Elcio Queiroz Couto - R. A. 10.1699-7
Resenha do livro ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro & interação. São Paulo. Parábola Editorial, 2003.
Irandé Antunes é doutora em linguística pela Universidade Clássica de Lisboa e concentra seus estudos em coesão textual e gêneros textuais. Seus trabalhos, como Lutar com palavras: coesão e coerência coerência ,
são referências na área e integram a
bibliografia básica de diversos cursos de licenciatura de Letras Português. Além de sua atuação como pesquisadora, Antunes é profissional preocupada com a prática de ensino da língua portuguesa e exerce participação ativa na divulgação científica e de seus estudos junto a professores, por meio de palestras, cursos e outras atividades. A unificação desses dois interesses resulta no livro Aula de Português: encontro & interação,
em que a autora busca sistematizar suas reflexões e propostas para o
ensino do Português pela abordagem interacionista, funcional e discursiva da língua, com a prática de produção e interpretação textual oral e escrito. O livro tem publicação pela Parábola, editora reconhecida pelo catálogo abrangente de obras voltadas às práticas de ensino da língua e ao estudo e reflexão das diversas correntes linguísticas. Aula de Português: Português: encontro & interação interação
é composto por seis capítulos, em que a
linguista reflete, sob uma perspectiva crítica, sobre as atuais práticas de ensino de português; apresenta um conjunto de princípios teóricos para a instauração de uma nova prática pedagógica fundamentada no oferecimento aos alunos da possibilidade de exercício discursivo pleno, relevante e adequado; e propõe um programa e uma série de atividades para a prática dos professores, consonantes com os princípios teóricos apresentados anteriormente, além de expor, ao fim do livro, uma proposta de avalição dos resultados alcançados pelas novas metodologias de ensino. No capítulo 1, Refletindo Refletindo sobre a prática de aula de português, Antunes critica o trabalho realizado na maioria das escolas brasileiras com a oralidade, a escrita, a leitura e a gramática. Para a autora, a abordagem que se faz desses quatro campos não confere relevância funcional para o aluno, tampouco amplia sua capacidade discursiva, não
privilegia a participação do sujeito aprendiz e desfavorece as interações entre professor/aluno e aluno/aluno, além de apenas objetivar a avaliação de aprendizado de conceitos estanques para os quais não ocorrem práticas reflexivas: o ensino gramatical, por exemplo, segundo a especialista, concentra-se na apreensão da nomenclatura prescritiva e normativa, sem as noções de adequação e inadequação. Como consequência dessas reflexões, a professora apresenta no capítulo 2, Assumindo a dimensão interacional da linguagem ,
princípios teóricos concernentes aos
mesmos quatro campos analisados no capítulo anterior, sob a perspectiva interacionista da língua, e as respectivas implicações pedagógicas. Nesse capítulo, Antunes, apoiandose nos preceitos de Bakhtin, conceitua língua como atividade de interação verbal entre interlocutores vinculada às circunstâncias de sua “atualização”, e defende que apenas o
estudo textual e discursivo, relativamente à sua produção e interpretação, constitui o objeto de um ensino de língua relevante, funcional e produtivo. Dessa maneira, o ensino de produção e interpretação de textos orais e escritos deve conferir relevância funcional para o aluno, garantir a interação entre os agentes envolvidos no processo como sujeitos produtores (autores) e interlocutores, e contextualizar a gramática, não mais como nomenclatura prescritiva, mas como importante aos usos sociais da língua. A seguir, no capítulo 3, Repensando o objeto de ensino de uma aula de português, a autora propõe atividades concretas que possam auxiliar o professor numa abordagem de ensino da língua que garanta a consecução dos objetivos apresentados nos capítulos anteriores: o ensino da língua que possibilite o “a ampliação da competência
comunicativa do aluno para falar, ouvir, ler e escrever textos fluentes, adequados e socialmente relevantes” (pag. 122).
A abordagem de Antunes é essencialmente didática, mas sem descuido do escopo teórico, e busca, por meio de uma linguagem simples, clara e acessível, conquistar a adesão do professor para a prática de reflexão do ensino de português e incitá-lo à mudança. Não se trata de um manual ou guia, ou ainda um receituário e, embora os exemplos e propostas de atividades prodiguem pelo texto, o leitor é instigado a buscar por si só, a partir do referencial teórico apresentado, as alternativas mais viáveis e condizentes com a realidade específica em que se insere. Aula de Português: encontro & interação
posiciona Antunes como importante
referência para a reflexão sobre o ensino contextualizado e de relevância social da
língua portuguesa. Aqui encontram eco os preceitos oficiais dos PCNs e os apontamentos reflexivos de Por que (não) ensinar gramática na escola, de Sírio Possenti, por exemplo, quanto à preocupação da reformulação da abordagem do ensino da língua. Embora não tenha se furtado a considerar que a consecução dos objetivos pretendidos para o ensino da língua não depende unicamente da intervenção do professor em sala de aula, mas de políticas públicas efetivas é importante salientar que o livro poderia ter reservado um espaço maior a esse tipo de discussão. A ideia é que não se reserve apenas ao professor o “privilégio” de comandar a guinada total na qualidade
de ensino do país: é preciso que se tenha consciência da importância do apoio do sistema oficial que sustenta o ensino. À parte dessas considerações, Aula de Português: encontro & interação é obra indicada a todos que enxergam no ensino da língua uma importância fundamental para plena e mais eficaz participação social dos alunos, cidadãos.