PRINCÍPIOS DE NEFROLOGIA E
DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS Miguel Carlos Riella Professor Titular de Clínica Médica da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Professor Titular de Clínica Médica e Diagnóstico da Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná. Diretor do Serviço de Nefrologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. Ex-Research Fellow em Nefrologia na University of Washington (Seattle, U.S.A.). Doutor em Medicina pela UNIFESP
QUARTA EDIÇÃO
CONTEÚDO
I. ESTRUTURA E FUNÇÃO RENAL 1 2 3 4 5 6 7
Anatomia Renal, 1 Circulação Renal, 20 Filtração Glomerular, 30 Função Tubular, 37 Mecanismos de Acidificação Urinária, 49 Mecanismo de Concentração e de Diluição Urinária, 58 Peptídeos Vasoativos e o Rim, 69
II. DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS 8 9 10 11 12 13 14 15
Compartimentos Líquidos do Organismo, 90 Metabolismo da Água, 100 Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema, 132 Metabolismo Ácido-Básico, 162 Metabolismo do Potássio, 189 Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio, 213 Metabolismo do Ácido Úrico, 238 Terapia Parenteral. Reposição Hidroeletrolítica, 254
26 27 28 29 30 31 32 33 34 35
Nefropatia do Refluxo, 507 Doenças Vasculares dos Rins, 519 Nefropatia e Gestação, 537 Hipertensão na Mulher, 546 Tubulopatias Hereditárias, 557 Doenças Císticas Renais, 580 Nefropatia Diabética, 597 Nefrolitíase, 609 Uropatia Obstrutiva, 620 Tumores Renais, 631
IV. FISIOPATOLOGIA DAS NEFROPATIAS 36 Insuficiência Renal Crônica (IRC), 649 37 Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia, 661 38 Conseqüências Hematológicas da Uremia, 691 39 O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal, 705 40 Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal, 717 41 Hipertensão Arterial Primária, 730 42 Hipertensão Renovascular, 757 43 Hipertensão Arterial e Doença Renal Parenquimatosa, 769
III. PATOGENIA DAS NEFROPATIAS 16 17
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal, 267 Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto, 294 I. Introdução aos Métodos de Diagnóstico por Imagem da Doença Renal, 294 II. Radiologia do Aparelho Urinário no Adulto, 295 18 Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética, 315 I. Ultra-sonografia Renal, 315 II. Imagem Renal por Ressonância Magnética, 326 19 Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança, 336 20 Radioisótopos em Nefrourologia, 372 21 Insuficiência Renal Aguda, 388 22 Glomerulonefrites Primárias, 402 23 Glomerulopatias Secundárias, 424 24 Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial, 450 25 Infecção do Trato Urinário, 490
V. MANEJO CLÍNICO DO PACIENTE COM INSUFICIÊNCIA RENAL 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54
Diuréticos. Mecanismo de Ação e Uso Clínico, 775 Drogas Anti-hipertensivas, 787 Uso de Medicamentos em Insuficiência Renal, 799 Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico, 843 Nutrição Parenteral Intradialítica, 861 Hemodiálise, 869 Métodos Hemodialíticos Contínuos para Tratamento da Insuficiência Renal Aguda, 908 Diálise Peritoneal, 919 Imunologia do Transplante Renal, 929 Manejo Clínico do Transplante Renal, 944 Infecções em Transplante Renal, 974
Índice Alfabético, 988
Capítulo
Anatomia Renal
1
Leonardo Vidal Riella, Luiz Antonio Ribeiro de Moura e Miguel Carlos Riella
MACROSCOPIA
Células epiteliais viscerais
VASCULARIZAÇÃO
Células epiteliais parietais
CIRCULAÇÃO LINFÁTICA
Aparelho justaglomerular
INERVAÇÃO
Células peripolares
EMBRIOLOGIA
Túbulo proximal
Anomalias do desenvolvimento O NÉFRON
Alça de Henle Túbulo distal
Glomérulo
Ducto coletor
Células endoteliais
INTERSTÍCIO RENAL
Células mesangiais
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
MACROSCOPIA Os rins, em número de dois, são órgãos que lembram a forma de um grão de feijão, de coloração marrom-avermelhada, situados no espaço retroperitoneal, um de cada lado da coluna vertebral, de tal forma que seu eixo longitudinal corre paralelamente ao músculo psoas maior. Na posição ortostática, sua margem superior encontrase ao nível da primeira vértebra lombar e a inferior, da quarta vértebra lombar. Em decúbito dorsal, as margens superior e inferior dos rins elevam-se ao nível do bordo superior da 12-ª vértebra torácica e da terceira vértebra lombar, respectivamente.1 Com a respiração os rins podem deslocar-se cerca de 1,9 cm, chegando a 4,1 cm na inspiração profunda. Normalmente, o rim direito é um centímetro menor e encontra-se ligeiramente mais caudal em relação ao esquerdo (Fig. 1.1). O rim de um indivíduo adulto mede de 11 a 13 cm de comprimento, 5 a 7,5 cm de largura e 2,5 a 3 cm de espessura, pesando entre 125 e 170 gramas, no homem, e 115 e 155 gramas, na mulher. Com o envelhecimento, há uma diminuição do peso renal.6 Em recém-nascidos este peso varia
de 13 a 44 gramas.7 A variação do tamanho e do peso dos rins na população demonstrou estar mais relacionada com a superfície corporal do indivíduo, não sendo influenciada por sexo, idade ou raça, quando se leva em consideração o tipo de constituição corporal. Outros estudos demonstraram também que o nível de hidratação do organismo e a pressão arterial provocam variações no tamanho do rim.8 Na parte medial côncava de cada rim, localiza-se o hilo renal, local onde se encontram a artéria e a veia renal, vasos linfáticos, plexos nervosos e o ureter, que se expande dentro do seio renal, formando a pelve. O rim é envolvido em toda sua superfície por membrana fibroelástica muito fina e brilhante, denominada cápsula renal. Esta adere à pelve e aos vasos sanguíneos na região do hilo. No rim sadio, consegue-se destacar facilmente a cápsula renal do restante do órgão, sendo que o mesmo não acontece no rim doente. Ao redor dos rins, no espaço retroperitoneal, tem-se uma condensação de tecido conjuntivo, que representa a fáscia de Gerota ou fáscia renal. Ela divide-se em fáscias renais anterior e posterior, envolvendo um tecido adiposo, denominado gordura perirrenal, que contorna o rim e a glândula adrenal de cada lado, constituindo o espaço perirrenal. Essa gordura é a responsável pela visualização radio-
2
Anatomia Renal
Pleura (recesso costodiafragmático)
Músculo grande dorsal
Ligamento lombocostal
Músculo serrátil posterior inferior
Músculo quadrado lombar (seccionado) Diafragma
Músculo oblíquo externo do abdome
Nervo subcostal
Aponeurose do músculo transverso do abdome
Rim direito Colo ascendente
Músculo oblíquo interno do abdome
Músculo transverso do abdome Nervo ílio-hipogástrico
Fáscia toracolombar (lâmina posterior) Crista ilíaca Músculo eretor da espinha
Nervo ílio-inguinal Músculo quadrado lombar (seccionado)
Fáscia (aponeurose glútea) sobre o músculo glúteo médio
Músculo psoas maior Ligamento iliolombar
Músculo glúteo máximo
Fig. 1.1 Relações anatômicas dos rins com a estrutura músculo-esquelética em uma visão posterior da região lombar. (Obtido de Netter, F.H. Anatomia, estrutura e embriologia. Seção I: rins, ureteres e bexiga. Ciba-Geigy, vol. 6, 1973.4)
lógica da silhueta renal, devido à sua maior radiotransparência. A fáscia renal tem a tendência de limitar a disseminação de infecções renais, hemorragias ou extravasamento de urina1 e determina a divisão do retroperitônio em três compartimentos: espaços pararrenal anterior, perirrenal e pararrenal posterior. Ao corte, o parênquima renal apresenta uma porção cortical de cor avermelhada e uma porção medular de cor amarelo-pálida. Na região medular, observam-se várias projeções cônicas ou piramidais, de aspecto estriado, cujas bases estão voltadas para o córtex, enquanto seus ápices se dirigem ao hilo renal e se projetam na pelve renal. O conjunto, pirâmide renal e seu córtex associado, denomina-se lobo renal. A parte do córtex que encobre a base denomina-se córtex centrolobar, e a parte localizada lateralmente à pirâmide renal é o septo renal. A união de septos renais adjacentes constitui a formação das colunas renais ou de Bertin, que separam uma pirâmide da outra (Fig. 1.2).
Segundo Löfgren, o rim humano contém, em média, 14 lobos, sendo seis no pólo renal superior, quatro no pólo médio e quatro no pólo inferior. Outro estudo, feito por Inke, propõe que o rim se forma a partir de quatro protolobos, que se dividem de maneira desigual, resultando num número variável de lobos, sendo geralmente oito.9,10 A medula é constituída somente por túbulos e dividese em duas regiões. A zona medular interna contém os ductos coletores, as partes ascendente e descendente dos segmentos delgados das alças de Henle e os vasa recta. A zona medular externa é formada por duas faixas: a externa, composta pela porção terminal reta dos túbulos contornados proximais, segmentos espessos da alça de Henle e ductos coletores, e a interna, contendo os ramos ascendentes espessos e descendentes delgados das alças de Henle e os ductos coletores (Fig. 1.3). O córtex, com cerca de um centímetro de espessura, contém túbulos e glomérulos. Nele observam-se, a inter-
Cápsula fibrosa Córtex renal Medula renal (com pirâmide) Papila renal Coluna renal (de Bertin) Radiações medulares (parte radiada) Base da pirâmide Rim direito seccionado em vários planos, expondo o parênquima e a pelve renal
Cálices renais menores Vasos sangüíneos entrando no parênquima renal Seio renal Cálices renais maiores Pelve renal Gordura no seio renal Cálices renais menores Ureter
Fig. 1.2 Rim direito seccionado em planos, mostrando o parênquima e a pelve renal. (Obtido de Netter, F.H. Anatomia, estrutura e embriologia. Seção I: rins, ureteres e bexiga. Ciba-Geigy, vol. 6, 1973.4)
3
capítulo 1
apresentam formato circular, rígido, achatado, ou até mesmo côncavo, predispondo ao surgimento do fenômeno do refluxo intra-renal, relacionado na etiologia da pielonefrite crônica e da nefropatia do refluxo. Seqüelas de pielonefrite são mais observadas nos pólos renais, locais de maior ocorrência de papilas compostas.11 A porção do cálice menor que se projeta para cima, ao redor da papila, é chamada de fórnix e é importante porque os primeiros sinais de infecção ou obstrução ocorrem a este nível (v. Fig. 1.2). Os cálices menores unem-se para formar os cálices maiores, que são em número de dois a quatro. Comumente, apenas três cálices são vistos no urograma excretor (v. Cap. 17). Os cálices maiores, por sua vez, unem-se para formar um funil curvo, chamado pelve renal, que se curva no sentido medial e caudal, para tornar-se o ureter a um ponto denominado junção ureteropélvica.
Pontos-chave: Fig. 1.3 Relações entre os vários segmentos do néfron e o córtex e medula renal. (Obtido de Netter, F.H. Anatomia, estrutura e embriologia. Seção I: rins, ureteres e bexiga. Ciba-Geigy, vol. 6, 1973.4)
valos regulares, estriações denominadas raios medulares. Estes raios originam-se das bases das pirâmides e contêm túbulos coletores, ramos ascendentes da alça de Henle e as porções retas terminais dos túbulos contornados proximais, cuja disposição em paralelo é responsável pelo aspecto estriado das pirâmides (Fig. 1.2). Cada raio medular ocupa o centro de um lóbulo renal, uma pequena e cilíndrica área de córtex, delimitada por artérias interlobulares. O termo lóbulo renal, apesar de descrito, não é muito empregado, uma vez que não se consegue definir uma importância anatomofuncional para o mesmo. Alguns dos túbulos se unem para formar ductos coletores. Os ductos coletores maiores, ou ductos de Bellini, abremse no ápice da pirâmide, na papila renal, região que contém a área crivosa com cerca de 10 a 25 perfurações. A urina, que daí drena, cai num receptáculo chamado cálice menor. Até a 28-ª semana de gestação existem 14 cálices, de tal maneira que cada cálice se associa apenas a uma papila. Após este período, dá-se início a um processo de fusão lobar, que pode prolongar-se até após o nascimento, e que determina a diminuição do número de cálices e de papilas renais. O grau de fusão calicial é maior que o de fusão papilar, o que determina o aparecimento de cálices compostos, ou seja, cálices que recebem mais que uma papila. Aparecem também papilas compostas, que drenam mais de um lobo. Este processo mostra-se mais evidente nos pólos superior e inferior do rim, sendo que na região central predominam os cálices e papilas simples.9 As papilas simples possuem extremidades convexas, enquanto as compostas, dependendo do número de fusões,
• Órgão retroperitoneal localizado entre as vértebras L1 e L4, apresenta aproximadamente 12 cm de comprimento. Seu peso médio é de 150 g. A diminuição do tamanho renal está principalmente associada à nefropatia crônica • Macroscopicamente, pode ser dividido em córtex e medula. O córtex se constitui de glomérulos, túbulos contorcidos proximais e distais; já a medula contém as alças de Henle e os túbulos coletores, os quais se abrem nas papilas dos cálices menores • A gordura perirrenal, localizada entre o rim e a fáscia renal, é a responsável pela visualização radiológica da silhueta renal • Cálculos renais obstruem os ureteres principalmente em três regiões: junção ureteropiélica, porção anterior à bifurcação da artéria ilíaca comum e junção ureterovesical • Na cirurgia de histerectomia, especial atenção deve ser tomada na hora de ligar a artéria uterina, devido à sua relação íntima com o ureter, o qual passa posteriormente O ureter é um tubo muscular que se estende da pelve renal à bexiga urinária. Localiza-se no compartimento retroperitoneal e descende anteriormente ao músculo psoas. Em seu trajeto apresenta algumas relações importantes com outras estruturas: é cruzado anteriormente pelos vasos gonadais; passa anteriormente à bifurcação da artéria ilíaca comum na entrada da pelve, e se situa posteriormente
4
Anatomia Renal
Artéria do segmento superior Artéria do segmento ântero-superior
Nefro cortical
Faixa externa
Artéria e veia interlobular
Vasa recta
Alça de Henle espessa
Ducto coletor Alça de Henle delgada
Ductos de Bellini
Fig. 1.5 Diagrama ilustrando a circulação renal. (Obtido de Pitts, R.F.3)
Secção frontal do rim esquerdo: vista anterior
Ramos capsular e perirrenal Artéria supra-renal inferior
Artérias interlobares
Ramo (divisão) anterior da artéria renal Artéria renal
Artérias arqueadas
Ramo (divisão) posterior da artéria renal (artéria do segmento posterior)
Nefro justamedular
Artéria e veia interlobular
Faixa interna
Córtex
Arteríola aferente Arteríola eferente
Zona externa
Cada rim recebe uma artéria renal principal, que se origina da aorta ao nível da primeira ou da segunda vértebra lombar (v. também Cap. 2). A artéria renal direita geralmente se origina da aorta a um nível mais inferior em relação à esquerda e passa posteriormente à veia cava inferior. Em 20 a 30% dos casos, podemos ter artérias renais acessórias que, usualmente, nutrem os pólos inferiores dos rins. De um modo geral, a artéria renal divide-se, no hilo, em um ramo anterior que passa diante da pelve e em um ramo posterior que passa por trás. Estes ramos — anterior e posterior — dividem-se por sua vez em várias artérias segmentares, que nutrirão os vários segmentos do rim (Fig. 1.4). O ramo anterior divide-se em quatro artérias segmentares, que irrigarão o ápice do rim, os segmentos superior e médio da superfície anterior e todo o pólo inferior, respectivamente. O ramo posterior nutre o restante do órgão. Estas artérias segmentares são artérias terminais, pois não há anastomoses entre seus ramos. Os ramos anteriores não se comunicam com os posteriores, oferecendo ao cirurgião uma linha de incisão no rim que sangra muito pouco. As artérias segmentares sofrem nova divisão, originando as artérias interlobares. As artérias interlobares correm ao lado das pirâmides medulares e dentro das colunas renais. Na junção córtico-medular, os vasos interlobares dividem-se para formar os vasos arque-
Medula
VASCULARIZAÇÃO
ados, que correm ao longo da base da pirâmide medular e dão origem às artérias interlobulares. Essas artérias interlobulares dirigem-se perpendicularmente em direção à cápsula do rim, e delas originam-se as arteríolas aferentes que nutrem um ou mais glomérulos (Fig. 1.5). As arteríolas aferentes dividem-se dentro de cada glomérulo formando uma rede capilar. Em seguida, confluem-se e emergem do tufo capilar para formar as arteríolas eferentes que deixam o glomérulo e formam os capilares peritubulares, no caso dos néfrons corticais, ou as arteríolas retas (vasa recta), no caso dos néfrons justamedulares. As arteríolas retas são vasos paralelos, relativamente sem ramos colaterais, que se estendem até a medula renal, onde originam os plexos capilares. Anatomi-
Zona interna
ao ducto deferente no homem e posteriormente à artéria renal na mulher. Esta última relação é especialmente importante nas cirurgias de histerectomia, em que o ureter pode ser inadvertidamente ligado ou clampeado junto com a artéria uterina. O ureter apresenta três segmentos onde a impactação de um cálculo é mais freqüente: na junção ureteropiélica, na porção ureteral anterior à bifurcação das artérias ilíacas comuns e na junção ureterovesical.
Artérias interlobulares
Ramos pélvico e uretérico Artéria do segmento ântero-inferior Artérias dos segmentos posteriores Artéria do segmento inferior
Ramo capsular perfurante
Fig. 1.4 Corte longitudinal mostrando a vascularização arterial renal em vista anterior. (Obtido de Netter, F.H. Anatomia, estrutura e embriologia. Seção I: rins, ureteres e bexiga. Ciba-Geigy, vol. 6, 1973.4)
5
capítulo 1
camente, a circulação venosa costuma seguir paralelamente o trajeto do sistema arterial. As veias são formadas perto da superfície do rim por confluência dos capilares do córtex. Elas drenam nas veias interlobulares e tornam-se veias arqueadas na junção do córtex com a medula (v. Fig. 1.5). As vênulas retas na medula também drenam nas veias arqueadas, que então formam as veias interlobares. Estas veias interlobares drenam em veias segmentares, as quais, eventualmente, formam as veias renais. A veia renal esquerda recebe a veia adrenal esquerda e a veia gonadal esquerda e passa inferiormente à artéria mesentérica superior antes de entrar na veia cava inferior. As veias adrenal e gonadal direita entram diretamente na veia cava inferior. A veia renal direita é menor e situa-se dorsalmente ao duodeno. Devido à migração dos rins durante seu desenvolvimento, a vascularização renal também apresenta um processo de transformação no qual as artérias mais inferiores regridem e novas artérias mais superiores surgem, acompanhando o trajeto renal. Quando as artérias inferiores não regridem, os rins podem apresentar artérias acessórias, as quais devem ser identificadas pela arteriografia antes de um procedimento cirúrgico renal.
CIRCULAÇÃO LINFÁTICA Aparentemente, nos animais estudados, os linfáticos intra-renais distribuem-se, primariamente, ao longo das artérias interlobulares e arqueadas, não penetrando no parênquima propriamente. Os linfáticos corticais originam-se ao nível do tecido conjuntivo que envolve as artérias interlobulares, drenam nos linfáticos arqueados na junção córtico-medular e atingem os linfáticos do hilo através dos linfáticos interlobares. Há também uma rede linfática no interior e sob a cápsula renal, comunicando-se com os linfáticos intra-renais.5
INERVAÇÃO Origina-se basicamente do plexo celíaco. Há, no entanto, contribuições do plexo hipogástrico superficial e de nervos intermesentéricos, esplâncnicos superiores e torácicos. A distribuição das fibras nervosas segue os vasos arteriais através do córtex e medula externa. Parece não haver inervação nos túbulos renais (com exceção do aparelho justaglomerular) e tampouco terminações nervosas nos glomérulos. No entanto, uma extensa inervação dos vasos arteriolares eferentes foi descrita. Há evidência da presença, no parênquima renal, de fibras nervosas colinérgicas e adrenérgicas. As fibras para a sensibilidade dolorosa, principalmente a partir da pelve renal e da parte superior do ureter, penetram na medula espinhal através dos nervos esplâncnicos.12
Pontos-chave: • A circulação renal apresenta uma característica única: duas redes capilares se encontram em série em um mesmo órgão — rede capilar e peritubular • A artéria renal se divide em ramo anterior e ramo posterior. Algumas vezes é possível encontrar artérias acessórias renais, as quais apresentam importância cirúrgica, por exemplo na nefrectomia • A inervação simpática renal atua principalmente nas arteríolas aferentes e eferentes e no aparelho justaglomerular. Nesta estimula a secreção de renina e naquela atua na musculatura lisa • A inervação aferente da dor também apresenta papel importante, pois pode ajudar a localizar a altura de um cálculo em migração. O rim distendido estimula as terminações nervosas da cápsula renal e provoca dor em região lombar agravada à punho-percussão. Já a dilatação ureteral por cálculo causa dor que segue o trajeto do ureter à medida que o cálculo desce, com irradiação para a genitália quando localizado principalmente no segmento inferior ureteral
EMBRIOLOGIA O desenvolvimento do sistema urinário está intimamente relacionado com o do sistema genital, sendo estes os últimos sistemas a se desenvolverem durante a embriogênese. Ambos têm origem mesodérmica, e seus canais excretores penetram inicialmente numa cavidade comum denominada cloaca. Durante o desenvolvimento embrionário, identificam-se três sistemas de excreção: pronefro, mesonefro, que são transitórios, e metanefro, ou rim permanente. Estes sistemas originamse do mesoderma intermediário ou cordão nefrogênico.
Pronefro A sua formação se inicia por volta da terceira semana de vida. Cada pronefro é composto de aproximadamente sete túbulos. A porção cefálica degenera-se e forma nefrostomas que se abrem na cavidade celômica (Fig. 1.6 A). A porção caudal funde-se com a do lado oposto, formando o ducto pronéfrico (mesonefro), que se abre na cloaca. Na maioria dos vertebrados adultos, o pronefro é vestigial ou nem sempre existe, embora na lampreia, o mais inferior dos vertebrados, funcione como um rim permanente.
6
Anatomia Renal
Mesonefro Desenvolve-se a partir da quarta semana, numa posição caudal à do pronefro. Cada túbulo mesonéfrico possui uma estrutura glomerular proximal, um segmento tubular proximal e um distal, que se abre no ducto mesonéfrico (Fig. 1.6 B). Nos peixes superiores e nos anfíbios, o mesonefro é o órgão excretor final. Nos répteis, aves e mamíferos, o mesonefro também degenera, formando o metanefro em posição mais caudal. No homem, os túbulos e ductos mesonéfricos originam vários componentes do sistema reprodutor masculino: epidídimo, ducto deferente e vesículas seminais. Na mulher os mesonefros degeneram e os ductos de Müller, que aparecem na oitava semana, originarão o útero, a vagina e as trompas.
Metanefro Representa o desenvolvimento final do rim do mamífero. Sua formação resulta da interação entre o broto ureteral, que surge a partir do ducto metanéfrico por volta da quarta e da quinta semana, com o blastema metanéfrico, derivado da parte caudal do mesoderma intermediário (Fig. 1.6 A). Estudos atribuem ao broto ureteral um papel importante como indutor da gênese renal, uma vez que na ausência ou no distúrbio de sua interação com a massa metanéfrica o metanefro não se forma, constituindo os casos de agenesia renal. Após se dilatar e se subdividir em cálices primários e secundários, seguindo um padrão muito bem estudado por Osathanondh e Potter, o broto ureteral formará o sistema coletor do rim: pelve, cálices e os ductos coletores; enquanto o blastema formará o sistema excretor: corpúsculo renal, túbulos proximais e distais e alça de Henle.13,14 O blastema metanefrogênico origina-se de pequenos focos de mesênquima condensado, localizados ao lado do broto ureteral. As células do mesoderma metanefrogênico, estimuladas pelo epitélio da extremidade cega dilatada de cada ducto coletor, agregam-se ao redor desta (Fig. 1.6 C), sofrem diversas mitoses e estágios de diferenciação, formando inicialmente uma vesícula que se alonga e se une à luz do ducto coletor. Esta vesícula alongada tem a forma de um S; uma depressão na extremidade do S é o local do futuro glomérulo. Nesta depressão aparecem células mesenquimais e, a seguir, forma-se uma membrana basal ao redor da estrutura em S (Fig. 1.6 D). Algumas células tubulares da estrutura em S formarão as células epiteliais ou podócitos, e as células mesenquimais darão origem às células endoteliais e mesangiais. Outras células mesenquimais se diferenciam em células musculares lisas das arteríolas aferentes e eferentes (Fig. 1.6 E). Portanto, esta vesícula alongada em S origina, na sua porção inferior, o corpúsculo renal, e na outra porção origina os túbulos proximal e distal da alça de Henle. Com o crescimento do sistema coletor e a indução do blastema metanéfrico simultaneamente, tem-se um padrão de crescimento centrífugo ao longo do córtex renal, de tal maneira que os primeiros néfrons passam a ocupar uma
posição justamedular, enquanto os últimos encontram-se mais externamente no córtex. Embora os néfrons do metanefro comecem a funcionar em torno da 11-ª e 12-ª semanas de vida, a maturação renal continua após o nascimento. Alguns autores sugerem que o corpúsculo renal pode aumentar por 20 anos e os túbulos contornados proximal e distal chegam a atingir um comprimento 10 vezes maior, desde o nascimento até a vida adulta. Naturalmente, o que foi descrito é uma explicação simplificada do desenvolvimento do rim, e não envolve as várias teorias e fatores existentes para explicar este complexo processo. Não foram enfatizados aqui os mecanismos celulares e moleculares da formação renal. Segundo Clapp e Abrahamson, estes parecem estar relacionados também com as desordens genéticas primárias do rim, com o tipo de resposta e com a recuperação renal frente às doenças, o que torna o seu entendimento de grande importância.15
Anomalias do Desenvolvimento Podemos observar ausência congênita ou agenesia de um ou ambos os rins, assim como hipoplasia renal. Agenesia bilateral, quando presente, é freqüentemente observada em
Pontos-chave: • O sistema urinário tem origem na mesoderma intermediária. Durante a embriogênese, ocorre regressão de algumas estruturas, sendo que são os metanefros os responsáveis pela formação do rim adulto • A agenesia renal bilateral não é compatível com a vida e deve ser suspeitada na presença de oligoidrâmnio por volta da 14-ª semana de gestação • A doença policística da infância é outra grave enfermidade que leva a insuficiência renal e morte, caso um transplante renal não seja realizado. É uma doença autossômica recessiva, diferente da forma do adulto, a qual é autossômica dominante • A migração deficiente do rim pode levar a localização pélvica renal, a qual apresenta principal importância no diagnóstico diferencial de massa pélvica • O rim em ferradura é uma anormalidade relativamente comum causada pela fusão dos pólos inferiores dos rins. O rim se situa em região lombar baixa devido à incapacidade de migração superiormente à raiz da artéria mesentérica inferior
7
capítulo 1
Blastema metanefrogênico
Túbulos pronéfricos em degeneração Ducto mesonéfrico (ducto pronéfrico) Túbulos mesonéfricos no tecido nefrogênico
Intestino anterior Intestino posterior Alantóide Membrana cloacal Cloaca
Brotamento uretérico (ducto metanéfrico) Blastema metanefrogênico
Cápsula Pelve Cálice primário Cálice secundário Ductos coletores
Somito Aorta dorsal Glomérulo Veia cardinal posterior Ducto mesonéfrico Túbulo mesonéfrico Crista genital Celoma Intestino
Fig. 1.6 A. Representação esquemática do embrião humano mostrando a topografia do pronefro, mesonefro e metanefro. B. Corte através do mesonefro. Observem que ramos da aorta dorsal alcançam as extremidades cegas dos túbulos e formam os glomérulos. Embora os túbulos e glomérulos tenham uma função excretora pela sexta semana de vida intra-uterina, ambos começam a degenerar logo em seguida. C. Agregação de células do mesoderma metanefrogênico ao redor da extremidade cega dilatada de cada ducto coletor. D. Após a fusão da vesícula metanéfrica alongada (em forma de S) com o ducto coletor, aparecem células dentro de uma invaginação da estrutura em S e forma-se a membrana basal. E. As células da invaginação diferenciam-se em células endoteliais, mesangiais, musculares lisas e justaglomerulares. As células tubulares de estrutura em S originam as células epiteliais ou podócitos. (Baseada na representação de Netter, F.H. Anatomia, estrutura e embriologia. Seção I: rins, ureteres e bexiga. Ciba-Geigy, vol. 6, 1973.4)
fetos natimortos. A agenesia unilateral é uma anomalia congênita, não muito rara, com uma incidência de 1/1.000. Hipoplasia renal verdadeira é uma condição bastante rara e de difícil diagnóstico. O rim Ask-Upmark é uma forma rara de hipoplasia renal caracterizada pela parada de desenvolvimento de um ou mais lóbulos renais e ectasia do cálice correspon-
dente. Rins supranumerários são geralmente ectópicos e menores. Uma das malformações renais mais comuns é a fusão dos pólos inferiores dos rins, formando o rim em ferradura. Ela ocorre em 0,25% da população em geral. Estes rins têm um risco elevado de infecção e são sujeitos à formação de cálculos, principalmente devido à distorção ureteral.
8
Anatomia Renal
O NÉFRON A unidade funcional do rim é o néfron, formado pelos seguintes elementos: o corpúsculo renal, representado pelo glomérulo e pela cápsula de Bowman; o túbulo proximal; a alça de Henle; o túbulo distal e uma porção do ducto coletor (v. Fig. 1.3). Há aproximadamente 700.000 a 1,2 milhão de néfrons em cada rim.16 Os néfrons podem ser classificados como superficiais, corticais e justamedulares. Existe uma segunda classificação que os divide segundo o comprimento da alça de Henle, existindo néfrons com alça curta e néfrons com alça longa. A maior parte dos néfrons são corticais e possuem uma alça de Henle curta, com o ramo delgado curto ou praticamente não-existente. Apenas um oitavo dos néfrons é justaglomerular, com os glomérulos na junção córtico-medular, e têm longas alças de Henle, as quais possuem longos ramos delgados (v. Fig. 1.3). A alça de Henle é formada pela porção reta do túbulo proximal (pars recta), segmento delgado e porção reta do túbulo distal. Em função das partes específicas do néfron localizadas em vários níveis da medula, é possível, como já indicamos, dividir a medula em zona interna e zona externa, esta última ainda dividida em faixa interna e externa. Estas divisões têm importância quando se relaciona a estrutura renal com a capacidade do rim em concentrar o máximo de urina. Acredita-se que a capacidade máxima de concentração urinária está relacionada ao comprimento do sistema multiplicador. Como no mamífero as alças de Henle atuam como
sistema multiplicador, acredita-se numa relação direta entre a capacidade máxima de concentração urinária e o comprimento da medula renal.17
Glomérulo Esta porção do néfron é responsável pela produção de um ultrafiltrado a partir do plasma. Está formada por uma rede de capilares especializados (tufo glomerular) nutridos pela arteríola aferente e drenados pela arteríola eferente. Esta rede capilar projeta-se dentro de uma câmara que está delimitada por uma cápsula (cápsula de Bowman) que, por sua vez, possui uma abertura comunicando a câmara diretamente com o túbulo contornado proximal. No hilo do glomérulo passa a arteríola aferente que se divide em quatro a oito lóbulos, formando o tufo glomerular. Aparentemente, existem anastomoses entre os capilares de um lóbulo, mas não entre lóbulos (Fig. 1.7). Os capilares se reúnem para formar a arteríola eferente, que deixa o glomérulo através do mesmo hilo. O glomérulo possui cerca de 200 nm de diâmetro, sendo que os glomérulos justamedulares possuem um diâmetro 20% maior em relação aos demais. Têm uma área de filtração ao redor de 0,136 milímetro quadrado. Entram na sua composição as células epiteliais dos folhetos parietal e visceral da cápsula de Bowman e as respectivas membranas basais, uma rede capilar com células endoteliais e uma região central de células mesangiais circundadas por um material denominado matriz mesangial (Fig. 1.8).
Fig. 1.7 Estrutura do glomérulo e cápsula de Bowman que o envolve. A cápsula de Bowman se constitui de dois folhetos: o visceral (formado pelos podócitos — terceira camada da barreira de filtração) e o parietal (delimitador do espaço capsular — receptor do ultrafiltrado glomerular). Na mesma figura ainda se observa o aparelho justaglomerular, composto pela mácula densa (túbulo distal) e pelas células justaglomerulares localizadas na arteríola aferente. (Obtido de Kumar, V., Cotran, R., Robbins, S. Basic Pathology, 6th Edition, W. B. Saunders Company, 1997.70)
capítulo 1
Arteríola aferente Células justaglomerulares
Mácula densa Arteríola eferente Pólo vascular
Folheto visceral (podócitos)
Folheto parietal ou externo
Espaço capsular Pólo urinário
Túbulo contorcido proximal
Fig. 1.8 Representação esquemática de um corte transversal ao nível central do glomérulo. (Obtido de Junqueira, L. C., Carneiro, J. Histologia Básica, 8ª Edição, Guanabara Koogan, 1995.71).
A parede do capilar glomerular está formada por três camadas: 1. Células endoteliais que formam a porção mais interna e representam uma continuação direta do endotélio da arteríola aferente. Este prolongamento é também denominado lâmina fenestrada, pela característica peculiar dos citoplasmas das células endoteliais (Figs. 1.8 e 1.9);
9
2. Uma membrana basal contínua que constitui a camada média; 3. Uma camada mais externa, formada de células epiteliais (podócitos), que constitui o folheto visceral da cápsula de Bowman (Figs. 1.7 e 1.9). A membrana basal do capilar glomerular está formada por uma região central densa, denominada lâmina densa, e por duas camadas mais finas, menos densas, denominadas lâminas raras interna e externa (Fig. 1.9). A espessura total da membrana basal está em torno de 310 nm.19 Num estudo recente verificou-se, em rins doados para transplante, uma espessura de 373 nm para membranas basais glomerulares nos rins de homens e de 326 nm nos de mulheres.20 Não há evidência morfológica de que existam poros na membrana basal. Ela está constituída basicamente por duas substâncias: colágeno e glicoproteína. O principal componente da membrana basal é uma molécula apolar do tipo procolágeno associada a glicoproteínas, sendo a molécula procolágeno composta de cadeias alfa ricas em hidroxiprolina, hidroxilisina e glicina. Um segundo componente seria uma fração não-colágena, polar, representada por unidades de polissacarídeos ligados à asparagina. O colágeno tipo IV representa o principal constituinte da fração colágena da membrana basal. Sua molécula, de aspecto helicoidal, forma-se pela união de três cadeias alfa, sendo duas delas idênticas entre si. Esta união inicia-se nas porções carboxiterminais dessas cadeias através de pontes dissulfeto, onde não se tem o aspecto helicoidal, e continua em direção às porções aminoterminais num formato de tripla hélice.22 Uma vez formado, o colágeno tipo IV é secretado e incorporado à matriz extracelular, envolvendo as células.
Fig. 1.9 Micrografia eletrônica da barreira de filtração glomerular. São mostrados o espaço urinário (US), as projeções dos podócitos (PE), a membrana basal (BL) e o endotélio capilar (E). Ainda se podem observar as fendas de filtração (FS) e as três camadas que constituem a membrana basal: as lâminas rara interna e externa (LRI e LRE) e a lâmina densa (LD). (Obtido de Berman, I. Color Atlas of Basic Histology, 2nd Edition, Appleton & Lange, 1998.69)
10
Anatomia Renal
Já foram identificados tipos diferentes de cadeias alfa formadoras de colágeno tipo IV. A cadeia alfa-1, codificada pelo gene COL4A1, e a cadeia alfa-2,23 codificada pelo gene COL4A2, ambos situados no cromossomo 13, aparecem no mesângio, na membrana basal glomerular (subendotelial), na cápsula de Bowman, em toda membrana basal tubular e vasos. A cadeia alfa-3,24 codificada pelo gene COL4A3, a cadeia alfa-4,25 codificada pelo gene COL4A4, localizado no cromossomo 2, e a cadeia alfa-5, codificada pelo gene COL4A5, situado no braço longo do cromossomo X,26 aparecem na membrana basal glomerular (lâmina densa), na cápsula de Bowman e na membrana basal do túbulo distal. Alterações nessas cadeias podem levar ao surgimento de alterações estruturais com conseqüências mórbidas, como a síndrome de Alport, onde foi detectada ausência das cadeias alfa-3 e alfa-4 na membrana basal glomerular,27 em função de uma mutação do gene da cadeia alfa-5.28 Esta mutação impede a formação do colágeno tipo IV, uma vez que as cadeias alfa-3 e alfa-4 necessitam da cadeia alfa-5 para formar a tripla hélice. Como conseqüência, observamse graus variados de malformação estrutural da membrana basal, com repercussões na filtração e seletividade da mesma ao longo do tempo. Ao contrário dos outros tipos de colágeno, o colágeno tipo IV apresenta nas suas cadeias numerosas seqüências Gly-X-Y, onde X e Y representam outros tipos de aminoácidos, aumentando a flexibilidade da molécula.29 Além disso, o colágeno tipo IV não perde sua porção carboxiterminal após ser secretado pela célula, o que possibilita três tipos diferentes de interações entre as moléculas: porção carboxiterminal de uma molécula com porção carboxiterminal de outra (head-to-head); porção carboxiterminal de uma com porção lateral da tripla hélice de outra;30 e, finalmente, porção aminoterminal de uma com porção aminoterminal de outras três moléculas (tail-to-tail). Com isso, temos a formação de uma rede poligonal, não-fibrilar e flexível que servirá de arcabouço para o depósito de glicoproteínas e para a fixação das células.31 Colágeno tipo V,32 laminina, fibronectina33 e entactina/ nidógeno34 também foram identificados na membrana basal. Dados recentes indicam que a membrana basal do glomérulo possui locais fixos de cargas negativas capazes de influenciar a filtração de macromoléculas.35 Ela seria a principal responsável pela seletividade da filtração glomerular, permitindo ou não a passagem de moléculas, de acordo com a carga elétrica e com o tamanho destas. Num experimento, empregando-se o processo de digestão enzimática, retiraram-se os glicosaminoglicanos ricos em heparan sulfato, presentes no lado aniônico da membrana basal, e notou-se um aumento da permeabilidade à ferritina36 e à albumina sérica em bovinos.37 Os efeitos de danos glomerulares, alterando a seletividade e a permeabilidade da membrana basal, foram estudados utilizando-se o modelo experimental de nefrite causa-
da por soro nefrotóxico.38 Evidenciou-se que nessa situação experimental há perda ou diminuição do conteúdo polianiônico da membrana basal, explicando um aumento na filtração de poliânions circulantes, incluindo a albumina. Outros experimentos evidenciaram, também, que a perda de cargas negativas pode influenciar na localização e na magnitude da deposição de imunocomplexos, bem como na deposição de agregados circulantes não-imunes no mesângio e na parede glomerular.39 Esses agregados levam a um estímulo contínuo à produção de matriz mesangial, que, quando se estende por muito tempo, pode levar à esclerose nodular.
CÉLULAS ENDOTELIAIS Revestem o lúmen dos capilares glomerulares. O núcleo e a maior parte do citoplasma estão no lado mesangial do capilar, sendo que uma estreita faixa do citoplasma estende-se ao longo da parede capilar (Fig. 1.13). Esta faixa de citoplasma é contínua, mas apresenta várias fenestras ou poros, cujo diâmetro aproximado é de 70 a 100 nm (Fig. 1.9). Membranas delgadas, ou diafragmas, foram observadas entre poros (Fig. 1.12). Alguns acreditam que estes diafragmas são altamente permeáveis e não constituem barreira à passagem de moléculas maiores. Estas células possuem uma superfície carregada negativamente devido à presença de glicoproteínas polianiônicas, como a podocalixina.40 Na sua membrana são apresentados antígenos como os de grupo sanguíneo ABO e HLA de tipos I e II.
CÉLULAS MESANGIAIS Muitos acreditam serem de origem mesenquimal, pois apresentam certas propriedades características das células do músculo liso. As células têm forma irregular, com vários processos citoplasmáticos estendendo-se do corpo da célula. Na região paramesangial e ao longo dos processos citoplasmáticos mesangiais justamedulares, foi evidenciada uma extensa rede de microfilamentos compostos pelo menos em parte por actina, alfa-actina e miosina.41 Sua membrana plasmática apresenta receptores de B1-integrina para fibronectina e, talvez, também para laminina.42 O material que as circunda, aparentemente sintetizado pelas próprias células, chama-se matriz mesangial. Nela se encontram glicosaminoglicanos sulfatados, laminina e fibronectina.43 É similar na aparência mas não idêntica à membrana basal do glomérulo. Ao conjunto célula mesangial e matriz dá-se o nome de mesângio. Este está separado da luz capilar pelo endotélio. A função da célula mesangial não está bem definida, mas, além da função de suporte estrutural, ela provavelmente participa de mecanismos de fagocitose e da modulação da filtração glomerular, regulando o fluxo sanguíneo nos capilares glomerulares através de suas propriedades musculares de contração e relaxamento. A célula mesangial também produz muitos agentes vasoativos, sintetiza e degrada várias substâncias do tufo glomerular.44
capítulo 1
Segundo Schlondorff, substâncias como vasopressina, angiotensina II, fator de ativação plaquetária, tromboxane, leucotrienos e fator de crescimento derivado de plaqueta atuam na indução da contração da célula mesangial.44 A produção local de prostaglandina E2, pela própria célula mesangial, faria o papel contrário dos vasoconstritores anteriormente citados. Acredita-se, no entanto, que esse mecanismo de contração seria mais para prevenir a distensão da parede capilar e para elevar a pressão hidrostática intracapilar45 e não tanto para ser o controle da filtração glomerular. Há evidências de que células mesangiais tenham propriedades de endocitose de imunocomplexos, fagocitose, de produzir e de ser alvo de substâncias reguladoras de crescimento celular, além de atuarem na modulação de dano celular glomerular.44 A produção de prostaglandinas influencia a proliferação celular local, a produção de citocinas, a produção e a destruição de matriz mesangial e de membrana basal. A interação entre células mesangiais, prostaglandinas e citocinas deve fornecer pistas importantes para a compreensão da lesão glomerular presente nos processos patológicos. Além do mais, é provável que a célula mesangial possa transformar-se em célula endotelial quando houver necessidade da expansão da rede capilar.
CÉLULAS EPITELIAIS VISCERAIS Conhecidas também como podócitos, são as maiores células do glomérulo. Possuem lisossomos proeminentes, um aparelho de Golgi bem desenvolvido e muitos filamentos de actina. Do corpo da célula, estendem-se trabéculas alongadas, das quais se originam processos denominados pedicelos ou pés dos podócitos, que ficam em contato com a lâmina rara externa da membrana basal do glomérulo (Figs. 1.7 e 1.10). A distância entre os pés dos podócitos
11
varia de 25 a 60 nm, ao nível da membrana basal. Este espaço é também referido como fenda de filtração ou, impropriamente, poro (Fig. 1.12). Aqui também há uma membrana delgada ou diafragma entre os pés dos podócitos. Nela encontrou-se, por estudos imuno-histoquímicos,46 a proteína ZO-1, específica dos complexos unitivos intercelulares (tight junctions). Uma densidade central com um diâmetro de 11 nm é observada neste diafragma. Esta densidade representa um filamento central contínuo conectado à membrana plasmática do pedicelo adjacente por pontes espaçadas regularmente com 7 nm de diâmetro e 14 nm de comprimento, dando uma configuração semelhante a um zíper.47 Discute-se se esta estrutura também entra na determinação da seletividade da barreira de filtração. Na superfície das células epiteliais viscerais notou-se o receptor C3b em glomérulos humanos,48 bem como o antígeno de Heymann, gp 330.49 A superfície negativa que cobre os pedicelos é rica em ácido siálico. Encontrou-se também podoxilina na superfície urinária, mas não na superfície basal, dos podócitos.50 Em várias nefropatias associadas com proteinúria, os pés dos podócitos são substituídos por uma faixa contínua de citoplasma adjacente à lâmina rara externa. Este aspecto tem sido denominado fusão dos pés dos podócitos. É uma expressão errônea porque não se sabe se realmente há uma fusão, e tudo indica que alguns pés na verdade se retraem e os que permanecem expandem-se. A fusão dos pés dos podócitos resulta, pelo menos em parte, da perda de forças eletrostáticas repulsoras normais entre os processos adjacentes, devido à neutralização (ou perda) de sua cobertura aniônica. Em estudos experimentais, com a perfusão de rins de rato com neuroaminidase, que remove ácido siálico, observou-se que tanto as células viscerais quanto as epiteliais
Fig. 1.10 Imagem de microscopia eletrônica das células viscerais da cápsula de Bowman (podócitos). São visualizados os corpos celulares dos podócitos (CB) e as projeções citoplasmáticas primárias (PB) e secundárias (SB). (Obtido de Berman, I. Color Atlas of Basic Histology, 2nd Edition, Appleton & Lange, 1998.69)
12
Anatomia Renal
Aparelho Justaglomerular Está situado no hilo do glomérulo e é formado pelos seguintes elementos: 1. 2. 3. 4.
porção terminal da arteríola aferente; mácula densa; uma região mesangial extraglomerular; a arteríola eferente.
A região mesangial extraglomerular está localizada entre a mácula densa e as células mesangiais do tufo glomerular (Figs. 1.7 e 1.11). Nesta região, encontram-se dois tipos de células: agranulares e granulares. As células agranulares ocupam o centro dessa região e são as mais abundantes. As células granulares ou mioepiteliais (pois parecem representar células especializadas do músculo liso) estão localizadas principalmente no interior das paredes das arteríolas glomerulares aferentes e eferentes. Os grânulos representam o hormônio renina ou o seu precursor. Durante o desenvolvimento renal a expressão da renina aparece ao longo de todas as arteríolas do glomérulo em formação. Especula-se que a alta expressão de renina esteja relacionada à proliferação vascular.53
Células agranulares
af
er
en t
e
Células granulares
Mácula densa
ola er í Art te
ren
efe
• O néfron é a unidade funcional do rim e é constituído pelo corpúsculo renal (glomérulo ⫹ cápsula de Bowman), túbulo contorcido proximal, alça de Henle, túbulo contorcido distal e ducto coletor • A barreira de filtração glomerular é constituída por três camadas: -Endotélio fenestrado do capilar glomerular -Membrana basal -Células epiteliais especializadas (podócitos), as quais circunscrevem os capilares com suas projeções citoplasmáticas, formando inúmeras fendas de filtração • Esta complexa barreira permite a passagem seletiva de água e pequenos solutos. Moléculas de carga negativa apresentam uma menor taxa de filtração em relação a cátions devido à negatividade da barreira glomerular • Alterações estruturais na barreira podem levar a uma série de doenças renais, dentre elas as glomerulonefrites primárias • A fusão dos pés dos podócitos está presente na nefrose lipoídica e na glomeruloesclerose focal e segmentar, levando a um quadro de síndrome nefrótica com proteinúria maciça • As glomerulonefrites rapidamente progressivas apresentam à microscopia óptica uma proliferação anormal das células epiteliais parietais associada à infiltração de monócitos e macrófagos, formando as crescentes glomerulares • A nefropatia por IgA é uma doença glomerular extremamente comum caracterizada por hematúria recorrente, freqüentemente seguindo um quadro infeccioso. As imunoglobulinas A são depositadas no mesângio glomerular
São células escamosas que revestem a parede externa da cápsula de Bowman (v. Fig. 1.7). Possuem esparsas organelas, pequenas mitocôndrias e numerosas vesículas, de 40 a 90. Apresentam microvilosidades de até 600 nm de comprimento na superfície livre e, freqüentemente, em cada célula encontra-se um longo cílio. Estas células são responsáveis pela manutenção da integridade da cápsula. Em algumas nefropatias, como na glomerulonefrite rapidamente progressiva, estas células parietais podem vir a proliferar, vindo a constituir um dos elementos das semiluas ou crescentes. O estímulo para esta proliferação parece ser a presença de fibrina ou material proteináceo e hemácias no espaço urinário.
té ria
Pontos-chave:
CÉLULAS EPITELIAIS PARIETAIS
Ar
descolam-se da membrana basal glomerular.51 Portanto, sugere-se que os campos de carga negativa da membrana destas células sejam muito importantes na manutenção da estrutura e da função da barreira de filtração. Acredita-se que a célula epitelial visceral seja capaz de fazer endocitose, capturando proteínas e outros componentes do ultrafiltrado, e que ela também seja responsável, pelo menos em parte, pela síntese e manutenção da membrana basal do glomérulo,52 embora ainda se conheça pouco sobre a dinâmica desse processo.
Fig. 1.11 Diagrama do aparelho justaglomerular.
13
capítulo 1
A mácula densa deriva de células epiteliais da borda superior da fissura vascular, que se estabelecem no segmento ascendente espesso da alça de Henle, parte do túbulo distal. O túbulo distal está em extenso contato com a arteríola eferente e com a região mesangial extraglomerular e possui um contato menos extenso com a arteríola aferente. O corte transversal do túbulo distal, a este nível, mostra que as células adjacentes do hilo são distintas das demais: são colunares, com um núcleo apical (v. Fig. 1.11). A microscopia eletrônica mostra interdigitações entre a base da célula e as células mesangiais extraglomerulares. O aparelho justaglomerular é a estrutura mais importante do sistema renina-angiotensina. Ele parece participar do mecanismo de feedback entre o túbulo distal e as arteríolas aferentes e eferentes, atuando ativamente na regulação da excreção de sódio pelo organismo (v. Cap. 10). Há duas teorias para explicar o mecanismo de liberação de renina pelo aparelho justaglomerular: a da mácula densa e a do receptor de volume. A primeira infere que a concentração de sódio na mácula densa controla a liberação de renina;54 a segunda, que alterações no volume da arteríola aferente seriam responsáveis pelo fato.55 Posteriormente, as duas teorias foram integradas na explicação deste mecanismo, que se baseia no seguinte princípio: quanto maior for o contato entre o túbulo e os componentes vasculares do aparelho justaglomerular, menor quantidade de renina é secretada; quanto menor for este contato, maior será a secreção da substância. Assim, pela teoria da mácula densa, quanto menos sódio atingir o túbulo distal, menor o diâmetro do túbulo e, portanto, menor o contato com os componentes vasculares, havendo, então, um aumento da secreção de renina. O inverso ocorre quando muito sódio chega ao túbulo distal. Pela outra teoria, um aumento do volume arteriolar aumenta o contato dos componentes vasculares com o túbulo distal, e logo menos renina é liberada. Havendo um volume arteriolar reduzido, ocorrerá o contrário.56 Atualmente, sabe-se que o sistema simpático também é capaz de estimular a secreção de renina.
justaglomerular e especula-se que a liberação de seus fatores no espaço de Bowman afete o transporte de elementos distalmente do corpúsculo renal.
Túbulo Proximal Com cerca de 14 nm de comprimento, inicia-se no pólo urinário do glomérulo, forma vários contornos próximos ao glomérulo de origem e depois desce, sob a forma de segmento reto, em direção à medula. O segmento inicial é geralmente denominado pars convoluta e o mais distal, pars recta, sendo que estes últimos constituem parte dos raios medulares. As células da pars convoluta são colunares e possuem um bordo em escova, devido às projeções da membrana plasmática, denominadas microvilos (Figs. 1.12 e 1.13). Há numerosas mitocôndrias alongadas, estendendo-se da base ao ápice da célula, possuindo ramificações e anastomoses entre elas.61 Essas células também possuem numerosos processos interdigitais laterais de outras células, o que aumenta o espaço intercelular. A microscopia eletrônica revela numerosas mitocôndrias de forma alongada, situadas dentro desses compartimentos formados pelos processos interdigitais entre células adjacentes. Como resultado dessa extensa interdigitação lateral entre células adjacentes, forma-se um complexo compartimento extracelular, denominado espaço intercelular lateral. Este espaço intercelular
Túbulo contorcido proximal
Túbulo contorcido distal e parte espessa da alça de Henle
Células Peripolares Acredita-se que sejam um componente adicional do aparelho justaglomerular. Encontram-se interpostas entre células epiteliais parietais e viscerais na origem do tufo glomerular da cápsula de Bowman, estando comumente separadas da arteríola aferente pela membrana basal da cápsula. Têm seu lado oposto voltado para o espaço urinário ou espaço de Bowman. Estas células possuem grânulos eletrondensos que se acredita serem do tipo secretório. Evidenciaram-se exocitoses desse material granular em rins de ovelhas depletadas de sódio. Acredita-se que as células peripolares estejam envolvidas no controle da função do aparelho
Parte delgada da alça de Henle
Tubo coletor
Fig. 1.12 Representação esquemática da ultra-estrutura celular dos vários segmentos do néfron. Apesar da semelhança das células da parte espessa da alça de Henle e as do túbulo distal, suas funções são diferentes. (Obtido de Junqueira, L.C. , Carneiro, J. Histologia Básica, 8ª Edição, Guanabara Koogan, 1995.71)
14
Anatomia Renal
Fig. 1.13 Microscopia eletrônica do túbulo proximal mostrando os inúmeros microvilos que constituem o característico bordo em escova da microscopia óptica. Ainda se observam mitocôndrias (M) — responsáveis pela energia para o transporte ativo; lisossomos (L) e vesículas pinocíticas (V), e os complexos juncionais próximos à superfície luminal (J). (Obtido de Burkitt, H.G., YOUNG, B., HELATH, J.W. Weather’s Functional Histology, 3rd Edition, Churchill Livingston, 1993.68)
está separado do lúmen tubular por uma estrutura especializada, localizada na parte superior do espaço e denominada tight junction ou zonula occludens (Fig. 1.13). A importância deste espaço intercelular está na sua participação ativa na reabsorção de água e de solutos no túbulo proximal, assunto particularmente abordado no Cap. 10. Além disso, a pars convoluta reabsorve várias substâncias protéicas (p. ex., albumina) e não-protéicas (p. ex., carboidratos). O epitélio da pars recta é geralmente cubóide. A superfície apical da célula é convexa e recoberta de microvilos. É uma célula mais simples, com menos vesículas, vacúolos, mitocôndrias e interdigitações entre as células. Esta redução de complexidade morfológica sugere que esta região está menos envolvida no transporte ativo de sódio e água quando comparada com a pars convoluta. Essa impressão é corroborada por estudos experimentais. O túbulo proximal promove uma reabsorção, quase isosmótica, de 2/3 do ultrafiltrado, acoplada a transporte ativo de sódio. Qualquer doença que afete essa região causa um desequilíbrio hidroeletrolítico mais importante. As células do túbulo contornado proximal possuem um sistema vacúolo-lisossomal muito bem desenvolvido. Assim, uma importante função da pars convoluta e, em menor grau, da pars recta é a reabsorção e a degradação de várias macromoléculas, inclusive a albumina e proteínas de baixo peso molecular do filtrado glomerular. As proteínas são reabsorvidas, levadas ao lisossomo e degradadas. A reabsorção dá-se juntamente com o transporte ativo de sódio, constituindo um transporte ativo secundário. É um proces-
so seletivo determinado pela carga elétrica e pela distribuição desta carga na molécula, além do tamanho e configuração moleculares da proteína. Há evidências também de endocitose mediada por receptor nessas células. O túbulo proximal é importante na formação de amônia e na secreção de íons de hidrogênio. Foi bem estabelecido que bases fracas, como cloreto de amônio e cloroquina, acumulam-se nos compartimentos acídicos intracelulares, incluindo endossomos e lisossomos. Este mecanismo talvez explique o acúmulo de drogas catiônicas anfifílicas, como a cloroquina, os antidepressivos tricíclicos e os antibióticos aminoglicosídeos. Metais pesados também se acumulam nos lisossomos, provavelmente porque estão ligados a proteínas. Por muitos anos sabe-se que a pars recta do túbulo proximal está envolvida na secreção de ácidos e bases orgânicas. Assim, essa porção é freqüentemente lesada por compostos nefrotóxicos, incluindo várias drogas e metais pesados, secretados por essa via de transporte.
Alça de Henle A transição entre o túbulo contornado proximal e o segmento delgado da alça de Henle é abrupta e marca a divisão entre a faixa externa e a faixa interna da zona externa da medula. As células do segmento delgado ascendente têm aspecto morfológico distinto das células do segmento delgado descendente (Fig. 1.12). Estas últimas são mais com-
15
capítulo 1
plexas, irregulares na configuração e apresentam extensas interdigitações entre si. Este segmento delgado da alça de Henle possui grande importância no mecanismo de concentração da urina, participando do mecanismo de contracorrente e gerando um interstício medular hipertônico (v. Cap. 6). O segmento ascendente é relativamente impermeável à água, mas bastante permeável a sódio e cloro, enquanto, no segmento descendente, a água passa passivamente para o interstício hipertônico e sódio e cloro praticamente não passam. Não há evidências de que nesses segmentos delgados haja um transporte ativo de sódio e cloro. Estudos recentes indicam que a concentração de urina na medula interna é um processo puramente passivo, embora o debate ainda persista. Verificou-se que a saída de sódio e cloro do segmento ascendente é maior que a entrada de uréia, o que ajuda na formação do gradiente osmótico da medula interna.
Túbulo Distal Constitui-se através do segmento ascendente espesso da alça de Henle (pars recta), da mácula densa e do túbulo contornado distal (pars convoluta). A pars recta atravessa a medula externa e sobe no raio medular do córtex até ficar em contato com o seu próprio glomérulo. Esta porção tubular contígua ao glomérulo forma a mácula densa. As células neste segmento aumentam de altura, tornando-se cubóides na parte média do segmento (Fig. 1.11). A transição entre o segmento ascendente delgado e o segmento espesso marca a divisão entre zona externa e zona interna da medula. A pars recta possui um alto metabolismo, sendo especialmente sensível à isquemia.62 Nos processos laterais de suas células e próximas à membrana basal aparecem muitas mitocôndrias alongadas, contendo vários tipos de filamentos e inclusões cristalinas. A principal função da pars recta encontra-se no transporte de cloreto de sódio (transporte ativo de sódio, ATPase sódio/potássio, e passivo de cloro) para o interstício, função muito importante para o mecanismo contracorrente58 (v. Cap. 10). A pars recta tem sua atividade influenciada por hormônios, como paratormônio (PTH), vasopressina, calcitonina e glucagon, através da ativação do sistema adenilato ciclase. O PTH estimula a reabsorção de cálcio e magnésio no segmento ascendente, parte cortical. A pars convoluta estende-se da mácula densa ao início do ducto coletor. As células desse segmento são muito semelhantes às da pars recta. A relação entre a estrutura e a função neste segmento do néfron é um pouco complicada, pela diferente terminologia usada por anatomistas e fisiologistas. Para os fisiologistas dedicados à micropunção, o túbulo distal é definido como aquela região do néfron que se inicia após a mácula densa e se estende até a junção com outro túbulo distal (TD). Mas em muitas ocasiões o segmento cortical do ramo ascendente da alça de Henle se estende além da
mácula densa e há também evidência anatômica para a presença de uma região de conexão ou transição entre a pars convoluta do túbulo distal e o ducto coletor. Desta maneira, o túbulo distal pode ser formado por quatro tipos diferentes de epitélio. Em geral, a porção inicial do túbulo distal corresponde ao túbulo contornado distal ou pars convoluta do anatomista. Este possui a maior atividade sódio/potássio ATPase, comparando-se com os demais segmentos. Possui também muitas mitocôndrias e está associada à reabsorção de cálcio e magnésio, apresentando, em estudos histoquímicos, uma elevada reatividade imunológica para uma proteína carreadora de cálcio, vitamina D-dependente. A porção mais distal do túbulo distal está representada pelo túbulo conector e a primeira porção do ducto coletor, habitualmente referido como túbulo coletor inicial (v. Cap. 4). O túbulo conector é uma região de transição e parece estar envolvido com a secreção de potássio, pelo menos em parte, regulada por mineralocorticóides, e na secreção de íons H⫹.
Ducto Coletor Deriva-se do broto ureteral. De acordo com a localização no rim, costuma-se dividir o ducto coletor (DC) em três segmentos: segmento coletor cortical, segmento medular interno e externo. O segmento coletor cortical está formado no começo pelo túbulo coletor inicial e, depois, continua com uma porção arqueada e medular. O segmento medular interno termina na papila.5
Fig. 1.14 Microscopia óptica do ducto coletor (CD), segmento delgado da alça de Henle (TL) e algumas arteríolas retas (V). (Obtido de Berman, I. Color Atlas of Basic Histology, 2nd Edition, Appleton & Lange, 1998.69)
16
Anatomia Renal
A célula mais abundante no ducto coletor é uma célula clara, contendo um núcleo central cercado por um citoplasma claro e um pequeno número de mitocôndrias (Fig. 1.14). Um outro tipo de célula encontrado é uma célula escura ou intercalada: citoplasma escuro com numerosas mitocôndrias. Estudos imuno-histoquímicos demonstraram altos níveis de atividade da anidrase carbônica nessas células, sugerindo que elas estejam envolvidas no processo de acidificação da urina. As funções do ducto coletor são muitas, embora às vezes seja difícil separá-las das funções do túbulo contornado distal. Juntos, ducto coletor e túbulo contornado distal formam o néfron distal, onde vários processos fisiológicos ocorrem: reabsorção de bicarbonato, secreção de hidrogênio, reabsorção e secreção de potássio, secreção de amônia, reabsorção de água, etc. Evidência experimental documenta nitidamente que todo ducto coletor reabsorve água sob a influência de vasopressina (Fig. 1.15). Na presença de vasopressina, sendo a água reabsorvida do interior do ducto coletor, há uma maior concentração de uréia no interior do ducto coletor, cujos segmentos cortical e medular são impermeáveis à uréia. Os segmentos medular interno e papilar são permeáveis à uréia, facilitando a passagem desta para o interstício medular, fato muito importante no mecanismo de concentração de urina (v. Cap. 9). Além disso, há evidência de que o DC participa da reabsorção de cloreto de sódio, secreção ou reabsorção de potássio, secreção de íons hidrogênio e do processo de acidificação urinária, como já foi citado.
Túbulo contornado distal
Túbulo coletor
Isotônico
Hipertônico
Epitélio permeável à água Epitélio impermeável à água Epitélio permeável à água somente em presença de HAD
Fig. 1.15 Representação esquemática do nefro procurando salientar as diferenças morfológicas e funcionais da porção inicial e distal do túbulo distal. Observem que o túbulo contornado distal é impermeável à água, como o ramo ascendente da alça de Henle. A porção distal do TD (túbulo coletor) responde ao HAD, como todo o ducto coletor.
INTERSTÍCIO RENAL O interstício renal engloba tudo o que se encontra no espaço extravascular e intertubular do rim, estando limitado pelas membranas basais dos vasos e túbulos. Segundo Lemley e Kriz,63 o interstício não se constitui de um simples espaço com elementos celulares e uma matriz extracelular que envolve as “estruturas funcionais dos rins”, néfrons e túbulos. Há evidências de que ele não só fornece suporte estrutural, mas também funciona como mediador, ou mais exatamente como modulador de quase todas as trocas que ocorrem ao longo dos vasos capilares e túbulos do parênquima renal. Considera-se provável sua influência na filtração glomerular, através de seus efeitos no feedback túbulo-glomerular. Ele também tem muita importância no crescimento e na diferenciação das células do parênquima renal, bem como na determinação da distribuição da microvasculatura peritubular e na circulação linfática. Além disso, produz fatores autacóides e hormônios de ação local, como a adenosina e a prostaglandina, e sistêmica, como a eritropoetina. Alterações no interstício renal contribuem para as manifestações clínicas da doença renal. O interstício renal divide-se nos compartimentos cortical e medular, que por sua vez têm suas subdivisões. No córtex têm-se as partes peritubular, periarterial e especial, formada pelo mesângio glomerular e extraglomerular. Na medula observam-se as faixas externa e interna da medular externa e a medular interna. Na região periarterial do interstício cortical encontram-se os vasos linfáticos renais, particularmente abundantes ao redor das artérias arqueadas e corticais radiais ou interlobulares. Eles possuem um endotélio perfurado e sem membrana basal. Não existem vasos linfáticos na medula renal. O volume do interstício em relação ao parênquima vai aumentando em direção à papila renal, a partir do córtex. Assim, temos um volume relativo intersticial de 30 a 40% na medula interna de rins de animais de laboratório, enquanto a parte intersticial cortical tem apenas 7 a 9%. Em rins de adultos jovens normais o volume relativo do interstício varia de 5 a 10% no córtex e aumenta com a idade.64 No córtex, identificam-se basicamente dois tipos de células intersticiais. O tipo mais freqüente assemelha-se a fibroblastos, e o outro lembra células mononucleares (macrófagos). A produção de adenosina por células semelhantes a fibroblastos da parte cortical inibe a liberação de renina e diminui a reabsorção de sódio, tendo-se revelado parte do mecanismo de proteção renal frente a situações de hipóxia. Durante a hipóxia, há evidências de aumento de adenosina e de eritropoetina. Sugere-se que a síntese desta última é estimulada pela adenosina, representando a resposta celular a um sinal de diminuição do O2 disponível. Na medula, especialmente na medula interna, as células intersticiais são numerosas e vários tipos foram identificados. Através de microscopia eletrônica identificaram-
17
capítulo 1
Pontos-chave: • O aparelho justaglomerular é principalmente formado pelas células granulares da arteríola aferente (secretoras da renina) e pela mácula densa (diferenciação celular do túbulo distal). Esta estrutura é a principal responsável pelo controle do sistema renina-angiotensinaaldosterona (SRAA), o qual tem como função a regulação do metabolismo de sódio • A estenose de artéria renal diminui o fluxo glomerular, atuando diretamente no aparelho justaglomerular. Ocorre, então, uma estimulação do SRAA, o qual leva a um quadro de hipertensão arterial sistêmica de causa renovascular • O túbulo proximal é responsável pela reabsorção da maioria dos pequenos solutos filtrados, e dentre eles temos os íons sódio, cloreto, potássio, cálcio e bicarbonato, assim como moléculas de aminoácidos e glucose. A água é permeável neste segmento, sendo reabsorvida passivamente. Uma disfunção hereditária ou adquirida no túbulo proximal leva à síndrome de Fanconi • A alça de Henle possui grande importância na concentração da urina, participando na criação do mecanismo de contracorrente através da criação de um interstício medular hipertônico • Os túbulos distais, junto com os ductos coletores, formam os néfrons distais. Nestes segmentos agem a aldosterona (reabsorção de sódio e secreção de potássio), o hormônio antidiurético (reabsorção de água) e o fator natriurético atrial (inibe reabsorção de sódio). Além disto, o ducto coletor tem papel importante na secreção de ácido através do amônio e no mecanismo de contracorrente com a uréia • A nefrite intersticial é um quadro de inflamação aguda do interstício renal provocada principalmente por drogas, como derivados da penicilina e antiinflamatórios não-esteroidais
se, inclusive, partículas de gordura em determinadas células, muito abundantes nessa região. Por meio de reações histoquímicas, revelou-se que estas partículas são compostas de ácidos graxos saturados e insaturados. Esses ácidos são precursores de prostaglandinas, formando assim a evidência de que essas células intersticiais medulares estejam envolvidas na síntese de prostaglandinas renais, sendo a medula o principal sítio de produção. Evidenciou-se também que elas participam da síntese de glicosaminoglicanos presentes na matriz do interstício e que têm uma função endócrina anti-hipertensiva.65 As células mononucleares têm a capacidade de fagocitose e estão freqüentemente associadas às células dendríticas intersticiais, que não se diferenciam claramente das células semelhantes a fibroblastos e funcionam como excelentes apresentadoras de antígenos, como se observou em trabalhos experimentais.66 Em humanos, as células homólogas a essas células dendríticas intersticiais encontram-se mais no parênquima, como células endoteliais, e expressam o antígeno comum leucocitário CD45.67
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. CHAPMAN, W.H. et al. The Urinary System. An Integrated Approach. W.B. Saunders Co., 1973. 2. HEPTINSTALL, R.H. Pathology of the Kidney, 2nd edition. Little, Brown and Co., cap. 1, 1974. 3. PITTS, R.F. Physiology of the Kidney and Body Fluids. Year Book Medical Publishers, 1972. 4. NETTER, F.H. Anatomia, estrutura e embriologia. Seção I: rins, ureteres e bexiga. Ciba-Geigy e Guanabara Koogan, vol. 6, 1973. 5. TISHER, C.C. & MADSEN, K.M. Anatomy of the kidney. In Brenner, B.M. & Rector Jr, F.C. The Kidney. W.B. Saunders Co., p. 3, 1986. 6. WALD, H. The weight of normal adult human kidneys and its variability. Arch. Pathol. Lab. Med., 23:493-500, 1937. 7. EMERY, J.L.; MITHAL, A. The weight of kidneys in late intra-uterine life and childhood. J. Clin. Pathol., 13:490-3, 1960. 8. KASISKE, B.L.; UMEN, A.J. The influence of age, sex, race and body habitus on kidney weight in humans. Arch. Pathol. Lab. Med., 110:5560, 1986. 9. SYKES, D. The morphology of renal lobulations and calyces, and their relationship to partial nephrectomy. Br. J. Surg., 51:294-304, 1964. 10. INKE, G. The Protolobar Structure of the Human Kidney: Its Biologic and Clinical Significance. New York, Alan R. Liss, 1988. 11. HODSON, C.J. Reflux nephropathy: A personal historical review. Am. J. Roentgenol., 137:451-62, 1981. 12. GARDNER, GRAY, O’RAHILLY. Anatomia do Corpo Humano — Estudo Regional, 4-ª edição. Ed. Guanabara Koogan, Caps. 37 e 38, 1988. 13. OSATHANONDH, V.; POTTER, E.L. Development of human kidney as shown by microdissection: II. Renal pelvis, calyces, and papillae. Arch. Pathol., 76:277-89, 1963. 14. OSATHANONDH, V.; POTTER, E.L. Development of human kidney as shown by microdissection: III. Formation and interrelationships of collecting tubules and nephrons. Arch. Pathol., 76:290-302, 1963. 15. CLAPP, W.L.; ABRAHAMSON, D. Development and gross anatomy of the kidney. In Tisher, C.C. & Brenner, B.M. Renal Pathology, 2nd edition. Philadelphia, J.B. Lippincott Company, pp. 3-59, 1994. 16. DUNNIL, M.S.; HALLEY, W. Some observations on the quantitative anatomy of the kidney. J. Pathol., 110:113-21, 1973.
18 17.
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31. 32.
33.
34.
Anatomia Renal
BANKIR, B.; de ROUFFIGNAC, C. Urinary concentrating ability: Insights from comparative anatomy. Am. J. Physiol., 249 (Regulatory Integ. Comp. Physiol., 18):R643-66, 1985. TISHER, C.C.; BRENNER, B.M. Structure and function of the glomerulus. In Renal Pathology, 2nd edition. Philadelphia, J.B. Lippincott Company, pp. 143-61, 1994. OSTERBY, R. Morphometric studies of the peripheral glomerular basement membrane in early juvenile diabetes: Development of initial basement membrane thickening. Diabetologia, 8:84-92, 1972. STEFFES, M.W.; BARBOSA, J.; BASGEN, J.M.; SUTHERLAND, D.E.R.; NAJARIAN, J.S.; MAUER, S.M. Quantitative glomerular morphology of the normal human kidney. Lab. Invest., 49:82-6, 1983. KASHTAN, C.E.; MICHAEL, A.F.; SIBLEY, R.K.; VERNIER, R.L. Hereditary nephritis — Alport syndrome and thin glomerular basement disease. In Tisher, C.C. & Brenner, B.M. Renal Pathology, 2nd edition. Philadelphia, J.B. Lippincott Company, p. 1250, 1994. WEBER, S.; ENGEL, J.; WIEDEMANN, H.; GLANVILLE, R.W.; TIMPL, R. Subunit structure and assembly of the globular domain of basement membrane collagen type IV. Eur. J. Biochem., 139:401-10, 1984. BOYD, C.D.; TOTH-FEJEL, S.; GADI, I.K.; LITT, M.; CONDON, M.R.; KOLBE, M.; HAGEN, I.K.; KURKINEN, M.; MACKENZIE, J.W.; MAGENIS, E. The genes coding for human pro alpha 1(IV) and pro alpha 2(IV) collagen are both located at the end of the long arm of the chromossome 13. Am. J. Hum. Genet., 42:309-14, 1988. MORRISON, K.E.; GERMINO, G.G.; REEDERS, S.T. Use of the polymerase chain reaction to clone and sequence a cDNA encoding the bovine alpha-3 chain of the type IV collagen. J. Biol. Chem., 266:34-9, 1991. MARIYAMA, M.; KALLURI, R.; HUDSON, B.J.; REEDERS, S.T. The alpha-4(IV) chain of basement membrane collagen: isolation of cDNAs encoding bovine alpha-4(IV) and comparison with other type of collagens. J. Biol. Chem., 67:1253-8, 1991. HOSTIKKA, S.L.; EDDY, R.L.; BYERS, M.G.; HOYHTYA, M.; SHOWS, T.B.; TRYGGVASON, K. Identification of a distinct type IV collagen alpha chain with restricted kidney distribution and assignment of its gene to the locus of X chromossome-linked Alport syndrome. Proc. Natl. Acad. Sci. USA, 87:1606-10, 1990. KLEPPEL, M.M.; KASHTAN, C.E.; BUTKOWSKI, R.J.; FISH, A.J.; MICHAEL, A.F. Alport familial nephritis — absence of 28 kilodalton non-collagenous monomers of type IV collagen in glomerular basement membrane. J. Clin. Invest., 80:263-6, 1987. ANTIGNAC, C.; DECHENES, G.; GROS, F.; KNEBELMANN, B.; TRYGGVASON, K.; GUBLER, M.C. Mutations in the COL4A5 gene in Alport syndrome. J. Am. Soc. Nephrol., 2:249, 1991. BRAZEL, D.; OBERBAUMER, I.; DIERINGER, H.; BABEL, W.; GLANVILLE, R.W.; DEUTZMANN, R.; KUHN, K. Completion of the amino acid sequence of the alfa-1 chain of human basement membrane collagen (type IV) reveals 21 non-triplet interruptions located within the collagenous domain. Eur. J. Biochem., 168:529-36, 1987. TSILIBARY, E.; CHARONIS, A. The role of the main noncollagenous domain (NC1) in type IV collagen assembly. J. Cell. Biol., 103:2467-73, 1986. AUMAILLEY, M.; TIMPL, R. Attachment of cells to basement membrane collagen type IV. J. Cell Biol., 103:1569-75, 1986. MARTINEZ-HERNANDEZ, A.S.; GAY, S.; MILLER, E.J. Ultrastructural localization of type V collagen in rat kidney. J. Cell Biol., 92:3439, 1982. MADRI, J.A.; ROLL, F.J.; FURTHMAYR, H.; FOIDART, J.M. Ultrastructural localization of fibronectin and laminin in basement membranes of murine kidney. J. Cell Biol., 86:682-7, 1980. KATZ, A.; FISH, A.J.; KLEPPEL, M.M.; HAGEN, S.G.; MICHAEL, A.F.; BUTKOWSKI, R.J. Renal entactin (nidogen): isolation, characterization and tissue distribution. Kidney Int., 40:643-52, 1991.
35.
36.
37.
38.
39.
40.
41.
42.
43.
44. 45.
46.
47.
48.
49.
50.
51.
52.
53. 54.
55.
FARQUHAR, M.G. The glomerular basement membrane — A selective macromolecular filter. In Hay, E.D. Cell Biology of Extracellular Matrix. New York, Plenum Press, p. 335-78, 1981. KANVAR, Y.S.; LINKER, A.; FARQUHAR, M.G. Increased permeability of the glomerular basement membrane to ferritin after removal of glycosaminoglycans (heparan sulfate) by enzyme digestion. J. Cell Biol., 86:688-93, 1980. ROSENZWEIG, L.J.; KANVAR, Y.S. Removal of sulfated (heparan sulfate) or nonsulfated (hyaluronic acid) glycosaminoglycans results in increased permeability of the glomerular basement membrane to 123I-bovine serum albumin. Lab. Invest., 47:177-84, 1982. BOHRER, M.P.; BAYLIS, C.; HUMES, H.D.; GLASSOCK, R.J.; ROBERTSON, C.R.; BRENNER, B.M. Permselectivity of the glomerular capillary wall: Facilitated filtration of circulating polycations. J. Clin. Invest., 61:72-8, 1978. COUSER, W.G.; HOYER, J.R.; STILMANT, M.M.; JERMANOVICH, N.B.; BELOCK, S. Effect of aminonucleoside nephrosis on immune complex localization in autologous immune complex nephritis in the rat. J. Clin. Invest., 61:561-72, 1978. HORVAT, R.; HOVOKA, A.; DEKAN, G.; POCZEWSKI, H.; KERJASCHKI, D. Endothelial cell membranes contain podocalyxin — the major sialoprotein of visceral glomerular epithelial cells. J. Cell Biol., 102:484-91, 1986. DRENCKHAHN, D.; SCHNITTLER, H.; NOBILING, R.; KRIZ, W. Ultrastructural organization of contractile proteins in rat glomerular mesangial cells. Am. J. Pathol., 137:1343-52, 1990. GEHLSEN, K.R.; DILLNER, L.; ENGVALL, E.; RUOSLAHTI, E. The human laminin receptor is a member of the integrin family of cell adhesion receptors. Science, 241:1228-9, 1988. LAITINEN, L.; VARTIO, T.; VIRTANEN, I. Cellular fibronectins are differentially expressed in human fetal and adult kidney. Lab. Invest., 64:492-8, 1991. SCHLONDORFF, D. The glomerular mesangial cell — An expanding role for a specialized pericyte. FASEB J. 1:272-81, 1987. KRIZ, W.; ELGER, M.; LEMLEY, K.; SAKAI, T. Structure of the glomerular mesangium: A biomechanical interpretation. Kidney Int., 38(Suppl 30):S2-9, 1990. SCHNABEL, E.; ANDERSON, J.M.; FARQUHAR, M.G. The tight junction protein ZO-1 is concentrated along the slit diaphragms of the glomerular epithelium. J. Cell Biol., 111:1255-63, 1990. SCHNEEBERGER, E.E.; LEVEY, R.H.; McCLUSKEY, R.I.; KARNOVSKY, M.J. The isoporous substructure of the human glomerular slit diaphragm. Kidney Int., 8:48-52, 1975. KAZATCHKINE, M.D.; FEARON, D.T.; APPAY, M.D.; MANDET, C.; BARIETY, J. Immunohistochemical study of the human glomerular C3b receptor in normal kidney and in 75 cases of renal diseases. J. Clin. Invest., 69:900-12, 1982. KERJASCHKI, D.; FARQUHAR, M.G. Immunocytochemical localization of the Heymann antigen (gp 330) in glomerular epithelial cells of normal Lewis rats. J. Exp. Med., 157:667-86, 1983. KERJASCHKI, D.; SHARKEY, D.J.; FARQUHAR, M.G. Identification and characterization podocalyxin — the major sialoprotein of renal glomerular epithelial cell. J. Cell Biol., 98:1591-6, 1984. KANVAR, Y.S.; FARQUHAR, M.G. Detachment of the endothelium and epithelium from the glomerular basement membrane produced by kidney perfusion with neuraminidase. Lab. Invest., 42:375-84, 1980. KURTZ, S.M.; FELDMAN, J.D. Experimental studies on the formation of the glomerular basement membrane. J. Ultrastr. Res., 6:19-27, 1962. GOMEZ, R.A.; PUPILLI, C.; EVERETT, A.D. Molecular aspects of renin during kidney ontogeny. Pediatr. Nephrol., 5:80-7, 1991. THURAU et al. Composition of tubular fluid in the macula densa segment as a factor regulating the function of the juxtaglomerular apparatus. Circ. Res., 20:suppl. 2:79, 1967. TOBIAN et al. Correlation between granulation of juxtaglomerular cells and extractable renin in rats with experimental hypertension. Proc. Soc. Exp. Biol. Med., 100:94, 1959.
56. 57. 58.
59.
60.
61.
62. 63. 64.
65.
66. 67.
68.
capítulo 1
19
69.
BERMAN, I. Color Atlas of Basic Histology, 2nd Edition, Appleton & Lange, 1998. KUMAR, V.; COTRAN, R.; ROBBINS, S. Basic Pathology, 6th Edition, W.B. Saunders Company, 1997. JUNQUEIRA, L.C.; CARNEIRO, J. Histologia Básica, 8-ª Edição, Guanabara Koogan, 1995.
BARAJAS, L. Renin secretion: an anatomical basis for tubular control. Science, 172:485, 1971. RHODIN, J.A.G. Structure of the kidney. In Disease of the Kidney, 2nd edition. Little, Brown and Co., 1971. ROCHA, A.S. and KOKKO, J.P. Sodium chloride and water transport in the medullary thick ascending limb of Henle: evidence for active chloride transport. J. Clin. Invest., 52:612, 1973. WOODHALL, P.B. and TISHER, C.C. Response of the distal tubule and cortical collecting duct to vasopressin in the rat. J. Clin. Invest., 47:203, 1968. MADSEN, K.M., BRENNER, B.M. Structure and function of the renal tubule and interstitium. In Tisher, C.C. & Brenner, B.M. Renal Pathology, 2nd edition. Philadelphia, J.B. Lippincott Company, pp. 661-98, 1994. BERGERON, M.; GUERETTE, D.; FORGET, J.; THIÉRY, G. Threedimentional characteristics of the mitochondria of the rat nephron. Kidney Int., 17:175-85, 1980. ALLEN, F.; TISHER, C.C. Morphology of the ascending thick limb of Henle. Kidney Int., 9:8-22, 1976. LEMLEY, K.V.; KRIZ, W. Anatomy of the renal interstitium. Kidney Int., 39:370-81, 1991. KAPPEL, B.; OLSEN, S. Cortical interstitial tissue and sclerosed glomeruli in the human kidney related to age and sex: A quantitative study. Virchows Arch.(A), 387:271-7, 1980. MUIRHEAD, E.E.; GERMAIN, G.S.; ARMSTRONG, F.B.; BROOKS, B.; LEACH, B.E.; BYERS, L.W.; PITCOCK, J.A.; BROWN, P. Endocrine-type antihypertensive function of renomedullary interstitial cells. Kidney Int., 8:S271-82, 1975. GURNER, A.C.; SMITH, J.; CATTEL, V. The origin of Ia antigenexpressing cells in the rat kidney. Am. J. Pathol., 127:169-75, 1984. ALEXPOULOS, E.; SERON, D.; HARTLEY, R.B.; CAMERON, J.S. Lupus nephritis: correlation of interstitial cells with glomerular function. Kidney Int., 37:100-9, 1990. BURKITT, H.G.; YUONG, B.; HELATH, J.W. Wheather’s Functional Histology, 3rd Edition, Churchill Livingston, 1993.
70. 71.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.nlm.nih.gov/medlineplus/aboutmedlineplus.html — site do MEDLINEplus, uma mina de ouro de informações na área da saúde da maior biblioteca médica do mundo, a National Library of Medicine. http://www.e-kidneys.net/ — site do ALtruis Biomedical Network, uma colecão de websites com foco na pesquisa médica e cuidado da saúde. http://www.mhhe.com/biosci/ap/saladin2e/student/ adam/aoa.mhtml — acesso a Anatomia e Fisiologia de Kenneth Saladin. http://www.gradesummit.com/studentinfo-q1.htm — um instrumento de auto-avaliacão e preparação para exames. Há uma seção de anatomia e fisiologia. http://www.abdn.ac.uk/~phy050/kidney.htm — é um programa tutorial desenvolvido com Asymetrix Toolbook e serve como uma introdução e revisão tutorial para estudantes de medicina do primeiro ano. Introduz o estudante na anatomia e histologia do rim e complementa as aulas.
Capítulo
2
Circulação Renal José Luiz Monteiro e Claudia Maria de Barros Helou
Método das microesferas marcadas com isótopos
INTRODUÇÃO ANATOMIA VASCULAR RENAL MEDIDAS DO FLUXO SANGUÍNEO RENAL Fluxo sanguíneo renal total Métodos de medida do fluxo sanguíneo renal
radioativos Fluxo sanguíneo medular Doppler REGULAÇÃO DA CIRCULAÇÃO RENAL
Método das microesferas radioativas
Inervação renal
Fluxômetro eletromagnético
Auto-regulação do fluxo sanguíneo renal
Técnicas de processamento de imagem DISTRIBUIÇÃO INTRA-RENAL DO FLUXO SANGUÍNEO Fluxo sanguíneo cortical Técnica dos gases inertes
Teoria miogênica Teoria do feedback túbulo-glomerular Regulação parácrina da microcirculação renal Mecanismos de ativação em resposta a estímulo BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
INTRODUÇÃO Os rins humanos pesam cerca de 300 g, representando aproximadamente 0,5% do peso corpóreo. Apesar deste baixo peso, recebem de 20 a 25% do débito cardíaco, correspondendo a 400 ml de fluxo por 100 g de tecido renal por minuto, 5 a 50 vezes maior que o de outros órgãos também importantes, coração, cérebro e fígado. Devido à sua baixa resistência vascular, associada à grande capacidade filtrante, possui, portanto, a maior taxa de perfusão entre todos os tecidos dos mamíferos. A circulação renal apresenta certas características interessantes: ocorre uma baixa diferença arteriovenosa de oxigênio, indicando que o alto fluxo sanguíneo é muito maior que sua necessidade metabólica. Por outro lado, em estado de choque circulatório sistêmico, uma freqüente complicação é a ocorrência de insuficiência renal aguda, muito mais comum que lesões no coração, cérebro e fígado. Outra peculiaridade do rim refere-se às diferentes po-
pulações de néfrons superficiais e profundos (justamedulares), tanto quanto ao fluxo sanguíneo como à taxa de filtração glomerular. Com os avanços recentes através de técnicas de microdissecção, conseguiu-se isolar heterogêneas arteríolas aferentes e eferentes, como será descrito adiante. As células endoteliais eram consideradas no passado como simples membranas semipermeáveis, que impediam a passagem principalmente de proteínas. Atualmente, atuam como verdadeiros órgãos, dotados de propriedades metabólicas autócrinas e parácrinas, isto é, com síntese de fatores vasomotores agindo nas próprias células ou nos tecidos adjacentes. Para que ocorra um verdadeiro equilíbrio na regulação da circulação renal, são evidenciados vasodilatadores representados pelo óxido nítrico, pelas prostaglandinas e pelo fator hiperpolarizante derivado do endotélio (EDHF) e os vasoconstritores, endotelina e tromboxane. Estes agonistas, uma vez liberados pelo endotélio, exercem a sua função na musculatura lisa das arteríolas renais.
capítulo 2
Pontos-chave: • Os rins são órgãos de baixa resistência vascular cujo fluxo sanguíneo corrigido por grama de tecido é o maior do organismo. • A circulação renal não é homogênea. • As células endoteliais sintetizam e/ou liberam agonistas que modulam a tonicidade da musculatura lisa das arteríolas renais.
ANATOMIA VASCULAR RENAL As artérias renais usualmente são únicas, dividindo-se junto ao hilo em um ramo anterior e outro posterior. O ramo anterior se divide em quatro artérias segmentares responsáveis pela irrigação de todo o pólo inferior, do ápice e dos segmentos superior e médio da face anterior renal. Os segmentos restantes são irrigados pelo ramo posterior. Não existem anastomoses entre estes ramos iniciais da artéria renal, subentendendo-se daí que a obstrução de qualquer deles levará à isquemia de todo o tecido para o qual o fluxo sanguíneo se distribui. Essas artérias segmentares dividem-se em várias outras que se dirigem até a junção córtico-medular, delimitando espaços denominados de lobos, e por isso elas recebem o nome de artérias interlobares. Na região córtico-medular, as artérias interlobares assumem forma encurvada, originando-se então as artérias ar-
21
queadas. A partir destas, formam-se as artérias radiais corticais, que se dirigem perpendicularmente ao córtex superficial, dividindo-o em lóbulos, e por isso eram antigamente denominadas de artérias interlobulares. Das artérias radiais corticais originam-se as arteríolas aferentes, cuja porção distal penetra na cápsula de Bowman ramificando-se em múltiplos capilares que convergem e formam as arteríolas eferentes (Fig. 2.1). Estas arteríolas são importantes na regulação da resistência vascular glomerular por apresentarem estruturas esfinctéricas modulando, então, a hemodinâmica renal e a filtração glomerular. Essa rede capilar formada no interior da cápsula de Bowman tem o endotélio envolvido por prolongamentos das células epiteliais da cápsula, os podócitos. Além das células endoteliais e epiteliais, há um terceiro tipo de células que são responsáveis pela matriz e denominadas de células mesangiais. As células mesangiais, além da importante participação no arcabouço glomerular, também desempenham papel na regulação da filtração glomerular devido à presença de elementos contráteis que induzem variações das áreas filtrantes. A esse conjunto de estruturas vasculares, epiteliais e mesangiais é dado o nome de glomérulo. Os diâmetros glomerulares são heterogêneos ao longo do córtex renal, sendo maiores os justamedulares em relação aos superficiais, correspondendo também a uma maior filtração por cada unidade funcional renal, o néfron. As arteríolas aferentes, que são os vasos pré-glomerulares, caracterizam-se por apresentarem parede espessa e regular devido à distribuição homogênea das fibras circulares de músculo liso independentemente de sua localiza-
Fig. 2.1 Fotomicrografia dos vasos do córtex renal humano, fixados com silicone. As flechas indicam as artérias radiais corticais (interlobulares), perpendiculares à superfície renal, e os glomérulos são visíveis como pequenos objetos arredondados. (Obtido de Brenner, B.M. et al. The renal circulations. In: Brenner, B.M. and Rector, F.C., Jr. (eds). The Kidney, 4th ed. W.B. Saunders Company, Philadelphia, 1991, p. 165.)
22
Circulação Renal
ção cortical. O citoplasma da célula muscular possui dois prolongamentos laterais simétricos que envolvem o tubo endotelial formando um anel de cada lado. É interessante salientar que, se de um lado a espiral formada é no sentido horário, no outro o sentido é anti-horário (Fig. 2.2). Dessa maneira, a contração da célula muscular induz redução do diâmetro luminal sem haver torção do vaso. Próximo ao glomérulo, dois tipos distintos de células compõem a parede das arteríolas aferentes: as células musculares lisas já descritas e as justaglomerulares, que se caracterizam por serem do tipo mioepitelial com a função de secretar renina. Estas células são mais abundantes nas arteríolas aferentes do córtex superficial em relação às do córtex justamedular. As arteríolas eferentes, por sua vez, são heterogêneas ao longo do córtex renal. Elas se caracterizam por apresentarem ramificações laterais que vão formar um plexo capilar para envolver o túbulo contornado proximal. Aliás, essa rede capilar não necessariamente envolve o túbulo de cujo glomérulo a arteríola eferente se originou. As arteríolas efe-
IV
III aferente
rentes são também responsáveis pela irrigação da medula renal, que é realizada por longas arteríolas, localizadas no córtex justamedular. Estas, ao penetrarem na medula externa, formam os vasa recta através de suas múltiplas divisões. Dessa maneira, as arteríolas eferentes desempenham importante função na reabsorção de água e eletrólitos, além de sua participação na filtração glomerular já referida anteriormente. De modo geral, as arteríolas eferentes são mais finas que as respectivas aferentes e apresentam parede irregular devido à distribuição descontínua de células de musculatura lisa. Aliás, a célula muscular das arteríolas eferentes tem forma totalmente irregular, não permitindo o envolvimento total da camada endotelial e deixando fenestrações. Essa descrição é válida para todas as arteríolas eferentes, exceto para o grupo de localização justamedular responsável pela formação dos vasa recta. Neste grupo observa-se que as arteríolas eferentes apresentam diâmetro igual ou até maior que sua respectiva aferente. A parede é regular e uniforme na microscopia óptica devido à camada contínua de mus-
III
eferente
aferente
I
IV eferente
I
A
IV
B
CÓRTEX MEDULA
aferente
aferente
IV
III eferente
IV
I
aferente
eferente
I
II
eferente III
IV
I
II II
C
D
E III
III
III
Tipos de células musculares I
IV
III IV
II
IV
IV
IV
Fig. 2.2 Esquema que demonstra a heterogeneidade morfológica das arteríolas eferentes. No córtex superficial encontram-se dois tipos de arteríolas eferentes, que podem ser denominadas de eferentes superficiais finas, cujas ramificações podem ocorrer próximo (A) ou longe do glomérulo (B). No córtex justamedular se observam três tipos de arteríolas eferentes: eferente justamedular fina (C), eferente justamedular espessa muscular (D), responsável pela formação dos vasa recta, e eferente justamedular intermediária (E). A heterogeneidade morfológica das arteríolas eferentes é devida aos diferentes tipos de célula muscular lisa que compõem a túnica média dos microvasos renais. Enquanto as arteríolas aferentes se caracterizam por apresentar parede muscular espessa à custa da distribuição homogênea de células que possuem citoplasma largo e prolongamentos laterais (I) que envolvem o tubo endotelial, as arteríolas eferentes apresentam parede constituída por células musculares cujo citoplasma é totalmente irregular (II), resultando em ocasionais junções entre as células. As arteríolas eferentes finas, como também as porções distais das arteríolas eferentes espessas musculares, são formadas por células de morfologia mais irregular e são denominadas de pericitos (III). Estes podem ser também do tipo delgado (IV), sendo observados principalmente nas ramificações e na formação dos capilares peritubulares.
capítulo 2
culatura lisa e é somente pela presença de ramificações que se permite distingui-las das aferentes. Entretanto, na microscopia eletrônica também se observam fenestrações na parede muscular, uma vez que a irregularidade dos prolongamentos laterais dessas células não permite a formação de um anel contínuo muscular sobre o tubo endotelial (Fig. 2.2). No córtex superficial as arteríolas eferentes são sempre finas (16 a 18 µm de diâmetro no rim do rato) e de parede irregular. Entretanto, elas podem mostrar padrão heterogêneo quanto ao local da ramificação. Algumas se ramificam bem próximas ao glomérulo e em outras as ramificações só ocorrerão a partir de 100 a 200 m. Ao local onde ocorrem as ramificações é dado o nome de “welling point”, ou “vaso estrelado”, como preferiam os micropuncionadores. No córtex intermediário, as arteríolas eferentes também
23
são finas e de parede irregular, mas elas são extremamente curtas devido às múltiplas ramificações para formar o plexo capilar que envolve o túbulo contornado proximal. Esta rede vascular é tão complexa que impede distinguir o caminho individual de um capilar. No córtex profundo ou justamedular, também se observam arteríolas eferentes finas com parede irregular e ramificações laterais situadas longe do glomérulo e portanto
Pontos-chave: • As artérias renais são únicas e se dividem sucessivamente até a formação do glomérulo (a. renal 씮 a. segmentar 씮 a. interlobar 씮 a. arqueada 씮 a. radial cortical 씮 arteríola aferente) • Devido à ausência de anastomoses entre as múltiplas divisões da artéria renal, a obstrução de uma dessas divisões ocasiona isquemia parcial do órgão • As arteríolas aferentes apresentam o mesmo padrão morfológico por todo o córtex renal • As arteríolas eferentes apresentam heterogeneidade morfológica e caracterizam-se pela presença de ramificações laterais que formam os plexos capilares que envolvem os túbulos. No córtex justamedular, as a. eferentes espessas musculares penetram na medula e formam os vasa recta através de múltiplas divisões longitudinais • As arteríolas eferentes participam do controle da filtração glomerular, da irrigação medular e da reabsorção de água e eletrólitos através da formação dos plexos capilares e dos vasa recta • O sangue retorna à circulação através dos vasa recta ascendentes, de anastomoses venosas entre os capilares peritubulares e as veias na região cortical que drena para v. interlobulares 씮 v. interlobares 씮 v. renal 씮 v. cava inferior
Fig. 2.3 Representação esquemática da organização microvascular e tubular do rim de cão. Notam-se três tipos de néfrons com seus glomérulos situados no córtex externo, médio e interno. À direita, há a divisão do córtex (C), medula externa (OM) e medula interna (IM). À esquerda, notam-se o glomérulo (G), arteríolas aferentes (AA) e os vasos eferentes (EV), dos quais formam-se os capilares peritubulares. Na superfície renal, os túbulos contornados proximais (PCT) são vistos ao lado de densa rede capilar peritubular (retângulo 1). No córtex médio e interno, os túbulos proximais localizam-se ao lado de artérias interlobulares e rede capilar adjacentes (retângulos 2 e 4). Vêem-se também ductos coletores (CD), entre vasos interlobulares e alças de Henle. Os capilares peritubulares desta região, derivados de arteríolas eferentes do córtex médio, orientam-se paralelamente às estruturas tubulares do raio medular (retângulo 3). No córtex interno ou justamedular, os glomérulos têm arteríolas eferentes que se dirigem para baixo, dividindo-se para formar uma extensa rede vascular da medula externa. Em direção à medular interna, há a formação dos vasa recta, ao lado de alças de Henle e ductos coletores. (Obtido de Beeuwkes, R. e Bonventre, J.V. Tubular organization and vascular tubular relations in the dog kidney. Am. J. Physiol., 229:695, 1975.)
24
Circulação Renal
com aspecto morfológico semelhante ao daquelas do córtex superficial. Como já foi referido em parágrafos anteriores, nesta região se localizam as arteríolas eferentes espessas musculares (diâmetro de 23,0 1,5 m em ratos) que se dirigem à medula para formar os vasa recta. Além disso, nesta região também se reconhece um outro tipo de arteríola eferente de diâmetro (19,3 0,5 m) e morfologia intermediários entre as eferentes finas e as espessas musculares. Do plexo capilar oriundo dos vasa recta descendentes formam-se a circulação venosa e os vasa recta ascendentes. Esses capilares, além de suprirem as necessidades metabólicas locais, são também responsáveis pela captação e remoção de água extraída dos ductos coletores durante o processo de formação da urina. Para manter a tonicidade do interstício, o fluxo sanguíneo medular desempenha importante função na formação de gradiente de solutos. A representação esquemática desta microcirculação é mostrada na Fig. 2.3. Anastomoses venosas entre capilares peritubulares e veias são encontradas na região cortical. A circulação venosa inicia-se então através das veias corticais superficiais que formam as veias interlobulares. Estas, na região córticomedular, originam as veias arqueadas, saindo destas as veias interlobares, que vão formar finalmente a veia renal principal, saindo do hilo renal em direção à veia cava inferior.
MEDIDAS DO FLUXO SANGUÍNEO RENAL Fluxo Sanguíneo Renal Total Como foi dito anteriormente, o fluxo sanguíneo renal corresponde a 1/4 do débito cardíaco, ou seja, em torno de 1.200 ml/min no homem adulto. É um pouco maior no sexo masculino, e em crianças de até um ano de idade corresponde à metade dos valores do adulto, índice que alcança ao redor dos três anos de vida. A partir da terceira década começa a decrescer, chegando à metade dos valores normais aos 80 anos. Baseado no peso renal, o fluxo sanguíneo renal total é aproximadamente de 4 ml/min/g de tecido. O fluxo cortical é cerca de duas vezes e meia maior em relação ao medular.
FPR
Ux Vu Ax 2 Vx
(2)
Esta remoção da substância do sangue arterial renal é designada de extração renal do referido indicador. O mais utilizado é o ácido paraminoipúrico (PAH), o qual é ativamente secretado pelos túbulos proximais. Sua extração é cerca de 0,7 a 0,9 em humanos. Com infusão constante exógena do PAH, em clínica assume-se este valor igual a 1 e, nestas condições, a equação (2) representaria o clearance de PAH. É importante salientar que este método somente é válido quando a substância é administrada continuamente, mantido um bom fluxo urinário, e a mesma não seja sintetizada nem metabolizada pelos rins. O fluxo sanguíneo renal (FSR) pode ser calculado através da correção pelo hematócrito (Ht): FSR FPR/1 Ht
MÉTODO DAS MICROESFERAS RADIOATIVAS É utilizado especificamente para condições experimentais. Microesferas são partículas plásticas de dimensões uniformes de 15 5 m de diâmetro, com propriedades químicas inertes e densidade específica muito próxima à do sangue. Possuem a vantagem de poderem ser marcadas com isótopos radioativos e ser extraídas pelo leito capilar de um órgão, distribuindo-se de acordo com o fluxo sanguíneo do mesmo. No rim, são captadas pelas arteríolas ou capilares glomerulares, sem alterar a hemodinâmica local. Quando injetadas no ventrículo esquerdo ou aorta, distribuem-se homogeneamente por toda a circulação. A quantidade de microesferas que atinge o rim, ou seja, a medida da radioatividade renal total (Qt), é proporcional ao fluxo sanguíneo renal total (FSR), assim como a radioatividade por minuto de amostra de sangue coletada por aspiração na artéria femoral durante a administração das microesferas (qt) é proporcional ao fluxo sanguíneo (ml/ min) na artéria femoral (Ff) coletado por bomba de aspiração contínua. Assim: FSR Qt Ff/qt
Métodos de Medida do Fluxo Sanguíneo Renal
FLUXÔMETRO ELETROMAGNÉTICO
O método mais utilizado em clínica baseia-se na aplicação do princípio de Fick. Se uma substância não é sintetizada nem metabolizada dentro do rim, a sua passagem pelo órgão e posterior aparecimento na urina poderá ser calculada através da equação: Ux Vu (Ax Vx) FPR
onde Ux concentração do indicador x na urina; Vu fluxo urinário; Ax e Vx concentração do indicador na artéria e veia renal, respectivamente; e FPR fluxo plasmático renal. Portanto:
(1)
Para medidas diretas do fluxo sanguíneo renal total, este método oferece a vantagem de monitorização contínua da taxa de perfusão do rim. Baseia-se na implantação de eletrodos circulares ao redor da artéria renal, sendo captadas ondas magnéticas oriundas do volume líquido em movimento nas mesmas, registrando-se os valores em velocidade do fluxo sanguíneo renal. Pode ser utilizado em condi-
25
capítulo 2
ções experimentais e mesmo no homem, quando em cirurgias com acesso às artérias renais.
TÉCNICAS DE PROCESSAMENTO DE IMAGEM Baseiam-se no método de processamento eletrônico da imagem microscópica capilar, com a determinação da velocidade do eritrócito e o tempo necessário para percorrer uma distância conhecida. Medidas simultâneas do diâmetro do vaso e o hematócrito determinam o fluxo sanguíneo neste vaso. Através de filmagem de vídeo, as imagens podem ser transferidas para um sistema com avaliação em maior grau do fluxo arterial e, por conseguinte, o fluxo sanguíneo renal. A região medular é mais bem examinada por este método. A principal crítica a esta técnica refere-se à distribuição preferencialmente axial das hemácias, ocorrendo, portanto, superestimação do fluxo sanguíneo capilar.
Pontos-chave: • Diversos métodos vêm sendo utilizados para medida do fluxo sanguíneo renal total em pesquisa clínica e/ou experimental • O método do clearance de PAH permite estimar o fluxo sanguíneo renal total em humanos
DISTRIBUIÇÃO INTRA-RENAL DO FLUXO SANGUÍNEO Fluxo Sanguíneo Cortical A distribuição intra-renal do fluxo sanguíneo e a função renal parecem não se correlacionar com os métodos de estudo até o momento realizados. Exemplo neste sentido são os resultados, principalmente após trauma e hemorragia, com as diferentes taxas de perfusão nas regiões internas do rim. Como foi dito anteriormente, existem heterogêneas populações de néfrons, não só quanto à sua anatomia microvascular, como também quanto à função e à taxa de perfusão de cada uma.
TÉCNICA DOS GASES INERTES Baseia-se na administração endovenosa ou diretamente em artéria renal de um marcador (criptônio ou xenônio) com captação externa em região lombar com detector cintilográfico da passagem pelo rim deste marcador. Tenta correlacionar os vários componentes de uma curva multiexponencial, obtida com o detector, com as diversas regiões córtico-medulares, baseado em comparações autoradiográficas. São descritos quatro componentes: cortical, medular externo, medular interno e perirrenal e gordura
hilar. Devido a várias dificuldades técnicas relacionadas a este método, como distribuição do gás no tecido renal e o fato de a medida do fluxo ser dada por volume, praticamente não está mais sendo utilizado.
MÉTODO DAS MICROESFERAS MARCADAS COM ISÓTOPOS RADIOATIVOS É o método mais utilizado experimentalmente. As microesferas marcadas com isótopos são injetadas diretamente no ventrículo esquerdo ou aorta, distribuindo-se para todos os órgãos de forma homogênea, sendo proporcional ao fluxo sanguíneo de cada um. No rim ficam impactadas nas arteríolas ou capilares glomerulares. A medida do fluxo sanguíneo para diferentes regiões do rim pode ser determinada através de cortes paralelos, no sentido horizontal da superfície para o córtex mais interno. Com a retirada de um fragmento do córtex, seccionando-se três fatias paralelas, da superfície externa para a interna, de igual espessura, designamos, respectivamente, zona 1 o córtex externo, zona 2 o córtex médio e zona 3 o córtex interno. Determinando-se a radioatividade e o peso de cada zona, a porcentagem de fluxo sanguíneo de cada zona (Pz) é calculada pela fórmula: Pz qz/qt onde qz é a radioatividade (contagens) por minuto por grama de uma determinada zona do córtex renal e qt é a radioatividade das três zonas (qz1 qz2 qz3). As críticas a este método relacionam-se, na distribuição axial das microesferas, à semelhança das hemácias. Desta maneira, em vasos menores, tipo artéria interlobular, sua concentração mediana poderia estar superestimando o fluxo sanguíneo cortical superficial, local de maior população destas artérias e das arteríolas aferentes.
Fluxo Sanguíneo Medular A circulação medular provém das arteríolas pós-glomerulares dos néfrons justamedulares. O fluxo medular, mesmo sendo menor que o cortical, assemelha-se ao de outros órgãos. Característica importante é a baixa pressão parcial de oxigênio nesta região, em torno de 10 a 20 mmHg, ao contrário da cortical, cerca de 50 mmHg. Esta hipóxia medular é considerada como tendo papel fisiológico para que ocorra uma eficiente concentração urinária. Se o fluxo sanguíneo for excessivo, rompe o gradiente osmolar do interstício, alterando o mecanismo de contracorrente multiplicador. Se for baixo, ocorre lesão isquêmica das células tubulares. Pré-requisito crítico para que a urina se concentre devidamente é uma exata perfusão de oxigênio e a demanda, através de um preciso equilíbrio entre a regulação do fluxo sanguíneo medular e o trabalho tubular. As técnicas de medida do fluxo sanguíneo medular ne-
26
Circulação Renal
cessitam de estudos em conjunto, ou seja, avaliação do fluxo dos néfrons justamedulares combinados com estudos anatômicos detalhados da região medular. Os mais utilizados são os realizados através de indicadores não-difusíveis, tais como albumina marcada com 131I, eritrócitos marcados com 32P e rubídio radioativo.
DOPPLER O princípio do Doppler é utilizado na transmissão do som do sangue fluindo através dos vasos numa freqüência que é captada por um transdutor. As imagens detectadas quantificam o fluxo sanguíneo correspondente ao vaso específico, indicando também a direção do respectivo fluxo. A maior importância deste método aplica-se nos estudos de anastomoses de vasos em transplante renal, tanto artérias como veias, identificando-se possíveis estenoses ou oclusões.
Pontos-chave: • A distribuição do fluxo sanguíneo é heterogênea no rim, sendo que 80% deste fluxo destina-se à região cortical • A medula renal apresenta baixa pressão parcial de oxigênio
REGULAÇÃO DA CIRCULAÇÃO RENAL Os vasos renais possuem musculatura lisa em várias camadas, porém a partir das arteríolas aferentes elas se restringem a uma única camada. A vasoconstrição ou dilatação arteriolar manifesta-se dependendo de fatores físicos intra-renais, humorais e neurogênicos agindo na arteríola aferente e/ou eferente. Este aumento ou diminuição da resistência vascular altera tanto a filtração glomerular como o fluxo sanguíneo renal, desde que a pressão de perfusão não se altere. A Fig. 2.4 ilustra as várias mudanças que ocorrem no fluxo sanguíneo e na filtração glomerular quando a resistência é alterada.
Inervação Renal No rim são encontradas terminações nervosas simpáticas ao longo das arteríolas aferentes e eferentes até o complexo justaglomerular. Através de microscopia eletrônica, revelou-se a presença de vesículas granulares em nervos renais, que são típicas de fibras adrenérgicas, e vesiculares agranulares, provavelmente de natureza colinérgica. Entre os túbulos renais, existem também ocasionalmente nervos, que podem influenciar os processos de reabsorção tubular.
À estimulação do nervo renal, ocorre imediatamente contração da musculatura lisa dos vasos, com conseqüente queda do fluxo sanguíneo. Este efeito pode ser minimizado com pequenas doses de noradrenalina e totalmente abolido com agentes bloqueadores alfa-adrenérgicos. São encontrados também receptores beta-adrenérgicos e dopaminérgicos. O efeito da estimulação do nervo renal sobre a microcirculação renal mostra um aumento na resistência arteriolar aferente e eferente, com grande redução do fluxo sanguíneo glomerular, com semelhantes alterações no coeficiente de ultrafiltração do capilar glomerular e vasos peritubulares.
Auto-Regulação do Fluxo Sanguíneo Renal A maioria dos órgãos são capazes de manter o seu fluxo sanguíneo quando ocorrem alterações da pressão de perfusão. O fenômeno da auto-regulação no rim é demonstrado com variações da pressão arterial entre 80 e 180 mmHg. Um aumento da pressão de perfusão é acompanhado por um equivalente aumento da resistência vascular, tornando-se inalterado o fluxo sanguíneo renal total. A auto-regulação persiste mesmo após denervação renal, em rim isolado e perfundido in vitro com plasma e após retirada da medula adrenal (que previne a produção de catecolaminas). Portanto, auto-regulação é um fenômeno intrínseco que ocorre dentro do rim e só não está presente
RESISTÊNCIA NAS ARTERÍOLAS
FSR
TFG
CONTROLE Af
Ef
REDUÇÃO NA AFERENTE
AUMENTO NA AFERENTE
REDUÇÃO NA EFERENTE
AUMENTO NA EFERENTE
Fig. 2.4 Efeito das alterações da resistência das arteríolas aferente e eferente sobre o fluxo sanguíneo renal (FSR) e filtração glomerular (TFG), mantendo-se constante a pressão de perfusão.
27
capítulo 2
quando existem grandes alterações da pressão de perfusão arterial. É importante salientar que a auto-regulação também se aplica à taxa de filtração glomerular, de tal maneira que no caso de alterações mais profundas da pressão de perfusão, por exemplo quando da administração do vasodilatador papaverina, ocorre abolição do efeito da auto-regulação tanto do fluxo como da filtração. As teorias envolvidas, muito provavelmente em combinação, no processo da auto-regulação são: miogênica e feedback túbulo-glomerular.
TEORIA MIOGÊNICA Segundo esta teoria, a musculatura lisa arterial contraise e relaxa-se em resposta a um aumento ou redução da tensão na parede vascular, respectivamente. Perante uma elevação abrupta da pressão de perfusão, há um aumento do raio do vaso. Entretanto, quase imediatamente, a musculatura lisa se contrai, permitindo que o fluxo sanguíneo se mantenha constante. O contrário existe quando há uma queda da pressão de perfusão. Crê-se atualmente que o mediador deste processo de relaxamento e constrição vascular seja a entrada de cálcio nas células musculares lisas dos vasos. Nas situações de aumento de pressão intravascular, o estímulo mecânico exercido na parede do vaso deflagra a despolarização da membrana da célula muscular lisa. Os canais de cálcio operados por voltagem (VOCC) se abrem, permitindo a entrada de cálcio do extracelular para o intracelular. A elevação deste íon no citosol deflagra a fosforilação das pontes de miosina, resultando na contração da célula muscular. O mecanismo miogênico baseia-se na lei de Laplace, pela equação: T R/(Pi Pe) onde T é a tensão na parede do vaso, R é o seu raio interno, Pi é a pressão hidrostática intravascular e Pe é a pressão hidrostática extravascular. O gradiente de pressão transmural (Pi Pe) reduzindo-se, diminuiria a tensão na parede e a resistência vascular. Quando a pressão de perfusão renal cai, reduz-se também a pressão transmural e a tensão na parede do vaso, e a resistência na arteríola aferente diminui igualmente para manter relativamente constante o fluxo sanguíneo renal. Convém também lembrar que a regulação miogênica só ocorre nos vasos pré-glomerulares, ou seja, ao nível da artéria interlobular e principalmente da arteríola aferente.
Teoria do Feedback Túbulo-Glomerular O mecanismo túbulo-glomerular na auto-regulação do fluxo sanguíneo renal envolve também a taxa de filtração glomerular. Sugere-se que, quando ocorre uma elevação da pressão arterial, há um aumento do fluxo sanguíneo
renal e da pressão hidráulica do capilar glomerular. Estas alterações causam um aumento na taxa de filtração glomerular, elevando-se o fluxo de fluido ao túbulo distal. O aumento de oferta de fluido a este segmento sensibilizaria a mácula densa, que ativaria mecanismos efetores, aumentando a resistência pré-glomerular, reduzindo o fluxo sanguíneo renal, a pressão glomerular e, por conseguinte, a taxa de filtração glomerular. O principal soluto envolvido nesta resposta da mácula densa alterando o tônus da musculatura lisa das arteríolas aferentes talvez seja o cloreto de sódio. Algumas evidências experimentais foram demonstradas, principalmente após perfusão intratubular em velocidades crescentes de NaCl. Entretanto, o verdadeiro mecanismo efetor não está esclarecido, podendo ser através da ativação do sistema renina-angiotensina, da adenosina, do ATP ou de algum prostanóide não-ciclooxigenase. Convém salientar que tanto a resposta miogênica como o feedback túbulo-glomerular são indispensáveis para que ocorra a auto-regulação renal. Estes dois mecanismos não são apenas aditivos, pois existe uma interação complexa para que a auto-regulação ocorra em sua eficiência máxima.
Regulação Parácrina da Microcirculação Renal Além da ação dos hormônios circulantes, a microcirculação renal pode ser controlada néfron a néfron através de agonistas liberados pelo endotélio, pelo epitélio ou pelo interstício. Esta regulação local recebe o nome de regulação parácrina. Entre os vários sistemas que exercem esta função, podemos citar: 1) sistema renina-angiotensina intra-renal, 2) mediadores purinérgicos, 3) metabólitos do ácido araquidônico, 4) agonistas liberados ou sintetizados pelo endotélio (endotelina, óxido nítrico, fator hiperpolarizante derivado do endotélio). Atualmente, reconhecem-se dois sistemas renina-angiotensina, que podem ser denominados como circulante e intra-renal. No primeiro, a síntese de angiotensina II é realizada pela ação integrada do rim, fígado e endotélio pulmonar. No segundo, a angiotensina II é formada localmente no rim. Em ambas as situações a angiotensina II exerce ação de constricção dos vasos pré- e pós-glomerulares. Há indícios de que esta ação seja preferencial nas arteríolas aferentes em relação às eferentes no córtex superficial. Por outro lado, estudos vêm demonstrando ação semelhante entre as arteríolas aferentes e eferentes no córtex justamedular. Assim, a regulação da microcirculação renal feita pela angiotensina II não é homogênea, como se pensou durante tantos anos. E o conhecimento da regulação parácrina permite compreender melhor a heterogeneidade que existe na microcirculação renal. Os compostos purinérgicos, em especial o ATP, vêm sendo citados como importantes reguladores parácrinos.
28
Circulação Renal
A ação do ATP ou da adenosina seria através da ativação dos receptores P2 presentes apenas nas arteríolas aferentes induzindo a vasoconstrição. A hipótese aventada é de que grandes quantidades de ATP seriam liberadas pela mácula densa em resposta a um aumento do aporte de NaCl aos segmentos distais do néfron. Assim, o ATP seria o mediador parácrino do feedback túbulo-glomerular. Um dos argumentos para esta hipótese é devido ao fato de as células da mácula densa serem ricas em mitocôndrias e de a atividade da Na-K-ATPase ser baixa em relação à quantidade de ATP que é gerada nestas células. Importante ação parácrina é exercida pelos metabólitos do ácido araquidônico que são também conhecidos como eicosanóides. Estes metabólitos apresentam importante ação reguladora principalmente ao nível da arteríola aferente mediando tanto a vasoconstrição quanto a vasodilatação. Atualmente são reconhecidas três vias enzimáticas: a da ciclooxigenase (COX), a da lipooxigenase e a do citocromo P-450 (CYP450). Os eicosanóides podem ser originários das células endoteliais, epiteliais ou intersticiais. Entre os mediadores da vasoconstrição podemos citar o tromboxane, os leucotrienes e os ácidos hidroxieicosatetraenóicos (HETEs). Na vasodilatação geralmente são descritas as ações das prostaglandinas PGE2 e PGI2, como também as dos ácidos epoxieicotrienóicos (11,12-EET). E por fim, outro importante sistema na regulação parácrina é representado pelos agonistas e/ou metabólitos que são gerados ou liberados pelo endotélio. Na vasoconstrição, as endotelinas exercem importante ação tanto nas arteríolas aferentes quanto nas eferentes. Na vasodilatação, o óxido nítrico, a bradicinina e o fator hiperpolarizante derivado do endotélio (EDHF) são os mediadores. A ação do óxido nítrico é evidente nas arteríolas aferentes mas discutível nas eferentes. Provavelmente, o não-reconhecimento de que grupo morfológico a arteríola eferente estudada pertença seja responsável pelos resultados contraditórios. Assim, o óxido nítrico exerce possivelmente ação vasodilatadora nas arteríolas eferentes que formam os vasa recta e não tem ação nos outros grupos morfológicos. Mais uma vez, o conhecimento da regulação parácrina permite compreender melhor a heterogeneidade que existe na microcirculação renal.
Mecanismos de Ativação em Resposta a Estímulo Além da já mencionada heterogeneidade morfológica existente entre as arteríolas glomerulares, a microcirculação renal é dotada de distintos mecanismos de ativação em resposta a estímulo mecânico ou induzido por agonistas. Assim, no córtex superficial, canais de cálcio operados por voltagem (VOCC) participam dos mecanismos para a resposta vascular apenas nas arteríolas aferentes. Então, o aumento do cálcio citosólico ([Ca2]i) ocorre principalmen-
te pela abertura dos VOCC presentes na membrana da musculatura lisa. Entretanto, outros mecanismos como a liberação do cálcio estocado nas organelas também contribuem para elevação da [Ca2]i. As arteríolas eferentes do córtex superficial não possuem VOCC e a sinalização via cálcio é feita preferencialmente por outros mecanismos de entrada deste cátion do extracelular para o intracelular, como também pela liberação deste íon estocado nas organelas citoplasmáticas. No córtex justamedular, os canais de cálcio operados por voltagem estão presentes tanto nas arteríolas aferentes como também nas arteríolas eferentes espessas musculares que são responsáveis pela formação dos vasa recta. Então, a regulação da microcirculação renal deve ser heterogênea, ou seja, os fatores que influenciam o córtex superficial não necessariamente influenciam a região medular e vice-versa.
Pontos-chave: • A circulação renal é regulada pelas terminações simpáticas presentes nas arteríolas glomerulares e pela ação de agonistas circulantes ou sintetizados localmente pelo endotélio, pelo epitélio ou pelo interstício (regulação parácrina) • O rim possui um sistema de auto-regulação de fluxo sanguíneo a fim de que este permaneça constante independente da variação da pressão arterial. A autoregulação renal ocorre quando a pressão arterial está entre 80 e 180 mmHg • A resposta miogênica exercida pelos vasos pré-glomerulares e o feedback túbuloglomerular são os fatores determinantes para que ocorra a auto-regulação do fluxo sanguíneo renal • A microcirculação renal pode ser regulada localmente, néfron a néfron, através de agonistas parácrinos: a) sistema reninaangiotensina, b) mediadores purinérgicos, c) metabólitos do ácido araquidônico, d) agonistas liberados ou sintetizados pelo endotélio (endotelina, óxido nítrico, fator hiperpolarizante derivado do endotélio)
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ARENDSHORST, W.J. and NAVAR, L.G. Renal Circulation and Glomerular Hemodynamics. In: Schrier, R.W. and Gottschalck C.W. (eds). Diseases of the Kidney, 6th ed. Little, Brown and Company, pp. 59-106, 1996. BREZIS, M. and ROSEN, S. Hypoxia of the renal medulla — Its implications for disease. The New England Journal of Medicine, 332:647-655, 1995.
capítulo 2
DWORKIN, L.D., SUN A.M. and BRENNER, B.M. The renal circulations. In: Brenner, B.M. and Rector, F.C., Jr. (eds). The Kidney, 6th ed. W.B. Saunders Company, Philadelphia, pp. 277-318, 2000. EVAN, A.P. and DAIL, W.G., Jr. Efferent arterioles in the cortex of the rat kidney. Anat. Rec., 187:135-145, 1977. GATTONE II, V.H.; LUFT, F.C. and EVAN, A.P. Renal afferent and efferent arterioles of the rabbit. American Journal of Physiology, 247:F219F228, 1984.
29
NAVAR, LG. Integrating multiple paracrine regulators of renal microvascular dynamics. American Journal of Physiology, 274:F433-F444, 1998. VALTIN, H. and SCHAFER, J.A. Renal hemodynamics and oxygen consumption. In: Valtin, H. and Schaffer, J.A. (eds). Renal Function, 3rd ed. Little, Brown and Company, pp. 95-114, 1995.
Capítulo
3
Filtração Glomerular Antonio Carlos Seguro e Luis Yu
DETERMINANTES DA FILTRAÇÃO GLOMERULAR
HIPERFILTRAÇÃO GLOMERULAR
FILTRAÇÃO GLOMERULAR POR NEFRO
MEDIDA DA FILTRACÃO GLOMERULAR
REGULAÇÃO HORMONAL DA FILTRAÇÃO GLOMERULAR
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
PERMEABILIDADE SELETIVA GLOMERULAR
ENDEREÇO RELEVANTE NA INTERNET
Os rins recebem normalmente 20% do débito cardíaco, o que representa um fluxo sanguíneo de 1.000 a 1.200 ml/ min para um homem de 70-75 kg. Este alto fluxo é ainda mais significativo se considerado pelo peso dos rins, cerca de 300 gramas. Assim, o fluxo sanguíneo por grama de rim é de cerca de 4 ml/min, um fluxo 5 a 50 vezes maior que em outros órgãos. Este sangue que atinge o rim passa inicialmente pelos glomérulos, onde cerca de 20% do plasma é filtrado, totalizando uma taxa de filtração glomerular de 120 ml/min ou 170 litros/dia. Os estudos de micropunção mostraram que o líquido filtrado tem composição iônica e de substâncias cristalóides (glicose, aminoácidos etc.) idêntica ao plasma, porém sem a presença de elementos figurados do sangue (hemácias, leucócitos, plaquetas) e com quantidades mínimas de proteínas e macromoléculas, constituindo-se, portanto, em um ultrafiltrado do plasma.
onde K é o coeficiente de permeabilidade hidráulica do capilar glomerular; P é a diferença entre a pressão hidrostática do capilar glomerular (Pcg) e a pressão hidrostática do fluido da cápsula de Bowman, que é igual à pressão intratubular (PT); é a diferença entre a pressão oncótica do capilar glomerular (cg), que é uma força que se opõe à ultrafiltração, e a pressão oncótica do fluido da cápsula de Bowman, esta última igual a zero, uma vez que este fluido é um ultrafiltrado, portanto, isento de proteínas. Assim, a equação pode ser estendida para:
DETERMINANTES DA FILTRAÇÃO GLOMERULAR A passagem de água e moléculas através do capilar glomerular é governada pelas mesmas forças que atuam em qualquer outro capilar do organismo. Tomando-se um determinado ponto do capilar glomerular, o ritmo de ultrafiltração (Jv) neste local é dado pela equação: Jv K (P )
Jv K (Pcg PT cg), onde Pcg PT cg é igual à pressão de ultrafiltração (Puf). Com a descoberta de uma raça mutante de ratos Wistar (ratos Wistar de Munique), que apresentam glomérulos na superfície renal, portanto, acessíveis à micropunção, foi possível fazer medidas diretas da pressão capilar glomerular e estimar todos os determinantes da ultrafiltração. Desta forma, a pressão capilar glomerular, em condições de hidropenia, tem um valor de 45 mmHg e se mantém praticamente constante ao longo do capilar glomerular. A pressão intratubular é em torno de 10 mmHg. A pressão oncótica no início do capilar glomerular é de 20 mmHg, sendo igual à pressão oncótica da artéria renal. À medida que vai havendo saída de água ao longo do capilar glomerular, aumenta a concentração de proteína intracapilar, traduzindo-se por uma pressão oncótica mais elevada (Fig. 3.1). A determinação direta da pressão oncóti-
31
capítulo 3
intermediário do capilar glomerular. A Fig. 3.2 mostra duas das infinitas possibilidades de valores da Puf na condição de equilíbrio.
Pontos-chave: • A pressão capilar glomerular é uma força que favorece a filtração glomerular • A pressão intratubular e a pressão oncótica do capilar glomerular são forças que se opõem à filtração • A filtração glomerular depende da permeabilidade do capilar glomerular
Fig. 3.1 Determinantes da pressão de ultrafiltração. Representação esquemática de um capilar glomerular. Pcg é a pressão hidrostática do capilar glomerular, constante ao longo de toda sua extensão. Pt é a pressão intratubular e cg é a pressão oncótica das proteínas do capilar glomerular, que aumenta progressivamente ao longo do capilar, à medida que a água vai sendo filtrada, concentrando-se as proteínas.
ca do capilar glomerular ao nível da arteríola eferente, através de ultramicrométodo, revela uma pressão em torno de 35 mmHg. A pressão de ultrafiltração pode, então, ser calculada em dois pontos: Puf no início do capilar glomerular 45 mmHg 10 mmHg 20 mmHg 15 mmHg. Puf no fim do capilar glomerular 45 mmHg 10 mmHg 35 mmHg 0 mmHg. A esta condição observada em ratos e macacos, em que a pressão de ultrafiltração chega a zero no fim do capilar glomerular, chama-se de equilíbrio de pressão de filtração. A pressão de filtração, nesta condição de equilíbrio, não pode ser calculada, pois poderia ser 0 em qualquer ponto
FILTRAÇÃO GLOMERULAR POR NEFRO Considerando-se a filtração glomerular de um único glomérulo (RFGn), pode-se escrever: RFGn Kf Puf onde Kf, o coeficiente de permeabilidade glomerular, é igual ao produto de k e S, sendo k o coeficiente de permeabilidade hidráulica do capilar glomerular, anteriormente descrito, e S é a área, ou superfície filtrante de todo o glomérulo. Vários estudos mostraram que a filtração glomerular por nefro nos ratos Wistar é altamente dependente do fluxo plasmático glomerular, isto é, o aumento do fluxo plasmático glomerular leva ao aumento da filtração glomerular por aumento da pressão de ultrafiltração, deslocando o ponto de equilíbrio para mais próximo do fim do capilar glomerular, como, por exemplo, na Fig. 3.2, levando da condição A para a condição B. Através de infusões endovenosas isoncóticas de plasma em ratos, pode-se aumentar o fluxo plasmático glomerular a níveis três vezes maiores que o normal, até um ponto em que a pressão oncótica não se iguala à pressão hidros-
Fig. 3.2 Equilíbrio da pressão de filtração. Em abscissa está representada a distância do capilar glomerular. Zero corresponde ao início do capilar, e 1, ao fim. Em ordenadas, os valores de pressão em mmHg. A diferença de pressão hidrostática (∆p) é praticamente constante ao longo do capilar. A diferença de pressão oncótica (∆π) aumenta progressivamente. A pressão de ultrafiltração (Puf) é representada pela área entre as duas curvas. Os gráficos A e B representam duas das infinitas possibilidades de valores de Puf em condição de equilíbrio de filtração. Em ambas (A e B), se iguala a P antes do fim do capilar glomerular.
32
Filtração Glomerular
Fig. 3.3 Desequilíbrio da pressão de filtração. Nesta condição, como vemos, não se iguala a ∆P no fim do capilar glomerular, podendo-se calcular um único valor da pressão de ultrafiltração (Puf), correspondente à área entre as duas curvas.
tática no fim do capilar glomerular, como pode ser visto na Fig. 3.3. Nesta condição, denominada de desequilíbrio de pressão de filtração, induzida no rato, porém encontrada normalmente no cão, pode-se calcular a Puf e, conseqüentemente, o Kf. Valores calculados de Kf são da ordem de 0,08 nl/s mmHg. Tomando-se uma superfície média (S) de 0,0019 cm2 do glomérulo do rato, obtém-se um coeficiente de permeabilidade hidráulica (k) em torno de 42,1 nl/(s mmHg cm2) para o capilar glomerular, coeficiente este 10 a 100 vezes maior que qualquer outro capilar do organismo, o que permite ao capilar glomerular manter um alto ritmo de filtração, apesar de uma pressão de ultrafiltração baixa.
Pontos-chave: • A filtração glomerular depende do coeficiente de permeabilidade glomerular (k), da superfície da membrana filtrante e da pressão de ultrafiltração • O Kf é o produto do coeficiente de permeabilidade glomerular e a área filtrante • A permeabilidade do capilar glomerular é 10 a 100 vezes maior do que a de qualquer outro capilar do organismo • A filtração glomerular por nefro depende diretamente do fluxo plasmático glomerular
REGULAÇÃO HORMONAL DA FILTRAÇÃO GLOMERULAR Alterações da perfusão vascular são em última análise mediadas pelas células musculares lisas através de contra-
ção ou relaxamento, ocasionando modificações do diâmetro dos vasos e da resistência vascular. Toda a vasculatura está alinhada sobre uma camada contínua de células endoteliais que previnem a ocorrência de trombose intravascular e atuam como barreira na difusão de solutos e fluidos através dos capilares. As células endoteliais são unidades metabólicas dinâmicas que possuem receptores e enzimas acopladas às suas membranas. Estas enzimas formam ou degradam substâncias vasoativas circulantes como a angiotensina II (enzima de conversão), bradicinina (cininase II), adeninonucleotídeos (nucleotidases) e endotelina (metalopeptidase). Estas células participam diretamente dos mecanismos contráteis e dilatadores através da resposta a vários estímulos, e também formando e liberando substâncias vasoativas. Entre os fatores relaxadores encontram-se o fator relaxador do endotélio (EDRF), identificado como o óxido nítrico e a prostaciclina; e entre os fatores contráteis, destacam-se a endotelina, tromboxane, angiotensina II e os radicais livres de oxigênio. Além dos efeitos vasculares, a angiotensina II e o hormônio antidiurético, in vitro, ligam-se às células mesangiais, causando contração destas células, pois elas possuem microfilamentos intracelulares contráteis. É possível que estes hormônios, in vivo, provoquem contração das células mesangiais, causando diminuição da superfície glomerular filtrante (S) e conseqüente redução do Kf e da própria filtração glomerular. Outros hormônios, como o hormônio da paratireóide e a prostaglandina E2, não agem diretamente sobre a célula mesangial, porém aumentam, via AMP cíclico, a síntese local de angiotensina II. Desta forma, o paratormônio pode reduzir a filtração glomerular por diminuição do Kf. A prostaglandina E2, apesar de aumentar o fluxo plasmático glomerular, não altera a filtração glomerular devido à diminuição do Kf, efeito este devido à liberação local de angiotensina II induzida pela prostaglandina. Os hormônios glicocorticóides no homem aumentam a filtração glomerular. Estudos em ratos Wistar mostraram que esta ação dos glicocorticóides se faz seletivamente por aumento do fluxo plasmático renal. O fator atrial natriurético promove vasodilatação renal com aumento do fluxo plasmático glomerular e conseqüente aumento da filtração glomerular. O óxido nítrico é produzido pelas células mesangiais e é importante na manutenção do fluxo plasmático renal e da filtração glomerular. O bloqueio da síntese de óxido nítrico aumenta a resistência das arteríolas aferente e eferente e diminui o Kf, causando queda da filtração glomerular. A filtração glomerular diminui com a infusão de endotelina1. A endotelina-1 contrai a célula mesangial, diminuindo o Kf, e aumenta proporcionalmente as resistências das arteríolas aferente e eferente, reduzindo o fluxo plasmático renal sem alterar a pressão capilar glomerular. Existem, portanto, várias evidências de que os hormônios têm um papel importante na regulação da filtração
33
capítulo 3
glomerular e podem também estar envolvidos nas alterações da filtração glomerular, observados em condições patológicas ou induzidas por drogas. O uso crônico da gentamicina induz queda da filtração glomerular. Estudos com ratos Wistar mostraram que esta queda ocorre principalmente devido à redução do Kf, efeito este que pode ser atenuado por ingestão de dieta rica em sal, ou pela administração crônica de captopril, situações estas que diminuem a geração de angiotensina II, sugerindo um papel deste hormônio na insuficiência renal aguda nefrotóxica causada por aminoglicosídeos. A ciclosporina diminui a filtração glomerular por nefro devido ao aumento das resistências das arteríolas aferente e eferente com diminuição do fluxo plasmático glomerular e do Kf. Em modelos experimentais de obstrução renal parcial, demonstrou-se que a filtração glomerular por nefro pouco se altera, embora ocorra queda do Kf, e esta é contrabalançada por aumento do gradiente de pressão hidrostática (∆P). Entretanto, se a síntese de prostaglandina for inibida pela indometacina, os valores da filtração glomerular por nefro no rim parcialmente obstruído caem intensamente, sugerindo que durante a obstrução ureteral parcial o efeito vasodilatador da prostaglandina antagoniza o efeito vasoconstritor simultâneo, provavelmente da angiotensina II. Experimentalmente, tem sido demonstrado que nas lesões glomerulares primárias há mediação da angiotensina II. O aminonucleosídeo puromicina, quando administrado em ratos, causa proteinúria, acompanhada por queda da filtração glomerular devido principalmente à diminuição do Kf, que pode ser parcialmente revertida pela infusão de um antagonista da angiotensina II (saralasina). Em resumo, a filtração glomerular é regulada por uma série de substâncias vasoativas sistêmicas ou localmente sintetizadas pelas células glomerulares, incluindo-se as células endoteliais e musculares lisas. A célula mesangial pode ser o alvo destas substâncias devido à sua capacida-
Pontos-chave: • A angiotensina II e o hormônio antidiurético promovem contração das células mesangiais e redução do Kf • A endotelina-1 e o bloqueio do óxido nítrico diminuem o Kf • O fator atrial natriurético aumenta o fluxo plasmático glomerular • Os glicocorticóides aumentam o fluxo plasmático glomerular • A gentamicina diminui o Kf • A ciclosporina diminui o fluxo plasmático glomerular e o Kf
de de contração, com conseqüente redução da área filtrante (S) e do Kf. Estes mecanismos reguladores podem estar afetados e contribuir para a queda da filtração glomerular observada em doenças renais.
PERMEABILIDADE SELETIVA GLOMERULAR Os capilares glomerulares permitem a passagem livre de pequenas moléculas como a água, uréia, sódio, cloretos e glicose; mas não permitem a passagem de moléculas maiores como eritrócitos ou proteínas plasmáticas. O capilar glomerular comporta-se como uma membrana filtrante contendo canais aquosos localizados entre as células e a membrana basal do capilar glomerular. Além destes componentes, as células epiteliais com seus podócitos também fazem parte desta barreira filtrante. Estima-se que o diâmetro desses canais varie entre 75 e 100 Å devido à permeabilidade seletiva que eles apresentam. Vários estudos foram feitos, tanto no homem como em animais, para se estudar a permeabilidade seletiva do capilar glomerular. A maioria destes estudos foram feitos utilizando-se macromoléculas, como o dextran, uma substância homogênea quanto à estrutura química e forma molecular, porém encontrado em tamanhos diferentes, os quais podem ser utilizados para o estudo da permeabilidade glomerular. O dextran, uma vez filtrado, não é reabsorvido nem secretado pelos túbulos renais. Pode-se comparar o clearance do dextran com o clearance de inulina, molécula pequena que é filtrada pelo rim, cuja concentração no fluido da cápsula de Bowman é a mesma do plasma, e também não é reabsorvida nem secretada pelos túbulos. Desta forma, a razão entre o clearance do dextran e o clearance de inulina é uma medida indireta da permeabilidade seletiva. Esta razão pode variar de 0 (zero), quando determinada molécula de dextran não é filtrada pelo rim, até 1 (um), quando a molécula atravessa livremente o filtro glomerular, como a inulina. A Fig. 3.4 mostra a variação do clearance fracional de dextran em função do raio da molécula. Verifica-se que não ocorre qualquer restrição à passagem de dextran com raio molecular até 20 Å (clearance fracional igual a 1). A partir deste valor, à medida que se aumenta o raio molecular, a molécula vai sendo menos filtrada pelo rim até se tornar impermeável (raio de 42 Å). Estes dados não explicam por que uma molécula como a albumina, de raio molecular de aproximadamente 36 Å, não é filtrada pelo rim, visto que uma molécula de dextran de mesmo raio ainda atravessa o filtro glomerular. Outros estudos mostraram que a permeabilidade glomerular não depende só do tamanho da molécula, mas também da forma, flexibilidade, e especialmente da carga
34
Filtração Glomerular
Fig. 3.4 Em abscissa está representado o raio molecular e em ordenada o clearance fracional de dextran neutro (sem cargas elétricas). Como vemos, não existe qualquer restrição à filtração de moléculas com menos de 20 Å de raio. À medida que aumenta o tamanho da molécula, esta vai sendo menos filtrada até se tornar impermeável com 42 Å de raio. Por esta figura, vemos que moléculas de raio de 36 Å ainda seriam parcialmente filtradas (clearance fracional 0,2). (Adaptado de Brenner, B.M.)
elétrica. A Fig. 3.5 mostra as medidas do clearance fracional de dextran sulfato, portanto, com cargas negativas, em animais normais. Verifica-se que para moléculas de 18 Å de raio molecular ocorre certa restrição à filtração, que aumenta mais acentuadamente do que demonstrado na figura anterior, tornando-se impermeável para moléculas de 36 Å. Entende-se, então, o fato de a albumina ser pouco
Fig. 3.5 Nesta figura está representado o clearance fracional de dextran sulfato (carregado com cargas negativas) em função do raio molecular, em ratos normais (䊉) e ratos com nefrite por soro nefrotóxico — NSN — (䊊). Como vemos, nos ratos normais existe uma maior restrição à filtração de moléculas aniônicas, quando comparados ao dextran neutro (Fig. 3.4). Os animais com nefrite por soro nefrotóxico apresentam um maior clearance fracional de dextran aniônico do que os normais para qualquer raio molecular. (Adaptado de Brenner, B.M.)
filtrada, já que se trata de uma molécula aniônica, isto é, carregada com cargas negativas como o dextran sulfato. Esta maior barreira às moléculas aniônicas ocorre devido à presença de glicoproteínas carregadas negativamente, as sialoproteínas, que revestem todos os componentes do capilar glomerular, especialmente o endotélio, membrana basal e os podócitos. Este conhecimento é de grande importância na compreensão da proteinúria maciça, que ocorre na síndrome nefrótica. Vários estudos mostraram que a perda das cargas negativas da membrana glomerular pode ser a causa da proteinúria em algumas formas de glomerulonefrites. Na mesma Fig. 3.5, observando-se a curva do clearance fracional de dextran sulfato em ratos com nefrite por soro nefrotóxico, constata-se maior clearance fracional de dextran sulfato para qualquer raio molecular nos animais nefríticos quando comparados aos normais, sugerindo que as cargas negativas do filtro glomerular nos animais nefríticos podem estar diminuídas. Além disto, cátions polivalentes, como as protaminas, podem produzir alterações estruturais nos podócitos, semelhantes às observadas na síndrome nefrótica de lesões mínimas. É interessante notar que estas alterações produzidas pelas protaminas podem ser revertidas ou normalizadas experimentalmente pela administração de um ânion polivalente, como a heparina. Embora não haja um modelo definitivo quanto à natureza da barreira filtrante glomerular, muitos admitem que o endotélio atua como um filtro grosseiro que separa as células e controla o acesso ao filtro principal, a membrana basal. O epitélio se constitui em uma barreira adicional importante, podendo fagocitar macromoléculas que ultrapassarem a membrana basal. E finalmente, as células mesangiais que envolvem as alças capilares podem influen-
35
capítulo 3
ciar o fluxo plasmático e conseqüentemente a filtração glomerular devido às suas propriedades contráteis.
Pontos-chave: • A permeabilidade seletiva da barreira glomerular depende do tamanho, da forma e especialmente da carga da molécula • A albumina tem raio molecular de 32 Å e é muito pouco filtrada por se tratar de molécula aniônica • Nas glomerulonefrites a perda das cargas negativas da membrana glomerular aumenta a filtração de proteínas
Tem sido demonstrado que a redução da ingesta protéica retarda a deterioração da função renal nestas condições, assim como a hiperfiltração do diabetes pode ser normalizada com um tratamento adequado com insulina.
Pontos-chave: • Na redução de massa renal, no diabetes mellitus e no aumento da ingestão protéica ocorre hiperfiltração glomerular • O aumento do fluxo plasmático glomerular e da pressão capilar glomerular são os responsáveis pelo aumento da filtração glomerular por nefro
HIPERFILTRAÇÃO GLOMERULAR
MEDIDA DA FILTRAÇÃO GLOMERULAR
A redução da massa renal, cirúrgica ou por lesão do parênquima renal, induz aumento da filtração glomerular dos nefros remanescentes, principalmente devido ao aumento do fluxo plasmático glomerular e do gradiente de pressão hidrostática (∆P). O aumento da filtração glomerular por nefro é tanto maior, quanto maior a redução da massa renal. A hiperfiltração glomerular é também observada em crianças e adultos jovens com diabetes mellitus e parece contribuir com o início e a manutenção da glomerulopatia freqüentemente encontrada na doença. Estudos em ratos com diabetes induzido pela administração de estreptozocin mostraram que estes animais apresentam aumento da filtração glomerular devido ao aumento do fluxo plasmático e da pressão capilar glomerular. Outro fator que pode levar ao aumento da filtração glomerular é a ingestão protéica. Ratos mantidos em dieta com 35% de proteínas apresentam filtração glomerular 70% maior que animais mantidos com apenas 6% de proteínas na dieta. Este efeito parece ser devido à vasodilatação renal induzida pelas proteínas ou aminoácidos. Há evidências recentes sugerindo que este efeito seja mediado via liberação de óxido nítrico. Vários estudos sugerem que a hiperfiltração leva, ao longo do tempo, à lesão glomerular com aumento da permeabilidade glomerular às macromoléculas aniônicas, resultando no aparecimento de proteinúria. Este aumento de proteínas no mesângio serve como estímulo para a proliferação das células mesangiais e maior produção de matriz mesangial, causando a glomeruloesclerose. A esclerose glomerular reduz ainda mais o número de nefros funcionantes, com conseqüente maior redução de massa renal, conduzindo a uma progressão inexorável para a insuficiência renal crônica terminal.
A quantidade de plasma filtrado por minuto pode ser determinada pela depuração plasmática de alguma substância livre no plasma, que não esteja ligada às proteínas plasmáticas, com diâmetro menor que 75 Å, sem cargas elétricas e que passe prontamente pela membrana capilar glomerular. Além disso, não deve ser reabsorvida, secretada ou metabolizada pelos túbulos renais. Uma destas substâncias é a inulina, que possui um diâmetro aproximado de 30 Å. Assim, a filtração glomerular pode ser avaliada pela medida da depuração ou clearance da inulina. Esta medida é feita após infusão endovenosa contínua de inulina, envolvendo as seguintes etapas, conforme o exemplo abaixo em seres humanos: 1) Medida do fluxo urinário (V) em ml/min: 1,0 ml/min 2) Medida da concentração urinária de inulina (Uin): 60 mg/ ml 3) Cálculo da quantidade de inulina excretada por minuto: Uin V 60 mg/ml 1,0 ml/min 60 mg/min Uma vez que toda a inulina alcançou os rins por filtração e não foi secretada, reabsorvida ou metabolizada pelos túbulos renais e a concentração plasmática de inulina (Pin) medida foi de 0,5 mg/ml, pode-se afirmar que 120 ml de plasma foram filtrados por minuto para haver uma excreção urinária (Uin V) de 60 mg/min, ou seja: 60 mg/min 5 mg/ml 60 mg/min 1 ml/0,5 mg 120 ml/min Desta forma, em 1 minuto, 120 ml de plasma e os solutos foram separados por ultrafiltração do sangue e das proteínas plasmáticas. Esta medida da filtração glomerular é o clearance de inulina, cuja fórmula é esta: Cin Uin V/Pin
36
Filtração Glomerular
O resultado é expresso em ml/min/1,73 m2 de superfície corpórea, significando o volume de plasma no qual toda a inulina é retirada em 1 minuto. O clearance de inulina é muito utilizado para estudos experimentais e clínicos, porém é pouco utilizado na prática médica diária devido à necessidade de infusão plasmática contínua da inulina. Por esta razão, geralmente utiliza-se o clearance de creatinina, que é uma substância endógena e não necessita de infusão venosa, para avaliação rotineira da filtração glomerular. A creatinina não é um marcador ideal da filtração glomerular, pois existe uma pequena secreção tubular desta substância. Como outras substâncias endógenas do plasma interferem com a dosagem sérica de creatinina superestimando sua concentração plasmática, estes dois efeitos contrários acabam se compensando, o que faz com que o clearance de creatinina seja uma medida bastante razoável da filtração glomerular na clínica, exceto em pacientes com filtração glomerular muito baixa, situação na qual a secreção tubular de creatinina aumenta muito. Mais recentemente um outro composto endógeno, a cistatina C, tem-se mostrado promissor como marcador da filtração glomerular. A cistatina C é produzida por todas as células nucleadas e seu ritmo de produção é constante. A cistatina C é livremente filtrada pelo glomérulo e primariamente catabolizada pelos túbulos, de tal forma que como molécula intacta não é reabsorvida nem secre-
tada pelos túbulos. Os níveis plasmáticos da cistatina C já aumentam quando a filtração glomerular cai para 88 ml/min/1,73 m2, sugerindo que a medida da cistatina C sérica pode ser importante na clínica para se detectar a insuficiência renal inicial que acontece em uma série de doenças renais para as quais um tratamento precoce é crítico.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BOIM, M.A.; TEIXEIRA, V.P.C.; SCHOR, N. Rim e compostos vasoativos. In: Zatz, R. Fisiopatologia Renal. Atheneu 2000, p. 21-39. BRENNER, B.M. The Kidney., 6th ed. W.B. Saunders Company, 2000. COLL, E.; BOTEY, A.; ALVAREZ, L. et al. Serum cystatin C — a new marker for noninvasive estimation of glomerular filtration rate and as a marker for early renal impairment. Am. J. Kidney Dis., 36:29-34, 2000. STANTON, B.A.; KOEPPEN, B.M. Elements of renal function. In: Berne, R.M.; Levy, M.N. Physiology, 4th ed. Mosby, 1998, p. 677-698. VALTIN, H. and SCHAFER, J.A. Renal Function, 3rd ed. Little, Brown and Company, 1995, p. 41. ZATZ, R. Distúrbios da filtração glomerular. In: Zatz, R. Fisiopatologia Renal. Atheneu, 2000, p. 1-20. ZATZ, R. Proteinúria. In: Zatz, R. Fisiopatologia Renal. Atheneu, 2000, p. 41-55.
ENDEREÇO RELEVANTE NA INTERNET www.renalnet.org
Capítulo
4
Função Tubular Antonio Carlos Seguro, Lúcia H. Kudo e Claudia M. de B. Helou
INTRODUÇÃO
Túbulo contornado distal
TRANSPORTE ATRAVÉS DA MEMBRANA EPITELIAL
Túbulo de conexão
PROCESSOS REGULADORES DE TRANSPORTE
Ducto coletor
TRANSPORTE AO LONGO DO NÉFRON Túbulo proximal
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Alça de Henle
INTRODUÇÃO O néfron é a unidade funcional do rim e é constituído pelo glomérulo e 14 segmentos tubulares. O trabalho de milhões de néfrons resulta na formação da urina. Cerca de 25% do plasma que atinge o rim são ultrafiltrados pelos glomérulos, levando à formação de 100 a 120 ml/min de ultrafiltrado em média no homem. Entretanto, apenas 1,2% desse volume é eliminado, e o restante reabsorvido da luz tubular para o espaço peritubular (Fig. 4.1). Ao lado deste intenso processo de reabsorção temos outro, não menos importante, o de secreção tubular. Este se caracteriza pelo transporte de substâncias do espaço peritubular (vasos e interstício) para a luz tubular. Este processo permite a excreção pela urina de substâncias que não passaram pela barreira dos capilares glomerulares, como macromoléculas ou partículas ligadas a proteínas. Portanto, a formação da urina resulta de três processos: 1. Filtração glomerular 2. Reabsorção tubular 3. Secreção tubular O túbulo renal é formado por uma parede de epitélio simples, ou seja, uma única camada de células que repousa sobre a membrana basal birrefringente. As células epiteliais renais são ditas polarizadas devido às diferentes
características de transporte de suas duas membranas: apical e basolateral (Fig. 4.2). A membrana apical ou luminal, que está em contato direto com o fluido tubular, apresenta diferentes canais iônicos, carregadores, trocadores e co-transportadores, de acordo com as necessidades de transporte do segmento, além de bombas de transporte ativo, como a H-ATPase. A membrana basolateral é a que está em contato com o espaço intercelular e o capilar peritubular. Além de canais e outros tipos de transportes facilitados, a membrana basolateral apresenta uma densidade variável de bombas, que utilizam a energia liberada pela hidrólise do ATP para transportar ativamente o Na para fora e o K para o interior da célula (Fig. 4.3). Essas bombas são na verdade enzimas transportadoras e são denominadas de Na,K ATPases. Em condições normais as Na,K-ATPases distribuem-se apenas na face basolateral das células tubulares renais. Como esta enzima necessita de ATP, a sua distribuição nos segmentos do néfron é diretamente proporcional aos segmentos que possuem maior quantidade de mitocôndrias. Portanto, o túbulo contornado proximal e a porção espessa ascendente da alça de Henle são os segmentos do néfron que apresentam maior distribuição quantitativa da Na,K-ATPase. A maior parte do transporte de solutos e de água no epitélio renal é realizada pela via transcelular, ou seja, através da célula. Mas o fluido e os solutos podem atingir o
38
Função Tubular
TÚBULO PROXIMAL TÚBULO DISTAL E COLETOR ARTÉRIA EFERENTE 60%-80% 3%-5% G L O M É R U L O
14-20 mM/min NaCl 1-2 kg/dia
20%-25% ARTÉRIA AFERENTE
1-10 g 0,1%-1%
ALÇA DE HENLE
NaCl
Fig. 4.1 Filtração glomerular e reabsorção tubular de NaCl ao longo do néfron. Observe que apenas 0,1% da carga filtrada de NaCl é eliminada na urina.
PROTEÍNAS PLASMÁTICAS CÉLULA INICIAL
Na
70 mV ATP
Na+
K+
GLICOSE
GLICOSE
Na+ H+ + OH + CO2
HOH A.C.
ENDOTÉLIO
HCO3 Na Cl
“TIGHT JUNCTION”
H2O Na+ Cl
ATP
ÂNION
K+
Cl H+ Na+
CÉLULA FINAL MEMBRANA APICAL
CAPILAR PERITUBULAR MEMBRANA BASAL
Fig. 4.2 Célula do início e do final do túbulo proximal demonstrando o transporte de Na, Cl e H2O através das vias transcelular e paracelular.
39
capítulo 4
baixa condutância dos complexos juncionais que se determina a resistência ao movimento molecular pela via paracelular em muitas células. Pode-se citar como exemplo o túbulo contornado proximal, que é considerado como segmento do néfron cujo epitélio é de vazamento devido à alta condutância do complexo juncional (Fig. 4.2). O contrário é observado no ducto coletor medular interno, onde as células epiteliais são fortemente aderidas devido à presença de complexos juncionais de baixa condutância, além de desmossomos.
2K+
A
Ouabaína
3 2
Citoplasma
1
5
4
3 Na+ Mg ADP + Pi
Mg ATP
B
subunidade
subunidade
C
c
C ?
b
2
a
N
3
O transporte de uma substância através de uma membrana epitelial pode ser feito por:
N
C ?
1 4
TRANSPORTE ATRAVÉS DA MEMBRANA EPITELIAL
5
Fig. 4.3 Estrutura da Na-K-ATPase. (A) A bomba pode ser um heterodímero , . A subunidade contém os sítios de ligação para Na (1), para ATP (4), para fosforilação (5), para K (2) e para ouabaína (3). (B) O painel inferior mostra a subunidade atravessando a membrana sete a oito vezes. A subunidade , que é glicosilada em sua porção extracelular, atravessa somente uma vez a membrana. A função da subunidade não é conhecida, mas ela é indispensável para o completo funcionamento da Na-KATPase.
capilar pela via paracelular, que é através das junções estreitas (tight junctions) e do espaço intercelular, portanto, o movimento é realizado pela face lateral das células. As junções estreitas variam de morfologia e de componentes dependendo do segmento, e por isso são denominadas atualmente de complexos juncionais. É através da alta ou da
Pontos-chave: • A formação da urina se deve à filtração glomerular e ao trabalho do epitélio tubular em processos de reabsorção e secreção • O transporte tubular se faz pelas vias transcelular e paracelular através dos complexos juncionais • O gradiente eletroquímico gerado pela Na,K-ATPase inserida na membrana basolateral é o responsável por diversos transportes que ocorrem na membrana luminal
1. Mecanismo passivo 2. Mecanismo ativo Nos processos de transporte passivo, o movimento transepitelial (reabsorção ou secreção) se faz sem gasto de energia, obedecendo às forças físicas como gradiente químico (reabsorção de uréia), pressão hidrostática (filtração glomerular), gradiente elétrico (reabsorção de cloretos no túbulo proximal) ou pela diferença de potencial eletroquímico ocorrido pelo transporte de algum íon, ou então pela força física resultante do movimento do arrasto do solvente (solvent drag). O transporte passivo pode ser então por simples difusão ou por difusão facilitada através de poros, carregadores ou canais existentes na membrana. O processo de difusão simples através do epitélio ocorre com muitas substâncias ao longo do néfron, caracterizando-se pela migração transmembrana de uma substância apenas sob a ação do gradiente químico, elétrico ou então de pH. Neste caso a quantidade transportada dependerá apenas do gradiente existente e da maior ou menor permeabilidade da membrana em relação à substância a ser transportada. Com relação ao solvente como a água, que também é reabsorvida em muitos segmentos do néfron, a difusão passiva se dá no túbulo renal por osmose, isto é, a água se movimenta do meio menos concentrado (com menor osmolalidade) para o mais concentrado (com maior osmolalidade). O coeficiente de reflexão do soluto, que pode variar de zero a um, é que determina o movimento da água através da membrana. Quanto maior o coeficiente de reflexão, maior a capacidade do soluto de produzir um movimento de água através da membrana. Isto é, o soluto que possui alto coeficiente de reflexão exerce maior pressão osmótica para um mesmo gradiente de concentração. A osmose determina a reabsorção de 99% da água filtrada pelo glomérulo, e é este tipo de transporte que permite a formação de urina concentrada (alta osmolalidade).
40
Função Tubular
O gradiente gerado por pH também pode induzir difusão passiva de uma substância pela membrana epitelial. Provavelmente devido à natureza hidrofóbica da membrana celular, formas não-ionizadas de ácidos e bases fracas penetram mais rapidamente do que formas ionizadas. Considerando que em muitos segmentos do néfron o pH do fluido tubular difere do existente no espaço peritubular, a geração de um gradiente de pH favorece a difusão de ácidos e bases fracas pelo epitélio. Se o pH do fluido tubular for mais ácido, como ocorre normalmente, o gradiente resultante favorecerá a reabsorção de ácidos fracos do lúmen para o espaço peritubular. Mesmo que a concentração do ácido fraco seja idêntica nos dois lados do epitélio, o baixo pH luminal favorecerá a não-dissociação do ácido e portanto a sua difusão do espaço luminal para o peritubular. Entretanto, se o pH luminal for mais elevado que o do espaço peritubular, a dissociação do ácido será favorecida, resultando em menor reabsorção, por ser esta forma menos permeável (Fig. 4.4). O inverso ocorre com bases fracas. A acidificação do fluido tubular aumenta a dissociação de bases fracas, dificultando então a sua difusão do lúmen para o espaço peritubular (Fig. 4.4). Em resumo, a evidência de transporte passivo originase de duas observações básicas: 1a) desaparecimento do transporte quando se abole ou anula o gradiente elétrico e/ou químico; 2a) quando o uso de inibidores metabólicos não altera o transporte da substância em estudo. No caso de transporte ativo, a reabsorção ou a secreção de uma determinada substância se faz contra gradiente elétrico, químico ou ambos, e por conseguinte é feita à custa de energia. No transporte ativo temos uma dependência imediata do metabolismo celular, e a inibição deste determina a parada do transporte.
B
A
HA
HA
H
A
H
A B
OH
BOH
BOH B
pH 5,5 LUZ TUBULAR
pH 7,4 PERITUBULAR
pH 8,5 LUZ TUBULAR
OH
pH 7,4 PERITUBULAR
Fig. 4.4 Difusão transtubular à custa de um gradiente de pH. Esquema A: reabsorção de um ácido fraco (HA) e ausência de reabsorção de base fraca (BOH) em virtude de o pH do fluido tubular ser inferior ao peritubular. Esquema B: reabsorção de uma base fraca (BOH) e não-reabsorção de ácido fraco decorrente de um pH urinário alcalino.
Os transportadores que utilizam diretamente a energia liberada pela hidrólise do ATP são considerados como elementos de transporte ativo primário e são chamados de bombas. Na verdade, as bombas são enzimas que possuem um sítio de ligação para o ATP e por isso são também conhecidas como ATPases. A fosforilação destas enzimas permite que íons sejam transportados contra gradientes químicos e/ou elétricos (Fig. 4.3). Um bom exemplo é a Ca-ATPase, que ativamente transporta o Ca do intracelular, cuja concentração é de 100 a 150 nM, para o interstício, onde a concentração deste íon é aproximadamente 6.000 a 10.000 vezes maior (1 mM). A energia liberada por uma ATPase para o transporte de um íon pode induzir um gradiente eletroquímico que facilita o movimento desse íon a favor do gradiente gerado. A este transporte iônico pode-se acoplar um outro soluto que poderá ser na mesma direção, co-transporte, ou em sentido oposto, antiporte. Por isso, este transporte acoplado é tido como transporte secundariamente ativo (Fig. 4.2). Como exemplo de co-transporte secundariamente ativo podemos citar o de Na-glicose que existe na face luminal das células do túbulo proximal. As Na,K-ATPases presentes na face basolateral dessas células geram um gradiente eletroquímico que facilita a entrada de Na pela face luminal (Fig. 4.2). Esta entrada pode ser através de uma proteína transportadora que possui sítios específicos para Na e para glicose (Fig. 4.5). Primeiro, o Na se liga ao seu respectivo sítio e produz uma alteração na conformação protéica do carregador, expondo o sítio para a ligação da glicose. Essa segunda ligação (glicose e receptor) provoca uma nova alteração na estrutura da proteína, permitindo que tanto o Na quanto a glicose atravessem a membrana. Portanto, Na e glicose passam pela membrana lipoprotéica utilizando a energia liberada pela Na,K-ATPase. A florizina pode inibir este co-transporte, competindo com a glicose pelo mesmo sítio de ligação no carregador. A ligação da florizina ao sítio não promove a segunda alteração na proteína carregadora, impedindo então o co-transporte Na-glicose (Fig. 4.5). Em muitos segmentos do néfron a secreção de H ocorre através do transportador Na-H. Este sistema trocador de íons é também secundariamente ativo, pois a secreção de H para a luz tubular é feita acoplada a um movimento contrário de Na. O Na movimenta-se da luz para o intracelular a favor de gradiente eletroquímico gerado pela atividade da Na,K-ATPase (Fig. 4.2). Convém também citar um tipo especial de transporte ativo, que é a endocitose. Macromoléculas são reabsorvidas através do seu envolvimento pela membrana apical, resultando em invaginações e formação de vacúolos. Quando o conteúdo dos vacúolos é de substâncias sólidas, esse processo recebe o nome de fagocitose, e quando o vacúolo é formado por fluido, a denominação é de pinocitose. No citoplasma, o material fagocitado pode sofrer ações de digestão. A extrusão do conteúdo vacuolar para o extracelu-
41
capítulo 4
GLICOSE
GLICOSE Na
Na
GLICOSE OU FLORIZINA Na
LISINA TIROSINA FLORIZINA Na
FLORIZINA Na
Fig. 4.5 Representação esquemática do co-transporte Na-glicose. Os sítios de ligação de sódio e glicose na proteína transportadora localizam-se no lado externo da membrana celular. A ligação do sódio causa alteração estrutural na enzima transportadora, resultando na exposição do sítio de ligação à glicose. A interação glicose e receptor induz uma segunda alteração estrutural que permite a passagem do Na e da glicose para o interior da célula. A florizina pode competir com a glicose pelo receptor. Entretanto, a ligação florizina-receptor não induz alteração estrutural, impedindo então que tanto florizina quanto Na sejam transportados para o intracelular.
lar recebe o nome de exocitose e consiste na fusão da membrana vacuolar à membrana basolateral da célula e conseqüente extrusão do conteúdo do vacúolo para o espaço extracelular. Nos túbulos renais o transporte de macromoléculas é representado principalmente pela reabsorção de proteínas filtradas pelo glomérulo, que ocorre logo no primeiro segmento do néfron, túbulo contornado proximal.
Pontos-chave: • Transporte passivo: difusão, difusão facilitada, “solvent-drag” • O transporte ativo é realizado por ATPases, enzimas que hidrolisam o ATP • O gradiente eletroquímico gerado pelas ATPases pode permitir o transporte secundário de outros íons
PROCESSOS REGULADORES DE TRANSPORTE Didaticamente podemos dividir os processos reguladores de transporte em: fatores cinéticos, endocitosesexocitoses e segundos mensageiros. Os fatores cinéticos modulam a velocidade de transporte alterando a concentração de solutos. O transporte de uma
substância pode ser saturável ou insaturável, independente de ele ser ativo ou passivo. Um transporte é classificado como saturável quando a quantidade da substância transportada na unidade de tempo aumenta até um certo limite, acima do qual o aumento da substância a ser transportada não mais incrementa o transporte, pois alcançou o transporte máximo, Tm. Portanto, quando se atinge o Tm de uma substância, nem a adição de energia, no caso de transporte ativo, nem o aumento do gradiente químico e/ou elétrico, no caso de transporte passivo, aumenta o transporte. A existência de um transporte máximo saturável pode ser decorrente de vários mecanismos: 1. Existência de um carregador auxiliando no transporte. Então, o Tm da substância a ser transportada é determinado pela quantidade de carregadores existentes, ou, então, se o sítio de ligação a uma determinada substância apresenta afinidade a uma outra, resultando em um processo de competição. A galactose por exemplo compete com a glicose pelos mesmos receptores da proteína carregadora presente no túbulo contornado proximal. 2. Limite de energia para transporte ativo. Por exemplo, o Tm de glicose pode ser diminuído pela presença de transporte de fosfato que compete pela energia liberada pela Na,K-ATPase. 3. Limite do gradiente eletroquímico gerado pelo transporte ativo. Assim, uma substância ou íon sendo transportado da luz tubular para o espaço peritubular por um
42
Função Tubular
mecanismo ativo diminuiria progressivamente sua concentração luminal, aumentando-a no espaço peritubular se esses fluidos não fossem removidos. Este aumento de concentração no espaço peritubular e o gradiente elétrico criado pelo transporte favorecem a volta deste íon ou da substância para a luz tubular, anulando o trabalho ativo efetuado. O processo de endocitose-exocitose é considerado como regulador de transporte, pois em condições de repouso os transportadores podem estar seqüestrados em vesículas logo abaixo da membrana apical. É necessário um estímulo apropriado para que ocorra a inserção dessas proteínas formando evaginações na face luminal da membrana. O aumento de inserções dessas proteínas favorece o transporte da substância em questão. Como exemplos podemos citar a secreção de H e o fluxo de água induzido pela vasopressina. No caso da secreção de H, a acidificação da célula é o estímulo para a inserção na borda luminal das vesículas que contêm as H-ATPases. No caso do transporte de água estimulado pela vasopressina, os canais de água (aquaporinas) são ancorados à membrana através da geração de AMP cíclico e portanto com a utilização de um segundo mensageiro. A exocitose por sua vez requer a ação integrada do citoesqueleto celular. Assim, um estímulo induz o aumento de circulação de vesículas ativando tanto a endocitose quanto a exocitose. A regulação de transporte através da ação de segundos mensageiros vem sendo amplamente estudada, principalmente nos últimos anos. Entre eles podemos citar a geração do AMP e GMP cíclicos e a variação da concentração do Ca livre intracelular ([Cai]), que podem modular diretamente as proteínas transportadoras ou afetar a abertura de um canal iônico. Na regulação de transporte existe ainda o fenômeno de adaptação ao longo do tempo. O melhor exemplo é o da estimulação da reabsorção de Na no ducto coletor induzido pela aldosterona. Este hormônio estimula a produção de proteínas que ativam os canais de Na+ existentes na membrana luminal, como também aumenta a síntese de Na,KATPase. Este mineralocorticóide também favorece a inser-
Pontos-chave: • Certos transportadores como o da glicose são saturáveis. Portanto, atingem um transporte máximo (Tm) • O processo de endocitose permite estocar dentro das células ATPases e outras proteínas, como por exemplo as aquaporinas. O inverso, a exocitose, permite a inserção dessas proteínas na membrana celular em condições de estímulo
ção e a ativação desta bomba na membrana basolateral. A capacidade metabólica da célula também é influenciada pela mediação da aldosterona a nível de mitocôndria e portanto pela produção de ATP (Fig. 4.3). Assim, a aldosterona é um agonista que participa da adaptação da célula do ducto coletor para aumentar o transporte de Na neste segmento do néfron.
TRANSPORTE AO LONGO DO NÉFRON Túbulo Proximal O túbulo proximal, segmento que segue imediatamente o glomérulo, é responsável pela reabsorção da maior parte das substâncias que são filtradas pelo glomérulo. Por isso, este segmento do néfron desempenha importante papel no controle da eliminação de diversas substâncias. Assim, pequenas alterações na intensidade de reabsorção ao nível do túbulo proximal podem causar variações significantes na excreção urinária de uma dada substância. O túbulo proximal é constituído por três segmentos. Os dois primeiros, que são denominados de S1 e S2, correspondem à parte convoluta do túbulo e a eles se segue uma porção retificada, S3, conhecida também como pars recta. A maior parte de água, sódio e cloro filtrados pelo glomérulo (60% a 70% da carga filtrada) é reabsorvida pelo túbulo proximal (Fig. 4.1). A análise da composição química do fluido obtido do túbulo proximal mostra que a concentração de Na permanece idêntica à do plasma (⬃140 mEq/L), assim como a osmolaridade. Estes dados indicam, então, que a reabsorção do Na nesta região do néfron é acompanhada pela mesma proporção de água, portanto, uma reabsorção isotônica. Como já foi referido em parágrafos anteriores, a entrada do Na pela membrana apical das células do túbulo proximal ocorre através de mecanismos passivos a favor de um gradiente eletroquímico gerado pelas Na,KATPases presentes na membrana basolateral. Na verdade, esses mecanismos são secundariamente ativos, pois utilizam a energia liberada pela quebra do ATP. A entrada de sódio na célula se faz através de dois mecanismos: 1. co-transporte que pode ser com a glicose, com o fosfato inorgânico, com os aminoácidos, com os sulfatos ou então com os outros ácidos orgânicos (Fig. 4.2). Este sistema ocorre principalmente nos segmentos S1 e S2 e é através de um processo de difusão facilitada que essas substâncias saem passivamente da célula pela membrana basolateral; 2. trocador Na-H. Através da quebra da molécula da água o íon H+ é liberado e secretado para a luz tubular através de uma troca com o Na. A hidroxila, por sua
43
capítulo 4
vez, em presença da anidrase carbônica, reage com o CO2 formando o HCO3 que sai da célula pela membrana basolateral por um co-transporte ligado ao Na na proporção de 1 cátion para 3 ânions (Fig. 4.2). No início do túbulo proximal, o gradiente elétrico entre a luz tubular e o espaço peritubular é da ordem de 2 a 4 mV, lúmen negativo (Fig. 4.6). Estes dados sugerem que a reabsorção de Na se faz contra gradiente elétrico. O movimento de cargas positivas devido à ação das Na,KATPases existentes na face basolateral das células seria responsável por essa diferença de potencial transtubular. Entretanto, nos segmentos finais do túbulo proximal onde praticamente toda a glicose, o fosfato e os aminoácidos foram reabsorvidos, a diferença de potencial transtubular passa a ser de 1 a 2 mV, lúmen positivo (Fig. 4.6). Isto é explicado pela difusão de íons cloro, cuja concentração aumenta progressivamente ao longo do túbulo proximal. No início do túbulo proximal, a reabsorção de sódio é preferencialmente acompanhada pela reabsorção do bicarbonato. Dessa maneira, a concentração de cloro na luz tubular aumenta progressivamente ao longo deste túbulo, atingindo a concentração de 135 mEq/L no segmento S3, valor este superior à do plasma e à do espaço peritubular, que é de 105 a 110 mEq/L, como está ilustrado na Fig. 4.6. A reabsorção de cloro se faz tanto pela via paracelular quanto pela transcelular. Neste último caso, o cloro entra pela membrana apical através de um trocador de Cl acoplado a outro ânion, e através de gradiente eletroquímico favorável, o cloro se difunde pela membrana basolateral da célula. Em conseqüência à difusão passiva dos íons Cl, o gradiente elétrico é gerado com lúmen positivo, favorecendo portanto a reabsorção passiva de cátions como Na, K e Ca neste segmento do néfron. Outro importante íon reabsorvido pelo túbulo proximal é o potássio. Este íon utiliza principalmente a via parace-
lular e mecanismos passivos. O fato de a água ser amplamente reabsorvida ao longo do néfron induz um aumento na concentração de potássio na luz tubular, criando-se então um gradiente químico que facilita a sua reabsorção. Além desse mecanismo, também se tem sugerido a possibilidade de o K ser reabsorvido neste segmento por um transporte ativo. Experimentos inibindo a reabsorção de Na com acetazolamida (inibidor da anidrase carbônica) mostraram que a concentração de potássio no fluido tubular diminui, atingindo valores inferiores aos observados no espaço peritubular e plasma, indicando que a reabsorção de potássio no túbulo contornado proximal envolve também um mecanismo ativo de transporte. O transporte de água através do túbulo proximal se faz tanto pela via transcelular quanto paracelular devido ao gradiente de pressão osmótica existente entre o fluido tubular e o espaço peritubular. Apesar do baixo gradiente osmótico, de 2 a 5 mOsm/kg H2O, ele é suficiente para induzir a reabsorção da água, uma vez que as membranas apical, basolateral e complexo juncional das células do túbulo proximal são muito permeáveis a este solvente. Por isso, como já foi referido anteriormente, este epitélio é considerado como de vazamento. Nas porções iniciais do túbulo proximal essa ligeira hipertonicidade do fluido peritubular em relação ao lúmen é induzida pela reabsorção de Na acoplada ao HCO3 ou ao co-transporte com outros solutos como a glicose. Na metade final deste túbulo, embora a concentração luminal de Cl (⬃135 mEq/L) seja maior que a do espaço peritubular, a reabsorção da água também é feita por osmose, uma vez que o sódio, o bicarbonato e os outros solutos que foram reabsorvidos na porção inicial geram um gradiente osmótico maior que o Cl. A intensa reabsorção de Na e água ao longo do túbulo contornado proximal forma o gradiente químico que fa-
TÚBULO CONTORNADO PROXIMAL A. EFERENTE
CAPILAR PERITUBULAR
FINAL
INICIAL
Cl 135
Cl 110 GLOMÉRULO
+ 1,0 mV
4 mV Na+ HCO3 FOSFATO
A. AFERENTE
GLICOSE AMINOÁCIDOS
Cl Na+ H2O Ca2+
Fig. 4.6 Transporte de água e solutos ao longo do túbulo contornado proximal.
44
Função Tubular
vorece a reabsorção passiva de outras substâncias permeáveis a este epitélio, como a uréia, o ácido úrico e os íons K e Cl. Desta maneira, a diminuição na reabsorção proximal de Na acarreta também a diminuição da reabsorção desses outros solutos. O transporte de Ca e Mg é modulado por fatores hormonais, mas existem evidências de que também está relacionado com o transporte ativo de Na. O fosfato também é intensamente reabsorvido, principalmente nas porções iniciais do túbulo contornado proximal. Este transporte diminui com a redução na quantidade de Na reabsorvida e com o aumento da concentração de paratormônio através do estímulo da adenilciclase. Ainda em relação ao transporte de Na no túbulo proximal, é importante descrever a teoria do balanço glomérulo-tubular. Verifica-se que frente a variações fisiológicas da filtração glomerular ocorrem alterações paralelas da reabsorção de Na no túbulo proximal, de modo que permanece constante a quantidade do íon reabsorvido em relação à sua carga filtrada, ou seja, a fração de reabsorção de Na mantém-se inalterada. O balanço glomérulo-tubular é decorrente pelo menos em grande parte das variações da concentração de proteínas nos capilares, pressão oncótica, que ocorre durante as alterações da filtração glomerular, como mostra a Fig. 4.7. Quanto à finalidade da existência do balanço glomérulo-tubular, acredita-se que esse processo, juntamente com o feedback túbulo-glomerular, que será descrito adiante, constituem os dois mecanismos pelos quais o rim impede a perda de sódio durante variações fisiológicas da carga filtrada de sódio devido a alterações da filtração glomerular.
Quanto às proteínas, que eventualmente escapam no processo de ultrafiltração glomerular, são reabsorvidas através de mecanismo de endocitose já descrito anteriormente. A pars recta ou segmento S3 do túbulo proximal se inicia no córtex renal a partir da última alça da parte convoluta e se dirige em linha reta para a medula terminando ao nível de medula externa. Na microscopia óptica as células desse segmento são semelhantes às da parte convoluta. Entretanto, os estudos de microscopia eletrônica revelam que a pars recta é constituída por células epiteliais retangulares com grande quantidade de mitocôndrias junto à membrana peritubular, mas com menor número de invaginações na membrana basolateral. Quanto à fisiologia da pars recta, a reabsorção de sódio também se faz à custa da geração de gradiente eletroquímico induzido pelas Na-K-ATPases presentes na membrana basolateral. O gradiente elétrico e químico criado pelo transporte de Na é que determina a reabsorção passiva de Cl, cuja concentração é elevada neste segmento. A reabsorção de Na também é do tipo isotônica, pois a mesma quantidade de água acompanha este cátion (Fig. 4.8). Apesar de a pars recta dos néfrons superficiais possuir um comprimento de 5 mm, a quantidade reabsorvida de NaCl e água é apenas em torno de 5 a 10% da carga filtrada, e portanto significativamente menor do que nas porções convolutas. Entretanto, analisando a capacidade de secreção de ácidos orgânicos, verifica-se que a pars recta tem maior capacidade em secretar ácido úrico, para-amino-hipurato e outros ácidos que os segmentos S1 e S2. O transporte des-
BALANÇO GLOMÉRULO-TUBULAR TE
EN
A.
ER AF
14 mEq/min Na+ E NT
2,8 mEq/min
A.
E ER
AF
+
Na
m 0,9
Eq/
min
Na+Cl H 2O P A R S
3-5%
A CUL MÁ S A DEN
Cl
T.C. Proximal
GLOMÉRULO
70%
15%
R E C T A
Ác. Orgânicos K+ Uréia Na+Cl H2O Ác. Orgânicos
10%
“FEEDBACK” TÚBULO-GLOMERULAR Fig. 4.7 Mecanismos que impediriam a perda de NaCl: balanço glomérulo-tubular e feedback túbulo-glomerular.
Fig. 4.8 Processos de reabsorção e secreção na pars recta do túbulo proximal.
45
capítulo 4
ses ácidos orgânicos é mediado por carregadores e portanto por mecanismo saturável. Do ponto de vista clínico e farmacológico, a alta capacidade do segmento S3 em secretar ácidos orgânicos constitui uma via importante de excreção de muitos medicamentos como a aspirina, antibióticos e diuréticos. Uma outra função muito importante atribuída ao segmento S3 é a sua capacidade de secretar K e uréia. Portanto, a pars recta participa dos mecanismos de concentração urinária como elemento integrante no sistema de contracorrente.
PORÇÃO ESPESSA ASCENDENTE DA ALÇA DE HENLE LÚMEN
CÉLULA
PERITUBULAR
+3 a +10 mV
70 mV
0 mV
1 Na+
Na+
2 Cl 1 K+ Na+
ATP
K+ K+ +
H + OH K+
Pontos-chave: • O túbulo proximal é responsável pela reabsorção isotônica de 60 a 70% da carga filtrada de NaCl e água • O sódio é reabsorvido na membrana luminal através de diferentes mecanismos: trocador Na-H, co-transporte com glicose, fosfato e aminoácido • O bicarbonato é preferencialmente reabsorvido nos segmentos S1 e S2 • Na pars recta (segmento S3) ocorre reabsorção preferencial de Cl e secreção de ácidos orgânicos
Alça de Henle A alça de Henle é dividida em porção fina descendente, porção fina ascendente, porção espessa ascendente medular e porção espessa ascendente cortical. A porção fina descendente é altamente permeável à água e pouco permeável a solutos. Aproximadamente 20% da água filtrada é reabsorvida neste segmento. A diferença de potencial transtubular é próxima a zero com lúmen negativo (2 a 4 mV). O segmento que se segue à porção fina descendente da alça de Henle é a curvatura. Esta porção do néfron é muito utilizada pelos micropuncionadores para o estudo da função dos néfrons justamedulares. A porção fina ascendente da alça de Henle apresenta como característica ser impermeável à água mas permeável a Cl e a Na, que são reabsorvidos por um processo passivo na sua maior parte. A porção espessa ascendente da alça de Henle que também é impermeável à água é responsável pela reabsorção de 25% da carga filtrada de sódio. A Na, K-ATPase presente na membrana basolateral gera um gradiente eletroquímico que favorece a entrada do Na pela membrana apical através de um co-transporte Na-K-2Cl (Fig. 4.9). Existem indícios de que o co-transporte Na-K-2Cl obedece a uma seqüência de ligações iônicas que se suce-
+ CO2
HOH A.C. HCO3
Cl
Na+ e OUTROS CÁTIONS
Fig. 4.9 Célula da porção espessa ascendente da alça de Henle mostrando o co-transporte Na-K-2Cl e o contratransporte Na-H na membrana luminal. Os íons Na são ativamente transportados através da membrana basal pela Na-K-ATPase e os íons K e Cl saem passivamente da célula através de canais. Outro dado importante a assinalar é o potencial positivo do fluido tubular em relação ao peritubular.
dem resultando em alterações na estrutura do co-transportador para poder permitir as uniões seguintes. Primeiro é o Na que se liga, seguindo-se um íon Cl e em terceiro lugar o K, e só então é que se liga o segundo Cl. A furosemida e a bumetanida podem inibir este sistema de cotransporte ao se ligarem no lugar do segundo Cl na última etapa. Uma vez no intracelular, o Na é ativamente transportado para o interstício através da ação da Na-K-ATPase na membrana basal, mas o K e o Cl são transportados passi-
Pontos-chave: • A porção fina descendente é permeável à água e muito pouco a solutos • 25% da carga filtrada de NaCl é reabsorvida nas porções ascendentes da alça de Henle • Presença do co-transportador Na-K-2Cl, sensível ao furosemide, na membrana luminal da porção espessa ascendente. Este co-transportador é elemento muito importante nos mecanismos de concentração e diluição urinárias • Ca2 e Mg2 são reabsorvidos pela via paracelular
46
Função Tubular
vamente. O K retorna ao lúmen através de um canal específico (pertencente à família ROMK) na membrana apical e o Cl sai da célula pela membrana basal através de um canal específico a este ânion. A saída de carga positiva para o lúmen e de uma carga negativa para o interstício gera um potencial positivo luminal de cerca de 7 mV. Esta diferença de potencial permite que o Na+ e outros cátions como o próprio K, Ca e Mg sejam reabsorvidos passivamente pelos espaços intercelulares laterais, como ilustra a Fig. 4.9. No segmento cortical da porção espessa ascendente da alça de Henle é descrita também a secreção de H através do trocador Na-H presente na membrana luminal; cerca de 10% da carga filtrada de bicarbonato são reabsorvidos neste segmento.
e a regulação da filtração glomerular. De acordo com esta teoria, a quantidade de Na ao atingir o início do túbulo distal sensibiliza a mácula densa, que por sua vez ativa mecanismos efetores que irão modular a resistência dos vasos pré-glomerulares. Portanto, se grande quantidade de Na atinge o início do túbulo distal, a renina é liberada, induzindo vasoconstrição da arteríola aferente com conseqüente redução do fluxo sanguíneo renal, pressão glomerular e filtração glomerular (Fig. 4.7).
Túbulo Contornado Distal
Túbulo de Conexão
O túbulo contornado distal é a continuidade do segmento cortical da porção espessa ascendente da alça de Henle se estendendo da mácula densa até a região de transição com o ducto coletor. Este segmento do néfron também é impermeável à água e apresenta características especiais quanto ao transporte de sódio e cloro. Através de um cotransporte com o Cl, o Na é transportado pela membrana luminal de maneira passiva. Este co-transporte pode ser inibido por tiazídicos e é secundariamente ativo à ação da Na-K-ATPase que transporta ativamente o Na+ pela membrana basal, mas o Cl sai do interior da célula através de mecanismo passivo por canal específico (Fig. 4.10). A teoria do feedback túbulo-glomerular relaciona a quantidade de Na que chega aos segmentos distais do néfron
A região de transição entre o túbulo contornado distal e o ducto coletor pode ser abrupta ou gradual, e como neste local vários túbulos distais se reúnem para formar o ducto coletor, esse segmento do néfron recebe então o nome de túbulo de conexão. Ele é constituído por dois tipos de células: as do túbulo de conexão e as intercaladas. As células do túbulo de conexão apresentam características morfológicas compatíveis com a transição entre as células do distal e as principais do ducto coletor. A principal função dessas células está relacionada à secreção de potássio, que é em parte regulada por mineralocorticóides. As células intercaladas, por sua vez, desempenham importante papel nos mecanismos de secreção de H, que será descrito em detalhes no parágrafo referente ao túbulo coletor. Neste segmento do néfron, o sódio pode ser reabsorvido através de um co-transporte acoplado ao Cl semelhante ao acima descrito nas células do túbulo contornado distal. Aliás, estudos em coelhos onde o túbulo de conexão é bem evidente sugerem que o co-transporte Na-Cl sensível a tiazídico ocorre apenas neste segmento. O Na pode também ser transportado para o intracelular através de canais sensíveis ao amiloride e do trocador Na-H acoplado a um trocador Cl-HCO3. A ação ativa da Na,KATPase presente na membrana basal também é responsável pela saída do Na da célula (Fig. 4.11). É importante ressaltar que o túbulo de conexão e o coletor cortical são os únicos segmentos do néfron onde o bicar-
TÚBULO DISTAL INICIAL LÚMEN NEGATIVO
PERITUBULAR 0 mV
CÉLULA 70 mV
Na+ Na+ Cl
ATP
K+ INIBIÇÃO PELO TIAZÍDICO
Cl
Ponto-chave: • Presença do co-transportador Na-Cl sensível a tiazídicos na membrana luminal
Pontos-chave:
Fig. 4.10 Célula do túbulo distal inicial mostrando o transporte de Na acoplado a Cl sensível ao tiazídico na membrana luminal secundariamente ativo à ação de Na-K-ATPase da membrana basal.
• Constituído por células de transição entre as do túbulo distal e do ducto coletor • Presença do trocador Cl-HCO3 na membrana luminal pode permitir a secreção de bicarbonato em certas condições de alcalemia
capítulo 4
TÚBULO DE CONEXÃO LÚMEN 5 mV
PERITUBULAR 0 mV
CÉLULA 85 mV
Na+ Cl
Na+
ATP
K+ INIBIÇÃO PELO AMILORIDE
Na+ Na+ KCl
+
H HCO3
KCl
Cl
Fig. 4.11 Célula do túbulo de conexão mostrando na membrana luminal os canais de Na sensíveis ao amiloride, o co-transporte Na-Cl e os co-transportes Na-H e Cl-HCO3 secundariamente ativos à Na-K-ATPase da membrana basal.
bonato pode ser secretado para a luz tubular utilizando para tal o trocador Cl-HCO3 presente na membrana apical. Também é descrita a presença de uma ATPase na face luminal das células intercaladas neste segmento, denominada H,K-ATPase. Esta enzima seria estimulada pela depleção de K.
Ducto Coletor O ducto coletor é dividido em cortical, medular externo e medular interno, apresentando dois tipos de células: as principais e as intercaladas. As células principais caracterizam-se na microscopia eletrônica por apresentarem um cílio central. O sódio é reabsorvido nestas células por mecanismo passivo através de canais na membrana luminal sensíveis ao amiloride ou trianterene, denominados ENaC. É também através da Na,K-ATPase que o transporte ativo de Na gera potencial negativo no lúmen na ordem de 30 mV no coletor cortical (Fig. 4.12). A concentração de K no intracelular das células principais do ducto coletor é elevada devido à alta atividade das Na,K-ATPases presentes na membrana basal. É através de canais específicos (ROMK) tanto na membrana apical quanto na basolateral que o K é transportado passivamente para fora da célula (Fig. 4.12). A secreção de K está diretamente relacionada à diferença de potencial gerada pela quantidade de Na reabsorvida. Tanto a reabsorção de sódio quanto a secreção de potássio nas células principais do ducto coletor são moduladas pela aldosterona. Este mineralocorticóide entra no citoplasma da célula induzindo através de RNAm a síntese de proteínas pelo núcleo, que aumentam o número de canais de
47
sódio da membrana apical, a densidade de Na,K-ATPases da membrana basal e por fim estimulam a produção de ATP pelas mitocôndrias, resultando em aumento na atividade das Na,K-ATPases. A espironolactona interfere com o sítio citoplasmático da aldosterona impedindo a produção do RNAm, e dessa maneira a reabsorção de Na e a secreção de K ficam prejudicadas. As células intercaladas caracterizam-se por serem células escuras devido à presença de grânulos em seu citoplasma. São descritos atualmente dois tipos de células intercaladas: as e as . Elas estão relacionadas ao transporte ativo de H através de H-ATPases. Estas se localizam na membrana luminal nas células do tipo e na membrana basal nas do tipo . No caso das células intercaladas do tipo α a secreção luminal de H está acoplada ao sistema trocador Cl-HCO3 na membrana basal. O inverso é observado nas células intercaladas do tipo , onde o H é transportado pela H-ATPase agora localizada na membrana basal da célula e o sistema trocador Cl-HCO3 tem localização na membrana apical. Acredita-se que as condições ácido-básicas determinam a quantidade de células ou . Na acidose predominam as células do tipo e na alcalose, as do tipo . Como já foi referido no túbulo de conexão, uma ATPase relacionada à reabsorção de K está presente nas células intercaladas do ducto coletor. A H,K-ATPase é mais abundante nos segmentos corticais e diminui à medida que se aproxima da papila. Ainda é controverso na literatura se alterações ácido-básicas modulam a atividade dessa enzima. Há indícios de que no ducto coletor medular interno outros cátions possam ocupar o lugar do H na H,K-ATPase, e por isso ela tem sido denominada como X,K-ATPase, como o amônio (NH4). O ducto coletor medular interno é dividido em três segmentos devido à sua heterogeneidade morfológica e funcional: IMCD1, IMCD2 e IMCD3. As células que compõem o IMCD1 são muito semelhantes às do ducto coletor medular externo, estando presentes as células do tipo principal e cerca de 10% de intercaladas. Entretanto, as porções IMCD2 e IMCD3 parecem representar um segmento distinto. Estudos recentes têm considerado que o ducto coletor medular interno apresenta dois segmentos funcionalmente distintos: a porção inicial que corresponde ao IMCD1 e a porção distal com os segmentos IMCD2 e IMCD3. Este último segmento do néfron tem importante papel na regulação final da composição da urina pelo ajuste da reabsorção de sódio, potássio, uréia e água. Convém salientar que o ducto coletor medular interno é o único segmento do néfron que possui sítio de ação aos peptídios atriais natriuréticos, e também existem evidências da presença do co-transporte Na-K-2Cl. O transporte de água no túbulo distal final e ducto coletor varia com a concentração plasmática do hormônio antidiurético, HAD, que altera a permeabilidade destes segmentos à água. A ação do hormônio antidiurético torna também o epitélio do coletor medular permeável à uréia.
48
Função Tubular
CÉLULA
CÉLULA
CÉLULA PRINCIPAL
Cl PERITUBULAR
PERITUBULAR HCO3
ATP
Cl H+
Cl
ATP
PERITUBULAR K+
K+ Cl
H+
Na
+
Na+
Cl
ATP
3
HCO
K+
Cl K+ LUMINAL
LUMINAL
Cl
Cl
LUMINAL
Fig. 4.12 Representação dos três tipos de células do ducto coletor: intercalada α, intercalada e principal. Observa-se que na intercalada α a inserção da H-ATPase é na membrana luminal, e do contratransporte Cl-HCO3 , na membrana basolateral, o que favorece a secreção de ácidos. O inverso é observado nas células intercaladas . Na face luminal das células principais o Na é reabsorvido através de canais sensíveis ao amiloride. O K é secretado passivamente para a luz tubular. Ambos os transportes são decorrentes do gradiente eletroquímico gerado pela Na-K-ATPase na membrana basal.
Esta permeabilidade aumenta em direção à papila, promovendo a hipertonicidade do interstício. Esta propriedade, que é importante na determinação da osmolaridade da urina, será discutida com mais detalhes em outro capítulo referente a mecanismos de concentração urinária. Antes de finalizar este capítulo sobre a função tubular, é importante salientar dois aspectos da função renal: 1.º) A descrição da função tubular foi feita considerando o rim como constituído por uma população homogênea de néfrons; entretanto, sabemos que existem diferenças morfológicas e funcionais entre os néfrons justamedulares (córtex profundo) e os néfrons superficiais. Entre as diferenças deve-se destacar a maior capacidade dos néfrons justamedulares de variar a excreção de NaCl frente a variações do volume extracelular. Em condições de depleção intensa do volume extracelular, observa-se uma maior reabsorção de NaCl pelos néfrons justamedulares e, em condições de expansão, também são os néfrons profundos os que apresentam a maior capacidade de excreção de NaCl. 2.º) A função renal foi apresentada como simplesmente um processo de filtração glomerular, reabsorção e secreção
Pontos-chave: • As células principais são responsáveis pela reabsorção de sódio e secreção de potássio, sendo estes processos modulados pela aldosterona • As células intercaladas são células escuras responsáveis pela acidificação urinária • O ducto coletor medular interno é a porção final do néfron, onde ocorrem os ajustes finais para a formação da urina
tubular que permite a manutenção do balanço de sódio, potássio, hidrogênio e água; entretanto, o rim tem outras importantes funções do ponto de vista metabólico, como, por exemplo: no metabolismo de hidratos de carbono pela síntese de glicose que ocorre no córtex renal e pela inativação de insulina e glucagon, diminuindo a meia-vida desses hormônios; no metabolismo ósseo pela regulação da excreção de cálcio, fósforo, ativação de vitamina D e inativação de paratormônio. Não devemos esquecer também o importante papel do rim na regulação da pressão arterial.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA KRIZ, W. and BANKIR, L. A standard nomenclature for structures of the kidney. American Journal of Physiology, 254(23):F1-F8, 1988. MOE, O.W.; BERRY, C.A. and RECTOR JR, F.C. Renal transport of glucose, amino acids, sodium, chloride, and water. In: Brenner, B.M. and Rector, F.C., Jr. (eds.) The Kidney, 6th ed. W.B. Saunders Company, Philadelphia, pp. 375-415, 2000. SEGURO, A.C.; MAGALDI, A.J.B.; HELOU, C.M.B.; MALNIC, G. e ZATZ, R. Processamento de água e eletrólitos pelos túbulos renais. In Zatz, R. (ed.) Fisiopatologia Renal, 1.ª edição, Atheneu, pp. 71-96, 2000. STOKES, J.B. Principles of epithelial transport. In: Narins, R.G. (ed.) Maxwel & Kleeman’s Clinical Disorders of Fluid and Electrolyte Metabolism, 5th ed. McGraw-Hill, Inc. New York, pp. 21-44, 1994. VALTIN, H. and SCHAFER, J.A. Tubular reabsorption. In: Valtin, H. and Schafer, J.A. (eds.) Renal Function, 3rd ed. Little, Brown and Company, pp. 62-82, 1995. VALTIN, H. and SCHAFER, J.A. Tubular secretion. In: Valtin, H. and Schafer, J.A. (eds.) Renal Function, 3rd ed. Little, Brown and Company, pp. 84-93, 1995.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.hdcn.com http://www.nephron.com http://www.renalnet.org
Capítulo
Mecanismos de Acidificação Urinária
5
Alexander J. Rouch
INTRODUÇÃO
SÍNTESE E EXCREÇÃO RENAL DE AMÔNIA
SECREÇÃO DE H E REABSORÇÃO DE HCO
3
NO
TÚBULO PROXIMAL SECREÇÃO DE H E REABSORÇÃO DE HCO
REGULAÇÃO DA ACIDIFICAÇÃO URINÁRIA FUTUROS ESTUDOS
3
NO
TÚBULO DISTAL
RESUMO REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FORMAÇÃO E EXCREÇÃO DE ÁCIDO TITULÁVEL
INTRODUÇÃO O rim, para cumprir o seu papel na manutenção do balanço ácido-básico, deve excretar ácido não-volátil numa proporção igual à sua produção metabólica, que sob as condições de dieta normal é cerca de 1,0 mEq/kg por dia. Portanto, a excreção de ácido (EA) para um indivíduo que pesa 70 kg deve ser de aproximadamente 70 mEq/dia. A excreção renal de ácido (EA) pode ser determinada através da seguinte equação: EA U NH 4 V UTAV UHCO3V Esta equação mostra que a excreção de ácido, EA, é igual à taxa de excreção de amônia (U NH 4 V) mais a taxa de excreção de ácido titulável (UTAV) menos a taxa de excreção de bicarbonato (UHCO3V). Para excretar esse ácido, o rim deve acidificar a urina. Mecanismos de acidificação urinária envolvem secreção de H ao longo do néfron, particularmente no túbulo contornado proximal e no ducto coletor. É importante observar que a taxa de secreção de H foi “projetada” para manter normal a concentração plasmática de [HCO3]. Isto requer que o rim reabsorva todo o HCO3 filtrado e gere novo
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
HCO3 para substituir aquele que foi usado para tamponar o ácido não-volátil.
Pontos-chave: • O principal papel do rim é no balanço ácido-básico de todo o organismo • O rim acidifica a urina a fim de excretar ácido não-volátil e manter normal a concentração plasmática de bicarbonato [HCO3] Investigações sobre os mecanismos de acidificação urinária têm enfocado o transporte celular da secreção renal de H e a reabsorção de HCO3. Neste capítulo, discutiremos primeiro estes mecanismos de transporte celular no túbulo proximal e no túbulo distal. A importância da anidrase carbônica (AC) será enfatizada. Os fatores determinantes da excreção de ácido titulável serão então apresentados seguidos por uma discussão sobre a síntese e a excreção renal de amônia e, finalmente, a regulação da acidificação urinária.
50
Mecanismos de Acidificação Urinária
Pontos-chave: • • • • • • • •
EA (UNH4V) (UTAV) – (UHCO3V) EA produção de ácido não-volátil Mecanismos de ação celular Túbulo proximal Túbulo distal Excreção de ácido titulável Síntese e excreção de amônia Regulação de acidificação urinária
SECREÇÃO DE H E REABSORÇÃO DE HCO3 NO TÚBULO PROXIMAL O túbulo proximal reabsorve cerca de 80% do HCO3 filtrado. Pesquisadores acreditam que a reabsorção de HCO3 pode ocorrer através de dois mecanismos: 1) secreção de próton pela célula para o lúmen; ou 2) transporte direto do HCO3 filtrado através da membrana apical. Estudos utilizando diferentes tipos de eletrodos sensíveis ao pH e medindo o pH intracelular na presença e na ausência de inibição da anidrase carbônica (AC) demonstraram que a secreção de H é o mecanismo responsável pela acidificação do fluido luminal e pela reabsorção de HCO3 no túbulo proximal, e não o transporte direto de HCO3. O leitor pode obter mais detalhes desta técnica nos trabalhos indicados nas referências 1 a 3. A Fig. 5.1 ilustra os mecanismos fundamentais da secreção de H e da reabsorção de HCO3 no túbulo proximal. A secreção de H ocorre primariamente através da troca
Fig. 5.1 Mecanismos de secreção e reabsorção de HCO3 no túbulo proximal.
Na/H na membrana apical, embora haja também a participação da H-ATPase. O primeiro processo está ligado à entrada passiva de Na para o interior da célula e o último é um mecanismo de transporte primariamente ativo. O H secretado combina-se com o HCO3 filtrado para formar H2CO3, que é convertido em CO2 e H2O no lúmen. O CO2 difunde para o interior da célula, onde a reação química é revertida e então formando íons H para posterior secreção de íons HCO3, que deixa a célula pelo lado basolateral e entra para o fluido peritubular. A anidrase carbônica (AC) estimula a reação química tanto no lúmen quanto no citoplasma celular e mantém alta a taxa de secreção de H (ver adiante). O transporte de HCO3 para fora da célula pela membrana basolateral ocorre passivamente através de dois principais processos: cotransporte Na/3HCO3 e troca HCO3/Cl. Algumas discussões sobre esses transportadores estão em ordem.
Pontos-chave: • O túbulo proximal reabsorve cerca de 80% do HCO3 filtrado • Secreção de H é o mecanismo responsável pela acidificação do fluido luminal e pela reabsorção de HCO3 no túbulo proximal e não o transporte direto de HCO3 • A secreção de H ocorre primariamente através da troca Na/H na membrana apical, embora haja também a participação da H-ATPase Troca Naⴙ/Hⴙ. Vários estudos têm sido realizados para examinar as características funcionais e moleculares do antiporte Na/H na membrana apical do túbulo proximal (ver Cap. 4). A troca Na/H foi primeiro demonstrada nas vesículas de membrana da borda em escova do córtex renal de ratos. 4 Outros trabalhos demonstraram que o antiporte apresenta uma saturação cinética de MichaelisMenten e que pode ser inibida pelo amiloride.5,6 Estudos utilizando medidas de pH intracelular no túbulo proximal e técnicas de substituição de Na confirmaram a existência de um transportador Na/H na membrana apical do túbulo proximal.7-9 Além disso, este transportador é diferente do chamado “housekeeping” trocador Na/H, que ajuda a controlar o pH e o volume celular.10 Foram identificados cinco isoformas de trocador Na/H, (NHE 1-5) através de estudos em ratos e coelhos, e NHE-1 a NHE-4 foram identificados no rim.11,12 Pesquisas empregando técnicas de imuno-histoquímica, expressão molecular de RNAm e métodos de “knockout” de gens confirmam que a isoforma NHE-3 é a proteína da membrana apical do túbulo proximal responsável pela secreção de H.13,14 Esta isoforma é sensível ao amiloride e apresenta um peso molecular apa-
51
capítulo 5
rente de 92.997, e assim como as outras NHEs ela possui sítios de fosforilação para proteína-quinase. A maior parte da secreção de H no túbulo proximal ocorre via trocador NHE-3 dependente de Na. O restante, via H-ATPase, independente de Na. Isso tem sido demonstrado nas vesículas de membrana da borda em escova e túbulo proximal de ratos.15,16 Existem evidências que demonstram que as células do túbulo proximal podem defender o pH intracelular em presença de uma carga de ácido na ausência de Na extracelular, e este mecanismo é eletrogênico, criando uma voltagem luminal positiva sob condições apropriadas.17,18 Quando a célula secreta H para o interior do lúmen, uma base equivalente é formada e esta deve ser transportada. Existem dois mecanismos aparentes para a saída da base através da membrana basolateral: transporte eletrogênico Na/3HCO3 e troca Cl/HCO3. Pesquisas mostram que a maior parte do transporte de HCO3 ocorre via transportador Na/3HCO3. Técnicas eletrofisiológicas bem como termodinâmicas foram usadas para determinar a estequiometria de três HCO3 para um Na no efluxo de HCO3 através da membrana basolateral.19,20 Além disso, tem sido mostrado que a absorção de HCO3 no túbulo proximal é muito mais dependente de Na do que de Cl.21 Estudos empregando técnicas de cloning sobre esse transporte certamente fornecerão mais detalhes para melhor entendimento da regulação da absorção de HCO3.22
Pontos-chave: • Mecanismos de secreção de H e absorção de HCO3 no túbulo proximal • A maior parte da secreção de H no túbulo proximal ocorre via trocador NHE-3 dependente de Na • Secreção de H através da membrana apical – NHE-3 e H-ATPase • A absorção de HCO3 no túbulo proximal é muito mais dependente de Na do que de Cl • Transporte de HCO3 através da membrana basolateral – Na/3HCO3 Cl/HCO3 Porção espessa ascendente. Na alça de Henle, particularmente na porção espessa ascendente, a secreção de H e a reabsorção de HCO3 ocorrem através de mecanismos semelhantes que ocorrem no túbulo proximal. 23,24 A secreção de H é sensível ao amiloride e mediada pelo antiporte NHE-3, e a absorção de HCO3 ocorre via cotransporte Na/3HCO3. A alça de Henle reabsorve cerca de 10 a 15% do HCO3 filtrado. Portanto, apenas 5 a 10% do HCO3 filtrado é liberado para o túbulo distal e ducto coletor.
SECREÇÃO DE H E REABSORÇÃO DE HCO3 NO TÚBULO DISTAL O néfron distal reabsorve o restante do HCO3 filtrado através de mecanismos que secretam H. A secreção de H no néfron distal também resulta em titulação de ânions tampões, primariamente fosfato, e em amônia impulsionando dois processos necessários para a formação de novo bicarbonato (discutidos adiante). A pequena quantidade do HCO3 filtrado é liberada para o ducto coletor e reabsorvida da mesma forma básica que foi descrita no túbulo proximal. Isto é, o íon H secretado combina-se com o íon HCO3 e forma CO2 e H2O no lúmen. O CO2 então se difunde para o interior da célula e é convertido em HCO3, que deixa a célula através da membrana basolateral. O néfron distal apresenta uma considerável heterogeneidade em relação à morfologia e à função celular. Segmentos distais que precedem o ducto coletor parecem acidificar o lúmen via membrana apical pela troca Na/H mediada pela NHE-2.25,26 O túbulo coletor cortical (TCC) e o ducto coletor da medula externa (DCME) acidificam o lúmen por uma via eletrogênica, mecanismo independente de Na que tem sido atribuído ao H-ATPase na membrana apical das células intercaladas.27,28 Técnicas de imuno-histoquímica têm sido empregadas para identificar H-ATPase na membrana apical e na basolateral do túbulo coletor cortical e na membrana apical do ducto coletor da medula externa.15 Estes resultados são consistentes com o modelo atual de transporte funcional das células intercaladas do túbulo distal. Estas células podem ser divididas em tipo alfa e tipo beta (IC e IC). O mecanismo básico destas células é ilustrado na Fig 5.2. A IC secreta H e absorve HCO3, enquanto a IC secreta HCO3 e absorve H. Pesquisas têm mostrado que no TCC a absorção de HCO3 predomina durante as condições de acidose, enquanto a secreção de HCO3 predomina durante as condições de alcalose.29
Pontos-chave: • A alça de Henle reabsorve cerca de 10 a 15% do HCO3 filtrado • O néfron distal reabsorve o restante do HCO3 filtrado através de mecanismos que secretam H • A secreção de H no néfron distal também resulta em titulação de ânions tampões, primariamente fosfato, e em amônia, impulsionando dois processos necessários para a formação de novo bicarbonato • No TCC, a absorção de HCO3 predomina durante as condições de acidose, enquanto a secreção de HCO3 predomina durante as condições de alcalose
52
Mecanismos de Acidificação Urinária
Evidências também indicam que H/K-ATPase no ducto coletor funciona para promover a absorção de K e secreção de H.30 A depleção de K estimula a H/KATPase no ducto coletor.31,32 A significância deste transportador sobre regulação global da acidificação urinária não está ainda esclarecida, e é a H-ATPase o método predominante para secreção de H no túbulo distal. Assim como no túbulo proximal, a secreção de um próton através da membrana apical do néfron distal obriga a saída de uma base equivalente através da membrana basolateral. Evidências indicam que no túbulo distal o trocador Cl/HCO3 na membrana basolateral é o mediador neste mecanismo.33 O íon Cl que entrou na célula via este trocador deixa a célula através da membrana basolateral via canal condutor de Cl. 34
Pontos-chave: Mecanismos de secreção de H1 e absorção de HCO3 no túbulo distal • IC • Membrana apical — H-ATPase, H/KATPase • Membrana basolateral — troca H/HCO3 • IC • Membrana apical — trocador Cl/HCO3 • Membrana basolateral — H-ATPase Importância da anidrase carbônica. Esta enzima já foi mencionada anteriormente, sendo importante reconhecer a sua função na acidificação urinária. Ela catalisa a reação entre CO2 e OH para formar HCO3.35 Sem a anidrase carbônica (AC), as reações químicas no lúmen e na célula ocorreriam num ritmo muito lento e a secreção de H e a reabsorção de HCO3 seriam significantemente reduzidas. Ânions monovalentes e sulfonamidas inibem a AC.36 É bem conhecido que a acetazolamida, inibidor da AC, reduz a secreção de H e a reabsorção de HCO3 e pode causar uma acidose metabólica. No organismo existem quatro isoformas de AC (I-IV) e sua distribuição ao longo do néfron tem sido muito estudada.37,38 A isoforma tipo II é encontrada no citoplasma das células renais, enquanto a do tipo IV é encontrada na membrana plasmática. Nas células do túbulo contornado proximal, a AC é encontrada tanto no citoplasma quanto na membrana apical e na basolateral. A atividade enzimática é aparentemente reduzida nos segmentos terminais do túbulo proximal. A porção espessa ascendente da maioria das espécies estudadas mostrou uma atividade da AC no citoplasma e nas membranas apical e basolateral, embora o segmento do coelho seja uma exceção. As células intercaladas no ducto coletor contêm altos níveis de AC, que está correlacionada com o seu papel na acidificação urinária.
Fig. 5.2 Transporte de H e HCO3 pelas células intercaladas (Cl e Cl).
Pontos-chave: Papel funcional da anidrase carbônica • Esta enzima catalisa a reação entre CO2 e OH para formar HCO3 • CO2 OH HCO3 • Acelera a secreção de H e a absorção de HCO3
FORMAÇÃO E EXCREÇÃO DE ÁCIDO TITULÁVEL Como já foi mencionado anteriormente, o organismo produz uma quantidade de ácido fixo ou não-volátil através do metabolismo de uma dieta normal. Estes ácidos primariamente incluem ácido sulfúrico produzido a partir do metabolismo de aminoácidos contendo enxofre, ácido fosfórico produzido pelo metabolismo de fosfolípides e ácido clorídrico produzido pelo metabolismo de aminoácidos catiônicos. A produção de ácido metabólico é par-
53
capítulo 5
cialmente balanceada pela produção de HCO3 através do metabolismo de aminoácidos aniônicos e ácidos orgânicos. Entretanto, o efeito global do metabolismo é a produção resultante de ácido que entra na corrente sanguínea e é tamponado pelo HCO3 extracelular. Estes ácidos são filtrados no glomérulo e titulados pelo mecanismo de secreção de H, descrito anteriormente. A Fig. 5.3 ilustra um exemplo de titulação de fosfato em que a quantidade de ácido titulável na urina pode ser determinada medindo a quantidade de base forte necessária para trazer de volta o pH urinário para o mesmo pH plasmático, que é em torno de 7,4. Quantitativamente, é o ácido titulável mais importante. O H secretado combina-se com o fosfato monoidrogênico para formar o fosfato diidrogênico que é excretado pela urina final. O importante evento neste processo é que um novo íon HCO3 (isto é, aquele que não foi filtrado) é formado na célula e absorvido para repor o HCO3 usado no tamponamento extracelular. Três fatores determinam a eficácia da excreção de ácido titulável: 1) a quantidade total de ácido fraco disponível para a titulação; 2) o pK do ácido fraco; e 3) o limite de capacidade do rim acidificar a urina (isto é, o menor pH urinário). A reação de equilíbrio de fosfato é um bom exemplo: HPO4 2 H ↔ H2PO4 pK 6,8 H2PO4 H ↔ H3PO4 pK 2,1 O menor pH urinário que o rim é capaz de produzir é cerca de 4,5 ([H] 3,2 105 M). A este nível, H-ATPase não é capaz de bombear íons H contra um gradiente de concentração (entre a célula e o lúmen) tão grande (maior que 1:1.000). A um pH de 4,5, virtualmente todo o fosfato está sob a forma de fosfato diidrogênico (H2PO4). H3PO4 não pode ser formado em grande quantidade na urina porque o baixo pK desta reação está fora da amplitude de variação do pH urinário. Deve ser observado que
o menor pH urinário é obtido no ducto coletor, enquanto o pH no final do túbulo proximal é cerca de 6,5. Se mais fosfato puder ser liberado para o ducto coletor, então mais H2PO4 poderá ser formado no lúmen e mais HCO3 novo poderá ser liberado para a corrente sanguínea. Outros ácidos que são titulados são: citrato acetato e creatinina, mas eles contribuem muito pouco para a quantidade total de ácido titulável comparado ao fosfato. Simplesmente não há ácido titulável suficiente para o rim repor completamente o HCO3 usado no tamponamento de ácidos não-voláteis. Felizmente, o rim utiliza um outro mecanismo para gerar novo HCO3, que é a síntese e a excreção de amônia.
Pontos-chave: Ácido titulável (AT) • A quantidade de ácido titulável na urina pode ser determinada medindo a quantidade de base forte necessária para trazer de volta o pH urinário para o mesmo pH plasmático, que é em torno de 7,4 • Forma novo HCO3 • Fosfato — o AT mais abundante Importantes fatores na excreção de AT • Quantidade total de AT • pK • pH urinário
SÍNTESE E EXCREÇÃO RENAL DE AMÔNIA Amônia é uma base fraca existente em equilíbrio como amônia iônica, NH4, e não-iônica, NH3: NH3 H ↔ NH4 pK 9,2
Fig. 5.3 Mecanismo de titulação do fosfato.
Tanto a amônia quanto o fosfato são tampões urinários. Por definição, a amônia não é um ácido titulável. Como já foi mencionado anteriormente, o ácido titulável é determinado pela quantidade de base forte necessária para trazer de volta o pH urinário para 7,4. Como o pK da reação da amônia é 9,2 num pH de 7,4, a maior parte da amônia permanece ainda como NH4 e não se dissocia até o pH alcançar 8,0 a 8,5. Sob condições normais, a maioria do H na urina final é excretada como NH4 e a excreção renal de NH4 aumenta significantemente durante condições de acidose. Portanto, quantitativamente, embora o fosfato seja o ácido titulável mais importante, a amônia é o mais importante tampão urinário. O mecanismo básico da síntese renal de amônia é ilustrado na Fig. 5.4. NH4 é produzido primariamente no tú-
54
Mecanismos de Acidificação Urinária
para NaCl estabelecido pelo mecanismo de contracorrente multiplicador. O epitélio renal é relativamente impermeável ao íon NH4 mas é permeável ao NH3, não-iônico, que se difunde passivamente para o lúmen do ducto coletor onde ocorre a secreção de H pelas células intercaladas , formando então NH4. A NH4 é assim captada no lúmen e excretada. Como o pK da amônia é 9,2, sua maior parte está sob a forma de NH4 na urina ácida. Este mecanismo é referido como “difusão-captação” da amônia. Observe que, diferente do fosfato que é derivado somente da dieta, NH4 é sintetizada pelo rim e portanto está sujeita a regulação fisiológica (ver adiante).
Pontos-chave: Fig. 5.4 Mecanismo da síntese renal de amônia.
bulo proximal a partir do metabolismo de aminoácido, glutamina, via enzima glutaminase I. A amônia pode também ser sintetizada em outros segmentos do néfron, mas sua síntese é mais abundante e fisiologicamente mais relevante no túbulo contornado proximal.39,40 A síntese envolve a entrada de glutamina nas células do túbulo proximal e uma série de passos bioquímicos para formar dois íons NH4 e dois íons HCO3. O NH4 é secretado no lúmen pela substituição de H do trocador Na/ H na membrana apical. O HCO3 é transportado para a corrente sanguínea pelo mesmo mecanismo ilustrado na Fig. 5.1. A manipulação renal da amônia secretada é ilustrada na Fig. 5.5. Este mecanismo é relativamente complexo e não é completamente conhecido. Uma parte da NH4 secretada no túbulo proximal é reabsorvida na porção espessa ascendente pela substituição de íon K do cotransportador Na/ K/2Cl na membrana apical. Uma parte da NH4 reabsorvida entra na porção fina descendente da alça de Henle e portanto é reciclada. Este processo produz um gradiente córtico-medular para NH4 semelhante ao gradiente
Fig. 5.5 Manipulação renal do NH4 excretado.
• Significância da síntese de amônia — gera novo HCO3 • Tanto a amônia quanto o fosfato são tampões urinários • Quantitativamente, embora o fosfato seja o ácido titulável mais importante, a amônia é o mais importante tampão urinário • Síntese da amônia – Metabolismo de glutamina no túbulo proximal Manipulação renal de amônia • Secreção de NH4 no túbulo proximal • Absorção de NH4 na porção espessa ascendente • Difusão de NH4 para o túbulo distal • “Difusão-captação” via secreção de H no túbulo distal
REGULAÇÃO DA ACIDIFICAÇÃO URINÁRIA Existem vários fatores que influenciam os mecanismos de acidificação já descritos. Alguns desses fatores regulam a quantidade e o ritmo de acidificação, enquanto outros simplesmente afetam esses mecanismos. Um fator importante que afeta a reabsorção de HCO3 é a sua carga filtrada. O balanço glomérulo-tubular para HCO3 ocorre da mesma forma que ocorre para o Na, onde a mudança na carga filtrada de HCO3 resulta numa mudança apropriada na reabsorção de HCO3 no túbulo proximal. Um aumento na carga filtrada resulta num aumento na reabsorção, prevenindo assim a bicarbonatúria. O mecanismo para esta resposta adaptativa é ainda desconhecido. Aumentando a taxa de filtração glomerular (RFG), aumenta o fluxo luminal no túbulo proximal, e isso
55
capítulo 5
de alguma forma estimula a troca Na/H e/ou transporte Na/3HCO3.41 Como a troca Na/H é responsável pela maior parte da secreção de H no túbulo proximal, fatores que regulam a reabsorção de Na afetarão também a secreção de H neste segmento do néfron. Obviamente, estes fatores também afetarão a reabsorção de HCO3 no túbulo proximal. Talvez o fator mais importante seja o volume extracelular (VEC). Quando o VEC se expande, a reabsorção de Na no túbulo proximal diminui e portanto a reabsorção de HCO3 também diminui. Quando o VEC se contrai, aumenta a reabsorção de Na e de HCO3 no túbulo proximal. O status ácido-base influencia a secreção de H. Tanto a acidose metabólica quanto a respiratória estimulam a secreção de H no túbulo proximal, porção espessa ascendente e ducto coletor. A acidose aumenta a secreção porque quando o fluido intracelular acidifica, o gradiente célulalúmen torna-se favorável para a secreção de H através de ambas as vias: troca Na/H e H-ATPase. Como era esperado, a alcalose diminui a secreção de H. Existem evidências interessantes indicando que mudanças no pH peritubular resultam na inserção de novos transportadores de H na membrana apical do túbulo proximal e ducto coletor.42 Acidose, tanto a crônica quanto a aguda, também estimula a síntese renal de amônia, provavelmente ativando enzimas envolvidas no metabolismo da glutamina. Diminuição do pH intracelular aparentemente estimula a produção enzimática da amônia e conseqüentemente a produção de novos HCO3. A concentração plasmática de K também influencia a síntese de amônia. O mecanismo para este efeito não está totalmente esclarecido, entretanto, acredita-se que está relacionado às mudanças na concentração intracelular de H. Hipercalemia diminui a concentração intracelular de H, assim inibindo a síntese de amônia, enquanto a hipocalemia apresenta efeitos opostos. Doucet mostrou que a deficiência de K estimula a secreção de H via o aumento da expressão aparente de H/K-ATPase na membrana apical do ducto coletor.31 Efeitos hormonais sobre a acidificação urinária. Vários hormônios afetam a secreção de H no néfron. Existem novamente questões como: se estes efeitos hormonais são destinados a regular a acidificação urinária ou se eles são simplesmente destinados a alterar a secreção de H. Dois hormônios que têm sido muito estudados são a aldosterona e o hormônio da paratireóide, o paratormônio (PTH). Aldosterona estimula a secreção de H no ducto coletor através de diferentes mecanismos. Um é pela estimulação da reabsorção de Na nas células principais. Como já foi dito anteriormente, o ducto coletor apresenta células principais e células intercaladas. As células principais reabsorvem o Na e secretam o K, e a aldosterona estimula ambos os processos. A estimulação da reabsorção de Na no ducto coletor pela aldosterona produz uma voltagem negativa no lúmen que aumenta o gradiente eletroquími-
co para secreção de H. Isto representa um mecanismo indireto da aldosterona na secreção de H no ducto coletor. Há também evidências que mostram que a aldosterona estimula diretamente a secreção de H e a troca Cl/ HCO3 no ducto coletor.43 Um outro mecanismo indireto pelo qual a aldosterona afeta a acidificação urinária está relacionado com a síntese de amônia. Aldosterona estimula a secreção de K nas células principais e isto pode levar à hipocalemia, que aumenta a produção de amônia, como já foi explicado. Com maior produção de amônia no túbulo proximal, maior reabsorção de HCO3 pode ocorrer no ducto coletor. Assim como a aldosterona, o PTH afeta a secreção de H de várias formas. Evidências mostram que o PTH estimula a adenil-ciclase no túbulo proximal, e o aumento de concentração celular de AMPc inibe a troca Na/H. O PTH pode estimular a fosfolipase C levando a um aumento de cálcio intracelular e ativando a proteinoquinase C. Estas vias celulares podem estar ligadas à inibição da acidificação. PTH também inibe a reabsorção de HCO3 na porção espessa ascendente. Evidências também indicam que o PTH aumenta a secreção de H no ducto coletor, aumentando a excreção de ânions não-reabsorvíveis e agindo como um tampão urinário, tal como o fosfato. Isso pode ser um mecanismo compensatório para a inibição de secreção de H induzido pelo PTH no túbulo proximal. As influências do PTH sobre a acidificação urinária continuam
Pontos-chave: Regulação da acidificação urinária • Carga filtrada de HCO3 – Aumento da carga filtrada aumenta a absorção e vice-versa • Status ácido-base – Acidose aumenta a secreção de H e a alcalose diminui a secreção de H • Status volume extracelular (VEC) – Expansão de VEC inibe a secreção de H e a contração do VEC estimula a secreção de H • Amoniagênese – Acidose aumenta a síntese e a alcalose diminui a síntese – Hipocalemia aumenta a síntese, e a hipercalemia diminui a síntese • Hormônios – Aldosterona aumenta a secreção de H direta e indiretamente – PTH inibe a secreção de H no túbulo proximal
56
Mecanismos de Acidificação Urinária
controversas, e mais estudos são necessários para melhor entendimento. Glicocorticóides aumentam a troca Na/H no túbulo proximal, aumentando a quantidade de proteína NHE-3 e de RNAm.44 Outros hormônios que também aumentam a secreção de H e HCO3 são: adenosina, catecolaminas, endotelinas e angiotensina II. Provavelmente existem outros envolvidos.
Para obter uma discussão mais completa e detalhada, aconselhamos o leitor a consultar a seguinte referência: Alpern, R.J. Renal acidification mechanisms. Brenner, B.M. (Ed.) The Kidney, 6th ed. Philadelphia: Saunders, 2000, Capítulo 11.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
FUTUROS ESTUDOS A evidência com relação ao efeito de glicocorticóides e da proteína NHE-3 enfatiza a necessidade de futuras pesquisas nesta área. O transporte de proteínas responsáveis pela acidificação urinária ao nível molecular está agora esclarecido, e evidências sobre a regulação destas proteínas a este nível certamente irão fornecer respostas às questões de como a acidificação urinária é regulada e irão distinguir os reguladores e os efetores.
2.
3.
4.
5.
6.
RESUMO O complexo mecanismo de acidificação urinária é destinado a manter o balanço ácido-básico que requer um pH plasmático estável (entre 7,35 e 7,40 ) e a concentração plasmática de HCO3 (entre 23 e 25 mM). O rim deve reabsorver todo o HCO3 e fabricar novo HCO3 para substituir aquele que foi usado para tamponar o ácido não-volátil. O rim reabsorve HCO3 através da secreção de H que ocorre através de três mecanismos primários: troca Na/H, HATPase e troca K/H. O túbulo proximal e a porção espessa ascendente secretam H primariamente pela troca Na/H via proteína NHE-3, e esses segmentos do néfron reabsorvem a maior parte da carga filtrada de HCO3. O túbulo distal e o ducto coletor secretam H primariamente pela HATPase nas células intercaladas alfa (CI). Novo HCO3 é gerado pela excreção de ácido titulável e síntese de amônia. Quantitativamente, o ácido titulável mais importante é o fosfato. Amônia, o tampão mais importante, é sintetizada através do metabolismo de glutamina no túbulo proximal. A carga filtrada de HCO3 afeta a sua reabsorção no túbulo proximal assim como o status de VEC, alterando a reabsorção de Na. Acidose estimula e alcalose inibe a secreção de H. Acidose e hipocalemia estimulam a síntese de amônia, enquanto alcalose e hipercalemia apresentam efeitos inibitórios. Aldosterona estimula a secreção de H no ducto coletor através de um mecanismo indireto associado ao aumento de reabsorção de Na e um mecanismo direto associado à H-ATPase, e por um outro mecanismo indireto associado à hipocalemia e à síntese de amônia. PTH inibe a troca Na/H no túbulo proximal estimulando a adenil-ciclase.
7. 8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15. 16.
17.
18.
DUBOSE, T.D.J.; PUCACCO, L.R. and CARTER, N.W. Determination of disequilibrium pH in the rat kidney in vivo: evidence for hydrogen secretion. Am. J. Physiol., 240 (Renal Fluid Electrolyte Physiol., 9):F138-F146, 1981. KURTZ, I.; STAR, R.; BALABAN, R.S.; GARVIN, J.L. and KNEPPER, M.A. Spontaneous luminal disequilibrium pH in S3 proximal tubules. J. Clin. Invest., 78:989-996, 1986. VIEIRA, G.L. and MALNIC, B. Hydrogen ion secretion by rat renal cortical tubules as studied by an antimony microelectrode. Am. J. Physiol., 214: 710-718, 1968. MURER, H.; HOPFER, U. and KINNE, R. Sodium/proton antiport in brush-border membrane vesicles isolated from rat small intestine and kidney. Biochem. J., 154: 597-604, 1976. KINSELLA, J.L. and ARONSON, P.S. Amiloride inhibition of the NaH exchanger in renal microvillus membrane vesicles. Am. J. Physiol., 241:F374-F379, 1981. WARNOCK, D.G.; REENSTRA, W.W. and YEE, V.J. Na/H antiporter of brush border vesicles: Studies with acridine orange uptake. Am. J. Physiol., 242:F733-F739, 1982. ALPERN, R.J. and CHAMBERS, M. Cell pH in the rat proximal convoluted tubule. J. Clin. Invest., 78:502-510, 1986. BORON, W.F. and BOULPAEP, E.L. Intracellular pH regulation in the renal proximal tubule of the salamander. J. Gen. Physiol., 81:5394, 1983. SASAKI, S.; SHIIGAI, T. and TAKEUCHI, J. Intracellular pH in the isolated perfused rabbit proximal straight tubule. Am. J. Physiol., 249(Renal Fluid Electrolyte Physiol., 18):F417-F423, 1985. HAGGERTY, J.G.; AGARWAL, N. and REILLY, R.F. Pharmacologically different Na/H antiporters on the apical and basolateral surfaces of cultured porcine kidney cells (LLC-PK1). Proc. Natl. Acad. Sci., 85:6797-6801, 1988. ORLOWSKI, J.; KANDASAMY, R.A. and SHULL, G.E. Molecular cloning of putative members of Na/H exchanger gene family. J. Biol. Chem., 267:9331-9339, 1992. TSE, C.M.; BRANT, S.R.; WALKER, M.S.; POUYSSEGUR, J. and DONOWITZ, M. Cloning and sequencing of a rabbit cDNA encoding an intestinal and kidney-specific Na/H exchanger isoform (NHE-3). J. Biol. Chem., 267:9340-9346, 1992. ORLOWSKI, J. Heterologous expression and functional properties of amiloride high affinity (NHE-1) and low affinity (NHE-3) isoforms of the rat Na/H exchanger. J. Biol. Chem., 268:16369-16377, 1993. TSE, C.M.; LEVINE, S.A.; YUN, C.H.C.; BRANT, S.R.; POUSYSSEGUR, J.; MONTROSE, M.H. and DONOWITZ, M. Functional characteristics of a cloned epithelial Na/H exchanger (NHE3): resistance to amiloride and inhibition by protein kinase C. Proc. Natl. Acad. Sci., 90:9110-9114, 1993. BROWN, D.; HIRSCH, S. and GLUCK, S. Localization of a protonpumping ATPase in rat kidney. J. Clin. Invest., 82:2114-2126, 1988. KINNE-SAFFRAN, E.; BEAUWENS, R. and KINNE, R. An ATPdriven proton pump in brush-border membranes from rat renal cortex. J. Membrane Biol., 64:67-76, 1982. KURTZ, I. Apical Na/H antiporter and glycolysis-dependent HATPase regulate intracellular pH in the rabbit S3 proximal tubule. J. Clin. Invest., 80:928-935, 1987. YOSHITOMI, K.; BURCKHARDT, B.C. and FROMTER, E. Rheogenic sodium-bicarbonate cotransport in the peritubular cell membrane of rat renal proximal tubule. Pflugers Arch., 405:360-366, 1985.
19. 20.
21.
22.
23. 24. 25.
26.
27.
28.
29. 30.
31.
32.
capítulo 5
57
33.
HAYS, S.R. and ALPERN, R.J. Apical and basolateral membrane H extrusion mechanisms in inner stripe of rabbit outer medullary collecting duct. Am. J. Physiol., 259(Renal Fluid Electrolyte Physiol., 28):F628-F635, 1990. KOEPPEN, B.M. Conductive properties of the rabbit outer medullary collecting duct: Inner stripe. Am. J. Physiol., 248:F500-F506, 1985. SILVERMAN, D.N. and VINCENT, S.H. Proton transfer in the catalytic mechanism of carbonic anhydrase. CRC Crit. Rev. Biochem., 14:207-255, 1983. MAREN, T.H. Carbonic anhydrase: Chemistry, physiology, and inhibition. Physiol. Rev., 47:595-781, 1967. DOBYAN, D.C. and BULGER, R.E. Renal carbonic anhydrase. Am. J. Physiol., 243:F311-F324, 1982. PREISIG, P.A.; TOTO, R.D. and ALPERN, R.J. Carbonic anhydrase inhibitors. Renal Physiol., 10:136-159, 1987. CURTHOYS, N.P. and LOWRY, O.H. The distribution of glutaminase isoenzymes in the various structures of the nephron in normal, acidotic, and alkalotic rat kidney. J. Biol. Chem.; 248:162-168, 1973. GOOD, D.W. and BURG, M.B. Ammonia production by individual segments of the rat nephron. J. Clin. Invest., 73:602-610, 1984. ALPERN, R.J.; COGAN, M.G. and RECTOR, F.C.J. Flow dependence of proximal tubular bicarbonate absorption. Am. J. Physiol., 245:F478F484, 1983. SCHWARTZ, G.J. and AL-AWQATI, Q. Carbon dioxide causes exocytosis of vesicles containing H pumps in isolated perfused proximal and collecting tubules. J. Clin. Invest., 75:1638-1644, 1985. HAYS, S.R. Mineralocorticoid modulation of apical and basolateral membrane H/OH/HCO3 transport processes in the rabbit inner stripe of outer medullary collecting duct. J. Clin. Invest., 90:180-187, 1992. BAUM, M.; MOE, O.W.; GENTRY, D.L. and ALPERN, R.J. Effect of glucocorticoids on renal cortical NHE-3 mRNA. Am. J. Physiol., 267:F437-F442, 1994.
ALPERN, R.J. Cell mechanisms of proximal tubule acidification. Physiol. Rev., 70:79-114, 1990. PREISIG, P.A. and ALPERN, R.J. Basolateral membrane H/OH/ HCO3 transport in the proximal tubule. Am. J. Physiol. 256:F751-F765, 1989. SASAKI, S. and BERRY, C.A. Mechanism of bicarbonate exit across basolateral membrane of the rabbit proximal convoluted tubule. Am. J. Physiol., 246:F889-F896, 1984. ROMERO, M.F.; HEDIGER, M.A.; BOULPAEP, E.L. and BORON, W.F. Expression cloning and characterization of a renal electrogenic Na/HCO3 cotransporter. Nature., 387:409-413, 1997. GOOD, D.W. Ammonia and bicarbonate transport by thick ascending limb of rat kidney. Am. J. Physiol., 248:F821-F829, 1984. KRAPF, R. Basolateral membrane H/OH/HCO3 transport in the rat cortical thick ascending limb. J. Clin. Invest., 82:234-241, 1988. CHAMBREY, R.; WARNOCK, D.G.; PODEVIN, R.A. BRUNEVAL, P.; MANDET, C.; BELAIR, M.F.; BARIETY, J. and PAILLARD, M. Immunolocalization of the Na/H exchanger isoform NHE2 in rat kidney. Am. J. Physiol., 275:F379-F386, 1998. WANG, T.; MALNIC, G.; GIEBISCH, G. and CHAN, Y.L. Renal bicarbonate reabsorption in the rat. IV. Bicarbonate transport mechanisms in the early and late distal tubule. J. Clin. Invest., 91:27762784, 1993. KOEPPEN, B.M. and HELMAN, S.I. Acidification of luminal fluid by the rabbit cortical collecting tubule perfused in vitro. Am. J. Physiol. 242(Renal Fluid Electrolyte Physiol., 11):F521-F531, 1982. LOMBARD, W.E.; KOKKO, J.P. and JACOBSON, H.R. Bicarbonate transport in cortical and outer medullary collecting tubules. Am. J. Physiol., 244(Renal Fluid Electrolyte Physiol., 13):F289-F296, 1983. MCKINNEY, T.D. and BURG, M.B. Bicarbonate transport by rabbit cortical collecting tubules. J. Clin. Invest., 60:766-768, 1977. NAKAMURA, S.; WANG, Z.; GALLA, J.H. and SOLEIMANI, M. K depletion increases HCO3 reabsorption in OMCD by activation of colonic H-K-ATPase. Am. J. Physiol., 274:F687-F692, 1998. DOUCET, A. and MARSY, S. Characterization of K-ATPase activity in distal nephron: Stimulation by potassium depletion. Am. J. Physiol., 253:F418-F423, 1987. WINGO, C.S. Active proton secretion and potassium absorption in the rabbit outer medullary collecting duct. J. Clin. Invest., 84:361-365, 1989.
34. 35.
36. 37. 38. 39.
40. 41.
42.
43.
44.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.qldanaesthesia.com/AcidBaseBook/AB85.htmhttp://www.ha.org.hk/tmh/medicine/rta.html http://www.niddk.nih.gov/health/kidney/pubs/rta/rta.htm
Capítulo
Mecanismo de Concentração e de Diluição Urinária
6
Antonio José Barros Magaldi
INTRODUÇÃO
SECREÇÃO DE HAD
FORMAÇÃO DA MEDULA HIPERTÔNICA
REGULAÇÃO DA INGESTA — MECANISMO DA SEDE
AÇÃO DO HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
BALANÇO HÍDRICO
ENDEREÇO RELEVANTE NA INTERNET
INTRODUÇÃO O estudo do mecanismo de concentração e de diluição urinária constitui um dos capítulos mais fascinantes da fisiologia renal. Os recentes avanços na metodologia de pesquisa e as admiráveis descobertas acerca da secreção e do mecanismo de ação do hormônio antidiurético mostram como o rim, com um mínimo gasto de energia, consegue variar a osmolaridade da urina e a excreção de água de acordo com as necessidades do organismo. A eliminação de urina concentrada resulta da reabsorção de água no ducto coletor. Para que esta reabsorção aconteça, dois fatos devem ocorrer: 1.º) formação de medula hipertônica em relação ao fluido do ducto coletor e 2.º) permeabilidade do ducto coletor à água aumentada pelo hormônio antidiurético (HAD). Portanto, a análise do mecanismo de concentração e diluição urinária resume-se no estudo do processo pelo qual o rim acumula solutos no interstício medular durante os estados hidropênicos e o modo de ação do hormônio antidiurético.
Pontos-chave: Condições para a reabsorção de água no ducto coletor medular • Formação de uma medula hipertônica • Ação do hormônio antidiurético
FORMAÇÃO DA MEDULA HIPERTÔNICA O estudo da medula renal de animais em estado de restrição aquosa mostra que a hipertonicidade aí existente decorre, fundamentalmente, da acumulação de uréia e solutos, principalmente NaCl. O mecanismo pelo qual estes solutos se depositam no interstício medular foi genialmente idealizado em 1942 por Werner e Kuhn, com a hipótese da existência de um sistema de contracorrente multiplicador nos ramos em “U” da alça de Henle. Este sistema produziria um aumento progressivo da osmolaridade da medula renal do córtex em direção à papila, com pouco gasto de energia. Esse modelo foi baseado no sistema multiplicador de calor, utilizado na indústria, onde uma fonte constante de calor aquece o fluido em um ponto na alça de um tubo em forma de “U”, promovendo um aumento progressivo da temperatura desse fluido, sem grande consumo de energia. Este tubo dobrado e justaposto um ao lado do outro faz com que exista um fluxo do mesmo fluido em sentidos opostos proporcionando troca de calor contínua a partir do ponto que recebe o calor, formando um gradiente de temperatura (Fig. 6.1). Um sistema semelhante existe nos membros inferiores das aves pernaltas que ficam com os pés mergulhados em águas de baixa temperatura, onde a artéria descendente fica justaposta às veias ascendentes, ajudando a aumentar gradualmente a temperatura do sangue que se dirige dos pés ao coração.
59
capítulo 6 Fluido 30° Fluido 30°
40° 30°
40°
60°
70°
90°
100°
30° Fonte de Calor 40°
A
B 40°
Fonte de Calor
Fig. 6.1 Princípio da contracorrente. Tanto no sistema reto A quanto no sistema dobrado B a fonte de calor produz a mesma quantidade de calorias; no entanto, no sistema B ocorre a formação de um gradiente de temperatura, em decorrência da conformação de dois tubos justapostos com fluxos inversos. Este modelo explica a formação de gradiente de osmolaridade que ocorre na medula renal com a conformação idêntica à existente na alça de Henle. Adaptado de Berliner, R.W., Lewinsky, N.G., Davidson, D.G., Eden, M. Am. J. Med., 24:730-744, 1958.
tuados com a técnica de microperfusão em porções isoladas do néfron de coelhos, que permitiram a análise direta das características de permeabilidade e de transporte nos segmentos medulares do néfron. Os estudos funcionais da porção espessa da alça de Henle, tanto da região medular como da região cortical (segmento diluidor), mostraram ser eles impermeáveis à água, mesmo na presença de hormônio antidiurético. Neste segmento, na membrana luminal ocorre uma reabsorção de Na acoplado a Cl e K em um co-transporte Na:K:2Cl, secundariamente ativo ao transporte de Na ativo pela Na-K-ATPase na membrana basolateral. Este transporte ativo propicia um gradiente eletroquímico favorável à entrada de Na na célula. A passagem de Na da luz tubular para o interstício, retirando Na do fluido filtrado e adicionando-o ao interstício, constitui o chamado efeito uni-
Uréia
CÓRTEX
NaCl
No rim, este tubo dobrado corresponde às alças descendentes e ascendentes de Henle. O sistema de contracorrente multiplicador inicialmente idealizado e aplicado à medula renal é apresentado na Fig. 6.2. A energia inicial que movimentaria este sistema seria dada pelo transporte ativo de NaCl da luz tubular para o interstício medular na porção ascendente da alça de Henle. Este transporte de NaCl é que, aumentando a osmolaridade do interstício, promoveria a reabsorção de água no ramo descendente da alça, com conseqüente aumento progressivo da osmolaridade do seu fluido tubular em direção à papila. Este efeito inicial seria multiplicado e o gradiente osmótico então criado determinaria maior reabsorção de água no ducto coletor. Alguns estudos experimentais que se seguiram à proposta do sistema de contracorrente multiplicador na medula renal foram compatíveis com a sua existência. Assim, observou-se que o fluido no início do túbulo distal é hipotônico (100 mOsm/kg H2O) em relação ao filtrado glomerular (289 mOsm/kg H2O) e que está de acordo com a existência de uma reabsorção ativa de NaCl, na ausência de transporte de água no ramo ascendente da alça de Henle. Observou-se, também, que o aumento da osmolaridade da medula externa em direção à papila é diretamente proporcional ao comprimento da alça de Henle do animal em estudo. São semelhantes as osmolaridades dos fluidos colhidos dos vasa recta e da porção fina descendente da alça de Henle. A maioria das proposições para explicar o mecanismo de contracorrente foram elucidadas através de estudos efe-
1
2 HAD
NaCl
MEDULA INTERNA
VASA RECTA
Uréia H2O NaCl
NaCl
NaCl
NaCl
H2O
NaCl
NaCl
HAD Uréia 2
NaCl
NaCl
H2O
H2O
H2O
1
3
HAD H2O
Uréia
Uréia
H2O
Uréia H2O 7 NaCl
NaCl
H2O
Uréia
7
HAD Uréia NaCl 5
3
H2O
H2O
Uréia
NaCl
H2O 2 HAD
Uréia
6
NaCl H2O
MEDULA EXTERNA
H2O
6
NaCl
NaCl
Uréia
5
HAD 2 H2O H2O
Uréia
NaCl
4
7 NaCl
6 Uréia
4
HAD
Uréia
H2O
Fig. 6.2 Mecanismo de concentração urinária. 1) Transporte ativo de cloreto de sódio no ramo ascendente espesso da alça de Henle — efeito inicial — aumentando a quantidade de sódio no interstício. 2) Reabsorção de água no ducto coletor cortical, medular externo e interno, na presença de HAD ocasionado pelo gradiente osmótico resultante do transporte ativo de NaCl na porção espessa ascendente. 3) Reabsorção de água na alça descendente de Henle frente ao gradiente osmótico entre a luz tubular e a medula. 4) Adição de uréia à medula interna na presença de HAD. 5) Efluxo de NaCl da porção fina ascendente, na ausência de transporte de água, aumentando a osmolaridade medular e multiplicando o efeito inicial. 6) Aumento da reabsorção de água no ducto coletor medular interno, decorrente do aumento da tonicidade intersticial dado pelo sistema multiplicador. 7) Reabsorção de solutos e de água pelos vasa recta, fazendo a recirculação de uréia e mantendo a medula hipertônica.
60
Mecanismo de Concentração e de Diluição Urinária
tário do mecanismo de contracorrente multiplicador. Este co-transportador Na:K:2Cl já foi clonado e seqüenciado pela técnica de biologia molecular. A porção espessa ascendente da alça de Henle é uma região importante para o mecanismo de concentração urinária e é o local de ação dos chamados diuréticos de alça, como a furosemida e a bumetanida, que se ligando ao sítio do íon Cl promovem a inibição do co-transportador Na:K:2Cl. Os ramos finos da alça de Henle, tanto ascendentes como descendentes, são formados por um epitélio simples escamoso, que repousa sobre uma membrana basal, e o citoplasma de suas células é escasso em mitocôndrias. Este padrão morfológico é de um epitélio favorável ao equilíbrio osmótico entre o lúmen e o interstício, e não a um transporte ativo com gasto de energia. O estudo funcional da porção fina descendente da alça de Henle mostra que este ramo é altamente permeável à água e pouco permeável ao sódio e a outros solutos, sugerindo que o equilíbrio osmótico com o interstício medular ocorra à custa da reabsorção de água, com conseqüente aumento da concentração de cloreto de sódio, uréia e outros solutos no fluido tubular, em direção à papila renal, como está apresentado na Fig. 6.2. A porção fina ascendente da alça de Henle apresenta características opostas às descritas acima para o ramo descendente. Observa-se que a porção ascendente é impermeável à água e é altamente permeável a Na e Cl, sendo que o movimento transtubular de cloretos deve ocorrer por um mecanismo passivo facilitado. Nestas condições, a mudança de características de permeabilidade à água e solutos nos ramos finos descendentes e ascendentes permite que o acúmulo de NaCl que ocorre na porção descendente da alça de Henle por reabsorção de água se desfaça, pelo menos em parte, na porção fina ascendente, como ilustra a Fig. 6.2. No entanto, neste segmento ascendente o equilíbrio osmótico com o interstício medular dá-se à custa do efluxo de NaCl rápido e influxo de uréia mais lento, o que resulta na formação de um fluido tubular com menor concentração de NaCl que o interstício. Este fluido, agora atingindo a porção espessa ascendente onde ocorre grande reabsorção de NaCl ativamente, ficará cada vez mais hipotônico, sendo que a sua osmolaridade pode atingir valores inferiores a 100 mOsm/kg H2O no início do túbulo distal. Assim, por este fato, este segmento é chamado de segmento diluidor. Vê-se, portanto, que apenas as características opostas de permeabilidade dos ramos finos, descendentes e ascendentes, proporcionam um meio genial de adicionar soluto (NaCl) ao nível da região medular interna e de formar um fluido hipotônico à custa, unicamente, da reabsorção ativa de NaCl da região medular externa, como está esquematizado na Fig. 6.2. Esses dados sobre as características de transporte de Na, Cl, H2O e uréia nas várias porções da alça de Henle são capazes de explicar, pelo menos qualitativamente, o
acúmulo de NaCl e uréia no interstício papilar. Entretanto, como descrevemos no início, a hipertonicidade medular se faz à custa de NaCl e uréia e, por conseguinte, precisamos explicar como se forma o gradiente túbulo-intersticial desse soluto (uréia). Como veremos a seguir, ele é também o resultado de diferenças nas características de permeabilidade dos vários segmentos medulares e principalmente das várias porções do túbulo coletor. O papel importante da uréia no mecanismo de concentração urinária já era conhecido de longa data pelas observações de que animais submetidos a dieta pobre em proteínas tinham menor capacidade de formar urina hipertônica. Contudo, foi só recentemente que as investigações acerca do transporte de solutos nos vários segmentos do néfron trouxeram a explicação para esse fato. O mecanismo de conservação de uréia no rim é dado por vias de recirculação indicadas na Fig. 6.3. A uréia filtrada pelo glomérulo e não reabsorvida pelo túbulo contornado proximal junta-se à secretada pela pars recta antes de atingir a porção fina descendente da alça de Henle. Nesse segmento, o equilíbrio osmótico com o interstício se faz principalmente à custa da saída de água e aumento da concentração de solutos do fluido tubular. No rato a permeabilidade à uréia aí existente permite que, em parte, ocorra influxo desse soluto, elevando ainda mais a concentração luminal. A seguir, no ramo fino ascendente, relativamente permeável à uréia, impermeável à água e altamente permeável a Na e Cl, o equilíbrio osmótico com o interstício se faz à custa de saída rápida de NaCl e entrada lenta de uréia. Vemos, portanto, que na porção fina ascendente da alça de Henle ocorre adição de uréia ao fluido tubular. Por outro lado, no ramo espesso ascendente, túbulo distal e túbulo coletor cortical não temos nenhum movimento Rotas de Recirculação da Uréia
Néfrons Corticais e Justamedulares
햵 Córtex
햶 zona externa
Medula
햳
햶 Externa
햴
zona interna
햶
햸 햲 햷
햷
Medula Interna
Fig. 6.3 Recirculação da uréia. Mecanismo pelo qual alta concentração de uréia é mantida na medula (1) à custa da sua difusão da luz do ducto coletor medular interno para a papila e reabsorção ao nível da porção fina ascendente da alça de Henle (etapas 1 a 7) e (2) à custa da sua retirada do interstício pelos vasa recta, sendo novamente filtrada e lançada na luz tubular. Adaptado de Valtin, H. e Schafer, J.A. Renal Function, Little, Brown and Company, 1995.
61
capítulo 6
transtubular de uréia. No túbulo coletor distal, a reabsorção de água em presença de hormônio antidiurético determina elevação na concentração luminal de uréia até atingir o coletor papilar. Nesta porção final do coletor existe permeabilidade transtubular à uréia que permite que este soluto mais concentrado na luz tubular eflua para o interstício papilar. Esta uréia adicionada ao interstício medular promoverá maior reabsorção de água no ramo fino descendente da alça de Henle, acionando, ainda mais, o mecanismo de contracorrente multiplicador passivo. O equilíbrio osmótico medular é conseguido pela circulação sanguínea lenta e pela entrada de uréia, novamente, para a alça fina ascendente, conservando-a dentro do néfron. Segundo alguns autores, o epitélio que separa a papila renal da pelve é constituído por células relativamente permeáveis à uréia, que permitiriam que uma parte desse soluto eliminado pela urina se retrodifunda para a papila renal, constituindo outro mecanismo para conservação de soluto dentro da medula renal. No processo de formação da medula hipertônica os vasa recta possuem um papel importante, pois deve existir uma troca intensa entre o interstício medular e a luz dos vasos que penetram neste interstício para que se mantenha o gradiente de concentração medular (Fig. 6.4). Cerca de 5% do fluxo renal plasmático são dirigidos para os vasos da medula externa e interna, e como o fluxo plasmático renal é alto, o fluxo plasmático nos vasa recta descendente e ascendente é cerca de 10 vezes mais intenso que o fluxo do fluido tubuTroca em contracorrente nos vasa recta
325
291 400 350 450 425 600 750 900 1.050 1.200
575
Córtex
Pontos-chave:
400 475 450
Medula Externa
625 600
775
750 725
925 900
875 1.050 1.025
1.200 1.200
lar no começo do ducto coletor medular externo, isto é, entra 10 vezes mais plasma que fluido tubular numa mesma região da medula. A alta permeabilidade à água e a solutos de suas paredes, associada à sua disposição em forma de hairpin, como a alça de Henle, permite que seja possível a remoção de água e solutos do interstício medular também através de um mecanismo de troca em contracorrente sem alterar a formação do gradiente de concentração medular e auxiliando diretamente o mecanismo de contracorrente multiplicador que ocorre na luz tubular. Trabalhos publicados recentemente evidenciaram nestes vasos a existência de receptores do tipo V1 e V2 da vasopressina, mostrando que este hormônio também pode regular o fluxo medular — a estimulação do receptor V1 diminui o fluxo medular, enquanto a estimulação do receptor V2 aumentaria este fluxo — e evidenciaram também canais de água do tipo aquaporin 1 nos vasa recta descendentes. Vemos, portanto, que esquematicamente a formação de uma medula hipertônica consta de duas partes: A) uma relacionada com as diferenças de permeabilidade a NaCl e água nos ramos finos da alça de Henle, que leva à adição de NaCl ao interstício papilar a partir da reabsorção de NaCl na porção espessa ascendente, e B) outra que determina a adição de uréia ao interstício papilar, resultante das diferenças de permeabilidade à uréia entre o túbulo coletor cortical e o ducto coletor papilar. Esta uréia adicionada à papila constitui uma segunda força que promove a reabsorção de água no ramo fino descendente da alça de Henle, acelerando o mecanismo de contracorrente multiplicador passivo aí localizado. Estas idéias aqui apresentadas com base nos estudos experimentais constituem o modelo de contracorrente multiplicador atualmente aceito e que é esquematizado na Fig. 6.2.
1.075
Medula Interna
• Heterogeneidade tubular • Efeito unitário na porção espessa da alça de Henle • Sistema de contracorrente multiplicador • Recirculação da uréia
1.200 Papila
Difusão passiva de solutos Difusão passiva de água
Fig. 6.4 Contracorrente nos vasa recta. Os números referem-se às osmolaridades (mOsm/kg) no sangue e no fluido intersticial. Note-se que estes vasos propiciam a retirada da medula de parte dos solutos (principalmente NaCl e uréia) e da água, ajudando na formação e na manutenção da medula hipertônica. Adaptado de Berliner, R.W., Lewinsky, N.G., Davidson, D.G. and Eden, M.A. Am. J. Med., 24:730-744, 1958.
AÇÃO DO HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO O conhecimento dos eventos celulares envolvidos na ação do hormônio antidiurético (HAD) expandiu-se consideravelmente nos últimos anos. O HAD é um hormônio capaz de induzir alterações estruturais na parede luminal das células principais, determinando um aumento da permeabilidade à água e à uréia. O HAD, que evoca a resposta celular, é o “primeiro mensageiro”, e o seu efeito intracelular é
62
Mecanismo de Concentração e de Diluição Urinária
mediado por um “segundo mensageiro”, que é produzido como resultado da interação do hormônio com o seu receptor específico. Os dois mais importantes sistemas de “segundos mensageiros” conhecidos são os sistemas da adenosina monofosfato cíclico (AMPc) e o do Ca. O HAD exerce seu efeito hormonal estimulando dois tipos de receptores, chamados de V1 e V2, sendo que respectivamente utilizam o Ca e o AMPc como “segundos mensageiros”. Estes receptores estão localizados na membrana basolateral da célula principal e quando estimulados determinam alterações bioquímicas intracelulares que, por sua vez, acarretam modificações na membrana luminal modulando ou regulando a permeabilidade à água, como mostra a Fig. 6.5. O receptor V2 do HAD é uma estrutura inserida na membrana e que contém sete domínios intramembranosos, quatro extracelulares e quatro intracelulares formando quatro alças intracelulares. O receptor, uma vez estimulado pela inserção do HAD no seu locus específico, promove o estímulo do complexo proteína G, que contém três unidades: unidades , e , formando um complexo heterotrimérico. Existe uma família de proteínas G, e a proteína G acoplada ao receptor V2 é do grupo s. Este complexo de proteína-Gs, através da unidade , é capaz de se ligar na guanidina trifosfato (GTP) formando a Gs-GTP, que, por sua vez, auxiliada pelas unidades , vão estimular uma enzima chamada de adenilciclase (AC). A AC é
uma estrutura complexa que também está inserida na membrana celular e contém doze domínios intramembranosos divididos em dois grupos de seis domínios, mais oito domínios extracelulares e oito domínios intracelulares. A AC que atua na cascata do HAD é a de número IV e pertence a uma família de nove componentes. A ação da AC é catalisar a passagem da adenosina trifosfato (ATP) para adenosina monofosfato cíclico (AMPc, 3',5',AMPc), já referida acima como sendo o segundo mensageiro do HAD. A quantidade de AMPc intracelular é regulada pela fosfodiesterase, que é uma enzima que o transforma em uma forma inativa, o 3' AMPc. Prosseguindo na ativação da cascata do HAD, o AMPc vai estimular a proteinoquinase A (PKA), que é uma proteína multimérica que contém na sua forma inativa duas subunidades catalíticas e duas subunidades reguladoras. A unidade reguladora é composta por quatro tipos de proteína ( I e II e I e II), enquanto a unidade catalítica é composta por três tipos (, e ). Quando o AMPc se liga nas unidades reguladoras, estas se dissociam das unidades catalíticas, resultando na atividade quinásica das subunidades catalíticas. A PKA vai então fosforilar canais de água que se encontram inseridos na superfície de microvesículas livres do citoplasma. Proteínas dos microtúbulos (dineínas e dinactinas) e dos microfilamentos, que são sistemas motores citosólicos, e receptores localizados na superfície destas vesículas (VAMP-
Fig. 6.5 Esquema mostrando uma célula principal do ducto coletor e a translocação das vesículas contendo AQP. A cascata do HAD promove a formação de PKA que vai fosforilar a AQP contida nas vesículas. Proteínas motoras dos microtúbulos (dineínas e dinactinas) e receptores localizados nas vesículas (Vamp-2, sintaxina-4 e NSF) participam da fixação das vesículas na membrana luminal. A PKA, acredita-se, também agiria no núcleo celular fosforilando fatores nucleares (CREB-P e AP-1) e aumentando a transcrição gênica de AQP, resultando na sua síntese e na sua liberação para o citosol, e entrando no processo de traficking e docking. Adaptado de Nielsen, S., Kwon, T.-H., Christensen, B.M., Promeneur D., Frøkiær, J., Marples, D. JASN, 10:647-663,1999.
63
capítulo 6
2, sintaxina-4, NSF) participam do processo de trafficking e docking, isto é, de translocação destas vesículas em direção à membrana celular e que termina com a sua inserção na membrana apical da célula, expondo finalmente os canais de água na superfície luminal e aumentando a permeabilidade à água (Fig. 6.5). No modelo da Fig. 6.6 a AC estaria ligada a dois receptores de naturezas opostas: um deles a estimularia (Rs), enquanto o outro a inibiria (Ri), através das unidades reguladoras da proteína G, respectivamente Gs e Gi. Estes receptores ativariam (Gs) ou inibiriam (Gi) a adenilciclase, quando o receptor estimulador ou inibidor fossem ocupados, respectivamente. O receptor do HAD é o receptor estimulador (Rs), enquanto o receptor ocupado pelos agentes -2 adrenérgicos seria inibidor (Ri), uma vez que estes agentes inibem o transporte de água. Este processo, no entanto, pode ser modulado intracelularmente, como já foi dito acima, pela atividade da AMPc fosfodiesterase (que transformaria o AMPc na sua forma inativa, a 5’adenosina monofosfato, 5’AMPc), bem como por autacóides como as prostaglandinas e por outras substâncias como o Ca e a proteinoquinase C (PKC). No Quadro 6.1 podemos ver várias substâncias que estão envolvidas na geração do AMPc e na sua modulação.
PGE2 EXTRACELULAR
MEMBRANA CELULAR
O2 Ri
V2 Rs
V1
PGE2
Gs
Gi
PLA AC
PGE2 ATP
PLC
PGE2
CITOSOL
AA
PL
AMPc
PROTEINOQUINASE
PIP2
ITP Ca++
EFEITO V2 (SUPERFÍCIE APICAL)
A nível de receptor Ocupação do receptor V2 Agonistas — DDAVP (desmopressina) Antagonistas — d (CH2) 5 Tyr (Et) VAVP etc.* [Ca] sérico Ocupação do receptor V1 — ativação da via do fosfoinositol AVP Agentes 1-adrenérgicos Somatostatina Acetilcolina Carbacol Modulação do complexo adenilciclase A nível da proteína reguladora GTP Toxina da cólera (Ns) Toxina pertussis (Ni) Prostaglandina (Ns) Bradicinina (Ni) Agentes 2-adrenérgicos Ao nível da unidade catalítica (adenilciclase) Forskolin (Ni) Calmodulina (?) Ao nível ainda não determinado Fator atrial natriurético *Atualmente são conhecidos inúmeros agonistas e antagonistas do hormônio antidiurético. Adaptado de Abramov. M. et al. Kidney Int., 32 Suppl 21:S56-S66, 1987.
vasopressina
2-agonista MEMBRANA BASOLATERAL
Quadro 6.1 Eventos que envolvem a geração de AMPc
EFEITO V1
Fig. 6.6 Representação esquemática dos efeitos da vasopressina nas células do DCMI. Abreviações: V1 e V2 — subtipo de receptores; Rs e Ri — receptores para agentes estimuladores e inibidores, agindo sobre a adenilciclase; Gs e Gi — unidades guanina reguladoras, estimuladora e inibidora; AC — unidade catalítica adenilciclase; AMPc — adenosina monofosfato cíclica; ATP — adenosina trifosfato; PGE2; PL — pool de fosfolípides; AA — ácido araquidônico; PLA — fosfolipase A; PLC — fosfolipase C; PIP2 — fosfatidilinositol-4-5-bifosfato; ITP — inositol-trifosfato; Ca cálcio citosólico livre. Adaptado de Kinter, L.B., Huffman, W.F., Stassen, F.L. Am. J. Physiol., 254:F165-177, 1988.
Recentemente foi descrita a presença de receptores do tipo V1 nas células principais dos túbulos distais (Fig. 6.5). Este receptor, quando ocupado pelo HAD, desencadearia uma reação em cascata da seguinte forma: ativação de uma fosfolipase C (PLC) de membrana que clivaria o fosfatidilinositol-bifosfato (PIP2) em dois segundos mensageiros — o diacilglicerol (DAG) e o inositol-trifosfato (ITP). O DAG, junto com os Ca, ativaria uma proteinoquinase C (PKC), e o ITP estimularia a liberação de cálcio das organelas para o citosol. O aumento do cálcio intracelular mais a PKC regulariam a atividade da adenilciclase, exercendo sobre ele um efeito inibitório. O HAD também estimula uma fosfolipase A de membrana que, agindo sobre o ácido araquidônico (AA), transforma-o em prostaglandina (PGE2), que por sua vez tem um efeito inibitório sobre a adenilciclase, constituindo desta forma um sistema de feedback negativo modulando a ação do próprio HAD. Com a técnica recente da biologia molecular, foi demonstrado que existem vários tipos de canais de água no reino animal. Muitos são proteínas de baixo peso molecular (25.000 a 30.000 daltons) que pertencem a famílias de canais de água chamadas MIP 26 (Membrane Integral Protein com PM 26.000 daltons). São encontrados em grande variedade em tecidos transportadores de fluidos, como o
64
Mecanismo de Concentração e de Diluição Urinária
plexo coróide, o cristalino, os alvéolos pulmonares, o rim, bem como em leveduras e vegetais. O primeiro canal de água identificado foi no eritrócito e foi chamado de CHIP 28 (Channel-forming Integral Protein, com PM de 28.000 daltons). Este canal é capaz de transportar uma grande quantidade de água e tem a denominação genérica de aquaporinas (AQP). Até o momento já foram identificados nove tipos de AQP, sendo que as de número 1, 2, 3, 4, 6, 7 e 8 são expressas no rim. A AQP2 é o canal de água dependente da ação do HAD. A AQP é uma estrutura de alta complexidade. Ela possui seis domínios intramembranosos, três alças extracelulares (A, C e E) e duas intracelulares (B e D). As alças B e E contêm uma seqüência de aminoácidos NPA — asparagina-prolina-alanina — que quando combinadas de modo entrelaçado formam o poro de água. Esta disposição da molécula é conhecida pelo nome de ampulheta (hourglass model, Fig. 6.7). Uma unidade de AQP2 (monômero) se associa a mais três formando um tetrâmero com quatro canais conjuntos. Estudos recentes mostraram que a prostaglandina E2 também tem uma ação, através de um receptor na membrana celular, sobre a síntese de AQP no núcleo celular (Fig. 6.5). Como já foi dito, as células principais do ducto coletor medular interno possuem a AQP2 na membrana basolateral e possuem nas membranas basolaterais as AQP 3 e 4, que são os canais responsáveis pela saída de água da célula para o interstício. Em outros segmentos do néfron a presença das AQP 1, 3, 4, 6, 7 e 8 garante a passagem de água sem a necessidade da ação do HAD e participam ativamente no mecanismo de concentração do fluido tubular. O HAD também tem efeito sobre a permeabilidade à uréia no ducto coletor medular interno, função de extrema importância exercida pelo receptor V2. A uréia é um elemento essencial na formação da hipertonicidade medular, que é um dos dois fatores fundamentais para a reabsorção de água no ducto coletor. No mecanismo de concentração urinária a uréia é reabsorvida no ducto coletor e localizando-se no interstício. Do interstício, parte desta uréia é retirada pelos vasa recta e eritrócitos e vai ser novamente filtrada, voltando para os túbulos, e parte passa diretamente para o lúmen das alças de Henle descendente e ascendente, aumentando a sua concentração na luz tubular (ver recirculação da uréia, acima, e Fig. 6.3). A permeabilidade do ducto coletor à uréia é regulada pelo HAD através do receptor V2, que gerando PKA estimula transportadores de uréia (UT) localizados na membrana apical da célula tubular determinando um transporte facilitado. Dois tipos de transportadores de uréia já foram clonados e seqüenciados. O UT-A é expresso nos segmentos tubulares e apresenta quatro isoformas: UT-A1, UT-A2, UT-A3 e UT-A4. O UT-B é expresso nos eritrócitos e nas células endoteliais dos vasa recta. O UT-A1 se expressa no ducto coletor e é regulado pelo HAD. O UT-A2 está presente na alça fina descendente de Henle e os UT-A3 e UT-A4 não
Fig. 6.7 Aquaporina-modelo hourglass (ampulheta). Acima: CHIPAQP mostrando os domínios intramembranosos, intra- e extracelulares e as seqüências NPA nas duas alças B e E. As setas horizontais indicam a direção do dobramento da molécula com a justaposição dos terminais NH2 e COOH, resultando na estrutura em forma de ampulheta e na formação do poro para a passagem da água entre as duas seqüências NPA entrelaçadas. Abaixo: Oligomerização de quatro subunidades assimétricas formando um tetrâmero contendo quatro poros aquosos. Adaptado de Preston, G. M. and Agre, P. Proc. Natl. Acad. Sci. U.S.A., 88:1111011114, 1991.
