculo amigdalino, em torno da amígdala, juntamente com os ramos amigdalinos do nervo glossofaríngeo. As fibras nervosas deste plexo estão também distribuídas pelo palato mole e região do istmo orofaríngeo.
☤ A artéria amigdalina e as suas veias comitantes encontram-se, por vezes, dentro da prega palatoglossal, podendo ocorrer a sua hemorragia, caso esta prega fique danificada, aquando de uma cirurgia.
☤ A inervação da membrana mucosa que delimita a cavidade timpânica é assegurada pelo ramo timpânico do nervo glossofaríngeo. Dessa forma, a infecção, um tumor ou a inflamação pósoperatória da amígdala ou da fossa amigdalina pode resultar em dores no ouvido.
Anel de Waldeyer O anel de Waldeyer é um anel circunfaríngeo de tecido linfóide associado com mucosa, que rodeia as aberturas dos tractos digestivo e respiratório. Este anel é composto anteroinferiormente pela amígdala lingual, lateralmente pelas amígdalas palatina e tubal e posterosuperiormente pela amígdala faríngea e por pequenos agregados de tecido linfóide, nos intervalos inter-amigdalinos.
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Músculos do palato mole e faringe Elevador do véu do palatino O elevador do véu do palatino parte por um pequeno tendão de uma área rugosa, na extremidade medial da face inferior da porção petrosa do osso temporal, em frente à abertura inferior do canal carotídeo. Fibras adicionais partem da região inferior da porção cartilagínea do tubo faringeotimpânico e da apófise vaginal do osso esfenóide. O elevador do véu do palatino torna-se medial ao tubo faríngeotimpânico, ao nível da lâmina pterigóide medial. Passa medialmente ao bordo superior do constritor superior da faringe e anteriormente ao salpingofaríngeo. As suas fibras deslocam-se no terço medial do palato medial, por entre as duas porções do palatofaríngeo, para se inserir na face superior da aponevrose palatina, onde se entrelaça com o seu homólogo contralateral. A sua irrigação provém do ramo palatino ascendente da artéria facial e do ramo palatino maior da artéria maxilar. Já a sua inervação provém da porção craniana do nervo acessório. O elevador do véu do palatino permite a elevação da região posterior do palato mole, puxando-a um pouco posteriormente.
☤ Aquando da deglutição, o palato mole encontra-se elevado, de modo a contactar com a parede posterior da faringe, separando, assim, a nasofaringe da orofaringe.
Tensor do véu do palatino O tensor do véu do palatino parte da fossa escafóide na apófise pterigóide e, posteriormente, da região medial da espinha do esfenóide. Por entre esses dois locais, está ligado à parede membranosa anterolateral do tubo faríngeotimpânico. Inferiormente, as fibras convergem num tendão delicado, que se volta medialmente, em torno do hâmulo pterigóide, passando através da inserção do bucinador na aponevrose do palatino e a face óssea por detrás da crista palatina. Este músculo é fino e triangular, encontrando-se lateral à lâmina pterigóide medial, ao tubo faringeotimpânico e ao elevador do véu do palatino. A sua face lateral contacta com a parte superior e anterior do pterigóide medial e com a artéria meníngea média. O tensor do véu do palatino é irrigado pelo ramo palatino ascendente da artéria facial e pelo ramo palatino maior da artéria maxilar. A sua inervação motora é assegurada pelo nervo mandibular. Quando os dois músculos se contraem bilateralmente, estes aumentam a rigidez e deprimem o palato mole, especialmente a sua região anterior. Quando o tensor do véu do palatino se contrai unilateralmente, puxa o palato mole para um lado. Pensa-se que a rigidez ajude ao fecho palatofaríngeo. O tensor do véu do palatino ajuda também a abrir o tubo faringeotimpânico, por exemplo, durante a deglutição, como forma de equalizar a pressão de ar, entre o ouvido médio e a rinofaringe.
Palatoglosso O palatoglosso é mais estreito na sua região intermédia, que nas suas extremidades, sendo que juntamente com a sua mucosa, este músculo, forma o arco palatoglossal. O palatoglosso parte da face oral da aponevrose palatina, onde é contínuo com o seu homólogo contralateral. Estende-se anteriormente, inferiormente e lateralmente, em frente à amígdala palatina, até aos lados da língua. Algumas das suas fibras estendem-se até ao dorso da língua, enquanto outras passam profundamente,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II para se misturar com fibras do músculo transverso intrínseco. O palatoglosso é irrigado pelo ramo palatino ascendente da artéria facial e pela artéria faríngea ascendente. No que concerne à inervação, esta é assegurada pela parte craniana do nervo acessório. Em termos de funções, o palatoglosso eleva a raiz da língua, aproximando o arco palatoglossal do seu homólogo contralateral, permitindo assim, isolar a cavidade oral da orofaringe.
Palatofaríngeo O palatofaríngeo e a sua mucosa foram o arco palatofaríngeo. Dentro do palato mole, o palatofaríngeo é composto por dois fascículos que estão ligados à face superior da aponevrose palatina, estando separados um do outro pelo elevador do véu do palatino. O seu fascículo anterior, mais espesso, parte do bordo posterior do palato duro e da aponevrose palatina, onde algumas fibras se interdigitam ao longo da linha média. Já o fascículo posterior contacta com a mucosa da região faríngea do palato, juntando-se ao fascículo posterior do seu homólogo contralateral, na linha média. Passando lateralmente e inferiormente, posteriormente à amígdala, o palatofaríngeo desce posteromedialmente ao salpingofaríngeo, estando ligado ao bordo posterior da cartilagem tiróide. Algumas fibras terminam ligadas ao tecido fibroso faríngeo, enquanto outras cruzam a linha média posteriormente, juntando-se às do seu homólogo contralateral. A irrigação deste músculo é assegurada pelo ramo palatino ascendente da artéria facial, pelo ramo palatino maior da artéria maxilar e pelo ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente. Já a inervação é levada a cabo pela parte craniana do nervo acessório. Em termos de acções, o palatofaríngeo puxa a faringe superiormente, anteriormente e medialmente, encurtando-a, aquando da deglutição. Este músculo permite também a aproximação dos arcos palatoglossais.
Músculo uvular O músculo uvular parte da espinha nasal posterior do osso palatino e da face superior da aponevrose palatina, encontrando-se por entre as duas lâminas desta estrutura. Desloca-se posteriormente, inserindo-se por entre a mucosa da úvula. A sua irrigação provém do ramo palatino ascendente da artéria facial e do ramo palatino descendente da artéria maxilar. O músculo uvular é inervado pela porção craniana do nervo acessório e tem como funções, a retracção da úvula e o espessamento do terço médio do palato mole (ajudando assim ao fecho palatofaríngeo).
Salpingofaríngeo O salpingofaríngeo parte da porção inferior da cartilagem do tubo faringeotimpânico, perto da sua abertura faríngea e passa inferiormente, dentro da prega salpingofaríngea, para se misturar com o palatofaríngeo. Este músculo é irrigado pelo ramo palatino ascendente da artéria facial, pelo ramo palatino maior da artéria maxilar e pelo ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente. No que concerne à inervação, esta é assegurada pela parte craniana do nervo acessório. Em termos de acções, o salpingofaríngeo eleva a faringe, podendo ajudar o tensor do véu do palatino a abrir a extremidade cartilagínea do tubo faringeotimpânico, aquando da deglutição.
Estilofaríngeo O estilofaríngeo é um músculo cilíndrico superiormente e achatado, inferiormente. Parte do lado medial da base da apófise estilóide, desce ao longo do lado da faringe e passa por entre os constritores médio e superior, para se espalhar pela membrana mucosa. Algumas das suas fibras misturam-se com as dos constritores e com a prega glossoepiglótica lateral, enquanto outras juntam-se a fibras do
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II palatofaríngeo e estão fixas ao bordo posterior da cartilagem tiróide. O nervo glossofaríngeo curva-se ao longo do bordo posterior e do lado lateral do estilofaríngeo e passa por entre os constrictores médio e superior, até chegar à língua.A sua irrigação arterial provém do ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente, enquanto a sua inervação é assegurada pelo nervo glossofaríngeo. Em termos de acções, o estilofaríngeo eleva a faringe e a laringe.
Constritor superior da faringe O músculo constritor superior da faringe é quadrilateral e mais fino que os restantes constritores. Está fixo anteriormente ao hâmulo pterigóide, ao bordo posterior da rafe pterigomandibular, à extremidade posterior da linha milohióide da mandíbula e ao lado da língua. As fibras curvam-se num rafe faríngea mediana, que se fixa superiormente ao tubérculo faríngeo do occipital. No que concerne a relações, o constritor superior está separado da base do crânio por um intervalo em forma de crescente, que contém o elevador do véu do palatino, o tubo faringeotimpânico e uma projecção superior da fáscia faringobasilar. O bordo inferior deste músculo está separado do constritor médio pelo estilofaríngeo e pelo nervo glossofaríngeo. Anteriormente, a rafe pterigomandibular separa o constrictor superior do bucinador e, posteriormente, o constrictor superior sobrepõe-se aos músculos pré-vertebrais, estando deles separados, pelo espaço retrofaríngeo. A artéria faríngea ascendente, o plexo venoso faríngeo, os nervos glossofaríngeo e lingual, o estiloglosso, o constrictor médio, o pterigóide medial, o estilofaríngeo e o ligamento estilohióide encontram-se todos laterais a este músculo. A irrigação arterial do constritor superior é assegurada pelo ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente e pelo ramo amigdalino da artéria facial. No que concerne à inervação, esta é levada a cabo pela porção craniana do nervo acessório do plexo faríngeo. Finalmente, em termos de acções, o constritor superior estreita a porção superior da faringe.
Constritor médio da faringe O músculo constritor médio da faringe tem forma de leque, estando fixo anteriormente ao corno menor do osso hióide e à porção inferior do ligamento estilohióide (numa porção do músculo que é entendida como condrofaríngea), bem como ao bordo superior do corno maior do osso hióide (numa porção designada por ceratofaríngea). As fibras inferiores deslocam-se profundamente ao constritor inferior, atingindo a extremidade inferior da faringe, enquanto as fibras médias deslocam-se transversalmente e as fibras superiores ascendem e sobrepõe-se ao constritor superior. Todas as fibras se inserem na rafe faríngea. O nervo glossofaríngeo e o músculo estilofaríngeo passam através de um pequeno intervalo, situado entre os constritores médio e superior da faringe. Já o nervo laríngeo interno e o ramo laríngeo da artéria tiróide superior passam por entre os constritores médio e inferior. A fáscia pré-vertebral, o longo do pescoço e o longo da cabeça encontram-se posteriormente ao constritor médio da faringe, enquanto o constritor superior, o estilofaríngeo e o palatofaríngeo encontram-se internamente. Lateralmente ao constritor médio da faringe encontramos os vasos carótidos, o plexo faríngeo e alguns nódulos linfáticos. O ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente e o ramo amigdalino da artéria facial encarregam-se da vascularização, enquanto a inervação é levada a cabo pela porção craniana do nervo acessório do plexo faríngeo. De referir que, o constritor médio estreita a porção média da faringe, aquando da deglutição.
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Constritor inferior da faringe O músculo constritor inferior da faringe é o mais espesso dos três músculos constritores, sendo normalmente descrito em duas porções – o tirofaríngeo e o cricofaríngeo. O tirofaríngeo parte da linha oblíqua da lâmina tiróide e do corno inferior da tiróide. Algumas fibras adicionais partem de um feixe tendinoso que se arqueia sobre o cricotiróide. Já o cricofaríngeo parte do lado da cartilagem cricóide, por entre a fixação do cricotiróide e a faceta articular para o corno tiróide inferior. O cricofaríngeo e o tirofaríngeo estendem-se posteromedialmente juntando-se aos seus homólogos contralaterais. O tirofaríngeo insere-se na rafe faríngea mediana e as suas fibras superiores ascendem obliquamente, sobrepondo-se ao constritor médio. Já o cricofaríngeo mistura-se com as fibras circulares do esófago, ao nível da porção mais estreita da faringe. A fáscia bucofaríngea é externa a este músculo, enquanto a fáscia pré-vertebral e músculos associados são posteriores. Lateralmente ao constritor inferior da faringe, encontramos a glândula tiróide, a artéria carótida comum e o esternotiróide. Internamente, encontramos o constrictor médio, o estilofaríngeo e o palatofaríngeo. O nervo laríngeo interno e o ramo laríngeo da artéria tiróide superior atingem a membrana tirohióide, passando por entre os constritores médio e inferior, enquanto o nervo laríngeo externo desce ao nível da face superficial do músculo, posteriormente à sua inserção na tiróide, perfurando a sua parte inferior. O nervo laríngeo recorrente e o ramo laríngeo da artéria tiróide inferior ascendem profundamente ao bordo inferior do músculo constritor inferior, entrando na laringe. A irrigação arterial do constritor inferior é levada a cabo pelo ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente e por ramos musculares da artéria tiróide inferior, enquanto a inervação é assegurada pela porção craniana do nervo acessório. O tirofaríngeo estreita a porção inferior da faringe, enquanto o cricofaríngeo é o principal componente do esfíncter esofágico superior (no qual participam também o tirofaríngeo e a musculatura esofágica superior). De referir que, o esfíncter esofágico superior é definido como uma região de maior pressão intraluminal, localizada na junção da hipofaringe com o esófago cervical.
☤ Por entre as fibras oblíquas do tirofaríngeo e as fibras horizontais do cricofaríngeo encontra-se uma região designada por triângulo de Killian - uma local mais fraco e, como tal, mais propício ao aparecimento de divertículos.
Tabela de músculos do palato mole e da faringe Músculo
Origem
Inserção
Acção
Irrigação
Inervação
Elevador do véu do palatino
Face inferior da porção petrosa do temporal
Face superior da aponevrose palatina
Elevação da região posterior do palato mole
Ramo palatino ascendente da artéria facial e ramo palatino maior da artéria maxilar
Porção craniana do nervo acessório
Aponevrose palatina e espinha nasal posterior
Aumentar a rigidez e deprimir o palato mole (contracção bilateral). Puxar o palato mole para um lado (contracção unilateral)
Ramo palatino ascendente da artéria facial e ramo palatino maior da artéria maxilar
Nervo mandibular
Tensor do véu do palatino
Fossa escafóide da apófise pterigóide e espinha do esfenóide
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Palatoglosso
Face oral da aponevrose palatina
Dorso e lados da língua
Elevação da raíz da língua
Ramo palatino ascendente da artéria facial e artéria faríngea ascendente
Porção craniana do nervo acessório
Palatofaríngeo
Bordo posterior do palato duro e aponevrose palatina (fascículo anterior) e mucosa da região faríngea do palato (fascículo posterior)
Bordo posterior da cartilagem tiróide
Puxar a faringe superiormente, anteriormente e medialmente
Ramo palatino ascendente da artéria facial, ramo palatino maior da artéria maxilar e ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente
Porção craniana do nervo acessório
Músculo uvular
Espinha nasal posterior e face superior da aponevrose palatina
Retracção da úvula e espessamento do terço médio do palato mole
Ramo palatino ascendente da artéria facial e ramo palatino descendente da artéria maxilar
Porção craniana do nervo acessório
Elevação da faringe
Ramo palatino ascendente da artéria facial, ramo palatino maior da artéria maxilar e ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente
Porção craniana do nervo acessório
Salpingofaríngeo
Porção inferior da cartilagem do tubo faringeotimpânico
Estilofaríngeo
Lado medial da base da apófise estilóide
Bordo posterior da cartilagem tiróide e prega glossoepiglótica lateral
Elevação da faringe e da laringe
Ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente
glossofaríngeo
Constritor superior da faringe
Hâmulo pterigóide, bordo posterior da rafe pterigomandibular, extremidade posterior da linha milohióide e lado da língua
Tubérculo faríngeo
Estreitar a porção superior da faringe
Ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente e ramo amigdalino da artéria facial
Porção craniana do nervo acessório
Constritor médio da faringe
Corno menor do osso hióide, porção inferior do ligamento estilohióide e bordo superior do corno maior do osso hióide
Rafe faríngea
Estreitar a porção média da faringe
Ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente e ramo amigdalino da artéria facial
Porção craniana do nervo acessório
Tirofaríngeo (porção do constritor inferior da faringe)
Linha oblíqua da lâmina tiróide e corno inferior da tiróide
Rafe faríngea
Estreitar a porção inferior da faringe
Ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente e ramos musculares da artéria tiróide inferior
Porção craniana do nervo acessório
Cricofaríngeo (porção do constritor inferior da faringe)
Cartilagem cricóide, por entre a fixação do cricotiróide e a faceta articular para o corno tiróide inferior
Mistura com as fibras circulares do esófago
Componente do esfíncter esofágico superior
Ramo faríngeo da artéria faríngea ascendente e ramos musculares da artéria tiróide inferior
Porção craniana do nervo acessório
Nervo
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Glândula tiróide e glândulas paratiróides A glândula tiróide é uma estrutura vermelho-acastanhada e altamente vascularizada, estando localizada anteriormente, na região inferior do pescoço, ao nível entre C5 e T1. Esta estrutura está envolvida na camada pré-traqueal da fáscia cervical profunda e consiste em lobos esquerdo e direito, ligados por um estreito e mediano istmo. Os lobos da tiróide são aproximadamente cónicos. Os seus ápices ascendentes divergem lateralmente, até ao nível das linhas oblíquas nas lâminas da cartilagem tiróide, estando as bases ao nível das quarta e quinta cartilagens traqueais. As regiões posteromediais dos lobos estão fixas aos lados da cartilagem cricóide, pelo ligamento tiróide lateral. O istmo conecta as porções inferiores dos dois lobos, embora por vezes possa estar ausente. Esta estrutura é normalmente anterior à segunda e à terceira cartilagens da traqueia. Por vezes, um lobo piramidal cónico ascende em direcção ao osso hióide, a partir do istmo ou da parte adjacente de qualquer um dos lobos (normalmente o esquerdo), estando normalmente dividido em duas ou mais partes. Um feixe fibroso, ou fibromuscular, o elevador da glândula tiróide, desce por vezes do corpo do osso hióide até ao istmo ou ao lobo piramidal. Por entre o istmo e o buraco cego da língua, encontramos vestígios do canal tiroglossal, através de nódulos acessórios.
☤ A glândula tiróide
pesa cerca de 25g, sendo mais pesada nas mulheres, nas quais alarga durante a menstruação e na gravidez. Estimar o tamanho da tiróide é clinicamente importante para avaliar e lidar com desordens nesta glândula. Dos oito meses até aos quinze anos, não são detectadas diferenças sexuais, no que concerne ao volume da tiróide. Um aumento do volume da tiróide, sem ser devido à menstruação ou à gravidez designa-se por bócio e leva a um aumento de pressão nas estruturas adjacentes, nomeadamente na traqueia e nos nervos laríngeos recorrentes. Nesse caso, deve ser levada a cabo a remoção parcial ou total da tiróide – tiroidectomia, que deve ser feita com cuidado para evitar danificar os nervos laríngeos.
Faces e relações A face lateral (ou superficial) é convexa e coberta pelo esternotiróide, cuja fixação à linha tiróide oblíqua previne o pólo superior da glândula de se estender para o tirohióide. Anteriormente a esta face
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II encontram-se o esternohióide, o ventre superior do omohióide e o esternocleidomastoideu (mais inferiormente). A face medial da glândula está adaptada à laringe e à traqueia, sendo que o seu pólo superior contacta com o constritor inferior da faringe e com a porção posterior do cricotiróide, que o separa da porção posterior da lâmina tiróide e da cartilagem cricóide. O nervo laríngeo externo é medial a esta porção da glândula. Inferiormente, a traqueia e, mais posteriormente, o nervo laríngeo recorrente e o esófago são relações mediais. A face posterolateral da glândula tiróide, por sua vez, está próxima da bainha carotídea e sobrepõe-se à artéria carótida comum. O bordo anterior da glândula é pouco espesso, deslocando-se medialmente, perto do ramo anterior da artéria tiróide superior. O bordo posterior é arredondado e relaciona-se inferiormente com a artéria tiróide inferior e com a sua anastomose com o ramo posterior da artéria tiróide superior. Do lado esquerdo, a extremidade inferior do bordo posterior encontra-se perto do canal torácico. As glândulas paratiróides relacionam-se normalmente com o bordo posterior da tiróide. O istmo da tiróide encontra-se coberto pelo esternotiróide, do qual está separado pela fáscia prétraqueal. Mais superficialmente, esta estrutura está coberta pelo esternohióide, pelas veias jugulares anteriores, por fáscia e por pele. As artérias tiróides superiores anastomosam-se ao longo do seu bordo superior, enquanto as veias tiróides inferiores abandonam a glândula ao nível do seu bordo inferior.
Irrigação e drenagem venosa A glândula tiróide é irrigada pelas artérias tiróides superior e inferior e por vezes pela artéria tiroideia ima, proveniente do tronco braquiocefálico ou do arco aórtico. Estas artérias são grandes e os seus ramos anastomosam-se frequentemente dentro, ou na superfície da glândula. A artéria tiróide superior, relacionada com o nervo laríngeo externo, perfura a fáscia tiróide e depois divide-se em ramos anterior e posterior. O ramo anterior irriga a face anterior da glândula, enquanto o ramo posterior irriga as faces medial e lateral. A artéria tiróide inferior aproxima-se da base da glândula tiróide e divide-se em ramos superior e inferior, para irrigar as faces inferior e posterior da glândula. O ramo superior desta artéria também irriga as glândulas paratiróides. A drenagem venosa da glândula tiróide é assegurada pelas veias tiróides superior, média e inferiores. A veia tiróide superior emerge da parte superior da glândula e desloca-se com a artéria tiróide superior até à bainha carotídea, drenando na veia jugular interna. A veia tiróide média recebe sangue da porção inferior da glândula e emerge da face lateral da glândula e drena na veia jugular interna. Por último, as veias tiróides inferiores partem por um plexo venoso glandular, que também liga as veias tiróides média e superior. Essas veias formam um plexo pré-traqueal, de onde desce a veia inferior esquerda, para se juntar à veia braquiocefálica, enquanto a direita se junta à veia braquiocefálica, na sua junção com a veia cava.
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Inervação A glândula tiróide é inervada pelos gânglios simpáticos cervicais superior, médio e inferior. As fibras pós-ganglionares do gânglio cervical inferior formam um plexo na artéria tiróide inferior, que acompanha a artéria até à glândula tiróide e comunica com os nervos laríngeo externo e laríngeo recorrente.
Glândulas paratiróides As glândulas paratiróides são pequenas estruturas castanho-amareladas, de natureza ovóide, que se encontram por entre os bordos posteriores dos lobos da glândula tiróide e a sua cápsula. Normalmente, existem duas de cada lado (uma superior e uma inferior para cada lado), mas podem existir mais, ou podem apenas existir três glândulas paratiróides. A ligação anastomósica entre as artérias tiróides superior e inferior, que ocorre ao longo do bordo posterior da glândula tiróide, normalmente passa muito perto das glândulas paratiróides, sendo um bom meio para as identificar. As glândulas paratiróides superiores apresentam uma localização mais constante que as inferiores e encontram-se normalmente, a meio caminho dos bordos posteriores da glândula tiróide. As glândulas paratiróides inferiores têm uma localização mais variável, podendo-se localizar na bainha tiróide fascial, inferiormente às artérias tiróides inferiores e perto dos pólos lobares inferiores; ou fora da bainha, imediatamente superior às artérias tiróides inferiores; ou ainda, na glândula tiróide, perto do seu pólo inferior. De referir que, as glândulas paratiróides superiores são normalmente posteriores, enquanto as paratiróides inferiores são normalmente anteriores, aos nervos laríngeos recorrentes.
☤ A localização das glândulas paratiróides inferiores é deveras importante, na medida em que um tumor numa glândula paratiróide inferior, situada ao nível da bainha tiróide pode descer ao longo das veias tiróides inferiores, anteriormente à traqueia, até ao mediastino superior. Por outro lado, se a glândula está fora da bainha, o tumor pode-se estender posteroinferiormente, por detrás do esófago, até ao mediastino posterior.
Irrigação, drenagem venosa e inervação As glândulas paratiróides são, normalmente, irrigadas pelas artérias tiróides inferiores, embora a glândula paratiróide superior possa ser irrigada pela artéria tiróide superior ou por anastomoses entre as artérias tiróides superior e inferior. Estas glândulas drenam em plexos venosos na face anterior da tiróide. No que concerne à inervação, esta provém dos gânglios cervicais médio ou superior, ou de um plexo na fáscia das regiões lobares posteriores. A actividade nas glândulas paratiróides é controlada por variações dos níveis sanguíneos de cálcio, sendo inibida por um aumento de cálcio e estimulada por uma diminuição.
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2. Sistema respiratório Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Laringofaringe A laringofaringe encontra-se situada posteriormente à laringe, estendendo-se do bordo superior da epiglote até ao bordo inferior da cartilagem cricóide, sendo a partir daí, contínua com o esófago. O seu diâmetro diminui rapidamente, especialmente na sua porção inferior, constituindo a porção mais estreita do aparelho digestivo, com excepção do apêndice vermiforme. A sua parede anterior é formada superiormente pela face posterior da epiglote e pelo inlet laríngeo (entrada da laringe) e, inferiormente, pela membrana mucosa da face posterior das cartilagens cricóide e aritenóide. De cada lado do inlet laríngeo, existe um pequeno recesso, a fossa piriforme. A parede posterior encontra-se em frente das vértebras C3-C6.
Fossa piriforme A pequena fossa piriforme encontra-se de cada lado do inlet laríngeo, sendo delimitada medialmente pela prega ariepiglótica e lateralmente pela cartilagem tiróide e pela membrana tirohióide. Os ramos do nervo laríngeo interno encontram-se externamente à membrana mucosa do recesso.
☤ A laringofaringe é uma região onde é frequente a acumulação de corpos estranhos. Aquando da sua remoção de forma descuidada, ocorre frequentemente a lesão dos ramos do nervo laríngeo interno.
Inlet laríngeo O inlet (ádito) laríngeo encontra-se na porção anterior da laringofaringe, sendo delimitado anteriormente pelo bordo superior da epiglote, inferiormente pelas cartilagens aritenóides da laringe, posteriormente pela prega mucosa transversa entre as duas cartilagens aritenóides, e lateralmente pelas pregas ariepiglóticas. Inferiormente ao inlet, a parede anterior da laringofaringe passa a ser formada pela face posterior da cartilagem cricóide. A linha média entre os dois tubérculos corniculados é entendida como a incisura interaritenóide.
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Laringe A laringe é uma passagem aérea, um esfíncter e um órgão de fonação. A laringe comunica superiormente com as cavidades oral e nasal através da faringe e, inferiormente, com a traqueia. O seu limite superior (a extremidade da epiglote) encontra-se ao nível de C3 e a sua extremidade inferior, ao nível do bordo inferior da cartilagem cricóide, encontra-se ao nível de C6, embora este órgão se encontre mais elevado nas crianças, bebés (onde o seu limite superior se encontra ao nível da junção entre o dente e corpo do áxis) e em mulheres. Aquando da inspiração profunda, da extensão do pescoço, ou aquando da deglutição, a laringe sobe a sua posição relativamente às vértebras. Após a puberdade, a laringe masculina torna-se consideravelmente mais larga que a feminina, pois as cartilagens que a constituem aumentam as suas dimensões (a cartilagem tiróide projecta-se anteriormente, duplicando quase o seu diâmetro sagital, crescendo até aos 40 anos). Em termos de relações, encontramos posteriormente à laringe, a faringe e o espaço retrofaríngeo, que permite o movimento da laringe e da faringe ao nível da fáscia prévertebral. Lateralmente, encontramos a glândula tiróide, coberta anterolateralmente pelos músculos infrahióides e ligada à laringe por fáscia pré-traqueal, de forma a ser possível o movimento conjunto. Posterolateralmente à laringe encontram-se as bainhas carotídeas e respectivos conteúdos. A laringe apresenta uma estrutura de cartilagens ligadas por articulações sinoviais e ligamentos e que se movimentam, por acção de músculos intrínsecos. A junção de C3 com C4 está ao nível do bordo superior da cartilagem tiróide, enquanto C6 está ao nível da cartilagem cricóide.
☤ As cartilagens corniculada, cuneiforme, tritícea e epiglótica, bem como o ápice da cartilagem aritenóide são compostos por fibrocartilagem elástica, tendo pouca tendência a calcificar. Já as cartilagens cricóide, tiróide e grande parte da aritenóide consistem em cartilagem hialina, tendo tendência para ossificar a partir dos 25 anos (sendo a cartilagem tiróide, a primeira a calcificar).
Epiglote A epiglote é uma fina lâmina de fibrocartilagem elástica, que se encontra posteriormente à cartilagem tiróide, à membrana tirohióide, ao osso hióide e à base da língua, formando a parede superior da laringe superior. A sua base é uma lâmina perfurada em forma de folha com uma porção fixa (pecíolo) estreita, ligada à região posterior da proeminência laríngea da cartilagem tiróide, através do ligamento tiroepiglótico.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A sua terminação anterior, larga e arredondada é livre, apresenta ocasionalmente uma incisura na linha média e dirigese superiormente. Esta porção está coberta por mucosa, sendo esta contínua com a da porção faríngea da língua e encontrando-se reflectida através das pregas glossoepiglóticas mediana e laterais. As pregas glossoepiglóticas delimitam as valéculas (existe uma valécula de cada lado da prega glossoepiglótica mediana). Por seu turno, a porção inferior da face anterior da cartilagem epiglótica encontra-se ligada ao osso hióide pelo ligamento hioepiglótico e separada da membrana tirohióide por tecido adiposo, que constitui o espaço préepiglótico, com particular relevância clínica. A membrana mucosa da epiglote também cobre a sua face posterior, encontrando-se ligada às cartilagens aritenóides, através das pregas ariepiglóticas. Estas pregas contêm o músculo ariepiglótico e projectam-se posteriormente, até à faringe, separando o vestíbulo da laringe do recesso piriforme da faringe. Relativamente à face posterior (ou laríngea) da epiglote, esta apresenta-se côncava em corte transverso e concavo-convexo em corte vertical. Na linha média da região inferior da face posterior da epiglote é visível uma elevação proeminente, à qual se dá o nome de tubérculo da epiglote. A epiglote apresenta inúmeras glândulas mucosas e é perfurada pelo nervo laríngeo interno e por tecido fibroso, o que significa que a face posterior contacta através dessas perfurações com o espaço préepiglótico.
Cartilagem tiróide A cartilagem tiróide é a maior cartilagem da laringe, consistindo em duas lâminas quadrilaterais com bordos anteriores, que se fundem ao longo dos seus dois terços inferiores, num ângulo mediano para formar a proeminência laríngea (vulgarmente designada por “maçã de Adão”). Esta projecção é mais distinta na sua extremidade superior, sendo particularmente visível nos homens, onde o ângulo formado pela fusão dos bordos anteriores é de cerca de 90º, contra 120º nas mulheres. Este ângulo
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II mais fechado nos homens está associado a uma maior proeminência laríngea e a um maior comprimento das cordas vocais. Superiormente, as lâminas encontram-se separadas pela incisura tiróide superior, que tem a forma de um V. Posteriormente, as lâminas divergem e os seus bordos posteriores encontram-se projectados como cornos superiores e inferiores. Uma crista fina, a linha oblíqua, desloca-se do tubérculo tiróide superior (que se encontra um pouco anteriormente à raiz do corno superior) até ao tubérculo tiróide inferior, no bordo inferior da lâmina. A esta linha, que descreve um trajecto inferior e anterior, ligam-se os músculos esternotiróide, tirohióide e tirofaríngeo (parte do constritor inferior da faringe). A face interna da lâmina é macia, sendo ligeiramente côncava superior e posteriormente. A esta face estão ligados o ligamento tiroepiglótico, os ligamentos vocais e vestibulares, os músculos tiroaritenóide, tiroepiglótico e vocal e o pecíolo da epiglote, no ângulo por entre as lâminas. As pregas vocais (também designadas por cordas vocais) encontram-se a 6-9 mm, inferiormente à incisura tiróide mediana. O bordo superior de cada lâmina é côncavo posteriormente e convexo anteriormente, sendo que a membrana tirohióide se liga a este bordo. Por seu turno, o bordo inferior de cada lâmina é côncavo posteriormente e quase recto anteriormente, estando as duas porções separadas pelo tubérculo tiróide inferior. Anteriormente, a cartilagem tiróide está ligada à cartilagem cricóide pelo ligamento cricotiróide anterior (uma porção mais espessa da membrana cricotiróide). Por fim, o bordo posterior é espesso e arredondado, recebendo fibras do estilofaríngeo e do palatofaríngeo. Este bordo termina como duas projecções – os cornos. O corno superior, que é longo e estreito curva-se posterior, superior e medialmente, terminando num ápice cónico, onde se liga o ligamento tirohióide lateral. Já o corno inferior é curto e espesso, curvando-se inferior e um pouco anteromedialmente. Na sua face medial existe uma pequena faceta oval, muito variável, para articulação com a cartilagem cricóide.
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Cartilagem cricóide A cartilagem cricóide está fixa inferiormente à traqueia e articula-se com a cartilagem tiróide e com as duas cartilagens aritenóides, através de articulações sinoviais. Esta forma um anel completo em torno da passagem aérea, sendo a única cartilagem laríngea com tal disposição. Apesar de ser mais pequena que a cartilagem tiróide, é mais espessa e forte, apresentando um arco curvo, anteriormente e uma lâmina achatada, posteriormente. O arco cricóide é verticalmente estreito em frente e alarga-se posteriormente em direcção à lâmina. O cricotiróide está fixo à região externa da sua frente e dos seus lados, enquanto o cricofaríngeo (parte do constritor inferior da faringe), está fixo posteriormente ao cricotiróide. O arco cricóide é palpável inferiormente à proeminência laríngea, da qual está separado por uma depressão que contém a membrana cricotiróide. De referir que o bordo inferior deste arco é horizontal e circular, enquanto o bordo superior é mais elíptico, inclinando-se para se juntar ao bordo superior da lâmina cricóide. A lâmina cricóide é aproximadamente quadrilateral, tendo cerca de 2-3 cm de comprimento. Apresenta uma crista vertical mediana, na sua face posterior, que cria concavidades posteriores em ambos os lados. Fibras dos dois fascículos da camada longitudinal do esófago estão fixos por um tendão à parte superior da crista. Por seu turno, o cricoaritenóide posterior fixa-se a uma ténue depressão nessa crista. A junção entre a lâmina cricóide e o arco circóide é marcada por uma faceta sinovial circular, que se desloca posterolateralmente. Esta junção indica também o local onde a cartilagem cricóide se articula com o corno tiróide inferior. O bordo inferior da cartilagem cricóide é horizontal, estando junto à primeira cartilagem da traqueia pelo ligamento cricotraqueal. Já o bordo superior desloca-se obliquamente em direcção superior e posterior, sendo o local onde, anteriormente, se fixa a porção mediana da membrana cricotiróide e, lateralmente, se fixam as porções membranosas da membrana cricotiróide e o cricoaritenóide lateral. A região posterosuperior da lâmina cricóide apresenta uma ténue incisura mediana, ladeada por uma faceta convexa, oval e macia, dirigida superior e lateralmente, para articulação com a base da cartilagem aritenóide. Já a face interna da cartilagem cricóide é macia e delimitada por mucosa.
☤ A malformação congénita da cartilagem cricóide pode resultar num acentuado estreitamento da passagem aérea subglótica, com consequente obstrução respiratória. Esta desordem, designada por estenose subglótica, é a patologia congénita da laringe mais comum. A estenose subglótica também pode ser adquirida, sendo resultado do trauma e cicatrização após entubação pós-traqueal prolongada, com fins de ventilação, em bebés prematuros presentes nas unidades de cuidados intensivos.
Cartilagem aritenóide As duas cartilagens aritenóides articulam-se com as porções laterais do bordo superior da lâmina cricóide. Cada cartilagem é piramidal, apresentando três faces, duas apófises, uma base e um ápice. A face posterior, de natureza triangular, mole e côncava, encontra-se coberta pelo aritenóide transverso. A face anterolateral é convexa e rugosa, apresentando, perto do ápice, uma elevação, a partir da qual, uma crista se desloca posterior, inferior e depois anteriormente, até à apófise vocal. A porção inferior desta crista arqueada separa duas depressões ou fóveas – a fóvea triangular, mais superior e onde se liga o ligamento vestibular; e a fóvea oblonga, mais inferior e onde se ficam o vocal e o cricoaritenóide. A face medial é estreita, macia e achatada, estando coberta por mucosa.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A base é côncava, articulando-se com a porção lateral do bordo superior da lâmina cricóide. Aí, encontramos um ângulo lateral proeminente, o qual é designado por apófise muscular, uma estrutura que se desloca posterior e lateralmente, dando fixação ao cricoaritenóide posterior, posteriormente, e ao cricoaritenóide lateral, anteriormente. Na base desta cartilagem, encontramos ainda a apófise vocal, correspondente ao seu ângulo anterior. Esta apófise projecta-se anteriormente e nela se fixa o ligamento vocal.
Cartilagens cuneiformes As cartilagens cuneiformes são dois pequenos e elongados nódulos de fibrocartilagem elástica (um em cada prega ariepiglótica), anterosuperiores às cartilagens corniculadas e que são visíveis através de elevações esbranquiçadas na mucosa.
Cartilagens tritíceas As cartilagens tritíceas são dois pequenos nódulos de cartilagem elástica, situados, um de cada lado sobre a laringe dentro do bordo posterior livre da membrana tirohióide, a meio caminho entre o corno superior da cartilagem tiróide e a ponta do corno maior do osso hióide.
Articulações da laringe As articulações cricotiróide, cricoaritenóide e aritenocorniculadas conectam as várias cartilagens da laringe, sendo inervadas por ramos dos nervos laríngeos recorrentes.
Articulação cricotiróide As articulações entre os cornos inferiores da cartilagem tiróide e os lados da cartilagem cricóide são sinoviais. Estas estão envoltas por um ligamento capsular fortalecido posteriormente por bandas fibrosas. Nesta articulação ocorre um movimento de rotação em torno de um eixo transverso que passa por ambas as articulações cricotiróides. Isto permite movimentar as cartilagens cricóide e tiróide mais próximas, de modo a juntar a lâmina da cartilagem tiróide com o arco da cartilagem cricóide. Isto permite aumentar a tensão vocal e elongar as cordas vocais.
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Articulação cricoaritenóide As articulações cricoaritenóides são articulações sinoviais presentes entre as facetas das porções laterais do bordo superior da lâmina da cartilagem cricóide e as bases das aritenóides. Cada articulação está envolta por um ligamento capsular e fortalecida pelo ligamento cricoaritenóide posterior (que apesar do seu nome, apresenta uma posição medial). Nesta articulação ocorrem dois movimentos – um movimento de rotação e outro de deslizamento. O movimento de rotação das cartilagens aritenóides em torno do grande eixo da faceta caudal leva a uma rotação medial ou lateral das apófises vocais. Já no movimento de deslizamento, as aritenóides aproximam-se ou afastam-se mutuamente. De referir que, os movimentos de deslizamento e rotação estão associados – o deslizamento medial acompanha a rotação medial, enquanto o deslizamento lateral acompanha a rotação lateral, o que leva à aducção ou abducção das pregas vocais, respectivamente.
Articulação aritenocorniculada Esta articulação é de natureza cartilagínea ou sinovial, consistindo na junção das cartilagens aritenóide e corniculada.
Ligamentos e membranas O esqueleto da laringe está fixo às estruturas adjacentes por membranas extrínsecas e as diferentes porções que constituem este esqueleto estão unidas por ligamentos intrínsecos e membranas fibroelásticas.
Membrana tirohióide A membrana tirohióide é uma camada fibroelástica larga, de natureza extrínseca. Encontra-se fixa inferiormente ao bordo superior da cartilagem tiróide e ao seu corno superior e, superiormente, ao bordo superior do corpo e cornos maiores do osso hióide. Ascende posteriormente à face posterior do osso hióide, separada do seu corpo por uma bolsa. A sua parte mais espessa constitui o ligamento tirohióide mediano, enquanto as porções mais laterais e pequenas são perfuradas pelos vasos laríngeos superiores e pelos nervos laríngeos internos. Externamente, esta membrana contacta com o tirohióide, o omohióide e com o corpo do osso hióide. A sua face interna relaciona-se com a face lingual da epiglote e com as fossas piriformes da faringe. Os bordos posteriores desta membrana são formados pelos ligamentos tirohióides laterais, que conectam as pontas dos cornos tiróides superiores com as extremidades posteriores dos cornos maiores do osso hióide.
Ligamentos tiroepiglóticos e hioepiglóticos Estes ligamentos extrínsecos ligam a epiglote à cartilagem tiróide e ao osso hióide, respectivamente.
Ligamento cricotraqueal Este ligamento extrínseco une o bordo inferior da cricóide à primeira cartilagem da traqueia, sendo contínuo com o pericôndrio da traqueia.
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Membrana quadrangular A membrana quadrangular é uma estrutura intrínseca, sendo que cada uma destas membranas passa desde o bordo lateral da epiglote até à cartilagem aritenóide ipsilateral. Encontra-se frequentemente mal definida, sobretudo na sua porção superior. Os seus bordos superior e inferior são livres, sendo que o bordo superior desloca-se posteriormente, formando o ligamento ariepiglótico (que constitui o componente central da prega ariepiglótica) e ajudando a formar o ligamento cornicofaríngeo mediano, ao passar no plano facial do ligamento suspensor do esófago. Por seu turno, o bordo inferior da membrana quadrangular forma a prega vestibular.
Ligamento cricotiróide O ligamento cricotiróide é um ligamento intrínseco, sendo composto, sobretudo, por tecido elástico. Consiste em duas porções – a membrana cricotiróide, inferiormente, e o corno elástico, superiormente. A membrana cricotiróide passa superiormente do bordo superior da cartilagem cricóide, até ao bordo inferior da cartilagem tiróide. Anteriormente, esta membrana encontra-se espessada, formando o ligamento cricotiróide mediano (anterior), que é mais largo inferiormente e mais estreito, superiormente. O corno elástico (ligamento cricovocal), por sua vez, parte debaixo da membrana cricotiróide, desde a face interna da cartilagem cricóide, perto do seu bordo inferior. Desloca-se superiormente, debaixo do bordo inferior da cartilagem tiróide, estando fixo anteriormente à face interna do ângulo da cartilagem tiróide e, posteriormente, à ponta da apófise vocal da cartilagem aritenóide. Por entre esses pontos de fixação, o bordo superior do corno elástico é livre e espessado, formando o ligamento vocal, que se encontra dentro da prega vocal. Em termos de espessura, o corno elástico é mais fino que o ligamento cricotiróide anterior e em termos de funções, esta estrutura maximiza o fluxo de ar que se desloca para a rima da glote, aquando da fonação.
Cavidade laríngea A cavidade laríngea estende-se do inlet laríngeo (desde a faringe) até ao bordo inferior da cartilagem cricóide, onde se continua com a traqueia. As paredes da cavidade são formadas por membranas
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II fibroelásticas e estão delimitadas por membrana mucosa, que forma pregas sobre os bordos livres dessas membranas fibroelásticas. De cada lado, a continuidade da membrana fibroelástica é interrompida pelas pregas superior e inferior. Essas pregas projectam-se para o lúmen da cavidade, dividindo-o em partes superior, média e inferior. As pregas superiores são as pregas vestibulares, também designadas por pregas ventriculares ou vocais falsas, envolvendo uma abertura mediana, que é a rima do vestíbulo. Já as pregas inferiores são as pregas vocais (também designadas por pregas vocais verdadeiras ou cordas vocais), cuja fissura que se encontra entre estas é a rima da glote. As pregas vocais verdadeiras permitem a fonação, enquanto as pregas vestibulares normalmente não contribuem para a produção de som.
Porção superior A porção superior da cavidade laríngea contém o inlet (ou ádito) laríngeo, a prega ariepiglótica e o vestíbulo laríngeo. A prega ariepiglótica contém fibras musculares e ligamentosas, correspondendo, estas últimas, ao bordo superior livre da membrana quadrangular. As fibras musculares são contínuas com os aritenóides oblíquos. A porção posterior da prega ariepiglótica contém duas elevações ovais, separadas por um ténue sulco vertical, contínuo, inferiormente, com a abertura do ventrículo laríngeo. Já o vestíbulo laríngeo é o espaço entre o inlet laríngeo e as pregas vestibulares, sendo um termo, sobretudo, clínico. É mais largo superiormente, estreito, inferiormente e mais elevado, anteriormente, que posteriormente. A sua parede anterior é formada pela face posterior da epiglote e as suas paredes laterais são formadas pelas faces mediais das pregas ariepiglóticas. A sua parede posterior consiste na mucosa interaritenóide, existente sobre as pregas vestibulares.
Porção média A porção média da cavidade laríngea é a mais pequena, estendendo-se desde a rima do vestíbulo, superiormente, até à rima da glote, inferiormente. De cada lado, contém as pregas vestibulares, o ventrículo e o sáculo da laringe. O estreito ligamento vestibular representa o espesso bordo inferior da membrana quadrangular. Está fixo, em frente, ao ângulo da tiróide, inferiormente à cartilagem epiglótica e, posteriormente, à face anterolateral da cartilagem aritenóide, sobre a sua apófise vocal. Quando este ligamento está coberto por mucosa, passa a designar-se prega vestibular. O ventrículo (ou seio) laríngeo é uma abertura situada, entre as pregas vestibular e vocal. Abre-se num recesso fusiforme de cada lado da laringe e estende-se superiormente pela parede laríngea lateral, até à prega vestibular, abrindo-se no sáculo laríngeo. Esta estrutura é um espaço que ascende anteriormente do ventrículo, por entre a prega vestibular e a cartilagem tiróide, ocasionalmente atingindo o bordo superior desta última. Apresenta uma forma cónica, estando o seu orifício envolto pela prega ventriculosacular. O sáculo laríngeo apresenta uma cápsula fibrosa e no seu lúmen abrem-se entre 60 a 70 glândulas mucosas.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Por outro lado, o espessamento do bordo superior livre do corno elástico forma o ligamento vocal. Este estende-se posteriormente do nível médio do ângulo da tiróide, até às apófises vocais das aritenóides. Quando este ligamento se encontra coberto por mucosa, é designado por prega vocal. As pregas vocais formam os bordos anterolaterais da rima da glote, estando envolvidas na produção de som. Cada prega consiste em cinco camadas – uma de mucosa, três de lâmina própria e o músculo vocal. O local onde as pregas vocais se encontram, anteriormente, é designado por comissura anterior, sendo a região onde as fibras do ligamento vocal passam através da cartilagem tiróide, misturando-se com o pericôndrio adjacente e formando o ligamento de Broyle.
☤ O ligamento de Broyle contém vários vasos sanguíneos e linfáticos representando, desse modo, uma via potencial para a proliferação de tumores malignos da laringe. Por entre as cordas vocais, anteriormente, e as cartilagens aritenóides, posteriormente, encontramos a rima da glote. Esta fissura é dividida em duas regiões – uma porção intermembranosa, anterior, que constitui cerca de 3/5 do seu comprimento anteroposterior e que é formada pelo ligamento vocal que se lhe sobrepõe; e uma porção intercartilagínea, posterior, formada pelas apófises vocais das cartilagens aritenóides. A rima da glote é a porção mais estreita da laringe, sendo que a sua largura e forma variam com o movimento das pregas vocais e das cartilagens aritenóides, aquando da respiração e fonação.
Porção inferior A porção inferior da cavidade laríngea, designada por subglote, ou cavidade infraglótica, estende-se desde as pregas vocais, até ao bordo inferior da cricóide. Quando seccionada transversalmente, esta porção é elíptica superiormente e mais larga e circular, inferiormente, sendo contínua com a traqueia. As suas paredes são suportadas pelo ligamento cricotiróide, superiormente, e pela cartilagem cricóide, inferiormente. Pensa-se que as paredes desta porção da cavidade laríngea sejam extremamente curvas, como forma de acelerar o fluxo de ar que circula para a glote, sem grandes dispêndios energéticos.
Músculos intrínsecos da laringe Os músculos da laringe podem ser divididos num grupo extrínseco e num grupo intrínseco. Os músculos extrínsecos unem a laringe às estruturas vizinhas, sendo responsáveis pelo seu movimento vertical,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II aquando da deglutição e fonação. Estes incluem os músculos tirohióide, esternohióide, esternotiróide, o constritor inferior da faringe, o estilofaríngeo e o palatofaríngeo. Já os músculos intrínsecos da laringe podem ser divididos em três grupos, de acordo com as suas acções principais, dado existir um conjunto de músculos que faz variar as dimensões da rima da glote, outro que regula a tensão das pregas locais e outros que alteram o tamanho do inlet laríngeo. Com excepção do cricotiróide, os músculos intrínsecos da laringe encontram-se todos por entre o esqueleto cartilagíneo da laringe e a membrana mucosa. De referir que, com excepção do músculo aritenóide transverso, todos os restantes músculos da laringe são pares.
Cricotiróide O músculo cricotiróide parte das regiões lateral e anterior da face externa da cartilagem cricóide. As suas fibras dirigem-se posterosuperiormente, até ao bordo inferior da lâmina e corno inferior da cartilagem tiróide. Este músculo apresenta uma porção recta (mais medial) e uma porção oblíqua (mais lateral). A sua inervação é assegurada pelo nervo laríngeo superior, enquanto a sua irrigação é assegurada pelo ramo cricotiróide da artéria tiróide superior. Em termos de acções, o cricotiróide é o principal tensor das pregas vocais – a sua contracção diminui o espaço entre as cartilagens tiróide e cricóide, aumentando a distância por entre a ponta da apófise vocal da cartilagem aritenóide e a face posterior da lâmina tiróide. A porção posterior do cricotiróide puxa a tiróide anteriormente, o que permite aumentar o comprimento das pregas vocais.
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Crico-aritenóide posterior O músculo crico-aritenóide posterior parte da região posterior da lâmina da cartilagem cricóide, sendo que as suas fibras se deslocam superior e lateralmente, inserindo-se na apófise muscular da cartilagem aritenóide. As fibras mais superiores são quase horizontais, enquanto as mais inferiores são quase verticais. O ceratocricóide é um ventre adicional deste músculo, que se encontra por vezes, partindo da cartilagem cricóide e inserindo-se na região posterior do corno inferior da cartilagem tiróide. A inervação é levada a cabo pelo ramo laríngeo recorrente do nervo vago, enquanto a vascularização é assegurada pelos ramos laríngeos das artérias tiróides superior e inferior. Em termos de acções, o cricoaritenóide posterior é o único abductor das pregas vocais, permitindo a rotação das cartilagens aritenóides em torno de um eixo vertical, que passa através das articulações cricoaritenóides, permitindo a separação das apófises vocais e das cordas vocais. O cricoaritenóide posterior ajuda também o cricotiróide a aumentar o comprimento das pregas vocais.
Crico-aritenóide lateral O músculo crico-aritenóide lateral parte do bordo superior do arco da cartilagem cricóide, deslocandose posterosuperiormente e inserindo-se na região anterior da apófise muscular da cartilagem aritenóide. A sua inervação é assegurada pelo nervo laríngeo recorrente, enquanto a sua vascularização é assegurada pelos ramos laríngeos das artérias tiróides superior e inferior. No que concerne a acções, o crico-aritenóide lateral é um dos principais aductores dos ligamentos vocais, pois permite a rotação medial das cartilagens aritenóides e a aproximação das apófises vocais, fechando a rima da glote. A contracção deste músculo também permite a diminuição do tamanho e o relaxamento das pregas vocais.
Aritenóide transverso O músculo aritenóide transverso é o único músculo ímpar da laringe, encontrando-se por entre as faces posteriores dos corpos e apófises musculares das cartilagens aritenóides. Este músculo é inervado pelo nervo laríngeo recorrente e irrigado pelos ramos laríngeos das artérias tiróides. Em termos de acções, o
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II aritenóide transverso junta as cartilagens aritenóides, ajudando a fechar a porção posterior da rima da glote, algo que acontece, por exemplo, quando se assobia.
Aritenóide oblíquo O músculo aritenóide oblíquo encontra-se posteriormente ao aritenóide transverso. Este músculo parte da região posterior da apófise muscular de uma cartilagem aritenóide, para se inserir no ápice da cartilagem do lado oposto, cruzando o seu homólogo contralateral, formando um “X”. Algumas fibras deslocam-se para as pregas ariepiglóticas, formando o músculo ariepiglótico. A inervação deste músculo provém do nervo laríngeo recorrente, a sua irrigação é assegurada pelos ramos laríngeos das artérias tiróides. Em termos de acções, o músculo ariepiglótico e as fibras contínuas do aritenóide oblíquo ajudam a fechar o ádito da laringe, aproximando as cartilagens aritenóides e puxando-as superiormente, em direcção à epiglote, ao mesmo tempo que puxam a epiglote posteriormente, sobre o ádito laríngeo. São por isso considerados músculos esfincterianos da laringe.
Tiro-aritenóide O músculo tiro-aritenóide é um músculo achatado que se origina da metade inferior da face interna da cartilagem tiróide, ao nível do seu ângulo, bem como da extremidade superior do ligamento cricotiróide. As suas fibras deslocam-se superiormente, posteriormente e horizontalmente, sendo que as fibras mais inferiores se fixam na face lateral da apófise vocal da cartilagem aritenóide. As fibras mais profundas deste grupo constituem o músculo vocal, um músculo paralelo e lateral ao ligamento vocal, ao qual, muitas das suas fibras se ligam. As fibras mais superiores do tiro-aritenóide deslocam-se para a prega ariepiglótica e algumas delas atingem a epiglote, formando o músculo tiro-epiglótico. Na face lateral do tiro-aritenóide, encontra-se por vezes um músculo inconstante e pequeno, o tiroaritenóide superior, que se estende obliquamente do ângulo tiróide até à apófise muscular da cartilagem aritenóide. A sua irrigação é assegurada pelos ramos laríngeos das artérias tiróide superior e inferior, enquanto a sua inervação provém do nervo laríngeo recorrente. Em termos de acções, os músculos tiro-aritenóides puxam as cartilagens aritenóides anteriormente, até à cartilagem tiróide, relaxando assim, os ligamentos vocais. Por outro lado, estes músculos estão também encarregues da rotação medial das cartilagens aritenóides e da aproximação das pregas vocais. O músculo vocal permite ajustar a tensão das pregas vocais, levando a mudanças no timbre.
Tabela de músculos intrínsecos da laringe Músculo
Origem
Inserção
Acção
Irrigação
Inervação
Cricotiróide
Face externa da cartilagem cricóide
Bordo inferior da lâmina e corno inferior da cartilagem tiróide
Aumentar a tensão das pregas vocais e aumentar o seu comprimento (porção posterior)
Ramo cricotiróide da artéria tiróide superior
Nervo laríngeo superior
Cricoaritenóide posterior
Região posterior da lâmina da cartilagem cricóide
Apófise muscular da cartilagem aritenóide
Abducção das pregas vocais e aumentar o seu comprimento (porção posterior)
Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Adução dos ligamentos Ramos vocais (para fechar a rima da laríngeos das glote) e relaxamento das artérias pregas vocais tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Juntar as cartilagens aritenóides, para fechar a rima da glote
Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Fechar o ádito laríngeo
Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Face lateral da Metade inferior da face apófise vocal da interna da cartilagem cartilagem aritenóide tiróide e extremidade (fibras mais superior do ligamento inferiores) e prega cricotiróide ariepiglótica (fibras mais superiores)
Puxar as cartilagens aritenóides anteriormente (relaxando os ligamentos vocais) e aproximação das pregas vocais
Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Vocal (fibras mais profundas das fibras inferiores do tiro-aritenóide)
Metade inferior da face interna da cartilagem tiróide e extremidade superior do ligamento cricotiróide
Ligamento vocal
Ajustar a tensão das pregas vocais e o timbre
Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Tiro-epiglótico (fibras mais superiores do tiroaritenóide)
Metade inferior da face interna da cartilagem tiróide e extremidade superior do ligamento cricotiróide
Epiglote
Compressão das glândulas nos sáculos laríngeos para lubrificar as pregas vocais. Efeito esfincteriano da epiglote
Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Apófise muscular da cartilagem aritenóide
Puxar as cartilagens aritenóides anteriormente (relaxando os ligamentos vocais) e aproximação das pregas vocais
Ramos laríngeos das artérias tiróides
Nervo laríngeo recorrente
Ceratocricóide (porção do crico-aritenóide posterior)
Cartilagem cricóide
Região posterior do corno inferior da cartilagem tiróide
Cricoaritenóide lateral
Bordo superior do arco da cartilagem cricóide
Região anterior da apófise muscular da cartilagem aritenóide
Aritenóide transverso
Músculo presente posteriores dos musculares das aritenóides
Aritenóide oblíquo
Tiroaritenóide
Tiroaritenóide superior
Região posterior da apófise muscular de uma cartilagem aritenóide
Ângulo tiróide
entre as faces corpos e apófises cartilagens .
Ápice da cartilagem do lado oposto
Abducção das pregas vocais
Irrigação arterial A irrigação arterial da laringe provém, sobretudo, das artérias laríngeas superior e inferior. A artéria laríngea superior é um ramo da artéria tiróide superior, irrigando a maior parte dos tecidos da laringe, desde a epiglote, até às pregas vocais, entrando na laringe, ao penetrar a membrana tirohióide.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Já a artéria laríngea inferior irriga a região em torno do cricotiróide. Esta artéria é menor que a artéria laríngea superior, sendo um ramo da artéria tiróide inferior, que por sua vez parte do tronco tirocervical. A artéria laríngea inferior ascende na traqueia, juntamente ao nervo laríngeo recorrente, entra na laringe, ao nível do bordo inferior do constritor inferior da faringe e irriga os músculos e a mucosa da laringe. Esta artéria dá, geralmente, um ramo posterior e anastomosa-se com a sua homóloga contralateral e com o ramo laríngeo superior da artéria tiróide superior. A artéria cricotiróide também contribui para a irrigação arterial da laringe, partindo da artéria tiróide superior. O seu percurso é variável, podendo se deslocar superficial ou profundamente ao esternotiróide. Pode se anastomosar com a sua homóloga contralateral e com as artérias laríngeas.
Drenagem venosa A drenagem venosa da laringe é assegurada pelas veias laríngeas superior e inferior, que se deslocam paralelamente às artérias laríngeas, sendo tributárias das veias tiróide superior e tiróide inferior, respectivamente.
Inervação A laringe é inervada por ramos internos e externos do nervo laríngeo superior, pelo nervo laríngeo recorrente e por nervos simpáticos. Convencionalmente, o nervo laríngeo interno é entendido como sensitivo, o nervo laríngeo externo, como motor e o nervo laríngeo recorrente, como misto. Existem várias anastomoses entre estes nervos, ocorrendo a sua maioria na face posterior da laringe, formandose assim, aquilo que se designa por plexo laríngeo.
Nervo laríngeo superior O nervo laríngeo superior parte da região média do gânglio vagal inferior, recebendo, ao longo do seu percurso, uma ou mais comunicações do gânglio simpático cervical superior. O nervo laríngeo superior divide-se em dois ramos, a cerca de 1.5 cm inferiormente ao gânglio. A sua menor divisão é o nervo laríngeo externo, enquanto o nervo laríngeo interno é a maior. O nervo laríngeo interno desloca-se anteriormente, perfurando a membrana tirohióide e dividindo-se em ramos superior, médio e inferior, na sua entrada para a laringe. O ramo superior inerva a mucosa na fossa piriforme, enquanto o ramo médio é o maior e está distribuído pela mucosa do ventrículo, especificamente pela membrana quadrangular. Por fim, o ramo inferior está principalmente distribuído para a mucosa do ventrículo e cavidade subglótica. O nervo laríngeo externo, por sua vez, continua-se inferiormente e anteriormente na face lateral do constrictor inferior da faringe, o qual inerva. Passa por debaixo da zona de fixação do esternotiróide na linha oblíqua da cartilagem tiróide e inerva o cricotiróide. Emite um nervo comunicante, que se continua a partir da face posterior do cricotiróide, cruza a fossa piriforme e entra no tiroaritenóide, onde se anastomosa com ramos do nervo laríngeo recorrente.
☤ A proximidade do nervo laríngeo externo à artéria tiróide superior coloca o nervo em risco, aquando da compressão da artéria durante uma lobectomia da tiróide.
Nervo laríngeo recorrente O nervo laríngeo recorrente, na sua porção superior tem uma relação próxima com a artéria tiróide inferior, passando anterior, posterior ou paralelamente a esta. Este nervo entra na laringe, passando
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II profundamente ou entre as fibras do cricofaríngeo e da sua zona de fixação na região lateral da cartilagem cricóide, inervando esse músculo. Nessa região, o nervo laríngeo recorrente divide-se em dois ou mais ramos, geralmente inferiormente ao constritor inferior da faringe. O ramo anterior do nervo laríngeo recorrente é principalmente motor e, por vezes, designado por nervo laríngeo inferior, ascendendo posteriormente à articulação cricotiróide e ao seu ligamento e estando normalmente coberto por fibras do cricoaritenóide. Este nervo desloca-se então anteriormente, sobre o músculo cricoaritenóide lateral, terminando dentro do tiroaritenóide. Já o ramo posterior do nervo laríngeo recorrente é, sobretudo, sensitivo, ascendendo profundamente ao nervo cricotiróide posterior, juntando-se ao ramo descendente do nervo laríngeo interno. Nos músculos interaritenóides encontramos ainda a ansa de Galeno, que forma uma ligação directa entre os nervos recorrente e laríngeo interno. Na face posterior dos músculos interaritenóides encontrase ainda uma anastomose complexa.
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Traqueia A traqueia é um tubo formado por cartilagem e membrana fibromuscular, que se apresenta como sendo a continuação da laringe. A sua porção anterolateral é formada por entre quinze a vinte anéis incompletos de cartilagem, enquanto a porção posterior é formada por uma parede muscular achatada. No que toca ao seu diâmetro transverso, este é cerca de 2 cm nos indivíduos adultos do sexo masculino e de cerca de 1,5 cm nos indivíduos adultos do seco feminino. A primeira cartilagem traqueal é a mais larga, enquanto a última é mais espessa centralmente e mais larga. A carena é uma apófise triangular em forma de gancho, que se curva inferiormente e posteriormente, por entre os brônquios, envolvendo o início de cada brônquio principal. A traqueia apresenta 4 cm ao nascimento e entre 10 e 11 cm na idade adulta, encontrando-se desde o nível de C6 até ao bordo superior de T5, onde se divide em brônquios principais esquerdo e direito. Em termos de relações, anteriormente ao nível de bifurcação da traqueia, encontramos o ângulo esternal e a segunda cartilagem costal. Durante a inspiração profunda, ou em posição erecta, a traqueia desce um pouco, até ao nível de T6, em parte devido ao aumento do comprimento da traqueia, em cerca de 2 cm. De referir que, a traqueia encontra-se ao nível da linha média, mas ao nível da sua bifurcação, inclina-se um pouco para a direita.
☤ Um
brônquio traqueal pode, por vezes, partir da parede lateral da traqueia, mais frequentemente do lado direito, podendo ser supranumerário, ou representar uma passagem lobular aérea superior deslocada.
Relações A traqueia pode ser dividida numa porção cervical e numa porção torácica, com diferentes relações para cada uma das porções. Posteriormente à traqueia encontramos, em ambas as porções, o esófago, que a separa da coluna vertebral (e, na região do pescoço, da fáscia pré-vertebral). Anteriormente à traqueia, encontramos pele, fáscias superficial e cervical profunda e músculos esternohióide e esternotiróide. A traqueia é ainda cruzada anteriormente, na sua porção cervical, pelo arco venoso jugular e, da segunda à quarta cartilagens traqueais, a traqueia encontra-se coberta pelo istmo da glândula tiróide, sobre o qual, uma artéria anastomósica conecta as artérias tiróides superiores. Inferiormente ao istmo tiróide encontramos a fáscia pré-traqueal e as veias tiróides inferiores. Já na sua porção torácica, relaciona-se anteriormente com o manúbrio esternal e com as artérias braquiocefálica (do lado direito) e carótida comum (do lado esquerdo). Na porção mais inferior
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II da traqueia, esta é ainda cruzada pelo arco aórtico, pela veia braquiocefálica esquerda, pelo plexo cardíaco profundo e por alguns nódulos linfáticos. Lateralmente à porção cervical da traqueia encontramos os lobos da glândula tiróide, as artérias carótidas comuns e as artérias tiróides inferiores. Já lateralmente e à direita da porção torácica da traqueia, encontramos o pulmão direito, a pleura, a veia braquiocefálica direita, a veia cava superior, o nervo vago direito e a veia ázigos. Por outro lado, encontramos à esquerda, a crossa da aorta e as artérias carótida comum e subclávia esquerda. O nervo laríngeo recorrente encontra-se, inicialmente por entre a traqueia e o arco aórtico, ascendendo depois no sulco entre a traqueia e o esófago.
Vascularização A traqueia é irrigada por ramos das artérias tiróides inferiores, sendo que a porção torácica da traqueia é ainda irrigada por ramos das artérias bronquiais, que ascendem para se anastomosar com os ramos traqueais das artérias tiróides inferiores. Já as veias que drenam a traqueia terminam no plexo venoso tiróide inferior.
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Brônquios Os brônquios principais, direito e esquerdo, diferem em comprimento, diâmetro e ângulo formado com a traqueia. Cada brônquio principal divide-se em brônquios lobares, sendo que os ramos primários dos brônquios lobares esquerdo e direito são designados por brônquios segmentais, porque cada um se ramifica numa unidade de tecido pulmonar, estruturalmente separada e funcionalmente independente – o segmento broncopulmonar. De referir que cada segmento bronco-pulmonar não é uma unidade vascular completa, com um brônquio individual, uma artéria e uma veia – várias estruturas venosas não se encontram somente num segmento, mas entre estes, drenando segmentos adjacentes.
Brônquio principal direito O brônquio principal direito tem um comprimento de cerca de 2,5 cm, tendo um maior diâmetro e formando um ângulo de 155º com a traqueia (é por isso, mais vertical que o esquerdo). Isto explica porque é que corpos estranhos inalados entram no brônquio principal direito, mais frequentemente que no esquerdo. O brônquio principal direito dá o seu primeiro ramo, o brônquio lobar superior, entrando depois no pulmão direito. A veia ázigos cruza-se sobre este brônquio e a artéria pulmonar direita encontra-se inicialmente inferior e depois anterior a este. Depois de dar o brônquio lobar superior, que parte posterosuperiormente à artéria pulmonar direita, o brônquio principal direito entra no hilo pulmonar, posteroinferiormente nesta estrutura, dividindo-se em brônquios lobares inferior e médio.
☤ Por vezes, podemos encontrar anomalias na anatomia dos brônquios, que podem consistir em vias aéreas adicionais ou deslocadas. Essas anomalias incluem uma origem comum para os brônquios lobares superior e médio direito, a presença de um brônquio cardíaco acessório e um brônquio lobar inferior direito a partir do brônquio principal esquerdo. Essas variações anatómicas são normalmente assintomáticas, mas podem resultar em infecções recorrentes, expectoração sanguínea e dilatação dos brônquios.
Brônquio lobar superior direito O brônquio lobar superior direito parte da região lateral do brônquio principal direito e desloca-se superolateralmente, para entrar no hilo pulmonar, dividindo-se a 1 cm da sua origem em três brônquios segmentais. O brônquio segmental apical continua-se superolateralmente, até ao ápice do pulmão, que abrange, e divide-se, perto da sua origem, em ramos apical e anterior. O brônquio segmental posterior abrange a porção posteroinferior do lobo superior, desloca-se posterolateralmente e ligeiramente superiormente, e divide-se rapidamente num ramo posterior e num ramo lateral. Por último, o brônquio segmental anterior desloca-se anteroinferiormente, abrangendo a restante porção do lobo superior e dividindo-se, perto da sua origem, num ramo anterior e num ramo lateral.
Brônquio lobar médio direito O brônquio lobar médio direito parte a 2 cm, inferiormente, ao brônquio lobar superior, descendo anterolateralmente e rapidamente dividindo-se em brônquios segmentais lateral e medial, que vão para as porções lateral e medial, do lobo médio.
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Brônquio lobar inferior direito O brônquio lobar inferior direito é a continuação do brônquio principal direito, dando o brônquio segmental superior (apical), ao nível da sua origem, ou um pouco inferiormente a esta. O brônquio segmental superior desloca-se posteriormente até à porção superior do lobo inferior, dividindo-se em ramos superior, medial e lateral (os dois primeiros normalmente partem de um tronco comum). Depois de dar o ramo segmental superior, o brônquio lobar inferior direito desce posterolateralmente, dando, a partir da sua região anteromedial, o brônquio segmental basal medial, que abastece uma pequena região inferior ao hilo. O brônquio lobar inferior continua-se, então, inferiormente, dividindose num brônquio segemental basal anterior, que desce anteriormente, e num tronco, que se divide num brônquio segmental basal lateral e num brônquio segmental basal posterior (estas estruturas descem lateral e posteriormente, respectivamente). Em mais de metade dos pulmões direitos, um brônquio segmental subsuperior (subapical) parte posteriormente do brônquio lobar inferior direito, entre 1 a 3 cm, inferiormente à origem do brônquio segmental superior. De referir que, o brônquio segmental subsuperior encontra-se distribuído para a região do pulmão, por entre os segmentos basais posterior e superior.
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Brônquio principal esquerdo O brônquio principal esquerdo apresenta um comprimento de cerca de 5 cm, desde a origem até ao seu primeiro ramo (o brônquio lobar superior esquerdo), sendo mais estreito que o direito e formando com a traqueia um ângulo de cerca de 135º. Inicia-se ao nível da quinta vértebra torácica e encontra-se, no princípio, imediatamente anterior ao esófago e canal torácico, deslocando-se inferolateralmente, anteriormente à aorta descendente. A artéria pulmonar superior é inicialmente anterior ao brônquio, sendo depois superior, na região do hilo do pulmão, ao nível da sexta vértebra torácica. Aí, o brônquio principal esquerdo divide-se em brônquios lobares superior e inferior.
Brônquio lobar superior esquerdo O brônquio lobar superior esquerdo parte da região anterolateral do brônquio principal esquerdo, deslocando-se lateralmente e dividindo-se rapidamente em dois brônquios, correspondentes aos ramos do brônquio principal direito, no sentido da área abrangida. A divisão superior ascende 1 cm e dá um brônquio segmental anterior, continua-se mais 1 cm como brônquio segmental apicoposterior, dividindo-se depois em ramo apical e posterior. Já a divisão inferior, desloca-se anterolateralmente até à porção anteroinferior do lobo superior esquerdo (a língula), formando o brônquio lingular, que se divide depois em brônquios segmentais lingulares superior e inferior.
Brônquio lobar inferior esquerdo Já o brônquio lobar inferior esquerdo desloca-se posterolateralmente e divide-se para abranger os territórios pulmonares abrangidos pelo brônquio lobar inferior direito. Este brônquio dá um brônquio segmental superior (apical) a 1 cm da sua origem, na sua região posterior. Após mais 1 ou 2 cm, o brônquio lobar inferior divide-se num tronco anteromedial e num tronco posterolateral. Este último divide-se em brônquios segmentais basal lateral e basal posterior. Por vezes, do brônquio lobar inferior parte um brônquio segmental basal anterior. É possível também, que um brônquio segmental subsuperior (subapical) parta posteriormente do brônquio lobar inferior esquerdo.
Irrigação arterial A irrigação arterial dos brônquios provém das artérias bronquiais, que são ramos da aorta torácica, quer directamente, quer indirectamente. A artéria bronquial direita é, normalmente, um ramo da terceira artéria intercostal posterior. Já do lado esquerdo, existem normalmente duas artérias bronquiais, uma superior e uma inferior, que partem separadamente da aorta torácica. As artérias bronquiais acompanham a árvore bronquial, formando um plexo capilar na túnica muscular das passagens aéreas e irrigando a parede bronquial até aos bronquíolos respiratórios, anastomosando-se com ramos das artérias pulmonares, ao nível das paredes dos brônquios mais pequenos e da pleura visceral. Outros ramos arteriais ramificam-se no tecido conjuntivo interlobular e a maioria termina em veias bronquiais superficiais ou profundas, formando plexos capilares subpleurais.
Drenagem venosa A drenagem venosa é assegurada pelas veias bronquiais, existindo duas de cada lado. As veias bronquiais drenam sangue dos brônquios maiores e das estruturas do hilo, formando dois sistemas – as veias bronquiais profundas iniciam-se como plexos bronquiolares intrapulmonares que comunicam
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II livremente com as veias pulmonares e que se juntam num tronco único que pode terminar na veia pulmonar principal. Já as veias bronquiais superficiais drenam os brônquios extrapulmonares, a pleura visceral e os nódulos linfáticos do hilo. Estas veias também comunicam com as veias pulmonares, mas terminam na veia ázigos, do lado direito, e na veia hemiázigos acessória, ou na veia intercostal suprema, do lado esquerdo. De referir que, as veias bronquiais não recebem todo o sangue conduzido pelas artérias bronquiais, porque algum deste entra nas veias pulmonares.
Inervação A traqueia e os brônquios são inervados pelos plexos pulmonares anterior e posterior, estando estes plexos interconectados. A traqueia é inervada por ramos do nervo vago, do nervo laríngeo recorrente e do tronco simpático. Os nervos entram no pulmão, como redes que se deslocam “à boleia” de ramos dos brônquios e dos vasos bronquiais e pulmonares, até à pleura visceral.
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Pulmões Os pulmões encontram-se situados, lateralmente ao coração e a outros conteúdos do mediastino. Cada pulmão é livre na sua cavidade pleural, excepto para se ligar ao coração e à traqueia, pelo hilo e pelo ligamento pulmonar, respectivamente. O pulmão é uma estrutura semi-cónica, que apresenta um ápice, uma base, três bordos e duas faces. O pulmão encontra-se suspenso na cavidade torácica pela raiz do pulmão, que é constituída pelas estruturas que entram e saem do hilo do pulmão. A raiz encontra-se entre o quinto e o sétimo espaço intercostal – anteriormente à raiz encontra-se o nervo frénico e o plexo pulmonar inferior; posteriormente, encontra-se o nervo vago e o plexo pulmonar posterior e inferiormente encontra-se o ligamento pulmonar.
☤ O pulmão adulto direito pesa normalmente cerca de 625 g, enquanto o esquerdo pesa 565 g. Em proporção com a estrutura corporal, os pulmões são mais pesados nos indivíduos do sexo masculino.
Bordos e faces Ápice O ápice é a extremidade superior e arredondada do pulmão. Este projecta-se sobre o inlet torácico, onde contacta com a pleura cervical e está coberto pela membrana suprapleural. Uma vez que o inlet torácico é oblíquo, o ápice ascende 3-4 cm, até ao nível da primeira cartilagem costal. Posteriormente ao ápice do pulmão, encontramos o colo da primeira costela, sendo que o seu ponto mais superior se encontra a 2,5 cm sobre o terço médio da clavícula, encontrando-se por isso, na raiz do pescoço. A artéria subclávia cruza superior e lateralmente, sobre a membrana suprapleural, sulcando a face anterior do ápice, perto do seu ponto mais alto e separando-o do escaleno anterior. Já o gânglio simpático cervico-torácico, o ramo ventral do primeiro nervo espinhal torácico e a artéria intercostal suprema encontram-se posteriormente ao ápice. Lateralmente, encontramos o escaleno médio. A artéria braquiocefálica, a veia braquiocefálica direita e a traqueia encontram-se adjacentes à face medial direita do pulmão, enquanto a artéria subclávia esquerda e a veia braquiocefálica esquerda são adjacentes à região medial esquerda do ápice do pulmão.
Base A face basal do pulmão apresenta uma forma semilunar, sendo côncava e estando sobre a face superior do diafragma, que separa o pulmão direito do lobo direito do fígado e o pulmão esquerdo do lobo esquerdo do fígado, do baço e do fundo gástrico. Uma vez que, o diafragma se estende mais
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II superiormente à direita, que à esquerda, a concavidade da face basal dos pulmões é mais acentuada na base do lado direito. Posterolateralmente, a base apresenta um bordo aguçado, que se projecta um pouco para o recesso costodiafragmático.
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Face costal A face costal do pulmão é mole e convexa, contacta com a pleura costal e apresenta uma face adaptada à da parede torácica, sendo mais profunda posteriormente. Ao longo da face costal encontramos vários sulcos costais, provocados pelas costelas.
Face medial A face medial apresenta uma porção vertebral (posterior) e uma porção mediastínica (anterior). A porção vertebral encontra-se em contacto com os lados das vértebras torácicas e respectivos discos intervertebrais, com os vasos intercostais posteriores e com os nervos esplâncnicos. Já a porção mediastínica é profundamente côncava, pois encontra-se adaptada ao coração, na impressão cardíaca, que é maior e mais profunda no pulmão esquerdo. Posterosuperiormente, a esta concavidade, encontra-se o hilo pulmonar, com uma forma aproximadamente triangular, por onde várias estruturas entram ou abandonam o pulmão, rodeadas colectivamente por uma porção de pleura, que também se estende inferiormente ao hilo e posteriormente à impressão cardíaca, como ligamento pulmonar.
Impressões na superfície pulmonar Os pulmões apresentam várias impressões e sulcos originados por estruturas adjacentes. No pulmão direito, a impressão cardíaca relaciona-se com a face anterior da aurícula direita, com a face anterolateral da aurícula direita e, parcialmente, com a face anterior do ventrículo direito. A impressão ascende anteriormente ao hilo, como o sulco para a veia cava superior e para a veia braquiocefálica direita. Posteriormente, junta-se a este sulco, um sulco profundo que se arqueia anteriormente, sobre o
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II hilo pulmonar e que é designado por sulco da veia ázigos. Posteriormente ao hilo e ao ligamento pulmonar, encontramos um sulco vertical, que se inclina para a esquerda, em direcção ao diafragma – o sulco esofágico. Posteroinferiormente, a impressão cardíaca é confluente com o sulco para a veia cava inferior, pequeno e largo. Por entre o ápice e o sulco para a veia ázigos, a traqueia e o nervo vago direito encontram-se próximos do pulmão, não o sulcando. No pulmão esquerdo, a impressão cardíaca relaciona-se com as faces anterior e lateral do ventrículo esquerdo e da aurícula esquerda. A face infundibular anterior e a porção adjacente do ventrículo direito relacionam-se igualmente com o pulmão, quando este ascende em frente ao hilo, para acomodar o tronco pulmonar. No pulmão esquerdo é passível de ser observado um grande sulco, que se arqueia sobre o hilo e desce posteriormente a esta estrutura e ao ligamento pulmonar – o sulco aórtico (para a crossa da aorta e para a aorta descendente). A partir da crossa da aorta, o sulco subclávio, de natureza mais estreita, ascende até ao ápice do pulmão. Posteriormente a este sulco e sobre o sulco aórtico, o pulmão contacta com o canal torácico e com o esófago, sendo um sulco esofágico, passível de ser identificado. Em frente ao sulco subclávio, encontramos ainda uma ténue depressão linear para a veia braquiocefálica.
Bordos pulmonares O bordo inferior é estreito e aguçado, na região que separa a base da face costal do pulmão. Este bordo estende-se para o recesso costodiafragmático, sendo mais arredondado medialmente, onde divide a base da face mediastínica. Este bordo corresponde a uma linha desenhada do ponto inferior do bordo anterior (que passa ao nível
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II da sexta costela), até à linha médio-clavicular e que depois se continua, até à oitava costela, ao nível da linha médio-axilar, continuando-se, posterosuperomedialmente até um ponto 2 cm lateral à décima espinha torácica. O bordo posterior separa a face costal da face mediastínica e corresponde às cabeças das costelas. Não apresenta características particulares, sendo uma junção arredondada das faces costal e vertebral. Por fim, o bordo anterior é fino e aguçado, sobrepondo-se ao pericárdio. Do lado direito, corresponde, quase à linha costomediastínica da reflexão pleural, sendo quase vertical. Já do lado esquerdo, é similar até à quarta cartilagem costal, inferiormente à qual, apresenta uma incisura cardíaca variável, cujo bordo não atinge a linha de reflexão pleural. Dessa forma, o pericárdio apenas está coberto nessa região por uma dupla camada de pleura.
Fissuras, lobos pulmonares e segmentos bronco-pulmonares Fissuras e lobos pulmonares do pulmão direito O pulmão direito encontra-se dividido em lobos superior, médio e inferior por duas fissuras – uma fissura horizontal e uma fissura oblíqua. A fissura oblíqua é superior e separa o lobo inferior dos restantes, correspondendo à fissura oblíqua do pulmão esquerdo, embora seja menos vertical. No bordo posterior, esta fissura encontra-se quer ao nível da espinha de T4, quer ligeiramente inferior. Desce ao longo do quinto espaço intercostal e segue até ao nível da sexta junção costocondral. Já a fissura horizontal é mais pequena e separa os lobos médio e superior. Passa anteriormente desde a fissura oblíqua, perto da linha médio-axilar, até ao bordo anterior do pulmão, ao nível da extremidade esternal da quarta cartilagem costal. Passa então, posteriormente, até ao hilo, na face mediastínica. Relativamente aos lobos, o lobo médio é pequeno e apresenta forma em cunha. Este lobo inclui parte da face costal, a porção inferior do bordo anterior e a porção anterior da base do pulmão. Por vezes, a porção medial do lobo superior, encontra-se parcialmente separada por uma fissura de profundidade variável, que contém a porção terminal da veia ázigos, o que forma o “lobo da veia ázigos”, que por vezes inclui o ápice do pulmão. Embora sejam menos comuns, outras variações incluem a presença de uma fissura acessória inferior, a separar o segmento basal medial do resto do lobo inferior; ou de uma fissura acessória superior, que separa o segmento apical do lobo inferior dos segmentos basais.
☤ A identificação de fissuras incompletas é importante, antes de se fazer uma lobectomia. Isto porque indivíduos com fissuras incompletas são mais susceptíveis ao desenvolvimento de fugas de ar pós-operatórias, podendo requerer procedimentos adicionais.
Fissuras e lobos pulmonares do pulmão esquerdo O pulmão esquerdo encontra-se dividido num lobo superior e num lobo inferior, por uma fissura oblíqua, que se estende das faces costal à medial do pulmão, quer superiormente, quer inferiormente, ao hilo pulmonar. Superficialmente, esta fissura inicia-se na face medial, na porção posterosuperior do hilo. Ascende depois obliquamente e posteriormente, para cruzar o bordo posterior do pulmão, a 6 cm inferiormente ao ápice, descendo depois ao longo da face costal, para atingir o bordo inferior, quase na sua extremidade anterior. Por fim, a fissura oblíqua ascende na face medial do pulmão, até à porção inferior do hilo. A fissura oblíqua esquerda é normalmente mais vertical que a direita, sendo indicada aproximadamente, pelo bordo medial da omoplata, quando o braço se encontra em abdução total. Por vezes, é possível
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II encontrar uma fissura horizontal esquerda. Anterosuperiormente à fissura oblíqua, encontramos o lobo superior, que inclui o ápice, o bordo anterior e a maior parte das faces costal e medial. Na extremidade inferior da incisura cardíaca, encontramos, frequentemente, uma pequena apófise – a língula. Já o lobo inferior é maior e encontra-se posteroinferiormente à fissura, contribuindo para a quase totalidade da base, para grande parte da face costal e para a maior parte do bordo posterior do pulmão.
Segmentos bronco-pulmonares Como referido, cada brônquio segmentar abastece um segmento bronco-pulmonar. Os segmentos principais encontram-se agrupados pelos lobos e são designados e numerados de acordo com a classificação seguinte: Pulmão direito Lobos Lobo superior Lobo médio Lobo inferior
Segmentos I – apical; II – posterior; III - anterior IV – lateral; V - medial VI – superior (apical); VII – basal medial; VIII – basal anterior; IX – basal lateral; X – basal posterior
Pulmão esquerdo Lobos Lobo superior Lobo inferior
Segmentos I – apical; II – posterior; III – anterior; IV – lingular superior; V – lingular inferior VI – superior (apical); VIII – basal anterior; IX – basal lateral; X – basal posterior
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Lóbulos pulmonares secundários Em cada segmento bronco-pulmonar, vão ocorrendo subdivisões progressivas dos brônquios, que se vão tornando cada vez mais pequenos. Os brônquios intrapulmonares são envoltos por lâminas cartilagíneas, cujo tamanho vai também progressivamente decrescendo, até desaparecer por completo, quando os tubos ficam com menos de um milímetro de diâmetro. Aí, os brônquios passam a designar-se por bronquíolos. O bronquíolo terminal é o mais periférico, não apresentando alvéolos na sua parede, distalmente ao qual, encontramos um ácino, que consiste em três ou quatro ordens de bronquíolos respiratórios, que conduzem a entre três a oito ordens de canais alveolares. As paredes desses canais consistem em sacos alveolares. O lóbulo primário do pulmão é a porção pulmonar distal ao bronquíolo respiratório, enquanto o lóbulo secundário é a sub-secção mais pequena de tecido pulmonar periférico, delimitado por um septo de tecido conjuntivo e consistindo em aproximadamente seis bronquíolos terminais.
Irrigação arterial Os pulmões apresentam dois circuitos circulatórios funcionalmente distintos. Os vasos pulmonares transportam sangue pobre em oxigénio para as paredes alveolares e drenam sangue rico em oxigénio para a região esquerda do coração. Por outro lado, os vasos bronquiais, que apresentam menores dimensões, derivam da circulação sistémica e fazem a oxigenação dos tecidos pulmonares que não têm acesso directo ao oxigénio atmosférico, tais como os tecidos dos brônquios e dos bronquíolos de maiores dimensões. A artéria pulmonar bifurca-se em artérias pulmonar direita e esquerda, que passam pelos respectivos hilos pulmonares. A artéria pulmonar direita dividese em dois grandes ramos, ao emergir posteriormente à veia cava superior, sendo essa bifurcação, normalmente ocupada por um nódulo linfático. O ramo superior, que é o mais pequeno, irriga o lobo superior, dividindo-se depois em dois outros ramos, que irrigam a maioria desse lobo. O ramo inferior, por sua vez, desce anteriormente ao brônquio intermédio e imediatamente posterior à veia pulmonar superior. Dá um ramo recorrente para o lobo inferior e, na região em que a fissura horizontal cruza a fissura oblíqua, um ramo para o lobo médio, anteriormente, e um ramo para o lobo inferior, posteriormente. Este ramo continua-se e divide-se, de modo as irrigar o resto dos segmentos lobares inferiores. Já a artéria pulmonar esquerda emerge da concavidade da crossa da aorta e desce anteriormente à aorta descendente, para entrar na fissura oblíqua, sendo os seus ramos altamente variáveis. O primeiro
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II e maior ramo é, normalmente, dado para o segmento anterior do lobo superior esquerdo. Antes de atingir a fissura oblíqua, a artéria pulmonar dá ainda um número variável de outros ramos para o lobo superior e, ao entrar na fissura, normalmente envia um grande ramo para o segmento superior do lobo inferior. Dentro da fissura, partem vários ramos lingulares, sendo que a restante porção do lobo inferior é irrigada por ramos que podem partir das mais variadas maneiras. De referir que, no tecido pulmonar, os ramos dados pelas artérias pulmonares acompanham os brônquios segmentais e sub-segmentais, encontrando-se, normalmente, dorsolateralmente a estes. Os capilares pulmonares formam plexos, imediatamente no exterior do epitélio das paredes e septos dos alvéolos e sacos alveolares, sendo que cada plexo forma uma única camada no septo interalveolar, cujos capilares apresentam paredes extremamente finas.
Veias pulmonares Existem normalmente quatro veias pulmonares (duas de cada pulmão), que são desprovidas de válvulas e se originam de redes capilares nas paredes alveolares e fazem o retorno de sangue oxigenado para o átrio esquerdo. Todas as tributárias principais das veias pulmonares recebem tributárias mais pequenas, quer intra-, quer intersegmentais, que se vão juntando, formando um tronco único em cada lobo (ou seja, três no pulmão direito e duas no pulmão esquerdo). De resto, as veias mais pequenas deslocam-se independentemente das artérias e dos brônquios, enquanto os vasos de maior calibre, por estas formados, acompanham as artérias e os tubos bronquiais até ao hilo pulmonar. Ao nível do hilo pulmonar, a veia pulmonar superior é anteroinferior à artéria pulmonar e a veia pulmonar inferior é a estrutura hilar mais inferior, sendo também ligeiramente posterior. Do lado direito, a união das veias apical, anterior e posterior (que drenam o lobo superior) com uma veia lobar média (formada por tributárias medial e lateral) formam a veia pulmonar superior direita. Já a veia pulmonar inferior direita é formada pela união hilar da veia basal comum (formada pela união das veias basal superior e inferior) com a veia apical, provenientes do lobo inferior. Já do lado esquerdo, a veia pulmonar superior esquerda, que drena o lobo superior, é formada pela união das veias apicoposterior (que drena os segmentos posterior e apical), anterior e lingular. Por outro lado, a veia pulmonar inferior esquerda, que drena o lobo inferior, é formada pela união hilar de duas veias – a veia superior (apical) e basal comum (esta última formada pela união de uma veia basal superior com uma veia basal inferior). Quer a veia pulmonar superior esquerda, quer a inferior esquerda, passam anteriormente à aorta torácica descendente. Por vezes, as duas veias pulmonares esquerdas formam um tronco único ou pode existir uma terceira veia pulmonar, devido à presença de uma veia lobar acessória.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II As veias pulmonares direita e esquerda perfuram o pericárdio fibroso e abrem-se separadamente na região posterosuperior do átrio esquerdo. As suas terminações encontram-se separadas centralmente pelo seio pericárdio oblíquo e, lateralmente, pelos recessos venosos pulmonares, que se dirigem medial e superiormente.
Inervação O sistema nervoso autónomo controla vários aspectos da funcionalidade da passagem aérea, nomeadamente a regulação da secreção de muco das glândulas submucosas, a permeabilidade vascular e o fluxo sanguíneo. Anteriormente e posteriormente a outras estruturas hilares dos pulmões, encontramos dois plexos pulmonares – o plexo anterior e o plexo posterior. O plexo pulmonar anterior é pequeno e é formado por ramos vagais e dos nervos cardíacos cervicais do simpático. Já o plexo pulmonar posterior é formado por ramos dos nervos vago e por ramos cardíacos simpáticos do segundo ao quinto ou sexto gânglios simpáticos torácicos. O plexo esquerdo também recebe ramos do nervo laríngeo recorrente esquerdo.
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Pleura Cada pulmão encontra-se coberto por pleura, uma membrana serosa disposta como um saco invaginado fechado. A pleura visceral ou pulmonar adere firmemente à superfície pulmonar e às suas fissuras interlobares. A sua continuação, a pleura parietal, delimita a metade correspondente da parede torácica e cobre a maior parte do diafragma e as estruturas que ocupam a região média do tórax. A pleura parietal apresenta diferentes regiões, que apresentam um nome diferente. A pleura costovertebral delimita a face interna da parede torácica e os corpos vertebrais. A pleura diafragmática encontra-se na face torácica do diafragma, enquanto a pleura cervical encontra-se sobre os ápices pulmonares (sendo também designada por “cúpula da pleura”). Por fim, a pleura mediastínica é a região da pleura relacionada com as estruturas que se encontram por entre os pulmões (no mediastino). As pleuras visceral e parietal são contínuas uma com a outra, ao nível das estruturas hilares, mantendose em contacto através do seu deslizamento, em todas as fases da respiração. O espaço potencial por entre as duas porções da pleura é designado por cavidade pleural, que é mantida por uma pressão negativa, por exemplo, por acção da retracção elástica do pulmão. Os sacos pleural direito e esquerdo formam compartimentos separados, apenas contactando, posteriormente à metade superior do corpo esternal, embora estas estruturas estejam também próximas posteriormente ao esófago, ao nível médio-torácico. A região por entre estes sacos é designada por mediastino (espaço interpleural). A cavidade pleural esquerda é a mais pequena das duas, porque o coração estende-se mais para a esquerda. Os limites superior e inferior das pleuras são aproximadamente iguais em ambos os lados, embora a pleura esquerda, por vezes, se encontre a um nível mais inferior, na linha médio-axilar.
Pleura parietal Pleura costovertebral A pleura costovertebral delimita o esterno, as costelas, o músculo transverso do tórax, os músculos intercostais e os lados dos corpos vertebrais, sendo facilmente separada destas estruturas. Externamente à pleura, encontra-se uma fina camada de tecido conjuntivo solto – a fáscia endotorácica (análoga à fáscia transversalis da parede abdominal). Anteriormente, a pleura costal inicia-se posteriormente ao esterno, onde é contínua com a pleura mediastínica, ao longo de uma junção que se estende desde posteriormente à articulação esternoclavicular até medialmente e posteriormente ao ângulo esternal. A partir daqui, as pleuras costais esquerda e direita descem em contacto uma com a outra, até ao nível da quarta cartilagem costal, nível a partir da qual elas divergem. Do lado direito, a pleura costal desce até à articulação xifo-esternal, enquanto do lado esquerdo, a pleura costal diverge lateralmente e desce até à sexta cartilagem costal, formando a incisura cardíaca. De cada lado, a
102
Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II pleura costal desloca-se lateralmente, delineando as faces internas das cartilagens costais, costelas, transverso do tórax e músculos intercostais. Posteriormente, passa sobre a cadeia do simpático para chegar aos lados dos corpos vertebrais, onde é contínua com a pleura mediastínica. A pleura costovertebral é contínua com a pleura cervical no bordo interno da primeira costela e torna-se contínua com a pleura diafragmática ao longo de uma linha, que à direita inicia-se posteriormente à apófise xifóide, passa posteriormente à sétima cartilagem costal até atingir o bordo superior da espinha da décima-segunda vértebra torácica (após ter cruzado a décima-segunda costela). Já do lado esquerdo, a linha inicialmente segue a porção ascendente da sexta cartilagem costal, mas depois segue um percurso similar à da direita.
Pleura diafragmática Já a pleura diafragmática é uma camada fina e fortemente aderente, que cobre a maior parte da superfície superior do diafragma. Esta estrutura é contínua com a pleura costal e na sua região medial e é contínua com a pleura mediastínica, ao longo da linha de fixação do pericárdio ao diafragma.
Pleura cervical A pleura cervical, por sua vez, é uma continuação da pleura costovertebral, ao nível do ápice pulmonar. Esta estrutura ascende medialmente, desde o bordo interno da primeira costela até ao ápice do pulmão, nomeadamente, até ao bordo inferior do colo da primeira costela. Depois, a pleura cervical desce lateralmente à traqueia, tornando-se a pleura mediastínica. A pleura cervical é reforçada por uma membrana suprapleural fascial, que está fixa em frente ao bordo interno da primeira costela e, posteriormente, ao bordo anterior da apófise transversa da sétima vértebra cervical. Esta membrana contém algumas fibras musculares, relacionadas com os escalenos, nomeadamente o escaleno mínimo, que se estende do bordo anterior da apófise transversa de C7 até ao bordo interno da primeira costela, posteriormente ao sulco para artéria subclávia. Em termos de funções, o músculo escaleno mínimo aumenta a tensão na doma pleural.
Pleura mediastínica Por fim, a pleura mediastínica é a fronteira lateral do mediastino, formando uma superfície contínua, que se estende do esterno até à coluna vertebral, sobre o hilo do pulmão. Do lado direito, a pleura mediastínica cobre a veia braquiocefálica, a porção superior da veia cava superior, a porção terminal da veia ázigos, os nervos vago e frénico direito, a traqueia e o esófago. Já do lado esquerdo, esta pleura cobre a crossa da aorta, os nervos vago e frénico esquerdos, a veia braquiocefálica esquerda, as veias intercostais esquerdas, a artéria carótida comum esquerda, a artéria subclávia, o canal torácico e o esófago. No hilo do pulmão, a pleura mediastínica desloca-se lateralmente, formando um tubo que envolve as estruturas hilares, sendo contínua com a pleura pulmonar.
Pleura visceral A pleura visceral ou pulmonar é altamente aderente a todas as superfícies do pulmão, incluindo as das fissuras, com excepção do hilo do pulmão e ao longo de uma linha que desce desta estrutura e que assinala a inserção do ligamento pulmonar.
Ligamentos pulmonares inferiores Inferiormente ao hilo pulmonar, a pleura mediastínica estende-se como ligamento pulmonar, uma dupla camada que vai desde a face lateral do esófago até à face mediastínica do pulmão, onde é
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II contínuo com a pleura parietal. Inferiormente, este ligamento termina como um bordo livre, em forma de foice.
Recessos pleurais A pleura estende-se consideravelmente posteriormente ao bordo inferior do pulmão, mas não até à zona de fixação do diafragma, o que significa que o diafragma contacta com as cartilagens costais e com os músculos intercostais, inferiormente à linha de reflexão pleural, desde a parede torácica até ao diafragma. Na inspiração normal, o bordo inferior do pulmão não atinge esta linha de reflexão e as pleuras costal e diafragmática encontram-se separadas pelo estreito recesso costodiafragmático. Um recesso costomediastínico existe posteriormente ao esterno e às cartilagens costais, onde o bordo anterior do pulmão não atinge a linha de reflexão pleural.
Vascularização da pleura A pleura parietal é irrigada de forma diferente, consoante as suas porções. A pleura costovertebral é irrigada por ramos das artérias torácica interna e intercostais, enquanto a pleura mediastínica é irrigada por ramos das artérias bronquiais, diafragmática superior, torácica interna e mediastínica. Já a pleura cervical é irrigada por ramos da artéria subclávia e, por fim, a pleura diafragmática é vascularizada pela parte superficial da microcirculação do diafragma. No que concerne à drenagem venosa, as veias drenam em veias sistémicas na parede torácica, que por sua vez drenam na veia cava superior. A pleura visceral forma parte integral do pulmão e, como tal, a sua drenagem venosa e irrigação arterial provém dos vasos bronquiais.
Inervação da pleura A pleura diafragmática, na sua porção periférica, e a pleura costal são inervadas pelos nervos intercostais, enquanto as pleuras mediastina e a porção central da pleura diafragmática são inervadas pelo nervo frénico. A pleura visceral, por sua vez, é inervada por aferentes viscerais que se deslocam ao longo dos vasos bronquiais com as fibras autónomas.
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3. Coração e grandes vasos Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Coração O coração é um órgão muscular envolto num saco fibroseroso, o pericárdio, situado no mediastino médio e disposto obliquamente no tórax. O coração encontra-se ao nível de T6-T9, num indivíduo em posição erecta, e encontra-se posteriormente ao corpo do esterno, entre os dois sacos pleurais. Em termos de forma, o coração é, de grosso modo, piramidal, sendo um pouco achatado, nas regiões anterior e posterior. O seu grande eixo desloca-se anteriormente, para a esquerda e um pouco inferiormente. O coração apresenta ainda um ápice, uma base (face posterior) e três faces (face esternocostal, diafragmática e esquerda ou pulmonar). Já quanto a dimensões, o coração adulto apresenta 12 cm da base ao ápice, 8-9 cm no seu diâmetro transverso mais largo e 6 cm anteroposteriormente. O seu peso médio é de 300 g nos indivíduos do sexo masculino e de 250 g nos indivíduos do sexo feminino. O interior do coração encontra-se separado por um septo longitudinal posicionado obliquamente. Cada porção consiste numa câmara posterior, a aurícula (que recebe o sangue proveniente das veias) e num compartimento anterior, o ventrículo (que ejecta o sangue a partir do coração). Externamente, o sulco coronário indica o local de separação das aurículas relativamente aos ventrículos, enquanto internamente, essas passagens são asseguradas pelos orifícios aurículo-ventriculares, que apresentam válvulas, que permitem a passagem de sangue das aurículas para os ventrículos, mas impedem o seu retorno em sentido inverso. Em termos de porções, a porção direita do coração (“coração direito”) forma também a maior parte da porção anterior do coração (excepto uma faixa do lado esquerdo, incluindo o ápice). Já o “coração esquerdo” é sobretudo posterior.
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Fluxo sanguíneo no coração A porção esquerda do coração tem um funcionamento fisiologicamente separado da porção direita. Esta última inicia-se na aurícula direita, recebendo as veias cavas superior e inferior, bem como sangue venoso do próprio coração, proveniente do seio coronário. O sangue venoso proveniente da circulação sistémica atravessa, então o orifício aurículo-ventricular direito (onde está presente a válvula tricúspide), para entrar no ventrículo direito. A contracção deste ventrículo, nomeadamente do seu componente trabecular apical, fecha a válvula tricúspide e permite a ejecção do sangue para o tronco pulmonar. O sangue flui então para a circulação pulmonar com baixa resistência. Já a porção esquerda do coração inicia-se na aurícula esquerda, que recebe o fluxo pulmonar de sangue oxigenado e algum fluxo de veias coronárias. O sangue atravessa o orifício auriculoventricular esquerdo, guardado pela válvula mitral, e entra no ventrículo esquerdo. A contracção deste ventrículo, nomeadamente do seu componente trabecular apical, fecha a válvula mitral, abre a válvula aórtica e permite a ejecção do sangue para a artéria aorta e o sangue flui então para a circulação sistémica. De referir que a porção esquerda do coração apresenta uma organização estrutural mais maciça e a fase de ejecção no ventrículo esquerdo é menor que no direito, embora as variações de pressão sejam maiores.
Sulcos da superfície cardíaca O sulco coronário, ou aurículo-ventricular desloca-se obliquamente em torno do coração e separa uma porção auricular, posterosuperior, de uma porção ventricular, anteroinferior. Este sulco contém os troncos principais das artérias coronárias, descendo para a direita, na face esternocostal e separando a aurícula direita do bordo oblíquo direito do ventrículo direito. A sua porção superior e esquerda é interrompida, onde é cruzada pelo tronco pulmonar e, posteriormente, pela aorta. Ainda mais à esquerda, o sulco curva-se em torno do bordo obtuso, deslocando-se para a direita, separando a base das aurículas da face diafragmática dos ventrículos. Esta porção curva-se ao nível da extremidade inferior direita do bordo inferior, tornando-se confluente com a porção esternocostal do sulco. Na base do coração, um ténue sulco vertical assinala a separação das aurículas esquerda e direita (sulco interauricular). Já a divisão entre os ventrículos esquerdo e direito é assinalada pelos sulcos interventriculares anterior e posterior, que correspondem aos bordos murais do septo e se encontram ao nível do bordo inferior da face esternocostal, à direita do ápice do coração. O sulco interventricular anterior é quase paralelo ao bordo obtuso, enquanto o sulco posterior encontra-se próximo do ponto médio da massa ventricular.
Faces e bordos Base A base do coração é formada pelas aurículas (sobretudo pela aurícula esquerda), estando dirigida posteriormente. Esta face é mais ou menos achatada e algo quadrilateral. A base estende-se da porção
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II postero-inferior do sulco coronário (onde se encontra a principal veia do coração – o seio coronário), até às artérias pulmonares, superiormente. A base do coração encontra-se separada das quatro vértebras torácicas médias (T5-T8) pela aorta descendente, pelo esófago, pelos nervos vagos, pelo canal torácico, pelas veias ázigos e hemiázigos e pela cavidade pericárdica. Seis grandes veias entram no coração, através da sua base. As quatro veias pulmonares perfuram a aurícula esquerda, sendo que as duas veias esquerdas entram perto do bordo esquerdo da base e que as duas veias direitas entram à esquerda do sulco inter-auricular. As veias cavas superior e inferior entram para a aurícula direita, sendo que a superior entra pelo ângulo superior direito da base e a inferior, pelo seu ângulo inferior direito.
Ápice O ápice do coração é arredondado e é formado pelo ventrículo esquerdo, encontrando-se dirigido anteriormente, inferiormente e para a esquerda. Esta estrutura encontra-se coberta pelo pulmão esquerdo, pela pleura, posteriormente ao quinto espaço intercostal esquerdo, ao nível da linha médioclavicular.
Face esternocostal A face esternocostal (anterior) dirige-se anteriormente, com uma ligeiramente inclinação superior e para a esquerda, sendo formada, sobretudo pelo ventrículo direito. Encontra-se posteriormente ao corpo do esterno, às extremidades mediais da terceira à sexta cartilagens costais direitas e às porções correspondentes das cartilagens esquerdas. O pericárdio fibroso encontra-se a separar a face esternocostal dessas estruturas e dos músculos transversos do tórax. A porção ventricular desta face encontra-se inferiormente e à esquerda da porção anterosuperior do sulco coronário e está dividida pelo sulco interventricular anterior numa porção esquerda, mais pequena, e numa porção direita, de maiores dimensões. Já a porção auricular da face esternocostal é formada pela aurícula direita e pelas auriculetas de ambas as aurículas, que envolvem as raízes da aorta ascendente e do tronco pulmonar. Estes grandes vasos ascendem em frente à aurícula esquerda, de modo a que apenas a auriculeta esquerda contribua para a face esternocostal.
Face esquerda A face esquerda dirige-se superior, posteriormente e para a esquerda, consistindo quase somente no bordo esquerdo do ventrículo esquerdo, embora receba contribuições, ao nível superior, da aurícula esquerda e da sua auriculeta (auriculeta é o mesmo que apêndice auricular). Esta face é convexa e mais larga superiormente, onde é cruzada pelo sulco auriculoventricular, tornando-se mais estreita até ao ápice cardíaco. Esta face encontra-se separada do pericárdio pelo nervo frénico esquerdo e pelos vasos acompanhantes, e da pleura esquerda pela concavidade profunda do pulmão esquerdo.
Face direita A face direita é também quase toda da contribuição do bordo direito, sendo arredondada e formada pela parede da aurícula direita. Encontra-se separada da região mediastinal do pulmão direito pelo
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II pericárdio e pela pleura. Nesta face, encontramos o sulco terminal, por entre os componentes auricular e venoso da aurícula direita.
Face diafragmática A face diafragmática (inferior) do coração é altamente horizontal, deslocando-se anteroinferiormente e um pouco em direcção ao ápice. Esta face é formada pelos ventrículos, nomeadamente pelo esquerdo e encontra-se, sobretudo, sobre o tendão central, mas também numa pequena área da porção muscular esquerda do diafragma. Encontra-se separada da base anatómica do coração pelo sulco aurículoventricular e é atravessada obliquamente pelo sulco interventricular posterior.
Bordos do coração O bordo superior da aurícula esquerda corresponde ao bordo superior do coração e encontra-se imediatamente inferior à bifurcação do tronco pulmonar e do seu ramo direito. O bordo direito é ligeiramente convexo para a direita e formado pela aurícula direita, sendo por vezes marcado pelo sulco terminal, um sulco que se desloca de frente da veia cava superior para o lado direito da veia cava inferior e que corresponde internamente, à crista terminal. Já o bordo inferior é também designado por bordo agudo do coração, sendo aguçado, pouco espesso e quase horizontal. Estende-se do limite inferior do bordo direito, até ao ápice, sendo formado sobretudo pelo ventrículo direito, embora perto do ápice haja uma contribuição do ventrículo esquerdo. Os sulcos interventriculares anterior e posterior encontram-se ao nível deste bordo, numa ligeira depressão, designada por incisura apical, que se encontra um pouco à direita do ápice. Por último, o bordo esquerdo (também conhecido como bordo obtuso) assinala a transição entre a face esternocostal com a face esquerda. Este bordo é arredondado e formado, sobretudo, pelo ventrículo esquerdo, embora superiormente, receba uma pequena contribuição da auriculeta esquerda. Este bordo desce obliquamente, da aurícula até ao ápice cardíaco.
Aurículas As aurículas são de natureza cubóide, embora arredondadas na região da aorta ascendente e do tronco pulmonar. A cavidade auricular encontra-se dividida pelo septo inter-auricular, que se desloca posteriormente, desde a parede anterior até à região direita. O maior eixo de cada aurícula é vertical e apresenta uma prolongação em forma de orelha, a auriculeta, ou apêndice auricular, que se projecta anteriormente, desde o seu ângulo anterior e superior.
Aurícula direita A aurícula direita apresenta uma porção superior, que contacta com o lado direito da aorta ascendente e a sua auriculeta sobrepõe-se à face anterior da raiz desse vaso. O lado direito desta aurícula forma o lado direito do coração e encontra-se separado da pleura direita e do pulmão pelo pericárdio. Posteriormente e à esquerda, o septo inter-auricular separa a aurícula direita da aurícula esquerda. Na região posterior, dois vasos juntam-se à aurícula direita – a veia cava superior, superiormente e a veia cava inferior, inferiormente. Um pouco superiormente à região média, esta aurícula é ainda cruzada posteriormente pela veia pulmonar inferior direita.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Interior da aurícula direita As paredes da aurícula direita são delimitadas por endocárdio, sendo de natureza mole, excepto anteriormente e na auriculeta, onde fibras musculares (os músculos pectíneos) formam uma série de colunas oblíquas, que partem de um conjunto de elevações na aurícula, deslocando-se inferiormente e posteriormente, para terminar na crista terminal. Esta separa a porção posterior da aurícula, da aurícula propriamente dita. Na região posterior da aurícula direita encontra-se, superiormente, o orifício da veia cava superior e, inferiormente, o orifício da veia cava inferior. Enquanto o orifício para a veia cava superior não apresenta válvulas, o orifício para a veia cava inferior é delimitado anteriormente pela válvula da veia cava inferior. Imediatamente em frente e à esquerda dessa válvula, por entre esta e o orifício aurículo-ventricular direita, encontramos a abertura do seio coronário, guardada pela válvula do seio coronário (que é unicúspide). Já o orifício aurículo-ventricular direito encontra-se guardado pela válvula tricúspide, encontrando-se na porção anteroinferior da parede esquerda da aurícula. Dispersas pelas paredes da aurícula, encontram-se os orifícios das veias cardíacas mínimas, pequenos vasos que se asseguram de parte da drenagem venosa do coração. Posteroinferiormente ao orifício para o seio coronário, encontramos um recesso proeminente, que se encontra posteriormente à válvula da veia cava inferior. Na parede septal encontramos uma depressão oval, a fossa oval, cujo pavimento é formado pelo septum primum, do coração embrionário. Já o seu tecto é formado por um bordo elevado, o limbo da fossa oval. O limbo representa o bordo livre do septum secundum embrionário. Antes do nascimento, as duas aurículas encontram-se em comunicação através do buraco oval, sendo que no indivíduo adulto, parte desse buraco pode se ainda encontrar aberto, na região superior da fossa oval. Ao nível da parede septal, na proximidade com o ventrículo direito, encontramos ainda a porção aurículo-ventricular da porção membranosa do septo, assim designada, porque esta separa o ventrículo esquerdo da aurícula direita. Já na parede posterior da aurícula, encontramos uma ligeira elevação, por entre as aberturas das veias cavas, superiormente à porção superior da fossa oval - o tubérculo intervenoso, que se pensa ajudar a direccionar o sangue da veia cava superior até ao orifício tricúspide, durante o período fetal. Outra elevação é visível na aurícula direita – o tórus aórtico, resultante do contacto entre a aorta e a parede desta aurícula. Válvulas associadas A válvula da veia cava inferior é uma prega em forma de foice, pouco espessa e por vezes fenestrada. Esta estrutura encontra-se ligada pelo seu bordo convexo ao bordo anterior do orifício caval, enquanto o seu bordo côncavo livre é contínuo com a porção anterior do limbo da fossa oval à esquerda e com a crista terminal à direita. Já a válvula do seio coronário é uma prega semilunar de endocárdio localizada no bordo direito do orifício do seio. O seu bordo superior junta-se à válvula da veia cava inferior e a partir desta junção parte o tendão de Todaro, até ao seio septal (septo por entre o seio coronário e a fossa oval). A sua forma e tamanho são muito variáveis e pensa-se que previna o refluxo de sangue para o seio, aquando da contracção auricular.
☤ O triângulo
de Koch encontra-se por entre a valva septal da válvula tricúspide, o bordo anteromedial da abertura do seio coronário e o tendão de Todaro. Este triângulo é um ponto
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II de particularmente importante em termos cirúrgicos, indicando o local do nó auriculoventricular, um ponto de extrema importância em termos cirúrgicos, e das suas ligações auriculares.
Aurícula esquerda A aurícula esquerda apresenta uma forma irregularmente cubóide, sendo que o seu eixo maior se desloca verticalmente. Este compartimento forma a maior parte da base do coração e, posteriormente, encontra-se separada pelo pericárdio e seio oblíquo, da aorta torácica descendente e do esófago. De referir que, na parte posterosuperior desta aurícula entram as quatro veias pulmonares, duas de cada lado. O seu bordo superior encontra-se posteroinferiormente à artéria pulmonar direita e centralmente, encontra-se inferiormente à bifurcação da traqueia. Já a sua face esternocostal é côncava e encontra-se escondida pela aorta ascendente e pelo tronco pulmonar. O seu lado direito é formado pelo septo interauricular, que se dirige anteriormente e para a direita. O seu lado esquerdo forma uma pequena porção da região esquerda do coração e a sua auriculeta esquerda sobrepõese ao sulco coronário e ao lado esquerdo da raiz do tronco pulmonar. Interior da aurícula esquerda As paredes da aurícula esquerda são moles, excepto na auriculeta, onde os músculos pectíneos se encontram presentes. Os orifícios das veias pulmonares são desprovidos de válvulas, sendo que os das veias pulmonares esquerdas se encontram por detrás de uma elevação muscular, que se projecta para a aurícula (não podendo ser vistos de frente). Na parede septal pode ser encontrada uma região oval correspondente à fossa oval da
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II aurícula direita. Espalhados pelas paredes desta aurícula encontramos orifícios para as veias cardíacas mínimas e na região anterior e inferior, encontramos o orifício aurículo-ventricular esquerdo, ou orifício mitral, que se abre anteriormente e ligeiramente inferiormente e para a esquerda. Este orifício é guardado por uma válvula bicúspide, que por fazer lembrar a mitra de um bispo é designada por válvula mitral.
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Ventrículos A porção ventricular do coração forma um cone ligeiramente achatado. A sua base dirige-se posterosuperiormente e encontra-se perfurada por quatro orifícios, sendo que nesta região de transição existe tecido fibroso denso e fibrocartilagíneo, por vezes designado por esqueleto cardíaco. O septo interventricular encontra-se obliquamente disposto, com uma face virada anteriormente e para a direita e outra voltada posteriormente e para a esquerda. De referir que, os seus bordos são assinalados pelos sulcos interventriculares anterior e posterior. Ambos os ventrículos são formados por três grandes porções – uma câmara de entrada, onde chega o sangue que vem das aurículas, uma câmara de saída, por onde o sangue sai para as respectivas artérias e um componente apical trabecular, perto do ápice do coração.
Ventrículo direito O ventrículo direito forma a maior parte da face esternocostal do coração e do seu bordo inferior, mas, simultaneamente, a menor porção da face diafragmática deste órgão. Sobre este compartimento, e à sua direita, encontra-se a aurícula direita e, saindo da porção superior do ventrículo, encontramos o tronco pulmonar. De referir que, a parede do ventrículo direito apresenta um terço da espessura do esquerdo. Interior do ventrículo direito Superiormente, por entre os orifícios pulmonar e aurículo-ventricular, encontra-se um arco muscular espesso, designado por crista supraventricular. Esta crista separa a porção inferior (ou câmara de entrada), da cavidade da porção superior, também designada por infundíbulo (ou cone pulmonar, ou câmara de saída), que transporta o sangue para o tronco pulmonar. A crista supraventricular estende-se obliquamente anteriormente e para a direita, decompondo-se um limbo septal, superiormente, na parede septal interventricular e um limbo parietal na região anterolateral da parede ventricular direita. De referir que a região posterolateral da crista dá fixação à valva anterosuperior da válvula tricúspide. Na região do infundíbulo, que é formada por parte do bulbo cardíaco embrionário, a parede é mole, mas nas restantes regiões, a parede ventricular encontra-se elevada por várias projecções musculares – as trabéculas carnudas. Algumas destas trabéculas são simples elevações, enquanto outras são fibras arredondadas ligadas em cada extremidade à parede do ventrículo, mas livres na região média. O orifício aurículo-ventricular direito (também designado por orifício tricúspide) é guardado pela válvula tricúspide, também designada por válvula aurículo-ventricular direita, cujas três valvas, apresentam uma forma grosseiramente triangular e são designadas por valvas posterior, septal e anterior. Pequenas valvas acessórias estão, por vezes, presentes nos ângulos por entre as valvas principais e, tal como estas, consistem numa prega de endocárdio fortalecida por tecido fibroso. As bases das valvas encontram-se ligadas a um anel fibroso no orifício tricúspide, onde podem ser contínuas umas com as outras, formando comissuras. A valva anterior é a maior valva desta válvula, estando fixa, sobretudo, à junção aurículo-ventricular na região posterolateral da crista supraventricular, embora se estenda ao longo do seu limbo septal, até ao septo membranoso, terminando na comissura anteroseptal. Já a fixação da valva septal passa da comissura posteroseptal na parede ventricular posterior, ao longo do septo muscular, para depois terminar na comissura anteroseptal, ao nível do septo membranoso. Por fim, a valva posterior tem uma fixação totalmente mural, estando limitada pelas comissuras posteroseptal e anteroposterior.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O orifício pulmonar encontra-se à frente e à esquerda do orifício tricúspide, sendo guardado por uma válvula pulmonar, composta por três valvas semilunares – as valvas esquerda, direita e anterior. O bordo externo e convexo de cada valva encontra-se ligado à raiz do tronco pulmonar, enquanto o seu bordo interno e livre encontra-se espessado na sua região média, formando um nódulo (nó de Arentius) de cada lado, onde existe uma área crescêntica de pequenas dimensões e menor espessura - a lúnula. Quando vistas superiormente, as valvas delimitam os três seios do tronco pulmonar. As cordas tendinosas suportam as valvas das válvulas aurículo-ventriculares, conectando a válvula tricúspide e a válvula bicúspide aos músculos papilares. As cordas falsas conectam os músculos uns aos outros, ou à parede ventricular (incluindo o septo), enquanto as cordas verdadeiras, partem dos músculos papilares (das pontas ou das bases), das paredes ventriculares, ou do septo e fixam-se às várias porções das regiões ventriculares dos bordos livres das valvas. Já os músculos papilares no ventrículo direito incluem um músculo anterior, por onde as cordas passam para as valvas anterior e posterior da válvula tricúspide; um músculo posterior, por vezes representado por duas ou mais porções, por onde as cordas passam para as valvas septal e posterior; e um grupo variável de pequenos músculos septais, cujas cordas se deslocam para a as valvas anterior e septal. Quando o ventrículo se contrai, os músculos papilares também fazem o mesmo e a sua distribuição assegura-se dos bordos das valvas se juntam e que as valvas não invadem a aurícula. Uma protusão particularmente evidente, a trabécula septomarginal (ou banda moderadora) inicia-se ao nível da parede septal, suportando depois a base do músculo papilar anterior e cruzando para a parede parietal do ventrículo.
Ventrículo esquerdo O ventrículo esquerdo é cónico e o seu ápice, forma o ápice do coração. Na sua base, a cavidade comunica posteroinferiormente com a aurícula esquerda através da válvula mitral e com a aorta, anterosuperiormente, através da válvula aórtica. Inferiormente, a sua superfície é achatada e forma dois terços da face diafragmática do coração, sendo convexa anteriormente e à esquerda, onde forma, quase um terço da porção ventricular da face esternocostal e quase toda a face esquerda. A sua parede direita, ou septal, é côncava em direcção à cavidade, enquanto a parede muscular é mais espessa em torno da porção mais larga da cavidade, sendo mais fina na região do ápice. Contudo, a porção membranosa do septo (posterosuperior) é a região mais fina de toda a parede ventricular. Interior do ventrículo esquerdo Enquanto no ventrículo direito os dois principais orifícios se encontram 2,5 cm separados, no ventrículo esquerdo estes encontram-se separados apenas pela valva anterior da válvula mitral. Na verdade, essa continuidade fibrosa é assegurada pela cortina subaórtica.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O orifício aurículoventricular esquerdo, ou mitral, é oval, deslocando-se o seu eixo, inferior, anteriormente e para a direita. Este orifício encontra-se guardado pela válvula aurículoventricular esquerda, ou mitral, uma válvula bicúspide com duas valvas triangulares desiguais. A valva posterior é mais pequena e posteroinferior, encontrando-se à esquerda do orifício. Já a valva anterior é maior e anterosuperior, localizando-se à direita do orifício mitral, por entre este e orifício aórtico, sendo contínua com a cortina sub-aórtica. As bases das valvas estão ligadas ao anel fibroso em torno do orifício mitral, onde podem ser contínuas uma com a outra (formando as comissuras anteromedial e posterolateral), ou separadas por valvas acessórias. Estas valvas são moles nas suas faces auriculares e a sua estrutura é similar às da válvula tricúspide, recebendo também a inserção de cordas tendinosas. Neste ventrículo a porção que comunica com a aorta é designada por vestíbulo aórtico, sendo a sua parede fibrosa não-contráctil. O orifício aórtico é circular e encontra-se por entre o infundíbulo e o orifício aurículo-ventricular direito, imediatamente sobre e em frente ao orifício mitral, do qual esta separado pela valva anterior da válvula mitral. O orifício aórtico encontra-se guardado pela válvula aórtica, que é formada por três valvas semilunares – as valvas coronária direita, coronária esquerda e não-coronária (que se encontra posteriormente), prendendo-se esta designação com as artérias coronárias, que destas se originam. Também aqui, as valvas definem seios – os seios aórticos, mais proeminentes que os seios pulmonares e que são designados por seio direito, seio esquerdo e seio nãocoronário. Superiormente aos seios e, por entre estes e a artéria aorta, encontra-se a crista sinotubular, também presente ao nível da válvula pulmonar.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Ao nível das paredes do ventrículo esquerdo encontramos várias trabéculas carnudas, especialmente presentes, ao nível do ápice e da parede inferior. Encontram-se neste ventrículo dois músculos papilares – um músculo anterior, que parte da parede esternocostal e um músculo posterior, que parte da parede inferior, sendo cada um deles ligados por cordas tendinosas a ambas as valvas da válvula mitral. O septo interventricular estende-se da região à direita do ápice do coração até ao intervalo que separa os orifícios pulmonar e tricúspide, dos orifícios aórtico e mitral. Os seus bordos correspondem aos sulcos interventriculares anterior e posterior. Quase todo o septo interventricular é espesso e muscular, mas a sua porção posterosuperior é fibrosa e não apresenta mais que 1 mm de espessura, sendo designada por porção membranosa do septo interventricular.
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Esqueleto fibroso do coração e sistema de condução Esqueleto fibroso do coração Desde o epicárdio até ao endocárdio e desde os orifícios das grandes veias até às raízes dos troncos arteriais, os espaços intercelulares, por entre os elementos contrácteis e de condução, são permeados por tecido conjuntivo, cuja quantidade varia muito em disposição e textura, em diferentes localizações. A matriz do miocárdio desloca-se na base dos ventrículos, encontrando-se intimamente relacionada com as válvulas aurículo-ventriculares e com o orifício aórtico, sendo uma rede complexa de colagénio denso com extensões membranosas, tendinosas e fibroareolares. Daí que no seu conjunto, estas estruturas possam ser designadas como sendo constituintes do esqueleto fibroso do coração. O esqueleto fibroso apresenta duas funções – assegura a descontinuidade electrofisiológica, por entre as porções auricular e ventricular (excepto no local de penetração do tecido de condução) e funciona como uma base estável, mas simultaneamente deformável, para fixação dos núcleos fibrosos das válvulas auriculoventriculares. Apesar de por vezes se considerar que as quatro válvulas se encontram contidas neste esqueleto, isto não é verdade. As valvas da válvula pulmonar encontram-se suportadas por uma projecção livre, o tendão do infundíbulo, que pode ser facilmente removido do coração, sem perturbar o esqueleto fibroso ou o ventrículo esquerdo. O esqueleto fibroso é mais forte na junção das válvulas aórtica, mitral e tricúspide, sendo que essa união constitui o corpo fibroso. Dois pares de projecções de colagénio estendem-se desde o corpo fibroso, (sendo mais fortes do lado esquerdo) passando parcialmente ao longo dos orifícios mitral e tricúspide (que são quase coplanares) e inclinando-se para se dirigir para o ápice cardíaco, constituindo os anéis fibrosos. De referir que ao conjunto formado pelos anéis fibrosos, válvulas, cordas tendinosas e músculos papilares dá-se o nome de complexo valvular, sendo que se um dos elementos do complexo deixar de operar correctamente, a válvula deixa de funcionar. A válvula aórtica, por sua vez, dirige-se superiormente, para a direita e ligeiramente anteriormente, sendo anterosuperior e encontrando-se à direita do orifício mitral. Duas das valvas da válvula aórtica encontram-se em continuidade fibrosa com a valva aórtica da válvula mitral, e daí que a cortina subaórtica também seja considerada parte integral deste esqueleto fibroso. As duas extremidades da cortina encontram-se fortalecidas, constituindo os trígonos fibrosos esquerdo e direito, que são as porções mais fortes do esqueleto fibroso. De facto, o trígono direito, juntamente com o septo membranoso constitui o corpo fibroso central, que é penetrado pelo feixe auriculoventricular (feixe de His), uma estrutura do mecanismo de condução auriculo-ventricular. De referir que o septo membranoso é cruzado, no seu lado direito, pela fixação da válvula tricúspide, que divide o septo membranoso numa porção auriculoventricular e interventricular. A raiz do tronco aórtico ocupa uma posição central dentro do esqueleto fibroso e é por vezes descrita como sendo um “anel” integrado no esqueleto fibroso. Contudo, tal como ocorre na válvula pulmonar, a estrutura da raiz aórtica corresponde às fixações semilunares fibrosas das suas três valvas. Ao nível
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II desta zona circunferencial complexa, existem três áreas triangulares, que são de importância capital, separando, ao nível ventricular, os seios bulbares aórticos, que contêm as valvas valvulares. No seu conjunto, estes três triângulos são designados por espaços subaórticos, sendo que os seus ápices triangulares correspondem às pontas das comissuras valvulares. Já as suas paredes, que são significativamente mais finas que as paredes dos seios, consistem em colagénio e fibras de tecido muscular e fiborelástico, formando as extensões subvalvulares do vestíbulo aórtico. O intervalo por entre os seios coronário esquerdo e não-coronário encontra-se preenchido pela deformável cortina subaórtica. Já o segundo espaço ocorre por entre os seios não-coronário e coronário direito, sendo contínuo com a face anterior do septo membranoso. Por fim, o terceiro espaço subaórtico, por entre os dois seios aórticos coronários, encontra-se preenchido por tecido fibroelástico, que separa a extensão da raiz subaórtica, da parede do infundíbulo subpulmonar. Triângulos similares foram encontrados a separar os seios do tronco pulmonar, mas estes são significativamente menos robustos. Os anéis mitral e tricúspide, por sua vez, não são estruturas de colagénio rígido, mas sim estruturas dinâmicas e deformáveis, de ligação valvular, que diferem amplamente em diferentes pontos periféricos e mudam consideravelmente em cada fase do ciclo cardíaco e com o avanço da idade. As fixações tricúspides são, inclusive, menos robustas que as da válvula mitral, sendo que em vários locais, apenas porções de tecido fibroareolar separam as massas musculares ventricular e auricular.
Tecido de condução cardíaco As células do músculo cardíaco diferem das do músculo esquelético, na medida em que apresentam a capacidade inerente de se contraírem e relaxarem espontaneamente (não existindo unidades motoras no coração). As células ventriculares contraem e relaxam a uma menor frequência que as células auriculares, mas no coração intacto, ambas encontram-se sintonizadas num ritmo mais rápido. As células que criam esses impulsos e as células do sistema de condução são células cardíacas modificadas, podendo ser células P (primitivas), transicionais, ou fibras de Purkinje. Estes três tipos são morfologicamente distintos das células cardíacas normais. Os nós e redes das células “especializadas” do miocárdio constituem o sistema de condução cardíaca. Os componentes deste sistema são os nós sino-arterial e aurículo-ventricular, bem como o feixe aurículo-ventricular, com os seus ramos esquerdo e direito, bem como o plexo subendocárdico das células de condução ventricular (fibras de Purkinje). Ao nível de este sistema, o principal ritmo de pacemaker do coração é gerado, sendo influenciado por nervos e transmitido especificamente das aurículas até aos ventrículos e, a partir daí, a toda a musculatura.
Nó sinusal O nó sinusal (sino-auricular) é uma estrutura elíptica, que apresenta entre 10 a 20 mm de comprimento, encontrando-se na junção das porções da aurícula direita derivadas do seio venoso e da aurícula propriamente dita. Este nó estende-se por entre 1 a 2 cm à direita da crista terminal, na aurícula direita, e desloca-se posteroinferiormente até à porção superior do sulco terminal. O tecido nodal não ocupa a espessura total do epicárdio ao endocárdio, mas sim um local de tecido especializado, subepicárdico, ao nível do sulco terminal. A localização deste nó é assinalada consistentemente pela artéria do nó sinusal, que pode ser um ramo da artéria circunflexa esquerda, ou de um ramo auricular anterior da artéria coronária direita. As células nodais encontram-se agrupadas circunferencialmente em torno desta artéria e misturam-se na sua densa adventícia. Essas células são então consideradas pacemakers, sendo que as células P são as mais
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II abundantes na região central do nó sinusal, mas menos abundantes na sua periferia, onde se misturam com células transicionais.
Nó auriculo-ventricular O nó aurículo-ventricular é uma estrutura arterial, que se encontra na raiz de uma extensa árvore de condução, que atinge o ápice dos ventrículos, os músculos papilares e outras regiões dos ventrículos. Este nó, juntamente com as suas zonas de transição, encontra-se localizado ao nível da componente auricular muscular do septo aurículo-ventricular. Os seus pontos de identificação anatómica são os limites do triângulo de Koch, ou seja, o tendão de Todaro, superiormente, a fixação da valva septal da válvula tricúspide, inferiormente, e o orifício do seio coronário, basalmente. O nó auriculo-ventricular apresenta uma região auricular, convexa, à qual se sobrepõe o miocárdio auricular. O seu bordo esquerdo é côncavo e encontra-se adjacente à região superior do corpo fibroso central. Já a sua extremidade basal projecta-se para o músculo auricular, enquanto a sua extremidade anteroinferior entra no corpo fibroso central, tornando-se o feixe aurículo-ventricular. O nó auriculo-ventricular é menos denso que o nó sinusal, sendo a sua irrigação arterial proveniente de um vaso característico, que se origina da artéria coronária dominante, ao nível da cruz do coração. Este nó apresenta uma zona compacta constituída por células nodais, que normalmente apresentam estratificação. As células transicionais são encontradas superficialmente e posteriormente, sendo que a maior parte do atraso aurículo-ventricular é provavelmente produzido ao nível dessas zonas de transição do nó.
Feixe auriculo-ventricular O feixe aurículo-ventricular é a continuação directa do nó aurículo-ventricular, tornando-se oval, quadrangular ou triangular, sem corte transverso, quando entra no corpo fibroso central. Após atravessar o corpo fibroso, ramifica-se ao nível da crista do septo interventricular (da sua porção muscular), sendo que o ramo direito do feixe é um grupo arredondado e estreito de fascículos que se desloca, inicialmente dentro do miocárdio e depois subendocardicamente, em direcção ao ápice do ventrículo, entrando na trabécula septomarginal, para chegar ao músculo papilar anterior. O ramo direito dá poucos ramos para as paredes ventriculares no seu percurso septal. Ao nível da origem do músculo papilar anterior, este ramo divide-se em fascículos subendocárdicos, que são distribuídos para as restantes paredes ventriculares. O facto deste ramo se deslocar envolto em tecido conjuntivo até ao ápice do coração leva a que só a partir daí, seja despoletado o estímulo para os ventrículos. Já o ramo esquerdo parte como vários fascículos que abandonam o bordo esquerdo do feixe, deslocando-se ao longo da crista do septo ventricular muscular. Esses fascículos formam
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II um folheto, que diverge apicalmente e subendocardicamente ao longo da região esquerda do septo ventricular, separando-se em divisões anterior, septal e posterior. Vários ramos abandonam essas divisões, formando redes subendocárdicas, que rodeiam inicialmente os músculos papilares e depois se curvam posteriormente, ao nível do subendocárdio, para se distribuírem para todas as partes do ventrículo. De referir que, os contactos funcionais por entre a condução ventricular e os miócitos tornam-se apenas numerosos, ao nível das ramificações terminais subendocárdicas.
☤ A síndrome de Wolff-Parkinson-White é causada por pequenas fibras anormais de miocárdio ventricular, que ligam as massas miocárdicas auricular e ventricular em torno das junções aurículo-ventriculares.
Sistema de condução De todas as células do coração, as do nó sinusal geram o ritmo mais rápido (na ordem das 70 pulsações por minuto), funcionando como o pacemaker do coração. Este impulso, que se pensa ser gerado nas células P, é transmitido para vias de condução, sobretudo, para as aurículas esquerda e direita e para o nó aurículo-ventricular. Ao nível do nó aurículo-ventricular (onde o impulso gerado é de cerca de 40 pulsações por minuto), o impulso sofre um atraso de 40 ms. Este atraso permite às aurículas ejectar os seus conteúdos, na totalidade, antes de se iniciar a contracção dos ventrículos. O atraso estabelece também um limite superior na frequência de sinais que podem ser transmitidos para os ventrículos. O coração humano bate continuamente a 70 ciclos por minuto, durante várias décadas, sendo que a eficiência cardíaca depende da precisão dos tempos de operação em estruturas interdependentes. Após o enchimento passivo das aurículas e ventrículos, aquando da diástole, ocorre uma sístole auricular, estimulada por uma descarga, a partir do nó sinusal, o que completa o preenchimento ventricular. Deste modo, a excitação e contracção das aurículas deve ser sincronizada e terminar, antes de se iniciar a contracção ventricular. Isto é possível, graças ao atraso, que ocorre ao nível do nó aurículo-ventricular. Depois, um sistema especializado de condução ventricular assegura-se que ao fecho das válvulas aurículo-ventriculares, segue-se uma rápida excitação e contracção ventricular, que se espalha desde os ápices ventriculares, até às câmaras e orifícios de ejecção. Dessa forma, as células transicionais estendem-se desde o nó aurículo-ventricular até ao tronco e principais ramos do feixe aurículo-ventricular (feixe de His). Aqui, estas células tornam-se contínuas com as fibras de Purkinje, sendo que no feixe e nos seus ramos, a condução do impulso é rápida, sendo na ordem dos 2-3 metros por segundo, contra 0,6 metros por segundo no miocárdio normal. Dessa forma, o impulso cardíaco atinge o ápice cardíaco, antes de chegar às paredes ventriculares, o que leva à ocorrência de uma ejecção coordenada. O facto de o estímulo se propagar desde o ápice do coração até às paredes ventriculares é igualmente vantajoso, na medida em que permite que, aquando da contracção do ápice do ventrículo, ocorra simultânea contracção dos músculos papilares, que “puxam” as cordas tendinosas, impedindo que o sangue retorne às aurículas e fazendo com que este flua para a artéria aorta e tronco pulmonar. A condução cardíaca origina-se, inequivocamente, em miócitos especializados, mas as influências neurais são importantes, na adaptação do ritmo cardíaco intrínseco para exigências funcionais de todo o corpo. Todos os miócitos cardíacos são excitáveis, apresentando despolarização e repolarização membranares rítmicas e autónomas, permitindo a condução de impulsos de excitação, por via de gap junctions, para miócitos adjacentes, bem como excitação acoplada à contracção. Essas propriedades encontram-se desenvolvidas em diferentes graus, em diferentes locais e tipos de miócitos. A velocidade de despolarização e repolarização é menor no miocárdio dos ventrículos, intermédia ao nível da porção
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II muscular das aurículas e maior nos miócitos do nó sinusal. Dessa forma, estas últimas células, no coração normal, são o local para a iniciação rítmica de ciclos cardíacos. Por outro lado, a velocidade de condução é menor nos miócitos nodais, intermédia, nos miócitos cardíacos “normais” e maior nos miócitos do sistema de condução ventricular. A propagação da excitação é muito rápida, mas não é instantânea. Diferentes partes dos ventrículos são excitadas em momentos ligeiramente diferentes, o que traz consequências funcionais importantes. De facto, a falha no sistema de condução não bloqueará a contracção cardíaca, mas o sistema ficará pior coordenado, ou totalmente descoordenado – o ritmo tornar-se-á mais lento, na medida em que se origina a partir de uma actividade espontânea (miogénica), nos miócitos cardíacos, ou num pacemaker subsidiário, numa porção mais distal do sistema de condução afectado. De referir que, não existem vias de condução internodais ou interauriculares especializadas. O impulso que parte do nó sinusal propaga-se para a musculatura auricular e para o nó aurículo-ventricular, por via do miocárdio auricular normal. O arranjo geométrico das fibras ao longo dos feixes musculares auriculares (por exemplo, ao nível da crista terminal) permite que a condução seja mais rápida nas margens, do que em qualquer outro local da aurícula.
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Artérias coronárias As artérias coronárias esquerda e direita partem da aorta ascendente no seus seios anterior e posterior esquerdo. Os níveis das aberturas coronárias são variáveis. As duas artérias formam uma coroa oblíqua invertida (e daí o seu nome), onde um círculo anastomósico no sulco coronário é ligado por ansas marginais e descendentes (interventriculares), que intersectam o ápice cardíaco. As principais artérias e os seus ramos principais são, normalmente, subepicardíacos, mas aquelas que se encontram nos sulcos coronário e interventricular encontram-se, frequentemente, mais profundamente situadas e, por vezes envoltas em miocárdio, ou cobertas por este. A artéria coronária que dá o ramo interventricular posterior é tida como a “dominante”, sendo normalmente a artéria coronária direita (60% dos casos). De referir que, o ramo interventricular posterior irriga a porção posterior do septo e, por vezes, parte da parede posterolateral do ventrículo esquerdo.
☤ Anastomoses entre as artérias coronárias direita e esquerda são abundantes durante o período fetal, mas tornam-se muito reduzidas no final do primeiro ano de vida. Vias anastomósicas de circulação colateral podem se tornar relevantes, em condições de hipoxia e de doença coronária. Uma circulação colateral adicional é originada por pequenos ramos dos vasos mediastinais, pericárdicos e bronquiais.
Artéria coronária direita A artéria coronária direita parte do seio coronário direito (aórtico anterior). Esta artéria é normalmente única, mas já foram observadas até quatro artérias coronárias! Esta artéria passa inicialmente anteriormente e ligeiramente à direita, por entre a auriculeta direita e o tronco pulmonar, onde o seio coronário direito, normalmente se eleva. Atinge o sulco coronário e desce ao longo deste, quase verticalmente até ao bordo cardíaco direito, curvando-se em torno deste, até à porção posterior do sulco. A artéria chega então até à cruz do coração (a região de cruzamento entre os sulcos interauricular e interventricular) e termina um pouco à sua esquerda, por vezes anastomosando-se com o ramo circunflexo da artéria coronária esquerda. Os ramos da artéria coronária direita irrigam a aurícula e ventrículo direito e, por vezes, partes do septo aurículoventricular. O primeiro ramo é a
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II artéria do cone arterial, por vezes designada por “terceira artéria coronária”. Esta é dada, por vezes ao nível do seio aórtico anterior e ramifica-se anteriormente, ao nível da porção mais inferior do cone pulmonar e porção superior do ventrículo direito. Pode se anastomosar com um ramo similar proveniente da artéria descendente anterior esquerda, formando o anel de Vieussens, um círculo anastomósico em torno do ventrículo direito. O primeiro segmento da artéria coronária direita (por entre a sua origem e o bordo direito do coração) dá os ramos auriculares e ventriculares anteriores. Os ramos ventriculares anteriores são normalmente dois ou três e ramificam-se em direcção ao ápice cardíaco, onde raramente chegam. A artéria marginal direita é dada na mesma região, apresentando um maior calibre que as restantes artérias ventriculares anteriores, chegando ao ápice do coração na maioria dos indivíduos. Quando este ramo se encontra muito grande, os restantes ramos ventriculares anteriores podem estar reduzidos a um, ou podem mesmo estar ausentes. Relativamente aos ramos ventriculares posteriores, estes são normalmente dois (podendo haver até três), sendo de pequenas dimensões. Estes ramos partem da segunda porção da artéria coronária direita, por entre o bordo direito e a cruz, irrigando a região diafragmática do ventrículo direito. O seu tamanho é inversamente proporcional ao da artéria marginal direita. De referir que partem dos ramos ventriculares, pequenos ramos aurículo-ventriculares recorrentes, quando os primeiros cruzam o sulco coronário. À medida que a artéria coronária direita aproxima-se da cruz do coração, normalmente dá um a três ramos interventriculares posteriores, sendo que um deles, a artéria interventricular, encontra-se ao nível do sulco interventricular posterior. No que concerne aos ramos auriculares da artéria coronária direita, estes são descritos em grupos anterior, lateral e posterior, sendo normalmente pequenos vasos de 1 mm de diâmetro. Os ramos anteriores e laterais são por vezes duplos e irrigam a aurícula direita. O ramo posterior é normalmente único e irriga as aurículas direita e esquerda. A artéria do nó sinusal é um ramo arterial que irriga o miocárdio de ambas as aurículas, mas sobretudo da direita. Este ramo apresenta uma origem variável – por vezes é dado a partir do ramo circunflexo da artéria coronária esquerda, mas normalmente parte do ramo auricular anterior da artéria coronária direita. Esta artéria passa normalmente, posteriormente no sulco por entre a auriculeta direita e a aorta, ramificando-se em torno da base da veia cava superior, formando uma ansa, a partir de onde partem vários ramos para irrigar a aurícula direita. De referir que o nó sinusal é ainda atravessado por um ramo da crista terminal. A artéria coronária direita dá ainda ramos septais de pequenas dimensões, que abandonam o ramo interventricular posterior, para irrigar o septo interventricular posterior. Estes ramos são numerosos, mas normalmente não atingem as porções apicais do septo. A artéria septal posterior é o maior destes ramos e normalmente o primeiro, partindo da ansa invertida que a artéria coronária forma na cruz do coração.
Artéria coronária esquerda A artéria coronária esquerda apresenta um calibre maior que a direita, irrigando a maior parte do septo interventricular e uma maior porção de miocárdio, incluindo quase todo o ventrículo e aurícula esquerdas, excepto nos casos de “dominância da direita”, onde se verifica a presença aí de uma região,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II onde a artéria coronária direita irriga uma porção posterior do ventrículo esquerdo. Esta artéria parte do seio aórtico posterior esquerdo (ou coronário esquerdo), cujo óstio se pode encontrar inferiormente ao bordo das valvas, ou ser duplo. A porção inicial desta artéria, por entre o óstio e os seus primeiros ramos, é muito variável em termos de dimensões. Aqui, a artéria encontra-se por entre o tronco pulmonar e a auriculeta esquerda, emergindo do sulco coronário, a partir de onde vira à esquerda. Esta porção encontra-se envolta em gordura sub-epicárdica e normalmente não dá ramos, embora, por vezes, dê um pequeno ramo auricular, ou a artéria do nó sinusal. Ao chegar ao sulco coronário, a artéria coronária esquerda divide-se em dois ou três ramos principais, sendo a artéria interventricular anterior descrita como a sua continuação. Esta artéria desce obliquamente, anteriormente e para a esquerda no sulco interventricular, encontrando-se por vezes envolta ou cruzada por pontes de tecido do miocárdico e pela grande veia cardíaca e suas tributárias. A artéria interventricular anterior chega quase sempre ao ápice, sendo que em dois terços dos indivíduos, continua-se no sulco interventricular posterior, terminando anastomosando-se com os ramos terminais dos ramos interventriculares posteriores da artéria coronária direita. A artéria interventricular anterior dá ramos ventriculares anteriores esquerdo e direito, ramos septais anteriores e um número variável de ramos posteriores correspondentes. Os ramos ventriculares anteriores direitos são pequenos e raramente são mais que dois. Já os ramos ventriculares anteriores esquerdos são entre dois a nove e cruzam a porção anterior do ventrículo esquerdo diagonalmente, sendo que os maiores atingem o bordo esquerdo. Um desses ramos é maior e é designado por artéria diagonal esquerda, sendo que esta pode partir separadamente do tronco coronário esquerdo e por vezes encontrar-se duplicada. Uma pequena artéria do cone esquerdo normalmente abandona a artéria
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II interventricular anterior, perto da sua origem e anastomosa-se ao nível do cone, com a artéria do cone direito e com os vasos que irrigam as artérias pulmonar e aorta. Os ramos septais anteriores abandonam a artéria interventricular anterior, quase perpendicularmente e passam posteroinferiormente no septo, irrigando normalmente os seus dois-terços ventrais. Já os ramos septais posteriores são de pequenas dimensões e irrigam o terço posterior do septo. A artéria circunflexa apresenta um calibre comparável ao da artéria interventricular anterior e é um ramo da artéria coronária esquerda. Este ramo curva-se para a esquerda no sulco coronário, continuando-se em torno do bordo esquerdo, na região posterior do sulco e terminando à esquerda da cruz do coração (embora em alguns corações se continue como artéria interventricular posterior). De referir que a auriculeta esquerda se sobrepõe a esta artéria na sua porção mais proximal. Na maioria dos casos, a artéria marginal esquerda, um grande ramo ventricular, parte perpendicularmente da artéria circunflexa, ramificando-se sobre o bordo obtuso e irrigando a maior parte das porções adjacentes do ventrículo esquerdo, até ao ápice. Da artéria circunflexa partem ainda ramos ventriculares anteriores e posteriores, de menores dimensões. Os ramos ventriculares anteriores (são, normalmente, dois ou três, variando o seu número entre um e dois) deslocam-se paralelamente à artéria diagonal, quando esta está presente e substituem-na, quando esta se encontra ausente. Já os ramos ventriculares posteriores são menos e de menores dimensões. A artéria circunflexa pode irrigar a aurícula esquerda, através dos seus ramos auriculares anterior, lateral e posterior. A artéria circunflexa apresenta ainda ramos inconstantes. A artéria para o nó sinusal deriva normalmente do segmento circunflexo anterior, irrigando a aurícula esquerda, envolvendo a veia cava superior e enviando um grande ramo para o nó Já a artéria para o nó aurículo-ventricular parte próxima da cruz do coração. Por fim, a artéria anastomósica de Kugel é um ramo da artéria circunflexa, que parte, normalmente, da sua parte anterior e atravessa o septo interauricular, para estabelecer uma anastomose directa ou indirecta com a artéria coronária direita.
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Distribuição coronária Normalmente, a artéria coronária direita irriga o ventrículo direito (excepto numa região à direita do sulco inter-ventricular anterior), uma porção variável da região diafragmática do ventrículo esquerdo e o terço posteroinferior do septo intraventricular, a aurícula direita e parte da aurícula esquerda. Já a artéria coronária esquerda irriga a maior parte do ventrículo esquerdo, uma pequena região do ventrículo direito, os dois-terços anteriores do septo interventricular e a maior parte da aurícula esquerda. Variações no sistema arterial coronário afectam a região diafragmática dos ventrículos e levam a uma “dominância” relativa da artéria coronária esquerda ou direita. Essa referência à dominância é enganadora, pois a artéria esquerda irriga quase sempre uma maior quantidade de tecidos que a direita. No caso de “dominância da direita”, a artéria interventricular posterior deriva da artéria coronária direita, enquanto se houver “dominância da esquerda”, essa artéria é um ramo da artéria coronária esquerda. Existe ainda um “padrão de equilíbrio”, onde ramos de ambas as artérias se deslocam ao nível do sulco interventricular posterior, ou perto deste.
Anastomoses coronárias Anastomoses por entre ramos das artérias coronárias, quer subepicáridcas, quer miocárdicas, e por entre estas artérias e vasos extra-cardíacos apresentam importância médica capital. Estas anastomoses não conseguem rapidamente apresentar vias colaterais de circulação suficiente, aquando de uma obstrução coronária repentina. Contudo, assume-se que estas anastomoses ocorrem de facto, particularmente por entre ramos subepicárdicos, sendo que o seu número aumenta, durante a vida individual. Os locais mais frequentes para anastomoses extramurais são o ápice do coração, a região anterior do ventrículo direito, a região posterior do ventrículo esquerdo, os sulcos inter-auricular e interventricular e por entre o vaso do nó sinusal e outros vasos auriculares. Já no que concerne às anastomoses extra-cardíacas, estas podem ligar vários ramos coronários com outros vasos torácicos, através das artérias pericárdicas e dos vasos que irrigam grandes vasos.
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Veias cardíacas O coração é drenado pelo seio coronário e pelas suas tributárias, pelas veias cardíacas anteriores e pelas veias cardíacas mínimas. O seio coronário e respectivas tributárias fazem a drenagem venosa para a aurícula direita, a partir de todo o coração (incluindo os seus septos), excepto a região anterior do ventrículo direito e pequenas regiões variáveis na aurícula e no ventrículo esquerdo. As veias cardíacas anteriores drenam uma região anterior no ventrículo direito e, quando a veia marginal direita se junta a este grupo, uma região em torno do bordo cardíaco. Já as veias cardíacas mínimas abrem-se na aurícula e ventrículo direitos e, em menor extensão, na aurícula esquerda, podendo ainda abrir-se ao nível do ventrículo esquerdo.
Seio coronário A grande maioria das veias cardíacas drenam para o seio coronário, que apresenta entre 2 a 3 cm de comprimento e se encontra na região posterior do sulco coronário, por entre o ventrículo e a aurícula esquerda. O seio abre-se na aurícula direita, por entre a abertura da veia cava inferior e o orifício mitral. As suas tributárias são a grande, média e pequena veias cardíacas, a veia posterior do ventrículo esquerdo e a veia oblíqua da aurícula esquerda, sendo que todas estas veias apresentam válvulas nos seus orifícios, com excepção da última.
Grande veia cardíaca A grande veia cardíaca inicia-se ao nível do ápice cardíaco, ascende no sulco interventricular anterior até ao sulco coronário, deslocando-se ao longo deste, passando para a esquerda e posteriormente, para entrar no seio coronário, na sua origem. Recebe tributárias da aurícula esquerda e de ambos os ventrículos, incluindo a veia marginal esquerda, que ascende ao nível do bordo esquerdo do coração.
Pequena veia cardíaca A pequena veia cardíaca encontra-se no sulco coronário posterior, por entre a aurícula e o ventrículo direito, abrindo-se ao nível do sulco coronário, próximo da sua terminação auricular. Recebe sangue da região posterior da aurícula e ventrículo direito. A veia marginal direita passa à direita, ao longo do bordo cardíaco inferior e pode se juntar à pequena veia cardíaca no sulco coronário, ou abrirse directamente ao nível da aurícula direita, como acontece mais frequentemente.
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Veia cardíaca média A veia cardíaca média inicia-se ao nível do ápice cardíaco e desloca-se posteriormente, no sulco interventricular posterior, terminando no seio coronário, perto da sua terminação auricular.
Veia posterior do ventrículo esquerdo A veia posterior do ventrículo esquerdo encontra-se na face diafragmática do ventrículo esquerdo, um pouco à esquerda da veia cardíaca média. Normalmente abre-se no centro do seio coronário, mas por vezes abre-se na grande veia cardíaca.
Veia oblíqua da aurícula esquerda A veia oblíqua da aurícula esquerda é um pequeno vaso que desce obliquamente na região posterior da aurícula esquerda, para se juntar ao seio coronário, perto da sua região terminal. Este vaso é contínuo superiormente com o ligamento da veia cava superior.
Veias cardíacas anteriores As veias cardíacas anteriores drenam a região anterior do ventrículo direito. Estas são normalmente duas, três, ou até mesmo cinco e ascendem no tecido sub-epicárdico, cruzando a porção direita do sulco coronário, passando profundamente ou superficialmente à artéria coronária direita. Estas veias terminam na aurícula direita, perto do sulco. A veia marginal direita desloca-se ao longo do bordo cardíaco inferior, drenando porções adjacentes do ventrículo direito e, por vezes, abre-se separadamente na aurícula direita, podendo-se juntar às veias cardíacas anteriores, ou, menos frequentemente, ao seio coronário.
Veias cardíacas mínimas As veias cardíacas mínimas são estruturas muito variáveis, quer em número, quer em tamanho. O seu calibre é reduzido e estas são mais facilmente encontradas na porção direita do coração.
Anastomoses venosas cardíacas Existem várias anastomoses venosas cardíacas, numa escala que excede as que ocorrem a nível arterial. Verificam-se ligações entre veias adjacentes e entre tributárias do seio coronário e tributárias das veias cardíacas anteriores. O ápice cardíaco é a região preferencial da ocorrência de anastomoses venosas. De referir que, as veias cardíacas estão conectadas com vasos extracardíacos, nomeadamente com os vasos que irrigam os grandes vasos.
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Pericárdio O pericárdio contém o coração e as porções cardíacas justapostas dos grandes vasos, consistindo em dois componentes – o pericárdio fibroso e o pericárdio seroso. O pericárdio fibroso é um saco de tecido conjuntivo forte, rodeando completamente o coração, sem estar ligado a este, sendo que as suas paredes laterais estão revestidas externamente por pleura mediastinal parietal. Já o pericárdio seroso consiste em duas camadas de membrana serosa - uma interna, visceral, que adere ao coração e forma a sua cobertura externa, designada por epicárdio; e uma externa, parietal, que delimita a superfície interna do pericárdio fibroso. Entre as duas camadas serosas encontra-se a cavidade pericárdica, onde existe uma fina camada de fluido (que permite o movimento da membrana interna e do coração, aderente a esta), excepto nas áreas arterial e venosa do pericárdio, onde as duas membranas serosas do pericárdio se misturam. Estas regiões constituem as duas linhas parieto-visceral de reflexão serosa.
Pericárdio fibroso O pericárdio fibroso é, de grosso modo, cónico e reveste o coração. Superiormente, é contínuo exteriormente com a túnica adventícia dos grandes vasos; inferiormente, encontra-se ligado ao tendão central do diafragma e a uma pequena região muscular na sua metade esquerda. Superiormente, o pericárdio fibroso é ainda contínuo com a fáscia pré-traqueal. Anteriormente, esta estrutura encontrase também ligada à face posterior do esterno, pelos ligamentos esterno-pericárdicos superior e inferior, embora o superior não seja frequentemente detectável. Ao estar fixo a estas estruturas, o pericárdio assume uma função de “cinto de segurança do coração”, mantendo a sua posição torácica. Em termos de relações, anteriormente, o pericárdio fibroso encontra-se separado da parede torácica pelos pulmões e dos revestimentos pleurais. Contudo, numa pequena área posteriormente à metade inferior esquerda do corpo do esterno e das extremidades esternais da quarta e quinta cartilagens costais esquerdas, o pericárdio contacta directamente com a parede torácica. Os brônquios principais, o esófago, o plexo esofágico, a aorta torácica descendente e as regiões posteriores das faces mediastinais de ambos os pulmões são relações posteriores do pericárdio fibroso. Lateralmente, encontramos as coberturas pleurais das faces mediastinais dos pulmões. O nervo frénico, com os seus vasos acompanhantes, desce por entre o pericárdio fibroso e a pleura mediastinal de cada lado. Já inferiormente, o pericárdio encontra-se separado pelo diafragma do fígado e fundo gástrico.
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Pericárdio seroso O pericárdio seroso é um saco fechado dentro do pericárdio fibroso, apresentando camadas visceral e parietal. A camada visceral, ou epicárdio, cobre o coração e grandes vasos, encontrando-se reflectido na camada parietal, que delimita a face interna do pericárdio fibroso. Estas reflexões dispõem-se como dois “tubos” complexos – a aorta e o tronco pulmonar encontram-se envoltos num, enquanto as veias cavas e as quatro veias pulmonares encontram-se envoltos noutro. O tubo que rodeia as veias apresenta a forma de um J invertido. O fundo do saco, dentro da sua curva, encontra-se posteriormente à aurícula esquerda e é designado por seio oblíquo. Já o seio transverso é uma passagem por entre os dois tubos pericárdicos, encontrando-se a aorta e o tronco pulmonar em frente das aurículas e as grandes veias, posteriormente. Em paralelismo com estes tubos, encontramos vários recessos, agrupados de acordo com a localização dos seus orifícios.
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Grandes vasos do coração Tronco pulmonar O tronco pulmonar ou artéria pulmonar envia sangue pouco oxigenado do ventrículo direito para os pulmões. Este vaso apresenta cerca de 5 cm de comprimento e 3 cm de diâmetro, sendo o mais anterior dos vasos cardíacos e parte da base do ventrículo direito (ao nível do cone arterial), sobre e à esquerda da crista supraventricular. Deslocase superior e posteriormente, inicialmente em frente da aorta ascendente e depois à sua esquerda. Inferiormente à crossa da aorta divide-se, ao nível de T5 e à esquerda da linha média, em artérias pulmonares esquerda e direita. Esta bifurcação encontrase inferiormente, em frente e à esquerda da bifurcação traqueal. A artéria pulmonar encontra-se dentro do pericárdio, envolta com a aorta ascendente num tubo comum de pericárdio visceral. O pericárdio fibroso gradualmente desaparece dentro da adventícia das artérias pulmonares. Anteriormente, encontra-se separado da extremidade esternal do segundo espaço intercostal, pela pleura, pulmão esquerdo e pericárdio. Posteriormente, encontra-se, inicialmente, a aorta ascendente e a artéria coronária esquerda e depois, a aurícula esquerda. A aorta ascendente termina à direita deste tronco. O plexo cardíaco superficial encontra-se entre a bifurcação pulmonar e a crossa da aorta, enquanto a bifurcação traqueal, os nódulos linfáticos e os nervos encontram-se superiormente, bilateralmente e à direita.
Artéria torácica Aorta ascendente A aorta ascendente apresenta cerca de 5 cm, iniciando-se ao nível da base do ventrículo esquerdo, a nível com o bordo inferior da terceira cartilagem costal esquerda. Ascende obliquamente, curvando-se anteriormente e para a direita, posteriormente à metade esquerda do esterno, até ao nível do bordo superior da segunda cartilagem costal esquerda. Ao nível da sua origem, proximalmente ao ânulo aórtico, o seu perfil seccional é maior e não-circular, devido às três valvas da válvula aórtica.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Distalmente, encontram-se três seios aórticos, o que forma uma dilatação neste vaso e lhe confere uma secção oval. A aorta ascendente encontra-se dentro do pericárdio fibroso, envolta num tubo de pericárdio seroso com o tronco pulmonar. Anteriormente à sua porção inferior, encontramos o infundíbulo, o segmento inicial do tronco pulmonar e a auriculeta direita. Superiormente, este vaso está separado do esterno pelo pericárdio, pleura direita, bordo anterior do pulmão direito, tecido areolar solto e remanescentes do timo. Posteriormente, encontramos a aurícula esquerda, a artéria pulmonar direita e o brônquio pulmonar. Lateralmente e à direita, encontramos a veia cava superior e a aurícula direita, enquanto lateralmente e à esquerda, encontramos a aurícula esquerda e, a um nível superior, o tronco pulmonar. Pelo menos duas estruturas, os corpos aórtico-pulmonares (remanescentes dos baroreceptores e receptores químicos carótidos arteriais) encontram-se por entre a aorta ascendente e o tronco pulmonar. O corpo aórtico-pulmonar inferior encontra-se próximo do coração e anteriormente à aorta, enquanto o corpo aórtico-pulmonar médio encontra-se perto do lado direito da aorta ascendente.
Crossa da aorta A crossa da aorta continua-se da aorta ascendente. A sua origem, um pouco à direita, encontra-se ao nível do bordo superior da segunda articulação esternocostal direita. A crossa ascende inicialmente posteriormente e para à esquerda, sobre a face anterior da traqueia, continuando-se posteriormente, ao longo do seu lado esquerdo e, finalmente, descendo para a esquerda de T4, continuando-se como aorta torácica descendente. Essa terminação dá-se ao nível da extremidade esternal da segunda cartilagem costal esquerda, o que leva a que a crossa da aorta se encontre totalmente no mediastino superior, curvando-se em torno do hilo do pulmão e estendendo-se superiormente até ao nível médio do manúbrio esternal.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II No que toca ao diâmetro da crossa da aorta, este é na sua origem o mesmo da aorta ascendente, ou seja 28 mm. Contudo, no seu final, encontra-se reduzido a 20 mm, após serem dados os seus grandes ramos colaterais. O istmo aórtico encontra-se no bordo com a aorta torácica, sendo seguido por uma dilatação. No que concerne a relações, anteriormente e à esquerda da crossa da aorta encontra-se a pleura mediastinal esquerda. Profundamente à pleura, o arco é cruzado de anterior para posterior pelo nervo frénico esquerdo, ramo cardíaco cervical inferior esquerdo do vago, ramo cardíaco cervical superior esquerdo do simpático e pelo vago esquerdo. A veia intercostal superior esquerda ascende obliquamente e anteriormente no arco, superficialmente ao nervo vago esquerdo e profundamente ao frénico esquerdo, sendo que o pulmão esquerdo e a pleura separam todas estas estruturas da parede torácica. Posteriormente e à direita da crossa da aorta, encontramos a traqueia, o plexo cardíaco profundo, o nervo laríngeo recorrente esquerdo, o esófago, o canal torácico e a coluna vertebral, enquanto superiormente, partem desta convexidade as artérias braquiocefálica, carótida comum esquerda e subclávia esquerda, sendo estas cruzadas anteriormente, pela veia braquiocefálica esquerda. Inferiormente à crossa da aorta, encontra-se a bifurcação traqueal, o brônquio principal esquerdo, o ligamento arterial, o plexo cardíaco superficial e o nervo laríngeo recorrente esquerdo. Ramos Três ramos partem da região convexa do arco – o tronco braquiocefálico, a artéria carótida comum e a artéria subclávia esquerda. Estas podem partir do início do arco, ou mesmo da porção superior da aorta ascendente, a distância variável entre estes.
Aorta torácica descendente A aorta torácica é o segmento da aorta descendente confinado ao mediastino posterior. Inicia-se ao nível do bordo inferior de T4, sendo contínua com a crossa da aorta e terminando anteriormente ao bordo inferior de T12 no orifício aórtico do diafragma. Na sua origem, encontra-se à esquerda da coluna vertebral, aproximando-se da linha média à medida que desce, para terminar anteriormente a esta. Anteriormente à aorta torácica descendente, encontramos, de superior para inferior, o hilo pulmonar esquerdo, o pericárdio (que a separa da aurícula esquerda), o esófago e o diafragma. Posteriormente, encontramos a coluna vertebral e a veia hemiázigos. Lateralmente e à direita encontram-se a veia ázigos e o canal torácico e inferiormente, encontra-se a pleura e pulmão direitos, enquanto lateralmente e à esquerda, encontramos a pleura e o pulmão. O esófago, com o seu plexo de nervos, encontra-se lateralmente e à direita, superiormente, mas torna-se anterior, no tórax inferior, tornando-se anterolateral esquerdo, próximo do diafragma. No que toca a ramos, a aorta torácica dá ramos viscerais para o pericárdio, pulmões, brônquios e esófago e ramos parietais para a parede torácica. Os ramos parietais são pequenos e distribuídos para a região posterior do pericárdio.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Já as artérias bronquiais variam em número, dimensões e origem. Existe, normalmente apenas uma artéria bronquial direita, que parte quer da artéria bronquial esquerda superior, quer da terceira artéria intercostal posterior, deslocando-se posteriormente no brônquio direito. Já as artérias bronquiais esquerdas, são normalmente duas, partindo da aorta descendente – a superior parte perto de T5, enquanto a inferior parte inferiormente ao brônquio esquerdo e desloca-se posteriormente para o brônquio esquerdo. Os ramos mediaistinais da aorta torácica descendente são pequenos e numerosos, irrigando os nódulos linfáticos e tecido areolar no mediastino posterior. Por outro lado, os ramos frénicos partem da aorta torácica inferior, encontrando-se distribuídos posteriormente para a superfície diafragmática superior, anastomosando-se com as artérias musculofrénica e periocardiofrénica. As artérias intercostais posteriores são também ramos da aorta torácica descendente, bem como as artérias subcostais – as últimas artérias pares da aorta torácica, encontrando-se inferiormente às 12ª costelas. Por vezes, encontramos ainda uma pequena artéria (“artéria aberrante”), que abandona a aorta torácica à sua direita, perto da origem da artéria bronquial direita. Esta artéria ascende para a direita, posteriormente à traqueia e esófago e pode-se anastomosar com a artéria intercostal superior direita, sendo um vestígio da aorta dorsal direita.
☤ Os aneurismas (dilatações anormais) da aorta podem se formar em qualquer porção da aorta. A degeneração da parede medial da aorta e dissecção íntima ocorrem na maioria dos aneurismas torácicos, afectando particularmente a aorta ascendente e a crossa da aorta, resultando normalmente em anomalias no tecido conjuntivo deste vaso. Grande parte dos aneurismas da aorta descendentes são provocados por aterosclerose.
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Corpos aórticos Os corpos aórticos desenvolvem-se progressivamente durante a vida fetal, obtendo tamanho máximo nos primeiros três anos pós-natais. Estes corpos são acastanhados, flanqueando a aorta abdominal e encontrando-se normalmente unidos, anteriormente a esta estrutura, por uma massa horizontal, imediatamente superiormente à artéria mesentérica inferior. As células destes corpos dispersam-se e atrofiam e, aos 14 anos, podem-se ter já desintegrado por completo. Em termos de funções, os corpos aórticos segregam noradrenalina, sendo constituídos por células de cromafina.
Artéria braquiocefálica A artéria braquiocefálica é o maior ramo da crossa da aorta, tendo entre 4 a 5 cm de comprimento. Parte da convexidade do arco, posteriormente ao centro do manúbrio do esterno e ascende posterolateralmente para a direita, inicialmente, anteriormente à traqueia e depois à sua direita. Ao nível do bordo superior da articulação esternoclavicular direita, a artéria braquiocefálica divide-se em artéria carótida comum direita e subclávia direita. No que toca a relações, a artéria braquiocefálica, encontramos anteriormente, a separar esta artéria do manúbrio, o esternohióide, o esternotiróide, remanescentes do timo, a veia braquiocefálica esquerda e as veias tiróides inferiores direitas e ramos cardíacos direitos do vago, cruzando a sua raiz. Posteriormente à artéria encontramos, mais superiormente, a traqueia e, mais inferiormente, a pleura direita. O vago direito encontra-se posterolateral, tornando-se depois lateralmente à traqueia. Lateralmente e à direita, encontramos a veia braquiocefálica direita, a porção superior da veia cava superior e a pleura e lateralmente e à esquerda, encontramos remanescentes do timo, a origem da artéria carótida comum, veias tiróides inferiores e a traqueia. Normalmente, a artéria braquiocefálica não dá ramos, senão os seus terminais. Contudo, por vezes, um ramo tímico ou bronquial, ou a artéria tiróide ima partem desta artéria. A artéria tiróide ima é um pequeno e inconstante ramo que também pode partir da aorta, artéria carótida comum direita, subclávia ou torácicas internas, ascendendo na traqueia, até ao istmo da tiróide, onde termina.
Veia braquiocefálica direita A veia braquiocefálica direita apresenta um comprimento de cerca de 2,5 cm, iniciando-se posteriormente à extremidade esternal da clavícula direita. Esta veia desce quase verticalmente, juntando-se à veia braquiocefálica esquerda, formando a veia cava superior, posteriormente ao bordo inferior da primeira cartilagem costal direita, perto do bordo esternal direito. Encontra-se anterolateralmente à artéria braquiocefálica e ao nervo vago direito. Posteriormente e superiormente a esta veia, encontramos a pleura direita, o nervo frénico e a artéria torácica interna, sendo que estas estruturas se tornam laterais, mais inferiormente. Como tributárias, encontramos as veias vertebral direita, torácica interna, tiróide inferior e, por vezes, a primeira veia intercostal posterior direita.
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Veia braquiocefálica esquerda A veia braquiocefálica esquerda é maior que a direita, apresentando cerca de 6 cm de comprimento. Inicia-se posteriormente à extremidade esternal da clavícula esquerda, anteriormente à pleura cervical e desce obliquamente à direita, posteriormente à metade superior do manúbrio esternal, até à extremidade esternal da primeira cartilagem costal direita, onde se junta à veia braquiocefálica direita para formar a veia cava superior. Esta veia encontra-se separada da articulação esternoclavicular esquerda e do manúbrio esternal pelo esternohióide, esternotiróide, timo ou seus remanescentes e tecido areolar. Na sua região terminal, encontramos anteriormente, a pleura direita. Cruza anteriormente às artérias torácica interna esquerda, subclávia, braquiocefálica e carótidas comuns, nervos frénico e vago e à traqueia. A crossa da aorta encontra-se inferiormente à veia braquiocefálica esquerda. Esta veia apresenta como tributárias a veia vertebral esquerda, torácica interna, tiróide inferior, intercostal superior e por vezes a primeira intercostal posterior esquerda e as veias tímica e pericárdica.
Veia cava superior A veia cava superior faz o retorno venoso de sangue para o coração desde os tecidos superiores ao diafragma. Apresenta cerca de 7 cm de comprimento e é formada pela junção das veias braquiocefálicas, posteriormente ao bordo inferior da primeira cartilagem costal, próxima do esterno. Desce verticalmente, posteriormente aos dois primeiros espaços intercostais e termina na região superior da aurícula direita, posteriormente à terceira cartilagem costal direita. A sua metade inferior encontra-se no pericárdio fibroso, o qual perfura, ao nível da segunda cartilagem costal. Esta veia encontra-se coberta anterolateralmente por pericárdio seroso (a partir de onde se projecta um recesso retrocaval), sendo ligeiramente convexa para a direita. Este vaso não apresenta válvulas e recebe como tributárias as veias ázigos e pequenas veias do pericárdio e outras estruturas mediastinais. No que concerne a relações, os bordos anteriores do pulmão direito e pleura encontram-se anteriormente, enquanto o pericárdio se encontra inferiormente. Estas estruturas separam a veia cava superior da artéria torácica interna, primeiros dois espaços intercostais e segunda e terceira cartilagens costais. A traqueia e o nervo vago direito encontram-se posteromedialmente, enquanto o
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II pulmão direito e a pleura encontram-se posterolateralmente. Já o hilo pulmonar direito encontra-se posteriormente. O nervo frénico direito e a pleura são relações laterais direitas, enquanto a artéria braquiocefálica e a aorta ascendente são relações laterais esquerdas. Em termos de variações, pode ocorrer que as veias braquiocefálicas entrem na aurícula esquerda separadamente, com a aurícula direita a assumir o normal papel da veia cava superior. Pode existir uma veia cava superior esquerda, com uma ligação com a veia direita e passando anterior ao hilo pulmonar esquerdo, para entrar na aurícula esquerda. A presença deste vaso substitui a veia oblíqua da aurícula esquerda e o seio coronário e, daí, receber todas as tributárias do seio.
☤ A obstrução da veia cava superior é caracterizada por dores de cabeça, congestão facial e edema facial, o que reflecte uma drenagem venosa deficiente da cabeça, pescoço e membros superiores. Esta obstrução é frequentemente causada por carcinoma bronquial, envolvendo o lobo superior direito do pulmão, ou por envolvimento metastático dos nódulos linfáticos paratraqueal direitos.
Veia cava inferior A veia cava inferior faz o retorno venoso do sangue para o coração, desde os tecidos inferiores ao diafragma. Este vaso passa através do diafragma, por entre o folheto direito e a porção central do tendão central, ao nível de T8 e T9, drenando na porção posteroinferior da aurícula direita. Esta porção torácica é muito curta, encontrando-se em parte dentro e em parte for a do pericárdio. A porção que se encontra fora está separada da pleura direita e do pulmão pelo nervo frénico, sendo que a porção que se encontra dentro está coberta, excepto posteriormente, pelo pericárdio seroso.
☤ Aquando da obstrução da veia cava inferior, as veias ázigos e hemiázigos e os plexos venosos vertebrais são os principais canais colaterais, que mantêm a circulação venosa. Estes unem as veias cavas superior e inferior e comunicam com a veia ilíaca comum pelas veias lombares ascendentes.
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Mediastino O mediastino é a região que se encontra por entre os pulmões e inclui a pleura mediastinal, embora o termo seja normalmente aplicado à região que se encontra por entre os dois sacos pleurais, sendo delimitado, anteriormente, pelo esterno e, posteriormente, pela porção torácica da coluna vertebral. O mediastino estende-se verticalmente do inlet torácico até ao diafragma. Para fins descritivos, o mediastino é dividido arbitrariamente em mediastino superior e inferior, sendo este último subdividido em porções anterior, média e posterior. De referir que, o plano de divisão entre mediastinos superior e inferior cruza a articulação manubriosternal e a superfície inferior de T4.
☤ O mediastino comunica com a cavidade oral através do espaço para-faríngeo e de outros planos fasciais no pescoço. O espaço para-faríngeo é mais propício a ser infectado que qualquer outro espaço na cabeça e no pescoço e a infecção pode passar deste espaço para os espaços retrofaríngeo e pré-traqueal, atingindo o mediastino superior, a partir do qual, pode chegar à porção anterior do mediastino inferior.
Mediastino superior O mediastino superior encontra-se por entre o manúbrio esternal e as quatro vértebras torácicas superiores, sendo delimitado inferiormente pelo plano esternal, superiormente, pelo plano do inlet torácico e, lateralmente, pelas pleuras mediastinais. Esta região contém as extremidades inferiores do esternohióide, esternotiróide e longo do pescoço, os remanescentes do timo, as artérias e veias torácicas internas, as veias braquiocefálicas, a metade superior da veia cava superior, a crossa da aorta, as artérias braquiocefálica, carótida comum esquerda e subclávia, a veia intercostal superior esquerda, os nervos frénicos e vagos, o nervo laríngeo recorrente esquerdo, os nervos cardíacos, a porção superficial do plexo cardíaco, a traqueia, o esófago e o canal torácico. Contém ainda os nódulos linfáticos para-traqueal, braquiocefálico e traqueobronquial.
Mediastino inferior O mediastino inferior encontra-se subdividido numa porção anterior, numa porção média e numa porção posterior. O mediastino anterior encontra-se por entre o corpo do esterno e o pericárdio, estreitandose sobre as quatro cartilagens costais, onde os sacos pleurais se aproximam. Esta região contém tecido conjuntivo solto, os ligamentos esternopericárdicos, alguns nódulos linfáticos e os ramos mediastinais da artéria torácica interna. Por vezes, no mediastino anterior está ainda contida parte do timo, ou dos seus remanescentes degenerados.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Já o mediastino médio é a porção mais larga do mediastino inferior, contendo o pericárdio, o coração, a aorta ascendente, a metade inferior da veia cava superior, a crossa da ázigos, a bifurcação traqueal, os brônquios principais, o tronco pulmonar e as artérias e veias pulmonares esquerda e direita, os nervos frénicos, a porção profunda do plexo cardíaco e os nódulos linfáticos traqueobronquiais. O mediastino posterior é delimitado anteriormente pela bifurcação da traqueia, pelos vasos pulmonares, pericárdio e pela porção posterior da face superior do diafragma. Posteriormente, esta região é delimitada pela coluna vertebral, pelo bordo inferior das vértebras T4-T12 e, de cada lado, pela pleura mediastinal. Esta região contém a aorta torácica descendente, as veias ázigos, hemiázigos, e ázigos acessória, as cadeias simpáticas esquerda e direita, os nervos esplâncnicos, os nervos vagos, o esófago, o canal torácico e os nódulos linfáticos mediastinais posteriores.
Timo O timo é um dos dois órgãos linfóides primários, sendo o outro a medula óssea. Este órgão bilobado e mole, encapsulado, sendo as suas duas porções unidas na linha média, por tecido conjuntivo, que se mistura com a cápsula de cada lobo. Esta última pode normalmente ter adesões ao pericárdio fibroso. O timo é maior nas primeiras etapas da vida, principalmente na puberdade, persistindo activamente em idade mais avançada, apesar da sua degeneração considerável.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A maior parte do timo encontra-se ao nível do mediastino superior e no mediastino anterior, sendo que o seu bordo inferior atinge o nível das quartas cartilagens costais. Superiormente, extensões para o pescoço são comuns, reflectindo a origem embrionária do timo, do terceiro espaço faríngeo. Os seus pólos superiores juntam-se e estendem-se superiormente ao nível da incisura suprasternal, sendo que o esquerdo normalmente se estende mais superiormente, por vezes atingindo os pólos inferiores da glândula tiróide, ou mesmo regiões mais superiores. O timo liga-se à tiróide pelo ligamento tiro-tímico. Em termos de relações, a extremidade inferior do lobo direito encontra-se, inferiormente, por entre o lado direito da aorta ascendente e o pulmão direito e, anteriormente à veia cava superior. Anteriormente ao timo, encontra-se o esternohióide, o esternotiróide e fáscia (no pescoço) e o manúbrio esternal, os vasos torácicos internos e as três cartilagens costais superiores, no tórax. As pleuras encontram-se lateralmente e os nervos frénicos encontram-se anterolateralmente e inferiormente. Posteriormente, o timo contacta com os vasos do mediastino superior (a veia braquiocefálica esquerda pode estar em parte envolta na glândula), com a porção superior da traqueia torácica e com a face anterior do coração.
Irrigação arterial O timo é irrigado, principalmente, por ramos das artérias torácica interna e tiróide inferior, que também irrigam o tecido conjuntivo mediastinal adjacente. Um ramo da artéria tiróide superior encontra-se, por vezes, presente. O timo não apresenta um hilo principal, mas os ramos arteriais passam quer directamente através da cápsula, ou, mais frequentemente, para as profundezas dos septos interlobares, antes de entrarem no timos, na junção entre o seu córtex e medula.
Drenagem venosa As veias tímicas drenam para as veias braquiocefálica esquerda, torácica interna e tiróides inferiores e, por vezes, directamente, para a veia cava superior. Uma ou mais veias, por vezes, emergem medialmente de cada lobo do timo, formando um tronco comum que se abre na veia braquiocefálica.
Inervação O timo é inervado pelo tronco simpático, através do gânglio cervico-torácico, ou ansa subclávia e pelo nervo vago. Ramos dos nervos frénico e cervical descendente estão distribuídos principalmente para a cápsula. Os dois lobos são inervados separadamente através das suas regiões medial, dorsal e lateral.
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4. Sistema digestivo Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Esófago O esófago é um tubo muscular, que apresenta um comprimento de cerca de 25 cm e liga a faringe ao estômago. Inicia-se no pescoço, ao nível do bordo inferior da cartilagem cricóide e de C6 e desce, anteriormente à coluna vertebral, atravessando os mediastinos superior e posterior. Após passar pelo orifício esofágico do diafragma, ao nível de T10, o esófago termina no orifício cardíaco do estômago, ao nível de T11. De referir que, o esófago inicia-se no plano mediano, mas inclina-se para a esquerda, até à raiz do pescoço, voltando gradualmente até ao plano mediano, perto de T5. Já ao nível de T7, o esófago volta-se de novo para a esquerda, antes de perfurar o diafragma. De referir que, com excepção do apêndice vermiforme, o esófago é a porção mais estreita do tracto digestivo.
Esófago cervical O esófago cervical é posterior à traqueia, estando ligada a esta por tecido conjuntivo solto. Os nervos laríngeos recorrentes ascendem de cada lado, ou perto do sulco traqueo-esofágico. Posteriormente ao esófago cervical encontram-se a coluna vertebral, o longo do pescoço e a camada pré-vertebral da fáscia cervical profunda. Lateralmente, de cada lado, estão as artérias carótidas comuns e a porção posterior da glândula tiróide. Na região inferior do pescoço, onde o esófago se desvia para a esquerda, este torna-se mais próximo da bainha carotídea esquerda e da glândula tiróide (que fica à sua direita).
Esófago torácico O esófago torácico encontra-se situado um pouco à esquerda, no mediastino superior, por entre a traqueia e a coluna vertebral. Passa posteriormente e à direita da crossa da aorta, para descer no mediastino posterior, com o lado direito da aorta torácica descendente. Inferiormente, à medida que o esófago torácico se inclina para a esquerda, cruza anteriormente à aorta e entra no abdómen, ao nível de T10. No que concerne a relações, anteriormente encontramos (de superior para inferior) a traqueia, a artéria pulmonar direita, o brônquio principal esquerdo, o pericárdio (que o separa da aurícula esquerda) e o diafragma. Posteriormente ao esófago torácico, estão a coluna vertebral, longo do pescoço, artérias intercostais posteriores direitas, canal torácico, veia ázigos e porções terminais das veias hemiázigos e hemiázigos acessória e, perto do diafragma, a aorta. Um grande recesso do saco pleural direito encontra-se por entre o esófago e
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II a veia ázigos e coluna vertebral, no mediastino posterior. No mediastino superior, a porção terminal da crossa da aorta, a artéria subclávia esquerda, o canal torácico, a pleura esquerda e o nervo laríngeo recorrente são relações laterais esquerdas. Já lateralmente e à direita, encontramos a veia ázigos e a pleura direita. Inferiormente às raízes pulmonares, os nervos vagos descem em contacto com o esófago, o direito, mais posteriormente e, o esquerdo, mais anteriormente. Inferiormente no mediastino posterior, o canal torácico encontra-se posteriormente e à direita do esófago (a níveis mais superiores o ducto é posterior, cruzando-se para a esquerda do esófago ao nível de T5). À direita do esófago, superiormente ao diafragma, pode existir uma pequena bolsa infracardíaca serosa.