65
capítulo 6
têm ainda bem definidos os papéis que efetuam, apesar de serem expressos no ducto coletor. A uréia é o produto final do metabolismo das proteínas e o seu excesso deve ser eliminado pelo rim. Este processo de secreção se dá principalmente no terço final do DCMI e não é dependente da ação do HAD, envolvendo um mecanismo de transporte secundariamente ativo acoplado ao sódio, um contratransporte na membrana apical das células destes segmentos.
H2O
Pontos-chave: • Receptor V2-membrana basolateral • Geração de AMPc-segundo mensageiro • Inserção da aquaporina 2 na membrana luminal
BALANÇO HÍDRICO O balanço de água do organismo é dado pela quantidade de água que é ingerida, comparada com a quantidade de água que é excretada. Sob condições basais, as perdas hídricas e a ingesta aquosa variam em torno de 2 a 2,5 litros. Assim, o balanço aquoso pode ser mantido por longos períodos sem a intervenção de mecanismos reguladores específicos. No entanto, esta condição ideal pode ser rompida pela atividade física, por alterações climáticas, por variação de dieta ou outras alterações ambientais. Sempre que tais desvios ocorrem, um poderoso mecanismo homeostático entra em ação, aumentando ou diminuindo a ingesta ou a excreção de água e solutos. Esta homeostase se faz pela regulação da secreção de HAD (eliminação) e pela regulação da sede (ingestão).
Pontos-chave: • Água ingerida • Perdas hídricas
SECREÇÃO DE HAD O principal meio pelo qual o organismo elimina a água sem movimento resultante de solutos ocorre no rim, pela ação do hormônio antidiurético nos túbulos renais, como já foi mencionado anteriormente. Quimicamente o hormônio antidiurético, na maioria dos mamíferos, é a arginina vasopressina. Nos suínos é constituído pela lisina vasopressina. Ambos são octapeptídios de aproximadamente 1.100 daltons. Nos animais vertebrados mais inferiores, o hormônio antidiurético é a arginina vasotocina. Até o momento já foram identificados sete octa-
Fig. 6.8 Modelo esquemático representando o CHIP-aquaporin inserido na membrana de bicamada lipídica compreendendo um complexo homotetramérico com uma subunidade de polilactosaminoglicano e possíveis canais de água individuais dentro de cada subunidade. Adaptado de Agre, P. et al. Am. J. Physiol., 265:F463-476, 1993.
peptídios na neuro-hipófise de vertebrados e mais de 200 análogos já foram sintetizados. O grande progresso obtido na química desse hormônio trouxe a descoberta de compostos sintéticos de variável potência, tempo de ação prolongada, fácil absorção etc., o que é de extrema importância no tratamento substitutivo nos casos de portadores de diabetes insipidus. O hormônio antidiurético, ou arginina vasopressina nos mamíferos, é secretado pelos corpos celulares dos neurônios existentes nos núcleos supra-ópticos e paraventriculares do hipotálamo em forma de grânulos. Há uma estreita correlação entre o número desses grânulos nas células nervosas secretoras e o estado de hidratação do animal. O hormônio antidiurético está como que “empacotado” nesses grânulos que percorrem o axoplasma dos nervos em direção à glândula pituitária posterior (Fig. 6.9). Dentro desses grânulos o hormônio antidiurético está ligado a uma proteína específica chamada neurofisina A ou neurofisina II, formando um complexo. Ambos, tanto o hormônio como a neurofisina, podem originar-se de um mesmo precursor biológico. As células secretoras da oxitocina na neuro-hipófise também têm grânulos nos quais a oxitocina está ligada a uma outra proteína carregadora, a neurofisina B ou neurofisina I. As neurofisinas são cadeias de polipeptídios contendo 90 a 100 aminoácidos de aproximadamente 10.000 daltons. Estudos com a técnica de freezefracture e estudos eletromicroscópicos mostram que a secreção na neuro-hipófise ocorre por exocitose. Tem sido sugerido que na neuro-hipófise existem dois pools de hormônio antidiurético: um pronto para ser liberado e outro
66
Mecanismo de Concentração e de Diluição Urinária
npv
polidipsia primária normal diabetes insipidus nefrogênico
Vasopressina plasmática (pg/ml)
12
or
nso
10 8 6 4 2
diabetes insipidus pituitário
0 270
co
ds
ah
280
290
300
310
320
Osmolalidade plasmática (mOsm/kg H2O)
Fig. 6.10 Relação entre níveis plasmáticos de vasopressina e osmolaridade do plasma em indivíduos normais e em diferentes tipos de poliúria.
nh ap nts
br
Fig. 6.9 Esquema da neuro-hipófise e das suas relações anatômicas. Abreviações: nh — neuro-hipófise; ah — adeno-hipófise; ds — diafragma da sela; co — quiasma óptico; nso — núcleo supraóptico; npv — núcleo paraventricular; or — osmorreceptores; br — barorreceptores; nts — núcleo do trato solitário; ap — área postrema. Adaptado de Robertson, G.L. and Berl, T. In: Brener, B.M. and Rector Jr., F.C. The Kidney W.B. Saunders Company.
de estoque. Os grânulos prontos para serem liberados estariam próximos à membrana plasmática das células. O estímulo para exocitose de grânulos depende em parte de alterações da membrana plasmática pelo cálcio. Parece provável que a estimulação das áreas quimiossensitivas para produção de hormônio antidiurético no hipotálamo por fibras colinérgicas resulta numa excitação celular, despolarização parcial e subseqüente potencial de ação. Esta despolarização da membrana aumentaria a permeabilidade ao cálcio, o qual, por mecanismo não identificado, ativaria a exocitose dos grânulos neurossecretores e a liberação de hormônio antidiurético e neurofisina na circulação. A secreção de hormônio antidiurético pelo hipotálamo é determinada por dois fatores: tonicidade plasmática e volemia. Em estado de hipovolemia ou hipertonicidade há estímulo para secreção do hormônio. A grande sensibilidade na dosagem de arginina vasopressina pelo método de radioimunoensaio permitiu correlacionar os níveis plasmáticos deste hormônio com a osmolaridade do sangue. Vemos na Fig. 6.10 que após 280 65 mOsm/kg H2O (limiar osmótico) ocorre um aumento linear de vasopressina plasmática em relação à osmolaridade e é tão constante
essa relação individualmente, que num mesmo animal pode-se calcular a osmolaridade plasmática a partir dos níveis de vasopressina com um erro menor que 1%. Tanto a arginina como a lisina vasopressina existem no plasma de forma livre não ligada a proteínas, e devido ao seu baixo peso molecular elas são filtradas facilmente através dos capilares glomerulares. A extração plasmática desses hormônios é feita principalmente pelo fígado e pelo rim, mas outros tecidos como o cérebro podem também quebrar sua molécula. A excreção urinária é o segundo método de eliminação e a sua concentração urinária correlaciona-se perfeitamente com a sua concentração plasmática. Em indivíduos com diabetes insipidus nefrogênico familial (nos quais o túbulo coletor é incapaz de responder ao hormônio antidiurético) ocorre alta concentração de vasopressina na urina. A destruição tecidual e a eliminação renal dão um clearance de hormônio antidiurético de 2 a 4 ml/ min, o que determina uma meia-vida curta para esse hormônio (10 a 40 minutos). Esta observação indica que em indivíduos normais a supressão da secreção de hormônio antidiurético resulta em alterações detectáveis na diurese em aproximadamente 20 a 30 minutos. Como dissemos, a secreção de hormônio antidiurético e conseqüentemente seus níveis plasmáticos são determinados por dois fatores: 1. Fator osmótico — tonicidade plasmática. O aumento da osmolaridade plasmática por solutos impermeáveis à célula determinam aumento na secreção de vasopressina. Os osmorreceptores são: a) as próprias células do núcleo supra-óptico e paraventricular; b) os osmorreceptores intracardíacos (localizados na artéria carótida e aurículas) que por via vagal estimulam os centros hipotalâmicos. É interessante notar que o aumento da osmolaridade por solutos permeáveis através das membranas celulares e portanto que penetram no interior das células dos núcleos
67
capítulo 6
hipotalâmicos não determinam aumento da secreção de hormônio antidiurético. Assim, por exemplo, tanto a infusão de uréia como o aumento da glicemia no diabetes mellitus (em ausência de hipovolemia e desidratação), apesar de aumentarem a osmolaridade do plasma, não acarretam aumento da secreção de hormônio antidiurético. Ao contrário, a hiperglicemia (na ausência de hipovolemia) determina uma diminuição na liberação de vasopressina, o que indica ser a poliúria do diabetes mellitus o resultado de, pelo menos, dois fatores: diurese osmótica inibição do hormônio antidiurético, causando uma menor reabsorção de água no túbulo e ducto coletor. 2. Fatores não-osmóticos — volemia. Em condições de depleção de volume, o fator volemia é mais importante como estímulo que a osmolaridade plasmática. Assim, em condições de hipovolemia, mesmo com hipotonicidade do plasma, observa-se um aumento na secreção de hormônio antidiurético. Ao contrário, em condições de hipertonicidade (osmolaridade plasmática acima de 280 mOsm/kg H2O) o fator tonicidade predomina, observando-se aumento da secreção do hormônio mesmo em condições de expansão do volume extracelular. Os receptores de volume para secreção de hormônio antidiurético podem ser divididos em: de baixa pressão (localizados no setor venoso — aurícula direita) e de alta pressão (localizados no setor arterial — aurícula esquerda, carótida etc.). A via aferente desses receptores é o vago e glossofaríngeo. O sistema de baixa pressão é mais sensível que o de alta pressão, bastando ocorrer uma depleção de volume de 10%, mesmo sem alterações da pressão arterial, para que se observe um aumento de 6 vezes na secreção de hormônio antidiurético através de estímulos recebidos no sistema de baixa pressão. Além desses fatores volêmicos e osmóticos, outros, como a ação de drogas vasoativas, levam a alterações na secreção desse hormônio. É comum a observação de antidiurese durante a infusão de isoproterenol em animais em diurese aquosa. Também a infusão de noradrenalina, em pequenas doses, pode determinar aumento da diurese por aumento da pressão arterial ou menor reabsorção de água no túbulo coletor. Inúmeros trabalhos têm chamado a atenção para a participação do sistema renina-angiotensina na regulação da excreção urinária de urina. Estudos têm demonstrado que a administração sistêmica ou intracerebral (liquórica) de angiotensina II determina aumento na secreção de hormônio antidiurético. Por outro lado, a administração de HAD exógeno a ratos Brattleboro, que apresentam diabetes insipidus hipotalâmico hereditário, produz diminuição da secreção renal e níveis plasmáticos de renina. Foi verificado, também, que o sistema renina-angiotensina pode desempenhar um papel importante no centro regulador da sede. Recentemente foi descrito que um heptapeptídio formado diretamente da angiotensina I sem a participação da
enzima conversora e denominado de angiotensina 1-7 possui efeitos semelhantes ao do HAD, isto é, é capaz de aumentar a permeabilidade à água no ducto coletor medular interno. É importante salientar que em certas condições patológicas observa-se quadro de oligúria (antidiurese) em presença de hipotonicidade plasmática, mesmo com volemia normal ou aumentada, como nos casos de: 1. Síndrome de secreção inapropriada de hormônio antidiurético que ocorre associada a tumores, patologias pulmonares, lesões cranianas etc. 2. Decorrente da administração de drogas que estimulam a produção de hormônio antidiurético, como morfina, barbitúricos e clofibrato, ou mesmo de drogas que aumentam a atividade do hormônio, como clorpropamida e carbamazepina (Tegretol). 3. Endocrinopatias, como o mixedema, no qual os fatores responsáveis pela incapacidade de eliminar urina diluída permanecem ainda por serem esclarecidos, e na doença de Addison, onde se observa também uma insuficiente excreção de água conseqüente à falta de glicocorticóides. A combinação da excreção de urina hipertônica associada à hipotonicidade do sangue ocorre em condições de hipovolemia, depleção ou má distribuição de volume. Observamos, também, em condições de redução da pressão na aurícula esquerda durante a comissurotomia mitral, ventilação pulmonar prolongada, insuficiência cardíaca grave e cirrose hepática avançada.
Pontos-chave: • Fator osmótico • Fator volêmico • Outros fatores — secreção inapropriada de HAD
REGULAÇÃO DA INGESTA – MECANISMO DA SEDE A sede é a maior defesa do organismo contra a depleção dos fluidos corporais e é definida como a sensação que compele o indivíduo a beber água. É estimulada pelas mesmas variáveis que estimulam o HAD, ou seja, o aumento da osmolaridade plasmática ou a diminuição da volemia, mas a hipertonicidade do plasma parece ser mais potente que a hipovolemia. No homem, um aumento de apenas 2% a 3% acima do nível basal produz um desejo intenso de ingestão de água. O nível efetivo de osmolaridade plasmática que provoca um desejo urgente consciente de ingestão de água é chamado de limiar da sede e é ligeiramente diferente de indivíduo para indivíduo e varia em
68
Mecanismo de Concentração e de Diluição Urinária
torno de 295 mOsm/kg. O limiar para o estímulo da sede está ligeiramente abaixo do limiar para o estímulo de liberação do HAD. As vias neuronais que medeiam a dipsogênese osmótica não estão ainda bem definidas, mas parece que envolvem osmorreceptores localizados na área ventromedial do hipotálamo próximo àquelas que regulam a secreção de HAD e devem ter uma representação no córtex cerebral, a fim de permitir que o indivíduo tenha consciência da necessidade de ingerir líquidos. Além dos fatores já descritos, o sistema renina-angiotensina e mesmo o próprio HAD exercem uma mediação parcial sobre a dipsogênese.
Pontos-chave: • Fator osmótico • Fator volêmico
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA AGRE, P. et al. Aquaporin CHIP: the archetypal molecular water channel. Am. J. Physiol., 265:F463, 1993. BRENNER, B.M. and RECTOR Jr., F.C. (eds) The Kidney, 6th edition. W. B. Saunders Company, Phil., 2000. KINTER, L.B. et al. Antagonist of the antidiuretic activity of vasopressin. Am. J. Physiol., 254:F165, 1988. KOVÁCS, L. and LICHARDUS, B. Vasopressin — Disturbed Secretion and its Effects, 1.ª ed., Kluwer Academic Publishers, 1989. NIELSEN, S. et al. Aquaporins in the kidney: from molecules to medicine. Physiol. Ver., 82:205, 2002. NIELSEN, S. et al. Physiology and pathophysiology of renal aquaporins. JASN, 10:647, 1999. SANDS, J.M. Regulation of urea transporters. JASN, 10:635, 1999. SANDS, J.M. et al. Urea transporters in the kidney and erythrocytes. Am. J. Physiol., 273:F321, 1997.
ENDEREÇO RELEVANTE NA INTERNET http://www.ndif.org
Capítulo
7
Peptídeos Vasoativos e o Rim Irene L. Noronha e Miguel Luis Graciano
INTRODUÇÃO
Receptores para cininas
SISTEMA RENINA-ANGIOTENSINA (SRA)
Localização renal dos componentes do sistema
Componentes do SRA Angiotensinogênio Renina Biossíntese da Renina ESTRUTURA DO APARELHO JUSTAGLOMERULAR CONTROLE DA SECREÇÃO DE RENINA
calicreína-cinina Ações do sistema calicreína-cinina no rim Efeitos na hemodinâmica renal Efeitos na excreção de sódio e água Inter-relações entre sistema calicreína-cinina e outros sistemas
QUANTIFICAÇÃO DA ATIVIDADE DA RENINA
Sistema renina-angiotensina
ENZIMA CONVERSORA DE ANGIOTENSINA (ECA)
Eicosanóides
Propriedades bioquímicas Distribuição tecidual ANGIOTENSINA II Ações na vasculatura
Peptídeo natriurético atrial (ANP) Óxido nítrico SISTEMA CALICREÍNA-CININA EM SITUAÇÕES FISIOPATOLÓGICAS
Ações renais
Cirrose hepática
Ações na supra-renal
Hipertensão arterial
Ações no sistema nervoso central
Fibrose miointimal
Ações da Ang II no crescimento celular Receptores para Ang II e mecanismo de ação celular ANGIOTENSINASES SISTEMA RENINA-ANGIOTENSINA EM SITUAÇÕES FISIOPATOLÓGICAS
Infarto do miocárdio PEPTÍDEOS NATRIURÉTICOS Peptídeo natriurético atrial (ANP) Síntese e estrutura Regulação da secreção do ANP
Hipertensão arterial
Receptores para ANP
Nefropatia diabética
Ações do ANP
Nefropatias crônicas
Efeitos na hemodinâmica renal e efeitos na indução de
PEPTÍDEOS DERIVADOS DAS ANGIOTENSINAS Ang-(I-7) Ang III Ang IV SISTEMA RENAL CALICREÍNA-CININA Componentes do sistema renal calicreína-cinina
natriurese Efeitos no sistema renina-angiotensina-aldosterona, vasopressina e endotelina Efeitos na vasculatura ANP em situações fisiopatológicas Insuficiência cardíaca congestiva
Cininogênios
Taquicardia supraventricular
Calicreínas
Hipertensão arterial
Cininas
Cirrose hepática
Cininases
Doença renal
70
Peptídeos Vasoativos e o Rim
PEPTÍDEO NATRIURÉTICO CEREBRAL (BNP) Peptídeo natriurético do tipo C (CNP) URODILATINA
Hipertensão arterial Ciclosporina A Doenças glomerulares
ENDOTELINA
Fibrose renal e insuficiência renal crônica
Biossíntese e estrutura
ADRENOMEDULINA
Receptores para endotelina e mecanismo de ação celular
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Ações da endotelina no rim
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Endotelina em situações fisiopatológicas Insuficiência renal aguda
INTRODUÇÃO Existe no rim um importante balanço entre agentes vasoconstritores e vasodilatadores, responsável pela regulação da filtração glomerular. Dentre os agentes vasoconstritores devem ser ressaltados: peptídeos como a angiotensina (Ang II) e endotelina, além de outras substâncias como adenosina, PAF (fator ativador de plaquetas) e metabólitos do ácido araquidônico (PGF2a, tromboxane A2 e leucotrienos). Os agentes vasodilatadores incluem: peptídeos como bradicinina e peptídeos natriuréticos, além de outras substâncias como óxido nítrico, PGE2, PGI2 e dopamina. No presente capítulo, serão abordados alguns dos mais relevantes peptídeos vasoativos que desempenham papel fundamental na regulação da hemodinâmica renal.
mantém uma adequada perfusão capilar principalmente quando ocorrem alterações do volume de água corporal. A atividade do SRA é regulada pela renina, que é produzida e armazenada no aparelho justaglomerular renal e liberada em resposta a uma série de sinais. A renina é uma enzima proteolítica que quebra o angiotensinogênio existente no plasma, formando o decapeptídeo angiotensina I (Fig. 7.1). Este peptídeo, biologicamente inativo, é convertido pela enzima conversora formando o hormônio ativo Ang II. A Ang II é clivada por aminopeptidases formando a angiotensina III, que é subseqüentemente quebrada em fragmentos inativos.1,2,3 Atualmente tem sido cada vez mais conhecido o papel fisiológico de metabóli-
ANGIOTENSINOGÊNIO pró-renina
Pontos-chave:
renina
Principais peptídeos vasoconstritores • Angiotensina II • Endotelina Principais peptídeos vasodilatadores • Bradicinina • Peptídeo atrial natriurético
ANGIOTENSINA I
enzima conversora
ANGIOTENSINA II
SISTEMA RENINAANGIOTENSINA (SRA) O sistema renina-angiotensina (SRA) tem como importante função a regulação da pressão arterial e do volume intravascular. Este controle é possível graças à ação da angiotensina II (Ang II), que promove uma potente vasoconstrição na musculatura lisa dos vasos (e assim aumenta a resistência vascular periférica), além de diminuir a excreção renal de sódio (mediado pela aldosterona). Deste modo,
pressão de perfusão
VASOCONSTRIÇÃO
síntese de ALDOSTERONA
reabsorção de Na⫹ e H2O
Fig. 7.1 Componentes do sistema renina-angiotensina-aldosterona.
71
capítulo 7
tos das angiotensinas, como por exemplo a ação vasodilatadora da Ang-(1-7).4
Componentes do SRA ANGIOTENSINOGÊNIO O angiotensinogênio plasmático é uma glicoproteína de peso molecular que varia de 52 a 60 kDa, produzido primariamente no fígado. No entanto, RNAm para angiotensinogênio também foi encontrado no cérebro, rim, suprarenal, coração, pulmão, vasos e trato gastrintestinal,5 demonstrando que o angiotensinogênio pode ser produzido em diversos tecidos extra-hepáticos. O sítio de produção do angiotensinogênio pode ter relevância fisiopatológica, uma vez que pode contribuir para a formação local de Ang II, que por sua vez pode ser importante na regulação local de diversas funções nos tecidos.
que correspondem ao mRNA para renina, localizados no hilo renal (Fig. 7.2). Tal localização corresponde à topografia das arteríolas aferentes, o que é confirmado pelo exame da imuno-histoquímica (Fig. 7.3). A mácula densa é a parte da alça ascendente espessa de Henle que se encontra próxima à região da arteríola aferente.
Pontos-chave: Principais componentes do sistema reninaangiotensina • Renina • Angiotensinogênio • Enzima conversora da angiotensina II • Angiotensina II • Aldosterona • Receptores AT1 e AT2 da angiotensina II
RENINA Biossíntese da Renina Renina foi o nome dado em 1898 por Tigerstedt e Bergamann6 à substância com capacidade pressora extraída de rins de coelhos. A renina é uma protease que quebra especificamente a ligação LEU-VAL da região aminoterminal do angiotensinogênio, formando a Ang I. O gene da renina humana (localizado no cromossoma 1) codifica uma proteína precursora de 45 kDa chamada de PRÉ-PRÓ-renina, que rapidamente é quebrada formando a PRÓ-renina. Tanto a PRÉ-PRÓ-renina como a PRÓ-renina são completamente inativas. A PRÓ-renina é clivada formando a enzima ativa de 40 kDa denominada renina. Apesar de o rim ser a principal fonte da produção de renina, existem diversos órgãos que têm a capacidade de sintetizar renina: fígado, cérebro, próstata, testículo, baço, timo e pulmão.5
CONTROLE DA SECREÇÃO DE RENINA Inúmeros fatores estão envolvidos no controle da secreção da renina (Quadro 7.1). Os estímulos primários para a liberação de renina renal dependem, basicamente, da redução da pressão de perfusão renal e da restrição da ingesta de sódio ou perda de sódio. O grau de estimulação do eixo renina-angiotensina depende do grau de depleção de volume.1,3 A diminuição da pressão de perfusão renal pode ser decorrente de hemorragia aguda, estenose crônica de artéria renal ou depleção do fluido de volume extracelular (resultado da restrição de sódio ou da administração de
ESTRUTURA DO APARELHO JUSTAGLOMERULAR O aparelho justaglomerular, situado no hilo glomerular, é formado pelas células justaglomerulares, pela mácula densa e por um tecido interposto entre eles, o mesângio extraglomerular, que é um prolongamento do mesângio glomerular. As células justaglomerulares são células modificadas da musculatura lisa encontradas na parede da arteríola aferente. A renina é produzida e armazenada nas células justaglomerulares, que aparecem à microscopia eletrônica como grânulos eletrodensos, sendo secretada por exocitose. Utilizando-se imuno-histoquímica, foi possível demonstrar que os grânulos intracelulares contêm renina e Ang II.7,8,9 Estudos utilizando-se hibridização in situ demonstraram claramente uma grande concentração de grânulos negros,
Fig. 7.2 Expressão de mRNA para renina utilizando-se hibridização in situ em rim de rato submetido a restrição de sódio na dieta associado ao uso de diurético de alça (furosemida). Note a grande concentração de grânulos negros, que correspondem ao mRNA para renina, localizados no hilo renal.
72
Peptídeos Vasoativos e o Rim
Quadro 7.1 Condições que alteram níveis de renina Estimula Secreção de RENINA
Fig. 7.3 Expressão de renina em arteríola aferente. Imuno-histoquímica. Note a arteríola marcada em vermelho. (Ver o Cd-ROM.)
diuréticos). Além disso, situações clínicas que cursam com baixa perfusão renal, como é o caso da insuficiência cardíaca congestiva descompensada e cirrose hepática, estão freqüentemente associadas ao aumento da liberação renal de renina. Ao contrário, a expansão de volume e a dieta rica em sódio levam à supressão da liberação de renina.6,10 Assim, a liberação de renina responde inversamente a alterações da perfusão renal. Esta resposta parece ser mediada por mecanismo barorreceptor renal localizado nas células justaglomerulares da arteríola aferente, sensíveis a pequenas alterações de pressão transmural e de estiramento da parede da arteríola. O aumento da pressão de perfusão estira a parede da arteríola aferente induzindo diminuição da secreção de renina, enquanto a redução da pressão de perfusão renal aumenta a secreção de renina. Existe também uma relação inversa entre a ingestão de sódio e a atividade da renina. Devido à disposição anatômica especial da alça de Henle (no local da mácula densa) com as células justaglomerulares produtoras de renina (na arteríola aferente), a concentração de cloreto de sódio do fluido tubular é detectada pela mácula densa, regulando a secreção de renina. Dieta rica em sódio e expansão do volume estão associadas com baixos níveis plasmáticos de renina, enquanto dieta pobre em sal e depleção de volume são acompanhadas por baixos níveis de sódio e cloro no fluido tubular distal, que estimula renina.6,10 Foi objeto de grande discussão se era o conteúdo de sódio ou de cloro do fluido tubular o responsável pela sensibilização da mácula densa. A favor da possibilidade do cloro como principal modulador da secreção de renina, os estudos de Hackenthall e cols demonstraram que a infusão de sais de sódio (outros que não o cloreto de sódio) não consegue diminuir a liberação de renina, enquanto a infusão de variadas concentrações de cloro produz alterações da secreção de renina.10 No entanto, é importante observar que este padrão de resposta é idêntico ao que se observa na alça ascendente espessa de Henle quando se estuda o
Inibe Secreção de RENINA
pressão de perfusão renal
pressão de perfusão renal
restrição na ingesta de Na⫹ perda de Na⫹ (uso de diuréticos) depleção de volume hipovolemia funcional (ICC, cirrose hepática com ascite, síndrome nefrótica)
dieta rica em Na⫹ expansão de volume
estímulo adrenérgico (epinefrina, norepinefrina, dopamina)
deficiência de catecolamina
inibição de AII
AII
Íons Ca⫹⫹ intracelular (quelação de Ca com EDTA, bloqueador de canais de Ca) Mg⫹⫹ K⫹
Íons Ca⫹⫹ intracelular
K⫹
prostaglandinas (PGE2 e PGI2)
inibição de prostaglandinas
adenosina
ADH
Fatores de crescimento TNF, IL-1 IGF TGF-
Fatores de crescimento EGF
tumor secretor de renina
comportamento do transportador sensível à furosemida (Na-K-2 Cl). Na verdade as células da mácula densa são células da alça de Henle e o fato de ser o canal Na-K-2 Cl o mediador do sinal para a secreção de renina explica por que o uso de furosemida aumenta em grande monta a secreção deste hormônio. Isto ocorre porque quanto menor o transporte de NaCl na mácula densa, maior é a liberação de renina pelas células justaglomerulares.11 O estímulo adrenérgico desempenha um papel relevante na regulação da secreção de renina. As células justaglomerulares são inervadas por fibras simpáticas e apresentam receptores -adrenérgicos. Diversos estudos demonstraram que a estimulação elétrica dos nervos renais12 ou infusões de concentrações farmacológicas de epinefrina e norepinefrina13 estimulam diretamente a secreção de renina, sem alterar o fluxo sanguíneo renal nem a excreção de sódio. A dopamina também influencia a secreção de renina, uma vez que existe inervação dopaminérgica específica no aparelho justaglomerular. Infusão intra-renal de dopamina produz um aumento da secreção de renina que é dose-dependente e bloqueada por drogas bloqueadoras dopaminérgicas.
73
capítulo 7
A secreção de renina pode ser influenciada de maneira significativa por substâncias circulantes e por substâncias produzidas localmente. Neste contexto, destaca-se a participação da Ang II, que inibe diretamente a liberação de renina.10 Assim, a inibição de Ang II por qualquer modalidade (por exemplo, inibidores da enzima de conversão) é um potente estímulo para a liberação de renina. Prostaglandinas, tais como PGE2 ou PGI2, estimulam a secreção de renina,14 e a inibição da síntese de prostaglandinas bloqueia a liberação de renina. As cininas são vasodilatadores que também estimulam a liberação de renina. O hormônio antidiurético (ADH) inibe a liberação de renina estimulada, porém não está claro se esta inibição é devida a uma ação direta nas células justaglomerulares ou à expansão do volume plasmático. A ação do peptídeo atrial natriurético (ANP) na secreção de renina é controversa. Na maioria dos estudos o ANP diminui a atividade da renina plasmática. O óxido nítrico pode tanto inibir quanto estimular a secreção de renina.15 Como a mácula densa tem grande quantidade de sintetase do óxido nítrico do tipo b (bNOS), que é uma das enzimas que sintetizam óxido nítrico, é bastante provável que o óxido nítrico participe do sinal para produção de renina gerado na mácula densa. Alterações nas concentrações extracelulares de diversos íons podem também alterar a liberação de renina. O cálcio tem um papel central no controle da secreção de renina: diminuição do cálcio citosólico estimula a secreção de renina, enquanto aumento do cálcio intracelular está associado com diminuição da liberação de renina.10 Tanto a quelação do cálcio com EDTA quanto o uso de bloqueadores de canais de cálcio estimulam a secreção de renina. O aumento da concentração de magnésio estimula a secreção de renina provavelmente por hiperpolarização da membrana celular, que inibe o influxo de cálcio. Existe uma correlação entre potássio e liberação de renina. Aumento de potássio despolariza a membrana celular, aumenta a permeabilidade da célula ao cálcio e assim permite um aumento do influxo de cálcio. A adenosina parece ser um sinal adicional inibindo a liberação de renina. A adenosina exógena, in vivo, leva a uma vasoconstrição renal passageira, com redução da taxa de filtração glomerular e inibição da secreção de renina. Estudos com bloqueadores do receptor da adenosina mostraram que a adenosina é um mediador parcial da liberação de renina dependente da mácula densa.16 Assim, seus efeitos na secreção de renina podem também ser secundários às alterações na hemodinâmica renal. Mais recentemente, tem sido analisado o papel dos fatores de crescimento na hemodinâmica renal e sistêmica. O fator de necrose tumoral (TNF) e a interleucina-1 (IL-1) são potentes indutores da secreção de renina mas inibem a secreção de aldosterona. Estas citocinas foram implicadas na síndrome do hipoaldosteronismo hiper-reninêmico observado em pacientes graves. Concentrações fisiológicas de insulina e fator de crescimento semelhante à insulina (IGF) também estimulam a renina. Os fatores transforma-
dores do crescimento 1 e 2 (TGF-1 e TGF-2) estimulam a renina e aparentemente seus efeitos são mediados via prostaglandinas. A privação de água aumenta a expressão de TGF- com aumento da atividade da renina plasmática. Ao contrário, o fator de crescimento epidérmico (EGF) (que apresenta muitas propriedades em comum com Ang II) é mais potente inibidor de renina que de Ang II.
Pontos-chave: Principais estímulos para secreção de renina • Diminuição da volemia • Hipoperfusão renal Principais estímulos para diminuição da secreção de renina • Aumento da volemia • Aumento da perfusão dos rins
QUANTIFICAÇÃO DA ATIVIDADE DA RENINA A renina plasmática circulante é constituída por sua forma precursora inativa (PRÓ-renina) e sua forma ativa (renina). A atividade da renina plasmática é determinada através da medida da taxa de geração de Ang I a partir do angiotensinogênio plasmático endógeno. A quantidade de Ang I produzida durante um determinado período é medida por radioimunoensaio e expressa em unidade de nanogramas por ml/min. A coleta de sangue de veia renal para dosagem de renina é realizada para auxiliar o diagnóstico de estenose de artéria renal unilateral (hipertensão arterial renovascular). Nos pacientes com suspeita de estenose de artéria renal a administração de inibidores de enzima de conversão ressalta a secreção de renina no rim afetado. A medida da atividade da renina periférica pode ser um importante parâmetro para avaliação da participação do SRA em determinadas situações fisiopatológicas. Uma vez que a secreção de renina é altamente influenciada pela ingesta de sódio na dieta e pelo estado do volume extracelular, a determinação de renina plasmática deve estar correlacionada ao balanço de sódio.
ENZIMA CONVERSORA DE ANGIOTENSINA (ECA) Propriedades Bioquímicas A enzima conversora de angiotensina (ECA) é uma carboxipeptidase com peso molecular de 120-180 kDa que
74
Peptídeos Vasoativos e o Rim
converte Ang I para Ang II e, adicionalmente, inativa a bradicinina.
Distribuição Tecidual A ECA encontra-se totalmente distribuída no organismo e mais abundantemente no endotélio, mas também na borda em escova (p. ex.: rim, duodeno e íleo) e em órgãos sólidos como útero e coração. Além disso a ECA também está presente no sistema nervoso central e em células mononucleares.17 Originalmente o endotélio pulmonar foi responsabilizado como principal local da conversão de Ang I para Ang II. No entanto, a formação de Ang II em tecidos periféricos pode ser igualmente importante. No rim, a ECA está localizada nas células endoteliais e na borda em escova do túbulo proximal.18 Uma vez que o túbulo proximal é capaz de produzir Ang II isoladamente,19 a ECA produzida pelas células da borda em escova nestes túbulos deve participar da ativação local do SRA, importante na regulação da reabsorção do fluido tubular proximal.
em-se sob a ação da Ang II.22 Entretanto, existe uma maior sensibilidade na arteríola eferente. O óxido nítrico pode modular a ação vasoconstritora da Ang II na arteríola aferente mas não na eferente. Ang II induz ainda a contração de células mesangiais e com isso leva à redução da superfície de filtração glomerular, reduzindo o coeficiente de filtração glomerular (Kf). A Ang II afeta ainda o tamanho do poro da membrana basal glomerular e assim influencia a proteinúria: aumento do tamanho do poro induzido por aumento dos níveis locais de Ang II resulta em proteinúria. Por outro lado, inibidores de Ang II diminuem a proteinúria na síndrome nefrótica. No túbulo proximal, a Ang II estimula a reabsorção de sódio, água e bicarbonato.
Ações na Supra-renal Ang II estimula a síntese de aldosterona na zona glomerulosa do córtex supra-renal. Desta maneira, o SRA mantém a homeostase de sódio, água e potássio.
Ações no Sistema Nervoso Central ANGIOTENSINA II A Ang II é um peptídeo que tem um papel chave na regulação da pressão arterial e no balanço de sódio e água em resposta a alterações do volume extracelular ou da pressão sanguínea sistêmica. Estas ações são resultado de uma ação direta no rim, na vasculatura extra-renal e nos túbulos renais e indiretamente através dos efeitos na supra-renal e no sistema nervoso central.1,2,3
Ações na Vasculatura A Ang II é um potente vasoconstritor, fundamental para manter a homeostase da pressão sanguínea. A infusão de Ang II aumenta a resistência periférica total, principalmente na circulação renal, mesentérica e da pele, mas não em músculo esquelético.20 O sistema nervoso central responde à Ang II aumentando a descarga simpática e diminuindo o tônus vagal.
Ações Renais No rim existe um SRA completo que gera Ang II localmente. Assim, as ações da Ang II no rim podem ser derivadas de Ang II da circulação ou da produção local. A Ang II tem ações importantes no rim que incluem modificações da resistência vascular com conseqüente alteração da função glomerular, além de influir de maneira marcante na reabsorção de sódio. A Ang II diminui o fluxo sanguíneo renal e a taxa de filtração glomerular devido ao aumento da resistência vascular.21 Tanto a arteríola aferente como a eferente contra-
A Ang II age aumentando a sede e o apetite ao sal, contribuindo assim para o aumento do volume extracelular.
Ações da Ang II no Crescimento Celular A Ang II pode promover crescimento e hipertrofia celular. A Ang II induz uma resposta hipertrófica em células mesangiais em cultura, além de induzir a produção de fatores de crescimento, tais como fator de crescimento derivado de plaqueta (PDGF) e TGF-, levando ao aumento da produção de matriz extracelular.23 A Ang II modula também o crescimento celular das células da musculatura lisa dos vasos e dos miócitos cardíacos e assim deve ter participação no desenvolvimento da hipertrofia cardíaca que acompanha algumas formas de hipertensão arterial.24
Pontos-chave: • A angiotensina II mantém a volemia conservando sal e água e promovendo vasoconstrição periférica (ação sistêmica) • A angiotensina II é um agente proliferativo e fibrogênico (ação local)
Receptores para Ang II e Mecanismo de Ação Celular As células respondem à Ang II através de receptores altamente específicos presentes na membrana celular.25
75
capítulo 7
Duas classes principais de receptores para a Ang II foram identificadas: AT1 e AT2. O receptor AT1 é o mediador de quase todas as funções fisiológicas conhecidas da Ang II (vasoconstrição, secreção de aldosterona, sede, crescimento e reabsorção tubular de sódio). O Losartan é um antagonista do receptor AT1 e o PD-123177 é o antagonista do receptor AT2. Os receptores para Ang II, particularmente AT1, foram demonstrados no sistema nervoso central, nos vasos, fígado, supra-renal, rim, ovário, baço, pulmão e coração. Os receptores vasculares para Ang II se concentram nas células da musculatura lisa dos vasos. No rim, receptores para Ang II estão localizados nos vasos, glomérulos, túbulos proximais e distais, mácula densa e na medula renal.26,27 Após a interação da Ang II com seus receptores ocorre ativação de uma cascata de eventos regulada principalmente pelas proteínas G associadas ao receptor. Estas proteínas reguladoras ativam (fosfolipase C) ou inibem (adenilciclase) enzimas presentes na membrana celular, levando à alteração da concentração de componentes intracelulares (“segundos mensageiros”) como o aumento do inositol trifosfato (IP3) e diacilglicerol (DAG) e a diminuição dos níveis de AMP cíclico (AMPc). O IP3 liga-se a receptores no retículo endoplasmático, liberando cálcio ionizado de organelas não-mitocondriais e assim aumenta o cálcio intracitoplasmático. O DAG, na presença do aumento do cálcio livre citosólico, une-se e ativa a proteína cinase C. Este mecanismo de ativação promove a contração das células da musculatura lisa dos vasos, como também a contração de células mesangiais, além de agir como estímulo mitogênico.28
ANGIOTENSINASES A inativação da Ang II e da Ang III ocorre por hidrólise causada por angiotensinases não-específicas que estão presentes no sangue e tecidos. A degradação da angiotensina ocorre nos diferentes órgãos, incluindo o rim.
SISTEMA RENINAANGIOTENSINA EM SITUAÇÕES FISIOPATOLÓGICAS
vidade do SRA. Já nas formas de hipertensão arterial essencial, os níveis de renina se encontram dentro da faixa de normalidade em 60% dos casos, enquanto que em 15% dos casos os níveis estão elevados. As principais formas de inibir o SRA são através da utilização de inibidores da ECA, que bloqueiam a formação de Ang II, e dos antagonistas dos receptores AT1, que impedem a ação da Ang II. São drogas usadas na terapêutica da hipertensão arterial e da insuficiência cardíaca congestiva, situações nas quais há excessiva retenção de sal. A inibição da ECA está associada ao aumento das cininas, que também contribuem para o efeito terapêutico (como será discutido ainda neste capítulo). Por outro lado, são responsáveis pelo aparecimento da tosse seca como efeito colateral. Os antagonistas dos receptores AT1 diminuem a pressão arterial e inibem os efeitos mitogênicos mediados por Ang II.
Nefropatia Diabética No diabetes, associado ou não com hipertensão arterial, os níveis de renina encontram-se diminuídos, provavelmente como resultado da expansão de volume, função anormal do sistema nervoso autônomo e baixa produção renal de PGI2. Como conseqüência, há baixa produção de aldosterona, levando à hiperpotassemia. Curiosamente, apesar de a atividade do SRA ser baixa no diabetes, a Ang II é um importante mediador das alterações fisiopatológicas da nefropatia diabética. A Ang II leva ao aumento da pressão intraglomerular (por vasoconstrição da arteríola eferente) e induz hipertrofia da célula mesangial com aumento da produção de matriz. O uso de inibidores da ECA (e mais recentemente antagonista do receptor AT1) diminui a proteinúria assim como retarda a progressão da nefropatia diabética, tanto em modelos experimentais como em humanos.
Nefropatias Crônicas Em diversas nefropatias foi demonstrada a atividade do SRA, que por mecanismos mediados via Ang II pode levar ao aumento da pressão capilar intraglomerular e proteinúria. Assim, inibidores da ECA têm sido utilizados
Pontos-chave:
Hipertensão Arterial Não há dúvida de que a infusão de Ang II leva à hipertensão arterial por induzir vasoconstrição, além de aumentar o volume intravascular mediado pela aldosterona. Existem formas de hipertensão arterial que são classicamente renina-dependentes, como é o caso da estenose de artéria renal e tumor secretor de renina. No entanto, a hipertensão maligna também está associada com hiperati-
Patologias tratáveis pela inibição do sistema renina-angiotensina • Hipertensão arterial • Hipertrofia do ventrículo esquerdo • Insuficiência cardíaca congestiva • Nefropatia diabética • Insuficiência renal crônica (inicial)
76
Peptídeos Vasoativos e o Rim
como agentes antiproteinúricos e nefroprotetores. No entanto, o efeito antiproteinúrico é variável: a resposta parece melhor em pacientes normotensos e quando se associa a restrição de sal na dieta. Além desses efeitos o bloqueio do SRA pode ser nefroprotetor por inibir a formação de fibrose intersticial.
PEPTÍDEOS DERIVADOS DAS ANGIOTENSINAS Alguns peptídeos derivados da degradação das angiotensinas não são biologicamente inertes. Os mais conhecidos são Ang-(1-7), Ang-(2-8) ou Ang III e Ang-(3-8) ou Ang IV. Estes peptídeos são gerados através da ação de angiotensinases, conforme mostrado na Fig. 7.4.
Ang-(1-7) A Ang-(1-7) é um derivado da angiotensina que tem ações fisiológicas, na maior parte das vezes, antagônicas às da Ang II. O heptapeptídeo é produzido pela ação de peptidases teciduais sobre a angiotensina e é rapidamente hidrolisado depois de formado, principalmente através da ação da enzima conversora da angiotensina. Desta forma, com o uso dos inibidores da ECA ocorre acúmulo de Ang(1-7). Neste caso, o aumento da concentração de Ang-(1-7)
Angiotensinogênio
deriva tanto do bloqueio da degradação do heptapeptídeo quanto do acúmulo de substrato (Ang I). Além disso, o uso de bloqueador de receptor AT1 também pode levar ao acúmulo de Ang-(1-7).4 A Ang-(1-7) potencializa os efeitos hipotensores da bradicinina. O mecanismo envolvido é complexo e inclui facilitação da liberação de óxido nítrico, prostaglandinas, fator hiperpolarizante derivado do endotélio (EDHF) e inibição da quebra de bradicinina (BK) via ECA. No entanto, a Ang-(1-7) também pode agir tendo a BK como mediador, pois a Ang-(1-7) é capaz de se ligar ao receptor AT2 e a ativação deste estimula a síntese de bradicinina.29 No rim a Ang-(1-7) produz diurese e natriurese. Estes efeitos são bloqueáveis por losartan, mas não são devidos à ação do receptor AT1 e sim a um outro receptor sensível a losartan, denominado receptor AT1-símile. A Ang-(1-7) também afeta o transporte de água no túbulo renal, e como este efeito é bloqueável por PD 123319, deve ser mediado por AT2. Parte dos efeitos da Ang-(1-7) no rim também pode ser mediada pelo receptor da Ang IV, uma vez que a Ang-(1-7) pode ser convertida em Ang-(3-7) que, por sua vez, é capaz de ativar o receptor da Ang IV.
Ang III A Ang III determina os mesmos efeitos da ativação do receptor AT1 da Ang II, tendo já sido inclusive questionado se os efeitos fisiológicos da Ang II não seriam mediados por Ang III. Destes efeitos, parece que a Ang III realmente é a responsável pela liberação de vasopressina, uma vez que quando se bloqueia a conversão Ang II–Ang III o efeito não é mais observável. Além disso, a Ang III pode ter um papel importante na inflamação e fibrose glomerulares.30
Ang IV
Ang I (1-10)
Ang-(1-7)
Ang II (1-8)
Ang III (2-8)
A Ang IV está envolvida nos mecanismos de recordação de memória, vasodilatação encefálica e crescimento celular da adeno-hipófise. O receptor da Ang IV está distribuído em vários sítios anatômicos do sistema nervoso central, mas também está presente em outros órgãos e tecidos como coração, supra-renais e músculo liso vascular. Sua ação nestes alvos ainda está sob investigação.31
Ang IV (3-8)
Pontos-chave:
Ang-(3-7) Fig. 7.4 Catabolismo das angiotensinas. § representa ACE, * endopeptidases neutras, # aminopeptidases e † carboxipeptidases.
Efeitos dos metabólitos da angiotensina II • Ang-(1-7): vasodilatação e antiproliferação • Ang III: vasoconstrição e proliferação celular • Ang IV: efeitos no sistema nervoso central
capítulo 7
SISTEMA RENAL CALICREÍNA-CININA As cininas são peptídeos vasodilatadores, sendo que o mais conhecido, a bradicinina, foi descoberta por um cientista brasileiro, o Professor Rocha e Silva.32 A participação do sistema calicreína-cinina na função renal, com ações primordialmente vasodilatadoras, continua pouco definida. No entanto, existem fortes evidências de que estas substâncias atuem na regulação do fluxo sanguíneo renal e no controle da excreção renal de sódio e água.2,3,33
Componentes do Sistema Renal Calicreína-cinina Assim como existe um sistema vasoconstritor (sistema renina-angiotensina) cujo elemento ativo é um peptídeo (Ang II, com oito aminoácidos), existe um sistema vasodilatador cujo agonista ativo mais comum é outro peptídeo (bradicinina, com nove aminoácidos). Da mesma forma que o SRA, o sistema calicreína-cinina tem um zimogênio precursor (cininogênio) que é quebrado para gerar os peptídeos ativos através da ação de uma enzima ativadora (calicreína). Além disso, os peptídeos são degradados por enzimas proteolíticas (cininases).34 A bradicinina é gerada na circulação, mas nos tecidos é produzido um decapeptídeo chamado calidina, que é uma molécula de bradicinina acrescida de uma lisina em sua porção amino-terminal, portanto é uma lisil-bradicinina. Uma pequena quantidade da calidina pode ser convertida a bradicinina por uma aminopeptidase (Fig. 7.5).
CININOGÊNIOS Os cininogênios são glicoproteínas de cadeia simples sintetizados primariamente no fígado e depois secretados e transportados no plasma. O gene do cininogênio humano (localizado no cromossoma 3q26) codifica a produção de dois cininogênios: um cininogênio de alto peso molecular — HMW (88-120 kDa) — e outro cininogênio de bai-
Cininogênio de baixo peso molecular
Cininogênio de alto peso molecular
77
xo peso molecular — LMW (50-68 kDa). Na circulação sistêmica a calicreína quebra o cininogênio de alto peso molecular e nos tecidos a calicreína age sobre os dois tipos de cininogênio. Os cininogênios estão também presentes na membrana das plaquetas, nos neutrófilos e no endotélio vascular. No rim, LMW-cininogênio (o substrato preferido para calicreína tissular renal) é detectado tanto no córtex como na medula renal.
CALICREÍNAS As calicreínas são proteases que existem em duas grandes formas, a plasmática e a tissular, e que diferem entre si estrutural e funcionalmente. A calicreína plasmática (100 kDa) participa da cascata de coagulação e libera cininas (principalmente bradicinina) do cininogênio de alto peso molecular mas não do LMW-cininogênio. A calicreína plasmática não é encontrada no rim e é pouco provável que afete a função renal. No entanto, pela liberação de bradicinina, um potente vasodilatador, podem ocorrer efeitos vasculares periféricos. A calicreína tissular (24-45 kDa), também chamada calicreína glandular, está presente em glândulas endócrinas e exócrinas e no rim. Diversas proteinases são capazes de ativar a PRÓ-calicreína. Uma vez ativada, a calicreína renal quebra usualmente o LMW-cininogênio liberando a lisil-bradicinina (calidina). A atividade enzimática das calicreínas tissulares pode ser inibida pela aprotinina (6,5 kDa). A aprotinina está disponível comercialmente e é amplamente empregada como inibidor tissular de calicreína, ainda que não seja específica para este fim. O gene humano da calicreína renal localiza-se no cromossoma 19 (q13.2-13.4) e é denominado hKLK1. Foi observado que existe homologia, tanto no nível genômico DNA como no nível protéico, entre a calicreína tissular e o hKLK3, que codifica o antígeno prostático específico (PSA). O PSA está presente na próstata e é relevante na detecção do carcinoma de próstata. Na verdade, o PSA pertence, do ponto de vista estrutural, à família das calicreínas, embora não tenha função correlata às mesmas. Outras proteínas também têm esta característica, como a tonina, que, embora seja assemelhada às cininas, gera angiotensina II a partir de angiotensinogênio.
CININAS As cininas têm uma meia-vida extremamente curta de 10 a 30 segundos, o que dificulta e limita o estudo destas substâncias. A concentração de cininas em fluidos biológicos também é muito baixa, da ordem de pg/ml. A cinina formada no rim é detectada na urina, no fluido intersticial renal e, em algumas circunstâncias, no sangue venoso renal.
Calidina
Bradicinina
CININASES Fig. 7.5 Componentes do sistema calicreínas-cininas. * representa calicreína tissular, # calicreína plasmática e § aminopeptidase.
As cininas são rapidamente inativadas por cininases (cininases I e II) e pelas endopeptidases neutras (EPN),
78
Peptídeos Vasoativos e o Rim
todas presentes no sangue e nos tecidos.35 A cininase I é uma carboxipeptidase específica que remove o aminoácido carboxiterminal das cininas (arginina). A cininase II e a endopeptidase neutra EPN 24-11 quebram a ligação ProPhe da bradicinina.36 A cininase II também quebra a ligação His-Leu da Ang I, levando à formação da Ang II, sendo também conhecida como enzima conversora da angiotensina I. Os rins são muito ativos em degradar cininas, pois 90% do hormônio é inativado e 1% é excretado na urina.37
Receptores para Cininas As cininas agem nas células-alvo através de receptores, denominados BK1 e BK2.38 Os receptores BK2 são os principais mediadores das cininas. Os receptores BK1 são menos proeminentes que os BK2 e exercem efeitos quando induzidos por inflamação, como no choque endotóxico induzido por endotoxina de E. coli, situação na qual ocorre uma marcante vasodilatação e hipotensão.
Pontos-chave: Componentes do sistema calicreína-cininas • Cininogênio (tissular ou plasmático) • Calicreína • Bradicinina ou calidina • Receptores BK1 e BK2 • Cininase II (ECA)
Localização Renal dos Componentes do Sistema Calicreína-cinina Utilizando técnicas de imuno-histoquímica39 e de hibridização in situ,40 foi possível localizar os componentes do sistema calicreína-cinina ao longo do néfron. LMW-cininogênio foi identificado no néfron distal, particularmente nos túbulos distais medulares e corticais e nos ductos coletores.39 Imunorreatividade para calicreína e atividade enzimática foram demonstradas predominantemente no túbulo de conexão no córtex renal.39,41 Técnicas de imunocitoquímica sugerem que a calicreína é encontrada predominantemente na membrana plasmática e sua reatividade é maior do lado luminal. A calicreína é secretada para a luz do túbulo distal, e parte vai para o espaço peritubular, onde pode agir no cininogênio plasmático e formar bradicinina. A calicreína urinária consiste predominantemente em calicreína secretada pelo rim, embora uma pequena parte possa ser resultado de calicreína filtrada. Tanto a calidina como a bradicinina são excretadas na urina. É provável que os túbulos coletores sejam o principal sítio de produção de cinina e de sua ação. A bradicini-
na extra-renal filtrada não alcança este local porque ocorre degradação no néfron proximal. A cininase II está localizada nas células endoteliais, células epiteliais do túbulo proximal (borda em escova) e do túbulo distal e no glomérulo. A endopeptidase neutra está localizada na borda em escova do túbulo proximal. Assim, os rins são muito ativos em degradar. As cininas circulantes filtradas pelo rim são degradadas rapidamente pela cininase II na borda em escova do túbulo proximal,33 e se elas entram na circulação pós-glomerular são inativadas pela cininase II das células endoteliais ou então degradadas no pulmão. Uma vez que a atividade das cininases é tão abundante no túbulo proximal e na vasculatura, é pouco provável que cininas circulantes sejam capazes de modular a função renal. Por isso, a geração endógena parece ser necessária para a ativação da cinina in vivo.33 Receptores para bradicinina estão presentes em alta densidade nos túbulos coletores corticais e medulares e em células intersticiais, e mais recentemente foram detectados também em células mesangiais em cultura.42 Em resumo, a localização de cininogênio, calicreína e locais específicos de ligação para cininas no néfron distal sugere que esta região seja o principal local de produção e de ação das cininas renais.
Ações do Sistema Calicreína-cinina no Rim Desde 1909, quando foram constatadas as propriedades hipotensoras da urina (agora reconhecidas como sendo devido à excreção renal de calicreína), discute-se o papel do sistema calicreína-cinina na função renal, no controle da pressão arterial e na regulação da excreção de sódio e água. No entanto, até hoje a contribuição isolada do sistema calicreína-cinina isoladamente ainda não foi estabelecida. Os dados demonstrando um alto turnover diário da taxa de calicreína renal em humanos, além da presença de altas concentrações de cininases renais e da identificação de receptores para cininas em túbulos, células intersticiais e células mesangiais, falam a favor da ação local deste sistema. Por outro lado, estudos mais recentes indicam que o sistema calicreína-cinina parece agir como parte de um complexo sistema de regulação que envolve também as prostaglandinas, a renina, a Ang II e outros peptídeos vasoativos.
EFEITOS NA HEMODINÂMICA RENAL Os primeiros estudos sobre a ação das cininas na função renal foram realizados em 1964 por Webster43 e cols e em 1965 por Gill e cols.44 Foi demonstrado que a infusão aguda de doses farmacologicamente ativas de cininas induzia um importante efeito de vasodilatação renal, com aumento do fluxo sanguíneo renal e aumento da excreção de sódio e água. Estes resultados sugerem que as cininas sejam fatores capazes de regular o fluxo sanguíneo renal.
79
capítulo 7
Já a administração crônica de bradicinina na artéria renal mostrou que, embora a vasodilatação renal permaneça, o aumento na excreção de sódio e água não se mantém ao longo do tempo.45 Estes achados falam contra a possibilidade de as cininas terem um papel natriurético cronicamente. Todos estes resultados devem ser analisados criteriosamente, pois infusões destes peptídeos podem não refletir verdadeiramente os efeitos da bradicinina gerada endogenamente. É pouco provável que in vivo as cininas circulantes modulem a função renal, pois, como já discutido acima, devido à abundante atividade das cininases nos vasos e no túbulo proximal, estas substâncias são rapidamente degradadas. Assim, a geração endógena parece ser necessária para a ação de cinina in vivo. A bradicinina tem um potente efeito relaxante na arteríola glomerular, promovendo vasodilatação tanto da arteríola aferente como da eferente.46 Entretanto, a arteríola eferente dilata em resposta à bradicinina de uma maneira dose-dependente.46
EFEITOS NA EXCREÇÃO DE SÓDIO E ÁGUA As cininas induzem o aumento da excreção de sódio e água, porém o exato mecanismo deste efeito continua controverso. Muitos autores correlacionam a natriurese aos efeitos vasodilatadores das cininas. Desde os experimentos de Webster e Granger tem sido documentado que infusão de bradicinina na artéria renal induz natriurese sem alterar a taxa de filtração glomerular,43,45 sugerindo efeito direto no transporte tubular de sódio. A favor desta possibilidade estão os estudos de microperfusão de porções distais do túbulo proximal com soluções suprafisiológicas de bradicinina, nos quais há aumento da excreção de sódio, provavelmente por ação direta no epitélio urinário.35,47 A inibição do eixo calicreína-bradicinina endógeno usando anticorpos específicos antibradicinina ou utilizando-se aprotinina acaba com o efeito natriurético e diurético da infusão salina.35 Estes resultados indicam que as cininas endógenas podem agir como substâncias natriuréticas. A cinina produzida endogenamente, quer seja pelo uso de inibidores de cininases renais (captopril) ou pelo tratamento crônico com desoxicorticosterona (que aumenta os níveis de cininas endógenas), aumenta o fluxo sanguíneo
papilar, a diurese e a excreção de sódio. Neste modelo, o uso de bloqueadores específicos de receptores de cininas BK2 consegue atenuar ou mesmo abolir estes efeitos. Assim, fica claro que cinina produzida endogenamente afeta de forma significativa a hemodinâmica renal e a função excretora.33
Inter-relações entre Sistema Calicreína-cinina e outros Sistemas É provável que as cininas exerçam seus efeitos moduladores na função renal por interação com outros hormônios vasoativos, incluindo o sistema renina-angiotensina, prostaglandinas e vasopressina.33
SISTEMA RENINA-ANGIOTENSINA A inter-relação entre o sistema calicreína-cinina e o sistema renina-angiotensina é complexa e não compreendida completamente. No entanto, alguns aspectos têm sido bem reconhecidos. Há evidências de que a bradicinina pode estimular diretamente a liberação de renina no glomérulo.48 Por outro lado, a enzima conversora de angiotensina é eficiente em inativar cininas. Por este motivo, parte do efeito anti-hipertensivo dos inibidores da ECA pode ser uma conseqüência da diminuição da destruição de cinina, mantendo os seus efeitos vasodilatadores. É possível que o uso de bloqueadores do receptor AT1 da Ang II conduza a efeitos semelhantes, pois com o bloqueio destes receptores há aumento da concentração de Ang II e conseqüentemente maior ativação dos receptores AT2. Existe a suspeita de que os receptores AT2 possam ativar o sistema calicreína-cininas.38 É interessante que em algumas situações os dois sistemas parecem ter comportamentos opostos e paradoxais. Por exemplo, dietas pobres em sódio e outras alterações sistêmicas, como depleção de volume, estimulam a síntese de renina e aumentam os níveis de Ang II e aldosterona, com objetivo de reter sódio e água e aumentar a pressão arterial em defesa da homeostase circulatória. Por outro lado, estes mesmos estímulos aumentam a calicreína renal e a produção de cinina, que têm ações vasodilatadoras e objetivam uma defesa local do fluxo sanguíneo renal e da taxa de filtração glomerular.
EICOSANÓIDES Pontos-chave: Principais efeitos das cininas • Diminuição da pressão arterial • Vasodilatação sistêmica • Vasodilatação renal • Natriurese • Diurese
O sistema calicreína-cinina ativa a síntese de eicosanóides no rim. Diversos estudos demonstram que a cinina estimula a liberação do ácido araquidônico e subseqüente síntese de eicosanóides na vasculatura renal, células intersticiais e células epiteliais. Isto tudo parece ocorrer via ativação de receptor BK2 e liberação de ácido araquidônico mediado por fosfolipase A2. A estimulação da produção de PGE2 ocorre em resposta à cinina em células dos ductos coletores assim como em
80
Peptídeos Vasoativos e o Rim
arteríolas glomerulares e células mesangiais. A síntese de PGI2 vascular é poderosamente estimulada pela cinina, assim como é a síntese de tromboxane A2. A vasopressina estimula a liberação de calicreína renal e a produção de cininas, mas as cininas inibem a reabsorção de sódio e água induzida por vasopressina nos ductos coletores, provavelmente via produção de PGE2 neste local. Assim, é possível que existam alças de feedback negativo local entre cininas, eicosanóides e vasopressina no néfron distal.
PEPTÍDEO NATRIURÉTICO ATRIAL (ANP) A calicreína tissular é capaz de formar ANP a partir de seu precursor e catabolizar a atividade dos eupeptídeos in vitro. A administração de ANP afeta a excreção urinária de calicreína. A endopeptidase neutra NEP 24.11 degrada tanto as cininas quanto os peptídeos natriuréticos, assim os efeitos farmacológicos de sua ação são inespecíficos. Fato semelhante ocorre com o bloqueio da ECA, que tanto impede a formação de Ang II quanto impede a degradação das cininas.
ÓXIDO NÍTRICO O óxido nítrico é um mediador implicado na vasodilatação induzida por cinina. A vasodilatação produzida pela administração de bradicinina é significativamente, mas não totalmente, dependente da síntese de óxido nítrico e pode ser marcadamente atenuada por inibidores da óxido nítrico sintetase.
SISTEMA CALICREÍNA-CININA EM SITUAÇÕES FISIOPATOLÓGICAS
dores da enzima de conversão diminui a destruição das cininas, o que provavelmente desempenha papel significante na sua eficiência anti-hipertensiva.
Fibrose Miointimal Os inibidores da ECA são capazes de prevenir a fibrose miointimal que ocorre em artérias lesadas. Estudos mais aprofundados mostraram que tanto a Ang II quanto as cininas desempenham um papel na formação/prevenção da fibrose miointimal. O efeito das cininas é, provavelmente, mediado pela geração de óxido nítrico.41
Infarto do Miocárdio Os inibidores da ECA, quando usados no infarto agudo do miocárdio, são capazes de melhorar a função cardíaca, diminuir a mortalidade e a taxa de reinfarto. A maior quantidade de cininas presentes na circulação coronária poderia, neste caso, gerar maior quantidade de PGI2 e NO, que são importantes inibidores da agregação plaquetária. Além disso, as cininas são estimuladores potentes da liberação de tPA (ativador tissular de plasminogênio), que pode, por sua vez, ativar a plasmina e induzir fibrinólise.41
Pontos-chave: Patologias associadas à depleção de cininas (ou que poderiam se beneficiar do aumento de cininas) • Síndrome hepatorrenal • Fibrose miointimal • Infarto do miocárdio • Hipertensão arterial
Cirrose Hepática Pacientes com cirrose hepática apresentam aumento da excreção urinária de calicreína. Quando estes pacientes evoluem para a síndrome hepatorrenal ocorre uma diminuição drástica desta excreção, sugerindo que a incapacidade de produzir cininas possa contribuir para a gênese da insuficiência renal aguda na síndrome hepatorrenal.
Hipertensão Arterial Em hipertensão arterial clínica e experimental foi demonstrada uma diminuição da excreção urinária de calicreína e que esta redução correlaciona-se com a gravidade da hipertensão. A diminuição da atividade do sistema calicreína-cinina renal pode ser responsável, em parte, pela retenção de sódio e assim participar da fisiopatologia da hipertensão arterial. Além disso, a terapêutica com inibi-
PEPTÍDEOS NATRIURÉTICOS Existe uma família de peptídeos natriuréticos conhecidos, todos com fórmula estrutural semelhante, consistindo em um anel de 17 aminoácidos ligados por uma ponte de dissulfeto. No momento, quatro destes peptídeos foram razoavelmente estudados, ANP, BNP, CNP e urodilatina. O ANP e a urodilatina são codificados pelo mesmo gene e o BNP e o CNP são codificados cada um por seu próprio gene.
Peptídeo Natriurético Atrial (ANP) O peptídeo natriurético atrial (ANP), que foi o primeiro peptídeo natriurético descrito, é um potente hormônio natriurético produzido principalmente pelos miócitos do
81
capítulo 7
átrio cardíaco em resposta à distensão local da parede atrial. Desta maneira, é uma substância que tem uma participação importante na regulação da homeostase de volume do organismo. DeBold e cols49 foram os primeiros a demonstrar que a injeção intravenosa de extratos de átrio em ratos produzia um efeito potente e imediato de aumentar a excreção renal de sódio e de água. Sua infusão leva concomitantemente a uma diminuição da pressão arterial. Subseqüentemente, foi demonstrado que os grânulos localizados no átrio armazenavam uma substância natriurética. Este peptídeo foi inicialmente chamado de fator natriurético atrial. O ANP age principalmente nos rins, na vasculatura e nas glândulas supra-renais através de receptores específicos. Os principais efeitos do ANP incluem inibição do transporte de sódio e supressão da liberação de renina e aldosterona, além do relaxamento da musculatura lisa dos vasos. Por estes mecanismos leva à natriurese, diurese e diminuição da pressão arterial, com conseqüente diminuição do volume extravascular.50,51
SÍNTESE E ESTRUTURA O gene humano que codifica o PRÉ-PRÓ-ANP está localizado no braço curto do cromossoma 1 e contém 3 exons (Fig. 7.4). O produto do gene é o PRÉ-PRÓ-ANP formado por 151 aminoácidos. A quebra da molécula resulta em PRÓANP, que é a principal forma de armazenamento como grânulos nos miócitos cardíacos. No momento da liberação do átrio cardíaco, o PRÓ-ANP é convertido no peptídeo ativo ANP (composto por 28 aminoácidos), que é a forma do hormônio que se encontra na circulação com importantes funções fisiológicas.50,51 Utilizando-se anticorpos específicos anti-PRÉ-PRÓ-ANP foi possível localizar imunorreatividade nos grânulos secretórios do átrio cardíaco.52 Uma pequena quantidade do pró-hormônio também é produzida no ventrículo esquerdo e esta produção está muito aumentada na hipertrofia do ventrículo esquerdo. A expressão de mRNA para ANP também foi encontrada em cérebro, pituitária, hipotálamo, arco aórtico, pulmão, medula adrenal e rim, confirmando a produção deste peptídeo em outros tecidos. No entanto, a quantidade de ANP sintetizada nestes locais é bem menor que a encontrada em átrio e aparentemente não contribui de maneira significativa para o hormônio circulante.
REGULAÇÃO DA SECREÇÃO DO ANP O estímulo mais importante para liberação de ANP é o estiramento cardíaco,53 que pode ser resultado de vários fatores, dentre eles: sobrecarga de sal, sobrecarga aguda e crônica de volume, estados clínicos associados com o aumento da pressão intra-atrial (insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal aguda e insuficiência renal crônica), aldosteronismo primário e síndrome da produção
Quadro 7.2 Situações que estimulam a secreção de ANP • estiramento cardíaco e aumento da pressão intraatrial — sobrecarga de sal — sobrecarga aguda e crônica de volume — insuficiência cardíaca congestiva — insuficiência renal aguda — insuficiência renal crônica — aldosteronismo primário — síndrome da produção inapropriada do hormônio antidiurético • endotelina • acetilcolina • epinefrina • vasopressina • glicocorticóides
inapropriada do hormônio antidiurético. Finalmente, endotelina, acetilcolina, epinefrina, vasopressina e glicocorticóides aumentam a secreção de ANP50,51,53 (Quadro 7.2). A secreção do ANP pode ser controlada basicamente pelos seguintes mecanismos: primeiro, a conversão de PRÓANP em ANP (e liberação de ANP armazenado) e aumento da síntese de mRNA (levando ao aumento de PRÓ-ANP e ANP). O primeiro mecanismo está principalmente envolvido na liberação de ANP quando ocorrem estímulos agudos de aumento da pressão intra-atrial. Já estímulos crônicos promovem a secreção de ANP, via aumento da síntese.2,54
RECEPTORES PARA ANP Para exercer seus efeitos fisiológicos, o ANP tem que se ligar a receptores específicos presentes na membrana das células alvo.51 Os receptores estão presentes no rim, suprarenal, cérebro e vasculatura. No rim, localizam-se principalmente nos vasos renais, no glomérulo e na medula e papila renal. Há três tipos de receptores para ANP: GC-A (guanilato-ciclase A), GC-B (guanilato-ciclase B) e CR (clearance receptor, ou receptor catabólico). Os receptores GC-A e GC-B são biologicamente ativos, são os mediadores das ações do ANP e dos outros peptídeos natriuréticos e apresentam um domínio citosólico com atividade enzimática associada à proteína G. O ANP age via receptor GC-A. Quando o hormônio se liga ao receptor na superfície da membrana celular, a atividade da guanilato ciclase é estimulada e desta maneira é sintetizado cGMP (que é o mediador dos efeitos do ANP). Os receptores CR não apresentam atividade enzimática e são receptores de clearance que servem para depurar o ANP da circulação e regular desta maneira o nível circulante de ANP.2 O ANP tem uma outra importante via de catabolismo que ocorre pela ação da endopeptidase neutra NEP 24.11.
82
Peptídeos Vasoativos e o Rim
AÇÕES DO ANP A ação do ANP é imediata e de curta duração. A meiavida do ANP exógeno injetado endovenoso é de 2 a 4 minutos.55,56 A administração endovenosa de ANP ou a injeção em artéria renal produz imediata diurese e natriurese, porém de duração muito curta.49 O aumento da excreção de sódio e água é acompanhado por aumento importante da excreção de cálcio, magnésio e cloro.2
EFEITOS NA HEMODINÂMICA RENAL E EFEITOS NA INDUÇÃO DE NATRIURESE O exato mecanismo pelo qual o ANP induz natriurese é multifatorial. No rim, o ANP aumenta a taxa de filtração glomerular.57 Estudos de micropunção demonstraram que o ANP dilata a arteríola aferente e leva à vasoconstrição da arteríola eferente, resultando em aumento da pressão hidráulica do capilar glomerular. Outros estudos mostraram que o Kf aumenta significantemente após infusão de ANP.58 Efetivamente, o aumento da filtração glomerular pode levar ao aumento da natriurese.50,51 A diminuição da hipertonicidade medular também contribui para o efeito natriurético.50,51 Apesar de estas ações hemodinâmicas serem importantes, aparentemente a principal ação natriurética do ANP é o efeito direto nos túbulos, inibindo o transporte de sódio nos ductos coletores.50,51,59 O principal local de ação do ANP são as células do ducto coletor da medula interna. O ANP estimula a produção de cGMP nestas células e estudos de microperfusão in vitro demonstraram que a reabsorção de sódio é inibida pelo ANP neste segmento.
EFEITOS NO SISTEMA RENINAANGIOTENSINA-ALDOSTERONA, VASOPRESSINA E ENDOTELINA A infusão de ANP diminui significativamente a secreção de renina e aldosterona.60,61 A inibição da secreção de renina pode ser devida ao aumento da carga filtrada de cloreto de sódio que alcança a mácula densa, que responde diminuindo a secreção de renina.62 Existe também um efeito inibitório direto do ANP na secreção de renina.63 O ANP inibe a secreção de aldosterona, indiretamente pela diminuição da secreção de renina e diretamente afetando as células da camada glomerulosa do córtex adrenal, que secretam a aldosterona.64 ANP inibe a liberação de vasopressina,50,51 levando ao aumento do clearance de água livre. O ANP também diminui a liberação de endotelina, um peptídeo vasoconstritor.65
EFEITOS NA VASCULATURA ANP causa relaxamento da musculatura lisa dos vasos levando à vasodilatação. Infusão de doses farmacológicas de ANP em indivíduos normais e hipertensos induz uma rápida e mantida diminuição da PA média. Os mecanismos pelos quais o ANP diminui a pressão sanguínea incluem
diminuição do débito cardíaco, redução da resistência vascular periférica e diminuição do volume intravascular, o que ocorre tanto devido à diurese/natriurese como por transferência de líquido do interior dos vasos para o interstício.
Pontos-chave: Principal estímulo para secreção de peptídeo natriurético atrial • Aumento da volemia Principais efeitos do peptídeo natriurético atrial • Diurese • Natriurese • Vasodilatação sistêmica • Diminuição da produção de vasoconstritores (Ang II, endotelina e vasopressina)
ANP em Situações Fisiopatológicas INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA Uma vez que ANP é secretado em resposta ao estiramento atrial, não causam surpresa os achados de níveis plasmáticos elevados de ANP em pacientes com insuficiência cardíaca congestiva. Na insuficiência cardíaca congestiva com hipertrofia ventricular foi detectada síntese aumentada de ANP também pelos ventrículos.50 Há correlação entre os níveis plasmáticos de ANP com a gravidade da insuficiência cardíaca congestiva, e o tratamento da insuficiência cardíaca se acompanha por diminuição de ANP. No entanto, em fases avançadas de descompensação cardíaca, os efeitos do sistema nervoso simpático e do sistema renina-angiotensina-aldosterona passam a dominar, levando a um estado refratário ao ANP, contribuindo com a retenção de sal e água. O PRÓ-ANP está presente no sangue de pacientes com insuficiência cardíaca congestiva classe I (assintomática), e o peptídeo natriurético cerebral (BNP) (ver adiante) se correlaciona com o grau de disfunção miocárdica avaliado pelo ecocardiograma. Assim, os peptídeos natriuréticos são marcadores da disfunção cardíaca.54,65
TAQUICARDIA SUPRAVENTRICULAR Na taquicardia supraventricular pode haver diurese/ natriurese induzidas pela liberação anômala de ANP desencadeada pela estimulação elétrica das fibras atriais.65
HIPERTENSÃO ARTERIAL O ANP reduz a pressão arterial porque, além dos efeitos natriurético, diurético e vasodilatador, suprime a libe-
83
capítulo 7
ração de renina e aldosterona. Os níveis de ANP em pacientes portadores de hipertensão arterial essencial são muito variáveis. A administração de ANP em pacientes hipertensos resulta em diminuição da pressão arterial. No entanto, o uso de ANP como um agente anti-hipertensivo é limitado devido à falta de apresentação via oral desta substância. O uso de preparações de ANP intranasal mostrou ser de difícil manuseio: pequenas doses têm pouco efeito e doses um pouco maiores causam hipotensão grave.66,67
CIRROSE HEPÁTICA Na cirrose hepática avançada ocorre retenção de sódio e água, situação na qual existe a possibilidade do envolvimento do ANP. Em pacientes com ascite, os níveis plasmáticos de ANP encontram-se elevados. Entretanto, como na insuficiência cardíaca congestiva, parece existir uma falta de resposta do rim ao ANP, provavelmente por predomínio do estado de vasoconstrição induzido por ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e do sistema nervoso simpático, impedindo a ação do ANP em induzir diurese e natriurese. A infusão de ANP em pacientes cirróticos com ascite resultou em modesta e transiente natriurese e diurese. Adicionalmente causou como efeito colateral hipotensão arterial grave.
DOENÇA RENAL Os níveis de ANP na síndrome nefrótica estão geralmente diminuídos, apesar do aumento do sódio e da água corporal total, sugerindo que nesta situação existe uma diminuição do volume sanguíneo efetivo, o que realmente acontece em alguns tipos de síndrome nefrótica. A administração de ANP não se acompanha por aumento da excreção renal de sódio e água, demonstrando um estado de falta de resposta ao ANP na síndrome nefrótica.68 No entanto, este estado de refratariedade ao ANP não foi observado em humanos.69 Na insuficiência renal crônica, os níveis de ANP estão diretamente relacionados ao grau de expansão do volume.
Pontos-chave: Patologias que cursam com aumento de ANP • Insuficiência renal com hipervolemia • Ascite • Insuficiência cardíaca • Obstrução ureteral • Taquicardia supraventricular Patologias que cursam com diminuição de ANP • Síndrome nefrótica (com diminuição do volume efetivo)
Em pacientes em hemodiálise, os níveis de ANP pré-diálise encontram-se muito elevados, sendo que após a diálise há redução de ANP circulante. Finalmente, em casos de obstrução ureteral bilateral, o ANP pode estar envolvido na resposta diurética e natriurética que ocorre após a desobstrução.
PEPTÍDEO NATRIURÉTICO CEREBRAL (BNP) Este peptídeo foi inicialmente detectado em cérebro de porco (daí o nome em inglês, brain natriuretic peptide). No entanto, seu principal sítio de produção é no ventrículo cardíaco, sendo secretado de forma constitutiva e não regulada. O BNP tem 32 aminoácidos e é estruturalmente semelhante ao ANP, pois também tem um anel de 17 aminoácidos ligados por ponte de dissulfeto. A seqüência está localizada na parte carboxiterminal de um transcrito de 134 aminoácidos (PRÉ-PRÓ-BNP). Após a remoção de 26 aminoácidos obtém-se uma molécula de 108 aminoácidos, o PRÓ-BNP, e deste é formado o peptídeo ativo, após clivagem proteolítica. A secreção de BNP aumenta enormemente na hipertrofia do ventrículo esquerdo. Nesta condição, o pró-hormônio também é liberado na circulação, mas não está provado que este pró-hormônio circulante possa funcionar como uma reserva periférica de BNP. Os efeitos biológicos do BNP são os mesmos do ANP: natriurese e diurese, hipotensão arterial e diminuição do volume intravascular e diminuição de renina e aldosterona. Tal panorama é esperável, uma vez que os dois peptídeos agem através do mesmo receptor, isto é, via GC-A. Como descrito anteriormente, o ANP não tem um efeito diurético importante na insuficiência cardíaca. Entretanto, o BNP mantém seu efeito natriurético mesmo na insuficiência cardíaca congestiva. Isto se deve ao fato de que o BNP tem menos afinidade pelas vias de degradação dos peptídeos natriuréticos, seja pelos CR, seja pela endopeptidase neutra NEP 24.11, e portanto tem uma meia-vida maior. A meia-vida do BNP é de 8 a 22 minutos, comparada aos 1 a 4 minutos do ANP.54,65
Peptídeo Natriurético do Tipo C (CNP) Este peptídeo tem 22 aminoácidos e foi inicialmente isolado de cérebro de porco. Parece estar restrito ao cérebro, mais exatamente ao tálamo, cerebelo e hipotálamo. O CNP se liga ao receptor GC-B, cuja sinalização intracelular e efeitos biológicos desencadeados são diferentes do receptor que liga os peptídeos ANP e BNP. A injeção sistêmica de CNP provoca hipotensão arterial e diminuição do débito cardíaco; no entretanto o peptídeo
84
Peptídeos Vasoativos e o Rim
é completamente desprovido de efeitos renais. Além disso, o CNP é antimitogênico para vasos estimulados por diversos fatores de crescimento (FGF, PDGF, EGF) e pode estar envolvido no controle da fibrose vascular induzida por hipertensão arterial. Uma analogia pode ser traçada aqui com o sistema renina-angiotensina. Um dos motivos pelos quais o bloqueio do SRA se mostrou superior terapeuticamente quando comparado, por exemplo, com a hidralazina é o fato de que aquele tratamento inibe a proliferação e a fibrose induzidas por Ang II. De modo semelhante, o CNP (ou possíveis agonistas do receptor GC-B) tem vantagem terapêutica teórica, ainda não comprovada, sobre os peptídeos que agem no receptor GC-A,65 pois inibiriam a proliferação induzida por fatores de crescimento (FGF, PDGF, EGF).
URODILATINA Em 1988 foi identificado um peptídeo natriurético na urina humana que era praticamente idêntico ao ANP, exceto pela adição de quatro aminoácidos suplementares à extremidade amino-terminal. Na verdade este peptídeo é codificado pelo mesmo gene do ANP e é produzido através da clivagem da molécula precursora em um sítio diferente do sítio de clivagem do ANP. Tal peptídeo foi denominado urodilatina (Fig. 7.6).70 A urodilatina é produzida no córtex renal no néfron distal (túbulo contorcido distal, túbulo de conexão e túbulo coletor cortical) e age preferencialmente no ducto coletor
ANP
CNP
medular interno, local onde se dá a regulação fina da excreção de sódio. Deve ser ressaltado que muito pouco do que é filtrado de peptídeos natriuréticos alcança o ducto coletor medular interno pela luz tubular, uma vez que há uma grande quantidade de endopeptidases neutras no túbulo contorcido proximal. Estas endopeptidases virtualmente extinguem qualquer traço de peptídeos natriuréticos no fluido tubular. Assim, a urodilatina é o peptídeo capaz de impedir a absorção de sódio agindo na superfície luminal do ducto coletor medular interno, onde há de fato receptores para o peptídeo. A urodilatina age neste sítio, bloqueando a absorção de sódio via canal de sódio sensível ao amiloride.71 Entretanto, os outros peptídeos natriuréticos também podem estimular as células do ducto coletor medular interno, mas atingindo o rim por via sistêmica, ativando receptores na superfície basolateral. A urodilatina tem variação circadiana concomitantemente à excreção de sódio, donde se infere sua importância na regulação fisiológica na excreção deste íon. Outro papel importante da urodilatina é o fato de que ela é o principal modulador da natriurese que ocorre após infusão salina. Estas funções permanecem ativas mesmo na denervação do coração e podem ocorrer independentemente da secreção de ANP. Os efeitos biológicos da urodilatina, assim como os do ANP, são mediados por receptores GC-A, mas a urodilatina é um natriurético mais potente que o ANP, mesmo quando os dois peptídeos agem sob uma mesma pressão de perfusão.
BNP
URODILATINA
Fig. 7.6 Estrutura dos peptídeos natriuréticos. Os aminoácidos conservados estão em azul-escuro e os variantes estão em amarelo. Observar que a urodilatina é idêntica ao ANP exceto pela adição de quatro aminoácidos à extremidade aminoterminal (parte superior dos desenhos).
85
capítulo 7
Embora a urodilatina não esteja aumentada na insuficiência cardíaca congestiva, ela pode ser benéfica nesta patologia, uma vez que sua infusão em pacientes com esta síndrome leva à natriurese e diurese, efeitos estes que não são vistos na infusão de ANP. O mesmo pode ocorrer na insuficiência renal aguda.70,71
Pontos-chave: Efeitos do BNP • Natriurese e diurese • Vasodilatação e hipotensão • Diminuição da secreção de vasoconstritores Efeitos do CNP • Vasodilatação e hipotensão • Antimitogênese Efeitos da urodilatina • Natriurese e diurese
ENDOTELINA A endotelina (ET) é uma substância produzida pelo endotélio vascular que apresenta um potente efeito vasoconstritor.72 A família das endotelinas é composta por três peptídeos de 21 AA: endotelina-1 (ET-1), endotelina-2 (ET2) e endotelina-3 (ET-3). A expressão das três endotelinas é diferente nos diversos tecidos. A ET-1 é a única endotelina expressa pelas células do endotélio vascular e foi também detectada em cérebro, rim e pulmão. ET-1 é a forma clássica de endotelina e é a única forma do peptídeo identificada na circulação humana. ET2 e ET3 são produzidos no cérebro, rim, supra-renal e intestino. Todas as isoformas de endotelina são potentes vasoconstritores.
Biossíntese e Estrutura Três genes para endotelina humana foram identificados, cada um deles codificando um produto diferente.73 A ET1 humana é derivada de PRÉ-PRÓ-endotelina, um precursor de 210 resíduos.74 A PRÉ-PRÓ-endotelina-1 é convertida em pré-endotelina intermediária, também chamada de “ET-1 grande”. A “ET-1 grande” é convertida em ET-1 ativa através da enzima conversora de endotelina. A secreção de ET-1 por células endoteliais é controlada em nível transcripcional, e estas células não armazenam ET-1 para liberação. A expressão de mRNA da PRÉ-PRÓendotelina aumenta induzida por trombina, epinefrina, estresse na parede do vaso, TGF-b, IL-1 e AII.75,76 No rim, a endotelina é produzida pelas células endoteliais renais, glomérulo e também pelas células tubulares renais.75
Receptores para Endotelina e Mecanismo de Ação Celular Receptores específicos para endotelina foram identificados em diversos tecidos.77 Existem dois subtipos de receptores para endotelina, receptor tipo A (ET-RA) e receptor tipo B (ET-RB), que apresentam afinidades diferentes para as várias isoformas de endotelina. ET-1 age principalmente no ET-RA. A afinidade para ET-RA das diferentes endotelinas é: ET-1⬎ET-2⬎ET-3. Já o ET-RB tem afinidade semelhante para as três isoformas. O ET-RA está expresso nas células da musculatura lisa dos vasos. O ET-RB está presente nas células endoteliais e parece ser o responsável pela liberação de prostaciclina e óxido nítrico. A este respeito é curioso notar que na infusão de endotelina inicialmente ocorre uma vasodilatação fugaz seguida de vasoconstrição sustentada. A ligação da ET com seu receptor leva à ativação da via do fosfatidil inositol,77 com estimulação da fosfolipase C, que aumenta o cálcio intracelular pelo aumento do influxo de cálcio através dos canais de cálcio. A ET leva à liberação de ácido araquidônico por ativação da fosfolipase A2. Além disso, a ET age despolarizando o potencial de membrana e aumentando a bomba de Na⫹/H⫹, e assim alcaliniza o interior da célula e inibe a Na+/K+-ATPase. No rim, receptores para endotelina foram identificados principalmente na vasculatura renal, incluindo as alças capilares glomerulares, capilares peritubulares, vasa recta, e no endotélio das artérias e veias arqueadas, assim como nas arteríolas renais. Em menor intensidade nas células mesangiais, nos túbulos proximais e nos ductos coletores.76,77
Ações da Endotelina no Rim A ET é um vasoconstritor renal potente, 30 vezes mais potente que a AII.76 A injeção de endotelina endovenosa leva a uma resposta pressora bifásica caracterizada inicialmente por uma resposta vasodilatadora periférica e diminuição da pressão sanguínea de curta duração, provavelmente devido à liberação de óxido nítrico e prostaciclina e diminuição de liberação de norepinefrina. Em seguida, ocorre uma resposta de vasoconstrição que leva ao aumento da pressão arterial sistêmica. No rim, ET-1 produz vasoconstrição renal também precedida de uma resposta vasodilatadora de curta duração. Em resposta ao ET-1, ocorre vasoconstrição tanto nas arteríolas aferentes como nas eferentes. Infusões de ET diretamente na artéria renal causam primariamente constrição da arteríola aferente, enquanto a administração endovenosa de doses maiores causa um maior efeito no vaso eferente.76 A infusão endovenosa de ET-1 em humanos resulta em diminuição do fluxo sanguíneo renal (dose-dependente) com diminuição da taxa de filtração glomerular. A ET causa uma diminuição do Kf, o qual pode ser explicado, pelo
86
Peptídeos Vasoativos e o Rim
cDNA
EXON 1
EXON 2
ção in situ, foi possível detectar aumento do mRNA para ET-1 no glomérulo e nos ductos coletores 12 horas após isquemia com normalização 48 horas após. Concomitantemente, o mRNApara ET-RB está aumentado nestas regiões. O uso de antagonista de receptor de endotelina, assim como o uso de anticorpos antiendotelina, tem efeito protetor.78
EXON 3
151 AA
Pré-Pró-ANP
Met
126 AA
Pró-ANP
HIPERTENSÃO ARTERIAL 28 AA
ANP
COOH
Fig. 7.7 Biossíntese do ANP.
menos em parte, pela contração da célula mesangial induzida pela ET-1. Em doses que não diminuem a taxa de filtração glomerular, o ET é natriurético.74 Este efeito é abolido se a pressão de perfusão renal for mantida constante, o que sugere que a natriurese é pelo menos em parte relacionada à pressão. Entretanto, também há evidências de um efeito tubular direto.74 É discutível se a liberação de ANP induzida por ET participe da resposta natriurética. A ET tem outros efeitos que podem ser importantes na homeostase do fluido e de eletrólitos. ET-1 estimula a liberação adrenal de catecolaminas e aldosterona. Apesar de inibir a liberação de renina das células justaglomerulares in vitro, a ET, quando administrada por via sistêmica, aumenta a atividade da renina plasmática.74,78 Os níveis plasmáticos de ANP aumentam com a infusão de ET-1. A ET pode ter um papel na inflamação glomerular através do efeito mitogênico. A ET tem ação mitogênica nas células da musculatura lisa dos vasos, células mesangiais e fibroblastos. As células mesangiais humanas em cultura expressam mRNA para ET-1 e a expressão do gene de ET1 é aumentada com a incubação com certos mediadores inflamatórios.79
Pontos-chave: Efeitos da endotelina • Vasoconstrição sistêmica • Aumento da pressão arterial • Mitogênese
Endotelina em Situações Fisiopatológicas INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA A ET regula a hemodinâmica sistêmica e renal e tem papel na reperfusão após a injúria induzida por isquemia renal. Cinco minutos após a isquemia, os níveis de ET-1 estão significativamente elevados. Utilizando-se hibridiza-
O papel da ET na hipertensão arterial tem sido amplamente discutido, uma vez que esta substância causa potente vasoconstrição. Em ratos hipertensos, a administração de fosfaramidone, que bloqueia a ação de enzima conversora da endotelina, reduz a pressão arterial. Os níveis circulantes de endotelina não estão aumentados em diversas formas de hipertensão arterial. No entanto, pacientes hipertensos com insuficiência renal crônica apresentam níveis de ET maiores que os de indivíduos normotensos.
CICLOSPORINA A A ciclosporina leva a alterações da hemodinâmica renal caracterizadas por vasoconstrição com aumento da resistência vascular renal e diminuição da taxa de filtração glomerular. Foi demonstrado que a ciclosporina aumenta a liberação de ET de células endoteliais em cultura. Além disso, pacientes em uso de ciclosporina apresentam aumento dos níveis sanguíneos de ET. Anticorpos antiendotelina e antagonistas do receptor de endotelina abolem a vasoconstrição induzida por ciclosporina. Assim, a endotelina pode ser a responsável pela diminuição do fluxo sanguíneo renal durante a administração de ciclosporina e possivelmente por sua nefrotoxicidade.
DOENÇAS GLOMERULARES É sabido que a ET é um potente mitógeno e que pode mediar os efeitos proliferativos de várias citocinas e que, portanto, pode participar da patogênese de doenças inflamatórias. A produção renal de ET está aumentada na glomerulonefrite humana e experimental e há maior expressão do receptor ETB na glomerulonefrite (GN) em ratos. Além disso, a ET está aumentada no plasma de pacientes com doenças glomerulares. O uso de antagonista de receptor de ET diminui a proliferação mesangial na glomerulonefrite experimental e diminuiu a lesão renal no lúpus murino.
FIBROSE RENAL E INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA A ET-1 induz acúmulo de matriz e conseqüentemente leva à fibrose. A ET age na produção de componentes da matriz (fibronectina e colágeno), na inibição de sua degradação (metaloproteases) e na liberação de citocinas fibrogênicas (TGF-). O uso de um antagonista de receptor de
capítulo 7
ET diminui o acúmulo de matriz em modelos experimentais de glomerulonefrite. Interessantemente, o uso destes bloqueadores de ET promove diminuição da proteinúria, hipertensão e elevação da creatinina no modelo de ablação renal.
6.
7.
Pontos-chave: Patologias potencialmente tratáveis pela inibição da endotelina • Insuficiência renal aguda • Hipertensão arterial • Toxicidade por ciclosporina • Glomerulonefrites • Insuficiência renal crônica
8.
9.
10.
11.
ADRENOMEDULINA A adrenomedulina é um peptídeo vasodilatador de 52 aminoácidos, inicialmente isolado de amostras de feocromocitoma, mas que está presente na medula adrenal normal. Ela também é encontrada em outros tecidos como cérebro, coração e pulmões. No rim, o peptídeo é expresso no glomérulo e túbulos coletores, corticais e medulares. A adrenomedulina é derivada de um PRÉ-PRÓ-hormônio de 185 aminoácidos, codificado por um gene no cromossoma 11. Inicialmente esta molécula precursora é convertida em PRÓhormônio de 164 aminoácidos e então na molécula ativa.80 Seus efeitos renais incluem natriurese e diurese e são devidos a aumento da taxa de filtração glomerular e diminuição da reabsorção de sódio. A concentração plasmática da adrenomedulina está aumentada na hipertensão arterial, insuficiência renal crônica e insuficiência cardíaca congestiva, possivelmente como mecanismo compensador à vasoconstrição e à retenção de sal e água que ocorre nestas doenças.
12. 13. 14. 15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 22. 1.
2.
3.
4.
5.
HSUEH, W.A.; ANTONIPILLAI, I. Renin-angiotensin system. In: Textbook of Nephrology, 3.ª edição, editado por Massry, S.G. e Glassock, R.J. Baltimore, Williams & Wilkins, pp. 197, 1995. BALLERMANN, B.J.; ZEIDEL, M.L.; GUNNING, M.E.; BRENNER, B.M. Vasoactive peptides and the kidney. In: The Kidney, 5.ª edição, volume 1, editado por Brenner, B.M. Philadelphia, WB Saunders Co, pp. 510, 1986. RABKIN, R.; DAHL, D.C. Hormones and the kidney. In: Diseases of the Kidney. 5.ª edição, editado por Schrier, R.W. e Gottschalk, C.W. Little, Brown and Company, pp. 283, 1993. SANTOS, R.A.S.; PASSAGLIO, K.T.; PESQUERO, J.B.; BADER, M.; SIMÕES E SILVA, A.C. Interactions between angiotensin-(1-7), kinins, and angiotensin II in kidneys and blood vessels. Hypertension, 38[part II]:660-664, 2001. PAUL, M.; WAGNER, J.; DZAU, V.J. Gene expression of the renin-
23. 24. 25.
26.
27.
87 angiotensin system in human tissues. Quantitative analysis by the polymerase chain reaction. J. Clin. Invest., 91:2058-2064, 1993. LARAGH, J.H.; SEALEY, J.E. The renin-angiotensin-aldosterone system for normal regulation of blood pressure and sodium and potassium homeostasis. In: Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd edition, edited by J.H. Laragh and B.M. Brenner. Raven Press, New York, pp. 1763, 1995. CELIO, M.R. Angiotensin II immuno-reactivity coexisting with renin in the human juxtaglomerular epithelioid cells. Kidney Int., 22(suppl. 12):S30-32, 1982. CANTIN, M.; GUTKOWSKA, J.; LACASSE, J. Ultrastructural immunocytochemical localization of renin and angiotensin II in the juxtaglomerular cells of the ischaemic kidney in experimental renal hypertension. Am. J. Pathol., 115:212, 1984. TAUGNER, R.; KIM, S.J.; MURAKAMI, K.; WALDHERR, R. The fate of prorenin during granulopoiesis in epithelioid cells. Histochemistry, 86:249, 1987. HACKENTHAL, E.; PAUL, M.; GANTEN, D.; TAUGNER, R. Morphology, physiology, and molecular biology of renin secretion. Physiol. Rev., 70:1067, 1990. BRIGGS, J.P.; SCHNERMANN, J. Control of renin release and glomerular vascular tone by the juxtaglomerular apparatus. In: Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd edition, edited by J.H. Laragh and B.M. Brenner. Raven Press, New York, pp. 1359, 1995. DiBONA, G.F. Neural control of renal function: Cardiovascular implications. Hypertension, 13:539, 1989. TIDGREN, B.; HJEMDAHL, P. Renal responses to mental stress and epinephrine in humans. Am. J. Physiol., 257:F682, 1989. BEIERWALTES, W.H. Possible endothelial modulation of prostaglandin-stimulated renin release. Am. J. Physiol., 258:F1363, 1990. BACHMANN, S.; OBERBÄUMER, I. Structural and molecular dissection of the juxtaglomerular apparatus: new aspects for the role of nitric oxide. Kidney Int., 54(Suppl. 67):S29-S33, 1998. LORENZ, J.N.; WEINPRECHT, H.; SCHNERMANN, J.; SK∅TT, O., BRIGGS, J.P. Characterization of the macula densa for renin secretion. Am. J. Physiol., 259:F186-F193, 1990. CHAI, S.Y.; JOHNSTON, C.I. Tissue distribution of angiotensin-converting enzyme. In: Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd edition, edited by J.H. Laragh and B.M. Brenner. Raven Press, New York, pp. 1683, 1995. METZGER, R.; BOHLE, R.M.; KATHARINA, P. Angiotensin-converting enzyme in non-neoplastic kidney diseases. Kidney Int., 56:1442-1454, 1999. BRAAM, B.; MITCHELL, K.D.; FOX, J.; NAVAR, L.G. Proximal tubular secretion of angiotensin II in rats. Am. J. Physiol., 264:F891-F898, 1993. FORSYTH, R.P.; HOFFBRAND, B.I.; MELMON, K.L. Hemodynamic effects of angiotensin in normal and environmentally stressed monkeys. Circulation, 44:119, 1971. ROSIVALL, L.; NAVAR, G. Effects on renal hemodynamics of intra-arterial infusions of angiotensins I and II. Am. J. Physiol., 245:F181, 1983. ICHIKAWA, I.; HARRIS, R.C. Angiotensin actions in the kidney: Renewed insight into the old hormone. Kidney. Int., 40:583, 1991. MEZZANO, S.A.; RUIZ-ORTEGA, M.; EGIDO, J. Angiotensin II and renal fibrosis. Hypertension, 38[part 2]:635-638, 2001. MORGAN, H.E.; BAKER, K.M. Cardiac hypertrophy: Mechanical, neural, and endocrine dependence. Circulation, 83:13, 1991. GUNTHER, S.; ALEXANDER, R.W.; ATKINSON, W.J.; GIMBRONE, M.A. Jr. Functional angiotensin II receptors in cultured vascular smooth muscle cells. J. Cell. Biol., 92:289, 1982. MIYATA, N.; PARK, F.; LI, X.F.; COWLEY, A.W. Distribution of AT1 and AT 2 receptors subtypes in the rat kidney. Am. J. Physiol., 277:F437-F446, 1999. HARRISON-BERNARD, L.M.; GABRIEL NAVAR, L.; HO, M.M.; VINSON, G.P.; EL-DAHR, S.S. Immunohistochemical localization of ANG II AT1 receptor in adult rat using a monoclonal antibody. Am. J. Physiol., 273:F170-F177, 1997.
88 28. 29.
30.
31. 32.
33.
34.
35. 36.
37.
38.
39.
40. 41.
42.
43. 44.
45. 46. 47. 48.
49.
50.
51. 52. 53.
Peptídeos Vasoativos e o Rim
SIRAGY, H.M. AT1 and AT2 receptors in the kidney: role in disease and treatment. Am. J. Kidney Dis., 36 (Suppl. 1):S4-S9, 2000. TSUTSUMI, Y.; MATSUBARA, H.; MUSAKI, H. Angiotensin II type 2 receptor expression activates the vascular kinin system and causes vasodilation. J. Clin. Invest., 104:925-935, 1999. RUIZ-ORTEGA, M.; LORENZO, O.; EGIDO, J. Angiotensin III upregulates genes involved in kidney damage in mesangial cells and renal interstitial fibroblasts. Kidney Int., 54 (Suppl. 68):S41-S45, 1998. MOELLER, I.; ALLEN, A.M.; CHAI, S-Y.; MENDELSON, F.A.O. Bioactive angiotensin peptides. J. Human Hypertens., 12:289-293, 1998. ROCHA E SILVA, M.; BERALDO, W.T.; ROSENFELD, G. Bradykinin, a hypotensive and smooth muscle stimulating factor released from plasma globin by snake venoms and by trypsin. Am. J. Physiol., 156:261-273, 1949. MARGOLIUS, H.S. Kallikrein-kinin system. In: Textbook of Nephrology, 3.ª edição, editado por Massry, S.G. e Glassock, R.J. Baltimore, Williams & Wilkins, pp. 203, 1995. BHOOLA, K.D.; FIGUEROA, C.D.; WORTHY, K. Bioregulation of kinins: kallikreins, kininogens, and kininase. Pharmacol. Rev., 44:180, 1992. SCICLI, A.G.; CARRETERO, O.A. Renal kallikrein-kinin system. Kidney Int., 29:120, 1986. URA, N.; CARRETERO, O.A.; ERDOS, E.G. Role of renal endopeptidase 24.11 in kinin metabolism in vitro and in vivo. Kidney Int., 32:507, 1987. NASJLETTI, A.; COLESSA-CHORERIO, J.; McGIFF, J.C. Disappearance of bradykinin in the renal circulation of dogs: Effects of kininase inhibition. Cir. Res., 37:59, 1975. CAMPBELL, D.J. Towards understanding the kallikrein-kinin system: insights from measurements of kinin peptides. Braz. J. Med. Biol. Res., 33:665-677, 2000. FIGUEROA, C.D.; MACLVER, A.G.; MACKENZIE, J.C.; BHOOLA, K.D. Localization of immunoreactive kininogen and tissue kallikrein in the human nephron. Histochemistry, 89:437, 1988. XIONG, W.; CHAO, L.; CHAO, J. Renal kallikrein mRNA localization by in situ hybridization. Kidney Int., 35:1324, 1989. CARRETERO, O.A.; SCICLI, A.G. The kallikrein-kinin system as a regulator of cardiovascular and renal function. In: Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd edition, edited by J.H. Laragh and B.M. Brenner. Raven Press, New York, pp. 983, 1995. BASCANDS, J.L.; PECHER, C.; ROUAUD, S.; EDMOND, C.; TACK, J.L.; BASTIE, M.J.; BURCH, R.; REGOLI, D.; GIROLAMI, J.P. Evidence for existence of two distinct bradykinin receptors on rat mesangial cells. Am. J. Physiol., 264:F548, 1993. WEBSTER, M.E.; GILMORE, J.P. Influence of kallidin-10 on renal function. Am. J. Physiol., 206:714, 1964. GILL, J.R.; MELMON, K.L.; GILLESPIE, L.; BARTTER, F.C. Bradykinin and renal function in normal man: Effects of adrenergic blockade. Am. J. Physiol., 209:844, 1965. GRANGER, J.P.; HALL, J.E. Acute and chronic actions of bradykinin on renal function and arterial pressure. Am. J. Physiol., 248:F87, 1985. EDWARDS, R.M. Response of isolated renal arterioles to acetylcoline, dopamine and bradykinin. Am. J. Physiol., 248:F183, 1985. KAUKER, M.L. Bradykinin action on the efflux of luminal 22Na in the rat nephron. J. Pharmacol. Exp. Ther., 214:119, 1980. BEIERWALTES, W.H.; SCHRYVER, S.; SANDERS, E. Renin release selectively stimulated by prostaglandin PGI2 in isolated rat glomeruli. Am. J. Physiol., 243:F276, 1982. DeBOLD, A.J.; BORENSTEIN, H.B.; VERESS, A.T.; SONENBERG, A. A rapid and potent natriuretic response to intravenous injection of atrial myocardial extract in rats. Life Sci., 28:89, 1981. BRENNER, B.M.; BALLERMANN, B.J.; GUNNING, M.E.; ZEIDEL, M.L. Diverse biological actions of atrial natriuretic peptide. Physiol. Rev., 70:665, 1990. COGAN, M.G. Atrial natriuretic peptide. Kidney Int., 37:1148, 1990. TANG, J.; FEI, H.; XIE, C.W. Characterization and localization of atriopeptin in rat atrium. Peptides, 5:1173, 1984. INAGAMI, T. Atrial natriuretic factor. J. Biol. Chem., 264:3043, 1989.
54.
55.
56.
57.
58.
59.
60.
61.
62.
63.
64. 65.
66.
67.
68.
69.
70.
71.
72.
73. 74.
75.
SUZUKI, T.; YAMAZAKI, T.; YAKAZI, Y. The role of the natriuretic peptides in the cardiovascular system. Cardiovasc. Res., 51:489-494, 2001. LUFT, F.C.; LANG, R.E.; ARONOFF, G.R. Atriopeptin III kinetics and pharmacodynamics in normal and anephric rats. J. Pharmacol. Exp. Ther., 236:416, 1986. YANDLE, T.G.; RICHARDS, A.M.; NICHOLLS, M.G. Metabolic clearance rate and plasma half life of alpha human atrial natriuretic peptide in man. Life Science, 38:1827, 1986. YUKIMURA, T.; ITO, K.; TAKENAGA, T. Renal effects of synthetic human atrial natriuretic polypeptide in anesthetized dogs. Eur. J. Pharmacol., 103:363, 1984. FRIED, T.A.; McCOY, R.N.; OSGOOD, R.W.; STEIN, J.H. Effect of atriopeptin II on determinants of glomerular filtration rate in the in vitro perfused dog glomerulus. Am. J. Physiol., 250:F 1119, 1986. LIGHT, D.B.; SCHWIEBERT, E.M.; KARLSON, K.H.; STANTON, B.A. Atrial natriuretic peptide inhibits a caption channel in renal inner medullary collecting duct cells. Science, 243:383, 1989. OELKERS, W.; KLEINER, S.; BAHR, V. Effects of incremental infusions of atrial natriuretic factor on aldosterone, renin, and blood pressure in humans. Hypertension, 12:462, 1988. MAACK, T.; MARION, D.N.; CAMARGO, M.J. Effects of auriculin on blood pressure, renal function, and the renin-aldosterone system in dogs. Am. J. Medicine, 77:1069, 1984. OPGENORTH, T.J.; BURNETT, J.C. Jr.; GRANGER, J.P.; SCRIVEN, T.A. Effects of atrial natriuretic peptide on renin secretion in nonfiltering kidney. Am. J. Physiol., 250:F798, 1986. KURTZ, A.; DELLA BRUNA, R.D.; PFEILSCHIFTER, J. Atrial natriuretic peptide inhibits renin release from juxtaglomerular cells by a cGMP-mediated process. Proc. Natl. Acad. Sci. USA, 83:4769, 1986. KUDO, T.; BAIRD, A. Inhibition of aldosterone production in the adrenal glomerulosa by atrial natriuretic factor. Nature, 312:756, 1984. LEWICKI, J.A.; PROTTER, A.A. Physiological studies of the natriuretic peptide family. In: Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd edition, edited by J.H. Laragh and B.M. Brenner. Raven Press, New York, pp. 1029-1053, 1995. JANSSEN, W.M.T.; deJONG, P.E.; VAN DER HEM, G.K.; de ZEEUW, D. Effect of human atrial natriuretic peptide on blood pressure after sodium depletion in essential hypertension. Br. Med. J., 293:351, 1986. RICHARDS, A.M.; NICHOLLS, M.G.; ESPINER, E.A. Effects of alpha-human atrial natriuretic peptide in essential hypertension. Hypertension, 7:812, 1985. HILDEBRANDT, D.A.; BANKS, R.O. Effects of atrial natriuretic factor on renal function in rats with nephrotic syndrome. Am. J. Physiol., 254:F210,1988. ZIETSE, R.; SCHALEKAMP, M.A. Effect of synthetic human atrial natriuretic peptide (102-126) in nephrotic syndrome. Kidney Int., 34:717, 1988. FORSSMANN, W.G.; MEYER, M.; FORSSMANN, K. The renal urodilatin system: clinical implications. Cardiovasc. Res., 51:450-462, 2001. GUNNING, M.; BRENNER, B.M. Urodilatin. In: Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd edition, edited by J.H. Laragh and B.M. Brenner. Raven Press, New York, pp. 1021-1027, 1995. YANAGISAWA, M.; KURIHARA, H.; KIMURA, S. A novel potent vasoconstrictor peptide produced by vascular endothelial cells. Nature, 332:411, 1988. RUBANYI, G.M.; BOTELHO, L.H.P. Endothelins. FASEB J., 5:2713, 1991. MARSDEN, P.A.; GOLIGORSKY, M.S.; BRENNER, B.M. Endothelial cell biology in relation to current concepts of vessel wall structure and function. J. Am. Soc. Nephrol., 1:931, 1991. LUSCHER, T.F.; BOCK, H.A.; YANG, Z.; DIEDERICH, D. Endothelin-derived relaxing and contracting factors: Perspectives in nephrology. Kidney Int., 39:575, 1991.
capítulo 7
76.
KING, A.J.; BRENNER, B.M. Endothelium-derived vasoactive factors and the renal vasculature. Am. J. Physiol., 260:R653, 1991. 77. SIMONSON, M.S.; DUNN, M.J. Cellular signaling by peptides of the endothelin gene family. FASEB J., 4:2989, 1990. 78. NAICKER, S.; BHOOLA, K.D. Endothelins: vasoactive modulators of renal function in health and disease. Pharmacology & Therapeutics, 90:61-88, 2001. 79. SIMONSON, M.S.; DUNN, M.J. Endothelin peptides: A possible role in glomerular inflammation. Lab. Invest., 64:1, 1991. 80. JOUGASAKI, M.; BURNETT, J.C. Adrenomedullin: potential in physiology and pathophysiology. Life Sci., 66:855-872, 2000.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Brazilian Journal of Medical and Biological Research http://www.scielo.br/scielo.php?script⫽sci-serial&pid⫽0100879X&lng⫽en&nrm⫽iso
89
American Heart Association http://www.americanheart.com American Heart Association (journals) http://www.ahajournals.org American Society of Physiology http://www.the-aps.com American Society of Physiology (journals) http://intl-ajpcon.physiology.org Nomenclatura de peptídeos (IUPAC) http://www.chem.qmw.ac.uk Grupos de discussão sobre peptídeos http://www.bio.net/hypermail/PEPTIDES Federation of American Societies for Experimental Biology (FASEB) http://www.faseb.org
Capítulo
8
Compartimentos Líquidos do Organismo Miguel Carlos Riella, Maria Aparecida Pachaly e Leonardo Vidal Riella
UNIDADES DE MEDIDA DE ÁGUA E DE ELETRÓLITOS
Plasma
Peso atômico
Volume intersticial-linfático
Peso molecular
Volume dos líquidos transcelulares
Equivalente eletroquímico Pressão osmótica, osmol e miliosmol Concentração molar ou molaridade (M) Concentração molal ou molalidade (m)
Determinação do volume intracelular (VIC) COMPOSIÇÃO ELETROLÍTICA DOS COMPARTIMENTOS LÍQUIDOS DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA ENTRE COMPARTIMENTOS
DIFUSÃO E OSMOSE
Adição de água ou solução hipotônica
OSMOLALIDADE E TONICIDADE
Adição de solução hipertônica de NaCl
Soluções isotônicas, hipertônicas e hipotônicas Soluções isosmóticas, hiperosmóticas e hiposmóticas ÁGUA TOTAL DO ORGANISMO Determinação da água corporal total COMPARTIMENTOS LÍQUIDOS Determinação do volume extracelular (VEC)
Adição de solução isotônica de NaCl TROCAS LÍQUIDAS ENTRE PLASMA E INTERSTÍCIO EXERCÍCIOS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS
Determinação do volume dos subcompartimentos extracelulares
A água é o principal constituinte do corpo humano e de todos os organismos vivos. O próprio organismo é uma solução aquosa na qual estão dissolvidos vários íons e moléculas. Em circunstâncias normais, mesmo havendo variações na dieta, o conteúdo de água e eletrólitos é mantido estável au6évés de modificações na excreção urinária.1 A distribuição desta solução aquosa e de seus vários constituintes no organismo é objeto de discussão nas páginas seguintes.
UNIDADES DE MEDIDA DE ÁGUA E DE ELETRÓLITOS O corpo humano é formado por uma solução aquosa que representa 45 a 60% do peso corporal.2 Nesta solução, o solvente é a água e o soluto está representado por substâncias orgânicas e inorgânicas. Para melhor compreensão das unidades que expressam a concentração dos solutos, os seguintes conceitos são importantes:
91
capítulo 8
2). Por exemplo, no cloreto de cálcio 1 mol de Ca combina-se com 2 moles de Cl e é igual a 2 equivalentes.1
Peso Atômico Peso atômico é o peso total de um átomo ou a média das massas dos isótopos naturais de um elemento químico. O peso de 1 átomo de oxigênio é 16 e serve como referência para o peso atômico de todas as substâncias. Assim, o peso atômico do potássio é 39, em relação ao peso atômico do oxigênio.1
Por sua pequena concentração no organismo, os eletrólitos são comumente expressos em miliequivalentes (mEq). Um miliequivalente é igual a 103 equivalentes.
Peso Molecular
Pressão Osmótica, Osmol e Miliosmol
É a soma dos pesos atômicos de todos os elementos encontrados na fórmula de uma substância. O peso molecular expresso em gramas é igual a mol (M) e, em miligramas, é igual a milimol (mM).1 Exemplo:
Outra maneira de expressar o número de partículas de soluto presentes é através da pressão osmótica, que determina a distribuição de água entre os compartimentos. A pressão osmótica é proporcional ao número de partículas por unidade do solvente e não se relaciona à valência ou peso das partículas.1 As unidades utilizadas são o osmol (Osm) e o miliosmol (mOsm). Um osmol é o número de íons por mol ou a quantidade de substância que se dissocia em solução para formar um mol de partículas osmoticamente ativas. Por exemplo, 1 mol de NaCl tem 2 osmóis de soluto, pois se dissocia em Na e Cl. Um mol de glicose contém apenas 1 osmol de soluto, pois a glicose não é ionizável. A pressão osmótica determina a distribuição de água entre os espaço intra- e extracelular, como será discutido ao se abordar tonicidade (v. a seguir).
SUBSTÂNCIA
Cloreto de Potássio
FÓRMULA
PESO MOLECULAR
MOL (M)
MILIMOL (mM)
KCl
39 35,5 74,5
74,5 g
74,5 mg
Equivalente Eletroquímico Partículas com carga positiva são chamadas cátions (por exemplo, Na e K) e partículas com carga negativa são chamadas ânions (Cl e HCO3). Quando cátions e ânions se combinam, eles o fazem de acordo com sua carga iônica (valência) e não de acordo com seu peso.1 Equivalência eletroquímica se refere ao poder de combinação de um íon. Um equivalente é definido como o peso em gramas de um elemento que se combina com ou substitui 1 g de íon hidrogênio (H). Também se obtém o equivalente de uma determinada substância dividindo-se o peso molecular por sua valência.1 Para íons monovalentes, 1 mol é igual a 1 equivalente. Para íons divalentes, 1 mol é igual a 2 equivalentes. 1 Eq
peso molecular valência iônica
Como 1 g de H é igual a 1 mol de H (contendo aproximadamente 6,02 1023 partículas), um mol de qualquer ânion monovalente (carga –1) se combinará como H e será igual a um equivalente (eq). 1 mol H (1 g) 1 mol Cl (35,5 g) 씮 1 mol HCl (36,5 g) Da mesma forma, 1 mol de um cátion monovalente (carga 1) também é igual a 1 equivalente, pois pode substituir o H e combinar-se com 1 equivalente de algum ânion. 1 mol Na(23 g) 1 mol Cl (35,5 g) 씮 1 mol NaCl (58,5 g) Já o cálcio ionizado (Ca) é um cátion divalente (carga
1 mol Ca (40 g) 2 mol Cl (71g) 씮 1 mol CaCl2 (111 g)
Concentração Molar ou Molaridade (M) É o número de moles do soluto por litro de solução, a uma dada temperatura.
Concentração Molal ou Molalidade (m) É o número de moles do soluto por 1.000 gramas do solvente.
DIFUSÃO E OSMOSE A difusão é dividida em dois subtipos: a difusão simples e a difusão facilitada. Na difusão simples, a passagem de íons ou moléculas através de uma membrana ocorre devido ao movimento cinético aleatório destas partículas, sem a necessidade de ligação com proteínas de transporte. A taxa de difusão simples depende da quantidade de substância disponível, velocidade de movimento cinético e número de aberturas na membrana celular através das quais as moléculas ou íons podem se mover. Na difusão facilitada, há necessidade de interação com uma proteína transportadora, a qual se liga quimicamente às moléculas e facilita sua passagem através da membrana.5 A osmose ocorre quando duas soluções de concentrações diferentes encontram-se separadas por uma membra-
92
Compartimentos Líquidos do Organismo
na semipermeável. Há então um movimento de água da solução menos concentrada para a mais concentrada, a qual sofre uma diluição progressiva, até que as duas soluções atinjam um equilíbrio. A
OSMOLALIDADE E TONICIDADE É importante diferenciar os conceitos de osmolalidade e tonicidade. A osmolalidade é determinada pela concentração total de solutos numa determinada solução ou compartimento. Tonicidade é a capacidade que os solutos têm de gerar uma força osmótica que provoca o movimento de água de um compartimento para outro.3,4 Para que ocorra aumento da tonicidade no espaço extracelular, por exemplo, é necessário que solutos permaneçam confinados neste espaço sem atravessar livremente as membranas celulares e sem migrar para os demais compartimentos. Isto provocará o movimento de água do compartimento intracelular para o extracelular (osmose) para estabelecer um equilíbrio osmótico, gerando também diminuição do volume das células. Alguns dos solutos capazes de produzir este movimento de água (osmóis efetivos) são: sódio, glicose, manitol e sorbitol. O sódio permanece no espaço extracelular sem movimentar-se para outros compartimentos devido à ação da bomba sódio-potássio ATPase, que continuamente bombeia o sódio para fora das células. A glicose é um osmol efetivo, mas é normalmente metabolizada no interior das células, e desta forma não contribui significativamente para a tonicidade sob circunstâncias normais. No diabetes mellitus descontrolado, a concentração elevada de glicose no plasma pode levar a um aumento significativo da osmolalidade e da tonicidade, causando movimento de água para dentro do espaço extracelular. A uréia contribui para a osmolalidade, mas atravessa livremente as membranas e não influi no movimento de água entre compartimentos.3,4
Soluções Isotônicas, Hipertônicas e Hipotônicas As soluções isotônicas apresentam a mesma tonicidade que o plasma, e conseqüentemente não induzem movimento de água através das membranas celulares e não provocam variação do volume celular. Exemplo de solução isotônica: solução salina a 0,9%; solução glicosada a 5%. Soluções hipertônicas geram o movimento de água em direção ao espaço extracelular, provocando diminuição do volume celular. Exemplo: solução salina em concentração superior a 0,9%. As soluções hipotônicas provocam o movimento de água em direção ao compartimento intracelular, provocando edema celular.5 Exemplo: solução salina em concentra-
B
C
Fig. 8.1 Efeito do contato de diferentes soluções com hemácias: solução isotônica (A); solução hipertônica (B); e solução hipotônica (C).
ção inferior a 0,9%. A Fig. 8.1 exemplifica os efeitos descritos.
Soluções Isosmóticas, Hiperosmóticas e Hiposmóticas A osmolalidade de uma solução é determinada pela quantidade total de partículas dissolvidas, incluindo os solutos que atravessam as membranas celulares. Os termos isosmótico, hiperosmótico e hiposmótico se referem a uma comparação com o fluido extracelular normal. Por exemplo, a solução salina a 0,9% é ao mesmo tempo isotônica (não provoca movimento de água) e isosmótica (apresenta o mesmo número de partículas de soluto) em relação ao espaço extracelular.
Pontos-chave: • A osmolalidade depende do número total de solutos numa solução ou compartimento • Tonicidade é a capacidade que os solutos têm de provocar movimento de água de um compartimento para outro. Esta propriedade define o que são soluções isotônicas, hipotônicas e hipertônicas
ÁGUA TOTAL DO ORGANISMO A água total do organismo varia entre 45 e 60% do peso corporal, de acordo com a idade, o sexo e a composição corporal do indivíduo.3,7 Esta proporção variável é devido às diferentes quantidades de gordura presentes no organismo, pois em gordura neutra quase não existe água. Assim, indivíduos obesos, embora mais pesados, possuem menos água no organismo. Da mesma forma, por possuírem maior quantidade de gordura no organismo, as mulheres têm menor proporção de água corporal (50%). Já os idosos, por apresentarem menor massa muscular, têm um menor conteúdo de água.3 Nas crianças, a água corporal total equivale a cerca de 70%-80% do peso, pois apresentam menor conteúdo de tecido adiposo.
93
capítulo 8
Para efeitos práticos de cálculo, consideraremos a água total como sendo 60% do peso corporal, independentemente das variações anteriormente mencionadas.
Determinação da Água Corporal Total O método laboratorial que determina a água total do organismo baseia-se na técnica de diluição,5,8 fundamentada no seguinte princípio: quando se adiciona uma quantidade conhecida de soluto a um volume desconhecido de solvente, e dosa-se a concentração final da substância, é possível calcular o volume do solvente. Por exemplo, adicionando 1 kg (1.000 mg) de uma substância a um volume de solvente, e obtendo-se uma concentração final de 100 mg/litro, chega-se à conclusão de que o volume do solvente é igual a 10 litros. Acompanhe com a fórmula abaixo: Ci/Vf Cf e Vf Ci/Cf Onde: Ci: concentração (quantidade) inicial da substância adicionada; Cf: concentração final da substância adicionada; Vf: volume final da solução. 1.000 mg/Vf 100 mg/litro Vf 1.000/100 10 litros A determinação da quantidade de água do organismo in vivo só foi possível após o emprego de isótopos da água: estáveis (deutério) ou radioativos (trítio). Um destes compostos é injetado na circulação e aguarda-se um determinado período para que haja equilíbrio no plasma. Naturalmente, a quantidade da substância que é metabolizada e excretada durante este período de equilíbrio deve ser considerada. A antipirina foi também uma substância bastante utilizada na determinação da água total do organismo.
COMPARTIMENTOS LÍQUIDOS A água do organismo se distribui em compartimentos, em parte devido a diferentes composições iônicas (Fig. 8.2). No entanto, estes compartimentos não são estanques, havendo um constante intercâmbio hidroeletrolítico. Basicamente, identificam-se dois grandes compartimentos: intracelular e extracelular. O compartimento intracelular é composto pela água existente no citoplasma de todas as células. Já o compartimento extracelular, como o próprio termo indica, referese a toda a água externa às células e possui subcompartimentos: plasma, líquido intersticial e linfa, água dos ossos e líquidos transcelulares (Fig. 8.2). Os líquidos transcelulares representam coleções de líquidos que não são simples transudatos, mas são líquidos secretados e incluem: secreções das glândulas salivares, pâncreas, fígado e árvore biliar, além dos líquidos nas cavidades pleurais, oculares, peritoneal, no lúmen do trato gastrintestinal e líquido cefalorraquidiano.4 Terceiro espaço é um termo proposto por Randall, em 1952, para descrever a situação na qual o líquido extracelular é perdido ou seqüestrado numa área do corpo onde não participa das trocas, e conseqüentemente não satisfaz às necessidades hídricas do paciente. Exemplos: líquido no intestino na presença de íleo, líquido peritoneal na peritonite, líquido peripancreático na pancreatite aguda e o edema do queimado. Por exemplo, no paciente com obstrução intestinal ou íleo intenso, vários litros de fluidos ricos em eletrólitos podem estar confinados ao intestino, sem que o paciente possa utilizá-los, mesmo que esteja hipovolêmico.
Determinação do Volume Extracelular (VEC) O método utilizado também se baseia no princípio da técnica de diluição, preferindo-se uma substância que seja excluída das células e permaneça no espaço extracelular. Várias substâncias têm sido utilizadas: 36Cl, sulfato, tiossulfato e tiocianato, além de certos sacarídeos (manitol, inulina e sucrose).8 Nenhuma destas substâncias é considerada ideal. Elas variam na sua capacidade de penetração nas células e os resultados da determinação do VEC são, portanto, diversos, variando de 16 a 28%. Na prática, considera-se que o volume extracelular corresponde a 20% do peso corporal.5
Determinação do Volume dos Subcompartimentos Extracelulares PLASMA Fig. 8.2 Compartimentos líquidos do organismo (percentual do peso corporal).
O volume plasmático é determinado empregando-se substâncias que ficam confinadas ao leito vascular. A al-
94
Compartimentos Líquidos do Organismo
bumina ou eritrócitos podem ser utilizados. A albumina marcada com 131I é a mais empregada, e o volume de distribuição determinado está em torno de 4,5% do peso corporal. Entretanto, alguma 131I-albumina escapa do leito vascular para o interstício. Quando se empregam eritrócitos, eles são previamente marcados com crômio-51 (51Cr).
VOLUME INTERSTICIAL-LINFÁTICO É calculado indiretamente, subtraindo-se o volume plasmático do volume extracelular, e aproxima-se de 20% da água total ou 12% do peso corporal.
VOLUME DOS LÍQUIDOS TRANSCELULARES É calculado pela soma das várias secreções e aproximase de 1,5% do peso corporal ou 2,5% da água total (Quadro 8.1).
Determinação do Volume Intracelular (VIC) O volume intracelular não pode ser determinado diretamente e é calculado subtraindo-se o volume extracelular da água corporal total. Na prática, considerando-se a água total do organismo como sendo 60% do peso corporal e o volume extracelular 20%, conclui-se que o volume intracelular é de 40% do peso total.5
Quadro 8.1 Distribuição da água total num adulto jovem* % do Peso Corporal
% da Água Total
Plasma
4,5
7,5
Líquido intersticial linfático
12,0
20,0
Tecido conjuntivo denso e cartilagem
4,5
7,5
Água do osso (inacessível)
4,5
7,5
Transcelular
1,5
2,5
Extracelular total
27,0
45,0
Extracelular funcional**
21,0
—
Água total
60,0
100,0
Água intracelular
33,0
55,0
Compartimento
*Modificado de Edelman, I. S. e Leibman, J.11 **O líquido extracelular funcional representa o extracelular total menos a água do osso e do líquido transcelular.
Pontos-chave: • Regra 60:40:20 • Água corporal total 60% do peso corporal. • Compartimentos: Intracelular 40% do peso corporal Extracelular 20% do peso corporal
COMPOSIÇÃO ELETROLÍTICA DOS COMPARTIMENTOS LÍQUIDOS A composição eletrolítica do plasma e dos líquidos intersticial e intracelular pode ser apreciada no Quadro 8.2. No líquido extracelular o cátion mais abundante é o sódio, e o cloro é seu principal ânion. Em menor concentração no líquido extracelular, observamos K, Ca e Mg e os ânions HPO4 , H 2 PO4 e SO4 . Além disso, muitos ácidos orgânicos (láctico, pirúvico, cítrico) existem no líquido extracelular como ânions e podem estar elevados em diversas enfermidades.5 O sódio no líquido extracelular representa a metade de sua osmolalidade. No líquido intracelular o cátion mais abundante é o potássio, e os ânions prevalentes são compostos orgânicos como os fosfatos, sulfatos e proteínas. Observam-se ainda Mg, Ca e os ânions inorgânicos Cl e HCO3. Note que o total de íons intracelulares excede o do plasma e, no entanto, a osmolalidade intra- e extracelular é a mesma. Acredita-se que alguns destes íons intracelulares sejam osmoticamente inativos, isto é, ligados a proteínas e a outros constituintes celulares. Metade da osmolalidade do líquido intracelular é dada pelo K. A determinação de eletrólitos no interior das células é tecnicamente difícil, além de variar de acordo com a origem do tecido estudado. Por exemplo, apesar da possibilidade de acesso às hemácias do sangue periférico, a dosagem dos eletrólitos nestas células, que não possuem núcleos e mitocôndrias, pode não refletir o que ocorre no tecido muscular.6 O líquido intersticial é um ultrafiltrado do plasma. Sendo assim, não contém os elementos celulares (hemácias, leucócitos, plaquetas), e sim um líquido ultrafiltrado que praticamente não contém proteínas. Note-se que a soma total de íons no plasma é maior que a do líquido intersticial. A explicação está na distribuição de Gibbs-Donnan5,7,9 (Fig. 8.3): a) quando há um ânion pouco difusível num dos lados da membrana (no caso, as proteínas no lado vascular), a concentração de um íon positivo difusível será maior neste lado, e a concentração de um ânion difusível será menor;
95
capítulo 8
Quadro 8.2 Composição iônica do plasma, líquido intersticial e intracelular
Íons
mEq/L
Plasma mEq/kg/H2O
Líquido Intersticial mEq/L
Líquido Intracelular mEq/kg/H2O
Cátions
Sódio (Na) Potássio (K) Cálcio (Ca) Magnésio (Mg)
142,0 4,0 5,0 3,0
151,0 4,3 5,4 3,2
144,0 4,0 2,5 1,5
10,0 156,0 3,3 26,0
Total
154,0
163,9
152,0
195,3
103,0
109,7
114,0
2,0
27,0 2,0 1,0 5,0 16,0
28,7 2,1 1,1 5,3 17,0
30,0 2,0 1,0 5,0 0,0
8,0 95,0 20,0 — 55,0
154,0
163,9
152,0
180,0
Ânions Cloro (Cl) Bicarbonato (HCO3) Fosfato (HPO4) Sulfato (SO4) Ácidos orgânicos Proteínas Total
las e de uma eliminação ativa de outros íons do interior da célula. Assim, a concentração de sódio no líquido extracelular é alta e no interior das células é baixa, porque o sódio é ativamente eliminado das células por meio de bombas iônicas.
Pontos-chave:
Fig. 8.3 Equilíbrio de Gibbs-Donnan. No diagrama, os compartimentos A e B estão separados por uma membrana permeável ao Na e Cl, mas impermeável à proteína. Após o equilíbrio final, observa-se que: 1.º) O produto da concentração de íons difusíveis num compartimento é igual ao produto dos mesmos íons no outro compartimento (94 no compartimento A e 66 no compartimento B); 2.º) Em cada compartimento, a soma dos cátions deve ser igual à soma dos ânions (9 Na e 4 Cl 5 Pr no compartimento A; 6 Na e 6 Cl no compartimento B); 3.º) A concentração de cátions difusíveis será maior no compartimento que contém a proteína (carga negativa) não difusível que no outro compartimento, e a concentração de ânions difusíveis será menor no compartimento A que no B; 4.º) A osmolalidade é maior no compartimento A, que contém a proteína. (Obtido de Valtin, H.9)
b) o número total de íons difusíveis será maior no lado que contiver o ânion pouco difusível. A diferente concentração iônica nos diversos compartimentos não é devido a uma impermeabilidade iônica entre um compartimento e outro. A diferença é o resultado de uma acumulação ativa de certos íons dentro das célu-
• Os solutos dissolvidos na água não se distribuem igualmente no intracelular e no extracelular, devido à ação de bombas iônicas • Partículas restritas a um compartimento determinam seu volume. Exemplo: o sódio, restrito ao espaço extracelular por meio de bombas iônicas, determina o volume deste espaço. O mesmo vale para o potássio em relação ao espaço intracelular
DISTRIBUIÇÃO DA ÁGUA ENTRE COMPARTIMENTOS As membranas celulares permitem o livre movimento de água em qualquer direção. Este movimento depende da distribuição dos íons. É a quantidade de soluto e não de solvente que define o volume do compartimento. Cada compartimento líquido no organismo tem um soluto que, devido a seu confinamento àquele espaço, determina o volume do compartimento: proteínas séricas para o volu-
96
Compartimentos Líquidos do Organismo
me intravascular, sódio para o compartimento extracelular e potássio para o intracelular. A rápida distribuição proporcional de água entre os compartimentos assegura uma concentração osmolar intra- e extracelular essencialmente idêntica. A osmolalidade plasmática de um indivíduo normal está em torno de 289 mOsm/kg H2O, atribuída principalmente ao sódio e aos ânions uréia e glicose. A osmolalidade plasmática é igual a duas vezes a concentração plasmática do sódio, mais a osmolalidade da uréia, mais a osmolalidade da glicose. A osmolalidade plasmática poderá ser deduzida, considerando-se as seguintes concentrações normais: sódio plasmático — 140 mEq/L; uréia plasmática — 30 mg/100 ml, e glicemia — 90 mg/100 ml. Osmolalidade plasmática (Na 2) (
Glic Uréia 10) ( 10) 180 60
por uma camada de células e uma membrana pouco permeável à água. Desta forma, secreções gastrintestinais e o suor são hiposmóticos. Como a osmolalidade é a mesma dentro e fora das células, a passagem de água do interior para fora das células, ou vice-versa, só ocorre se houver mudança de osmolalidade e tonicidade. As seguintes circunstâncias, ilustradas na Fig. 8.4 e baseadas na discussão de Robert Pitts, traduzem situações em que se alteram a osmolalidade e o volume dos compartimentos extra- e intracelular.10
Pontos-chave: • Osmolalidade plasmática (Na 2) ( Uréia 10) ( Glic 10) 60 180 • Osmolalidade plasmática normal ⬵ 290 mOsm/kg H2O
Na 2 140 mEq/L 280 mOsm/kg H2O Uréia:
30 mg / 100 ml 10 5 mOsm/kg H2O 60
90 mg / 100 ml Glicemia: 10 5 mOsm/kg H2O 180 Então, a osmolalidade plasmática estimada com os dados acima é de 290 mOsm/kg H2O. Para o cálculo da contribuição da uréia para a osmolalidade, dividimos a concentração plasmática da uréia por 60, que é seu peso molecular. Da mesma forma, dividimos a glicose por seu peso molecular, que é 180. Multiplicamos ambos os cálculos por 10, a fim de convertermos mg/100 ml em mg/L. Quando não se dispõe das concentrações de uréia e glicose, a osmolalidade do plasma pode ser estimada multiplicando-se a concentração de sódio por dois. Alguns líquidos transcelulares têm uma osmolalidade muito diferente dos outros compartimentos. Isto se deve ao fato de estarem separados dos outros compartimentos
Adição de Água ou Solução Hipotônica Se administrarmos água ou solução hipotônica a um indivíduo, seja por via oral ou endovenosa, e se considerarmos que não haverá diurese durante o período do estudo, a água distribui-se rápida e proporcionalmente entre os dois compartimentos. Observa-se uma redução uniforme na osmolalidade e um aumento no volume dos dois compartimentos (aumento maior no intracelular por ser maior que o extracelular)5,7 (Fig. 8.4).
Adição de Solução Hipertônica de NaCl A infusão endovenosa de uma solução hipertônica de NaCl expande o compartimento extracelular e provoca um movimento passivo de água do compartimento intracelular (osmolalidade menor) para o extracelular (os-
Fig. 8.4 Alterações no volume e na osmolalidade dos compartimentos intra- e extracelulares, quando se adiciona: A) apenas água ao organismo; B) uma solução salina hipertônica; C) uma solução salina isotônica. O estado inicial dos compartimentos intracelular (I) e extracelular (E) está representado pelas linhas contínuas e no final está representado por linhas interrompidas. A altura do compartimento representa a osmolalidade, e a largura, o volume. (Modificado de Pitts, R.10)
97
capítulo 8
molalidade maior devido à solução adicionada), até que ambos os compartimentos se equilibrem e se tornem isosmóticos. A saída de água reduz o volume do compartimento intracelular e, conseqüentemente, aumenta a osmolalidade deste compartimento. No final, ambos os compartimentos terão uma osmolalidade maior que a inicial5,7 (Fig. 8.4).
Adição de Solução Isotônica de NaCl Como o sódio permanece principalmente no compartimento extracelular, há uma expansão do volume deste compartimento, mas não ocorre alteração na osmolalidade intra- e extracelular e, tampouco, no volume intracelular5,7 (Fig. 8.4).
Pontos-chave: • Soluções de diferentes tonicidades provocam variações no volume dos compartimentos intra- e extracelular • Soluções isotônicas de sódio aumentam o extracelular, pois o sódio se mantém neste compartimento • Soluções hipotônicas e água se distribuem no intra- e extracelular (maior proporção no intracelular) • Soluções hipertônicas causam movimento de água do intra- para o extracelular, diminuindo o primeiro e aumentando o segundo
TROCAS LÍQUIDAS ENTRE PLASMA E INTERSTÍCIO A nutrição das células e a remoção dos produtos do metabolismo celular somente são possíveis devido à existência de uma circulação capilar. Ela permite uma rápida troca de nutrientes entre a circulação e as células através do líquido intersticial. O transporte dos nutrientes e catabólitos pelo sangue depende da adequação da função circulatória e do volume líquido circulante. Portanto, manter o volume plasmático é essencial. A pressão hidrostática determinada pela bomba cardíaca num compartimento (vascular) altamente permeável à água e aos solutos poderia determinar a passagem de todo o líquido intravascular rapidamente para o interstício. Isto não ocorre porque a esta pressão hidrostática se opõe uma outra pressão — a pressão osmótica determinada pelas proteínas, principalmente albumina, também conhecida como pressão coloidosmótica ou pressão oncótica. A pressão oncótica está em torno de 25 mmHg. Já o líquido intersticial tem pouca proteína, tendo uma pressão oncótica em torno de 5 mmHg.2 A diferença, portanto, entre a pressão osmótica do plasma e a do interstício é de 20 mmHg e esta força se opõe à pressão hidrostática.5,7 Foi Starling quem primeiro formulou o mecanismo de distribuição de líquido entre os compartimentos vascular e intersticial (Fig. 8.5). Segundo ele, o sangue chega aos capilares com uma certa força (pressão hidrostática), capaz de determinar o retorno venoso ao coração. A pressão hidrostática é determinada pela pressão mecânica gerada pelo coração. A pressão média nas grandes artérias é de 95 mmHg, mas, quando o sangue chega ao leito capilar, a
Fig. 8.5 Hipótese de Starling para troca de líquido entre plasma e interstício. Os fatores que determinam esta troca são denominados forças de Starling. (Obtido de Valtin, H.9)
98
Compartimentos Líquidos do Organismo
pressão hidrostática cai para 40-45 mmHg. Esta pressão hidrostática de 40-45 mmHg determina a passagem de líquido intravascular para o interstício e a ela se opõem a pressão oncótica das proteínas, em torno de 25-30 mmHg, e uma pressão do turgor intersticial de 2-5 mmHg. Desta forma, o balanço dessas forças resulta numa pressão de filtração positiva, em torno de 10-15 mmHg.5 Uma pequena quantidade de proteínas atravessa os capilares, mas quase tudo retorna à circulação através do sistema linfático. No entanto, uma fração permanece no interstício e é responsável pela pressão oncótica intersticial de 3 mmHg. Quando a coluna de sangue atinge o lado venoso do capilar, a pressão hidrostática está reduzida a 10-15 mmHg e o balanço das forças é negativo, determinando a reabsorção do líquido filtrado no lado venoso capilar.5 Acredita-se que o principal mecanismo que altera a pressão hidrostática intracapilar não é a resistência ao longo do capilar e sim a atividade de esfíncteres pré-capilares (Fig. 8.5). Quando há um relaxamento do esfíncter, a pressão hidrostática intracapilar aumenta, favorecendo a filtração ao longo do capilar; quando o esfíncter se contrai, a pressão hidrostática cai, e talvez só ocorra reabsorção ao longo do capilar. Também é importante a área de superfície dos capilares. Quando o esfíncter se contrai, muitos capilares são desviados da circulação arterial, reduzindo a área de superfície capilar; quando o esfíncter se relaxa, ocorre o inverso. Além do mais, o ritmo de fluxo líquido através do capilar endotelial não depende só das forças de Starling, mas também do coeficiente de filtração, expresso pela seguinte fórmula:9 q Kf(Pc – Pt) – (pp – pt), onde: q ritmo de fluxo através do capilar; Kf coeficiente de filtração; Pc pressão hidrostática intracapilar; Pt pressão do turgor tecidual; pp pressão oncótica do plasma; pt pressão oncótica intersticial. Conclui-se que se a pressão hidrostática for excessiva, ou a pressão oncótica do plasma reduzida, haverá um excesso de filtração de líquido para o interstício e, se for ul-
Pontos-chave: • A pressão hidrostática é a principal força que provoca o movimento de líquido para fora da luz do capilar • A pressão coloidosmótica ou oncótica (determinada principalmente pela albumina) é a principal força que se opõe à hidrostática e provoca o movimento de líquido para dentro da luz do capilar sanguíneo
trapassada a capacidade de remoção pelos linfáticos, haverá edema.
EXERCÍCIOS (Respostas no final do capítulo.) 1) Adulto jovem de 70 kg. Calcular a água corporal total, espaço extracelular, volume plasmático e volume intracelular. 2) Em relação à proporção de água corporal total, que diferenças existem em pacientes obesos, mulheres, crianças e idosos? 3) Qual a osmolalidade plasmática de um paciente que apresenta as seguintes dosagens plasmáticas: uréia 240 mg/dl; glicose 360 mg/dl; sódio 133 mEq/litro. 4) Frente à osmolalidade encontrada na questão anterior, o que ocorre com os compartimentos intra- e extracelular? 5) O que ocorre com as forças de Starling em presença de hipoalbuminemia? 6) Cite um exemplo de solução endovenosa que deve ser administrada quando se deseja aumentar o volume do espaço extracelular. 7) Cite um exemplo de solução endovenosa que se administra para expandir o espaço extracelular e contrair o espaço intracelular.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ROSE, B.; POST, T.W. Units of solute measurement. Up to Date, vol. 9, n. 1, Cap. 1B. 2000. 2. HAYS, R.M. Dynamics of body water and electrolytes, Cap. 1, pág. 1. In: Clinical Disorders of Fluid and Eletrolyte Metabolism. Eds. Morton H. Maxwell and C. R. Kleeman. McGraw-Hill Book Co., 1972. 3. PRESTON, R.A. Acid-Base, Fluids and Electrolytes Made Ridiculously Simple. Cap.1, pág. 3. MedMaster Inc., Miami, 1997. 4. OH, M.S. and CARROLL, H.J. Regulation of intracellular and extracellular volume. In: Fluid, Electrolyte and Acid-Base Disorders. Eds. Arieff, A.I. and DeFronzo, R.A. Cap. 1, pág. 1. Churchill Livingstone Inc. New York, 1995. 5. GUYTON, A.C. and HALL, J.E. The body fluid compartments: extracellular and intracellular fluids; interstitial fluid and edema. In: Textbook of Medical Physiology. Cap. 25, págs. 297-313. W.B. Saunders Co., 1996. 6. MAFFLY, R.H. The body fluids: volume, composition and physical chemistry, Cap. 2, pág. 65. In: The Kidney. Eds. B. M. Brenner and F. C. Rector Jr. W. B. Saunders Co., 1976. 7. HALPERIN, M.L.; GOLDSTEIN, M.B. Sodium and water physiology. In: Fluid, Electrolyte and Acid-Base Physiology — A Problem-Based Approach. Cap. 6, pág. 217. W.B. Saunders Co., 1994. 8. MALNIC, G. e MARCONDES, M. Fisiologia Renal. EPU, 1986. 9. VALTIN, H. Renal Function: Mechanisms Preserving Fluid and Solute Balance in Health. Cap. 2, pág. 20, Little, Brown and Co., Boston, 1995. 10. PITTS, R.D. Physiology of the Kidney and Body Fluids. Cap. 2, pág. 11. Year Book Medical Publishers Inc., 3rd edition, 1974. 11. EDELMAN, I.S. and LEIBMAN, J. Am. J. Med., 27:256, 1959.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Química e soluções http://dbhs.wvusd.k12.ca.us Forças de Starling www.liv.ac.uk/⬃petesmif/teaching/1bds - mb/notes/fluid/ text.htm
99
capítulo 8
Outros www.physio.mcgill.ca/209A/Body - fluids/Body - fl3.htm www.umds.ac.uk/physiology/rbm/bodyflu
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS 1) Num adulto jovem de 70 kg: a. Água corporal total 60% de 70 kg 42 litros b. Volume do espaço extracelular 20% de 70 kg 14 litros c. Volume plasmático 4,5% de 70 kg 3,15 litros d. Volume do espaço intracelular 40% de 70 kg 28 litros 2) A água corporal total encontra-se diminuída (menos que 60% do peso corporal) em pacientes obesos e mulheres, devido ao maior conteúdo de gordura que apresentam. Os idosos apresentam menor massa muscular, e conseqüentemente menor proporção de água em relação ao peso. As crianças apresentam conteúdo de gordura reduzido, e então a proporção de água corporal total é maior em relação ao peso. Uréia Glic 3) Osmolalidade plasmática (Na 2) ( 10) ( 10), 60 180 então:
Osmolalidade plasmática (133 2) (240/60 10) (360/180 10) 326 mOsm/kg H2O 4) No exemplo acima, com o aumento da osmolalidade e tonicidade do plasma (a osmolalidade normal oscila entre 280 e 290 mOsm/ kg H2O), ocorre a passagem de água do espaço intracelular para o extracelular até haver um equilíbrio osmótico entre os dois compartimentos. Como resultado final, o volume do espaço intracelular sofre redução (pela perda de água) e o extracelular sofre o acréscimo de água, inclusive diluindo o sódio do intravascular. 5) Em presença de hipoalbuminemia, existe redução da pressão oncótica, o que favorece a filtração de líquido para o interstício no lado venoso do capilar e dificulta a reabsorção de líquido intersticial no lado venoso do capilar; caso seja ultrapassada a capacidade de absorção pelos linfáticos, isto resultará em edema. 6) Solução salina a 0,9% (chamada solução salina isotônica). 7) Solução salina hipertônica (concentração maior que 0,9%).
Capítulo
9
Metabolismo da Água Miguel Carlos Riella e Maria Aparecida Pachaly
MECANISMO DA SEDE
Manejo do paciente com hipernatremia
VASOPRESSINA (HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO) Mecanismo de ação do hormônio antidiurético (HAD) —
Linhas gerais Cálculo do déficit de água
aquaporinas OUTROS HORMÔNIOS
Tipo de fluido Ritmo de correção
Catecolaminas Hormônio tireoidiano Hormônios adrenocorticais Sistema renina-angiotensina MECANISMO RENAL DE REGULAÇÃO DA ÁGUA Considerações anatômicas Vascularização da medula renal Concentração da urina — mecanismo de contracorrente
Evolução EXCESSO DE ÁGUA — HIPONATREMIA — ESTADO HIPOSMOLAR Causas de hiponatremia Pseudo-hiponatremia Redistribuição de água Intoxicação aguda pela água Hiponatremia crônica
Fluxo sanguíneo medular Papel da uréia no mecanismo de concentração
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DE HIPONATREMIA Diagnóstico
urinária Recirculação medular da uréia
TRATAMENTO DA HIPONATREMIA Linhas gerais
Diluição da urina DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DA ÁGUA
Cálculo do excesso de água Tratamento da hiponatremia sintomática
DÉFICIT DE ÁGUA — HIPERNATREMIA — ESTADO HIPEROSMOLAR
Ritmo de correção Complicações do tratamento
Causas de hipernatremia e estado hiperosmolar Hipernatremia com hipovolemia
EXERCÍCIOS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Hipernatremia com hipervolemia Hipernatremia com volemia aparentemente normal
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS
Manifestações clínicas de hipernatremia
No dia-a-dia, a ingesta de líquidos deve igualar-se às perdas através da respiração, suor, trato gastrintestinal e diurese.*1 Nos adultos, a água corresponde a 60% do peso *O termo diurese refere-se a um fluxo de urina maior do que o normal, isto é, superior a 1 ml/min no adulto; antidiurese refere-se a um fluxo urinário reduzido, geralmente inferior a 0,5 ml/min no adulto.
corporal, sendo a maior parte localizada no espaço intracelular. Para evitar que haja variações na osmolalidade plasmática, a qual é determinada principalmente pela concentração plasmática de sódio, devem ser feitos ajustes adequados na ingesta e excreção de água. Estes ajustes são realizados de forma mais significativa sobre o controle da sede,
101
capítulo 9
secreção do hormônio antidiurético (HAD) e mecanismos renais de conservação ou eliminação de água.1 Quando existe déficit de água no organismo, os rins participam de um sistema de retroalimentação com osmorreceptores e hormônio antidiurético, minimizando a perda de água. Já quando existe excesso de água no organismo, estes mecanismos se dirigem a uma maior excreção de água pelos rins. 2
MECANISMO DA SEDE Para equilibrar as perdas diárias de água, é necessário haver ingesta de líquido, que é regulada pelo mecanismo da sede. Sede é definida como o desejo consciente de ingerir água.2 Acredita-se que os estímulos para a sede se originam tanto no compartimento intracelular como no extracelular. A sensação de sede origina-se no centro da sede, localizado nas porções anterior e ventromedial do hipotálamo. Na verdade, os neurônios que compõem o centro da sede são especializados na percepção de variações de pressão osmótica do plasma, e por isso recebem a denominação de osmorreceptores. Um dos mais importantes estímulos para a sede é o aumento da osmolaridade do líquido extracelular, e o “limiar” para o surgimento da sede é em torno de 290 mOsm/L. Nesta situação, os osmorreceptores sofrem certo grau de desidratação, gerando impulsos que são conduzidos por neurônios especializados até centros corticais superiores, onde então a sede se torna consciente.2,3 Este mecanismo é ativado nas situações em que há aumento da osmolalidade do plasma, como no déficit de água e na administração de soluções hipertônicas cujos solutos não penetram nas células. Por sua vez, déficits no volume extracelular e na pressão arterial também desencadeiam a sede, por vias independentes das estimuladas pelo aumento da osmolaridade do plasma. Por exemplo, depleção do espaço extracelular (diarréia, vômitos) e a perda de sangue por hemorragia estimulam a sede mesmo sem haver modificação na osmolaridade do plasma. O mecanismo para que isto ocorra está relacionado ao estímulo de barorreceptores, que são receptores de pressão existentes na circulação torácica.2 Um terceiro importante estímulo à sede é a angiotensina II. Fitzsimons acredita que a angiotensina e outras substâncias vasoativas atuem em estruturas vasculares periventriculares (seriam receptores mecânicos da sede no cérebro), reduzindo o volume vascular a esse nível e causando sede.4 Como a angiotensina II também é estimulada pela hipovolemia e baixa pressão arterial, seu efeito sobre a sede auxilia na restauração do volume sanguíneo e pressão arterial, juntamente com as ações renais da angiotensina II, reduzindo a excreção de fluidos.2 Alguns outros fatores influenciam a ingesta de água. Por exemplo, a falta de umidade da mucosa oral e do esôfago
desencadeia a sensação de sede. Nesta situação, a ingestão de água pode provocar alívio imediato da sede, mesmo antes de ter havido absorção da água no trato gastrintestinal ou qualquer modificação na osmolaridade do plasma. Porém este alívio da sede é de curta duração, e o desejo de ingerir água só é efetivamente interrompido quando a osmolaridade plasmática ou o volume extracelular retornarem ao normal. De modo geral, a água é absorvida e distribuída no organismo cerca de 30-60 minutos após a ingestão. O alívio imediato da sede, apesar de temporário, é um mecanismo que impede que a ingestão de água prossiga indefinidamente, o que levaria ao excesso de água e diluição excessiva dos fluidos corporais. 2 Estudos experimentais demonstram que os animais não ingerem quantidades de água superiores às necessárias para restaurar a osmolaridade plasmática e volemia ao normal.2 Já em humanos, a quantidade de água ingerida varia de acordo com a dieta e a atividade do indivíduo, e em geral é excessiva em relação às necessidades diárias. Esta ingestão excessiva, que não é induzida por um déficit de água e cujo mecanismo é desconhecido, é extremamente importante, pois assegura as necessidades futuras do indivíduo. Habitualmente, a sede e a ingesta líquida representam uma resposta normal a um déficit de água. Isto é o que ocorre nos exemplos já mencionados, de vômitos, diarréia, diabetes insipidus, diabetes mellitus, hipocalemia, hipercalcemia etc. No entanto, em algumas situações, o paciente tem sede, mas não há um déficit de água. Este estado patológico pode ser devido à irritação contínua dos neurônios da sede por tumor, trauma ou inflamação, ingestão compulsiva de água, hiper-reninemia etc. Hipodipsia (diminuição ou ausência de sede) é usualmente causada por tumor (p.ex., craniofaringioma, glioma, pinealoma ectópico etc.) ou trauma. Além de afetarem o centro da sede, estes exemplos podem também ocasionar lesão do sistema supra-óptico-hipofisário, causando diabetes insipidus, o que agrava o déficit de água e dificulta o manejo clínico.
VASOPRESSINA (HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO) O hormônio antidiurético (HAD) interage com porções terminais do nefro, aumentando a permeabilidade destes segmentos à água, desta forma aumentando a conservação da água e a concentração urinária. Além do aumento da permeabilidade à água nos túbulos coletores, o HAD tem uma importante participação na recirculação da uréia entre o ducto papilar e a porção fina ascendente da alça de Henle, pois aumenta a permeabilidade do ducto coletor à uréia, e este mecanismo auxilia na manutenção da hipertonicidade da medula renal.5
102
Metabolismo da Água
O HAD é um hormônio sintetizado no hipotálamo por grupos de neurônios que formam os núcleos supra-óptico e paraventricular, próximos ao centro da sede. Após a síntese, este decapeptídio (arginina-vasopressina em humanos) é armazenado em grânulos e transportado ao longo dos axônios, em direção à neuro-hipófise (lobo posterior da hipófise). No interior dos grânulos, o hormônio forma um complexo com uma proteína chamada neurofisina A ou neurofisina II. Parte destes grânulos pode ser liberada rapidamente, através de exocitose, enquanto os demais serviriam de estoque.3 A liberação deste hormônio está condicionada a estímulos, que podem ser osmóticos ou não-osmóticos. O estímulo osmótico refere-se a uma alteração da osmolalidade. Quando ocorre déficit de água no organismo, há um aumento na osmolalidade, reduzindo o volume das células por desidratação celular* (inclusive das células dos núcleos supra-óptico e paraventricular), estimulando assim a liberação do HAD. É necessário ressaltar que os osmorreceptores são estimulados apenas por variações reais da tonicidade plasmática, isto é, por solutos que não atravessam as membranas. Solutos que atravessam as membranas celulares, como a uréia (e glicose nas células cerebrais), não aumentam a secreção de HAD.5,6 Por outro lado, quando há excesso de água no organismo, a hiposmolalidade que se estabelece inibe a liberação do hormônio antidiurético. Tudo indica que a alteração do volume celular altera a atividade elétrica dos neurônios dos núcleos hipotalâmicos, afetando assim a liberação de vasopressina. A sensibilidade deste mecanismo osmorregulador pode ser apreciada na Fig. 9.1. Observem que, à medida que aumenta a osmolalidade plasmática, aumenta a concentração plasmática de HAD (Fig. 9.1 A). Com pressões osmóticas plasmáticas superiores a 280 mOsm/L (limiar osmótico) a concentração plasmática de HAD aumenta de modo linear com a pressão osmótica. Mesmo com variação de 1 mOsm ou menos, a secreção de HAD varia.3,7 A sensibilidade deste mecanismo osmorregulador pode ser ainda melhor avaliada quando se examina a relação entre o HAD plasmático e a osmolalidade urinária. Observem na Fig. 9.1 B que, para cada aumento de uma unidade na concentração plasmática de HAD, a osmolalidade urinária aumenta em média 25 mOsm/kg. Isto significa que pequenas alterações na osmolalidade plasmática são rapidamente seguidas por grandes alterações na osmolalidade urinária. Assim sendo, uma alteração na osmolalidade plasmática de 1 mOsm/kg normalmente acarreta uma alteração na osmolalidade urinária de 95 mOsm/kg. Isto é muito importante, permitindo que o organismo altere rapidamente o volume urinário, compensando a variação na *O termo desidratação é empregado aqui para indicar um déficit isolado de água. V. Cap. 10 para miores detalhes sobre a conotação genérica do termo desidratação.
ingesta líquida e mantendo, assim, a água total constante. Desta forma, a tonicidade da água total do organismo é preservada dentro de uma estreita margem, cujo limite superior é regulado pelo osmorreceptor da sede, e o inferior, pelo osmorreceptor do HAD. Dentro destes limites (280-294 mOsm/kg), a tonicidade da água total ainda é regulada por ajustes na excreção de água livre (v. a seguir) controlada pelo HAD. A liberação de ADH pode ser desencadeada por estímulos não-osmóticos, entre os quais destacamos: diminuição da pressão arterial; diminuição da tensão da parede do átrio esquerdo e das veias pulmonares; dor, náusea, hipóxia, hipercapnia, hipoglicemia, ação da angiotensina, estresse emocional; aumento da temperatura do sangue que perfunde o hipotálamo e drogas: colinérgicas e betadre-
Fig. 9.1 A. Representação esquemática dos efeitos de pequenas alterações na osmolalidade plasmática sobre os níveis plasmáticos de vasopressina. B. Repercussões de alterações na vasopressina plasmática sobre a osmolalidade urinária. Ver texto para interpretação da figura. (Obtido de Robertson, B.L. e col.6)
103
capítulo 9
nérgicas (acetilcolina e isoproterenol, respectivamente), morfina, nicotina, ciclofosfamida, barbitúricos etc.2,7 Entre os estímulos não-osmóticos para a liberação do HAD, estão os provenientes de áreas onde se encontram receptores de pressão (barorreceptores): seio carotídeo, átrio esquerdo e veias pulmonares. Eles respondem a variações da pressão sobre a parede do órgão receptor, emitindo impulsos nervosos que modulam a liberação hipotalâmica de HAD. Quando há uma menor tensão na parede do órgão, há transmissão de estímulos para a liberação central de HAD. Isto pode ocorrer, por exemplo, na contração do volume extracelular ou volume circulante efetivo e hipotensão arterial.8 Ao contrário, uma inibição não-osmótica da liberação de ADH ocorre quando há: aumento da pressão arterial, aumento da tensão da parede do átrio esquerdo e das veias pulmonares, diminuição da temperatura do sangue que perfunde o hipotálamo e uso de algumas drogas (norepinefrina, clonidina, haloperidol, difenil-hidantoína, álcool).2
O HAD é o principal hormônio atuante na regulação da excreção de água. No entanto, outros hormônios afetam a excreção de água, como veremos na seção seguinte.
Mecanismo de Ação do Hormônio Antidiurético (HAD) — Aquaporinas
Catecolaminas
O HAD modifica a membrana luminal das células principais dos túbulos distal final e coletor, causando aumento da permeabilidade à água. O HAD interage com receptores específicos da superfície (receptores V1 e V2), localizados na membrana basolateral. Esta interação produz efeitos sobre o cálcio e o AMPc intracelulares, que por sua vez modificam a permeabilidade da membrana luminal à água. O receptor V1 existe também no músculo liso vascular, sendo responsável pelo efeito vasoconstritor do HAD, que por isto também recebe o nome de vasopressina.5,7 Recentemente, foi evidenciada a existência de uma família de proteínas de membrana que exercem a função de canais de água em tecidos transportadores de fluidos (por exemplo, no cristalino, nos túbulos renais, etc).3,9 Estes canais de água são hoje conhecidos como aquaporinas. Até o momento, já foram identificadas cinco aquaporinas que se expressam nos rins (AQP 1, 2, 3, 4 e 6).10 Nas células principais dos túbulos distais e ductos coletores, está presente a aquaporina 2, que é um canal de água sensível ao HAD. Na presença de HAD, o receptor V2 é estimulado e ativa a adenil ciclase e o AMP cíclico. Com isto, vesículas específicas no citoplasma se movem e se fundem com a membrana apical (luminal). Estas vesículas contêm a aquaporina 2, que, uma vez inserida na membrana luminal das células principais dos túbulos distais e coletores, permite a passagem de água para dentro da célula.11 No bordo basolateral das células principais, estão presentes as aquaporinas 3 e 4, que permitem o transporte de água de dentro da célula para o interstício, porém neste ponto sem a participação do HAD.5 As aquaporinas 1 e 6 estão relacionadas à absorção de água, mas em outros segmentos tubulares, também sem dependência do HAD.10
Pontos-chave: • A sede e a liberação de HAD são desencadeadas por um aumento da osmolalidade plasmática e têm por objetivo manter a osmolalidade estável • No rim, o HAD ativa a fusão de canais de água (aquaporina 2) com a membrana luminal dos túbulos coletores, permitindo a reabsorção de água
OUTROS HORMÔNIOS
As catecolaminas afetam a excreção de água através de um mecanismo intra-renal e outro extra-renal. No mecanismo intra-renal, os agentes adrenérgicos alteram a resposta da membrana tubular renal ao HAD. Assim, os agonistas alfadrenérgicos tipo norepinefrina causam aumento do volume urinário, por diminuírem o efeito do HAD sobre a permeabilidade da membrana tubular renal à água. Já a estimulação betadrenérgica aumenta a permeabilidade tubular à água, causando diminuição do volume urinário.12 No mecanismo extra-renal, a ação das catecolaminas se faz através de alterações na liberação de HAD, como já mencionado. Várias outras substâncias vasoativas (angiotensina II, prostaglandina E1, nicotina) têm efeitos sobre os barorreceptores atriais, alterando a liberação de HAD.
Hormônio Tireoidiano Sabe-se que pacientes hipotireóideos têm comprometida a sua capacidade de excretar uma carga de água. Por outro lado, são desconhecidos os mecanismos pelos quais o hormônio tireoidiano facilita a excreção de água. Uma das hipóteses é a de que o hormônio tireoidiano altera a sensibilidade do túbulo renal ao HAD. Há evidência de que a maioria dos pacientes com hipotireoidismo e hiponatremia têm elevada concentração plasmática de HAD. Como o hipotireoidismo cursa com débito cardíaco habitualmente diminuído,13 nestes casos a liberação de HAD pode estar sendo estimulada pela redução associada do volume arterial efetivo. Também se encontrou queda da taxa de filtração glomerular nestes pacientes, o que é revertido com a terapia hormonal apropriada.14
104
Metabolismo da Água
Hormônios Adrenocorticais Na insuficiência adrenal, pode ser observado um comprometimento na excreção de água, cuja causa não está esclarecida. Alguns autores acreditam que a deficiência de glicocorticóides seja responsável pela deficiente excreção de água. Segundo eles, a deficiência de glicocorticóides produziria alguns efeitos hemodinâmicos sistêmicos (taquicardia, diminuição do volume sistólico), e estas alterações estimulariam o mecanismo barorreceptor de estímulo ao HAD, causando retenção de água. Também tem sido investigada a participação da deficiência dos mineralocorticóides na diminuição da excreção de água existente na insuficiência adrenal. Acredita-se que os mineralocorticóides influenciam a secreção de HAD indiretamente, pois ao manter o volume extracelular evitam a liberação nãoosmótica de HAD observada na depleção de volume.
Sistema Renina-Angiotensina O sistema renina-angiotensina também participa no controle da secreção de HAD, principalmente quando a osmolalidade plasmática está aumentada. A angiotensina estimula a liberação de HAD e aumenta a sensibilidade do sistema de osmorregulação.8
MECANISMO RENAL DE REGULAÇÃO DA ÁGUA O tremendo progresso nesse campo deve-se basicamente à aplicação de técnicas de micropuntura in vivo no rim de mamíferos, principalmente o rato, e mais recentemente pelo avanço da biologia molecular. Para que seja mantida a homeostase do organismo, é necessário que o rim apresente a capacidade de variar o volume urinário de modo a reter ou eliminar água, ou seja, concentrar ou diluir a urina. Diariamente o organismo humano necessita eliminar produtos tóxicos resultantes do metabolismo (p.ex., uréia, ácidos orgânicos) e solutos em excesso (sódio, potássio, cálcio, magnésio). A média diária a ser eliminada é de cerca de 750 mOsm/dia. Com a ingestão usual de água (2-2,5 L/dia), a osmolaridade urinária encontra-se entre 400 e 450 mOsm/L, o que requer um volume urinário de 1,5 litro/dia. Caso a ingestão de água seja deficiente, a osmolaridade da urina pode subir até 1.300 mOsm/L, e então o volume urinário vai variar correspondentemente, da seguinte forma: 750 mOsm a serem eliminados osmolaridade de 1.300 volume urinário de 0,6 litro.3 Esta variação decorre do efeito do HAD, conforme já discutido, causando a reabsorção de água no ducto coletor. Da mesma forma, a capacidade de diluir a urina é importante para que o organismo elimine excessos de água. Isto é obtido através da redução da osmolaridade da urina até valores como 50 mOsm/L.3
Para melhor compreensão dos mecanismos de concentração e diluição da urina, vale a pena relembrar alguns conceitos anatômicos.
Considerações Anatômicas Como sabemos, cada nefro (unidade funcional básica do rim) é constituído pelo glomérulo e por uma formação tubular longa, onde os sucessivos segmentos apresentam diferentes características quanto a estrutura e função. Em sua maior parte, os nefros são superficiais, contendo alças de Henle curtas e sem ramo ascendente delgado. Os nefros restantes são justamedulares, e seus glomérulos estão situados próximo à junção corticomedular, possuindo longas alças de Henle com ramo ascendente delgado (Fig. 9.2). Os trabalhos experimentais mostraram que o transporte de água e solutos no nefro distal ocorre em pelo menos cinco segmentos morfologicamente distintos: a) Ramo ascendente espesso da alça de Henle; b) Mácula densa; c) Túbulo contornado distal; d) Ductos coletores corticais e e) Ductos coletores papilares. O ramo ascendente espesso da alça de Henle estendese da medula externa até a mácula densa. Este segmento reabsorve NaCl através de uma membrana impermeável à água, elaborando, portanto, um líquido hipotônico. A mácula densa é um segmento mais curto, cujas células parecem agir como sensoras no mecanismo regulador do feedback túbulo-glomerular (v. Cap. 10). Na mácula densa, inicia-se o túbulo contornado distal. O túbulo distal clássico sempre foi considerado como o segmento que se estende da mácula densa até a junção com
Fig. 9.2 Relação dos vários segmentos do nefro com o córtex e a medula renal.
capítulo 9
105
outro túbulo distal. Recentemente, foi mostrado que este segmento, na verdade, está formado por dois segmentos distintos: segmento proximal, cujo epitélio é similar ao do ramo ascendente espesso, e segmento distal (também denominado túbulo coletor), cujo epitélio é similar ao do ducto coletor cortical15 (v. também Cap. 1). O segmento distal (túbulo coletor) do túbulo contornado distal só responde à ação do hormônio antidiurético em algumas espécies de animais. Já o segmento cortical do ducto coletor tem uma permeabilidade alta à água na presença de HAD e uma permeabilidade baixa na ausência deste. A permeabilidade à uréia do segmento cortical do ducto coletor é baixa, mesmo na presença de HAD. O segmento medular interno-papilar do ducto coletor tem uma permeabilidade à uréia mais alta que a do segmento cortical e, na presença de HAD, ela aumenta mais. A permeabilidade deste segmento medular interno-papilar à água é alta na presença de HAD e baixa na ausência deste.
Vascularização da Medula Renal A medula renal pode ser dividida em: a) Medula externa, com uma faixa externa e outra interna (a faixa externa é também conhecida como zona subcortical), e b) Medula interna (v. Fig. 9.2). O sangue chega à medula renal através das arteríolas eferentes de glomérulos justamedulares. Estes vasos dividem-se na zona subcortical para formarem os vasa recta arteriais, que atravessam a medula em feixes em forma de cone e, às vezes, deixam estes feixes para suprirem um plexo capilar adjacente. Os plexos capilares são drenados por vasa recta venosos que entram num destes feixes e ascendem até a base do cone, na zona subcortical (Fig. 9.3). No rato, uma secção transversal da medula externa mostra três zonas concêntricas: a) área central, contendo vasa recta arterial e venoso; b) anel periférico, contendo vasa recta venosos e a maioria dos ramos descendentes das alças de Henle, e c) por fora do anel, o ramo ascendente da alça de Henle, ducto coletor e plexo capilar.16 Acredita-se que os vasa recta têm a função de remover o líquido absorvido dos ductos coletores e segmento descendente da alça de Henle. O fluxo de plasma na parte terminal dos vasa recta ascendentes é maior que o fluxo de plasma na entrada dos vasa recta descendentes, e esta diferença é igual ao ritmo de absorção de líquido do segmento descendente da alça de Henle e do ducto coletor. Isto é necessário, pois não se conhece nenhuma outra via pela qual a água reabsorvida possa chegar da medula à circulação sistêmica.
Concentração da Urina — Mecanismo de Contracorrente Recorde-se que são 180 litros de líquido filtrados pelos rins diariamente e que apenas 1,5 litro é excretado na urina. Isto
Fig. 9.3 Esquema da estrutura da medula renal no rato (zona interna e zona externa). VRA = vasa recta arteriais; VRV vasa recta venosos; RD ramo descendente da alça de Henle; RA ramo ascendente da alça de Henle; DC ducto coletor. (Modificado de Kriz, W. e Lever, A.F.16)
significa que, num adulto, aproximadamente 100 ml de filtrado glomerular chegam aos túbulos proximais a cada minuto. A maior parte da água filtrada (60 a 70%) é reabsorvida no túbulo contornado proximal, acompanhando a reabsorção de NaCl. Portanto, neste segmento a absorção de água é passiva. Cerca de 10% são reabsorvidos na pars recta do túbulo proximal pelo mesmo mecanismo. No ramo descendente delgado da alça de Henle, ocorre a reabsorção (10 a 15%) de água livre (sem soluto), devido ao gradiente osmótico existente entre o túbulo e o interstício medular. Este gradiente osmótico se estabelece graças a um sistema de contracorrente multiplicador (v. a seguir). O restante é reabsorvido nos ductos coletores, sob a influência do hormônio antidiurético. O líquido que atinge o túbulo contornado distal é sempre hipotônico e a eliminação de urina concentrada ou diluída depende da reabsorção de água nos ductos coletores. Foi observado inicialmente, em vários mamíferos, que o grau de concentração urinária por eles alcançado estava relacionado com o comprimento do segmento delgado das alças de Henle. Posteriormente, comprovou-se que apenas mamíferos e alguns pássaros podiam elevar a concentração de urina acima da do plasma e que estes animais possuíam alças de Henle medulares (portanto, longas). Este fato sugeriu que a concentração de urina deveria ocorrer no interior das alças de Henle.
106
Metabolismo da Água
A hipótese do sistema de contracorrente multiplicador para explicar a concentração de urina ao longo dos túbulos foi sugerida em 1942 por Werner Kuhn, baseada na configuração em U da alça de Henle. Ele observou que, devido a esta configuração, o líquido tubular fluiria em ramos adjacentes, mas em direções opostas. Sendo um físico-químico familiarizado com termodinâmica, ele sabia que um fluxo contracorrente poderia estabelecer grandes gradientes de temperatura ao longo do eixo longitudinal de canais adjacentes, enquanto são pequenos os gradientes de temperatura entre canais transversais (v. Fig. 9.5).17 Transportando estes princípios para a pressão osmótica, ele imaginou que pequenas diferenças na concentração de solutos entre os dois ramos da alça de Henle poderiam resultar em grandes diferenças de concentração ao longo dos túbulos. Além do mais, ele achou que estas grandes diferenças de concentração poderiam ser transmitidas ao interstício que cerca os túbulos, criando assim um aumento progressivo na concentração de soluto, paralelo aos túbulos. Haveria necessidade, no entanto, de três fatores básicos para que o sistema de contracorrente multiplicador funcionasse: a) fluxo contracorrente (proporcionado pela alça de Henle); b) diferenças de permeabilidade entre os túbulos (o ramo ascendente é praticamente impermeável à água), e c) uma fonte de energia (atualmente atribuída ao transporte ativo de cloro no ramo ascendente espesso).
Na presença destes elementos, o líquido tubular seria concentrado da seguinte maneira (Fig. 9.4): 1. No segmento espesso ascendente da alça de Henle, há uma reabsorção ativa de cloro. Esta reabsorção ativa cria uma diferença transtubular de potencial elétrico, que é responsável pela remoção passiva de sódio. 2. O segmento ascendente espesso tem uma baixa permeabilidade à água, o que permite que o fluido tubular neste segmento se torne hiposmótico em relação ao do interstício. No entanto, a uréia permanece no interior do túbulo, pois este segmento tem uma permeabilidade baixa à uréia. 3. No ducto coletor cortical já existe ação do HAD, e, na presença deste, a água é reabsorvida, tornando o líquido tubular isosmótico com o sangue. A permeabilidade deste segmento à uréia é baixa, e, com a perda de água, a concentração intraluminal de uréia aumenta ainda mais. 4. Na medula externa, o interstício hiperosmolar (osmolalidade determinada em parte pela reabsorção de NaCl no segmento ascendente espesso) retira mais água do líquido tubular, aumentando ainda mais a concentração de uréia. 5. Na medula interna, tanto a água como a uréia são reabsorvidas do ducto coletor na presença do HAD. Este
Fig. 9.4 Sistema de contracorrente multiplicador.* O diagrama mostra os ramos descendente e ascendente da alça de Henle, o túbulo distal e o ducto coletor. O contorno mais espesso do ramo ascendente da alça de Henle indica que este ramo é impermeável à água. 1. Reabsorção ativa de cloro e passiva de sódio, mecanismo que dilui o líquido tubular e torna o interstício medular hiperosmótico. 2. No segmento distal (túbulo coletor) do túbulo distal (em algumas espécies de animais) e 햴 no ducto coletor, ocorre reabsorção de água através de um gradiente osmótico. A presença de HAD (v. texto) facilita este transporte passivo. Com a reabsorção de água, ocorre concentração intratubular da uréia. Na medula interna, a água e a uréia são reabsorvidas. 3. O acúmulo da uréia no interstício medular cria o gradiente osmótico para a reabsorção passiva de água no ramo descendente da alça de Henle 햵 e, assim, concentra o NaCl no ramo descendente da alça de Henle. O tamanho das letras dos solutos indica-lhes a concentração relativa. *Baseado na hipótese de Stephenson19 e Kokko e Rector.20
capítulo 9
segmento (medular interno do ducto coletor) tem uma permeabilidade mais alta à uréia do que o segmento cortical do ducto coletor; esta permeabilidade aumenta mais na presença de HAD. Este segmento apresenta uma permeabilidade alta à água na presença de HAD e baixa na sua ausência. 6. O cloreto de sódio e a uréia no interstício exercem uma força osmótica para retirar água do segmento delgado descendente da alça de Henle. Este segmento é relativamente impermeável a uréia e NaCl. Esta perda de água faz aumentar a concentração de NaCl no ramo descendente delgado, de tal forma que, na curva da alça, a concentração de NaCl será maior no interior do túbulo do que no interstício. No entanto, o líquido tubular a esse nível é isosmótico com o interstício papilar, cuja concentração total de soluto está na maior parte constituída pela uréia. 7. Quando líquido tubular atingir o ramo ascendente delgado da alça de Henle (segmento impermeável e permeável ao NaCl), o NaCl passará passivamente para o interstício (devido ao gradiente de concentração). Como a permeabilidade deste segmento é mais alta para o NaCl do que para a uréia, o NaCl sai do túbulo para o interstício mais rapidamente que a uréia quando esta passa do interstício para o interior do túbulo. Com o aumento da concentração de NaCl no interstício, haverá maior absorção de água na porção fina descendente da alça, com conseqüente maior hipertonicidade do fluido tubular, o que gera um maior fluxo de Na e Cl no ramo fino ascendente da alça de Henle, constituindo assim um sistema de contracorrente multiplicador, aparentemente passivo na medula interna, que foi iniciado e mantido pelo transporte de Na e Cl na porção espessa da alça na região medular externa. 8. O ramo espesso ascendente recebe, portanto, um fluido diluído, que se tornará ainda mais diluído em virtude da reabsorção de NaCl neste segmento. A urina final pode alcançar uma concentração próxima, mas não exceder a concentração do interstício medular. No homem, em condições de antidiurese, a concentração urinária máxima alcançada é de aproximadamente 1.200-1.300 mOsm/kg, ou seja, quatro vezes a osmolalidade do plasma. Apesar do progresso alcançado nos últimos anos em relação aos mecanismos de concentração da urina, muitos aspectos ainda permanecem sem solução. Atualmente, aceita-se que a alça de Henle é o elemento multiplicador no sistema de contracorrente e que o segmento delgado da alça é o multiplicador na medula interna.18 Pouca dúvida resta também de que o segmento delgado ascendente da alça é a fonte de NaCl responsável pelo aumento na concentração de NaCl desde a base da medula interna até a papila.18 A incerteza permanece em relação ao mecanismo de reabsorção do NaCl no segmento delgado ascendente: se ativo ou passivo. Nos últimos anos, vários modelos experimentais tentaram solucionar o problema, como os de
107
Stephenson,19 e ainda de Kokko e Rector.20,21 A descrição utilizada acima para o mecanismo de concentração do líquido tubular baseou-se no modelo de Kokko e Rector, que parte do pressuposto que não há um transporte ativo na medula interna (segmento delgado ascendente), no que diz respeito ao mecanismo de concentração.
FLUXO SANGUÍNEO MEDULAR Como já mencionamos, acredita-se que os vasa recta têm a função de remover o líquido absorvido nos ductos coletores e segmento descendente da alça de Henle. Naturalmente, o fluxo sanguíneo medular deve ser de tal ordem que os solutos do interstício não sejam excessivamente removidos, o que eliminaria o gradiente osmótico medular, tão importante na concentração urinária. Sabe-se, pois, que a concentração osmolar na ponta da papila é inversamente proporcional ao fluxo sanguíneo para esta área. A manutenção deste interstício hiperosmolar deve-se: a) a um baixo fluxo sanguíneo medular (apenas 5% do fluxo plasmático renal passam pela área medular e papilar); b) à presença dos vasa recta, responsáveis por um sistema de contracorrente trocador. A disposição anatômica da circulação capilar na medula tem todas as características de um sistema de contracorrente trocador. O princípio deste sistema, conhecido em termodinâmica, tem sido aplicado a sistemas biológicos e está ilustrado na Fig. 9.5. Suponhamos um tubo ao qual fornecemos água a 30°C e a um fluxo de 10 ml/min (Fig. 9.5 A). Esta água passa por uma fonte de calor e recebe 100 calorias por minuto. Logo, a água que sai do tubo está a uma temperatura de 40°C. A seguir, dobramos o tubo, introduzindo, portanto, um fluxo contracorrente no sistema e mantendo a fonte de calor no mesmo local (Fig. 9.5 B). O sistema é montado de tal maneira que o fluxo de saída passa próximo do fluxo de entrada, propiciando a troca de calor entre os dois fluxos (entrada e saída). Desta forma, a água aquecida (que está saindo) encontra a água fria (que está entrando) e perde calor para ela. Portanto, a temperatura da água que entra se eleva antes de atingir a fonte de calor. O processo continua até que se atinja um estado de equilíbrio. A temperatura máxima alcançada no sistema de contracorrente é maior que no fluxo retilíneo. As mesmas considerações são válidas para a adição de soluto em vez de calor (Fig. 9.5 C). O soluto (NaCl) é adicionado ao interstício e o equilíbrio entre os capilares se faz através do interstício. A finalidade deste sistema é facilitar ao máximo a transferência de uma molécula permeável entre canais adjacentes, evitando o movimento das moléculas ao longo desses canais. A arquitetura vascular da medula renal facilita a troca de água e solutos entre os vasa recta ascendentes e descendentes, minimizando a entrada de água e saída de soluto da medula renal da seguinte maneira22 (v. Fig. 9.6). 1. O sangue circula pelos vasa recta através do interstício medular, progressivamente mais hiperosmolar em dire-
108
Metabolismo da Água
Fig. 9.5 Princípios do sistema de contracorrente trocador. Observem que a temperatura máxima obtida no sistema de contracorrente (B) é maior que a obtida no sistema de fluxo linear (A). Em (C), representamos uma alça capilar em contato com o líquido intersticial. Notem que, no início (flechas), os sais de sódio penetram no capilar e, no final, retornam para o interstício (v. texto para uma explicação mais detalhada). (Modificado de Berliner R.W. e col.17)
ção à papila. A pressão hidrostástica transcapilar favorece a saída de líquido do capilar, e a pressão oncótica transcapilar favorece a entrada de líquido para o capilar. Como o sangue circula rapidamente, não há tempo para um equilíbrio osmótico entre o capilar e o interstício.
2. Como a concentração dos solutos no interstício é maior, a pressão osmótica transcapilar favorece a saída de água do capilar descendente, aumentando a concentração das proteínas plasmáticas. 3. Como os capilares são permeáveis a NaCl e uréia, e a concentração destes no interstício é maior que no capilar, eles entram no capilar descendente. 4. Quando o sangue atinge o capilar ascendente, a concentração de solutos no plasma excede a do interstício (que se torna progressivamente menos hiperosmolar em direção ao córtex), e os solutos, então, deixam o capilar. 5. Da mesma forma, a pressão oncótica (determinada pelas proteínas plasmáticas) está elevada quando o sangue atinge o capilar ascendente. A soma da pressão oncótica e da pressão osmótica (determinada pelos solutos não-protéicos) determina a entrada de líquido no capilar. 6. A quantidade de líquido que entra no capilar ascendente é maior que a quantidade de líquido removida do capilar descendente, e a diferença é igual ao volume de líquido reabsorvido no ramo descendente da alça de Henle e nos ductos coletores. 7. Em resumo, os vasa recta preservam os solutos e removem a água, mantendo a hiperosmolalidade da medula renal.
PAPEL DA URÉIA NO MECANISMO DE CONCENTRAÇÃO URINÁRIA Fig. 9.6 Sistema de contracorrente trocador pelos vasa recta. Pr proteína plasmática. O tamanho das letras dos solutos indica a concentração relativa de cada soluto com relação à sua localização na medula (v. texto para detalhes de funcionamento do sistema). Obtido de Jamison, R.L. e Maffly, R.H.22
A uréia é o produto final do metabolismo protéico nos mamíferos, sendo excretada quase unicamente pelos rins. Além da água e dos gases sanguíneos, a uréia é a substância mais difusível no organismo. Investigações passadas já haviam demonstrado que a presença de uréia era essencial para a obtenção de uma
109
capítulo 9
osmolalidade urinária máxima. Se um animal deficiente em proteínas recebia uréia, a capacidade de concentração urinária aumentava.
RECIRCULAÇÃO MEDULAR DA URÉIA 1. Uma quantidade mais ou menos constante de uréia é reabsorvida no túbulo proximal, independentemente do balanço de água. 2. No ducto coletor cortical (e, em algumas espécies, no túbulo coletor), sob a influência do hormônio antidiurético, a água é reabsorvida, o que determina um aumento da concentração intraluminal de uréia (Fig. 9.4). 3. No segmento medular interno-papilar do ducto coletor, a permeabilidade à uréia aumenta mesmo na ausência do HAD, o qual, quando presente, parece aumentar ainda mais esta permeabilidade. Desta forma, devido à diferença transtubular da concentração de uréia, esta se difunde para o interstício medular. 4. A uréia, então, torna a entrar no túbulo renal na pars recta do túbulo proximal ou ramo descendente de nefros superficiais e justamedulares. Como a alça delgada justamedular está numa região contendo uma alta concentração de uréia no interstício, mais uréia entra no nefro justamedular do que no superficial. Portanto, o fluxo de uréia que deixa o túbulo distal justamedular é maior do que o que deixa o nefro superficial.
Pontos-chave: • Quando existe déficit de água, os rins reabsorvem mais água pelo mecanismo de concentração urinária, estimulado pelo HAD • A concentração urinária depende da manutenção de uma medula renal hipertônica pelo mecanismo de contracorrente e recirculação de uréia
Diluição da Urina Não importa se a urina final será hiper- ou hipotônica: o líquido tubular que chega ao túbulo contornado distal será sempre hipotônico. Os ductos coletores (segmento cortical e medular interno-papilar) e o segmento distal do túbulo contornado distal são segmentos sensíveis à ação do HAD. Quando há uma redução ou cessação na liberação de HAD, estes segmentos tornam-se relativamente impermeáveis à água. Em conseqüência, no sistema coletor o líquido hipotônico permanece hiposmótico em relação ao plasma. No segmento medular interno-papilar do ducto coletor, ocorre reabsorção de água, pois o segmento ainda é permeável à água (embora menos) na ausência de HAD.
Devido à ausência de HAD, a permeabilidade à uréia do segmento medular interno-papilar do ducto coletor diminui; logo, a reabsorção de uréia também diminui. Além disso, como há redução geral na reabsorção de água, o gradiente transtubular de uréia também diminui (recorde-se que é a reabsorção de água dos segmentos pouco permeáveis à uréia que determina o aumento de sua concentração intratubular), e logo se reduz a recirculação medular do sistema coletor para a alça de Henle. E, como já foi exposto, a uréia exerce um papel fundamental no sistema de contracorrente. A capacidade de um indivíduo ingerir grande quantidade de água, sem desenvolver um excesso de água, traduz a capacidade renal de excretar grande quantidade de urina diluída. A osmolalidade mínima que pode ser alcançada pelo rim humano é de aproximadamente 50 a 60 mOsm/ kg, permitindo volumes de urina de 15 a 20 litros por dia. É necessário frisar alguns pontos importantes no mecanismo de diluição da urina e expor os conceitos de clearance osmolar e clearance de água livre. Baseando-se no que já foi exposto nas páginas precedentes, conclui-se que a formação e a excreção de uma urina diluída dependem de três fatores básicos: a) oferta adequada de líquido tubular ao segmento diluidor do nefro; b) reabsorção adequada de soluto no segmento diluidor do nefro; c) impermeabilidade do segmento diluidor do nefro à água. Se analisarmos a urina, veremos que ela está constituída por uma fase aquosa na qual vários solutos estão dissolvidos. Os solutos são ânions e cátions não-voláteis e os produtos do metabolismo nitrogenado. Se relacionarmos a concentração destes solutos na urina (ou seja, a osmolalidade urinária) com a osmolalidade plasmática, poderemos ter três tipos de tonicidade urinária: urina isotônica, hipotônica e hipertônica em relação ao plasma (v. Fig. 9.7). Foi Homer Smith quem originalmente considerou a urina como contendo dois volumes virtuais: um volume contendo uma quantidade de soluto excretado numa concentração igual à do plasma (isotônica) e um outro volume contendo água sem soluto.23 Quando se considera o fluxo urinário (ml de urina por minuto), o volume de urina que contém os solutos numa concentração igual à do plasma é denominado de clearance osmolar e o volume de urina sem solutos refere-se ao clearance de água livre. O termo clearance de água livre é errôneo, pois, na verdade, não indica a depuração de uma substância e não é calculado pela fórmula clássica U V/P, e sim pela fórmula: CH2O V Cosm Onde: CH2O clearance de água livre V volume de urina (fluxo urinário em ml/min) Cosm clearance osmolar
110
Metabolismo da Água
Fig. 9.7 Relação do clearance de água livre com a tonicidade da urina (v. texto). (Modificado de Hays, R.M. e Levine, S.D.33)
Considerando de outra maneira, podemos dizer que o clearance de água livre refere-se à quantidade de água livre (água sem solutos) que precisa ser adicionada ou retirada da urina para que a urina se torne isosmótica com o plasma. Observem na Fig. 9.7 B que, quando a urina é isotônica, isto é, tem a mesma concentração osmolar que o plasma, o clearance de água livre é zero. Já na urina hipotônica, o clearance de água livre é positivo e, na hipertônica, negativo. Costuma-se empregar a expressão TCH2O quando o clearance de água livre for negativo. A letra C indica que a reabsorção ocorre nos ductos coletores. Portanto, TCH2O CH2O. O clearance osmolar, que se refere ao volume de urina necessário para excretar todos os solutos urinários numa proporção isosmótica, é calculado através da fórmula clássica do clearance: Cosm
Uosm V Posm
Onde: Cosm osmolalidade urinária (mOsm/L) V fluxo urinário (ml/min) Posm osmolalidade plasmática (mOsm/L) Vejamos, nos dois exemplos seguintes, o cálculo do clearance osmolar e do clearance de água livre. 1. Calcular o Cosm de um paciente que apresenta osmolalidade plasmática de 300 mOsm/L, osmolalidade urinária de 100 mOsm/L e fluxo urinário de 5 ml/min: Cosm
100 5 1,66 ml/min 300
2. Calcular o clearance de água livre de um paciente cuja urina apresenta osmolalidade de 600 mOsm/L, osmolalidade plasmática de 300 mOsm/L e fluxo urinário de 1 ml/min: CH O 1 2
600 1 1 300
(significa urina hipertônica)
Interpretação do clearance osmolar e do clearance de água livre É óbvio que variações na ingesta e na excreção osmolar não causarão alterações na osmolalidade plasmática (pois a fração osmolar é sempre isosmótica). No entanto, para que a osmolalidade seja mantida, a fração de água livre ingerida deverá ser igual ao clearance de água livre. Se a ingestão de água livre exceder o clearance de água livre, haverá uma diminuição da osmolalidade plasmática. Fica claro, portanto, a importância do mecanismo renal de diluição da urina (excreção de água livre) na preservação da osmolalidade plasmática.
Pontos-chave: • A diluição urinária é resultado da impermeabilidade dos túbulos coletores à água na ausência de HAD • A excreção dos excessos de água é realizada através da elaboração de urina final diluída
111
capítulo 9
DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DA ÁGUA A integração do sistema sede-HAD-rim permite que mesmo com grandes variações na ingesta líquida a osmolalidade no organismo seja mantida mais ou menos constante. Quando há déficit de água, ocorre aumento da osmolalidade no organismo, a qual estimula a sede e a liberação de HAD; esta altera a permeabilidade do epitélio do ducto coletor, permitindo maior conservação de água. Na presença de excesso de água, ocorre o inverso: hiposmolalidade, ausência de sede e menor liberação de HAD e conseqüente menor permeabilidade à água no ducto coletor, causando, portanto, maior diurese. Daí se deduz que alterações no mecanismo de concentração e diluição da urina provocam distúrbios no metabolismo da água, que são a hipernatremia e a hiponatremia. É importante também relembrar que os distúrbios do metabolismo da água estão relacionados a alterações na osmolalidade plasmática e são evidenciados pela dosagem do sódio plasmático, o qual estará concentrado ou diluído no plasma, de acordo com a água corporal total do indivíduo. Já os distúrbios do metabolismo do sódio são verificados pela avaliação do estado do espaço extracelular, através do exame físico (v. Caps. 8 e 10).24 O termo desidratação refere-se à perda de água que leva a uma elevação do sódio plasmático e a um déficit de água intracelular devido ao movimento de água das células para o líquido extracelular. Já o termo depleção de volume se refere à diminuição do espaço extracelular devido à perda de sódio e água, como ocorre, por exemplo, nas diarréias.24,25
DÉFICIT DE ÁGUA — HIPERNATREMIA — ESTADO HIPEROSMOLAR Hipernatremia ocorre quando a concentração plasmática de sódio encontra-se acima de 145 mEq/L. A hipernatremia é um dos distúrbios eletrolíticos mais comuns em pacientes hospitalizados. Chega a ser preocupante que, nesta população, uma importante causa de hipernatremia é a iatrogenia, por reposição inadequada das perdas em pacientes com acesso restrito à água.26 Um déficit de água no organismo é acompanhado por um aumento na concentração plasmática de sódio. Como já foi abordado no Cap. 8, o sódio é o principal íon determinante da osmolalidade no compartimento extracelular, de forma que a hipernatremia tem grande importância clínica, por sua associação com hiperosmolaridade e conseqüentes efeitos sobre o conteúdo celular de água. A hipernatremia é a principal causa de hiperosmolaridade. Uma série de adaptações ocorre em todo o organismo para minimizar o efeito da hiperosmolaridade sobre a es-
trutura e a função da célula, especialmente no cérebro. Os sintomas de hiperosmolaridade aparecem quando estes mecanismos de adaptação são ultrapassados.27 A membrana celular é de modo geral altamente permeável à água, o que torna o volume intracelular muito suscetível às variações da osmolaridade do extracelular. A hiperosmolalidade induz um movimento de água do intracelular para o extracelular, reduzindo o volume celular. Esta alteração no volume celular leva a mudanças no volume e função celulares. Por razões anatômicas, o cérebro é especialmente vulnerável às alterações no volume celular. Reduções agudas no volume cerebral podem levar a uma separação entre o cérebro, as meninges e o crânio, com ruptura de vasos sanguíneos e hemorragia. Porém, no cérebro, os astrócitos são capazes de restaurar o volume cerebral ao normal após transtornos osmóticos. No caso da hipernatremia, após algum tempo estas células respondem com um aumento na concentração intracelular de vários solutos osmoticamente ativos, incluindo o sódio, o potássio, o cloro. Além destes, progressivamente há acúmulo também dos chamados osmóis idiogênicos, que incluem aminoácidos (glutamato, glutamina, taurina, ácido gama-aminobutírico), creatina, fosfocreatina, mioinositol e glicerofosforilcolina. Na hipernatremia aguda, por não ter havido tempo suficiente para o acúmulo destas substâncias, que manteriam o volume celular, é mais provável ocorrer variação do volume celular cerebral, com manifestações clínicas importantes. Na hipernatremia crônica, estes osmóis acumulados no interior das células levam à manutenção do volume celular, com menor sintomatologia.27 Os outros mecanismos de adaptação à hipernatremia são a liberação de HAD e a ativação do mecanismo da sede.27 Normalmente, o centro da sede é muito sensível mesmo a pequenos aumentos da osmolalidade, da ordem de 1 a 2%. Porém, mesmo que o mecanismo da sede seja ativado, muitos pacientes podem não expressar a sede adequadamente ou não ter acesso à água. Isto é observado em crianças pequenas e adultos com alterações do nível de consciência, principalmente idosos. Além disso, a capacidade de concentração urinária e conservação de água diminuem com a idade, e, nos idosos, a osmolalidade urinária máxima pode ser de apenas 500-700 mOsm/kg.28-30 Então, vários fatores tornam estes indivíduos mais propensos ao desenvolvimento de hipernatremia significativa.
Pontos-chave: • Hipernatremia é diagnosticada com concentração plasmática de sódio maior que 145 mEq/L • Hipernatremia produz hiperosmolalidade, uma vez que o sódio é o principal determinante da osmolalidade plasmática
112
Metabolismo da Água
Fig. 9.8 Relação entre a osmolalidade plasmática e a ingesta e excreta osmolar e de água livre. Como a fração osmolar é sempre uma fração isotônica, não há alterações na osmolalidade plasmática quando se modifica a ingesta ou excreta da fração osmolar. No entanto, variações na ingesta ou excreta de água livre modificam a osmolalidade plasmática. (Baseado no diagrama de Hays, R.M. e Levine, S.D.33)
Causas de Hipernatremia e Estado Hiperosmolar No Quadro 9.1 podem ser observadas as principais causas de hipernatremia. Uma abordagem também bastante didática se baseia na determinação do estado do espaço extracelular nos pacientes com hipernatremia, agrupando as causas mais prováveis do distúrbio de acordo com a volemia do paciente e o sódio urinário31 (v. Quadro 9.10). A hipernatremia é uma das causas de estado hiperosmolar, o qual pode também ser ocasionado por uréia, glicose e etanol.
HIPERNATREMIA COM HIPOVOLEMIA Hipernatremia com depleção do espaço extracelular e hipovolemia pode ser decorrente de perdas extra-renais ou
Quadro 9.1 Causas de hipernatremia Perda de água • Perdas insensíveis (respiração e sudorese) • Hipodipsia • Diabetes insipidus central • Diabetes insipidus nefrogênico Perda de fluido hipotônico • Perdas renais • Diurese osmótica • Diuréticos de alça • Fase poliúrica de NTA • Diurese pós-obstrutiva • Perdas gastrintestinais • Vômitos, sondagem nasogástrica • Diarréia • Catárticos osmóticos • Perdas cutâneas • Queimaduras Sobrecarga de sódio • Administração de soluções hipertônicas de sódio • Enemas ricos em sódio • Hiperaldosteronismo primário • S. de Cushing
renais de fluidos hipotônicos.31 Há uma perda concomitante de água e sódio, embora haja proporcionalmente uma maior perda de água. Clinicamente, observam-se sinais de contração de volume: veias jugulares invisíveis, hipotensão ortostática, taquicardia, pobre turgor da pele e mucosas secas. Devido à hemoconcentração, o hematócrito e as proteínas plasmáticas estão elevados. Perdas extra-renais podem ser decorrentes de sudorese excessiva ou diarréia, particularmente em crianças. Em alguns tipos de diarréia, principalmente nas osmóticas, ocorre perda de fluido hipotônico em relação ao plasma, provocando aumento na concentração plasmática de sódio. Isto pode ser observado também em crianças em que o fluido de reposição é hipertônico. Como resposta às perdas, os rins são estimulados a conservar água e sódio, a urina mostra-se hipertônica e a concentração urinária de sódio é baixa, menor que 20 mEq/L.31 Por sua vez, perda de fluidos hipotônicos pelos rins pode ser observada durante a diurese osmótica, como ocorre na administração de manitol e no paciente diabético descompensado, com glicosúria. A glicosúria é a principal causa de diurese osmótica em pacientes ambulatoriais. Não se evidencia conservação renal de água e sódio, pois a urina é justamente a fonte de perda. A urina pode ser isoou hipotônica e o sódio urinário é maior que 20 mEq/L. Em pacientes hospitalizados, outras causas de diurese osmótica são encontradas: alimentação hiperprotéica (a uréia age como agente osmótico); expansão do volume por solução salina e liberação de obstrução urinária bilateral. A osmolalidade urinária nestas situações está geralmente acima de 300 mOsm/kg, ao contrário da urina diluída da diurese aquosa. Além do mais, a excreção de solutos (produto da urina de 24 h volume osmolalidade) é normal na diurese aquosa (600-900 mOsm/kg/dia) e aumentada na diurese osmótica.
HIPERNATREMIA COM HIPERVOLEMIA Esta categoria de hipernatremia é pouco freqüente. Geralmente ocorre em pacientes que receberam grandes quantidades de cloreto ou bicarbonato de sódio hipertônico. Ao exame físico há sinais do excesso de extracelular,
113
capítulo 9
como congestão pulmonar e ingurgitamento dos vasos do pescoço.31
HIPERNATREMIA COM VOLEMIA APARENTEMENTE NORMAL Este é o tipo mais freqüente de hipernatremia, e se deve a perdas de água sem eletrólitos. Ao exame, o espaço extracelular pode ser considerado normal. Devido à permeabilidade das membranas celulares à água, um terço da água perdida provém do extracelular, e dois terços, do intracelular. É por isso que a principal conseqüência da perda de água é a hipernatremia, e não a depleção do extracelular.31 Hipernatremia com volemia normal pode ser decorrente de perdas insensíveis pelo suor e respiração, que, se não forem apropriadamente repostas, elevam a concentração plasmática de sódio. Estas perdas em geral somam 0,6 ml/ kg/hora, mas aumentam muito nas queimaduras, febre, taquipnéia e exercícios intensos.32 É causada principalmente por distúrbios que prejudicam os mecanismos normais de conservação renal de água, por baixa concentração plasmática de hormônio antidiurético (diabetes insipidus pituitário ou central) ou por comprometimento da resposta renal a níveis máximos de HAD (diabetes insipidus nefrogênico). Se a perda líquida for através da pele e do trato respiratório, a urina será hipertônica. A quantidade de sódio urinário é variável e reflete a ingesta diária. Se a perda líquida for de origem renal (diabetes insipidus central ou nefrogênico), a urina será hipotônica, e a quantidade de sódio urinário, também variável.
Ponto-chave: • Hipernatremia pode cursar com espaço extracelular normal, diminuído ou aumentado Diabetes insipidus (DI) pituitário ou central Caracteriza-se por uma alteração central na síntese ou secreção de HAD, limitando a capacidade renal de concentrar a urina e causando graus variados de poliúria e polidipsia. A falta de HAD pode ser induzida por distúrbios em um ou mais locais de secreção do HAD: osmorreceptores hipotalâmicos, núcleos supra-óticos ou paraventriculares; ou a porção superior do trato supra-ótico hipofisário. Por outro lado, lesão do trato abaixo da eminência média ou da parte posterior da hipófise produz apenas uma poliúria transitória. Nestes casos, o HAD produzido no hipotálamo ainda pode ser secretado na circulação sistêmica através dos capilares portais da eminência média. CAUSAS. As cirurgias de hipófise, tumores supra-selares e traumatismo craniano são causas de DI central33 (v. Quadro 9.2). As neoplasias primárias ou secundárias do
Quadro 9.2 Causas de diabetes insipidus pituitário Pós-hipofisectomia Idiopático Pós-traumático Tumores supra- e intra-selares — metastático (pp. mama) craniofaringioma pinealoma Cistos Histiocitose Granulomas — tuberculose, sarcoidose Vasculares — aneurismas, trombose, síndrome de Sheehan Infecciosas e imunológicas — meningite, encefalite síndrome de Guillain-Barré
cérebro, que envolvam a região pituitário-hipotalâmica, podem cursar com DI central. Isto ocorre mais freqüentemente com metástases de câncer de pulmão, leucemia ou linfoma. A incidência de DI varia com a extensão da lesão: 10-20% na remoção transesfenoidal de adenoma hipofisário restrito à cela e até 60-80% nos casos de grandes tumores que requerem hipofisectomia total. Alguns pacientes apresentam um padrão trifásico de polidipsia-poliúria no pós-operatório: na primeira fase, imediata à cirurgia, os pacientes apresentam polidipsia-poliúria; segue-se a segunda fase, caracterizada por quatro a cinco dias de antidiurese; e, após vários dias, uma terceira fase, na qual a poliúria reaparece. Acredita-se que, na primeira fase, ocorra uma lesão aguda dos núcleos hipotalâmicos e que, portanto, não haja síntese e liberação de vasopressina. Já a segunda fase ocorreria devido à liberação de vasopressina pelo tecido neuro-hipofisário necrosado. Nesta fase, entre os dias 6 e 11, ingestão excessiva de água pode causar hiponatremia. Pacientes com lesões menos graves podem ter um DI central transitório que começa 24-48 horas depois da cirurgia e melhora em uma semana. Além disto, nem todos os pacientes passam pelas três fases. É importante frisar que a maioria dos casos de poliúria após neurocirurgia não são decorrentes de DI central, mas devidos a um excesso de líquidos durante a cirurgia e diurese osmótica pelo uso de manitol e corticosteróides para minimizar o edema cerebral (que podem causar hiperglicemia e glicosúria). A diferenciação pode ser feita pela osmolalidade urinária, resposta à restrição de água e administração exógena de HAD. Aproximadamente 30% dos casos de DI central são de natureza idiopática, por um processo auto-imune com inflamação linfocítica da haste hipofisária e da parte posterior. Uma causa mais rara é o diabetes insipidus central familiar, habitualmente transmitido como um traço autossômico dominante. O DI central familiar parece estar associado a uma mutação do gene que controla a síntese de HAD: preprovasopressina-neurofisina II. O precursor não é clivado em HAD, acumulando-se localmente e causando a morte de células produtoras de HAD.
114
Metabolismo da Água
A encefalopatia hipóxica (ou isquemia grave, como ocorre na parada cardiocirculatória ou choque) causa uma diminuição da liberação de HAD. A gravidade do defeito pode ser variável, desde uma discreta e assintomática poliúria até uma forma mais evidente. Exemplo: síndrome de Sheehan, onde a secreção de HAD é subnormal, mas a manifestação clínica é discreta. Após um quadro de taquicardia supraventricular pode ocorrer poliúria transitória devido à liberação aumentada do fator atrial natriurético e secreção diminuída de HAD. As alterações hormonais parecem ocorrer devido à ativação de receptores locais de volume devido ao aumento da pressão no átrio esquerdo e da pressão sistêmica. Na anorexia nervosa a liberação de HAD é subnormal ou errática, talvez devido à disfunção cerebral. É um defeito geralmente discreto, e quando ocorre poliúria, esta é decorrente do aumento na sede.
Quadro 9.4 Causas de diabetes insipidus nefrogênico Congênito Adquirido Nefropatia crônica Doença policística Doença cística medular Amiloidose Pielonefrite Uropatia obstrutiva Anemia de células falciformes Distúrbios eletrolíticos (hipercalcemia, hipocalemia) Alterações na dieta — redução na ingesta de proteína e sódio — ingestão crônica excessiva de água Agentes farmacológicos: lítio, metoxiflurano, demeclociclina etc.
Diabetes insipidus nefrogênico Refere-se à diminuição da capacidade de concentração urinária que resulta da resistência à ação do HAD. Isto pode refletir uma resistência no local de ação do HAD nos ductos coletores ou interferência com o mecanismo contracorrente devido à lesão medular ou diminuição na reabsorção de NaCl no segmento medular espesso ascendente da alça de Henle. CAUSAS. As principais causas de DI nefrogênico estão agrupadas no Quadro 9.4. O diabetes insipidus nefrogênico hereditário é um distúrbio infreqüente que resulta em graus variados de resistência ao HAD. Há dois receptores diferentes para o HAD: os receptores V1 e V2. Ativação dos receptores V1 induz va-
Quadro 9.3 Diferenciação de distúrbios poliúricos por desidratação e administração exógena de vasopressina
Normal (N = 9) Diabetes insipidus (N = 18) Diabetes insipidus incompleto (N = 12) Polidipsia primária (N = 7)
Uosm antes*
Uosm depois**
1,067 ± 68,7
987,0 ± 79,4
168 ± 13,0
445,0 ± 52,0
437 ± 33,6
548,0 ± 28,2
738 ± 52,9
779,8 ± 73,1
Modificado de Berl, T. e cols.29 após adaptação do trabalho de Miller, M. e cols.38 N indica o número de casos estudados em cada grupo. Uosm osmolalidade urinária. *antes — ao término do período de privação líquida e antes de receber vasopressina. **depois — após a administração de vasopressina.
soconstrição e aumento da liberação de prostaglandinas, enquanto receptores V2 se relacionam a resposta antidiurética, vasodilatação periférica e liberação do fator VIII e fator de von Willebrand das células endoteliais. A transmissão é ligada ao sexo (X-linked). Como a mutação é no receptor V2, estão comprometidas as respostas antidiuréticas, vasodilatadoras e do fator de coagulação, enquanto os efeitos vasoconstritores e nas prostaglandinas estão intactos. A herança ligada ao sexo significa que os homens têm marcada poliúria e as mulheres variam de um estado portador a uma importante poliúria. Recentemente uma forma autossômica recessiva foi descrita na qual o receptor V2 está intacto, assim como as respostas sobre a vasodilatação e a coagulação; o defeito está nos “canais de água” coletores (chamados aquaporina-2). Estes canais normalmente armazenados no citosol, sob influência do HAD, movem-se e se fundem com a membrana luminal, permitindo a reabsorção de água. O diabetes insipidus nefrogênico adquirido é mais comum que o congênito e também menos grave, porque a capacidade renal de concentrar a urina até a osmolalidade do plasma está preservada. Assim, a polidipsia e a poliúria são moderadas: 3-5 litros por dia. As principais causas de DI nefrogênico são abordadas a seguir. As nefropatias crônicas podem causar DI nefrogênico, com comprometimento da capacidade renal de concentração máxima da urina (geralmente quando a TFG for menor que 60 ml/min). Embora se possa encontrar hipostenúria (osmolalidade urinária menor que a plasmática) em nefropatias crônicas avançadas, uma poliúria sintomática é rara. No entanto, a evidência mais precoce e mais grave deste comprometimento na concentração urinária ocorre em enfermidades que afetam a região medular e papilar do rim, tais como: doença policística, doença cística medular, amiloidose, pielonefrite, uropatia obstrutiva, anemia de células falciformes, etc. As causas deste defeito na con-
115
capítulo 9
centração urinária são múltiplas: destruição na medula renal das inter-relações anatômicas entre a alça de Henle, vasa recta e ducto coletor; talvez a presença de toxinas urêmicas na circulação, que antagonizam a ação da vasopressina, e a diurese osmótica a que são submetidos os nefros remanescentes. Alterações na dieta podem causar diabetes insipidus nefrogênico. Em reduções crônicas na ingesta protéica, a concentração máxima da urina está comprometida, e isto parece estar relacionado com a menor formação de uréia, que representa mais ou menos 50% da tonicidade do interstício medular. Da mesma forma, a restrição de sódio compromete o mecanismo de concentração, pois o primeiro passo no mecanismo de contracorrente multiplicador é a reabsorção ativa de cloro (e passiva de sódio) no segmento espesso ascendente da alça de Henle. A restrição de cloreto de sódio resulta num aumento da reabsorção proximal destes íons, e, portanto, a quantidade que chega à alça de Henle é menor. Por fim, a ingestão crônica de excessos de água, como ocorre nos bebedores compulsivos de água (polidipsia primária), reduz a tonicidade do interstício medular e compromete a capacidade de concentração máxima da urina 34 (v. Quadro 9.4). Alguns distúrbios eletrolíticos também são causa de diabetes insipidus nefrogênico. Entre eles, a hipercalcemia e a hipocalemia. O mecanismo pelo qual a hipercalcemia compromete a concentração urinária ainda não está esclarecido. A deposição de cálcio na medula renal e a contração de volume que geralmente acompanha a hipercalcemia são fatores a considerar. Uma ação direta a nível celular alterando o equilíbrio osmótico também tem sido considerada. O defeito na concentração torna-se clinicamente aparente quando a concentração plasmática de cálcio está persistentemente acima de 11 mg/dl. Com concentração plasmática de potássio persistentemente abaixo de 3 mEq/L, há indícios de que ocorre redução da reabsorção de NaCl no segmento ascendente espesso da alça de Henle e uma menor resposta do túbulo coletor ao HAD. Tanto na hipercalcemia como na hipocalemia, o defeito no mecanismo de concentração é discreto, e, para explicarem a ingesta líquida superior às vezes a 3-5 litros, alguns autores sugerem um efeito destes eletrólitos no mecanismo da sede. Uma outra causa de DI nefrogênico é a anemia de células falciformes, em que há uma tendência das hemácias em adquirir a forma de foice no ambiente hipertônico e de baixa tensão de oxigênio na medula renal. Esta alteração na forma das hemácias compromete a circulação dos vasa recta e causa edema e infartos da papila renal, ocasionando a incapacidade de concentrar adequadamente a urina. Existem drogas que interferem com a ação renal do HAD, prejudicando a reabsorção de água. Entre estas drogas, destacamos o lítio, a dimetilclortetraciclina, o metoxifluorano e as sulfoniluréias. O lítio é uma droga muito usada em psiquiatria no manejo de psicose maníaco-depressiva. Aparentemente esta droga inibe a ação da
vasopressina na formação de adenosina-monofosfato cíclico (cAMP) e induz poliúria reversível.35 Pacientes com acne tratados com doses altas de dimetilclortetraciclina (demeclociclina) podem apresentar poliúria e polidipsia.36 Esta droga inibe a ação da vasopressina, possivelmente através de uma interferência na geração e ação de cAMP. Ela também se liga a uma proteína específica da célula epitelial, que é importante na ação do HAD. O metoxifluorano é um agente anestésico que pode causar diabetes insipidus nefrogênico por induzir redução da permeabilidade do ducto coletor ou diminuição da tonicidade do interstício medular.37 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DO DI CENTRAL E NEFROGÊNICO. Além da poliúria, noctúria e da polidipsia que pode chegar a 15 litros ao dia, a maior parte dos pacientes portadores de DI central apresenta níveis de sódio plasmático normal ou pouco aumentado, uma vez que o mecanismo da sede está intacto, repondo pelo menos parcialmente a perda de água. Porém, pode ocorrer hipernatremia no DI central em que o paciente não tenha acesso à água ou que tenha seu mecanismo da sede alterado. Com o tempo, pode ocorrer grande dilatação vesical e dos ureteres, a ponto de não haver mais noctúria. Além disso, outras manifestações decorrem da doença de base.
Pontos-chave: • Diabetes insipidus central é causado por alteração da produção e/ou liberação do HAD • Diabetes insipidus nefrogênico decorre da insensibilidade renal ao HAD DIAGNÓSTICO DO DI CENTRAL, NEFROGÊNICO E OUTRAS FORMAS DE POLIÚRIA. Além da poliúria, polidipsia e hipernatremia com volemia normal, no diabetes insipidus central a densidade da urina é bastante baixa (1,001-1,005), embora formas parciais de DI, na vigência de desidratação intensa, possam formar urina hipertônica. Há alguns testes para o diagnóstico de DI, como a restrição de água, administração de solução salina hipertônica e administração exógena de hormônio antidiurético, como veremos a seguir. A restrição simples de água é o teste mais utilizado e determina a capacidade de o paciente elaborar HAD em resposta à hipertonicidade do plasma. O paciente é pesado e, a seguir, restringe-se a água por 12-16 horas ou até que ele perca 3-5% do peso corporal. Cada amostra de urina é coletada para determinação do volume e densidade urinária e/ou osmolalidade. Um indivíduo normal reduz o volume urinário para menos de 0,5 ml/min e aumenta a osmolalidade urinária (superior a 800 mOsm/kg). O paciente com DI mantém um alto volume urinário e uma osmolalidade urinária em torno de 200 mOsm/kg. Alguns
116
Metabolismo da Água
autores preferem um teste mais curto (6-8 horas) e comparam a osmolalidade sérica e urinária inicial com a final. Um longo período de restrição líquida deve ser evitado devido ao risco de depleção de volume e hipernatremia, e alguns autores sugerem períodos de restrição de água de apenas 2-3 horas. O volume e a osmolalidade urinária são determinados a cada hora, e o sódio plasmático, a cada 2 horas. Com a administração de solução salina hipertônica (300 ml de NaCl a 5%), ocorre aumento da osmolalidade plasmática e, nos indivíduos normais, há uma liberação de HAD e conseqüente redução do volume urinário. Este teste não tem sido utilizado de rotina. O aumento da osmolalidade plasmática em indivíduos normais conduz a uma elevação progressiva da liberação do HAD e, portanto, da osmolalidade urinária. Quando a osmolalidade plasmática atinge 295-300 mOsm/kg (normal 275-290 mOsm/kg), a ação endógena do HAD no rim é máxima. Neste ponto, administrar HAD não eleva a osmolalidade urinária, a menos que haja um problema central na liberação de HAD, ou seja, DI central. O teste de restrição da água continua até que a osmolalidade urinária atinja um nível normal (acima de 600 mOsm/kg), indicando liberação e ação intactas do HAD, a osmolalidade urinária fique estável em duas medidas consecutivas, apesar de um aumento na osmolalidade plasmática, ou se a osmolalidade plasmática exceder 295-300 mOsm/kg. Nestas duas últimas situações, administra-se HAD exógeno (10 mg de DDAVP por spray nasal). Monitora-se o volume e a osmolalidade urinária. Os padrões de resposta à restrição de água e à administração de DDAVP são distintos, dependendo da causa do DI.29,38 No DI central, que é geralmente parcial, a liberação de HAD e a osmolalidade urinária podem aumentar com o aumento da osmolalidade plasmática. Porém, como a liberação de HAD é inadequada, a concentração urinária obtida não é máxima, e neste caso o HAD exógeno leva a um aumento da osmolalidade urinária e queda no débito urinário. No DI nefrogênico a restrição de água causa elevação submáxima na osmolalidade urinária. O aumento da osmolalidade plasmática estimula a liberação de HAD, mas como os pacientes com DI nefrogênico de modo geral são parcialmente resistentes ao HAD, pode haver um aumento pequeno na osmolalidade urinária. A administração de HAD exógeno também pode aumentar a osmolalidade urinária. Na polidipsia primária, a restrição de água aumenta a osmolalidade urinária. Como a liberação de HAD está normal, não há resposta ao HAD exógeno. A capacidade de concentração urinária está diminuída, pois a poliúria e a polidipsia crônicas retiram solutos da medula renal, diminuindo o gradiente intersticial medular.39 Talvez no futuro os resultados do teste de restrição à água e administração de HAD possam ser confirmados
pela medida da excreção urinária de aquaporina-2, que é o “canal de água” do túbulo coletor. A excreção de aquaporina-2 aumenta muito após a administração de HAD em indivíduos normais e naqueles com DI central, podendo ser usada como um índice da ação deste hormônio no rim.39,40
Ponto-chave: • Ο diagnóstico diferencial entre diabetes insipidus central, nefrogênico e outras formas de poliúria é realizado através da história clínica e dos testes de restrição de água, infusão de salina hipertônica e administração de HAD TRATAMENTO DO DI CENTRAL. O tratamento do DI central visa a diminuição do débito urinário, através do aumento na atividade do HAD e reposição adequada das perdas líquidas. O DI central é tratado com a administração do hormônio antidiurético (HAD) ou com o uso de outros medicamentos não-hormonais.41 Atualmente, está disponível a desmopressina (DDAVP), que tem efeito antidiurético potente, sem efeito vasopressor. A desmopressina é apresentada na forma líquida e pode ser utilizada pela via intranasal, aplicada através de um pequeno tubo plástico ou na forma de spray. Inicia-se com dose de 5 µg à noite; dependendo dos efeitos sobre a noctúria, a dose pode ser aumentada em 5 µg e depois acrescentadas doses diurnas. Nos EUA está disponível uma apresentação oral de DDAVP, mas que tem potência de apenas 10-20% da forma nasal.41 O risco da administração do DDAVP é a retenção de água e hiponatremia, já que, sob o efeito desta droga, o paciente é incapaz de excretar normalmente a água ingerida. Para os pacientes que têm resposta incompleta à desmopressina, pode ser necessário acrescentar drogas que aumentem a liberação de ADH, aumentem o efeito do ADH no rim (em DI central parcial) ou diminuam o débito urinário de maneira independente do HAD. Entre estas drogas, podem ser utilizadas a clorpropamida, clofibrato, acetaminofen e tegretol, diuréticos tiazídicos e antiinflamatórios não-hormonais. A clorpropamida é uma droga utilizada no manejo de diabetes mellitus, mas também é eficaz no tratamento do DI central. Esta droga é capaz de reduzir o volume urinário e elevar a osmolalidade urinária em pacientes portadores de DI central. Acredita-se que potencialize os efeitos do HAD circulante, talvez sensibilizando o túbulo renal à ação da HAD. Ainda não está esclarecido se a clorpropamida tem uma ação central (estimulando a liberação de HAD). Após o diagnóstico, administram-se 250 mg de clorpropamida uma ou duas vezes ao dia, e o efeito será observado entre o terceiro e o sétimo dia após a administração. Ela não é
117
capítulo 9
efetiva na forma nefrogênica do DI e é menos efetiva quanto mais grave for o DI. O maior problema é a hipoglicemia que causa, sobretudo em crianças. O clofibrato (droga usada no tratamento de dislipidemias) parece aumentar a secreção pituitária de vasopressina e não possuir nenhuma ação sensibilizante ao nível de túbulo renal. Por não ter efeitos colaterais (como a hipoglicemia da clorpropamida), pode ser utilizado no manejo do DI parcial. A dose de 500 mg cada 6 horas pode reduzir a poliúria em DI central. A carbamazepina (usada no tratamento da epilepsia) parece aumentar a resposta tubular ao HAD. A carbamazepina é utilizada numa dose de 100 a 300 mg duas vezes ao dia. A clorpropamida, clofibrato e carbamazepina podem reduzir o débito urinário no DI central em até 50%.41 A indução de discreta depleção de volume com uma dieta baixa em sódio e diuréticos tiazídicos (hidroclorotiazida, 25 mg uma ou duas vezes ao dia) são medidas eficazes no tratamento do DI, reduzindo o débito urinário em cerca de 50%. A hipovolemia induzida aumenta a reabsorção proximal de água e sódio, reduzindo assim a oferta de água aos locais HAD-sensíveis dos ductos coletores.41 Os antiinflamatórios não-hormonais (principalmente o ibuprofeno) causam inibição da síntese de prostaglandinas renais, e isto aumenta a capacidade de concentração urinária, já que as prostaglandinas normalmente antagonizam a ação do HAD. Podem reduzir o débito urinário em 2550%.41 TRATAMENTO DO DI NEFROGÊNICO. O tratamento se dirige à correção da doença de base e à diminuição da poliúria. Os pacientes com DI nefrogênico não se beneficiam da administração de HAD ou drogas que aumentem sua secreção ou resposta renal, pois o defeito é justamente uma resistência renal (parcial ou completa) ao HAD. Ao invés disso, apresentam efeitos favoráveis no tratamento do DI nefrogênico: diuréticos tiazídicos, antiinflamatórios nãohormonais e dieta hipossódica e baixa em proteínas. Como já mencionado, os diuréticos tiazídicos induzem uma depleção do extracelular, aumentando a reabsorção proximal de sódio e água, com isso diminuindo a oferta de água aos locais sensíveis ao HAD nos túbulos coletores. Esta resposta é potencializada com o uso concomitante de amiloride ou outro diurético poupador de potássio. Os diuréticos de alça induzem uma resistência relativa ao ADH e não devem ser usados.42 Os antiinflamatórios não-hormonais apresentam no DI nefrogênico os mesmos efeitos já discutidos com relação ao tratamento do DI central. O débito urinário no DI nefrogênico pode ainda ser reduzido com a utilização de uma dieta com pouco sal e pouca proteína, que induz uma diminuição na excreção de solutos (sal e uréia) e no volume de água necessário para excretá-los. Para os pacientes com DI nefrogênico parcial, talvez a utilização de níveis suprafisiológicos de HAD possa au-
mentar a resposta renal a este hormônio. Dessa forma, a desmopressina pode ser utilizada em pacientes com poliúria persistente após a utilização das outras medidas.
Pontos-chave: • Ο princípio do tratamento do diabetes insipidus central é a utilização de análogos do HAD (DDAVP). Também são úteis: clorpropamida, clofibrato, acetaminofen, carbamazepina, tiazídicos e antiinflamatórios não-hormonais • No diabetes insipidus nefrogênico, recomenda-se dieta com baixo teor de sal e proteínas, e o uso de tiazídicos e antiinflamatórios não-hormonais
Manifestações Clínicas de Hipernatremia As manifestações clínicas de um estado hiperosmolar dependem da existência ou não de alterações no volume dos compartimentos líquidos. Isto, por outro lado, depende de a substância que determina o estado hiperosmolar ter livre acesso à água intracelular. O estado hiperosmolar pode ser classificado em dois grupos: devido à substância com fácil acesso à água intracelular (uréia, etanol) e devido ao acúmulo de solutos habitualmente excluídos do compartimento intracelular (glicose, sódio).43 Como já mencionamos, a hipernatremia é uma das causas mais importantes de estado hiperosmolar. Como a uréia é altamente difusível, alterações na concentração plasmática de uréia não são acompanhadas de mudanças no volume dos compartimentos líquidos. Apenas quando é administrada rapidamente e em grandes doses, a uréia pode causar um gradiente osmótico transcelular e produzir mudanças nos compartimentos líquidos. A ingestão de etanol é uma causa comum de hiperosmolalidade, mas, da mesma forma que a uréia, tem fácil acesso à água intracelular e, portanto, não causa mudanças no volume dos compartimentos líquidos. Apenas o álcool etílico pode causar um aumento da osmolalidade de significação clínica, pois cada 100 mg/100 ml elevam a osmolalidade em 22 mOsm/L. A glicose, por sua vez, é uma substância osmoticamente ativa, pois atravessa as membranas celulares muito lentamente. Diabetes mellitus e diálise peritoneal com glicose hipertônica são situações clínicas comuns de hiperosmolalidade plasmática. Durante a fase inicial de descompensação do diabetes mellitus, ocorre hiperglicemia sem glicosúria, enquanto o limiar renal de excreção da glicose não foi excedido. Esta hiperglicemia inicial causa um aumento da osmolalidade plasmática, e o desvio da água do compartimento intracelular para o extracelular torna os dois com-
118
Metabolismo da Água
partimentos isosmóticos. O resultado final é um aumento da osmolalidade nos dois compartimentos, aumento do volume do compartimento extracelular e hiponatremia devido à diluição do sódio no extracelular pela água proveniente do compartimento intracelular. Na segunda fase de descompensação do diabetes mellitus, a hiperglicemia excede o limiar de excreção renal e aparece a glicosúria. Nesta fase ocorre uma diurese osmótica, com grandes perdas urinárias de água e cloreto de sódio e conseqüente contração do volume plasmático. No coma diabético hiperglicêmico não-cetótico, a depleção de água pode ser tão grande que, apesar da hiperglicemia (1.000 mg/100 ml), o sódio plasmático está normal ou elevado. O organismo reage à contração do volume plasmático, desviando líquido do interstício e, mais importante, desviando líquido das células para expandir o compartimento extracelular. A água intracelular sai, acompanhada de eletrólitos (K, Cl , HPO4), para que a isosmolalidade transcelular seja mantida. O manejo desses pacientes requer, além da administração de insulina, a administração de líquidos e eletrólitos. Se a osmolalidade inicial não for muito elevada, administra-se solução salina isotônica, a fim de restaurar o volume plasmático. Particular atenção deve ser dada à reposição de potássio, pois, mesmo na presença de hipercalemia, a administração de insulina e líquido é seguida de rápida queda na concentração plasmática de potássio. Quando a osmolalidade plasmática inicial for muito elevada, recomenda-se a administração de uma solução salina hipotônica (NaCl a 0,45%). O sódio tem um acesso limitado ao compartimento intracelular, e o estado hiperosmolar que acompanha a hipernatremia reflete um déficit de água total, sobretudo da água intracelular. Este déficit de água pode ser acompanhado de um déficit de sódio, mas sempre em menor quantidade que a perda de água29 (v. Quadros 9.6 e 9.10). Além da associação com hipovolemia, também é possível encontrar hipernatremia com volemia normal ou aumentada. É necessário avaliar o espaço extracelular através de um cuidadoso exame físico, conforme será abordado no Cap. 10. Entre as manifestações clínicas da própria hipernatremia, predominam aquelas que refletem disfunção do sistema nervoso central, principalmente se o aumento na concentração do sódio se fez de forma rápida, ao longo de algumas horas. A maior parte dos pacientes não internados que apresentam hipernatremia é muito jovem ou idosa. Estes grupos etários apresentam alterações do mecanismo da sede, redução da capacidade de concentração máxima da urina e falha na resposta normal ao ADH.44 Em crianças, são comuns a hiperpnéia, fraqueza muscular, inquietude, choro, insônia, letargia e até mesmo coma. As crianças geralmente não apresentam sintomas até que a concentração plasmática de sódio exceda 160 mEq/L. Se o paciente está consciente, a sede pode ser intensa. O nível de consciência se correlaciona com a gravidade da hipernatremia. Convulsões não ocorrem, a menos que o pa-
Quadro 9.5 Mecanismos renais necessários para o clearance de água A. Produção de um gradiente osmótico 1. Número suficiente de nefros funcionantes 2. Oferta suficiente de NaCl aos segmentos medulares 3. Transporte suficiente de NaCl nos segmentos medulares 4. Conservação suficiente de uréia na medula renal B. Utilização do gradiente osmótico 1. Fluxo sanguíneo renal apropriado 2. Ação apropriada da vasopressina nos ductos coletores 3. Resposta apropriada da vasopressina pelos ductos coletores 4. Fluxo urinário apropriado
ciente receba sobrecarga de sódio ou reidratação muito intensa. Entre os pacientes hospitalizados, as manifestações podem não ser tão nítidas, pois muitos deles apresentam doença neurológica preexistente. Na maioria das vezes, há alterações sensoriais, como confusão mental, estupor e, eventualmente, coma. Pode haver hipotensão, taquicardia e até hipertermia. O volume urinário é pequeno, a menos que haja uma diurese osmótica ou uma síndrome poliúrica. A concentração plasmática das proteínas está elevada e, se houver um déficit de sódio associado, verifica-se uma elevação da hemoglobina e do hematócrito. O líquido cefalorraquidiano pode ser xantocrômico ou sanguinolento, graças a um aumento da permeabilidade ou mesmo ruptura dos capilares cerebrais devido à redução de volume do cérebro.
Pontos-chave: • As principais manifestações da hipernatremia se relacionam ao sistema nervoso central e dependem da idade do paciente e da rapidez de instalação • Os sintomas são mais intensos na hipernatremia aguda que na crônica, pois o mecanismo de compensação (ganho intracelular de osmóis) não está ativado
Manejo do Paciente com Hipernatremia LINHAS GERAIS O tratamento da hipernatremia depende de dois fatores importantes: volume do compartimento extracelular e ritmo de aparecimento da hipernatremia. Na hipernatremia associada à depleção do volume extracelular, o primeiro objetivo é restaurar a volemia com
119
capítulo 9
Quadro 9.6 Interpretação e manejo da hipernatremia* Distúrbio básico
Sódio total do organismo
Perda de água e sódio
Sódio total reduzido
Causas clínicas
Osmolalidade urinária e NaU**
Tratamento Solução salina isotônica
Perdas extra-renais: sudorese
Urina iso - ou hipotônica; NaU 20 mEq/L Urina hipertônica NaU 10 mEq/L
Perdas renais: (diurese osmótica)
Perda de água
Sódio total normal
Perdas renais: diabetes insipidus, central ou nefrogênico Perdas extra-renais: pele e trato respiratório
Urina iso-, hipo- ou hipertônica NaÜ variável Urina hipertônica NaÜ variável
Água ou soro glicosado a 5%
Adição de sódio
Excesso de sódio total
Hiperaldosteronismo primário; síndrome de Cushing; diálise hipertônica; bicarbonato de sódio hipertônico
Urina iso - ou hipertônica NaU 20 mEq/L
Água ou soro glicosado a 5% diuréticos
*Modificado de Berl, T. e cols.8 **NaÜ indica a concentração urinária de sódio.
soro fisiológico. Se houver sinais de colapso circulatório pela contração de volume, a solução salina isotônica deve ser administrada até que a instabilidade hemodinâmica seja corrigida. Posteriormente, podem ser utilizados o soro glicosado a 5% ou uma solução hipotônica (0,45%) de cloreto de sódio. Se não houver instabilidade hemodinâmica inicial, inicia-se a administração simultânea de soro glicosado a 5% e solução salina isotônica. Quando se dispuser de uma solução salina hipotônica (NaCl 0,45%), esta será preferida. O manejo dos pacientes com hipernatremia associada a um excesso de volume extracelular baseia-se na reposição de água por via oral ou parenteral e na remoção do sódio com diuréticos de alça. Na presença de insuficiência renal, hipernatremia e excesso de volume são manejados através de diálise. Finalmente, naqueles pacientes com hipernatremia e volemia normal o manejo baseia-se na interrupção da perda continuada de líquido e na administração de água sob a forma de soro glicosado a 5%. A administração de líquido pode ser feita por via oral, via sonda nasogástrica ou via parenteral.46
CÁLCULO DO DÉFICIT DE ÁGUA Considere um paciente com peso usual de 70 kg, apresentando sódio plasmático atual de 155 mEq/L e sódio normal de 140 mEq/L: 1.º passo: Calcular a água total normal deste paciente: 70 kg x 60% 42 litros (alguns autores consideram a água total do homem como 60% do peso corporal, e 50% nas mulheres, por possuírem mais tecido adiposo e, logo, menos água. Além disso, consideram a água total atual como
sendo menor em pacientes hipernatrêmicos e que estão com déficit de água; logo usam, em vez de 60% e 50%, valores de 50% e 40% para homens e mulheres, respectivamente). 2.° passo: Calcular a quantidade de água total que este paciente possui com o sódio em 155 mEq/L. Água atual
Água normal Sódio normal Sódio atual
42 140 155
⬵ 38 litros
3.º passo: Calcular o déficit de água: Água atual água normal 38 42 4 litros de déficit de água. Esta é a quantidade de fluido hipotônico que o paciente necessita receber para que seu sódio plasmático retorne a 140 mEq/L.
TIPO DE FLUIDO A escolha do fluido a ser infundido para a correção da hipernatremia depende da via de administração e da necessidade de corrigir outro distúrbio hidroeletrolítico coexistente. Para uso enteral, podem ser utilizadas a água destilada ou soluções eletrolíticas hipotônicas.27 Para reposição endovenosa, o fluido ideal é aquele que não contém osmóis efetivos e ao mesmo tempo não ocasione o risco de hemólise por exposição dos eritrócitos a um fluido excessivamente hipotônico. Alguns autores sugerem que a correção com solução contendo glicose está associada a acidose láctica intracelular cerebral, devendo por isto ser evitada.27 Em alguns casos, a solução salina a 0,9%, contendo 154 mEq de sódio por litro, pode ser útil. Isto é verdadeiro quando coexiste depleção do espaço extracelular com a
120
Metabolismo da Água
hipernatremia. Esta solução (154 mEq/L) terá ainda um certo efeito diluidor sobre o plasma em condições de hipernatremia muito intensa. Na maioria das vezes, entretanto, a correção de hipernatremia somente com solução salina isotônica é um procedimento inadequado. É preferível repor uma solução salina a 0,45%, o que pode ser obtido pela infusão simultânea de volumes iguais de SG 5% (ou água destilada) e solução salina isotônica (a 0,9%).27 Há autores que recomendam que a solução glicosada a 5% seja utilizada nas situações em que existe a possibilidade de sobrecarga de volume com a infusão de fluidos contendo sódio, como na insuficiência cardíaca.27
RITMO DE CORREÇÃO Uma correção rápida da hipernatremia é perigosa. Com a hipernatremia ocorre saída de líquido das células cerebrais. Dentro de 1-3 dias o volume cerebral é restaurado por líquido cefalorraquidiano (aumentando o volume intersticial) e pela entrada de solutos nas células (atraindo água para o interior das células e logo restaurando o volume). Em casos de hipernatremia aguda, que se desenvolve em algumas horas, a correção rápida é relativamente segura e eficaz. Porém, nas hipernatremias que se instalam ao longo de várias horas ou dias, é necessária uma abordagem mais cautelosa. Nesta situação crônica, uma correção rápida causa movimento osmótico de água para dentro do cérebro, aumentando o seu volume.27 Este edema cerebral pode causar convulsões, lesão neurológica irreversível e morte. Há evidência de que existe segurança com um ritmo de correção entre 0,5-0,7 mEq/L por hora, acima do qual reações adversas ocorrem.47 Nenhuma reação adversa ocorre quando o ritmo de correção não excede 0,5 mEq/L por hora. Assim, se o sódio plasmático for de 168 mEq/L, o excesso de 28 mEq/L (168-140) deve ser corrigido em 56 horas (28 divididos por 0,5 mEq).27 Algumas vezes, a taxa de correção não se iguala àquela que foi calculada. Isto provavelmente se deve a perdas continuadas de fluidos hipotônicos. Nestas circunstâncias, o tratamento da doença de base deve ser revisado e todas as perdas fluidas devem ser reavaliadas e acrescentadas à reposição já calculada. Idealmente, deve ser feita uma monitorização laboratorial a cada 4-6 horas para avaliar a eficácia do tratamento.27 A piora do quadro neurológico durante a reposição de fluido hipotônico pode significar o desenvolvimento de edema cerebral e requer reavaliação imediata e interrupção temporária da reposição.44
EVOLUÇÃO Aparentemente, a morbidade e a mortalidade pela hipernatremia se relacionam principalmente com a rapidez de instalação do distúrbio, e não com sua intensidade. Mesmo com o tratamento, a mortalidade em adultos ultrapassa 40%, o que em parte pode ser conseqüência da do-
ença de base. Muitos dos pacientes que sobrevivem desenvolvem algum grau de dano cerebral permanente.27 Além disso, alguns autores relatam a possibilidade de a hipernatremia crônica acionar um processo catabólico sistêmico. A hipótese é que a diminuição do volume das células hepáticas e musculares pela hipernatremia desencadearia um processo de catabolismo protéico, caquexia e degradação tecidual.27
Pontos-chave: • Ο tratamento da hipernatremia é feito com soluções hipotônicas • Para evitar edema cerebral, a correção dos níveis plasmáticos de sódio não deve exceder 0,5 mEq/L por hora
EXCESSO DE ÁGUA — HIPONATREMIA — ESTADO HIPOSMOLAR Em condições normais, a concentração plasmática de sódio é mantida dentro de limites estreitos, 135 a 145 mEq/L, devido à regulação da sede e adequada secreção e ação do HAD. A capacidade de o rim excretar água sem solutos (controlada pelo HAD) é um ponto fundamental no controle da tonicidade do organismo.45 A osmolalidade efetiva ou tonicidade se refere à contribuição de solutos que não podem atravessar livremente todas as membranas celulares (como o sódio e a glicose), induzindo assim desvios transcelulares de água (v. Cap. 8).48 A dificuldade na excreção de água livre é uma das causas mais comuns de hiponatremia ou estado hiposmolar encontrado no paciente hospitalizado, correspondendo a 1-2% dos pacientes admitidos por doença aguda ou crônica.45 Os idosos apresentam diminuição da capacidade de eliminação de uma carga de água, o que pode explicar em parte a suscetibilidade deste grupo ao desenvolvimento de hiponatremia.44 As principais situações clínicas associadas à hiponatremia estão agrupadas no Quadro 9.7. A hiponatremia pode resultar de liberação excessiva de HAD, anormalidades na diluição urinária e/ou desordens do mecanismo da sede.45 Enquanto a hipernatremia sempre implica hipertonicidade e hiperosmolalidade, a hiponatremia pode cursar com tonicidade baixa, normal ou aumentada.48 A hiponatremia dilucional ou hipotônica (também chamada de hiponatremia real), que é a forma mais comum de hiponatremia, é causada por retenção de água e cursa com osmolalidade plasmática menor que 275 mOsm/kg. Se a ingesta ou aporte de água é superior à capacidade de excreção renal, ocorrerá diluição dos solutos do organismo,
capítulo 9
Quadro 9.7 Situações clínicas associadas com hiponatremia* 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.
Pseudo-hiponatremia Insuficiência cardíaca congestiva Cirrose hepática avançada Síndrome nefrótica Insuficiência renal crônica Contração de volume intravascular ou extravascular Estresse emocional e físico Distúrbios endócrinos Agentes farmacológicos Síndrome de secreção inapropriada de vasopressina
*Obtido de Berl, T. e col.8
resultando em hiposmolalidade e hipotonicidade. São causas deste tipo de hiponatremia: insuficiência cardíaca, secreção inapropriada de HAD e depleção do espaço extracelular.48-50 A hiponatremia hiperosmolar ou hipertônica ocorre na hiperglicemia e infusão de manitol e cursa com osmolalidade plasmática habitualmente superior a 290 mOsm/kg.48,50 Por fim, a hiponatremia isosmolar ou isotônica é a causada por hiperproteinemia ou hiperlipidemia graves (pseudo-hiponatremia) e cursa com osmolalidade plasmática normal, de 275-290 mOsm/kg.49 A hiponatremia também pode ser classificada de acordo com sua duração, sendo chamada de aguda, quando dura menos que 48 horas, e crônica, quando ultrapassa este período.51
Causas de Hiponatremia PSEUDO-HIPONATREMIA Tanto a hiperproteinemia (por exemplo, no mieloma múltiplo) como a hiperlipidemia podem resultar em dosagens aparentemente baixas de sódio, devido ao espaço que estas substâncias ocupam na fase aquosa de uma amostra de sangue.45,52 Se grandes quantidades de macromoléculas ou lipídios estão presentes, a quantidade de água por unidade de volume de plasma está diminuída. Os laboratórios apresentam os resultados da dosagem de sódio por unidade de volume de plasma. Entretanto, a concentração real de sódio é a quantidade (mEq) em uma unidade de volume (1 litro) de plasma dividida pela percentagem de água no plasma (cerca de 93%). Os 7% restantes do plasma correspondem às proteínas e lipídios. Uma vez que os íons sódio estão dissolvidos somente na fase aquosa do plasma, uma concentração de sódio de 143 mEq/L no plasma total equivale a uma concentração de 154 mEq/L na água do plasma (143 0,93). Para evitar avaliações errôneas, o plasma pode ser centrifugado para separar e remover as proteínas e os lipídios, ou a dosagem pode ser feita diretamente com eletrodos sensíveis a íons, que somente reconhecem a quantidade de sódio dissolvido na água do plasma.45
121
A redução na dosagem de sódio causada por hipertrigliceridemia pode ser calculada multiplicando-se a concentração plasmática dos triglicérides (mg/dl) por 0,002. Por exemplo, para uma concentração de triglicérides de 5.000 mg/dl, a concentração de sódio diminuiria de 144 para 134 mEq/L.45 Para pacientes com hiperproteinemia, calcula-se a repercussão sobre a dosagem plasmática de sódio multiplicando-se a quantidade de elevação da proteína total acima de 8 g/dl por 0,25. Por exemplo, para uma concentração plasmática de proteína de 17 g/dl, a concentração de sódio diminui apenas 2,25 mEq/L. A pseudo-hiponatremia é tratada com a correção da doença que ocasiona o distúrbio.45 Em todo caso, para uma conclusão correta sobre uma baixa concentração de sódio, é prudente verificar que método está sendo utilizado pelo laboratório para a dosagem deste íon.
REDISTRIBUIÇÃO DE ÁGUA Outra causa de hiponatremia em que a diminuição na concentração de sódio não está associada com uma diminuição na osmolalidade plasmática também merece um comentário especial. Quando está presente no plasma grande quantidade de um soluto (que não o sódio) que não se difunde livremente através das membranas celulares, criase um gradiente osmótico que favorece o movimento de água do intracelular para o extracelular, resultando em hiponatremia com hipertonicidade. A causa mais comum deste tipo de hiponatremia é a hiperglicemia, mas também tem sido relatada durante terapia com manitol hipertônico. Ao contrário do que ocorre com a hiperlipidemia e hiperproteinemia, a baixa concentração de sódio nestas circunstâncias é um reflexo real da concentração de sódio no espaço extracelular. O que ocorre é a passagem de água do intracelular para o extracelular, diluindo o sódio do plasma. O tratamento deste tipo de hiponatremia deve ser dirigido à correção das concentrações elevadas de glicose ou manitol, o que resultará no movimento de água para o intracelular, com restauração da concentração do sódio plasmático ao normal.45 Outra causa é a irrigação durante cirurgia de próstata, com grandes volumes de manitol, sorbitol, glicina ou água destilada, que acabam sendo absorvidos através do leito cirúrgico cruento. Inicialmente, o soluto absorvido fica confinado ao espaço extracelular, trazendo água do intracelular, a qual dilui o sódio plasmático, resultando num estado de hiponatremia isotônica. O manitol é imediatamente excretado na urina, mas o sorbitol e a glicina são metabolizados, causando severa hipotonicidade e desvio de água para o intracelular. Sintomas neurológicos graves podem ocorrer, especialmente com a glicina, devido à neurotoxicidade direta do aminoácido e níveis elevados de amônio gerados durante seu metabolismo.45 Para calcular a contribuição da glicose ou do manitol para a osmolalidade plasmática, basta dividir a concentra-
122
Metabolismo da Água
ção plasmática (mg/100 ml) pelo peso molecular da substância (glicose e manitol têm peso molecular de 180). Multiplica-se a concentração plasmática da substância por 10 para transformar mg/100 ml em mg/L. Exemplo: se a concentração plasmática da glicose for 180 mg/100 ml, a contribuição para a osmolalidade será: 180 10 180 10 mOsm/L. Pode-se também considerar que para cada 100 mg/dl de elevação na glicemia acima de 200 mg/dl, há uma redução de 1,6 mEq/L no sódio plasmático. Exemplo: a glicemia passou de 200 a 1.200 mg/dl. A concentração de sódio plasmático deve cair de 140 para 124 mEq/L sem alteração no conteúdo total de água ou de eletrólitos, mas apenas com desvio de água do intracelular para o extracelular (1,6 mEq/L 10 16 mEq).
INTOXICAÇÃO AGUDA PELA ÁGUA Hiponatremia pode desenvolver-se agudamente em pacientes que ingerem grandes quantidades de fluido hipotônico. Isto ocorre em três situações: pacientes com taxa de filtração glomerular (TFG) normal que ingerem grandes quantidades de água (polidipsia psicogênica); pacientes com TFG muito reduzida que ingerem quantidades moderadas de água; e pacientes bebedores de cerveja.45 A polidipsia psicogênica ou ingestão compulsiva de água é relatada em pacientes psiquiátricos, sendo que parte deles desenvolve hiponatremia sintomática. A ingesta aguda de líquidos pode exceder 15-20 litros ao dia, superando a capacidade máxima do rim em eliminar a sobrecarga de água. De modo geral, a interrupção da ingesta excessiva e uma diurese volumosa são suficientes para a correção da hiponatremia; estes pacientes raramente desenvolvem sintomas. Porém, um grupo de pacientes psiquiátricos desenvolve hiponatremia sintomática. Nestes, estudos demonstraram sensibilidade aumentada ao HAD, defeito na diluição urinária independente do HAD ou mesmo níveis elevados de HAD. Alguns fatores, tais como a própria psicose, náuseas, nicotina e várias drogas psicotrópicas, estimulam a secreção de HAD.45 Hiponatremia é bem descrita em indivíduos que ingerem grandes quantidades de cerveja, sem aporte nutricional adequado. Nesta situação, há redução da quantidade de urina diluída que pode ser formada, pois há poucos solutos na urina. Na insuficiência renal, a diluição urinária não está comprometida, mas a quantidade total de urina que pode ser excretada está muito reduzida devido ao comprometimento da TFG. Por exemplo, num paciente com TFG de 5 litros ao dia, apenas 30% do filtrado glomerular alcançam os segmentos diluidores do nefro, resultando em 1,5 litro de urina ao dia. Mesmo que os níveis de HAD estivessem completamente suprimidos, e que os 5 litros de filtrado alcançassem o segmento diluidor, o volume urinário não poderia exceder 5 litros. Então, no paciente com insuficiência renal severa, a ingestão excessiva de água pode fa-
cilmente exceder a capacidade do rim de excretar uma carga de água, mesmo que o mecanismo de diluição esteja intacto.45
HIPONATREMIA CRÔNICA A abordagem racional ao paciente com hiponatremia envolve uma avaliação correta do sódio corporal total e espaço extracelular (através do exame físico),31 osmolalidade urinária e sódio urinário (v. Quadros 9.11 e 9.12). A avaliação e a classificação do paciente hiponatrêmico com base na volemia têm sido utilizadas desde a década de 1960.
Hiponatremia com Sódio Corporal Total Aumentado Hiponatremia com um aumento no sódio corporal é observada em três situações: cirrose, síndrome nefrótica e insuficiência cardíaca congestiva. O exame físico destes pacientes demonstra sinais de sobrecarga e excesso do extracelular (v. Cap. 10). O denominador comum entre estas condições é um volume circulante efetivo diminuído, ao qual o rim responde como se estivesse sendo hipoperfundido, com menor TFG e retendo sódio proximalmente. Esta diminuição do volume circulante efetivo ativa a liberação não-osmótica de HAD, o sistema reninaangiotensina-aldosterona e o sistema simpático. A concentração urinária encontra-se aumentada, como resultado da secreção excessiva de HAD e pelo menor fluxo urinário, que tem maior tempo de contato com o epitélio do ducto coletor, permitindo maior retrodifusão passiva de água para o interstício. Com aumento da gravidade da cirrose, síndrome nefrótica ou insuficiência cardíaca congestiva, perde-se a capacidade de concentrar a urina, e uma urina isotônica com o plasma, e com alto teor de sódio, é elaborada. Deve-se tomar cuidado ao avaliar a dosagem de sódio urinário nos pacientes que recebem diuréticos, particularmente os diuréticos de alça, pois também produzem urina hipotônica e com sódio alto.45
Hiponatremia com Sódio Corporal Total Diminuído Hiponatremia associada com diminuição do espaço extracelular pode ocorrer por perdas renais ou não-renais. A semiologia evidencia sinais de contração do espaço extracelular (v. Cap. 10). As perdas não-renais incluem as perdas gastrintestinais (diarréia e vômitos), perdas cutâneas excessivas (queimaduras, raramente sudorese) ou acúmulo de terceiro espaço (pancreatite, peritonite, queimaduras, esmagamento muscular). Em todas estas situações, a redução do espaço extracelular resulta em hipoperfusão renal e diminuição da TFG. Isto provoca aumento da reabsorção de sódio no túbulo proximal, com menos sódio disponível para os segmentos diluidores distais. Também existe um estímulo ao HAD, com maior reabsorção de água. Recentemente tem sido descrita a síndrome de hiponatremia dos maratonis-
123
capítulo 9
tas, em que os atletas perdem grandes quantidades de sódio pelo suor e de modo geral ingerem fluidos de reposição que contêm água, glicose e pouco sódio.45,53,54 Perdas renais de sódio são observadas com o uso de diuréticos, doença renal intersticial crônica e deficiência de aldosterona. Todos os diuréticos, independentemente de seu local de ação, induzem um balanço negativo de sódio. Esta depleção de sódio, por sua vez, desencadeia a liberação não-osmótica de HAD. Na nefrite intersticial crônica, há lesão direta das células tubulares nos segmentos diluidores distais e alteração da arquitetura renal normal. Disso resultam uma perda renal de sódio e diminuição do clearance de água livre. Por fim, na deficiência de aldosterona, o defeito na diluição urinária está relacionado ao balanço negativo de sódio, que resulta em diminuição do sódio que chega aos segmentos diluidores distais, e à liberação não-osmótica de HAD induzida pela depleção do EEC.45
Hiponatremia com Sódio Corporal Aparentemente Normal Hiponatremia em um paciente com o espaço extracelular aparentemente normal pode resultar de secreção inapropriada de HAD (SIHAD) ou de um reajuste de osmostato.45 A SIHAD foi inicialmente descrita em 1957.55 É assim chamada, pois a secreção de HAD não se deve a um estímulo osmótico ou não-osmótico. Tem como características a hiponatremia, hipotonicidade, urina inapropriadamente concentrada, sódio urinário elevado e, freqüentemente, ácido úrico plasmático em níveis baixos.56 As causas desta síndrome podem ser observadas no Quadro 9.8. O mecanismo básico da SIHAD é atividade HAD ou HAD-símile excessiva, causando aumento da reabsorção de água no ducto coletor, resultando em expansão do espaço extracelular. Como apenas um terço da água retida é distribuída no espaço extracelular, sinais de hipervolemia, como edema ou ingurgitamento das veias do pescoço, não estão presentes. Porém, uma discreta expansão do intravascular resulta em aumento do fluxo plasmático renal e TFG e diminuição da reabsorção proximal de sódio. Como a secreção de aldosterona é normal ou tende a ser suprimida pela expansão crônica de volume, uma quantidade significativa de sódio deixa de ser reabsorvida na alça de Henle e túbulo distal. Conseqüentemente, quantidades aumentadas de sódio chegam ao túbulo coletor, que possui capacidade limitada de absorver sódio, e a excreção de sódio está aumentada.45 A hipouricemia encontrada na SIHAD se deve a uma menor reabsorção proximal de ácido úrico.57 Cabe aqui um comentário a respeito da hiponatremia em pacientes com SIDA (síndrome da imunodeficiência adquirida). A hiponatremia é encontrada em 35-55% dos pacientes aidéticos internados e é geralmente causada por SIHAD relacionada a pneumonia, neoplasia ou infecção do sistema nervoso central. Eventualmente perdas por diar-
Quadro 9.8 Situações clínicas associadas com SIHAD* 1. Produção excessiva de HAD por tumor • Pulmão, gastrintestinal, timo, próstata, linfoma 2. Aumento da liberação hipotálamo-hipofisária de HAD a) Doença pulmonar • Tuberculose, pneumonia, abcesso b) Doenças do sistema nervoso central • Trauma, convulsões, meningite, encefalite, abcesso • Tumor • Hemorragia subdural, subaracnóide, aneurisma • Acidente vascular encefálico c) Doenças endócrinas • Deficiência de glicocorticóides • Mixedema d) Drogas • Opiáceos e barbitúricos • Ecstasy • Sulfoniluréias (clorpropamida, tolbutamida) • Nicotina • Clofibrato • Antidepressivos tricíclicos • Inibidores seletivos da recaptação de serotonina (fluoxetina, sertralina) • Carbamazepina • Drogas antineoplásicas (vincristina, vinblastina) • Tiazídicos e) AIDS 3. Administração exógena de HAD 4. Drogas que potencializam o efeito do HAD ou têm efeito HAD-símile • Clorpropamida • Ciclofosfamida64 • Ocitocina *SIHAD = Síndrome da secreção inapropriada de HAD.
réia podem causar depleção de volume circulante efetivo, ativando a liberação de HAD pelos mecanismos já descritos. Uma causa menos comum de hiponatremia em aidéticos é a insuficiência de adrenais, relacionada com infecção por citomegalovírus, micobactérias, pelo próprio HIV ou ainda por infiltração e hemorragia por sarcoma de Kaposi.58 Os pacientes com um quadro compatível com reajuste do osmostato possuem um limiar de osmorregulação em torno de uma hiposmolalidade plasmática. Estes pacientes conseguem suprimir o HAD adequadamente quando a osmolalidade plasmática está baixa e a diluição urinária é adequada. Em situação de hipertonicidade, há aumento apropriado na secreção de HAD e concentração urinária. O reajuste de osmostato pode ser encontrado em qualquer uma das causas de SIHAD, estados hipovolêmicos, quadriplegia, psicose, desnutrição e tuberculose.45,59 A hiponatremia não é progressiva e melhora espontaneamente com a resolução da doença básica.45
124
Metabolismo da Água
Pontos-chave: • Ο diagnóstico de hiponatremia é feito com concentrações plasmáticas de sódio 135 mEq/L • Hiponatremia pode cursar com volemia normal, aumentada ou diminuída
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DE HIPONATREMIA O nível de hiponatremia que pode causar sinais e sintomas varia com o ritmo de queda do sódio plasmático e com a idade do paciente. Em geral, um paciente mais jovem tolera melhor um determinado nível de hiponatremia que um mais idoso. Entretanto, hiponatremia aguda pode determinar importantes sinais e sintomas do sistema nervoso central: depressão do nível de consciência, convulsões e morte, mesmo com níveis de sódio plasmático entre 125 e 130 mEq/L. Estas manifestações são atribuídas principalmente a um edema cerebral, causado pela rápida redução na concentração plasmática de sódio.60 Isto ocorre porque não há tempo para as células cerebrais eliminarem partículas osmoticamente ativas do seu interior, reduzindo assim o edema celular. Por outro lado, este mecanismo protetor contra o edema cerebral é muito efetivo na hiponatremia crônica, de forma que um paciente pode estar assintomático com um sódio plasmático inferior a 110 mEq/L. Os sinais e sintomas se correlacionam com o grau de edema cerebral. Náuseas e mal-estar são sintomas precoces e podem ser observados quando a concentração plasmática de sódio cai para 125-130 mEq/L. Na seqüência ocorrem cefaléia, letargia, obnubilação e eventualmente convulsões, coma e parada respiratória, caso o sódio caia para 115-120 mEq/L.60 Outros sinais e sintomas incluem câimbras e anorexia, diminuição dos reflexos tendinosos profundos, reflexos patológicos, hipotermia e paralisia pseudobulbar. São particularmente suscetíveis ao edema cerebral mulheres jovens em pós-operatório, mulheres idosas usando diuréticos tiazídicos, crianças e pacientes hipoxêmicos.51 Estão presentes também os sinais e sintomas relacionados à doença de base que ocasionou a hiponatremia.45
Diagnóstico Na avaliação de um paciente hiponatrêmico, a história clínica é de grande importância, assim como a verificação do balanço hídrico, perdas e aporte de fluidos nos dias precedentes.50 Além da dosagem do sódio plasmático e do sódio urinário, a osmolalidade plasmática, osmolalidade urinária,
potássio plasmático e gasometria são de utilidade no diagnóstico diferencial das hiponatremias. A osmolalidade plasmática encontra-se diminuída na maior parte dos pacientes hiponatrêmicos, uma vez que é basicamente determinada pela concentração plasmática de sódio. Mas, em alguns casos, a osmolalidade (e não a tonicidade) do plasma está normal (como na hiperlipidemia e na hiperproteinemia) ou elevada (hiperglicemia, administração de manitol). Quando há osmolalidade plasmática elevada, ocorre movimento osmótico de água para fora das células, e a concentração de sódio no plasma diminui por diluição.57 A resposta renal apropriada em presença de um excesso de água é excretar urina maximamente diluída. Quando isto não ocorre, deve-se suspeitar de que exista ação do ADH ou anormalidade renal.61 Na urina, a osmolalidade auxilia a diferenciar entre uma alteração na capacidade de excretar urina diluída (presente na maior parte dos casos) e a polidipsia primária, na qual a excreção de água é normal, mas a ingesta é tão volumosa que ultrapassa a capacidade de excreção. Na polidipsia primária, a resposta à hiponatremia é a supressão do HAD, resultando numa urina com osmolalidade abaixo de 100 mOsm/kg e densidade menor que 1,003. No restante dos casos, a secreção de HAD continua apesar da hiponatremia, prejudicando a diluição urinária e mantendo a osmolalidade urinária maior ou igual a 300 mOsm/kg.57 Concentrações urinárias de sódio menores que 25 mEq/L sugerem a participação de perdas não-renais de sódio na gênese da hiponatremia, enquanto concentrações superiores a 40 mEq/L sugerem secreção inapropriada de HAD.57 A dosagem do potássio e a verificação do estado ácidobásico podem auxiliar a diferenciar algumas situações: por exemplo, alcalose metabólica e hipocalemia indicam uso de diuréticos ou vômitos; acidose metabólica e hipocalemia sugerem diarréia ou uso de laxantes, e acidose metabólica e hipercalemia sugerem insuficiência adrenal.57
TRATAMENTO DA HIPONATREMIA Linhas Gerais Com exceção da pseudo-hiponatremia e da hiperglicemia, a hiponatremia implica um desvio de água para dentro das células e edema das células. Este desvio é particularmente importante no sistema nervoso central, uma vez que o cérebro está alojado no espaço inextensível da caixa craniana e o edema cerebral causa sintomas graves.61 A idade do paciente, rapidez de instalação da hiponatremia, avaliação do volume do compartimento extracelular e a concentração do sódio urinário são muito importantes no planejamento terapêutico dos pacientes com hiponatremia (Quadros 9.9 e 9.11).45 A doença básica deve ser
125
capítulo 9
Quadro 9.9 Interpretação e manejo da hiponatremia* Distúrbio básico
Compartimento extracelular
Déficit de água total e déficit maior de sódio total
Depleção do volume extracelular
Causas clínicas Perdas renais: excesso de diuréticos; Deficiência de mineralocorticóide; Nefrite perdedora de sal; Acidose tubular renal com bicarbonatúria Perdas extra-renais: vômitos, diarréias, terceiro espaço; queimaduras, pancreatite
Concentração urinária de sódio (NaU)** NaÜ > 20 mEq/L
Tratamento Solução salina isotônica
NaÜ 10 mEq/L
Excesso de água total
Discreto excesso de volume extracelular (sem edema)
Defic. de glicocorticóide; Hipotireoidismo; Dor, emoção, drogas; Síndrome de secreção inapropriada de HAD
NaÜ 20 mEq/L
Restrição de água
Excesso de sódio total e maior excesso de água total
Excesso do volume extracelular (edema)
Síndrome nefrótica; Insuf. cardíaca; Cirrose hepática
NaÜ 10 mEq/L
Restrição de água
Insuf. renal aguda e crônica
NaÜ 20 mEq/L
*Modificado de Berl, T. e cols.8 **NaÜ indica a concentração urinária de sódio.
avaliada e tratada adequadamente. Deve ser interrompido o uso de qualquer agente farmacológico que interfira com o manejo renal da água.45 A maior parte dos pacientes hiponatrêmicos são assintomáticos e apresentam concentração plasmática de sódio maior que 120 mEq/L. Nestes, a correção da hiponatremia pode ser feita de modo mais lento e gradual, através da restrição de água livre,62 e o tratamento com solução salina hipertônica não é indicado.45 Com a restrição de água livre para menos de 1 litro ao dia, ocorre balanço negativo de água, e o sódio plasmático é corrigido lentamente. Em pacientes que se alimentam normalmente por via oral, a taxa de correção do sódio com a restrição de água raramente excede 1,5 mEq/dia. Já nos que não estão recebendo nutrição via oral, e são mantidos apenas com fluidos intravenosos, o balanço entre as perdas insensíveis e a reposição pode estar próximo de zero, e será ainda mais difícil obter um balanço negativo de água.45 Em um paciente hiponatrêmico com depleção do extracelular concomitante, a solução salina isotônica (154 mEq de sódio por litro) é a solução escolhida. A solução salina causa repleção do extracelular, interrompendo o estímulo
para a liberação de HAD, permitindo que a água em excesso seja eliminada. Além disso, a solução salina também auxilia na correção da hiponatremia por possuir uma concentração de sódio mais elevada (154 mEq/L) que o plasma hiponatrêmico.62 Se o paciente apresenta excesso do extracelular concomitantemente, ou se o paciente estiver perdendo o sódio infundido através da urina, pode ser administrado diurético de alça juntamente com a salina hipertônica. Nesta situação, é necessário avaliar a dosagem do sódio na urina após início do tratamento, para que este sódio seja reposto, ao menos parcialmente. Se a correção do sódio plasmático for menor que a esperada, a infusão deve ser reajustada. 45 Na hiponatremia que ocorre no diabetes, a correção da hiperglicemia fará a água retornar para o interior das células, normalizando a concentração plasmática de sódio. A hiponatremia associada a um excesso de sódio total no organismo ocorre na insuficiência cardíaca, insuficiência renal, cirrose ou síndrome nefrótica. O manejo destes pacientes com excesso de água e sal baseia-se na restrição
126
Metabolismo da Água
Quadro 9.10 Diagnóstico diferencial da hipernatremia HIPERNATREMIA
AVALIAR VOLEMIA
NORMOVOLEMIA – Água corporal total 앗 – Sódio corporal total ↔
HIPOVOLEMIA – Água corporal total 앗앗 – Sódio corporal total 앗
NaU 20
NaU 20
Perda Renal de H2O Na Diurético osmótico de alça Pósdesobstrução Doença renal
Perda Extra-renal de H2O Na Sudorese excessiva Queimaduras Diarréia Fístulas
NaU variável
Perda Renal de H2O D insipidus Hipodipsia
Perda Extra-renal de H2O Perda insensível Pele Respiratória
HIPERVOLEMIA – Água corporal total 앖 – Sódio corporal total 앖앖
NaU 20
Ganho de Sódio Primário Hiperaldosteronismo S. Cushing Diálise hipertônica Bic. sódio hipertônico Comprimidos de NaCl
Adaptado de Schrier, R.W.31 NaU sódio urinário (mEq/L).
Quadro 9.11 Diagnóstico diferencial da hiponatremia HIPONATREMIA
AVALIAR VOLEMIA
HIPOVOLEMIA – Água corporal total 앗 – Sódio total 앗앗
NaU 20
Perda Renal – Diuréticos – Deficiência de mineralocorticóide – Nefrite intersticial crônica – Diurese osmótica Adaptado de Schrier, R.W.31 NaÜ sódio urinário (mEq/L).
NaU 20
Perda Extra-renal – Vômitos – Diarréia – Terceiro espaço
EUVOLEMIA – Água corporal total 앖 – Sódio total ↔
NaU 20
– Deficiência de glicocorticóide – Hipotireoidismo – Drogas – Estresse – SIHAD
HIPERVOLEMIA – Água corporal total 앖앖 – Sódio total 앖
NaU 20
– Insufic. renal aguda ou crônica
NaU 20
– Síndrome nefrótica – Cirrose – Insufic. cardíaca
127
capítulo 9
de água e sal e no uso apropriado de diuréticos. Considerar hemodiálise nos casos de concomitante insuficiência cardíaca congestiva ou síndrome nefrótica. O manejo dos pacientes com hiponatremia e depleção do volume extracelular baseia-se na expansão do volume circulante com solução salina isotônica. Os diuréticos, se em uso, deverão ser suspensos, e potássio deverá ser administrado, se houver hipocalemia. No caso da insuficiência de adrenal, deve ser feita a adequada reposição hormonal. Nos pacientes com hiponatremia e sem sinais de alteração do sódio total do organismo, como ocorre na SIHAD e reajuste do osmostato, o manejo básico é a restrição líquida, que geralmente normaliza a concentração plasmática do sódio. Apenas quando há sintomas de intoxicação aquosa, há necessidade de uma correção mais rápida (estupor, coma, convulsões). Em caso de necessidade de uso de solução contendo sódio, considerar que o manejo renal do sódio na SIHAD está intacto, ao contrário da depleção do extracelular, em que o sódio é retido. Isto significa que o sódio administrado será eliminado na urina, e para isso necessitará de um volume de água. Por exemplo, ao se administrar 1 litro de solução salina isotônica (300 mOsm), o sódio será eliminado juntamente com cerca de 500 ml de água. Os 500 ml restantes terminarão por diluir ainda mais o plasma hiponatrêmico. Se for administrada uma solução hipertônica a 3% (1.026 mOsm/L), o sódio será eliminado pela urina, mas para isso necessitando de um volume maior de água, o que produz um balanço negativo de água, colaborando para a correção da hiponatremia. Concluindo, na hiponatremia sintomática da SIHAD a osmolalidade do fluido administrado deve exceder a osmolalidade da urina (que nesta síndrome geralmente é superior a 300 mOsm/L). Portanto, a solução salina é de pouca utilidade nesta situação. Pode haver benefício também na administração de diurético de alça, o qual inibe a reabsorção de cloro no ramo ascendente espesso da alça de Henle, o que interfere com o mecanismo de contracorrente e induz um estado de resistência ao ADH. A demeclociclina e o lítio diminuem a responsividade do túbulo coletor ao HAD e aumentam a excreção de água.62 Para os pacientes hiponatrêmicos com insuficiência cardíaca, cirrose ou SIHAD, uma perspectiva para o futuro é a utilização de um antagonista seletivo dos receptores V2 (antidiuréticos) do HAD, atualmente em fase de testes. Este agente produziria um balanço negativo de água sem produzir mudanças na excreção de sódio e potássio.62,63
Cálculo do Excesso de Água Calcular qual o excesso de água em um paciente de 70 kg, com sódio plasmático de 120 mEq/L. 1.° passo: Calcular qual seria a água total normal deste paciente: 70 kg 60% 42 litros.
2.° passo: Calcular a quantidade de água total que este paciente possui com o sódio em 120 mEq/L. Água atual
Água normal Sódio normal Sódio atual
42 140 120
49 litros
3.º passo: Excesso de água: Água atual água normal 49 42 7 litros de excesso de água.
Tratamento da Hiponatremia Sintomática A hiponatremia sintomática é uma emergência médica, e muitas vezes os pacientes necessitam de suporte avançado de vida, dada a intensidade do edema cerebral. Os sinais neurológicos e sintomas já foram descritos. Esta síndrome pode ocorrer em qualquer estado hiposmolar, independente do volume extracelular do paciente. Mesmo pacientes com hiponatremia e grave depleção de volume podem desenvolver edema cerebral. Nestas circunstâncias, é necessária correção mais ágil do distúrbio (v. Quadro 9.12). Por isso, a restrição de água não é considerada terapia adequada para a hiponatremia sintomática, uma vez que promove correção lenta do sódio plasmático.45 Nos indivíduos com hiponatremia sintomática, o tratamento de escolha é a administração de solução salina hipertônica (a 3%). O cálculo da quantidade de sódio necessária para elevar a concentração plasmática a um determinado valor é feito com a fórmula a seguir: Na necessário (mEq) Água corporal normal (Na desejado Na atual) Por exemplo, quantos mEq de sódio são necessários para elevar o sódio plasmático de 110 para 120 mEq/L num paciente de 70 kg? Na necessário (mEq) 42 L (120 110) 420 mEq Então, são necessários 420 mEq de sódio. Uma vez que a solução salina a 3% contém aproximadamente 514 mEq de sódio por litro, serão necessários cerca de 800 ml desta solução para atingir o objetivo, o que pode causar sobrecarga de volume, principalmente nos pacientes com baixa reserva cardíaca. Quando a solução salina a 3% não estiver disponível, pode ser preparada a partir da solução salina isotônica a 0,9%, acrescentando 10 ml de cloreto de sódio a 20% para cada 100 ml de salina isotônica. Observe que, no exemplo acima, a correção de 10 mEq estaria dentro do limite de segurança para as 24 horas, mas, na presença de sintomas, a correção inicial pode chegar a 1,5-2 mEq nas primeiras 3-4 horas, até a melhora dos mesmos (v. Quadro 9.12). Este modo de correção não deve ser usado para restaurar o sódio plasmático a níveis normais! A utilização da salina hipertônica visa a melhora dos sintomas neurológicos mais graves. Durante o intervalo em que a correção da hiponatremia sintomática estiver sendo feita, devem ser monitorados os
128
Metabolismo da Água
Quadro 9.12 Tratamento da hiponatremia, com base na duração e nos sintomas HIPONATREMIA
SINTOMÁTICA
AGUDA
Solução salina hipertônica 1-2 ml/kg/h Furosemide A correção não deve ultrapassar 2 mEq/L por hora
ASSINTOMÁTICA
CRÔNICA
Solução salina hipertônica 1-2 ml/kg/h Furosemide
AGUDA
CRÔNICA
Restrição de água livre
Não é necessária correção imediata
A correção não deve ultrapassar 10-12 mEq/dia
Baseado em Berl, T.51
eletrólitos plasmáticos, até que o paciente esteja neurologicamente estável.45 Além disso, há necessidade de se monitorar a volemia, se possível com medida da pressão central venosa (considerando suas limitações potenciais) ou pressão em capilar pulmonar com o cateter de SwanGanz. Em 1973, Hantman e colaboradores propuseram o emprego de furosemida no manejo da hiponatremia.64 Isto se aplica sobretudo aos pacientes que não podem tolerar uma expansão do compartimento extracelular. A administração endovenosa de furosemida induz um balanço negativo de água, quando ao mesmo tempo se repõem as perdas eletrolíticas (sódio e potássio) através de uma solução mais concentrada. Os autores propõem a administração inicial de 1 mg/kg de furosemida. A concentração urinária de sódio e potássio é determinada a cada hora, e a quantidade excretada é reposta através de uma solução salina hipertônica (3%) com a quantidade apropriada de potássio. Nesta circunstância, a infusão de salina hipertônica deve ser igual às perdas de sódio, potássio e cloro. O balanço negativo de água assim obtido é a diferença entre o fluxo urinário e a quantidade de solução hipertônica administrada. Doses subseqüentes de furosemida são administradas para manter o balanço líquido negativo. No caso de uma correção muito rápida ocorrer e ser prontamente reconhecida, deve-se suspender temporariamente a correção da hiponatremia e administrar DDAVP para os pacientes com osmolalidade urinária baixa, pois o ADH é suprimido pela hiponatremia. No caso da SIHAD, suspender a salina hipertônica. Os dados obtidos experimentalmente sugerem que o benefício deste tipo de abor-
dagem ocorre se o tratamento for iniciado antes do aparecimento de sintomas neurológicos, ou seja, nas primeiras 24 horas. Não há benefício se a desmielinização já se instalou.62
Ritmo de Correção Não se sabe ao certo com que rapidez se deve corrigir uma hiponatremia grave. Em pacientes assintomáticos, considera-se adequado corrigir cerca de 10-12 mEq/dia (0,5 mEq/hora). Já os pacientes sintomáticos necessitam de uma correção mais rápida, com outra estratégia, mas mantendo os limites de segurança. Nos pacientes sintomáticos, com convulsões ou outros sintomas graves, recomenda-se uma correção inicial mais rápida, cerca de 1,5-2 mEq/hora, nas primeiras 3-4 horas, ou até melhora dos sintomas neurológicos. A correção no primeiro dia também não deve ultrapassar 12 mEq.
Complicações do Tratamento A adaptação que preserva o volume cerebral na hiponatremia crônica protege contra o aparecimento de edema cerebral, mas cria problemas no momento do tratamento, pois um aumento rápido na concentração de sódio no plasma durante a correção pode levar à mielinólise pontina central (ou desmielinização osmótica). O termo mielinólise pontina central pode não ser o mais adequado, uma vez que a desmielinização é geralmente mais difusa e muitas vezes não envolve a ponte. Estas al-
129
capítulo 9
terações podem ocasionar graves repercussões neurológicas que permanecem transitória ou definitivamente após o tratamento. Na hiponatremia crônica (desenvolve-se em mais de 48 horas) há perda de osmóis intracelulares como proteção contra o edema cerebral. Porém, estes osmóis não podem ser rapidamente repostos quando o cérebro diminui de volume durante a elevação do nível de sódio no sangue. Como resultado, o volume do cérebro diminui durante a correção rápida da hiponatremia. É nas áreas onde o reacúmulo de osmóis é mais lento que as lesões de mielinólise são mais intensas. Um mecanismo possível é que a diminuição de volume dos axônios induzida pela variação osmótica produza a desmielinização pela ruptura de conexões dos axônios com sua bainha de mielina.60 De maneira geral, as manifestações clínicas de desmielinização osmótica ocorrem 2-6 dias após a correção dos níveis de sódio. Os sintomas incluem disartria, disfagia, letargia, paraparesia ou quadriparesia e até coma. Estes sintomas podem não ser reversíveis.62 Evidências demonstram que é a rapidez de correção nas primeiras 24 horas que determina a ocorrência de lesões desmielinizantes. Estas lesões são mais freqüentes quando a correção ultrapassa 20 mEq/dia ou quando o sódio se eleva para mais de 140 mEq/L, e mais raras com correções abaixo de 0,5 mEq/hora ou 10-12 mEq/dia. Lesões desmielinizantes não são vistas quando a correção é mais lenta.62 A tomografia computadorizada e a ressonância magnética detectam as lesões de desmielinização, sendo este último método o preferido.65 Às vezes são necessárias até quatro semanas para as lesões serem detectadas.62 Encontram-se em maior risco para o desenvolvimento da desmielinização osmótica: mulheres na fase pré-menopausa usando tiazídicos, etilistas, desnutridos, queimados, pacientes depletados em potássio e crianças pré-púberes e pacientes em insuficiência respiratória.51,66 Os pacientes psiquiátricos que desenvolvem polidipsia com hiponatremia de modo geral corrigem rapidamente a hiponatremia, sem seqüelas.60,62
Pontos-chave: • O tratamento da hiponatremia depende da gravidade dos sintomas e rapidez de instalação. Os sintomas mais graves decorrem de edema cerebral • A hiponatremia sintomática é corrigida com a administração de solução salina hipertônica a 3% • A correção da hiponatremia sintomática não deve ultrapassar 0,5 mEq/L/hora
EXERCÍCIOS 1) Um paciente de 35 anos sofreu trauma cranioencefálico grave e foi internado em coma, escala de Glasgow 5, evoluindo para Glasgow 3. Seu débito urinário nos primeiros dois dias foi de aproximadamente 7 litros/dia. Além de receber 2 litros de solução salina isotônica e 1 litro de solução glicosada a 5% a cada dia, manitol era administrado na dose de 70 ml a cada 8 horas. Seus exames atuais demonstraram: Na 165 mEq/litro. Responda: a) Existe distúrbio hidroeletrolítico? Qual? b) Qual a causa mais provável para o mesmo? c) Como você corrigiria este distúrbio? 2) Para um sódio plasmático de 150 mEq/litro, num paciente de 70 anos de idade, com 60 kg e assintomático, calcule: a) Qual a água normal? b) Qual a água atual? c) Como corrigir este distúrbio? 3) Mulher de 55 anos, usuária de fluoxetina, internada por broncopneumonia. Na admissão, espaço extracelular aparentemente normal, contactuando adequadamente. Na 128 mEq/litro. Durante a internação atual, tornou-se confusa e progressivamente sonolenta. Na 117 mEq/litro. Peso = 55 kg. a) Existe distúrbio hidroeletrolítico? Qual? b) Qual a causa mais provável? c) Como tratar? 4) Homem portador de síndrome nefrótica, em anasarca, internado por tromboflebite em membro inferior. Sem outros sintomas. Peso = 72 kg. Na 125 mEq/L. a) Qual a água normal? b) Qual a água atual? c) Qual o tratamento?
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
ROSE, B.D.; POST, T.W. Cap. 9A: Water balance and regulation of plasma osmolality. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 2. GUYTON, A.C.; HALL, J.E. Regulation of extracellular fluid osmolarity and sodium concentration. In: Textbook of Medical Physiology, pp. 349-365, Saunders, 1996. 3. SEGURO, A.C.; ZATZ, R. Distúrbios da tonicidade do meio interno: regulação do balanço de água. In: ZATZ, R. (ed.) Fisiopatologia Renal, pp. 189-208, Atheneu, 2000. 4. FITZSIMONS, J.T. The physiological basis of thirst. Kidney Int., 10(1):3, 1976. 5. MAGALDI, A.J.B. Mecanismos de concentração e diluição urinárias. In: ZATZ, R. (ed.). Fisiopatologia Renal, pp. 57-69, Atheneu, 2000. 6. ROBERTSON, G.L. e col. The osmoregulation of vasopressin. Kidney Int., 10(1):25, 1976. 7. ROSE, B.D.; POST, T.W. Cap. 6B: Antidiuretic hormone and water balance. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 8. BERL, T.; ROBERTSON, G.L. Pathophysiology of water metabolism. In: BRENNER, B.; RECTOR, F. (eds) The Kidney, pp. 866-924, Saunders, 2000. 9. KNEPPER, M.A.; VERBALIS, J.G.; NIELSEN, S. Role of aquaporins in water balance disorders. Nephrology and hypertension – Current opinion, jul. 1997. 10. KWON, T.H.; HAGER, H.; NEJSUM, L.N.; ANDERSEN, M.L.E.; FROKIAER, J.; NIELSEN, S. Physiology and pathophysiology of renal aquaporins. Seminars in Nephrology, 21(3):231-238, 2001. 11. ZEIDEL, M.L. Recent advances in water transport. Seminars in Nephrology, 18(2):167-177, 1998. 12. MCDONALD, K.M. e col. Hormonal control of renal water excretion. Kidney Int., 10(1):38, 1976.
130 13. 14.
15.
16. 17. 18. 19. 20.
21.
22. 23.
24. 25.
26. 27.
28. 29. 30. 31. 32. 33.
34. 35. 36. 37.
38. 39. 40.
41. 42.
Metabolismo da Água
ROSE, B.D. Hyponatremia in hypothyroidism. Up To Date, v.9, n.3, 2001. CAPASSO, G.; De TOMMASO, G.; ANASTASIO, P. Glomerular hemodynamics and renal sodium handling in hypothyroid and hyperthyroid patients. J. Am. Soc. Nephrol., 9:68A, 1998. WOODHALL, P.B. e TISHER, C.C. Response of the distal tubule and cortical collecting duct to vasopressin in the rat. J. Clin. Invest., 52:3095, 1975. KRIZ, W. e LEVER, A.F. Renal countercurrent mechanisms: structure and function. Am. Heart J., 78. BERLINER, R.W. e col. Dilution and concentration of the urine and the action of antidiuretic hormone. Am. J. Med., 24:730, 1958. BERLINER, R.W. The concentrating mechanism in the renal medulla. Kidney Int., 9(2):214, 1976. STEPHENSON, J.L. Concentration of urine in a central core of the renal counterflow system. Kidney Int., 2:85, 1972. KOKKO, J.P. e RECTOR, Jr., F.C. Countercurrent multiplication system without active transport in inner medulla. Kidney Int., 2:214, 1972. KOKKO, J.P. e TISHER, C.C. Water movement across nephron segments involved with the countercurrent multiplication system. Kidney Int., 10(1):64, 1976. JAMISON, R.L. e MAFFLY, R.H. The urinary concentrating mechanism. N. Engl. J. Med., 295:1059, 1976. AYUS, J.C. Hypo and hypernatremia – Pathogenesis and diagnosis. Part 1 and 2. American Society of Nephrology Board Review Course, sep. 1998 (slide and audio symposium – www.hdcn.com). ROSE, B.D.; POST, T.W. Cap. 8D: Volume regulation versus osmoregulation. Up To Date, v.9, n.3, 2001. MANGE, K.; MATSUURA, D.; CIZMAN, B.; SOTO, H.; ZIYADEH, F.N.; GOLDFARB, S.; NEILSON, E.G. Language guiding therapy: the case of dehydration versus depletion. Ann. Intern. Med., 127(9):848-853, 1997. PALEVSKY, P.M.; BHAGRATH, R.; GREENBERG, A. Hypernatremia in hospitalized patients. Ann. Intern. Med., 124:197-203, jan., 1996. AYUS, J.C.; BRENNAN, S. Hipernatremia. In: De FRONZO, R.; ARIEFF, A.I. (eds) Fluid, Electrolyte, and Acid-Base Disorders, pp.304317, Churchill-Livingstone, 1995. ROSE, B.D.; POST, T.W. Cap. 9B: Renal water excretion and reabsorption. Up To Date, v.9, n.3, 2001. BERL, T. e col. Clinical disorders of water metabolism. Kidney Int., 10(1):117, 1976. ROSE, B.D. Causes of hypernatremia. Up To Date, v.9, n.3, 2001. SCHRIER, R. The patient with hyponatremia or hypernatremia. In: Manual of Nephrology, pp. 20-36, Little, Brown, 1994. FRIED, L.F.; PALEVSKY, P.M. Hyponatremia and hypernatremia. Med. Clin. N. Am., 81(3):585-609, 1997. HAYS, R.M. e LEVINE, S.D. Pathophysiology of water metabolism. Cap. 15, p. 553 in The Kidney. Eds. B.M. Brenner e F.C. Rector Jr. W.B. Saunders Co., 1976. SINGER, I. e FORREST Jr., J.N. Drug-induced states of nephrogenic diabetes insipidus. Kidney Int., 10(1): 82, 1976. COX, M. e SINGER, I. Lithium and water metabolism. Am. J. Med., 59:153, 1975. MILLER, M. e MOSES, A.M. Drug-induced states of impaired water excretion. Kidney Int., 10(1): 96, 1976. MAZZE, R.I. e col. Renal dysfunction associated with methoxyflurane anesthesia: a randomized, prospective clinical evaluation. JAMA, 216:278, 1971. MILLER, M. e col. Recognition of partial defects in antidiuretic hormone secretion. Ann. Inter. Med., 73:721, 1970. ROSE, B.D. Diagnosis of polyuria and diabetes insipidus. Up To Date, v.9, n.3, 2001. KANNO, K.; SASAKI, S.; HIRATA, Y. e cols. Urinary excretion of aquaporin-2 in patients with diabetes insipidus. N. Engl. J. Med., 332:1540-5, jun. 1995. ROSE, B.D. Treatment of central diabetes insipidus. Up To Date, v.9, n.3, 2001. ROSE, B.D. Treatment of nephrogenic diabetes insipidus. Up To Date, v.9, n.3, 2001.
43. LOEB, J.N. The hyperosmolar state. The New Engl. J. Med., 290:1184, 1974. 44. KUGLER, J.P.; HUSTEAD, T. Hyponatremia and hypernatremia in the elderly. Am. Fam. Phys., 61:3623-30, 2000. 45. De FRONZO, R.; ARIEFF, A.I. Disorders of sodium metabolism – Hyponatremia. In: Fluid, Electrolyte, and Acid-Base Disorders, pp.255303, Churchill-Livingstone, 1995. 46. ADROGUÉ, H.J.; MADIAS, N.E. Hypernatremia. N. Engl. J. Med., 342(20):1493-1499, may, 2000. 47. ROSE, B.D. Treatment of hypernatremia. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 48. ADROGUÉ, H.J.; MADIAS, N.E. Hyponatremia. N. Engl. J. Med., 342(21):1581-1589, may, 2000. 49. FALL, P.J. Hyponatremia and hypernatremia. A systematic approach to causes and their correction. Postgrad. Med., 107(5):7582, may 2000. 50. PRESTON, R.A. Hyponatremia. In: Acid-Base, Fluids and Electrolytes Made Ridiculously Simple, pp. 39-64, MedMaster, Inc., 1997. 51. BERL, T. Therapy of hypo and hypernatremia. Parts 1, 2, 3. American Society of Nephrology Board Review Course, sep. 1998 (slide and audio symposium – www.hdcn.com). 52. ROSE, B.D. Causes of hyponatremia. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 53. DAVIS, D.P.; VIDEEN, J.S.; VILKE, G.M. e cols. Exercise-associated hyponatremia in marathon runners: a two-year experience. J. Emerg. Med, 21(1):47-57, jul. 2001. 54. SPEEDY, D.B.; NOAKES, T.D.; SCHNEIDER, C. Exercise-associated hyponatremia: a review. Emerg. Med., 13(1):5-6, mar., 2001. 55. SCWARTZ, W.B. e col. Syndrome of renal sodium loss and hiponatremia probably resulting from inappropriate secretion of antidiuretic hormone. Am. J. Med., 23:529, 1957. 56. ROSE, B.D. Causes of the SIADH. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 57. ROSE, B.D. Diagnosis of hyponatremia. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 58. ROSE, B.D. Electrolyte disturbances with HIV infection. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 59. ROSE, B.D. Treatment of hyponatremia: SIADH and reset osmostat. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 60. ROSE, B.D. Symptoms of hyponatremia and hypernatremia. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 61. HALPERIN, M.L.; GOLDSTEIN, M.B. Sodium and water physiology. In: Fluid, Electrolyte and Acid-Base Physiology. A problem-based approach, pp.217-320. W.B. Saunders, 1994. 62. ROSE, B.D. Treatment of hyponatremia. Up To Date, v.9, n.3, 2001. 63. GROSS, P. Correction of hyponatremia. Seminars in Nephrology, 21(3):269-272, may 2001. 64. HANTMAN, D. e col. Rapid correction of hyponatremia in the syndrome of inappropriate secretion of Antidiuretic Hormone. An alternative treatment to hypertonic saline. Ann. Intern. Med., 78:870, 1973. 65. PIRZADA, N.A. Central pontine myelinolysis. Mayo Clin. Proc., 76(5):559-62, may, 2001. 66. ARIEFF, A.L.; AYUS, J.C. Outcome in hyponatremic encephalopathy is unrelated to rate of correction. J. Am. Soc. Nephrol., 10:119A, 1999.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.kidneyatlas.org/book1/adk1_01.pdf — Excelente capítulo do Atlas on-line de Doenças Renais de Robert Schrier. Ótimas figuras. http://www.postgradmed.com/issues/2000/05_00/ fall.htm — Artigo interessante sobre hipo- e hipernatremia. http://www.aafp.org/afp/20000615/3623.html — Artigo sobre hipo- e hipernatremia em idosos. http://www.emedicine.com/emerg/topic263.htm — Boa revisão sobre hipernatremia. http://www.emedicine.com/emerg/topic275.htm — Boa revisão sobre hiponatremia. http://www.learndoctor.com/chapterpages/chapter19.htm — Auto-avaliação em metabolismo da água. http://www.swmed.edu/stars/resources/toto.pdf — Grupo de slides muito bons sobre hipernatremia.
capítulo 9
http://www.curriculum.som.vcu.edu/m2/renal/ppt/ Homeostasis/ — Grupo de slides sobre distúrbios do metabolismo do sódio e da água. http://www.ndif.org/Translation/jtran-160.html — Resumo de um artigo da Medical Clinics of North America de maio de 1997, pela Nephrogenic Diabetes Insipidus Foundation.
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS OBS.: Nestes exercícios utilizaremos 60% como a percentagem de água em relação ao peso corporal, para homens e mulheres. 1) 35 anos, trauma cranioencefálico, sódio 165 mEq/litro. a) Existe distúrbio hidroeletrolítico? Sim. Qual? Hipernatremia. b) Qual a causa mais provável? Este paciente apresenta pelo menos três causas em potencial para o desenvolvimento de hipernatremia. A primeira é o trauma cranioencefálico, que pode causar dano à secreção ou liberação de HAD, tornando o paciente incapaz de concentrar a urina, o que explicaria a poliúria apresentada. Em segundo lugar, a administração de manitol induz à produção de urina hipotônica. E por último, as perdas de água livre através da respiração e pela urina não estão sendo adequadamente repostas. c) Para corrigir esta hipernatremia, deveria ser reposta uma solução hipotônica. O déficit de água que o paciente apresenta é de: Sódio atual água atual sódio normal água normal Água atual 140 (70 0,6)/165 35,6 litros Déficit de água água atual água normal 35,6 42 6,36 litros Portanto, para que o sódio retorne ao normal (140 mEq/litro), é necessário administrar 6,36 litros de solução salina hipotônica ou SG 5%. A correção não deve ultrapassar 0,5 mEq/litro/hora, em pelo menos 50 horas (a dosagem de sódio está 25 mEq/litro acima do normal; 25 divididos pela taxa de 0,5 50 horas).
131
2) 70 anos de idade, 60 kg, sódio 150 mEq/litro. a) Água normal 60% do peso 60 0,6 36 litros b) Sódio atual água atual sódio normal água normal Água atual 140 36/150 33,6 litros Déficit de água 33,6 36 2,4 litros c) Deve ser administrada solução salina hipotônica (2,4 litros) em 20 horas (a dosagem de sódio está 10 mEq/litro acima do normal; 10 divididos pela taxa de 0,5 20 horas). 3) 55 anos, broncopneumonia. Sódio 117 mEq/litro. a) Trata-se de hiponatremia. b) Existem algumas possibilidades: a primeira é que a paciente tenha uma SIHAD pela broncopneumonia, daí a impossibilidade de eliminar urina diluída. Em segundo lugar, está em uso de fluoxetina, que pode induzir aumento na liberação de HAD. Neste caso, deveria ser cuidadosamente verificado o balanço de fluidos dos dias antecedentes, para excluir a participação de uma reposição excessiva de soro glicosado a 5%. c) Como a paciente tornou-se agudamente sintomática, deve receber solução salina hipertônica (3%). A quantidade de sódio necessária para elevar o sódio plasmático para 125 mEq é: Sódio necessário água corporal normal (sódio desejado atual) Sódio necessário (55 60%) (125 117) 33 8 264 mEq Sabendo que a solução salina hipertônica tem 514 mEq/litro, serão necessários aproximadamente 500 ml desta solução. Nas primeiras 3-4 horas, o ritmo de correção pode ser mais rápido (1,5-2 mEq/hora), e depois manter 0,5 mEq/hora. Observe que em 264 ml desta solução há tanto sódio como em 1.700 ml de salina isotônica. Além de corrigir a hiponatremia sintomática, este sódio também estará provocando expansão do extracelular, com o risco de congestão circulatória. 4) Paciente com síndrome nefrótica, em anasarca. Sódio 125 mEq/ litro. a) Água normal (72 0,6) 43 litros. b) Água atual 43 140/125 48 litros. c) Este paciente apresenta excesso de 5 litros de água e está assintomático. Deve ser restrita a ingestão de água e administrado diurético, pois apresenta extracelular aumentado.
Capítulo
10
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema Miguel Carlos Riella, Maria Aparecida Pachaly e Leonardo Vidal Riella
INTRODUÇÃO Balanço do sódio RESPOSTA DO RIM ÀS ALTERAÇÕES NA INGESTA DE SÓDIO QUEM PERCEBE E REGULA AS ALTERAÇÕES DO VOLUME EXTRACELULAR? REGULAÇÃO INTRA-RENAL DA EXCREÇÃO DE SÓDIO
Fatores derivados do endotélio Prostaglandinas Sistema nervoso simpático Diurese pressórica DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DO SÓDIO Depleção de sódio ou do volume extracelular Dados laboratoriais
Auto-regulação renal
Conseqüências da depleção do volume extracelular
Filtração glomerular — balanço glomérulo-tubular
Tratamento da depleção
Reabsorção e propriedades físicas no capilar peritubular
Tipo de solução
Pressão oncótica peritubular
Velocidade de administração
Pressão hidrostática no capilar peritubular
Volume a ser infundido (grau de depleção)
Balanço glomérulo-tubular e fatores humorais intra-renais
Monitorização do tratamento
Reabsorção dependente da velocidade do fluxo de líquido tubular Reabsorção dependente do volume do túbulo proximal TIPOS DE TRANSPORTE DE SÓDIO REABSORÇÃO NOS DIFERENTES SEGMENTOS DO NEFRO
EXCESSO DE VOLUME EXTRACELULAR—EDEMA Fisiopatologia do edema Edema localizado Edema generalizado Fisiopatologia do edema em situações clínicas específicas Insuficiência cardíaca congestiva (ICC)
Túbulo contornado proximal (TCP)
Cirrose hepática
Segmentos delgados da alça de Henle
Síndrome nefrótica
Segmento ascendente espesso da alça de Henle
Glomerulonefrite aguda
(segmento diluidor) Túbulo contornado distal (TCD) Ducto coletor OUTROS FATORES QUE REGULAM A EXCREÇÃO DE SÓDIO
Edema observado em mulheres Causas diversas de edema Princípios gerais no tratamento do edema Tratamento da doença básica Adequação da ingesta de sal e água
Redistribuição do filtrado glomerular
Mobilização do edema
Angiotensina II
Indução de balanço negativo de sódio
Aldosterona
EXERCÍCIOS
Fatores físicos e volume do espaço extracelular
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Hormônio natriurético
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Fator natriurético atrial (FNA)
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS
133
capítulo 10
INTRODUÇÃO O sódio é o íon mais abundante do compartimento extracelular, e a quantidade de sódio neste compartimento é que determina o seu volume. O sódio e seus dois principais ânions, o cloro e o bicarbonato, constituem 90% ou mais da quantidade de soluto no líquido extracelular. Por outro lado, a quantidade de sódio no líquido intracelular é pequena, devido a mecanismos que ativamente eliminam o sódio das células. A concentração de solutos é a mesma nos compartimentos intra e extracelular devido à livre movimentação da água pelas membranas celulares, em resposta a um gradiente osmótico. Portanto, se há retenção de sódio no líquido extracelular, a pressão osmótica deste compartimento aumenta e a água intracelular move-se para o compartimento extracelular até que haja equilíbrio osmótico. A hiperosmolalidade do líquido extracelular também pode estimular a sede e a liberação do hormônio antidiurético, ambos determinando um balanço positivo de água. Então, o resultado final de um aumento de sódio no líquido extracelular é um aumento do volume extracelular. Da mesma forma, uma diminuição da quantidade de sódio no líquido extracelular determina uma redução do volume extracelular. Tudo indica, portanto, que o sistema que controla o balanço de sódio faz parte integrante do sistema que controla o volume extracelular. Tendo em vista que a maior parte do volume líquido extracelular corresponde à água, seria legítimo supor que a regulação daquele volume fosse realizada por intermédio dos mecanismos que controlam o balanço de água.1 No entanto, as alterações na liberação de HAD e na excreção de água são mediadas principalmente pela tonicidade dos líquidos no organismo, a qual é controlada pelo sistema osmorregulador e não pelo sistema de controle do volume extracelular. Desde que o balanço de sódio é preservado, o controle da tonicidade serve para manter o volume de líquido extracelular constante. Contudo, em algumas situações, a excreção de água é regulada primariamente pelo volume e não pela tonicidade. Isto ocorre, por exemplo, quando há uma intensa contração do volume extracelular. Neste caso, a água é continuamente reabsorvida (apesar da hipotonicidade que se estabelece), na tentativa de restaurar o volume extracelular. Nesta situação, a regulação do volume tem preferência sobre a osmorregulação. Num indivíduo normal, o volume de líquido extracelular e o balanço de sódio variam dentro de limites estreitos, mesmo em face de grandes variações na ingesta e excreção renal de água e sal. E é o rim que mantém o volume extracelular constante, modulando a excreção de sódio. Assim, qualquer distúrbio que reduza o volume do compartimento extracelular é acompanhado por uma redução da excreção de sódio, enquanto um aumento de volume
do compartimento extracelular determina aumento na excreção de sódio. Se determinarmos a osmolalidade plasmática ou sérica, teremos a relação da soma dos solutos osmoticamente ativos (intra e extracelulares) com o volume de água nestes compartimentos. Como o sódio é o principal soluto no líquido extracelular, a concentração do sódio no plasma ou soro indica a relação existente entre a quantidade total de soluto e água no organismo. Normalmente, a excreção de sódio na urina não depende da concentração plasmática de sódio, e vários experimentos demonstram isto. Por exemplo, quando se expande o volume extracelular com solução salina isotônica, a excreção urinária de sódio aumenta. Da mesma forma, a ingestão de água, combinada à administração de vasopressina, causa retenção de água que, eventualmente, acarreta expansão do volume extracelular. Com o volume extracelular expandido, há aumento na excreção urinária de sódio, apesar da hiponatremia causada pela administração simultânea de água e vasopressina. Um outro exemplo é a situação em que o organismo só perde água, o que causa diminuição do volume extracelular e, conseqüentemente, diminuição da excreção urinária de sódio, apesar da hipernatremia.
Balanço do Sódio A ingestão média de cloreto de sódio em um adulto normal é de 7 g ou 150 mEq por dia.1 Para manter o equilíbrio, a mesma quantidade deve ser excretada.2 Ao contrário da água, cuja ingestão é controlada pela sede, não existe no ser humano um apetite específico para sódio. Uma vez absorvido, o íon sódio distribui-se no organismo da seguinte maneira: 45% para o líquido extracelular, 7% para o líquido intracelular e 48% para o esqueleto. O sódio do esqueleto se apresenta sob duas formas: permutável (50%) e não-permutável (50%). Esta divisão é baseada na maior ou menor facilidade com que o sódio se liberta do osso para a circulação. O sódio não-permutável integra áreas firmemente mineralizadas, sendo menos acessível à circulação e, portanto, dificilmente se liberta do esqueleto. O sódio permutável pode libertarse do osso em condições especiais como a acidose metabólica, onde o carbonato de sódio dos cristais depositados na matriz óssea neutraliza o íon H⫹, trocando-o pelo sódio.1 A concentração plasmática de sódio está entre 135 e 145 mEq/L, sendo a concentração intracelular em torno de 10% da concentração plasmática. O sódio é eliminado do organismo na urina, fezes e suor. Para efeito de balanço, o que importa é a excreção urinária de sódio. A eliminação pelo suor adquire importância somente em casos de sudorese profusa, pois a concentração de sódio no suor é baixa. Da mesma forma, diarréias graves podem determinar perdas consideráveis de sódio nas fezes.
134
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
RESPOSTA DO RIM ÀS ALTERAÇÕES NA INGESTA DE SÓDIO Quando se altera a ingesta de sódio, a adaptação na excreção renal de sódio é lenta, podendo levar muitos dias para que se iguale à ingesta.3 Observem na Fig. 10.1 que, quando a ingestão de NaCl aumenta, apenas uma parte deste incremento é eliminada no primeiro dia. O restante é retido, juntamente com água, resultando numa expansão do volume extracelular. A expansão do volume extracelular estimula progressivamente um aumento na excreção de sódio, até que a quantidade excretada se iguale à ingerida. Por outro lado, se a ingesta de sódio for reduzida abruptamente, levará muitos dias para que a excreção de sódio seja reduzida a uma quantidade igual à ingesta. O mecanismo pelo qual alterações no volume extracelular modificam a excreção de sódio não está totalmente esclarecido e será abordado a seguir. Normalmente, a quantidade de sódio excretado na urina está em torno de 0,5% da quantidade filtrada pelo rim. Na Fig. 10.2, um único nefro representa a função total de ambos os rins. Considerando uma filtração glomerular de 125 ml/min e um sódio plasmático de 140 mEq/L, o sódio total filtrado por dia será de 25.200 mEq. Aproximadamente 67% do sódio filtrado são reabsorvidos no túbulo contornado proximal e 10% na parte reta do túbulo proximal. Isto significa que a reabsorção proximal de sódio está em torno de 80% da carga filtrada, enquanto 20% do sódio filtrado são reabsorvidos em segmentos distais ao túbulo proximal.
RFG ⫽ 125 ml/min = 180 L/DIA PNa⫹ ⫽ 140 mEq/L
UNa⫹ ⫽ 100 mEq/L
Fig. 10.2 Filtração e excreção diária de sódio num adulto normal. No diagrama, o nefro representa toda a população de nefros de ambos os rins. Observe que cerca de 80% do sódio filtrado são reabsorvidos no nefro proximal e que no final apenas 0,6% da carga filtrada aparece na urina. Observe, também, que a quantidade excretada é mais ou menos igual à quantidade ingerida, o que indica que há um balanço. (Baseado na concepção de Valtin, H. 53)
Considerando-se um fluxo urinário normal de 1 ml por minuto (1.440 minutos em 24 horas), o volume urinário estará em torno de 1.500 ml. Se a concentração urinária de sódio for de 100 mEq/L, a excreção urinária diária de sódio será em torno de 150 mEq ou 0,6% do sódio total filtrado.
Fig. 10.1 Balanço de sódio no homem. Observe que, quando a ingesta de sódio é subitamente elevada, apenas cerca da metade do incremento aparece na urina no primeiro dia. O restante do incremento fica retido no organismo e aumenta o volume de líquido extracelular, que se traduz por um aumento do peso. Nos dias subseqüentes, uma fração menor de sódio é retida, e a excreção de sódio aumenta progressivamente, até que em três a cinco dias a excreção se iguala à ingestão. O estímulo para o aumento na excreção de sódio se deve à expansão do volume extracelular. Observe também que, quando se reduz abruptamente a ingesta, a diminuição na excreção de sódio é também gradual e os mesmos mecanismos operam, só que de maneira inversa. (Obtido de Earley, L.E.3)
capítulo 10
Pelo exposto, poderíamos deduzir que uma alteração da filtração glomerular ou da reabsorção tubular de sódio pode comprometer o balanço de sódio e, conseqüentemente, o volume dos compartimentos líquidos do organismo.
Pontos-chave: • A concentração plasmática de sódio é de 135-145 mEq/L • A adaptação renal às variações na ingesta de sódio é lenta • A excreção urinária diária de sódio deve equilibrar-se com a ingesta • Apenas 0,6% de todo o sódio filtrado é eliminado na urina
QUEM PERCEBE E REGULA AS ALTERAÇÕES DO VOLUME EXTRACELULAR? A homeostase dos fluidos é essencial para a manutenção da estabilidade circulatória. Pequenas modificações no volume extracelular devem ser prontamente identificadas e corrigidas, para que o equilíbrio seja mantido.4 Existem estruturas no organismo que agem como receptores de volume, e, através de mecanismos nervosos, humorais e hormonais, provocam adaptações funcionais em vários órgãos e fornecem aos rins os elementos para correção dos desvios no volume extracelular1 (Quadro 10.1). Por exemplo, a expansão de volume ativa uma seqüência de sinais provenientes de vários destes receptores, aumentando a excreção de sódio. Ao contrário, a resposta à depleção de volume é a conservação renal de sal e água.4 A redistribuição interna do volume intravascular, mesmo sem mudança no volume circulante, provoca alteração na excreção de sódio. Por exemplo, quando um indivíduo se deita, a excreção de sódio aumenta, e, quando fica de
Quadro 10.1 Receptores mecânicos sensíveis a alterações regionais da volemia Receptores de volume intratorácicos Aurículas Ventrículo direito Capilares pulmonares Receptores de volume no sistema arterial Artérias carótidas Arco aórtico Receptores de volume no rim Receptores de volume no sistema nervoso central Receptores de volume no fígado
135
pé, a excreção de sódio diminui.3 Isto significa que a postura influi sobre a excreção de sódio. Epstein e cols. verificaram que, quando se comprimia externamente uma fístula arteriovenosa grande, a excreção de sódio na urina aumentava.5 No caso da fístula arteriovenosa, a compressão externa impede a passagem do sangue arterial para o sistema venoso, causando aumento do volume arterial efetivo. Isto sugere que o volume arterial efetivo exerce controle sobre o volume extracelular. Há receptores de volume no leito vascular venoso e pulmonar (intratorácicos),6 capazes de perceber reduções no retorno venoso e ativar uma diminuição na excreção urinária de sal. Isto ocorre, por exemplo, quando o indivíduo fica muito tempo em pé, quando se aplicam torniquetes nas pernas ou em indivíduos em ventilação com pressão positiva. De modo inverso, o aumento do retorno venoso torácico aumenta a excreção urinária de sódio, como se observa em indivíduos em decúbito dorsal. O tônus simpático e a secreção de adrenalina e noradrenalina são ativados quando existe queda no débito cardíaco ou queda de pressão arterial. Esta redução na pressão ativa os receptores cardíacos e arteriais, aumentando as descargas em tronco cerebral que aumentam o tônus simpático, iniciando eventos que levam à normalização da perfusão, entre eles um aumento da reabsorção tubular de sódio.7 Talvez a demonstração mais convincente da influência da volemia intratorácica e receptores cardiopulmonares na natriurese derive de estudos com indivíduos normais imersos em água até o pescoço. A pressão hidrostática do líquido de imersão ocasiona a redistribuição do fluido intravascular e do interstício dos membros inferiores para o tórax. O conseqüente aumento no volume circulante central provoca natriurese e aumento da diurese. Resposta similar é obtida em pacientes cirróticos, que excretam pouco sódio em condições basais.7 Foram identificados receptores de volume localizados nos átrios, seio carotídeo e arco aórtico. Quando existe queda na pressão arterial ou débito cardíaco, o tônus simpático e a secreção de adrenalina e noradrenalina são ativados por estes receptores, iniciando eventos que levam à normalização da perfusão, entre eles aumento da reabsorção tubular de sódio.7 Além disso, estes receptores estão associados ao controle da liberação de HAD (v. Cap. 9). A liberação de HAD e a sede, mecanismos de restauração do déficit de água, podem também ser estimulados por aumento da osmolalidade plasmática e pela contração isosmótica do volume extracelular (através do sistema reninaangiotensina). O rim percebe alterações no volume e na pressão intravascular através de um sistema barorreceptor localizado no aparelho justaglomerular da arteríola aferente e células da mácula densa no túbulo distal (v. Cap. 7). Estes receptores influenciam a atividade do sistema renina-angiotensina-aldosterona, endotelina e óxido nítrico.7 Uma re-
136
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
dução na pressão de perfusão renal promove liberação de renina do aparelho justaglomerular, com formação de angiotensina II, liberação de aldosterona e retenção de sódio. A administração de soluções distintas causa diferentes taxas de excreção de sódio. Uma expansão do compartimento intravascular com a administração de plasma ou sangue, por exemplo, causa natriurese menos significativa do que a obtida com quantidades equivalentes de solução salina isotônica. Todavia, a administração de uma solução hipertônica de albumina expande o intravascular e contrai o compartimento intersticial, podendo não modificar a excreção de sódio. Isto indica que outros estímulos, além da expansão absoluta do volume extracelular, são importantes na excreção de sódio.3 Há sugestões de que o fígado também possua receptores especiais e participe da regulação da excreção de água e sal. Estudos demonstraram que a infusão de solução salina isotônica ou hipertônica no sistema porta causa uma natriurese mais significativa do que se a mesma solução fosse infundida numa veia sistêmica.8
Pontos-chave: • O sódio é o principal cátion do extracelular • A quantidade de sódio no organismo determina o volume do espaço extracelular • Para manter a estabilidade circulatória, o volume extracelular deve ser adequadamente controlado • Os sensores de volume e pressão desencadeiam mecanismos de regulação do extracelular, aumentando ou diminuindo a excreção de sódio
REGULAÇÃO INTRA-RENAL DA EXCREÇÃO DE SÓDIO Num indivíduo sadio a quantidade reabsorvida de sódio é superior a 99% da quantidade filtrada. Como a quantidade filtrada excede em muito a excretada, torna-se claro que o rim deve possuir um sistema de conservação de sódio altamente desenvolvido.
Auto-regulação Renal Vários mecanismos mantêm a quantidade de sódio filtrada relativamente constante. Os rins são capazes de manter a taxa de filtração glomerular constante, mesmo que haja amplas variações da pressão de perfusão renal. Este fenômeno é chamado auto-regulação renal. Respostas na musculatura lisa das arteríolas aferentes ocorrem em direta proporção com mudanças na pressão de perfusão re-
nal, mantendo estáveis o fluxo sanguíneo renal, TFG e sódio filtrado.9 Porém, somente modificações na TFG não são suficientes para explicar os ajustes na excreção de sódio.4
Filtração Glomerular — Balanço Glomérulo-tubular Observou-se que uma diminuição da filtração glomerular, causada por hemorragia ou constrição da artéria renal, diminuía a excreção de sódio. Já um aumento na filtração glomerular causado pela administração de solução salina era acompanhada por aumento na excreção de sódio. Portanto, estes estudos demonstravam um paralelo entre filtração glomerular e excreção de sódio. Entretanto, De Wardener10 e outros investigadores demonstraram que o aumento na excreção de sódio que ocorre com a expansão do volume extracelular permanece mesmo quando se reduz a filtração glomerular e conseqüentemente a quantidade de sódio filtrada. Por outro lado, ao se produzir um aumento na filtração glomerular, mas sem expandir o volume extracelular, a excreção de sódio permanece inalterada ou aumenta muito pouco. Isto tudo indica que as alterações na filtração glomerular não são essenciais para o rim regular o volume extracelular.6 O ponto principal na regulação do equilíbrio de sódio é o controle de sua reabsorção,2 como veremos a seguir. Numerosas investigações demonstraram que alterações na filtração glomerular são acompanhadas por alterações proporcionais na reabsorção de líquido no túbulo proximal, de modo que a fração do volume filtrado que é reabsorvida pelo túbulo proximal permanece mais ou menos constante.1 Normalmente, 80% do filtrado glomerular são reabsorvidos pelo túbulo proximal. O fenômeno pelo qual alterações na taxa de filtração glomerular se acompanham de modificações correspondentes na reabsorção tubular de sódio é chamado de balanço glomérulo-tubular (v. Quadro 10.2).1,2 Este balanço evita alterações excessivas na excreção de sódio quando a filtração é abruptamente aumentada ou diminuída. Os principais mecanismos responsáveis pelo balanço glomérulo-tubular são: pressão oncótica e hidrostática peritubu-
Quadro 10.2 Balanço glomérulo-tubular Filtração Glomerular (ml/min) 150 100 50
Reabsorção Proximal (ml/min)
Fração de Volume não Reabsorção Reabsorvido (%) (ml/min)
120 80 40
Obtido de Malnic, G. e Marcondes, M.1
80 80 80
30 20 10
capítulo 10
lares, fatores humorais intra-renais, velocidade do fluxo tubular e volume do túbulo proximal.11 Estes mecanismos são descritos a seguir.
Reabsorção e Propriedades Físicas no Capilar Peritubular PRESSÃO ONCÓTICA PERITUBULAR Alterações na concentração de albumina e pressão oncótica nos capilares peritubulares afetam o movimento transtubular de sódio. A concentração de albumina no capilar peritubular é determinada pela concentração plasmática de albumina na arteríola eferente e pela fração de filtração (porção do fluxo plasmático renal que é filtrada). Portanto, um aumento no ritmo de filtração glomerular aumenta a fração de filtração, formando o ultrafiltrado (plasma sem proteínas), retirando água e eletrólitos do capilar glomerular e aumentando a concentração relativa de albumina no capilar peritubular. Este aumento da pressão oncótica favorece a reabsorção de sal e água. A diminuição da filtração glomerular tem efeito oposto. Brenner e cols. demonstraram que a diminuição da reabsorção de sódio no túbulo proximal, que ocorre durante a expansão do volume extracelular com solução salina isotônica, é decorrente da diminuição da pressão oncótica do capilar peritubular. Quando os autores perfundiam o capilar peritubular com uma solução de albumina, normalizando a pressão oncótica, a inibição da reabsorção de sódio era corrigida.12,13
PRESSÃO HIDROSTÁTICA NO CAPILAR PERITUBULAR Earley e cols. sugeriram que alterações na pressão hidrostática do capilar peritubular seriam responsáveis por modificações na reabsorção de sal e água.14 Um aumento da pressão capilar peritubular causaria natriurese, e a diminuição da pressão capilar teria um efeito oposto. O mesmo grupo de investigadores demonstrou que a natriurese induzida por aumento na pressão hidrostática do capilar peritubular poderia ser inibida por um aumento da pressão oncótica do plasma. Estas observações levaram o grupo a postular que o ritmo de reabsorção de sódio pode ser influenciado pelo balanço das forças de Starling (v. Cap. 8). Existem importantes diferenças no movimento transcapilar de líquido entre os capilares periféricos, glomerulares e peritubulares. As forças de Starling que norteiam a troca de líquido no capilar periférico já foram abordadas no Cap. 8, enquanto as forças que governam a filtração glomerular foram abordadas no Cap. 3. No capilar peritubular são muito distintas as forças responsáveis pela troca de líquido. A arteríola eferente, funcionando como um vaso de resistência, contribui para a redução da pressão hidrostática entre o glomérulo e o capilar peritubular. Além do mais, como o capilar peritubu-
137
lar recebe sangue do glomérulo, a pressão oncótica plasmática é alta no início do capilar devido ao ultrafiltrado glomerular (líquido sem proteína). Logo, quanto maior for o ritmo de filtração glomerular em relação ao fluxo plasmático (fração de filtração), maior será a concentração protéica na arteríola eferente. Assim sendo, ao contrário do capilar periférico e glomerular, o capilar peritubular é caracterizado por valores elevados de pressão oncótica que em muito excedem a pressão hidrostática, resultando em absorção de líquido. Apesar de a pressão oncótica no capilar peritubular diminuir ao longo do capilar, à medida que o líquido é reabsorvido, esta pressão permanece maior que a pressão hidráulica.
BALANÇO GLOMÉRULO-TUBULAR E FATORES HUMORAIS INTRA-RENAIS A participação de um fator luminal na reabsorção de sódio foi sugerida por Leyssac.15 Segundo este autor, um aumento na reabsorção tubular proximal reduz a pressão intraluminal e, conseqüentemente, aumenta as forças que promovem a filtração glomerular. Um maior ritmo de filtração glomerular aumenta a quantidade de líquido ofertado ao túbulo proximal, restaurando o balanço glomérulo-tubular. Uma diminuição na reabsorção tubular aumentaria a pressão intraluminal, a qual diminuiria a filtração glomerular. Thuray e Schnermann, por sua vez, propuseram um mecanismo diferente para explicar a relação entre a filtração glomerular e a reabsorção tubular de sódio.16 Segundo estes autores, a quantidade de sódio que atinge a mácula densa do nefro pode, por um mecanismo de feedback (controle retrógrado), controlar a filtração glomerular deste nefro, através da liberação local de renina e geração de angiotensina II, que é um potente constritor de músculo liso. Um aumento na filtração glomerular aumenta a quantidade de sal e água que chega à mácula densa. Isto promove a liberação de renina e formação de angiotensina II. A angiotensina II causa constrição da arteríola aferente, diminuindo a filtração glomerular e restaurando, assim, o balanço glomérulo-tubular. Uma redução da filtração glomerular resulta em diminuição da quantidade de sal e água que atinge a mácula densa, havendo então redução na liberação de renina. Com isso, menos angiotensina II é formada, resultando em vasodilatação da arteríola aferente, o que causa aumento na filtração glomerular. Posteriormente, os mesmos autores concluíram que não era a concentração de sódio intraluminal na mácula densa que daria o sinal para liberação de renina, e sim a quantidade de sódio transportada pelas células da mácula densa e que entraria em operação somente quando houvesse aumento no transporte de sódio a esse nível. No entanto, até o momento esta teoria é conflitante e talvez não tenha participação na regulação da filtração glomerular em condições fisiológicas.
138
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
REABSORÇÃO DEPENDENTE DA VELOCIDADE DO FLUXO DE LÍQUIDO TUBULAR Alguns estudos mostram que a reabsorção de líquido é maior no segmento inicial do túbulo contornado proximal do que nos segmentos mais distais. Postulou-se, então, que o acúmulo de um soluto pouco reabsorvível nos segmentos iniciais do túbulo contornado proximal (acúmulo devido à reabsorção de água, que progressivamente concentra este soluto) inibiria a reabsorção de sal nos segmentos mais distais. Entretanto, túbulos isolados e perfundidos in vitro não exibiram esta característica de reabsorção aumentada no segmento inicial do túbulo contornado proximal (TCP). Mas, quando o líquido perfundido utilizado foi um ultrafiltrado do plasma, esta relação entre fluxo e reabsorção de sódio foi novamente detectada.17 A conclusão é de que esta relação fluxo/reabsorção ainda padece de demonstração mais convincente.
REABSORÇÃO DEPENDENTE DO VOLUME DO TÚBULO PROXIMAL Esta teoria propõe que o ritmo de absorção de líquido do túbulo proximal é diretamente proporcional ao volume tubular. Segundo os proponentes desta teoria, a variação do volume tubular é importante, pois expõe o filtrado glomerular a uma maior ou menor área de reabsorção e permite um maior tempo de contato do líquido intratubular com as paredes do túbulo proximal.18 Assim sendo, um aumento na filtração glomerular proporciona um volume maior de filtrado e, conseqüentemente, maior volume tubular, que se acompanha de aumento na sua capacidade de reabsorção. Uma redução da filtração glomerular reduz o volume de filtrado, e, portanto, o volume tubular, reduzindo a capacidade reabsortiva. Em face de outras investigações, que concluíram que o volume tubular não é fator importante no balanço glomérulo-tubular, a hipótese original não é por todos aceita. Em resumo, pode-se afirmar que alterações na filtração glomerular podem ou não ser acompanhadas de alterações na excreção de sódio. Tudo depende de como se alterou a
Pontos-chave: • O ponto principal na regulação do balanço do sódio é o controle de sua reabsorção • Balanço glomérulo-tubular: é um mecanismo de ajuste na reabsorção de sódio pelos túbulos, de acordo com a filtração glomerular • Variações nas pressões oncótica e hidrostática peritubulares, pressão e volume tubulares e fatores hormonais afetam a excreção de sódio
filtração glomerular. Se o volume extracelular não é alterado, um aumento na filtração glomerular acompanha-se de pouco ou nenhum aumento na excreção de sódio. Por outro lado, uma expansão do volume extracelular sempre causa aumento na excreção de sódio, mesmo que não se reduza a filtração glomerular. Atualmente, vários investigadores têm tentado esclarecer o papel destes fatores na reabsorção distal de sódio. Alguns estudos sugerem que as alterações nas forças de Starling são também capazes de alterar a reabsorção de sódio no nefro distal.
TIPOS DE TRANSPORTE DE SÓDIO O transporte ativo de Na⫹ através de tecidos epiteliais é o processo fisiológico primário responsável pela manutenção do balanço de sal em vertebrados. O conhecimento que se tem sobre o transporte tubular de sódio deve-se ao estudo de segmentos isolados do nefro através da técnica de micropunção em animais como o rato (Quadro 10.3). Nesta técnica, obtêm-se amostras do líquido tubular através de micropipetas. Além disto, os segmentos do nefro podem ser isolados e perfundidos in vitro, observando-se sua função. Mais recentemente, a evolução das técnicas de micropunção (patch-clamp) e a biologia molecular trouxeram grandes progressos no entendimento do transporte de íons e solutos através de membranas biológicas. Pela técnica patch-clamp uma pipeta cheia de líquido é colocada contra a superfície da célula e leve sucção é aplicada, permitindo o estudo do movimento de íons pelos canais existentes nesta área. É possível até mesmo obter dados de um único canal e saber quanto tempo permanece aberto ou fechado (gating). Os mecanismos de entrada de sódio nas células tubulares são: a) Via canais de sódio: Esta entrada é característica do túbulo distal (contornado) e ducto coletor, e ocorre pela membrana apical. Estes canais são especificamente bloqueados pelo diurético amiloride. b) Acoplada ao movimento de outros íons ou solutos: Estes sistemas de co-transporte são encontrados em todo o nefro e são as vias predominantes de transporte apical de Na⫹ no túbulo proximal e ramo espesso ascendente da alça de Henle. Os sistemas de co-transporte são classificados em symporters ou antiporters. Os symporters operam o movimento de Na⫹ e o íon ou soluto acoplado na mesma direção. Por exemplo, o transportador de Na⫹/glicose, em que ambos são transportados para dentro da célula. Já os antiporters trocam o Na⫹ por outro íon ou soluto. Um exemplo de sistema antiporter é o co-transporte de Na⫹/H⫹.
139
capítulo 10
Quadro 10.3 Transporte de NaCl e permeabilidade de diferentes segmentos do nefro a H2O e NaCl Permeabilidade
PROXIMAL Contornado Pars recta SEGMENTO DELGADO ALÇA DE HENLE Descendente Ascendente DISTAL Segmento diluidor Contornado SEGMENTO COLETOR Ducto coletor Ducto papilar
Absorção Ativa
H2O
NaCl
Na⫹ Na⫹
⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹⫹
⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹
Nenhuma Nenhuma
⫹⫹⫹⫹ ⫾
⫹ ⫹⫹⫹⫹
Cl⫺ Na⫹
± ⫾
⫹⫹⫹ ⫹
Na⫹ Na⫹
± HAD ⫹⫹⫹ ⫾
⫹ ⫹
Modificado de Burg, M.B.19
c) Transporte pela via paracelular: Além dos mecanismos acima, no tecido epitelial tubular há uma via adicional para o movimento de íons entre células através das tight junctions; esta via é conhecida como via paracelular. O transporte paracelular é passivo e depende da magnitude e direção de gradientes químicos e elétricos transepiteliais.
REABSORÇÃO NOS DIFERENTES SEGMENTOS DO NEFRO Túbulo Contornado Proximal (TCP) O túbulo proximal é constituído por um segmento contornado proximal e uma parte reta (pars recta). Cada célula do túbulo proximal possui uma membrana luminal (apical) e uma membrana peritubular (basolateral). As células adjacentes estão ligadas no bordo apical por uma estrutura denominada zonula occludens ou tight junction (Fig. 10.5) (v. Cap. 1). O transporte realizado através da membrana apical é chamado de transcelular, e o realizado através da membrana basolateral é chamado paracelular. A permeabilidade do túbulo proximal a água, sódio e cloro é muito alta. Cerca de 67% do sódio filtrado são reabsorvidos no túbulo contornado proximal e 10% na pars recta. A reabsorção de líquido no túbulo proximal é isosmótica, isto é, mesmo após a reabsorção de 2/3 do líquido filtrado, o líquido remanescente no lúmen do túbulo proximal tem a mesma osmolalidade do plasma. Portanto, a concentração do sódio em condições normais permanece constante em toda a extensão do túbulo proximal. A reabsorção de líquido está acoplada ao transporte ativo de sódio. Isto significa que, se o sódio é substituído por
outro cátion, a reabsorção de líquido cessa.19 O principal ânion que acompanha a reabsorção do sódio neste segmento é o bicarbonato. Além do sódio e bicarbonato, a glicose, aminoácidos e outros substratos orgânicos como o lactato são reabsorvidos neste segmento. Observa-se também aqui que, se estes substratos são retirados do líquido tubular, a reabsorção diminui.19 Na porção inicial do túbulo proximal (S1) o sódio é reabsorvido junto com o HCO3⫺ e com vários solutos orgânicos, como glicose e aminoácidos. Como resultado desta reabsorção preferencial de ânions não-cloro, a concentração luminal de cloro aumenta. Nas outras porções do túbulo proximal (S2 e S3) a reabsorção de Na⫹e Cl⫺ é acoplada. A membrana apical das células S1 contém um sistema de co-transporte para açúcares acoplado ao sódio. O symporter Na/glicose transporta um Na⫹ junto com uma molécula de glicose. Há também sistemas de transporte acoplados ao Na⫹ para aminoácidos, ácidos orgânicos e íons inorgânicos, como fosfato e sulfato. Como já frisamos, uma grande parte do Na⫹ é reabsorvida durante o processo de “resgate” do HCO3⫺ filtrado. Isto ocorre devido à atividade do antiporter Na⫹/H⫹ na membrana apical da célula. A entrada de Na⫹ na célula, favorecida pelo gradiente eletroquímico, gera uma força secundária para o transporte de H⫹ para o lúmen (secreção), o qual vai titular o HCO3⫺, gerando CO2 e H2O. Esta interação entre os substratos orgânicos (glicose, aminoácidos) e o sódio também é encontrada no intestino delgado, onde o transporte ativo destes substratos aumenta a entrada de sódio nas células absortivas do intestino. Com o transporte de sódio, há um transporte adicional de ânions e líquido. Este mecanismo tem sido aproveitado na prática no manejo de pacientes portadores de cólera.20 Na cólera, a diarréia é profusa, e grandes quantidades de líquidos e eletrólitos precisam ser administradas. Natural-
140
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
mente a via oral é mais prática e mais econômica. No entanto, a administração de uma solução de água e eletrólitos acompanha-se de uma reabsorção intestinal pequena, insuficiente para corrigir as perdas. No entanto, se a solução eletrolítica contiver glicose, ocorre aumento na reabsorção intestinal de sódio e, conseqüentemente, de outros ânions e líquido. Do total de NaCl reabsorvido, estima-se que 2/3 movem-se pela via transcelular e 1/3 pela via paracelular. Como a concentração intracelular de sódio é baixa, a entrada de sódio do lúmen para a célula depende de um gradiente eletroquímico. Já a principal via de saída do Na⫹ da célula é pela membrana basolateral, através da Na,K-ATPase. Além disto, o Na⫹ sai através do symporter 1 Na⫹/3HCO3⫺. O transporte de sódio para fora da célula é ativo (Fig. 10.4). O transporte paracelular de NaCl é passivo. É movido por gradientes químicos e elétricos transepiteliais (transporte difuso) ou por fluxo de líquido através do epitélio (transporte convectivo ou solvent drag effect — efeito arrastão). A via paracelular tem uma alta permeabilidade a NaCl e água. Já mencionamos também que a composição do líquido tubular é diferente nas porções iniciais e finais do túbulo proximal. Assim, no segmento inicial do TP há uma queda dramática na concentração de HCO3⫺, glicose e aminoácidos, e um aumento concomitante no cloreto. Na parte final do TP este cloreto se difunde para o interstício passivamente e a geração de voltagem proporciona a força para a reabsorção difusa de Na⫹. A reabsorção de água pelo TP proporciona um mecanismo adicional para o transporte paracelular de NaCl. Com a reabsorção de solutos, o líquido luminal fica um pouco hipotônico em relação ao interstício. Este pequeno gradiente osmótico é suficiente para causar a reabsorção de grande quantidade de água e junto levar o NaCl pelo efeito de arrasto. O sódio parece entrar na célula passivamente, através da membrana apical, e é transportado para o espaço intercelular. Isto causa aumento na concentração (osmolalidade) no espaço intercelular, o que atrai água passivamente devido ao gradiente osmótico. Com a chegada de água, a pressão hidrostática aumenta no espaço intercelular e o líquido é forçado a sair através da membrana basal (Fig. 10.5). Portanto, a pressão hidrostática elevada do espaço intercelular cria um gradiente de pressão entre este espaço e o interstício, fazendo com que este líquido passe para o interstício. Daí para o capilar, há um outro gradiente de pressão determinado pela pressão hidrostática intracapilar (que favorece a saída de líquido) e pela pressão oncótica do plasma (que se opõe à filtração do líquido). Os solutos orgânicos transportados para o espaço intercelular aumentam a osmolalidade, explicando em parte por que eles, quando presentes no líquido tubular, aumentam a reabsorção de líquido. Naturalmente, o líquido tubular contém vários íons e o movimento de sódio altera o ritmo de absorção destes íons. Quando
Fig. 10.3 Repercussões sobre a excreção urinária de sódio quando se aumenta o ritmo de filtração glomerular, com ou sem expansão simultânea do volume extracelular, através de solução salina isotônica e hormônio da paratireóide (PTH), respectivamente. Observe que, quando se administra PTH, a carga filtrada de sódio (CFNa) aumenta aproximadamente 6.000 mEq/min, enquanto a excreção de sódio (UNaV) aumenta somente 100 mEq/ min. Durante a expansão do volume, a CFNa aumentou 1.200 mEq/min com uma natriurese significativa (1.600 mEq/min). (Obtido de Slatopolski, E. e col.54)
o ambiente hiperosmolar do espaço intercelular criado pela reabsorção ativa de sódio atrai água, também atrai outros solutos. (efeito arrastão). Isto explica por que, quando se expande o volume extracelular e se reduz a reabsorção proximal de sal e água, também se percebe diminuição na reabsorção de potássio, cloro, bicarbonato, cálcio e fosfato. O balanço dos gradientes de pressão oncótica e hidrostática é que determina a força que move o líquido do interstício para o capilar peritubular. Se a pressão hidrostática aumentar, ou a pressão oncótica diminuir, menos líquido passará do interstício para o capilar. A presença de mais líquido no interstício aumenta a pressão hidrostática no local. Haverá, então, inversão do gradiente de pressão no espaço intercelular e fluxo retrógrado de sal e água para o lúmen tubular. Além disto, poderá haver redução no transporte ativo de sódio para o espaço intercelular devi-
capítulo 10
141
Fig. 10.4 Transporte de sódio através da célula tubular proximal. Observe que a entrada de sódio na célula é passiva, devido ao gradiente de potencial eletroquímico. Para sair da célula para o sangue, o sódio deve vencer um gradiente de potencial eletroquímico e para isto precisa ser ativamente eliminado através de uma bomba de sódio. (Modificado de Burg, M.B.19)
Fig. 10.5 Mecanismo proposto para o transporte isosmótico de líquido através de membranas epiteliais. (Obtido de Valtin, H.53)
do ao movimento lento de líquido no espaço, permitindo aumento na concentração de sódio. Esse aumento na concentração de sódio limita o transporte de sódio das células, devido a um elevado gradiente de concentração entre as células e o espaço intercelular. Por outro lado, um aumento na pressão oncótica ou uma diminuição na pressão hidrostática dos capilares peritubulares aumentam o transporte do líquido do interstício para o capilar. Este modelo oferece a explicação provável para algumas interações importantes entre fluxos de diferentes solutos através do túbulo proximal e a ligação com o transporte de sódio. O espaço intercelular é o local provável desta ligação.
O processo ativo de transporte do sódio também envolve alguma forma de troca com o íon hidrogênio.21 Afirmase freqüentemente que, ao longo do nefro e mais especialmente no túbulo proximal, o hidrogênio secretado é trocado pelo sódio, implicando uma certa ligação direta no movimento destes dois íons. Mas não parece haver uma bomba que troque ativamente sódio e hidrogênio. Aceitase, no entanto, que a passagem do hidrogênio da célula para o lúmen é um processo ativo, mas a passagem do sódio do lúmen para a célula é um processo passivo. No momento, acredita-se que o mecanismo de troca (Na⫹/H⫹) não é específico e resulta da necessidade de manter uma neutralidade elétrica dentro do lúmen tubular.21 Nos segmentos mais distais do túbulo contornado proxi-
142
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
mal, o transporte ativo de sódio ainda é o processo básico responsável pela absorção de líquido. Como no segmento proximal do TCP a reabsorção de bicarbonato foi mais rápida que a de cloro (devido ao processo de acidificação), neste segmento distal a concentração de bicarbonato no líquido tubular é menor e a do cloro maior, e é possível que o transporte de cloro neste segmento seja passivo, devido ao gradiente de concentração entre o lúmen e o sangue. Alguns acreditam que a difusão do cloro, através deste gradiente químico, possa ser a força primária na reabsorção de água e sal nestes segmentos mais distais do TCP. Devido à extensa reabsorção no segmento inicial do TCP, a concentração de glicose, aminoácidos e outros substratos orgânicos diminui no segmento distal, e, conseqüentemente, o ritmo de absorção de líquido também diminui. A pars recta é relativamente inacessível à micropuntura, razão pela qual tem sido estudada em preparações in vitro. O transporte de sódio é ativo, e o de cloro, provavelmente passivo.
Segmentos Delgados da Alça de Henle As características de permeabilidade dos segmentos delgados à água e solutos são bastante importantes para a compreensão do transporte destes elementos.19 No segmento delgado descendente a permeabilidade à água é alta, enquanto no segmento delgado ascendente é baixa. A permeabilidade ao sódio e à uréia é maior no segmento delgado ascendente do que no descendente. No segmento ascendente a permeabilidade ao sódio excede a da uréia. A evidência atual é de que não há transporte ativo de NaCl nos segmentos delgados da alça de Henle, e as características de permeabilidade anteriormente descritas explicam o transporte passivo de NaCl e uréia nos segmentos delgados da alça de Henle. No segmento descendente ocorre concentração de soluto devido à saída passiva de água, determinada pelo gradiente osmótico. Alguns autores sugeriram que o aumento na concentração de soluto também se dá devido à entrada de soluto do interstício para o lúmen tubular (devido ao gradiente osmótico), embora em menor proporção que a saída de água. Na curva da alça, o líquido é hiperosmolar e tem a mesma osmolalidade que o interstício, mas a concentração de NaCl é superior à do interstício. A isosmolalidade é dada pela uréia, cuja concentração no interstício é maior que a do lúmen tubular. Devido a estas características de concentração e de permeabilidade do segmento ascendente delgado, o NaCl difunde-se do lúmen para o interstício. A uréia não se difunde tão rapidamente do interstício para o lúmen, porque o segmento é mais permeável ao sódio do que à uréia. Desta forma, ocorre a reabsorção de NaCl e diluição do líquido tubular no segmento ascendente delgado da alça de Henle (v. Cap. 4).
Segmento Ascendente Espesso da Alça de Henle (Segmento Diluidor) Este segmento estende-se do ramo ascendente delgado à mácula densa. A permeabilidade à água é baixa e a reabsorção de sal em excesso (em relação à água) gera um fluido tubular diluído. No segmento espesso ascendente, a reabsorção ativa de cloro gera uma diferença de potencial capaz de reabsorver passivamente o sódio. O ritmo de reabsorção de NaCl no segmento diluidor depende da quantidade absoluta de NaCl que chega. Por outro lado, o ritmo de transporte de NaCl no segmento diluidor depende da concentração de NaCl no lúmen. Se aumenta a quantidade absoluta do NaCl que chega ao segmento diluidor, aumenta a concentração de NaCl no segmento e, portanto, aumenta a reabsorção de NaCl. Se a reabsorção de NaCl no túbulo proximal diminui, aumenta a quantidade de NaCl que chega ao segmento diluidor, e logo aumenta a reabsorção de NaCl, minimizando as alterações na quantidade de NaCl ofertada ao túbulo contornado distal. Este segmento normalmente absorve 20% da carga filtrada de NaCl. A entrada de Na⫹ e Cl⫺ ocorre através da membrana apical por um symporter eletroneutro: 1 Na⫹:1 K⫹:2 Cl⫺. Os diuréticos de alça são inibidores específicos deste transportador. O gradiente de Na⫹ do lúmen para a célula gera um grande componente da força propulsora para reabsorção destes íons. O gradiente de Na⫹ é mantido pela Na,K-ATPase na membrana basolateral, que ativamente elimina o Na⫹ do interior da célula. Além da via transcelular, o Na⫹ é reabsorvido pela via paracelular. Como durante o transporte transcelular se gera uma voltagem transepitelial, a absorção de Na⫹ se faz pela via paracelular (aproximadamente 50% da reabsorção de Na⫹).
Túbulo Contornado Distal (TCD) Aproximadamente 7% da carga filtrada de NaCl é aqui reabsorvida. Estende-se da mácula densa até a junção com outro túbulo contornado, formando, a partir de então, o ducto coletor cortical. A reabsorção de sal continua neste segmento e a reabsorção de água depende da resposta deste segmento ao HAD. O líquido tubular que chega ao TCD é hiposmótico devido à reabsorção de NaCl no segmento diluidor. Em algumas espécies de animais, como o cão e o macaco, o líquido permanece hiposmótico porque a parte distal do TCD (túbulo coletor) não responde à ação do HAD. Em outras espécies animais, a osmolalidade do líquido aumenta, e isto porque o segmento distal do TCD responde à ação do HAD. Acredita-se que Na⫹ e Cl⫺ entram na célula por um sistema de transporte eletroneutro e a força propulsora é o gradiente de Na⫹ do lúmen para a célula. O gradiente é
143
capítulo 10
mantido pela atividade da Na,K-ATPase na membrana basolateral. A reabsorção de cloro ocorre de modo ativo e passivo.
Ducto Coletor Normalmente este segmento reabsorve 3% da carga filtrada de sódio. Entretanto, é nesta porção que existem os maiores gradientes de concentração entre sangue e urina e onde são feitos os ajustes finais para a excreção de íons. Os ductos coletores vão desde o córtex externo até a ponta da papila. São divididos em três segmentos. O primeiro segmento (ducto coletor cortical) se estende do córtex externo até a junção corticomedular. Contém dois tipos de células: célula principal e célula intercalada. A célula principal é local de reabsorção de Na⫹ e K⫹, e a célula intercalada está envolvida na acidificação da urina. A reabsorção ativa de Na⫹ se faz pela atividade da Na,K-ATPase localizada na membrana basolateral. Com esta atividade, estabelece-se um grande gradiente eletroquímico para a entrada do Na⫹ na célula através de um canal seletivo de Na⫹, sensível ao amiloride. O segundo segmento (ducto coletor medular externo) vai da junção corticomedular até a junção da medula interna e externa. O transporte de Na⫹ parece ser o mesmo do ducto coletor cortical. O terceiro segmento (ducto coletor medular interno) é um segmento muito ramificado com um único tipo de célula. Pouco se sabe sobre o transporte de íons neste segmento.
Pontos-chave: • O túbulo proximal (parte contornada e parte reta) é o principal local de reabsorção do sódio filtrado — cerca de 77% do sódio filtrado são aí reabsorvidos • O restante do sódio é reabsorvido nos segmentos distais ao túbulo proximal
OUTROS FATORES QUE REGULAM A EXCREÇÃO DE SÓDIO A regulação da excreção de sódio depende em última análise do controle da diferença entre a quantidade de sódio filtrada e a quantidade reabsorvida. Teoricamente, a excreção de sódio pode ser regulada por alterações na filtração glomerular ou reabsorção tubular. Mas, como já foi mencionado, a filtração glomerular não é peça crítica na excreção de sódio, e, portanto, alterações na excreção são resultado de alterações da reabsorção tubular. Os fatores que parecem ter um papel importante na regulação da excreção de sódio são apresentados a seguir.11
Redistribuição do Filtrado Glomerular O rim do mamífero é formado por uma população heterogênea de nefros. Aproximadamente 85% dos nefros são superficiais, localizados próximo ao córtex (nefros corticais), e possuem alças de Henle curtas. Os nefros restantes, mais ou menos 15%, estão localizados na junção do córtex com a medula (nefros justamedulares) e possuem alças de Henle longas. A excreção renal de sódio pode ser influenciada por uma redistribuição de filtrado glomerular entre os nefros corticais e justamedulares. Os nefros corticais (alça curta) teriam mais chances de deixar o sódio escapar do que os justamedulares (alça longa). Por outro lado, uma redistribuição do filtrado dos nefros corticais para os justamedulares facilitaria a retenção de sódio. Embora seja uma hipótese atraente, ainda faltam dados mais convincentes para aceitá-la.
Angiotensina II A angiotensina II é produzida quando a renina é liberada pelo aparelho justaglomerular. A angiotensina integra o sistema renina-angiotensina-aldosterona (v. Cap. 7). Uma diminuição do volume circulante efetivo é estímulo à produção de renina, que gera angiotensina; esta estimula a secreção de aldosterona, que, por sua vez, aumenta a reabsorção tubular de sódio, tentando restaurar o volume circulante. O principal efeito renal da angiotensina II é estimular a reabsorção de NaHCO3⫺ no túbulo contornado proximal. Como o fluido deve permanecer isosmótico neste local, a água é reabsorvida, e o cloro intraluminal aumenta. Este aumento cria uma diferença de concentração que leva à reabsorção passiva de cloro (arrastando sódio pela eletroneutralidade e água pela isosmolalidade). A angiotensina II é também potente vasoconstritora seletiva de arteríolas eferentes. Com isso, ocorre aumento na fração de filtração, alterando a reabsorção proximal devido a fatores físicos.2
Aldosterona É um hormônio secretado pela zona glomerulosa das glândulas adrenais. É capaz de estimular o transporte de eletrólitos por células epiteliais de glândulas salivares, trato gastrintestinal e túbulos renais. A aldosterona tem um papel importante na manutenção da homeostase do Na⫹, e chega a ser responsável por 5% da reabsorção total de sódio. A secreção de aldosterona é estimulada pela angiotensina, concentração de potássio plasmático e hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). Aparentemente a aldosterona entra na célula por difusão, migra até o núcleo e induz a
144
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
síntese de proteínas que aumentam a entrada de sódio do meio externo para o interior da célula. No epitélio tubular, a aldosterona induz aumento da permeabilidade da membrana apical ao sódio e, ao mesmo tempo, excreção de potássio. Após ser absorvido, o sódio é então removido para o capilar peritubular pela bomba de sódio. O transporte ao nível da bomba de sódio também está vinculado ao de potássio. À medida que o sódio é expulso da célula, aumenta a concentração intracelular de potássio, o qual, devido ao gradiente químico que se estabelece entre o meio intracelular e o meio extracelular, sai passivamente da célula1 (v. também Cap. 12).
Fatores Físicos e Volume do Espaço Extracelular Como já abordamos, há evidência de que fatores físicos influenciam o ritmo de absorção de líquido do túbulo contornado proximal. Os principais fatores são: hematócrito, concentração plasmática de proteínas e as pressões hidrostáticas na artéria renal, veia renal e ureter.22 O papel das pressões oncótica e hidrostática do capilar peritubular já foi comentado. Com relação à pressão venosa renal, demonstrou-se que um aumento desta pressão diminui a reabsorção de sódio no nefro proximal, desde que não haja redução da filtração glomerular. Quando o volume do espaço extracelular está reduzido, a urina eliminada contém quantidades muito pequenas de sódio. O inverso ocorre quando o espaço extracelular encontra-se expandido. Nos indivíduos euvolêmicos, o rim excreta a carga diária de NaCl. Então, não se costumam definir valores “normais” de sódio na urina, pois os mesmos devem ser avaliados de acordo com o estado fisiológico e a ingesta pelo paciente.2 Quanto ao hematócrito, uma redução deste causa aumento na excreção de sódio e redução da fração de filtração e da resistência vascular renal. Estes efeitos podem ser mediados pela alteração da viscosidade do sangue na circulação pós-glomerular, a qual, alterando a fração de filtração e a resistência vascular renal, altera as pressões peritubulares oncótica e hidrostática, respectivamente.
Hormônio Natriurético Observações experimentais conduziram ao conceito da existência de um regulador da bomba Na,K-ATPase há mais de 30 anos.10 Foram as experiências de De Wardener e cols. que demonstraram que a natriurese que ocorria com a infusão de solução salina não dependia dos dois fatores até então considerados importantes no controle da excreção de sódio, isto é, ritmo de filtração glomerular e aldosterona.10 Os experimentos iniciais foram feitos com circulação cruzada entre animais, um dos quais tinha o volume extracelular expandido.10 Os efeitos natriuréticos da expan-
são do espaço extracelular em um animal também ocorriam no segundo animal. A expansão do intravascular com solução salina provocava diurese ativa, sem modificações na pressão de perfusão renal, taxa de filtração glomerular, ou atividade mineralocorticóide. Presumiu-se que a natriurese era devida a uma substância circulante que exercia seus efeitos diretamente nos processos de reabsorção tubular de sódio. Experimentos posteriores confirmaram que extratos do plasma, urina e certos tecidos eram natriuréticos in vivo e apresentavam um efeito direto no transporte transepitelial do sódio. Entre os vários fatores natriuréticos isolados, o fator isolado por Bricker e cols. parece apresentar a melhor correlação com a manipulação renal de sódio. Este fator foi encontrado também no sangue e na urina de pacientes urêmicos.23,24 Estas substâncias possuem características semelhantes aos digitálicos. A descoberta destas substâncias nos tecidos dos mamíferos e a existência de isoformas de Na,K-ATPase com diferentes afinidades pelos glicosídeos cardíacos sugerem que a bomba Na,K-ATPase é endogenamente regulada por este composto. Porém, ainda não foi esclarecido se o hormônio natriurético e o inibidor digital-like da bomba Na,K-ATPase são a mesma molécula. Possivelmente o local de origem do hormônio natriurético é o hipotálamo. Cogita-se que esta substância se origina nas adrenais.25,26 O hormônio natriurético induz: a) natriurese in vivo; b) inibição do transporte ativo de sódio in vitro; c) inibição da Na,K-ATPase; d) inotropismo positivo e e) reatividade vascular aumentada (pode estar envolvido na gênese da hipertensão essencial). Recentemente a estrutura química do inibidor endógeno da Na,K-ATPase foi caracterizada como um isômero do glicosídeo cardíaco ouabaína. É possível que mais de um composto digital-like esteja presente em humanos.25 Outros hormônios conhecidos afetam a excreção de sódio. A ocitocina pode aumentar a excreção de sódio, mas não há evidência de que normalmente participe da regulação da excreção de sódio. A vasopressina, quando administrada por muito tempo, pode aumentar a excreção de sódio, parecendo isto ocorrer por expansão do volume extracelular, devido à retenção de água. A angiotensina, quando administrada em doses capazes de elevar a pressão arterial, pode aumentar a excreção de sódio, na ausência de uma elevação da filtração glomerular. O efeito parece ser devido a um aumento na pressão hidrostática do capilar peritubular.
Fator Natriurético Atrial (FNA) Na década de 60, estudos demonstraram a presença de grânulos nos miócitos atriais. Em 1981 confirmou-se que
145
capítulo 10
estes grânulos produzem substâncias que possuem importante participação na regulação do volume extracelular. A investigação inicial demonstrou que a administração endovenosa de um extrato atrial causava uma abrupta diurese, natriurese, caliurese e uma diminuição da pressão arterial. Mais recentemente verificou-se que este fator atrial natriurético é um peptídeo, cuja seqüência de aminoácidos já foi identificada e sintetizada. Em seres humanos este peptídeo provoca redução da pressão arterial média, elevação do ritmo de filtração glomerular, do fluxo urinário e aumento da excreção de sódio e potássio. A elevação do ritmo de filtração produzida se acompanhou de fluxo plasmático renal inalterado ou diminuído.26,27 O mecanismo pelo qual o fator atrial eleva a filtração glomerular não está elucidado. É possível que exerça efeito vasoconstritor aferente e eferente,26 elevando a pressão capilar glomerular e, portanto, o ritmo de filtração. Outras hipóteses seriam: redistribuição da filtração glomerular para nefros mais profundos e elevação do coeficiente de filtração. O FNA também diminui a reabsorção de sódio no túbulo proximal, através da liberação local de dopamina e inibição da liberação de renina pelo rim, inibição da liberação de aldosterona pelas adrenais e inibição da reabsorção proximal mediada pela angiotensina II.26,27 A redução da secreção de renina pode ser devida em parte a um aumento na carga de sódio para a mácula densa gerada pela elevação do ritmo de filtração glomerular. No músculo liso de grandes artérias isoladas e pré-constritas, leitos vasculares periféricos e músculo liso intestinal, o FNA produz relaxamento. Aparentemente, o estiramento das paredes dos átrios cardíacos é o principal estímulo à síntese do fator natriurético atrial, como ocorre na sobrecarga de volume.25 Porém, as células ventriculares podem ser recrutadas para a sua produção.24 Em pacientes com doença cardíaca ou pulmonar, o FNA pode ser utilizado como marcador de prognóstico, pois existe correlação entre os níveis de FNA circulantes e as pressões de átrio direito e esquerdo.25 A principal forma circulante de FNA é um peptídeo de 28 aminoácidos, consistindo nos aminoácidos 99 a 126 da extremidade C da pró-FNA. Além desta forma, já foram isolados e descritos outros tipos de agentes natriuréticos, que podem ter importância similar ou superior ao FNA em termos de natriurese.26 Estas substâncias diferem do FNA pela seqüência de aminoácidos envolvida: além de pelo menos quatro subtipos de FNA, existem ainda o peptídeo natriurético cerebral (BNF) e o peptídeo atrial natriurético tipo C (CNF). O local de produção varia de um tipo para outro, mas estas substâncias mantêm funções similares ao FNA.26,27 Estes agentes natriuréticos e diuréticos, com certo efeito vasodilatador renal seletivo, têm potencial terapêutico em situações clínicas tais como: insuficiência renal aguda, síndrome hepatorrenal e insuficiência cardíaca congestiva. Além disso, podem ser úteis no manejo da retenção
de sódio e sobrecarga de volume da insuficiência renal crônica.26,27
Fatores Derivados do Endotélio O endotélio é importante fonte de substâncias capazes de regular o tônus vascular, tais como a endotelina, o óxido nítrico (antes conhecido como fator de relaxamento derivado do endotélio — FRDE) e a prostaciclina. Estas substâncias estão envolvidas no equilíbrio do sódio e água, pois têm propriedades vasodilatadoras e vasoconstritoras que regulam a pressão de perfusão dos rins, coração e vasculatura.4 A endotelina tem efeitos vasoconstritores, com redução do fluxo sanguíneo renal e TFG e retenção de sódio e água. O óxido nítrico pode ser produzido na mácula densa e tem efeito vasodilatador aferente,28 com aumento da natriurese por inibição da Na,K-ATPase e aumento da diurese.4
Prostaglandinas As prostaglandinas têm efeitos sobre o fluxo sanguíneo renal e sobre o manejo tubular de água e sal. Aparentemente, os resultados finais da estimulação da síntese de prostaglandinas pelo rim são: vasodilatação, aumento da perfusão renal, natriurese e facilitação da excreção de água. Quando se bloqueia a ciclo-oxigenase com antiinflamatórios não-hormonais, existe diminuição da excreção de sódio, aumento da resposta vasoconstritora renal à angiotensina II e queda da TFG.4
Sistema Nervoso Simpático O tônus simpático aumenta a reabsorção de sódio pelos túbulos por um efeito direto e pela secreção de angiotensina II e aldosterona.7
Diurese Pressórica Em indivíduos normais, mesmo pequenas elevações da pressão arterial são acompanhadas de um aumento na excreção renal de sódio e água, por diminuição da reabsorção no túbulo proximal e alça de Henle. Possivelmente o aumento da pressão arterial sistêmica seja transmitido ao interstício, desencadeando estas alterações. As prostaglandinas e o óxido nítrico podem estar envolvidos.29
Ponto-chave: • O aumento ou diminuição da excreção renal de sódio resulta de uma ampla rede de eventos, em que participam fatores físicos, hemodinâmicos, humorais e hormonais
146
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DO SÓDIO Distúrbios do equilíbrio do sódio são diagnosticados através de uma avaliação do volume extracelular. Um déficit de sódio total no organismo causa depleção do volume extracelular, e as manifestações clínicas dependem da magnitude desta depleção. Um excesso de sódio total no organismo expande o volume extracelular e, se a expansão for considerável, poderá manifestar-se clinicamente por edema. O termo desidratação, freqüentemente empregado, pode causar confusão. Partilhamos da opinião de outros, segundo os quais as expressões excesso ou depleção do volume extracelular refletem melhor a idéia de que distúrbios do sódio são distúrbios de volume e envolvem déficit ou excesso de uma solução isotônica de sódio, o que tem também implicações terapêuticas.30 Os pacientes com depleção do extracelular perderam sal e água, e a concentração plasmática de sódio é de modo geral normal. Ao contrário, os distúrbios do balanço de água são distúrbios da osmolalidade plasmática, traduzida por alterações na concentração de sódio plasmático e indicados pela terminologia déficit ou excesso de água. Talvez o termo desidratação seja melhor empregado em situações em que existe déficit de água, como nas hipernatremias.31 É preciso salientar que os distúrbios do balanço de água dependem somente da quantidade relativa de água (em relação à quantidade de soluto), e não da quantidade absoluta de água. Assim, um paciente com edema pode ter aumento na água total do corpo, mas desde que o sódio e a água retidos no extracelular sejam isotônicos, não haverá alteração na água intracelular e, portanto, não haverá distúrbio do balanço de água.
Habitualmente grande parte do volume secretado na luz do trato gastrintestinal é reabsorvida, resultando num volume fecal de cerca de 100-200 ml ao dia. Porém, em situações em que a reabsorção se encontra diminuída, como nas diarréias e sondagem gástrica, perdas significativas de fluido extracelular podem ocorrer, resultando em depleção.32 Os rins possuem um sistema de ajuste para equilibrar a excreção com a ingesta. Mas se este sistema falha e a excreção é excessiva, a depleção pode instalar-se. São exemplos disso situações como o uso de diuréticos, nefropatias perdedoras de sal e o hipoaldosteronismo.32 Não existe nenhum método laboratorial prático para se determinar o volume extracelular. O diagnóstico se baseia na história clínica, exame físico e alguns exames laboratoriais. O dado mais importante no diagnóstico é a história de perda de líquido que contém sódio. Na história clínica, o paciente relata vômitos e/ou diarréia, sudorese profusa, poliúria etc. O diagnóstico de depleção do volume extracelular, na ausência de história de perda de líquido que contém sódio, obriga-nos a questionar e rever o diagnóstico. Isto porque, se a ingesta de sódio cessa, o mecanismo renal de conservação do sódio é tão eficiente que um déficit de sódio não se estabelecerá. O paciente pode inicialmente apresentar fraqueza, anorexia, náuseas e, a seguir, tonturas, síncope e, finalmente, um estado de colapso circulatório. Os sintomas resultam de inadequado volume circulante e dependem de quatro fatores principais: a) magnitude da perda de volume; b) velocidade na perda de volume; c) natureza do fluido perdido, se somente água, água com sódio, ou sangue; e d) resposta vascular à redução de volume.4 Por exemplo, a perda aguda de 1 litro de sangue por hemorragia gastrintestinal resulta em oligúria e manuten-
Pontos-chave:
• A avaliação e o diagnóstico dos distúrbios clínicos do metabolismo do sódio e do espaço extracelular são feitos através da história clínica e do exame físico, detectando-se a depleção ou o excesso (edema) • O diagnóstico de distúrbios do metabolismo da água é feito através da dosagem do sódio plasmático
Depleção de Sódio ou do Volume Extracelular As causas de depleção do espaço extracelular encontram-se listadas no Quadro 10.4, sendo divididas basicamente em causas renais e não-renais.
Quadro 10.4 Causas de depleção de sódio 1. Perdas renais A. Ausência de doença renal a. Diurese osmótica (glicosúria, manitol etc.) b. Diuréticos (tiazídicos, furosemida etc.) c. Insuficiência adrenal (primária) d. Secreção inapropriada de HAD (primária) B. Enfermidades renais a. Nefropatia crônica (particularmente doença medular cística e nefrite intersticial) b. Fase diurética da necrose tubular aguda c. Uropatia pós-obstrução 2. Perdas extra-renais A. Gastrintestinal: vômitos, diarréia, fístulas etc. B. Pele: sudorese, queimaduras C. Iatrogênicas: paracentese, toracocentese D. Terceiro espaço: pancreatite aguda, fraturas, esmagamentos, íleo Modificado de Chapman, W.H. e col.30
capítulo 10
ção do hematócrito, com pouca contribuição do fluido intersticial em expandir o intravascular. A perda mais lenta da mesma quantidade de sangue permite que haja transferência de fluido do intersticial para o intravascular, com queda conseqüente do hematócrito. Com a parcial restauração do volume sanguíneo, o volume de urina e a resposta hemodinâmica à contração de volume podem estar pouco afetados.4 Os achados clínicos também dependem do tipo de fluido perdido. A perda de 1 litro de água sem eletrólitos num paciente de 70 kg reduz o volume sanguíneo em 2,5%, e a hemodinâmica renal e sistêmica são pouco afetadas. A perda de 1 litro de fluido extracelular reduz o volume de sangue em 6,6%, e instalam-se oligúria e taquicardia discretas com o paciente deitado. A perda de 1 litro de sangue reduz o volume em 20%, resultando em oligúria grave e choque.4 Entre os sinais mais sensíveis no diagnóstico de um inadequado volume circulante, destacamos as alterações ortostáticas de pressão arterial e a determinação simultânea do pulso periférico. Portanto, determinam-se a pressão arterial e o pulso com o paciente deitado, sentado no leito, com os pés para fora da cama e de pé, quando possível. Fazer o paciente sentar-se no leito, sem que os pés fiquem pendentes para fora da cama, pode não ser suficiente para produzir uma queda ortostática da pressão arterial. Normalmente, quando o paciente muda da posição deitada para a sentada ou de pé, a sua pressão sistólica quase não se altera, e a pressão diastólica aumenta 5 ou 10 mm Hg. Se há um inadequado volume circulante, as pressões sistólica e diastólica caem 10 mm Hg ou mais, e nota-se aumento da freqüência cardíaca ou pulso periférico. Uma queda ortostática da pressão arterial também pode ocorrer independente do volume circulante e estar relacionada com comprometimento do sistema nervoso autônomo periférico, tal como ocorre no diabetes mellitus, insuficiência renal crônica ou com o uso de drogas, especialmente bloqueadores adrenérgicos. É necessário salientar que pressão arterial aparentemente normal pode ser encontrada em indivíduos previamente hipertensos que estejam depletados.32 Os sinais chamados clássicos de depleção do volume extracelular, como diminuição do turgor da pele, diminuição do volume da língua ou diminuição do tônus ocular, têm pouco valor clínico. Quando estes sinais são detectáveis, o grau de depleção do volume extracelular é de tal ordem que o paciente está quase em choque. Por outro lado, pessoas obesas, jovens ou com depleções leves podem apresentar turgor de pele normal.32 Um outro sinal clínico bastante útil é a avaliação do enchimento venoso no pescoço. Quando um paciente está em decúbito dorsal, as veias jugulares são visíveis até quase o ângulo da mandíbula. Se as veias jugulares não forem visíveis ou mostrarem pobre enchimento, suspeita-se de depleção do volume extracelular. É necessário, no entanto, salientar que, em algumas pessoas normais, as veias
147
jugulares são invisíveis e, em outras, se apresentam cheias por possuírem válvulas ou alterações da elasticidade, sem refletirem o volume circulante. Desta forma, em alguns casos, necessitamos da determinação direta da pressão venosa central. Quando a depleção de volume é intensa, o débito cardíaco cai, o mesmo ocorrendo com a pressão venosa sistêmica intratorácica. Portanto, a determinação da pressão venosa central (PVC) poderia ser um indicador sensível de redução no retorno venoso e débito cardíaco. Entretanto, como os limites de normalidade são muito amplos em indivíduos diferentes, é impossível definir hipovolemia numa única determinação. Por outro lado, uma única determinação do volume sanguíneo não dá idéia do grau de deficiência e de como o coração vai tolerar a restauração do volume. Quando se correlacionaram o volume sanguíneo e a PVC em pacientes em choque, observou-se que a correlação era pobre33 (v. Fig. 10.6). Talvez o melhor guia da adequação do volume sanguíneo circulante não seja uma única determinação da PVC ou do volume sanguíneo, e, sim, a observação da resposta cardiovascular à expansão do volume (v. próxima seção). Para uma boa interpretação da PVC, os seguintes princípios são importantes:33 1. Uma PVC reduzida não permite uma conclusão evidente de que o volume sanguíneo está reduzido. 2. Num paciente com insuficiência circulatória (choque), uma PVC baixa indica que uma expansão do volume será benéfica. No entanto, uma PVC alta não contra-indica uma expansão do volume sanguíneo, mas deve permanecer a mesma ou cair à medida que o volume sanguíneo aumenta. Por outro lado, se a PVC inicial é elevada e continua a elevar-se à medida que a expansão de volume prossegue, a infusão deve ser suspensa. 3. Uma elevação da PVC acima do normal, durante a expansão, indica que a expansão está sendo excessiva. É preciso lembrar que o controle da PVC fornece-nos uma idéia mais ou menos precisa da pressão de enchimento do ventrículo direito, mas não nos esclarece nada sobre a função do ventrículo esquerdo. Num indivíduo normal, a expansão de volume eleva simetricamente as pressões de átrio direito e esquerdo, o que não ocorre em indivíduos com insuficiência ventricular esquerda. A pressão venosa intratorácica, normalmente, não deve exceder 8 cm de água, podendo ser determinada através de um cateter em veia cava superior e tomando-se o zero do manômetro na altura da linha axilar média.
DADOS LABORATORIAIS Entre os exames de laboratório, a elevação do hematócrito e da concentração plasmática das proteínas acompanha a depleção do volume extracelular, pois ambos estão confinados ao espaço intravascular. Uréia e creatinina podem estar elevadas, dependendo do grau de redução da taxa de filtração glomerular.32
148
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
Fig. 10.6 Comparação entre a pressão venosa central (PVC) e o volume sanguíneo em 46 pacientes em choque. Embora exista uma correlação grosseira, observe que alguns pacientes com volume sanguíneo baixo têm PVC elevada. (Obtida de Cohn, J.N.33)
A determinação urinária do sódio ou cloro também é um guia útil para as necessidades de sódio. Na presença de função renal normal e depleção do volume extracelular, a concentração urinária de sódio e cloro geralmente é inferior a 10 e 50 mEq/L, respectivamente. A densidade urinária acima de 1.015 é consistente com uma urina concentrada, encontrada nas situações de depleção do espaço extracelular. Além disso, a urinálise é praticamente normal.32 Dependendo da causa da depleção do espaço extracelular, podem ser encontradas anormalidades na concentração plasmática de potássio e sódio e no estado ácidobásico.32
o aumento do fluxo sanguíneo medular, dissipa-se o gradiente osmótico córtico-papilar. Como a concentração urinária de sódio é baixa, não explica a hipertonicidade da urina, que se deve à concentração urinária elevada de uréia.1 Quando a depleção de volume é significativa, o sistema nervoso simpático entra em atividade. Ocorre venoconstrição, mobilizando sangue da periferia para a circulação central, assegurando o enchimento cardíaco. A estimulação cardíaca aumenta a freqüência e a força de contração do miocárdio. A vasoconstrição arterial mantém a pressão arterial e a perfusão de áreas críticas. A resposta final traduz-se por taquicardia, oligúria e vasoconstrição cutânea.
Conseqüências da Depleção do Volume Extracelular
Tratamento da Depleção
Como conseqüência da depleção do espaço extracelular, há queda do ritmo de filtração glomerular, aumento moderado da fração de filtração e diminuição proporcional do fluxo sanguíneo medular em relação ao cortical. Se a depleção for grave, a fração de filtração se reduz e o fluxo sanguíneo medular se eleva.1 Observa-se aumento da reabsorção proximal de sódio, com a liberação de um menor volume de fluido isotônico para as porções distais do nefro. Há também maior produção de aldosterona e de HAD. Conseqüentemente, há redução da diurese e natriurese e a urina final é hipertônica. Mas se a depleção for intensa, a pressão osmótica da urina se aproxima da plasmática. Isto ocorre porque, com
TIPO DE SOLUÇÃO O tipo de solução a ser administrado depende do tipo de fluido que foi perdido e da existência de outros distúrbios hidroeletrolíticos34 (v. Cap. 15). O tratamento da depleção do espaço extracelular deve ser feito com uma solução que contenha sódio, preferencialmente a solução salina isotônica (1 litro de solução salina a 0,9% contém 154 mEq de sódio e 154 mEq de cloro). Após a administração de 1 litro de solução salina isotônica, 300 ml permanecem no intravascular.4 A repleção do espaço extracelular também pode ser feita com a solução de Ringer lactato35 (1 litro contém 130 mEq de sódio, 109 mEq de cloro, 4 mEq de potássio, 3 mEq de cálcio e 28 mEq de lactato). Em situações em que a quantidade a ser reposta é muito grande, esta solução apresenta
capítulo 10
benefícios, pois o lactato é convertido a bicarbonato no fígado e ameniza ou evita uma acidose dilucional. Não deve ser utilizada em pacientes hipercalêmicos e com função renal comprometida. As soluções colóides (plasma, albumina) expandem principalmente o intravascular, pois suas grandes moléculas não ultrapassam o endotélio capilar. Este tipo de fluido deve ser reservado para situações graves, em que a expansão do intravascular necessita ser rápida e efetiva, como, por exemplo, em queimaduras extensas e choque. Não se justifica a administração destas soluções em outras situações. Devem também ser levados em conta fatores como o alto custo e a meia-vida curta destas soluções.4 Mais recentemente, tem sido utilizado o amido hidroxietílico (hetastarch), cujas moléculas têm cerca de 200.000 daltons e que permanece por até 24-36 horas no compartimento intravascular. No Brasil, estão disponíveis as apresentações a 6% e 10% (Haes-steril®), que em 1 litro contém 60-100 g do amido e 154 mEq de sódio. Ao se administrar sangue, este permanece inteiramente no intravascular. Deve ser administrado quando hemorragia tiver sido a causa da depleção e das alterações hemodinâmicas já mencionadas.4 O hematócrito não deve ser elevado acima de 35%.36 A administração de solução glicosada a 5% não é adequada no tratamento da depleção do extracelular, pois equivale à administração de água sem sódio, que se distribui uniformemente na água corporal total e não permanece em volume suficiente no intravascular. Por exemplo, após a administração de 1 litro de solução glicosada a 5%, permanecem no intravascular apenas 75-100 ml.
VELOCIDADE DE ADMINISTRAÇÃO A velocidade de administração da solução salina depende da magnitude da insuficiência circulatória. Desde que não haja cardiopatia, pode-se administrar um litro de solução salina por hora ou até em menor intervalo, em casos graves. Não há necessidade de que todo o déficit de volume seja corrigido em poucas horas. O importante é que os sinais de hipovolemia grave desapareçam. A partir de então, a reposição de volume pode ser mais lenta. Um dos elementos muito importantes no manejo clínico é o controle dos fatores precipitantes: sangramento, vômitos, diarréia etc. Não havendo mais perdas, uma maior parcela do líquido administrado permanecerá no espaço extracelular, restaurando o seu volume.
VOLUME A SER INFUNDIDO (GRAU DE DEPLEÇÃO) O grau de depleção do volume extracelular pode ser estabelecido pela história clínica e achados de exame físico, sendo o cálculo aproximado. Por exemplo: um indivíduo de 70 kg tem 14 litros, aproximadamente, de volume extracelular (20% do peso corporal).
149
Uma depleção leve (10-15% de redução no EEC) não cursa com sinais clínicos muito significativos, mas há história de perda. Uma depleção moderada está entre 20 e 30% de redução no volume extracelular.37 O paciente pode apresentar, em decúbito dorsal, pressão arterial normal, mas ao mesmo tempo ter taquicardia, pobre perfusão capilar e diminuição da temperatura da pele (devido à vasoconstrição). Uma determinação dos sinais vitais, na posição sentada ou em pé, aumenta os sinais de insuficiência circulatória. Considerando o paciente acima, o déficit seria de 2,8 a 4,2 litros de solução salina isotônica (v. Cap. 15 para maiores detalhes sobre reposição hidroeletrolítica). Uma depleção intensa representa 40 a 50% de redução do volume extracelular.37 Clinicamente, o paciente apresenta hipotensão arterial mesmo em decúbito dorsal, ou já está em choque. O déficit de volume extracelular será, portanto, de 5,6 a 7 litros. Além disso, os pacientes em choque hipovolêmico apresentam intensa ativação adrenérgica, caracterizada por taquicardia, extremidades frias com enchimento capilar lento, cianose de extremidades, oligúria e agitação e confusão mental, que se devem à diminuição do fluxo sanguíneo cerebral.32
MONITORIZAÇÃO DO TRATAMENTO Em pacientes com reserva cardíaca normal, o efeito de um desafio líquido pode ser monitorizado pela avaliação do pulso, pressão arterial e fluxo urinário. Em pacientes com função cardíaca comprometida, a determinação seriada da PVC ou preferencialmente da pressão em capilar pulmonar (PCap) e débito cardíaco através de um cateter de Swan-Ganz possibilitam o diagnóstico precoce de sobrecarga de volume secundária ao desafio hídrico. Estas medidas devem ser seriadas e sua avaliação dinâmica, ou seja, à medida que se vai expandindo o volume circulante. Administra-se rapidamente um volume de 100 ml e observam-se as mudanças na PVC e PCap. Durante a expansão de volume, a PVC ou a pressão em capilar pulmonar podem inicialmente subir para depois cair. Esta elevação inicial se deve à infusão de fluidos num leito vascular vaso-
Pontos-chave: • São sinais sensíveis para o diagnóstico de depleção do espaço extracelular: alterações ortostáticas da pressão arterial e pulso, enchimento das jugulares e débito urinário • A depleção pode ser classificada como leve, moderada e intensa, dependendo das alterações encontradas no exame físico • O tratamento geral da depleção do extracelular consiste na administração de solução isotônica contendo sódio
150
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
constrito.4 Enquanto persistirem o choque, a hipotensão, ou se a PVC não se elevar, a expansão do volume é considerada inadequada. Um outro dado útil na avaliação da adequação do volume sanguíneo é o volume urinário horário. Se, durante a reposição do volume, o volume urinário aumentar de 0-10 ml/h para 50 ml/h ou mais, isto indica um adequado plano de reposição. Por outro lado, a queda do volume urinário indica que a reposição não está sendo suficientemente rápida.
EXCESSO DE VOLUME EXTRACELULAR — EDEMA Um excesso de sódio total no organismo acompanha-se de expansão do volume extracelular, que, se considerável, se manifestará por edema. Edema é o acúmulo anormal de fluido em qualquer parte do organismo. Geralmente isto ocorre em pacientes com cardiopatia, nefropatia, hepatopatia ou hipoproteinemia.
Fisiopatologia do Edema Edema significa um acúmulo excessivo de líquido no compartimento intersticial, ou seja, na parte não-vascular do compartimento líquido extracelular. A passagem para o interstício de fluido ultrafiltrado do plasma (sem proteínas), decorrente da alteração das forças de Starling, é denominada transudação.38 São exemplos deste mecanismo os edemas decorrentes de obstrução venosa, insuficiência cardíaca e edema pulmonar cardiogênico. Outro tipo de edema ocorre por aumento da permeabilidade dos capilares a determinados solutos, tais como as proteínas, num mecanismo de exsudação. 38 Este mecanismo de formação de edema é observado em queimaduras, trauma, abcessos. O edema pode ser bem localizado, como numa pequena inflamação, ou generalizado, como na insuficiência cardíaca.
EDEMA LOCALIZADO O edema localizado resulta de fatores inflamatórios ou físicos que aumentam a formação ou diminuem a remoção de líquido intersticial em uma região do corpo.9 O mecanismo de formação do edema localizado pode ser adequadamente explicado com base numa alteração das forças de Starling que controlam a troca de líquido entre o plasma e o interstício. Estas forças estão relacionadas na seguinte expressão: 39 . q Kf [(Pc Pt) – (p t) . onde: q ritmo do fluxo de líquido através da parede capilar
Kf coeficiente de filtração (proporcional à permeabilidade capilar e à área do leito capilar) Pc pressão hidrostática intracapilar Pt pressão do turgor tecidual p pressão oncótica do plasma t pressão oncótica intersticial O edema localizado ocorre quando as alterações nas forças de Starling estão restritas a um órgão ou a um determinado território vascular. Normalmente, o balanço de forças de Starling na porção arteriolar do capilar é de tal ordem que ocorre filtração de líquido para o interstício. Com isto ocorre diminuição da pressão hidráulica capilar e aumento da pressão coloidosmótica do plasma (v. também Cap. 8). De acordo com a visão clássica de distribuição de líquido transcapilar, a reversão do balanço das forças de Starling ocorria na porção terminal venosa do capilar, havendo então reabsorção do líquido filtrado. Assim sendo, havendo equilíbrio entre o líquido filtrado e reabsorvido, apenas uma pequena quantidade deveria retornar ao sistema vascular via linfáticos. No entanto, recentemente demonstrou-se que a pressão hidráulica transcapilar excede a pressão coloidosmótica do plasma em toda a extensão do capilar, de sorte que a filtração ocorre ao longo de todo o capilar.40 O líquido filtrado retorna à circulação via linfáticos. Desta forma a circulação linfática passa a ter um papel importante no controle da formação do edema. Também existe vasodilatação que aumenta a saída de líquido do capilar principalmente através de aumento da pressão hidrostática intracapilar e do coeficiente de filtração. O aumento do Kf ocorre devido à abertura de novos capilares, dilatação dos capilares e aumento da permeabilidade. Uma diminuição da p e um aumento da t também contribuem para a saída de líquido do capilar (Quadro 10.5).
Edema Generalizado É a principal manifestação clínica da expansão do volume líquido do compartimento extracelular e está invariavelmente associado a uma retenção renal de sódio. É uma manifestação comum em situações clínicas tais como: insuficiência cardíaca, cirrose hepática e síndrome nefrótica, onde a retenção renal de sódio é apenas uma resposta renal a um distúrbio hemodinâmico determinado pela enfermidade básica (Quadro 10.6). A distribuição do edema generalizado é afetada por fatores locais e gravitacionais. Assim sendo, o líquido intersticial em excesso pode acumular-se nos membros inferiores de pacientes ambulatoriais e na região pré-sacra de pacientes acamados. A baixa pressão do turgor tecidual nas regiões periorbital e escrotal pode acentuar o edema nestas áreas.9 O edema classifica-se em dois tipos: edema duro e edema mole.42 O edema mole revela o sinal do cacifo quando a
capítulo 10
Quadro 10.5 Fatores que contribuem para a formação do edema* 1. Dilatação arteriolar A. Inflamação B. Calor C. Toxinas D. Excesso ou déficit neuro-humoral 2. Redução da pressão osmótica A. Hipoproteinemia a. Desnutrição b. Cirrose hepática c. Síndrome nefrótica d. Gastroenteropatia perdedora de proteína B. Aumento da permeabilidade capilar a. Inflamação b. Queimaduras c. Trauma d. Reação alérgica ou imunológica C. Obstrução linfática 3. Aumento da pressão venosa A. Insuficiência cardíaca congestiva B. Tromboflebite C. Cirrose hepática 4. Retenção de sódio A. Ingesta excessiva de sal B. Elevada reabsorção tubular renal de sódio a. Redução da perfusão renal b. Aumento da secreção de reninaangiotensina-aldosterona *Baseado em Leaf, A. e Cotran, R.S.41
pressão digital deixa uma depressão transitória na pele, como ocorre por exemplo na insuficiência cardíaca. O edema duro não revela o sinal do cacifo, pois a pressão digital não consegue mobilizar o líquido intersticial devido a obstrução linfática (linfedema), fibrose do tecido subcutâneo, como pode ocorrer na obstrução venosa crônica, ou aumento da matriz intersticial, como no mixedema.43 É importante salientar que pode haver um acúmulo de 4 a 5 litros de líquido no compartimento extracelular antes que o paciente ou o médico percebam o edema com sinal do cacifo presente. Há, no entanto, sinais e sintomas sugestivos do excesso de líquido no organismo: ganho de peso, flutuações diárias no peso (mais pesado à noite), redução da diurese, noctúria, tosse ou dispnéia ao deitar-se e dispnéia aos esforços. A intensidade do edema é graduada em cruzes (, , ou /4), dependendo da profundidade da depressão criada com a compressão digital e também de acordo com a extensão do edema. Por exemplo, um paciente com síndrome nefrótica com moderado edema de membros inferiores até os joelhos tem um edema de / 4. Já um paciente com edema até a raiz das coxas, edema de parede abdominal e sinais de ascite tem um edema de /4 e anasarca.42 A fisiopatogenia do edema em situações clínicas diversas será abordada na próxima seção.
151
Quadro 10.6 Causas de edema generalizado 1. Enfermidades renais A. Glomerulonefrite aguda B. Síndrome nefrótica C. Insuficiência renal aguda D. Insuficiência renal crônica 2. Insuficiência cardíaca A. Baixo débito B. Alto débito (anemia, beribéri, tireotoxicose, sepse etc.) 3. Enfermidades hepáticas A. Cirrose B. Obstrução da drenagem hepática venosa 4. Enfermidades confinadas a mulheres A. Gravidez B. Toxemia gravídica C. Síndrome da tensão pré-menstrual D. Edema cíclico idiopático 5. Enfermidades vasculares A. Fístulas arteriovenosas B. Obstrução das veias do tórax a. Veia cava inferior b. Veia cava superior 6. Distúrbios endócrinos A. Hipotireoidismo B. Excesso de mineralocorticóides C. Diabetes mellitus 7. Drogas A. Estrogênios, anticoncepcionais orais B. Agentes anti-hipertensivos 8. Miscelânea A. Hipocalemia crônica B. Anemia crônica C. Edema nutricional D. Síndrome da permeabilidade capilar elevada
Pontos-chave: • Um dos principais sinais de excesso de sódio no organismo é o edema • O edema pode ser localizado ou generalizado, e forma-se por transudação ou exsudação
Fisiopatologia do Edema em Situações Clínicas Específicas INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA (ICC) A ICC ocorre quando o coração falha na sua função de bomba e está habitualmente associada a uma retenção renal de sal e água e com edema pulmonar ou periférico. Há muito se discutem os fatores que estariam envolvidos na retenção renal de sódio na insuficiência cardíaca. A teoria de “insuficiência retrógrada” propõe que à medida que o coração falha, as pressões venosas periféricas e centrais aumentam, elevando a pressão hidráulica transcapilar e
152
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
conseqüentemente promovendo a transudação de líquido no espaço intersticial, edema e contração do volume circulante. A teoria da “insuficiência anterógrada” diz que, com o comprometimento da função cardíaca e do ventrículo esquerdo, a periferia, incluindo o rim, passa a ser mal perfundida, o que estimula mecanismos renais e intra-renais para a retenção renal de sódio. É provável que haja uma interdependência entre as duas teorias, e que o acontecimento básico seria uma retenção renal de sódio, e a transudação transcapilar seria um evento secundário. Na insuficiência cardíaca os rins estão funcionando adequadamente e retêm sódio numa tentativa de restaurar o volume circulante efetivo. Este mecanismo, denominado “subpreenchimento” (underfilling) é também observado na cirrose hepática e síndrome nefrótica.38
Volume Sanguíneo Arterial Efetivo Na insuficiência cardíaca congestiva há um distúrbio na relação normal do volume intravascular (volume efetivo) e a capacidade do leito vascular. Há sugestões de que o aumento da reabsorção tubular renal de sódio seja decorrente de alterações circulatórias percebidas por sensores de volume nos átrios cardíacos e grandes vasos torácicos. Como já mencionado anteriormente, talvez os efeitos na excreção renal de sódio sejam oriundos da estimulação mecânica dos átrios cardíacos, através da liberação de um peptídio atrial natriurético e por reflexos neurais bem estabelecidos.
A importância do fluxo sanguíneo no circuito arterial para controle da volemia foi demonstrada pela resposta renal à abertura e fechamento de uma fístula arteriovenosa.44 O fechamento da fístula acarretava uma rápida natriurese sem alteração no ritmo de filtração glomerular, enquanto a abertura da fístula novamente reduzia a excreção de sódio. Nestas circunstâncias, as pressões hidráulicas nos átrios e circulação pulmonar diminuíam com o fechamento da fístula e aumentavam com a abertura da fístula. A percepção arterial ocorre em vários locais do leito vascular arterial. Existem os barorreceptores carotídeos e os barorreceptores intra-renais no aparelho justaglomerular. Uma redução da pressão de perfusão renal estimula a liberação de renina do aparelho justaglomerular resultando na formação de angiotensina II, aldosterona e retenção de sódio (Fig. 10.7). Esta retenção de sódio é na verdade um mecanismo protetor para preservar a adequação do volume circulante.
Papel do Rim na Retenção de Sódio Na ICC há aumento do tônus simpático e das catecolaminas circulantes, responsáveis por aumento da resistência vascular periférica. No rim também ocorre aumento da resistência vascular e freqüentemente redução do ritmo de filtração glomerular (RFG). Mas não é a redução do RFG a responsável pela retenção de sódio, pois esta ocorre mesmo na ausência de qualquer alteração no
Fig. 10.7 Esquema dos mecanismos envolvidos na retenção de sódio e edema da insuficiência cardíaca. (Baseado em Schrier, R.W.9)
capítulo 10
153
Fig. 10.8 Controle peritubular da reabsorção de líquido do túbulo proximal. p pressão hidráulica transcapilar pressão oncótica transcapilar A elevação da resistência vascular renal na ICC reduz a . O aumento da fração de filtração na ICC aumenta a . As alterações em ambas as pressões aumentam a reabsorção proximal de sódio.
RFG. Na ICC os nefros apresentam elevada fração de filtração, decorrente de aumento da resistência arteriolar eferente. Com a elevação da fração de filtração há aumento da pressão oncótica pericapilar tubular, alterando as forças peritubulares de Starling e acarretando aumento da reabsorção de sódio a nível de túbulo proximal (Fig. 10.8). Outras alterações hemodinâmicas intra-renais podem estar envolvidas: talvez o aumento do tônus simpático a nível renal cause uma redistribuição do fluxo sanguíneo para nefros justamedulares (alças de Henle longas) que podem reabsorver sódio mais avidamente que nefros corticais.
Sistema Renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) Como já frisamos, a diminuição da perfusão renal estimula a liberação de renina com formação de angiotensina I e II e aldosterona. A manutenção da pressão arterial em face de uma redução do volume sanguíneo arterial é explicada pela elevação da angiotensina II. A retenção renal de sódio decorre da ação hemodinâmica da angiotensina II (vasoconstrição da arteríola glomerular eferente e aumento da fração de filtração), da sua ação direta no túbulo proximal e do hiperaldosteronismo.
Prostaglandinas Mesmo que haja variação no volume plasmático, a interação entre angiotensina II e prostaglandinas mantém o fluxo sanguíneo renal quase constante. A inibição da síntese da prostaglandina em animais normovolêmicos não compromete a filtração glomerular, mas quando há depleção de volume e níveis elevados de angiotensina II, o blo-
queio da síntese de prostaglandina reduz o fluxo sanguíneo renal e a filtração glomerular. Da mesma maneira, a inibição da síntese de prostaglandina só reduz a excreção de sódio se houver concomitante depleção de volume ou comprometimento intrínseco da função renal. Em resumo, os níveis elevados de substâncias vasoconstritoras, especialmente angiotensina II e catecolaminas, têm um importante papel na preservação de um adequado fluxo sanguíneo renal na ICC.
Fator Natriurético A infusão contínua deste fator atrial causa uma redução da pressão arterial média, com elevação do ritmo de filtração glomerular, do fluxo urinário e da excreção de sódio e potássio. A influência do FNA na pressão arterial relaciona-se à sua capacidade de suprimir níveis plasmáticos de renina e em relaxar diretamente os vasos sanguíneos. Como o FNA pode aumentar a filtração glomerular em doses que diminuem a pressão arterial e o fluxo sanguíneo renal, pode vir a ser útil no tratamento agudo do coração insuficiente.45 Ao estudarem as anormalidades na excreção de sódio e água na ICC, Mettaurer et al. verificaram que os principais fatores determinantes na excreção de sódio eram a ativação do sistema renina-angiotensina e a função ventricular.46 Com relação à excreção de água, os fatores mais importantes foram os níveis plasmáticos de vasopressina e norepinefrina, a função renal e o grau de comprometimento da função ventricular esquerda. Um dos principais mecanismos de que o organismo lança mão para compensar a queda do débito cardíaco é a ativação de sistemas neuro-humorais. Na ICC, a secreção de vasopressina e a ativação
154
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
dos sistemas simpático e renina-angiotensina servem para otimizar a pré-carga e aumentar a contratilidade do miocárdio.
CIRROSE HEPÁTICA As alterações hepáticas estruturais terminam por causar obstrução à drenagem venosa hepática, hipertensão portal e shunt sanguíneo porta-sistêmico. Além destas alterações hemodinâmicas, a função hepatocelular está comprometida, causando redução na síntese de albumina e fatores de coagulação. Há comprometimento na excreção de sal e água e redução do ritmo de filtração glomerular (RFG). De modo semelhante à insuficiência cardíaca, a retenção renal de sódio e água não se deve a uma anormalidade intrínseca dos rins, mas a mecanismos extra-renais que regulam a excreção renal destes elementos. Alguns autores, como Levy, Wexler e Allotey propõem que um mecanismo de overflow esteja presente ao menos nas fases iniciais da cirrose. De acordo com este conceito, uma retenção de sódio pelo rim, não dependente de volume, é o distúrbio primário na homeostase do sódio em pacientes com cirrose. Nesta teoria, a retenção de sódio e expansão plasmática resultam da ausência do “escape” de mineralocorticóides e antecedem o “subpreenchimento”. A predileção pelo acúmulo de líquido no peritônio, sob
forma de ascite, deve-se às alterações localizadas das forças de Starling, pela hipertensão portal. Aqueles autores demonstraram aumento no volume efetivo de sangue nas fases iniciais da cirrose. A retenção de sódio ocorreu independentemente de débito cardíaco, pressão arterial média, fluxo sanguíneo esplâncnico e hepático, TFG, fluxo sanguíneo renal, níveis de aldosterona, estrógenos e progesterona ou atividade simpática.4 Há várias outras influências independentes do volume sistêmico que sustentam a hipótese de overflow. A percepção de uma obstrução da drenagem venosa hepática e elevada pressão hepática intra-sinusoidal através de uma via neural reflexa podem ser importantes mecanismos na retenção renal de sal e água, efetivada através de aumento na atividade simpática renal e cardiopulmonar (Fig. 10.9).47 Mesmo que o volume plasmático total esteja elevado na cirrose, o enchimento relativo do leito vascular arterial estará reduzido devido à redução da resistência vascular periférica, inclusive com comprometimento dos reflexos vasomotores autônomos e diminuição da resposta pressórica a angiotensina II e catecolaminas.48 Isto resulta num leito vascular dilatado, hiporreativo a alterações de volemia e comprometido na sua capacidade de regular o tônus e a capacidade. Assim sendo, pacientes cirróticos se tornam
Fig. 10.9 Esquema dos mecanismos envolvidos na retenção de sódio e edema na cirrose hepática. (Baseado em Schrier, R.W.9 e Seifter, J.L. et al.47)
capítulo 10
muito vulneráveis e sujeitos a um colapso hemodinâmico quando sofrem uma perda de volume aguda, como numa hemorragia ou diurese agressiva.47 A percepção por sensores intratorácicos e arteriais da redução do volume sanguíneo arterial efetivo promove a retenção de sódio. A redução da resistência vascular periférica observada em cirrose hepática avançada está relacionada, pelo menos em parte, a shunts arteriovenosos, mas talvez um vasodilatador (produzido, ou não inativado pelo fígado) tenha alguma participação. A seqüestração venosa esplâncnica que ocorre secundária à hipertensão portal também contribui para a redução da volemia. Com a obstrução da drenagem hepática venosa, os sinusóides hepáticos (altamente permeáveis a proteínas) permitem a passagem para o interstício de um elevado fluxo de filtrado rico em proteínas, resultando num aumento da formação de linfa hepática, principal responsável pela ascite em cirróticos. Quando o ritmo de formação da linfa hepática excede o ritmo de retorno do líquido extracelular à circulação via ducto torácico, ocorre diminuição do volume intravascular.47 O sucesso de procedimentos tais como o shunt peritoniovenoso, nos cirróticos com ascite, parece estar relacionado a uma rápida elevação do volume intravascular. Além disso, a hipoalbuminemia freqüentemente presente nos cirróticos e a resultante redução da pressão coloidosmótica do plasma contribuem para a transudação de líquido no compartimento intersticial e cavidade abdominal. Em conjunto, estes fatores levariam a um “subpreenchimento” da árvore arterial levando à ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e do eixo simpático e liberação de vasopressina. Estes eventos causariam a retenção de sódio e água pelo rim em fases mais avançadas da cirrose hepática.4
Função Renal na Cirrose Hepática Os distúrbios característicos de função renal na cirrose são a retenção de sódio e o comprometimento no clearance de água livre.47 A retenção renal de sódio pode ocorrer na cirrose na vigência de um RFG normal. Com a redução do volume intravascular efetivo, há um aumento na reabsorção tubular proximal de sódio e uma redução da oferta de líquido aos túbulos distais, sendo esta última a causa da redução do clearance de água livre.
Renina-angiotensina-aldosterona Embora as causas de diminuição do volume sanguíneo arterial efetivo sejam distintas na cirrose e na insuficiência cardíaca, são similares os eventos subseqüentes que causam retenção renal de sódio e água. A resistência vascular renal está elevada nos cirróticos com ascite. A angiotensina II determina aumento da resistência da arteríola glomerular eferente, causando aumento da fração de filtração, aumento da pressão oncótica pericapilar tubular e conse-
155
qüentemente aumento da reabsorção de sódio ao nível do túbulo proximal. O aldosteronismo secundário ocorre devido à elevação de angiotensina II, esta última procurando preservar a pressão arterial. Portanto, face a uma redução do volume intravascular, a ativação do eixo reninaangiotensina-aldosterona serve para preservar a pressão arterial numa situação em que a capacidade vascular está muito aumentada. Além da estimulação da angiotensina II sobre a produção de aldosterona, a redução do fluxo sanguíneo hepático compromete a degradação da aldosterona e contribui ainda mais para a elevada atividade da aldosterona na cirrose. Entretanto, como na insuficiência cardíaca, antagonistas da aldosterona não são efetivos em aumentar a excreção de sódio no tratamento do edema e da ascite do cirrótico.9 Na síndrome hepatorrenal existe caracteristicamente uma pronunciada redução do fluxo sanguíneo renal com isquemia cortical e elevada resistência vascular renal, provavelmente devido à ação de substâncias vasoconstritoras como a angiotensina II e norepinefrina.
Prostaglandinas A função das prostaglandinas na cirrose descompensada é provavelmente a mesma de outros estados hipovolêmicos: manutenção do fluxo sanguíneo renal e ritmo de filtração glomerular através do antagonismo aos efeitos pressóricos da angiotensina II e outros vasoconstritores na microvasculatura renal.
SÍNDROME NEFRÓTICA Pacientes com síndrome nefrótica apresentam proteinúria maciça, hipoalbuminemia, edema periférico ou generalizado (anasarca) e hipercolesterolemia.49 O fenômeno primário na síndrome nefrótica é a perda maciça de proteínas pelo rim. Estudos iniciais revelam uma correlação entre a concentração sérica de albumina e o grau de edema em pacientes nefróticos. Em face destas observações, achava-se que a hipoalbuminemia, através da redução da pressão oncótica do plasma, era responsável pela saída de líquido do compartimento intravascular para o intersticial. Entretanto, investigações experimentais não corroboraram esta hipótese: diminuições da concentração plasmática de proteína no homem e em animais eram acompanhadas de volume plasmático constante ou elevado. Logo, ponderouse que ajustes nos mecanismos de troca transcapilar periférico deveriam ocorrer: queda da pressão oncótica do líquido intersticial, aumento na pressão hidráulica do líquido intersticial e aumento do fluxo linfático e proliferação linfática.50 Outros estudos recentes demonstraram que a permeabilidade do capilar periférico à albumina varia diretamente com as alterações na concentração sérica de albumina e inversamente com as alterações do volume plas-
156
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
Quadro 10.7 Mecanismos protetores contra a formação do edema periférico em estados hipoalbuminêmicos* Elevada drenagem linfática Vasoconstrição pré-capilar Diluição da proteína do líquido intersticial Baixa complacência do tecido intersticial Ajustes da permeabilidade da parede capilar à albumina *Obtido de Skorecki, K.L. et al.50
mático.40,51 Portanto, há certos mecanismos protetores contra a formação de edema em estados hipoproteinêmicos (Quadro 10.7). Parece, então, que o grau de edema não está tão relacionado com o grau de hipoalbuminemia per se, mas com alterações de mecanismos renais de controle do volume extracelular. Na síndrome nefrótica por lesões mínimas na criança, a hipoalbuminemia tem um papel importantíssimo na formação do edema. Nestes casos a redução do volume intravascular ativa a retenção renal de sódio (mecanismo de underfilling). A seqüência de eventos que determinam aumento na reabsorção renal de sódio pode ser apreciada na Fig. 10.10 e é semelhante à que ocorre na insuficiência cardíaca e cirrose. Entretanto, convém salientar que muitos pacientes com síndrome nefrótica podem ter volume plasmático elevado. O perfil renina-angiotensina-aldosterona também tem va-
riado de acordo com o volume plasmático. Ativação do eixo renina-angiotensina-aldosterona é encontrada nos casos de volume plasmático reduzido e supressão do eixo nos casos de volume plasmático elevado. Logo, parece não haver um único mecanismo para explicar a retenção renal de sal na síndrome nefrótica. Como na insuficiência cardíaca e cirrose hepática, a atividade simpática e o nível de catecolaminas circulantes estão elevados, refletindo-se num aumento de resistência vascular renal. Entretanto, o fluxo sanguíneo renal e o RFG não estão uniformemente diminuídos na síndrome nefrótica e, em algumas circunstâncias, o RFG está elevado. Esta filtração elevada é devida à hipoalbuminemia, que diminui a pressão oncótica do capilar glomerular e, portanto, tende a aumentar a pressão de filtração glomerular. Por outro lado, em situações de importante hipoalbuminemia, a vasoconstrição da arteríola aferente do glomérulo pode diminuir a pressão hidrostática do capilar glomerular e reduzir o aumento do RFG. Portanto, na síndrome nefrótica, o RFG pode estar normal, elevado ou reduzido, dependendo do balanço entre o efeito da redução da pressão oncótica do plasma, a resistência vascular renal e a pressão de filtração glomerular. Outro aspecto do edema nefrótico quando comparado com o cirrótico ou cardíaco é o seguinte: há uma maior diminuição na reabsorção tubular proximal de sódio e água devido à redução da pressão oncótica peritubular causada pela hipoalbuminemia. Além disso, quando se bloqueia a reabsorção distal de sódio com diuréticos, os nefróticos excretam uma fração maior da carga filtrada de sódio. Logo, nefróticos podem responder melhor do que cardíacos e cirróticos a diuréticos que agem no nefro distal. Estes achados sugerem que o principal local de retenção de sódio na síndrome nefrótica está no nefro distal. Não se sabe se a elevada atividade da aldosterona explica este achado. Em certos casos de síndrome nefrótica causada por glomerulonefrites do tipo membranosa e membranoproliferativa, pode existir lesão renal que afete a capacidade intrínseca do rim em excretar sódio, resultando na retenção líquida e edema pelo mecanismo de overflow.38
GLOMERULONEFRITE AGUDA
Fig. 10.10 Esquema dos mecanismos atuantes na retenção de sódio e edema da síndrome nefrótica. (Baseado em Schrier, R.W.9)
Glomerulonefrite proliferativa difusa aguda e outras formas de lesão glomerular aguda podem causar retenção de sódio e água e formação de edema sem muitas alterações na concentração plasmática de albumina. Este balanço positivo de sódio e água aumenta o volume sanguíneo e a pressão arterial. Se houver elevação também da pressão hidráulica capilar, há desequilíbrio nas forças de Starling, com passagem de fluido intravascular para o interstício. Se as defesas do interstício forem vencidas (aumento do fluxo linfático, características físicas do interstício), ocorre edema. Este mecanismo de retenção de líquido devido a uma incapacidade renal de excretar sódio e
capítulo 10
água é conhecido como “transbordamento”(overflow) e é também observado na insuficiência renal crônica.38 Os mecanismos envolvidos na retenção de sódio na glomerulonefrite aguda (Fig. 10.11) são discutidos a seguir.
Comprometimento do Coeficiente de Ultrafiltração A lesão glomerular compromete o coeficiente de ultrafiltração (Kf) causando redução do ritmo de filtração glomerular (RFG), o qual causa redução na excreção de sódio. Havendo manutenção da ingestão normal de sódio, haverá balanço positivo de sódio com expansão do volume extracelular. Em condições normais esta expansão do volume extracelular acarretaria uma série de reações que alterariam a reabsorção tubular de sódio, aumentando a excreção fracional de sódio e restaurando o balanço. Por razões desconhecidas, na glomerulonefrite aguda estas adaptações na reabsorção de sódio não ocorrem.
Alterações na Função Tubular Renal Não é surpresa que lesões obstrutivas e inflamatórias dos capilares glomerulares resultem em alterações significativas das forças de Starling do capilar peritubular, modificando o ritmo de absorção tubular. Um achado característico na glomerulonefrite aguda é uma queda da fração de filtração (FF), que se acompanha de diminuição da pressão oncótica capilar, a qual, transmi-
157
tida ao capilar peritubular, resulta numa redução de reabsorção de líquido no túbulo proximal. Há, no entanto, pouca evidência de que as alterações na reabsorção proximal de sódio sejam o principal mecanismo na retenção de sódio da glomerulonefrite aguda. Existem evidências de que o nefro distal participe ativamente na reabsorção de sódio da nefrite aguda. Com a redução do coeficiente de ultrafiltração e do RFG, diminui a oferta distal de sódio e conseqüentemente cai a excreção absoluta e fracional de sódio. A atividade plasmática da renina está reduzida face à expansão do volume extracelular e a secreção de aldosterona habitualmente não está elevada.
Insuficiência Cardíaca A insuficiência cardíaca que pode ocorrer na glomerulonefrite aguda, tanto pela elevação da pré-carga (volume) como da pós-carga (hipertensão arterial), acaba sendo mais um mecanismo que determina retenção de sódio. O edema na glomerulonefrite aguda resulta de uma expansão do volume extracelular e elevação da pressão intracapilar sistêmica, alterando as forças de Starling nos capilares periféricos. Com isto há saída de sal e água para o interstício, e, dependendo do grau de volume e pressão do líquido intersticial, haverá evidência clínica de edema.
EDEMA OBSERVADO EM MULHERES Edema da Gravidez Numa gravidez normal há aumento na retenção renal de sal, expansão do volume plasmático e ganho de peso. Há também aumento significativo do RFG, fluxo plasmático renal e do débito cardíaco. Esta retenção de sódio na gravidez é considerada fisiológica para satisfazer as necessidades do feto, o aumento da capacidade vascular materna e a seqüestração de líquido na cavidade amniótica. Alguns dos fatores importantes na retenção de sódio da gravidez estão enumerados no Quadro 10.8.29 Alterações de fatores físicos atuantes no túbulo renal parecem ser importantes na retenção de sódio. O RFG está mais elevado do que o fluxo plasmático renal, resultando num aumento da fração de filtração.42,43 Edema localizado nas extremidades inferiores ocorre em 75% das mulheres grávidas. Este edema ocorre por várias razões: • Efeito mecânico do útero aumentando a pressão venosa nos membros inferiores; • Perfusão elevada nas pernas devido a um aumento no débito cardíaco e diminuição da resistência vascular periférica; • Aumento do volume plasmático e redução da pressão oncótica do plasma; • Outros fatores enumerados no Quadro 10.8.
Fig. 10.11 Fisiopatologia do edema nefrítico. (Baseado em Glassock, R.J. et al.56)
Edema generalizado pode ocorrer em até 20% das mulheres grávidas e na ausência de toxemia é considerado até fisiológico.
158
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
Quadro 10.8 Possíveis fatores importantes na retenção renal de sódio da gravidez normal* 1. Obstrução ureteral devida ao útero grávido 2. Efeitos da postura no RFG e na perfusão renal 3. Efeitos da postura na seqüestração venosa nos membros inferiores 4. Possível aumento no apetite por sal 5. Mecanismos responsáveis pela retenção tubular renal de sódio a. Níveis elevados de aldosterona e outros mineralocorticóides b. Níveis elevados de estrogênios c. Presença de fatores humorais retentores de sódio ? d. Diminuição da resistência vascular periférica e. Aumento anatômico da capacidade vascular *Obtido de Levy & Seely.57
Edema Pré-menstrual O edema geralmente faz parte da síndrome pré-menstrual caracterizada por nervosismo, irritabilidade e cefaléia. A causa da retenção de sódio não é conhecida mas é provavelmente devida a um distúrbio endócrino como uma alteração na relação estrógeno/progesterona ou, como sugerido mais recentemente, uma elevação dos níveis plasmáticos de prolactina.52
CAUSAS DIVERSAS DE EDEMA Síndrome da Permeabilidade Capilar Elevada Há relatos de alguns pacientes que apresentaram angioedema generalizado recorrente. Desconhece-se a causa da elevada permeabilidade capilar, sendo a única anormalidade detectada a presença de uma paraproteína monoclonal IgG.53
Hipocalemia Crônica Toxemia Gravídica Os fatores responsáveis pela elevada retenção de sódio na toxemia são desconhecidos. Os níveis de renina-angiotensina-aldosterona diminuem com o aparecimento da toxemia assim como diminuem o RFG e o fluxo sanguíneo renal. Postula-se que a retenção de sódio pode ser devida a um comprometimento do balanço glomérulo-tubular resultante de uma hiper-reabsorção do filtrado, a exemplo do que ocorre numa glomerulonefrite proliferativa aguda, pois na toxemia há importante lesão endotelial com deposição de material fibrinóide.
Edema Cíclico Idiopático Esta é uma síndrome observada predominantemente em mulheres obesas, adultas, que ainda não entraram na menopausa. A síndrome é caracterizada por períodos de edema, cefaléia, irritabilidade e distensão abdominal. A investigação não revela alterações cardíacas, renais ou hepáticas. Como a maioria destas pacientes apresenta boa diurese e natriurese quando em repouso no leito, questiona-se se a elevada reabsorção de sódio não estaria associada à posição ortostática. Além do componente ortostático de retenção de líquido, há considerável evidência de que estas pacientes têm diminuição do volume plasmático. Entre outros fatores aventados para explicar o edema destacam-se: defeito na permeabilidade capilar e elevados níveis de prolactina. Muitas pacientes usam ou usaram diuréticos. Como os diuréticos causam contração do volume circulante, há um estímulo à retenção de sódio com elevação dos níveis de renina-angiotensina-aldosterona e participação de outros mecanismos. O edema parece ocorrer principalmente após a cessação do uso dos diuréticos. A magnitude do ganho de peso está aumentada com uma dieta alta em sal e em carboidratos.
Alguns pacientes com depleção crônica de potássio podem apresentar edema periférico. Não se conhece a causa da elevada reabsorção tubular de sódio.
Medicamentos Várias substâncias administradas e pacientes podem determinar um aumento na reabsorção de sódio: estrogênios (anticoncepcionais); diazóxido; hidralazina; minoxidil e outras drogas simpatolíticas como metildopa, guanetidina e clonidina. Mais recentemente antiinflamatórios não-esteróides foram incluídos neste grupo de drogas. O mecanismo da retenção de sódio dos estrógenos não é conhecido, mas provavelmente relaciona-se a uma ação a nível tubular. Os vasodilatadores utilizados na hipertensão arterial reduzem a resistência vascular periférica, alterando a relação volume plasmático/capacitância vascular.
Microangiopatia Capilar do Diabetes Mellitus Há relatos de alguns diabéticos com função renal normal que apresentam edema idiopático. Para estes casos tem sido sugerido que, na posição ereta, pode haver uma passagem excessiva de líquido para o interstício devido a uma microangiopatia capilar, com conseqüente retenção de sódio e edema.
Pontos-chave: • A fisiopatogênese do edema na insuficiência cardíaca, cirrose, síndrome nefrótica e síndrome nefrítica tem a participação dos mecanismos de subpreenchimento e/ou transbordamento • O tratamento medicamentoso do edema é feito com diuréticos
159
capítulo 10
Princípios Gerais no Tratamento do Edema TRATAMENTO DA DOENÇA BÁSICA Como a redução do volume sanguíneo arterial efetivo é um denominador comum na retenção de sódio da insuficiência cardíaca, cirrose hepática e síndrome nefrótica, o manejo clínico deve ser dirigido para a correção deste distúrbio básico. Assim sendo, na insuficiência cardíaca melhorar o débito cardíaco restaura o volume circulante efetivo. Na síndrome nefrótica por lesões mínimas o uso de corticosteróides reduz a proteinúria e conseqüentemente a hipoalbuminemia.
ADEQUAÇÃO DA INGESTA DE SAL E ÁGUA Embora a restrição de sódio seja efetiva na prevenção do aumento do edema, ela não causa um balanço negativo de sódio. A diurese de pacientes cardíacos hospitalizados e colocados em dietas hipossódicas está mais relacionada ao efeito benéfico do repouso no débito cardíaco do que resultante da dieta hipossódica. Pacientes que estão formando edema retêm uma fração da ingesta diária de sal a fim de restaurar o volume sanguíneo arterial efetivo. A excreção urinária diária de sódio destes pacientes reflete a capacidade de excreção renal. Conhecendo-se a oferta de sódio na dieta, a determinação da excreção de sódio nas 24 horas permite saber se o balanço de sódio é positivo ou negativo. Concentrações urinárias de sódio da ordem de 10 a 15 mEq/L geralmente indicam um balanço positivo, ou seja, maior quantidade de sódio está sendo reabsorvida nos túbulos renais. A maior parte dos pacientes edemaciados tem um comprometimento na excreção renal de água. A ingesta diária de líquido deve ser ajustada para as perdas insensíveis (500 a 700 ml) por dia mais as perdas urinárias.
Quadro 10.9 Princípios gerais no tratamento do edema* 1. Avaliação da adequação do tratamento da doença básica responsável pelo edema 2. Avaliação do grau de ingesta de água e sal 3. Mobilização do edema 4. Avaliação da indicação do uso de diuréticos A. Comprometimento da função respiratória a. Edema pulmonar b. Ascite com elevação dos diafragmas e associada a atelectasias B. Comprometimento da função cardiovascular secundária a sobrecarga de volume C. Excesso de líquido comprometendo a atividade física e causando desconforto D. Permitir maior liberalização do sal na dieta, aumentando o paladar dos alimentos E. Indicação cosmética *Obtido de Schrier, R.W.9
pacientes em uso de diuréticos seja feita cuidadosa monitorização diária do peso, volume urinário e pressão arterial com o paciente deitado, sentado e em pé.38 Além disso, é essencial o conhecimento da potência, local de ação e complicações do uso de diuréticos (ver Cap. 43). A presença de edema per se não é uma indicação de uso de diuréticos. Em geral, o uso dos diuréticos deve ficar restrito a situações tais como: comprometimento da função cardíaca e/ou respiratória; desconforto físico devido ao acúmulo excessivo de líquido e permitir liberalização do sal na alimentação de pacientes que toleram pouco dietas hipossódicas (Quadro 10.9).
EXERCÍCIOS (Respostas no final do capítulo.)
MOBILIZAÇÃO DO EDEMA O repouso no leito é capaz de induzir diurese devido à redução da seqüestração venosa na periferia, aumentando assim o volume sanguíneo arterial efetivo. Efeito similar possuem as meias elásticas.
INDUÇÃO DE BALANÇO NEGATIVO DE SÓDIO É possível induzir balanço negativo de sódio com a utilização de diuréticos (v. Cap. 43). Com a eliminação de sódio provocada por estas drogas, há redução do volume circulante, diminuição da pressão capilar e conseqüente movimentação de fluido do interstício para o intravascular, devido à modificação das forças de Starling. O fluido assim trazido ao intravascular torna-se disponível para a filtração glomerular.38 Deve ser salientado, porém, que a redução no volume intravascular obtida com os diuréticos pode provocar hipovolemia e insuficiência renal. Recomenda-se que nos
1) Num indivíduo de 70 kg, qual o volume do espaço extracelular? Nos exercícios 2 e 3, responda às seguintes perguntas: a. Qual o distúrbio do extracelular que este paciente apresenta? b. Qual a intensidade deste distúrbio (em percentagem aproximada)? c. Que tipo de solução administrar? d. Qual a quantidade de solução a infundir? e. Em quantas horas deve ser administrada esta solução? 2) Tome como exemplo o mesmo indivíduo acima, com história de dois dias de evolução com vômitos e diarréia profusa. Ao exame físico apresenta queda de 15 mmHg na pressão sistólica e diastólica quando fica em pé. A mucosa oral está seca e as jugulares têm enchimento lento. 3) Considere uma paciente de 60 kg, que permaneceu internada por três dias em outra cidade, com quadro de encefalite, com drenagem por sonda nasogástrica de aproximadamente 2 litros de estase ao dia, utilizando manitol, e recebendo solução glicosada 2.000 ml/dia. Esta paciente é admitida, no hospital onde você é plantonista, com PA 60 30 mmHg, FC 132 bpm, extremidades frias e perfusão periférica comprometida, enchimento capilar lento, jugulares colabando com a inspiração e anúria. Além disso, encon-
160
Metabolismo do Sódio e Fisiopatologia do Edema
tra-se confusa e sonolenta. Assim que a paciente chega, você punciona uma veia jugular e encontra uma PVC de 3 cm H2O.
21. 22.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
2.
3.
4.
5. 6.
7. 8. 9.
10.
11.
12.
13.
14.
15. 16.
17.
18.
19.
20.
MALNIC, G. e MARCONDES, M. Fisiologia Renal, pág. 91, 3.ª parte — Regulação do volume extracelular. EDART — São Paulo Livraria Ltda. 1972. HALPERIN, M.L.; GOLDSTEIN, M.B. Sodium and water physiology. In: Fluid, Electrolyte and Acid-Base Physiology — A Problem Based Approach, Eds. Halperin, M.L.; Goldstein, M.B., pp. 217-251. W.B. Saunders Co, 1994. EARLEY, L.E. Sodium metabolism. Cap. 3, pp. 95-119. In: Clinical Disorders of Fluid and Electrolyte Metabolism. Eds. Maxwell, M.H. and Kleeman, C.R. McGraw-Hill Book Co., 1972. WINAVER, J.; ABASSI, Z.; GREEN, J.; SKORECKI, K.L. Control of extracellular fluid volume and the pathophysiology of edema formation. Cap. 19, pp. 795-866. In: The Kidney, Eds. Brenner, B.M.; Rector Jr, F.C. W.B. Saunders Co., 2000. EPSTEIN, F.H. e cols. Effects of an arteriovenous fistula on renal hemodynamics and electrolyte excretion. J. Clin. Invest., 32:233, 1955. DIRKS, J.H. e cols. Control of extracellular fluid volume and the pathophysiology of edema formation. Cap. 4, pp. 495-552. In: The Kidney, Eds. Brenner, B.M. and Rector Jr, F.C. W.B. Saunders Co., 1976. ROSE, B.D.; POST, T.W. Up to Date v. 9., n. 3. Cap. 8B: Regulation of the effective circulating volume, 2001. HABERICH, F.J. Osmoreception in the portal circulation. Fed. Proc., 27:1.137, 1968. BICHET, D.G.; ANDERSON, R.J.; SCHRIER, R.W. Renal sodium excretion, edematous disorders, and diuretic use. In: Renal and Electrolyte Disorders, Ed. Schrier, R.W. Cap. 2, pp. 89-159, Little, Brown and Co, 1992. DE WARDENER, H.E. e cols. Studies on the efferent mechanism of the sodium diuresis, which follows the administration of intravenous saline in the dog. Clin. Sci., 21:249, 1961. KLAHR, S. e SLATOPOLSKY, E. Renal regulation of sodium excretion. Function in health and in edema-forming states. Arch. Intern. Med., 131:780, 1973. BRENNER, B.M. e cols. Postglomerular vascular protein concentration: evidence for a causal role in governing fluid reabsorption and glomerulotubular balance by the renal proximal tubule, J. Clin. Invest., 50:336, 1971. BRENNER, B.M. e col. Quantitative importance of changes in postglomerular colloid osmotic pressure in mediating glomerulotubular balance in the rat. J. Clin. Invest., 52:190, 1973. EARLEY, L.E. e FIEDLER, R.N. The effect of combined renal vasodilatation and pressor agents on renal hemodynamics and the tubular reabsorption of sodium. J. Clin. Invest., 45:542, 1966. LEYSSAC, P.P. Dependence of GFR on proximal tubular reabsorption of salt. Acta Physiol. Scand., 58:236, 1963. THURAY, K. e SCHNERMANN, J. Die Natriumkonzentration an den Macula Densa-Zellen als regulierender faktor für das glomerulumfiltrat (Mikropunktions-versuche). Klin. Wochenschr., 43:410, 1965. BARTOLI, E. e EARLEY, L.E. Evidence for the intraluminal action of plasma factors on proximal sodium reabsorption. Clin. Res., 20:586, 1972. BRUNNER, F.P. e col. Mechanism of glomerulotubular balance: II. Regulation of proximal tubular reabsorption by tubular volume, as studied by stopped-flow microperfusion. J. Clin. Invest., 54:603, 1966. BURG, M.B. The renal handling of sodium chloride. Cap. 7, pp. 272298. In: The Kidney. Eds. Brenner, B.M. and Rector Jr, F.C. W.B. Saunders Co., 1976. PEIRCE, N.F. e col. Replacement of water and electrolyte losses in cholera by an oral glucose-electrolyte solution. Ann. Inter. Med., 70:1.173, 1969.
23. 24.
25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34. 35.
36. 37. 38. 39. 40. 41. 42. 43.
44.
45.
46.
47.
48. 49.
GIEBISCH, G. Coupled ion and fluid transport in the kidney. The New Engl. J. Med., 287:913, 1972. SCHRIER, R.W. e DE WARDENER, H.E. Tubular reabsortion of sodium ion: influence of factors other than aldosterone and glomerular filtration. N. Engl. J. Med., 285:1231, 1971 e 285:1292, 1971. BOUGOIGNIE, J.J. e col. The presence of a natriuretic factor in urine of patients with chronic uremia. J. Clin. Invest., 53:1559, 1974. BRICKER, N.S.; ZEA, L.; SHAPIRO, M., et al. Biologic and physical characteristics of the non-peptidic, non-digitalis-like natriuretic hormone. Kidney Int., 44:937, 1993. HAUPERT, G.T. Natriuretic hormones. In: Cecil Textbook of Medicine, W.B. Saunders Co, Cap. 234, pp. 1194-1198, 2000. ROSE, B.D. Natriuretic hormones: atrial peptides and ouabain-like hormone. Up to Date v. 9, n. 3, 2001. LEVIN, E.R.; GARDNER, D.G.; SAMSON, W.K. Natriuretic Peptides. The New Engl. J. Med., 339(5):321-328, 1998. HIGA, E.M.S. Óxido nítrico e o rim. In: Atualidades em Nefrologia, Eds: Cruz, J.; Barros, R.T., vol. 4, pp. 357-365, Sarvier, 1996. ROSE, B.D.; POST, T.W. Regulation of renal Na excretion. Cap. 8C, Up to Date v. 9, n. 3, 2001. CHAPMAN, W.H. e col. The Urinary System. An Integrated Approach. W.B. Saunders Co. 1973. POST, T.W.; ROSE, B.D. Dehydration is not synonymous with hypovolemia. Up to Date v. 9, n. 3, 2001. POST, T.W.; ROSE, B.D. Clinical manifestations and diagnosis of volume depletion, Up to Date v. 9, n. 3, 2001. COHN, J.N. Central venous pressure as a guide to volume expansion. Ann. Intern. Med., 66:1283, 1967. ROSE, B.D. Fluid replacement in volume depletion. Up to Date v. 9, n. 3, 2001. PRESTON, R.A. IV solutions and IV orders. In: Acid-Base, Fluids and Electrolytes Made Ridiculously Simple. Ed. Preston, R.A., Cap. 2, pp. 31-38, MedMaster, Inc., 1997. ROSE, B.D.; MANDEL, J. Treatment of severe hypovolemia or hypovolemic shock. Up to Date v. 9, n. 3, 2001. SCRIBNER, B.H. Apostila para o curso de Equilíbrio Hidroeletrolítico (Syllabus), 1953. SEGURO, A.C.; HELOU, C.M.B.; ZATZ, R. Fisiopatologia do edema. Cap. 2, pp. 151-172, In: Fisiopatologia Renal. Ed. Zatz, R., Atheneu, 2000. VALTIN, H. Renal Dysfunction: Mechanisms Involved in Fluid and Solute Imbalance. Cap. 3, p. 65 Little, Brown and Co. 1979. INTAGLIETTA, M.E.; ZWEIFACH, B.W. Microcirculatory basis of fluid exchange. Adv. Biol. Med. Phys., 15:11, 1974. LEAF, A., COTRAN , R.S. Renal Pathophysiology. Cap. 6, p. 136. Oxford University Press, 1976. PORTO, C.C. Exame físico geral. In: Porto, C.C. Semiologia Médica, Cap. 7, pp. 65-114. Guanabara Koogan, 1997. BAKRIS, G.L.; STEIN, J.H. Sodium metabolism and maintenance of extracellular fluid volume. In: Fluid, Electrolyte and Acid-Base Disorders, Eds. Arieff, A.I.; DeFronzo, R.A. Cap. 2, pp. 29-49. Churchill-Livingstone, 1995. EPSTEIN, F.H.; POST, R.S.; McDOWELL, M. Effects of an arteriovenous fistula on renal hemodynamics and electrolyte excretion. J. Clin., Invest., 32:233, 1953. NEEDLEMAN, P.; GREENWALD, J.E. Atriopeptin: a cardiac hormone intimately involved in fluid, electrolyte and blood pressure homeostasis. New Engl. J. Med., 314:828, 1986. METTAURER, B.; ROULEAU, J.L.; BICHET, D. et al. Sodium and water excretion abnormalities in CHF. Ann Intern. Med., 105:161, 1986. SEIFTER, J.L.; SKORECKI, K.L.; STIVELMAN, J.C.; HAUPER, G.; BRENNER, B.M. Control of extracellular fluid volume and pathophysiology of edema formation. Cap. 10, p. 343. In: The Kidney. Eds. Brenner B.M., Rector Jr., F.C. W.B. Saunders Co. 1986. LUNZER, M.R.; NEWMAN, S.P.; BERNARD, A.G. et al. Impaired cardiovascular responsiveness in liver disease. Lancet, 2:382, 1975. ROSE, B.D. Approach to the patient with edema. Up to Date, v. 9, n. 3, 2001.
161
capítulo 10
50.
51. 52.
53.
54. 55.
56.
57.
SKORECKI, K.L.; NADLER, S.P.; BADR, K.F.; BRENNER, B.M. Renal and systemic manifestations of glomerular diseases. Cap. 21. p. 891. In: The Kidney, Eds. Brenner, B.M., Rector Jr, F.C. W.B. Saunders Co., 1986. WRIGHT, E.P. Capillary permeability of protein as a factor in the control of plasma volume. J. Physiol., 237:39, 1974. HALBREICH, U.; ASSAEL, M.; BEN-DAVID, M.; BORNSTEIN, R. Serum prolactin in women with premenstrual syndrome. Lancet, 2:654, 1976. ATKINSON, J.P.; WALDMANN, T.A.; STEIN, S.F. et al. Systemic capillary leak syndrome and monoclonal IgG gammopathy. Medicine, 56:225, 1977. VALTIN, H. Renal Function: Mechanisms Preserving Fluid and Solute Balance in Health, p. 114. Little, Brown and Co., 1973. SLATOPOLSKI, E. e cols. Studies on the characteristics of the control system governing sodium excretion in uremic man. J. Clin. Invest., 47:521, 1968. GLASSOCK, R.J.; COHEN, A.H.; BENNET, C.M.; MARTINEZMALDONADO, M. Primary glomerular diseases. Cap. 26. p. 1351. In: The Kidney. Eds. Brenner, B.M.; Rector, Jr, F.C. W.B. Saunders Co., 1981. LEVY, M.; SEELY, J.F. Pathophysiology of edema formation. The Kidney, Eds. Brenner, B.M.; Rector, Jr. F.C. W.B. Saunders Co., p. 723, 1981.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.kidneyatlas.org/book1/adk1-02.pdf — Excelente capítulo do atlas on-line editado pelo Dr Schrier. http://umed.med.utah.edu/ms2/renal/Word%20files/ c)%20Disorders%20of%20Volume-Ed.htm — página que aborda a fisiopatogenia e tratamento do edema. http://www.medonline.com.br/med-ed/med10/ orimicc.htm — artigo que aborda as alterações renais encontradas na insuficiência cardíaca.
http://www.geocities.com/HotSprings/4234/cirrose.html — página que entre outros itens descreve a fisiopatogenia das alterações renais encontradas na cirrose hepática. http://www.learndoctor.com/chapterpages/chapter22.htm — site com questões de auto-avaliação.
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS 1) Espaço extracelular 20% do peso. Paciente de 70 kg 14 litros. 2) Paciente de 70 kg com diarréia e queda de PA e aumento da FC ortostáticas. a. Depleção do espaço extracelular. b. 20-30% de depleção. c. Solução salina isotônica. d. 70 kg 14 litros de EEC; 20-30% de DEEC 14 0,2-0,3 2,8-4,2 litros de solução a infundir, pois este é o déficit apresentado. e. Na primeira hora infundir volume suficiente para que os sinais hemodinâmicos encontrados sejam melhorados; o restante do volume infundir nas próximas horas. 3) Paciente de 60 kg com história de perda por sonda gástrica e uso de diurético osmótico. a. Esta paciente apresenta um grau avançado de depleção do espaço extracelular, com sinais de choque hipovolêmico. b. Depleção de 40-50% do espaço extracelular. c. Solução salina isotônica. d. 60 kg 12 litros de EEC; 40-50% de DEEC 12 0,4-0,5 4,86 litros de solução a infundir, pois este é o déficit apresentado. e. Na primeira hora é importante infundir volume suficiente para desaparecerem os sinais de comprometimento hemodinâmico. A monitorização da diurese auxilia a verificar a adequação da reposição; continuar monitorizando a PVC, avaliando este parâmetro sem esquecer de suas limitações.
Capítulo
11
Metabolismo Ácido-Básico Miguel Carlos Riella e Maria Aparecida Pachaly
INTRODUÇÃO
Manifestações clínicas e efeitos sistêmicos
CONCEITOS E PRINCÍPIOS QUÍMICOS
Achados laboratoriais
Ácido
Tratamento Alcalose metabólica
Base Sistema tampão
Causas de alcalose metabólica
pH
Geração da alcalose metabólica
Lei de ação das massas
Manutenção da alcalose metabólica
Equação de Henderson-Hasselbalch
Mecanismos de defesa do pH na alcalose metabólica
Eletroneutralidade METABOLISMO ÁCIDO-BÁSICO
Manifestações clínicas
SISTEMAS TAMPÃO
Dados laboratoriais
Sistema tampão ácido carbônico-bicarbonato
Tratamento Acidose respiratória
Proteínas plasmáticas Hemoglobina
Causas
Tamponamento nos ossos
Conseqüências clínicas
CONTROLE RESPIRATÓRIO DA PCO2
Conseqüências fisiológicas
CONTROLE RENAL DO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BÁSICO
Tratamento
Reabsorção tubular do bicarbonato filtrado
Alcalose respiratória
Secreção tubular de H
Causas
Fatores que influenciam na reabsorção do bicarbonato
Conseqüências clínicas Conseqüências fisiológicas
filtrado
Tratamento
Excreção de acidez titulável (AT) 4
Distúrbios ácido-básicos mistos
Excreção de amônio (NH ) 4
Produção proximal e secreção de NH
Diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos
Gradiente intersticial corticopapilar para NH4/NH3
Roteiro para interpretação dos distúrbios
Secreção de amônia nos ductos coletores (NH3) Difusão não-iônica DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO ÁCIDO-BÁSICO Acidose metabólica Causas
ácido-básicos Alguns exemplos EXERCÍCIOS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS
163
capítulo 11
INTRODUÇÃO Para que seja mantida a estabilidade do meio interno, deve haver equilíbrio entre a produção e a remoção de íons hidrogênio (H) em nosso organismo. Os rins são fundamentais na eliminação do H, mas o controle da concentração deste íon envolve ainda outros mecanismos, como o tamponamento realizado pelo sangue, células e pulmões.1 A quantidade de íon hidrogênio é mantida dentro de limites estreitos, num processo extremamente sensível, uma vez que a quantidade de hidrogênio no extracelular (40 nanoequivalentes/litro 0,00004 mEq/litro) é cerca de 1 milionésimo das concentrações do sódio, potássio ou cloro.2 A manutenção desta baixa concentração hidrogeniônica é essencial para a função celular normal. Os íons hidrogênio são altamente reativos, particularmente com porções de moléculas protéicas com carga negativa.2 Assim, variações na concentração de hidrogênio produzem grande impacto sobre as funções celulares, pois quase todos os sistemas enzimáticos de nosso organismo e proteínas envolvidas na coagulação e contração muscular são influenciados pela concentração de íons hidrogênio.2,3
Sistema Tampão É o sistema formado por um ácido e uma base a ele conjugada, cuja finalidade é a de minimizar alterações na concentração hidrogeniônica [H] de uma solução. Em outras palavras, uma base fraca se liga aos H dissociados de um ácido forte para formar um ácido fraco pouco dissociável, tamponando e, portanto, minimizando as alterações na concentração de H. Além disso, um sistema tampão também pode doar H.5
pH Como a concentração hidrogeniônica [H] é muito baixa, torna-se mais simples expressar esta concentração em escala logarítmica, utilizando as unidades de pH. O pH é inversamente proporcional à concentração hidrogeniônica. Um baixo pH corresponde a uma alta concentração de íons hidrogênio, enquanto um pH alto corresponde a uma concentração hidrogeniônica baixa. Portanto, a atividade dos íons H em uma solução determina a sua acidez.1,6 pH log 1/H log [H] Para a [H] normal de 40 mEq/litro, o pH é: pH log [0,00000004] 7,4
CONCEITOS E PRINCÍPIOS QUÍMICOS Ácido Substância capaz de doar íons H (prótons). Exemplos: H2CO3, NH4, HCl. Um ácido forte como o HCl se dissocia rapidamente e libera grandes quantidades de H. Os ácidos fracos têm uma menor tendência à dissociação, liberando H com menor intensidade. O acúmulo excessivo de íons H é chamado de acidose.1,4
Base Substância (íon ou molécula) capaz de receber íons H. Exemplos: HCO3, NH3, HPO4. Uma base forte (p.ex., o OH) reage de maneira rápida e intensa com o H, removendo-o de uma solução. Uma base fraca reage de maneira pouco intensa. O termo base é usado como sinônimo de álcali. Álcali é uma molécula formada pela combinação de um metal alcalino (p. ex., sódio, potássio) com um íon fortemente básico, como o íon hidroxila (OH). Os íons hidroxila reagem rapidamente com os íons hidrogênio, portanto são bases típicas. A remoção excessiva de íons H dos líquidos corporais é chamada de alcalose. No equilíbrio ácido-básico normal, a maior parte dos ácidos e bases existentes no espaço extracelular é fraca.1
Nos líquidos corporais e diferentes tecidos existe uma ampla variação de pH. O pH arterial normal é 7,40, sendo um pouco menor no sangue venoso e interstício (7,35), devido à quantidade de CO2 que se difunde dos tecidos. O pH urinário pode variar de 4,5 a 8,0, dependendo do estado ácido-básico do fluido extracelular. No estômago, a produção de HCl pode reduzir o pH para 0,8.1 Considera-se o pH como normal se estiver entre 7,35 e 7,45. Os limites de pH sanguíneo compatível com a vida são 6,8 e 8,0.1
Lei de Ação das Massas A lei de ação das massas estabelece que a velocidade de uma determinada reação química é proporcional à concentração dos reagentes. Por exemplo, na reação abaixo, a velocidade com que a reação ocorre para a direita ou para a esquerda é uma constante que depende da concentração dos substratos. HPO4 H ↔ H2PO4 Em equilíbrio, são iguais as constantes para cada lado da equação. Porém, se houver maior quantidade de substrato em um lado, a reação se dirige para o lado oposto. A lei de ação das massas é útil para descrever a dissociação de todos os ácidos e bases do organismo. Por exemplo, para a dissociação de um ácido HA em H A: 7
164
Metabolismo Ácido-Básico
Ka
[H] [A] [HA]
Onde: Ka constante de dissociação para este ácido (há um valor para cada ácido).
Equação de Henderson-Hasselbalch A equação que acabamos de ver pode ser reorganizada, originando a equação de Henderson-Hasselbalch, que quando aplicada ao sistema tampão ácido carbônico-bicarbonato, um dos mais importantes de nosso organismo, define a relação entre pH, PCO2 e HCO3. Neste caso, pK é a constante de dissociação do ácido carbônico. Fica assim demonstrado que o pH do sangue é determinado pela concentração de bicarbonato e tensão de CO2.6,7 pH pK
log [HCO3] log [H2CO3]
Eletroneutralidade É o princípio segundo o qual não pode haver acúmulo de quantidades significativas de cargas elétricas em sistemas biológicos, pois isto geraria diferenças muito altas de potencial elétrico nos tecidos. Então, ao ser absorvido um cátion, é necessário que seja reabsorvido um ânion, ou eliminado outro cátion, de forma que resulte o mesmo número de cargas positivas e negativas.8
METABOLISMO ÁCIDO-BÁSICO O metabolismo de gorduras e carboidratos origina CO2 e H2O. Aproximadamente 20.000 mEq de CO2 são produzidos diariamente. Ao observar a reação abaixo, percebe-se que se o CO2 não fosse eliminado, a reação se dirigiria no sentido de produção do H2CO3, que se dissociaria e aumentaria a quantidade de hidrogênio no organismo, resultando em acidose. A eliminação do CO2 é realizada pelos pulmões; por este motivo o CO2 é chamado de ácido volátil.2 CO2 H2O ↔ H2CO3 ↔ H HCO3 Além da produção de ácido volátil, são produzidos outros ácidos em nosso metabolismo. A dieta ocidental contém aminoácidos e outras substâncias ácidas. Por exemplo, o cloreto de lisina é metabolizado em ácido clorídrico e uréia; a hidrólise de proteínas e ácidos nucléicos forma ácido fosfórico, e a oxidação de aminoácidos que contêm enxofre gera ácido sulfúrico. Desta forma, produz-se uma carga ácida diária da ordem de 1 mEq/kg/dia. Além disso, a oxidação incompleta da glicose pode originar 20-30 mEq de ácidos orgânicos por dia.9
A produção endógena de ácidos é um processo normal, mas pode estar aumentada na presença de certas influências hormonais, substratos exógenos ou interrupção das vias de controle. Alguns estados patológicos se caracterizam por um aumento significativo na produção de ácidos orgânicos, como os cetoácidos formados no diabetes melito descompensado, alcoolismo ou jejum prolongado. Drogas e toxinas podem acelerar a produção de ácidos orgânicos, como o ácido fórmico a partir do metanol; ácido oxálico a partir do etilenoglicol, e ácido salicílico a partir da aspirina. Outro mecanismo para acúmulo de ácido ocorre quando seu metabolismo e excreção estiverem comprometidos. Exemplo disso é o acúmulo de ácido láctico, caso sua conversão para glicose (ciclo de Cori) seja interrompida por algum motivo; como o tecido muscular produz imensas quantidades deste ácido todos os dias, ele rapidamente se acumularia.9 Ao contrário do CO2, que pode ser eliminado pelos pulmões, os demais ácidos são denominados ácidos não-voláteis ou fixos e devem ser eliminados pelo rim. Além do ganho diário de ácidos voláteis e não-voláteis, nosso organismo também deve compensar as perdas fisiológicas de substâncias alcalinas, de cerca de 20-30 mEq de bicarbonato por dia. Em algumas doenças diarréicas, esta perda pode aumentar dez vezes.1 Frente a todos estes dados, percebemos que existe em nosso organismo uma predominância de mecanismos que levam a um excesso de ácidos. A manutenção de um pH normal nos fluidos corporais frente a uma carga ácida requer a integração de mecanismos fisiológicos que impedem que haja variações muito intensas na concentração de hidrogênio. A primeira linha de defesa que atua na manutenção de um pH fisiológico frente à adição de ácidos são os tampões (bicarbonato e outros tampões extracelulares), que agem instantaneamente. Já a segunda linha de defesa envolve o sistema respiratório e consiste na variação da PCO2 de acordo com a [H] em minutos a horas. Por último, há a terceira linha de defesa, que envolve o sistema renal através do controle da concentração de bicarbonato. A eficácia máxima deste último sistema é atingida 24 a 48 horas após o início do desequilíbrio.2,10 Desta maneira, e voltando à equação de HendersonHasselbalch, podemos compreender que o organismo atua na normalização do pH atuando nas variáveis que determinam o pH: PCO2 e HCO3. O desvio do pH arterial abaixo de 7,35 ou acima de 7,45 é referido como acidemia e alcalemia, respectivamente. Os processos que tendem a reduzir ou elevar o pH são chamados acidose e alcalose. Desta maneira, poderemos ter quatro alterações primárias do estado ácido-básico: 1. acidose metabólica: quando o HCO3 diminuir, ou quando a concentração de H aumentar; 2. alcalose metabólica: quando o HCO3 estiver elevado ou quando ocorrer uma perda de H;
165
capítulo 11
3. acidose respiratória: quando ocorrer um aumento na PCO2; 4. alcalose respiratória: quando a PCO2 for reduzida. Porém, há situações em que duas ou mais anormalidades estão presentes, caracterizando os distúrbios ácidobásicos mistos.2
Pontos-chave: • Os ácidos voláteis e não-voláteis, produzidos diariamente, são eliminados pelos pulmões e rins, respectivamente • pH normal 7,35-7,45. Para preservar as funções celulares, variações de pH devem ser corrigidas, através das seguintes linhas de defesa: 1.ª (instantânea): Sistemas tampão 2.ª (minutos): Componente respiratório 3.ª (horas a dias): Componente renal (lento)
SISTEMAS TAMPÃO A manutenção de um pH relativamente constante no organismo se deve à integração renal-respiratória, já mencionada, e à atuação de sistemas tampão (componente químico), que minimizam as variações de pH conseqüentes a uma carga ácida ou alcalina. Os sistemas tampão são de modo geral formados por ácidos fracos (e o sal correspondente ou base), que não se dissociam completamente e, portanto, têm a capacidade de receber ou doar H quando a concentração de H se altera. Por exemplo, quando um ácido forte é introduzido no sangue, ele se dissocia completamente e aumenta a concentração de H. Ao entrar em contato com o sistema tampão, o hidrogênio dissociado do ácido forte liga-se ao sal do sistema tampão, reduzindo a atividade de H. Assim, o ácido forte é substituído por um ácido fraco, de dissociação menos intensa.1,11 Ácido forte base fraca ↔ sal neutro ácido fraco Exemplo: HCl Na2HPO4 ↔ NaCl NaH2PO4 Ao acrescentar uma base forte a um sistema tampão, ela é substituída por seu sal de base e um ácido fraco.1,11 Base forte ácido fraco ↔ base fraca água Exemplo: NaOH NaH2PO4 ↔ Na2HPO4 H2O A capacidade do sistema tampão em resistir às alterações do pH é dependente da concentração e do pK do sistema tampão (Fig. 11.1). Quanto mais próximo do pK do sangue estiver o pK do tampão, maior será a sua capacidade de tamponamento. Quando se adiciona ácido (H) ao organismo, parte dele é tamponada quimicamente no líquido extracelular, e parte
Fig. 11.1 Alteração no pH de uma solução tampão, à medida que um ácido é adicionado à solução. Observem que, quando o tampão estiver 50% livre e 50% combinado com H (pK do tampão), haverá pouca alteração do pH. Portanto, o tampão será mais eficiente em soluções com um pH nesta faixa. (Obtido de Makoff, D.L.49)
difunde-se para dentro das células (Fig. 11.2). Aproximadamente 60% são tamponados nas células e nos ossos, num processo que envolve troca de H por Na ou K. Os 40% restantes são tamponados no líquido extracelular pelos tampões existentes. Quando se adiciona uma substância alcalina, aproximadamente 70% são tamponados em líquido extracelular e o restante nas células.12 O movimento de H, OH ou HCO3 através da membrana celular é importante para o tamponamento de variações de pH que ocorrem no extracelular ou intracelular.10 No organismo, os seguintes sistemas tampão são importantes: bicarbonato, proteínas plasmáticas (extracelulares) e hemoglobina, fosfato, complexos organofosfatados, amônio, proteínas intracelulares e cristais de apatita do osso. De acordo com o princípio iso-hídrico, todos os tampões em uma solução estão em equilíbrio com a mesma concentração de hidrogênio. Estes vários sistemas tampão não agem isoladamente; eles atuam ao mesmo tempo, cada qual com seu pK e concentração. Quando ocorre uma variação na concentração de hidrogênio, ocorrem modificações em todos os sistemas tampão. Qualquer condição que modifique o equilíbrio de um sistema tampão altera o equilíbrio de todos os outros.1,8
Sistema Tampão Ácido CarbônicoBicarbonato É o principal sistema tampão do organismo. Observe que as reações químicas deste sistema tampão obedecem à quantidade existente de substrato e acontecem ao mesmo tempo no sangue e nos túbulos renais. Quando íons H são adici-
166
Metabolismo Ácido-Básico
Fig. 11.2 Mecanismos de defesa frente a um excesso de ácido. Quando ocorre alcalose, as reações se processam em sentido inverso. (Obtido de Makoff, D.L.49)
onados ao organismo, combinam-se com o HCO3 do plasma, formando H2CO3, que se dissocia em água e CO2, o qual pode ser removido pelos pulmões. Neste sistema, o pH do líquido extracelular é controlado pela eliminação ou recuperação de HCO3 pelos rins e remoção de CO2 pelos pulmões. H HCO3 ↔ H2CO3 ↔ CO2 H2O Devido à sua importância no equilíbrio ácido-básico, o sistema tampão ácido carbônico-bicarbonato será abordado em mais detalhe ao longo deste capítulo.
Proteínas Plasmáticas As proteínas e aminoácidos do sangue e intracelulares são tampões importantes, pois possuem grupos químicos capazes de receber ou liberar H, comportando-se como ácidos ou bases. As proteínas possuem numerosos grupos
carboxila (COOH), que podem perder um próton e formar COO. Também apresentam grupos amino (NH2), que podem receber um próton e formar NH3.10 A ação tamponante de uma proteína pode ser vista na Fig. 11.3. A carga elétrica das proteínas varia com o pH do extracelular. Para uma determinada proteína, a carga é determinada pelo equilíbrio entre seus grupos de carga negativa e positiva. Uma proteína pode ser caracterizada pelo seu ponto isoelétrico, isto é, o pH em que não apresenta cargas negativas. Para as proteínas plasmáticas, o ponto isoelétrico está em torno de 5,1-5,7, ou seja, bem abaixo do pH normal de nosso organismo. Por isso, de modo geral as proteínas plasmáticas se comportam como poliânions.10 A albumina realiza uma parte significativa da ação tamponante do plasma que não é executada pelo bicarbonato, pois há vários grupos imidazol em sua molécula. Sua capacidade tamponante é superior à da globulina.10
Fig. 11.3 Representação esquemática da ação tamponante de uma proteína.
167
capítulo 11
As proteínas localizadas no espaço intracelular também contribuem para o tamponamento do H. Por exemplo, as proteínas intracelulares do músculo esquelético colaboram com 60% do tamponamento não realizado por bicarbonato, sendo os 40% restantes realizados por fosfatos orgânicos e inorgânicos.10
Hemoglobina A hemoglobina é responsável pela maior parte do tamponamento plasmático não realizado pelo bicarbonato, devido à sua alta concentração nas hemácias e sua grande capacidade de tamponamento, por possuir vários grupos ácidos ou básicos em sua molécula: carboxila (COOH), amino (NH2), amônia (NH3). O CO2 proveniente do metabolismo tissular difunde-se para dentro das hemácias. A hemoglobina reduzida, presente ao nível tecidual, tem máxima afinidade por radicais ácidos, favorecendo a captação e o transporte de CO2. Dentro das hemácias, apenas uma pequena parte do CO2 permanece dissolvida. A maior parte do CO2 que adentra a célula sofre hidratação, por ação da anidrase carbônica (presente em grandes quantidades nas hemácias), formando H2CO3, que se dissocia em H e HCO3. O hidrogênio assim liberado é tamponado por grupos amino da hemoglobina, a qual se transforma em H-Hb. 10 CO2 H2O ↔ H2CO3 ↔ H HCO3 앖 anidrase carbônica (AC) Com o aumento da concentração intra-eritrocitária de bicarbonato, este se difunde para o plasma devido ao gradiente de concentração. Portanto, é nas hemácias que se forma parte do bicarbonato plasmático. Com a saída de HCO3, o Cl adentra a célula, a fim de manter a eletroneutralidade.10
Pontos-chave: • Tampões são substâncias capazes de doar ou receber íons hidrogênio, atenuando variações de pH • Os principais tampões existentes em nosso organismo são: Bicarbonato Proteínas plasmáticas e intracelulares Hemoglobina Ossos • Cerca de 95% dos ácidos voláteis são tamponados no intracelular. Dos ácidos fixos, 50% são tamponados no intracelular e 50% no extracelular
No sangue que transita pelos pulmões, a reação química anterior sofre uma inversão, e o CO2 é eliminado.10
Tamponamento nos Ossos Os ossos contêm cerca de 60% do CO2 do organismo, sendo a maior parte sob a forma de carbonato, formando complexos com cálcio, sódio e outros cátions. O restante existe sob a forma de bicarbonato, associado à hidroxiapatita. Existem evidências demonstrando que na acidose crônica (como na insuficiência renal crônica) a necessidade de tamponamento leva à dissolução óssea, com liberação de tampões fosfato e carbonato, num mecanismo possivelmente mediado pelo paratormônio.10
CONTROLE RESPIRATÓRIO DA PCO2 A segunda linha de proteção contra distúrbios ácidobásicos é o controle da concentração de CO2 pelos pulmões. A equação de Henderson-Hasselbalch demonstra que a variação da PCO2 através da respiração é uma importante maneira de normalizar o pH. Assim, quando há aumento da concentração de H, este se combina com o bicarbonato, formando ácido carbônico (H2CO3), que se dissocia em H2O e CO2. O CO2 continuamente produzido pelo metabolismo e resultante das reações dos sistemas tampão é rapidamente eliminado pelos pulmões. H HCO3 ↔ H2CO3 ↔ H2O CO2 씮 respiração 앖 metabolismo
Além disso, a ventilação alveolar é estimulada ou inibida por variações na [H]. Quando a concentração hidrogeniônica está elevada, o centro respiratório é estimulado, aumentando a amplitude dos movimentos respiratórios (hiperventilação alveolar), eliminando mais CO2. Uma inibição do centro respiratório (hipoventilação alveolar) ocorre se a concentração de hidrogênio está baixa, por um mecanismo de feedback.1
CONTROLE RENAL DO EQUILÍBRIO ÁCIDO-BÁSICO Apesar da eficiência dos sistemas tampão e do controle respiratório, estes mecanismos proporcionam proteção temporária, minimizando alterações do pH quando ácidos fortes ou bases são adicionados ao organismo, ou quando a concentração de CO2 se altera. Um mecanismo mais duradouro é realizado pelos rins, através da reabsorção de quase todo o bicarbonato filtrado e recuperação do HCO3 que foi consumido no proces-
168
Metabolismo Ácido-Básico
Fig. 11.4 Filtração, reabsorção e excreção de bicarbonato de acordo com a concentração plasmática. Observem que todo o bicarbonato será reabsorvido quando a concentração plasmática for inferior a 25-26 mM/L. (Modificado de Pitts, R.F.50)
so de tamponamento de ácidos fixos. Este último processo é obtido através da excreção de uma quantidade equivalente de H na urina.3 Para cada molécula de bicarbonato consumida, o rim reabsorve ou regenera uma nova molécula de bicarbonato.8 A urina torna-se ácida pela reabsorção das substâncias alcalinas ou pela adição de ácido ao fluido tubular.13
Reabsorção Tubular do Bicarbonato Filtrado Como o sódio e outros solutos, o bicarbonato é filtrado livremente pelo glomérulo. Em adultos, cerca de 4.500 mEq de bicarbonato são filtrados por dia. Se houvesse perdas de bicarbonato, mesmo que pequenas em relação ao total, os estoques seriam rapidamente esgotados. Isto é evitado pela existência de uma grande avidez tubular pela reabsorção de bicarbonato, que ultrapassa 99,9% do bicarbonato filtrado, ou seja, apenas 2 mEq de bicarbonato são excretados por dia.3
Secreção Tubular de H Os estudos de Pitts e colaboradores na década de 1940 demonstraram que grande parte do ácido excretado chega até a urina não por filtração glomerular, e sim por secreção tubular. Dentro das células tubulares, a água está em equilíbrio com o H e OH. O hidrogênio é secretado para a luz tubular principalmente por dois mecanismos: 1) Através de um processo ligado à entrada passiva de sódio filtrado para a célula (troca Na / H)13,14 e 2) Através de um processo ativo por uma bomba iônica (H-ATPase). A presença e importância de cada um desses mecanis-
mos na secreção de H varia nos diferentes segmentos tubulares. Nos ductos coletores há um terceiro mecanismo, por meio de uma bomba H-K-ATPase.3 A maior capacidade secretora de H ocorre no túbulo proximal (80-90%), alça de Henle e túbulo contornado distal (10-20%), e apenas uma pequena fração no túbulo coletor. No entanto, os segmentos proximais conseguem pequenas alterações de pH urinário; as maiores alterações são obtidas no ducto coletor. Vários fatores interferem com a secreção de hidrogênio na luz tubular, como a PCO2, níveis de potássio e hormônios adrenais. A secreção de hidrogênio aumenta quando há retenção de CO2. Se a PCO2 cair, aumenta o pH intracelular e diminui a secreção de H. O potássio também interfere na secreção de H. Quando existe depleção de potássio, ocorre aumento na concentração intracelular de H, com aumento de sua secreção e da reabsorção de bicarbonato. Quando existe excesso de potássio, diminuem a concentração intracelular e a secreção de hidrogênio, diminuindo também a reabsorção de bicarbonato. A elevação dos níveis circulantes de hormônios adrenais leva a um aumento na reabsorção de HCO3 principalmente em presença de deficiência de potássio. Quando não há déficit de potássio, a aldosterona parece atuar apenas nas porções mais distais do nefro, aumentando sua capacidade de secretar H. Aldosterona causa expansão do extracelular, diminuindo sua capacidade de reabsorção proximal de HCO3 e contrabalançando o aumento que causa na secreção distal de H. Então, em presença de potássio normal, não há nem alcalose nem acidose. Porém, quando há hipocalemia, o déficit de potássio aumenta a reabsorção proximal de bicarbonato, suplantando o efeito supressor da expansão do extracelular sobre a reabsorção do
capítulo 11
mesmo, e ainda secretando mais hidrogênio. Como resultado, estabelece-se uma alcalose metabólica. Outro fator que interfere com a secreção do H é a presença de ânions não-reabsorvíveis em alta concentração no túbulo distal, como carbenicilina e penicilina. Isto aumenta o fluxo e a eletronegatividade intraluminal, favorecendo a secreção de hidrogênio e potássio, resultando em alcalose metabólica.15,16 Uma vez na luz tubular, o hidrogênio secretado se combina com HCO3 filtrado, formando H2CO3, que é convertido em CO2 e H2O. No túbulo proximal e ramo ascendente espesso da alça de Henle (mas não em segmentos mais distais), esta reação ocorre em milissegundos, sob influência da anidrase carbônica, que é uma enzima presente na membrana luminal das células e que não existe no fluido tubular. A anidrase carbônica é encontrada na porção contornada do túbulo proximal, porção ascendente espessa da alça de Henle e túbulo contornado distal. A inibição desta enzima (p.ex., pela acetazolamida) bloqueia a reabsorção de bicarbonato e acidificação urinária. O CO2 assim formado dentro do lúmen se difunde para dentro da célula, onde se combina com o OH que resulta da dissociação da água, e novamente, sob ação da anidrase carbônica, forma-se HCO3. O HCO3 então se difunde passivamente para o fluido peritubular e sangue. Em muitos segmentos do nefro o HCO3 atravessa a membrana basolateral por difusão facilitada, acompanhando o Na (por um co-transportador), ou em troca por Cl. Apesar de que algum Na que acompanha o HCO3 então atravesse a célula passivamente, a maior parte é transportada ativamente para o fluido peritubular e sangue, pela bomba NaK-ATPase. Assim, para cada H secretado um HCO3 retorna ao fluido peritubular e sangue, e praticamente todo o bicarbonato filtrado é recuperado. Note que este não é um mecanismo puro de secreção de hidrogênio, pois o CO2
Fig. 11.5 Mecanismo de reabsorção do bicarbonato filtrado. Ver o texto. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3)
169
formado dentro dos túbulos pelo H secretado retorna à célula, formando mais H por hidroxilação. Até aqui, não houve secreção verdadeira de hidrogênio.3 Como se observa na Fig. 11.5, a maior parte da reabsorção de bicarbonato (70-85%) ocorre nos segmentos iniciais do túbulo proximal e proporções variáveis na alça de Henle, túbulo distal e ducto coletor. 3
Fatores que Influenciam na Reabsorção do Bicarbonato Filtrado A proporção de bicarbonato que retorna ao sangue é afetada por fatores que interagem entre si, como: a) quantidade de bicarbonato apresentada aos túbulos; b) estado do espaço extracelular; e c) PCO2 arterial. É possível que estes fatores alterem a reabsorção de bicarbonato principalmente através de modificações na ativação ou no número de trocadores Na/K e H-ATPases. Alguns hormônios e substâncias vasoativas (paratormônio, hormônios adrenais, angiotensina II, catecolaminas e dopamina) afetam a reabsorção de bicarbonato, através de mecanismos ainda não muito compreendidos. Outros fatores, como a deficiência de potássio e cloro, exercem influência importante apenas em presença de doença.3 1) A quantidade de bicarbonato filtrado e apresentado aos túbulos varia de acordo com a concentração plasmática de bicarbonato e a taxa de filtração glomerular. Se as outras variáveis estiverem constantes (p.ex., o volume do extracelular), a quantidade de bicarbonato reabsorvido é quase igual à quantidade filtrada. O mecanismo deste efeito ainda não está esclarecido, mas a taxa de reabsorção parece estar ligada à reabsorção de sódio, principalmente no túbulo proximal. Isto pode ser em parte decorrente da necessidade de conservar sódio e manter o espaço extracelular.3,13 2) Efeito do volume do extracelular: quando o volume está bastante expandido, ocorre diminuição da reabsorção de bicarbonato filtrado; o oposto ocorre quando o extracelular está contraído. Novamente, o mecanismo parece estar ligado a modificações na reabsorção de sódio impostas pelas variações no volume extracelular.3 3) Influência de modificações prolongadas na PCO2: quando ocorre diminuição da PCO2 (como, por exemplo, por hiperventilação crônica), a reabsorção do bicarbonato diminui; quando há elevação da PCO2, aumenta a reabsorção de bicarbonato. Dois mecanismos parecem estar envolvidos nesta variação de reabsorção: a) mudança na quantidade de bicarbonato filtrado e apresentado aos túbulos (isto só ocorre em distúrbios crônicos, pois, nos agudos, a concentração plasmática de bicarbonato muda muito pouco); e b) efeito direto da PCO2 sobre a atividade da H-ATPase e H-K-ATPase.3
170
Metabolismo Ácido-Básico
Como já foi mencionado, a dieta ocidental rica em proteínas produz vários ácidos não-voláteis (fixos), como o ácido sulfúrico, fosfórico e ácidos orgânicos. Estes ácidos são tamponados nos seguintes tipos de reação: 2 H SO4 2 Na 2 HCO3 ↔ 2 Na SO4 2 H2O 2 CO2 2 H HPO4 2 Na 2 HCO3 ↔ 2 Na HPO4 2 H2O 2 CO2 Nestes exemplos, o CO2 assim produzido é eliminado pelos pulmões, e os dois sais neutros, Na2SO4 e Na2PO4, são filtrados pelo glomérulo. Se estes sais fossem excretados pela urina, o organismo ficaria em déficit de bicarbonato de sódio (NaHCO3), o principal tampão extracelular utilizado na neutralização dos ácidos fixos. Os rins evitam este déficit de bicarbonato de sódio através da excreção de NH4 e de acidez titulável. Em ambas as operações, o bicarbonato recém-formado nas células tubulares renais é absorvido para o sangue peritubular, juntamente com o sódio que foi filtrado.3
Fig. 11.6 Mecanismo de formação de acidez titulável. Ver o texto. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3)
Excreção de Amônio (NH4) Excreção de Acidez Titulável (AT) Se considerarmos uma urina com pH de 5,2, podemos adicionar a ela uma substância alcalina até que seu pH se iguale ao pH do sangue, ou seja, 7,4. A quantidade de substância alcalina (em ml) necessária para titular a urina até se igualar ao pH do sangue é equivalente à quantidade de H ligada aos tampões filtrados. Esta quantidade de ácido assim excretada é calculada e denominada acidez titulável. Com a reabsorção de bicarbonato, a urina nos túbulos renais se torna ácida. O hidrogênio secretado para a luz tubular se combina com outros tampões que foram filtrados. Como parte deste último processo, o sal neutro Na2HPO4 é convertido no sal ácido NaH2PO4, principal maneira de excreção de acidez titulável. Outros tampões filtrados, como ânions orgânicos, citrato, acetato e 3-hidroxibutirato, são também titulados, mas de modo geral contribuem pouco para a AT, devido à sua baixa concentração e baixo pK.3 O esquema de formação da AT urinária é mostrado na Fig. 11.6 (note as semelhanças com a Fig. 11.5). A principal reação que gera o hidrogênio secretado parece ser a dissociação da água; o OH que é simultaneamente liberado se combina com o CO2 intracelular, sob ação da anidrase carbônica. Forma-se HCO3, que é adicionado ao fluido peritubular e sangue. No lúmen tubular, o H secretado se combina com Na e HPO4, formando NaH2PO4, que é excretado como ácido titulável na urina. Estas reações ocorrem no túbulo proximal, túbulo distal e ductos coletores. O efeito aqui obtido é reabastecer o sangue com um bicarbonato para cada bicarbonato consumido no processo de tamponamento de um ácido fixo.3
Se a formação de acidez titulável fosse o único mecanismo para excretar H, a quantidade de hidrogênio eliminado na urina seria muito limitada pela quantidade de fosfato e outros tampões que são filtrados. A observação de que na acidose existe um aumento não só da AT mas também do NH4 na urina gerou a hipótese de que o NH4 pudesse constituir um mecanismo adicional. Note que o amônio aparece na urina sob forma de sais neutros (p.ex., cloreto de amônio — NH4Cl), o que serve para excretar H sem uma maior diminuição no pH urinário.3 O provável mecanismo para a excreção de NH4 é demonstrado nas Figs. 11.7 e 11.8. Este processo consta de três etapas: 1) produção e secreção de NH4 nos túbulos proximais; 2) mecanismo de contracorrente multiplicador de NH4 nas alças de Henle, resultando no desenvolvimento de um gradiente corticopapilar para NH4/ NH3 dentro do interstício medular; e c) difusão não-iônica de NH3 para dentro dos ductos coletores.3
PRODUÇÃO PROXIMAL E SECREÇÃO DE NH4ⴙ Esta primeira etapa ocorre predominantemente nas células tubulares proximais, onde a deaminação da glutamina produz dois íons NH4 e um íon de alfa-cetoglutarato. O metabolismo do último para glicose, ou para CO2 e água, produz dois novos íons HCO3. Assim como na excreção de AT, esta reação adiciona um HCO3 para cada H que é excretado — neste caso, como parte do NH4. O sódio que acompanha o HCO3 pode adentrar o fluido peritubular através da Na-K-ATPase ou via co-transportador HCO3. Em muitas circunstâncias, o NH4 produzido no túbulo proximal é responsável por quase todo o NH4 excretado na urina.3 É importante lembrar que nos quadros de aci-
capítulo 11
171
Nos segmentos ascendentes delgados a reabsorção de NH4 pode ser passiva. A secreção de NH4 nos ramos descendentes pode ocorrer mais por secreção paralela de H e NH3 do que por secreção de NH4. O efeito final é o mesmo, e a conseqüência importante é que a concentração intersticial de amônia total (isto é, NH4 e NH3) se eleva com a proximidade da papila.3
SECREÇÃO DE AMÔNIA NOS DUCTOS COLETORES (NH3)
Fig. 11.7 Produção de amônio (NH4) nos túbulos proximais, a partir da glutamina. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3)
dose metabólica há um aumento significativo na produção de NH3 a partir da glutamina, tornando-se a molécula de NH4 o principal meio de excreção dos íons H na urina. Além disso, a hipocalemia aumenta a produção de NH4, levando a uma maior secreção de H para o lúmen tubular.
GRADIENTE INTERSTICIAL CORTICOPAPILAR PARA NH4ⴙ/NH3 Nas alças de Henle, há um mecanismo contracorrente multiplicador de NH4 que produz um gradiente para NH4/NH3 no interstício medular. Nos segmentos ascendentes espessos, o NH4 é reabsorvido principalmente por transporte ativo secundário, substituindo o K no co-transportador Na:K:2Cl que se localiza na membrana apical.
O segmento distal dos túbulos coletores e o ducto coletor são constituídos por pelo menos dois tipos principais de células, uma das quais, a célula intercalada alfa, secreta H mas não reabsorve Na. Nesta célula, o H que é derivado da dissociação da água é secretado na luz tubular por dois co-transportadores, H-ATPase e H-K-ATPase. O H secretado se combina com o NH3 para formar NH4, que é então excretado sob a forma de sais neutros, como o NH4Cl ou (NH4)2SO4. O NH3 pode difundir-se passivamente do interstício onde é gerado pelo mecanismo de contracorrente multiplicador, através da célula, para a luz tubular.3 O HCO3 formado pela dissociação da água cruza a membrana basolateral para o fluido peritubular por difusão facilitada, através de um trocador HCO3/Cl. Então, como na excreção de AT e com o mecanismo do NH4 dos túbulos proximais, o resultado da reação nos ductos coletores é a recuperação de um HCO3 para cada H que é excretado, ou seja, exatamente o que é preciso após um HCO3 ter sido consumido no tamponamento de um H adicionado. O sódio filtrado é reabsorvido pelas células principais.3
DIFUSÃO NÃO-IÔNICA A amônia (NH3) é um gás que atravessa a membrana celular com grande facilidade, por ser lipossolúvel, e pode
Fig. 11.8 Produção de amônio nas células intercaladas alfa dos ductos coletores. (Adaptado de Valtin, H.; Schafer, J.A.3)
172
Metabolismo Ácido-Básico
difundir-se do interstício para o lúmen tubular. Praticamente todo o NH3 que se difunde é transformado em NH4, pois o fluido tubular é ácido. Quanto mais ácida for a urina, maior é esta transformação. Devido à impermeabilidade do segmento, o NH4 formado não pode difundirse novamente através do epitélio, e então tem que ser excretado. Mais de 98% da amônia total (NH3 NH4) estão sob a forma de NH4, pois o pH urinário está na faixa de 4,4-7,4.3 A excreção ácida total corresponde à soma da acidez titulável e amônio urinário, menos o bicarbonato restante na urina (AT NH4 HCO3 urinário).17
Ponto-chave: • O controle renal do equilíbrio ácido-básico é realizado através dos seguintes mecanismos: Reabsorção do HCO3 filtrado Regeneração de HCO3 através da excreção de H ligado a tampões (AT) e na forma de amônio (NH4)
DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO ÁCIDO-BÁSICO O estado ácido-básico é avaliado através da gasometria, e não há diferenças significativas entre uma amostra arterial ou venosa com relação ao pH, bicarbonato e PCO2. No sangue arterial, porém, é possível avaliar também as variáveis de oxigenação, como a PO2 e a saturação arterial de oxigênio, que permitem considerações sobre a ventilação do paciente. Tomar o cuidado de não utilizar garrote e heparinizar a seringa adequadamente. Após a coleta do sangue, homogeneizar o conteúdo, eliminar as bolhas de ar e vedar a seringa, encaminhando a amostra imediatamente para laboratório ou mantendo-a refrigerada até o momento da análise. A demora em processar a amostra promove o consumo de oxigênio e a produção de CO2, modificando os resultados.18,19 Como mencionamos há pouco, a observação da equação de Henderson-Hasselbalch indica que quatro distúrbios primários do metabolismo ácido-básico podem ocorrer: acidose metabólica, acidose respiratória, alcalose metabólica e alcalose respiratória. Em princípio, pode parecer que o diagnóstico de anormalidade metabólica ou respiratória pode ser feito apenas conhecendo-se o bicarbonato plasmático e a PCO2, respectivamente. Em realidade, isto não é possível, pois cada distúrbio ácido-básico primário produz uma reação compensatória secundária. Além das reações compensatórias normais, podem surgir distúrbios ácido-básicos mistos, como veremos nas próximas seções.
Acidose Metabólica A acidose metabólica é um distúrbio em que há elevação na concentração de hidrogênio, gerando pH baixo no fluido extracelular. O bicarbonato encontra-se diminuído, por estar sendo consumido no tamponamento do excesso de ácido (H). O hidrogênio em excesso estimula o centro respiratório, provocando hiperventilação como mecanismo compensatório, eliminando mais CO2.19
CAUSAS A acidose metabólica pode ser resultado de um aumento na produção ou diminuição na excreção renal de ácido, ou ainda, perda de bicarbonato (v. Quadro 11.1).
Produção Aumentada de Ácido Quando existe aumento na produção de ácidos, pode ocorrer acidose grave, causando significativa diminuição no bicarbonato plasmático. São exemplos disso a acidose láctica, a cetoacidose diabética ou alcoólica e a intoxicação por algumas drogas (como, por exemplo, o ácido acetilsalicílico).19 ACIDOSE LÁCTICA. O ácido láctico é normalmente produzido em nosso organismo, sendo quase todo convertido em glicose ou piruvato, no fígado e nos rins. O lactato acumula-se quando sua produção está aumentada ou sua utilização diminuída.19
Quadro 11.1 Causas de acidose metabólica Produção ácida aumentada a) Acidose láctica • Hipoperfusão tecidual • Metformin • Etilismo • Doenças malignas • Infecção por HIV • Acidose D-láctica b) Cetoacidose • Diabetes melito • Etilismo c) Toxinas ingeridas • Aspirina • Etilenoglicol • Metanol Perda de bicarbonato pela urina ou fezes a) Diarréia b) Fístulas pancreáticas, biliares c) Acidose tubular renal proximal (tipo 2) Redução na excreção renal de ácido a) Insuficiência renal b) Acidose tubular renal tipo 1 c) Acidose tubular renal tipo 4 (hipoaldosteronismo) Outras • Dilucional Adaptado de Rose, B.D.19
capítulo 11
A produção deste ácido aumenta em situações em que a oferta de oxigênio para os tecidos é inferior às necessidades, como, por exemplo, na hipoperfusão presente no choque hipovolêmico, cardiogênico ou séptico. Nestas circunstâncias, além de o piruvato ser preferencialmente convertido a lactato, sua utilização está diminuída, devido às alterações na perfusão do fígado e rins.19 Menos freqüentemente, a produção de ácido láctico pode aumentar ou seu metabolismo diminuir, por doenças hepáticas ou deficiências enzimáticas hereditárias.20 O uso de metformin no diabetes melito pode produzir acidose láctica, principalmente em presença de disfunção renal, hepática, ou etilismo. Eventualmente, pacientes etilistas apresentam acidose láctica, causada por hipoperfusão ou diminuição da utilização hepática de lactato.21 Nas doenças malignas, o metabolismo anaeróbio que ocorre dentro de massas celulares mal vascularizadas pode ocasionar acidose láctica. Em pacientes com SIDA, a acidose láctica está relacionada à doença hepática ou miopatia induzidas pela zidovudina, ou à presença de deficiência de riboflavina.21 A acidose D-láctica ocorre em pacientes submetidos a bypass jejuno-ileal, ressecção de intestino delgado ou outras causas de síndrome do intestino curto. Nestas situações, na presença de crescimento exagerado de bactérias anaeróbicas, o cólon converte glicose e amido em ácido Dláctico, que é absorvido pela circulação. A desidrogenase L-láctica, que metaboliza o L-lactato fisiológico em piruvato, não atua sobre o ácido D-láctico. Os pacientes apresentam anormalidades neurológicas após sobrecarga de carboidratos.22 CETOACIDOSE. A cetoacidose diabética é uma desordem em que a deficiência de insulina e o excesso de glucagon produzem aumento da síntese hepática de cetoácidos, principalmente ácido beta-hidroxibutírico e ácido acetoacético.19 O jejum prolongado também pode produzir cetoacidose, mas de modo geral os ácidos gerados não consomem mais do que 3-4 mEq de bicarbonato/litro. Em etilistas, a associação de um aporte deficiente de carboidratos com os efeitos do álcool inibindo a gliconeogênese e estimulando a lipólise também pode produzir cetoacidose. A presença de diabetes agrava esta condição.23 INGESTÃO DE TOXINAS. Em nosso organismo, o ácido acetilsalicílico é convertido em ácido salicílico. A intoxicação por altas doses deste ácido produz acidose metabólica devido à interferência com o metabolismo oxidativo, levando ao acúmulo de ácidos orgânicos, como o lactato e cetoácidos. Em doses menores, o ácido acetilsalicílico pode induzir alcalose respiratória, por estimulação direta do centro respiratório.19,24 A intoxicação pelo metanol produz um quadro característico de sintomatologia do sistema nervoso central, ocular e abdominal. Agudamente os pacientes apresentam sintomas de embriaguez, confusão mental, dor abdominal e
173
vômitos, podendo evoluir com pancreatite. As alterações oculares, como hiperemia conjuntival, diplopia e amaurose, acompanham-se de alteração da fundoscopia, que demonstra neurite óptica. O metabolismo do metanol produz ácido fórmico, responsável pela acidose.24,25 O etilenoglicol está presente em produtos anticongelantes e fluido de radiador, e é também utilizado em algumas etapas na indústria de bebidas. O etilenoglicol ingerido é metabolizado em compostos tóxicos, como o ácido oxálico, pela ação da desidrogenase alcoólica. Estes compostos tóxicos provocam disfunção neurológica aguda, com ataxia, confusão, convulsões e coma. Nos rins, determinam a deposição de cristais de oxalato de cálcio e insuficiência renal aguda.25
Perda de Bicarbonato Para cada molécula de base que é perdida, um próton deixa de ser tamponado, resultando em acúmulo de ácido fixo.20 A perda de secreções alcalinas do pâncreas e árvore biliar e as diarréias induzidas ou não por laxantes podem causar acidose metabólica.19 Na acidose tubular renal proximal ocorre perda de grandes quantidades de bicarbonato.
Redução na Excreção Renal de Ácido Para que o equilíbrio ácido-básico seja mantido na insuficiência renal, é necessário que ocorram adaptações nos nefros restantes. Inicialmente, há aumento da excreção de amônio (NH4) por nefro. Porém, quando a taxa de filtração glomerular cai para menos de 30-40% do normal, começa a haver retenção da carga ácida diária; acidose ocorre quando a massa renal remanescente estiver em torno de 20%. A diminuição da excreção ácida na falência renal é causada principalmente pela pequena quantidade de nefros funcionantes. Aumento de PTH, expansão volêmica e diurese de solutos, observados na insuficiência renal, inibem a reabsorção de bicarbonato. Também ocorre diminuição da produção de amônia (NH3). Como o bicarbonato está sendo consumido, outros tampões acabam sendo acumulados (sulfato e fosfato).24 Os tampões plasmáticos são utilizados para neutralizar parte do ácido retido, mas a principal forma de tamponamento nesta situação é feita dentro das células e nos ossos.19 As acidoses tubulares do tipo 1 (distal) e 4 (hipoaldosteronismo) são raras. Na ATR tipo 1, o acúmulo de ácido resulta de uma incapacidade de diminuir o pH urinário para menos que 5,5-6. O pH urinário alcalino que resulta impede os mecanismos de produção de acidez titulável e aprisionamento da amônia no lúmen tubular sob forma de amônio.19 Na acidose distal tipo 4, a deficiência de aldosterona impede a secreção distal de hidrogênio e potássio, resultando em acidose metabólica e hipercalemia.18
Outras Cabe aqui um comentário sobre a acidose dilucional. Esta acidose, de modo geral discreta, resulta da diluição
174
Metabolismo Ácido-Básico
do bicarbonato plasmático pela infusão rápida de grandes quantidades de fluido que não contém bicarbonato ou seus precursores (p.ex., o lactato). Habitualmente a queda no bicarbonato não ultrapassa 10% e é rapidamente corrigida pelos rins.18,25
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E EFEITOS SISTÊMICOS As manifestações clínicas da acidose metabólica dependem da doença primária que está produzindo a acidose e da velocidade de instalação do distúrbio. Porém, em circunstâncias graves, pode haver sintomas decorrentes da própria acidose metabólica. Como já foi mencionado, a acidose metabólica produz uma hiperventilação, com movimentos respiratórios profundos (respiração de Kussmaul), observada ao exame físico, principalmente quando o pH é menor que 7,20. Observam-se vômitos, dores pelo corpo e fadiga. Com o aumento da gravidade da acidose, geralmente com bicarbonato inferior a 10 mEq/litro, observa-se diminuição da contratilidade miocárdica, dilatação arteriolar, venoconstrição periférica e arteriolar pulmonar. Conseqüentemente há diminuição do débito cardíaco, hipotensão arterial, diminuição do fluxo sanguíneo para os rins e fígado, maior sensibilidade a arritmias cardíacas e diminuição da responsividade cardiovascular às catecolaminas. A associação destas manifestações gera um ambiente propício para o desenvolvimento de insuficiência cardíaca congestiva. Há também manifestações neurológicas, com progressiva diminuição do nível de consciência e até coma. Observa-se também maior degradação protéica e redução da densidade óssea, principalmente nas acidoses crônicas.26
ACHADOS LABORATORIAIS A acidose metabólica caracteristicamente causa uma diminuição do pH, diminuição do bicarbonato e diminuição da PCO2. A compensação respiratória se inicia na primeira hora e se completa em até 24 horas. Esta compensação causa a queda de 1,2 mmHg na PCO2 para cada redução de 1 mEq/litro na concentração de bicarbonato. [HCO3] 1,2 [CO2] (podem ser aceitas diferenças de 2 mEq/litro)27 Por exemplo, para um bicarbonato de 18 (redução de 6 em relação ao normal), a hiperventilação deverá trazer a PCO2 para cerca de 32,8 (PCO2 normal de 40 7,2). Se a PCO2 estiver maior ou menor que este valor, o paciente tem um distúrbio misto: além da acidose metabólica, acidose ou alcalose respiratória, respectivamente.25,27 Pode haver hipercalemia, causada pelo desvio iônico conseqüente à necessidade de tamponamento do excesso de hidrogênio dentro das células.26 Um íon hidrogênio entra na célula, mas ao mesmo tempo, para manter a eletroneutralidade, deve sair da célula um outro íon de carga positiva — o potássio, principal cátion do intracelular. Talvez
esta saída do potássio da célula se deva a uma inibição da bomba Na-K-ATPase celular pela acidose. Ao se corrigir a acidose, o potássio retorna para dentro das células, pois não existe mais necessidade de tamponamento intracelular. Além dos dados da história clínica, uma medida que auxilia no diagnóstico causal da acidose metabólica é o cálculo do anion gap (hiato-iônico).28 A necessidade de manter a eletroneutralidade faz com que o número de cátions no plasma seja igual ao número de ânions. Os cátions são representados principalmente pelo sódio (o potássio não é habitualmente incluído no cálculo, pois sua interferência é pequena), e os ânions, pelo cloro e bicarbonato. Porém, há outros ânions, que não são dosados habitualmente, mas que contribuem para a fração aniônica do plasma: proteínas, lactato fosfato e sulfato. Esta fração de ânions é identificada ao se verificar que a soma dos ânions medidos não é igual à dosagem do sódio.24 Anion gap Na (Cl HCO3) Utilizando as concentrações normais dos eletrólitos na fórmula acima (Na 140, HCO3 24, e Cl 105), verificamos que entre cátions e ânions existe uma diferença de 8-16 mEq/litro, e que corresponde aos ânions que não foram medidos (ânions “não mensuráveis”), mas que estão presentes no plasma e contribuem para contrabalançar as cargas catiônicas.20,24 Possivelmente os ânions que constituem o hiato iônico sejam os tampões aniônicos do espaço extracelular. 20 Observe a fórmula do hiato iônico. Se a concentração de cloro se mantém constante na acidose metabólica, mesmo havendo queda no bicarbonato (usado no tamponamento do hidrogênio dissociado), a manutenção da eletroneutralidade se faz à custa do aumento de algum ânion que não o cloreto.20 Os fosfatos e as proteínas não sofrem variações rápidas, de forma que existe pequena possibilidade de que sejam os responsáveis pelo aumento. Então, a eletroneutralidade deve estar sendo mantida pelo aumento de algum ânion que em condições normais não está presente no plasma. Exemplos disso são: a) lactato, que se acumula na acidose láctica; b) beta-hidroxibutirato na cetoacidose; c) aumento dos ânions sulfato, fosfato e ácidos orgânicos, na insuficiência renal crônica; d) ácido fórmico na intoxicação pelo metanol; oxalato e glicolato na intoxicação por etilenoglicol, e lactato e cetonas na intoxicação pelo ácido acetilsalicílico.27 Esse tipo de acidose metabólica, em que o cloro permanece normal, é chamada de acidose normoclorêmica, ou com anion gap (hiato iônico) aumentado.20,27 Ao contrário, nas acidoses causadas por perda de bicarbonato, como as diarréias, não há retenção de ânions anômalos, e o hiato iônico praticamente não se altera, já que à medida que diminui o bicarbonato, pela perda intestinal, aumenta a reabsorção de cloro, para manter a eletroneutralidade. Este tipo de acidose, em que há perda de bicarbonato, com aumento do cloro, é chamada de acidose hiperclorêmica, ou com anion gap normal (v. Fig. 11.10).20
capítulo 11
Fig. 11.9 Relação entre o pH urinário e a excreção de NH3. Observem que, quando o pH urinário diminui, a produção de NH3 aumenta. (Obtido de Pitts, R.F.50)
Alguns autores têm ressaltado o fato de que outros ânions e cátions, medidos rotineiramente ou não, podem alterar o cálculo do hiato iônico, e que, na verdade, o termo anion gap não é correto. Na verdade, o hiato iônico seria a diferença entre os ânions e os cátions não mensuráveis (ânions não mensuráveis cátions não mensuráveis). Assim, fica mais simples compreender o AG aumentado em conse-
175
qüência de hipocalcemia, hipomagnesemia ou hiperalbuminemia na contração de volume, e o AG diminuído em presença de hipercalemia ou hipoalbuminemia.27 Porém, rotineiramente, a interpretação tradicional do anion gap é suficiente. No Quadro 11.2 são observadas as concentrações normais dos cátions e ânions não determinados. As acidoses metabólicas podem ser classificadas de acordo com o anion gap (v. Quadro 11.3). Esta classificação pode auxiliar principalmente quando há dificuldade em definir a causa da acidose metabólica, por exemplo, num paciente comatoso, cuja história clínica se desconhece; o cálculo do anion gap permite situar entre as causas mais prováveis, possibilitando uma abordagem apropriada para cada caso. Além do desvio de potássio originado pela necessidade de manter a eletroneutralidade, os níveis de potássio no sangue podem fornecer pistas quanto à etiologia da acidose metabólica. No Quadro 11.4 observa-se a correlação entre os níveis de potássio e causas de acidose metabólica. Em algumas situações pode haver sobreposição de causas de anion gap normal ou aumentado. Por exemplo, de modo geral, a cólera causa acidose com anion gap normal, como as outras diarréias. Porém, quando esta doença cursa com hipoperfusão (acidose láctica) e contração de volume (hiperalbuminemia), o anion gap pode estar aumentado.27 Além destas alterações laboratoriais, a acidose metabólica ocasiona leucocitose, hiperfosfatemia, hiperglicemia e hiperuricemia. A leucocitose, muitas vezes superior a 25.000 leucócitos, é conseqüente a uma diminuição da marginação leucocitária, devendo ser excluídos processos infecciosos subjacentes.24 A acidose láctica hipóxica pode provocar degradação muscular e hiperfosfatemia. A acidose inibe a ação periférica da insulina, gerando hiperglicemia. A competição de ânions orgânicos e uratos pela secreção leva a um aumento dos níveis de ácido úrico no sangue.24,26
Fig. 11.10 Classificação da acidose metabólica de acordo com o anion gap. (Adaptado de Adrogué, H.J.; Madias, N.E. In: Schrier, R. Atlas of Kidney Diseases on line — www.HDCN.com)
176
Metabolismo Ácido-Básico
Quadro 11.2 Concentrações normais dos cátions e ânions não mensurados rotineiramente
Quadro 11.4 Correlação entre os níveis de potássio, anion gap e causas de acidose metabólica
Cátions não determinados
Anion gap normal
Anion gap aumentado
mEq/L
Ânions não determinados
mEq/L
4,5
Proteína
15
Potássio sérico reduzido
Potássio sérico normal ou elevado
Ca
5
PO4
2
Diarréia
Cetoacidose diabética
Mg
1,5
SO4
1
Ácidos orgânicos
5
Inibição da anidrase carbônica
Cetoacidose alcoólica
Acidose tubular renal
Acidose láctica
K
Total
11
23
Intoxicação por salicilato
TRATAMENTO O tratamento é dirigido à doença básica e, em algumas situações, à própria acidose metabólica, como veremos a seguir.
Tratamento da Doença de Base A acidose metabólica é manifestação de uma doença primária, e o tratamento deve ser dirigido à correção desta doença. Na cetoacidose diabética, o ponto fundamental no tratamento é a administração de insulina e a correção dos distúrbios da água, sódio e potássio. Não se deve administrar álcali de rotina, pois o metabolismo dos cetoácidos
Quadro 11.3 Causas de acidose metabólica de acordo com o hiato iônico Hiato iônico normal (hiperclorêmica) Perdas de bicarbonato a) Gastrointestinal • Diarréia • Fístulas pancreáticas, biliares b) Renal • Inibidores da anidrase carbônica • Acidose tubular renal Outras • Acidose dilucional • Nutrição parenteral Hiato iônico aumentado (normoclorêmica) Produção ácida aumentada • Cetoacidose diabética ou alcoólica • Acidose láctica • Erros inatos do metabolismo Ingestão de substâncias tóxicas • Intoxicação por salicilato • Ingestão de metanol • Ingestão de etilenoglicol Falha na excreção ácida • Insuficiência renal aguda ou crônica Adaptado de Shapiro, J.I.18
Potássio sérico elevado
Metanol
Administração de NH4Cl
Ingestão de paraldeído
Pielonefrite crônica
Etilenoglicol
Uropatia obstrutiva
Insuficiência renal
retidos resulta em rápida regeneração do bicarbonato, com resolução parcial ou completa da acidemia. O álcali pode até mesmo retardar a recuperação, por aumentar a cetogênese hepática. Em pacientes com cetoacidose diabética e pH inferior a 7,10, pequenas doses de bicarbonato podem ser administradas com o objetivo de minimizar a depressão miocárdica e hipoperfusão tecidual.29 A cetoacidose alcoólica é corrigida com a apropriada reposição de nutrientes e interrupção da ingestão de etanol. A infusão de glicose estimula a secreção de insulina mas inibe a secreção de glucagon, promovendo a regeneração dos estoques de bicarbonato a partir do metabolismo dos cetoácidos retidos.29 Nos casos de acidose láctica causada por oxigenação tecidual inadequada, o ponto essencial no tratamento é a correção da mesma, com repleção do volume circulante efetivo, suporte ventilatório, agentes inotrópicos e tratamento da septicemia. Na acidose láctica resultante de intoxicação por metanol ou etilenoglicol, está indicada a diálise para remoção das toxinas, além da administração de grandes quantidades de álcali. Etanol é o antagonista do metanol. 29
Tratamento da Acidose Metabólica Para pacientes com acidemia leve ou moderada (pH
7,20), ou quando o processo subjacente possa ser rapidamente controlado, muitas vezes a administração de álcali não é necessária. Porém, em pacientes com acidose grave (pH menor que 7,20; bicarbonato inferior a 8), já existem depressão miocárdica e disfunções enzimáticas significativas, e a adminis-
capítulo 11
tração de bicarbonato de sódio pode ser benéfica. A acidose deve ser tratada se estiver causando disfunções orgânicas graves.18 Para calcular a quantidade necessária de bicarbonato a ser administrada, utilizamos a fórmula a seguir: Bic necessário (Bicdesejado Bicatual) espaço do Bic18 Onde: Bicnecessário quantidade de bicarbonato de sódio a administrar (em mEq) Bicdesejado nível desejado de bicarbonato Bicatual bicarbonato dosado no sangue Espaço do Bic 50% do peso corporal O espaço de bicarbonato é uma estimativa da capacidade total de tamponamento do organismo, que inclui o bicarbonato do extracelular, proteínas intracelulares e carbonato do osso. Com bicarbonato normal ou pouco reduzido, o excesso de hidrogênio é tamponado proporcionalmente na água corporal total, e o espaço aparente de bicarbonato é de 50% do peso magro do indivíduo.18,30 Este espaço aumenta na acidose metabólica grave, pois as células e o osso passam a contribuir cada vez mais para o tamponamento, podendo chegar a 70% do peso corporal quando a concentração de bicarbonato cai abaixo de 10 mEq/litro; com bicarbonato menor que 5 mEq/litro, o espaço pode ser de 100%.29-31 Por exemplo, um paciente de 70 kg tem um bicarbonato de 9 mEq/litro, que se deseja elevar para 15 mEq/litro. O espaço de bicarbonato é de 70% e 50% para estas concentrações, respectivamente. Considere então como espaço de bicarbonato a média entre 70% e 50%, ou seja, 60%. Bicnecessário (Bicdesejado Bicatual) espaço do Bic Bicnecessário (15 9) (0,7 70 kg) 6 49 294 mEq
Então, de acordo com este cálculo, cerca de 290 mEq de álcali (geralmente bicarbonato de sódio intravenoso) podem ser administrados nas primeiras 4-6 horas. Alguns autores sugerem que sempre se utilize o valor de 50% para o espaço de bicarbonato, independente do valor do bicarbonato plasmático.29 Deve ser assinalado que esta estimativa não é exata, e são necessárias avaliações do pH extracelular pelo menos 30 minutos após o término da infusão. Com o pH em nível mais seguro, não é mais necessária reposição intravenosa, pois os rins serão capazes de regenerar o bicarbonato necessário.30 O tratamento da acidose metabólica é controverso, em função dos potenciais efeitos deletérios do bicarbonato administrado.18 A infusão de grandes quantidades de bicarbonato de sódio a 8,4% (1 mEq/ml) pode ocasionar hipernatremia, hiperosmolalidade, diminuição da fração ionizada do cálcio, hipocalemia e aumento da produção de ácidos orgânicos.26 Outra complicação que ocorre principalmente em pacientes cardiopatas ou nefropatas é a sobrecarga de volume ocasionada pelo sódio da solução, que pode ser evitada ou tratada com o uso de diuréticos de alça,
177
e, se necessário, diálise. Outro aspecto desfavorável é a possibilidade de alcalose muito abrupta, quando a correção da acidose for muito agressiva.29 O tamponamento de prótons pelo bicarbonato libera CO2 (HCO3 H ↔ H2CO3 ↔ H2O CO2), elevando a PCO2 nos líquidos corporais. Este efeito pode ser prejudicial em pacientes com reserva ventilatória limitada, falência circulatória ou que estão sendo submetidos a ressuscitação cardiopulmonar. Nestas circunstâncias, paradoxalmente pode ocorrer piora da acidose intracelular e extracelular, se a PCO2 exceder a fração de HCO3. No sistema nervoso central isto traz conseqüências graves, pois o CO2 em maior quantidade atravessa rapidamente a barreira liquórica, elevando a PCO2 do líquor e piorando a acidose do sistema nervoso central.29,32 De acordo com os consensos mais recentes da Sociedade Americana de Cardiologia sobre parada cardiorrespiratória, o uso de bicarbonato de sódio na parada cardiorrespiratória é considerado Classe 3 (tratamento inadequado, sem evidência científica de validade, e que pode ser prejudicial). Porém, em situações especiais, e sob monitorização adequada, o bicarbonato de sódio pode vir a ser utilizado: a) Quando houver acidose e hipercalemia comprovada (Classe 1 — considerado tratamento útil e efetivo); b) No tratamento de acidose metabólica responsiva a bicarbonato (Classe 2a — existência de evidências favoráveis ao seu uso); e c) Para controle de acidose pós-circulação espontânea em parada cardiorrespiratória de longa duração e como coadjuvante na parada cardiorrespiratória desencadeada por antidepressivos tricíclicos (Classe 2b — tratamento não validado em estudos clínicos, podendo ser útil em alguns doentes e provavelmente sem reações adversas).33 Nas acidoses metabólicas crônicas, o bicarbonato de sódio pode ser administrado por via oral.18 No Brasil está disponível o bicarbonato de sódio em pó, contendo 12 mEq de bicarbonato e 12 mEq de bicarbonato por grama.
Pontos-chave: • A acidose metabólica é classificada de acordo com o hiato iônico, que indica qual a causa mais provável: hiato iônico Na (HCO3 Cl) Hiato iônico aumentado: acréscimo de ácido Hiato iônico normal: perda de bicarbonato • O mecanismo esperado de compensação é a eliminação de CO2, através de hiperventilação • A administração de bicarbonato tem indicações precisas, e a quantidade é calculada pela fórmula: Bicnecessário (Bicdesejado Bicatual) espaço do Bic
178
Metabolismo Ácido-Básico
Como alternativa à administração de bicarbonato, que tem como inconveniente a produção de CO2, poderia ser utilizada uma mistura de bicarbonato de sódio com carbonato de sódio (Carbicarb® — ainda não disponível para uso clínico), que gera mais bicarbonato do que CO2; além disso, o carbonato de sódio reage com o ácido carbônico, consumindo o CO2. Esta solução não evita hipervolemia e hipertonicidade.29
Alcalose Metabólica É a situação clínica em que há pH elevado (alcalino), baixa concentração hidrogeniônica, aumento na concentração de bicarbonato e PCO2 elevada. A alcalose é um distúrbio ácido-básico relativamente comum, e sua importância pode ser melhor avaliada quando se correlacionam mortalidade e grau de alcalose. Em um grupo de 177 pacientes cirúrgicos intensamente alcalóticos, verificou-se que, num pH de 7,54 a 7,56, a mortalidade foi de 40%, e num pH de 7,65 a 7,7, ela atingiu 80%.34
CAUSAS DE ALCALOSE METABÓLICA Ao se avaliar um paciente com alcalose metabólica, é necessário esclarecer dois pontos fundamentais: o motivo que levou ao aumento do bicarbonato (fase de geração da alcalose metabólica) e os fatores que evitaram a excreção de bicarbonato pelos rins, permitindo a persistência da alcalose (fase de manutenção)2,35 (v. Quadros 11.4 e 11.5).
GERAÇÃO DA ALCALOSE METABÓLICA Perda de Hidrogênio O íon H pode ser perdido do líquido extracelular através do trato gastrintestinal, dos rins ou por um desvio para o interior das células. Se a perda for maior que o ganho de ácido proveniente da dieta e catabolismo, ocorrerá um aumento da concentração plasmática de bicarbonato. O Quadro 11.4 mostra as diversas situações clínicas em que esta perda de H pode ocorrer. PERDA GASTROINTESTINAL DE Hⴙ. Em indivíduos normais, a secreção de ácido pelo estômago não leva a alcalose metabólica, pois esta perda de hidrogênio equilibra-se com uma perda de bicarbonato nas secreções pancreáticas. Porém, quando o suco gástrico é eliminado através de vômitos ou drenagem gástrica por sondas, há tendência para alcalose metabólica por dois motivos: perda pura do hidrogênio e ausência de estímulo para a secreção de bicarbonato. Quando se perde hidrogênio, a reação do sistema ácido carbônico-bicarbonato gera HCO3, de forma que para cada mEq de hidrogênio perdido é gerado 1 mEq de bicarbonato.2 CO2 H2O ↔ H2CO3 ↔ H HCO3 PERDA RENAL DE Hⴙ. É possível haver perda renal de hidrogênio quando a secreção distal deste íon estiver
aumentada. Isto ocorre em situações em que existe aporte adequado de sódio e água aos sítios tubulares distais e aumento dos níveis de aldosterona. Além de estimular a bomba H-ATPase, a aldosterona estimula a reabsorção de sódio, tornando a luz tubular mais eletronegativa e minimizando a retrodifusão dos íons hidrogênio para fora da luz tubular. A secreção distal de potássio também está aumentada, resultando em hipocalemia.35 O excesso primário de mineralocorticóides cursa com alcalose metabólica e freqüentemente com hipertensão arterial. Porém, os pacientes com hiperaldosteronismo secundário (p.ex., na cirrose ou insuficiência cardíaca) de modo geral não apresentam alcalose metabólica ou hipocalemia, pois o efeito estimulatório da aldosterona é contrabalançado pelo menor aporte distal de sódio e menor volume urinário. Estes fatores reduzem a quantidade de hidrogênio e potássio na urina final. Se um ânion não reabsorvível (p.ex., penicilina) for administrado na vigência de depleção de volume, a excreção deste ânion obriga a perda de H ou K para manter a eletroneutralidade, levando então a hipocalemia e alcalose metabólica.35 O uso de diuréticos de alça ou tiazídicos produz aumento do aporte distal de sódio e água, possibilitando a indução de excreção aumentada de hidrogênio. Uma diurese volumosa pode produzir algum grau de depleção, contribuindo para o desenvolvimento de alcalose metabólica.35 A acidose respiratória crônica leva a um aumento na secreção de hidrogênio, ao mesmo tempo em que o bicarbonato do plasma aumenta, para normalizar o pH (mecanismo de compensação). Mas quando se reduz abruptamente a PCO2 (p.ex., em ventilação mecânica), desenvolve-se alcalose metabólica, por não ter havido tempo para os rins eliminarem o excesso de bicarbonato. Nesta situação, podem desenvolver-se graves anormalidades neurológicas, pois o pH no cérebro aumenta rapidamente com a diminuição da PCO2. Estas complicações justificam a necessidade de redução gradual da PCO2 em pacientes com acidose respiratória crônica.35 DESVIO DO HIDROGÊNIO PARA O INTRACELULAR. O desvio do íon hidrogênio para o espaço intracelular pode ocorrer na hipocalemia (v. Cap. 12). Com o objetivo de repor o potássio do espaço extracelular, a hipocalemia induz a saída do potássio do intracelular; para manter a eletroneutralidade, o hidrogênio entra nas células, diminuindo os níveis plasmáticos e aumentando o pH.
Adição de Bicarbonato ao Líquido Extracelular A administração de bicarbonato ou seus precursores, tais como lactato, citrato ou acetato, num ritmo maior que a produção diária de ácido elevará os níveis plasmáticos de bicarbonato. Se a função renal for normal, uma carga de bicarbonato é quase toda excretada, causando pequena variação no pH (v. Quadro 11.5). Porém, se a capacidade de excreção renal for ultrapassada, a alcalose metabólica se estabelece.
capítulo 11
Quadro 11.5 Etiologia e classificação da alcalose metabólica Responsiva ao cloreto (cloro urinário menor que 10 mEq/L) a) Distúrbios gastrointestinais • Vômitos • Drenagem gástrica • Adenoma viloso do cólon • Cloridorréia congênita b) Uso de diuréticos c) Correção de hipercapnia crônica d) Fibrose cística Resistente ao cloreto (cloro urinário maior que 20 mEq/L) a) Excesso de mineralocorticóide • Hiperaldosteronismo • Síndrome de Cushing • Síndrome de Bartter • Alcaçuz b) Hipocalemia Adaptado de Shapiro, J.I.18
Outro fato a ser considerado é que o lactato (na acidose láctica) e o beta-hidroxibutirato (na cetoacidose diabética) regeneram bicarbonato quando são metabolizados. Nestas duas circunstâncias, a administração de bicarbonato exógeno representaria um excesso de álcali, resultando em alcalose metabólica. O citrato utilizado em anticoagulação para hemodiálise em pacientes com risco de sangramento, ou na anticoagulação de hemoderivados, pode também ser convertido a bicarbonato. A administração de mais de oito unidades de sangue estocado ou plasma fresco congelado produz este efeito.35
Perda de Líquido Contendo Grandes Quantidades de Cloro Quando se perde sódio, cloro e pouco bicarbonato, como ocorre na administração de diurético de alça, há contração do extracelular com aumento relativo na concentração do bicarbonato. Em certas situações, porém, há perda de fluidos muito ricos em cloro. São exemplos disso a perda de secreções gástricas em pacientes com acloridria, a diarréia no adenoma viloso do cólon e cloridorréia congênita (esta última um defeito raro na reabsorção intestinal de cloro e secreção de bicarbonato, com diarréia crônica). Note que grande parte dos adenomas vilosos do cólon, que constituem 5% dos pólipos intestinais e que têm potencial de malignidade, produzem acidose metabólica hiperclorêmica, pela perda de grandes volumes de fluido contendo potássio e bicarbonato. Cerca de 10-20% destes tumores têm um padrão secretor diverso, com secreção preferencial de cloro.36
179
A síndrome de Bartter é uma desordem rara, diagnosticada principalmente em crianças, e que causa hipocalemia e alcalose metabólica resistente ao cloreto (v. próximas seções). Os pacientes apresentam cloro urinário elevado, alcalose metabólica, hiperplasia do aparelho justaglomerular (inespecífica), gradiente transtubular de potássio inapropriadamente alto e hiperaldosteronismo hiperreninêmico, sem hipertensão arterial. É causada por uma alteração na função do co-transportador potássio/cloreto.37 A síndrome de Gitelman tem características semelhantes à síndrome de Bartter, porém com hipomagnesemia e hipocalciúria. É causada por alteração na função do cotransportador sódio/cloreto no túbulo contornado distal.37
MANUTENÇÃO DA ALCALOSE METABÓLICA Como já foi mencionado, normalmente os rins são capazes de excretar os excessos de bicarbonato. Portanto, para que uma alcalose metabólica persista, é necessária a presença de dois grupos de anormalidades: 1) Perda continuada de hidrogênio, desvio transcelular de hidrogênio, administração de bicarbonato ou alcalose de contração; e 2) Aumento na reabsorção renal de bicarbonato ou diminuição na secreção distal de bicarbonato.35 Em presença de função renal normal, o aumento ou manutenção da reabsorção de bicarbonato pelos rins se deve a pelo menos um dos seguintes fatores: a) Depleção do volume circulante efetivo; b) Depleção de cloro; c) Hipocalemia, e d) Hipoventilação e hipercapnia.35 Estes fatores acima mencionados são responsáveis pela manutenção da alcalose metabólica, pois impedem a atuação dos mecanismos renais fisiológicos de eliminação de maiores quantidades de bicarbonato que levariam à normalização do bicarbonato no plasma. O esclarecimento de qual o fator envolvido auxilia na classificação das alcaloses metabólicas e no planejamento terapêutico posterior.
Volume Extracelular A depleção de volume aumenta a reabsorção de sódio e o resgate de bicarbonato no túbulo proximal. No túbulo distal, também ocorre um aumento na reabsorção de sódio (mediada por mineralocorticóide) em troca da secreção de H ou K. Com um aumento da secreção de H, ocorre regeneração de bicarbonato. Um aumento na reabsorção distal de sódio também pode ocorrer na ausência de depleção de volume extracelular, devido a um excesso de mineralocorticóide, como no hiperaldosteronismo primário. A elevada reabsorção distal de sódio pode gerar e manter uma concentração elevada de bicarbonato se os hormônios mineralocorticóides estimularem a secreção de H.18
Deficiência de Cloro Para que seja mantida a eletroneutralidade, quando a concentração plasmática de bicarbonato se eleva, a con-
180
Metabolismo Ácido-Básico
centração de cloro deve reduzir-se. Porém, com a perda de sódio, e conseqüente contração do volume extracelular, o estímulo para restaurar o volume extracelular supera o estímulo para aumentar a excreção de bicarbonato. O papel do cloro é crucial nesta situação, pois é o único outro ânion, além do bicarbonato, que pode acompanhar a reabsorção de sódio. Portanto, para se elevar ou manter a reabsorção de sódio enquanto simultaneamente se eleva a excreção de bicarbonato, um ânion reabsorvível (cloro) precisa estar presente para acompanhar a reabsorção de sódio. Se há deficiência de cloro, os rins reabsorvem outro ânion, o bicarbonato, perpetuando a alcalose metabólica.18
Depleção de Potássio É um fator importante na origem e manutenção da alcalose metabólica. Com a saída de potássio das células, aumenta a concentração de H intracelular, inclusive nas células tubulares renais. Havendo mais H para secreção, maior será o resgate de bicarbonato. Além disso, em presença de hipocalemia, as bombas H-K-ATPase (que promovem reabsorção de potássio e secreção de hidrogênio) e a síntese de NH3 são estimuladas, resultando em eliminação de maiores quantidades de H, na forma de NH4.18,35
Hipoventilação e Hipercapnia Da mesma forma que a depleção de potássio, a hipercapnia aumenta a concentração intracelular de H disponível para secreção e, portanto, para resgate de bicarbonato.
MECANISMOS DE DEFESA DO pH NA ALCALOSE METABÓLICA Com a elevação do bicarbonato plasmático por um dos três mecanismos básicos já mencionados, os mecanismos de defesa do organismo entram em ação, na tentativa de normalizar o pH.
de elevação até 60-75 mmHg em indivíduos normais. Devido a estes fatores, a compensação respiratória na alcalose metabólica é menos intensa que na acidose metabólica.
Correção Renal O rim é responsável pela terceira fase do mecanismo de defesa do pH. O rim tem a capacidade de eliminar o excesso de bicarbonato, a não ser que outros fatores comprometam esta capacidade renal (v. a seguir). Esta eliminação de base é bem mais rápida que a capacidade renal de excretar H.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Na maioria das vezes, os sinais e sintomas da enfermidade básica dominam o quadro clínico e dificilmente poderão ser separados. Não há sintomas ou sinais patognomônicos. A avaliação do espaço extracelular fornece dados muito importantes. Num paciente depletado, com deficiência de potássio, a causa provável da alcalose metabólica é a perda renal (diuréticos) ou gastrintestinal (vômitos). Além destes sintomas, há os referentes à hipocalemia, como fraqueza ou paralisia muscular, distensão abdominal, íleo e arritmias cardíacas, poliúria e aumento da produção de amônia (que aumenta o risco de encefalopatia em hepatopatas).38 Um extracelular expandido, com hipertensão arterial e hipocalemia, leva à suspeita de hiperaldosteronismo.37 O elevado risco de intoxicação digitálica, intervalo QT prolongado e ondas U são complicações conhecidas da alcalose. A resistência vascular cerebral é sensível à PCO2 e a hipocapnia é uma potente força vasoconstritora cerebral. Um fluxo sanguíneo cerebral reduzido pode justificar muitos sinais e sintomas neurológicos observados, como cefaléia, convulsões, letargia, delirium e estupor.38
DADOS LABORATORIAIS Sistema Tampão A fase de tamponamento é controlada pelo imediato tamponamento químico. Aproximadamente 1/3 do excesso de bicarbonato é tamponado pelo H intracelular, que sai das células para o líquido extracelular. Exemplo disto é a saída de lactato das células musculares, para tamponar o espaço extracelular.
Compensação Respiratória A segunda fase do mecanismo de defesa do pH é controlada pelo sistema respiratório. Para que o pH retorne ao normal, em face de uma elevação na concentração de bicarbonato, a PCO2 deve ser elevada. Isto ocorre através da hipoventilação alveolar, com retenção de CO2 e elevação da PCO2. O grau de compensação é limitado pelas necessidades de O2, já que a pO2 será reduzida com a hipoventilação. O limite superior de elevação compensatória da PCO2 é geralmente aceito como 55 mmHg, mas há relatos
O padrão diagnóstico no sangue arterial é elevação do pH, da concentração de bicarbonato e PCO2. O padrão eletrolítico é de hipocloremia e hipocalemia. A hipocalemia é basicamente conseqüente à perda urinária de potássio que se deve a uma elevada secreção distal. Como o mecanismo de compensação da alcalose é a retenção de CO2 através de hipoventilação, em alguns casos observa-se hipóxia, dependendo da função pulmonar prévia do paciente. A concentração urinária de cloro é muito útil na avaliação inicial da alcalose metabólica. Concentração de cloro numa amostra de urina inferior a 10 mEq/litro indica que o rim está reabsorvendo sódio avidamente, compatível com situações associadas à depleção de volume e que respondem à infusão de cloreto de sódio (“sensíveis” ao cloreto de sódio) (v. a seguir). Concentração urinária de cloro superior a 20 mEq/litro demonstra que não há depleção de volume e que o cloro
capítulo 11
não é um elemento crucial na manutenção da alcalose; este perfil geralmente corresponde às alcaloses resistentes ao cloreto de sódio. O sódio urinário não é útil nestas circunstâncias porque pode estar elevado durante períodos de bicarbonatúria. Como a alcalemia estimula a glicólise anaeróbica e aumenta a produção de ácido láctico e cetoácidos, pode haver moderada elevação no anion gap. A alcalemia aguda reduz a liberação de oxigênio para os tecidos, por aumentar a afinidade entre oxigênio e hemoglobina. A alcalemia crônica anula este efeito, aumentando a concentração de ácido 2,3 difosfoglicérico nas hemácias.38
TRATAMENTO Pelo exposto, fica evidente a necessidade de serem corrigidos os mecanismos que impedem os rins de excretarem quantidades maiores de bicarbonato. Abordaremos o tratamento da alcalose metabólica de acordo com sua classificação.
Alcalose Metabólica Responsiva ao Cloreto Apesar de a correção do déficit de cloreto ser essencial, a seleção do cátion que o acompanha em solução (sódio, potássio ou próton) depende do estado do espaço extracelular, da presença e do grau de depleção de potássio associada, e do grau e reversibilidade de qualquer diminuição da taxa de filtração glomerular. Quando a função renal é normal, ao se repor cloreto o excesso de bicarbonato será eliminado pelos rins.36 Se existe depleção de cloreto e do extracelular concomitantemente (que é a situação mais comum), a administração de solução salina isotônica (NaCl 0,9%) é adequada e corrige os dois déficits. Em presença de sinais de depleção do extracelular, a quantidade a ser administrada está em torno de 3-5 litros de solução salina isotônica. Porém, se não há sinais de depleção do extracelular, o déficit de cloro pode ser calculado pela fórmula: 0,2 peso (kg) aumento desejado no cloreto plasmático (mEq/litro). As perdas continuadas de cloro e potássio devem ser calculadas e acrescentadas à reposição. Como se instala diurese alcalina com a correção do cloreto, recomenda-se acrescentar 10-20 mEq de potássio por litro de solução administrada, para evitar que se some uma hipocalemia.36 Na presença de sobrecarga de volume, está contra-indicada a reposição de grandes quantidades de volume contendo sódio; então repor cloreto sob forma de cloreto de potássio, em doses de 10-20 mEq. O HCl é indicado se o NaCl ou KCl não puderem ser usados, ou se houver necessidade de correção imediata, por exemplo, se o pH for maior que 7,55, ou na presença de encefalopatia hepática, arritmia cardíaca, intoxicação digitálica ou alteração do estado mental. A quantidade necessária de HCl, administrado como solução 0,1 ou 0,2 M, é calculada pela fórmula: 0,5 peso (kg) redução deseja-
181
da no bicarbonato plasmático (mEq/L). O objetivo do tratamento com HCl é reverter uma alcalose grave, e inicialmente deve-se calcular uma correção parcial do bicarbonato, e não total. Pode-se preparar uma solução isotônica de HCl adicionando-se 150 ml de ácido clorídrico 1 N em 1 litro de água destilada. A infusão de 1 a 2 litros desta solução, em 24 horas, corrige a alcalose na maioria dos casos.36 (Obs: solução 0,1-0,2 N é a solução contendo 100200 mEq de hidrogênio por litro.)38 O HCl deve ser administrado em ambiente de terapia intensiva, por cateter em veia cava ou outra veia central de grande calibre, sendo a posição do cateter necessariamente confirmada por RX, já que a administração de HCl fora do vaso provocaria repercussões dramáticas.36 A velocidade de infusão pode chegar a 25 ml/hora. Recentemente Knutsen mostrou a possibilidade de se administrar, através de uma veia periférica, ácido clorídrico 0,15 N em uma solução de aminoácidos e emulsão lipídica.39 Alternativas ao HCl são: o cloreto de amônio (NH4Cl) e a arginina mono-hidrocloreto. O cloreto de amônio (374 mEq de hidrogênio por litro) pode ser administrado por veia periférica, em quantidade não superior a 300 mEq nas 24 horas; é contra-indicado na insuficiência renal ou hepática.36 A arginina mono-hidrocloreto (475 mEq de H por litro) pode causar hipercalemia grave em pacientes com insuficiência renal, principalmente se houver doença hepática concomitante.38 Se a taxa de filtração glomerular for adequada, o uso de acetazolamida, que é um diurético inibidor da anidrase carbônica, na dose de 250-500 mg via oral ao dia aumenta significativamente a excreção renal de bicarbonato e potássio. É benéfico para pacientes que tenham sobrecarga de volume e particularmente útil para os pacientes em que se necessita manter eliminação de sódio ou quando o potássio estiver elevado. Se não houver hipocalemia, é aconselhável a reposição de potássio, pela alta probabilidade de se desenvolver hipocalemia na vigência de diurese alcalina.18,36 Caso não haja resposta renal após a repleção de cloro ou for necessária diálise para o controle da insuficiência renal, a diálise corrigirá a alcalose metabólica. Porém, se só estiverem disponíveis os líquidos de diálise com altas concentrações de bicarbonato ou seus precursores, pode ser realizada diálise peritoneal de emergência com solução salina isotônica, sendo a manutenção de potássio, cálcio e magnésio feita pela via intravenosa.36 No caso de a alcalose ser conseqüência de perdas continuadas de suco gástrico, são úteis os antieméticos. Na alcalose da gastrocistoplastia, a administração de um inibidor da bomba de prótons, como o omeprazol, bloqueará a secreção gástrica na neobexiga.
Alcalose Metabólica Resistente ao Cloreto Quando a hipocalemia estiver associada com uma alcalose discreta a moderada, a administração de 40-60 mEq de KCl quatro vezes ao dia é de modo geral suficiente. No
182
Metabolismo Ácido-Básico
entanto, se estiver presente arritmia cardíaca ou situação de ameaça à vida, o KCl pode ser administrado na proporção de 40 mEq/hora, em concentrações não superiores a 60 mEq/litro, sob monitorização eletrocardiográfica. A glicose deve ser inicialmente omitida da solução de reposição, pois a secreção de insulina pode diminuir ainda mais a concentração de potássio. Uma vez iniciada a reposição de potássio, a presença de glicose na solução auxilia na repleção celular de potássio.36 Quando a causa for um excesso de mineralocorticóide, o tratamento é dirigido à remoção cirúrgica da fonte ou bloqueio da mesma. Os efeitos do mineralocorticóide sobre o sódio, o potássio e o bicarbonato podem ser revertidos com a espironolactona, diurético poupador de potássio. Além disso, podem ser úteis a restrição de sódio e o acréscimo de potássio na dieta.36 Nas síndromes de Bartter e Gitelman, o principal objetivo do tratamento é diminuir a perda urinária de potássio. Na síndrome de Bartter, os inibidores da enzima conversora reduzem a produção de angiotensina II e diminuem a secreção de aldosterona. Como a síntese de prostaglandinas está elevada nesta síndrome, e pode contribuir para as perdas de sódio, cloro e potássio, inibidores da prostaglandina sintetase podem melhorar a alcalose metabólica. Na síndrome de Gitelman, os diuréticos poupadores de potássio e a suplementação dietética de potássio são necessários.36
Pontos-chave: • A alcalose metabólica apresenta as fases de geração e manutenção. Na fase de manutenção a eliminação de bicarbonato pelos rins está prejudicada • Classificação: responsiva ou resistente ao cloreto • O tratamento se baseia na correção de: Espaço extracelular Deficiência de potássio Deficiência de cloro • Em casos graves, pode ser necessária a administração de ácido clorídrico
Acidose Respiratória Ocorre quando há uma retenção de CO2 (hipercapnia) no organismo e traduz-se por uma elevação da PCO2 no sangue. Isto ocorre quando a produção de CO2 nos tecidos excede a capacidade de remoção pelos pulmões.
CAUSAS Mais comumente são distúrbios neuromusculares (lesões do sistema nervoso central, da parede torácica e mio-
patias) ou enfermidades pulmonares (asma, enfisema etc.). O denominador comum é uma hipoventilação alveolar, que pode ser causada por uma simples obstrução das vias aéreas superiores. V. Quadro 11.6.
CONSEQÜÊNCIAS CLÍNICAS Clinicamente, há uma diferença entre o estabelecimento rápido e o gradual da retenção de CO2. Os pacientes se adaptam melhor quando a elevação é gradual. A retenção de CO2 pode causar confusão mental, tremor do tipo flapping e coma. O único sinal clínico fidedigno de hipercapnia é a demonstração de PCO2 elevada no sangue. A PCO2 venosa é geralmente 6 mmHg mais elevada que a arterial.
CONSEQÜÊNCIAS FISIOLÓGICAS Observando-se a equação de Henderson-Hasselbalch, fica claro que, para o organismo manter o pH sanguíneo, a concentração plasmática de bicarbonato deve variar. Os tampões celulares desempenham o papel principal na resposta a alterações agudas da concentração de CO2. Quando a PCO2 aumenta, aumenta também a concentração de H2CO3, e, portanto, a concentração de H. O H
Quadro 11.6 Causas de acidose respiratória (aguda e crônica) Acidose respiratória aguda a) Anormalidades neuromusculares • Lesão neurológica (tronco, medula alta) • Síndrome de Guillain-Barré, miastenia gravis • Drogas b) Obstrução de vias aéreas • Corpo estranho • Edema ou espasmo de laringe • Broncoespasmo grave c) Desordens tóraco-pulmonares • Tórax instável • Pneumotórax • Pneumonia grave • Inalação de fumaça • Edema pulmonar d) Doença vascular pulmonar • Embolia pulmonar maciça e) Ventilação mecânica controlada • Parâmetros inadequados (freqüência, volume corrente) • Espaço morto aumentado Acidose respiratória crônica a) Anormalidades neuromusculares • Paralisia diafragmática • Síndrome de Pickwick b) Desordens tóraco-pulmonares • Doença pulmonar obstrutiva crônica • Cifoescoliose • Doença pulmonar intersticial terminal Baseado em Kaehny W.D.43
183
capítulo 11
entra na célula em troca por Na e K e é tamponado pelas proteínas celulares, deixando o bicarbonato no líquido extracelular. Este tamponamento celular é responsável por aproximadamente 50% do aumento agudo na concentração plasmática de bicarbonato.40 Ao mesmo tempo, parte do CO2 entra na hemácia, formando H2CO3, o qual, dissociando-se, libera H e HCO3. O íon H é tamponado pela hemoglobina, e o bicarbonato entra no líquido extracelular em troca de cloro. Este mecanismo é responsável por aproximadamente 30% do aumento agudo na concentração plasmática de bicarbonato. No homem, a magnitude do aumento na concentração de bicarbonato plasmático é pequena, sendo inferior a 5 mEq quando a PCO2 aumenta gradualmente de 40 para 80 mm Hg.40,41 Quando a hipercapnia continua, a capacidade de tamponamento se esgota rapidamente. A necessidade de compensação leva a um aumento na excreção de H e na reabsorção e produção de bicarbonato. Schwartz e cols. mostraram, em cães expostos a uma atmosfera de CO2, que o rápido aumento que ocorria nas primeiras 24 horas no bicarbonato plasmático não se acompanhava de um aumento na excreção urinária de H. Mas, entre três e seis dias, o bicarbonato plasmático continuava aumentando, até atingir um platô. O autor, então, demonstrou que este último aumento no bicarbonato estava associado a um aumento na excreção urinária de H, sob a forma de NH4, e, durante esta fase, o rim restaurou os tampões celulares e extracelulares consumidos durante a fase aguda, gerando novo bicarbonato (v. Fig. 11.9).42 Portanto, na retenção crônica de CO2, o limiar da reabsorção de bicarbonato está elevado, assim como há uma excreção elevada de cloro. É preciso mencionar que, no homem com retenção crônica de CO2, não há uma compensação completa.
TRATAMENTO É dirigido à causa da hipoventilação alveolar. Exemplo: desobstrução das vias aéreas superiores, alívio do broncoespasmo do asmático, etc.
Alcalose Respiratória Ocorre quando há uma redução de CO2 no organismo e traduz-se por uma diminuição da PCO2 no sangue. Esta situação é conhecida como hipocapnia e é o resultado de uma hiperventilação alveolar.
CAUSAS Qualquer condição que estimule a ventilação pulmonar poderá ocasionar uma redução da PCO2. Exemplos: dor, ansiedade, salicilatos, tumores cerebrais ou acidentes vasculares encefálicos, estados de hipóxia (cardiopatias cianóticas, altitudes, insuficiência cardíaca congestiva, anemia
etc.), estados infecciosos (septicemias), estados hipermetabólicos (febre, delirium tremens), insuficiência hepática, estados conversivos, etc.43
CONSEQÜÊNCIAS CLÍNICAS Clinicamente, a hiperventilação pulmonar, além das manifestações clínicas da enfermidade básica, pode ser acompanhada de outros sintomas e sinais, possivelmente relacionados com o pH do sangue, circulação cerebral e nível de cálcio iônico: parestesias nas extremidades e região perioral, alteração na consciência e espasmos carpopedais.
CONSEQÜÊNCIAS FISIOLÓGICAS Quando há redução da PCO2 (hipocapnia), ocorrem reações em sentido inverso ao daquelas que mencionamos durante retenção de CO2. Os tampões intracelulares liberam H e trocam cloro e bicarbonato na direção oposta.40 Estes processos causam redução do bicarbonato plasmático. Geralmente, esta redução é da ordem de 7-8 mEq/L quando a PCO2 é reduzida de 40 para 15 mmHg. Há também redução do limiar de reabsorção renal de bicarbonato e retenção de cloro pelo rim.
TRATAMENTO É dirigido ao distúrbio que originou a hiperventilação alveolar. No entanto, a PCO2 pode ser rapidamente elevada, fazendo-se o paciente respirar uma mistura de gás carbônico a 5%, ou aumentando o espaço morto e diminuindo o volume-minuto quando em uso de ventilador.
Distúrbios Ácido-básicos Mistos Chamamos distúrbio ácido-básico misto à ocorrência de dois ou mais distúrbios ácido-básicos simultaneamente no mesmo paciente. Assim, as desordens combinadas podem mascarar umas às outras, resultando em pH relativamente normal. Distúrbios ácido-básicos graves podem passar despercebidos, a menos que uma abordagem passo a passo seja utilizada na avaliação das gasometrias.44
DIAGNÓSTICO DOS DISTÚRBIOS ÁCIDO-BÁSICOS História clínica e exame físico completos devem ser realizados, verificando antecedentes de perdas fluidas, uso de medicamentos e estado do espaço extracelular. Verifique os valores encontrados na gasometria (arterial ou venosa) e compare com os valores normais (Quadro 11.7). Alguns autores sugerem que, antes de iniciar a avaliação dos resultados da gasometria, seja verificada a validade interna dos dados obtidos, através da fórmula de Henderson: [H] 24 PCO2/[HCO3]. A concentração hidrogeniônica (em mEq/litro) para cada pH é encontrada no Quadro 11.8. Os valores intermediários podem ser
184
Metabolismo Ácido-Básico
Quadro 11.7 Valores normais para a gasometria em sangue arterial e venoso pH
HCO3
PCO2
pO2
Sangue arterial
7,35-7,45
22-26 mEq/litro
35-45 mmHg
80-100 mmHg
Sangue venoso
0,05 unidade menor
igual ao arterial
6 mmHg maior
50% menor
Obtido de Kratz, A.52
Quadro 11.8 pH e concentração hidrogeniônica correspondente pH
6,80
6,90
7,00
7,10
7,20
7,30
7,40
7,50
7,60
7,70
7,80
[H]
160
125
100
80
63
50
40
32
26
20
16
calculados por interpolação. Caso não haja correspondência entre a [H] e o pH, há erro na medida de uma das variáveis, no registro dos dados, ou ainda, as amostras foram obtidas em momentos diferentes.45
ROTEIRO PARA INTERPRETAÇÃO DOS DISTÚRBIOS ÁCIDO-BÁSICOS 1) Primeira etapa: através do pH, PCO2 e HCO3ⴚ, identificar a desordem mais aparente (Quadro 11.9). a) Se pH menor que 7,35 acidemia = acidose metabólica ou acidose respiratória. Se o HCO3 estiver baixo, é uma acidose metabólica. Se a PCO2 estiver alta, é uma acidose respiratória. b) Se pH maior que 7,45 alcalemia alcalose metabólica ou alcalose respiratória. Se o HCO3 estiver alto, é uma alcalose metabólica. Se a PCO2 estiver baixa, é uma alcalose respiratória. c) Se o pH estiver normal (7,35-7,45), mas o HCO3 e/ou a PCO2 estiverem alterados, verificar qual deles está mais anormal. Por exemplo, pH 7,40; PCO2 60; HCO3 36. Tanto a PCO2 como o HCO3 estão alterados.
Como o pH está normal neste caso, os diagnósticos possíveis seriam uma alcalose metabólica (bicarbonato elevado) ou acidose respiratória (PCO2 elevada).46 2) Aplicar as fórmulas para verificar se a compensação está adequada (Quadro 11.10). Uma vez identificado um distúrbio, a aplicação da fórmula específica permite identificar se um segundo distúrbio está presente. A pergunta deve ser: a compensação está adequada para o que era previsto? Por exemplo: para as desordens metabólicas, qual deveria ser a PCO2 após a compensação. Para as desordens respiratórias, qual deveria ser a concentração de bicarbonato após a compensação? As fórmulas mostram aproximadamente a compensação esperada. Se a compensação não foi consistente com o que se previa, então um segundo distúrbio está presente.46 Uma medida auxiliar no diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos é o mapa ácido-básico idealizado por Arbus (v. Fig. 11.11).47 3) Calcular o anion gap. Isto permite classificar a acidose metabólica, como foi discutido anteriormente. Anion gap entre 16 e 20 pode ser causado por outras situações, além da acidose metabólica.
Quadro 11.9 Roteiro de diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos: identificação da desordem mais evidente, através do pH, PCO2 e HCO3 Distúrbio
pH
PCO2
HCO3
Acidose metabólica
Diminuído
Diminuída (secundária)
Diminuído (primário)
Alcalose metabólica
Aumentado
Aumentada (secundária)
Aumentado (primário)
Acidose respiratória
Diminuído
Aumentada (primária)
Aumentado (secundário)
Alcalose respiratória
Aumentado
Diminuída (primária)
Diminuído (secundário)
Adaptado de Preston, R.A.46
capítulo 11
185
Quadro 11.10 Roteiro de diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos: aplicar as fórmulas para verificar se a compensação está adequada Acidose metabólica
PCO2 1,5 [HCO3] 8 ou [HCO3] 1,2 [CO2] Variação aceita nos distúrbios simples: 2 mEq/litro
Alcalose metabólica
PCO2 40 0,7 [HCO3 atual HCO3 normal] Variação aceita nos distúrbios simples: 5 mEq/litro
Acidose respiratória
Aguda: [HCO3] aumenta 1 mEq para cada 10 mmHg de aumento na PCO2 Crônica: [HCO3] aumenta 3,5 mEq para cada 10 mmHg de aumento na PCO2
Alcalose respiratória
Aguda: [HCO3] diminui 2 mEq para cada 10 mmHg de queda na PCO2 Crônica: [HCO3] diminui 5 mEq para cada 10 mmHg de queda na PCO2
Adaptado de Preston, R.A.46
Valores acima de 30 sempre significam acidose metabólica com anion gap aumentado. Para valores acima de 20, existe alta probabilidade de ser acidose metabólica com anion gap aumentado.46
Observação: Os elementos BE (base excess) e BD (base deficit) da gasometria refletem o excesso de álcalis na alcalose e a falta de bases na acidose metabólica. Valores normais: BE 2 mEq/L; BD 2mEq/L. Na alcalose metabóli-
BICARBONATO mEq/l
PCO2 (mmHg)
Fig. 11.11 Mapa ácido-básico. A área central (N) representa a área de normalidade. Conhecendo-se pelo menos duas das variáveis (PCO2, pH e HCO3), traça-se uma linha pelos respectivos valores, e o ponto de encontro de duas linhas indica o distúrbio ácidobásico e a variação normal de compensação que pode ocorrer. Se o ponto de encontro das linhas cair fora das áreas sombreadas, as chances são de que o paciente tenha um distúrbio ácido-básico misto. (Obtido de Arbus, G.S.47)
186
Metabolismo Ácido-Básico
ca encontramos valor positivo de BE e valor negativo de BD. Na acidose metabólica, valor negativo de BE e valor positivo de BD. Não julgamos aconselhável utilizar os conceitos de déficit ou excesso de base como ferramenta principal de diagnóstico dos distúrbios ácido-básicos. De fato, entre 152 pacientes estudados por Fencl e colaboradores, o BE deixou de diagnosticar distúrbio ácido-básico grave em 1/6 dos pacientes.48
ALGUNS EXEMPLOS Exemplo 1 Paciente com os seguintes valores na gasometria arterial: pH 7,15; HCO3 6 mEq/litro; PCO2 18 mmHg Na 135 mEq/litro; Cl 114 mEq/litro; K 4,5 Etapa 1: Com pH baixo e bicarbonato baixo = acidose metabólica Etapa 2: Qual deveria ser a PCO2 para esta acidose metabólica? PCO2 (1,5 6) 8 17 Então, a PCO2 esperada seria de 17 mmHg, e está em 18. Como os valores estão muito próximos e a variação não é superior a 2 mmHg, consideramos que se trata de uma acidose metabólica pura (simples). Etapa 3: Anion gap [Na] [Cl HCO3] 135 (114 6) 15. Portanto, o anion gap está normal. Diagnóstico final: Acidose metabólica simples, com anion gap normal.
Exemplo 2 pH 7,08; HCO3 10 mEq/litro; PCO2 35 mmHg. Anion gap 14 Etapa 1: Com pH baixo e bicarbonato baixo acidose metabólica
Etapa 2: Qual deveria ser a PCO2 para esta acidose metabólica? PCO2 (1,5 10) 8 23 Então, a PCO2 esperada seria de 23 mmHg, e está em 35, ultrapassando em muito a variação aceitável. O paciente deveria ter tido uma hiperventilação suficiente para que sua PCO2 caísse até 23 mmHg, mas ela permaneceu em torno de 35. Podemos concluir que o paciente hipoventilou, e não eliminou CO2. Então, o distúrbio que apresenta é uma acidose metabólica com acidose respiratória. Etapa 3: Anion gap 14. Portanto, o anion gap está normal. Diagnóstico final: Acidose mista, metabólica e respiratória, com anion gap normal.
Exemplo 3 pH 7,15; HCO3 6 mEq/litro; PCO2 12 mmHg (não é necessário calcular o AG neste exemplo) Etapa 1: Com pH baixo e bicarbonato baixo acidose metabólica Etapa 2: Qual deveria ser a PCO2 para esta acidose metabólica? PCO2 = (1,5 6) 8 17 Então, a PCO2 esperada seria de 17 mmHg, e está em 12. Este valor ultrapassa a variação aceitável. A hiperventilação estimulada pela acidose metabólica deveria ter permitido que a PCO2 chegasse a 17, porém, o que ocorreu foi uma variação acima da esperada, por hiperventilação. Portanto, o distúrbio que o paciente apresenta é misto: uma acidose metabólica com alcalose respiratória. Diagnóstico final: Distúrbio misto (acidose metabólica e alcalose respiratória). No Quadro 11.11, você encontra resumidos alguns exemplos de distúrbios ácido-básicos.