Esófago abdominal O esófago abdominal apresenta entre 1 a 2,5 cm de comprimento, sendo ligeiramente mais largo no orifício cardíaco, que ao nível do orifício esofágico do diafragma. Encontra-se à esquerda da linha média e entra no abdómen, através da abertura esofágica (formada pelos dois pilares do diafragma), do lado oposto ao de T10. Desloca-se obliquamente para a esquerda e ligeiramente posteriormente, terminando ao nível do orifício cardíaco do estômago. O esófago abdominal encontra-se posteriormente ao lobo esquerdo do fígado, que sulca ligeiramente. Por seu turno, esta estrutura é anterior ao pilar esquerdo, aos vasos frénicos inferiores esquerdos e ao nervo esplâncnico maior esquerdo. A superfície do esófago abdominal encontra-se coberta por uma fina camada de tecido conjuntivo e peritoneu visceral, que contém os nervos vagos anterior e posterior, bem como ramos esofágicos dos vasos gástricos esquerdos. O vago anterior pode ser um nervo único ou composto por múltiplos troncos, enquanto o vago posterior é normalmente um tronco único. O esófago abdominal encontra-se junto ao diafragma por tecido conjuntivo – o ligamento freno-esofágico. Este é formado por duas bandas espessadas de tecido conjuntivo rico em elastina, sendo uma extensão da fáscia transversalis.
Irrigação arterial O esófago cervical é irrigado pela artéria tiróide inferior, enquanto o esófago torácico é irrigado pelos ramos bronquiais e esofágicos da aorta torácica. Quatro ou cinco ramos esofágicos partem da face anterior da aorta e descem obliquamente para o esófago, onde formam uma cadeia vascular que se anastomosa superiormente com os ramos esofágicos das artérias tiróides inferiores e, inferiormente, com os ramos ascendentes das artérias frénica esquerda e gástrica esquerda. Por seu turno, o esófago abdominal é irrigado pelos ramos esofágicos da artéria gástrica esquerda. Estes ascendem como um ramo anterior e um ramo posterior, inferiormente ao peritoneu visceral, para dar ramos perfurantes para os plexos intramural e submucoso. A face posterior normalmente recebe uma irrigação arterial, através de ramos das artérias gástricas pequenas superiores, dos ramos terminais dos ramos esofágicos da aorta torácica e, por vezes, de um ramo ascendente da artéria gástrica posterior.
Drenagem venosa O sangue proveniente do esófago drena num plexo submucoso e, a partir daí, num plexo venoso periesofágico, a partir do qual partem as veias esofágicas. As veias provenientes do esófago torácico drenam, predominantemente para a veia ázigos e, em menor extensão, para as veias hemiázigos, intercostal e bronquiais. Já as veias do esófago cervical drenam na veia tiróide inferior. As veias da porção abdominal do esófago drenam, através de plexos, para as veias gástricas pequenas superiores. A
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II veia gástrica esquerda encontra-se com as veias esofágicas inferiores na abertura esofágica, na curvatura menor, drenando depois na veia porta.
Inervação O esófago superior é inervado pelos ramos do nervo laríngeo recorrente e por fibras simpáticas pósganglionares, que o atingem, ao se deslocarem juntamente com as artérias tiróides inferiores. A porção inferior do esófago é inervada pelo plexo esofágico, uma rede de sistema nervoso autónomo, que rodeia o esófago inferiormente ao nível dos troncos pulmonares e contêm uma mistura de fibras simpáticas e para-simpáticas. Estas últimas derivam directamente do plexo torácico peri-esofágico e, com menor relevância, dos nervos vago anterior e posterior. Já a inervação simpática provém dos segmentos espinhais 5-12 e está sobretudo, distribuída através dos nervos esplâncnicos maior e menor e plexo celíaco.
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Estômago O estômago é a porção mais larga do tracto alimentar, encontrando-se por entre o esófago e o duodeno. Este órgão está situado na região superior do abdómen, estendendose desde o quadrante superior esquerdo, inferiormente e para a direita, encontrando-se nas regiões hipocondríaca esquerda, epigástrica e umbilical e ocupando um recesso inferior ao diafragma e à parede abdominal anterior, que é delimitado pelas vísceras abdominais de cada lado. A superfície peritoneal do estômago encontra-se interrompida pelos omentos maior e menor, que definem as curvaturas maior e menor, que separam as duas superfícies. O estômago é dividido em fundo, corpo, antro pilórico e piloro, por linhas arbitrárias desenhadas na sua superfície externa. O fundo apresenta uma forma de cúpula, projectando-se superiormente e para a esquerda do orifício cardíaco, para contactar com a cúpula esquerda do diafragma. O fundo situa-se sobre uma linha, desenhada horizontalmente, desde a incisura cardíaca, até à curvatura maior. O corpo do estômago estende-se desde o fundo, até à incisura angular, uma incisura externa constante, na extremidade inferior da curvatura menor. O bordo inferior do corpo é definido por uma linha desenhada da incisura angular para um sulco na curvatura maior. Já o antro pilórico estende-se desde essa linha até ao sulco intermédio, onde o estômago se estreita, até se tornar o canal pilórico, que termina no orifício pilórico. Ao longo do estômago, encontramos várias fibras musculares, que apresentam disposições diferentes. Acompanhando as curvaturas, encontramos as fibras do músculo longitudinal externo. Já na porção mais central, encontramos fibras do músculo oblíquo íntimo (dispostas diagonalmente) e do músculo circular (dispostas circularmente).
Curvaturas do estômago A curvatura menor estende-se por entre os orifícios cardíaco e pilórico, formando o bordo medial (posterior e superior) do estômago. Esta curvatura desce do lado medial do esófago, em frente às fibras do pilar direito do diafragma, curva-se inferiormente e para a direita e encontra-se anteriormente ao bordo superior do pâncreas. Esta curvatura termina ao nível do piloro, à direita da linha média. Ao nível desta curvatura, existe normalmente uma incisura angular, cuja posição e aparência, varia com a distensão gástrica. O omento menor está ligado à curvatura menor e contém os vasos gástricos direito e esquerdo (o omento é uma prega de peritoneu). A curvatura maior é quatro ou cinco vezes maior que a curvatura menor. Esta inicia-se a partir da incisura cardíaca, que é formada por entre o bordo lateral do esófago e o fundo do estômago. A curvatura maior arqueia-se superiormente, posterolateralmente e para a esquerda. A sua zona de maior
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II convexidade é designada por ápice do fundo, estando aproximadamente ao nível do quinto espaço intercostal, inferiormente ao mamilo esquerdo, nos indivíduos do sexo masculino. A partir deste nível, a curvatura maior desloca-se inferiormente e anteriormente e ligeiramente para a esquerda, até à décima cartilagem costal. Aí, esta curvatura desloca-se medialmente, terminando ao nível do piloro. Ao nível desta curvatura, encontra-se frequentemente um sulco – o sulco intermédio, perto da constrição pilórica. O início da curvatura maior encontra-se coberto por peritoneu, que se continua sobre a face anterior do estômago. Lateralmente, a curvatura maior dá inserção ao ligamento gastrosplénico e, depois, ao omento maior, que contém os vasos gastroepiplóicos.
☤O
ligamento gastrosplénico e o omento maior, juntamente com os ligamentos gastrofrénico e esplenorenal são porções contínuas do mesogástrio dorsal original. Os seus nomes indicam simplesmente, as regiões da mesma banda contínua de peritoneu.
Faces do estômago No que concerne a faces, o estômago apresenta uma face anterior e uma face posterior, contudo, quando o estômago está vazio e contraído, estas passam a olhar superior e inferiormente, respectivamente.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A porção lateral da face anterior é posterior ao bordo costal esquerdo, contactando com o diafragma, que a separa da pleura esquerda, da base do pulmão esquerdo, do pericárdio e da sexta à nona costelas esquerdas. Esta porção encontra-se posterior à zona de fixação costal das fibras superiores do músculo transverso do abdómen, que a separa da sétima à nona cartilagens costais. A porção superior e esquerda desta superfície curva-se posterolateralmente, contactando com a face gástrica do baço. Já a metade direita da face anterior relaciona-se com os lobos esquerdo e quadrado do fígado e com a parede abdominal anterior. Quando o estômago se encontra vazio, o cólon transverso pode se encontrar adjacente à sua face anterior, que é totalmente coberta por peritoneu. A face posterior encontra-se anteriormente ao pilar esquerdo e fibras inferiores do diafragma, aos vasos frénicos esquerdos inferiores, à glândula supra-renal esquerda, ao pólo superior do rim esquerdo, à artéria esplénica, à face pancreática anterior, ao ângulo do cólon e à camada superior do mesocólon transverso. A porção superior esquerda da face posterior curva-se anterolateralmente, contactando com a face gástrica do baço. O omento maior e o mesocólon transverso separam o estômago do ângulo duodenojejunal e do íleo. A face posterior encontra-se coberta por peritoneu, excepto perto do orifício cardíaco, onde uma pequena área triangular contacta com o pilar diafragmático esquerdo e, por vezes, com a glândula supra-renal esquerda. Os vasos gástricos esquerdos atingem a curvatura menor na sua extremidade direita, na prega gastropancreática esquerda. O ligamento gastrofrénico passa desde a região lateral da face posterior até à face inferior do diafragma.
Orifícios A abertura do esófago no estômago designa-se por orifício cardíaco, encontrando-se tipicamente situado à esquerda da linha média, posteriormente à sétima cartilagem costal, ao nível de T11. O esófago abdominal é contínuo com o orifício cardíaco – o lado direito é contínuo com a curvatura menor, enquanto o esquerdo é contínuo com a curvatura maior. Este orifício não apresenta nenhum esfíncter anatómico.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O orifício pilórico é a abertura do estômago no duodeno, encontrando-se tipicamente, entre 1 a 2 cm à direita da linha média, no plano trans-pilórico, quando o estômago se encontra vazio. O esfíncter pilórico é um anel muscular formado por um espessamento do músculo gástrico, em intersecção com algumas fibras longitudinais. A constrição pilórica, de natureza circular, ao nível da superfície do estômago, normalmente indica a localização do esfíncter pilórico, sendo marcada por uma veia prépilórica, que cruza a face anterior do estômago, verticalmente e inferiormente.
Inervação do estômago A inervação simpática do estômago tem origem no quinto ao décimo-segundo segmentos espinhais torácicos, encontrando-se sobretudo distribuída para o estômago, através dos nervos esplâncnicos maior e menor, através do plexo celíaco. Os plexos peri-arteriais formam-se ao longo das artérias e inervam o estômago, através do tronco celíaco. Inervação adicional provém de fibras do plexo hepático, que passam para o corpo superior e fundo, através do limite superior do omento menor e por ramos directos dos nervos esplâncnicos maiores. Já a inervação para-simpática do estômago é assegurada pelos nervos vagos anterior e posterior. O nervo vago anterior é por vezes duplo, ou até mesmo triplo, e inerva filamentos para o orifício cardíaco. O nervo encontra-se muito próximo do músculo externo do esófago abdominal e divide-se perto da terminação esofágica da curvatura menor em ramos gástrico e pilórico/hepático. Os ramos gástricos são anteriores e superiores, estando presentes ao nível da face anterior do corpo superior e do fundo, sendo que o principal nervo gástrico é designado por nervo gástrico anterior maior, encontrando-se ao nível do omento menor, perto da curvatura menor. Já os ramos hepáticos/pilóricos originam-se inferiormente ao orifício cardíaco, sendo que o nervo pilórico/hepático principal desloca-se por entre as camadas de peritoneu do omento menor, até ao hilo do fígado, sendo que os ramos pilóricos deste nervo chegam até ao piloro. O nervo vago posterior tende a encontrar-se mais medialmente ao anterior e produz dois grandes grupos de ramos – nervos gástricos e nervos celíacos. Os ramos gástricos partem e deslocam-se posteriormente ao orifício cardíaco e ao corpo superior do estômago, estendendo-se sobre a superfície posterior do corpo e o fundo até ao antro proximal, embora não atinjam, normalmente, o esfíncter pilórico. O maior dos nervos gástricos é o nervo gástrico posterior maior, que se desloca posteriormente, ao longo da curvatura menor, dando ramos celíacos, que, por sua vez, dão ramos hepáticos.
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Duodeno O duodeno adulto apresenta entre 20 a 25 cm de comprimento, sendo a porção mais curta, larga e menos variável em termos de localização, do intestino delgado. O duodeno encontra-se sobre o nível do umbigo e apenas em parte está coberto pelo peritoneu, normalmente nos seus 2,5 cm proximais. Esta estrutura forma um “C” alongado que se encontra por entre L1 e L3, sendo que a projecção inferior do “C” estende-se mais para a esquerda da linha média que a projecção superior. A cabeça e a apófise unciforme do pâncreas encontram-se ao nível da concavidade do duodeno. Por outro lado, para além do “C” formado pelo duodeno, este encontra-se dobrado em direcção antero-posterior. De referir que, interiormente, ao nível do duodeno, encontramos várias pregas circulares.
Primeira porção (porção superior) A primeira e mais móvel porção do duodeno apresenta cerca de 5cm de comprimento, iniciando-se como uma continuação do piloro (constituindo a sua porção mais proximal, o bulbo duodenal) e terminando no ângulo duodenal superior. O peritoneu cobre a porção anterior e superior da sua região posterior, próxima do piloro, onde o duodeno participa na formação da parede anterior do buraco epiplóico. Aqui, o omento menor encontra-se fixo ao bordo superior do duodeno e o omento maior ao seu bordo inferior. Os primeiros 2-3 cm são normalmente referidos como a “cobertura do duodeno”, apresentando várias pregas internas e o mesmo padrão de rugas internas, que o piloro. O duodeno passa então superiormente, posteriormente e lateralmente, por 5 cm, antes de se curvar inferiormente para o ângulo duodenal superior, tornando-se cada vez menos coberto por peritoneu. A secção que vai desde a cobertura duodenal até ao ângulo duodenal superior encontra-se posterior e inferiormente ao lobo quadrado do fígado. A primeira porção do duodeno encontra-se anterior à artéria gastroduodenal, canal biliar comum e veia porta, sendo anterosuperior à cabeça e colo do pâncreas. Por outro lado, esta porção é posterior ao colo da vesícula biliar. Os nódulos linfáticos hepatoduodenal e hepático comum encontram-se próximos da primeira parte do duodeno, sendo que a junção entre a primeira e a segunda parte do duodeno encontra-se posterior ao colo da vesícula biliar.
Segunda porção (porção descendente) A segunda porção do duodeno apresenta entre oito e dez centímetros. Inicia-se no ângulo duodenal superior e desloca-se inferiormente numa ligeira curva, convexa para o lado direito da coluna vertebral, e
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II estendendo-se para o bordo inferior de L3. Esta porção vira-se, então, descaradamente medialmente até ao ângulo duodenal inferior, que marca a sua junção com a terceira porção do duodeno. A região superior da segunda porção do duodeno, tal como a região distal da primeira encontra-se coberta por peritoneu só na sua face anterior. A segunda porção do duodeno encontra-se posteriormente ao colo da vesícula biliar e ao lobo direito do fígado, na sua região inicial, sendo cruzada anteriormente pelo cólon transverso. A extremidade medial do omento gastrocólico e a origem do mesocólon transverso estão fixos à face anterior do duodeno por tecido conjuntivo solto. Inferiormente à fixação do mesocólon transverso, o tecido conjuntivo e os vasos que formam o mesentério do cólon ascendente e ângulo hepático encontram-se juntos à parede anterior desta porção do duodeno. A segunda porção do duodeno encontra-se anteriormente ao hilo do rim direito, dos vasos renais direitos, ao bordo da veia cava inferior e ao psoas maior direito. A cabeça do pâncreas e o ducto biliar comum encontram-se medialmente, enquanto o ângulo hepático encontrase superior e lateralmente. Uma pequena porção da cabeça pancreática encontra-se por vezes envolta na parede duodenal medial. No que concerne à aparência interna, esta é similar à da porção distal da primeira porção do duodeno, apresentando pregas mucosas salientes. O tronco biliar comum e o canal pancreático entram na parede medial obliquamente e, normalmente, unem-se formando a ampola hepatopancreática, cuja extremidade distal é estreita e abre-se ao nível da papila duodenal maior (ampola de Vater), que se encontra situada na parede posteromedial da segunda porção do duodeno, 8 a 10 cm distalmente ao piloro. Por vezes, encontra-se um canal pancreático acessório, que se pode abrir a 2 cm sobre a papila maior, numa papila duodenal menor.
Terceira porção (porção horizontal) A terceira porção do duodeno inicia-se no ângulo duodenal inferior, apresentando aproximadamente 10 cm de comprimento. Desloca-se desde o lado direito do bordo inferior de L3, sendo posterior aos mesentérios do cólon transverso e do intestino delgado (origem) e aos vasos mesentéricos superiores. A porção inferior da sua região anterior encontra-se coberta por peritoneu, que se encontra reflectido anteriormente, para formar a camada posterior de origem do mesentério do intestino delgado. A terceira porção do duodeno encontra-se anteriormente ao uréter direito, ao psoas maior direito, aos vasos gonadais direitos e à veia cava inferior e aorta abdominal (na origem da artéria mesentérica
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II inferior) e inferiormente à cabeça do pâncreas. Anteroinferiormente, ansas do jejuno encontram-se nos compartimentos infracólicos direito e esquerdo. A porção média da terceira parte encontra-se no ângulo por entre os vasos mesentéricos superiores, anteriormente, e a aorta abdominal, posteriormente.
Quarta porção (porção ascendente) A quarta porção do duodeno apresenta 2,5 cm, iniciando-se à esquerda da aorta e deslocando-se superiormente e lateralmente ao nível do bordo superior de L2. Depois, esta porção desloca-se anteroinferiormente ao nível do ângulo duodenojejunal, tornando-se contínua com o jejuno. O tronco principal da veia mesentérica inferior encontra-se, quer posteriormente à flexura duodenojejunal, quer inferiormente à prega peritoneal adjacente. A aorta, o tronco simpático esquerdo, o psoas maior esquerdo, os vasos gonadais esquerdos e renais esquerdos são relações posteriores, enquanto o rim esquerdo e o uréter esquerdo são posterolateral. Anteriormente à quarta porção do duodeno encontramos a porção superior da raiz do mesentério do intestino delgado, o mesocólon transverso lateral esquerdo e o cólon transverso (que o separa do estômago). O peritoneu da raiz do mesentério do intestino delgado continua-se sobre a sua face anterior. Superiormente, encontramos o bordo inferior do corpo do pâncreas. Na sua terminação lateral esquerda, a quarta porção torna-se progressivamente coberta por peritoneu, nas suas faces superior e inferior, tal como a que se encontra suspensa do retroperitoneu, por uma dupla prega de peritoneu – o ligamento de Treitz, no início do ângulo duodenojejunal. O ligamento de Treitz pode conter o músculo suspensor do duodeno, que quando presente, contém fibras esqueléticas que se deslocam do pilar esquerdo do diafragma para o tecido conjuntivo em torno do eixo celíaco e fibras lisas que saem do tronco celíaco.
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Jejuno e íleo Jejuno O jejuno apresenta um diâmetro externo mediano de 4cm e um diâmetro interno de 2,5 cm, apresentando uma parede mais espessa que o íleo. As pregas circulares são mais distintas no jejuno proximal, onde são mais numerosas e profundas, que em mais qualquer lugar do intestino delgado. Estas ramificam-se frequentemente em torno do lumen, consistindo em grandes pregas valvulares, que se projectam para o lúmen do intestino. O jejuno ocupa o compartimento infracólico esquerdo superior, estendendo-se inferiormente até à região umbilical. A primeira das duas ansas, por vezes, ocupa um recesso por entre a porção esquerda do mesocolon transverso e rim esquerdo.
Íleo O íleo apresenta um diâmetro externo mediano de 3,5 cm e um diâmetro interno de 2 cm, apresentando uma parede mais fina que a do jejuno. As pregas circulares tornam-se cada vez menos óbvias na mucosa distal no íleo, podendo ser únicas, mais achatadas e com cristas menos pronunciadas, sendo que a mucosa do íleo terminal imediatamente proximal à válvula íleo-cecal pode parecer quase achatada. O íleo terminal encontrase frequentemente na pelve, a partir de onde ascende sobre o psoas maior direito e vasos ilíacos direitos, terminando abrindo-se na válvula íleo-cecal na fossa ilíaca direita.
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☤ Um divertículo ileal (divertículo de Meckel) existe em 3% dos adultos e representa os restos da porção proximal do canal intestino-vitelino. Projecta-se do bordo antimesentérico do íleo terminal e encontra-se localizado, normalmente, entre 50 a 100 cm da válvula íleo-cecal. O lúmen do divertículo normalmente tem um calibre similar ao do íleo, sendo a ponta normalmente livre, embora possa estar ligada à parede abdominal anterior por uma banda fibrosa. A inflamação diverticular pode similar a apendicite aguda.
Diferenças entre jejuno e íleo Calibre e espessura Pregas Irrigação Número de arcadas Quantidade de gordura
Jejuno Maior Abundantes e vincadas Mais irrigado Menor Menos abundante
Íleo Menor Quase ausentes Menos irrigado Maior Mais abundante
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Intestino grosso O intestino grosso estendese desde a válvula íleo-cecal até ao ânus. Este intestino inicia-se na fossa ilíaca direita, como ceco, a partir do qual parte o apêndice vermiforme. O ceco torna-se o cólon ascendente, que passa superiormente na região lombar direita e no hipocôndrio até à região inferior do fígado, onde se dobra para a esquerda, formando o ângulo esquerdo (ângulo cólico direito) e tornando-se o cólon transverso. Esta porção forma uma ansa ao longo do abdómen, apresentando uma convexidade anteroinferior, até chegar ao hipocôndrio esquerdo, onde se curva inferiormente, para formar o ângulo esplénico. Aí torna-se o cólon descendente, que se desloca através das regiões lombar esquerda e ilíaca, para se tornar o cólon sigmóide, na fossa ilíaca esquerda. O cólon sigmóide desce, profundamente na pelve, tornando-se o recto, que termina no canal anal, ao nível do pavimento da pelve. O intestino grosso tem aproximadamente 1,5 metros nos adultos, embora existam variações consideráveis no que toca ao seu comprimento. Em termos de calibre, este é maior perto do ceco, diminuindo gradualmente até ao nível do cólon sigmóide. O intestino grosso difere do intestino delgado, em várias formas – apresenta um calibre maior, uma posição mais fixa, o seu músculo longitudinal encontra-se concentrado em três feixes longitudinais – as ténias coli, presentes ao nível de todo o intestino, excepto no cólon sigmóide e recto. Pequenas projecções adiposas – os apêndices epiplóicos encontram-se dispersos sobre a superfície livre do cólon (tendem a estar ausentes do ceco, apêndice vermiforme e recto). A parede colónica apresenta saculações, que podem ser, em parte devidas à presença das ténias coli. De referir que o espaço por entre as ténias se designa por bussoladura. As haustra (pequenos espaços causados pela saculação) do cólon encontram-se por vezes ausentes ao nível do ceco, proximalmente à origem do cólon ascendente, sendo, por vezes, relativamente finas no cólon ascendente e transverso proximal. Nessas regiões, as ténias coli são normalmente finas e ocupam apenas uma pequena percentagem da circunferência do cólon. Existem poucos ou nenhuns apêndices epiplóicos na face serosa do ceco e, muito poucos, na superfície do cólon ascendente. As haustra tornam-se mais pronunciadas a partir das regiões média e transversa do cólon até à porção distal do cólon descendente – o cólon sigmóide é, de facto, frequentemente caracterizado por uma saculação bem definida. O comprimento das ténias coli mantém-se relativamente constante, ao longo de todo o cólon, mas o número de apêndices epiplóicos normalmente aumenta. As ténias encontram-se localizadas em posições, também, constantes inferiormente à superfície serosa do cólon, excepto ao nível do cólon
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II transverso. Estas encontramse dispostas anteriormente, do lado oposto à linha média da fixação mesentérica (ténia livre), posterolateralmente (ténia omental) e posteromedialmente (ténia mesocólica), por entre as ténias livres e o mesentério. No cólon transverso, as ténias sofrem uma rotação de 90º e dessa forma, a anterior tornase inferior, a posteromedial torna-se posterior e a posterolateral torna-se superior. Estas bandas unemse para formar um músculo longitudinal completo, que cobre o recto, que não tem saculação externa, nem apêndices epiplóicos. Ao longo da sua extensão, a aparência interna do cólon caracteriza-se pela presença de haustra. Contudo, estas nunca formam um anel circunferencial completo. Na porção do ceco, onde ocorrem as haustra, as três ténias longitudinais convergem, formando um padrão característico de trevo, na parede do ceco. De resto, a parede do pólo inferior do ceco é desprovida de haustra. Partes do cólon encontram-se fixas no retroperitoneu, sendo que outras se encontram suspensas por um mesentério (dupla camada de peritoneu, que suspende porções dos intestinos da parede posterior do abdómen, envolvendo tecido conjuntivo adiposo, vasos, nervos e linfáticos), à cavidade peritoneal. O ceco pode se encontrar envolto em retroperitoneu, mas mais frequentemente encontra-se suspenso por um pequeno mesentério. O cólon ascendente é normalmente retroperiotneal, embora o ângulo hepático possa se encontrar suspenso por um mesentério. O cólon transverso emerge do retroperitoneu, num mesentério, encontrando-se no abdómen superior. O mesocolon transverso pode se tornar retroperitoneal ao nível do ângulo esplénico, que se pode encontrar suspenso por um pequeno mesentério. O cólon descendente é retroperitoneal, normalmente até ao nível da crista ilíaca esquerda. À medida que o cólon entra na pelve, torna-se cada vez mais mesentérico, na origem do cólon sigmóide, embora o comprimento geral do mesentério sigmóide seja altamente variável. Ao nível da junção rectosigmóide, o mesentério já praticamente não existe e daí que o recto entre na pelve, como uma estrutura retro-peritoneal.
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Ceco O ceco é um grande espaço que se encontra na fossa ilíaca direita, inferiormente à válvula íleo-cecal, sendo contínuo proximalmente com o íleo distal e, distalmente, com o cólon ascendente. O apêndice vermiforme normalmente parte do seu lado medial, ao nível da sua abertura do íleo. O seu comprimento axial médio é de 6 cm e a sua largura é de 7,5 cm. Posteriormente, encontra-se o ilíaco direito e o psoas maior, com o nervo cutâneo lateral da coxa entreposto, bem como o recesso retro-cecal, que frequentemente contém o apêndice vermiforme. Anteriormente ao ceco, encontramos a parede abdominal anterior, excepto quando o ceco se encontra vazio – aí, podemos encontrar entrepostos, o omento maior e algumas ansas do intestino delgado. Normalmente o ceco encontra-se totalmente coberto por peritoneu, mas por vezes, esta cobertura é incompleta posterosuperiormente, onde se encontra sobre a fáscia ilíaca, apenas separado desta por tecido conjuntivo solto.
☤ O processo de reabsorção de fluidos e electrólitos inicia-se no ceco, embora ocorra sobretudo ao nível das porções ascendente e transversa do cólon. A natureza distensível e a morfologia em saco do ceco permite o armazenamento de grandes volumes de quimo semi-líquido, que entra através da válvula íleo-cecal. O íleo abre-se na região posteromedial do intestino grosso na junção do ceco e do cólon, através da válvula íleo-cecal. O orifício apresenta duas pregas que se projectam no lúmen do intestino grosso. A forma precisa da válvula varia. O lábio superior, aproximadamente horizontal, encontra-se fixo à junção do íleo e do cólon, sendo que o lábio inferior é maior e mais côncavo, estando fixo à junção do íleo e do ceco. Nas suas extremidades, as pregas fundem-se, continuando-se como estreitas cristas membranosas – os freios da válvula.
☤ Pensa-se que esta válvula previna o refluxo de quimo do ceco para o íleo e que atrase a passagem de conteúdo ilíaco para o ceco, quando o músculo circular da válvula se encontra contraído por estimulação simpática.
Apêndice vermiforme O apêndice vermiforme é um tubo estreito em forma de verme, que parte da parede posteromedial do ceco, aproximadamente a 2 cm inferiormente à terminação do íleo, podendo ocupar várias posições. As posições mais comuns são a retrocólica, a retrocecal (por detrás do cólon ascendente inferior ou do ceco, respectivamente), a pélvica ou a descendente (quando o apêndice se encontra pendurado, sobre a abertura pélvica, em relação com a trompa de Falópio direito e com o ovário, nos indivíduos do sexo feminino). Outras posições incluem, a localização inferior ao ceco e pré e pós ilíaca (anterior ou posteriormente ao íleo terminal, respectivamente).
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O apêndice apresenta um tamanho que varia entre 2 a 20 cm, sendo normalmente maior nas crianças e podendo atrofiar na etapa adulta média. De referir que, o apêndice encontra-se ligado por um mesoapêndice pequeno à porção inferior do mesentério ilíaco, sendo este normalmente triangular e estendendo-se quase até à ponta apendicular. As três ténias cólicas no cólon ascendente e ceco convergem na base do apêndice e misturam-se com o seu músculo longitudinal. A ténia cecal anterior é normalmente distinta. Já quanto ao lúmen do apêndice, este é pequeno e abre-se no ceco, por um orifício, que se encontra inferiormente e ligeiramente posterior à abertura íleo-cecal. O orifício é por vezes guardado por uma prega mucosa que forma uma valva assimétrica, que tende a encontrar-se paralela à parede medial do ceco e à válvula íleo-cecal.
☤ Em anatomia de superfície, a localização do apêndice é feita com recurso ao ponto de Mc Burney – que se encontra na junção de uma linha que vai desde o umbigo até à espinha ilíaca antero-superior com a junção dos dois terços direitos e o terço esquerdo do cólon transverso.
Cólon Cólon ascendente O cólon ascendente apresenta cerca de 15 cm e é mais estreito que o ceco. Ascende até à face inferior do lobo direito do fígado, onde forma uma ténue depressão; deslocando-se depois abruptamente, para a frente e para a esquerda, no ângulo hepático. Esta estrutura é retroperitoneal, sendo coberta anteriormente e por ambos os lados por peritoneu. A sua superfície posterior encontra-se separada da fáscia ilíaca, ligamento iliolombar, quadrado lombar, aponervose do transverso do abdómen e fáscia peri-renal anterior, por tecido conjuntivo solto. O nervo cutâneo femoral lateral, por vezes a quarta artéria lombar e os nervos ilioinguinal e iliohipogástrico encontram-se posteriormente, enquanto cruzam o quadrado lombar. Lateralmente, o peritoneu forma o recesso paracólico lateral e medialmente, o recesso paracólico medial. O cólon ascendente apresenta ainda um estreito mesocolon, em parte do seu percurso num terço dos indivíduos. Anteriormente, este contacta com ansas do íleo, com o omento maior e com a parede abdominal anterior. O ângulo hepático forma a junção dos cólon ascendente e transverso, quando o último se volta inferiormente, para a frente e para a esquerda. A sua posição é variável e normalmente forma um ângulo menos agudo, comparativamente ao ângulo esplénico. A face anterior do pólo inferior do rim direito encontra-se posteriormente, enquanto o lobo direito do fígado é superior e anterolateral. Medialmente, encontramos a porção descendente do duodeno e anteromedialmente, o fundo da vesícula biliar. O ângulo hepático encontra-se, por vezes, coberto pelo omento maior, que pode por vezes estar fixo à face anterior, que na porção superior do cólon ascendente e a extremidade proximal (direita) do cólon transverso.
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Cólon transverso O cólon transverso apresenta cerca de 50 cm, estendendo-se desde o ângulo hepático, na região lombar direita, ao longo da região hipocondríaca esquerda, onde se curva posteroinferiormente, inferiormente ao baço, como ângulo esplénico. O cólon transverso é altamente variável em comprimento e posição, mas por vezes, descreve um arco invertido, cuja concavidade se dirige posteriormente e superiormente. Perto da fissura esplénica, uma curva em forma de U, pode descer mais inferiormente que o arco principal. A superfície posterior, ao nível do ângulo hepático encontra-se desprovida de peritoneu, encontrando-se fixa por tecido conjuntivo à frente da porção descendente do duodeno e à cabeça do pâncreas. O cólon transverso desde esta região até ao ângulo esplénico é completamente coberta por peritoneu. Esta porção do cólon encontrase suspensa do bordo anterior do corpo do pâncreas pelo mesocolon transverso, que está ligado desde a porção inferior do rim direito, passando ao longo da segunda porção do duodeno e pâncreas, até ao pólo inferior do rim esquerdo. O cólon transverso encontra-se suspenso por entre os ângulos, chegando por vezes à pelve. Superiormente ao cólon transverso, encontramos o fígado, a vesícula biliar, a curvatura maior do estômago e o corpo do baço. A superfície anterior e inferior da porção do intestino grosso está normalmente fixa ao estômago pelo ligamento gastrocólico, que é contínuo com o omento maior. Posteriormente e inferiormente ao cólon transverso, encontram-se a porção descendente do duodeno, a cabeça do pâncreas, a extremidade superior do mesentério do intestino delgado, o ângulo duodenojejunal e as ansas do jejuno e do íleo. O ângulo esplénico forma a junção entre o cólon transverso e descendente, encontrando-se no hipocôndrio esquerdo, inferomedialmente ao pólo inferior do baço. Encontra-se anterior à cauda pancreática e ao rim esquerdo, do qual se encontra separado pela fáscia peri-renal
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II anterior. O ângulo esplénico por vezes é muito agudo, de tal modo a que o fim do cólon transverso se sobrepõe ao início do cólon descendente, podendo haver estruturas peritoneais ou omentais, por entre essas duas estruturas. O ângulo esplénico encontra-se mais superiormente e posteriormente que o ângulo hepático, sendo que o peritoneu visceral que cobre a sua região lateral está por vezes fixo ao diafragma, ao nível da 10ª e 11ª costela, através do ligamento frénico-cólico (este ligamento encontra-se inferiormente ao pólo anterolateral do baço).
Cólon descendente O cólon descendente apresenta cerca de 25 cm, descendo através do hipocôndrio esquerdo e região lombar, inicialmente seguindo o bordo lateral do pólo inferior do rim esquerdo e depois, descendo, no ângulo por entre o psoas maior e o quadrado lombar, até à crista ilíaca. Esta porção do intestino grosso curva-se, então, inferomedialmente, encontrando-se anteriormente ao ilíaco e psoas maior, para se tornar o cólon sigmóide, inferiormente ao nível da crista ilíaca. O cólon descendente é uma estrutura retroperitoneal, estando coberto anteriormente em ambos os lados por peritoneu. A sua superfície posterior encontra-se separada por tecido conjuntivo solto da fáscia peri-renal anterior (inferolateralmente ao rim direito), da aponevrose do transverso do abdómen, quadrado lombar, ilíaco e à porção mais superolateral do psoas maior. Os vasos e nervos subcostais e os nervos iliohipogástricos, ílio-inguinais, cutâneos femorais laterais, femorais e genitofemorais, bem como a quarta artéria lombar encontram-se posteriormente ao cólon descendente. Anteriormente, encontramos as ansas do jejuno. De referir que, o cólon descendente é mais pequeno em calibre, mais localizado profundamente e mais, frequentemente, coberto por peritoneu, que o cólon ascendente.
Cólon sigmóide O cólon sigmóide inicia-se inferiormente ao inlet pélvico e termina no recto. Normalmente, esta estrutura forma uma ansa móvel, que normalmente se encontra na pelve menor, embora o seu comprimento e forma sejam os mais variáveis de todos os segmentos do cólon. Normalmente, encontra-se totalmente coberto por peritoneu, estando ligado à porção inferior da parede abdominal posterior e à parede posterior da pelve falsa, pelo mesocolon sigmóide, cuja raiz apresenta uma fixação em forma de “V” à parede abdominal posterior. De referir que, a posição e a forma do cólon sigmóide variam de acordo com o comprimento do cólon. O cólon sigmóide inicialmente desce sobre a crista ilíaca na pelve falsa, mas a sua posição é altamente variável. Pode permanecer dobrado e, em contacto, ou aderente, ao peritoneu sobre o ilíaco, ou pode cruzar a cavidade pélvica, por entre o recto e a bexiga, nos indivíduos do sexo masculino; ou o recto e o útero, nos indivíduos do sexo feminino, podendo até chegar à parede pélvica direita.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A ansa sigmóide termina numa posição relativamente constante, encontrando-se imediatamente à esquerda da linha média, ao nível de S3, onde se dobra inferiormente e é contínua com o recto. Esta ansa encontra-se fixa às suas junções com o cólon descendente e com o recto, mas é deveras móvel, por entre estes, apresentando relações variáveis. Lateralmente, encontramos os vasos ilíacos externos esquerdos, o nervo obturador, o ovário ou canal deferente e a parede pélvica lateral. Posteriormente, encontram-se os vasos ilíacos externos esquerdos e internos, os vasos gonadais, os ureteres, o piriforme e o plexo sagrado. Anteroinferiormente, encontram-se a bexiga, nos indivíduos do sexo masculino, ou o útero e a bexiga, nos indivíduos do sexo feminino. Superiormente e para a direita, temos as ansas do íleo.
Recto O recto é contínuo com o cólon sigmóide, ao nível de S3, terminando ao nível da extremidade superior do canal anal. Desce ao longo da concavidade sacro-coccígea, como ângulo sagrado do recto, inicialmente inferoposteriormente e, depois, inferoanteriormente, juntando-se ao canal anal, ao passar através do diafragma pélvico. A junção ano-rectal encontra-se a 2-3 cm em frente e, ligeiramente, inferiormente à ponta do cóccix, que se encontra do lado oposto ao do ápice da próstata, nos indivíduos do sexo masculino. A partir deste nível, o canal anal passa inferiormente e posteriormente, desde a extremidade inferior do recto. A dobra posterior é designada por ângulo perineal do recto, sendo que o ângulo que forma com o canal anal superior é tido como o ângulo ano-rectal. O recto também se desvia em três curvas laterais – uma curva superior, convexa para a direita; uma curva média (a mais proeminente), convexa para a esquerda, e uma curva inferior, convexa para a direita, sendo que essas curvas são assinaladas, interiormente por pregas transversas. De referir que, ambas as extremidades do recto encontram-se no plano mediano. O diâmetro inicial do recto é similar ao do cólon sigmóide, mas mais inferiormente, torna-se dilatado, como ampola rectal. O recto difere do cólon sigmóide, na medida em que não apresenta saculações, ou apêndices epiplóicos. As ténias misturam-se a cerca de 5cm superiormente à junção recto-sigmóide, formando dois largos feixes musculares, que descem anteriormente e posteriormente, na parede rectal. Estes fundem-se, formando uma camada circular de músculo longitudinal, que reveste o total comprimento do recto. Ao nível da ampola rectal, algumas fibras longitudinais anteriores passam anteriormente para o corpo perineal, como músculo rectouretral. Para além disso, dois fascículos de músculo liso podem passar anteroinferiormente, das faces anteriores dos corpos das segunda e terceira vértebras coccígeas, para se misturarem com as fibras musculares longitudinais da parede posterior do canal anal, formando os músculos recto-coccígeos. O
terço
superior
do
recto
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II encontra-se coberto por peritoneu, nas suas regiões anterior e lateral. Anteriormente, relaciona-se com o cólon sigmóide, ou ansas de íleo, caso estas se encontrem na pelve; caso contrário, relaciona-se com a bexiga nos indivíduos do sexo masculino e com o cérvix e corpo do útero, nos indivíduos do sexo feminino. Já o terço médio do recto encontra-se coberto por peritoneu, apenas na sua região anterior. O peritoneu encontra-se reflectido superiormente na bexiga, nos indivíduos do sexo masculino, formando o espaço recto-vesical, ou na parede vaginal posterior, nos indivíduos do sexo feminino, formando o espaço recto-uterino. Esta reflexão encontra-se mais superiormente nos homens, nomeadamente a cerca de 7,5 cm da junção ano-rectal, contra 5,5 cm nas mulheres. Não existem haustra no recto. Quando a mucosa se encontra vazia, esta forma várias pregas longitudinais na sua porção inferior no interior do recto. O recto, normalmente, apresenta três pregas transversas permanentes, semi-lunares ou horizontais, melhor visíveis em distensão rectal. A prega superior, no início do recto, pode se encontrar, quer à esquerda, quer à direita, rodeando por vezes o lúmen rectal. A prega média, por sua vez, é a maior e a mais constante, encontrando-se imediatamente superiormente à ampola rectal, projectando-se da parede anterior e direita, inferiormente ao nível da reflexão peritoneal anterior. A prega inferior é a mais variável, encontrando-se à esquerda, inferiormente à prega média e delimitando a ampola rectal.
☤ Apesar de apresentar um comprimento absolutamente variável, em termos clínicos o recto é identificado a um comprimento de 15 cm superiormente ao bordo anal externo. No que concerne a relações, posteriormente ao recto, e separados deste pela fáscia pré-sagrada, encontramos, no plano mediano, as três últimas vértebras sagradas, o cóccix, os vasos sagrados medianos e a porção mais inferior da cadeia simpática sagrada. Lateralmente, a parte superior do recto relaciona-se com a fossa para-rectal e seus conteúdos (cólon sigmóide, ou íleo terminal), enquanto inferiormente à reflexão peritoneal, se encontram o piriforme, os ramos anteriores dós últimos três nervos sagrados e coccígeos, o tronco simpático, os vasos sagrados laterais inferiores e os músculos coccígeo e elevador do ânus. Anteriormente, superiormente ao nível da reflexão peritoneal, encontramse ansas do cólon sigmóide, ou do íleo terminal (caso estas se encontrem na pele); caso contrário, o recto relaciona-se com as porções superiores da base da bexiga, nos indivíduos do sexo masculino, ou com o cérvix/corpo do útero e porção superior da vagina, nos indivíduos do sexo feminino. As porções inferiores da base da bexiga, vesículas seminais, canais deferentes, porções terminais dos ureteres e próstata, nos indivíduos do sexo masculino, ou a porção inferior da vagina, nos indivíduos do sexo feminino, encontram-se inferiormente à reflexão.
☤ O mesorecto é um termo cirúrgico que designa, não um mesentério associado ao recto, mas sim uma porção de tecido conjuntivo por onde passam os vasos rectais superiores. Este não é, por isso, um termo anatómico.
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Canal anal O canal anal inicia-se na junção ano-rectal, terminando no bordo anal, sendo angulado em relação ao recto, devido ao puborectal, que produz o ângulo ano-rectal. Este canal encontra-se entre 2 a 3 cm em frente, e ligeiramente inferiormente à ponta do cóccix, que se encontra do lado oposto ao do ápice da próstata, nos indivíduos do sexo masculino. O canal anal funcional é representado por uma zona de alta pressão, consistindo num limite epitelial interno, num subeptélio vascular, esfíncteres anais interno e externo e tecido fibromuscular de suporte, bem como uma rede neuronal densa. Este canal é normalmente de menores dimensões nos indivíduos do sexo feminino, apresentando entre 2,5 e 5 cm. Já no que concerne a paredes, a parede anterior é um pouco menor que a posterior. Anteriormente, o terço médio do canal anal encontra-se fixo por tecido conjuntivo denso ao corpo perineal, que o separa da uretra membranosa e do bulbo do pénis, nos indivíduos do sexo masculino, ou da porção inferior da vagina, em indivíduos do sexo feminino. Lateralmente e posteriormente, o canal anal encontra-se rodeado por tecido adiposo solto, dentro das fossas ísquio-rectais. Posteriormente, o canal anal encontra-se fixo ao cóccix pelo ligamento ano-coccígeo, uma estrutura fibro-elástica, situada na linha média e que se desloca desde a região posterior da porção média do esfíncter anal externo e o cóccix. Ao nível do canal anal médio, encontram-se entre 6 a 10 pregas verticais, as colunas anais, pior definidas nos indivíduos adultos. Cada coluna contém uma radícula terminal da artéria e veia rectal superior. As extremidades inferiores das colunas podem formar pequenas pregas crescênticas – as valvas anais, por entre as quais, se encontram pequenos recessos – os seios anais. As valvas e os seios anais formam, no seu conjunto, a linha pectínea (também designada por dentada). Cerca de seis glândulas anais abrem-se em pequenas depressões, as criptas anais, presentes ao nível das valvas anais. Ao nível do bordo inferior do esfíncter anal interno, encontramos uma depressão, a qual é designada por sulco interesfinctérico (esta estrutura é apenas visível no vivo e nos cadáveres é assinalada pela linha branca). Inferiormente a este, o canal é contínuo com a pele peri-anal.
Esfíncter anal interno O canal anal é rodeado por esfíncteres anais interno e externo, separados pela camada longitudinal. O esfíncter anal interno é um anel bem definido, de fibras de músculo liso, obliquamente orientadas, que é contínuo com o músculo circular do recto e que termina na junção dos componentes superficial e subcutâneos do esfíncter anal externo. A sua espessura varia entre 1,5 e 3,5 mm, sendo normalmente mais fino nos indivíduos do sexo feminino e tornando-se mais espesso com a idade.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A irrigação do esfíncter anal interno é assegurada por ramos terminais dos vasos rectais superiores e por ramos dos vasos rectais inferiores. No que concerne à inervação, esta é assegurada por fibras simpáticas que se originam dos dois segmentos espinhais lombares inferiores, causando contracção do esfíncter. Já as fibras para-simpáticas originam-se no segundo ao quarto segmentos sagrados, causando o relaxamento do esfíncter.
Esfíncter anal externo O esfíncter anal externo é um tubo oval complexo, constituído por músculo estriado, sendo que as suas fibras mais superiores se misturam com as fibras mais inferiores do pubo-rectal. No terço superior, algumas dessas fibras superiores cruzam-se anteriormente nos músculos perineais transversos superficiais e, posteriormente, algumas fibras encontram-se fixas à rafe ano-coccígea. No que concerne ao seu terço médio, a maioria das suas fibras rodeia a porção inferior do esfíncter anal interno, encontrando-se fixo, anteriormente, ao corpo perineal e, posteriormente, ao cóccix, através do ligamento ano-coccígeo: algumas fibras de cada lado do esfíncter formam uma comissura nas linhas médias anterior e posterior. Por último, as fibras do terço inferior encontram-se inferiormente ao nível do esfíncter anal interno, encontrando-se separadas por submucosa do epitélio anal mais inferior. A irrigação do esfíncter anal externa é assegurada por ramos terminais dos vasos rectais inferiores, com uma pequena contribuição da artéria sagrada mediana. Já a inervação provém, sobretudo, do ramo rectal inferior do nervo pudendo.
☤ O comprimento e a espessura do esfíncter anal externo variam entre sexos. Nos indivíduos do sexo feminino, a porção anterior tende a ser mais pequena, sendo que a parede tende a ser ligeiramente mais fina. Por outro lado, este esfíncter pode formar um cone assimétrico, sendo que os transversos do períneo e o bulbosponjoso fundem-se com o esfíncter na porção inferior do períneo. Nos indivíduos do sexo masculino, o esfíncter anal externo é mais anular, estando separado do ponto central do períneo, onde o bulbosponjoso e os transversos do períneo se unem. A camada longitudinal encontra-se situada por entre os esfíncteres interno e externo, contendo uma camada fibromuscular, o revestimento longitudinal conjunto, e um espaço inter-esfintérico, contendo tecido conjuntivo.
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Fígado O fígado é a maior víscera abdominal, ocupando uma área considerável na cavidade abdominal superior. Este órgão ocupa o hipocôndrio direito e epigástrio e frequentemente estende-se para o hipocôndrio esquerdo, até à linha lateral esquerda. O fígado representa cerca de 5% do peso corporal na infância, sendo que essa percentagem desce até a cerca de 2% na idade adulto. O tamanho do fígado também varia de acordo com o sexo, idade e tamanho corporal. O fígado desempenha um vasto leque de actividades metabólicas necessárias para a homeostasia, nutrição e defesa imunitária, sendo, por exemplo, importante para a remoção e quebra de materiais tóxicos, ou potencialmente tóxicos, a partir do sangue, para a regulação da glicose e lípideos presentes no sangue, bem como para o armazenamento de certas vitaminas, ferro e outros micronutrientes e para a quebra e modificação de aminoácidos. Uma vez que a maioria destes processos são exotérmicos, uma porção substancial da produção de energia térmica corporal é produzida pelo fígado, que é um local de hematopoiese no feto.
Faces do fígado O fígado é normalmente descrito como tendo faces superior, anterior, direita, posterior e inferior, bem como um distinto bordo inferior. Contudo, as faces superior, anterior e direita são contínuas e não apresentam bordos definidos a separá-los e daí, que fosse mais apropriado agrupá-las numa só face diafragmática, separada por um estreito bordo inferior, da face visceral (inferior).
Face superior A face superior é a maior face do fígado, encontrando-se imediatamente inferior ao diafragma e separada deste, por peritoneu, excepto numa pequena área triangular, onde os dois folhetos do ligamento falciforme divergem. A maioria da face superior encontra-se inferiormente à cúpula direita, existindo uma ténue impressão cardíaca, centralmente, que corresponde à posição do coração, sobre o tendão central do diafragma. O lado esquerdo da face superior encontra-se inferiormente à cúpula esquerda do diafragma.
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Face anterior A face anterior é aproximadamente triangular e convexa, sendo coberta por peritoneu, excepto na zona de fixação do ligamento falciforme. A maior parte desta face encontra-se em contacto com a região de ligação anterior do diafragma. À direita, o diafragma separa a face anterior da pleura e sexta a décima costelas e cartilagens costais, enquanto à esquerda, o diafragma separa-a da sétima e oitava cartilagens costais.
Face direita A face direita encontrase coberta por peritoneu e adjacente à cúpula direita do diafragma, que a separa do pulmão e pleura direita e da sétima à décima-primeira costelas. O pulmão direito e a pleura basal encontram-se superior e lateralmente ao seu terço superior, por entre o diafragma e a sétima e oitava costelas. O diafragma, o recesso costodiafragmático, delimitado pela pleura, e a nona e décima cartilagens costais encontram-se laterais ao terço médio da face direita. Lateralmente ao terço inferior, o diafragma e a parede torácica encontram-se em contacto directo com esta face hepática.
Face posterior A face posterior é convexa, mais larga à direita, mas mais estreita à esquerda. Uma profunda concavidade mediana corresponde à zona de convexidade anterior da coluna vertebral, próxima da fixação do ligamento venoso. A maior parte da face posterior encontra-se ligada ao diafragma por tecido conjuntivo solto, formando a triangular “área nua”. A veia cava inferior encontra-se num sulco ou túnel, na extremidade medial da “área nua”. Para a esquerda do sulco da veia cava inferior, a face posterior do fígado é formada pelo lobo caudado e é coberta por uma camada de peritoneu, contínua com a da camada inferior do ligamento coronário e com as camadas do omento menor. O lobo caudado relaciona-se com os pilares do diafragma, superiormente ao orifício aórtico e com a artéria frénica inferior direita, estando separado dessas estruturas pela aorta torácica descendente. A fissura para o ligamento venoso separa a região posterior do lobo caudado da porção principal do lobo esquerdo. Esta fissura contém duas camadas de omento menor. A face posterior sobre o lobo superior apresenta uma ténue impressão perto da extremidade superior da fissura do ligamento venoso, que é causada pela porção abdominal do esófago (impressão esofágica). A face posterior do lobo esquerdo à
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II esquerda dessa impressão relaciona-se com parte do fundo do estômago (impressão gástrica). Por entre a impressão gástrica e a impressão esofágica, encontra-se a tuberosidade omental, uma faixa mais proeminente. Do lado direito, encontramos também várias impressões, nomeadamente, uma impressão renal, de grandes dimensões e, mais para a esquerda, uma impressão cólica.
Face inferior A face inferior é delimitada pelo bordo inferior do fígado. Mistura-se com a face posterior na região de origem do omento menor, a porta hepática, e com a camada inferior do ligamento coronário, sendo marcada, perto da linha média por uma fissura aguçada que contém o ligamento redondo. A vesícula biliar normalmente encontra-se numa ténue fossa (a fossa para a vesícula biliar), embora isso seja variável – esta pode apresentar um pequeno mesentério, ou ser completamente intra-hepática, encontrando-se numa fenda no parênquima hepático. O lobo quadrado encontra-se por entre a fissura para o ligamento redondo e a vesícula biliar.
Lobos do fígado A face inferior do lobo esquerdo relaciona-se inferiormente com o fundo do estômago e com o omento menor superior. O lobo quadrado encontra-se adjacente ao piloro, à primeira porção do duodeno e à porção inferior do omento menor. Por vezes, o cólon transverso encontra-se por entre o duodeno e o lobo quadrado. À direita da vesícula biliar, a face inferior relaciona-se com o ângulo hepático do cólon, com a glândula supra-renal direita, com o rim direito e com a primeira porção do duodeno.
Lobo direito O lobo direito é aquele que apresenta maior volume, contribuindo para todas as faces do fígado. Encontra-se dividido do lobo esquerdo, pelo ligamento falciforme, superiormente, e pelo ligamento venoso, inferiormente. Na face inferior, à direita do sulco formado pelo ligamento venoso, existem duas proeminências separadas pela porta hepática – o lobo caudado, que se encontra posteriormente, e o lobo quadrado, que se encontra anteriormente. A vesícula biliar encontra-se numa ténue fossa, à direita do lobo quadrado.
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Lobo esquerdo O lobo esquerdo é o mais pequeno dos dois lobos principais, sendo substancialmente mais fino que o lobo direito. Encontra-se à esquerda do ligamento falciforme e não apresenta subdivisões, embora tenha um fino ápice. De referir que, nas crianças, os dois lobos apresentam dimensões similares.
Lobo quadrado O lobo quadrado é visível como uma proeminência na face inferior do fígado, à direita do sulco para o ligamento venoso. Encontra-se anteriormente à porta hepática e é delimitado pela fossa para a vesícula biliar à direita, por uma pequena porção do bordo inferior, anteriormente, pela fissura para o ligamento redondo, à esquerda, e pela porta hepática, posteriormente.
Lobo caudado O lobo caudado é visível como uma proeminência nas faces inferior e posterior à direita do sulco formado pelo ligamento venoso e encontrando-se posteriormente à porta hepática. À sua direita, encontra-se o sulco para a veia cava inferior. Superiormente, continua-se com a face superior à direita da extremidade superior da fissura para o ligamento venoso. O lobo caudado apresenta duas projecções, na sua região anterior – a apófise papilar, do lado esquerdo, sendo arredondada; e a apófise caudada, uma projecção mais longa, do lado direito.
Sectores e fissuras portais O fígado é dividido em quatro sectores portais pelos quatro ramos principais da veia porta. Esses são os sectores lateral direito, medial direito, medial esquerdo e lateral esquerdo. As três veias hepáticas principais encontram-se por entre estes sectores, como veias intersectoriais. Esses planos intersectoriais são também designados por fissuras portais (cissuras). As fissuras que contêm pedículos portais são denominadas fissuras hepáticas. Cada sector encontra-se subdividido em segmentos (normalmente dois), baseados na sua irrigação por divisões terciárias das bainhas biliares vasculares. Existem três fissuras principais no fígado, que não são visíveis ao nível da sua superfície e que se deslocam através do parênquima hepático, alojando as três veias hepáticas principais. As três fissuras principais incluem a portal principal, portal esquerda e portal direita. Já as fissuras menores são visíveis, como fendas físicas na superfície hepática. Estas fissuras incluem a umbilical, venosa e a fissura de Gans.
Fissura portal principal A fissura portal principal estende-se da ponta da vesícula biliar até à região do ponto médio da veia cava inferior, contendo a veia hepática média (principal). Esta fissura separa o fígado em semi-fígados direito e esquerdo. Os segmentos V e VIII encontram-se à direita, enquanto o segmento IV encontra-se à esquerda da fissura.
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Fissura portal esquerda A fissura portal esquerda divide o semi-fígado esquerdo em sectores medial (anterior) e lateral (posterior), estendendo-se desde o ponto médio do bordo anterior do fígado, por entre o ligamento falciforme e o ligamento triangular esquerdo, até ao ponto que marca a confluência entre as veias hepáticas média e esquerda. Esta fissura contém a veia hepática esquerda e separa o sector medial esquerdo do lateral esquerdo: O segmento III encontra-se anteriormente e o segmento II, posteriormente.
Fissura portal direita A fissura portal direita divide o semi-fígado direito em sectores lateral (posterior) e medial (anterior). O plano de fissura direita é o mais variável, entre as fissuras principais, e desloca-se aproximadamente na diagonal, através do lobo direito, desde a extremidade lateral do bordo anterior até à confluência das veias hepáticas média e esquerda. A fissura divide o sector medial direito, à sua esquerda (segmentos V e VIII) do sector lateral direito, à sua direita (segmentos VI e VII) e contém a veia hepática direita. De referir que a fissura direita marca o ponto mais espesso do parênquima hepático.
Fissura umbilical A fissura umbilical separa o segmento III do segmento IV, dentro do sector anterior esquerdo e contém um ramo principal da veia hepática esquerda (a veia da fissura umbilical). Esta fissura é marcada pela fixação do ligamento falciforme e encontra-se por vezes coberta por uma crista de tecido hepático, que se estende por entre os segmentos. A fissura umbilical contém a porção umbilical da veia porta esquerda, as divisões finais do canal hepático esquerdo e ramos da artéria hepática esquerda.
Fissura venosa A fissura venosa é uma continuação da fissura umbilical na face inferior do fígado e contém o ligamento venoso, encontrando-se por entre o lobo caudado e o segmento IV. A continuação mais profunda deste plano é designada por fissura dorsal.
Fissura de Gans A fissura de Gans encontra-se na face inferior do lobo direito do fígado, posteriormente à fossa da vesícula biliar, contendo, por vezes, o pedículo portal. Fissura
Veia contida
Estruturas separadas
Segmentos adjacentes
Fissura portal principal Fissura portal esquerda Fissura portal direita Fissura umbilical
Veia hepática média
Semi-fígados esquerdo e direito
Veia hepática esquerda
Sector medial esquerdo e lateral esquerdo Sector lateral direito e sector medial direito Segmento III e segmento IV
V e VIII (à direita) e IV (à esquerda) III (anteriormente) e II (posteriormente) V e VIII (à esquerda) e VI e VII (à direita) Segmento III e segmento IV
Lobo caudado e segmento IV
Segmento IV
Veia hepática direita Veia da fissura umbilical
Fissura venosa
Segmentos hepáticos Os sectores do fígado são formados por entre um e três segmentos. Os segmentos são numerados de acordo com o sentido inverso ao dos ponteiros do relógio, tendo a espiral centro, na veia porta, com o
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II fígado visto de baixo, desde o segmento I até ao segmento VI. Depois a contagem passa a ser no sentido dos ponteiros do relógio até aos segmentos VII e VIII.
O segmento I corresponde anatomicamente Sector Segmentos ao lobo caudado, encontrando-se Sector lateral direito VI e VII posteriormente (dorsalmente) ao segmento Sector medial direito V e VIII IV, com a sua metade esquerda, Sector medial esquerdo III e IV (e parte do I) directamente posterior aos segmentos II e III Sector lateral esquerdo II e a sua metade medial rodeada por grandes ramos vasculares. As bainhas glissonianas (pertencentes à cápsula do fígado) para o segmento I partem das bainhas principais direita e esquerda, e sendo assim, o segmento I recebe uma vascularização adicional à conferida pelas artérias hepáticas e veias portas esquerda e direita. Os canais biliares que drenam este segmento encontram-se intimamente relacionados com a confluência dos canais hepáticos esquerdo e direito. O segmento II é o único segmento no sector lateral esquerdo do fígado, encontrando-se posterolateralmente à fissura esquerda. Por vezes apresenta uma única bainha glissoniana e drena na veia hepática esquerda. O segmento III encontra-se por entre a fissura umbilical e a fissura esquerda, sendo por vezes abastecido por uma a três bainhas glissonianas e drenando na veia hepática esquerda. A veia do ligamento falciforme pode se revelar uma via de drenagem alternativa para este segmento. O segmento IV corresponde anatomicamente ao lobo quadrado e encontra-se por entre a fissura umbilical e a fissura principal, anteriormente à fissura dorsal e ao segmento I. Este segmento encontrase associado a três, quatro, ou cinco bainhas glissonianas, cuja maioria parte da fissura umbilical, perto das origens das bainhas para os segmentos II e III. Por vezes, o segmento IV é irrigado por ramos do pedículo esquerdo principal. A drenagem venosa é sobretudo efectuada para a veia hepática média, embora este segmento também possa drenar na veia hepática esquerda, através da veia para o ligamento falciforme. O segmento V é o segmento inferior do sector medial direito, encontrando-se por entre as veias hepáticas média e direita. Apresenta um tamanho e um número de bainhas glissonianas associadas variáveis. A drenagem venosa é efectuada para as veias hepáticas direita e média.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O segmento VI forma a porção inferior do sector lateral direito, posteriormente à fissura porta direita. Este segmento é por vezes irrigado por dois ou três ramos da bainha glissoniana posterior direita, mas ocasionalmente, a bainha de Glisson para o segmento VI parte directamente do pedículo direito. A drenagem venosa é normalmente efectuada para a veia hepática direita, mas pode ser feita directamente para a veia cava inferior, através da veia hepática inferior direita. O segmento VII forma a porção superior do sector posterior, encontrando-se por detrás da veia hepática direita. Por vezes existe uma única bainha para este ligamento. A drenagem venosa é efectuada para a veia hepática direita, ou por vezes, para a veia cava inferior, através da veia hepática média direita. O segmento VIII é a porção superior do sector anterior direito. As bainhas sectoriais anteriores direitas terminam no segmento VIII e abastecem-no, depois de dar ramos para o segmento V. A drenagem venosa é feita para as veias hepáticas direita e média. O segmento IX é uma recente subdivisão do segmento I, correspondendo à porção desse segmento, que se encontra posteriormente ao segmento VIII. Segmento I II III IV V VI VII VIII
Número de bainhas glissonianas
Drenagem venosa
1 (por vezes) 1-3 3-5 Variável 2-3 1 (por vezes) Bainhas sectoriais anteriores direitas
Veias porta e hepáticas Veia hepática esquerda Veia hepática esquerda Veia hepática média (por vezes para a v. hepática esquerda) Veias hepáticas direita e média Veia hepática direita (por vezes para a veia cava inferior) Veia hepática direita ou veia cava inferior Veias hepáticas direita e média
Ligamentos associados O fígado é estabilizado e mantido na sua posição, no quadrante superior direito do abdómen por factores dinâmicos e estáticos, sendo estes classificados em factores primários (que incluem as ligações suspensoras, na parede abdominal posterior, a veia cava inferior; as veias hepáticas e os ligamentos coronário e triangular), factores secundários (que incluem o suporte dado pelo rim direito, o ângulo cólico direito e o complexo duodenopancreático) e factores terciários (onde se inclui a ligação à parede abdominal anterior e ao diafragma, pelo ligamento falciforme). Outros factores responsáveis pela manutenção da posição do fígado dentro da cavidade abdominal incluem a pressão intra-abdominal positiva e o movimento do diafragma durante a respiração.
Ligamento falciforme O fígado encontra-se ligado à frente da parede abdominal anterior pelo ligamento falciforme. As duas camadas deste ligamento descem da face posterior da parede abdominal anterior e do diafragma e viram-se para as faces anterior e superior do fígado. Ao nível da cúpula da face superior, o folheto direito desloca-se lateralmente e é contínuo com a camada superior do ligamento coronário. O folheto esquerdo do ligamento falciforme desloca-se medialmente e é contínuo com o folheto anterior do ligamento triangular esquerdo. O ligamento redondo, que representa a veia umbilical esquerda obliterada, desloca-se no bordo inferior livre do ligamento falciforme e continua-se numa fissura na face inferior do fígado. Durante o período fetal, a veia umbilical esquerda abre-se na veia porta esquerda, contudo, esta veia deve ficar obliterada, aquando da vida adulta, embora por vezes, permaneçam remanescentes desta. Este ligamento é
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II irrigado por inúmeros ramos arteriais (principalmente pela artéria do segmento IV), que formam anastomoses com ramos da artéria torácica interna. De referir que o ligamento redondo sulca o bordo inferior, originando a incisura para o ligamento redondo.
Ligamento coronário O ligamento coronário é formado pela reflexão do peritoneu do diafragma para a região posterior do lobo direito do fígado. Uma grande área triangular hepática desprovida de cobertura peritoneal – a “área nua” do fígado é delimitada por entre as duas camadas de folhetos do ligamento coronário – o folheto superior e o folheto inferior. Aqui, o fígado encontra-se ligado ao diafragma por tecido areolar e em continuidade, inferiormente, com o espaço para-renal anterior. O ligamento coronário é contínuo à direita com o ligamento triangular direito e, à esquerda, as duas camadas tornam-se mais próximas, formando o ligamento triangular esquerdo. A camada superior de ligamento coronário encontra-se reflectida inferiormente sobre a glândula supra-renal direita e o rim direito e, superiormente, na face inferior do fígado.
Ligamento triangular esquerdo O ligamento triangular esquerdo é uma dupla camada de peritoneu, que se estende até uma distância variável, sobre o bordo superior do lobo esquerdo do fígado. Medialmente, o folheto anterior é contínuo com o folheto esquerdo do ligamento falciforme, enquanto o folheto posterior é contínuo com a camada esquerda do omento menor. O ligamento triangular esquerdo encontra-se em frente da porção abdominal do esófago, da extremidade superior do omento menor e de parte do fundo do estômago. Já o ligamento triangular direito é uma pequena estrutura que se encontra no ápice da “área nua” do fígado, sendo contínuo com as camadas do ligamento coronário.
Omento menor O omento menor é uma prega de peritoneu que se estende da curvatura menor do estômago e duodeno proximal até à face inferior do fígado, tendo esta inserção uma forma de L. A componente vertical segue a linha da fissura para o ligamento venoso. Mais inferiormente, esta ligação desloca-se horizontalmente, completando o”L” na porta hepática. Na sua extremidade superior, a camada superior do omento menor é contínua à esquerda com a camada posterior do ligamento triangular esquerdo, enquanto a camada inferior é contínua à direita com o ligamento coronário, à medida que envolve a veia cava inferior. Na sua extremidade inferior, as duas camadas divergem, rodeando as estruturas da porta hepática. Uma fina condensação fibrosa de fáscia desloca-se, normalmente, desde a extremidade medial da porta hepática até à fissura na face inferior, que contém o ligamento redondo. Essa fáscia é contínua com o bordo inferior do ligamento falciforme, quando o ligamento redondo re-emerge, ao nível do bordo inferior do fígado.
Ligamento venoso O ligamento venoso representa a ligação venosa obliterada, que existia por entre a veia porta esquerda e a veia hepática esquerda, durante a vida fetal.
Porta hepática A porta hepática é uma fissura profunda, localizada ao nível da face inferior do fígado, encontrando-se situada por entre o lobo quadrado, em frente, e o lobo caudado, posteriormente. A porta hepática contém a veia porta, a artéria hepática e os plexos nervosos hepáticos, à medida que estes ascendem pelo parênquima do fígado. Os canais hepáticos encontram-se anteriormente à veia porta e aos seus
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II ramos, enquanto a artéria hepática com os seus ramos, se encontra por entre os dois. Todas estas estruturas encontram-se envoltas numa cápsula fibrosa peri-vascular – a cápsula hepato-biliar de Glisson, uma bainha de tecido conjuntivo solto, que rodeia os vasos, enquanto estes se deslocam através dos canais portais do fígado e que também é contínua com a cápsula hepática. O denso agregado de vasos, suportando o tecido conjuntivo e o parênquima hepático, imediatamente superiormente à porta hepática é por vezes designado por “lâmina hilar” do fígado. A artéria hepática, o canal biliar e a veia porta estendem-se desde a porta hepática até ao duodeno, no bordo livre do ligamento hepatoduodenal, que forma o limite anterior do buraco epiplóico.
Cápsula de Glisson A cápsula de Glisson condensa-se em torno dos ramos das estruturas portais, como bainhas glissonianas, na região em que estas entram no parênquima hepático. Estas bainhas estendem-se até aos segmentos individuais do fígado.
Mnemónicas sobre fígado: - Face posterior do fígado: VC do lado do VC – Significa que adjacente à veia cava inferior (e respectivo sulco) se encontra o ligamento Venoso e o lobo Caudado.
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Tronco biliar O tronco biliar consiste num sistema de vasos e canais que recolhem e lançam bílis do parênquima hepático até à segunda porção do duodeno. Este é convencionalmente dividido em troncos biliares extrahepático e intrahepático. Os canais intrahepáticos são formados a partir dos canalículos biliares maiores, que se deslocam juntos, formando canais segmentais. Estes, por sua vez, fundem-se, junto à porta hepática em canais hepáticos esquerdo e direito. Já o tronco biliar extra-hepático consiste em canais hepáticos esquerdo e direito, no canal hepático comum, no canal cístico, na vesícula biliar e no canal biliar comum.
Vesícula biliar A vesícula biliar é um divertículo “sem saída” em forma de frasco, que se encontra ligado ao canal biliar comum, pelo canal cístico. No vivo, esta estrutura é cinzenta-azulada, encontrando-se fixa à face inferior do lobo direito do fígado por tecido conjuntivo. Nos indivíduos adultos, a vesícula biliar apresenta entre 7 e 10 cm, tendo uma capacidade até 50 mL. A vesícula encontra-se normalmente numa ténue fossa, situada no parênquima hepático, sendo coberta por peritoneu, contínuo com o que cobre a superfície hepática. Contudo isto é alvo de variações – a vesícula biliar pode estar completamente coberta pela superfície hepática, não apresentando cobertura peritoneal (padrão intra-parenquimal), ou, no outro extremo, pode se encontrar suspensa por um pequeno mesentério formado por duas camadas de peritoneu, separadas apenas por tecido conjuntivo e alguns vasos pequenos (padrão mesentérico). A vesícula biliar apresenta um fundo, um corpo e um colo. O colo encontra-se na extremidade medial, perto da porta hepática e, quase sempre, apresenta uma pequena ligação coberta por peritoneu, ao fígado, sendo que neste mesentério, encontra-se normalmente contida, a artéria cística. A mucosa na extremidade medial do colo apresenta uma elevação oblíqua, formando um sulco espiral contínuo com a válvula espiral do canal cístico. Na sua extremidade lateral, o colo alarga-se, formando o corpo da vesícula biliar, sendo este alargamento por vezes designado por “espaço de Hartamann”. Em termos de relações, o colo encontra-se anteriormente à segunda porção do duodeno. O corpo da vesícula biliar normalmente encontra-se em contacto com a superfície hepática. Quando o colo possui um mesentério, este rapidamente diminui de dimensões, ao longo do comprimento do corpo. Em termos de relações, o corpo encontra-se anteriormente à segunda porção do duodeno e à extremidade direita do cólon transverso. O fundo encontra-se na extremidade lateral do corpo e, normalmente, projecta-se para um comprimento variável, após o bordo inferior
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II do fígado. Normalmente, esta estrutura encontra-se em contacto com a parede abdominal anterior, posteriormente à sétima cartilagem costal, onde o bordo lateral do recto abdominal direito cruza o bordo costal. De referir que o fundo normalmente se encontra adjacente ao cólon transverso. A vesícula biliar apresenta variações em tamanho e forma. O fundo pode se encontrar elongado e altamente móvel. Mais raramente, o fundo encontra-se dobrado para trás, sobre o corpo da vesícula biliar, formando o “capacete frígio”. Variações raras incluem também a presença de uma vesícula biliar bífida ou duplicada.
Tronco biliar intra-hepático Os canais segmentais da porção esquerda do fígado apresentam um padrão relativamente constante, embora vários canais segmentais possam drenar cada segmento particular. O canal hepático esquerdo é formado pela união dos canais dos segmentos II e III, posteriormente à porção umbilical da veia porta esquerda. O canal do segmento IV é mais variável, mas normalmente drena para o canal hepático esquerdo. Já o canal hepático direito é formado pela união dos canais sectoriais medial (anterior) direito e lateral (posterior) direito. O canal sectorial medial direito é formado pelos canais segmentais V e VIII, enquanto o canal segmental lateral direito é formado pelos canais segmentais VI e VII. O canal hepático direito e os seus ramos apresentam mais variações que o sistema esquerdo.
Tronco biliar extra-hepático Canal hepático comum Os canais hepáticos direito principal e esquerdo principal partem do fígado e unem-se perto da extremidade direita da porta hepática, formando o canal hepático comum. O canal direito extrahepático é pequeno e quase vertical, enquanto o esquerdo é mais horizontal, encontrando-se na base do segmento IV. O canal hepático comum desce a aproximadamente três centímetros antes de se juntar ao canal cístico, formando o canal biliar comum. O canal hepático comum encontra-se à direita da artéria hepática e anterior à veia porta, no bordo livre do omento menor.
Canal cístico O canal cístico drena a vesícula biliar no canal biliar comum. Apresenta entre 3 e 4 cm de comprimento, passando posteriormente à esquerda do colo da vesícula biliar e juntando-se ao canal hepático comum, formando o canal biliar comum. Este canal desloca-se quase sempre, paralelamente ao canal hepático
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II comum, sendo aderente a esta estrutura, antes de se juntar a este. Essa junção normalmente ocorre perto da porta hepática, mas pode ocorrer mais inferiormente, ao nível do bordo livre do omento menor. O canal cístico pode apresentar variações importantes na sua anatomia. Raramente, esta estrutura encontra-se ao longo do bordo direito do omento menor, até ao nível do duodeno, antes da junção ocorrer. O canal cístico pode ocasionalmente drenar no canal hepático direito, que por sua vez, pode ser elongado, encontrar-se anteriormente ou posteriormente ao canal hepático comum, juntando-se ao canal hepático comum, ao nível do seu bordo esquerdo. O canal cístico pode ainda, em casos mais raros, ser duplo, ou até encontrar-se ausente e, nesse caso, a vesícula biliar drena directamente no canal biliar comum. Um ou mais canais hepáticos acessórios, por vezes, emergem do segmento V do fígado, juntando-se ao canal hepático direito, ao canal hepático comum, ao canal biliar comum, ao canal cístico ou directamente à vesícula biliar. Essas variações na anatomia do canal cístico são de importância capital, aquando da excisão cirúrgica da vesícula biliar. A mucosa do canal cístico apresenta entre 5 a 12 pregas crescênticas, contínuas com aquelas presentes no colo da vesícula biliar. Estas projectam-se obliquamente em sucessão regular, aparentando formar uma válvula espiral, quando o canal se encontra cortado em secção longitudinal. Quando o canal se encontra distendido, os espaços por entre as pregas dilatam e externamente, este parece torcido, como o colo da vesícula biliar.
Canal biliar comum O canal biliar comum é formado perto da porta hepática pela junção dos canais hepático comum e cístico, apresentando normalmente entre 6 a 8 cm de comprimento. O seu diâmetro tende a aumentar, com a idade, mas apresenta cerca de 6 mm nos adultos. Este canal desce posteriormente e um pouco para a esquerda, anteriormente ao buraco epiplóico, no bordo direito do omento menor, onde se encontra anteriormente e à direita da veia porta e à direita da artéria hepática. Este canal passa por detrás da primeira porção do duodeno com a artéria gastroduodenal à sua esquerda, deslocando-se depois num sulco na porção superolateral da superfície posterior da cabeça do pâncreas. O canal encontra-se anteriormente à veia cava inferior, por vezes envolto, no tecido pancreático. Esta estrutura encontra-se próxima da parede medial da segunda porção do duodeno, onde drena a bílis.
Triângulo de Calot O espaço quase triangular formado pelo canal cístico, canal hepático comum e pela face inferior do segmento V do fígado é designada por triângulo de Calot. Este encontra-se envolto pela dupla camada de peritoneu que forma o pequeno mesentério do canal cístico. Uma vez que as duas camadas não estão completamente opostas, este triângulo contém uma quantidade considerável de tecido conjuntivo e daí que possa ser descrito como um “espaço” piramidal, com um dos vértices a apontar para a junção do canal cístico com o fundo da vesícula biliar, outro para a porta hepática e os outros dois, mais próximos apontam para a vesícula biliar. Este espaço normalmente contém a artéria cística, à medida que esta se aproxima da vesícula biliar, o nódulo linfático cístico e linfáticos da vesícula biliar, uma ou duas pequenas veias císticas, os nervos autónomos que se deslocam até à vesícula e algum tecido adiposo solto. Por vezes, este espaço contém canais acessórios, que drenam para a vesícula biliar a partir do fígado.
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Pâncreas O pâncreas é a maior glândula digestiva, desempenhando uma grande quantidade de funções endócrinas e exócrinas. A maior parte da glândula é exócrina, segregando uma variedade de enzimas envolvidas na digestão de lipídeos, glicídeos e proteínas. A função endócrina do pâncreas deriva de células, espalhadas através da substância do pâncreas, participando na regulação de glicose e estando também envolvidos no controlo da mobilidade e função gastrointestinal. O pâncreas apresenta uma cor rosa salmão, tendo uma superfície lobulada. A porção principal é dividida em quatro porções – cabeça, colo, corpo e cauda, em funções das suas relações anatómicas, uma vez que existem muito poucas diferenças anatómicas ou funcionais entre estas. O pâncreas possui ainda um lobo acessório – a apófise unciforme, embriologicamente distinta. Nos adultos, o pâncreas apresenta um comprimento entre 12 e 15 cm, tendo uma forma semelhante a uma língua achatada, mais espessa na sua extremidade medial (na cabeça) e mais fina na extremidade lateral (na cauda). O pâncreas encontra-se na curva definida na primeira, segunda e terceira porções do duodeno, e estende-se transversalmente e ligeiramente superiormente ao longo da parede abdominal posterior, até ao hilo do baço, posteriormente ao estômago. Por causa, da sua forma achatada, as porções do pâncreas, particularmente o seu corpo são entendidas como tendo faces e bordos.
Cabeça A cabeça do pâncreas encontra-se à direita da linha média, anteriormente ao lado direito da coluna vertebral, dentro da curva duodenal. A cabeça é a porção mais espessa e mais larga do pâncreas, mas mesmo assim é achatada num plano antero-posterior. Superiormente, encontra-se adjacente à primeira porção do duodeno, mas perto do piloro e do duodeno, encontra-se num pequeno mesentério e aqui o duodeno encontra-se anteriormente à porção superior da cabeça. O bordo duodenal da cabeça é achatado e ligeiramente côncavo, sendo firmemente aderente à segunda porção do duodeno. As artérias pancreático-duodenais superior posterior e inferior encontram-se por entre a cabeça e o duodeno, nessa área. O bordo inferior encontra-se superiormente à terceira porção do duodeno e é contínuo com a apófise unciforme. Perto da linha média, a cabeça é contínua com o colo. A fronteira por entre a cabeça e o colo é, por vezes, marcada anteriormente por um sulco para a artéria gastroduodenal e, posteriormente, por um sulco mais profundo, que contém a união das veias mesentérica superior e esplénica, à medida que estas formam a veia porta. A face anterior da cabeça encontra-se coberta por peritoneu e relaciona-se com a origem do mesocólon transverso. Já a face posterior relaciona-se com a veia cava inferior, que ascende posteriormente a esta e cobre quase toda a sua superfície. A face posterior também se relaciona com a veia renal direita e com o pilar direito do diafragma, normalmente ao nível da origem da veia gonadal direita.
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Colo O colo do pâncreas apresenta uma largura de cerca de 2 cm, unindo a cabeça e o corpo, sendo, por vezes, a porção mais anterior da glândula. O colo do pâncreas é definido como a porção do pâncreas que se encontra anteriormente à veia porta, que se encontra intimamente relacionada com a face posterior superior. A porção inferior do colo encontra-se anteriormente à veia mesentérica superior, imediatamente antes da formação da veia porta. A face anterior do colo encontra-se coberta por peritoneu e adjacente ao piloro, imediatamente inferior ao buraco epiplóico. As artérias gastroduodenal e pancreatico-duodenal superior anterior descem em frente à glândula na região da junção do colo e da cabeça.
Corpo O corpo do pâncreas é a porção mais longa deste órgão, deslocando-se desde o lado esquerdo do colo até à cauda. Apresenta uma forma triangular, quando seccionado transversalmente, tornando-se progressivamente menos espesso e mais fino, em direcção à cauda. O corpo apresenta faces anterosuperior, posterior e anteroinferior. A face anterosuperior do pâncreas forma a maior parte da região anterior da glândula, perto do colo. Lateralmente, estreita-se e encontra-se ligeiramente mais superiormente para partilhar a região anterior com a face anteroinferior. Esta face encontra-se coberta por peritoneu, que se desloca anteroinferiormente, desde a superfície da glândula, para ser contínuo com a camada ascendente, anterior do omento maior. O folheto superior do mesocólon transverso encontra-se reflectido e é contínuo com o folheto posterior, descendente, do omento maior, imediatamente superiormente ao bordo anterior. Esta face encontra-se separada do estômago pelo saco menor.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A face posterior do pâncreas é desprovido de peritoneu, encontrando-se anteriormente à aorta e à origem da artéria mesentérica superior, pilar esquerdo do diafragma, glândula supra-renal esquerda, rim esquerdo e vasos renais, particularmente a veia renal esquerda. Esta face relaciona-se intimamente com a veia esplénica, que se encontra por entre a face posterior e as restantes relações posteriores e se desloca da esquerda para a direita, podendo formar desde um ténue sulco, até um “túnel” na substância da glândula. O rim esquerdo encontra-se também separado da face posterior por fáscia perirenal e gordura. A face anteroinferior do pâncreas inicia-se como uma faixa estreita, imediatamente à esquerda do colo. À medida que o corpo se desloca lateralmente, alarga-se formando a maior parte da região anterior do corpo. Esta face está coberta por peritoneu, que é contínua com a da camada posteroinferior do mesocólon transverso. A quarta porção do duodeno, o ângulo duodeno-jejunal e as ansas do jejuno encontram-se inferiormente. A extremidade lateral do bordo inferior por vezes se encontra superior e posteriormente ao ângulo esplénico. O peritoneu da camada anterosuperior do mesocólon transverso está reflectido na porção superior da face anteroinferior, no limite do bordo anterior, onde é contínuo com o folheto posterior do omento maior. O ápice do ligamento de Treitz pode ser uma relação anterior desta superfície do corpo, lateralmente. Do lado direito, o bordo superior do pâncreas é inicialmente arredondado e algo achatado, mas à medida que a glândula se dirige para a esquerda, este torna-se cada vez melhor definido. Uma tuberosidade omental normalmente projecta-se da extremidade direita do bordo superior, superiormente ao nível da curvatura menor do estômago, contactando com a face posterior do omento menor. O bordo superior relaciona-se com a artéria celíaca. A artéria hepática comum desloca-se para a direita, superiormente à glândula. A artéria esplénica desloca-se num percurso que é por vezes tortuoso, em direcção à esquerda, ao longo do bordo superior, tendendo a elevar-se superiormente ao nível do bordo superior em vários pontos, ao longo do seu percurso. O bordo anterior do pâncreas separa as faces anterosuperior da anteroinferior. As duas camadas do mesocolon transverso divergem ao longo do seu bordo. A camada superior relaciona-se inferiormente, após uma pequena distância do folheto posterior (descendente) do omento maior, enquanto a outra se desloca inferior e posteriormente sobre a face anteroinferior. O bordo inferior do pâncreas separa as faces posterior da anteroinferior. Ao nível da extremidade medial do bordo inferior, adjacente ao colo do pâncreas, os vasos mesentéricos superiores emergem de posteriormente da glândula. Mais lateralmente, a veia mesentérica inferior desloca-se inferiormente ao bordo inferior para se juntar à veia esplénica, na face posterior.
Cauda A cauda do pâncreas é a porção mais estreita e mais lateral da glândula, encontrando-se por entre as camadas do ligamento espleno-renal. A cauda é contínua medialmente com o corpo, apresentando entre 1,5 e 3,5 cm de comprimento, nos indivíduos adultos. Pode terminar ao nível da base do ligamento espleno-renal ou estender-se até ao hilo esplénico. Posteriormente, relaciona-se com os ramos esplénicos da artéria esplénica e com a veia esplénica e suas tributárias.
Apófise unciforme A apófise unciforme do pâncreas estende-se desde a extremidade lateral inferior da cabeça desta glândula, sendo embriologicamente distinta do resto do pâncreas, encontrando-se por isso posteriormente à veia mesentérica superior e, por vezes, à artéria, enquanto estas descem e se
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II deslocam, anteriormente para a raiz do mesentério ilíaco, em próximo contacto com a sua face anterior. Posteriormente, a apófise unciforme encontra-se anteriormente à aorta e inferiormente, encontra-se na superfície superior da terceira porção do duodeno. Adjacente à apófise unciforme, por entre esta e o colo encontra-se um espaço designado por incisura pancreática.
☤ Tumores
da apófise unciforme não causam obstrução do tronco biliar comum, mas frequentemente comprimem a terceira porção do duodeno, devido à sua relação próxima.
Canais pancreáticos O tecido pancreático exócrino drena em múltiplos canais lobulares pequenos. O arranjo dos canais principais que drenam o pâncreas é alvo de variação, mas o padrão mais comum envolve um canal principal e um único canal acessório. Este arranjo reflecte o desenvolvimento embrionário dos canais pancreáticos dorsal e ventral. O canal pancreático principal (canal de Wirsung) normalmente desloca-se na substância do pâncreas, da esquerda para a direita. Este canal tende a encontrar-se mais posteriormente que anteriormente, sendo formado pela junção de vários canais lobulares (secundários) ao nível da cauda. O seu calibre aumenta, enquanto se desloca dentro do corpo, porque recebe mais canais lobulares, que se juntam, em quase ângulos rectos no seu eixo. Quando o canal pancreático principal atinge o colo do pâncreas, normalmente volta-se inferior e posteriormente em direcção ao canal biliar, que se encontra à sua direita. Os dois canais entram na parede da porção descendente do duodeno, obliquamente, unindo-se na ampola hepatopancreática. O canal pancreático acessório (canal de Santorini) normalmente drena a região superior da porção anterior da cabeça do pâncreas. Este canal apresenta um calibre muito menor que o canal principal, sendo formado dentro da substância da cabeça. A partir de vários canais lobulares, ascendendo anteriormente ao canal principal. O canal acessório normalmente abre-se numa pequena papila duodenal menor, de natureza arredondada, que se encontra a cerca de 2cm anterosuperiormente à papila duodenal maior.
☤ Os
canais pancreáticos principal e acessório demonstram alguma variabilidade na sua anatomia, o que mostra as variações no desenvolvimento e fusão dos canais ventral e dorsal. Uma variação clinicamente importante é o “pancreas divisum”, onde ocorre drenagem totalmente separada, para diferentes porções do pâncreas. Isto permite que algumas formas de pancreatite afectem apenas uma dada porção da glândula.
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Baço O baço consiste numa grande massa encapsulada de tecido vascular e linfóide situado no quadrante esquerdo superior da cavidade abdominal, por entre o fundo do estômago e o diafragma. A sua forma pode ser prismática, ou então formar um “tetraedro com cúpula”, sendo a forma determinada pelas suas relações com as estruturas vizinhas, durante o desenvolvimento. A região superolateral é moldada pela cúpula esquerda do diafragma, enquanto a região inferomedial é, sobretudo, influenciada pelo ângulo esplénico do cólon, pelo rim esquerdo e estômago. O grande eixo do baço encontra-se aproximadamente no plano da décima costela. O seu bordo posterior encontra-se a cerca de 4cm da linha médio-dorsal, ao nível da espinha de T10. Já o seu bordo anterior normalmente atinge a linha médio-axilar. O tamanho e a massa do baço variam com a idade e com o género, sendo que no adulto este órgão apresenta normalmente 12 cm de comprimento, 7 cm de espessura e 3-4 cm de largura. De referir que, o baço é comparativamente grande na infância e, embora a sua massa aumente durante a puberdade, na idade adulta esta estrutura é relativamente mais pequeno, em comparação com os órgãos vizinhos. Em termos de massa média, esta ronda os 150g no indivíduo adulto, embora valores entre os 80g e os 300g sejam considerados normais, indicando somente a quantidade de sangue lá contida. Porções adicionais de tecido esplénico totalmente funcional, podem se encontrar perto do baço, especialmente ao nível do ligamento gastrosplénico e omento maior. Estes baços acessórios, ou esplenúnculos, encontram-se normalmente isolados, embora possam estar ligados ao baço por finos feixes de tecido similar, e podem ser numerosos e amplamente dispersos pelo abdómen.
Faces do baço O baço apresenta uma face diafragmática (superolateral) e uma face visceral (inferomedial), bordos superior e inferior e extremidades (ou pólos) anterior e posterior. A face diafragmática é convexa e mole, olhando, sobretudo, superiormente e lateralmente, embora a porção posterior possa olhar posteriormente e quase medialmente, à medida que se aproxima do bordo inferior. A face diafragmática relaciona-se com a face abdominal da cúpula esquerda do diafragma, que a separa da pleura basal, do lobo inferior do pulmão esquerdo e da nona, décima e décima primeira costelas. O recesso costodiafragmático estende-se inferiormente até ao seu bordo inferior. Já a face visceral olha inferomedialmente em direcção à cavidade abdominal, sendo irregular e marcada pelas impressões gástrica, renal, pancreática e cólica. A impressão gástrica dirige-se anteromedialmente, sendo larga e côncava, onde o baço se encontra adjacente à região posterior do
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II fundo, porção superior do corpo e da curvatura maior do estômago. Esta impressão está separada do estômago por um recesso peritoneal, que é limitado pelo ligamento gastrosplénico. Já a impressão renal é ligeiramente côncava e encontra-se na porção mais inferior da face visceral, estando separada da impressão gástrica, superiormente, por uma faixa elevada de tecido esplénico e pelo hilo esplénico. Esta impressão olha inferomedialmente e ligeiramente posteriormente, relacionando-se com as regiões superior e lateral da face anterior do rim esquerdo e, por vezes, com o pólo superior da glândula supra-renal esquerda. A impressão cólica encontra-se no pólo inferior do baço, sendo normalmente achatada e relacionandose com o ângulo esplénico do cólon e com o ligamento frénico-cólico. A impressão pancreática, por sua vez, nem sempre se encontra, sendo pequena, quando presente e encontrando-se por entre a impressão cólica e porção lateral do hilo. Esta impressão relaciona-se com a cauda do pâncreas, que se encontra no ligamento espleno-renal. O hilo do baço é uma longa fissura, perfurada por várias aberturas irregulares, através das quais os ramos da artéria e veia esplénica, bem como nervos e linfáticos entram e abandonam o baço. O hilo encontra-se na face visceral, mais próximo dos bordos anterior e inferior.