Quadro 11.11 Quadro gasométrico resumido dos principais distúrbios ácido-básicos pH
PCO2
[HCO3]
[Cl]
[Na]
Hiato iônico
Normal
7,40
40
24
100
140
20
Acidose metabólica com hiato iônico normal
7,32
29
14
111
140
20
Acidose metabólica com hiato iônico aumentado
7,32
29
14
100
130
30
Alcalose metabólica
7,63
49
36
Acidose respiratória aguda
7,21
70
27
Acidose respiratória crônica
7,35
70
38
Alcalose respiratória aguda
7,63
20
20
Alcalose respiratória crônica
7,50
20
15
Adaptado de Zatz.20
capítulo 11
EXERCÍCIOS
20. 21.
Nos exercícios a seguir, avalie os dados clínicos e laboratoriais, e utilizando o roteiro sugerido, responda: a) Qual o distúrbio ácido-básico? b) Qual a compensação esperada? c) Qual o hiato iônico? pH 7,54; PCO2 53; HCO3 42; Na 141; K 3,1; Cl 88. pH 7,27; PCO2 26; HCO3 12; Na 142; K 3,6; Cl 100. pH 7,10; PCO2 20; HCO3 11; Na 140; K 3,8; Cl 110. pH 7,54; PCO2 32; HCO3 16; Na 141; K 3,1; Cl 88. Paciente ingeriu 6 g de ácido acetilsalicílico há 12 horas. Freqüência respiratória: 32 mrm. 5) pH 7,18; PCO2 65; HCO3 48; Na 137; K 4,3; Cl 95. Paciente enfisematoso, internado com extensa broncopneumonia. Creatinina 4,5 mg/dl.
1) 2) 3) 4)
22. 23. 24.
25. 26.
27. 28.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
2.
3. 4.
5. 6. 7. 8.
9.
10.
11. 12. 13.
14. 15. 16.
17. 18.
19.
GUYTON, A.C.; HALL, J.E. Regulation of acid-base balance. In: Guyton, A.C.; Hall, J.E. (eds) Textbook of Medical Physiology, pp. 385403, W.B. Saunders, 1996. ROSE, B.D.; RENNKE, H.G. Acid-base physiology and metabolic alkalosis. In: Renal Pathophysiology — The Essentials, pp. 123-151, Williams & Wilkins. VALTIN, H.; SCHAFER, J.A. H balance. In: Valtin, H.; Schafer, J.A. Renal Function, pp.183-133. RECTOR Jr, F.C. Renal acidification and ammonia production; chemistry of weak acids and bases; buffer mechanisms. Cap. 9, p. 318. In: The Kidney. Eds. B.M. Brenner e F.C. Rector Jr. W.B. Saunders Co. 1976. SCRIBNER, B.H. Teaching Syllabus for the Course on Fluid and Eletrolyte Balance. University of Washington, 7th revision, 1969. CHAPMAN, W.H. e col. The Urinary System. An integrated approach. W.B. Saunders Co. 1973. ROSE, B.D.; POST, T.W. Acids and bases. Up To Date, v.9, n.3, 2001. SEGURO, A.C.; MAGALDI, A.J.B.; HELOU, C.M.B.; MALNIC, G.; Zatz, R. Processamento de água e eletrólitos pelos túbulos renais. In: Zatz, R. Fisiopatologia Renal, pp. 71-96, Atheneu, 2000. BRENNER, B.; COE, F.L.; RECTOR, F.C. Acid base homeostasis. In: Brenner, B.; Coe, F.L.; Rector, F.C. Renal Physiology in Health and Disease, pp. 112-131. W.B. Saunders Co, 1987. BIDANI, A.; DuBOSE, T.D, Jr. Cellular and whole-body acid-base regulation. In: Arieff, A.I.; DeFronzo, R.A. (eds) Fluid, Electrolyte, and Acid-base Disorders, pp. 69-103. Churchill, Livingstone, 1995. MALNIC, G. e MARCONDES, M. Fisiologia Renal. Pág. 125, EdartSão Paulo, 1972. SWAN, R.C. e PITTS, R.F. Neutralization of infused acid by nephrectomized dogs. J. Clin. Invest., 34:205, 1955. RECTOR Jr, F.C. Acidification of the urine. Cap. 14, p. 431. In: Handbook of Physiology. Ed. Geiger, S.R. Waverly Press, Inc., Baltimore, 1973. PITTS, R.F. e ALEXANDER, R.S. The nature of the renal tubular mechanism for acidifying the urine. Am. J. Physiol., 144:239, 1945. CLAPP, J.R. e col. Effects of unreabsorbed anions on proximal and distal transtubular potentials in rats. Am. J. Physiol., 202:781, 1962. SCHWARTZ, W.B. e col. Effect of chronic hypercapnia on eletrolyte and acid-base equilibrium. II. Recovery with special reference to the influence of chloride intake. J. Clin. Invest., 40:1238, 1961. ROSE, B.D.; POST, T.W. Renal hydrogen excretion. Up To Date, v.9, n.3, 2001. SHAPIRO, J.I.; KAEHNY, W.D. Pathogenesis and management of metabolic acidosis and alkalosis. In: Schrier, R.W. (ed). Renal and Electrolyte Disorders, pp. 161-210. Little, Brown, 1992. ROSE, B.D.; RENNKE, H.G. Metabolic acidosis. In: Renal Pathophysiology — The Essentials, pp. 152-168, Williams & Wilkins.
29. 30. 31. 32. 33. 34. 35.
36. 37. 38. 39. 40. 41. 42.
43.
44. 45. 46.
47. 48.
49.
50. 51.
187 ZATZ, R.; MALNIC, G. Distúrbios do equilíbrio ácido-base. In: Zatz, R. Fisiopatologia Renal, pp. 209-244, Atheneu, 2000. ROSE, B.D.; POST, T.W.; NARINS, R.G. Causes of lactic acidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001. ROSE, B.D. D-Lactic acidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001. ROSE, B.D. Alcoholic and fasting ketoacidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001. NARINS, R.G. Introduction to metabolic acidosis, Part 1, 2 and 3. American Society of Nephrology Board Review Course, sep. 1998 (www.hdcn.com). PRESTON, R.A. Metabolic Acidosis. In: Acid-base, Fluids, and Electrolytes Made Ridiculously Simple, pp. 97-115, MedMaster Inc., 1997. ADROGUÉ, H.J.; MADIAS, N.J. Disorders of acid-base balance. In: Schrier, R.W. Atlas of Kidney Diseases (on line - http://www.kidneyatlas.org/), Blackwell Science, 1999. POST, T.W.; ROSE, B.D. Approach to the patient with metabolic acidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001. OH, M.S. e CARROL, H.J. Current concepts: the anion gap. New Engl. J. Med., 297:814, 1977. ADROGUÉ, H.J.; MADIAS, N.E. Management of life-threatening acid-base disorders. Part I. N. Engl. J. Med., 38(1):26-34, 1998. ROSE, B.D. Treatment of metabolic acidosis. Up To Date, v.9, n.3, 2001. GARELLA, S. e col. Severity of metabolic acidosis as a determinant of bicarbonate requirements. New Engl. J. Med., 289:121, 1973. POSNER, J.B. e PLUM, F. Spinal fluid pH and neurologic symptoms in systemic acidosis. New Engl. J. Med., 277:605, 1967. MATTAR, J.A. Bicarbonato de sódio na parada cardiorrespiratória. Rev. Soc. Cardiol. Est. São Paulo, 1997;1. WILSON, R.F. e col. Severe alkalosis in critically ill surgical patients. Arch Surg., 105:197, 1972. BLACK, R.M.; ALFRED, H.J.; FAN, P.Y.; STOFF, J.S. Metabolic alkalosis. In: Rose & Black’s Problems in Nephrology, pp. 64-73, Little, Brown and Co., 1996. GALLA, J.H. Metabolic alkalosis. J. Am. Soc. Nephrol., 11:369-375, 2000. DuBOSE, T., Jr. Metabolic alkalosis. American Society of Nephrology Board Review Course, sep. 1998 (www.hdcn.com). ADROGUÉ, H.J.; MADIAS, N.E.; Management of life-threatening acid-base disorders. Part 2. N. Engl. J. Med., 38(2):107-111, 1998. KNUTSEN, O.H. New method for administration of hydrochloric acid in metabolic alkalosis. Lancet, 2:953, 1983. RASTEGAR, A. e THIERS, S.O. Physiologic consequence and bodily adaptations to hyper- and hypocapnia. Chest., 62:283, 1972. BRACKETT, N.C. e col. Carbon dioxide titration in man. New Engl. J. Med., 272:6, 1965. SCHWARTZ, W.B. e col. The response of extracellular hydrogen ion concentration to grade degree of chronic hypercapnia: the physiologic limit of the defense of pH. J. Clin. Invest., 44:291, 1965. KAEHNY, W.D. Pathogenesis and management of respiratory and mixed acid-base disorders. In: Schrier, R.W. (ed) Renal and Electrolyte Disorders, pp. 211-230. Little, Brown, 1992. MCCURDY, D.K. Mixed metabolic and respiratory acid-base disturbance: diagnosis and treatment. Chest, 62:35S, 1972. FALL, P.A stepwise approach to acid-base disorders. Postgrad. Med., 107(3):249-263, 2000. PRESTON, R.A. Mixed acid-base disorders. In: Acid-base, Fluids, and Electrolytes Made Ridiculously Simple, pp. 125-143, MedMaster Inc., 1997. ARBUS, G.S. An in vivo acid-base nomogram for clinical use. Can. Med. Assoc. J., 109:291, 1973. FENCL, V.; JABOR, A.; KAZDA, A.; FIGGE, J. Diagnosis of metabolic acid-base disturbances in critically ill patients. Am. J. Respir. Crit. Care Med., 162(6):2246-51, 2000. MAKOFF, D. L. Acid-base metabolism. Cap. 8, p. 297. In: Clinical Disorders of Fluid and Electrolyte Metabolism. Eds. M.H. Maxwell e C.R. Kleeman. McGraw-Hill Book Co., 1972. PITTS, R.F. Physiology of the Kidney and Body Fluids, 3rd Edition. Year Book Medical Publishers Inc., 1974. SELDIN, D.W e RECTOR Jr, F.C. The generation and maintenance of metabolic alkalosis. Kidney Int., 1:306, 1972.
188
Metabolismo Ácido-Básico
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.kidneyatlas.org/book1/adk1 – 06.pdf — Excelente capítulo do Atlas de Doenças Renais on line de Robert Schrier. http://www.biology.arizona.edu/biochemistry/ problem – sets/medph/01q.html — Tutorial muito interessante com perguntas e respostas comentadas. http://perfline.com/cursos/cursos/acbas/acbas.htm — Revisão geral do equilíbrio ácido-básico e testes.
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS 1) pH 7,54; PCO2 53; HCO3 42. a) Distúrbio ácido-básico: pH alto, bicarbonato alto, PCO2 alta 씮 alcalose metabólica. b) Compensação esperada para a alcalose metabólica é a hipoventilação alveolar, com aumento na PCO2, como se observa nesta gasometria. Aplicando a fórmula para verificar se a compensação da alcalose metabólica é adequada: (PCO2 40 0,7 [HCO3 atual HCO3 normal]) 씮 53 40 0,7 (42 24) 씮 53 52,6. Portanto, a compensação está dentro do que era esperado, e se trata de um distúrbio simples. c) Anion gap Na (HCO3 Cl) 씮 AG 11. 2) pH 7,27; PCO2 26; HCO3 12; Na 142; K 3,6; Cl 100. a) Distúrbio ácido-básico: pH baixo, bicarbonato baixo, PCO2 baixa 씮 acidose metabólica. b) A compensação esperada para a acidose metabólica é a hiperventilação alveolar, com diminuição na PCO2, como se observa nesta gasometria. Aplicando a fórmula para verificar se a compensação da acidose metabólica é adequada: PCO2 1,5 [HCO3] 8 씮 26 (1,5 12) 8 씮 26 26. Portanto, a compensação está adequada: a acidose estimulou a hiperventilação, reduzindo a PCO2 ao nível que era esperado. c) Anion gap Na (HCO3 Cl) 씮 AG 142 – (12 100) 씮 AG 30. O anion gap está aumentado. Verificar quais as causas prováveis. 3) pH 7,10; PCO2 32; HCO3 11; Na 140; K 3,8; Cl 110.
a) Distúrbio ácido-básico: pH baixo, bicarbonato baixo, PCO2 baixa 씮 acidose metabólica. b) Compensação esperada para a acidose metabólica é a hiperventilação alveolar, com diminuição na PCO2, como se observa nesta gasometria. Aplicando a fórmula para verificar se a compensação da alcalose metabólica é adequada: PCO2 1,5 [HCO3] 8 씮 32 (1,5 11) 8 씮 24,5 17. O mecanismo de compensação foi insuficiente e não reduziu a PCO2 aos níveis esperados. Portanto, trata-se de uma acidose mista (acidose metabólica acidose respiratória). c) Anion gap Na (HCO3 Cl) 씮 AG 140 – (11 110) 씮 AG 19. O anion gap está normal. Verifique as causas prováveis. 4) pH 7,54; PCO2 32; HCO3 16; Na 141; K 3,1; Cl 88. Paciente ingeriu 6 g de ácido acetilsalicílico há 12 horas. Freqüência respiratória: 32 mrm. a) Distúrbio ácido-básico: pH alto, bicarbonato baixo, PCO2 baixa 씮 alcalose respiratória. b) Compensação esperada para a alcalose respiratória é a eliminação de bicarbonato e retenção de ácido pelo rim. Aplicando a fórmula de alcalose respiratória (aguda) para verificar se a compensação é adequada: [HCO3] deveria diminuir 2 mEq para cada 10 mmHg de queda na PCO2. Como a PCO2 caiu 8 mmHg, a concentração de bicarbonato deveria cair para cerca de 22,4 mEq/L. Porém, a queda no bicarbonato foi superior, chegando a 16 mEq/L. O mecanismo de compensação foi inadequado, e conclui-se que este paciente apresenta um distúrbio ácido-básico misto: alcalose respiratória e acidose metabólica. c) AG Na (HCO3 Cl) 씮 AG 37. 5) pH 7,18; PCO2 65; HCO3 28; Na 137; K 4,3; Cl 95. Paciente enfisematoso, internado com extensa broncopneumonia. Creatinina 4,5 mg/dl. a) Distúrbio ácido-básico: pH baixo, bicarbonato alto, PCO2 alta 씮 acidose respiratória. b) Compensação esperada para a acidose respiratória é a retenção de bicarbonato pelo rim. Aplicando a fórmula de acidose respiratória (crônica) para verificar se a compensação é adequada: [HCO3] Deve aumentar 3,5 mEq para cada 10 mmHg de aumento na PCO2. Como a PCO2 aumentou 25 mmHg, o bicarbonato deveria estar em torno de 32,75. Observe que o bicarbonato elevou-se pouco, frente ao que era esperado, talvez devido ao comprometimento de função renal que este paciente apresenta. Então, o distúrbio apresentado por ele é uma acidose mista (metabólica respiratória). c) AG Na (HCO3 Cl) 씮 AG 14.
Capítulo
12
Metabolismo do Potássio Miguel Carlos Riella e Maria Aparecida Pachaly
INTRODUÇÃO
Hormônios adrenocorticais
DISTRIBUIÇÃO DO POTÁSSIO NO ORGANISMO MÉTODOS DE AVALIAÇÃO DA QUANTIDADE DE POTÁSSIO NO ORGANISMO
Como age a aldosterona? ADAPTAÇÃO A NÍVEIS ELEVADOS DE POTÁSSIO Adaptação renal ao potássio
Concentração plasmática do potássio 40
Adaptação extra-renal ao potássio
Determinação do potássio total com K
PAPEL DO BALANÇO ÁCIDO-BÁSICO
Determinação do potássio trocável
HOMEOSTASIA DO POTÁSSIO NA INSUFICIÊNCIA RENAL
Outros métodos INTERPRETAÇÃO DO POTÁSSIO PLASMÁTICO FATORES QUE AFETAM A DISTRIBUIÇÃO TRANSCELULAR DE POTÁSSIO BALANÇO DO POTÁSSIO Ingesta e excreta
Papel do sistema renina-angiotensina-aldosterona Excreção gastrintestinal de potássio Tolerância celular ao potássio AÇÃO DOS DIURÉTICOS DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DO POTÁSSIO Depleção de potássio (hipocalemia)
Excreção renal de potássio
Causas de hipocalemia
Transporte tubular renal de potássio
Manifestações clínicas
Canais de potássio
Diagnóstico diferencial
Túbulo proximal
Tratamento da hipocalemia
Ramo descendente da alça de Henle (RDAH)
Cálculo do déficit de potássio
Ramo ascendente da alça de Henle (RAAH)
Reposição de potássio em algumas situações especiais
Túbulo distal (TD)
Excesso de potássio (hipercalemia)
Reciclagem medular de potássio
Causas de hipercalemia
Fatores que influenciam a secreção de potássio nos
Diagnóstico diferencial
túbulos distal e coletor SISTEMAS HORMONAIS ATUANTES NA HOMEOSTASIA DO POTÁSSIO
Manifestações clínicas Tratamento da hipercalemia EXERCÍCIOS
Insulina
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Glucagon
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Catecolaminas
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS
190
Metabolismo do Potássio
INTRODUÇÃO O potássio é o cátion intracelular mais abundante e sua influência se faz sentir em vários processos metabólicos da célula. A função neuromuscular e os potenciais de membrana dependem de maneira crítica da relação entre a concentração de potássio intracelular e extracelular. Em vista disso, os mecanismos que regulam a concentração de potássio devem ser bastante precisos. Embora a concentração de potássio no líquido extracelular seja reduzida, quando comparada com a concentração intracelular, a variação é pequena (3,5 a 5,0 mEq/L). As repercussões clínicas de pequenas variações nesta concentração extracelular de potássio são, no entanto, dramáticas. Cabe ao rim grande parte da responsabilidade pelo controle da concentração de potássio.
DISTRIBUIÇÃO DO POTÁSSIO NO ORGANISMO O potássio total do corpo está em torno de 55 mEq/kg, e portanto, num indivíduo de 70 kg, há aproximadamente 3.500 mEq de potássio, sendo pelo menos 90% intracelulares1,2 e 10% extracelulares (Fig. 12.1). Porém, apenas 2% do potássio extracelular se encontram no plasma e fluido intersticial (50-70 mEq); o restante encontra-se no tecido ósseo, de onde pode ser mobilizado lentamente.3 A maior parte do potássio intracelular (em torno de 3.000 mEq) está no interior das células musculares, o que não implica um acúmulo relativo de potássio no músculo, mas apenas reflete a preponderância da massa muscular em relação à massa corporal. A acentuada diferença de concentração entre os espaços intracelular e extracelular é mantida pela bomba iônica sódio-potássio-ATPase (Na-K-ATPase), que ativamen-
te transporta o potássio para dentro e o sódio para fora das células.4 O papel do potássio intracelular com relação à água é análogo ao papel do sódio no líquido extracelular, isto é, cada um é o principal determinante da osmolalidade do seu compartimento e a quantidade absoluta de cada um está relacionada com o volume do compartimento intraou extracelular.5 A facilidade com que se pode determinar a concentração de sódio no líquido extracelular contrasta com as dificuldades existentes na determinação direta do potássio intracelular.
MÉTODOS DE AVALIAÇÃO DA QUANTIDADE DE POTÁSSIO NO ORGANISMO Concentração Plasmática do Potássio Demonstrou-se que há uma correlação entre a quantidade de potássio no plasma e a quantidade total de potássio no organismo de um indivíduo normal.6 Embora alguns estudos não tenham mostrado uma correlação entre a concentração plasmática de potássio e o potássio total do organismo, há muita evidência na literatura que demonstra que a concentração plasmática de potássio reflete a quantidade total de potássio no organismo.5
Determinação do Potássio Total com 40K A administração de potássio radioativo (40K) permite a detecção externa de toda a radiação emitida pelo 40K proveniente do corpo.7 Por este método, chegou-se à conclusão de que o potássio total do homem está em torno de 55 mEq/kg, e o da mulher, em torno de 49 mEq/kg.1 A dife-
Fig. 12.1 Distribuição do potássio num adulto pesando 70 kg. Observe que a maior parte do potássio está contida nas células musculares. (Obtido de Black, D.A.K.1)
capítulo 12
rença deve-se ao fato de as mulheres possuírem maior quantidade de tecido adiposo e menor massa muscular.
Quadro 12.1 Alterações no potássio sérico Distribuição transcelular alterada 1. Ácido-básico a. Acidose: para cada 0,1 unidade de pH que cai, o potássio se eleva em 0,6 mEq/L b. Alcalose: para cada 0,1 unidade de pH que sobe, o potássio diminui em 0,1 mEq/L
Determinação do Potássio Trocável* O potássio trocável representa 92 a 99% do potássio total e refere-se ao potássio que se mobiliza com mais facilidade. O método baseia-se na administração de uma quantidade conhecida de 42K, e, após um período de equilíbrio, a concentração de 42K, multiplicada pela dose administrada, fornece o potássio trocável.
2. Insulina 3. Aldosterona 4. Agentes -adrenérgicos (epinefrina) Alteração das reservas de potássio 1. Depleção — 1 mEq/L de redução para um déficit de 200-300 mEq 2. Retenção — 1 mEq/L de aumento reflete um excesso de 200 mEq
Outros Métodos A determinação do potássio total ou trocável não nos permite saber a concentração intracelular de potássio. Para isto haveria necessidade de determinar a água do organismo e o volume do compartimento extracelular.5 Estas determinações são difíceis e não muito precisas. Felizmente, existem outras maneiras de expressar os dados de potássio: o potássio do organismo pode ser relacionado com o peso do indivíduo (v. Quadro 12.2), com a sua massa corporal sem gordura e com a altura e excreção de creatinina. Além disso, há métodos de análise tissular. A biópsia de músculo é útil, pois o músculo contém aproximadamente 60% do potássio do organismo, e uma estimativa do potássio muscular total dá uma idéia grosseira do potássio total do organismo.5 A determinação do potássio intracelular em eritrócitos e leucócitos também tem sido utilizada para a estimativa do potássio total. Os vários métodos existentes refletem as dificuldades encontradas pelos investigadores.
INTERPRETAÇÃO DO POTÁSSIO PLASMÁTICO Scribner e Burnell desenvolveram a idéia de que depleção e excesso de potássio devem ser definidos em face das alterações do potássio total do organismo, tomando-se um ponto de referência.8 Os autores acreditavam que um ponto
*A determinação da massa de eletrólitos no corpo está intimamente relacionada com a determinação do volume dos líquidos no corpo. Quando se administra sódio ou potássio radioativo, eles são diluídos pelos isótopos, que ocorrem normalmente no corpo. Alguns eletrólitos do corpo estão em solução e se equilibram rapidamente com os eletrólitos marcados por substâncias radioativas. Outros eletrólitos estão incorporados em fáscias, tendões, ossos etc. e se equilibram mais lentamente com os eletrólitos marcados. Isto dificulta o cálculo da massa total de determinado eletrólito. A massa de eletrólito que se equilibra ou se troca rapidamente com o eletrólito marcado é denominada massa trocável ou permutável. Daí as expressões sódio ou potássio trocável, de troca ou permutável. É óbvio que a massa trocável será sempre inferior à massa total do organismo.7
191
Modificado de Tannen, R.L. Manual of Nephrology. Edit. Robert Schrier. Little, Brown and Co., 1981.
Quadro 12.2 Depleção de potássio: algumas causas gastrintestinais Diarréia Fezes líquidas: cólera, síndrome de Zollinger-Ellison Fezes formadas: esteatorréia, pós-gastrectomia Secreção de tumores: adenoma viloso Exsudato inflamatório: colite ulcerativa Vômito e diarréia: gastroenterite Vômito: estenose pilórica Aspiração gástrica contínua Fístulas: biliar, pancreática, gastrocólica Outras: abuso de purgativos, enemas Modificado de Black, D.A.K.1
de referência era essencial, pois que alterações no potássio total, per se, não tinham significado. Exemplificavam com o paciente em jejum, que perde potássio mas não se torna deficiente em potássio porque, ao mesmo tempo, destrói massa protéica (devido ao jejum). O ponto de referência escolhido foi denominado capacidade total do potássio (total potassium capacity)§ e refere-se à soma de todos os ânions e outros grupos químicos fora do líquido extracelular e capazes de reter íons K⫹ ou ligarem-se a estes. A capacidade do potássio teria vários componentes (v. Fig. 12.2). As células musculares contribuiriam com a maior parcela, além do fígado, glicogênio, hemácias e ossos. Desta maneira, define-se depleção de potássio como uma diminuição do potássio total em relação à capacidade do potássio. Exemplo: depleção de potássio devido a perdas gastrintestinais ou renais, sem ingesta adequada (v. Fig. 12.2). §
O termo capacidade total do potássio talvez não traduza com fidelidade o significado do termo total potassium capacity.
192
Metabolismo do Potássio
Fig. 12.2 Diagrama ilustrando as relações entre o potássio total e a capacidade do potássio. (Modificado de Chapman, W.H. e cols.44)
Define-se excesso de potássio como um aumento na relação potássio total/capacidade do potássio. Como os rins normalmente excretam rapidamente um excesso de potássio, a causa mais comum de excesso de potássio é uma diminuição da capacidade do potássio e não um aumento no potássio total. O exemplo representativo seria aquele do paciente com insuficiência renal aguda. O paciente geralmente não se alimenta, de forma que o potássio total permanece constante, pois o rim cessou a excreção. No entanto, devido ao jejum, ele passa a destruir a sua massa celular em busca de fontes de energia, consome as reservas de glicogênio e, assim, reduz a sua capacidade do potássio (Fig. 12.2). Quando existe um quadro de caquexia ou jejum prolongado, não há depleção de potássio, pois o potássio total e a capacidade do potássio decrescem simultaneamente (Fig. 12.2). Entretanto, como veremos a seguir, existem fatores que afetam a distribuição transcelular de potássio, sem alterarem a quantidade total de potássio no organismo.
FATORES QUE AFETAM A DISTRIBUIÇÃO TRANSCELULAR DE POTÁSSIO a) Estado ácido-básico: a acidose determina a saída de potássio das células, enquanto a alcalose age no sentido inverso, determinando redução na concentração sérica do potássio. A isto chamamos desvio iônico. b) Insulina: promove a entrada de potássio nas células. Deficiência de insulina aumenta o potássio no extracelular.
c) Aldosterona: modifica a excreção urinária de potássio. Deficiência de aldosterona provoca retenção de potássio e aumento do potássio no extracelular. d) Agentes adrenérgicos: por exemplo, a epinefrina promove a entrada de potássio nas células. Se nenhum dos fatores acima estiver atuando, a concentração sérica de potássio reflete o potássio total. Para se avaliar a magnitude da depleção a partir do potássio sérico, podemos utilizar a seguinte regra prática: a redução de 1 mEq/L no potássio sérico corresponde a uma perda aproximada de 200-300 mEq do potássio total. Uma outra maneira de se interpretar a magnitude do déficit leva em consideração o nível sérico de potássio: nível sérico entre 2,5 e 3,5 mEq/L significa aproximadamente uma redução de 10% (200-400 mEq) no potássio total. Este déficit geralmente não acarreta sintomas e pode ser manejado com reposição oral de potássio. Nível sérico inferior a 2,5 mEq/L indica 15-20% ou mais de depleção do potássio total (400-700 mEq) e pode exigir uma reposição mais agressiva, dependendo das ma-
Pontos-chave: • Potássio normal ⫽ 3,5-5,0 mEq/L • O nível de potássio no sangue deve ser avaliado com base na capacidade calêmica total • O potássio pode redistribuir-se entre os compartimentos extra- e intracelular e viceversa, de acordo com o estado ácido-básico, insulina e estímulo adrenérgico
193
capítulo 12
H⫹
H⫹
H⫹
H⫹
H⫹ H⫹
H⫹ H⫹
H⫹ K⫹
K⫹
K⫹
K⫹ K⫹
K⫹
K⫹
ACIDOSE 앗0,1 pH ⫽앖K 0,6 mEq/L
K⫹ K⫹ K⫹ K⫹ K⫹
ALCALOSE 앖0,1 pH ⫽앗K 0,1 mEq/L
Fig. 12.3 Desvio iônico do potássio em presença de acidose e alcalose. Na acidose, para cada 0,1 de queda no pH, há uma elevação de 0,6 mEq/L no potássio sérico. Na alcalose, para cada 0,1 de aumento no pH, o nível do potássio sérico cai 0,1 mEq/L.
guma excreção também ocorre nos segmentos proximais, enquanto alguma reabsorção ocorre no ducto coletor. Cerca de 65% do potássio filtrado são reabsorvidos no túbulo proximal, e 25-30% na alça de Henle, principalmente no ramo ascendente espesso. Como estes segmentos tubulares mais proximais executam principalmente processos de reabsorção de potássio, a maior parte da variação em sua excreção é causada por ajustes na secreção nos segmentos tubulares mais distais (como os túbulos distais e túbulos coletores).2
Transporte Tubular Renal de Potássio CANAIS DE POTÁSSIO
nifestações clínicas. É difícil imaginar-se o déficit quando o nível sérico é inferior a 1,8-2,0 mEq/L. Em caso de hipercalemia, um aumento de 1 mEq/L no potássio sérico reflete pelo menos 200 mEq de excesso de potássio total.
BALANÇO DO POTÁSSIO Ingesta e Excreta Normalmente, a quantidade diária de potássio ingerida varia entre 50 e 150 mEq. A quantidade de potássio excretada pela pele através do suor é pequena, cerca de 16 a 18 mEq/L. A excreção de potássio nas fezes é da ordem de 5 a 10 mEq por dia, mas perdas consideráveis ocorrem nas diarréias, esteatorréias e com uso de laxantes.1 Em vista da pequena excreção cutânea e intestinal de potássio, é óbvio que a maior responsabilidade pela excreção do potássio cabe ao rim.2
Excreção Renal de Potássio A excreção renal de potássio depende de três processos: a) taxa de filtração glomerular do potássio (que é igual à taxa de filtração glomerular ⫻ concentração plasmática de potássio); b) taxa de transporte de potássio do lúmen tubular para o sangue (reabsorção), e c) taxa de transporte do potássio do sangue para o lúmen tubular (secreção). Em condições habituais, a taxa de filtração do potássio é mantida constante, e a maior parte do potássio excretado não resulta do processo de filtração glomerular, e sim do processo de secreção tubular. Em circunstâncias em que a taxa de filtração glomerular está reduzida, como a insuficiência renal, pode haver acúmulo de potássio com graves repercussões clínicas.2 De maneira geral, as porções iniciais do nefro reabsorvem potássio e as mais distais o secretam. No entanto, al-
Sabe-se atualmente que o movimento passivo de íons e água através de membranas biológicas é facilitado por um grupo de proteínas conhecidas como canais. Canal de íon é definido como uma proteína transmembrana com um orifício ou poro através do qual os íons podem passar por eletrodifusão. Canais de potássio (K⫹) constituem um grupo de proteínas de membrana que facilitam o movimento passivo (guiado pelo gradiente eletroquímico para K⫹) de K⫹ através de membranas celulares. Um ou mais tipos de canais de K⫹ podem ser detectados em virtualmente todas as células de mamíferos. Os canais de K⫹ que se abrem e fecham em resposta a alterações na voltagem da membrana são chamados de canais voltagem-dependentes (Kv). Uma subclasse de canais Kv necessita de cálcio para ativação e são conhecidos como maxicanais K⫹. Recentemente verificou-se que canais Kv têm um papel crucial na regulação da contração vascular da musculatura lisa e portanto na resistência vascular periférica e pressão arterial. Os íons K⫹ atravessam as membranas fundamentalmente por dois mecanismos: via canais ou carregadores. A força propulsora do movimento de potássio através do canal é a diferença de potencial eletroquímico. O transporte de potássio mediado por carregador envolve a ligação com uma proteína específica carregadora, e a alteração na conformação desta proteína é necessária para atravessar a barreira celular. Embora a importância fisiológica de canais Kv não possa ser imediatamente óbvia no epitélio renal, está claro que vários destes genes se expressam no rim e que os Kv podem ter um papel na secreção de potássio no ducto coletor cortical e na reciclagem de K na medula interna.9
TÚBULO PROXIMAL Após a filtração, 60-65% do potássio no líquido tubular são reabsorvidos no túbulo contornado proximal. O túbulo proximal funciona como um epitélio de baixa resistência, onde ocorre uma extensa reabsorção de água, sódio, potássio e outros íons. Duas forças passivas promovem
194
Metabolismo do Potássio
CARGA FILTRADA 600-700 MEQ/DIA
RAMO ASCENDENTE DA ALÇA DE HENLE (RAAH)
REABSORÇÃO DE K⫹ 60-70% SECREÇÃO DE K⫹
INICIAL MÉDIA K⫹ REABSORÇÃO Túbulo proximal 20-30%
FINAL
Túbulo distal
Túbulo coletor
SECREÇÃO DE K⫹
Está bem estabelecido que a reabsorção de potássio através da membrana luminal se faz contra um gradiente eletroquímico e através de um mecanismo de co-transporte, de tal forma que um Na⫹, um K⫹ e dois Cl⫺ são translocados simultaneamente. Este processo eletricamente neutro constitui o transporte ativo secundário de potássio. A força promotora origina-se da extrusão ativa de sódio através da membrana baso-lateral da célula. A saída de potássio da célula se faz pela membrana baso-lateral e pode ser por difusão através de canais de potássio ou acoplado a íons cloro via um co-transportador KCl.
TÚBULO DISTAL (TD) EXCREÇÃO URINÁRIA 90 mEq/dia
Fig 12.4 Reabsorção tubular de potássio nos diferentes segmentos do nefro. Adaptado de DeFronzo, R.A.; Smith, J.D.47
reabsorção transepitelial de potássio: a) o movimento de líquido através de junções intercelulares provoca um arrasto de potássio no mesmo sentido (solvent drag effect); b) uma força eletroquímica, determinada por uma diferença de potencial transepitelial que varia de valores positivos no túbulo proximal, favorecendo a reabsorção, a valores negativos nos segmentos distais (túbulo coletor), favorecendo a secreção de potássio. Desta forma, ocorre uma reabsorção passiva por eletrodifusão.4 Além destas forças passivas, há evidência de uma via transcelular ativa para reabsorção de potássio. Esta informação deriva de experimentos em que a reabsorção de líquido e sódio é marcadamente reduzida e a reabsorção de potássio continua. A saída de potássio da célula para o líquido peritubular e capilar peritubular é exclusivamente passiva. Isto ocorre pelo gradiente eletroquímico e pela alta permeabilidade da membrana celular baso-lateral.
RAMO DESCENDENTE DA ALÇA DE HENLE (RDAH) Atualmente, acredita-se que o potássio seja secretado no líquido tubular neste segmento do nefro. Jamison e cols. mostraram que, no final deste segmento, a quantidade de potássio excede a filtrada e concluíram que este potássio secretado provém do potássio absorvido no ramo ascendente da alça de Henle (v. a seguir) e que o ritmo de secreção depende do gradiente existente entre o interstício medular e o lúmen tubular. Portanto, o mecanismo de transporte parece ser passivo.10
A porção do túbulo distal responsável pela secreção de potássio parece estar restrita à parte final do segmento entre a mácula densa e a confluência de dois túbulos distais: a parte mais distal do TD e o túbulo coletor cortical. A parte convoluta do TD (parte inicial) não participa funcionalmente do transporte de potássio. Há dois tipos de células no túbulo distal que participam do transporte de potássio: as células principais (claras), mais numerosas e responsáveis pela reabsorção e secreção de potássio, e as células intercaladas (escuras), que regulam a reabsorção de potássio e a secreção de íons H⫹.4 A célula principal transporta o K⫹ através da membrana baso-lateral pela atividade Na-K-ATPase. O movimento preferencial do K⫹ se faz para o lúmen, e isto ocorre pela eletrodifusão de sódio do lúmen para a célula pela membrana apical. A secreção de potássio pode ser poderosamente influenciada por qualquer coisa que altere a entrada de sódio (íons) na célula através da membrana apical. A aldosterona aumenta a condução de sódio pela membrana apical, aumentando secundariamente a secreção e a saída de potássio. Um segundo tipo de reabsorção de potássio está nos ductos coletores medulares. É possível que o transporte de potássio e hidrogênio esteja ligado neste local. A estimulação da secreção de H⫹ aumenta o potencial positivo do lúmen, aumentando a reabsorção passiva de potássio, e vice-versa.
RECICLAGEM MEDULAR DE POTÁSSIO Há evidência recente de que é diferente o transporte de potássio entre os nefros superficiais (corticais) e os profundos (justamedulares). A base da alça de Henle contém mais K⫹ do que está presente no filtrado glomerular. Há evidência de que este K⫹ adicionado à alça de Henle provém do ducto coletor medular. Desta forma, o K sofre uma reciclagem na medula renal, similar ao que ocorre com a uréia. A alta concentração medular de K origina um gradiente que favorece a secreção passiva de potássio na pars recta e ramo fino descendente da alça de Henle. A reciclagem de K
195
capítulo 12
proporciona ótimas condições para o nefro distal excretar K. Quando ocorre uma alta ingesta de K, a urina deve excretar o excesso. Assim, a alta concentração de K no ducto coletor não se dissipa para o interstício devido à alta concentração de K na medula.
FATORES QUE INFLUENCIAM A SECREÇÃO DE POTÁSSIO NOS TÚBULOS DISTAL E COLETOR a) Ingesta de potássio: a secreção de potássio aumenta quando o potássio dietético é elevado e diminui quando este é reduzido. O efeito do aporte de potássio sobre a secreção é mediado por alterações na concentração plasmática de potássio, aumentando ou diminuindo a atividade da enzima sódio-potássio-ATPase da membrana baso-lateral. Além disso, a elevação dos níveis de potássio estimula a secreção de aldosterona, que aumenta a secreção de potássio.2,4 b) Fluxo de líquido tubular distal e concentração intracelular: se o fluxo é maior, aumenta a secreção de potássio.3 Porém, a secreção depende também da concentração intracelular de potássio: mesmo que haja um aumento de fluxo tubular, se a concentração intracelular de potássio for baixa, não há aumento em sua secreção.4,11 c) Aporte de sódio aos segmentos distais: como já mencionamos, a concentração de sódio intraluminal a esse nível pode potencialmente modificar o ritmo de secreção de potássio. A entrada de sódio pela membrana luminal das células principais diminui a negatividade intracelular, favorecendo a secreção de potássio. Com o aumento da concentração intracelular de sódio, aumenta também a atividade da sódio-potássio-ATPase baso-lateral, o que aumenta o potássio intracelular e aumenta sua secreção. Então, quando a concentração de sódio do TCD aumenta, a secreção de potássio também aumenta.12 Isto explica por que situações em que existe aumento da oferta de sódio às porções finais do túbulo distal (por exemplo, uso de diuréticos) podem levar a um déficit de potássio.3 Quando se remove o sódio do lúmen, a secreção de potássio diminui.12 d) Aldosterona: é um hormônio produzido pelas glândulas adrenais; influencia diretamente alguns dos principais determinantes da secreção de potássio, tais como concentração de potássio intracelular, permeabilidade da membrana luminal ao potássio e diferença de potencial transepitelial4 (v. adiante). e) Ânions não absorvíveis na luz tubular: o gradiente transepitelial distal é lúmen-negativo devido à contínua reabsorção ativa de sódio; a presença de ânions como bicarbonato, sulfato e fosfato ajuda a manter negativa a diferença de potencial elétrico entre luz e interstício, favorecendo a secreção de potássio. Quanto mais negativo o gradiente, maior é a secreção de potássio.3,4
f) Modificações agudas no estado ácido-básico: a alcalose aguda aumenta e a acidose aguda diminui a secreção de potássio. É possível que com elevações na concentração de íons H⫹ (acidose) haja diminuição da atividade da Na-K-ATPase das células, gerando acúmulo de potássio no extracelular. O pH ácido pode também aumentar a permeabilidade celular à saída de potássio. Nas células principais, isto ocasiona redução na secreção, sendo o resultado final uma retenção de potássio. Nas alcaloses, o movimento de potássio é do extracelular para o intracelular, levando à hipocalemia.3,4
Pontos-chave: • A principal forma de excreção do potássio é através de secreção nos segmentos mais distais do nefro • A excreção renal de potássio sofre a influência dos níveis plasmáticos do íon, aldosterona, fluxo tubular e estado ácidobásico
SISTEMAS HORMONAIS ATUANTES NA HOMEOSTASIA DO POTÁSSIO A regulação da concentração do potássio extra- e intracelular e da sua excreção pelo rim parece estar sob a influência de vários sistemas hormonais. E eles se inter-relacionam de maneira a garantir a existência de um mecanismo de segurança contra falhas. Se ocorrer elevação dos níveis de potássio, todo o sistema é acionado, procurando reduzir sua concentração.
Insulina A insulina provoca a entrada de potássio para dentro das células, de modo independente de sua ação sobre o metabolismo da glicose.3 Este efeito se deve à capacidade da insulina de ativar a Na-K-ATPase, aumentando a concentração intracelular de potássio e diminuindo a de sódio. A interação insulina-receptor também ativa um contratransportador Na⫹-H⫹, que resulta em entrada de sódio na célula e que estimula ainda mais a NaK-ATPase, com os efeitos já descritos. Além disso, a hipercalemia aguda estimula a liberação de insulina pelo pâncreas.3,13 Há muito tempo já se reconhecia que a administração de glicose reduzia a concentração de potássio no plasma e na urina. Hoje, sabe-se que a insulina liberada pela hiperglicemia promove a transferência de potássio para muitos
196
Metabolismo do Potássio
tecidos, sobretudo fígado e músculo esquelético. Esta capacidade da insulina em transferir potássio para dentro das células pode ser clinicamente observada durante o tratamento da cetoacidose diabética e tem uma extraordinária importância prática na terapêutica da hipercalemia.13,14 Uma discreta hipercalemia num indivíduo normal é acompanhada de uma liberação de insulina. Isto faz pressupor que um indivíduo com deficiência de insulina seria mais propenso a desenvolver hipercalemia. Porém, os mecanismos de defesa contra uma hipercalemia não dependem só da insulina, mas também de aldosterona, a qual tem uma ação mais retardada. A implicação prática desta inter-relação é a propensão de pacientes diabéticos a desenvolverem hipercalemia quando recebem uma droga que interfere com a ação da aldosterona, tipo triamterene.14,15 Assim como a alteração no metabolismo dos carboidratos provoca mudanças no metabolismo do potássio, o inverso é também verdadeiro. Há evidências na literatura de que uma deficiência de potássio compromete o metabolismo dos carboidratos. Demonstrou-se que o uso de diuréticos tiazídicos, em pacientes com curva anormal de tolerância à glicose, era capaz de causar diabetes mellitus sintomático.14,16 Esta intolerância à glicose que se desenvolve em pacientes que recebem tiazídicos pode ser corrigida com suplementação de potássio. A implicação prática é de que uma intolerância aos carboidratos clinicamente importante associada a diuréticos ocorre mais provavelmente em pacientes diabéticos ou com diabetes mellitus latente. Talvez pela deficiência de insulina, pode não haver hipocalemia, o que pode levar o médico a não suspeitar de um déficit de potássio.
do pâncreas. A insulina, por sua vez, causa a entrada de potássio nas células. Com a estimulação -adrenérgica há passagem de potássio para dentro das células do músculo esquelético. As implicações são as seguintes:14 1.º) Alguns agentes que possuem atividade estimuladora de receptor -adrenérgico podem ser úteis no tratamento da hipercalemia aguda; 2.º) Agentes -bloqueadores como o propranolol, que evitam a entrada de potássio no músculo esquelético, podem ser úteis em estados hipocalêmicos nos quais a entrada de potássio no músculo está acelerada. Exemplo: paralisia periódica. 3.º) Pacientes que recebem -bloqueadores podem desenvolver hipercalemia, pelo menos em cinco situações: deficiência de insulina, insuficiência renal, exercício, administração de KCl e quando ingerem simultaneamente drogas que interferem com a ação da aldosterona, tipo espironolactona. A infusão endovenosa de epinefrina ou nor-epinefrina pode causar uma hipercalemia aguda transitória que parece ocorrer por liberação de potássio do fígado.18 A epinefrina aumenta a produção de glucagon pelas células alfa do pâncreas e estimula a produção de glicose pelo fígado. Ambos os mecanismos podem estimular a liberação de insulina, a qual, como já mencionamos, é capaz de reduzir o potássio plasmático. A estimulação α-adrenérgica causa efeitos opostos, podendo originar hipercalemia pela saída de potássio das células e inibição da liberação de insulina pelo pâncreas.12
Hormônios Adrenocorticais Glucagon A administração de doses farmacológicas de glucagon pode causar hiperglicemia e hipercalemia agudas. O glucagon tem efeito glicogenolítico potente, responsável pela hiperglicemia. A hipercalemia é proveniente da liberação de potássio pelo fígado.17
Catecolaminas Os efeitos das catecolaminas na concentração de potássio do espaço extracelular são complexos e dependem do tipo de receptor estimulado. Os estímulos aos receptores 2-adrenérgicos estimulam o movimento de potássio para dentro das células, provavelmente via Na-K-ATPase, podendo causar hipocalemia.3,13 Este mecanismo pode envolver um aumento no AMP cíclico e, como resultado, fosforilação e ativação da sódio-potássio-ATPase. As catecolaminas também podem atuar de modo indireto, estimulando a glicogenólise, que leva a hiperglicemia e liberação de insulina pelas células β
A aldosterona é um dos mais potentes mineralocorticóides naturais e tem uma participação importantíssima na regulação da quantidade de sódio e potássio no organismo. Este hormônio, atuando nos túbulos renais, aumenta a reabsorção de sódio e a secreção de potássio. Embora as ações sejam opostas, o balanço de sódio permanece estável, mesmo quando a ingesta de potássio varia muito, e vice-versa. Um aumento de 0,3 mEq/L na concentração de potássio é suficiente para produzir um aumento significativo na secreção de aldosterona.19,20 A administração de potássio aumenta a secreção de aldosterona, ao passo que a depleção a diminui. Além dos níveis de potássio, outro fator de estímulo à síntese de aldosterona pelas adrenais são os níveis de angiotensina II. A depleção de volume ou de sódio ativa a secreção de renina pelas células dos aparelhos justaglomerulares dos rins. A renina age sobre um substrato plasmático chamado angiotensinogênio, convertendo-o em angiotensina I, o qual, sob o efeito da enzima conversora no pulmão, converte-se em angiotensina II. Esta estimula a secreção de
197
capítulo 12
aldosterona, que causa secreção tubular de potássio e reabsorção de sódio, restaurando a volemia, a qual inibe o estímulo inicial para produção de renina. Como se pode observar, estes fatores não atuam isoladamente, e o conjunto recebe o nome de sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA).2,13 Uma concentração elevada de potássio estimula a secreção de aldosterona, a qual, atuando nos túbulos renais, aumenta a excreção de potássio, normalizando o potássio plasmático. Quando a concentração de potássio plasmático cai, desaparece o estímulo para secreção de aldosterona, completando-se um sistema fechado de controle retrógrado. Simultaneamente, o potássio plasmático elevado inibe diretamente a secreção de renina e vice-versa.
COMO AGE A ALDOSTERONA? Estudos mostram que a aldosterona e os mineralocorticóides atuam no túbulo coletor cortical e não no túbulo contornado distal, como se pensava anteriormente. Acredita-se que a aldosterona entra na célula pelo lado sanguíneo e se liga a um receptor de proteína no citoplasma, o qual se une com o núcleo para promover síntese protéica. As proteínas assim sintetizadas poderiam aumentar a permeabilidade da membrana plasmática apical ao sódio, aumentando o aporte de sódio para o lado sanguíneo da célula (local do transporte ativo). A bomba de sódio na face peritubular, estimulada pela maior síntese protéica, aumenta a extrusão de sódio da célula para o espaço extracelular. Este maior transporte de sódio determina um maior gradiente elétrico transtubular, criando condições para maior secreção de potássio.6 A entrada de potássio pela membrana peritubular em troca pelo sódio é mediada pela Na-K-ATPase. Cargas de potássio aumentam a atividade de Na-K-ATPase, independente da secreção de aldosterona.
Pontos-chave: • A insulina e os estímulos 2-adrenérgicos estimulam a captação do potássio pelas células • A aldosterona atua no túbulo coletor cortical, aumentando a reabsorção de sódio e a secreção de potássio
ADAPTAÇÃO A NÍVEIS ELEVADOS DE POTÁSSIO Atualmente, aceita-se a existência de um mecanismo de adaptação que explica a tolerância de animais a doses elevadas de potássio. Por exemplo, quando se administram por via endovenosa doses elevadas de potássio a animais submetidos a uma ingestão alta de potássio, há uma rápi-
da secreção urinária deste íon. Da mesma forma, na insuficiência renal crônica, os nefros remanescentes aumentam a sua capacidade de excretar potássio.21
Adaptação Renal ao Potássio Em vista do que mencionamos acima, concluímos que o rim tem uma capacidade intrínseca de responder a uma carga de potássio, excretando mais potássio na urina. O mecanismo responsável por esta secreção elevada de potássio reside na atividade das células do nefro distal, já abordada anteriormente. São um pouco contraditórios os dados experimentais com relação ao local no nefro responsável pela adaptação ao potássio. Parece não haver dúvida de que o túbulo distal tem um papel crítico na secreção de potássio, mas a participação do sistema coletor não está definida. Wright e cols., por exemplo, mostraram que, em ratos submetidos à ingestão crônica de potássio, só o túbulo distal era responsável pela excreção elevada de potássio. No entanto, se os animais não recebiam sódio, o sistema coletor contribuía significativamente para a excreção de potássio. Estudos mostraram que o epitélio do sistema coletor é potencialmente capaz de secretar potássio.22
Adaptação Extra-renal ao Potássio Em situações de excesso de potássio, outros órgãos podem contribuir para a homeostase do potássio. Há várias evidências de que a aldosterona age em outros tecidos de modo semelhante ao observado nos túbulos renais.3 Por exemplo, o cólon pode aumentar a excreção de potássio, num mecanismo mediado pela aldosterona. No tecido muscular, a aldosterona parece deslocar o potássio para o intracelular.3 Experimentalmente, a entrada de potássio nas células é maior em animais submetidos à ingestão elevada crônica de potássio (e presumivelmente com níveis elevados de aldosterona), do que em animais submetidos a uma ingesta normal de potássio.23 As inter-relações potássio-insulina-glucagon e catecolaminas já foram analisadas nas páginas precedentes.
PAPEL DO BALANÇO ÁCIDO-BÁSICO Existe evidência de que a produção de amônia está intimamente relacionada com a homeostase do potássio.24,25 Assim, durante uma depleção de potássio, há um aumento na excreção de amônio (NH4⫹), possivelmente devido a um aumento na produção renal de amônia (NH3). Simultaneamente, observa-se um aumento no pH urinário, o que levou alguns autores a postular a possível coexistência de um defeito no gradiente de hidrogênio.
198
Metabolismo do Potássio
Existe um pouco de controvérsia quanto ao distúrbio ácido-básico que uma depleção de potássio produz. Alguns investigadores demonstraram que, no cão, a depleção de potássio causa acidose sistêmica, e esta seria responsável pela produção aumentada de amônia.26 Já no rato, ocorre alcalose metabólica e no homem não há alteração ou ocorre discreta alcalose metabólica. Em vista desta discrepância, acredita-se, no momento, que não é o estado ácidobásico sistêmico que influi sobre a produção de amônia e pH urinário.24 Em face de um excesso de potássio, ocorre uma diminuição na excreção de amônio. O metabolismo do sódio parece estar intimamente relacionado com a homeostase potássio/ácido-básico. A inter-relação, embora ainda controvertida, seria da seguinte maneira:19 A depleção de potássio aumenta a atividade da renina plasmática e diminui a secreção de aldosterona. Parece também resultar num aumento da reabsorção de sódio no nefro proximal e numa diminuição da reabsorção do nefro distal.27 É provável que a diminuição da reabsorção de sódio no nefro distal seja mediada pela diminuição na secreção de aldosterona. Um excesso de potássio diminui a atividade da renina e estimula a secreção de aldosterona. Além disto, diminui a reabsorção proximal de sódio e estimula a sua reabsorção distal. O aumento da secreção de aldosterona contribui para a reabsorção distal elevada de sódio. Estes ajustes na reabsorção de sódio servem para manter a homeostase do sódio e do potássio quando a ingesta de potássio é modificada. Assim, na presença de um déficit de potássio, como há um aumento na reabsorção proximal de sódio, menos sódio chega ao nefro distal, onde normalmente ocorre a troca Na⫹-K⫹, e como a secreção de aldosterona também está diminuída, a reabsorção distal de sódio também é reduzida. Assim, o balanço de sódio é mantido, enquanto a excreção de potássio é diminuída. Quando há um excesso de potássio, ocorre o inverso. Várias observações indicam que a reabsorção de sódio também influencia a excreção de hidrogênio no nefro distal.28 Acredita-se que a produção de amônia possa minimizar as alterações ácido-básicas quando a reabsorção de sódio é modificada. Se existe menos amônia para tamponar o H⫹ no lúmen, o pH urinário cai muito, elevando o gradiente transtubular para a secreção de H⫹ e, portanto, diminuindo a excreção de ácido.24 Na presença de uma depleção de potássio, há uma diminuição na reabsorção distal de sódio e um aumento na produção de amônia. A amônia tampona o H⫹ no lúmen, transformando-se em amônio (NH4⫹). Com isto, o pH no lúmen não cai muito e, por conseguinte, o gradiente transtubular para a secreção de H⫹ também não é muito grande, e logo a excreção de ácido não é reduzida. Portanto, o papel da amônia é manter a excreção de ácido na vigência
de uma diminuição na reabsorção distal de sódio, a qual, como mencionamos anteriormente, se acompanha de uma diminuição na excreção de ácido.24 Uma das implicações práticas do aumento na produção de amônio foi dada em 1963. É clássico o conceito de que hipocalemia pode precipitar coma hepático. Como em pacientes cirróticos muitas vezes se administram diuréticos, estes podem causar hipocalemia, a qual aumenta a produção de amônia, e o paciente com disfunção hepática pode ser incapaz de metabolizar a amônia, predispondose à instalação de coma hepático.29 A secreção de K⫹ e H⫹ depende muito da concentração intracelular destes íons. Por exemplo, numa alcalose aguda (respiratória ou metabólica), o potássio passa do líquido extracelular para o interior das células, e, numa acidose (respiratória ou metabólica), o potássio sai das células. O mecanismo deste movimento transcelular não está bem esclarecido. Portanto, na alcalose, a concentração intracelular de potássio aumenta (inclusive na célula tubular renal), e mais potássio está disponível para excreção. Na acidose, ocorre o contrário. Uma alcalose sistêmica aumenta a perda urinária de potássio, enquanto uma acidose sistêmica diminui a excreção renal de potássio. Mas, na verdade, o potássio e o hidrogênio não competem pela secreção, e os dados experimentais mostram que, enquanto a secreção de hidrogênio aumenta, a de potássio também aumenta, e vice-versa.12
HOMEOSTASIA DO POTÁSSIO NA INSUFICIÊNCIA RENAL A manutenção do balanço de potássio, durante a instalação de insuficiência renal crônica, reflete a participação progressiva de mecanismos de adaptação.30 A concentração plasmática de potássio aumenta apenas na fase terminal da insuficiência renal crônica. Isto implica que, à medida que cai o ritmo de filtração glomerular, a fração do potássio filtrado também aumenta. Bank e cols. demonstraram que, em ratos com insuficiência renal causada por nefrectomia subtotal, não havia alteração na fração de reabsorção de potássio ao longo do túbulo distal (quando comparados com o grupo-controle), mas aumentava muito a secreção de potássio no ducto coletor.31 Tanto na insuficiência renal como na ingestão crônica de potássio, a adaptação renal resulta de um aumento de atividade da Na-K-ATPase.
Papel do Sistema Renina-Angiotensina-Aldosterona A aldosterona é um estimulador potente da secreção tubular de potássio. A evidência baseada em dados experimentais é de que uma produção elevada de aldosterona
199
capítulo 12
não é indispensável para a manutenção do equilíbrio de potássio na uremia. Vários autores mostraram que a concentração plasmática de aldosterona na insuficiência renal terminal é normal, desde que a renina e o potássio plasmático estejam dentro do normal. Quando aumenta a concentração plasmática de potássio e/ou renina, aumenta a concentração de aldosterona.32 A conclusão é de que há necessidade, pelo menos, de níveis normais de aldosterona, pois se uma insuficiência renal se complica com hipoaldosteronismo, ocorre hipercalemia.33
Excreção Gastrintestinal de Potássio Normalmente, a quantidade de potássio excretada nas fezes representa uma quantidade pequena da ingesta diária. No entanto, o intestino é potencialmente uma fonte de perda de potássio, como ocorre nas diarréias. Estudos em indivíduos normais e urêmicos, numa dieta normal de potássio, mostraram que, enquanto nos indivíduos normais a excreção fecal era de 12% da ingesta, em urêmicos era de 34%.34 Tem sido sugerido que o mecanismo da excreção intestinal aumentada de potássio seja mediado pela aldosterona.
Como alguns diuréticos inibem a reabsorção proximal de sódio, uma maior quantidade de sódio chega ao nefro distal, e postulou-se inicialmente que a caliurese que ocorria com estes diuréticos era resultado da maior concentração intraluminal de sódio no túbulo distal cortical. Atualmente, não se acredita que esta concentração intraluminal de sódio limite a secreção de potássio (apenas potencialmente, como já foi frisado). Mas há evidência de que, no sistema coletor (cortical e medular), a concentração intraluminal de sódio limita a secreção de potássio. Assim, um aumento da oferta de sódio ao sistema coletor aumenta a secreção de potássio (v. também Cap. 43).
DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DO POTÁSSIO Depleção de Potássio (Hipocalemia) Refere-se a uma diminuição do potássio total em relação à capacidade do potássio ou resultado de uma distribuição transcelular e traduz-se habitualmente por uma redução na sua concentração plasmática (hipocalemia ⬍ 3,5 mEq/L). A alcalose é a causa mais comum de alteração na distribuição transcelular. Um déficit real de potássio resulta geralmente de perdas gastrintestinais ou renais.
Tolerância Celular ao Potássio Quando se administra potássio a urêmicos, o potássio sérico aumenta muito mais do que em pacientes normais. Isto indica que a tolerância celular ao potássio diminui na insuficiência renal. Conclui-se, portanto, que um mecanismo de adaptação renal existe em indivíduos normais e urêmicos, mas um mecanismo de adaptação extra-renal só existe em normais.30
Ponto-chave: • Na insuficiência renal, existe uma adaptação aos níveis elevados de potássio, com aumento da excreção renal e intestinal frente a cargas de potássio, pela ação da aldosterona
CAUSAS DE HIPOCALEMIA A depleção a que nos referimos é a que se deve à perda do íon K⫹ e não pela redução da massa celular (capacidade do potássio). Isto pode ocorrer durante um período de ingesta reduzida de potássio, não compensada por uma redução na excreção de potássio. Isto não é freqüente, pois quando a ingesta diminui por letargia, anorexia, coma etc., a excreção também diminui. Portanto, depleção de potássio por falta de ingesta só ocorre se os rins forem impedidos de conservar potássio. A causa mais comum de depleção de potássio é uma perda elevada de potássio do corpo. Como a perda de potássio pela pele é desprezível (a não ser em sudorese profusa), restam o rim e o trato gastrintestinal como vias importantes na perda de potássio.
Desvio Transcelular ou Redistribuição
AÇÃO DOS DIURÉTICOS Como já mencionamos, um dos fatores determinantes do ritmo de secreção distal de potássio é o fluxo de urina pelo segmento do nefro. Portanto, quanto maior o fluxo de urina pelo túbulo distal cortical, maior é a excreção de potássio. E os diuréticos são agentes que aumentam o fluxo de urina.12
Apenas uma pequena fração do potássio corporal total está localizada no espaço extracelular, e pequenos desvios para o intracelular produzem grandes variações na concentração plasmática de potássio.35 Estes desvios podem ser causados por: a) Alterações do estado ácido-básico: na alcalose metabólica ou respiratória, íons hidrogênio saem das células para minimizar as mudanças no pH do extracelular. A necessidade de manter a eletroneutralidade entre os
200
Metabolismo do Potássio
compartimentos leva à entrada de potássio nas células. Este efeito produz um aumento de 0,6 mEq/L no potássio do extracelular para cada 0,1 unidade de pH que cai, no caso da alcalose metabólica, e 0,1 mEq/L no caso de alcalose respiratória.36 b) Ação da insulina: como já comentado anteriormente, a insulina promove a entrada de potássio nas células musculares e hepáticas, reduzindo os níveis plasmáticos. Este efeito pode ser observado após a administração de insulina na hiperglicemia grave ou na cetoacidose diabética.36 c) Infusão de glicose: a concentração plasmática de potássio diminui com a administração de glicose, por mecanismo similar à insulina.36 d) Atividade -adrenérgica: a estimulação de receptores 2adrenérgicos promove a entrada de potássio nas células. Então, hipocalemia transitória pode ser observada em situações em que há liberação de epinefrina, como, por exemplo, intoxicação por teofilina e isquemia coronariana. A infusão de aminas vasoativas também pode provocar este efeito, que pode ser utilizado terapeuticamente na hipercalemia: a administração de um agonista adrenérgico (como a terbutalina e o albuterol) reduz os níveis de potássio em cerca de 0,5-1 mEq/L.36 e) Paralisia periódica hipocalêmica: um raro distúrbio caracterizado por ataques recorrentes de paralisia flácida desde a infância, acompanhados de hipocalemia devido a uma redistribuição do potássio para o interior das células.36,37 f) Envenenamento pelo bário (carbonato de bário): pode produzir paralisia flácida e hipocalemia devido a um bloqueio dos canais de potássio na membrana, que normalmente permitem a passagem de potássio para o extracelular. O sulfato de bário utilizado em exames radiográficos não acarreta risco para os pacientes.36 g) Tratamento de anemias graves: resulta em rápida assimilação do potássio para dentro das hemácias que estão sendo produzidas, levando a hipocalemia. Este efeito habitualmente é observado dois dias após o início do tratamento da anemia.35 h) Outras causas: hipotermia, intoxicação por teofilina, cloroquina.35,36
Perdas Gastrintestinais As principais causas gastrintestinais de hipocalemia estão enumeradas no Quadro 12.2. a) Aporte dietético insuficiente: pode ocorrer em pacientes idosos e etilistas, em que a ingesta de potássio é inadequada, e em pacientes em fase de rápida síntese celular, como os submetidos a hiperalimentação. b) Diarréias: normalmente, a excreção de potássio para um volume fecal habitual de 200 ml não excede 10 mEq/dia, mas pode elevar-se muito em certas situações, como nas diarréias agudas ou crônicas e abuso de laxativos. As
hipocalemias causadas pelas diarréias podem cursar também com acidose metabólica pela perda de bicarbonato. A acidose provoca um desvio iônico que mesmo em vigência de hipocalemia provoca a saída de potássio de dentro das células, mascarando os níveis plasmáticos de potássio. Normalmente, a resposta à perda de potássio pelo intestino é a conservação renal de potássio, através da diminuição de sua secreção tubular. Porém, esta resposta sofre um efeito antagônico: como a diarréia provoca depleção de sódio e hipovolemia, e estas ocasionam maior produção de aldosterona, a secreção de potássio pode estar elevada.3 c) Ureterossigmoidostomia: resulta em absorção anormal de cloreto de sódio em associação com secreção de potássio e bicarbonato para a luz da alça intestinal. Causa também acidose metabólica do tipo hiperclorêmica.37 d) Vômitos: o teor de potássio no suco gástrico não é elevado, mas os vômitos ou a drenagem nasogástrica podem ocasionar hipocalemia. Isto se deve mais à perda de ácido clorídrico do que à perda de potássio.3,38 A perda de ácido leva à alcalose metabólica, a qual produz um desvio iônico de potássio para dentro das células e secreção de potássio pelas células tubulares distais. Também está ativo o sistema renina-angiotensina-aldosterona, pela perda de água e sódio, o que acelera a perda de potássio pelos rins.3
Perdas Renais Já apresentamos, nas páginas precedentes, muita evidência da importância do rim como via final de controle da homeostase do potássio. Muitas vezes, a resposta renal é apropriada pela interferência dos mecanismos de controle do balanço de potássio. Outras vezes, a resposta renal indica uma nefropatia ou um distúrbio na ação dos mecanismos de controle, como ocorre, por exemplo, com o uso de diuréticos. a) Diuréticos: o uso de diuréticos é, talvez, a causa mais freqüente de hipocalemia na prática clínica. Todos os diuréticos provocam excreção de potássio, exceto os chamados poupadores de potássio (v. Cap. 43 para maiores informações). Os tiazídicos causam maior perda de potássio porque aumentam o fluxo de urina pelos segmentos corticais do nefro distal, além de, em parte, serem inibidores da anidrase carbônica.12 O furosemide e o ácido etacrínico inibem a reabsorção ativa de cloro no ramo ascendente da alça de Henle, responsável provável pela reabsorção passiva de potássio neste segmento. Ademais, além de produzirem um maior fluxo de urina, estes agentes parecem inibir a reabsorção proximal de potássio, promovendo caliurese.12 Os inibidores da anidrase carbônica, tipo acetazolamida, não afetam o transporte proximal de potássio mas
capítulo 12
aumentam a secreção de potássio no nefro distal. O mecanismo parece ser duplo: a inibição da secreção de H⫹ no nefro distal causa hiperpolarização transtubular, que é uma força para o movimento passivo do potássio da célula para a urina. Além disto, como estes agentes inibem a reabsorção proximal de bicarbonato, mais bicarbonato chega ao nefro distal e, sendo ele pouco reabsorvível, induz um aumento do fluxo de urina, como fazem outros agentes.12 Algumas drogas utilizadas na prática clínica, como a anfotericina e a carbenicilina, também aumentam a perda de potássio. Os diuréticos osmóticos, tipo manitol, também aceleram a excreção de potássio por elevarem o fluxo de líquido tubular no nefro distal. b) Hiperaldosteronismo: a produção excessiva de aldosterona por um tumor ou hiperplasia adrenais (hiperaldosteronismo primário) ou por hipovolemia e hipoperfusão renal (hiperaldosteronismo secundário) determina um aumento na excreção de potássio pelos mecanismos já abordados anteriormente, com conseqüente hipocalemia. O mesmo ocorre com a estenose de artéria renal.38 O alcaçuz (Glycyrrhiza glabra, elemento utilizado na fabricação de laxantes, indústria de doces, tabaco e cervejarias) contém um esteróide, o ácido glicirrízico, o qual inibe uma enzima que converte o cortisol em cortisona. Desta forma o cortisol em níveis elevados induz um aumento na atividade mineralocorticóide.38 c) Alterações tubulares: como as estruturas tubulares do nefro distal excretam a maior parte do potássio ingerido, é fácil compreender que alterações tubulares podem levar a uma excreção excessiva de potássio. Exemplos: acidose tubular renal, síndrome de Fanconi, pielonefrite, fase poliúrica da necrose tubular aguda, etc. d) Alterações genéticas: a síndrome de Bartter é uma desordem rara que se manifesta na infância e cursa com hipocalemia, alcalose metabólica, hiper-reninemia, hiperaldosteronismo, hiperplasia do aparelho justaglomerular e, algumas vezes, hipomagnesemia. São comuns poliúria, polidipsia, hipercalciúria. Mais rara é a ocorrência de hipomagnesemia. Também existe aumento na liberação renal de prostaglandinas vasodilatadoras, o que pode explicar a pressão arterial normal. Resulta de anormalidades na função tubular, primariamente no transporte de cloreto de sódio na porção espessa da alça de Henle. Com isso, ocorre uma discreta depleção de volume, que ativa o sistema renina-angiotensina-aldosterona. A combinação de hiperaldosteronismo e aumento do fluxo distal (pelo defeito reabsortivo) aumenta a secreção de potássio e hidrogênio nos túbulos coletores, levando a hipocalemia e alcalose metabólica.36 A síndrome de Gitelman cursa com os mesmos achados da síndrome de Bartter, porém o defeito é no cotransportador sódio-potássio do segmento inicial do túbulo distal.3 Nesta síndrome, perda de magnésio é
201
mais comum, e podem ocorrer tetania e fadiga. Geralmente é diagnosticada em crianças maiores ou adultos jovens.36 e) Ânions não reabsorvíveis: normalmente o gradiente elétrico negativo no túbulo coletor, gerado pela reabsorção de sódio, é equilibrado pela reabsorção de cloreto. Em algumas situações, o sódio chega ao nefro distal acompanhado de um ânion não reabsorvível (por exemplo, bicarbonato, penicilina). Nestes casos, parte do sódio será reabsorvida em troca com o potássio, aumentando sua excreção.36 f) Hipomagnesemia: uma grande parte dos pacientes com hipocalemia apresentam hipomagnesemia (por uso de diuréticos, diarréia). A hipomagnesemia induz à perda renal de potássio por mecanismos complexos. É comum encontrar hipomagnesemia em pacientes em que existe dificuldade para correção da hipocalemia; nestes casos, só se conseguirá corrigir o potássio após a reposição de magnésio.35,36 g) Anfotericina B: este medicamento modifica a permeabilidade celular através da interação com esteróis da membrana, promovendo secreção de potássio.36 h) Outras causas: gentamicina e cisplatina têm efeito tóxico direto sobre as células tubulares, induzindo à perda renal de potássio.35
Ponto-chave: • A hipocalemia (potássio ⬍ 3,5 mEq/L) pode ser causada por redistribuição, perdas gastrintestinais e renais
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Metabólicas A hipocalemia pode afetar o metabolismo protéico e gerar dificuldade em obter balanço nitrogenado positivo durante nutrição parenteral. Testes de tolerância à glicose podem estar alterados, possivelmente devido a uma menor resposta das células beta do pâncreas à glicose. Além disso, encontram-se comprometidas, também, a liberação de aldosterona e hormônio de crescimento.37
Cardiovasculares Ocorrem irregularidades do ritmo cardíaco, caracterizadas por batimentos ectópicos e alterações eletrocardiográficas: alargamento do QRS, depressão do segmento ST, diminuição de ondas T e, eventualmente, o aparecimento de ondas U após as ondas T (Fig. 12.7). Estas alterações refletem o impacto da hipocalemia sobre o potencial de membrana. A depleção de potássio também aumenta o risco de arritmias em pacientes recebendo digital. Estes pacientes costumam receber diuréticos e uma dieta pobre
202
Metabolismo do Potássio Complexo juncional
Via paracelular
Membrana basal
em sal, o que aumenta a propensão para um déficit de potássio. É relatada também a associação de hipocalemia com o desenvolvimento de hipotensão arterial ortostática pelos efeitos sobre o sistema nervoso autônomo e diminuição da resistência vascular sistêmica.37
Espaço intercelular lateral
Na⫹
K⫹
Na⫹
Neuromusculares
K⫹
Na⫹
Na⫹
Na⫹ K⫹
Na⫹
K⫹
Membrana apical Membrana basolateral
Fig. 12.5 Representação esquemática de células dos túbulos proximais. A via de transporte transcelular consiste nas membranas apical e basolateral. A via paracelular consiste nos complexos juncionais e espaços intercelulares laterais. (Baseado em: Brenner, .4)
0
Potencial de ação
Milivolts ⫺65
Os sinais e sintomas de depleção de potássio habitualmente não aparecem até que a deficiência seja significativa. A hipocalemia diminui a excitabilidade neuromuscular. Os sintomas podem ir desde apatia, fraqueza, parestesias, até tetania. Uma depleção grave causa fraqueza no músculo esquelético e, eventualmente, paralisia flácida. Uma das conseqüências da hipocalemia sobre o músculo esquelético é a rabdomiólise, por diminuição do fluxo sanguíneo para o músculo, redução dos depósitos de glicogênio e diminuição da sódio-potássio-ATPase e potencial de membrana.37 Em pacientes portadores de doença hepática grave a hipocalemia pode precipitar ou exacerbar a encefalopatia, aumentando a concentração de amônia no tecido cerebral e líquor.37
Limiar normal
Repouso
⫺90
NORMAL
Kⴙ ELEVADO
Kⴙ BAIXO
Caⴙⴙ ELEVADO
Caⴙⴙ BAIXO
Fig. 12.6 Efeitos do potássio e cálcio séricos nos potenciais de membrana. (Adaptado de Leaf, A.; Cotran, R.S.48)
Fig. 12.7 Alterações eletrocardiográficas seqüenciais na hipocalemia. (Modificado de Krupp, A.M.49 — gentileza do Dr. Olavo G. Ferreira da Silva Jr.)
203
capítulo 12
Digestivas Podem ocorrer sintomas digestivos, como náuseas e distensão abdominal e de alças intestinais (íleo paralítico).
Renais Como conseqüência da hipocalemia, os mecanismos de conservação de potássio encontram-se ativados, e a concentração urinária de potássio está diminuída. Além disso, vários estudos, no ser humano e em animais, demonstraram que a depleção de potássio está associada a uma vacuolização das células epiteliais tubulares, mais pronunciada no túbulo proximal, todavia também vista no túbulo contornado distal. Tudo indica que as lesões são reversíveis, pelo menos nas fases iniciais da depleção.39 Há uma sugestão na literatura, baseada em observações clínicas e experimentais, de que a depleção de potássio torna os indivíduos (e animais) suscetíveis à pielonefrite.40
Podem ocorrer ainda polidipsia por estímulo da sede e poliúria pela incapacidade de concentrar maximamente a urina, como um diabetes insípido nefrogênico. Aparentemente, a hipocalemia causa uma dificuldade de o ADH formar o segundo mensageiro, o AMP cíclico.37,38
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Naturalmente para se determinar a causa da hipocalemia devemos verificar se a mesma resulta de uma redistribuição do potássio ou representa realmente um déficit. As causas de alteração na distribuição (alcalose, insulina, aldosterona e drogas -adrenérgicas) já foram abordadas. Se a causa da hipocalemia não estiver na redistribuição do potássio, estaremos frente a um déficit real de potássio, e devemos determinar se a perda de potássio é renal ou extra-renal (Quadros 12.3 e 12.7). Pela própria história clínica podemos ter idéia da causa
Quadro 12.3 Diagnóstico diferencial de hipocalemia I - Perda extra-renal (K urinário ⬍ 20 mEq/dia) A. Ácido-básico normal 1. Ingesta inadequada a. anorexia nervosa b. dieta de chá c/torradas 2. Pele a. suor II - Perda renal (K urinário ⬎ 20 mEq/dia) A. Acidose metabólica 1. Acidose tubular renal a. distal (tipo I) b. proximal (tipo II) 2. Diamox 3. Cetoacidose diabética 4. Enterostomia ureteral a. ureterossigmoidostomia b. ureteroileostomia C. Alcalose metabólica Cloro urinário baixo (cloro urinário < 10 mEq/dia) Cloro urinário elevado (cloro urinário ⬎ 10 mEq/dia) Excesso de mineralocorticóide (hipertensão arterial) 앖 Aldosterona
Aldosterona N ou ↓
B. Acidose metabólica 1. Perdas gastrintestinais a. diarréia b. fístula c. adenoma viloso d. abuso de laxativos B. Ácido-básico variável 1. Síndrome de Fanconi 2. Fase diurética (NTA, pós-obstrução) 3. Nefrite intersticial 4. Leucemia 5. Antibióticos (penicilina, carbenicilina) 6. Depleção de magnésio a. adquirida b. perda renal hereditária 1. 2. 3. 4.
앗 Renina 1. Hiperaldosteronismo primário a. adenoma b. hiperplasia 앖 Renina 1. Hipertensão renovascular 2. Hipertensão maligna 3. Tumor secretor de renina
1. Excesso de corticosterona ou DOC 2. Alcaçuz 3. Síndrome de Liddle 4. Síndrome de Cushing 5. ACTH ectópico Outros 1. Diuréticos, síndrome de Bartter, depleção grave de K Modificado de Narins, R.G.; Heilig, C.W.; Kupin, W.L.41
Vômitos ou perda gástrica Diuréticos Pós-hipercapnia Diarréia perdedora de Cl (congênita)
204
Metabolismo do Potássio
do distúrbio, porém alguns dados laboratoriais além da dosagem do potássio plasmático podem fornecer significativas informações. Por exemplo, a dosagem do potássio em urina de 24 horas pode auxiliar a determinar se a causa da hipocalemia é uma perda urinária ou não. Caso o potássio urinário esteja acima de 20 mEq/litro, suspeita-se de perda renal. Se menor que 20 mEq/litro, demonstra que a conservação renal de potássio está ocorrendo, e a causa da hipocalemia é extra-renal. A dosagem de potássio em amostra aleatória de urina pode ser usada, mas é menos precisa.36 Também a gasometria venosa, além de demonstrar a possibilidade de desvio iônico, pode evidenciar uma causa provável para o distúrbio: por exemplo, vômitos e síndrome de Bartter cursam com alcalose; alguns distúrbios tubulares renais e cetoacidose diabética cursam com acidose.
Ponto-chave: • Além da dosagem plasmática de potássio, auxiliam no diagnóstico de hipocalemia: Dosagem de potássio na urina Gasometria venosa
TRATAMENTO DA HIPOCALEMIA Está indicada a reposição de potássio para os pacientes que apresentem hipocalemia cuja causa não seja a redistribuição entre compartimentos.38 A hipocalemia é raramente uma emergência, e, sempre que possível, a via oral deverá ser empregada para reposição de soluções de potássio, preferencialmente sob a forma de cloreto.35 No Brasil, estão disponíveis as seguintes apresentações de cloreto de potássio: drágeas de 500 mg, drágeas de liberação lenta contendo 600 mg e xarope contendo 900 mg em 15 ml. Na prática, a correção de hipocalemia somente pela ingestão de alimentos com alto teor de potássio não é adequada. A via endovenosa só será utilizada se houver necessidade de uma administração mais rápida ou se o paciente não puder ingerir. A urgência na administração do potássio depende basicamente das repercussões cardíacas e neuromusculares. Pacientes com envolvimento muscular significativo ou alterações eletrocardiográficas deverão receber quantidades maiores e em menor tempo. A maior parte da literatura indica que não mais de 40 mEq de potássio devam ser colocados em cada litro de solução para uso endovenoso e que a administração não deve ser inferior a 60 minutos. Hamill sugere que a infusão de até 0,5 mEq/kg em uma hora é segura para pacientes gravemente doentes.42 Outros sugerem 0,75 mEq/kg ou 30 mEq/m2 em pessoas obesas durante 1 a 2 horas. As quantidades de potássio a serem administradas serão tanto maiores quanto maior a depleção, pois primeiramente
o potássio adentra as células e refaz os estoques intracelulares, para em seguida iniciar a normalização dos níveis no extracelular. É importante lembrar que a administração de potássio em solução que contenha glicose pode reduzir ainda mais os níveis de potássio; se for possível, a reposição inicial deve ser feita em solução salina isotônica.36 Numa hipocalemia grave (⬍ 2,0 mEq/L) e associada a arritmias cardíacas, até 80-100 mEq deverão ser administrados em 1 hora para suprimir a irritabilidade cardíaca. O fator limitante nestas altas doses é a dor no trajeto venoso durante a infusão. Uma solução para este problema seria a administração através de dois acessos periféricos, cada infusão contendo 40-50 mEq/L. Se houver problema de excesso de volume, podemos concentrar a solução, mas aí devemos utilizar uma veia de alto fluxo, como por exemplo uma veia femoral. A infusão de grandes quantidades através das veias subclávia, jugular ou através de cateter atrial não é recomendada, pois as altas concentrações intracardíacas de potássio podem causar arritmias. Sempre que for urgente a reposição de potássio, esta deverá ser efetuada sob controle eletrocardiográfico. No Brasil, a apresentação de cloreto de potássio mais utilizada para uso endovenoso é na concentração de 19,1%, onde cada ml tem 2,5 mEq de potássio e 2,5 mEq de cloro. Os riscos da utilização de potássio dependem da via de administração, idade e presença de co-morbidades, como por exemplo a insuficiência renal. Mesmo administrado por via oral, o potássio pode ocasionar parada cardíaca por hipercalemia, sendo este fato mais observado em pacientes idosos, pacientes com insuficiência renal, pacientes que recebem simultaneamente potássio por via oral e endovenosa e naqueles que recebem potássio e diuréticos poupadores de potássio.43 As drágeas de potássio para liberação entérica eventualmente provocam ulceração do intestino delgado. Já as preparações líquidas de potássio não têm bom paladar, mas raramente causam ulcerações intestinais.
CÁLCULO DO DÉFICIT DE POTÁSSIO Na ausência de um distúrbio ácido-básico, a magnitude do déficit pode ser calculada considerando-se a capacidade para potássio (massa muscular) do paciente44 (Quadro 12.4) ou utilizando-se as regras práticas já enumeradas. Portanto, se o potássio total pode ser estimado (considerando-se o peso e a massa muscular do paciente), podese calcular o déficit de potássio em mEq (v. exercícios adiante). Se desejarmos usar o potássio plasmático como guia da terapêutica, há necessidade de uma estimativa grosseira da influência do distúrbio ácido-básico na relação entre o potássio plasmático e o intracelular. Esta relação é exposta na Fig. 12.9, a qual indica a influência do pH sanguíneo na concentração do potássio plasmático sem que haja alteração no potássio total. Pode-se verificar que, para cada
205
capítulo 12
Quadro 12.4 Estimativa da capacidade do potássio Massa Muscular Normal Perda moderada Perda acentuada
Potássio Total (mEq/kg) Homens Mulheres 45 32 23
35 25 20
Modificado de Chapman, W.H. e col.44
Excesso de Potássio (Hipercalemia) O excesso de potássio é definido como um aumento na relação potássio total/capacidade de potássio ou devido a uma redistribuição transcelular e é geralmente identificado por um aumento da concentração plasmática acima dos valores normais (hipercalemia > 5 mEq/L).
CAUSAS DE HIPERCALEMIA alteração no pH de 0,1 unidade, ocorre uma alteração no potássio plasmático de 0,6 mEq/L. Portanto, tendo-se o pH, pode-se deduzir o potássio plasmático, como se não houvesse distúrbio ácido-básico (v. exercícios adiante).
REPOSIÇÃO DE POTÁSSIO EM ALGUMAS SITUAÇÕES ESPECIAIS Em pacientes não edemaciados e que desenvolvem hipocalemia durante a administração de diuréticos tiazídicos, pode-se normalizar o potássio plasmático administrando-se 60 mEq de cloreto de potássio por dia.43 Apenas alguns permanecem hipocalêmicos mesmo que se administrem 100 mEq por dia.45 A administração de diuréticos que poupam potássio normaliza o potássio plasmático durante a terapia com diuréticos tiazídicos ou de alça, mas a experiência clínica mostra que a administração de cloreto de potássio em quantidades suficientes tem o mesmo efeito. O bom senso atual indica que, em pacientes não edemaciados recebendo diuréticos de modo crônico, não há necessidade de administrar potássio profilaticamente. Nestes pacientes, recomenda-se um controle laboratorial a cada um ou dois meses e, se a concentração plasmática do potássio chegar a menos de 3 mEq/L, administra-se uma solução de potássio a 10% por via oral, proporcionandose 50-60 mEq por dia.43 A administração de sais de potássio ou diuréticos poupadores de potássio a pacientes edemaciados está particularmente indicada naqueles que recebem digital ou que são suscetíveis ao desenvolvimento de coma hepático. A administração diária de 40-80 mEq de uma solução de potássio é em geral suficiente. Se a administração de sais de potássio por via oral não corrige o déficit, podem-se empregar agentes bloqueadores da secreção de potássio no nefro distal. A espironolactona é eficiente, mas o custo é elevado e a terapia prolongada pode causar ginecomastia. O custo do triamterene é menor, mas ele já é menos eficiente. Em pacientes com alcalose metabólica e hipocalemia, a administração de sais de potássio, sob a forma de acetato, gluconato ou lactato, não corrige o déficit de potássio, a não ser que o déficit de cloro seja corrigido através da administração de cloreto de potássio ou através da administração simultânea de um destes sais de potássio e uma outra fonte de cloro (v. Cap. 11).
As situações que mais comumente resultam em hipercalemia são aquelas em que o rim não mais consegue excretar o potássio ingerido ou proveniente de uma liberação endógena. A capacidade de excreção renal do potássio é muito grande, e, em indivíduos normais, a ingestão excessiva de potássio não produz um excesso de potássio.
Pseudo-hipercalemia Refere-se à elevação da concentração sérica ou plasmática de potássio por movimento deste íon para fora das células durante ou após a coleta de sangue. Geralmente isto se relaciona a trauma durante a coleta, quando o garrote é mantido por muito tempo antes da punção venosa, ou quando há demora no processamento da amostra, resultando em liberação de potássio das hemácias por hemólise.36,46 Leucócitos acima de 100.000/mm3 ou plaquetas acima de 400.000/mm3 podem resultar em pseudo-hipercalemia, pois estas são células ricas em potássio, que pode ser liberado durante o processo de coagulação.36 O ECG pode ser útil na diferenciação entre a hipercalemia verdadeira e a factícia, pois alterações só ocorrem na hipercalemia verdadeira.
Redistribuição A entrada de íons hidrogênio em excesso pelas células, como ocorre nas acidoses, leva a um movimento de potássio para fora das células com o objetivo de manter a eletroneutralidade. Para cada 0,1 unidade de pH que cai, o potássio extracelular sobe 0,6 mEq/L. Uma liberação rápida de potássio pode ocorrer também em destruição celular maciça após cirurgia, trauma com esmagamento e lesão muscular (rabdomiólise), infecções extensas ou hemólise maciça.38 Estes quadros geralmente se acompanham de um comprometimento da função renal e conseqüente redução na excreção de potássio. Outras causas de hipercalemia por redistribuição seriam: uso de -bloqueadores, intoxicação digitálica, paralisia periódica familiar hipercalêmica, exercícios extenuantes e administração de succinilcolina.38
Insuficiência Renal Aguda Na insuficiência renal aguda, há uma redução importante na excreção do potássio, pois se estabelece um quadro de oligúria ou anúria, geralmente com destruição ce-
206
Metabolismo do Potássio
lular num paciente hipercatabólico, diminuindo a capacidade do potássio e lançando na circulação o potássio liberado das células. Hipercalemia em insuficiência renal crônica não é comum, por razões já abordadas nas páginas precedentes. Cumpre apenas salientar que vários estudos mostram que a secreção de potássio na insuficiência renal crônica está aumentada, talvez pelo maior aporte de sódio ao nefro distal. De modo geral, pacientes renais crônicos sem aporte excessivo de potássio podem manter-se sem hipercalemia enquanto o clearance de creatinina estiver acima de 5-10 ml/min.35
Insuficiência Adrenal Os principais estímulos fisiológicos para a liberação de aldosterona são a angiotensina II (gerada pela liberação de renina pelos rins) e a elevação do potássio plasmático. Deste modo, a hipercalemia por diminuição do efeito da aldosterona se deve geralmente a doença renal (prejudicando a secreção de renina), disfunção adrenal (alterando a liberação de aldosterona) ou resistência tubular à ação da aldosterona. Na insuficiência adrenal com hipoaldosteronismo, se o paciente ingere uma dieta adequada em sal, não ocorre hipercalemia, talvez porque, havendo uma oferta adequada de sódio ao nefro distal, haverá secreção de potássio, apesar do hipoaldosteronismo. A hipercalemia é mais freqüentemente observada na crise addisoniana, que depende de uma depleção de sódio.1 Existe uma situação chamada hipoaldosteronismo hiporreninêmico, que acomete principalmente idosos diabéticos com algum grau de insuficiência renal. Neles, a hipercalemia seria causada por uma baixa produção de renina devido à lesão de células justaglomerulares. Esta seria também uma explicação para o fato de que os pacientes diabéticos são mais suscetíveis a desenvolverem hipercalemia quando utilizam diuréticos poupadores de potássio. A heparina e inibidores da enzima conversora também podem suprimir a produção de aldosterona.
Pontos-chave: • A hipercalemia (potássio ⬎ 5,0 mEq/L) pode ocorrer por problemas durante a coleta ou por redistribuição, insuficiência adrenal e insuficiência renal • É raro ocorrer hipercalemia sem disfunção renal DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Ao se identificar uma hipercalemia, devemos diferenciar entre uma falsa determinação laboratorial (pseudohipercalemia), fenômeno de redistribuição e um aumento real do potássio total (Quadro 12.5). Mais uma vez, a his-
Quadro 12.5 Diagnóstico diferencial de hipercalemia I - Pseudo-hipercalemia 1. Hemólise 2. Trombocitose 3. Leucocitose II - Redistribuição 1. Acidose 2. Insulina 3. Bloqueio -adrenérgico 4. Infusão de arginina 5. Succinilcolina 6. Intoxicação digitálica (superdose) 7. Paralisia periódica III - Retenção de potássio RFG ⬍ 5 ml/min — 1. Oligoanúria 2. Carga de potássio a. exógena b. endógena — necrose tissular hemólise hipercatabolismo RFG ⬎ 20 ml/min 앗 Aldosterona
Diuréticos Poupadores (Retentores) de Potássio A utilização de espironolactona, amiloride e triamterene pode causar hipercalemia, sobretudo se empregados em pacientes com insuficiência renal. Como já mencionamos nas páginas precedentes, a administração de diuréticos poupadores de potássio a pacientes diabéticos os predispõe à hipercalemia.
Ureterojejunostomia O jejuno absorve o potássio existente na urina, provocando elevação dos níveis sanguíneos deste íon.
Outras Causas Trimetoprim, antiinflamatórios não-esteróides.
Aldosterona normal
1. Doença de Addison 2. Hipoaldosteronismo hiporreninêmico 3. Inibição de prostaglandina sintetase 1. Tubulopatias primárias a. Adquiridas — transplante renal — lúpus eritematoso — amilóide — anemia de células falciformes b. Hereditárias 2. Drogas a. espironolactona b. amiloride c. triamterene
Modificado de Narins, R.G.; Heilig, C.W.; Kupin, W.L.41
capítulo 12
207
tória clínica e a correlação com a gasometria arterial também são importantes na determinação correta da etiologia do distúrbio.41 (V. Quadro 12.8.)
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As manifestações clínicas podem estar ausentes, mas, quando ocorrem, são intensificadas pela presença concomitante de hiponatremia, hipocalcemia ou acidose. As manifestações neuromusculares são similares às da hipocalemia e as parestesias podem ser manifestações mais precoces. Outras manifestações neuromusculares são: fraqueza, arreflexia e paralisia muscular ou respiratória.
Neuromusculares
Fig. 12.8 Relação entre a concentração plasmática e o potássio total. (Obtido de Chapman, W.H. e cols.44)
A facilidade em gerar um potencial de ação (chamada excitabilidade de membrana) depende da magnitude do potencial de repouso e do estado de ativação dos canais de sódio da membrana. A abertura destes canais de sódio leva à difusão passiva de sódio do extracelular para o interior das células. De acordo com a equação de Nernst, o potencial de repouso depende da relação entre o potássio intra e extracelular. Uma elevação do potássio extracelular diminui esta relação e parcialmente despolariza a membrana das células musculares (torna o potencial de repouso menos eletronegativo). Entretanto, o efeito final no paciente é que a despolarização persistente inativa os canais de sódio da membrana, produzindo uma diminuição na excitabilidade, o que clinicamente se manifesta como alteração na condução cardíaca ou fraqueza e paralisia musculares. Pequenas são as repercussões sobre o sistema nervoso central.
Cardiovasculares As manifestações cardíacas são freqüentes quando a concentração plasmática do potássio ultrapassa 8,0 mEq/L. Elas são incomuns quando a concentração é inferior a 6,07,0 mEq/L. As repercussões cardíacas incluem: bradicardia, hipotensão, fibrilação ventricular e parada cardíaca. As manifestações eletrocardiográficas seqüenciais (v. Fig. 12.10) são: ondas T altas, pontiagudas nas derivações precordiais (devido à despolarização mais rápida); segmento ST deprimido; diminuição de amplitude das ondas R; prolongamento do intervalo PR, ondas P diminuídas ou ausentes e alargamento do complexo QRS com prolongamen-
Fig. 12.9 Relação entre o pH sanguíneo e a concentração plasmática de potássio. (Obtido de Chapman, W.H. e cols.44)
to do intervalo QT. Pode ocorrer a fusão de um complexo QRS com uma onda T, formando uma configuração ondulada ou sinusoidal. Arritmias ventriculares ou parada cardíaca podem ocorrer. Estas manifestações indicam grave risco de vida para o paciente. 37,38
Fig. 12.10 Alterações eletrocardiográficas seqüenciais na hipercalemia. (Modificado de Krupp, A.M.49 — gentileza do Dr. Olavo G. Ferreira da Silva Jr.)
208
Metabolismo do Potássio
Hormonais e Renais Em resposta à hipercalemia, há aumento da insulina e aldosterona, que efetuam mecanismos protetores, como entrada de potássio nas células e aumento da excreção através do túbulo distal. Se há número reduzido de nefros, há um sensível aumento na secreção de potássio pelo sistema coletor. Portanto, o sistema coletor sobressai como um importante órgão de reserva, colocado no final do nefro para impedir uma intoxicação de potássio no organismo.12
TRATAMENTO DA HIPERCALEMIA A primeira etapa é confirmar a dosagem de potássio com uma nova coleta, desta vez sem garrote. Como regra geral deve ser suspensa qualquer medicação que forneça ou retenha potássio.35 A forma de tratamento empregado (antagonizar os efeitos do potássio, desviar o potássio para dentro das células ou remover o potássio do organismo) depende da gravidade da hipercalemia refletida pela concentração plasmática de potássio e presença de alterações eletrocardiográficas. Portanto, toda vez que se identifica um paciente hipercalêmico, um eletrocardiograma deve ser obtido. Se o paciente apresentar potássio menor que 6,5 mEq/litro e sem alterações eletrocardiográficas, pode ser suficiente diminuir a ingesta e suspender as drogas que diminuam a excreção de potássio. Se houver alterações eletrocardiográficas ou se o potássio for maior que 6,5 mEq/L, medidas mais agressivas devem ser tomadas (Quadro 12.6).
potássio na célula muscular cardíaca. O aumento do cálcio no extracelular restaura a diferença normal entre o potencial de repouso e o limiar, tornando normal a excitabilidade. Sempre que o eletrocardiograma apresentar sinais de hipercalemia, o cálcio é a primeira droga a ser utilizada, pois sua ação é imediata. Seu uso é contra-indicado no paciente digitalizado, pois pode precipitar a intoxicação digitálica.36 Sob controle eletrocardiográfico, 10 a 20 ml de gluconato de cálcio a 10% são injetados lentamente na veia. Ao mesmo tempo, prepara-se uma solução de manutenção, contendo 500 ml de soro glicosado a 5% e 10 ml de gluconato de cálcio a 10%; esta solução deve ser infundida continuamente na veia, em velocidade suficiente para manter o eletrocardiograma normal. O cálcio não deve ser administrado em soluções contendo bicarbonato, pois ocorre precipitação de carbonato de cálcio.36
Bicarbonato de Sódio Desvia o potássio para dentro das células e é mais eficaz em pacientes que apresentam algum grau de acidose.36 O bicarbonato de sódio (50-100 mEq) pode ser administrado por via endovenosa em 15 a 30 minutos. Lembrar que cada grama de bicarbonato de sódio leva consigo 12 mEq de sódio, o que pode ser um fator limitante nos pacientes com excesso de volume extracelular. No Brasil, uma das apresentações disponíveis de bicarbonato de sódio é na concentração de 8,4%, onde 1 ml contém 1 mEq de bicarbonato e 1 mEq de sódio.
Agonistas -adrenérgicos Cálcio A administração endovenosa de cálcio não reduz o potássio plasmático, mas antagoniza os efeitos tóxicos do
A administração endovenosa ou inalatória destes agentes também provoca uma redistribuição do potássio para o intracelular. Estudos foram feitos com o uso de albute-
Quadro 12.6 Terapêutica da hipercalemia aguda Mecanismo
Dose
Início
Duração
Gluconato de cálcio 10%
Antagonismo de membrana
10-20 ml EV
1-3 min
30-60 min
Bicarbonato de sódio
Redistribuição
50-100 mEq EV
5-10 min
2h
Insulina e glicose
Redistribuição
20 U de insulina simples ⫹ 40 g de glicose EV em 1 hora
30 min
4-6 h
-agonistas inalatórios (Albuterol)
Redistribuição
10-20 mg
30 min
2h
Resina catiônica de troca (Kayexalate, Sorcal)
Remoção
20-50 g VO ou 100 g retal com sorbitol
1-2 h
4-6 h
Hemodiálise ou diálise peritoneal
Remoção
Minutos
Da diálise
209
capítulo 12
Quadro 12.7 Diagnóstico da hipocalemia HIPOCALEMIA Pseudo-hipocalemia
Redistribuição Depleção real de potássio
Perda extra-renal (potássio urinário ⬍ 20 mEq/L)
Perda renal (potássio urinário ⬎ 20 mEq/L) Pressão Arterial
Bicarbonato Baixo
Normal
Alto
Diarréias Fístulas intestinais baixas
Sudorese profusa
Diuréticos Vômitos Fístula gástrica
Normal
Elevada
Renina Plasmática Alta
Hipertensão: Maligna Renovascular Túbulo secretor renina
Bicarbonato
Baixa
Baixo
Aldosterona
Acidose Tubular Renal
Alta
Hiperaldosteronismo primário
Baixa S. de Cushing Mineralocorticóide Hiperpasia congênita de adrenais
Alto Cloreto Urinário
⬍ 10 mEq/dia Vômitos
⬎ 10 mEq/dia Diuréticos S. de Bartter Hipomagnesemia Hiperaldosteronismo com pressão normal Depleção extrema de potássio
Adaptado de Narins, R.G.; Heilig, C.W.; Kupin, W.L.41
rol, 10-20 mg por via inalatória em 4 ml de solução salina, ou 0,5 mg via endovenosa (no Brasil, o albuterol não é disponível). Também pode ser utilizada a epinefrina via endovenosa (0,05 g/kg/minuto). Deve ser lembrado que a absorção via inalatória é errática e a administração endovenosa é potencialmente arritmogênica. Outros efeitos incluem: taquicardia e angina de peito em indivíduos suscetíveis. Então, estes agentes devem ser evitados em pacientes com doença coronariana. Em pacientes renais crônicos, que muitas vezes têm doença coronariana subclínica, deve ser feita monitorização cuidadosa.36
Infusão de Glicose-Insulina Desvia o potássio para dentro das células, causando rápida redução do potássio plasmático. Pode-se utilizar 1 unidade de insulina para cada 2 g de glicose. Se o paciente não estiver alimentando-se e para evitar hipoglicemia, recomenda-se administrar 4 g de glicose para cada unida-
de de insulina. Costuma-se gotejar na veia 200 ml de soro glicosado a 20% com 20 unidades de insulina, durante 60 minutos. É necessária cuidadosa observação para sinais de hipoglicemia, como sonolência, sudorese, taquicardia.
Resinas de Troca As resinas de troca removem o potássio do organismo, mas atuam mais lentamente. As resinas são substâncias que, administradas por via oral ou retal, promovem a troca de sódio ou cálcio (dependendo da resina empregada) pelo potássio plasmático. Elas são capazes de remover 1 mEq de potássio por grama de resina. É importante lembrar que as resinas que trocam sódio por potássio (1,7 a 2,5 mEq de Na⫹/mEq de K⫹) podem acarretar um excesso de sódio no organismo e, conseqüentemente, determinar sobrecarga cardiovascular. No Brasil, a resina disponível é à base de poliestirenossulfonato de cálcio (Sorcal), apresentada em envelopes de 30 gramas.
210
Metabolismo do Potássio
Quadro 12.8 Diagnóstico da hipercalemia HIPERCALEMIA PSEUDO-HIPERCALEMIA
REDISTRIBUIÇÃO
Garrote Hemólise Leucocitose Trombocitose
Acidose Hiperglicemia Beta-bloqueadores Succinilcolina Intoxicação digitálica Paralisia periódica
EXCESSO REAL DE POTÁSSIO TFG ⬍ 10 ml/min
TFG ⬎ 20 ml/min
Oligúria de qualquer causa Aporte de potássio Exógeno Endógeno Hemólise Necrose de tecido Hipercatabolismo
Aldosterona normal ou alta
Aldosterona baixa
Renina plasmática baixa Hipoaldosteronismo hiporreninêmico Inibição da PG sintetase Ciclosporina
Renina plasmática normal ou alta
Desordens tubulares primárias Transplante renal Lúpus eritematoso Amiloidose Anemia falciforme Uropatia obstrutiva Drogas Espironolactona Triamterene Amiloride Trimetoprim
Doença de Addison Defeitos hereditários na síntese de aldosterona Heparina Inibidores da enzima conversora
Adaptado de Narins, R.G.; Heilig, C.W.; Kupin, W.L.41
Diálise Quando os métodos conservadores falham, o tratamento dialítico remove o potássio do organismo (v. Cap. 48).
apropriada para sintomas de sobrecarga de volume, uma vez que retém sódio ao mesmo tempo em que elimina potássio.
Mineralocorticóides A fludrocortisona é usada no tratamento dos pacientes com hipoaldosteronismo, porém com monitorização
Pontos-chave: • A hipercalemia é um distúrbio grave, principalmente por suas repercussões sobre a condução cardíaca • Eletrocardiograma sempre deve ser solicitado na hipercalemia • Os achados no ECG determinam a rapidez com que deve ser tratada a hipercalemia
EXERCÍCIOS 1) Um homem de 70 kg e sem perda aparente de massa muscular chega ao hospital após um quadro de gastroenterite, e a investigação laboratorial mostra um potássio plasmático de 2,8 mEq/L. Calcular o potássio total e a percentagem de déficit. 2) Um paciente chega ao hospital após três dias de vômitos e a investigação mostra um pH de 7,6 e um potássio plasmático de 3,0 mEq/L. Qual seria a concentração de potássio com pH de 7,4? 3) Um paciente etilista, com quadro de vômitos há três dias, vem ao pronto-socorro. Seu espaço extracelular está reduzido em 20%. Potássio = 2,3 mEq/L; pH de 7,52 e bicarbonato de 40 mEq/L. Que distúrbio de potássio apresenta e qual a causa? 4) Ao ser chamado(a) para avaliar uma paciente diabética, renal crônica, com potássio de 6,8, qual sua conduta? 5) Paciente de 27 anos, admitido na UTI em mal epiléptico após overdose de cocaína. pH ⫽ 6,9; bicarbonato ⫽ 12 mEq/L; potássio ⫽ 8,5 mEq/L.
capítulo 12
Urina acastanhada, positiva para hemoglobina. Enzimas musculares elevadas. Explique os motivos pelos quais este paciente apresenta hipocalemia e qual é o potássio real para um pH de 7,4.
23. 24. 25.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BLACK, D.A.K. Potassium metabolism. Cap. 4, p. 121. In: Clinical Disorders of Fluid and Electrolyte Metabolism. Eds. Maxwell, M.H. e Kleeman, C.R. McGraw-Hill Book Co., 1972. 2. GUYTON, A.C. and HALL, J.E. Integration of renal mechanisms for control of blood volume and extracelular fluid volume; and renal regulation of potassium, calcium, phosphate and magnesium. In: Textbook of Medical Physiology. Cap. 29, p. 367-383. W.B. Saunders Co., 1996. 3. SEGURO, A.C.; MALNIC, G.; ZATZ, R. Distúrbios do metabolismo do potássio. In: Fisiopatologia Renal, Ed. Zatz, R. Cap. 8, p. 123-150. Atheneu, 2000. 4. BRENNER, B.; COE, F.L.; RECTOR, F.C. Potassium Homeostasis. In: Renal Physiology in Health and Disease. Eds: Brenner, B.; Coe, F.L.; Rector, F.C. W.B. Saunders Co., 1987. 5. PATRICK, J. Assessment of body potassium stores. Kidney Int., 11(6):476, 1977. 6. BODDY, K. e cols. The relation between potassium in body fluids and total body potassium in healthy and diabetic subjects. Clin. Sci. Mol. Med., 49:385, 1975. 7. BLAHD, W.H. Radioisotope techniques, Cap. 15, p. 613. In: Clinical Disorders of Fluid and Electrolyte Metabolism. Eds. Maxwell, M.H. e Kleeman, C.R. McGraw-Hill Book Co., 1972. 8. SCRIBNER, B.H. e BURNELL, J.M. Interpretation of the serum potassium concentration. Metabolism, 5:468, 1956. 9. Symposium on Ion Channels. Kidney International, vol. 48, out. 1995. 10. JAMISON, R.L. e cols. Potassium secretion by the descending limb of pars recta of the juxtamedullary nephron in vivo. Kidney Int., 9:323, 1976. 11. KHURI, R.N. e col. Effects of flow rate and potassium intake on distal tubule potassium transfer. Am. J. Physiol., 228:1.249, 1975. 12. GRANTHAM, J.J. Renal transport and excretion of potassium. Cap. 8, p. 299. In: The Kidney. Eds. Brenner, B.M. e Rector Jr., F.C. W.B. Saunders Co., 1976. 13. HALPERIN, M.L.; GOLDSTEIN, M.B. Potassium Physiology. In: Fluid, Electrolyte and Acid-Base Physiology – A Problem-Based Approach. Cap. 9, p. 321-424. W.B. Saunders Co., 1994. 14. KNOCHEL, J.P. Role of glucoregulatory hormones in potassium homeostasis. Kidney Int., 11(6):443, 1977. 15. WALKER, B.R. e col. Hyperkalemia after triamterene in diabetic patients. Clin. Pharmacol. Ther., 13:643, 1972. 16. SHAPIRO, A.P. e cols. Effect of thiazides on carbohydrate metabolism in patients with hypertension. N. Engl. J. Med., 265:1028, 1961. 17. ELLIS, S. e BECKETTS, S.B. Mechanism of the potassium mobilizing action of epinephrine and glucagon. J. Pharmacol. Exp. Ther., 142:318, 1963. 18. CRAIG, A.B.J.R. e col. Blockade of hyperkalemia and hyperglycemia induced by epinephrine in frog liver and in cats. Am. J. Physiol., 197:52, 1959. 19. SEALEY, J.E. e LARAGH, J.H.A. Proposed cybernetic system for sodium and potassium homeostasis: Coordination of aldosterone and intrarenal physical factors. Kidney Int., 6:281, 1974. 20. BODY, J.E. e MULROW, P.J. Further studies of the influence of potassium upon aldosterone production in the rat. Endocrinology, 90:299, 1972. 21. SILVA, P. e cols. Adaptation to potassium. Kidney Int., 11(6):466, 1977. 22. WRIGHT, F.S. Relation of electrical potencial difference to potassium secretion by the distal renal tubule. Int. Congr. Physiol. Sci., 11:115, 1974.
26. 27. 28.
29.
30. 31. 32. 33. 34.
35.
36. 37.
38.
39.
40.
41.
42.
43.
44. 45. 46. 47.
48. 49.
211 ALEXANDER, E.A. e LEVINSKY, N.G. An extrarenal mechanism of potassium adaptation. J. Clin. Invest., 47:740, 1968. TANNER, R.L. Relationship of renal ammonia production and potassium homeostasis. Kidney Int., 11(6):453, 1977. PITTS, R.F. Control of renal production of ammonia. Kidney Int., 1:297, 1972. BURNELL, J.M. e col. Metabolic acidosis accompanying potassium deprivation. Am. J. Physiol., 227:329, 1974. BRANDIS, M. e cols. Potassium induced inhibition of proximal tubular fluid reabsorption in rats. Am. J. Physiol., 222:421, 1972. SCHWARTZ, W.B. e cols. Acidification of urine and increased ammonium excretion without change in acid-base equilibrium: sodium reabsorption as a stimulus to acidifying process. J. Clin. Invest., 34:673, 1955. BAERTL, J.M. e cols. Relation of acute potassium depletion to renal ammonium metabolism in patients with cirrhosis. J. Clin. Invest., 42:696, 1963. van YPERSELE de STRIHOU, C. Potassium homeostasis in renal failure. Kidney Int., 11(6):491, 1977. BANK, N. e AYNEDJIAN, H.S. A micropuncture study of potassium excretion by the remnant kidney. J. Clin. Invest., 52:1.480, 1973. WEIDMAN, P. e cols. Plasma aldosterone in terminal renal failure. Ann. Intern. Med., 78:13, 1973. GERSTEIN, A.R. e cols. Aldosterone deficiency in chronic renal failure. Nephron, 5:90, 1968. HAYES, C.P. e cols. An extrarenal mechanism of the maintenance of potassium balance in severe chronic renal failure. Trans. Assoc. Am. Physicians, 80:207, 1967. PRESTON, R.A. Hypokalemia and Hyperkalemia. In: Acid-Base, Fluids and Electrolytes Made Ridiculously Simple. Caps. 5 e 6, p. 77-96. Medmaster Inc. Miami, 1997. ROSE, B. Potassium. In:. Up to Date, vol. 9, n.1, 2000. GABOW, P.A.; PETERSON, L.N. Disorders of potassium metabolism. In: Renal and Electrolyte Disorders. Cap. 5, p. 231-285, Ed: Schrier, R.W. Little, Brown, 4th edition, 1992. ROSE, B.D.; RENNKE, H.G. Disorders of potassium balance. In: Renal Pathophysiology — the Essentials. Cap. 7, p. 169-190. Eds: Rose, B.D.; Rennke, H.G. Williams & Wilkins. SUKI, W.N. e EKNOYAN, G. Tubulo-interstitial disease. Cap. 25, p. 1.126. In: The Kidney. Eds. Brenner, B. M. and Rector Jr, F.C. W.B. Saunders Co., 1976. MUEHRCKE, R.C. e McMILLAN, J.C. The relationship of chronic pyelonephritis to chronic potassium deficiency. Ann. Intern. Med., 59:427, 1963. NARINS, R.G.; HEILIG, C.W.; KUPIN, W.L. The patient with hypokalemia or hyperkalemia. In: Manual of Nephrology, Cap. 3, p. 37-54. Ed.: Schrier, R.W. Little, Brown, 4th edition, 1995. HAMILL, R.J. Efficacy and safety of potassium infusion therapy in hypokalemia critically ill patients. Critical Care Medicine, 19(6):694, 1991. KASSIRER, J.P. e HARRINGTON, J.T. Diuretics and potassium metabolism: a reassessment of the need, effectiveness and safety of potassium therapy. Kidney Int., 11(6):505, 1977. CHAPMAN, W.H. e cols. The Urinary System. Cap. 4, p. 114. W.B. Saunders Co., 1973. SCHWARTZ, A.B. e SWARTZ, C.D. Dosage of potassium chloride elixir to correct thiazide-induced hypokalemia. JAMA, 230:702, 1974. BOEDEKER, E.C. e DAUBER, J.H. Manual of Medical Therapeutics. Cap. 2, p. 44, 21st edition. Little, Brown and Co., Boston, 1974. DeFRONZO, R.A.; SMITH, J.D. Disorders of potassium metabolism. In: Fluid, Electrolyte and Acid-Base Disorders, Eds: Arieff, A.I.; DeFronzo, R.A., Churchill Livingstone, 1995. LEAF, A.; COTRAN, R.S. Renal Pathophysiology, 2nd edition, New York, Oxford University Press, 1980. KRUPP, A.M. Fluid and electrolyte disorders. Ap. 2, pp. 13-30. In: Current Diagnosis and Treatment. Eds: Krupp, M.A. e Chatton, M.J. Lange Medical Publications, 1973. (Gentileza do Dr. Olavo G. Ferreira da Silva Jr.)
212
Metabolismo do Potássio
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.emedicine.com/emerg/topic273.htm — com exemplos de ECG. http://www.learndoctor.com/chapterpages/chapter22. htm — questões para self-assessment com respostas discutidas – Chris O’Callaghan e Barry Brenner. http://www.seaox.com/lz/lz20-b.html — exemplos de ECG em hipo- e hipercalemia. http://www.barttersite.com/hyper&hypoK.htm — página muito boa, com um artigo de revisão da Medical Clinics of North America de 1997. http://www.medinfo.ufl.edu/year2/clinmed/Nephrology/Potassium.PDF — artigo com bom resumo da clínica de hipo- e hipercalemia, inclusive com as alterações de ECG e potencial de ação.
RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS 1) Com a ajuda do Quadro 12.4, obtém-se: 45 mEq ⫻ 70 kg ⫽ 3.150 mEq. Como não há distúrbio ácido-básico, verificamos, na Fig. 12.8, que um potássio plasmático de 2,8 corresponde a um déficit de aproximadamente 13% do potássio total, ou seja, em torno de 400 mEq. 2) Na Fig. 12.9, verificamos que, se não houver alteração no potássio total, a concentração normal de potássio para um pH de 7,6 seria 3,0 mEq/L.
Isto significa que, se o pH fosse corrigido para 7,4, o potássio plasmático seria de 4,5 mEq/L. 3) Este paciente apresenta hipocalemia (potássio menor que 3,5 mEq/L), que provavelmente se deve à perda renal de potássio, uma vez que a depleção do espaço extracelular ativa o sistema renina-angiotensinaaldosterona, aumentando a excreção renal de potássio. Além disso, o bicarbonato age como um ânion pouco reabsorvível, carregando sódio para o túbulo coletor, o que também aumenta a secreção de potássio na luz tubular. A alcalose metabólica que este paciente apresenta pode ter ocasionado um desvio iônico de cerca de 0,6 mEq/L de potássio para o intracelular; seu potássio real deve ser em torno de 2,3 ⫹ 0,6 ⫽ 2,9 mEq/L. 4) Interromper qualquer administração de potássio. Obter um eletrocardiograma. A presença de ondas T apiculadas confirma a hipercalemia verdadeira. Neste caso, é necessária intervenção imediata para antagonizar os efeitos tóxicos do potássio sobre a fibra cardíaca (administrar cálcio EV). Prosseguir com as outras etapas de tratamento da hipercalemia: bicarbonato, glicose-insulina, agentes 2-adrenérgicos, resinas de troca e diálise. Afastar a possibilidade de redistribuição. Afastar a possibilidade de pseudo-hipercalemia. 5) Este paciente apresenta dados compatíveis com rabdomiólise, possivelmente decorrente das convulsões prolongadas. Além disso, apresenta acidose metabólica, que pode ter sido causada pelo metabolismo anaeróbio induzido pela hipoxemia e convulsões. O potássio dosado é de 8,5 para um pH de 6,9. O potássio real deste paciente para um pH de 7,4 é de 5,5. As causas da hipercalemia neste caso poderiam ser: redistribuição, pela acidose metabólica, e destruição de células musculares, principal reservatório de potássio no organismo. Devemos realizar um ECG imediatamente e tratar a hipercalemia de acordo com a seqüência já mencionada.
Capítulo
13
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio Marcelo Mazza do Nascimento, Miguel Carlos Riella e Marcos Alexandre Vieira
CÁLCIO
Introdução
Introdução
Causas
Homeostase do cálcio
Quadro clínico
Distribuição do cálcio
Diagnóstico
Absorção, excreção, balanço interno
Formas de apresentação
Fatores que regulam a homeostase do cálcio PTH e vitamina D
Hiperfosfatemia Introdução
Funções no organismo
Causas
Hipocalcemia
Pseudo-hiperfosfatemia
Definição
Quadro clínico
Causas de hipocalcemia
Tratamento
Diagnóstico Quadro clínico Tratamento Hipercalcemia
MAGNÉSIO Homeostase do magnésio Distribuição Unidades de medida
Definição
Absorção, excreção e balanço interno
Resposta adaptativa
Fatores que influenciam a excreção de magnésio
Causas de hipercalcemia Quadro clínico
Funções do magnésio no organismo Hipomagnesemia
Diagnóstico
Causas
Tratamento
Quadro clínico
FÓSFORO Introdução Homeostase do fósforo
Diagnóstico Tratamento Hipermagnesemia
Distribuição
Definição
Absorção, excreção e balanço interno
Causas de hipermagnesemia
Mecanismos de transporte
Quadro clínico
Fatores que regulam a excreção de fósforo Funções do fósforo no organismo Hipofosfatemia
Tratamento REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
214
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
CÁLCIO Introdução A manutenção da homeostase do cálcio é de fundamental importância, do ponto de vista fisiológico, metabólico e estrutural, em nosso organismo. Sua participação na cascata da coagulação, reações enzimáticas e na transmissão neuromuscular dá a dimensão de sua importância para que se mantenham níveis plasmáticos normais. Os mecanismos fisiológicos necessários à manutenção de níveis séricos normais de cálcio, bem como as alterações deste equilíbrio (hipocalcemia, hipercalcemia), serão discutidos a seguir.
Homeostase do Cálcio DISTRIBUIÇÃO DO CÁLCIO Cerca de 99% do cálcio do nosso organismo encontrase no esqueleto. Um indivíduo normal de 70 kg contém aproximadamente 1,2 kg de cálcio. Deste total, 5,3 g estão no fluido intracelular, 1,3 g no fluido extracelular (excluindo-se ossos) e mais de 1 kg encontra-se nos ossos sob a forma de cristais de hidroxiapatita. A distribuição sanguínea do cálcio se dá da seguinte maneira: cerca de 50% na forma difusível (cálcio ionizável e na forma de complexos) e o restante, não-difusível, ligado às proteínas plasmáticas. Como a albumina é a proteína mais abundante no plasma, 90% do cálcio ligado às proteínas encontra-se ligado a ela. Sendo assim, a diminuição dos níveis séricos de albumina determina alterações na concentração de cálcio sérico total. Por exemplo, a diminuição em 1,0 g/dl da concentração sérica de albumina diminui a concentração de cálcio total em 0,8 mg/dl. As alterações da concentração sérica de globulinas determinam menores variações na concentração de cálcio sérico (1,0 g/dl de globulina para 0,12 mg/dl de cálcio total). A porção do cálcio difusível se divide em fração ionizável, 90% do total (ultrafiltrável), e o restante formando complexos com bicarbonato, citrato, fosfato, lactato e sulfato. A fração ionizável de cálcio varia com o pH sanguíneo, sendo que a alcalose diminui a concentração de cálcio ionizável, ao contrário da acidose. Alteração em 0,1 unidade no pH sérico modifica a ligação proteína-cálcio em 0,12 mg/dl.1,2,3
ABSORÇÃO, EXCREÇÃO, BALANÇO INTERNO Absorção Intestinal Um indivíduo normal ingere aproximadamente 1.000 mg de cálcio elementar ao dia (15 mg/kg/dia). Dependendo da concentração de 1,25-diidroxivitamina D3 (calcitriol) e do conteúdo de cálcio na dieta, 20 a 40% deste total é
absorvido no duodeno (400 mg). O suco digestivo acresce cerca de 200 mg de cálcio nas 24 horas, perfazendo no total uma absorção diária de 600 mg. Os mecanismos de transporte do cálcio são realizados tanto de forma ativa quanto passiva. O transporte ativo se dá principalmente pela presença de sódio na luz intestinal, baixa concentração de cálcio e ação do calcitriol. O mecanismo não dependente de energia ocorre quando a concentração de cálcio no lúmen intestinal é alta (13 mg/dl).1,2,3
Rins A filtração renal do cálcio se dá pela sua porção difusível (complexos na forma de vários sais e fração ionizável), isto é, 60% do cálcio total. A reabsorção tubular do cálcio acontece principalmente no túbulo contornado proximal, ramo ascendente espesso da alça de Henle e no túbulo contornado distal.
Ponto-chave: • Cálculo da concentração plasmática de cálcio na presença de hipoalbuminemia [Ca] corrigido [Ca] medido 0,8 (4,5 [albumina] [Ca] medido em mg/dl Albumina medida em g/dl Exemplo: [Ca] medido 7,6 mg/dl Albumina 2,5 g/dl [Ca] corrigido 7,6 0,8 2 9,2 mg/dl No túbulo contornado proximal, o cálcio é reabsorvido conjuntamente com o sódio, e em estados de depleção de volume extracelular a sua reabsorção é aumentada. Em situações de expansão do espaço extracelular, porém, ocorre o inverso. Cerca de 60% do cálcio filtrado é reabsorvido no túbulo contornado proximal. No ramo espesso ascendente da alça de Henle, outros 20 a 25% do cálcio filtrado são reabsorvidos, e drogas que atuam neste segmento específico do néfron, como o furosemide, aumentam a excreção de cálcio, como se verá posteriormente.
Ponto-chave: • No túbulo contornado proximal o cálcio é reabsorvido conjuntamente com o sódio e na presença de depleção extracelular a sua reabsorção aumenta. Na presença de expansão extracelular, ocorre o inverso, e isto pode ser usado no tratamento da hipercalcemia
215
capítulo 13
pela tireóide, fazendo com que aconteça uma diminuição na produção de calcitriol, normalizando os níveis de cálcio. Os principais reguladores da atividade da 1-hidroxilase são o PTH (estímulo) e o fósforo inorgânico, sendo que a hiperfosfatemia possui uma ação inibidora da atividade enzimática, ao contrário da hipofosfatemia.
Funções no Organismo
Fig. 13.1 Demonstração das áreas e da proporção de reabsorção de cálcio.
A regulação da reabsorção do cálcio ocorre no túbulo contornado distal (10% do total), pela ação do PTH e do calcitriol. Estas substâncias aumentam a reabsorção local através de mecanismos ativos da bomba de cálcio e trocas de sódio por cálcio.
Fatores que Regulam a Homeostase do Cálcio PTH E VITAMINA D A vitamina D3 é formada a partir da dieta e da clivagem fotolítica na pele do 7-desidrocolesterol. A vitamina D2, proveniente de fonte dietética (ergosterol), juntamente com a vitamina D3, são as formas ativas da vitamina D no sangue. No fígado a vitamina D sofre a ação da 25-hidroxivitamina D3 (calcidiol), que nos rins, pela ação da 1-hidroxilase diidroxivitamina D3 (1-hidroxilase), transforma-se em calcitriol. Em situações de hipocalcemia ou em estados de demanda de cálcio, é feita a conversão de calcidiol em calcitriol, porém em estados de normocalcemia o calcitriol não é formado em grande quantidade.1,2,3 O calcitriol aumenta o transporte de cálcio no intestino, age no néfron distal aumentando a reabsorção de cálcio e nos ossos aumenta a mobilização de cálcio. O PTH em situações de hipocalcemia tem sua síntese aumentada e agirá sobre os ossos aumentando a atividade das células reabsortivas (osteoclastos). Nos rins, no túbulo distal aumenta a reabsorção de cálcio e estimula a atividade da enzima 1-hidroxilase, com conseqüente maior síntese de calcitriol. A normocalcemia e o aumento do calcitriol agem como inibidores da secreção de PTH. Já em situações de hipercalcemia, dar-se-á uma inibição da produção de PTH e um estímulo à liberação de calcitonina
A função do cálcio no organismo humano a nível celular se dá principalmente pela estabilização das membranas celulares e pelo transporte de sódio e potássio. Seu papel em processos como a endocitose e a exocitose está bem estabelecido.1,2,3,7 No osso exerce função estrutural. A transmissão neuromuscular e a excitação nervosa são dependentes do cálcio, já que este regula a entrada de sódio e potássio no interior da célula, necessária para a propagação do potencial de ação.7 No músculo o cálcio se liga à superfície da célula determinando o nível de despolarização necessária para que se inicie a contração. Também a intensidade de contração depende da concentração de cálcio ionizado a nível intracelular. Daí se percebe que as alterações para cima ou para baixo dos níveis de cálcio causam sinais e sintomas principalmente a nível neuromuscular.
Hipocalcemia DEFINIÇÃO A queda do cálcio sérico total abaixo de 8,8 mg/dl é indicativo de hipocalcemia, porém isto não define uma diminuição da concentração da fração ionizável, já que existe uma ligação do cálcio à albumina. Para cada queda de albumina em 1,0 g/dl abaixo de 4,0 g/dl, adicionamos 0,8 mg/dl à concentração total de cálcio plasmático (v. fórmula mais precisa no ponto-chave, anteriormente). Nas situações de hipocalcemia, a resposta do organismo se dá pela atuação das paratireóides na liberação de PTH. Quando a normocalcemia é atingida, diminui a secreção de PTH, e este efeito de retroalimentação negativo é exercido e estimulado pelo aumento do calcitriol e normalização dos níveis de cálcio.7,8 HIPOCALCEMIA
PTH Fração excretora de cálcio Atividade da 1-hidroxilase 25(OH)D3 Calcitriol
NORMOCALCEMIA
Mobilização óssea
216
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
CAUSAS DE HIPOCALCEMIA São inúmeras as causas de hipocalcemia. As principais que se apresentam na prática clínica serão comentadas a seguir (v. Quadro 13.1).
Hipoparatireoidismo Idiopático. A forma idiopática se encontra ligada a defeitos na embriogênese ou sendo parte de síndromes poliglandulares. Na primeira forma, há uma ausência congênita das quatro glândulas que, quando associada à ausência de timo, é conhecida como síndrome de DiGeorge.1,10 Quando associado a síndromes poliglandulares, inclui insuficiência supra-renal, hipogonadismo primário, diabetes mellitus, hepatite crônica ativa, má absorção, anemia perniciosa. Anticorpos antiparatireóide são encontrados em até 40% dos casos.10 Pós-cirúrgico. A forma mais comum de hipoparatireoidismo é a cirurgia na região cervical (doença de Graves, das paratireóides, câncer de tireóide). Estes pacientes podem desenvolver hipocalcemia grave com 24 horas de pósoperatório. A hipofosfatemia e a hipomagnesemia acompanham o quadro clínico.10
Pseudo-hipoparatireoidismo Nesta síndrome há uma resistência periférica (rins e esqueleto) à ação do PTH. A osteodistrofia hereditária de Albright (pseudo-hipoparatireoidismo do tipo 1), com suas alterações somáticas características (face arredondada, pescoço grosso, retardo mental, encurtamento de falange, tórax em barril), é o exemplo clássico deste quadro, que tem como característica uma não-formação de AMP cíclico (AMPc) em resposta ao PTH.1,2,10 Os pacientes apresentam sinais de hipocalcemia crônica (catarata, achados neuromusculares, dentição anormal,
Quadro 13.1 Causas de hipocalcemia HIPOPARATIREOIDISMO PRIMÁRIO Idiopático Pós-cirúrgico PSEUDO-HIPOPARATIREOIDISMO HIPOCALCEMIA ASSOCIADA A DOENÇA MALIGNA HIPOMAGNESEMIA SÍNDROME DO CHOQUE TÓXICO NEONATAL PANCREATITE AGUDA INSUFICIÊNCIA RENAL HIPERFOSFATEMIA RELACIONADA À VITAMINA D Dietético (baixa ingesta) Má absorção Terapia anticonvulsivante Doença hepática Raquitismo dependente de vitamina D DOENÇAS TUBULARES RENAIS DROGAS (mitramicina, colchicina, furosemide, citrato endovenoso, drogas anticonvulsivantes)
alterações cardiovasculares). O diagnóstico é feito por um não-aumento do AMP cíclico urinário à infusão de PTH. No pseudo-hipoparatireoidismo tipo 2, há a formação de AMPc urinário, porém com uma resposta fosfatúrica prejudicada (diminuída). Os níveis de PTH no sangue se apresentam normais ou elevados.
Hipomagnesemia (v. Hipomagnesemia) A hipocalcemia vista nos pacientes com deficiência em magnésio acontece principalmente nos etilistas, que concomitantemente apresentam má absorção intestinal e déficit de vitamina D. Níveis séricos menores que 0,8 mEq/L de magnésio atuam sobre as paratireóides diminuindo a liberação e a ação do PTH; nos ossos, reduzindo a mobilização de cálcio e inibindo sua ação diretamente no túbulo renal. A hipocalcemia nesta situação só será corrigida com reposição de magnésio.11
Hiperfosfatemia (v. Hiperfosfatemia) A hiperfosfatemia causa diminuição na produção de calcitriol, pela inibição da atividade da 1-hidroxilase, com conseqüente menor formação de calcitriol diminuindo a absorção intestinal e óssea de cálcio. A infusão de fósforo pode fazer com que haja precipitação de cálcio quando o produto cálcio fósforo atinge 70.2,3,13,14
Drogas Anticonvulsivantes Cerca de 20% dos pacientes epilépticos recebendo drogas anticonvulsivantes apresentam hipocalcemia e osteomalácia. Níveis subnormais de calcitriol, por inibição da 1-hidroxilase ou maior degradação enzimática do calcidiol no hepatócito, são hipóteses que tentam explicar este achado.
Relacionadas à Vitamina D Má Absorção. Encontrada em etilistas, idosos e pacientes com esteatorréia (lipossolubilidade da vitamina D), que apresentam absorção diminuída de vitamina D. Drogas. Rifampicina, isoniazida e cetoconazol podem diminuir a síntese de calcitriol e calcidiol. A gentamicina pode causar hipocalcemia por mecanismo indireto devido à perda de magnésio pela urina.
Pontos-chave: • Hipocalcemia resistente ao tratamento pode ser secundária a hipomagnesemia e só melhora com a correção dos níveis séricos de magnésio • Hiperfosfatemia inibe a atividade da 1hidroxilase, diminuindo a produção de calcitriol e logo diminuindo a reabsorção intestinal de cálcio
capítulo 13
Doença Hepática Crônica. A hipocalcemia pode ocorrer nesta situação pela deficiência na 25-hidroxilação da vitamina D e deficiência na formação de bile (diminuição na absorção intestinal da vitamina D). Raquitismo Dependente de Vitamina D. Há dois tipos fundamentais: Tipo I – Deficiência enzimática da 1-hidroxilase. Tipo II – Resistência periférica à ação ao calcitriol. Estes pacientes desenvolvem hipofosfatemia grave, por diminuição da absorção intestinal de fósforo, e fosfatúria devido ao hiperparatireoidismo secundário, ocasionando deformidades ósseas significativas.8,10,12
Causas Renais Síndrome Nefrótica. A diminuição dos níveis de calcidiol tem sido relatada, proporcionalmente à intensidade da proteinúria e da hipoalbuminemia. Suspeita-se que a perda da proteína ligante de vitamina D seja eliminada na urina. Disfunções Tubulares. As disfunções tubulares distais e proximais podem causar hipocalcemia e raquitismo. A interferência da acidose na produção de calcitriol tem sido descrita. Insuficiência Renal Crônica. A hipocalcemia aparece devido à retenção de fósforo e diminuição da produção de calcitriol, com conseqüente hiperparatireoidismo secundário.1,2,3,6,13 A concentração sérica elevada ou normal de calcidiol, com calcitriol diminuído, sugere a presença de insuficiência renal crônica ou raquitismo dependente de vitamina D.
Outras Causas Doenças Malignas. Câncer de próstata, mama, ou leucemia aguda podem causar hipocalcemia (não devido à hipoalbuminemia) em decorrência de lesões osteoblásticas no esqueleto que captam cálcio. Pancreatite Aguda. Várias causas concorrem para a hipocalcemia nesta situação: insuficiência renal aguda, níveis elevados de calcitonina, necrose gordurosa, que nesta situação formam sais insolúveis de gordura com o cálcio. Hipocalcemia Pré-natal. Níveis baixos de PTH e níveis elevados de calcitonina nos três primeiros dias de nascimento podem ser responsáveis por esta síndrome. Ocorre mais em filhos de mães diabéticas, prematuros e com angústia respiratória. Síndrome do Choque Tóxico. Ocorre em mulheres jovens que utilizam tampões durante a menstruação e é produzida por algumas cepas de estafilococo que provocam o choque endotóxico. Alcalose Respiratória. Aumenta a ligação do cálcio ionizável à albumina.
217
DIAGNÓSTICO O diagnóstico de hipocalcemia deve levar em conta a sua fração ionizável, que se detecta por medidas diretas (normal de 4,75 a 5,2 mg/dl) ou do cálcio sérico total, considerando as correções quanto à medida de albumina sérica e pH (v. discussão anterior). O comportamento dos níveis séricos de fósforo pode auxiliar na descoberta da etiologia da hipocalcemia. A hiperfosfatemia sugere hipoparatireoidismo, pseudo-hipoparatireoidismo e insuficiência renal, enquanto a hipofosfatemia é comumente observada nos casos de hiperparatireoidismo secundário (diminuição na produção renal de calcitriol) e em outros distúrbios da vitamina D. Medidas séricas do PTH podem distinguir os pacientes com hipoparatireoidismo primário de pacientes com pseudo-hipoparatireoidismo. A medida na urina de fósforo, cálcio e AMP cíclico após infusão de PTH (teste de Ellsworth-Howard) auxilia no diagnóstico diferencial de hipoparatireoidismo primário, que apresenta aumento dos níveis de AMPc e fósforo com diminuição da excreção de cálcio, não havendo nenhuma mudança destes parâmetros quando da suspeita de pseudo-hipoparatireoidismo. A concentração de calcidiol se encontra diminuída nos pacientes com má absorção intestinal e déficit de vitamina D. A suspeita de hipomagnesemia, como causa de hipocalcemia, dá-se quando os níveis plasmáticos de magnésio se encontram abaixo de 1,2 mg/dl.1,2,3,7,8,12,13,14 Nos pacientes com concentração diminuída de calcidiol, a presença de hipocalcemia e hipofosfatemia são indicadores de baixa absorção e ingestão de alimentos. As concentrações de PTH devem ser dosadas conjuntamente com cálcio sérico e variam conforme a causa de hipocalcemia. Pacientes com hipomagnesemia podem ter PTH elevado, normal ou baixo. Sua concentração geralmente é reduzida nos pacientes com hipoparatireoidismo. Anormalidades como pseudo-hipoparatireoidismo ou distúrbios no metabolismo da vitamina D apresentam concentrações de PTH elevadas.
QUADRO CLÍNICO As principais manifestações clínicas encontradas na hipocalcemia são principalmente de caráter neuromuscular (v. Quadro 13.2). Neuromuscular. Tetania e convulsões são as manifestações mais graves. A tetania latente pode ser demonstrada pelo sinal de Chvostek (encontrado em 10% da população normal) percutindo-se o nervo facial após sua saída do canal auditivo, sendo positivo quando se observa uma contração da musculatura da hemiface.1,2,3 Outro sinal para se detectar tetania incipiente é o de Trousseau, que não se encontra em pessoas normais e consiste em se insuflar o manguito do aparelho de pressão arterial 3 mmHg acima da pressão arterial sistólica por
218
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
Quadro 13.2 Manifestações clínicas da hipocalcemia NEUROMUSCULARES Tetania Convulsões Papiledema Ansiedade, depressão, psicose ECTODÉRMICAS Pele seca Perda de cabelo Catarata Eczema CARDIOVASCULARES Hipotensão Arritmias Insuficiência cardíaca GASTRINTESTINAL Esteatorréia
3 min, observando-se então a pressão de contração espasmódica dos músculos da região. O sinal é negativo em 34% dos pacientes com hipocalcemia latente. Convulsões e distúrbios emocionais, como irritabilidade, labilidade emocional, alucinações e depressão, também são observados.1,2,3 Cardiovascular. Hipotensão arterial e arritmias (cujo eletrocardiograma aponta prolongamento do intervalo QT e alterações de onda T) têm sido descritas. Lesões Dermatológicas. Anormalidades da pele, unhas, dentes e oculares são vistas na hipocalcemia crônica. Gastroenterológicas. Constipação e dor abdominal podem fazer parte do quadro. Diarréia com deficiência de absorção de vitamina B6 e gorduras ocasionalmente podem aparecer.
TRATAMENTO Deve-se tratar a hipocalcemia quando o valor corrigido de cálcio sérico total é inferior a 7 mg/dl e naqueles pacientes cujos sintomas neuromusculares (tetania, parestesias, convulsões) estão presentes. A terapêutica também se divide quanto à apresentação na forma aguda e crônica. Forma Aguda. A situação clínica mais evidente nesta forma de apresentação é pós-paratireoidectomia. A abordagem nesta situação deve ser encarada como urgente. Os sintomas geralmente estão presentes quando os valores de cálcio total são menores que 7,0 mg/dl. A administração endovenosa de gluconato de cálcio a 10% (1 a 2 g de gluconato de cálcio-cálcio intravenoso, 100 a 200 mg de cálcio elementar), infundindo num tempo não inferior a 10 minutos, é a abordagem inicial. Outras formas de apresentação incluem o cloreto e o citrato de cálcio. O gluconato de cálcio é a apresentação escolhida geralmente pela menor propensão a necrose teci-
dual quando ocorre infusão rápida ou no extravasamento tecidual. A administração de cálcio deve ser feita até o desaparecimento dos sintomas, repetindo a infusão de gluconato a 10% lentamente na dose de 0,5 a 1,5 mg/kg/hora (90 mg de cálcio elementar em 10 ml da ampola), com monitoração dos níveis séricos, até atingir uma concentração de cálcio total de 8,0 mg/dl. Alguns cuidados devem ser tomados quanto à infusão de cálcio. • Pacientes tomando digital. A infusão de cálcio aumenta a sensibilidade miocárdica à intoxicação por digital, devendo-se fazer a monitoração cardíaca durante a infusão. • Hipopotassemia e hipomagnesemia devem ser corrigidas. • Irritação endovenosa pode acontecer, se a solução for muito concentrada. • A solução não deve ter bicarbonato ou fosfato, pois podem formar complexos insolúveis com o cálcio. Forma Crônica. Administração oral de cálcio e vitamina D nas situações de deficiência vitamínica e diminuição da função das paratireóides. Cálcio na forma oral deve ser dado para que se atinja uma concentração de 1 g de cálcio elementar ao dia. As formas de apresentação incluem o carbonato de cálcio em comprimidos de 500 mg com 400 mg de cálcio elementar, e acetato de cálcio, comprimidos de 350 mg com 87,5 mg de cálcio elementar.
Pontos-chave: • Hipocalcemia: Ca 8,8 mg/dl • Relação cálcio-albumina: Redução de 1,0 g/ dl no valor da albumina abaixo de 4,0 eleva 0,8 no valor do cálcio total • Diagnóstico: Nível de cálcio total corrigido ou cálcio ionizável. Correlacionar com níveis de fósforo e PTH e calcidiol para facilitar o diagnóstico. Pesquisar sinais de Trousseau e Chvostek • Quadro clínico: Caracteriza-se por manifestações neuromusculares • Tratamento: Forma aguda — Gluconato de cálcio 10% lentamente. Correção do magnésio e potássio concomitante se necessário • Tratamento: Forma crônica — Cálcio oral, vitamina D ou tiazídicos conforme a etiologia
capítulo 13
Vitamina D. A vitamina D, como já foi visto, aumenta os níveis séricos de cálcio, conseqüentemente provocando hipercalciúria. Devido a este fato, nefrocalcinose e calcificação de tecidos moles podem ser observadas. A monitoração dos níveis de cálcio no sangue e na urina deve ser feita periodicamente. As formas de vitamina D mais utilizadas são o calcitriol (biologicamente mais potente — de 0,5 a 1,0 g) e a outra menos ativa, o ergocalciferol (vitamina D3 — 1 a 10 g/dia). A hiperfosfatemia pode acontecer com a correção da hipocalcemia pela vitamina D e aumentar os riscos de nefrocalcinose e calcificação de partes moles. Manutenção dos níveis de fósforo através da dieta e drogas como acetozolamide pode ser de utilidade clínica. Tiazídicos. Limitam a excreção urinária de cálcio, diminuindo as necessidades de vitamina D e cálcio (v. Hipercalcemia).1,2,3,13
Hipercalcemia DEFINIÇÃO A hipercalcemia é definida quando os níveis séricos de cálcio total são superiores a 10,5 mg/dl. Em aproximadamente 80% dos casos, as causas mais comuns são hiperparatireoidismo e tumores malignos.
RESPOSTA ADAPTATIVA Os eventos metabólicos principais que ocorrem em resposta à hipercalcemia são apresentados abaixo: A hipercalcemia provoca a diminuição na liberação de PTH e aumento na produção de calcitonina, provocando diminuição na atividade da 1-hidroxilase e conseqüen-
CAUSAS DE HIPERCALCEMIA As duas principais causas de hipercalcemia são hiperparatireoidismo e malignidade. As etiologias principais deste distúrbio serão descritas a seguir (v. Quadro 13.3).
Hiperparatireoidismo Primário Incidência. O hiperparatireoidismo primário apresenta uma média anual de incidência na população de 22 casos por 100.000, havendo um aumento progressivo com a idade, sendo duas vezes mais comum nas mulheres do que nos homens. Causas. Cerca de 85% dos pacientes com hiperparatireoidismo primário têm como causa principal o adenoma simples de uma das quatro glândulas da paratireóide. O restante se deve à hiperplasia e carcinoma, este responsável por menos de 1% dos casos. As causas podem ser de origem genética ou devido à irradiação da região cervical. A causa genética mais conhecida é a neoplasia endócrina do tipo I. Prévia irradiação da cabeça e pescoço pode dar origem a adenomas, numa incidência que pode atingir 4 a 11%. A hipercalcemia se desenvolve pelo aumento da produção de PTH, com conseqüente aumento na reabsorção tubular de cálcio e diminuição de sua excreção. O conseqüente estímulo da atividade osteoclástica e aumento do turnover ósseo é demonstrado pelo aumento dos níveis de fosfatase alcalina, osteocalcina e hidroxiprolina urinária. O aumento dos níveis de calcitriol determina incremento da absorção intestinal de cálcio. O PTH também eleva a
Quadro 13.3 Causas de hipercalcemia HIPERPARATIREOIDISMO • Primário • Terciário: Má absorção/Insuficiência renal crônica (IRC)
HIPERCALCEMIA
Liberação de PTH e Calcitonina
ASSOCIADA A DOENÇAS MALIGNAS ASSOCIADA A DOENÇAS ENDÓCRINAS • Hipertireoidismo • Feocromocitoma • Insuficiência adrenal
Atividade 1-hidroxilase 25(OH)D3 Fração excretora de cálcio
Mobilização óssea Calcitriol NORMOCALCEMIA
te redução do calcitriol. Por conseguinte, isto se traduz na redução da absorção e reabsorção do cálcio na luz intestinal e no túbulo distal, respectivamente, com aumento da fração excretora de cálcio e diminuição da mobilização do cálcio ao nível ósseo, levando à normocalcemia.1,2,5,17
219
SARCOIDOSE E OUTRAS DOENÇAS GRANULOMATOSAS INTOXICAÇÃO POR VITAMINA D INTOXICAÇÃO POR VITAMINA A SÍNDROME ÁLCALI-LEITE IMOBILIZAÇÃO PROLONGADA ASSOCIADA A DROGAS • Diuréticos tiazídicos • Carbonato de lítio • Estrógenos DOENÇA DE PAGET HIPERCALCEMIA IDIOPÁTICA DA INFÂNCIA
220
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
excreção de fósforo e bicarbonato urinário, devido à diminuição da reabsorção no túbulo proximal destes íons e ocasionando uma acidose metabólica hiperclorêmica, além de elevação do AMPc urinário. Diagnóstico. Além da hipercalcemia, a elevação dos níveis de PTH (tanto fração terminal como região média da molécula) é característica da doença. Os pacientes se apresentam habitualmente com cálculos renais recorrentes e ocasionalmente com alterações ósseas características (aumento da reabsorção óssea pelo aumento da atividade osteoclástica), levando à osteíte fibrosa e à osteopenia. É importante notar que pacientes apresentam carcinoma de paratireóide em 10% dos casos. Tratamento. A cirurgia com remoção do tecido anormal da paratireóide é o tratamento de escolha. Naqueles pacientes com quadro discreto, assintomáticos, o tratamento clínico pode estar indicado, devendo o paciente ser acompanhado freqüentemente (v. tratamento da hipercalcemia). Em mãos experimentadas, a cura pela cirurgia pode chegar a 95% dos casos.1,2,5,6,12,17
Malignidade Incidência. É a causa mais comum de hipercalcemia encontrada em pacientes internados, sendo a segunda causa mais freqüente, depois do hiperparatireoidismo. Estimase a incidência de 135 casos de câncer por ano que desenvolvem hipercalcemia. Os principais tumores envolvidos estão descritos no Quadro 13.4. Causas. Os mecanismos principais envolvidos no desenvolvimento de hipercalcemia incluem: Produção de PTHrP (Peptídio Relacionado ao Paratormônio). Esta substância produzida pelo tumor, com estrutura de aminoácidos semelhante ao PTH, liga-se aos seus receptores, aumentando a reabsorção tubular de cálcio e também ao nível ósseo. Os tumores mais envolvidos na produção de PTHrP são: tumor de células escamosas do pulmão, pescoço e carcinoma de células renais. A abordagem da hipercalcemia induzida por câncer poderá ocorrer com a redução da liberação de proteína relacionada ao PTH. O uso de análo-
Quadro 13.4 Hipercalcemia e malignidade INCIDÊNCIA (em porcentagem) Pulmão Mama Hematológico (mieloma, linfoma) Cabeça/Pescoço Renal Próstata Origem desconhecida Outros
35 25 14 6 3 3 7 8
Adaptado de Mundy, G.R. e Martin, T.J. Metabolism, 31:1247-77, 1982.
gos do calcitriol, como 22-oxacalcitriol, pode ser uma alternativa no futuro.54 Produção de Fatores que Estimulam Osteoclastos e Análogos da Vitamina D. Tumores hematológicos como o mieloma causam hipercalcemia devido à liberação de citocinas produzidas pelas células malignas, que são os fatores de ativação do osteoclasto nas superfícies ósseas trabeculares. Linfomas de células T podem produzir calcitriol. Os tumores de mama, além de poderem aumentar a absorção óssea diretamente através de suas células malignas, podem produzir prostaglandinas que estimulam a atividade osteoclástica.2,5,17,18
Tireotoxicose É uma causa relativamente freqüente de hipercalcemia, com incidência chegando a 10 a 20% dos pacientes portadores deste distúrbio. O hormônio tireoidiano age diretamente no osso, acelerando o turnover ósseo. O tratamento do hipertireoidismo é eficaz na diminuição dos níveis de cálcio.2,5
Doenças Granulomatosas Dentre as doenças granulomatosas, como tuberculose, histoplasmose, candidíase e coccidioidomicose, destaca-se a sarcoidose como a principal causa de hipercalcemia. A hipercalcemia na sarcoidose se deve ao fato dos macrófagos (localizados no pulmão destes pacientes) converterem o calcidiol em calcitriol. Isto provoca um aumento da reabsorção intestinal de cálcio, com conseqüente supressão da produção de PTH, resultando em hipercalciúria, formação de cálculos de oxalato de cálcio e nefrocalcinose. O acometimento renal pela sarcoidose associado a nefrocalcinose leva à insuficiência renal observada neste distúrbio. A medida da concentração sérica do PTH é de fundamental importância no diagnóstico diferencial, pois o hiperparatireoidismo pode ocorrer conjuntamente com a sarcoidose.1,2,5
Imobilização A imobilização prolongada é uma causa conhecida de hipercalcemia e hipercalciúria. A perda de massa óssea é acompanhada de paralisia muscular de qualquer etiologia — a chamada osteoporose de desuso. A hipercalcemia suprime a produção de PTH e formação de calcitriol, promovendo a hipercalciúria e conseqüente nefrolitíase. A causa principal de imobilização é o trauma raquimedular, porém outras situações como poliomielite, síndrome de Guillain-Barré e queimaduras extensas são outras causas descritas.1,2,5
Intoxicação por Vitamina D A maior parte dos casos desenvolve-se durante o tratamento com vitamina D em casos de hipoparatireoidismo,
capítulo 13
doenças ósseas ou tentativas de minorar os efeitos do corticóide sobre o esqueleto a longo prazo. Também doses excessivas de suplementos vitamínicos podem causar intoxicação. A hipercalcemia é devida tanto a um aumento na absorção óssea, como a um aumento na absorção intestinal. A presença de hiperfosfatemia, diminuição da função renal (nefrocalcinose) e deposição tecidual de cálcio nos tecidos são outros achados. Altas concentrações de vitamina D aumentam a 25-hidroxilação hepática, elevando os níveis de calcidiol. Por outro lado, a 1-hidroxilação no rim é inibida por altas concentrações de calcitriol, determinando nesta situação níveis altos de calcidiol e normais de calcitriol.1,2,5,8,16,17
Drogas Diuréticos Tiazídicos. A maior parte de seus efeitos no metabolismo de cálcio pode ser explicada pela contração do volume plasmático, associada à dieta hipossódica geralmente prescrita aos pacientes hipertensos (aumentando a reabsorção proximal de cálcio conjuntamente com o sódio, devido à depleção de volume extracelular). Especula-se um efeito potencializador do PTH nos rins. Geralmente não se observam elevações significativas dos níveis séricos de cálcio (acima de 11 mg/dl), ocorrendo na maioria das vezes a reversão da hipercalciúria e hipercalcemia. Elevações significativas do cálcio sérico com uso crônico de tiazídico devem levar à suspeita de outras doenças subjacentes, em especial o hiperparatireoidismo.1,2,5,17 Diuréticos de Alça. Agem diminuindo a reabsorção de cálcio na alça de Henle, porém este efeito pode ser mascarado pela contração de volume. Nestes casos, geralmente associados a dieta hipossódica, maior quantidade de cálcio é reabsorvida no túbulo proximal e menos cálcio chega até a alça de Henle, podendo piorar estados prévios de hipercalcemia.1,2,5,17,39 Carbonato de Lítio. Têm sido descritos casos (em torno de 5%) de pacientes em uso desta mediação nos quais a suspensão da droga faz com que haja retorno dos níveis de cálcio sérico aos valores normais.
Pontos-chave: • Hiperparatireoidismo e doença maligna são as principais causas de hipercalcemia • Neoplasias de pulmão e mama são as mais freqüentemente associadas à hipercalcemia • Hipercalcemia e hipofosfatemia sugerem hiperparatireoidismo ou malignidade • Mais recentemente o uso indiscriminado de multivitamínicos contendo vitamina D tem sido associado à hipercalcemia
221
Aminofilina. A toxicidade por aminofilina tem sido relatada como causa de hipercalcemia em até 20% dos casos. A causa do distúrbio é desconhecida.1,2,5 Aspirina. Níveis tóxicos de ácido acetilsalicílico podem causar hipercalcemia, sem aumento nos níveis de albumina. Estrógenos e Antiestrógenos. Podem causar hipercalcemia no tratamento do câncer de mama metastático.
Outras Causas Síndrome Álcali-leite. Esta doença está associada à ingestão de carbonato de sódio (forma de antiácido) mais leite. A fisiopatologia deste distúrbio envolve a hiperabsorção intestinal de cálcio e álcali, como também a excreção urinária inadequada de cálcio, diminuição da função renal e alcalose metabólica. Hoje em dia esta síndrome é menos comum, restringindo-se aos casos de uso de cálcio no tratamento da osteoporose.2,5,17 Intoxicação por Vitamina A. A vitamina A é um fator de estímulo à atividade do osteoclasto e, quando ingerida numa quantidade superior a 50.000 UI/dia, pode causar osteopenia por diminuição da função do osteoblasto. O achado radiológico característico é a calcificação laminar periosteal que pode ser vista na radiografia das mãos.5,17 Hipercalcemia Hipocalciúrica Familiar. É uma patologia que se caracteriza pela presença de hipercalcemia e diminuição na fração excretora de cálcio (menor que 100 mg/g de creatinina), transmitindo-se como um traço autossômico dominante. Difere do hiperparatireoidismo por apresentar uma diminuição na fração excretora de cálcio e níveis normais de PTH. A presença de familiares com este distúrbio auxilia no diagnóstico. A maioria dos pacientes não requer tratamento.1,2,5,17 Doença de Addison. Os mecanismos envolvidos nesta patologia devem-se principalmente à contração de volume aumentando a reabsorção tubular de cálcio e deficiência na ação do glicocorticóide, que normalmente possui uma ação antivitamina D.17 Insuficiência Renal Aguda. A hipercalciúria pode, por si só, causar insuficiência renal (mecanismo de vasoconstrição renal), principalmente na sarcoidose, mieloma, intoxicação por vitamina D, ou ser sua conseqüência, como ocorre na fase de recuperação da insuficiência renal aguda e na rabdomiólise.1,2,5,17 Insuficiência Renal Crônica. É observada principalmente nos pacientes em hemodiálise em que a água usada no tratamento contém alta concentração de alumínio. Isto ocorre pelo fato de que o alumínio, ao ser depositado no osso, retarda a formação óssea e inibe a atividade osteoblástica. A osteomalácia resultante não responde à vitamina D, e o osso não atua mais como depósito de cálcio, resultando em hipercalcemia. A hipocalcemia crônica da IRC pode levar ao desenvolvimento de hiperparatireoidismo secundário, por estímulo contínuo na glândula, tornando-se esta autônoma. O uso
222
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
continuado de quelantes de fósforo, que contenham cálcio (carbonato de cálcio e acetato de cálcio), e de calcitriol pode levar à hipercalcemia.1,2,5,17 Pseudo-hipercalcemia. Elevações na concentração de proteínas plasmáticas no sangue podem levar ao aumento do cálcio sérico total porém sem aumento da fração livre. Isto pode ocorrer após infusão de grande quantidade de plasma (tratamento da púrpura trombocitopênica trombótica) e no mieloma múltiplo, quando a proteína do mieloma se liga ao cálcio, aumentando sua concentração sérica.1,5,17
QUADRO CLÍNICO Sintomas Gerais. A hipercalcemia na sua forma leve pode não apresentar sintomas, porém nos quadros mais graves sintomas como anorexia, náuseas, vômitos, obnubilação, cefaléia, poliúria e nictúria podem estar presentes (v. Quadro 13.5).
Sistemas Afetados Nervoso. Embora os mecanismos não estejam completamente estabelecidos, o aumento do cálcio livre no sistema nervoso central pode acarretar diminuição da condução nervosa nos terminais nervosos, traduzindo-se em letargia em casos mais graves, confusão mental, coma. Cardiovascular. Pacientes portadores de hipercalcemia desenvolvem hipertensão arterial provavelmente por mecanismos de vasoconstrição. No coração, o cálcio provoca um aumento da contratilidade cardíaca. As alterações eletrocardiográficas mais comuns são encurtamento do espaço PR e do QT, bloqueio AV de primeiro grau e alterações da onda T. Gastrintestinal. A ação do cálcio na musculatura lisa e condução nervosa, além de seu efeito sobre a produção de gastrina, aponta para as principais manifestações clínicas,
que são: constipação, anorexia, náuseas, vômitos e úlcera duodenal. Renal. A litíase renal pode ser observada nos quadros de hiperparatireoidismo. A nefrocalcinose (calcificação parenquimatosa principalmente a nível da medula renal) não é necessariamente associada à litíase, sendo que nos pacientes com hiperparatireoidismo as duas condições podem ocorrer separadamente. A insuficiência renal é multifatorial e decorre de: • Obstrução tubular • Depósito parenquimatoso (nefrite intersticial) • Vasoconstrição renal, depleção do volume extracelular. A correção da hipercalcemia pode reverter e melhorar significativamente o ritmo de filtração glomerular. Outra anormalidade causada pela hipercalcemia é a resistência à ação do ADH nos túbulos coletores, cujo mecanismo exato não está estabelecido. Alcalose metabólica, devido ao aumento da capacidade de tamponamento ósseo, pelo acometimento do esqueleto nos tumores malignos, pode ser responsável por este distúrbio ácido-básico. Acidose tubular renal pode ser ocasionada nos pacientes com hiperparatireoidismo pela ação do PTH no túbulo contornado proximal, resultando em perda de bicarbonato e conseqüente acidose metabólica hiperclorêmica. Perdas renais de sódio, magnésio e potássio também são descritas na hipercalcemia.1,2,5,15,16,18
Pontos-chave: • Hipercalcemia pode acarretar depleção do volume extracelular e contribuir para aumentar a reabsorção proximal de cálcio • Na hipercalcemia há uma resistência à ação do hormônio antidiurético nos túbulos coletores, contribuindo para a poliúria observada na hipercalcemia
Quadro 13.5 Sinais e sintomas de hipercalcemia NEUROLÓGICOS: Confusão mental, estupor, irritabilidade, coma. CARDIOVASCULARES: Aumento da contratilidade miocárdica, alterações no ECG (aumento do QTc, bloqueio AV de primeiro grau, etc.), hipertensão arterial sistemática. GASTRINTESTINAIS: Constipação, náusea, vômito, úlcera duodenal. RENAIS: Nefrocalcinose, litíase renal, insuficiência renal, diabetes insipidus nefrogênico, distúrbios ácido-básicos (acidose e alcalose metabólica), perdas renais de fosfato, magnésio, potássio, glicose e aminoácidos. OCULAR: Calcificação da conjuntiva e da córnea. HEMATOLÓGICO: Fibrose de medula óssea nos casos de hiperparatireoidismo secundário.
DIAGNÓSTICO Cerca de 80 a 90% dos casos de hipercalcemia são causados por hiperparatireoidismo ou tumores malignos. Estes mais encontrados em pacientes hospitalizados e aquele, em pacientes assintomáticos. A história clínica, o exame físico e a dosagem de PTH sérico oferecem uma precisão diagnóstica em 99% dos casos. Além disto, é importante destacar que no hiperparatireoidismo alguns detalhes clínicos são de fundamental importância no auxílio diagnóstico, destacando-se: • Hipercalcemia assintomática • História familiar ou evidência de neoplasia endócrina • Irradiação prévia na região cervical • Mulheres na menopausa.
223
capítulo 13
Fósforo. A hipofosfatemia só acontece nas situações de elevação do PTH sérico, como no hiperparatireoidismo, ou na presença do PTHrP nos tumores malignos, em conseqüência destes aumentarem a excreção de fósforo pelos rins. A hiperfosfatemia estará presente nas outras situações onde não acontece uma maior excreção de fósforo urinário, como se presencia nas doenças granulomatosas, intoxicação por vitamina D, síndrome leite-álcali e tireotoxicose, entre outras. Cálcio Urinário. A dosagem do cálcio urinário é um importante auxílio diagnóstico principalmente na síndrome de hipercalcemia hipocalciúrica familiar, quando a evidência de uma dosagem de cálcio na urina menor que 100 mg/g de creatinina faz o diagnóstico. Outras duas situações em que se presencia a hipocalciúria são a síndrome álcali-leite e o uso de tiazídicos. Cloro. Devido à redução de bicarbonato (bicarbonatúria), evidenciada no hiperparatireoidismo, a dosagem de cloro pode ser de ajuda diagnóstica, já que concentrações acima de 103 mEq/L podem ser encontradas. Na síndrome leite-álcali se verá a situação inversa, ou seja, a presença de alcalose metabólica com dosagem de cloro inferior a 100 mEq/L. RX. A presença de alterações radiológicas características da osteíte fibrosa — reabsorção subperiosteal falangiana, lesões císticas na clavícula e imagens de “pimenta e sal” no crânio — é observada em 5% dos casos de hiperparatireoidismo. PTH. A dosagem da fração intacta do PTH, pelo método imunorradiométrico, é o exame de escolha no diagnóstico do hiperparatireoidismo primário. A presença de níveis de PTH normais deve ser vista com cuidado, pois a hipercalcemia persistente suprime a sua produção. A presença de elevação do PTHrP acontece nos tumores malignos.17,18 Vitamina D. Quando as dosagens de PTH e PTHrP estão normais, e não for encontrada nenhuma evidência de neoplasia maligna, deve-se proceder à dosagem de calcitriol e calcidiol. O aumento do calcidiol sugere intoxicação por vitamina D. O calcitriol se elevará nas seguintes condições clínicas: doenças granulomatosas, linfomas, produção renal aumentada causada por hiperparatireoidismo.1,2,5,16,17,18 Deve-se iniciar o tratamento da hipercalcemia naqueles pacientes sintomáticos ou que apresentam cálcio sérico acima de 15 mg/dl. Conforme o mecanismo fisiopatológico causador da hipercalcemia, modalidades terapêuticas diferenciadas são instituídas (v. Quadro 13.6).
TRATAMENTO Aborda-se este distúrbio tentando, conforme a causa subjacente, agir sobre o mecanismo desencadeador da hipercalcemia, promovendo:
Quadro 13.6 Tratamento da hipercalcemia Diminuição da absorção intestinal • Corticóide • Fosfato oral Aumento da excreção urinária • Solução salina + furosemide Diminuição na reabsorção óssea • Calcitonina • Mitramicina • Difosfonatos • Nitrato de gálio Diálise Quelação do cálcio ionizado • EDTA • Fosfato endovenoso ou oral
• • • •
Diminuição da absorção intestinal de cálcio Aumento na excreção urinária Diminuição na reabsorção óssea Quelação do cálcio ionizado.
Os pacientes assintomáticos que apresentam cálcio sérico com valores menores ou iguais a 13 mg/dl também devem ser tratados, pelos efeitos deletérios da hipercalcemia crônica. As principais drogas utilizadas no tratamento da hipercalcemia serão discutidas a seguir.1,2,5,16,17,18,19 Corticóides. São utilizados em pacientes nos quais a causa da hipercalcemia é uma maior absorção de cálcio intestinal. Agem diretamente no epitélio intestinal, inibindo a absorção de cálcio. Na sarcoidose e em outras doenças granulomatosas, têm seu efeito direto sobre a atividade da doença. São eficazes nas doenças malignas em 30% dos casos, e especialmente naqueles com doença hematológica. Têm seu efeito em torno de 7 a 10 dias do início de seu uso, utilizando-se prednisona na dose de 1 mg/kg/dia.1,2,5,17,19 Solução Salina e Furosemide. O cálcio é principalmente reabsorvido no túbulo contornado proximal e na alça de Henle, devido ao gradiente elétrico criado pela reabsorção concomitante de sódio e cloro, neste segmento do néfron. Desta forma, a inibição da reabsorção de sódio no túbulo contornado proximal inibe o transporte passivo de cálcio, promovendo a calciúria. A expansão de volume plasmático ocasionada pela infusão salina leva à natriurese e conseqüentemente à excreção concomitante de cálcio pela urina. Como há uma maior oferta de sódio, cálcio e água na alça de Henle, a adição de furosemide inibe o transporte destes íons, incrementando o efeito calciúrico da infusão salina. Deve-se ter cuidado antes da infusão de furosemide, já que a maioria destes pacientes podem estar depletados
224
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
pelas condições clínicas subjacentes às quais estão sujeitos e devido ao próprio efeito natriurético da hipercalcemia. A infusão prévia de solução salina, antes de administrar furosemide, faz-se necessária. O regime sugerido é a administração de solução salina isotônica (3 a 5 L/dia), com a verificação e eventual reposição de potássio e magnésio sendo feita de acordo com as medidas séricas. Utilizando-se este esquema, espera-se normalizar os níveis de cálcio em 12 a 24 horas.1,5,17 Regimes com maior infusão salina são descritos, iniciando-se a infusão de 1 a 2 litros de solução salina isotônica em período de 1 hora, acrescido de furosemide, 80 mg a cada 2 horas, a fim de se manter um débito urinário não inferior a 250 ml/h. Este regime produz uma maior excreção urinária de sódio, fósforo, cálcio, cloro, magnésio e água, sendo que se este tratamento tiver duração maior que 100 horas, a infusão de magnésio se faz necessária, num ritmo de 15 mg/h. O volume urinário deve ser reposto a cada hora, com solução contendo soro glicosado a 5%, 90 a 120 mEq/L de sódio e 10 a 20 mEq/L de potássio. Haverá queda do cálcio sérico, de 2 a 4 horas, havendo normalização em até 24 horas. Deve-se lembrar da necessidade de reposição dos outros eletrólitos (sódio, fósforo, cloro, magnésio), através de suas medidas na urina coletadas a intervalos de 4 horas.2 O regime deve ser cuidadosamente avaliado em pacientes portadores de insuficiência cardíaca e renal onde a sobrecarga de volume pode ser uma complicação. O diurético só é utilizado quando se descarta a presença de depleção do espaço extracelular.1,2,5,17,18
Pontos-chave no manejo da hipercalcemia: • Lembrar que a expansão do volume extracelular inibe o transporte passivo de cálcio, promovendo a calciúria • A adição de um diurético de alça (furosemide) inibe a reabsorção de cálcio a este nível mas não deve ser usado sem antes corrigir-se a depleção do volume extracelular Bifosfonatos. Este grupo de drogas se utiliza no tratamento da hipercalcemia na malignidade, conjuntamente com a infusão salina. Sua ação se dá pela inibição da atividade osteoclástica, diminuindo os níveis de cálcio sérico e diminuindo a dor nos pacientes com lesões osteolíticas significativas. O efeito máximo dos bifosfonatos se dá entre o quinto e o sétimo dia. Nos Estados Unidos, o etidronato e o pamidronato são as drogas disponíveis, existindo uma terceira droga, o clodronato, sendo maior a experiência clínica com as duas primeiras.
O etidronato (EDHP) deve ser iniciado na forma endovenosa, 7,5 mg/kg/dia em 250 ml de solução salina em um período não inferior a 4 horas, por três dias. O prolongamento do tratamento de três para cinco dias aumenta a resposta em 60 a 100%. A duração da normocalcemia é de 1 a 7 semanas. A terapia deve ser mantida por via oral, na dose de 10 mg/kg/ dia, e é ineficaz sem o uso intravenoso prévio. Os efeitos colaterais mais importantes são a hiperfosfatemia, devido a uma maior reabsorção de fosfato. A dosagem deve ser reduzida em 50% na presença de insuficiência renal. O pamidronato é mais potente que o etidronato e causa menor desmineralização óssea, sendo a droga de escolha entre os bifosfonatos. É utilizada na forma intravenosa, numa dose inicial de 30 mg num período de infusão de 4 horas em dose única, podendo ser repetida em sete dias.2,5,17,18,19 Em caso de hipercalcemia grave, a dose pode ser de até 90 mg. Várias preparações orais estão sendo propostas para substituir o pamidronato como agente de escolha na hipercalcemia associada a malignidade. Os bifosfonatos têm sido utilizados no tratamento dos pacientes com hiperparatireoidismo primário, porém com menor eficácia do que nos pacientes portadores de neoplasias. Calcitonina. Utilizada na maioria das vezes em pacientes com hipercalcemia associada a malignidade e nos pacientes com função renal alterada. Em situações onde os bifosfonatos são contra-indicados, a calcitonina, na dose de 4 UI/kg intramuscular ou subcutânea, age rapidamente, normalizando o cálcio em até 2 a 3 horas. A resposta ocorre em 60 a 70% dos pacientes que a utilizam. Há controvérsia na literatura quanto ao uso simultâneo de corticóide, no sentido de diminuir o aparecimento de resistência à calcitonina. Quando utilizado, administra-se hidrocortisona na dose de 100 mg a cada 6 horas.2,5,17,18 Mitramicina. É uma droga antineoplásica que inibe a síntese de DNA dependente de RNA e é altamente efetiva no tratamento da hipercalcemia, principalmente associada às neoplasias. Utiliza-se na dose de 25 g/kg em um período de 6 horas, com pico máximo de ação em 12 horas, durando seu efeito por alguns dias e repetindo-se a dose a cada 3 a 7 dias. Hepatotoxicidade, nefrotoxicidade e disfunção plaquetária limitam o seu uso.2,5,17,18 Fósforo Oral. Tem utilidade no tratamento dos pacientes portadores de hiperparatireoidismo primário, com hipofosfatemia (menor que 3,5 mg/dl), na dose de 1 a 3 g/dia. Outros quelantes do cálcio ionizado, como o EDTA (ácido etileno diaminotetracético), e o fósforo endovenoso podem determinar insuficiência renal, precipitação de cálcio e fósforo em partes moles e arritmias fatais, limitando a sua utilização.1,2,5,17,18 Estrógenos. Nos pacientes portadores de hiperparatireoidismo primário, a cirurgia é a terapia de eleição, po-
225
capítulo 13
rém, quando a cirurgia é contra-indicada, em quadros de hipercalcemia sintomática, ou níveis superiores a 11 mg/ dl nas mulheres em menopausa, os estrógenos podem ser utilizados. O seu modo de ação é desconhecido, podendo ser utilizado como estilbestrol ou preparação equivalente de etinil estradiol.1,2,5,17 Cloroquina e Cetoconazol. Utilizados na sarcoidose. Devido a não existir grande experiência na utilização destes medicamentos, serão utilizados nos casos de ausência de resposta ao corticóide e na contra-indicação destes.1,2,5,17 Nitrato de Gálio. É um inibidor da reabsorção óssea, com relatos de ser mais potente que o etidronato, sendo administrado pela via endovenosa por até cinco dias, tornando seu uso de alto custo. Tem efeito nefrotóxico comprovado.1,2,5,17 Diálise. Está reservada àqueles pacientes que apresentam insuficiência cardíaca ou insuficiência renal em que a infusão salina não pode ser suportada. A utilização de diálise peritoneal é uma alternativa à hemodiálise.1,2,5,15 Agentes calcimiméticos, como a norcalcina, ligam-se aos receptores sensíveis ao cálcio e suprimem a liberação de PTH, podendo ser um tratamento futuro do hiperparatireoidismo primário. O uso de anticorpos contra os hormônios responsáveis pela hipercalcemia pode ser feito futuramente. Imunização em pacientes com hipercalcemia por carcinoma de paratireóide também pode ter resultados benéficos.59,60,61
FÓSFORO Introdução Embora o fósforo não seja o principal ânion em nosso organismo (é o sexto mais abundante), seu papel é de fundamental importância na manutenção do metabolismo celular, processo de mineralização óssea e manutenção do equilíbrio ácido-básico, entre outras funções. A sua homeostase é dependente da interação entre os sistemas digestivo, ósseo e dos rins, cabendo ao paratormônio (PTH) e à vitamina D a sua regulação.
Homeostase do Fósforo DISTRIBUIÇÃO O fósforo representa 1% do peso corporal total. A sua distribuição é a seguinte: 85% se encontram nos ossos, 14% nos tecidos moles e 1% no fluido extracelular. O fósforo se apresenta no sangue principalmente na forma de fosfolipídio (fósforo orgânico), cerca de 70% do total, sendo os 30% restantes na forma inorgânica. Nesta última forma, 15% estão ligados a proteínas e 75% são formas livres; destas, 50% formam fosfato monovalente e di-
valente, e outros 40% formam sais com sódio, magnésio e cálcio. Menos de 0,01% existe na forma de PO4. Os valores normais nos adultos vão de 2,5 a 4,5 mg/dl (0,81 a 1,45 mmol).
ABSORÇÃO, EXCREÇÃO E BALANÇO INTERNO Os mecanismos envolvidos na regulação do fósforo envolvem o trato gastrintestinal, rins e ossos. O PTH, cálcio, vitamina D e a calcitonina desempenham papel fundamental na homeostase deste ânion. Absorção Intestinal. A ingestão diária varia de 800 a 1.850 mg/dia; deste total, 65% são absorvidos principalmente a nível de duodeno e jejuno. No duodeno, sua absorção ocorre por meio de transporte ativo, intimamente relacionado e estimulado pela presença de vitamina D (cujo mecanismo é independente da absorção de cálcio), e pela concentração de sódio no lúmen intestinal. Outro mecanismo envolvido é o transporte passivo do íon, que ocorre no jejuno e no íleo e é diretamente proporcional à concentração de fósforo nestes segmentos. O PTH age indiretamente na absorção de fosfato por aumentar os níveis de calcitriol e conseqüentemente aumentando a absorção intestinal de fósforo. O cálcio e o magnésio em altas concentrações no lúmen digestivo se ligam ao fósforo, diminuindo sua absorção. O alumínio também forma complexos insolúveis no trato digestivo com o fósforo, sendo esta uma terapia utilizada na hiperfosfatemia da insuficiência renal crônica, por tempo limitado.1,2,21,23,25 Ossos. O fósforo participa de maneira direta e indireta do processo de mineralização óssea. Indiretamente, através da ação do PTH e da vitamina D. A hipofosfatemia leva a defeitos da mineralização óssea, além de aumento da atividade absortiva do osso por aumento dos níveis de vitamina D. Diretamente, pela ação do fosfato na matura-
Quadro 13.7 Fatores que influenciam a excreção de fósforo HIPERCALCEMIA
DIMINUI
PTH
AUMENTA
ACIDOSE
AUMENTA
ALCALOSE
DIMINUI
VITAMINA D
DIMINUI
INSULINA
DIMINUI
GLUCAGON
AUMENTA
DIURÉTICOS
AUMENTA
EXPANSÃO DE VOLUME
AUMENTA
CALCITONINA
AUMENTA
CORTICÓIDE
DIMINUI
226
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
ção e mineralização da matriz óssea, participando da produção de colágeno.20 Rins. Em um adulto normal, cerca de 5,25 g de fósforo inorgânico (Pi) são filtrados diariamente. Deste total, 80 a 97% são reabsorvidos nos túbulos renais. No túbulo contornado proximal (TCP) acontece 80% da reabsorção, com reabsorção quase nula a nível de alça de Henle. No túbulo contornado distal, 10% do total de Pi filtrado é reabsorvido, sendo controversa a reabsorção nos ductos coletores.
MECANISMOS DE TRANSPORTE O principal mecanismo de transporte, no túbulo proximal, é transcelular, dependente de energia, mantido pelo gradiente de sódio gerado pela bomba Na-K-ATPase na membrana basolateral. Este mecanismo é saturável, necessitando da presença de sódio no local de entrada na célula (bordo em escova da membrana), sugerindo assim um mecanismo carreador. O transporte se dá em torno de uma molécula de fósforo para duas moléculas de sódio, ou seja, sódio e fósforo são co-transportados.23,24
FATORES QUE REGULAM A EXCREÇÃO DE FÓSFORO Gradiente de Sódio e pH. Estes fatores fazem a regulação renal a curto prazo (modificação alostérica). Quando a concentração de sódio luminal está aumentada, ocorre uma maior absorção de fósforo pelos mecanismos já descritos. A atividade de co-transporte de sódio e fósforo é reduzida pelo aumento da concentração luminal de íons hidrogênio, sendo o efeito luminal da acidose maior quando a concentração de sódio no lúmen tubular diminui; isto pode ser explicado por um efeito inibitório da acidose no transporte de sódio.20,23,24,25 PTH. É o fator hormonal mais importante na reabsorção do fósforo nos rins, especialmente no túbulo contornado proximal. Sua ação a nível intracelular parece ser mediada pelo AMPc e proteína cinase C, regulando o cotransporte de sódio e Pi e inibindo a reabsorção local de fósforo.23,24 Vitamina D. A vitamina D, em especial o calcitriol, tem ação independente do PTH, pela maior absorção de fósforo no trato digestivo, promovendo sua maior reabsorção no túbulo contornado proximal. Calcitonina. Tem efeito hiperfosfatúrico pela diminuição do cálcio ionizado plasmático, diminuindo assim a reabsorção de fósforo no túbulo proximal. Insulina, Glicose e Glucagon. A insulina tem um efeito independente, aumentando a entrada de fósforo no interior da célula e levando à hipofosfatemia. A inibição da neoglicogênese diminui a concentração do fósforo citosólico e aumenta a reabsorção tubular de fósforo.
A administração de glicose provoca fosfatúria devido à diurese osmótica por ela provocada. Cálcio. A hipercalcemia provoca alterações na quantidade de Pi filtrado no túbulo, principalmente provocada pela saída de fósforo do interior da célula e conseqüente formação de complexos com o cálcio [Ca(PO4)2]; este efeito independe da ação do PTH. O efeito indireto se dá pela ação do PTH na hipercalcemia anteriormente descrita no metabolismo do cálcio. Corticóides. O corticóide diminui a reabsorção tubular de fósforo agindo diretamente no túbulo proximal, como acontece na síndrome de Cushing.
FUNÇÕES DO FÓSFORO NO ORGANISMO Nos ossos, o fósforo tem papel fundamental na mineralização óssea, pois ele é depositado na forma de cristais de hidroxiapatita, na matriz orgânica do osso. A sua deficiência pode ocasionar osteomalácia e raquitismo. Nos tecidos moles é componente das membranas celulares, material genético (DNA e RNA) e fator intermediário no metabolismo celular. Os fosfolipídios são os constituintes essenciais das membranas celulares e das organelas intracelulares. No eritrócito, o 2,3-difosfoglicerato (2,3-DPG) exerce influência direta na disponibilidade de oxigênio aos tecidos. Na deficiência de fósforo há redução na síntese de 2,3DPG, aumentando a afinidade da hemoglobina com o oxigênio e diminuindo sua disponibilidade aos tecidos. O fósforo faz parte da formação da adenosina trifosfato (ATP), que fornece energia para vários processos metabólicos fundamentais na vida da célula.1,2,20,25
Pontos-chave: • Em torno de 80% do fósforo filtrado é reabsorvido no túbulo contornado proximal • PTH é o fator mais importante na reabsorção de fósforo pelos rins
Hipofosfatemia INTRODUÇÃO Cerca de 1% do fósforo se distribui no espaço extracelular, sendo que deste total 30% representam a sua fração inorgânica, e é esta fração que é medida no plasma (Pi). Sendo assim, pode-se ter uma depleção do fósforo corporal total com concentrações “normais” no sangue. A hipofosfatemia é considerada leve quando os níveis de Pi estão em torno de 1 a 2,5 mg/dl, e grave quando esta concentração se encontra abaixo de 1,5 mg/dl. Um grupo especial de pacientes, os etilistas, desenvolvem mais freqüentemente este distúrbio, chegando à incidência de 10% em pacientes hospitalizados.25,26
capítulo 13
227
CAUSAS
Diminuição da Absorção Intestinal
São três os mecanismos responsáveis pela diminuição da concentração plasmática de Pi: redistribuição do fosfato extracelular para dentro da célula, diminuição da absorção intestinal e aumento das perdas urinárias. As principais causas de hipofosfatemia são listadas no Quadro 13.8.
A causa mais comum nesta situação é o uso de antiácidos, que formam complexos insolúveis com o fósforo e não são absorvidos. Doenças do trato gastrintestinal que causam dificuldade de absorção de fósforo (doença de Crohn, síndrome do intestino curto, doença celíaca, entre outras) e má absorção de vitamina D também são responsáveis pela diminuição na absorção. A diminuição da ingesta de fósforo é raramente causa isolada de hipofosfatemia, mas freqüentemente esta situação é associada a diarréia crônica, onde a deficiência de vitamina D também desempenha o seu papel, causando hiperparatireoidismo secundário e aumentando a excreção de fósforo. O jejum prolongado por si só raramente causa deficiência de fósforo, já que nesta situação há uma hipoinsulinemia e aumento do catabolismo celular, liberando fósforo da célula. Quando esses pacientes são novamente alimentados, este processo se inverte sem reposição de fósforo, e a hipofosfatemia aparecerá.2,28,30
Redistribuição Interna Nutrição. No processo de nutrição (enteral ou parenteral) em pacientes desnutridos, há um consumo maior de fósforo intracelular. Se quantidades insuficientes de fósforo são fornecidas na repleção nutricional destes pacientes, e concomitantemente grandes quantidades de carboidrato (estímulo à liberação de insulina) forem fornecidas, a hipofosfatemia aguda pode desenvolver-se. Pacientes submetidos a nutrição parenteral podem, por má absorção, jejum e aumento do metabolismo, desenvolver o mesmo quadro se a repleção de fosfato não for adequada.2,21 Alcalose Respiratória. A queda da pressão parcial de CO2 provoca a saída de CO2 do interior da célula, não sendo acompanhada na mesma proporção pelo bicarbonato. Isto desencadeia uma alcalose intracelular, com ativação da glicólise (ativada pela fosfofrutoquinase) e deslocamento do fósforo do extra- para o intracelular. É a causa mais comum de hipofosfatemia em pacientes hospitalizados. Situações clínicas como alcoolismo, síndrome de abstinência, queimaduras, hiperalimentação, uso de corticóides, calcitonina e catecolaminas determinam este distúrbio ácido-básico, levando à hipofosfatemia.31 Leucose. Contagens superiores a 100.000 leucócitos em leucemias ou crise blástica podem aumentar o consumo de fósforo pela intensa proliferação celular. Síndrome do Osso Faminto. Deposição de cálcio e fósforo nos ossos após cirurgia na região cervical (paratireoidectomia) causa hipocalcemia e hipofosfatemia, pela intensa deposição de cálcio e fósforo ósseo.
Quadro 13.8 Causas de hipofosfatemia REDISTRIBUIÇÃO INTERNA Aumento de insulina, durante nutrição Alcalose respiratória aguda Síndrome do osso faminto DIMINUIÇÃO DA EXCREÇÃO URINÁRIA Hiperparatireoidismo primário e secundário Raquitismo resistente à vitamina D • ligado ao X (infância) • osteomalácia oncogênica (no adulto) Raquitismo hereditário hipofosfatêmico com hipercalciúria Síndrome de Fanconi Acetazolamida
Aumento da Excreção Urinária Hiperparatireoidismo e Raquitismo. A hipersecreção de PTH ou análogo (PTHrP) leva a um quadro de hipofosfatemia por aumento na secreção de fosfato. A forma hereditária de raquitismo (raquitismo resistente à vitamina D) ou em associação a tumores na vida adulta (osteomalácia oncogênica) provoca defeitos seletivos tubulares na reabsorção de fósforo. Raquitismo severo, osteomalácia e retardo do crescimento manifestam-se nas crianças. Os níveis de calcitriol são reduzidos nas duas situações. Outra forma mais rara de raquitismo é aquele conhecido como hereditário hipercalciúrico hiperfosfatêmico de transmissão autossômica recessiva, apresentando níveis elevados de calcitriol devido à hipercalciúria2,21,23,26 Diabetes Mellitus. Pacientes que apresentam diabetes descompensado com glicosúria, poliúria e acidose aumentam a excreção de fósforo na urina em grandes quantidades. No quadro de cetoacidose ocorre uma maior produção de fósforo intracelular, havendo maior liberação para o plasma e aumentando ainda mais a sua excreção renal. A correção da cetoacidose com insulina e repleção do volume extracelular leva a queda rápida dos níveis de fósforo, porém a níveis dificilmente inferiores a 1 mg/dl, tornando sua reposição na maioria das vezes desnecessária.21,25,26 Síndrome de Fanconi. É uma disfunção tubular proximal que acontece no adulto geralmente em decorrência de mieloma múltiplo e na criança devido a cistinose ou doença de Wilson, que se traduz por glicosúria, aminoacidúria e hipouricemia com acidose tubular renal tipo 2, além de hiperfosfatúria.
228
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
QUADRO CLÍNICO
Sistema Cardiopulmonar
A hipofosfatemia causa uma variedade de sinais e sintomas. O quadro clínico é decorrente da diminuição dos níveis de 2,3-difosfoglicerato (2,3-DPG) e de compostos energéticos fundamentais à base de fósforo que mantêm o metabolismo celular (adenosina trifosfato-ATP). Os pacientes sintomáticos apresentam níveis de Pi abaixo de 1,0 mg/dl. As condições clínicas mais associadas à sintomatologia são: alcoolismo crônico, hiperalimentação sem fosfato e ingestão crônica de antiácidos. A cetoacidose diabética e a hiperventilação causam hipofosfatemia grave, porém em menor freqüência por não causar uma depleção crônica. Os principais sistemas atingidos com suas respectivas repercussões clínicas serão descritos adiante.2,21,26,27,28
A depleção de ATP prejudica a contratilidade miocárdica, levando à insuficiência cardíaca de baixo débito, podendo levar à falência miocárdica franca quando os níveis de fósforo atingem limites inferiores a 1,0 mg/dl. O acometimento da musculatura diafragmática e insuficiência respiratória podem acontecer em casos graves de hipofosfatemia.21
Disfunção Hematológica Hemácias. A diminuição intracelular do ATP leva a uma maior rigidez do eritrócito, promovendo a hemólise quando as concentrações de fósforo são inferiores a 0,5 mg/dl. Leucócitos. Também a diminuição do ATP intracelular leva a defeitos na fagocitose e quimiotaxia. Plaquetas. Trombocitopenia com defeitos na retração do coágulo é observada.
Sistema Nervoso Central Um quadro de encefalopatia metabólica pode ocorrer, levando a sintomas de irritabilidade, confusão mental, estupor e até mesmo coma, por provável mecanismo de hipóxia.
Sistema Músculo-esquelético Os músculos necessitam de grande quantidade de ATP para manter atividades de contração e manutenção de potencial de membrana, que são prejudicadas pela hipofosfatemia. A hipofosfatemia crônica leva a um acúmulo de água, sódio e cloro no interior da célula. O quadro clínico pode apresentar-se como uma miopatia proximal ou disfagia (atingindo a musculatura lisa). A rabdomiólise pode ocorrer quando a hipofosfatemia aguda acontece em um paciente que já apresenta depleção prévia de fósforo. Tais situações são vistas no alcoolismo crônico e em pacientes recebendo hiperalimentação sem suplemento de fósforo. Elevação da creatinina fosfoquinase aponta para necrose muscular.29
Sistema Ósseo A hipofosfatemia leva a um aumento de calcitriol que dá origem a uma maior reabsorção óssea, levando à hipercalciúria pela liberação de cálcio do osso. Hipofosfatemia prolongada leva ao raquitismo na infância e à osteomalácia no adulto, por defeitos na mineralização óssea.30
DIAGNÓSTICO Na maioria das vezes a causa da hipofosfatemia é aparente, pelos dados de história e exame físico. Quando a depleção de fosfato se estabelece, a reabsorção renal é máxima: sendo assim, podem-se diferenciar as situações clínicas calculando-se a fração excretora de fósforo ou medindo-se a sua concentração urinária nas 24 horas. A fração excretora de fósforo é calculada da seguinte maneira: Fep
fósforo urinário creatinina plasmática 100 fósforo plasmático creatinina urinária
Uma fração excretora de fósforo abaixo de 5% ou uma concentração urinária menor que 100 mg na urina de 24 horas afasta o diagnóstico de perda renal de fosfato. As principais causas envolvidas nesta situação se devem ou a um desvio intracelular de fósforo ou a uma diminuição da absorção intestinal. O desvio intracelular aumentado acontece mais freqüentemente se o paciente recebeu infusões de glicose ou insulina, como no tratamento do diabetes mellitus descompensado ou realimentação. A alcalose respiratória se encontra dentro das principais causas. Diarréia crônica, uso de antiácidos ou deficiência de vitamina D são as principais causas de má absorção. Quando a fração excretora de fósforo é maior que 20% ou a urina de 24 horas apresenta uma concentração maior que 100 mg, a perda renal de fosfato está presente, devendo-se investigar como causas principais hiperparatireoidismo primário e secundário (hipercalcemia, hipofosfatemia, perda urinária de fósforo), defeitos tubulares já anteriormente descritos, como a síndrome de Fanconi, raquitismo resistente à vitamina D (na criança) e osteomalácia oncogênica no adulto.1,2,21,25 Os sintomas de hipofosfatemia se iniciam quando os níveis séricos de fósforo atingem níveis inferiores a 1,5 mg/ dl; a maioria dos pacientes hipofosfatêmicos são assintomáticos, de maneira que o tratamento da causa subjacente é o principal objetivo. Por outro lado, nos pacientes sintomáticos, ou nos que tenham defeitos tubulares crônicos e que venham a desenvolver hipofosfatemia, a correção com suplementos à base de fósforo deve ser feita. O fósforo dosado no plasma é a forma elementar (inorgânico), e o fosfato se encontra nos sistemas biológicos, embora na prática não se faça esta distinção. A concentração plasmática de fosfato (2,5 a 4,5 mg/dl) é medida em
229
capítulo 13
mg/dl ou mmol/L, sendo que a conversão de uma unidade em outra obedece aos seguintes cálculos:2 1 mmol de fosfato 31 mg de fósforo elementar 1 mmol de fosfato 3,1 mg/dl de fósforo 1 mg de fósforo 0,032 mmol de fosfato 1 mg/dl de fósforo 0,32 mmol/L de fosfato A reposição é preferível na forma oral, já que a reposição endovenosa apresenta riscos de precipitação com cálcio, insuficiência renal e arritmias cardíacas. A administração oral se dá numa dose de 2,5 a 3,5 g (80 a 110 mmol) diários em doses divididas. Valores séricos abaixo de 1,0 mg/dl podem causar danos importantes ao paciente, como rabdomiólise, sendo a administração endovenosa necessária.58 No paciente sintomático a administração endovenosa não deve ultrapassar 2,5 mg (0,08 mmol/L)/kg a cada 6 horas, com monitorização dos níveis de fósforo, cálcio, potássio e magnésio a cada 6 horas, podendo a dose ser dobrada se as manifestações clínicas são muito graves. A infusão deve ser suspensa quando os níveis de fósforo atingem 2,0 mg/dl e os de cálcio estão menores que 8,0 mg/dl.1,2,21,25
FORMAS DE APRESENTAÇÃO Intravenosa Fosfato de Potássio. Cada ml contém 3 mmol de fosfato (93 mg de fósforo) e 4,4 mEq de potássio. Ampola de 5 ml e 15 ml são disponíveis. Fosfato de Sódio. Cada ml contém 3 mmol de fosfato (93 mg de fósforo) e 4 mEq de sódio. Ampolas de 15 e 30 ml são disponíveis.
Via Oral K/Phos Neutro. Cada tablete possui 250 mg de fósforo, 13 mEq de sódio e 1,1 mEq de potássio.
Pontos-chave: • Hipofosfatemia: Fósforo 2,5 mg/dl • Freqüente em alcoólatras • Diagnóstico através do quadro clínico e exame físico • Fração excretora de fósforo auxilia o diagnóstico • Dieta geralmente é o suficiente para tratar o déficit • Quando presentes sintomas graves, preferir a reposição endovenosa • Dipiridamol parece elevar os níveis de fósforo
Neutra-Phos. 75 ml de solução contém 250 mg e fósforo e 7,1 mEq de sódio e potássio. Neutra-Phos-K. Cada cápsula ou 75 ml de solução contém 350 mg de fósforo e 14,2 mEq de potássio. Prie demonstrou que o uso de dipiridamol na dose de 75 mg quatro vezes ao dia pode ser útil para aumentar os níveis de fósforo em pacientes com aumento idiopático da fosfatúria.69
Hiperfosfatemia INTRODUÇÃO A hiperfosfatemia, na maioria das vezes, é resultado da incapacidade dos rins em excretar, de maneira eficiente, o fosfato do organismo. Em indivíduos normais, elevações na ingesta de fósforo não acarretam elevações similares na concentração plasmática. A hiperfosfatemia é diagnosticada quando o nível plasmático de fósforo se encontra acima de 4,5 mg/dl.1,2,22
CAUSAS As principais causas de hiperfosfatemia são conseqüências de: • Aumento da ingesta • Diminuição de sua excreção • Desvios intracelulares de fósforo. A seguir se discutirão as principais causas dos distúrbios e suas conseqüências clínicas (v. Quadro 13.9).
Quadro 13.9 Causas de hiperfosfatemia DIMINUIÇÃO NA EXCREÇÃO RENAL Insuficiência renal • aguda • crônica Hipoparatireoidismo Pseudo-hiperparatireoidismo Acromegalia Difosfonatos Calcinose tumoral DESVIOS TRANSCELULARES Infecções Estados hipercatabólicos Leucose/leucemia Acidose metabólica e respiratória Síndrome de esmagamento (rabdomiólise) Hipertermia Anemia hemolítica PSEUDO-HIPERFOSFATEMIA Paraproteinemias Mieloma múltiplo Macroglobulinemia de Waldenström Hiperlipidemia Refrigeração prolongada Contaminação por heparina sódica
230
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
Diminuição na Excreção Insuficiência Renal. A hiperfosfatemia acontece quando o ritmo de filtração glomerular cai em torno de 20 a 25 ml/min, mantendo-se uma ingesta normal de fósforo. Na insuficiência renal crônica, a carga de fósforo filtrada por néfron aumenta, porém à custa da elevação dos níveis plasmáticos. Já na insuficiência renal aguda, quando há uma queda repentina do ritmo de filtração glomerular, este fenômeno compensatório não acontece, observando-se maiores elevações nos níveis plasmáticos de fósforo. Hipoparatireoidismo. As situações clínicas de deficiência na produção ou resistência na ação do PTH (pseudohipoparatireoidismo) levam à hiperfosfatemia. A diferenciação entre estas duas situações clínicas se dá pela medida dos níveis de PTH (que se encontram elevados no pseudo-hipoparatireoidismo) e pela medida do AMP cíclico urinário (diminuído no hipoparatireoidismo). Acromegalia/Hipertireoidismo. Cerca de um terço dos pacientes com hipertireoidismo podem apresentar hiperfosfatemia leve devido a uma maior reabsorção tubular e óssea de fósforo. Na acromegalia por ação do hormônio de crescimento se dá uma maior reabsorção tubular e óssea de fósforo. Na acromegalia por ação do hormônio de crescimento se dá uma maior reabsorção tubular e óssea de fósforo, porém na maioria das vezes de forma discreta, sem repercussão clínica.33 Drogas. Os bifosfonatos usados no tratamento da hipercalcemia e doença de Paget diminuem a excreção, bem como provocam desvios intracelulares de fósforo, elevando seus níveis séricos. Outras medicações, como uso abusivo de enemas e laxativos à base de fósforo, bem como a administração endovenosa de fosfato e derivados de vitamina D (calcitriol) em portadores de insuficiência renal, são outras causas bem estabelecidas. Calcinose Tumoral. É uma síndrome rara, encontrada em pacientes jovens da raça negra que apresentam calcificações ao longo de suas articulações. Trata-se de uma anormalidade genética causada por um aumento na reabsorção tubular de fósforo. Os níveis de cálcio e PTH são normais, porém há elevação dos níveis de calcitriol. O fósforo forma complexos com o cálcio causando hipocalcemia. Os níveis de cálcio permanecem normais devido a uma maior reabsorção no néfron distal, não havendo evidência de hipoparatireoidismo ou pseudo-hipoparatireoidismo.
Desvios Intracelulares de Fósforo Sendo o fósforo o ânion predominante no espaço intracelular, o intenso catabolismo celular ou sua destruição permite a passagem de fósforo do interior da célula para o meio extracelular. Situações clínicas que provocam necrose celular, tais como hepatite fulminante, hipertermia maligna e síndrome de esmagamento com rabdomiólise, causam hiperfosfatemia. A terapia citotóxica em doenças hematológicas, como a leucemia linfoblástica aguda e linfomas, provoca a cha-
mada síndrome de lise tumoral, caracterizada por hiperfosfatemia, hipocalcemia, hiperuricemia e hiperpotassemia. Quando existe precipitação de ácido úrico nos túbulos renais, ocorre insuficiência renal, podendo agravar a hiperfosfatemia. Na cetoacidose diabética, apesar de haver uma diminuição do fósforo corporal total devido à diurese osmótica, há um desvio de fósforo (Pi) do intracelular para o extracelular (v. hipofosfatemia), revertido com o tratamento e que posteriormente evolui para hipofosfatemia.1,2,22,32 A acidose metabólica provoca um maior metabolismo do fósforo orgânico para inorgânico e conseqüente liberação para o extracelular.2
PSEUDO-HIPERFOSFATEMIA Situações como a hemólise durante a coleta de sangue, ou a presença de gamopatias monoclonais (provocando uma maior ligação do fósforo com as paraproteínas), podem causar elevações falsas dos níveis plasmáticos.35
QUADRO CLÍNICO As manifestações clínicas da hiperfosfatemia se dão em função de sua ação sobre os níveis de cálcio sérico, PTH, calcitriol e na ação inibitória sobre a atividade da 1α-hidroxilase. A hiperfosfatemia grave leva à hipocalcemia, devido aos depósitos de cálcio e fósforo nos tecidos moles, além do efeito inibitório sobre o calcitriol. Este processo de deposição é visto quando o produto cálcio e fósforo ultrapassa o valor de 70 (normal de 40), e a calcificação se dá nos vasos sanguíneos, pulmão, córnea, rins, pele e mucosas.2,22,32,33 A síndrome do olho vermelho, devido à calcificação da córnea, e deposição periarticular atingindo articulações dos dedos, costelas e ombros são outros achados. A hipocalcemia sintomática aparecerá, levando a convulsões em casos graves de hiperfosfatemia. Mesmo assim, elevações súbitas dos níveis de fósforo, que atinjam 6 mg/ dl, podem causar sintomas.2
Pontos-chave: • A insuficiência renal é a principal causa de hiperfosfatemia • Sendo o fósforo o principal ânion intracelular, situações clínicas de destruição celular (ex., rabdomiólise) se acompanham de hiperfosfatemia TRATAMENTO Os princípios do tratamento da hiperfosfatemia são aqueles que procuram atingir a causa subjacente do distúrbio, diminuindo a absorção e promovendo a maior excreção renal deste íon. Em pacientes que apresentam função
231
capítulo 13
renal normal, o aumento da ingesta de fósforo raramente causa hiperfosfatemia. Na síndrome de lise tumoral, quando da quimioterapia, a promoção de uma diurese vigorosa (como aquela promovida na hipercalcemia), com infusão de solução salina e uso de acetazolamida 15 mg/kg ou 500 mg a cada 6 horas, diurético que alcaliniza a urina impedindo a precipitação de cristais de ácido úrico e promovendo a natriurese, é eficaz na produção de uma maior excreção de fósforo.2,22 Nos pacientes portadores de insuficiência renal crônica, quando o ritmo de filtração glomerular atinge 20 a 25 ml/min, a restrição da ingesta de fósforo em 600 a 900 mg/ dia se faz necessária, porém a utilização de substâncias que se liguem ao fósforo na luz intestinal (quelantes), impedindo a sua absorção, é de uso corriqueiro.34 O hidróxido de alumínio na dose de 500 a 1.800 mg 3 a 6 vezes por dia com as refeições ou 20 minutos após as refeições está indicado para pacientes com hiperfosfatemia visando à redução mais rápida dos níveis séricos de fósforo. As formas de apresentação podem ser cápsulas, líquido, suspensão e tabletes. As cápsulas se apresentam nas doses de 400 mg ou 500 mg; líquido, 600 mg/5 ml; suspensão oral, 320 mg/5 ml, 450 mg/5 ml ou 675 mg/5 ml; e tabletes de 300 mg, 500 mg ou 600 mg.51,63 No Brasil a forma mais comum de apresentação parece ser a suspensão oral. O carbonato de cálcio na dose de 8,5 g (variando de 2,5 a 20 g/dia), com efeito máximo de 1 g junto às refeições, liga-se ao fosfato tanto exógeno como endógeno (secretado pelo pâncreas e parótidas) na luz intestinal e inibe de maneira eficaz a absorção do fósforo.1,2,22,34 A dose de carbonato de cálcio é aumentada gradualmente até o fósforo plasmático atingir uma concentração entre 4,5 e 5,5 mg/ dl. Hipercalcemia é uma complicação comum com o uso de carbonato de cálcio, ocorrendo mais freqüentemente quando usadas preparações de vitamina D (calcitriol).62,63 O uso crônico de hidróxido de alumínio em pacientes em hemodiálise pode levar à intoxicação por este metal, com quadro de encefalopatia, osteomalácia resistente à vitamina D, anemia e miopatia, devendo-se fazer substituição pelo carbonato de cálcio. Quando há hipercalcemia, cálcio em torno de 11 mg/dl com hiperfosfatemia persistente em níveis elevados, o acréscimo de hidróxido de alumínio deve ser feito por um período provisório até o melhor controle de cálcio e fósforo.22 Um novo agente não contendo cálcio, alumínio e magnésio, assim evitando os problemas das medicações contendo estes íons, está sendo usado com bons resultados. O sevelamar é um polímero catiônico que quela o fósforo por troca iônica. Trabalhos mostraram que o sevelamar foi tão efetivo quanto os quelantes habitualmente usados, como carbonato de cálcio ou acetato de cálcio, não alterando a concentração plasmática de cálcio e controlando os níveis de fósforo. Também foi constatado um efeito na redução dos níveis de colesterol total. O uso de sevelamer (Rena-
gel®) fica reservado, geralmente, para pacientes com hipercalcemia, devido aos seus custos.64,65,68 Em pacientes portadores de hipoparatireoidismo, a administração de PTH aumentaria a excreção de fosfato urinário, porém o uso a longo prazo determina a formação de auto-anticorpos, limitando sua ação terapêutica. A importância de sua utilização se dá na diferenciação do hipoparatireoidismo primário do pseudo-hipoparatireoidismo, quando se mede o fósforo urinário nestas duas situações, após sua administração. Observar-se-á que, no pseudo-hiperparatireoidismo, não há aumento na excreção urinária de fósforo, ao contrário do que ocorre no hipoparatireoidismo. Os genes responsáveis pelo transporte fosfato-sódio dependente foram recentemente isolados. Novas drogas estão sendo estudadas para tratar a hiperfosfatemia. Estas drogas atuam nos transportadores fosfato-sódio, como o ácido fosfomórfico (PFA), que inibe o transporte fosfatosódio-dependente no túbulo renal. Em ratos esta droga aumentou a fração de excreção de fósforo, resultando em melhora dos valores séricos. O uso de PFA em humanos é limitado pela toxicidade renal.66,67
Pontos-chave: • Hiperfosfatemia: Fósforo 4,5 mg/dl • Quadro clínico: Semelhante à hipocalcemia. Predomínio de sintomas neurológicos. Depósitos nos tecidos moles quando produto cálcio fósforo 70 • Tratamento da causa. Restrição dietética de fósforo. Evitar prescrever hidróxido de alumínio devido a doença óssea relacionada ao alumínio. Uso restrito para redução rápida do fósforo • Sevelamer: Uso na presença de hipercalcemia concomitante
MAGNÉSIO Homeostase do Magnésio DISTRIBUIÇÃO O magnésio (Mg) é o quarto íon mais abundante do organismo, sendo a nível intracelular o segundo mais prevalente, após o potássio. Um adulto normal possui cerca de 24 g de Mg, sendo a fração sérica muito pequena em relação ao magnésio corporal total, distribuindo-se da seguinte maneira: • 60% nos ossos • 39% no espaço intracelular • 1% no espaço extracelular.
232
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
No plasma cerca de 60% do magnésio se encontram livres (fração iônica),30 35% ligados às proteínas e 5 a 10% formando complexos com bicarbonato, citrato e fosfato.
Néfron Justamedular
Néfron Cortical Superficial
UNIDADES DE MEDIDA O magnésio é mensurado em três unidades; mmol/L, mg/dl e mEq/L. 1 mEq/L corresponde a 0,5 mmol/L e 1,2 mg/dl. O valor definido como normal para a concentração sérica de magnésio é de 1,4 a 1,7 mEq/L.
ABSORÇÃO, EXCREÇÃO E BALANÇO INTERNO Absorção Intestinal A dieta habitual de Mg é de aproximadamente 4 mg/ kg/dia. Deste total, 25 a 60% são absorvidos no intestino delgado. Os mecanismos envolvidos neste processo são: difusão passiva e difusão facilitada. O movimento de água na luz intestinal tem papel relevante na absorção de Mg. Os principais fatores que influenciam na absorção intestinal de magnésio são: • proteínas, carboidratos, sódio, água e vitamina D ⇒ estimulam a absorção • fosfato ⇒ inibe a absorção. A quantidade de magnésio na dieta é de fundamental importância, pois dietas com baixo teor de magnésio aumentam a capacidade de absorção intestinal em até 90% do total ingerido. A excreção diária de magnésio é em torno de 30 a 40 mg/dia pelas fezes.1,2,36
Rins O Mg difere da absorção de outros ânions pelo fato de o túbulo contornado proximal não ser o responsável principal pela sua reabsorção e sim a alça de Henle (ramo ascendente espesso). Do total de 3.400 mg/dia de Mg filtrado, 15 a 25% são reabsorvidos no TCP e 5 a 10% no túbulo distal, sendo o restante na alça de Henle.1,2,36 Os mecanismos responsáveis pela absorção de magnésio na alça de Henle não estão completamente estabelecidos, porém o transporte paracelular por difusão devido a um gradiente elétrico favorável, gerado pela reabsorção de cloreto de sódio, é a teoria mais aceita.36 A reabsorção paracelular parece ser facilitada por uma proteína chamada paracelin 1 (PCLN-1). A perda de magnésio estaria relacionada a mutações no gene da proteína PCLN-1, que estão localizadas na alça espessa de Henle.52 A ação do PTH, aumentando a reabsorção local, é um fator relevante no transporte deste íon no ramo ascendente espesso da alça de Henle. Também o transporte passivo de Mg se dá devido a um gradiente eletronegativo no interior da célula, gerado por uma concentração intracelular de magnésio de 1,0 mEq/L, facilitando o transporte do lúmen tubular para o interior da célula.2,36
Fig. 13.2 Demonstração das áreas de reabsorção de magnésio no néfron justamedular e néfron cortical superficial.
A célula tubular da alça de Henle na membrana basolateral possui um processo ativo de transporte de Mg para fora da célula, através de bomba ativa ou troca de Na por Mg. No túbulo proximal, a absorção do magnésio é de 15 a 25%, sendo o mecanismo unidirecional e dependente da quantidade de magnésio na luz tubular. Já no túbulo distal, 10% do Mg filtrado é ofertado a este segmento, onde somente uma pequena fração é reabsorvida, através de canais de magnésio da membrana luminal e com mecanismos na membrana basolateral semelhantes àqueles da alça de Henle.1,2,36
Ponto-chave: • Reabsorção de magnésio: Principalmente no ramo espesso da alça de Henle (70 a 75%), ao contrário de outros íons FATORES QUE INFLUENCIAM A EXCREÇÃO DE MAGNÉSIO Os principais fatores envolvidos na excreção do magnésio são: Hipo- e Hipermagnesemia. A concentração de magnésio plasmático é a principal responsável pela excreção urinária, principalmente no segmento cortical ascendente da alça de Henle. A hipermagnesemia diminui a reabsorção, ao contrário da hipomagnesemia. Há alguma evidência de que a concentração intracelular de Mg regula esta resposta, modificando o número de canais de Mg na membrana luminal.36 Hipo- e Hipercalcemia. A hipercalcemia parece aumentar a excreção de magnésio devido ao fato de o cálcio com-
capítulo 13
petir com o transporte passivo de magnésio. Por outro lado, a hipocalcemia pode aumentar a reabsorção de Ca e Mg. Este fato se reflete nos pacientes portadores da síndrome de hipercalcemia hipocalciúrica que apresentam hipermagnesemia devido à ausência do efeito inibitório da hipercalcemia na reabsorção de magnésio. PTH. Como já foi visto, o PTH aumenta a reabsorção de magnésio, principalmente na alça de Henle. Diuréticos. Tanto os diuréticos de alça como os tiazídicos e diuréticos osmóticos causam hipermagnesiúria, principalmente por diminuir o transporte de sódio, cloro e cálcio.38 Expansão de Volume. A expansão de volume causa uma diminuição na reabsorção de sódio, água e magnésio, por um aumento do fluxo tubular que chega à alça de Henle, gerando um menor gradiente elétrico transtubular comprometendo a reabsorção. Ossos. Aproximadamente 60% do magnésio total se encontra nos ossos, na superfície óssea na forma de cristais, pronto para a mobilização em estados de deficiência. A hipocalcemia que se dá em situações de hipomagnesemia pode em parte ser explicada pela troca a nível da superfície óssea do cálcio pelo magnésio.1,2,36
FUNÇÕES DO MAGNÉSIO NO ORGANISMO O magnésio participa de múltiplas funções no organismo. É importante para a ação de cerca de 300 enzimas, na glicogenólise e respiração celular, nas funções da membrana e aderência celular, transporte transmembrana de sódio, potássio e cálcio. Participa das funções de contração e relaxamento muscular, neurotransmissão e condução do potencial de ação e influencia na função de proteínas e mitocôndrias. Também auxilia na estrutura do ribossomo e na ligação do RNA mensageiro ao ribossomo.70,71
Hipomagnesemia Define-se hipomagnesemia quando a concentração sérica de magnésio é menor que 1,4 mEq/L (0,7 mmol/L ou 1,7 mg/dl). A incidência deste distúrbio chega a 12% dos pacientes hospitalizados, chegando em unidades de tratamento intensivo a 65%. Desnutrição, hipoalbuminemia e uso de aminoglicosídeos contribuem para esta maior incidência, nas unidades de tratamento intensivo.37,44
CAUSAS Há três mecanismos principais causando a hipomagnesemia: redução na absorção intestinal, aumento da perda urinária e desvio intracelular do íon. As causas principais de hipomagnesemia se encontram no Quadro 13.10.
Perdas Gastrintestinais As principais causas de perdas gastrintestinais se devem a quadros de má absorção intestinal, como o espru tropi-
233
Quadro 13.10 Causas principais de hipomagnesemia PERDAS GASTRINTESTINAIS Diarréia, pancreatite aguda, síndrome do intestino curto, hipomagnesemia intestinal primária, esteatorréia PERDAS RENAIS Diuréticos (de alça e tiazídicos), cisplatina, aminoglicosídeos, anfotericina B, pentamidina, ciclosporina Álcool Expansão de volume Hipercalcemia Transplante renal Diurese pós-obstrutiva Síndrome de Bartter Perda renal primária de magnésio MISCELÂNEA Síndrome do osso faminto Foscarnet Pós-operatório
cal, ressecção intestinal, fístulas biliares, causadoras de perdas significativas de magnésio. Outras condições, como a pancreatite aguda, causam deficiência de magnésio. A esteatorréia, outra situação de perda gastrintestinal, forma “sabões” na luz intestinal, com perda de magnésio. Aspiração nasogástrica contínua sem reposição concomitante de magnésio causa hipomagnesemia, já que o fluido gástrico tem aproximadamente 1 mEq/L de magnésio. Outra situação mais rara é um erro inato do metabolismo caracterizado por deficiência seletiva na absorção de magnésio, sendo que esta desordem se apresenta no período neonatal, quando ocorre hipocalcemia, que se corrige com reposição de magnésio. O desenvolvimento de hipomagnesemia por ingestão diminuída é uma causa rara do distúrbio. O abuso de laxativos e diarréia crônica são outras causas.2,36,37,45
Perdas Renais As perdas renais de magnésio se dão ou por defeitos tubulares específicos no transporte de magnésio, ou por defeitos tubulares específicos no transporte de sódio, com conseqüente déficit na reabsorção de magnésio nos segmentos do néfron onde ocorre o transporte passivo de sódio e magnésio.36,45 Diuréticos. Os diuréticos de alça e os tiazídicos inibem a reabsorção de magnésio, enquanto os poupadores de potássio aumentam o transporte de magnésio do lúmen tubular para o interior da célula no túbulo coletor. A diurese osmótica, provocada por estados de hiperglicemia, e a diurese pós-obstrutiva causam perdas de magnésio na urina.2,36,41 Nefrotoxinas. Os aminoglicosídeos causam hipomagnesemia, hipocalcemia e hipopotassemia. A cisplatina é
234
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
outra droga que causa hipomagnesemia, chegando a 50% dos pacientes em algumas séries. Outras drogas são a anfotericina B, que causa acidose tubular renal e hipomagnesemia leve, e a ciclosporina, que ocasiona perda renal de magnésio após transplante renal e de medula óssea.1,2,36,43,45 Álcool. Vários mecanismos estão envolvidos no desenvolvimento de hipomagnesemia nos pacientes etilistas: diarréia, baixa ingestão e efeito direto do álcool no túbulo renal, causando perda urinária de magnésio. Hipercalcemia. Cálcio e magnésio parecem competir pelo mesmo local de reabsorção no ramo espesso ascendente da alça de Henle, onde a hipercalciúria nesta situação provoca maior perda de magnésio na urina. Isto pode ser comprovado pela hipomagnesemia leve encontrada no hiperparatireoidismo primário.2,36 Disfunção da Alça de Henle. Disfunções aí localizadas, como na fase de recuperação da necrose tubular aguda, diurese pós-obstrutiva e na síndrome de Bartter (defeito congênito que promove a perda renal de potássio, alcalose metabólica, hipercalciúria e hipomagnesemia).45 Expansão de Volume. O maior exemplo é o que acontece nos estados de hiperaldosteronismo cuja expansão do volume extracelular leva a um menor efeito de reabsorção do magnésio através de seus mecanismos passivos. Miscelânea. Dentre outras causas, destacamos a cetoacidose diabética antes do tratamento, pelo quadro hipercatabólico, e a perda urinária devida à diurese osmótica intensa. Na síndrome do osso faminto pós-tireoidectomia com ressecção inadvertida da paratireóide ou paratireoidectomia pode ocorrer uma maior deposição de magnésio ao nível ósseo. Na insuficiência renal crônica, acidose tubular renal e nefrite intersticial, pode-se observar uma perda maior de magnésio na urina.1,2,36,41,43,44,45
Outros estudos demonstram que a administração de magnésio após eventos isquêmicos nas primeiras 24 horas diminui a incidência de arritmias neste período. O risco de intoxicação digitálica pode ser observado na hipomagnesemia, pela perda intracelular de potássio. Isto decorre do fato de que a diminuição na concentração de magnésio intracelular provoca uma diminuição na atividade do ATP, responsável por inibir a secreção de potássio do interior da célula, abrindo-se os canais permeáveis ao potássio com conseqüente secreção deste para o interior do lúmen tubular. A hipocalemia se desenvolve e só é corrigida com a reposição concomitante de magnésio.39 O papel que desempenha o magnésio na patogênese da hipertensão arterial é investigado, parecendo haver uma correlação inversa entre a ingestão de magnésio e a incidência de hipertensão.2,36 Hipocalcemia. O sinal mais proeminente de hipomagnesemia grave é a hipocalcemia, onde são encontrados níveis de PTH normais ou baixos. A hipomagnesemia suprime a secreção de PTH, aumenta a resistência óssea ao hormônio e diminui os níveis de AMPc em resposta à ação do PTH.2,36,42,45
QUADRO CLÍNICO
Onde U e P são as amostras das concentrações urinária e plasmática de magnésio e creatinina, respectivamente. A concentração plasmática de magnésio é multiplicada por 0,7 devido ao fato de 70% do magnésio se encontrar livre no plasma; este produto é então multiplicado pela concentração urinária de creatinina. A coleta da amostra para determinação do magnésio sérico pode alterar-se quando ocorre hemólise, elevando in vitro a sua concentração. Para cada 1 g/L de queda de hemoglobina por lise, há elevação de 0,05 mmol/L. Valores de FE Mg maiores que 2% ou magnésio medido nas 24 horas maior que 10 mg representam perdas devido ao uso de drogas (aminoglicosídeos, cisplatina, diuréticos).1,2,44
O quadro clínico da hipomagnesemia é acompanhado na maioria das vezes por outros distúrbios metabólicos, como hipopotassemia, hipocalcemia e alcalose metabólica, além de depender da velocidade de instalação do distúrbio. Manifestações Neuromusculares. A tetania é um achado comum, quando associada a hipocalcemia, sendo rara na ausência deste distúrbio. O sinal de Chvostek é mais comum que o de Trousseau na hipomagnesemia. Convulsões, tremores e mioclonia também são outros achados.2 Os sinais neuromusculares são mais comuns em etilistas e pacientes com má absorção intestinal. Manifestações Cardiovasculares. As manifestações cardiovasculares mais importantes são as arritmias ventriculares, especialmente durante os fenômenos isquêmicos. Muitos estudos não controlados têm apontado uma maior incidência de arritmias ventriculares em pacientes com hipomagnesemia do que com níveis normais de magnésio.42,45
DIAGNÓSTICO A hipomagnesemia deve ser suspeitada na presença de: diarréia crônica, uso de diuréticos, hipocalcemia, hipopotassemia refratária, arritmias ventriculares particularmente após eventos isquêmicos. Para diferenciar se a causa da hipomagnesemia é de origem renal ou gastrintestinal, deve-se medir a excreção de magnésio nas 24 horas. A medida em 24 horas e não em uma amostra é importante devido às variações diurnas na excreção do magnésio.53 A fração de excreção de magnésio se calcula através da seguinte fórmula: FE Mg MgU CrP / (0,7 MgP) CrP
TRATAMENTO A hipomagnesemia leve (níveis em torno de 1,4 mg/dl a 1,7 mg/dl) não necessita de tratamento, mas de correção da causa subjacente. Alguns autores recomendam terapia oral com tabletes de magnésio para pacientes assintomáti-
capítulo 13
cos. O uso de 2 a 4 tabletes com 5 a 7 mEq por tablete parece ser suficiente. Nos casos mais severos deve-se aumentar para 6 a 8 tabletes. Já em casos de emergência, pacientes apresentando convulsões ou tetania, as primeiras medidas são infusão de 200 mg (8,2 mmol) de sulfato de magnésio a 50%, ou 4 ml de MgSO4 a 50% em 100 ml de solução salina isotônica, devendo ser administrados em 10 minutos e os níveis de magnésio novamente medidos em 30 minutos. Pode ser repetida a dose quando necessário.1,2,36 Em casos menos urgentes, uma infusão constante de 0,5 mmol/kg nas 24 horas ou 2 ml de sulfato de magnésio a 50% (4,1 mmol ou 100 mg) intramuscular a cada 3 ou 4 horas podem ser administrados no primeiro dia, com posterior redução da dose. Outra forma de reposição, quando há presença de arritmia ou tetania, é realizar a infusão de 50 mEq de magnésio via endovenosa em 8 a 24 horas, com o intuito de manter a concentração de magnésio acima de 1,0 mg/dl. Em pacientes sob nutrição parenteral, a adição de 4,1 mmol (100 mg) previne o desenvolvimento de hipomagnesemia. Adultos com perda intestinal podem receber terapia oral na dose de 240 a 720 mg/dia.1,36,45 Como o magnésio plasmático é o principal responsável pela reabsorção renal, elevações abruptas no plasma podem levar à eliminação de 50% do magnésio infundido, pela abolição do estímulo de conservação do magnésio.36
Pontos-chave: • Hipomagnesemia geralmente é acompanhada de outros distúrbios metabólicos, como hipocalcemia e hipopotassemia. A hipocalcemia é um indicador de gravidade da hipomagnesemia • Hipomagnesemia leve: sem tratamento • Hipomagnesemia com sintomas severos: terapia endovenosa
Hipermagnesemia DEFINIÇÃO Define-se hipermagnesemia quando os níveis de magnésio são superiores a 2,1 mEq/L (1 mmol/L ou 2,6 mg/ dl). Em indivíduos com ingestão normal, ao redor de 3% do magnésio ingerido é excretado na urina, em especial no ramo ascendente espesso da alça de Henle.2,48,49
CAUSAS DE HIPERMAGNESEMIA As causas principais de hipermagnesemia encontramse no Quadro 13.11. Como o aumento de magnésio não possui um sistema hormonal regulador e o rim é o principal responsável pela sua excreção, a hipermagnesemia se
235
Quadro 13.11 Causas principais de hipermagnesemia AUMENTO DA INGESTA • Administração excessiva de magnésio: oral, retal; rara em pacientes com função renal normal DIMINUIÇÃO DA EXCREÇÃO RENAL • Aumento da ingesta de substâncias que contenham magnésio, como antiácidos, laxativos, lítio, diuréticos, poupadores de potássio • Conteúdo alto de magnésio no dialisado OUTRAS CAUSAS • Hiperparatireoidismo primário • Hipercalcemia hipocalciúrica familiar • Cetoacidose diabética • Estados hipercatabólicos • Tratamento da intoxicação por teofilina • Síndrome álcali-leite • Insuficiência supra-renal
desenvolverá em casos de insuficiência renal ou devido ao abuso de magnésio administrado sob a forma oral (antiácidos e laxativos), enema ou endovenosa.1,2,48,49,50 Insuficiência Renal. Como se sabe, o rim tem grande capacidade de excretar o excesso de magnésio do organismo. Desta maneira, a hipermagnesemia acontece nos pacientes portadores de insuficiência renal crônica e em pacientes que estão em hemodiálise. O uso, nesta população, de antiácidos, enemas e dialisados com alta concentração de magnésio são causas deste distúrbio. Aumento da Ingestão. Em pacientes com função renal normal, a administração excessiva de magnésio por via oral, retal ou endovenosa pode ser responsável pelo aumento dos níveis de magnésio no plasma. O exemplo clássico é o tratamento da eclâmpsia, quando níveis de 6 a 8,5 mg/dl podem causar hipocalcemia materna (inibição da liberação de PTH) e hipopotassemia neonatal. Quantidades substanciais de magnésio são absorvidas pelo intestino grosso na forma de enemas. Por exemplo, 400 a 800 mmol/d de magnésio via retal aumentam a concentração plasmática de 7,2 até 19,2 mg/dl. Outras Causas. A insuficiência supra-renal e o hiperparatireoidismo têm sido relatados como causa de hipermagnesemia, por provocarem contração de volume plasmático no primeiro caso e pelo efeito direto do PTH no segundo, aumentando a reabsorção tubular de magnésio. A hipercalcemia diminui a reabsorção renal de magnésio, contrabalançando o efeito do PTH e deixando os níveis de magnésio normais e até baixos. Nos pacientes com a síndrome familiar da hipercalcemia hipocalciúrica, a ausência do efeito inibitório do cálcio no túbulo renal provoca a hipermagnesemia. O desvio de magnésio para o extracelular pode dar-se
236
Metabolismo do Cálcio, Fósforo e Magnésio
em casos de acidose, feocromocitoma, estados hipercatabólicos e síndrome de lise tumoral.1,2,48,49
QUADRO CLÍNICO A hipermagnesemia é uma situação rara na ausência de insuficiência renal ou administração de substâncias que contenham magnésio. A gravidade e a presença dos sintomas vão variar com a intensidade do distúrbio que, quando leve (menor que 3 mEq/L, 3,6 mg/dl ou 5 mmol/L), causa poucos sintomas. Neuromuscular. O aumento dos níveis de magnésio diminui o impulso nervoso através da junção neuromuscular, provocando um efeito curarizante. Há diminuição dos reflexos profundos, notados quando os níveis atingem 4 a 6 mEq/L (4,8 a 7,2 mg/dl ou 2 a 3 mmol/L); se houver maior elevação dos níveis plasmáticos, poder-se-ão observar quadriplegia flácida e paralisia respiratória.47 Cardiovascular. No coração o magnésio tem efeito através do bloqueio dos canais de cálcio e de potássio, levando a efeito inotrópico negativo e arritmogênico, quando sua concentração atinge 4 a 5 mEq/L (4,8 a 7,2 mg/dl ou 2,0 a 2,5 mmol/L), com conseqüente hipotensão arterial e bradicardia. Em quadros mais graves, bloqueio atrioventricular total poderá ocorrer.46 Hipocalcemia. Hipermagnesemia leve a moderada pode levar a inibição na secreção de PTH, levando a uma redução transitória na concentração de cálcio e na maioria das vezes não associada a sintomas, além de exercer um efeito bloqueador sobre os canais de cálcio.2,46,48 Hiperpotassemia. A hipermagnesemia provoca o bloqueio dos canais de secreção de potássio.2,48
TRATAMENTO A maioria dos casos de hipermagnesemia pode ser evitada, como nos renais crônicos, não utilizando produtos que contenham magnésio. Quando a função renal é normal, a parada de infusão de magnésio determina a resolução do distúrbio. Nos pacientes com quadro de risco de vida a infusão de gluconato de cálcio, 100 a 200 mg, infundido em 5 a 10 minutos, agindo como antagonista do magnésio (o magnésio é um bloqueador dos canais de cálcio), deve ser feita imediatamente. A associação de insulina e glicose aumenta a entrada de magnésio para o interior da célula.48,49 Nos pacientes em hemodiálise se fará o tratamento com um dialisado livre de magnésio.2,48,49
3. 4.
5.
6.
7. 8.
9.
10. 11.
12.
13. 14. 15.
16. 17. 18. 19. 20.
21.
22.
23. 24. 25. 26.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
27. 28.
1. SUTTON, R.A.L., DIRKS, J.H. Disturbance of calcium and magnesium metabolism. In: Brenner, B.M., Rector Jr, F.C. The Kidney, Philadelphia: W.B. Saunders, 841, 1991. 2. BLACK, R.M.; ALFRED, H.J.; FAN, P.Y.; STOFF, J.S. Disorders of calcium, phosphorus, and magnesium. In: Rose, D.; Black, R.M. Cli-
29. 30.
nical Problems in Nephrology. New York: Little, Brown and Company, 1995, 96-120. KUMAR, R. Calcium metabolism. In: Jacobson, H.R.; Stiker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology. St Louis: Mosby, 964, 1995. MUNDY, G.R.; REASNER, C.A. Hypocalcemia. In: Jacobson, H.R.; Stiker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology. St Louis: Mosby, 971, 1995. MUNDY, G.R.; REASNER, C.A. Hypocalcemia. In: Jacobson, H.R.; Stiker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology. St Louis: Mosby, 977, 1995. WASSERMANN, R.H. and FULMER, C.S. Calcium transport proteins, calcium absorption, and vitamin D. Ann. Rev. Physiol., 45:375, 1983. KUROKAWA, K. Calcium regulating hormones and the kidney. Kidney Int., 32:760, 1987. REICHEL, H.; KOEFFLER, H.; NORMANN, A. The role of vitamin D endocrine system in health and disease. N. Engl. J. Med., 320:980, 1989. DESAI, T., CALRSON, R., GEHEB, M. Prevalence and clinical implications of hypocalcemia in acutely ill pacients in a medical intensive care setting. Am. J. Med., 84:209, 1988. BRESLAU, N.A. and PAK, C.Y. Hypoparathyroidism. Metabolism, 28:1261, 1979. GRABER, M.L. and SCHULMAN, G. Hypomagnesemic hypocalcemia independent of parathyroid hormone. Ann. Int. Med., 104:804, 1986. PAPAPOULOS, S.E.; CLEMENS, T.L.; FRAHER, L.J. et al. Metabolites of vitamin D in human vitamin D deficiency: Effect of vitamin D, or 1,25-dihydroxycholecalciferol. Lancet, 2:612, 1980. THOMES, J.F., BILEZKIAN, J.P. Hypocalcemic emergencies. Endocrinol. Metab. Clin. North Am., 22:363, 1993. ATTIE, M. Hypocalcemic symptoms following parathyroidectomy. JAMA, 265:2888, 1991. MERIC, F.; YAP, P.; BIA, M. Etiology of hypercalcemia in hemodialysis pacients on calcium carbonate therapy. Am. J. Kidney Dis., 16:459, 1990. ADAMS, J. Vitamin D metabolite related hypercalcemia. Endocrinol. Metab. Clin. North Am., 18:765, 1989. MALLETE, L.E. The hypercalcemias. Semin. Nephrol., 12:159, 1992. ADAMI, S.; ROSSINI, M. Hypercalcemia of malignancy: pathophysiology and treatment. Bone, 13 Suppl 1:51, 1992. MORTON, A.R.; FRIEFELD, J.; HALPERIN, F. Done of biphosphonate of malignancy. Lancet, 335:1496, 1990. HRUSKA, K.A.; KOVACH, K.L. Phosphate balance and metabolism. In: Jacobson, H.R.; Sticker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology. St Louis: Mosby, 986, 1995. HRUSKA, K.A.; KOVACH, K.L. Hypophosphatemia. In: Jacobson, H.R.; Sticker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology. St Louis: Mosby, 986, 1995. HRUSKA, K.A.; KOVACH, K.L. Hypophosphatemia. In: Jacobson, H.R.; Sticker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology. St Louis: Mosby, 1000, 1995. GMAJ, P.; MURER, H. Cellular mecanisms of inorganic phosphate transport in kidney. Physiol. Rev., 66:36, 1986. HAMMERMAN, M.R. Phosphate transport across renal proximal tubular cell membranes. Am. J. Physiol., 251:385, 1986. YU, C.G.; LEE, D.B.N. Clinical disorders of phosphorus metabolism. West. J. Med., 147:569, 1987. CAMP, M.A.; ALLON, M. Severe hypophosphatemia in hospitalized pacients. Miner. Electrol. Metab., 16:365, 1990. KNOCHEL, J.P. The clinical status of hypophosphatemia. N. England J. Med., 313:447, 1985. KNOCHEL, J. The pathophysiology and clinical characteristics of severe hypophosphatemia. Arch. Intern. Med., 137:203, 1977. KNOCHEL, J. Hypophosphatemia and rhabdomyolisis. Am. J. Med., 92:455, 1992. GLORIEUX, F.H. Calcitriol treatment in vitamin D dependent and vitamin D resistant rickets. Metabolism, 39:10, 1990.
237
capítulo 13
31.
32.
33. 34. 35. 36.
37.
38.
39. 40.
41. 42.
43.
44. 45. 46. 47. 48.
49. 50.
51. 52. 53.
54.
55.
56. 57.
KRAPF, R.; JAEGER, P.; HULTER, H.N. Chronic respiratory alkalosis induces renal PTH resistance, hyperphosphatemia and hypocalcemia in humans. Kidney Int., 42:727, 1992. DELMEZ, J.A.; SLATOPOLSKY, E. Hyperphosphatemia: its consequence and treatment in pacients with chronic renal disease. Am. J. Kidney Dis., 19:303, 1992. ALFREY, A.C.; ZHU, J.M. The role of hyperphosphatemia. Am. J. Kidney Dis., 17:53, 1991. SLATOPOLSKY, E.; RUTHEFORD, W.E.; ROSENBAUM, R. et al. Hyperphosphatemia. Clin. Nephrol., 7:138, 1977. McCLOSKEY, E. et al. Pseudohyperphosphatemia in multiple myeloma. Br. Med. J., 299:1381, 1989. SUTTON, R.A.L.; SAKHAEE, K. Magnesium balance and metabolism. In: Jacobson, H.R.; Striker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology, St Louis: Mosby, 1005, 1995. SUTTON, R.A.L.; SAKHAEE, K. Hypomagnesemia. In: Jacobson, H.R.; Striker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology, St Louis: Mosby, 1008, 1995. AL-GHAMDI, S.M.G., CAMERON, E.C.; SUTTON, R.A.L. Magnesium deficiency: Pathophysiologic and clinical overview. Am. J. Kidney Dis., 24:737, 1994. RYAN, M. Diuretics and potassium/magnesium depletion: Directions for treatment. Am. J. Med., 82 (3A):38, 1987. SALEM, M., KASISKI, N., ANDREI, A.M.; BRUSSEL, T.; GOLD, M.R.; CONN, A.; CHERNOW, B. Hypomagnesemia is a frequent finding in the emergency department in pacients with chest pain. Arch. Intern. Med., 151:2185, 1991. WHANG, R.; RYDER, K. Frequency of hypomagnesemia and hypermagnesemia. Requested vs routine. JAMA, 263:3063, 1990. RASMUSSEN, H. et al. Magnesium infusion reduces the incidence of arrythmias in acute miocardial infarction. Arch. Intern. Med., 147:753, 1987. MARTINS, B.J.; BLACK, J.; McLELLAND, A.S. Hypomagnesemia in elderly hospital admissions: a study of clinical significance. Q. J. Med., 78:177, 1991. REINHART, R.A.; DESBIENS, N.A. Hypomagnesemia in pacients entering the ICU. Crit. Care Med., 13:506, 1985. WHANG, R. Magnesium deficiency: pathogenesis, prevalence, and clinical implications. Am. J. Med., (suppl 3A):24, 1987. ZWERLING, H. Hypermagnesemia induced hypotension and hypoventilation. JAMA, 266:2374, 1991. KRENDELL, D. Hypermagnesemia and neuromuscular transmission. Semin. Neurol., 10:42, 1990. SUTTON, R.A.L.; SAKHAEE, K. Hypermagnesemia. In: Jacobson, H.R., Striker, G.E.; Klahr, S. The Principles and Practice of Nephrology, St Louis: Mosby, 1013, 1995. ELLYN, R.J. Magnesium metabolism in health and disease. Disease A Month, 34:161, 1988. JUPPNER, H.; SCHIPANI, E. Receptors for parathyroid hormone and parathyroid hormone-related peptide. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 5(4):300-6, 1996. LACY, C. Drug Information Handbook, 1978. SIMON, D.B. et al. Science , jul 2;285 (5424):103-6, 1999. FLEMING, C.R.; GEORGE, L.; STONER, G.L. et al. The importance of urinary magnesium values in patients with gut failure. Mayo Clin. Proc. 71:21, 1996. YU, J.; RMI, J.; GOLTZMAN, D. et al. Vitamin D analogs as potencial for the treatment of cancer associated with hypercalcemia (CAH). Proc. Annu. Meet. Am. Assoc. Cancer Res., 34:A1526, 1993. RYZEN, E.; NELSON, T.A.; RUDE, R.K. Low blood mononuclear cell magnesium content and hypocalcemia in normomagnesemic patients. West J. Med., 147:549, 1987. BIBER, J. Celular aspects of proximal phosphate reabsorption. Kidney Int, 36:360, 1989. MURER, H. Celular mechanisms in proximal tubular Pi reabsorption: Some answers and more questions. J. Am. Soc. Nephrol., 2:1649, 1992.
58. 59.
60.
61. 62.
63.
64.
65.
66. 67.
68.
69.
70.
71.
LENTZ, R.D.; BROWN, D.M.; KJELLSTRAND, C.M. Treatment of severe hypophosphatemia. Intern. Med. Dec; 89 (6):941-4, 1978. ANTONSEN, J.L.; SHERRARD, D.J.; ANDRÉS, D.L. A calcimimetic agent acutely suppresses parathyroid hormone levels in patients with cronic renal failure. Rapid communication. Kidney Int., 53:223, 1998. COLLINS, M.; SKARUKIS, M.C.; BILEZIKIAN, J.P. et al. Treatment of hypercalcemia secondary to parathyroid carcinoma with a novel calcimimetic agent. J. Clin. Endocrinol. Metab.; 83:1083, 1998. BRADWELL, A.R.; HARVEY, T.C. Control of hypercalcemia of parathyroid carcinoma by immunization. Lancet, 353:370, 1999. FOURNIER, A.; MONIERE, P.; BEN HAMIDA, F. et al. Use of alkaline calcium salts as phosphate binder in uremic patients. Kidney Int. Suppl., 38:S50, 1992. SLATOPOLSKY, E.; WEERTS, C.; LOPEZ-HIKER, S. et al. Calcium carbonate as a phosphate binder in patients with chronic renal failure undergoing dialysis. N. Engl. J. Med., 315:317, 1986. CHERTOW, G.M.; BURKE, S.K.; LAZARUS, J.M.; et al. Polyallylamine hydrochloride (RenaGel): A noncalcemic phosphate binder for the treatment of hyperphosphatemia in chronic renal failure. Am. J. Kidney Dis., 29:66, 1997. BLEYER, A.J.; BURKE, S.K.; DILLON, M. et al. A comparison of the calcium-free phosphate binder sevelamar hydrochloride with calcium acetate in the treatment of hyperphosphatemia in hemodialysis patients. Am. J. Kidney Dis., 33:694, 1999. MURER, H.; BIBER, J. Molecular mechanisms in renal phosphate reabsorption. Nephrol. Dial. Transplant, 10:1501, 1995. BROOKS, D.P.; ALI, S.M.; CONTINO, L.C. et al. Phosphate excretion and phosphate transporter messenger RNA in uremic rats treated with phosphonoformic acid. J. Pharmacol. Exp. Ther., 281:1440, 1997. SLATOPOLSKY, E.A.; BURKE, S.K.; DILLON, M.A. and THE RENAGEL STUDY GROUP. Renagel®, a nonabsorbed calcium- and aluminium free phosphate binder, lowers serum phosphorus and parathyroid hormone. Kidney Int., 55;299:307, 1999. PRIE, D.; BLANCHET, F.B.; ESSIG, M.; JOURDAIN, J.P., FRIEDLANDER, G. Dipyridamole decreases phosphate leak and augments serum phosphorus in patients with low renal phosphate threshold. J. Am. Soc. Nephrol., jul; 9(7);1264-9, 1998. SWAMINATHAN, R. Hypo-hypermagnesemia In: Oxford Textbook of Clinical Nephrology, 2nd ed., edited by Davison A.M.; Cameron, J.S.; Grunfeld, J.P.; Kerr, D.N.S.; Ritz, E.; Winearls, C.G. Oxford University Press, 271-310, 1998. FAUCI, A.S.; BRAUNVALD, E.; ISSELBACHER, K.J.; WILSON, J.D.; MARTIN, J.B.; KASPER, D.L.; HAUSER, S.L.; LONGO, D.L.; Laboratory values of clinical importance. In: Harrison´s Principles of Internal Medicin, 14th international ed., McGraw-Hill Book Company: A1A9, 1998.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET www.hdcn.com www.nejm.org www.immunologyed.com www.acpjc.org www.ajkd.org www.annals.org www.nature.com www.science.com www.jcb.org www.jci.org www.ovid.com www.utol.com
Capítulo
14
Metabolismo do Ácido Úrico Paulo Henrique Fraxino e Miguel Carlos Riella
INTRODUÇÃO
Nefropatia hiperuricêmica familiar
METABOLISMO DAS PURINAS E SÍNTESE DO ÁCIDO
Nefrolitíase pelo ácido úrico
ÚRICO
Hiperuricemia no transplante renal
METABOLISMO DO ÁCIDO ÚRICO Produção de ácido úrico
Manejo clínico e farmacológico dos estados de hiperuricemia
Produção exógena de ácido úrico
Hiperuricemia assintomática
Produção endógena de ácido úrico
Gota
Excreção de ácido úrico
Nefropatia aguda pelo ácido úrico
Aparelho gastrintestinal
Nefropatia crônica pelo ácido úrico
Aparelho urinário
Nefropatia hiperuricêmica familiar
ESTADOS DE HIPERURICEMIA Definição
Nefrolitíase pelo ácido úrico Hiperuricemia no transplante renal
Classificação
ESTADOS DE HIPOURICEMIA
Hiperuricemia primária
Definição
Hiperuricemia secundária
Diminuição na produção de ácido úrico
Epidemiologia
Deficiência da xantina-oxidase
Apresentação clínica
Excreção aumentada de ácido úrico
Gota
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Nefropatia aguda pelo ácido úrico
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Nefropatia crônica pelo ácido úrico
INTRODUÇÃO O conhecimento das particularidades do metabolismo do ácido úrico torna-se imprescindível para a compreensão da gênese de diversas patologias relacionadas, bem como dos seus tratamentos. É sabido que alterações dos níveis séricos do ácido úrico poderão implicar complicações sistêmicas importantes, como gota, nefropatia aguda e crônica pelo ácido úrico e
litíase renal, patologias geralmente relacionadas a estados de hiperuricemia. Ou ainda, situações clínicas observadas em associação a estados de hipouricemia, a saber: na deficiência de xantina-oxidase, em doenças hepáticas, na síndrome de Fanconi, na síndrome da imunodeficiência adquirida, entre outras. É objetivo deste capítulo revisar a síntese do ácido úrico, como ocorre sua produção e excreção, as patologias decorrentes das alterações do seu metabolismo, as manifestações clínicas destas doenças e seus manejos clínicos e terapêuticos.
239
capítulo 14
METABOLISMO DAS PURINAS E SÍNTESE DO ÁCIDO ÚRICO A partir do metabolismo dos nucleotídeos das purinas é que teremos a formação do ácido úrico (Fig. 14.1). Sabe-se que a síntese das purinas dar-se-á a partir da ribose-5’-fosfato. Inicialmente ocorrerá uma aminação do 5’-fosforribosil-1’-pirofosfato (PRPP), catalisada pela enzima PRPP-sintetase. Seqüencialmente observa-se a utilização de um nitrogênio amídico
da glutamina associada a uma inversão do C-1 da ribose, originando a 5’-fosforribosil-1’-amina. A partir de então esta amina será conjugada a glicina. O resultante desta reação será amidado com o nitrogênio amídico da glutamina. A etapa seguinte corresponderá a uma desidratação, dependente de ATP, e fechamento do anel originando a porção imidazólica da purina (5’-aminoimidazol-ribonucleotídeo). O 5’-aminoimidazol-ribonucleotídeo sofrerá uma carboxilação e uma amidação, formando um intermediário denominado 5’-aminoimidazol-4’-carboximida-ribonucleotídeo, que sofrerá uma
Ribose-5ⴕ-Fosfato PRPP-Sintetase
5’-Fosforribosil-1ⴕ-Pirofosfato (PRPP) ⴙ Glutamina
5ⴕ-Fosforribosil-1ⴕ-Alanina Glutamina
Glicina
5ⴕ-Aminoimidazol-Ribonucleotídeo Aspartato
CO2
5ⴕ-Aminoimidazol-4ⴕ-Carboximida-Ribonucleotídeo Formato
Ácido Guanílico
H2O Ácido Inosínico
Ácido Adenílico
HPRT
Guanosina
Inosina
Adenosina
HPRT
Guanina
Hipoxantina Xantina-oxidase
Guanase
Xantina Xantina-oxidase
Ácido Úrico
Fig. 14.1 Representação esquemática: Metabolismo da purina no homem. (Baseado em Brobeck, J.; Herbert, P.N.; Hricik, D.2)
240
Metabolismo do Ácido Úrico
formilação, recebendo um último átomo de carbono. Após a sua desidratação completar-se-á a síntese do ribonucleotídeo da hipoxantina, o ácido inosínico (IMP).34 Como podemos observar na Fig. 14.1, que corresponde à representação esquemática do metabolismo das purinas nos seres humanos, a partir da formação do ácido inosídico (IMP) teremos uma ramificação na via de biossíntese das purinas. Para um lado ocorrerá oxidação e aminação do IMP na dependência do ATP, originando o ácido guanílico (GMP), e para outro, dependendo agora do GTP, o IMP sofrerá aminação para originar o ácido adenílico (AMP). Seguindo-se a via de biossíntese, observamos que o ácido inosídico (IMP) passará a inosina e esta a hipoxantina, que por ação da enzima xantino-oxidase originará a xantina e esta o ácido úrico na dependência da ação da mesma enzima.34 Uma vez revisado o metabolismo das purinas, vale ressaltar que a velocidade de formação ou síntese do ácido úrico dependerá da concentração intracelular da PRPP. Portanto, é correto afirmar que uma ação maior da enzima PRPP-sintetase implicará concentração maior de PRPP e conseqüente biossíntese acelerada de purinas com maior formação de ácido úrico. Outra forma possível de aumento da PRPP seria por uma deficiência ou menor atividade da enzima hipoxantina-guanina-fosforribosil-transferase (HPRT), enzima esta responsável pela conversão da hipoxantina em IMP e da guanina em GMP.34 Segundo a literatura, cerca de 10% dos pacientes com produção aumentada de ácido úrico teriam como causa principal uma deficiência parcial de HPRT.2 Tanto esta alteração quanto a hiperatividade da PRPP-sintetase são defeitos familiares herdados como caráter ligado ao cromossomo X.3
Pontos-chave: • A maioria das espécies mamíferas tem níveis muito baixos de ácido úrico porque o mesmo é convertido em alantoína, um produto excretado e altamente solúvel • Em humanos o ácido úrico é o produto final do metabolismo das purinas porque o homólogo humano do gene uricase dos mamíferos foi modificado e não tem expressão (pseudogene)
METABOLISMO DO ÁCIDO ÚRICO Produção de Ácido Úrico O ácido úrico é produzido no fígado a partir da degradação de purinas sintetizadas de forma endógena ou ingeridas através da alimentação. Uma quantidade significativa de pre-
cursores de uratos é oriunda da dieta alimentar; sabe-se que fórmulas dietéticas livres de purinas chegam a reduzir a excreção urinária de ácido úrico em aproximadamente 40%.33 O processo de produção de uratos envolve a quebra dos nucleotídeos de purinas, o ácido guanílico (GMP), o ácido inosínico (IMP) e o ácido adenílico (AMP). Finalmente, a guanina e a hipoxantina são então metabolizadas em xantina e esta, sob a ação irreversível da xantina-oxidase, em ácido úrico.
PRODUÇÃO EXÓGENA DE ÁCIDO ÚRICO Uma dieta alimentar sem restrição de purinas será suficiente para a manutenção da excreção urinária de ácido úrico. Esta, por sua vez, dependerá da quantidade e do tipo de purina existentes na dieta.34 Adultos jovens e hígidos, submetidos a uma dieta sem purina, reduzirão a concentração sérica de ácido úrico em cerca de 37% em 10 dias e a excreção urinária em torno de 33%, no mesmo período.4
PRODUÇÃO ENDÓGENA DE ÁCIDO ÚRICO A síntese continuada e o turnover endógenos das purinas mantêm a excreção urinária do ácido úrico em torno de 300 a 400 mg/dia, fato este que independerá até mesmo de uma restrição dietética de purinas.34
Excreção de Ácido Úrico De uma maneira geral, o organismo humano não é capaz de metabolizar o urato, o que significa dizer que para a manutenção da homeostase de seu metabolismo o urato deverá ser eliminado através dos rins ou intestino. Um indivíduo adulto do sexo masculino apresenta um pool de ácido úrico de aproximadamente 1.200 mg, sendo que, nas mulheres, esta quantidade se reduz a 600 mg. Diariamente, 50 a 60% das quantidades acima citadas serão renovadas através dos metabolismos endógeno e exógeno. A excreção diária média através da urina será em torno de 450 mg, e a intestinal, de aproximadamente 200 mg.4
APARELHO GASTRINTESTINAL Sabe-se que a entrada de urato através do intestino ocorre por um processo passivo variável de acordo com a concentração sérica do ácido úrico. As bactérias do trato intestinal são capazes de degradar o ácido úrico em dióxido de carbono e amônia, através da ação das uricases, alantoinases, alantoicases e ureases, num processo denominado “uricólise intestinal”.4,34 A quantidade de ácido úrico encontrada nas fezes, apesar de pequena, poderá estar aumentada em alguns estados patológicos, como nas situações de insuficiência renal.
APARELHO URINÁRIO Os processos que envolvem a excreção renal de ácido úrico têm sido definidos através de estudos de fisiologia e
241
capítulo 14
farmacologia renal em animais de experimentação e em seres humanos. Cerca de 5% do ácido úrico circulante está ligado a proteínas, o que significa dizer que todo o restante poderá ser filtrado pelos glomérulos renais livremente.5,6 Além da filtração glomerular, outras três etapas do seu metabolismo poderão ser identificadas como de responsabilidade renal: a reabsorção pré-secretória, a secreção e a reabsorção pós-secretória, todas ocorrendo no túbulo proximal.5, 35
Pontos-chave: • A uricólise intestinal é responsável por aproximadamente 1/3 do metabolismo total de urato e é responsável pela eliminação extra-renal de todo o urato • A excreção urinária de urato é responsável pelos 2/3 restantes do ácido úrico produzido diariamente • O clearance de ácido úrico, no entanto, está em 7-12% de toda a carga filtrada Filtração Glomerular Como já foi visto, apenas uma pequena porcentagem do ácido úrico circulante está ligado à proteína. Conclui-se, desta forma, que uma grande quantidade deste será filtrada pelos glomérulos diariamente. Apesar disto, o clearance do ácido úrico em adultos normais encontra-se em torno de 7 a 12% de toda a carga filtrada, justificado pelo fato de que cerca de 90% do urato filtrado sofre reabsorção tubular.
Túbulo Proximal Após sofrer a filtração glomerular, o urato que chega ao túbulo proximal passará por três processos distintos:4,35 • Reabsorção, no início do túbulo proximal, de cerca de 90 a 100% de tudo que foi filtrado. • No segmento S2 do túbulo proximal, haverá secreção de urato, proporcionando um retorno de 50% do que foi filtrado novamente ao lúmen tubular. • Finalmente no segmento S3 ocorrerá a dita absorção póssecretória. Os mecanismos através dos quais estes processos ocorrem não estão completamente definidos. Acredita-se, no entanto, que as trocas aniônicas desempenhem um importante papel. A reabsorção de urato poderá ser mediada por um urato-OH (ou urato-HCO3) contratransportador na membrana luminal do túbulo proximal que opera em paralelo a uma troca Na-H (Fig. 14.2). A secreção de uratos no segmento S2 do túbulo proximal envolve mecanismos mais complexos no que diz respeito à troca de ânions. Essa secreção depende, na realidade, de um transporte ativo secundário que envolve um processo de co-transporte de sódio, que permite a excreção renal não somente do ácido úrico mas também de fármacos, como aspirina, antibióticos e diuréticos.43 Desta forma, identificam-se situações de hiperuricemia resultantes da redução da secreção habitual de uratos por ação de alguns destes ácidos.35 Modernamente, tenta-se explicar este mecanismo com a teoria de carreadores de ânions na membrana basolateral e, talvez, na membrana luminal.7,8,9 O número e a distribuição de cargas negativas parecem ser os principais determinantes do grau de ligação. Os compostos formados adentram a célula através de um co-trans-
Célula do Túbulo Proximal
Lúmen
Capilar Peritubular 3 Na
Na
ATP ase 2 K
H
OH
Ur
Ur
A(?Cl)
Ur
Fig. 14.2 Representação esquemática. Reabsorção de ácido úrico no túbulo proximal.
242
Metabolismo do Ácido Úrico
porte com o sódio e, também, podem ser produzidos dentro destas células criando um gradiente favorável que servirá como um mediador nas trocas aniônicas7,8,34,43 (Fig. 14.3). Além disso, um gradiente elétrico favorável poderá propiciar um transporte por difusão facilitada de um ânion orgânico para o interior da luz tubular, permitindo, desta forma, a sua secreção.8 Após o exposto, conseguimos compreender a importância dos mecanismos que permitem ao túbulo proximal secretar e, especialmente, reabsorver ácido úrico. A concentração urinária deste será reflexo direto daquilo que acontece principalmente nos segmentos S2 e S3 do túbulo proximal. Em termos numéricos, sabe-se que apenas 12% do ácido úrico filtrado aparecerão na urina.4
geral, como resultado de uma excessiva produção de uratos, pela diminuição da sua excreção renal ou por uma combinação de ambos os fatores.36 Baseados neste conhecimento, poderemos classificar a hiperuricemia em duas categorias: primária e secundária.
Classificação HIPERURICEMIA PRIMÁRIA Corresponde às situações em que níveis séricos elevados de ácido úrico são identificados sem doenças coexistentes ou uso de drogas que possam diminuir a sua excreção ou aumentar a sua produção (Quadro 14.1).
HIPERURICEMIA SECUNDÁRIA
ESTADOS DE HIPERURICEMIA Definição A melhor definição para o que é uma hiperuricemia baseia-se no limite de solubilidade dos uratos nos fluidos humanos, ou seja, ocorrerá quando a concentração de uratos séricos corresponder a um estado de maior saturação neste compartimento orgânico. Esta definição físico-química corresponde à concentração de urato excedendo 7 mg/dl quando utilizarmos métodos enzimáticos (uricase) na sua mensuração. Um valor inferior em até 1 mg/dl poderá ser aceito quando métodos calorimétricos sejam utilizados. A persistência de níveis séricos elevados de ácido úrico (hiperuricemia) é uma alteração bioquímica relativamente comum em nosso meio. Tal situação ocorrerá, de maneira
Nesta categoria encontramos as situações resultantes de uma excessiva produção de uratos (Quadro 14.2) ou quando se identifica uma diminuição de seu clearance renal (Quadro 14.3) por uso de drogas, toxinas, dieta ou outra doença associada. Uma situação clínica que merece discussão especial é a hiperuricemia assintomática. Neste caso a situação de hiperuricemia não se encontra associada a nenhum achado clínico específico, como artrite, tofo ou litíase urinária. Embora a hiperuricemia esteja freqüentemente associada a outras entidades clínicas, como hipertensão, obesidade, dislipidemias ou abuso no consumo de álcool, não há evidência clínica de que o ácido úrico seja um fator causal para elas.39 Alguns indivíduos apresentam este estado hiperuricêmico durante toda a sua vida sem o desenvolvimento de qualquer outro tipo de complicação de maior gravidade.10,37,38
Célula do Túbulo Proximal
Lúmen
Capilar Peritubular 3 Na
ATP ase 2 K Ur
A(?Cl)
Ur Ur A
Fig. 14.3 Representação esquemática. Secreção de ácido úrico no túbulo proximal.
243
capítulo 14
Quadro 14.1 Origem das hiperuricemias Hiperuricemias Primárias
Hiperuricemias Secundárias
A. Produção Aumentada de Purina: 1. Idiopática 2. Defeitos enzimáticos (s. de Lesch-Nyhan, doenças do armazenamento de glicogênio)
A. 1. 2. 3. 4. 5. 6.
Aumento do Catabolismo e do Turnover de Purina Distúrbios mieloproliferativos Distúrbios linfoproliferativos Sarcoma e carcinoma disseminados Anemias hemolíticas crônicas Drogas citotóxicas Psoríase
B. Diminuição do Clearance Renal do Ácido Úrico: 1. Idiopático
B. 1. 2. • • • • •
Diminuição do Clearance Renal do Ácido Úrico: Doença renal intrínseca Alteração da função de transporte tubular Induzido por drogas (tiazídicos, probenecide) Lactacidemia (acidose láctica, alcoolismo) Cetoacidose (diabetes) Diabetes insipidus Síndrome de Bartter
Modificado de Hellmann, D.B.11
Quadro 14.2 Causas de hiperuricema secundária. Aumento da biossíntese de purinas e/ou da produção de uratos A. Defeitos Enzimáticos Genéticos: 1. Deficiência de hipoxantina-guanina-fosforribosiltransferase. 2. Deficiência de fosfatase-6-glicose. 3. Hiperatividade da fosforribosil-pirofosfato-sintetase. B. Alterações Clínicas que Cursam com Aumento da Produção de Purinas ou Uratos: 1. Doenças mieloproliferativas. 2. Doenças linfoproliferativas. 3. Hemólise. 4. Psoríase. 5. Hipóxia tecidual. 6. Síndrome de Down. 7. Doenças malignas. C. Aumento da Produção de Purinas Induzida por Drogas, Dieta e Toxinas: 1. Etanol. 2. Dieta rica em purinas. 3. Frutose. 4. Vitamina B12 (pacientes com anemia perniciosa). 5. Ácido nicotínico. 6. Drogas citotóxicas. 7. Warfarina.
Quadro 14.3 Causas de hiperuricemia secundária pelo decréscimo do clearance renal A. 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. B. 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9.
Alterações Clínicas: Insuficiência renal crônica de qualquer etiologia. Depleção de volume. Nefropatia por chumbo. Cetoacidose diabética. Acidose láctica. Pré-eclâmpsia. Obesidade. Hiperparatireoidismo. Hipotireoidismo. Sarcoidose. Nefropatia hereditária associada a hiperuricemia ou gota. Induzida por Droga ou Dieta: Diuréticos tiazídicos e de alça. Ciclosporina. Salicilatos em baixas doses. Etambutol. Pirazinamida. Etanol. Levodopa. Abuso de laxantes (alcalose). Restrição de sal.
244
Metabolismo do Ácido Úrico
Epidemiologia A incidência de hiperuricemia difere entre os sexos masculino e feminino, especialmente quando as mulheres encontram-se em idade reprodutiva; este fato justifica-se devido a um maior clearance de uratos por ação estrogênica.41 De uma maneira geral, os homens hiperuricêmicos já apresentam início de elevações dos níveis de ácido úrico durante a puberdade, e as manifestações clínicas se fazem presentes, em média, duas décadas após.
Apresentação Clínica A hiperuricemia poderá apresentar-se clinicamente de diversas formas; abordaremos a seguir as principais: gota, nefropatia aguda pelo ácido úrico, nefropatia crônica pelo ácido úrico, nefropatia hiperuricêmica familiar e nefrolitíase pelo ácido úrico.
Fig. 14.5 GOTA: Deformidade articular e tofo.
GOTA A gota é um transtorno metabólico de natureza heterogênea e familiar, decorrente de alterações no metabolismo das purinas, que se caracteriza, principalmente, por hiperuricemia associada ao depósito de ácido úrico em diversas estruturas (preferencialmente articulações). Sendo assim, as crises agudas de artrite, geralmente monoarticulares, são achados freqüentes. Com a evolução do quadro clínico a artrite torna-se crônica, associando-se a deformidades articulares e ao aparecimento de tofos, que são depósitos de monourato de sódio (Figs. 14.4 a 14.6). A maior incidência de gota nos homens ocorre entre 30 e 45 anos de idade, e nas mulheres, entre 55 e 70 anos (pósmenopausa). Cerca de 90% dos pacientes com gota primária são do sexo masculino.11 Campion e cols, em 1982, após um acompanhamento de 2.046 homens saudáveis por 15 anos, evidenciaram uma incidência de gota em 4,9%, 0,5% e 0,1% em decorrência de um aumento dos níveis séricos de ácido úrico maiores que 9,0 mg/dl, entre 7,0 e 8,9 mg/ dl e inferiores a 7,0 mg/dl, respectivamente.37 Já Langford e cols, em 1987, demonstraram que apenas 12% dos pacientes com níveis de ácido úrico sangüíneo entre 7,0 e 7,9
Fig. 14.4 GOTA: Deformidade articular e tofo (gonagra).
Fig. 14.6 Monourato de sódio.
mg/dl desenvolveram gota num período de estudo de 14 anos.42 Alguns autores afirmam que 90% dos casos de gota possam estar relacionados com uma excreção de ácido úrico deficiente.2 Tal situação será identificada quando tivermos uma menor filtração glomerular de uratos, um aumento na reabsorção tubular, uma menor secreção tubular ou ainda uma combinação dos fatores citados.34 Nos quadros de insuficiência renal, aguda ou crônica, a redução do clearance renal do ácido úrico poderá resultar em hiperuricemia; contudo, a gota raramente se manifesta nos pacientes renais, talvez por uma diminuição da resposta inflamatória aos cristais de ácido úrico proporcionada pela uremia.2 Berger e Yu afirmam que a gota por si só raramente levará a uma deterioração da função renal.12,13,14 Gota acompanhada de insuficiência renal grave poderá ser vista em associações com outras patologias subjacentes, como litíase urinária, hipertensão arterial sistêmica, infecção urinária e outras.34 A maioria dos investigadores acredita que a nefropatia gotosa é uma manifestação dependente do grau e da duração da hiperuricemia.34 Vários estudos correlacionam achados histopatológicos encontrados em biópsias renais com a ocorrência concomitante de hiperuricemia.12,15,16,17,18
capítulo 14
Pontos-chave: • As mulheres pré-menopausa têm um clearance maior de uratos devido à ação estrogênica • Cerca de 90% dos pacientes com gota primária são homens • Gota per se raramente causa deterioração da função renal Quadro Clínico Clinicamente, manifesta-se por um quadro de artrite aguda, de aparecimento súbito, que ocorre na maioria das vezes durante a noite, extremamente doloroso, que se segue a flutuações rápidas dos níveis de ácido úrico após ingestão excessiva de álcool ou certos tipos de alimentos, cirurgias, infecção, diuréticos ou drogas uricosúricas.34,40 Febre de até 39°C poderá estar presente.11 O quadro artrítico acomete preferencialmente a primeira articulação metatarsofalangiana (podagra), entretanto, outras articulações poderão estar comprometidas, como os joelhos (gonagra — Fig. 14.4) e, menos freqüentemente, os punhos (quiragra).40 Nas mãos a articulação mais afetada é a interfalangiana do quinto pododáctilo. As apresentações poliarticulares são infreqüentes, e quando presentes caracterizam-se por serem assimétricas. De uma maneira geral, após a primeira crise (monoartrite aguda), crises poliarticulares poderão surgir. Com a evolução da doença o período intercrítico se reduz progressivamente, acabando por instalar-se uma artrite crônica que sofre períodos de agudização. Nesse momento depósitos de monourato de sódio em tecidos moles começam a ser reconhecidos, sendo denominados de tofos. Estes acometem preferencialmente as mãos, pés, olécrano, patela e pavilhão auricular. A aspiração do material contido nos tofos confirma a deposição dos cristais birrefringentes de urato de sódio que poderão aparecer livres ou no interior de neutrófilos. O comprometimento articular crônico, caracterizado por lesões de reabsorção osteocartilaginosa em “saca-bocado” e deformidades, aparecerá com a evolução da doença (Fig. 14.5).
Diagnóstico Laboratorial 1. Níveis elevados de ácido úrico (7,5 mg/dl), excetuando-se os casos em que drogas para sua redução tenham sido empregadas. 2. VHS elevado nos surtos agudos. 3. Elevação na contagem de células brancas poderá acompanhar também os quadros agudos. 4. Cristais de urato de sódio observados na aspiração do conteúdo dos tofos ou líquido sinovial confirmam o diagnóstico (Fig. 14.6).
245
Diagnóstico por Imagem 1. Ausência de achados radiológicos nos quadros iniciais (radiografia negativa pode não afastar a gota). 2. O aparecimento de cavidades ou erosões marginais nas extremidades ósseas poderá ser identificado nos quadros de mais longa duração. 3. Edema, do tipo granuloso, nos tecidos moles de pacientes portadores de tofo gotoso.19 É importante a observação de que achados radiológicos semelhantes aos da gota poderão ser identificados na artrite reumatóide, sarcoidose, mieloma múltiplo, hiperparatireoidismo e na doença de Hand-Schüller-Christian.11
Diagnóstico Diferencial 1. Celulite. 2. Artrite piogênica aguda. 3. Condrocalcinose aguda (pseudogota), onde se identificam depósitos de pirofosfato de cálcio no líquido sinovial, raio X positivo e nível sérico de ácido úrico normal. 4. Artrite reumatóide, sarcoidose, mieloma múltiplo, hiperparatireoidismo e doença de Hand-SchüllerChristian.
NEFROPATIA AGUDA PELO ÁCIDO ÚRICO A característica desta patologia é o aparecimento de um quadro de insuficiência renal oligúrica ou anúrica decorrente da precipitação intratubular de ácido úrico.20,21,34 Tal situação relaciona-se a uma produção ou excreção aumentada de ácido úrico em pacientes portadores de linfoma, leucemia, doenças mieloproliferativas (policitemia vera), particularmente naqueles submetidos à radioterapia ou quimioterapia, em decorrência de uma intensa lise celular. Outras causas, porém com menor freqüência, são: crises convulsivas que levam a um maior catabolismo celular, tratamento de tumores sólidos, síndrome de deficiência da enzima hipoxantina-guanina-fosforribosil-transferase (HPRT) ou na síndrome Fanconi-like por diminuição na reabsorção de uratos no túbulo proximal.20,21,22,34
Quadro Clínico Deve-se suspeitar do diagnóstico em pacientes que desenvolvam um quadro de insuficiência renal associada às situações clínicas anteriormente mencionadas e que cursem com quadro de hiperuricemia. Os níveis de ácido úrico geralmente são superiores a 15 mg/dl, diferente de outras situações de insuficiência renal aguda, onde estes valores geralmente são inferiores a 12 mg/dl (faz-se exceção às de etiologia prérenal). Sintomas urinários não necessariamente se fazem presentes, podendo-se observar dor lombar ou em flanco referida por pacientes que apresentem litíase associada.
246
Metabolismo do Ácido Úrico
Diagnóstico Laboratorial 1. Hiperuricemia. 2. Função renal alterada. 3. Urinálise evidenciando cristais de ácido úrico. Quando normal não afasta o diagnóstico. 4. A relação entre ácido úrico (mg)/creatinina (mg) em uma amostra de urina será maior que 1,0. Nas demais causas de insuficiência renal aguda costuma variar entre 0,60 e 0,75.20 5. Hipercalemia, hiperfosfatemia e hipocalcemia poderão ser identificadas nos pacientes que apresentem síndrome de lise tumoral.33,44
NEFROPATIA CRÔNICA PELO ÁCIDO ÚRICO Esta é uma forma de insuficiência renal crônica decorrente da deposição de cristais de urato de sódio no interstício medular, originando microtofos. Tal deposição determinará uma resposta inflamatória crônica que levará a uma fibrose intersticial.44 A deposição de cristais de urato no interior dos túbulos renais também poderá ocorrer, causando lesão epitelial e obstrução intratubular. Alguns autores sugerem que a deposição intersticial ocorra como conseqüência dos depósitos intratubulares de ácido úrico, que promoveriam uma ruptura da membrana basal com posterior retubulização.23 A hiperuricemia como causa primária de insuficiência renal crônica não é algo comum.34 A nefropatia por urato já foi relacionada num passado à gota tofácea. Na atualidade a formação de tofos e, especialmente, o comprometimento da função renal são infreqüentes.16
Quadro Clínico Uma manifestação inicial comum da nefropatia crônica pelo ácido úrico é a albuminúria que, normalmente, é leve e de caráter intermitente.34 Com a progressão da doença renal, aparecem os sinais de uremia. Neste estágio, é difícil diferenciar se a doença renal é causa ou conseqüência da hiperuricemia.34
Diagnóstico Laboratorial Considera-se uma elevação dos níveis séricos de ácido úrico desproporcional ao grau de insuficiência renal quando este excede 9 mg/dl frente a uma creatinina plasmática igual ou inferior a 1,5 mg/dl, 10 mg/dl nas situações em que a concentração de creatinina esteja entre 1,5 e 2,0 mg/dl, e 12 mg/dl nas situações de insuficiência renal mais avançada.17
NEFROPATIA HIPERURICÊMICA FAMILIAR A nefropatia hiperuricêmica familiar foi descrita no início da década de 60 por Duncan e Dixon.24 Embora seja uma patologia rara, vários relatos sobre ela permeiam a literatura médica nas últimas décadas.25 A sua etiologia está relacionada com uma irregularidade na mobilização tubular renal de urato, que resultaria de uma incapacidade das
células tubulares renais em fazer a remoção de ácido úrico do interstício.3 Não há portanto, nestes pacientes, síntese acelerada de purinas.25,26 A exemplo do que foi descrito na nefropatia crônica pelo ácido úrico, a presença de uratos no interstício renal levaria inicialmente a uma reação inflamatória local que se seguirá de fibrose e comprometimento progressivo da função renal.
NEFROLITÍASE PELO ÁCIDO ÚRICO A incidência de nefrolitíase pelo ácido úrico pode ser bastante variável, estando relacionada diretamente com a população analisada. As características nutricionais, genéticas e ambientais parecem ser bastante significativas no que diz respeito à sua epidemiologia. Nos Estados Unidos da América e Europa a sua prevalência é de aproximadamente 5 a 10% do total de casos relatados de nefrolitíase.4 Em países em desenvolvimento esta prevalência poderá chegar a 40%, especialmente naqueles de clima árido e quente, nos quais há uma maior tendência de se observar um volume urinário menor e um pH urinário mais ácido, favorecendose assim a precipitação de cristais de ácido úrico. Um estudo multicêntrico acerca da litíase renal no Brasil observou hiperuricosúria em aproximadamente 30% dos litiásicos.49 Sabe-se que este tipo de cálculo pode incidir também numa população sem história prévia de gota; contudo, cerca de 20% dos portadores de gota acabam por desenvolvê-lo.4 Mais de 80% dos cálculos de urato, encontrados em pacientes portadores de gota, são exclusivamente de ácido úrico. Nos demais casos geralmente se observa oxalato de cálcio ou fosfato de cálcio circundando um núcleo central de urato. A prevalência de cálculos de oxalato de cálcio entre pacientes com gota chega a ser 10 a 30 vezes maior que na população não-gotosa. Na gota primária, a incidência na formação de cálculos variará de acordo com a quantidade de ácido úrico excretada. Incidirá em 10 a 20% dos pacientes com excreção urinária normal (800 mg/dia no homem e 750 mg/dia na mulher), podendo variar entre 40 e 50% quando a excreção de ácido úrico atinja 1.000 mg/dia.28,52,53 A formação de cálculos de ácido úrico, decorrente da precipitação urinária de seus cristais, está na dependência direta de dois fatores: a sua alta concentração urinária e o pH urinário ácido. Observe a equação a seguir: H Urato ↔ Ácido Úrico O desvio desta reação converterá sais relativamente solúveis de urato em ácido úrico insolúvel.27 A solubilidade total do ácido úrico na urina cai de 200 mg/dl num pH urinário de 7,0 para 15 mg/dl num pH de 5,0.27 Outras situações clínicas também poderão estar relacionadas com a formação de litíase por ácido úrico, como: aumento na produção do ácido úrico nas doenças mieloproliferativas, uso de drogas uricosúricas (aspirina, probenecide) diminuindo a sua reabsorção tubular, nas diarréias crônicas em virtude da diminuição do volume urinário
247
capítulo 14
associado a uma queda do pH urinário27,28 ou pelo aumento da excreção de ácido úrico proporcionado pelo uso de alguns hormônios, como estrógenos e corticosteróides.4 Houve a preocupação de alguns clínicos com a possibilidade de que aqueles pacientes que apresentavam hiperuricemia induzida pelo uso de tiazídicos pudessem desenvolver nefrolitíase no momento em que se associassem inibidores da enzima de conversão da angiotensina ou mesmo antagonistas dos receptores de angiotensina II.54 Tal fato parece infundado em virtude de drogas como o losartan, por exemplo, serem capazes de aumentar o pH urinário pela redução da reabsorção de bicarbonato. Para finalizar, poderíamos citar ainda casos idiopáticos de nefrolitíase pelo ácido úrico, acometendo pacientes que apresentam sua concentração plasmática e renal normais porém com uma tendência à acidificação urinária sem outras anormalidades da função renal.4
Fig. 14.8 Nefrolitíase. Dilatação ureteral, pielocalicial e hidronefrose por uropatia obstrutiva.
Quadro Clínico
HIPERURICEMIA NO TRANSPLANTE RENAL
Os achados clínicos são comuns às demais situações de litíase urinária com ou sem uropatia obstrutiva (ver capítulo específico) (Figs. 14.7 e 14.8). Nestes pacientes o que nos chama a atenção é a presença de quadro sugestivo de urolitíase subjacente a outras patologias que cursem com hiperuricemia e/ou hipersecreção urinária de ácido úrico.
Lin e colaboradores, em 1989, demonstraram a incidência de hiperuricemia em 84% dos pacientes transplantados em uso de ciclosporina comparada a 30% naqueles pacientes que tinham a sua imunossupressão feita com azatioprina e prednisona.29 A artrite gotosa tem sido relatada em 7 a 24% dos pacientes tratados com ciclosporina,29,30 sendo o diagnóstico inicial mais freqüentemente feito entre os meses 17 e 24 após o transplante renal.29 Além da ciclosporina, que pode promover hiperuricemia por uma diminuição do fluxo plasmático renal, outros fatores também poderão ser relacionados, como o uso de diuréticos e as situações de insuficiência renal decorrente de episódios de rejeição.29,30,31
Diagnóstico Laboratorial 1. 2. 3. 4.
Dosagem sérica de ácido úrico. pH urinário. Dosagem da concentração urinária de ácido úrico. Análise bioquímica do cálculo eliminado e/ou retirado.
Diagnóstico por Imagem 1. Os cálculos puros de ácido úrico não são radiopacos, desta forma o exame radiológico simples poderá ser negativo. 2. Ultra-som e/ou tomografia de rins e vias urinárias poderão identificar a presença do cálculo. 3. A urografia excretora revelará uma lesão intraluminar radiotransparente, sendo imprescindível o diagnóstico diferencial com tumores e presença de coágulos.
Fig. 14.7 Nefrolitíase. Hidronefrose por uropatia obstrutiva.
Manejo Clínico e Farmacológico dos Estados de Hiperuricemia HIPERURICEMIA ASSINTOMÁTICA Considerações Gerais A hiperuricemia assintomática na grande maioria das vezes (80 a 90%) ocorrerá por um excesso no consumo de purinas, por uma secreção diminuída de uratos ou uma soma destes dois fatores. Um grupo menor de pessoas poderão apresentá-la devido a um aumento da sua produção endógena. As causas etiológicas de hiperuricemia secundária deverão ser investigadas e tratadas individualmente (Quadro 14.2, Quadro 14.3). A coleta da urina de 24 horas, com dosagem de ácido úrico e da creatinina, em pessoas com função renal normal (recebendo uma dieta standard, com exclusão de álcool e drogas que alterem o metabolismo do ácido úrico) geralmente poderá estabelecer se estamos frente a uma superprodução de ácido úrico ( 800 mg/dia ou 12 mg/kg/dia) ou uma diminuição de seu clearance renal.
248
Metabolismo do Ácido Úrico
A relação entre o clearance de urato e creatinina na urina de 24 horas menor que 6% define um déficit de excreção. Pacientes que persistem com níveis urinários superiores a 670 mg/dia, mesmo após uma dieta baixa em purinas durante um período de cinco dias (Quadro 14.4), deverão ser considerados inicialmente como superprodutores.
artrítico agudo e da hiperuricemia.34,56 Sabe-se que reduções súbitas nos níveis séricos de ácido úrico poderão precipitar episódios de artrite gotosa.34 Pelo exposto, o manejo do quadro de hiperuricemia deverá ser postergado até a resolução do quadro artrítico agudo.
Tratamento Farmacológico do Quadro Agudo Tratamento Farmacológico Quando analisamos riscos e benefícios, o tratamento com drogas hipouricemiantes nestes pacientes, na maioria das vezes, não se fará necessário. Entretanto, três situações clínicas deverão merecer atenção especial, com conseqüente instituição de tratamento famacológico, são elas: • Paciente em radioterapia ou quimioterapia deverá receber alopurinol na profilaxia da nefropatia aguda pelo ácido úrico.21 • Níveis séricos de ácido úrico persistentemente altos, 13 mg/dl no homem e 10 mg/dl na mulher.34 • Alopurinol deverá ser prescrito para paciente que apresente excreção urinária de ácido úrico maior que 1.000 mg/dia, quando o controle dietético não está sendo satisfatório.34 Deve-se objetivar uma excreção urinária de 800 mg/dia.
GOTA Considerações Gerais Uma abordagem equivocada relativamente freqüente, nos portadores de gota, é o manejo simultâneo do quadro Quadro 14.4 Conteúdo de purina nos alimentos A. Alimentos com Pouca Purina: 1. Cereais refinados e seus produtos, flocos de milho, arroz branco, massa, araruta, sagu, farinha de milho, bolos, pães, fubá, tapioca. 2. Leite e seus derivados, ovos. 3. Açúcar, doces, gelatina. 4. Manteiga, margarina poliinsaturada, outras gorduras. 5. Tomate, vegetais de folhas verdes (algumas exceções). 6. Frutas, nozes, manteiga de amendoim. 7. Sopas ou cremes feitos com vegetais permitidos e sem carnes. 8. Água, suco de frutas, bebidas carbonatadas, chá, café. B. 1. 2. 3.
Alimentos com Muita Purina: Todos os tipos de carnes. Extratos e molhos de carne. Fermento e derivados, cerveja, outras bebidas alcoólicas. 4. Feijão, ervilha, lentilha, grão-de-bico, espinafre, aspargo, couve-flor, soja, cogumelos. 5. Cereais integrais (arroz, trigo, centeio, aveia). 6. Coco, castanha-do-pará, castanha de caju.
• Repouso O paciente deverá ser mantido em repouso por pelo menos 24 horas após melhora dos sintomas agudos. Isto porque a deambulação precoce poderá precipitar a recorrência do quadro artrítico.56 • Antiinflamatórios não-hormonais (AINH) Os AINH têm sido as drogas de escolha no manejo do quadro artrítico agudo. Dentre eles, tradicionalmente, prescreve-se a indometacina, embora outros antiinflamatórios tenham bons resultados. A dose preconizada é de 25 a 50 mg a cada 8 horas por 5 a 10 dias, período este em que os sintomas deverão estar resolvidos.10,11,34,56 Nos casos em que há risco do desenvolvimento de sangramento digestivo uma opção seria o uso dos inibidores da COX-2,56 nas doses recomendadas pela farmacopéia. É importante salientarmos, no entanto, que o risco do desenvolvimento de nefropatia pelos antiinflamatórios ditos tradicionais ou aqueles inibidores da COX-2 é similar.57 • Colchicina A colchicina é uma droga que poderá ser empregada tanto nos períodos intercrise como no manejo do quadro agudo da gota. Esta droga é capaz de inibir a fagocitose de cristais de urato pelos neutrófilos, não interferindo no metabolismo dos uratos.34 Sua excreção se dará através da bile, secreções intestinais e urina.34 Sua administração deverá ser iniciada poucas horas após o início dos sintomas.56 O esquema posológico preconizado é de 0,5 a 0,6 mg via oral a cada hora até que sintomas gastrintestinais apareçam, como náuseas, vômitos ou dor abdominal.56 A dose total necessária geralmente variará entre 4 e 6 mg e não deverá jamais exceder 8 mg.56 O uso endovenoso poderá ser uma opção para que não tenhamos sintomas gastrintestinais, contudo dor local, extravasamento com dano tecidual e supressão de medula óssea são complicações possíveis. A dose endovenosa inicial será de 1 a 2 mg diluídos em 20 a 50 ml de solução salina administrados através de catéter intravascular.10,11,32,56 Duas doses adicionais de 2 mg poderão ser administradas em intervalos de seis horas.56 Não se deverá exceder um total de 4 mg, e a colchicina não deverá ser administrada pela via oral por pelo menos três semanas.56 Pacientes portadores de insuficiência renal ou hepática e indivíduos idosos deverão ter a dose reduzida em 50%. É importante salientar que o risco de toxicidade estará aumentado para aqueles pacientes que fazem uso simultaneamente de drogas inibidoras da enzima P-450 (eritromicina, cimetidina, tolbutamina).32 Frente à associação
capítulo 14
entre doença hepática e renal, a via de administração endovenosa deverá ser proscrita11 • Corticóides Os corticóides estarão bem indicados para aqueles pacientes que apresentarem contra-indicação para o uso de AINH.56 Uma possibilidade para o seu uso seria através de injeções intra-articulares nos pacientes que apresentem comprometimento monoarticular, desde que o diagnóstico de artrite séptica já tenha sido afastado.34 A administração intra-articular poderá ser feita com o uso de triancinolona, 10 a 40 mg, na dependência do tamanho da articulação comprometida.56 Nos casos de gota com comprometimento poliarticular, a via endovenosa deverá ser priorizada, com a administração de metilprednisolona, 40 mg ao dia, com redução da dose e retirada dentro de sete dias.56 O uso oral de corticóides também poderá ser uma opção de tratamento; preconiza-se o uso de prednisona, 40 a 60 mg ao dia, com retirada da droga em sete dias.56 • Analgésico Poderemos lançar mão dos opióides somente nos casos de dor intensa.
Tratamento Farmacológico do Período Intercrise
249
• Evitar medicamentos hiperuricemiantes Diuréticos de alça e tiazídicos inibem a secreção renal de ácido úrico e portanto devem ser evitados. O uso de baixas doses de aspirina ( 3 g/dia) também agrava a hiperuricemia.56
Redução dos Níveis Séricos de Ácido Úrico • Agentes uricosúricos Estas drogas diminuem o pool de uratos pelo bloqueio de sua reabsorção tubular. Seu emprego é ineficaz em pacientes com creatinina maior que 2 mg/dl.11 Sua principal indicação seria nos casos em que há um aumento na freqüência ou gravidade dos ataques agudos, desde que a excreção urinária diária de ácido úrico seja inferior a 800 mg.11 O probenecide pode ser usado na dose de 500 mg por dia, chegando até 1 a 2 gramas ao dia.32,56 A sulfinpirazona é utilizada em dose inicial de 50 a 100 mg duas vezes ao dia, com aumentos graduais até 200 a 400 mg duas vezes ao dia.32,56 Para minimizar o risco de precipitação de cristais de ácido úrico com conseqüente formação de cálculos, sempre que optarmos pelo uso destas drogas deveremos manter o pH urinário em torno de 6,0 (citrato de potássio, 30 a 80 mEq/dia) e um volume urinário superior a 2 litros ao dia.
• Orientações dietéticas As purinas contidas na dieta usualmente não contribuirão com mais que 1 mg/dl na concentração sérica de uratos.32 Mesmo com uma pequena contribuição aparente, a orientação dietética deverá sempre ser feita, especialmente para aqueles pacientes com alta ingesta de purinas (Quadro 14.4). A obesidade, o uso abusivo de álcool bem como períodos prolongados de jejum deverão ser desencorajados. Um débito urinário superior a 2 litros ao dia deverá ser estimulado através de uma ingesta hídrica adequada.
• Alopurinol Pacientes hiperuricêmicos, que apresentem uma excreção urinária diária de ácido úrico superior a 800 mg, se beneficiarão com o uso de alopurinol. Esta droga é uma inibidora da xantina-oxidase e prontamente diminui os níveis plasmáticos e urinários de ácido úrico. A dose inicial é de 100 mg ao dia por sete dias, com aumento da dose caso os níveis séricos de ácido úrico permaneçam elevados. Os melhores resultados serão obtidos com doses entre 200 a 300 mg de alopurinol ao dia.32,56
• Colchicina A colchicina aparece como uma das melhores opções na profilaxia dos quadros agudos. A dose preconizada é de 0,5 a 0,6 mg duas vezes ao dia.10,11,32,56 Pacientes com disfunção hepática ou renal deverão receber uma única dose ao dia, reduzindo-se assim o risco do desenvolvimento de neuropatia periférica e miosite.56 A interrupção da droga poderá ser feita quando não mais ocorrerem crises agudas num período de 6 a 8 semanas.10,11,32 Além da prevenção dos quadros agudos, o uso da colchicina também estará indicado no momento em que iniciarmos a administração de drogas uricosúricas ou alopurinol, evitando-se quadros agudos precipitados por mudanças abruptas nos níveis séricos de ácido úrico.11
NEFROPATIA AGUDA PELO ÁCIDO ÚRICO
• Antiinflamatórios não-hormonais (AINH) Doses diárias de indometacina ou seus equivalentes poderão ser utilizadas nos casos em que a colchicina isolada falha na prevenção de quadros agudos.32
A nefropatia aguda pelo ácido úrico é uma entidade clínica que acontece como parte da síndrome de lise tumoral, com já foi descrito anteriormente. A sua prevenção parece ser a melhor conduta terapêutica. Pacientes que serão submetidos a radioterapia ou quimioterapia para tratamento de neoplasias, que possuem um alto turnover celular, deveriam receber profilaticamente alopurinol em doses elevadas (600 a 900 mg/dia).21,45 O débito urinário deverá ser mantido elevado, acima de 2,5 litros ao dia, que poderá ser conseguido através da administração de solução salina e até mesmo manitol. A alcalinização da urina com o uso de acetazolamida ou bicarbonato é controversa na literatura. Conger e colaboradores, em 1976, num trabalho clássico demonstraram que a simples hidratação com solução salina seria tão efetiva quanto a alcalinização no sentido de diminuir a precipitação de cristais de ácido úrico.45 A alcalinização da urina
250
Metabolismo do Ácido Úrico
objetivaria transformar o ácido úrico em sais de urato, mais solúveis e portanto com menor risco de precipitação. Contudo, tal conduta poderia promover a precipitação de fosfato de cálcio em pacientes com hiperfosfatemia. Pacientes que evoluem com a instalação de um quadro de insuficiência renal aguda devem ser manejados com a prescrição de alopurinol, hidratação vigorosa e diuréticos de alça, estando contra-indicado o uso de bicarbonato de sódio. O tratamento dialítico (hemodiálise) deverá ser restrito aos casos em que se necessita remover o excesso de ácido úrico circulante porém não se consegue induzir a diurese. Outros agentes têm sido usados no manejo destes pacientes, que são a uricase e o polietileno-glicol-uricase (PEGuricase), ainda em fase experimental. Sabe-se que a uricase ou urato oxidase é uma enzima que catalisa a oxidação do ácido úrico em compostos mais solúveis.58 O seu uso atualmente tem sido limitado a pacientes com câncer que desenvolvem hiperuricemia induzida pela quimioterapia. Isto porque a sua administração associa-se com certa freqüência a reações alérgicas com possibilidade de anafilaxia.59
NEFROPATIA CRÔNICA PELO ÁCIDO ÚRICO Uma vez que se instale a insuficiência renal crônica, o tratamento mais efetivo no que diz respeito à remoção de uratos é a hemodiálise. Conseguimos uma depuração de 150 ml/min utilizando-se um fluxo de bomba de sangue em torno de 300 a 400 ml/min. Estes valores são muito superiores àqueles obtidos através da diálise peritoneal.4 Mejias e Maldonado referem a possibilidade de uma redução superior a 50% da concentração plasmática inicial de ácido úrico em um período de 6 horas de hemodiálise.4 Pacientes que já estejam em programa de tratamento dialítico regular e que mesmo assim persistam com níveis séricos de ácido úrico acima dos valores desejados devem ser tratados com alopurinol, para que se previnam surtos de artrite recorrente. Sabendo-se que o alopurinol é uma droga que depende da excreção renal para sua eliminação, o ajuste de dose se faz necessário.47 Uma sugestão de prescrição baseada no clearance de creatinina seria a seguinte: pacientes com Clcreatinina entre 20 e 50 ml/min deveriam receber apenas 1/3 da dose habitual, enquanto pacientes com Clcreatinina inferior a 20 ml/min, 1/6 da dose diária recomendada.48
NEFROPATIA HIPERURICÊMICA FAMILIAR O tratamento desta entidade patológica deve fundamentar-se no uso de agentes uricosúricos, do alopurinol, que tem demonstrado alguns bons resultados, como demonstraram Reitter e colaboradores em 1995,3 além do controle rigoroso dos níveis pressóricos.
NEFROLITÍASE PELO ÁCIDO ÚRICO Existem três pontos fundamentais que regem o tratamento dos pacientes portadores de litíase urinária pelo ácido úrico: 27,28
• Deve-se manter um débito urinário em torno de 2 litros ao dia no intuito de se diminuir a concentração urinária de ácido úrico. • Alcalinizar a urina, pois se sabe que, em torno de um pH de 6,5, cerca de 90% do ácido úrico urinário estará sob a forma de urato, minimizando-se assim o risco de precipitação. Tal eficácia poderá ser comprovada pela observação da equação de Henderson-Hasselbalch, que demonstra a relação entre urato e ácido úrico: pH 5,35 log ([urato] [ácido úrico]) • Uso de alopurinol, para que se reduza a produção de ácido úrico e conseqüentemente a sua excreção. A administração de bicarbonato ou citrato de potássio, na dose de 60 a 80 mEq/dia,28,37 pode ser eficaz na dissolução dos cálculos já formados ou na prevenção da formação de novos cálculos. A alcalinização utilizando-se sais de sódio não produz o efeito desejado, pois a expansão de volume resultante de sua administração aumentará a excreção de sódio e secundariamente de cálcio.27,28 A hipercalciúria resultante poderá trazer conseqüências indesejáveis, pois o ácido úrico poderá atuar como um nicho para a formação de cálculos de oxalato de cálcio.27,28 Habitualmente, os pacientes que mantêm uma excreção de ácido úrico diária superior a 1.000 mg e que não respondem a alcalinização e hidratação requerem o uso continuado de alopurinol.27 Agentes uricosúricos são proscritos. Procedimentos como litotripsia extracorpórea geralmente não são necessários, visto que as recomendações acima mencionadas podem levar à dissolução dos cálculos de ácido úrico.
HIPERURICEMIA NO TRANSPLANTE RENAL Sabendo-se que o tratamento da hiperuricemia nestes pacientes não é isento de riscos, recomenda-se que pacientes assintomáticos não deverão ser tratados. Dado o grande número de interações medicamentosas, especialmente no que diz respeito às drogas imunossupressoras, a hiperuricemia ou gota em pacientes transplantados renais só deverá ser conduzida por profissionais experimentados nesta área. • Colchicina É a droga de escolha para os casos de artrite gotosa aguda em pacientes transplantados. A dose recomendada variará de 0,15 a 0,6 mg ao dia, prescrito somente para pacientes que não apresentem disfunção renal. Convém lembrar que a administração simultânea de ciclosporina ou tacrolimus à colchicina diminui seu clearance.60,61 • Antiinflamatórios não-hormonais (AINH) O uso deste grupo farmacológico poderá aumentar os riscos de nefrotoxicidade à ciclosporina em função da diminuição da taxa de filtração glomerular possibilitada pela
capítulo 14
251
inibição da síntese renal de prostaglandinas. Riscos e benefícios deverão ser avaliados antes da prescrição dos AINH.
enzima xantina-oxidase. O emprego desta droga talvez seja a causa mais comum de hipouricemia, porém os níveis séricos dificilmente serão inferiores a 2,5 mg/dl.
• Corticóides Aumento nas doses de prednisona para 20 ou 30 mg ao dia poderá ser uma medida eficaz frente a quadros artríticos agudos.
• Doenças hepáticas Comprometimentos hepatocelulares graves poderão culminar com uma perda da ação enzimática da xantinaoxidase hepática, levando a uma situação de hipouricemia.
• Alopurinol Pacientes que fazem uso de azatioprina não deverão receber alopurinol. O seu uso implicará o acúmulo de um metabólito ativo da azatioprina denominado 6-mercaptopurina, que acarretará maior risco de toxicidade à medula óssea.62,63 Em situações em que o uso do alopurinol seja imprescindível, duas alternativas se apresentam: a primeira delas seria a redução na dose diária de azatioprina em pelo menos 50%, com monitorização rigorosa da contagem de células brancas, ou até mesmo a descontinuação da droga; e a segunda seria a prescrição do micofenolato em lugar da azatioprina.
• Xantinúria hereditária A xantinúria é resultante de uma marcada redução da atividade da enzima xantina-oxidase e está associada com os mais profundos graus de hipouricemia no homem. Este defeito enzimático leva à síntese reduzida de ácido úrico com acúmulo de seus precursores, hipoxantina e xantina. A concentração sérica de ácido úrico na xantinúria é usualmente inferior a 1 mg/dl.4,34
• Agentes uricosúricos O uso de drogas como probenecide ou sulfinpirazona só poderá ser aventado para aqueles pacientes que apresentem função renal normal e não tenham história de cálculos renais. Lembrando que a sulfinpirazona reduz os níveis de ciclosporina.
ESTADOS DE HIPOURICEMIA Definição A hipouricemia, por definição, corresponderia a todas as situações clínicas em que nos deparamos com um nível sérico de ácido úrico igual ou inferior a 2 mg/dl.4 Esta situação poderá ser identificada em até 2% dos pacientes hospitalizados e em menos de 0,5% na população em geral.64 Os estados de hipouricemia de maneira geral resultarão de uma diminuição na produção de uratos ou do aumento de sua excreção.
Diminuição na Produção de Ácido Úrico Muitos mecanismos poderão estar envolvidos neste processo; em seguida descreveremos alguns deles.
DEFICIÊNCIA DA XANTINA-OXIDASE • Alopurinol O alopurinol é uma droga que atua na redução dos níveis séricos de ácido úrico através da inibição da ação da
EXCREÇÃO AUMENTADA DE ÁCIDO ÚRICO • Expansão de volume extracelular A hipouricemia nesta situação será induzida pela redução na reabsorção de sódio e ácido úrico no túbulo proximal, decorrente da expansão do volume extracelular. Tal situação poderá ser identificada nos pacientes que estão recebendo grandes quantidades de líquido endovenoso, nos portadores de síndrome da secreção inapropriada do hormônio antidiurético, ou ainda naqueles com polidipsia psicogênica.52,65 • Síndrome de Fanconi Esta síndrome mais freqüentemente é observada em crianças portadoras de cistinose e em adultos com mieloma múltiplo. Observa-se uma redução na reabsorção de ácido úrico nos túbulos proximais e também de glicose, fosfato, potássio, bicarbonato e aminoácidos. • Hipouricemia renal familiar Esta é uma síndrome de herança autossômica caracterizada por um defeito tubular no transporte de uratos. • Síndrome da imunodeficiência adquirida A hipouricemia tem sido identificada em alguns pacientes portadores de SIDA e relacionada a algum comprometimento intracraniano, a doença disseminada relacionada e a um pobre prognóstico. Um outro fator associado que poderá justificar a sua presença seria o uso de altas doses de sulfametoxazol-trimetoprim no tratamento das infecções por Pneumocystis carinii.55 • Drogas Talvez uma das causas mais comuns de hipouricemia fosse secundária ao uso de alguns fármacos. Alguns autores referem que este tipo de etiologia poderia representar cerca de 66% do total de casos de hipouricemia.4 Algumas
252
Metabolismo do Ácido Úrico
drogas poderiam induzir a uricosúria diminuindo a ligação de urato às proteínas plasmáticas, inibindo a reabsorção do urato filtrado ou dificultando a secreção de urato na porção média do túbulo proximal. Exemplos clássicos são os salicilatos em altas doses, certos tipos de contrastes radiológicos, o sulfametoxazol-trimetoprim e ainda alguns antagonistas dos receptores de angiotensina II, como por exemplo o losartan.
20.
21. 22.
23.
24.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BROBECK, J.R. Fisiologia das purinas e pirimidinas. In: ———. As Bases Fisiológicas da Prática Médica, 9.ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1976, pp. 116-124. 2. HERBERT, P.N.; HRICIK, D. Hiperuricemia e gota. In: Andreoli, T.E.; Carpenter, C.C.J.; Plum, F.; Smith, L. Cecil — Medicina Interna Básica, 2.ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991, pp. 337-380. 3. REITTER, L.; BROWN, M.; EDMONDS, J. Familial hyperuricemic nephropathy. American Journal of Kidney Diseases, v. 25, n. 2, pp. 235241, february, 1995. 4. MEJIAS, E.; MALDONADO, M.M. Disturbances of uric acid metabolism. In: Handbook of Renal Therapeutics (Edit. Maldonado, M.M.). Plenum Medical Book Co., 1983, Cap. 8, pp. 155-171. 5. KAHN, A.M. Effect of diuretics on the renal handling of urate. Seminars in Nephrology, 8:305, 1988. 6. GUGGINO, S.E.; MARTIN, G.J.; ARONSON, P.S. Specificity and modes of the anion exchanger in dog renal microvillus membranes. American Journal of Physiology, 244:F612, 1983. 7. BURCKHARDT, G.; ULLRICH, K.J. Organic anion transport across contraluminal membrane-dependence on sodium. Kidney International, 36:370, 1989. 8. PRITCHARD, J.B.; MILLER, D.S. Comparative insights into the mechanisms of renal organic anion and cation secretion. American Journal of Physiology, 261:R1329, 1991. 9. ULLRICH, K.J.; RUMRICH, G. Contraluminal transport systems in the proximal renal tubule involved in secretion of organic anion. American Journal of Physiology, 254:f453, 1988. 10. KAHL, L.E. Artrite e doenças reumatológicas. In: Woodley, M.; Alison, W. Manual de Terapêutica Clínica, 27.ª ed. Rio de Janeiro: Medsi — Editora Médica e Científica Ltda, 1994, pp. 637-643. 11. HELLMANN, D.B. Arthritis and musculoskeletal disorders. In: Tierney, L.M.; McPhee, S.J.; Papadakis, M.A. Current Medical Diagnosis and Treatment, 3.ªed. East Norwalk, Connecticut: Appleton and Lange, 1994, pp. 668-672. 12. YU, T.F.; BERGER, L. Impaired renal function in gout: its association with hypertensive vascular disease and intrinsic renal disease. American Journal of Medicine, 72:95-100, 1982. 13. BERGER, L.; YU, T.F. Renal function in gout. IV. An analysis of 524 gouty subjects including long-term follow up studies. American Journal of Medicine, 59:605-613, 1975. 14. YU, T.F.; BERGER, L.; DORPH, D.J.; SMITH, H. Renal function in gout. V. Factors influencing the renal hemodynamics. American Journal of Medicine, 67:766-771, 1979. 15. TARNG, D.C. et al. Renal function in gout patients. American Journal of Nephrology, 15:31-37, 1995. 16. BECK, L.H. Requiem for gouty nephropathy. Kidney International, 30:280-287, 1986. 17. MURRAY, T.; GOLDBERG, M. Chronic intersticial nephritis. Annals of Internal Medicine, 82:453-459, 1975. 18. FESSEL, W.J. Renal outcomes of gout and hyperuricemia. American Journal of Medicine, 67:74-82, 1979. 19. PAUL, L.W.; JUHL, J.H. Doenças das articulações. In: ———. Interpretação Radiológica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1977, pp. 246248.
25. 26.
27. 28. 29. 30.
31.
32. 33. 34.
35. 36. 37.
38.
39.
40.
41.
42.
43.
44.
ROSE, B.D. Pathophysiology of renal disease. In: ———. Pathophysiology of Renal Disease, 2nd ed. New York, USA: McGraw-Hill, 1987, pp. 418-425. KJELLSTRAND, C.M.; CAMPBELL, D.C. et al. Hyperuricemic acute renal failure. Archives of Internal Medicine, 133:349, 1974. HRICIK, D.E.; GOLDSMITH, G.H. Uric acid nephrolithiasis and acute renal failure due to streptozocin nephrotoxicity. American Journal of Medicine, 84:153, 1988. EMMERSON, B.T. The kidney and gout. In: Hamburger, J.; Crosnier, J.; Grunfeld, J.P. (Eds) Nephrology. New York, USA, Wiley, 1979, pp. 747-756. DUNCAN, H.; DIXON, A. Gout, familial hyperuricemia, and renal disease. Q.J. of Medicine, 113:127-135, 1960. CAMERON, J.S. et al. Gout, uric acid and purine metabolism in paediatric nephrology. Pediatric-Nephrology, 7:105-118, 1993. MORO, F. et al. Familial juvenile gouty nephropathy with renal urate hyposecretion preciding renal disease. Clinical Nephrology, 35:263269, 1991. COE, F.L. Uric acid and calcium oxalate nephrolithiasis. Kidney International, 24:392, 1983. RIESE, R.J. et al. Uric acid nephrolithiasis: patogenesis and treatment. Journal of Urology, 148:765, 1992. LIN, H. et al. Cyclosporine-induced hyperuricemia and gout. The New England Journal of Medicine, 321:287, 1989. NOORDZIJ, T.C. et al. Renal handling of urate and incidence of gouty arthritis during cyclosporine and diuretic use. Transplantation, 52:64, 1991. DERAY, G.; BEHMIDA, M.; LEHOANG, P. et al. Renal function and blood pressure in patients receiving long-term, low dose cyclosporine therapy for idiopathic uveitis. Annals of Internal Medicine, 117:578, 1992. EMMERSON, B.T. The management of gout. The New England Journal of Medicine, February, v. 334, n. 7, p. 445-451, 1996. GRIEBSCH, A.; ZOLLNER, N. Effects of ribonucleotides given orally on uric acid production in man. Adv. Exp. Med. Biol., 4:4, 1974. FRAXINO, P.H.; CUBAS, J.A.M.; RIELLA, M.C. Metabolismo do ácido úrico. In: Riella, M.C. Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos, 3.ª ed. Rio de Janeiro; Guanabara Koogan S.A., 1996, pp. 161-170. KAHN, A.M. Indirect coupling between sodium and urate transport in the proximal tubule. Kidney International, 36:378, 1989. WYNGAARDEN, J.B.; KELLEY, W.N. Gout and hyperuricemia. Grune and Stratton, New York, 1976. CAMPION, E.W.; GLYNN, R.J.; DeLABRY, L.O. Assintomatic hyperuricemia. Risks and consequences in the normative aging study. American Journal of Medicine, 82:421, 1982. HALL, A.P.; BARRY, P.E.; DAWBER, T.R.; McNAMARA, P.M. Epidemiology of gout and hyperuricemia: A long term population study. American Journal of Medicine, 42:27, 1967. JOHNSON, R.J.; KIVLIGHN, S.D.; KIM, Y.G. et al. Reappraisal of pathogenesis and consequences of hyperuricemia in hypertension, cardiovascular disease and renal disease. American Journal of Kidney Disease, 33:225, 1999. PORTO, C.C. e colaboradores. Sinais e Sintomas. In: Porto, C.C. Exame Clínico, 3.ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S.A., 1996, pp. 116. ANTON, F.M.; PUIG, J.G.; RAMOS, T. et al. Sex differences in uric acid metabolism in adults. Evidence for a lack of influence of estradiol 17 (E2) on the renal handling of urate. Metabolism, 35:343, 1988. LANGFORD, H.G.; BLAUFOX, M.D.; BORHANI, N.O. et al. Is thiazide-produced uric acid elevation harmful? Analysis of data from the hypertension detection and follow-up program. Archives of Internal Medicine, 147:645, 1987. SEGURO, A.C.; MAGALDI, A.J.B.; HELOU, C.M.B.; MALNIC, G.; ZATZ, R. Processamento de água e eletrólitos pelos túbulos renais. In: Zatz, R. Série Fisiopatologia Clínica — Fisiopatologia Renal (vol. 2), 1.ª ed. São Paulo: Editora Atheneu, 2000, pp. 71-96. MONBALLYU, J.; ZACHEE, P.; VERBECKMOES, R.; BOOGAERTS, M.A. Transient acute renal failure due to tumor-lysis-induced severe
253
capítulo 14
45.
46.
47.
48. 49.
50.
51. 52.
53. 54.
55.
56.
57.
58.
59.
phosphate load in a patient with Burkitt’s lymphoma. Clinical of Nephrology, 22:47, 1984. RAZIS, E.; ARLIN, Z.A.; AHMED, T. et al. Incidence and treatment of lysis syndrome in patients with acute leukemia. Acta Haematology, 91:171, 1994. CONGER, J.D.; FALK, S.A. et al. A micropuncture study of the early phase of acute urate nephropathy. Journal of Clinical Investigation, 58:681, 1976. KOZENY, G.A., HANO, J.E. Rheumatologic disease. In: Daugirdas, J.E., Ing, T.S. Handbook of Dialysis, 2.ª ed. USA: Little Brown, 1994, pp. 665-666. GUZMAN, N.J. Use of drugs in renal failure. In: ———. Nephrology, 3.ª ed. Baltimore, Maryland, USA: William and Wilkins, 1995, p. 289. LARANJA, S.M.R.; HEILBERG, I.P.; COÊLHO, S.T.S.N. e colaboradores. Estudo multicêntrico de litíase renal no Brasil (Multilit). In: Calculose Renal — Fisiopatologia, Diagnóstico e Tratamento. São Paulo: Editora Sarvier, 1995, pp. 295-298. PAK, C.Y.; SAKHAEE, K.; FULLER, C. Successful treatment of uric acid nephrolithiasis with potassium citrate. Kidney International, 30:442, 1986. YU, T.F. Urolithiasis in hyperuricemia and gout. Journal of Urology, 126:424, 1981. BECK, L.H. Hypouricemia in the syndrome of inappropriate secretion of antidiuretic hormone. The New England Journal of Medicine, 301:528, 1979. YU, T.F.; GUTMAN, A.B. Uric acid nephrolithiasis in gout: Predisposing factors. Annals of Internal Medicine, 67:1133, 1967. SHAHINFAR, S.; SIMPSON, R.L.; CARIDES, A.D. et al. Safety of losartan in hypertensive patients with thiazide-induced hyperuricemia. Kidney International, 56:1879, 1999. CHERTOW, G.M.; SEIFTER, J.L.; CHRISTIANSEN, C.L.; O’DONNEL, W.J. Trimethoprim-sulfamethoxazole and hypouricemia. Clinical Nephrology, 46:187, 1996. HELLMAN, D.B.; STONE, J.H. Arthritis & musculoskeletal disorders. In: Tierney Jr, L.M.; McPhee, S.J.; Papadakis, M.A. Current — Medical Diagnosis & Treatment, 2001, pp. 817-821. PERAZELLA, M.A.; TRAY, K. Selective cyclooxygenase-2 inhibitors: a pattern of nephrotoxicity similar to traditional nonsteroidal antiinflammatory drugs. American Journal of Medicine, 111(1): 64-67, 2001. LOUYOT, P.; MONTET, Y.; ROLAND, J. et al. L’urate oxydase dans le traitement de la goutte et de l’hyperuricemie. Ver. Rheum. Mal. Oteortic., 37:795, 1970. MONTAGNAC, R.; SCHILLINGER, F. Accident anaphylactique lié à l’injection intraveineuse d’urate-oxydase chez une dialysée. Nephrologie, 11:59, 1990.
60.
61.
62.
63.
64. 65.
BURACK, D.A.; GRIFFITH, B.P.; THOMPSON, M.E. et al. Hyperuricemia and gout among heart transplant recipients receiving cyclosporine. American Journal of Medicine, 92:141, 1992. SIMKIN, P.A.; GARDNER, G.C. Colchicine use in cyclosporine treated transplant recipients: how little is too much? [editorial]. Journal of Rheumatology, 27:1334, 2000. ELLION, G.B.; CALLAHAN, S.; NATHAN, H. Potentiation by inhibition of drug degradation: 6-substituted purine and xanthine oxidase. Biochem. Pharmacol., 12:85, 1963. RAGAB, A.H.; GILKERSON, E.; MYERS, M. The effect of 6mercaptopurine and allopurinol on granulopoiesis. Cancer Res., 34:2246, 1974. OGINO, K.; SAITOH, M. et al. Clinical significance of hypouricemia in hospitalized patients. J. Med., 22:76, 1991. PERETZ, A.; DECAUX, G.; FAMAEY, J.P. Hypouricemia and intravenous infusions. Journal of Rheumatology, 10:66, 1983.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Nephrology, Dialysis and Transplantation http://ndt.oupjournals.org American Society of Nephrology http://www.asn-online.com/ International Society of Nephrology http://www.isn-online.org The New England Journal of Medicine http://www.nejm.org/content/index.asp Cyber Nephrology http://www.cybernephrology.org American Society of Hypertension http://www.ash-us.org American College of Rheumatology http://www.rheumatology.org Annals of the Rheumatic Disease http://www.anrheumdis.org Arthritis Foundation http://www.arthritis.org Johns Hopkins Arthritis Center http://www.hopkins-arthritis.org
Capítulo
15
Terapia Parenteral. Reposição Hidroeletrolítica Miguel Carlos Riella e Maria Aparecida Pachaly
INTRODUÇÃO
Correções para o sódio
COMO SE FORMULA O PLANO PARENTERAL DIÁRIO? CÁLCULO DA NECESSIDADE BÁSICA Perdas urinárias
O terceiro espaço Sangue e plasma Ácido-básico
Volume
Potássio
Sódio
PRINCÍPIOS GERAIS DO PLANO PARENTERAL
Potássio
PLANO DE ADMINISTRAÇÃO
Cloro
PRESCRIÇÃO MÉDICA
Sensível e insensível
EXEMPLOS
Perdas gastrintestinais
APÊNDICE
Volume
Soluções cristalóides
Eletrólitos
Soluções colóides
CÁLCULO DAS CORREÇÕES Correções para a água
INTRODUÇÃO O desenvolvimento da terapia parenteral iniciou-se por volta de 1616, quando William Harvey descobriu a circulação do sangue. Mas foi só em 1818 que Blundell realizou a primeira transfusão humana. No início, as complicações foram muitas. Os grupos sangüíneos não eram conhecidos e as reações fatais eram freqüentes, a ponto de a troca de sangue humano ter sido proibida por lei. Atribuiu-se a Thomas Latta, da Escócia, em 1831, o mérito de ter sido o primeiro a empregar a terapia parenteral de maneira racional. Ele administrou uma solução salina a pacientes com cólera e diarréia intensa. Quando Karl Landsteiner descobriu os grupos sangüíneos em 1901, reavivou-se o interesse na transfusão de sangue e na terapia parenteral. Porém, os problemas com as infecções e as reações pirogênicas continuavam de-
Outras soluções e aditivos para uso parenteral REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
sencorajando os investigadores. Apenas quando Florence Seibert descobriu por que havia substâncias pirogênicas na água destilada, o progresso da terapia parenteral foi mais rápido. No entanto, a grande utilidade da terapia parenteral no pós-operatório foi restringida durante muitas décadas, pelo conceito de que o paciente cirúrgico apresentava uma intolerância ao sal. Isto se baseava na observação de que, no pós-operatório, a excreção urinária de sódio diminuía muito, chegando a quase zero quando se administravam pequenas quantidades de soluções salinas. Na época, acreditouse que isto refletia uma incapacidade do rim, pós-cirurgia, de tolerar grandes quantidades de sal. Em vista disso, pacientes no pós-operatório receberam, por muitos anos, apenas uma solução de água e glicose. É evidente que, numa análise retrospectiva, muitas das complicações pósoperatórias, como o íleo prolongado, insuficiência renal, hipotensão, catabolismo excessivo, etc., podem ser atribu-
255
capítulo 15
ídas a déficits de volume e sódio.1 Apenas quando se evidenciou que a redução de sódio urinário no pós-operatório era uma resposta compensatória, é que passaram a ser administradas soluções mais balanceadas. Nas últimas décadas, têm havido grandes progressos nesta área. Técnicas mais sofisticadas permitiram uma análise da composição corporal, de seus vários compartimentos líquidos e de seus constituintes. Foram determinadas as necessidades básicas diárias do organismo com relação à água, a eletrólitos, minerais, vitaminas e, inclusive, necessidades energéticas (calorias) e suas fontes: lipídios, carboidratos e proteínas. Com isto, tornou-se possível modificar a necessidade básica, para corrigir déficits decorrentes de perdas anormais de água, solutos e fontes de energia. O suporte nutricional e a hiperalimentação passaram a ter um lugar de destaque na terapia parenteral, complementando a terapia hidroeletrolítica. A escolha entre a reposição hidroeletrolítica e a de agentes nutritivos (nutrição parenteral) passou a depender do período em que o paciente permanecerá em jejum. A reposição de água e eletrólitos não deverá prolongar-se por mais de sete dias (em média), sem um suporte nutricional. A partir de então, a nutrição parenteral poderá atender às necessidades básicas de água, eletrólitos e substratos energéticos. O capítulo atual integra os conhecimentos adquiridos nos capítulos anteriores sobre a fisiologia e distúrbios dos compartimentos líquidos, água, sódio, potássio e equilíbrio ácido-básico, abordando os princípios da reposição hidroeletrolítica. As indicações, técnica, complicações e resultados da nutrição parenteral são os assuntos do capítulo seguinte.
COMO SE FORMULA O PLANO PARENTERAL DIÁRIO? A etapa inicial para a formulação do plano parenteral é a obtenção de todos os dados possíveis da história clínica, exame físico e dados laboratoriais.2 Na história, alguns sintomas podem sugerir distúrbios hidroeletrolíticos específicos. Por exemplo, se o paciente relatar que está vomitando, é mais provável que apresente uma alcalose metabólica e um déficit de sódio e potássio. Se ele tiver sintomas de insuficiência cardíaca congestiva, poderá apresentar um excesso de sódio. Rápidas mudanças no peso geralmente traduzem ganho ou perda líquida. As informações sobre ingesta e excreta são extremamente úteis.2 Há necessidade de uma anotação diária do volume de líquido administrado e da quantidade excretada sob a forma de urina, perdas gastrintestinais, drenagem etc. A determinação diária do peso, quando possível, pode servir como guia para as necessidades diárias de sódio (v. a seguir). As determinações das concentrações plasmáticas de
sódio, potássio, cloro, bicarbonato, glicose, uréia e creatinina já são rotina na maioria dos hospitais e, como veremos, são de extrema valia no diagnóstico e correção dos distúrbios hidroeletrolíticos. O método delineado a seguir, para a reposição hidroeletrolítica, foi idealizado e aperfeiçoado pelo Dr. Belding H. Scribner, da Universidade de Washington, em Seattle, Estados Unidos.2 Ele acredita que o método é útil porque permite a formulação de um plano parenteral diário para cada paciente. Portanto, o plano é individualizado, de acordo com as necessidades do paciente naquele momento. Acreditamos, particularmente, que a sua grande utilidade também está em proporcionar um plano de trabalho para o diagnóstico e o tratamento de problemas complexos. Uma vez obtida toda a informação possível do paciente, a formulação do plano obecede à seguinte ordem: 1) Cálculo da necessidade básica: refere-se à quantidade de líquidos e eletrólitos que se prevê como perdas para o paciente nas próximas 24 horas. Estas perdas incluem: perdas urinárias, digestivas e perdas sensíveis e insensíveis (pele e pulmão). 2) Cálculo das correções hidroeletrolíticas em face dos distúrbios detectados através de uma avaliação clínica e laboratorial. 3) O balanço entre a necessidade básica e as correções indica o total de líquido e eletrólitos a ser administrado.
CÁLCULO DA NECESSIDADE BÁSICA O plano parenteral básico tem por objetivo a reposição de perdas de fluidos e eletrólitos ocorridas em 24 horas, através da pele, pulmões, urina e outros fluidos corporais. A necessidade básica de líquidos e eletrólitos corresponde à somatória das perdas ocorridas nas últimas 24 horas. Os volumes e a quantidade de eletrólitos necessários encontram-se expostos no Quadro 15.1. As estimativas baseiamse em valores médios de populações saudáveis. Porém, quando o paciente se encontra internado, e estiver sendo monitorizada a diurese ou a dosagem dos eletrólitos urinários, estes valores são mais exatos e devem ser utilizados. Recomendamos que seja utilizado o Quadro 15.3, para organizar a anotação dos volumes das perdas líquidas e eletrolíticas de cada paciente. Uma vez tabulados todos os dados de forma sistematizada, torna-se muito mais fácil calcular os subtotais, assegurando que todas as perdas sejam consideradas e repostas.
Perdas Urinárias VOLUME O volume urinário para um indivíduo normal varia entre 500 ml (em condições de restrição hídrica intensa) e
256
Terapia Parenteral. Reposição Hidroeletrolítica
Quadro 15.1 Necessidades básicas diárias Perdas
ÁGUA
ELETRÓLITOS (mEq/dia)
(ml/dia)
Sódio
Potássio
Cloro
Urina
1.500
75
40
115
Sensível e Insensível
1.000
0
0
0
50 mEq/L 100 mEq/L
10 mEq/L 10 mEq/L
100 mEq/L 100 mEq/L
Gastrintestinalb pH 4 pH 4
a
a) indica-se o volume perdido no dia anterior. b) a secreção gástrica contém ainda 90 mEq de H por litro.
2.500 ml ao dia. O volume urinário de 1.500 ml, utilizado para cálculo, representa um valor médio entre os volumes urinários mínimo e máximo excretados habitualmente. Desta forma, se o volume líquido administrado for excessivo em relação às necessidades do paciente, o rim excretará o excesso, e se porventura for insuficiente, ele conservará o máximo possível de líquido. É necessário lembrar também que a urina contém dois componentes líquidos: um, correspondente à água sem eletrólitos, e outro, em que a água veicula eletrólitos. Por exemplo, num volume urinário de 1.500 ml, com sódio de 75 mEq/litro, concluímos que cerca de 500 ml são suficientes para a eliminação do sódio sob forma de uma solução isotônica, enquanto os restantes 1.000 ml correspondem a água livre. Quando o paciente apresenta um distúrbio da função renal, os rins não são capazes de variar a excreção de água e eletrólitos de acordo com a ingesta. Por exemplo: a) se o paciente apresenta oligúria devido a um comprometimento orgânico do rim, haverá uma incapacidade do rim em regular o balanço de água. A administração excessiva de líquido em relação ao volume excretado causará um excesso de água no organismo. Nestes casos, o volume urinário da necessidade básica deverá ser igual ao volume de urina excretada (v. também manejo da insuficiência renal aguda — Cap. 20); b) da mesma forma, a presença de edema implica um excesso de volume extracelular e, portanto, de sódio total. É preciso, então, reduzir a necessidade básica de sódio a zero. É necessário lembrar que o metabolismo de proteínas, gorduras e carboidratos produz a chamada água endógena, num volume de cerca de 400 ml ao dia. O metabolismo de 1 g de lipídios gera 1 ml de água; de 1 g de glicose, 0,64 ml de água, e de 1 g de proteína, 0,4 ml de água. Este volume de água pode, em algumas circunstâncias especiais, como a insuficiência renal anúrica, contribuir para o aparecimento de hiponatremia dilucional.
mais sódio quando há modificações da dieta, num processo de adaptação que é efetivo após alguns dias (v. Cap. 10). Para atender às necessidades básicas, costumamos administrar 50-75 mEq diários de sódio, permitindo ao rim eliminar uma maior ou menor quantidade, de acordo com as necessidades.3
POTÁSSIO A perda diária habitual pela urina e fezes é de 40 mEq (v. Cap. 12).3 Na necessidade básica, administramos estes 40 mEq, observando que caberá ao rim modular a excreção deste íon, de acordo com as necessidades.
CLORO A necessidade básica de cloro é deduzida pela soma da necessidade dos dois cátions: Na e K.
SENSÍVEL E INSENSÍVEL Habitualmente consideramos, para a necessidade básica, uma perda líquida diária pela pele e pulmões da ordem de 1.000 ml. A perda diária através da pele está em torno de 400 ml, mas aumenta muito por sudorese profusa, febre, ambientes quentes e de pouca umidade. As perdas eletrolíticas na sudorese e respiração são desprezíveis (v. Quadro 15.1: zero nas colunas de sódio, potássio e cloro), e a reposição é feita apenas com água. Caso haja febre, acrescentar mais 100 ml de água para cada grau acima de 38°C. Em presença de taquipnéia, adicionar 100200 ml para cada 4 movimentos respiratórios por minuto acima de 20 no homem e 16 na mulher. Se a sudorese for excessiva, haverá perdas eletrolíticas que deverão ser repostas.
Perdas Gastrintestinais VOLUME
SÓDIO A ingesta média diária de sódio é de 135 a 170 mEq (8 a 10 g de sal). Os rins são capazes de conservar ou excretar
No plano parenteral básico são levadas em conta as perdas ocorridas pela drenagem de fluidos corporais, através de sondas e fístulas. Procura-se fazer uma estimativa
257
capítulo 15
antecipada do volume a ser eliminado nas próximas 24 horas, baseando-se nas perdas ocorridas em dias anteriores. Isto é, se um paciente vem eliminando 1.000 ml de suco gástrico ao dia, é natural esperar que ele elimine a mesma quantidade nas próximas 24 horas. No entanto, é importante salientar que, se uma avaliação ao final das primeiras oito horas revela um volume eliminado próximo do esperado para as 24 horas, há necessidade de revisar o plano terapêutico traçado.
ELETRÓLITOS Sem dúvida, o melhor meio de avaliar as perdas eletrolíticas em um determinado fluido do trato gastrintestinal é proceder à análise bioquímica do líquido. Como isto não é realizado rotineiramente, utilizamos algumas regras práticas. No caso do suco gástrico, costuma-se utilizar o seguinte raciocínio: suco gástrico de pH superior a 4 tem uma concentração de sódio em torno de 100 mEq/L, ou 10% do volume eliminado; se o pH for inferior a 4, a concentração de sódio será de 50 mEq/L, ou 5% do volume eliminado. De modo geral, consideramos que o suco gástrico eliminado apresenta pH menor que 4. Exemplo: volume de suco gástrico eliminado 1.500 ml, com pH 6; quantidade provável de sódio eliminado: 10% de 1.500 150, ou seja, 150 mEq de sódio. A perda de potássio no suco gástrico é pequena e não varia com a acidez do líquido. O cálculo é geralmente feito na base de 10 mEq/L, ou 1% do volume eliminado. A concentração habitual de cloro está em torno de 100 mEq/L (Quadro 15.2). Para as demais secreções do trato gastrintestinal, o Quadro 15.2 demonstra as concentrações eletrolíticas médias nos fluidos pancreáticos, biliares, intestinais, etc. Estas perdas também devem ser repostas no plano básico.
CÁLCULO DAS CORREÇÕES A segunda fase do plano parenteral tem por objetivo a correção de distúrbios encontrados em cada uma das categorias enumeradas a seguir: 1) água; 2) sódio; 3) ácidobásico; 4) potássio, e 5) sangue e plasma. Deve ser rotineiramente verificada a presença de distúrbios em cada um destes elementos. Isto será extremamente útil na abordagem dos distúrbios hidroeletrolíticos mais complexos. Na folha de reposição hidroeletrolítica, há uma seção específica para correções (Quadro 15.3). Se não há distúrbios a corrigir, deve-se colocar um zero na coluna apropriada. Um sinal de adição () ou subtração () indica se a quantidade deverá ser adicionada ou retirada do plano parenteral.
Correções para a Água Naturalmente as considerações feitas no Cap. 9 são valiosas para a análise e a compreensão dos distúrbios do metabolismo da água. Como foi frisado, a maneira mais prática de avaliar a necessidade de água é determinar o sódio plasmático, que reflete a osmolalidade plasmática. O objetivo é administrar uma quantidade de água que mantenha o sódio plasmático entre 130 e 135 mEq/L. Considerando que a água corporal total (ACT) equivale a cerca de 60% do peso corporal, o déficit ou excesso de água podem ser calculados pela fórmula abaixo. Ao se comparar a água corporal normal com a atual, será possível verificar a magnitude do excesso ou déficit. Água atual
Água normal Sódio normal Sódio atual
Quadro 15.2 Conteúdo eletrolítico dos fluidos corporais (mEq/L) LÍQUIDO
Naⴙ
Kⴙ
Clⴚ
HCO3ⴚ
Volume (L/dia)
Saliva Suco gástrico — pH 4 Suco gástrico — pH 4 Bile Duodeno Pâncreas Íleo Ceco Cólon Suor Ileostomia — recente Ileostomia — adaptada Colostomia
30 50 100 145 140 140 130 80 60 50 130 50 50
20 10 10 5 5 5 10 20 30 5 20 5 10
35 100 100 110 80 75 110 50 40 55 110 30 40
15 40 50 90 30 20 20 30 25 20
1-1,5 2,5 2 1,5 0,7-1 3,5 0-3 0,5-2 0,4 0,3
Adaptado de Koch, S.M.7
258
Terapia Parenteral. Reposição Hidroeletrolítica
Quadro 15.3 Folha de reposição hidroeletrolítica Plano Básico Fonte
Volume
Naⴙ
Kⴙ
Clⴚ
Urina Sensível Insensível Gastrintestinal Total – Básico (A) Plano de Correções Fonte
Volume
Naⴙ
Kⴙ
Clⴚ
Bic
Água Sódio Potássio Ácido-Básico Sangue e plasma Total – Correções (B) TOTAL (A + B) Prescrição médica: 1.____________________________________________________________________________________________________________ 2.____________________________________________________________________________________________________________ 3.____________________________________________________________________________________________________________ 4.____________________________________________________________________________________________________________ Adaptado de Scribner, B. H.2
Exemplo: Um paciente de 65 anos, que usualmente pesa 70 kg, chega ao hospital com um quadro de gastroenterite, queixando-se de sede. A determinação do sódio plasmático revela uma concentração de 154 mEq/L. Baseado no sódio plasmático, o diagnóstico inicial é de hipernatremia (déficit de água livre). Que quantidade de água livre deve ser administrada no plano parenteral de correção? Observe o cálculo, empregando-se a fórmula anterior. Água corporal total normal 60% de 70 kg 42 litros
Água atual
Água normal Sódio normal Sódio atual
Água atual
42 140 38 154
Portanto, se a água normal é 42 litros e a atual é 38 litros, existe déficit de 4 litros de água livre. Na coluna de correção para a água, anotaremos: 4.000 ml.
Correções para o Sódio Os dados importantes de história e exame físico para uma avaliação das necessidades de sódio já foram abordados no Cap. 10, onde mencionamos que se pode estimar o déficit de sódio através de uma avaliação criteriosa dos sinais físicos e pressão arterial e pulso nas três posições (deitado, sentado e de pé). A ausência de sinais ao exame físico, mas com história de perdas fluidas, permite o diagnóstico de depleção de pelo menos 10%. A variação da pressão e pulso permite a caracterização de graus mais intensos de déficit de sódio: 20 a 30% ou 40 a 50% do volume extracelular. A orientação dada no Cap. 10 para avaliar o sódio no organismo é a habitualmente utilizada no dia-a-dia. Poderão ocorrer, uma ou outra vez, dúvidas quanto às reais necessidades de sódio. Podemos, então, lançar mão de uma outra maneira de avaliar as necessidades de sódio, com base na interpretação das alterações do peso corporal. Estas alterações podem refletir mudanças no volume extracelular e, portanto, mudanças no sódio total. Mas, para que
capítulo 15
259
o peso reflita o volume extracelular, duas correções são necessárias: uma para o catabolismo e outra para a água intracelular. Estas correções são necessárias, pois é óbvio que, se um indivíduo perdeu 2 kg nas últimas 48 horas, parte pode ter sido devido a uma diminuição do volume extracelular, parte a um déficit de água, e o restante, ao catabolismo por jejum, infecção etc. Atribui-se ao catabolismo uma perda diária de peso (massa protéica e gordurosa) entre 0,3 e 0,5 kg, dependendo do grau de catabolismo. A seguinte equação indica os fatores que causam alterações no peso:
Comentário: A análise dos dados deste paciente permite deduzir que, no 10.º dia de pós-operatório, ele deveria ter perdido 3 kg à custa do catabolismo. No entanto, ele perdeu só 2 kg, e, como não houve variação no sódio plasmático, deduz-se que não houve variação na água intracelular. Portanto, o aumento de 1 kg foi à custa de um aumento no volume extracelular. Suponhamos agora que, no mesmo exemplo anterior, o sódio plasmático esteja em 126 mEq/L no 10.º dia de pósoperatório. Vejamos qual a alteração no volume extracelular.
peso VEC LIC Perda de massa protéica e gordurosa, onde:
peso VEC (0,4 peso) (PNai PNaf)/PNai (0,3 n.º dias)
peso diferença entre o peso inicial e final;
2 kg VEC (0,4 60) (140 126)/140 0,3 10
VEC diferença entre o volume de líquido extracelular inicial e final;
2 kg VEC 24 10% 3
LIC diferença entre a quantidade de líquido (água) intracelular inicial e final;
2 kg VEC 0,6
Perda de massa protéica e gordurosa diferença na massa celular devido ao catabolismo diário.
Comentário: Como houve uma redução do sódio plasmático da ordem de 10% (140 126 14 ou 10% de 140), este paciente ganhou 10% do volume de água intracelular (24 litros), ou seja, 2,4 litros. Como no final de 10 dias ele deveria ter perdido 3 kg devido ao catabolismo e adquirido 2,4 kg pelo ganho de água, a redução de peso deveria ser de apenas 0,6 kg. Mas, como ele perdeu 2 kg, isto significa que o volume extracelular foi reduzido em 1,4 litro, como se deduziu acima. A correção para sódio implica a administração de uma solução isotônica de água e sódio. Se chegarmos à conclusão de que há um déficit de sódio da ordem de 1.000 ml, colocamos na coluna de volume o valor de 1.000 ml precedido do sinal . Nas colunas do sódio e cloro, colocamos o valor 150 mEq, que se refere à quantidade de sódio e cloreto existente por litro de solução salina isotônica. Na presença de edema e, portanto, de excesso de sódio no organismo, nenhuma solução contendo sódio será administrada, e a coluna de Na terá apenas zeros.
A água intracelular equivale a 40% do peso corporal, e supõe-se que alterações na água intracelular reflitam alterações na osmolalidade plasmática e, conseqüentemente, alterações no sódio plasmático. Desta forma, a diferença no líquido intracelular será: LIC LIC PNa PNa diferença entre o sódio plasmático inicial (PNai) e o sódio plasmático final (PNaf) em relação ao sódio plasmático inicial. Pode-se também usar a percentagem de alteração no sódio plasmático ( % Na). Logo, LIC (0,4 peso) (PNai - PNaf)/ PNai A equação final será: peso VEC (0,4 peso) (PNai PNaf)/PNai (0,3 n.º dias)
2 kg VEC 2,4 3 VEC 1,4 litro.
ou, substituindo (PNai PNaf)/PNai por % Na: peso VEC (0,4 peso) % Na (0,3 n.o dias) Exemplo: Um paciente de 60 kg é submetido a uma gastrectomia total, recebendo apenas água e eletrólitos por via parenteral. No 10.º dia de pós-operatório, seu peso é de 58 kg. O sódio plasmático inicial e agora no 10.º dia é o mesmo: 140 mEq/L. Qual foi a alteração no volume extracelular? Aplicando a equação anterior, teremos: 2 kg VEC (24 litros 0 3kg) 2 kg VEC (0 3 kg) 2 kg VEC 3 kg VEC 1 litro.
O TERCEIRO ESPAÇO Este termo foi criado para descrever um compartimento físico ou fisiológico no qual líquidos do organismo, especialmente o líquido extracelular, acumulam-se em decorrência de uma lesão e não mais participam do volume circulante.1,4 Seria talvez mais preciso imaginar este líquido como um volume seqüestrado internamente e oriundo do líquido extracelular. Desta forma, pode haver uma enorme diminuição no volume extracelular, sem que haja alteração do peso. Como dissemos, este líquido localiza-se mais comumente em tecidos lesados, como na pele, após queimaduras; na superfície peritoneal, após uma agressão química ou bacteriana; na massa muscular esquelética, após trauma ou esmagamento; acúmulo intraluminal de
260
Terapia Parenteral. Reposição Hidroeletrolítica
secreções digestivas no caso de uma obstrução intestinal e o próprio líquido ascítico. Até que exista um restabelecimento da integridade celular dos tecidos lesados, este líquido acumulado não tem valor funcional. É importante relembrar que, como este líquido se origina do extracelular, inicialmente há uma redução do volume extracelular, e o organismo responde com retenção de água e sal, que se traduz por aumento do peso. A redução da excreção de sódio urinário que ocorre no pós-operatório, que por muitos anos foi interpretada como uma intolerância do rim ao sódio (v. introdução do capítulo), nada mais é que uma resposta fisiológica face a uma redução do volume extracelular, decorrente de uma seqüestração de líquido (terceiro espaço) na área de incisão cirúrgica, área de dissecção e nos espaços manipulados, como ocorre com o edema das alças intestinais pós-manipulação.
Sangue e Plasma Se houver uma redução importante do volume globular ou evidência de sangramento ativo, a administração de sangue pode estar indicada. Da mesma forma, nos processos inflamatórios intraperitoneais (peritonites) ou no grande queimado, a perda de plasma é significativa, e a sua reposição será importante na manutenção de um bom volume circulante. É importante salientar que o volume plasmático e o volume extracelular podem variar em direções opostas. Por exemplo, na presença de hipoproteinemia e edema, o volume extracelular está aumentado e o volume plasmático reduzido, podendo haver sinais de hipovolemia.
Ácido-básico O processo diagnóstico de um distúrbio ácido-básico já foi abordado no Cap. 11. Ficou explícito que, se houver uma alcalose metabólica, a correção da depleção do volume extracelular e do déficit de potássio, em geral, será suficiente. Raramente há necessidade da administração de ácidos minerais. Se o diagnóstico é de acidose metabólica, calculamos a quantidade de bicarbonato de sódio a ser administrada (já abordada no Cap. 11) e anotamos na coluna do sódio. Lembrar de anotar, na coluna de volume, a quantidade de líquido que será utilizada para administrar o bicarbonato. Também é necessário deduzir, da necessidade básica ou da correção para sódio, a quantidade de sódio administrada com o bicarbonato de sódio.
Potássio O potássio plasmático nos dá uma idéia do potássio total do organismo. Uma vez determinado o déficit (método
exposto no Cap. 12), anotamos o valor na coluna do potássio e do cloro. Um outro modo de fazer um cálculo aproximado do déficit de potássio é o seguinte:3 1. Se K sérico 3 mEq/L: para elevar o K sérico em 1 mEq/L, há necessidade de administrar de 100 a 200 mEq de potássio. 2. Se K sérico 3 mEq/L: para elevar o K sérico em 1 mEq/L, há necessidade de administrar de 200 a 400 mEq de potássio. 3. Para cada alteração no pH de 0,1 unidade, há uma alteração inversa de 0,6 mEq/L na concentração sérica de K. Exemplo: pH 7,3; K 4,6 mEq/L. Como houve uma redução de 0,1 no pH, o K sérico se elevou em 0,6 mEq/L. Com a correção do pH para 7,4, o K sérico voltará a 4,0 mEq/L.
PRINCÍPIOS GERAIS DO PLANO PARENTERAL 1. É necessário que se faça apenas uma estimativa da magnitude do distúrbio, a qual servirá de guia para a reposição. Uma determinação exata não é possível e tampouco necessária. 2. À medida que se faz a correção do distúrbio, o plano terapêutico seguinte deverá aproximar-se da necessidade básica e permitir que o próprio rim faça os ajustes finais. 3. Nunca há necessidade de corrigir o distúrbio completamente nas primeiras 24 horas. 4. Cálcio, magnésio e fósforo normalmente não são acrescentados às soluções hidrossalinas que se destinam a uma reposição hidroeletrolítica de poucos dias de duração, porém são essenciais na nutrição parenteral. No Cap. 13 se encontram as diretrizes para o diagnóstico e o tratamento dos distúrbios relacionados a esses elementos.
PLANO DE ADMINISTRAÇÃO Na folha de reposição hidroeletrolítica, determinam-se os totais combinados de volume e eletrólitos da necessidade básica e correções. Sódio. É administrado sob a forma de solução salina isotônica, na qual cada 1.000 ml possui 150 mEq de sódio. Se a quantidade de sódio a ser determinada for de 300 mEq, são necessários 2.000 ml de solução salina isotônica (soro fisiológico). Este volume (2.000 ml) é deduzido do volume total do líquido previsto na reposição. Água. É administrada sob a forma de uma solução de glicose a 5% (isotônica). Soluções de glicose mais concentradas (10, 20 ou 50%) poderão ser utilizadas, mas por veia central, já que em veia periférica soluções hipertônicas causam flebite.
capítulo 15
Potássio. É encontrado sob a forma de cloreto de potássio, acetato de potássio e fosfato de potássio. Na reposição hidroeletrolítica, geralmente utilizamos o cloreto de potássio. As outras formas de apresentação são reservadas para a nutrição parenteral. O KCl a 19,1% (ampolas de 10 ml) contém 2,5 mEq de K por ml. A quantidade de potássio prevista na reposição é distribuída preferencialmente pelos frascos de soro glicosado a 5%. Evita-se a colocação de potássio em soro fisiológico porque, numa emergência (p. ex., choque), o líquido a ser administrado rapidamente é o soro fisiológico e nunca o soro glicosado. Se o soro fisiológico contiver K, sua administração rápida poderá causar sérias arritmias cardíacas. Evitar uma concentração de K superior a 30 mEq/L, pois concentrações maiores causam irritação e dor ao longo da veia. Se o paciente se apresenta oligúrico ou com retenção nitrogenada, é preferível não adicionar potássio ao primeiro frasco de solução. Se houver boa diurese em resposta à reposição líquida, adicionase potássio aos demais frascos.
PRESCRIÇÃO MÉDICA A prescrição do plano parenteral: a) especifica a solução básica a ser administrada: soro fisiológico, soro glicosado a 5% etc.; b) especifica o volume de cada solução básica: 1.000 ml, 3.000 ml etc.; c) identifica os frascos de cada solução por um número consecutivo: p. ex., soro fisiológico, 3.000 ml; frascos 1, 2 e 3; d) indica os aditivos a serem usados na solução: p. ex., adicionar 10 ml de KCl 19,1% aos frascos 4, 5, 6 e 7 de soro glicosado a 5%; e) indica a velocidade de infusão, ou gotejamento por minuto. Aproximadamente, utilizando-se equipos comuns de infusão, a seguinte relação é válida: gotas/min
ml/h
L/24 h
6 12 18 24
21 42 63 84
0,5 1 1,5 2
EXEMPLOS Exemplo n.º 1: Uma jovem de 28 anos é submetida a uma colecistectomia e, 24 horas após, apresenta-se bem, apenas com sede. Dados vitais: PA 140/80 mm Hg, deitada; pulso: 80 b.p.m.; T 36,2°C; FR 10 m.r.m.; peso 60 kg; diurese das 24 horas: 600 ml; sódio e potássio plasmáticos: 147 mEq/L e 3,9 mEq/L, respectivamente; drenagem nasogástrica: 2.500 ml (pH 6,0). Formular o plano parenteral para as próximas 24 horas. Acompanhe pelo Quadro 15.4.
261
1.ª etapa — cálculo do plano básico: • Perda por diurese 600 ml, com 30 mEq de Na; 15 mEq de K e 45 mEq de cloreto. • Perda sensível e insensível 1.000 ml (sem eletrólitos). • Perda gastrintestinal 2.500 ml (é previsto um volume de perda igual ao do dia anterior). Como o pH do suco gástrico é elevado, a perda de sódio equivale a 10% do volume eliminado, ou seja, 250 mEq; a perda de potássio geralmente é de 1% do volume eliminado: 25 mEq. 2.ª etapa — cálculo do plano de correções: • Água: A análise deste caso mostra que há um déficit de água (traduzido por hipernatremia). No cálculo do déficit, verificamos que a água corporal normal desta paciente deveria ser 36 litros; porém, com sódio plasmático de 147 mEq/L, a água corporal (atual) se encontra em 34,2 litros. Existe, portanto, um déficit de 1.800 ml. • Sódio: Não são evidenciados sinais de depleção ou excesso do extracelular, apesar de uma certa redução no débito urinário em relação ao esperado para um adulto normal. Observe que os dados de pressão arterial e pulso estão normais. Não é necessária correção. • Potássio: O potássio sérico está normal. Não é necessária correção. • Ácido-básico: Não há dados. • Sangue e plasma: Não há dados. Exemplo n.º 2: Um homem de 35 anos é trazido para o Serviço de Emergência do hospital após ter sido encontrado por amigos num estado semi-estuporoso. Segundo os amigos, ele vinha bebendo muito nos últimos dias. A história médica pregressa era irrelevante, a não ser por um tratamento ambulatorial de úlcera péptica. Ao exame físico, ele se apresentava obnubilado, com os seguintes dados vitais: PA (deitado): 100/60 mm Hg PA (sentado): 40/? mm Hg Pulso (deitado): 100 b.p.m. Pulso (sentado): 140 b.p.m. Freq. Resp.: 18 m.r.m. Temp 38°C Peso: 60 kg As veias jugulares não eram visíveis em decúbito dorsal. O exame do abdome acusou dor epigástrica e ruídos hidroaéreos hipoativos. Não havia edema. Os exames de laboratório revelaram: hematócrito 45%; 10.500 leucócitos com 75% de polimorfonucleares; glicemia 120 mg/100 ml; sódio plasmático 125 mEq/L; potássio plasmático 3,0 mEq/L; cloro plasmático 75 mEq/L; bicarbonato plasmático 25 mEq/L; creatinina 1,8 mg/100 ml; pH arterial 7,41; pCO2 38 e pO2 60. Formular o plano parenteral para as próximas 24 horas (Quadro 15.5).
Quadro 15.4 Plano parenteral: exemplo n.º 1 Plano Básico Fonte
Volume
Naⴙ
Kⴙ
Clⴚ
Urina
600
30
15
45
Sensível Insensível
1.000
0
0
0
Gastrintestinal
2.500
250
25
275
Subtotal — Básico
4.100
310
40
320
Plano de Correções Fonte
Volume
Naⴙ
Kⴙ
Clⴚ
Bic
Água
1.800
0
0
0
0
Sódio
0
0
0
0
0
Potássio
0
0
0
0
0
Ácido-Básico
0
0
0
0
0
Sangue e plasma
0
0
0
0
0
Subtotal — Correções
1.800
0
0
0
0
TOTAL
5.900
310
40
320
0
Do total de 5.900 ml, qual volume de soro fisiológico (SF) é necessário para repor 310 mEq de sódio? Em 1 litro de SF há 150 mEq de sódio e 150 mEq de cloreto. Por uma regra de três, concluímos que são necessários aproximadamente 2.000 ml de SF. O restante do volume será reposto sob forma de soro glicosado a 5% (SG 5%). São necessários ainda 40 mEq de potássio, ou seja, 16 ml de KCl a 19,1%. O cloreto é veiculado com o sódio (NaCl) e com o potássio (KCl). Prescrição médica para o exemplo n.º 1: 1. Soro fisiológico: 2.000 ml (frascos 1 e 2); EV, 24 gotas/minuto. 2. Soro glicosado a 5%: 4.000 ml (frascos 3, 4, 5 e 6); EV, 48 gotas/minuto. 3. KCl a 19,1% — acrescentar 4 ml em cada frasco de soro glicosado a 5% (frascos 3, 4, 5 e 6).
Quadro 15.5 Plano parenteral: exemplo n.º 2 Plano Básico Fonte
Volume
Naⴙ
Kⴙ
Clⴚ
Urina
1.500
75
40
115
Sensível Insensível
1.000
0
0
0
Gastrintestinal Subtotal — Básico
0
0
0
0
2.500
75
40
115
Plano de Correções Fonte
Volume
Naⴙ
Kⴙ
Clⴚ
Bic
Água
2.000
0
0
0
0
Sódio
3.600
540
0
540
0
0
0
90
90
0
Potássio Ácido-Básico
0
0
0
0
0
Sangue e plasma
0
0
0
0
0
Subtotal — Correções
1.600
540
0
630
0
TOTAL
4.100
615
130
745
0
Do total de 4.100 ml, qual volume de soro fisiológico (SF) é necessário para repor 615 mEq de sódio? Cerca de 4.000 ml. Você percebe que, nesta situação, todo o volume a ser administrado para o paciente será composto por soro fisiológico. São necessários 130 mEq de potássio (52 ml), que, pela ausência de SG 5% no plano, serão fracionados entre os frascos de SF. Prescrição médica para o exemplo n.º 2: 1. Soro fisiológico: 4.000 ml (frascos 1, 2, 3 e 4); EV, 48 gotas/minuto. 2. KCl 19,1%: acrescentar 13 ml em cada frasco de soro fisiológico (frascos 1, 2, 3 e 4).
263
capítulo 15
1.ª etapa — cálculo do plano básico:
atual de cerca de 40 litros. Portanto, o excesso de água é de 4 litros. Não há necessidade de fazer a correção total nas primeiras 24 horas. Além disso, se retirarmos os 4 litros, não teremos volume para administrar sódio. Portanto, na coluna para volume, colocamos 2.000 ml. • Sódio: Existe uma diminuição da pressão arterial e aumento da freqüência cardíaca com a mudança da posição deitado para sentado, e jugulares invisíveis. Isso permite fazer o diagnóstico de uma depleção do espaço extracelular de cerca de 20-30%. Como o espaço extracelular equivale a 20% do peso corporal, a depleção
• Perda por diurese desconhecida – considerar 1.500 ml, com 75 mEq de Na; 40 mEq de K e 115 mEq de cloreto. • Perda sensível e insensível 1.000 ml (sem eletrólitos). • Perda gastrintestinal não houve. 2.ª etapa — cálculo do plano de correções: • Água: A hiponatremia apresentada significa excesso de água. A água normal deste paciente de 60 kg deveria ser 36 litros. O cálculo da água atual demonstra um valor
Quadro 15.6 Conversões comumente utilizadas mEq do ânion ou cátion/g de sal
mg de sal/mEq
NaCl
17§
58
NaHCO3
12
84
Lactato de sódio
9
112
NaSO4 1OH2O
6
161
KCl
13
75
Acetato de potássio
10
98
Gluconato de potássio
4
234
CaCl2 2H2O
14
73
Gluconato2 de cálcio 1H2O
4
224
Lactato2 de cálcio 5H2O
6
154
MgSO4 7H2O
0,8
123
NH4Cl
19
54
§Lembrar que, numa dieta, 1 g de Na contém 43 mEq, enquanto 1 g de sal (NaCl) contém 17 mEq de Na. Desta forma, uma dieta contendo 4 g de sódio tem a mesma quantidade de sódio que uma dieta com 10 g de sal. Modificado de Boedecker E.C. e Dauber J.H.8
Quadro 15.7A Composição* das principais soluções utilizadas em terapia hidroeletrolítica FLUIDO
Naⴙ
Clⴚ
Kⴙ
Caⴙⴙ
Osm
pH
PCO
Soro glicosado a 5%
0
0
0
0
252
5,0
0
Solução salina a 0,9%
154
154
0
0
308
5,7
0
Solução salina a 3%
513
Ringer lactato**
130
513
0
0
1.025
5,8
0
109
4
3
275
6,5
0
Albumina 5%
130-160
130-160
0
0
308
6,9
20
Albumina 25%
130-160
130-160
0
0
1.500
6,9
100
Plasma fresco
140
100
4
0
300
6,7-7,3
20
Hidroxietil-amido (6%)
154
154
0
0
310
5,5
70
Dextran 70 (6%)
154
154
0
0
287
3-7
60
*Eletrólitos em mEq/L ** Contém 28 mEq de lactato por litro. Osm osmolaridade (mOsm/L) PCO pressão coloidosmótica (mm Hg) Adaptado de Kumar, A.; Wood, K.E.9
Quadro 15.7B Expansão inicial de volume ( 3 horas) com alguns fluidos intravenosos (ml)* FLUIDO
EIC
EEC
EIT
PL
Soro glicosado a 5%
600
40
255
85
Solução salina a 0,9%
100
1.100
825
275
Solução salina a 3%
2.950
3.950
2.690
990
Ringer lactato
0
1.000
670
330
Albumina 5%
0
1.000
100
900
Albumina 25%
0
1.000
3.500
4.500
Papa de hemácias
0
1.000
130
870
Plasma fresco
0
1.000
0
1.000
Sangue total
0
1.000
0
1.000
Dextran 70 (6%)
0
1.000
1.000
2.000
HAES-steril
0
1.000
500
1.500
*Após infusão de 1 litro de solução. EIC espaço intracelular EIT espaço intersticial
EEC espaço extracelular PL volume plasmático Adaptado de Carlson, R.W.; Rattan, S.; Haupt, M.10
Quadro 15.8 Principais aditivos utilizados ADITIVOS
ELETRÓLITOS – mEq/ml Na
K
Cl
Ca
Mg
HCO3§
NaCl 20%
3,4
-
3,4
-
-
-
KCl 19,1%
-
2,5
2,5
-
-
-
Gluc. Cálcio 10%
-
-
4,8
-
-
4,8
CaCl2 10%
-
-
13,6
13,6
-
-
Sulfato de Mg 10%
-
-
-
-
8,1
-
NaHCO3 10% NH4Cl 20%
1,2
-
-
-
-
1,2
-
-
3,75
-
-
-
§Incluídos lactato, gluconato, acetato. Modificado de Faintuch, J.11
Quadro 15.9 Perda estimada de líquido e sangue de acordo com os dados clínicos iniciais do paciente Classe I
Classe II
Classe III
Classe IV
Perda de sangue (ml)
Até 750
750-1.500
1.500-2.000
2.000
Perda de sangue (% volume sanguíneo)
Até 15%
15-30%
30-40%
40%
100
100
120
140
Pressão de pulso (mm Hg)
N ou 앖
앗
앗
앗
Freq. respiratória (m.r.m.)
14-20
20-30
30-40
35
Pulso (b.p.m.)
Diurese (ml/h) Estado mental / SNC Reposição volêmica (regra 3:1)
30
20-30
5-15
Desprezível
Ansiedade
Ansiedade
Ansiedade e
Confusão e
leve
moderada
confusão
letargia
Cristalóide
Cristalóide
Cristalóide e sangue
Cristalóide e sangue
A regra 3:1 se baseia no fato de que a maior parte dos pacientes em choque hemorrágico necessita de 300 ml de solução eletrolítica para cada 100 ml de sangue perdido. A avaliação clínica contínua de cada paciente pode minimizar as dificuldades existentes para o cálculo exato da quantidade e tipo de fluidos a administrar. Baseado em: Advanced Trauma Life Support.12
265
capítulo 15
apresentada neste caso corresponde a 2.400-3.600 ml. Neste caso, optamos por reposição de 3.600 ml, pois a PA e o pulso em decúbito dorsal poderiam ser considerados alterados. • Potássio: O potássio sérico encontra-se diminuído (2,5 mEq/litro). Como não há distúrbio ácido-básico nem desvio iônico, a necessidade de potássio deste paciente está entre 200 e 400 mEq. Outra forma de calcular a necessidade de potássio é através da Fig. 12.5, onde verificamos que para um potássio de cerca do 3,0, corresponde uma deficiência de 10%. Calculando o potássio total (45 mEq/kg 45 60 2.700 mEq), concluímos que o déficit é de 270 mEq. Não há necessidade de corrigir este déficit nas primeiras 24 horas, e, além do mais, como estamos restringindo água livre, não temos volume para administrar o potássio, pois não desejamos ultrapassar a concentração de 30 mEq/L. Em vista disso, optamos pela correção de apenas 1/3 do déficit total e anotamos 90 mEq na coluna do potássio e cloro. • Ácido-básico: sem distúrbios. • Sangue e plasma: sem distúrbios.
lução que contenha sódio tende a se distribuir no espaço de distribuição do sódio, ou seja, no extracelular. Soluções hipotônicas contêm um maior teor de água livre, que se distribuirá parte para o extracelular e parte para o intracelular. A solução salina isotônica é adequada para a correção de depleção do espaço extracelular, manejo líquido em pós-operatório (em que soluções hipotônicas causariam hiponatremia), correção inicial do choque, hemorragias e queimaduras. Por ser isotônica, esta solução não provoca desvios de líquido entre compartimentos. Em 1 litro desta solução há aproximadamente 150 mEq de sódio.5,6 3) Ringer lactato: é uma solução levemente hipotônica, que contém sódio e lactato. No fígado, o lactato é convertido em bicarbonato. Sua utilização atenua a acidose metabólica dilucional que poderia ocorrer em situações em que é necessária a reposição de grandes volumes de solução salina isotônica. 4) Solução salina a 3%: é uma solução cristalóide hipertônica, que promove desvios de água do intracelular para o intravascular. É utilizada no tratamento da hiponatremia sintomática.
APÊNDICE
Soluções Colóides
Soluções Cristalóides
São suspensões de partículas muito grandes, que não atravessam membranas semipermeáveis. Sua presença em um dos lados da membrana exerce uma força de atração (pressão oncótica) que é proporcional à sua concentração. Os colóides são utilizados para manter o volume plasmático, produzindo uma expansão efetiva do volume circulante, com pouca ou nenhuma perda para o interstício. A permanência destas soluções no intravascular (quando o endotélio está íntegro) aumenta a duração de sua ação. Se o endotélio estiver lesado, pode haver escape de solução colóide para o interstício. Devido às características da distribuição destas soluções, doses menores de colóide causam maior expansão do intravascular que os cristalóides. De modo geral, na ausência de lesão endotelial significativa, são necessários três volumes de solução cristalóide para promover um efeito equivalente a 1 volume de solução colóide em expansão do intravascular (“regra 3:1”). Esta distribuição modifica-se muito no choque séptico. São exemplos de colóides: a albumina, o hidroxietil-amido, os dextrans e as gelatinas.5 As referências bibliográficas 13 a 23 demonstram a controvérsia atual existente em torno da escolha da solução mais adequada a ser administrada em situações especiais.
São soluções verdadeiras em que sólidos cristalinos estão dissolvidos em água, sob a forma de íons ou moléculas. Exemplo: solução salina isotônica, solução de Ringer lactato, solução glicosada 5%. Os cristalóides são infundidos no espaço intravascular, mas distribuem-se em todo o espaço extracelular e, eventualmente, para o intracelular.5 1) Soro glicosado a 5% (SG 5%): é uma solução hipotônica, que veicula água e pequena quantidade de glicose. Em condições normais, a glicose é assimilada pelas células e não causa alterações na glicemia do paciente. Porém, no diabetes melito, pode desenvolver-se hiperglicemia. Num paciente não-diabético, ao administrarmos SG 5% juntamente com SSI, a SSI permanecerá no espaço intravascular; a glicose será metabolizada, e a água livre se distribuirá no espaço extracelular e intracelular. É útil no tratamento da hipernatremia, como forma de administração de água livre, veículo para a administração de medicamentos, manutenção de acessos venosos permeáveis. Soluções mais concentradas de glicose (10, 20 ou 50%) podem ser utilizadas, mas causam flebite quando infundidas em veias periféricas. Como não contém sódio, não é adequada para repleção do extracelular.6 2) Solução salina a 0,9% — isotônica (SSI): esta solução é denominada isotônica por apresentar tonicidade semelhante à do plasma. É utilizada quando se necessita expandir o espaço extracelular, pois o sódio é o principal cátion deste espaço, e determina seu volume. Uma so-
1) Albumina (Albumina Humana 20%): é a principal proteína do soro, contribuindo com 80% da pressão oncótica do plasma. É disponível em solução a 20%. Doses acima de 20 ml/kg causam maior aumento no intravascular que o volume infundido, pois o incremento na pressão oncótica provoca movimento de líquido para o
266
Terapia Parenteral. Reposição Hidroeletrolítica
intravascular. A meia-vida intravascular da albumina é de 16 horas. É um efetivo expansor de volume no trauma e choque. São argumentos contra seu uso a possibilidade de transmissão de doenças infecciosas (hepatite e SIDA) e a ocorrência de eventuais reações anafiláticas.5 2) Hidroxietil-amido (Haes-Steril): é um polímero ramificado da glicose, com peso molecular e clearance variáveis. É um expansor efetivo de volume. Acima de 20 ml/ kg, pode causar coagulopatia. Não possui o risco de transmitir infecções; a possibilidade de reações anafiláticas é pequena.5 3) Dextrans (Dextran 40): são misturas de polímeros da glicose, de vários tamanhos e pesos moleculares (dextran 40 e dextran 70). A expansão de volume causada por estas soluções depende do peso molecular, quantidade, velocidade de administração e taxa de eliminação. A infusão de dextran 70 causa expansão mais prolongada e efetiva que o dextran 40. Estas soluções modificam as propriedades reológicas do sangue na microcirculação (diminuem a viscosidade), podendo melhorar o consumo de oxigênio em pacientes gravemente doentes. Como os outros colóides sintéticos, pode causar reações de hipersensibilidade e efeitos sobre a coagulação.5 4) Gelatinas (Haemacel e Hisocel a 3,5%): o nível e a duração de seu efeito sobre o volume plasmático dependem da taxa de infusão. De modo geral não alteram a coagulação e são eliminadas inalteradas pelos rins e intestino. Experimentalmente, demonstrou-se que esta solução pode extravasar para o compartimento intersticial com certa rapidez.5
trado rapidamente é o soro fisiológico e nunca o soro glicosado. Se o soro fisiológico contiver potássio, sua administração poderá causar complicações cardíacas. Cada ml desta solução contém 25 mEq de potássio. 2) Bicarbonato de sódio: está disponível a solução de bicarbonato de sódio a 8,4%, que contém 1 mEq de bicarbonato e 1 mEq de sódio por ml. Frascos de 250 ml.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. 3.
4. 5. 6.
7. 8. 9. 10. 11.
12.
Outras Soluções e Aditivos para Uso Parenteral 1) Cloreto de potássio a 19,1% (KCl 19,1%): é o aditivo utilizado para repor as perdas e deficiências de potássio, principalmente em pacientes intolerantes ao potássio administrado por via oral. A dose prescrita deve ser cuidadosamente observada. O potássio é um agente irritante para as veias, dependendo de sua diluição (se maior que 30 mEq/litro). Mais importante, porém, é que pacientes com disfunção renal podem desenvolver hipercalemia fatal.6 Neste caso é preferível não adicionar potássio ao primeiro frasco de solução. Se houver boa diurese em resposta à reposição líquida, adiciona-se potássio aos demais frascos. O potássio pode ser administrado com o soro glicosado ou com solução salina isotônica. Como apresentado no Cap. 12, a infusão com soro glicosado causa a entrada de potássio mais rapidamente nas células, devido à liberação de insulina, o que dificultaria a correção do potássio no sangue. Por outro lado, após a correção de uma hipocalemia grave, evitase colocar o potássio em soro fisiológico, pois, numa emergência (p.ex., o choque), o líquido a ser adminis-
13. 14.
15.
16. 17.
18.
19. 20.
21. 22. 23.
DUKE, J.H. Jr. e BOWEN, J.C. Fluids and electrolytes: basic concepts and recent developments. Contemporary Surgery, 7:19, 1975. SCRIBNER, B.H. Teaching Syllabus for the Course on Fluid and Electrolyte Balance, 1969, University of Washington, Seattle. ARIEF, A.I. Principles of parenteral therapy and parenteral nutrition. Cap. 13, pág. 567. Clinical Disturbance of Fluid and Electrolyte Metabolism. Edits. M.M. Maxwell e C.R. Kleeman. McGraw-Hill Co., 1972. CHAPMAN, W.H. et al. The Urinary System. An Integrated Approach. Cap. 4, pág. 89. W.B. Saunders Co., 1973. McCUNN, M.; KARLIN, A. Nonblood fluid resuscitation. Anesth. Clin. North America, 17(1):107-123, 1999. PRESTON, R.A. IV solutions and IV orders. In: Preston, R.A. AcidBase, Fluids, and Electrolytes Made Ridiculously Simple, Cap. 2, pp. 3138, MedMaster Inc., 1997. KOCH, S.M. Appendix: Critical care catalog. In: Civetta, J.M.; Taylor, R.W.; Kirby, R.R. Critical Care, 1997. BOEDECKER, E.C. e DAUBER, J.H. Manual of Medical Therapeutics, 21 st. edition. Little, Brown and Co., 1974. KUMAR, A.; WOOD, K.E. Hemorrhagic and hypovolemic shock. In: Parrillo, J.E. Current Therapy in Critical Care Medicine, 1997. CARLSON, R.W.; RATTAN, S.; HAUPT, M. Anesth. Rev., 17 (suppl.3):14, 1990. FAINTUCH, J. Hidratação no pós-operatório. Cap. 38, pág. 311. Manual de Pré- e Pós-Operatório. Edits. J. Faintuch, M.C.C. Machado e A.A. Raia. Edit. Manole Ltda., 1978. AMERICAN COLLEGE OF SURGEONS Advanced Trauma Life Support, 1993. BUNN, F.; ALDERSON, P.; HAWKINS, V. Colloid solutions for fluid resuscitation (Cochrane Review) — The Cochrane Library, Issue 1, 2002. ALDERSON, P.; SCHIERHOUT, G.; ROBERTS, I.; BUNN, F. Colloids versus crystalloids for fluid resuscitation (Cochrane Review) — The Cochrane Library, Issue 1, 2002. KWAN, I.; BUNN, F.; ROBERTS, I. (WHO Pre-Hospital Trauma Care Steering Committee). Timing and volume of fluid administration for patients with bleeding following trauma. (Cochrane Review) — The Cochrane Library, Issue 1, 2002. WHATLING, P.J. Intravenous fluids for abdominal aortic surgery (Cochrane Review) — The Cochrane Library, Issue 1, 2002. ORLINSKY, M.; SHOEMAKER, W.; REIS, E.; KERSTEIN, M.D. Current controversies in shock and resuscitation. Surgical Clinics of North America, 81(6), dec. 2001. NGUYEN, T.T.; GILPIN, D.A.; MEYER, N.A.; HERNDON, D.N. Current treatment of severely burned patients. Annals of Surgery, 223(1):15-26, 1996. ASTIZ, M.E.; RACKOW, E.C. Crystalloid-colloid controversy revisited. Critical Care Medicine, 27(1):34-35, 1999. INTERNATIONAL TASK FORCE Practice parameters for hemodynamic support of sepsis in adult patients. Critical Care Medicine, 27(3):639-660, 1999. HENRY, S.; SCALEA, T.M. Resuscitation in the new millennium. Surgical Clinics of North America, 79(6):1259-1267, 1999. WAXMAN, K. Are resuscitation fluids harmful? Critical Care Medicine, 28(1):264-265, 2000. DROBIN, D.; HAHN, R.G. Volume kinetics of Ringer’s solution in hypovolemic volunteers. Anesthesiology, 90(1):81-91, 1999.
Capítulo
16
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal Miguel Carlos Riella, Maria Aparecida Pachaly e Daltro Zunino
DADOS SUBJETIVOS Alterações na micção Alterações no volume urinário Alterações na cor da urina Dor renal Edema PROCEDÊNCIA E HISTÓRIA PREGRESSA Hipertensão arterial Doenças sistêmicas Distúrbios bioquímicos Infecções Traumatismo e cirurgia prévia HISTÓRIA FAMILIAL DADOS OBJETIVOS Hálito Pele Unhas Pressão arterial Fundo de olho Aparelho cardiopulmonar Exame dos rins Palpação Ausculta Percussão
Exames Laboratoriais Urinálise Sedimento urinário Exame microscópico da urina Provas de função renal Biópsia renal Indicações Contra-indicações Preparo do paciente e material necessário Técnica da biópsia renal percutânea Complicações Radioisótopos e o rim COMO DIAGNOSTICAR UMA NEFROPATIA? Insuficiência renal aguda Insuficiência renal crônica Síndrome nefrítica aguda Síndrome nefrótica Anormalidades urinárias assintomáticas Infecção urinária Obstrução do trato urinário Síndromes renais tubulares Hipertensão arterial Nefrolitíase REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
O diagnóstico de uma enfermidade do aparelho urinário depende dos dados subjetivos fornecidos pelo paciente, na história clínica, e dos dados objetivos obtidos através do exame físico e de testes laboratoriais.
a) Polaciúria: aumento da freqüência miccional, com eliminação de pequenos volumes de urina. É um sintoma de irritação vesical. b) Urgência miccional: é a sensação de necessidade impreterível de urinar. c) Disúria: dor, ardência ou desconforto à micção. Freqüentemente os sintomas de urgência miccional, disúria e polaciúria ocorrem juntos e são secundários a processos inflamatórios da bexiga, próstata ou uretra.1 d) Nictúria: é a inversão do ritmo miccional, em que o predomínio da diurese ocorre no período noturno. Normalmente o indivíduo não acorda à noite para urinar, de-
DADOS SUBJETIVOS Alterações na Micção Uma pessoa saudável urina a cada 4-6 horas durante o dia, e normalmente não urina à noite. Entre as alterações miccionais mais importantes, destacamos:
268
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
vido a uma queda no ritmo de formação da urina. A nictúria pode refletir uma perda da capacidade de concentração urinária, como nas fases precoces da insuficiência renal crônica. É um sintoma anormal, mas não específico, e pode ocorrer também na hipertrofia prostática benigna, diabetes mellitus, infecções do trato urinário, hepatopatias e insuficiência cardíaca congestiva. Nestas duas últimas circunstâncias, o excesso de líquido retido na periferia durante o dia retorna à circulação com o decúbito, aumentando o ritmo de filtração glomerular neste período.1 e) Incontinência urinária: perda involuntária de urina, que pode ocorrer após esforços (evacuação, tosse, levantar peso). Ocorre com mais freqüência em mulheres multíparas e comumente está associada a cistouretrocele. Outro tipo de incontinência urinária é a paradoxal, que consiste na perda involuntária de urina por extravasamento, devido à retenção urinária crônica. Pode ocorrer por obstrução de uretra, como na hiperplasia prostática benigna, ou secundária à bexiga neurogênica. f) Retenção urinária: resulta da incapacidade de esvaziar a bexiga, mesmo que a produção de urina pelos rins esteja normal. Pode instalar-se agudamente, causando um quadro de dor suprapúbica intensa. Na retenção urinária crônica, a dor pode não estar presente, mas o paciente apresenta dilatação da bexiga e eventualmente ureteres e pelves renais, sendo esta uma causa de insuficiência renal crônica. As causas mais comuns de retenção urinária são: hiperplasia e neoplasia de próstata, estenose de uretra e bexiga neurogênica. Na história clínica do paciente devem ser objetivamente investigados sintomas que possam sugerir doença prostática, como dor perineal, redução da força e calibre do jato urinário, hesitação para iniciar o jato urinário, esforço para urinar e gotejamento quando o indivíduo termina a micção.1,2
Alterações no Volume Urinário No adulto, o volume urinário diário varia entre 700 e 2.000 ml. As alterações de volume urinário podem ser assim subdivididas: a) Oligúria: volume urinário igual ou inferior a 400 ml/dia. A oligúria pode ser decorrente de uma resposta normal do rim, como nos estados hipovolêmicos (contração do volume extracelular, choque etc.) e estados de volume arterial efetivo diminuído (insuficiência cardíaca congestiva, cirrose hepática etc.), ou decorrente de uma lesão renal: glomerular (glomerulonefrite difusa aguda, necrose cortical bilateral), tubular (necrose tubular) ou obstrutiva. b) Poliúria: volume urinário igual ou superior a 2.500 ml/ dia. A poliúria pode ser observada quando a ingesta líquida é grande (p. ex., polidipsia psicogênica); quando existe um estado hiperosmolar no plasma (p. ex., hiper-
glicemia do diabetes mellitus) causando diurese osmótica, ou quando a capacidade de concentração renal está comprometida (insuficiência renal crônica, anemia de células falciformes etc.). Além disso, poliúria também é observada no diabetes insipidus, causado por deficiência na produção ou liberação neuroendócrina de hormônio antidiurético (diabetes insipidus central) ou por falta de resposta dos túbulos renais a este hormônio (diabetes insipidus nefrogênico) (Cap. 9). c) Anúria: volume urinário igual ou inferior a 100 ml/dia. A anúria pode refletir uma obstrução do trato urinário, impedindo a passagem da urina, ou uma súbita interrupção da perfusão renal, como ocorre na trombose das artérias renais. Além disso, ela pode estar associada a uma insuficiência renal aguda (orgânica) grave e por vezes a uma necrose cortical do rim. A determinação do volume urinário diário é utilizada como um importante parâmetro de função renal, em várias situações clínicas: pós-operatório, insuficiência cardíaca congestiva grave, choque, etc. Toda vez que a diurese nas 24 horas é inferior a 400 ml podemos afirmar que há um comprometimento funcional ou orgânico do rim. Por outro lado, uma diurese normal não indica, de maneira alguma, função renal normal e integridade orgânica do rim. É freqüente observar-se insuficiência renal aguda (orgânica) com diurese normal ou até poliúria, apesar da elevação dos níveis plasmáticos de creatinina e uréia, os quais indicam uma redução da filtração glomerular. Até mesmo na insuficiência renal crônica o volume urinário pode ser normal.
Alterações na Cor da Urina A cor da urina pode variar desde o amarelo claro, quando diluída, até o amarelo escuro, quando concentrada. Quando o paciente não está ingerindo medicamentos ou alimentos que contenham corantes, as alterações na cor da urina podem indicar doenças em que há a presença de certos pigmentos na urina: hemoglobina, mioglobina, porfirina, etc. Urina turva geralmente resulta da presença de fosfatos e uratos amorfos (normal) ou leucócitos e bactérias (anormal). Urina de coloração alaranjada é observada na bilirrubinúria e uso de rifampicina. Urina esverdeada pode ser causada pelo uso de fenazopiridina ou infecções urinárias por Proteus. Urina de cor preta é vista na alcaptonúria, porfiria aguda intermitente, uso de imipenem, nitrofurantoína e levodopa.3
Urina Turva Geralmente indica piúria secundária a uma infecção. Outras vezes pode ser devida à precipitação de sais de fosfatos amorfos (pH alcalino) ou uratos amorfos (pH ácido). Uma discreta acidificação da urina (1 a 2 gotas de ácido clorídrico) determina o desaparecimento da turvação cau-
269
capítulo 16
sada por fosfatúria, o que não acontece se a turvação foi causada pela presença de leucócitos.
Urina Avermelhada A urina pode estar avermelhada pela presença de sangue (hematúria), hemoglobina (hemoglobinúria) ou mioglobina (mioglobinúria). A hematúria macroscópica é aquela reconhecida a olho nu, com urina de cor vermelha ou marrom, dependendo da acidez da urina e da quantidade de sangue. Uma mínima quantidade de sangue (1 ml) em 1,5 L de urina é suficiente para produzir hematúria macroscópica. Em urinas ácidas, o sangue adquire coloração acastanhada, e em urina alcalina, o tom avermelhado é mantido por mais tempo.1 Já a hematúria microscópica só é detectada ao microscópio e pelas tiras reagentes. Costuma-se ainda classificar a hematúria de acordo com a fase da micção em que ocorre: hematúria inicial ou final está usualmente associada às doenças do trato urinário baixo. Hematúria durante toda a micção pode originar-se do rim, do ureter ou da bexiga. Nas mulheres, a urina pode ter coloração avermelhada pelo contato com o sangue menstrual. A urina também pode adquirir cor vermelha pela ingestão de medicamentos e alimentos com pigmentos vermelhos (p. ex., beterraba).2 Hemoglobinúria pode ocorrer, por exemplo, na hemólise intravascular induzida por drogas ou transfusões sanguíneas incompatíveis. Mioglobinúria consiste na presença de um pigmento de origem muscular (mioglobina) na urina, o qual torna a urina avermelhada. Este pigmento é liberado quando há grande destruição de massa muscular, por necrose induzida por isquemia, infecção ou queimaduras extensas.
Dor Renal A dor renal característica situa-se no flanco ou na região lombar, entre a décima segunda costela e a crista ilíaca, e às vezes ocorre irradiação anterior. A dor parece surgir por distensão da cápsula renal, que ocorre quando há obstrução do fluxo urinário (p. ex., cálculo ureteral) ou em condições que causam edema do parênquima renal (p. ex., pielonefrite aguda). Uma irritação da pelve renal ou do ureter causa dor no flanco e hipocôndrio, com irradiação para a fossa ilíaca ipsilateral e freqüentemente para o testículo ou grandes lábios. Esta irradiação reflete a distribuição cutânea da inervação renal.
Edema É uma manifestação comum em nefropatias. Qualquer que seja a causa do edema, ele significa excesso de água e sal, o qual causa aumento do componente intersticial do volume extracelular. O edema é geralmente percebido nas regiões periorbitárias (tecido celular subcutâneo frouxo) e
nas extremidades inferiores (ação da gravidade); no paciente em decúbito dorsal o edema é facilmente percebido na região sacral e dorso (Cap. 10). Existem quatro situações clínicas em nefrologia que são comumente acompanhadas de edema: glomerulonefrite aguda, síndrome nefrótica e insuficiência renal aguda e crônica. Na prática, é possível caracterizar dois tipos de edema renal: a) Generalizado (anasarca). Os pacientes apresentam edema de face, de extremidades superiores e inferiores e acúmulo de líquido nas cavidades pleural e abdominal. Este tipo de edema é habitualmente encontrado em portadores de síndrome nefrótica, a qual se caracteriza por proteinúria intensa e hipoalbuminemia. A hipoalbuminemia causa diminuição no volume plasmático efetivo, desencadeando aumento da reabsorção tubular de sódio e água, na tentativa de restaurar o volume plasmático ao normal. Com isto, há uma expansão do volume extracelular, que em condições normais seria suficiente para inibir a reabsorção de sódio aumentada. Entretanto, no edema, o mecanismo de retenção de sódio está alterado e não responde normalmente aos processos fisiológicos de controle de volume. Assim, temos um indivíduo com edema e volume extracelular expandido, e que continua a reabsorver sal e água avidamente (v. Cap. 10). b) Um edema de menor intensidade, que atinge predominantemente o rosto, pode ser observado nas doenças renais, como as glomerulonefrites agudas. Nestas situações, há redução do sódio excretado, por aumento na reabsorção tubular, mas sem a hipoalbuminemia observada no item anterior. Também na insuficiência renal aguda e crônica, o edema é de menor intensidade e se deve a uma redução do sódio filtrado por redução do número de nefros funcionantes. No Cap. 10 são discutidos os outros fatores que participam da gênese do edema em diversas situações clínicas.
PROCEDÊNCIA E HISTÓRIA PREGRESSA A procedência do paciente é uma informação importante em nosso meio. Pacientes provenientes de regiões endêmicas de malária ou esquistossomose podem apresentar nefropatia decorrente de uma infecção por estes parasitas (v. Cap. 23). Além disso, os dados da história pregressa do paciente podem sugerir a etiologia da doença renal, como veremos a seguir.
Hipertensão Arterial A época da detecção da hipertensão arterial é útil no esclarecimento da gênese e evolução de uma determinada nefropatia. Se a hipertensão arterial já existia anteriormen-
270
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
te, é possível que, com o decorrer dos anos, ela tenha lesado o parênquima renal, causando uma nefropatia crônica. Por outro lado, o aparecimento mais tardio de hipertensão arterial pode indicar que ela é conseqüência de uma nefropatia crônica (p. ex., glomerulonefrite crônica) que se tenha instalado lenta e progressivamente.
Além disso, alguns procedimentos com instrumentação das vias urinárias (p. ex., sondagem vesical) podem originar infecção urinária, que é uma das mais freqüentes causas de infecção hospitalar.
HISTÓRIA FAMILIAL Doenças Sistêmicas A nefropatia diabética é uma complicação grave em pacientes diabéticos. A incidência cumulativa de nefropatia no diabetes mellitus tipo 1 é de 10-20% ao ano, em um período de 10-15 anos, sendo rara nos cinco primeiros anos de diabetes. Uma proporção maior de pacientes do tipo 2 se apresenta com microalbuminúria ou proteinúria logo após o diagnóstico, tanto pelo fato de que o diabetes está presente por muitos anos antes do diagnóstico, como porque a albuminúria pode ser menos específica para a presença de nefropatia diabética.4 Doenças auto-imunes e imunológicas, como o lúpus eritematoso sistêmico (LES), poliarterite nodosa e esclerodermia, podem comprometer os rins de formas variadas. Alguns dados podem ser bastante sugestivos de algumas destas doenças. Por exemplo, o LES predomina em mulheres jovens, e o encontro de síndrome nefrótica ou nefrítica nesta população deve aumentar o índice de suspeita desta doença (v. Cap. 23).
A identificação de uma doença renal em familiares do paciente pode orientar na caracterização da enfermidade em estudo. Assim, por exemplo, a nefrite hereditária, ou síndrome de Alport, é uma forma hereditária de nefropatia e clinicamente é indistinguível de uma glomerulonefrite crônica. O achado radiológico de rim em esponja medular pode ser visto em gerações sucessivas, embora sem evidência de transmissão genética; a doença policística do rim é transmitida geneticamente por um gene autossômico dominante. Estes são alguns exemplos que ilustram a contribuição de uma boa história familial à elucidação diagnóstica.
DADOS OBJETIVOS A sistemática utilizada na avaliação dos dados objetivos é a mesma que se aplica habitualmente no exame de qualquer paciente. Na avaliação do paciente renal, os seguintes pontos são pertinentes:
Distúrbios Bioquímicos A hipercalcemia e a hiperuricemia podem levar à precipitação de cristais no parênquima renal ou no lúmen tubular, causando uma nefrite intersticial ou nefrolitíase (v. Caps. 13 e 14).
Infecções As infecções de orofaringe ou pele causadas pelo estreptococo beta-hemolítico podem causar glomerulonefrite aguda. Além disso, várias infecções bacterianas (abscessos, endocardite etc.) podem causar comprometimento renal, geralmente de caráter imunológico (Caps. 22 e 23).
Traumatismo e Cirurgia Prévia Traumatismo lombar ou abdominal pode produzir um hematoma intra- ou perirrenal, que eventualmente poderá ser o responsável por uma hipertensão arterial futura. Também são importantes todos os dados que se puderem obter a respeito de uma cirurgia prévia. Devido à multiplicidade de fatores envolvidos (desde agentes anestésicos utilizados, hipovolemia, transfusão de sangue, até ligadura acidental dos ureteres), uma análise detalhada poderá orientar o médico na descoberta do agente causal de uma oligúria ou anúria.
Hálito No paciente urêmico o hálito apresenta um odor descrito comumente como amoniacal. Era detectado mais freqüentemente na era pré-diálise, quando era rotina observarem-se pacientes renais debilitados, com estomatite, gengivite e ulcerações da cavidade oral. A flora bacteriana oral hidrolisa a uréia (de concentração elevada na saliva), originando amônia, efeito que também ocorre pela presença de tártaro dentário. Atualmente, com o tratamento dialítico e melhores condições de higiene oral e tratamento odontológico, não se observa mais esta característica amoniacal no hálito dos pacientes renais. É descrito que, pela presença de substâncias como a di- e trimetilamina, pode ser percebido no hálito um certo odor de peixe.5
Pele Em pacientes renais crônicos, freqüentemente se observa pele pálida (por anemia normocrômica e normocítica — v. Cap. 36) e de tom amarelado (devido à retenção de urocromos). Escoriações decorrentes de prurido intenso são também encontradas em insuficiência renal crônica e atribuídas em parte ao hiperparatireoidismo secundário que se estabelece, causando hiperfosfatemia e formação de
271
capítulo 16
complexos insolúveis com o cálcio, os quais se depositam no subcutâneo (v. Cap. 36). A presença de púrpura e lesões equimóticas, principalmente na superfície extensora dos membros, também faz parte da síndrome urêmica. Nos pacientes intensamente urêmicos pode haver deposição de cristais de uréia na face, descrita como orvalho urêmico. Atualmente, com a diálise e o diagnóstico precoce, é raro o paciente tornar-se tão intensamente urêmico.
por ser um exame que permite uma avaliação da repercussão sistêmica e microvascular de doenças como a hipertensão arterial e o diabetes mellitus, comumente envolvidos na gênese das nefropatias crônicas. Na classificação de Keith-Wagener-Barker, as retinopatias hipertensivas foram agrupadas em quatro tipos, de acordo com a gravidade e a presença de alterações ateroscleróticas: KWB - I KWB - II
Unhas Aproximadamente 10% dos pacientes portadores de insuficiência renal crônica apresentam unhas cuja metade proximal é pálida e a metade distal é rósea (half and half nails of Lindsay).6 Além disso, na síndrome nefrótica os pacientes podem apresentar nas unhas a linha de Muehrke, que é uma única linha branca transversal.
KWB - III
KWB - IV
Pressão Arterial Quando a média de três determinações de pressão arterial em pelo menos três consultas médicas excede 140 mm Hg (sistólica) ou 90 mm Hg (diastólica), caracteriza-se um quadro de hipertensão arterial,7 que, como foi frisado anteriormente, muitas vezes está associada às nefropatias, como causa ou conseqüência. Na determinação da pressão arterial, é importante que a mesma seja determinada com o paciente em três posições: deitado, sentado e em pé. Além de permitir uma avaliação do volume circulante (v. Cap. 10), a pressão arterial pode refletir a integridade do sistema nervoso autônomo. Por exemplo, pacientes urêmicos ou diabéticos muitas vezes apresentam queda ortostática da pressão arterial (na ausência de medicamentos), devido a um comprometimento do sistema nervoso autônomo. Nestes pacientes, deve ser evitado o uso de drogas anti-hipertensivas que agravam a queda ortostática da pressão arterial. Por ocasião da primeira visita do paciente, é imprescindível palpar os pulsos periféricos de membros superiores e inferiores. Quando se detectam pulsos femorais de pequena amplitude, ou em atraso em relação aos braquiais, em associação com hipertensão em ambos os membros superiores, é necessário medir a pressão arterial também nos membros inferiores. O objetivo é excluir a coarctação da aorta, que de modo geral se acompanha de pressão arterial elevada nos membros superiores e baixa ou indetectável nos membros inferiores. Existem outros padrões anatômicos de coarctação de aorta em que o pulso braquial esquerdo ou os pulsos dos quatro membros podem estar diminuídos.8
Fundo de Olho O exame de fundo de olho deve ser rotina em qualquer exame clínico. A sua importância é grande em Nefrologia,
Estreitamento ou esclerose arteriolar mínimos. Alargamento do reflexo dorsal da arteríola (aspecto de fio de cobre); estreitamento localizado e generalizado das arteríolas; alterações nos cruzamentos arteriovenosos; hemorragias arredondadas ou em forma de chama de vela e alguns exsudatos pequenos. Pode haver oclusão vascular. Retinopatia angioespástica (espasmo arteriolar localizado, hemorragias, exsudatos, edema da retina e corpos citóides). KWB - III e edema de papila.
Para uma boa interpretação desses achados, as seguintes considerações são pertinentes:
Reflexo Dorsal da Arteríola Normalmente a parede arteriolar é transparente e o que se vê na realidade é a coluna de sangue no interior do vaso. O reflexo de uma luz sobre a coluna de sangue aparece como uma delgada luz amarela, sendo a sua espessura 1/ 5 da largura da coluna de sangue. Quando ocorrem alterações escleróticas, as paredes das arteríolas tornam-se infiltradas com lipídios e colesterol. Os vasos gradualmente perdem a sua transparência e tornam-se visíveis. A coluna de sangue parece mais larga, assim como o reflexo dorsal. A coloração amarela dos lipídios, com a cor vermelha do sangue, é responsável pela coloração de fio de cobre e reflete uma arteriosclerose moderada. Com o agravamento da esclerose, o reflexo dorsal se parece a um fio de prata.
Espasmo Vascular Há um estreitamento da coluna de sangue de uma maneira irregular e indica hipertensão.
Corpos Citóides São manchas esbranquiçadas, de 1/5 do tamanho do disco papilar, e representam um grupo de células gliais edemaciadas, resultantes de um infarto isquêmico da arteríola terminal na camada de fibras nervosas.
Exsudatos Duros Representam a fração não-absorvida do soro após um edema de retina.
Alterações nos Cruzamentos Arteriovenosos Nas áreas de cruzamentos arteriovenosos, as paredes de ambos os vasos estão muito próximas. Com o espessamen-
272
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
to da parede arteriolar, a veia, sendo menos resistente, é comprimida.
Edema de Papila Reconhecido pela perda da nitidez do contorno papilar, é um achado sério na hipertensão arterial maligna. Ele pode estar associado a um aumento da pressão intracraniana, devido a alterações na circulação cerebral. Em geral são reversíveis as seguintes alterações no fundo de olho, decorrentes da hipertensão arterial: espasmo vascular, edema de retina, hemorragias, corpos citóides e edema de papila. Já as alterações decorrentes da arteriosclerose são relativamente irreversíveis: alterações do reflexo dorsal da arteríola, compressão venosa nos cruzamentos arteriovenosos, exsudatos e oclusão de vasos da retina de maior calibre.
Aparelho Cardiopulmonar O exame dos pulmões é inespecífico. Os achados de derrame pleural ou congestão pulmonar são comuns a várias doenças. No entanto, um atrito pleural evanescente e recorrente pode ser detectado em pacientes urêmicos e parece fazer parte do quadro de polisserosite visto nestes pacientes, os quais muitas vezes apresentam também sinais de pericardite ou ascite (Cap. 36). No exame do coração, também os sinais clássicos de sobrecarga de volume circulante ou de pericardite urêmica podem ser encontrados. Um sopro diastólico de insuficiência aórtica pode ser observado em pacientes com insuficiência renal e parece estar relacionado ao excesso de volume circulante que faz dilatar o anel aórtico. A remoção do volume excedente, por exemplo, através de tratamento dialítico, faz desaparecer este sopro.9 Entretanto, Barrat e colaboradores concluíram que o sopro diastólico precoce, associado à insuficiência renal, freqüentemente não é devido à insuficiência aórtica funcional e pode ser um som de origem pericárdica.10
Exame dos Rins PALPAÇÃO O paciente é colocado em decúbito dorsal, com os joelhos levemente fletidos. Coloca-se a mão posteriormente, debaixo do rebordo costal, e faz-se pressão para cima. A outra mão é colocada anteriormente, debaixo do rebordo costal na linha clavicular média. Com a inspiração, o rim se desloca para baixo, possibilitando a palpação. Pode ser também de valia colocar o paciente em decúbito lateral. O rim tende a se deslocar para baixo e medialmente. Tumores renais benignos são raros e usualmente pequenos demais para serem palpáveis. O tumor de Wilms é maligno, ocorre em crianças menores de cinco anos e freqüentemente a apresentação é uma massa palpável no flanco.
Rins policísticos são normalmente bilaterais e contêm múltiplos cistos. À medida que os cistos aumentam, massas podem ser palpáveis nas áreas renais. Obstrução urinária, independente da localização, aumenta a pressão hidrostática no sistema coletor do rim. Quanto mais alta a obstrução, maior é a repercussão no rim. Com a persistência da obstrução, o rim aumenta de volume e pode ser palpado.
AUSCULTA É útil na verificação de sopros abdominais, como ocorre na estenose da artéria renal. Utiliza-se o diafragma do estetoscópio para a ausculta do mesogástrio e hipocôndrios.
PERCUSSÃO Dor renal pode ser pesquisada com a mão fechada, fazendo-se leve percussão nos ângulos costovertebrais (ângulo formado entre a décima segunda costela e a musculatura paravertebral).
Pontos-chave: • O diagnóstico das doenças renais se fundamenta numa boa história clínica e cuidadoso exame físico do paciente, que inclui a avaliação do fundo de olho • É importante considerar as alterações subjetivas na micção, no volume urinário e na cor da urina, assim como a existência de dor renal ou edema • A existência de doenças prévias, como a hipertensão arterial, diabetes, vasculites, infecções ou trauma e cirurgia, muitas vezes permite estabelecer uma relação causaefeito com as doenças renais • Os dados laboratoriais, biópsia renal e exames de imagem complementam o raciocínio clínico construído com os dados de história e exame físico
Exames Laboratoriais URINÁLISE (EXAME DE URINA) O exame de urina compreende uma avaliação qualitativa de certos constituintes químicos e o exame microscópico do sedimento urinário. A urina para exame deverá ter sido recém-emitida, preferencialmente sem cateterismo vesical. Para a coleta de urina na mulher, a genitália externa deverá ser cuidadosamente limpa. Em homens e mulheres o jato miccional inicial é desprezado, coletando-se o jato intermediário. Esta amostra de urina deve ser avaliada no máximo 60-120 minutos após a coleta, desde que mantida em geladeira a 4°C.
capítulo 16
Grande parte dos dados num exame de urina podem ser obtidos através das fitas reativas, porém, estas não substituem a realização do exame microscópico da urina.11
pH Embora seja determinado rotineiramente, não identifica nem exclui enfermidade renal. O pH urinário varia de 4,5 a 8,0, mas o pH urinário normal geralmente está entre 5 e 6 na primeira urina da manhã. Uma urina alcalina (pH 7,0) pode sugerir infecção urinária ou proliferação de bactérias que desdobram a uréia, como ocorre quando há demora em se realizar o exame. O pH urinário também pode estar elevado pelo uso de diuréticos, dieta vegetariana, sucção gástrica, vômitos e terapia com substâncias alcalinas. Por outro lado, nas acidoses e dieta rica em carne, a urina produzida é ácida.12 Nas acidoses tubulares renais, em que há alteração na reabsorção do bicarbonato filtrado, ou incapacidade para acidificar apropriadamente a urina, testes mais precisos devem ser efetuados.
Bilirrubina e Urobilinogênio Apenas a bilirrubina conjugada (direta) é hidrossolúvel e passa para a urina. Na estase biliar por obstrução ou drogas, a pesquisa de bilirrubina na urina é positiva. Em condições de hemólise, em que a bilirrubina indireta (não-conjugada) aumenta na circulação, a pesquisa de bilirrubina na urina é negativa.
Esterase Leucocitária e Nitrito O método da esterase se baseia na liberação de esterase por granulócitos urinários que sofreram lise. A reação com o sal de diazônio da fita resulta numa cor rosa a roxa. Resultados falso-positivos ocorrem quando há contaminação vaginal. A reação pode ser inibida quando a urina contiver muita glicose, albumina, ácido ascórbico, tetraciclina, cefalexina, cefalotina ou ácido oxálico. Algumas bactérias (principalmente Enterobacteriaceae) convertem o nitrato urinário em nitrito. O nitrito reage na fita com uma substância que no final resulta numa cor rosa. Resultados falso-negativos podem ocorrer quando existe demora para a realização do exame, o que causa degradação dos nitritos. Também deve ser levado em consideração o fato de que alguns patógenos não convertem nitrato em nitrito, como, por exemplo, o Streptococcus faecalis, a Neisseria gonorrhoeae e o Mycobacterium tuberculosis.
Glicose A maior parte das fitas usa o método glicose oxidase/ peroxidase. Este método geralmente detecta níveis baixos de glicose urinária (50 mg/dl). Como o limiar renal de glicose é de 160-180 mg/dl, a presença de glicose na urina geralmente indica glicemia superior a 210 mg/dl. Grandes quantidades de corpos cetônicos, ácido ascórbico e metabólitos da fenazopiridina (Pyridium®) podem interferir com
273
a reação. Como teste de screening para diabetes, a pesquisa de glicosúria em jejum tem uma especificidade de 98% mas uma sensibilidade de apenas 17%. A glicosúria também pode ocorrer com níveis normais de glicemia, como nas tubulopatias, isoladamente (glicosúria renal primária) ou como parte de um distúrbio tubular complexo, que envolve também alterações na reabsorção de aminoácidos, fósforo, ácido úrico e outros elementos (síndrome de Fanconi).11
Corpos Cetônicos Acetoacetato e acetona podem aparecer na urina em jejum prolongado e cetoacidose alcoólica ou diabética. Geralmente são detectados com a reação de nitroprussiato. Entretanto, o -hidroxibutirato (freqüentemente 80% dos corpos cetônicos em cetose) não é detectado pelo nitroprussiato.
Hemoglobina e Mioglobina A fita reagente utiliza a atividade peroxidase-like da hemoglobina para catalisar a reação. A presença de hemácias, hemoglobina ou mioglobina produz uma reação positiva.Quando a capacidade da haptoglobina do plasma em se ligar à hemoglobina livre é excedida, hemoglobina aparece na urina. A principal causa de hemoglobina livre é a hemólise. Rabdomiólise produz mioglobinúria. O teste positivo para hemoglobina na urina na ausência de hemácias sugere hemólise (com hemoglobinúria) ou rabdomiólise (com mioglobinúria). A presença de hemoglobina ou mioglobina também é caracterizada pela manutenção da coloração avermelhada no sobrenadante de uma amostra de urina após centrifugação. Nestas circunstâncias, o aspecto do plasma pode auxiliar na diferenciação entre hemoglobinúria e mioglobinúria: na hemoglobinúria o plasma é de coloração avermelhada e na mioglobinúria o plasma é de cor normal.11 Um resultado negativo na fita reativa afasta com segurança hematúria, hemoglobinúria e mioglobinúria. A presença de urina vermelha, com reação negativa na fita, pode representar a excreção de pigmentos após a ingestão de medicamentos (p.ex., fenazopiridina), alimentos (beterraba), ou a presença de porfiria.11
Densidade Urinária A concentração de solutos na urina pode ser determinada pela densidade, índice de refração ou osmolalidade urinária. É uma medida da concentração urinária. O valor normal é de 1,003-1,030. A relação entre a densidade e a osmolalidade urinária está ilustrada na Fig. 16.1. O dado isolado de densidade ou osmolalidade da urina tem pouco valor, a menos que o estado de hidratação do paciente seja conhecido. Terá valor uma osmolalidade maior que 700 mOsm/L ou densidade superior a 1,023, pois este grau de concentração indica uma boa função renal.
274
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
Fig. 16.1 Relação entre a osmolalidade e a densidade urinária. Observem que a relação não é linear.
A osmolalidade urinária pode ser estimada a partir da densidade da urina (sem glicose, manitol ou proteína), multiplicando-se por 35 os algarismos decimais do valor da densidade.13 Exemplo: densidade 1,010. Osmolalidade urinária 35 10 350 mOsm/kg. A presença de glicose e radiocontraste na urina pode modificar a densidade, com pouca mudança na osmolalidade. Usualmente, a capacidade de concentração urinária pode ser determinada após um período de privação hídrica, ou através da administração exógena de hormônio antidiurético (v. Cap. 9).
Proteinúria Normalmente são filtrados 180 litros de plasma a cada dia pelos glomérulos, cada um contendo 70 gramas de proteína. No entanto, graças a um eficiente mecanismo de reabsorção efetuado principalmente pelos túbulos proximais, menos de 150 mg de proteína aparecem por dia na urina. De modo geral, as proteínas que aparecem na urina são de baixo peso molecular. Dos 150 mg de proteínas excretadas por dia, 30-50 mg são de uma mucoproteína (Tamm-Horsfall) de alto peso molecular. Esta proteína é formada na superfície epitelial do ramo ascendente espesso da alça de Henle e parte inicial do túbulo contornado distal e é a maior constituinte dos cilindros hialinos. A eletroforese de urina normal revela que o restante da proteína se constitui de globulinas e muito pouca albumina (menos que 30 mg/dia). Em algumas situações, é possível observar proteinúria transitória sem que haja nenhuma lesão glomerular ou tubular. Esta é a chamada proteinúria funcional, na qual tal-
vez exista um aumento da permeabilidade glomerular pela ação de angiotensina II ou norepinefrina.14 Exemplos disso são: infecção urinária, febre, exposição ao frio e calor, convulsões e exercício intenso.12 Além disso, existem algumas condições clínicas em que a presença intermitente de proteinúria não se associa a doença renal (histologia normal) e não acarreta repercussões clínicas, como foi evidenciado em estudos com até 50 anos de seguimento. Exemplo disso é a proteinúria postural (ortostática), geralmente inferior a 1,0 g/dia, e que ocorre em 3-5% dos jovens sadios. Sua característica é ser detectada durante o dia, desaparecendo durante a noite, em posição supina. Para este diagnóstico, é necessário colher a urina em dois períodos de 12 horas, um diurno e um noturno. O aumento da permeabilidade glomerular nestes casos está relacionado à ativação neuro-humoral e à alteração da hemodinâmica glomerular.14 É fundamental uma cuidadosa observação para diferenciar estes casos daqueles em que os pacientes aumentam a proteinúria com a posição ortostática por apresentarem um comprometimento renal.12 Pacientes com proteinúria persistente mais freqüentemente têm doença renal ou sistêmica, como diabetes, insuficiência cardíaca ou hipertensão arterial.14 MECANISMOS DE PROTEINÚRIA. Durante sua formação, o filtrado glomerular atravessa três camadas: a) uma camada fenestrada de células endoteliais, cujos poros têm um diâmetro de 700 Å; b) a membrana basal (espessura total de 3.000 Å), composta de uma lâmina densa entre uma lâmina rarefeita interna e outra externa (lâmina rara interna e externa); c) uma camada de células epiteliais (podócitos) constituída de processos interdigitados denominados pés dos podócitos ou pedicelas, originários de prolongamentos das células epiteliais. Os pés dos podócitos estão separados nas bases por poros de 250-500 Å. Além desta barreira baseada no tamanho dos poros, existe uma barreira que depende da carga negativa da parede glomerular, repelindo a passagem de proteínas de carga negativa.14 O glomérulo normal usualmente impede seletivamente a passagem de moléculas do tamanho da albumina plasmática (PM 40.000 daltons) ou maiores. O clearance de proteínas plasmáticas é inversamente proporcional ao seu diâmetro efetivo. A perda da seletividade, com aparecimento de grandes moléculas na urina, reflete a gravidade da lesão. Assim, em pacientes com síndrome nefrótica e com lesões glomerulares importantes, a relação do clearance de moléculas maiores (p.ex., 2-macroglobulina) com o clearance de moléculas menores (p. ex., albumina) é relativamente mais alto do que em pacientes proteinúricos com lesões glomerulares mínimas. Entre as frações plasmáticas não detectáveis na urina normal pelo seu diâmetro elevado estão: 2lipoproteínas, 2-lipoproteínas e -macroglobulinas. Quantidades anormais de proteínas podem aparecer na urina por mecanismos variados, como veremos resumidamente a seguir:
capítulo 16
a) Dano da parede capilar glomerular, permitindo a passagem de proteínas de alto peso molecular em quantidades que superam a capacidade de reabsorção tubular. Esta proteinúria é chamada de proteinúria glomerular.12 Em casos de proteinúria glomerular intensa, a albumina constitui 60-90% da proteinúria total. Quantidades menores das quatro maiores frações de globulinas também são excretadas. De modo geral, consideramos que proteinúrias acima de 1,0 g/dia muito provavelmente têm origem glomerular. Quando, no seguimento de um paciente com proteinúria glomerular, observamos redução da excreção de proteína, isto pode ser devido a uma melhora da lesão glomerular, progressão da destruição glomerular (menos proteína é filtrada), ou diminuição significativa dos níveis de albumina. Porém, existem algumas condições em que, apesar da piora da função renal, não há redução proporcional da proteinúria: diabetes mellitus, amiloidose renal e nefropatia membranosa. b) Disfunções ou lesões tubulares proximais podem impedir a reabsorção normal de proteínas neste local, resultando no aparecimento de proteínas, principalmente de baixo peso molecular (geralmente globulinas – 2-microglobulina e 2-microglobulina) na urina. A este tipo denominamos proteinúria tubular, a qual não excede 1-2 g/dia.12 Também pode haver aumento de produção de proteínas pelos túbulos (pouco freqüente). c) Proteínas normais ou anormais produzidas em maior quantidade, ultrapassando os mecanismos de reabsorção proximal.12 Esta é a chamada proteinúria de hiperfluxo.14 Em algumas enfermidades a excreção de globulinas excede a de albumina (p. ex., mieloma múltiplo). Em pacientes com mieloma, as globulinas detectadas na urina são proteínas de cadeia leve, de baixo peso molecular: 22.500-45.000 (Bence-Jones). Estas proteínas são estrutural e antigenicamente idênticas às cadeias leves das proteínas mielomatosas IgG e IgA e têm uma característica térmica: coagulam ao serem aquecidas entre 45 e 55°C e novamente se solubilizam ao ferver-se a urina. Este simples teste de aquecimento é útil no diagnóstico inicial de discrasias de células plasmáticas, mas só é positivo em 50-60% dos casos. Albuminúria elevada em mieloma múltiplo significa aumento da permeabilidade glomerular, secundária à infiltração por amilóide. DETERMINAÇÃO QUALITATIVA DA PROTEINÚRIA. Existem vários métodos cujos resultados são usualmente expressos em cruzes (0 a ), dependendo da intensidade da reação. É importante salientar que, com estes métodos, há necessidade de se obter simultaneamente a densidade da urina para melhor interpretação da proteinúria. Isto porque, com fluxos urinários muito elevados (o que usualmente significa uma urina diluída), a concentração de proteína pode ser baixa e não ser detectada pelos métodos habituais.
275
1. Calor e ácido acético: algumas gotas de ácido acético são adicionadas à urina, a qual é então fervida. A presença de proteína torna a urina opalescente. 2. Ácido sulfossalicílico a 3%: adicionam-se algumas gotas de ácido sulfossalicílico a 5 ml de urina, que se turva na presença de proteína.11 3. Tiras de papel: nestes testes, as tiras reativas são impregnadas com tetrabromofenol azul, que tem grande afinidade por proteínas de carga negativa (como a albumina) e menor afinidade por proteínas de carga positiva (como as imunoglobulinas de cadeias leves).12 Apenas na presença de quantidade superior a 300-500 mg de proteínas ao dia, a tira torna-se verde, em intensidade que depende da quantidade de proteína. O teste detecta albumina em quantidades maiores, mas não outras proteínas, como as cadeias leves de imunoglobulinas e proteínas de Bence-Jones. O teste da fita reativa pode ser falso-positivo para proteínas por cerca de 24 horas em pacientes que receberam agentes de contraste radiográfico. As tiras comuns também não detectam microalbuminúria (30-300 mg/dia), que é um evento precoce na evolução da nefropatia diabética. Para esta finalidade, poderiam ser usadas fitas específicas (Micral-test®, Albustix®, Microbumintest®), que detectam quantidades baixas de albumina na urina.12 DETERMINAÇÃO QUANTITATIVA DA PROTEINÚRIA. É útil na identificação e seguimento de certos tipos de nefropatias. A avaliação quantitativa usualmente é feita colhendo-se urina de 24 horas e determinando-se o conteúdo de proteína, pelo método de precipitação, que detecta grande parte das proteínas. Como já foi mencionado, a quantidade normal de proteínas na urina não ultrapassa 150 mg por dia. Quantidades superiores a esse limite representam grandes modificações na permeabilidade glomerular. Proteinúria acima de 3 g/dia é considerada proteinúria em faixa nefrótica.15 O maior problema na coleta de urina de 24 horas é assegurar que a coleta seja completa. Para verificar se toda a urina foi adequadamente colhida, podemos nos basear na quantidade de creatinina presente na urina: para homens entre 20 e 50 anos, a excreção urinária de creatinina nas 24 horas é de 18,5 a 25 mg/kg/ dia, e para mulheres de mesma idade, 16,5 a 22,4 mg/kg/ dia. Para homens e mulheres de 50 a 70 anos de idade, os valores seriam 15,7 a 20,2 mg/kg/dia e 11,8 a 16,1 mg/kg/ dia, respectivamente. Valores inferiores podem evidenciar coleta incompleta da urina. É importante frisar que pacientes desnutridos e com massa muscular reduzida têm menor excreção de creatinina.12 A quantificação também é utilizada como screening em algumas situações especiais. Por exemplo, a presença de albuminúria entre 30 e 300 mg/dia em pacientes diabéticos é indicativa de nefropatia diabética, mesmo com excreção urinária de proteínas nas 24 horas aparentemente normal. A albuminúria pode estar transitoriamente elevada em situações como a hiperglicemia, febre, exercício e in-
276
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
suficiência cardíaca.16 São maneiras de quantificar a albumina urinária: radioimunoensaio, imunoturbidimetria, nefelometria e ELISA imunoensaio. Todos estes métodos têm precisão similar.12 Ao invés de usar a urina de 24 horas, também é possível determinar a quantidade de proteína em relação à creatinina, numa amostra de urina, eliminando-se o fator tempo. Normalmente a relação proteína/creatinina na urina é menor que 0,1. Uma relação maior que 3,0-3,5 indica excreção protéica maior que 3,0-3,5 g/24 h, e menor que 0,2 indica menos de 0,2 g em 24 h. Este cálculo pode ser feito também em diabéticos: um valor acima de 0,03 sugere que a excreção de albumina é superior a 30 mg/ dia, e que microalbuminúria está presente. Deve ser considerado o fato de que em diabéticos existe variação na excreção de proteínas na urina ao longo do dia, e que preferencialmente deve ser utilizada uma amostra colhida logo pela manhã.16 Porém, a relação proteína/creatinina apresenta algumas limitações: subestima a excreção de proteínas em indivíduos musculosos, com maior excreção de creatinina, e a superestima em indivíduos caquéticos, com menor excreção de creatinina. Além disso, a avaliação em amostra isolada de urina não é apropriada para o diagnóstico de proteinúria ortostática ou postural.15
Pontos-chave: • O exame de uma amostra de urina com as fitas reativas permite a avaliação qualitativa dos constituintes da urina, como: pH, glicose, nitrito, esterase leucocitária, hemoglobina, densidade e proteínas • A avaliação quantitativa da proteinúria pode ser feita na urina de 24 horas ou com a relação proteína/creatinina em uma amostra de urina
Quadro 16.1 Elementos formados encontrados na urina 1. Células do sangue a. eritrócitos b. leucócitos c. linfócitos d. células plasmáticas etc. 2. Células do trato urinário a. rim: células tubulares b. trato inferior: células transicionais, escamosas 3. Células estranhas a. bactérias b. fungos c. parasitas d. células neoplásicas 4. Cristais a. oxalato b. fosfatos c. uratos d. drogas etc.
intensa. Quando esta última possibilidade ocorre, os processos exacerbados de reabsorção de proteína levam a uma degeneração gordurosa das células epiteliais tubulares, com aparecimento de gotículas de gordura no citoplasma. As células epiteliais tubulares repletas de gordura são denominadas corpúsculos ovais de gordura e são encontradas em grande número na síndrome nefrótica, em que o número de corpúsculos parece ser proporcional ao grau de proteinúria. Leucócitos e hemácias presentes na urina podem ser originários dos rins, assim como de qualquer outra parte do trato urinário. Apenas quando inclusos em cilindros, pode-se ter certeza de sua origem renal.
Cilindros
Células
Os cilindros são elementos do sedimento urinário de grande importância na distinção entre nefropatia primária e doenças do trato urinário baixo. São massas alongadas (cilíndricas) de material aglutinado, formadas usualmente nas partes distais dos nefros, onde a urina é concentrada. A largura dos cilindros é determinada pela largura do túbulo onde eles se formam. Por exemplo, os cilindros mais largos são os formados nos ductos coletores. Os cilindros geralmente são formados por uma matriz protéica, onde podem aglutinar-se células. Aumento da concentração do líquido tubular e urina ácida favorecem a formação de cilindros.
As células encontradas no sedimento urinário podem ser provenientes de descamação do epitélio e do trato urinário ou dos elementos celulares do sangue. Nas nefropatias, as células epiteliais degeneram e são excretadas em grande número, particularmente quando há proteinúria
a) Cilindro hialino: formado pela precipitação de proteína no lúmen tubular. Basicamente, é constituído pela mucoproteína de Tamm-Horsfall (Fig. 16.2). b) Cilindro epitelial: é um cilindro celular formado por células epiteliais tubulares, com pouca matriz protéica. No
SEDIMENTO URINÁRIO Embora o exame microscópico do sedimento urinário não nos dê uma idéia da função renal, ele pode indicar a presença de uma nefropatia e muitas vezes a natureza e a extensão das lesões. Normalmente, um pequeno número de células e outros elementos formados podem ser detectados na urina (Quadro 16.1). Na presença de uma enfermidade, o número destes elementos aumenta.
capítulo 16
277
Fig. 16.2 Principais elementos formados no sedimento urinário. A. Cilindro hialino (100 ); B. Cilindro granular fino (100 ); C. Cilindro granular grosso (125 ); D. Cilindro leucocitário (100 ) corado com o corante de Sternheimer-Malbin; E. Cilindro hemático (100 ) corado com o corante de Sternheimer-Malbin; F. Cilindro céreo (100 ); G. Cilindro largo.
278
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
Fig. 16.2 Continuação. H. Numerosas hemácias e alguns leucócitos (400 ); I. Conglomeração de leucócitos (piócitos) (400 ); J. Corpúsculo oval de gordura. (Gentileza de Produtos Roche Químicos e Farmacêuticos S/A — com exceção da Fig. G.)
início, as células podem ser identificadas facilmente no cilindro epitelial. À medida que o cilindro permanece no túbulo ou se move em direção à pelve renal, as células começam a desintegrar-se. Há dispersão do material nuclear e aparecem vários fragmentos (cilindros granulosos). Com a progressão do processo de desintegração, os grânulos tornam-se menores (cilindros finamente granulosos) e no final são massas homogêneas (cilindros céreos). c) Cilindro leucocitário: é um cilindro hialino contendo leucócitos. d) Cilindro gorduroso: é um cilindro hialino impregnado com gotículas de gordura. Algumas vezes, percebem-se cilindros cujo diâmetro é maior do que o habitual. Eles são chamados de cilindros largos, são formados nos ductos coletores e resultam de estase urinária (Fig. 16.2). Em geral são cilindros epiteliais ou céreos. Como geralmente a estase urinária reflete diminuição da função renal, eles são vistos na insuficiência renal, razão pela qual são conhecidos também como cilindros da insuficiência renal. No entanto, os cilindros céreos são considerados não-específicos. Aparentemente resultam da degeneração de cilindros celulares e podem ser vistos em várias nefropatias.
e) Cilindros hemáticos: neste tipo, as hemácias dismórficas estão incluídas no cilindro hialino, sendo sua presença patognomônica de glomerulopatia.
Cristais Podem ser observados na urina cristais de diferentes morfologias e significados. Os cristais se formam na urina na dependência de vários fatores, que serão melhor abordados no capítulo de litíase urinária. A presença de cristais de ácido úrico, fosfato ou oxalato de cálcio na urina pode não ter significado diagnóstico, pois pode ocorrer cristalização na amostra, de acordo com temperatura ambiente, pH e outras características da urina. A presença de grande quantidade destes cristais nos túbulos renais pode causar insuficiência renal aguda, como na síndrome de lise tumoral. Os cristais de fosfato amoníaco-magnesiano (estruvita) podem ser encontrados em litíase associada a infecções urinárias por bactérias produtoras de urease, como Proteus e Klebsiella. A presença de cristais de cistina também é anormal e significa doença.11
EXAME MICROSCÓPICO DA URINA É interessante ressaltar que a urina deve ser examinada pelo próprio médico interessado, quando há suspeita de
capítulo 16
uma nefropatia. Há duas razões específicas para esta recomendação: propicia um exame cuidadoso por um indivíduo competente e familiarizado com o quadro clínico e permite que o exame seja feito logo após a coleta da urina. Amostras de urina enviadas ao laboratório central podem permanecer várias horas à temperatura ambiente antes de serem processadas. Esta espera, aliada por vezes à infecção da urina com organismos que desdobram a uréia, eleva o pH da urina. Já foi demonstrado que há uma correlação inversa, altamente significativa, entre o número de cilindros e o pH urinário. Desta maneira, à medida que o pH urinário se torna mais alcalino, menor número de cilindros é detectado, devido ao processo de degradação que se desenvolve. Assim, sugere-se que, se a urina não puder ser examinada logo após a micção, a mesma deverá ser preservada com uma gota de formol a 10%, para prevenir a degradação de cilindros.17 A urina para exame deverá ser colhida com os devidos cuidados de higiene, em frasco estéril. A seguir, 10-15 ml de urina são centrifugados a 3.000 rpm por cinco minutos. O sobrenadante é então descartado e o sedimento ressuspendido. Uma gota do sedimento é colocada numa lâmina sob lamínula e examinada ao microscópio sob iluminação reduzida. O número de cilindros, hemácias e células brancas e epiteliais é avaliado em pelo menos 10 campos (400). No serviço de nefrologia do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, realizamos como rotina a análise microscópica de uma amostra de urina não centrifugada na câmara de Neubauer. Logo após a coleta adequada, a urina é homogeneizada com movimentos rotatórios, sendo preenchida a câmara, sob lamínula, com uma pipeta pequena. Para a contagem dos elementos figurados (leucócitos, hemácias, cilindros), deve ser utilizada a objetiva de 400, sob iluminação reduzida. A seguir, procede-se à contagem dos elementos figurados, inclusos nas linhas triplas, em dois dos grandes retículos da câmara, diametralmente opostos, multiplicando-se o resultado por 5, obtendo-se a contagem por mm3. Para a quantificação das bactérias (que podem ser facilmente visualizadas pelo observador experiente sem necessidade de coloração pelo Gram), adotamos a seguinte sistematização: 1) raras, quando visualizadas esparsamente nos dois retículos; 2) , até 10 bactérias por campo de 400; 3) , até 100 bactérias por campo; 4) , mais de 100 bactérias por campo. Com a experiência, é muito difícil a confusão com uratos ou fosfatos amorfos (que podem ser eliminados com técnicas adequadas) ou partículas com movimentos brownianos. Este método permite, em qualquer local (enfermaria, ambulatório, consultório) a quantificação dos elementos urinários como leucócitos, hemácias, cristais, cilindros e bactérias (tanto bacilos como cocos). Associando estes dados com os obtidos pelas tiras reagentes, com freqüência é possível o diagnóstico de glo-
279
Fig. 16.3 Câmara de Neubauer: aspecto lateral, superior, e detalhe do retículo. Nas áreas sombreadas (A) é realizada a contagem, sendo este resultado multiplicado por 5, obtendo-se o número de células por milímetro cúbico.
merulopatias ou infecções urinárias. Eventualmente, existindo poucos elementos, pode-se proceder à centrifugação do material em ambientes com esta facilidade. Estando presente hematúria, é fundamental a análise da morfologia eritrocitária (perfeitamente possível sob microscopia óptica, não havendo necessidade da microscopia de fase). Hemácias isomórficas, com forma íntegra ou crenada, de tamanhos pouco diversos, com quantidade apropriada de hemoglobina, refringentes, semelhantes às observadas em esfregaços de sangue periférico, são características de doenças de origem não-glomerular, como neoplasia, litíase renal, traumatismo do aparelho urinário, infecção urinária, etc. Já as hemácias dismórficas, com vários tamanhos e formas, algumas com apêndices em suas membranas (acantócitos), com pouca hemoglobina, e por isso difíceis de visualizar (ghost cells), indicam doença glomerular. Basta a análise cuidadosa da morfologia das hemácias, neste último caso, para afirmar, mesmo sem a presença de cilindros ou proteinúria, que o paciente apresenta glomerulonefrite. Outros elementos importantes no diagnóstico de doenças renais são os eosinófilos urinários, que, quando detectados pela coloração de Giemsa ou Wright, podem evidenciar uma nefrite intersticial aguda.11
280
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
A
B
C Fig. 16.4 Aspecto das hemácias na urina. Em A observam-se hemácias isomórficas, de origem não-glomerular. Em B estão demonstradas hemácias dismórficas, de origem glomerular. Em C observa-se um esquema com a morfologia provável de hemácias de origem não-glomerular (grupo 1) e glomerular (grupos 2 e 3). Obtido de Barthe, P., et al. Annales de Pédiatrie, v. 33, n. 3, 1986.
Interpretação do Sedimento Urinário em Nefropatias A associação de certas características na urinálise, sob a forma de padrões, sugere doenças renais específicas, facilitando e dirigindo o raciocínio diagnóstico: a) Como já foi mencionado, a presença de cilindros no sedimento urinário tem uma importância fundamental, pois são formados no parênquima renal. Da mesma forma, as células que podem estar inclusas no cilindro indicam que elas também se originam no parênquima renal. Assim, a presença de hematúria não sugere ao médico o local de sangramento no trato urinário, se não for analisada a morfologia das hemácias. No entanto, a presença de células vermelhas no interior do cilindro
(cilindro hemático) indica a sua origem como sendo glomerular, como ocorre nas glomerulonefrites. Cilindros largos indicam a presença de insuficiência renal e geralmente refletem um mau prognóstico. No entanto, podem ser vistos também na fase de diurese franca da necrose tubular aguda e na recuperação de glomerulonefrite aguda, grave. b) Numerosos cilindros granulosos e de células epiteliais, além de células epiteliais livres, são encontrados na urina de pacientes com necrose tubular aguda ou em insuficiência renal aguda. Sua presença na urina se deve ao desprendimento destas células de sua membrana basal em conseqüência a uma lesão isquêmica ou tóxica.11 c) Leucocitúria pode ser encontrada em qualquer nefropatia. Quando os leucócitos se apresentam em grande quantidade ou agregados, e associados a bacteriúria, geralmente indicam infecção do trato urinário. A única forma de identificar que os leucócitos têm origem renal é a existência de cilindros onde os leucócitos estejam inclusos (cilindros leucocitários). Os cilindros leucocitários podem ser encontrados nas glomerulonefrites, juntamente com outros cilindros. Contudo, quando somente os cilindros leucocitários estiverem presentes, na ausência de outros cilindros, podem sugerir o diagnóstico de pielonefrite. Piúria associada com cilindros leucocitários ou céreos, com proteinúria discreta ou ausente, sugerem doença tubular ou intersticial ou, ainda, obstrução urinária. Leucócitos e cilindros leucocitários também são vistos na glomerulonefrite aguda pós-infecciosa, mas nesta também estão presentes outros sinais de doença glomerular, como hematúria dismórfica, cilindros hemáticos e proteinúria. Piúria isolada sugere a contaminação com secreções vaginais (juntamente com células epiteliais vaginais), infecções urinárias, doença tubulointersticial e tuberculose do aparelho urinário.11 O achado de bacteriúria em urina coletada e processada adequadamente permite o diagnóstico de infecção urinária de imediato, quer seja assintomática (bacteriúria assintomática) ou associada a sintomas e sinais característicos (bacteriúria sintomática). O diagnóstico de infecção urinária é facilitado com a análise do aspecto e do odor da urina, e resultados das fitas reagentes. d) A presença de gotículas de gordura dispersas na urina ou no interior das células, como já foi referido, é característica de nefropatias que se acompanham de proteinúria importante (síndrome nefrótica). e) A associação de hematúria com cilindros hemáticos, hemácias dismórficas, proteinúria maciça ou lipidúria sugere doença glomerular ou vasculite. Hemácias e piócitos, com tipos variados de cilindros, sugerem doença glomerular, vasculite, nefrite intersticial, obstrução, infarto renal. Como já foi mencionado, a eosinofilúria pode ser encontrada na nefrite intersticial aguda. A ausência de eosinófilos na urina não afasta este diagnóstico. Hematúria isolada sugere litíase urinária, nefropa-
capítulo 16
tia por IgA, doença da membrana basal fina, nefrite hereditária, doença renal policística, tumores e doença prostática.11 f) Parcial de urina com poucas alterações (poucas células, ausência ou pequena quantidade de cilindros e proteinúria): insuficiência renal aguda do tipo pré-renal, alguns casos de necrose tubular aguda, obstrução do trato urinário, hipercalcemia, rim do mieloma (teste do ácido sulfossalicílico fortemente positivo), nefroesclerose benigna, doenças tubulares.11
Pontos-chave: • É possível realizar a contagem de leucócitos e hemácias na Câmara de Neubauer, em amostra de urina centrifugada ou não • A presença de hemácias isomórficas na urina sugere que as mesmas não se originam nos glomérulos. A origem glomerular das hemácias é evidenciada pelo dismorfismo eritrocitário PROVAS DE FUNÇÃO RENAL Avaliação da Função Glomerular A uréia e a creatinina são substâncias basicamente excretadas pelo rim através de filtração glomerular e, assim sendo, sua concentração plasmática depende da filtração glomerular. A função de filtração glomerular é avaliada através da concentração plasmática e capacidade de depuração renal (clearance) dessas substâncias. A determinação da excreção de proteína na urina é também um importante método de avaliação da função glomerular. Sendo uma das funções do glomérulo a de fornecer um ultrafiltrado do plasma praticamente sem proteína, um excesso de proteína na urina significa uma disfunção glomerular. Como a avaliação da excreção de proteína pelo rim já foi abordada, vamos nos restringir aos métodos de avaliação da depuração renal. Entre as funções mais significativas dos rins, está a de retirar do sangue algumas substâncias, através da filtração glomerular. A taxa de filtração glomerular (TFG) corresponde à somatória das taxas de filtração de cada nefro. Então, a TFG fornece uma estimativa do número de nefros funcionantes, o que é de fundamental importância quando se avalia a repercussão de uma doença sobre a função renal. Por exemplo, TFG reduzida demonstra comprometimento da função renal, enquanto TFG aumentando progressivamente demonstra melhora funcional.18 Esta função renal de limpar, depurar, é conhecida como clearance.* Considere uma substância que seja livremente *Palavra de origem inglesa, derivada do verbo to clear, significando o ato de limpar, livrar.
281
filtrada pelos glomérulos, que não se ligue às proteínas plasmáticas e que não seja secretada ou reabsorvida pelos túbulos renais. O clearance desta substância é igual à filtração glomerular, ou seja, é a quantidade removida do plasma dividida pela concentração plasmática média num determinado período de tempo. O clearance é interpretado como o volume de plasma que pode ser depurado (limpo) de certa substância na unidade de tempo.12 CREATININA PLASMÁTICA E CLEARANCE DA CREATININA ENDÓGENA. A creatinina é um produto do metabolismo da creatina e fosfocreatina musculares. A sua produção e liberação pelo músculo são constantes e dependem pouco da atividade física, da ingesta e do catabolismo protéico usuais. Normalmente, os níveis séricos de creatinina variam no homem de 0,8 a 1,3 mg/100 ml e na mulher de 0,6 a 1,0 mg/100 ml. Há pouca variação durante o dia e de um dia para o outro.12 Algumas circunstâncias podem elevar agudamente os níveis de creatinina no sangue, como, por exemplo, a ingesta de grande quantidade de carne numa refeição, ou a destruição muscular extensa, como na rabdomiólise. Além disso, certos medicamentos podem aumentar o nível plasmático de creatinina, como: trimetoprim, cimetidina, probenecid, amiloride, espironolactona, triamtereno, que são cátions que competem com a creatinina e inibem sua secreção tubular.19 Outras substâncias, por serem cromógenas, elevam em até 20% os níveis de creatinina por interferência em alguns testes de dosagem que se baseiam em colorimetria. São exemplos disso: glicose, frutose, piruvato, acetoacetato (na cetoacidose diabética), ácido úrico, ácido ascórbico, cefalosporinas, fluocitosina.3,12,19 Após sua liberação pelo músculo, a creatinina é excretada exclusivamente pelo rim. Como esta substância é livremente filtrada (não se liga a proteínas), não é reabsorvida pelos túbulos renais e apenas uma pequena fração é secretada (15%); a quantidade filtrada será praticamente igual à quantidade excretada. O clearance de creatinina reflete portanto, com bastante aproximação, a filtração glomerular. Observe a fórmula utilizada para o cálculo do clearance de creatinina:
Onde: CrUr: creatinina urinária (mg/100 ml) CrPl: creatinina plasmática ou sérica (mg/100 ml) V: volume urinário por minuto (ml/min) No entanto, com o desenvolvimento da insuficiência renal e a conseqüente elevação da concentração plasmática de creatinina, a fração secretada aumenta muito. Isto acarreta, na avaliação do clearance de creatinina, um resultado mais elevado do que o da filtração glomerular renal. Por exemplo, num paciente urêmico, o clearance de creatinina pode ser de 20 ml/min e a filtração glomerular efeti-
282
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
va de 15 ml/min. Na verdade, esta discrepância não é importante do ponto de vista prático. Qualquer redução na filtração glomerular reduz a excreção de creatinina. Como a liberação da creatinina pelo músculo é constante, quando há queda da TFG ocorre um acúmulo desta substância e elevação de sua concentração sérica. O acúmulo de creatinina é progressivo, até que a quantidade diária produzida seja igual à quantidade excretada (filtrada) (Fig. 16.5). A quantidade de creatinina excretada também varia em função da massa muscular, isto é, quanto maior a massa muscular, maior a excreção. No homem, a excreção de creatinina é de 20-26 mg/kg/dia, e na mulher, 14-22 mg/kg/ dia.20 No envelhecimento natural do ser humano, nas do-
Fig. 16.5 Alterações na creatinina sérica quando o ritmo de filtração glomerular (RFG) é abruptamente reduzido. Observem que entre os dias 0 e 1 toda a creatinina produzida é excretada. Uma redução de 50% no RFG no dia 1 reduz abruptamente a quantidade de creatinina filtrada e excretada. Como a produção diária de creatinina é constante (flecha), haverá um aumento na concentração de creatinina. Com o aumento da creatinina sérica, a quantidade filtrada e excretada também aumenta. Quando a quantidade de creatinina excretada igualar-se à creatinina produzida, um novo estado de equilíbrio é alcançado. (Adaptado de Kassirer, J.P.20 )
enças renais crônicas e em pacientes que sofreram amputação ou paralisia de membros, a massa muscular também diminui, e a relação entre a concentração plasmática de creatinina e o clearance de creatinina se altera.3,21 O clearance de creatinina então diminui, sem que haja um aumento proporcional de creatinina plasmática (Quadro 16.2). Do ponto de vista prático, uma redução de 50% na filtração glomerular dobra a concentração sérica de creatinina (Fig. 16.6). Um pequeno aumento de creatinina acima do normal significa uma grande alteração percentual da função glomerular. Porém, quando a creatinina já estiver moderadamente elevada, um aumento comparável representa uma alteração percentual muito menor da função renal. Por exemplo, quando a creatinina sérica aumenta de 1 para 2 mg/100 ml, isto equivale a uma diminuição de 50% da função glomerular. No entanto, um aumento de 7 para 8 mg/100 ml implica uma perda de somente 2-3% da função glomerular (v. Fig. 16.6). Em indivíduos idosos, a elevação da creatinina plasmática de 0,6 mg/100 ml para 1,2 mg/100 ml significa uma redução do clearance de creatinina de 50%, mesmo que o nível sérico esteja dentro da faixa considerada normal. Num indivíduo jovem e sadio, níveis normais de creatinina indicam TFG normal, mas num idoso podem significar uma redução de 50% na TFG, devido a uma redução da massa muscular.12 Apesar de o clearance de creatinina ser um exame relativamente fácil de ser realizado, algumas desvantagens existem, razão pela qual a concentração sérica da creatinina é mais utilizada rotineiramente para se avaliar a função glomerular.
Fig. 16.6 Relação entre a creatinina sérica, uréia nitrogenada plasmática e RFG. Observem que para cada redução de 50% no RFG a concentração sérica de creatinina é o dobro. Isto é, um aumento na creatinina sérica de 1,0 para 2,0 mg/100 ml implica uma redução de 50% da função renal. Observem, no entanto, que se o aumento na creatinina sérica for de 7,0 para 8,0 mg/100 ml, isto indicará uma redução na função de apenas 1 a 3%. (Adaptado de Kassirer, J.P.20)
283
capítulo 16
Quadro 16.2 Relação entre idade, creatinina e clearance de creatinina*
Idade (variação em anos) 18-29 30-39 40-49 50-59 60-69 70-79 80-92
Média de idade (anos)
N.º de pacientes estudados
Creatinina plasmática média (mg/100 ml )
24,6 34,6 46,2 54,4 64,6 74,4 85,1
22 21 28 66 53 42 17
0,99 1,08 1,17 1,49 1,39 1,78 1,39
Clearance de creatinina médio (ml/min) 114,9 98,6 95,4 77,9 57,6 38,6 37,4
Excreção média de creatinina (mg/kg/24 h) e D.P. 23,6 5,0 20,4 5,1 19,2 5,8 16,9 4,6 15,2 4,0 12,6 3,5 12,1 4,1
*Adaptado de Cockcroft D.W. e Gault M.H.21
Entre as desvantagens do clearance de creatinina está o fato de que alguns métodos de determinação da creatinina sérica são inespecíficos, pois, além da creatinina, detectam outros cromógenos. Em razão disto, os valores séricos podem ser 10-40% mais elevados do que os obtidos por métodos mais específicos. Além disso, pode haver erro na determinação do clearance de creatinina em função de coleta inadequada da urina (p.ex., esvaziamento incompleto da bexiga). Existe uma margem de erro de 10% na determinação da creatinina, mesmo nos melhores laboratórios. Técnica para Determinação do Clearance de Creatinina. É necessária a coleta de urina durante um período aproximado de 24 horas. Ao se iniciar este período, é necessário esvaziar completamente a bexiga pela manhã, desprezando esta micção e anotando a hora. A partir daí, toda a urina é coletada em frascos apropriados (inclusive a da madrugada, se se levantar para urinar), incluindo a primeira miccção da manhã, novamente marcando a hora, completando assim o período máximo de 24 horas. A urina é então enviada ao laboratório, com os horários anotados. A seguir, observam-se as etapas para o cálculo do clearance de creatinina. Exemplo: Calcular o clearance de creatinina de uma paciente de 60 kg, 1,60 m de altura, quando o volume urinário das 24 horas é de 1.440 ml e as concentrações da creatinina urinária e plasmática são 70 mg/100 ml e 7,0 mg/100 ml, respectivamente. 1.ª) Determinar a superfície corporal do paciente (com tabelas ou fórmulas apropriadas) e o fluxo urinário/minuto: • Superfície corporal: 1,62 m2 • Fluxo urinário / minuto: 2.ª) Aplicar a fórmula de clearance:
3.ª) Corrigir o clearance obtido para a superfície corporal do paciente em questão. (O clearance obtido se refere a uma superfície corporal de 1,73 m2. Como o clearance (Cl) varia com a superfície corporal (SC), é necessário corrigilo para a SC da paciente, que é de apenas 1,62 m2.) O clearance de creatinina corrigido será:
Tradicionalmente, a correção da TFG tem sido feita linearmente de acordo com a superfície corporal. Porém, nos últimos anos, alguns autores têm chamado a atenção para o fato de que a TFG seria determinada fundamentalmente pela taxa de metabolismo basal. Indivíduos de diferentes superfícies corporais são diferentes entre si também com relação à sua taxa metabólica basal, TFG, fluxo sanguíneo renal e excreção de produtos nitrogenados. Assim, como os organismos não são isométricos entre si, mesmo quando apresentam padrões corporais similares, deveriam ser utilizadas as escalas alométricas (não-isométricas), que caracterizariam melhor a relação entre TFG e taxa metabólica.22-24 Uma outra fórmula pode ser utilizada à beira do leito para uma estimativa rápida da TFG, sem a necessidade da coleta de urina de 24 horas (fórmula de Cockcroft-Gault) e levando em consideração a idade, sexo e peso corporal.3 Cabe ressaltar, porém, que esta fórmula não substitui a realização do clearance de creatinina padrão, mas facilita algumas condutas mais imediatas, como o cálculo da correção de doses de medicamentos na insuficiência renal. Em mulheres, pelo fato de a massa muscular ser proporcionalmente menor que nos homens, o resultado desta fórmula deve ser multiplicado por 0,85.18
284
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
Já que a secreção tubular de creatinina interfere nos resultados do clearance de creatinina, superestimando a função renal, é possível obter um clearance mais exato bloqueando a secreção tubular de creatinina. Este bloqueio pode ser realizado, por exemplo, com a cimetidina, que é antagonista do receptor de histamina H2. A cimetidina é um cátion orgânico que, por competição, diminui a secreção tubular de creatinina.12 Outro fato a ser considerado é a influência que o processo normal de envelhecimento poderia ter sobre a função renal, mesmo que a massa muscular se mantenha inalterada. Utilizando a correlação entre idade e clearance de creatinina, alguns autores demonstraram que a taxa de declínio fisiológico da função renal seria em torno de 0,75 ml/minuto por ano. Porém, nem todos os pacientes idosos apresentam redução da TFG.25 Num paciente idoso, também deve ser levada em conta a presença de co-morbidades, como a insuficiência cardíaca, que pode agravar a função renal.18,33,34 URÉIA PLASMÁTICA E CLEARANCE DA URÉIA. A uréia é o produto final do metabolismo nitrogenado e a sua concentração plasmática depende de muitos fatores que afetam o metabolismo do nitrogênio: ingesta calórica e protéica, catabolismo protéico aumentado, relacionado a trauma, infecção e febre, uso de corticosteróides, absorção de sangue do trato gastrintestinal, depleção do espaço extracelular e ingestão de quantidades excessivas de proteínas. Desta forma, ao contrário da creatinina, a concentração plasmática de uréia pode variar muito, sem que haja alteração do clearance de uréia. Aproximadamente metade da uréia filtrada é reabsorvida no túbulo proximal, independentemente da presença ou ausência do hormônio antidiurético (HAD) e do fluxo urinário. No entanto, nos segmentos distais do nefro, a reabsorção de uréia acompanha a reabsorção de água. Quando o fluxo urinário é baixo, a reabsorção de água nos segmentos distais do nefro aumenta a concentração intratubular de uréia, o que favorece sua reabsorção. A reabsorção de uréia também é favorecida pela presença de HAD nestes segmentos. É devido a este fato que verificamos um aumento desproporcional de uréia em relação à creatinina plasmática num paciente com depleção do volume extracelular, com débito urinário reduzido. Quando o fluxo urinário é alto, o segmento distal do nefro torna-se relativamente impermeável à uréia, o que aumenta a sua excreção (Fig. 16.7). Portanto, para uma determinação precisa do clearance de uréia, deve-se estabelecer inicialmente um fluxo urinário alto (pelo menos 2 ml/min). Como há uma variação diária da uréia plasmática, o teste deverá ser realizado por um curto período, minimizando os erros. Os erros causados por uma coleta de urina imprecisa e um esvaziamento incompleto da bexiga são maiores quando o tempo de coleta é menor, como no clearance de creatinina. Estes problemas, aliados à reabsorção proximal de uréia (50%) e à ne-
Fig. 16.7 Influência do fluxo urinário sobre a excreção de uréia.
cessidade de se manter um alto fluxo urinário, durante o teste, fazem do clearance da uréia um teste menos preciso, subestimando a função renal. Cabe ressaltar que na maior parte da literatura nefrológica em língua inglesa utiliza-se o nitrogênio uréico do sangue (BUN) em vez da uréia. Para utilizar apropriadamente os dados, é necessário realizar a conversão numérica abaixo:
MÉDIA DOS CLEARANCES DE CREATININA E URÉIA. Como o clearance de creatinina superestima e o de uréia subestima a filtração glomerular (os desvios para mais e para menos seriam de magnitude comparável), alguns investigadores sugerem que a média dos dois clearances seria uma estimativa razoável da filtração glomerular, pelo menos em pacientes com creatinina plasmática acima de 4 mg/100 ml.18,26,31
CISTATINA C PLASMÁTICA. Como existem variações na produção e secreção de creatinina, têm sido estudadas outras substâncias endógenas que pudessem fornecer uma avaliação mais precisa da TFG. Uma substância que apresenta esse potencial é a cistatina C plasmática, que é uma proteína de baixo peso molecular, produzida numa taxa constante pelas células nucleadas e que não sofre modificações com a dieta ou presença de inflamações. Além disso, a concentração plasmática de cistatina C independe de sexo, idade ou massa muscular. Aparentemente os níveis plasmáticos de cistatina C se correlacionam melhor com a TFG do que a creatinina. Estudos recentes, utilizando o 125iodo-iotalamato para medir a TFG, demonstram que os níveis plasmáticos de cistatina C começam a
capítulo 16
se elevar com TFGs mais altas, enquanto os de creatinina se elevam a partir de TFGs mais baixas (88 ml/min/1,73 m2 e 75 ml/min/1,73 m2, respectivamente). Isto permitiria detectar pequenas modificações da função renal mais precocemente do que com a tradicional dosagem dos níveis de creatinina.12,18,32 Em indivíduos idosos com creatinina aparentemente normal, a cistatina C também parece ser um melhor marcador de disfunção renal.33 INULINA. Por muito tempo a inulina foi considerada como o marcador exógeno padrão para a determinação da TFG. O alto custo e a dificuldade técnica tornaram a inulina um marcador pouco utilizado na rotina. A inulina é um polímero da frutose, de baixo peso molecular (5.200 daltons), encontrado em alguns vegetais. É uma substância que reúne as características de um marcador ideal da TFG, pois não se liga às proteínas, distribuise no espaço extracelular, é filtrada pelo glomérulo e não é reabsorvida ou secretada pelos túbulos renais. Além de cateterizar a bexiga, é necessário administrar uma quantidade de água por via oral antes e durante o teste, e, a seguir, iniciar a infusão constante de inulina. Amostras seriadas de sangue e urina são colhidas.12 RADIOISÓTOPOS E MEIOS DE CONTRASTE. A TFG pode ser medida com segurança e precisão também após a injeção endovenosa de um marcador radioisotópico. A quantidade de radiação recebida pelos pacientes durante este tipo de avaliação da TFG é inferior à recebida na maior parte dos procedimentos radiológicos comuns. Porém, são métodos mais caros e de acesso limitado. Os marcadores que podem ser utilizados são: o 51Cr-EDTA (ácido etileno-diamino-tetraacético marcado com 51cromo), o I-iotalamato e o 99Tc-DTPA (ácido dietileno-triaminopentaacético ligado ao tecnécio marcado). Após a injeção endovenosa, amostras de sangue venoso são colhidas para medir o clearance.12 O 51Cr-EDTA tem moléculas de baixo peso molecular e pequena ligação com proteínas, sendo filtradas livremente pelos glomérulos. Estudos em seres humanos demonstraram que o clearance do 51Cr-EDTA é cerca de 10% mais baixo que o da inulina, quando ambos são medidos simultaneamente.12 O I-iotalamato é um composto utilizado como radiocontraste. Também tem baixo peso molecular e clearance semelhante ao da inulina. O clearance de I-iotalamato é considerado uma maneira segura de avaliar a TFG.12 Além da valiação da TFG, a cintilografia com o 99TcDTPA fornece informações sobre fluxo sanguíneo renal, captação renal e excreção. Em casos de suspeita de obstrução, é possível complementar o exame com a administração intravenosa de um diurético de alça, acompanhando a curva de eliminação do radioisótopo. Na suspeita de estenose de artéria renal, a complementação é feita com a administração de captopril. Já o 99Tc-DMSA (ácido dimercapto-succínico) é utilizado para avaliar a superfície dos rins e detectar cicatrizes renais corticais.
285
Mais recentemente, tem sido utilizado o ioexol para a medida da TFG, evitando o uso de radioisótopos. O ioexol é um meio de contraste de baixa osmolalidade e propriedades não-iônicas, portanto, de baixa toxicidade, mas que não pode ser utilizado em pacientes alérgicos ao iodo. Aparentemente, é um bom método para a medida de TFGs reduzidas, permitindo a determinação da função renal residual de pacientes em diálise.12 Para a avaliação do clearance pelos métodos do ioexol e I-iotalamato é necessária a cromatografia líquida de alta eficiência, que é de alto custo.
Ponto-chave: • Os métodos mais comumente utilizados no dia-a-dia para avaliação da função glomerular são: creatinina e uréia plasmáticas e clearance de creatinina e uréia Avaliação da Função Tubular Considerando as múltiplas funções dos túbulos renais, é difícil de se conseguir um único teste capaz de avaliar a função tubular, especialmente se considerarmos que as funções dos segmentos proximais do nefro diferem das funções dos segmentos distais. Os testes que avaliam predominantemente a função tubular são: densidade e osmolalidade urinárias (já mencionados em urinálise), testes de concentração e diluição da urina, teste de acidificação urinária, excreção urinária de eletrólitos e secreção de algumas substâncias, como veremos a seguir. CONCENTRAÇÃO URINÁRIA. Os detalhes do mecanismo renal de concentração e diluição da urina já foram expostos nos Caps. 6 e 9. Na prática, a concentração máxima de urina é obtida após um período determinado de restrição líquida. Em indivíduos normais, são necessárias pelo menos 12 horas de restrição líquida para que se alcance 90% ou mais da concentração urinária máxima. Uma pessoa adulta pode concentrar sua urina até quatro vezes a osmolalidade do plasma (em torno de 1.200-1.400 mOsm/kg/H2O). A tonicidade urinária é habitualmente avaliada por dois métodos: o primeiro é a determinação da osmolalidade pela verificação do ponto de congelamento da urina com o osmômetro, que infelizmente não está disponível em todos os laboratórios. O segundo é a determinação da densidade urinária, que, pela simplicidade de sua determinação (com um urodensímetro ou tiras reativas), é o teste mais comumente usado na prática. Tanto a densidade como a osmolalidade urinária dependem da quantidade de água excretada com os solutos na urina. A densidade urinária representa apenas um resultado aproximado em relação à osmolalidade (Fig. 16.1) e depende do número e da natureza das partículas em solução. Partículas maiores e mais densas, como a glicose e a
286
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
mões. Mas mesmo com esta participação rápida do pulmão, ainda resta um excesso de H na circulação e um bicarbonato plasmático reduzido. Caberá ao rim eliminar o excesso de hidrogênio e restaurar o bicarbonato plasmático. Normalmente, o rim restaura o bicarbonato plasmático, resgatando, no túbulo proximal, quase todo o bicarbonato filtrado. Este resgate se faz de forma indireta. O HCO3 combina-se na luz tubular com o H, formando H2CO3, o qual origina CO2 e água. A difusão do CO2 para dentro da célula e a sua combinação com H2O origina H HCO3. O bicarbonato assim formado retorna à circulação. Este H que se combinou com o bicarbonato chega à luz tubular através de um processo de troca com o Na (Fig. 16.8). No nefro distal, o H é secretado e tamponado na luz tubular por tampões filtrados, como o fosfato (HPO4), ou tamponado pela amônia (NH 3), formando o amônio (NH4). Cada H excretado desta forma origina HCO3 em quantidades eqüimolares (Fig. 16.8). Há aqui, portanto, formação de novo bicarbonato, o qual, na circulação, irá restaurar o bicarbonato plasmático reduzido. Pode-se calcular esta quantidade de H excretado com os tampões, tipo fosfato. Basta titular-se a urina final, desde o seu pH ácido até o pH do sangue, ou seja, 7,4. A quantidade de substância alcalina necessária para chegar ao pH 7,4 é igual à quantidade de H excretada, e a isto costuma-se denominar acidez titulável. Quando o bicarbonato plasmático é reduzido, menos HCO3 chega ao túbulo proximal e logo menos H se combina com o HCO3, porém mais H será excretado através de combinações com HPO4 e NH3. Quando a concentração plasmática de HCO3 aumenta, a excreção de H diminui e a de bicarbonato aumenta. Portanto, fica claro que, se quisermos avaliar a capacidade renal de excretar H, devemos reduzir o bicarbonato plasmático.
HCO3 RESGATADO
NOVO HCO3
TÚBULO PROXIMAL
TÚBULO DISTAL CO2 H2O
CO2 H2O C.A. H2CO3
H
H2CO3 NH3
HCO3
H Na HCO 3
Na
H
H 3 NH = H O4 HP
4
PO H2 4
HPO4=
HCO3
NH
HCO3
Na
=
HPO4
O CO2 H2
proteína, e alguns contrastes radiológicos aumentam a densidade urinária. Um aumento de 10 g de proteínas por litro de urina aumenta a densidade em 0,003; 0,01 g/dl de glicose aumenta a densidade em 0,004.35 A osmolalidade urinária é uma determinação mais precisa da capacidade de concentração urinária e reflete apenas o número de partículas ou íons osmoticamente ativos e capazes de dissociação iônica por unidade de solvente. Não é necessário fazer correções da osmolalidade pela presença de glicosúria ou proteinúria. Valores de densidade na primeira urina da manhã iguais ou superiores a 1,023 demonstram que o mecanismo de concentração é apropriado. Valores abaixo de 1,023 exigem melhor avaliação, com restrição de líquido e eventualmente administração de um análogo do HAD, como a desmopressina.35 DILUIÇÃO DA URINA. A capacidade de diluir a urina e eliminar grandes quantidades de água também é uma prova de função renal. Após a administração de 1.000-1.500 ml de água durante aproximadamente 30 minutos, indivíduos normais são capazes de excretar mais da metade deste volume em três horas, e a densidade urinária de pelo menos uma das amostras cai para 1,003 ou menos (correspondendo a 80 mOsm/kg ou menos). A capacidade de concentração da urina pode estar alterada na fase inicial de uma nefropatia, muito antes de a concentração plasmática de creatinina ou uréia indicar qualquer disfunção. Portanto, é um teste sensível. No entanto, alguns fatores fisiológicos são capazes de alterar esta capacidade de concentração (v. Caps. 6 e 9), como a excreção de soluto, fluxo sanguíneo medular, ingesta protéica etc. A alteração da concentração urinária pode ser detectada em várias nefropatias, o que reflete a inespecificidade do método. A avaliação da capacidade de diluição tem menor aplicação clínica, pois está alterada em diversas enfermidades não-renais, como hepatopatias, insuficiência cardíaca ou adrenal etc., e devido ao risco de intoxicação aquosa nos nefropatas. PROVA DE ACIDIFICAÇÃO URINÁRIA. Os mecanismos de acidificação da urina já foram abordados com detalhes nos Cap. 5 e 11. Em condições normais, a ingesta diária resulta numa produção de ácido em torno de 50 mEq/dia (íon H). Tanto as células como o líquido extracelular dispõem de sistemas-tampões capazes de minimizar as variações no pH sanguíneo. Um dos principais sistemas-tampão no plasma é o sistema ácido carbônico-bicarbonato. Quando o HCO3 se combina com o H livre, há a formação de CO2, que, por ser volátil, é rapidamente eliminado da circulação pelos pulmões: H HCO3 ↔ H2CO3 ↔ H2O CO2 Portanto, caso se adicione H ao organismo, esta reação se desvia para a direita, havendo redução do bicarbonato plasmático (consumido no tamponamento do H) e aumento na produção de CO2, que é eliminado pelos pul-
HPO4
Fig. 16.8 Resgate do bicarbonato filtrado e regeneração do novo bicarbonato. (Baseado em Papper, S.43)
capítulo 16
Na prática, para se avaliar a capacidade renal de excreção de ácido, dispomos de provas de acidificação. Observa-se o comportamento do rim (a sua capacidade de reduzir o pH urinário e aumentar a acidez titulável e a excreção de NH4) face à ingestão de uma carga de ácido. Uma das provas mais utilizadas é a prova de Wrong e Davies, que avalia a resposta renal frente a uma única dose de cloreto de amônio (0,1 g/kg). Entre três e oito horas após a ingestão do ácido, determina-se o pH urinário, acidez titulável e excreção de NH4. A prova, quando comparada aos demais testes descritos na literatura, tem as seguintes vantagens: é realizada durante um curto período (oito horas), não há necessidade de hospitalização ou restrição dietética e a dose de cloreto de amônio administrado é menor, reduzindo o risco de acidose grave.37 Wrong e Davies mostraram que, após a ingestão do ácido, os pacientes reduzem o pH urinário para 4,49-5,24. A prova mostra que a capacidade do rim em reduzir o pH urinário e a sua capacidade em excretar NH4 estão independentemente comprometidas por diferentes formas de nefropatias. Por exemplo, na insuficiência renal crônica (filtração glomerular baixa), o rim consegue excretar uma urina ácida, mas a excreção de ácido titulável está reduzida (devido à redução na excreção do tampão fosfato), e a excreção de NH4 está reduzida ainda mais. No Quadro 16.3 mostramos os resultados da prova de acidificação realizada num paciente com insuficiência renal crônica, comparados com um indivíduo normal. A análise baseia-se nos comentários de Malnic e Marcondes.38 No nefropata crônico, antes da carga de ácido, a excreção de H se fazia predominantemente sob a forma de acidez titulável (16,83 mEq/min) e muito pouco era excretado como NH4 (4,77 mEq/min). Por outro lado, no indivíduo normal, a quantidade de H eliminada com NH4 (27,61 mEq/min) era maior que a excretada como acidez titulável (19,92 mEq/min). Após a carga ácida, o indivíduo normal aumenta a excreção de H principalmente como NH4. Já o nefropata crônico não eleva a excreção de NH4, e o aumento da acidez titulável é discreto. Testes mais prolongados do que esta prova de oito horas são mais úteis para se demonstrar a anormalidade na excreção de NH4, porque a produção enzimática de NH3
Quadro 16.3 Prova de acidificação renal em indivíduo normal e nefropata crônico Normal
pH urinário Acidez titulável NH4
Nefropatia
Antes
Depois
Antes
Depois
6,20 19,92 27,61
4,75 41,74 95,82
5,90 16,83 4,77
5,20 21,33 4,02
Modificado de Helga M. Cruz. Tese de Doutoramento FMUSP, 1963. Citado por Malnic, G. e Marcondes, M.38
287
aumenta com a duração do estímulo ácido. A grande utilidade desta prova curta está na avaliação da capacidade do indivíduo em reduzir o pH urinário, uma anormalidade detectável na acidose tubular renal. Nesta doença, há um defeito na acidificação da urina, sem ou com mínima redução da massa renal quando determinada pela filtração glomerular. A síndrome clínica do distúrbio na acidificação da urina é caracterizada por não-retenção ou discreta retenção sanguínea de substâncias nitrogenadas, acidose hiperclorêmica, pH urinário inapropriadamente elevado, bicarbonatúria e excreção reduzida de acidez titulável e NH4 (v. Cap. 29). EXCREÇÃO DE ELETRÓLITOS. A excreção urinária de alguns eletrólitos nas 24 horas (ou em amostra de urina) pode ser utilizada como teste de avaliação de funções tubulares. Normalmente, os mecanismos de reabsorção do sódio filtrado são muito eficientes. Quando há dano renal parenquimatoso bilateral (agudo ou crônico), a capacidade de reabsorção tubular de sódio diminui, e a concentração urinária de sódio aumenta. Por outro lado, uma urina com baixo teor de sódio (inferior a 20 mEq/L) demonstra que os mecanismos de reabsorção tubular deste íon estão íntegros. Isto é o que ocorre, por exemplo, na insuficiência renal aguda do tipo pré-renal.36 Outra forma de avaliar esta capacidade funcional tubular é através do cálculo da fração excretada (FE) de uma substância; com a fórmula abaixo, calcula-se a FE do sódio (percentagem de sódio excretado em relação ao sódio filtrado):
Onde: FENa: Fração excretada de sódio (%) NaUr: Concentração urinária de sódio (mEq/L) NaPl: Concentração plasmática de sódio (mEq/L) CrPl: Concentração plasmática de creatinina (mEq/L) CrUr: Concentração urinária de creatinina (mEq/L) Valores de FENa abaixo de 1% indicam insuficiência renal do tipo pré-renal, e valores acima de 2% são indicativos de necrose tubular aguda.36 Uma dificuldade a ser considerada na avaliação da concentração urinária de sódio e FENa é o fato de que a administração de diuréticos, solução salina ou drogas vasoativas modifica o padrão de excreção de eletrólitos. Por este motivo, é necessária cautela na interpretação dos resultados.36 A FE de vários eletrólitos (potássio, magnésio, fósforo, bicarbonato) pode ser calculada com esta fórmula, substituindo o sódio pelo eletrólito a ser estudado. EXCREÇÃO DE OUTRAS SUBSTÂNCIAS. A presença na urina de quantidades elevadas de substâncias livremente filtradas pelos glomérulos, e que normalmente são reabsorvidas nos túbulos renais, pode indicar lesão tubular proximal, já que nos túbulos distais não ocorre reabsorção de proteínas ou aminoácidos. Entre as substâncias que
288
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
podem ser dosadas para evidenciar disfunções tubulares, podemos mencionar: alfa-1-microglobulina, beta-2-microglobulina, aminoácidos, proteína ligadora do retinol (RBP — retinol binding protein).3,36 Uma outra substância, a N-acetil-beta-glicosaminidase (NAG) é uma enzima de alto peso molecular que não é filtrada por glomérulos íntegros e que se origina principalmente no túbulo proximal. A excreção de NAG aumenta na lesão tubular, em situações como a nefrite intersticial, nefrotoxicidade por drogas e rejeição de transplantes renais. É útil para o diagnóstico de lesões tubulares, com glomérulos normais. No caso de nefrotoxicidade por drogas, a excreção de NAG na urina pode estar elevada antes mesmo do aparecimento de beta-2-microglobulina na urina.3
Pontos-chave: • A função tubular renal é avaliada pelas capacidades de concentração, diluição e acidificação urinária • Além disso, a fração excretada (FE) de vários eletrólitos e a excreção de outras substâncias podem demonstrar outros aspectos da função tubular
Biópsia Renal A biópsia renal é uma contribuição de importância extraordinária na avaliação das nefropatias. Não deve ser encarada como exame diagnóstico definitivo, mas como um exame complementar capaz de auxiliar o nefrologista no diagnóstico final. Na verdade, poucas são as enfermidades que apresentam um aspecto histológico renal característico. Este fato deve ser salientado, face à frustração de muitos nefrologistas quando o patologista não indica o diagnóstico da enfermidade. Sem dúvida, cabe ao patologista descrever os achados histoimunológicos, mas caberá ao nefrologista associar estes achados à clínica e assim formular o diagnóstico mais provável.
INDICAÇÕES A biópsia renal é, hoje em dia, utilizada sempre que se faz necessário elucidar a natureza e a magnitude de lesões renais, assim como na orientação do nefrologista para a terapêutica e o prognóstico da enfermidade renal. Biópsias seriadas podem caracterizar a história natural da nefropatia. Striker e colaboradores categorizaram as nefropatias de acordo com a utilidade clínica da biópsia renal39 (v. Quadro 16.4). Quando se tem uma idéia acurada da natureza das lesões renais e da evolução da doença (p. ex., na glomerulonefrite aguda pós-estreptocócica), não há necessidade de
Quadro 16.4 Indicações para biópsia renal Muito útil 1. Síndrome nefrótica 2. Colagenoses (p. ex., lúpus eritematoso disseminado) 3. Doença túbulo-intersticial de início agudo 4. Proteinúria de origem desconhecida 5. Hematúria de origem desconhecida 6. Transplante renal 7. Pesquisa Provavelmente útil 1. Glomerulopatia de início agudo, com ou sem progressão rápida 2. Doença túbulo-intersticial de progressão lenta Possivelmente útil 1. Doença vascular de início agudo 2. Nefropatia da gravidez 3. Nefropatia gotosa 4. Nefropatia diabética Inútil 1. Fase final de nefropatia 2. Lesão policística 3. Nefropatia infecciosa 4. Síndrome hepatorrenal Obtido de Striker, G.E. et al.39
se efetuar uma biópsia renal, a não ser que a evolução não seja a esperada e haja suspeita de lesão renal mais grave, implicando uma conduta terapêutica diversa. Em outras circunstâncias, a investigação laboratorial não acusa nenhuma anormalidade renal. Por exemplo, no lúpus eritematoso disseminado, devido à freqüente associação com doença renal e importância de seu reconhecimento precoce, têm sido biopsiados pacientes sem evidência clínica de nefropatia. Nestes pacientes, é possível detectar alterações na microscopia óptica, imunofluorescência ou microscopia eletrônica. De modo geral, a biópsia está indicada nas seguintes situações: síndrome nefrótica, lúpus eritematoso sistêmico, glomerulonefrite rapidamente progressiva, disfunção de rim transplantado, nefrite intersticial aguda, doença renal ateroembólica. Normalmente não se biopsiam pacientes com nefropatia diabética. Porém, é indicada a biópsia renal naqueles pacientes diabéticos que apresentem proteinúria maciça apesar de terem diagnóstico de diabetes há pouco tempo, e naqueles em que não há outros sinais de doença microvascular, o que leva à suspeita de outra doença glomerular associada.
CONTRA-INDICAÇÕES Basicamente, procura-se evitar a biópsia quando há apenas um rim, um distúrbio da coagulação sanguínea (contra-indicação absoluta) ou hipertensão arterial grave. Estas duas últimas situações clínicas aumentam o risco de sangramento renal pós-biópsia. Entretanto, nos últimos
289
capítulo 16
anos, a experiência obtida com biópsia de rim transplantado (rim único) tem permitido a biópsia de rim único primitivo com mais segurança. Por outro lado, rins pequenos, contraídos, raramente são biopsiados. Nestes casos, o aspecto histológico invariavelmente demonstra graus variados de esclerose, sem que se possa discernir a enfermidade básica. Este é o aspecto geralmente encontrado nas fases terminais da insuficiência renal crônica, independente do agente causador. Outras contra-indicações relativas associadas a uma maior morbidade pós-biópsia são: tumores renais, grandes cistos renais, hidronefrose, abscessos perinefréticos e um grau avançado de uremia.
PREPARO DO PACIENTE E MATERIAL NECESSÁRIO Inicialmente, faz-se um estudo da coagulação sanguínea (tempo de coagulação e sangramento, tempo de atividade da protrombina e contagem de plaquetas). No passado obtinha-se uma radiografia simples do abdômen, após o devido preparo intestinal. Esta radiografia permitia saber se havia um ou dois rins e fornecia a localização dos mesmos (Fig. 16.9). Hoje em dia, com a ultra-sonografia, é um exame dispensável (v. Cap. 17). O paciente poderá ser biopsiado no próprio quarto, em uma sala de pequena cirurgia ou no próprio setor de ultrasonografia. Caso haja necessidade de anestesia geral (eventualmente em crianças), a biópsia será realizada no centro cirúrgico. É necessária uma agulha especial para se retirar um fragmento do rim. No passado, utilizava-se a agulha de Franklin-Silverman. Posteriormente, surgiram agulhas descartáveis do tipo Trucut, e mais recentemente as agulhas acopladas a um dispositivo tipo “pistola”. A agulha de biópsia e os outros materiais necessários (campos esterilizados, seringa, agulhas, lâmina de bisturi, pinça de as-
Fig. 16.9 Tomografia renal. Os contornos renais estão delineados por uma linha pontilhada.
sepsia e gaze) são acondicionados numa bandeja e levados para o local onde a biópsia será realizada, juntamente com o aparelho portátil de ecografia.
TÉCNICA DA BIÓPSIA RENAL PERCUTÂNEA Geralmente não há necessidade de uma sedação prévia, a não ser nos pacientes adultos mais apreensivos. Em crianças, geralmente abaixo dos 12 anos, haverá necessidade de sedação com midazolam e cetamina EV. O paciente é colocado em decúbito ventral com um coxim sob o abdômen, procurando-se assim corrigir a lordose lombar (Fig. 16.10). Com o auxílio da ecografia, escolhe-se o rim a ser biopsiado (geralmente o esquerdo). Naturalmente, escolhese o rim cujos contornos estejam melhor delineados. Para pessoas destras, é mais confortável biopsiar o rim esquerdo. Somente na presença de esplenomegalia dá-se preferência ao rim direito. A seguir, é feita a assepsia da pele e colocam-se os campos esterilizados, delimitando-se a área de punção. Feita a anestesia local no ponto escolhido ecograficamente para a introdução da agulha, faz-se uma pequena incisão da pele, paralela à linha das apófises espinhosas, o que permitirá uma livre movimentação da agulha com a respiração. Estando a agulha de biópsia localizada no tecido renal (sob visão ecográfica ou pela movimentação com a respiração), dispara-se o mecanismo da pistola ou se procede aos movimentos manuais para obtenção do fragmento de tecido. Em nosso Serviço, após a obtenção dos fragmentos, estes são observados ao microscópio óptico (100), para termos certeza da presença de glomérulos nas amostras obtidas. Os fragmentos são então colocados em líquido de Bouin por 2 a 4 horas e posteriormente transferidos para formalina tamponada (para a microscopia óptica). Para a imunofluorescência, o fragmento é colocado em solução de Michel (se vai ser transportado para locais distantes, estável por 3-5 dias), ou mantido em soro fisiológico gelado, e depois congelado até o processamento (se enviado para o
Fig. 16.10 Correção da lordose através de coxim.
290
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
Serviço de Patologia local). Se houver necessidade e dependendo da rotina do Serviço, um fragmento é colocado em glutaraldeído a 2,5%, para microscopia eletrônica. Até algum tempo atrás, o paciente era mantido em repouso absoluto por 24 horas, sendo a pressão arterial e pulso controlados seguidamente. Observava-se o aspecto da urina emitida após a biópsia, durante as próximas 24 horas. A finalidade era detectar hematúria macroscópica. Hoje em dia já é possível sermos mais liberais e fazermos a biópsia renal em caráter ambulatorial. Recentemente Marwah e cols. estudaram o momento em que as complicações pós-biópsia ocorrem e o período ideal de observação. Em todos os casos (98%), as complicações foram aparentes em 24 horas. De uma maneira geral, as complicações foram identificadas em períodos inferiores a 12, 8 e 4 horas, em 95%, 82% e 50% dos pacientes, respectivamente. Complicações menores foram identificadas em 12 horas ou menos em 100% dos pacientes. Portanto, observação por 24 h é o ideal.40
COMPLICAÇÕES Durante o procedimento, pode haver uma queda da pressão arterial, com sudorese e vômitos, decorrente do estado emocional, e/ou dor intensa. A complicação mais freqüente é a hematúria microscópica, que ocorre em praticamente todos os pacientes; hematúria macroscópica ocorre em cerca de 10%. A hematúria geralmente se resolve em 48-72 horas,12 seguindo-se o hematoma perirrenal e a fístula arteriovenosa intra-renal (15-18%). Muito menos freqüentes são: sangramento renal exigindo transfusão sanguínea (0,1-3% dos pacientes) ou cirurgia (0,3%), obstrução do fluxo urinário por coágulo, infecção, laceração de vísceras. A mortalidade é muito baixa (0,12% em 14.492 biópsias).12
Pontos-Chave: • Conhecer a natureza de uma doença renal pela biópsia permite considerar adequadamente o prognóstico e melhor manejo terapêutico • A biópsia renal pode ser realizada à beira do leito, com anestesia local, sendo um procedimento com baixo índice de complicações
Radioisótopos e o Rim Os procedimentos de investigação com radioisótopos têm como principais vantagens a rapidez, a precisão, o fato de não serem invasivos e utilizarem uma dose baixa de radiação (v. Cap. 20). A contribuição dos radioisótopos no estudo da fisiologia e fisiopatologia renal tem sido extraordinária. Estes métodos permitem uma avaliação geral da
integridade do sistema urinário (v. Cap. 19) e podem ser utilizados em determinações de filtração glomerular, fluxo sanguíneo renal e fluxo plasmático renal efetivo e também na avaliação da morfologia renal, investigação da uropatia obstrutiva, inclusive possibilitando a determinação do volume urinário residual pós-miccional, assim como na detecção de refluxo vésico-ureteral e avaliação do rim transplantado.
COMO DIAGNOSTICAR UMA NEFROPATIA? No início deste capítulo frisamos que o processo diagnóstico em medicina se baseia nos seguintes elementos: dados subjetivos (dados de história do paciente), dados objetivos (obtidos no exame físico) e dados fornecidos pelos exames complementares. Nas páginas precedentes, abordamos detalhadamente as principais queixas urinárias que um paciente pode apresentar, os sinais que podem ser detectados ao exame físico e os principais exames laboratoriais utilizados para avaliação da função renal. Determinados sintomas e sinais discutidos são comuns a várias enfermidades que podem acometer o trato urinário. O processo diagnóstico se torna mais fácil quando, através do agrupamento destes sintomas, sinais e anormalidades laboratoriais, algumas síndromes nefrológicas são reconhecidas. Inicialmente, Black enumerou oito síndromes que indicavam a existência de uma nefropatia. Posteriormente, Coe modificou um pouco a conceituação dessas síndromes e incluiu mais duas, perfazendo então um total de dez síndromes nefrológicas41,42 (Quadro 16.5). Portanto, o primeiro passo no processo diagnóstico é a identificação de um grupo sindrômico. Vejamos a seguir quais são as características essenciais de cada síndrome e quais hipóteses podem surgir de seu reconhecimento.
Insuficiência Renal Aguda (IRA) Costumamos suspeitar de IRA, quando existe redução abrupta da função renal, caracterizada por anúria ou oligúria. No entanto, é oportuno lembrar que pode haver IRA com poliúria (v. Cap. 21). Algumas vezes é difícil a diferenciação entre insuficiência renal aguda e crônica, e somente uma redução rápida da creatinina sérica ou do ritmo de filtração glomerular pode nos indicar o caráter agudo do processo. Os elementos diagnósticos de uma IRA podem ser assim resumidos: redução abrupta do volume urinário, retenção de uréia e creatinina, tendência à hipercalemia e acidose metabólica, expansão do volume extracelular e conseqüente tendência à hipertensão arterial e sobrecarga cardíaca. O exame do sedimento urinário também pode ser útil. Quando ocorre necrose tubular aguda, caracteristicamente observam-se cilindros granulares escuros e células
291
capítulo 16
Quadro 16.5 Principais síndromes em nefrologia Insuficiência renal aguda Insuficiência renal crônica Síndrome nefrítica aguda Síndrome nefrótica Anormalidades urinárias assintomáticas Infecção urinária Obstrução do trato urinário Síndromes tubulares renais Hipertensão arterial Nefrolitíase
epiteliais livres ou inclusas em cilindros. Na IRA funcional, podem estar presentes cilindros hialinos ou finamente granulosos. A ausência de elementos formados na urina pode alertar para uma obstrução.
Insuficiência Renal Crônica (IRC) Ao contrário da IRA, na IRC a redução na função renal é um processo lento, permitindo ao organismo lançar mão de mecanismos de adaptação. Isto explica o fato de que é possível encontrar pacientes com IRC avançada completamente assintomáticos, sendo o diagnóstico realizado devido a uma intercorrência, como infecção ou trauma. Outras vezes a intercorrência precipita um agravamento abrupto na função renal residual (agudização da IRC), tornando o paciente sintomático. Exemplo: redução do volume extracelular devido a vômitos e diarréia. Naturalmente, os sintomas de uma IRC dependem da doença básica, dos hábitos alimentares e do grau de redução da função renal. A retenção nitrogenada pode causar uremia, sendo esta responsável pela presença de anorexia, náuseas e vômitos. Há palidez amarelada da pele, decorrente da anemia e retenção de urocromos. O volume urinário é variável, podendo até haver poliúria, sendo a urina de cor clara, com uma densidade baixa: 1,003-1,005. Edema, hipertensão arterial e insuficiência cardíaca podem coexistir, refletindo um distúrbio no metabolismo do sódio. A presença de rins pequenos e contraídos ao ultra-som e os sinais de osteodistrofia renal são elementos indicativos da cronicidade do processo (v. Cap. 37).
Síndrome Nefrítica Aguda O quadro clássico é facilmente diagnosticável por hematúria macroscópica, edema, hipertensão arterial e moderada retenção nitrogenada. Estes elementos refletem um processo inflamatório do nefro. A hematúria por si só não é indicativa da localização do processo inflamatório, pois pode originar-se de qualquer parte do trato urinário. No entanto, na presença de dismorfismo eritrocitário ou cilindros hemáticos, não resta dúvida de que o processo infla-
matório se localiza no nefro. O exemplo clássico da síndrome nefrítica aguda é a glomerulonefrite difusa aguda pósestreptocócica (Cap. 22).
Síndrome Nefrótica Classicamente, refere-se à presença de proteinúria maciça (superior a 3,5 g/1,73 m2/dia), acompanhada de hipoalbuminemia, hiperlipidemia e edema. Hoje em dia aceita-se o diagnóstico de síndrome nefrótica quando houver proteinúria maciça, mesmo que não haja hipoalbuminemia, hiperlipidemia e edema, e desde que a proteína na urina seja principalmente albumina. Esta última ressalva é feita porque em discrasias de células plasmáticas (mieloma múltiplo), mesmo sem comprometimento renal, globulinas anormais podem aparecer na urina, porque são pequenas e podem atravessar um glomérulo normal. Geralmente não há hipertensão arterial e tampouco retenção nitrogenada. A presença de hipertensão arterial pode refletir uma lesão renal grave ou ser secundária ao uso de drogas, como os corticosteróides. Moderada retenção nitrogenada pode ser observada em decorrência de uma diminuição da perfusão renal, resultado de uma diminuição do volume circulante efetivo causado pela hipoalbuminemia (Cap. 22).
Anormalidades Urinárias Assintomáticas Proteinúria, hematúria ou piúria podem ser consideradas anormalidades assintomáticas, desde que não estejam associadas a uma síndrome nefrítica, nefrótica, infecção urinária etc. Geralmente uma proteinúria superior a 1 grama/dia indica um envolvimento glomerular. Proteinúria inferior a 1 grama/dia sugere nefrite intersticial (pielonefrite), nefroesclerose, hipercalcemia, tumor etc. Proteinúria intensa exige uma biópsia renal para complementar a investigação. Uma proteinúria moderada (1 a 3 gramas/ dia), especialmente se assintomática, poderá ser observada clinicamente, sem que se faça uma biópsia renal. Hematúria não-glomerular isolada requer investigação urológica, para localização da origem do sangramento. Habitualmente, tumores, cálculos ou mesmo lesões de tuberculose podem ser responsáveis por hematúria assintomática não-glomerular. A associação de hematúria dismórfica e proteinúria superior a 1 grama/dia sugere uma lesão glomerular. Uma biópsia renal poderá, então, mostrar glomerulonefrite focal proliferativa, proliferação mesangial difusa ou uma lesão mínima inespecífica.
Infecção Urinária É uma das síndromes mais comuns encontradas na prática nefrológica. A presença de dor lombar, febre, disúria e polaciúria é indicativa de uma infecção renal. A presença
292
Avaliação Clínica e Laboratorial da Função Renal
apenas de sintomas de irritação vesical (disúria, polaciúria) e a ausência de febre e dor lombar refletem geralmente uma infecção baixa (vesical) do trato urinário. Os critérios para diagnóstico de uma infecção urinária já estão atualmente bem estabelecidos: presença de mais de 100.000 colônias de bactérias por ml de urina. Em mulheres com disúria, mesmo 100 colônias/ml podem indicar infecção. O sedimento urinário usualmente apresenta numerosos leucócitos ou piócitos e bacteriúria, sendo este diagnóstico facilitado com os dados obtidos pelas tiras reagentes (Cap. 25).
a 140 mm Hg ou de uma pressão diastólica acima de 90 mm Hg. A hipertensão arterial pode ser tanto decorrente de uma nefropatia primária, como pode causar uma nefropatia secundária. A investigação inicial procura encontrar causas potencialmente curáveis: estenose de artéria renal, feocromocitoma, ou excesso de mineralocorticóide. Quando uma causa curável não é encontrada, o que ocorre em 95% dos casos, institui-se uma terapêutica médica farmacológica e não-farmacológica a longo prazo (v. Caps. 29 e 41 a 43).
Obstrução do Trato Urinário
Nefrolitíase
O aparecimento abrupto de anúria requer sempre a exclusão de uma obstrução do trato urinário. É uma das considerações no diagnóstico diferencial de insuficiência renal aguda. As obstruções unilaterais do trato urinário, freqüentemente por cálculos, costumam apresentar-se de uma maneira dramática, com dor lombar tipo cólica, bastante intensa, mas de prognóstico bom na maioria das vezes. As obstruções de aparecimento mais insidioso podem comprometer a parte alta ou baixa do trato urinário. Na obstrução alta, o aparecimento de insuficiência renal crônica implica um comprometimento bilateral do trato urinário, como se verifica numa fibrose retroperitoneal ou por tumores retroperitoneais. O diagnóstico é estabelecido através de ultra-som e urografia excretora, demonstrando dilatação do sistema coletor acima da obstrução, ou através de pielografia retrógrada. Uma obstrução baixa do trato urinário é habitualmente secundária a hipertrofia prostática, manifesta através de resíduo pósmiccional, diminuição do jato urinário etc. (Cap. 34).
É bastante freqüente o quadro de cólica nefrética secundária a um cálculo que obstrui o sistema coletor de urina. As causas de urolitíase são múltiplas (Cap. 33) e vão desde estados hipercalcêmicos (como hiperparatireoidismo primário), estados hipercalciúricos (como hipercalciúria idiopática), hiperuricosúria, cistinúria, até processos inflamatórios do intestino. Uma vez reconhecida a síndrome, procede-se à avaliação funcional e identificação específica da enfermidade.
Ponto-chave: • A análise dos dados da história clínica, exame físico e exames complementares possibilita a identificação das grandes síndromes nefrológicas, facilitando o diagnóstico de doenças específicas
Síndromes Renais Tubulares As anormalidades dos túbulos renais são classicamente divididas em anatômicas e funcionais. Anormalidades anatômicas referem-se às nefropatias císticas, rins policísticos, doença medular cística e rim espongiomedular. Geralmente, o diagnóstico é estabelecido através de urografia excretora, pielografia retrógrada ou arteriografia renal. As tubulopatias funcionais referem-se a anormalidades nos mecanismos de secreção ou reabsorção tubular ou a um comprometimento na concentração ou diluição urinária. Por exemplo, uma anormalidade na secreção de H pelo nefro distal (Cap. 30). Distúrbios no mecanismo de reabsorção podem causar hipouricemia, hipofosfatemia, aminoacidúria ou glicosúria. São estas manifestações, como acidose, glicosúria, poliúria ou anormalidades bioquímicas, que permitem o diagnóstico.
Hipertensão Arterial O diagnóstico baseia-se na observação, pelo menos por três vezes consecutivas, de uma pressão sistólica superior
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PORTO, C.C. Sistema urinário – Exame clínico. In: _____. Semiologia Médica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997. p. 667-670. 2. BATES, B. Análise dos sintomas — O aparelho urinário. In: _____. Propedêutica Médica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1998. p. 48-53. 3. FAIRLEY, K.F. Urinalysis. In: Johnson, R.J.; Feehaly, J. Comprehensive Clinical Nephrology. Mosby, 2000. p. 4.1-4.10. 4. American Diabetes Association. Diabetic Nephropathy. Diabetes Care, v. 25, supl. 1, p. s85-s89, jan. 2002. 5. SIMENHOFF, M.L. et al. Biochemical profile of uremic breath. N. Engl. J. Med., 297:132, 1977. 6. DANIEL III, C. R. et al. The half and half fingernail. A clue to chronic renal failure (Abstract). Clinical dialysis and transplant forum. National Kidney Foundation. New York, 1975. 7. National Institutes of Health. The Sixth Report of the Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure. National Institutes of Health publication. Nov. 1997. 8. AGARWALA, B.N.; BACHA, E.; CAO, Q.L. et al. Coarctation of the aorta. In: Rose, B.D. (Ed.) Up to Date, 2001. 9. MATALON, R. et al. Functional aortic insufficiency: a feature of renal failure. N. Engl. J. Med., 285:1.522, 1971. 10. BARRAT, L.J. et al. The diastolic murmur of renal failure. N. Engl. J. Med., 295:121, 1976. 11. POST, T.W.; ROSE, B.D. Urinalysis in the diagnosis of renal disease. In: Rose, B.D. (Ed.) Up to Date, 2001. 1.
capítulo 16
12.
13. 14. 15. 16.
17. 18. 19. 20. 21. 22.
23.
24.
25.
26. 27.
KASISKE, B.L.; KEANE, W.F. Laboratory assessment of renal disease: Clearance, urinalysis and renal biopsy. In: Brenner, B.; Rector, F. (eds). The Kidney. Saunders, 2000, p. 1129-1170. ARRAMBIDE, K. e TOTO, R.D. Tumor lysis syndrome. Sem. Nephrol, 13:273-280, 1993. ROSE, B.D. Evaluation of isolated proteinuria. In: Rose, B.D. (ed.) Up to Date, 2001. ROSE, B.D. Measurement of urinary protein excretion. In: Rose, B.D. (ed.) Up to Date, 2001. ROSE, B.D.; McCULLOCH, D.K. Microalbuminuria in diabetic nephropathy and as a risk factor for cardiovascular disease. In: Rose, B.D. (ed.) Up to Date, 2001. BURTON, J.R. e ROWE, J.W. Quantitation of casts in urine sediment. Ann. Int. Med., 83:518, 1975. POST, T.W.; ROSE, B.D. Assessment of renal function: plasma creatinine; BUN; and GFR. In: Rose, B.D. (ed.) Up to Date, 2001. ROSE, B.D. Drugs that elevate the plasma creatinine concentration. In: Rose, B.D. (ed.) Up to Date, 2001. KASSIRER. J.P. Clinical evaluation of kidney function-glomerular filtration. N. Engl. J. Med., 285:385, 1971. COCKCROFT, D.W. e GAULT, M.H. Prediction of creatinine clearance from serum creatinine. Nephron, 16:31, 1976. SINGER, M.A. Of mice and men and elephants: metabolic rate sets glomerular filtration rate. American Journal of Kidney Diseases, v. 37, n. 1, p. 164-178, jan. 2001. TURNER, S.T.; REILLY, S.L. Fallacy of indexing renal and systemic hemodynamic measurements for body surface area. Am. J. Physiol., v. 268, n. 4, part 2, p. 978-988, 1995. PACHALY, J.R.; BRITO, H.F.V. Interspecific allometric scaling. In: Fowler, M.E.; Cubas, Z.S. (eds). Biology, Medicine and Surgery of South American Wild Animals. Iowa State University Press, 2001, p. 475-481. FEINFELD, D.A.; KELLER, S.; SOMER, B. et al. Serum creatinine and blood urea nitrogen over a six-year period in the very old. Creatinine and BUN in the very old. Geriatric Nephrology and Urology, v. 8, n. 3, p. 131-135, mar. 1998. ROSE, B.D. Calculation of the creatinine clearance. In: Rose, B.D. (ed.) Up to Date, 2001. CARAVACA, F.; ARROBAS, M.; PIZARRO, J.L. et al. Uraemic symptoms, nutritional status and renal function in predialysis end-stage renal failure patients. Nephrol. Dial. Transplant., v. 16, p. 776-782, 2001.
28. 29.
30.
31.
32.
33.
34.
35. 36. 37. 38. 39. 40.
41. 42.
43.
293 CARAVACA, F. When is it time to initiate dialysis? 2nd International Congress of Nephrology in Internet (2001). www.uninet.edu/cin2001 CHURCHILL, D.N.; BLAKE, P.G.; JINDAL, K.K. et al. Clinical practice guidelines for initiation of dialysis (Canadian Society of Nephrology). Journal of the American Society of Nephrology, v. 10, suppl. 13, jun. 1999. GLASSOCK, R.J. Progressive renal disease. Mechanisms, assessment and treatment. Best Practice of Medicine, jul. 1999. http:// merck.praxis.md/bpm/np/rd K-DOQI Clinical practice guidelines for chronic kidney disease: evaluation, classification, and stratification. American Journal of Kidney Diseases, v. 39, suppl. 1, p. 1-246, feb. 2002. COLL, E.; BOTEY, A.; ALVAREZ, L. et al. Serum cystatin C as a new marker for noninvasive estimation of glomerular filtration rate and as a marker for early renal impairment. American Journal of Kidney Diseases, v. 36, n. 1, jul. 2000. FLISER, D.; FRANEK, E.; JOEST, M. et al. Renal function in the elderly: impact of hypertension and cardiac function. Kidney Int., v. 51, n. 4, p. 1196-1204, apr. 1997. FLISER, D.; FRANEK, E.; RITZ, E. Renal function in the elderly – is the dogma of inexorable decline of renal function correct? Nephrol. Dial. Transplant., v. 12, p. 1553-1555, 1997. RAVEL, R. Urinalysis and renal disease. In: _____. Clinical Laboratory Medicine, p. 147-166, Mosby-Year Book, 1995. RAVEL, R. Renal function tests. In: _____. Clinical Laboratory Medicine, p. 166-178, Mosby-Year Book, 1995. WRONG, O.; DAVIES, H.E.F. The excretion of acid in renal disease. Quart. J. Med., 28(110):259, 1959. MALNIC, G.; MARCONDES, M. Fisiologia Renal. São Paulo, Edart, Livraria Editora Ltda., 1972. Terceira parte, p. 125. STRIKER, G.E. et al. Use and interpretation of renal biopsy. In: Major Problems in Pathology. W.B. Saunders, 1978. V. 8. MARWAH, D.; KORBET, S. Timing of complications in percutaneous renal biopsy: what is the optimal period of observation. JASN, 6:427, 1995. BLACK, D. Renal Disease. London, 3.ª edição, Blackwell, 1972. COE, F.L. The clinical and laboratory assessment of the patient with renal disease. In: The Kidney. Eds. B.M. Brenner e F.C. Rector Jr., W.B. Saunders Co., 1986. Cap. 18, p. 703. PAPPER, S. Clinical Nephrology, 2.ª edição, Little Brown and Co., 1978. Cap. 2, p. 91.
Capítulo
17
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
I. INTRODUÇÃO AOS MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO POR IMAGEM DA DOENÇA RENAL Sérgio Augusto de Munhoz Pitaki
Na primavera de 1896, John Macintyre realizou a primeira imagem de um cálculo renal com um exame novo na medicina chamado de radiografia. Entretanto, foi de aproximadamente 12 minutos para a exposição do paciente aos raios X naquele dia em Glasgow, e o resultado, com subseqüente cirurgia de remoção do cálculo, foi somente o começo de um século que trouxe avanços enormes no campo da nefrourologia e da radiologia. Howard Pollack dividiu o último século em três fases: 1. pré-urográfica — antes do uso de contrastes radiopacos iodados; 2. urográfica – do uso de iodeto de sódio até os modernos meios de contraste de baixa osmolaridade, nãoiônicos e solúveis em água; 3. pós-urográfica — da urografia intravenosa até as técnicas de imagem seccionais: ultrasonografia (ecografia), tomografia computadorizada, imagem por ressonância magnética e medicina nuclear. De acordo com esta classificação, o conhecimento médico progrediu mais nos últimos 50 anos do que nos 2000 anos precedentes. Isto foi devido a uma grande aceleração da pesquisa em todas as áreas, a qual tem levado à chamada era científica da medicina. Todos os ramos da medicina progrediram imensamente; entretanto, nenhuma área da medicina aplicada diretamente ao paciente destacou-se tanto quanto o diagnóstico por imagem. Uma sucessão de desenvolvimentos, incluindo angiografia e medicina nuclear nos anos 50 e 60, ultra-sonografia (US) e tomografia computadorizada (TC) nos anos 70 e ressonância magnética (RM) e radiologia intervencionista nos anos 80, marcaram esta área da medicina. A descoberta da tomografia computadorizada, no começo dos anos 70, é tida como a mais revolucionária, porque estabeleceu uma ligação entre a radiologia convencional e o computador, chegando assim à US, à RM e à tomografia por emissão de pósitrons (PET).
Atualmente todos os estudos e pesquisas atuam no sentido da caracterização da doença, que depende do princípio de maximizar a diferença entre os sinais, densidades, imagens ou realces obtidos de tecidos doentes e sadios. Neste capítulo poder-se-ão, de maneira didática, correlacionar os diversos métodos de diagnóstico por imagem que auxiliam no diagnóstico das doenças renais. A seguir exemplificamos os exames por imagem de escolha nas doenças renais: DOENÇA Insuficiência renal (de causa desconhecida) Hematúria Síndrome nefrótica/ proteinúria Hipertensão Infarto renal Hidronefrose (diagnosticada por US)
Cisto renal (detectado por US) Massa renal Cálculo
EXAME DE ESCOLHA Ultra-sonografia (US) US ⫹ RX simples, urografia excretora US US ⫹ Doppler Tomografia computadorizada (TC) Urografia (se função renal preservada), cintilografia com tecnécio 99 TC com contraste em cistos complexos TC ou imagem por ressonância magnética Urografia e TC sem contraste (atual padrão-ouro)
295
capítulo 17
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA KEOGAN, M.T. AND EDELMAN, R.R. Technologic advances in abdominal MR imaging. Radiology 2001, 220:310-320. MARGULIS, A.R. AND SUNSHINE, J.H. Radiology at the turn of the millennium. Radiology 2000, 214:15-23.
McCLENNAN, B.L. Syllabus: A Categorical Course in Genitourinary Radiology. RSNA, 1994. FRIEDENBERG, R.M. The future of medicine and radiology: Part I. Radiology 1999, 212:301-304. FRIEDENBERG, R.M. The future of medicine and radiology: Part II. Radiology 1999, 213:3-5.
II. RADIOLOGIA DO APARELHO URINÁRIO NO ADULTO Carlos Jader Feldman, Mariangela M. Cosner e Flávio M. Barbosa
INTRODUÇÃO
PIELONEFRITE CRÔNICA
MANEIRAS DE INVESTIGAR
PIELONEFRITE XANTOGRANULOMATOSA
Radiografia simples do abdome
TUBERCULOSE RENAL
Urografia
PAPILITE NECROSANTE
Fisiologia do contraste Nefrotomografia
RIM E SIDA MASSA EXPANSIVA RENAL
Pielografia ascendente
Radiografia simples de abdome
Pielografia anterógrada
Urografia excretora
Tomografia computadorizada (TC)
Tomografia computadorizada
Angiografia
Ultra-sonografia
Ressonância magnética
Ressonância magnética
Ultra-sonografia
Angiografia
ANATOMIA RADIOLÓGICA RADIOLOGIA DA LITÍASE URINÁRIA
HIPERTENSÃO ARTERIAL RENOVASCULAR Métodos de investigação
Radiografia simples e tomografia linear
Urografia excretora
Urografia excretora
Arteriografia convencional ou digital
Ultra-som
Tomografia computadorizada
Tomografia computadorizada (TC)
Ressonância magnética
Ressonância magnética (RM)
Renina
INFECÇÃO URINÁRIA PIELONEFRITE AGUDA
Angioplastia de artéria renal INSUFICIÊNCIA RENAL
Urografia excretora
TROMBOSE DE VEIA RENAL
Tomografia computadorizada
TRANSPLANTE RENAL
Ultra-sonografia
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Ressonância magnética
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
PIELONEFRITE ENFISEMATOSA
INTRODUÇÃO A evolução dos métodos de imagem tem sido constante, tanto no que se refere aos já existentes, como às novas técnicas em tomografia e ressonância.
Também no terreno terapêutico o uso dos stents mudou a história evolutiva da estenose osteal da artéria renal. Por tais aspectos, este capítulo procura trazer os elementos desta transformação da radiologia no campo do aparelho urinário.
296
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
MANEIRAS DE INVESTIGAR Radiografia Simples do Abdome A radiografia simples do abdome é o ponto de partida da maioria dos estudos do aparelho urinário (Fig. 17.II.1). Cabe ressaltar que na insuficiência renal, no diagnóstico de massas renais, em alguns casos de cólicas nefréticas, a ultra-sonografia pode ser o primeiro exame de imagem a ser realizado antes do estudo contrastado (urografia excretória). No exame simples em que há limpeza intestinal, os rins, a bexiga e os músculos psoas são visibilizados graças à camada de tecido adiposo que os circunda. Torna-se difícil ou impossível a visualização dessas estruturas na presença de pouco tecido adiposo, nas infiltrações deste e em pacientes com gases intestinais e resíduos fecais. A radiografia simples muitas vezes permite avaliar a forma, a situação e as dimensões renais, avaliar cálculos calcários, calcificações renais e extra-renais. Também são analisadas outras estruturas abdominais e ósseas na radiografia simples. O exame simples do aparelho urinário pode constituir-se em exame independente, no acompanhamento da migração de cálculos do aparelho urinário radiopacos e na avaliação dos resultados da litotripsia.
Urografia Dos procedimentos médicos não-invasivos, a urografia excretora é o mais importante nos adultos, enquanto a uretrocistografia miccional o é na criança (v. Cap. 19).
Consiste a urografia excretora na opacificação do parênquima renal, sistema pielocalicial, ureteres e bexiga, por injeção, usualmente endovenosa, de contraste iodado. O paciente deve receber, do médico que solicitou o exame ou do radiologista, informações sobre o tipo de investigação que se vai realizar, duração e finalidade desta. É ponto pacífico que a maioria das reações vagais durante o procedimento pode ser eliminada por um bom preparo psicológico, diminuindo as ansiedades do paciente. A tranqüilidade do radiologista, do pessoal auxiliar e as condições da sala de raios X também representam fator importante durante o exame. Serão dadas instruções relativas à alimentação e à restrição líquida num período de 12 a 16 h antes do exame. Na insuficiência renal, mieloma múltiplo e nas emergências, não é feita restrição de líquidos. À radiografia simples, segue-se a injeção de contraste no menor tempo possível, para o que se usam agulhas calibrosas. Obtém-se filme de 1 min após a injeção, no qual se pode verificar a densidade do efeito nefrográfico e os contornos renais. Na seqüência, um filme de 5 min é realizado para se observar a excreção bilateral do contraste, avaliando-se o grau de opacificação das cavidades coletoras — é a chamada radiografia funcional (Fig. 17.II.2). Uma vez começada a eliminação renal do contraste, a compressão abdominal é realizada ao nível das cristas ilíacas, com a finalidade de distender as cavidades pielocaliciais. São obtidos filmes focados dos rins em número variável segundo o caso em exame. Também o tempo da compressão dependerá da patologia estudada — em pacientes suspeitos de tuberculose renal, poderá prolongar-se por até 45 min para que se opacifiquem eventuais cavidades
Fig. 17.II.1 A, Radiografia simples do abdome. Os contornos dos rins e dos músculos psoas estão satisfatoriamente identificados. B, Demonstração esquemática dos rins e de suas relações anatômicas.
297
capítulo 17
O exame completa-se com radiografias, em várias incidências, da bexiga urinária.
FISIOLOGIA DO CONTRASTE
Fig. 17.II.2 Radiografia obtida 5 min após a injeção rápida de 40 ml de contraste. O parênquima renal está bem opacificado (efeito nefrográfico). Já existe certo grau de excreção de contraste opacificando as cavidades coletoras e os ureteres — radiografia funcional.
parenquimatosas. Alguns pacientes não suportam o desconforto da compressão abdominal; entretanto, é um procedimento que permite demonstrar, com precisão, a anatomia do sistema pielocalicial. Não será realizada nas emergências, na gravidez e na minoria dos tumores abdominais. Os ureteres são estudados por filmes obtidos rapidamente após a descompressão abdominal (Fig. 17.II.3).
Fig. 17.II.3 Radiografia obtida após a descompressão abdominal. O efeito nefrográfico não mais é identificado. Há completa opacificação dos cálices, bacinetes e ureteres, bem como da bexiga — radiografia anatômica.
A urografia excretora visa à avaliação do parênquima renal e das cavidades coletoras. A qualidade do exame depende da concentração do contraste no sistema pielocalicial, da distensão deste, bem como da densidade do efeito nefrográfico. Dá-se o nome de efeito nefrográfico ao acúmulo de contraste nos túbulos com densa opacificação do parênquima renal. O contraste injetado é eliminado pelos rins por filtração glomerular, não havendo absorção ou excreção pelos túbulos. Este fato possibilita admitir que, em todas as ocasiões em que se desejar aumentar sua concentração no filtrado glomerular, devem-se injetar maiores doses de substância de contraste. O filtrado glomerular sofre um processo de concentração no túbulo proximal por reabsorção de água (80 a 90%), independente do grau de hidratação do paciente. No túbulo distal são reabsorvidos os 10 a 20% restantes de água, regulados pelos níveis plasmáticos de hormônio antidiurético (ver capítulo correspondente). Nas pessoas que efetuam restrição de líquidos, os níveis sangüíneos desses hormônios elevam-se, determinando maior reabsorção de água e, conseqüentemente, aumento da concentração do contraste. A velocidade da injeção também afeta a concentração. Uma dose injetada em 15 minutos atingirá uma concentração menor do que quando administrada em 1 minuto. Os contrastes iodados usados na urografia excretória podem provocar vários tipos de reações, desde urticária, hipotensão arterial, edema de laringe ou angioneurótico, estado asmatiforme até o choque anafilático com morte do paciente. Na experiência de Witten e col., a mortalidade estaria numa proporção de três pacientes em cem mil, o que é expressivo. Segundo outros autores, a mortalidade estaria na proporção de um em dezessete mil para um em setenta e cinco mil pacientes. Os contrastes iodados usados na urografia excretora são iônicos e não-iônicos. A incidência de reações seria atenuada pelo uso de contrastes não-iônicos. Entretanto, a redução de reações mais graves com estes contrastes em relação aos iônicos não está ainda bem estabelecida. O uso de pré-medicação nos exames contrastados endovenosos do aparelho urinário também diminuiria o número de pacientes com reações ao contraste. Os medicamentos usualmente usados nesta eventualidade são o Teldane e o Tagamet.
Nefrotomografia A nefrotomografia é um procedimento que cada vez mais se incorpora à rotina da urografia excretora, como já
298
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
foi mencionado anteriormente. Consiste no uso da tomografia durante a fase de efeito nefrográfico, o que permite melhor juízo das dimensões e contornos renais, bem como das alterações intraparenquimatosas. Entre as situações em que está indicada, destacam-se:
Tomografia Computadorizada (TC)
Neste exame a opacificação dos ureteres e cavidades pielocaliciais é feita por cateterismo ureteral, após cistoscopia. O procedimento seria melhor chamado de ureteropielografia ascendente e exige a participação do radiologista e do urologista. É um exame invasivo, atualmente pouco usado com o advento das novas técnicas de imagem. Contudo, pode ser uma técnica útil no diagnóstico, quando há repleção inadequada do sistema pielocalicial, particularmente na suspeita dos tumores uroteliais e na melhor avaliação das patologias ureterais (Fig. 17.II.4).
A TC é um exame relativamente fácil de realizar, seguro, rápido e de grande valor para diagnóstico de grande parte das doenças renais. Pode-se avaliar a extensão de tumores renais bem como a presença de metástases. É necessário o uso de contraste EV para a maioria dos exames. Com a introdução dos tomógrafos helicoidais os exames ficaram mais rápidos, sendo menor a quantidade de contraste necessária. Com esta modalidade realiza-se a “Angio-CT,” permitindo a fácil demonstração da aorta e das artérias renais (Fig. 17.II.5). Pelas diferenças de densidade pode-se diferenciar um parênquima renal normal de outro com lesão. Normalmente o valor de atenuação do parênquima, sem injeção de contraste, situa-se entre 30 e 50 UH (unidades Housfield). As lesões com valor maior serão denominadas de hiperatenuação, como na maioria dos tumores ou nos cálculos. As lesões de hipoatenuação, cujos valores são mais baixos, acontecem, por exemplo, nos cistos não complicados (Fig. 17.II.6).
Pielografia Anterógrada
Angiografia
Consiste na opacificação das cavidades coletoras após punção percutânea destas sob controle fluoroscópico ou ultra-sonográfico e é usada principalmente nas uropatias obstrutivas para verificar o local e eventualmente a causa da obstrução. É uma alternativa menos agressiva que a ureteropielografia retrógrada e pode ser seguida da colocação de um tubo de nefrostomia ou um cateter ureteral.
Ocorreu um declínio na utilização da angiografia para a investigação das lesões renais, em face do aparecimento de novos métodos e do aperfeiçoamento dos antigos. Cabe salientar, no entanto, que o uso da angiografia digital melhorou a qualidade da imagem, diminuiu a quantidade de contraste usado bem como abreviou a duração dos exames. Também se reduziu o diâmetro dos cateteres e guias, com o que a expectativa de complicações ficou extremamente reduzida.
(a) pacientes com gases e fezes no intestino; (b) insuficiência renal; (c) massas expansivas renais.
Pielografia Ascendente
Fig. 17.II.4 Pielografia ascendente mostrando cálculos radiolucentes determinando defeitos de enchimento nos cálices inferiores e na pelve renal.
Fig. 17.II.5 Angio-TC espiral mostrando lesão proximal bilateral em paciente com hipertensão arterial grave.
299
capítulo 17
substâncias de contraste como o gadolínio DTPA, que intensifica as imagens de determinadas estruturas em órgãos. A ressonância magnética, além de ser uma técnica nãoinvasiva que não usa radiação ionizante, permite a obtenção de imagens nos três planos ortogonais (transverso, sagital e coronal). Do ponto de vista prático, a ressonância magnética é uma técnica que apenas em algumas situações oferece vantagens diagnósticas em nefrologia, em relação à tomografia computadorizada.
Ultra-sonografia A ultra-sonografia é um procedimento de imagem de grande valia no diagnóstico de patologias renais e será avaliado em capítulo independente deste livro. Fig. 17.II.6 Tomografia computadorizada (TC) mostrando área de hipoatenuação nítida, no pólo inferior do rim direito, correspondendo a cisto renal.
A angiografia é, portanto, hoje mais segura e continua com algumas indicações precisas, como as atitudes terapêuticas, na embolização pré-operatória de tumores, na embolização de sangramentos e na angioplastia dos casos de hipertensão renovascular. A angiografia nos casos de hematúria em que os demais exames são normais é de pouco valor, sendo normal na maioria. Deve sempre ser realizado o exame seletivo de cada rim na busca de pequenos tumores ou malformações vasculares. Nas hematúrias conseqüentes a traumas ou biopsiasdiagnósticas pode-se realizar a embolização através do cateter. Procura-se seletivar o cateter na intenção de preservar a maior porção possível do parênquima. A embolização é realizada com partículas reabsorvíveis (Gelfoam) ou com material permanente. Também a angiografia pode ser útil no diagnóstico diferencial entre pequenos cistos renais complicados e pequenos tumores. Nos tumores veremos revascularização aumentada.
Ressonância Magnética A ressonância magnética é um procedimento de imagem que requer poderoso e amplo magneto que possa conter o paciente no seu interior. O método baseia-se no fato do magneto produzir ondas de radiofreqüência que alinham e desalinham os prótons dos núcleos de hidrogênio existentes no corpo humano. Isto se traduz através do computador em imagens dos órgãos que podem ser vistas num monitor de TV e registradas em fita magnética e filmes. A ressonância magnética também permite o uso de
ANATOMIA RADIOLÓGICA O grande interesse que o radiologista guarda pela anatomia — e pelas repercussões da fisiologia nesta — são facilmente compreensíveis. Nos rins, as pequenas variações na forma de um cálice podem levar a um diagnóstico definitivo; para tanto, é indispensável o perfeito conhecimento do normal. O eixo longitudinal dos rins situa-se de dentro para fora e de trás para diante. Quando o eixo se orientar medialmente (pólos inferiores mais próximos da coluna), rins em ferradura devem ser suspeitados. O rim direito é normalmente menor que o esquerdo e tem situação mais caudal. O inverso, no entanto, pode ocorrer, isto é, o rim D mais cranial, o que não significa patologia. Deslocamentos dos rins de até 3 cm podem ser determinados por variações da fase respiratória. Diâmetro longitudinal do rim é a distância medida entre o pólo superior e o inferior; o transversal é a medida entre os contornos medial e lateral, na porção média do órgão (Fig. 17.II.7). O diâmetro longitudinal é o mais usado, e os valores médios (cm) estão descritos na tabela de Moëll:
Rim D Rim E
Homens 12,9 (0,80) ⫻ 6,3 (0,45) 13,3 (0,49) ⫻ 6,3 (0,49)
Mulheres 12,3 (0,79) ⫻ 5,7 (0,46) 12,6 (0,77) ⫻ 5,9 (0,42)
Uma série de fatores altera as dimensões renais. O envelhecimento, por exemplo, determina a diminuição progressiva dos rins. Também a hipotensão arterial, por decréscimo da perfusão, pode acarretar acentuada redução de suas dimensões. A diferença no diâmetro longitudinal entre os rins favorece o esquerdo, que pode ser de 1 a 1,5 cm maior. Um
300
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
mal. Quando há redução na quantidade de tecido papilar, ou quando ocorre distensão volumétrica do cálice, o ângulo do fórnix alarga-se. A distância entre o ápice da papila e a margem externa do rim é a substância parenquimatosa renal, constituída de cortical e medular. O parênquima é maior nos pólos — em torno de 3 cm — e menor na porção média — em torno de 2,5 cm (Fig. 17.II.7). Os rins podem normalmente sofrer compressão do baço e fígado, o que não deve ser confundido com patologia. Anomalias de rotação renal determinam aparente alteração das dimensões e da forma deste órgão na urografia excretória.
RADIOLOGIA DA LITÍASE URINÁRIA Fig. 17.II.7 Esquema demonstrativo das dimensões renais.
rim com duplicidade pielocalicial sempre tem dimensões maiores. Os contornos renais são lisos, podendo persistir no adulto as primeiras lobulações fetais. Nestas, o entalhe situase entre dois cálices, que apresentam morfologia normal, ao passo que, na pielonefrite ou infarto, há redução do parênquima na zona da cicatriz, que é oposta ao cálice (Fig. 17.II.8). Os pequenos cálices recebem de uma a três papilas e reúnem-se, formando os grandes cálices, distribuídos em três grupos: o superior, o médio e o inferior. A reunião destes forma o bacinete ou pelve renal, que se continua pelo ureter. Os cálices distribuem-se em dois grupos: os ventrais, que são laterais, e os dorsais, projetados medialmente. Na base do cálice encontra-se a papila, formando um ângulo agudo com aquele; é o chamado fórnix. Este permanece agudo enquanto o volume do tecido papilar é nor-
Fig. 17.II.8 Esquema dos contornos renais. A, Normal; os detalhes anatômicos, quando presentes, localizam-se entre dois cálices e na união dos pólos superior e inferior com o terço médio. B, Infarto renal; entalhe no contorno oposto ao cálice normal. C, Pielonefrite; as retrações do contorno são opostas ao cálice deformado.
Continua sendo um capítulo importante na Radiologia a investigação diagnóstica ou o estudo evolutivo dos pacientes com cálculos urinários. Toda interrupção ao fluxo de urina pelos ureteres acarreta alterações anatômicas e funcionais que dependerão do grau de obstrução, do tempo de duração e da distância entre o fator oclusivo ureteral e o rim. A causa mais freqüente da obstrução aguda ureteral é a litíase. O aumento de volume que ocorre no rim é devido à passagem do líquido (urina) para o interstício e dilatação dos túbulos, particularmente os distais. A repercussão anatômica renal mais dramática que ocorre na uropatia obstrutiva crônica é a redução da substância parenquimatosa, que diminui, em alguns casos, a uma camada de 2 ou 3 mm. Os cálices dilatados comprimem as estruturas vasculares, determinando isquemia e conseqüente atrofia. O contorno renal não se altera, ao contrário do que ocorre na pielonefrite crônica, onde os rins são irregulares pela presença de cicatrizes no parênquima. Na uropatia obstrutiva, o rim pode estar aumentado de volume, mesmo com marcada atrofia parenquimatosa. Ocorre, entretanto, numa fase mais tardia, diminuição de tamanho, particularmente se o processo obstrutivo teve seu início no período de crescimento. Hodson e Craven (1966) estudaram a atrofia pós-obstrutiva, onde os rins, diminuídos de volume, com redução de parênquima e alterações mínimas nos cálices e papilas, conservam satisfatória função renal. O estudo por imagem desta patologia é hoje realizado tanto para ajudar na decisão do tratamento a seguir — clínico ou intervencionista — como para a escolha do método de intervenção, quando existe indicação. Para o radiologista é importante a escolha ou indicação do método menos agressivo e com maior potencial diagnóstico. As opções para tratamento mudaram nos últimos anos, especialmente com o surgimento da litotripsia extracorpórea, e com isto uma valorização diferente dos métodos diagnósticos disponíveis deve ser feita.
capítulo 17
301
Pontos-chave: Exames úteis • Radiografia simples • Ecografia • Tomografia computadorizada • Ressonância magnética
Radiografia Simples e Tomografia Linear A denominação de nefrolitíase refere-se à formação de cálculos nos cálices e bacinetes. Nefrocalcinose é a deposição calcária no parênquima renal.
Pontos-chave: • Nefrolitíase: cálculo em cálices e bacinetes • Nefrocalcinose: cálcio no parênquima renal A formação de cálculos pode estar relacionada a distúrbios metabólicos endócrinos, alterações no hábito alimentar ou depleção cálcica por destruição óssea (v. Cap. 23 para maiores detalhes). A radiografia permite a identificação dos cálculos radiopacos (oxalato de cálcio, fosfato de cálcio) no clichê simples. Os cálculos de ácido úrico, cistina e xantina, de baixa densidade, usualmente não são identificados na radiografia simples e sim nos filmes contrastados, pelo defeito de enchimento que acarretam. Constituem os cálculos radiotransparentes uma porcentagem de aproximadamente 10% (Fig. 17.II.4). Denominam-se cálculos coraliformes aqueles que ocupam as cavidades do bacinete e cálices, assumindo a forma anatômica destas estruturas. Na hipercalciúria decorrente do hiperparatireoidismo, sarcoidose e doença de Cushing, os cálculos tendem a formar-se nos túbulos e cálices. Não são freqüentes, nestas entidades, cálculos coraliformes. Na hipercalciúria idiopática, acidose tubular renal distal e em alguns tipos de hipercalcemia, os cálculos formamse, principalmente, nos cálices e a forma coraliforme é freqüente (Fig. 17.II.9). A nefrocalcinose tem como causas mais freqüentes as seguintes situações: hiperparatireoidismo, acidose tubular renal distal sarcoidose e glomerulonefrite crônica. Uma outra causa é o rim espongiomedular. Nesta entidade existe dilatação congênita dos túbulos coletores, que podem ou não conter depósitos de cálcio no seu interior. Na urografia excretória, os rins estão aumentados de volume, os cálices são alargados, e os ductos coletores dilatados assumem, às vezes, a forma cística (Fig. 17.II.10). Uma vez que apenas 10% dos cálculos urinários não são radiopacos, pode-se inferir que o exame simples de abdome é muito importante para o diagnóstico.
Fig. 17.II.9 Radiografia simples dos rins — cálculo coraliforme modelado pelo sistema coletor do rim direito.
Fig. 17.II.10 Rim espongiomedular, aumento de volume do rim. Os cálices estão aumentados ao nível da papila. Dilatação cística dos túbulos coletores.
Pode-se determinar a localização, o tamanho e o número dos cálculos. Para separar as calcificações extra-renais, poderemos acrescentar as radiografias em expiração e inspiração, bem como o filme ascendente ou a tomografia (Fig. 17.II.11). Quando a calcificação muda de posição, não acompanhando o movimento dos rins, ela é considerada como estando fora do aparelho urinário. O exame simples também serve para diagnosticar algumas anomalias associadas, como por exemplo a escoliose, e pode contribuir para a escolha da terapêutica. O controle pós-intervenção (litotripsia) é feito com RX simples, observando-se a fragmentação ocorrida e os cálculos residuais. A tomografia simples é importante na demonstração dos cálculos urinários, especialmente nos pacientes em que a
302
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
Fig. 17.II.11 Nefrotomografia evidenciando cálculo renal no pólo superior. A fase seguinte da urografia mostra que o cálculo situase em divertículo calicial.
presença de resíduos intestinais interfere com a visibilização do aparelho urinário. O método permite identificar cálculos de até 1 mm de diâmetro. É mais eficiente que o ultra-som para os cálculos pequenos.
Urografia Excretora A urografia excretora continua sendo um valioso procedimento na investigação dos pacientes com cálculos. Em-
303
capítulo 17
bora muitas das suas indicações tenham sido substituídas pelo ultra-som, ela fornece, junto com o RX simples, a maioria das informações necessárias para o planejamento da conduta a ser adotada. É lógico que sua utilização fica prejudicada quando existe história de alergia grave ao contraste, insuficiência renal ou nas grávidas.
Pontos-chave: Contra-indicações da urografia • Alergia ao contraste • Insuficiência renal • Gravidez Através da urografia podemos localizar um cálculo no sistema pielocalicial ou no ureter, bem como seu tamanho. Quando o ureter está obstruído haverá um nefrograma persistente, também chamado de nefrograma ou efeito nefrográfico obstrutivo, bem como uma contrastação tardia do aparelho excretor (Fig. 17.II.12). Com um exame bem conduzido, esperando o tempo necessário, podemos, na maioria dos casos, apontar o local exato da obstrução. Ao lado destes sinais sempre se encontra alguma dilatação pielocalicial e do ureter, proporcionais ao grau da obstrução, bem como a presença de reabsorção no sistema coletor, pelo refluxo pielovenoso, pielossinusal ou pielolinfático. É importante lembrar que estes sinais são mais sutis quando o grau de obstrução é mais leve, ou menos agudo. Os locais mais comuns de obstrução ureteral são a junção pielocalicial, o cruzamento dos vasos ilíacos e a junção uretero-vesical. Por vezes é muito difícil diferenciar um
Fig. 17.II.12 Obstrução aguda do ureter terminal esquerdo por cálculo. Aumento de volume renal com efeito nefrográfico prolongado. Rim, bacinete e ureter direitos normais.
cálculo de um flebólito na pelve. Ainda que os flebólitos costumem ser arredondados e ter centro menos denso, eles podem ser indistinguíveis de cálculos. A urografia permite, ao lado do entendimento da anatomia calicial, a localização do cálculo no cálice. Sabendose da inclinação dorsal do rim, localizaremos os cálices anteriores mais lateralmente que os posteriores, sendo que estes são vistos mais de face e os anteriores em perfil. A anatomia calicial é importante ao se considerar a terapêutica pelas ondas de choque. Os cálculos do pólo superior, por exemplo, são difíceis de manipular pelas técnicas percutâneas. Existindo dilatação piélica ou estreitamento dos infundíbulos, as ondas de choque têm menos sucesso, uma vez que os cálculos fragmentados podem ficar retidos nestas áreas. Também é significativo o conhecimento de estenoses na junção pielocalicial ou o tamanho e a forma da pelve. No que se refere ao ureter, a urografia possibilita o diagnóstico de anomalias associadas, como o ureter retrocava ou a ectopia cruzada. Também outros processos importantes, como a fibrose retroperitoneal, os tumores renais ou abdominais e os ureteres tortuosos por lesões antigas ou crescimento de próstata, podem ser evidenciados. Na urografia, mesmo sem compressão ureteral, como se faz nos casos agudos, é possível exata noção do estado do outro rim. Não podemos esquecer que mesmo após ser eliminado o cálculo pode ficar um edema ureteral, pelo traumatismo produzido, e o exame urográfico apresentar sinais obstrutivos.
Ultra-Sonografia Independente da composição química, os cálculos aparecem ecogênicos e produzem sombra acústica posterior. Pequenos cálculos (menos de 5 mm de diâmetro) podem não ser vistos ou podem ser perdidos dentro do seio renal normalmente ecogênico. Cálculos situados medialmente na pelve renal podem ser obscurecidos pelo processo transverso do corpo vertebral adjacente. Na uropatia obstrutiva o ultra-som demonstra hidronefrose ou mesmo o próprio cálculo, porém cálculos obstrutivos são mais comumente localizados nas junções ureteropélvicas ou uretero-vesicais e o acesso destes dois locais pelo ultra-som requer experiência e habilidade. É importante lembrar que o uso do ultra-som no diagnóstico de cálculo renal pode ser confundido quando houver obstrução sem hidronefrose. Por exemplo, hidronefrose pode estar ausente se a obstrução é parcial ou houver ruptura do fórnice, resultando em descompressão urinária. Assim, achados por ultra-som negativos, na presença de sintomas clínicos que sugerem obstrução calculosa, não deveriam afastar avaliação posterior com urografia excretória. O ultra-som pode ser útil na detecção concomitante de pionefrose.
304
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
Tomografia Computadorizada (TC) Ponto-chave: • TC sem contraste é o melhor método de investigação na cólica renal A tomografia computadorizada sem contraste é atualmente o melhor método para o diagnóstico da litíase nas vias urinárias. Foi proposta em 1995 como método para investigar pacientes com dor lombar aguda sugestiva de cólica ureteral (Smith). A TC consegue detectar a grande maioria dos cálculos urinários, já que sua densidade é maior do que a dos tecidos adjacentes, incluindo os radiotransparentes difíceis de demonstrar na radiologia convencional. Sua sensibilidade para cálculos tanto renais quanto ureterais é superior a 95%, e a especificidade, em torno de 99%. Quando comparada a acurácia da TC com a da combinação de ultra-som e radiografia simples, a TC teve maior sensibilidade (92% ⫻ 77%), segundo Catalano. Outra vantagem é a não-utilização do meio de contraste e a rapidez de sua obtenção, compatível com as situações de emergência. Além disso, tem a vantagem de poder diagnosticar outras causas de manifestações semelhantes às da litíase. É também possível ter uma boa imagem espacial da localização dos cálculos e de seu tamanho, bem como da anatomia tridimensional do trato urinário, o que ajuda na escolha do método terapêutico. Por vezes, o conhecimento preciso das anomalias congênitas e das dimensões dos cálculos é decisivo para evitar complicações na conduta escolhida ou até para determinar o prognóstico e a evolução do tratamento. No controle pós-operatório, especialmente nas complicações como sangramento, infecções ou urinomas, é mais simples o uso da TC para o diagnóstico. Em situações em que é necessário esclarecer diagnósticos concomitantes, ou um maior detalhamento da pelve renal e ureteres, é recomendável a administração de contraste. A combinação de ultra-som com radiografia simples pode ser usada quando os dados clínicos não são tão importantes ou quando os recursos diagnósticos são limitados.
Ponto-chave: • Nos pacientes com poucos sintomas, ecografia e radiografia simples são suficientes
Ressonância Magnética (RM) Com o desenvolvimento de novos programas é possível obter imagens de urografia por RM, o que torna este método um adjuvante no diagnóstico de litíase do trato
urinário. Isso pode ser feito com e sem a administração de meio de contraste paramagnético, tendo o último método resultados mais satisfatórios até o presente momento. Quando comparada à urografia convencional, a urografia por RM demonstrou uma sensibilidade superior a 96% e especificidade de 100% na detecção de cálculos ureterais, em um estudo. A possibilidade de substituir-se a urografia convencional por aquela por RM pode ser cogitada, especialmente em pacientes alérgicos, tendo em vista o potencial atópico muito menor do contraste paramagnético em relação ao radiopaco. Tem-se ainda como maiores dificuldades a pouca disponibilidade e o custo deste método.
INFECÇÃO URINÁRIA A infecção urinária pode determinar processos inflamatórios renais agudos, subagudos e crônicos. A extensão do processo inflamatório, sua virulência e cronicidade dependem do germe infectante e da imunidade do paciente. Os processos podem começar de uma maneira aguda e difusa, constituindo a chamada pielonefrite aguda, e podem evoluir para a forma focal ou perinefrética com formação de abscessos. Também o processo pode evoluir de uma forma focal para a difusa com abscesso renal e perirrenal. A pielonefrite crônica geralmente é uma doença inflamatória que se inicia na infância e se caracteriza por cistites de repetição, refluxo vésico-ureteral e alterações renais caracterizadas por cicatrizes nos contornos do rim com formação de áreas atróficas e hipertróficas, diminuição de tamanho do rim comprometido e deformidades caliciais.
PIELONEFRITE AGUDA Pielonefrite aguda é um processo inflamatório que compromete o interstício renal e geralmente as cavidades pielocaliciais e pode decorrer de infecções usualmente bacterianas. Os germes mais freqüentes são o Escherichia coli, Enterobacter, Klebsiella, Pseudomonas e Proteus mirabilis. A infecção costuma ocorrer por via ascendente ureteral ou através da via linfática vesical e ureteral. Também pode ocorrer a infecção por via hemática na estafilococcemia. No adulto a infecção caracteriza-se clinicamente por episódios de dor lombar, febre e bacteriúria, sendo mais freqüente em pacientes do sexo feminino na faixa etária de 15 a 40 anos. Em pacientes imunossuprimidos, em terapia com córtico-esteróides ou no diabete mellitus, a infecção pode progredir por um quadro mais intenso chamado de nefrite bacteriana focal ou difusa com formação de abscessos, inclusive com envolvimento perirrenal.
305
capítulo 17
Na infecção aguda nenhum estudo por imagem será necessário, se houver resposta clínica imediata aos antibióticos apropriados. Se houver dúvida diagnóstica ou resposta insatisfatória ao tratamento, deve ser realizado estudo por imagem para detectar possíveis complicações. As possibilidades do diagnóstico por imagem são listadas a seguir.
Urografia Excretora Em 25% dos pacientes ocorrem alterações na urografia excretora caracterizadas por: 1) aumento de volume do rim uni- ou bilateral. Os contornos permanecem regulares, a não ser que ocorram complicações; 2) a eliminação do contraste é deficiente e as cavidades pielocaliciais estão dilatadas.
Pontos-chave: • Aumento de volume renal uni ou bilateral, permanecendo contornos regulares • Eliminação deficiente da substância de contraste e dilatação das cavidades pielocaliciais Os rins podem voltar ao aspecto normal quando ocorrer remissão do quadro clínico.
nor que o parênquima renal nos filmes pré-contraste. Após a injeção de contraste identificam-se áreas de baixa atenuação em relação ao parênquima (Fig. 17.II.13), estendendo-se da papila envolvida até a cápsula renal. Pode haver infiltração e perfusão da cápsula com formação de abscessos perirrenais. A presença de gás no abscesso indica infecção bacteriana com necrose tecidual ou eventualmente decorre de punções percutâneas diagnósticas ou terapêuticas. A intervenção percutânea, terapêutica ou diagnóstica, só está indicada em casos de acentuada gravidade do estado geral do paciente ou na dúvida do diagnóstico. A TC constitui-se num grande auxílio semiológico para a rapidez da conclusão diagnóstica.
Ultra-sonografia A ultra-sonografia tem menor sensibilidade do que a TC, a RM e a cintilografia no diagnóstico de infecções agudas renais. A maioria dos casos é normal ao exame de ultrasom, mesmo em pacientes que já apresentam alterações na TC. Aumento de volume do rim e parênquima hipossônico podem ser encontrados na pielonefrite aguda. Na forma focal o ultra-som pode evidenciar áreas de ecogenicidade heterogênea ou diminuída, sendo os aspectos semelhantes a tumor. Os abscessos renais podem ser representados por áreas anecóicas ou hipossônicas com debris. Ao estudo doppler colorido pode-se observar aumento difuso da vascularização, quando comparado ao rim contralateral, na infecção aguda.
Tomografia Computadorizada
Ressonância Magnética
A TC não é rotineiramente indicada na infecção renal não complicada. Seu valor é estabelecer o diagnóstico em casos duvidosos e determinar a extensão da doença. Em alguns casos em que a infecção é discreta do ponto de vista clínico-laboratorial, os achados da TC podem ser normais. A pielonefrite intersticial aguda, a forma focal bacteriana e os abscessos renais podem produzir anormalidades na TC que estão obviamente relacionadas ao edema inflamatório, extensão focal ou difusa do processo e alterações da função renal. Os aspectos da pielonefrite aguda na TC são:
A RM na avaliação da infecção renal aguda é indicada em pacientes que não possam ser submetidos a um estudo de TC contrastado ou que tenham uma TC questioná-
Pontos-chave: • Aumento do rim afetado • Hipoatenuação focal • Efeito expansivo Coleções líquidas perirrenais e aspecto estriado do contraste no parênquima renal podem ser visibilizados. Na forma focal as áreas envolvidas podem mostrar atenuação me-
Fig. 17.II.13 Pielonefrite focal demonstrada na tomografia computadorizada (TC). Observa-se área triangular de hipoatenuação em relação ao parênquima normal.
306
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
vel. É mais difícil produzir boas imagens de RM em pacientes muito enfermos. É possível, na RM, a obtenção de imagens como o nefrograma estriado e as áreas segmentares não-realçadas, sem a injeção de contraste iodado, em pacientes alérgicos ou urêmicos.
PIELONEFRITE ENFISEMATOSA A pielonefrite enfisematosa é infecção grave do parênquima renal, com produção de gás, geralmente causada pela Escherichia coli ou outros Gram-negativos. Ocorre freqüentemente em diabéticos. Devido ao comprometimento do suprimento vascular e a diminuição da imunidade nesses pacientes, a E. coli e outras bactérias Gram-negativas proliferam em um meio anaeróbico, produzindo CO2 a partir do tecido necrótico. Embora radiografias simples ou a US possam sugerir a presença de gás no rim, a TC é mais informativa, mostrando a localização precisa do gás, bem como a extensão do processo. Na pielonefrite enfisematosa, é observado gás no próprio parênquima renal, e não apenas no sistema coletor.
PIELONEFRITE CRÔNICA Pielonefrite crônica é uma doença inflamatória causada por infecção bacteriana, usualmente germes Gram-negativos. Contudo o refluxo vésico-ureteral tem papel importante, na infância, na gênese ou evolução dessa doença, que é também chamada por alguns autores (Hodson) de nefropatia de refluxo. A combinação de infecção bacteriana do trato urinário inferior (cistite) e refluxo vésicoureteral levaria à infecção e alterações patológicas do trato urinário superior. A presença de refluxo intra-renal determina a formação de cicatrizes que envolvem a cortical e medular do rim e são mais freqüentes nos pólos. É tema de discussão o refluxo de urina estéril na nefropatia. No adulto, a descoberta de refluxo vésico-ureteral não costuma acarretar cicatrizes em rim anatomicamente normal. A presença de refluxo vésico-ureteral em adultos com litíase, bexiga neurogênica e obstrução urinária pode determinar após muitos anos a formação de cicatrizes renais na pielonefrite crônica. Os procedimentos de imagem mais importantes para o diagnóstico de pielonefrite crônica na infância são a uretrocistografia miccional e a cintilografia estática (DMSA).
PIELONEFRITE XANTOGRANULOMATOSA É um processo inflamatório crônico renal que acomete mais freqüentemente pacientes do sexo feminino e usual-
Fig. 17.II.14 Pielonefrite xantogranulomatosa; pielografia ascendente (rim excluído na urografia excretória). Aumento do volume renal. Pelve e cálices dilatados e irregulares pela presença de grande quantidade de material purulento (gentileza do Dr. Cleano Wanderley).
mente é unilateral. A pielonefrite xantogranulomatosa é uma doença supurativa crônica com substituição do parênquima renal por macrófagos contendo lipídios (células xantomatosas). A apresentação da doença pode ser focal ou difusa e se acompanha freqüentemente de cálculos piélicos, muitas vezes coraliformes. A infecção determina espessamento da fáscia de Gerota e pode estender-se para os tecidos perirrenais. Na forma focal, o diagnóstico diferencial deve ser feito com os tumores renais. Na urografia excretora pode haver exclusão funcional do rim ou um nefrograma não-homogêneo com áreas escavadas. A apresentação da doença pode ser apenas sob a forma de hidronefrose com litíase (Fig. 17.II.14). Na ultra-sonografia pode ser evidenciado aumento de volume do rim com áreas hipoecóicas ou anecóicas que correspondem às coleções cavitárias com elementos xantomatosos e perda de definição córtico-medular. Observam-se cálculo ou cálculos no bacinete e cálices. A tomografia computadorizada é o procedimento de imagem mais útil no diagnóstico. Identifica o cálculo e as áreas granulomatosas de elementos xânticos. A tomografia mostra o espessamento da fáscia de Gerota, e a infiltração da gordura e dos tecidos perirrenais e pararrenais.
TUBERCULOSE RENAL A tuberculose do aparelho urinário ocorre mais freqüentemente em pacientes do sexo masculino e os germes disseminam para os rins por via hematógena de um foco a distância. Os bacilos atingem ambos os rins, mas a do-
307
capítulo 17
ença tem evolução unilateral. A magnitude das lesões depende da virulência dos germes e da imunidade do paciente. Do ponto de vista anátomo-patológico há, inicialmente, a formação de granulomas no parênquima renal que podem evoluir para a cicatrização, sem comprometimento do sistema pielocalicial e, portanto, sem alterações na urografia excretora. Quando os granulomas se localizam nas alças de Henle, produzindo ulcerações na papila correspondente, a lesão, às vezes, compromete um cálice isolado ou grupo de cálices. Os granulomas sofrem um processo de caseificação com eliminação do cáseo pelo cálice e formação de cavidade no parênquima em comunicação com este. As lesões eventualmente comprometem um grupo de cálices, um lobo ou todo o rim. Na evolução do processo ocorrem zonas de fibrose com estenose, particularmente no colo dos cálices, bacinetes, e há envolvimento do ureter com estenoses, particularmente no segmento distal. A formação de calcificações parenquimatosas com exclusão funcional e auto-amputação renal é uma manifestação tardia na evolução da doença e constitui o chamado “putty kidney”.
Ponto-chave: • Calcificações amorfas (massa de vidraceiro) podem sugerir o diagnóstico Os achados radiológicos traduzem as manifestações patológicas mencionadas. A erosão de uma papila ou de um grupo de papilas constitui uma alteração na tuberculose. A opacificação de pequenas cavidades medulares ou de fístulas papilares caracteriza a forma de papilite necrosante desta doença (Fig. 17.II.15).
O crescimento dos granulomas determina massas expansivas, localizadas ou generalizadas, e os cálices adjacentes apresentam compressões extrínsecas. O envolvimento do sistema coletor conduz a estenoses caliciais ou do bacinete com dilatação dos segmentos a montante, configurando formas de hidronefrose. Na evolução deste processo há amputação de cálices pela estenose. O enchimento de cavidades parenquimatosas é dificultado pela estenose do cálice, exigindo compressão ureteral prolongada na urografia excretora (Fig. 17.II.11). Em 50% dos casos, segundo Olsson, ocorrem calcificações na tuberculose renal. A ultra-sonografia não mostra achados específicos na tuberculose renal e o método é útil para permitir a punção percutânea de massas e exame laboratorial. Os achados na tomografia computadorizada como caliectasias, hidronefrose, massas parenquimatosas e calcificações não são específicos de tuberculose renal. Uma vantagem adicional da TC é de não necessitar da compressão abdominal para demonstração das cavidades.