Bordos do baço O bordo superior separa a face diafragmática da impressão gástrica e é normalmente convexo. Perto da extremidade anterior, podem existir uma ou duas incisuras que tenham persistido da forma lobulada do baço, nos primórdios da vida fetal. O bordo inferior separa a impressão renal da face diafragmática e encontra-se por entre o diafragma e a porção superior do bordo lateral do rim esquerdo. Este bordo é mais arredondado que o superior, estando ao nível do bordo inferior da 11ª costela. A extremidade posterior, ou pólo superior, olhando normalmente para a coluna vertebral. A extremidade anterior, ou pólo inferior, é maior e menos angulada que a extremidade posterior e liga as extremidades laterais dos bordos superior e inferior, encontrando-se relacionada com a impressão cólica e pode se encontrar adjacente ao ângulo esplénico e ligamento frénico-cólico.
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Cobertura de peritoneu do baço O baço é quase inteiramente coberto por peritoneu que adere firmemente à sua cápsula e encontra-se separado do estômago e rim esquerdo por recessos do saco maior. Desenvolve-se no mesogástrio dorsal superior e continua-se ligado por pregas de peritoneu à parede abdominal posterior (pelos ligamentos espleno-renal, frénico-cólico e frénico-esplénico). O ligamento espleno-renal é formado por duas camadas de peritoneu. A camada anterior é contínua com o peritoneu da parede posterior do saco menor, sobre o rim esquerdo e com o peritoneu do hilo esplénico, onde se desloca na camada posterior do ligamento gastro-esplénico. A camada posterior do ligamento espleno-renal é contínuo com o peritoneu, sobre a face inferior do diafragma e desloca-se na face esplénica sobre a impressão renal. Os vasos esplénicos encontram-se por entre as camadas do ligamento espleno-renal – a cauda do pâncreas encontra-se normalmente presente na sua porção mais inferior. O comprimento do ligamento espleno-renal pode variar. Já o ligamento gastro-esplénico também apresenta duas camadas. A camada posterior é contínua com o peritoneu, no hilo esplénico e sobre a região posterior do estômago. A camada anterior é formada a partir do peritoneu, que se encontra reflectido para fora da impressão gástrica e atinge a curvatura maior do estômago, anteriormente. Os ramos gástricos pequenos e gastro-epiplóico esquerdo da artéria esplénica passam por entre as suas camadas. O ligamento frénico-cólico estende-se desde o ângulo esplénico do cólon para o diafragma, ao nível da 11ª costela, estendendo-se inferiormente e lateralmente, sendo contínuo com o peritoneu da extremidade lateral do mesocólon transverso, no bordo lateral da cauda pancreática, e com o ligamento espleno-renal, ao nível do hilo do baço.
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Aorta abdominal A aorta abdominal inicia-se ao nível do hiato aórtico do diafragma, anteriormente ao bordo inferior de T12 e ao disco intervertebral toracolombar. Desce anteriormente às vértebras lombares para terminar ao nível do bordo inferior de L4, um pouco à esquerda da linha média, dividindo-se em duas artérias ilíacas comuns. Diminui rapidamente em calibre, à medida que se desloca inferiormente, pois os seus ramos são de grande calibre. De referir que, o seu diâmetro superior e inferior situam-se entre os 9-14 mm e os 8-12 mm respectivamente. A aorta abdominal superior relaciona-se anteriormente com o tronco celíaco e seus ramos. O plexo celíaco e o saco menor encontram-se por entre esta e o lobo esquerdo do fígado e o omento menor. Inferiormente, a artéria mesentérica superior abandona a aorta, cruzando anteriormente à veia renal esquerda. O corpo do pâncreas, com a veia esplénica na sua face posterior, estende-se obliquamente, superiormente e para a esquerda, ao longo da aorta abdominal, da qual se encontra separado, através da artéria mesentérica superior e da veia renal esquerda. Inferiormente ao pâncreas, as porções proximais das artérias gonadais e a terceira parte do duodeno encontram-se anteriormente. Na sua porção mais inferior, encontra-se coberta pelo peritoneu parietal posterior e é cruzada obliquamente pela origem do mesentério do intestino delgado. O disco intervertebral toracolombar, as quatro vértebras lombares superiores, os discos intervertebrais respectivos e o ligamento longitudinal anterior encontram-se posteriormente à aorta abdominal. Já as artérias lombares partem da sua região dorsal e cruzam-na posteriormente. A terceira e a quarta (e por
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II vezes a segunda) veias lombares esquerdas também a cruzam posteriormente, para chegar à veia cava inferior. A aorta pode se sobrepor ao bordo anterior do psoas maior esquerdo. À direita, a aorta relaciona-se superiormente com o canal torácico, com a veia ázigos e com o pilar direito do diafragma, que se lhe sobrepõe e a separa da veia cava inferior e do gânglio celíaco direito. Inferiormente a L2, a aorta está intimamente associada ao lado esquerdo da veia cava inferior. À esquerda, a aorta relaciona-se superiormente com o pilar esquerdo do diafragma e com o gânglio celíaco esquerdo. Ao nível de L2, relaciona-se com o ângulo duodeno-jejunal e com o tronco simpático esquerdo, com a quarta porção do duodeno e com a veia mesentérica inferior. Os ramos da aorta são agrupados em anteriores, laterais e dorsais. Os ramos anteriores e laterais estão distribuídos para as vísceras, enquanto os ramos dorsais irrigam a parede corporal, a coluna vertebral, o canal vertebral e o seu conteúdo. A aorta termina dividindo-se em artérias ilíacas comuns esquerda e direita.
Tronco celíaco O tronco celíaco é o primeiro ramo anterior e parte imediatamente inferiormente ao hiato aórtico, ao nível dos corpos de T12 e L1. Apresenta entre 1,5 e 2 cm de comprimento e passa, quase horizontalmente, anteriormente e um pouco superiormente ao pâncreas e veia esplénica. Este tronco divide-se em artérias gástrica esquerda, hepática comum e esplénica, podendo ainda dar uma ou ambas artérias frénicas inferiores. A artéria mesentérica superior pode partir com o tronco celíaco, tendo uma origem comum. Anteriormente ao tronco celíaco encontra-se o saco menor. À direita, encontra-se o gânglio celíaco direito, o pilar direito do diafragma e o lobo caudado do fígado. À esquerda encontram-se o gânglio celíaco esquerdo, o pilar esquerdo do diafragma e a extremidade cardíaca do estômago. O pilar direito pode comprimir a origem do tronco celíaco. Já inferiormente, encontramos o corpo do pâncreas e a veia esplénica.
Artéria mesentérica superior A artéria mesentérica superior origina-se da artéria aorta, a aproximadamente 1 cm inferiormente ao tronco celíaco, ao nível do disco intervertebral de L1/L2. Encontra-se posteriormente à veia esplénica e ao corpo do pâncreas e encontra-se separada da aorta, pela veia renal esquerda. Esta artéria desloca-se
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II inferiormente e anteriormente, sendo anterior à apófise unciforme do pâncreas e terceira porção do duodeno.
Artéria mesentérica inferior A artéria mesentérica inferior apresenta normalmente um calibre menor que a superior. Esta artéria parte da região anterior ou anterolateral esquerda da aorta, mais ou menos ao nível de L3, a cerca de 3 ou 4 cm superiormente à bifurcação aórtica e posteriormente à porção horizontal do duodeno.
Artérias supra-renais médias As artérias supra-renais médias partem da região lateral da aorta abdominal, ao nível da artéria mesentérica superior. Deslocam-se sobre os pilares do diafragma, em direcção às glândulas supra-renais, onde se anastomosam com os ramos supra-renais das artérias frénicas e renais. A artéria suprarenal média direita passa posteriormente à veia cava inferior, perto do gânglio celíaco direito. Já a artéria suprarenal média esquerda passa próxima do gânglio celíaco esquerdo, artéria esplénica e bordo superior do pâncreas. De referir que, as artérias supra-renais superiores são ramos das artérias frénicas inferiores, enquanto as artérias suprarenais inferiores são ramos das artérias renais.
Artérias renais As artérias renais são dois dos maiores ramos da aorta abdominal e partem lateralmente deste vaso, inferiormente à origem da artéria mesentérica superior. A artéria renal direita é maior e normalmente parte ligeiramente a um nível superior que a esquerda. Esta artéria passa posteriormente à veia cava inferior, à veia renal direita, à cabeça do pâncreas e à segunda porção do duodeno. A artéria renal esquerda parte um pouco inferiormente e passa posteriormente à veia renal esquerda, ao corpo do pâncreas e a veia esplénica.
Artérias gonadais As artérias gonadais são dois grandes vasos que partem da aorta, um pouco inferiormente às artérias renais. Cada uma passa inferolateralmente, inferiormente ao periotneu parietal, ao nível do psoas maior.
Artérias frénicas inferiores As artérias frénicas inferiores normalmente partem da região dorsal da aorta,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II imediatamente superiormente ao nível do tronco celíaco. Ocasionalmente, partem de uma origem comum com o tronco celíaco, do próprio tronco celíaco, ou da artéria renal. Estas artérias contribuem para a irrigação arterial do diafragma. Cada artéria ascende e desloca-se lateralmente, anteriormente ao pilar do diafragma, perto do bordo medial da glândula supra-renal. A artéria frénica esquerda passa posteriormente ao esófago (e anteriormente no lado esquerdo do seu orifício diafragmático). Já a artéria direita passa posteriormente à veia cava inferior, deslocando-se depois ao longo do orifício diafragmático para a veia cava inferior. Perto do bordo posterior do tendão central do diafragma, cada uma se divide em ramos medial e lateral. O ramo medial curva-se anteriormente para se anastomosar com o seu homólogo contralateral, em frente ao tendão central, e com as artérias musculo-frénica e pericardíaco-frénica. O ramo lateral da artéria direita, por sua vez, fornece a irrigação arterial à parede da veia cava inferior, enquanto o ramo lateral da artéria esquerda envia ramos ascendentes à face serosa do esófago abdominal. Cada artéria frénica inferior apresenta dois ou três pequenos ramos supra-renais. A cápsula do fígado e o baço podem receber uma pequena irrigação destas artérias.
Artérias lombares Existem normalmente quatro artérias lombares de cada lado, paralelas às artérias intercostais posteriores. Estas partem da região posterolateral da aorta, do lado oposto ao das vértebras lombares. Um quinto par, constituído por ramos mais pequenos, por vezes, parte da artéria sagrada mediana, mas os ramos lombares das artérias iliolombares normalmente tomam o seu lugar. As artérias lombares deslocam-se posterolateralmente à esquerda do corpo de L4, posteriormente aos troncos simpáticos, para intervalos por entre as apófises transversas das vértebras lombares. A partir daqui, estas continuam-se para os músculos da parede abdominal posterior. As artérias direitas passam posteriormente à veia cava inferior, sendo que as duas primeiras e a primeira artéria lombar esquerda se encontram posterior ao pilar correspondente do diafragma. As artérias lombares deslocam-se posteriormente ao psoas maior, ao plexo lombar e depois cruzam a superfície anterior do quadrado lombar. Ao nível do bordo lateral do quadrado lombar, estas artérias perfuram a aponevrose posterior do transverso do abdómen e deslocam-se anteriormente por entre estas e o oblíquo interno. De referir que as artérias lombares anastomosam-se umas com as outras e com as artérias intercostais posteriores inferiores, subcostais, iliolombares, ilíacas circunflexas profundas e epigástricas inferiores. Cada artéria lombar apresenta um ramo dorsal, que passa posteriormente, por entre as apófises transversas das vértebras adjacentes, para irrigar os músculos dorsais das costas, as articulação e a pele das costas. Cada ramo apresenta um ramo espinhal, que entra no canal vertebral para irrigar os seus conteúdos e as vértebras adjacentes, anastomosando-se com as artérias sobre e inferiormente a este e ao longo da linha média. O ramo espinhal da primeira artéria lombar irriga a porção terminal da corda espinhal, em si, e o resto irriga a cauda equina, as meninges e o canal vertebral.
Artéria sagrada mediana A artéria sagrada mediana é um pequeno ramo que parte da região posterior da aorta, um pouco sobre a sua bifurcação, descendo ao nível da linha média, anteriormente a L4, L5, sacro e cóccix e terminando ao nível do corpo do cóccix. Ao nível de L5, esta artéria é cruzada pela veia ilíaca comum esquerda e, por vezes, dá uma pequena artéria lombar esquerda (artéria lombar ima). Anteriormente a L5, a artéria sagrada mediana anastomosa-se com um ramo lombar da artéria iliolombar. Anteriormente ao sacro, esta artéria anastomosa-se com as artérias sagradas laterais e envia ramos para os buracos sagrados anteriores.
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Veia cava inferior A veia cava inferior envia sangue proveniente de todas as estruturas inferiores ao diafragma, para a aurícula direita. Na maioria do seu percurso encontra-se no abdómen, mas uma pequena secção encontra-se dentro do pericárdio fibroso, no tórax. A veia cava inferior é formada pela junção das veias ilíacas comuns, anteriormente ao corpo de L5 e um pouco à sua direita. Esta veia ascende anteriormente à coluna vertebral, à direita da aorta, estando contida num sulco profundo na face posterior do fígado ou, por vezes, num túnel completado por uma banda de tecido hepático. De seguida, cruza a porção tendinosa do diafragma, por entre os folhetos mediano e direito, inclinando-se ligeiramente anteromedialmente e passa através do pericárdio fibroso. Anteriormente, a veia cava inferior relaciona-se com a artéria ilíaca comum direita, ao nível da sua origem. Esta veia é cruzada obliquamente pela raiz do mesentério e pelos vasos e nervos que lá estão contidos, bem como pela artéria gonadal direita. A veia cava inferior encontra-se posteriormente ao peritoneu e à parede abdominal anterior e à terceira porção do duodeno, ascendendo posteriormente à cabeça do pâncreas e, depois, à primeira porção do duodeno, estando destas separadas pelo canal biliar com um e pela veia porta. Superiormente ao duodeno, encontra-se coberta pelo peritoneu da parede abdominal posterior, que forma a parede posterior do buraco epiplóico. Os últimos três corpos das vértebras lombares e seus discos intervertebrais, o ligamento longitudinal anterior, o psoas maior direito, o tronco simpático e a terceira e quarta artérias lombares são estruturas
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II posteriores da veia cava inferior. Superiormente a essas estruturas, a veia cava inferior relaciona-se posteriormente com o pilar direito do diafragma, com a porção medial da glândula supra-renal direita, com o gânglio celíaco direito e com as artérias renal média, supra-renal média e frénicas inferiores. O uréter direito, a segunda porção do duodeno, o bordo medial do rim direito e o lobo direito do fígado são estruturas laterais ao lado direito da veia cava inferior. Já a artéria aorta, o pilar direito do diafragma e o lobo caudado do fígado são estruturas laterais ao lado esquerdo desta veia.
Veia lombares Quatro pares de veias lombares recolhem sangue de tributárias dorsais, dos músculos lombares e da pele. Os seus ramos anastomosam-se com as tributárias da origem lombar das veias ázigos e hemiázigos. As tributárias abdominais das veias lombares drenam sangue das paredes abdominais anterior, lateral e posterior, incluindo o peritoneu parietal. Anteriormente, as tributárias abdominais anastomosam-se com os ramos das veias epigástricas superior e inferior. Estas anastomoses são vias de drenagem venosa contínua, a partir da pelve e membro inferior, até ao coração, no caso de obstrução da veia cava inferior. As tributárias abdominais drenam nas veias epigástricas superiores, enquanto as tributárias dorsais transportam sangue para os sistemas ázigos e hemiázigos e, por isso, para a veia cava superior. Perto da coluna vertebral, as veias lombares drenam os plexos vertebrais e estão ligadas pela veia lombar ascendente, que é um vaso que se desloca longitudinalmente anterior às raízes das apófises transversas das vértebras lombares. A terceira e quarta veias lombares são, de grosso modo, consistentes no seu curso e, normalmente, passam anteriormente dos lados dos corpos vertebrais correspondentes, para entrar na região posterior da veia cava inferior. As veias lombares esquerdas passam posteriormente à aorta abdominal, sendo por isso, maiores. Já a primeira e a segunda veias lombares são muito mais variáveis, podendo drenar na veia cava inferior, na veia lombar ascendente ou nas veias ázigos lombares, estando, por vezes, ligadas umas às outras. Dessa forma, a primeira veia lombar não entra normalmente na veia cava inferior directamente, mas desloca-se inferiormente para se juntar à segunda veia lombar, ou mais raramente, podem drenar directamente na veia lombar ascendente, ou passar anteriormente sobre o corpo de L1, para se juntar à veia ázigos lombar. A segunda veia lombar pode se juntar à veia cava inferior, ao nível das veias renais, ou próxima destas, ou, menos frequentemente, juntar-se à terceira veia lombar ou à veia lombar ascendente.
Veia lombar ascendente A veia lombar ascendente liga as veias ilíacas comuns, iliolombares e lombares. Esta veia encontra-se por entre o psoas maior e as raízes das apófises transversas das vértebras lombares, apresentando uma variabilidade considerável. Superiormente, normalmente junta-se à veia subcostal para formar a veia ázigos à direita e a hemiázigos, à esquerda. Estas veias deslocam-se anteriormente sobre o corpo de T12 e passam profundamente aos pilares do diafragma e para o tórax. À veia lombar ascendente junta-se um pequeno vaso da região posterior da veia cava inferior ou veia renal esquerda, do lado esquerdo. Esta pequena veia representa a linha da ázigos, sendo designada por veia ázigos lombar. Por vezes, a veia lombar ascendente termina na primeira veia lombar, que depois contorna L1, juntamente com a primeira artéria lombar, para se juntar à veia ázigos. Nestes circunstâncias, as veias subcostais juntamse à veia ázigos, à direita, e à veia hemiázigos, à esquerda.
Veia gonadal direita Apenas a veia gonadal direita se junta directamente à veia cava inferior. Esta abre-se na sua região anterolateral, por um ângulo agudo, imediatamente inferior ao nível da veia renal esquerda. A veia gonadal direita é por vezes dupla.
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Veias renais As veias renais são vasos de grande calibre, que se encontram anteriormente às artérias renais e se abrem na veia cava inferior, por ângulos quase rectos. A veia renal esquerda é três vezes maior que a direita em comprimento (apresentam 7,5 e 2,5 cm respectivamente). A veia esquerda encontra-se na parede abdominal posterior, posteriormente à veia esplénica e corpo do pâncreas. Perto da sua abertura na veia cava inferior, a veia renal esquerda encontra-se anteriormente à aorta, estando a artéria mesentérica superior, imediatamente superiormente a esta. Na veia renal esquerda abrem-se as veias supra-renais, superiormente, e a veia gonadal esquerda, inferiormente. Já a veia renal direita encontra-se posterior à segunda porção do duodeno e, por vezes, à porção lateral da cabeça do pâncreas. A veia supra-renal direita drena directamente na veia cava inferior, ao nível de T12.
Veias frénicas inferiores As veias frénicas inferiores deslocam-se na superfície inferior do tendão central do diafragma. Estas drenam na região posterolateral da veia cava inferior, em torno do nível de T10. A veia esquerda tende a drenar a um nível ligeiramente superior que a direita e desloca-se superiormente ao nível da abertura esofágica do diafragma. A veia frénica inferior esquerda pode ser dupla, tendo um ramo drenando a veia renal esquerda ou supra-renal esquerda.
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Vascularização do estômago A irrigação arterial do estômago provém predominantemente do tronco celíaco, embora existam anastomoses intramurais com vasos de outras origens, nas duas extremidades do estômago. A artéria gástrica esquerda parte directamente do tronco celíaco. A artéria esplénica dá origem às pequenas artérias gástricas, bem como à artéria gastroepiplóica, podendo, ocasionalmente, originar uma artéria gástrica posterior. A artéria hepática, por fim, origina a artéria gástrica direita e a artéria gastroduodenal, que por sua vez, origina a artéria gastroepiplóica direita.
Artéria gástrica esquerda A artéria gástrica esquerda é o ramo mais pequeno do tronco celíaco. Ascende para a esquerda da linha média e cruza, sobre o bordo inferior ou inferiormente ao nível de origem do pilar esquerdo do diafragma, inferiormente ao peritoneu da parede posterior e superior do saco menor. Aqui, encontra-se adjacente à artéria frénica inferior esquerda e medial ou anterior, à glândula supra-renal esquerda. Desloca-se anteriormente para a porção superior do omento menor, adjacente à terminação superior da curvatura menor e desloca-se anteroinferiormente para se deslocar ao longo da curvatura menor, por entre os dois folhetos peritoneais do omento menor. No ponto mais superior do seu percurso, esta artéria dá um ou mais ramos esofágicos, sendo que no seu percurso ao longo da curvatura menor, dá múltiplos ramos que se deslocam pelas superfícies anterior e posterior do estômago e se anastomosam com a artéria gástrica direita, na região da incisura angular. Mais raramente, a artéria gástrica esquerda parte da artéria hepática comum ou dos seus ramos.
Artérias gástricas curtas As artérias gástricas curtas irrigam o fundo do estômago, partindo da artéria esplénica, à esquerda da curvatura maior do estômago. Estas são de número variável, sendo normalmente entre cinco e sete. Geralmente são ramos da artéria esplénica ou das suas divisões, podendo também ser dadas a partir da artéria gastroepiplóica esquerda proximal, passando por entre as camadas do ligamento gastrosplénico para irrigar o orifício cardíaco e o fundo gástrico. Estas artérias anastomosam-se com ramos da artéria gástrica esquerda e gastroepiplóca esquerda.
Artéria gastroepiplóica esquerda A artéria gastroepiplóica esquerda é o maior ramo da artéria esplénica, partindo de perto do hilo esplénico e deslocando-se anteroinferiormente por entre as camadas do ligamento gastrosplénico, para
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II a região superior do omento gastrocólico. Esta artéria encontra-se por entre as camadas de peritoneu, perto da curvatura maior, deslocando-se inferiormente para se anastomosar com a artéria gastroepiplóica direita. A artéria gastroepiplóica esquerda dá ramos gástricos para o fundo do estômago, através do ligamento gastrosplénico, e para o corpo do estômago através do omento gastrocólico. Já os ramos epiplóicos (ou omentais) desta artéria partem ao longo do percurso deste vaso, descendo por entre as camadas do omento gastrocólico até ao omento maior.
Artéria gástrica posterior A artéria gástrica posterior é um ramo inconstante que, quando presente, parte da artéria esplénica na sua secção média, posteriormente ao corpo do estômago. Ascende posteriormente ao peritoneu do saco menor, em direcção ao fundo, e atinge a superfície posterior do estômago na prega gastrofrénica.
Artéria gástrica direita A artéria gástrica direita parte da artéria hepática (embora possa ter uma origem variável), quando esta passa anteriormente, desde a parede posterior do saco menor, até ao bordo inferior do omento menor, sobre a primeira parte do duodeno. Desloca-se por entre as camadas peritoneais do omento menor, superiormente à terminação medial da curvatura menor, passa superiormente ao longo da curvatura menor, dando múltiplos ramos para as superfícies anterior e posterior do estômago e anastomosa-se com a artéria gástrica esquerda.
Artéria gastroduodenal A artéria gastroduodenal parte da artéria hepática comum, posterior e superiormente à primeira porção do duodeno, originando as artérias gastroepiplóica direita e pancreático-duodenal superior, ao nível do bordo inferior da primeira porção do duodeno.
Artéria gastroepiplóica direita A artéria gastroepiplóica direita origina-se da artéria gastroduodenal, posteriormente à primeira porção do duodeno, anteriormente à cabeça do pâncreas. Esta artéria passa inferiormente, em direcção à linha média, por entre as camadas do omento gastrocólico, situando-se inferiormente ao piloro e deslocandose, depois, lateralmente ao longo da curvatura maior e terminando, anastomosando-se com a artéria gastroepiplóica esquerda. A artéria gastroepiplóica direita dá ramos gástricos que ascendem pelas superfícies posterior e anterior do antro e corpo inferior do estômago; ramos epiplóicos que descem para o omento maior e ramos que contribuem para a irrigação da região inferior da primeira porção do duodeno.
Drenagem venosa do estômago As veias que drenam o estômago drenam, em última instância, na veia porta. Uma rede venosa intramural e submucosa origina veias que normalmente acompanham as artérias correspondentes e drenam nas veias esplénica ou mesentérica superior, embora outras passem directamente para a veia porta, sendo o seu percurso muito variável.
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Veias gástricas curtas Quatro ou cinco veias gástricas curtas drenam o fundo gástrico e a porção superior da curvatura maior para a veia esplénica ou para uma das suas grandes tributárias.
Veia gastroepiplóica esquerda A veia gastroepiplóica esquerda drena as superfícies anterior e posterior do corpo do estômago e o omento maior adjacente, através das suas múltiplas tributárias. Esta veia desloca-se superolateralmente, ao longo da curvatura maior, por entre as camadas do omento gastrocólico e drena na veia esplénica, ao nível do ligamento gastrosplénico.
Veia gastroepiplóica direita A veia gastroepiplóica direita drena o omento maior, o corpo distal e o antro do estômago. Passa medialmente, inferiormente à curvatura maior, na porção superior do omento gastrocólico. Proximalmente à constrição pilórica, a veia gastroepiplóica direita passa posteriormente, drenando para a veia mesentérica superior, inferiormente ao colo do pâncreas. A veia gastroepiplóica direita pode receber a veia pancreaticoduodenal superior, perto da sua entrada na veia mesentérica superior.
Veia gástrica esquerda A veia gástrica esquerda drena o corpo superior e o fundo do estômago, ascendendo ao longo da curvatura menor até à abertura esofágica, onde recebe várias veias esofágicas inferiores. Esta veia curva-se então posteriormente e medialmente, por detrás da face peritoneal posterior do saco menor, drenando para a veia porta, directamente, ao nível do bordo superior da primeira porção do duodeno.
Veia gástrica direita A veia gástrica direita é tipicamente pequena e desloca-se ao longo da terminação medial da curvatura menor, passando inferiormente ao peritoneu, pois está reflectida da região posterior do piloro e primeira parte do duodeno até à parede posterior do saco menor. Esta veia drena directamente para a veia porta ao
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II nível da primeira porção do duodeno, recebendo a veia pré-pilórica, quando esta ascende, anteriormente ao piloro, ao nível da abertura pilórica.
Veias gástricas posteriores Podem estar presentes várias veias gástricas posteriores, que, quando presentes, acompanham a artéria gástrica posterior das regiões média e posterior do estômago e drenando na veia esplénica.
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Vascularização do duodeno Os principais vasos que irrigam o duodeno são as artérias pancreaticoduodenal superior e inferior. A primeira e a segunda porções do duodeno também recebem contribuições de outros vasos, nomeadamaente a artéria gástrica direita, supraduodenal, gastroepiplóica direita, hepática e gastroduodenal. Ramos da artéria pancreaticoduodenal superior podem contribuir para irrigar o canal pilórico.
Artéria gastroduodenal A artéria gastroduodenal parte normalmente da artéria hepática comum posteriormente, ou, por vezes, superiormente à primeira porção do duodeno, descendo por entre a primeira porção do duodeno e o colo do pâncreas, imediatamente à direita da reflexão peritoneal da superfície posterior do duodeno. Normalmente, encontra-se à esquerda do canal biliar comum, mas ocasionalmente encontra-se anteriormente. Ao nível do bordo inferior da primeira porção do duodeno, divide-se em artérias gastroepiplóica direita e pancreaticoduodenal superior. Antes da sua divisão, a porção inferior da artéria origina pequenos ramos que irrigam a terminação pilórica do estômago e pâncreas e ramos retroduodenais que irrigam a primeira porção do duodeno e a região proximal da segunda porção.
Artéria supraduodenal A artéria supraduodenal, por vezes, parte da artéria gastroduodenal, posteriormente ao bordo superior da primeira porção do duodeno e irriga a região superior desta, podendo por vezes partir da artéria hepática comum ou da artéria gástrica direita.
Artéria pancreaticoduodenal superior A artéria pancreaticoduodenal superior divide-se num ramo anterior e num ramo posterior. A artéria pancreaticoduodenal superior anterior é um ramo terminal da artéria gastroduodenal e desce no sulco anterior, por entre a segunda porção do duodeno e a cabeça do pâncreas, irrigando as primeiras duas porções do duodeno e a cabeça do pâncreas e anastomosando-se com a divisão anterior da artéria pancreaticoduodenal inferior. Já a artéria pancreaticoduodenal superior posterior é dada ao nível do bordo superior da primeira porção do duodeno. Desce para a direita e anteriormente para a veia porta e canal biliar comum. De seguida, desloca-se posteriormente à cabeça do pâncreas, cruza posteriormente ao canal biliar comum, entra na parede do duodeno e anastomosa-se com a divisão posterior da artéria pancreaticoduodenal
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II inferior. A artéria posterior irriga a cabeça do pâncreas, as primeiras duas porções do duodeno e a porção mais inferior do canal biliar comum.
Artéria pancreaticoduodenal inferior A artéria pancreaticoduodenal inferior normalmente parte da artéria mesentérica superior ou do seu primeiro ramo jejunal, perto do seu bordo superior da terceira porção do duodeno. Esta artéria cruza posteriormente à veia mesentérica superior e divide-se directamente em ramos anterior e posterior. O ramo anterior passa para a direita, anteriormente ao bordo inferior da cabeça do pâncreas, deslocandose superiormente para se anastomosar com a artéria pancreaticoduodenal superior anterior. Já o ramo posterior desloca-se posteriormente e superiormente para a direita, encontrando-se posteriormente ao bordo inferior da cabeça do pâncreas e anastomosa-se com a artéria pancreaticoduodenal posterior superior. Ambos os ramos irrigam a cabeça do pâncreas, a sua apófise unciforme e a segunda e terceira porção do duodeno.
Ramos da artéria jejunal Ramos do primeiro ramo jejunal da artéria mesentérica superior irrigam a quarta porção do duodeno e, frequentemente, formam uma anastomose com o ramo terminal da artéria pancreaticoduodenal inferior anterior (que parte da artéria mesentérica superior).
Drenagem venosa do duodeno As veias duodenais drenam, em última instância, na veia porta. As veias submucosa e intramural originam as veias pancreaticoduodenais, que normalmente acompanham as artérias correspondentes. A veia pancreaticoduodenal superior é formada medialmente ao ponto médio da segunda porção do duodeno. Desloca-se superomedialmente na face posterior da cabeça do pâncreas, passa posteriormente à porção distal do canal biliar comum e drena na veia porta, posteriormente ao colo do pâncreas. A veia pancreaticoduodenal inferior, por seu turno, desloca-se da região anteromedial da segunda porção do duodeno, inferiormente no sulco, por entre a segunda e a terceira porção do duodeno e a cabeça do pâncreas. Normalmente, esta veia drena na veia mesentérica superior, mas pode drenar na veia gastroepiplóica direita.
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Vascularização do jejuno e íleo Artéria mesentérica superior A artéria mesentérica superior parte da artéria aorta, a cerca de 1cm inferiormente ao tronco celíaco, ao nível do disco intervertebral, por entre L1 e L2. O ângulo da sua origem da aorta é agudo, sendo que a artéria mesentérica superior se desloca inferiormente e anteriormente, anterior à apófise unciforme do pâncreas e à terceira porção do duodeno e, posteriormente, à veia esplénica e corpo do pâncreas. A veia renal esquerda encontra-se posteriormente a esta artéria e separa-a da aorta. A artéria cruza anteriormente à veia cava inferior, uréter direito e psoas maior direito, à medida que desce na raiz do mesentério do intestino delgado. O seu calibre diminui progressivamente, à medida que dá ramos sucessivos para as ansas do jejuno e íleo, sendo que o seu ramo terminal anastomosa-se com a artéria íleo-cólica. A artéria mesentérica superior dá os ramos cólico médio, cólico direito (por vezes), ileocólico, ileais e jejunais. Pode também dar os ramos hepático comum, gastroduodenal, hepático direito acessório, pancreático acessório ou esplénico e pode partir através de um tronco comum celíaco-mesentérico. Os seus ramos jejunais e ileais formam arcadas dentro do mesentério até uma extensão variável, sendo que a última destas arcadas é entendida como formando uma “artéria marginal” do intestino delgado, sendo que desta última arcada partem os vasos rectos, para irrigar directamente o intestino delgado.
Ramos jejunais Existem normalmente entre cinco a dez ramos jejunais, que partem do lado esquerdo da porção superior da artéria mesentérica superior. Estes estão distribuídos para o jejuno, como uma série de pequenas arcadas, que formam uma fila (única ou dupla) de arcos anastomósicos, antes de originar os múltiplos vasos rectos. Estes vasos deslocam-se quase paralelamente no mesentério, encontrando-se distribuídas alternativamente para lados opostos da sua parede, onde as duas séries de vasos formam “folhetos” distintos dentro do mesentério.
Ramos ileais Os ramos ileais são mais numerosos que os ramos jejunais, mas apresentam calibre menor. Estes partem das regiões esquerda e anterior da artéria mesentérica superior. O comprimento do mesentério é maior no íleo e os seus ramos formam entre três a cinco filas de arcos dentro do mesentério, antes de originar múltiplos vasos rectos, que se deslocam directamente em direcção à parede do íleo. Os ramos ileais deslocam-se paralelamente no mesentério e estão distribuídos para regiões alternadas do íleo. A irrigação da última ansa do íleo terminal é limitada. Existem normalmente apenas duas arcadas separadas, na zona média do mesentério. Cada uma recebe uma contribuição do ramo ileal da artéria íleo-cólica e o último ramo ileal da artéria mesentérica superior, tendo normalmente um calibre maior que os vasos ilíacos médios.
Drenagem venosa A veia mesentérica superior drena o intestino delgado, o ceco e as porções ascendente e transversa do cólon. Esta veia é formada no mesentério inferior direito do intestino delgado, pela união das tributárias do íleo terminal, ceco e apêndice vermiforme. A veia mesentérica superior ascende no mesentério à direita da artéria mesentérica superior, passando anteriormente ao uréter direito, veia cava inferior, terceira porção do duodeno e apófise unciforme do pâncreas, terminando por se juntar à veia esplénica, posteriormente ao colo do pâncreas, para formar a veia porta.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II No que concerne a tributárias, a veia mesentérica superior recebe as veias jejunais, ileais, ileo-cólica, cólica direita (quando presente), cólica média, gastroepiplóica direita e pancreático-duodenal, numa distribuição similar à das artérias correspondentes.
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Vascularização do intestino grosso Vascularização do ceco, apêndice vermiforme e cólon ascendente As artérias para o ceco, apêndice vermiforme e cólon ascendente são, de certa forma, variáveis, mas derivam todas da artéria mesentérica superior, por via das artérias ileo-cólica e cólica direita (quando presente).
Artéria íleo-cólica A artéria íleo-cólica parte do lado direito da artéria mesentérica superior, na sua metade superior, na raiz do mesentério. Desce para a direita, inferiormente ao peritoneu parietal, em direcção ao ceco e cruza anteriormente ao uréter direito, aos vasos gonadais e ao psoas maior, para entrar na fossa ilíaca direita. Apesar da distribuição terminal variar, a artéria normalmente divide-se numa divisão superior, que se desloca superolaterlamente, em direcção ao cólon ascendente, onde se anastomosa com a artéria cólica direita (ou com o ramo direito da artéria cólica média), e numa divisão inferior, que se anastomosa com o ramo ileal final da artéria mesentérica superior distal. A divisão inferior aproxima-se do bordo superior da junção íleo-cólica, dando normalmente origem aos ramos cólico ascendente (que passa superiormente no cólon ascendente, para se anastomosar com a divisão superior), cecal anterior, cecal posterior (que normalmente origina a artéria apendicular) e ileal (que ascende para a esquerda, na região inferior do íleo, irrigando-o e anastomosando-se com o último ramo ileal da artéria mesentérica superior). Artéria apendicular A artéria apendicular parte da artéria íleo-cólica e desce posteriormente ao íleo terminal, para entrar no mesoapêndice, a uma pequena distância da base apendicular. Aqui, esta dá um ramo recorrente, que se anastomosa na base do apêndice com um ramo da artéria cecal posterior. A artéria apendicular principal aproxima-se da ponta do órgão, inicialmente próxima, e depois no bordo do mesoapêndice. A porção terminal da artéria encontra-se na parede do apêndice, sendo comum a presença de artérias acessórias para irrigar o apêndice.
Artéria cólica direita A artéria cólica direita é um pequeno vaso, cuja anatomia é altamente variável. Normalmente, esta artéria parte como um tronco comum com a artéria cólica média. Alternativamente, pode partir como um ramo separado do lado direito da artéria mesentérica superior, ou da artéria íleo-cólica. Desde a sua origem comum com a artéria cólica média, passa em direcção ao cólon ascendente, profundamente ao peritoneu parietal e anteriormente aos vasos gonadais direitos, ao uréter direito e a o psoas maior. Por vezes, parte mais superiormente e cruza a segunda porção do duodeno e o pólo inferior do rim direito. Perto do cólon, divide-se num ramo descendente, que se anastomosa com o ramo superior da artéria íleo-cólica e num ramo ascendente, que se anastomosa com o ramo direito da artéria cólica média. Estas formam a artéria marginal na região do ângulo hepático, a partir de onde, os vasos se encontram distribuídos para o terço superior do cólon ascendente e para o lado direito do cólon transverso.
Drenagem venosa do ceco, apêndice vermiforme e cólon ascendente O sangue venoso da parede do ceco, apêndice e cólon ascendente drena para as arcadas mesentéricas e subsequentemente, para veias segmentais, que acompanham as respectivas artérias e tendem a
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II apresentar as variações da drenagem arterial. As veias segmentais drenam na veia mesentérica superior, que se encontra à direita da arteira mesentérica superior. A veia mesentérica superior recebe uma ou mais veias cólicas médias, a veia cólica direita e a veia íleocólica e drena na veia porta. As tributárias da veia íleo-cólica seguem um padrão similar aos ramos da artéria íleo-cólica, sendo formadas por tributárias superiores e inferiores. A veia ascende ao longo da artéria íleo-cólica, inferiormentente ao peritoneu do mesentério íleo-cecal e drena na veia mesentérica superior. A tributária inferior recebe veias apendiculares (através das veias íleo-cólica ou cecal posterior), veia cecal posterior e as veias ileais, enquanto a tributária superior drena as veias cólicas ascendentes. As tributárias ascendentes das veias íleo-cólicas e cólica direita acompanham as suas respectivas artérias para a raiz do mesentério e drenam, pela veia íleo-cólica, na veia mesentérica superior. A veia cólica direita é altamente variável e pode drenar directamente para a veia mesentérica superior, ou para as veias gastroepiplóica direita ou pancreaticoduodenal, para formar um tronco gastrocólico, que drena na veia mesentérica superior. De referir que a veia cólica direita pode estar totalmente ausente.
Vascularização do cólon transverso Os dois terços direitos do cólon transverso são irrigados pela artéria mesentérica superior, através da artéria cólica média. O terço distal é normalmente irrigado pelo ramo ascendente da artéria cólica esquerda, através da artéria marginal do cólon, apesar de isto ser algo variável.
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Artéria cólica média A artéria cólica média normalmente parte da região anterolateral da artéria mesentérica superior, quer separadamente, quer como um tronco comum com a artéria cólica direita, imediatamente inferiormente à apófise unciforme do pâncreas e anteriormente à terceira porção do duodeno. Inicialmente, esta artéria passa inferiormente, deslocando-se depois anteriormente e superiormente, dentro da raiz do mesocolon transverso, imediatamente à direita da linha média, acabando por se dividir num ramo esquerdo e num ramo direito. O ramo direito anastomosa-se com a artéria cólica direita, enquanto o ramo esquerdo se anastomosa com a artéria cólica esquerda. Por vezes, a artéria cólica média divide-se em três ou mais ramos dentro do mesocolon transverso, sendo que os ramos mais laterais formam uma anastomose arterial. Uma artéria cólica acessória pode partir das artérias pancreática dorsal, hepática, mesentérica inferior ou cólica esquerda.
Drenagem venosa do cólon transverso A veia mesentérica superior recebe uma ou mais veias cólicas médias e a veia ileo-cólica. A veia cólica direita encontra-se por vezes ausente, ou drena como uma tributária para o ramo direito da artéria cólica média. Várias tributárias drenam numa ou em mais veias cólicas médias, que são altamente variáveis, em extensão e posição. A veia cólica média drena, quer para a veia mesentérica superior, imediatamente antes da sua junção com a veia esplénica, ou directamente, para a veia porta hepática.
Vascularização do cólon descendente e cólon sigmóide A irrigação arterial do cólon descendente parte da artéria mesentérica inferior, por via do seu ramo cólico esquerdo, que também se anastomosa com a artéria marginal do cólon (na região do ângulo esplénico) e com as artérias sigmóides (na região de junção com o cólon sigmóide).
Artéria mesentérica inferior A artéria mesentérica inferior tem normalmente um calibre menor que a artéria mesentérica superior. Esta artéria parte da região anterolateral esquerda ou anterior da aorta, quase ao nível de L3, 3 ou 4 cm superiormente à bifurcação aórtica e inferiormente à terceira porção do duodeno. Esta desce na raiz do mesentério cólico esquerdo, inicialmente anterior e, depois, à esquerda da aorta, cruza a origem da artéria ilíaca comum esquerda, medialmente ao uréter esquerdo e depois entra e continua-se na raiz do mesocolon sigmóide, como artéria rectal superior. A veia mesentérica inferior encontra-se lateralmente,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II quando a artéria se encontra distalmente. Os ramos principais da artéria mesentérica inferior são o cólico esquerdo, sigmóide e rectais superiores.
Artéria cólica esquerda A artéria cólica esquerda parte da artéria mesentérica inferior, a curta distância da sua origem, ascendendo dentro do mesentério cólico esquerdo, anteriormente ao psoas maior esquerdo e bifurcase em ramos ascendente e descendente. A artéria ou os seus ramos cruzam o uréter esquerdo e os vasos gonadais. O ramo ascendente passa anteriormente ao rim esquerdo e anastomosa-se com o ramo esquerdo da artéria cólica média, no espaço subperitoneal, dentro do mesocolon transverso. Já o ramo descendente passa lateralmente no retroperitoneu e aproxima-se do cólon descendente, onde participa na formação da artéria marginal, anastomosando-se com a segunda artéria sigmóide mais superior. Por vezes, a artéria cólica esquerda pode ser originada a partir do tronco da artéria mesentérica superior, ou dos primeiros ramos jejunais. Quando presente, desloca-se lateralmente no mesentério cólico esquerdo superior, imediatamente inferiormente ao nível da junção duodeno-jejunal, para irrigar a porção superior do cólon descendente e formar parte da artéria marginal e a anastomose arterial na região do cólon transverso distal. A artéria cólica esquerda pode, ela própria, originar uma artéria cólica média esquerda acessória. Por vezes, a artéria cólica esquerda origina um ramo, pouco após a sua origem, ascendendo este no mesentério e anastomosando-se directamente com um ramo descendente similar, do ramo esquerdo da artéria cólica média (formando o arco de Riolan).
Artérias sigmóides Existem entre duas a cinco artérias sigmóides, que são ramos da artéria mesentérica inferior. Estas descem obliquamente dentro do espaço subperitoneal, no mesentério sigmóide, anteriormente ao psoas maior esquerdo, uréter e vasos gonadais. As artérias sigmóides irrigam a porção distal do cólon descendente e o cólon sigmóide e anastomosam-se superiormente com a artéria cólica esquerda e, inferiormente, com a
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II artéria rectal superior. Contrariamente ao que ocorre no intestino delgado, não se formam arcadas arteriais, até as artérias se aproximarem da parede do cólon, onde partem pequenos ramos para irrigar directamente o cólon sigmóide. A formação de uma verdadeira artéria marginal é menos distinta na região do cólon sigmóide, que na região do cólon descendente. Um espaço significante por vezes existe no mesentério, por entre a artéria sigmóide mais superior e o ramo descendente da artéria cólica esquerda. Na região do ângulo esplénico, a artéria marginal recebe contribuições do ramo esquerdo da artéria cólica média, que se anastomosa com um ramo ascendente da artéria cólica esquerda para irrigar a região superior do cólon descendente. O ramo descendente da artéria cólica esquerda anastomosa-se com os ramos superiores da artéria sigmóide mais superior, para irrigar o cólon descendente. De referir que a origem da irrigação arterial principal para o ângulo esplénico e terço distal do cólon transverso é feita pela artéria cólica esquerda, mas também pode ser feita pelo ramo esquerdo da artéria cólica média.
Drenagem venosa do cólon descendente e cólon sigmóide A veia mesentérica inferior drena o recto, o cólon sigmóide, descendente e transverso distal, iniciandose como veia rectal superior, a partir do plexo rectal, através do qual se liga com as veias rectais média e inferior. A veia mesentérica inferior encontra-se à esquerda da artéria mesentérica inferior, ascendendo profundamente ao peritoneu e anteriormente ao psoas maior esquerdo, podendo cruzar os vasos testiculares ou ováricos ou ascender medialmente a estes. Normalmente, encontra-se lateral, ou por vezes posterior, ao ângulo duodenojejunal e à prega peritoneal. A veia mesentérica inferior drena normalmente na veia esplénica, mas por vezes drena na confluência das veias esplénica e mesentérica superior, ou directamente na veia mesentérica superior. De referir que a veia mesentérica inferior recebe tributárias de várias veias sigmóides e das veias cólicas esquerda e média. A veia cólica esquerda é formada a partir de várias tributárias, incluindo um ramo ascendente e descendente, correspondentes às artérias equivalentes. Estas tributárias podem não formar uma veia, propriamente dita, até drenarem na veia mesentérica inferior. A veia cólica normalmente encontra-se mais superiormente no mesentério cólico esquerdo, que a sua artéria homóloga e apresenta um percurso mais curto, devido ao facto de a veia mesentérica inferior se encontrar mais lateralmente que a artéria mesentérica inferior. De referir que várias veias sigmóides drenam o cólon sigmóide e deslocam-se superiormente, ao longo das suas artérias respectivas, para drenar na veia mesentérica inferior.
Vascularização do recto e canal anal A artéria rectal superior é a principal artéria que irriga os dois terços superiores do recto. Ramos da artéria rectal média contribuem para irrigar o terço médio e ramos ascendentes da artéria rectal inferior irrigam o terço inferior. A artéria sagrada mediana contribui também com um pequeno ramo, que entra na parede posterior da junção ano-rectal, na fáscia sacro-rectal.
Artéria rectal superior A artéria rectal superior é a principal continuação da artéria mesentérica inferior. Desce ao nível da pelve, no mesocólon sigmóide, cruza os vasos ilíacos comuns esquerdos e passa sobre o promontório sagrado, normalmente, à esquerda da linha média. Encontra-se anteriormente às vértebras sagradas superiores e passa para o mesorecto superior, descendo, inicialmente na linha média e dividindo-se em dois ramos, ao nível de S3. Esses ramos encontram-se inicialmente posterolateralmente e depois
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II lateralmente, à parede rectal, à medida que descem, um de cada lado do recto. Os ramos terminais perfuram a parede muscular, a partir do nível do mesorecto superior, para entrar na submucosa rectal, onde se anastomosam com ramos ascendentes das artérias rectais inferiores.
Drenagem venosa do recto e canal anal As veias rectais superiores são formadas a partir do plexo rectal interno. As tributárias da veia rectal superior ascendem na submucosa rectal, como cerca de seis vasos de dimensões consideráveis, que perfuram a parede rectal, a aproximadamente 7,5 cm sobre o ânus. Esses ramos unem-se para formar a veia rectal superior, que se desloca juntamente com a artéria rectal superior, na raiz do mesorecto e mesosigmóide, cruzando os vasos ilíacos comuns esquerdos, juntamente com a artéria rectal superior e continuando-se superiormente, como veia mesentérica inferior, para a esquerda da linha média. O recto e o canal anal têm ainda drenagem venosa assegurada pelas veias rectais médias.
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Vascularização do fígado Os vasos associados ao fígado são a veia porta, a artéria hepática e as veias hepáticas. A veia porta e a artéria hepática ascendem no omento menor, até à porta hepática, onde cada uma destas estruturas se bifurca. O canal biliar hepático e os vasos linfáticos descem a partir da porta hepática, no mesmo omento. As veias hepáticas abandonam o fígado, através da sua face posterior e deslocam-se directamente para a veia cava inferior.
Artéria hepática Nos indivíduos adultos, a artéria hepática, apresenta um tamanho intermédio entre as artérias gástrica esquerda e esplénica, enquanto nos fetos, este é o maior ramo do tronco celíaco. A artéria hepática dá as artérias gástrica direita, gastroduodenal e cística, bem como ramos directos para o canal biliar, a partir da artéria hepática direita e, por vezes, da supraduodenal. Após a sua origem do tronco celíaco, a artéria hepática passa anteriormente e lateralmente, inferiormente ao buraco epiplóico, até à região superior da primeira porção do duodeno. Esta artéria pode ser subdividida numa primeira porção, que vai desde o tronco celíaco até à origem da artéria gastroduodenal e que é designada por artéria hepática comum; e numa segunda porção – a artéria hepática própria, até à ocorrência da sua bifurcação. A artéria hepática própria passa anteriormente à veia porta e ascende anteriormente ao buraco epiplóico, por entre as camadas do omento menor. Ao nível do bordo livre do omento menor, a artéria hepática é medial ao canal biliar comum e anterior à veia porta. Ao nível da porta hepática, esta artéria divide-se em ramos direito e esquerdo, que depois se vão deslocar no parênquima do fígado. A artéria hepática direita divide-se num ramo anterior, para os segmentos V e VIII e num ramo posterior, para os segmentos VI e VII. A divisão anterior por vezes irriga o segmento I e a vesícula biliar.
☤ A artéria hepática direita normalmente cruza-se posteriormente ao canal hepático comum. Esta proximidade significa que a artéria hepática direita se encontra méis envolvida no cancro do canal biliar que a artéria hepática esquerda.
Drenagem venosa do fígado O fígado apresenta dois sistemas venosos – o sistema porta que fornece sangue da maioria do tracto gastrointestinal e seus órgãos associados até ao fígado e o sistema venoso hepático, que drena sangue, a partir do parênquima hepático, até à veia cava inferior.
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Veia porta A veia porta inicia-se ao nível de L2, sendo formada a partir da convergência das veias mesentérica superior e esplénica. Esta veia apresenta cerca de 8 cm e encontra-se anteriormente à veia cava inferior e posteriormente ao colo do pâncreas. Esta veia encontra-se obliquamente disposta para a direita e ascende posteriormente à primeira porção do duodeno, ao canal biliar comum e à artéria gastroduodenal, sendo que nesta região, a veia porta é directamente anterior à veia cava inferior. A veia porta entra no bordo direito do omento menor, ascendendo anteriormente ao buraco epiplóico, para chegar à extremidade direita da porta hepática, onde se divide em ramos principais direito e esquerdo, que acompanham os ramos correspondentes da artéria hepática. De referir que, ao nível do omento menor, a veia porta encontra-se posteriormente, quer ao canal biliar comum, quer à artéria hepática, estando rodeada pelo plexo hepático e acompanhada por muitos vasos linfáticos. As principais tributárias extra-hepáticas da veia porta são a veia gástrica esquerda, que termina ao nível do bordo esquerdo da veia porta, a veia gástrica direita, e a veia pancreato-duodenal superior posterior, que drena mais perto da cabeça do pâncreas. A veia porta divide-se em ramos esquerdo e direito, ao nível do hilo. A veia porta esquerda apresenta um percurso extra-parenquimal mais longo (cerca de 4-5cm), sendo normalmente mais horizontal, mas tendo um calibre menor que a veia portal direita. De facto, podemos dividir a veia porta esquerda em porções horizontal e vertical – a porção horizontal desloca-se ao longo da base do segmento VI, dando por vezes ramos para o segmento I e VI. O ramo para o segmento II continua-se lateralmente, mas a veia porta esquerda principal assume um percurso mais anterior e vertical, ao nível da fissura umbilical (tornando-se a veia da fissura umbilical), onde dá ramos para os segmentos III e IV e recebe a veia umbilical esquerda obliterada.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O segmento IV é do domínio, normalmente, da veia porta esquerda, mas por vezes, pode ter vascularização da veia porta direita, através de ramos de veias para os segmentos V ou VIII, ou através de ramos proximais da própria veia hepática direita. De referir que a veia porta direita apresenta apenas 2-3 cm de comprimento, dividindo-se, normalmente numa divisão sectoral medial direita (que é anterior), para os segmentos V e VIII (e por vezes para o I), e numa divisão sectoral lateral direita (que é posterior), para os segmentos VI e VII.
Veias hepáticas O fígado é drenado por três grandes veias hepáticas (que se encontram por entre os quatro principais sectores do fígado), para a porção supra-hepática da veia cava inferior, e por um conjunto de veias hepáticas menores, que drenam na porção intra-hepática da veia cava inferior. A veia hepática direita é a maior e a mais variável veia hepática. Normalmente é única, mas pode ser dupla, deslocando-se no plano inter-sectoral, por entre os sectores medial direito e lateral direito. Esta veia drena a totalidade dos segmentos VI e VII e partes dos segmentos V e VIII. A veia hepática direita é formada, perto dos bordos anterior e inferior do fígado e encontra-se num plano coronal, na maior parte do seu percurso. Esta veia drena para a veia cava inferior, perto do bordo superior do lobo caudado. A veia hepática média encontra-se ao longo do plano, por entre os sectores medial direito e medial esquerdo do fígado. Normalmente, esta veia junta-se à veia hepática esquerda, formando um tronco comum, que se abre na veia cava inferior. Esta veia drena a porção central do fígado, recebendo ramos constantes, dos segmentos IV, V e VIII, apresentando esses ramos, um tamanho variável. A veia hepática esquerda encontra-se por entre os sectores medial esquerdo e lateral esquerdo. Esta veia drena os segmentos II, III e por vezes o IV. Pequenas veias, que drenam o segmento II e, por vezes, a porção superior do segmento IV, podem drenar directamente na veia cava inferior, embora isso não seja muito comum. A veia da fissura umbilical é normalmente uma das tributárias principais da veia hepática esquerda, sendo que esta se desloca no plano inter-segmental, por entre os segmentos III e IV, contribuindo para a sua drenagem.
Veias menores As veias do segmento I drenam directamente na veia cava inferior e variam em número, podendo ser entre uma e cinco. Raramente, existe uma veia média direita acessória ou uma veia hepática acessória, que, caso apresetem mais de 5mm de diâmetro, drenam os segmentos V e VI, independentemente das três grandes veias.
Irrigação da vesícula biliar Artéria cística A artéria cística normalmente parte da artéria hepática direita, passando, frequentemente, posteriormente ao canal hepático comum e anteriormente ao canal cístico, para chegar à região superior do colo da vesícula biliar, onde se divide em ramos superficial e profundo. O ramo superficial ramifica-se na região inferior do corpo da vesícula, enquanto o ramo profundo se ramifica na região superior. Estas artérias anastomosam-se sobre a face do corpo e fundo da vesícula.
205
Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A origem da artéria cística é variável, sendo a variação mais comum, a partir da artéria hepática comum. Sendo que, aquando de variações como esta, a artéria cística cruza anteriormente ao canal biliar comum, ao canal hepático comum, para chegar à vesícula biliar. Uma artéria cística acessória pode partir da artéria hepática comum, ou de um dos seus ramos, sendo que a artéria cística, por vezes, se bifurca próximo da sua origem. A artéria cística origina vários ramos que irrigam os canais lobar hepático e hepático comum e a porção superior do canal biliar. Esses ramos formam uma rede, que se anastomosa com os vasos, que ascendem em torno do canal biliar comum e com os vasos, do parênquima hepático, que descem com os canais hepáticos esquerdo e direito.
Artérias dos canais O canal biliar comum e os canais biliares são irrigados por uma rede de vasos, que normalmente recebem contribuições por várias fontes, e que se encontra em proximidade com os canais. O canal biliar comum é normalmente irrigado por entre duas a quatro artérias ascendentes e descendentes que formam estreitos canais anastomósicos, ao longo do comprimento do canal, estando os mais proeminentes dispostos em troncos medial e lateral. Posteriormente, uma artéria retroportal normalmente parte do tronco celíaco, da artéria mesentérica superior, ou de um dos seus ramos principais, perto da sua origem. A artéria retroportal desloca-se superiormente na superfície posterior da veia porta, terminando normalmente, juntando-se à artéria retro-duodenal, perto da extremidade inferior do canal biliar supra-duodenal, embora por vezes, possa passar superiormente e posteriormente ao canal biliar, para se juntar à artéria hepática direita. Por fim, os canais hilar e intra-hepático são irrigados por uma rede de artérias peri-ductais, que partem de artérias segmentais, dentro das bainhas Glissonianas.
Drenagem venosa da vesícula biliar A drenagem venosa da vesícula biliar é raramente assegurada por uma única veia cística. Existem normalmente múltiplas pequenas veias. Aquelas que partem da superfície superior do corpo e colo da vesícula encontram-se por entre a vesícula biliar e o fígado e entram no parênquima hepático, para drenar nas veias portais segmentais. As restantes veias formam uma ou duas pequenas veias císticas, que entram no fígado, quer directamente, quer após se juntarem às veias que drenam os canais hepáticos e a porção superior do canal biliar.
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Vascularização do pâncreas e baço Irrigação arterial do pâncreas O pâncreas apresenta uma rica irrigação arterial, derivada do tronco celíaco e da artéria mesentérica superior, através de vários vasos inominados e nominados.
Artéria pancreático-duodenal inferior A artéria pancreático-duodenal inferior parte da artéria mesentérica superior, ou do seu primeiro ramo jejunal, perto do bordo superior da terceira porção do duodeno. Normalmente, esta artéria divide-se em ramos anterior e posterior. O ramo anterior passa para a direita, anteriormente ao bordo inferior da cabeça do pâncreas e desloca-se superiormente, para se anastomosar com a artéria pancréticoduodenal superior anterior. Já o ramo posterior desloca-se posteriormente e superiormente para a direita, encontrando-se posterior ao bordo inferior da cabeça do pâncreas e anastomosando-se com a artéria pancreático-duodenal superior posterior. Ambos os ramos irrigam a cabeça do pâncreas, a sua apófise unciforme e a segunda e terceira porções do duodeno.
Artéria pancreático-duodenal superior A artéria pancreático-duodenal superior é normalmente dupla, irrigando a cabeça do pâncreas e a segunda porção do duodeno. A artéria anterior é um ramo terminal da artéria gastroduodenal e desce no sulco anterior, por entre a segunda porção do duodeno e a cabeça do pâncreas. Esta artéria dá ramos para a cabeça do pâncreas e anastomosa-se com a divisão anterior da artéria pancreáticoduodenal inferior. Já a artéria posterior é normalmente um ramo separado da artéria gastroduodenal, partindo ao nível do bordo superior da primeira porção do duodeno. Esta artéria desce para direita, anteriormente à veia porta e canal biliar comum, onde o canal passa posteriormente à primeira porção do duodeno. De seguida, a artéria desloca-se posteriormente à cabeça do pâncreas e cruza posteriormente ao canal biliar comum, envolta na cabeça do pâncreas. Por fim, a artéria posterior entra na parede duodenal e anastomosa-se com a divisão posterior da artéria pancreático-duodenal inferior.
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Ramos pancreáticos O pâncreas é irrigado por vários pequenos ramos arteriais, que normalmente se deslocam nesta glândula, sendo particularmente numerosos, na região do colo, corpo e cauda. A maior parte destes ramos têm origem na artéria esplénica, sendo dados, à medida que esta se desloca ao longo do bordo superior do pâncreas, irrigando a porção esquerda da cauda e corpo. Um ramo dorsal desce posteriormente ao pâncreas, dividindo-se em ramos direito e esquerdo. Este ramo parte por vezes das artérias mesentérica superior, cólica média, hepática, ou, mais raramente, da artéria celíaca. O ramo direito é por vezes duplo e desloca-se por entre o colo e a apófise unciforme, para formar um arco arterial pré-pancreático, ao anastomosar-se com um ramo da artéria pancreáticoduodenal superior anterior. Já o ramo esquerdo desloca-se ao longo do bordo inferior do pâncreas até à cauda pancreática, onde se anastomosa com a artéria pancreática maior e com a artéria para a cauda do pâncreas. Pequenos ramos inominados também partem da primeira arcada jejunal da artéria mesentérica superior e dos ramos arteriais dos vasos retro-peritoneais. Estas pequenas artérias deslocam-se tipicamente, ao longo dos bordos superior e inferior do pâncreas, quer encontrando-se na substância da glândula, quer ao nível de um sulco profundo.
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Drenagem venosa do pâncreas A drenagem venosa do pâncreas é feita sobretudo, para o sistema porta. A cabeça e o colo drenam, sobretudo, pelas veias pancreaticoduodenal superior e inferior. O corpo e a cauda drenam, sobretudo, através de pequenas e numerosas veias que se deslocam directamente para a veia esplénica, ao longo da região posterior do pâncreas.
Irrigação arterial do baço Artéria esplénica O baço é irrigado exclusivamente pela artéria esplénica, que é o maior ramo do tronco celíaco, sendo o seu percurso extremamente tortuoso. A partir da sua origem, a artéria desloca-se um pouco inferiormente e depois volta-se rapidamente para a esquerda, para se deslocar inicialmente horizontalmente, superiormente ao nível do colo do pâncreas, antes de ascender, à medida que passa mais lateralmente. A artéria esplénica encontra-se posteriormente ao bordo superior do pâncreas e anteriormente ao rim esquerdo e glândula supra-renal esquerda e desloca-se no ligamento espleno-renal, posteriormente à cauda do pâncreas. A artéria esplénica divide-se em dois ou três ramos principais, antes de entrar no hilo do baço. À medida que estes ramos entram no hilo, estes dividem-se em quatro ou cinco artérias segmentais, sendo que cada uma irriga um segmento de tecido esplénico. De referir que a artéria esplénica, ao longo do seu percurso dá vários ramos para o pâncreas e artérias gástricas pequenas para o estômago, imediatamente antes de se dividir.
Drenagem venosa do baço A veia esplénica é formada no ligamento espleno-renal, perto da ponta da cauda do pâncreas, a partir de cinco ou seis tributárias, que emergem do hilo do baço. A veia esplénica desloca-se então no ligamento espleno-renal, inferiormente à artéria esplénica e, posteriormente, à cauda do pâncreas. Desce para a direita e cruza a parede abdominal posterior, inferiormente à artéria esplénica e posteriormente ao corpo do pâncreas, recebendo várias pequenas tributárias, provenientes do pâncreas. A veia esplénica cruza então anteriormente ao rim esquerdo e hilo renal, encontrando-se separada do tronco simpático esquerdo e pilar esquerdo do diafragma, pelos vasos renais esquerdos e da aorta abdominal, pela artéria mesentérica superior e pela veia renal esquerda. De referir que esta veia termina posteriormente ao colo do pâncreas, onde se junta à veia mesentérica superior, para formar a veia porta. As veias gástricas pequenas e gastro-epiplóica esquerda drenam na veia esplénica, através das pregas de ligamento gastro-esplénico, perto da sua origem.
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Sistema ázigos Veia ázigos A veia ázigos inicia-se no aspecto posterior da veia cava inferior, mais ou menos na zona renal, embora possa existir uma ázgios lombar. Anteriormente a T12, juntase à ázigos, a veia lombar ascendente direita e veias subcostais, através de um grande vaso. A ázigos ascende até T4, onde se cruza na crossa da ázigos, sendo tributária da veia cava inferior. A ázigos é posterior às últimas oito torácicas e às artérias intercostais posteriores direitas.
Veia hemiázigos A veia hemiázigos encontra-se à esquerda da ázigos, sendo formada pelas três últimas veias intercostais posteriores, veias subcostais e lombar ascendente. Esta veia é muito variável, existindo uma veia hemiázigos acessória, que se lhe pode juntar, ou pode drenar directamente na veia ázigos.
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Anatomia geral do peritoneu O peritoneu é a maior membrana serosa do corpo humano, formando um saco fechado nos indivíduos do sexo masculino, mas encontrando-se aberto nos indivíduos do sexo feminino, ao nível das extremidades laterais das trompas de Falópio. O peritoneu consiste numa camada única de células mesoteliais achatadas, que se encontram numa camada de tecido conjuntivo solto. A cavidade peritoneal é um espaço potencial, situado por entre o peritoneu parietal, que delimita a parede abdominal, e invaginações de peritoneu visceral, que suspendem as vísceras abdominais dentro da cavidade. Esta cavidade contém uma pequena quantidade de fluido seroso mas, tirando isso, encontra-se vazia. Este fluido lubrifica o peritoneu visceral e permite que as vísceras deslizem na parede abdominal e entre si, dentro dos limites definidos pelas suas fixações. O fluido intraperitoneal contém água, proteínas, electrólitos, solutos e algumas células, nomeadamente macrófagos, fibroblastos e linfócitos. Este fluido desloca-se inferiormente, por acção da gravidade, e superiormente, como consequência das pressões intra-abdominais negativas, que se fazem sentir, em consequência da respiração. O peritoneu parietal encontra-se separado das camadas musculares das paredes abdominais por tecido conjuntivo extraperitoneal. O peritoneu parietal que cobre a parede abdominal anterior e as paredes pélvicas encontra-se geralmente ligado apenas por este tipo de tecido, o que permite mudanças consideráveis nas dimensões da bexiga e no recto. O peritoneu visceral, por sua vez, encontra-se firmemente aderente aos tecidos que recobre, não sendo deles facilmente separado. A sua camada de tecido conjuntivo é, por vezes, contínua com a matriz fibrosa da parede das vísceras e raramente contém muito tecido conjuntivo solto ou tecido adiposo.
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Arranjo geral do peritoneu O peritoneu organiza-se constituindo diferentes tipos de estruturas. Um omento ou epiplon é uma reflexão peritoneal em forma de folha larga. Um ligamento é uma reflexão de peritoneu situada entre órgãos ou entre órgãos e a parede corporal. Uma prega é uma reflexão peritoneal com um bordo livre. Por fim, um mesentério é uma estrutura que envolve ou suspende vísceras na parede abdominal posterior. Os mesentérios fixam as suas vísceras respectivas à parede abdominal posterior, sendo essa fixação designada por raiz do mesentério, sendo que nessa região o peritoneu do mesentério é contínuo com o da parede abdominal posterior. Todas estas estruturas são compostas por duas camadas de peritoneu visceral separadas por quantidades variáveis de tecido conjuntivo. A única excepção é o omento maior, que se encontra dobrado sobre si mesmo e, como tal, consiste em quatro camadas de peritoneu visceral, separadas por quantidades variáveis de tecido adiposo. No que concerne às funções do peritoneu, destaque para o facto de permitir o deslizamento das vísceras entre si e contra a parede com atrito mínimo, o facto de permitir a delimitação de roturas e a localização de infecções, bem como as funções de absorção e excreção. Aquando do desenvolvimento embrionário, o sistema digestivo desenvolve-se como um único tubo suspenso na cavidade celómica pelos mesentérios dorsal e ventral. Ulteriormente, o mesentério ventral é amplamente reabsorvido, embora algumas porções persistam no abdómen superior e formem estruturas como o ligamento falciforme e o omento menor. Já os mesentérios intestinais no indivíduo adulto são remanescentes do mesentério dorsal. A migração e subsequente fixação das porções do tracto gastrointestinal produzem os segmentos retroperitoneais (duodeno, cólon ascendente, cólon descendente e recto) e quatro ansas intraperitoneais separadas e suspensas por mesentérios de dimensões variáveis. Estas ansas são cobertas por peritoneu visceral, que é contínuo com o peritoneu parietal que cobre a parede abdominal posterior. A primeira ansa intraperitoneal é formada pelo esófago intraperitoneal, pelo estômago e pela primeira porção do duodeno. A segunda ansa engloba o ângulo duodeno-jejunal, o jejuno, o íleo e, por vezes, o ceco e o cólon ascendente proximal. A terceira ansa contém o cólon transverso e a quarta ansa, o cólon sigmóide e, por vezes, o cólon descendente distal.
Peritoneu do abdómen superior O esófago abdominal, estômago, fígado e baço estão envoltos num duplo folheto de peritoneu visceral que une as paredes abdominais anterior e posterior. Este duplo folheto tem uma inserção complexa na parede abdominal e origina o ligamento falciforme, o ligamento coronário, o omento menor (divisível nos ligamentos gastro-hepático e hepato-duodenal), o omento maior (incluindo o ligamento gastrocólico), o ligamento gastro-esplénico, espleno-renal e frénico-cólico.
Ligamento falciforme O ligamento falciforme é uma fina prega peritoneal anteroposterior, que liga o fígado à região posterior da parede abdominal anterior, imediatamente à direita da linha média. De referir que este ligamento estende-se inferiormente até ao nível do umbigo. O ligamento falciforme é mais largo, por entre o fígado e o umbigo, estreitando-se superiormente, à medida que a distância por entre o fígado e a parede abdominal anterior diminui. A cerca de um
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II centímetro sobre a face superior do fígado, os seus dois folhetos dividem-se para envolver este órgão, sendo contínuos com o peritoneu visceral, que se encontra aderente à superfície do fígado. Superiormente, estes folhetos reflectem-se para a face inferior do diafragma, sendo contínuos com o peritoneu parietal que cobre a cúpula direita. Ao nível do limite posterior (ápice) do ligamento falciforme, os dois folhetos também se reflectem verticalmente, para a esquerda e para a direita, sendo contínuos com o folheto anterior do ligamento triangular esquerdo e com o folheto superior do ligamento coronário do fígado. A porção inferior do ligamento falciforme forma um bordo livre, onde os dois folhetos de peritoneu se tornam contínuos um com o outro, à medida que se dobram, para envolver o ligamento redondo.
☤ Uma vez que o peritoneu do ligamento falciforme é contínuo com o da cobertura da parede abdominal posterior com o da parede abdominal anterior peri-umbilical, o sangue associado a uma hemorragia retroperitoneal (pancreatite hemorrágica aguda comum) pode passar por entre as camadas de peritoneu e aparecer como uma descoloração hemorrágica em torno do umbigo (sinal de Cullen). Mudanças inflamatórias a partir do pâncreas podem se espalhar a partir do ligamento gastrohepático e depois, por via do ligamento falciforme, até ao umbigo.
Ligamento coronário O ligamento coronário é formado a partir da reflexão do peritoneu, desde o diafragma até à face posterior do lobo direito do fígado. Por entre os dois folhetos que constituem este ligamento, existe uma grande área triangular desprovida de peritoneu e que é designada por “área nua do fígado”. Aí, o fígado fica em continuidade, inferiormente, com o espaço para-renal anterior. O ligamento coronário é contínuo à direita com o ligamento triangular direito e à esquerda forma o ligamento triangular esquerdo. O folheto superior do ligamento coronário reflecte-se superiormente sobre a face inferior do diafragma e inferiormente sobre as faces direita e superior do fígado. O folheto inferior do ligamento coronário, por sua vez, reflecte-se inferiormente sobre a glândula supra-renal direita e rim direito e, superiormente, sobre a face inferior do fígado.
Ligamentos triangulares O ligamento triangular esquerdo é uma dupla camada de peritoneu que se estende, até uma extensão variável, sobre o bordo superior do lobo esquerdo do fígado. Medialmente, o seu folheto anterior é contínuo com o folheto esquerdo do ligamento falciforme. Por sua vez, o folheto posterior é contínuo com o folheto esquerdo do omento menor. Este ligamento encontra-se em frente da porção abdominal do esófago, da extremidade superior do omento menor e de parte do fundo do estômago. O ligamento triangular direito é uma pequena estrutura, que se encontra no ápice da “área nua” do fígado e é contínuo com as camadas do ligamento coronário.
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☤A
divisão do ligamento triangular esquerdo permite que o lobo esquerdo do fígado seja mobilizado para exposição do esófago abdominal e pilares do diafragma.
Omento menor O omento menor é derivado do mesogástrio ventral e é formado por dois folhetos de peritoneu, separados por uma quantidade variável de tecido conjuntivo. O omento menor desloca-se desde a face visceral inferior do fígado até ao esófago abdominal, estômago, piloro e primeira porção do duodeno. Superiormente, a sua fixação à face inferior do fígado forma um L, sendo que o componente vertical do L encontra-se na fissura para o ligamento venoso. Já a componente horizontal do L é mais inferior e encontra-se na fissura portal. As componentes vertical e horizontal deslocam-se por entre o fígado e o estômago e o duodeno, constituindo os ligamentos hepatogástrico e hepatoduodenal, respectivamente. Ao nível da curvatura menor, os dois folhetos do omento menor dividem-se para envolver o estômago, sendo contínuos com o peritoneu visceral, que cobre as faces anterior e posterior do estômago. O folheto anterior do omento menor desce desde a fissura para o ligamento venoso até à face anterior do esófago abdominal, estômago e duodeno. Já o folheto posterior desce desde a porção posterior da fissura para o ligamento venoso e desloca-se para a face posterior do estômago e piloro. Dessa forma, o omento menor forma a face anterior do saco menor. O ligamento hepatogástrico contém os vasos gástricos esquerdo e direito, ramos do nervo vago e nódulos linfáticos gastrosplénicos, por entre os seus dois folhetos, perto da sua zona de fixação ao estômago. O bordo lateral direito do omento menor é espessado, estendendo-se desde a junção, por entre a primeira e a segunda porção do duodeno até à porta hepática. Este bordo é livre, formando a parede anterior do buraco epiplóico e contendo a veia porta, o canal biliar comum, a artéria hepática, os nódulos linfáticos portocavais e o plexo hepático. O bordo esquerdo do omento menor é pequeno e desloca-se sobre a face inferior do diafragma, por entre o fígado e a região medial do esófago abdominal. De referir que o omento menor é mais fino do lado esquerdo e pode se encontrar fenestrado ou incompleto – as variações na sua espessura dependem da quantidade de tecido conjuntivo, especialmente gordura.
Omento maior O omento maior é a maior prega peritoneal, encontrando-se suspenso inferiormente, desde a curvatura maior do estômago. O omento maior é constituído por dois folhetos (um folheto anterior e um folheto posterior) e cada folheto é constituído por duas lâminas (uma anterior e uma posterior) separadas por uma pequena quantidade de tecido conjuntivo. O folheto anterior desce desde a curvatura maior do estômago e da primeira porção do duodeno. A sua lâmina anterior é contínua com o peritoneu visceral sobre a face anterior do estômago e duodeno, enquanto a sua lâmina posterior é contínua com o peritoneu sobre a parede posterior do estômago e piloro. O folheto anterior do omento maior desce até uma distância variável para a cavidade peritoneal, para depois ascender como folheto posterior. Este último passa anteriormente ao cólon transverso e ao mesocolon transverso, encontrando-se fixo à parede abdominal posterior, superiormente à origem do mesentério do intestino delgado e anteriormente à cabeça e corpo do pâncreas.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A lâmina anterior do folheto posterior é contínua com o peritoneu da parede posterior do saco menor, enquanto a lâmina posterior se encontra reflectida inferiormente, sendo contínua com a camada anterior do mesocolon transverso. O folheto posterior do omento maior aderente à raiz do mesocolon transverso é designado por ligamento gastrocólico, que corresponde à porção supra-cólica do omento maior. Nos primórdios da vida fetal, o omento maior e o mesocolon transverso são estruturas separadas e este arranjo, por vezes, persiste. De facto, caso a porção superior do folheto posterior do omento maior se encontre dividida, é possível obter um acesso cirúrgico para a parede posterior do estômago e face anterior do pâncreas. O omento maior é contínuo à esquerda com o ligamento gastro-esplénico, e à direita estende-se até ao início do duodeno. O ligamento hepatocólico é uma prega de peritoneu que se pode deslocar, quer desde a face inferior do lobo direito do fígado, quer desde a primeira porção do duodeno, até ao lado direito do omento maior ou ao ângulo hepático do cólon. O bordo direito do omento maior é ocasionalmente aderente à face anterior do cólon ascendente até ao ceco, contudo, as suas camadas peritoneais não são contínuas com o peritoneu, sobre esta porção do cólon. Apesar de ser representado em ilustrações como anterior às ansas intestinais, o omento maior encontra-se frequentemente enrolado em torno dos órgãos abdominais superiores. O omento maior contém sempre algum tecido adiposo, sendo um local comum de armazenamento de gordura, nos indivíduos obesos, nomeadamente, os do sexo masculino.
☤ Por entre as duas lâminas do folheto anterior do omento maior, perto da curvatura maior do estômago, os vasos gastroepiplóicos direito e esquerdo formam um grande arco anastomósico, a partir do qual são dados vários vasos. Pensa-se que esta irrigação exceda as necessidades metabólicas do omento e que reflicta o papel que o omento maior desempenha em processos de doenças peritoneais – o omento maior é altamente móvel e torna-se frequentemente aderente a vísceras inflamadas, dentro da cavidade abdominal. Este facto pode ajudar a limitar a transmissão da infecção e o omento pode, através da sua grande vascularização, participar nos processos iniciais de reparação.
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As ligações peritoneais do baço As ligações peritoneais do baço suspendem este órgão no quadrante superior esquerdo do abdómen e incluem os ligamentos gastro-esplénico, espleno-renal e frénico-cólico. Ligamento gastro-esplénico O ligamento gastro-esplénico desloca-se por entre a curvatura maior do estômago e o hilo do baço, sendo contínuo com o lado esquerdo do omento maior. Os seus dois folhetos separam-se para envolver o baço, juntando-se de novo para formar os ligamentos espleno-renal e frénico-cólico. O ligamento espleno-renal estende-se desde o baço até à parede abdominal posterior, enquanto o ligamento frénico-cólico estende-se até à parede abdominal anterolateral. No que concerne aos folhetos do ligamento gastro-esplénico, o folheto posterior é contínuo com o peritoneu do hilo esplénico e com o peritoneu que cobre a face posterior do estômago. Já o folheto anterior é formado a partir do peritoneu que se reflecte na impressão gástrica do baço e com o peritoneu que cobre a face anterior do estômago. De referir que os ramos gástricos pequenos e gastroepiplóico esquerdo da artéria esplénica, juntamente com as suas veias correspondentes, passam por entre os dois folhetos do ligamento gastro-esplénico. Ligamento espleno-renal O ligamento espleno-renal é formado por dois folhetos de peritoneu – o folheto anterior é contínuo medialmente com o peritoneu da parede posterior do saco menor, sobre o rim esquerdo e desloca-se superiormente até ao hilo esplénico, onde é contínuo com o folheto posterior do ligamento gastroesplénico. Já o folheto posterior do ligamento espleno-renal é contínuo lateralmente com o peritoneu que cobre a face inferior do diafragma e desloca-se sobre a impressão renal do baço. De referir que, os vasos esplénicos encontram-se por entre os dois folhetos do ligamento espleno-renal e a cauda do pâncreas encontra-se normalmente presente na sua porção mais inferior. Ligamento frénico-cólico O ligamento frénico-cólico estende-se desde o ângulo esplénico do cólon até ao diafragma, ao nível da 11ª costela. Este ligamento estende-se inferior e lateralmente, sendo contínuo com o peritoneu da extremidade lateral do mesocolon transverso, ao nível do bordo lateral da cauda pancreática, e com o ligamento espleno-renal, ao nível do hilo do baço. Uma prega em forma de leque estende-se frequentemente desde a região anterior do ligamento gastro-esplénico, perto da curvatura maior do estômago, inferiormente ao pólo inferolateral do baço, misturando-se com o ligamento frénico-cólico.
Peritoneu do abdómen inferior A face posterior da porção inferior da parede abdominal anterior é delimitada por peritoneu parietal, que se estende desde a linha alba, centralmente, até ao bordo lateral do quadrado lombar. Aqui, o
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II peritoneu parietal é contínuo com o peritoneu da goteira paracólica lateral e encontra-se reflectido sobre os lados e a frente do cólon ascendente à direita, e sobre o cólon descendente à esquerda. Por vezes, o cólon ascendente e o cólon descendente encontram-se suspensos por um pequeno mesentério, desde a parede abdominal posterior. Por entre o cólon ascendente e descendente, o peritoneu delimita a parede abdominal posterior, reflectindo-se anteriormente para formar os folhetos esquerdo e direito do mesentério do intestino delgado.
Mesocólon transverso O mesentério do cólon transverso é uma prega larga de peritoneu visceral, que se encontra reflectida anteriormente, desde a parede abdominal posterior, suspendendo o cólon transverso na cavidade peritoneal. A raiz do mesocolon transverso encontra-se ao longo de uma linha oblíqua, que passa desde a região anterior da segunda porção do duodeno, sobre a cabeça e o colo do pâncreas (superiormente à junção duodenojejunal) até ao ângulo esplénico, sobre o pólo superior do rim esquerdo. Esta estrutura está intimamente relacionada com o limite superior da raiz do mesentério do intestino delgado, perto da apófise unciforme do pâncreas. A partir da raiz do mesocolon transverso, os dois folhetos do mesocolon transverso passam para a face posterior do cólon transverso, onde se separam para cobrir esta porção do cólon. O folheto superior do mesocolon transverso reflecte-se desde a parede abdominal posterior, tornando-se contínuo com o folheto posterior do omento maior, ao qual adere. Já o folheto inferior do mesocolon transverso é contínuo com o peritoneu da parede abdominal posterior. Extensões laterais do mesocolon transverso produzem duas pregas em forma de prateleira, do lado esquerdo e do lado direito da cavidade abdominal. À direita, o ligamento duodeno-cólico estende-se desde o mesocolon transverso, ao nível do ângulo hepático, até à segunda porção do duodeno. Já à esquerda, o ligamento frénico-cólico estende-se desde o mesocolon transverso, ao nível do ângulo esplénico, até ao diafragma, ao nível da 11ª costela. O mesocolon transverso apresenta um tamanho muito variável, sendo mais pequeno nas extremidades. Esta estrutura contém os vasos cólicos médios e os seus ramos, juntamente com ramos do plexo mesentérico superior, linfáticos e nódulos linfáticos regionais.
Mesentério do intestino delgado O mesentério do intestino delgado dispõe-se como um leque complexo, formado a partir de dois folhetos de peritoneu (o anterosuperior e o posteroinferior), separados por tecido conjuntivo e vasos. A raiz do mesentério encontra-se ao longo de uma linha, que se desloca diagonalmente a partir do ângulo duodenojejunal, do lado esquerdo do corpo de L2, até à articulação sacroilíaca direita. A raiz do mesentério cruza a terceira porção do duodeno, a aorta, a veia cava inferior, o uréter direito e o psoas
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II maior direito, sendo o seu comprimento médio de 15 cm, nos indivíduos adultos. O facto do intestino delgado se encontrar pregueado, leva a que a sua fixação intestinal tenha um comprimento similar ao do intestino delgado (cerca de 5m). A profundidade média do mesentério desde a raiz até ao bordo intestinal é de 10 cm, contudo, este valor varia ao longo do comprimento do intestino delgado. De facto, o mesentério é mais pequeno ao nível do jejuno e íleo terminal e maior, ao nível da região média do íleo. Os seus dois folhetos contêm o jejuno, o íleo, os ramos jejunais e ileais dos vasos mesentéricos superiores, ramos do plexo mesentérico superior e nódulos linfáticos. O mesentério do intestino delgado junta-se por vezes ao mesocolon transverso por uma banda peritoneal, ao nível da junção duodenojejunal. Por vezes, a quarta porção do duodeno apresenta um mesentério muito pequeno, que é contínuo com a extremidade superior da raiz do mesentério do intestino delgado. A raiz do mesentério é ainda contínua com o peritoneu que rodeia o apêndice, o ceco e a fossa ilíaca direita.
☤ Devido
ao comprimento e mobilidade deste mesentério, a identificação das terminações proximal e distal de uma ansa do intestino delgado pode se revelar difícil, através de pequenas incisões cirúrgicas.
Mesocolon sigmóide O mesocolon sigmóide é alvo de grandes variações em termos de comprimento e profundidade. A sua raiz forma um ténue V invertido, cujo ápice se encontra próximo da divisão da artéria ilíaca comum esquerda, embora a raiz possa constituir uma pequena linha recta ou uma fixação curva. A extremidade esquerda (e superior) da raiz do mesentério desloca-se medialmente sobre o psoas maior esquerdo, enquanto a extremidade direita (e inferior) passa para pelve, em direcção à linha média, ao nível de S3. De referir que, a raiz estende-se por uma distância variável sobre o bordo da pelve e a porção inferior da parede abdominal posterior. O folheto anteromedial do mesocolon sigmóide é contínuo com o peritoneu da porção inferior esquerda da parede abdominal posterior. Já o folheto posterolateral é contínuo com o peritoneu da pelve e parede abdominal lateral. Por entre os dois folhetos do mesocolon sigmóide encontram-se os vasos sigmóides e os vasos rectais superiores e, posteriormente ao ápice deste mesentério, encontramos o uréter esquerdo. As extremidades proximal e distal do cólon sigmóide são por vezes unidas por um feixe fibroso, que está normalmente associado a um mesentério estreito, que parte a esse nível. Feixes consideráveis de peritoneu podem também ser observados a deslocar-se desde o cólon sigmóide proximal até à parede abdominal posterior.
Peritoneu da parede abdominal anterior inferior O peritoneu da região inferior da parede abdominal anterior forma cinco pregas que divergem, à medida que se deslocam inferiormente, à partir do umbigo. Estas pregas são a prega umbilical mediana, as pregas umbilicais mediais (esquerda e direita) e as pregas umbilicais laterais (esquerda e direita), estando estas pregas separadas umas das outras por via de fossas.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A prega umbilical mediana é a mais central, estendendo-se desde o umbigo até ao ápice da bexiga e contendo o úraco, ou o seu remanescente. Lateralmente a esta prega, de cada lado, encontra-se a prega umbilical medial, formada pela artéria umbilical obliterada, que se encontra inferiormente. Esta prega ascende desde a pelve, até ao umbigo. Por entre a prega umbilical medial e a prega umbilical mediana, encontra-se a fossa supra-vesical. A prega umbilical lateral é lateral à prega umbilical medial e cobre a artéria e a veia epigástrica inferior, inferiormente à sua entrada na bainha dos rectos. Esta prega encontra-se separada da prega umbilical medial pela fossa inguinal medial. Lateralmente à prega umbilical lateral, encontra-se a fossa inguinal lateral, que cobre o anel inguinal profundo. Por fim, a fossa femoral, que se sobrepõe ao anel femoral, encontra-se inferomedialmente à fossa inguinal lateral, da qual está separada pela extremidade medial do ligamento inguinal.
Arranjo geral da cavidade peritoneal A cavidade peritoneal é um espaço único e contínuo situado por entre o peritoneu parietal, que delimita a parede abdominal, e o peritoneu visceral, que envolve os órgãos abdominais. Esta cavidade consiste numa região principal, o saco maior, que equivale à maior parte da cavidade peritoneal. O saco menor, ou bolsa omental, é um pequeno divertículo, delimitado por peritoneu e que se encontra situado posteriormente ao estômago e omento menor e em frente ao pâncreas e retroperitoneu. Estas duas regiões comunicam por via do buraco epiplóico. A cavidade peritoneal é dividida em vários espaços por razões patológicas. Dessa forma, consideram-se os compartimentos supramesocólico e inframesocólico, que se encontram parcialmente separados pelo cólon transverso e pelo seu mesentério.