PAPILITE NECROSANTE A papilite necrosante é um quadro patológico relacionado a várias causas como ingestão de medicamentos analgésicos à base de fenacetina, diabete sacarínico, infecção urinária, uropatia obstrutiva e hemoglobinopatia por células falciformes. Consiste na necrose de papilas ou de extensas áreas medulares, decorrentes de comprometimento vascular, particularmente dos vasa recta. O tecido necrótico sofre as seguintes evoluções: (a) é reabsorvido lentamente, formando uma cavidade em comunicação ou não com o cálice;
Fig. 17.II.15 Tuberculose renal. A, Pequena massa expansiva comprimindo os cálices do grupo médio. B, Mesmo caso, tempos mais tarde, mostrando que houve drenagem espontânea do granuloma caseificado. Há opacificação da cavidade tuberculosa a partir do sistema coletor.
308
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
(b) permanece in situ, podendo sofrer incrustações de sais cálcicos; (c) é eliminado de todo ou em fragmentos pela urina. Do ponto de vista anátomo-patológico e radiológico, as cavidades na papilite necrosante têm duas formas: (a) necrose medular — inicia-se geralmente na porção central da papila e quando o segmento necrótico se destaca, a cavidade se comunica com o cálice, permanecendo o fórnix intacto. A cavidade pode ter várias formas e os contornos são lisos ou irregulares. (b) necrose de forma papilar — envolve toda a papila e porção adjacente da pirâmide. Inicia no fórnix e a cavidade formada é continuação do cálice, notando-se desaparecimento do primeiro. O tecido necrótico permanecendo no interior da cavidade, há um defeito de enchimento, e o diagnóstico pode ser difícil pela urografia excretória. A papilite necrosante é mais freqüente em pacientes do sexo feminino e pode comprometer papilas isoladamente, embora o envolvimento múltiplo seja mais freqüente. Nas formas avançadas há processo inflamatório intersticial com redução da função renal e insuficiência renal. Nestes casos os rins estão diminuídos de volume e os contornos são ondulados. Clinicamente os sintomas se assemelham aos de infecção urinária. A passagem de papilas necróticas ou parcialmente calcificadas pode acarretar obstrução ureteral e cólica renal. Na fase inicial da doença, as alterações radiológicas são mínimas e quando não há ruptura do epitélio calicial, o urograma é normal.
Ponto-chave: • O diagnóstico diferencial deve ser feito com a tuberculose, pielonefrite crônica, cisto pielogênico e rim espongio medular
As calcificações usualmente estão restritas ao córtex renal e podem tornar-se obscuras após a administração da substância de contraste. Além do P. carinii, outros organismos oportunistas, como o citomegalovírus e o Mycobacterium avium – intracellulare, também podem causar calcificações viscerais nos pacientes com SIDA. Lesões fúngicas renais não são comuns estes pacientes. A possibilidade de invasão vascular determina extensos infartos corticais e necrose medular renal. Na TC podemse observar lesões heterogêneas em todo rim.
MASSA EXPANSIVA RENAL As massas expansivas renais que vamos considerar são as sólidas (tumores e pseudotumores) e císticas, enfatizando o diagnóstico por imagem. O objetivo maior da radiologia é separar as lesões malignas daquelas que não necessitam de cirurgia. Podem ser identificados os cistos complicados, os abcessos, pseudotumores inflamatórios, infartes, linfomas e angiomiolipomas.
Radiografia Simples de Abdome Os seguintes sinais podem ocorrer na radiografia simples do abdome em massas renais: 1) abaulamentos circunscritos nos contornos do rim ou alargamento localizado ou generalizado deste. 2) calcificações renais. Em 8 a 18% dos carcinomas renais ocorrem calcificações irregulares, puntiformes ou com aspecto de flocos. Calcificações em paredes de cistos podem ocorrer em menos de 1% dos casos. A presença de massa com calcificações centrais e irregulares é um sinal muito importante para o diagnóstico de carcinoma renal. Alterações no eixo renal podem ocorrer se a massa tem um crescimento exofítico, especialmente medial.
Urografia Excretora RIM E SIDA Infecção recorrente do trato urinário ocorre em 50% dos pacientes com SIDA. Estes podem desenvolver cistite, pielonefrite e abscessos renais com ou sem extensão perirrenal. Embolia séptica pode ocorrer em pacientes com história de uso de drogas endovenosas. Embora o Pneumocystis carinii seja considerado usualmente um germe respiratório, disseminação generalizada a partir dos pulmões pode ocorrer em pacientes imunocomprometidos. A TC sem contraste mostra calcificações nos rins, linfonodos, baço, fígado e glândulas adrenais.
São vários os sinais que sugerem massas renais na urografia venosa. 1) Anormalidades da imagem pielocalicial quando as massas determinam compressões extrínsecas ou deslocamentos dos cálices e/ou bacinete, defeitos de enchimento em cálices ou bacinete ou sua obstrução por invasão tumoral. 2) Os carcinomas de rim geralmente têm aumento de vascularização e aparecem como áreas mais densas na nefrotomografia efetuada com injeção rápida do contraste. Os cistos simples sendo avasculares podem determinar defeitos de enchimento na fase nefrográfica. 3) Os tumores renais podem provocar obstrução da veia renal com exclusão funcional do rim. Déficits funcio-
309
capítulo 17
nais podem ocorrer em grupos de cálices e no bacinete por infiltração tumoral. Na urografia excretória devem também ser avaliadas a estrutura ósteo-articular e bases pulmonares para pesquisa de eventuais metástases.
Tomografia Computadorizada A TC tornou-se o método mais adequado para a elaboração diagnóstica dos tumores e cistos renais. Tanto a TC simples como o método helicoidal possibilitam informações adequadas. É, no entanto, imprescindível que seja realizada técnica adequada, com cortes de pequena espessura e injetado o contraste em dose adequada. Também é importante que se obtenham imagens nas diferentes fases de contrastação parenquimatosa, as quais, junto com os cortes pré-contraste, apresentam diferentes informações, todas importantes. Os tumores renais, mesmo os de pequenas dimensões, costumam impregnar-se após a administração do contraste (Fig.17.II.16). Por outro lado, a TC permite avaliar a extensão da lesão, bem como o envolvimento perirrenal ou a invasão vascular, e a presença de gânglios regionais. O conhecimento destes detalhes é de grande importância quando se opta pela nefrectomia parcial. A demonstração radiológica de um tumor renal pequeno, bem delimitado e com pseudocápsula, praticamente afasta a possibilidade de existir infiltração da gordura perirrenal. As lesões císticas podem ser únicas ou múltiplas, e de variadas dimensões. A medida da sua densidade é semelhante à densidade da urina (inferior a 20UH).
Ponto-chave: • Cisto simples tem densidade semelhante à urina, na TC (⬍ 20 UH) Os chamados cistos complicados por hemorragia (Fig. 17.II.17) têm densidade mais alta. A presença de septações espessas ou vegetações (Fig. 17.II.18), no interior dos cistos, também é um sinal de alarme no sentido de neoplasia.
Cisto Renal Não-cirúrgico
Cirúrgico
Parede
Fina
Espessa
Septos
Finos
⬎ 3 mm
Calcificações
Puntiformes
Grosseiras
Impregnação
Ausente
Presente
Vegetação
Ausente
Presente
Fig. 17.II.17 Cisto renal complicado. Em corte tomográfico observa-se lesão arredondada com densidade semelhante ao parênquima, a maior parte projetada para fora do rim. Após a administração de contraste não ocorreu impregnação da lesão.
Fig. 17.II.16 Tumor renal demonstrado na tomografia computadorizada (TC). Observa-se zona de impregnação heterogênea pelo meio de contraste no pólo superior.
Os angiomiolipomas ou hamartomas renais constituem lesões com mistura de gordura, músculo liso e vasos sangüíneos. Em 50% estão associados à esclerose tuberosa, sendo mais freqüentemente bilaterais. O CT permite o diagnóstico, tanto mais fácil, quanto maior for o conteúdo de gordura da lesão. A gordura aparecerá na tomografia com densidade negativa (Fig. 17.II.19).
310
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
importante procedimento para o estadiamento de tumores e intervencionismo. O ultra-som é menos acurado que a TC no diagnóstico de tumores sólidos menores do que 3 cm. O aumento da vascularização demonstrada ao estudo Doppler aumenta a possibilidade de processo maligno.
Ressonância Magnética
Fig. 17.II.18 Paciente com cisto renal complicado. Observa-se vegetação na parede do cisto, no corte tomográfico.
A ressonância magnética (RM) é tão acurada quanto a TC na detecção e avaliação das massas renais. São usados os mesmos critérios morfológicos da TC, e a capacidade peculiar da RM na distinção de caracaterísticas teciduais auxilia na distinção entre cistos simples e massas complexas. Fazse necessário a utilização de contraste paramagnético na avaliação de massas que não sejam facilmente caracterizáveis como cistos simples. Porém este contraste é menos deletério do que o contraste iodado, estando indicada a RM para a avaliação de massas renais de pacientes alérgicos. A RM é também mais acurada do que a TC e tão acurada quanto a venocavografia, no diagnóstico e avaliação da extensão de invasão venosa em pacientes com tumores malignos.
Angiografia A aortografia e a angiografia seletiva renal, inclusive digital, são procedimentos que estão sendo substituídos rapidamente pela TC. A angiografia é útil no diagnóstico de tumores com aumento de vascularização para avaliação de sua extensão e invasão de vasos sangüíneos adjacentes (Fig. 17.II.20) ou para planejamento de ressecções parciais. Nos tumores avasculares ou hipovasculares, cuja incidência é em torno de 22%, e no estadiamento das neo-
Fig. 17.II.19 Exemplo de angiomiolipoma. Observa-se densidade negativa, característica de gordura, na lesão do rim direito.
Ultra-sonografia A ultra-sonografia é um procedimento simples, preciso e de baixo custo para o diagnóstico diferencial de lesões sólidas e císticas. O ultra-som permite identificar se os cistos simples são únicos ou múltiplos, envolvendo um rim ou ambos os rins. Os critérios ecográficos de cisto simples estão bem estabelecidos e são tratados em outro capítulo deste livro. É alta a incidência de cistos em pacientes na faixa etária acima de 50 anos. Mais de 50% dos pacientes nessa faixa apresentam cistos. A ultra-sonografia é também um
Fig. 17.II.20 Carcinoma de rim. Artéria renal aumentada de calibre. Intensa vascularização na metade inferior do rim, onde se destacam fístulas arteriovenosas, áreas de acentuada impregnação de contraste, intercaladas com zonas de necrose (avasculares).
311
capítulo 17
plasias, a TC pode oferecer vantagens no diagnóstico em relação à angiografia. Pelo procedimento do cateterismo realizamos a embolização pré-operatória de tumores muito grandes. Esta embolização deve ser realizada 48 horas antes da cirurgia e a finalidade é de reduzir o tamanho do tumor e reduzir o sangramento transoperatório. Em casos especiais a embolização é realizada em pacientes sem possibilidade cirúrgica e que apresentam hematúrias importantes.
HIPERTENSÃO ARTERIAL RENOVASCULAR Hipertensão renovascular é encontrada em menos de 5% da população de hipertensos. Este índice muda, podendo chegar a mais de 40%, quando considerarmos os pacientes enviados para centros de referência. Alguns dados clínicos são considerados relevantes na busca do fator renovascular como etiologia da hipertensão. A presença de sopro abdominal, especialmente sisto-diastólico, é muito sugestiva da presença de estenose renal. Em um dos estudos multicêntricos esta alteração foi encontrada em 48% dos casos e em apenas 7% dos portadores de hipertensão essencial. Na tabela abaixo são referidos os dados mais importantes para a suspeita de hipertensão renovascular. SOPRO ABDOMINAL RETINOPATIA HIPERTENSIVA, GRAU III OU IV HIPOCALEMIA HIPERTENSÃO COM INÍCIO ANTES DOS 20 OU APÓS OS 50 ANOS HIPERTENSÃO DE DIFÍCIL CONTROLE INSUFICIÊNCIA RENAL APÓS INÍCIO DE USO DE ENZIMA CONVERSORA INSUFICIÊNCIA RENAL NÃO EXPLICADA OU PROGRESSIVA AUMENTO DA RENINA PLASMÁTICA
clichês aos 20 min da injeção permitem identificar as alterações consideradas indicativas de rim isquêmico. A diminuição do volume do rim é a modificação mais importante determinada por estenose da artéria renal. Quando o diâmetro longitudinal direito for 2,0 cm menor que o oposto, ou quando o esquerdo for 1,5 menor que o direito, deve-se suspeitar de fator renovascular como causa etiológica. O rim isquêmico inicia a excreção do contraste mais tardiamente que o normal, uma vez que a filtração glomerular, naquela situação, está diminuída. Este dado, quando presente, é identificado nas radiografias iniciais (Quadro 17.II.1). O aumento da reabsorção de sódio e água, que ocorre no rim isquêmico, determina a excreção do contraste mais concentrado, ou seja, mais denso que o rim normal. Outras alterações, como as compressões extrínsecas no bacinete e ureter determinadas por circulação colateral, diminuição das proporções do sistema coletor secundário à redução do filtrado glomerular e duração aumentada do efeito nefrográfico, são consideradas como sinais acessórios de isquemia renal.
ARTERIOGRAFIA CONVENCIONAL OU DIGITAL É um dos métodos mais empregados para a confirmação da existência de lesão em artéria renal. O desenvolvimento de cateteres mais finos e guias mais adequadas tornaram a angiografia um exame muito seguro, com poucas complicações. O surgimento da angiografia digital possibilita o uso de menor quantidade de contraste e mais rapidez no procedimento ao lado de imagens com melhor detalhe. Quando disponível, deve ser preferida ao método convencional. Eventualmente, na mesma sessão pode ser realizada a angioplastia, tendo o paciente sido previamente informado da possibilidade e dos riscos (Fig. 17.II.21). Não devemos esquecer que a simples existência de estenose de artéria renal não significa que a mesma seja responsável pela hipertensão. É comum o diagnóstico de estenoses renais em pacientes normotensos que fazem investigação angiográfica por outra indicação.
Métodos de Investigação UROGRAFIA EXCRETORA A urografia excretora é considerada como um método satisfatório na detecção de estenose da artéria renal. Embora existam casos falso-negativos e falso-positivos, tratase de um teste de baixo risco e relativamente econômico, permitindo a visibilização de alterações em 78% dos pacientes hipertensos por isquemia renal unilateral. A rápida injeção intravenosa de uma dose de 40 a 50 ml de contraste na veia e a obtenção de três a cinco clichês radiográficos durante os primeiros 5 min e de um ou mais
Quadro 17.1 Hipertensão renovascular Alterações na urografia excretora Principais Diminuição do volume do rim, retardo da excreção
Aumento da densidade no sistema coletor
Acessórias Compressões extrínsecas Diminuição das proporções do sistema coletor Efeito nefrográfico prolongado
312
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
Fig. 17.II.21 Na foto menor observa-se estenose grave, por fibrodisplasia, da artéria renal direita. Na foto maior o resultado após a angioplastia. O paciente ficou normotenso.
A arteriografia renal consiste na injeção de contraste na aorta e artérias renais simultaneamente. Estenoses segmentares intra-renais devem ser buscadas, uma vez que mesmo pequenas lesões podem ser a causa da doença.
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA A TC espiral permite demonstrar, com nitidez, a artéria renal principal em praticamente todos os pacientes (Fig. 17.II.5). O exame é realizado através de injeção periférica de contraste, e as imagens são obtidas em menos de 30 segundos. Recentemente foi introduzido um tomógrafo com maior número de detectores que permite um exame com ainda maior rapidez e adequada demonstração da circulação intra-renal (tomografia multislice). Com estes equipamentos fica praticamente dispensável a realização de arteriografia, a qual será utilizada quando do procedimento terapêutico.
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA A angiorressonância, embora ainda não tenha a mesma resolução espacial da TC, é o exame mais solicitado para diagnóstico da hipertensão renovascular (Fig. 17.II.22). Sua vantagem é de não necessitar de contraste iodado, o que é particularmente importante nos pacientes com perda de função renal ou com forte história de alergia.
Ponto-chave: • A angiorressonância é a melhor indicação para investigar hipertensão renovascular em pacientes alérgicos ou com insuficiência renal
Fig. 17.II.22 Angiorressonância mostrando estenose proximal na artéria renal direita.
É contra-indicada em pacientes portadores de marcapasso e de algumas próteses. Por outro lado, indivíduos com claustrofobia têm dificuldade de realizar este exame.
RENINA Cada vez tem sido menos usada a dosagem de renina no sangue periférico ou nas veias renais para o diagnóstico de HRV. As condições necessárias para uma adequada valorização das dosagens laboratoriais, tais como a descontinuidade do uso de determinadas medicações hipotensoras, tornam pouco prático este exame. Também as causas de erros laboratoriais, caso um protocolo rígido não seja seguido, dificultam sobremaneira o seu uso rotineiro. A dosagem da renina, nos tempos atuais, tem sido reservada para os casos mais difíceis quanto à decisão terapêutica.
ANGIOPLASTIA DE ARTÉRIA RENAL A angioplastia da artéria renal, realizada através do cateter, é o método preferido para o tratamento das estenoses. É um método seguro desde que realizado com instrumental adequado. Quando a causa da estenose é displasia fibromuscular, o sucesso da angioplastia corresponde, em percentual elevado, à cura da hipertensão (Fig. 17.II.21). Em casos de aterosclerose, no entanto, o resultado não atinge índices
313
capítulo 17
maiores que 50%. Mas também se pode obter como resultado a melhor resposta ao tratamento. Por outro lado, não podemos esquecer que ao lado de tentar remover a causa da hipertensão estamos colaborando na manutenção da função renal, quando tratamos uma estenose. É importante tentar a angioplastia como método de tratamento inicial, porque se a mesma não for factível sempre haverá a possibilidade cirúrgica. Por outro lado, se realizada a angioplastia não melhorar a hipertensão, também a cirurgia não o fará.
INSUFICIÊNCIA RENAL A urografia excretora atualmente é um exame que não tem validade em pacientes com insuficiência renal. Quando as taxas de creatinina são maiores do que 4 ml/dl ou uréia maior do que 50 ml/dl, não deve ser usada a urografia excretória e sim a ultra-sonografia, que é o procedimento de eleição particularmente na insuficiência renal por uropatia obstrutiva. Nesta patologia a sensibilidade diagnóstica para detecção da hidronefrose é de 90 a 100%. Nos pacientes com insuficiência renal também deve ser considerada a nefrotoxicidade do contraste, que pode agravar o quadro. Na insuficiência renal por doença médica o ultra-som e a tomografia computadorizada são úteis, mostrando alterações na ecogenicidade e densidade dos rins, seu tamanho e contornos. O diagnóstico definitivo será feito por biópsia percutânea dirigida por ultra-som ou CT.
TROMBOSE DE VEIA RENAL Atualmente a TC pode, com facilidade, fazer o diagnóstico de trombose venosa renal, dispensando o uso da angiografia. Em praticamente todos os exames podemos delinear as veias renais e a veia cava inferior. Nos casos de tumor renal, especialmente, o conhecimento prévio do envolvimento venoso é útil para o planejamento cirúrgico.
TRANSPLANTE RENAL Na avaliação pré-operatória do doador costumam-se avaliar, através de angiografia ou tomografia computadorizada espiral, as condições das artérias renais. O detalhamento do número de artérias, bem como suas divisões, é útil para o cirurgião no planejamento técnico do transplante. A utilidade da angiografia no transplante renal começa na avaliação do número e das condições das artérias que
irrigam os rins do doador selecionado. O conhecimento destes detalhes anatômicos é indispensável para o cirurgião no planejamento do ato operatório. As alterações pré-renais, renais e pós-renais, no rim transplantado, são diagnosticadas pela arteriografia em qualquer período do pós-operatório, entre os quais destacamos: a) rejeição: na fase aguda, caracteriza-se por aumento de volume do rim devido ao intenso edema provocado pela infiltração inflamatória, necrose vascular, tubular e cortical, bem como pela presença de áreas de hemorragia e infarto. As artérias intra-renais podem apresentar-se estreitadas ou ocluídas, e o tempo de circulação, prolongado. A filtração glomerular está prejudicada, e a opacificação das veias é escassa ou nula. Na fase crônica da rejeição, o rim se apresenta menor que na ocasião do transplante, e é possível identificar cicatrizes do infarto. O tempo de circulação não está significativamente retardado. b) Estenose da artéria renal: relaciona-se a problemas técnicos ou à progressão de lesões ateroscleróticas não diagnosticadas previamente. Estas lesões podem determinar hipertensão arterial sistêmica ou comprometer a perfusão renal e, conseqüentemente, sua função. c) Trombose da veia renal: às vezes é secundária à rejeição; os sinais arteriográficos podem confundir-se nestas duas situações: aumento de volume do rim, espasmos arteriais, perfusão cortical pobre e tempo de circulação renal extremamente retardado. O trombo venoso ocasionalmente se estende até a veia ilíaca ou cava inferior, sendo facilmente demonstrado pela flebografia.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA CUNHA, L.; YORDI, L.N.; AND FELDMAN, C.J. Radiologia no diagnóstico nefrológico. In: Loboto, O. & Braga, B.F. (eds.) Orientação Diagnóstica em Nefrologia. Porto Alegre: Falmed, 1975; (4):45-66. CURRY, N.S. Small renal masses (lesions smaller than 3 cm). Imaging evaluation and management. AJR, 1995; 164:262-355. DAVIDSON, A.J. Diagnostic uroradiologic techniques. In: Davidson, A.J. (ed.) Radiology of the Kidney. Philadelphia: Philadelphia Saunders, 1985: 3-24. DAVIDSON, A.J. Radiologic Diagnosis of Renal Parenchymal Disease. WB Saunders Company, 1977. GOLD, R.P.; McCLENNAN, B.L. Acute infections of the renal parenchyma. In: Pollack, H.M. (eds.) Clinical Urography. Philadelphia: Philadelphia Saunders, 1990:799-821. GOLDRAICH, N.P. Refluxo Vésico-Ureteral Primário: Repercussões Renais. Tese de doutorado. Porto Alegre, 1977. HODSON, C.J. and CRAVEN, J.D. The radiology of obstructive athrophy of the kidney. Clin Radiol, 1966; 17:305. HODSON, C.J.; MALING, T.M.J.; McMANAMON, P.J. and LEWI, M.G. The pathogenesis of reflux nephropathy (chronic atrophic pyelonephritis). Br Journal Radiol, 1975; Suplement 13. JACOBSON, B.F.; JORULF, H.; MOHSEN, S.K.; NARASIMHAN, D.L. Nonionic versus ionic contrast media in intravenous urography: Clinical trial in 1.000 consecutive patients. Radiology, 1988; 167:601-05.
314
Investigação por Imagem do Aparelho Urinário no Adulto
KAWASHIMA, A.; SANDLER, C.M.; GOLDMAN, S.M.; RAVAL, B.K.; FISHMAN, E.K. CT of renal inflammatory disease. Radiographics, 1997;17:851-866. KENNEY, P.J.; BREATNACH, E.S. And STANLEY, R.J. Renal inflamation. In.: Pollack, H.M. (eds.) Clinical Urography. Philadelphia: Philadelphia Saunders, 1990:799-849. LEE, J.K.T.; STANLEY, R.J.; SAOEL, S.S.; HEIKEN, J.P. Tomografia Computadorizada do Corpo em Correlação com Ressonância Magnética, 3.ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. LEVINE, E. Malignant renal parenchymal tumors in adults. In: POLLACK, H.M. (ed.) Clinical Urography. Philadelphia: Philadelphia Saunders, 1990:1216-91. LINDVALL, N. Renal papilary necrosis. A roentgenographic study of 155 cases. Acta Radiologica (Diagn.), 1960; Suppl. 192. MILLER, F.H.; PARICH, S.; GORE, R.M.; NEMCEK Jr, A.A.; FITZGERALD, S.W.; VOGELZANG, R.L. Renal manifestations of AIDS. Radiographics 1993; 13:587-96. OLSSON, O. and JONSSON, G. Roentgen examination of the kidney and the ureter. In: Encyclopedia of Urology. Berlin: Springer-Verlag, 1962. PRANDO, A.; PRANDO, D.; CASERTA, N.; BAUAB Jr, T. Urologia Diagnóstico por Imagem. São Paulo: Sarvier, 1997. STAIR, D.C.; RIOS, W.A.; BLACK, H.R. Atypical causes of curable renovascular hypertension: a review. Progress in Cardiovascular Diseases, 1990; vol XXXIII (3):185-210. STEPHEN, G.; PAUKER, and RICHARD, I.K. Screening for renovascular hypertension. A whitch hunt. Hypertension, 1989;14:258-260. SYLLABUS: A Categorical Course in Genitourinary Radiology. In: 80th Scientific Assembly and Annual Meeting of the Radiological Socie-
ty of North America. St. Louis: Bruce L. McClennan (ed.), nov/dec 1994. TALNER, L.B.; DAVIDSON, A.J.; LEBOWITZ, R.L.; PALMA, L.D.; GOLDMAN, S.M. Acute pyelonephritis: Can we agree on terminology? Radiology, 1994; 192:297-305. TALNER, L.B.; DAVIDSON, A.J.; LEBOWITZ, R.L.; PALMA, L.D.; GOLDMAN, S.M. Acute pyelonephritis: Can we agree on terminology? Radiology, 1994; 192:297-305. VINCENT, J.; CANZANELLO, M.D. and STEPHEN, C. Noninvasive diagnosis of renovascular disease. Mayo Clin Proc, 1994; 69:1172-1181. VINCENT, J.; CANZANELLO, M.D. and STEPHEN, C. Noninvasive diagnosis of renovascular disease. Mayo Clin Proc, 1994; 69: 1172-1181.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.fpnotebook.com/URO16.htm http://www.esur.org/training.cfm — European Society of Urogenital Radiology. http://www.radsci.ucla.edu:8000/gu/stones/ kidneystone.html http://www.duj.com — Digital Urology Journal. http://www.vh.org — Virtual Hospital. http://www.acr.org — American College of Radiology. http://www.cbr.org.br — Colégio Brasileiro de Radiologia.
Capítulo
18
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética Sérgio Augusto de Munhoz Pitaki
I. ULTRA-SONOGRAFIA RENAL INTRODUÇÃO
Litíase renal
PRINCÍPIOS DA ULTRA-SONOGRAFIA
Doença inflamatória
LIMITAÇÕES DO MÉTODO ULTRA-SONOGRAFIA RENAL
Tumores renais APLICAÇÕES AVANÇADAS
Preparo para o exame
Nefrostomia percutânea
Aspecto ultra-sonográfico
Biópsia renal
Dimensões renais
Punção de cistos renais
Doença renal
Litotripsia extracorpórea por ondas de choque
Anomalias congênitas
Doença vascular — Doppler
Integridade cortical e medular
Transplante renal
Doença cística renal
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Uropatia obstrutiva
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO Os exames ultra-sonográficos do aparelho urinário são comumente realizados devido à sua elevada acurácia e segurança, e por não requererem a utilização de contraste ou função renal normal. Podem ser realizados em ambiente ambulatorial, hospitalar, mesmo em pacientes debilitados à beira do leito e em unidades de terapia intensiva. As indicações mais comuns para ultra-sonografia (US) do trato urinário incluem avaliação da obstrução do sistema coletor, demonstrando tanto a dilatação como o fluxo ureteral no interior da bexiga urinária; avaliação de nefrolitíase; avaliação de doença cística renal; detecção de massa renal, adrenal ou perinéfrica; caracterização de massa renal sólida ou cística ou de conteúdo gorduroso, avaliação vascular de rins primitivos e transplantados e como guia de biópsias e de aspiração de cistos renais.
PRINCÍPIOS DA ULTRA-SONOGRAFIA O princípio da US baseia-se na aplicação de estímulos elétricos sobre um cristal, que alterando seu volume produz onda sonora de alta freqüência, o ultra-som (infra-som ⫽ freqüência abaixo de 16 Hz; som ⫽ freqüência entre 16 e 16.000 Hz; ultra-som ⫽ freqüência entre 16 kHz e 100 MHz; hipersom ⫽ freqüência acima de 100 MHz), que se propaga pelos tecidos e por eles é refletida pelas interfaces proporcionadas pelas estruturas internas de diferentes densidades. As ondas refletidas são captadas pelo mesmo cristal, amplificadas e processadas, resultando em imagem no monitor. Estas ondas têm intensidade muito reduzida e são isentas de irradiação ionizante, sendo inócuas, sem risco, podendo ser utilizadas em pacientes gestantes como diagnóstico desde o princípio do primeiro trimestre.
316
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
A transmissão é adequada às partes moles do organismo, não sendo necessária a utilização de meios de contraste. Nos últimos anos têm sido realizados experimentos para ampliar o efeito Doppler nos vasos e no estudo do refluxo vésicoureteral com substâncias chamadas contrastes sonográficos. A US é um exame anatômico, que possibilita a visualização de estruturas normais e suas alterações, sendo que a avaliação funcional do parênquima renal deve ser realizada por outros exames, como urografia excretora e cintilografia.
LIMITAÇÕES DO MÉTODO As limitações físicas do exame ultra-sonográfico são o ar, o osso e o tecido adiposo. A presença de ar e sólidos ocasiona a formação de sombra acústica, impedindo a visualização de estruturas posicionadas posteriormente. O tecido adiposo, por sua vez, ocasiona atenuação do feixe sonoro, prejudicando a visualização de estruturas mais profundas, e o osso (ou calcificações) impede a visualização posterior, devido à alta velocidade do som através dos mesmos. A ultra-sonografia não é um método infalível, capaz de dissecar estruturas ou de fornecer laudos anatomopatológicos. É um exame de alta sensibilidade e de baixa especificidade. Em algumas ocasiões os achados são considerados característicos e em outras apenas sugestivos e comuns a várias doenças. O exame ultra-sonográfico depende de fatores fundamentais, como a aparelhagem utilizada e a experiência do ultra-sonografista. A aparelhagem utilizada deve apresentar recursos suficientes para a formação de boa imagem, com alto poder de resolução associado à versatilidade de uso, podendo assim realizar exames nas variadas regiões do corpo. A realização e a interpretação do exame dependem exclusivamente do imaginologista. Dele depende o resultado final, que passa por várias etapas, desde o conhecimento anatômico e fisiopatológico, a história clínica e a interpretação das imagens, até o bom conhecimento do equipamento e de seus recursos, todos fundamentais para um bom diagnóstico.
ULTRA-SONOGRAFIA RENAL Preparo para o Exame O exame ultra-sonográfico renal, propriamente dito, não necessita de preparo. A localização dos rins não oferece obstáculos à onda sonora; utiliza-se, à direita, o fígado como “janela” acústica e, à esquerda, eventualmente o baço associado ao decúbito lateral direito. Podem-se, também, observá-los através da via dorsal, com o paciente em decúbito ventral, sentado ou em posição ortostática.
Aspecto Ultra-sonográfico A anatomia seccional do rim é determinada por várias estruturas que dão o seu aspecto característico. A interface mais externa corresponde à gordura perirrenal, fáscia de Gerota e cápsula renal (Fig. 18.I.1). Internamente a estas estruturas, visualiza-se o parênquima renal, que é a somatória dos ecos provenientes do córtex e pirâmides renais. As invaginações normais do tecido cortical chamam-se septos de Bertin e separam as pirâmides renais. A ecogenicidade do parênquima renal é menor que a do parênquima hepático e menor que a do parênquima esplênico (Fig. 18.I.2). Podem-se individualizar as pirâmides renais diferenciando-as do córtex renal em alguns pacientes adultos, em todos os recém-natos e até os seis meses de idade (Fig. 18.I.3). As artérias arqueadas delimitam verdadeiramente as pirâmides e o córtex renal. Os ecos centrais são intensos devido às estruturas que os compõem, que são basicamente sistema coletor (cálices, infundíbulo e porção da pelve), tecido conjuntivo, vasos renais e sistema linfático.
Dimensões Renais As dimensões renais na US são menores que as detectadas pela radiografia porque não há nenhum tipo de magnificação ou alterações de tamanho relacionadas à
Pontos-chave: Ultra-sonografia • Vantagens • Sem radiação ionizante • Não-invasivo • Grande disponibilidade • Baixo custo • Alta sensibilidade • Limitações • Ar • Ossos
COLUNA DE BERTIN CÁPSULA RENAL
PIRÂMIDE CÓRTEX TEC. ADIPOSO
PELVE RENAL JUNÇÃO URETEROPIÉLICA
Fig. 18.I.1 Esquema da anatomia renal.
317
capítulo 18
O aumento de volume renal mais característico é o encontrado nas lesões ocupantes de espaço, de natureza sólida ou cística. A diminuição do tamanho do rim é encontrada na maioria das doenças renais de evolução crônica. Nestes estágios, a estrutura renal pode confundir-se com a gordura perirrenal. Apresenta-se como uma estrutura ovóide, hiperecogênica, com dimensões reduzidas, em torno de 5 a 7 cm.
Doença Renal Fig. 18.I.2 Aspecto sonográfico do rim direito normal.
diurese osmótica do contraste na urografia excretora. As medidas renais normais correspondem àquelas descritas nas autópsias, em média 11 a 12 cm longitudinalmente, 6 cm transversalmente e 3 cm de espessura, no adulto. No recém-nato com peso entre 3.000 e 3.500 g, o rim mede em torno de 4 cm, no seu maior eixo. O aumento do volume renal pode ser devido a um acúmulo de líquido intersticial, propiciando uma diminuição difusa da ecogenicidade do parênquima (padrão hipoecóico), por exemplo, na fase aguda da trombose da veia renal e na pielonefrite difusa aguda. Com o acúmulo de amilóide ou de gordura, pode haver aumento do volume renal, porém neste caso o parênquima tornar-se-á mais ecogênico.
Pontos-chave: Características sonográficas de rins normais • Tamanho: 11 cm (média de 9 a 13 cm) • Ecogenicidade: menor que a do fígado, baço e pâncreas • Parênquima: não-homogêneo • Superfície: lisa • Formato: característico
Fig. 18.I.3 Rim do recém-nato.
ANOMALIAS CONGÊNITAS Achados ultra-sonográficos como a hipoplasia e atrofia renais são causas freqüentes de exclusão renal na urografia excretora. A agenesia renal refere-se à ausência congênita do rim e ureter, que pode ser uni- ou bilateral. Na agenesia renal bilateral o diagnóstico ultra-sonográfico prénatal baseia-se na não-visualização de rins, ureteres, bexiga e acompanhados de oligoidrâmnio. A hipoplasia e a agenesia unilateral também ocorrem comumente com anomalias dos sistemas de Muller e de Wolff, obrigando-se a investigação dos mesmos pela US. Duplicação de pelve e hipertrofia das colunas de Bertin são destacadas por poderem mimetizar lesão expansiva, devendo-se correlacionar com exames funcionais. As anomalias de posição, como rins pélvicos e ectopia renal cruzada, podem mimetizar um rim único com sistema pielocalicial duplicado, ou ainda massa tumoral sólida. O rim em “ferradura” é característico à US. Seus pólos inferiores estão anteriorizados e desviados medialmente, com o istmo passando anteriormente aos grandes vasos. O diagnóstico diferencial é feito com massa pancreática ou linfonodomegalias.
INTEGRIDADE CORTICAL E MEDULAR As alterações parenquimatosas renais repercutem de maneira inespecífica à US, e o diagnóstico é presuntivo. Normalmente o córtex apresenta espessura e ecogenicidade características, discretamente hiperecóico em relação às pirâmides renais e de ecogenicidade semelhante ao parênquima hepático ou esplênico. A característica ultrasonográfica da doença parenquimatosa é o aumento difuso da ecogenicidade do parênquima renal bilateralmente. A maior ou menor ecogenicidade do córtex renal não pode servir como parâmetro de gravidade do acometimento. Os maiores aumentos de ecogenicidade do córtex renal estão relacionados com alterações intersticiais ativas, provavelmente devido ao fato de haver maiores quantidade de túbulos e interstício que de néfrons ou vasos, que juntos compõem o córtex renal. Não se pode distinguir entre as múltiplas causas de insuficiência renal aguda, que resultam em aumento inespecífico da ecogenicidade renal; a biópsia é essencial para o diagnóstico anatomopatológico.
318
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
O aumento da ecogenicidade medular em relação à ecogenicidade cortical representa vários tipos de doenças. São descritas alterações na gota, rins espongiomedulares, hiperaldosteronismo primário, hiperparatireoidismo, doença de armazenamento do glicogênio, doença de Wilson e síndrome de Sjögren. Também estes achados ultra-sonográficos podem ser somente secundários a anormalidades anatômicas, como, por exemplo, ectasia tubular medular, depósito de proteínas nos túbulos coletores, depósitos de uratos, fibrose das pirâmides ou simplesmente congestão vascular. As doenças crônicas afetam os rins de maneira inespecífica à US, levando a redução volumétrica bilateral e aumento intenso da ecogenicidade (Fig. 18.I.4).
DOENÇA CÍSTICA RENAL Os cistos são as massas renais mais comuns. Do ponto de vista patológico, existem classificações bem elaboradas dos cistos renais. Do ponto de vista ultra-sonográfico prático, podemos classificá-los em três grupos: cistos renais simples (Fig. 18.I.5), cistos renais múltiplos e cistos renais atípicos ou complexos (Fig. 18.I.6). A importância maior da US é a diferenciação com doenças mais sérias, como doença renal policística, abcessos renais e carcinomas do rim. Os cistos renais simples são de natureza benigna, podem apresentar infecção ou, pelo aumento de volume, levar à hipertensão induzida pela angiotensina. Em ambos os casos a punção aspirativa está indicada, pelo fato de os antimicrobianos não penetrarem no cisto e pela redução da compressão do parênquima renal com o esvaziamento do mesmo. Podem causar dor lombar e sensação de peso conforme o tamanho e a localização. Podem apresentar localização indiscriminada pelo córtex renal, porém são visualizados preferencialmente nos pólos, principalmente no pólo superior. Sua freqüência aumenta com a idade e está presente na metade da população acima de 50 anos. O aspecto ultra-sonográfico é característico, geralmente esférico, com paredes definidas, não apresentando irre-
Fig. 18.I.4 Rim atrófico: paciente adulto com rim de 6,5 cm, hiperecogênico, com perda da diferenciação córtico-medular.
Fig. 18.I.5 Cisto simples no pólo superior do rim direito.
gularidades, reentrâncias ou espessamentos. Seu conteúdo deve ser totalmente livre de ecos (anecóico ou sonolucente), o que sugere a presença de líquido seroso. Podem atingir grandes volumes de até 10 a 15 cm. O diagnóstico pode ser dificultado se a localização for central ou peripélvica. O cisto diferencia-se da anomalia da junção pieloureteral, pois esta se apresenta geralmente triangular, e a comunicação com os cálices assegura o diagnóstico de dilatação do sistema coletor.
Pontos-chave: Características sonográficas de cistos simples • Paredes finas e lisas • Ausência de irregularidade na superfície interna • Conteúdo sem ecos (anecóico) • Reforço acústico posterior • Sombras laterais Os cistos renais atípicos podem apresentar-se com múltiplas loculações. Como assinalamos anteriormente, o conteúdo de um cisto simples deve ser totalmente livre de ecos. Neste, porém, encontramos septações incompletas, permi-
Fig. 18.I.6 Cisto atípico ou complexo: cisto com septações grosseiras e calcificações murais.
capítulo 18
tindo a livre comunicação do líquido entre os vários lóculos. Estas estruturas não apresentam valor clínico significativo. Se houver dificuldade na visualização das superfícies internas dos septos, ou irregularidade nos mesmos, indica-se a punção aspirativa para esclarecimento diagnóstico, pois pode tratar-se de um tumor ou alteração do conteúdo, como pus ou sangue. Os cistos infectados geralmente são complicações de um cisto simples. Notam-se discretas alterações da ecogenicidade do conteúdo, por tratar-se de líquido espesso, como nos abcessos. Suas paredes podem estar ligeiramente espessadas. Aproximadamente 6% dos cistos renais sofrem hemorragias. O sangramento intracístico pode ser causado principalmente por traumatismos, varicosidades da parede e diátese hemorrágica. Os tumores também são causa importante de sangramento intracístico. Enfatizamos, por esta razão, que caso tenham ocorrido alterações dos cistos simples em relação ao exame anterior, elas devem ser rigorosamente investigadas.
Pontos-chave: Incidência de cistos renais por idade e sexo • 15 a 29 anos Masc ⫽ 0,0 Fem ⫽ 0,0 • 30 a 49 anos Masc ⫽ 1,9 Fem ⫽ 1,4 • 50 a 69 anos Masc ⫽ 15,0 Fem ⫽ 6,7 • acima de 70 anos Masc ⫽ 32,3 Fem ⫽ 14,6 O sangramento recente apresenta nível líquido/líquido. Com a evolução do quadro há formação de coágulos. A lesão assume um padrão complexo que a torna semelhante ao aspecto ultra-sonográfico de um tumor renal, variando a lesão de aspecto cístico até sólido. Os cistos calcificados são de difícil análise à US, devido à forte sombra acústica posterior, por ter densidade próxima à densidade do osso. A classificação dos cistos complicados foi introduzida por Bosniak, que descreveu quatro categorias, reduzindo assim o impacto das lesões malignas nos achados incidentais em exames por imagem. Cisto simples, categoria ou classe I de Bosniak, referese ao cisto simples, descrito acima, o qual pode ser diagnosticado por TC ou US e não requer seguimento. Os cistos complicados, categoria II, permitem ainda um diagnóstico seguro de benignidade e incluem as imagens que apresentam finas septações, calcificações septais ou parietais, ou densidades homogêneas no cisto menores que 3 cm. Se estes cistos são detectados pela US, devem ser encaminhados para a TC com e sem contraste, no sentido de observar o realce das alterações visualizadas. A falta de realce é o achado mais importante, sugerindo seguimento para observar a estabilidade da lesão. As lesões indeterminadas ou categoria III de Bosniak apresentam espessamento de parede, calcificações irregu-
319
lares, septações ou espessamentos focais, que podem apenas representar aspecto pós-hemorrágico, infeccioso ou cisto multilocular, como também demonstrar malignidade. Estas lesões devem ser removidas cirurgicamente com técnicas de preservação renal, se possível. Deve-se ter em mente que estas lesões removidas podem ser benignas. As lesões císticas claramente malignas ou categoria IV de Bosniak indicam uma alta probabilidade de malignidade, como espessamento sólido, irregular, com intenso realce na TC. Dentro da classificação de cistos renais múltiplos, a doença renal policística do tipo adulto, ou autossômica dominante, apresenta-se à US com aspecto característico (Fig. 18.I.7). Os rins encontram-se freqüentemente aumentados de volume. A chave diagnóstica é o achado de várias lesões císticas de tamanhos diferentes, com localização difusa pela loja renal. Se houver dificuldade técnica na avaliação da imagem, sugerimos correlação com tomografia computadorizada ou ressonância magnética. O exame de outros órgãos é concomitante, e a busca de outras lesões deve ser sempre realizada. Os cistos hepáticos são encontrados em 25 a 30% dos pacientes com doença policística renal do tipo adulto. Os cistos pancreáticos são encontrados apenas ocasionalmente. A doença renal policística tipo infantil, autossômica recessiva, tem aspecto mais ou menos característico aos ultra-sons. Há um aumento generalizado do rim, as bordas são irregulares e há perda de definição entre o seio renal, medular e cortical. O intenso aumento de ecogenicidade em toda a loja renal deve-se à ectasia tubular, transformando o aspecto característico dos rins do recém-nato descrito anteriormente. O rim multicístico (displasia renal multicística) pode representar uma hidronefrose secundária a atresia do ureter, pelve ou ambos, durante o estágio metanéfrico do desenvolvimento intra-uterino. Dependendo da época ou do nível de obstrução, o espectro de formas varia desde um rim multicístico unilateral, displasia multicística focal ou segmentar, até o aspecto de doença renal multicística bilateral. Os cistos peripélvicos originam-se no hilo do rim, não se comunicando com o sistema coletor. São achados de exame e algumas vezes apresentam-se como massas à uro-
Fig. 18.I.7 Aspecto sonográfico da Doença Policística Autossômica Dominante (DPAD).
320
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
grafia excretora. Deve ser feito diagnóstico diferencial com hidronefrose e com pelve extra-renal.
Diagnóstico Diferencial da Doença Cística Renal Entre os diagnósticos diferenciais, a obstrução da junção ureteropélvica pode ser diagnosticada durante a vida intra-uterina ou ser suspeitada no recém-nato com massa palpável na loja renal. O diagnóstico ultra-sonográfico baseia-se no achado de pelve de grande volume que se comunica com os cálices e não apresenta dilatação ureteral. Deve-se então complementar com cintilografia para quantificar a função renal e o padrão obstrutivo. A US pode auxiliar na detecção de duplicação pielocalicial identificando duas densidades no seio renal, separadas por faixa de parênquima renal. Tem importância no diagnóstico de ureterolitíase, drenagem anômala do ureter distalmente ao trígono vesical (ureterocele, vesícula seminal, uretra prostática) e na identificação da quantidade de parênquima da porção superior do rim duplicado. A megacalicose (megacálice congênito) é considerada uma dilatação não-obstrutiva dos cálices como resultado de um subdesenvolvimento das pirâmides. Doença cística medular, numa de suas formas de apresentação (rim espongiomedular), produz alterações nos túbulos coletores na zona medular, que eventualmente podem ser evidenciadas ao exame ultra-sonográfico. As pirâmides assumem uma ecogenicidade aumentada em relação ao córtex renal devido à ectasia tubular cística dos ductos coletores, onde podem ser visualizados pequenos cálculos. A US pode ser de grande importância na detecção destas anomalias, oferecendo um diagnóstico rápido, sem utilização de contrastes.
Pontos-chave: Diagnóstico diferencial de cistos complexos • Cistos hemorrágicos • Cistos infectados • Cistos multisseptados • Abcesso • Hematoma • Carcinoma cístico de células renais • Nefroma cístico multilocular UROPATIA OBSTRUTIVA A US tem sido o método de imagem de escolha no diagnóstico dos processos obstrutivos. O grau de sensibilidade da US em detectar obstrução é de 93 a 98%. Classifica-se como leve, moderada, acentuada ou severa (Fig. 18.I.8), conforme o grau de dilatação do sistema coletor. Outro dado importante a ser detectado é a quantidade de parênquima renal, com valor prognóstico importante, maior inclusive que o grau de dilatação. Alguns dados técnicos devem ser notados, como grau de hidratação do paciente, avaliação
Fig. 18.I.8 Uretero-hidronefrose acentuada.
pré- ou pós-miccional e repleção intensa da bexiga urinária. Na obstrução aguda o sistema coletor pode não estar dilatado, bem como a obstrução concomitante com doença cística configura um diagnóstico falso-negativo. Por outro lado, o diagnóstico falso-positivo pode estar associado à pelve extra-renal, megacalicose congênita, hiperidratação, pielonefrite aguda, cisto peripélvico, período pós-obstrutivo, dilatação pós-operatória e refluxo vésico-ureteral. Entre as causas de obstrução estão as anomalias congênitas e as adquiridas. Entre as congênitas podemos citar as válvulas de uretra posterior, estenoses uretrais e meatais, obstrução do colo vesical, estreitamento ou obstrução da junção pieloureteral e refluxo vésico-ureteral grave. Entre as causas adquiridas podemos citar os cálculos, hiperplasia prostática benigna, doenças malignas com metástases infiltrativas (colo uterino, próstata, bexiga), processos inflamatórios (prostatite, uretrite ou ureterite), coágulos, gestação normal, doenças funcionais (bexiga neurogênica) e outras causas, como fibrose retroperitoneal, diabetes insipidus e obstrução prévia.
Pontos-chave: Causas de hidronefrose • Comuns Congênitas Válvula de uretra posterior, estenose ureteral, meatal e de junção pieloureteral, refluxo vésico-ureteral Adquiridas Hiperdistensão vesical, bexiga neurogênica, hiperplasia prostática, gestação, litíase, tumores, metástases • Incomuns Diabetes mellitus Nefropatia de refluxo Fibrose retroperitoneal
321
capítulo 18
LITÍASE RENAL A sensibilidade da US em detectar cálculo renal é superior àquela da radiografia convencional e é pouco menor que quando combinados os métodos radiografia convencional e nefrotomografia. Atualmente o método com maior sensibilidade na detecção de litíase renal é a tomografia computadorizada sem contraste. A sensibilidade de detecção de ureterolitíase não é tão boa quanto a detecção intra-renal. A localização nos segmentos proximais e distais é consideravelmente mais fácil. Devido à maioria dos cálculos impactarem no ureter distal, é sempre recomendado o início do exame por este segmento. A visualização de cálculos não se baseia no conteúdo mineral do mesmo (Fig. 18.I.9). Basta, para tanto, constituir-se em uma estrutura sólida com dimensões suficientes para refletir parte do feixe sonoro e apresentar (ou não) sombreamento acústico posterior. Pode ocorrer diagnóstico falso-positivo, devido a fatores como, por exemplo, cicatrizes de processos inflamatórios antigos e gordura ou ar no sistema coletor, que mimetizam a imagem de cálculo. As artérias podem aparecer como imagens ecogênicas, principalmente as de maior calibre, porém apresentam pulsação e atualmente podem ser diferenciadas através da técnica duplex-Doppler e colorDoppler. Quando observamos placas ateromatosas o problema ainda é maior, porque estas se manifestam com ecos de forte intensidade, podendo apresentar sombra acústica posterior. O diagnóstico diferencial também pode ser dificultado em algumas colagenoses, como na esclerose sistêmica progressiva, nas quais podem ocorrer lesões arteriais.
DOENÇA INFLAMATÓRIA A avaliação do sistema coletor, parênquima e espaço retroperitoneal adjacente é de extrema importância na avaliação da doença inflamatória ou evidência de infecção. Tem valor de procedimento de screening na avaliação de
Fig. 18.I.9 Hidronefrose com cálculo na pelve renal.
infecção do trato urinário em crianças para detecção de anormalidades congênitas, particularmente obstrutivas, e as do refluxo vésico-ureteral. Os sinais ultra-sonográficos nestas doenças podem ser variados, desde achados inespecíficos, como espessamento da mucosa da pelve renal e uma hipoecogenicidade ao redor do sistema coletor, e sinais objetivos, como aumento de volume renal unilateral com redução de ecogenicidade compatível com intenso edema, até a presença de abcesso intra-renal (Fig. 18.I.10). Nos casos de crianças com suspeita de refluxo vésicoureteral salientamos que a US é o primeiro exame por imagem a ser indicado. São indicados outros exames, como uretrocistografia miccional, urografia excretora e cintilografia, quando são visualizadas alterações como ectasia ureteral ou hidronefrose em qualquer grau.
TUMORES RENAIS A detecção de neoplasias renais de dimensões cada vez menores (⬍ 3 cm) deve-se ao fato de o exame ultra-sonográfico abdominal incluir o exame das lojas renais e maior número de rins serem examinados (Figs. 18.I.11 e 18.I.12 ), bem como ao aumento da qualidade das imagens obtidas pela tomografia computadorizada e pela US, que detectam lesões não visualizadas na urografia excretora. Os autores são unânimes em que a tomografia constitui o melhor método de detecção de pequenos tumores nos rins, devido ao realce pelo contraste, e a US é o melhor método para diferenciá-los entre textura sólida ou cística. Independente do tamanho da lesão, não se pode por estes métodos de imagem considerar uma lesão sólida benigna ou maligna. O carcinoma de células renais representa de 1 a 3% de todos os cânceres viscerais e aproximadamente 80 a 90% dos cânceres renais no adulto. Classicamente o paciente apresenta dor lombar, massa palpável e hematúria. Freqüentemente observa-se hematúria como o primeiro sinal da doença. As caraterísticas ultra-sonográficas mais comuns correspondem à presença de massa de ecogenicidade diferente do parênquima renal sem reforço acústico posterior (Figs. 18.I.13 e 18.I.14).
Fig. 18.I.10 Abcesso renal.
322
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
O estudo com Doppler colorido demonstra o grau de vascularização e a imagem demonstra o comprometimento da cápsula e da gordura perirrenal, bem como a presença e a extensão do trombo na veia renal e na cava inferior (Fig. 18.I.15).
Pontos-chave:
Fig. 18.I.11 Tumor renal sólido.
Diagnóstico diferencial de massas renais • Carcinoma de células renais • Angiomiolipoma • Carcinoma de células transicionais • Oncocitoma • Linfoma • Tumor de células justaglomerulares • Hipertrofia focal do parênquima • Pielonefrite • Metástases
APLICAÇÕES AVANÇADAS Nefrostomia Percutânea Fig. 18.I.12 Macroscopia do tumor renal sólido.
Nefrostomia percutânea é uma técnica bem estabelecida para derivação temporária ou permanente da obstrução urinária. A US é escolhida como método por imagem para direcionar a punção e colocação de cateteres para derivação. O procedimento é rápido e com uma ótima relação custo-benefício. O índice de complicações é baixo. A única contra-indicação relativa é a diátese hemorrágica.
Biópsia Renal Desde a introdução da biópsia renal percutânea, em 1949, a técnica vem sendo continuamente desenvolvida. São inú-
Fig. 18.I.13 Tumor sólido em pólo superior.
Fig. 18.I.14 Tumor sólido no terço médio do rim.
Fig. 18.I.15 Trombo na veia renal e veia cava inferior.
capítulo 18
meras suas indicações, entre elas estabelecer o provável diagnóstico da doença renal, auxiliar na terapia e determinar o grau de doença, se aguda ou crônica, e sua potencial reversibilidade. Atualmente a US é considerada padrão-ouro como método de imagem auxiliar na biópsia renal (Fig. 18.I.16). Até 1982, eram utilizados aparelhos estáticos para a localização do rim. Com a utilização de aparelhos dinâmicos houve acentuada melhora da técnica, que possibilitou a visualização simultânea da agulha e do rim durante o procedimento e escolha do local ideal para a retirada do fragmento. Exames laboratoriais, como por exemplo tempo parcial de tromboplastina, tempo de protrombina, contagem de plaquetas e tempo de coagulação, são imprescindíveis para realização da biópsia. Para garantir a coagulação normal, os pacientes devem interromper o uso de aspirina e antiinflamatórios não-hormonais pelo menos uma semana antes do procedimento. O uso de heparina deve ser interrompido no dia anterior. Se houver diátese hemorrágica deve ser indicada biópsia a céu aberto. A técnica de biópsia renal percutânea guiada por US é feita sob anestesia local. A localização do pólo desejado evita a punção de vasos maiores. Determina-se o tamanho renal, a presença de cistos, massas, obstruções ou coleções perinéfricas não observadas em exames anteriores, que quando presentes indicam a punção do rim contralateral. A tomografia computadorizada pode ser uma alternativa como guia de biópsia, quando o rim é mal visualizado ou o paciente apresenta acentuada obesidade. O uso da US, em vez da fluoroscopia, trouxe vantagens importantes, principalmente por ser inócua para o paciente e para a equipe médica, mais eficiente e com pequeno índice de complicações. Uma ampla variedade de agulhas são utilizadas, dependendo a escolha de preferência pessoal. O importante é a obtenção do maior número de glomérulos. Há na literatura comparação entre vários tipos de agulhas descartáveis para diagnóstico histológico. Agulhas finas de aspiração também estão disponíveis para diagnóstico citológico, no caso de tumores. As agulhas Tru-Cut®, de maior calibre,
Fig. 18.I.16 Biópsia renal.
323
apresentaram retirada de menor número de glomérulos com queda de hematócrito mais pronunciada. Atualmente utilizamos agulhas Bard® 18 gauge, sendo recomendada a retirada de dois fragmentos. Há casos como a nefrite lúpica proliferativa difusa, que necessita de um grande número de glomérulos para se fazer o diagnóstico preciso. Nestes casos a biópsia percutânea é insuficiente, sendo recomendada a biópsia a céu aberto. A biópsia percutânea é contra-indicada quando há diátese hemorrágica não corrigida, quando há atrofia renal indicativa de doença crônica irreversível, hipertensão severa, não controlada com medicação anti-hipertensiva, cistos múltiplos bilaterais, tumor renal, hidronefrose, infecção renal ativa ou perirrenal e em pacientes não colaborativos.
Pontos-chave: Contra-indicações de biópsia renal percutânea • Doença crônica irreversível • Rins atróficos • Hipertensão severa • Cistos múltiplos bilaterais • Tumor renal • Hidronefrose • Infecção renal ativa ou perirrenal • Rim único • Pacientes não colaborativos São descritas na literatura complicações em 0,7 a 10,0%. Em nosso material de estudo foram realizadas mais de 2.500 biópsias, de 1982 até 2001. Foram observadas complicações leves, como dor no local e hematúria leve, sem
Pontos-chave: Complicações de biópsia renal percutânea (dados da literatura) • Hematúria microscópica transitória — quase 100% • Hematúria macroscópica transitória — 3 a 10% • Hematoma perirrenal — 100% (mínimo a maciço) • Sangramento severo necessitando de transfusão — 1 a 2% • Cirurgia por sangramento — 0,1 a 0,4% • Nefrectomia — 0,06% • Obstrução por coágulos — 4% • Índice de mortalidade — 0,08 a 0,12% • Fístulas artério-venosas silenciosas — 18%
324
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
queda do hematócrito em grande número de pacientes. Complicações importantes, como hematúria maciça, foram observadas em cinco pacientes, que necessitaram de internamento e reposição de hemocomponentes. Nenhum hematoma perirrenal foi compressivo a ponto de necessitar de punção ou drenagem. Houve um óbito (0,0004%), em paciente jovem, 19 anos de idade, portadora de lúpus eritematoso sistêmico, a qual persistiu com hematúria severa, associada a complicações pulmonares e cardíacas e falência múltipla de órgãos relativas à doença básica.
Punção de Cistos Renais O tratamento de escolha dos cistos renais é a punção percutânea guiada pela US, por ser realizado em ambiente ambulatorial, de fácil execução, baixo custo, apresentando excelente acurácia e baixa morbi-mortalidade.
Litotripsia Extracorpórea por Ondas de Choque A litotripsia extracorpórea por ondas de choque atualmente é o tratamento de escolha para os cálculos renais. Os aparelhos atuais podem utilizar-se da localização dos cálculos por fluoroscopia e/ou US. No protocolo do procedimento são encaminhados para tratamento os cálculos acima de 0,9-1,0 cm, isto é, os cálculos que poderão provocar obstrução do trato urinário ou os cálculos infecciosos que, devido à sua presença, mantêm-se com processos infecciosos recorrentes.
Doença Vascular — Doppler
Fig. 18.I.18 Técnica de detecção de fluxo.
vasculares, medindo-se sua freqüência ou velocidade, direção e características qualitativas e quantitativas. Nos rins normais o traçado característico é semelhante ao da irrigação de leitos vasculares de baixa resistência (p. ex., artéria carótida interna, testículos, endométrio secretor, placenta, tumores ricamente vascularizados). Nas doenças que comprometem o fluxo tornando-o de alta resistência, obtém-se um traçado com elevação do pico sistólico e redução da onda diastólica, fazendo-a tender à linha basal ou mesmo tornando-a negativa. Nos casos onde há um aumento do fluxo, como nas fístulas arteriovenosas, o achado é de fluxo caótico com elevação da velocidade sistólica e diastólica. Nos segmentos estenosados observa-se elevação das velocidades sistólica e diastólica.
Transplante Renal
A dopplerfluxometria (dopplermetria, dopplervelocimetria, duplex-Doppler) e dopplerfluxometria em cores (triplex — Fig. 18.I.17; detecção de fluxo pulsátil — Fig. 18.I.18, e powerdoppler — Fig. 18.I.19) têm possibilitado o estudo do fluxo sanguíneo em determinados segmentos
Nos enxertos a visualização ultra-sonográfica é praticamente ideal pela localização superficial, tendo-se apenas a parede abdominal entre o transdutor e o rim. O aspecto é semelhante ao rim primitivo, com discreto aumento de volume no pós-operatório, tendendo à normalização até o sexto mês após a cirurgia.
Fig. 18.I.17 Doppler de artéria renal.
Fig. 18.I.19 Powerdoppler. Fluxo vascular intra-renal.
325
capítulo 18
Pontos-chave: Complicações do transplante renal • Rejeição do enxerto • Necrose tubular aguda • Toxicidade do imunossupressor • Causas urológicas Linfocele Urinoma Hematoma Abcesso Estenose de ureter Estenose da artéria renal Trombose venosa As coleções perinéfricas pós-operatórias (linfoceles, abcesso perinéfrico, urinomas, hematomas — Fig. 18.I.21) são facilmente detectadas; entretanto, freqüentemente não se podem diferenciá-las, devendo-se correlacionar com a clínica e o tempo de aparecimento. As obstruções ou estenoses ureterais parciais ou totais são complicações urológicas esperadas, porém a hidronefrose precoce é comum devido à atonia ureteral e ao edema na anastomose vésicoureteral. As complicações vasculares (estenose da artéria renal, infarto renal, trombose da veia renal, fístula arteriovenosa) podem ser diagnosticadas pela dopplerfluxometria. O exame Doppler colorido auxilia na rapidez do exame, porém a quantificação e a análise do fluxo devem ser feitas com o duplex-Doppler (ou Doppler espectral — Fig. 18.I.20). Tanto a rejeição aguda ou crônica, necrose tubular aguda, toxicidade à ciclosporina, pielonefrites e infartos também têm na US um auxílio diagnóstico. Nestas complicações médicas são indícios de alterações aumento de volume, época do aparecimento, aumento de ecogenicidade do parênquima renal, proeminência das pirâmides renais, perda de definição das estruturas renais e ectasia calicial discreta, que quando associadas a alterações do traçado Doppler aumentam a precisão do método.
Fig. 18.I.21 Complicação de transplante renal: coleção líquida perirrenal compatível com linfocele.
Em resumo, na avaliação do paciente pós-transplantado com complicações, é fundamental a diferenciação entre rejeição (terapia imunossupressora), necrose tubular aguda (conduta expectante), toxicidade pela ciclosporina (redução da dose) e complicações urológicas (correção específica). O diagnóstico correto direciona para a terapia específica.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BABKA, J.C.; COHEN, M.S.; SODE, J. Solitary intrarenal cyst causing hypertension. N. Engl. J. Med., 1974; 291:343. BOSNIAK, M.A. The small (⬍ or ⫽ 3.0 cm) renal parenchymal tumor: Detection, diagnosis and controversies. Radiology, 1991; 179:207. BROWN, E.D.; CHEN, M.Y.M. et al. Complications of renal transplantation: Evaluation with US and radionuclide imaging. Radiographics. 2000; 20:607. CAGLIOTI, A.; ESPOSITO, C.; FUIANO, G. et al. Prevalence of symptoms in patients with simple renal cysts. B.M.J., 1993; 306:430. COHEN, H.L.; BECKER, J.A. Taveras and Ferrucci. Radiology on CDROM. Diseases of the kidney. Imaging of Renal Transplantation and Its Complications. 2001. Radiology. Volume 4. Chapter 122. FURIANO, G.; MAZZA, G.; COMI, N. et al. Current indications for renal biopsy: A questionnaire-based survey. Am. J. Kidney Dis., 2000; 35:448. KIMBERLING, W.J.; FEIN, A.R.; KENYON, J.B. et al. Linkage heterogeneity of autosomal dominant polycystic kidney disease. N. Engl. J. Med., 1988; 319-913. PLATT, J.F. Sem US CT MR. 1997;18-22. RICHTER, F.; KASABIAN, N.G.; IRWIN, R.J. et al. Accuracy of diagnosis by guided biopsy of renal mass lesions classified indeterminate by imaging studies. Urology, 2000; 55:348. RAVINE, D.; GIBSON, R.N.; WALKER, R.G. et al. Evaluation of ultrasonographic diagnostic criteria for autosomal dominant polycystic kidney disease 1. Lancet, 1994; 343-824. RUMACK, C.M.; CHARBONEAU, J.W.; WILSON, S.R. Diagnostic Ultrasound. Mosby-Year Book, 2nd edition, 1998. STILES, K.P.; YUAN, C.M. et al. Renal biopsy in high risk patients with medical diseases of the kidney. Am. J. Kidney Dis., 2000; 36:419. ZUNINO, D.; PITAKI, S.A.M. Investigação radiológica e ultra-sonográfica em pacientes com infecção do trato urinário. J. Pediatr., 1991; 67:381-7.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Fig. 18.I.20 Doppler da artéria renal do enxerto.
Ultrasonografia Abdominal http://www.radiologyinfo.org/content/ultrasound-abdomen.htm
326
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
Imaging the Human Body with Ultrasound http://www.yale.edu/ynhti/curriculum/units/1983/7/ 83.07.06.x.html Geniturinary Imaging: Ultrasound http://www.meddean.luc.edu/lumen/meded/urology/ ushome.htm Doença Renal Policística http://www.niddk.nih.gov/health/kidney/pubs/polycyst/ polycyst.htm Câncer Renal http://www.methodisthealth.com/cancer/kidney.htm Imagens Médicas http://www.mic.ki.se/Medimages.html#radiol Ultra-sonografia http://www.radiologychannel.net/ultrasound/
Litíase Renal http://www.niddk.nih.gov/health/kidney/pubs/stonadul/ stonadul.html Litíase Renal http://www.aafp.org/afp/20010401/1329.html Pionefrose http://www.brighamrad.harvard.edu/Cases/bwh/hcache/4/ full.html Angiomiolipoma http://www.emedicine.com/radio/topic28.htm Transplante Renal http://www.emedicine.com/radio/topic374.htm Tópicos http://www.alphasonic.com.br
II. IMAGEM RENAL POR RESSONÂNCIA MAGNÉTICA INTRODUÇÃO
Tumores renais
Princípios físicos
Doenças difusas
Ressonância do núcleo
Uropatia obstrutiva
Relaxamento T1 e T2
Doença inflamatória
Contrastes
Doença vascular
INDICAÇÕES
Transplante renal
Anomalias congênitas
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Doença cística
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO Princípios Físicos A designação de Ressonância Nuclear Magnética, isto é, um método de imagem com formação de imagem a partir do núcleo do átomo, foi abandonada devido ao fato de haver associação com energia nuclear, o que causava pânico em alguns pacientes, além de associar o método com o perigo de contágio por elementos radioativos. Atualmente nos referimos ao método simplesmente como imagem por ressonância magnética (IRM). A geração de IRM emprega métodos não-invasivos, sem radiação ionizante, e está associada com princípios diferentes dos raios X, tomografia computadorizada e ultra-sonografia. A IRM representa a resposta relativa de um núcleo específico à energia de radiofreqüência absorvida. Tal como a radiografia ou ultra-sonografia, esta imagem representa densidade, nesse caso, da distribui-
ção dos núcleos que estão sendo observados. O contraste observado nas imagens é influenciado por outros fatores físicos, incluindo diferenças da habilidade de cada núcleo em reemitir o sinal de radiofreqüência absorvida, chamado de relaxação. A IRM é um mapa tomográfico da distribuição de prótons da região observada. Além disso, as intensidades relativas dos tecidos normais e patológicos podem ser modificadas pela alteração de parâmetros operacionais específicos nos protocolos de aquisição, de modo a enfatizar diferentes características físico-químicas de prótons específicos, assegurando um excepcional contraste entre uma grande distribuição de diferentes tecidos. O termo momento angular (spin) descreve o movimento de rotação de um corpo e deve ser diferente de zero para que ocorra o fenômeno de ressonância. Sem o momento angular, um núcleo não apresenta precessão ou oscilação, quando colocado num campo magnético. Sem precessão não vai haver ressonância, portanto não há sinal de ressonância nuclear magnética.
327
capítulo 18
De todos os átomos com núcleos não-pareados, o hidrogênio é o mais simples por ter apenas um próton, sendo o átomo mais importante para a formação de IRM — também por constituir dois terços de todos os átomos e estar distribuído por todos os tecidos e líquidos do ser humano. Além disso, é altamente magnético e por isso proporciona uma sensibilidade elevada na IRM. O núcleo do átomo de hidrogênio é um próton carregado positivamente com momento angular associado. Esta situação representa uma corrente e leva a formação de um campo magnético, com dois pólos (dipolar 씮 norte e sul). Os prótons num tecido com um momento magnético dipolar tendem a alinhar-se aos campos magnéticos externamente aplicados, agindo como magnetos em barra e representados por vetores, em magnitude e direção. Na ausência de campo magnético externo, os dipolos estão orientados ao acaso no espaço. Através da teoria quântica sabe-se que praticamente metade dos prótons estão alinhados e paralelos ao campo magnético. Uma proporção incrivelmente mínima, quando estimulados, poderá ser suficiente para produzir o sinal de IRM.
Fig. 18.II.1 Núcleos atômicos (A) girando rapidamente e apresentando momento magnético podem ser vistos como se fossem pequenas barras magnéticas (B).
O grau que um tecido responde ao campo magnético aplicado é denominado de suscetibilidade magnética. Para produzir um sinal de RM que possa ser detectado e processado de modo a criar uma imagem, o vetor de magnetização dever ser reorientado, para produzir um sinal nas bobinas receptoras ou antenas, que detectarão um pulso eletromagnético ou de radiofreqüência (RF). O paciente é colocado em um equipamento com forte campo magnético, cuja medida é chamada Tesla (T) ou Gauss (G). Atualmente os campos magnéticos utilizados apresentam entre 0,2 e 2,0 T ou de 2.000 a 20.000 G. Para fins de comparação, o campo magnético terrestre é de aproximadamente 0,0005 T ou 0,5 G (0,5 G no equador e 0,5 G nos pólos).
Ressonância do Núcleo A precessão da Terra é o terceiro movimento executado pelo nosso planeta (rotação, translação e precessão). Acontece apenas um movimento de precessão a cada 20.000 anos. Os prótons de hidrogênio apresentam o mesmo tipo de precessão, porém numa razão giromagnética muito maior, ou seja, de 42,58 MHz/T (que equivale a um milhão de ciclos por segundo quando submetidos a 1 Tesla). Esta freqüência é conhecida como freqüência ressonante ou de Larmor, onde a freqüência é proporcional à potência do campo magnético aplicado. A amplitude e a duração da RF podem ser controladas para produzir diversos graus de angulação do vetor, que vai do plano longitudinal para o plano transverso. Todos os efeitos de contraste produzidos na RM manifestam-se como alterações na magnetização transversa detectada pela bobina receptora de RF.
Pontos-chave: Fenômenos necessários para a formação de imagem por RM • Induzir de um campo magnético no organismo • Reorientar esse campo para um valor conhecido • Permitir que este campo retorne à sua orientação original (relaxação) • Detectar e medir o campo depois da relaxação
Relaxamento T1 e T2 Fig. 18.II.2 Precessão de um núcleo atômico em torno do campo magnético.
Após a excitação pela RF, os núcleos retornam ao equilíbrio, perdendo energia pela emissão de radiação eletromagnética e pela transferência de energia para os tecidos
328
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
a gordura, aparecendo brilhantes quando a imagem é analisada, pesada ou ponderada em T1. O tempo de relaxação transversal ou spin-spin é medido através do tempo T2, onde ocorre a transferência de energia para um núcleo vizinho. Após a excitação pela RF, os spins executam o movimento de precessão, criando um componente de magnetização transversal. Nas seqüências planejadas para obter um tempo T2 longo dos tecidos, estruturas com tempo de relaxação T2 longo aparecerão brilhantes, como por exemplo a maioria dos líquidos estáticos e tecidos edemaciados, sendo que nestes casos quando analisados em T1 apresentarão sinal mais fraco ou nenhum sinal. Fig. 18.II.3 A. Prótons alinhados com o campo B0. B. Após estímulo de RF a 90°.
ou entre os mesmos. Este processo é denominado relaxação e tem início imediatamente após o pulso de RF. Durante o processo de relaxação, os componentes longitudinal (Mz) e transversal (Mxy) da magnetização retornam aos seus valores de equilíbrio. Os processos envolvidos na relaxação dos componentes transversal e longitudinal da magnetização são independentes. Entende-se como relaxação longitudinal ou spin-rede o tempo T1, ou seja, o tempo necessário para que a magnetização retorne a 63% de seu valor original, transferindo a energia entre os núcleos excitados e a rede ou os tecidos vizinhos. Um tecido com recuperação rápida do tempo T1 apresenta uma intensidade maior de sinal, e por esta razão são chamados tecidos com tempo de relaxação T1 curto, como
Fig. 18.II.5 Processo de relaxação. A. T1 é o intervalo de tempo necessário para que a magnetização longitudinal retorne a 63% de seu valor original. B. T2 é o intervalo de tempo requerido para que a magnetização transversal decaia 63% de seu valor original. T1 e T2 são independentes. T2 é sempre menor ou igual a T1.
Fig. 18.II.4 A. Na situação de equilíbrio a magnetização encontra-se alinhada com B0 e o componente transversal é nulo. B. Com estímulo de RF aumenta o componente xy, sendo mensurável a magnetização nos planos transversal e longitudinal.
329
capítulo 18
Fig. 18.II.6 Paciente obesa posicionada em aparelho de ressonância magnética com magneto aberto.
Fig. 18.II.8 IRM de gestação para demonstração da anatomia fetal em imagens ponderadas em T1 e T2. Observe o líquido amniótico sem sinal em T1 e com hipersinal em T2.
Contraste O exame básico por RM deve incluir uma imagem ponderada em T1, pré- e pós-administração de contraste, para detecção de gordura e hemorragia, como também o grau de vascularização de determinadas estruturas; uma imagem ponderada em T2, para detectar líquido, cistos e suas anormalidades, e imagem com supressão de gordura, para o realce do acúmulo de líquido ou edema. O contraste paramagnético é o gadolínio, que demonstra um realce de estruturas, vasos, tumores ou órgãos ricamente vascularizados, quando analisados ou ponderados em T1 (Fig. 18.II.7).
Pontos-chave: Informações primárias com seqüências ponderadas em T2 • Presença de aumento de líquido (livre ou edema) em tecido doente 씮 alta intensidade de sinal • Presença de tecido fibrótico crônico 씮 baixa intensidade de sinal • Presença de depósito de ferro 씮 baixa intensidade de sinal
Pontos-chave: Informações primárias com seqüências précontraste ponderadas em T1 • Aumento anormal de conteúdo líquido ou tecido fibroso 씮 baixa intensidade de sinal • Sangramento subagudo ou concentrado de proteínas ou gordura 씮 alta intensidade de sinal
INDICAÇÕES ANOMALIAS CONGÊNITAS Ausência (agenesia — Fig. 18.II.9), hipoplasia, rins extranumerários, rins em ferradura (Fig. 18.II.10) e ectopia renal cruzada-fundida podem ser diagnosticados pela US, TC ou IRM. Há com freqüência uma relação com outros processos patológicos, como obstrução, infecções e outras anomalias congênitas. A duplicação do sistema coletor, a hipertrofia da coluna de Bertin e o dismorfismo renal podem ser detectados através da IRM. Lobulação fetal é outra variante normal que pode ser demonstrada com imagens coronais na IRM, que demonstram contornos ondulados, e imagens imediatamente após a administração de gadolínio indicam espessamento cortical uniforme nãotumoral.
DOENÇA CÍSTICA
Fig. 18.II.7 Corte coronal em T1 pós-contraste paramagnético (gadolínio) em fase nefrográfica.
Cistos são a causa mais comum de massa renal no adulto e são comumente de localização cortical. Cistos corticais (Fig. 18.II.11) são de formato oval, não realçam com gadolínio e têm margens bem definidas com o parênquima re-
330
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
Fig. 18.II.9 Agenesia renal à esquerda. Paciente com 11 anos de idade. Reconstrução em 3D, com imagem ponderada em T2 com supressão de gordura.
A visualização pré- e pós-gadolínio é importante quando garante o realce ou a ausência do mesmo na caracterização dos cistos. A doença policística autossômica dominante (DPAD — Figs. 18.II.12, 18.II.13 e 18.II.14) é caracterizada pelo desenvolvimento de cistos de dimensões variadas, os quais progridem com o tempo. A doença torna-se manifesta em adultos, o que explica a denominação de doença policística do adulto. Insuficiência renal é um evento tardio. A doença é quase sempre bilateral, ainda que doença unilateral tenha sido descrita. Também podem ser encontrados cistos em outros órgãos, incluindo fígado, baço e pâncreas. Estes pacientes têm risco de hemorragia cerebral pela presença de aneurismas. O aspecto típico da DPAD é de aumento bilateral dos rins, com múltiplos cistos, de dimensões variadas, alterando a arquitetura renal. No início os cistos são pequenos, aumentando com o tempo, alcançando grandes dimensões. A intensidade de sinal alterada no interior dos cistos é devido à presença de produtos de degradação da hemoglobina, ou seja, devido a sangramento intracístico em di-
Fig. 18.II.10 Rins em “ferradura”, corte coronal com reconstrução 3D após a injeção de contraste paramagnético (gadolínio).
nal. Cistos simples têm baixo sinal em imagens ponderadas em T1 e alto sinal quando ponderadas em T2. São considerados cistos simples quando contêm líquido com composição semelhante à urina. São chamados de cistos complicados quando contêm sangue, septações, calcificações ou tecidos inflamatórios.
Fig. 18.II.11 Cisto simples. A. T1; B. T2.
Fig. 18.II.12 Doença policística autossômica dominante, IRM axial, com imagem ponderada em T1, nefrectomia à direita.
Fig. 18.II. 13 Mesmo paciente, corte axial e imagem ponderada em T2.
331
capítulo 18
Fig. 18.II.14 Mesmo paciente, corte coronal e imagem ponderada em T1.
ferentes idades. A utilização dos US como referência de volume na doença policística tem sido alterada pela medida realizada pela IRM, obtendo-se uma diferença de até 25% a mais no volume previamente obtido. A medição do volume e acompanhamento da DPAD com IRM demonstra maior acurácia no controle de sua evolução. Outras doenças como displasia multicística, doença cística medular, doença cística adquirida associada à diálise a longo prazo, nefroma cístico multilocular e rim espongiomedular têm na IRM um grande auxílio diagnóstico, devido às características do contraste, resolução e aquisição multiplanar, ainda com o benefício do contraste utilizado, gadolínio, não ser nefrotóxico.
Carcinoma de células renais varia no seu aspecto. Em imagens ponderadas em T1, eles apresentam tipicamente menor sinal em relação ao parênquima normal (Figs. 18.II.15 e 18.II.16), porém podem conter alta intensidade de sinal se apresentarem componentes hemorrágicos. Em imagens ponderadas em T2, carcinomas de células renais são geralmente hiperintensos comparados ao rim normal; entretanto, produtos de degradação da hemoglobina dentro do tumor podem dar menor intensidade de sinal. Depois da administração venosa de meio de contraste a maioria dos carcinomas de células renais realça intensamente (Fig. 18.II.17), porém menos que o parênquima renal. As metástases, linfomas, sarcomas, fibromas e os carcinomas de células transicionais são indistinguíveis dos carcinomas na IRM. A IRM é o método de escolha para avaliação e classificação por estágios do tumor de Wilms. Intensidades de sinal variáveis são vistos nas seqüências ponderadas em T1 e T2, dependendo da presença de componentes císticos e hemorrágicos. Os vasos e a extensão intravascular geralmente são bem visualizados e são detectados os linfonodos anormais.
TUMORES RENAIS A IRM dos rins e glândulas adrenais atualmente se equipara ou supera a tomografia computadorizada em acurácia diagnóstica. Substitui a tomografia computadorizada quando esta não pode ser realizada em pacientes com alergia a contraste iônico ou que apresentam disfunção renal. Contrastes baseados no gadolínio não reagem como os meios iônicos de contraste e não são nefrotóxicos. Estas características são especialmente relevantes quando as condições patológicas envolvem os rins e o uso de contraste se faz necessário. Por exemplo, a avaliação de massa renal na vigência de disfunção renal é limitada pela impossibilidade de se administrar contraste iônico intravenoso. Isto porque o diagnóstico se baseia na demonstração do realce do mesmo no interior da massa. Mantendo-se os mesmos parâmetros da seqüência antes e depois da administração do meio de contraste (quelatos de gadolínio), o realce da massa renal pode ser avaliado acuradamente com a IRM. Diferentemente da tomografia computadorizada, critérios para realce patológico não foram ainda padronizados. Em pacientes preocupados com a exposição à radiação ou para os quais exposição a contraste iodado pode ser relativamente contra-indicada, a IRM é o método de escolha.
Fig. 18.II.15 Tumor renal sólido no terço médio do rim direito. Corte coronal com imagem ponderada em T1.
Fig. 18.II.16 Carcinoma de células renais, coronal T1.
332
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
primários mais comuns, mas podem ocorrer metástases em inúmeras outras doenças malignas. Em massas que não realçam na tomografia computadorizada, mas são complexas na ultra-sonografia, a IRM pode ser decisiva na determinação da indicação cirúrgica. Devese ter sempre em mente a dificuldade da IRM em não detectar calcificações. A IRM é mais sensível que TC e a US na detecção de trombos nas veias cava e renais, auxiliando o estadiamento pré-operatório destes pacientes. Em crianças e pacientes com síndromes paraneoplásicas a IRM é preferida pela ausência de radiação ionizante. Fig. 18.II.17 Tumor sólido no pólo inferior do rim esquerdo. A. Pré-contraste (gadolínio). B. Pós-contraste. C. Ultra-sonografia.
O envolvimento linfomatoso do rim pode ocorrer por invasão direta de doença adjacente, ou infiltrado focal solitário (também chamado de cloroma) ou múltiplo ou por infiltração difusa. O mais comum é o linfoma não-Hodgkin e comumente por células tipo B. Freqüentemente apresenta-se na IRM com baixo sinal em T1 e ligeiramente hipointenso ou isointenso em T2, com realce heterogêneo após a administração de gadolínio. Somente os tumores que contêm uma grande quantidade de tecido adiposo, como os angiomiolipomas, lipomas ou hibernomas, podem ser caracterizados como benignos. Eles aparecem isointensos em relação ao tecido adiposo perinéfrico circundante, e no caso dos angiomiolipomas (Fig. 18.II.18), que têm componente vascular, muscular liso e gordura, tipicamente se apresentam com alta intensidade de sinal em imagens ponderadas em T1, realçando fracamente com gadolínio. Nestes casos a realização de seqüências com supressão de gordura otimizam o diagnóstico. Metástases para os rins são manifestações de doença avançada. Câncer de pulmão e de mama são os tumores
Fig. 18.II.18 Angiomiolipoma. A. T1. B. Supressão de gordura. C. Ultra-sonografia.
Pontos-chave: Tumores renais na IRM • Realce pós-contraste paramagnético (gadolínio) dos tumores • Sensibilidade em detectar trombose tumoral na veia renal e veia cava inferior • Comprometimento da gordura perirrenal • Carcinoma de células renais indistinguível de outros tumores DOENÇAS DIFUSAS Doenças difusas do parênquima renal são condições médicas comuns e podem ser classificadas em várias categorias, como doença glomerular, doença túbulo-intersticial aguda e crônica, nefropatia diabética e nefrosclerose, doença isquêmica das artérias renais, nefropatia obstrutiva e doenças renais infecciosas. A IRM tem poucas indicações na avaliação da doença renal parenquimatosa difusa. Perda da diferenciação córtico-medular (DCM) em pacientes com elevada creatinina sérica foi descrita. Este é um achado inespecífico, sendo observado em virtualmente todas as doenças renais que resultam em diminuição da função renal. A perda da DCM em pacientes com creatinina sérica entre 1,5 e 2,9 mg/dl aparece em aproximadamente 50% do pacientes. A perda da DCM após a administração de gadolínio não foi observada até a creatinina sérica atingir níveis de 8,5 mg/dl. As manifestações clínicas da doença glomerular são variáveis e vão desde anormalidades urinárias assintomáticas, até a nefrite aguda, síndrome nefrótica e insuficiência renal crônica. Em pacientes com síndrome nefrótica, a maioria com nefropatia membranosa, são apenas discretos os achados na IRM. Rins atróficos em estágio final aparecem com redução intensa do volume, refletindo intensa hipovascularização secundária à perda de suprimento arterial. Uma grande variedade de doenças em estágio final leva a rins atróficos, podendo ser demonstrados nas IRM com pequeno volu-
capítulo 18
me e padrão característico de hipossinal devido ao tecido fibrótico ou de cicatrização. O rim hipoplásico verdadeiro é congenitamente pequeno, com menos papilas que o rim normal. Apresenta o sistema coletor e o córtex com aspecto e intensidade de sinal normais. Outras causas como trauma renal, cirurgia na infância, radiação ou refluxo podem resultar em rins pequenos, similares aos rins hipoplásicos. O rim hiperplásico ou vicariante é o que resulta em aumento de volume devido ao comprometimento crônico do rim contralateral ou pela ausência do mesmo. A hiperplasia é mais pronunciada quando o estímulo original ocorre na infância.
UROPATIA OBSTRUTIVA As alterações da nefropatia obstrutiva aguda e crônica são bem conhecidas na IRM (Figs. 18.II.19 e 18.II.20). Na obstrução aguda o tamanho do rim está aumentado e o contraste persiste no parênquima renal com uma fase nefrográfica prolongada. A DCM está diminuída em imagens pósgadolínio. Na obstrução crônica os rins inicialmente estão aumentados e, com o tempo, começam gradativamente a diminuir juntamente com a redução da perfusão renal.
333
A nefropatia do refluxo representa alterações no parênquima renal secundárias ao refluxo de urina no interior do sistema coletor do rim. Estas alterações são mais comuns nas regiões polares. Retrações cicatriciais são comuns e ocorrem superficialmente ao cálice dilatado. A pielonefrite crônica é caracterizada pela combinação de dilatação calicial extensa e irregularidade com cicatrização do córtex adjacente.
DOENÇA INFLAMATÓRIA A pielonefrite aguda usualmente resulta no aumento de volume do rim afetado. A infecção é freqüentemente causada por um bacilo Gram-negativo devido a infecção ascendente do trato urinário inferior. Líquido perinéfrico pode ser observado. Material proteináceo nos túbulos renais pode resultar em um aumento da intensidade de sinal nas imagens ponderadas em T1 com supressão de gordura. Estas alterações podem evoluir para abcesso. A infecção via hematógena também pode ocorrer. Nas IRM o abcesso renal aparece como massa irregular com região central sem sinal. Às vezes é difícil distinguir abcesso de tumor renal. Exames seqüenciais devem ser realizados, no sentido de avaliar sua resolução após o tratamento. A pielonefrite xantogranulomatosa é uma infecção rara que se desenvolve na presença de obstrução crônica, quase sempre associada à infecção por Proteus mirabilis. Diferentemente, a pionefrose é a infecção do sistema coletor dilatado. Nas IRM observa-se a presença de debris no conteúdo líquido com intenso realce pós-gadolínio das paredes da pelve renal. Com relação às hemorragias, intra-renal ou perirrenal, elas podem ser visualizadas em pacientes com distúrbios hemorrágicos, trauma, neoplasias e também nos pacientes submetidos à litotripsia e à biópsia. A IRM é mais sensível na detecção de hemorragia e coleções líquidas.
DOENÇA VASCULAR Fig. 18.II.19 Obstrução renal à direita (planos coronal à esquerda e axial à direita em T1).
A estenose da artéria renal é conhecida desde há muito tempo como causa de hipertensão e estágio final da doen-
Fig. 18.II.20 Obstrução renal por cálculo de ureter, urografia excretora, RM com projeção de intensidade máxima (MIP) e imagem original, sem filtro ou reconstrução.
334
Ultra-sonografia Renal e Imagem Renal por Ressonância Magnética
ça renal. A doença renovascular está implicada, como causa subjacente, em 1 a 5% dos pacientes com hipertensão e em 5 a 15% dos pacientes com doença renal terminal que se incorporam a cada ano aos programas de diálise. Um extenso estudo de autópsias tem mostrado estenose da artéria renal em 10% dos pacientes com diabetes mellitus combinada com hipertensão, em aproximadamente 22% dos pacientes com aneurisma da aorta abdominal e em 45% dos pacientes com doença vascular periférica. A possibilidade de opções terapêuticas com uma boa relação custo-benefício, que incluem a angioplastia intraluminal percutânea e a revascularização cirúrgica, tem dado origem à investigação de modalidades de estudo nãoinvasivas, que mantenham esta mesma relação. A angiografia por ressonância magnética (ARM) tem sido considerada promissora por pesquisadores devido à sua nãoinvasibilidade, além de ser o contraste paramagnético (gadolínio) não-nefrotóxico, como previamente descrito. A utilização de contraste paramagnético permitiu o estudo das artérias renais em sua totalidade, incluindo seus ramos principais e artérias renais acessórias. Por outro lado, sua rapidez, sua independência de quem as realiza, sua elevada resolução espacial e contraste, assim como a ausência de efeitos colaterais, fazem da ARM com contraste uma boa alternativa para o estudo da patologia renovascular. Em torno de dois terços das estenoses da artéria renal (Fig. 18.II.22) são decorrentes de aterosclerose, podendo estar localizada nas artérias renais ou formar parte de uma doença difusa. Em sua variedade difusa, a doença aterosclerótica da aorta pode estender-se até a origem da artéria renal, comprometendo deste modo o fluxo sangüíneo. Nestas ocasiões, são progressivas, tendem a afetar o óstio ou o terço proximal da artéria renal e são freqüentemente excêntricas. Outra causa importante da estenose da artéria renal é a displasia fibromuscular (DFM), uma patologia congênita que afeta os pacientes mais jovens, e as mulheres com maior freqüência. Contrariamente às estenoses por ateros-
Fig. 18.II.22 Estenose da artéria renal direita, angiografia por RM com contraste e reconstrução 3D.
clerose, a DFM tende a afetar os terços médio e distal das artérias renais, respeitando sua origem. O aspecto característico encontrado tem o formato em “colar de contas”. Em alguns estudos, a ARM com contraste tem obtido sensibilidade entre 83 e 96% e especificidade entre 92 e 98%. As diferenças obtidas entre a ARM e a angiografia por subtração digital encontram-se basicamente nas limitações desta em detectar estenoses excêntricas, que podem passar despercebidas. Os aneurismas da artéria renal podem produzir-se como manifestação da doença aterosclerótica. Podem ser encontrados na vigência de neurofibromatose e da pan-arterite nodosa. A natureza tridimensional dos estudos por ARM auxilia no estudo da estrutura dos aneurismas, estabelecendo-se seu aspecto sacular ou fusiforme. Esta diferenciação pode ter implicações terapêuticas, que ajudam a decidir quais pacientes são tratados com técnicas de embolização percutânea ou quais com cirurgia aberta. O estudo da anatomia vascular tem valor potencial em doadores vivos de rins. Antes de se extrair o rim, é importante assegurar-se de que o doador conservará um rim normal. A falha de identificar artérias renais acessórias antes da cirurgia pode complicar o transplante e comprometer a evolução. De maneira específica, a confiabilidade de estabelecer o número, o comprimento e a localização das artérias renais é fundamental para planejar a cirurgia.
TRANSPLANTE RENAL
Fig. 18.II.21 Drenagem das veias renais na VCI, coronal T2, sem contraste.
A perda da DCM em imagens ponderadas em T1 no enxerto renal é uma observação que sugere rejeição. Em um estudo comparativo de acurácia entre IRM, cintilografia quantitativa e sonografia para detecção de rejeição do enxerto renal, a sensibilidade para estas modalidades foi de 97, 80 e 70%, respectivamente. A perda da DCM, entretanto, é um achado inespecífico, observado também na toxicidade pela ciclosporina e outras doenças infiltrativas difusas ou parenquimatosas.
335
capítulo 18
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
2.
3.
4.
Fig. 18.II.23 Enxerto renal em FID em corte coronal e seqüência com supressão de gordura.
5. 6. 7.
A estenose arterial é uma causa importante de falha do enxerto renal. Seu diagnóstico precoce é importante, porque pode corrigir-se mediante angioplastia ou revascularização cirúrgica. O método habitual para o diagnóstico das estenoses tem sido a angiografia convencional, porém a ARM com contraste mostra-se como alternativa segura e não-invasiva. Antes de proceder-se à ARM com contraste, sugere-se a realização de radiografia convencional no sentido de se observarem os clipes metálicos, que em grande número podem originar artefatos de imagem na RM, devendo-se assim considerar-se outros métodos de diagnóstico. A IRM com e sem administração de gadolínio parece ser mais sensível na detecção de pequenos infartos em rins transplantados.
Pontos-chave: Principais indicações de IRM renal • Anomalias congênitas: agenesia, hipoplasia, ectopia renal, rins em ferradura, lobulação fetal • Doença cística: cisto simples, cisto complexo, doença policística • Tumores renais: diagnóstico diferencial com cistos simples e complexos, estadiamento (trombose tumoral, veia renal e veia cava inferior, comprometimento da gordura perirrenal) • Doença inflamatória: pielonefrites, pionefrose obstrutiva, abcessos • Doença vascular: estenose da artéria renal (aterosclerose, displasia fibromuscular), trombose da veia renal • Transplante renal: complicações urológicas e vasculares
8. 9. 10.
11. 12.
13. 14.
15. 16. 17. 18.
19.
ALI, M.G.; COAKLEV, F.V.; HRICAK, H. and BRETAN, P.N. Complex post-transplantation abnormalities of renal allografts: Evaluation with MR imaging. Radiology, 1999; 211:95. BAKKER, J. et al. Renal volume measurements: Accuracy and repeatability of US compared with that of MR imaging. Radiology, 1999; 211:623. BOSNIAK, M.A. The small (⬍ 3.0 cm) renal parenchimal tumor: Detection, diagnosis and controversies. Radiology, 1991; 179:307317. HEISS, S.G.; SHIFRIN, R.Y. and SOMMER, F.G. Contrast-enhanced three-dimensional fast spoiled gradient-echo renal MR imaging: Evaluation of vascular and nonvascular disease. RadioGraphics, 2000; 20: 1341-1352. McCLENNAN. Syllabus: a Categorical Course in Geniturinary Radiology. RSNA, 1994. HOHENWALTER, M.D. et al. Renal transplant evaluation with MR angiography and MR imaging. Radiographics, 2001; 21:1505. JINZAKI, M. et al. Angiomyolipoma: imaging findings in lesions with minimal fat. Radiology, 1997. LEONIDAS, J.C. and BERDON, W.E. MR Imaging of urinary tract infections in children. Radiology, 1999. LUFKIN, R.B. The MRI Manual. Mosby-Year Book, 1998. NASCIMENTO, A.B.; MITCHEL, D.; ZHANG, X.M.; KAMISHIMA; PARKER, L. and HOLLAND, G.A. Rapid MR imaging detection of renal cysts: age-based standards. Radiology, 2001; 221:628. NEIMATALLAH, M.A. et al. Magnetic resonance imaging in renal transplantation. JRMI, 1999; 10: 357. AMIN, R.S.; NIKOLAIDIS, P.; KAWASHIMA, A.; KRAMER, L.A. and ERNST, R.D. Normal anatomy of the fetus at MR imaging. RadioGraphics, 1999; 19: 201-214. ROFSKY, N.M.; BOSNIAK, M.A. MR imaging in the evaluation of small (lesions lesser than 3.0 cm) renal masses. Clin North Am, 1997. ROFSKY, N.M.; WEINREB, J.C.; BOSNIAK, M.A.; LIBES, R.B.; BIRNBAUM, B.A. Efficacy and safety in patients with renal insuficiency. Radiology, 1991; 180: 85-89. PHILIPS. Princípios Básicos de Imagem por RM, 1998. PRINCE, M.R. et al. Diagnosis of renal vascular disease with MR angiography. Radiographics, 1999; 19: 1535-1554. PRINCE, M.R.; GRIST, T.M.; DEBATIN, J.F. 3D Contrast MR Angiography. Springer, 1997. DONG, O.; SCHOENBERG, S.O.; CARLOS, R.C.; NEIMATALLAH, M.; CHO, K.J.; WILLIAMS, D.M.; KAZANJIAN, S.N. and PRINCE, M.R. Diagnosis of renal vascular disease with MR angiography. RadioGraphics, 1999; 19: 1535-1554. SEMELKA, R.C. MRI of the Abdomen and Pelvis: A Text-Atlas. WilleyLiss, 1997; 379-469.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Introdução à Ressonância Magnética http://www.sunnybrook.utoronto.ca:8080/~gawright/ menu-mr-nf.html The Basics in MRI http://www.cis.rit.edu/htbooks/mri Introdução à IRM http://www.mritutor.org/mritutor/index.html Practice Guidelines http://www.rsna.org/practice/practiceguidelines.html Hidronefrose http://www.shimane-med.ac.jp/IMAGE/MRURO/ MRuroG.GIF Geral http://www.alphasonic.com.br
capítulo 19
Vasos acessórios, originários das artérias principais, poderão determinar obstrução ou não da junção pieloureteral.
Anomalias de Fusão dos Rins Isto implica fusão de duas estruturas, cada uma com sua via excretora, e ectopia. Sintomas e complicações são os mesmos já descritos. Classificam-se em: 1. Fusão bilateral: rim em ferradura, havendo fusão nos pólos superiores, inferiores ou em L; 2. Fusão unilateral, com ectopia cruzada; 3. Rins fundidos pélvicos.
Anomalias do Ureter DUPLICAÇÃO Significa segmentação longitudinal, parcial ou completa dos ureteres. Pode ocorrer refluxo uretero-ureteral nas duplicações parciais, com estase e dilatação. Não havendo ectopia ureteral, geralmente estão livres dos sintomas; todavia, como qualquer anomalia, estão mais sujeitos à infecção, litíase e obstrução. Suspeita-se de duplicidade da via excretora quando, à ultra-sonografia, observa-se interrupção do complexo ecogênico por faixa hipoecóica de textura semelhante ao parênquima renal (Fig. 19.20). Nos casos não complicados, não há evidências de dilatação dos sistemas pielocaliciais. Já nos casos complicados, pode ocorrer dilatação do grupo calicial superior com grupo calicial médio e inferior normais e vice-versa
Fig. 19.20 Duplicidade da via excretora superior não complicada. Ultra-sonografia. Corte longitudinal do rim D demonstrando interrupção do complexo ecogênico por faixa hipoecóica, representando o parênquima.
349
ou, ainda, dilatação de ambos os grupos caliciais (Fig. 19.24). Quando há dilatação da porção superior, esta é em conseqüência de ectopia ureteral extravesical ou ureterocele, enquanto a dilatação da porção média e inferior está relacionada ao refluxo vésico-ureteral.
ECTOPIA URETERAL O termo é aplicado quando o ureter termina em local anormal, podendo ser intra- ou extravesical. Entre 70 e 80% das ectopias ureterais ocorrem em ureter com duplicação completa, e 20 a 30% são ureteres com duplicação parcial ou simples (Fig. 19.21). Sendo os ureteres originários do ducto de Wolff, mesmo ectópicos, estão acima do esfíncter externo no sexo masculino. No sexo feminino, havendo regressão deste, o orifício ureteral ectópico pode estar dentro ou fora do controle esfincteriano, podendo ser encontrado no útero, trompas, vagina e vestíbulo, derivados do ducto de Müller. Quando existe duplicidade completa, o ureter que drena a porção superior é o ectópico (lei de Weigert-Meyer). A anomalia associada mais freqüente é ureterocele. Os sintomas habituais são infecção de repetição e perda de urina constante nas mulheres, devido à implantação extravesical do ureter. Devido à situação do orifício ectópico, é muito provável haver obstrução com dilatação a montante (Figs. 19.22 e 19.23). Como a maioria dos casos de ectopia ureteral ocorre em ureter com duplicação completa, a ultra-sonografia é muito útil no seu diagnóstico, principalmente nos casos com hidronefrose onde a função renal está seriamente comprometida.
Fig. 19.21 Esquema das duplicidades ureterais e suas complicações mais comuns. A. Duplicidade parcial. B. Duplicidade completa. C. Duplicidade completa com ureterocele. D. Duplicidade ureteral com ureterocele insinuada na uretra. E. Duplicidade ureteral com ureter ectópico na uretra. F. Duplicidade ureteral com ureter ectópico na vagina.
350
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Fig. 19.22 Menina de nove anos de idade com perda constante de urina. Ureter ectópico na uretra. A. O urograma mostrou duplicidade completa da via excretora esquerda, com sinais de hidronefrose da via excretora superior (seta). B. Na uretrocistografia miccional, refluxo de contraste para o ureter implantado na uretra (setas).
Ao urograma suspeita-se de outro sistema não-funcionante quando existe efeito de massa no pólo superior do rim e o sistema funcionante apresenta-se desviado para baixo e lateralmente (Figs. 19.22 e 19.23). Se alguma função renal estiver presente, o ureter pode ser identificado, e algumas vezes pode-se ver o ureter drenando ectopicamente na bexiga ou fora dela. Se o ureter implantar-se na uretra, pode ser demonstrado à uretrocistografia miccional, caso ocorra refluxo uretroureteral (Fig. 19.22B). Quando o ureter tem implantação na vagina, a vaginografia pode ser útil, revelando refluxo para o ureter (Fig. 19.23B).
URETEROCELE É a dilatação cística congênita ou adquirida do ureter terminal, secundária a estenose do meato ureteral. Pode ser simples ou ectópica, em ureter simples (Fig. 19.25) ou duplicado (Fig. 19.26). Sua origem está relacionada à dificuldade de drenagem do ureter e sempre em relação com o assoalho vesical. A ureterocele simples é rara em crianças, enquanto a ectópica é própria delas, e mais no sexo feminino, a grande maioria em ureter duplicado e drenando a porção superior (lei de Weighert-Meyer).
Fig. 19.23 Menina de 14 anos de idade com perda constante de urina. Ureter ectópico na vagina. A. Urograma excretor mostrou dupla via excretora à direita, com dilatação e fraca opacificação da via excretora do pólo superior (seta). B. Realizadas a cistografia e a vaginografia (setas), nesta última houve passagem de contraste para o ureter que drena o pólo superior do rim.
351
capítulo 19
Há quase sempre hidronefrose associada, no mesmo rim e do lado oposto nos casos de ureteroceles volumosas que obstruem o óstio ureteral (Fig. 19.25). A ureterocele pode ainda insinuar-se no colo vesical, levando ao quadro de obstrução uretral (Fig. 19.26B). Facilmente diagnosticada na ultra-sonografia como imagem cística, de paredes finas, intravesical, em continuação com o ureter dilatado e associada a hidronefrose ou displasia do segmento afetado (Fig. 19.24). No urograma e uretrocistografia apresenta-se como falha de enchimento arredondada no interior da bexiga. Quando no urograma enche-se de contraste, apresenta-se circundada por halo radiolucente, correspondente à pare-
de ureteral, sendo esta imagem chamada de “sinal da cabeça de cobra”. Ao urograma, observa-se ainda ausência de excreção ou excreção retardada em relação ao pólo inferior (Figs. 19.24 e 19.26). As pequenas ureteroceles podem ser mascaradas na uretrocistografia miccional, quer pela densidade do contraste, quer pelo aumento da pressão intravesical colapsando-as, ou ainda por herniação para dentro do ureter, simulando divertículo vesical. Atualmente um dos tratamentos para ureterocele é o seu rompimento via endoscópica, e nestes casos freqüentemente se nota que o ureter afetado passa a apresentar, como complicação, refluxo vésico-ureteral.
BEX U
A
C
B
D
Fig. 19.24 Duplicidade completa da via excretora superior com ureterocele. A e B. Ultra-sonografia. A. Corte longitudinal do rim E mostrando duplicidade com dilatação da unidade superior e inferior com predomínio do primeiro. B. Corte longitudinal da bexiga, demonstrando dilatação do ureter distal, o qual termina em estrutura cística intravesical, correspondente à ureterocele (U). C. Uretrocistografia miccional, demonstrando refluxo vésico-ureteral à E para a unidade inferior. D. Urografia excretora revelando desvio lateral e inferior do sistema pielocalicial da unidade inferior à E e exclusão funcional do pólo superior. Observar a falha de enchimento intravesical em C e D, que representa a ureterocele (U).
352
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Ocorre com maior freqüência no lado esquerdo, em rins em ferradura, ectópicos e mal rodados. Os fatores predisponentes são: vasos renais aberrantes, aderências, inserção alta do ureter, estenoses e displasia da musculatura lisa, a qual pode ser em conseqüência de refluxo. Sintomas podem aparecer devido à obstrução aguda, com dor abdominal e vômitos, associados a infecção de repetição, cólica nefrética e hematúria. Tanto na ultra-sonografia como no urograma, os achados são os mesmos; pelve e cálices dilatados, sendo na maioria dos casos a pelve desproporcionalmente maior que os cálices. Não há dilatação ureteral (Figs. 19.27 e 19.28). Aconselha-se a investigação de refluxo vésico-ureteral.
MEGAURETER
Fig. 19.25 Menina de um ano de idade com infecção urinária. No urograma excretor evidenciou-se hidronefrose bilateral por obstrução ao nível da junção vésico-ureteral, por grande ureterocele (seta), pertencente a ureter único à esquerda.
OBSTRUÇÃO DA JUNÇÃO PIELOURETERAL É a dificuldade do fluxo de urina da pelve para o ureter, determinando hidronefrose, infecção, litíase, pielonefrite e progressiva destruição do parênquima renal. Pode ser bilateral, predominando num lado.
Doença predominante da criança. Pode ser bilateral ou unilateral, mais à esquerda. Caracteriza-se por existir um curto segmento distal do ureter de calibre normal, com grande dilatação a montante; uropatia obstrutiva funcional. Há várias teorias para explicar a causa: aganglionose, hipertrofia de fibras musculares e excesso de tecido fibroso. Os sintomas decorrem da obstrução funcional, com dor na fossa ilíaca, infecção, hematúria, levando à hidronefrose e à redução da função renal. O diagnóstico é realizado utilizando-se urograma com alta dose de contraste ou pielografia descendente, demonstrando-se o segmento aperistáltico e aparentemente estreitado do ureter distal (Fig. 19.29C).
Fig. 19.26 Menina de oito meses de idade com infecção urinária e hidronefrose bilateral. A. O urograma excretor mostrou defeito de enchimento na bexiga (setas) por ureterocele pertencente a ureter que drena o grupo calicial superior direito, o qual não se opacificou em virtude da obstrução. Hidronefrose das vias excretoras à direita e da via excretora à esquerda. B. A uretrocistografia miccional mostrou refluxo vésico-ureteral bilateral, sendo, à direita, para o ureter que drena os grupos caliciais médio e inferior. As setas indicam defeito de enchimento na uretra correspondendo a insinuação da ureterocele no canal uretral.
353
capítulo 19
A
B
Fig. 19.27 Estenose da junção pieloureteral. A. Ultra-sonografia. Corte longitudinal do rim D, mostrando dilatação dos cálices e pelve renal. B. Urografia excretora demonstrando os achados radiográficos típicos da estenose da junção pieloureteral.
Fig. 19.28 Hidronefrose bilateral em menina de seis meses de idade. A. Radiografias simples do abdome, de frente e perfil, mostrando que a massa é mais evidente no perfil, pelo deslocamento das vísceras para a frente. B. Urograma excretor mostrando o sinal do crescente no pólo superior do rim esquerdo aos 20 minutos. C. Na radiografia tardia houve opacificação dos sistemas pielocaliciais e sinais de obstrução da junção pieloureteral bilateral por estenose congênita (setas).
354
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
A
B
Fig. 19.29 Megaureter primário. A e B. Ultra-sonografia. Corte da bexiga mostrando dilatação do ureter distal. B. Dilatação do sistema pielocalicial. C. Pielografia descendente demonstrando estreitamento do ureter distal com dilatação a montante do ureter e sistema pielocalicial.
C
A ultra-sonografia demonstra o ureter dilatado, e em alguns casos o segmento distal estreitado (Fig. 19.29A). A realização da uretrocistografia miccional é importante para excluir que a alteração não se deva a refluxo vésicoureteral.
ANOMALIAS CONGÊNITAS DA BEXIGA Úraco São raras, e os sintomas variam com o seu grau de permeabilidade. Classificam-se em: 1. Úraco permeável 2. Divertículo vésico-úraco 3. Cisto umbilical.
Duplicações São muito raras e classificam-se em: 1. Completas
2. Incompletas, com variantes. Não há diagnóstico clínico, suspeitando-se em casos de anomalias da genitália, ânus e coluna vertebral inferior. Os exames diagnósticos complementares são ultra-sonografia, urograma, uretrocistografia e cistoscopia.
Divertículos Os divertículos vesicais podem ser congênitos ou adquiridos. Os divertículos congênitos (verdadeiros) são raros. Os mais comuns são os adquiridos, conseqüentes da herniação da mucosa através de um defeito da muscular. Nas crianças, são habitualmente simples, predominando em torno do trígono. Não há sintomas característicos, sendo encontrados na investigação de infecção, dificuldade de micção e enurese. O exame para o diagnóstico é a ultra-sonografia e a uretrocistografia miccional (Fig. 19.30).
Complexo Extrofia-Epispádia Anomalias complexas comprometem o aparelho urinário e rotineiramente afetam as estruturas músculo-esqueléticas do abdome inferior.
355
capítulo 19
B D
B D
A
B
Fig. 19.30 Divertículo vesical. A. Ultra-sonografia. Corte longitudinal da bexiga mostrando estrutura cística de contornos irregulares, que se comunica com a bexiga. B. Cistografia demonstrando a bexiga (B) e o divertículo (D).
Classificam-se em: 1. Epispádias com continência, situando-se abaixo do esfíncter externo; 2. Epispádias com incontinência, acima do esfíncter externo. Na extrofia clássica, a mais comum, a bexiga está exteriorizada, vêem-se os orifícios ureterais, a epispádia e a separação da sínfise pubiana. Nos meninos, existe pênis reduzido; nas meninas, lábios separados, clitóris bífido e vagina estreita. Há sinais de uropatia obstrutiva, uni- ou bilateral, associada a pielonefrite. A causa da obstrução é o prolapso e metaplasia da mucosa vesical adjacente aos orifícios ureterais.
ANOMALIAS CONGÊNITAS DA URETRA As anomalias da uretra são várias, e seu conhecimento atual deve-se à introdução da uretrocistografia miccional como exame complementar de rotina.
Válvulas Uretrais São pregas da mucosa que determinam obstrução ao fluxo normal da urina durante a micção. Obstrução significando obstáculo, com dilatação a montante da válvula, refluxo de contraste para utrículo e canalículos prostáticos e sinais de bexiga de esforço. Sendo a anomalia obstrutiva mais comum da uretra, há grande número de casos na literatura. Do ponto de vista prático, é própria do sexo masculino, e sua classificação clássica, a de Young, tem três tipos: Tipo I, Tipo II e Tipo III.
A causa parece estar relacionada à deficiente integração do ducto de Wolff nas paredes da uretra ou persistência da membrana urogenital. A obstrução causará freqüentemente alteração nos rins, ureteres, bexiga, colo vesical e uretra proximal à obstrução. O aparecimento de sintomas é muito variado, quer quanto à época de início quer quanto ao tipo. Vêem-se casos com dias de vida, e autores relatam casos na segunda década. Podem ocasionar infecção de repetição, hematúria, diminuição do jato, micção interrompida, incontinência e até insuficiência renal. O diagnóstico é feito com a uretrocistografia miccional, demonstrando-se a válvula, dilatação da uretra a montante, bexiga de esforço, com hipertrofia da parede, e divertículos (Figs. 19.32 e 19.33). Às vezes, modificações do colo vesical e refluxo vésico-ureteral em um terço dos casos. Suspeita-se de válvula de uretra posterior quando, na ultra-sonografia, observa-se dilatação do sistema pielocalicial e ureter bilateralmente, com bexiga grande, de paredes espessadas, e dilatação da uretra posterior (Fig. 19.31). É importante salientar a necessidade deste diagnóstico ainda no período intra-uterino, para que se possa intervir no feto, no sentido de aliviar o processo obstrutivo, e assim preservar a função renal. A cintilografia renal é o exame indicado para a avaliação da função renal, pois a obstrução uretral pode determinar hidronefrose e atrofia renal secundária, mesmo nos casos sem refluxo, por dificuldade de drenagem ureteral em bexiga de alta pressão. Complementar a investigação radiológica com urograma, que, além de avaliar a função, permite uma visualização panorâmica da anatomia do aparelho urinário (Figs. 19.32 e 19.33). Nos casos de válvula de uretra posterior nos quais o processo obstrutivo é grave e de longa data, desenvolve-se dis-
A
B
C
Fig. 19.31 Válvula de uretra posterior. Ultra-sonografia. A. Corte longitudinal do rim D e E mostrando acentuada hidronefrose. B. Corte transversal da bexiga demonstrando espessamento da parede vesical (Bex) e dilatação ureteral. Ureter D (UD). Ureter E (UE). C. Corte longitudinal da bexiga apresentando espessamento da sua parede, observar a uretra posterior dilatada (UP).
B
A
Fig. 19.32 Válvula de uretra posterior. A. Uretrocistografia miccional, presença de dilatação da uretra posterior e refluxo vésico-ureteral à E. B. Urografia excretora. Houve exclusão funcional do rim E, presença de uretero-hidronefrose à D, por dificuldade de esvaziamento ureteral devido à alta pressão intravesical.
357
capítulo 19
Fig. 19.33 Menino de 13 meses de idade com válvula de uretra posterior. Infecção urinária grave. A. Bexiga de contorno irregular com divertículo ao nível do trígono. Dilatação da uretra posterior devida a estreitamento importante provocado pela válvula (seta). Ausência de refluxo. B. No urograma excretor, exclusão funcional do rim direito e eliminação do contraste à esquerda com baixa densidade e dilatação do sistema pielocalicial (seta). Sinais de atrofia de parênquima renal por infecção.
plasia das vias excretoras, e nestes casos, mesmo após aliviado o processo obstrutivo, as vias excretoras superiores permanecem dilatadas. O diagnóstico diferencial inclui a síndrome de prune-belly.
Divertículo da Uretra Anterior São dois tipos: um com bolsa local abrindo-se na uretra e outro com dilatação de todo um segmento da uretra, denominado megauretra. A forma sacular pode determinar obstrução, com sintomas de infecção e micção interrompida. O diagnóstico é obtido com uretrocistografia miccional (Fig. 19.34).
Duplicidade da Uretra Pode ser completa e incompleta, havendo variações. São anomalias encontradas em associação com hipospádias e epispádias. Os sintomas são infecção, jato em dupla abertura e incontinência.
Hipospádias Ocorrem por desenvolvimento incompleto da uretra, havendo deformidade do pênis, proporcional ao grau de hipospádia. Estão associadas a criptorquidia em 15% dos casos e, quando o meato uretral é próximo ao ângulo peno-escrotal, o escroto é bífido.
No homem, são classificadas em glandular (40-50%), peniana (25-30%), peno-escrotal (10-15%) e perineal. Pode existir estenose do meato (Fig. 19.35). No sexo feminino, a incidência é maior do que a esperada, situando-se o meato na parede vaginal anterior obliquamente, em qualquer nível.
HIDRONEFROSE Hidronefrose significa dilatação do sistema pielocalicial e do ureter ou apenas do primeiro. Na hidronefrose, o volume do rim pode estar aumentado, diminuído ou normal. Algumas vezes o rim pode estar parcialmente aumentado, como nos casos de duplicidade de via excretora, em que uma delas pode estar hidronefrótica. O aumento de volume do rim é o resultado da dilatação do sistema pielocalicial e não necessariamente é devido ao aumento de espessura do parênquima, mesmo porque pode haver grande aumento de volume do rim, com atrofia do parênquima renal. A hidronefrose pode ser de causa obstrutiva, por refluxo vésico-ureteral, e pode ocorrer, ainda, por anomalia congênita da parede do ureter, como na síndrome de prunebelly e megaureter primário congênito. As causas de obstrução da via excretora são as mais variadas, podendo ser classificadas como intrínsecas e extrínsecas. As intrínsecas são aquelas que estão relacionadas com a luz do ureter, podendo ser adquiridas, como cálculos (Fig. 19.36), ureteroceles (Fig. 19.25), pólipos, coágulos
358
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
B
A
Fig. 19.34 Divertículo de uretra anterior. Uretrocistografia miccional demonstrando bexiga alongada e de contornos irregulares. A. Durante a micção houve enchimento de formação diverticular na porção distal na uretra peniana (setas). B. Final de micção mostrando melhor a formação diverticular (setas).
Ponto-chave: • A hidronefrose pode ser de causa obstrutiva, por refluxo vésico-ureteral, e pode ocorrer, ainda, por anomalia congênita da parede do ureter
Achados Radiológicos
Fig. 19.35 Menino de 10 anos de idade com infecção urinária e hipospádia. Na uretrocistografia miccional houve dilatação da uretra devido à estenose de meato uretral (seta) em paciente com hipospádia.
etc., e congênitas, como estenoses das junções pieloureterais (Figs. 19.27 e 19.28) e vésico-ureterais (Fig. 19.29), ureter ectópico na vagina (Fig. 19.23) ou uretra (Fig. 19.22) etc. Como causas extrínsecas, temos os processos expansivos intra-abdominais e especialmente os retroperitoneais benignos e malignos (Fig. 19.37) e os de natureza inflamatória (abscessos e massas ganglionares), que provocam obstrução pelo fator compressivo exercido especialmente sobre o ureter. Além dos processos expansivos, geralmente retroperitoneais, temos ainda as compressões vasculares (ureter retrocava) e as bridas ao nível da junção pieloureteral.
A radiografia simples do abdome pode mostrar aumento de volume do rim, ou massa com densidade de partes moles, que representam importante dilatação do ureter. Além disto, a radiografia simples será necessária para a visualização de concreções opacas que estejam projetadas no parênquima renal ou via excretora, significando, na maioria das vezes, cálculos renoureterais (Fig. 19.36A). Como não raramente há exclusão funcional do rim, a ultra-sonografia, mais uma vez, é o grande método tanto triador como diagnóstico, e embora não avalie a função renal, demonstra a anatomia do parênquima. Determina não só o nível da dilatação como também muitas vezes a natureza da hidronefrose. Nos casos de obstrução alta, como na estenose da junção pieloureteral, há dilatação dos cálices e pelve renal, não se identificando dilatação ureteral (Fig. 19.27A), enquanto nos casos de obstrução ureteral baixa e refluxo vésico-ureteral, além da dilatação dos cálices e pelve, existe dilatação do ureter (Figs. 19.29A e 19.39A e B). Quando a obstrução está ao nível da uretra, esta dilatação será bilateral (Fig. 19.31).
capítulo 19
359
Fig. 19.36 Menino de cinco anos de idade com infecção urinária. Uretrocistografia miccional normal. A. Radiografia simples mostra cálculo coraliforme no sistema pielocalicial esquerdo (seta); B. No urograma excretor, aos 3 minutos, houve efeito nefrográfico indicando que o rim esquerdo está diminuído de volume e de contorno regular; C. Aos 30 minutos, sinais de enchimento no bacinete determinado pelo cálculo (seta).
No urograma, em virtude de a eliminação do contraste se fazer lentamente e estar retardada, será importante a realização de radiografias tardias para que o contraste opacifique a via excretora e determine o local da obstrução (Fig. 19.28). A dificuldade de excreção do contraste está relacionada com a atrofia do parênquima renal e com o grau de hipertensão dentro da via excretora (Figs. 19.12 e 19.28). Caso o parênquima seja normal, tão logo o processo obstrutivo seja afastado, o rim recuperará sua função normal. Nos casos em que houver atrofia do parênquima, pro-
vocada pelo processo obstrutivo e pela infecção, o retorno da função dependerá do grau de comprometimento do parênquima (Fig. 19.33). Na vigência de um processo obstrutivo, haverá estase pieloureteral, fato que propicia a instalação da infecção. Em virtude da dilatação calicial, os ductos coletores se dilatam e mudam de orientação, propiciando, durante a sua opacificação, o aparecimento de imagem linear densa, em forma de meia-lua, chamada “sinal do crescente” (Fig. 19.28B), e, menos freqüentemente, pontilhados densos dis-
Fig. 19.37 Menina de 13 anos de idade, com massas abdominais por linfossarcoma. A. No urograma excretor, aos 15 minutos, evidenciou-se eliminação lenta do contraste à esquerda e sinais de hidronefrose bilateral. B. Aos 60 minutos, sinais de hidronefrose bilateral com obstrução do terço distal dos ureteres e compressão da bexiga (setas).
360
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Fig. 19.38 Menina com infecção urinária com refluxo vésico-ureteral bilateral — grau III. No urograma excretor presença de estriações do bacinete esquerdo (setas).
postos em curva. Estes dois sinais possibilitam realizar precocemente o diagnóstico de hidronefrose e costumam estar presentes nos 10 primeiros minutos do exame. Para que se faça o diagnóstico definitivo de hidronefrose, será necessária a presença da dilatação da via excretora, que pode restringir-se ao sistema pielocalicial, nos casos de obstrução da junção pieloureteral (Fig. 19.27) e também do ureter, nos casos de obstrução ao nível do seu terço distal (Fig. 19.29). Nos casos de obstrução ao nível dos ureteres, os cálices costumam estar proporcionalmente mais dilatados que o bacinete, e nos casos de obstrução da junção pieloureteral, o bacinete está mais dilatado do que os cálices. As estriações no bacinete e ureter proximal são um sinal de dilatação da via excretora superior, principalmente nas hidronefroses por refluxo vésico-ureteral (Fig. 19.38). A hidronefrose por refluxo ocorrerá naqueles refluxos de graus IV e V (Fig. 19.39).
B
A
C
Fig. 19.39 Refluxo vésico-ureteral. A e B. Ultra-sonografia. A. Corte transversal da bexiga mostrando dilatação dos ureteres distais. Ureter direito (UD). Ureter esquerdo (UE). B. Corte longitudinal do rim D e E demonstrando acentuada dilatação dos cálices e pelve renais com conteúdo ecogênico, correspondente a pus. O parênquima renal apresenta-se reduzido de espessura, hiperecogênico e com perda da distinção córtico-medular. C. Cistografia. Presença de refluxo vésico-ureteral grau V bilateral.
361
capítulo 19
A
Fig. 19.40 Refluxo vésico-ureteral. Uretrocistografia. Radiografia panorâmica pós-miccional mostrando refluxo vésico-ureteral primário grau V bilateral. B
Durante a ultra-sonografia ou o urograma, a via excretora pode ser normal ou quase normal, e durante a uretrocistografia miccional, em virtude do refluxo, a via excretora poderá apresentar-se bastante dilatada. Assim sendo, será indispensável a uretrocistografia miccional para melhor avaliação dos ureteres e sistemas pielocaliciais (Fig. 19.41). Nos casos de obstrução da junção vésico-ureteral com hidronefrose, será necessária a realização de uretrocistografia miccional para diagnóstico diferencial entre hidronefrose por refluxo e obstrução da extremidade distal do ureter. Nos casos de hidronefrose por ureterocele, a presença de defeito de enchimento arredondado na bexiga ou uretra será importante para este diagnóstico. Quando a ureterocele for grande, poderá haver obstrução do meato ureteral do lado oposto (Fig. 19.25). Em ureter ectópico na uretra e vagina, a realização de uretrocistografia miccional e vaginografia, respectivamente, trará os subsídios necessários para o diagnóstico final (Figs. 19.22B e 19.23B). Outros exames ainda poderão ser utilizados para complementar a investigação, tais como: pielografia descendente (Fig. 19.29), arteriografia renal e tomografia computadorizada.
C
REFLUXO Refluxo é o retorno do conteúdo líquido de um compartimento para outro, sendo da bexiga para o ureter (refluxo vésico-ureteral) ou dos cálices para os túbulos coletores (refluxo intra-renal) (Fig. 19.44), podendo ocorrer antes ou durante a micção e ser uni- ou bilateral (v. Cap. 26).
Fig. 19.41 Refluxo vésico-ureteral. A. Ultra-sonografia. Corte longitudinal do rim D e E mostrando rim D normal, rim E reduzido de volume, sinal de nefropatia por refluxo. B e C. Uretrocistografia miccional. B. Demonstrando uretra e bexiga normais. C. Presença de refluxo vésico-ureteral grau IV bilateral.
362
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Fig. 19.42 Menina de cinco anos de idade com infecção urinária moderada. A. Início da micção, bexiga contraindo-se. Uretra normal. B. Aparecimento de refluxo. A seta indica o esfíncter externo parcial aberto. C. Refluxo vésico-ureteral primário, grau III à direita.
Fig. 19.44 Menina de cinco meses de idade com infecção urinária. A e B. Uretrocistografia miccional com refluxo vésico-ureteral bilateral, sendo à direita intra-renal (seta).
䉳 Fig. 19.43 Menina de 10 anos de idade com infecção urinária grave. A. No urograma excretor há sinais de dilatação de cálices de ambos os lados com atrofia do parênquima, principalmente em pólos superiores (setas). B. Na uretrocistografia miccional, refluxo primário bilateral grau IV à E e grau III à D.
capítulo 19
Na pesquisa de RVU, o exame indicado é a uretrocistografia miccional e, se necessário, complementada com a ultra-sonografia. O exame de eleição para investigar e avaliar o refluxo é a uretrocistografia miccional, não sendo suficiente a simples cistografia, pois ele poderá ocorrer somente durante a micção. Pode-se flagrar a dilatação intermitente das vias excretoras superiores durante o exame ultra-sonográfico, porém o exame normal, tanto ultra-sonográfico como urográfico, não exclui o refluxo vésico-ureteral, tornando-se imprescindível a realização da uretrocistografia miccional (Fig. 19.41). Podemos classificar o RVU de várias maneiras, como:
363
Nos casos de infecção e processos obstrutivos, o refluxo deverá desaparecer após removida a causa que o motivou.
1. Primário: quando há anomalia de implantação do ureter na parede vesical estando alterado o mecanismo anti-refluxo (Fig. 19.40). 2. Secundário: quando a implantação do ureter é normal, mas por fatores outros, como infecção urinária, processos obstrutivos do trato urinário inferior (Fig. 19.32), implantação do ureter na uretra (Fig. 19.22), e em divertículos vesicais etc., o refluxo poderá ocorrer. Classificação do refluxo vésico-ureteral, segundo a sua intensidade (Fig. 19.45): 1. Grau I — Somente para o ureter. 2. Grau II — Refluxo para o ureter, pelve e cálices, porém sem dilatação. 3. Grau III — Refluxo com pequena dilatação do ureter, pelve e cálices e discreto borramento dos fórnices caliciais (Figs. 19.42 e 19.43B). 4. Grau IV — Dilatação mais acentuada do ureter, pelve e cálices, maior borramento dos fórnices e ureter tortuoso (Fig. 19.41C). 5. Grau V — Acentuada dilatação do ureter, pelve e cálices e acentuada tortuosidade dos ureteres (Fig. 19.40).
Fig. 19.45 Classificação internacional do refluxo vésico-ureteral, segundo a sua intensidade.
Fig. 19.46 Menina de dois anos de idade com infecção urinária, dupla via excretora e hidronefrose à direita. A. No urograma excretor, aos 10 minutos, evidenciou-se dilatação dos grupos caliciais médios e inferiores e ureterocele (setas). B. Aos 30 minutos, opacificação do grupo calicial superior D (seta), com sinais de hidronefrose e obstrução ureteral pela ureterocele. A repleção vesical dificulta a visualização da ureterocele. C. Uretrocistografia miccional mostrando refluxo vésico-ureteral primário, grau III, para o ureter que drena os cálices médios e inferiores direitos.
364
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Fig. 19.47 Menina de oito anos de idade, com infecção urinária de repetição. A. No urograma excretor, aos 10 minutos, não houve eliminação de contraste pelo pólo inferior do rim esquerdo. Sinais de duplicidade completa da via excretora esquerda e quase completa à direita. B. Radiografia tardia com opacificação e dilatação dos grupos caliciais médio e inferior esquerdos. C. Radiografia mais tardia (nove horas), mostrando retenção do contraste nos cálices e bacinete da via excretora E, por obstrução da junção pieloureteral. D. Uretrocistografia miccional com refluxo vésico-ureteral para a via excretora inferior, grau III, mostrando a junção pieloureteral de calibre reduzido (seta). Uretra normal.
Fig. 19.48 Menina de oito meses de idade com infecção urinária. A. Urograma excretor mostrando dilatação e duplicidade parcial da via excretora direita, com atrofia renal localizada. B. Na uretrocistografia miccional evidenciou-se refluxo vésico-ureteral bilateral, grau III à direita e grau II-a à esquerda. Uretra normal.
365
capítulo 19
Fig. 19.49 Menina de três anos de idade com infecção urinária e refluxo vésico-ureteral bilateral importante, grau III. Uretra normal. No urograma evidenciou-se atrofia de rim direito com áreas de retração do parênquima (seta lateral) e dilatação e distorção dos cálices.
O refluxo vésico-ureteral costuma ocorrer quando há duplicidade completa da via excretora, sendo notado no ureter que drena os grupos caliciais médio e inferior (Figs. 19.46 e 19.47). O RVU e a infecção urinária (pielonefrite crônica) podem impedir o crescimento do rim ou torná-lo mais lento que o normal e provocar atrofia localizada (Fig. 19.48) ou difusa do parênquima (Fig. 19.49), podendo chegar à exclusão funcional, sendo estes sinais de nefropatia de refluxo.
BEXIGA NEUROGÊNICA Bexiga neurogênica constitui-se em um transtorno funcional importante, no qual o funcionamento sincrônico entre a contração vesical e esfíncteres uretrais desaparece. O esfíncter interno é o responsável pelo fechamento e abertura involuntários da uretra proximal, enquanto o esfíncter externo é responsável pela abertura e fechamento voluntários da uretra (Fig. 19.7). O esfíncter interno está ao nível do colo vesical, enquanto o esfíncter externo está ao nível da uretra membranosa (Fig. 19.8). A bexiga neurogênica ocorre quando existe alteração da inervação da parede vesical ou dos esfíncteres, quer por lesões congênitas — disrafismo, agenesia de sacro e mielomeningocele, quer por lesões adquiridas — traumatismos ou tumores que afetem as raízes nervosas que saem do canal raquidiano.
Assim sendo, podemos ter lesões isoladas da inervação da bexiga ou dos esfíncteres ou lesões associadas. O músculo detrusor é a unidade responsável pela contração e esvaziamento vesical; baseando-se na sua contratilidade, pode-se classificar a bexiga neurogênica em dois tipos: do tipo detrusor arreflexo e do tipo detrusor hiperreflexo, antigamente denominados, respectivamente, bexiga neurogênica hipotônica e hipertônica. Na bexiga neurogênica do tipo detrusor arreflexo, a lesão geralmente é do arco reflexo sacral (neurônio motor inferior). Os achados radiográficos serão de uma bexiga grande e de contornos regulares. Quando os esfíncteres são competentes ou parcialmente competentes, o trato urinário superior costuma ser normal. A micção ocorre por transbordamento, ou seja, quando a pressão intravesical ultrapassar a competência dos esfíncteres haverá micções intermitentes (Fig. 19.50, Fig. 19.52 e Fig. 19.54). Na bexiga neurogênica do tipo detrusor hiper-reflexo, a lesão está acima do neurônio motor inferior ao nível do cérebro ou medula espinhal, e nestes casos aparecem sinais de bexiga de esforço, com forma alongada, de contornos irregulares e com pseudodivertículos. Quando os esfíncteres são competentes ou parcialmente competentes, freqüentemente haverá hidronefrose devido ao refluxo vésico-ureteral ou à dificuldade de esvaziamento ureteral em bexiga de alta pressão (Fig. 19.51 e Fig. 19.53). A presença de refluxo vésico-ureteral ocorre em dois terços dos pacientes e sinais de pielonefrite crônica na maioria, mesmo que não haja refluxo. Por isso, torna-se necessária a realização da ultra-sonografia para o estudo da anatomia do trato urinário superior, complementada com a cintilografia para avaliação da função renal (Fig. 19.50). A uretrocistografia miccional torna-se imperiosa nestes pacientes, embora nem sempre seja um exame simples de se realizar, devido à falta de controle da micção pelo paciente. Na bexiga neurogênica do tipo detrusor arreflexo, facilitamos a micção comprimindo a bexiga com uma câmara de ar. Na bexiga neurogênica do tipo detrusor hiperreflexo, haverá micção involuntária já com pequena quantidade de líquido na cavidade vesical.
INFECÇÃO URINÁRIA A infecção urinária é mais comum na menina do que no menino, e para uma boa investigação será necessária a realização da ultra-sonografia e da uretrocistografia miccional, por vezes complementada com a cintilografia e/ou urograma. Na maioria dos casos, a infecção não está associada a anormalidades anatômicas ou funcionais do aparelho urinário. Quando estas existem, as mais comuns são: o RVU primário e os processos obstrutivos, sejam do trato urinário superior ou inferior.
366
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
RIM E
RIM D
B
A
C
Fig. 19.50 Bexiga neurogênica do tipo detrusor arreflexo. A. Ultra-sonografia. Corte longitudinal do rim D e E. Rim E ecograficamente normal, rim D diminuído de volume, com sinais de atrofia do parênquima, notável principalmente no seu pólo superior (setas). B. Uretrocistografia miccional. Bexiga urinária de capacidade aumentada e contornos irregulares, micção intermitente por transbordamento e ausência de refluxo vésico-ureteral. C. Urografia excretora, reforçando os achados ecográficos. Sinais de pielonefrite crônica à D.
A
B
Fig. 19.51 Bexiga neurogênica do tipo detrusor hiperreflexo. A. Uretrocistografia miccional. Bexiga alongada, de contornos irregulares com formações pseudodiverticulares. Uretra de aspecto anatômico. Ausência de refluxo vésico-ureteral; no entanto, na urografia excretora (B) há exclusão funcional do rim D e o rim E apresenta acentuada dilatação da via excretora superior.
367
capítulo 19
Fig. 19.52 Menino com bexiga neurogênica, com dificuldade à micção por espasmo de esfíncter externo (seta proximal) e jato fino (seta distal). A uretra posterior está dilatada e há refluxo de contraste para dentro dos canalículos prostáticos (seta proximal).
O exame radiológico poderá ser absolutamente normal em crianças portadoras de infecção. O Quadro 19.2 ilustra a rotina de investigação utilizada no nosso serviço para pacientes com infecção urinária, dividindo-os de acordo com a faixa etária.
Fig. 19.53 Menina nascida com mielomeningocele. Bexiga neurogênica. Na uretrocistografia miccional evidenciou-se dificuldade de micção por espasmo de esfíncter interno (seta). A bexiga está alongada e de contorno irregular. Refluxo vésico-ureteral bilateral, grau IV. Sinais de bexiga neurogênica.
Quadro 19.2 0-5 anos ↓ Ultra-sonografia ⫹ Uretrocistografia miccional
↓
Patológico ↓ Cintilografia
↓
Acompanhamento ultrasonográfico a cada 6 meses
↓
↓
Normal ↓
Normal ↓ Acompanhamento ultra-sonográfico
Patológico ↓ Urografia excretora
↓
↓
⬎ 5 anos ↓ Ultra-sonografia Patológico ↓ Uretrocistografia miccional
↓
Normal ↓ Fim
↓
Normal ↓ Fim
Patológico ↓ Cintilografia ⫹ Urografia excretora
368
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Nos casos de infecção aguda, tanto a ultra-sonografia quanto o urograma são pouco sensíveis, mostrando alterações somente em um terço dos casos. A ultra-sonografia quando anormal pode revelar o rim aumentado de volume com alteração da sua ecotextura, assim como a urografia excretora pode revelar dilatação da pelve renal, cálices e ureter por hipotonia da via excretora (íleo paralítico reflexo). Nos casos de infecção crônica, observa-se hiperecogenicidade do parênquima renal com perda da distinção córtico-medular. Tanto na ultra-sonografia como no urograma os rins são pequenos e de contornos irregulares, com retração e distorção do sistema pielocalicial em virtude da fibrose do parênquima renal (Figs. 19.50 e 19.55). A capacidade de excreção do contraste pode estar reduzida, podendo chegar à exclusão funcional nos casos de sérios danos do parênquima. A uretrocistografia miccional tem como objetivos avaliar o esvaziamento vesical, a presença de refluxo vésicoureteral, a capacidade contrátil da bexiga e a anatomia da uretra. A existência de refluxo vésico-ureteral facilita a transferência de urina infectada para a via excretora superior e para o parênquima renal (Fig. 19.44). A dificuldade de esvaziamento vesical por processo obstrutivo da uretra, como na válvula de uretra posterior (Fig. 19.33) e divertículo de uretra anterior (Fig. 19.34), ou causa funcio-
Fig. 19.55 Menina de 12 anos de idade com infecção urinária apresentando refluxo vésico-ureteral à direita. Urograma excretor mostrando sinais de dilatação dos cálices e ureter à direita, com sinais de atrofia do parênquima renal, principalmente em pólo superior, e diminuição da distância entre os cálices e a coluna (seta).
nal, como na bexiga neurogênica (Fig. 19.51), facilita a instalação e a manutenção da infecção, assim como propicia o desenvolvimento da hidronefrose por refluxo ou por dificuldade de drenagem dos ureteres em bexiga de alta pressão. Resta à cintilografia com DMSA o papel de avaliação da função do parênquima renal, tanto nos processos agudos como nos cicatriciais. Em alguns tipos de infecção, especialmente na tuberculose, além do que já foi descrito, podemos encontrar alterações como depósito de contraste nas papilas, significando necrose papilar, e ureteres de contorno irregular, devido a pequenos defeitos de enchimento na coluna de contraste, determinados por lesões císticas na superfície interna do ureter, que recebe o nome de ureterite cística, depósitos de contraste no parênquima, em cavidades tuberculosas, estenoses ureterais e redução da capacidade vesical. Nos casos de atrofia renal importante, o diagnóstico diferencial deverá ser feito com hipoplasia renal.
NEFRITES Fig. 19.54 Menina com mielomeningocele e bexiga neurogênica. A uretrocistografia miccional mostrou bexiga hipotônica, de contorno liso e espasmo de esfíncter externo (seta).
A glomerulonefrite aguda e crônica e a síndrome nefrótica são as doenças mais comuns do parênquima renal (v. Caps. 22 e 23).
369
capítulo 19
Embora não haja uma correlação entre o aspecto ecográfico e o tipo histológico, a ultra-sonografia constitui o melhor método de avaliação anatômica do parênquima renal. Os achados consistem em aumento da ecogenicidade do rim com perda da sua arquitetura normal (Fig. 19.56). Normalmente o parênquima renal tem ecogenicidade menor que a do parênquima hepático, e quando ocorrer qualquer alteração da textura daquele para mais deve-se suspeitar de patologia. Convém ressaltar que no recémnascido e lactente pequeno a textura do parênquima renal normalmente é semelhante à hepática, e não deve ser confundida com patologia. Os pacientes com nefrites que evoluem para insuficiência renal crônica freqüentemente apresentam complicações cardiovasculares e osteodistrofia renal (Fig. 19.57).
TUMOR DE WILMS Segundo Potter, o tumor de Wilms resulta da proliferação anormal do blastoma metanéfrico e por isto é chamado de metanefroblastoma. Raramente é congênito. O tumor de Wilms está entre os dois primeiros tumores malignos na criança. Em 90% dos casos ele é encontrado abaixo de cinco anos, sendo 70% até os três anos. Em 95% dos casos é unilateral. O tumor de Wilms e a hidronefrose correspondem às duas causas mais importantes de aumento de volume do rim na criança. Os achados clínicos mais importantes são: massa no flanco e hematúria. A investigação radiológica deverá ser feita inicialmente com a ultra-sonografia preferentemente precedida pela tomografia computadorizada, e esta pode ser seguida pela arteriografia renal. O diagnóstico diferencial deverá ser feito com neuroblastoma, nefroma mesoblástico (hamartoma renal) e teratomas.
Fig. 19.56 Glomerulonefrite — Ultra-sonografia. Rim direito e esquerdo diminuídos de volume, com aumento da ecogenicidade do parênquima e perda da diferenciação córtico-medular.
Fig. 19.57 Osteodistrofia renal crônica. Radiografia do tórax de uma criança de seis anos com insuficiência renal crônica, observe o aumento da densidade óssea do arcabouço costal e os sinais de raquitismo (alargamento e irregularidade das extremidades dos arcos costais e metáfises proximais dos úmeros). No abdome notar a calcificação dos rins (nefrocalcinose) e cateter de diálise peritoneal.
Achados Radiológicos Na radiografia simples de abdome, poderemos evidenciar a massa que, às vezes, ultrapassa a coluna vertebral. Raramente encontramos calcificações em tumor de Wilms, sendo estas comuns no neuroblastoma, carcinoma renal e de supra-renal. À ultra-sonografia, o tumor de Wilms apresenta características muito variadas (Fig. 19.58A) e geralmente tem textura mista com áreas sólidas heterogêneas e áreas císticas que representam locais de necrose ou hemorragia tumoral. Quando o tumor é predominantemente exofítico, a ultrasonografia pode ter dificuldade em identificar a origem renal da lesão; e como grandes massas do pólo superior do rim podem simular neuroblastoma ou tumor hepático e a ultrasonografia pode ser falha na diferenciação destas patologias, é então importante a complementação com o urograma, o qual mostrará deslocamento do rim em virtude do crescimento extrínseco do tumor, distorção do sistema pielocalicial com sinais de compressão, dilatação e desvio dos cálices e dos seus ramos de sustentação (Fig. 19.58C). O ultra-som tem demonstrado melhor precisão na procura de trombos na veia cava inferior (VCI) e átrio direito (AD) que a tomografia computadorizada (Fig. 19.58B), enquanto a tomografia computadorizada tem sido mais efetiva na avaliação de lesões expansivas, nas extensões retroperitoneais e na pesquisa de pequenas metástases hepáticas e pulmonares, além de ser mais sensível que a radiografia simples para a evidenciação de pequenas calcificações (Fig. 19.59). Menos freqüentemente, vamos encontrar sinais de invasão da via excretora pelo tumor e, algumas vezes, exclusão funcional do rim, que representa destruição do parênquima renal.
370
A
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
B
C
Fig. 19.58 Tumor de Wilms. A e B. Ultra-sonografia. A. Corte longitudinal do rim D mostrando grande lesão expansiva sólida no pólo superior do rim D. B. Corte longitudinal da veia cava inferior demonstrando trombo na sua luz. C. Urografia excretora do mesmo paciente revelando a lesão expansiva intra-renal no pólo superior do rim D com distorção e deslocamento dos cálices para baixo.
O aumento de volume do rim poderá ser importante, chegando a massa a ultrapassar a coluna vertebral. As metástases deste tipo de neoplasia fazem-se mais comumente para o pulmão e, às vezes, para o fígado, sistema linfático e raramente esqueleto. Na venocavografia, podemos encontrar sinais de compressão e desvio da cava, bem como obstrução.
Ponto-chave: • O ultra-som tem demonstrado melhor precisão na procura de trombos na veia cava inferior (VCI) e átrio direito (AD) que a tomografia computadorizada
A
B Fig. 19.59 Tumor de Wilms — Tomografia computadorizada. A. Corte axial ao nível dos rins demonstrando lesão expansiva renal direita, com área hipodensa central, correspondente à área de necrose. B. Corte axial do tórax do mesmo paciente revelou imagem nodular no pulmão direito; tratava-se de uma metástase única.
TROMBOSE DA VEIA RENAL A trombose da veia renal mais comumente é unilateral, podendo ser bilateral. É mais comum no recém-nascido do que nos lactentes. Na maioria das vezes (80%), a trombose da veia renal está relacionada com hipovolemia e hemoconcentração, devidas à desidratação e septicemia. Os tumores renais ou perirrenais podem invadir a veia renal e provocar obstrução da mesma. Como achados clínicos importantes, na fase aguda, salientam-se a palpação e o aumento de volume do rim; concomitantemente, ocorre hematúria. Atualmente o exame ultra-sonográfico juntamente com a cintilografia são os exames de escolha no diagnóstico e acompanhamento da trombose da veia renal. O aspecto ecográfico depende da fase em que o exame é realizado, fase aguda ou tardia.
371
capítulo 19
Na fase aguda, o rim apresenta-se aumentado de volume e hiperecogênico; esta alteração da textura pode ser difusa ou local, ou ainda exibir um padrão misto. Após duas semanas ocorre o restabelecimento da diferenciação córtico-medular, e após dois meses aparecem os sinais de atrofia renal. Estes achados incluem redução do volume renal com aumento da ecogenicidade do parênquima e perda da distinção córtico-medular. Como complemento da ultra-sonografia pode-se utilizar o Doppler, o qual demonstrará ausência de fluxo. A evolução de um rim com trombose da sua veia renal poderá fazer-se de três formas, do ponto de vista anatomopatológico: a. O rim apresenta área localizada de atrofia e volta a ter função normal, em virtude da intensa circulação colateral que se instala, na tentativa de suprir a função da veia renal. b. Atrofia renal moderada com recuperação da função, podendo simular hipoplasia renal. c. Atrofia renal grave com ou sem calcificações, exclusão funcional do rim e atrofia da artéria renal. As calcificações têm aspecto reticular e estão relacionadas com as veias renais trombosadas. Uma das complicações da trombose da veia renal com atrofia renal, principalmente, será o desenvolvimento de hipertensão arterial. Freqüentemente há concomitância de hemorragia da supra-renal, e, no geral, esta é à esquerda.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BERDON, W.E. Contemporary imaging approach to pediatric urologic problems. The Radiologic Clinic of North America, Saunders, v. 29, n. 3, pp. 605-18, May 1991. 2. BERDON, W.E. The neonate and the young infant. The genitourinary tract. In: Silverman, F.N. Caffey’s Pediatric X-Ray Diagnosis: An Integrated Imaging Approach, 8th ed. Chicago. Year Book Medical Publishers, 1984, pp. 1885-1934. 3. CURRARINO, G. The genitourinary tract. In: Silverman, F.N. Caffey’s Pediatric X-Ray Diagnosis: An Integrated Imaging Approach, 8th ed. Chicago. Year Book Medical Publishers, 1984, pp. 1587-1743. 4. EMIS, E.S. JR.; BLAIVAS, J.G. Neurogenic bladder simplified. The Radiologic Clinic of North America, Saunders, v. 29, n. 3, pp. 571-80, May 1991. 5. SWISCHUK, L.E. Imaging of the Newborn, Infant, and Young Child, 3rd ed. Baltimore. Williams & Wilkins, 1991, pp. 559-668. 6. SWISCHUK, L.E.; HAYDEN, C.K. Pediatric Ultrasonography. Baltimore. Williams & Wilkins, 1990, pp. 259-340. 7. EMMETT, J.L.; WITTEN, D.M. Clinical Urography. An Atlas and Textbook of Roentgenologic Diagnosis, 3rd ed. Philadelphia. W.B. Saunders, 1971.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BERTSCHY, C.; BAWAB, F.; LIARD, A.; VALIOULIS, I.; MITROFANOFF, P. Enterocystoplasy complications in children. A study of 3 cases. Eur J Pediatr Surg; 10 (1):30-4, 2000 Feb. CUSHING, B.; SLOVIS, T.L. Imaging of Wilms’ tumor: what is important? Urol Radiol; 14:241-251, 1992. DALLA-PALMA, L.; POZZI-MUCELLI, F.; POZZI-MUCELLI, R.S. Delayed CT findings in acute renal infection. Clin Radiol; 50:364-370, 1995. FULTZ, P.J.; HAMPTON, W.R.; TOTTERMAN, M.S. Computed tomography of pyonephrosis. Abdom Imaging; 18:82-87, 1993. GOLDMAN, S.M.; FISHMAN, E.K. Upper urinary tract infection; the current role of CT, ultrasound, and MRI. Semin Ultrasound CT MR; 12:335-360, 1991. KAWASHIMA, A.; SANDLER, C.M.; GOLDMAN, S.M.; RAVAL, B.K.; FISHMAN, E.K. CT of renal inflammatory disease. Radiographics; 17:851-866, 1997. OZOKUTAN, B.H.; KUCUKAYDIN, M.; GUNDUZ, Z.; KABAKLIOGLU, M.; TURAN, C. Urolithiasis in childhood. Pediatr Surg Int; 16 (1-2):603, 2000. SCHWARTZ, B.F.; STOLLER, M.L. The vesical calculus. Urol Clin North Am; 27 (2):333-46, 2000 May. SIEGEL, M.J.; LUKER, G.D. Pediatric applications of helical (spiral) CT. Radiol Clin North Am; 33:997-1022, 1995. SONG, J.H.; HANSEN, K.; WALLACH, M.T. Extrarenal Wilms’ tumor. J Ultrasound Med; 16:149-151, 1997. STRIFE, J.L.; SOUZA, A.S.; KIRKS, D.R. et al. Multicystic dysplastic kidney in children: US follow-up. Radiology; 186:785-788, 1993. SUSUKI, K.; MIYAKE, H.; TASHIRO, M. et al. Extrarenal Wilms’ tumor. Pediatr Radiol; 23:149, 1993.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.pedrad.org Site oficial da Society for Pediatric Radiology, organização médica profissional dedicada à radiologia pediátrica. Contém link direto para o site da revista Pediatric Radiology, publicada a cada dois meses. O site da revista oferece os artigos publicados em edições anteriores. http://www.pediatricradiology.com Site dedicado à radiologia pediátrica contendo variado número de doenças e de imagens em radiologia pediátrica. Link direto para doenças do trato urinário. Também intitulado de biblioteca/livraria digital para radiologia pediátrica. http://www.uab.edu/pedradpath Site de correlação clínica, radiológica e patológica. Muito bom para entendimento abrangente de determinadas patologias disponíveis no site, com discussão sobre as mesmas.
Capítulo
19
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança Vanildo J. Ozelame, Telma Sakuno, Sebastião O. L. de Carvalho e Rodrigo V. Ozelame
INTRODUÇÃO
Anomalias de rotação
TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO
Anomalias vasculares
Ultra-sonografia
Anomalias de fusão dos rins
Radiografia simples do abdome
Anomalias do ureter
Urografia excretora
Duplicação
Uretrocistografia miccional
Ectopia ureteral
Tomografia computadorizada
Ureterocele
Cintilografia renal
Obstrução da junção pieloureteral
Ressonância magnética CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS INDICAÇÕES PARA A INVESTIGAÇÃO RADIOLÓGICA
Megaureter ANOMALIAS CONGÊNITAS DA BEXIGA Úraco Duplicações
Infecção
Divertículos
Massas abdominais
Complexo extrofia-epispádia
Traumatismo abdominal Anomalias congênitas da coluna lombossacra, da genitália externa e anorretais
ANOMALIAS CONGÊNITAS DA URETRA Válvulas uretrais Divertículo da uretra anterior
Mielomeningocele
Duplicidade da uretra
Hematúria
Hipospádias
Cólica renal Insuficiência renal ANOMALIAS CONGÊNITAS DO APARELHO URINÁRIO
HIDRONEFROSE Achados radiológicos REFLUXO
Agenesia
BEXIGA NEUROGÊNICA
Hipoplasia
INFECÇÃO URINÁRIA
Doença cística dos rins
NEFRITES
Cistos simples Rim multicístico displásico Cisto multilocular Doença policística
TUMOR DE WILMS Achados radiológicos TROMBOSE DA VEIA RENAL REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Tipo infantil
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Tipo adulto
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Ectopia renal
337
capítulo 19
INTRODUÇÃO O aparelho urinário da criança constitui-se em um dos principais setores do organismo a apresentar anormalidades, sejam elas congênitas ou adquiridas. Não raramente, estas anormalidades são descobertas ocasionalmente, através de exames, e, outras vezes, estes exames são indicados para confirmação de suspeitas clínicas.
TÉCNICAS DE INVESTIGAÇÃO Os exames de imagem mais comumente usados para exploração do aparelho urinário da criança são: ultra-sonografia, radiografia simples de abdome, urografia excretora e uretrocistografia miccional. Além destes, pielografia descendente, cintilografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética e arteriografia renal seletiva complementam a investigação, quando necessárias.
Ultra-sonografia Com o advento da ultra-sonografia de tempo real, o diagnóstico por imagem das patologias urinárias adquiriu uma perspectiva completamente nova, e o uso da urografia excretora, que por muitos anos foi o principal método de imagem, aos poucos vai sendo substituído pela ultra-sonografia (v. também o Cap. 18-I). Esta representa um método eficiente, prático, econômico e não-irradiante. Raramente há necessidade de sedação do paciente e rapidamente informa quanto à anatomia do trato urinário superior (Fig. 19.1).
Fig. 19.1 Ultra-sonografia normal do rim. Corte longitudinal do rim D, demonstrando o parênquima renal de ecogenicidade menor que a do parênquima hepático. As pirâmides (P) triangulares e hipoecóicas em relação à cortical, na periferia. O seio renal (SR) hiperecogênico, na região central.
Os aparelhos portáteis permitem o exame da criança em unidades de terapia intensiva, no seu próprio leito, sem a necessidade do deslocamento do mesmo para o serviço de radiodiagnóstico. Com o uso rotineiro da ultra-sonografia em gestantes, muitas das anomalias congênitas são diagnosticadas ainda no período intra-uterino, alertando o médico quanto à necessidade de se investigar e confirmar estas malformações logo após o nascimento, ou mesmo quanto à necessidade de cirurgia intrafetal, no intuito de drenar o trato urinário dilatado, preservando-se assim a função renal. O exame ultra-sonográfico pode ainda ser utilizado como guia nas biópsias renais percutâneas, aspiração de cistos e abscessos, colocação de cateter de nefrostomia, nas hidronefroses e pielografia descendente. Sua limitação está na ineficiência em informar sobre a função renal.
Radiografia Simples do Abdome A radiografia simples do abdome, além do estudo prévio de todo o abdome, nos permite a identificação de cálculos radiopacos e informações da coluna vertebral e bacia, que não raramente apresentam anomalias envolvidas com alterações do trato urinário, como veremos adiante.
Urografia Excretora A urografia excretora (Fig. 19.2) visa principalmente o estudo do trato urinário superior, quando houver obstrução e duplicidade ureteral. Para a realização da urografia excretora será necessária a utilização de contrastes que, após serem injetados na corrente sanguínea, são eliminados preferencialmente pelos rins.
Fig. 19.2 A. Urograma excretor normal. B. Urograma excretor normal, mostrando esvaziamento do ureter direito pelo peristaltismo.
338
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Os contrastes têm na sua composição compostos orgânicos iodados. A quantidade de contraste usada na criança varia de acordo com o peso e com a idade. Nos recémnascidos e lactentes empregam-se, em média, 3 a 4 ml por quilograma de peso; nas crianças em idade pré-escolar e escolar, em média de 1 a 2 ml por quilo de peso. Nos exames convencionais, o contraste é injetado lentamente por via venosa e as radiografias são obtidas logo após o término da injeção e aos 5, 10 e 15 minutos. Não usamos compressão ureteral, a não ser nas crianças em idade escolar e quando necessária. Somente serão prescritos laxante e restrição de líquidos anteriores ao exame para as crianças em idade pré-escolar e escolar. Está contra-indicada a restrição de líquidos nos recém-nascidos e lactentes, bem como o uso de laxantes. Nesta faixa etária, para melhor visualização dos rins, freqüentemente se usa administrar mamadeira após o término da injeção do contraste. Deglutindo leite e ar, haverá distensão do estômago, possibilitando, na maioria das vezes, ver com mais nitidez o contorno renal e os sistemas pielocaliciais. Esta conduta também poderá ser adotada em crianças maiores, utilizando-se bebidas efervescentes. O contraste poderá ainda ser diluído em igual quantidade de soro fisiológico e esta solução ser administrada gota a gota na veia, em média 40 gotas por minuto. A técnica descrita chama-se urograma por infusão, sendo indicada quando forem necessárias dosagens de contraste acima do normal.
Uretrocistografia Miccional A uretrocistografia miccional será feita com duas finalidades básicas: investigar o trato urinário inferior e investigar a existência de refluxo vésico-ureteral. Este exame torna-se um complemento da urografia excretora e da ultra-sonografia, sendo necessária a realização destes exames quando quisermos fazer uma exploração completa do aparelho urinário. Um exame ultra-sonográfico ou urográfico normal não exclui anormalidades como refluxo vésico-ureteral, válvulas de uretra, divertículos de bexiga, etc. Este exame, sempre que possível, deve ser realizado sob controle radioscópico através da televisão, porque, além das informações anatômicas, poderemos ter informações de ordem funcional, e neste caso serão utilizados os contrastes hidrossolúveis. Para controles de refluxo vésicoureteral, a uretrocistografia miccional convencional pode ser substituída pela uretrocistografia miccional com radioisótopos. Para a realização da uretrocistografia miccional convencional, será necessária uma solução composta de contraste e soro fisiológico, na proporção de 1 para 3, ou seja, 1 ml de contraste para 3 ml de soro fisiológico, usando-se, em média, 200 ml de solução. Esta solução será introduzida na bexiga através de uma sonda vesical, por gotejamento.
Quando a mesma estiver distendida, a criança sentirá vontade de urinar. Ao começar a micção, faremos as radiografias, surpreendendo-se o contraste passando pela uretra, verificando-se a contração vesical e a presença de refluxo vésico-ureteral, se existir.
Pontos-chave: • A radiografia simples do abdome, além do estudo prévio de todo o abdome, nos permite a identificação de cálculos radiopacos e informações da coluna vertebral e bacia • A urografia excretora visa principalmente o estudo do trato urinário superior, quando houver obstrução e duplicidade ureteral • A uretrocistografia miccional será feita com duas finalidades básicas: investigar o trato urinário inferior e a existência de refluxo vésico-ureteral Na menina, durante a micção, é comum a passagem de líquido para dentro da vagina.
Tomografia Computadorizada Assim como a ultra-sonografia, a tomografia computadorizada permite o estudo do parênquima renal e das vias excretoras, sua relação com os espaços peri- e pararrenais e com outras estruturas retroperitoneais, independentemente da sua função (Fig. 19.3). A tomografia computadorizada tem-se demonstrado mais precisa do que a ultra-sonografia e a urografia excretora nos casos de massas abdominais, determinando o local, o tamanho e a extensão da lesão, e nos casos de pequenas lesões parenquimatosas. Além disso, tem sido amplamente usada na abordagem do trauma abdominal, com boa precisão em demonstrar pequenas lesões traumáticas do rim. Possibilita uma avaliação parcial da função do parênquima renal.
Cintilografia Renal A cintilografia se constitui no exame de eleição para a avaliação da função renal, tanto do rim como um todo ou de um determinado segmento (v. Cap. 20). Teoricamente qualquer material radioativo que tenha a sua excreção feita pelo rim pode ser utilizado para avaliação da função renal, porém os mais usados são o 99mTcDTPA e o 99mTc-DMSA. O DTPA avalia a filtração glomerular, sendo excretado pelo rim, demonstrando o seu acúmulo no parênquima renal e subseqüente excreção para a pelve renal, ureter e bexi-
339
capítulo 19
B
A
Fig. 19.3 Tomografia computadorizada normal. A e B. Corte tomográfico após a injeção de contraste endovenoso, mostrando a impregnação homogênea do parênquima renal, sua relação com os espaços peri- e pararrenais. Aorta (A), veia cava inferior (VCI), veia renal direita (VRD), veia renal esquerda (VRE), pelve renal (P), cálices (C).
ga urinária. A concentração quantitativa relativa do material em cada rim é demonstrada na mesma proporção das suas respectivas funções. É amplamente utilizada na avaliação da dilatação do trato urinário superior, sendo nestes casos o uso do furosemide, após o esvaziamento vesical por cateterismo, obrigatório. Este procedimento determinará se a dilatação do trato urinário superior é por processo obstrutivo ou não. O DMSA tem concentração renal alta, e este material é depositado primariamente nos túbulos renais, tendo excreção vagarosa e mínima. Por ser acumulado nos túbulos renais, permite uma boa visualização do córtex renal (Fig. 19.4), sendo indicado nos processos inflamatórios agudos e cicatriciais. Sua desvantagem é a impossibilidade de avaliar as vias excretoras.
A limitação da cintilografia está no fato da sua precariedade em informar sobre a anatomia do trato urinário.
Ressonância Magnética A ressonância magnética estará indicada especialmente nas lesões expansivas do trato urinário e para o estudo dos vasos do hilo renal, tendo como vantagens permitir o estudo detalhado das estruturas anatômicas sem a utilização de meios de contraste, bem como de não utilizar radiação ionizante (v. também o Cap. 18-II). No entanto, nas crianças abaixo de cinco anos, será necessária a utilização de sedação profunda, sendo este aspecto desvantajoso perante a tomografia computadorizada, além de ser de maior custo para o paciente.
Pontos-chave:
Fig. 19.4 Cintilografia renal normal com 99mTc-DMSA. Observe a captação homogênea do material radioativo e sua alta concentração parenquimatosa.
• A tomografia computadorizada permite o estudo do parênquima renal e das vias excretoras. Tem-se demonstrado mais precisa do que a ultra-sonografia e a urografia excretora nos casos de massas abdominais • O DTPA avalia a filtração glomerular. É amplamente utilizado na avaliação da dilatação do trato urinário superior • O DMSA, por ser acumulado nos túbulos renais, permite uma boa visualização do córtex renal, sendo indicado nos processos inflamatórios agudos e cicatriciais
340
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
CONSIDERAÇÕES ANATÔMICAS De uma maneira geral, os rins devem possuir um comprimento longitudinal que corresponde a 3 ou 4 corpos vertebrais. O rim esquerdo, na maioria das vezes, é maior e mais alto que o rim direito. Em aproximadamente 10% dos casos, eles podem ser iguais e estar na mesma altura. Algumas vezes o rim esquerdo é menor que o direito, não devendo esta diferença ultrapassar 0,5 cm em relação ao direito. Quando o rim esquerdo estiver mais baixo que o direito, deve-se suspeitar de presença de massa acima do pólo superior, como, por exemplo, neuroblastoma de supra-renal, o qual, à medida que cresce, desloca o rim para baixo e para fora. O rim possui duas áreas importantes: parênquima renal, formado pela cortical e pela medular, e sistema pielocalicial. A ultra-sonografia permite o estudo anatômico do rim, distinguindo na periferia o córtex e a medular hipoecogênicos e, no centro, o seio renal hiperecogênico (Fig. 19.1). No recém-nascido e lactente pequeno a cortical do rim é tão ecogênica quanto o fígado, enquanto na criança maior e no adulto a cortical é de menor ecogenicidade que o fígado. A medular, representada pelas pirâmides renais, é identificada como uma área contendo estruturas triangulares hipoecóicas, e no neonato estas são relativamente grandes e sonolucentes, podendo por vezes ser confundidas, pelos menos experientes, com cálices dilatados. O seio renal é formado pela pelve renal, artérias renais, veias renais, linfáticos e gordura. No neonato o seio renal é menos ecogênico que na criança maior, provavelmente devido à menor quantidade de gordura. Dependendo do grau de hidratação do paciente e da distensão vesical, a pelve renal pode ser identificada como estrutura anecóica, sem que isto signifique patologia, sendo prudente o reexame após o esvaziamento vesical, observando-se que a mesma desaparece.
Com a ultra-sonografia tornou-se muito fácil a mensuração dos diâmetros renais, da espessura do parênquima renal e da relação córtico-medular. Na urografia excretora, a mensuração do parênquima faz-se de modo indireto, sendo calculada pela distância entre o bordo do rim e o fórnice dos cálices (Fig. 19.5). A medular poderá ser identificada quando houver retenção de contraste nos ductos de Belini e túbulos coletores, que terminam na papila renal, a qual estará separada da via excretora propriamente dita pela lâmina crivosa. O contorno renal, na grande maioria dos casos, é regular, mas, em poucas circunstâncias, poderá ser bocelado, em virtude da persistência de lobulação fetal. Neste caso, as áreas de depressão não coincidem com os cálices, que estão normais, fato importante para diferenciá-las de uma área de retração do parênquima por atrofia do mesmo. Aqui, a área de retração estará na mesma direção de um cálice, geralmente dilatado. Estes achados permitem-nos fazer o diagnóstico de pielonefrite crônica localizada. É importante que a distância entre os cálices dos grupos superiores e a coluna vertebral seja simétrica, bem como a distância entre os cálices e o contorno dos pólos superiores dos rins. Este raciocínio vale em relação ao contorno dos pólos inferiores, coluna vertebral e cálices. À medida que o contraste vai sendo eliminado pelos rins, ele opacifica as vias excretoras, possibilitando visualizar os cálices, bacinetes, ureteres e bexiga. Os cálices, quando vistos de perfil, apresentam-se em forma de meia-lua e, quando vistos de frente, são arredondados. Possuem dois pontos de referência: o fórnice e o vértice. Entre o cálice e o bacinete, há o ramo de sustentação do cálice. Os cálices apresentam uma grande variação anatômica, principalmente quanto ao número. O bacinete pode ser intra- ou extra-renal e varia quanto à forma.
Fig. 19.5 Anatomia renal. A. PAR ⫽ parênquima; INF ⫽ infundíbulo; F ⫽ fórnix; B ⫽ bacinete. B. Urograma normal.
capítulo 19
Após o bacinete, vêem-se a junção pieloureteral e o ureter, que se constitui no segmento mais longo do aparelho urinário. Os ureteres são segmentos tubulares, de pequeno calibre, que correm paralelamente à coluna e terminam na junção vésico-ureteral. No exame ultra-sonográfico, os ureteres normais não são identificados. No urograma, não raramente, há discreta estase do conteúdo ureteral ao nível dos vasos ilíacos, que comprimem levemente os ureteres. O conteúdo do ureter chegará à bexiga por gravidade e principalmente pelo peristaltismo ureteral (Fig. 19.2), que começa no bacinete e se dirige em direção à bexiga, impulsionando a urina. Assim como no exame ultra-sonográfico, se por ocasião do urograma a bexiga estiver bastante distendida por urina (globo vesical), o esvaziamento dos ureteres estará prejudicado, haverá dilatação dos mesmos e estase ureteral, produzindo-se um quadro semelhante ao da hidronefrose bilateral. Será importante que se façam radiografias após o esvaziamento da bexiga, verificando-se que a estase desaparece e os ureteres voltam ao calibre normal (Fig. 19.6). A bexiga, no exame ultra-sonográfico, possui paredes finas e regulares, seu conteúdo é anecóico, quando em repouso; e apresenta-se com diâmetro horizontal maior que o vertical e contorno liso; em repleção plena, o diâmetro vertical predomina. A anatomia do trato urinário inferior é mais bem avaliada pela uretrocistografia miccional. Durante a micção há contração vesical, a parede anterior desloca-se posteriormente, o trígono para a frente e seu bordo inferior marca o esfíncter interno.
341
A uretra no sexo feminino é mais curta que no masculino (Fig. 19.7). No sexo masculino, a uretra apresenta quatro segmentos básicos: logo abaixo do colo vesical, a uretra prostática, na qual podemos identificar o veromontano. A seguir, a uretra membranosa, distalmente a esta a uretra bulbar e, finalmente, a uretra peniana, que termina no meato uretral (Fig. 19.8). A uretra membranosa é o segmento de menor calibre, correspondendo ao diafragma urogenital ou esfíncter externo. Em condições normais, a bexiga deve esvaziar-se completamente ao final da micção, e quando há restos de contraste no seu interior, podemos identificar o relevo mucoso.
Fig. 19.7 Uretrocistografia miccional feminina normal. U ⫽ uretra; EI ⫽ esfíncter interno; EE ⫽ esfíncter externo; V ⫽ vagina.
Fig. 19.6 Menino de quatro anos de idade com infecção urinária. Uretrocistografia miccional normal. A. No urograma excretor presença de globo vesical determinando dilatação e estase ureteral bilateral. Dilatação do sistema piélico direito. B. Minutos após a micção houve desaparecimento das alterações mencionadas (urograma normal sem globo vesical).
342
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
me na vigência da infecção. A cintilografia renal estará indicada para avaliação dos focos de infecção e das seqüelas da mesma. A tomografia computadorizada estará especialmente indicada quando o processo infeccioso se acompanhar de lesões expansivas, como por exemplo abscessos. Caso não sejam adotadas estas normas, correremos o risco de fazer diagnósticos tardios, quando já houver sérios danos do parênquima renal, obrigando, às vezes, a submeter a criança à nefrectomia.
Massas Abdominais
Fig. 19.8 Uretrocistografia miccional masculina normal. B ⫽ bexiga; EI ⫽ esfíncter interno; V ⫽ veromontano; EE ⫽ esfíncter externo; UB ⫽ uretra bulbar; UP ⫽ uretra peniana.
A presença de um processo expansivo abdominal, quer seja benigno ou maligno, quase sempre significa necessidade de investigação por imagem, inicialmente através da ultra-sonografia (Fig. 19.9). Esta determina se a lesão é intra- ou extra-renal, qual a sua relação com o aparelho urinário e informa quanto à sua natureza, cística ou sólida. Freqüentemente associa-se a tomografia computadorizada, que estadiará melhor a lesão expansiva.
Traumatismo Abdominal INDICAÇÕES PARA A INVESTIGAÇÃO RADIOLÓGICA Infecção; massas abdominais; traumatismo abdominal; anomalias congênitas da coluna, genitália externa e anorretais; mielomeningocele; hematúria; cólica renal; insuficiência renal.
Pontos-chave:
Face a um traumatismo abdominal, com a presença de hematúria ou punção da cavidade peritoneal positiva, estará indicada a ultra-sonografia (Fig. 19.10). A tomografia computadorizada é de grande precisão no diagnóstico das lesões traumáticas intra- ou extra-renais, principalmente naquelas de pequenas dimensões, sendo em muitos serviços o exame de eleição no trauma abdominal. A uretrocistografia retrógrada está reservada para a pesquisa de lesão da uretra e da bexiga.
• Os rins devem possuir um comprimento longitudinal que corresponde a 3 ou 4 corpos vertebrais • O rim esquerdo, na maioria das vezes, é maior e mais alto que o rim direito • A anatomia do trato urinário inferior é mais bem avaliada pela uretrocistografia miccional
O exame radiológico é imprescindível pela freqüência com que as anormalidades do trato urinário acompanham as referidas anomalias.
Infecção
Mielomeningocele
A infecção urinária constitui-se na indicação mais freqüente para a realização de exames por imagens do aparelho urinário. Atualmente, independentemente do sexo da criança, o primeiro surto de infecção urinária já deve conduzir à investigação, porque a infecção pode estar associada a anomalias do trato urinário. Para uma boa exploração do trato urinário frente à infecção, tornam-se imprescindíveis a ultra-sonografia e, quando necessário, complementada com a uretrocistografia miccional, não sendo recomendada a realização do exa-
A presença desta anomalia congênita indica formalmente a investigação através da ultra-sonografia e da uretrocistografia miccional, e, quando necessário, complementadas com a cintilografia e urografia excretora, para a pesquisa de bexiga neurogênica e as suas repercussões para o trato urinário.
Anomalias Congênitas da Coluna Lombossacra, da Genitália Externa e Anorretais
Hematúria A hematúria por si só constitui fato de importância para a investigação, geralmente com a ultra-sonografia. As anor-
343
capítulo 19
A
A
B
Fig. 19.10 Trauma renal. Ultra-sonografia. A. Corte longitudinal do rim E, aumento do volume e da ecogenicidade dos 2/3 superiores do rim com perda da sua arquitetura normal (hematoma). B. Corte transversal da bexiga, demonstrando coágulo sanguíneo no seu interior.
tolerância ao contraste, poderá ser utilizada a tomografia computadorizada sem a utilização de contraste.
Insuficiência Renal Nos casos de insuficiência renal, torna-se importante a visualização dos rins para avaliar o seu volume, seu parênquima e sua localização, fatos que servem como prognóstico e para a orientação de biópsia. B Fig. 19.9 Neuroblastoma da adrenal esquerda. Lactente apresentando massa palpável no hipocôndrio esquerdo (HCE). A. Ultrasonografia. Corte longitudinal do HCE, mostrando lesão expansiva sólida na topografia da loja adrenal, desviando o rim para baixo e lateralmente. B. Tomografia computadorizada do mesmo paciente, demonstrando a lesão expansiva (m); na topografia da adrenal, o rim E encontrava-se desviado para baixo.
malidades que mais comumente provocam hematúria são os tumores, anomalias congênitas e litíase (Fig. 19.11). Nos casos de lesões expansivas, a tomografia computadorizada será o método de escolha para prosseguir na investigação. Nas anomalias congênitas e litíase, a urografia excretora fornecerá informações importantes.
Cólica Renal Na cólica renal, mesmo que a ultra-sonografia e a radiografia simples do abdome não mostrem imagem de litíase, se houver indícios clínicos deste diagnóstico, a urografia excretora estará indicada (Fig. 19.12). Nos casos de in-
A
B
Fig. 19.11 Litíase renoureteral. Menino de 10 anos com hematúria e dores abdominais tipo cólica. Ultra-sonografia. A. Corte longitudinal do rim direito mostrando imagem ecogênica com sombra acústica posterior (setas) na pelve renal, determinando hidronefrose, cálices dilatados (C). B. Corte longitudinal do ureter esquerdo apresentando duas imagens de litíases na sua porção distal com dilatação ureteral a montante.
344
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Fig. 19.12 Menino de nove anos de idade com cólica renal à direita. A. Na radiografia simples de abdome, aumento de volume do rim direito (seta). Presença de concreção opaca (cálculo) à direita do cóccix. B. O urograma excretor mostrou rim esquerdo normal. Aumento de volume do rim direito, com exclusão funcional.
O exame de eleição é a ultra-sonografia, uma vez que demonstra a anatomia renal independentemente da sua função (Fig. 19.56), servindo inclusive como guia para biópsia. A cintilografia estará indicada para a avaliação da função renal.
ANOMALIAS CONGÊNITAS DO APARELHO URINÁRIO Estima-se que grande parte das doenças renais está associada com anomalias congênitas do aparelho urinário. A classificação embriológica das anomalias é: 1. Falha do desenvolvimento dos metanefros: a. Aplasia b. Agenesia c. Hipoplasia. 2. Doença cística renal 3. Alteração do crescimento ureteral e dos vasos: a. Ectopia simples b. Ectopia cruzada c. Má-rotação d. Vasos aberrantes. 4. Falha de separação da massa celular metanefrogênica: a. Rim em ferradura b. Fusão renal unilateral c. Rim pélvico fundido.
Agenesia Significa falta de desenvolvimento dos metanefros, com ausência de estrutura renal. Pode ser unilateral ou bilateral e há freqüente associação de outras malformações. Merece atenção apenas a forma unilateral, desde que a bilateral é incompatível com a vida. O diagnóstico é suspeitado quando, na ultra-sonografia, não se identifica um rim e outro encontra-se aumentado de volume. No urograma, há excreção apenas unilateral e este rim é hipertrofiado. Para confirmação, deve ser feita cintilografia renal. Agenesia bilateral está associada a outras malformações: sirenomelia, monomelia e síndrome de Potter. Nos casos de agenesia ou ectopia do rim E, a porção proximal do cólon descendente ocupa a loja renal (Fig. 19.18B).
Hipoplasia Hipoplasia é o hipodesenvolvimento ou desenvolvimento lento do rim, não alcançando a maturidade normal. Habitualmente unilateral, pode raramente ser bilateral. Os rins hipoplásicos ocupam quase sempre a posição normal, com glomérulos pequenos e em menor número; túbulos dilatados e císticos, medular com pirâmides rudimentares e em menor número; artérias normais ou de diâmetro reduzido. A hipoplasia pode ser: a. Total, comprometendo todo o rim; b. Parcial, apenas uma metade de um rim duplicado; c. Segmentar. Em geral não há manifestação clínica e, quando acontece, decorre de complicações, já na segunda década.
capítulo 19
Na forma bilateral, embora rara, as complicações são precoces, com hipertensão e insuficiência renal. É difícil o diagnóstico diferencial entre hipoplasia e seqüela de nefropatia de refluxo. Tanto na ultra-sonografia como no urograma, o rim é pequeno e de contornos lisos. Ao urograma os cálices são pequenos e em menor número, de extremidades anatômicas e pelve diminuta, proporcional aos cálices, com excreção de contraste normal ou reduzida (Fig. 19.13).
Pontos-chave: • Os rins hipoplásicos ocupam quase sempre a posição normal • Na agenesia renal o diagnóstico é suspeitado quando, na ultra-sonografia, não se identifica um rim e o outro encontra-se aumentado de volume
Doença Cística dos Rins Várias são as divergências quando se trata de lesões císticas dos rins, existindo inúmeras classificações, cada uma dividindo-as a partir de diferentes pontos de vista (v. também o Cap. 31). O Quadro 19.1 ilustra a classificação adotada por Swischuk, que representa um resumo de várias classificações. A ultra-sonografia é o exame de eleição para o diagnóstico das doenças císticas dos rins, podendo ser complementada com a tomografia computadorizada, quando necessário.
345
Quadro 19.1 A. Doença policística 1. Infantil (Potter tipo I, autossômica recessiva) 2. Juvenil (idêntica à forma infantil) 3. Adulto (Potter tipo III, autossômica dominante) B. Doença multicística 1. Rim multicístico-displásico (Potter tipo II) 2. Cisto multilocular (nefroma cístico multilocular, tumor de Wilms cístico, nefroma policístico) C. Cistos medulares 1. Rim esponjoso-medular 2. Doença cística medular; nefronoftíase juvenil. D. Cistos solitários 1. Cisto simples 2. Hidrocalicose, cisto pelvicocalicial, divertículo calicial E. Outros cistos (corticais) 1. Doença de Conradi, síndrome de Zellweger, trissomias, síndrome de Turner 2. Esclerose tuberosa 3. Cistos corticais com hidronefrose obstrutiva (Potter tipo IV) 4. Cistos corticais sem hidronefrose obstrutiva 5. Adquiridos: após infecção, traumatismos, degeneração neoplásica
CISTOS SIMPLES Também denominados cistos solitários, raramente são encontrados em crianças e determinam poucos sintomas. Facilmente diagnosticados na ultra-sonografia como lesões anecóicas com reforço acústico posterior, de paredes finas e contornos regulares. A tomografia computadorizada demonstra lesão expansiva arredondada ou oval com compressão e distorção pielocalicial.
RIM MULTICÍSTICO DISPLÁSICO
Fig. 19.13 Hipoplasia renal à direita. Urograma excretor mostrando boa eliminação do contraste de ambos os lados. Os cálices são normais. O rim direito é pequeno. A pelve direita é verticalizada.
Sua etiologia está na atresia da pelve renal e/ou ureter, provavelmente por injúria vascular intra-uterina. Geralmente é unilateral, muito raramente bilateral, ou ainda pode acometer somente um segmento do rim, nestes casos geralmente o pólo superior. Antigamente postulava-se a nefrectomia, uma vez que estes rins não possuem função, porém mais recentemente tem-se optado pelo tratamento conservador, pois o acompanhamento ultra-sonográfico demonstra que há uma tendência destes rins de involuírem. À ultra-sonografia apresentam-se como múltiplos cistos de tamanhos variados, podendo-se observar tecido displásico de permeio (Fig. 19.14). No urograma há exclusão renal. O diagnóstico diferencial deve ser feito com hidronefrose. No rim multicístico displásico os cistos não se comunicam entre si e não se identifica a pelve renal. O exame com cintilografia não revela função renal.
346
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
Doença Policística TIPO INFANTIL
Fig. 19.14 Rim multicístico displásico. Ultra-sonografia. Corte longitudinal do flanco esquerdo mostrando múltiplos cistos de tamanhos variados, com tecido displásico (ecogênico) de permeio. Observe que os cistos não se comunicam.
Doença do recém-nascido, autossômica recessiva, que por vezes determina morte precoce, podendo haver fibrose hepática associada. As mudanças císticas são bilaterais, simétricas, de arranjo radiado, com cistos arredondados ou ovais formados nos túbulos coletores. Ao ultra-som, os rins são grandes e lobulados, hiperecogênicos, com perda da diferenciação córtico-medular, podendo-se por vezes observar uma borda anecóica que representa o córtex renal comprimido. A hiperecogenicidade é devido às múltiplas interfaces acústicas dos túbulos dilatados (Fig. 19.15A). Na urografia excretora há retardo de horas para a opacificação, e esta demonstra um padrão característico de rins grandes com aspecto radiado (Fig. 19.15B).
TIPO ADULTO CISTO MULTILOCULAR Tumor cístico benigno, também chamado de nefroma cístico multilocular, nefroma benigno, hamartoma cístico, tumor de Wilms cístico. Na ultra-sonografia e tomografia computadorizada apresenta-se como lesão cística multisseptada comprimindo o restante do parênquima existente.
A
Doença autossômica dominante, ocorre em adultos, podendo ocasionalmente ser encontrada em crianças. Há história familial, albuminúria e sintomas de fraqueza, hipertensão e policitemia. Na ultra-sonografia há cistos anecóicos cujo comprometimento pode ser assimétrico, mas geralmente bilateral (Fig. 19.16B). Na tomografia computadorizada há sinais de compressão, alongamento e distorção pielocalicial, e rins aumen-
B
Fig. 19.15 Rins policísticos do tipo infantil. A. Ultra-sonografia. Corte longitudinal dos rins D e E, os quais se apresentam aumentados de volume e hiperecogênicos, observe o bordo anecóico. B. Urografia excretora. Rins aumentados de volume com efeito nefrográfico estriado e prolongado, devido à coleção de contraste nos túbulos dilatados.
347
capítulo 19
B
Fig. 19.16 Rins policísticos do tipo adulto. A. Radiografia simples do abdome de um recém-nascido, observe o aumento do volume abdominal e o abaulamento dos flancos. B. Ultra-sonografia do mesmo paciente, revelando rim D aumentado de volume com múltiplos cistos de tamanhos variados. O acometimento era bilateral.
A
tados de volume, devido à presença de múltiplas imagens císticas. O fígado e o pâncreas também podem estar acometidos.
Ectopia Renal A posição normal dos rins é alcançada ao final do segundo mês de gestação. Hinman advoga a teoria de que o rim é ectópico, por falta de crescimento do ureter ou falta de degeneração dos vasos primitivos, mantendo o rim baixo. Classificação 1. Ectopia simples ou unilateral 2. Ectopia bilateral 3. Ectopia cruzada Com fusão Sem fusão. Ectopia Simples. Significa rim em posição anormal, sem cruzar a linha média. A posição pode ser lombossacra, sacroilíaca ou pélvica. Está sempre associada a alguma rotação anterior do rim. O rim apresenta-se ultra-sonograficamente normal, somente de topografia mais baixa que o usual (Fig. 19.17). Em urograma, a pelve é anterior. Pode haver pelve duplicada ou duplicidade pieloureteral. Os rins ectópicos estão sujeitos a infecção, cálculos e hidronefrose, devido à dificuldade de drenagem.
Ectopia Bilateral. Quando os rins estão em posição anômala (Fig. 19.18). Rins ectópicos sem fusão é raridade. Ectopia Renal Cruzada. Deslocamento de um dos rins para o lado oposto da coluna vertebral, podendo ou não estarem fundidos (Fig. 19.19). A transposição de um ureter para o lado oposto quase sempre resulta em fusão dos rins. Esta anomalia pode estar associada a anormalidades genitais. Podem ocorrer múltiplas variações no modo de apresentação. Os sintomas são dor e a massa pode ser palpável. Freqüentemente, eles são decorrentes de complicações: infecções, cálculos, hidronefroses.
Anomalias de Rotação Segundo Olson, é rotação incompleta ou excessiva. Há vários tipos: 1. 2. 3. 4.
Ventral — falta de rotação Ventro-interna — rotação incompleta Lateral — rotação reversa Dorsal — rotação excessiva.
A condição só tem importância quando advêm complicações como infecção, litíase e hidronefrose.
Anomalias Vasculares Inicialmente, a vascularização renal deriva de vasos sacros, pélvicos e aórticos inferiores. Persistência desta circulação pode determinar ectopia.
348
Investigação por Imagem do Trato Urinário na Criança
A
Fig. 19.17 Rim ectópico pélvico. A. Ultra-sonografia. Corte oblíquo da pelve mostrando rim atrás da bexiga. B. Uretrocistografia miccional do mesmo paciente, houve refluxo vésico-ureteral grau II bilateral, revelando rim E ectópico na cavidade pélvica.
Fig. 19.18 Menina de 12 meses de idade. Assintomática. Massas palpáveis no abdome inferior. A. No urograma excretor evidenciou-se ectopia renal bilateral (setas). B. Radiografia em decúbito ventral mostrando parte do cólon descendente (seta) na projeção da loja renal esquerda.
Fig. 19.19 Ectopia renal cruzada em paciente de 15 anos de idade, portador de malformação nas mãos e pés. Amenorréia. Baixa estatura. A e B. Rim direito hipertrofiado com sistema pielocalicial normal. Rim esquerdo pequeno, provavelmente hipoplásico, situado entre a coluna e o rim direito (seta).
Capítulo
Radioisótopos em Nefrourologia
20
Antonio Barbieri, Gilberto Alonso, João P. F. Júnior, Márcia C. de Almeida e Paulo S. Duarte
INTRODUÇÃO
Metodologia
PRINCÍPIOS DE MEDICINA NUCLEAR Radiofármacos
Refluxo vésico-ureteral
99m
Tc-DMSA
Metodologia
99m
Tc-DTPA
9m 51
Avaliação da urodinâmica
Avaliação do rim transplantado
Tc-MAG3
Interpretação
Cr-EDTA
Fase vascular
99m
Tc-GHA
131
I-OIH ou
Fase funcional 123
I-OIH
Equipamentos
CINTILOGRAFIA RENAL ESTÁTICA — INFECÇÃO URINÁRIA
Tipos de exames Medidas de clearance
Metodologia NOVAS PERSPECTIVAS
Renograma radioisotópico
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Análise e interpretação do renograma
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
APLICAÇÕES CLÍNICAS Hipertensão renovascular (HRV)
INTRODUÇÃO A medicina nuclear tem como característica principal a avaliação, de forma não-invasiva, da função de um órgão, ou então de um processo metabólico específico. Em nefrologia não poderia ser diferente, já que com uma gama de diferentes exames é capaz de auxiliar o clínico na investigação de quadros de hipertensão arterial, infecção urinária, obstruções ao fluxo urinário, transplante renal, etc. Tendo em vista a baixa exposição radiológica a que o paciente é exposto, tem-se mostrado como método de escolha para seguimento a longo prazo, quando a repetição e a comparação entre exames é fundamental para tomadas de decisão. Atualmente a disponibilidade de equipamentos, radiofármacos (RF) e isótopos radioativos é ampla em todo o país,
não se restringindo apenas às grandes cidades. Assim sendo, é importante que o médico se familiarize de maneira mais profunda com a metodologia e a indicação de cada exame em medicina nuclear, podendo contar com mais um elemento valioso na sua propedêutica de investigação.
PRINCÍPIOS DE MEDICINA NUCLEAR Radiofármacos Em medicina nuclear utilizam-se principalmente isótopos capazes de emitir radiação gama (a radiação é constituída por ondas eletromagnéticas que diferem dos raios X apenas por terem sua origem no núcleo, enquanto os raios
373
capítulo 20
que a utilização de moléculas marcadas com 123I (no exemplo citado, o 123I-Hipuran) é mais conveniente, pois a exposição radiológica é muito menor; a menor exposição radiológica observada permite o uso de doses (atividades) maiores, obtendo-se assim imagens de melhor qualidade. No Quadro 20.1 estão relacionados os radiofármacos mais comumente utilizados em nefrologia, e no Quadro 20.2, a exposição radiológica de alguns destes radiofármacos nos órgãos alvo. Uma descrição mais detalhada será dada em seguida. A escolha do radiofármaco a ser empregado deve recair sobre aquele que melhor reflita o aspecto específico da função estudada e garanta a menor exposição radiológica possível.
X têm sua origem nos elétrons orbitais). Atualmente o isótopo mais freqüentemente utilizado é o 99mTc (tecnécio), obtido em geradores a partir do decaimento do 99molibdênio. A meia-vida do 99mTc é de 6 horas e seu pico de energia de 140 keV (quiloeletronvolts) é adequado para utilização nas gama-câmaras. A principal função do 99mTc é marcar os fármacos. Cada fármaco apresenta mecanismos de interação específicos com um determinado órgão, e dentro deste, com diferentes componentes estruturais; assim sendo, cada radiofármaco possui um comportamento biológico específico (p.ex.: a isonitrila liga-se às mitocôndrias da célula miocárdica, os isótopos do iodo são captados pelas células foliculares da tireóide, etc.). O fármaco poderia ser então chamado de substância vetora, e precisa necessariamente ser marcado com o isótopo radioativo, tornando-se um radiofármaco, o que lhe permite ser detectado. O processo de marcação, ou seja, a introdução de um isótopo na molécula vetora, geralmente não altera o metabolismo da molécula. Outro fato importante é que uma mesma molécula pode, às vezes, ser marcada por mais de um radioisótopo, como, por exemplo, o Hipuran — ortohipurato de sódio — que pode ser marcado com 123I ou 131I. O comportamento biológico do composto é idêntico, diferindo apenas em suas características físicas. O 123I é emissor gama puro, ou seja, não emite radiação particulada, tem meia-vida física de apenas 13,2 horas e a energia de seu fóton, de 159 keV, é adequada para detecção nas gamacâmaras. O 131I, por sua vez, além de seu fóton principal ter energia de 364 keV (detecção mais difícil), emite radiação do tipo beta, aumentando de modo expressivo a exposição radiológica; soma-se a essas características a sua elevada meia-vida física (oito dias). Dessa forma, é evidente
99m
Tc-DMSA
É utilizado por via endovenosa; 90% da dose injetada se liga a proteínas plasmáticas e somente pequena parte é excretada pela urina. Após 1 hora da injeção, cerca de 50% da dose está ligada aos grupos sulfidril das células do túbulo contornado proximal; em 24 horas a taxa de ligação pode chegar a 70% da dose administrada; praticamente não há visualização do sistema excretor. É utilizado fundamentalmente para avaliação estática do córtex renal e da função renal percentual, 2 a 24 horas após a injeção. 99m
Tc-DTPA
É utilizado por via endovenosa; uma pequena fração (510%) é ligada às proteínas plasmáticas. A sua excreção se faz principalmente por filtração glomerular. Quando utilizado, permite estudos dinâmicos da perfusão renal, da capacidade de concentração e do fluxo urinário pelo siste-
Quadro 20.1 Principais radiofármacos utilizados em nefrourologia 99m
Tc-DMSA (99mTc-ácido dimercaptossuccínico) Tc-DTPA (99mTc-ácido dietilenotriaminopentacético) 99m Tc-MAG3 (99mTc-mercaptoacetil triglicina) 51 Cr-EDTA (51Cr-ácido etilenodiaminotetracético) 99m Tc-GHA (99mTc-gluco-heptonato) 131 I-OIH ou 123I-OIH (131-ortoiodo-hipurato ou 123I-ortoiodo-hipurato) 99m
Quadro 20.2 Exposição radiológica de diversos órgãos*
Urografia excretora DTPA-99mTc DMSA-99mTc Hipuran-131I Hipuran-123I MAG3-99mTc
(5 filmes) (1 mCi) (1 mCi) (100 Ci) (1 mCi) (1 mCi)
Rins
Bexiga
Testículos
Ovários
Tiróide
0,80 0,014 0,7 0,01 0,03 0,015
0,60 0,35 0,19 0,3 0,5 0,44
0,58 0,014 0,01 0,01 0,01 0,05
0,76 0,020 0,02 0,01 0,02 0,02
0,014 0,01 3,6 0,8 0,01
*Dose estimada em REM (adulto). REM ⫽ Radiation Equivalent Men.
374
Radioisótopos em Nefrourologia
ma pielocalicial, ureteres e bexiga. Imagens tardias permitem avaliação do sistema coletor intra-renal e ureteres, mas não a avaliação do parênquima renal, tendo em vista a sua rápida excreção pelo néfron. 99m
Tc-MAG3
É classificado como um agente tubular utilizado por via endovenosa; liga-se a proteínas plasmáticas (90%) e é quase exclusivamente excretado por secreção pelo túbulo contornado proximal. Cerca de 3 horas após sua injeção, 90% do material é eliminado. Sua fração de extração é de 40-50%, o que o faz dele o radiofármaco de escolha, quando disponível, em pacientes com suspeita de obstrução, com déficit de função renal e especialmente em crianças. Seu clearance é de 300 ml/min/1,73m2 até os 40 anos e a partir da 5.ª década decai a um nível de 3-4 ml/ano. Sua curva nefrográfica é virtualmente idêntica àquela do OIH. Apresenta excreção hepatobiliar parcial; imagens tardias podem gerar dúvidas, pois a presença do radioindicador na vesícula biliar ou no intestino pode confundir-se com as vias urinárias (imagens localizadas laterais podem auxiliar na distinção das estruturas observadas). 51
Cr-EDTA
O 51Cr tem meia-vida de 27 dias e é excretado exclusivamente por filtração glomerular; não se liga a proteínas plasmáticas e é facilmente obtido, com um custo operacional baixo. Por todas essas características, tem sido utilizado, principalmente, na avaliação do Ritmo de Filtração Glomerular. Não é utilizado para obtenção de imagens do sistema urinário.9 99m
Tc-GHA
É utilizado por via endovenosa. Possui características do DMSA e DTPA, pois permite o estudo precoce da perfusão renal, do trânsito pelo parênquima e excreção urinária do radiofármaco, como avaliação tardia (2-4 horas após) das imagens corticais. É excretado por filtração glomerular e secreção tubular; 12% da dose administrada liga-se às células do túbulo contornado proximal. 131
I-OIH ou 123I-OIH
É utilizado por via endovenosa; é reconhecido como um análogo do ácido paramino-hipúrico (relação OIH/PAH ⫽ 0,85). É excretado por filtração glomerular (20%) e secreção tubular através do túbulo contornado proximal (80%); 70% da dose é encontrada na urina 35 minutos após a injeção. Seu clearance é de aproximadamente 500-600 ml/ min em indivíduos normais. Tem sido utilizado para avaliação do fluxo plasmático renal e para estudo dinâmico do parênquima renal e sistema excretor.29 O principal fator limitante à sua utilização mais ampla é o isótopo radioativo; o 131I não apresenta características físicas adequadas para o emprego nos mais modernos equipamentos de
medicina nuclear e expõe o paciente a maior dose de radiação absorvida. A marcação do OIH pelo 123I torna o radiofármaco mais adequado do ponto de vista de qualidade de imagem e de exposição radiológica ao paciente, entretanto seu custo é maior. Novos radiofármacos têm sido estudados e podem representar uma perspectiva interessante ao lado daqueles já disponíveis. O 99mTc-EC (99mTc-etileno-dicisteína) é considerado um agente tubular cuja forma de excreção renal se faz por filtração glomerular e secreção ativa tubular, não apresentando nenhum percentual de reabsorção; uma hora após sua administração endovenosa, 70% estão presentes na urina. Sua fração de ligação a proteínas plasmáticas é de 30%, índice menor que o do 99mTc-MAG3 (90%) e OIH (60%). O seu clearance plasmático é de 473⫾22 ml/1,73 m2, 30% maior que o do 99mTc-MAG3 e 0,75% daquele do OIH; tem sido utilizado na realização de estudos dinâmicos e obtenção de imagens renais. Outro radiofármaco em estudo é o 99mTcECMA [N,N’etileno (cisteína) (mercaptoacetamida)], que combina características estruturais do 99mTc-MAG3 e do 99m Tc-EC, sendo também definido como agente tubular.36,44,57
Equipamentos O equipamento universalmente utilizado em medicina nuclear é a gama-câmara. A radiação emitida pelo isótopo radioativo, após atravessar os furos do colimador, é absorvida pelo detector de cintilação (daí o nome freqüentemente utilizado de cintilografia), constituído por um cristal de NaI ativado com tálio presente na cabeça da gama-câmara; a energia assim absorvida é convertida a fótons de luz (efeito fotoelétrico). Estes fótons de luz, através de diferentes equipamentos acoplados à gama-câmara, produzem um pulso elétrico que é proporcional à radiação absorvida pelo cristal. Os equipamentos atuais, que podem conter um, dois e eventualmente até três detectores, são acoplados a computadores e produzem uma imagem digitalizada que reflete as variações da interação da radiação com o órgão em estudo. Esta imagem pode ser processada de múltiplas formas, como veremos ao longo do capítulo.37
Tipos de Exames MEDIDAS DE CLEARANCE Atualmente dispomos de radiofármacos cujo comportamento biológico permite avaliar a filtração glomerular (FG) e o fluxo plasmático renal efetivo (FPRE). Estes parâmetros podem ser determinados por diversas técnicas de medida que podem ser esquematizadas em dois grupos: métodos onde a concentração plasmática do radiotraçador é mantida constante e métodos baseados no decaimento da concentração plasmática do radiofármaco.6 Os métodos do primeiro grupo requerem a manutenção da concentração plasmática do RF em nível constante,
capítulo 20
e medimos o clearance através da contagem da radioatividade no sangue e na urina do paciente. É uma metodologia que exige portanto a manutenção do nível referido acima e ainda a coleta de amostras de urina. Esta técnica, apesar de ser precisa, é muito trabalhosa, dificultando sua implantação na rotina clínica, sendo, entretanto, adequada para padronização de outros métodos. Uma forma de simplificar, em parte, estes procedimentos consiste na administração subcutânea de uma dose única do RF. O ritmo de extração do RF do “botão” é lento e permite em pouco tempo a manutenção de níveis plasmáticos constantes, eliminando, portanto, a necessidade da bomba de infusão. Os métodos baseados no decaimento da concentração radioativa no plasma são realizados com apenas uma injeção endovenosa do RF seguida da coleta de várias amostras de plasma, em tempos apropriados. Esta metodologia baseia-se no fato de que estas substâncias são excretadas unicamente por via renal e que a sua concentração plasmática diminui gradualmente em função direta do seu clearance. Apesar das críticas teóricas que a metodologia pode suscitar, ela apresenta boa correlação com os demais métodos 68 e é aquele que empregamos em nosso serviço. Uma simplificação ainda maior no cálculo do clearance foi obtida, com bons resultados, por Tauxe,74 que avaliou o FPRE pelos métodos tradicionais e o comparou com o obtido com a coleta de sangue realizada em diversos tempos. Isso permitiu a obtenção de uma curva de padronização, onde se verificou que a coleta de sangue realizada aos 44-45 minutos fornecia os melhores resultados, com um erro de ⫾30 ml/min. Este método apresenta a vantagem de requerer apenas uma coleta de sangue realizada em um tempo específico (44 minutos), após a administração do radiofármaco. O método radioisotópico apresenta diversas vantagens em relação aos métodos tradicionais de cálculo de clearance. Observamos que ele não requer coleta de urina, o que representa inúmeras vantagens: o exame pode ser realizado independente do estado funcional dos rins, a falta de integridade das vias urinárias excretoras ou de suas malformações não impede o exame, não necessita da colaboração do paciente, não sofre interferência do volume urinário residual e, fundamentalmente, não é modificado pelo estado de hidratação do paciente. Devido à aferição da concentração da substância traçadora ser realizada através da detecção da radiação, não existe interferência de outras substâncias presentes no meio. Este aspecto é particularmente importante, se lembrarmos que os métodos tradicionais de avaliação correlacionam a concentração de um determinado componente em dois meios distintos de composição química diversa: sangue e urina. Evidentemente, este fato é contornado quimicamente; contudo, constitui mais um fator de erro e é uma desvantagem em relação à técnica radioisotópica. A quantificação da concentração radioativa é mais simples, segura e reprodutiva que a bioquímica. Finalmente, o método radioisotópico permi-
375
te, de forma absolutamente não-invasiva, avaliar o clearance de cada rim em separado através da monitorização externa dos rins quando da realização do renograma radioisotópico. Como vimos, existem múltiplas técnicas, cada qual com suas vantagens e desvantagens, para estimar a FG e FPRE. A escolha de uma delas baseia-se principalmente no tipo de equipamento disponível e na precisão desejada. Rotineiramente utilizamos o método de injeção única com duas coletas de sangue em tempos prefixados; além da simplicidade, o método apresenta uma precisão satisfatória. Esta técnica, aliada à realização simultânea do renograma, que permite avaliar entre outros parâmetros o clearance unilateral da substância utilizada, fornece dados importantes para o clínico. Por outro lado, se desejarmos uma precisão maior, como numa investigação científica, na padronização de novos métodos, no controle de qualidade das técnicas mais simples ou nos pacientes cuja situação clínica exige uma monitoração mais precisa, podemos recorrer à técnica de múltiplas amostras de sangue ou de preferência à técnica do “botão” subcutâneo.55 Um dos traçadores utilizados para avaliar a filtração glomerular é o quelante 51Cr-EDTA.9,70 Devido às suas características, o seu clearance mede a FG da mesma forma que a inulina, com a qual apresenta elevado índice de correlação.25,32 Uma desvantagem do 51Cr-EDTA é que o 51Cr, devido ao seu baixo fluxo de fótons, não é adequado para a realização de imagens dinâmicas através de detecção externa. Buscando aliar as vantagens da obtenção de um estudo dinâmico com a avaliação da FG, utiliza-se o 99mTcDTPA.1,3,11,33,46,52 Como uma pequena parte do DTPA (5%) liga-se às proteínas plasmáticas e outra pequena parte, em igual percentagem, difunde-se em vários tecidos, a FG calculada através deste agente ocasiona um erro de 5 a 10 ml/ min de plasma, inferior ao da inulina. Para indivíduos com função renal normal ou próxima desta, o erro é irrelevante, mas quando se trata de pacientes com insuficiência renal, esta diferença poderá determinar ou não uma intervenção, como, por exemplo, uma diálise. Nestes casos onde uma precisão maior é exigida, devemos lançar mão dos métodos baseados na concentração constante do RI. A técnica que utilizamos é a do “botão” subcutâneo, que consta da injeção subcutânea de uma dose de 51Cr-EDTA em uma área onde foi realizado um “botão” com adrenalina 1:1.000 (0,1 ml) e xilocaína a 2% sem vasoconstritor (0,9 ml). Este recurso garante uma absorção lenta do material radioativo e a manutenção de seu nível plasmático em valores constantes durante o tempo de realização da prova. A correlação entre a FG assim determinada e a da inulina é de 0,97 em portadores de déficit acentuado da função renal.55 Para a avaliação do fluxo plasmático renal efetivo usase um sal do ácido paramino-hipúrico (PAH), o ortohipurato de sódio marcado com 131I ou, de preferência, com 123 71 I. À semelhança do PAH, o Hipuran é integralmente eliminado pelo rim em cada passagem tanto por filtração
376
Radioisótopos em Nefrourologia
(20%), como por secreção tubular (80%). Desta forma, a determinação do clearance do Hipuran permite estimar o fluxo plasmático renal efetivo. A metodologia utilizada, semelhante à pesquisa da FG, baseia-se na coleta de duas amostras de sangue (aos 20 e 30 minutos) após a administração do Hipuran. Os valores encontrados são em geral 15% menores que os do PAH.10,69 Esta diferença pode ser explicada por diversos fatores; a presença de iodo livre na preparação, diferenças no transporte tubular, diferenças nas características de ligação com as proteínas e uma pequena parte do Hipuran que se liga aos glóbulos vermelhos. Para um adulto, os valores do FPRE são considerados normais quando maiores que 420 ml/min, variando segundo a idade, sexo e unidades renais presentes. Alguns autores têm sugerido o 99mTc-MAG3 como radiofármaco de escolha para pesquisa do FPRE; embora com custo elevado, ele também permite a obtenção simultânea do renograma.13,24
RENOGRAMA RADIOISOTÓPICO O renograma radioisotópico ou estudo dinâmico renal consiste no registro gráfico das variações da concentração radioativa em função do tempo, ao nível das lojas renais, após a administração endovenosa de um radiofármaco cuja via de excreção seja renal. Dentre os compostos utilizados temos o DTPA marcado com 99mTc, o Hipuran marcado com 131I ou 123I e o MAG3 marcado com 99mTc. Historicamente, o renograma, introduzido por Taplin,73 era realizado usando-se, como sistema de detecção e registro da radiação, duas sondas detectoras acopladas a registradores gráficos e que eram colocadas ao nível das lojas renais.29 Desta forma, obtinha-se um histograma de variação temporal da atividade, refletindo a passagem do radiofármaco pelos rins. Este método tem como principais desvantagens a impossibilidade de obtenção de imagens renais e a dificuldade na correção da radiação de fundo (RDF), presente em expressiva proporção nas curvas nefrográficas, secundária à presença do traçador no sangue circulante e estruturas extra-renais. Atualmente utiliza-se a câmara de cintilação acoplada ao computador para a realização do renograma. Em seu campo de visão é possível englobar de uma só vez a região lombossacra, permitindo obter imagens simultâneas da aorta abdominal, rins, vias urinárias e bexiga. O armazenamento das imagens na memória do computador e a sua manipulação, da forma mais adequada para cada caso, permite extrair muitas informações. Na prática, o renograma pode ser realizado com o paciente em decúbito, sentado ou em pé, com a gama-câmera localizada na região posterior. Imediatamente após a administração do radiofármaco é iniciada a aquisição contínua de uma série de imagens seqüenciais, por um período de tempo não inferior a 20 minutos. O número total e a duração das imagens que compõem o estudo são muito variáveis e dependem do tipo de equipamento disponível
e dos programas utilizados, não existindo infelizmente uma padronização internacional. A análise das imagens obtidas permite a obtenção de uma série de informações morfológicas e funcionais. Logo nas primeiras imagens, quando vemos a chegada do “bolo” radioativo na aorta abdominal e em seguida nos rins, podemos avaliar as características da perfusão renal. As imagens subseqüentes, por sua vez, irão dar informações sobre o estado funcional de cada rim. Estas imagens já têm definição suficiente para podermos apreciar aspectos morfológicos, tais como tamanho, forma, localização, existência de áreas no interior do órgão que não concentram o radiotraçador etc. Mais adiante, podemos observar a presença de estases e dilatações ao nível da pelve renal ou dos ureteres, ou ainda, de refluxos contracorrente, como o refluxo vésico-ureteral. Entretanto, é a quantificação das informações contidas nas imagens que nos permitirá explorar, ao máximo, o exame realizado. Para isto, é necessário criar diversas áreas de interesse (ADI), dentre elas as das unidades renais, do ruído de fundo, da bexiga, etc. Este procedimento permite delimitar precisamente as áreas de estudo e, a partir destas, obter curvas de variação temporal da atividade, onde cada ponto da curva representa a quantidade de radiação existente no interior da área de interesse.42 Vários parâmetros semiquantitativos podem ser obtidos das curvas: tempo para atingir o pico máximo (Tmáx), FG ou FPRE (dependendo do RI) de cada rim, T1/2 de excreção e as relações entre a atividade do 20.º ou 30.º minuto com a atividade máxima. Ainda com relação à técnica de realização do exame, convém ressaltar a importância da correta administração do RF, que deve ser injetado rapidamente sob a forma de um “bolo” radioativo (volume não maior que 0,5 ml) numa veia calibrosa do antebraço seguida imediatamente da injeção de 10 a 15 ml de soro fisiológico. Outro ponto importante a ser ressaltado é a necessidade de hidratar convenientemente o paciente antes do exame. O estado de hidratação, por interferir no fluxo urinário, altera de forma pronunciada a morfologia do renograma ao aumentar o tempo de trânsito renal e diminuir a excreção urinária do radioindicador. As determinações da filtração glomerular e do fluxo plasmático renal efetivo não sofrem esta influência, pois independem do fluxo urinário.22 Um fluxo urinário de 2 ml/min é suficiente para eliminar as alterações morfológicas do renograma.
Pontos-chave: Principais indicações do renograma • Hipertensão renovascular • Avaliação de obstrução das vias urinárias • Rim transplantado
377
capítulo 20
ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DO RENOGRAMA A curva nefrográfica é a resultante de múltiplos fenômenos fisiológicos relacionados com a passagem de um determinado RF pelos rins (Fig. 20.1). A primeira fase se caracteriza por uma ascensão abrupta da atividade durante um curto espaço de tempo e corresponde à chegada do “bolo” radioativo nas áreas de interesse renais. Ela depende da velocidade e da qualidade da injeção e reflete a integridade do sistema vascular que irriga o rim e estruturas vizinhas. Com efeito, cerca de apenas 60% desta atividade é devida à presença do radioindicador no parênquima renal, o restante corresponde à sua presença nos vasos do próprio rim e nos vasos e tecidos extra-renais, e devem, portanto, ser considerados como ruído de fundo. A segunda fase apresenta uma elevação contínua, porém menos rápida, da atividade radioativa até atingir um ponto máximo (Tmáx). A subida mais lenta desta curva devese à retirada do RI do sangue, por filtração glomerular e/ou secreção tubular, à chegada do RI que se encontrava na circulação sistêmica e ao fato de que não ocorreu ainda eliminação. A forma e a duração desta fase dependem de diversos fatores: da fase anterior, do ritmo de suprimento e da eficiência de extração renal do RI utilizado e do seu deslocamento através das vias urinárias. Ao atingir o pico máximo, que nos indivíduos normais ocorre entre 2 e 5 minutos (para qualquer dos tipos de RI utilizado), ocorre uma queda acentuada da atividade, traduzindo o início da terceira fase, que coincide com o seu aparecimento na bexiga. A terceira fase é também resultante de diversos fenômenos fisiológicos que ocorrem simultaneamente. Ela depende do fármaco e do fluxo urinário através dos ureteres. Na ausência de obstrução do trato urinário e na presença de fluxo urinário adequado, a terceira fase se caracteriza por
uma queda, bastante acentuada, da radioatividade presente nos primeiros minutos do estudo (coincidindo com o aparecimento da radioatividade observada na curva obtida na ADI da bexiga), seguida de uma queda menos abrupta e mais prolongada. Na interpretação do renograma, devemos levar em consideração algumas pequenas diferenças da curva relacionadas com o tipo de RF usado e que têm relação, em grande parte, com o ritmo de extração renal de cada RF (90% para o Hipuran e 20% para o DTPA). Quando empregamos este agente, observamos em comparação com o primeiro uma menor inclinação da segunda fase, um discreto retardo no tempo do pico e uma excreção mais lenta. As alterações observadas na curva nefrográfica não são específicas e, portanto, um mesmo padrão pode ser observado em mais de uma situação patológica. Podem-se identificar alguns padrões típicos (Fig. 20.3): na obstrução do trato urinário observa-se, logo no início do exame, um prolongamento da segunda fase, que é sempre ascendente, e ausência da fase de excreção. Sem tratamento adequado, à medida que a função do rim se deteriora, nota-se, nos exames seqüenciais, uma modificação progressiva do padrão anterior traduzida por um achatamento cada vez maior da segunda fase. Quando o rim estiver funcionalmente ausente, a curva observada é semelhante àquela da região do ruído de fundo ou de ausência do rim, e se caracteriza pela queda exponencial da radiação que é devida à excreção do RF pelo rim contralateral. Este padrão pode ser ocasionado por qualquer situação que leve a uma exclusão funcional do rim. Na estenose da artéria renal, devido à maior reabsorção tubular de sódio e água, que levam a uma diminuição do fluxo urinário, a curva apresenta a segunda fase achatada, com um retardo no tempo para atingir o pico máximo, associada a uma terceira fase mais prolongada. Este padrão é igualmente observado nas alterações de função renal. Através das ADI renais e do ruído de fundo, é possível calcular a função renal percentual de cada rim em separado, e os valores considerados normais variam entre 50/50 e 56/44%.78
APLICAÇÕES CLÍNICAS Hipertensão Renovascular (HRV)
Fig. 20.1 Renograma normal.
A Hipertensão Renovascular responde por 1-2% das causas de hipertensão, em uma população de hipertensos não selecionados, e pode chegar a 15-30% em uma população de hipertensos refratários a tratamento.77 Trata-se de uma importante causa de hipertensão secundária, tendo em vista a possibilidade de cura ou grande melhora do quadro hipertensivo inicial após a revascularização e, conseqüentemen-
378
Radioisótopos em Nefrourologia
te, reversão ou interrupção da instalação de seus efeitos nos órgãos alvo. A causa da HRV é a obstrução das artérias renais ou de seus ramos principais; entretanto, é preciso diferenciar os casos em que a obstrução arterial constitui-se em um achado de exame, não sendo responsável pelo desencadeamento do processo isquêmico inicial e conseqüente hipertensão, daquele onde a obstrução é responsável diretamente pelo quadro hipertensivo. A HRV é definida como uma elevação da pressão arterial causada por hipoperfusão renal, normalmente secundária à estenose anatômica da artéria renal e ativação do sistema renina-angiotensina (SRA). Diferentes métodos diagnósticos têm sido utilizados na investigação da HRV, dentre eles ultra-som com Doppler,43 angiorressonância7 e cintilografia renal pós-inibidores da enzima conversora (IECA),76 sendo o “gold standard” para a detecção da obstrução arterial a angiografia. O objetivo principal destes exames é a detecção daqueles pacientes cuja hipertensão seja causada por obstrução da artéria renal, ou seus ramos principais, e prever em quais casos a revascularização será eficiente para reverter ou interromper o processo isquêmico inicial.21 Quando se utiliza a cintilografia renal sob ação de uma droga que inibe a produção da angiotensina II (AII) é possível observar e quantificar seus efeitos sobre o rim isquêmico. O IECA bloqueia o efeito vasoconstritor (renal e sistêmico) da AII, bem como o estímulo à produção da aldosterona; a vasoconstrição da arteríola pós-glomerular desaparece, reduzindo as pressões transcapilares que mantêm a filtração glomerular do rim comprometido. A cintilografia renal com IECA tem mostrado, em média, sensibilidade e especificidade ao redor de 90% para detecção de HRV e tem a peculiaridade de indicar aqueles casos em que a revascularização terá maior probabilidade de levar à normalização da pressão arterial, sem medicação ou com menor número de drogas.28,53, 76,77 A relação custo-benefício é melhor, para o renograma com IECA, quando utilizado em pacientes com moderado a alto risco de HRV: hipertensão aguda ou severa, hipertensão resistente à terapia medicamentosa, sopros abdominais, déficit da função renal sem causa conhecida, piora da função renal com o uso de drogas que interfiram no SRA, retinopatia hipertensiva graus 3 ou 4, doenças oclusivas em outros leitos arteriais, início da hipertensão antes dos 30 ou depois dos 55 anos.16,28,78
METODOLOGIA Preparo. O paciente deverá ser mantido em adequado estado de hidratação através da reposição oral de líquidos. Quando se optar pela utilização do captopril, orienta-se jejum para alimentos sólidos nas 4 horas que precedem a realização do exame; tais cuidados não se aplicam ao enalaprilato (uso endovenoso). A suspensão do uso crônico de IECA é importante; o captopril e o enalapril/lisinopril deverão ser suspensos por 48 e 96 horas, respectivamente. Os
bloqueadores dos receptores de AII, como o losartan, também deverão ser suspensos, pois seu uso crônico interfere de maneira semelhante ao uso crônico de IECA.78 Os diuréticos utilizados cronicamente deverão ser suspensos alguns dias antes caso o paciente se apresente desidratado. A desidratação e o uso crônico de IECA reduzem a sensibilidade do método.76,78 A suspensão dos demais anti-hipertensivos é controversa, já tendo sido descritos falso-positivos para pacientes em uso crônico de antagonistas de cálcio.12 Radiofármacos. Os RF mais utilizados são 99mTc-MAG3 e o 99mTc-DTPA; o 99mTc-MAG3, por ser um agente tubular, tem-se mostrado superior ao 99mTc-DTPA nos pacientes com déficit de função renal. Pode-se utilizar também o 131 I-OIH que, semelhante ao 99mTc-MAG3, é um agente tubular, com as ressalvas comentadas acima, ou, se disponível, o 123I-OIH. Inibidores de Enzima Utilizados. Utiliza-se dose única oral de captopril (25-50 mg) ou o enalaprilato endovenoso (40 g/kg, dose máxima ⫽ 2,5 mg). A injeção do RF se faz 60 min após o captopril ou 15 min após o enalaprilato, com ou sem injeção de furosemida.26,76,78 Estudos comparando o captopril ao valsartan (antagonista do receptor de AII, subtipo 1 — AT1) demonstraram que o captopril é mais sensível na detecção da HRV. A diferença observada (89% ⫻ 30%) provavelmente se deve aos múltiplos mecanismos de ação do captopril, especialmente através da alteração do metabolismo do sistema prostaglandina-bradicinina.45 Assim sendo, tal categoria de fármacos não poderia substituir os IECA na investigação da HRV. Protocolo de Aquisição. Realiza-se estudo dinâmico com 30-45 min de duração com o paciente em decúbito dorsal. As imagens assim obtidas permitem, após o traçado de ADI renais e do ruído de fundo, a construção de uma curva atividade/tempo e a avaliação da função renal percentual, o cálculo do tempo para atingir a atividade máxima (Tmáx) e a relação da atividade no 20.º ou 30.º minutos/ pico da atividade (20 min/máx ou 30 min/máx). Estes dados são obtidos após o uso do IECA com ou sem estudo basal. Muitos serviços assumem que um exame normal pós-captopril exclui a possibilidade de hipertensão renovascular e torna desnecessária a realização do exame basal.26,78 Avaliações do tempo de trânsito pelo parênquima (TTP) poderão ser utilizadas, se os softwares estiverem disponíveis, em pacientes com função renal normal; indivíduos com déficit de função renal deverão ser investigados através dos outros critérios, tendo em vista sua baixa sensibilidade neste grupo de pacientes.27 Critérios de Análise. O critério mais específico para o diagnóstico de hipertensão renovascular é a alteração da curva renográfica com seus diferentes parâmetros. Em pacientes com hipertensão renovascular o captopril induz alterações nas imagens cintilográficas do rim obstruído, que se expressam por uma diminuição na captação (função renal percentual) e/ou prolongamento da excreção com retenção cortical do radiofármaco (Fig. 20.2).
379
capítulo 20
Fig. 20.2 Renograma sem e com captopril. Note o prolongamento de tempo de trânsito renal do 99mTc-DTPA no rim esquerdo póscaptopril.
De uma maneira mais geral, os critérios para definição de HRV pela cintilografia seriam: alteração na função renal percentual, do perfil da curva tempo/atividade e do tempo de excreção do rim estenosado. A avaliação visual da retenção cortical, especialmente importante para RF tubulares, está prejudicada em pacientes com retenção pélvica. Nestes pacientes este critério diagnóstico deve ser avaliado com cautela.47 Considera-se como baixa probabilidade para HRV (⬍10%) estudos pós-captopril normais, ou basais alterados que melhoram no estudo pós-captopril. São considerados estudos de probabilidade intermediária aqueles que são anormais em condições basais (compatíveis com déficit de função renal) e que não se alteram na avaliação pós-captopril; neste grupo estão incluídos alguns pacientes renais crônicos e hipertensos com um rim pequeno com função reduzida (função renal percentual ⬍30%). Estudos de probabilidade alta (⬎90%) são aqueles em que os estudos pós-IECA, comparados ao basal, apresentam importante alteração da curva renográfica. Alterações simétricas bilaterais pós-IECA, quando estão excluídas depleção de sal, hipotensão, desidratação e bexiga distendida, representam probabilidade intermediária de HRV (critérios específicos para DTPA e MAG3). Alguns critérios são específicos para determinado RF: o critério mais importante para exames realizados com agentes tubulares (99mTc-MAG3 e 131I-OIH ou 123I-OIH) é a reten-
ção unilateral (alta probabilidade de doença renovascular, ⬎90%) e que pode ser determinada pela alteração de 15% ou mais em relação ao valor normal do parâmetro do 20 min/máx, prolongamento do TTP, pelo aumento do Tmáx em relação ao basal de 2 min ou 40%, pela alteração unilateral de perfil de curva do renograma e pela diminuição de 10% ou mais na função renal percentual em relação ao basal. Para exames realizados com 99mTc-DTPA, o critério mais importante é a alteração em 10% ou mais na função renal percentual ou na função renal absoluta; alterações de 5-9% são consideradas de probabilidade intermediária. Outro critério utilizado para o 99mTc-DTPA é a alteração do perfil da curva em relação ao exame basal.17,27,76,78 Alguns autores sugerem estudo semelhante, utilizandose ácido acetilsalicílico, no lugar do IECA (20 mg/kg), 60 min antes da injeção do radiofármaco. Os autores se baseiam no princípio de que a síntese de prostaglandinas está aumentada no rim estenosado, especialmente a PGE2, que por sua vez estimula a secreção de renina. Portanto, a inibição da PGE2 pelo ácido acetilsalicílico diminuiria a síntese da renina, obtendo-se efeito semelhante àquele observado com o uso dos IECA.23,26
Avaliação da Urodinâmica A avaliação cintilográfica renal pode ser utilizada em pacientes com suspeita clínica de obstruções do trato urinário
380
Radioisótopos em Nefrourologia
com finalidade diagnóstica, para avaliar o grau de comprometimento do parênquima renal, para determinar o melhor momento da correção cirúrgica e para avaliar a resposta aos diversos tratamentos existentes. As técnicas radioisotópicas atualmente disponíveis têm a desvantagem de não fornecer dados referentes às alterações anatômicas presentes, quando comparadas a métodos radiográficos como a ultra-sonografia, urografia excretora, tomografia e ressonância; entretanto, elas permitem um estudo mais adequado da função e dinâmica renal. Essa metodologia tem sido utilizada para controle evolutivo das obstruções ao fluxo urinário.39,50,58,60 Os radiofármacos empregados para avaliação dos quadros obstrutivos são o 99mTc-DTPA, o 99mTc-MAG3 e o 99mTcDMSA. No Brasil, a utilização do 99mTc-MAG3 ainda é muito pouco difundida devido ao seu alto custo e pelo fato de não apresentar uma superioridade muito expressiva em relação à utilização do 99mTc-DTPA. Tanto o DTPA quanto o MAG3 permitem uma avaliação renal dinâmica e o cálculo da função renal relativa, sendo considerados os agentes ideais para a avaliação de quadros obstrutivos. A principal diferença entre os dois, além do preço, é o modo de excreção renal; enquanto o DTPA é excretado predominantemente por filtração glomerular, o MAG3 é secretado pelos túbulos. O DMSA, que será tratado com maiores detalhes em outro local deste capítulo, é filtrado pelos glomérulos e posteriormente extraído pelos túbulos renais, permitindo somente a realização de imagens estáticas da sua distribuição intra-renal, não sendo adequado para estudos dinâmicos. O diagnóstico de obstrução das vias urinárias com radioisótopos apresenta algumas limitações em pacientes com dilatação importante, os quais podem apresentar estase prolongada do radiofármaco no sistema pielocalicial, mesmo na ausência de obstrução anatômica. Nas situações em que o paciente apresenta dilatação importante, é necessária a utilização de diuréticos com a finalidade de aumentar a pressão na pelve renal e drenar as possíveis áreas de estase, possibilitando, desta forma, a diferenciação mais acurada entre as duas situações.65,75 O diurético empregado é a furosemida por via endovenosa, e os protocolos de administração, descritos na literatura, são: injeção do diurético 20 minutos após a administração do RF (F+20), com aquisição das imagens por mais 15 minutos, e administração do diurético 15 minutos antes da administração do RF (F-15).78 O primeiro protocolo é o mais utilizado na rotina laboratorial; o segundo tem seu papel em alguns casos onde ainda persistem dúvidas quanto à presença ou não de obstrução após a utilização do primeiro protocolo. Em neonatos, recém-nascidos e lactentes até quatro meses, devido à imaturidade renal, a resposta ao diurético encontra-se prejudicada e a interpretação do renograma sob hiperdiurese é duvidosa.59 Independente do protocolo escolhido, o enchimento rápido dos sistemas coletores com um esvaziamento abrupto é um padrão diagnóstico de dilatação sem obstru-
ção. O enchimento lento da pelve acompanhado por uma fase de platô mesmo após a administração do diurético ou um enchimento contínuo são fortemente sugestivos de obstrução. Respostas ao diurético intermediárias entre estes dois padrões podem indicar algum grau de obstrução, no entanto a expressão “semi-obstrutivo” deve ser evitada, e o termo indeterminado fica mais bem empregado (Fig. 20.3). Isto se deve ao fato deste padrão não necessariamente ser decorrente de obstruções parciais, e rins com função muito diminuída e com resposta inadequada ao diurético podem apresentar este padrão mesmo sem componente obstrutivo. Uma avaliação quantitativa da excreção do RF após a administração do diurético pode diminuir o número de casos indeterminados. Numerosos índices têm sido descritos para avaliar a meia-vida (T1/2) de excreção do radiotraçador pós-furosemida. Como a reprodutibilidade dos resultados depende dos equipamentos e programas de cada serviço, cada laboratório deve padronizar os seus próprios índices. Taylor sugere como critérios: ⬍10 minutos, sem obstrução; 10 a 20 minutos, indeterminado; ⬎20 minutos, obstrução.78 Alguns fatores, além da diminuição da função renal, podem alterar os padrões da curva de eliminação do RF, e o médico nuclear deve estar sempre atento a estes. Destacamos entre eles: a baixa hidratação, a repleção vesical e a complacência da pelve renal. Pacientes
Fig. 20.3 Padrões de curvas. Diferentes padrões de curvas obtidas no exame de cintilografia renal dinâmica com 99mTc-DTPA ou 99m Tc-MAG3. A curva 1 é o padrão considerado normal, nele observa-se o acúmulo do RF no rim com um rápido esvaziamento do sistema pielocalicial. Na curva 2, observa-se um acúmulo progressivo do RF no rim com o esvaziamento do sistema pielocalicial somente após a administração do diurético. Este padrão é considerado indicativo de aumento da complacência do sistema coletor, sem obstrução. Na curva 4, observa-se um acúmulo progressivo do RF no rim sem resposta à ação do diurético. Este padrão é sugestivo de obstrução. Na curva 3, observa-se acúmulo progressivo do RF no rim com resposta parcial ao diurético. Este padrão é considerado indeterminado para a presença de obstrução, podendo ser decorrente de algum grau de obstrução parcial, pois ele é considerado inespecífico para a presença de obstrução.
capítulo 20
hidratados inadequadamente podem apresentar uma filtração glomerular diminuída e, portanto, uma menor pressão no sistema pielocalicial, diminuindo o ritmo de enchimento e esvaziamento. Um sistema pielocalicial complacente pode reter uma grande quantidade de urina antes que a pressão atinja valores suficientes para que ocorra um esvaziamento da pelve, e, finalmente, uma bexiga muito cheia pode impor uma resistência considerável à drenagem renal, alterando o padrão da curva. Para evitar estes inconvenientes algumas medidas podem ser tomadas, tais como garantir a hidratação adequada dos pacientes através da administração de líquidos pela via oral, ou em alguns casos especiais pela via endovenosa, e a realização de sondagem vesical em alguns casos mais específicos. A realização de uma imagem extra ao final do exame, após o paciente ter deambulado e urinado, pode ser de grande utilidade na diferenciação de quadros obstrutivos de retenção por estase. Esta imagem pode inclusive ser realizada em posição ortostática, recomendada, principalmente, nos pacientes que podem apresentar refluxo vésico-ureteral passivo na posição supina.
Refluxo Vésico-ureteral Refluxo vésico-ureteral é o fluxo retrógrado de urina da bexiga para os ureteres, podendo atingir os rins. O refluxo predispõe a infecções e a processos inflamatórios renais que podem evoluir para a perda total ou parcial da função. O diagnóstico é estabelecido por métodos radiográficos: cistouretrografia miccional, ou cintilográficos: cistocintilografia direta. Ambos utilizam a cateterização e a infusão intravesical de contraste radiológico ou de material radioativo e avaliam a presença de refluxo durante as fases de enchimento da bexiga e de diurese. A cistouretrografia miccional fornece imagens de alta resolução que permitem uma avaliação anatômica detalhada da uretra posterior e da bexiga e, nos casos em que haja refluxo, dos ureteres e dos rins. A técnica radiográfica permite a classificação do refluxo em cinco categorias conforme a altura do refluxo e o grau de comprometimento dos cálices renais, enquanto a cistocintilografia, por não apresentar resolução suficiente, só permite a classificação em termos de altura do refluxo. A principal desvantagem da cistouretrografia radiológica é a dose de radiação recebida pelo paciente, que é cerca de 40 a 200 vezes maior do que aquela recebida na cistocintilografia direta. Este aspecto passa a ser ainda mais relevante quando sabemos que o paciente será acompanhado ao longo dos anos com exames seriados. Atualmente considera-se que uma boa estratégia para o diagnóstico e acompanhamento de pacientes com refluxo vésico-ureteral é a realização de uma cistouretrografia miccional radiográfica inicial, para detecção e classificação do refluxo, e a realização do acompanhamento evolutivo, através da cistocintilografia direta.
381
A cistocintilografia pode também ser realizada de maneira indireta (cistocintilografia indireta), que não necessita de cateterização vesical. Aqui o radiofármaco, injetado por via endovenosa, chega à bexiga através de sua excreção fisiológica.8 Este procedimento nada mais é do que uma complementação do renograma clássico. Quando houver grande quantidade de material radioativo na bexiga, solicita-se que o paciente urine, enquanto são adquiridas as imagens seqüenciais, que permitirão a avaliação da presença de refluxo para os ureteres.
METODOLOGIA Cistocintilografia Direta Nesta técnica, a bexiga é cateterizada utilizando-se uma sonda de alívio com dimensões apropriadas para o tamanho do paciente e em condições assépticas. Esvazia-se totalmente a bexiga, coloca-se o paciente em posição supina e com o detector da gama-câmara posicionado posteriormente inicia-se a infusão do radiofármaco enquanto imagens seqüenciais de 30 segundos são adquiridas até que a repleção esteja completa e o esvaziamento vesical tenha sido concluído. Utiliza-se o 99mTc na sua forma pura (pertecnetato) ou marcando enxofre coloidal ou DTPA; a dose utilizada varia entre 18,5 e 37 MBq (0,5 a 1,0 mCi). O radiofármaco é infundido diretamente na bexiga pelo cateter vesical. Pode-se injetar toda a dose diretamente e em seguida inicia-se a infusão de 50 a 1.500 ml de soro fisiológico (dependendo do tamanho do paciente), ou dilui-se a dose no soro fisiológico e inicia-se a infusão; o frasco de infusão deve estar posicionado cerca de 90 cm acima da bexiga. A primeira forma é preferível, pois garante uma grande quantidade de radiação na bexiga desde o início do exame, aumentando desta maneira a sensibilidade do método; utilizando-se a dose diluída é possível que pequenos refluxos, que possam ocorrer no começo da infusão, sejam perdidos (v. Fig. 20.4).
Cistocintilografia Indireta Esta metodologia requer a realização de um renograma; e no seu término, quando a atividade radioativa nos rins estiver bem diminuída e a bexiga estiver cheia, pede-se para que o paciente esvazie a bexiga, enquanto são obtidas as imagens. Esta técnica possui várias desvantagens quando comparada com o método direto. O tempo necessário para que o trato urinário alto esvazie completamente é variável em pacientes com insuficiência renal ou com dilatações do sistema pielocalicial e pode ocorrer estase renal do RF que dificulta a avaliação das imagens. A necessidade de colaboração do paciente restringe este exame a crianças maiores. Como o refluxo não pode ser avaliado na fase de enchimento vesical, alguns casos poderão não ser detectados, sendo esta perda estimada em 25% dos pacientes. Finalizando, a dose radioativa recebida utilizando a técnica indireta é significativamente maior do que
382
Radioisótopos em Nefrourologia
Fig. 20.4 Cistocintilografia direta. Nota-se, desde a fase de enchimento da bexiga, a presença de refluxo vésico-ureteral importante para o rim esquerdo.
aquela recebida na técnica direta. A vantagem do método, além da ausência de risco de infecção, é a obtenção simultânea de dados referentes à função renal (renograma) e à presença do refluxo.
Avaliação do Rim Transplantado O papel da cintilografia na propedêutica do rim transplantado ainda está por ser estabelecido. Em muitas situações pode servir como investigação complementar a outros métodos diagnósticos: ultra-som com Doppler, biópsia por agulha fina, urinálises, etc. Muitos dos estudos realizados sobre o papel da medicina nuclear foram anteriores à introdução da imunossupressão com ciclosporina; sua utilização permitiu que houvesse sobreposição de critérios anteriormente estabelecidos. Outro aspecto polêmico é o estabelecimento do ponto inicial (start point) para o estudo do enxerto renal: avaliação eletiva logo após o procedimento cirúrgico (até 48h) ou quando houver alguma alteração na evolução do rim transplantado. O estudo basal é bastante interessante, tendo em vista a possibilidade de estudos comparativos; por outro lado, nem sempre há condições clínicas adequadas do paciente ou disponibilidade do procedimento. A cintilografia renal pode ser utilizada nas investigações de trombose arterial, defeitos regionais de perfusão, hidronefrose, extravasamento de urina, linfocele, necrose tubular aguda, rejeição aguda, rejeição crônica e toxicidade a drogas.22 O preparo do paciente transplantado é igual ao do paciente com rins nativos funcionantes; a adequada hidratação é fundamental. O RI escolhido pode ser o 99mTc-MAG3, 99m Tc-DTPA, 123I-OIH ou o 131I-OIH. A injeção do RI deve
ser em “bolo”, em veia do membro contralateral ao da fístula artério-venosa. Diferentemente da cintilografia em indivíduos normais, o aparelho é posicionado em anterior, de tal maneira que o enxerto, aorta abdominal, artérias ilíacas e bexiga possam ser visualizados; caso tenham alguma função residual, os rins nativos também deverão ser avaliados. As imagens obtidas permitem a construção da curva tempo/atividade e, a partir dela, obter dados quantitativos.22 O estudo cintilográfico pode ser dividido em duas fases: fase vascular e fase funcional (nefrográfica ⫹ excretora). Imagens da bexiga antes e depois de urinar permitem estudar possíveis extravasamento de urina, refluxo vésicoureteral e obstrução ao fluxo urinário. Muitos métodos têm sido utilizados para estudar a fase vascular, relacionando fluxo sanguíneo renal ao das artérias ilíaca/aorta abdominal, dentre eles o Índice de Perfusão de Hilson (IP) (Hilson) e relação enxerto/aorta, de Kirchner.22 O índice de Hilson (IP) baseia-se na relação entre as áreas compreendidas sob as curvas de atividade/tempo, das artérias ilíacas e renal, calculadas a partir do momento em que o RI chega ao enxerto, estendendo-se até o pico máximo de atividade; o valor normal é ⬍150 e aumenta em função da redução da perfusão.40 Em algumas situações podem-se realizar os estudos sob intervenção de drogas: furosemida (diagnóstico diferencial de obstrução) e inibidor de enzima de conversão ou losartan (pesquisa de hipertensão renovascular).30 A interpretação dos dados obtidos é a mesma dos pacientes com rins nativos.
INTERPRETAÇÃO Um renograma normal exclui problemas clínicos com alto grau de certeza.38 Inicia-se a análise do renograma pela inspeção visual da fase vascular; ela permite avaliar a presença ou não de fluxo adequado pela artéria renal e seus ramos, presença de fístulas artério-venosas e pseudo-aneurismas. A observação da fase funcional permite avaliar a presença de defeitos no parênquima renal (infartos, cicatrizes, lesões ocupando espaço) e a presença do RI em outras estruturas (extravasamento de urina, urinoma).
FASE VASCULAR Normalmente observa-se o bolo do RI chegar à aorta abdominal e 4-6 segundos depois ao enxerto. Pacientes com necrose tubular aguda têm menor comprometimento da perfusão do que aqueles com rejeição aguda. Tal avaliação pode ser visual e baseada nos índices de perfusão (IP), como o de Hilson (⬎150 mais freqüentemente encontrado nas estenoses de artéria renal e rejeição) e outros índices menos utilizados e que necessitam de validação (índice de fluxo, tempo de trânsito vascular, índice de perfusão do MAG3, etc.).22,38,40
383
capítulo 20
FASE FUNCIONAL As imagens seqüenciais e a curva atividade-tempo devem ser estudadas simultaneamente. No rim transplantado normal o pico de atividade é alcançado aos 5 minutos e cai até a metade em 5-6 minutos; em cerca de 30 minutos após a injeção os agentes tubulares (OIH e MAG3) deverão estar presentes na bexiga de maneira quase integral.22 Na necrose tubular aguda podemos ter um padrão inicial de redução da função renal (detectado por uma diminuição da função renal percentual e de seus índices, do RFG, do FPRE, etc.) e trânsito lento pelo parênquima (detectado pelo retardo no tempo do Tmáx, Tempo de Trânsito pelo Parênquima — TPP, tempo de aparecimento do RI na bexiga, etc.). Na necrose tubular aguda mais severa evidencia-se aumento da atividade do RI até o final do estudo e sua ausência de excreção RI na bexiga; a curva nefrográfica apresenta um padrão continuamente ascendente. Com a resolução da necrose tubular aguda, a curva, anteriormente ascendente, se normaliza. Rins gravemente comprometidos têm uma curva nefrográfica com um pico inicial precoce seguido por uma queda rápida. A não-visualização do enxerto implica um prognóstico bastante ruim. A rejeição aguda, mediada por células, tem um padrão cintilográfico muito semelhante àquele da necrose tubular aguda na fase funcional; o quadro clínico do paciente e a apresentação temporal da alteração da viabilidade do enxerto podem auxiliar no diagnóstico diferencial. Na rejeição crônica estável os índices de função renal estão reduzidos, mas o trânsito no parênquima é normal. As imagens seqüenciais e curva atividade/tempo podem estar normais; se não houver quantificação da função, o quadro pode passar despercebido. Nas formas mais avançadas observa-se retenção parenquimatosa; todos os parâmetros se alteram denunciando grave comprometimento da função renal e estabelecimento de doença terminal. Pode-se observar aspecto de hidronefrose, que na verdade é secundário ao afilamento do córtex renal. Não existe padrão típico para nefrotoxicidade por drogas; nas formas mais leves pode assemelhar-se à rejeição crônica (imagens normais com diminuição da função) e nas formas mais graves ter características de rejeição aguda (diminuição da função e retenção cortical). Talvez a utilização de estudos em medicina nuclear para avaliação da função renal dos transplantes ainda seja polêmica. Entretanto, não se pode desprezar o fato de que a cintilografia é capaz de fornecer informações sobre as condições atuais do enxerto, enquanto os outros exames podem levar horas ou dias para se alterarem. Esta demora pode causar uma perda de tempo por demais preciosa para as chances de sobrevida do rim e necessárias tomadas de decisão.
CINTILOGRAFIA RENAL ESTÁTICA — INFECÇÃO URINÁRIA A cintilografia renal estática é um procedimento utilizado para estudo do parênquima renal, excluindo-se o sistema excretor, permitindo a avaliação da localização, alteração da forma, presença de cicatrizes e função renal percentual. Tem sido empregada na investigação de infecção de trato urinário (pielonefrite aguda e lesões parenquimatosas tardias), rim em ferradura, rins multicísticos e policísticos, ectopia renal, trauma, rins contraídos e estenose de artéria renal. Inicialmente utilizavam-se diuréticos mercuriais marcados com 203Hg ou 197Hg;51 posteriormente estudos foram realizados com traçadores marcados com 99mTc (glucoheptonato, DMSA e MAG3). Destes os mais utilizados são o MAG3 e o DMSA, sendo este último considerado o método de escolha para avaliação da córtex renal; foi introduzido em 1974 por Lin e col. e desde então o seu uso se universalizou. O 99mTc-DMSA é considerado um agente tubular, que alcança o túbulo contornado proximal tanto por filtração glomerular como através dos capilares peritubulares; sua ligação se faz com os grupamentos sulfidril das células do túbulo contornado proximal.64 Acidose tubular renal secundária a cistinose nefropática pode cursar com reduzida captação pelo parênquima renal mesmo com função renal conservada; estudos experimentais revelaram que nessa situação haveria alteração na cinética de DMSA.34 Tubulopatias como a síndrome de Fanconi e nefronoftise podem levar a uma má visualização do parênquima renal; isso se deve à incapacidade do 99mTc-DMSA em ser absorvido ou em se ligar à célula tubular, e sua conseqüente perda pela urina. A utilização do 99mTc-MAG3 é bastante restrita, já que, devido à sua rápida eliminação, a avaliação do parênquima renal deve ser feita nos minutos iniciais do estudo dinâmico, não sendo possível observar outras projeções dos rins, além da posterior; também demonstrou limitações para avaliar e diagnosticar lesões de grau leve.48,64
METODOLOGIA Preparo. Não é necessário submeter o paciente a qualquer alteração das medicações em uso ou da alimentação. A sedação é um procedimento excepcional, tendo em vista a simplicidade na realização do exame. Procedimento. As imagens são adquiridas 2-4h após a injeção do 99mTc-DMSA. Pacientes portadores de hidronefrose poderão realizar imagens com 6-24h, pois a retenção do radiofármaco pelo sistema coletor pode superestimar a função renal percentual do rim comprometido. São adquiridas imagens em posterior e oblíquas posteriores; ima-
384
Radioisótopos em Nefrourologia
gens anteriores poderão ser realizadas na investigação de rim em ferradura ou ectopia renal. O uso de imagens tomográficas (SPECT) ainda é discutível, tendo em vista dificuldades na padronização da normalidade, a possibilidade de falso-positivos, a necessidade de sedação e a movimentação do paciente. Alguns trabalhos avaliam o SPECT como altamente desejável na investigação de ITU e cicatrizes tardias,80,81 e outros o consideram desnecessário14 quando avaliado isoladamente, sem as imagens planares. Estudos em adultos normais têm demonstrado padrão heterogêneo na captação pelo parênquima renal, principalmente áreas hipocaptantes no pólo superior à esquerda,19 sugerindo uma variabilidade muito grande, o que dificultaria a avaliação de indivíduos possivelmente nefropatas. Alguns autores têm sugerido medidas que reduzissem essas variações da normalidade, como por exemplo aquisição tomográfica nos 180o posteriores ao invés da aquisição padrão de 360°.63 Interpretação. As imagens obtidas permitem análise da forma, localização, dimensões, bordos e função renal percentual. Considera-se como função renal no limite inferior o valor de 45%.64,67 São considerados anormais exames cujas funções renais percentuais tenham diferença superior a 10% entre os rins e/ou diminuição ou ausência de captação na córtex renal, causando distorção ou irregularidade do contorno renal.67 Muito se tem discutido a respeito da variabilidade entre os observadores na análise das cintilografias com 99mTcDMSA. Trabalhos recentes têm demonstrado boa concordância entre diferentes observadores tanto na análise de crianças com pielonefrite aguda ou com seqüelas tardias pós-infecção de trato urinário (⬎6 meses após episódio agudo),14,20,35 como em crianças portadoras de diferentes patologias renais, bem como utilizando-se imagens planares para análise, associadas ou não ao SPECT;15 bons resultados também foram obtidos quando se estudaram adultos e crianças com ITU.20 A concordância entre os observadores nos diferentes trabalhos varia entre 75% e 92%. Crianças portadoras de infecção do trato urinário (ITU) de repetição constituem um grupo especial devido à necessidade de adequada avaliação do episódio agudo e controle temporal evolutivo. Estima-se que 1 a 4% das crianças possam apresentar ITU; 6 a 15% das portadoras de pielonefrite não-obstrutiva podem evoluir com cicatrizes renais, quando avaliadas pela urografia excretora. Quando estudadas através da cintilografia com DMSA, estes valores podem elevar-se. A importância epidemiológica é que estes pacientes, se não houver a instituição de procedimentos adequados, poderão evoluir para hipertensão arterial sistêmica e até mesmo insuficiência renal crônica. A cintilografia estática com DMSA tem sido sugerida como diagnóstica na pielonefrite aguda quando, na presença de quadro clínico sugestivo, não houver comprovação laboratorial,49 e no estudo evolutivo das possíveis seqüelas conseqüentes aos quadros infecciosos.72 Devido à pos-
sibilidade de que as alterações observadas sejam decorrentes de um quadro agudo, sugere-se o intervalo de seis meses a um ano entre o exame inicial e uma segunda avaliação para definição de uma cicatriz.79
Pontos-chave: Principais indicações da cintilografia estática • Pielonefrite aguda • Avaliação evolutiva da lesão parenquimatosa (formação da cicatriz)
NOVAS PERSPECTIVAS Começam a chegar em nosso meio equipamentos baseados na detecção de emissões provenientes das desintegrações de pósitrons. São as câmaras de cintilação híbridas com duas cabeças e dois cristais planos para recepção das imagens, e as câmaras circulares com múltiplos cristais facetados, também chamadas de câmaras dedicadas. Estes equipamentos são projetados para a realização de exames que utilizam esse tipo de emissão e ambos possuem o sistema de coincidência para detecção dos fótons.61 O funcionamento dos equipamentos é baseado na emissão de pósitrons, ou seja, quando o núcleo do átomo apresenta um desequilíbrio na relação nêutron/próton com um maior número de prótons, o átomo torna-se instável e o próton tende a se desintegrar, ocorrendo a sua transformação em neutrino e pósitron (⫹). Esta é uma partícula que é emitida pelo núcleo e possui a massa do elétron e a mesma carga, tendo como diferença o sinal contrário, ou seja, a carga é positiva. Como a partícula de carga positiva percorre o nosso meio, a interação com a matéria ocorre de maneira fugaz, levando à aniquilação, quando a massa do elétron e do pósitron sofrem a transformação de matéria em energia, com a emissão de duas ondas eletromagnéticas diametralmente opostas, de 511 keV, que atingem os cristais provocando a cintilação. O isótopo emissor de pósitron mais utilizado atualmente, e o único disponível no Brasil, é o flúor (18F), e que pode ser ligado, entre outras, à molécula de deoxiglicose de modo satisfatório (18FDG). Esta molécula apresenta um comportamento biológico semelhante à glicose, podendo ser utilizada para avaliar o seu metabolismo. Assim, mantendo-se o paciente em jejum, condição que permite maior avidez dos tecidos, inclusive tumoral, para a glicose, teremos a marcação da atividade metabólica do tecido. As imagens obtidas permitem avaliar a localização, determinar o volume e o grau de atividade metabólica do tecido. O uso do PET e 18FDG tem sua principal indicação nas investigações oncológicas,18,41 seja para localização de metástases ou avaliação das possíveis condutas terapêuticas. Pode também ser utilizado na avaliação do músculo car-
capítulo 20
díaco, fluxo sanguíneo regional do cérebro e estudos baseados na fisiologia das alterações. No estudo do tumor maligno renal podemos, após sua ressecção cirúrgica ou nefrectomia, realizar avaliação de possíveis metástases através da utilização do 18FDG.56 Não podemos terminar esta revisão sobre os métodos radioisotópicos na avaliação das alterações renais sem lembrar algumas técnicas úteis na exploração de outros órgãos ou sistemas que podem ser comprometidos por uma afecção originariamente renal. Lembramos a cintilografia do esqueleto (mapeamento ósseo), exame importante realizado no estadiamento inicial e no seguimento de pacientes com carcinoma renal, das vias urinárias e principalmente da próstata.66 Ressaltamos, igualmente, a possibilidade de localização do feocromocitoma através da meta-iodo-benzilguanidina (MIBG) marcada com 131I ou 123I e seu tratamento com o primeiro radiofármaco.54 A localização de adenomas das glândulas paratireóides, atualmente, é realizada com o 99m Tc-MIBI.62 Finalmente, as repercussões hemodinâmicas da hipertensão arterial podem ser estudadas pela ventri-
Fig. 20.5 Cintilografia normal com 99mTc-DMSA.
Fig. 20.6 Cintilografia com 99mTc-DMSA. Retrações cicatriciais.
385
culografia radioisotópica de primeira passagem e durante o equilíbrio, que permitem o cálculo de vários parâmetros hemodinâmicos como a fração de ejeção e o débito cardíaco, entre outros, e avaliar a contratilidade regional.2 A utilização de traçadores específicos para avaliar a perfusão miocárdica no repouso e exercício ou estresse farmacológico, como o tálio (201Tl), a isonitrila (MIBI) e o tetrofosmin, marcados com 99mTc, são indispensáveis no arsenal propedêutico dos pacientes com hipertensão.4,5
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ARNOLD, R.W.; SUBRAMANIAN, G.; McAFEE, J.G. et al. Comparison of 99mTc complexes for renal imaging. Journal of Nuclear Medicine, 16:357, 1975. 2. BARBIERI, A. Avaliação de diversos métodos de cálculo da fração de ejeção radioisotópica do ventrículo esquerdo. Tese de Doutorado apresentada à Escola Paulista de Medicina no Curso de Pós-Graduação em Radiologia Clínica. Área de Medicina Nuclear, 1984. 3. BARBOUR, G.L.; CRUMB, K.; BOYD, M. et al. Comparison of inulin, iohalamate, and 99mTc-DTPA for measurement of glomerular filtration rate. Journal of Nuclear Medicine, 17:317, 1976. 4. BELLER, G.A. Myocardial thallium 201 perfusion imaging. Am J Card Imaging, 5(1):12-20, 1991. 5. BELLER, G.A. Radionuclide perfusion techniques for evaluation of patients with known or suspected coronary artery disease. Adv Intern Med, 42:139-201 1997. 6. BLAUFOX, M.D.; AURELL, M.; BUBECK, B. Report of the radionuclides in nephrourology committee on renal clearance. Journal of Nuclear Medicine, 37:1883-1890, 1996. 7. BONGERS, V; BAKKER, J.; BEUTLER, J.J. et al. Assessment of renal artery stenosis: Comparison of captopril renography and gadoliniumenhanced breath-hold MR angiography. Clinical Radiology, 55:346-352, 2000. 8. BOWER, G.; LOVEGROVE, F.T.; GEISSEL, H. et al. Comparison of “direct” and “indirect” radionuclide cystography. Journal of Nuclear Medicine, 26:465-8, 1985. 9. BRIEN, T.G.; O’HAGAN, R.; MJLDOWNEY, F.P. Chomium 51EDTA in the determination of glomerular filtration rate. Acta Radiologica, 8:523-9, 1969. 10. BURBANK, M.K.; TAUXE, W.N.; MAHER, F. et al. Evalution of radioiodinated hippuran for the estimation of renal plasma flow. Proc. Staff Meet. Mayo Clin., 36:372, 1961. 11. CHERVU, I.R.; LEE, H.B.; GOYAL, Q. et al. Use of 99mTc-Cu DTPA complexes as a renal function agent. Journal of Nuclear Medicine, 18:62, 1977. 12. CLAVEAU-TREMBLAY, R.; TURPIN, S.; De BRAEKELEER, M. et al. False positive captopril renography in patients taking calcium antagonists. Journal of Nuclear Medicine, 39(9):1621-1626, 1998. 13. CONWAY, J.J. and MAIZELS, M. “The WELL tempered” diuretic renogram: a standard method to examine the asymptomatic neonate with hydronephrosis or hydroureteronephrosis. J. Nucl. Med., 33:2047-51, 1992. 14. CRAIG, J.C.; IRWIG, Les M.; HOWMAN-GILES, R.B. et al. Variability in the interpretation of dimercaptosuccinic acid scintigraphy after urinary tract infection in children. Journal of Nuclear Medicine, 39(8), 1998. 15. CRAIG, J.C.; IRWIG, Les M.; FORD, M. et al. Reliability of DMSA for the diagnosis of renal parenchymal abnormality in children. European Journal of Nuclear Medicine, 27(11):1610-1616, 2000. 16. DATSERIS, I.E.; BOMANJI, J.B.; BROWN, E.A. et al. Captopril renal scintigraphy in patients with hypertension and chronic renal failene. Journal of Nuclear Medicine, 35:251-4, 1994. 17. DAY, H.M.; HOFFER, P.B.; SERVER, E. et al. Quantitative analysis of the technetium 99mDTPA captopril renogram: contribution of
386
18.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25.
26. 27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
Radioisótopos em Nefrourologia
washout parameters to the diagnosis of renal artery stenosis. Journal of Nuclear Medicine, 34:1416-19, 1993. DELBEKE, D. Oncological applications of FDG PET imaging: brain tumors, colorectal cancer lymphoma and melanoma. Journal of Nuclear Medicine, 40:591-603, 1999. De SADELEER, C.; BOSSUYT, A.; GÓES, E. et al. Renal technetium99m-DMSA SPECT in normal volunteers. Journal of Nuclear Medicine, 37(8):1346-1349, 1996 De SADELEER, C.; TONDEUR, M.; MELIS, K. et al. A multicenter trial on interobserver reproducibility in reporting on 99mTc-DMSA planar scintigraphy: a Belgian survey. Journal of Nuclear Medicine, 41(1):23-26, 2000. DONDI, M.; FANTI, S.; DEFABRITIIS, A. et al. Prognostic value of captopril renal scintigraphy renovascular hypertension. Journal of Nuclear Medicine, 33:2040-4, 1992. DUBOVISKY, E.V.; RUSSEL, C.D.; BISCHOF-DELALOYE, A. et al. Report of the radionuclides in nephrourology committee for evaluation of transplanted kidney (review of techniques). Seminars of Nuclear Medicine, 29(2):175-88, 1999. ERGUN, E.L.; MELTEN, ÇAGLAR; ERDEM, Y. et al. Tc-m99 DTPA Acetylsalicylic acid (aspirin) renography in the detection of renovascular hypertension. Clinical Nuclear Medicine, 25(9):682-690, 2000. ESHIMA, D.; TAYLOR, Jr, A. Technetium-99m (99mTc) mercaptoacetyltriglycine: update on the new 99mTc renal tubular function agent. Seminars Nuclear Medicine, 22:61-73, 1992. FAVRE, H.R.; WING, A.J. Simultaneous 51Cr edetic acid inulin and endogenous creatinine in 20 patients with renal disease. British Medical Journal, I:84, 1968. FINE, E.J. Interventions in renal scintirenography. Seminars in Nuclear Medicine, 29(2):128-145, 1999. FINE, E.J.; LI, Y.; BLAUFOX, D.Parenchimal mean transit time analysis of 99mTc-DTPA captopril renography. Journal of Nuclear Medicine, 41(10):1627-1631, 2000. FINE, E.J. Diuretic renography and angiotensin converting enzyme inhibitor renography. The Radiologic Clinics of North America, 39(5): 979-995, 2001. FREEMAN, L.M. Clinical aspects of dynamic renal imaging with radiochlormerodrin, technetium-99m pertechnetate and iodine-131 ortho-iodohippurate. In: Croll, M.N. et al. (eds.) Clinical Dynamic Function Studies with Radionuclides. New York, Meredith Corporation, 1972, pp. 47-63. FUSTER, D.; PAZ MARCO, M.; SETOAIN, F.J. A case of renal artery stenosis after transplantation: can losartan be more accurate than captopril renography? Clinical Nuclear Medicine, 23(11):731-734, 1998. GANDOLPHO, L.; SEVILLANO, M.; BARBIERI, A. et al. Scintigraphy and Doppler ultrasonography for the evaluation of obstructive urinary calculi. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, 34:745-751, 2001. GARNETT, E.S.; PARSONS, V.; VEALL, N. Measurement of glomerular filtration rate in man using a 51Cr edetic acid complex. Lancet, I:818, 1967. GATES, F.G. Computation of glomerular filtration rate with Tc-99m DTPA: an in-house computer program. Journal of Nuclear Medicine, 15:613-8, 1984. GREEN, D.A. and DAVIES, S.G. Dimercaptosuccinic acid distribution in renal tubular acidosis. The British Journal of Radiology, December, 1291-1292, 1997. GUEVARA, D.L.; FRANKEN, P.; DE SADELER, C. et al.Interobserver reproducibility in reporting on 99mTc-DMSA scintigraphy for detection of late renal sequelae. Journal of Nuclear Medicine, 42(4):564-566, 2001. HANSEN, L.; LIPOWSKA, M.; MARZILI, L.G. et al. A promising renal tubular function agent that combines the structural features of MAG3 and EC (abstract). Journal of Nuclear Medicine, 37:17p, 1996. HARBERT, J.C.; ECKELMAN, W.C.; NEUMANN, R.D. Single Photon Imaging in Nuclear Medicine, Diagnosis and Therapy. Thieme Medical Publishers, New York, 1996. HEAF, J.G.; IVERSEN, J. Uses and limitations of renal scintigraphy in renal transplantation monitoring. European Journal of Nuclear Medicine, 27(7):871-879, 2000.
39. HEYMAN, S. Radionuclide studies of the genitourinary tract. In: Milier, J.; Gelfand, M.J. (editors). Pediatric Nuclear Imaging, lst ed. Philadelphia: W.B. Saunders Company, 1994:195-252. 40. HILSON, A.J.W.; MAISEY, M.N.; BROWN, C.B. et al. Dynamic renal transplant imaging with Tc-99m DTPA (Sn) supplemented by a transplant perfusion index in the management of renal transplants. Journal of Nuclear Medicine, 19:994-1000, 1978. 41. HUSTINX, R.; BERNARD, F.; ALAVI, A. Whole-body FDG-PET imaging in the management of patients with cancer. Seminars of Nuclear Medicine, 32(1):35-46, 2002. 42. ITI, R.; PHILIPPE, L. L’analyse des courbes dynamiques en médicine nucléaire. J. Fr. Biophys. Méd. Nucl., I:83-94, 1977. 43. JOHANSSON, M.; JENSEN, G.; AURELL, M. et al. Evaluation of duplex ultrasound and captopril renography for detection of renovascular hypertension. Kidney Int, 58:774-782, 2000. 44. KABASAKAL, L. Technetium-99m ethylene dicysteine: a new agent tubular function agent. European Journal of Nuclear Medicine, 27(3): 351-357, 2000. 45. KARANIKAS, G ; BECHERER, A.; WIESNER, K. et al. ACE inhibition is superior to angiotensin receptor blockade for renography in renal artery stenosis. European Journal of Nuclear Medicine, 29(3): 312-318, 2002. 46. KLOPPER, J.F.; HAUSER, W.; ATKINS, H.L. et al. Evaluation of 99m Tc-DTPA for the measurement of glomerular filtration rate. Journal of Nuclear Medicine, 13:107, 1972. 47. KRIJNEN, P.; OEI, HONG-YOE; ROEL, A.M.J. et al. Interobserver agreement on captopril renography for assessing renal vascular disease. Journal of Nuclear Medicine, 43(3):330-37, 2002. 48. LAGUNA, R.; SILVA, F.; ORDUNA, E. et al. Technetium-99m-MAG3 in early identification of pyelonephritis in children. Journal of Nuclear Medicine, 39(7):1254-57, 1998. 49. LEVTCHENKO, E.N.; LAHY, C., LEVY, C. et al. Role of Tc-99m DMSA scintigraphy in the diagnosis of culture negative pyelonephritis. Pediatric Nephrology, 16:503-506, 2001. 50. LOWRY, P.A.; PJURA, G.A.; KIM, E.; BROWN, W.D. Radionuclide Imaging of The Lower Genitourinary Tract. In: Gottschalk, A.; Hoifer, P.B.; Potchen, E.J. (editors) Diagnostic Nuclear Medicine. 2nd ed. Baltimore: Golden’s Diagnostic Radiology, 1988:967-984. 51. McAFFE, J.G.; WAGNER Jr, H.N. Visualization of renal parenchyma: scintiscanning with 203Hg neohydrin. Radiology, 75:820, 1960. 52. McAFFE, J.C.; SUBRAMANIAN, G.; SCHNEIDER, R.F. et al. Technetium-99m DADS complexes as renal function and imaging agents: II Biological comparison with iodine-131 hippuran. Journal of Nuclear Medicine, 26:375-86, 1985. 53. MITTAL, B.R. et al. Role of captopril renography in the diagnosis of renovascular hypertension. American Journal of Kidney Disease, 28(2): 209-213, 1996. 54. McDOUGALL, I.R. Malignant pheochromocytoma treated by I-131 MIBG. Journal of Nuclear Medicine, 25:249-50, 1984. 55. MONTEIRO, M.C.A.; ALONSO, G.; AJZEN, H. et al. Assessment of glomerular filtration rate utilizing subcutaneously injected Ji CrEdta. Brazilian Journal Medicine Biological Research, 27:1-8, 1994. 56. MONTRAVERS, F.; GRAHEK, D. et al. Evaluation of FDG uptake by renal malignancies (primary tumor or metastases) using a coincidence detection gama-camara. Journal of Nuclear Medicine, 78-84, 2000. 57. MORAN, JUSTIN K. Technetium-99m-EC and other potential new agents in renal nuclear medicine. Seminars in Nuclear Medicine, 29(2): 91-101, 1999. 58. O’REILLY, P.H.; SHIELDS, R.A.; TESTA, H.J. Nuclear Medicine in Urology and Nephrology. Butterworths, p. 29, 1979. 59. O‘REILLY, P.H.; AURELL, M.; BRITTON, K. et al. Consensus on diuresis renography for investigating the dilated upper urinary tract. Journal of Nuclear Medicine, 37(11):1872-1876, 1996. 60. O’TUAMA, L.A.; TREVES, S.T.; PETERS, C.A. Tracking the natural history of infantile hydronephrosis with diuretic renography. Journal of Nuclear Medicine, 33:2098-102, 1992. 61. PATTON, J.; TURKINGTON, T.G. Coincidence imaging with dualhead scintillation camera. Journal of Nuclear Medicine, 40(3): 432-441, 1999. 62. PATTOU, F.; HUGLO, D.; PROYE, C. Radionuclides scanning in parathyroid diseases. British Journal of Surgery, 85:1605-1616, 1998.
capítulo 20
63. 64.
65.
66.
67.
68.
69.
70.
71.
72. 73.