Compratimento supramesocólico O espaço supramesocólico encontra-se superiormente ao mesocolon transverso, por entre o diafragma e o cólon transverso, podendo ser dividido arbitrariamente em espaço supramesocólico esquerdo e supramesocólico direito que, por sua vez, podem ser divididos em vários subespaços comunicantes. O espaço supramesocólico direito pode ser dividido em três subespaços – o espaço subfrénico direito, o espaço subhepático direito e o saco menor. Já o espaço supramesocólico esquerdo pode ser dividido em dois subespaços – o espaço subfrénico esquerdo e o espaço peri-hepático esquerdo.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Espaço subfrénico esquerdo O espaço subfrénico esquerdo encontra-se por entre o diafragma, as faces anterior e superior do lobo esquerdo do fígado, a face anterosuperior do estômago e a face diafragmática do baço. Este espaço é delimitado à direita pelo ligamento falciforme e posteriormente pelo folheto anterior do ligamento triangular esquerdo. Este espaço encontra-se muito aumentado, aquando da ausência de baço e é um local comum de acumulação de fluido. O espaço subfrénico esquerdo é substancialmente maior que o direito e é por vezes descrito como sendo dividido num porção anterior e numa porção posterior. O espaço subfrénico posterior esquerdo é pequeno e encontra-se por entre o fundo do estômago e o diafragma, sobre a origem do ligamento espleno-renal. Já o espaço subfrénico anterior esquerdo é grande e encontra-se por entre as faces superior e anterolateral do baço e a cúpula esquerda do diafragma. Inferiormente e medialmente, este espaço é delimitado pelos ligamentos espleno-renal, gastro-esplénico e frénico-cólico, o que constitui uma barreira parcial à goteira paracólica esquerda. Espaço peri-hepático esquerdo O espaço peri-hepático esquerdo é por vezes dividido em espaços anterior e posterior. O espaço perihepático anterior esquerdo encontra-se por entre a face anterosuperior do lobo esquerdo do fígado e o diafragma. Já o espaço peri-hepático posterior esquerdo é também designado por espaço subhepático esquerdo ou recesso gastro-hepático, encontrando-se inferiormente ao lobo esquerdo do fígado e estendendo-se até à fissura para o ligamento venoso, à direita, anteriormente à veia porta principal. Posteriormente, o omento menor separa este espaço do recesso superior do saco menor e à esquerda, este espaço é delimitado pela curvatura menor do estômago. Espaço subfrénico direito O espaço subfrénico direito encontra-se por entre o diafragma e as faces anterior, superior e lateral direita do lobo direito do fígado. Este espaço é delimitado do lado esquerdo pelo ligamento falciforme e, posteriormente, pelo folheto superior do ligamento coronário. Este é um local relativamente comum para acumulações de fluido, após uma inflamação abdominal do lado direito. Espaço subhepático direito O espaço subhepático direito é também designado por recesso hepato-renal, encontrando-se por entre o lobo direito do fígado e o rim direito. Este espaço é delimitado superiormente pelo folheto inferior do ligamento coronário, lateralmente pela parede abdominal lateral direita, posteriormente pela face anterior do pólo superior do rim direito e, medialmente, pela segunda porção do duodeno, ângulo hepático, mesocolon transverso e por parte
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II da cabeça do pâncreas. Este é um local relativamente comum para acumulação de fluidos. Saco menor O saco menor, ou bolsa omental, é uma cavidade delimitada por peritoneu e que comunica com o saco maior, através do buraco epiplóico. Este espaço é considerado parte do espaço supramesocólico direito, na medida em que, embriologicamente, o fígado cresce para o espaço peritoneal direito e estica o mesentério dorsal, formando o saco menor, posteriormente ao estômago. O saco menor varia em tamanho, de acordo com o tamanho das vísceras que constituem as suas paredes. Este espaço apresenta paredes anterior e posterior, bem como bordos superior, inferior, direito e esquerdo. A parede anterior é constituída pelo folheto peritoneal posterior do omento menor, pelo peritoneu que cobre a parede posterior do estômago e a primeira porção do duodeno e pela porção mais superior do folheto anterior do omento maior. Ao nível do seu bordo direito, a parede anterior do saco menor é maioritariamente formada pelo omento menor, contudo, o omento menor vai se tornando progressivamente mais pequeno, à medida que caminhamos para a esquerda, e a parede anterior passa a ser maioritariamente constituída pela região posterior do estômago e pelo omento maior. Já a parede posterior do saco menor é sobretudo formada pelo peritoneu que cobre a parede abdominal posterior nesta região. Na sua porção inferior, a parede posterior do saco menor é constituída pelo folheto posterior do omento maior, à medida que este se encontra no mesocolon transverso. Esta parede cobre, de inferior para superior, uma pequena porção da cabeça e a totalidade do colo e corpo do pâncreas, a porção medial da região anterior do rim esquerdo, a maior parte da glândula supra-renal esquerda, o início da aorta abdominal e tronco celíaco e parte do diafragma. As artérias frénicas inferiores, esplénica, gástrica esquerda e hepáticas encontram-se parcialmente posteriormente à bolsa. A maior parte dessas estruturas formam a “cama do estômago” e encontramse deste separadas, apenas pelas paredes do saco menor. O bordo superior do saco menor é estreito e encontra-se por entre o lado direito do esófago e a extremidade superior da fissura para o ligamento venoso. Aqui, o peritoneu da parede posterior do saco menor encontra-se reflectido anteriormente desde o diafragma, para se juntar ao folheto posterior do omento menor. O bordo inferior do saco menor desloca-se ao longo da linha de fusão dos folhetos do omento maior, ou seja, desde o ligamento gastro-esplénico até à prega peritoneal posterior na primeira porção do duodeno. Quando os folhetos do omento menor não são completamente aderentes, um ao outro, o saco menor pode se estender até à região inferior dos dois folhetos. O bordo direito do saco menor é formado pela reflexão do peritoneu, desde o colo e cabeça do pâncreas até à região inferior da primeira porção do duodeno. A linha desta reflexão ascende para a esquerda, ao longo do lado medial da artéria gastro-duodenal. Perto do bordo duodenal superior, o bordo direito junta-se ao pavimento do buraco epiplóico, em torno da artéria hepática própria. O buraco epiplóico constitui, dessa forma, uma interrupção no bordo direito. Sobre o buraco epiplóico, o bordo direito é formado pela reflexão do peritoneu, desde o diafragma, até ao bordo direito do lobo caudado do fígado e ao longo do lado esquerdo da veia cava inferior, envolvendo o recesso hepático. O bordo esquerdo do saco menor desloca-se desde a extremidade esquerda da raiz do mesocolon transverso e é maioritariamente formado pela camada interna de peritoneu dos ligamentos esplenorenal e gastro-esplénico. Dessa forma, a porção do saco menor, que se encontra por entre os ligamentos espleno-renal e gastro-esplénico é designada por recesso esplénico. Superiormente ao nível do baço, os
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II dois ligamentos fundem-se, originando-se o pequeno ligamento gastrofrénico, que passa anteriormente, desde o diafragma até à região posterior do fundo do estômago e que constitui parte do bordo esquerdo superior do saco menor. Os dois folhetos do ligamento gastrofrénico divergem perto do esófago abdominal, deixando a face gástrica posterior desprovida de peritoneu. O saco menor é estreitado por duas pregas peritoneais crescênticas, produzidas pelas artérias gástrica esquerda e hepática. A prega gastropancreática esquerda sobrepõe-se à artéria gástrica esquerda, à medida que esta se desloca desde a parede abdominal posterior, até à curvatura menor do estômago. Já a prega gastropancreática direita sobrepõe-se à artéria hepática, à medida que esta se desloca desde a parede abdominal posterior até ao omento menor. O tamanho destas pregas é variável e, quando estas são proeminentes, dividem o saco num recesso superior de menores dimensões e num recesso inferior de maiores dimensões. O recesso superior encontra-se posteriormente ao omento menor e ao fígado e envolve o lobo caudado do fígado, que se encontra coberto por peritoneu, quer na sua face anterior, quer na sua face posterior. Este recesso estende-se superiormente para a fissura do ligamento venoso e encontra-se adjacente ao pilar direito do diafragma, posteriormente. Já o recesso inferior do saco menor encontra-se por entre o estômago e o pâncreas, estando contido no duplo folheto do omento maior. Buraco epiplóico O buraco epiplóico, também designado por buraco de Winslow, é uma pequena abertura vertical, que apresenta normalmente 3 cm nos indivíduos adultos e se encontra ao nível da porção superior do bordo direito do saco menor, permitindo a sua comunicação com o saco maior. O ligamento hepatoduodenal, que é formado pelo bordo direito espessado do omento menor e que se estende desde o ângulo duodenal superior, forma o bordo anterior do buraco, que contém, por entre as suas duas camadas, o canal biliar comum (à direita), a veia porta (posteriormente) e a artéria hepática (à esquerda). Superiormente, o peritoneu do folheto posterior do ligamento hepatoduodenal desloca-se sobre o lobo caudado do fígado, que forma o tecto do buraco epiplóico. Esta camada de peritoneu é então reflectida para a veia cava inferior, que forma o bordo posterior do buraco epiplóico. Ao nível do bordo superior da primeira porção do duodeno, o peritoneu desloca-se anteriormente, desde a veia cava inferior, superiormente à cabeça do pâncreas, sendo contínuo com o folheto posterior do omento menor, que forma o pavimento do buraco epiplóico. Uma passagem estreita, o vestíbulo do saco menor, pode ser encontrada à direita do buraco epiplóico, por entre a apófise caudada e a primeira porção do duodeno. Para a direita, o bordalete do buraco é contínuo com o peritoneu do saco maior, enquanto o tecto é contínuo com o peritoneu na face inferior do lobo hepático direito.
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Compartimento inframesocólico O compartimento inframesocólico encontra-se inferiormente ao mesocólon transverso e ao cólon transverso, até à pelve verdadeira, sendo dividido em dois espaços desiguais, pela raiz do mesentério do intestino delgado. Este compartimento contém as goteiras paracólicas esquerda e direita, que são laterais ao cólon ascendente e ao cólon descendente.
☤ Como consequência da mobilidade do mesocólon transverso e do mesentério do intestino delgado, os processos patológicos raramente ficam contidos nesses espaço e o fluido dentro do espaço infracólico tende a descer para a pelve, ou para as goteiras paracólicas O espaço infracólico direito é um espaço triangular, menor que o seu homólogo contralateral, que se encontra posteriormente e inferiormente ao cólon transverso e ao mesocólon e à direita do mesentério do intestino delgado. Este espaço é mais estreito inferiormente, porque a fixação da raiz do mesentério do intestino delgado se encontra à direita da linha média. O apêndice vermiforme encontra-se, por vezes, na porção inferior do espaço infra-cólica direito. O espaço infracólico esquerdo é maior que o direito e comunica livremente com a pelve à direita da linha média. Este espaço encontra-se posteriormente e inferiormente ao cólon transverso e ao respectivo mesocolon, e à esquerda do mesentério do intestino delgado. Goteiras paracólicas As goteiras paracólicas (laterais) direita e esquerda são recessos peritoneais, situados ao nível da parede abdominal posterior e que se encontram ao longo do cólon ascendente e do cólon descendente. As goteiras paracólicas principais encontram-se lateralmente ao cólon, uma de cada lado. Uma goteira paracólica medial, menos óbvia, pode se formar, especialmente do lado direito, caso o cólon apresente um pequeno mesentério em parte da sua extensão. A goteira paracólica (lateral) direita desloca-se desde a região superolateral do ângulo hepático do cólon, inferiormente à região anterior do cólon ascendente e em torno do ceco. Esta goteira é contínua com o peritoneu, à medida que desce na pelve sobre a abertura da pelve. Superiormente, esta goteira é contínua com o peritoneu que delimita o espaço hepato-renal e, através do buraco epiplóico, com o saco menor. A goteira paracólica direita é maior que a esquerda. Espaços subfrénicos extraperitoneais Existem dois “espaços” potenciais, que de facto se encontram fora das coberturas peritoneais do abdómen, apresentando relevância clínica, devido à possibilidade de acumulações de fluido ao nível destes. O espaço extraperitoneal direito é delimitado pelos dois folhetos do ligamento coronário, pela “área nua do fígado” e pela face inferior da cúpula direita do diafragma. O espaço extraperitoneal esquerdo encontra-se anteriormente à glândula supra-renal esquerda e ao pólo superior do rim esquerdo,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II contendo tecido conjuntivo extraperitoneal.
Recessos da cavidade peritoneal As pregas peritoneais podem criar fossas ou recessos dentro da cavidade peritoneal. Estas têm interesse clínico, na medida em que são possíveis lugares para a ocorrência de hérnias. Recessos duodenais Várias pregas de peritoneu podem existir em torno da quarta porção do duodeno e da junção duodenojejunal, formando vários recessos. O recesso duodenal superior encontra-se ocasionalmente presente, normalmente em associação com o recesso duodenal inferior. Este recesso encontra-se à esquerda da terminação da quarta porção do duodeno, do lado oposto ao de L2 e posteriormente a uma prega duodenal superior em forma de meialua (a prega duodenojejunal). Esta prega apresenta um bordo inferior livre semilunar, que se mistura, do lado esquerdo, com o peritoneu anterior ao rim esquerdo. A veia mesentérica inferior encontra-se directamente posteriormente à junção da extremidade esquerda (lateral) desta prega com o peritoneu parietal posterior. O recesso duodenal abre-se inferiormente, estando o seu orifício no ângulo formado pela veia renal esquerda, à medida que esta passa ao longo da aorta abdominal. O recesso duodenal inferior encontra-se normalmente presente, por vezes em associação com o recesso duodenal superior, com o qual pode partilhar um orifício. Este recesso encontra-se à esquerda da quarta porção do duodeno, do lado oposto ao de L3, posteriormente a uma prega triangular e não vascular (a prega duodenal inferior ou prega duodenomesocólica), que apresenta um bordo superior aguçado. Este recesso abre-se superiormente em direcção ao recesso duodenal superior, estendendo-se por vezes, para além da quarta porção do duodeno e para a esquerda. O recesso paraduodenal pode existir em conjunção com os recessos duodenal superior e inferior, sendo raro nos adultos, mas mais comum em recém-nascidos. Este recesso encontra-se um pouco à esquerda e ligeiramente posteriormente à quarta porção do duodeno, posteriormente a uma prega paraduodenal falciforme. O bordo direito livre contém a veia mesentérica inferior e o ramo ascendente da artéria cólica esquerda e representa parte do mesentério cólico esquerdo superior. O recesso retroduodenal é o maior recesso duodenal, mas encontra-se raramente presente. Este recesso encontra-se posteriormente à terceira e quarta porções do duodeno, em frente da aorta abdominal. Este espaço ascende quase até à junção duodenojejunal, apresenta entre 8 e 10 cm de profundidade e é delimitado, em ambos os lados, pelas pregas duodenoparietais. O seu orifício é amplo e olhe inferiormente e para a esquerda. O recesso duodenojejunal ou mesocólico ocorre tipicamente em 20% dos adultos. Quando se encontra presente, nunca se encontra associado a outros recessos duodenais. Este recesso tem aproximadamente 3 cm de profundidade e encontra-se à esquerda da aorta abdominal, por entre a junção duodenojejunal e a raiz do mesocolon transverso. O seu limite superior é o pâncreas, o seu limite esquerdo é o rim e o seu limite inferior é a veia renal esquerda. Este recesso apresenta uma abertura circular, por entre as duas pregas peritoneais e olha inferiormente e para a direita. O recesso mesentericoparietal encontra-se raramente presente. Este recesso encontra-se imediatamente inferiormente à terceira porção do duodeno e invagina-se para a porção superior do mesentério (para a direita). O seu orifício é largo e olha para a esquerda, posteriormente a uma prega de mesentério, elevada pela artéria mesentérica superior.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Recessos cecais Várias pregas de peritoneu podem existir em torno do ceco, formando recessos. Os recessos paracecais são locais comuns para a formação de abcessos, após uma apendicite aguda. O recesso íleo-cecal superior encontra-se normalmente presente e melhor desenvolvido nas crianças, enquanto nos indivíduos mais velhos, nomeadamente nos obesos, este recesso encontra-se por vezes reduzido ou ausente. O recesso íleo-cecal superior é formado pela prega vascular do ceco, que se arqueia sobre a artéria cecal anterior e o delimita anteriormente. Posteriormente, o recesso íleo-cecal superior é delimitado pelo mesentério ilíaco, inferiormente é delimitado pelo íleo terminal e à direita é delimitado pela junção íleo-cecal. O seu orifício abre-se para a esquerda. O recesso íleo-cecal inferior encontra-se bem definido na juventude, mas frequentemente obliterado por gordura nos indivíduos adultos. Esta estrutura é formada pela prega íleo-cecal, que se estende desde a região antero-inferior do íleo terminal até à frente do mesoapêndice. Este recesso é delimitado anteriormente pela prega íleo-cecal, superiormente, pela face íliaca posterior e pelo seu mesentério, à direita, pelo ceco e posteriormente pelo mesoapêndice superior. O seu orifício abre-se inferiormente e para a esquerda. O recesso retrocecal encontra-se posteriormente ao ceco, apresentando um tamanho e uma extensão variáveis. Este recesso ascende posteriormente ao cólon ascendente, sendo delimitado anteriormente pelo ceco, posteriormente, pelo peritoneu parietal e de cada lado pelas pregas cecais (pregas parietocólicas, pregas que se deslocam desde o ceco até à parede abdominal posterior). O apêndice vermiforme ocupa frequentemente este espaço, quando se encontra em posição retrocecal. O recesso intersigmóide é constante na vida fetal e na infância, mas pode desaparecer durante o desenvolvimento tardio. Este espaço afunilado encontra-se posteriormente ao ápice da fixação do mesocolon sigmóide, dirigindo-se superiormente e abrindo-se inferiormente. O tamanho do recesso intersigmóide é muito variável. A sua parede posterior é formada pelo peritoneu parietal da parede abdominal posterior, que cobre o uréter esquerdo, à medida que cruza a bifurcação da artéria ilíaca comum esquerda. Ocasionalmente, o recesso encontra-se dentro das camadas do mesocólon sigmóide.
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5. Sistema urogenital Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Rins Os rins excretam os produtos terminais do metabolismo e a água em excesso. Essas acções revelam-se essenciais para o controlo das concentrações das várias substâncias no corpo, mantendo um equilíbrio entre a água e os electrólitos nos fluidos constantes, de grosso modo, aproximadamente constante. Os rins também têm funções endócrinas, produzindo e libertando eritropoietina, que afecta a formação dos eritrócitos; renina, que influencia a pressão sanguínea e 1,25-di-hidroxicolecalciferol (a forma metabolicamente activa de vitamina D), que está envolvida no controlo da absorção de cálcio e metabolismo mineral. Os rins encontram-se situados posteriormente ao peritoneu, de cada lado da coluna vertebral, encontrando-se rodeados por tecido adiposo. Superiormente, encontram-se ao nível do bordo superior de T12 e inferiormente, estão ao nível de L3, sendo o rim direito, ligeiramente inferior ao esquerdo, devido à sua relação com o fígado. O rim esquerdo é um pouco maior e mais estreito que o direito, encontrando-se mais próximo do plano mediano. O grande eixo de cada rim dirige-se inferolateralmente, enquanto o eixo transverso se dirige posteromedialmente, o que significa que as estruturas descritas classicamente como “anteriores” ou “posteriores”, olham de facto anterolateralmente e posteromedialmente. Cada rim apresenta cerca de 11 cm de comprimento, 6 cm de largura e 3 cm em dimensão anteroposterior, podendo o rim esquerdo ser até 1,5 cm maior que o direito. Cada rim tem uma massa média de 150g nos indivíduos do sexo masculino e 135g nos indivíduos do sexo feminino.
Estrutura externa Os pólos superiores de ambos os rins são espessos e arredondados, sendo que cada um se relaciona com a respectiva glândula supra-renal. Já os pólos inferiores são menos espessos e estendem-se até 2,5 cm para além das cristas ilíacas. Os bordos laterais são convexos, enquanto os bordos mediais são convexos, na região adjacente aos pólos e côncavos, por entre estes. Em cada bordo, uma fissura vertical profunda abre-se anteromedialmente, como hilo renal. O hilo renal encontra-se delimitado pelos lábios anterior e posterior e contém os vasos e nervos renais e a pelve renal (porção proximal e dilatada do uréter). Em termos de posições das estruturas hilares, a veia renal é anterior, a artéria renal apresenta uma posição intermédia e a pelve do rim é posterior. Normalmente, um ramo da artéria renal principal desloca-se sobre o bordo superior da pelve renal, para entrar no hilo, ao nível da região posterior da pelve, enquanto uma tributária da veia renal, por vezes, abandona o hilo da mesma forma. Sobre o hilo, o bordo medial relaciona-se com a glândula supra-renal, enquanto inferiormente se relaciona com a origem do uréter.
Macrostructura interna O rim pode ser dividido numa medula, mais interna, e num córtex, mais externo. A medula é constituída pelas pirâmides renais, que são as suas bases periféricas e cujos ápices convergem para o seio renal. Ao nível do seio renal, estas projectam-se para os cálices como papilas. O córtex renal é subcapsular, arqueando-se sobre as bases das pirâmides e estendendo-se por entre estas, em direcção ao seio renal, formando colunas renais. As suas regiões periféricas são designadas por arcos corticais, que são atravessados pelos radiais raios medulares, que são separados por tecido mais escuro – a porção covoluta. Os raios estreitam-se em direcção à cápsula renal, sendo prolongamentos periféricos das bases das pirâmides renais. O córtex renal é ainda histologicamente divisível em zonas externa e interna – a zona interna encontra-se separada da medula, por vasos
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II sanguíneos tangenciais (artérias e veias arqueadas). Contudo, do lado medular desta região, podemos discriminar ainda uma fina camada de tecido cortical – o subcórtex. De referir que o córtex, próximo da medula é por vezes designado por córtex justamedular.
Pelve renal e cálices O hilo renal conduz a um seio renal central, delimitado pela cápsula renal e quase preenchido, na sua totalidade pela pelve e vasos renais, sendo o restante espaço preenchido por gordura. Dentro do seio renal, os túbulos colectores dos nefrónios abrem-se nos ápices das papilas renais, para drenar nos cálices menores, que são expansões afuniladas do tracto urinário superior. A cápsula renal cobre a face externa do rim e continua-se pelo hilo, delimitando o seio e fundindo-se com os revestimentos adventícios dos cálices menores. Cada cálice menor rodeia, quer uma papila única, quer (mais raramente), grupos de duas ou três papilas. Os cálices menores unem-se com os seus vizinhos, formando duas, ou possivelmente, três câmaras maiores – os cálices maiores. A pelve afunila-se e estreita-se à medida que passa inferomedialmente, em direcção ao hilo, para se tornar contínua com o uréter, sendo muito difícil determinar com precisão onde termina a pelve renal e começa o uréter. Essa fronteira é normalmente extra-hilar, encontrando-se adjacente à porção inferior do bordo medial do rim. Mais raramente, a pelve renal encontra-se totalmente dentro do seio renal, sendo que aquando de situações do género, a região pelvi-uretérica encontra-se, quer ao nível do hilo renal, quer completamente, dentro do seio renal.
Irrigação arterial dos rins As artérias renais partem lateralmente da artéria aorta, imediatamente inferiormente à origem da artéria mesentérica superior. Ambas cruzam o pilar correspondente do diafragma, saindo por ângulos rectos da artéria aorta. A artéria renal direita é maior, e por vezes, mais superior, passando posteriormente à veia cava inferior, à veia renal direita, à cabeça do pâncreas e à porção descendente
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II do duodeno. Já a artéria renal esquerda é um pouco mais inferior e passa posteriormente à veia renal esquerda, ao corpo do pâncreas e à veia esplénica. Esta artéria pode ser cruzada anteriormente, pela veia mesentérica inferior. No seu percurso extra-renal, cada artéria renal dá uma ou mais artérias supra-renais inferiores, um ramo para o uréter e ramos que irrigam o tecido peri-néfrico, a cápsula renal e a pelve. Perto do hilo renal, cada artéria divide-se numa divisão anterior e numa divisão posterior, sendo que estas se dividem em artérias segmentais, para os segmentos renais. Em 30% dos indivíduos encontramos artérias renais acessórias, que normalmente partem da aorta, sobretudo inferiormente, à artéria renal principal, acompanhando-a até ao hilo renal. As artérias renais ramificam-se lateralmente a partir da aorta, imediatamente inferiormente à origem da artéria mesentérica superior, cruzando o pilar correspondente do diafragma, em ângulos rectos até à veia cava inferior. Perto do hilo renal, cada artéria se divide numa divisão anterior e numa divisão posterior, que por sua vez se dividem em artérias segmentais. Existem cinco artérias segmentais, que por sua vez se dividem em artérias lobares (normalmente uma para cada pirâmide renal), antes de atingirem a pirâmide, as artérias lobares subdividem-se em duas ou três artérias interlobares, que se deslocam por entre cada pirâmide. Na junção do córtex e da medula, as artérias interlobares originam artérias arqueadas, se arqueiam sobre cada pirâmide, dando ramos interlobulares, que divergem radialmente para o córtex. Por vezes, estão presentes artérias polares que não entram no hilo renal, mas deslocam-se para os pólos dos rins.
Drenagem venosa dos rins A drenagem venosa é similar à irrigação arterial, mas a veia renal sai anteriormente, ao nível do hilo renal, comparativamente às artérias renais. Contudo, existem veias que se encontram ao nível da superfície renal e que se designam por veias estreladas. As veias renais encontram-se anteriormente às artérias renais e abrem-se na veia cava inferior, quase por ângulos rectos. A veia renal esquerda é três vezes maior que a direita (7,5 e 2,5 cm respectivamente). A veia renal esquerda desloca-se desde o hilo renal, posteriormente à veia esplénica e ao corpo do pâncreas e depois, em torno da região anterior da aorta, inferiormente à origem da artéria mesentérica superior, entrando na veia cava inferior a um nível, normalmente superior à direita. A veia renal direita, por sua vez, encontra-se posteriormente ao duodeno descendente e por vezes à porção lateral da cabeça do pâncreas.
Relações A face anterior do rim é convexa e olha anterolateralmente, diferindo as suas relações à esquerda e à direita. Já a face posterior dos rins olha posteromedialmente, apresentando relações similares em ambos os lados do corpo.
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No que concerne às relações da face anterior do rim, à direita, uma pequena área do pólo superior contacta com a glândula supra-renal direita, que se pode sobrepor à porção superior do bordo medial do pólo superior. Uma grande área inferiormente a esta relaciona-se imediatamente com o lobo direito do fígado, estando deste separada por uma camada de peritoneu. Uma região estreita e medial relaciona-se com a porção descendente e retroperitoneal do duodeno. Inferiormente, a face anterior, contacta lateralmente, directamente com o ângulo cólico direito retro-peritoneal e, medialmente, com uma porção do intestino delgado intra-peritoneal. Já do lado esquerdo, uma pequena região do pólo superior relaciona-se com a glândula supra-renal esquerda. A metade superior da face anterior relaciona-se com o baço, do qual está separada por uma camada de peritoneu. Uma região quadrilateral central encontra-se em contacto directo com o pâncreas retroperitoneal e com os vasos esplénicos, sendo que superiormente a esta, uma pequena e variável região triangular, por entre as áreas pancreática e esplénica, contacta com o estômago, estando desta separado por uma camada de peritoneu. Inferiormente às regiões pancreática e esplénica, uma estreita faixa lateral, que se estende até ao bordo lateral do rim relaciona-se directamente com o ângulo cólico esquerdo e com o início do cólon descendente. Uma extensa região medial relaciona-se ainda com as ansas do jejuno. De referir que, a área gástrica encontra-se coberto por peritoneu do saco menor, enquanto as áreas jejunal e esplénica encontra-se cobertas por peritoneu do saco maior. Posteriormente ao peritoneu e a cobrir a área jejunal, ramos dos vasos cólicos
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II esquerdos relacionam-se com o rim. A face posteromedial dos rins encontra-se envolta em gordura, sendo desprovida de peritoneu. Ao nível desta face, o rim esquerdo e direito relacionam-se com estruturas similares. Superiormente, encontramse o diafragma e os ligamentos arqueados medial e lateral. Mais inferiormente, e de medial para lateral, encontram-se o psoas maior, quadrado lombar e o tendão aponevrótico do transverso do abdómen, os vasos subcostais e os nervos subcostal, iliohipogástrico e ilioinguinal. O pólo superior do rim direito encontra-se ao nível da décima segunda costela, enquanto o do rim esquerdo, encontra-se ao nível da décima primeira e décima segunda. O diafragma separa o rim da pleura, que desce para formar o recesso costodiafragmático.
Fáscia peri-renal A fáscia peri-renal é uma bainha densa de tecido conjuntivo elástico, que envolve cada rim e glândula supra-renal, juntamente com uma camada de gordura peri-renal adjacente. O rim e os seus vasos encontram-se envoltos em gordura peri-renal, que é mais espessa, ao nível dos bordos renais e que se estende para o seio renal, no hilo. A fáscia peri-renal foi originalmente descrita como sendo constituída por duas entidades separadas – a fáscia posterior de Zuckerkandl e a fáscia anterior de Gerota, contudo, estudos mais recentes mostram que a fáscia peri-renal é uma estrutura única multi-laminada, unida posteromedialmente com as fáscias musculares do psoas maior e do quadrado lombar, que se estende anterolaterlamente, posteriormente ao rim, como um folheto bilaminado, que depois se divide numa fina lâmina anterior (que passa em frente do rim, como fáscia peri-renal anterior) e numa lâmina posterior, mais espessa, que se continua anterolateralmente, como fáscia cónica lateral e se funde com o peritoneu parietal.
Mnemónicas sobre rins: - Projecções parietais dos rins: L-1 goes through hilum of only 1 kidney, and it's the Left one.
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Ureteres Os ureteres são dois tubos musculares, cujas contracções peristálticas enviam a urina, desde os rins até à bexiga. Cada um apresenta um comprimento que varia entre os 25 e os 30 cm, apresentando uma espessa parede e um pequeno diâmetro. Os ureteres são contínuos superiormente com a afunilada pelve renal, sendo que cada um desce medialmente, anteriormente ao psoas maior e entra na cavidade pélvica, onde se curva, de início lateralmente, e depois medialmente, para se abrir na base da bexiga.
☤ O diâmetro do uréter é normalmente de 3mm, mas este é ligeiramente menor na sua junção com a pelve renal, ao nível do limite da pelve menor, perto do bordo medial do psoas maior, e a partir do momento que se passa a deslocar dentro da bexiga (essa é a sua porção mais estreita). Esses locais são os mais comuns para a ocorrência de um bloqueio causado por cálculos renais.
Relações No abdómen, o uréter desce posteriormente ao peritoneu, ao nível da porção medial do psoas maior, que o separa das pontas das apófises transversas das vértebras lombares. Anteriormente ao psoas maior, cruza em frente do nervo genitofemoral, sendo obliquamente cruzado pelos vasos gonadais. O uréter entre na pelve menor anteriormente, quer ao final dos vasos ilíacos comuns, quer à origem dos vasos ilíacos externos. A veia cava inferior é medial ao uréter direito, enquanto o uréter esquerdo é lateral à aorta. A veia mesentérica inferior apresenta um longo percurso retroperitoneal, encontrandose em próximo contacto com a região medial do uréter esquerdo. A segunda porção do duodeno normalmente sobrepõe-se à origem do uréter direito, que desce lateralmente à veia cava inferior e é cruzado anteriormente pelos vasos cólico direito e ileo-cólico. Perto da abertura superior da pelve menor, o uréter direito passa posteriormente à porção inferior do mesentério e íleo terminal. Já o uréter esquerdo é cruzado pelos vasos gonadais e cólicos esquerdos, passando posteriormente às ansas do jejuno e cólon sigmóide e ao seu mesentério, na parede posterior do recesso intersigmóide. Na pelve, o uréter encontra-se no tecido areolar extra-peritoneal. Inicialmente, desce posterolateralmente na parede lateral da pelve menor, ao longo do bordo anterior da incisura isquiática maior. Do lado oposto, ao da espinha isquiática, desloca-se anteromedialmente, superiormente ao elevador do ânus, para chegar à base da bexiga. Do lado da parede pélvica, o uréter é anterior à artéria ilíaca interna e ao início do seu tronco anterior, posteriormente aos quais, se encontra a veia ilíaca interna, o nervo lombosagrado e a articulação sacro-ilíaca. Lateralmente, o uréter encontra-se na fáscia do obturador interno, cruzando-a progressivamente, para se tornar medial às artérias umbilical, vesical inferior e rectal média. Nos indivíduos do sexo masculino, o uréter pélvico
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II desloca-se inferiormente aos canais deferentes, passando depois em frente e ligeiramente superiormente ao pólo superior da vesícula seminal, para atravessar a parede da bexiga obliquamente, antes de abertura do ângulo trigonal ipsilateral. Já a sua porção terminal encontra-se rodeada por tributárias das veias vesicais. Nos indivíduos do sexo feminino, a porção pélvica apresenta, inicialmente as mesmas relações que nos indivíduos do sexo masculino, contudo, quando passa anteriormente à artéria ilíaca interna, encontra-se imediatamente posterior ao ovário, formando o limite posterior da fossa ovárica. Na porção anteromedial à bexiga, do seu percurso, o uréter relaciona-se com a artéria uterina, cérvix e com os fórnices vaginais. De referir que se encontra em tecido conjuntivo extra-peritoneal, na porção inferomedial do ligamento largo do útero, região onde a artéria uterina é anterosuperior ao uréter em 2,5 cm e depois cruza para o seu lado medial, para ascender a par com o útero. O uréter volta-se então anteriormente e ligeiramente superiormente, sobre o fórnix vaginal lateral, sendo normalmente 2cm lateral á porção supra-vaginal do cérvix uterino, nesta localização. Depois, o uréter inclina-se medialmente, para chegar à bexiga, apresentando uma relação variável com a região anterior da vagina.
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Bexiga A bexiga é um reservatório, sendo que o seu tamanho, forma, posição e relações variam, de acordo com o seu conteúdo e com o estado das vísceras vizinhas. Quando a bexiga está vazia, encontra-se totalmente na pelve menor, mas à medida que se distende, expande-se anterosuperiormente, para a cavidade abdominal. Uma bexiga vazia é algo tetraédrica, apresentando uma base (fundo), um colo, um ápice, uma face superior e duas faces inferolaterais.
Relações A base da bexiga é triangular, encontrando-se localizada posteroinferiormente e correspondendo à face posterior da bexiga. Nos indivíduos do sexo feminino, a base relaciona-se intimamente com a parede vaginal anterior, enquanto nos indivíduos do sexo masculino, relaciona-se com o recto, do qual está separada, superiormente, pela fossa retrovesical e, inferiormente, pela vesícula seminal, canais deferentes e fáscia de Denovillier. Já o colo encontra-se mais inferiormente, a 3-4 cm posteriormente à porção inferior da sínfise púbica e imediatamente superior ao plano da abertura inferior da pelve menor. O colo da bexiga consiste essencialmente no orifício uretral interno, que se encontra numa posição constante, independentemente de variações de posição associadas à bexiga e recto. Nos indivíduos do sexo masculino, o colo encontra-se em continuidade directa com a base da próstata, enquanto nos indivíduos do sexo feminino, este relaciona-se com a fáscia pélvica, que rodeia a porção superior a uretra. Em ambos os sexos, o ápice da bexiga olha para a porção superior da sínfise púbica. O ligamento umbilical mediano (úraco) ascende posteriormente à parede abdominal anterior, desde o ápice, até ao umbigo, sendo coberto por peritoneu, para formar a prega umbilical mediana. A face anterior da bexiga encontra-se separada da fáscia transversalis, por gordura, no espaço retropúbico. Nos indivíduos do sexo masculino, cada face inferolateral relaciona-se anteriormente com o púbis e com os ligamentos puboprostáticos. Nos indivíduos do sexo feminino, as relações são similares, mas os ligamentos pubovesicais substituem os puboprostáticos. As faces inferolaterais da bexiga não se encontram cobertas por peritoneu. A face superior, por sua vez, é triangular e delimitada pelos bordos laterais (que se deslocam desde o ápice até aos orifícios de entrada dos ureteres) e por um bordo posterior, que se junta a estes. Nos indivíduos do sexo masculino, a face superior encontra-se completamente coberta por peritoneu, que se estende ligeiramente para a base e continua-se posteriormente para o espaço retrovesical e anteriormente para a prega umbilical mediana, contactando com o cólon sigmóide e com as ansas terminais do íleo. Já nos indivíduos do sexo feminino, a face superior encontra-se amplamente coberta por peritoneu, que se encontra reflectido posteriormente para o útero (na zona de junção entre o corpo uterino e o cérvix), formando a fossa vesico-uterina. De referir que a porção posterior da face superior encontra-se desprovida de peritoneu, encontrando-se separada do cérvix supra-vaginal, por tecido fibroareolar. À medida que a bexiga enche, torna-se ovóide. Anteriormente, este órgão desloca o peritoneu parietal, desde a região supra-púbica da parede abdominal. As suas faces inferolaterais tornam-se anteriores e passam a contactar com a parede abdominal, sem a intervenção de peritoneu, encontrando-se a sínfise púbica inferiormente e a uma distância variável. O ápice da bexiga cheia aponta superior e anteriormente, sobre a fixação do ligamento umbilical mediano, de tal forma que o peritoneu forma um recesso supra-vesical de profundidade variável, por entre o ápice e a parede abdominal anterior.
Interior da bexiga O trígono da bexiga é uma região, cujo ângulo anteroinferior é formado pelo orifício uretral interno, enquanto os seus ângulos posterolaterais são formados pelos orifícios uretéricos. O limite trigonal
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II superior é a crista interuretérica, que é ligeiramente curva e conecta os dois orifícios uretéricos e é produzida pela continuação do músculo longitudinal interno uretérico para a parede vesical. Lateralmente, esta crista estende-se para além das aberturas uretéricas, constituindo as pregas uretéricas, que são produzidas pelas porções terminais dos ureteres, que se deslocam obliquamente através da parede vesical.
Trígono vesical O músculo liso do trígono consiste em duas camadas distintas, por vezes designadas por músculo trigonal superficial e músculo detrusor trigonal profundo. Este último é composto por células musculares indistinguíveis das do músculo detrusor, sendo simplesmente a porção posteroinferior do músculo detrusor, propriamente dito. O músculo trigonal superficial, por sua vez, representa um componente distinto do trígono, sendo composto por fibras musculares com um diâmetro relativamente pequeno e que são contínuas proximalmente com as dos ureteres intra-murais. Apesar de o músculo trigonal superficial ser relativamente fino, este encontra-se espessado, ao longo do seu bordo superior, formando a crista inter-uretérica. Em ambos os sexos, o músculo trigonal superficial torna-se contínuo com o músculo liso da uretra proximal, sendo que nos indivíduos do sexo masculino, este estende-se ao longo da crista uretral, até às aberturas dos canais ejaculatórios.
Orifícos uretéricos e uretral interno Os orifícios uretéricos constituem os ângulos trigonais posterolaterais, distando cerca de 2,5 cm em bexigas vazias e 2,5 cm do orifício uretral interno. Já em bexigas distendidas, estas distâncias podem ser duas vezes maiores. O orifício uretral interno encontra-se ao nível do ápice trigonal, na porção mais inferior da bexiga e é algo crescêntico, quando seccionado. Existe por vezes uma elevação imediatamente posterior a este orifício, nos indivíduos do sexo masculino, que é causada pelo lobo prostático mediano e que se designa por úvula vesical.
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Glândula supra-renal As glândulas supra-renais encontram-se imediatamente superiormente e ligeiramente anteriormente ao pólo superior de cada rim. Cada uma apresenta duas áreas distintas, estruturalmente e funcionalmente – um córtex externo e uma medula interna. Estas glândulas encontram-se rodeadas por tecido conjuntivo, contendo gordura peri-renal, envolta em fáscia renal e separada dos rins, por uma pequena quantidade de tecido fibroso. As dimensões das glândulas supra-renais de um indivíduo adulto são diferentes à esquerda e à direita – as dimensões transversas do corpo são de 61 mm à direita e 79 mm à esquerda. Já a massa é similar dos dois lados e apresenta um valor de cerca de 5g. As glândulas são macroscopicamente diferentes, no que concerne à sua aparência externa. A glândula direita apresenta uma forma piramidal, apresentando duas projecções inferiores (os membros), sendo que quando seccionada transversalmente, a glândula direita assemelha-se a uma seta com a cabeça larga. Já a glândula esquerda (que é mais larga que a direita) apresenta uma forma mais semilunar, sendo achatada num plano anteroposterior. A glândula supra-renal direita encontra-se sobre o ápice do rim direito, encontrando-se geralmente a um nível mais elevado que a esquerda, que se encontra sobre a região anteromedial do pólo superior do rim esquerdo. Pequenas glândulas supra-renais acessórias, compostas sobretudo por tecido cortical, podem se encontrar presentes no tecido areolar, perto das glândulas supra-renais principais. Estas glândulas acessórias são designadas por corpos corticais e também podem estar presentes ao nível do cordão espermático, epidídimos e ligamento largo do útero.
Glândula supra-renal direita A glândula supra-renal direita encontra-se posteriormente à veia cava inferior, estando desta separada, somente por uma fina camada de fáscia e tecido conjuntivo. Encontra-se posteriormente ao lobo direito do fígado e anteriormente ao pilar direito do diafragma e pólo superior do rim direito. A sua face inferior é designada por base, encontrando-se adjacente à região anterosuperior do pólo superior do
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II rim direito. Por vezes, sobrepõe-se ao ápice do pólo superior, nomeadamente, quando as duas projecções inferiores (membros) se sobrepõem ao tecido renal. A face anterior, por sua vez, olha ligeiramente lateralmente e apresenta duas facetas. A faceta medial é um pouco estreita, deslocando-se verticalmente e encontrando-se posteriormente à veia cava inferior. Já a faceta lateral é triangular e encontra-se em contacto com a área nua do fígado. A porção mais inferior da face anterior pode ser coberta por peritoneu reflectido, a partir do folheto inferior do ligamento coronário, sendo que esta região pode se encontrar posterior ao bordo lateral da segunda porção do duodeno. Inferiormente ao ápice, perto do bordo anterior da glândula, o hilo encontra-se num pequeno sulco, a partir de onde, a veia supra-renal direita (que é particularmente pequena) emerge, para se juntar à veia cava inferior. Por fim, a face posterior é dividida em áreas superior e inferior por uma curva crista transversa. A área superior, mais larga, é ligeiramente convexa e encontra-se adjacente ao diafragma. Já a área inferior, mais pequena, é côncava e contacta com a região superior do pólo superior do rim direito. O bordo medial da glândula supra-renal direita é fino e encontra-se lateralmente ao gânglio celíaco direito e à artéria frénica inferior direita, quando esta se desloca sobre o pilar direito do diafragma.
Glândula supra-renal esquerda A glândula supra-renal esquerda encontra-se separada do pilar esquerdo do diafragma, apenas por uma fina camada de fáscia e tecido conjuntivo. A sua região medial é convexa, enquanto a lateral é côncava, pois é moldada pelo lado medial do pólo superior do rim esquerdo. No que concerne a bordos, o bordo superior é mais aguçado, enquanto o bordo inferior é mais arredondado. A face anterior apresenta uma grande área superior, coberta por peritoneu, na parede posterior do saco menor, que a separa do cárdia do estômago e, por vezes, da região posterior do baço. Já a face inferior é mais pequena e é desprovida de peritoneu, contactando com o pâncreas e com a artéria esplénica. O hilo olha inferiormente, desde a região medial, encontrando-se próximo da porção inferior da face anterior. A veia supra-renal esquerda emerge do hilo e desloca-se inferomedialmente, para se juntar à veia renal esquerda. A face posterior, por seu turno, é dividida por uma crista, numa área lateral, adjacente ao rim e numa área medial, mais pequena, que contacta com o pilar esquerdo do diafragma. O bordo medial encontra-se lateral ao gânglio celíaco esquerdo e às artérias frénica inferior esquerda e gástrica esquerda.
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Aparelho genital feminino
Vulva A vulva corresponde à genitália externa feminina e inclui o monte do púbis, os lábios maiores, os lábios menores, o clítoris, o bulbo vestibular e as glândulas vestibulares maiores.
Monte do púbis O monte do púbis é a área arredondada de pele situada sobre a sínfise púbica e porção adjacente do púbis. Esta região é relativamente achatada antes da puberdade, estando os lábios maiores vagamente definidos. Durante a adolescência, começam a aparecer pêlos sobre o monte, tornando-se os lábios maiores e menores mais proeminentes. Nos indivíduos adultos, os pêlos encontram-se até a um limite horizontal (contrariamente aos indivíduos do sexo masculino, cujos pêlos púbicos se continuam até ao umbigo), sendo que depois da menopausa, estes pêlos tornam-se mais finos e o tecido labial atrofia ligeiramente.
Lábios maiores Os lábios maiores são duas pregas longitudinais proeminentes, que se estendem posteriormente, desde o monte do púbis, até ao períneo, formando os bordos laterais da vulva. Cada lábio apresenta uma face externa, que é pigmentada e coberta com pêlos, e uma face interna, lisa e rosada com grandes folículos sebáceos. Por entre essas faces, encontra-se tecido conjuntivo e tecido adiposo, misturado com músculo liso, vasos, nervos e glândulas. O ligamento redondo do útero pode terminar no tecido adiposo e na pele na porção anterior do lábio. Uma apófise vaginal e uma hérnia inguinal congénita podem também chegar aos lábios. Os lábios maiores são mais espessos anteriormente, onde se juntam, formando a comissura anterior. Posteriormente, estes não se juntam, mas misturam-se com a pele das vizinhanças, terminando próximos e quase paralelos. A pele que une os lábios posteriormente forma uma crista – a comissura posterior – que se sobrepõe ao corpo perineal e forma o limite posterior da vulva. A distância por entre a comissura e o ânus apresenta entre 2,5 a 3 cm de espessura e é designada por “períneo ginecológico”.
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Lábios menores Os lábios menores são duas pequenas pregas cutâneas, desprovidas de gordura, que se encontram por entre os lábios maiores. Os lábios menores estendem-se inferiormente, lateralmente e posteriormente, a partir do clítoris, flanqueando o orifício vaginal. Anteriormente, cada lábio menor bifurca-se – a camada superior de cada lado passa sobre o clítoris, para formar uma prega, o prepúcio, que projecta a glande do clítoris. Já a camada inferior de cada lado passa inferiormente ao clítoris, formando o freio do clítoris. Por vezes, uma prega labial adicional (o terceiro lábio) encontra-se num ou em ambos os lados, por entre os lábios menores e lábios maiores.
Vestíbulo O vestíbulo é a cavidade que se encontra por entre os lábios menores, contendo os orifícios vaginal e ureteral externo, bem como as aberturas das duas glândulas vestibulares maiores e de várias glândulas vestibulares menores. Por entre o orifício vaginal e os freios dos lábios menores encontra-se uma ténue depressão – a fossa vestibular. Orifício uretral A uretra abre-se no vestíbulo, cerca de 2,5 cm inferiormente ao clítoris e sobre o orifício vaginal, através de uma pequena fenda sagital, cujos bordos ligeiramente elevados constituem o meato uretral. O meato é muito distensível apresentando uma forma variável – a abertura pode ser arredondada, em forma de meia-lua, de estrela, ou de incisura. Bulbos do vestíbulo Os bulbos do vestíbulo encontram-se de cada lado do vestíbulo, consistindo em duas massas alongadas de tecido eréctil, com cerca de 3 cm. Estas estruturas flanqueiam o orifício vaginal, unindo-se anteriormente a este pela estreita comissura do bulbo (ou parte intermédia). As extremidades anteriores estão também unidas ao clítoris, por via de dois pequenos feixes de tecido eréctil. Já as extremidades posteriores do bulbos são expandidas e contactam com as glândulas vestibulares maiores. As faces profundas dos bulbos do vestíbulo contactam com a região inferior do diafragma urogenital e, superficialmente e posteriormente, cada uma encontra-se coberta pelo bulbosponjoso. Glândulas vestibulares maiores As glândulas vestibulares maiores (ou glândulas de Bartholin) são homólogas às glândulas bulbouretrais apresentadas pelos indivíduos do sexo masculino. Estas glândulas são dois corpos pequenos, arredondados ou ovalados e amarelos-avermelhados, que flanqueiam o orifício vaginal, em contacto com a (e por vezes sobrepostas pela) extremidade posterior do bulbo vestibular. Cada glândula abre-se na porção posterolateral do vestíbulo por um canal com 2cm, situado no sulco por entre o hímen e o lábio menor. As suas células segregam um muco claro ou esbranquiçado com propriedades lubrificantes, aquando da estimulação sexual.
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Clítoris O clítoris é uma estrutura eréctil, parcialmente envolta pelas extremidades anteriores bifurcadas dos lábios menores. O clítoris apresenta uma raiz, um corpo e uma glande. O corpo pode ser palpado através da pele, contendo dois corpos cavernosos, constituídos por tecido eréctil e separados medialmente por um septo pectiniforme incompleto. O tecido eréctil é envolto em tecido fibroso, que forma um ligamento suspensor, fixo superiormente à sínfise púbica. Cada corpo cavernoso encontra-se fixo ao ramo ísquio-púbico por um pilar, que se estende desde a raiz do clítoris. A glande do clítoris é um pequeno tubérculo arredondado composto por tecido eréctil esponjoso. A glande encontra-se no final do corpo do clítoris e está ligada aos bulbos do vestíbulo por finos feixes de tecido eréctil. A glande do clítoris encontra-se exposta por entre as extremidades anteriores dos lábios menores, sendo que o seu epitélio apresenta uma elevada sensibilidade cutânea, importante, aquando da resposta sexual.
Vagina A vagina é um tubo fibromuscular, que se estende desde o vestíbulo até ao útero. A extremidade superior da vagina rodeia a projecção vaginal do cérvix uterino. O recesso anular por entre o cérvix e a vagina designa-se por fórnix, sendo que as diferentes porções deste recesso têm nomes específicos (tais como fórnix anterior, fórnix posterior, lateral esquerdo e lateral direito) mas são contínuas.
A vagina ascende posterosuperiormente, formando um ângulo de mais de 90º com o eixo uterino (este ângulo varia de acordo com o conteúdo da bexiga e recto). A largura da vagina aumenta, à medida que esta ascende – superiormente ao nível do hímen, as faces internas das paredes vaginais anterior e posterior encontram-se, de grosso modo, em contacto uma com a outra, formando apenas uma fenda transversa. A parede vaginal anterior apresenta apenas 7,5 cm de comprimento, contra 9 cm da parede posterior. A parede anterior da vagina relaciona-se com a base da bexiga nas suas porções média e superior e com a uretra (que está nela envolta), inferiormente. Já a parede posterior encontra-se coberta por peritoneu no seu quarto superior e encontra-se separada do recto pelo espaço recto-uterino superiormente e por tecido conjuntivo (fáscia de Denonvillier), na sua metade média. Por fim, no seu quarto inferior, a parede posterior da vagina encontra-se separada do canal anal pelo corpo perineal. Lateralmente à vagina encontram-se o elevador do ânus e a fáscia pélvica. Os ureteres passam próximos dos fórnices
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II laterais, à medida que passam anteromedialmente, para chegar ao fundo da bexiga. Quando os ureteres entram na bexiga são anteriores à vagina, sendo que a este nível, cada uréter é cruzado transversalmente por uma artéria uterina. A vagina abre-se externamente por via do orifício vaginal, que se posiciona inferiormente ao meato uretral. O orifício é sagital e o seu tamanho varia: Aquando da infância e de uma relação sexual, este orifício apresenta uma maior capacidade de distensão. O hímen é uma fina prega de membrana mucosa, que se situa imediatamente dentro do orifício vaginal, sendo que as faces internas das pregas contactam normalmente uma com a outra e o orifício vaginal aparece como uma fenda por entre estas. As dimensões e a forma do hímen são muito variáveis – quando esta estrutura se encontra esticada, é anular e mais larga posteriormente. O hímen pode também ser semilunar e côncavo em direcção ao monte do púbis, cribiforme, ausente, ou completo e não perfurado. O anel do hímen normalmente rompe-se, aquando da primeira relação sexual, mas essa ruptura pode se dar anteriormente, no decurso de actividade física não sexual. Após se ter dado essa ruptura, restam remanescentes do hímen, os quais são designados por carúnculas do hímen. Remanescentes do canal de Gartner (embriologicamente é a estrutura caudal do canal mesonéfrico) encontram-se ocasionalmente presentes, ao nível dos fórnices laterais, ou porções laterais da vagina.
Útero O útero é um órgão muscular, de paredes espessas, e que se encontra situado na pelve, por entre a bexiga e o recto. Encontra-se posteriormente à bexiga e espaço uterovesical e anteriormente ao recto e espaço recto-uterino, sendo móvel, ou seja, a sua posição varia com a distensão da bexiga e recto. O útero encontra-se dividido em duas regiões principais – o corpo do útero forma os dois-terços superiores, enquanto o cérvix forma o terço inferior. No estado adulto nulíparo, o útero inclina-se anteriormente, cerca de 90º relativamente ao eixo da vagina (anterversão), enquanto o corpo se inclina anteriormente, cerca de 170º em relação ao cérvix (anteflexão).
Corpo O corpo do útero é uma estrutura em forma de pêra, que se estende superiormente desde o fundo, até ao cérvix, inferiormente. Perto da sua extremidade superior, as trompas de Falópio entram no útero, de cada lado, ao nível dos cornos uterinos. Anteroinferiormente a cada corno encontra-se o ligamento redondo e posteroinferiormente encontra-se o ligamento ovárico. O fundo do útero apresenta uma forma de cúpula e é superior aos pontos de entrada das trompas de Falópio, sendo coberto por peritoneu. Esta estrutura contacta com as ansas do intestino delgado e, por vezes, com o cólon sigmóide. Os bordos laterais do corpo do útero são convexos e, de cada lado, o seu peritoneu encontra-se reflectido lateralmente, formando o ligamento largo, que se estende como um folheto achatado para a parede da pelve. Já o peritoneu que recobre a face anterior do corpo do útero encontra-se coberto por peritoneu, que se encontra reflectido para a bexiga, constituindo a prega uterovesical. Esta reflexão ocorre normalmente ao nível do orifício interno do útero, ou seja, ao nível do bordo inferior do corpo do útero. O espaço vesico-uterino, situado por entre a bexiga e o útero encontra-se obliterado, quando a bexiga se encontra distendida, mas pode ser ocupado pelo intestino
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II delgado, quando a bexiga se encontra vazia. Por sua vez, a face posterior do útero é convexa transversalmente e o seu revestimento peritoneal continua-se inferiormente para o cérvix e porção superior da vagina, encontrando-se depois reflectido posteriormente para o recto, ao longo do espaço recto-uterino, que se encontra posteriormente ao útero. O cólon sigmóide e, por vezes, o íleo terminal encontram-se posteriormente ao útero. A cavidade do corpo uterino mede normalmente 6 cm, desde o orifício externo do cérvix, até à parede do fundo, sendo achatada anteroposteriormente. Em corte coronal, esta cavidade é triangular, sendo mais larga superiormente, onde as duas trompas de Falópio se juntam ao útero, estreitando-se inferiormente, ao nível do orifício interno do cérvix.
☤ Por vezes, os canais paramesonéfricos (Müllerianos) falham na sua fusão, o que resulta na génese de um útero que não apresenta forma de pêra. Pode se formar um septo, ou uma fenda parcial do útero. O exemplo mais extremo inclui uma vagina septada, dois cérvices e dois úteros discretos, cada um com dois tubos uterinos.
Cérvix O cérvix de uma mulher adulta, e que não está grávida, é mais cilíndrico que o corpo do útero, apresentando normalmente 2,5 cm de comprimento. A extremidade superior comunica com o corpo do útero, através do orifício interno, enquanto a extremidade inferior abre-se na vagina, através do orifício externo. Em mulheres nulíparas, o orifício externo é normalmente uma abertura circular, enquanto depois do parto, este torna-se uma fenda transversa. A esse nível, duas cristas transversas, uma na parede anterior e outra na parede posterior, geram pequenas pregas oblíquas, que ascendem lateralmente, constituindo o lábio anterior e o lábio posterior do orifício externo do cérvix. O terço superior do cérvix é a sua porção mais estreita, constituindo o istmo, que nas mulheres que não se encontram grávidas, vai sofrendo variações, de acordo com o ciclo menstrual, mas que são menos pronunciadas, que as que ocorrem no corpo do útero. A extremidade externa do cérvix entra na extremidade superior da vagina, sendo o cérvix dividido numa porção supravaginal e numa porção vaginal. A porção supravaginal encontra-se separada anteriormente da bexiga pelo paramétrio, uma porção de tecido conjuntivo, que também passa lateralmente por entre os dois folhetos dos ligamentos largos. No interior do cervix encontramos uma crista, a qual é designada por crista longitudinal, que é cruzada por pregas palmadas.
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Ligamentos pélvicos e pregas peritoneais O útero encontra-se ligado por vários ligamentos, sendo alguns ligamentos verdadeiros, que dão suporte ao útero, enquanto outros são fibrosos e não suportam o útero. Ainda há ligamentos que são simples pregas de peritoneu. Pregas peritoneais O peritoneu parietal reflecte-se sobre o tracto genital superior, produzindo pregas peritoneais laterais, anterior (uterovesical) e posterior (rectovaginal). As pregas laterais constituem os ligamentos largos. A prega peritoneal anterior ou uterovesical consiste em peritoneu, reflectido para a bexiga, desde a junção entre o cérvix e o corpo do útero. Já a prega rectovaginal ou peritoneal posterior consiste em peritoneu reflectido desde o fórnix vaginal posterior, na frente do recto, sendo assim criado o espaço de Douglas ou recto-uterino profundo. O espaço de Douglas é delimitado anteriormente pelo útero, cérvix supra-vaginal e fórnix vaginal posterior. Posteriormente, encontramos o recto e, lateralmente, os ligamentos útero-sagrados. Já as pregas laterais, ou ligamentos largos, estendem-se a partir de cada lado do útero, até às paredes pélvicas laterais, onde se tornam contínuos com o peritoneu que cobre essas paredes. O seu bordo superior é livre e o seu bordo inferior é contínuo com o peritoneu sobre a bexiga, recto e paredes laterais da pelve. Os bordos são contínuos um com o outro, ao nível do bordo livre, por via do fundo uterino e divergem, inferiormente às faces superiores dos elevadores do ânus. A trompa de Falópio encontra-se no bordo superior livre dos ligamentos largos. O ligamento largo divide-se numa mesosalpinge, num mesovário, posterior e num mesométrio, inferior.
A mesosalpinge encontra-se fixa superiormente à trompa de Falópio e, posteroinferiormente, ao mesovário. Superior e lateralmente, encontra-se fixa ao ligamento suspensor do ovário e, medialmente, encontra-se fixa ao ligamento ovárico. A fímbria do infundíbulo tubal projecta-se a partir da sua extremidade lateral livre. Por entre o ovário e a trompa de Falópio, a mesosalpinge contém anastomoses vasculares, por entre os vasos uterinos e ováricos, o epooforon e o paraooforon. O mesovário projecta-se desde a região posterior do ligamento largo e encontra-se fixo ao hilo do ovário, transportando vasos e nervos para o ovário. Esta é a menor porção das pregas laterais. O mesométrio é a parte mais larga do ligamento largo, estendendo-se desde o pavimento pélvico até ao ligamento ovárico e ao corpo uterino. A artéria uterina passa por entre os seus dois folhetos peritoneais,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II tipicamente a 1,5 cm lateralmente ao cérvix – esta artéria cruza o uréter a pequena distância da sua origem. Por entre a pirâmide formada, o mesométrio contém os vasos e nervos ováricos, encontrados dentro do ligamento suspensor do ovário (ligamento infunibulopélvico). Este ligamento continua-se lateralmente sobre os vasos ilíacos externos, como uma prega distinta. O mesométrio também envolve à porção proximal do ligamento redondo do útero, bem como músculo liso e tecido conjuntivo liso. Ligamento redondo do útero Os ligamentos redondos são feixes estreitos e achatados, com entre 10 e 12 cm de comprimento. Cada um destes ligamentos se encontra fixo medialmente à porção superior do útero, imediatamente inferior e anteriormente aos cornos laterais. A partir daqui, cada ligamento passa lateralmente dentro da porção superior do ligamento largo, até às parede laterais da pelve. No início da artéria epigástrica inferior, o ligamento redondo entra no anel inguinal profundo, atravessando o canal inguinal e dividindo-se em filamentos que se misturam com o tecido conjuntivo em seu redor, antes de terminar no monte do púbis, superiormente aos lábios maiores. Perto do útero, o ligamento redondo contém uma quantidade considerável de músculo liso, que diminui gradualmente, de tal modo que a porção terminal é puramente fibrosa. O ligamento redondo contém vasos sanguíneos, nervos e linfáticos. Nos fetos, uma projecção de peritoneu, a apófise vaginal, é transportada com o ligamento redondo por uma curta distância até ao canal inguinal. Esta projecção encontra-se normalmente obliterada nos indivíduos adultos, embora possa estar presente, inclusive, em indivíduos idosos. No canal inguinal, o ligamento recebe as mesmas coberturas que o cordão espermático, embora estas sejam mais finas e se misturem com o ligamento em si.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Ligamentos útero-sagrados, cervicais transversos e pubocervical Os ligamentos útero-sagrados são pregas recto-uterinas que contêm tecido fibroso e músculo liso. Estes ligamentos passam posteriormente, desde o cérvix e corpo do útero, por ambos os lados do recto, e terminam fixando-se anteriormente ao sacro. Os ligamentos cervicais transversos (também designados por ligamentos cardinais ou ligamentos de Mackenrodt) estendem-se desde os lados do cérvix e fórnices laterais da vagina, para se fixarem extensivamente na parede pélvica. Ao nível do cérvix, algumas fibras interdigitam-se com fibras dos ligamentos útero-sagrados. As fibras dos ligamentos cervicais transversos são contínuas com o tecido fibroso em torno das porções inferiores dos ureteres e vasos sanguíneos pélvicos. Já a fibras do ligamento pubocervical passam anteriormente, desde a região anterior do cérvix e porção da superior da vagina, para divergir em torno da uretra. Estas fibras ficam-se na região posterior dos ossos púbicos.
Trompas de Falópio As trompas de Falópio (ou trompas uterinas) encontram-se fixas à porção superior do corpo do útero e os seus óstios abrem-se na cavidade uterina. A abertura medial da trompa (o orifício uterino) encontrase localizada ao nível do ângulo superior da cavidade uterina. A trompa passa superolateralmente e consiste em quatro porções principais: porção intramural, istmo, ampola e fímbria. A porção intramural apresenta 0,7 mm de largura e 1 cm de espessura, encontrando-se no miométrio. Esta porção é contínua lateralmente com o istmo, que apresenta entre 1 e 5 mm de largura e 3 cm de comprimento, sendo arredondada, muscular e firme. O istmo é contínuo lateralmente com a ampola, a porção mais larga da trompa, que tem um diâmetro luminal máximo de 1cm. A ampola tem cerca de 5cm de comprimento e apresenta uma parede fina e uma face luminal pragueada, sendo o local onde normalmente ocorre a fecundação. A ampola abre-se no infundíbulo, uma porção em forma de trompete, que se localiza ao nível do orifício abdominal. As fímbrias, pregas numerosas com 1 mm de largura e que são similares a dedos, encontram-se fixas às extremidades do infundíbulo e estendem-se a partir da sua circunferência interna, para além da parede muscular da trompa. Uma dessas fímbrias, a fímbria ovárica é maior e mais profundamente sulcada que as restantes. De referir que, por altura da ovulação dá-se um alargamento das fímbrias.
Ovários Numa mulher adulta, que não se encontre grávida, os ovários encontram-se de cada lado do útero, próximos da parede pélvica lateral e suspensos na cavidade pélvica por uma dupla prega de peritoneu (o mesovário), que se encontra fixo ao limite superior da região posterior do ligamento uterino largo. Os ovários consistem em tecido fibroso denso, onde estão embebidas as células da linha germinativa. Antes
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II da ovulação regular, os ovários apresentam uma face lisa, mas depois, as suas faces tornam-se distorcidas, pela cicatrização, que se segue à degeneração dos sucessivos corpos lúteos. As suas dimensões médias são de 4 x 2 x 3 cm em mulheres na idade reprodutiva, contudo, as suas dimensões mais que duplicam, durante a gravidez. Antes do primeiro período menstrual, o tamanho do ovário é cerca de um terço do ovário adulto e na menopausa as suas dimensões diminuem progressivamente. A face lateral do ovário contacta com o peritoneu parietal na fossa ovárica. Posteriormente à fossa, encontram-se estruturas como o uréter, os vasos ilíacos internos, os vasos e nervo obturadores, que são classificadas como sendo retroperitoneais. Já a face medial olha para o útero e vasos uterinos no ligamento largo, sendo o recesso peritoneal designado aí por bolsa ovárica. Superiormente à extremidade superior, encontram-se as fímbrias e secção distal das trompas de Falópio. A extremidade uterina dirige-se inferomedialmente, em direcção ao pavimento pélvico. O bordo anterior olha para o folheto posterior do ligamento largo e contém o mesovário, enquanto o bordo posterior é livre e olha para o peritoneu, que se sobrepõe à porção superior da artéria e veia ilíacas internas e do uréter. Do lado direito, superiormente e lateralmente ao ovário, encontra-se a junção íleo-cecal, o ceco e o apêndice, enquanto do lado esquerdo, o cólon sigmóide passa sobre o pólo superior do ovário e juntase ao recto, que se encontra por entre as faces mediais de ambos os ovários. A mesosalpinge encontrase inferiormente à trompa de Falópio, enquanto o ligamento ovárico é inferior e medial. O mesovário e o ovário encontram-se inferiormente à sua extremidade tubária. O ligamento redondo do útero é anterior à trompa, enquanto as faces posterior e superior da trompa encontram-se livres na cavidade peritoneal.
Ligamentos peritoneais e ligamentos de suporte do ovário O ligamento suspensor do ovário é também designado por ligamento infundibulo-pélvico, sendo uma prega peritoneal, que está ligada à porção superior da face lateral do ovário. Este ligamento contém os vasos e nervos ováricos. Do lado direito, o ligamento infundibulo-pélvico encontra-se ligado a uma prega de peritoneu, que se encontra posterior e inferior ao apêndice. Do lado esquerdo, a ligação peritoneal encontra-se a um nível mais elevado que do lado direito, sendo lateral à junção dos cólon descendente e sigmóide. À medida que o ligamento infundibulo-pélvico se junta ao peritoneu que cobre o psoas maior, passa superiormente sobre os vasos ilíacos externos, nervo genitofemoral e uréter.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O ligamento ovárico, por sua vez, liga a extremidade uterina (inferomedial) do ovário ao ângulo lateral do útero, posteroinferiormente às trompas de Falópio. Este ligamento encontra-se no folheto posterior do ligamento largo do útero e contém células de músculo liso. Este ligamento é contínuo com o bordo medial do ligamento redondo, sendo ambos remanescentes do gubernáculo. Por fim, o mesovário é uma pequena prega peritoenal, que liga o ovário à região posterior do ligamento largo. O mesovário transporta vasos e nervos sanguíneos até ao hilo ovárico. O tubo uterino arqueia-se sobre o ovário e ascende em relação ao seu bordo mesovárico, curvando-se depois sobre a sua extremidade tubal e passa inferiormente no seu bordo posterior, livre, e à sua face medial.
Uretra feminina A uretra feminina tem cerca de 4cm de comprimento e 6mm de diâmetro, iniciando-se no orifício uretral interno da bexiga, aproximadamente do lado oposto ao da sínfise púbica. A uretra desloca-se então anteroinferiormente, posteriormente à sínfise púbica, envolta na parede anterior da vagina. Os ligamentos pubouretrais posteriores suspendem a uretra, por debaixo do púbis, enquanto o ligamento suspensor do clítoris suspende-a anteriormente. A uretra cruza então a membrana perineal, terminando normalmente ao nível do orifício uretral externo, no vestíbulo, como uma fenda anteroposterior, com bordos proeminentes, que são imediatamente anteriores ao orifício da vagina, localizando-se a 2,5 cm posteriormente à glande do clítoris. Por vezes, a uretra abre-se ao nível da parede vaginal anterior. As paredes anterior e posterior da uretra encontram-se apostas, sendo que o seu epitélio forma pregas longitudinais, uma das quais é designada por crista uretral, encontrando-se ao nível da parede posterior da uretra. Isto acontece, excepto aquando da passagem de urina. Várias pequenas glândulas uretrais e recessos (designados por lacunas) abrem-se na uretra, podendo originar os divertículos uretrais. De cada lado, perto da extremidade inferior da uretra, um conjunto dessas glândulas, designadas por glândulas de Skene, encontram-se agrupadas, abrindo-se no canal para-uretral – cada canal desloca-se inferiormente no tecido submucoso e termina numa pequena abertura no bordo lateral do orifício uretral externo.
Mnemónicas sobre aparelho genital feminino: - Ângulo de anteflexão/anteversão: VV: AnteVersão é o ângulo que o útero faz com a Vagina.
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Aparelho genital masculino
Escroto O escroto é um saco cutâneo fibromuscular, que contém os testículos e as porções inferiores dos cordões espermáticos, encontrando-se suspenso, inferiormente à sínfise púbica, por entre as faces anteromediais das coxas. O escroto consiste em pele, músculo dartos e nas fáscias espermática externa, cremastérica e espermática interna. A fáscia espermática interna encontra-se fracamente ligada à camada parietal da túnica vaginal. O escroto é dividido em duas metades (esquerda e direita) por uma rafe escrotal, a qual se continua ventralmente para a face inferior do pénis e, dorsalmente, ao longo da linha média do períneo, até ao ânus. O escroto encontra-se, normalmente, a um nível mais inferior do lado esquerdo, pois o cordão espermático esquerdo é maior. O músculo dartos é uma fina camada de músculo liso contínua para além do escroto com as fáscias inguinal superficial e perineal. Este músculo estende-se até ao septo escrotal, que liga a rafe à face inferior da raiz do pénis. O septo contém todas as camadas da parede escrotal, com excepção da pele. O músculo dartos encontra-se intimamente unido à pele, mas encontra-se ligado às porções subjacentes por tecido conjuntivo. De referir que, a partir do músculo dartos, até ao pólo testicular inferior, parte um “ligamento escrotal” de natureza fibromuscular, pensando-se que este tenha influência na termorregulação dos testículos.
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Testículos Os testículos são as gónadas masculinas, sendo órgãos ovóides, responsáveis pela produção de esperma e testosterona (sendo por isso classificados como reprodutivos e endócrinos). Os testículos encontram-se suspensos no escroto pelo músculo dartos e pelos cordões espermáticos, tendo em média entre 4 e 5 cm de comprimento, 2.5 cm de largura e 3 cm de diâmetro anteroposterior. Já a sua massa varia entre 10,5 e 14g. Cada testículo encontra-se obliquamente disposto no escroto, sendo que o seu pólo superior se inclina anterolateralmente e o seu pólo inferior olha posteromedialmente, sendo que junto ao pólo superior, encontra-se, por vezes um remanescente embrionário - o apêndice testicular. A região anterior é convexa, enquanto a região posterior é quase recta, sendo o local de fixação do cordão espermático. As faces anterior, medial, lateral e ambos os pólos são convexos, lisos e encontram-se cobertos, de dentro para fora, pela camada visceral da serosa túnica vaginal, pela camada parietal e tecidos escrotais. Cada testículo encontra-se separado do seu homólogo contralateral por uma rafe mediana fibrosa, que é deficiente superiormente. A região posterior de cada testículo é apenas em parte coberta por membrana serosa, na medida em que o epidídimo se encontra adjacente à sua porção lateral. Os testículos encontram-se cobertos por três revestimentos, que são, de fora para dentro, a túnica vaginal, a túnica albugínea e a túnica vasculosa. O interior dos testículos encontra-se dividido em várias unidades, os lóbulos testiculares, dividido pelos septos testiculares. Os espematozóides produzidos nos túbulos seminíferos, em cada lóbulo, são então conduzidos, para os epidídimos, passando primeiro pela rede testicular, uma rede de túbulos, situada ao nível do mediastino testicular e que comunica com os epidídimos.
Túnica vaginal A túnica vaginal é a extremidade inferior da apófise vaginal, uma estrutura peritoneal. A túnica vaginal encontra-se reflectida a partir dos testículos até à face interna do escroto, sendo constituída por folhetos parietal e visceral. O folheto visceral cobre todas as regiões dos testículos, excepto a maior parte da região posterior. Posteromedialmente, este folheto encontra-se reflectido anteriormente até ao folheto parietal. Posterolateralmente, o folheto visceral passa para a região medial do epidídimo, delimitando o seio do epidídimo, passando depois lateralmente ao seu bordo posterior, onde se encontra reflectido anteriormente, para se tornar contínuo com o folheto parietal. Os folhetos visceral e parietal são contínuos em ambos os pólos, mas no pólo superior, o folheto visceral sobrepõe-se à
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II cabeça do epidídimo, antes de se reflectir. Verifica-se sempre a presença de um fino filme de fluido por entre os dois folhetos da túnica vaginal. Já o folheto parietal, é mais extenso, chegando até inferiormente aos testículos e ascendendo em frente e medialmente ao cordão espermático.
Túnica albugínea A túnica albugínea é um revestimento denso e branco azulado, composto sobretudo por fibras entrelaçantes de colagénio. Esta túnica encontra-se coberta externamente pelo folheto visceral da túnica vaginal, excepto ao nível da cabeça e cauda dos epidídimos e da região posterior dos testículos, onde entram vasos e nervos. A túnica vaginal cobre a túnica vasculosa e, ao nível do bordo posterior dos testículos, projectase para o interior dos testículos como um septo fibroso incompleto, o mediastino testicular, que se estende desde a extremidade superior até à extremidade inferior dos testículos, sendo o local onde se deslocam os vasos testiculares e a partir de onde se projectam os septos testiculares.
Túnica vasculosa A túnica vasculosa contém um plexo de vasos sanguíneos e tecido conjuntivo solto, estendendo-se sobre a região interna da túnica albugínea e cobrindo os septos e, como tal, os lóbulos testiculares.
Epidídimos O epidídimo encontra-se posteriormente e ligeiramente lateral ao testículo, enquanto o canal deferente se encontra ao longo do seu lado medial. Os epidídimos apresentam, superiormente, uma cabeça expandida, também designada por globo maior, adjacente à qual encontra-se o apêndice do epidídimo, um remanescente embrionário. As restantes porções do epidídimo constituem o corpo e a cauda (ou globo menor). O epidídimo encontra-se coberto pela túnica vaginal, excepto no seu bordo posterior. Lateralmente, por entre o testículo e o epidídimo existe um sulco profundo - o seio do epidídimo. O canal deferente ascende a partir da cauda do epidídimo até ao anel inguinal profundo, encontrando-se dentro do canal inguinal.
Paradídimo O paradídimo é um pequeno conjunto de túbulos convolutos, encontrando-se anteriormente no cordão espermático, sobre a cabeça dos epidídimos. Os paradídimos são também designados por órgãos de Giraldes, em honra do anatomista e cirurgião portuense Joaquim Albino C. Casado Giraldes (1808-1875).
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Cordão espermático Os cordões espermáticos suspendem os testículos no escroto e estendem-se desde o anel inguinal profundo até à região posterior dos testículos, sendo resultado da descida dos testículos desde a parede abdominal até ao escroto. O cordão esquerdo é um pouco mais longo que o direito. Por entre o anel inguinal superficial e os testículos, o cordão é anterior ao tendão do aductor longo, sendo cruzado anteriormente pela artéria pudenda externa e posteriormente pela artéria pudenda externa profunda. O nervo ilioinguinal encontra-se inferiormente ao cordão, à medida que atravessa o canal inguinal. No canal inguinal, o cordão espermático passa a ser coberto pelas camadas da parede abdominal, que se estendem para a parede do escroto, como fáscias espermática interna, cremastérica e espermática externa. A fáscia espermática interna deriva da fáscia transversalis e forma uma fina e solta camada em torno do cordão espermático. A fáscia cremastérica, por seu turno, contém fascículos de músculo esquelético, unidos por tecido conjuntivo solto, para formar o creamster, que é contínuo com o músculo oblíquo interno. Por fim, a fáscia espermática externa desce desde os pilares do anel inguinal superficial, consistindo numa fina camada fibrosa contínua superiormente com a aponevrose do oblíquo externo. O cordão espermático contém os canais deferentes, a artéria e veias testiculares, a artéria cremastérica e a artéria para os canais deferentes, bem como o ramo genital do nervo genitofemoral, o nervo cremastérico, componentes simpáticos do plexo testicular e 4-8 vasos linfáticos.
Canais deferentes O canal deferente é a continuação distal dos epidídimos, iniciando-se como um tubo muscular, ao nível da cauda do epidídimo. Estes canais apresentam 45 cm de comprimento, enviando esperma para os canais ejaculatórios. Inicialmente, muito tortuosa, a porção convoluta dos canais deferentes tornase mais recta, à medida que ascende ao longo da região posterior dos testículos, medialmente aos epidídimos. A partir do pólo superior dos testículos, o canal deferente ascende na porção posterior do cordão espermático, atravessando o
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II canal inguinal. Ao nível do anel inguinal profundo, o canal deferente abandona o cordão, curvando-se em torno do lado lateral da artéria epigástrica inferior e ascendendo por cerca de 2,5 cm anteriormente à artéria ilíaca externa. A partir daí, este canal volta-se posteriormente e inclina-se ligeiramente inferiormente e obliquamente ao longo dos vasos ilíacos externos, para entrar na pelve verdadeira. Ao nível da pelve, os canais deferentes encontram-se situados retroperitonealmente, deslocando-se posteriormente e medialmente à artéria umbilical obliterada, ao nervo e vasos obturadores e aos vasos vesicais. O canal deferente cruza então o uréter e forma um ângulo agudo para passar anteromedialmente por entre a face posterior da bexiga e o pólo superior da vesícula seminal, descendo depois em contacto com a vesícula seminal, aproximando-se gradualmente do seu homólogo contralateral. Aqui, o canal deferente encontra-se por entre a base da bexiga e o recto, do qual se encontra separado pela fáscia de Denonvillier. Ao nível da base da próstata, o canal deferente junta-se ao canal da vesícula seminal por um ângulo agudo para formar o canal ejaculatório. Posteriormen te à bexiga, lúmen dos canais deferentes torna-se dilatado e tortuoso, sendo designado por ampola. Ao nível do local de junção com a vesícula seminal, o canal deferente encontra-se já muito diminuído em calibre.
Vesículas seminais As duas vesículas seminais são tubos saculados e contorcidos, localizados por entre a bexiga e o recto. Cada vesícula apresenta cerca de 5cm de comprimento, sendo algo piramidal. A sua base encontra-se dirigida superiormente e posterolateralmente. A vesícula seminal é, de grosso modo, um saco que apresenta divertículos irregulares, que se encontram ligados a este saco por tecido fibroso. O diâmetro do tubo é de 3-4mm e o seu comprimento total é de 10-15 cm. O pólo superior das vesículas é um “beco sem saída”, enquanto o pólo inferior estreita-se até um canal recto, que se junta ao canal deferente ipsilateral, para formar o canal ejaculatório. A face anterior contacta com a região posterior da bexiga e estende-se desde perto da entrada do uréter até à base prostática (a próstata encontra-se intimamente relacionada com as vesículas seminais). A face posterior, por sua vez, relaciona-se com o recto, a partir do qual se encontra separada pela fáscia de Denonvillier. De cada lado, as vesículas seminais encontram-se relacionadas com o canal deferente e terminação do uréter ipsilateral, encontrando-se parcialmente cobertas por peritoneu. A ampola dos canais deferentes encontra-se ao longo do bordo medial de cada vesícula seminal, enquanto as veias do plexo venoso prostático, que drenam posteriormente, para as veias ilíacas internas, se encontram lateralmente.
Canais ejaculatórios Os canais ejaculatórios são formados de cada lado, pela união do canal da vesícula seminal com a ampola do canal deferente. Cada canal apresenta quase 2cm de comprimento, iniciando-se na base da próstata e deslocando-se anteroinferiormente, ao longo dos lobos mediano direito e mediano esquerdo. Estes canais contornam o utrículo prostático, diminuindo de tamanho e convergindo, para terminar no verumontano, através de duas fendas, ao nível do orifício utricular.
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Glândulas bulbouretrais As duas glândulas bulbouretrais são massas pequenas, arredondadas, amareladas e algo lobuladas, que apresentam um diâmetro de cerca de 1 cm. Estas glândulas encontram-se lateralmente à uretra membranosa, sobre a membrana perineal e bulbo do pénis, encontrando-se envoltas por fibras do esfíncter uretral. O canal excretor de cada glândula apresenta cerca de 3cm de comprimento, passando obliquamente, anteriormente e externamente à mucosa da uretra membranosa e penetrando na membrana perineal. Este canal abre um pequeno orifício no pavimento da uretra bulbar, que se encontra a cerca de 2,5 cm inferiormente à membrana perineal.
Uretra masculina A uretra masculina apresenta entre 18 e 20 cm de comprimento, estendendo-se desde o orifício uretral interno, na bexiga, até ao orifício uretral externo, ou meato, na terminação do pénis. Este órgão pode ser dividido em duas porções – a uretra anterior apresenta cerca de 16cm de comprimento, encontrando-se no períneo (proximalmente) e no pénis (distalmente), sendo rodeada pelo corpo esponjoso. Já a uretra posterior apresenta 4cm de comprimento, encontrando-se na pelve, proximalmente ao corpo esponjoso, onde actuam mecanismos esfinctéricos. Funcionalmente, ambas as porções actuam como canais condutores. A uretra anterior encontra-se dividida numa componente proximal, a uretra bulbar (que se encontra rodeada pelo bulbosponjoso e se encontra totalmente dentro do períneo), e numa componente distal, o pêndulo ou componente peniana, que se continua até à ponta do pénis. A uretra posterior, por sua vez, encontra-se dividida em segmentos pré-prostático, prostático e membranoso. No pénis flácido, a uretra apresenta uma dupla curva. O canal uretral é uma mera fenda, excepto aquando da passagem de urina – quando seccionado transversalmente, o canal uretral é arqueado na porção prostática, estrelado nas porções pré-prostática e membranosa, transverso nas porções bulbar e peniana e sagital, ao nível do orifício externo.
Porção posterior Uretra pré-prostática A uretra pré-prostática apresenta cerca de 1 cm de comprimento e estende-se, desde a base da bexiga até à próstata. Nesse local podem existir pequenas glândulas peri-uretrais, que podem contribuir para uma hiperplasia benigna da próstata. Uretra prostática A uretra prostática apresenta entre 3 e 4 cm de comprimento, deslocando-se através da substância da próstata, mas mais próxima da face anterior da glândula. Esta porção da uretra é contínua proximalmente com a porção pré-prostárica e emerge da próstata, ligeiramente anteriormente ao seu ápice (a porção mais inferior da próstata). Durante a maior parte do seu comprimento, a parede posterior apresenta uma crista situada ao nível da linha média, a crista uretral, que se projecta para o lúmen, sendo ladeada por ténues depressões, os seios prostáticos, cujo pavimento se encontra perfurado pelos orifícios dos 15-20 canais prostáticos. Uma elevação, o verumontano, ou colículo seminal, encontra-se, de grosso modo, a meio do comprimento da crista uretral. A este nível, a uretra desloca-se 35º anteriormente, contendo o orifício do utrículo prostático. A ladear este orifício, ou dentro deste, encontram-se as duas pequenas
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II aberturas dos canais ejaculatórios. O utrículo prostático é um “beco sem saída” com 6 mm de comprimento, que se desloca superiormente e posteriormente, na substância da próstata, posteriormente ao seu lobo mediano. As suas paredes são compostas por tecido fibroso, fibras musculares e membrana mucosa, esta última, perfurada pelas aberturas de inúmeras pequenas glândulas. Devido ao facto de se pensar que o utrículo é homólogo à vagina, este é por vezes designado por “vagina masculina”. Contudo, de acordo com o ponto de vista mais comum, o utrículo é homólogo ao útero. A porção mais inferior da uretra prostática encontra-se fixa pelos ligamentos puboprostáticos e é, por isso, imóvel.
Uretra membranosa A porção membranosa da uretra é a secção mais curta (apresentando entre 2 e 2,5 cm), menos dilatável e, com excepção do orifício externo, mais estreita da uretra. Esta porção desce com uma ligeira concavidade ventral, desde a próstata, até ao bulbo do pénis, passando através da membrana perineal, a 2,5 cm posteroinferiormente à sínfise púbica. A parede da uretra membranosa consiste num revestimento muscular, o qual se encontra separado do limite epitelial por uma fina camada de tecido conjuntivo fibroelástico. A camada muscular contém uma relativamente fina camada de fibras de músculo liso, que são contínuas proximalmente com as da uretra prostática, e uma proeminente camada externa de fibras musculares estriadas orientadas circularmente e que, todas juntas, formam o esfíncter uretral externo. O revestimento muscular da uretra e do puborectal rodeia a uretra membranosa e encontra-se fixo à face interna do ramo ísquio-púbico (as fibras também atingem a porção mais inferior do colo da bexiga e encontram-se na face da próstata). O esfíncter uretral externo estriado encontra-se fixo ao corpo perineal, relacionando-se anteriormente com o complexo da veia dorsal, lateralmente, com o elevador do ânus e posteriormente, com o corpo
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II perineal e rectouretral. As glândulas bulbouretrais encontram-se investidas em músculo esfinctérico e drenam para a uretra bulbar, aquando da excitação sexual.
Porção anterior A porção anterior (ou esponjosa) da uretra encontra-se dentro do corpo esponjoso do pénis. No pénis flácido, apresenta cerca de 15 cm de comprimento e estende-se desde o fim da uretra membranosa, até ao orifício uretral externo, ao nível da glande do pénis. A porção anterior inicia-se como uretra bulbar, inferiormente à membrana perineal, anteriormente ao nível mais inferior da sínfise púbica. Esta é a porção mais larga da uretra (sobretudo ao nível da fossa bulbar, a sua região mais larga), encontrandose rodeada pelo bulbosponjoso. As glândulas bulbouretrais abrem-se na uretra bulbar, a cerca de 2,5 cm inferiormente à membrana perineal. A uretra curva-se então inferiormente, como uretra peniana, consistindo numa fenda estreita e transversa. Ao nível da sua terminação (na glande do pénis), a uretra peniana encontra-se dilatada, sendo designada por fossa navicular. O orifício uretral externo é a porção mais estreita da uretra, consistindo numa fenda sagital, com cerca de 6 mm de comprimento, ladeada de cada lado por um pequeno lábio. O epitélio uretral, particularmente nos segmentos bulbar e distal do pénis, apresenta os orifícios de pequenas glândulas uretrais mucosas, bem como vários recessos, ou lacunas, de dimensões variáveis e cujos orifícios se encontram dirigidos anteriormente. Um desses recessos, a lacuna magna, é maior que os restantes, encontrando-se situado no tecto da fossa navicular.
Próstata A próstata é uma glândula fibromuscular piramidal, que rodeia a uretra prostática, desde a base da bexiga, até à uretra membranosa. Esta glândula não apresenta uma verdadeira cápsula fibrosa, mas encontrase envolta por fáscia visceral, que contém tecido neurovascular. Esta fáscia adere firmemente à próstata, sendo contínua com o septo mediano e com numerosos septos fibromusculares, que dividem o tecido glandular em lóbulos indistintos. A próstata encontra-se a um nível inferior na pelve verdadeira, posteriormente ao bordo inferior da sínfise púbica e arco púbico e anteriormente ao recto uretral e ampola rectal. Devido ao facto de ser, de grosso modo piramidal, apresenta uma base, ou região vesical, superiormente, um ápice, inferiormente,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II bem como faces posterior, anterior e inferolaterais. A base da próstata mede cerca de 4cm transversalmente. A glândula apresenta 2cm e no seu conjunto, a próstata apresenta 2cm em diâmetro anteroposterior e 3cm em diâmetro vertical, apresentando uma massa de cerca de 8g, na juventude, e de cerca de 40g, após os primeiros 50 anos de vida. Superiormente, a base é adjacente ao colo da bexiga. O ápice é inferior, rodeando a junção das porções prostática e membranosa, da uretra posterior. Posteriormente ao ápice da próstata e ao esfíncter uretral interno, encontra-se o rectouretral, um músculo em forma de Y, que se origina desde o revestimento longitudinal externo do recto. Os membros superiores do Y estendem-se desde a parede rectal lateral, até à linha média, onde o rectouretral se insere no corpo perineal, ao nível da junção anorectal. A face anterior da próstata encontra-se no arco do púbis, do qual se encontra separada pelo complexo venoso dorsal (plexo de Santorini) e por tecido adiposo solto. Esta face é transversamente estreita e convexa, estendendo-se desde o ápice, até à base. Perto do seu limite superior, encontra-se ligada ao púbis, pelos ligamentos puboprostáticos. A uretra emerge desta face, anterosuperiormente ao ápice da glândula. As regiões anterior e lateral da próstata encontram-se cobertas, de cada lado, por uma camada de fáscia derivada da fáscia endopélvica, que é designada por fáscia prostática lateral. Esta fáscia é aderente medialmente à próstata, continuando-se posteriormente sobre a região lateral da próstata, feixes neurovasculares e o recto (fáscia rectal lateral) e passando distalmente sobre a uretra. O plexo venoso prostático encontra-se por entre esta extensão da fáscia endopélvica e a próstata. Anteroinferiormente, as fáscias pareital e visceral da próstata fundem-se e misturam-se com os ligamentos puboprostáticos. As faces inferolaterais da próstata encontram-se relacionadas com os músculos da parede lateral da pelve – as fibras anteriores do elevador do ânus envolvem a próstata pelo pubouretral, que se encontra separado da próstata por uma fina camada de tecido conjuntivo. A face posterior da próstata é transversalmente achatada e verticalmente convexa. Próximo do seu bordo superior (justavesical), encontra-se uma depressão, na região onde a próstata é penetrada pelos dois canais ejaculatórios. Inferiormente, encontra-se um ténue sulco mediano, que se considera, normalmente, como o indicador de uma separação em lobos lateral direito e lateral esquerdo. A face posterior encontra-se separada da gordura pré-rectal, no espaço pré-rectal e no recto, pela fáscia de Denonvillier, uma condensação de fáscia pélvica, que se desenvolve à conta da obliteração do espaço peritoneal retrovesical e de tecido areolar. Superiormente à fáscia de Denonviller, encontra-se o peritoneu do espaço retrovesical. Lateralmente, esta fáscia funde-se com a fáscia pélvica lateral, sendo que anteriormente à fáscia de Denonviller, esta passa a ser chamada de fáscia prostática lateral, enquanto posteriormente, designa-se por fásica rectal lateral. A próstata encontra-se atravessada pela uretra e canais ejaculatórios, contendo o utrículo prostático. A uretra entra na próstatra, próxima do seu bordo anterior e, normalmente, passa por entre o seu terço médio e posterior. Já os canais ejaculatórios passam anteroinferiormente, através da sua região posterior, para se abrirem na uretra prostática.
Anatomia regional da próstata Em situações normais, depois das 20 semanas de desenvolvimento fetal, a próstata apresenta três lobos – dois lobos laterais e um lobo mediano. Sob um ponto de vista anatómico, o tecido glandular da próstata pode ser subdividido em três zonas distintas – tecido periférico (constitui cerca de 70% do volume glandular), tecido central (25% do volume) e tecido transicional (5% do volume). O tecido não-
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II glandular preenche o espaço por entre as zonas periféricas, anteriormente à uretra prostática. A zona central rodeia os canais ejaculatórios, posteriormente à uretra pré-prostática, sendo mais ou menos cónica e apresentando o seu ápice no verumontano. A zona transicional encontra-se em torno da porção distal da uretra pré-prostática, imediatamente proximalmente ao ápice da zona central e aos canais ejaculatórios. Por fim, a zona periférica apresenta forma de chávena e envolve a zona transicional central e a uretra pré-prostática, excepto anteriormente, onde o espaço se encontra preenchido por estroma fibromuscular anterior. Glândulas simples, secretoras de muco encontram-se no tecido em torno da uretra pré-prostática, superiormente à zona de transição, encontrando-se rodeadas pelo esfíncter pré-prostático.
Pénis O pénis consiste numa raiz fixa ao períneo e num corpo, livre, que se encontra completamente envolto em pele.
Pele A pele do pénis é fina, encontrando-se fracamente ligada à túnica albugínea. Ao nível da coroa da glande, encontra-se dobrada, constituindo o prepúcio, que se sobrepõe à glande. A camada prepucial interna é confluente ao nível do colo, com a fina pele que cobre e adere firmemente à glande. Na região uretral da glande, uma prega mediana, o freio, passa desde a face profunda do prepúcio até à glande, imediatamente proximalmente ao orifício, sendo flanqueado por duas ténues fossas.
Raiz A raiz do pénis consiste em três massas de tecido eréctil, localizadas no triângulo urogenital, nomeadamente os dois pilares e o bulbo do pénis, que se encontram firmemente fixos ao arco púbico e à membrana perineal, respectivamente. Os pilares são as extremidades posteriores dos corpos cavernosos, enquanto o bulbo é a extremidade posterior e dilatada do corpo esponjoso. Cada pilar do pénis inicia-se posteriormente, como uma estrutura alongada, mas arredondada, ligada firmemente ao bordo evertido do ramo isquiopúbico e coberta pelo isquiocavernoso. Anteriormente, os pilares convergem, juntando-se, perto do bordo sinfisial inferior. A partir daqui, os dois pilares continuam-se como os corpos cavernosos do corpo do pénis.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Já o bulbo do pénis encontra-se por entre os pilares, encontrando-se firmemente ligado à região inferior da membrana perineal, a partir da qual recebe uma cobertura fibrosa. O bulbo é oval, quando seccionando, estreitando-se anteriormente para constituir o corpo esponjoso. A sua face superficial convexa encontra-se coberta pelo bulbosponjoso, enquanto a sua face profunda e achatada encontra-se perfurada superiormente, no seu centro, pela uretra, que a atravessa, para poder chegar até ao corpo esponjoso.
Corpo O corpo do pénis consiste em três massas de tecido eréctil – os corpos cavernosos esquerdo e direito e o corpo esponjoso (mediano), que são continuações dos pilares e bulbo do pénis, respectivamente. Aquando da erecção, estas estruturas tornam-se alargadas com sangue. De referir que o pénis é cilíndrico, quando flácido, mas torna-se triangular, quando erecto. A face que se encontra posterosuperiormente, durante a erecção, é designada por dorso do pénis, enquanto a região oposta constitui a sua face ventral. Corpos cavernosos Os corpos cavernosos constituem a maior parte do corpo do pénis. Estas estruturas partilham um envelope fibroso comum – a túnica albugínea, encontrando-se em próxima aposição, ao longo do seu percurso, embora se encontrem separados por um septo mediano fibroso. Ao nível da face uretral, as suas massas combinadas apresentam um largo sulco medial, adjacente ao corpo esponjoso, enquanto dorsalmente, um sulco similar, mas mais estreito, contém o feixe neurovascular dorsal. Os corpos terminam distalmente, ao nível da região proximal da glande do pénis, num cone arredondado, no qual cada corpo cavernoso apresenta uma pequena projecção terminal. A forte e fibrosa túnica albugínea consiste em estratos superficial e profundo. As fibras superficiais deslocam-se longitudinalmente, formando um único tubo, que rodeia ambos os corpos, enquanto as fibras profundas encontram-se arranjadas de forma circular e rodeiam cada corpo separadamente. As fibras profundas juntam-se para formar o septo mediano do pénis, que é espesso e completo, proximalmente, de modo a que os corpos cavernosos se possam encontrar separados proximalmente por 5-7cm. Distalmente, o septo mediano consiste numa série de feixes em forma de pente, que constituem o septo pectiniforme. Este septo encontra-se incompleto, permitindo a circulação de sangue cruzada, por entre ambos os corpos. Corpo esponjoso
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O corpo esponjoso do pénis encontra-se atravessado pela uretra, sendo adjacente ao sulco mediano, na face ureteral dos corpos cavernosos. O corpo esponjoso é cilíndrico, estreitando-se ligeiramente distalmente e encontrando-se rodeado pela túnica albugínea. Perto do final do pénis, este corpo expande-se para a glande do pénis, que se projecta dorsalmente sobre as terminações dos corpos cavernosos, apresentando uma ténue face côncava, à qual esses corpos se encontram fixos. A coroa da glande projecta-se a partir da base da glande, suspendendo o colo do pénis, uma estrutura obliquamente sulcada. Inúmeras glândulas prepuciais, na coroa da glande e colo do pénis, segregam o smegma sebáceo, que mantém a glande húmida e actua como um lubrificante, aquando do coito. A fossa navicular da uretra encontra-se na glande, abrindo-se através de uma fenda sagital, no seu ápice, ou próximo deste. Fáscia superficial do pénis A fáscia superficial do pénis (também designada clinicamente por camada dartos) é desprovida de gordura, consistindo em tecido conjuntivo solto invadido por fibras do músculo dartos do escroto. O seu folheto mais profundo encontra-se condensado, formando assim uma bainha fascial designada por fáscia de Buck. A fáscia superficial do pénis rodeia os corpos cavernosos e divide-se para envolver o corpo esponjoso, separando as veias dorsal profunda e superficial. Ao nível do colo do pénis, esta fáscia mistura-se com a cobertura fibrosa de todos os corpos. Proximalmente, a fáscia superficial do pénis é contínua com o músculo dartos e com a fáscia que cobre a região urogenital do períneo. Ligamentos suspensores do pénis O corpo do pénis é suportado por dois ligamentos – o ligamento fundiforme e o ligamento triangular, sendo estes contínuos com a sua fáscia e consistindo amplamente em fibras de elastina. O ligamento fundiforme parte da porção mais inferior da linha alba, dividindo-se em duas lamelas, que contornam o pénis e se unem, inferiormente, com o septo do escroto. Já o ligamento suspensor do pénis é profundo ao ligamento fundiforme, encontrando-se fixo superiormente à frente da sínfise púbica e misturando-se inferiormente com a fáscia do pénis, de cada lado.
Mnemónicas sobre aparelho genital masculino: - Conteúdos do cordão espermático: 3 artérias (testicular, cremastérica e para o canal deferente), 3 nervos (cremastérico, ramo genital do genitofemoral e inervação autónoma) e 3 outras coisas (plexo pampiniforme, canal deferente, linfáticos). - Camadas do escroto: "Some Days Eddie Can Irritate People Very Thourougly": Skin, Dartos layer, External spermatic fascia, Cremaster muscle, Internal spermatic fascia, Parietal tunica vaginalis, Visceral tunica vaginalis, Tunica albuginea
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Artérias ilíacas internas Cada artéria ilíaca interna apresenta cerca de 4cm de comprimento, iniciando-se na bifurcação ilíaca comum, ao nível do disco intervertebral lombo-sagrado e anteriormente à articulação sacro-ilíaca. Estas artérias descem posteriormente ao bordo superior do buraco isquiático maior, onde se dividem num tronco anterior, que continua em direcção à espinha isquiática, e num tronco posterior, que passa posteriormente ao buraco isquiático maior. Anteriormente à artéria ilíaca interna encontra-se o uréter e, nos indivíduos do sexo feminino, o ovário e a extremidade fimbriada da trompa de Falópio. A veia ilíaca interna, o tronco lombosagrado e a articulação sacroilíaca encontram-se posteriormente. Lateralmente à artéria, encontra-se a veia ilíaca externa, por entre a artéria e o psoas maior, bem como o nervo obturador, que se encontra inferiormente à veia. O peritoneu parietal encontra-se medialmente, separando-se do íleo terminal, à direita, e do cólon sigmóide, à esquerda. As tributárias da veia ilíaca interna são também mediais a esta artéria. Nos fetos, a artéria ilíaca interna apresenta o dobro do tamanho da externa, sendo a continuação directa da artéria ilíaca comum. O tronco principal ascende na parede abdominal anterior, até ao umbigo, convergindo com a artéria contralateral, sendo que as duas artérias se deslocam através do umbigo para entrar no cordão umbilical como artérias umbilicais.
Tronco posterior Os ramos do tronco posterior são a artéria iliolombar, as artérias sagradas laterais e as artérias glúteas superiores.
Artéria iliolombar A artéria iliolombar é o primeiro ramo do tronco posterior, ascendendo lateralmente e anteriormente à articulação sacroilíaca e ao tronco lombo-sagrado. Esta artéria encontra-se posterior ao nervo obturador e aos vasos ilíacos externos e atinge o bordo medial do psoas maior, dividindo-se posteriormente a este músculo, num ramo lombar e num ramo ilíaco. O ramo lombar irriga o psoas maior e o quadrado lombar e anastomosa-se com a quarta artéria lombar. Este ramo envia um pequeno ramo espinhal, através do buraco intervertebral, por entre L5 e S1, para irrigar a cauda equina. O ramo ilíaco, por sua vez, irriga o ilíaco. Por entre o músculo e o osso, este ramo anastomosa-se com os ramos ilíacos da artéria obturadora.
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Artérias sagradas laterais As artérias sagradas laterais são normalmente duplas, mas caso seja um único tronco, este divide-se rapidamente em ramos superior e inferior. A artéria superior, de maiores dimensões, passa medialmente para o primeiro ou segundo buracos sagrados anteriores, irrigando as vértebras sagradas e conteúdos do canal sagrado, abandonando depois o sacro, através do buraco dorsal correspondente, para irrigar a pele e músculos, que se encontram dorsais ao sacro. Já a artéria inferior cruza obliquamente anteriormente ao piriforme e aos ramos espinhais sagrados anteriores, descendo depois lateralmente à cadeia do simpático, para se anastomosar com a sua homóloga e com a artéria sagrada mediana, anteriormente ao cóccix. Os seus ramos entram nos buracos sagrados anteriores e encontram-se distribuídos da mesma maneira, que os ramos da artéria superior.
Artéria glútea superior A artéria glútea superior é o maior ramo da artéria ilíaca interna, formando a continuação principal do seu tronco posterior. Esta artéria desloca-se posteriormente, por entre o tronco lombo-sagrado e o primeiro ramo sagrado, ou por entre o primeiro e o segundo ramo, voltando-se depois ligeiramente inferiormente, abandonando a pelve, através do buraco isquiático maior, sobre o piriforme e dividindose em ramos superficial e profundo. Na pelve, esta artéria irriga o piriforme, o obturador interno e dá um ramo nutritivo para o íleo.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O ramo superficial entra na face profunda do glúteo máximo. Os seus vários ramos irrigam este músculo e anastomosam-se com os ramos glúteos inferiores, enquanto outros perfuram a fixação medial tendinosa deste músculo, para irrigar a pele sobre o sacro, onde se anastomosam com os ramos posteriores das artérias sagradas laterais. Já o ramo profundo da artéria glútea superior passa por entre o glúteo médio e o osso, dividindo-se depois em ramos superior e inferior. O ramo superior contorna o bordo superior do glúteo mínimo, anteriormente à espinha ilíaca superior anterior e anastomosando-se com a artéria ilíaca circunflexa profunda e com o ramo ascendente da artéria femoral circunflexa lateral. Por fim, o ramo inferior desloca-se obliquamente através do glúteo mínimo, irrigando-o. Este ramo anastomosa-se com a artéria femoral circunflexa lateral.
Tronco anterior Os ramos do tronco anterior da artéria ilíaca interna incluem os ramos vesical superior, vesical inferior, rectal médio, vaginal, obturador, uterino, pudendo interno e glúteo inferior.
Artéria vesical superior A artéria vesical superior é o primeiro ramo grande do tronco anterior, encontrando-se na parede lateral da pelve, imediatamente inferiormente ao bordo da pelve. Esta artéria desloca-se anteroinferiormente, medialmente ao periósseo da face posterior do púbis, irrigando a extremidade distal do uréter, a bexiga, a extremidade proximal do canal deferente e as vesículas seminais. Esta artéria também origina a artéria vesical, nos fetos, que se mantém no adulto como um cordão fibroso, o ligamento umbilical mediano. Este vaso mantém-se por vezes, como uma pequena artéria que irriga o umbigo.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II As artérias para os canais deferentes, que partem da artéria vesical superior, na maior parte dos casos, anastomosam-se com as artérias testiculares, para irrigar os epidídimos e os testículos.
Artéria vesical inferior A artéria vesical inferior pode partir como um ramo comum com a artéria rectal média. Nos indivíduos do sexo feminino, esta artéria encontra-se por vezes substituída pela artéria vaginal. A artéria vesical inferior irriga a base da bexiga, a próstata, as vesículas seminais, a porção inferior do uréter e, por vezes, os canais deferentes. Os ramos prostáticos desta artéria por vezes comunicam ao longo da linha média e podem ser uretrais (caso entrem na junção prostatovesical, sobretudo posteriormente) ou capsulares.
Artéria rectal média A artéria rectal média é por vezes múltipla e pode ser pequena. Esta artéria desloca-se pelas coberturas fasciais laterais do mesorecto. Nos indivíduos do sexo masculino esta artéria parte, por vezes, perto ou com uma origem comum à da artéria vesical inferior. Quando se encontra presente, a artéria rectal média irriga o músculo do recto médio e inferior, formando poucas anastomoses com as artérias rectais superiores e inferiores.
Artéria vaginal A artéria vaginal substitui, por vezes, a artéria vesical inferior, nos indivíduos do sexo feminino. Esta artéria pode partir perto da artéria uterina, deslocando-se depois em direcção à vagina, onde se anastomosa com a sua homóloga contralateral e forma os vasos longitudinais anteriores e posteriores, denominados por “artérias ázigos da vagina”, que se anastomosam superiormente com os ramos vaginais das artérias uterina. A artéria vaginal irriga a uretra, o útero e a vagina.
Artéria obturadora A artéria obturadora desloca-se anteroinferiormente, desde o tronco anterior na parede pélvica lateral até à porção superior do buraco obturador. Esta artéria abandona a pelve, através do canal obturador e divide-se em ramos anterior e posterior. Na pelve, relaciona-se lateralmente com a fáscia sobre o obturador interno e é cruzada na sua região medial pelo uréter e, nos indivíduos do sexo masculino, pelo canal deferente. Em mulheres nulíparas, o ovário encontra-se medialmente à artéria obturadora. Superiormente à artéria, encontramos o nervo obturador e, inferiormente, a veia obturadora. Na pelve, a artéria obturadora dá ramos ilíacos para a fossa ilíaca, que irrigam o osso ilíaco e o músculo com o mesmo nome, anastomosando-se com a artéria iliolombar. A artéria obturadora dá ainda um ramo vesical, que se desloca medialmente à bexiga e, por vezes, substitui o ramo vesical inferior da artéria ilíaca interna. Um ramo púbico normalmente parte imediatamente antes da artéria obturadora abandonar a pelve e ascende sobre o púbis para se anastomosar com o seu homólogo contralateral e com o ramo púbico da artéria epigástrica inferior.
Artéria uterina A artéria uterina é um ramo adicional dos indivíduos do sexo feminino. Esta artéria desloca-se medialmente e ligeiramente anteriormente ao elevador do ânus, até ao bordo inferior do ligamento largo. Esta artéria passa então medialmente por entre os seus folhetos. A cerca de 3cm de distância da linha média, a artéria uterina cruza superior e anteriormente ao uréter e passa sobre o fórnix lateral da vagina, até à junção cervico-uterina, onde se ramifica. O seu ramo principal ascende então de forma
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II tortuosa, ao longo do útero, voltando-se lateralmente, inferiormente às trompas de Falópio, para terminar anastomosando-se com a artéria ovárica, na região do hilo ovárico (dessa forma, a artéria uterina irriga os dois-terços mediais da trompa de Falópio, enquanto a artéria ovárica irriga o terço lateral). Outro ramo desce para irrigar o cérvix e anastomosa-se com ramos da artéria vaginal, para formar as artérias ázigos da vagina, que descem anteriormente e posteriormente à vagina. De referir que, a artéria uterina irriga o útero, a vagina, os dois-terços mediais das trompas de Falópio e os ovários e que, ao nível do útero, cada artéria uterina dá imensos pequenos ramos, que entram na parede uterina, dividem-se e deslocam-se circunferencialmente, formando grupos de artérias arqueadas anteriores e posteriores, que se ramificam e estreitam, originando depois as artérias heicinas.
Artéria pudenda interna A artéria pudenda interna parte imediatamente inferiormente à origem da artéria obturadora, descendo lateralmente ao bordalete inferior do buraco isquiático maior, por onde abandona a pelve, por entre o piriforme e o coccígeo. A artéria pudenda interna entra então na região glútea, curvando-se em torno do dorso da espinha isquiática, para entrar no períneo, pelo buraco isquiático menor. Na pelve, a artéria pudenda interna cruza o plexo sagrado e a artéria glútea inferior, anteriormente ao piriforme. Posteriormente à espinha isquiática, a artéria pudenda interna encontra-se coberta pelo glúteo máximo, medialmente ao nervo pudendo e lateralmente ao nervo para o obturador interno. Na pelve e região glútea, a artéria pudenda interna dá vários pequenos ramos, que irrigam os músculos e nervos adjacentes. No períneo, a artéria pudenda interna desloca-se na parede lateral da fossa ísquio-rectal, no canal pudendo, com as veias e o nervo pudendo. O canal pudendo ou de Alcock é formado por tecido conjuntivo que se liga os vasos e o nervo à face perineal da fáscia sobre o obturador interno, encontrando-se a cerca de 4cm superiormente ao limite inferior da tuberosidade isquiática. À medida que a artéria se aproxima do bordo do ramo isquiático, esta continua-se superior ou inferiormente à membrana perineal, ao longo do bordo medial do ramo púbico inferior, terminando posteriormente ao ligamento púbico inferior. Nos indivíduos do sexo masculino, a artéria pudenda interna, distalmente à artéria perineal dá um ramo para o bulbo do pénis, antes de se dividir na artéria profunda (cavernosa) do pénis e na artéria dorsal do pénis. Devido à sua distribuição, a artéria pudenda interna, distalmente ao seu ramo perineal é
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II designada por artéria do pénis. A artéria do bulbo irriga o corpo esponjoso, enquanto a artéria profunda do pénis irriga os corpos cavernosos de cada lado. Por outro lado, a artéria dorsal do pénis desloca-se na região dorsal do pénis, dando ramos circunflexos para os corpos cavernosos e para o corpo esponjoso, que terminam anastomosando-se no sulco coronal e irrigando a glande e a pele que se lhe sobrepõe. Nos indivíduos do sexo feminino, a artéria para o bulbo encontra-se distribuída para o tecido eréctil do bulbo vestibular e para a vagina. A artéria cavernosa, por sua vez, é muito pequena, irrigando os corpos cavernosos do clítoris. Já a artéria dorsal irriga a glande e o prepúcio do clítoris. Os ramos da artéria pudenda interna derivam por vezes de uma artéria pudenda acessória, que é normalmente um ramo da artéria pudenda, antes de esta sair da pelve.
Artéria rectal inferior A artéria rectal inferior parte imediatamente após a artéria pudenda interna entrar no canal na parede lateral da fossa ísquio-rectal e desloca-se anteromedialmente, através do tecido adiposo da fossa ísquiorectal, para chegar à porção profunda do esfíncter anal externo. Por vezes, a artéria ramifica-se, antes de chegar ao esfíncter. Artéria perineal A artéria perineal é um ramo da artéria pudenda interna, perto da extremidade anterior do canal pudendo e desloca-se através da membrana perineal. Nos indivíduos do sexo masculino, a artéria
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II perineal aproxima-se do escroto no espaço perineal superficial, por entre o bulbosponjoso e o isquiocavernoso. Um pequeno ramo transverso passa medialmente, inferiormente ao músculo perineal transverso superficial, para se anastomosar com a sua homóloga contralateral e com as artérias escrotal posterior e rectal inferior. Esta artéria irriga os músculos transversos do períneo, o corpo perineal e a fixação posterior do bulbo do pénis. As artérias escrotais posteriores são normalmente os ramos terminais da artéria perineal, mas podem também partir do seu ramo transverso. Estes ramos encontram-se distribuídos para a pele do escroto e para o músculo dartos, podendo irrigar os músculos do períneo. Nos indivíduos do sexo feminino, a artéria perineal desloca-se num percurso quase idêntico ao descrito nas artérias dos indivíduos do sexo masculino, dando também pequenos ramos – as artérias escrotais posteriores encontram-se substituídas pelas artérias labiais posteriores. Artéria do bulbo do pénis A artéria do bulbo do pénis é pequena, mas larga, deslocando-se medialmente através do músculo transverso profundo do períneo, até ao bulbo do pénis, que penetra. Esta artéria irriga o corpo esponjoso e a glândula bulbouretral. Artéria cavernosa (artéria profunda) do pénis A artéria cavernosa é um ramo terminal da artéria pudenda interna, passando através da membrana perineal, entrando no pilar do pénis de cada lado e deslocando-se ao longo do corpo cavernoso, para irrigar o tecido eréctil. Dentro do corpo, as artérias cavernosas dividem-se em ramos que terminam, quer directamente em redes capilares que se abrem em espaços cavernosos, ou se tornam contorcidas e algo dilatadas, que também se abrem nos espaços cavernosos. Estas últimas artérias chamam-se artérias helicinas e são mais abundantes nas regiões posteriores dos corpos cavernosos.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Artéria dorsal do pénis A artéria dorsal do pénis é o outro ramo terminal da artéria pudenda interna, deslocando-se por entre os pilares do pénis e a sínfise púbica, para depois perfurar o ligamento suspensor do pénis e depois se deslocar ao longo do dorso até à glande, onde termina em vários ramos para a glande e prepúcio. No pénis, a artéria dorsal do pénis encontra-se profunda à fáscia de Buck, por entre os nervos dorsais e a veia dorsal profunda, sendo esta última estrutura a mais medial. A artéria dorsal do pénis irriga a pele do pénis, por ramos que se deslocam através da camada dartos. Esta artéria dá também ramos circunflexos que se deslocam ao longo do corpo do pénis, inicialmente profundamente e depois dentro da fáscia de Buck, para irrigar a túnica albugínea do corpo cavernoso, anastomosando-se na túnica com o sistema cavernoso. Artéria uretral No sexo masculino, a artéria uretral parte da artéria pudenda interna, ou da artéria peniana comum, imediatamente inferiormente à membrana perineal e desloca-se através do corpo esponjoso, para chegar à glande. Esta artéria irriga a uretra e o tecido eréctil à sua volta. Para além disso, a uretra é irrigada pela artéria dorsal do pénis, através dos seus ramos circunflexos, de cada lado, e dos seus ramos
terminais, por via de ramos que se deslocam desde a glande de forma retrógrada. Nos indivíduos do sexo feminino, a uretra é irrigada pela artéria vaginal.
Artéria glútea inferior A artéria glútea inferior é o maior ramo terminal do tronco ilíaco interno anterior e irriga, sobretudo, a nádega e a coxa. Esta artéria desce posteriormente, anterior ao plexo sagrado e ao piriforme, mas posterior à artéria pudenda interna. Esta artéria passa por entre o primeiro e o segundo, ou o segundo e o terceiro ramos do nervo espinhal sagrado anterior e, depois, por entre o piriforme e o coccígeo, deslocando-se através da porção mais inferior do buraco isquiático maior, para chegar à região glútea. A artéria glútea inferior desloca-se então inferiormente, por entre o trocânter maior e a tuberosidade isquiática, acompanhando os nervos cutâneo posterior da coxa e ciático, profundamente ao glúteo máximo. Esta artéria continua-se inferiormente para a coxa, irrigando a pele e anastomosando-se com os ramos das artérias perfurantes. Para além dos ramos musculares, nos indivíduos do sexo masculino, a artéria glútea inferior pode dar vasos para as vesículas seminais e para a próstata.
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Veias ilíacas internas A veia ilíaca interna é formada pela convergência de várias veias, superiormente ao buraco isquiático maior. Esta veia não apresenta os troncos previsíveis e os ramos da artéria ilíaca interna, mas as suas tributárias drenam os mesmos territórios. As veias ilíacas internas ascendem posteromedialmente à artéria ilíaca interna, para se juntar à veia ilíaca externa, formando a veia ilíaca comum, ao nível do bordo da pelve, anteriormente à porção inferior da articulação sacroilíaca, encontrando-se cobertas anteromedialmente por peritoneu parietal. As suas tributárias são as veias glútea, pudenda interna e obturadora, que se originam fora da pelve, as veias sagradas laterais, que se deslocam desde a face anterior do sacro e as veias rectal média, vesical, uterina e vaginal, que se originam nos plexos venosos das vísceras pélvicas.
Veias glúteas superiores As veias glúteas superiores são as veias comitantes da artéria glútea superior recebendo tributárias correspondentes aos ramos da artéria glútea superior e entrando na pelve, por via do buraco isquiático maior, superiormente ao piriforme. Estas veias juntam-se à veia ilíaca interna, normalmente por um tronco comum.
Veias glúteas inferiores As veias glúteas inferiores são as veias comitantes da artéria glútea inferior. Estas iniciam-se proximalmente e posteriormente na coxa, onde se anastomosam com as veias circunflexa femoral medial e com a primeira perfurante, para entrar na pelve, inferiormente no buraco isquiático maior, juntando-se para formar um vaso que se abre na porção inferior da veia ilíaca interna.
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Veia obturadora A veia obturadora inicia-se na região adutora proximal, entrando na pelve, por via do buraco obturador. Desloca-se posteriormente e superiormente, ao nível da parede pélvica lateral, inferiormente à artéria obturadora e por entre o uréter e a artéria ilíaca interna, para terminar na veia ilíaca interna. Por vezes esta veia encontra-se substituída por uma veia púbica alargada, que se junta à veia ilíaca externa.
Veias sagradas laterais As veias sagradas laterais acompanham as artérias sagradas laterais, encontrando-se interligadas por um plexo venoso sagrado.
Veia rectal média A veia rectal média inicia-se no plexo venoso rectal e drena o recto e o mesorecto. Esta veia apresenta um tamanho variável, deslocando-se lateralmente na superfície pélvica do elevador do ânus, para terminar na veia ilíaca interna. A veia rectal média por vezes recebe tributárias da bexiga e da próstata e vesícula seminal (nos indivíduos do sexo masculino), ou da região posterior da vagina (nos indivíduos do sexo feminino).
Veias pudendas internas As veias pudendas internas são comitantes da respectiva artéria, unindo-se como um único vaso, que termina na veia ilíaca interna. As suas tributárias incluem as veias rectais inferiores, veias do bulbo do pénis e do escroto (nos indivíduos do sexo masculino) e veias dos lábios e clítoris (nos indivíduos do sexo feminino). Veias dorsais do pénis As veias que drenam os corpos cavernosos abandonam estas estruturas ao passar obliquamente através da túnica albugínea, por via de uma série de pequenos vasos – as veias sub-tunicais. Estas drenam para as veias circunflexas, que se deslocam circunferencialmente, em torno do corpo do pénis, desde a sua região ventral, onde recebem tributárias do corpo esponjoso, até à sua região dorsal, onde drenam para a veia dorsal profunda. As veias dorsais (superficial e profunda) são ímpares. A veia dorsal superficial drena o prepúcio e a pele do pénis, deslocando-se posteriormente no tecido subcutâneo e inclinandose, quer para a direita, que para a esquerda, antes de se abrir numa das veias pudendas externas. Já a veia dorsal profunda encontra-se profundamente à fáscia de Buck. Esta veia drena a glande e os corpos cavernosos, deslocando-se posteriormente na linha média, por entre as artérias dorsais. Perto da raiz do pénis, esta artéria passa profundamente ao ligamento suspensor e através de um intervalo, por entre o ligamento púbico arqueado e o bordo anterior da membrana perineal. A veia dorsal profunda divide-se em ramos direito e esquerdo, que se ligam inferiormente à sínfise púbica, às veias pudendas internas, entrando, em última análise, no plexo prostático.
Veias vaginais e uterinas As veias vaginais, uma de cada lado, formam-se a partir de plexos laterais, que se ligam aos plexos uterino, vesical e rectal e drenam nas veias ilíacas internas. Já as veias uterinas estendem-se lateralmente nos ligamentos largos, deslocando-se adjacentemente às artérias e passando sobre os
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II ureteres, drenando nas veias ilíacas internas. Os plexos uterino e vaginal podem representar vias de drenagem venosa colateral para o membro inferior.
Veias rectais médias e plexo venoso rectal As veias rectais médias passam ao longo das artérias rectais médias para drenar na divisão anterior da veia ilíaca interna, na parede lateral da pelve. Estas veias participam no plexo venoso rectal, que rodeia o recto, estando anteriormente ligado ao plexo vesical (nos indivíduos do sexo masculino) ou ao plexo uterovaginal (nos indivíduos do sexo feminino). Este plexo consiste numa porção interna, por debaixo do epitélio anal e do epitélio rectal; e numa porção externa, por fora da parede muscular. No canal anal, o plexo interno apresenta dilatações longitudinais, ligadas por ramos transversos, em círculos imediatamente superiores às valvas anais. A porção inferior do plexo venoso externo é drenada pela veia rectal inferior, para a veia pudenda interna, enquanto a porção média é drenada por uma ou mais veias rectais médias para a veia ilíaca interna. Por fim, a porção mais superior deste plexo é drenada pela veia rectal superior, para a veia mesentérica inferior.
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Peritoneu pélvico O peritoneu parietal da face posterior da parede abdominal anterior e o peritoneu que delimita a parede abdominal posterior continuam-se para a pelve, formando o peritoneu pélvico. O peritoneu pélvico envolve as superfícies das vísceras pélvicas verdadeiras e as paredes laterais da pelve, embora indivíduos de sexos diferentes registem diferenças consideráveis a este nível.
Peritoneu da pelve masculina Nos indivíduos do sexo masculino, o peritoneu da parede abdominal inferior esquerda reflecte-se a partir da junção do cólon sigmóide com a face anterolateral do recto, para delimitar o bordo e a face interna superior da pelve verdadeira. O peritoneu passa inferiormente para a pelve verdadeira, encontrando-se sobre a face anterior do recto, que depois se torna um órgão extraperitoneal. Lateralmente, o peritoneu encontra-se reflectido para as paredes laterais da pelve, para formar as fossas para-rectais esquerda e direita, cujo tamanho varia, de acordo com o grau de distensão do recto. O peritoneu encontra-se reflectido anteriormente, desde a face anterior do recto, sobre os pólos superiores das vesículas seminais e até à face posterior da bexiga, formando o espaço recto-vesical. O espaço recto-vesical é delimitado lateralmente pelas pregas sacro-genitais - pregas peritoneais que se estendem desde os lados da bexiga, até à região anterior do sacro. Às extremidades anteriores das pregas sacro-genitais pode se juntar uma crista, que separa o espaço recto-vesical principal de uma fossa média. O peritoneu cobre a face superior da bexiga e forma uma fossa para-vesical de cada lado, delimitada lateralmente por uma crista de peritoneu, que contém o canal deferente. O tamanho das fossas paravesicais depende do volume de urina na bexiga – quando a bexiga se encontra vazia, uma prega vesical transversa divide cada fossa em duas. Por entre as fossas para-vesical e pararectal, os ureteres e os vasos ilíacos internos podem causar ligeiras elevações no peritoneu. Desde o ápice da bexiga, o peritoneu estende-se superiormente, ao longo da face posterior da parede abdominal anterior inferior até ao umbigo. Quando a bexiga se distende, o peritoneu deixa de estar em contacto com a parede abdominal anterior
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II inferior, de tal modo que a face anterior da bexiga fica em contacto directo com a face posterior da área mediana inferior da parede abdominal anterior.
Peritoneu da pelve feminina Nos indivíduos do sexo feminino, o peritoneu cobre a porção superior do recto, descendo sobre a face anterior desta porção do intestino grosso. O limite lateral das fossas para-rectal e para-vesical é o peritoneu que cobre o ligamento redondo do útero. Dessa forma, o peritoneu do recto reflecte-se anteriormente na face posterior do fórnix posterior da vagina e útero, o que leva à formação do espaço recto-uterino. O peritoneu cobre o fundo do útero, na sua face anterior, até à sua junção com o corpo do útero e cérvix, a partir do qual se encontra reflectido anteriormente, até à face superior da bexiga, formando o espaço vesico-uterino. O peritoneu encontra-se reflectido a partir da bexiga, até à face posterior da parede abdominal anterior, tal como acontece nos indivíduos do sexo masculino. Nos indivíduos do sexo feminino encontramos pregas rectouterinas marginais, correspondentes às pregas sacro-genitais apresentadas pelos indivíduos do sexo masculino. Estas pregas passam posteriormente até ao sacro, desde os lados do cérvix, lateralmente ao recto. O peritoneu que se reflecte a partir das faces uterinas anterior e posterior, para as paredes pélvicas laterais, constitui o ligamento largo do útero. Este apresenta folhetos anteroinferior e posterosuperior, que são contínuos, ao nível do bordo superior do ligamento. O ligamento largo do útero estende-se desde os lados do útero até às paredes pélvicas laterais, contendo as trompas de Falópio, ao nível do bordo superior, e os ovários, ao nível do seu folheto posterior. Inferiormente, este ligamento é contínuo com o peritoneu parietal pélvico lateral. Por entre as cristas formadas pelas artérias umbilicais obliteradas e o uréter, o peritoneu forma uma ténue depressão na cavidade pélvica lateral, a qual é designada por fossa ovárica. Esta fossa, na qual se encontra o ovário em mulheres nulíparas, encontra-se posteriormente à fixação lateral do ligamento largo.
Ligamentos uterinos O útero encontra-se ligado por vários ligamentos, sendo alguns ligamentos verdadeiros, que dão suporte ao útero, enquanto outros são fibrosos e não suportam o útero. Ainda há ligamentos que são simples pregas de peritoneu. O peritoneu parietal reflecte-se sobre o tracto genital superior, produzindo
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II pregas peritoneais laterais, anterior (uterovesical) e posterior (rectovaginal). As pregas laterais constituem os ligamentos largos. A prega peritoneal anterior ou uterovesical consiste em peritoneu, reflectido para a bexiga, desde a junção entre o cérvix e o corpo do útero. Já a prega rectovaginal ou peritoneal posterior consiste em peritoneu reflectido desde o fórnix vaginal posterior, até à frente do recto, sendo assim criado o espaço de Douglas ou recto-uterino profundo. O espaço de Douglas é delimitado anteriormente pelo útero, cérvix supra-vaginal e fórnix vaginal posterior. Posteriormente, encontramos o recto e, lateralmente, os ligamentos útero-sagrados. Ligamentos largos do útero As pregas laterais, ou ligamentos largos, estendem-se a partir de cada lado do útero, até às paredes pélvicas laterais, onde se tornam contínuas com o peritoneu que cobre essas paredes. O seu bordo superior é livre e o seu bordo inferior é contínuo com o peritoneu sobre a bexiga, recto e paredes laterais da pelve. Os bordos são contínuos um com o outro, ao nível do bordo livre, por via do fundo uterino e divergem, inferiormente às faces superiores dos elevadores do ânus. A trompa de Falópio encontra-se no bordo superior livre dos ligamentos largos. O ligamento largo divide-se numa mesosalpinge, num mesovário, posterior e num mesométrio, inferior. A mesosalpinge encontra-se fixa superiormente à trompa de Falópio e, posteroinferiormente, ao mesovário. Superior e lateralmente, encontra-se fixa ao ligamento suspensor do ovário e, medialmente, encontra-se fixa ao ligamento ovárico. A fímbria ovárica projecta-se a partir da sua extremidade lateral livre. Por entre o ovário e a trompa de Falópio, a mesosalpinge contém anastomoses vasculares, por entre os vasos uterinos e ováricos, o epooforon e o paraooforon. O mesovário projecta-se desde a região posterior do ligamento largo e encontra-se fixo ao hilo do ovário, transportando vasos e nervos para o ovário. Esta é a menor porção das pregas laterais. O mesométrio é a parte mais larga do ligamento largo, estendendo-se desde o pavimento pélvico até ao ligamento ovárico e ao corpo uterino. A artéria uterina passa por entre os seus dois folhetos peritoneais, tipicamente a 1,5 cm lateralmente ao cérvix – esta artéria cruza o uréter a pequena distância da sua origem. Por entre a pirâmide formada, o mesométrio contém os vasos e nervos ováricos, encontrados dentro do ligamento suspensor do ovário (ligamento infunibulopélvico). Este ligamento continua-se lateralmente sobre os vasos ilíacos externos, como uma prega distinta. O mesométrio também envolve à porção proximal do ligamento redondo do útero, bem como músculo liso e tecido conjuntivo liso.
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Ligamento redondo do útero Os ligamentos redondos são feixes estreitos e achatados, com entre 10 e 12 cm de comprimento. Cada um destes ligamentos se encontra fixo medialmente à porção superior do útero, imediatamente inferior e anteriormente aos cornos laterais. A partir daqui, cada ligamento passa lateralmente dentro da porção superior do ligamento largo, até às parede laterais da pelve. No início da artéria epigástrica inferior, o ligamento redondo entra no anel inguinal profundo, atravessando o canal inguinal e dividindo-se em filamentos que se misturam com o tecido conjuntivo em seu redor, antes de terminar no monte do púbis, superiormente aos lábios maiores. Perto do útero, o ligamento redondo contém uma quantidade considerável de músculo liso, que diminui gradualmente, de tal modo que a porção terminal é puramente fibrosa. O ligamento redondo contém vasos sanguíneos, nervos e linfáticos. Nos fetos, uma projecção de peritoneu, a apófise vaginal, é transportada com o ligamento redondo por uma curta distância até ao canal inguinal. Esta projecção encontra-se normalmente obliterada nos indivíduos adultos, embora possa estar presente, inclusive, em indivíduos idosos. No canal inguinal, o ligamento recebe as mesmas coberturas que o cordão espermático, embora estas sejam mais finas e se misturem com o ligamento em si.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Ligamentos útero-sagrados, cervicais transversos e pubocervical Os ligamentos útero-sagrados são pregas recto-uterinas que contêm tecido fibroso e músculo liso. Estes ligamentos passam posteriormente, desde o cérvix e corpo do útero, por ambos os lados do recto, e terminam fixando-se anteriormente ao sacro. Os ligamentos cervicais transversos (também designados por ligamentos cardinais ou ligamentos de Mackenrodt) estendem-se desde os lados do cérvix e fórnices laterais da vagina, para se fixarem extensivamente na parede pélvica. Ao nível do cérvix, algumas fibras interdigitam-se com fibras dos ligamentos útero-sagrados. As fibras dos ligamentos cervicais transversos são contínuas com o tecido fibroso em torno das porções inferiores dos ureteres e vasos sanguíneos pélvicos. Já a fibras do ligamento pubocervical passam anteriormente, desde a região anterior do cérvix e porção da superior da vagina, para divergir em torno da uretra. Estas fibras ficam-se na região posterior dos ossos púbicos.
Ligamentos peritoneais e ligamentos de suporte do ovário O ligamento suspensor do ovário é também designado por ligamento infundibulopélvico, sendo uma prega peritoneal, que está ligada à porção superior da face lateral do ovário. Este ligamento contém os vasos e nervos ováricos. Do lado direito, o ligamento infundibulopélvico encontra-se ligado a uma prega de peritoneu, que se encontra posterior e inferior ao apêndice. Do lado esquerdo, a ligação peritoneal encontra-se a um nível mais elevado que do lado direito, sendo lateral à junção dos cólons descendente e sigmóide. À medida que o ligamento infundibulopélvico se junta ao peritoneu que cobre o psoas maior, passa superiormente sobre os vasos ilíacos externos, nervo genitofemoral e uréter. O ligamento ovárico, por sua vez, liga a extremidade uterina (inferomedial) do ovário ao ângulo lateral do útero, posteroinferiormente às trompas de Falópio. Este ligamento encontra-se no folheto posterior do ligamento largo do útero e contém células de músculo liso. Este ligamento é contínuo com o bordo medial do ligamento redondo, sendo ambos remanescentes do gubernáculo. Por fim, o mesovário é uma pequena prega peritoenal, que liga o ovário à região posterior do ligamento largo. O mesovário transporta vasos e nervos sanguíneos até ao hilo ovárico. O tubo uterino arqueia-se sobre o ovário e ascende em relação ao seu bordo mesovárico, curvando-se depois sobre a sua extremidade tubal e passa inferiormente no seu bordo posterior, livre, e à sua face medial.
Ligamentos da bexiga A bexiga encontra-se ancorada inferiormente por condensações de fáscia pélvica que a fixam ao púbis, às paredes laterais da pelve e ao recto. Em ambos os sexos, os ligamentos pubovesicais, constituídos por tecido fibromuscular, estendem-se a partir do colo da bexiga, até à região inferior do púbis. Estes ligamentos derivam do músculo detrusor (músculo liso da parede da bexiga). Nos indivíduos do sexo feminino, os ligamentos pubovesicais constituem as extensões superiores dos ligamentos pubouretrais, enquanto nos indivíduos do sexo masculino, uma extensão do músculo detrusor estende-se sobre a face anterior da próstata e condensa-se distalmente e anteriormente, formando os ligamentos puboprostáticos. Os ligamentos pubovesicais encontram-se de cada lado do plano mediano, deixando um hiato localizado ao nível da linha média e através do qual, passam numerosas veias pequenas. Foram também descritos outros ligamentos em relação com a base da bexiga, nomeadamente os ligamentos vesicais posterior e lateral, nos indivíduos do sexo masculino e os ligamentos cardinal e útero-sagrado, nos indivíduos do
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II sexo feminino. De facto, estes não são verdadeiros ligamentos, na medida em que consistem somente em condensações de tecido conjuntivo, em torno de estruturas neurovasculares importantes. O ápice da bexiga encontra-se ligado ao umbigo pelos remanescentes do úraco, que forma o ligamento umbilical mediano. Este é composto por fibras musculares longitudinais, que derivam do músculo detrusor e torna-se mais fibroso, em direcção ao umbigo. A partir da face superior da bexiga, o peritoneu apresenta uma série de pregas – os “falsos” ligamentos da bexiga. Anteriormente, existem três pregas, a prega umbilical mediana sobre o ligamento umbilical mediano (úraco) e duas pregas umbilicais mediais sobre as artérias umbilicais obliteradas. De referir que, os vasos epigástricos inferiores são laterais a essas pregas, na parede abdominal anterior.
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6. Sistema nervoso autónomo Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Sistema Nervoso Autónomo O Sistema Nervoso Autónomo é entendido como aquele que inerva glândulas, músculo liso e músculo cardíaco, sendo por vezes designado por “Involuntário”, na medida em que as estruturas abrangidas não parecem estar sob controlo voluntário. Contudo, existem músculos lisos, que sendo inervados pelo sistema nervoso autónomo, participam em actos voluntários (a bexiga, por exemplo, aquando do acto de urinar, ou o músculo ciliar, aquando da focagem da lente do olho). Por outro lado, vários músculos, classificados histologicamente como “voluntários”, podem não se contrair por vontade própria, nomeadamente os constritores da faringe. No sistema nervoso autónomo temos a presença de dois conjuntos de neurónios – os neurónios préganglionares, provenientes do sistema nervoso central e que vão sinaptizar, ao nível dos gânglios (que se localizam fora do sistema nervoso central) com neurónios pós-ganglionares, que se vão assegurar da inervação das vísceras. O sistema nervoso autónomo encontra-se distribuído pelo corpo, sendo que a maior parte das suas células encontra-se disposta em gânglios, embora noutras situações, particularmente associadas ao tracto digestivo e vasos sanguíneos, as células nervosas formam plexos autónomos, um arranjo de fibras nervosas pré-ganglionares, pós-ganglionares e sensitivas. O sistema nervoso autónomo é divisível em componentes simpático, parassimpático e entérico, diferentes na resposta que produzem, do modo como estão distribuídas as fibras neuronais e dos neurotransmissores envolvidos.
Sistema nervoso parassimpático Relativamente ao sistema parassimpático, temos neurónios pré-ganglionares muito longos, que sinaptizam muito próximos das vísceras com os respectivos neurónios pós-ganglionares, que são curtos. As fibras pré-ganglionares para a componente parassimpática, emergem das regiões craniana e sagrada (entre S2 e S3) – outflow cranio-sagrado.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Dessa forma, ao nível craniano as fibras pré-ganglionares do sistema parassimpático apanham boleia de vários pares de nervos cranianos, nomeadamente o III (nervo óculo-motor), o VII (nervo facial), o IX (nervo glossofaríngeo) e o X (nervo vago). As fibras que acompanham o nervo óculo-motor encontramse responsáveis pelo músculo ciliar da pupila, enquanto as fibras que acompanham o nervo facial fazem a inervação das glândulas submandibular, sublingual e lacrimal, sinaptizando-se ao nível dos gânglios submandibular e pterigopalatino. Já as fibras que acompanham o nervo glossofaríngeo sinaptizam ao nível do gânglio ótico, sendo que os respectivos neurónios pós ganglionares, inervam a glândula parótida. Por fim, dado o percurso do nervo vago, as fibras do sistema nervoso parassimpático que lhe estão associadas, vão inervar todas as vísceras associadas às regiões cervical, torácica e abdominal, até aos dois terços direitos do cólon transverso (algo que se prende com motivos embriológicos). Por outro lado, as fibras pré-ganglionares sacro-pélvicas emergem ao nível de S2/S3 (por vezes, S4), associadas aos nervos sacro-pélvicos.
Sistema nervoso simpático No que concerne ao sistema nervoso simpático, regista-se uma presença de neurónios pré-ganglionares curtos, que geralmente sinaptizam ao nível dos gânglios presentes na cadeia do simpático com neurónios pós ganglionares, que vão inervar as respectivas vísceras. Contudo, as fibras pré-ganglionares podem também formar plexos, não se sinaptizando ao nível dos gânglios. A observação da espinal medula seccionada transversalmente permite concluir que esta não é sempre igual. Ao nível torácico e lombar (de T1 a L2), esta apresenta uma proeminência lateral, designada por coluna lateral, onde se encontram os corpos celulares do sistema nervoso simpático. A partir daqui, partem as fibras préganglionares do sistema nervoso simpático, “à boleia” das fibras motoras que partem do corno anterior (ou seja, as fibras do sistema nervoso autónomo acompanham as raízes ventrais dos nervos espinhais). Compreende-se por isso, que se registe um outflow toraco-lombar no sistema nervoso autónomo. As fibras simpáticas pré-ganglionares chegam então à cadeia do simpático, como ramos comunicantes brancos (pois são mielinizados), sendo estes laterais à cadeia (existem 14 ramos comunicantes brancos de T1 a L2). Ao nível da cadeia do simpático, os neurónios pré-ganglionares podem se sinaptizar com os neurónios pós-ganglionares, que depois abandonam o gânglio simpático, através dos ramos comunicantes cinzentos (assim designados, devido ao facto de não serem mielinizados), que são superiores aos ramos comunicantes brancos. Por outro lado, as fibras pré-ganglionares podem não se sinaptizar ao nível da cadeia do simpático, abandonando-a e deslocando-se em direcção medial (como nervos esplâncnicos), para se sinaptizar em plexos autonómicos, dos quais é exemplo o plexo celíaco. Por último, as fibras pré-ganglionares podem ascender ou descer ao nível da cadeia do simpático, sinaptizando num gânglio mais distante. Isto explica como é que se regista inervação simpática, por exemplo, ao nível cervical (onde não emergem fibras pré-ganglionares simpáticas) – os neurónios pré-
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II ganglionares torácicos superiores ascendem no tronco simpático e sinaptizam-se ao nível dos gânglios cervicais.
Sistema nervoso entérico Ao nível de cada órgão do tubo digestivo existe um plexo mientérico, localizado entre as duas camadas musculares de cada órgão (entre o músculo longitudinal e o músculo circular) e que se relaciona com o peristaltismo e com a segmentação necessária para a digestão e absorção de nutrientes. Por outro lado, ao nível da camada submucosa, encontra-se outro plexo, designado por plexo submucoso, que se encontra associado à secreção de glândulas mucosas. Segundo alguns autores, estes plexos constituem o sistema nervoso entérico (enquanto outros defendem que são parte do sistema nervoso autónomo). Isto porque, caso isolássemos um órgão, que estivesse sendo inervado apenas pelo sistema nervoso entérico, este manteria funções próprias, nomeadamente de apreensão de estímulos a partir do seu epitélio e da sua parede visceral. Contudo, estas funções são, no cômputo geral moduladas pelo sistema nervoso autónomo. De qualquer forma, os autores que defendem que o sistema nervoso entérico é totalmente independente referem que existem mais neurónios nas paredes do tubo digestivo, que na medula espinhal.
Neurotransmissores e acção exercida As duas componentes do sistema nervoso autónomo também podem ser distinguidas, na medida em que o sistema nervoso simpático se encontra distribuído a todas as partes do corpo, mais particularmente para os vasos sanguíneos; enquanto o sistema nervoso parassimpático tem uma distribuição limitada ao tracto digestivo e estruturas que se desenvolvam nas suas paredes ou a partir destas, aos sistemas respiratório, urogenital e ao olho (dessa forma, estas estruturas têm inervação, quer pelo sistema nervoso simpático, quer pelo sistema parassimpático). Quando os sistemas nervoso simpático e parassimpático inervam a mesma estrutura, os seus efeitos são frequentemente opostos – o coração é acelerado pelo simpático e atrasado pelo parassimpático, a pupila é dilatada pelo simpático e constrita pelo parassimpático, os movimentos peristálticos do sistema digestivo são favorecidos pelo sistema parassimpático, enquanto o simpático reduz esses movimentos e induz a contracção dos esfíncteres. Contudo, estes não apresentam sempre um totalmente antagónico – as duas partes cooperam produzindo um equilíbrio, necessário para o normal funcionamento em diversas circunstâncias – por exemplo, ao nível genital, o sistema nervoso simpático promove a ejaculação, enquanto o sistema parassimpático promove a erecção. Diz-se, por isso, que o componente simpático como que prepara o corpo para uma reacção a uma crise (fight-or-flight response), enquanto
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II o parassimpático está mais envolvido na conservação e “aquisição” de energia (rest and digest response). No que concerne aos neurotransmissores associados aos neurónios de cada sistema nervoso, a acetilcolina é o neurotransmissor libertado, quer pelos neurónios préganglionares, quer pelos neurónios pósganglionares do sistema nervoso parassimpático. Já ao nível do sistema nervoso simpático, ocorre libertação de acetilcolina, por parte dos neurónios préganglionares e de noradrenalina ou adrenalina, por parte dos neurónios pósganglionares. A inervação simpática da glândula salivar é aqui uma excepção, na medida em que ocorre libertação de acetilcolina por parte dos neurónios pós-ganglionares. O caso das células da glândula supra-renal é também bastante peculiar. Estas células derivam embriologicamente das células da crista neural, tal como os gânglios do sistema nervoso simpático. Dessa forma, as células da glândula supra-renal recebem directamente fibras pré-ganglionares, actuando depois de modo análogo a neurónios, ao libertar adrenalina e noradrenalina, que serão lançadas na corrente sanguínea (o que permite às células da glândula supra-renal ter uma actividade rápida).
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Tronco simpático cervical O tronco simpático cervical encontra-se na fáscia pré-vertebral, posteriormente à bainha carotídea, contendo três gânglios inter-conectados – gânglio superior, médio e inferior (cervico-torácico). Contudo, por vezes existem dois ou quatro gânglios. Os gânglios simpáticos cervicais enviam ramos comunicantes cinzentos para todos os nervos espinhais cervicais, mas não recebem ramos comunicantes brancos por parte destes. Dessa forma, as suas fibras pré-ganglionares espinhais emergem dos ramos comunicantes brancos dos primeiros cinco nervos torácicos espinhais (principalmente, dos três superiores) e ascendem no tronco simpático, para que a sua sinapse ocorra nos gânglios cervicais. No seu percurso, os ramos comunicantes cinzentos podem perfurar o longo da cabeça, ou o escaleno anterior.
Gânglio cervical superior O gânglio cervical superior é o maior dos três gânglios, encontrando-se ao nível das apófises transversas de C2 e C3. Anteriormente a este, encontramos a artéria carótida interna, dentro da bainha carotídea, enquanto o longo da cabeça é posterior. A extremidade inferior deste gânglio encontra-se unida ao gânglio médio por um tronco de ligação. Os seus ramos mediais incluem ramos laringofaríngeos, para o corpo carotídeo e faringe, ajudando a formar o plexo faríngeo (juntamente com ramos vagais e glossofaríngeos) e um ramo cardíaco, constituído por fibras eferentes e que desce posteriormente à artéria carótida comum, em frente ao longo da cabeça e cruza anteriormente à artéria tiróide inferior e nervo laríngeo recorrente, juntando-se ao plexo cardíaco e recebendo filamentos do nervo laríngeo externo, na região média do pescoço e do nervo laríngeo recorrente, na sua entrada do tórax. O gânglio cervical superior tem ainda ramos anteriores e laterais para a região craniana.
Gânglio cervical médio O gânglio cervical médio é o mais pequeno dos três, encontrando-se por vezes ausente, ou fundido com o gânglio cervical superior. Esta estrutura encontra-se normalmente ao nível de C6, anteriormente ou
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II superiormente à artéria tiróide inferior, podendo-se ainda juntar ao gânglio cervical inferior. De qualquer das formas, o gânglio cervical médio encontra-se ligado ao gânglio cervical inferior por duas ou mais cordas variáveis. Este gânglio dá ramos tiróides, que acompanham a artéria tiróide inferior para a glândula tiróide (e que comunicam com os nervos cardíaco, laríngeo externo e laríngeo recorrente) e um ramo cardíaco, que é o maior nervo cardíaco simpático, que também pode partir do próprio tronco simpático. Este ramo desce posteriormente à artéria carótida comum, anterior ou posteriormente à artéria subclávia (do lado direito), ou por entre a artéria carótida comum esquerda e subclávia (do lado esquerdo), recebendo vários filamentos do nervo laríngeo recorrente e juntando-se à porção profunda do plexo cardíaco.
Gânglio cervico-torácico O gânglio cervico-torácico (gânglio estrelado ou gânglio cervical inferior, embora esta última designação seja preferível, quando não se regista a fusão com o primeiro gânglio torácico) é formado pela fusão dos dois últimos gânglios cervicais e do primeiro gânglio segmental torácico (incluindo, por vezes, o segundo, terceiro e quarto gânglios torácicos). Este gânglio encontra-se no bordo lateral do longo do pescoço, ou lateralmente a este, por entre a base da apófise transversa de C7 e o colo da primeira costela (sendo ambos relações posteriores deste gânglio). Anteriormente ao gânglio encontramos os vasos vertebrais, estando o gânglio inferiormente separado da região posterior da pleura cervical, pela membrana suprapleural. Lateralmente, ao gânglio cervical inferior encontra-se a artéria intercostal suprema. Os ramos para os vasos sanguíneos formam plexos na artéria subclávia e os seus ramos, que derivam do gânglio cervical inferior e da ansa subclávia (uma ansa entre os gânglios cervicais médio e inferior), estendendo-se tipicamente até à primeira parte da artéria axilar. Um pequeno gânglio vertebral pode se encontrar presente no tronco simpático, anterior ou anteromedialmente à origem da artéria vertebral e superiormente à artéria subclávia.
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Inervação autónoma do tórax A inervação autónoma do tórax consiste nos troncos simpáticos esquerdo e direito, nervos vagos e plexos cardíacos, esofágicos e pulmonares.
Tronco simpático (porção torácica) Os troncos simpáticos são ganglionados e encontramse anteriormente às cabeças das costelas. Os seus gânglios encontram-se arranjados de forma segmentada, sendo o seu número quase igual ao dos nervos espinhais torácicos (são normalmente onze, mas por vezes doze e, mais raramente, 10 ou 13). Os axónios simpáticos préganglionares originam-se dos neurónios na coluna cinzenta lateral da corda espinhal, de T1 a L2, abandonando a corda espinhal com as raízes ventrais correspondentes, como ramos brancos comunicantes. Algumas fibras entram no tronco simpático, onde ocorre a sua sinapse, no seu gânglio segmental, sendo que outras fibras ascendem ou descem no tronco, para que nos gânglios cervicais ou lombares possa ocorrer a sua sinapse. A maior parte dos axónios pré-ganglionares que se originam nos segmentos espinhais torácicos inferiores (de T5 a T12) não fazem sinapse localmente, mas entram na cavidade abdominal, como nervos esplâncnicos torácicos, ocorrendo a sua sinapse ao nível dos gânglios pré-vertebrais, especialmente ao nível do gânglio celíaco, ou em torno de células medulares da glândula supra-renal. Quase sempre, o primeiro gânglio torácico encontra-se fundido com o gânglio cervical inferior, formando o gânglio cervico-torácico. Por vezes, o segundo gânglio encontra-se incluído naquela fusão. Este encontra-se localizado frequentemente no segundo espaço intercostal. Com excepção dos dois ou três últimos gânglios torácicos, os restantes encontram-se posteriormente à pleura costal, adjacentes às cabeças costais. Mais inferiormente, o tronco simpático torácico passa dorsalmente ao ligamento arqueado medial do diafragma, para se tornar o tronco simpático lombar.
Gânglios associados Os ramos mediais dos cinco gânglios superiores são muito pequenos e os seus filamentos destinam-se à aorta torácica e seus ramos, formando um plexo aórtico torácico na aorta, juntamente com filamentos do nervo esplâncnico maior. Ramos do segundo ao quinto ou sexto gânglios entram no plexo pulmonar posterior, enquanto outros, do segundo ao quinto gânglios entram para a porção profunda do plexo
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II cardíaco. Pequenos ramos desses nervos cardíacos e pulmonares passam para o esófago e para a traqueia. Já os ramos mediais dos sete gânglios inferiores são grandes, inervando a aorta e unindo-se, formando os nervos esplâncnicos maior, menor e mínimo (sendo que os últimos dois não são sempre identificáveis).
Nervo esplâncnico maior O nervo esplâncnico maior consiste, sobretudo, em fibras pré-ganglionares mielinizadas eferentes e aferentes viscerais, sendo formado por ramos desde o quinto ao nono ou décimo gânglios torácicos, embora as fibras dos seus ramos superiores possam ter origem no primeiro ou segundo gânglios torácicos. As raízes deste nervo variam entre uma a oito, embora, o mais comum seja a presença de quatro. Este nervo desce obliquamente nos corpos vertebrais, dando ramos para a aorta torácica descendente e perfurando o pilar ipsilateral do diafragma para terminar, sobretudo no gânglio celíaco, mas também, nos gânglios aórtico-renal e na glândula suprarenal. Na maioria dos indivíduos, existe um gânglio esplâncnico, do lado oposto ao de T11 e T12.
Nervo esplâncnico menor O nervo esplâncnico menor é formado por ramos viscerais, mediais, do nono e décimo (por vezes, décimo e décimo-primeiro) gânglios torácicos e pelo tronco por entre estes. Este nervo perfura o diafragma com o nervo esplâncnico maior e junta-se ao gânglio aórtico-renal, podendo dar ramos para a região lateral do gânglio celíaco.
Nervo esplâncnico mínimo O nervo esplâncnico mínimo (ou nervo renal) parte dos ramos mediais, viscerais do gânglio torácico mais inferior e entra no abdómen com o tronco simpático, inferiormente ao ligamento arqueado medial, deslocando-se inferiormente para terminar no plexo renal. O tronco do nervo entra então no gânglio aórtico-renal e pode dar ramos para a região lateral do gânglio celíaco. Em termos de frequência, o nervo esplâncnico maior encontra-se sempre presente, enquanto o menor encontra-se normalmente presente. O nervo esplâncnico mínimo nem está presente numa menor percentagem de indivíduos, comparativamente ao menor e foi já descrito um nervo esplâncnico acessório (quarto nervo esplâncnico).
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Nervos vagos no tórax As fibras parassimpáticas pré-ganglionares do tórax partem dos corpos celulares dos neurónios do núcleo motor dorsal do nervo vago, na medula. As fibras destinadas para as vísceras torácicas provêm dos ramos pulmonares, cardíacos e esofágico do vago, ocorrendo as suas sinapses em gânglios presentes nas paredes viscerais.
Inervação do coração Todos os ramos cardíacos do nervo vago (parassimpático) e todos os ramos simpáticos (excepto o ramo cardíaco do gânglio simpático cervical superior, que é totalmente eferente) contêm fibras aferentes e eferentes. As fibras simpáticas aceleram o coração e dilatam as artérias coronárias, enquanto as fibras vagais retardam o coração e causam constrição das artérias coronárias. Os axónios simpáticos cardíacos pré-ganglionares partem dos neurónios na coluna intermediolateral, a partir dos quatro ou cinco segmentos espinhais torácicos superiores. Em alguns, as sinapses ocorrem nos gânglios simpáticos torácicos correspondentes, enquanto outros ascendem, para que as suas sinapses ocorram nos gânglios cervicais. Já as fibras pós-ganglionares desses gânglios formam os nervos cardíacos simpáticos. Já os axónios parassimpáticos cardíacos pré-ganglionares partem dos neurónios, quer no núcleo vagal dorsal, quer perto do núcleo ambíguo, deslocando-se em ramos cardíacos vagais e ocorrendo a sua sinapse nos plexos cardíacos e nas paredes auriculares. Perto do coração, os nervos autónomos formam um plexo cardíaco misto, que apresenta uma componente superficial, que se encontra normalmente, inferior ao arco aórtico, por entre este e o tronco pulmonar, e uma componente profunda, que se encontra por entre o arco aórtico e a bifurcação da traqueia. O plexo cardíaco é ainda descrito por nomes regionais, ou seja, pelas suas extensões coronárias, pulmonares, auriculares e aórticas.
Porção superficial do plexo cardíaco A porção superficial (ventral) do plexo cardíaco encontra-se inferiormente à crossa da aorta e anteriormente à artéria pulmonar direita, ligando a porção profunda, o plexo coronário direito e o plexo pulmonar anterior esquerdo. Esta porção é formada pelo ramo cardíaco do gânglio simpático cervical superior esquerdo e pelo mais inferior dos dois ramos cardíacos do nervo vago esquerdo. Um pequeno gânglio cardíaco encontra-se normalmente presente neste plexo, imediatamente inferior ao arco aórtico, à direita do ligamento arterioso.
Porção profunda do plexo cardíaco A porção profunda (dorsal) do plexo cardíaco é anterior à bifurcação da traqueia, superiormente ao ponto de divisão do tronco pulmonar e posteriormente à crossa da aorta. Esta porção é formada pelos ramos cardíacos dos gânglios simpáticos cervicais e torácicos superiores e dos nervos vago e laríngeo recorrente. Os ramos da metade direita da porção profunda do plexo cardíaco passam em frente e posteriormente à artéria pulmonar direita. Os que passam anteriormente são mais numerosos e enviam alguns filamentos para o plexo pulmonar anterior direito, continuando-se para formar parte do plexo coronário direito. Já os que se encontram posteriormente à artéria pulmonar enviam alguns filamentos para a aurícula direita, continuando-se depois no plexo coronário esquerdo.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Por outro lado, a metade esquerda da porção profunda do plexo cardíaco encontra-se ligada à porção superficial, enviando alguns filamentos para a aurícula esquerda e plexo pulmonar anterior esquerdo e formando a maior parte do plexo coronário esquerdo.
Plexo coronário esquerdo O plexo coronário esquerdo é maior que o direito, sendo formado, principalmente pelo prolongamento da metade esquerda da porção profunda do plexo cardíaco e por algumas fibras da metade direita. Este plexo acompanha a artéria coronária esquerda, inervando a aurícula e ventrículo esquerdos.
Plexo coronário direito O plexo coronário direito é formado pelas porções superficial e profunda do plexo cardíaco, acompanhando a artéria coronária direita, para inervar a aurícula e ventrículo direito.
Plexos auriculares Já os plexos auriculares derivam das continuações para a esquerda e para a direita do plexo cardíaco, a par com as artérias coronárias. As suas fibras encontram-se distribuídas para as aurículas correspondentes, sobrepondo-se às do plexo coronário.
Plexos pulmonares Os plexos pulmonares encontram-se anterior e posteriormente a outras estruturas hilares dos pulmões. O plexo pulmonar anterior é pequeno e formado por ramos vagais e por ramos simpáticos dos nervos cardíacos cervicais, através de ligações com o plexo cardíaco superficial. O plexo pulmonar posterior é formado pelos ramos vagais e por ramos cardíacos simpáticos do segundo ao quinto ou sexto gânglios simpáticos torácicos. O plexo esquerdo também recebe ramos do nervo laríngeo recorrente esquerdo.
Plexo esofágico O plexo esofágico rodeia o esófago, inferiormente ao nível das raízes dos pulmões. As fibras vagais podem passar através do plexo, ou ser dadas directamente pelo vago, no tórax. Todas as fibras encontram-se ao nível da parede esofágica e são motores para o músculo liso no esófago inferior e secretomotores, para as glândulas mucosas na mucosa esofágica. As fibras simpáticas vasomotoras partem dos seis segmentos torácicos superiores da corda espinhal, sendo que as sinapses das dos segmentos superiores ocorrem ao nível dos gânglios cervicais. Já as fibras dos segmentos inferiores passam directamente para o plexo esofágico ou gânglio celíaco, onde ocorre a sua sinapse.
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Inervação autónoma do abdómen e pelve A inervação autónoma das vísceras abdominais e pélvicas faz se por via da porção abdominopélvica na cadeia do simpático e através dos nervos esplâncnicos maior, menor e mínimo (no que concerne à inervação simpática) e dos nervos vago e parassimpáticos pélvicos (no que toca à inervação parassimpática). No que toca à inervação simpática, os corpos celulares dos neurónios encontram-se na substância cinzenta intermediolateral dos segmentos torácicos e dois primeiros lombares. Estes originam axónios mielinizados, que viajam no ramo ventral do nervo espinhal, ao mesmo nível, abandonando-o através do ramo comunicante branco, para entrar num gânglio torácico, ou num gânglio paravertebral lombar. Os ramos viscerais podem sair ao mesmo nível, ou ascender ou descer vários níveis antes de sair, mas abandonam os gânglios sem que ocorra a sua sinapse, algo que origina os nervos esplâncnicos.
Inervação parassimpática Os neurónios parassimpáticos que se asseguram da inervação do abdómen e da pelve encontram-se quer no núcleo motor dorsal do nervo vago, quer na substância cinzenta intermediolateral do segundo ao quarto segmentos espinhais sagrados. Os nervos vagos dão inervação parassimpática para as
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II vísceras abdominais, com excepção da porção do cólon distal ao cólon descendente médio, do recto e do canal anal superior. Os nervos são derivados do plexo esofágico e entram no abdómen, através da abertura esofágica do diafragma, estando intimamente associados às paredes anterior e posterior do esófago abdominal, do qual se encontram separados, através de tecido conjuntivo solto. O nervo vago anterior é, sobretudo derivado do vago esquerdo, enquanto o nervo vago posterior, do vago direito. Estes nervos inervam o esófago intra-abdominal e o estômago, directamente. O nervo anterior dá ramos para o plexo hepático, que inerva parênquima hepático e a sua rede vascular, o tronco biliar e as estruturas no bordo livre do omento menor. Já o nervo posterior dá ramos para o plexo celíaco. Essas fibras constituem, frequentemente, a maior porção das fibras do plexo celíaco.
Tronco simpático (porção lombar) A porção lombar de cada tronco simpático normalmente contém quatro gânglios interconectados. O tronco desloca-se no tecido conjuntivo extra-peritoneal, anteriormente à coluna vertebral e ao longo do bordo medial do psoas maior. Superiormente, este tronco é contínuo com o tronco torácico, posteriormente ao ligamento arqueado medial. Inferiormente, passa posteriormente à artéria ilíaca comum e é contínuo com o tronco simpático pélvico. Do lado direito, encontra-se posteriormente à veia cava inferior e à esquerda encontrase posteriormente aos nódulos linfáticos aórticos laterais. Este tronco é anterior à maior parte dos vasos lombares, mas pode passar posteriormente a algumas veias lombares. O primeiro, o segundo e, por vezes, o terceiro ramos espinhais ventrais lombares enviam ramos comunicantes brancos para os gânglios correspondentes. Os ramos comunicantes cinzentos passam desde os quatro gânglios lombares para os nervos espinhais lombares. Os ramos comunicantes são longos e acompanham as artérias lombares em torno dos lados dos corpos vertebrais, mediamente aos arcos fibrosos, ao qual se liga o músculo psoas maior.
Nervos esplâncnicos lombares Quatro nervos esplâncnicos lombares passam como ramos mediais dos gânglios, para se juntarem aos plexos celíaco, mesentérico inferior e, por vezes, hipogástrico superior. O primeiro nervo esplâncnico lombar deriva do primeiro gânglio, dando ramos para os plexos celíaco, renal e mesentérico inferior. O segundo nervo junta-se à porção inferior dos plexos intermesentérico ou mesentérico inferior. Já o terceiro nervo parte do terceiro ou quarto gânglio e passa anteriormente aos vasos ilíacos comuns, para se juntar ao plexo hipogástrico superior. Por fim, o quarto nervo esplâncnico lombar parte do gânglio mais inferior, passa superiormente aos vasos ilíacos comuns, juntando-se à porção mais inferior do plexo hipogástrico superior. Ramos vasculares Os ramos vasculares de todos os gânglios lombares juntam-se ao plexo aórtico abdominal. Fibras dos nervos esplâncnicos lombares inferiores passam para as artérias ilíacas comuns e formam um plexo, que se estende ao longo das artérias ilíacas interna e externa. Muitas fibras pós-ganglionares viajam nos
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II ramos musculares, cutâneos e safenos do nervo femoral. Outras fibras pós-ganglionares viajam através do nervo obturador para a artéria obturadora.
Tronco simpático (porção pélvica) O tronco simpático pélvico encontra-se no tecido extraperitoneal, anteriormente ao sacro, inferiormente à fáscia pré-sagrada. Este tronco encontra-se medialmente ou anteriormente aos buracos sagrados anteriores e apresenta quatro ou cinco gânglios sagrados interconectados. Superiormente, é contínuo com o tronco simpático lombar e recebe fibras pré-ganglionares, que descem através da cadeia lombar, desde os segmentos espinais lombares inferiores. Inferiormente aos gânglios mais inferiores, os dois troncos convergem, unindo-se num pequeno gânglio ímpar, anterior ao cóccix. Os ramos cinzentos comunicantes passam dos gânglios para os nervos espinais sagrados e coccígeos, não existindo ramos comunicantes brancos. Os ramos mediais unem-se ao longo da linha média e ramificam-se a partir dos primeiros dois gânglios, referidos como nervos esplâncnicos sagrados, juntando-se ao plexo hipogástrico inferior ou ao “nervo” hipogástrico, para se distribuírem para as vísceras pélvicas através do “plexo pélvico”. Pequenos ramos formam um plexo na artéria sagrada mediana.
Ramos vasculares As fibras pós-ganglionares passam através dos ramos comunicantes cinzentos até às raízes do plexo sagrado. As que formam o nervo tibial estão associados à artéria poplítea e seus ramos na perna e pé; enquanto as que estão presentes nos nervos pudendo e glúteos superior e inferior, acompanham as artérias com os mesmos nomes, até os tecidos glúteos e perineais. As fibras pré-ganglionares para o resto do membro inferior derivam dos três segmentos espinhais torácicos inferiores e dois ou três primeiros segmentos espinhais lombares superiores. Estas atingem os gânglios torácicos inferiores e lombares superiores através de ramos comunicantes brancos e descem ao longo do tronco simpático, para que se possa dar a sua sinapse, nos gânglios lombares.
Nervos esplâncnicos pélvicos Os nervos esplâncnicos pélvicos relacionam-se com as vísceras pélvicas e viajam nos ramos anteriores do segundo ao quarto nervos espinhais sagrados, abandonando-os à medida que saem dos buracos sagrados anteriores e passam no tecido pré-sagrado, formando uma rede de ramos, distribuídos por três localizações. A maior parte destes nervos passam anterolateralmente na rede, formando o plexo hipogástrico inferior, a partir de onde a maior parte se distribui como um plexo pélvico para as vísceras pélvicas. Algumas fibras juntam-se directamente às fibras que formam os nervos hipogástricos inferiores, ascendendo para fora da pelve, até ao plexo hipogástrico superior. Uma menor quantidade de fibras desloca-se ainda superolateralmente no tecido pré-sagrado, anteriormente aos vasos ilíacos, passando directamente no tecido do retroperitoneu e na região posterior do mesentério do sigmóide e do cólon descendente. Os nervos esplâncnicos pélvicos constituem a inervação para-seimpática e motora do músculo liso do recto, ânus e parede da bexiga, embora sejam inibitórios para o esfíncter vesical. Estes nervos fornecem fibras vasodilatadoras ao tecido eréctil do pénis e clítoris e são provavelmente vasodilatadoras dos testículos, ovários, trompas de Falópio e útero.
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Plexo celíaco O plexo celíaco é o maior plexo autónomo, localizando-se ao nível de T12 e L1. Este plexo é uma densa rede que une dois grandes gânglios celíacos e rodeia a artéria celíaca e a raiz da artéria mesentérica superior. Este plexo encontra-se posteriormente ao estômago e saco menor, anteriormente aos pilares do diafragma e ao início da aorta abdominal e por entre as glândulas supra-renais. O plexo e os gânglios são unidos pelos nervos esplâncnicos maior e menor e por ramos dos nervos frénicos e vagos. O plexo estende-se através de numerosos plexos secundários, ao longo de artérias adjacentes. De facto, o plexo celíaco encontra-se ligado ou origina os plexos frénico, esplénico, hepático, mesentérico superior, supra-renal, renal e gonadal.
Gânglios celíacos Os gânglios celíacos são massas irregulares de cada lado do tronco celíaco, adjacentes às glândulas supra-renais e anteriores aos pilares do diafragma. O gânglio direito é posterior à veia cava inferior e o gânglio esquerdo é posterior à origem da artéria esplénica. O nervo esplâncnico maior ipsilateral juntase à porção superior de cada gânglio, enquanto a porção inferior de cada gânglio forma uma subdivisão distinta, por vezes designada por gânglio aórtico-renal. O gânglio aórtico-renal recebe o nervo esplâncnico menor ipsilateral e origina maior parte do plexo renal (que normalmente, se encontra anteriormente à origem da artéria renal).
Plexo frénico O plexo frénico encontra-se em torno das artérias frénicas inferiores, nos pilares do diafragma. Este plexo parte como uma extensão superior do gânglio celíaco e, por vezes, recebe um ou dois ramos sensitivos do nervo frénico. O plexo frénico esquerdo é, normalmente, maior que o direito. À esquerda, este plexo dá ramos para a glândula supra-renal esquerda e para o orifício cardíaco do estômago. Já o plexo frénico direito junta-se ao nervo frénico, formando um pequeno gânglio frénico, que distribui ramos para a veia cava inferior, glândula supra-renal e plexo hepático.
Plexo mesentérico superior O plexo mesentérico superior encontra-se no tecido conjuntivo pré-aórtico, posteriormente ao pâncreas, em torno da origem da artéria mesentérica superior. Este plexo é uma continuação inferior do plexo celíaco, incluindo ramos deste e do nervo vago posterior. Os seus ramos acompanham a artéria mesentérica superior e dividem-se em plexos secundários, que se encontram distribuídos ao longo dos ramos da artéria. O gânglio mesentérico superior encontra-se superiormente no plexo, normalmente sobre a origem da artéria mesentérica superior.
Plexo aórtico abdominal O plexo aórtico abdominal (ou intermesentérico) encontra-se dos lados e em frente à aorta, por entre as origens das artérias mesentéricas superior e inferior. Este plexo consiste em 4-12 nervos
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II intermesentéricos, unidos por ramos oblíquos, sendo contínuo, superiormente, com o plexo mesentérico superior e, inferiormente, com o plexo hipogástrico superior. O plexo aórtico abdominal é formado por ramos parassimpáticos e simpáticos do plexo celíaco, recebendo ramos do primeiro e segundo nervos esplâncnicos lombares. Este plexo está ainda ligado aos plexos gonadal, mesentérico inferior, ilíaco e hipogástrico superior.
Plexo mesentérico inferior O plexo mesentérico inferior encontra-se próximo da origem da artéria mesentérica inferior e encontrase distribuído de acordo com os ramos desta. Este plexo é formado, sobretudo, pelo plexo aórtico e pelos primeiros dois nervos esplâncnicos lombares, embora também receba ligações do plexo hipogástrico superior (fibras simpáticas e parassimpáticas).
Plexo hipogástrico superior O plexo hipogástrico superior encontra-se anteriormente à bifurcação aórtica, à veia ilíaca comum esquerda, aos vasos sagrados mediais, ao corpo de L5, ao promontório sagrado e por entre as artérias ilíacas comuns. Este plexo é por vezes designado por nervo pré-sagrado, embora ele seja de facto prélombar. O plexo hipogástrico superior encontra-se mais frequentemente, à esquerda da linha média, encontrando-se em tecido conjuntivo extra-peritoneal. Este plexo é formado por ramos do plexo aórtico e do terceiro e quarto nervos esplâncnicos lombares, podendo também conter fibras parassimpáticas dos nervos esplâncnicos pélvicos, que ascendem dos dois plexos hipogástricos inferiores, através de uma série de filamentos, designados por vezes por “nervos hipogástricos esquerdo e direito”.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O limite superior do mesorecto, que contém os vasos rectais superiores, encontra-se anterior e à esquerda da porção inferior do plexo, estando separado deste apenas por uma fina camada de tecido conjuntivo solto. O plexo hipogástrico superior envia fibras para o plexo mesentérico inferior e para os plexos uretérico, gonadal e ilíaco comum, bem como pequenos ramos que se deslocam anteriormente para o mesorecto superior, para inervar o plexo em torno da artéria rectal superior.
Plexo hipogástrico inferior O plexo hipogástrico inferior encontra-se no tecido conjuntivo extra-peritoneal na parede pélvica, anterolateralmente à fáscia mesorectal. Este plexo encontra-se directamente relacionado com os vasos ilíacos internos e com a zona de fixação do elevador do ânus, coccígeo e obturador interno (que se encontram lateralmente) e com as artérias vesical superior e umbilical obliterada (superiormente). Nos indivíduos do sexo masculino, este plexo encontra-se posterolateralmente de cada lado das vesículas seminais, próstata e porção superior da bexiga. Já nos indivíduos do sexo feminino, cada plexo encontra-se lateral ao cérvix, fórnix vaginal e porção posterior da bexiga, estendendo-se, por vezes, para os ligamentos do útero. O plexo hipogástrico inferior é formado, sobretudo, pelos ramos esplâncnicos sagrados (simpáticos) e esplâncnicos pélvicos (parassimpáticos), ocorrendo uma pequena contribuição por parte de algumas fibras simpáticas provenientes do plexo hipogástrico superior, através dos “nervos hipogástricos inferiores”. Este plexo origina uma rede complexa de ramos pélvicos, designada por “plexo pélvico”, que inervam as vísceras pélvicas, quer directamente, quer através de plexos peri-arteriais. Os ramos do plexo pélvico inervam a bexiga e a porção distal do uréter, em ambos os sexos, e os canais deferentes, as vesículas seminais, a próstata, as glândulas acessórias e o pénis, nos indivíduos do sexo masculino. Já nos indivíduos do sexo feminino, estes ramos inervam os ovários, as trompas de Falópio, o útero, o cérvix e a vagina.
“Nervos” hipogástricos inferiores Os “nervos” hipogástricos inferiores são, por vezes, duplos, múltiplos, ou formam um plexo estendido de cada lado. Estes contêm principalmente fibras simpáticas, embora existam algumas parassimpáticas. A maior parte dessas fibras ascendem do plexo hipogástrico inferior, em direcção ao superior.
Mnemónicas sobre sistema nervoso autónomo: - Inervação pélvica e sagrada: PP/SS – Os nervos esplâncnicos Pélvicos correspondem a inervação Parassimpática. Os nervos esplâncnicos Sagrados correspondem a inervação Simpática.
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7. Sistema linfático Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Sistema linfático O sistema linfático tem por funções recolher o líquido intersticial, que contém água, electrólitos, produtos de catabolismo e macromoléculas; absorver gorduras, através dos vasos quilíferos e participar na imunidade (geral e específico). Os vasos linfáticos absorvem um fluido, designado por linfa que é incolor, excepto ao nível do intestino, onde o quilo tem uma cor leitosa, devido ao seu conteúdo em gordura. Os vasos linfáticos encontram-se ausentes em tecidos avasculares, bem como no sistema nervoso central, no endomísio e no osso e medula óssea. Os vasos são interrompidos pelos gânglios linfáticos, que filtram a linfa e funcionam como “fonte” de linfócitos. A maior parte da linfa passa por pelo menos um gânglio linfático, embora exista linfa que passe desde os testículos para o canal torácico, sem passar por gânglios. Os vasos linfáticos superficiais encontram-se na pele em tecidos subcutâneos, convergindo a partir de três grandes regiões em três grupos de gânglios linfáticos. Os vasos que drenam a pele do membro inferior, períneo, órgãos genitais externos e tronco, inferiormente ao nível do umbigo, confluem nos gânglios inguinais superficiais. Já os vasos que drenam a pele do membro superior e o tronco sobre o umbigo até ao nível da clavícula confluem até aos gânglios linfáticos na axila. Por fim, os vasos que drenam o escalpe, cara e o resto do pescoço confluem para os gânglios cervicais. Por outro lado, os vasos linfáticos profundos drenam a linfa de todas as regiões profundas à fáscia profunda e acompanham os vasos sanguíneos da respectiva região. Os gânglios linfáticos também podem ser classificados em profundos e superficiais. Os gânglios superficiais encontram-se na fáscia superficial, encontrando-se em menor número que os gânglios profundos.
Descrição geral do sistema linfático Os capilares linfáticos são mais largos que os capilares sanguíneos e mais irregulares no seu calibre. Estes capilares são capazes de absorver matéria particulada e moléculas de maiores dimensões (como proteínas), que passam desde os capilares sanguíneos. De referir que, os plexos capilares não têm válvulas e são drenados por vasos parecidos com vénulas. A partir dos plexos capilares, formam-se vasos colectores, que são pequenos e apresentam válvulas, distinguindo-se das veias pelo facto de se deslocarem em conjuntos de vasos individuais, não confluindo em troncos de maiores dimensões. Ao chegar a um gânglio linfático, os vasos colectores passam-se a designar por vasos aferentes, que se dividem em ramos mais pequenos, que penetram nas cápsulas dos gânglios, enquanto a linfa se difunde lentamente numa rede de seios linfáticos. As paredes dos gânglios permitem filtrar bactérias, partículas de carbono inaladas e outro material particulado, constituindo uma importante via de
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II defesa corporal. A partir dos gânglios, formam-se vasos eferentes, que se deslocam quer com vasos aferentes para outro gânglio de outro grupo, ou que passam para um grupo diferente. De referir que os vasos eferentes, que se formam a partir de um gânglio, são apenas ligeiramente maiores que os aferentes, apresentando a mesma estrutura. Os vasos eferentes do grupo mais proximal de cada cadeia unem-se para formar troncos linfáticos, sendo eles, o canal lombar, o canal intestinal, o canal bronco-mediastinal, o canal subclávio e o canal jugular. Cada tronco drena uma porção definida do corpo, terminando num grande vaso terminal, que pode ser o canal torácico ou o canal linfático direito. Os vasos terminais terminam-se nos grandes vasos da raiz do pescoço, formando as únicas comunicações linfático-venosas, para além de entradas directas ocasionais nas grandes veias, por parte dos troncos subclávio, jugular ou bronco-mediastinal.
☤ O movimento da linfa no sentido oposto ao da gravidade (ascendente) é, tal como no sistema venoso, auxiliado por factores como a contracção dos músculos esqueléticos adjacentes, a pulsatilidade arterial e a presença de pressão intra-tóracica negativa (resultante da respiração). A presença de músculo liso e a presença válvulas ao nível dos vasos linfáticos são factores que também contribuem para essa deslocação da linfa.
Estrutura geral dos gânglios linfáticos Os gânglios linfáticos variam em forma e tamanho, sendo normalmente ovóides ou reniformes e apresentando entre 1 e 25 mm de comprimento. Os gânglios maiores apresentam um hilo, a partir de onde partem os vasos eferentes. De referir que estes gânglios tendem a atrasar a proliferação de tumores. Os gânglios linfáticos são ainda constituídos por massas de tecido linfóide, suportadas por uma estrutura fibrosa, que inclui uma cápsula externa e trabéculas internas, que se encontram separadas do tecido linfóide, por espaços designados por seios linfáticos. O gânglio é classicamente descrito como sendo constituído por um córtex, internamente à cápsula (excepto no hilo, onde está ausente) e por uma medula, que forma a porção interna do gânglio, contactando directamente com o hilo da cápsula. Ao nível da medula, encontramos folículos linfóides, massas de linfócitos densamente arranjados, suportados por tecido reticular. O centro de cada folículo contém células de maiores dimensões – os linfoblastos, que geram linfócitos, por divisão (os linfoblastos constituem, no seu conjunto, o centro germinal).
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Drenagem linfática do pescoço e da cabeça Troncos linfáticos jugulares A área de drenagem do tronco jugular compreende a cabeça e o pescoço, com excepção da pele da porção inferior da região posterior do pescoço. Este tronco é formado pela união dos eferentes dos gânglios cervicais profundos.
Gânglios da cabeça e do pescoço Os gânglios da cabeça e do pescoço formam um grupo contínuo, sendo constituídos por uma cadeia jugular (que engloba os gânglios cervicais profundos), por gânglios cervicais anteriores (grupo nos quais se incluem os gânglios infrahióides, pré-laríngeos e traqueais) e por gânglios associados com o escalpe e a cara, formando uma “cadeia em colar”, por entre a cabeça e o pescoço (este grupo inclui os gânglios occipitais, retro-auriculares, parotídeos, cervicais superficiais, submandibulares e submentonianos).
Gânglios cervicais profundos Esta cadeia estende-se ao longo da bainha carotídea, desde a base do crânio até à raiz do pescoço. A maior parte dos gânglios encontram-se cobertos pelo esternocleidomastoideu, mas alguns aparecem nos triângulos anterior e posterior do pescoço. Os gânglios cervicais profundos são divididos num grupo superior e num grupo inferior, divididos pelo músculo omohióide. Os membros mais superiores dos gânglios cervicais profundos superiores encontram-se posteriormente ao bordo lateral da rinofaringe e são designados por gânglios retrofaríngeos. Ao nível do triângulo anterior, um desses gânglios (o gânglio jugulodigástrico) é frequentemente palpável inferiormente ao ângulo da mandíbula, por entre o músculo digástrico e a veia jugular interna, estando intimamente associado com a drenagem linfática da língua e da amígdala palatina. O gânglio juguloomohióide, por sua vez, encontra-se imediatamente superiormente ao tendão do omohióide, profundamente ao bordo posterior do esternocleidomastoideu, recebendo vasos linfáticos da língua. De referir que os eferentes dos gânglios cervicais profundos superiores passam para os gânglios cervicais profundos inferiores e para o tronco jugular.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Já os gânglios cervicais profundos inferiores encontram-se ao nível da veia jugular interna, profundamente às cabeças do esternocleidomastoide u, bem com em frente do plexo braquial e terceira porção da artéria subclávia. Os últimos gânglios encontram-se em comunicação com os gânglios axilares apicais e recebem vasos da pele da mama. De referir que os eferentes de todos os gânglios cervicais profundos inferiores passam para o tronco jugular.
Gânglios cervicais anteriores Os gânglios cervicais anteriores são compostos por vários subgrupos, que drenam a laringe, traqueia, esófago cervical e glândula tiróide. De referir que os seus eferentes são enviados para os gânglios cervicais profundos. Os gânglios infra-hióides acompanham a artéria tiróide superior e encontram-se ao nível da membrana tirohióide. A artéria tiróide superior é ainda acompanhada por gânglios faríngeos, que se encontram ao nível do ligamento cricotiróide. Já a artéria tiróide inferior é acompanhada por gânglios pré-traqueais, ao nível da extremidade inferior da glândula tiróide, e por gânglios para-traqueais, ao nível do sulco por entre a traqueia e o esófago.
Gânglios occipitais Os gânglios occipitais encontram-se ao nível dos vasos occipitais, sendo que os seus aferentes provêm do escalpe. Os gânglios retro-auriculares são entre dois ou três e encontram-se ao nível da apófise mastóide. Os seus aferentes drenam o escalpe e a região posterior da orelha. Já os gânglios parotídeos encontram-se ao nível da face superficial da glândula parotídea, na sua substância, superficialmente e profundamente à sua bainha fascial. Os gânglios parotídeos superficiais recebem aferentes provenientes da frente da orelha e do escalpe, testa, sobrancelha, pálpebras e bochechas, enquanto os seus eferentes passam para os gânglios parotídeos profundos e para os gânglios cervicais profundos superiores. Por sua vez, os gânglios parotídeos profundos recebem aferentes do meato acústico externo, trompa auditiva, ouvido médio, palato mole, porção posterior da cavidade nasal e porções mais profundas da bochecha, enquanto os seus eferentes passam para os gânglios cervicais profundos superiores.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II De referir que, os gânglios cervicais superficiais são meros gânglios parotídeos superficiais que se encontram dispersos ao longo a veia jugular externa. Por seu turno, os gânglios submandibulares são entre quatro e seis, encontrando-se por entre a mandíbula e a glândula salivar submandibular. Estes gânglios recebem os vasos da cara, inferiormente ao olho, e vários provenientes da língua. Os seus eferentes deslocam-se para os gânglios cervicais profundos, nomeadamente para o jugulo-digástrico e para o jugulo-omohióide. Por fim, os gânglios submentonianos formam um grupo mediano, ao nível dos músculos milohióides, sendo que os seus aferentes derivam do pavimento da boca, mandíbula e, possivelmente, da ponta da língua, lábio inferior e queixo. Já os seus eferentes deslocam-se para a cadeia cervical profunda, até ao gânglio jugulo-omohióide.
Vasos linfáticos da cabeça e do pescoço Os vasos linfáticos do esclape, testa e várias regiões da cabeça passam, na sua maioria, para os gânglios da “cadeia em colar”, mas muitos vasos passam directamente para os gânglios cervicais profundos. Os vasos superficiais do pescoço perfuram a fáscia profunda em numerosas regiões, para entrar nos gânglios cervicais profundos, enquanto os vasos da porção inferior da região posterior do pescoço passam com os vasos da região da omoplata para os gânglios axilares.
Drenagem linfática do nariz Os vasos do nariz e do limite da porção anterior da cavidade nasal terminam nos gânglios submandibulares, enquanto os vasos da região posterior passam posteriormente, através da parede faríngea até aos gânglios cervicais profundos superiores (incluindo os gânglios retrofaríngeos). Já os vasos dos seios perinasais seguem o trajecto dos vasos das paredes das cavidades nasais.