PENG, N.J.; KWOK, C.G.; CHIOU, Y.H. et al. Posterior 180º 99mTcdimercaptosuccinic acid renal SPECT. JNM, 40(1):60-63 1999. PIEPSZ, A.; BLAUFOX, I.; GORDON, G. et al. Consensus on renal cortical scintigraphy in children with urinary tract infection. Seminars in Nuclear Medicine, 29(2):160-174, 1999. PJURA, G.A.; LOWRY, P.A.; KIM, E. Radionuclide imaging of the upper genitourinary tract. In: Gottschalk, A.; Hoffer, P.B.; Potchen, E.J. (editors). Diagnostic Nuclear Medicine, 2nd ed. Baltimore: Golden’s Diagnostic Radiology, 1988:940-966. ROSEN, P.R.; MURPHY, K.G. Bone scintilography in the initial staging of patients with renal-cell carcinoma: concise communication. Journal of Nuclear Medicine, 25:289-91, 1984. ROSSLEIGH, M.A. Renal cortical scintigraphy and diuresis renography in infants and children. Journal of Nuclear Medicine, 42(1):91-95, 2001. RUSSEL, C.D.; DUBOVSKY, E.V. Comparison of single-infection multisample renal clearence methods with and without urine collection. Journal of Nuclear Medicine, 36:603-6, 1995. SCHWARTZ, F.D.; MADELOFF, M.S. Simultaneous renal clearances of radiohippuran and PAH in man. Clinical Research, 9:208, 1961. STACY, B.D.; THORBURN, G.D. Cromiun-51 ethylenediaminetetraacetate for estimation of glomerular filtration rate. Science, 152:10767, 1966. STADALMIK, R.C.; VOGEL, J.M.; JANSHOLT, A.L. et al. Renal clearance and extraction parameters of ortho-iodohippurate (I-123) compared with OIH (I-123) and PAH. Journal of Nuclear Medicine, 21:168, 1980. STOKLAND, E.; HELLSTROM, M.; JAKOBSSON, B. et al. Imaging of renal scarring. Acta Pediatriac (Suppl) 431:13-21, 1999. TAPLIN, G.V.; MEREDITH, O.M.; KADE, H. et al. The radioisotope renogram: an external test for individual kidney function and upper urinary tract patency. USAEC Report UCLA-366, May 1956. Journal Laboratory Clinical Medicine, 48:886, 1956.
387
74. TAUXE, W.N.; MAHER, F.T.; TAYLOR, W.F. Effective renal plasma flow: estimulation from theoretical volumes of distribution of intravenously injected 1311I-orthoiodohippurate. Mayo Clinical Procedure, 46:524-31, 1971. 75. TAYLOR Jr, A.; ZIFFER, J. Urinary Tract. In: Early, P.J.; Sodee, D.B. (editors) Principles and Practice of Nuclear Medicine, 2nd ed. St. Louis: Mosby: 579-616 -1995. 76. TAYLOR, A.T.; NALLY, J.; AURELL, M. et al. Consensus report on ACE inhibitor renography for detecting renovascular hypertension. Journal of Nuclear Medicine, 37(11): 1876-1882, 1996 . 77. TAYLOR, A.T.; FLETCHER, J.W.; NALLY, J.V. et al. Procedure Guideline for Diagnosis of Renovascular Hypertension. Journal of Nuclear Medicine, 39(7):1297-1302, 1998. 78. TAYLOR, A. Radionuclide renography: A personal approach. Seminars in Nuclear Medicine, (29/2):102-127, 1999. 79. WALLIN, L.; HELIN, I.; BAC, M. Follow-up of acute pyelonephritis in children by Tc-99m DMSA Scintigraphy. Quantitative and qualitative assessment. Clinical Nuclear Medicine, 26(5):423-432, 2001. 80. YEN, Tzu-Chen; CHEN, Wei-Peng; CHANG, Shu-Lian et al. Technetium-99m-DMSA renal SPECT in diagnosing and monitoring pediatric acute pyelonephritis. Journal of Nuclear Medicine, 37(8):13491353, 1996. 81. YEN, Tzu-Chen; TZEN, Kai-Yuan; LIN, Wan-Yu et al. Posterior 180° 99mTc-Dimercaptosuccinic Acid Renal SPECT. Clinical Nuclear Medicine, 23(12):828-831, 1998.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Links: www.jnm.snmjournals.org www.snm.org/educations/ce–online.html www.eanm.org
Capítulo
21
Insuficiência Renal Aguda Oscar F. P. dos Santos, Miguel C. Neto, Sergio A. Draibe, Mirian A. Boim e Nestor Schor
ETIOLOGIA
Diagnóstico por imagem
FISIOPATOLOGIA
Biópsia renal
Fatores vasculares e hemodinâmicos Lesão tubular Curso clínico da IRA com ênfase à necrose tubular aguda INCIDÊNCIA ALTERAÇÕES HIDROELETROLÍTICAS E ENVOLVIMENTO SISTÊMICO
TRATAMENTO Tratamento da IRA pré-renal Tratamento da IRA renal CONDIÇÕES BÁSICAS PARA A CRRT Acesso vascular Força motriz do sangue
Balanço de água
Dialisador
Balanço de sódio
Anticoagulação
Balanço de potássio
Solução de diálise
Balanço de cálcio e fósforo
Solução de reposição
MANIFESTAÇÕES EXTRA-RENAIS INFECÇÕES
TERAPIAS CONTÍNUAS DE REPOSIÇÃO DA FUNÇÃO RENAL
COMPLICAÇÕES GASTROINTESTINAIS
Ultrafiltração lenta contínua (SCUF)
COMPLICAÇÕES CARDIOVASCULARES
Hemofiltração arteriovenosa contínua
COMPLICAÇÕES NEUROLÓGICAS
Hemodiafiltração arteriovenosa contínua
PATOLOGIA
Hemodiafiltração venovenosa contínua
DIAGNÓSTICO
Escolha do método dialítico
Avaliação clínica inicial
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Diagnóstico laboratorial
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
A insuficiência renal aguda (IRA) é caracterizada por uma redução abrupta da função renal que se mantém por períodos variáveis, resultando na inabilidade dos rins em exercer suas funções básicas de excreção e manutenção da homeostase hidroeletrolítica do organismo. Apesar do substancial avanço no entendimento dos mecanismos fisiopatológicos da IRA, bem como no tratamento dessa doença, os índices de mortalidade ainda continuam excessivamente elevados, em torno de 50%.
ETIOLOGIA As causas de insuficiência renal aguda podem ser de origem renal, pré-renal ou pós-renal. A IRA pré-renal é rapidamente reversível se corrigida a causa e resulta principalmente de uma redução na perfusão renal, causada por uma série de eventos que culminam principalmente com diminuição do volume circulante e, portanto, do fluxo san-
389
capítulo 21
güíneo renal, como por exemplo desidratação (vômito, diarréia, febre), uso de diuréticos e insuficiência cardíaca. A IRA renal, causada por fatores intrínsecos ao rim, é classificada de acordo com o principal local afetado: túbulos, interstício, vasos ou glomérulo. A causa mais comum de dano tubular é de origem isquêmica ou tóxica. Entretanto, a necrose tubular isquêmica pode ter origem prérenal como conseqüência da redução do fluxo sangüíneo, especialmente se houver comprometimento suficiente para provocar a morte das células tubulares. Assim, o aparecimento de necrose cortical irreversível pode ocorrer na vigência de isquemia grave, particularmente se o processo fisiopatológico incluir coagulação microvascular, como por exemplo nas complicações obstétricas, picadas de cobra e na síndrome hemolítico-urêmica. As nefrotoxinas representam depois da isquemia a causa mais freqüente de IRA (v. Cap. 24). Os antibióticos aminoglicosídicos, os contrastes radiológicos e os quimioterápicos, como por exemplo a cisplatina, estão entre as drogas que podem causar dano tubular diretamente, embora também tenham participação substancial nas alterações da hemodinâmica glomerular. Por outro lado, drogas imunossupressoras como ciclosporina e FK-506, inibidores da enzima de conversão da angiotensina e drogas antiinflamatórias não-esteroidais podem causar IRA por induzir preponderantemente modificações hemodinâmicas (v. Cap. 24). A IRA devida a nefrite intersticial é mais freqüentemente causada por reações alérgicas a drogas (v. Cap. 24). As causas menos freqüentes incluem doenças auto-imunes (lúpus eritematoso) e agentes infecciosos. Apesar da predominância de um mecanismo fisiopatológico, a insuficiência renal aguda por drogas nefrotóxicas é freqüentemente causada por associação de um ou mais mecanismos, conforme sumarizado no Quadro 21.1. Mais ainda, a associação de isquemia e nefrotoxinas é comumente observada na prática médica como causa de IRA, especialmente em pacientes mais graves.
A IRA pós-renal ocorre na vigência de obstrução do trato urinário (v. Cap. 34). A obstrução das vias urinárias pode ser conseqüência de hipertrofia prostática, câncer de próstata ou cervical, distúrbios retroperitoneais ou bexiga neurogênica (causa funcional). Outras causas de insuficiência pós-renal incluem fatores intraluminais (cálculo renal bilateral, necrose papilar, carcinoma de bexiga etc.) ou extraluminais (fibrose retroperitoneal, tumor colorretal etc.). A obstrução intratubular também é causa de IRA e pode ser conseqüência da precipitação de cristais como ácido úrico, oxalato de cálcio, aciclovir e sulfonamida, dentre outros. Vale salientar que a reversibilidade da IRA pós-renal se relaciona ao tempo de duração da obstrução.
Pontos-chave: • Insuficiência renal aguda (IRA) é uma redução abrupta da função renal • Índices de mortalidade elevados (~50%) • A IRA pré-renal é reversível e resulta da diminuição do volume circulante • Isquemia seguida de toxinas são as causas mais comuns de dano tubular • A reversibilidade da IRA pós-renal se relaciona ao tempo de duração da obstrução
FISIOPATOLOGIA A fisiopatologia da IRA isquêmica ou tóxica envolve alterações estruturais e bioquímicas que resultam basicamente em comprometimento vascular e/ou celular, levando a vasoconstrição, alteração de função e/ou morte celular, descamação do epitélio tubular e obstrução intraluminal, vazamento transtubular do filtrado glomerular e inflamação.
Quadro 21.1 Mecanismos fisiopatológicos de IRA associada a drogas Mecanismo Predominante
Droga
Redução da perfusão renal e alterações na hemodinâmica renal
Ciclosporina, inibidores de enzima conversora, antiinflamatórios não-esteroidais, contrastes radiológicos, anfotericina B
Toxicidade tubular direta
Antibióticos aminoglicosídeos, contrastes radiológicos, cisplatina, ciclosporina, anfotericina B, solventes orgânicos, metais pesados, pentamidina
Toxicidade tubular — rabdomiólise
Cocaína, etanol, lovastatina
Obstrução intratubular — precipitação
Aciclovir, sulfonamidas, etilenoglicol, quimioterápicos
Nefrite intersticial alérgica
Penicilinas, cefalosporinas, sulfonamidas, ciprofloxacina, diuréticos tiazídicos, furosemida, cimetidina, alopurinol
Síndrome hemolítico-urêmica
Ciclosporina, mitomicina, cocaína, quinina
390
Insuficiência Renal Aguda
Fatores Vasculares e Hemodinâmicos A vasoconstrição intra-renal é causada por um desequilíbrio entre os fatores vasoconstritores e vasodilatadores resultantes da ação tanto sistêmica como local de agentes vasoativos. Assim, ocorrem modificações importantes na hemodinâmica glomerular e intra-renal, como conseqüência natural desse desequilíbrio. Esse mecanismo fisiopatológico é particularmente importante na IRA por drogas nefrotóxicas. Diversas nefrotoxinas são capazes de modificar o ritmo de filtração glomerular por induzir alterações em vários dos determinantes da filtração glomerular, de maneira geral mediadas por hormônios, com ativação de hormônios vasoconstritores (angiotensina II, endotelina etc.) e/ou inibição de vasodilatadores (prostaglandinas, óxido nítrico etc.). Esse desequilíbrio resulta em vasoconstrição das arteríolas aferente e eferente e contração da célula mesangial, levando à redução do coeficiente de ultrafiltração glomerular (Kf). Conforme referido, as alterações hemodinâmicas são, na maioria das vezes, mediadas por ação predominante de hormônios vasoconstritores; entretanto, a via final comum pela qual estes hormônios realizam suas ações envolve a elevação do cálcio intracelular (Ca) tanto em células da vasculatura como em células mesangiais. Nesse sentido, vários estudos experimentais mostram que o cálcio é um dos mediadores mais importantes da vasoconstrição intra-renal. O aumento do cálcio livre no citossol de células da musculatura lisa eleva o tônus vascular e contribui para a vasoconstrição, a qual pode ser revertida ou minimizada pela utilização de bloqueadores de canais de cálcio. Antagonistas de cálcio reduzem, por exemplo, a ação vasoconstritora da ciclosporina, minimizando seus efeitos sobre a hemodinâmica glomerular, bem como previnem a vasoconstrição associada aos contrastes radiológicos. Outra participação importante do cálcio na cascata fisiopatológica da IRA, envolvendo a hemodinâmica renal, relaciona-se com a contração da célula mesangial. O aumento do Ca é geralmente iniciado pela interação de hormônios vasoconstritores com seus receptores ou pela ação direta de toxinas. Em recente estudo foi demonstrado que o agente imunossupressor FK-506 provoca aumento na concentração de Ca em células mesangiais em cultura, desencadeando eventos cujo efeito biológico final é a contração destas células, levando à redução do Kf, diminuição da área glomerular disponível para a filtração e, portanto, ao declínio do ritmo de filtração glomerular.
Lesão Tubular Uma das características mais marcantes da IRA isquêmica e nefrotóxica é o dano às células tubulares, com conseqüências devastadoras sobre o epitélio tubular, levando à necrose tubular aguda. Assim, os eventos agressores podem variar de intensidade, causando graus variáveis de lesão celular, ou seja, modificações reversíveis das funções
fisiológicas da célula ou irreversíveis, podendo culminar com a morte celular. A reversibilidade do dano celular dependerá da intensidade, do tempo de duração e do tipo de evento desencadeador. Um dos eventos mais precoces resultante da isquemia ou mesmo na vigência de uma nefrotoxina é a redução dos níveis intracelulares de ATP e, portanto, das porções do néfron que possuem alta taxa de reabsorção tubular com gasto de energia, como o túbulo proximal e a alça ascendente espessa de Henle, que são particularmente mais suscetíveis à isquemia por apresentarem elevado consumo de ATP. Os efeitos imediatos da depleção de ATP são: redução da atividade ATPase da membrana citoplasmática, desequilíbrio nas concentrações intracelulares de eletrólitos como Na, K e Ca e edema celular. Esse desarranjo desencadeia, por sua vez, uma série de eventos, incluindo desestruturação do citoesqueleto, perda da polaridade celular, perda da interação célula-célula, produção das espécies reativas de oxigênio (altamente tóxicas para a célula) e alterações do pH intracelular, que podem culminar com a morte da célula. Um fator agravante na fisiopatologia da IRA, particularmente nas situações de IRA isquêmica, é a dificuldade em distinguir os danos causados pela isquemia per se daqueles causados pela reperfusão. Isso ocorre porque os efeitos da reoxigenação súbita podem produzir danos adicionais à célula, por mecanismos que envolvem a formação de espécies reativas de oxigênio, aumento do influxo de cálcio e reversão abrupta da acidose intratubular. Por outro lado, apesar da gravidade dessa doença, a IRA é na maioria das vezes um evento transitório e reversível que causa graus variáveis de lesão celular, em especial ao epitélio tubular renal, podendo, entretanto, tornar-se irreversível. Esse fenômeno é causado pela capacidade de regeneração e diferenciação das células tubulares, restabelecendo um epitélio íntegro e funcionante. Mesmo em situações mais graves, nas quais 90% das células epiteliais do túbulo proximal são destruídas, os 10% das células remanescentes são capazes de entrar em processo de proliferação estimulado por hormônios e fatores de crescimento, recompondo o epitélio tubular.
Pontos-chave: • As alterações hemodinâmicas são na maioria das vezes mediadas por ação de hormônios vasoconstritores • O cálcio é um dos mediadores mais importantes da vasoconstrição renal • Na lesão tubular, o túbulo proximal e a alça ascendente espessa de Henle são mais susceptíveis à isquemia por apresentarem elevado consumo de ATP
391
capítulo 21
Curso Clínico da IRA com Ênfase à Necrose Tubular Aguda O curso clínico da IRA renal tem sido tradicionalmente subdividido em quatro fases diferentes: inicial, de oligúria, de poliúria e de recuperação funcional. A fase inicial começa a partir do período de exposição a drogas nefrotóxicas ou a um insulto isquêmico. Sua duração é variável e depende do tempo de exposição ao agente causador. Nas situações de isquemia, pode ser muito curta, enquanto no caso de drogas nefrotóxicas a fase inicial pode durar alguns dias. O volume urinário pode estar normal ou diminuído, porém o rim começa a perder a capacidade adequada de excreção de compostos nitrogenados. A fase oligúrica é também variável em grau e duração. Uma vez que a produção de constituintes osmoticamente ativos é ao redor de 600 mOsm ao dia e a capacidade máxima de concentração urinária é de 1.200 mOsm/litro, um volume urinário inferior a 500 ml/dia é insuficiente para excretar as quantidades necessárias de soluto. Portanto, definimos oligúria como um volume urinário menor do que 500 ml/dia. Nessa segunda fase da IRA, o sedimento urinário pode conter hemácias, leucócitos e células epiteliais isoladas ou em cilindros, havendo também pequena perda protéica. Normalmente, a razão da concentração urinária sobre a concentração plasmática de uréia varia de 50 a 100:1. Na IRA, pela diminuição da concentração urinária e progressiva elevação sérica de uréia, a razão diminui para 10:1 ou menos, quanto maior e mais grave for a azotemia. Adicionalmente, por lesão tubular, a concentração urinária de Na é freqüentemente maior do que 20 mEq/L, sendo este valor importante no diagnóstico diferencial de oligúria prérenal (v. Cap. 10). A maioria dos pacientes que se recuperam desenvolve aumento do volume urinário após 10 a 14 dias do início da oligúria. Ocasionalmente, o volume urinário não está diminuído na presença de IRA e de azotemia. Nessas situações, refere-se à IRA como não-oligúrica e justifica-se a presença de volume urinário normal por uma grande elevação na fração de filtração de água apesar de pequena filtração glomerular, ou seja, apesar de uma filtração glomerular reduzida, a reabsorção tubular de líquido é pequena, ocorrendo um fluxo urinário não-oligúrico. Esse tipo de IRA é freqüentemente observado em associação com drogas nefrotóxicas, agentes anestésicos e sepse. A terceira fase, fase diurética, pode ser marcada por uma rápida elevação do volume urinário. A magnitude da diurese independe do estado de hidratação do paciente e representa habitualmente uma incapacidade dos túbulos regenerados em reabsorver sal e água. A excreção urinária de compostos nitrogenados não acompanha inicialmente o aumento da excreção urinária de sal e água. Como conseqüência, a concentração plasmática de uréia e creati-
nina continua a aumentar. Portanto, nessa fase, os sintomas urêmicos podem persistir e a indicação de diálise pode tornar-se necessária apesar do aumento do volume urinário. Considera-se essa fase da IRA como crítica, com cerca de 25% de mortes no período de elevação da diurese. Ocasionalmente, o volume urinário pode aumentar gradativamente, cerca de 100 a 200 ml/dia. Esse padrão é visto em pacientes com cuidadoso controle hidroeletrolítico e adequada indicação de tratamento dialítico. Entretanto, se após uma elevação inicial da diurese o volume urinário atingir um estágio constante e inferior ao normal, a recuperação total da função renal é menos provável. A última fase, a de recuperação funcional, ocorre após vários dias de diurese normal, com redução gradual de uréia e creatinina plasmática. Em cerca de 30% dos doentes ocorre discreta depressão na filtração glomerular que pode persistir, sendo que uma minoria deles exibe contínua diminuição do clearance de creatinina em níveis inferiores a 20 ml/min. Além das anormalidades na função glomerular, defeitos tubulares podem persistir por meses ou anos, sendo o mais freqüente deles uma permanente deficiência na concentração urinária.
INCIDÊNCIA Em levantamento nos Estados Unidos, dentre as etiologias de IRA renal, 62% são decorrentes de necrose tubular aguda conseqüente a causas isquêmicas (72%) e tóxicas (28%). As demais situações de IRA são motivadas por glomerulonefrites agudas (22%), nefrites intersticiais agudas (6%), necrose cortical (5%) e outras (5%). A principal apresentação clínica da NTA é oligúrica (74%), enquanto a forma não-oligúrica (26%) tem no uso de antibióticos o seu principal responsável (41%). A taxa de mortalidade média é significantemente mais alta (40%) na forma oligúrica do que na não-oligúrica (11 %), sendo que o óbito é oito vezes mais freqüente em pacientes com alguma complicação extra-renal quando comparados com aqueles não-complicados.
Pontos-chave: • Na fase oligúrica da NTA a concentração urinária diminui e a concentração urinária de sódio aumenta • IRA não-oligúrica ocorre freqüentemente em associação a drogas nefrotóxicas, agentes anestésicos e sepse • 25% das mortes ocorrem no período de elevação da diurese • A taxa de mortalidade é mais alta na forma oligúrica
392
Insuficiência Renal Aguda
ALTERAÇÕES HIDROELETROLÍTICAS E ENVOLVIMENTO SISTÊMICO Balanço de Água Normalmente, as perdas de água atingem 0,5 a 0,6 ml/ kg/h no indivíduo adulto (850 ml/dia). Considerando a produção endógena de água decorrente da oxidação de proteínas, gorduras e carboidratos como sendo de 450 ml/ dia, a ingestão de água no paciente oligúrico deve permanecer ao redor de 400 ml/dia, acrescida de volume igual à diurese emitida. Para prevenir a hiponatremia dilucional por excessiva oferta hídrica, o peso do paciente deve ser mantido igual ou com perda de até 300 g/dia (v. Cap. 9).
Balanço de Sódio Durante a fase oligúrica, um balanço positivo de sódio pode levar a expansão de volume, hipertensão e insuficiência cardíaca (v. Cap. 10). Por outro lado, uma menor oferta de sódio, principalmente na fase poliúrica, pode provocar depleção de volume e hipotensão. Estes últimos podem retardar a recuperação da função renal. Acredita-se que, durante a fase oligúrica, a oferta de solução salina isotônica (300 ml/dia) associada a controle rigoroso de peso é suficiente para equilibrar o balanço de sódio. Paralelamente, na fase poliúrica, a monitorização hídrica e eletrolítica é necessária para a adequada reposição desses elementos.
Balanço de Potássio A hipercalemia é a principal causa metabólica que leva o paciente com IRA ao óbito. Considerando que somente 2% do potássio corporal total se encontra fora da célula, pequenas alterações no conteúdo extracelular de potássio provocam profundos efeitos na excitabilidade neuromuscular. A elevação do K sérico pode ocorrer na IRA por aumento do catabolismo endógeno de proteínas, por dano tecidual, sangramento gastrointestinal, bem como por movimentação do K do intra- para o extracelular pelo mecanismo-tampão de estados acidóticos (v. Cap. 12). A mais temível complicação da hipercalemia é sua toxicidade cardíaca, manifestada por alterações eletrocardiográficas. Inicialmente, há surgimento de ondas T pontiagudas, seguindo-se de alargamento do complexo QRS, alargamento do intervalo PR e desaparecimento de onda P. Seguemse, então, arritmias ventriculares que, se não são prontamente corrigidas, podem levar rapidamente ao óbito. Por essa razão, é necessário rigoroso controle eletrocardiográfico e de K sérico no paciente com IRA. Na presença de alterações eletrocardiográficas ou de grave hipercalemia (K 6,5 mEq/L), algumas medidas
terapêuticas devem ser utilizadas. A administração endovenosa de gluconato de cálcio a 10% (10 a 30 ml) pode reverter prontamente as alterações verificadas, porém com duração de poucos minutos. Se houver necessidade de efeito protetor mais prolongado, deve-se utilizar bicarbonato de sódio, caso esteja ocorrendo concomitantemente um estado acidótico. Adicionalmente, resinas trocadoras de K (Kayexalate ou Sorcal) e/ou solução polarizante contendo 200 a 500 ml de solução glicosada a 10% com uma unidade de insulina simples para cada 5 g de glicose podem ser utilizadas. A solução polarizante aumenta a captação de K pela célula e reduz seu nível plasmático. Assim, exceto as resinas trocadoras, Kayexalate (troca K por Na) ou Sorcal (troca K por Ca), todas as demais medidas terapêuticas resultam apenas no remanejamento do potássio extracelular para o intracelular, sem contudo diminuir o K. A hemodiálise e a diálise peritoneal, isoladas ou em associação com as medidas acima referidas, são freqüentemente necessárias para melhor controle eletrolítico e efetivamente diminuir o conteúdo corporal total de K (v. Cap. 12).
Pontos-chave: • A hipercalemia é a principal causa metabólica de óbito na IRA • A mais temível complicação da hipercalemia é a sua toxicidade cardíaca • K 6,5 mEq/L — medidas terapêuticas: Gluconato de cálcio a 10% Bicarbonato de sódio Resinas trocadoras de potássio Hemodiálise e diálise peritoneal
Balanço de Cálcio e Fósforo A hipocalcemia é o achado mais freqüente no desequilíbrio do balanço de cálcio. Tetania, espasmos musculares e acentuação dos efeitos cardiotóxicos da hipercalemia podem estar presentes. Ocasionalmente, os níveis de Ca podem estar normais ou elevados, ocorrendo este achado quando a IRA está associada a rabdomiólise ou a injúrias complicadas por calcificação metastática. Hiperfosfatemia também é um freqüente achado em pacientes com IRA, em decorrência de diminuição da filtração glomerular (v. Cap. 13).
MANIFESTAÇÕES EXTRA-RENAIS As manifestações extra-renais da IRA são semelhantes às observadas na insuficiência renal crônica. Contudo, deve ser enfatizado que, pela rapidez com que ocorrem, são fre-
393
capítulo 21
qüentemente essas alterações que contribuem para a alta taxa de mortalidade da IRA.
INFECÇÕES As infecções continuam a ser as complicações mais freqüentes no paciente com IRA, variando sua incidência entre 45 e 80%. Apesar do seu reconhecimento e tratamento, cerca de 20 a 30% dos óbitos na IRA ocorrem em conseqüência de processos infecciosos. As complicações infecciosas são mais observadas em IRA pós-traumática ou póscirúrgica, particularmente quando envolve cirurgia gastrointestinal. As infecções urinárias são de grande importância em pacientes com IRA, visto a dificuldade dos antibióticos atingirem níveis teciduais ou urinários adequados, com freqüente evolução para septicemia. A presença de cateteres urinários, tanto de demora como intermitentes, é fator fundamental para o desenvolvimento e manutenção de infecção urinária, com seleção de agentes microbianos mais resistentes e de maior risco de disseminação. Infecções broncopulmonares são do mesmo modo uma freqüente complicação da IRA, principalmente em pacientes submetidos a diálise peritoneal. O diagnóstico pode tornar-se difícil quando da presença de edema pulmonar concomitante, porém outros sinais de hipervolemia devem ser considerados antes de se afirmar que se trata exclusivamente de congestão pulmonar.
COMPLICAÇÕES GASTROINTESTINAIS Sangramento gastrointestinal ocorre com freqüência de 10 a 40% e resulta em evolução fatal em 20 a 30% dos pacientes com IRA. Comumente, é observado em IRA pós-cirúrgica ou pós-traumática e menos freqüentemente em IRA por causa médica ou obstétrica. Ulcerações gástricas ou duodenais são os achados mais comuns. O tratamento clínico tem preferência, uma vez que o prognóstico se torna reservado quando é necessário tratamento cirúrgico. Obviamente, a presença de sangue no trato gastrointestinal contribui substancialmente para elevação da concentração plasmática de uréia e potássio, necessitando de adequação do programa dialítico.
COMPLICAÇÕES CARDIOVASCULARES A mais freqüente complicação cardíaca é a presença de pericardite fibrinosa (10%). Está geralmente associada com atrito pericárdico e pode estar complicada pela presença de derrame pericárdico. Caso o derrame leve a repercus-
sões hemodinâmicas (tamponamento), pronto tratamento, incluindo pericardiocentese e pericardiotomia, deve ser utilizado. Insuficiência cardíaca congestiva e hipertensão podem estar presentes e correlacionam-se com sobrecarga de volume. Entretanto, acidose metabólica e distúrbios eletrolíticos podem contribuir para o surgimento de insuficiência cardíaca congestiva (ICC), bem como de arritmias.
COMPLICAÇÕES NEUROLÓGICAS O sistema nervoso, entre todos os sistemas orgânicos, é o que menos tolera uma rápida redução da função renal. Como conseqüência, a encefalopatia urêmica é a mais comum manifestação da IRA. Observam-se contínuos sinais de alterações sensoriais, motoras (asterixes, tremores, mioclonias) e quadros convulsivos. Dentre os sinais de encefalopatia urêmica, alterações intelectuais e de memória são os mais precoces. Posteriormente, surgem alterações motoras e finalmente convulsões e coma, que representam os eventos terminais graves e de risco clínico (v. Cap. 39).
Pontos-chave: • As infecções continuam a ser as complicações mais freqüentes no paciente com IRA • 20 a 30% dos óbitos na IRA ocorrem em conseqüência de processos infecciosos • Sangramento gastrointestinal ocorre com freqüência de 10 a 40% e resulta em evolução fatal em 20 a 30% dos pacientes com IRA • A mais freqüente complicação cardíaca é a presença de pericardite fibrinosa (10%) • Encefalopatia urêmica é a mais comum manifestação da IRA
PATOLOGIA Os rins na IRA tendem a ser maiores e mais pesados em decorrência do edema intersticial e do aumento do conteúdo de água. Os capilares glomerulares podem apresentarse levemente congestos no início do processo, porém habitualmente os glomérulos não mostram alterações estruturais. Ocasionalmente, depósitos de fibrina e plaquetas, sugerindo trombose intraglomerular, podem ser visualizados no espaço capsular. Aumento no volume citoplasmático de células epiteliais e endoteliais tem sido descrito.
394
Insuficiência Renal Aguda
As lesões tubulares podem não ser facilmente observadas. De fato, variam com o tempo de isquemia. Inicialmente, há perdas do núcleo e dissolução da borda em escova. A seguir, ocorre aumento das células tubulares. Finalmente, os túbulos tornam-se dilatados e revestidos por um epitélio achatado, contendo células com citoplasma basófilo e núcleos hipercromáticos. As porções ascendente e descendente da alça de Henle mostram áreas focais de necrose com formação de cilindros intratubulares. O lúmen do túbulo distal apresenta-se dilatado e com pigmentos, particularmente se a IRA estiver associada com hemo ou mioglobinúria. Classicamente, dois padrões de dano tubular têm sido descritos: tubulorrexe e lesão nefrotóxica. A tubulorrexe é caracterizada por completa destruição da membrana basal tubular e está associada com insulto isquêmico grave. Essas lesões são de características focais, com néfrons perfeitos ao lado de néfrons acometidos e podem comprometer todo o trajeto tubular. A regeneração da tubulorrexe pode ocorrer ao acaso, com formação de pseudocistos, atrofia tubular e até mesmo fibrose (cicatrizes). Entretanto, dependendo da gravidade do insulto, é possível completa recuperação estrutural e funcional. Diferentemente, o padrão de lesão nefrotóxica é associado com exposição direta de agentes capazes de produzir dano renal. Considerando o gasto energético de reabsorção e secreção, as células do túbulo proximal são as mais afetadas por agentes nefrotóxicos. Contudo, alguns agentes nefrotóxicos agridem preferencialmente diferentes porções do túbulo proximal. As alterações tubulares variam desde simples aumento celular até franca necrose, porém a membrana basal permanece intacta. Em vista da grande variabilidade anatômica observada na IRA, é difícil correlacionar lesões específicas com as alterações fisiológicas constatadas. Devemos lembrar que não é achado infreqüente a presença de IRA com biópsia renal normal, sugerindo lesão renal submicroscópica e/ou alteração funcional.
DIAGNÓSTICO Avaliação Clínica Inicial Avaliar, na história do paciente, a presença de doença sistêmica crônica (diabetes, lúpus). Posteriormente, pesquisar doença sistêmica aguda (glomerulonefrite aguda), além de história de traumatismo recente como potenciais causas primárias de IRA. Adicionalmente, investigar antecedentes de uropatia obstrutiva (principalmente no homem idoso), uso de drogas nefrotóxicas e com potencial efeito de hipersensibilidade intersticial, bem como verificar a possibilidade de intoxicação acidental ou intencional por metais pesados, solventes orgânicos e outros. A seguir, principalmente no paciente hospitalizado, obter informações a respeito de depleção hídrica (diurese
excessiva, débito de sonda nasogástrica, drenos cirúrgicos, diarréia) em pacientes com pouca ingestão de água voluntária ou que não tenham sido adequadamente hidratados. Além disso, se o paciente foi submetido a cirurgia recente, qual o anestésico utilizado e quais intercorrências clínicas que se seguiram, como infecções, hipotensão, balanço hídrico negativo, etc. Ter conhecimento sobre o uso de antibióticos (dose, número de dias utilizados) e se houve procedimento radiológico com utilização de meio de contraste no período que antecedeu o desenvolvimento da IRA. Durante o exame físico, avaliar adequadamente o estado de hidratação pelo peso corporal, turgor cutâneo, alterações posturais de pulso e pressão arterial, membranas mucosas e pressão intra-ocular. Entretanto, lembrar que há situações clínicas (cirrose, síndrome nefrótica, ICC) em que o volume extracelular está normal ou aumentado, porém com diminuição do volume sangüíneo efetivo, acarretando hipoperfusão renal e conseqüente IRA pré-renal. A seguir, avaliar a possibilidade de obstrução do trato urinário por meio de cuidadoso exame abdominal (globo vesical palpável, rins hidronefróticos), toque retal no homem (avaliação prostática) e exame ginecológico bimanual na mulher (presença de massas pélvicas). Quando da suspeita de obstrução urinária baixa, proceder a uma cateterização vesical simples e estéril para confirmação diagnóstica. Observar a presença de febre e/ou erupções cutâneas macropapulares ou petequiais que possam sugerir nefrite intersticial aguda por hipersensibilidade a drogas. Por fim, avaliar o estado mental e o padrão respiratório para verificar possíveis causas de intoxicação, bem como avaliar qualquer outro sinal clínico que sugira a presença de doença sistêmica como causa da IRA.
Diagnóstico Laboratorial A primeira amostra de urina emitida ou cateterizada de pacientes com IRA deve ser utilizada para avaliação de índices urinários diagnósticos. Medidas de sódio, uréia, creatinina e osmolaridade urinária, bem como amostra de sangue para análise de sódio, uréia e creatinina, devem ser coletadas. Na IRA pré-renal, a osmolaridade urinária é freqüentemente elevada ( 500 mOsm), enquanto na IRA renal ou pós-renal tende a ser isosmótica ao plasma ( 350 mOsm). O Na urinário costuma estar elevado ( 40 mEq/ L) na IRA renal pela lesão tubular, enquanto na IRA prérenal é baixo ( 20 mEq/L) em virtude da ávida retenção de Na e H2O pela hipoperfusão renal. As relações U urinária/U plasmática e C urinária/C plasmática estão freqüentemente elevadas na IRA pré-renal ( 60 e 40, respectivamente) decorrente da reabsorção tubular de Na e H2O e conseqüentemente aumento da concentração urinária de uréia e creatinina. Inversamente, essa relação está diminuída na IRA renal ( 30 e 20, respectivamente) pelo dano tubular. É importante ter em mente que o uso de diuréticos pode invalidar a utilidade
395
capítulo 21
desses índices por até 24 horas. Valores intermediários podem ser encontrados tanto na IRA pós-renal como na transição de IRA pré-renal em renal. A análise do sedimento urinário pode ser de auxílio no diagnóstico da IRA. Cilindros hialinos ocorrem mais freqüentemente na IRA pré-renal, enquanto cilindros granulosos e discreta leucocitúria e grande quantidade de células tubulares podem ser observados na IRA renal (sedimento “sujo”). A presença de hemácias dismórficas e/ou cilindros hemáticos sugere a existência de uma glomerulonefrite aguda, podendo ser acompanhada de proteinúria moderada ou elevada. Entretanto, proteinúria leve (traços) pode ser compatível com IRA pré-renal ou mesmo renal. Fitas reagentes urinárias positivas para sangue, sem presença concomitante de hematúria no sedimento, podem sugerir rabdomiólise com mioglobinúria, sendo esse diagnóstico fortalecido pela presença de CPK e aldolase elevadas no soro. Adicionalmente, diante da suspeita de nefrite intersticial aguda, a presença de eosinofilia no sangue periférico em associação com sedimento urinário contendo hematúria e leucocitúria (com intenso predomínio de eosinófilos) pode sugerir fortemente esse diagnóstico.
Diagnóstico por Imagem O mais simples procedimento é a ultra-sonografia (v. Cap. 18-I). A ultra-sonografia, além de nos fornecer o tamanho renal, nos dá informações a respeito de obstruções nas vias urinárias, presença ou não de cálculos, bem como avaliação do parênquima renal. Portanto, é possível diferenciar IRA de IRC e, adicionalmente, pela diferenciação da relação parênquima sinusal e tamanho cortical, sugerir IRC com rins de tamanho normal (diabetes, mieloma). Alternativamente, o uso da cintilografia renal pode auxiliar na avaliação da perfusão renal (v. Cap. 20). Em casos de forte suspeita ou confirmação de obstrução urinária, estão indicados estudos urológicos, como a cistoscopia e a pielografia ascendente. Além de fins diagnósticos (obstrução por cálculos ou tumores ou coágulos) são úteis na colocação de cateteres ureterais para a desobstrução e como avaliação pré-operatória para posteriores desvios do fluxo urinário.
maférese), bem como nos trará uma indicação prognóstica pela avaliação histológica de componentes inflamatórios e fibróticos. Nos casos habituais de NTA, aguardam-se de quatro a cinco semanas para a recuperação da IRA antes de se proceder à biópsia (v. Cap. 16). Se a deficiência de função renal se estender por esse período, indica-se então a biópsia renal para determinar se um diagnóstico menos favorável, necrose cortical por exemplo, não é a causa da persistência da IRA.
Pontos-chave: • Lembrar que não é achado infreqüente a presença de IRA com biópsia renal normal, sugerindo lesão renal submicroscópica e/ou alteração funcional • Na IRA pré-renal, a osmolaridade urinária é freqüentemente elevada ( 500 mOsm), enquanto na IRA renal ou pós-renal tende a ser isosmótica ao plasma ( 350 mOsm) • O Na urinário costuma estar elevado ( 40 mEq/L) na IRA renal pela lesão tubular, enquanto na IRA pré-renal é baixo ( 20 mEq/L) em virtude da ávida retenção de Na e H2O pela hipoperfusão renal • As relações uréia urinária/uréia plasmática e creatinina urinária/creatinina plasmática estão freqüentemente elevadas na IRA prérenal ( 60 e 40, respectivamente) decorrente da reabsorção tubular de Na e H2O e conseqüentemente aumento da concentração urinária de uréia e creatinina. Essa relação está diminuída na IRA renal ( 30 e 20, respectivamente) pelo dano tubular • Eosinofilia no sangue periférico em associação com sedimento urinário contendo hematúria e leucocitúria (com intenso predomínio de eosinófilos) pode sugerir nefrite intersticial aguda
Biópsia Renal
TRATAMENTO
A biópsia renal precoce (um a cinco dias) está indicada quando há suspeita de ser a IRA decorrente de uma doença sistêmica (por exemplo: vasculite), de uma glomerulonefrite aguda (por exemplo: lúpus), de uma nefrite intersticial aguda quando houver suspeita de necrose cortical bilateral, ou na ausência de diagnóstico clínico provável. A biópsia nos fornecerá bases para justificar uma terapêutica mais agressiva (corticóides, agentes citotóxicos, plas-
Tratamento da IRA Pré-Renal Quando a IRA decorrer de deficiência no volume extracelular, a reposição hídrica deve ser feita de modo a restabelecer a quantidade de líquido perdida, associando-se com adequada correção eletrolítica (v. Cap. 10). Metade da deficiência hídrica estimada deve ser reposta nas primeiras 24 horas e, usualmente, o volume urinário aumenta em
396
Insuficiência Renal Aguda
4 horas. Todavia, em pacientes idosos ou com doença renal prévia, a oligúria pode persistir por mais tempo. Nas situações em que a IRA pré-renal é decorrente da diminuição do volume sangüíneo efetivo, a terapêutica orienta-se pela fisiopatologia da doença desencadeante, como referido a seguir: Insuficiência cardíaca congestiva (ICC) — uso de inotrópicos positivos. Quando necessário, associar o uso de drogas vasodilatadoras (hidralazina, prazosina, captopril) para diminuir a pós-carga; freqüentemente, o uso combinado restaura a diurese por melhor perfusão renal. Entretanto, em alguns pacientes pode haver persistência de algum grau de azotemia pré-renal, o qual deve ser encarado pelo médico como um problema participante do quadro clínico e perfeitamente controlável. Síndrome nefrótica — a terapêutica mais racional é orientada para a correção da doença de base, seja pelo uso de corticóides, seja de drogas citotóxicas. Entretanto, em determinados estados patológicos primários que se manifestam por síndrome nefrótica (glomerulonefrite membranosa, diabetes), o tratamento pode restringir-se somente ao controle de hidratação e uso criterioso de diuréticos. Cirrose — evitar desequilíbrios hemodinâmicos é fundamental para se impedir a evolução do paciente cirrótico para síndrome hepatorrenal. Quando já estabelecida, o prognóstico torna-se reservado com evolução para óbito em mais de 90% dos casos. Em situações de oligúria, cuidadosa expansão salina e uso de espironolactona, isoladamente ou em associação com furosemida, melhoram a diurese em até 80% dos doentes. Freqüentemente, a observação do paciente com azotemia pré-renal é feita apenas com o exame clínico. Entretanto, monitorização invasiva pode ser necessária quando vigorosa terapia hídrica é indispensável ou quando se desconhece a tolerância do paciente a grandes reposições de volume. Nessas situações, indica-se a utilização de cateter venoso central para a medida de pressão venosa de átrio direito (PVC), ou mesmo de um cateter de Swan-Ganz (pressão do capilar pulmonar) para melhor avaliação hemodinâmica.
Tratamento da IRA Renal Não há benefícios na utilização de diuréticos na IRA. Uma vez caracterizada, rigoroso controle hidroeletrolítico deve ser mantido. A reposição de volume deve ser restringida a 400 ml/dia acrescido do débito urinário. O balanço de sódio deve ser controlado por meio de uma dieta pobre em Na (1 g/dia) nos pacientes que não estão sendo submetidos a diálise, porém, com maior liberdade (até 3 g/dia) quando já em programa dialítico. Adicionalmente, corrigir eventual acidose quando o pH plasmático estiver menor do que 7,25 ou o HCO3 inferior a 12 mEq/L (v. Cap. 11). Manutenção em valores normais do nível plasmático
de K é feita por meio das medidas terapêuticas anteriormente discutidas. Lembrar de ajustar todas as drogas que tenham alteração de seu metabolismo pela presença de alteração na função renal. O principal responsável pela liberação orgânica de resíduos de nitrogênio é o metabolismo de proteínas, resultando em elevação da carga de uréia, de ácidos metabólicos (sulfatos, fosfatos, ácidos orgânicos) e de potássio. Inicialmente, devemos considerar que 100 g/dia de carboidratos são suficientes para diminuir o catabolismo protéico. Além disso, o suprimento adicional de calorias na forma de gorduras e de quantidades adequadas de proteína previne um balanço nitrogenado negativo. Quando o suprimento correto de carboidratos é fornecido em associação com proteínas que contenham aminoácidos de alto valor biológico (essenciais), ocorre balanço positivo de nitrogênio, com a vantagem de a uréia e outros compostos nitrogenados serem utilizados para a síntese de aminoácidos não-essenciais. Ocorre então concomitante melhora dos sintomas clínicos e diminuição na concentração plasmática de uréia. Portanto, uma dieta com 1.800 a 2.500 kcal/dia e 0,5 g/kg/dia de proteína de alto valor biológico é aconselhável para pacientes com IRA que estejam com boa aceitação oral. Nas situações em que for necessária a utilização de nutrição parenteral, glicose hipertônica e aminoácidos essenciais devem ser administrados. Diferentemente, alguns autores sugerem que a quantidade de proteínas fornecidas deve ser mantida normal (1 g/kg/dia) e a diálise realizada quando necessário. Haveria menor risco de desnutrição e menor incidência de processos infecciosos. Diálise precoce e freqüente deve ser utilizada para manter uréia abaixo de 180 mg/dl e creatinina inferior a 8 mg/ dl. Esses níveis previnem os sintomas clínicos da uremia, melhoram o estado nutricional do paciente e podem, indiscutivelmente, diminuir o risco de sangramento e infecções. Pacientes com significativa destruição tecidual (rabdomiólise, traumatismo, queimadura, septicemia, pós-operatório de cirurgias extensas) têm elevada produção de uréia e usualmente necessitam de hemodiálise quando se apresentam com IRA. A hemodiálise também está indicada em quadros de IRA por intoxicação exógena por metanol e etilenoglicol, visto seu efeito em remover toxinas rapidamente. A hemodiálise deve ser mantida por 4 ou mais horas e diariamente se for necessário. O maior perigo é o sangramento e, portanto, em pacientes de alto risco, doses reduzidas de heparina ou heparinização regional devem ser utilizadas. As complicações hidroeletrolíticas são semelhantes às da diálise peritoneal, porém ocorrem mais agudamente e, assim, necessitam de pronto tratamento. Nos últimos anos, procedimentos dialíticos ditos “especiais e contínuos” têm ganho grande espaço como instrumentos terapêuticos para reposição da função renal na IRA. Os procedimentos de hemofiltração e hemodiafiltração são utilizados freqüentemente para a reposição de função re-
397
capítulo 21
nal e clareamento de substâncias tóxicas em pacientes criticamente enfermos (v. também Cap. 50). Diferentes opções técnicas de tratamento são utilizadas dependendo das condições dos pacientes, porém quase sempre as diferentes modalidades são utilizadas de maneira contínua. Assim, é bastante comum o uso do termo terapia contínua de reposição renal (CRRT). A hemodiafiltração intermitente é também utilizada para pacientes com insuficiência renal crônica em alguns centros especializados na Europa.
Pontos-chave: • Não há benefícios na utilização de diuréticos na IRA • Diálise precoce e freqüente deve ser utilizada para manter uréia abaixo de 180 mg/dl e creatinina inferior a 8 mg/dl • Pacientes com significativa destruição tecidual (rabdomiólise, traumatismo, queimadura, septicemia, pós-operatório de cirurgias extensas) têm elevada produção de uréia e usualmente necessitam de hemodiálise quando se apresentam com IRA • Os procedimentos de hemofiltração e hemodiafiltração são utilizados freqüentemente para a reposição de função renal e clareamento de substâncias tóxicas em pacientes criticamente enfermos
Os shunts arteriovenosos (shunt de Quinton-Scribner, shunt AV) representam outra alternativa. Nesta técnica, implanta-se cirurgicamente um par de cânulas conectando uma artéria a uma veia das extremidades (antebraço ou perna), formando uma fístula externa. Apesar do baixo risco de sangramento e maior liberdade no manuseio do paciente, existe a necessidade do implante cirúrgico e os riscos de coagulação e de infecção. Além disso, o fluxo sangüíneo é relativamente baixo, podendo resultar em isquemia da extremidade em questão. Nos anos 80, alguns autores introduziram variantes dos cateteres de duplo lúmen. Os cateteres de duplo lúmen de longa permanência (PermcathTM e outros) são de silástico inseridos cirurgicamente, sendo que um túnel subcutâneo é construído para a sua via de saída. O cateter é firmemente fixado no túnel devido à presença de um cuff. Tais cateteres são mais flexíveis e biocompatíveis, implicando menor risco de trombose venosa. Além disso, a presença do túnel subcutâneo na via de saída e de um cuff no cateter reduz a taxa de infecções no local e, conseqüentemente, de bacteremia. Outra variante introduzida mais recentemente é o cateter de Tesio. Na verdade, este cateter é constituído por dois cateteres separados, ou seja, com os lumens arterial e venoso do circuito separados, porém com a extremidade externa dos cateteres juntando-se em uma só peça. Durante a implantação cirúrgica, o cateter venoso é implantado alguns centímetros mais profundamente para evitar recirculação. Devido ao grande calibre (10 Fr), estes cateteres permitem alto fluxo de sangue.
Força Motriz do Sangue CONDIÇÕES BÁSICAS PARA A CRRT Acesso Vascular A necessidade de um acesso vascular para HD ou hemofiltração em pacientes com IRA é habitualmente temporária. Os métodos para estabelecer esse acesso envolvem a punção percutânea de um grande vaso sangüíneo (jugular interna, subclávia ou femoral). Atualmente, os cateteres venosos de duplo lúmen são os mais populares, porém são calibrosos e apresentam risco de trombose ou estenose tardia da veia subclávia. Outra via de acesso que podemos utilizar é a introdução de cateteres mais calibrosos, por punção percutânea, na artéria e veia femorais. As vantagens desse método são o alto fluxo sangüíneo e a baixa incidência de coagulação e infecção local. Entretanto, este tipo de acesso exige o confinamento do paciente ao leito. Além disso, existe o risco de hematoma local ou retroperitoneal, além de isquemia distal se os vasos apresentarem estenose.
Ao optarmos por acessos vasculares arteriovenosos (punção percutânea de artéria e veia femoral ou shunt AV), o gradiente de pressão do lado arterial para o lado venoso do circuito pode funcionar como força motriz para o sangue passar por um sistema de baixa resistência (hemofiltração). Quando utilizamos somente cateteres venosos, não há gradiente de pressão e se faz necessária uma bomba para impulsionar o sangue. As máquinas de HD e de hemofiltração venovenosa são providas de bombas de rolete para tal propósito. Também se podem utilizar bombas de rolete avulsas para realização de ultrafiltração lenta contínua (SCUF).
Dialisador Os filtros de HD podem ter duas formas básicas de arquitetura: filtro capilar e filtro de placas paralelas. Os filtros capilares são mais utilizados do que os de placas paralelas. Os filtros de placas paralelas estão associados a uma maior taxa de coagulação do sistema e geralmente a caixa que os aloja é opaca, não permitindo a visualização dos coágulos.
398
Insuficiência Renal Aguda
As membranas que equipam os dialisadores podem ser classificadas em três tipos: celulose, celulose modificada e sintética. A celulose é obtida por meio do processamento do algodão e, até recentemente, o tipo de membrana mais comumente encontrado nos dialisadores era o cuprofane. Essa membrana tem alta permeabilidade para pequenas moléculas, PM 200 dáltons e baixa para moléculas maiores. As membranas sintéticas incluem a poliacrilonitrila (PAN), a polissulfona, a poliamida, o policarbonato e o polimetilmetacrilato. Essas membranas são mais permeáveis a moléculas médias e grandes do que o cuprofane. Esses filtros, por apresentarem alta capacidade de UF e serem altamente permeáveis aos solutos urêmicos, permitem a utilização do transporte por convecção, mimetizando a filtração glomerular (v. também Cap. 50).
Anticoagulação Decorrente da natureza artificial de um sistema de CRRT, existe ativação de complemento, cininas, cascata da coagulação e agregação plaquetária com formação de trombos em seu interior. A coagulação do sangue no filtro dialisador leva à diminuição progressiva da área de superfície de filtração. Assim, é necessário obter-se anticoagulação eficaz do sangue durante a passagem pelo filtro, porém, sem anticoagular excessivamente o paciente. A anticoagulação mais freqüentemente empregada é a heparinização. O sistema passa inicialmente por uma pré-lavagem com soro heparinizado (5.000 UI de heparina para um litro de soro fisiológico) e infusão de heparina em bolo ou por infusão contínua para manter o tempo de tromboplastina parcial ativado (TTPa) ou o tempo de coagulação ativado (TCa) uma e meia a duas vezes superior ao valor normal. Geralmente, isto requer uma dose em torno de 1.000 UI/hora, devendo-se proceder à monitorização do TTPa durante o tratamento. Nos procedimentos dialíticos prolongados ou contínuos, recomenda-se a heparinização contínua. A anticoagulação com heparina pode ser feita regionalmente, infundindo-se sulfato de protamina no final do circuito venoso (l ml para cada 1.000 UI de heparina). Tecnicamente, a heparinização regional é complicada e mais cara, por exigir a utilização de duas bombas de infusão e a monitorização freqüente (3 a 4 vezes por dia) do TTPa do sistema de CRRT e do paciente. O citrato trissódico é uma das alternativas à heparinização. Seu princípio de ação é a quelação do cálcio iônico, que é co-fator importante para a ação de várias enzimas da cascata de coagulação. Nesse tipo de anticoagulação, infunde-se o citrato trissódico (2 mol/l,5 litro de soro fisiológico para 4 horas de HD) na via arterial da CRRT, fazendose a reposição do cálcio na linha venosa, com cloreto de cálcio a 5% (120 ml em 4 horas). É importante a monitorização freqüente dos níveis de cálcio iônico. Apesar de se mostrar um excelente anticoagulante, seu uso torna-se limitado pelos motivos justificados para a heparinização
regional, adicionando-se a necessidade de monitorização do cálcio iônico, os riscos de hipo- ou hipercalcemia e alcalose metabólica (pela conversão do citrato em bicarbonato no fígado). Além da heparina e do citrato, outro anticoagulante promissor é a prostaciclina. Por enquanto, os inconvenientes para essa substância são o risco de hipotensão arterial e o alto custo do tratamento. Também é possível realizar procedimentos dialíticos com CRRT sem o uso de anticoagulantes. Neste caso, utilizam-se freqüentes lavagens do circuito da CRRT com solução salina a 0,9% (100 ml a cada 30 minutos) (v. Cap. 50).
Solução de Diálise Durante a HD, uma solução é infundida no compartimento externo do filtro dialisador, entrando em contato com a membrana dialítica. Com a finalidade de manter o equilíbrio eletrolítico e ácido-básico no organismo, a solução de diálise deve conter quantidades adequadas de íons como sódio, potássio, cálcio etc. Assim, certos íons apresentam concentração baixa na solução dialisadora com a finalidade de promover sua remoção do plasma (potássio), enquanto outros apresentam concentração equilibrada (sódio). Devido à perda de grandes quantidades de bicarbonato e à acidose da insuficiência renal, é necessária a sua reposição. A reposição é feita mediante tampão usado no banho de diálise, que pode ser o acetato de sódio ou o próprio bicarbonato. O acetato tem como vantagem o poder de inibir o crescimento bacteriano na solução dialisadora, o que vem reduzir a quantidade de fragmentos bacterianos que podem ser absorvidos pelo sangue durante a HD (com conseqüente ativação de produção de citocinas). Entretanto, os eventos metabólicos ligados à conversão do acetato em bicarbonato no fígado produzem um efeito vasodilatador com risco de hipotensão arterial durante a HD. As soluções com bicarbonato de sódio estão relacionadas a uma menor ocorrência de episódios hipotensivos. Como inconveniente, favorecem a precipitação, formando sais de cálcio, promovendo uma reposição inadequada desse íon e também ocasionando problemas na manutenção do equipamento. Essas dificuldades são contornáveis com a utilização de máquinas de proporção.
Solução de Reposição As soluções de reposição são utilizadas somente nas modalidades onde o objetivo é o transporte de solutos por convecção, ou seja, hemofiltração arteriovenosa contínua (CAVH) e hemodiafiltração arteriovenosa contínua (CAVHD). Como os objetivos de controle eletrolítico são os mesmos que os da HD intermitente, a solução tem composição semelhante. Entretanto, ao contrário das soluções de reposição, a solução de diálise na HD intermitente não necessita ser estéril. Assim, faz-se necessária a aquisição de
399
capítulo 21
uma solução adequada, ou a composição de uma solução no hospital, a partir da solução de Ringer. Alternativamente, pode-se utilizar solução de diálise peritoneal, que apresenta composição adequada, com exceção da elevada quantidade de glicose. No Quadro 21.2 pode-se observar a composição das diferentes soluções. A prescrição desta ou daquela solução dependerá da disponibilidade e da necessidade de cada paciente.
TERAPIAS CONTÍNUAS DE REPOSIÇÃO DA FUNÇÃO RENAL Os métodos hemodialíticos podem ser divididos em HD intermitente, onde geralmente são utilizados filtros de menor permeabilidade, e nas terapias contínuas de reposição renal ou CRRT, onde são utilizados filtros da altíssima permeabilidade (hemofiltros). A grande variedade de técnicas de CRRT desenvolvidas levou a uma confusão de nomenclatura.
Ultrafiltração Lenta Contínua (SCUF) Na SCUF, o gradiente de PTM determina o transporte de água. O propósito desta terapia é tão-somente o controle volêmico, assim, não há reposição do volume ultrafiltrado e o clearance de solutos é mínimo. O acesso vascular pode ser arteriovenoso ou venovenoso. Podem-se também usar filtros de diferentes permeabilidades. Apesar de não se utilizar solução dialisadora, pode ser mais seguro realizar-se o procedimento com uma máquina de HD com monitores acoplados (detector de bolhas, monitores de pressão do sistema etc.) do que com uma bomba de roletes isolada.
Hemofiltração Arteriovenosa Contínua A CAVH sem bombas foi descrita em 1977 por Kramer et al., embora o conceito de diafiltração já houvesse sido introduzido 10 anos antes. Nesse procedimento, além do
uso do filtro de alta permeabilidade (hemofiltro), utilizase o gradiente de pressão arteriovenoso do paciente para impulsionar o sangue na CRRT. Como a CAVH é um processo contínuo de remoção de líquido e substâncias urêmicas por convecção, há necessidade de retirada e reposição de grandes volumes de líquido. Essa técnica é útil para manter o paciente “seco”, preservando a estabilidade hemodinâmica. Por outro lado, o clearance médio de uréia na CAVH é em torno de 10 ml/min, sendo freqüentemente insuficiente para o controle adequado do nível de uréia em pacientes graves hipercatabólicos (v. também Cap. 50). Nesta modalidade, um hemofiltro de baixa resistência é interposto entre as vias arterial e venosa (volume total de sangue próximo a 75 ml) sem necessidade de bomba de sangue. Como banho de diálise, infundimos solução dialisadora por gravidade e em fluxo contrário ao do sangue. O líquido efluente é drenado para um coletor de fluidos (coletor de urina em sistema fechado, por exemplo), sendo a aferição horária. O volume infundido é subtraído do medido na unidade de tempo e anotado como UF. O coletor quando abaixo do nível do capilar gera uma pressão negativa, no compartimento externo do hemofiltro, proporcional à altura da coluna de ultrafiltrado. A combinação dessa pressão negativa com a pressão positiva exercida pelo sangue determina a PTM e conseqüentemente a velocidade de UF. O fluxo sangüíneo, por sua vez, é determinado pela pressão arterial média, resistência imposta pelo conjunto de vias, capilar e viscosidade sangüínea. A reposição de fluidos pode ser feita na linha arterial, antes do filtro (CAVH pré-dilucional) ou na linha venosa, após o filtro (CAVH pós-dilucional). A pré-dilucional pode reduzir o fluxo efetivo de sangue e conseqüentemente o clearance. Por outro lado, a pré-dilucional está associada a taxas consideravelmente menores de coagulação do sistema.
Hemodiafiltração Arteriovenosa Contínua Esta modalidade é muito semelhante à CAVH, porém uma solução de diálise é infundida de maneira contínua
Quadro 21.2 Composição das diferentes soluções de reposição utilizadas em CRRT
Glicose (mg/dl) Sódio (mEq/L) Potássio (mEq/L) Cloreto (mEq/L) Cálcio (mEq/L) Magnésio (mEq/L) Lactato (mEq/L)
Solução de Ringer-lactato
Fluido de Diálise Peritoneal
Fluido de Hemodiafiltração
— 130 4,0 109 2,7 — 28
1.360 132 — 96 3,5 0,5 40
100 140 2,0 117 3,5 1,5 30
400
Insuficiência Renal Aguda
no compartimento externo do filtro. Isto adiciona o transporte convectivo ao transporte difusional. Assim, esta modalidade é habitualmente prescrita quando se necessita de clearances maiores para se atingir o controle metabólico do paciente.
Existem situações em que a CAVHD é impraticável, quer pela ausência de pressão de perfusão arterial, quer pela dificuldade em se obter um acesso arteriovenoso adequado. Para esses casos, uma variante da CAVHD utilizando um cateter venoso de duplo lúmen posicionado na veia central e um aparelho equipado com bomba de sangue, monitor de pressão venosa e detector de bolhas de ar tem sido usada. Essa técnica é chamada de CVVHD. A introdução de uma máquina moderna operando de forma ininterrupta tem a vantagem de garantir fluxo constante usando um fácil acesso venoso. Por outro lado, a complexidade do funcionamento com os potenciais riscos de acidentes (embolia gasosa) pode causar uma certa apreensão na equipe de enfermagem.
tes com doenças abdominais não-esclarecidas, ou com “peritônio aberto”, ou ainda com cirurgia abdominal recente, não devem ser submetidos à diálise peritoneal. Por outro lado, em pacientes com diátese hemorrágica ou que apresentem contra-indicação para heparinização, a DP pode ser o método de escolha. Existem outras situações especiais, como nos pacientes com insuficiência hepática aguda ou crônica, nos quais, apesar de não se ter demonstrado maior sobrevida com a DP, é reconhecida a maior estabilidade do sódio plasmático (melhor controle da hiponatremia) e da glicemia (melhor controle da hipoglicemia) com esse tratamento. Além disso, em situações clínicas que envolvem o risco de hipoglicemia (intoxicação por hipoglicemiantes orais), a DP também pode ser indicada. Outra possível indicação especial é no aquecimento interno lento do paciente com hipotermia grave. Devemos ressaltar que os procedimentos contínuos de HD estão sendo usados com freqüência cada vez maior na UTI. Por outro lado, o maior clearance de drogas implica reajuste mais freqüente de dose, principalmente de antibióticos (notadamente a vancomicina e os aminoglicosídeos).
Escolha do Método Dialítico
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Ao escolher o método dialítico devemos considerar os aspectos relativos à eficiência do método, capacidade de UF, vias de acesso para a diálise e necessidade de anticoagulação. No Quadro 21.3, podemos observar a eficiência estimada pelo clearance da uréia (PM 60) de diferentes tipos de diálise. Podemos notar que HD, CAVHD e CVVHD produzem maior depuração de uréia. Assim, a HD e a CAVHD ou CVVHD são os métodos de escolha para pacientes hipercatabólicos, com elevados níveis de uréia. Por outro lado, quando se faz necessário retirar moléculas maiores, como mediadores imunológicos na SIRS, ou na intoxicação por drogas, a HF e provavelmente a CAVHD se aplicam melhor. É freqüente em alguns centros que não dispõem de CAVHD o uso concomitante de HF e HD. Neste caso, a HF garante a retirada do volume e a HD intermitente, o controle dos níveis de uréia. Vários fatores relacionados ao acesso da diálise podem interferir com a escolha do método. Obviamente, pacien-
BELLOMO, R.; RONCO, C.; MEHTA, R.L. Nomenclature for continuous renal replacement therapies. Am J Kidney Dis, 28(suppl 3):2-7, 1996. BONVENTRE, J.V. Acute renal failure. In: Essential Atlas of Nephrology. R.W. Schrier. Lippincott Williams & Wilkins Ed. 2001, pp 39-85. BOTELLA, J.; GHEZZI, P.; SANZ-MORENO, C. Multicentric study on paired filtration dialysis as a short, highly efficient dialisis technique. Nephrol Dial Transplant, 6:715-721, 1991. DRUML, W.; MITCH, W.E. Metabolism in acute renal failure. Sem Dial, 9:484-490, 1996. FISH, E.M.; MOLITORIS, B.A. Alterations in epithelial polarity and the pathogenesis of disease states. N Engl J Med, 330:1580, 1994. HENDERSEN, L.W. Hemofiltration: From the origin to the new wave. Am J Kidney Dis, 28 (suppl 3):100-104. 1996. JAKOB, S.M.; FREY, F.J.; UHLINGER, D.E. Does continuous renal replacement therapy favorably influence the outcome of patients? Nephrol Dial Transplant, 11:1250-1235, 1996. KEIRDORF, H.; SIERTH, H.G. Continuous treatment modalities in acute renal failure. Nephrol Dial Transplant, 10:2001-2008, 1995. KRUCZYNSKI, K.; IRVINE-BIRD, K.; TOFFELMIRE, E.B.; MORTON, A.R. A comparison of continuous arteriovenous hemofiltration and intermittent hemodialysis in acute renal failure patients in the intensive care unit. Am Soc Artif Intern Organs J, 39:778-781, 1993.
Hemodiafiltração Venovenosa Contínua
Quadro 21.3 Clearance de uréia obtido com diferentes métodos dialíticos DP
HD
HDI
CAVH
CAVHD
CVVHD
2 litros/h
3 ⴛ 4h/semana
7 ⴛ 4h/semana
0,5 litro/h
1 litro/h
2 litros/h
16,7 24 168
14,3 21 144
33,3 48 336
6,9 10 70
14,2 211 144
32 48 336
Prescrição ml/min litros/dia litros/semana
capítulo 21
KWON, T.H.; FROKIAER, J.; HAN, J.S.; KNEPPER, M.A.; NIELSEN, S. Decreased abundance of major Na() transporters in kidneys of rats with ischemia-induced acute renal failure. Am J Renal Physiol, 278(6):F925-39, 2000. LIAÑO, F.; PASCUAL, J. Epidemiology of acute renal failure: a prospective, multicenter, community-based study. Madrid Acute Renal Failure Study Group. Kidney Int, 50(3):811-818, 1996. LIAÑO, F.; PASCUAL, J. Outcomes in acute renal failure. Semin Nephrol 18(5):541-550, 1998. MEHTA, R.L. Therapeutic alternatives to renal replacement therapy for critically ill patients in acute renal failure. Sem Nephrol, 14:64-82, 1994. RABB, H.; WANG, Z.; POSTLER, G.; SOLEIMANI, M. Possible molecular basis for changes in potassium handling in acute renal failure. Am J Kidney Dis, 35(5):871-877, 2000. RABB, H.; BONVENTRE, J.V. Experimental approaches to acute tubular necrosis. In: BRADY, H.; WILCOX, C. (eds.) Therapy in Nephrology and Hypertension: Comparison to Brenner and Rector’s The Kidney. Philadelphia, PA Saunders, 1998, pp 72-80. RACUSEN, L.C. Pathology of acute renal failure: Structure/functions correlations. Adv Renal Replacement Ther, 4 (suppl 2):3-16, 1997.
401
SCHOR, N.; BOIM, M.A.; PAVÃO DOS SANTOS, O.F. In: Insuficiência Renal Aguda: Fisiopatologia, Clínica e Tratamento. Sarvier Editora de Livros Médicos, São Paulo, 1997. SCHOR, N. Acute renal failure and sepsis syndrome. Kidney Int, 61:764776, 2002. THADHANI, R.; PASCUAL, M.; BONVENTRE, J.V. Acute renal failure. N Engl J Med, 334(22):1448-1460, 1996.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET www.kidneyatlas.org www.niddk.nih.gov www.hdcn.com www.kidney.org www.embbs.com www.emedicine.com www.nlm.nih.com www.hosppract.com
Capítulo
22
Glomerulonefrites Primárias Maria Fernanda C. Carvalho, Marcello F. de Franco e Vitor A. Soares (In Memoriam)
FISIOPATOLOGIA DOS SINAIS E SINTOMAS DAS GLOMERULONEFRITES
GLOMERULONEFRITE MEMBRANOPROLIFERATIVA (GNMP) Anatomia patológica
Proteinúria
Etiopatogenia
Queda da filtração glomerular
Tratamento
Hematúria
Glomerulonefrite membranoproliferativa e transplante renal
Retenção de sódio
GLOMERULONEFRITE POR LESÕES MÍNIMAS
Alterações metabólicas
Anatomia patológica
Tratamento inespecífico
Etiopatogenia
Diagnóstico da glomerulonefrite GLOMERULONEFRITE PÓS-ESTREPTOCÓCICA
Tratamento GLOMERULOSCLEROSE FOCAL E SEGMENTAR
Anatomia patológica
Anatomia patológica
Etiopatogenia
Etiopatogenia
Tratamento
Tratamento
GLOMERULONEFRITE CRESCÊNTICA Anatomia patológica
Glomerulosclerose focal e segmentar e transplante GLOMERULONEFRITE MEMBRANOSA
Etiopatogenia
Anatomia patológica
Tratamento
Etiopatogenia
Glomerulonefrite crescêntica e transplante
Tratamento
NEFROPATIA POR IgA
Glomerulonefrite membranosa e transplante
Anatomia patológica
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Etiopatogenia
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Tratamento
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Nefropatia por IgA e transplante
As glomerulonefrites são classificadas de acordo com a presença ou ausência de doença sistêmica, com a apresentação clínica e quanto ao seu modo de instalação e progressão. Quando as glomerulopatias aparecem isoladamente, são classificadas como primárias, e quando estão associadas a doenças sistêmicas, tais como lúpus eritematoso sistêmico, diabetes etc., são classificadas como secundárias. Neste capítulo trataremos apenas das glomerulonefrites primárias.
As conseqüências da agressão glomerular são basicamente: proteinúria, hematúria, queda de filtração glomerular e retenção de sódio. Dependendo principalmente da intensidade e do tipo da agressão, pode haver predomínio de um sinal sobre outro, dando origem a diferentes apresentações clínicas: síndrome nefrítica, síndrome nefrótica, e não-nefrítica e não-nefrótica. Síndrome nefrítica é descrita como o aparecimento súbito de edema, hipertensão arterial e hematúria geralmente macroscópica.
403
capítulo 22
Síndrome nefrótica foi originariamente definida como proteinúria de 24 horas acima de 3,5 g, acompanhada de hipoalbuminemia, hipercolesterolemia e edema. O entendimento de que as três últimas alterações são apenas conseqüência da intensidade da proteinúria levou à definição mais recente de síndrome nefrótica, que é: proteinúria maciça, com tendência a edema, hipoalbuminemia e hipercolesterolemia. Na apresentação não-nefrítica e não-nefrótica são classificados aqueles casos de glomerulonefrites que não se encaixam nas classificações anteriores. Como será visto posteriormente, uma mesma glomerulonefrite pode ter diversas apresentações clínicas em diferentes indivíduos, ou até um mesmo indivíduo pode manifestar durante a sua evolução várias apresentações clínicas. Raramente as glomerulonefrites podem evoluir para insuficiência renal terminal em questão de semanas ou meses, e quando isto ocorre, elas são classificadas como glomerulonefrite rapidamente progressiva, independentemente do tipo histológico. Inicialmente, este termo foi utilizado como sinônimo de glomerulonefrite crescêntica, porém, o reconhecimento de que esta nem sempre apresenta deterioração rápida da função renal e de que outras glomerulonefrites podem evoluir rapidamente para insuficiência renal terminal fez com que este uso fosse abandonado. Estas classificações têm objetivo apenas didático e servem somente como orientação, quando se está frente a um portador de glomerulonefrite.
FISIOPATOLOGIA DOS SINAIS E SINTOMAS DAS GLOMERULONEFRITES Proteinúria A membrana basal glomerular é um gel com carga elétrica negativa, que apresenta grande quantidade de poros pequenos, denominados poros discriminantes, e baixa densidade de poros grandes, denominados poros não-discriminantes. Essas características fazem com que ela seja altamente permeável à água e pequenas moléculas, tais como uréia, creatinina, glicose etc., e praticamente impermeável a macromoléculas, como por exemplo imunoglobulinas. Em moléculas com tamanho intermediário, a carga elétrica é outro fator que influencia na permeabilidade da membrana basal glomerular. A albumina plasmática, por exemplo, apresenta raio molecular de 33 Å e, quando em solução no plasma, apresenta carga negativa. Pelo seu tamanho ela poderia atravessar a membrana basal, porém o fato de ela apresentar carga negativa faz com que a sua passagem através desta membrana seja desprezível.
Nas glomerulopatias tem sido demonstrado que existe perda de cargas aniônicas e aumento da densidade de poros não-discriminantes da membrana basal glomerular, o que leva ao aumento da sua permeabilidade com conseqüente proteinúria. Nas glomerulopatias onde ocorre apenas perda de carga (glomerulonefrite por lesões mínimas), as proteínas encontradas na urina são basicamente albumina e transferrina, enquanto naquelas onde ocorre aumento da densidade de poros não-discriminantes (glomerulonefrite membranosa, glomerulonefrite membranoproliferativa, glomerulosclerose focal e segmentar), além de albumina e transferrina, encontram-se também proteínas de maior peso molecular, como por exemplo imunoglobulinas. A maior parte das glomerulonefrites são mediadas pelo sistema imune, quer pela deposição de imunocomplexos circulantes, quer pela reação antígeno-anticorpo in situ. Essas reações ativam o sistema complemento, o que, direta ou indiretamente, leva ao aumento de permeabilidade da membrana basal glomerular, resultando em proteinúria (v. Cap. 21). Tem sido demonstrado que nas diferentes glomerulonefrites experimentais existe aumento da pressão hidrostática dentro do capilar glomerular e que esse aumento é outro fator importante na gênese da proteinúria.
Queda da Filtração Glomerular A filtração glomerular depende basicamente de dois fatores: a pressão intraglomerular e o coeficiente de permeabilidade da membrana glomerular (v. Cap. 3). Nas glomerulonefrites experimentais, onde esses parâmetros podem ser quantificados, tem sido demonstrado que existe aumento da pressão hidrostática e queda do coeficiente de ultrafiltração. Estudos realizados em seres humanos, onde esses parâmetros são deduzidos, têm sido compatíveis com esses achados. Vários fatores, tais como a retração dos podócitos (que ocorre em pacientes com síndrome nefrótica, independentemente do tipo histológico), a infiltração de neutrófilos ocluindo as fenestrações do endotélio e a diminuição da área filtrante da membrana basal ocasionada pela esclerose glomerular, têm sido propostos para explicar a queda do coeficiente de permeabilidade da membrana basal.
Hematúria O mecanismo de hematúria nas glomerulopatias é muito pouco estudado. O que se aceita hoje é que no curso da agressão renal acabam ocorrendo soluções de continuidade na membrana basal glomerular, através das quais ocorre a passagem de hemácias para o espaço de Bowman. Esta se faz através de diapedese, o que provoca intensa alteração da sua forma, e, por isso, a maior parte dos eritrócitos
404
Glomerulonefrites Primárias
encontrados na urina de pacientes com glomerulopatias apresenta alterações quanto à sua morfologia (hemácias dismórficas).
Retenção de Sódio (v. Cap. 10) Outra alteração muito freqüente nas glomerulopatias é a retenção de sódio, que se manifesta clinicamente por edema e hipertensão arterial. O edema presente nos pacientes portadores de nefropatia tem sido explicado por dois mecanismos diferentes. Nos pacientes portadores de nefropatia sem hipoalbuminemia, ele tem sido imputado à retenção primária de sódio pelo rim lesado, com aumento da volemia, aumento da pressão hidrostática intravascular e extravasamento de líquido para o interstício, com conseqüente aparecimento de edema. Nos pacientes onde ocorre hipoalbuminemia esta tem sido responsabilizada pela formação do edema. Assim, nestes casos ocorreria perda de proteínas pelo rim, com conseqüente hipoalbuminemia, e diminuição da pressão oncótica do plasma; essa diminuição levaria a extravasamento de líquido para o interstício com formação de edema, levando à hipovolemia, o que ativaria diferentes sistemas de retenção de sódio (ativação do sistema reninaangiotensina, do sistema simpático e diminuição do fator natriurético), agravando o edema. Nos últimos anos têm surgido evidências de que a hipoalbuminemia como principal causa do edema na síndrome nefrótica deve ser questionada. Assim, menos de 50% de pacientes portadores de analbuminemia congênita apresentam edema; a volemia de pacientes com síndrome nefrótica está normal ou aumentada em 70% dos casos; a concentração intersticial de albumina nos pacientes nefróticos encontra-se em níveis semelhantes à concentração plasmática e, portanto, não existe a diferença de pressão oncótica entre o intravascular e o interstício; nos pacientes que apresentam remissão da síndrome nefrótica a excreção urinária de sódio antecede o aumento da albumina plasmática. A expansão da volemia de pacientes nefróticos resulta em discreto aumento da natriurese. Além do mais, tem sido demonstrado que animais de experimentação com nefropatia unilateral apenas retêm sódio no rim lesado. Por estes motivos, hoje se acredita que, mesmo nos pacientes com hipoalbuminemia, a origem do edema é a maior retenção de sódio provocada pela lesão renal e não conseqüente às alterações sistêmicas.
Alterações Metabólicas O nível de albumina sérica do paciente com síndrome nefrótica é resultado de um balanço onde os fatores mais importantes são: a intensidade e a duração da perda urinária e a síntese hepática aumentada. Outro fator que influencia este balanço é o aumento do catabolismo protéico. Normalmente a pequena quantida-
de de albumina filtrada é reabsorvida pelos túbulos proximais. Nas situações onde existe aumento dessa filtração ocorre aumento da reabsorção tubular. A albumina reabsorvida é catabolizada, o que contribui para hipoalbuminemia. As alterações lipídicas encontradas na síndrome nefrótica relacionam-se diretamente com os níveis de albumina plasmática. A hipoalbuminemia é um estímulo para o aumento da síntese protéica pelo fígado, o que leva à maior síntese de lipoproteínas de baixa densidade e de muito baixa densidade; como as primeiras são carreadoras de colesterol e as segundas de triglicérides, ocorre hipercolesterolemia e hipertrigliceridemia. Acresce-se a isso o fato de que hipoalbuminemias muito intensas inibem a lipólise. O encontro de hipocalcemia não é incomum na síndrome nefrótica. Como parte do cálcio plasmático está ligada à albumina, esta pode ser explicada parcialmente pela queda da concentração plasmática desta proteína. Pode-se observar também queda do cálcio iônico, que é explicada pela perda urinária de proteínas ligadas ao metabolismo desse íon [1,25(OH)2 colecalciferol e 24,25(OH)2 colecalciferol]. Outras complicações relativamente comuns na síndrome nefrótica, como tromboses ou infecções repetidas, são decorrentes, pelo menos parcialmente, da perda urinária de fatores antitrombóticos e de imunoglobulinas, respectivamente.
Tratamento Inespecífico O tratamento específico de cada glomerulopatia será discutido separadamente, porém algumas medidas tomadas, independentemente do tipo histológico, serão discutidas neste item. Como foi dito anteriormente, um dos possíveis mecanismos que contribuem na gênese da proteinúria é o aumento da pressão intraglomerular. Esta depende basicamente do fluxo sanguíneo glomerular e da resistência que o glomérulo opõe a esse fluxo. O primeiro depende diretamente da pressão arterial sistêmica e inversamente da resistência da arteríola aferente. Os antiinflamatórios não-hormonais inibem a síntese de prostaglandinas, que são vasodilatadores da arteríola aferente, promovendo vasoconstrição desta arteríola, com conseqüente diminuição da pressão intraglomerular e da proteinúria. Nos glomérulos, a angiotensina II induz vasoconstrição da arteríola eferente e das células mesangiais, levando ao aumento da pressão intraglomerular; portanto, quando a sua síntese é inibida, ocorre diminuição desta pressão. Por esse motivo, os inibidores da enzima de conversão da angiotensina I têm sido utilizados como droga antiproteinúrica, com bons resultados. Ambos os grupos de drogas citadas podem induzir queda de filtração glomerular, que é reversível com a sua
405
capítulo 22
retirada. Em pacientes nos quais a filtração glomerular não se apresenta muito comprometida, essa piora da filtração não deve ser motivo para a suspensão da droga. Outro modo de se tentar diminuir a pressão intraglomerular, e com isso a proteinúria, é o uso de dietas hipoprotéicas, uma vez que essa dieta promove a vasoconstrição da arteríola aferente. A sua eficácia na redução da proteinúria a longo prazo, em seres humanos, é ainda discutível. O tratamento do edema deve ser feito preferencialmente com diuréticos de alça. Estes são substâncias catiônicas, de pequeno peso molecular, que após atingirem a corrente sanguínea se ligam à albumina. No rim eles são captados pelas células do túbulo proximal e secretados para a luz tubular, onde vão agir. Na síndrome nefrótica, devido à hipoalbuminemia, parte do diurético que atinge a corrente circulatória não se liga à albumina e se difunde para o interstício, diminuindo assim a sua concentração plasmática. Além disso, na luz tubular ele se liga à albumina aí presente, inibindo a sua ação. Por esses motivos, essas substâncias têm menor ação no paciente com síndrome nefrótica. Assim, é preferível que se administrem altas doses de diurético de uma só vez, do que pequenas doses várias vezes ao dia. O fracionamento das doses só deve ser feito quando a dose total a ser usada nas 24 horas for muito alta. Outro meio para se tentar aumentar a ação do diurético é administrá-lo associado a pequenas quantidades de albumina humana. Expansores de volume tipo albumina, plasma humano ou dextran raramente induzem natriurese nestes pacientes, podendo induzir hipervolemia; assim, o seu uso deve ser avaliado cautelosamente. Outra alteração importante é a presença de hipertensão arterial. Na maior parte, senão em todas as glomerulopatias, demonstrou-se que o controle da hipertensão arterial exerce influência positiva na evolução da nefropatia, independentemente do anti-hipertensivo utilizado. Assim, o controle pressórico rigoroso deve ser um dos objetivos do tratamento. A hipertrigliceridemia e a hipercolesterolemia são fatores de risco para doença cardiovascular em indivíduos normais. Pacientes com síndrome nefrótica apresentam maior risco de infarto agudo do miocárdio ou óbito devido a evento coronariano, quando comparados a indivíduos não-nefróticos, do mesmo sexo e idade. O uso de drogas antilipêmicas nestes casos pode ser benéfico, embora ainda discutível. Apesar do tratamento, uma certa percentagem dos pacientes portadora de glomerulonefrite evolui para insuficiência renal crônica terminal. Nestes casos a principal terapêutica preconizada é o transplante renal. Recorrência da glomerulopatia de base ou desenvolvimento de uma nova glomerulonefrite (glomerulonefrite de novo) pode ocorrer em 1 a 2% dos pacientes transplantados. Raramente, em cerca de 1 a 5% dos casos, estas glomerulopatias podem levar à perda do enxerto.
Diagnóstico da Glomerulonefrite A suspeita clínica de glomerulonefrite geralmente é bastante fácil. A principal queixa do paciente é de edema acompanhado ou não de hipertensão arterial e hematúria. Sinais e sintomas de insuficiência cardíaca secundária a hipervolemia (dispnéia, hepatomegalia, estase jugular) e de uremia (perda de peso, fraqueza, anorexia, anemia, náuseas, vômitos etc.) podem estar presentes. O diagnóstico de lesão glomerular se faz principalmente através do exame de urina. Assim, proteinúria é uma alteração praticamente obrigatória em todo paciente com glomerulopatia. Cilindros hemáticos e hemácias dismórficas, quando presentes, são altamente sugestivos de lesão glomerular. A presença de leucócitos e cilindros leucocitários é comum, principalmente nos pacientes que apresentam reação exsudativa nos glomérulos. O diagnóstico diferencial entre as diferentes glomerulopatias será discutido no final do capítulo.
GLOMERULONEFRITE PÓSESTREPTOCÓCICA A glomerulonefrite pós-estreptocócica pode ocorrer esporadicamente na forma epidêmica, porém, é mais freqüente em casos isolados. Acomete mais pacientes do sexo masculino, com idade variando entre 2 e 6 anos, podendo no entanto incidir em qualquer faixa etária. Usualmente o aparecimento do quadro clínico é precedido em 7 a 21 dias por escarlatina, ou infecção de vias aéreas superiores ou por piodermite provocada por estreptococos, principalmente alguns tipos do grupo A de Lancefield e mais raramente do grupo C. A apresentação clínica é bastante variável, sendo descritos desde quadros totalmente assintomáticos com discretas alterações urinárias, até pacientes com insuficiência renal grave. Em estudos epidemiológicos tem sido demonstrado que para cada caso sintomático existem pelo menos quatro casos assintomáticos. Comumente o paciente apresenta aparecimento súbito de edema, hematúria macroscópica e hipertensão arterial, e eventualmente dor lombar é referida. O edema geralmente é pré-tibial e/ou palpebral e de pequena intensidade. A hipertensão arterial geralmente é leve. Quando a hematúria é intensa, o paciente pode apresentar queixa de disúria. Raramente, dependendo do tempo em que o paciente procura atendimento médico e da gravidade da glomerulonefrite, o paciente pode apresentar sinais de hipervolemia grave, tais como crise hipertensiva, convulsões e edema agudo de pulmão. A função renal, quando avaliada pela creatinina plasmática, geralmente se apresenta normal ou discretamente alterada. Pacientes com insuficiência renal grave freqüentemente apresentam formação de crescentes e/ou necrose tubular aguda associada.
406
Glomerulonefrites Primárias
Laboratorialmente observa-se o aparecimento de marcadores de infecção pregressa por estreptococos, tais como antiestreptolisina O, anti-hialuronidase, antiestreptoquinase etc. Esses marcadores estão presentes em pacientes que tiveram infecção estreptocócica, tenham eles glomerulonefrite ou não. O exame de urina revela hematúria, com hemácias dismórficas, cilindros hemáticos, leucocitúria e cilindros leucocitários. A proteinúria de 24 horas em 90% dos casos é menor que 3 g. O consumo de complemento pode ser evidenciado pela diminuição de CH50 e C3 em praticamente 100% dos casos. Essa redução é transitória e normalmente desaparece entre quatro semanas e três meses após o início do quadro. A maior parte dos pacientes apresenta remissão dos sinais e sintomas duas a três semanas após o início do quadro, porém, hematúria microscópica mais freqüentemente, e proteinúria discreta, mais raramente, podem levar vários meses para desaparecer, sem que isso tenha algum significado prognóstico. Estudos de longo prazo têm demonstrado que a glomerulonefrite pós-estreptocócica raramente deixa seqüelas. Porém, em pequena percentagem de pacientes, principalmente adultos, tem sido observada a presença de discretos sinais de acometimento renal 10 a 15 anos após o surto inicial. Insuficiência renal grave como seqüela tem sido descrita muito raramente.
Fig. 22.1 Glomerulonefrite pós-estreptocócica: Glomérulo volumoso, hipercelular, com infiltrado neutrofílico. (Microscopia ótica, aumento original 400⫻.)
pósitos granulares contínuos ao longo da membrana basal, acompanhado de poucos depósitos mesangiais. Este último aspecto parece estar relacionado com mau prognóstico.
Etiopatogenia Anatomia Patológica À microscopia ótica (MO), a lesão glomerular é difusa, com todos os glomérulos atingidos igualmente. Estes são grandes, hipercelulares e isquêmicos; a luz capilar apresenta-se estreitada e às vezes até completamente obstruída (Fig. 22.1). Existe aumento de celularidade, devido principalmente à infiltração de polimorfonucleares, nos casos onde a biópsia é realizada precocemente; porém, na maior parte das vezes, a hipercelularidade é mesângio-endotelial, devido à proliferação das células residentes e infiltração de células mononucleares, provavelmente monócitos circulantes. Além destes achados, nos casos onde existe oligúria intensa ou anúria, ou ainda importante queda da filtração glomerular, podem ser observados crescentes celulares e/ou necrose tubular aguda associada. À microscopia eletrônica (ME), observa-se expansão e hipercelularidade mesangiais. O achado mais característico é a presença de depósitos subepiteliais de tamanho variável chamados de corcovas (humps) (Fig. 22.2). Depósitos elétron-densos subendoteliais e mesangiais são vistos freqüentemente. Na microscopia de imunofluorescência (MIF) observam-se depósitos de IgG e/ou C3 em praticamente todos os casos. Depósitos de IgM e IgA são encontrados mais raramente. O padrão dos depósitos é variável. Nas biópsias realizadas mais precocemente, IgG e C3 localizam-se tanto ao longo das alças capilares como no mesângio (Fig. 22.3); em casos onde a biópsia é realizada mais tardiamente, observa-se que os depósitos se localizam no mesângio. Outro aspecto descrito é o de de-
O estudo da etiopatogenia da glomerulonefrite pós-estreptocócica tem-se baseado nas seguintes observações: 1) apenas algumas cepas dos estreptococos são nefritogênicas e 2) nem todos os indivíduos infectados por estas cepas desenvolvem a doença, e portanto podemos deduzir que,
Fig. 22.2 Grande depósito subepitelial em forma de corcova (hump) em paciente com glomerulonefrite pós-estreptocócica. (Microscopia eletrônica, aumento original 27.500⫻.)
407
capítulo 22
dieta hipossódica e de diuréticos de alça geralmente é suficiente. Raramente se faz necessário o uso de anti-hipertensivos, uma vez que normalmente a pressão arterial se normaliza com o uso das medidas acima. Quando o comprometimento da função renal é intenso, ou o paciente apresenta complicações de hipervolemia tais como edema agudo de pulmão e convulsões, a diálise deve ser indicada, desde que os diuréticos não tenham sido eficazes. O tratamento da estreptococcia deve ser feito quando ela ainda estiver presente. Como a incidência de recidiva é pequena e como um novo surto de glomerulonefrite não piora o prognóstico, o uso de tratamento profilático não está indicado.
Fig. 22.3 Deposição de complemento (C3) em alça capilar e em mesângio, em padrão granular, em paciente com glomerulonefrite pós-estreptocócica. (Microscopia de imunofluorescência, aumento original 400⫻.)
para o aparecimento desta nefrite, são necessários tanto a presença de cepa nefritogênica como de resposta imune específica do paciente. O tempo de latência entre a infecção e a doença, a associação com a infecção estreptocócica, a presença de imunocomplexos circulantes, de depósitos imunes no mesângio e na região subepitelial sugerem que a glomerulonefrite pósestreptocócica seja decorrente da interação de anticorpos antiestreptococos com antígenos deste germe. Apesar de intensa procura, o antígeno ou antígenos componentes do imunocomplexo ainda não foram identificados. Ainda não está estabelecido se a lesão renal é resultado de deposição de imunocomplexo circulante ou da ligação de antígenos estreptocócicos ao rim com subseqüente formação de imunocomplexo in situ. Alguns estudos que têm procurado confirmar a teoria auto-imune propõem a existência de reatividade cruzada entre anticorpos contra antígenos da cápsula do estreptococo, os quais se ligariam aos antígenos normalmente presentes nas estruturas glomerulares. Outra teoria recente sugere que uma IgG sofreria modificações, tornando-se imunogênica e desenvolvendo uma afinidade pelo glomérulo normal, onde se depositaria, servindo como um antígeno plantado. Seja qual for o mecanismo envolvido na formação dos depósitos glomerulares na glomerulonefrite pós-estreptocócica, a resposta inflamatória responsável pela instalação da lesão nefrítica é conseqüência da ativação do complemento, da liberação de fatores quimiotáticos e do recrutamento de neutrófilos.
Tratamento O tratamento é basicamente sintomático, visando diminuir a sobrecarga hidrossalina. Neste sentido, o uso de
Pontos-chave: Glomerulonefrite pós-estreptocócica • Início abrupto • Acomete geralmente crianças • Secundária a cepas nefritogênicas do estreptococo • Apresentação: Edema, hematúria e hipertensão arterial • Lesão glomerular homogeneamente difusa, com exsudação leucocitária e hipercelularidade, e presença de depósitos subepiteliais (humps) e mesangiais • Tratamento sintomático, não sendo indicada terapêutica profilática posteriormente
GLOMERULONEFRITE CRESCÊNTICA Sinonímia: Glomerulonefrite proliferativa extracapilar ou glomerulonefrite rapidamente progressiva. Dependendo do mecanismo etiopatogênico, a glomerulonefrite crescêntica (GNCresc) pode ser dividida em três tipos. No tipo I a lesão glomerular é mediada por anticorpo antimembrana basal; no tipo II, por deposição de imunocomplexo circulante; e no tipo III (“pauciimune”) a agressão é conseqüente a uma reação de hipersensibilidade celular. A apresentação clínica é semelhante nos três tipos. Geralmente o paciente apresenta quadro de instalação aguda, com edema e hematúria macro- ou microscópica. Hipertensão arterial quando presente é leve. Em alguns pacientes a presença de síndrome nefrótica é a única manifestação clínica. Sinais gerais como febre, dor muscular discreta e dor articular não são incomuns. Oligúria acentuada ou anúria, e aumento rápido da creatinina, são sinais que sugerem o diagnóstico de GNCresc.
408
Glomerulonefrites Primárias
Hematúria com cilindros hemáticos e proteinúria intensa são achados freqüentes. Apesar da possível ocorrência de proteinúria maciça, hipoalbuminemia e hipercolesterolemia são raras, provavelmente devido à curta duração da doença. A creatinina plasmática geralmente se apresenta elevada já na primeira consulta, podendo, no entanto, estar normal. A evolução da função renal depende do número e tamanho dos crescentes observados (v. Anatomia patológica). Pacientes com crescentes circulares em 80 a 100% dos glomérulos geralmente evoluem em poucas semanas ou meses para insuficiência renal terminal. Pacientes com lesões menos intensas podem levar alguns anos para necessitar de tratamento dialítico. Embora as manifestações renais sejam semelhantes nos três tipos, alguns dados podem ajudar no diagnóstico diferencial. No tipo I os pacientes são jovens, no tipo II ou III os pacientes são de meia idade ou mais velhos. Em relação ao sexo, na GNCresc tipo III existe predomínio do sexo masculino, enquanto nas outras duas não existe diferença. Na GNCresc tipo I alguns pacientes referem inalação de vapor de hidrocarbonetos, ou infecção inespecífica de vias aéreas superiores antecedendo o aparecimento da nefropatia, o que não acontece nos outros dois tipos. A presença de anticorpo circulante antimembrana basal glomerular sugere tipo I, diminuição de C3 e CH50 e imunocomplexos circulantes são mais freqüentes no tipo II, e anticorpos antiantígenos citoplasmáticos de neutrófilos (ANCA) ocorrem em aproximadamente 80% dos pacientes com GNCresc tipo III.
Anatomia Patológica A GNCresc caracteriza-se pela presença de várias camadas de células, que preenchem o espaço de Bowman assumindo forma de meia-lua (crescentes celulares) (Fig. 22.4). Nos casos onde a biópsia é realizada mais tardiamente, as células são progressivamente substituídas por tecido colágeno, o que dá ao crescente aspecto fibrocelular e finalmente fibroso. Experimentalmente tem sido demonstrado que a síntese de tecido colágeno tem início já nas primeiras 24 horas após a indução da nefropatia, o que explica a presença, em uma mesma biópsia, de crescentes com graus variáveis de fibrose. A presença de crescentes, embora característica, não é patognomônica. Crescentes têm sido descritos em praticamente todas as glomerulopatias. Dentre estas, além da GNCresc, as glomerulonefrites pós-estreptocócica, membranoproliferativa tipo II e por IgA são as que mais freqüentemente podem apresentá-los. O crescente é resultado da proliferação das células epiteliais da cápsula de Bowman e da infiltração de células circulantes como macrófagos e linfócitos T. Quando existe ruptura da cápsula de Bowman, existe predomínio das
Fig. 22.4 Crescente celular, em forma de semilua, em paciente portador de glomerulonefrite crescêntica. (Microscopia ótica, aumento original 400⫻.)
células infiltrantes (macrófagos, linfócitos T e fibroblastos) sobre as células epiteliais. Rupturas da membrana basal do glomérulo e da cápsula de Bowman e compressão do tufo capilar pelos crescentes são outras alterações encontradas à microscopia ótica. A presença de fenômenos exsudativos faz suspeitar do diagnóstico de glomerulonefrite pós-estreptocócica. Em casos mais avançados, podem-se encontrar glomérulos obsolescentes. Ao microscópio eletrônico, observam-se soluções de continuidade da membrana basal tanto do glomérulo como da cápsula de Bowman e deposição de fibrina no espaço de Bowman. No tipo II observa-se presença de depósitos elétron-densos mesangiais e no espaço subendotelial. Nas GNCresc tipos I e III os depósitos estão ausentes. A diferenciação entre os três tipos de GNCresc se faz, basicamente, através da microscopia de imunofluorescência. O aspecto típico da GNCresc tipo I é a deposição linear de IgG (raramente IgA) e complemento ao longo da membrana basal glomerular. Na GNCresc tipo II observase deposição de IgG e/ou IgM comumente associada a C3, em padrão granular ao longo da membrana basal glomerular e no mesângio. A imunofluorescência do tipo III é negativa ou apresenta apenas traços de imunoglobulinas e complemento. A presença de fibrina no espaço de Bowman é comum aos três tipos.
Etiopatogenia A formação dos crescentes pode ser mediada por três mecanismos diferentes: reação antígeno-anticorpo in situ (anticorpo antimembrana basal glomerular, GNCresc tipo I), deposição de imunocomplexos circulantes (GNCresc tipo II) e alterações da imunidade celular (GNCresc tipo III ou glomerulonefrite “pauciimune”).
409
capítulo 22
No tipo I foi demonstrada a presença de anticorpos contra antígenos da membrana basal glomerular. Estes anticorpos geralmente reagem também contra membrana basal alveolar. Como alguns casos apresentam associação com aspiração de vapores de hidrocarbonetos, tem sido proposto que a lesão pulmonar liberaria antígenos da membrana basal alveolar, que ao entrarem em contato com as células imunocompetentes dariam origem à produção de anticorpos que iriam se ligar à membrana basal glomerular provocando a glomerulonefrite. A membrana basal glomerular é recoberta por endotélio fenestrado, enquanto o endotélio pulmonar não apresenta essas fenestrações. Isto facilita o contato dos anticorpos circulantes com os antígenos presentes na membrana basal glomerular, o que explica por que a lesão renal ocorre na ausência de lesão pulmonar. A existência de lesão pulmonar associada à lesão glomerular caracteriza a síndrome de Goodpasture. No tipo II a presença de imunocomplexo no plasma e na membrana basal glomerular sugere que esta lesão seja mediada pela deposição de imunocomplexos circulantes, embora o(s) antígeno(s) não tenha(m) sido identificado(s). A ocorrência de anticorpos anticitoplasma de leucócitos (ANCA) e a imunofluorescência glomerular negativa, levou alguns autores a proporem que a GNCresc tipo III poderia ser na verdade uma arterite sistêmica (principalmente a granulomatose de Wegener), que por algum motivo desconhecido ficaria restrita ao rim. Apesar de os mecanismos de lesão da membrana basal glomerular serem diferentes nos três tipos, a patogênese dos crescentes não difere entre eles. Inicialmente ocorre ruptura da membrana basal glomerular, o que permite a passagem de fibrinogênio para o espaço de Bowman. O fibrinogênio aí localizado se polimeriza e dá origem à fibrina, e esta vai estimular a proliferação das células epiteliais da cápsula de Bowman e a infiltração de células sanguíneas (linfócito T, macrófagos e fibroblastos). Além disso, a fibrina serve como arcabouço para a formação do crescente. Posteriormente os fibroblastos presentes nos crescentes passam a sintetizar colágeno, o que vai transformar o crescente celular em crescente fibroso.
Tratamento O tratamento das glomerulonefrites crescênticas difere de grupo para grupo, porém nos três grupos o tempo que se demora em instituir o tratamento é fator primordial na resposta terapêutica, o que torna o diagnóstico da GNCresc um procedimento de urgência. Nos pacientes com GNCresc tipo I o uso de plasmaférese associado a drogas citotóxicas (ciclofosfamida ou azatioprina) e corticóide tem dado bons resultados, desde que instituído precocemente. No tipo II vários esquemas terapêuticos têm sido propostos, sendo que o uso de três a quatro pulsos de metilprednisolona (1 g intravenosa, du-
rante três ou quatro dias consecutivos), seguido de prednisona oral, parece apresentar resultados efetivos, porém o número de trabalhos controlados é muito pequeno. O uso de imunossupressão mais intensa não parece associar-se com melhora de função renal, mas aumenta em muito a morbidade. Na GNCresc tipo III tanto o pulso de metilprednisolona como a ciclofosfamida por via oral têm sido propostos. A tendência atual é de se usar ciclofosfamida, porém a via a ser utilizada ainda é discutível.
Glomerulonefrite Crescêntica e Transplante A recorrência de glomerulonefrite antimembrana basal glomerular (tipo I) em rins transplantados é de aproximadamente 2%, sendo na maioria dos casos apenas histológica, e a perda do enxerto secundária a esta glomerulopatia é rara. Quanto às GNCresc tipos II e III, existem poucos dados na literatura, porém a recorrência parece ser rara. Pacientes portadores de síndrome de Alport, quando transplantados, podem raramente desenvolver GNCresc tipo I no enxerto. Estes indivíduos apresentam deficiência da cadeia ␣3 do colágeno tipo IV, o antígeno contra o qual os anticorpos antimembrana basal glomerular responsáveis pelo desencadeamento da GNCresc tipo I são dirigidos. Quando estes pacientes entram em contato com esta substância, presente no enxerto, reconhecem-na como nãoprópria e produzem anticorpos, desenvolvendo assim a glomerulonefrite crescêntica tipo I de novo.
Pontos-chave: • Instalação aguda • Idade: Tipo I, jovens; II e III, meia idade • Sexo: Tipo III, predominância no sexo masculino • Clínica: Edema, hematúria e sinais gerais inespecíficos • Dados laboratoriais: Aumento rápido da creatinina plasmática, hematúria e proteinúria • MO: Presença de crescentes celulares no espaço de Bowman • MIF: Padrão linear (tipo I); padrão granular (tipo II) ou ausência de depósitos fluorescentes (tipo III) • Tratamento: Tipo I, plasmaférese, corticóide e drogas citotóxicas; Tipo II, pulso de metilprednisolona seguido de prednisona oral; Tipo III, pulso de ciclofosfamida
410
Glomerulonefrites Primárias
NEFROPATIA POR IgA Sinonímia: Nefropatia de Berger A nefropatia de Berger apresenta incidência variável através do mundo, sendo a nefropatia mais comum na Ásia e Europa. Nos Estados Unidos ela apresenta menor prevalência. Se essa diferença reflete apenas diferenças quanto à indicação de biópsia ou é real, não está ainda estabelecido. Ela ocorre em qualquer faixa etária, sendo incomum em pacientes com idade inferior a 10 anos e superior a 50 anos; a idade média gira em torno dos 20 a 30 anos. Existe predomínio do sexo masculino de aproximadamente 3:1. É incomum na raça negra. A apresentação clínica mais comum é a de surtos de hematúria macroscópica, ou microscópica associada a infecções inespecíficas de vias aéreas superiores ou ao exercício físico. Freqüentemente o paciente apresenta quadro de malestar generalizado, com dores musculares discretas, acompanhado de disúria. Mais raramente, pode apresentar síndrome nefrótica. Hipertensão arterial ocorre em torno de 10% dos casos. A função renal, quando avaliada pela creatinina plasmática, apresenta-se normal. Laboratorialmente observam-se hematúria, caracterizada por hemácias dismórficas e/ou cilindros hemáticos, e proteinúria em torno de 1 a 2 g nas 24 horas. Elevação da IgA plasmática ocorre em 50% dos casos. Biópsia de pele do antebraço revela que 25 a 50% dos pacientes apresentam deposição de IgA, C3 e fibrina nos capilares da derme. No seguimento observam-se surtos de hematúria macroscópica e nos períodos entre surtos é comum o paciente apresentar proteinúria discreta e hematúria microscópica. Insuficiência renal aguda transitória, associada a hematúria macroscópica, tem sido descrita raramente. O comprometimento da função renal nestes pacientes é muito variável. Na maior parte a função renal se mantém normal. Outros podem apresentar queda lenta e progressiva da filtração glomerular. Após 20 anos de seguimento observa-se que entre 20 e 30% dos casos desenvolvem insuficiência renal crônica. Pacientes com surtos de hematúria macroscópica costumam apresentar função renal estável, enquanto aqueles com síndrome nefrótica persistente, ou glomérulos esclerosados vistos à biópsia renal, evoluem mais freqüentemente para insuficiência renal.
tes celulares podem ser observados. Alguns pacientes apresentam glomérulos normais. A análise ao microscópio eletrônico revela a existência de depósitos elétron-densos principalmente no mesângio e região paramesangial. Depósitos subendoteliais também podem ser encontrados. Nos casos onde a biópsia foi realizada após surto de hematúria macroscópica, é possível encontrar depósitos subepiteliais com aspecto semelhante a corcovas (humps), iguais aos observados na glomerulonefrite pós-estreptocócica. Por definição, encontra-se na microscopia de fluorescência deposição mesangial de IgA, de padrão granular, que é sempre a imunoglobulina predominante (Fig. 22.5). Esta pode estar isolada ou, mais freqüentemente, associada com depósitos de IgG e C3. IgM, C1q e C4 raramente são encontradas.
Etiopatogenia Pacientes portadores de nefropatia por IgA apresentam aumento dos níveis séricos desta imunoglobulina, que poderia ser conseqüente quer do aumento de sua síntese por linfócitos presentes nas mucosas ou circulantes, quer pela diminuição de sua depuração hepática e/ou esplênica. Outra alteração freqüentemente descrita é a presença de imunocomplexos circulantes. A hipótese mais aceita atualmente é a de que esta nefropatia é decorrente da deposição renal dos imunocomplexos circulantes. A demonstração de que animais imunizados por via oral, com diferentes antígenos, desenvolvem deposição mesangial de IgA, e a presença de antígenos dietéticos nos imunocomplexos circulantes, levanta a possibilidade de que os antígenos poderiam ser originários da dieta. Outras possíveis fontes de antígenos sugeridas têm sido as infecções virais, como por exemplo a infecção por citomegalovírus. Outro mecanismo aventado é que esta nefropatia dependa da deposição mesangial de agregados de IgA, sem in-
Anatomia Patológica O aspecto à microscopia ótica é bastante variável. O mais comumente descrito é o de proliferação de células mesangiais com expansão da matriz. Estas alterações tanto podem ser difusas como focais. Algumas vezes observa-se acentuação focal e segmentar da proliferação celular. Em casos mais avançados, pode-se observar a presença de esclerose glomerular focal e segmentar. Raramente crescen-
Fig. 22.5 Deposição de mesangial de IgA, em padrão granular, em paciente portador de nefropatia por IgA. (Microscopia de imunofluorescência, aumento original 400⫻.)
411
capítulo 22
teração com antígenos. Esta hipótese é reforçada pela demonstração de que agregados de IgA são capazes de fixar complemento, o que explicaria a presença de C3 no tecido renal. No entanto, não explicaria a deposição de outras imunoglobulinas que são normalmente encontradas. Frente à sua semelhança histológica com a nefropatia observada na púrpura de Henoch-Schönlein, vários autores têm proposto que ambas seriam a mesma doença. Na visão destes, a púrpura de Henoch-Schönlein poderia manifestar-se clinicamente de diferentes modos, sendo um deles apenas com lesão renal, o que corresponderia à nefropatia por IgA.
manifesta-se com hematúria macro- ou microscópica, sendo que a presença de síndrome nefrótica é rara. O diagnóstico é feito geralmente no primeiro ano pós-transplante, e perda do enxerto devido à recorrência ocorre em menos de 10% dos casos.
Tratamento
Sinonímia: Glomerulonefrite hipocomplementêmica, glomerulonefrite lobular, glomerulonefrite mesangial crônica, glomerulonefrite parietoproliferativa, glomerulonefrite mesangiocapilar. Termos mais utilizados: GNMP ou glomerulonefrite mesângiocapilar.
Na maior parte das vezes o tratamento é apenas sintomático. Vários esquemas com drogas citotóxicas ou corticosteróides têm sido utilizados sem resultados positivos. O uso de fenitoína foi capaz de diminuir o nível sérico da IgA, porém não alterou a história natural da nefropatia. Em pacientes que apresentam proteinúria maciça, com o rim normal à microscopia ótica, o uso de corticosteróides tem-se associado com remissão da síndrome nefrótica. O uso de dietas com pequena quantidade de antígenos é outro enfoque terapêutico que vem sendo tentado. Em pacientes com rápido declínio de função renal, o uso de altas doses de IgG humana tem sido proposto. Mais recentemente tem-se preconizada a utilização de óleo de peixe, rico em ácidos graxos ômega-3 eicosapentaenóico e decosaexaenóico, no tratamento desta nefropatia associada a déficit de função renal e/ou síndrome nefrótica, com resultados promissores mas ainda não conclusivos.
Nefropatia por IgA e Transplante A recorrência da nefropatia por IgA em rins transplantados varia nas diversas séries entre 25 e 50% dos casos. A apresentação clínica da recidiva, na maioria das vezes,
Pontos-chave: Nefropatia por IgA • Maior prevalência na Ásia e Europa • Acomete pacientes jovens, geralmente do sexo masculino • Secundária à deposição renal de imunocomplexos circulantes • Apresentação: Surtos de hematúria macroou microscópica associados a infecções virais do trato respiratório ou a exercício físico • MO: Variável, com deposição predominante de IgA em mesângio à imunoflorescência • Tratamento: Óleo de peixe (?), corticóide (?)
GLOMERULONEFRITE MEMBRANOPROLIFERATIVA (GNMP)
A glomerulonefrite membranoproliferativa é predominantemente doença de indivíduos jovens, podendo ocorrer, no entanto, em qualquer faixa etária, sendo que em torno de 70% dos pacientes apresentam idade inferior a 30 anos com discreta predominância do sexo feminino (52 a 58%). A presença de infecções de vias aéreas superiores antecedendo o aparecimento da GNMP, segundo relatos, varia em torno de 40%. Síndrome nefrótica na primeira consulta ocorre entre 40 e 70% dos pacientes; em torno de 20% apresentam síndrome nefrítica aguda; hematúria e proteinúria assintomática é outro modo de essa nefropatia apresentar-se, com freqüência variando entre 15 e 30% dos casos. Entre 5 e 10% dos pacientes procuram atendimento médico devido a hematúria macroscópica recorrente. A síndrome nefrítica aguda ocorre com maior freqüência em indivíduos mais jovens. A freqüência de hipertensão arterial, conforme alguns estudos, varia entre 40 e 75%, porém os diferentes autores têm definido hipertensão arterial como pressão arterial diastólica superior a 95 ou 100 mm Hg. Como a hipertensão arterial presente nesta nefropatia geralmente é leve, a sua freqüência provavelmente está subestimada. Quando se define hipertensão arterial como pressão arterial diastólica maior que 90 mm Hg como o preconizado, observase que 95% dos pacientes são hipertensos. Diminuição da filtração glomerular na primeira consulta ocorre entre 40 e 60% dos casos, sendo que entre 10 e 25% apresentam depuração da creatinina endógena inferior a 40 ml/min ou creatinina sérica superior a 5 mg/dl. Pacientes com insuficiência renal grave na primeira consulta devem ser estudados no sentido de excluir outras causas, que não a lesão glomerular, como responsável pela queda da filtração glomerular, como por exemplo necrose tubular aguda associada. Insuficiência renal na primeira consulta ocorre mais freqüentemente em pacientes com idade superior a 15 anos,
412
Glomerulonefrites Primárias
associa-se a hipertensão arterial e não tem relação com a presença de síndrome nefrótica ou com o tipo da GNMP. Correlaciona-se com as alterações do interstício e não com as glomerulares. Uma das características mais importantes dessa lesão é a hipocomplementemia, principalmente devido à queda de C3. A freqüência com que ocorre esta hipocomplementemia é variável de acordo com o tipo histológico. Quando se analisa a GNMP como um todo se observa queda do C3 sérico em torno de 40 a 60% dos casos. Na GNMP tipo II, hipocomplementemia ocorre em torno de 70 a 90% dos pacientes. Este achado é importante para o diagnóstico, porque as outras patologias que cursam com síndrome nefrótica geralmente apresentam nível sérico de C3 normal. A história natural dessa doença é variável, porém a maior parte dos pacientes apresenta queda progressiva da função renal. Remissão completa da síndrome nefrótica ocorre, segundo relatos, entre 2 e 10% dos casos, e remissão parcial e transitória, em torno de um terço dos pacientes. A sobrevida renal cinco anos após o diagnóstico tem variado entre 51 e 75% e em 10 anos, entre 36 e 65%. Em crianças, McEnery observou sobrevida renal de 80% após 10 anos de seguimento. Este melhor prognóstico para crianças, no entanto, não tem sido observado por outros autores. As principais alterações que, quando presentes na primeira consulta, indicam mau prognóstico são: insuficiência renal, hipertensão arterial, síndrome nefrótica, presença de crescentes e de lesão túbulo-intersticial. Recentemente, foi relatado que pacientes com síndrome nefrótica apresentam pior prognóstico apenas nos primeiros anos de seguimento, porém, após um seguimento médio de 12 anos, o prognóstico é semelhante, quer o indivíduo apresente ou não síndrome nefrótica. A atividade da doença, assim como a evolução do paciente para insuficiência renal, não é influenciada pela presença de hipocomplementemia ou pelo tipo da GNMP.
Fig. 22.6 Acentuação da lobulação glomerular, aumento de celularidade e espessamento de membrana basal glomerular em paciente com glomerulonefrite membranoproliferativa. (Microscopia ótica, aumento original 400⫻.)
Quando os glomérulos são corados por sais de prata, observa-se que a membrana basal glomerular apresentase como duas linhas pretas, separadas por zona clara, o que dá aspecto de duplicação (Fig. 22.7), que é geralmente focal e, freqüentemente, envolve apenas segmentos das alças capilares. Esta duplicação é decorrente da presença de depósitos imunes subendoteliais, que afastam o endotélio da membrana basal capilar; o endotélio neoforma uma outra membrana basal, assim como o mesângio se interpõe neste espaço para fagocitar os depósitos. Crescentes pequenos podem ser vistos com certa freqüência; crescentes circunferenciais podem estar presentes em torno de 10 a 20% dos casos.
Anatomia Patológica De acordo com o achado anatomopatológico, a GNMP pode ser classificada em GNMP tipos I, II ou III; o tipo III tem sido considerado, por alguns autores, como variante do tipo I. À microscopia ótica, a GNMP tipo I caracteriza-se pela presença de hipercelularidade glomerular, expansão da matriz mesangial e duplicação da membrana basal glomerular. A hipercelularidade é devida principalmente à proliferação mesângio-endotelial, porém, em alguns casos, pode ser encontrada também infiltração glomerular de polimorfonucleares. Quando a proliferação celular e a expansão da matriz mesangial são muito intensas, ocorre acentuação do caráter lobular dos glomérulos, que assumem o aspecto da assim chamada glomerulonefrite lobular (Fig. 22.6).
Fig. 22.7 Focos de duplicação da membrana basal glomerular em paciente portador de glomerulonefrite membranoproliferativa tipo I. (Microscopia ótica, impregnação pela prata, aumento original 400⫻.)
capítulo 22
Ao microscópio eletrônico, observa-se que a imagem de duplicação da membrana basal glomerular é decorrente da existência de membrana basal glomerular normal e de uma nova membrana basal formada imediatamente abaixo das células endoteliais. Entre essas duas membranas existem prolongamentos da célula mesangial, citoplasma da célula endotelial e depósitos elétron-densos. Estes geralmente são pequenos ou intermediários e se localizam no espaço subendotelial; pequenos depósitos mesangiais podem também ser vistos, principalmente na fase inicial da doença (Fig. 22.8). Outras alterações observadas são a presença de expansão da matriz mesangial e aumento da celularidade, principalmente à custa de células mesangiais. Além dessas alterações, alguns pacientes apresentam depósitos subepiteliais e espículas da membrana basal. Estas alterações são vistas na GNMP tipo III. Em alguns pacientes com GNMP tipo I observam-se também ruptura e replicação da lâmina densa e presença de grandes depósitos ocupando toda a membrana basal. À imunofluorescência observa-se deposição de imunoglobulinas, principalmente IgG e IgM. Deposição de C3 se encontra praticamente em 100% dos casos, C1q e C4 são encontrados menos freqüentemente. Estes depósitos localizam-se na membrana basal glomerular e no mesângio (Fig. 22.9). As lesões observadas ao microscópio ótico, na GNMP tipo II, são muito semelhantes às observadas no tipo I, porém a duplicação da membrana basal glomerular é mais rara, e crescentes circunferenciais podem ser observados mais freqüentemente. O aspecto da microscopia eletrônica característica desta lesão é a deposição linear, na lâmina densa, de uma substância com elétron-densidade várias vezes maior que os componentes normais da membra-
Fig. 22.8 Interposição de célula mesangial (M), duplicação de membrana basal e depósitos subendoteliais (seta) em paciente portador de glomerulonefrite membranoproliferativa tipo I. (Microscopia eletrônica, aumento original 8.000⫻.)
413
Fig. 22.9 Deposição granular de IgG ao longo da membrana basal glomerular e na região mesangial em paciente portador de glomerulonefrite membranoproliferativa. (Microscopia de imunofluorescência, aumento original 400⫻.)
na basal glomerular (Fig. 22.10). Algumas vezes, a maior parte da lâmina densa pode estar envolvida, outras vezes existe alternância de segmentos normais com segmentos alterados. Devido a tais depósitos na membrana basal glomerular, este tipo de GNMP é também denominado de Doença dos Depósitos Densos (DDD). Depósitos idênticos têm sido vistos tanto na cápsula de Bowman como na membrana basal tubular. Além dos depósitos, expansão da matriz mesangial e hipercelularidade também estão presentes. Deposição de complemento ocorre em praticamente 100% dos casos e de imunoglobulinas ocorre menos freqüentemente, tanto na membrana basal glomerular como
Fig. 22.10 Deposição linear de material elétron-denso ao longo da membrana basal glomerular em paciente portador de glomerulonefrite membranoproliferativa tipo II. (Microscopia eletrônica, aumento original 10.000⫻.)
414
Glomerulonefrites Primárias
no mesângio. Na membrana basal, os depósitos têm aspecto variável, como granular, linear, pseudolinear, rugoso e nodular. No mesângio, ocorre deposição sob a forma de grânulos esparsos que podem ou não ser confluentes. Dentre os vários componentes do sistema complemento, depósitos de C3 ocorrem em praticamente 100% dos casos, o mesmo acontecendo com a properdina; os componentes iniciais do sistema complemento (C1q e C4) raramente estão presentes.
Etiopatogenia A patogenia da GNMP ainda é obscura, principalmente a da GNMP tipo II. A presença de depósitos de imunoglobulinas e complemento no espaço subendotelial e no mesângio, as alterações do sistema complemento e o relato de que pacientes portadores de infecções crônicas, neoplasias e colagenoses apresentam lesão histológica semelhante são observações que sugerem que a GNMP tipo I poderia ser mediada pelo sistema imune, provavelmente pela deposição renal de imunocomplexos circulantes. Esta hipótese é reforçada pela demonstração de que coelhos tratados com inoculações repetidas de ovoalbumina podem desenvolver este tipo de nefrite. No entanto, na GNMP tipo II a participação do sistema imune na sua gênese é bastante controvertida. Os depósitos observados neste tipo têm aspecto peculiar, não sendo observado em outras glomerulopatias humanas aceitas como mediadas pelo sistema imune. Experimentalmente não se conseguiu até hoje reproduzir este tipo de depósitos com várias manipulações do sistema imune. Diferentes estudos têm demonstrado que os depósitos elétron-densos não são componentes normais da membrana basal glomerular nem imunoglobulinas, não são complemento e não apresentam tecido colágeno na sua estrutura. Alguns autores têm proposto que esses depósitos seriam conseqüência de alterações bioquímicas da membrana basal. Se os depósitos não são típicos de imunocomplexos, e portanto argumentam contra a participação do sistema imune na gênese da GNMP tipo II, a deposição de imunoglobulinas e complemento no parênquima renal e as alterações do complemento sugerem a participação deste sistema. Uma possibilidade é que os depósitos densos seriam imunocomplexos modificados por alguma resposta do hospedeiro. Uma das características da GNMP é a presença de hipocomplementemia, que pode ser contínua ou alternar com períodos de normocomplementemia. Nos pacientes com GNMP tipo II, a hipocomplementemia é mais freqüente e é conseqüência principalmente da ativação da via alternativa. Pacientes portadores de GNMP tipo II apresentam autoanticorpos circulantes (fator nefrítico-C3) que são capazes de ativar a via alternativa do sistema complemento. A importância destas alterações na gênese e evolução da nefropatia não está ainda definida. As observações de
que não existe relação entre a hipocomplementemia e a atividade ou prognóstico da nefropatia, que a nefrectomia bilateral não altera os níveis séricos dos componentes do sistema complemento e que alguns pacientes apresentam fator nefrítico-C3 e hipocomplementemia sem apresentar nefropatia sugerem não existir relação direta entre as alterações do sistema complemento e a GNMP. Além disso, tem sido demonstrado experimentalmente que a ativação crônica do sistema complemento não promove nefropatia. O sistema complemento participa da defesa do organismo contra infecções e também é importante na solubilização e clareamento de imunocomplexos circulantes. Assim sendo, outra possibilidade é que pacientes hipocomplementêmicos apresentem maior freqüência de infecções ou maior dificuldade de clareamento de imunocomplexos, ou ambos, o que facilitaria a deposição de imunocomplexos nos glomérulos, dando origem à GNMP. A descrição de que pacientes ou carneiros deficientes em componentes do sistema complemento apresentam maior freqüência de GNMP reforça esta hipótese.
Tratamento Vários têm sido os esquemas propostos para o tratamento da GNMP, porém a maior parte dos estudos têm sido retrospectivos, sem grupo controle, o que torna difícil a análise dos resultados. Estudos não controlados analisando a ação dos corticosteróides têm apresentado resultados contraditórios. Em estudo controlado em que se avaliou a ação da corticoterapia sobre a história natural da GNMP tipo I, não se observaram diferenças entre o grupo que recebeu placebo e o grupo tratado. Inicialmente, foi proposto que o uso da associação heparina, corticosteróides, ciclofosfamida e dipiridamol diminuía a progressão para insuficiência renal; porém, posteriormente foi demonstrado em estudo controlado que esse esquema terapêutico, além de não alterar a evolução natural, ainda apresentou grande número de efeitos colaterais, obrigando a suspensão do tratamento. Estudo prospectivo controlado demonstrou que o uso de dipiridamol associado ao uso de aspirina, em pacientes adultos com síndrome nefrótica e déficit da função renal, levaram à redução dos níveis de proteinúria, porém, o trabalho teve duração muito curta, impedindo a avaliação da terapêutica frente à função renal.
Glomerulonefrite Membranoproliferativa e Transplante Renal A prevalência de recidiva na GNMP varia de 20 a 30% no tipo I e de 70% a 100% dos casos no tipo II, dependendo da política de biópsia de cada serviço.
415
capítulo 22
O diagnóstico de recorrência é feito em média 10 a 30 meses após o transplante na GNMP tipo I, e na GNMP tipo II é imediato, do ponto de vista histológico, ocorrendo síndrome nefrótica em 1/3 dos casos. A concentração do nível sérico de complemento não parece predizer a recorrência; já a rápida evolução para insuficiência renal e a presença de extensos crescentes nos rins primitivos têm-se associado à maior freqüência de recorrência.
Pontos-chave: Glomerulonefrite membranoproliferativa • Acomete pacientes jovens • GNMP tipos I e III secundária à deposição renal de imunocomplexos circulantes; tipo II (?) • Apresentação: Proteinúria e hipertensão arterial • Dados laboratoriais: Queda de C3, hematúria microscópica e queda da filtração • MO: Hipercelularidade, expansão da matriz mesangial e duplicação da MBG A perda do enxerto devido à recidiva varia de 10 a 40% na GNMP tipo I e de 10 a 20% na tipo II, ocorrendo principalmente nos pacientes com síndrome nefrótica.
GLOMERULONEFRITE POR LESÕES MÍNIMAS Sinonímia: Nefrose lipoídica ou doença dos processos podálicos. A glomerulonefrite por lesões mínimas é a causa mais comum de síndrome nefrótica em crianças (80 a 95%) e, em adultos, responde por aproximadamente 25% das nefropatias primárias que cursam com síndrome nefrótica. Ocorre principalmente na faixa etária entre 1 e 6 anos, tendo porém sido descrita em todas as idades. Em torno de 70% das crianças acometidas são do sexo masculino. A apresentação clínica clássica é a de síndrome nefrótica sem hipertensão arterial ou hematúria, com função renal conservada, podendo ser precedida por infecção inespecífica de vias aéreas ou por infecção viral. Hipertensão arterial diastólica pode estar presente em torno de 10% das crianças e 30% dos adultos; a freqüência de hematúria microscópica oscila em torno de 30%. A existência de hematúria macroscópica praticamente exclui o diagnóstico de lesões mínimas. Geralmente a proteinúria é maciça e à custa de albumina (proteinúria seletiva), acompanhada por reduzido nível sérico de albumina e hiperlipidemia. Na primeira consulta, tem sido relatado que ocorre
elevação discreta da creatinina, em torno de 25 a 30% dos casos. Na evolução desta nefropatia tem sido descrito raramente o aparecimento de surtos de insuficiência renal aguda, que usualmente revertem apenas com uso de diurético. O mecanismo dessa insuficiência não é claro, porém tem sido proposto que ela seria conseqüência da obstrução intratubular por cilindros protéicos ou devido à presença de edema intrarenal. Remissão espontânea da síndrome nefrótica tem sido descrita, porém usualmente a remissão é obtida com uso de corticosteróides ou drogas citotóxicas (v. Tratamento). Em torno de 30% dos pacientes apresentam recidiva da síndrome nefrótica, que pode ser desencadeada por infecção viral, principalmente parotidite epidêmica.
Anatomia Patológica À microscopia ótica, observa-se que os glomérulos são praticamente normais, podendo, no entanto, apresentar discreta hipercelularidade mesangial e hipertrofia dos podócitos. Presença de gotículas de lipídios nas células dos túbulos proximais é um achado freqüente. À microscopia eletrônica observa-se apenas retração dos prolongamentos dos podócitos, não se detectando depósitos elétron-densos. À microscopia de fluorescência, não se encontram depósitos de imunoglobulinas e/ou complemento. As alterações descritas acima são encontradas em qualquer situação onde exista proteinúria intensa, não sendo em absoluto critério diagnóstico para essa patologia. O diagnóstico anatomopatológico é feito pela ausência de outras lesões glomerulares, sendo, portanto, um diagnóstico de exclusão.
Etiopatogenia O desaparecimento da proteinúria associada ao uso de corticosteróide, a associação de recidiva com infecções virais e as alterações dos linfócitos circulantes encontradas em pacientes portadores de glomerulonefrite por lesões mínimas sugerem que esta nefropatia seja decorrente de alterações do sistema imune, principalmente da imunidade celular. Como a proteinúria nessa lesão é decorrente somente da perda de carga elétrica da membrana basal, tem sido proposto que estes pacientes, frente a um estímulo ainda não determinado, poderiam produzir linfocinas com cargas positivas, que se ligariam às cargas negativas da membrana basal glomerular, neutralizando-as e dando origem a proteinúria. Essa hipótese, apesar de atraente, não foi ainda confirmada.
Tratamento A resposta terapêutica ao corticosteróide é característica da glomerulonefrite por lesões mínimas, ocorrendo remis-
416
Glomerulonefrites Primárias
são completa da síndrome nefrótica em aproximadamente 80% dos pacientes e parcial em torno de 10%. Recidiva da glomerulopatia ocorre freqüentemente (40 a 50% das vezes). O esquema terapêutico clássico é o de prednisona na dose de 1 a 2 mg/kg/dia durante oito semanas com retirada progressiva. Quando durante a redução da medicação se observa recorrência da síndrome nefrótica, deve-se aumentar a posologia para a dose mínima com a qual o paciente se mantém livre de proteinúria, com posterior diminuição da droga. Recorrências esporádicas devem ser tratadas do mesmo modo.
Pontos-chave: Glomerulonefrite de lesões mínimas • Acomete principalmente crianças préescolares do sexo masculino • Apresentação: Síndrome nefrótica • Dados laboratoriais: Albuminúria, hipoalbuminemia e hiperlipidemia • MO: Normal; MIF: Negativa; ME: Retração dos prolongamentos dos podócitos • Tratamento: 1.ª escolha — corticoterapia Quando o paciente não responde ao uso de corticosteróides ou quando as recidivas são muito freqüentes, a associação de ciclofosfamida na dose de 2 a 3 mg/kg/dia aos corticosteróides costuma induzir remissões nos pacientes resistentes ou diminuir a freqüência de recidiva. Ciclosporina na dose inicial de 4 a 5 mg/kg/dia pode ser tentada quando houver falhas nas terapêuticas anteriores.
ciência renal na primeira consulta ocorre raramente. Hipertensão arterial é mais freqüente em pacientes adultos, principalmente naqueles com queda de filtração glomerular. Hematúria microscópica ocorre em torno de 30 a 40% dos pacientes. Glicosúria, aminoacidúria, refletindo lesão tubular, podem ser vistas mais freqüentemente do que em outros quadros de síndrome nefrótica. A maioria dos pacientes apresenta queda progressiva de filtração glomerular e persistência da síndrome nefrótica. Remissão espontânea da síndrome nefrótica ocorre entre 10 e 20%. Pacientes que na primeira consulta apresentam proteinúria discreta, via de regra, evoluem para a síndrome nefrótica. A mortalidade renal em cinco anos oscila em torno de 30% e em dez anos, em torno de 60%. Quando a síndrome nefrótica remite ou nunca esteve presente, observa-se melhor sobrevida renal (90% em 10 anos) do que quando a síndrome nefrótica é persistente (45% em 10 anos). Em pacientes com proteinúria muito intensa (⬎ 10 g) tem sido descrito um curso rapidamente progressivo com evolução para insuficiência renal em meses ou 1 a 2 anos.
Anatomia Patológica A maior parte dos glomérulos apresenta-se histologicamente normal ou com discreta hipercelularidade mesangial. A doença é focal e segmentar porque somente alguns glomérulos estão alterados (focal), com lesões apenas localizadas (segmentar). Assim, em alguns glomérulos, observa-se de maneira segmentar aumento da matriz mesangial, com colapso de alça capilar (Fig. 22.11). Estas lesões segmentares são mais comumente observadas junto ao pólo vascular dos glomérulos. Em casos mais avançados pode-se observar presença de glomérulos totalmente hialinizados. Acredita-se que os
GLOMERULOSCLEROSE FOCAL E SEGMENTAR A glomerulosclerose focal e segmentar é responsável por aproximadamente 10 a 15% das síndromes nefróticas que ocorrem em crianças e em torno de 15 a 20% dos pacientes adultos. Quando se analisa apenas a população pediátrica, observa-se que a grande maioria dos casos ocorre em pacientes com idade inferior a cinco anos, enquanto na população adulta a maior parte dos pacientes apresenta síndrome nefrótica antes dos 40 anos de idade. Casos de pacientes com idade mais avançada (60-70 anos) também têm sido descritos. A maior parte dos trabalhos descreve discreta predominância do sexo masculino e da cor negra. A apresentação clínica mais comum é a de síndrome nefrótica, porém, em torno de 30% dos pacientes se apresentam com hematúria e proteinúria assintomática. Hematúria macroscópica pode ocorrer principalmente nos casos onde existe proliferação mesangial mais intensa. A insufi-
Fig. 22.11 Colapso segmentar de alças capilares com expansão de matriz e sinéquia com a cápsula de Bowman em paciente portador de glomerulosclerose focal e segmentar. (Microscopia ótica; tricômico de Masson; aumento original 400⫻.)
417
capítulo 22
glomérulos justamedulares são os mais precocemente atingidos. Lesões túbulo-intersticiais como dilatação e atrofia tubular e fibrose intersticial, usualmente desproporcionais à lesão glomerular, podem ser encontradas. A microscopia eletrônica dos glomérulos normais demonstra podócitos volumosos e degenerados, com retração dos processos podálicos, e usualmente com grandes vacúolos intracitoplasmáticos. Podócitos desgarrados da membrana basal glomerular são vistos freqüentemente, o que leva ao colapso das alças capilares glomerulares. A membrana basal apresenta aspecto normal. Nos glomérulos lesados, observa-se aumento de matriz mesangial e colapso capilar. Células xantomatosas na matriz mesangial também podem ser vistas. Os glomérulos normais usualmente são negativos à imunofluorescência, mas ocasionalmente apresentam pequena deposição de IgM e C3. Nas áreas onde existem lesões segmentares, observa-se deposição de IgM, C1q e C3, que apresentam aspecto nodular; estes depósitos são interpretados como aprisionamento (trapping) de imunorreagentes em áreas cicatriciais. Como lesões do tipo esclerose glomerular podem ser conseqüência da evolução de praticamente todas as glomerulopatias, o achado de glomerulosclerose focal e segmentar por si só não é suficiente para firmar o diagnóstico.
Etiopatogenia A deposição de imunoglobulinas e complemento tem sido interpretada como inespecífica porque ocorre apenas em áreas esclerosadas onde sabidamente existe deposição de macromoléculas de maneira inespecífica, portanto, atualmente não se acredita que esta nefropatia seja mediada pelo sistema imune. A rápida recorrência desta nefropatia em rins transplantados sugere que deva haver algum fator circulante responsável pela gênese desta lesão. Em modelos experimentais que mimetizam essa nefropatia, tem sido observado que as lesões túbulo-intersticiais são bastante intensas e antecedem a lesão glomerular, o que tem levantado a suspeita de que as lesões glomerulares poderiam ser secundárias às lesões túbulo-intersticiais. Outros fatores etiológicos, como hiperplasia da célula epitelial, hiperfluxo glomerular, lesão endotelial do capilar glomerular com conseqüente adesão plaquetária e formação de microtrombos, têm sido sugeridos como possíveis fatores etiológicos.
de 20 a 30%. Outros 20 a 40% apresentam diminuição da proteinúria, sem entretanto ocorrer desaparecimento da síndrome nefrótica. Os resultados obtidos com drogas citotóxicas (ciclofosfamida, clorambucil) não são conclusivos e foram preconizados para os pacientes aos quais contra-indicamse doses altas de corticóides, ou aqueles corticodependentes ou com recidivas freqüentes. Recentemente tem sido demonstrado que a ciclosporina é capaz de induzir remissão da síndrome nefrótica, porém, geralmente ocorre recidiva após a suspensão da droga, sendo que ela está contra-indicada em casos de insuficiência renal, hipertensão arterial grave e de lesão tubulointersticial na biópsia.
Glomerulosclerose Focal e Segmentar e Transplante A recorrência da glomerulosclerose focal e segmentar é de 20 a 40%. A recidiva na grande maioria dos casos ocorre no primeiro mês pós-transplante, com apresentação clínica de síndrome nefrótica. Os fatores de risco para a recorrência são idade inferior a 15 anos, rápida evolução (menor que três anos) para insuficiência renal crônica terminal e presença de proliferação mesangial nos rins primitivos. A freqüência de perda do enxerto devido à recidiva varia na literatura de 10 a 50%, sendo que uma vez perdido o primeiro enxerto por recorrência a freqüência de recorrência, em um segundo transplante é de 80%.
Pontos-chave: Glomerulosclerose segmentar e focal • Acomete pacientes jovens, com maior prevalência do sexo masculino e da cor negra • Apresentação: Edema e hipertensão • Dados laboratoriais: Proteinúria e hematúria microscópica • MO: Lesões esclerosantes segmentares e focais; MIF: Ausência de depósitos imunes; ME: Lesões degenerativas dos podócitos • Tratamento: 1.ª escolha — corticoterapia • Evolução lenta e progressiva para insuficiência renal crônica terminal
Tratamento Vários esquemas terapêuticos utilizando-se diferentes drogas têm sido relatados, porém, como a maior parte dos estudos não é controlada, é difícil chegar à conclusão de qual tratamento deve ser utilizado, uma vez que remissão espontânea desta nefropatia pode ocorrer. Nos pacientes com síndrome nefrótica o uso de corticosteróides, segundo relatos, tem induzido remissão em torno
GLOMERULONEFRITE MEMBRANOSA Sinonímia: Glomerulopatia membranosa, nefropatia membranosa, glomerulonefrite epimembranosa, glomerulonefrite perimembranosa. Termo mais utilizado: Glomerulonefrite membranosa (GNM).
418
Glomerulonefrites Primárias
A GNM é doença de instalação insidiosa que ocorre principalmente em pacientes do sexo masculino (60 a 70%), com idade média oscilando entre 45 e 50 anos, tendo sido descrita no entanto em qualquer faixa etária. Parece haver predomínio da raça branca. A apresentação clínica destes pacientes é a de síndrome nefrótica, com proteinúria variando entre 5 e 10 g nas 24 horas. Uma pequena percentagem destes indivíduos (20-30%) pode inicialmente apresentar-se com proteinúria assintomática. Hematúria microscópica está presente em mais ou menos 30% dos adultos, porém, em crianças sua freqüência está próxima de 100%. Hematúria macroscópica caracteristicamente está ausente. Os níveis séricos de creatinina costumam ser normais, e hipertensão arterial ocorre em torno de 70% dos pacientes. Na evolução observa-se que existe remissão espontânea da síndrome nefrótica em 40 a 60% dos casos, dependendo do tempo de seguimento avaliado. A função renal permanece estável na maior parte dos pacientes, enquanto um pequeno grupo (25-30%) evolui para insuficiência renal após 10 a 20 anos, porém progressão mais rápida também tem sido descrita. Os dados que se associam com pior prognóstico são: idade mais avançada, sexo masculino, síndrome nefrótica persistente, hipertensão arterial, queda de filtração glomerular na primeira consulta e presença de lesão túbulo-intersticial à biópsia renal. Uma complicação comum é a ocorrência de trombose de veia renal. O diagnóstico geralmente é feito devido ao aparecimento de embolia pulmonar. A influência desta complicação na evolução da função renal não está ainda definida.
Anatomia Patológica Na GNM, a lesão é basicamente da membrana basal glomerular, atingindo igualmente todos os glomérulos, não se observando hipercelularidade. Lesões inespecíficas túbulointersticiais podem ser observadas nos casos mais avançados. O aspecto dos glomérulos à microscopia ótica é bastante variável na dependência da duração da doença à época da biópsia. Inicialmente os glomérulos podem estar normais (estádio I), mas posteriormente observa-se na coloração pelos sais de prata a presença de espículas da membrana basal glomerular, o que confere a essa membrana o aspecto de pente (estádio II) ou de elo de corrente (estádio III); finalmente observa-se a presença de espessamento global da membrana basal glomerular (estádio IV). Estas lesões podem coexistir na mesma biópsia (Fig. 22.12 e Fig. 22.13). À microscopia eletrônica, a lesão característica é a presença de depósitos elétron-densos na região subepitelial ou intramembranosa. A membrana basal glomerular pode apresentar-se normal (estádio I) ou apresentar espículas que contornam o depósito (estádio II) (Fig. 22.14). Os depósitos podem ser integrados à membrana basal e finalmente serem reabsorvidos, vistos então como halos elétronlucentes (estádio IV).
Fig. 22.12 Espessamento difuso, homogêneo de membrana basal glomerular em paciente com glomerulonefrite membranosa. (Microscopia ótica, aumento original 400⫻.)
À microscopia de imunofluorescência, observa-se a deposição de imunoglobulinas, principalmente IgG e complemento ao longo da membrana basal glomerular com aspecto finamente granular, homogêneo (Fig. 22.15). Este padrão é constante, independentemente dos achados à microscopia ótica ou eletrônica.
Etiopatogenia Inicialmente se acreditava que a glomerulonefrite membranosa fosse conseqüência da deposição renal de imunocomplexos circulantes. Essa hipótese teve origem na observação de que tanto animais de experimentação, como pacientes com esta glomerulonefrite, além de apresentar
Fig. 22.13 Espessamento difuso da membrana basal capilar, com presença de espículas. (Microscopia ótica, impregnação pela prata, aumento original 400⫻.)
419
capítulo 22
Fig. 22.14 Depósitos subepiteliais de material elétron-denso em paciente portador de glomerulonefrite membranosa, estádio II. (Microscopia eletrônica, aumento original 26.500⫻.)
deposição de imunoglobulina e complemento nos glomérulos, apresentavam também imunocomplexos circulantes. Observações posteriores, no entanto, não confirmaram esta hipótese. Como já descrito, os depósitos na glomerulonefrite membranosa se localizam na região subepitelial; quando se inoculam imunocomplexos pré-formados, estes se localizam principalmente na região mesangial e subendotelial, e não na subepitelial. Em seres humanos foi observado que não existe correlação entre a presença de imunocomplexo circulante e a atividade da doença.
Nas duas últimas décadas foram descritos dois modelos experimentais de glomerulonefrite membranosa que dependem basicamente da reação antígeno-anticorpo realizada in situ. No primeiro foi demonstrado que a inoculação de anticorpos contra determinantes antigênicos presentes nos podócitos é capaz de provocar o aparecimento de glomerulonefrite membranosa em animais de experimentação. Outro modo de se provocar o aparecimento dessa nefropatia é a inoculação de proteínas estranhas catiônicas. Neste segundo modelo a proteína se fixa, através de interação eletrostática, à membrana basal glomerular. Como esta proteína não é reconhecida como própria, o organismo começa a produzir anticorpos contra ela, dando origem à reação antígenoanticorpo, com conseqüente glomerulonefrite. Com base nesses dados experimentais, tem sido proposto que pacientes portadores de glomerulonefrite membranosa poderiam produzir anticorpos contra determinantes antigênicos existentes normalmente nas células epiteliais viscerais (podócitos), ou contra proteínas estranhas ligadas à membrana basal glomerular.
Tratamento Como a glomerulonefrite membranosa apresenta remissões espontâneas e função renal estável, ou deterioração muito lenta, é difícil analisar o resultado do tratamento. O uso de corticosteróides tem sido defendido por vários autores. Em estudo controlado demonstrou-se que esta droga diminui o ritmo de progressão para insuficiência renal, o que, porém, não foi confirmado por outros estudos. Várias drogas citotóxicas, tais como a ciclofosfamida ou o clorambucil, têm sido propostas como alternativa terapêutica. Recentemente Ponticelli e cols. demonstraram que o uso alternado de prednisona e clorambucil aumentou significativamente a freqüência de remissão da síndrome nefrótica e diminuiu o ritmo de queda da filtração glomerular. Frente ao caráter relativamente benigno desta nefropatia e à toxicidade dos esquemas terapêuticos, uma das condutas preconizadas na literatura é que os pacientes devem ser tratados apenas sintomaticamente. No nosso serviço, pacientes que se apresentam com função renal estável são tratados apenas sintomaticamente; quando ocorre queda de função renal, a terapêutica escolhida é com metilprednisolona IV associada a ciclofosfamida VO ou então ciclosporina por 6 meses a 1 ano.
Glomerulonefrite Membranosa e Transplante Fig. 22.15 Depósitos granulares de IgG ao longo da membrana basal glomerular em paciente portador de glomerulonefrite membranosa. (Microscopia de imunofluorescência, aumento original 400⫻.)
A recidiva da glomerulonefrite membranosa varia em torno de 20%. A apresentação clínica se caracteriza pela presença de síndrome nefrótica que se manifesta 10 meses em média após o transplante. A perda do enxerto devido à recorrência é rara.
420
Glomerulonefrites Primárias
entre 1 e 2%. A apresentação clínica mais freqüente é a presença de proteinúria, que se manifesta em média 16 meses após o transplante, sendo que mais de 70% dos casos cursam com síndrome nefrótica. A perda do enxerto, decorrente da GNM de novo, ocorre em torno de 30 a 40% dos casos, 3 a 4 anos após o diagnóstico.
Pontos-chave: Glomerulonefrite membranosa • Instalação insidiosa • Acomete principalmente adultos entre 45 e 50 anos e do sexo masculino • Apresentação: Síndrome nefrótica e hipertensão arterial • Dados laboratoriais: Proteinúria, hipoalbuminemia, micro-hematúria e creatinina normal • MO: Espessamento global da membrana basal glomerular. Presença de espículas ou elo de corrente (prata); MIF: Deposição de IgG e C3 em alças capilares; ME: Depósitos elétron-densos subepiteliais • Sinais de mau prognóstico: Idade avançada, sexo masculino, síndrome nefrótica persistente, hipertensão arterial, queda de filtração glomerular na primeira consulta e presença de lesão túbulo-intersticial à biópsia renal • Tratamento: Só se devem tratar os pacientes com déficit da função renal com corticóide, ⫹ ciclofosfamida ou ciclosporina
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
A GNM muitas vezes se manifesta no rim transplantado como glomerulonefrite de novo. A sua incidência varia
O diagnóstico diferencial entre as várias glomerulonefrites freqüentemente só é possível através do estudo anatomopatológico completo (microscopia ótica, de imunofluorescência e eletrônica), porém em alguns casos é possível aproximar-se bastante do diagnóstico baseando-se apenas nos dados clínicos. Nos casos onde a apresentação clínica é a de síndrome nefrítica aguda, as principais suspeitas clínicas a serem levantadas são: glomerulonefrite pós-estreptocócica, glomerulonefrite membranoproliferativa, glomerulonefrite crescêntica em seus três tipos. Nos casos onde a creatinina plasmática está normal ou discretamente alterada (⬍ 2 mg/ dl), a proteinúria em torno de 1 a 2 g nas 24 horas e C3 está baixo, o primeiro diagnóstico a ser feito é o de glomerulonefrite pós-estreptocócica, mesmo que o paciente não conte história de estreptococcia anterior, pois, em 50% das vezes, ela não é detectada. A confirmação desse diagnóstico será feita na evolução quando, 7 a 10 dias após, os sinais clínicos começam a desaparecer, e o C3 sérico normalizar dentro de 30 a 45 dias após o início do quadro. Caso o paciente não apresente normalização dos sintomas rapidamente e o C3 não se normalize no período esperado, o diagnósti-
Quadro 22.1 Comparação entre os dados clínicos e laboratoriais das diferentes glomerulonefrites que se apresentam com síndrome nefrótica Faixa Etária
Gênero M:F
Hematúria Macro
Função Renal
C3 Sérico
IgA Sérica
GNLM
crianças
2.5:1
ausente
↔
↔
↔
GNM
> 50 anos
2:1
ausente
↔↓
↔
↔
GNMP
25-40 anos
1:1.2
++
↓ ou ↓↓
↓↓ ↔
↔
GNCresc-I
< 40 anos
1:1
++
↓↓↓
↔
↔
GNCresc-II
> 40 anos
1:1
++
↓↓↓
↔↓
↔
GNNCresc-III
> 40 anos
2:1
++
↓↓↓
↔
↔
IgA
25-40 anos
3:1
++++
↔
↔
↑
GEFS
< 40 anos
1.2:1
+
↓ ou ↓↓
↔
↔
GNLM = glomerulonefrite por lesões mínimas, GNM = glomerulonefrite membranosa, GNMP = glomerulonefrite membranoproliferativa, GNCresc = glomerulonefrite crescêntica, IgA = glomerulonefrite por IgA, GEFS = glomerulosclerose focal e segmentar, M:F = proporção masculino: feminino, hematúria macro = hematúria macroscópica, função renal = ↔ = estável, ↓ = piora lenta, ↓↓ = piora com velocidade moderada, ↓↓↓ = piora rápida. C3 sérico ou IgA sérica ↔ = normal, ↓ = diminuído, ↑ = aumentado.
capítulo 22
co de GNMP deve ser lembrado, e a biópsia renal deverá ser realizada. Se o paciente se apresentar com insuficiência renal já na primeira consulta ou apresentar queda rápida da filtração glomerular, devem-se levantar as seguintes possibilidades diagnósticas: glomerulonefrite pós-estreptocócica com crescentes e/ou necrose tubular aguda associada; glomerulonefrite membranoproliferativa com crescentes ou GNCresc propriamente dita em qualquer de seus tipos histológicos. O diagnóstico diferencial entre essas glomerulonefrites só pode ser feito através da biópsia renal. Nos casos onde a apresentação clínica se constitui de hematúria recorrente e há indícios da presença de glomerulonefrites, os dois principais diagnósticos diferenciais são nefropatia por IgA e GNMP. Nesses casos o aumento de IgA sérica sugere nefropatia por IgA, e C3 diminuído sugere GNMP, principalmente tipo II. Em crianças, como a glomerulonefrite por lesões mínimas é a causa mais freqüente de síndrome nefrótica, é comum utilizar teste terapêutico e só realizar a biópsia renal se o paciente não responder ao uso de corticosteróides. No Quadro 22.1 estão resumidos os achados clínicos e laboratoriais mais comuns nas diferentes glomerulonefrites que podem cursar com síndrome nefrótica. O conhecimento desses dados pode auxiliar a levantar uma hipótese diagnóstica, porém, a sua confirmação só será feita por biópsia renal.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ALVES, M.A.R. Glomerulonefrite crescêntica. In Soares, V.; Ribeiro Alves, M.A. (eds) Glomerulopatias: Patogenia, Clínica e Tratamento. Savier Editora de Livros Médicos Ltda, 1999, pp 118-128. AUSTIN, H.A.; ANTONOVYCH, T.T.; MacKAY, K.; BOUMPAS, D.T.; BALOW, J.E. Membranous nephropathy. Ann. Intern. Med., 116:672682, 1992. BARROS, R.T. Glomerulonefrites secundárias a infecções bacterianas. In Soares, V.; Ribeiro Alves, M.A. (eds) Glomerulopatias: Patogenia, Clínica e Tratamento. Savier Editora de Livros Médicos Ltda, 1999, pp 200-205. BALDWIN, D.S.; GLUCK, M.C.; SCHACHT, R.G.; GALLO, G. The longterm course of post-streptococcal glomerulonephritis. Ann. Intern. Med., 80:342-358, 1974. BEAUFILS, H.; ALPHONSE, J.C.; GUEDON, J.; LEGRAIN, M. Focal glomerulosclerosis: Natural history and treatment: Report of 70 cases. Nephron, 21:75-85, 1978. BERNSTEIN, J.; EDELMANN, C.M. Minimal change nephrotic syndrome: Histopathology and steroid responsiveness. Arch. Dis. Child., 57:816-817, 1982. BERTANI, T.; ROCCHI, G.; SACCHI, G.; MECCA, G.; REMUZZI, G. Adriamycin-induced glomerulosclerosis in the rat. Am. J. Kidney Dis., 7:12-19, 1986. BOHLE, A.; GARTNER, H.V.; FISCHBACH, H.; BOCK, K.D.; EDEL, H.H.; FROTSCHER, U.; KLUTHE, R.; MONNINGHOFF, W.; SCHELER, F. The morphological and clinical features of membranoproliferative glomerulonephritis in adults. Virchows Arch., 363:213-224, 1974. BRENNER, B.M. Nephrology Forum: Hemodynamically mediated glomerular injury and the progressive nature of kidney disease. Kidney Int., 23:647-655, 1983.
421
CADE, R.; MARS, D.; PRIVETTE, M.; THOMPSON, R.; CROKER, B.; PETERSON, J.; CAMPBELL, K. Effect of long-term azathioprine administration in adults with minimal-change glomerulonephritis and nephrotic syndrome resistant to corticosteroids. Arch. Intern. Med., 146:737-741, 1986. CAMERON, J.S.; TURNER, D.R.; C, S.; OGG, SHARPSTONE, P.; BROWN, C.B. The nephrotic syndrome in adults with “minimal change” glomerular lesions. Q. J. Med., 43:461-488, 1974. CAMERON, J.S., TURNER, D.R.; OGG, C.S.; CHANTLER, C.; WILLIAMS, D.G. The long-term prognosis of patients with focal segmental glomerulosclerosis. Clin. Nephrol., 10:213-218, 1978. CAMERON, J.S. Membranous nephropathy: The treatment dilemma. Am. J. Kidney Dis., 1:371-375, 1982. CAMERON, J.S. Glomerulonephritis in renal transplants. Transplantation, 34:237-245, 1982. CAMERON, J.S.; TURNER, D.R.; HEATON, J.; WILLIAMS, D.G.; OGG, C.S.; CHANTLER, C.; HAYCOCK, G.B.; HICKS, J. Idiopathic mesangiocapillary glomerulonephritis: Comparison of types I and II in children and adults and long-term prognosis. Am. J. Med., 74:175-192, 1983. CAMERON, J.S. Recurrent primary disease and de novo nephritis following renal transplantation. Pediatr. Nephrol., 5:412-421, 1991. CARRIE, B.J.; SALYER, W.R.; MYERS, B.D. Minimal change nephropathy: An electrochemical disorder of the glomerular membrane. Am. J. Med., 70:262-268, 1981. CARVALHO, M.F.C.; SOARES, V. Glomerulopatias primárias após transplante renal. In Soares, V.; Ribeiro Alves, M.A. (eds) Glomerulopatias: Patogenia, Clínica e Tratamento. Savier Editora de Livros Médicos Ltda, 1999, pp 236-249. CHADBAN, S.J. Glomerulonephritis recurrence in the renal graft. J. Am. Soc. Nephrol., 12:394-402, 2001. CHENG, S.C.; BALBI, A.L.; VIERO, R.M.; THEREZO, A.L.S. & SOARES, V.A. Glomerulonefrite membranoproliferativa: estudo anátomo-clínico e evolutivo de 22 pacientes. J. Bras. Nefrol., 2:122-130, 1989. CHOCAIR, P.R.; NORONHA, I.L.; IANHEZ, L.E.; ARAP, S.; SABBAGA, E. Recorrência de glomerulosclerose segmentar e focal em rins transplantados. Rev. Ass. Med. Brasil, 35:171-174, 1989. CLARKSON, A.R.; WOODROFFE, A.J.; BANNISTER, K.M.; LOMAXSMITH, J.D.; AARONS, I. The syndrome of IgA nephropathy. Clin. Nephrol., 21:7-14, 1984. COGGINS, C.H. Is membranous nephropathy treatable? Am. J. Nephrol., 1:219-221, 1981. COUSER, W.G. Rapidly progressive glomerulonephritis: Classification, pathogenetic mechanisms, and therapy. Am. J. Kidney Dis., 11:449-464, 1988. D’AMICO, G., IMBASCIATI, E.; BARBIANO DI BELGIOJOSO, G.; BERTOLI, S.; FOGAZZI, G.; FERRARIO, F.; FELLIN, G.; RAGNI, A.; COLOSANTI, G.; MINETTI, L.; PONTICELLI, C. Idiopathic IgA mesangial nephropathy: Clinical and histological study of 374 patients. Medicine, 64:49-60, 1985. D’AMICO, G. The commonest glomerulonephritis in the world: IgA nephropathy. Q. J. Med., 245:709-727, 1987. DANTAS, M. & COSTA, R.S. Glomerulopatias de lesões mínimas e glomerulosclerose segmentar e focal. In Soares, V.; Ribeiro Alves, M.A. (eds) Glomerulopatias: Patogenia, Clínica e Tratamento. Savier Editora de Livros Médicos Ltda, 1999, pp 47-65. DAVISON, A.M.; CAMERON, J.S.; KERR, D.N.S.; OGG, C.S.; WIKINSON, R.W. The natural history of renal function in untreated idiopathic membranous glomerulonephritis in adults. Clin. Nephrol., 22:61-67, 1984. DAVISON, A.M.; & JOHNSTON, P.A. Allograft membranous nephropathy. Nephrol. Dial. Transp. Suppl., 1:114-118, 1992. DI BELGIOJOSO, B.; TARANTINO, A.; COLASANTI, G.; BAZZI, C.; GUERRA, L.; DURANTE, A. The prognostic value of some clinical and histological parameters in membranoproliferative glomerulonephritis (MPGN): Report of 112 cases. Nephron, 19:250-258, 1977. DODGE, W.F.; SPARGO, B.H.; TRAVIS, L.; STRIVASTAVA, R.N.; CARVALJAL, H.F.; De-BEUKELAER, M.M.; LONGLEY, M.P.; MENCHACA, J.A. Post-streptococcal glomerulonephritis: A prospective study in children. N. Engl. J. Med., 286:273-278, 1972.
422
Glomerulonefrites Primárias
DONADIO, J.V. Jr.; SLACK, T.K.; HOLLEY, K.E.; ILSTRUP, D.M. Idiopathic membranoproliferative (mesangiocapillary) glomerulonephritis: A clinico-pathologic study. Mayo Clin. Proc., 54:141-150, 1979. DONADIO, J.V.; TORRES, V.E.; VELOSA, J.A.; WAGONER, R.D.; HOLLEY, K.E.; OKAMURA, M.; ILSTRUP, D.M.; CHU, C.P. Idiopathic membranous nephropathy: The natural history of untreated patients. Kidney Int., 33:708-715, 1988. DONADIO, J.V. Jr.; OFFORD, K.P. Reassessment of treatment results in membranoproliferative glomerulonephritis, with emphasis on lifetable analysis. Am. J. Kidney Dis., 14:445-451, 1989. DROZ, D.; ZANETTI, M.; NOEL, L.H.; LEIBOWITCH, J. Dense deposits disease. Nephron, 19:1-11, 1977. EMANCIPATOR, S.N.; GALLO, G.R.; LAMM, M.E. IgA nephropathy: Perspectives on pathogenesis and classification. Clin. Nephrol, 24:161-179, 1985. FALK, R.J. ANCA-associated renal disease. Kidney Int., 38:998-1010, 1990. GARTNER, H.V.; FISCHBACH, H.; WEHNER, H.; BOHLE, A.; EDEL, H.H.; KLUTHE, R.; SCHELER, F.; SCHMULLING, R.M. Comparison of clinical and morphological features of peri- (epi- extra-) membranous glomerulonephritis. Nephron, 13:288-301, 1974. HANCOCK, W.W.; ATKINS, R.C. Cellular composition of crescents in human rapidly progressively glomerulonephritis identified using monoclonal antibodies. Am. J. Nephrol., 4:177-181, 1984. HINGLAIS, N.; GARCIA-TORRES, R.; KLEINKNECT, D. Long-term prognosis in acute glomerulonephritis: The predictive value of early clinical and pathologic features observed in 65 patients. Am. J. Med., 56:52-60, 1974. HONKANEN, E. Survival in idiopathic membranous glomerulonephritis. Clin. Nephrol., 25:122-128, 1986. INTERNATIONAL STUDY OF KIDNEY DISEASE IN CHILDREN: Minimal change nephrotic syndrome in children: Deaths during the first 5 to 15 years’ observation. Pediatrics, 73:497-501, 1984. JENNETTE, J.C.; WILKMAN, A.S.; FALK, R.J. Anti-neutrophil cytoplasmic autoantibody-associated glomerulonephritis and vasculitis. Am. J. Pathol., 135:921-930, 1989. KIDA, H.; ASAMOTO, T.; YOKOYAMA, H.; TOMOSUGI, N.; HATTORI, N. Long-term prognosis of membranous nephropathy. Clin. Nephrol., 25:64-69, 1986. LEVY, M.; GONZALES-BURCHARD, G.; BROYER, M.; DOMMERGUES, J.P.; FOULARD, M.; SOREZ, J.P.; HABIB, R. Berger’s disease in children: Natural history and outcome. Medicine, 64:157-180, 1985. LEWIS, E.J.; CARPENTER, C.B.; SCHUR, P.H. Serum complement component levels in human glomerulonephritis. Ann. Intern. Med., 75:555560, 1971. LEWY, J.E.; SALINAS-MADRIGAL, L.; HERDSON, P.B.; PIRANI, C.L.; METCOFF, J. Clinicopathologic correlations in acute post-streptococcal glomerulonephritis. Medicine, 50:453-501, 1971. MAGIL, A.B.; WADSWORTH, L.D. Monocyte involvement in glomerular crescents: A histochemical and ultrastructural study. Lab. Invest., 47:160-166, 1982. MAZZUCCO, G.; BARBIANO DI BELGIOJOSO, G.; CONFALONIERI, R.; COPPO, R.; MONGA, G. Glomerulonephritis with dense deposits: A variant of membranoproliferative glomerulonephritis or a separate morphological entity? Light, electron microscopic and immunohistochemical study of eleven cases. Virchows Arch. [A], 387:17-29, 1980. MORRIN, P.A.F.; HINGLAIS, N.; NABARRA, B.; KREIS, H. Rapidly progressive glomerulonephritis: A clinical and pathological study. Am. J. Med., 65:446-460, 1978. MYERS, B.D.; OKARMA, T.B.; FIREDMAN, S.; BRIDGES, C.; ROSS, J.; ASSEFF, S.; DEEN, W.M. Mechanisms of proteinuria in human glomerulonephritis. J. Clin. Invest., 70:732-746, 1982. NEUMAYER, H-H.; KIENBAUM, M.; GRAF, S.; SCHREIBER, M.; MANN, J.F.E.; LUTT, F.C. Prevalence and long-term outcome of glomerulonephritis in renal allografts. Am. J. Kidney Dis., 22:320-325, 1993. NIAUDET, P.; MURCIA, I.; BEAUFILS, H.; BROYER, M.; HABIB, R. Primary IgA nephropathies in children: Prognosis and treatment. Adv. Nephrol., 22:121-140, 1993. NOEL, L.H.; ZANETTI, M.; DROZ, D.; BARBANEL, C. Long-term prognosis of idiopathic membranous glomerulonephritis: Study of 116 untreated patients. Am. J. Med., 66:82-90, 1979.
NOLASCO, F.; CAMERON, J.S.; HEYWOOD, E.F.; HICKS, J.; OGG, C.; WILLIAM, D.G. Adult-onset minimal change nephrotic syndrome. A long-term follow-up. Kidney Int., 29:1215-1223, 1986. NOLASCO, E.B.; CAMERON, J.S.; HARTLEY, B.; COELHO, A.; HILDRETH, G.; REUBEN, R. Intraglomerular T cells and monocytes in nephritis: Study with monoclonal antibodies. Kidney Int., 31:11601166, 1987. NUSSENZVEIG, I. Nefropatia da IgA. In Soares, V.; Ribeiro Alves, M.A. (eds.) Glomerulopatias: Patogenia, Clínica e Tratamento. Savier Editora de Livros Médicos Ltda, 1999, pp 100-117. ORDONEZ, J.D.; HIATT, R.A.; KILLEBREW, E.J.; FIREMAN, B.H. The increase risk of coronary heart disease associated with nephrotic syndrome. Kidney Int., 44:628-642, 1993. PONTICELLI, C. Prognosis and treatment of membranous nephropathy. Kidney Int., 29:927-940, 1986. POPOVIC-ROLOVIC, M.; KOSTIC, M.; ANTIC-PECO, A.; JOVANOVIC, O.; POPOVIC, D. Medium- and long-term prognosis of patients with acute post-streptococcal glomerulonephritis. Nephron, 58:393-399, 1991. RAMOS, E.L. & TISHER, C.C. Recurrent Diseases in Kidney Transplant. Am. J. Kidney Dis., 24:142-154, 1994. REKOLA, S.; BERGSTRAND, A.; BUCHT, H. IgA nephropathy: A retrospective evaluation of prognostic indices in 176 patients. Scand. J. Urol. Nephrol., 23:37-50, 1989. RODRIGUEZ-ITURBE, B. Epidemic post-streptococcal glomerulonephritis. Kidney Int., 25:129-136, 1984. SAMIY, A.H.; FIELD, R.A.; MERRILL, J.P. Acute glomerulonephritis in elderly patients: Report of seven cases over sixty years of age. Ann. Intern. Med., 54:603-609, 1961. SCHACHT, R.G.; BLUCK, M.C.; GALLO, G.R.; BALDWIN, D.S. Progression to uremia after remission of acute post-streptococcal glomerulonephritis. N. Engl. J. Med., 295:977-981, 1976. SOARES, V.A.; FRANCO, R.J.S.; ALMEIDA, D.B. Etiopatogenia da glomerulonefrite membranosa. J. Bras. Nefrol., 3:109-113, 1981. SOARES, V.A.; FRANCO, R.J.S.; MONTEIRO FILHO, R.C.; UGINO, A.; VIERO, R.M. & ALMEIDA, D.B. Estudo do quadro clínico de 121 pacientes portadores de glomerulopatias. 1) Estudo geral. J. Bras. Nefrol., 4:73-78, 1982. SOARES, V.A.; FRANCO, R.J.S. & ALMEIDA, D.B. Proteinúria de origem glomerular. J. Bras. Nefrol., 4:94-98, 1983. SOARES, V.A.; VIERO, R.M.; MONTEIRO FILHO, R.C.; FRANCO, R.J.S. & FRANCO, M.F. Necrose tubular aguda associada a glomerulonefrite difusa aguda — Estudo retrospectivo anátomo-clínico de 5 casos. J. Bras. Nefrol., 5:39-42, 1983. SOARES, V.A., FRANCO, R.J.S. & ALMEIDA, D.B. Proteinúria de origem glomerular. J. Bras. Nefrol., 5:94-98, 1983. SOARES, V.A.; FRANCO, R.J.S.; MONTEIRO FILHO, R.C.; VIERO, R.M. & ALMEIDA, D.B. Estudo do quadro clínico de 121 pacientes portadores de glomerulopatias. 2) Síndrome nefrítica. J. Bras. Nefrol., 5:114117, 1983. SOARES, V.A.; VIERO, R.M.; HABERMANN, F.; FRANCO, R.J.S.; FRANCO, M.F. & ALMEIDA, D.B. Necrose tubular aguda associada a glomerulonefrite membranoproliferativa. J. Bras. Nefrol., 7:84-86, 1985. SOARES, V.A.; FRANCO, R.J.S.; MONTEIRO FILHO, R.C.; VIERO, R.M.; HABERMANN, F. & ALMEIDA, D.B. Estudo do quadro clínico de 121 pacientes portadores de glomerulopatias. 3) Síndrome nefrótica. J. Bras. Nefrol., 5:118-122, 1983. SOARES, V.; VIERO, R.M. Glomerulonefrite membranosa. In Soares, V.; Ribeiro Alves, M.A. (eds) Glomerulopatias: Patogenia, Clínica e Tratamento. Savier Editora de Livros Médicos Ltda, 1999, pp 66-91. STILMANT, M.M.; BOLTON, W.K.; STURGILL, B.C.; SCHIMITT, G.W.; COUSER, W.G. Crescentic glomerulonephritis without immune deposit: Clinicopathologic features. Kidney Int., 15:184-195, 1979. SWAINSON, C.P.; ROBSON, J.S.; THOMSON, D.; MacDONALD, M.K. Mesangiocapillary glomerulonephritis: A long-term study of 40 cases. J. Pathol., 141:449-468, 1983. TEJANI, A.; NICASTRI, A.D.; SEN, D.; CHEN, C.K.; BUTT, K.M.H. Longterm evaluation of children with nephrotic syndrome and focal segmental glomerular sclerosis. Nephron, 35:225-231, 1983.
capítulo 22
TROMPETER, R.S.; LLOYD, B.W.; HICKS, J.; WHITE, R.H.; CAMERON, J.S. Long-term outcome for children with minimal-change nephrotic syndrome. Lancet, 1:368-370, 1985. VELOSA, J.A.; DONADIO, J.V. Jr.; HOLLEY, K.E. Focal sclerosing glomerulonephropathy: A clinicopathologic study. Mayo Clin. Proc., 50:121-133, 1975. VIERO, R.M. & FRANCO, M. Glomerulonefrites — Aspectos AnátomoPatológicos. In Schor, N. & Srougi, M. Nefrologia e Urologia Clínica. Savier, 1998, p. 322-333. WEHRMANN, M.; BOHLE, A.; HELD, H.; SCHUMM, G.; KENDZIORRA, H.; PRESSLER, H. Long-term prognosis of focal sclerosing glomerulonephritis: An analysis of 250 cases with particular regard to tubulointersticial changes. Clin. Nephrol., 33:115-122, 1990. WHITE, R.H.R.; GLASGOW, E.F.; MILLS, R.J. Clinicopathological study of nephrotic syndrome in childhood. Lancet, 1:1353-1359, 1970. WHITE, R.H.R.; GLASGOW, E.F.; MILLS, R.J. Focal glomerulosclerosis in childhood. In Kincaid-Smith, P.; Matthew, T.H.; Becker, E.L. (eds.) Glomerulonephritis, part II, pp. 231-238. New York, John Wiley & Sons, 1973.
423
WORONIK, V. Fisiopatologia do edema nefrótico. In Cruz, J.; Barros, R.T.; David-Neto, E.; Suassuna, J.H.R.; Heilberg, I.P.; Gouvea Filho, W.L. (eds.) Atualidades em Nefrologia 3. Savier Editora de Livros Médicos Ltda., 1994, Cap. 4, pp. 22-27.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET VirtualHospital:Glomerulonephritis-www.vh.org CollaborativeGlomerulonephritisTherapyStudyGroupwww.uni-tuebingen.de/uni/kmp/cgts1e.htm NephronInformationCenter-nephron.com Renalnet-www.renalnet.org Nationalkidneyandurologicdiseaseinformation-www. niddk.nih.gov Atlas of Renal Pathology — www.us.elsevierhealth.com/ ajkd/atlas/
Capítulo
23
Glomerulopatias Secundárias Rui Toledo Barros, Viktória Woronik, Euthymia Brandão A. Prado e Irina Antunes
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO
Mieloma múltiplo e doença de cadeias leves
Patogênese
Macroglobulinemia de Waldenström
Patologia
Crioglobulinemia
Classes histológicas da nefropatia lúpica Índices de atividade e cronicidade
Amiloidose Amiloidose primária
Manifestações clínicas
Amiloidose secundária
Avaliação laboratorial
Amiloidose renal hereditária
Prognóstico e tratamento VASCULITES SISTÊMICAS NECROTIZANTES Etiologia e prevalência
Glomerulonefrites fibrilares NEOPLASIAS GLOMERULOPATIAS EM DOENÇAS HEPÁTICAS
Patogênese
Infecção por vírus C
Quadro clínico
Infecção por vírus B
Diagnóstico diferencial
Cirrose hepática
Patologia Tratamento PÚRPURA DE HENOCH-SCHÖNLEIN
DOENÇAS INFECCIOSAS Glomerulonefrite da endocardite bacteriana Nefropatia do vírus da imunodeficiência humana (HIV)
Etiologia e patogênese
Quadro clínico
Manifestações clínicas
Alterações patológicas
Alterações laboratoriais e diagnóstico diferencial
Patogênese
Alterações patológicas Tratamento e prognóstico SÍNDROME DE GOODPASTURE Quadro clínico Alterações patológicas Patogênese Prognóstico e tratamento PARAPROTEINEMIAS E DISPROTEINEMIAS
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO A doença renal é uma manifestação clínica freqüente no lúpus eritematoso sistêmico (LES) e se desenvolve por ocasião do diagnóstico ou durante seguimento clínico a médio
Tratamento Nefropatia da esquistossomose Quadro clínico Alterações patológicas e patogênese Tratamento Outras doenças infecto-parasitárias BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
prazo. A prevalência real da nefropatia, entretanto, deve ser maior que 90%, uma vez que a biópsia renal em pacientes sem qualquer evidência clínica desta complicação pode revelar alterações glomerulares, especialmente depósitos de imunoagregados à microscopia de imunofluorescência. O diagnóstico de LES é definido pelo preenchimento de critérios clínicos e laboratoriais estabelecidos pela
capítulo 23
Quadro 23.1 Critérios da American Rheumatism Association para a Classificação do Lúpus Eritematoso Sistêmico (revistos em 1982) Rash malar Rash discóide Fotossensibilidade Úlceras da mucosa oral Artrite não-deformante Serosite (pleurite, pericardite) Doença renal (proteinúria persistente, cilindrúria) Envolvimento do sistema nervoso central Alterações hematológicas (anemia, leucopenia, plaquetopenia) 10. Alterações imunológicas: células LE, anti-DNA, antiSm, VDRL falso-positivo 11. Fator antinúcleo positivo 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9.
American Rheumatism Association (ARA), que definiu uma relação de 11 características principais (v. Quadro 23.1). O preenchimento de, no mínimo, quatro destes critérios, de modo simultâneo ou seqüencial, confere 96% de sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de LES. O envolvimento renal, com o propósito de atender aos critérios da ARA, é definido pela presença de proteinúria persistente acima de 500 mg/dia e/ou presença de cilindros celulares no sedimento urinário, desde que outras causas de alterações na urinálise estejam afastadas (infecções do trato urinário e efeito de drogas, por exemplo). Em várias séries da literatura mundial, a prevalência do LES na população varia de 14,6 a 50,8 casos por 100.000 habitantes, acometendo principalmente mulheres jovens. Vários fatores têm sido relatados no sentido de poderem influir na prevalência do LES e de suas manifestações renais. Fatores genéticos são importantes, tendo em vista os relatos do predomínio do LES na raça negra nos Estados Unidos, da freqüência aumentada de alguns haplótipos do sistema HLA, do encontro de autoanticorpos em familiares de pacientes com LES e da maior suscetibilidade ao lúpus dentre pacientes com deficiências congênitas de frações do sistema complemento.
Patogênese Múltiplos distúrbios imunológicos têm sido descritos em pacientes com LES, porém, os fatores iniciantes ainda são desconhecidos. A patogênese da doença renal no LES é similarmente complexa e com vários mecanismos envolvidos, os quais produzem amplo espectro de injúria renal. O envolvimento glomerular no LES tem sido considerado um exemplo de nefropatia humana induzida por imunocomplexos.
425
A formação de auto-anticorpos no LES é conseqüência direta da hiperatividade de linfócitos B. Tal hiperatividade, por sua vez, poderia decorrer de distúrbios regulatórios de subpopulações de linfócitos T, de ativação autógena dos linfócitos B, ou mesmo ser causada por disfunções mais complexas da imunorregulação. Os auto-anticorpos produzidos incluem aqueles contra o ácido desoxirribonucléico (DNA) de hélice simples (SS-DNA) ou hélice dupla (DSDNA), contra ribonucleoproteínas, histonas e, em certas circunstâncias, contra proteínas da matriz extracelular (laminina, colágeno IV, heparan sulfato). A deposição crônica de imunocomplexos circulantes, em parte constituídos pelos complexos DNA-anti-DNA, provavelmente assume grau de importância em certos padrões histológicos de nefrite lúpica, representados pelas lesões mesangiais e proliferativas endocapilares. A localização dos imunocomplexos nos glomérulos, por sua vez, é influenciada por vários fatores: tamanho, carga elétrica e avidez dos complexos, capacidade de clareamento do mesângio, ou ainda fatores hemodinâmicos locais. Uma vez depositados, os complexos ativam a cascata do sistema complemento e toda a série de eventos que daí decorre: ativação de fatores procoagulantes, infiltração de leucócitos, liberação de enzimas proteolíticas e liberação de citocinas reguladoras da proliferação glomerular e da síntese de matriz extracelular. Tem sido também demonstrado que outros auto-anticorpos circulantes podem ligar-se a antígenos intrínsecos da membrana basal (p.ex., laminina) ou, ainda, a antígenos “plantados” (p.ex., histonas, IgG catiônica, DNA), contribuindo para a patogênese da lesão glomerular do LES. Estas alterações se manifestam histologicamente pelo quadro de glomerulonefrite proliferativa (focal ou difusa) e, clinicamente, por um sedimento urinário ativo, proteinúria e, freqüentemente, redução aguda da função renal. Na glomerulopatia membranosa, a agressão imunológica provavelmente decorre da formação in situ de imunocomplexos no espaço subepitelial do capilar glomerular. Tais imunocomplexos seriam formados pela ligação de auto-anticorpos com antígenos relacionados às nucleoproteínas, previamente localizados no referido espaço. Esta forma de injúria também ativa o sistema complemento, com a formação do complexo de ataque à membrana C5b-C9; não ocorre, entretanto, influxo de células inflamatórias, já que a membrana basal se interpõe para impedir o acesso de mediadores celulares ao espaço subepitelial. A injúria glomerular e vascular no LES pode ser ampliada pelos fenômenos locais decorrentes da coagulação intravascular. Neste sentido, a participação dos anticorpos antifosfolípides poderia potencializar a agressão imunológica descrita, provocando alterações nas funções endoteliais e plaquetárias. Em pacientes com insuficiência renal aguda, hipertensão severa e anemia hemolítica com esquizócitos circulantes, não é incomum o encontro de microangiopatia trombótica associada à lesão glomerular do LES.
426
Glomerulopatias Secundárias
CLASSES HISTOLÓGICAS DA NEFROPATIA LÚPICA
Pontos-chave: • A nefrite lúpica é uma complicação muito freqüente no LES e tem importantes implicações prognósticas • A injúria glomerular ocorre pela deposição ou formação in situ de imunocomplexos • Anticorpos anti-DNA são formados pela hiperatividade de linfócitos B
Patologia A nefropatia do LES se caracteriza pela heterogeneidade no modo de apresentação histológica, pela freqüente superposição das várias lesões e pelo potencial de transformação de uma determinada classe em outra, que, em diferentes relatos, atingem de 15 a 40% dos pacientes. O envolvimento renal no LES se dá em sua grande maioria através de lesões glomerulares causadas pela deposição de imunocomplexos e que se traduzem em quatro padrões característicos: mesangial, proliferativo focal, proliferativo difuso e membranoso. A variabilidade histológica da nefropatia lúpica tem como principal implicação uma certa dificuldade na escolha da classificação morfológica que seja reproduzível e clinicamente relevante. Por este motivo, tem sido adotada internacionalmente a classificação da Organização Mundial de Saúde (OMS), revista e modificada em 1994 (v. Quadro 23.2).
Quadro 23.2 Classificação da nefropatia lúpica de acordo com a OMS — Organização Mundial de Saúde (modificada em 1994)
Classe I – Biópsia Normal. Os rins são completamente normais, tanto à microscopia ótica quanto à imunofluorescência e à microscopia eletrônica. Na prática clínica e nos relatos de literatura, a classe I é raramente observada, uma vez que depósitos mesangiais são freqüentes mesmo em pacientes sem quadro clínico renal, e também porque habitualmente não se indica biópsia nestes casos. Classe II – Alterações Mesangiais Puras. Pacientes com biópsias da classe II têm lesões glomerulares restritas ao mesângio. Na classe IIa os glomérulos são normais à microscopia ótica (MO), porém com depósitos imunes detectáveis pela imunofluorescência (IF) ou pela microscopia eletrônica (ME). Na classe IIb, além dos depósitos referidos, ocorre também hipercelularidade mesangial, definida pela presença de mais de três células em regiões do mesângio distantes do pólo vascular. A nefropatia lúpica mesangial é relativamente comum em pacientes ambulatoriais com função renal normal, proteinúria e hematúria discretas. As alterações histológicas em geral permanecem estáveis na maioria dos pacientes; em aproximadamente 20% dos casos pode haver transformação para a glomerulonefrite difusa. Classe III – Glomerulonefrite Focal e Segmentar. Caracteriza-se pela proliferação endocapilar à custa de células mesangiais, endoteliais, além de neutrófilos e monócitos que podem infiltrar o glomérulo. A denominação focal e segmentar é definida arbitrariamente pelo envolvimento de até 50% do total de capilares glomerulares com processo inflamatório. As lesões podem ser focais ou segmentares, ou focais e globais, desde que o total da área glomerular envolvida seja menor que 50%. As lesões ativas da classe III freqüentemente incluem necrose fibrinóide, pic-
I. II.
Glomérulo normal (por MO, IF, ME)* Alterações mesangiais puras a. MO normal, depósitos mesangiais à IF ou ME b. Hipercelularidade mesangial e depósitos à IF ou ME III. Glomerulonefrite segmentar e focal a. Lesões ativas necrotizantes b. Lesões ativas e esclerosantes c. Lesões esclerosantes IV. Glomerulonefrite difusa (mesangial grave, proliferação endocapilar ou mesangiocapilar e/ou depósitos subendoteliais extensos) a. Sem lesões segmentares b. Com lesões ativas necrotizantes c. Com lesões ativas esclerosantes d. Com lesões esclerosantes V. Glomerulonefrite membranosa a. Glomerulonefrite membranosa pura b. Associada a lesões da classe II (a ou b) VI. Glomerulonefrite esclerosante avançada *MO, microscopia ótica; IF, imunofluorescência; ME, microscopia eletrônica.
Fig. 23.1 Nefrite lúpica segmentar e focal (Classe III – OMS). Glomérulo parcialmente ocupado por lesão inflamatória de caráter necrosante. Coloração H.E. (450⫻).
capítulo 23
nose nuclear e ruptura da membrana basal glomerular com infiltração de neutrófilos. Crescentes epiteliais podem acompanhar as lesões mais ativas. A imunofluorescência mostra depósitos de imunoglobulinas e frações do complemento, distribuídos difusamente no mesângio e nas alças capilares, de modo segmentar. Depósitos elétron-densos à microscopia eletrônica são visualizados no espaço subendotelial e na matriz mesangial. Existe uma forte tendência entre os pesquisadores desta área em considerar a classe III da nefrite lúpica com os mesmos critérios prognósticos da classe IV, proliferativa difusa, uma vez que as diferenças entre estas lesões são apenas quantitativas, sendo freqüentemente difícil a separação entre as mesmas. Classe IV – Glomerulonefrite Proliferativa Difusa. O processo inflamatório nesta classe histológica acomete mais de 50% da superfície dos capilares glomerulares, com distribuição difusa e global. As lesões ativas incluem necrose fibrinóide, infiltração de neutrófilos, depósitos subendoteliais em “alça de arame”, corpos hematoxilínicos e crescentes epiteliais. Através da imunofluorescência e da microscopia eletrônica, são detectados extensos imunodepósitos ao longo do espaço subendotelial do capilar glomerular e também no mesângio. Além destes depósitos elétron-densos, na nefrite lúpica ativa podem ser observadas inclusões tubulorreticulares no citoplasma de células glomerulares e do endotélio vascular. Estas estruturas não são específicas do LES, sendo também encontradas em biópsias renais de pacientes com o vírus da imunodeficiência humana (HIV) e com outras infecções virais. Os depósitos elétron-densos ocasionalmente assumem a característica forma de impressão digital (finger print), com linhas curvas paralelas medindo de 10 a 15 nm de diâmetro. A IF é habitualmente rica, com presença de IgG, IgA, IgM e frações do complemento: C1q, C4, C3, properdina e o complexo de ataque à membrana C5b-C9. A glomerulonefrite proliferativa difusa é a classe histológica mais freqüentemente encontrada no LES, manifestando-se habitualmente por proteinúria em nível nefrótico, hematúria e perda de função renal. Em alguns pacientes, o quadro clínico é o de insuficiência renal rapidamente progressiva, que histologicamente corresponde a lesões glomerulares necrotizantes e com extensa formação de crescentes epiteliais. Classe V – Glomerulonefrite Membranosa. Este padrão histológico é caracterizado pelos depósitos imunes predominantes no espaço subepitelial do glomérulo, em geral associados a hipercelularidade mesangial, com depósitos de imunoglobulinas e complemento nessa região. Nas fases iniciais do envolvimento renal, a membrana basal pode parecer normal à microscopia ótica; com a evolução da doença, a membrana basal se torna espessada e revela a típica formação de espículas (spikes) quando se usa a coloração pela prata. Pacientes com glomerulonefrite membranosa habitualmente se apresentam com síndrome nefrótica e função renal preservada, mesmo na evolução a longo prazo.
427
Classe VI – Glomerulonefrite Esclerosante Avançada. Na classificação da OMS, este padrão se caracteriza pela presença de lesões cicatriciais e esclerosantes avançadas, que correspondem ao quadro clínico da insuficiência renal crônica. Outras Formas de Envolvimento Renal no LES. Além das glomerulopatias, ocorrem outras lesões renais menos comuns em pacientes com LES: a nefrite intersticial e as vasculopatias. O envolvimento túbulo-intersticial constitui um importante componente da injúria renal global, sendo freqüente sua associação com as lesões glomerulares mais ativas e graves. Em casos mais raros, a nefrite intersticial isolada pode ser a única manifestação de nefropatia lúpica. Esta possibilidade deve ser lembrada sempre que pacientes com LES se apresentarem com insuficiência renal, exame de urina normal e eventualmente com alterações da função tubular, tais como acidose tubular renal do tipo distal e hipo- ou hiperpotassemia. As lesões vasculares renais do LES incluem os depósitos vasculares imunes, a vasculopatia necrotizante nãoinflamatória, a microangiopatia trombótica e a arterite necrotizante. Os depósitos imunes são vistos apenas à imunofluorescência e à microscopia eletrônica, não alterando a estrutura morfológica do vaso. A vasculopatia nãoinflamatória se caracteriza pela necrose fibrinóide de arteríolas pré-glomerulares na nefrite lúpica ativa da classe IV. Em outras situações mais raras, pode ocorrer arterite necrotizante, semelhante à poliangeíte microscópica sistêmica, ou limitada ao parênquima renal. Microangiopatia trombótica tem sido ocasionalmente descrita no LES, levando a uma síndrome semelhante à da púrpura trombocitopênica trombótica (PTT). Em outros pacientes, portadores do anticoagulante lúpico, podem ser demonstrados trombos de fibrina nas pequenas artérias e nos capilares glomerulares. Estas lesões microvasculares
Fig. 23.2 Nefrite lúpica proliferativa difusa (Classe IV – OMS). Glomérulo com intensa reação inflamatória e exsudação de neutrófilos. Coloração H.E. (450⫻).
428
Glomerulopatias Secundárias
Quadro 23.3 Índices de atividade e cronicidade ÍNDICES DE ATIVIDADE Hipercelularidade endocapilar Infiltracão de leucócitos Depósitos hialinos subendoteliais Necrose fibrinóide e cariorréxis Crescentes celulares Infiltrado intersticial ÍNDICES DE CRONICIDADE Esclerose glomerular Crescentes fibróticos Atrofia tubular Fibrose intersticial Fig. 23.3 Glomerulonefrite membranosa lúpica (Classe V – OMS). Alças capilares difusamente espessadas. Coloração H.E. (280⫻).
podem ocorrer como doença primária ou se superpondo às formas de nefrite lúpica por imunocomplexos anteriormente descritas, independentes dos fatores etiopatogênicos envolvidos. A vasculopatia necrotizante do LES geralmente se acompanha de hipertensão grave e forte tendência à perda progressiva da função renal.
de 0 a 12. Com a aplicação destes índices, tem sido observado por alguns autores que pacientes com IC acima de 5 têm pior prognóstico em termos de sobrevida renal a longo prazo. Outros relatos porém não têm constatado tal valor prognóstico destes índices em estudos com casuísticas maiores. De qualquer forma, em casos individuais, este sistema de avaliação histológica pode ser bastante útil, quando aplicado em biópsias seqüenciais (v. Quadro 23.3).
ÍNDICES DE ATIVIDADE E CRONICIDADE Tendo em vista a grande variabilidade histológica encontrada na nefropatia lúpica, vários pesquisadores têm proposto um sistema semiquantitativo de graduação das lesões ativas, potencialmente reversíveis, e das lesões cronificadas, que representam dano renal irreversível. Um dos sistemas mais utilizados é o que classifica as lesões ativas e cronificadas em, respectivamente, 6 e 4 parâmetros histológicos. Cada parâmetro pode receber uma nota na escala de 1 a 3, exceto as crescentes epiteliais e a necrose fibrinóide, que, pela sua importância prognóstica, recebem notas de 2 a 6. Desta forma o Índice de Atividade (IA) pode ter o valor de 0 a 24 e o Índice de Cronicidade (IC),
Pontos-chave: • As lesões histológicas renais no LES são heterogêneas e sujeitas a transformações no decorrer do seguimento a longo prazo • A glomerulonefrite focal/segmentar e a glomerulonefrite proliferativa difusa são as formas mais graves de envolvimento renal • Necrose fibrinóide, lesões em “alça de arame”, crescentes epiteliais e imunofluorescência rica constituem achados típicos da nefrite lúpica
Manifestações Clínicas As manifestações clínicas do envolvimento renal no LES dependem da natureza e da gravidade das lesões histológicas renais. De modo geral, as alterações urinárias ou funcionais são concomitantes com outros sintomas sistêmicos do LES e, raramente, sinais de nefrite se apresentam como manifestação inicial nesta doença. No Quadro 23.4, podese notar que existe uma boa correlação entre as classes histológicas da nefrite lúpica e os principais parâmetros do envolvimento renal. Pacientes com as formas mais leves de lesões histológicas, confinadas à região mesangial (classe II – OMS), em geral têm sedimento urinário inativo e a proteinúria, presente em um terço desses pacientes, é menor que 1 g ao dia, nunca atingindo níveis nefróticos. Os testes sorológicos, entretanto, podem estar alterados: é comum a ocorrência de títulos elevados de anti-DNA e baixo nível de complemento sérico, mesmo não havendo comprometimento da função renal. As alterações clínicas renais são mais evidentes entre os pacientes com a glomerulonefrite proliferativa focal (classe III — OMS), constatando-se hematúria e cilindros hemáticos em metade desse grupo; a proteinúria está sempre presente, com características nefróticas em aproximadamente 30% dos casos. Hipertensão arterial é muito freqüente e a sorologia para LES costuma estar positiva no momento da biópsia renal.
429
capítulo 23
Quadro 23.4 Classes histológicas e quadro clínico-laboratorial da nefrite lúpica Classe/OMS I. II. III. IV. V.
NORMAL MESANGIAL PROLIFERATIVA FOCAL PROLIFERATIVA DIFUSA MEMBRANOSA
Sedimento urinário ativo
Proteinúria
Síndrome nefrótica
Disfunção renal
0 ⬍ 25% 50% 75% 50%
0 25-50% 65% 95-100% 95-100%
0 0 25-30% 50% 90%
0 ⬍ 15% 10-25% ⬎ 50% 10-20%
Pacientes com glomerulonefrite proliferativa difusa (classe IV — OMS) se apresentam com a forma mais ativa, e freqüentemente grave, de envolvimento renal. Ao redor de 75% dos casos têm sedimento urinário alterado, e mais da metade apresenta síndrome nefrótica franca. Insuficiência renal moderada é bastante comum, podendo, entretanto, ocorrer perda rápida de função, até níveis dialíticos, em 20% dos pacientes. Na glomerulonefrite membranosa do LES (classe V — OMS) o quadro clínico habitual é o da síndrome nefrótica com função renal preservada. Sedimento urinário ativo e hipertensão arterial podem estar presentes de modo inconstante. A nefropatia membranosa lúpica pode estar associada à trombose da veia renal, como complicação da síndrome nefrótica e/ou por defeitos de coagulação da própria doença de base, como, por exemplo, a presença de anticorpos antifosfolipídicos. A trombose da veia renal pode ocorrer sem qualquer manifestação clínica ou, então, acompanhar-se de aumento da proteinúria, de redução do ritmo de filtração glomerular, ou mesmo de tromboembolismo pulmonar. No seguimento a médio e longo prazos de pacientes com nefropatia lúpica, é freqüente a transformação de uma classe histológica para outra. As alterações mesangiais podem evoluir para lesões mais graves (classe III ou IV) e, quando isto ocorre, muda também o perfil laboratorial, que passa a se apresentar com sorologia positiva, sedimento urinário ativo, aumento da proteinúria e até certo grau de disfunção renal. Cerca de 25% dos pacientes com nefrite lúpica, apesar de tratados de maneira adequada, poderão evoluir de modo progressivo para insuficiência renal crônica. Na fase
Pontos-chave: • Síndrome nefrótica, hematúria e disfunção renal caracterizam a glomerulonefrite proliferativa difusa do LES • Síndrome nefrótica, função renal normal e reduzida atividade sorológica caracterizam a glomerulonefrite membranosa do LES
de tratamento dialítico, habitualmente as manifestações clínicas e sorológicas remitem. A mortalidade dos pacientes em diálise é semelhante à dos demais pacientes renais crônicos. O transplante renal costuma ser bem-sucedido, recomendando-se sua realização após um período mínimo de 12 meses de inatividade clínica do LES. A recorrência de nefrite lúpica no rim transplantado tem sido relatada, porém é bastante rara.
Avaliação Laboratorial A nefrite lúpica é tipicamente uma doença de evolução a longo prazo, caracterizada por episódios de recidivas e períodos de remissão. Um dos aspectos mais importantes no seguimento destes pacientes é, portanto, a detecção precoce dos surtos de atividade renal, para o uso judicioso das drogas imunossupressoras. Uma série de testes sorológicos sabidamente está alterada na atividade lúpica: velocidade de hemossedimentação, proteína C reativa, frações do complemento, auto-anticorpos, imunocomplexos e várias citocinas. Do ponto de vista da atividade nefrítica lúpica, entretanto, os testes com maior valor preditivo são os níveis séricos do complemento total (CH50), da fração C3 e dos títulos de anti-DNA. Hipocomplementemia persistente tem sido associada com progressão da doença renal no LES em alguns estudos prospectivos, porém esta correlação nem sempre está presente. De qualquer forma, no seguimento de pacientes que se encontram em remissão, as alterações sorológicas têm grande importância prognóstica porque podem preceder de meses as demais evidências de envolvimento clínico renal. O exame cuidadoso do sedimento urinário é extremamente útil, especialmente quando suas características podem ser comparadas com exames anteriores, em situações basais. Os exames que avaliam a função renal, tais como creatinina sérica e depuração de creatinina endógena, são considerados indicadores pouco sensíveis das mudanças que ocorrem na filtração glomerular e, freqüentemente, subestimam a gravidade das lesões. A correlação entre lesões histológicas e alterações clínico-laboratoriais pode ser vista no Quadro 23.4.
430
Glomerulopatias Secundárias
Prognóstico e Tratamento O prognóstico e o tratamento da nefropatia do LES dependem da lesão histológica subjacente, do grau de comprometimento da filtração glomerular e, possivelmente, das notas atribuídas aos índices de atividade e cronicidade avaliados pela biópsia renal. Pacientes portadores de alterações renais mínimas ou leves, como ocorre habitualmente na classe II da OMS, não necessitam de tratamento específico para a nefropatia, mas apenas de suporte terapêutico direcionado para as manifestações extra-renais. Assim, corticosteróides em doses baixas, salicilatos ou antimaláricos geralmente controlam bem os surtos de atividade sistêmica que não acometem os órgãos vitais. Deve-se tomar cuidado com o uso de antiinflamatórios não-esteróides em doses altas, pelo risco de piora da função renal, mesmo que a nefropatia tenha evolução estável. A longo prazo, os pacientes com alterações urinárias leves (proteinúria ⬍ 1,0 g/dia, creatinina sérica normal) têm bom prognóstico, com sobrevida renal superior a 85% em 10 anos. Em 20 a 30% dos casos o quadro clínico da classe II pode sofrer transformação para doença renal mais ativa, acompanhando também a transformação da lesão histológica, uma das mais marcantes características do envolvimento renal no LES. Pacientes com glomerulonefrite membranosa geralmente se apresentam com o quadro da síndrome nefrótica com função renal estável. O prognóstico a longo prazo é muito bom, havendo forte tendência à remissão total ou parcial da proteinúria nefrótica em mais de 50% dos pacientes no prazo de cinco anos. A conduta terapêutica para a classe V do LES é bastante controversa mas, habitualmente, os pacientes com esta lesão não necessitam de terapêutica imunossupressora agressiva. Na experiência relatada de vários Serviços, utiliza-se a prednisona em doses de 0,5 a 1,0 mg/kg/dia durante oito semanas, com retirada progressiva de 20 mg a cada dois meses. Nos pacientes com resposta irregular ao corticosteróide e manutenção do estado nefrótico muito sintomático, pode ser associada a ciclofosfamida na forma de pulsos endovenosos mensais, na dose de 1,0 g/m2 de superfície corpórea, por três a seis meses. Relatos recentes da literatura têm mostrado bons resultados com o uso prolongado de ciclosporina na nefropatia membranosa lúpica refratária às medidas convencionais; a maior limitação ao uso deste agente se refere à elevada taxa de recidiva da proteinúria, após sua suspensão. As glomerulonefrites proliferativas focal grave (classe III) e difusa (classe IV) devem ser consideradas em conjunto, já que têm o mesmo prognóstico e manifestações clínicas semelhantes. Nestes casos, a forma de tratamento será mais agressiva, com corticosteróides em doses elevadas e drogas citostáticas administradas a longo prazo. O uso de metil-prednisolona sob forma de pulsos endovenosos (1,0 g ao dia, por três dias) estará indicado para reverter as atividades sistêmica e renal mais graves, especialmente se
ocorrer disfunção renal. A corticoterapia por via oral é feita habitualmente com prednisona, 60 a 80 mg ao dia durante seis a oito semanas, seguida da redução lenta, na dependência do controle clínico adequado da atividade da doença. O uso de drogas citostáticas provavelmente estará indicado na maioria dos pacientes com classe IV, uma vez que tem sido demonstrado serem eficazes no controle das recidivas, na prevenção da insuficiência renal crônica e na redução da dose total de corticosteróides. O esquema ideal ainda não está bem estabelecido; um dos mais utilizados é o da administração endovenosa de ciclofosfamida na dose de 0,75 g por m2 de superfície corpórea, sob forma de pulsos mensais e trimestrais, num total de 18 a 24 meses, se a atividade renal estiver bem controlada. O uso da ciclofosfamida exige, evidentemente, rigoroso seguimento dos pacientes, com o sentido de se detectar qualquer efeito colateral mais sério, tal como leucopenia, infecções e cistite hemorrágica. Outros esquemas de tratamento da nefrite lúpica (classe IV) incluem a ciclofosfamida na fase de indução (3 a 6 meses iniciais), substituída posteriormente, na fase de manutenção, por drogas alternativas menos tóxicas, como a azatioprina e o micofenolato mofetil. Este último agente tem-se revelado como opção bastante eficaz na nefrite lúpica, porém seu custo elevado limita o uso corrente. A terapêutica adjuvante da nefrite lúpica tem também importante papel na prevenção da cronificação renal e da morbidade cardiovascular. Desta forma, o controle da hipertensão, da obesidade e da dislipidemia e a interrupção do tabagismo constituem medidas saudáveis neste contexto de atuação multifatorial. As drogas inibidoras da enzima conversora da angiotensina têm efeitos antiproteinúricos e outros efeitos antiproliferativos, admitindo-se que possam atuar como moduladores negativos da reação inflamatória e como inibidores da síntese de citocinas fibrogênicas. O prognóstico dos pacientes portadores das lesões proliferativas das classes III e IV tem melhorado muito nos
Pontos-chave: • O tratamento da glomerulonefrite proliferativa difusa do LES deve ser feito com esquemas de imunossupressão prolongada • O tratamento da glomerulonefrite membranosa do LES é controverso, devendo ser evitada a imunossupressão agressiva • O tratamento das lesões mesangiais é desnecessário, sendo indicado apenas o controle das manifestações extra-renais
431
capítulo 23
últimos anos. A sobrevida acima de 10 anos é atualmente maior que 80%, isto devido ao diagnóstico mais precoce do envolvimento renal, ao controle da hipertensão e dos fatores de risco cardiovascular, e à instituição de esquemas imunossupressores mais eficazes.
VASCULITES SISTÊMICAS NECROTIZANTES O termo vasculite renal tem sido empregado na literatura médica em duas situações distintas: 1) para descrever o envolvimento dos rins nas vasculites sistêmicas e 2) para descrever a presença de glomerulonefrites crescênticas e necrotizantes, sem depósitos imunes, com lesões glomerulares idênticas às vasculites microscópicas. Este padrão de glomerulonefrite crescêntica pauciimune tem sido incluído no grupo das vasculites renais não só pela semelhança histológica com as demais vasculites, mas também pelo fato de os pródromos clínicos serem da mesma ordem (febre, anemia, mialgias) e, em certas ocasiões, ocorrer a disseminação da doença, constatada até mesmo em necrópsias. A glomerulonefrite crescêntica e necrotizante, que ocorre sem evidência de vasculite sistêmica, tem sido chamada de “glomerulonefrite crescêntica idiopática” ou crescêntica pauciimune com o sentido de que não pertence às categorias imunopatológicas conhecidas de glomerulonefrites crescênticas, quais sejam, as decorrentes da localização tecidual de imunocomplexos e aquelas que resultam da injúria pelo anticorpo antimembrana basal glomerular (anti-GBM). As vasculites renais podem ser causadas por uma série de entidades que se caracterizam por processo inflamatório em vasos de praticamente todos os calibres, incluindo artérias, arteríolas, capilares glomerulares e os vasos retos da medula renal. Um dos maiores problemas no estudo das vasculites sistêmicas é a sua classificação: estas doenças podem ser descritas de acordo com o calibre do vaso envolvido, de acordo com síndromes orgânicas, com os achados histopatológicos ou, ainda, segundo supostos mecanismos etiopatogênicos. Com o objetivo de superar estas dificuldades, a Conferência Internacional de Chappel Hill propôs uma classificação de consenso, onde diversas vasculites conhecidas foram agrupadas conforme o calibre dos vasos predominantemente acometidos, como pode ser observado no Quadro 23.5.
Etiologia e Prevalência A etiologia das vasculites sistêmicas é desconhecida. Em certas circunstâncias, tem sido possível identificar agentes causais representados por drogas, tais como: alopurinol, rifampicina, penicilamina, hidralazina e sulfas. Em outras situações, agentes infecciosos têm sido incriminados: vírus B da hepatite, parvovírus B 19, infecções bacterianas. Parece existir predisposição genética em alguns casos de vascu-
Quadro 23.5 Classificação das vasculites (de acordo com a Conferência Internacional de Chappel Hill) 1. VASCULITES DE GRANDES VASOS • ARTERITE TEMPORAL • ARTERITE DE TAKAYASU Envolvimento renal infreqüente: hipertensão renovascular, nefropatia isquêmica 2. VASCULITES DE VASOS DE MÉDIO CALIBRE • POLIARTERITE NODOSA CLÁSSICA Envolvimento renal infreqüente: hipertensão renovascular, nefropatia isquêmica • DOENÇA DE KAWASAKI Envolvimento renal extremamente raro 3. VASCULITES DE PEQUENOS VASOS • GRANULOMATOSE DE WEGENER Afeta capilares, vênulas e arteríolas: comum ocorrência de glomerulonefrite necrotizante e positividade do ANCA • POLIANGEÍTE MICROSCÓPICA Afeta capilares, vênulas e arteríolas: comum ocorrência de glomerulonefrite necrotizante e positividade do ANCA • SÍNDROME DE CHURG-STRAUSS Afeta capilares, vênulas e arteríolas: envolvimento renal infreqüente; positividade do ANCA • PÚRPURA DE HENOCH-SCHÖNLEIN Comum ocorrência de glomerulonefrite mesangial com depósitos de IgA • VASCULITE DA CRIOGLOBULINEMIA Comum ocorrência de glomerulonefrite membranoproliferativa • ANGEÍTE CUTÂNEA LEUCOCITOCLÁSTICA Envolvimento renal muito raro
lites; em pacientes com deficiências hereditárias de alfa1antitripsina, tem sido descrita vasculite ANCA-positiva com anticorpo antiproteinase 3 (ANCA-C). Demonstrou-se recentemente que o antígeno de histocompatibilidade HLADQw7 está associado a vasculite ANCA-positiva, sugerindo forte caráter genético-hereditário nestas doenças. A prevalência de doença renal nas vasculites sistêmicas ocorre em 50 a 90% dos casos. A forma de glomerulonefrite crescêntica necrotizante pauciimune corresponde a aproximadamente 50% de todas as glomerulonefrites rapidamente progressivas. Na nefrite pauciimune, ao redor de 80% dos pacientes têm vasculites sistêmicas e até 85% têm sorologia positiva para o ANCA. Na população geral, vasculites dos vasos de pequeno calibre afetam principalmente a faixa etária acima dos 50 anos, mas podem também atingir pessoas mais jovens.
Patogênese O mecanismo mais freqüentemente envolvido na injúria vascular renal é o do processo inflamatório mediado por
432
Glomerulopatias Secundárias
anticorpos; a imunopatogênese das vasculites, entretanto, ainda não é bem conhecida. A via final comum da inflamação inclui o recrutamento de neutrófilos e macrófagos junto à parede vascular, à qual estas células aderem e na qual penetram e liberam os radicais livres de oxigênio e as enzimas proteolíticas, tais como a elastase, catepsinas, proteinase-3 (PR3) e mieloperoxidase (MPO). Vários mecanismos imunológicos têm sido propostos para explicar a reação inflamatória vascular: 1) deposição de imunocomplexos circulantes; 2) formação in situ de imunocomplexos; 3) interação de anticorpos com antígenos do endotélio; 4) ativação de neutrófilos mediada pelo ANCA. Os três primeiros mecanismos são os mais conhecidos e melhor documentados e envolvem basicamente a ativação de mediadores humorais, especialmente o sistema do complemento, e estão presentes em doenças mediadas por complexos antígeno-anticorpo. O quarto mecanismo ainda não está bem esclarecido, permanecendo no terreno das hipóteses, como veremos a seguir, e estaria presente nas vasculites ANCA-relacionadas. A participação do ANCA como fator determinante da etiopatogênese das vasculites renais, de acordo com estudos recentes, comporta algumas possíveis explicações documentadas em estudos experimentais. Uma primeira possibilidade seria o efeito direto do ANCA na ativação de neutrófilos circulantes, promovendo sua adesão ao endotélio e lesão vascular. Já foi demonstrado que in vitro o ANCA ativa neutrófilos e estes, por sua vez, produzem radicais livres de oxigênio e liberam enzimas proteolíticas de seus grânulos. Este processo de ativação de neutrófilos pode estar facilitado quando estas células são previamente expostas à ação de citocinas, como o fator de necrose tumoral (TNF) e o interferon-alfa. Um segundo mecanismo proposto para as vasculites mediadas pelo ANCA seria a ligação deste anticorpo a antígenos depositados no endotélio, com a formação de imunocomplexos in situ. De acordo com esta hipótese, quando os neutrófilos fossem ativados por algum agente (drogas, vírus, bactérias), os antígenos reconhecidos pelo ANCA (MPO e PR3) seriam liberados e, em vista de sua forte carga catiônica, seriam localizados no endotélio vascular. O ANCA poderia, então, ligar-se a estes antígenos e formar imunocomplexos. Um dos argumentos contra esta hipótese é o fato de depósitos de imunoglobulinas e complemento não serem detectados por tecidos envolvidos na agressão inflamatória (daí, portanto, a denominação de vasculites pauciimunes). Uma terceira hipótese na imunopatogênese das vasculites necrotizantes propõe que as células endoteliais têm a capacidade de expressar antígenos-alvo para o ANCA que, em presença do efeito ativador de citocinas, poderia ligar-se a estes antígenos e formar imunocomplexos in situ. Neste caso, mais uma vez, seria de esperar a demonstração de imunoglobulinas na parede vascular. Não se pode, entretanto, afastar a possibilidade de que uma pequena concentração de anticorpos patogênicos, não detectável pelas técnicas habituais, possa estar presente no sítio da lesão inflamatória.
Pontos-chave: • As vasculites renais são causadas por diferentes formas de agressão imunológica • O anticorpo ANCA está envolvido na patogenia de muitas formas de vasculites que afetam os pequenos vasos, com mínima expressão tecidual de anticorpos e complemento (pauciimunes)
Quadro Clínico A maioria dos pacientes com vasculites ANCA-positivas e envolvimento renal grave se enquadram nos diagnósticos de poliangeíte microscópica, granulomatose de Wegener, ou então, são portadores de glomerulonefrite crescêntica necrotizante pauciimune, sem evidências de vasculite extra-renal. A síndrome de Churg-Strauss é bastante rara; poucos pacientes com esta síndrome apresentam envolvimento renal importante. As vasculites associadas ao ANCA acometem indistintamente ambos os sexos, com maior prevalência por volta dos 55 anos de idade, com predileção para indivíduos da raça branca. Tipicamente, os pacientes se apresentam com febre, anorexia, emagrecimento e astenia, freqüentemente precedidos por pródromos que simulam um quadro viral, com artralgias e mialgias. As manifestações renais nas vasculites ANCA-positivas são polimórficas e incluem desde hematúria e proteinúria assintomáticas, até o quadro grave da glomerulonefrite rapidamente progressiva. A maioria dos pacientes tem hematúria micro- ou macroscópica, proteinúria de 1 a 3 gramas por dia, cilindrúria hemática e creatinina sérica elevada. Hipertensão arterial está presente em 25 a 50% dos pacientes, podendo ser grave, ou mesmo ter características de hipertensão maligna. Outra forma de quadro clínico menos freqüente é o da perda lenta e progressiva da função renal em um período de meses ou anos, geralmente se acompanhando de hematúria e proteinúria. A biópsia renal pode ser extremamente útil nestes casos, quando se torna importante diferenciar os pacientes que têm a forma aguda rapidamente progressiva daqueles portadores de lesões renais cronificadas de modo irreversível, que não irão se beneficiar em nada do tratamento imunossupressor. O envolvimento extra-renal é bastante comum nas vasculites ANCA-positivas. Aproximadamente 50% dos pacientes com glomerulonefrite necrotizante têm acometimento do trato respiratório, com padrões histopatológicos da granulomatose de Wegener ou da poliangeíte microscópica. Nestes pacientes, as manifestações do trato respiratório alto incluem: sinusites, otite média, ulcerações nasais e rinorréia; o quadro pulmonar se traduz por hemoptise, infiltrados evanescentes e nódulos com transformação
433
capítulo 23
cavitária. Alterações gastrointestinais são encontradas em um terço dos pacientes com nefropatia associada ao ANCA. O quadro mais comum é o da gastrite, com sintomas semelhantes ao da úlcera péptica. As manifestações mais graves incluem ulcerações decorrentes de isquemia da mucosa digestiva, perfurações e pancreatite aguda. Outras manifestações extra-renais das vasculites necrotizantes estão relacionadas à pele (púrpura palpável), sistema nervoso periférico (mononeurites), sistema nervoso central (encefalopatia, convulsões), aparelho ocular (episclerite, uveíte) e sistema músculo-esquelético (artrite, miosite). O exame laboratorial mais específico para as vasculites renais microscópicas é o teste do ANCA (anticorpo anticitoplasma de neutrófilos), encontrado em 80 a 90% dos pacientes. Achados menos específicos incluem: velocidade de hemossedimentação e proteína C reativa elevadas, anemia, leucocitose e, ocasionalmente, trombocitose. Eosinofilia é observada em pacientes com a síndrome de Churg-Strauss e, menos freqüentemente, em pacientes com granulomatose de Wegener e poliangeíte microscópica. O padrão de ANCA mais encontrado nas vasculites renais é o perinuclear (p-ANCA), geralmente específico para a mieloperoxidase (MPO-ANCA) e relacionado de modo predominante à poliangeíte microscópica, à glomerulonefrite crescêntica necrotizante e a alguns casos de granulomatose de Wegener. O padrão de ANCA citoplasmático (cANCA), relacionado ao antígeno proteinase-3 (PR3ANCA), é o mais freqüente em pacientes com granulomatose de Wegener, ocorrendo em 90% dos casos na fase ativa desta doença. O anticorpo p-ANCA pode estar presente em 10 a 20% dos pacientes com glomerulonefrite crescêntica associada ao anticorpo antimembrana basal glomerular (anti-GBM). Pacientes com p-ANCA e anti-GBM têm predisposição a apresentar vasculite extra-renal, habitualmente não descrita na síndrome de Goodpasture clássica. Em 10 a 15% de doenças renais mediadas por imunocomplexos, o ANCA pode ser positivo, podendo-se tomar como exemplos a transformação crescêntica de glomerulopatia primária (nefropatia membranosa) e o lúpus eritematoso sistêmico, em que 15% dos pacientes têm p-ANCA que reage com os antígenos citoplasmáticos elastase e lactoferrina.
(síndrome de Goodpasture) ou pelas doenças mediadas por imunocomplexos (lúpus, púrpura de HenochSchönlein, crioglobulinemia). Novamente a sorologia será muito importante no diagnóstico diferencial. O quadro clínico da vasculite sistêmica pode também se confundir com doenças renais sem vasculite e que levam a insuficiência renal rapidamente progressiva, tais como a microangiopatia trombótica e a nefropatia ateroembólica. Neste caso a biópsia renal poderá levar ao diagnóstico definitivo. A documentação histológica é imprescindível para o diagnóstico de vasculite necrotizante. Apesar do elevado grau de especificidade do ANCA, sabe-se hoje que este anticorpo pode ser positivo em doenças infecciosas (por exemplo, endocardite), hepatopatias auto-imunes e em algumas formas de enterocolopatias inflamatórias, sem qualquer relação com o envolvimento vascular. A biópsia renal estará indicada, portanto, para se estabelecer o diagnóstico definitivo da vasculite renal e para se avaliar o grau de reversibilidade das lesões.
Patologia O aspecto histológico dominante no parênquima renal de pacientes com vasculites é o da glomerulonefrite necrotizante focal e segmentar, sem depósitos de imunoagregados ou evidências de proliferação celular intraglomerular. Em 80% dos casos ocorre a formação de crescentes epiteliais agudos ou em vários estágios de evolução. Em geral existe boa correlação entre a creatinina sérica inicial e o percentual de glomérulos comprometidos com os crescentes. Nas doenças por imunocomplexos o aspecto histológico inclui a proliferação mesangial, o infiltrado celular à custa de neutrófilos e monócitos e a típica imunofluores-
Diagnóstico Diferencial As manifestações clínicas das vasculites renais associadas ao ANCA são similares às vasculites mediadas por imunocomplexos, tais como a púrpura de HenochSchönlein, a vasculite da crioglobulinemia essencial, a vasculite lúpica e as vasculites secundárias às infecções virais e bacterianas (vírus B, estreptococos). A análise sorológica adequada poderá ser útil na diferenciação entre estas doenças. A síndrome renal-pulmonar pode ser causada pelas vasculites associadas ao ANCA, pela doença anti-GBM
Fig. 23.4 Glomerulonefrite focal e segmentar necrosante em paciente com poliangeíte microscópica (PAMSS 450⫻).
434
Glomerulopatias Secundárias
cência nas diferentes entidades: o predomínio de IgA na púrpura de Henoch-Schönlein, os depósitos maciços de agregados de IgM na crioglobulinemia e a fluorescência rica com todos os isotipos de imunoglobulinas e componentes do complemento no lúpus eritematoso sistêmico. Na granulomatose de Wegener pode ser encontrada ocasionalmente formação de granuloma periglomerular. Infiltrado intersticial é achado freqüente na vasculite renal e geralmente acompanha a nefrite crescêntica grave. Granulomas necrotizantes intersticiais, com células gigantes multinucleadas, raramente são observados na granulomatose de Wegener. O envolvimento vascular extraglomerular é pouco freqüente: em apenas 30 a 50% das biópsias as arteríolas podem estar envolvidas pela vasculite. Este fato provavelmente decorre de um erro de amostragem da biópsia renal, uma vez que vasculite arteriolar pode ser encontrada em praticamente todos os casos que vão para a necrópsia. A lesão vascular renal predominante é a da inflamação dos pequenos vasos com infiltrado perivascular à custa de neutrófilos, linfócitos e monócitos. Ocorre também necrose fibrinóide da parede e ruptura das lâminas internas e externas, com insudação de proteínas no interior da parede vascular e no tecido perivascular. Alguns pacientes com vasculites ANCA-positivas, especialmente granulomatose de Wegener, apresentam lesões necrotizantes segmentares nos capilares peritubulares e nos vasos retos da medula renal. Granuloma de células gigantes e monócitos também podem ser observados em situação perivascular.
Tratamento A sobrevida média dos pacientes com vasculite necrotizante, antes do advento da terapêutica imunossupresso-
Fig. 23.5 Vasculite renal necrosante aguda de artéria de pequeno calibre, com intensa reação inflamatória transmural (H.E. 280⫻).
Fig. 23.6 Glomerulomatose de Wegener. Nota-se infiltrado periglomerular com células gigantes, linfócitos e macrófagos (PAMSS 250⫻).
ra, era no máximo de seis meses. Atualmente, várias séries da literatura têm apontado para sobrevida de até 70% em cinco anos, com o uso intensivo de corticosteróides e ciclofosfamida. A corticoterapia isolada não previne as recidivas que freqüentemente ocorrem nas vasculites necrotizantes, especialmente no que se refere à granulomatose de Wegener. O tratamento das vasculites renais inclui duas importantes fases: a da indução e a da manutenção terapêutica a longo prazo. Nas fase de indução, a droga de escolha é a metil-prednisolona, administrada sob forma de pulsos intravenosos (1,0 g por três dias consecutivos), seguida de prednisona por via oral na dose de 0,5-1,0 mg/kg/dia. Ciclofosfamida deve ser acrescentada a este esquema, preferencialmente por via oral, na dose de 1 a 3 mg/kg/dia, dependendo da função renal e da contagem de leucócitos. Em casos de vasculite extra-renal grave, ou mesmo na perda rápida da função renal até o nível dialítico, tem sido proposto o uso de plasmaférese intensiva, com 7 a 10 trocas diárias de 4 litros de plasma e substituição por albumina. Este método envolve alto custo e não está isento de complicações de ordem infecciosa. Após a fase da indução terapêutica da doença aguda, que dura até 8-12 semanas, inicia-se a fase do tratamento de manutenção (12 a 24 meses) com ciclofosfamida oral, 1 a 2 mg/kg/dia, acompanhada de prednisona, 10 a 20 mg/dia. Uma forma alternativa de tratamento na fase de manutenção é o uso da ciclofosfamida intravenosa sob forma de pulsos mensais na dose de 0,75-1,0 g/m2 de superfície corporal, por um período variável, de 6 a 12 meses. Azatioprina na dose de 2 mg/kg/dia também tem sido proposta como droga eficaz e menos tóxica que os agentes alquilantes na fase de manutenção, associada a doses baixas de prednisona. Também o micofenolato mofetil (MMF), na dose de 1 a 2 g/dia, pode ser usado nesta fase.
435
capítulo 23
Novas modalidades de tratamento das vasculites renais têm sido recentemente sugeridas, tais como gamaglobulina endovenosa em altas doses e uso de anticorpos monoclonais. O real benefício desses procedimentos na doença renal grave ainda não foi demonstrado. Alguns pacientes com granulomatose de Wegener, tratados com sulfa-trimetoprim, têm menor índice de recidivas da doença, provavelmente pelo efeito profilático desta associação no controle das infecções do trato respiratório, que podem desencadear a atividade das vasculites necrotizantes. Na avaliação da resposta terapêutica a longo prazo, devem ser cuidadosamente pesquisados os sinais e sintomas clínicos da atividade sistêmica e renal. Dentre os testes de laboratório usuais, a proteína C reativa, a velocidade de hemossedimentação, o sedimento urinário, a proteinúria quantitativa e a creatinina sérica devem ser habitualmente solicitados no seguimento. Na granulomatose de Wegener, a negativação do ANCA tem boa correlação com as fases inativas da doença, se bem que ANCA positivo pode ocorrer em até 25% dos pacientes que estão evoluindo assintomáticos. Dentre os pacientes que sobrevivem, a recuperação da função renal pode ocorrer após certo período de tratamento dialítico, que varia de 4 até 12 meses. Tão logo a função renal se recupere, é comum a ocorrência de proteinúria maciça e síndrome nefrótica, que a seguir remite lentamente com o passar do tempo. As recidivas nas vasculites associadas ao ANCA são relativamente freqüentes e estão diretamente relacionadas com a menor intensidade e menor duração do tratamento imunossupressor na fase de manutenção.
Pontos-chave: • A histologia renal mais freqüente nas vasculites é a da glomerulonefrite necrotizante segmentar e focal pauciimune, com crescentes • As vasculites associadas ao ANCA são a granulomatose de Wegener, a poliangeíte microscópica e a síndrome de ChurgStrauss • O tratamento das vasculites renais ANCApositivas, na fase de indução, inclui os corticosteróides em doses elevadas e a ciclofosfamida, preferencialmente por via oral • Na fase de manutenção (12 a 24 meses), o tratamento pode ser feito com ciclofosfamida endovenosa mensal, azatioprina ou micofenolato mofetil
PÚRPURA DE HENOCH-SCHÖNLEIN A púrpura de Henoch-Schönlein é definida como síndrome que habitualmente se manifesta como vasculite de pequenos vasos da pele, do trato gastrointestinal, das articulações e do tecido renal. As principais manifestações clínicas desta síndrome incluem a púrpura dos membros inferiores, artralgias, dor abdominal, sangramentos gastrointestinais e glomerulonefrite. Existem poucos estudos sobre a prevalência da púrpura de Henoch-Schönlein na população. Trabalhos realizados por autores escandinavos relatam ocorrência de 18 casos por 100.000 crianças com até 14 anos de idade e 0,8 caso por 100.000 habitantes, com idade de 15 anos em diante. Trata-se, portanto, de uma afecção que atinge especialmente crianças com menos de 10 anos de idade, sendo incomum em adultos. O sexo masculino é mais acometido, numa proporção de 2:1 em relação ao sexo feminino.
Etiologia e Patogênese A maioria dos pacientes com púrpura de HenochSchönlein relata antecedente de infecção do trato respiratório, precedendo o quadro clínico típico desta síndrome. Vários agentes patogênicos têm sido implicados na etiologia da púrpura de Henoch-Schönlein, sendo citados estreptococos beta-hemolíticos, estafilococos, micobactérias, Haemophilus, Yersinia e numerosos vírus. Mais raramente, os episódios de vasculite podem surgir após a ingestão de drogas ou de alimentos. Evidências clínicas e laboratoriais sugerem fortemente que fatores imunológicos estejam envolvidos na púrpura de Henoch-Schönlein. Além dos antecedentes de exposição a antígenos já citados, depósitos de imunoglobulinas e frações do complemento estão invariavelmente presentes na pele e nos glomérulos renais. Devido às semelhanças histológicas com a nefropatia da IgA (doença de Berger), muitos pesquisadores admitem que a púrpura de Henoch-Schönlein seja a forma de manifestação sistêmica daquela nefropatia. Nas duas entidades em questão, podemos detectar aumento na concentração sérica de IgA-fibronectina, imunocomplexos e fatores reumatóides da classe IgA, além de maior número de linfócitos B secretores de IgA. Estudos recentes também têm demonstrado que na nefropatia da IgA e, possivelmente, na púrpura de Henoch-Schönlein a estrutura da molécula da IgA estaria alterada quanto à sua composição de resíduos de carboidratos, via defeito genético. Esta alteração estrutural levaria a uma menor ligação aos receptores hepáticos, responsáveis por seu clareamento da circulação e, conseqüentemente, maior deposição em outros tecidos, tais como o mesângio glomerular. Apesar de inúmeras outras evidências de desregulação imunológi-
436
Glomerulopatias Secundárias
ca na púrpura de Henoch-Schönlein, sua patogênese ainda continua desconhecida.
Manifestações Clínicas A púrpura de Henoch-Schönlein pode ocorrer em qualquer faixa etária, porém, a maior prevalência se situa em crianças com menos de 10 anos de idade e, preferencialmente, no sexo masculino, numa proporção de 2:1 em relação ao sexo feminino. O antecedente mais comum costuma ser um episódio recente de infecção das vias aéreas superiores, seguindo-se então o típico rash purpúrico na face de extensão dos membros inferiores, artralgias, dores abdominais, hematúria e proteinúria. Em geral, os sinais e sintomas de cada surto purpúrico duram até três meses, exceto a nefrite, que pode ser evolutiva e se cronificar. Habitualmente, ocorrem duas a três recidivas da síndrome durante o primeiro ano, com tendência a remissões prolongadas, no seguimento a longo prazo. A hematúria macroscópica é a manifestação mais comum do envolvimento renal na púrpura de HenochSchönlein, ocorrendo em até 80% dos pacientes. Hematúria microscópica e síndrome nefrótica são bem menos freqüentes. Ocasionalmente, as manifestações renais têm as características da síndrome nefrítica com edema, hipertensão e redução da filtração glomerular. Em pacientes adultos, tem sido descrita a variante da glomerulonefrite rapidamente progressiva, que evolui quase sempre para a insuficiência renal terminal.
Alterações Laboratoriais e Diagnóstico Diferencial O diagnóstico da púrpura de Henoch-Schönlein é essencialmente clínico. O rash cutâneo, associado a artralgias, dor abdominal e hematúria, sugere fortemente o diagnóstico. Os testes laboratoriais podem ser vitais na exclusão de outros diagnósticos. Contagem de plaquetas e provas de coagulação habitualmente são normais, e o complemento sérico raramente está diminuído; fator antinúcleo e fator reumatóide clássico são negativos, assim como o anticorpo anticitoplasma de neutrófilo (ANCA). A IgA sérica está elevada em aproximadamente 50% dos pacientes, e crioglobulinas podem estar presentes. Imunocomplexos circulantes contendo IgA polimérica ou IgA ligada à fibronectina podem ser demonstrados, especialmente nos períodos de atividade da doença. Dentre as manifestações renais, as mais características são a hematúria microscópica com dismorfismo moderado, cilindros granulosos e/ou hemáticos e proteinúria menor que 2,0 g nas 24 horas. O diagnóstico diferencial deve ser feito com a glomerulonefrite aguda pós-estreptocócica, com o lúpus eritematoso sistêmico e com a crioglobulinemia mista, que podem ser afastados pelo estudo sorológico adequado.
Alterações Patológicas A biópsia de pele nas áreas afetadas pelo quadro purpúrico mostra o aspecto típico de vasculite leucocitoclástica de pequenos vasos, com deposição de IgA. O infiltrado inflamatório habitualmente inclui neutrófilos, histiócitos e eosinófilos, com localização perivascular. Podem também estar presentes necrose fibrinóide da parede vascular, extravasamento de eritrócitos e debris nucleares, que resultam da desintegração de neutrófilos. A biópsia renal de pacientes com a púrpura de HenochSchönlein pode revelar desde proliferação mesangial leve, até lesões mais graves de glomerulonefrite endocapilar difusa, com ou sem crescentes epiteliais. A presença de IgA no mesângio, demonstrada pela imunofluorescência, é o mais importante critério diagnóstico de envolvimento renal na púrpura de Henoch-Schönlein. Tendo em vista a semelhança dos achados histológicos nesta entidade e na nefropatia de IgA, pode-se supor que estas doenças tenham uma mesma base etiopatogênica.
Tratamento e Prognóstico Não há tratamento específico e eficaz para a púrpura de Henoch-Schönlein. Tendo em vista que a maioria dos casos se resolve espontaneamente, recomenda-se preferencialmente a terapêutica de suporte, que inclui o adequado balanço hidroeletrolítico, a pesquisa de eventual sangramento do trato digestivo, o tratamento das infecções associadas e a monitorização da função renal. A maioria dos pacientes tem envolvimento renal de pouca repercussão clínica, com hematúria microscópica, proteinúria leve e função renal conservada. Nestes casos, recomenda-se apenas o tratamento de suporte. Pacientes com insuficiência renal ou síndrome nefrótica devem ser biopsiados e, tendo lesões proliferativas mais graves, podem ser tratados com prednisona (1 mg/kg/dia), ciclofosfamida e/ou gamaglobulina intravenosa. A eficácia destes esquemas imunossupressores, no entanto, é bastante discutível. O prognóstico renal da púrpura de Henoch-Schönlein depende basicamente do quadro clínico inicial e das lesões histológicas subjacentes. Pacientes com hematúria microscópica e proliferação mesangial evoluem muito bem, com morbidade menor que 10% ao final de 10 anos. Pacientes com síndrome nefrótica persistente, elevação da creatinina sérica e presença de nefrite grave com mais de 50% de crescentes evoluem para a insuficiência renal crônica. O transplante renal tem sido indicado para os pacientes que chegam ao estágio de falência renal terminal, sendo freqüente a recidiva da doença original. A perda do enxerto, entretanto, costuma ocorrer somente nos casos em que a doença inicial foi muito agressiva, caracterizada pela evolução para insuficiência renal em menos de três anos após o diagnóstico da síndrome.
437
capítulo 23
Pontos-chave: • Na púrpura de Henoch-Schönlein o quadro clínico é de púrpura palpável de membros inferiores, artralgias, dor abdominal e glomerulonefrite (hematúria, proteinúria não-nefrótica) • Imunofluorescência renal com predomínio de IgA no mesângio, com depósitos ocasionais de outras imunoglobulinas e C3 • Tratamento de suporte na hematúria assintomática e tratamento imunossupressor se ocorrer síndrome nefrótica ou glomerulonefrite rapidamente progressiva
SÍNDROME DE GOODPASTURE (glomerulonefrite antimembrana basal glomerular) A glomerulonefrite antimembrana basal glomerular (anti-MBG), embora rara, é importante causa de uma forma grave de nefropatia que se manifesta com alto índice de morbidade e mortalidade. Apresenta-se, comumente, como síndrome de Goodpasture (GP), caracterizada por um quadro de insuficiência renal com hemorragia pulmonar. Em outras situações, ainda que a lesão renal seja do tipo rapidamente progressiva (GNRP), com crescentes epiteliais à biópsia, não há comprometimento pulmonar. Formas leves de hematúria microscópica, sem manifestações clínicas, são raramente vistas. A síndrome de Goodpasture acomete indivíduos em qualquer idade, com dois picos distintos de prevalência, na segunda e na quinta décadas de vida. Esta síndrome predomina em jovens do sexo masculino, enquanto em mulheres acima de 50 anos a forma GNRP, sem acometimento pulmonar, é mais freqüente. Nos países do hemisfério norte, ocorre uma típica distribuição sazonal (mais comum na primavera) e racial, com acometimento quase exclusivo da raça branca.
Quadro Clínico Exceto quando há hemorragia pulmonar, sugerindo a síndrome de Goodpasture, o quadro clínico difere de outras formas de GNRP. A oligúria é quase uma constante, com a insuficiência renal instalando-se em poucos dias, vindo 75% dos pacientes a necessitar de diálise. A anemia do tipo ferropriva é muito comum, provavelmente devida ao sangramento intra-alveolar. O fumo e inalantes hidrocarbonados podem precipitar a hemorragia pulmonar. A queda de função renal habitualmente acompanha estes
fenômenos hemorrágicos. A hematúria microscópica, com dimorfismo eritrocitário, é a alteração mais freqüente, podendo, raramente, ser a única manifestação da doença. A proteinúria é discreta, sendo incomuns a síndrome nefrótica e a hipertensão. Alguns pacientes com envolvimento pulmonar exclusivo foram descritos, exigindo um diagnóstico diferencial com a hemossiderose pulmonar idiopática. Casos foram relatados em que a hemorragia precedeu a nefropatia em até alguns meses. Outras glomerulonefrites, acompanhando doenças sistêmicas, podem cursar com hemorragia pulmonar. Entre elas, o lúpus eritematoso sistêmico (LES) e as vasculites (granulomatose de Wegener, púrpura de HenochSchönlein). O diagnóstico diferencial da glomerulonefrite antimembrana basal glomerular (GN anti-MBG) com as vasculites compreende a detecção de anticorpo antimembrana basal no soro de pacientes com GN anti-MBG, e do anticorpo anticitoplasma de neutrófilos (ANCA) em pacientes com granulomatose de Wegener e poliangeíte microscópica. No entanto, em alguns pacientes, a diferenciação pode não ser tão simples, uma vez que tem sido descrita vasculite extra-renal na GN anti-MBG, com o ANCA positivo em aproximadamente 10 a 20% dos casos.
Alterações Patológicas Do ponto de vista anatomopatológico, é a imunofluorescência (IF) o principal indicador do diagnóstico da GN anti-MBG pelo característico padrão linear do depósito de IgG ao longo da parede capilar glomerular. As imunoglobulinas IgA e IgM são raramente vistas. O mesmo padrão linear de IgG pode ser encontrado na membrana basal tubular. Depósito de C3 ocorre em 2/3 dos pacientes, sendo geralmente linear, às vezes descontínuos ou de aspecto granular. Depósitos de fibrina são vistos nos crescentes epiteliais e em alças capilares. Outras patologias podem apresentar o padrão linear à IF, como é o caso de depósito de albumina e IgG no diabetes mellitus e de IgG no LES. Falsa deposição linear de imunoglobulinas pode ser verificada em material de autópsia, e após perfusão renal do doador durante o transplante, sendo possível que a isquemia exerça um papel nesta forma de apresentação da IF. Deve-se ressaltar que, nos estados muito avançados da doença, o depósito fluorescente poderá ser irregular, devido à fragmentação da alça capilar. A microscopia ótica revela, geralmente, uma glomerulonefrite proliferativa com crescentes epiteliais, sendo habitual estarem os glomérulos no mesmo estágio de lesão. A presença de leucócitos e macrófagos pode ser abundante na luz capilar e, raramente, há proliferação de células mesangiais. Edema e infiltrado inflamatório no interstício são vistos freqüentemente. A microscopia eletrônica mostra ausência de imunodepósitos, alargamento da membrana basal glomerular à custa de substância lucente na lâmina rara interna, presen-
438
Glomerulopatias Secundárias
ça de fibrina nos capilares e nos crescentes, e ruptura de segmentos da membrana basal glomerular e da cápsula de Bowman.
Patogênese A partir do modelo experimental da nefrite nefrotóxica auto-imune de Masugi, caracterizou-se a GN anti-MBG humana como imunologicamente mediada. A presença dos anticorpos anti-MBG pode ser demonstrada tanto no soro como em eluatos de rim de animais e seres humanos portadores da doença, sendo este anticorpo capaz de produzir a lesão renal quando injetado em animais sadios. O fator que desencadeia a formação do anticorpo não é conhecido. O primeiro paciente descrito por Goodpasture era portador de influenza, mas posteriormente essa associação não foi verificada. A doença ocorre, ocasionalmente, em pintores e em pessoas que têm contato com poluentes orgânicos. Os indivíduos HLA DR2 são mais suscetíveis a desenvolver esta patologia, porém não existe uma nítida relação com sua ocorrência em grupos familiares. A MBG é composta por colágeno IV, laminina, entactina, glicosaminoglicanos e heparano sulfatos. No colágeno tipo IV foram identificadas seis cadeias alfa; sua estrutura básica monomérica é formada por três cadeias arranjadas de forma helicoidal, com as tríplices cadeias se associando entre si para formar a supra-estrutura do colágeno IV. Cada cadeia apresenta um longo domínio colágeno, alternado seqüencialmente por curtos segmentos não-colágenos (NC). A fração antigênica da GN anti-MBG encontra-se na porção não-colágena da cadeia alfa 3, e o anticorpo contra esta fração é habitualmente uma IgG com predomínio da subclasse IgG1. Pacientes com síndrome de Alport apresentam mutação genética na cadeia alfa 3. Alguns desses indivíduos, quando submetidos a transplante renal, desenvolvem anticorpos contra a cadeia alfa 3, ocasionando a glomerulonefrite da síndrome de Goodpasture. Anticorpos contra outros componentes da MBG têm sido descritos em outras patologias, como doença de Chagas, leishmaniose tegumentar, LES, glomerulonefrite pósestreptocócica, síndrome nefrótica idiopática. Alguns pacientes com glomerulonefrite membranosa foram descritos evoluindo com GNRP, sendo detectado o anticorpo anti-MBG no soro de 20% destes casos.
Concluindo, é possível que uma agressão de qualquer natureza (infecciosa, traumática, química), que possa lesar a MBG, exponha o antígeno de GP, desencadeando o processo em indivíduos geneticamente predispostos à doença. A interação antígeno-anticorpo ocasiona a ativação do complemento, leucócitos e macrófagos, liberação de mediadores (leucotrienos, citocinas) e intensa lesão inflamatória.
Prognóstico e Tratamento O tratamento da glomerulonefrite anti-MBG depende da precocidade do diagnóstico e da gravidade da lesão à biópsia renal. Os casos leves, sem déficit de função renal, podem prescindir de uma terapêutica específica. Diversos autores são unânimes em afirmar que pacientes anúricos com creatinina ⬎ 6 mg/dl dificilmente poderão se beneficiar com a medicação imunossupressora, dado o caráter de rápida colagenização dos crescentes glomerulares. A plasmaférese é a terapêutica de escolha, especialmente quando ocorrer hemorragia alveolar, e tem a finalidade de remover o auto-anticorpo circulante. A troca de plasma diária (4 L/dia) deve ser mantida por um período mínimo de 10 dias. Geralmente, em oito semanas de tratamento, o anticorpo torna-se indetectável. A prednisona, como antiinflamatório, e a ciclofosfamida (2 mg/ kg/dia), que tem o efeito de inibir a síntese do anticorpo, devem ser associadas, a fim de se manter a remissão. Na fase inicial do tratamento, poderá ser utilizada a metilprednisolona (MP) endovenosa na dose de 15 a 20 mg/ kg/dia, em três dias consecutivos. Após a terceira dose, a corticoterapia deve ser mantida por via oral, com dose inicial de 1 mg/kg/dia, e redução de acordo com a resposta terapêutica. A hemorragia pulmonar é também um grande limitante da sobrevida. Quando isolada, poderá ser tratada com pulsos endovenosos de MP e plasmaférese. Não há contra-indicação ao transplante para pacientes com síndrome de Goodpasture que evoluem para insuficiência renal crônica terminal, devendo-se tomar o cuidado de não realizá-lo enquanto houver o anticorpo anti-MBG detectado na circulação.
ANTÍGENO GP s s CADEIA ␣3
NCl
Fig. 23.7 Representação esquemática da estrutura da membrana basal glomerular. O antígeno de Goodpasture está contido no segmento não-colágeno (NC) da cadeia alfa 3.
439
capítulo 23
PARAPROTEINEMIAS E DISPROTEINEMIAS
Fig. 23.8 Síndrome de Goodpasture, aspecto de glomerulonefrite com crescente epitelial (H.E. 450⫻).
Constituem um grupo de doenças que se acompanham da produção de proteínas monoclonais ou de deposição de macromoléculas de composição complexa ao nível glomerular. Destacam-se, pela freqüência e gravidade, o mieloma múltiplo, a macroglobulinemia de Waldenström, as discrasias plasmocitárias associadas à amiloidose AL e as doenças de cadeia leve e pesada. Ocasionalmente, indivíduos normais acima de 25 anos podem apresentar um componente-M sem que se detecte doença subjacente. Para estes casos foi sugerido o nome “gamopatia monoclonal de significado indeterminado”. Neste capítulo, abordaremos o envolvimento glomerular, sem nos determos nas lesões túbulo-intersticiais, que são mais freqüentes no mieloma múltiplo e mais relacionadas ao comprometimento da função tubular.
Mieloma Múltiplo e Doença de Cadeias Leves
Fig. 23.9 Síndrome de Goodpasture, notando-se o padrão linear à imunofluorescência, positiva para IgG.
Pontos-chave: • A síndrome de Goodpasture se caracteriza pelo quadro clínico de hemoptise e glomerulonefrite aguda com insuficiência renal • O diagnóstico diferencial deve ser feito com outras síndromes pulmão-rim: vasculites ANCA positivas, lúpus, púrpura de Henoch-Schönlein • O tratamento deve ser precoce, com plasmaférese, corticosteróides e ciclofosfamida
Aproximadamente 65% dos pacientes com mieloma múltiplo excretam proteínas de Bence Jones, que são filtradas ao nível glomerular, relacionando-se com a alta incidência de comprometimento túbulo-intersticial. Proteinúria ocorre em 90% dos pacientes e 55% têm insuficiência renal ao diagnóstico. A causa do envolvimento renal é multifatorial e inclui hipercalcemia e hipercalciúria, hiperuricemia, infecção do trato urinário, infiltração renal por células plasmáticas e o chamado “rim do mieloma”. Em 15% dos casos, a porção variável da cadeia leve monoclonal, ou esta mais a cadeia leve intacta, depositase no rim como substância amilóide, constituindo a amiloidose AL. Nesses depósitos, as proteínas adquirem conformação beta-pregueada característica das fibrilas amilóides, com predomínio da cadeia leve lambda, sendo indistinguível da amiloidose primária e recebendo a denominação de proteína amilóide AL. À microscopia ótica, pode haver aumento na quantidade de matriz mesangial, com ou sem hipercelularidade concomitante, e discreto espessamento uniforme da membrana basal glomerular. Essas lesões foram descritas antes do reconhecimento da doença de deposição de cadeias leves. Há casos isolados de descrição de crescentes e glomerulonefrite membranoproliferativa. Lesões glomerulares isquêmicas de caráter crônico podem ocorrer, com enrugamento da membrana basal e, ocasionalmente, tufos obsolescentes, vistos em pacientes com anormalidades vasculares devidas ao envelhecimento, não se relacionando, provavelmente, com o mieloma múltiplo. Pode haver a presença de exsudatos de material proteináceo, seme-
440
Glomerulopatias Secundárias
lhante aos cilindros intratubulares, no espaço de Bowman. Este material se cora com anticorpo antiproteína de TammHorsfall, demonstrado em alguns pacientes com insuficiência renal aguda e mieloma múltiplo. Outro tipo de comprometimento glomerular é a doença de deposição de cadeias leves, onde o depósito glomerular é de cadeia leve intacta e, às vezes, de cadeia pesada. Esses depósitos são mais freqüentemente de cadeias leves kapa e não assumem a estrutura fibrilar do amilóide AL, não apresentando, também, a birrefringência verde-maçã quando corado com vermelho-Congo e visto por luz polarizada. Em uma das séries estudadas, a doença de deposição de cadeias leves ocorreu em 13% dos pacientes com mieloma múltiplo. As cadeias leves depositam-se na membrana basal glomerular e tubular, assim como no mesângio, resultando em lesão glomerular e tubular. A lesão glomerular mais característica é a glomeruloesclerose nodular, em 50% dos pacientes, muito semelhante à da nefropatia diabética. Os glomérulos apresentam-se grandes, com espaços vasculares marcadamente reduzidos. Quase todos os glomérulos apresentam nódulos, que se diferenciam dos da nefropatia diabética por maior uniformidade de tamanho. Os pacientes que não apresentam lesões glomerulares de tipo nodular apresentam, com freqüência, esclerose e hipercelularidade mesangiais discretas e/ou alterações da membrana basal, como rigidez e eosinofilia. As lesões devem ser diferenciadas da glomerulonefrite membranoproliferativa tipo II. À imunofluorescência, os depósitos são caraterizados como cadeia leve, sendo mais freqüente a cadeia leve kapa, e, ocasionalmente, pode-se detectar C3 no mesângio. Por microscopia eletrônica, notam-se depósitos elétron-densos não-fibrilares nos nódulos mesangiais. Embora os depósitos possam ocorrer em todos os órgãos, a maioria dos pacientes apresenta envolvimento renal isolado. A doença de deposição de cadeias leves pode ocorrer em pacientes com gamopatia monoclonal de significado indeterminado, e em pacientes sem componente monoclonal sérico ou urinário. Tem sido observado que o alto teor de glicosilação (11-15% de carboidratos, com N-glicosilação) favorece a polimerização e a deposição tecidual maciça, o que dificulta sua detecção na corrente sangüínea ou na urina. Quando o mieloma múltiplo se apresenta apenas com produção de cadeias leves (10 a 20% dos casos), há uma tendência a que a doença seja mais agressiva e com pior prognóstico. A única anormalidade sérica na apresentação pode ser a hipogamaglobulinemia, sem componente-M circulante, sendo este detectável algumas vezes na urina, como proteína de Bence Jones. Assim, hipogamaglobulinemia não explicada, em adultos, deve levar à pesquisa de proteína de Bence Jones urinária. Quando se instala a insuficiência renal, é mais freqüente o achado da paraproteína no soro.
Fig. 23.10 Nefropatia de cadeias leves, com o aspecto de glomeruloesclerose nodular em região mesangial.
Pontos-chave: • O envolvimento renal no mieloma é multifatorial e depende da cadeia leve excretada, de hipercalcemia, hiperuricemia, infecção do trato urinário e de hipovolemia concomitante • Comprometimento glomerular ocorre por deposição de proteína amilóide AL e/ou de cadeias leves circulantes. A lesão túbulointersticial, mais grave, caracteriza o “rim do mieloma”
Macroglobulinemia de Waldenström Nesta entidade, a proteína monoclonal patogênica é a IgM, sendo o quadro clínico diferente do mieloma múltiplo e relacionado a hiperviscosidade sangüínea, com fadiga, perda de peso, sangramentos e distúrbios visuais, em indivíduos com idade média de 67 anos. Seu curso é lento e progressivo, com anemia, hepatomegalia e linfoadenopatia. O envolvimento renal é raro, sendo o achado mais freqüente o depósito de material eosinofílico nas luzes capilares, que, à imunofluorescência, mostra ser a IgM. Alguns autores observam que 10 a 20% dos pacientes apresentam proteinúria de Bence Jones, sendo a quantidade excretada em geral menor que 500 mg/dia. Há pacientes ocasionais com glomeruloesclerose nodular, semelhante à da doença de deposição de cadeias leves, além de glomerulonefrite mesangiocapilar e doença de lesões mínimas, que se acompanha de síndrome nefrótica.
capítulo 23
Crioglobulinemia O envolvimento renal na crioglobulinemia mista ocorre em 20 a 25% dos pacientes, freqüentemente após vários anos do início das manifestações extra-renais. O quadro clínico mais freqüente é o da síndrome nefrítica, com proteinúria moderada, hipertensão grave e disfunção renal. Em outras situações, entretanto, a evolução pode ser mais protraída, caracterizada por proteinúria persistente, hipertensão e hematúria. O diagnóstico laboratorial pode ser firmado pela demonstração de crioglobulinas circulantes do tipo IgM monoclonal-IgG policlonal, pela presença de fator reumatóide (IgM) e por hipocomplementemia, à custa de consumo dos componentes iniciais da via clássica. O vírus da hepatite C tem sido considerado o principal fator etiológico da vasculite associada à crioglobulinemia mista, antigamente rotulada de “essencial”. Em pacientes com a doença ativa, tem sido relatada positividade de até 80% nos testes de replicação para vírus C, sendo igualmente detectados antígenos e anticorpos específicos no crioprecipitado. As lesões glomerulares da crioglobulinemia podem ter vários padrões de glomerulonefrites: aguda e exsudativa, membranoproliferativa focal e segmentar, sendo freqüente o encontro de depósitos eosinofílicos sob forma de “trombos” na luz dos capilares glomerulares e que correspondem a crioglobulinas precipitadas. Tendo em vista a freqüente ocorrência de remissões espontâneas do envolvimento clínico renal, torna-se, difícil avaliar a eficácia de esquemas terapêuticos a longo prazo. Corticosteróides, agentes alquilantes e plasmaférese têm sido indicados nos surtos de reagudização, com resultados aparentemente favoráveis no que se refere à reversão da insuficiência renal provocada pela deposição maciça de agregados de IgGIgM em capilares glomerulares.
Pontos-chave:
441
alteração na concentração e/ou na estrutura de uma proteína sérica que, após clivagem proteolítica anômala, passa por uma seqüência de polimerização e deposição tecidual. Dentre as proteínas envolvidas na gênese do depósito amilóide podemos incluir: • Cadeia leve de imunoglobulina: proteína amilóide AL; a proteína precursora é uma cadeia leve de imunoglobulina, geralmente do tipo lambda. Podem ocorrer discrasias de células plasmáticas (especialmente mieloma múltiplo e amiloidose sistêmica primária). • Amilóide A: proteína amilóide A (AA); a proteína precursora é a SAA. Acompanha as formas de amiloidose secundária (doenças infecciosas e inflamatórias crônicas, neoplasias, febre familiar do Mediterrâneo e síndrome de Muckle-Wells). • Outras proteínas: transtiretina, gelsolina, apolipoproteína, beta-2 microglobulina, calcitonina, polipeptídeo amilóide da ilhota de Langerhans, fator atrial natriurético, proteína Scrapie, cistatina C, todas estas proteínas acompanhando diversas patologias de menor freqüência. No rim, os depósitos geralmente se iniciam no mesângio, de forma segmentar e focal, com os seguintes padrões de deposição: nodular mesangial, mesângio-capilar, perimembranoso e hilar.
AMILOIDOSE PRIMÁRIA É assim considerada quando não se associa a outra doença sistêmica. A proteinúria está presente em 80% dos casos, em nível nefrótico em 30% destes. Os rins estão geralmente aumentados de tamanho. O diagnóstico de amiloidose primária deve ser considerado em paciente com síndrome nefrótica ou insuficiência renal de causa não definida, na faixa etária acima dos 40 anos, pesquisan-
• Na crioglobulinemia mista, sorologia positiva para vírus da hepatite C ocorre em até 80% dos casos • A histologia renal característica é a glomerulonefrite membranoproliferativa com “trombos” de crioprecipitados no capilar glomerular, positivos para IgM
Amiloidose Trata-se de uma doença caracterizada pela deposição de substância amorfa, com aspecto fibrilar beta-pregueado à microscopia eletrônica, corando-se com vermelho-Congo e tioflavina-T, resultando cor verde-maçã sob luz polarizada com o primeiro corante e intensa fluorescência verde amarelada com o segundo. A amiloidogênese é vista como um processo em que um determinado estímulo provoca
Fig. 23.11 Amiloidose renal, com extensos depósitos no mesângio e obliteração dos capilares glomerulares (260⫻).
442
Glomerulopatias Secundárias
do-se a presença de proteína monoclonal em soro e urina por imunoeletroforese. Praticamente 2/3 dos pacientes com amiloidose primária apresentam proteína monoclonal no soro, e em 20% dos casos se detectam proteínas de Bence Jones. Cadeias leves do tipo lambda (65%) são mais comuns que as do tipo kapa (35%), e o inverso ocorre no mieloma múltiplo. Os depósitos teciduais podem ser revelados por reatividade com anticorpos anticadeia leve, sendo negativos quando se utiliza anticorpo antiproteína amilóide A (AA). Além do rim, há depósitos no coração, língua, nervos periféricos, vasos sangüíneos e trato digestivo.
AMILOIDOSE SECUNDÁRIA Geralmente está associada a estímulo inflamatório crônico, acompanhando doenças infecciosas, inflamatórias e neoplasias. Gertz e Kyle, analisando um grupo de 64 pacientes com amiloidose secundária sistêmica, encontraram depósitos em biópsias renais em 100% dos casos. A proteína AA tem sido demonstrada como um polipeptídeo de 76 aminoácidos e peso molecular de 8.500 daltons, que possui um componente sérico antigenicamente relacionado à proteína sérica amilóide A (SAA); esta se apresenta de forma solúvel, ligada à lipoproteína HDL 3, com peso molecular de 12.500 daltons, exibindo terminal NH2 homólogo à proteína AA. Esta proteína é sintetizada no fígado, elevando-se o seu nível cerca de 1.000 vezes o valor basal em resposta a determinado estímulo inflamatório agudo ou necrose tecidual. A regulação da síntese de SAA é altamente complexa, estando envolvidos, sob certas circunstâncias, interleucina 6, interleucina 1, fator de necrose tumoral e corticosteróides em várias combinações. Na artrite reumatóide, níveis séricos de SAA estão igualmente aumentados em pacientes com e sem amiloidose, indicando que algum fator adicional necessita intervir para sua deposição. Uma possibilidade explicativa seria a diferença na degradação de SAA para AA. O tipo e o tamanho dos fragmentos podem determinar o potencial amiloidogênico e o local de deposição. Estudos preliminares mostram que fragmentos menores tendem a se depositar em glomérulos, enquanto fragmentos maiores se depositam nos vasos sangüíneos.
AMILOIDOSE RENAL HEREDITÁRIA É uma doença rara, em que a deposição de amilóide é preferencial no rim. Os pacientes parecem ter uma variante de cadeia semelhante à do fibrinogênio. Não se conhece o mecanismo pelo qual o depósito é preferencial em tecido renal. Há ainda uma outra forma de amiloidose renal hereditária, em que a proteína é uma variante da apolipoproteína A, a principal apolipoproteína da HDL. Nessa forma, o depósito é preferencialmente peritubular e intersticial, poupando-se os glomérulos, não havendo, habitualmente, proteinúria patológica.
Pontos-chave: • O quadro clínico mais comum da amiloidose é o da síndrome nefrótica em paciente acima de 40 anos • A amiloidose primária se caracteriza pela presença do amilóide AL no tecido e proteína monoclonal no soro de 70% dos pacientes. Cadeia leve do tipo lambda é a mais freqüente • A amiloidose secundária ocorre em doenças inflamatórias crônicas e neoplasias. A proteína AA é a que se encontra depositada em tecidos
Glomerulonefrites Fibrilares As glomerulonefrites fibrilares se caracterizam histologicamente pela deposição de fibrilas que não se coram como o depósito amiloide (vermelho-Congo-negativas); estas lesões têm sido relatadas com freqüência crescente nas biópsias renais, especialmente quando se realiza de rotina o estudo dos fragmentos por microscopia eletrônica, já que estas estruturas são dificilmente diagnosticadas apenas pela microscopia ótica. Neste tipo de exame, os achados são inespecíficos e freqüentemente podem simular qualquer forma de glomerulopatia primária (proliferativa mesangial, nodular, membranoproliferativa ou membranosa). Os pacientes se apresentam com proteinúria geralmente em nível nefrótico, hematúria microscópica, hipertensão e insuficiência renal. A alteração típica desta entidade é vista à microscopia eletrônica, que mostra fibrilas no mesângio e na parede capilar glomerular, claramente distintas da amiloidose, uma vez que são maiores (20 a 40 nm de diâmetro) e não se coram com o vermelho-Congo ou com a tioflavina-T. Tem-se sugerido que neste grupo podem ser consideradas duas patologias distintas: a glomerulonefrite fibrilar propriamente dita e a glomerulopatia imunotactóide. Na glomerulonefrite fibrilar (65% dos casos), a imunofluorescência é freqüentemente positiva para IgG, C3 e cadeias leves. Os depósitos podem ser tão intensos, que chegam a simular um quadro de glomerulonefrite antimembrana basal glomerular. Em alguns casos, não se detectam imunoglobulinas nos depósitos, o que sugere um caráter heterogêneo para esta doença. Na glomerulopatia imunotactóide as fibrilas são ainda maiores (30 a 40 nm de diâmetro), com aspecto de microtúbulos dispostos de modo ordenado. Em algumas casuísticas a glomerulopatia imunotactóide tem sido associada a patologias linfoproliferativas e/ou a paraproteínas circulantes, porém os mecanismos envolvidos nestas associações são desconhecidos.
443
capítulo 23
Fig. 23.12 Glomerulonefrite fibrilar, notando-se extensa área de esclerose mensangial de aspecto heterogêneo (PAMSS 450⫻).
mia circulante e estas proteínas podem depositar-se de modo inespecífico em vários tecidos. Deve também ser lembrado que a nefropatia membranosa é o tipo de lesão glomerular idiopática mais comum na população acima de 50 anos, que constitui também a faixa etária de maior ocorrência destas neoplasias. O tratamento das glomerulopatias associadas às neoplasias depende do tipo e do estadiamento da condição maligna. A remissão da proteinúria pode ocorrer em pacientes com neoplasias sólidas tratadas cirurgicamente, porém não se pode afastar nestes casos uma remissão espontânea da própria doença glomerular, fato bastante conhecido na evolução da glomerulonefrite membranosa. Em relação à doença de Hodgkin com síndrome nefrótica, o tratamento radioterápico e/ou quimioterápico guarda uma boa correlação de ordem temporal com a remissão da proteinúria. A recidiva da sídrome nefrótica, nestes casos, pode ser entendida como um parâmetro precoce de recidiva da neoplasia.
NEOPLASIAS A glomerulonefrite, associada ou não à síndrome nefrótica, ocorre em alguns pacientes com doenças malignas, especialmente tumores sólidos dos tratos respiratório, gastrointestinal e urogenital e também em algumas doenças linfoproliferativas. As neoplasias que mais freqüentemente se acompanham de glomerulopatias, sobretudo a glomerulonefrite membranosa, são os carcinomas broncogênicos, de cólon e reto, rim, mama e estômago. De um modo geral, a síndrome nefrótica se manifesta ao mesmo tempo de instalação da neoplasia mas, em algumas ocasiões, ela ocorre precedendo o diagnóstico clínico do tumor, especialmente nos linfomas. Como já foi referido, a lesão glomerular subjacente é a glomerulonefrite membranosa, em mais de 60% dos pacientes com tumores sólidos. Em contrapartida, a lesão renal mais comumente associada à doença de Hodgkin é a nefropatia de lesões mínimas, sendo a glomerulonefrite membranoproliferativa a forma mais encontrada na leucemia linfocítica crônica. O mecanismo envolvido nas lesões glomerulares associadas às neoplasias não é totalmente conhecido, tendo sido propostas algumas teorias explicativas. Antígenos associados a tumores foram incriminados como integrantes de imunocomplexos nefritogênicos. Existem relatos isolados nos quais são descritos pacientes com carcinoma broncogênico que apresentavam reatividade do antígeno tumoral com anticorpos eluídos do tecido renal. Antígenos de adenocarcinoma de cólon e antígenos derivados de células tubulares renais também foram descritos no mesângio e nas alças capilares dos glomérulos. Todos estes relatos, infelizmente, não constituem ainda prova conclusiva desta associação entre carcinomas e glomerulopatias, uma vez que nos tumores existe antigene-
GLOMERULOPATIAS EM DOENÇAS HEPÁTICAS Infecção por Vírus C É recente na literatura o conhecimento da associação entre infecção por vírus C e o desenvolvimento de glomerulopatias. Estudos epidemiológicos mostram que, enquanto em 1.244 doadores de sangue normais a sorologia para vírus C foi positiva em 1%, em 226 pacientes renais, não-dialíticos, foi de 7,9%. Nesta mesma amostra, quando considerados apenas os glomerulopatas (excluídos pacientes com nefrite intersticial, rins policísticos, etc.), a prevalência foi de 16,6%. Quando são considerados os grupos de riscos para infecção por vírus C (homossexuais, 4 a 8%, e consumidores de droga injetável, 60%), também serão estes os grupos com maior prevalência da doença glomerular. Esta pode ocorrer mesmo sem doença hepática evidente, assim como algumas casuísticas têm mostrado: em pacientes com glomerulonefrite membranoproliferativa (GNMP) e vírus C positivo, apenas 20% apresentam manifestações clínicas de hepatite, mas 60 a 70% mostram transaminases elevadas. Na história natural da infecção pelos vírus C, após 10 a 15 anos de replicação viral persistente, mais de 50% dos indivíduos infectados evoluem com quadro de hepatite crônica ativa e, ocasionalmente, podem instalar-se manifestações de auto-imunidade e de outras formas de hipersensibilidade humoral, tais como artrite, síndrome sicca e crioglobulinemia mista tipo II, que se manifesta por vasculite cutânea e glomerulonefrite. O achado de crioglobulinemia também traz repercussões laboratoriais importantes, tais como a presença de fator reumatóide e hipocomplemen-
444
Glomerulopatias Secundárias
temia à custa de consumo de fatores da via clássica (consumo de complemento total, C3 e C4). As manifestações renais predominantes são de síndrome nefrótica com insuficiência renal leve a moderada. O achado histológico mais freqüente é de glomerulonefrite membranoproliferativa tipo I, que se distingue da forma idiopática pela representatividade maior de imunoglobulinas – IgG, IgM e C3. Quando ocorre crioglobulinemia, a forma histológica pode ser a da GNMP crioglobulinêmica, que se caracteriza pela presença de pseudotrombos hialinos nos capilares glomerulares e pela infiltração de monócitos. Outras formas menos freqüentes de nefropatia por vírus C são a glomerulonefrite membranosa e a glomerulonefrite proliferativa mesangial. A patogênese da lesão é explicada pela deposição renal de imunocomplexos contendo antígeno HCV-anticorpo anti-HCV e fator reumatóide, nos casos de crioglobulinemia. É possível, portanto, nesta última situação a detecção de HCV-RNA no crioprecipitado. O tratamento proposto é ainda muito discutível, porque seus resultados não são constantes. Esquemas com corticosteróides e/ou imunossupressores não são eficazes na doença renal e podem, por outro lado, agravar a viremia e a hepatopatia. O esquema terapêutico para a glomerulopatia associada ao HCV tem por objetivo negativar a carga viral, para reduzir a produção de crioglobulinas e, portanto, reduzir a formação dos crioprecipitados nefritogênicos. Para tanto, ultimamente tem sido utilizada a associação de interferon-alfa com ribavirina, que resulta em negativação da carga viral em 60 a 70% dos pacientes infectados pelo HCV. As maiores limitações desta associação se referem aos seus efeitos colaterais e à elevada taxa de recidiva quando as drogas são suspensas.