Drenagem linfática dos lábios Os vasos linfáticos da pele e membrana mucosa de ambos os lábios terminam, sobretudo, em gânglios submandibulares, com excepção da drenagem linfática da pele e membrana mucosa da porção mediana do lábio inferior, que pode ser efectuada para os gânglios submentonianos.
Drenagem linfática dos dentes Os vasos dos dentes e das porções externas de ambas as gengivas passam para os gânglios submandibulares. Alguns dos vasos provenientes das porções internas das gengivas também terminam nesses gânglios, mas outros deslocam-se para os gânglios submentonianos e para os gânglios cervicais profundos superiores (mais posteriores).
Drenagem linfática da língua e pavimento da boca Quanto à drenagem linfática da língua, esta é assegurada por vasos linfáticos que se arranjam em três grupos – os vasos anteriores drenam os dois-terços anteriores do dorso e bordos da língua, passando para os gânglios cervicais profundos superiores e para os gânglios submandibulares. Os vasos anteriores podem ainda drenar para os gânglios submentonianos ou para o gânglio jugulo-omohióide. Já os vasos posteriores da língua drenam o terço posterior do dorso, terminando também ao nível da cadeia cervical profunda, nomadamente no gânglio jugulo-digástrico. Por fim, os vasos centrais partem no
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II plexo dorsal, perto do plano mediano, descendo por entre os genioglossos até aos gânglios cervicais profundos superiores, inferiormente ao músculo digástrico. Já os vasos linfáticos da membrana mucosa da porção anterior do pavimento da boca drenam para os gânglios submentonianos, enquanto os vasos da porção posterior acompanham os vasos da língua.
Drenagem linfática das glândulas salivares e das amígdalas Os vasos linfáticos da glândula parótida terminam nos gânglios parotídeos, enquanto os das glândulas submandibular e sublingual terminam nos gânglios submandibulares e cervicais profundos superiores. A partir das paredes faríngeas, vasos linfáticos passam para os gânglios retrofaríngeos e cervicais profundos. A nasofaringe e a amígdala faríngea drenam, sobretudo, para os gânglios cervicais profundos superiores posteriores. Vasos linfáticos da amígdala palatina e das porções adjacentes dos arcos palatoglossal e palatofaríngeo terminam nos gânglios cervicais profundos, muitos deles no gânglio jugulo-digástrico. A partir das fossas piriformes e da face posterior da laringe, os vasos linfáticos perfuram a membrana tirohióide e terminam nos gânglios cervicais profundos superiores.
Drenagem linfática da laringe O plexo linfático da laringe é divisível em porções superior e inferior, que se encontram separadas lateralmente e anteriormente, pelas pregas vocais. Os vasos linfáticos da porção superior deste plexo perfuram a membrana tirohióide e terminam nos gânglios cervicais profundos superiores. A partir da porção inferior a laringe, alguns vasos perfuram o ligamento cricotiróide e terminam nos gânglios cervicais profundos inferiores, pré-traqueais e pré-laríngeos. Existem ainda vasos da laringe, que perfuram a membrana crico-traqueal e terminam nos gânglios para-traqueais e cervicais profundos inferiores.
Drenagem linfática da tiróide A drenagem linfática da maior parte da glândula tiróide é assegurada por vasos linfáticos que passam directamente para os gânglios cervicais profundos, até ao nível da artéria tiróide superior. Contudo, a porção inferior do istmo e de cada lobo é drenada para os gânglios pré-traqueais e para-traqueais.
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Drenagem linfática da pelve e períneo Drenagem linfática dos órgãos genitais externos Os vasos linfáticos, provenientes do escroto, ou da vulva passam para os gânglios inguinais superficiais proximais mediais. Os vasos linfáticos superficiais do pénis drenam para o grupo inguinal superficial proximal medial, enquanto os vasos profundos, incluindo aqueles que drenam a uretra peniana, terminam quer no grupo inguinal superficial proximal, quer nos gânglios inguinais profundos. Existem ainda alguns vasos que seguem o trajecto da veia dorsal profunda e terminam nos gânglios ilíacos internos. De referir que, os vasos linfáticos do clítoris terminam como os do pénis. Os gânglios inguinais, para além de receberem a drenagem linfática da genitália externa, também colectam a linfa do membro inferior.
Gânglios linfáticos da pelve Os gânglios linfáticos da pelve podem ser agrupados com os vasos sanguíneos. Os gânglios ilíacos externos são entre oito e dez, encontrando-se ao longo dos vasos ilíacos externos. Estes gânglios recebem os eferentes dos gânglios inguinais, os vasos linfáticos profundos da fossa ilíaca e a drenagem linfática da porção inferior da parede abdominal anterior, bem como vários aferentes directos, provenientes das vísceras pélvicas. Os eferentes destes gânglios passam para os gânglios ilíacos comuns. Já os gânglios ilíacos internos encontram-se ao longo do tronco e ramos dos vasos ilíacos internos. Estes gânglios recebem aferentes provenientes de todas as vísceras pélvicas, excepto o ovário e porções adjacentes das trompas de Falópio, recebendo também tributárias do períneo e região glútea, incluindo a maior parte da articulação coxo-femoral. Já os eferentes dos gânglios ilíacos internos passam para os gânglios ilíacos comuns. Os gânglios sagrados são gânglios ilíacos internos, que se encontram ao longo da concavidade do sacro. Os gânglios ilíacos comuns são entre quatro a seis e estendem-se ao longo dos vasos ilíacos comuns até à bifurcação aórtica, onde formam os gânglios ilíacos comuns medianos. Os seus eferentes passam para os gânglios lombares. Dessa forma, os gânglios da pelve menor constituem dois grupos – os gânglios da cavidade pélvica (que incluem os gânglios ilíacos internos) e os gânglios ilíacos externos e ilíacos comuns. Ambos os grupos recebem aferentes directos desde as vísceras pélvicas, sendo que os gânglios ilíacos externos e os gânglios ilíacos comuns ainda recebem vasos eferentes, desde os gânglios da cavidade. Apesar disso, os vasos linfáticos da porção superior do recto, da porção do superior do útero, da trompa de Falópio e
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II ovário passam directamente para os gânglios lombares no abdómen, juntamente com os vasos mesentéricos inferiores e com os vasos ováricos.
Vasos linfáticos das vísceras pélvicas Os vasos linfáticos da bexiga passam, sobretudo, para os gânglios ilíacos externos, mas alguns, que drenam a base, terminam nos gânglios ilíacos internos. Já os vasos que drenam o colo da bexiga terminam nos gânglios ilíaco comum e sagrado. Os vasos linfáticos da próstata terminam, sobretudo, nos gânglios ilíacos internos, embora haja alguns que passem para os gânglios sagrados e outros que terminem nos gânglios ilíacos externos, seguindo o trajecto dos canais deferentes
Drenagem linfática da uretra Nos indivíduos do sexo masculino, os vasos da uretra esponjosa passam para os gânglios inguinais superficiais e profundos. Já os vasos que drenam as porções membranosa e prostática da uretra, terminam sobretudo nos gânglios ilíacos internos. Já nos indivíduos do sexo feminino, os vasos linfáticos da uretra correspondem àqueles que drenam as porções prostática e membranosa da uretra masculina, na medida em que terminam, na sua maioria, nos gânglios ilíacos internos. A extremidade inferior da uretra feminina, todavia, drena juntamente com a pele da vulva.
Drenagem linfática da vagina Inferiormente ao hímen, os vasos deslocam-se para os gânglios inguinais superficiais, juntamente com os vasos da vulva. Já desde a porção média da vagina, os vasos linfáticos acompanham a artéria vaginal, até aos gânglios ilíacos internos. Por fim, desde a porção superior da vagina, os vasos linfáticos acompanham os do cérvix e os do útero até aos gânglios ilíacos internos e externos.
Drenagem linfática do útero O plexo capilar no revestimento mucoso do útero comunica com um plexo subseroso, a partir de onde saem vasos colectores, que passam para grupos amplamente separados de gânglios linfáticos. A partir do cérvix, os vasos passam para os gânglios ilíacos externos e internos, bem como para os gânglios sagrados e ilíacos comuns medianos. Já a maioria dos vasos com origem na porção inferior do corpo drena para os gânglios ilíacos externos. Por sua vez, os vasos da porção superior do corpo e do fundo uterino drenam, principalmente, para os gânglios lombares, acompanhando os vasos da trompa de Falópio e ovário. Para além disso, alguns vasos que se originam ao nível do fundo e corpo uterino deslocam-se ao longo do ligamento redondo do útero, até aos gânglios inguinais superficiais.
Drenagem linfática do recto e canal anal A maior parte dos vasos linfáticos que drenam o recto e o canal anal terminam em gânglios pélvicos. Contudo, os vasos que se originam no canal anal, inferiormente à linha pectínea, drenam para os gânglios inguinais superficiais. Já os vasos que drenam a porção superior do recto deslocam-se superiormente, acompanhando os vasos rectais superiores, até aos gânglios mesentéricos inferiores. Grande parte dos vasos linfáticos que drenam o canal anal deslocam-se, quer ao longo da fossa ísquiorectal, quer superiormente, acompanhando os vasos linfáticos da porção inferior do recto (e
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II consequentemente, os vasos sanguíneos rectais médios), até aos gânglios ilíacos internos. A drenagem do recto termina ainda em gânglios sagrados e ilíacos comuns medianos. De referir que, existem vasos que se originam no canal anal e recto inferior que são interrompidos por pequenos gânglios linfáticos ano-rectais, enquanto alguns vasos que drenam as porções média e superior do recto são interrompidos por gânglios para-rectais, que se encontram ao nível da parede do recto.
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Drenagem linfática do abdómen Vasos linfáticos da parede abdominal anterior Os vasos linfáticos superficiais da porção superior da parede abdominal anterior deslocam-se, sobretudo, para o grupo peitoral dos gânglios axilares (havendo alguns que perfuram o tórax e terminam nos gânglios parasternais). Já os vasos linfáticos superficiais da porção inferior da parede abdominal terminam nos gânglios inguinais superficiais. Os vasos linfáticos profundos da porção superior da parede abdominal anterior, por sua vez, acompanham os vasos epigástricos superiores e terminam nos gânglios parasternais. Já os vasos linfáticos profundos da porção inferior da parede abdominal acompanham os vasos epigástricos e ilíacos circunflexos profundos, terminando nos gânglios ilíacos externos.
Gânglios linfáticos lombares Os gânglios linfáticos lombares são contínuos inferiormente com os gânglios ilíacos comuns, sendo que, partindo dos seus membros superiores partem os troncos linfáticos lombares esquerdo e direito. Os gânglios linfáticos lombares estão divididos em grupos lateral esquerdo, lateral direito, pré-aórtico e retro-aórtico, com base nas suas relações com a aorta. De referir que, estes gânglios se encontram interconectados. O território drenado pelos gânglios linfáticos lombares corresponde à distribuição dos ramos pares da aorta, juntamente com a região irrigada pela artéria mesentérica inferior. Os gânglios linfáticos recebem os seguintes vasos linfáticos:
Eferentes dos gânglios ilíacos comuns Eferentes dos gânglios mesentéricos inferiores Vasos linfáticos dos testículos e epidídimos (entre 6 e 8 que ascendem no cordão espermático, seguindo os vasos testiculares em direcção superior.
Vasos linfáticos do uréter (desde a região média do uréter). Os gânglios da região inferior passam para os gânglios ilíacos internos e externos e os da região superior acompanham os vasos linfáticos renais.
Vasos linfáticos que emergem do hilo renal 302
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Vasos linfáticos da glândula supra-renal e que terminam, sobretudo, nos gânglios lombares superiores.
Vasos linfáticos de articulações lombares sinoviais. Vasos linfáticos de peritoneu, sendo que os vasos linfáticos do peritoneu visceral deslocam-se com os dos órgãos, que este cobre.
Gânglios mesentéricos inferiores Os gânglios mesentéricos inferiores encontram-se ao longo do tronco da artéria mesentérica inferior e recebem gânglios linfáticos provenientes dos ramos das artérias (incluindo gânglios cólicos esquerdos) até à parede do intestino.
Gânglios cólicos Os gânglios linfáticos do cólon formam quatro grupos – os gânglios epiplóicos são pequenos gânglios nos apêndices epiplóicos. Os gânglios paracólicos encontram-se ao longo dos bordos mediais do cólon ascendente e descendente e ao longo dos bordos mesentéricos do cólon transverso e sigmóide. Os gânglios cólicos intermédios encontram-se ao longo dos ramos das artérias cólicas. Por fim, os gânglios cólicos principais encontram-se situados nas raízes das artérias cólicas.
Gânglios mesentéricos superiores Os gânglios mesentéricos superiores encontram-se ao nível do tronco e ramos da artéria mesentérica superior, drenando a área por esta artéria irrigada. Ao nível do tronco da artéria mesentérica superior, os gânglios mesentéricos superiores são grandes e numerosos, recebendo os eferentes de todos os grupos correspondentes aos ramos da artéria (grupos subsidiários), eferentes dos gânglios pilóricos, aferentes directos, que partem desde a cabeça do pâncreas e duodeno, e alguns eferentes que partem do grupo cólico esquerdo superior.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Relativamente aos grupos subsidiários, estes são:
Gânglios linfáticos do mesentério – Estes gânglios encontram-se dispersos ao longo do mesentério, sendo entre 100 e 200. Estes gânglios drenam o jejuno e o íleo, com excepção da sua porção mais inferior.
Gânglios íleo-cólicos – Neste grupo incluem-se os gânglios epicólico e paracólico, que formam um agregado, ao nível do ângulo íleo-cólico, inferiormente ao qual, alguns gânglios descem com os vasos cecais, anterior e posteriormente à junção íleo-cecal, constituindo os gânglios cecais. Um gânglio apendicular pode ainda ser encontrado ao nível do mesoapêndice. Os gânglios íleo-cólicos incluem ainda um grupo intermédio, cujos gânglios se encontram ao nível do tronco da artéria íleo-cólica, e um grupo principal, cujos gânglios se encontram ao nível da raiz da artéria íleo-cólicas. De referir que, os gânglios íleo-cólicos drenam a extremidade inferior do íleo, o apêndice, o ceco e a extremidade inferior do cólon ascendente.
Gânglios cólicos direitos – Estes gânglios encontram-se ao longo da artéria cólica direita, recebendo a linfa proveniente do cólon ascendente.
Gânglios cólicos médios – Estes gânglios acompanham os ramos e tronco da artéria cólica média, drenando o ângulo hepático e os dois-terços direitos do cólon transverso.
Gânglios celíacos Os gânglios celíacos rodeiam o tronco celíaco, drenando a porção abdominal das porções correspondentes ao intestino anterior. Apesar disso, alguns linfáticos do fígado, duodeno e pâncreas deslocam-se para outros gânglios. Os gânglios celíacos constituem vários grupos, que acompanham os ramos do tronco celíaco. Estes grupos incluem os gânglios gástricos esquerdos, gástricos direitos, hepáticos, pancreático-esplénicos e pilóricos. Os gânglios gástricos esquerdos formam três subgrupos. Os gânglios inferiores encontram-se na curvatura menor, à esquerda da incisura angular. Já os gânglios pericárdicos encontram-se na extremidade cárdica do estômago. Por fim, os gânglios superiores encontram-se ao nível do tronco da artéria gástrica esquerda. Os gânglios gástricos esquerdos drenam então a porção abdominal do esófago e os dois-terços direitos do estômago (desde o fundo até ao canal pilórico), para os gânglios celíacos. Os gânglios gástricos direitos, por sua vez, encontram-se ao nível do omento menor, ao longo da artéria gástrica direita, sendo que os seus
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II eferentes passam para o grupo hepático. Por sua vez, os gânglios hepáticos encontram-se ao longo da artéria hepática própria, até à porta hepática. Um gânglio deste grupo é designado por gânglio cístico, encontrando-se na curva do colo da vesícula biliar. Alguns gânglios hepáticos são ainda designados por gânglios biliares, pelo facto de se encontrarem ao longo do canal biliar. De referir que os gânglios hepáticos recebem aferentes desde o fígado, vesícula biliar, estômago, duodeno e pâncreas, sendo que os seus eferentes passam para os gânglios celíacos. Os gânglios pancreático-esplénicos encontram-se ao longo da artéria esplénica. Os gânglios no hilo do baço recebem vasos linfáticos, desde a cápsula deste órgão, bem como vasos que acompanham a artéria gastro-epiplóica esquerda, desde o estômago. Ao nível do ligamento gastro-esplénico, encontram-se ainda pequenos gânglios gastro-epiplóicos. De salientar que os eferentes dos gânglios pancreático-esplénicos terminam no grupo celíaco. Por fim, os gânglios pilóricos encontram-se ao nível da cabeça do pâncreas, inferiormente à porção superior do duodeno, recebendo vasos eferentes, por entre as camadas do omento maior – os gânglios gastro-epiplóicos direitos. Esses gânglios, todos juntos, drenam as porções adjacentes do estômago e duodeno, enviando eferentes para os gânglios mesentérico superior, celíaco e hepático. Os vasos eferentes dos gânglios celíacos e mesentéricos superiores juntam-se, para formar o tronco intestinal, que pode ser único ou múltiplo.
Tronco linfático intestinal O tronco intestinal entra na cisterna do quilo e é formado pela união dos eferentes dos membros proximais dos grupos de gânglios linfáticos situados ao nível das artérias celíaca e mesentérica superior e respectivos ramos.
Vasos linfáticos da porção abdominal do aparelho digestivo Os vasos linfáticos da porção abdominal do aparelho digestivo partem de um plexo capilar, inferiormente ao epitélio, que o delimita, e em torno das glândulas gástrica e intestinal. Estes vasos perfuram então as túnicas musculares, juntando-se a tributárias da rede subserosa, sendo que estes vasos seguem depois os vasos sanguíneos.
Drenagem linfática do intestino grosso A irrigação do intestino grosso é similar à sua drenagem linfática. De grosso modo, os vasos linfáticos acompanham as artérias e, após serem atravessados por gânglios linfáticos, terminam nos gânglios em torno das artérias mesentérica superior e inferior. Contudo, os vasos linfáticos do terço esquerdo do cólon transverso e do ângulo esplénico apresentam a particularidade de se dividirem, quando cruzados por gânglios intermédios, seguindo duas vias distintas – uma das divisões drena para os gânglios mesentéricos inferiores, enquanto a outra drena para os gânglios mesentéricos superiores.
Drenagem linfática do intestino delgado Os vasos linfáticos provenientes do íleo e do jejuno deslocam-se para os gânglios mesentéricos. A metade inferior duodeno, por sua vez, drena para os gânglios mesentéricos superiores, para a metade superior dos gânglios pilóricos (anteriormente) e para os gânglios biliares (posteriormente).
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Drenagem linfática do estômago Os vasos linfáticos do estômago drenam para três grandes grupos ganglionares. Os vasos que partem de parte do fundo e maior parte da região direita do corpo, até ao canal pilórico, drenam para os gânglios gástricos esquerdos. Já, os vasos que drenam a porção esquerda do corpo do estômago, até à incisura angular, terminam nos gânglios pancreático-esplénicos. Finalmente, os vasos linfáticos que drenam o canal pilórico terminam nos gânglios pilóricos, gastroepiplóicos, gástricos direitos, biliares e celíacos.
Drenagem linfática do pâncreas O pâncreas drena para os gânglios pancreático-esplénicos (superiormente), mesentéricos superiores (inferiormente) e para os gânglios lombares (posteriormente).
Drenagem linfática do fígado Os vasos colectores superficiais e profundos originam-se ao nível dos capilares dos lóbulos hepáticos. Os vasos superficiais deslocam-se por debaixo do peritoneu, sendo que muitos atravessam o ligamento falciforme, seguindo o trajecto dos vasos epigástricos superiores, até aos gânglios para-esternais inferiores. Existem também vasos que se deslocam em torno do bordo inferior do fígado, em direcção à porta hepática, onde recebem vasos da face visceral do fígado, da vesícula biliar e do interior do fígado. A maior parte desses vasos terminam em gânglios hepáticos, embora alguns terminem nos gânglios gástricos esquerdos. Desde a face posterior do fígado, existem ainda vasos que se deslocam para os gânglios celíacos. Os vasos profundos também emergem com as veias hepáticas, deslocando-se com a veia cava inferior para os gânglios diafragmáticos médios, no tórax. Existem, por isso, duas vias de circulação linfática no fígado. Uma que passa pelos gânglios celíacos até à cisterna do quilo e outra que passa pelo tórax até aos troncos mediastinais de ambos os lados.
Drenagem linfática do baço A cápsula do baço drena para os gânglios do grupo pancreático-esplénico, que se encontram próximos do seu hilo. Já a polpa do baço drena para a veia esplénica e não para vasos linfáticos.
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Drenagem linfática do tórax A via principal de drenagem dos vasos linfáticos do tórax é efectuada para o tronco broncomediastinal. Existem também dois troncos intercostais descendentes, bem como tributários directos do canal torácico, que se deslocam desde os gânglios mediastinais posteriores e intercostais.
Gânglios do tórax Os gânglios intercostais consistem num ou dois pequenos gânglios localizados na extremidade vertebral de cada espaço intercostal. Estes gânglios recebem aferentes da pleura parietal e tecidos profundos da parede torácica posterior. Os eferentes dos gânglios superiores deslocam-se para o canal torácico, enquanto os eferentes dos últimos quatro ou cinco espaços juntam-se de cada lado, para formar um tronco intercostal descendente, que passa através do orifício aórtico, para a cisterna do quilo. Já os gânglios mediastinais posteriores encontram-se em torno da porção inferior do esófago, pericárdio e diafragma. Os seus eferentes passam para o canal torácico e para os troncos intercostais descendentes. Por sua vez, os gânglios frénicos dividem-se num grupo posterior, num grupo anterior e num grupo médio. O grupo posterior encontra-se na continuidade dos membros mais inferiores do grupo mediastinal posterior. Já o grupo anterior encontra-se na continuidade dos membros mais inferiores da cadeia para-esternal. Por fim, o grupo médio encontra-se em cada metade do diafragma, recebendo aferentes do diafragma e do fígado e enviando eferentes para os gânglios para-esternais e mediastinais posteriores. Os gânglios para-esternais encontram-se ao longo da artéria torácica interna, ao nível dos espaços intercostais e posteriormente à apófise xifóide. Os gânglios mais inferiores recebem vasos do pericárdio, diafragma, fígado e porção superior da parede abdominal anterior. Os seus eferentes passam ao longo do esterno, recebendo os vasos linfáticos que se deslocam com os ramos intercostais e perfurantes da artéria torácica interna. De referir que os eferentes dos gânglios para-esternais unem-se num único
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II vaso, que se junta com os eferentes dos gânglios traqueo-bronquiais e mediastinais anteriores, formando assim, o tronco bronco-mediastinal. Relativamente aos gânglios broncopulmonares, estes encontram-se ao nível do hilo do pulmão, sendo que ao nível dos brônquios maiores são passíveis de ser encontrados pequenos gânglios pulmonares. Por seu turno, os gânglios traqueobronquiais inferiores encontram-se ao nível do ângulo de bifurcação de traqueia, enquanto os gânglios traqueo-bronquiais superiores são contínuos com os gânglios broncopulmonares superiores, de cada lado. De referir que estes três grupos de gânglios recebem vasos linfáticos do pulmão, pleura visceral, brônquios e metade inferior da traqueia. Vasos linfáticos provenientes do lado esquerdo do coração terminam no grupo traqueo-bronqueal superior. Os gânglios traqueais estendem-se ao longo de cada lado da traqueia, até ao pescoço, drenando a traqueia e parte do esófago. Finalmente, os gânglios mediastinais anteriores encontram-se ao nível das veias braquiocefálicas e crossa da aorta, recebendo vasos linfáticos do timo, pericárdio e do lado direito do coração. Os eferentes últimos dos gânglios broncopulmonares, traqueo-bronquiais, traqueais e mediastinais anteriores, unem-se num único vaso, que se junta, de cada lado, a um eferente dos gânglios paraesternais, para formar o tronco bronco-mediastinal. Após um pequeno percurso em direcção superior, o tronco normalmente termina na veia braquiocefálica correspondente.
Vasos linfáticos do diafragma Um plexo linfático extenso encontra-se presente em cada face do diafragma, sendo que os dois plexos se encontram unidos por numerosos vasos que perfuram o diafragma. Os vasos linfáticos que partem de ambas as faces do diafragma deslocam-se para os gânglios para-esternais, frénicos médios e mediastinais posteriores. Apenas uma quantidade reduzida de vasos linfáticos da face abdominal do diafragma drena para os gânglios lombares.
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Vasos linfáticos da pleura parietal Os vasos da pleura costal drenam sobretudo para os gânglios intercostais e para-esternais. A drenagem da pleura costal do primeiro espaço intercostal e da pleura cervical é efectuada para os gânglios cervicais profundos inferiores. Já a pleura mediastinal drena para os gânglios traqueo-bronquiais e mediastinais, enquanto a pleura diafragmática drena para os gânglios que drenam as porções correspondentes do diafragma.
Vasos linfáticos da pleura visceral e pulmões Um plexo de vasos linfáticos na árvore bronquial estende-se até aos bronquíolos mais pequenos. Contudo, os alvéolos pulmonares não apresentam vasos linfáticos. Por debaixo da pleura pulmonar, existe também um plexo de vasos que se estende sobre a superfície dos pulmões até ao hilo. Por entre os dois plexos existem vasos comunicantes, que se deslocam nos septos interlobulares, sendo que nestes vasos a linfa pode se deslocar em qualquer direcção. Os dois plexos chegam ao hilo e os vasos linfáticos que deles partem entram nos gânglios pulmonares, bronco-pulmonares e traqueo-bronquiais.
Vasos linfáticos do pericárdio e coração O pericárdio drena para os gânglios mais próximos – ou seja, gânglios mediastinais (anteriores e posteriores) e gânglios para-esternais. Relativamente à drenagem linfática do coração, esta ocorre a partir de um plexo, que se inicia inferiormente ao endocárdio. Os seus eferentes perfuram o miocárdio, para se juntarem a outros eferentes, provenientes de plexos mais ricos, que se encontram inferiormente ao epicárdio. A drenagem linfática das aurículas pensa-se que seja feita para os gânglios traqueo-bronquiais, enquanto os vasos colectores provenientes dos ventrículos passam para o sulco coronário, seguindo o trajecto das artérias coronárias, em direcção à sua origem – os vasos colectores que acompanham a artéria coronária direita, formam normalmente um tronco único que termina num nódulo mediastinal anterior, enquanto os vasos colectores que acompanham a artéria coronária esquerda também confluem num único tronco, que normalmente termina num nódulo ao nível do grupo traqueo-bronquial superior direito.
Vasos linfáticos do esófago A porção abdominal do esófago drena para os gânglios gástricos esquerdos, enquanto a porção torácica inferior deste órgão drena para os gânglios mediastinais posteriores. Por fim, as porções torácica superior e cervical do esófago drenam para os gânglios traqueais.
Vasos linfáticos do timo A partir do tecido conjuntivo interlobular, os vasos passam para os gânglios mediastinais anteriores e para-esternais de ambos os lados.
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Vasos linfáticos terminais Os vasos linfáticos terminais incluem o canal torácico e o tronco linfático direito, sendo que o canal torácico se inicia ao nível da confluência abdominal de troncos linfáticos, que por vezes corresponde à cisterna do quilo.
Cisterna do quilo e troncos linfáticos abdominais A origem abdominal do canal torácico encontra-se ao nível do bordo inferior de T12, sendo que este canal recebe toda a linfa drenada pelos quatro troncos linfáticos abdominais principais, que convergem num arranjo alongado de canais – a confluência abdominal de troncos linfáticos. Esta confluência pode constituir um único canal, encontrar-se duplicada, triplicada ou plexiforme. Por vezes, esta confluência é uma dilatação simples, fusiforme e sacular, designada por cisterna do quilo. A confluência abdominal de troncos linfáticos estende-se desde o início do canal torácico, até 5-7 centímetros verticalmente e inferiormente e encontra-se anterolateralmente e à direita dos corpos vertebrais das duas primeiras vértebras lombares. Esta confluência encontra-se imediatamente à direita da aorta abdominal, sendo que ao longo do seu comprimento, esta encontra-se por entre os territórios, que contêm os gânglios linfáticos aórticos laterais superiores direitos e os gânglios dos grupos celíaco, mesentérico superior e pré-aórtico, que se encontram do lado direito. As duas artérias lombares direitas superiores e a veia ázigos lombar direita, encontram-se por entre a confluência e a coluna vertebral, enquanto o bordo medial do pilar direito do diafragma encontra-se anteriormente à confluência abdominal dos troncos linfáticos. Os troncos lombares confluem para a cisterna do quilo, ou para a confluência abdominal de troncos linfáticos. Estas estruturas são formadas pelos vasos linfáticos que drenam desde os gânglios aórticos laterais, transportando linfa quer directa, quer indirectamente, desde os membros inferior, paredes pélvica, perineal e infra-umbilical e tecidos profundos da maior parte das paredes abdominais supraumbilicais, maior parte das vísceras pélvicas, gónadas, rins e glândulas supra-renais. Os troncos linfáticos intestinais recebem vasos, que drenam desde os gânglios celíacos e pré-aórticos, drenando portanto (directa ou indirectamente), maior parte da região do tracto gastrointestinal, até ao ânus.
Canal torácico Nos indivíduos adultos, o canal torácico, incluindo a confluência dos troncos linfáticos, apresenta um comprimento de 38-45 cm, estendendo-se desde L2 até à base do pescoço. O canal torácico inicia-se a partir do pólo superior da confluência, perto do bordo inferior de T12 e atravessa o espaço retrocrural do diafragma, acompanhando a aorta, veia ázigos e hemiázigos e depois ascendendo no mediastino
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II posterior, à direita da linha média, por entre a aorta torácica descendente (à esquerda) e a veia ázigos (à direita). A coluna vertebral, as artérias intercostais aórticas direitas e os segmentos terminais das veias hemiázigos e hemiázigos acessória são relações posteriores. Já o diafragma e o esófago são anteriores.
Ao nível de T5, o canal gradualmente inclina-se para a esquerda, entra no mediastino superior, ascendendo depois para o inlet torácico, ao longo do bordo esquerdo do esófago. Nesta porção do seu percurso, o canal é, inicialmente cruzado anteriormente pela crossa da aorta, deslocando-se depois posteriormente ao segmento inicial da artéria subclávia esquerda, em próximo contacto com a pleura mediastinal esquerda. Passando no pescoço, o canal torácico arqueia-se lateralmente ao nível da apófise transversa de C7. O seu arco eleva-se 3 ou 4cm superiormente à clavícula e curva-se anteriormente à artéria e veia vertebral, ao tronco simpático esquerdo, ao tronco tirocervical, ou aos seus ramos, ao nervo frénico esquerdo e ao bordo medial do escaleno anterior. Este canal passa então posteriormente à artéria carótida comum esquerda, ao nervo vago e à veia jugular interna. Finalmente, o canal desce anteriormente à primeira porção da artéria subclávia esquerda e termina abrindose na junção das veias subclávia e jugular interna, podendo-se abrir, quer nas grandes veias, quer na sua junção, ou pode-se dividir num número variável de vasos mais pequenos.
Tributárias Os troncos linfáticos descendentes bilaterais partem dos gânglios linfáticos intercostais dos últimos seis ou sete espaços intercostais de ambos os lados, atravessam o espaço retrocrural e juntam-se às
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II regiões laterais do canal torácico no abdómen, imediatamente após a sua origem. Já os troncos linfáticos lombares ascendentes bilaterais partem dos gânglios aórticos laterais superiores ascendem e perfuram os seus pilares diafragmáticos correspondentes, juntando-se depois ao canal torácico, a um nível variável. Os troncos intercostais superiores drenam os gânglios intercostais nos cinco ou seis espaços intercostais esquerdos superiores. Os troncos mediastinais drenam vários grupos nodulares e representam vias para o canal torácico da região diafragmática convexa do fígado, o diafragma, o pericárdio, o coração e o esófago. O tronco subclávio esquerdo normalmente junta-se ao canal torácico, mas pode se abrir independentemente na veia subclávia esquerda. Já o tronco jugular esquerdo juntase, normalmente, ao canal torácico, embora se possa abrir independentemente na veia jugular interna esquerda. Por outro lado, o tronco broncomediastinal ocasionalmente junta-se ao canal torácico, mas normalmente, tem uma abertura venosa independente. De referir que, a maior parte dos troncos anteriormente mencionados apresentam válvulas bicúspides terminais, que possivelmente impedem o refluxo da linfa. Importa ainda referir que o fígado, a glândula tiróide e o esófago apresentam drenagem linfática (em parte) directa para o canal torácico, constituindo as vias anoviais de drenagem.
Tronco linfático direito O tronco linfático direito apresenta uma anatomia variável, podendo ser duplo, ter uma terminação esquerda, direita ou bilateral. A natureza plexiforme dos troncos, a partir do qual o canal torácico se desenvolve leva a um número de possíveis anomalias. De referir que o tronco linfático direito nem sempre se encontra presente.
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Mnemónicas sobre sistema linfático: - Posição do canal torácico: “The duck between two gooses” – Thoracic duct (duck) lies between the “oesophagoose” and the “azygoose” veins.
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Drenagem linfática por estrutura Estrutura
Gânglios de drenagem
Pavimento da boca
Submandibulares (anteriormente) e cervicais profundos superiores (posteriormente) Trajecto dos vasos das paredes das cavidades nasais Submandibulares (maior parte) e submentonianos (porção mediana do lábio inferior) Submandibulares Submandibulares (porção externa) e submentonianos e cervicais profundos superiores (porção interna) Cervicais profundos superiores, nomeadamente jugulo-omohióide (vasos anteriores e médios) e jugulo-digástrico (vasos posteriores) Submentonianos (anteriormente) e drenagem similar à língua (posteriormente)
Glândula parótida
Parotídeos
Glândula submandibular
Submandibulares e cervicais profundos superiores
Glândula sublingual
Submandibulares e cervicais profundos superiores
Amígdala palatina
Cervicais profundos superiores
Amígdala faríngea
Cervicais profundos superiores
Rinofaringe
Cervicais profundos superiores Cervicais profundos superiores (superiormente) e cervicais profundos inferiores, pré-traqueais, para-traqueais e laríngeos (inferiormente)
Cavidade nasal Seios nasais Lábios Dentes Gengivas Língua
Laringe Tiróide
Canal torácico (directamente), cervicais profundos, pré-traqueais e para-traqueais
Timo
Mediastinais anteriores e para-esternais
Traqueia
Traqueais e traqueo-brônquicos
Pleura parietal costal
Intercostais e para-esternais
Pleura parietal cervical Pleura parietal mediastínica Pleura parietal diafragmática Pleura visceral
Cervicais profundos inferiores
Pulmões
Pulmonares, bronco-pulmonares e traqueo-brônquicos
Pericárdio
Mediastinais e para-esternais
Aurículas do coração
Esófago cervical
Traqueo-brônquicos Mediastinal anterior (vasos colectores que acompanham a artéria coronária direita) e traqueo-brônquicos superiores direitos (vasos colectores que acompanham a artéria coronária esquerda) Traqueais
Esófago torácico
Canal torácico (directamente) e mediastinais posteriores
Esófago abdominal
Gástricos esquerdos
Diafragma
Para-esternais, frénicos médios e mediastínicos posteriores
Fígado (via superficial)
Canal torácico (directamente), hepáticos, celíacos e gástricos esquerdos Pancreático-esplénicos (superiormente), mesentéricos superiores (inferiormente) e lombares (posteriormente) Pancreático-esplénicos (cápsula)
Ventrículos do coração
Pâncreas Baço
Traqueo-brônquicos e mediastínicos Drenagem similar à do diafragma Pulmonares, bronco-pulmonares e traqueo-brônquicos
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Duodeno
Gástricos esquerdos (região direita do corpo e fundo), pancreático-esplénicos (porção esquerda do corpo) e pilóricos, gastro-epiplóicos, gástricos direitos, biliares e celíacos (canal pilórico) Mesentéricos superiores e pilóricos (anteriormente) e biliares (posteriormente)
Jejuno e íleo
Mesentéricos superiores
Intestino grosso
Mesentéricos superiores e inferiores (conforme a irrigação)
Rins
Lombares (grupo aórtico-lateral)
Glândula supra-renal
Lombares (grupo aórtico-lateral)
Ureter
Ilíacos externos e internos e lombares (grupo aórtico-lateral)
Bexiga
Ilíacos externos, ilíacos internos, ilíacos comuns e sagrados
Recto
Escroto
Pélvicos e mesentéricos inferiores (recto superior) Inguinais superficiais (inferiormente à linha pectínea) e pélvicos (superiormente à linha pectínea) Inguinais superficiais
Testículos
Lombares (grupo aórtico-lateral)
Epidídimos
Lombares (grupo aórtico-lateral)
Próstata
Ilíacos externos, ilíacos internos e sagrados
Pénis
Inguinais superficiais e profundos
Estômago
Canal anal
Uretra masculina anterior Inguinais superficiais e profundos (como o pénis) Uretra masculina posterior (e uretra feminina) Ovário
Ilíacos internos Lombares (Grupo aórtico-lateral)
Trompas de Falópio
Lombares (Grupo aórtico-lateral)
Corpo do útero
Ilíacos externos (inferiormente) e lombares e inguinais superficiais (superiormente)
Cérvix
Íliacos externos, ilíacos internos, ilíacos comuns medianos e sagrados Inguinais superficiais (inferiormente ao himen), ilíacos internos (porção média e superior) e ilíacos externos (porção superior)
Vagina Vulva Clitoris
Inguinais superficiais Inguinais superficiais e profundos (como o pénis)
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8. Embriologia Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Embriologia geral Primeira semana de desenvolvimento Fecundação A fecundação é o processo a partir do qual o gâmeta masculino e feminino se fundem, algo que ocorre na ampola da trompa de Falópio – a parte mais larga da trompa, localizada próxima ao ovário. Os espermatozóides podem ficar no trato reprodutivo feminino por vários dias, sendo que apenas 1% destas células que são depositadas na vagina chegam ao cérvix (colo do útero), onde podem sobreviver por muitas horas. O movimento dos espermatozóides do cérvix para a trompa de Falópio (que demora entre 2 a 7 horas) ocorre graças à contracção muscular, sentida no útero e na trompa, bem como por acção da sua própria propulsão. Após chegarem ao istmo uterino, os espermatozóides tornam-se menos móveis, terminando a sua migração. Quando a mulher se encontra no período de ovulação, os espermatozóides tornam-se mais móveis, naquele lugar, deslocando-se até à ampola. Isto ocorre provavelmente por causa de substâncias químicas produzidas pelas células que rodeiam o oócito. Os espermatozóides não têm capacidade de fertilizar o oócito imediatamente após chegarem ao trato genital feminino, devendo sofrer capacitação e reacção acrossómica, processos de cariz celular. Após estas células sofrerem estes dois processos, os espermatozóides penetram a corona radiata do oócito, a zona pelúcida e, finalmente, dá se a formação do ovo ou zigoto, com fusão das membranas dos dois gâmetas. Se não for fecundado, o oócito degenera normalmente, 24 horas, após a fertilização.
☤A
título de curiosidade, dos 200-300 milhões de espermatozóides que são normalmente depositados no trato genital feminino, apenas entre 300 a 500 chegam ao local de fecundação. Apenas um destes fertiliza o oócito, enquanto os outros, pensa-se, ajudam o espermatozóide fertilizante a penetrar nas barreiras que protegem o gâmeta feminino.
Clivagem (segmentação) e formação da mórula Após ocorrer a primeira divisão celular no zigoto, este sofre uma série de divisões mitóticas, aumentando o seu número de células, que se tornam mais pequenas, após cada divisão. Estas células são denominadas de blastómeros. Após a terceira clivagem, os blastómeros maximizam o seu contacto, uns com os outros (processo de compactação). Três dias depois da fecundação, as células do embrião dividem-se de novo, formando a mórula, uma entidade com 16 células. As células internas da mórula constituem a massa celular interna, enquanto as células periféricas constituem a massa celular externa. Esta divisão é importante, na medida em que a massa celular interna origina os tecidos do embrião, propriamente dito, enquanto a massa celular externa origina o trofoblasto (que depois contribui para a placenta).
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Formação do blastocisto e implantação uterina Quando a mórula entra na cavidade uterina, começa a penetrar um fluido pela zona pelúcida, até aos espaços intercelulares da massa celular interna. Gradualmente, os espaços intercelulares tornam-se confluentes, originando-se uma cavidade única – o blastocélio. Nesta altura, o embrião é um blastocisto, encontrando-se as células da massa interna (designadas por embrioblasto) num pólo, enquanto as da massa celular externa (ou trofoblasto) tornam-se achatadas para formar a parede epitelial do blastócito. Ao nível do sexto dia, a zona pelúcida já desapareceu, o que permite que se dê a implantação, com as células do trofoblasto a começar a penetrar por entre as células epiteliais da mucosa uterina. Por esta altura, a mucosa uterina encontra-se na fase secretora, durante a qual, as glândulas uterinas e as artérias tornam-se enroladas e o tecido encontra-se mais consistente, sendo reconhecidas três camadas distintas no endométrio – uma mais superficial e compacta, uma intermédia, mas esponjosa e uma fina camada basal. Normalmente, o blastocisto implanta-se no endométrio, ao longo da parede posterior ou anterior do corpo do útero, onde se torna envolvido pelas aberturas das glândulas. Caso o oócito não tenha sido fertilizado, continua o ciclo uterino, seguindo-se a fase menstrual.
☤ Por vezes, o blastocisto não se consegue implantar na parede do útero, implantando-se noutro local (por exemplo, uma porção estreita da trompa), originando uma gravidez ectópica. Estas situações acarretam normalmente graves complicações para a mãe, que podem resultar inclusive na morte da mesma.
Eventos principais da primeira semana de desenvolvimento:
A fecundação ocorre ao nível da região ampulária das Trompas de Falópio, através da junção do pronúcleo masculino com o feminino. Formação do zigoto.
O embrião sofre uma série de divisões mitóticas (clivagens). Aumento do número de células blastómeros, que apresentam dimensões cada vez menores.
Formação da mórula (composta por 16 blastómeros) ao quarto dia. Penetração de um fluido na zona pelúcida da mórula – formação de uma grande cavidade (blastocélio) e de duas entidades celulares, o embrioblasto (células da massa celular externa) e o trofoblasto (células da massa celular externa). O embrião é um blastocisto.
Desaparecimento da zona pelúcida (pelo sexto dia) e implantação embrionária no endométrio.
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Segunda semana de desenvolvimento Oitavo dia No oitavo dia de desenvolvimento, o blastocisto já se encontra parcialmente envolvido no estroma do endométrio. Na área sobre o embrioblasto, as células do trofoblasto já se encontram diferenciadas em duas camadas – uma camada interna de células mononucleadas – o citotrofoblasto, e, camada externa com células multinucleadas sem limites distintos – o sincitiotrofoblasto. As células do citotrofoblasto dividem-se e migram para o sincitiotrofoblasto, onde se fundem e perdem as suas membranas individuais. As células do embrioblasto também se diferenciam em duas camadas – uma camada de pequenas células cubóides, adjacentes ao blastocisto (o hipoblasto) e outra camada, de células colunares, adjacentes à cavidade amniótica (o epiblasto), sendo originado o embrião bilaminar. A cavidade amniótica forma-se simultaneamente à ocorrência deste processo e aparece no epiblasto.
Nono dia Ao nono dia, o blastocisto já se encontra mais profundamente envolvido pelo endométrio. O trofoblasto apresenta já vacúolos no sincício, ao nível do pólo embriónico, que ao fundirem-se, originam lacunas de grandes dimensões. Esta fase do desenvolvimento embrionário é por isso conhecida como fase lacunar. Simultaneamente, no pólo oposto, células achatadas, provavelmente provenientes do hipoblasto, formam uma membrana fina – a membrana exocelómica, que delimita a superfície interna do citotrofoblasto. Esta membrana, juntamente com o hipoblasto, forma o limite da cavidade exocelómica, ou saco vitelino primitivo.
Décimo primeiro e décimo segundo dia Por esta altura, o blastocisto já está completamente envolto no estroma endometrial, estando isolado da cavidade uterina propriamente dita por um selo de fibrina. O trofoblasto caracteriza-se pelos espaços lacunares no sincício, que formam uma rede comunicante, que é particularmente evidente no pólo embrionário. No pólo oposto continuamos a ter, sobretudo, células citotrofoblásticas.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Simultaneamente, as células do sinciotrofoblasto penetram, mais profundamente no estroma e erodem os capilares maternos, que tal como se apresentam (dilatados), se designam por sinusóides. As lacunas tornam-se então contínuas com os sinusóides e o sangue materno entra no sistema lacunar. À medida que o trofoblasto continua a erodir os sinusóides, mais sangue materno começa a penetrar no trofoblasto, estabelecendo a circulação útero-placentária. Por outro lado, uma nova população de células aparece por entre a superfície interna do citotrofoblasto e a face externa da cavidade exocelómica. Estas células, derivadas do saco vitelino, formam uma fina camada de tecido conjuntivo – a mesoderme extra-embrionária, onde se desenvolvem grandes cavidades que, tornando-se confluentes, originam um novo espaço – o celoma extra-embrionário, ou cavidade coriónica. Este espaço rodeia o saco vitelino primitivo e a cavidade primitiva. A mesoderme extra-embrionária que delimita o citotrofoblasto e o âmnio é designada por mesoderme somatopleura extra-embrionária, enquanto a que delimita o saco vitelino primitivo é designada por mesoderme esplancopleura extra-embrionária. O crescimento deste disco bilaminar é relativamente lento, quando comparado com o do trofoblasto, mantendo-se o disco com dimensões muito reduzidas (entre 0,1 e 0,2 mm).
Décimo terceiro dia Ao nível do décimo terceiro dia de desenvolvimento, pode ocorrer a libertação de sangue, no local de implantação, como resultado de um maior fluxo sanguíneo para os espaços lacunares. Dado, isto ocorrer próximo do 28º dia do ciclo menstrual, pode por vezes ser confundido com o sangrar da menstruação. O trofoblasto, por esta altura, caracteriza-se pela presença de estruturas vilosas – as células do citotrofoblasto proliferam localmente e penetram no sincitiotrofoblasto, formando colunas, rodeadas por sincício, as quais são designadas por vilosidades primárias.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Simultaneamente, o hipoblasto produz células que migram ao longo da membrana exocelómica, que proliferam e gradualmente formam uma nova cavidade dentro da cavidade exocelómica – o saco vitelino secundário (ou saco vitelino definitivo). Por outro lado, o celoma extra-embrionário expande-se e forma uma grande cavidade – a cavidade coriónica. A mesoderme somatopleura passa então a designar-se por placa coriónica. O único lugar onde a mesoderme extraembrionária atravessa a cavidade coriónica é na região que originará o cordão umbilical.
☤ O facto de a circulação entre o sinciciotrofoblasto e a circulação materna estar completamente efectuada, leva a que o sinciotrofoblasto comece a produzir hCG (gonadotropina coriónica humana), o que faz com que os testes de gravidez que detectam esta hormona, passem a dar resultados positivos.
Eventos principais da segunda semana de desenvolvimento:
No oitavo dia, as células do trofoblasto diferenciam-se no citotrofoblasto e no sinciciotrofoblasto, enquanto as células do embrioblasto diferenciam-se em epiblasto e hipoblasto. O embrião designa-se por bilaminar.
No nono dia ocorre formação das lacunas do trofoblasto (fase lacunar) e o aparecimento da membrana exocelómica (adjacente à face interna do citotrofoblasto), delimitando o saco vitelino primitivo.
No décimo primeiro e décimo segundo dias ocorre estabelecimento da circulação úteroplacentária e formação da mesoderme extra-embrionária (por entre o citotrofoblasto e o saco vitelino primitivo).
Formação da cavidade coriónica ao nível da mesoderme extra-embrionária. A cavidade coriónica é delimitada por mesoderme extra-embrionária somatopleura, externamente, e pela mesoderme extra-embrionária esplancopleura, internamente.
Ao nível do décimo terceiro dia formam-se as vilosidades primárias, ao nível do trofoblasto e ocorre formação do saco vitelino secundário. A mesoderme extraembrionária somatopleura passa a designar-se por placa coriónica.
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Terceira semana de desenvolvimento Gastrulação – formação da mesoderme embriónica e da endoderme O evento mais característico durante a terceira semana de gestação é a gastrulação, o processo que estabelece as três camadas embrionárias – a ectoderme, a mesoderme e a endoderme (diz-se portanto, que se forma um embrião trilaminar). A gastrulação inicia-se com a formação da linha primitiva na superfície do epiblasto. Inicialmente, a linha encontra-se vagamente definida, mas no embrião com entre 15 e 16 dias, esta se encontra claramente visível como um sulco estreito – o sulco primitivo. A linha primitiva encontra-se na porção mais caudal do embrião, sendo que na extremidade cefálica da linha encontramos o nó primitivo – consiste numa área ligeiramente elevada, associada à fosseta primitiva. As células do epiblasto migram para a linha primitiva e ao chegar a essa região, destacam-se do epiblasto, movimentando-se para dentro, por uma invaginação (esta ocorre, mais precisamente, ao nível da fosseta primitiva pelo 14º/15º dia). Essas células vão estar por detrás da origem na endoderme, sendo que as restantes células do epiblasto originam a ectoderme. Por fim, as células da mesoderme aparecem por volta do 16º dia, por entre o epiblasto e a endoderme. As células que restam do epiblasto formam depois a ectoderme. Dessa forma, o epiblasto, através do processo de gastrulação é a fonte das três camadas germinativas, sendo que as células nessas camadas originarão todos os tecidos e órgãos no embrião. À medida que mais células se deslocam por entre o epiblasto e o hipoblasto, estas começam a deslocar-se lateralmente e em direcção craniana. Gradualmente, estas células migram para além da margem do disco, estabelecendo contacto com a mesoderme extraembrionária. A lâmina précordal forma-se por entre a ponta do notocórdio e a membrana bucofaríngea, sendo derivada de algumas das primeiras células que migram do nódulo na linha média e se movem em direcção cefálica. Essa lâmina será importante para induzir a região anterior do cérebro. A membrana bucofaríngea, na extremidade craniana do disco, consiste numa pequena região de células da ectoderme e endoderme, representando a abertura futura da cavidade oral.
Formação do notocórdio As células pré-notocordiais, que invaginam do nódulo primitivo movem-se em direcção craniana, na linha média, até atingirem a lâmina pré-cordal. Essas células tornam-se intercaladas com o hipoblasto e,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II então, por pouco tempo, a linha média passa a englobar duas camadas de células que formam a lâmina do notocórdio. O notocórdio é formado por células da lâmina do notocórdio que proliferam e se destacam da endoderme. O notocórdio definitivo sobrepõe-se ao tubo neural e é a base do esqueleto axial. No organismo adulto encontram-se ainda células remanescentes do notocórdio, ao nível do núcleo pulposo dos discos intervertebrais e do ligamento apical do dente do áxis. A sua elongação é um processo dinâmico, formando-se primeiro a extremidade craniana, às quais se vão juntando as regiões caudais. Forma-se inicialmente um prolongamento notocordal, que no seu interior vai ter um canal – o canal notocordal, que contactando com a endoderme, vai originar a lâmina cordal, que origina, independentemente da endoderme, o notocórdio propriamente dito. De referir que, durante um período de tempo transitório, ao nível da fosseta primitiva, forma-se um canal neurentérico que estabelece comunicação entre a cavidade amniótica e o saco vitelino. O estabelecimento dos eixos corporais ocorre antes e durante o período de gastrulação, sendo determinados os eixos anteroposterior, dorsoventral e esquerdo-direito. O eixo anteroposterior é assinalado por células no bordo anterior (cranial) do disco embrionário, numa área designada por endoderme visceral anterior.
Eventos principais da terceira semana de desenvolvimento:
Ocorrência de gastrulação, formando-se inicialmente a linha primitiva, que apresenta na sua extremidade cranial o nó primitivo associado à fosseta primitiva.
Formação subsequente do embrião trilaminar na gastrulação – registo de uma invaginação, ao nível da fosseta primitiva, das células do epiblasto que vão originar a endoderme. As restantes células do epiblasto originam a ectoderme. Passado algum tempo, regista-se o aparecimento da mesoderme, por entre a endoderme e o epiblasto.
Formação do notocórdio – migração das células pré-notocordiais em direcção cranial. Génese do prolongamento notocordial, que originará a lâmina cordal, que por sua vez, está na base da formação do notocórdio, propriamente dito.
O notocórdio é a base do esqueleto axial e é essencial para a determinação dos eixos corporais.
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Organogénese O processo de organogénese ocorre entre a terceira e a oitava semana, ocorrendo a formação dos derivados das três camadas germinativas. A partir da nona semana, deixamos de considerar o período embrionário e começamos a considerar o período fetal, que se continua até ao nascimento do indivíduo. Esta última etapa é marcada por uma maturação dos tecidos e órgãos e por um rápido crescimento do corpo.
Derivados da ectoderme Neurulação No início da terceira semana de desenvolvimento, a ectoderme apresenta a forma de um disco, mais largo na região cefálica, que na região caudal. O aparecimento do notocórdio e da mesoderme précordal induz o espessamento da ectoderme e a formação da placa neural, cujas células constituem a neuroectoderme. A placa neural origina o tubo neural, através do processo de neurulação. No final da terceira semana, os bordos laterais da placa neural elevam-se, formando as pregas neurais (diz-se que a placa neural sofre uma invaginação), sendo que a região deprimida por entre as pregas neurais constitui a goteira neural. Gradualmente, as pregas neurais aproximam-se uma da outra, unindo-se na linha média. Essa fusão inicia-se ao nível do quinto sómito (na região cervical), progredindo cranialmente e caudalmente. O fecho do neuroporo cranial ocorre aproximadamente no dia 25, enquanto o fecho do neuroporo caudal ocorre aproximadamente no dia 28. Quando isto ocorre, a neurulação encontra-se completa, estando o sistema nervoso central representado por uma estrutura tubular fechada (o tubo neural), com uma porção caudal estreita e uma porção cefálica mais larga, com várias dilatações (as quais designamos por vesículas cerebrais, que são inicialmente três, mas passam depois a ser cinco). Enquanto as pregas neurais se elevam e fundem, as células do bordo lateral da neuroectoderme começam a dissociar-se das vizinhas, originando a crista neural. Estas células deixam de ser epiteliais para passar a ser mesenquimatosas, entrando na mesoderme (a mesoderme refere-se às células derivadas do epiblasto e de tecidos extra-
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II embrionários, enquanto o mesênquima refere-se ao tecido conjuntivo embrionário organizado de qualquer origem). As células da crista neural vão ser essenciais para formar estruturas tais como os gânglios do sistema nervoso simpático, o sistema nervoso entérico, os melanócitos da pele, a medula da glândula supra-renal e a raiz dos vasos raquidianos, podendo as células da crista neural ser dividida em células cranianas, cardíacas e caudais.
Derivados da mesoderme Inicialmente, as células da mesoderme formam uma fina camada de tecido entrançado, de cada lado da linha média. Contudo, por volta do 17º dia, as células movem-se para próximo da linha média, proliferam e formam uma lâmina mais espessa de tecido – a mesoderme para-axial. Mais lateralmente, a mesoderme torna-se fina, sendo designada por mesoderme lateral. Com a presença e fusão das cavidades intercelulares na mesoderme lateral, esta passa a ser dividida em duas camadas – uma camada contínua com a mesoderme que cobre o âmnio e que passa a ser designada por mesoderme parietal ou somática e uma camada contínua com a mesoderme que cobre o saco vitelino e que é designada por mesoderme visceral ou esplâncnica. Estas duas camadas delimitam juntas o celoma (cavidade) intra-embrionário, que é contínuo com a cavidade extra-embrionária de cada lado do embrião. Este estará associado ao desenvolvimento das cavidades torácica e abdominal, através dos celomas pleuroperitoneal e pericárdica. A mesoderme intermédia, que liga a mesoderme para-axial à mesoderme lateral, está depois relacionada com a origem do tracto urogenital.
Mesoderme para-axial No início da terceira semana, a mesoderme para-axial começa a organizar-se em segmentos. Estes segmentos são designados por somitómeros, aparecendo inicialmente na região cefálica do embrião, sendo que a sua formação procede cefalo-caudalmente. A partir da região occipital, em direcção caudal,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II os somitómeros organizam-se em sómitos, sendo que o primeiro par de sómitos aparece na região occipital, por volta do 20º dia de desenvolvimento. A partir daqui, os novos sómitos aparecem em sequência cefalo-caudal, a uma taxa aproximadamente de três pares por dia, até que, no final da quinta semana, estão presentes entre 42 e 44 pares de sómitos. No que concerne ao número de pares de sómitos, estes são quatro occipitais, oito cervicais, doze torácicos, cinco lombares, cinco sagrados e entre oito e dez coccígeos. Devido ao facto de os sómitos aparecerem com uma periodicidade específica, a idade de um embrião pode ser precisamente determinada, através da contagem dos sómitos. Cada sómito forma o seu próprio esclerótomo (unidade que origina osso e cartilagem), miótomo (unidade que origina o músculo esquelético) e dermátomo (que vai originar a derme das costas). Cada miótomo e dermátomo apresenta também a sua própria componente nervosa segmental.
Mesoderme intermédia A mesoderme intermédia, que temporariamente liga a mesoderme para-axial com a mesoderme lateral diferencia-se em estruturas urogenitais. Nas regiões cervical e torácica superior, forma os futuros nefrótomos, enquanto mais caudalmente forma massas não segmentadas de tecido – a corda nefrogénica. As unidades excretoras do sistema urinário e as gónadas desenvolvem-se então a partir desta mesoderme, em parte segmentada e em parte não-segmentada.
Mesoderme lateral A mesoderme lateral diferencia-se em mesoderme parietal (somática) e mesoderme visceral (esplâncnica), que delimitam o celoma intra-embrionário e rodeiam os órgãos, respectivamente. Essas pregas, juntamente com a cabeça e com a cauda fecham a parede ventral do corpo. A camada parietal da mesoderme lateral forma a derme da pele, na parede corporal e nos membros, o esterno e os ossos e tecido conjuntivo dos membros. Já a camada visceral da mesoderme lateral, juntamente com a endoderme, forma a parede do tubo digestivo. As células da mesoderme da camada parietal, que rodeiam o celoma intra-embrionário formam finas membranas – as membranas mesoteliais, ou serosas, que delimitarão as cavidades peritoneal, pleural e pericárdica e segregarão um fluido seroso. Por outro lado, as células da mesoderme da camada visceral formam uma fina membrana serosa, em torno de cada órgão. Esta distribuição da mesoderme parietal e da mesoderme visceral explica a presença, por exemplo, de duas camadas de pericárdio, ou pleura. Neste último caso, a pleura parietal deriva da mesoderme parietal, enquanto a pleura visceral deriva da mesoderme visceral.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Parte da mesoderme esplâncnica vai constituir aquilo que se designa por mesoderme cardiogénica, na região onde o coração se desenvolve, originando os tubos cardíacos endocárdicos, que se fundem para originar o tubo cardíaco primordial.
Derivados da endoderme O tracto gastrointestinal é o principal sistema de órgãos derivados da endoderme. Esta camada germinativa cobre a superfície ventral do embrião e forma o tecto do saco vitelino. Com o desenvolvimento e crescimento das vesículas cerebrais, o disco embrionário, começa a invadir a cavidade amniótica e a dobrar-se cefalo-caudalmente. Este pragueamento é pronunciado nas regiões da cabeça e cauda, sendo também formadas pregas laterais (como resultado do crescimento dos sómitos), que se movem ventralmente, para ajudar no fecho da parede corporal, sendo integrado o saco vitelino. Como resultado destes pragueamentos, uma porção da camada germinativa endodermal é incorporada no corpo do embrião, formando o tubo digestivo. Este divide-se num intestino anterior, intestino médio e intestino posterior. O intestino médio comunica com o saco vitelino pelo ducto vitelino, que se torna cada vez mais estreito e maior, à medida que o embrião cresce. Na sua extremidade cefálica, o intestino anterior é delimitado temporariamente pela membrana bucofaríngea, com origem, quer ectodérmica, quer endodérmica. Esta membrana separa a cavidade oral primitiva (designada por estomadeu) da faringe. Já o intestino posterior termina temporariamente na membrana cloacal, também com origem ectodérmica e endodérmica. De referir que, a membrana bucofaríngea rompe-se à quarta semana (sendo estabelecida uma via aberta entre a cavidade oral, e como tal, a cavidade amniótica, e o intestino primitivo), enquanto a membrana cloacal rompe-se à sétima semana (sendo criada a abertura para o ânus). Para além do intestino, a endoderme origina outras estruturas, nomeadamente as bolsas faríngeas, os brotos pulmonares, a traqueia, o fígado, a vesícula biliar e o pâncreas. Parte da bexiga vai ser ainda derivada da membrana cloacal, enquanto a alantóide, uma estrutura relacionada com o sistema urogenital, vai ter origem na endoderme.
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Factos importantes sobre organogénese:
A organogénese ocorre da terceira à oitava semana. A partir da nona semana, o período embrionário passa a dar lugar ao período fetal.
A neurulação é o processo que conduz à formação do sistema nervoso central. Para que tal ocorra, a placa neural, derivada da ectoderme, sofre uma invaginação, originando as pregas neurais. Estas fundem-se, originando o tubo neural.
As células do bordo lateral da neuroectoderme separam-se das restantes células das pregas neurais, passando a constituir as células da crista neural. Estas estão na base, por exemplo, da formação de gânglios do sistema nervoso simpático e neurónios sensitivos.
A mesoderme vai passar a constituir três camadas – mesoderme para-axial (próxima da linha média) mesoderme lateral (mais lateralmente) e mesoderme intermédia. A mesoderme lateral diferencia-se em mesoderme parietal e mesoderme visceral.
No início da terceira semana, a mesoderme para-axial organiza-se em segmentos – os somitómeros. Ao nível do 20º dia de desenvolvimento, os somitómeros organizam-se em sómitos, que vão aparecendo em direcção cefalo-caudal, com periodicidade específica. Cada sómito tem-lhe associado um esclerótomo, um miótomo e um dermátomo.
A mesoderme intermédia diferencia-se em estruturas do tracto urogenital.
A mesoderme visceral está associada à formação de uma membrana serosa em torno de cada órgão. Juntamente com a endoderme, vai contribuir para delimitar o tubo digestivo.
A endoderme está associada ao desenvolvimento do tubo digestivo. Ocorre uma ruptura da membrana bucofaríngea à quarta semana e da membrana cloacal à sétima.
A mesoderme parietal está associada à formação das paredes corporais e aos limites das cavidades peritoneal, pleural e pericárdica.
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Organogénese das cavidades celómicas e do sistema respiratório Formação do celoma intra-embrionário No final da terceira semana, a mesoderme intra-embrionária de cada lado da linha média diferencia-se numa porção para-axial, numa porção intermédia e numa porção lateral. Quando aparecem fendas intercelulares na mesoderme lateral, esta fica dividida em duas camadas - a mesoderme somática e a mesoderme esplâncnica. Esta última é contínua com a mesoderme da parede do saco vitelino e o espaço situado por entre a mesoderme esplâncnica e a mesoderme somática constitui o celoma intraembrionário (ou cavidade corporal - celoma é sinónimo de cavidade). Inicialmente, o lado direito e o lado esquerdo no celoma intraembrionário encontram-se em comunicação com o celoma extraembrionário, mas quando o corpo do embrião se dobra cefalocaudalmente e lateralmente, essa ligação é perdida. Forma-se desta maneira um grande celoma intra-embrionário, que se estende da região torácica para a região pélvica.
Membranas serosas As células da mesoderme somática que delimitam a cavidade intraembrionária tornam-se mesoteliais e formam a camada parietal das membranas serosas. Esta camada delimita o exterior das cavidades peritoneal, pleural e pericárdica. De forma similar, as células da mesoderme esplâncnica formam a camada visceral das membranas serosas que cobrem os órgãos abdominais, os pulmões e o coração. As camadas visceral e parietal são contínuas uma com a outra, formando o mesentério dorsal, que suspende o intestino primitivo na cavidade peritoneal. Inicialmente, este mesentério dorsal é um feixe espesso de mesoderme, que se desloca continuamente desde o limite caudal do intestino anterior até ao fim do intestino posterior.
Diafragma e cavidade torácica O septo transverso é uma lâmina espessa de tecido mesodermal, que ocupa o espaço por entre a cavidade torácica e o canal do saco vitelino. Este septo não separa completamente as cavidades torácica
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II e abdominal, deixando grandes aberturas – os canais pericardioperitoneais, de cada lado do intestino anterior. Quando os divertículos pulmonares começam a crescer, estes expandem-se caudolateralmente, dentro dos canais pericardioperitoneais. Como resultado do rápido crescimento dos pulmões, os canais pericardioperitoneais tornam-se demasiado pequenos e os pulmões começam-se a expandir dorsalmente, lateralmente e ventralmente para o mesênquima da parede corporal. A expansão ventral e lateral ocorre posteriormente às pregas pleuropericárdicas. Inicialmente, estas pregas originam-se como pequenas cristas, que se projectam para a cavidade torácica primitiva. Com a expansão dos pulmões, a mesoderme da parede corporal divide-se em dois componentes – a parede definitiva do tórax e as membranas pleuropericárdicas, extensões das pregas pleuropericárdicas, que contêm as veias cardinais comuns e os nervos frénicos. Subsequentemente, com a descida do coração e mudanças posicionais do seio venoso, as veias cardinais comuns passam para a linha média e as membranas pleuropericárdicas prolongam-se, acabando por se unir uma com a outra e com as raízes dos pulmões. A cavidade torácica passa então a ficar dividida na cavidade pericárdica definitiva e nas duas cavidades pleurais. De referir que, no indivíduos adulto, as membranas pleuropericárdicas formam o pericárdio fibroso.
Formação do diafragma Apesar de as cavidades pleurais se encontrarem separadas da cavidade pericárdica, estas mantêm-se em comunicação aberta com a cavidade abdominal (peritoneal), uma vez que o diafragma se encontra incompleto. Durante etapas posteriores do desenvolvimento, a abertura por entre as cavidades pleural e peritoneal é fechada pelas membranas pleuroperitoneais, que têm forma de meia-lua e se projectam para a extremidade caudal dos canais pericardioperitoneais. Gradualmente estas pregas estendem-se medialmente e ventralmente, de modo a que pela sétima semana, estas fundem-se com o mesentério do esófago e com o septo transverso. A expansão ulterior das cavidades pleurais para o mesênquima corporal leva à adição um bordalete periférico às membranas pleuroperitoneais. Quando este bordalete se estabelece, os mioblastos da parede corporal penetram nas membranas pleuroperitoneais para formar a porção muscular do diafragma.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Desta forma, o diafragma deriva do septo transverso (que forma o seu tendão central), das duas membranas pleuroperitoneais, das componentes musculares das paredes corporais laterais e dorsal e do mesentério do esófago, a partir do qual se desenvolvem os pilares do diafragma. O septo transverso encontra-se do lado oposto ao dos segmentos cervicais, durante a quarta semana, contudo, ao nível da sexta semana, o diafragma em desenvolvimento encontra-se ao nível dos sómitos torácicos. O reposicionamento do diafragma é causado pelo rápido crescimento da porção dorsal do embrião (coluna vertebral), comparativamente ao da porção ventral. Os componentes nervosos do terceiro, quarto e quinto segmentos cervicais da espinal medula crescem ao nível do septo transverso. Estes nervos, designados por nervos frénicos, passam para o septo através das pregas pleuropericárdicas. De referir que a descida do diafragma explica o percurso descrito pelos nervos frénicos, desde a região cervical até ao diafragma, o qual inervam, quer por via de inervação motora, quer por via de inervação sensitiva.
Factos importantes sobre formação das cavidades celómicas: Factos importantes sobre a formação do celoma intra-embrionário e membranas serosas:
A mesoderme lateral fica dividida por fendas em mesoderme somática (parietal) e mesoderme esplâncnica (visceral). O espaço por entre estas duas camadas é o celoma intraembrionário.
As dobras cefalocaudal e lateral do embrião leva à perda de ligação entre o celoma intraembrionário e o celoma extra-embrionário. Formação de um grande celoma intraembrionário que se estende da região torácica para a região pélvica.
As células da mesoderme somática originam o folheto parietal das membranas serosas (p.e. pleura), enquanto as células da mesoderme esplâncnica originam o folheto visceral.
Factos importantes sobre formação das cavidades do tórax:
O septo transverso é uma lâmina de tecido mesodermal, que ocupa o espaço por entre a cavidade torácica e o canal do saco vitelino. A presença dos canais pericardioperitoneais leva a que este septo não separe completamente a cavidade torácica da abdominal.
A expansão dos pulmões ocorre posteriormente às pregas pleuropericárdicas, cujas extensões, as membranas pleuropericárdicas, contêm as veias cardinais comuns e os ervos. frénicos.
A descida do coração e a mudança de posição do seio venoso leva à fusão das membranas pleuropericárdicas. Isto leva à divisão da cavidade torácica nas cavidades pleurais e na cavidade pericárdica definitiva.
Factos importantes sobre formação do diafragma:
As membranas pleuroperitoneais fecham os canais pericardiopeitoneais. A estas membranas é adicionado um bordalete periférico, onde se estabelecem mioblastos, o que levará à génese da porção muscular do diafragma.
O mesentério do esófago origina os pilares do diafragma. O septo transverso origina o tendão central do diafragma. Este septo encontra-se inicialmente na região cervical, estando associado ao 3º-5º segmentos cervicais. A descida do diafragma é acompanhada pela descida dos nervos associados (os nervos frénicos).
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Organogénese do sistema respiratório Formação do divertículo pulmonar Quando o embrião tem cerca de quatro semanas, aparece o divertículo pulmonar, sendo formado a partir da parede ventral do intestino anterior. Dessa forma, o epitélio que forma o limite interno da laringe, traqueia, brônquios e pulmões é de origem endodérmica, enquanto o tecido cartilaginoso, muscular e conjuntivo que participa na constituição da traqueia e pulmões deriva da mesoderme esplâncnica, que rodeia o intestino anterior. Inicialmente, o divertículo pulmonar encontra-se em comunicação com o intestino anterior. Contudo, à medida que o divertículo se expande caudalmente, duas cristas longitudinais, as cristas traqueoesofágicas separam-no do intestino anterior. Subsequentemente, essas cristas fundem-se, formando o septo traqueo-esofágico, que divide o intestino anterior numa porção dorsal (o esófago) e numa porção ventral (a traqueia e os divertículos pulmonares). O primórdio respiratório mantém a sua ligação à faringe, através do orifício laríngeo.
Laringe O limite interno da laringe tem origem na endoderme, mas as suas cartilagens e os seus músculos originam-se a partir do mesênquima do quarto e sexto arcos faríngeos. Como resultado da rápida proliferação deste mesênquima, o orifício laríngeo modifica a sua aparência, passando de um orifício sagital a uma abertura em forma de T. Mais posteriormente, quando o mesênquima dos dois arcos se transforma nas cartilagens tiróide, cricóide e aritenóides, o orifício da laringe fica com a forma similar à de um indivíduo adulto. Quase concomitantemente à formação das cartilagens laríngeas, ocorre a rápida proliferação do epitélio laríngeo, o que resulta numa oclusão temporariamente do lúmen. A reabertura do canal produz um par de recessos laterais – os ventrículos laríngeos, ladeados por pregas de tecido que se diferenciam nas pregas vocais e nas pregas ventriculares. Uma vez que os músculos da laringe derivam do mesênquima do quarto e sexto arcos faríngeos, todos os músculos laríngeos são inervados por ramos do nervo vago. O nervo laríngeo superior inerva os derivados do quarto arco faríngeo, enquanto o nervo laríngeo recorrente inerva os derivados do sexto arco faríngeo.
Traqueia, brônquios e pulmões Aquando da sua separação do intestino anterior, o divertículo pulmonar forma a traqueia e duas proeminências laterais, os divertículos bronquiais. No início da quinta semana, cada um desses divertículos alarga-se, formando os brônquios principais direito e esquerdo. O brônquio principal direito
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II forma três brônquios secundários, enquanto o esquerdo forma dois, antevendo a génese de três lobos pulmonares do lado direito e dois do lado esquerdo. Em etapas posteriores do desenvolvimento, os brônquios secundários dividem-se repetidamente de maneira dicotómica, sendo formados dez brônquios segmentais do lado direito e oito do lado esquerdo e sendo assim criados os segmentos broncopulmonares. No final do sexto mês, cerca de 17 gerações de subdivisões já se formaram. No período pós-natal, contudo, seis divisões adicionais são ainda formadas e só aí é que o tronco bronquial fica completo. Enquanto essas subdivisões vão ocorrendo, os pulmões vão assumindo uma posição mais caudal, sendo que, aquando do nascimento, a bifurcação da traqueia encontra-se ao nível de T4. Com o crescimento subsequente em direcção caudal e lateral, os divertículos pulmonares expandem-se para a cavidade corporal. Os seus espaços, os canais pericardioperitoneais tornam-se estreitos, encontrando-se ladeando o intestino anterior. Dessa forma, as pregas pleuroperitoneais e pleuropericárdicas separam os canais pericardioperitoneais das cavidades peritoneal e pericárdica, respectivamente, sendo que os restantes espaços formam as cavidades pleurais primitivas. A mesoderme, que cobre a porção exterior do pulmão origina a pleura visceral, enquanto a camada de mesoderme somática, que cobre o interior da parede corporal, origina a pleura parietal (o espaço por entre as duas camadas é designado por cavidade pleural).
Maturação dos pulmões O período já descrito de desenvolvimento dos pulmões, que culmina com a formação dos bronquíolos terminais designa-se por período pseudo-glandular e inicia-se à quinta semana de desenvolvimento, terminando na décima sexta. A partir dessa semana até à vigésima sexta semana de desenvolvimento, os bronquíolos terminais dividem-se continuamente em mais canais de dimensões cada vez menores (cada bronquíolo terminal divide-se em dois ou mais bronquíolos respiratórios, que por sua vez se dividem em entre três a seis canais alveolares), sendo essas divisões acompanhadas por um aumento progressivo da vascularização. Esta fase é designada por período canalicular. A etapa seguinte designa-se por período sacular, que vai desde as 26 semanas de desenvolvimento até ao nascimento. Nesta fase são formados os alvéolos primitivos, também designados por sacos
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II primitivos, quando algumas células cubóides dos bronquíolos respiratórios se transformam em células finas e achatadas, associadas a vários vasos capilares sanguíneos e linfáticos. Durante o sétimo mês regista-se já um número suficiente de capilares para assegurar a ocorrência de trocas gasosas eficazes. Dessa forma, os indivíduos podem sobreviver, no meio exterior, a partir do sétimo mês. Durante os últimos dois meses de vida pré-natal e até aos dez anos de idade, o número de sacos terminais aumenta progressivamente e os pneumatócitos tipo I (células que delimitam os alvéolos) tornam-se mais finos, permitindo um alargamento da rede capilar para os alvéolos. Essa fase é por isso designada por período alveolar. Para além disso, outro tipo de células desenvolve-se no final do sexto mês – os pneumatócitos do tipo II, células que produzem surfactante, um fluido rico em fosfolipídeos, que é capaz de diminuir a tensão de superfície no interface ar-alvéolos. De facto, antes do nascimento ainda não estão presentes alvéolos maduros e os pulmões estão cheios de um fluido que contém uma grande concentração de cloreto, algum muco das glândulas bronquiais, surfactante e poucas proteínas. A quantidade de surfactante no fluido aumenta consideravelmente, sobretudo, durante as últimas duas semanas antes do nascimento. Os movimentos respiratórios fetais iniciam-se antes do nascimento e levam à aspiração do fluido amniótico. Estes movimentos são importantes para estimular o desenvolvimento dos pulmões e respectivos músculos respiratórios. Quando a respiração se inicia, aquando do nascimento, a maior parte do fluido pulmonar é rapidamente reabsorvido pelos capilares sanguíneos e linfáticos e uma pequena quantidade é provavelmente expulsa através da traqueia e dos brônquios, aquando do parto. Quando esse fluido é reabsorvido a partir dos sacos alveolares, o surfactante mantém-se depositado como um fino revestimento de fosfolipídeos nas membranas das células alveolares. Os movimentos respiratórios ocorridos após o nascimento permitem encher os pulmões de ar, o que leva à expansão destes órgãos que vão preencher a cavidade pleural. De referir que o crescimento dos pulmões deve-se sobretudo a um aumento do número de bronquíolos e alvéolos e não ao aumento do tamanho dos alveólos (que é um processo representa uma contribuição menor).
☤ Aquando do nascimento apenas encontramos um sexto do número de alvéolos presentes num indivíduo adulto. Os restantes alvéolos são formados progressivamente, durante os primeiros dez anos de vida pós-natal.
Factos importantes sobre organogénese do sistema respiratório: Factos importantes sobre a formação do divertículo pulmonar:
O divertículo pulmonar aparece por volta da quarta semana, a partir da parede ventral do intestino anterior.
A expansão caudal do divertículo é acompanhada pelo crescimento das cristas traqueoesofágicas, que se fundem, formando o septo traqueo-esofágico, que separa o esófago da traqueia dos divertículos pulmonares (que se encontram mais anteriormente).
O epitélio interno da laringe, traqueia, brônquios e pulmões tem origem na endoderme. O tecido cartilaginoso, muscular e conjuntivo da traqueia e pulmões deriva da mesoderme 333 esplâncnica.
Factos importantes sobre formação da laringe:
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Factos importantes sobre organogénese do sistema respiratório (continuação): Factos importantes sobre formação da laringe:
O limite interno da laringe tem origem na endoderme, mas as suas cartilagens e músculos têm origem no mesênquima do quarto e sexto arcos faríngeos.
O orifício laríngeo sofre várias alterações e é, inclusive, temporariamente ocludido. A reabertura do canal laríngeo leva à formação dos ventrículos e das pregas ventriculares.
Factos importantes sobre formação dos brônquios e pulmões:
Os divertículos bronquiais originam os brônquios principais esquerdo e direito, que subsequentemente originam dois e três brônquios secundários, respectivamente.
Da quinta semana até à 16ª vão ocorrendo sucessivas divisões nos brônquios até à formação dos bronquíolos terminais – período pseudo-glandular.
Da 16ª à 26ª semana, os bronquíolos terminais dividem-se continuamente em canais cada vez menores, sendo essas divisões acompanhadas pelo aumento progressivo da vascularização – período canalicular.
Da 26ª semana até ao nascimento são formados os alvéolos primitivos – período sacular. Ao nível do sétimo mês existe já um número suficiente de capilares para assegurar a sobrevivência do indivíduo no meio exterior.
A partir do nascimento até aos dez anos de idade ocorre um aumento progressivo do número de alvéolos pulmonares – período alveolar.
O surfactante é um fluido rico em fosfolipídeos, essencial para diminuir a tensão de superfície no interface ar-alvéolos. A quantidade de surfactante ao nível do fluido pulmonar aumenta muito nas últimas duas semanas do nascimento.
Antes do nascimento iniciam-se os movimentos respiratórios fetais, essenciais para estimular o desenvolvimento dos pulmões e respectivos músculos respiratórios.
A pleura visceral deriva da mesoderme esplâncnica, enquanto a pleura parietal deriva da mesoderme somática.
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Organogénese do coração Estabelecimento do campo cardiogénico O sistema vascular aparece a meio da terceira semana, quando o embrião não consegue satisfazer as suas necessidades nutricionais por difusão. As células progenitoras cardíacas encontram-se no epiblasto, imediatamente lateralmente à linha primitiva. A partir daí, estas migram através desta, sendo que inicialmente migram as células destinadas à porção cefálica do coração e só depois migram as restantes. As células deslocam-se então em direcção ao crânio e posicionam-se rostralmente à membrana bucofaríngea e às pregas neurais, encontrando-se ao nível da camada esplâncnica da mesoderme lateral. Por volta dos 18 dias, estas células formam mioblastos cardíacos. Ilhas sanguíneas também aparecem ao nível da mesoderme lateral, onde formarão células e vasos sanguíneos de novo pelo processo de vasculogénese. Esta região estabelecida é designada por campo cardiogénico, sendo que a cavidade intraembrionária presente a este nível originará a cavidade pericárdica. Várias ilhas sanguíneas aparecem fora do campo cardiogénico, bilateralmente, paralelamente e próximas da linha média, formando depois um par de vasos longitudinais – as aortas dorsais.
Formação e posicionamento do tubo cardíaco Inicialmente, a porção central da área cardiogénica é anterior à membrana bucofaríngea e à placa neural, mas com o fecho da placa neural e com a formação das vesículas cerebrais, regista-se um crescimento cefálico do sistema nervoso central tão rápido, que este se estende sobre a área cardiogénica central e a futura cavidade pericárdica. Consequentemente, a membrana bucofaríngea é puxada anteriormente, enquanto o coração e a cavidade pericárdica movem-se sequencialmente para a região cervical e para o tórax. À medida que o embrião se dobra cefalocaudalmente, também se dobra lateralmente e, como tal, as regiões caudais dos primórdios cardíacos fundem-se, excepto nas suas extremidades mais caudais. Simultaneamente, a porção em forma de crescente desta área em forma de ferradura expande-se para originar as futuras regiões ventriculares e sistema de ejecção. Dessa forma, o coração torna-se um tubo contínuo expandido, que recebe a drenagem venosa ao nível do seu pólo caudal e ejecta o sangue para a aorta dorsal (através do primeiro arco aórtico), ao nível do seu pólo craniano. Em termos histológicos, o coração consiste numa camada endotelial interna e numa camada externa de miocárdio. O desenvolvimento do tubo cardíaco é assinalado por uma ocupação cada vez maior da cavidade pericárdica. Inicialmente, o coração mantém-se fixo ao lado dorsal da cavidade por uma prega de tecido mesodérmico – o mesocárdio dorsal (não sendo, contudo formado, nenhum mesocárdio ventral). Todavia, o desenvolvimento adicional do embrião leva ao desaparecimento do mesocárdio dorsal, o que origina um espaço - o seio pericárdico transverso. O coração passa a estar suspenso na cavidade pericárdica pelos vasos sanguíneos, quer cranialmente, quer caudalmente. Por esta altura, células mesoteliais da região do seio venoso migram para o coração, formando o epicárdio. Dessa forma, o tubo cardíaco passa a consistir em três porções – o endocárdio, correspondente ao limite endotelial do coração, o miocárdio, formando a parede muscular e o epicárdio, ou pericárdio visceral, cobrindo a região externa do tubo. Esta camada externa é responsável pela formação das artérias coronárias, incluindo o seu limite endotelial e músculo liso. De referir que entre o miocárdio e o endocárdio, aparece uma camada de tecido conjuntivo, a qual é designada por geleia cardíaca e que ainda não se conhece bem o que origina
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Formação da ansa cardíaca O tubo cardíaco continua e elongar-se e dobra-se no dia 23. A porção cefálica do tubo dobra-se ventralmente, caudalmente e para a direita, enquanto a porção auricular (caudal) inclina-se dorsocranialmente e para a esquerda. Esta dobra cria a ansa cardíaca, que fica completa, por volta do dia 28. À medida que a ansa cardíaca se forma, expansões locais vão surgindo ao longo do tubo. A porção auricular, inicialmente uma estrutura par, fora da cavidade pericárdica, forma uma aurícula comum e é incorporada na cavidade pericárdica. A junção aurículo-ventricular continua estreita e forma o canal aurículo-ventricular, que liga a aurícula comum e o ainda primitivo ventrículo embrionário. Adjacente ao ventrículo, mais distalmente, encontra-se o bulbo cardíaco. A junção entre o ventrículo e o bulbo cardíaco é designada por buraco interventricular primário, uma estrutura estreita e assinalada externamente pela presença do sulco bulboventricular. O bulbo cardíaco pode ser dividido em três porções. O seu terço proximal é mais largo, que as restantes porções, sendo que esta porção originará a porção trabecular do ventrículo direito. A porção média é designada por cone cardíaco, sendo que este, por sua vez, formará as câmaras de saída de ambos os ventrículos. Por fim, a porção distal do bulbo é designada por tronco arterioso e formará as raízes e porção proximal da aorta e artéria pulmonar. No final da formação da ansa cardíaca, começam-se a formar as trabéculas primitivas, em duas áreas irregularmente definidas – a região imediatamente proximal e a região imediatamente distal ao buraco interventricular primário. O ventrículo primitivo, ao tornar-se trabeculado, passa a designar-se por ventrículo esquerdo primitivo, enquanto o terço proximal trabeculado do bulbo cardíaco passa a ser designado por ventrículo primitivo direito. De referir que, simultaneamente, a porção cono-troncal do bulbo cardíaco, inicialmente do lado direito da cavidade pericárdica, move-se gradualmente para uma posição mais medial. Essa alteração de posição resulta da formação de duas dilatações transversas na aurícula, visíveis como proeminências de cada lado do bulbo cardíaco.
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Desenvolvimento do seio venoso O seio venoso é uma grande cavidade quadrangular que se encontra proximal (caudalmente) à aurícula. No meio da quarta semana, o seio venoso recebe a drenagem venosa, dos cornos sinosais esquerdo e direito. Cada corno recebe o sangue a partir de três veias importantes – a veia vitelina ou onfalomesentérica, a veia umbilical e a veia cardinal comum. Inicialmente regista-se uma vasta comunicação por entre o seio e a aurícula. Contudo, passado pouco tempo, a entrada do seio volta-se para a direita. Com a obliteração da veia umbilical esquerda e da veia vitelina esquerda, durante a quinta semana, o corno sinusal esquerdo rapidamente perde importância. A obliteração da veia cardinal comum às 10 semanas leva a que tudo o que reste do corno sinusal esquerdo seja a veia oblíqua da aurícula esquerda e o seio coronário. Como resultado do desvio do sangue da esquerda para a direita, o corno sinusal direito e as respectivas veias aumentam descaradamente as suas dimensões – o corno direito, que nesta altura forma a única comunicação, por entre o seio venoso original e a aurícula, passa então a ser incorporado na aurícula direita, para formar a parede lisa da aurícula direita. A sua entrada – o orifício sino-auricular - é flanqueado de cada lado por uma prega valvular, constituída pela válvula venosa esquerda e pela válvula venosa direita. Dorsocranialmente as válvulas fundem-se, originando uma crista, o septo espúrio. Aquando da incorporação do corno sinusal direito na aurícula direita, a válvula venosa esquerda e o septo espúrio fundem-se com o septo auricular, que ainda está em desenvolvimento (mais propriamente com o septo secundário). Por outro lado, vai ocorrer o desaparecimento da porção superior da valva venosa direita e o desenvolvimento da porção inferior em duas estruturas distintas – a válvula da veia cava inferior e a válvula do seio coronário. De referir que a estrutura que assinala por entre a porção trabeculada da aurícula direita e a sua porção lisa (o sinus venarum, originado a partir do corno sinusal direito), se designa por crista terminal.
Formação dos septos cardíacos Os principais septos cardíacos são formados por entre o 27º e o 37º dia de desenvolvimento, quando o embrião cresce em comprimento. Os septos cardíacos podem se formar por dois métodos. O primeiro método envolve a presença de duas massas de tecido em crescimento activo e que se aproximam uma da outra, até se fundirem, dividindo o lúmen em dois canais separados. Um septo deste género pode também ser formado pelo crescimento activo de um tecido único em direcção ao lado oposto do lúmen. Estas massas de tecido que
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II são depositadas são designadas por almofadas endocárdicas (ou coxins endocárdicos), desenvolvendose nas regiões aurículo-ventricular e cono-troncal e permitindo a formação do septo auricular, da porção membranosa do septo ventricular, dos canais e valvas aurículo-ventriculares e dos canais aórtico e pulmonar. Alternativamente, um septo pode ser formado a partir de uma crista que se forma por entre duas porções em expansão. À medida que as porções se vão expandindo, as suas paredes vão se aproximando e, eventualmente passam a ficar unidas, formando um septo. Um septo desta natureza nunca divide completamente o lúmen original, deixando um estreito canal comunicante, por entre as duas porções em expansão. Este é normalmente fechado, depois por tecido proveniente dos tecidos que proliferam nas vizinhanças. Um septo desta natureza divide parcialmente as aurículas e os ventrículos.
Formação do septo na aurícula comum No final da quarta semana, uma crista em forma de foice cresce desde o tecto da aurícula comum, até ao seu lúmen. Essa crista é a primeira porção do septo primário. Os dois membros deste septo estendem-se em direcção às almofadas endocárdicas no canal aurículo-ventricular. A abertura por entre o bordo inferior do septo primário e as almofadas endocárdicas é designada por óstio primário. O desenvolvimento subsequente, leva a que extensões das almofadas endocárdicas superior e inferior cresçam ao longo do bordo do septo primário, fechando o óstio primário. Contudo, antes de ocorrer o fecho total do óstio primário, a morte de algumas células leva à génese de orifícios na porção superior do septo primário. Estes orifícios ao unirem-se vão originar o óstio secundário, que permite uma livre passagem sanguínea, desde a aurícula primitiva direita, até à aurícula primitiva esquerda. Quando o lúmen da aurícula direita se expande, por consequência da incorporação do corno sinusal direito, aparece uma nova prega em forma de meia-lua, que é designada por septo secundário e que nunca chega a dividir completamente a cavidade auricular. O seu membro anterior estende-se inferiormente para o septo no canal aurículo-ventricular. Quando a válvula venosa esquerda e o septo espúrio se fundem com o lado direito do septo secundário, o bordo côncavo livre do septo secundário começa a sobrepor-se ao óstio secundário.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Apesar disso, o septo secundário deixa uma abertura, a qual é designada por buraco oval. Entretanto, a porção superior do septo primário vai gradualmente desaparecendo e a porção restante deste septo vai formar a válvula do buraco oval. Após o nascimento, quando se dá o início da circulação pulmonar, regista-se um aumento na pressão na aurícula esquerda, o que faz com que a válvula do buraco oval seja comprimida contra o septo secundário, obliterando o buraco oval, que dá origem à fossa oval e separando totalmente as aurículas esquerda e direita.
Diferenciação ulterior das aurículas Enquanto a aurícula direita primitiva se alarga, pela incorporação do corno sinusal direito, a aurícula esquerda primitiva também se alarga. Inicialmente, uma única veia pulmonar embrionária desenvolvese a partir da parede posterior da aurícula esquerda, à esquerda do septo primário. Essa veia fica ligada às veias dos brotos pulmonares em desenvolvimento. Durante o desenvolvimento posterior, a veia pulmonar e os seus ramos são incorporados na aurícula esquerda, sendo que as suas paredes vão constituir a maior parte das paredes lisas desta aurícula. Como resultado desta integração, constatamos que passam a entrar quatro vasos na aurícula esquerda, contra um único que entrava inicialmente. No coração totalmente desenvolvido, a aurícula esquerda embrionária original encontra-se representada por pouco mais que a auriculeta esquerda, enquanto a porção de paredes lisas se origina a partir das veias pulmonares. Já do lado direito, a aurícula direita embrionária original encontra-se representada pela auriculeta direita, contendo os músculos pectíneos, sendo que a porção auricular de paredes lisas se origina a partir do corno sinusal direito.
Formação do septo no canal aurículo-ventricular No final da quarta semana, duas almofadas mesenquimais, as almofadas endocárdicas aurículoventriculares, aparecem ao nível dos bordos superior e inferior do canal aurículo-ventricular. Inicialmente, o canal aurículo-ventricular dá apenas acesso ao ventrículo esquerdo primitivo e encontrase separado do bulbo cardíaco pela ansa bulboventricular. Contudo, perto do fim da quinta semana, a extremidade posterior da ansa termina quase a meio caminho, ao longo da base da almofada endocárdica superior e é muito menos proeminente que antes. A partir do alargamento para a direita do canal aurículo-ventricular, o sangue que passa através do orifício aurículo-ventricular passa a ter acesso aos ventrículos primitivos esquerdo e direito. Para além das almofadas endocárdicas superior e inferior, duas almofadas aurículo-ventriculares laterais aparecem, ao nível dos bordos esquerdo e direito do canal. Simultaneamente, as almofadas superior e inferior projectam-se ainda mais para o lúmen, fundindo-se, o que resulta numa divisão completa do canal em orifícios aurículo-ventricular esquerdo e direito, por volta do fim da quinta semana.
Válvulas auriculo-ventriculares Após ocorrer a fusão das almofadas aurículo-ventriculares endocárdicas, cada orifício aurículoventricular passa a ficar rodeado por proliferações locais de tecido mesenquimatoso. Quando o fluxo sanguíneo se esvazia, o tecido da superfície ventricular dessas proliferações torna-se mais fino, o que
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II leva à formação das válvulas, que se mantêm fixas à parede ventricular, por cordas musculares. Finalmente, o tecido muscular nas cordas degenera e é substituído por tecido conjuntivo denso. As válvulas passam a ser constituídas por tecido conjuntivo coberto por endocárdio, permanecendo ligadas aos músculos papilares, através das cordas tendinosas. De facto, as válvulas do coração são constituídas por uma dupla camada de endocárdio com tecido fibroso.
Formação do septo nos ventrículos Por volta do final da quarta semana, os dois ventrículos primitivos começam se a expandir. Isto é acompanhado pelo crescimento contínuo do miocárdio externamente e por uma diverticulação e formação contínua de trabéculas, internamente. As paredes mediais dos ventrículos em expansão tornam-se apostas, sobrepondo-se gradualmente e formando o septo interventricular muscular. Por vezes, as duas paredes não se unem completamente, e uma fissura apical mais ou menos profunda aparece por entre os dois ventrículos. O espaço por entre o bordalete livre do septo ventricular muscular e as almofadas endocárdicas unidas permite a comunicação por entre os dois ventrículos. O buraco interventricular, sobre a porção muscular do septo interventricular encolhe, na terminação do septo do cone. Durante o desenvolvimento ulterior, o tecido resultante da almofada endocárdica inferior, ao longo do topo do septo interventricular muscular, permite o fecho do buraco, ao fundir-se com as porções adjacentes do septo do cone. De referir que, o fecho completo do buraco interventricular forma a porção membranosa do septo interventricular.
Formação do septo no tronco arterioso e no cone cardíaco Durante a quinta semana, aparecem pares de cristas opostas, ao nível do tronco arterioso. Estas cristas, designadas por cristas truncais ou almofadas truncais, encontram-se na parede superior direita (crista truncal superior direita) e na parede inferior esquerda (crista truncal inferior esquerda). A crista truncal
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II superior direita cresce distalmente e para a esquerda, enquanto a crista truncal inferior esquerda cresce distalmente e para a direita. Dessa forma, enquanto estão a crescer em direcção ao saco aórtico, essas cristas, enrolam-se uma sobre a outra, antevendo o que será o percurso espiral do futuro septo. Após ocorrer a fusão completa, as cristas formam o septo aórtico-pulmonar, dividindo o tronco num canal pulmonar e num canal aórtico. Simultaneamente ao aparecimento das cristas truncais, desenvolvem-se cristas (almofadas) similares, ao longo das paredes dorsal direita e ventral esquerda do cone cardíaco. Estas cristas crescem, em direcção uma à outra, para se unir com o septo do tronco. Com a união das duas cristas do cone, o septo passa a dividir o cone numa porção anterolateral (a câmara de saída do ventrículo direito) e numa porção posteromedial (a câmara de saída do ventrículo esquerdo).
☤ As células da crista neural, que migram desde os bordos das pregas neurais, na região posterior do cérebro, contribuem para a formação das almofadas endocárdicas, quer do cone cardíaco, quer do tronco arterioso. Devido ao facto de as células da crista neural também contribuírem para o desenvolvimento facial, não é raro ver indivíduos que apresentem simultaneamente anomalias faciais e cardíacas. Válvulas semilunares Quando a divisão do tronco arterioso se encontra quase completa, os primórdios das válvulas semilunares tornamse visíveis como pequenos tubérculos, encontrados ao nível das cristas truncais principais. Uma de cada par torna-se destinada aos canais aórtico e pulmonar respectivamente, sendo que um terceiro tubérculo aparece em ambos os canais, do lado oposto ao das cristas truncais unidas. Gradualmente, os tubérculos esvaziam-se de fluxo sanguíneo, na sua face superior, originando as válvulas semilunares.
Desenvolvimento do sistema vascular O desenvolvimento do sistema vascular ocorre por vasculogénese a angiogénese. O processo de vasculogénese é a formação de novo de vasos sanguíneos, por coalescência dos angioblastos, sendo o processo através do qual são formados os grandes vasos, nomeadamente a aorta dorsal e as veias cardinais. O resto do sistema vascular é formado por angiogénese, ou seja a partir de vasos já existentes.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Ao nível arterial, partem da aorta dorsal cinco pares de arcos aórticos confluentes, que depois originarão os vários vasos que se originam da aorta, ou das artérias carótidas, no indivíduo adulto. O primeiro arco origina as artérias maxilares, o segundo, as artérias hióides e estapédica, o terceiro arco está na base da génese das artérias carótidas comuns e primeira parte das carótidas internas. O quarto arco vai originar do lado esquerdo a crossa da aorta e do lado direito a porção proximal da artéria subclávia direita. Por fim, o sexto arco origina, do lado esquerdo, a artéria pulmonar esquerda e o canal arterioso, enquanto do lado direito origina a artéria pulmonar direita. Já no que concerne ao sistema venoso, na quinta semana podem ser distinguidos – as veias vitelinas, que transportam sangue do saco vitelino para o seio venoso; as veias umbilicais, que se originam nas vilosidades coriónicas e transportam sangue oxigenado para o embrião e as veias cardinais, que drenam o corpo do embrião, propriamente dito.
Circulação fetal Antes do nascimento, o sangue da placenta, saturado com cerca de 80% de oxigénio vai para o feto através da veia umbilical. Quando se aproxima do fígado, maior parte do sangue em questão, desloca-se através do canal venoso, directamente para a veia cava inferior. Um mecanismo esfinctérico no canal venoso, perto da entrada da veia umbilical regula o fluxo de sangue que passa para alguns sinusóides existentes ao nível do fígado. O esfíncter fecha aquando de um grande fluxo sanguíneo (por exemplo, por via de uma contracção uterina), evitando, desta forma, uma sobrecarga do coração. Ao nível da veia cava inferior, o sangue proveniente da placenta mistura-se com o sangue venoso proveniente dos membros inferiores e entra na aurícula direita. Da aurícula direita, a maioria do sangue circula para a aurícula esquerda, através do buraco oval. Contudo, uma pequena quantidade é impedida de o fazer, pelo bordo inferior do septo secundário, a
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II crista dividens, permanecendo na aurícula direita. O sangue que fica retido na aurícula direita misturase com o sangue venoso proveniente da cabeça e braços (por via da veia cava superior). Já o sangue que passa para a aurícula esquerda mistura-se com uma pequena quantidade de sangue venoso proveniente dos pulmões, entrando no ventrículo esquerdo e passando para a aorta ascendente. Uma vez que as artérias coronárias e as artérias carótidas são os primeiros ramos da aorta ascendente, a musculatura do coração e o cérebro são irrigados com sangue muito oxigenado. Já o sangue venoso proveniente da veia cava superior flui para o ventrículo direito, para o tronco pulmonar. Durante a vida fetal, a resistência nos vasos pulmonares é muito grande e, como tal, a maior parte do seu sangue, passa directamente através do canal arterioso para a aorta descendente, onde se mistura com o sangue da aorta proximal. Após se deslocar através da aorta descendente, o sangue passa pelas duas artérias umbilicais, em direcção à placenta. Como foi referido, ao longo da circulação fetal, o sangue proveniente da veia umbilical perde gradualmente o seu teor em oxigénio, à medida em que se vai misturando com sangue menos saturado nesse gás. Teoricamente, essas misturas podem ocorrer no fígado (por junção com uma pequena quantidade de sangue, proveniente do sistema porta), na veia cava inferior (que transporta sangue venoso proveniente das extremidades inferiores, pelve e rins), na aurícula direita (por mistura com o sangue proveniente da cabeça e membros), na aurícula esquerda (através da junção com o sangue proveniente dos pulmões) e na entrada do canal arterioso na aorta descendente. Aquando do nascimento, o fluxo de sangue placentário cessa e o indivíduo começa a respirar autonomamente. Isto leva a uma pressão aumentada na aurícula direita e à obliteração do buraco oval, que assegurava a passagem entre as duas aurículas. As artérias umbilicais também se tornam obliteradas – as suas porções proximais originam as artérias vesicais superiores, enquanto as porções distais originam os ligamentos umbilicais medianos. De seguida, fecha a veia umbilical e o canal venoso, sendo que a obliteração da veia umbilical origina o ligamento redondo do fígado, enquanto a obliteração do canal venoso origina o ligamento venoso. O fecho do canal arterioso, por sua vez, origina o ligamento arterioso.
Factos importantes sobre organogénese do coração: Factos importantes sobre formação do tubo cardíaco: O sistema vascular aparece a meio da terceira semana, sendo que por volta dos 18 dias, células do epiblasto que migraram pela linha primitiva formam mioblastos cardíacos. O aparecimento das ilhas sanguíneas, ao nível da mesoderme lateral permite estabelecer o campo cardiogénico.
A área cardiogénica é inicialmente anterior à membrana bucofaríngea, mas com o crescimento cefálico do SNC, o coração e a cavidade pericárdica movem-se para a região cervical e para o tórax.
As dobras cefalocaudal e lateral do embrião permite que o coração assuma a forma de um tubo contínuo expandido.
O coração mantém-se inicialmente fixo ao lado dorsal da cavidade pelo mesocárdio dorsal. O desaparecimento do mesocárdio dorsal leva à génese do seio pericárdico transverso.
A migração das células mesoteliais do seio venoso para o coração forma o epicárdio. O endocárdio corresponde ao limite endotelial do coração enquanto a miocárdio forma parede muscular do coração.
Factos importantes sobre formação da ansa cardíaca:
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A formação inicia-se no 23º dia de desenvolvimento e fica completa ao 28º dia. cardíaco, enquanto a porção distal é designada por tronco cardíaco. No final da formação da ansa cardíaca começam-se a formar as trabéculas primitivas, adjacentes ao buraco interventricular. O ventrículo primitivo passa a designar-se por
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Factos importantes sobre organogénese do coração (continuação): Factos importantes sobre formação da ansa cardíaca: A formação inicia-se no 23º dia de desenvolvimento e fica completa ao 28º dia. cardíaco, enquanto a porção distal é designada por tronco cardíaco. No final da formação da ansa cardíaca começam-se a formar as trabéculas primitivas, adjacentes ao buraco interventricular. O ventrículo primitivo passa a designar-se por ventrículo esquerdo primitivo, enquanto o terço primitivo do bulbo cardíaco é designado por ventrículo direito primitivo.
A este nível o coração é divisível numa aurícula (mais caudal), que comunica com o seio venoso, num ventrículo e no bulbo cardíaco. A porção média do bulbo é designada por cone cardíaco, enquanto a porção distal é designada por tronco cardíaco.
No final da formação da ansa cardíaca começam-se a formar as trabéculas primitivas, adjacentes ao buraco interventricular. O ventrículo primitivo passa a designar-se por ventrículo esquerdo primitivo, enquanto o terço primitivo do bulbo cardíaco é designado por ventrículo direito primitivo.
Factos importantes sobre desenvolvimento do seio venoso: No meio da quarta semana, o seio venoso recebe drenagem proveniente dos cornos sinosais. Cada corno tem como tributárias a veia vitelina, a veia umbilical e a veia cardinal comum ipsilaterais.
Durante a quinta semana, a veia vitelina esquerda e a veia umbilical esquerda ficam obliteradas e o corno sinusal esquerdo perde importância.
O desvio do sangue da esquerda para a direita permite um aumento das dimensões do corno sinusal direito e das suas tributárias. O corno sinusal direito passa a integrar a parede lisa da aurícula direita. A porção inferior da válvula venosa direita associada origina a válvula da veia cava inferior e a válvula para o seio coronário.
Factos importantes sobre desenvolvimento das aurículas e da sua septação:
O septo primário aparece no final da quarta semana, sendo que a abertura por entre o seu bordo inferior e as almofadas endocárdicas passa a constituir o óstio primário.
O crescimento subsequente das almofadas endocárdicas fecha o óstio primário, mas deixa um óstio secundário.
A incorporação do corno sinusal direito leva à génese do septo secundário, que se sobrepõe ao óstio secundário, mas deixa uma abertura – o buraco oval. Aquando do nascimento, por aumento de pressão na aurícula esquerda, dá-se o fecho do buraco oval.
A parede lisa da aurícula esquerda é formada por integração do tronco pulmonar único.
Factos importantes sobre septação aurículo-ventricular:
O septo aurículo-ventricular é formado através da fusão das almofadas endocárdicas aurículo-ventriculares. O tecido mesenquimatoso que rodeia cada orifício origina as válvulas aurículoventriculares. O tecido muscular das cordas musculares que as suportam degenera, originando as cordas tendinosas.
Factos importantes sobre septação inter-ventricular:
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A aposição das paredes mediais dos ventrículos em expansão leva à formação do septo interventricular muscular, não se dando a total separação dos dois ventrículos.
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Factos importantes sobre organogénese do coração (continuação): Factos importantes sobre septação inter-ventricular:
A aposição das paredes mediais dos ventrículos em expansão leva à formação do septo interventricular muscular, não se dando a total separação dos dois ventrículos. O buraco interventricular é fechado pelo tecido resultante da almofada endocárdica inferior, sendo formada a porção membranosa do septo interventricular.
Factos importantes sobre septação do tronco arterioso e cone cardíaco: Durante a quinta semana aparecem as cristas truncais ao nível do tronco arterioso. A crista truncal superior direita cresce distalmente e para a esquerda, enquanto a crista truncal inferior esquerda cresce distalmente e para a direita. Isto leva a que elas se enrolem uma sobre a outra.
Aquando da sua fusão completa, as cristas formam o septo aórtico-pulmonar, dividindo o tronco arterioso no canal pulmonar e no canal aórtico.
Ao longo as paredes do cone cardíaco aparecem, simultaneamente, duas cristas similares, que o dividem nas câmaras de saída do ventrículo esquerdo e do ventrículo direito. Quando o desenvolvimento do tronco arterioso se encontra quase completa, aparecem dois tubérculos que correspondem aos primórdios das válvulas semilunares. O aparecimento de um terceiro tubérculo e o esvaziamento do fluxo sanguíneo dos tubérculos origina as válvulas semilunares.
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Organogénese do sistema digestivo Divisões do tubo intestinal Como resultado da dobra cefalocaudal e lateral do embrião, uma porção da cavidade do saco vitelino, que é delimitada pela endoderme, é incorporada, sendo formado o intestino primitivo, na quarta semana. Nas porções cefálica e caudal do embrião, o intestino primitivo forma um tubo sem saída, que na porção cefálica se designa por intestino anterior e na porção caudal se designa por intestino posterior. A porção média, o intestino médio, mantém-se ligada ao saco vitelino, através do canal vitelino. No que concerne aos derivados do intestino primitivo, podemos então nomear o intestino anterior, que se estende desde a membrana bucofaríngea, até ao divertículo hepático. O intestino faríngeo está incluído no intestino anterior, estendendo-se desde a membrana bucofaríngea até ao divertículo traqueo-brônquico, sendo particularmente importante para o desenvolvimento da cabeça e pescoço. Já o intestino médio inicia-se caudalmente ao divertículo hepático e estende-se até aos dois terços direitos do cólon transverso. Por fim, o intestino posterior estende-se desde o terço esquerdo do cólon transverso até à membrana cloacal. A endoderme forma o limite epitelial do tracto digestivo e origina o parênquima das glândulas, tais como o fígado e o pâncreas. O tecido muscular, conjuntivo e os componentes peritoneais da parede do intestino derivam da mesoderme esplâncnica.
Mesentérios As porções do tubo digestivo e dos seus derivados encontram-se suspensos das paredes corporais (ventral e dorsal) por mesentérios, camadas duplas de peritoneu que podem envolver um órgão e o ligar à parede corporal. Tais órgãos são designados por intraperitoneais, enquanto órgãos que se encontram adjacentes à parede corporal posterior e se encontram cobertos por peritoneu apenas na sua parede anterior (como os rins) são considerados retroperitoneais. Os mesentérios e os ligamentos peritoneais representam vias para a passagem de vasos, nervos e linfáticos, desde e para as vísceras abdominais. Inicialmente, o intestino anterior, o intestino médio e o intestino posterior encontram-se em amplo contacto com o mesênquima da parede abdominal posterior. Pela quinta semana, contudo, a ponte de tecido conjuntivo sofreu já um estreitamento e a porção caudal do intestino anterior, o intestino médio e a maior parte do intestino posterior encontramse suspensos da parede abdominal, pelo mesentério dorsal, que se estende desde a extremidade inferior do esófago, até à região cloacal do intestino posterior. Na região do estômago, este mesentério forma o mesogástrio dorsal, ou omento maior; na região do duodeno, forma o mesoduodeno dorsal, enquanto na região do cólon, forma o mesocolon dorsal. O mesentério dorsal das ansas jejunais e ilíacas forma o mesentério propriamente dito.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II O mesentério ventral é uma estrutura derivada no septo transverso, existindo apenas na porção terminal do esófago, no estômago e na porção superior do duodeno. O crescimento do fígado para o mesênquima do septo transverso divide o mesentério ventral no omento menor e no ligamento falciforme.
Formação da faringe A faringe é formada a partir do intestino anterior, estendendo-se desde a membrana bucofaríngea até aos primórdios respiratórios. O intestino faríngeo está relacionado com os arcos faríngeos (também designados por arcos branquiais, devido às semelhanças destas estruturas com as brânquias dos peixes), que serão essenciais para a génese de várias estruturas da cabeça e do pescoço. Os arcos faríngeos aparecem por entre a quarta e a quinta semana, sendo protuberâncias externas de tecido mesenquimal separados pelas fendas faríngeas, de natureza externa. Cada arco faríngeo encontra-se recoberto internamente por endoderme e externamente por ectoderme, sendo que dentro deles encontra-se uma artéria, um nervo e uma cartilagem associada. A mesoderme original dos arcos origina a musculatura da cara e do pescoço, sendo que quando as células musculares migram, estas arrastam a sua inervação consigo. Simultaneamente ao desenvolvimento dos arcos e das fendas faríngeas, surgem internamente, ao nível das paredes laterais do intestino faríngeo, estruturas designadas por bolsas faríngeas. Existem quatro bolsas faríngeas e uma quinta rudimentar.
Arcos faríngeos Os arcos faríngeos são cinco, sendo numerados de um a seis, dado o quinto arco branquial não existir. O primeiro arco faríngeo vai ser constituído por uma porção dorsal (a apófise maxilar) e por uma porção ventral (a apófise mandibular), que vai conter a cartilagem de Meckel. Essa cartilagem vai desaparecer quase na totalidade, estando associada à ossificação da mandíbula. Já o mesênquima da apófise maxilar vai originar a pré-maxila, maxila, osso zigomático e parte do osso temporal. O martelo e a bigorna (dois ossículos do ouvido) têm também origem a partir do primeiro arco faríngeo. A sua inervação vai ser assegurada pelo nervo trigémio, que no indivíduo adulto se vai encarregar da inervação dos músculos da mastigação, do músculo tensor do tímpano, do tensor do véu do palatino, do ventre anterior do digástrico e do milohióide. O segundo arco faríngeo, por sua vez, a partir da sua cartilagem (cartilagem de Reichert) vai originar os cornos menores do osso hióide, a porção superior do seu corpo, o ligamento estilohióide, a apófise
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II estilóide e o estribo (outro ossículo do ouvido), estando associado aos músculos estapédio, estilohióide, ao ventre posterior do digástrico, ao músculo auricular e aos músculos da mímica, cuja inervação é assegurada pelo nervo facial. O terceiro arco faríngeo, por sua vez, está associado à formação dos cornos maiores do osso hióide e da porção inferior do corpo do osso hióide, estando associado ao nervo glossofaríngeo e ao músculo estilofaríngeo. Por fim, o quarto e o sexto arco faríngeos vão estar relacionados com a formação das cartilagens tiróide, cricóide, aritenóide, corniculada e cuneiforme. Os músculos do quarto arco (cricotiróide, elevador do véu do palatino, constrictores da faringe e músculos intrínsecos da laringe) são inervados pelo nervo vago e seus ramos.
Bolsas faríngeas No que concerne às bolsas faríngeas, a porção distal da primeira bolsa faríngea vai originar o meato acústico externo, enquanto a porção proximal vai originar a trompa auditiva. A segunda bolsa faríngea está relacionada com o desenvolvimento da amígdala palatina, sendo que parte da bolsa mantém-se no indivíduo adulto - a fossa amigdalina. Já a terceira bolsa faríngea (através da sua porção dorsal) origina as glândulas paratiróides inferiores, enquanto a quarta bolsa faríngea origina (por via da sua porção dorsal) as glândulas paratiróides superiores. O facto de uma bolsa faríngea que se encontra mais superiormente originar uma glândula mais inferior prende-se com o facto da terceira bolsa faríngea também originar (através da sua porção ventral) o timo. O timo desloca-se mais inferiormente, arrastando consigo as glândulas paratiróides inferiores, que se tornam caudais às glândulas paratiróides superiores. Esta migração das glândulas paratiróides inferiores explica porque é que estas se encontram numa posição mais inconstante que as superiores.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II A porção ventral da quarta bolsa faríngea, por sua vez, origina o corpo ultimo-branquial, que é depois incorporado na glândula tiróide. As células deste corpo originam as células parafoliculares (ou células C) da tiróide, que segregam calcitonina, uma hormona envolvida na regulação dos níveis sanguíneos de cálcio.
Fendas faríngeas Um embrião de cinco semanas apresenta ainda quatro fendas faríngeas, das quais apenas a primeira contribui para a estrutura definitiva do embrião. De facto, a porção dorsal da primeira fenda origina, juntamente com a porção dorsal da primeira bolsa faríngea, o meato acústico externo. As restantes fendas perdem contacto com o exterior e formam uma cavidade designada por seio cervical, que entretanto desaparece.
Desenvolvimento da língua A porção anterior da língua deriva do primeiro arco faríngeo, enquanto a porção mais posterior (a eminência hipobranquial) é derivada do 2º, 3º e 4º arcos faríngeos. A epiglote é também derivada do 4º arco faríngeo, contudo, deriva da sua porção mais posterior.
Intestino anterior Esófago Quando o embrião apresenta apenas quatro semanas, o divertículo respiratório (broto pulmonar) aparece na parede ventral do intestino anterior, ao nível da sua fronteira com o intestino faríngeo. O septo traqueo-esofágico gradualmente divide este divertículo, desde a porção dorsal do intestino anterior. Desta forma, o intestino anterior divide-se numa porção ventral (o primórdio respiratório) e uma porção dorsal (o esófago). Inicialmente, o esófago é pequeno, mas com a migração do coração e dos pulmões para o tórax, o esófago cresce rapidamente. O revestimento muscular, que é formado pelo mesênquima esplâncnico em seu redor, é estriado e inervado pelo vago nos seus dois-terços superiores. Já no seu terço inferior, o revestimento muscular do esófago é liso e inervado pelo plexo esplâncnico.
Estômago O estômago aparece na quarta semana de desenvolvimento, como uma dilatação fusiforme do intestino anterior. Durante as semanas seguintes, o seu aspecto e a sua posição mudam amplamente, como resultado das diferentes taxas de crescimento em várias regiões da sua parede e das mudanças de posição dos órgãos em seu redor. O estômago roda em torno de um eixo longitudinal e de um eixo anteroposterior. Ou seja, o estômago roda 90º no sentido dos ponteiros do relógio, em torno do seu eixo longitudinal, o que leva a que o seu lado esquerdo passe a olhar anteriormente e a que o seu lado direito passa a olhar posteriormente. Daí que o nervo vago esquerdo, que inicialmente inervava o lado esquerdo do estômago, passe a inervar a
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II sua parede anterior; enquanto o nervo vago direito passa a inervar a parede posterior. Durante esta rotação, a parede posterior original do estômago cresce mais rapidamente que a porção anterior, sendo por isso formadas as curvaturas maior e menor. As extremidades cefálica e caudal do estômago normalmente encontram-se na linha média, mas aquando de um crescimento ulterior, o estômago roda em torno de um eixo antero-posterior, de modo a que a extremidade caudal (a porção pilórica) se desloca para a direita e superiormente, enquanto a porção cefálica (a porção cárdica) se move para a esquerda e ligeiramente inferiormente. O estômago assume então a sua posição final, com o seu eixo a deslocar-se desde superiormente e para a esquerda, até inferiormente e para a direita. Uma vez que o estômago se encontra ligado à parede dorsal do corpo pelo mesogástrio dorsal e à parede ventral pelo mesogástrio ventral, a sua rotação e crescimento desproporcional alteram a posição desses mesentérios. A rotação em torno do eixo longitudinal puxa o mesogástrio dorsal para a esquerda, criando um espaço posterior ao estômago, designado por saco menor. Esta rotação também puxa o mesogástrio ventral para a direita. À medida que este processo continua, na quinta semana de desenvolvimento, o baço primordial aparece como uma proliferação mesodérmica, por entre os dois folhetos do mesogástrio dorsal. Com a rotação contínua do estômago, o mesogástrio dorsal sofre um espessamento e a porção por entre o baço e a linha média dorsal desloca-se para a esquerda e funde-se com o peritoneu da parede abdominal posterior. O folheto posterior do mesogástrio dorsal e o peritoneu ao longo dessa linha de fusão degeneram. O baço, que se mantém intra-peritoneal, passa a estar ligado à parede do corpo na região do rim esquerdo, pelo ligamento espleno-renal e ao estômago pelo ligamento gastro-esplénico. O espessamento e a fusão do mesogástrio dorsal na parede corporal posterior também determina a posição final do pâncreas. Inicialmente, este órgão cresce no mesoduodeno dorsal, mas, eventualmente, a sua cauda estende-se para o mesogástrio dorsal. Uma vez que esta porção do mesogástrio dorsal se funde com a parede dorsal do corpo, a cauda do pâncreas passa a encontrar-se adjacente a essa parede. Quando o folheto posterior do mesogástrio dorsal e o peritoneu da parede posterior do corpo
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II degeneram ao longo da linha de fusão, a cauda do pâncreas passa a ficar coberta por peritoneu, apenas na sua face anterior, tornando-se por isso uma estrutura retroperitoneal (como o pâncreas era anteriormente coberto por peritoneu, mas passa a ser retroperitoneal, diz-se que este órgão é retroperitoneal secundário). Como resultado da rotação do estômago em torno do seu eixo anteroposterior, o mesogástrio dorsal cresce inferiormente, formando uma estrutura de camada dupla, que se estende como um avental sobre o cólon transverso e as ansas do intestino delgado. Esta dupla camada constitui o omento maior. O omento menor e o ligamento falciforme formam-se a partir do mesogástrio ventral, que deriva da mesoderme do septo transverso. Quando o fígado cresce no septo, o mesogástrio ventral torna-se mais fino, para formar o peritoneu do fígado, o ligamento falciforme, que se estende desde o fígado até à parede ventral do corpo, e o omento menor, que se estende desde o estômago e porção superior do duodeno, até ao fígado. O bordo livre do ligamento falciforme contém a veia umbilical, que se torna obliterada ao nascimento, para formar o ligamento redondo do fígado. Já o bordo livre do ligamento hepatoduodenal (uma porção do omento menor) contém o canal biliar, a veia porta e a artéria hepática (tríade portal). Esse bordo livre também forma o tecto do buraco epiplóico, que é a transição por entre o saco menor e o resto da cavidade peritoneal.
Duodeno A porção terminal do intestino anterior e a porção cefálica do intestino médio formam o duodeno. A junção entre as duas porções é directamente distal à origem do divertículo hepático. Aquando da rotação do estômago, o duodeno adquire uma forma em “C” e roda para a direita. Essa rotação, juntamente com um rápido crescimento da cabeça do pâncreas, leva a que o duodeno seja desviado para a direita sua posição original (que se encontrava ao nível da linha média). O duodeno e a cabeça do pâncreas fazem pressão contra a parede dorsal do corpo e isto leva a que a face direita do mesoduodeno dorsal se funda com o peritoneu adjacente. Ambas as camadas desaparecem e, subsequentemente, o duodeno e a cabeça do pâncreas tornam-se fixos numa porção retroperitoneal. Isto faz com que o pâncreas adquira uma posição totalmente retroperitoneal. O mesoduodeno dorsal acaba por desaparecer completamente, excepto na região do piloro do estômago, onde uma pequena porção do duodeno (a “cobertura duodenal”) retém o seu mesentério, mantendose intraperitoneal. Durante o segundo mês de desenvolvimento, o lúmen do duodeno fica obliterado, devido à proliferação de células nas suas paredes. Contudo, esta abertura é reaberta pouco tempo depois. Uma vez que o intestino anterior é irrigado pela artéria celíaca e o intestino médio é irrigado pela artéria mesentérica superior, o duodeno é irrigado por ramos de ambas as artérias.
Fígado e vesícula biliar O divertículo hepático aparece no meio da terceira semana, a partir do epitélio endodermal, na extremidade distal do intestino anterior. Esta estrutura consiste em células que rapidamente proliferam e penetram no septo transverso (a lâmina mesodermal, por entre a cavidade pericárdica e o canal do saco vitelino). Enquanto as células hepáticas continuam a penetrar no septo, a ligação entre o divertículo hepático e o intestino anterior torna-se mais estreita, formando o canal biliar. Subsequentemente, o canal biliar forma uma pequena protuberância, que origina a vesícula biliar e o canal cístico. Numa fase posterior do desenvolvimento, cordas hepáticas epiteliais misturam-se com as veias vitelina e umbilical, formando os sinusóides hepáticos. As cordas hepáticas diferenciam-se em células hepáticas e formam o limite dos canais biliares.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Após se ter dado a invasão do septo transverso, por parte das células hepáticas, o fígado vai se estender caudalmente, para a cavidade abdominal, sendo que a mesoderme do septo transverso, que se vai encontrar por entre o fígado e o intestino anterior e por entre o fígado e a parede abdominal ventral, vai se tornar membranosa, formando o omento menor e o ligamento falciforme, respectivamente (ou seja, os constituintes do mesogástrio ventral). A mesoderme na superfície do fígado diferencia-se em peritoneu visceral, excepto na sua face mais craniana, onde o fígado se mantém em contacto com o resto do septo transverso original. Esta porção do septo, que consiste em mesoderme densamente arranjada, formará o tendão central do diafragma, enquanto a superfície do fígado que se encontra em contacto com o futuro diafragma, não sendo nunca coberto por peritoneu, constituirá a “área nua do fígado”. Ao nível da 10ª semana de desenvolvimento, a massa do fígado é cerca de 10% da massa total do corpo, sobretudo devido à função hematopoiética do fígado, que persiste até durante os últimos dois meses de vida intra-uterina. Dessa forma, aquando do nascimento, apenas restam algumas ilhas hematopoiéticas e a massa do fígado representa apenas 5% da massa total corporal. Outra função importante do fígado prende-se com a produção de bílis, algo que ocorre por volta da 12ª semana. Concomitantemente, uma vez que a vesícula biliar e o canal cístico já se desenvolveram e o canal biliar já se formou, a bílis pode entrar no tracto gastrointestinal. A entrada do canal biliar é inicialmente anterior ao duodeno, contudo, devido às mudanças de posição do duodeno, esta passa a ser posterior (e, consequentemente, o canal biliar passa a deslocar-se posteriormente ao duodeno).
Pâncreas O pâncreas é formado a partir de dois esboços, que se originam a partir do limite endodermal do duodeno. Enquanto o esboço pancreático dorsal se encontra no mesentério dorsal, o esboço pancreático ventral encontra-se próximo do canal biliar. Quando o duodeno roda para a direita e passa apresentar forma de C, o esboço pancreático ventral move-se dorsalmente, passando a encontrar-se imediatamente inferior e posterior ao esboço dorsal. Mais tarde, o parênquima e os sistemas canaliculares dos esboços pancreáticos ventral e dorsal unemse. O esboço ventral forma a apófise unciforme e a porção inferior da cabeça do pâncreas, enquanto a restante parte da glândula deriva do esboço dorsal. O canal pancreático principal é formado pela porção distal do canal pancreático dorsal e por todo o canal pancreático ventral. Já a porção proximal do canal pancreático dorsal, por sua vez, fica obliterada, ou persiste como um pequeno canal – o canal pancreático acessório.
Intestino médio Num embrião com cinco semanas, o intestino médio encontra-se suspenso a partir da parede abdominal dorsal, por um pequeno mesentério e comunica com o saco vitelino por via do canal vitelino. As estruturas derivadas do intestino médio vão desde distalmente à entrada do canal biliar no duodeno até
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II passados os dois-terços proximais do cólon transverso. Ao longo do seu percurso, o intestino médio é irrigado pela artéria mesentérica superior. O desenvolvimento do intestino médio é caracterizado pelo rápido crescimento do intestino e do seu mesentério, o que resulta na formação da ansa intestinal primária. Ao nível do seu ápice, a ansa mantém-se em ligação aberta com o saco vitelino, através do estreito canal vitelino. A projecção cefálica da ansa desenvolve-se como porção distal do duodeno, jejuno e parte do íleo, enquanto a projecção caudal da ansa, origina a porção inferior do íleo, o ceco, o apêndice, o cólon ascendente e os dois terços proximais do cólon transverso.
Hérnia umbilical fisiológica O desenvolvimento da ansa intestinal primária é caracterizado por uma rápida elongação, especialmente da sua projecção cefálica. Como resultado do crescimento e expansão do fígado, que ocorre simultaneamente, a cavidade abdominal torna-se temporariamente demasiado pequena, para conter todas as ansas intestinais, que entram na cavidade extraembrionária, pelo cordão umbilical, durante a sexta semana de desenvolvimento (hérnia umbilical fisiológica).
Rotação do intestino médio Concomitantemente ao crescimento em comprimento, a ansa intestinal primária roda em torno de um eixo formado pela artéria mesentérica superior. Quando vista anteriormente, esta rotação é no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio e tem uma amplitude total de quase 270º. Mesmo durante a rotação, o crescimento da ansa intestinal continua e o jejuno e o íleo formam um conjunto de ansas. O intestino grosso também aumenta consideravelmente o seu comprimento, mas não participa na formação de ansas. A rotação do intestino médio não ocorre toda de uma vez. Durante a herniação fisiológica, ocorre uma rotação de cerca de 90º e durante o regresso das ansas intestinais para a cavidade abdominal, o intestino médio roda os restantes 180º.
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Retracção das ansas Durante a 10ª semana de desenvolvimento as ansas intestinais herniadas começam a regressar à cavidade abdominal. Apesar de os factores responsáveis por este regresso ainda não estarem totalmente conhecidos, sabe-se que a regressão do rim mesonéfrico, uma menor taxa de crescimento do fígado e a expansão da cavidade abdominal desempenham importantes papéis. A porção proximal do jeujuno é a primeira parte a reentrar na cavidade abdominal, passando a situar-se do lado esquerdo. As ansas que vão reentrando subsequentemente, vão sendo dispostas progressivamente para a direita. O esboço cecal, que aparece por volta da sexta semana, como uma dilatação cónica da projecção caudal da ansa intestinal primária é a última porção do intestino médio a reentrar na cavidade abdominal. Esta estrutura vai se encontrar temporariamente no quadrante superior direito, imediatamente inferior ao lobo direito do fígado. A partir daqui, o esboço cecal vai descer na fossa ilíaca direita, o que permite que o cólon ascendente e o ângulo hepático fiquem do lado direito da cavidade abdominal. Durante este processo, a extremidade distal do esboço cecal forma um pequeno divertículo, o apêndice vermiforme. Dado o apêndice se desenvolver à medida que o cólon desce, na sua posição final vai se encontrar frequentemente posteriormente ao ceco ou ao cólon.
Mesentérios das ansas intestinais O mesentério da ansa intestinal primária, o mesentério propriamente dito, sofre mudanças profundas, aquando da rotação e espiralização do intestino. Quando a projecção caudal da ansa se move para o lado direito da cavidade abdominal, o mesentério dorsal vira-se sobre a origem da artéria mesentérica superior. Numa fase posterior, quando as porções ascendente e descendente do cólon adquirem as suas posições definitivas, os seus mesentérios embatem contra o peritoneu da parede abdominal posterior. Após fusão dessas camadas, o cólon ascendente e o cólon descendente passam a ficar permanentemente ancorados numa posição retroperitoneal. Por seu turno, o apêndice, a extremidade inferior do ceco e o cólon sigmóide retêm os seus mesentérios livres. O destino do mesocólon transverso é diferente. Esta estrutura funde-se com a parede posterior do omento maior, mas mantém a sua mobilidade. O mesocólon transverso encontra-se então fixo desde o ângulo hepático até ao ângulo esplénico. O mesentério das ansas ileo-jejunais é inicialmente contínuo com o do cólon ascendente. Quando o mesentério do mesocolon ascendente se funde com a parede abdominal posterior, o mesentério das ansas íleo-jejunais passa a deslocar-se desde a área de onde o duodeno se torna intraperitoneal, até à junção íleo-cecal.
Intestino posterior O intestino posterior origina o terço distal do cólon transverso, o cólon descendente, o cólon sigmóide, o recto e a porção superior do canal anal. A endoderme do intestino posterior também forma o limite interno da bexiga e da uretra. A porção terminal do intestino posterior entra na região posterior da cloaca (o canal anorectal primitivo), enquanto o alantóide entra na região anterior da cloaca (o seio urogenital primitivo). A cloaca é uma cavidade delimitada por endoderme e coberta no seu bordo ventral, por ectoderme, sendo que a fronteira por entre a endoderme e a ectoderme forma a membrana cloacal. Uma camada de mesoderme, o septo uro-rectal, separa a região por entre o alantóide e o intestino posterior. Este septo deriva da mistura da mesoderme que cobre o saco vitelino e rodeia o alantóide. À
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II medida que o embrião cresce e se dobra caudalmente, a ponta do septo uro-rectal torna-se mais próxima da membrana cloacal, embora as duas estruturas nunca contactem uma com a outra. No final da sétima semana dá-se a ruptura da membrana cloacal, sendo criada a abertura anal para o intestino posterior e uma abertura para o seio urogenital. Por entre estes dois espaços, a ponta do septo uro-rectal forma o corpo perineal. Por esta altura, a proliferação da ectoderme leva ao fecho da região mais caudal do canal anal, mas por volta da nona semana, o canal anal abre-se outra vez. Desta forma, a porção caudal do canal anal origina-se na ectoderme e é irrigada pelas artérias rectais inferiores (que são ramos das artérias pudendas internas), enquanto a porção craniana do canal anal se origina na endoderme e é irrigada pela artéria rectal superior (uma continuação da artéria mesentérica inferior, a artéria do intestino posterior).
Factos importantes sobre organogénese do aparelho digestivo: Factos importantes sobre formação de divisões do intestino primitivo:
A dobra cefalocaudal e lateral do embrião leva a que este incorpore uma porção da cavidade do saco vitelino delimitada por endoderme, sendo formado o intestino primitivo, pela quarta semana de desenvolvimento.
O intestino anterior estende-se desde a membrana bucofaríngea até ao divertículo hepático (incluindo a faringe), o intestino médio estende-se desde o divertículo hepático até aos dois-terços direitos do cólon transverso e, finalmente, o intestino posterior estende-se do terço esquerdo do cólon transverso até à membrana cloacal.
A endoderme origina o limite epitelial do tracto digestivo e o parênquima das glândulas. O tecido muscular, conjuntivo e o peritoneu da parede do intestino derivam da mesoderme esplâncnica.
Factos importantes sobre formação dos mesentérios:
Inicialmente o intestino primitivo contacta amplamente com o mesênquima da parede abdominal posterior.
Pela quinta semana, essa ligação sofre um estreitamento, sendo originado o mesentério dorsal, que se estende desde a extremidade inferior do esófago, até à região cloacal.
O mesentério ventral é, por sua vez, originado a partir do septo transverso, originando depois o omento menor e o ligamento falciforme.
Factos importantes sobre desenvolvimento da faringe:
O intestino faríngeo é formado a partir do intestino anterior, estendendo-se desde a membrana bucofaríngea até ao divertículo traqueo-brônquico.
Os arcos faríngeos aparecem por entre a quarta e a quinta semana, estando associados a uma cartilagem, uma artéria e um nervo, cada um. A sua mesoderme origina a musculatura 355 da cara e do pescoço. Os arcos faríngeos vão se encontrar separados por fendas faríngeas.
O primeiro arco faríngeo vai originar a maxila, osso zigomático, parte do osso temporal, parte da mandíbula, o martelo e a bigorna. Este arco está associado aos músculos da mastigação, tensor do tímpano, tensor do véu do palatino, ventre anterior do digástrico e milohióide. O nervo associado é o trigémio.
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Factos importantes sobre organogénese do aparelho digestivo (continuação):
O primeiro arco faríngeo vai originar a maxila, osso zigomático, parte do osso temporal, parte da mandíbula, o martelo e a bigorna. Este arco está associado aos músculos da mastigação, tensor do tímpano, tensor do véu do palatino, ventre anterior do digástrico e milohióide. O nervo associado é o trigémio.
O segundo arco faríngeo vai originar os cornos menores do osso hióide, a porção superior do seu corpo, o ligamento estilohióide, a apófise estilóide e o estribo. Está associado ao estapédio, estilohióide, ventre posterior do digástrico e músculos da mímica. O nervo associado é o facial.
O terceiro arco faríngeo vai originar os cornos maiores do osso hióide e a porção inferior do corpo do osso hióide, estando associado ao nervo glossofaríngeo e ao músculo estilofaríngeo.
O quarto e o sexto arco faríngeos (o quinto não existe) vão estar relacionados com a formação das cartilagens da laringe e dos músculos cricotiróide, elevador do véu do palatino, constritores da faringe e intrínsecos da laringe. O nervo associado é o vago.
As bolsas faríngeas são estruturas que surgem internamente, ao nível das paredes laterais da faringe.
A porção distal da primeira bolsa faríngea origina o meato acústico externo, enquanto a porção proximal origina a trompa auditiva.
A segunda bolsa faríngea está associada ao desenvolvimento da amígdala palatina.
A porção ventral da quarta bolsa faríngea origina o corpo ultimo-branquial, que é depois integrado na glândula tiróide, enquanto a porção dorsal origina as paratiróides superiores.
Das quatro fendas faríngeas, apenas a primeira contribui para uma estrutura definitiva do embrião (o meato acústico externo). As restantes originam o seio cervical, que desaparece.
A porção anterior da língua deriva do primeiro arco faríngeo, enquanto a porção mais posterior deriva do segundo, terceiro e quatro arcos.
A porção ventral da terceira bolsa faríngea origina o timo, enquanto a porção dorsal origina as glândulas paratiróides inferiores. A migração do timo arrasta consigo as glândulas paratiróides inferiores, que se tornam inferiores às glândulas paratiróides superiores.
Factos importantes sobre desenvolvimento do esófago:
Pela quarta semana de desenvolvimento surge o divertículo respiratório na parede ventral do intestino anterior. O septo traqueo-esofágico divide-o numa porção ventral (o primórdio respiratório) numa porção dorsal (o esófago). O esófago é inicialmente pequeno, mas cresce aquando da migração do coração e pulmões para o tórax.
Factos importantes sobre desenvolvimento do estômago:
O estômago aparece pela quarta semana de desenvolvimento, como uma dilatação fusiforme do intestino anterior A rotação do estômago 90º no sentido dos ponteiros do relógio, em torno do seu eixo longitudinal, leva a que o seu lado esquerdo passe a olhar anteriormente e o direito passe a olhar posteriormente. Durante esta rotação a parede posterior original do estômago cresce mais que a direita, o que origina as curvaturas maior e menor. O estômago roda depois em torno de um eixo antero-posterior – a porção pilórica deslocase para a direita e superiormente, enquanto a porção cárdica se desloca para a esquerda 356 e inferiormente. A rotação do estômago em torno do seu eixo longitudinal puxa o mesogástrio dorsal para a esquerda, criando um espaço (o saco menor) e puxa o mesogástrio ventral para a direita. A rotação do estômago em torno do seu eixo anteroposterior leva ao crescimento inferior do mesogástrio dorsal, que origina uma estrutura em dupla camada - o omento maior.
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Factos importantes sobre organogénese do aparelho digestivo (continuação):
O estômago roda depois em torno de um eixo antero-posterior – a porção pilórica deslocase para a direita e superiormente, enquanto a porção cárdica se desloca para a esquerda e inferiormente.
A rotação do estômago em torno do seu eixo longitudinal puxa o mesogástrio dorsal para a esquerda, criando um espaço (o saco menor) e puxa o mesogástrio ventral para a direita.
A rotação do estômago em torno do seu eixo anteroposterior leva ao crescimento inferior do mesogástrio dorsal, que origina uma estrutura em dupla camada - o omento maior.
O mesogástrio ventral origina o ligamento falciforme, aquando do crescimento do fígado, e o omento menor.
Factos importantes sobre desenvolvimento do duodeno:
O duodeno é formado pela porção terminal do intestino anterior e pela porção cefálica do intestino médio.
A rotação do estômago leva a que o duodeno adquira uma forma em C e a que seja desviado para a direita da linha média.
O duodeno e a cabeça do pâncreas fazem pressão contra a parede dorsal do corpo e o mesoduodeno dorsal vai se fundir com o peritoneu adjacente. O duodeno e o pâncreas tornam-se retroperitoneais, excepto na região da “cobertura duodenal”.
Factos importantes sobre desenvolvimento do fígado e vesícula biliar:
O divertículo hepático aparece na terceira semana, sendo que as suas células vão penetrar no septo transverso. À medida que esse processo ocorre, estreita-se a ligação entre o divertículo hepático e o intestino anterior e forma-se o canal biliar. A partir do septo transverso, o fígado vai se estender caudalmente para a cavidade abdominal. A mesoderme na sua superfície diferencia-se em peritoneu visceral, excepto na região mais superior do fígado, que se mantém em contacto com o septo transverso e origina a “área nua do fígado”. O canal biliar origina uma protuberância que, por sua vez, leva à formação da vesícula biliar e do canal cístico. A produção de bílis ocorre por volta da 12ª, sendo a entrada do canal biliar inicialmente anterior ao duodeno, mas passando depois a ser posterior.
Factos importantes sobre desenvolvimento do pâncreas:
O pâncreas é formado a partir de dois esboços que se originam a partir do limite endodermal do duodeno. O esboço pancreático dorsal encontra-se no mesentério dorsal, enquanto o esboço pancreático ventral se encontra próximo do canal biliar. Quando o duodeno roda para a direita, o esboço pancreático ventral move-se dorsalmente, ficando inferior e posterior ao esboço dorsal. O parênquima e os sistemas canaliculares dos esboços pancreáticos unem-se, sendo que o esboço ventral forma a apófise unciforme e porção inferior da cabeça do pâncreas, enquanto o esboço dorsal forma o resto da glândula.
Factos importantes sobre desenvolvimento do intestino médio:
O intestino médio cresce rapidamente, originando a ansa intestinal primária.
Aquando da herniação fisiológica, o intestino médio roda c. 90º do sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. Quando as ansas do intestino regressam à cavidade abdominal, o intestino médio roda c. 180º no mesmo sentido.
Durante a 10ª semana, as ansas intestinais começam a regressar à cavidade abdominal. A
Por volta da sexta semana, a cavidade abdominal torna-se demasiado pequena para conter todas as ansas intestinais, que passam para a cavidade extra-embrionária – hérnia umbilical357 fisiológica.
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Factos importantes sobre organogénese do aparelho digestivo (continuação):
A projecção cefálica da ansa originará a porção distal do duodeno, o jejuno e parte do íleo, enquanto a projecção caudal originará o resto do íleo, o ceco, o apêndice, o cólon ascendente e os dois terços proximais do cólon transverso.
Por volta da sexta semana, a cavidade abdominal torna-se demasiado pequena para conter todas as ansas intestinais, que passam para a cavidade extra-embrionária – ocorre a hérnia umbilical fisiológica.
Aquando da herniação fisiológica, o intestino médio roda c. 90º do sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. Quando as ansas do intestino regressam à cavidade abdominal, o intestino médio roda c. 180º no mesmo sentido.
Durante a 10ª semana, as ansas intestinais começam a regressar à cavidade abdominal. A primeira parte a entrar é a porção proximal do jejuno e o esboço cecal é a última. O esboço cecal vai se encontrar inicialmente no quadrante superior direito, mas vai descer, à medida que o apêndice vermiforme vai sendo formado, ao nível da sua extremidade distal.
Quando o cólon ascendente e descendente adquirem as suas posições definitivas, passam a ser estruturas retroperitoneais. Todas as outras porções do intestino médio mantêm o seu mesentério.
Factos importantes sobre desenvolvimento do intestino posterior:
A porção terminal do intestino posterior entra na região posterior da cloaca, originando o canal anorectal primitivo. Já o alantóide entra na região anterior da cloaca, originando o seio urogenital primitivo.
O septo uro-rectal separa a região por entre o alantóide e o intestino posterior, mas nunca contacta com a membrana cloacal.
No final da sétima semana dá-se a ruptura da membrana cloacal, sendo criada a abertura anal para o intestino posterior e uma abertura para o seio urogenital.
O canal anal fecha de novo, sendo reaberto definitivamente, por volta da nona semana. A porção mais caudal do canal anal tem origem na ectoderme, enquanto a porção mais craniana tem origem na endoderme.
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Organogénese do sistema urinário Funcionalmente, o sistema urogenital pode ser dividido em dois componentes distintos – o sistema urinário e o aparelho genital. Contudo, embriologicamente e anatomicamente, estes sistemas estão intimamente relacionados, na medida em que ambos se desenvolvem a partir da mesoderme intermédia, ao longo da parede posterior da cavidade abdominal e, inicialmente, os canais excretores de ambos os sistemas entram numa cavidade comum, designada por cloaca.
Rins Três sistemas renais, que se sobrepõem ligeiramente, são formados em sequência cefalocaudal, durante a vida intrauterina – o pronefros, o mesonefros e o metanefros. O pronefros é rudimentar e nãofuncional, o mesonefros pode funcionar por um pequeno período de tempo, durante o período fetal e, por fim, o metanefros forma o rim permanente.
Pronefros No início da quarta semana o pronefros encontra-se representado por entre 7 a 10 grupos celulares na região cervical. Esses grupos formam unidades excretoras vestigiais, os nefrótomos, que regridem, antes de se formarem nefrótomos mais caudais. Pelo final da quarta semana, todos os vestígios do sistema pronéfrico já desapareceram.
Mesonefros O mesonefros e os canais mesonéfricos derivam da mesoderme intermédia, encontrando-se desde o tórax superior até aos segmentos lombares superiores (L3). No princípio da quarta semana de desenvolvimento, aquando da regressão do sistema pronéfrico, aparecem os primeiros túbulos excretores do mesonefros. Estes túbulos crescem rapidamente, desde uma ansa em forma de S, adquirindo vários capilares que formarão um glomérulo, na sua extremidade medial. Em torno do glomérulo, os túbulos formam a cápsula de Bowman e, juntamente, estas estruturas constituem um corpúsculo renal. Lateralmente, o túbulo entra no canal colector longitudinal, designado por canal
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II mesonéfrico ou canal wolfiano. No meio do segundo mês, o mesonefros forma um grande órgão ovóide de cada lado da linha média. Uma vez que a gónada em desenvolvimento se encontra do seu lado medial, a crista formada por ambos os órgãos é designada por crista urogenital. Enquanto os túbulos caudais se encontram ainda em diferenciação, os túbulos craniais e os glomérulos mostram já alterações degenerativas, sendo que pelo final do segundo mês, a maioria já desapareceu. Nos indivíduos do sexo masculino, alguns túbulos caudais e o canal mesonéfrico persistem e participam na formação do sistema genital, mas nos indivíduos do sexo feminino isto não acontece e estas estruturas desaparecem.
Metanefros O terceiro órgão urinário, o metanefros, ou rim permanente, aparece na quinta semana. As suas unidades excretoras desenvolvem-se a partir da mesoderme metanéfrica, da mesma forma que ocorre no sistema mesonéfrico. Contudo, o desenvolvimento do sistema canalicular difere do de outros sistemas renais. Sistema colector Os canais colectores do rim permanente desenvolvem-se a partir do divertículo uretérico, que surge a partir do canal mesonéfrico, próximo à sua entrada na cloaca. O divertículo penetra no mesênquima metanéfrico, que se encontra moldado sobre a sua extremidade distal, constituindo o blastema metanéfrico. Subsequentemente, o divertículo dilata-se, formando a pelve renal primitiva, que se divide nas porções cranial e caudal, que originarão os futuros cálices maiores. Cada cálice forma dois novos divertículos, enquanto penetra no tecido metanéfrico. Os divertículos continuam-se a subdividir até se encontrarem formadas 12 ou mais gerações de túbulos. Simultaneamente, na periferia vão se formar mais túbulos até ao final do quinto mês. Os túbulos da segunda divisão alargam-se e absorvem os túbulos da terceira e quarta gerações, formando assim os cálices menores da pelve renal. Aquando do desenvolvimento ulterior, os túbulos colectores da quinta e sucessivas gerações alongam-se consideravelmente e convergem no cálice menor, formando a pirâmide renal. Conclui-se portanto, que o divertículo uretérico origina os ureteres, a pelve renal, os cálices maiores e menores, as pirâmides renais, e entre 1 a 3 milhões de túbulos colectores.
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Sistema excretor Cada túbulo recém-formado encontra-se coberto na sua extremidade distal pelo blastema metanéfrico (também designado por mesênquima metanéfrico ou mesoderme metanéfrica). Sob a influência indutiva do túbulo, as células do blastema formam as pequenas vesículas renais, que por sua vez, originam pequenos túbulos em forma de S. Numa das extremidades do S, dá-se o crescimento de capilares, que se diferenciam em glomérulos. Estes túbulos juntamente com os seus glomérulos, formam os nefrónios, ou unidades excretoras. A extremidade proximal de cada nefrónio forma a cápsula de Bowman, que se encontra profundamente recuada por um glomérulo. A extremidade distal, por sua vez, forma uma ligação aberta com um túbulo colector, sendo assim estabelecida uma via de passagem a partir da cápsula de Bowman até à unidade colectora. O crescimento contínuo do túbulo excretor resulta na formação do túbulo contornado proximal, ansa de Henle e túbulo contornado distal. Desta forma, o rim desenvolve-se a partir de duas fontes – o blastema mesonéfrico, que origina unidades excretoras e o divertículo uretérico, que origina o sistema colector. Os nefrónios vão sendo formados até ao nascimento, sendo que nessa altura existem aproximadamente um milhão de nefrónios em cada rim. A produção de urina inicia-se pouco tempo após a diferenciação dos capilares glomerulares, que se começam a formar por volta da décima semana de desenvolvimento, sendo essa urina de natureza hipertónica. Aquando do nascimento, os rins apresentam um aspecto lobulado, mas a lobulação desaparece durante a infância, como resultado do crescimento ulterior dos nefrónios (embora, não ocorra aumento do seu número).
Posicionamento do rim O rim encontra-se inicialmente na região pélvica, ascendendo depois para uma posição mais cranial no abdómen. A ascensão do rim é causada pela diminuição da curvatura do corpo e pelo crescimento do corpo nas regiões lombar e sagrada. Na pelve, o metanefros recebe a sua irrigação arterial a partir de um ramo pélvico da aorta. Durante a sua ascensão para a região abdominal, os rins passam a ser irrigados por artérias que se originam na aorta, a níveis cada vez mais superiores. Os vasos inferiores normalmente degeneram, mas alguns podem permanecer.
Funcionamento do rim O rim definitivo é formado a partir do metanefros e torna-se funcional perto da décima segunda semana. A urina passa para a cavidade amniótica e mistura-se com o fluido amniótico. Este fluido é
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II engolido pelo feto e reciclado nos rins. Durante a vida fetal, os rins não são responsáveis pela excreção dos resíduos metabólicos, na medida em que esta função é assegurada pela placenta.
Bexiga e uretra Entre a quarta e a sétima semana de desenvolvimento, a cloaca encontra-se dividida, sendo que a sua porção anterior constitui o seio urogenital, enquanto a sua porção posterior constitui o canal anal. O septo uro-rectal é a camada de mesoderme, que assegura essa divisão, sendo que a ponta do septo formará o corpo perineal. Ao nível do seio urogenital podemos distinguir três porções – a porção maior e mais superior é a bexiga, que é inicialmente contínua com o alantóide. Contudo, quando o lúmen do alantóide fica obliterado, um espesso feixe fibroso, o úraco, mantém-se, ligando o ápice da bexiga ao umbigo. No indivíduo adulto, o úraco origina o ligamento umbilical mediano. A segunda porção do seio é um canal deveras estreito e que corresponde à porção pélvica do seio urogenital, que nos indivíduos do sexo masculino origina as porções prostática e membranosa da uretra. Por fim, a última parte corresponde à porção fálica do seio urogenital, que é achatada de lado a lado, sendo que, à medida que o tubérculo genital cresce, esta porção é puxada ventralmente. De referir que o desenvolvimento da porção fálica do seio urogenital difere nos dois sexos. Durante a diferenciação da cloaca, as porções caudais dos canais mesonéfricos são absorvidas na parede da bexiga. Consequentemente, os ureteres, que inicialmente são gerados a partir dos canais mesonéfricos, entram separadamente na bexiga. Como resultado da ascensão dos rins, os orifícios dos ureteres movem-se ainda mais cranialmente, enquanto os orifícios dos canais mesonéfricos tornam-se mais próximos, entrando na uretra prostática e originando os canais ejaculatórios, nos indivíduos do sexo masculino. Uma vez que quer os canais mesonéfricos, quer os ureteres se originam na mesoderme, a mucosa da bexiga formada pela incorporação dos canais (o trígono da bexiga) tem também origem mesodérica. Com o tempo, o limite mesodermal do trígono é substituído por epitélio endodermal, de tal modo, que o interior da bexiga se torna completamente delimitado por epitélio endodérmico.
Uretra O epitélio da uretra origina-se, em ambos os sexos, a partir da endoderme, sendo que o tecido conjuntivo e músculo liso em seu redor deriva da mesoderme visceral. Pelo final do terceiro mês, o epitélio da uretra prostática começa a proliferar, formando um conjunto de brotos que penetram no mesênquima que se encontra nas suas proximidades. Nos indivíduos do sexo
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II masculino, esses brotos originam a glândula prostática, enquanto nos indivíduos do sexo feminino, a porção cranial da uretra origina as glândulas uretrais e para-uretrais.
Factos importantes sobre organogénese do sistema urinário: Factos importantes sobre desenvolvimento dos rins:
O sistema urinário, tal como o sistema genital, tem origem na mesoderme intermédia.
O pronefros é o primeiro sistema renal, estando presente na quarta semana. É rudimentar e não funcional, sendo constituído por nefrótomos (unidades excretoras vestigiais), presentes na região cervical.
O mesonefros encontra-se desde o tórax superior até L3. Os seus primeiros túbulos excretores aparecem no início da quarta semana. Estes túbulos crescem, formando as cápsulas de Bowman em torno dos glomérulos, formados pelos vários capilares. Os túbulos mesonéfricos entram no canal mesonéfrico. No final do segundo mês, o mesonefros já desapareceu quase todo, excepto nos indivíduos do sexo masculino, onde alguns túbulos caudais e o canal mesonéfrico originam estruturas do aparelho genital.
O metanefros, ou rim permanente, aparece na quinta semana.
O sistema excretor renal tem origem no blastema metanéfrico que cobre os túbulos na sua extremidade distal. As células do blastema formam as vesículas renais, que originam pequenos túbulos. Numa das extremidades desses túbulos formam-se os glomérulos, por associação de capilares, e os túbulos excretores originam a cápsula de Bowman, ansa de Henle e túbulos contornados.
Os rins, inicialmente presentes na pelve, ascendem para o abdómen, tornando-se funcionais a partir da décima segunda semana.
São formados três sistemas renais em sequência cefalocaudal, durante a vida uterina. Estes sistemas sobrepõem-se ligeiramente.
O sistema colector do metanefros tem origem no divertículo uretérico, que penetra no mesênquima metanéfrico, dilata-se e origina a pelve renal primitiva. Por sucessivas divisões, a pelve origina os cálices maiores, os cálices menores e a pirâmide renal.
Factos importantes sobre desenvolvimento da bexiga e uretra:
Entre a quarta e a sétima semana, a cloaca encontra-se dividida no seio urogenital (anteriormente) e no canal anal (posteriormente). A divisão é assgurada pelo septo urorectal, que formará o corpo perineal. No seio urogenital distinguem-se três porções. A porção mais superior é a bexiga, no início contínua com o alantóide (o úraco é um remanescente dessa ligação). A porção média é a porção pélvica do seio urogenital, que nos homens origina as porções prostática e membranosa da uretra. A porção mais inferior é a porção fálica do seio urogenital. Aquando da diferenciação da cloaca, dá-se a integração da porção caudal dos canais mesonéfricos na parede da bexiga. Isto faz com que os ureteres entrem na bexiga, separadamente destes canais. A incorporação dos canais mesonéfricos e dos ureteres origina o trígono da bexiga, que tem inicialmente origem mesodérmica. Com o tempo, o limite mesodermal da bexiga é substituído por epitélio endodérmico. O epitélio da uretra tem origem na endoderme, enquanto o músculo liso e tecido conjuntivo em seu redor tem origem na mesoderme visceral. No final do terceiro mês, o epitélio da uretra prostática começa a proliferar, formando brotos, que nos homens originam a próstata e nas mulheres as glândulas uretrais e para363 uretrais.
Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II
Organogénese dos aparelhos genitais A diferenciação sexual é um processo complexo, que envolve muitos genes, incluindo alguns autossomais. A chave para o dimorfismo sexual é o cromossoma Y, que contém o gene SRY (sexdetermining region on Y) no seu braço curto (Yp11). O produto proteico deste gene é um factor de transcrição, que inicia uma cascada de genes que determinam o destino dos órgãos sexuais rudimentares. A proteína SRY é o factor de determinação dos testículos, sob cuja influência ocorre desenvolvimento do tracto genital masculino. Na sua ausência ocorre o desenvolvimento do aparelho genital feminino.
Gónadas Apesar de o sexo do embrião se encontrar geneticamente determinado, aquando da fecundação, as gónadas não adquirem características morfológicas masculinas ou femininas até à sétima semana de desenvolvimento. As gónadas apresentam-se inicialmente como um par de cristas longitudinais, as cristas genitais (também designadas por cristas gonadais). Estas são formadas pela proliferação do epitélio e pela condensação do mesênquima ao qual se sobrepõem. Por seu turno, as células da linha germinativa não aparecem nas cristas genitais até à sexta semana de desenvolvimento. As células germinativas primordiais aparecem, inicialmente, por entre as células da endoderme na parede do saco vitelino, perto do alantóide. Estas migram, depois, por um movimento amebóide ao longo do mesentério dorsal do intestino posterior, chegando até às gónadas primitivas no início da quinta semana e invadindo as cristas genitais na sexta semana. Caso, estas células não cheguem às cristas, as gónadas não se desenvolvem e, dessa forma, as células primitivas da linha germinativa apresentam uma influência indutiva no desenvolvimento das gónadas em ovários ou testículos. Pouco tempo antes da chegada das células germinativas primordiais, o epitélio da crista genital prolifera e as células epiteliais penetram no mesênquima, ao qual se sobrepõem. Aqui, estas células formam vários cordões irregulares – os cordões sexuais primitivos. Nos embriões de ambos os sexos, esses cordões encontram-se ligados ao epitélio da superfície, sendo impossível distinguir entre a gónada masculina e a gónada feminina. Dessa forma, nesta fase, a gónada é designada por gónada indiferente.
Testículos Se o embrião apresenta nas suas células germinativas primordiais um complexo cromossómico XY no par 23, o embrião é geneticamente masculino. Sob a influência do gene SRY, que codifica o factor de determinação dos testículos, os cordões sexuais primitivos continuam a proliferar e penetram profundamente na medula, para formar os cordões testiculares ou cordões medulares. Em direcção ao hilo da glândula, os cordões fragmentam-se numa rede de pequenos filamentos celulares, que mais tarde originarão os túbulos da rede testicular. Numa etapa mais avançada, uma densa camada de tecido conjuntivo fibroso, a túnica albugínea, separa os cordões testiculares do epitélio da superfície. No quarto mês de desenvolvimento, os cordões testiculares passam a apresentar forma de ferradura, tornando-se as suas extremidades contínuas com as da rede testicular. Os cordões testiculares são,
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II nessa fase, constituídos por células germinativas primordiais e por células sustentaculares de Sertoli, que derivam do epitélio de superfície da glândula. As células intersticiais de Leydig derivam do mesênquima original da crista gonadal, encontrando-se por entre os cordões testiculares. O seu desenvolvimento inicia-se pouco tempo após começar a diferenciação desses cordões. Pelo final da oitava semana de gestação, as células de Leydig começam a produzir testosterona e os testículos tornam-se aptos a influenciar a diferenciação sexual dos canais genitais e da genitália externa. Os cordões testiculares mantêm-se sólidos até à puberdade, altura em que adquirem um lúmen, originando os túbulos seminíferos. Quando se forma um canal ao nível dos túbulos seminíferos, estes juntam-se aos túbulos da rede testicular, que, por sua vez, entram nos canalículos eferentes. Os canalículos eferentes são estruturas remanescentes dos túbulos excretores do sistema mesonéfrico, que ligam a rede testicular ao canal mesonéfrico ou wolfiano, que depois se torna o canal deferente.
Descida dos testículos Pelo final do segundo mês, o mesentério urogenital liga os testículos e o mesonefros à parede abdominal posterior. Com a degeneração do mesonefros, essa ligação mantém-se como um mesentério para a gónada. Caudalmente, o mesentério torna-se ligamentoso, passando a ser designado por ligamento genital caudal. A partir do pólo caudal dos testículos encontra-se também uma condensação mesenquimatosa, rica em matriz extracelular e que é designada por gubernáculo. Antes da descida dos testículos este feixe de mesênquima termina na região inguinal, por entre os músculos oblíquos externo e interno, que se estão a diferenciar. Mais tarde, antes de os testículos começarem a descer em direcção ao anel inguinal, forma-se uma porção extra-abdominal do gubernáculo, que cresce desde a região inguinal até às protuberâncias escrotais. Após os testículos terem passado através do canal inguinal, esta porção extra-abdominal do gubernáculo passa a contactar com o pavimento do escroto. De referir que nos indivíduos do sexo feminino também se forma o gubernáculo, mas normalmente, este mantém-se rudimentar. Pensa-se que seja o crescimento da porção extra-abdominal do gubernáculo que despolete a migração intra-abdominal dos testículos, que um aumento na pressão intra-abdominal devido ao crescimento dos testículos leve à sua passagem através do canal inguinal e que a regressão da porção extra-abdominal do gubernáculo motive a finalização do movimento dos testículos para o escroto. Normalmente, os testículos chegam à região inguinal por volta da 12ª semana de desenvolvimento, migram através do
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II canal inguinal, por volta da 28ª semana e chegam ao escroto, por volta da 33ª semana de desenvolvimento. Durante a descida, a irrigação dos testículos, desde a artéria aorta, é mantida e os vasos testiculares estendem-se desde a sua posição original (lombar) para o escroto. Independentemente da descida dos testículos, o peritoneu da cavidade abdominal forma uma evaginação de cada lado da linha média, para a parede abdominal ventral. Esta evaginação, designada por apófise vaginal, segue o percurso do gubernáculo até às protuberâncias escrotais, sendo acompanhado pelas camadas fascial e muscular da parede corporal. Enquanto desce, a apófise vaginal evagina-se na protuberância escrotal, formando o canal inguinal. Os testículos descem através do anal inguinal e sobre o bordalete do osso púbico, encontrando-se já presentes ao nível do escroto, aquando do nascimento. O canal estreito que liga o lúmen da apófise vaginal à cavidade peritoneal é obliterado aquando do nascimento, ou pouco tempo depois. Para além de se encontrarem cobertos pelos folhetos peritoneais que derivam da apófise vaginal, os testículos tornam-se envoltos por folhetos derivados da parede abdominal anterior, que atravessam. Dessa forma, a fáscia transversalis forma a fáscia espermática interna; o músculo oblíquo interno origina a fáscia cremastérica e o músculo cremaster; enquanto o músculo oblíquo externo forma a fáscia espermática externa. O músculo transverso do abdómen não contribui com nenhum folheto, na medida em que se arqueia sobre esta região, não cobrindo a via de migração dos testículos.
Ovários Nos embriões do sexo feminino (que apresentam um conjunto de dois cromossomas X no par 23 e nenhum cromossoma Y), os cordões sexuais primitivos dissociamse em grupos celulares irregulares. Esses agregados, contendo grupos de
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II células germinativas primordiais, ocupam a porção medular do ovário. Ulteriormente, esses grupos celulares desaparecem, sendo substituídos por um estroma medular, que forma a medula ovárica. O epitélio da superfície da gónada feminina, contrariamente ao da masculina, continua a proliferar. Ao nível da sétima semana, este epitélio origina uma segunda geração de cordões, os cordões corticiais, que penetram no mesênquima, ao qual se sobrepõem. No quarto mês, esses cordões dividem-se em grupos de células isoladas, sendo que cada grupo rodeia uma ou mais células germinativas primordiais. As células germinativas diferenciam-se subsequentemente em oogónias e o epitélio da superfície origina as células epiteliais que rodeiam as oogónias, formando as células foliculares. Isto explica porque é que o desenvolvimento folicular ocorre somente no córtex do ovário. Em suma, o sexo genético de um embrião é determinado na altura da fecundação, sendo que nos indivíduos que apresentam dois cromossomas X no par 23, os cordões medulares das gónadas regridem e uma segunda geração de cordões gonadais desenvolve-se. Por oposição, nos indivíduos com um complexo XY no par 23, as cordas medulares desenvolvem-se nos cordões testiculares, enquanto os cordões corticais secundárias não se desenvolvem. Descida dos ovários Nos indivíduos do sexo feminino, as gónadas descem consideravelmente menos, comparativamente aos indivíduos do sexo masculino, sendo que os ovários se mantêm imediatamente inferiormente ao bordalete da pelve verdadeira. O ligamento genital cranial forma o ligamento suspensor do ovário, enquanto o ligamento genital caudal forma o ligamento do ovário próprio e o ligamento redondo do útero, que se estende até aos lábios maiores.
Canais genitais Etapa indiferente Inicialmente, os embriões de ambos os sexos apresentam dois pares de canais genitais – os canais mesonéfricos (wolfianos) e os canais paramesonéfricos (canais müllerianos). O canal paramesonéfrico origina-se como uma invaginação longitudinal do epitélio na face anterolateral da crista urogenital. Cranialmente, o canal abre-se na cavidade abdominal, através de uma estrutura em forma de funil. Caudalmente, o canal desloca-se inicialmente lateral ao canal mesonéfrico, cruzando-o depois ventralmente, para crescer caudomedialmente. Na linha média, o canal paramesonéfrico aproxima-se do seu homólogo contralateral, estando os dois canais inicialmente separados por um septo, mas fundindo-se ulteriormente para formar o canal uterino. A ponta caudal dos canais paramesonéfricos projecta-se para a parede posterior do seio urogenital, onde forma uma pequena protuberância, o tubérculo mülleriano ou paramesonéfrico. Já os canais mesonéfricos abrem-se no seio urogenital, de cada lado do tubérculo paramesonéfrico.
Canais genitais nos indivíduos do sexo masculino À medida que o mesonefros regride, alguns túbulos excretores, os túbulos epigenitais, estabelecem contacto com os cordões da rede testicular, formando os canalículos eferentes dos testículos. Os túbulos excretores ao longo do pólo caudal dos testículos, os túbulos paragenitais, não se juntam aos cordões da rede testicular e os seus vestígios originam os paradídimos. Excepto nas suas porções mais craniais (os apêndices dos epidídimos), os canais mesonéfricos persistem e formam os canais genitais principais. Imediatamente inferiormente à entrada dos canalículos eferentes, os canais mesonéfricos alongam-se e tornam-se mais convolutos, formando os
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II epidídimos. A partir da cauda dos epidídimos, até ao broto da vesícula seminal, os canais mesonéfricos adquirem um espesso revestimento muscular, formando os canais deferentes. Por fim, a região dos canais mesonéfricos que se encontra para além das vesículas seminais origina o canal ejaculatório. Já os canais paramesonéfricos, nos indivíduos do sexo masculino, degeneram, excepto numa pequena porção das suas extremidades craniais – os apêndices testiculares.
Canais genitais nos indivíduos do sexo feminino Os canais paramesonéfricos originam os principais canais genitais nos indivíduos do sexo feminino. Inicialmente, distinguem-se três porções em cada canal – uma porção vertical cranial, que se abre na cavidade abdominal; uma porção horizontal, que cruza o canal mesonéfrico e uma porção vertical caudal que se funde com a sua homóloga contralateral. Aquando da descida dos ovários, as primeiras duas porções do canal paramesonéfrico originam as trompas de Falópio, enquanto a porção vertical caudal funde-se com a sua homóloga contralateral, formando o canal uterino. Quando a segunda porção dos canais paramesonéfricos se move mediocaudalmente, as cristas urogenitais passam se a dispor gradualmente num plano transverso. Após ocorrer a fusão dos canais na linha média, forma-se uma larga prega pélvica transversa, que se estende desde os lados laterais dos canais paramesonéfricos unidos, em direcção à pelve, constituindo o ligamento largo do útero. O útero encontra-se então ao nível do seu bordo superior, enquanto o ovário se encontra ao nível da sua face posterior. O útero e os ligamentos largos dividem então a cavidade pélvica num espaço útero-rectal e num espaço úterovescial. A porção unida dos canais paramesonéfricos origina o corpo e o cérvix do útero, que se encontram envoltos por uma camada de mesênquima, que origina o revestimento muscular do útero (o miométrio) e o seu revestimento peritoneal (o perimétrio).
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II Vagina Pouco tempo após as pontas dos canais paramesonéfricos atingirem o seio urogenital, duas evaginações sólidas crescem a partir da porção pélvica do seio. Essas evaginações, que constituem os bulbos sinovaginais, proliferam e formam uma sólida lâmina vaginal. A proliferação continua na extremidade cranial da lâmina, o que leva a um aumento da distância por entre o útero e o seio urogenital. Pelo quinto mês de desenvolvimento, a vagina apresenta já um canal completo, sendo que as expansões da vagina em torno do final do útero (os fórnices vaginais) são de origem paramesonéfrica. Desta forma, a vagina apresenta uma origem dupla – a porção superior deriva do canal uterino, enquanto a porção inferior deriva do seio urogenital. O lúmen da vagina mantém-se separado do lúmen do seio urogenital por uma fina lâmina de tecido, o hímen, que consiste no limite epitelial do seio e numa fina camada de células vaginais. Os indivíduos do sexo feminino podem manter alguns remanescentes dos túbulos excretores cranial e caudal no mesovário, onde formam o epoóforo e o paraóforo, respectivamente. O canal mesonéfrico desaparece, excepto numa pequena porção encontrada no epoóforo e, ocasionalmente, numa pequena porção caudal, que pode ser encontrada na parede do útero ou da vagina e que pode originar, mais tarde, o cisto de Gartner.
Genitália externa Etapa indiferente Na terceira semana de desenvolvimento, as células mesenquimatosas, que se originam na região da linha primitiva migram em torno da membrana cloacal para formar um par de pregas cloacais, ligeiramente elevadas. Cranialmente à
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II membrana clocal, essas pregas unem-se, formando o tubérculo genital. Caudalmente, as pregas encontram-se subdivididas em pregas uretrais, anteriormente, e em pregas anais, posteriormente. Simultaneamente, outro par de elevações, as protuberâncias genitais, torna-se visível de cada lado das pregas uretrais. Essas protuberâncias formam, mais tarde, as protuberâncias escrotais, nos indivíduos do sexo masculino, e os lábios maiores, nos indivíduos do sexo feminino. Contudo, no final da sexta semana é ainda impossível distinguir os dois sexos.
Genitália externa nos indivíduos do sexo masculino O desenvolvimento da genitália externa, nos indivíduos do sexo masculino, ocorre sob influência de androgénios segregados pelos testículos fetais, sendo caracterizado pelo rápido crescimento do tubérculo genital, que origina o falo. Durante esta elongação, o falo puxa as pregas uretrais anteriormente, de tal modo que estas passam a formar as paredes laterais do sulco uretral. Este sulco estende-se ao longo da região caudal do falo elongado, mas não atinge a sua porção mais distal, designada por glande. O limite epitelial do sulco, que tem origem na endoderme, forma então a lâmina uretral. No final do terceiro mês, as duas pregas uretrais fecham-se sobre a lâmina uretral, formando a uretra peniana, que não se estende até à ponta do falo. A porção mais distal da uretra forma-se aquando do quarto mês, quando células da ectoderme, com origem na ponta da glande, penetram profundamente, formando um pequeno cordão epitelial. Este cordão obtém ulteriormente um lúmen, sendo assim formado o meato uretral externo. As protuberâncias genitais, designadas nos indivíduos do sexo masculino por protuberâncias escrotais, originam-se na região inguinal. Com o seu desenvolvimento ulterior, estas deslocam-se caudalmente e cada protuberância forma metade do escroto, sendo que as protuberâncias se encontram separadas pelo septo escrotal.
Genitália externa nos indivíduos do sexo feminino O desenvolvimento da genitália externa dos indivíduos do sexo feminino é estimulado por estrogénios. O tubérculo genital alonga-se apenas ligeiramente, formando o clítoris. As pregas uretrais, por seu turno, não se unem, como acontece nos indivíduos do sexo masculino. Em
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Bernardo Manuel de Sousa Pinto Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Sebenta de Anatomia II vez disso, estas pregas originam os lábios menores. As protuberâncias genitais alargam-se, formando os lábios maiores. O sulco urogenital, por outro lado, mantém-se aberto formando o vestíbulo.
☤ Apesar do tubérculo genital não crescer muito nos indivíduos do sexo feminino, este é maior que nos indivíduos do sexo masculino, durante as etapas precoces do desenvolvimento. De facto, o comprimento do tubérculo não é um bom critério de identificação dos sexos, aquando do terceiro e quarto mês de desenvolvimento.
Factos importantes sobre organogénese dos aparelhos genitais: O cromossoma Y contém o gene SRY no seu braço curto. Este gene origina um factor de transcrição que inicia uma cascada de genes para o desenvolvimento das gónadas masculinas. Na ausência deste gene ocorre o desenvolvimento do aparelho genital feminino.
Factos importantes sobre o desenvolvimento inicial das gónadas:
As gónadas constituem inicialmente um par de cristas longitudinais (as cristas genitais).
Antes da chegada das células germinativas primordiais, o epitélio das cristas genitais prolifera e as células epiteliais penetram no mesênquima, originando os cordões sexuais primitivos. A gónada é ainda designada por gónada indiferente.
As células germinativas primordiais aparecem, no início, por entre as células da endoderme na parede do saco vitelino. Estas migram depois (por via do mesentério dorsal do intestino posterior) até às gónadas primitivas (às quais chegam na quinta semana), invadindo as cristas genitais na sexta semana. Estas células induzem o desenvolvimento das gónadas.
Factos importantes sobre o desenvolvimento dos testículos:
O gene SRY codifica o factor de determinação dos testículos, o que leva a uma proliferação dos cordões sexuais primitivos, que penetram na medula e formam os cordões testiculares. Alguns cordões fragmentam-se em filamentos celulares que gerarão a rede testicular.
No quarto mês, as extremidades dos cordões testiculares são contínuas com as da rede testicular. Os cordões testiculares são então constituídos por células germinativas primoridiais e pelas células de Sertoli, derivadas do epitélio de superfície da glândula.
As células de Leydig derivam do mesênquima original da crista gonadal, encontrando-se por entre os cordões testiculares. No final da oitava semana, começa a ser produzida testosterona e os testículos passam a influenciar a diferenciação sexual do resto dos canais genitais e genitália externa.
Os cordões testiculares apenas adquirem um lúmen na puberdade, originando os túbulos seminíferos. Estes unem-se aos túbulos da rede testicular, que entram nos canalículos eferentes.
Os testículos encontram-se inicialmente na região abdominal posterior e a partir do seu pólo caudal encontra-se uma condensação mesenquimatosa, designada por gubernáculo.
No gubernáculo forma-se uma porção extra-abdominal, que cresce desde a região inguinal até às protuberâncias escrotais. Esta porção vai despoletar a migração intra-abdominal dos testículos. Isto ocorre por volta da 12ª semana
Por aumento da pressão intra-abdominal, os testículos passam pelo canal inguinal e a porção extra-abdominal do gubernáculo passa a contactar com o pavimento do escroto, algo que ocorre por volta da 28ª semana.
A regressão da produção extra-abdominal do gubernáculo leva a que a os testículos terminem a sua migração para o escroto. Isto ocorre por volta da 33ª semana.
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Factos importantes sobre desenvolvimento da bexiga e uretra:
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Factos importantes sobre organogénese dos aparelhos genitais (continuação):
Simultaneamente à descida dos testículos, o peritoneu forma uma evaginação (a apófise vaginal), que origina o canal inguinal e os folhetos peritoneais que revestem os testículos.
À medida que os testículos atravessam a parede abdominal anterior, estes tornam-se igualmente cobertos por folhetos derivados dessa parede – a fáscia transversalis origina a fáscia espermática interna, o oblíquo interno forma a fáscia cremastérica e o cremaster e o oblíquo externo gera a fáscia espermática externa.
Factos importantes sobre o desenvolvimento dos ovários:
Nos indivíduos do sexo feminino, os cordões sexuais primitivos dissociam-se em grupos de células irregulares, que contêm células germinativas primordiais. Estes grupos celulares degeneram, sendo substituídos pelo estroma medular que forma a medula ovárica.
O epitélio de superfície continua a proliferar e pela sétima semana origina os cordões corticais. No quarto mês, estes cordões dividem-se em grupos de células isoladas. Cada grupo rodeia uma ou mais células germinativas primordiais, constituindo futuramente as células foliculares. As células germinativas, por seu turno, diferenciam-se em oogónias.
As gónadas femininas descem até inferiormente ao bordalete da pelve verdadeira. O ligamento genital cranial origina o ligamento suspensor do ovário, enquanto o ligamento genital caudal forma o ligamento do ovário e o ligamento redondo do útero.
Factos importantes sobre o desenvolvimento dos canais genitais (etapa indiferente):
Inicialmente, os embriões de ambos os sexos apresentam dois pares de canais genitais – os canais mesonéfricos e os canais paramesonéfricos. Estes últimos originam-se como invaginações longitudinais do epitélio, na face anterolateral da crista urogenital.
Cranialmente, os canais paramesonéfricos abrem-se na cavidade abdominal, enquanto, caudalmente, estes formam uma única protuberância, o tubérculo paramesonéfrico, ladeado pelas aberturas dos canais mesonéfricos, no seio urogenital.
Factos importantes sobre o desenvolvimento dos canais genitais no sexo masculino:
Aquando da regressão do mesonefros, alguns túbulos excretores (os túbulos epigenitais) estabelecem contacto com os cordões da rede testicular, formando os canalículos eferentes dos testículos. Inferiormente à sua entrada, os canais mesonéfricos tornam-se maiores e mais contorcidos, formando os epidídimos. Os canais mesonéfricos persistem, excepto nos apêndices dos epidídimos.
Desde a cauda dos epidídimos até ao broto da vesícula seminal, os canais mesonéfricos adquirem um espesso revestimento muscular, constituindo os canais deferentes. A região do mesonefros que se encontra para além das vesículas origina os canais ejaculatórios.
Os canais paramesonéfricos, por sua vez, degeneram, excepto ao nível dos apêndices testiculares.
Os tubérculos paragenitais, presentes ao nível do pólo caudal dos testículos não se juntam aos cordões da rede testicular e originam os paradídimos.
Factos importantes sobre o desenvolvimento dos canais genitais no sexo feminino: 372
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Factos importantes sobre organogénese dos aparelhos genitais (continuação): Factos importantes sobre o desenvolvimento dos canais genitais no sexo feminino:
Os canais paramesonéfricos dividem-se em três porções – uma porção vertical cranial, uma porção horizontal e uma porção vertical caudal. A porção vertical cranial e a porção horizontal unem-se, originando as trompas de Falópio, enquanto a porção caudal se une com a sua homóloga contralateral, formando o canal uterino.
Quando a porção horizontal dos canais paramesonéfricos se move mediocaudalmente, forma-se uma prega pélvica transversa, que origina o ligamento largo do útero.
Após as pontas dos canais para mesonéfricos atingirem o seio urogenital, formam-se duas evaginações – os bulbos sinovaginais. Estes proliferam e formam a lâmina vaginal, que cresce cranialmente e que inicialmente não apresenta um lúmen.
A região superior da vagina, incluindo os fórnices, tem origem paramesonéfrica. Pelo quinto mês de desenvolvimento, a vagina já apresenta um canal completo, encontrando-se separada do seio urogenital por uma fina lâmina – o hímen.
O canal mesonéfrico desaparece com excepção de uma pequena porção encontrada no epoóforo e, por vezes, do cisto de Gartner, que se encontra na parede do útero ou da vagina. Por sua vez, os remanescentes dos túbulos excretores cranial e caudal formam o epoóforo e o paraóforo, respectivamente, ao nível do mesovário.
Factos importantes sobre o desenvolvimento da genitália externa (etapa indiferente):
Na terceira semana, formam-se pregas cloacais em torno da membrana cloacal, que depois se vão unir cranialmente, formando o tubérculo genital. Caudalmente, as pregas cloacais subdividem-se em pregas uretrais (anteriormente) e em pregas anais (posteriormente).
Ladeando as pregas uretrais, desenvolvem-se, simultaneamente, as protuberâncias genitais.
Factos importantes sobre o desenvolvimento da genitália externa no sexo masculino:
Os testículos fetais segregam androgénios que estimulam o crescimento do tubérculo genital, que origina o falo. O falo puxa as pregas uretrais anteriormente e estas passam a formar as paredes laterais do sulco uretral. Este sulco apresenta um epitélio de origem endodérmica (a lâmina uretral) e não atinge a glande (porção mais distal do falo).
No final do terceiro mês, dá-se o fecho das duas pregas uretrais sobre a lâmina uretral, com formação da uretra peniana. A porção mais distal da uretra peniana forma-se, no quarto mês, quando células ectodermais da glande penetram profundamente, formando um cordão epitelial, que incorpora um lúmen e passa a constituir o meato uretral externo.
As protuberâncias genitais designam-se por protuberâncias escrotais e originam o escroto.
Factos importantes sobre o desenvolvimento da genitália externa no sexo feminino:
O desenvolvimento da genitália externa feminina é estimulado por estrogénios. O tubérculo genital alonga-se ligeiramente, formando o clítoris. As pregas uretrais não se unem, formando os lábios menores. As protuberâncias genitais alargam-se e formam os lábios maiores. O sulco urogenital mantém-se aberto e origina o vestíbulo.
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Tabela-síntese do desenvolvimento do aparelho genital Etapa indiferente Seio urogenital Gónada primitiva Cordões sexuais primitivos Cordões corticais Canais mesonéfricos
Masculino
Feminino
Próstata, glândulas bulbouretrais e uretra Testículos Cordões testiculares (originam depois os túbulos seminíferos) Não se formam Epidídimos, canais deferentes e canais ejaculatórios
Glândulas de Skene, glândulas de Bartholin e porção inferior da vagina Ovários Degeneram e são substituídos por estroma medular Córtex ovárico Porção do epoófero e (por vezes) cisto de Gartner Trompas de Falópio, canal uterino e porção superior da vagina Clítoris Lábios menores Lábios maiores
Canais paramesonéfricos
Apêndices testiculares
Tubérculo genital Pregas uretrais Protuberâncias genitais
Pénis Paredes da uretra peniana Escroto
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Links de apoio Gincanas de anatomia on-line: http://ect.downstate.edu/courseware/haonline/quiz.htm Mnemónicas sobre anatomia: http://www.medicalmnemonics.com/cgi-bin/return_browse.cfm?discipline=Anatomy&browse=1 Esquemas de anatomia (nomeadamente de relações anatómicas): http://www.instantanatomy.net/ Thieme atlas of anatomy (on-line no Google books): http://books.google.pt/books?id=TWVhGRckgHsC&printsec=frontcover&dq=thieme&hl=ptpt&ei=RMFDTbWrFcqLhQeIsOHRAQ&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=7&ved=0CEcQ6AEwBg# v=onepage&q&f=false Gray – edição de 1918 (com as imagens que vigoravam até à 37º edição do Gray!): http://www.bartleby.com/107/ Blogue com recursos para estudantes de medicina: http://medzebics.blogspot.com/
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