Infecção por Vírus B A glomerulonefrite associada ao vírus da hepatite B é uma entidade bem reconhecida desde o seu relato inicial há mais de 20 anos. A maioria dos pacientes descritos são crianças, onde predomina o sexo masculino (4:1). A doença ocorre predominantemente em algumas regiões da Europa, Ásia e África, com maior prevalência de infecção por vírus B (África do Sul, 5-10%; Hong-Kong, 9,5%, e Coréia, 11-15%), ao contrário de outras regiões, como América do Norte e Europa Ocidental, onde a presença do vírus B é baixa, por volta de 0,3%. A exata incidência da glomerulonefrite nas diversas áreas geográficas ainda é pouco conhecida. Em área endêmicas, 20 a 50% das crianças com síndrome nefrótica mostram sorologia positiva para vírus B. Esta positividade é ainda maior, ao redor de 85%, quando destacados os casos de glomerulonefrite membranosa (GNM) com comprovação histológica. De um modo geral, a população pediátrica que apresenta esta lesão glomerular evo-
lui de forma benigna, com remissão em 64% dos pacientes em quatro anos e mais de 80% em 10 anos. Tal remissão ocorre habitualmente no prazo de seis meses do clareamento do HBeAg (viragem espontânea). Esta constatação sugere uma forte associação causal entre o vírus e a doença renal mediada por imunocomplexos, já que uma vez depurado o agente viral, a doença renal pode remitir. Em adultos, a evolução costuma ser arrastada, não havendo dados precisos sobre remissão, mesmo após a viragem sorológica. Manifestações extra-hepáticas e extra-renais, como a artrite e a crioglobulinemia, são descritas, porém pouco freqüentes. A doença hepática, com ou sem hipertensão portal, habitualmente é sintomática, porém lesões glomerulares já foram descritas sem nenhuma evidência de lesão hepatocelular. A manifestação clínica da nefropatia do vírus B é a proteinúria, com ou sem síndrome nefrótica. Várias séries da literatura associam a hepatite crônica ativa do vírus B com a glomerulonefrite membranosa e, raramente, com a forma membranoproliferativa. Os achados de imunofluorescência mostram presença de IgG, IgM, C3 e, ocasionalmente, IgA. Lai, estudando 100 pacientes com glomerulonefrite e sorologia positiva para vírus B, usando anticorpos monoclonais contra vários antígenos (Hbs Ag, Hbc Ag e Hbe Ag) em tecido renal, detectou 39% dos casos positivos para pelo menos um dos antígenos estudados, tendo ocorrido também boa correlação entre HBeAg glomerular e no soro; quando se demonstrou a presença de antígenos de hepatite no glomérulo, a lesão morfológica mais freqüente foi a glomerulonefrite membranosa. O tratamento da nefropatia por vírus B é controverso. Em crianças, frente ao alto índice de remissão, o tratamento é sintomático. Em adultos, os corticóides e imunossupressores estariam contra-indicados, pela possibilidade de predisporem a maior replicação viral. Aventou-se recentemente o uso de interferon-alfa e/ou lamivudina, porém os dados disponíveis não são consistentes. Alguns casos esporádicos tratados com esquemas antivirais apontam para possível melhora da nefropatia, porém não se pode descartar, nesta situação, a possibilidade de ocorrerem remissões espontâneas da proteinúria.
Cirrose Hepática O depósito glomerular de IgA é um achado comum em cirrose hepática pós-alcoólica e ocorre em até um terço dos pacientes. Aventa-se que a predisposição para a deposição de IgA renal seja secundária a uma remoção deficiente dos complexos contendo IgA pelas células de Kupffer hepáticas. A observação de que a IgA pode estar também depositada na pele e nos sinusóides hepáticos é compatível com esta hipótese. Apesar da alta freqüência dos depósitos de IgA glomerular, a maioria dos adultos não demonstra sinais de doença glomerular, sendo a suspeita clínica feita pelo achado de hematúria e proteinúria discretas. Não há
capítulo 23
síndrome nefrótica nem hematúria macroscópica. O acometimento histológico mais freqüente ocorre sob forma de lesão proliferativa mesangial, com depósitos de IgA. A dissociação entre os achados e as manifestações clínicas pode estar relacionada à falta de depósito concomitante de IgG, minimizando, portanto, a ativação do complemento e a inflamação local. Outro acometimento renal na cirrose alcoólica, menos freqüente, é o da glomeruloesclerose cirrótica, onde ocorre uma lesão esclerótica difusa glomerular, obrigando a um diagnóstico diferencial com outras formas de glomeruloesclerose (diabetes, amilóide, nefropatia da cadeia leve, etc.) Esta lesão glomerular é geralmente silenciosa, manifestando-se apenas por proteinúria leve. A imunofluorescência, freqüentemente, revela IgA em mesângio, além de IgM e IgG. Outras glomerulopatias podem estar incidentalmente presentes em pacientes com cirrose alcoólica. Já foram descritas glomerulonefrite membranoproliferativa, glomerulonefrite membranosa e glomerulonefrites focais. Casuísticas em crianças mostram uma associação entre glomerulopatias e doença hepática avançada secundária à deficiência de ␣1-antitripsina ou atresia biliar. Pacientes acometidos por cirroses de outras etiologias, como as póshepatites, poderão desenvolver glomerulopatias secundárias aos vírus B e C, como já foi abordado anteriormente.
DOENÇAS INFECCIOSAS Glomerulonefrite da Endocardite Bacteriana A endocardite bacteriana pode comprometer o rim de várias maneiras: 1) ocorrendo septicemia, pode instalar-se insuficiência renal aguda, abscessos ou infartos renais por embolia séptica; 2) pode ocorrer glomerulonefrite por deposição de imunocomplexos; 3) pode ocorrer nefrite intersticial aguda devida à ação de medicamentos. A glomerulonefrite da endocardite, bem como a nefrite do shunt atrioventricular, segue o padrão das síndromes nefríticas pós-infecciosas, cujo quadro clínico é caracterizado por hematúria microscópica, edema, grau variável de hipertensão arterial e de redução da função renal, tendo um curso evolutivo para a cura, na maioria dos casos. O exame de urina mostra hematúria com hemácias dismórficas e cilindros hemáticos, leucocitúria e proteinúria. A síndrome nefrótica não é comum na endocardite e ocorre em até 30% dos pacientes com nefrite do shunt. A natureza imunológica é bem determinada: em 90% dos pacientes encontram-se imunocomplexos circulantes, a crioglobulinemia é achado freqüente e ocorre hipocomplementemia de CH50, C3 e C4, indicando ativação pela via clássica. Os principais agentes infecciosos são o Staphylococcus viridans, na endocardite subaguda; o Staphylococcus aureus,
445
na endocardite aguda, e o Staphylococcus epidermidis, na nefrite do shunt. A prevalência da glomerulonefrite por endocardite bacteriana vem diminuindo em função do uso adequado e precoce de antibióticos. A lesão histológica habitual é do padrão proliferativo, que pode ser focal ou difuso. Este último está comumente associado à etiologia estafilocócica. Quando presentes, os crescentes não atingem mais que 50% dos glomérulos. A imunofluorescência é sempre difusa, positiva para a IgG, IgM e C3. A microscopia eletrônica revela a presença dos imunodepósitos subepiteliais (humps) e menores depósitos em posição subendotelial ou mesangial. Não há necessidade de tratamento específico para a glomerulonefrite da endocardite. A maioria dos casos reverte com o tratamento antimicrobiano, ocorrendo, entretanto, perda da função renal de modo irreversível, se a terapêutica antibiótica for instituída muito tardiamente, ou se próteses valvares infectadas não forem prontamente removidas.
Pontos-chave: • A glomerulonefrite da endocardite se manifesta habitualmente por hematúria e proteinúria isoladas, ou por síndrome nefrítica • A insuficiência renal pode ser prevenida pela erradicação precoce do foco de infecção, não estando indicado o tratamento imunossupressor
Nefropatia do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) O vírus da imunodeficiência humana se disseminou muito rapidamente na década de 80 e 90, promovendo um acúmulo de novas informações e novas entidades patológicas em diferentes especialidades médicas. Com a introdução da terapia antiviral efetiva, na segunda metade da década de 90, houve uma grande melhora da sobrevida desses pacientes e com isso o crescimento de doentes HIVpositivos e sem outros acometimentos. A nefrotoxicidade da terapêutica e as alterações hemodinâmicas e eletrolíticas, muito freqüentes nos pacientes com AIDS, foram responsáveis pelas primeiras descrições de insuficiência renal aguda, que freqüentemente era irreversível. A nefropatia associada ao vírus HIV (HIVAN) é a forma mais comum de doença renal crônica em pacientes HIV-positivos e vem-se constituindo em um grande problema epidemiológico nos Estados Unidos, onde já é a terceira causa de IRC dialítica na população negra dos 20 aos 64 anos. Este tipo de lesão glomerular se refere a uma forma especial de glomeruloesclerose segmentar e
446
Glomerulopatias Secundárias
focal, geralmente associada à síndrome nefrótica e perda progressiva da função renal. Glomerulonefrites proliferativas por imunocomplexos também podem estar asssociadas ao HIV.
QUADRO CLÍNICO O quadro clínico do paciente com nefropatia do HIV (HIVAN) é semelhante, seja ele portador da forma clássica de glomeruloesclerose, ou das formas proliferativas. O paciente apresenta-se, comumente, já com déficit da função renal e com síndrome nefrótica instalada. O edema pode ser insidioso ou abrupto, mas sua presença não é constante. Casos com hematúria microscópica e proteinúria não-nefrótica, com ou sem insuficiência renal, são ocasionais; geralmente, não há hipertensão arterial, ainda que a progressão para uremia ocorra inevitavelmente. Os níveis séricos do complemento e de suas frações estão normais e as imunoglobulinas podem estar aumentadas, com padrão policlonal. A HIVAN é normalmente uma complicação tardia da infecção pelo HIV, sendo isso evidenciado pela diminuição dos linfócitos CD4 circulantes ou por uma história de infecção oportunística prévia. A imagem por ultra-sonografia não é específica, mostrando rins hiperecogênicos no estado nefrótico. As dimensões renais podem permanecer aumentadas, mesmo na fase de insuficiência renal crônica.
ALTERAÇÕES PATOLÓGICAS As lesões renais associadas ao HIV habitualmente podem ser descritas dentro dos seguintes tipos: 1) glomeruloesclerose focal, forma colapsante; 2) glomerulonefrites proliferativas, mediadas por imunocomplexos; 3) nefropatia túbulo-intersticial, mais freqüentemente relacionada ao envolvimento glomerular. O termo “nefropatia associada ao HIV” é reservado para a típica forma da glomeruloesclerose focal colapsante, com oclusão da luz capilar, segmentar ou global, cujos achados mais comuns são os seguintes: 1) acentuada hipertrofia das células epiteliais e endoteliais do glomérulo, com formação de “coroa” podocitária; 2) dilatação microcística dos túbulos, com presença de cilindros protéicos, degeneração celular e necrose; 3) alterações túbulo-intersticiais severas, sem relação com o grau de glomeruloesclerose, com infiltrado de linfócitos CD8, monócitos e linfócitos B. À imunofluorescência observa-se deposição segmentar de IgM e C3 em mesângio e alça capilar. Imunoglobulinas e albumina podem ser vistas nos cilindros, no espaço de Bowman e nos vacúolos citoplasmáticos das células epiteliais. A microscopia eletrônica traz, como colaboração ao diagnóstico, a presença de inclusões túbulo-reticulares no interior de células endoteliais que, embora não específicas, são muito sugestivas de infecção viral. Depósitos elétrondensos são infreqüentes e, quando presentes, são pequenos e esparsos. Notam-se os vacúolos citoplasmáticos nas células epiteliais com numerosos lisossomos, fusão de
Fig. 23.13 Glomeruloesclerose focal e segmentar colapsante em pacientes com infecção pelo HIV, notando-se também atrofia e dilatação cística dos túbulos (PAS 100⫻).
pedicelas e espessamento de membrana basal glomerular à custa de neoformação de membrana, ocupando o espaço subepitelial. Nos túbulos, os precipitados são pouco densos, homogêneos, finamente granulares, contrastando com os verdadeiros cilindros, que contêm a proteína de Tamm-Horsfall. As alterações anatomopatológicas descritas, quando isoladas, têm pouco significado diagnóstico, mas a combinação de glomeruloesclerose segmentar e focal colapsante, com alterações importantes nas células epiteliais glomerulares, dilatação tubular, infiltrado intersticial com fibrose e presença de estruturas túbulo-reticulares intracitoplasmáticas, sugerem fortemente o diagnóstico de HIVAN. A ocorrência de glomerulonefrites por imunocomplexos, durante a infecção por HIV, é variável, de acordo com as regiões e a população acometida, podendo ocorrer em até 35% dos pacientes com HIV positivo e doença renal. Dentre estas lesões devem ser destacadas a glomerulonefrite membranoproliferativa, a glomerulonefrite membranosa e a nefropatia da IgA. Não existe nenhuma comprovação que vincule diretamente estes tipos histológicos à infecção pelo HIV. Deve ser destacado que pacientes com infecção pelo HIV são muito susceptíveis a infecções virais, bacterianas e parasitárias, e que poderiam desencadear reações de hipersensibilidade com formação de imunocomplexos solúveis e conseqüente fixação nos glomérulos.
PATOGÊNESE A lesão histológica renal mais freqüente na infecção pelo HIV é a glomeruloesclerose segmentar e focal. Como se sabe, esta lesão ocorre associada a muitas outras situações clínicas e, em nenhuma delas, a etiopatogenia está esclarecida. Com o grande acúmulo de conhecimentos adquiridos sobre os efeitos das infecções virais nos tecidos, po-
capítulo 23
demos admitir atualmente que a nefropatia do HIV decorre de uma desregulação na interação entre vírus e hospedeiro, com algumas conseqüências já identificadas: 1) o HIV pode infectar diretamente as células mesangiais e epiteliais, exercendo efeito citopático e estimulando a expressão de citocinas e fatores de crescimento, propiciando a produção de matriz e a esclerose mesangial; 2) a infecção pelo HIV pode alterar a regulação do ciclo celular com intensificação da apoptose, desdiferenciação e alterações da polaridade celular, o que poderia explicar a dilatação tubular microcística característica desta nefropatia.
TRATAMENTO O tratamento da nefropatia associada ao HIV está exclusivamente baseado na terapêutica múltipla anti-retroviral, que teve grandes progressos na última década. No passado, foram relatadas algumas tentativas de remissão da proteinúria com corticosteróides, inibidores da enzima conversora de angiotensina, ciclosporina, porém todas falharam e não mudaram a sobrevida renal. A negativação da carga viral, propiciada pelas drogas combinadas, mudou inteiramente a história natural da HIVAN, ao ponto de ser muito raro nos dias atuais o encontro de pacientes com proteinúrias elevadíssimas e rápida evolução para a insuficiência renal. Pacientes com nefropatia e tratados tardiamente em geral têm remissão parcial da proteinúria e, devido às lesões esclerosantes mesangiais já instaladas, podem evoluir de modo lento para a insuficiência renal crônica, em tudo semelhante a outros pacientes com esta síndrome. Nestas circunstâncias será necessário o tratamento de suporte e, eventualmente, o posterior encaminhamento para a terapêutica dialítica e o transplante renal.
447
do descritos em outras regiões do país. Os primeiros casos de nefropatia secundária à esquistossomose foram referidos no Brasil, na década de 60, por pesquisadores da Bahia, que descreveram as manifestações clínicas, laboratoriais e histológicas.
QUADRO CLÍNICO A forma clínica mais comum de apresentação do paciente com nefropatia esquistossomótica é a síndrome nefrótica, que pode acompanhar-se de graus variáveis de insuficiência renal. A hematúria microscópica está quase sempre presente e pode ocorrer hipertensão arterial. Pacientes com este quadro costumam apresentar hepatomegalia, esplenomegalia e sinais de hipertensão portal. Na fase inicial da nefropatia, o paciente habitualmente é assintomático e o envolvimento renal se constata pelo achado de hematúria e proteinúria, em exame de urina. O diagnóstico da esquistossomose é feito através da pesquisa de ovos nas fezes ou por biópsia da mucosa retal. A concomitância de proteinúria, hematúria, hipertensão arterial, baixos níveis de C3 e gamaglobulina sérica elevada, em adultos jovens com hepatoesplenomegalia, provenientes de área endêmica de esquistossomose, faz sugerir o diagnóstico de nefropatia esquistossomótica, principalmente se a biópsia renal revelar uma glomerulonefrite membranoproliferativa, ou mesmo uma glomerulonefrite proliferativa mesangial, com imunofluorescência positiva para IgM e C3 em mesângio e alças capilares. A detecção do antígeno no tecido renal, naturalmente, reforça o diagnóstico. A nefropatia, em geral, tem curso progressivo, independente da presença do parasita e das tentativas terapêuticas com imunossupressores.
ALTERAÇÕES PATOLÓGICAS E PATOGÊNESE Pontos-chave: • A nefropatia do HIV se manifesta por síndrome nefrótica e insuficiência renal • A lesão histológica típica é da glomeruloesclerose focal, forma colapsante • A negativação da antigenemia com drogas anti-retrovirais induz à remissão da proteinúria
Nefropatia da Esquistossomose Dentre as cepas de esquistossomo patogênicas para o homem, três delas têm sido mais freqüentemente referidas, em diferentes regiões: o Schistosoma japonicum, na Ásia, que pode causar doença gastrointestinal e acometer o sistema nervoso central; o Schistosoma haematobium, na África, que afeta o trato urinário inferior, e o Schistosoma mansoni, na América do Sul. A região nordeste do Brasil é zona endêmica de esquistossomose mansônica, mas focos vêm sen-
Três tipos de lesão glomerular são mais comumente descritos na nefropatia da esquistossomose: 1) glomerulonefrite membranoproliferativa (GNMP); 2) glomerulonefrite proliferativa mesangial (PM); 3) glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF). À microscopia ótica, todas as lesões têm o mesmo padrão das formas idiopáticas. A GNMP é a lesão renal mais comumente descrita, sobretudo no estágio hepatoesplênico da doença. A glomerulonefrite mesangial é mais comum na fase hepatointestinal, podendo ser encontrada em indivíduos assintomáticos. A GESF é considerada por alguns autores como a segunda forma mais freqüente da nefropatia esquistossomótica, tendo sido também descrita em modelos experimentais. Deve ser ressaltado, no entanto, que a prevalência de GESF idiopática é bastante elevada e esta associação com a esquistossomose poderia ser apenas fortuita. A imunofluorescência (IF) revela, mais freqüentemente, depósitos de IgM e C3 no mesângio, nos três tipos de lesão glomerular anteriormente descritos, o que coincide com o padrão da forma idiopática da GESF, mas não coin-
448
Glomerulopatias Secundárias
cide com o padrão das formas idiopáticas da glomerulonefrite mesangial e da GNMP, nas quais a IgG é a imunoglobulina mais freqüentemente depositada. Nestas últimas, há também depósitos imunes em alça capilar. A IF pode ser utilizada para detectar a presença de antígeno esquistossomótico do verme adulto. A microscopia eletrônica revela proliferação mesangial e, de modo variável, fusão segmentar e difusa de pedicelos, expansão da matriz mesangial, “duplo contorno” da membrana basal glomerular, depósitos elétrondensos subendoteliais, mesangiais e, ocasionalmente, subepiteliais. O antígeno do Schistosoma está situado no intestino do verme adulto e, quando regurgitado, atinge a circulação do hospedeiro, dando origem aos anticorpos, formação de imunocomplexos solúveis e deposição com injúria glomerular. Em modelos experimentais, as lesões renais podem ser exacerbadas quando se faz previamente a esplenectomia ou a ligadura da veia porta, ressaltando, nesta situação, a importância do bloqueio do sistema reticuloendotelial, facilitando o depósito de imunocomplexos no tecido renal.
Quadro 23.6 Glomerulopatias associadas a outros agentes infecto-parasitários Mycobacterium leprae — A lesão histológica mais comum é a amiloidose; ocasionalmente tem sido observado quadro de síndrome nefrótica semelhante à glomerulonefrite pós-estreptocócica. Treponema pallidum — Síndrome nefrótica pode ocorrer em 0,5% dos pacientes com sífilis secundária e em até 8% dos pacientes com sífilis congênita; as lesões mais descritas são de nefropatia membranosa, ou várias formas de GN proliferativas. Plasmodium malariae — Manifesta-se por síndrome nefrótica em crianças que residem em áreas endêmicas; lesões histológicas são heterogêneas, incluindo formas proliferativas ou membranoproliferativas. A proteinúria pode persistir, mesmo após a erradicação da parasitose. Outras — Relatos isolados de glomerulopatias associadas a infecções bacterianas (Pneumococcus, Klebsiella, Staphylococcus), virais (citomegalovírus, varicela, sarampo) e parasitárias (Filaria, Toxoplasma).
TRATAMENTO Uma vez instalada a nefropatia, esta segue um curso progressivo, independente da presença do parasita. Tentativas de reverter a lesão, quer tratando a parasitose, quer tentando a remissão da síndrome nefrótica com corticóide e imunossupressores, não mostram bons resultados. O controle rigoroso da pressão arterial e a redução da proteinúria podem contribuir para o retardo da insuficiência renal. Alguns pacientes podem permanecer estáveis por vários anos, com proteinúria não-nefrótica e disfunção renal moderada.
Pontos-chave: • A nefropatia da esquistossomose se caracteriza por proteinúria/hematúria, ou síndrome nefrótica, e ocorre principalmente em pacientes com a forma hepatoesplênica • A lesão histológica mais encontrada é a glomerulonefrite membranoproliferativa, que decorre da deposição de imunocomplexos, com IgM e C3 positivos à imunofluorescência
Outras Doenças Infecto-Parasitárias Glomerulopatias secundárias a outras etiologias infecciosas ou parasitárias devem ser destacadas pela sua importância no contexto médico: a glomerulonefrite pós-estreptocócica, apresentada em detalhe em outro capítulo
deste livro, e as glomerulonefrites associadas às infecções pelos vírus das hepatites B e C, que foram incluídas no subtítulo das doenças hepáticas, neste mesmo capítulo. No Quadro 23.6 estão relacionadas outras infecções que, de modo menos comum, estão implicadas na etiologia de doenças glomerulares.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA APPEL, G.B.; KISHNAM, J.R. Secondary glomerular diseases: In Brenner and Rector’s The Kidney, 6th ed, B.M. Brenner (ed), Philadelphia, Saunders, 2000, pp 1350-1448. APPEL, G.B. Cyclophosphamide therapy for severe lupus nephritis. Am. J. Kidney Dis. 30:872-876, 1997. AUSTIN, H.A.; BOUMPAS, D.T.; VAUGHAN, E.M. et al. Predicting renal outcomes in severe lupus nephritis: Contributions of clinical and histologic data. Kidney Int., 43:544-550, 1994. BANSAL, V.K.; BETO, J.A. Treatment of lupus nephritis: A meta-analysis of clinical trials. Am. J. Kidney Dis., 29:193-199, 1997. BARSOUM, R.S. Schistosomal glomerulopathies. Kidney Int., 44:1-12, 1993. BRADY, H.R. Fibrillary glomerulopathy. Kidney Int., 53:1421-1429, 1998. COHEN, B.A.; CLARK, W.F. Pauci-immune renal vasculitis: Natural history, prognostic factors and impact of therapy. Am. J. Kidney Dis., 36:914-924, 2000. D’AGATI, V.D.; APPEL, G.B. HIV infection and the kidney. J. Am. Soc. Nephrol., 8:138-152, 1997. D’AMICO, G.; FERRARIO, F. Cryoglobulinemic glomerulonephritis: A MPGN induced by hepatitis C virus. Am. J. Kidney Dis., 25:361-369, 1995. GERTZ, M.A.; LACY, M.Q.; DISPENZIERI, A. Immunoglobulin light chain amyloidosis and the kidney. Kidney Int., 61:1-9, 2002. GOLDSTEIN, A.R.; WHITE, R.H.; ALEUSE, R. et al. Long-term followup of childhood Henoch-Schönlein nephritis. Lancet, 339:280-284, 1992. HAHN, B.H. Mechanism of disease: Anti-DNA antibodies to DNA. N. Engl. J. Med., 338:1359-1368, 1998.
capítulo 23
JENNETTE, J.C.; FALK, R.J.; ANDRASSY, K. Nomenclature of systemic vasculitides. The proposal of an international consensus conference. Arthritis Rheum., 37:187-192, 1994. JENNETTE, C.; FALK, R.J. Small-vessel vasculitis. N. Engl. J. Med., 338:1512-1523, 1998. KLUTH, D.C.; REES, A.J. Anti-glomerular basement membrane disease. J. Am. Soc. Nephrol., 10:2446-2453, 1999. KYLE, R.A. Clinical aspects of multiple myeloma and related disorders including amyloidosis. Pathol. Biol., 47:148-157, 1999. LAI, K.N.; LAI, F.M. Clinical features and natural course of hepatitis B virus glomerulonephritis in adults. Kidney Int., 40: S46-S54, 1991. LAUER, G.M.; WALKER, B.D. Hepatitis C virus. N. Engl. J. Med., 345: 4152, 2001. LIN, J.; MARKOWITZ, G.; VALERI, A.; KAMBAHAM, N. et al. Renal monoclonal immunoglobulin deposition disease (MIDD): The disease spectrum. J. Am. Soc. Nephrol., 12:1482-1492, 2001. MAJUMDAR, A.; CHOWDHARY, S.; FERREIRA, M.A.S. et al. Renal pathological findings in infective endocarditis. Nephrol. Dial. Transplant., 15:1782-1787, 2000. MERCADAL, L.; MONTCEL, S.T.; NOCHY, D. et al. Factors affecting outcome and prognosis in membranous lupus nephropathy. Nephrol. Dial. Transplant., 17:1771-1778, 2002. MONAHAN, M.; TANJI, N.; KLOTMAN, P.E. HIV-associated nephropathy: an urban epidemic. Semin. Nephrol., 21:394-402, 2001. MONTSENY, J.; KLEINKNETH, D.; MEYRIER, A. et al. Long-term outcome according to renal histological lesions in 118 patients with monoclonal gammopathies. Nephrol. Dial. Transplant., 13:1438-1445, 1998. NORRIS, S.H. Paraneoplasic glomerulopathies. Semin. Nephrol., 13: 258272, 1993. NUSSENZVEIG, I.; BRITO, T.; CARNEIRO, C.R.W. et al. Human Schistosoma mansoni-associated glomerulopathy in Brazil. Nephrol. Dial. Transplant., 17:4-7, 2002.
449
REMUZZI, G.; BERTANI, T. Pathophisiology of progressive nephropathies. N. Engl. J. Med., 339:1448-1556, 1998. SAVAGE, C.O.; HARPER, L.; HOLLAND, M. New findings in pathogenesis of antineutrophil cytoplasm antibody-associated vasculitis. Curr. Opin. Rheumatol., 14:15-22, 2002.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Clinical Nephrology Electronic Journal http://www.hdcn.com Atlas of Glomerular Diseases http://ajkd.wbsaunders.com/atlas http://www.kidneyatlas.com Secondary Glomerular Diseases/NIH Resources http://www.niddk.nih.gov/health/kidney/kidney.htm Immunologic Renal Diseases http://www.immunologyclinic.com Lupus Nephritis Case Study http://lupus.org/education/brochures/kidney.html Renal Vasculitis Case Demonstration http://path.upmc.edu/cases/case51.html Renal Amyloidosis Case Demonstration http://path.upmc.edu/cases/case125.html HIV Nephropathy Clinical Review http://www.mgh.harvard.edu/id/images/hivneph.pdf Cryoglobulinemia and Renal Disease http://www.mayo.edu/mmgrg/rst/cryo.htm Discussão Anátomo-Clínica da Sociedade Brasileira de Nefrologia http://sbn.org.br
Capítulo
24
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial Emmanuel de A. Burdmann , José Mauro V. Júnior e Edivaldo Celso Vidal
NEFROPATIA TÓXICA
Interleucina-2
Introdução
Interferon-A
Diagnóstico de lesão renal nefrotóxica
Fator de necrose tumoral
Nefrotoxicidade de agentes antiinfecciosos Agentes antibacterianos
OKT3 Nefrotoxicidade de agentes anticancerígenos
Agentes antifúngicos
Cisplatina
Agentes antivirais
Carboplatina
Nefrotoxicidade do meio de contraste radiológico Prevenção da nefropatia por contraste Nefrotoxicidade dos antiinflamatórios não-hormonais IRA hemodinamicamente mediada IRA por nefrite intersticial aguda com síndrome nefrótica
Metotrexate Nefrotoxicidade de peçonhas animais Serpentes Artrópodes peçonhentos NEFROPATIAS TUBULOINTERSTICIAIS
IRA com dor lombar e hematúria
Introdução
IRA por necrose cortical
Mecanismos de lesão tubulointersticial
Síndrome nefrótica sem IRA
Nefrite intersticial aguda
Insuficiência renal crônica
Manifestações clínicas
Alterações eletrolíticas
Patologia
Hipertensão Nefrotoxicidade dos inibidores da enzima de conversão da
Tratamento Nefropatia tubulointersticial crônica
angiotensina e dos bloqueadores dos receptores AT1 de
Introdução
angiotensina II
Patologia
Nefrotoxicidade de agentes imunossupressores e imunomoduladores
Quadro clínico e laboratorial Causas de nefropatia tubulointersticial crônica
Ciclosporina A
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Ciclosporina G
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Tacrolimus
capítulo 24
NEFROPATIA TÓXICA Introdução O rim possui características anatômicas e fisiológicas singulares, que o tornam particularmente vulnerável à ação lesiva de produtos químicos ou biológicos. Os complexos mecanismos de transporte tubular renal demandam elevado consumo energético, fazendo com que interferências com os sistemas enzimáticos intracelulares responsáveis pela geração de energia causem danos significantes ou irreversíveis às células renais. A massa de tecido renal representa menos do que 1% do peso corporal de um indivíduo, porém os rins recebem 25% do débito cardíaco em repouso. Desta forma, a extensa superfície endotelial glomerular é exposta de forma expressiva às substâncias tóxicas presentes na circulação, e o processo de filtração destas moléculas, geralmente pequenas, causa grande oferta de toxinas por unidade de tempo ao tecido renal. Além disso, os processos de metabolização renal podem desacoplar substâncias tóxicas de seus carreadores protéicos ou gerar substâncias com capacidade lesiva. Na luz tubular os mecanismos de concentração urinária induzem níveis extremamente elevados desses agentes tóxicos, muitas vezes superiores aos encontrados na circulação sistêmica. Finalmente, os mecanismos de transporte facilitam a entrada dessas substâncias do lúmen para o interior das células tubulares. As nefrotoxinas podem causar lesão através de diminuição do fluxo sanguíneo renal, interagindo diretamente com a membrana celular ou através da geração intracelular de metabólitos tóxicos ou de radicais livres de oxigênio, causando danos a estruturas intracelulares e interferindo com mecanismos enzimáticos vitais para o funcionamento celular.
Pontos-chave: Vulnerabilidade renal a substâncias tóxicas • Alto gasto energético • Fluxo sanguíneo elevado • Grande área de superfície endotelial • Geração de metabólitos tóxicos • Desacoplamento de substâncias das proteínas plasmáticas • Mecanismos de concentração urinária As substâncias nefrotóxicas podem acometer quaisquer das estruturas renais causando lesões glomerulares, tubulares, intersticiais e vasculares. Funcionalmente, a nefrotoxicidade pode manifestar-se como queda da filtração glomerular, proteinúria, alterações hidroeletrolíticas, alterações do equilíbrio ácido-básico ou dos meca-
451
nismos de concentração urinária. Um mesmo agente pode causar mais de um tipo de lesão, dependendo da dose, duração de exposição e variações individuais de resposta do indivíduo afetado. Os mecanismos mais freqüentes de agressão renal pelas nefrotoxinas são alterações de hemodinâmica renal e lesões estruturais tubulares, refletindo-se em quadro clínico de insuficiência renal aguda (IRA). A participação das substâncias nefrotóxicas na gênese da IRA em ambiente hospitalar aumentou de forma alarmante nas últimas décadas, acompanhando a maior oferta e o conseqüente aumento do uso de drogas, agentes químicos e agentes diagnósticos. Numa análise de 415 casos de IRA do Serviço de Nefrologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) no período de 1957 a 1966, apenas 4% dos pacientes apresentaram nefrotoxicidade como fator causador da lesão renal, enquanto na década de 80 o uso de drogas foi o fator etiológico mais freqüente nos pacientes com diagnóstico de IRA no mesmo hospital. O perfil das drogas responsáveis pelos episódios de nefrotoxicidade também vem se alterando. A análise dos pacientes com IRA associada a agentes nefrotóxicos do HC-FMUSP no período de 1980 a 1982 mostrou que a grande maioria dos casos foi relacionada a antibióticos. Já em 1983 os agentes mais freqüentemente implicados foram os antibióticos e o contraste iodado. Finalmente, em 1993, além de antibióticos e contraste, os antiinflamatórios não-hormonais (AINH), os bloqueadores da enzima de conversão de angiotensina e a ciclosporina surgiram como agentes de lesão renal em número significativo de casos.
Diagnóstico de Lesão Renal Nefrotóxica Na maior parte das vezes o diagnóstico de nefrotoxicidade é aventado somente quando o dano renal atinge proporções suficientes para diminuir a diurese e/ou a filtração glomerular (FG), causando redução da depuração de creatinina endógena e aumento da creatinina sérica. Oligúria é definida como diurese menor do que 400 ml em 24 horas. Este limite arbitrário baseia-se no conceito de que este é teoricamente o menor volume necessário para a eliminação dos solutos produzidos por um indíviduo normal em um dia. No entanto, a prevalência de IRA não-oligúrica aumentou exponencialmente nas útimas décadas, em parte por aumento de IRAs causadas por substâncias nefrotóxicas que não cursam com oligúria, como os antibióticos aminoglicosídeos. Em séries de casos mais recentes de IRA, mais da metade dos pacientes são não-oligúricos. Assim, a presença de diurese acima de 400 ml/24 h não exclui o diagnóstico de nefrotoxicidade e lesão renal em atividade. A dosagem de creatinina é provavelmente o método mais utilizado para a medida da FG na prática clínica. É
452
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
um marcador pouco sensível de lesão renal, pois elevase significativamente apenas quando a FG cai para valores de 30 a 50% abaixo do normal. A creatinina é gerada pela reação não-enzimática da creatina e fosfocreatinina musculares, e a sua produção diária é uma fração relativamente constante da quantidade total de creatina. Os seus níveis séricos são proporcionais à massa muscular do indivíduo, e portanto mulheres, indivíduos idosos ou com massa muscular reduzida podem apresentar creatininas séricas pouco elevadas ou mesmo dentro da faixa considerada “normal” na vigência de queda significativa da FG. A depuração de creatinina, apesar de ser método mais sensível e exato para a determinação da FG, também apresenta problemas significativos na sua interpretação. À medida que a FG cai, a secreção tubular de creatinina aumenta, fazendo com que a depuração de creatinina superestime de forma importante a FG real. Além disso, o rim possui importante reserva funcional que, ativada, pode mascarar a agressão renal até que a lesão tenha progredido de forma irreversível. Um exemplo desta situação é a nefrotoxicidade crônica causada pela ciclosporina A que evolui para fibrose intersticial irreversível na presença de depuração de creatinina estável ou mesmo normal. Estudos experimentais e clínicos têm utilizado a dosagem de enzimas tubulares renais como marcadores de lesão renal. Embora sensível como marcador, a elevação de enzimas urinárias é pouco específica e ainda não obteve ampla aceitação na prática clínica. Alterações dos testes de capacidade de concentração e acidificação urinárias ocorrem precocemente na lesão renal nefrotóxica, mas são de determinação trabalhosa e pouco prática, dificultando sua utilização rotineira. A excreção urinária de eletrólitos varia com a sua ingestão diária, tornando difícil a sua interpretação. Excreções urinárias inapropriadas de sódio, magnésio ou potássio em relação a níveis séricos e ingesta conhecidos podem indicar lesão tubular. A análise qualitativa da urina deve sempre ser realizada, pois apesar de pouco específica fornece informações preciosas de maneira relativamente simples e pouco invasiva. Por exemplo, densidade urinária baixa na presença de desidratação ou pH urinário elevado na presença de acidose sistêmica indicam a presença de lesão tubular. Proteinúria significativa indica lesão glomerular, aumento da presença de células tubulares ocorre na necrose tubular e eosinofilúria é fortemente sugestiva de nefrite intersticial. Deve-se manter em mente que os testes disponíveis para a detecção de nefrotoxicidade são pouco precisos e a inexistência de um método diagnóstico absoluto faz com que seja necessário o uso simultâneo, precoce e dinâmico de testes diferentes. O exame mais rotineiramente empregado, a dosagem de creatinina sérica, é pouco sensível, e valores de creatinina “normais” não excluem a possibilidade de lesão renal em atividade.
Pontos-chave: • Diurese “normal” não afasta a possibilidade de nefrotoxicidade • Creatinina sérica: marcador pouco sensível de lesão renal • Cr < 1,5 mg/dl não afasta a possibilidade de insuficiência renal • Enzimúria tubular: muito sensível e pouco específica
Nefrotoxicidade de Agentes Antiinfecciosos AGENTES ANTIBACTERIANOS Aminoglicosídeos Os aminoglicosídeos (gentamicina, tobramicina, amicacina e netilmicina) são antibióticos bactericidas de uso parenteral, extremamente eficazes em infecções graves causadas por bactérias Gram-negativas. São compostos policatiônicos, de pequeno peso molecular (em torno de 500 D), que se ligam muito pouco a proteínas plasmáticas e são excretados livremente por filtração glomerular. Em função destas características, a sua depuração aproximase da de inulina. Na luz do túbulo proximal uma pequena parte da carga filtrada liga-se a receptores fosfolipídicos aniônicos da membrana celular da região apical das células tubulares proximais e é transportada por pinocitose para o seu interior. No citoplasma formam-se vesículas que se fundem com os lisossomos. A acidez do interior lisossomal faz com que os aminoglicosídeos assumam sua forma catiônica, aumentando sua ligação com as camadas de fosfolípides e presumivelmente inibindo a função das fosfolipases A1 e A2. A interferência com o funcionamento das fosfolipases altera o ciclo normal de renovação das membranas fosfolipídicas e induz a formação de lisossomos secundários contendo os chamados corpos mielóides, estruturas lamelares elétron-densas formadas por membranas densamente compactadas e dispostas concentricamente. Estes mecanismos de transporte e acumulação intracelular fazem com que a concentração dessas drogas no córtex renal seja de 10 até 100 vezes superior à plasmática. Após ter ocorrido concentração do aminoglicosídeo no tecido renal, sua excreção é extremamente lenta, podendo durar de dias a meses. Os mecanismos pelos quais os aminoglicosídeos provocam lesão renal ainda não são bem definidos, apesar de extensamente estudados em modelos animais. Interferência com o funcionamento dos lisossomos, alterações mitocondriais, produção excessiva de radicais livres de oxigênio, inibição competitiva das reações citosólicas mediadas por cálcio e diminuição do coeficiente de ultrafiltração glo-
453
capítulo 24
merular têm sido apontadas como fatores etiopatogênicos da nefrotoxicidade destas drogas. Estudos experimentais indicam haver dissociação entre a acumulação tecidual do aminoglicosídeo e sua nefrotoxicidade. Ratos com volume extracelular expandido apresentam proteção contra a queda da filtração glomerular e diminuição da acumulação cortical renal do antibiótico. No entanto não há atenuação da lesão estrutural, ocorrendo necrose tubular mesmo com função renal relativamente preservada. De forma similar, o ácido poliaspártico preserva a filtração glomerular e a estrutura do túbulo proximal apesar de não impedir a deposição maciça do aminoglicosídeo no tecido renal. Durante a administração experimental contínua, por meses, de doses nefrotóxicas de aminoglicosídeo ocorre recuperação da função renal na presença de concentrações corticais renais elevadas do antibiótico, com histologia mostrando focos de regeneração e de necrose tubular acompanhados por áreas de fibrose intersticial focal. Aparentemente a captação celular da droga é necessária, mas não suficiente para o desencadeamento de toxicidade renal. A lesão estrutural causada pelos aminoglicosídeos tem sido melhor estudada em animais de experimentação. Existem poucos estudos clínicos disponíveis e estes são difíceis de interpretar, já que estes antibióticos são freqüentemente usados em doentes graves, onde podem existir outros fatores lesivos ao rim e uso concomitante de outras drogas nefrotóxicas. Estes estudos mostram histologia compatível com necrose tubular aguda do tipo isquêmico ocorrendo em focos, com perda da borda em escova e vacuolização de túbulos proximais. Os corpos mielóides surgem em tecido renal mesmo após tratamentos pouco prolongados e não indicam obrigatoriamente nefrotoxicidade. Outras drogas catiônicas que não são nefrotóxicas, como cloroquina ou clorpromazina, também induzem a formação de corpos mielóides. Desta forma, os corpos mielóides são considerados como indicadores de nefrotoxicidade dos aminoglicosídeos somente quando acompanhados de necrose tubular. Experimentalmente, a gentamicina provoca necrose tubular de intensidade proporcional à dosagem empregada. O pico da lesão ocorre em torno do sétimo dia de tratamento, e com a interrupção da droga ocorre regeneração tubular. Com a administração de doses reduzidas do antibiótico observa-se recuperação tubular mesmo se o tratamento for mantido. Existem alguns poucos relatos de caso onde o uso de aminoglicosídeos foi associado ao desenvolvimento de nefrite intersticial aguda. Os aminoglicosídeos são a causa mais comum de lesão nefrotóxica em indivíduos hospitalizados. Sua estreita margem terapêutica induz alterações renais clinicamente significativas em 10 a 20% dos pacientes. Em tratamentos prolongados, acima de duas semanas, esta porcentagem é ainda maior, chegando a 50%. A forma clínica mais comum de apresentação de sua nefrotoxicidade é IRA não-oligúrica, ao final da primeira semana de tratamento. Além da queda de filtração glomerular, os aminoglicosídeos causam
disfunção tubular que pode manifestar-se como poliúria e perda da capacidade de concentração urinária, enzimúria, glicosúria, aminoacidúria e perdas urinárias inadequadas de eletrólitos causando hipomagnesemia, hipocalemia e hipocalcemia. O exame de urina é incaracterístico, às vezes com leucocitúria, proteinúria e cilindrúria. Com a interrupção do uso da droga ocorre recuperação lenta da função renal, que pode durar semanas e ser incompleta. Os aminoglicosídeos podem provocar insuficiência renal crônica diálise-dependente em pacientes com insuficiência renal prévia submetidos a tratamentos prolongados ou doses muito elevadas destas drogas. O método mais sensível para o diagnóstico precoce da nefrotoxicidade por aminoglicosídeos é a detecção da elevação de seus níveis séricos “de vale”, que ocorre precocemente, antecedendo alterações da creatininemia. Vários fatores de risco para o desenvolvimento de nefrotoxicidade por aminoglicosídeos foram identificados e incluem tratamento prolongado, administrações repetidas da droga, depleção de volume extracelular, sexo masculino, obesidade, insuficiência renal prévia, uso concomitante de outros agentes nefrotóxicos (vancomicina, cefalexina ou cefalotina, anfotericina B, ciclosporina, cisplatina, agentes de contraste radiológico, antiinflamatórios nãohormonais), uso de furosemida, hipocalemia, hipomagnesemia, acidose, icterícia, idade avançada, choque e administração da droga durante o período de repouso noturno. Estudos experimentais demonstraram proteção renal com dose única da droga ao invés da mesma quantidade administrada em doses repetidas, expansão de volume intravascular com cloreto de sódio, uso concomitante de ticarcilina, suplementação oral de cálcio, suplementação de
Quadro 24.1 Fatores de risco para a nefrotoxicidade dos aminoglicosídeos MODIFICÁVEIS • • • • • • • • • • •
Duração do tratamento Dose utilizada Número de doses Horário da administração Depleção de volume extracelular Uso concomitante de outras drogas nefrotóxicas Uso de furosemida Hipocalemia Hipomagnesemia Hipotensão Acidose NÃO-MODIFICÁVEIS
• • • • •
Presença de insuficiência renal crônica Idade Obesidade Sexo masculino Icterícia
454
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
cloreto de potássio, indução de diabetes, administração de ácido poliaspártico, alcalinização urinária, uso de bloqueadores de canal de cálcio, administração de hormônio tireoidiano e depleção de fosfato. Clinicamente, a dose utilizada, o intervalo de administração da droga e a duração do tratamento são os fatores de risco mais consistentemente relacionados à gênese de insuficiência renal. A menor dose e o tratamento mais curto que sejam compatíveis com sucesso terapêutico são a melhor forma de prevenção da insuficiência renal causada por esses antibióticos. A contrapartida desta estratégia de tratamento é o risco de utilização de doses terapeuticamente ineficazes. As propriedades farmacocinéticas dessas drogas levaram à formulação da hipótese de que a sua administração em dose única diária manteria a eficácia bactericida (que depende do pico sérico) e atenuaria a sua nefrotoxicidade (que é dependente da área sob a curva, em função das características do seu transporte tubular). De fato, diversos autores têm demonstrado em estudos isolados e metaanálises que o uso de uma dose única diária de gentamicina, ao invés de doses fracionadas, preveniu a nefrotoxicidade sem inibir o efeito bactericida do antibiótico. Recentemente, demonstrou-se que a administração de gentamicina e tobramicina para pacientes com infecções graves durante o período de repouso noturno (da meia-noite às 7h30m da manhã) provocou maior nefrotoxicidade do que a administração dos aminoglicosídeos no período de atividade (8h às 23h30m). As medidas complementares de proteção para evitar ou atenuar a nefrotoxicidade dos aminoglicosídeos são relativamente óbvias: evitar depleção de volume extracelular, evitar hipotensão, não utilizar concomitantemente outras drogas nefrotóxicas, corrigir os níveis séricos de potássio, magnésio e bicarbonato.
Pontos-chave: • Insuficiência renal aguda não-oligúrica • Lesão renal usualmente detectável a partir do 5.º dia de tratamento • Dosar creatinina pré-tratamento • Em pacientes idosos, com insuficiência renal crônica ou massa muscular reduzida, realizar depuração de creatinina prétratamento • Corrigir administração da droga (aumentando o intervalo entre as doses) pela estimativa de filtração glomerular • Monitorizar creatinina durante o tratamento • Usar as medidas de proteção disponíveis A constatação de que alguns aminoglicosídeos apresentam menor nefrotoxicidade experimental do que outros não tem apresentado relevância clínica. É essencial assu-
mir que todos os aminoglicosídeos podem provocar alguma forma de lesão renal em praticamente todos os pacientes que os recebem, e portanto a monitorização contínua da função renal deve ser obrigatória com o seu uso. Se ocorrer IRA, a medida mais segura é a substituição do aminoglicosídeo por outro antibiótico. Se houver necessidade de manter o antibiótico, o intervalo entre as administrações da droga deve ser aumentado, o que também é válido para pacientes com insuficiência renal prévia.
Antibióticos Beta-lactâmicos PENICILINAS. Penicilinas são excretadas pelo sistema tubular transportador de ácidos orgânicos e podem permanecer ligadas à membrana basal tubular. Nefrite intersticial aguda tem sido relacionada ao uso de penicilinas naturais e sintéticas (das penicilinas comercializadas no Brasil, as que mais comumente podem causar esta lesão são a ampicilina e a oxacilina). Diferentes penicilinas podem apresentar reações de sensibilidade cruzada para este tipo de lesão. A tríade “clássica” de febre, reação cutânea e eosinofilia ocorre somente em 1/3 dos casos. Geralmente a lesão ocorre após uma ou duas semanas de administração da droga e há recuperação da função renal com a suspensão do antibiótico, porém se este for mantido causará dano renal progressivo. A ocorrência de outras alterações estruturais ou funcionais, dose-dependentes, com estas drogas é extremamente rara, se é que existe. É provável que casos descritos clinicamente como necrose tubular aguda sejam na verdade nefrites intersticiais agudas não diagnosticadas. As doses de penicilina G devem ser reduzidas em pacientes com insuficiência renal devido ao risco de neurotoxicidade e convulsões. CEFALOSPORINAS. As cefalosporinas utilizadas clinicamente são derivados semi-sintéticos dos antibióticos produzidos pelo fungo Cephalosporum acremonium. São incorporadas pelas células tubulares renais através do sistema de transporte basolateral de ácidos orgânicos e saem do meio intracelular através de difusão apical. Os mecanismos de lesão renal das cefalosporinas foram melhor estudados com a cefaloridina e a cefaloglicina, que possuem modelos consistentes de IRA em coelhos. A cefaloridina tem a sua molécula modificada no citoplasma da célula tubular, impedindo a sua secreção apical, o que causa significante acúmulo intracelular da droga. No interior da célula a cefaloridina interfere com a atividade do citocromo P-450 e induz peroxidação lipídica, levando à morte e à necrose celular. A cefaloglicina, por sua vez, interfere com o funcionamento da maquinaria energética mitocondrial, causando também necrose celular. Assim, o potencial nefrotóxico destas drogas parece estar ligado à sua capacidade de acúmulo intracelular e à configuração molecular, capaz de interferir com os mecanismos do metabolismo da célula. Muito da fama de nefrotoxicidade das cefalosporinas deve-se à cefaloridina, atualmente em desuso, que causa-
capítulo 24
va IRA e lesão tubular proximal dose-dependente mesmo quando utilizada em doses terapêuticas. Apesar de todas as cefalosporinas serem consideradas potencialmente nefrotóxicas, a prevalência de IRA causada pelos membros mais recentes desta classe de antibióticos é muito pequena, indicando que eles possuem grande margem terapêutica. Clinicamente, a lesão renal pode manifestar-se por quadros de NTA ou, mais raramente, com padrão de reação alérgica com histopatologia característica de NIA. Nos casos de NTA a droga foi usualmente empregada em pacientes com infecções graves, onde coexistiam vários outros fatores potencialmente lesivos ao rim, tornando questionável o papel das cefalosporinas como o agente isolado da lesão renal. Doses elevadas de cefalosporinas de primeira geração (cefalotina, cefalexina), uso concomitante de aminoglicosídeos e depleção de volume extracelular têm sido considerados fatores de risco para a toxicidade destas drogas. As cefalosporinas de terceira e quarta geração têm potencial nefrotóxico muito reduzido, causando elevações pouco significativas da creatinina sérica em aproximadamente 2% dos pacientes, tendo sido demonstrado que a administração clínica de ceftazidima provocou queda discreta da filtração glomerular. Recentemente, descreveu-se nefrotoxicidade com a mudança de antibioticoterapia profilática para cirurgia cardíaca da associação cefotriaxona + vancomicina para cefodizima + vancomicina. A nossa combinação causou IRA em 50% dos pacientes. Com a volta do esquema à associação cefotriaxona + vancomicina, os casos de IRA desapareceram. Deve-se lembrar que as cefalosporinas podem provocar falsas elevações da creatinina sérica por interferir com a reação de Jaffé, utilizada em vários laboratórios para determinação dos níveis deste marcador de função renal.
Pontos-chave: • Evitar o uso de cefalexina ou cefalotina em associação com aminoglicosídeos • Cefalosporinas podem interferir com a dosagem de creatinina • Cefalosporinas de terceira e quarta geração são muito pouco nefrotóxicas CARBAPENEM. Esta nova classe de antibióticos betalactâmicos, cujo primeiro membro disponível para uso clínico foi o imipenem, apresenta amplo espectro de atividade antibacteriana, sendo altamente efetiva contra bactérias Gram-positivas, Gram-negativas e anaeróbias. No entanto, o imipenem sofre rápida inativação pela enzima desidropeptidase 1 no túbulo renal. O metabólito formado revelou-se nefrotóxico, provocando NTA experimental. A solução foi ligar o antibiótico a um inibidor específico da desidropeptidase, a cilastatina, potencializando o seu
455
nível terapêutico e ao mesmo tempo impedindo a formação do metabólito tóxico. Como o imipenem é de excreção renal, a sua dosagem deve ser reduzida em casos de insuficiência renal. Dosagens diárias maiores do que 1 grama em pacientes com filtração glomerular menor do que 15 ml/min/1,73 m2 podem causar neurotoxicidade e convulsões. Não foi descrita nefrotoxicidade com os novos compostos desta classe, meropenem e ertapenem. AZTREONAM. O aztreonam pertence à classe dos antibióticos monobactâmicos, muito efetivos contra bactérias Gram-negativas. Esta droga parece ser bastante segura em relação ao desenvolvimento de toxicidade renal, não havendo descrição de nefrotoxicidade tubular e/ou funcional com o seu uso. Foi descrito um único caso compatível clinicamente com NIA num paciente recebendo aztreonam.
Glicopeptídeos VANCOMICINA. É um antibiótico extremamente efetivo contra bactérias Gram-positivas, sendo a droga de escolha para o tratamento de infecções por estafilococos resistentes à meticilina e diarréias causadas por Clostridium difficile. A vancomicina é de excreção predominantemente renal e é pouco eliminada pelos métodos de diálise convencionais. Quando de sua introdução na prática clínica, na década de 60, detectou-se nefrotoxicidade significativa em até 25% dos pacientes. Este importante efeito colateral foi atribuído a impurezas geradas durante o processo de fermentação da droga. Com a introdução de compostos com pureza superior a 90% após 1980, a ocorrência de nefrotoxicidade com o uso isolado de vancomicina caiu, variando de 0 a 25% em estudos prospectivos. Apesar de terem diminuído os relatos de lesão renal e necrose tubular aguda associados à vancomicina, esta droga deve ser considerada nefrotóxica, e estudos recentes ainda detectam elevações significativas de creatinina em até 10% dos pacientes recebendo o antibiótico. A combinação de vancomicina com aminoglicosídeos apresenta nítido sinergismo em termos de nefrotoxicidade experimental. Clinicamente, a combinação destes antibióticos pode provocar IRA em até 35% dos casos, prevalência que é até sete vezes superior à encontrada para a vancomicina isolada. A falta de controles adequados na maior parte dos estudos realizados e o fato desta combinação de antibióticos ser freqüentemente utilizada em pacientes com infecções graves, onde muitas vezes coexistem diversos mecanismos lesivos ao rim, torna difícil avaliar com precisão o papel da vancomicina na gênese da lesão renal nestes casos. Outros fatores que têm sido relacionados a maior incidência de nefrotoxicidade pela vancomicina são: nível sérico da droga maior do que 10 mg/L (até 8 vezes mais nefrotoxicidade), idade (nefrotoxicidade por vancomicina é raríssima em crianças), duração do tratamento maior do que três semanas, creatinina basal elevada e desidratação. Nefrite inters-
456
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
ticial aguda por vancomicina pode ocorrer, mas é muito pouco freqüente. TEICOPLAMIN. Este antibiótico apresenta indicações terapêuticas semelhantes às da vancomicina e também é eliminado pelos rins, principalmente através da filtração glomerular. Quando utilizado isoladamente apresentou nefrotoxicidade em torno de 0,4% e, aparentemente, quando associado a aminoglicosídeos provoca menos nefrotoxicidade do que a associação vancomicina-aminoglicosídeos. Já foi associado ao surgimento de NIA após tratamento prolongado.
Pontos-chave: • Vancomicina é nefrotóxica • Vancomicina apresenta sinergismo de nefrotoxicidade com aminoglicosídeos • Corrigir dosagem da droga pela estimativa de filtração glomerular • Monitorizar creatinina durante o tratamento • Dar preferência a teicoplamin em pacientes com lesão renal Tetraciclinas O efeito antianabolizante da tetraciclina pode induzir elevação dos níveis de uréia sem alteração da filtração glomerular, pois os aminoácidos não utilizados para a síntese protéica serão degradados, gerando uréia. Este efeito de aumento de uréia não é observado com a doxiciclina, que não é catabolizante. Doses muito elevadas de tetraciclina podem causar alterações funcionais tubulares como acidose ou até mesmo quadros semelhantes à síndrome de Fanconi. Tetraciclinas reduzem a excreção de carbonato de lítio e portanto podem causar intoxicação aguda pelo lítio. Existem alguns raros casos descritos de NIA após uso de tetraciclinas. Demeclociclina, utilizada no tratamento de hiponatremia dilucional, pode causar redução da função renal em pacientes com cirrose hepática ou insuficiência cardíaca congestiva, possivelmente por depleção de volume extracelular através da diminuição da sensibilidade tubular ao hormônio antidiurético.
Rifampicina Rifampicina é um antibiótico utilizado no tratamento de tuberculose e de infecções estafilocócicas. IRA associada a esta droga tem ocorrido quando a terapia é interrompida por dias ou mesmo meses e reiniciada, embora alguns pacientes tenham apresentado lesão renal durante tratamento contínuo. O quadro clínico é peculiar, com dor lombar, oligúria ou anúria de início abrupto, hematúria microscópica e hipertensão associadas a fenômenos sistêmicos como febre, náusea e vômitos, diarréia, cefaléia e mialgia. Histologicamente a lesão mais freqüente é nefrite intersticial
aguda, mas casos de necrose tubular aguda, glomerulonefrites proliferativas crescênticas, depósitos intratubulares de pigmento, doença de cadeias leves e necrose de papila também foram descritos. Podem ocorrer alterações tubulares isoladas, como acidose tubular renal, glicosúria, uricosúria, perda urinária exagerada de potássio e diabetes insipidus nefritogênico. Excreção urinária de imunoglobulinas de cadeia leve ocorre na maioria dos pacientes recebendo rifampicina, mesmo com função renal normal, sugerindo manuseio tubular inadequado de proteínas ou alterações imunológicas. Estas alterações renais usualmente desaparecem com a suspensão do antibiótico, mas existem casos de insuficiência renal irreversível. Os mecanismos etiopatogênicos deste complexo conjunto de efeitos colaterais ainda não estão definidos. A detecção de anticorpos anti-rifampicina circulantes, a presença de descrições de imunofluorescência renal positiva ao redor de túbulos lesados e em membrana basal tubular, a ocorrência de transformação linfocitária após contato com a droga e a excreção urinária de imunoglobulinas de cadeias leves falam a favor de um mecanismo imunológico. Por outro lado, os anticorpos anti-rifampicina não estão presentes em todos os pacientes com reações adversas; pacientes com anticorpos positivos podem evoluir sem complicações e a imunofluorescência renal dos indivíduos afetados é quase sempre negativa.
Sulfonamidas Quando estas drogas começaram a ser utilizadas, na década de 40, sua baixa solubilidade provocava casos de IRA por deposição intratubular de cristais ou mesmo por formação de cálculos, com quadros clínicos caracterizados por hematúria (micro- ou macroscópica), cristalúria, oligoanúria e cólicas renais. O advento de compostos mais solúveis em água fez com que esse tipo de lesão praticamente desaparecesse. No entanto, o uso recente de doses elevadas desses antibióticos no tratamento de doenças infecciosas ligadas à síndrome da imunodeficiência adquirida levou ao ressurgimento dessa forma de nefrotoxicidade, pois os metabólitos dessas drogas podem precipitar em pH urinário inferior a 5,5. Estas alterações renais podem ser evitadas ou revertidas com hidratação adequada e alcalinização urinária, evitando a saturação e a precipitação desses compostos na urina. SULFADIAZINA. É utilizada em conjunto com pirimetamina no tratamento de encefalite por toxoplasma. Pode causar IRA por precipitação intratubular ou formação de cálculos radiotransparentes do seu metabólito primário, acetilsulfazina. Pode também provocar nefrite intersticial aguda. SULFAMETOXAZOL/TRIMETOPRIM. Quando utilizado em doses elevadas no tratamento de infecção pulmonar por Pneumocystis carinii pode também provocar lesão renal por cristalúria e formação de cálculos a partir de seu metabólito pouco solúvel. Causa com maior freqüência
capítulo 24
IRA por reações de hipersensibilidade com diagnóstico histológico de nefrite intersticial aguda, às vezes com a presença de granulomas não-caseosos. O trimetoprim pode causar elevação da creatininemia e hipercalemia na presença de filtração glomerular normal por interferir com processos tubulares de secreção de creatinina e transporte de potássio.
Pontos-chave: Prevenção da nefrotoxicidade das sulfonamidas • Manter hidratação adequada • Alcalinizar a urina Quinolonas Esta classe de antibióticos (norfloxacin, ciprofloxacin, ofloxacin, pefloxacin, levofloxacin, etc.) vem sendo bastante utilizada devido ao seu amplo espectro e flexibilidade de administração, pois pode-se iniciar o tratamento por via parenteral e prossegui-lo por via oral. Experimentalmente as quinolonas podem causar lesão renal através de precipitação urinária da droga e/ou metabólitos com magnésio e proteínas causando obstrução intra-renal e processo inflamatório na parede tubular. No entanto, esta forma de nefrotoxicidade é clinicamente rara, possivelmente porque a precipitação de cristais da droga ocorre em urina alcalina, dificilmente existente em humanos. Mesmo quando cristalúria foi induzida em voluntários normais através de alcalinização urinária, não se evidenciaram efeitos adversos sobre a função renal. Por outro lado, casos de nefrite intersticial aguda têm sido descritos em pacientes recebendo ciprofloxacin e em pelo menos um paciente recebendo norfloxacin. Surgimento de vasculites também tem sido associado às quinolonas, e existem relatos de casos de vasculite renal após uso de ciprofloxacin ou ofloxacin.
Polimixinas Esta classe de drogas é representada pela polimixina B e pelo colistin (polimixina E). São antibióticos utilizados por via parenteral quase exclusivamente para tratamento de bactérias Gram-negativas multirresistentes, especialmente Pseudomonas. Os efeitos colaterais mais importantes destas drogas são nefrotoxicidade e neurotoxicidade, havendo relato de IRA em aproximadamente 20% dos pacientes tratados. A histologia renal mostra necrose tubular aguda ou pode ser normal. Mesmo após a interrupção do antibiótico pode continuar a haver queda da filtração glomerular por aproximadamente uma semana.
Pentamidina Pentamidina, por via endovenosa ou por aerossol, é utilizada no tratamento de pneumonias causadas por Pneu-
457
mocystis carinii. IRA tem complicado de 25 até 95% dos tratamentos por via endovenosa e muito raramente os tratamentos por aerossol. Apesar de sua excreção renal ser reduzida, a pentamidina acumula-se no tecido renal após múltiplas doses. A IRA, geralmente não-oligúrica, costuma ocorrer após a primeira semana de tratamento e pode ser grave o bastante para necessitar de diálise. O exame de urina pode mostrar leucocitúria, hematúria e proteinúria com formação de cilindros. A interrupção do uso da droga associa-se a melhora progressiva da função renal. O mecanismo de nefrotoxicidade da pentamidina é desconhecido. Além de queda da filtração glomerular, a droga induz lesão tubular, provocando quadros clínicos de hipocalcemia, hipomagnesemia com fração de excreção de magnésio elevada e hipercalemia.
Dapsona Esta droga, utilizada profilaticamente contra Pneumocystis carinii, é causa rara de lesão nefrotóxica. Casos de IRA foram descritos associados a doses maciças da droga, a necrose de papila e a hemólise intravascular.
AGENTES ANTIFÚNGICOS Anfotericina B É um antibiótico produzido a partir do Streptomyces nodosus, que age através da formação de complexos com as moléculas de esterol na membrana celular dos fungos, aumentando a sua permeabilidade e causando seu rompimento. Desde a sua introdução, em 1950, permanece como o mais efetivo agente antifúngico disponível. Tem grande relevância clínica atual, pois a partir da década de 80 houve aumento significativo da incidência de infecções intrahospitalares por fungos graças a doenças como a síndrome da imunodeficiência adquirida e ao incremento do número de pacientes imunossuprimidos por causa de transplantes de órgãos e uso de quimioterapia. As mesmas propriedades que a tornam tão efetiva contra os fungos fazem com que a anfotericina seja tóxica para diversos tecidos, incluindo o rim. Os mecanismos fisiopatogênicos da nefrotoxicidade da anfotericina são múltiplos. A droga liga-se às moléculas de esterol das células epiteliais, aumentando a sua permeabilidade a água e solutos, provocando alterações estruturais e funcionais. Experimentalmente causa vasoconstrição sistêmica e da arteríola aferente, que parece ocorrer independentemente de ativação do feedback túbulo-glomerular. Esta ação vascular é endotélio-independente e cálcio-dependente e pode ser bloqueada por teofilina, pelo peptídeo atrial natriurético e por bloqueadores do canal de cálcio. Expansão com cloreto de sódio em ratos tratados com anfotericina previne as alterações glomerulares mas não as tubulares, indicando existirem mecanismos de nefrotoxicidade diferentes para as células vasculares e tubulares. Nefrotoxicidade ocorre em até 80% dos pacientes tratados com anfotericina. A lesão é dependente tanto da dose
458
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
diária quanto da dose acumulada da droga. Doses cumulativas maiores do que 2 a 3 gramas provocam invariavelmente disfunção renal. Outros fatores de risco associados a maior nefrotoxicidade são idade avançada, sexo masculino, obesidade, insuficiência renal crônica, uso concomitante de outras drogas nefrotóxicas (especialmente ciclosporina e amicacina), uso simultâneo de diuréticos, depleção salina, hipocalemia e hipomagnesemia. A anfotericina causa lesão tubular direta (perda da capacidade de concentração e acidificação urinárias e perda urinária excessiva de eletrólitos) e alterações da hemodinâmica renal (aumento da resistência vascular renal, queda da filtração glomerular e do fluxo plasmático renal). Clinicamente a nefrotoxicidade manifesta-se por poliúria, hipocalemia, hipomagnesemia, acidose tubular distal e por insuficiência renal aguda não-oligúrica levando à queda da filtração glomerular. O quadro geralmente manifesta-se após alguns dias do início do uso da droga, porém pode ocorrer após semanas de tratamento. O exame de urina é pouco característico, podendo apresentar hematúria, leucocitúria, células tubulares, proteinúria e cilindros. O quadro histológico é de necrose tubular aguda tóxica com dilatação tubular, necrose e calcificação dos túbulos proximais e distais e vacuolização inespecífica de pequenas e médias artérias e arteríolas. As alterações de função renal são usualmente reversíveis com a suspensão do medicamento. Esta melhora pode demorar meses, especialmente se doses cumulativas maiores do que 4 gramas forem empregadas. Insuficiência renal crônica já foi descrita em pacientes submetidos a repetidas exposições à anfotericina. Considerando-se a alta prevalência clínica de nefrotoxicidade com esta droga, a procura de medidas de proteção tornou-se obrigatória. O uso de manitol ou de furosemida em pacientes não foi efetivo e a eficácia clínica dos bloqueadores de canal de cálcio não foi comprovada. A manobra de proteção comprovadamente mais eficaz para pacientes re-
Quadro 24.2 Fatores de risco para a nefrotoxicidade por anfotericina MODIFICÁVEIS • • • • • • •
Dose diária elevada Dose cumulativa elevada Depleção salina Uso simultâneo de diuréticos Uso simultâneo de outras drogas nefrotóxicas Hipocalemia Hipomagnesemia NÃO-MODIFICÁVEIS
• • • •
Idade avançada Sexo masculino Insuficiência renal crônica Obesidade
cebendo anfotericina é a expansão de volume extracelular. Estudos clínicos mostraram prevenção, e mesmo recuperação, da queda da filtração glomerular induzida por anfotericina com o uso de suplementação de cloreto de sódio, geralmente por via endovenosa. Com os dados atualmente disponíveis é razoável propor, desde que as condições clínicas do paciente permitam, a administração diária de 150 mEq de cloreto de sódio (1 litro de solução de cloreto de sódio a 0,9%), começando um dia antes ou no dia do início do tratamento com anfotericina, como medida básica de prevenção. Esta manobra, no entanto, não previne as alterações tubulares, e pacientes recebendo solução salina apresentaram hipocalemia mais pronunciada do que pacientes controle. Outra forma possível para minimizar a nefrotoxicidade da anfotericina é a manipulação das formulações farmacológicas para sua administração. A anfotericina é extremamente hidrófoba e o veículo normalmente utilizado na preparação da droga, o deoxicolato de sódio, tem propriedades nefrotóxicas. Trabalhos clínicos e experimentais mostraram menor nefrotoxicidade hemodinâmica e tubular quando a anfotericina foi diluída em soluções de lípides utilizadas para nutrição parenteral ao invés de soro glicosado. Na mesma linha de raciocínio, desenvolveramse três novas formulações comerciais com o intuito de melhorar a toxicidade sem perda de eficácia: anfotericina em complexo lipídico, anfotericina em dispersão coloidal e anfotericina em preparação lisossomal. As três preparações parecem ser menos tóxicas do que a formulação convencional do antibiótico, mas apresentam custo expressivamente mais elevado. Das três, é a preparação lisossomal que reuniu o maior número de evidências comprovando significativa redução da nefrotoxicidade (tanto a nível de creatinina quanto a nível de potássio) sem prejuízo da eficácia.
Pontos-chave: • Nefrotoxicidade depende da dose diária e da dose total • Causa hipocalemia, hipomagnesemia, acidose e poliúria • Expansão salina previne queda da filtração glomerular, mas não a hipocalemia • Existem fatores de risco modificáveis • Dissolução em lípides pode atenuar a nefrotoxicidade • Preparação lisossomal é menos nefrotóxica, porém cara AGENTES ANTIVIRAIS Aciclovir e Ganciclovir Aciclovir é um nucleosídeo análogo da guanosina que é fosforilado no interior da célula e inibe de forma seletiva a DNA-polimerase. É utilizado no tratamento de infecções
capítulo 24
por vírus da varicela zoster e herpes simples, principalmente em doentes imunossuprimidos. A droga é excretada inalterada pelos rins, em parte através da filtração glomerular e principalmente através de secreção tubular proximal. A dosagem dos níveis teciduais de aciclovir mostrou que a sua concentração em tecido renal é até 10 vezes superior à plasmática. Nefrotoxicidade tem ocorrido em 12 a 16% dos pacientes tratados com este agente antiviral, manifestando-se geralmente como IRA não-oligúrica que se instala no primeiro ou segundo dia de tratamento. Podem ocorrer cólica renal, náuseas e vômitos, hematúria e leucocitúria. Embora alguns pacientes tenham necessitado de diálise, o quadro é geralmente reversível com a interrupção do uso da droga e hidratação do paciente. A ocorrência de lesão renal parece relacionada à dose, velocidade e via de administração da droga, ao estado de hidratação e função renal prévia do paciente, bem como ao uso concomitante de outros agentes nefrotóxicos. Infusões rápidas, endovenosas, de dosagens maiores do que 500 mg/m2, níveis séricos superiores a 20 mg/ml e depleção de volume intravascular são os fatores de risco mais importantes para a IRA causada pelo aciclovir. A patogênese da lesão renal ainda não está bem determinada. A baixa solubilidade da droga e a presença de cristalúria (cristais birrefringentes em forma de agulha) em pacientes tratados com aciclovir levou à hipótese de que a nefrotoxicidade seja causada por precipitação intraluminal da substância em ductos coletores renais. Infelizmente, descrições histológicas da lesão são raras e não comprovaram de forma definitiva a presença de cristais obstruindo a luz tubular. Trabalhos experimentais mostraram que o aciclovir pode causar insuficiência renal associada a alterações tubulares proximais e distais. A droga causou poliúria, fosfatúria e hipofosfatemia, perda urinária aumentada de sódio e potássio e resistência à ação do hormônio antidiurético, sugerindo que a gênese da IRA causada por aciclovir deva ser bem mais complexa do que simples obstrução intratubular. A prevenção clínica da lesão deve ser feita através de hidratação adequada antecedendo o uso da droga e evitando-se infusões endovenosas rápidas (em menos de 60 minutos). O ganciclovir é um agente estruturalmente similar ao aciclovir, mais efetivo contra citomegalovírus, que tem demonstrado nefrotoxicidade bastante reduzida.
Cidofovir É um nucleosídeo análogo da citosina ativo contra vírus herpes e que tem sido usado no tratamento de retinite por citomegalovírus em pacientes com síndrome da imunodeficiência adquirida. É excretado, de forma intacta, por filtração glomerular e secreção tubular. O seu maior efeito colateral é nefrotoxicidade dose-dependente. A droga provoca elevação da creatinina, proteinúria e síndrome de Fanconi. A sua toxicidade pode ser atenuada por administração simultânea de solução salina e probenicida, que bloqueia a sua secreção tubular.
459
Foscarnet É um agente antiviral utilizado por via endovenosa em infecções por citomegalovírus em pacientes imunossuprimidos. Pode ser usado localmente para tratamento de herpes genital. Age inibindo a DNA polimerase em vírus herpes, a RNA polimerase dos vírus influenza e a transcriptase reversa dos retrovírus. A droga não é metabolizada, depositando-se no esqueleto e sendo excretada de forma inalterada na urina. Foscarnet é extremamente nefrotóxico, causando IRA em até 66% dos pacientes tratados. O fato de ser utilizado em doentes graves, muitas vezes recebendo administração concomitante de outros agentes nefrotóxicos, poderia explicar em parte a sua alta taxa de nefrotoxicidade. No entanto, em um estudo retrospectivo envolvendo 56 pacientes demonstrou-se que 40% dos indivíduos que desenvolveram IRA com foscarnet não estavam utilizando outros agentes nefrotóxicos, confirmando o seu alto índice de nefrotoxicidade. A lesão renal costuma manifestar-se por elevação dos níveis de uréia e creatinina durante a primeira semana de tratamento, e pode evoluir para IRA grave, necessitando de diálise, em 10 a 15% dos pacientes. Foscarnet causa hipomagnesemia, e acidose tubular renal e quadros de extrema poliúria (7 a 8 litros/dia) já foram descritos, indicando lesão tubular. A interrupção da droga faz com que ocorra melhora total ou parcial da função renal, o que pode demorar até meses. Os poucos resultados anatomopatológicos disponíveis mostram necrose tubular aguda grave ou fibrose intersticial e deposição de cristais no tufo glomerular. A etiopatogenia da disfunção renal causada pelo foscarnet não está esclarecida. Como ocorre com outros agentes nefrotóxicos, desidratação, insuficiência renal prévia e uso concomitante de outras drogas lesivas ao rim potencializam a ocorrência de IRA por foscarnet. Em um estudo prospectivo a administração de 2,5 litros/dia de cloreto de sódio antes e durante a administração da droga reduziu drasticamente a ocorrência de nefrotoxicidade.
Inibidores da Protease Estas drogas assumiram grande importância devido ao seu sucesso na terapêutica de pacientes portadores da síndrome da imunodeficiência adquirida. Existem quatro inibidores da protease aprovados para uso clínico: indinavir, ritonavir, saquinavir e nelfinavir. Destes, pelo menos dois, o indinavir e o ritonavir, têm quadros de nefrotoxicidade relevante descritos. Indinavir é o inibidor de protease mais comumente utilizado. Aproximadamente 20% da droga é excretada de forma inalterada na urina. O sal de indinavir é muito pouco solúvel em água, fazendo com que haja precipitação intra-renal ou urinária, com formação de cristais. Esta cristalúria pode ser assintomática ou apresentar-se clinicamente como dor lombar ou no flanco, litíase renal, cólica nefrética ou disúria e urgência miccional. Os cálculos de indinavir não foram visualizados em radiografias abdomi-
460
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
nais ou tomografias computadorizadas em aproximadamente metade das vezes. IRA oligúrica (associada ou não a cálculos obstrutivos), elevação de creatinina, nefrite intersticial e proteinúria também têm sido observadas em pacientes utilizando esta droga. Biópsias renais desses casos revelaram fibrose e nefrite intersticial, atrofia tubular, preenchimento da luz tubular por cristais e hipercelularidade mesangial. É provável que a etiopatogenia da lesão esteja ligada à precipitação da droga no parênquima renal. O fator de risco mais importante para a nefrotoxicidade do indinavir é obviamente desidratação. Pacientes tratados com este inibidor de protease devem ser orientados a beber 1 a 2 litros de fluido por dia, previamente à ingestão da droga, para prevenção da lesão renal. Nefrotoxicidade também foi descrita com o ritonavir, ocorrendo precocemente (até três dias após a introdução do medicamento) e manifestando-se por elevação de creatinina em diversos pacientes e pelo menos um caso de IRA dependente de diálise. Os mecanismos etiopatogênicos e a histologia desta lesão renal são ainda desconhecidos.
Nefrotoxicidade do Meio de Contraste Radiológico Meios de contraste iodado são amplamente utilizados em diversos procedimentos radiológicos, como angiografias, urorradiologia e tomografias computadorizadas. A incidência da nefrotoxicidade atribuída ao seu uso vai de 0 a 90%. Esta enorme variação deve-se a particularidades inerentes à população estudada, a diferenças na definição de lesão renal, ao intervalo de tempo transcorrido entre o uso do contraste e o estudo da função renal e à sensibilidade dos métodos usados para avaliar as alterações renais. Considerando-se que aproximadamente 10 milhões de procedimentos com o uso de contraste intravascular são realizados anualmente nos Estados Unidos, mesmo uma incidência de 0,1% significaria 10.000 casos de nefropatia por contraste/ano. O estudo deste problema pela óptica do universo de pacientes com queda aguda da função renal mostra que o uso de contraste tem sido relacionado como fator etiopatogênico em 10 a 15% dos casos de IRA intrahospitalar. De fato, a análise dos pacientes atendidos na década de 90 pelo Grupo de IRA do HC-FMUSP revelou que o contraste, isoladamente ou em associação com outras drogas, foi responsável por aproximadamente 9% de todos os casos de IRA atendidos e por aproximadamente 25% dos casos de IRA causada por agentes nefrotóxicos. A fisiopatologia da nefrotoxicidade por contraste é ainda mal definida. O rim normal é extremamente resistente à sua ação lesiva, e modelos animais foram obtidos apenas quando outros mecanismos de agressão renal, como insuficiência cardíaca, desidratação, hipercolesterolemia ou uso de indometacina, foram somados à administração da droga. A lesão parece ser multifatorial, e os principais
mecanismos aventados para a sua patogênese são alterações hemodinâmicas, lesão das células tubulares e obstrução intraluminal. A administração de contraste induz resposta bifásica na vasculatura renal. Há vasodilatação precoce e fugaz, seguida por vasoconstrição prolongada, queda do fluxo plasmático renal e da FG. Este fenômeno parece ser dependente do íon cálcio, pois pode ser bloqueado por bloqueadores de canal de cálcio mas não por alfabloqueadores. O sistema das prostaglandinas também pode estar envolvido: estudos experimentais identificaram diminuição no nível de prostaglandinas vasodilatadoras, e a vasoconstrição é agravada pela indometacina. Outros possíveis mediadores são a adenosina, pois teofilina previne a vasoconstrição induzida pelo contraste, e liberação aumentada de endotelina, que tem sido demonstrada tanto experimental como clinicamente após o uso de contraste. Trabalhos recentes mostraram potencialização da nefrotoxicidade do contraste através do bloqueio da formação de óxido nítrico ou proteção com o uso de L-arginina em modelos experimentais. Os meios de contraste podem induzir alterações reológicas em hemácias, induzindo a sua agregação e potencializando a queda de fluxo sanguíneo a nível de microcirculação. As evidências de lesão tubular direta são a presença de enzimúria em pacientes e animais de experimentação e as perturbações na respiração celular em modelos in vitro, induzidas pelo contraste. Outra forma de lesão tubular seria a decorrente da precipitação intraluminal de proteínas de Tamm-Horsfall, de cristais de oxalato ou de urato após a infusão de meio de contraste. A alteração estrutural renal provocada pelo contraste é mal caracterizada, devido à ausência de estudos anatomopatológicos adequados. Vacuolização citoplasmática de células tubulares proximais (“nefrose osmótica”) foi encontrada retrospectivamente em 20% das biópsias de pacientes submetidos a contraste iodado de alto poder osmótico. Esta alteração estava presente tanto em pacientes com função renal rebaixada como naqueles com função renal normal, e portanto não parece ser específica para a nefrotoxicidade do contraste. Mais recentemente, foi descrita também após administração de contraste de baixa osmolalidade. Lesões compatíveis com necrose tubular aguda já foram encontradas em pacientes com nefropatia por contraste, e necrose da porção espessa ascendente medular da alça de Henle foi descrita em animais submetidos à infusão de meio de contraste. A incidência da nefropatia por contraste está intimamente ligada à presença de fatores de risco para o seu desenvolvimento. Dentre esses, o mais importante é, sem dúvida, insuficiência renal prévia. O risco de desenvolvimento de nefropatia está diretamente correlacionado ao grau de insuficiência renal, isto é, quanto menor a função renal basal, maior a incidência de nefrotoxicidade. Diabetes também tem sido considerado um fator de risco independente para a nefropatia por contraste. No entanto, estudos prospectivos não encontraram maior incidência de
capítulo 24
nefrotoxicidade em grupos de pacientes diabéticos com função renal normal quando comparados a indivíduos nãodiabéticos. Por outro lado, o risco de nefrotoxicidade e a gravidade da lesão renal são nitidamente maiores em diabéticos com função renal rebaixada. Em indivíduos diabéticos com insuficiência renal leve a moderada a incidência de nefropatia por contraste é de 9 a 40%, e em pacientes diabéticos com insuficiência renal grave pode chegar até a 90%. Além disso, estes pacientes apresentam quedas da FG mais intensas para qualquer nível de elevação de creatinina pré-contraste do que pacientes não-diabéticos. Outros fatores de risco que têm sido associados ao desenvolvimento de nefrotoxicidade pelo contraste são idade avançada, depleção de volume intravascular, insuficiência cardíaca, infusão de volume de contraste maior do que 125 ml, exposição repetida ao contraste, uso concomitante de outras drogas nefrotóxicas, proteinúria, hiperuricemia, hepatopatia e mieloma múltiplo. O quadro clínico da nefropatia por contraste varia de alterações leves na função renal a IRA dependente de diálise. A lesão manifesta-se por elevação da creatinina sérica 48 a 72 horas após a injeção do contraste, com volta aos valores basais entre o 7.º e o 10.º dia pós-exposição. Casos de IRA prolongada, com duração de 2 a 4 semanas, podem ocorrer. O exame de urina “típico” tem células do epitélio tubular, cilindros granulosos e ocasionalmente cristais de oxalato de cálcio ou de urato. A fração de excreção de sódio pode ser baixa (< 1%), assim como a concentração urinária de sódio. Em condições normais de função renal o nefrograma deve ser mínimo ou ausente 6 horas após a infusão do meio de contraste. A persistência de nefrograma 24 a 48 horas após a administração de contraste é um indicador sensível para a ocorrência de nefro-
Quadro 24.3 Fatores de risco para a nefrotoxicidade por contraste DEFINIDO • Insuficiência renal prévia PROVÁVEIS • • • • • •
Diabetes Desidratação IRA por contraste prévia Mieloma Quantidade do contraste Insuficiência cardíaca
POSSÍVEIS • • • • •
Idade Vasculopatia Proteinúria Hiperuricemia Hepatopatia
461
patia por contraste. Por outro lado, a especificidade do nefrograma permanente para o diagnóstico de nefropatia por contraste é limitada, com aproximadamente 20% de resultados falso-positivos. A intensidade da lesão renal causada pelo contraste está relacionada à presença de fatores de risco, especialmente à função renal basal do indivíduo. Indivíduos com função renal pré-contraste normal ou pouco alterada podem apresentar quedas da filtração glomerular de até 30%, com elevações discretas ou moderadas da creatinina sérica, sem oligúria, necessidade de diálise ou outras repercussões clínicas. Em trabalho realizado pelo Grupo de IRA do HC-FMUSP, observou-se queda de aproximadamente 20% na FG de pacientes com depuração de creatinina basal de 82 ± 39 ml/min (média ± desvio padrão) 72 horas após uso de contraste, com completa normalização após uma semana. Por outro lado, pacientes com déficit moderado a grave da função renal basal, e particularmente indivíduos diabéticos com grau avançado de lesão renal, podem desenvolver insuficiência renal grave, oligúrica e diálise-dependente. Esta lesão pode ser irreversível (na nossa casuística isto tem ocorrido em aproximadamente 4% dos pacientes), determinando a inclusão do paciente em programa crônico de diálise.
PREVENÇÃO DA NEFROPATIA POR CONTRASTE Inúmeras medidas têm sido propostas para a prevenção da nefrotoxicidade por contraste. A mais óbvia, e freqüentemente esquecida, é a sua não-utilização. Em pacientes de alto risco os exames contrastados devem ser substituídos, sempre que possível, por outros métodos diagnósticos. Neste sentido, é vital a identificação adequada destes pacientes e o questionamento da real necessidade e utilidade do exame. É importante lembrar que pacientes com pouca massa muscular podem ter FG consideravelmente rebaixada na presença de valores de creatinina sérica “normais”. É absolutamente essencial assegurar-se de que indivíduos de risco para nefrotoxicidade pelo contraste estejam convenientemente hidratados antes da realização do exame. Entre as medidas ativas de prevenção da nefropatia por contraste a mais consistentemente efetiva do ponto de vista clínico é a expansão do volume extracelular. Esta expansão deve ser feita com solução salina (50 a 100 ml de NaCl 0,9% por hora), deve ser iniciada ao redor de 12 horas antes do procedimento e deve ser mantida por aproximadamente 12 horas após a infusão do contraste. O objetivo desta expansão é tanto evitar a nefrotoxicidade como minimizá-la ao máximo em pacientes de alto risco, evitando a necessidade de diálise ou a instalação de lesão renal irreversível. Outras medidas universalmente preconizadas para pacientes de alto risco são a utilização da menor quantidade possível de contraste, evitar a exposição repetida em intervalos de tempo curtos ou enquanto a creatinina não
462
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
retornar aos seus valores basais e suspender a utilização de drogas nefrotóxicas com potencial de causar alterações hemodinâmicas renais, como antiinflamatórios não-hormonais, ciclosporina, etc. Os novos contrastes não-iônicos, de baixa osmolalidade, causam indubitavelmente menos reações alérgicas e alterações cardiovasculares. A sua eficácia em relação à redução da incidência de nefrotoxicidade foi demonstrada de maneira significativa apenas em pacientes diabéticos com insuficiência renal prévia. A manutenção de alto fluxo urinário através do uso de furosemida e/ou manitol é outra medida profilática que tem sido recomendada. No entanto, trabalhos prospectivos bem conduzidos não só não demonstraram proteção com o uso de diuréticos, como até mesmo encontraram piora de função renal em pacientes que os utilizaram. A utilização destas drogas pode ser deletéria se ocorrer desidratação por diurese excessiva associada a reposição volêmica inadequada, e o seu uso em associação com contraste está contra-indicado. Existem também estudos clínicos e experimentais mostrando proteção contra a nefrotoxicidade do contraste através do uso prévio ou simultâneo de dopamina, bloqueadores dos canais de cálcio (nifedipina, nitrendipina), antagonistas da adenosina (teofilina), fator atrial natriurético, prostaglandina E1 por via endovenosa, L-arginina e N-acetilcisteína por via oral. Em um estudo clínico recente o uso de bloqueadores dos receptores de endotelina em pacientes com insuficiência renal crônica agravou, ao invés de melhorar, a nefrotoxicidade induzida pelo contraste. Tentativas de reduzir nefrotoxicidade em pacientes com lesão renal prévia através de retirada do meio de contraste por hemodiálise imediatamente após o seu uso não obtiveram resultados favoráveis consistentes.
Pontos-chave: • Creatinina eleva-se após 48 a 72 horas do uso do contraste • Fator de risco melhor definido: insuficiência renal prévia • Insuficiência renal prévia mais diabetes: aumenta o risco de nefrotoxicidade • Em pacientes de alto risco: considerar o uso de exames sem contraste • Melhor medida preventiva: expansão com solução salina • Contraste não-iônico: menos nefrotoxicidade em diabéticos com creatinina elevada • Não usar diuréticos para prevenção da nefrotoxicidade
Nefrotoxicidade dos Antiinflamatórios Não-hormonais A alta eficácia dos antiinflamatórios não-hormonais (AINHs) como agentes analgésicos e anti-reumáticos faz com que estas drogas estejam entre as mais largamente utilizadas no mundo nos dias de hoje. Calcula-se que aproximadamente 50 milhões de pessoas tomem algum tipo de AINH por dia nos Estados Unidos. Os efeitos colaterais mais comuns destas drogas são a nível gastrointestinal, porém a grande disseminação de seu uso fez com que os seus efeitos nefrotóxicos também se tornassem evidentes. Em uma série de 393 pacientes com IRA seguidos pelo Grupo de IRA do HC-FMUSP, os AINHs estiveram envolvidos na etiopatogenia da lesão renal em pelo menos 6% dos casos. Trabalhos epidemiológicos bem conduzidos demonstraram que indivíduos tomando AINH têm risco significativamente aumentado para internação por IRA. Estas drogas podem determinar diferentes tipos de lesão renal, compreendendo desde alterações funcionais até lesões estruturais irreversíveis em tecido renal (v. Quadro 24.4).
Quadro 24.4 Lesões renais possíveis causadas por antiinflamatórios não-hormonais • IRA mediada por vasoconstrição renal • Nefrite intersticial aguda acompanhada por síndrome nefrótica • Dor lombar e hematúria • Necrose cortical • Síndrome nefrótica sem IRA • Necrose de papila • Insuficiência renal crônica • Retenção de sódio • Hipercalemia • Hipertensão
IRA HEMODINAMICAMENTE MEDIADA É a manifestação de nefrotoxicidade mais comumente associada aos AINHs. Está ligada à capacidade de bloqueio da ciclooxigenase e conseqüente diminuição da síntese renal de prostaglandinas, que é comum a todos os diferentes AINHs. Em condições normais de volemia e fluxo sanguíneo renal, as prostaglandinas têm participação reduzida na manutenção da função renal. No entanto, quando substâncias vasoconstritoras intra-renais como angiotensina II, catecolaminas e hormônio antidiurético são liberadas, a produção de prostaglandinas vasodilatadoras, particularmente PGI2 e PGE2, torna-se essencial para a modulação do tônus vascular renal e adequação da filtração glomerular. Nesta situação, o bloqueio da síntese de prostaglandinas pelos AINHs pode resultar em quedas dra-
capítulo 24
máticas e abruptas da função renal, que se manifestam clinicamente como IRA. As situações de risco para o desenvolvimento desta forma de nefrotoxicidade por AINHs podem ser divididas esquematicamente em dois grandes grupos. No primeiro, os episódios de aumento de atividade vasoconstritora estão ligados a circunstâncias onde o volume sanguíneo efetivo absoluto ou relativo está diminuído. Enquadram-se nesta categoria os pacientes com hemorragias, hipovolemias de causas diversas (diarréia, vômitos, excesso de ingestão alcoólica, exercício físico extenuante, etc.), depletados em sal, em uso de diuréticos, hipotensos, com insuficiência cardíaca congestiva, cirróticos (principalmente com ascite), nefróticos, sépticos e em pós-operatório (onde se somam os efeitos da anestesia com seqüestros de volume em “terceiro espaço”). O segundo grupo engloba situações em que apesar do volume sanguíneo estar normal ou mesmo elevado, as prostaglandinas são importantes para a manutenção da função renal. São os pacientes com insuficiência renal crônica, idosos (mais de 65 anos), diabéticos, hipertensos, com quadros urológicos obstrutivos, em uso de outros agentes nefrotóxicos que provocam vasoconstrição renal (contraste, ciclosporina, tacrolimus) ou de drogas que alterem a hemodinâmica renal, como os bloqueadores de enzima de conversão e os bloqueadores de receptor AT1 da angiotensina II. A IRA desencadeada pelos AINHs nestas situações caracteriza-se por elevação abrupta dos níveis séricos de uréia e creatinina, oligúria, fração de excreção de sódio reduzida (<1%) e sedimento urinário normal. Pode existir hipercalemia desproporcional ao nível de insuficiência renal. A função renal costuma melhorar rapidamente com a suspensão do AINH. Necessidade de diálise é incomum, mas pode ocorrer, assim como evolução para lesão renal irreversível. Existem descrições de IRA após uso endovenoso, oral e mesmo tópico dos AINHs. Casos de IRA e insuficiência renal crônica irreversível têm sido descritos em neonatos quando AINHs foram administrados durante a gravidez ou nos primeiros dias para fechamento do ducto arterioso ou como analgésicos. Os novos antiinflamatórios que bloqueiam especificamente a COX2 (celecoxib e rofecoxib) parecem ter potencial nefrotóxico similar aos antiinflamatórios não-específicos. Já existe um número considerável de casos de IRA descritos após o uso destas drogas por pacientes com função renal prévia normal ou comprometida. Os fatores de risco são semelhantes aos descritos para os AINHs mais antigos.
IRA POR NEFRITE INTERSTICIAL AGUDA COM SÍNDROME NEFRÓTICA Esta forma de disfunção renal pelos AINHs é rara, porém o grande número de pacientes expostos a estas drogas fez com que mais de 100 casos com comprovação histológica já tenham sido descritos na literatura. Pelo menos
463
20 AINHs diferentes foram associados a episódios de nefrite intersticial aguda (NIA), e é provável que esta seja uma característica comum a esta classe de drogas. Proteinúria nefrótica costuma ocorrer em mais de 80% desses pacientes, tendo sido relacionada com maior freqüência ao uso de fenoprofen, naproxen e ibuprofen. Já existem relatos de casos associados aos novos inibidores específicos da COX2, celecoxib e rofecoxib. Quando IRA e proteinúria maciça desenvolvem-se concomitantemente em pacientes tomando AINHs, deve-se sempre suspeitar de nefrite intersticial. Os sintomas e sinais sistêmicos “clássicos” de NIA (febre, eosinofilia e rash cutâneo) estão presentes em menos de 20% das vezes. Os pacientes costumam ser idosos, predominantemente do sexo feminino, com função renal basal normal ou alterada e em uso de AINHs por meses. O nível de disfunção renal que acompanha esta síndrome é variável, compreendendo desde insuficiência renal leve até uremia grave, dependente de diálise. O sedimento urinário pode ser normal ou apresentar hematúria e leucocitúria, além, é claro, de proteinúria. Manifestações extra-renais são pouco freqüentes, porém quadros de hepatite, vasculite, dor abdominal e diarréia já foram descritos. Usualmente ocorre resolução da insuficiência renal e proteinúria com a suspensão do uso da droga. Em alguns pacientes esta remissão pode ser muito lenta, demorando meses. Embora na maioria dos casos a recuperação da função renal tenha sido completa, existem relatos de déficits permanentes de função renal e evolução para insuficiência renal crônica terminal. O resultado do uso de corticosteróides no tratamento destes pacientes é controverso, como em outros casos de NIA, e sua indicação deve ser analisada individualmente, em função das características de cada caso. Pode ocorrer recidiva da síndrome se o indivíduo for novamente exposto ao AINH causador da lesão ou a outras drogas da mesma classe. A histologia renal típica destes pacientes mostra nefrite intersticial aguda caracterizada por edema e infiltração focal ou difusa do interstício renal por linfócitos, macrófagos e eosinófilos. Os túbulos podem apresentar vacuolização, degeneração celular, atrofia e focos de necrose. A presença de granulomas e células gigantes tem sido eventualmente descrita. O infiltrado celular é composto na sua quase totalidade por linfócitos do tipo T, predominantemente CD8. Os glomérulos são normais, exceto pela fusão de podócitos que está sempre presente nos pacientes com síndrome nefrótica. Raramente, observou-se leve proliferação mesangial ou depósitos mesangiais de material elétron-denso. Em alguns poucos casos ocorreu a associação de glomerulonefrite membranosa, nefrite intersticial e necrose tubular aguda. Os mecanismos geradores da associação de nefrite intersticial com lesão glomerular não são claros. A lesão intersticial tem sido atribuída a reação de hipersensibilidade tardia aos AINHs. A necessidade de exposição prolongada à droga, a baixa prevalência dos sinais “clássicos” de
464
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
hipersensibilidade e a predominância de linfócitos T no infiltrado falam a favor desta hipótese. A patogênese da alteração glomerular é ainda mais obscura. É possível que ocorram alterações de permeabilidade da membrana basal glomerular em decorrência da ação local de citoquinas liberadas pelos linfócitos infiltrantes, em uma situação onde o efeito modulador negativo das prostaglandinas sobre a função dos linfócitos T está ausente. A inibição da ciclooxigenase poderia também estar desviando a metabolização do ácido araquidônico para o ciclo da lipoxigenase e aumentando a produção de leucotrienes, que são substâncias com importante ação pró-inflamatória.
IRA COM DOR LOMBAR E HEMATÚRIA O uso de suprofen foi associado ao desenvolvimento de IRA acompanhada por hematúria macroscópica e dor lombar de forte intensidade. Esta droga tem estrutura similar ao diurético uricosúrico ticrinafen e, provavelmente, induz lesão renal por obstrução tubular causada por precipitação intraluminal de ácido úrico. O quadro de IRA pode ocorrer após algumas doses ou mesmo após a primeira tomada do medicamento, em indivíduos com função renal normal, sem a presença de fatores de risco para o desenvolvimento de nefrotoxicidade por AINHs. O uso de suprofen deve ser evitado, pois existem diversas alternativas de AINHs sem este efeito colateral.
IRA POR NECROSE CORTICAL Existem relatos de casos de necrose cortical associados ao uso de ibuprofen em pacientes sem fatores de risco para o desenvolvimento de nefrotoxicidade por AINHs. Os mecanismos desta lesão são obscuros.
SÍNDROME NEFRÓTICA SEM IRA Aproximadamente 10% dos pacientes que desenvolvem lesão renal com o uso de AINHs podem apresentar quadros de síndrome nefrótica por glomerulopatia de lesões mínimas após meses de uso da droga, sem a presença de nefrite intersticial ou IRA. O achado histopatológico é característico, mostrando glomérulos normais ou discreta hipercelularidade mesangial à microscopia óptica e fusão de podócitos à microscopia eletrônica. Diversos tipos de AINHs podem provocar esta alteração. A interrupção da droga associa-se à remissão do quadro. Recidivas espontâneas e progressão para glomerulosclerose focal, mesmo com a suspensão do AINH, têm sido descritas. A eficácia dos corticosteróides nesta forma de lesão é desconhecida. O uso de diclofenaco, fenoprofen, cetoprofen, ibuprofen, tolmetin, piroxican e sulindac associou-se a alguns casos de síndrome nefrótica onde o achado histológico foi glomerulonefrite membranosa. A interrupção do uso do AINH resultou em diminuição progressiva da proteinúria, porém esta persistiu por meses em alguns pacientes.
INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA Dados recentes sugerem que pacientes que tenham feito uso prolongado de AINHs apresentam maior probabilidade de desenvolver insuficiência renal crônica (IRC). A lesão desenvolve-se após meses ou anos de ingestão continuada do medicamento. Idade avançada, sexo masculino, insuficiência cardíaca e hipoperfusão renal crônica têm sido aventados como possíveis fatores de risco para sua instalação. Sua fisiopatologia é mal definida. É possível que mecanismos imunológicos desencadeados durante a fase aguda da nefrite intersticial causada pelos AINHs continuem ativados cronicamente e, somados aos efeitos de fatores de crescimento e citoquinas, produzam fibrose intersticial crônica. Até que estudos prospectivos mais completos sejam realizados, é prudente evitar o uso prolongado e regular destas drogas. Necrose de papila renal tem sido associada ao uso de AINHs. Fenilbutazona e indometacina são as drogas presentes na maior parte dos casos, porém existem relatos desta lesão em pacientes recebendo fenoprofen, ibuprofen, naproxen, ácido mefenâmico e piroxicam. Muitos desses indivíduos tomavam concomitantemente aspirina, fenacetina ou múltiplos agentes analgésicos e apresentavam alterações da função renal basal. Ao contrário dos usuários crônicos de fenacetina, esses pacientes apresentaram predomínio do sexo masculino, tomaram a droga segundo orientação médica e não possuíam perfil psicológico característico. Isquemia da medula renal é considerada como a alteração inicial na indução de necrose de papila, e os AINHs provocam diminuição do fluxo sanguíneo medular através da ruptura do equilíbrio do tônus vascular induzido pelo bloqueio da ciclooxigenase. Este fenômeno é ainda mais significativo na presença de outras agressões à circulação medular, como lesão intersticial crônica prévia ou presença de pielonefrite. Necrose de papila pode também ser conseqüente ao acúmulo de metabólitos ativos dos AINHs ou de fosfolípides na região papilar. Finalmente, existem dados clínicos e experimentais que sugerem que o consumo elevado de cafeína pode potencializar os efeitos nefrotóxicos dos AINHs. Neste sentido, é importante lembrar que cafeína está freqüentemente presente em diversas das formulações de analgésicos utilizadas na prática diária.
ALTERAÇÕES ELETROLÍTICAS As prostaglandinas inibem ativamente a reabsorção de sódio na alça de Henle, túbulo distal e ducto coletor medular e, atuando como vasodilatadores, aumentam a carga filtrada de sódio. Além disso, reduzem a hipertonicidade intersticial medular através de aumento do fluxo sanguíneo medular, diminuindo a reabsorção de água na porção descendente da alça de Henle. Isto provoca diminuição da concentração intraluminal de sódio e conseqüentemente diminui a reabsorção passiva de sódio na porção fina da alça de Henle, impermeável à água. Assim, não causa surpresa que o uso de AINHs freqüentemente provoque retenção de só-
465
capítulo 24
dio. Este efeito é geralmente pouco relevante do ponto de vista clínico. No entanto, alguns indivíduos podem desenvolver balanços positivos de sódio importantes com repercussões sistêmicas significativas. Neste sentido, pacientes com função cardíaca comprometida recebendo estas drogas devem ser alvo de atenção especial. Os AINHs podem também induzir resistência à ação de diuréticos, provavelmente através de mecanismos vasopressores. As prostaglandinas participam dos mecanismos de diluição renal, modulando os efeitos do hormônio antidiurético. O uso dos AINHs pode alterar este equilíbrio, provocando retenção de água livre e hiponatremia. PGE2 e PGI2 são agonistas de renina e participam dos mecanismos que regulam a liberação de renina intra-renal. O uso de AINHs pode induzir balanço positivo de potássio através de um estado de hipoaldosteronismo hiporreninêmico, causando hipercalemia mesmo em pacientes com função renal normal. Em indivíduos diabéticos e em pacientes usando beta-bloqueadores, inibidores de enzima de conversão ou antagonistas de angiotensina II há risco considerável de desenvolvimento de hipercalemias graves com a administração de AINHs.
HIPERTENSÃO Os AINHs podem causar aumento da pressão arterial, provavelmente através de seus efeitos vasopressores e de retenção de sódio e água. Este aumento é geralmente modesto em pacientes normotensos e mais pronunciado em pacientes previamente hipertensos. Os indíviduos com maior vulnerabilidade a este efeito colateral são aqueles com hipertensão associada a baixa atividade de renina plasmática (idosos e negros, por exemplo). Os AINHs podem também interferir com o controle medicamentoso da hipertensão, especialmente em pacientes recebendo beta-bloqueadores ou diuréticos. Hipertensos tratados com vasodilatadores, clonidina ou bloqueadores de canal de cálcio são menos suscetíveis aos efeitos hipertensores dos AINHs. O efeito anti-hipertensivo dos inibidores da enzima de conversão parece ser pouco afetado por essas drogas, no entanto, deterioração da função renal após o uso concomitante desses agentes hipotensores e AINHs já foi descrita.
Pontos-chave: • Evitar o seu uso quando existirem fatores de risco • Medir função renal basal • Evitar depleção de sal e volume • Evitar outras drogas nefrotóxicas • Monitorizar função renal: suspender a droga precocemente se houver alteração • Inibidores específicos da COX2 também são nefrotóxicos
Nefrotoxicidade dos Inibidores da Enzima de Conversão da Angiotensina e dos Bloqueadores dos Receptores AT1 de Angiotensina II Estas classes de drogas são bastante utilizadas no controle da hipertensão, no tratamento da insuficiência cardíaca congestiva e na prevenção da progressão da doença renal, particularmente em pacientes diabéticos. Ironicamente, apesar de serem drogas “nefroprotetoras” podem desencadear IRA. Em uma análise dos pacientes que apresentaram falência renal aguda no ano de 1993 no HCFMUSP, os inibidores da enzima de conversão estavam envolvidos em 6% dos casos e existem inúmeras descrições de IRA por estes agentes na literatura. Mais recentemente, vários autores têm relatado IRA com características semelhantes à desencadeada pelos bloqueadores da enzima de conversão com o uso de bloqueadores dos receptores AT1 de angiotensina II. A IRA desencadeada por estes agentes está relacionada a condições fisiopatológicas em que a manutenção da filtração glomerular torna-se dependente do sistema reninaangiotensina. São situações em que o fluxo sanguíneo renal apresenta-se comprometido e a pressão do capilar glomerular é preservada à custa de vasoconstrição da arteríola eferente induzida pela ação da angiotensina II. Se o sistema renina-angiotensina for bloqueado e ocorrer diminuição importante do fluxo sanguíneo renal por obstrução arterial, hipotensão, hipovolemia ou vasoconstrição fixa da
Quadro 24.5 Fatores de risco para a nefrotoxicidade por AINHs Volume sanguíneo efetivo diminuído • • • • • • • • •
Desidratação Hemorragia Hipotensão Insuficiência cardíaca Uso de diuréticos Cirrose Síndrome nefrótica Sépsis Pós-operatório
Volume sanguíneo efetivo normal • • • • • • • •
Insuficiência renal crônica Idade avançada Obstrução urinária Hipertensão Diabetes Uso de contraste Uso de ciclosporina ou tacrolimus Uso de bloqueadores de enzima da conversão ou de bloqueadores de receptores AT1 de angiotensina II
466
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
Quadro 24.6 Situações associadas a nefrotoxicidade dos inibidores da enzima de conversão da angiotensina II e provavelmente aos bloqueadores dos receptores AT1 de angiotensina II 1. Estenose significante (maior do que 70%) de artérias renais bilateralmente, de artéria renal em rim único (anatômica ou funcionalmente) ou de artéria renal em rim transplantado. 2. Insuficiência cardíaca congestiva grave. 3. Nefrosclerose intra-renal grave. 4. Indivíduos idosos. 5. Insuficiência renal crônica. 6. Uso concomitante de drogas com ação vasoconstritora intra-renal (ciclosporina, tacrolimus, AINHs, contraste iodado, etc.). 7. Hipotensão e/ou contração da volemia por perdas (hemorragia, diarréia, vômitos, etc.). 8. Uso de diuréticos ou depleção em sal.
arteríola aferente, a pressão do capilar glomerular irá diminuir em função da presença de vasodilatação de arteríola eferente. Como conseqüência da perda deste mecanismo de auto-regulação, podem acontecer quedas dramáticas na filtração glomerular. É importante ressaltar que a associação de hipotensão ou hipovolemia com qualquer dos outros fatores de risco listados no Quadro 24.6 é altamente sinérgica para o desenvolvimento de nefrotoxicidade por estes agentes. Por outro lado, sempre que ocorrer queda da função renal ou IRA após o uso de um bloqueador da enzima de conversão ou bloqueador dos receptores AT1 de angiotensina II, deve-se suspeitar de alterações nas artérias renais de grande ou pequeno calibre. Indivíduos com risco aumentado para desenvolver nefrotoxicidade por estas drogas devem ter a sua função renal basal avaliada cuidadosamente antes e imediatamente após a introdução do medicamento. O quadro clínico da nefrotoxicidade por estas drogas foi melhor descrito para os inibidores da enzima de conversão e caracteriza-se por queda da filtração glomerular que em geral reverte rapidamente após a suspensão da droga, confirmando o caráter funcional da lesão. No entanto, pacientes com insuficiência renal prévia podem apresentar perda irreversível da função renal. Em pacientes anúricos ou com recuperação insatisfatória da função renal, a possibilidade de trombose de artéria renal deve ser considerada. A maioria dos bloqueadores da enzima de conversão (captopril, enalapril, lisinopril, etc.) é de excreção renal, e portanto sua dosagem deve ser reduzida em presença de insuficiência renal. Os bloqueadores da enzima de conversão podem causar hipercalemia grave em pacientes diabéticos, com insuficiência renal ou que estejam usando beta-bloqueadores, AINHs ou diuréticos poupadores de potássio. Muito raramente o uso de bloqueadores da enzi-
ma de conversão foi associado a casos de nefrite intersticial ou de glomerulonefrite membranosa.
Nefrotoxicidade de Agentes Imunossupressores e Imunomoduladores CICLOSPORINA A Em 1970, uma nova cepa de fungos (Tolypocladium inflatum Gams) foi cultivada a partir de amostras de solo norueguês. Estes fungos produziam polipeptídeos com baixa capacidade fungicida, porém com importantes propriedades imunossupressoras na ausência de citotoxicidade. Em 1972, as potentes propriedades imunossupressoras de um desses peptídeos, a ciclosporina A (CSA), foram caracterizadas e descritas. A introdução da ciclosporina A na prática clínica, em 1978, revolucionou o transplante de órgãos sólidos e medula óssea. O seu uso associou-se a significativa melhora da sobrevida dos enxertos a curto e médio prazos, à possibilidade do uso de doses menores de corticosteróides e à diminuição das complicações agudas em transplante de medula. Posteriormente, a sua utilidade foi também demonstrada no tratamento de doenças auto-imunes como uveítes, psoríase, asma brônquica, diabetes de início recente e síndromes nefróticas de etiologias diversas, aumentando o número de pacientes expostos à sua ação. A ciclosporina A é um polipeptídeo cíclico neutro, composto por 11 aminoácidos, lipofílico e com peso molecular de 1.202 daltons. As suas propriedades imunossupressoras manifestam-se através da inibição seletiva da ativação dos linfócitos T e dos eventos mediados pela interleucina2. No compartimento intracelular a CSA liga-se a uma imunofilina, a ciclofilina. O complexo CSA/ciclofilina inibe a enzima calcineurina, uma fosfatase cálcio-dependente, responsável pela translocação dos fatores necessários para a transcripção dos genes da interleucina-2. Quando ocorre saturação da ciclofilina e da calcineurina a CSA ligase às membranas celulares, inclusive à membrana mitocondrial. A molécula de CSA é extremamente hidrofóbica e lipofílica, característica responsável pelo seu largo volume de distribuição e acúmulo em tecido pancreático, hepático, renal, linfático e gordura. CSA cruza a barreira placentária e é secretada no leite materno. Aproximadamente 99% da droga ativa é metabolizada no fígado pelo sistema enzimático do citocromo P-450, com a formação de mais de 10 metabólitos com diferentes atividades biológicas. A eliminação dos metabólitos ocorre principalmente por via biliar, com menos de 5% sendo excretados pela urina. Em situações normais, CSA inalterada é encontrada em níveis muito reduzidos na bile e na urina (menos do que 5% da dose administrada). Pacientes com disfunção hepática necessitam de correção de sua dosagem, o que não é necessário no caso de insuficiência renal. Drogas que interferem com o sistema do citocromo P-450 podem alterar o meta-
capítulo 24
Quadro 24.7 Drogas que interferem com o metabolismo da ciclosporina A, alterando os seus níveis sanguíneos AUMENTAM NÍVEL
DIMINUEM NÍVEL
Verapamil Diltiazem Nicardipina Amlodipina Eritromicina Claritromicina Ketoconazole Fluconazole Itraconazole
Rifampicina Isoniazida Fenitoína Carbamazepina Barbitúricos
bolismo da CSA. Cetoconazol, eritromicina, verapamil e diltiazem, por exemplo, aumentam a sua concentração sanguínea por inibirem este sistema enzimático. No sangue, a maior parte da CSA está ligada às hemácias (55 a 60%) e lipoproteínas (30 a 50%), com apenas 5 a 10% circulando como “droga livre”. Ironicamente, logo ficou evidente que o principal efeito colateral da nova droga, que havia melhorado de forma tão espetacular a sobrevida do transplante renal, era a sua nefrotoxicidade. A CSA pode induzir diversas formas de alterações renais: nefrotoxicidade aguda (função retardada do enxerto renal, disfunção renal reversível e síndrome hemolítico-urêmica), nefrotoxicidade crônica, hipertensão e alterações eletrolíticas (hipomagnesemia, hipercalemia e hiperuricemia). As concentrações séricas de CSA não são um indíce sensível ou específico para auxiliar o diagnóstico de nefrotoxicidade, e lesão renal pode ocorrer com níveis da droga considerados “terapêuticos”. Mais de vinte anos de pesquisa e uso clínico de CSA ainda não esclareceram se os seus efeitos nefrotóxicos e imunossupressores podem ser dissociados. Quando métodos suficientemente sensíveis de avaliação da função renal são utilizados, fica claro que o uso de doses clínica ou farmacologicamente relevantes de CSA está sempre associado a maior ou menor grau de alterações hemodinâmicas renais. O rótulo de nefrotoxicidade aguda deve ser reservado a situações em que o comprometimento renal induzido pela CSA é de natureza funcional e reversível, sem alterações histológicas significativas em tecido renal. A nefrotoxicidade crônica, por sua vez, manifesta-se por queda da filtração glomerular e lesões estruturais irreversíveis em parênquima renal, que podem evoluir para insuficiência renal crônica terminal.
Nefrotoxicidade Aguda FUNÇÃO RETARDADA DO ENXERTO RENAL. O uso de CSA foi associado a aumento da incidência de insuficiência renal oligoanúrica no período pós-transplante imediato, principalmente quando o tempo de isquemia
467
Quadro 24.8 Formas de apresentação da nefrotoxicidade da ciclosporina A • • • • • •
Retardo no funcionamento do enxerto renal Elevação assintomática da creatinina sérica Insuficiência renal aguda Síndrome hemolítico-urêmica Insuficiência renal crônica Alterações eletrolíticas (hipomagnesemia, hipercalemia, hipofosfatemia, hiperuricemia) • Alterações da capacidade de concentração urinária • Acidose hiperclorêmica • Hipertensão
renal era prolongado. Notava-se também recuperação mais lenta do que a habitual da função renal pós-transplante, com “imunossupressão convencional”, sem CSA. Esta lesão renal provavelmente associou-se, em muitos casos, às altas doses de ciclosporina A utilizadas quando da introdução da droga na prática clínica. O manuseio clínico destes pacientes pode obrigar a realização de biópsia renal para detecção de possíveis episódios de rejeição e diminuição, ou mesmo suspensão, da administração da droga para confirmação da suspeita de nefrotoxicidade. O uso de doses menores de ciclosporina A no período inicial do transplante e o desenvolvimento de protocolos de imunossupressão, que aguardam o bom funcionamento do enxerto para iniciar sua administração, têm minimizado este problema. DISFUNÇÃO RENAL REVERSÍVEL. A forma mais comum de nefrotoxicidade aguda da CSA é a de elevações moderadas da creatinina sérica (ao redor de 25% do valor basal), em pacientes clinicamente assintomáticos. Quedas transitórias da filtração glomerular e fluxo plasmático renal foram observadas após as doses diárias de CSA em recipientes de enxerto renal que recebiam cronicamente a droga. Da mesma forma, notou-se melhora significativa da função renal em pacientes transplantados renais “estáveis”, sem evidências clínicas de nefrotoxicidade, que necessitaram suspender o uso de CSA por razões econômicas. Esta forma de alteração da função renal pode ser acompanhada por hipertensão, retenção hídrica, hipercalemia, hipomagnesemia e hiperuricemia. Apesar da toxicidade por CSA raramente ser observada com níveis sanguíneos da droga inferiores a 200 ng/ml (radioimunoensaio monoclonal), quedas reversíveis da função renal podem claramente ocorrer com níveis de CSA considerados “terapêuticos”. É importante frisar que mesmo após administração experimental ou clínica prolongada, a suspensão da droga causa melhora significativa ou mesmo normalização da filtração glomerular. Pode ocorrer quadro clínico de IRA, com queda intensa da filtração glomerular e da diurese, quando doses elevadas de CSA são usadas. Esta forma de nefrotoxicidade é
468
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
atualmente muito rara no transplante renal. No entanto, ocorre com relativa freqüência em transplantes cardíacos, hepáticos, pulmonares ou de medula óssea, situações onde freqüentemente coexistem outras drogas nefrotóxicas e condições hemodinâmicas adversas. Pode acontecer também quando a CSA é administrada em conjunto com outras drogas nefrotóxicas ou que provocam alterações da hemodinâmica intra-renal, como os antiinflamatórios nãohormonais, os bloqueadores da enzima de conversão, aminoglicosídeos, anfotericina B, etc. A insuficiência renal geralmente é de instalação abrupta, oligúrica, com sódio urinário reduzido (menor do que 10 mEq/L) e associada a níveis sanguíneos elevados da CSA. A regra é a pronta recuperação da função renal com a interrupção ou diminuição da droga, confirmando o caráter funcional da lesão. A IRA que ocorre imediatamente após a administração endovenosa de CSA parece ser causada pela ação conjugada da droga e do seu veículo, cremofor. Dados de nosso laboratório mostraram que CSA dissolvida em uma solução de ácidos graxos utilizada em alimentação parenteral, em vez de cremofor, não provocou queda da filtração glomerular e manteve sua capacidade imunossupressora in vitro. Muitas vezes é difícil estabelecer a diferenciação entre disfunção renal reversível causada pela CSA e rejeição aguda do enxerto renal. Parâmetros clínicos como o intervalo de tempo entre o transplante e a elevação da creatinina, a intensidade desta elevação, ganho de peso, a presença de febre e os níveis sanguíneos da droga podem ajudar, porém têm baixa sensibilidade e especificidade diagnóstica. Quando o episódio de disfunção renal ocorre nos primeiros seis meses após o transplante, diversos grupos optam por tratá-lo inicialmente como rejeição. Se a resposta a este tratamento for insatisfatória, a dose de CSA é alterada. Outros centros optam pela realização de biópsia renal para tentar definir o diagnóstico. A histologia renal da IRA por CSA é pouco característica, sendo raros os casos com lesões compatíveis com necrose tubular aguda. Os parâmetros histológicos relacionados à toxicidade aguda da CSA, como vacuolização isométrica tubular, microcalcificações e mitocôndrias gigantes, são inespecíficos. Podem ocorrer sem que exista alteração evidente da função renal e, por serem focais, podem não ser achados na presença de nefrotoxicidade. O diagnóstico anatomopatológico de nefrotoxicidade aguda por CSA será feito muitas vezes por exclusão, afastando-se a presença de rejeição aguda na biópsia. É importante lembrar que pacientes tratados com CSA podem apresentar infiltrado intersticial inflamatório focal em enxertos renais com função estável. Para complicar ainda mais a situação, nefrotoxicidade aguda por CSA e rejeição podem ocasionalmente coexistir, e a identificação da entidade predominante na queda de função renal dependerá de teste terapêutico. A etiopatogenia da nefrotoxicidade aguda da CSA está nitidamente vinculada a alterações hemodinâmicas. A le-
são tubular, quando presente, é discreta, a menos que doses extremamente altas de CSA sejam usadas. CSA causa intensa vasoconstrição da arteríola aferente com conseqüente aumento da resistência vascular, diminuição do fluxo sanguíneo renal e queda da filtração glomerular. Os mecanismos responsáveis por esta vasoconstrição renal ainda não estão totalmente esclarecidos. Evidências clínicas e experimentais sugerem a participação de diferentes mediadores: aumento da produção de tromboxane A2 e redução da síntese de prostaglandinas vasodilatadoras, ativação do sistema renina-angiotensina, aumento da atividade do sistema nervoso simpático, aumento da liberação renal e sistêmica de endotelina, efeito direto da droga na musculatura lisa vascular, perturbações no relaxamento vascular dependente de óxido nítrico, geração de radicais oxidantes. Em contrapartida, vários procedimentos têm sido usados na tentativa de bloquear as alterações hemodinâmicas agudas provocadas pela CSA: antagonistas de tromboxane, análogos de prostaglandina, ácido ômega 3, bloqueadores do sistema renina-angiotensina, denervação renal, bloqueio farmacológico do sistema nervoso simpático, anticorpos antiendotelina e antagonistas competitivos dos receptores para endotelina, bloqueadores de canal de cálcio, doadores de óxido nítrico e L-arginina, antagonistas do fator ativador de plaquetas, agonistas de receptores de dopamina, pentoxifilina e hormônio atrial natriurético. Algumas dessas manobras induziram melhoras parciais na hemodinâmica renal, mas nenhuma delas, isoladamente, protegeu completamente contra as alterações de função renal induzidas pela droga. É provável que a etiopatogênese da vasoconstrição causada pela CSA seja multifatorial, ocorrendo através da combinação de lesão endotelial e desequilíbrio entre os sistemas vasodilatadores e vasoconstritores. Clinicamente, o uso de bloqueadores de canal de cálcio, a manutenção de volume extracelular adequado, a monitorização dos níveis séricos de CSA e o cuidado com o uso de associações de drogas potencialmente sinérgicas em termos de nefrotoxicidade são as formas mais efetivas de proteção contra a lesão funcional aguda induzida pela ciclosporina A. SÍNDROME HEMOLÍTICO-URÊMICA. Algumas vezes pacientes tratados com CSA podem apresentar quadros de vasculopatia aguda com características clínico-laboratoriais de síndrome hemolítico-urêmica. Esta patologia foi inicialmente descrita em pacientes submetidos a transplante de medula óssea, porém logo surgiram casos em transplantes de fígado e de rim. O quadro clínico compreende insuficiência renal aguda fulminante associada à trombocitopenia, com mau prognóstico em relação à evolução do enxerto em casos de transplante renal. A histologia renal é compatível com microangiopatia trombótica, podendo apresentar graus variados de trombose capilar glomerular e necrose fibrinóide. Coelhos tratados com endotoxina bacteriana e então submetidos a CSA podem desenvolver alterações semelhantes. A etiopatogenia desta lesão é des-
capítulo 24
conhecida. A agressão ao endotélio tem sido relacionada ao aumento da agregação plaquetária e à síntese de tromboxane induzidos pela CSA. O desenvolvimento desta dramática situação em pacientes transplantados cria o dilema da retirada da CSA ou de sua troca por outro agente imunossupressor. Existem relatos de casos onde se obteve a reversão da síndrome com a redução da dose de ciclosporina.
Nefrotoxicidade Crônica Pacientes tratados com CSA por tempo prolongado (meses a anos) podem apresentar perda progressiva da função renal, freqüentemente acompanhada por hipertensão arterial, e lesões estruturais irreversíveis em parênquima renal. Embora incomum, pode ocorrer evolução para insuficiência renal crônica terminal dependente de diálise. Esta lesão poderia ser atribuída à rejeição crônica no caso de enxerto renal, mas a sua ocorrência em recipientes de outros órgãos sólidos, como fígado e coração, e em pacientes portadores de doenças auto-imunes indica de maneira inequívoca sua relação com a droga. O fato de a CSA ter prevenido significativamente a perda precoce do enxerto renal, mas não ter sido capaz de melhorar a sua sobrevida a longo prazo, pode ser decorrente da presença de nefrotoxicidade crônica nestes pacientes. Os fatores de risco para esta patologia são mal definidos. Manutenção de níveis séricos e dosagem diária ou cumulativa da droga elevada e ocorrência de episódios repetidos de nefrotoxicidade aguda têm sido incriminados. No entanto, as lesões estruturais podem evoluir mesmo se a dose de CSA for diminuída, e nefrotoxicidade crônica tem também sido descrita em pacientes que receberam doses pequenas de CSA. Histologicamente esta síndrome caracteriza-se por atrofia e dilatação tubular, fibrose intersticial com aspecto em faixas, comprometendo os raios medulares, e alterações das camadas musculares e íntima das arteríolas aferentes e de pequenas artérias, que vão desde depósitos nodulares de material hialino até necrose de parede, causando diminuição do lúmen ou mesmo oclusão arteriolar. Os glomérulos estão inicialmente preservados, mas à medida que a lesão evolui surgem glomérulos hipertrofiados, com esclerose focal e mesmo hialinizados. A patogênese da nefropatia crônica causada pela CSA é obscura. A vasoconstrição mantida de arteríola aferente poderia ser responsável pela lesão através de isquemia do néfron e do tecido renal a jusante. Entretanto, estudos experimentais recentes demonstraram haver dissociação dos mecanismos causadores das alterações de hemodinâmica glomerulares e das lesões estruturais desencadeadas pela droga. O uso de bloqueadores de canal de cálcio ou de endotelina protegeu contra a queda de filtração glomerular porém não atenuou o aparecimento das lesões histológicas em ratos tratados com CSA. Da mesma forma, o uso de enalapril e/ou losartan preveniu de maneira significante o desenvolvimento de fibrose intersticial sem impedir as
469
alterações de hemodinâmica glomerular causadas pela CSA. Esta proteção estrutural pode ser decorrente da melhora do fluxo medular, regulado por receptores de angiotensina II na região dos vasa recta, ou da inibição dos efeitos proliferativos da angiotensina II e da própria CSA. Trabalhos recentes mostram que CSA estimula a proliferação celular, e a produção de colágeno, tanto in vivo como in vitro, aumenta a produção de fibroblastos e matriz extracelular em vários tecidos, como o gengival, e estimula a produção in vivo e in vitro de TGF-, citoquina com importantes propriedades fibrinogênicas, anticolagenases e de deposição de matriz extracelular. No momento, não dispomos de informações suficientes para tentar estabelecer estratégias de prevenção clínica contra esta forma de lesão crônica. O fato de que mesmo doses reduzidas da droga, possivelmente sem efeito significativo na hemodinâmica renal, induzem alterações histológicas pode significar que esta forma de nefrotoxicidade talvez seja inevitável e que o preço a ser pago por imunossupressão efetiva por CSA será algum grau de dano estrutural em parênquima renal. A introdução de novos agentes imunossupressores sem ação nefrotóxica, como rapamicina e mofetil micofenolato, tem permitido a substituição da ciclosporina, com subseqüente melhora da função renal.
Pontos-chave: Nefrotoxicidade aguda • Hemodinamicamente mediada e reversível • Má correlação com os níveis séricos da droga • Histologia renal inespecífica • Diagnóstico diferencial com rejeição • Melhora com diminuição ou interrupção da droga Nefrotoxicidade crônica • Lesão estrutural (fibrose intersticial) irreversível • Hialinização de arteríola aferente • Pode evoluir para insuficiência renal crônica terminal CICLOSPORINA G Ciclosporina G (CSG) é um análogo natural da CSA com importante atividade imunossupressora. Em estudos experimentais, em ratos, a CSG causou menor queda da filtração glomerular e menor alteração estrutural renal do que a CSA, quando dosagens equivalentes ou níveis séricos semelhantes das duas drogas foram obtidos. A farmacocinética das duas formas de ciclosporina foi profundamente diferente, com a CSG apresentando maior velocidade de depuração do
470
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
que a CSA. Em estudos in vivo e em vasos isolados a CSG, ao contrário da CSA, não causou hipertensão ou alterações de contratilidade. Ensaios clínicos iniciais mostraram que a CSG tem capacidade imunossupressora semelhante à CSA, com menor incidência de alterações funcionais renais.
TACROLIMUS Este agente imunossupressor com estrutura semelhante aos antibióticos macrolídeos é produzido pelo fungo Streptomyces tsukubaensis. É extremamente lipofílico, tem metabolização hepática e, de forma similar à CSA, bloqueia a ativação dos linfócitos T através da ligação a uma imunofilina citoplasmática. O tacrolimus é 100 vezes mais potente do que a CSA in vitro. Esta droga é empregada em transplantes de órgãos sólidos e no tratamento de doenças auto-imunes. A sua maior utilização tem ocorrido em transplante hepático, onde parece ter um efeito hepatotrópico, e em recipientes de enxerto renal no caso de rejeição aguda refratária aos tratamentos convencionais. O perfil de nefrotoxicidade do tacrolimus é muito semelhante ao CSA, exceto por induzir menos hipertensão. Clinicamente, provoca alterações agudas da função renal e, quando usado por tempo prolongado, causa lesão arteriolar e fibrose intersticial. Pode também induzir hipercalemia, hipomagnesemia, alterações do metabolismo da glicose e neurotoxicidade. Casos de síndrome hemolíticourêmica também foram descritos com esta droga. Recentemente, criou-se um modelo experimental adequado de nefrotoxicidade com tacrolimus em ratos depletados em sal, onde os níveis séricos da droga são semelhantes aos níveis considerados terapêuticos em seres humanos. O estudo deste modelo demonstrou que bloqueadores de canal de cálcio e antagonistas de angiotensina II conferiram proteção parcial contra as alterações renais causadas pela droga. O uso combinado de CSA e tacrolimus mostrou-se extremamente nefrotóxico e deve ser evitado.
INTERLEUCINA-2 Interleucina-2 (IL-2) recombinante é utilizada no tratamento de melanomas, câncer de rim ou outros tumores refratários à terapia convencional. O seu uso é freqüentemente complicado por hipotensão, aumento da freqüência cardíaca, retenção de fluido, aumento de peso e IRA oligúrica com sódio urinário reduzido e fluxo plasmático renal preservado. O quadro sugere lesão pré-renal associada a alterações de hemodinâmica glomerular a nível de Kf ou de arteríola eferente. Idade avançada, insuficiência renal prévia, doses elevadas e infusão rápida da IL-2 parecem ser fatores relacionados à maior incidência de lesão renal. A suspensão da droga implica melhora da função renal. O uso concomitante de AINH para minimizar os efeitos colaterais da IL-2 é comum, o que pode contribuir para potencializar a queda de função renal observada. As alterações causadas pela IL-2 têm sido atribuídas a uma “síndrome de vazamento vascular”, com saída de
proteínas para a região intersticial e diminuição do volume intravascular. Hipoalbuminemia e diminuição da pressão colóido-osmótica já foram documentadas clinicamente após a infusão da droga. Estudos experimentais e in vitro não encontraram evidências de que a IL-2 provoque lesão endotelial direta. É provável que o “vazamento” seja conseqüência de aumento da permeabilidade vascular causada por ativação linfocitária e liberação de citoquinas. Ensaios clínicos mostraram prevenção da lesão renal induzida pela IL-2 através da administração concomitante de noradrenalina ou dopamina. O uso de infusão contínua, lenta, de IL-2 ao invés de injeções “em bolo” diminui a intensidade da lesão renal. O uso de AINH em associação com IL-2 deve ser evitado.
INTERFERON-A Interferon recombinante humano vem sendo utilizado no tratamento de tumores sólidos e hematológicos e no tratamento de hepatite B crônica. Aproximadamente 20% dos pacientes apresentam proteinúria. Insuficiência renal aguda grave, às vezes evoluindo para insuficiência renal irreversível, pode ocorrer. Síndrome hemolítico-urêmica, nefrite intersticial aguda, necrose tubular aguda, glomerulosclerose focal e síndrome nefrótica já ocorreram em pacientes recebendo interferon. Evidências experimentais, obtidas a partir de culturas de células tubulares proximais humanas, e a presença clínica de enzimúria sugerem a possibilidade da droga ter efeitos tóxicos tubulares diretos.
Quadro 24.9 Drogas causadoras de nefrite intersticial aguda • • • • • • • • • • • • • • • • •
Penicilinas Cefalosporinas Sulfonamidas Rifampicina Quinolonas Vancomicina Teicoplamina Etambutol Aciclovir Aminoglicosídeos Tetraciclina Azitromicina Nitrofurantoína Piperacilina Minociclina Indinavir Quinino
• Antiinflamatórios nãohormonais • Ácido 5aminossalicílico • Mesalazina • Paracetamol
• Furosemida • Tiazídicos • Amilorida • • • •
Omeprazol Cimetidina Ranitidina Famotidina
• Amlodipina • Diltiazen • Captopril • Clozapina • Fenitoína • Fenobarbital • Interferon • Interleucina 2 • • • •
Estreptoquinase Ticlopidina Alopurinol Propiltiouracil
capítulo 24
FATOR DE NECROSE TUMORAL Em torno de 13 a 21% dos pacientes submetidos ao uso de fator de necrose tumoral apresentam lesão renal. O mecanismo parece ser semelhante ao da IL-2: “vazamento vascular” causando IRA pré-renal. O achado de enzimúria em 50% dos indivíduos recebendo a droga sugere lesão tubular direta.
OKT3 É um anticorpo monoclonal anticélula T usado como agente imunossupressor. Costuma causar queda reversível da função renal, possivelmente associada à liberação de citoquinas, por mecanismos semelhantes aos observados com IL-2. Este fenômeno desaparece após a administração da segunda ou terceira dose da droga. A histologia renal de pacientes acometidos por esta forma de nefrotoxicidade não revelou necrose tubular aguda.
Nefrotoxicidade de Agentes Anticancerígenos CISPLATINA É a droga antineoplásica mais utilizada no tratamento de tumores sólidos, particularmente de células germinativas (testículos e ovários), de cabeça e pescoço, de bexiga e de pulmão (tumor de células pequenas). Age através da inibição da síntese de DNA, e sua eficácia terapêutica é dose-dependente. Seu principal efeito colateral é nefrotoxicidade, que também é dose-dependente. O rim é o órgão mais importante para o metabolismo da cisplatina. Além de ser o responsável pela maior parte da excreção da droga, é o principal local de acúmulo e retenção deste antineoplásico (a concentração em córtex renal é aproximadamente 6 vezes mais elevada do que a em qualquer outro tecido). Após infusão endovenosa, mais de 90% da droga liga-se às proteínas plasmáticas. A fração livre, de peso molecular pequeno e carga elétrica neutra, é filtrada pelos glómerulos, não é reabsorvida pelos túbulos e aparece inalterada na urina. A cisplatina entra na célula tubular proximal, principalmente do segmento S3, através da região basolateral da membrana celular. No interior da célula é transformada em metabólitos não-mutagênicos. Os mecanismos pelos quais a droga provoca a lesão celular ainda não estão definidos. Os processos de transporte responsáveis pela acumulação da cisplatina na pars recta tubular parecem ser importantes para a sua toxicidade. De fato, esta é a região de maior lesão anatômica, e correlações clínicas positivas foram estabelecidas entre concentração cortical da droga e lesão renal. Os possíveis mecanismos e mediadores da nefrotoxicidade da cisplatina são: metabólitos (gerados a nível sistêmico ou intra-renal), inibição de sistemas enzimáticos celulares (ATPase, gama-glutamil transpeptidase), inibição da síntese de macromoléculas
471
(DNA, RNA, proteínas), geração de radicais livres de oxigênio, perturbações no funcionamento mitocondrial e alterações na homeostase do cálcio. A histologia renal tem mostrado predominantemente lesões tubulares. Gotas hialinas em células epiteliais proximais, degeneração da membrana basal tubular, áreas focais de necrose em túbulos proximais, distais e ductos coletores, dilatação tubular distal e cilindros podem ser encontrados. Atipias celulares com núcleos gigantes e formações sinciciais em ductos coletores indicam ter ocorrido alterações na síntese de DNA. Os glomérulos e vasos são geralmente normais. A nefrotoxicidade induzida pela cisplatina é dose-dependente e progressiva. No entanto, queda significativa e abrupta da filtração glomerular pode ocorrer após a administração da primeira dose da droga. Doses únicas de 2 mg/kg são suficientes para causar insuficiência renal em até 33% dos pacientes. A nefrotoxicidade da cisplatina tem caráter bifásico. A lesão inicial acontece ao nível do túbulo proximal, na presença de filtração glomerular e fluxo plasmático renal normais. Vinte e quatro a 48 horas após a administração da droga observam-se poliúria e diminuição da osmolalidade urinária, por diminuição da reabsorção tubular proximal de sódio e água. A poliúria responde à administração de hormônio antidiurético e pode ser bloqueada pela aspirina, o que sugere envolvimento das prostaglandinas na sua gênese. Enzimúria e proteinúria de origem tubular podem ser detectadas. Setenta e duas a 96 horas após a infusão da droga ocorre piora da poliúria associada a queda dramática da FG e do fluxo plasmático renal e aumento da resistência vascular renal. Estudos experimentais demonstraram que os mecanismos de reabsorção tubular de sódio em túbulo proximal e na porção espessa ascendente da alça de Henle estão profundamente alterados na presença de funcionamento normal do ducto coletor medular. Outras alterações relacionadas à disfunção tubular são: hipomagnesemia por magnesiúria exagerada, hipocalemia, hiperfosfatúria e aminoacidúria. A mais comum e com maior importância clínica é a hipomagnesemia, que pode ocorrer mesmo na presença de creatinina sérica normal. A lesão renal desencadeada pela droga pode ser irreversível, determinando quedas permanentes de FG e tubulopatia persistente, que se manifesta por hipomagnesemia e hipocalcemia. Estudos clínicos e experimentais mostram evolução silenciosa de fibrose intersticial progressiva com exposição repetida à cisplatina. Cisplatina pode também causar síndrome hemolítico-urêmica grave. A alta eficácia clínica da cisplatina motivou o desenvolvimento de técnicas para tentar minimizar a incidência e a gravidade da sua nefrotoxicidade. O uso de verapamil e de bloqueadores de enzima de conversão foi ineficaz na prevenção da lesão, enquanto o fator atrial natriurético protegeu parcialmente contra a queda da FG. Infusões rápidas da droga devem ser evitadas, pois estão nitidamente associadas a maior incidência de nefrotoxicidade do que administração contínua, lenta. A dosagem da droga está
472
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
associada à sua toxicidade: doses maiores do que 33 mg/ m2/semana causam invariavelmente efeitos colaterais. Outras drogas nefrotóxicas como aminoglicosídeos e AINHs não devem ser usadas concomitantemente. Recentemente, foi descrito um caso de insuficiência renal irreversível em uma paciente, com função renal basal normal, submetida a exame com contraste iodado de baixo peso molecular seis dias após ter recebido cisplatina intraperitoneal. O uso de hidratação vigorosa associada à manutenção de alto volume urinário através de manitol e/ou furosemida tem permitido o uso de doses de cisplatina de até 100 mg/m2, com minimização do efeito nefrotóxico da droga. Recomenda-se manter infusão volêmica com solução salina antecedendo de 6 a 12 horas a administração da droga e prolongando-se por mais 6 a 12 horas. O ritmo de infusão volêmica e de diurese deve ser mantido entre 100 e 200 ml/min. Este procedimento deve ser controlado cuidadosamente para não provocar alterações hidroeletrolíticas. O mecanismo de proteção é desconhecido. A hidratação/diurese não diminui o conteúdo cortical ou plasmático de cisplatina e não previne a necrose de segmento S3. Considerando-se que o transporte da droga ocorre na parede basolateral, o fluxo urinário aumentado ou a sua diluição intraluminal não têm importância na sua captação intracelular. É possível que a proteção observada esteja ligada a fenômenos de vasodilatação intra-renal. A administração de tiossulfato de sódio, que age alterando o perfil farmacocinético da droga, tem permitido o uso de dosagens maiores da droga ao mesmo tempo que diminuiu a incidência de toxicidade. Outros agentes de proteção que vêm sendo usados ou testados são: WR-2721 (ácido S-2-(3aminopropilamino)etilfosforotióico), DDTC (dietilditiocarbamato), probenecida, mercaptoetanossulfatona, MT (metalotioneína) e selenito de sódio. É importante lembrar que estas manobras e drogas mostraram proteção contra os efeitos agudos da cisplatina, mas a sua eficiência em relação à prevenção de desenvolvimento de lesão túbulo-intersticial crônica não foi determinada.
Pontos-chave: • Nefrotoxicidade dependente da dose diária e acumulada • Pode causar lesão renal irreversível • Causa hipomagnesemia importante • Manter hidratação/diurese elevadas • Evitar uso simultâneo de outras drogas nefrotóxicas • Não infundir em bolo, usar infusão lenta • Não utilizar doses maiores do que 25 a 33 mg/m2/semana • Infusão simultânea de tiossulfato de sódio reduz nefrotoxicidade
CARBOPLATINA É um análogo da cisplatina desenvolvido especificamente para apresentar menor nefrotoxicidade e aprovado para uso clínico em 1989. A incidência de nefrotoxicidade é rara com o seu uso, ocorrendo com doses elevadas em pacientes que já haviam recebido cisplatina ou que estavam usando outras drogas nefrotóxicas. Os seus principais efeitos colaterais são supressão medular e trombocitopenia.
METOTREXATE Este agente quimioterápico age através da inibição da diidrofolato redutase. É efetivo em tumores de cabeça e pescoço, tumores de mama, sarcomas, linfomas não-Hodgkin, tumores de bexiga, coriocarcinoma e leucemias linfocíticas agudas. É eliminado, assim como o seu principal metabólito (7-hidroximetotrexate), por filtração glomerular e secreção tubular. Doses elevadas podem causar IRA não-oligúrica em 10 a 30% dos pacientes. Esta nefrotoxicidade pode ser causada em parte pela pouca solubilidade do metotrexate e do 7-hidroximetotrexate, que é acentuada pela acidez urinária. A droga parece também ser capaz de causar lesão tubular direta, pois induz enzimúria e proteinúria tubular. Necrose tubular aguda já foi demonstrada sem a presença de depósitos intratubulares. A manutenção de função renal adequada é crucial em pacientes recebendo metotrexate. A queda da filtração glomerular resultará em um círculo vicioso extremamente perigoso: os níveis séricos da droga aumentarão induzindo maior toxicidade, a excreção de metotrexate diminuirá ainda mais, etc. Nestas situações deve-se usar leucovorin como antídoto aos efeitos da droga. Hemoperfusão pode ser uma alternativa para a redução das concentrações plasmáticas de metotrexate na presença de IRA. Outra opção para redução dos níveis séricos de metotrexate em pacientes com insuficiência renal é o uso da carboxipeptidase-G2 (CPDG2). Esta enzima bacteriana hidrolisa o metotrexate em metabólitos inativos, podendo rapidamente reduzir as concentrações plasmáticas da droga para níveis não-tóxicos. A prevenção da lesão renal pode ser feita através de expansão volêmica, manutenção de alto fluxo urinário (>3 litros/dia) e alcalinização da urina. O uso concomitante deste quimioterápico com outros agentes nefrotóxicos como cisplatina e AINHs deve ser evitado. Recentemente, relatou-se que mesmo doses baixas de metotrexate causaram queda significativa da FG em pacientes com artrite reumatóide tratados em associação com AINHs.
Nefrotoxicidade de Peçonhas Animais SERPENTES Existem no mundo aproximadamente 3.000 espécies de serpentes, das quais 10 a 14% são consideradas peçonhentas. No Brasil encontram-se quatro gêneros de serpentes
capítulo 24
peçonhentas: Bothrops (jararaca, jararacuçu, urutu, caiçara, etc.), Crotalus (cascavel), Lachesis (surucucu, surucutinga) e Micrurus (coral verdadeira). Cerca de 20.000 casos de acidentes ofídicos são reportados por ano ao Ministério da Saúde brasileiro, com mortalidade variando em torno de 6%. Insuficiência renal aguda (IRA) é uma das principais complicações do acidente ofídico e importante causa de letalidade nos pacientes que sobrevivem à ação inicial da peçonha. Praticamente todas as serpentes com importância médica podem causar IRA. No entanto, análise dos casos publicados revela que acidentes com as serpentes da espécie Vipera russeli (“Russell’s viper”) na Ásia e as serpentes do gênero Bothrops e Crotalus na América do Sul apresentam a maior incidência de lesão renal. A alteração histológica renal mais comum nos casos de IRA por acidente ofídico é a necrose tubular aguda (NTA). Outras lesões, como necrose cortical, nefrite intersticial aguda, alterações glomerulares, arterite e necrose de papila, podem ser encontradas. Casos com evolução clínica compatível com síndrome hemolítico-urêmica ou síndrome nefrótica já foram descritos. As peçonhas das serpentes são substâncias extremamente complexas, compostas por enzimas, peptídeos, proteínas não-enzimáticas e várias outras substâncias. Podem existir diferenças qualitativas e quantitativas de toxinas não somente entre espécies de um mesmo gênero, como também entre indivíduos de uma mesma espécie. A composição da peçonha pode variar num mesmo animal dependendo do sexo, idade, época do ano e condições ambientais. A complexidade e a diversidade da composição das peçonhas faz com que os mecanismos causadores de IRA após acidente ofídico sejam de difícil definição. A etiopatogenia da lesão renal tem sido atribuída a nefrotoxicidade direta da peçonha, miólise, hemólise, hipotensão, coagulação capilar glomerular, ação tóxica vascular da peçonha e até mesmo a reações de hipersensibilidade à toxina ou ao soro antiofídico.
Bothrops As serpentes do gênero Bothrops são responsáveis por 90% dos acidentes ofídicos no Brasil. É o gênero mais numeroso em espécies, todas causando quadros clínicos muito semelhantes. O veneno botrópico tem importante atividade proteolítica, causando lesões locais, destruição tecidual e promovendo a liberação de substâncias hipotensoras. Ativa a cascata de coagulação induzindo sangramentos e incoagulabilidade sanguínea por consumo de fibrinogênio. Pode causar lesão vascular direta e tem atividade hemolítica. Mais de 100 casos de IRA após picada de Bothrops foram descritos na literatura. A prevalência de IRA causada por acidente botrópico varia de 2 a 10%, dependendo da série estudada. Deve-se ressaltar que todos os estudos reportando as freqüências de IRA são retrospectivos, e utili-
473
zaram métodos pouco sensíveis de avaliação da função renal. A insuficiência renal é precoce e freqüentemente grave, com presença de oligúria e necessidade de diálise. A lesão mais freqüentemente encontrada na histologia renal tem sido NTA, embora casos de necrose cortical também tenham sido descritos. Vários fatores têm sido aventados para justificar a maior ou menor freqüência de IRA: idade do paciente, tamanho e espécie da serpente, quantidade de veneno injetada, intervalo de tempo entre a picada e a administração do soro antiofídico e quantidade e via de administração do soro. A única relação documentada até o momento foi a correlação positiva entre idade do paciente e prevalência de IRA. A etiopatogenia da IRA associada à picada de Bothrops tem sido relacionada a hipotensão, mioglobinúria, hemoglobinúria, coagulação glomerular e nefrotoxicidade direta do veneno. No entanto, hipotensão ou choque são eventos raros após picada por Bothrops, e embora o veneno botrópico possa causar lesão tecidual localizada, não possui ação miotóxica sistêmica similar à do veneno crotálico e não induz elevações significativas de creatinofosfoquinase (CPK). O desenvolvimento de um modelo experimental de IRA com a peçonha botrópica permitiu o estudo dos mecanismos da lesão renal. Neste modelo, a injeção endovenosa da peçonha provocou queda acentuada e precoce da filtração glomerular, do fluxo plasmático renal e da diurese, fenômenos acompanhados por elevação da resistência vascular renal e da fração de excreção de sódio. Não ocorreu queda da pressão arterial ou elevação de CPK. Houve acentuado consumo de fibrinogênio e hemólise intravascular. A atividade de calicreína urinária reduziu-se significativamente. Duas horas após a injeção da peçonha a análise histológica renal mostrou extensa deposição glomerular de trombos de fibrina e necrose tubular aguda. Estudo funcional e histológico realizado 48 horas após a administração do veneno encontrou filtração glomerular ainda rebaixada, túbulos com áreas de necrose e com cilindros de hemácias hemolisadas e resolução do quadro glomerular. Trombos glomerulares de fibrina já foram detectados em autópsias de indivíduos que morreram após picada de Bothrops ou em pacientes com necrose cortical após acidente botrópico. É provável que a isquemia causada pela deposição de microtrombos glomerulares provoque desde lesão renal reversível até necrose cortical focal ou total, dependendo da quantidade de peçonha injetada e da velocidade com que ela alcança a corrente sanguínea. A peçonha botrópica é considerada hemolítica in vitro e existem relatos clínicos de anemia e hemólise após acidente com Bothrops, assim como relatos de hemoglobinúria após injeção intraperitoneal de peçonha botrópica em ratos. É possível que a hemoglobinúria contribua para a gênese da lesão renal neste tipo de acidente ofídico, agravando a vasoconstrição renal e a coagulação glomerular ou causando nefrotoxicidade tubular. O sistema calicreína-cinina é considerado um dos responsáveis pela modulação do tô-
474
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
nus vascular intra-renal, e quedas da sua atividade têm sido encontradas em IRA experimental. O achado de redução significativa de sua atividade após a injeção de peçonha pode estar relacionado a excesso de consumo na tentativa de contrabalançar a vasoconstrição renal e/ou destruição das células tubulares distais onde o sistema se localiza, e provavelmente está relacionado à queda de fluxo plasmático renal observada. O fato de a peçonha ser de excreção renal, a precocidade e a alta prevalência de IRA após acidente botrópico sugerem a possibilidade de ação nefrotóxica direta do veneno. De fato, a adição da peçonha botrópica à suspensão de túbulos proximais provoca toxicidade tubular direta significativa. Esta nefrotoxicidade direta foi prevenida pelo acréscimo prévio ou simultâneo de soro antibotrópico à suspensão de túbulos proximais.
Pontos-chave: • Responsável pela maior parte dos acidentes com serpentes peçonhentas no Brasil • IRA precoce e grave (prevalência real?) • Casos documentados de necrose cortical • Mecanismos de lesão: isquemia glomerular, hemólise e nefrotoxicidade direta • Proteção: soro antiofídico? Crotalus As serpentes do gênero Crotalus são responsáveis por aproximadamente 9% dos acidentes ofídicos em nosso meio. A sua peçonha é considerada a mais tóxica entre as serpentes brasileiras, com letalidade de 72% nos casos não tratados e de 5% nos casos onde houve soroterapia. A peçonha das Crotalus sul-americanas difere bastante da de suas congêneres norte-americanas, as rattlesnakes. Possui diversas frações enzimáticas e várias toxinas já foram identificadas: crotoxina, crotamina, giroxina, convulsina, etc. A peçonha é neurotóxica, pode causar incoagulabilidade sérica por consumo de fibrinogênio decorrente de sua ação coagulante, quase não produz lesão local e possui forte atividade miotóxica sistêmica, causando rabdomiólise generalizada. Há destruição preferencial das fibras musculares do tipo 1, ricas em mioglobina, causando mioglobinúria e alterações da cor da urina. A peçonha é também hemolítica in vitro, e durante muito tempo o aparecimento de urina vinhosa e reação de benzidina positiva urinária após acidente crotálico foi atribuído à hemoglobinúria. No entanto, tanto a alteração de cor da urina como o teste da benzidina são inespecíficos, podendo ocorrer indiferentemente com mio- ou hemoglobinúria. Em 1987, Azevedo-Marques e col. comprovaram a ocorrência de miólise (mioglobina positiva no sangue e urina, elevação de enzimas e biópsia muscular) na ausência de hemólise (hemoglobina livre e haptoglobina plasmática normais
e ausência de hemoglobinúria) em pacientes picados por Crotalus. IRA é a principal complicação deste acidente. Apesar do acidente crotálico ser aproximadamente 10 vezes menos freqüente do que o botrópico, o número absoluto de casos de IRA reportados na literatura com os dois gêneros de serpente é semelhante. A lesão renal pode surgir horas após a picada, é freqüentemente oligúrica e dependente de diálise e é considerada a principal causa de óbito nestes pacientes. A alteração histológica mais comum é necrose tubular aguda, porém casos de nefrite intersticial foram descritos por nosso grupo. Estudo experimental recente do nosso laboratório mostrou que os mecanismos de lesão renal da peçonha são rabdomiólise, toxicidade tubular direta e provavelmente vasoconstrição. Este mesmo estudo demonstrou que desidratação agrava e expansão do volume extracelular atenua a nefrotoxicidade da peçonha. A prevalência reportada de IRA após acidente crotálico em estudos retrospectivos é elevada, variando de 9 a 31%. Em um estudo retrospectivo, idade avançada e intervalo de tempo mais longo entre o acidente e o atendimento médico foram identificados como fatores de risco para desenvolvimento de IRA. Os mesmos autores acharam que para pacientes maiores de 40 anos mialgia e face neurotóxica foram fatores preditivos de falência renal. Estudo prospectivo recente de nosso grupo encontrou aproximadamente 25% de prevalência de IRA após acidente crotálico. Os fatores de risco identificados para o desenvolvimento de IRA foram demora em receber o soro antiofídico, menor superfície corpórea e nível sérico de CPK. As medidas clássicas de proteção à função renal contra rabdomiólise, como expansão do volume extracelular e uso de manitol endovenoso, devem ser empregadas neste tipo de acidente.
Pontos-chave: • Alta prevalência de IRA • Mecanismos de nefrotoxicidade: rabdomiólise, vasoconstrição e toxicidade tubular • Fatores de risco para lesão renal: desidratação, demora em receber o soro antiofídico, menor superfície corpórea e grau de rabdomiólise • Medidas de proteção: soroterapia precoce, em quantidade adequada, expansão do volume extracelular e manitol ARTRÓPODES PEÇONHENTOS IRA tem sido descrita após acidentes com múltiplas picadas de vespas ou abelhas. O aparecimento das abelhas “africanizadas” em 1957 tornou este tipo de acidente mais comum. Apesar da composição da peçonha das abelhas
475
capítulo 24
européias e africanas ser semelhante, estas atacam em grande número, com provocações mínimas e com grande intensidade e persistência. O quadro clínico dependerá da quantidade de peçonha injetada e afeta vários órgãos e sistemas. Podem ocorrer hemólise intravascular, rabdomiólise, lesão hepática, plaquetopenia, coagulopatia, sangramentos, alterações cardiovasculares e pulmonares e insuficiência renal aguda. A peçonha contém, entre outras substâncias, melitina, histamina, hialuronidase, apamina, fosfatase ácida e fosfolipase A2. Mais de 50% do peso seco da peçonha é melitina, que tem ação sinérgica com a fosfolipase A2 e provoca hemólise e miólise. Estudos experimentais mostraram que a etiopatogenia da lesão renal está relacionada a mioglobinúria, vasoconstrição renal e nefrotoxicidade direta da peçonha. Nos casos onde foi realizada a histologia renal a lesão encontrada foi necrose tubular aguda. As lagartas das mariposas do gênero Lonomia podem provocar acidentes caracterizados por distúrbios de coagulação, levando a síndromes hemorrágicas. A peçonha provoca fibrinólise direta e/ou ativação do sistema de coagulação com ação semelhante ao fator X ativado ou à calicreína. No Brasil, os acidentes foram descritos inicialmente na região norte, com mortalidade de até 38%, e mais recentemente nas regiões sul e sudeste do país. O contato com os espinhos ou com a hemolinfa das lagartas provoca reação local imediata e horas após surgem os fenômenos hemorrágicos, de gravidade variável. Em 1990, descreveuse pela primeira vez a ocorrência de IRA reversível após acidente com Lonomia. Posteriormente, os mesmos autores relataram 18% de IRA em 33 indivíduos expostos à Lonomia obliqua na região sul do Brasil. O quadro clínico da IRA incluiu anúria e necessidade de diálise durante 20 dias. No grupo com IRA a mortalidade foi de 50%, ao contrário da mortalidade de 4% no grupo com função renal preservada. Em 1995, tivemos a oportunidade de atender, no Grupo de IRA do Hospital das Clínicas, São Paulo, paciente que desenvolveu anúria horas após contato maciço com lagartas do gênero Lonomia. Este paciente tinha função renal normal previamente ao acidente, não apresentou em nenhum momento hipotensão e não fez uso de drogas nefrotóxicas. O seu quadro de IRA foi arrastado, necessitando de diálise durante aproximadamente três semanas e recebendo alta 40 dias após o contato com creatinina de 1,9 mg/ dl. Biópsia renal realizada no 17.º dia após o acidente revelou apenas membrana basal enrugada e espessada em túbulos e glomérulos e discreta fibrose intersticial. É possível que, da mesma maneira que no acidente botrópico, a peçonha destas lagartas provoque formação de microtrombos de fibrina levando a coagulação glomerular, isquemia tubular e conseqüentemente IRA. Aranhas do gênero Loxosceles são pequenas e pouco agressivas. No entanto, sua peçonha pode provocar necrose tardia no local da picada, hemólise intravascular, alterações no sistema de coagulação e lesão renal. Não há corre-
lação entre a gravidade dos fenômenos locais e a hemólise. Pacientes com lesões cutâneas pouco intensas podem apresentar hemólises graves e IRA, que é a principal causa de mortalidade nestes acidentes.
NEFROPATIAS TUBULOINTERSTICIAIS Introdução Infiltrados intersticiais têm sido relacionados a drogas, infecções ou nefropatias primárias. A história das nefropatias tubulointersticiais inicia-se em meados do século XIX, quando o compartimento tubulointersticial foi reconhecido anatomicamente como parte da estrutura renal. Em 1898, descreveu-se pela primeira vez um caso de nefrite intersticial aguda (NIA), e em 1914 as nefrites intersticiais ganhavam seu espaço na classificação das doenças renais. Na década de 40, a expansão do uso de antibióticos chamou a atenção para as nefrites intersticiais por drogas, e em 1953 houve o reconhecimento da nefropatia por analgésicos. Desde então, o número de drogas envolvidas na gênese de nefropatias tubulointersticiais aumentou de forma alarmante. A etiologia da lesão tubulointersticial tem sido melhor compreendida recentemente. Nas últimas décadas acumularam-se evidências, principalmente experimentais, mostrando a importância da imunidade celular na produção de inflamação e lesão intersticial primária ou secundária a eventos glomerulares. Sabe-se hoje que agressões tóxicas ou infecciosas ao interstício são associadas a processos imunológicos caracterizados pela presença de infiltrado mononuclear que produz citoquinas e outros mediadores de amplificação da inflamação. Desta agressão inicial pode resultar lesão crônica irreversível, caracterizada por fibrose intersticial e atrofia tubular, e evolução para insuficiência renal crônica terminal. A falta de correlação entre lesão glomerular e disfunção renal tem sido constatada há tempos. Em patologias onde o glomérulo é o alvo inicial (glomerulonefrite membranosa e nefrite lúpica, por exemplo), a lesão glomerular muitas vezes não justifica o grau de comprometimento funcional renal. A morfologia glomerular também não guarda boa correlação com a evolução das nefropatias. Por outro lado, o grau de lesão tubulointersticial associada a estas nefropatias mostra boa correlação tanto com a gravidade como com o prognóstico das doenças. No estágio inicial de qualquer glomerulopatia, vários grupos celulares (principalmente monócitos e macrófagos) e mediadores (fatores de crescimento, complemento, citoquinas, moléculas de adesão, etc.) são ativados no interstício, levando a inflamação e fibrose renal. Outra importante questão relaciona-se ao mecanismo através do qual uma lesão predominantemente tubuloin-
476
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
tersticial leva à queda da filtração glomerular. Existem várias hipóteses, que não se excluem. Pode haver obstrução tubular, com aumento da pressão intratubular e queda “mecânica” da filtração glomerular. Outra possibilidade seria a de aumento da resistência vascular pós-glomerular causada por edema e inflamação intersticial, levando à isquemia deste compartimento. Um terceiro mecanismo seria o de insuficiência tubular conseqüente a atrofia tubular e inflamação intersticial causando diminuição da absorção de solutos pelos segmentos tubulares mais comprometidos e conseqüente diminuição do gradiente osmótico renal, queda da reabsorção tubular de água e formação de urina hipoosmolar. Esta insuficiência tubular seria “compensada” por queda da filtração glomerular.
Mecanismos de Lesão Tubulointersticial A maior parte das informações existentes sobre os mecanismos de lesão tubulointersticial é oriunda de trabalhos experimentais que utilizam diversos modelos de nefrite tubulointersticial aguda. Os mais comuns são aqueles de imunização com antígenos homólogos ou heterólogos da membrana basal tubular. Outros modelos utilizam-se da imunização com proteína de Tamm-Horsfall ou outros antígenos. A nefrite de Heymann, além de causar glomerulopatia membranosa, produz infiltrado mononuclear intersticial. Na maioria desses modelos há predominância da imunidade celular, e o papel dos anticorpos é mal definido ou mesmo considerado pouco importante. A etiopatogenia da nefrite tubulointersticial clínica parece também estar predominantemente relacionada a alterações da imunidade celular, embora o mecanismo exato e a importância dos diferentes tipos celulares no desenvolvimento da lesão sejam desconhecidos. A inflamação que ocorre nas patologias tubulointersticiais tem como alvo antígenos renais que se tornaram nefritogênicos após um estímulo do tipo infeccioso ou tóxico. Assim, várias drogas podem agir como hapteno, ligando-se ao parênquima (células tubulares, por exemplo), alterando sua estrutura e tornando-o imunogênico. Outras drogas podem ter ação tóxica direta sobre estruturas intersticiais, formando novos antígenos. No caso das infecções, provavelmente ocorre mimetismo entre a estrutura renal e antígenos de determinados agentes infecciosos. Entretanto, para que haja lesão imunológica o indivíduo deve perder a tolerância aos antígenos “próprios” do parênquima renal. Assim, outro aspecto da patogênese das lesões tubulointersticiais diz respeito aos genes de resposta imune, que estão associados à suscetibilidade às doenças. Vários trabalhos experimentais mostraram que a capacidade de um antígeno desencadear resposta imune depende, dentre outras coisas, da presença e interação com moléculas do complexo maior de histocompatibilidade (CMH). Por exemplo, sabe-se que a função da célula T supressora é regulada por genes do CMH. Portanto, uma explicação
para a auto-agressão tubulointersticial a partir de determinado estímulo antigênico (drogas, por exemplo) seria a ausência, em alguns indivíduos, deste mecanismo regulador da resposta imune a antígenos “próprios”, determinada geneticamente.
Nefrite Intersticial Aguda Os dados relativos à incidência de nefrite intersticial aguda (NIA) na população são sujeitos a críticas, pois provêm na maioria das vezes de levantamentos retrospectivos. Na investigação de nefropatias inespecíficas (hematúria ou proteinúria), o diagnóstico histológico de NIA é raro. No entanto, quando o grupo avaliado é de pacientes com insuficiência renal aguda, esta incidência é de aproximadamente 15%. Por outro lado, é interessante notar que até 25% dos pacientes com insuficiência renal crônica têm como diagnóstico nefrite intersticial crônica, confirmando o dado anterior. Existem diversos fatores etiológicos para NIA, porém a causa mais importante é sem dúvida o uso de drogas. Os antibióticos beta-lactâmicos (penicilinas, cefalosporinas), a rifampicina, as sulfonamidas, as quinolonas, a fenitoína, o alopurinol, a furosemida, a cimetidina, o omeprazol e os antiinflamatórios não-hormonais (AINH) são as drogas mais comumente implicadas, porém este grupo está sempre em expansão. Dentre as infecções, causas importantes de NIA em pediatria, as mais importantes são difteria, infecções estreptocócicas e infecção pelo vírus Epstein-Barr. Outro grupo engloba as doenças relacionadas a fenômenos auto-imunes como sarcoidose, síndrome de Sjögren, lúpus eritematoso sistêmico, doença antimembrana basal tubular, além de uma síndrome descrita nos últimos anos composta de uveíte e nefrite intersticial. Finalmente, no grupo das NIAs idiopáticas nenhum fator etiológico pode ser identificado.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A apresentação clínica mais marcante é de insuficiência renal aguda, de gravidade variável, geralmente relacionada a doença intercorrente ou tomada de nova medicação. Muitas vezes são casos de insuficiência renal aguda em que a história, manifestações clínicas e exames laboratoriais não se encaixam nos diagnósticos de IRA pré-renal, necrose tubular aguda ou glomerulonefrite aguda. Nestes casos, o uso de biópsia renal é essencial para a realização do diagnóstico. Existem sintomas e sinais que sugerem NIA. No caso da NIA induzida por drogas, manifestações cutâneas podem ocorrer em até 50% dos pacientes, febre em 75% e eosinofilia em 80%. Infelizmente, a presença desta tríade característica é rara, geralmente ocorrendo em menos de 30% dos casos. Algumas vezes é relatada dor lombar, provavelmente relacionada a edema renal e distensão de sua cápsula. A insuficiência renal pode ou não
capítulo 24
ser oligúrica, mas a fração de excreção de sódio é geralmente maior que 1%. Pode ocorrer hipertensão, provavelmente devido a hipervolemia, distúrbios hidroeletrolíticos e do equilíbrio ácido-básico. Anormalidades tubulares graves são mais características da nefrite intersticial crônica. O exame da urina revela, na maioria das vezes, hematúria microscópica, leucocitúria, podendo ou não ocorrer cilindros leucocitários, e proteinúria de pequena intensidade. Eosinofilúria, demonstrada pela coloração de Hansel, pode ocorrer, porém a presença de eosinófilos na urina não é patognomônica. Eosinofilúria pode ocorrer também na prostatite, infecções urinárias, câncer de bexiga e glomerulonefrite rapidamente progressiva. Os rins são normais ou aumentados de tamanho ao ultra-som, e a presença de hiperecogenicidade do parênquima renal sugere NIA. A cintilografia com gálio pode ser útil para diferenciar necrose tubular aguda de NIA, pois é negativa na primeira e positiva na segunda patologia. Em casos de insuficiência renal aguda de etiologia obscura ou quadro clínico atípico, a biópsia renal é fundamental para diagnóstico mais preciso, devido à possibilidade de NIA. Mesmo em casos muito sugestivos de NIA, a avaliação histológica está indicada, devido às suas implicações terapêuticas e prognósticas.
Pontos-chave: • Sinais e sintomas clínicos: uso de droga suspeita, IRA prolongada (mais do que quatro semanas), febre, dor articular e rash cutâneo • Diagnóstico laboratorial: eosinofilia e eosinofilúria • Cintilografia com gálio positiva • Diagnóstico de certeza: histologia renal PATOLOGIA A principal característica das NIAs é a presença de infiltrado inflamatório intersticial, composto basicamente por linfócitos T, monócitos e ocasionalmente plasmócitos e eosinófilos. Este infiltrado varia em gravidade, podendo ser focal ou difuso. Em casos mais graves observa-se ruptura da membrana basal tubular. Classicamente, as células tubulares são agredidas por linfócitos, processo conhecido como “tubulite”. Não existe consenso quanto ao subtipo linfocitário predominante, se CD4 ou CD8, pois os níveis destes podem variar com o decorrer da agressão. Edema intersticial acompanha o infiltrado e, excetuandose os casos relacionados a AINHs, os glomérulos são poupados da lesão. A imunofluorescência raramente mostra imunoglobulina ou complemento. A ausência de depósitos imunes predomina nessas lesões. Em alguns casos de NIA, principalmente naqueles relacionados a drogas, po-
477
dem ocorrer granulomas não-caseosos acompanhando o infiltrado inflamatório.
TRATAMENTO Uma vez feito o diagnóstico de NIA, a primeira medida a ser tomada é a retirada das drogas potencialmente implicadas. Em alguns casos apenas esta medida será suficiente para a melhora da função renal em alguns dias. Por outro lado, a transição do processo inflamatório agudo para um processo de fibrogênese pode ocorrer rapidamente, com deposição importante da matriz extracelular ocorrendo em até sete dias. Assim, se não houver resposta rápida da função renal à retirada do agente causal, deve-se instituir terapêutica baseada em corticosteróides e agentes citotóxicos. A despeito da ausência de trabalhos prospectivos e controlados avaliando o uso destas drogas na NIA em humanos, a maioria dos autores, baseados em casos relatados da literatura, dados experimentais e na própria patogênese da lesão, concorda que a terapêutica inicial com prednisona, seguida da associação com ciclofosfamida no caso de não haver resposta, pode trazer benefícios. Quando ocorre resposta com a ciclofosfamida, este tratamento deverá ser mantido por um período mais longo. Do contrário, poderá ser suspenso com cerca de seis semanas. O prognóstico deste tipo de lesão depende basicamente do tempo de duração da insuficiência renal precedendo o diagnóstico e tratamento, o que se correlaciona com a evolução da lesão histológica. Lesão tubulointersticial ativa e prolongada antes do diagnóstico clínico aumenta a chance de evolução para fibrose intersticial irreversível. Acredita-se que cerca de 50% dos pacientes acometidos por esta patologia não recuperarão totalmente a função renal.
Nefropatia Tubulointersticial Crônica INTRODUÇÃO Anteriormente denominada “nefrite intersticial”, “doença tubulointersticial”, “nefrite tubulointersticial”, a nefrite intersticial crônica é responsável por 10% a 40% dos casos de insuficiência renal crônica. Existem diferenças regionais significantes em sua freqüência: na Bélgica, 18% dos pacientes com insuficiência renal crônica terminal (IRCT) sofrem de nefropatia por analgésicos, enquanto na população européia, como um todo, a incidência é de apenas 3%.
PATOLOGIA O quadro anatomopatológico da nefropatia tubulointersticial crônica (NTIC) compreende atrofia de células tubulares com achatamento das células epiteliais e dilatação tubular, fibrose intersticial e áreas de infiltração de células mononucleares no espaço intersticial e entre os túbulos. A membrana basal tubular encontra-se freqüentemente espessada. O infiltrado celular constitui-se basica-
478
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
mente de linfócitos e ocasionalmente neutrófilos, plasmócitos e eosinófilos. A imunofluorescência pode revelar a presença de C3 e imunoglobulinas ao longo da membrana basal tubular, tipicamente em padrão linear. Nas fases iniciais da NTIC o glomérulo permanece normal à microscopia óptica. Com a evolução da enfermidade podem ser detectadas fibrose glomerular, esclerose segmentar e por fim esclerose global. À imunofluorescência a coloração do glomérulo é freqüentemente negativa, e excepcionalmente encontram-se C3 e imunoglobulina M no segmento mesangial. Pequenas artérias e arteríolas mostram espessamento fibrointimal de grau variável.
QUADRO CLÍNICO E LABORATORIAL Geralmente os pacientes com NTIC apresentam-se com os sintomas sistêmicos da doença primária, ou com sintomas inespecíficos de insuficiência renal, tais como fraqueza, náuseas, vômitos, nictúria, poliúria, isostenúria e distúrbios do sono. Em alguns casos os exames de rotina apresentam anormalidades no sedimento urinário e/ou elevação da creatinina sérica. Pode haver envolvimento vascular e glomerular na NTIC, mas nos estágios iniciais da doença estas manifestações (refletidas como proteinúria e hipertensão) são pouco importantes, predominando as disfunções tubulares. Nos estágios avançados da doença, com o surgimento da glomerulosclerose, há declínio progressivo da filtração glomerular (FG), desenvolvimento de proteinúria glomerular e hipertensão volume-dependente. Quando comparadas às glomerulonefrites, as nefropatias tubulointersticiais apresentam hipertensão menos grave, menor velocidade de perda da função renal e menor formação de edema. A sintomatologia específica das NTIC varia de acordo com a porção do néfron acometida. Na acidose tubular renal proximal por exemplo (tipo II), pode ocorrer disfunção na reabsorção do bicarbonato pelo túbulo proximal, geralmente associada a hipopotassemia, em decorrência da perda de potássio pelo néfron distal. Na síndrome de Fanconi, que é caracterizada por disfunção generalizada do túbulo proximal, há prejuízo na absorção de bicarbonato, potássio, fósforo, aminoácidos, glicose e ácido úrico. Proteinúria constituída basicamente por proteínas de baixo peso molecular pode refletir disfunção tubular proximal na absorção de proteínas filtradas. O acometimento do néfron distal pode manifestar-se por acidose tubular renal distal (tipo I), resultante de um defeito na acidificação acompanhada de hipopotassemia, ou pelo quadro de acidose tubular renal do tipo IV causada pela resistência do néfron distal à aldosterona ou hipoaldosteronismo hiporreninêmico, caracterizado por hiperpotassemia e acidose metabólica desproporcionalmente graves em relação ao grau de acometimento da função renal. Pode-se também encontrar perda renal de sódio em decorrência de alteração da reabsorção distal do néfron e alteração na capaci-
dade de concentração urinária secundária a alteração na reabsorção de água pelo ducto coletor.
CAUSAS DE NEFROPATIA TUBULOINTERSTICIAL CRÔNICA Drogas Diversas drogas tais como ciclosporina, cisplatina, lítio, nitrosuréias e antiinflamatórios não-hormonais podem ser responsabilizadas pelo aparecimento de NTIC. ANALGÉSICOS. O consumo excessivo e continuado de analgésicos tem sido associado ao desenvolvimento de NTIC e necrose de papila renal. Geralmente os pacientes ingerem cumulativamente mais do que 3 kg de analgésicos-antipiréticos até que o diagnóstico seja feito. Este é de grande importância, já que a interrupção do uso das drogas poderá retardar ou mesmo impedir a progressão da doença renal. A incidência de nefropatia por analgésicos varia nos diferentes países e entre diferentes áreas geográficas. Na Escócia, Bélgica e Austrália, por exemplo, é responsável por 10% a 20% dos casos de IRC terminal. A nefropatia por analgésicos acomete mais freqüentemente (5 a 7 vezes mais) as mulheres do que os homens. Tipicamente, são pacientes que ingerem analgésicos para cefaléia, dores articulares inespecíficas e desconforto abdominal. As manifestações clínicas englobam nictúria, piúria estéril e hipertensão. A anemia pode estar presente como manifestação da IRC ou devido a úlcera péptica. Ansiedade e distúrbios neuropsiquiátricos são freqüentes. Estes pacientes têm maior incidência de neoplasias uroepiteliais, portanto surtos de hematúria devem ser investigados com maior profundidade. Geralmente é necessário haver associação de analgésicos (aspirina, acetaminofen, fenacetina, cafeína ou codeína) para que ocorra a nefropatia, porém existem relatos onde apenas o acetaminofen estava envolvido. O acetaminofen (um metabólito hepático da fenacetina) apresenta grandes concentrações na papila renal, principalmente em situação de antidiurese. Posteriormente, é metabolizado pelo rim para vários metabólitos que podem ter sua ação potencializada pela ação de outros analgésicos, tais como aspirina, e outros antiinflamatórios não-hormonais. As alterações histológicas da nefropatia por analgésicos são inespecíficas e comuns a todas as formas de NTIC. Os rins geralmente são contraídos e necrose de papila pode ou não estar presente. LÍTIO. O lítio pode desencadear várias alterações renais, incluindo NTIC. Diabetes insipidus nefrogênico e alteração da capacidade de concentração renal, acidose tubular renal incompleta, doença tubulointersticial progressiva, microcistos em túbulo distal e insuficiência renal aguda são as principais lesões renais provocadas por esta droga. A alteração na capacidade de concentração urinária é complicação que ocorre em 50% dos pacientes após terapêutica prolongada com lítio. O lítio inibe a adenilciclase
capítulo 24
e portanto diminui a concentração de AMP cíclico, que é o segundo mensageiro na ação do ADH. Cerca de 20% dos pacientes desenvolvem poliúria. Lesão tubulointersticial, principalmente dilatação tubular distal e microcistos, são observadas em pacientes que recebem terapêutica com lítio a longo prazo, porém não se pode descartar a possibilidade de que estas lesões já existiam anteriormente ao tratamento. A ação do lítio sobre a filtração glomerular é controversa. Cerca de 85% dos pacientes submetidos à droga apresentam filtração glomerular normal e apenas 15% apresentam alterações discretas da função glomerular após 10 a 15 anos de tratamento. A toxicidade do lítio é dose-dependente, portanto a monitorização dos seus níveis séricos é importante na prevenção de toxicidade aguda e desenvolvimento de alterações na capacidade de concentração urinária. O manuseio renal do lítio é muito semelhante ao do sódio. Os seus níveis séricos podem aumentar em situações de insuficiência renal, uso de diuréticos, desidratação e administração de antiinflamatórios não-hormonais. METAIS PESADOS. Chumbo e cádmio são os metais pesados mais comumente relacionados ao desenvolvimento de NTIC. Arsênico, bário, bismuto, cobre, ouro, mercúrio e silicone também têm sido incriminados. Chumbo. A exposição ao chumbo ocorre principalmente em pintores, restauradores de arte, devido às tintas contendo chumbo, e picheleiros. Fontes contínuas de exposição ocorrem em canos de água e moradias velhas, olarias, cristais. Atualmente as maiores fontes ambientais de poluição são a gasolina, a produção de aço e o processamento de carvão de pedra. O diagnóstico do excesso de exposição é difícil, porque a concentração sanguínea reflete somente a exposição recente. O diagnóstico é sugerido por aumento (> 0,6 mg) na excreção urinária de 24 horas do metal após duas doses de 1 g do agente quelante EDTA dissódico (nesta dose o EDTA não é nefrotóxico). O valor do teste é maximizado quando comparado com níveis basais de excreção urinária. O teste também pode ser usado em pacientes com insuficiência renal: quando oligúricos, recomenda-se um período de coleta de vários dias. A fluorescência ao raio X, in vivo, é alternativa não-invasiva para quantificar o chumbo nos ossos, especialmente nos pacientes com IRC. A patogênese da nefropatia pelo chumbo não está esclarecida. O metal é depositado preferencialmente no segmento S3 do túbulo proximal. Inclusões nucleares dentro das células tubulares proximais são característica da nefropatia por chumbo. Funcionalmente observam-se alterações da função tubular proximal (principalmente em crianças), com defeito tubular isolado ou como síndrome de Fanconi. Estas alterações são potencialmente reversíveis, sendo incomum a evolução para IRC em crianças. Em adultos a nefropatia pelo chumbo é caracterizada por nefrite intersticial crônica, com fibrose intersticial, atrofia e nefrosclerose. Há freqüentemente gota recorrente e a maioria dos pacientes tem hiperuricemia e hipertensão.
479
O EDTA tem sido recomendado como opção terapêutica. Em alguns pacientes pode interromper ou mesmo reverter a progressão da insuficiência renal. Cádmio. O cádmio é muito utilizado nas indústrias, principalmente por trabalhadores de fundições. A sua absorção ocorre tanto por via gastrintestinal como pelo trato respiratório. Quando absorvido, sua meia-vida excede 10 anos. No organismo acumula-se nos rins e no fígado. No fígado liga-se a uma proteína rica em cistina (metalotioneína) e é transportado pela corrente sanguínea para os rins, onde o complexo cádmio-metalotioneína é nefrotóxico. Adentra as células tubulares proximais por pinocitose, acumulando-se nos lisossomos. A concentração do cádmio na corrente sanguínea cai rapidamente em decorrência da sua deposição hepática. A excreção urinária não aumenta até que o limiar cortical renal de 100 a 300 ng/g de córtex seja atingido, o que corresponde grosseiramente a 160 a 170 mg de cádmio absorvido. A excreção urinária de 20 µg/L ou 10 µg/g de creatinina significa excesso de cádmio corporal, mesmo com concentrações sanguíneas normais. Clinicamente a disfunção tubular causada por este metal caracteriza-se por aminoacidúria, glicosúria, acidose tubular renal e por excreção de proteínas de baixo peso molecular, tais como 2-microglobulina. Nefrolitíase (25% dos casos) e fraturas podem ocorrer. Evolução para IRC é incomum. Em uma vila do Japão onde há contaminação pela água e pelo arroz, ocorre dor óssea generalizada com fraturas, associadas à síndrome de Fanconi. O quadro histológico é de nefrite intersticial. Na maior parte das vezes a disfunção tubular é irreversível mesmo quando o paciente é protegido contra novas exposições. Não há nenhum tratamento específico para a toxicidade crônica pelo cádmio. Ouro. Os sais de ouro, utilizados em reumatologia na terapêutica da artrite reumatóide, podem produzir síndrome nefrótica. A prevalência de proteinúria, geralmente menor do que 3 g diários, em pacientes tratados com ouro é de 3%. A lesão mais freqüentemente encontrada é glomerulopatia membranosa, porém lesões mínimas e depósitos elétron-densos endoteliais e mesangiais também podem ocorrer. Em análises ultra-estruturais podemos encontrar o metal em células tubulares. A interrupção de sua administração leva ao desaparecimento da proteinúria, geralmente no prazo de 6 a 12 meses. A patogênese da nefropatia induzida pelo ouro é desconhecida. Proteinúria tubular, 2-microglobulinúria e excreção de antígenos tubulares são comuns nos pacientes que recebem sais deste metal. Animais de experimentação expostos a sais de ouro por via parenteral desenvolvem NTI auto-imune e glomerulopatia por imunocomplexos com anticorpos para antígeno de células tubulares e membrana basal tubular. A nefrotoxicidade por ouro está fortemente associada aos antígenos de histocompatibilidade HLA-DR3 e HLA-B8, sugerindo ligação genética para a doença. É interessante o fato de que a glomerulo-
480
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
patia membranosa idiopática também está associada ao HLA-DR3. DOENÇAS METABÓLICAS. Alterações no metabolismo do oxalato, urato, cálcio, potássio e cistina são apontados como causas de NTIC. Uratos. Embora a nefropatia aguda e a nefrolitíase por ácido úrico sejam complicações conhecidas, é muito pouco provável que hiperuricemia crônica leve ou moderada provoque insuficiência renal crônica. A função renal é geralmente estável em pacientes gotosos assintomáticos, e a ocorrência de insuficiência renal nesta população é usualmente relacionada a algum fator complicante, como diabetes mellitus, hipertensão ou arteriosclerose. A principal lesão renal da hiperuricemia crônica é o depósito de material amorfo de cristais de urato no interstício renal. Estas lesões desencadeiam reação de células gigantes. Pode ocorrer precipitação de cristais de ácido úrico no ducto coletor, com conseqüente obstrução tubular, dilatação, atrofia e fibrose intersticial. Em acompanhamentos prolongados, disfunção renal pode ser documentada apenas em homens que mantinham níveis séricos persistentemente elevados acima de 13 mg/dl e em mulheres com níveis séricos acima de 10 mg/dl. O tratamento com alopurinol em pacientes assintomáticos com níveis séricos inferiores a estes é bastante discutível, pois a droga não é inócua. Atenção especial deve ser dada aos pacientes com hipertensão, hiperuricemia e disfunção renal que apresentam história pregressa de exposição ao chumbo. Cistinose. É uma rara alteração autossômica recessiva caracterizada por acúmulo excessivo de cistina em múltiplos órgãos, incluindo o rim. A cistina acumula-se principalmente dentro dos lisossomos devido a um defeito no transportador da cistina lisossomal. Há vários tipos de cistinose, sendo o envolvimento renal mais grave na forma infantil, com menor gravidade na forma intermediária (adolescente) e inexistente na forma adulta. As crianças são normais ao nascimento e o diagnóstico geralmente é feito no primeiro ano de vida pela detecção de defeito tubular proximal que precede a diminuição da filtração glomerular e geralmente manifesta-se por síndrome de Fanconi, raquitismo e retardo de crescimento. A evolução para a IRCT é inevitável, ocorrendo nas primeiras décadas de vida. O diagnóstico é feito pelo achado de depósitos de cristais de cistina na córnea e pelo aumento do conteúdo de cistina nos leucócitos. A cistinose é tratada pela reposição de fluidos, correção das alterações eletrolíticas e uso de cisteamina. A cisteamina atravessa a barreira dos lisossomos, liga-se à cisteína e este complexo deixa os lisossomos pelo sistema de transporte de aminoácidos catiônicos. O transplante renal permite prolongar a sobrevida dos pacientes. Ocorre comprometimento de outros órgãos, podendo haver disfunção hepática importante. Após o transplante a cistina reaparece no interstício porém não em células tubulares e não compromete a função do enxerto.
Oxalato. As hiperoxalúrias podem ser primárias ou secundárias. A hiperoxalúria primária consiste em enfermidade autossômica recessiva de ocorrência rara, caracterizada por deficiência das enzimas hepáticas alanina, glioxilato aminotransferase e D-glicerato desidrogenase, acompanhadas por superprodução de oxalato. O quadro clínico inclui acúmulos renais e sistêmicos de oxalato, nefrocalcinose, obstrução tubular e nefropatia tubulointersticial crônica. A oxalose sistêmica é invariavelmente fatal. Na hiperoxalúria primária a IRC se desenvolve por volta dos 20 anos de idade. A forma secundária ocorre em adultos e geralmente traduz aumento da absorção de oxalato da dieta (má absorção de gorduras e ressecção do intestino delgado) ou grande ingestão de substâncias que posteriormente são metabolizadas para oxalato (xilitol, etileno glicol, ácido ascórbico). A lesão geralmente inicia-se no túbulo proximal, onde a substância é secretada, porém é mais grave na medula, onde ocorre precipitação de oxalato de cálcio. Nefrolitíase recorrente por cálculos de oxalato de cálcio também contribui para o desenvolvimento de NTIC, por causar obstrução. Hipercalcemia e Nefrocalcinose. A hipercalcemia persistente promove degeneração focal e necrose do epitélio tubular, afetando primariamente a medula renal onde o cálcio é concentrado em um meio tubular ácido. Os túbulos acometidos se atrofiam e tornam-se obstruídos, com conseqüente dilatação. A subseqüente calcificação e destruição da membrana basal tubular resulta em reação infiltrativa e proliferativa no interstício adjacente. O depósito de cálcio nas áreas lesadas resulta em nefrocalcinose. A nefrocalcinose pode também ocorrer em situações de normocalcemia e é basicamente um fenômeno medular. Nefrocalcinose cortical pode ocorrer, usualmente em associação com glomerulonefrites crônicas ou outras formas de doença renal crônica, onde o produto cálcio-fósforo encontra-se continuamente elevado. O tratamento é dirigido à doença de base e à normalização do cálcio sérico. Depleção de Potássio. A hipopotassemia associada com a depleção do potássio total corporal, seja por perdas gastrintestinais ou renais, pode levar a alterações histológicas no rim, principalmente no túbulo proximal. Estas lesões são caracterizadas por vacuolização, presença intracitoplasmática de grânulos PAS-positivos e cistos na medula renal. As anormalidades desaparecem com a reposição de potássio. Há defeito na concentração urinária, que provém em parte da resistência ao ADH. Aumentos na síntese de tromboxane podem explicar a diminuição do fluxo sanguíneo renal. Demonstrou-se experimentalmente que a ativação da via alternada do complemento pela amônia pode iniciar e sustentar a resposta inflamatória e lesão tubulointersticial. A progressão para IRC tem sido descrita em pacientes com hipopotassemia sustentada. DOENÇAS HEMATOPOIÉTICAS. As principais enfermidades hematopoiéticas associadas a NTIC são a anemia falciforme, a discrasia de células plasmáticas e as doenças linfoproliferativas.
capítulo 24
Anemia Falciforme. A lesão é mais comum na anemia falciforme, porém pode ser encontrada também nos portadores do traço falciforme, anemia falciforme com doença da hemoglobina C e talassemia. A hemoglobina S tende a se polimerizar em ambiente com baixa saturação de oxigênio, pH ácido e hipertônicos, como o encontrado na região medular renal. Com isso, eventos oclusivos ocorrerão nos vasos medulares levando à NTIC, principalmente na medula renal. Necrose de papila também é relativamente comum na anemia falciforme. Os pacientes apresentam defeitos tubulares, particularmente deficiência de concentração urinária e acidose tubular renal do tipo IV. A evolução para IRC é rara, mas pode ser prevista pelo desenvolvimento de proteinúria e hipertensão refletindo glomerulopatia concomitante. Discrasias de Células Plasmáticas. A patogênese do envolvimento renal na discrasia de células plasmáticas tem origem variada. Insuficiência renal aguda e crônica são comuns em pacientes com mieloma múltiplo e podem ser atribuídas à interação de múltiplos mecanismos, incluindo nefropatia de cilindros (“rim do mieloma”), depleção de volume, hipercalcemia, nefrocalcinose e nefropatia por ácido úrico. O acometimento renal ocorre em 50 a 70% dos pacientes com mieloma múltiplo e pode apresentar-se antes mesmo das manifestações extra-renais. As complicações renais do mieloma incluem insuficiência renal aguda, defeitos tubulares tais como alteração da acidificação ou síndrome de Fanconi, síndrome nefrótica secundária a amiloidose ou glomerulopatia de cadeia leve e insuficiência renal crônica progressiva pelo chamado “rim do mieloma”. A insuficiência renal aguda é desencadeada pela desidratação ou hipercalcemia. A amiloidose ocorre em 15% dos pacientes. O “rim do mieloma” é caracterizado por cilindros intratubulares com obstrução e atrofia tubular, fibrose e células gigantes multinucleadas. Nefrocalcinose pode estar presente. Os cilindros tipicamente apresentam proteína de Tamm-Horsfall e de cadeias leves. A disfunção renal origina-se na obstrução tubular e no efeito tóxico direto das proteínas de Bence Jones. A toxicidade da cadeia leve depende do tipo, do peso molecular, da carga filtrada e da carga elétrica. O diagnóstico deve ser suspeitado em pacientes com idade acima de 50 anos que venham a apresentar disfunção renal e proteinúria inexplicada. Outros achados sugestivos incluem hipercalcemia e diminuição do anion gap. O diagnóstico é embasado no encontro de cadeias leves na urina e no soro e confirmação do aumento de células plasmáticas na medula óssea. O tratamento deve ser dirigido contra a depleção de volume e a hipercalcemia, combinado com a quimioterapia e plasmaférese. A diálise está indicada para a insuficiência renal, e um certo número de pacientes pode apresentar recuperação funcional. Doenças Linfoproliferativas. Embora o envolvimento renal ocorra em 40 a 50% dos casos de leucemias e linfomas em análise de material de autópsia, raramente provo-
481
ca sintomas clínicos significantes. As manifestações linfomatosas envolvendo o rim incluem obstrução urinária e complicações resultantes da lise tumoral. A infiltração do rim por células malignas ocorre basicamente no interstício e resulta em atrofia tubular com preservação do glomérulo, mimetizando o quadro de NTIC. São mais comuns em doenças linfoproliferativas, especialmente em linfoma nãoHodgkin e leucemias linfoblásticas. As leucemias podem provocar disfunção tubular proximal e manifestar-se por acidose tubular renal tipo II ou síndrome de Fanconi. Hemoglobinúria Paroxística Noturna. A hemoglobinúria paroxística noturna é uma rara doença hemolítica na qual a deficiência de duas proteínas da membrana tornam os eritrócitos sensíveis à lise mediada pelo complemento. A hemólise intravascular leva a hemoglobinemia e hemoglobinúria, que em alguns casos pode provocar insuficiência renal aguda. Esses pacientes são suscetíveis a desenvolver microtrombos e necrose de papila. A histologia mostra doença tubulointersticial, com quantidades variáveis de hemossiderina no túbulo proximal. Pode ocorrer evolução para IRC. DOENÇAS IMUNOLÓGICAS. A NTIC ocorre em diversas doenças sistêmicas, tais como lúpus eritematoso sistêmico, síndrome de Sjögren, amiloidose, crioglobulinemia, nefropatia por IgA e na síndrome de imunodeficiência adquirida (AIDS). O mecanismo de lesão intersticial não está claramente compreendido, embora existam evidências clínicas e experimentais de que o mecanismo é imunemediado. No lúpus, na crioglobulinemia e na síndrome de Sjögren, encontram-se imunocomplexos consistindo em depósitos granulares constituídos por IgG e C3 depositados no interstício, de significado desconhecido. No lúpus também têm sido encontrados depósitos de DNA na membrana basal tubular, ao redor dos capilares peritubulares e no interstício. A proteína de Tamm-Horsfall pode estar implicada em certas formas de NTI clínica. Anticorpos contra essa proteína têm sido encontrados no soro de pacientes com refluxo vesicoureteral, pielonefrite e no interstício de pacientes com nefrite hereditária, hidronefrose e doença cística medular. Em certas formas de doenças imunológicas tais como síndrome de Goodpasture, doença tubulointersticial crônica, lúpus eritematoso sistêmico e rejeição de transplante, têm sido encontrados anticorpos contra a membrana basal tubular. Encontramos infiltrado celular intersticial constituído principalmente por células T e, em menos de 20%, por células B. Este perfil celular sugere lesão imunológica mediada por células. Diversas evidências clínicas e experimentais valorizam o papel do infiltrado celular na progressão da doença através de citoquinas, autacóides e fatores de crescimento que iniciam e perpetuam a lesão. INFECÇÕES. O conceito clássico de que a pielonefrite crônica com alteração da função renal ocorria em conseqüência de surtos de pielonefrite aguda, infeccões urinárias recorrentes e bacteriúria assintomática carece atualmen-
482
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
te de subsídios relevantes. A NTIC encontrada nesses pacientes (geralmente crianças ou adultos jovens), parece muito mais relacionada a refluxo vesicoureteral ou a outras anomalias de desenvolvimento do trato urinário. Cabe salientar que em mulheres com surtos de pielonefrite aguda de repetição, embora não se detecte perda funcional, lesões cicatriciais corticais podem ser encontradas através de tomografia computadorizada. OBSTRUÇÃO E ANORMALIDADES DO DESENVOLVIMENTO. A obstrução do trato urinário é causa relativamente comum de doença tubulointersticial, principalmente em adultos jovens devido a anormalidades anatômicas ou do desenvolvimento. Em pacientes mais velhos, cálculo, aumento prostático e tumores pélvicos e abdominais são as causas mais comuns de uropatia obstrutiva. Infiltrado celular mononuclear ocorre em obstrução do trato urinário superior, e nos casos mais prolongados pode sobrevir fibrose, atrofia e dilatação tubular. O fluxo sanguíneo renal inicialmente aumenta, porém diminui com a manutenção da obstrução, bem como a filtração glomerular. Os mecanismos responsáveis pelas alterações histológicas incluem lesão por aumento da pressão tubular, isquemia, substâncias humorais liberadas pelas células infiltrantes e possivelmente extravasamento da proteína de TammHorsfall para o interstício. O paciente apresenta-se clinicamente com acidose tubular renal do tipo IV e diminuição da capacidade de concentração urinária devido à resistência à ação do ADH. O diagnóstico de uropatia obstrutiva pode ser confirmado pela presença de resíduo vesical aumentado, constatado por cateterização vesical ou ultra-som ou pela presença de hidronefrose ao exame tomográfico ou à ultra-sonografia. Pode ocorrer recuperação funcional após a remoção da obstrução. O refluxo vesicoureteral está associado a nefropatia tubulointersticial e pode evoluir para insuficiência renal crônica mesmo após a sua correção cirúrgica. Nas fases avançadas pode apresentar como complicação esclerose glomerular focal, proteinúria de nível nefrótico e hipertensão sistêmica.
Outras Causas NEFROPATIA ENDÊMICA DOS BÁLCÃS. É uma doença endêmica, restrita geograficamente às proximidades do Rio Danúbio, principalmente na Bulgária, Iugoslávia e Romênia. Cerca de 20.000 pessoas são acometidas, e o quadro histológico é de NTIC. Sua etiologia não é bem definida, porém fatores ambientais e familiares são responsabilizados na sua patogênese. SARCOIDOSE E DOENÇAS GRANULOMATOSAS. Sarcoidose, tuberculose, pielonefrite xantogranulomatosa, granulomatose de Wegener, candidíase renal, hipersensibilidade à hidantoína, oxalose e nefropatia dos dependentes de heroína pode evoluir para uma forma rara de NTIC acompanhada por reação granulomatosa intersticial. Na sarcoidose o envolvimento renal ocorre em até 10% dos casos e se manifesta de várias maneiras. A hipercalce-
mia ocorre em 10% a 20% dos pacientes, enquanto a hipercalciúria ocorre em 60% deles. Esta anormalidade ocorre em decorrência de excesso de 1,25-diidroxivitamina D3 produzida por macrófagos ativados com localização extrarenal. A hipercalcemia ou hipercalciúria está associada a nefrocalcinose e nefrolitíase, situações que predispõem a doença intersticial crônica e insuficiência renal. O envolvimento renal granulomatoso, a hipercalcemia e a hipervitaminose D respondem muito bem ao tratamento com corticosteróides e freqüentemente ocorre completa reversão da insuficiência renal. Fibrose intersticial residual, nefrocalcinose e cálculos renais podem prejudicar a normalização da função renal após o tratamento. NEFRITE DE RADIAÇÃO. A lesão renal por radiação depende da dose total aplicada, do volume de rim irradiado e da dose por sessão de aplicação. Estima-se como uma dose tolerável 2.000 a 2.500 rads administrados por 3 a 5 semanas em todo o rim. Os rins de pacientes jovens são mais suscetíveis a lesões. As complicações da radiação incluem desenvolvimento de insuficiência renal progressiva, proteinúria, perda de sódio com contração de volume, anemia e hipertensão. Após um ano da radiação os rins podem estar contraídos. Podem ocorrer hipertensão isolada e proteinúria. A lesão inicial é endotelial e caracterizase por edema. O endotélio lesado permite a aderência e a agregação plaquetárias, que liberam substâncias inflamatórias, mitogênicas. Conseqüente à obstrução vascular desenvolve-se atrofia tubular. Estas alterações estimulam a produção de renina, que exacerba a hipertensão com conseqüente agravamento da lesão endotelial. No glomérulo há proliferação mesangial e mesangiólise. Alterações tubulares e intersticiais são geralmente seqüelas a longo prazo. A nefrite de radiação progride lentamente para insuficiência renal crônica terminal. A incidência desta complicação tem diminuído em decorrência de melhora no equipamento utilizado, fracionamento da dose de radiação e proteção renal por bloqueio durante a aplicação.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA Gerais BENNETT, W.M.; ELZINGA, L.W. e PORTER, G.A. Tubulointerstitial disease and toxic nephropathy. In Brenner, B.M. e Rector Jr, F.C.R. (eds) The Kidney, 4th edition. Philadelphia, W.B. Saunders, 1991, vol. II, pp. 1430-1496. BURDMANN, E.A.; OLIVEIRA, M.B.; FERRABOLI, R.; MALHEIRO, P.S.; ABDULKADER, C.R.M.; YU, L.; GALVÃO, P.C.A.; MONTEIRO, J.L.; SABBAGA, E.; MARCONDES, M. Epidemiologia. In Schor, N.; Boim, M.A.; dos Santos, O.F.P. (eds) Insuficiência Renal Aguda – Fisiopatologia, Clínica e Tratamento. São Paulo, Sarvier, 1997, pp. 1-7. CASTRO, M.C.M.; MARTINS, V.; NADALIN, F.; MALHEIROS, P.; SABBAGA, E. e MARCONDES, M. Mudança do perfil etiológico da insuficiência renal aguda. J. Bras. Nefrol., 5:26-28, 1983. CRONIN, R.E. e HENRICH, W.L. Toxic nephropathy. In Brenner, B.M. (ed) The Kidney, 6th edition. Philadelphia, W.B. Saunders, 2000, vol. II, pp. 1563-1596.
capítulo 24
HOOK, J.B. e GOLDSTEIN, R.S. (eds) Toxicology of the Kidney, 2nd edition. New York, Raven Press, 1993. OLSEN, S. e SOLEZ, K. Acute tubular necrosis and toxic renal injury. In Tisher, C.C. e Brenner, B.M. (eds) Renal Pathology: With Clinical and Functional Correlations, 2nd edition. Philadelphia, J. B. Lippincott, 1994, pp. 769-809. SWAN, S.S. e BENNETT, W.M. Role of the sodium ion in acute renal failure. Miner. Electrolyte Metab., 17:89-99, 1991. SWAN, S.S e BENNETT, W.M. Nephrotoxic acute renal failure. In Brenner, B.M. e Lazarus, J.M. (eds) Acute Renal Failure, 3rd edition. New York, Churchill Livingstone, 1993, pp. 357-392.
Agentes Antiinfecciosos ANDERSON, C.M. Sodium chloride treatment of amphotericin B nephrotoxicity - standart of care? West J. Med., 162:313-317, 1995. BAILEY, J.R.; TROTT, S.A. e PHILBRICK, J.T. Ciprofloxacin-induced acute interstitial nephritis. Am. J. Nephrol., 12:272-273, 1992. BARQUIST, E.; FEIN, E.; SHADICK, D.; JOHNSON, J.; CLARK, J.; SHATZ, D. A randomized prospective trial of amphotericin B lipid emulsion versus dextrose colloidal solution in critically ill patients. J. Trauma, 47:336-340, 1999. BEAUCHAMP, D.; LABRECQUE, G. Aminoglycoside nephrotoxicity: do time and frequency of administration matter? Curr. Opin. Crit. Care, 7:401-408, 2001. BECKER, B.N.; FALL, P.; HALL, C.; MILAM, D.; LEONARD, J.; GLICK, A.; SCHULMAN, G. Rapidly progressive acute renal failure due to acyclovir: case report and review of the literature. Am. J. Kidney Dis., 22:611-615, 1993. BECKER, B.N.; SCHULMAN, G. Nephrotoxicity of antiviral therapies. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 5:375-379, 1996. BENNETT, W.M. Mechanisms of aminoglycoside nephrotoxicity. Clin. Exp. Pharmacol. Physiol., 16:1-6, 1989. BENVENISTE, O.; LONGUET, P.; DUVAL, X.; Le MOING, V.; LEPORT, C.; VILDE, J.L. Two episodes of acute renal failure, rhabdomyolysis, and severe hepatitis in an AIDS patient successively treated with ritonavir and indinavir. Clin. Infect. Dis., 28:1180-1181, 1999. BERNS, J.S.; COHEN, R.M.; SILVERMAN, M.; TURNER, J. Acute renal failure due to indinavir crystalluria and nephrolithiasis: report of two cases. Am. J. Kidney Dis., 30:558-560, 1997. BHATT-MEHTA, V.; SCHUMACHER, R.E.; FAIX, R.G.; LEADY, M.; BRENNER, T. Lack of vancomycin-associated nephrotoxicity in newborn infants: a case-control study. Pediatrics, 103:e48, 1999. CAMPOS, S.B.; SEGURO, A.C.; CESAR, K.R. e ROCHA, A.S. Effects of acyclovir on renal function. Nephron, 62:74-79, 1992. CHATELAIN, E.; DEMINIERE, C.; LACUT, J.Y.; POTAUX, L. Severe renal failure and polyneuritis induced by foscarnet. Nephrol. Dial. Transplant., 13:2368-2369, 1998. CHOW, A.W.; AZAR, R.M. Glycopeptides and nephrotoxicity. Intensive Care Med., 20:523-529, 1994. CHUGH, S.; BIRD, R.; ALEXANDER, E.A. Ritonavir and renal failure. N. Engl. J. Med., 336:138, 1997. COHEN, E.; DADASHEV, A.; DRUCKER, M.; SAMRA, Z.; RUBINSTEIN, E.; GARTY, M. Once-daily versus twice-daily intravenous administration of vancomycin for infections in hospitalized patients. J. Antimicrob. Chemother., 49:155-160, 2002. CONWAY, S.P.; POND, M.N.; WATSON, A.; ETHERINGTON, C.; ROBEY, H.L.; GOLDMAN, M.H. Intravenous colistin sulphomethate in acute respiratory exacerbations in adult patients with cystic fibrosis. Thorax, 52:987-993, 1997. COSTA, S.; NUCCI, M. Can we decrease amphotericin nephrotoxicity? Curr. Opin. Crit. Care, 7:379-383, 2001. De VRIESE, A.S.; ROBBRECHT, D.L.; VANHOLDER, R.C.; VOGELAERS, D.P.; LAMEIRE, N.H. Rifampicin-associated acute renal failure: pathophysiologic, immunologic, and clinical features. Am. J. Kidney Dis., 31:108-115, 1998. DERAY, G. Amphotericin B nephrotoxicity. J. Antimicrob. Chemother., 49 Suppl 1:37-41, 2002.
483
DERAY, G.; BOCHET, M.; KATLAMA, C.; BRICAIRE, F. Nephrotoxicity of ritonavir. Presse Med., 27:1801-1803, 1998. DERAY, G.; MARTINEZ, F.; KATLAMA, C. et al. Foscarnet nephrotoxicity: mechanism, incidence and prevention. Am. J. Nephrol., 9:316-321, 1989. DHARNIDHARKA, V.R.; NADEAU, K.; CANNON, C.L.; HARRIS, H.W.; ROSEN, S. Ciprofloxacin overdose: acute renal failure with prominent apoptotic changes. Am. J. Kidney Dis., 31:710-712, 1998. DIELEMAN, J.P.; van der FELTZ, M.; BANGMA, C.H.; STRICKER, B.H.; van der ENDE, M.E. Papillary necrosis associated with the HIV protease inhibitor indinavir. Infection, 29:232-233, 2001. DILLON, J.J. Nephrotoxicity from antibacterial, antifungal and antiviral drugs. In Molitoris, B.A. e Finn, W.F. (eds) Acute Renal Failure, a Companion to Brenner & Rector’s The Kidney, Philadelphia, W.B. Saunders, 2000, pp. 349-364. DOREA, E.L.; YU, L.; DE CASTRO, I.; CAMPOS, S.B.; ORI, M.; VACCARI, E.M.; LACAZ, C.D.A.S.; SEGURO, A.C. Nephrotoxicity of amphotericin B is attenuated by solubilizing with lipid emulsion. J. Am. Soc. Nephrol., 8:1415-1422, 1997. DOS SANTOS, M. de F.; DOS SANTOS, O.F.; BOIM, M.A.; RAZVICKAS, C.V.; DE MOURA, L.A.; AJZEN, H.; SCHOR, N. Nephrotoxicity of acyclovir and ganciclovir in rats: evaluation of glomerular hemodynamics. J. Am. Soc. Nephrol., 8:361-367, 1997. FIACCADORI, E.; MAGGIORE, U.; ARISI, A.; CABASSI, A.; BEGHI, C.; CAMPODONICO, R.; GHERLI, T. Outbreak of acute renal failure due to cefodizime-vancomycin association in a heart surgery unit. Intensive Care Med., 27:1819-1822, 2001. FRIMAT, L.; HESTIN, D.; HANESSE, B.; CAO-HUU, T. e KESSLER, M. Acute renal failure due to vancomycin alone. Nephrol. Dial. Transplant., 10:550-551, 1995. GILBERT, D.N.; WOOD, C.A.; KOHLHEPP, S.J. et al. Polyaspartic acid prevents experimental aminoglycoside nephrotoxicity. J. Infect. Dis., 159:945-953, 1989. HADIMERI, H.; ALMROTH, G.; CEDERBRANT, K.; ENESTROM, S.; HULTMAN, P.; LINDELL, A. Allergic nephropathy associated with norfloxacin and ciprofloxacin therapy. Report of two cases and review of the literature. Scand. J. Urol. Nephrol., 31:481-485, 1997. HARBARTH, S.; PESTOTNIK, S.L.; LLOYD, J.F.; BURKE, J.P.; SAMORE, M.H. The epidemiology of nephrotoxicity associated with conventional amphotericin B therapy. Am. J. Med., 111:528-534, 2001. HEIN, R.; BRUNKHORST, R.; THON, W.F. et al. Symptomatic sulfadiazine cristaluria in AIDS patients: a report of two cases. Clin. Nephrol., 39:254-256, 1993. HOFFBARAND, B.I. Dapsone and renal papillary necrosis. Br. Med. J., 1:78, 1978. HOUGHTON, D.C.; ENGLISH, J.; BENNETT, W.M. Chronic tubulointerstitial nephritis and renal insufficiency associated with long-term “subtherapeutic” gentamicin. J. Lab. Clin. Med., 112:694-703, 1988. JAYAWEERA, D.T. Minimising the dosage-limiting toxicities of foscarnet induction therapy. Drug. Saf., 16:258-266, 1997. JOHNSON, P.C.; WHEAT, L.J.; CLOUD, G.A.; GOLDMAN, M.; LANCASTER, D.; BAMBERGER, D.M.; POWDERLY, W.G.; HAFNER, R.; KAUFFMAN, C.A.; DISMUKES, W.E. Safety and efficacy of liposomal amphotericin B compared with conventional amphotericin B for induction therapy of histoplasmosis in patients with AIDS. Ann. Intern. Med., 137:105-109, 2002. KOCH-WESER, J.; SIDEL, V.W.; FEDERMAN, E.B.; KANAREK, P.; FINER, D.C.; EATON, A.E. Adverse effects of sodium colistimethate. Manifestations and specific reaction rates during 317 courses of therapy. Ann. Intern. Med., 72:857-868, 1970. MINGEOT-LECLERCQ, M.-P.; TULKENS, P.M. Aminoglycosides nephrotoxicity. Antimicrob. Agents Chemother., 43:1003-1012, 1999. MARINELLA, M.A. Case report: reversible hiperkalemia associated with trimethoprim-sulfamethoxazole. Am. J. Med. Sci., 310:115-117, 1995. MILLER, R.F.; DELANY, S. e SEMPLE, S.J.G. Acute renal failure after nebulised pentaminidine. Lancet, 1:1271-1272, 1989. MONTEIRO, J.L.; de CASTRO, I. e SEGURO, A.C. Hypophosphatemia induced by acyclovir. Transplantation, 55:680-682, 1993.
484
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
MONTEIRO, J.L.; SEGURO, A.C. e ROCHA, A.S. Nefrotoxicidade aguda da anfotericina-B no cão. Rev. Hosp. Clin. Fac. Med. S. Paulo, 48:5459, 1993. MORALES, J.M.; MUÑOZ, M.A.; ZATARAÍN, G.F. et al. Reversible acute renal failure caused by the combined use of foscarnet and cyclosporin in organ transplanted patients. Nephrol. Dial. Transplant., 10:882883, 1995. NAKAJIMA, T.; HISHIDA, A.; KATO, A. Mechanisms for protective effects of free radical scavengers on gentamicin-mediated nephropathy in rats. Am. J. Physiol., 226:F425-F431, 1994. NUCCI, M.; LOUREIRO, M.; SILVEIRA, F.; CASALI, A.R.; BOUZAS, L.F.; VELASCO, E.; SPECTOR, N.; PULCHERI, W. Comparison of the toxicity of amphotericin B in 5% dextrose with that of amphotericin B in fat emulsion in a randomized trial with cancer patients. Antimicrob. Agents Chemother., 43:1445-1448, 1999. OLYAEI, A.J.; DEMATTOS, A.M.; BENNETT, W.M. Renal toxicity of protease inhibitors. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 9:473-476, 2000. PAZMINO, P. Acute renal failure, skin rash, and eosinophilia associated with aztreonam. Am. J. Nephrol., 8:68-70, 1988. PERAZELLA, M.A. Crystal-induced acute renal failure. Am. J. Med., 106:459-465, 1999. PLOSKER, G.L.; NOBLE, S. Cidofovir: a review of its use in cytomegalovirus retinitis in patients with AIDS. Drugs, 58:325-345, 1999. PRINS, J.M.; BULLER, H.R.; KUIJPER, E.J.; TANGE, R.A. e SPEELMAN, P. Once versus thrice daily gentamicin in patients with serious infections. Lancet, 341:335-339, 1993. PRINS, J.M.; WEVERLING, G.J.; VAN KETEL, R.J.; SPEELMAN, P. Circadian variations in serum levels and the renal toxicity of aminoglycosides in patients. Clin. Pharmacol. Ther., 62:106-111, 1997. REILLY, R.F.; TRAY, K.; PERAZELLA, M.A. Indinavir nephropathy revisited: a pattern of insidious renal failure with identifiable risk factors. Am. J. Kidney Dis., 38:E23, 2001. SAWAYA, B.P.; BRIGGS, J.P. e SCHNERMANN, J. Amphotericin B nephrotoxicity: the adverse consequences of altered membrane properties. J. Am. Soc. Nephrol., 6:154-164, 1995. SEGURO, A.C.; MONTEIRO, J.L. e ROCHA, A.S. Efeito imediato da administração de uma simples dose de gentamicina e cefalotina sobre a função renal. Rev. Hosp. Clin. Fac. Med. S. Paulo, 43:180-185, 1988. SHIH, D.; KORBET, S.M.; RYDEL, J.J. e SCHWARTZ, M.M. Renal vasculitis associated with ciprofloxacin. Am. J. Kidney Dis., 26:516-519, 1995. VACHVANICHSANONG, P.; PATAMASUCON, P.; MALAGON, M.; MOORE, E.S. Acute renal failure in a child associated with acyclovir. Pediatr. Nephrol., 9:346-347, 1995. van der SANDE, F.M. e HOORNTJE, S.J. Acute interstitial nephritis with septicemia and erythromycin. Nephron, 67:244, 1994. YANO, Y.; MONTEIRO, J.L.; SEGURO, A.C. Effect of amphotericin B on water and urea transport in the inner medullary collecting duct. J. Am. Soc. Nephrol., 5:68-74, 1994. ZANETTA, G.; MAURICE-ESTEPA, L.; MOUSSON, C.; JUSTRABO, E.; DAUDON, M.; RIFLE, G.; TANTER, Y. Foscarnet-induced crystalline glomerulonephritis with nephrotic syndrome and acute renal failure after kidney transplantation. Transplantation, 67:13761378, 1999.
Meio de Contraste Radiológico AGMON, Y.; PELEG, H.; GREENFELD, Z.; ROSEN, S. e BREZIZ, M. Nitric oxide and prostanoides protect the renal outer medulla from radiocontrast toxicity in the rat. J. Clin. Invest., 94:1069-1075, 1994. ANDRADE, L.; CAMPOS, S.B.; SEGURO, A.C. Hypercholesterolemia aggravates radiocontrast nephrotoxicity: protective role of L-arginine. Kidney Int., 53:1736-1742, 1998. ARAKAWA, K.; SUZUKI, H.; NAITOH, M. et al. Role of adenosine in the renal responses to contrast medium. Kidney Int., 49:1199-1206, 1996. BARRETT, B.J. Contrast nephrotoxicity. J. Am. Soc. Nephrol., 5:125-137, 1994. COHEN, E.; DADASHEV, A.; DRUCKER, M.; SAMRA, Z.; RUBINSTEIN, E.; GARTY, M. Once-daily versus twice-daily intravenous adminis-
tration of vancomycin for infections in hospitalized patients. J. Antimicrob. Chemother., 49:155-160, 2002. DERAY, G.; JACOBS, C. Radiocontrast nephrotoxicity. A review. Invest. Radiol., 30:221-225, 1995. DONADIO, C.; TRAMONTI, G.; GIORDANI, R. et al. Renal effects and nephrotoxicity of contrast media in renal patients. Contrib. Nephrol., 101:241-250, 1993. HENTSCHEL, M.; GILDEIN, P.; BRANDIS, M.; ZIMMERHACKL, L.B. Endothelin (ET-1) is involved in the contrast media induced nephrotoxicity in children with congenital heart disease. Clin. Nephrol., 43 (Suppl 1):S12-S15, 1995. LARANJA, S.M.; AJZEN, H.; SCHOR, N. Nephrotoxicity of low-osmolality contrast media. Ren. Fail., 19:307-314, 1997. LISS, P.; NYGREN, A.; OLSSON, U.; ULFENDAHL, H.R.; ERIKSON, U. Effects of contrast media and mannitol on renal medullary blood flow and red cell aggregation in the rat kidney. Kidney Int., 49:1268-1275, 1996. MOON, S.S.; BÄCK, S.-E.; KURKUS, J.; NILSSON-EHLE, P. Hemodialysis for elimination of the nonionic contrast medium iohexol after angiography in patients with impaired renal function. Nephron, 70:430-437, 1995. MORAES, S.D.S.; BURDMANN, E.A.; LOBO, M.L. et al. Alterações da função renal após o uso de contraste iodado. Anais do VI Congresso Latino-Americano de Nefrologia, 1985, p. 107. MUELLER, C.; BUERKLE, G.; BUETTNER, H.J.; PETERSEN, J.; PERRUCHOUD, A.P.; ERIKSSON, U.; MARSCH, S.; ROSKAMM, H. Prevention of contrast media-associated nephropathy: randomized comparison of 2 hydration regimens in 1620 patients undergoing coronary angioplasty. Arch. Intern. Med., 162:329-336, 2002. RUDNICK, M.R.; GOLDFARB, S.; WEXLER, L. et al. Nephrotoxicity of ionic and nonionic contrast media in 1196 patients: a randomized trial. Kidney Int., 47:254-261, 1995. SAFIRSTEIN, R.; ANDRADE, L.; VIEIRA, J.M. Acetylcysteine and nephrotoxic effects of radiographic contrast agents — a new use for an old drug. N. Engl. J. Med., 343:210-212, 2000. SKETCH, M.H. JR; WHELTON, A.; SCHOLLMAYER, E.; KOCH, J.A.; BERNINK, P.J.; WOLTERING, F.; BRINKER, J.; PROSTAGLANDIN E1 STUDY GROUP. Prevention of contrast media-induced renal dysfunction with prostaglandin E1: a randomized, double-blind, placebo-controlled study. Am. J. Ther., 8:155-162, 2001. SOLOMON, R. Contrast-medium-induced acute renal failure. Kidney Int., 53:230-242, 1998. SOLOMON, R.; WERNER, C.; MANN, D.; D’ELIA, J.; SILVA, P. Effects of saline, mannitol, and furosemide on acute decreases in renal function induced by radiocontrast agents. N. Engl. J. Med., 331:1416-1420, 1994. STERNER, G.; FRENNBY, B.; KURKUS, J.; NYMAN, U. Does postangiographic hemodialysis reduce the risk of contrast-medium nephropathy? Scand. J. Urol. Nephrol., 34:323-326, 2000. TEPEL, M.; VAN DER GIET, M.; SCHWARZFELD, C.; LAUFER, U.; LIERMANN, D.; ZIDEK, W. Prevention of radiographic-contrastagent-induced reductions in renal function by acetylcysteine. N. Engl. J. Med., 343:180-184, 2000. WANG, A.; HOLCSLAW, T.; BASHORE, T.M. et al. Exacerbation of radiocontrast nephrotoxicity by endothelin receptor antagonism. Kidney Int., 57:1675-1680, 2000. WEINSTEIN, J.-M.; HEYMAN, S.; BREZIS, M. Potential deleterious effect of furosemide in radiocontrast nephropathy. Nephron, 62:413-415, 1992.
Antiinflamatórios Não-hormonais ANÔNIMO. Renal impairment due to topical NSAIDS. Prescrire, Int., 11:86, 2002. ADHIYAMAN, V.; ASGHAR, M.; OKE, A.; WHITE, A.D.; SHAH, I.U. Nephrotoxicity in the elderly due to co-prescription of angiotensin converting enzyme inhibitors and nonsteroidal anti-inflammatory drugs. J. R. Soc. Med., 94:512-514, 2001.
capítulo 24
AHMAD, S.R.; KORTEPETER, C.; BRINKER, A.; CHEN, M.; BEITZ, J. Renal failure associated with the use of celecoxib and rofecoxib. Drug Saf., 25:537-544, 2002. ATTA, M.G.; WHELTON, A. Acute renal papillary necrosis induced by ibuprofen. Am. J. Ther., 4:55-60, 1997. BENNETT, W.M.; HENRICH, W.L.; STOFF, J.S. The renal effects of nonsteroidal anti-inflammatory drugs: summary and recommendations. Am. J. Kidney Dis., 28(1 Suppl 1):S56-62, 1996. BERNSTEIN, J.; WERNER, A.L.; VERANI, R. Nonsteroidal anti-inflammatory drug fetal nephrotoxicity. Pediatr. Dev. Pathol.,1:153-156, 1998. DRUKKER, A.; GUIGNARD, J.P. Renal aspects of the term and preterm infant: a selective update. Curr. Opin. Pediatr., 14:175-182, 2002. DUBOSE, Jr. T.; MOLONY, D.A.; VERANI, R.; McDONALD, G.A. Nephrotoxicity of non-steroidal anti-inflammatory drugs. Lancet, 344:515518, 1994. ENRIQUEZ, R.; SIRVENT, A.E.; ANTOLIN, A.; CABEZUELO, J.B.; GONZALEZ, C.; REYES, A. Acute renal failure and flank pain after binge drinking and non-steroidal anti-inflammatory drugs. Nephrol. Dial. Transplant., 12:2034-2035, 1997. GRIFFIN, M.R.; YARED, A.; RAY, W.A. Nonsteroidal antiinflammatory drugs and acute renal failure in elderly persons. Am. J. Epidemiol., 151:488-496, 2000. HARRIS, R.C. Jr. Cyclooxygenase-2 inhibition and renal physiology. Am. J. Cardiol., 89:10D-17D, 2002. HENAO, J.; HISAMUDDIN, I.; NZERUE, C. M.; VASANDANI, G.; HEWAN-LOWE, K. Celecoxib-induced acute interstitial nephritis. Am. J. Kidney Dis., 39:1313-1317, 2002. HENRICH, W.L.; AGODOA, L.E.; BARRETT, B. et al. Analgesics and the kidney: summary and recommendations to the scientific advisory board of the National Kidney Fundation from an ad hoc committee of the National Kidney Fundation. Am. J. Kidney Dis., 27:162-165, 1996. JOHNSON, G.R.; WEN, S.-F. Syndrome of flank pain and acute renal failure after binge drinking and nonsteroidal anti-inflammatory drug ingestion. J. Am. Soc. Nephrol., 5:1647-1652, 1995. KLEINKNECHT, D. Interstitial nephritis, the nephrotic syndrome, and chronic renal failure secondary to nonsteroidal anti-inflammatory drugs. Sem. Nephrol., 15:228-235, 1995. KRUMMEL, T.; DIMITROV, Y.; MOULIN, B.; HANNEDOUCHE, T. Drug points: Acute renal failure induced by topical ketoprofen. B.M.J., 320:93, 2000. LANDAU, D.; SHELEF, I.; POLACHECK, H.; MARKS, K.; HOLCBERG, G. Perinatal vasoconstrictive renal insufficiency associated with maternal nimesulide use. Am. J. Perinatol., 16:441-444, 1999. PALMER, B.F.; HENRICH, W.L. Clinical acute renal failure with nonsteroidal anti-inflammatory drugs. Sem. Nephrol., 15:214-227, 1995. PERAZELLA, M.A.; TRAY, K. Selective cyclooxygenase-2 inhibitors: a pattern of nephrotoxicity similar to traditional nonsteroidal anti-inflammatory drugs. Am. J. Med., 111:64-67, 2001. PEREZ GUTTHANN, S.; GARCIA RODRIGUEZ, L.A.; RAIFORD, D.S.; DUQUE OLIART, A., RIS ROMEU, J. Nonsteroidal anti-inflammatory drugs and the risk of hospitalization for acute renal failure. Arch. Intern. Med., 156:2433-2439, 1996. ROCHA, J.L.; FERNANDEZ-ALONSO, J. Acute tubulointerstitial nephritis associated with the selective COX-2 enzyme inhibitor, rofecoxib. Lancet, 357:1946-1947, 2001. SANDERS, L.R. Exercice-induced acute renal failure associated with ibuprofen, hydrochlorothiazide, and triamterene. J. Am. Soc. Nephrol., 5:2020-2023, 1995. STURMER, T.; ELSEVIERS, M.M.; de BROE, M.E. Nonsteroidal anti-inflammatory drugs and the kidney. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 10:161-163, 2001. WHELTON, A. Renal and related cardiovascular effects of conventional and COX-2-specific NSAIDs and non-NSAID analgesics. Am. J. Ther., 7:63-74, 2000. WOYWODT, A.; SCHWARZ, A.; MENGEL, M.; HALLER, H.; ZEIDLER, H.; KOHLER, L. Nephrotoxicity of selective COX-2 inhibitors. J. Rheumatol., 28:2133-2135, 2001. ZHAO, S.Z.; REYNOLDS, M.W.; LEJKOWITH, J.; WHELTON, A.; ARELLANO, F.M. A comparison of renal-related adverse drug reac-
485
tions between rofecoxib and celecoxib, based on the World Health Organization/Uppsala Monitoring Centre safety database. Clin. Ther., 23:1478-1491, 2001.
Inibidores da Enzima de Conversão da Angiotensina ANGLADA PINTADO, J.C.; GALLEGO PUERTO, P.; ZAPATA LOPEZ, A.; CAYON BLANCO, M. Acute renal failure associated with irbesartan Med. Clin. (Barc), 113:358-359, 1999. BRIDOUX, F.; HAZZAN, M.; PALLOT, J.L. et al. Acute renal failure after the use of angiotensin-converting-enzyme inhibitors in patients without renal artery stenosis. Nephrol. Dial. Transplant, 7:100104, 1992. DESCOMBES, E.; FELLAY, G. End-stage renal failure after irbesartan prescription in a diabetic patient with previously stable chronic renal insufficiency. Ren. Fail., 22:815-821, 2000. DEVOY, M.A.B.; TOMSON, C.R.V.; EDMUNDS, M.E.; FEEHALLY e WALLS, J. Deterioration in renal function associated with angiotensin converting enzyme inhibitor therapy is not always reversible. J. Int. Med., 232:493-498, 1992. DIONÍSIO, P.; VALENTI, M.; CARAMELLO, E. et al. Acute kidney failure and losartan: a recently observed event of antagonists of angiotensin II AT1 receptors. Minerva Urol. Nefrol., 52:123-125, 2000. GARCIA, T.M.; da-COSTA, J.A.; COSTA, R.S.; FERRAZ, A.S. Acute tubular necrosis in kidney transplant patients treated with enalapril Renal. Fail., 16:419-423, 1994. HRICIK, D.E. e DUNN, M.D. Angiotensin-converting enzyme inhibitorinduced renal failure: causes, consequences and diagnostic uses. J. Am. Soc. Nephrol., 1:845-858, 1990. LAMB, R.V.; WALTON, T. Acute renal failure after administration of losartan. W.V. Med. J., 92:241, 1996. LEE, H.Y.; KIM, C.H. Acute oliguric renal failure associated with angiotensin II receptor antagonists. Am. J. Med., 111:162-163, 2001. LEHMANN, K. e RITZ, E. Angiotensin-converting enzyme inhibitors may cause renal dysfunction in patients on long-term lithium treatment. Am. J. Kidney Dis., 25:82-87, 1995. MANDAL, A.K.; MARKERT, R.J.; SAKLAYEN, M.G.; MANKUS, R.A. e YOKOKAWA, K. Diuretics potentiate angiotensin converting enzyme inhibitor-induced acute renal failure. Clin. Nephrol., 42:170-174, 1994. NAKHOUL, F. e BETTER, O.S. Acute renal failure following massive mannitol infusion and enalapril treatment. Clin. Nephrol., 44:118-120, 1995. OSTERMANN, M.; GOLDSMITH, D.J.; DOYLE, T.; KINGSWOOD, J.C.; SHARPSTONE, P. Reversible acute renal failure induced by losartan in a renal transplant recipient. Postgrad. Med. J., 73:105-107, 1997. RABB, H.; GUNASEKARAN, H.; GUNASEKARAN, S.; SABA, S.R. Acute renal failure from multiple myeloma precipitated by ACE inhibitors. Am. J. Kidney Dis., 33:E5, 1999. SCHEPKENS, H.; VANHOLDER, R.; BILLIOUW, J.M.; LAMEIRE, N. Life-threatening hyperkalemia during combined therapy with angiotensin-converting enzyme inhibitors and spironolactone: an analysis of 25 cases. Am. J. Med., 110:438-441, 2001. van de VEN, P.J.; BEUTLER, J.J.; KAATEE, R.; BEEK, F.J.; MALI, W.P.; KOOMANS, H.A. Angiotensin converting enzyme inhibitor-induced renal dysfunction in atherosclerotic renovascular disease. Kidney Int., 53:986-993, 1998. WYNCKEL, A.; EBIKILI, B.; MELIN, J.P.; RANDOUX, C.; LAVAUD, S.; CHANARD, J. Long-term follow-up of acute renal failure caused by angiotensin converting enzyme inhibitors. Am. J. Hypertens., 11:10801086, 1998.
Agentes Imunossupressores e Imunomoduladores ANDOH, T.F.; BURDMANN, E.A.; LINDSLEY, J.; HOUGHTON, D.C. e BENNETT, W.M. Functional and structural characteristics of experimental FK506 nephrotoxicity. Clinical and Experimental Pharmacology and Physiology, 22:646-654, 1995.
486
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
ANDOH, T.F.; BURDMANN E.A.; BENNETT, W.M. Nephrotoxicity of immunosuppressive drugs: experimental and clinical observations. Semin. Nephrol., 17:34-45, 1997. ASSIS, S.M.; MONTEIRO, J.L.; SEGURO, A.C. L-Arginine and allopurinol protect against cyclosporine nephrotoxicity. Transplantation, 63:10701073, 1997. BARROS, E.J.; BOIM, M.A.; AJZEN, H.; RAMOS, O.L. e SCHOR, N. Glomerular hemodynamics and hormonal participation on cyclosporine nephrotoxicity. Kidney Int., 32:19-25, 1987. BENNETT, W.M. Therapeutic implications of arachidonic acid metabolism in transplant-associated acute renal failure. Ren. Fail., 14:261-265, 1992. BENNETT, W.M.; BURDMANN, E.A.; ANDOH, T.F.; HOUGHTON, D.C.; LINDSLEY, J. e ELZINGA, L.W. Nephrotoxicity of immunosuppressive drugs. Nephrol. Dial. Transplant, 9 (Suppl 4):141-145, 1994. BOBADILLA, N.A.; TAPIA, E.; FRANCO, M. et al. Role of nitric oxide in renal hemodynamic abnormalities of cyclosporin nephrotoxicity. Kidney Int., 46:773-779, 1994. BONSER, R.S.; ADU, D.; FRANKLIN, I. e McMASTER, P. Cyclosporininduced haemolytic uraemic syndrome in liver allograft recipient [letter]. Lancet, 2:1337, 1984. BURDMANN, E.A.; ANDOH, T.F.; PRADO, E.A.B. et al. Renal, immunosuppressive and pharmacokinetic effects of the substitution of intralipid (LIP) for cremophor (CRE) as vehicle for parenteral cyclosporine (CSA) administration. J. Am. Soc. Nephrol., 6:995, 1995. BURDMANN, E.A.; ANDOH, T.F.; LINDSLEY, J.; HOUGHTON, D.C. e BENNETT, W.M. Effects of oral magnesium supplementation on acute experimental cyclosporin nephrotoxicity. Nephrol. Dial. Transplant, 9:16-21, 1994. BURDMANN, E.A.; ANDOH, T.F.; NAST, C.C. et al. Prevention of experimental cyclosporin-induced interstitial fibrosis by losartan and enalapril. Am. J. Physiol., 269:F491-F499, 1995. BURDMANN, E.A.; ANDOH, T.F.; ROSEN, S. et al. Experimental nephrotoxicity, hepatotoxicity and pharmacokinetics of cyclosporin G versus cyclosporin A. Kidney Int., 45:684-691, 1994. BURDMANN, E.A.; YOUNG, B.; ANDOH, T.F. et al. Mechanisms of cyclosporine-induced interstitial fibrosis. Transplant. Proc., 26:25882589, 1994. CAMARA, N.O.; MATOS, A.C.; RODRIGUES, D.A.; PEREIRA, A.B.; PACHECO-SILVA, A. Urinary retinol binding protein is a good marker of progressive cyclosporine nephrotoxicity after heart transplant. Transplant. Proc., 33:2129-2131, 2001. CURTIS, J.J.; LUKE, R.G.; DUBOVSKY, E. e DIETHELM, A.G.; WHELCHEL J.D.; JONES, P. Cyclosporin in therapeutic doses increases renal allograft vascular resistance. Lancet, 2:477-479, 1986. DAVID-NETO, E.; ARAUJO, L.M.; LEMOS, F.C.; DAVID, D.S.; MAZZUCCHI, E.; NAHAS, W.C.; ARAP, S.; IANHEZ, L.E. Introduction of mycophenolate mofetil and cyclosporin reduction in children with chronic transplant nephropathy. Pediatr. Transplant., 5:302-309, 2001. de MATTOS, A.M.; OLYAEI, A.J.; BENNETT, W.M. Nephrotoxicity of immunosuppressive drugs: long-term consequences and challenges for the future. Am. J. Kidney Dis., 35:333-346, 2000. DIMITROV, Y.; HEIBEL, F.; MARCELLIN, L.; CHANTREL, F.; MOULIN, B.; HANNEDOUCHE, T. Acute renal failure and nephrotic syndrome with alpha interferon therapy. Nephrol. Dial. Transplant., 12:200203, 1997. ELZINGA, L.W.; ROSEN, S. e BENNETT, W.M. Dissociation of glomerular filtration rate from tubulointerstitial fibrosis in experimental chronic cyclosporine nephropathy: role of sodium intake. J. Am. Soc. Nephrol., 4:214-221, 1993. FINN, W.F. FK506 nephrotoxicity. Ren. Fail., 21:319-329, 1999. FIORETTO, P.; STEFFES, M.W.; MIHATSCH, M.J.; STRM, E.H.; SUTHERLAND, D.E.R. e MAUER, M. Cyclosporine associated lesions in native kidneys of diabetic pancreas transplant recipients. Kidney Int., 48:489495, 1995. FEUTREN, G. e MIHATSCH, M.J. Risk factors for cyclosporine-induced nephropathy in patients with autoimmune diseases. International
Kidney Biopsy Registry of Cyclosporine in Autoimmune Diseases. N. Engl. J. Med., 326:1654-1660, 1992. GARDINER, D.S.; WATSON, M.A.; JUNOR, B.J.; BRIGGS, J.D.; MORE, I.A. e LINDOP, G.B. The effect of conversion from cyclosporin to azathioprine on renin-containing cells in renal allograft biopsies. Nephrol. Dial. Transplant, 6:363-367, 1991. GHIGGERI, G.M.; ALTIERI, P.; OLEGGINI, R.; VALENTI, F.; GINEVRI, F. e PERFUMO, F.; GUSMANO, R. Cyclosporine enhances the synthesis of selected extracellular matrix proteins by renal cells “in culture”. Different cell responses and phenotype characterization. Transplantation, 57:1382-1388, 1994. GRIEFF, M.; LOERTSCHER, R.; SHOHAIB, S.A. e STEWART, D.J. Cyclosporine-induced elevation in circulating endothelin-1 in patients with solid-organ transplants. Transplantation, 56:880-884, 1993. HADAD, S.J.; SOUZA, E.R.; FERREIRA, A.T. et al. FK506: effects on glomerular hemodynamics and on mesangial cells in culture. Kidney Int., 48:56-64, 1995. JANKAUSKIENE, A.; DRUSKIS, V.; LAURINAVICIUS, A. Cyclosporine nephrotoxicity: associated allograft dysfunction at low through concentration. Clin. Nephrol., 56:S27-29, 2001. JOHNSON, R.W.; KREIS, H.; OBERBAUER, R.; BRATTSTROM, C.; CLAESSON, K.; ERIS, J. Sirolimus allows early cyclosporine withdrawal in renal transplantation resulting in improved renal function and lower blood pressure. Transplantation, 72:777-786, 2001. KAHAN, B.D. Potential therapeutic interventions to avoid or treat chronic allograft dysfunction. Transplantation, 71(11 Suppl):SS52-57, 2001. KREIS, H. New strategies to reduce nephrotoxicity. Transplantation, 72(12 Suppl):S99-104, 2001. LIMA, R.; SERONE, A.P.; SCHOR, N.; HIGA, E.M. Effect of cyclosporin A on nitric oxide production in cultured LLC-PK1 cells. Ren. Fail., 23:43-52, 2001. MIRANDA-GUARDIOLA, F.; FDEZ-LLAMA, P.; BADIA, J.R. et al. Acute renal failure associated with alpha-interferon therapy for chronic hepatitis B. Nephrol. Dial. Transplant, 10:1441-1443, 1995. MEMOLI, B.; de NICOLA, L.; LIBETTA, C. et al. Interleukin-2-induced renal dysfunction in cancer patients is reversed by low-dose dopamine infusion. Am. J. Kidney Dis., 26:27-33, 1995. MYERS, B.D.; SIBLEY, R.; NEWTON, L. et al. The long-term course of cyclosporine-associated chronic nephropathy. Kidney Int., 33:590-600, 1988. NASSAR, G.M.; PEDRO, P.; REMMERS, R.E.; MOHANTY, L.B.; SMITH, W. Reversible renal failure in a patient with the hypereosinophilia syndrome during therapy with alpha interferon. Am. J. Kidney Dis., 31:121-126, 1998. NEUMAYER, H.H.; KUNZENDORF, U. e SCHREIBER, M. Protective effects of calcium antagonists in human renal transplantation. Kidney Int., (Suppl 36):S87-S93, 1992. OLYAEI, A.J.; DE MATTOS, A.M.; BENNETT, W.M. Nephrotoxicity of immunosuppressive drugs: new insight and preventive strategies. Curr. Opin. Crit. Care, 7:384-389, 2001. PERICO, N.; RUGGENENTI, P.; GASPARI, F. et al. Daily renal hypoperfusion induced by cyclosporine in patients with renal transplantation. Transplantation, 54:56-60, 1992. PESCOVITZ, M.D.; GOVANI, M. Sirolimus and mycophenolate mofetil for calcineurin-free immunosuppression in renal transplant recipients. Am. J. Kidney. Dis., 38(4 Suppl 2):S16-21, 2001. PLATZ, K.P.; MUELLER, A.R.; BLUMHARDT, G. et al. Nephrotoxicity following orthotopic liver transplantation. A comparison between cyclosporine and FK506. Transplantation, 58:170-178, 1994. PLOSKER, G.L.; FOSTER, R.H. Tacrolimus: a further update of its pharmacology and therapeutic use in the management of organ transplantation. Drugs, 59:323-389, 2000. ROSEN, S.; GREENFELD, Z. e BREZIS, M. Chronic cyclosporine-induced nephropathy in the rat. A medullary ray and inner stripe injury. Transplantation, 49:445-452, 1990. ROULLET, J.B.; XUE, H.; BURDMANN, E.A.; CHAPMAN, J.; McCARRON, D.A. e BENNETT, W.M. Cardiovascular consequences of immunosuppressive drug treatment: a comparative study of cyclosporine A and cyclosporine G. Transplant Proc., 27:346-347, 1995.
capítulo 24
SCHNUELLE, P.; van der HEIDE, J.H.; TEGZESS, A. et al. Open randomized trial comparing early withdrawal of either cyclosporine or mycophenolate mofetil in stable renal transplant recipients initially treated with a triple drug regimen. J. Am. Soc. Nephrol., 13:536-543, 2002. SHEHATA, M.; COPE, G.H.; JOHNSON, T.S.; RAFTERY, A.T. e EL NAHAS, A.M. Cyclosporine enhances the expression of TGF-b in the juxtaglomerular cells of the rat kidney. Kidney Int., 48:1487-1496, 1995. SHIMIZU, T.; TANABE, K.; TOKUMOTO. T. et al. Clinical and histological analysis of acute tacrolimus (TAC) nephrotoxicity in renal allografts. Clin. Transplant., 13 Suppl 1:48-53, 1999. STEIN, D.F.; AHMED, A.; SUNKHARA, V.; KHALBUSS, W. Collapsing focal segmental glomerulosclerosis with recovery of renal function: an uncommon complication of interferon therapy for hepatitis C. Dig. Dis. Sci., 46:530-535, 2001. STILLMAN, I.E.; ANDOH, T.F.; BURDMANN, E.A.; BENNETT, W.M. e ROSEN, S. FK506 nephrotoxicity: morphologic and physiologic characterization of a rat model. Lab. Invest., 73:794-803, 1995. VIEIRA, J.M. Jr.; NORONHA, I.L., MALHEIROS, D.M.; BURDMANN, E.A. Cyclosporine-induced interstitial fibrosis and arteriolar TGF-beta expression with preserved renal blood flow. Transplantation, 68:17461753, 1999. YOUNG, B.; BURDMANN, E.A.; JOHNSON, R.J. et al. Cellular proliferation and macrophage influx precede interstitial fibrosis in cyclosporine nephrotoxicity. Kidney Int., 48:439-448, 1995. YOUNG, B.; BURDMANN, E.A.; JOHNSON, R.J.; ANDOH, T. et al. Cyclosporine A induced arteriolopathy in a rat model of chronic cyclosporine nephropathy. Kidney Int., 48:431-438, 1995.
Agentes Anticancerígenos AGRAHARKAR, M.; NERENSTONE, S.; PALMISANO, J.; KAPLAN, A.A. Carboplatin-related hematuria and acute renal failure. Am. J. Kidney Dis., 32:E5, 1998. BERNS, J.S.; FORD, PA. Renal toxicities of antineoplastic drugs and bone marrow transplantation. Semin. Nephrol., 17:54-66, 1997. BRILLET, G.; DERAY, G.; JACQUIAUD, C. et al. Long-term renal effect of cisplatin in man. Am. J. Nephrol., 14:81-84, 1994. ERDLENBRUCH, B.; NIER, M.; KERN, W.; HIDDEMANN, W.; PEKRUN, A.; LAKOMEK, M. Pharmacokinetics of cisplatin and relation to nephrotoxicity in paediatric patients. Eur. J. Clin. Pharmacol., 57:393-402, 2001. GREIL, J.; WYSS, P.A.; LUDWIG, K. et al. Continuous plasma resin perfusion for detoxification of methotrexate. Eur. J. Pediatr., 156:533536, 1997. KAWABATA, K.; MAKINO, H.; NAGAKE, Y. et al. A case of methotrexate-induced acute renal failure successfully treated with plasma perfusion and sequential hemodialysis. Nephron, 71:233-234, 1995. KEPKA, L.; DE LASSENCE, A.; RIBRAG, V. et al. Successful rescue in a patient with high dose methotrexate-induced nephrotoxicity and acute renal failure. Leuk. Lymphoma, 29:205-209, 1998. KINTZEL, P.E. Anticancer drug-induced kidney disorders. Drug Saf., 24:19-38, 2001. KOPECNA, L. Late effects of anticancer therapy on kidney function in children with acute lymphoblastic leukemia. Bratisl. Lek. Listy, 102:357360, 2001. KREMER, J.M.; PETRILLO, G.F. e HAMILTON, R.A. Pharmacokinetics and renal function in patients with rheumatoid arthritis receiving a standard dose of oral weekly methotrexate: association with significant decreases in creatinine clearance and renal clearance of the drug after 6 months of therapy. J. Rheumatol., 22:38-48, 1995. LAJER, H.; DAUGAARD, G. Cisplatin and hypomagnesemia. Cancer Treat. Rev., 25:47-58, 1999. NARINS, R.G.; CARLEY, M.; BLOOM, E.J. e HARRISON, D.S. The nephrotoxicity of chemotherapeutic agents. Sem. Nephrol., 10:556-564, 1990. OYMAK, O. Contrast media induced irreversible acute renal failure in a patient treated with intraperitoneal cisplatin. Clin. Nephrol., 44:135-136, 1995.
487
PERSONS, D.A.; GARST, J.; VOLLMER, R.; CRAWFORD, J. Tumor lysis syndrome and acute renal failure after treatment of non-small-cell lung carcinoma with combination irinotecan and cisplatin. Am. J. Clin. Oncol., 21:426-429, 1998. SAUER, M.; RYDHOLM, N.; PIATKOWSKI, J.; LEWIS, V.; STEINER, M. Nephrotoxicity due to intermediate-dose methotrexate without rescue in an obese adolescent with acute lymphoblastic leukemia. Pediatr. Hematol. Oncol., 19:135-140, 2002. SEGURO, A.S.; SHIMIZU, M.H.M.; KUDO, L.H. e ROCHA, A.S. Renal concentration defect induced by cisplatin — the role of thick ascending limb and papillary collecting duct. Am. J. Nephrol., 9:59-65, 1989. SHINOZAKI, T.; WATANABE, H.; TOMIDOKORO, R.; YAMAMOTO, K.; HORIUCHI, R.; TAKAGISHI, K. Successful rescue by oral cholestyramine of a patient with methotrexate nephrotoxicity: nonrenal excretion of serum methotrexate. Med. Pediatr. Oncol., 34:226228, 2000. WIDEMANN, B.C.; HETHERINGTON, M.L.; MURPHY, R.F.; BALIS, F.M.; ADAMSON, P.C. Carboxypeptidase-G2 rescue in a patient with high dose methotrexate-induced nephrotoxicity. Cancer, 76:521-526, 1995.
Peçonhas Animais AMARAL, C.F.; da SILVA, O.; GOODY, P. e MIRANDA, D. Renal cortical necrosis following Bothrops jararaca and B. jararacussu snake bite. Toxicon., 23:877-885, 1985. AMARAL, C.F.; de REZENDE, N.A.; da SILVA, O.A. et al. Insuficiência renal aguda secundária a acidentes ofídicos botrópico e crotálico. Análise de 63 casos. Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, 28:220-227, 1986. AROCHA-PIÑANGO, C.L.; de BOSCH, N.B.; TORRES, A. et al. Six new cases of a caterpillar-induced bleeding disorder. Thromb. Haemost., 67:402-407, 1992. AZEVEDO-MARQUES, M.M.; CUPO, P.; COIMBRA, T.M.; HERING, S.E.; ROSSI, M.A. e LAURE, C.J. Myonecrosis, myoglobinuria and acute renal failure induced by South American rattlesnake (Crotalus durissus terrificus) envenomation in Brazil. Toxicon, 23:631-636, 1985. AZEVEDO-MARQUES, M.M.; HERING, S.E. e CUPO, P. Evidence that Crotalus durissus terrificus (South American rattlesnake) envenomation in humans causes myolysis rather than hemolysis. Toxicon, 25:1163-1168, 1987. BOER-LIMA, P.A.; GONTIJO, J.A.; da CRUZ-HOFLING, M.A. Histologic and functional renal alterations caused by Bothrops moojeni snake venom in rats. Am. J. Trop. Med. Hyg., 61:698-706, 1999. BUCARETCHI, F.; HERRERA, S.R.; HYSLOP, S.; BARACAT, E.C.; VIEIRA, R.J. Snakebites by Bothrops spp in children in Campinas, São Paulo, Brazil. Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, 43:329-333, 2001. BURDMANN, E.A.; BARCELLOS, M.A.; CARDOSO, J.L. et al. Acute interstitial nephritis after snake bite. Renal Fail., 11:51-52, 1989. BURDMANN, E.A.; ANTUNES, I.; SALDANHA, L.B. e ABDULKA-DER, R.C.R.M. Severe acute renal failure induced by the venom of Lonomia caterpillars. Clin. Nephrol., 46:337-339, 1996. BURDMANN, E.A.; CAIS, A.; VIDAL, E.C. IRA nefrotóxica: animais peçonhentos. In Schor, N.; Boim, M.A.; dos Santos, O.F.P. (eds) Insuficiência Renal Aguda – Fisiopatologia, Clínica e Tratamento. São Paulo, Sarvier, 1997, pp. 135-141. BURDMANN, E.A.; WORONIK, V.; PRADO, E.B. et al. Snakebite-induced acute renal failure: an experimental model. Am. J. Trop. Med. Hyg., 48:82-88, 1993. CASTRO, I.; BURDMANN, E.A.; YU, L. Bothrops antivenom prevented snake venom tubular toxicity but not the venom-induced protection against hypoxia/reoxygenation injury. J. Am. Soc. Nephrol., 10:644A645A, 1999. CASTRO, I.; BURDMANN, E.A.; YU, L. Bothrops snake venom causes direct tubular nephrotoxicity. Renal Fail., 21:571-572, 1999. CHUGH, K.S. Snake-bite-induced acute renal failure in India. Kidney Int., 35:891-907, 1989. DATE, A.; PULIMOOD, R.; JACOB, C.K.; KIRUBAKARAN, M.G. e SHASTRY, J.C. Haemolytic-uraemic syndrome complicating snake bite. Nephron, 42:89-90, 1986.
488
Nefropatia Tóxica e Tubulointersticial
DOS REIS, M.A.; COSTA, R.S.; COIMBRA, T.M.; TEIXEIRA, V.P. Acute renal failure in experimental envenomation with Africanized bee venom. Ren. Fail., 20:39-51, 1998. DUARTE, A.C.; CAOVILLA, J.; LORINI, I. et al. Insuficiência renal aguda por acidentes com lagartas. J. Bras. Nefrol., 12:184-187, 1990. FRANÇA, F.O.S.; BENVENUTI, L.A.; FAN, H.W. et al. Severe and fatal mass attacks by “killer” bees (Africanized honey bees-Apis mellifera scutellata) in Brazil: clinicopathological studies with measurement of serum venom concentrations. Q. J. Med., 87:269-282, 1994. GRISOTTO, L.S.; MENDES, G.E.; CASTRO, I.; YU, L.; BURDMANN, E.A. Mechanisms of bee venom-induced acute renal failure. J. Am. Soc. Nephrol., 11:129A, 2000. JORGE, M.T. e RIBEIRO, L.A. Epidemiologia e quadro clínico do acidente por cascavel sul-americana (Crotalus durissus). Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, 34:347-354, 1992. NISHIOKA, S.A. e SILVEIRA, P.V.P. A clinical and epidemiological study of 292 cases of lance-headed viper bite in a Brazilian teaching hospital. Am. J. Trop. Med. Hyg., 47:805-810, 1992. PINHO, F.M.O.; BURDMANN, E.A. Crotalus snake venom-induced acute renal failure (ARF): clinical picture and risk factors — a prospective study. J. Am. Soc. Nephrol., 10:149A, 1999. PINHO, F.M.; BURDMANN, E.A. Fatal cerebral hemorrhage and acute renal failure after young Bothrops jararacussu snake bite. Ren. Fail., 23:269-277, 2001. PINHO, F.M.; VIDAL, E.C.; BURDMANN, E.A. Insuficiência renal aguda após acidente crotálico. J. Bras. Nefrol., 22:162-168, 2000. RIBEIRO, L.A.; ALBUQUERQUE, M.J.; de CAMPOS, V.A.; KATZ, G.; TAKAOKA, N.Y.; LEBRAO, M.L.; JORGE, M.T. [Deaths caused by venomous snakes in the State of São Paulo: evaluation of 43 cases from 1988 to 1993.] Rev. Assoc. Med. Bras., 44:312-318, 1998. REZENDE, N.A.; AMARAL, C.F.; BAMBIRRA, E.A.; LACHATT, J.J. e COIMBRA, T. Functional and histopathological renal changes induced in rats by Bothrops jararaca venom. Braz. J. Med. Biol. Res., 22:407-416, 1989. SEZERINO, U.M.; ZANNIN, M.; COELHO, L.K. et al. A clinical and epidemiological study of Loxosceles spider envenoming in Santa Catarina, Brazil. Trans. R. Soc. Trop. Med. Hyg., 92:546-548, 1998. SILVEIRA, P.V.P. e NISHIOKA, S.A. South American rattlesnake bite in a Brazilian teaching hospital. Clinical and epidemiological study of 87 cases, with analysis of factors predictive of renal failure. Trans. Royal Soc. Trop. Med. Hyg., 86:562-564, 1992. TAYLOR, E.H. e DENNY, W.F. Hemolysis, renal failure and death presumed secondary to bite of brown recluse spider. South Afr. Med. J., 59:1209-1211, 1966. VIDAL, E.C.; BURDMANN, E.A. Insuficiência renal aguda causada por venenos animais. Ars Curandis, 30:9-19, 1997. VIDAL, E.C.; YU, L.; CASTRO, I.; ORI, M.; MALHEIROS, D.M.; BURDMANN, E.A. Snake venom-induced nephrotoxicity — in vivo and in vitro studies. J. Am. Soc. Nephrol., 8:131A, 1997. WILLIANS, S.T.; KHARE, V.K.; JOHNSTON, G.A. e BLACKALL, D.P. Severe intravascular hemolysis associated with brown recluse spider envenomation. Am. J. Clin. Pathol., 104:463-467, 1995. ZUGAIB, M.; de BARROS, A.C.; BITTAR, R.E.; BURDMANN, E.A. e NEME, B. Abruptio placentae following snake bite. Am. J. Obstet. Gynecol., 151:754-755, 1985.
Nefropatia Tubulointersticial BORDER, W.A.; NOBLE, N.A.; YAMAMOTO, T. et al. Natural inhibitor of transforming grow factor- protects against scarring in experimental kidney disease. Nature, 360:361-364, 1992. BOTON, R.; GAVIRIA, M. e BATLLE, D.C. Prevalence, pathogenesis and treatment of renal dysfunction associated with chronic lithium therapy. Am. J. Kidney Dis., 10:329-345, 1990. BUTKOWSKI, R.J.; KLEPPEL, M.M.; KATZ, A.; MICHAEL, A.F.; FISH, A.J. Distribution of tubulointerstitial nephritis antigen and evidence for multiple forms. Kidney Int., 40:838-846, 1991. CAMERON, J.S. Allergic interstitial nephritis: clinical features and pathogenesis. Q. J. Med., 66:97-115, 1988.
CAMERON, J.S. Immunologically mediated interstitial nephritis: primary and secondary. Adv. Nephrol., 18:207-248, 1989. CAMERON, J.S. Tubular and interstitial factors in the progression of glomerulonephritis. Pediatr. Nephrol., 6:292-303, 1992. DHARMARAJAN, T.S.; YOO, J.; RUSSELL, R.O.; BOATENG, Y.A. Acute post streptococcal interstitial nephritis in an adult and review of the literature. Int. Urol. Nephrol., 31:145-148, 1999. EDDY, A.A. Experimental insights into the tubulointerstitial disease accompanying primary glomerular lesions. J. Am. Soc. Nephrol., 5:12731287, 1994. EKNOYAN, G.; McDONALD, M.A.; APPEL, D. e TRUONG, L.D. Chronic tubulointerstitial nephritis: correlation between structural and functional findings. Kidney Int., 38:736-743, 1990. ELSEVIERS, M.M. e de BROE, M.E. Diagnostic criteria of analgesic nephropathy in patients with end-stage renal failure. Renal Fail., 15:435-437, 1993. FISHER, A.A.; Le COUTEUR, DG. Nephrotoxicity and hepatotoxicity of histamine H2 receptor antagonists. Drug Saf., 24:39-57, 2001. HAAS, M.; SPARGO, B.H.; WIT, E.J.; MEEHAN, S.M. Etiologies and outcome of acute renal insufficiency in older adults: a renal biopsy study of 259 cases. Am. J. Kidney Dis., 35:433-447, 2000. HARRIS, D.C. Tubulointerstitial renal disease. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 10:303-313, 2001. HRUSKA, K.A. Treatment of chronic tubulointerstitial disease: A new concept. Kidney Int., 61:1911-1922, 2002. JÄRUP, L.; PERSSON, B.; EDLING, C. e ELINDER, C.G. Renal function impairment in workers previously exposed to cadmium. Nephron, 64:75-81, 1993. JOSEPHSON, M.A.; CHIU, M.Y.; WOODLE, E.S.; THISTLETHWAITE, J.R.; HAAS, M. Drug-induced acute interstitial nephritis in renal allografts: histopathologic features and clinical course in six patients. Am. J. Kidney Dis., 34:540-548, 1999. KELLY, C.J. T cell regulation of autoimmune interstitial nephritis. J. Am. Soc. Nephrol., 1:140-149, 1990. KELLY, C.J. e NEILSON, E.G. Tubulointerstitial diseases. In Brenner, B.M. (ed) The Kidney, 5th edition. Philadelphia, W.B. Saunders, 1996, vol. II, pp. 1655-1679. KELLY, C.J.; ROTH, D.A. e MEYERS, C.M. Immune recognition and response to renal interstitium. Kidney Int., 39:518-530, 1991. KOSELJ, M.; KVEDER, R.; BREN, A.F.; ROTT, T. Acute renal failure in patients with drug-induced acute interstitial nephritis. Renal Fail., 15:69-72, 1993. KUNCIO, G.S.; NEILSON, E.G. e HAVERTY, T. Mechanisms of tubulointerstitial fibrosis. Kidney Int., 39:550-556, 1991. MEEUS, F.; ROSSERT, J. e DRUET, P. Cellular immunity in interstitial nephropathy. Renal Fail., 15:325-329, 1993. MICHEL, D.M.; KELLY, C.J. Acute interstitial nephritis. J. Am. Soc. Nephrol., 9:506-515, 1998. MICHIELSEN, P.; de SCHEPPER, P. Trends of analgesic nephropathy in two high-endemic regions with different legislation. J. Am. Soc. Nephrol., 12:550-556, 2001. NATH, K.A. Tubulointerstitial damage as a major determinant in the progression of renal damage. Am. J. Kidney Dis., 20:1-17, 1992. NEILSON, E.G. Pathogenesis and therapy of interstitial nephritis. Kidney Int., 35:1257-1270, 1989. ONG, A.C.M.; FINE, L.G. Tubular-derived growth factors and cytokine in the pathogenesis of tubulointerstitial fibrosis: implications in human renal disease progression. Am. J. Kidney Dis., 23:205-208, 1994. OSUKA, M.D.; LOVITA, L. e CRYSTAL, J.T. Clinical manifestations and management of acute lithium intoxication. Am. J. Med., 97:383-389, 1994. POWARS, D.R.; ELLIOTT-MILLS, D.D.; CHAN, L. et al. Chronic renal failure in sickle cell disease: risk factors, clinical course and mortality. Annals Inter. Med., 115:614-620, 1991. PORTER, G.A. Uric acid nephropathy. In Bennett, W.M. (ed) Drugs and Renal Disease. New York, Churchill-Livingstone, 1986, p. 142. ROSSERT, J. Drug-induced acute interstitial nephritis. Kidney Int., 60:804817, 2001. SANDLER, D.P.; SMITH, J.C.; WEINBERG, C.R. et al. Analgesic use and chronic renal disease. N. Engl. J. Med., 320:1238-1243, 1989.
capítulo 24
SCHWARZ, A.; KRAUSE, P.H.; KUNZENDORF, U.; KELLER, F.; DISTLER, A. The outcome of acute interstitial nephritis: risk factors for the transition from acute to chronic interstitial nephritis. Clin. Nephrol., 54:179-190, 2000. VANHERWEGHEM, J.-L.; ABRAMOWICZ, D.; TIELEMANS, C. e DEPIERREUX, M. Effects of steroids on the progression of renal failure in chronic interstitial renal fibrosis: a pilot study in chinese herbs nephropathy. Am. J. Kidney Dis., 27:209-215, 1996. WEDEEN, R.P. Environmental renal disease: lead, cadmium, and Balkan endemic nephropathy. Kidney Int., 34 (Suppl):4-8, 1991. WILSON, C.B. Nephritogenic tubulointerstitial antigens. Kidney Int., 39:501-517, 1991. WOLF, G. e NEILSON, E.G. Molecular mechanisms of tubulointerstitial hypertrophy and hyperplasia. Kidney Int., 39:401-420, 1991. ZEISBERG, M.; STRUTZ, F.; MULLER, G.A. Renal fibrosis: an update. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 10:315-320, 2001.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Nefrotoxicidade AJKD Atlas of Renal Pathology: Nefrotoxicidade do indinavir http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/atlas/36/4/ atlas36-4.htm Nefrotoxicidade da ciclosporina http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/atlas/36/1/ atlas36-1.htm The Schrier Atlas of Diseases of the Kidney Volume 1 SECTION II: ACUTE RENAL FAILURE http://cnserver0.nkf.med.ualberta.ca/cn/Schrier/ Default6.htm
489
Chapter 11 — Renal Injury Due to Environmental Toxins, Drugs, and Contrast Agents. Marc E. De Broe http://www.kidneyatlas.org/book1/adk1-11.pdf Chapter 15 — Pathophysiology of Nephrotoxic Acute Renal Failure. Rick G. Schnellmann & Katrina J. Kelly http://www.kidneyatlas.org/book1/adk1-15.pdf
Doença Túbulo-intersticial AJKD Atlas of Renal Pathology: Nefrite intersticial aguda http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/atlas/34/4/ atlas34-4.htm Oxalose http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/atlas/36/5/ atlas36-5.htm Nefropatia da anemia falciforme http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/atlas/37/5/ atlas37-5.htm Sarcoidose http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/ atlas/37/2/atlas37-2.htm
Gota http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/atlas/36/6/ atlas36-6.htm
Mieloma http://www.us.elsevierhealth.com/ajkd/atlas/32/4/ atlas32-4.htm
Capítulo
25
Infecção do Trato Urinário Reinaldo Martinelli e Heonir Rocha
ASPECTOS GERAIS BACTERIÚRIA SIGNIFICANTE: PROBLEMAS DE NOMENCLATURA EM INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO DIAGNÓSTICO Manifestações clínicas Exames complementares Estudos de imagem do aparelho urinário; outros procedimentos diagnósticos Testes de localização da infecção urinária PATOGÊNESE Agentes etiológicos das ITU Fatores de virulência
COMPLICAÇÕES DAS INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO Complicações imediatas Complicações supurativas Necrose de papilas renais Bacteremia Complicações tardias Atrofia do parênquima renal e insuficiência renal crônica Hipertensão arterial Litíase urinária Complicações na gravidez Aumento da mortalidade TRATAMENTO DAS INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO
Vias de infecção
Padrões de resposta ao tratamento
Mecanismos de defesa do trato urinário e conseqüências
Esquemas terapêuticos propostos
da infecção renal MECANISMOS DE AGRESSÃO RENAL SITUAÇÕES CLÍNICAS ESPECIAIS Infecções recorrentes do trato urinário
Dose única versus dose convencional Quimioprofilaxia prolongada Situações terapêuticas especiais Dificuldades para erradicação da bacteriúria BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
ASPECTOS GERAIS
tância deste tipo de infecção e justificam a merecida atenção que têm recebido:
Diz-se que existe infecção do trato urinário (ITU) quando, além de colonização, microrganismos ali sediados se multiplicam produzindo ou não manifestações clínicas. Este conceito engloba não apenas o resultado imediato de uma infecção, mas também as suas conseqüências, não estando incluídas sob esta designação as infecções sexualmente transmissíveis que afetam a uretra e a próstata, assim como a tuberculose do aparelho urinário. As infecções do trato urinário são de elevada prevalência na prática médica. Alguns fatos demonstram a impor-
1) cerca de 5% de pacientes ambulatoriais vistos em hospital geral apresentam infecção do trato urinário; 2) as infecções do trato urinário, atualmente, representam o tipo mais comum de infecção hospitalar; 3) aproximadamente 30% a 40% das bacteremias por bacilos Gram-negativos se originam de infecções do trato urinário; 4) infecção do trato urinário pode acelerar a destruição do rim no curso de nefropatia obstrutiva, constituindo-se numa causa significante de estadio final de doença renal;
491
capítulo 25
5) cerca de 20% dos tratamentos com antibacterianos num hospital geral são direcionados ao problema de infecção urinária; 6) as infecções do trato urinário são mais comuns na mulher grávida e podem causar aumento de abortamento, prematuridade e baixo peso; 7) infecção do trato urinário é causa inconteste de litogênese do trato urinário, com suas conseqüências. De outra parte, urolitíase é fator predisponente de grande importância para as infecções urinárias; 8) a associação de pielonefrite à necrose da papila renal no diabético é fato conhecido de há muitos anos. Nestes casos, existe agravamento do processo e a letalidade é significante; 9) em idosos, tem-se sugerido um aumento de mortalidade em grupo bacteriúrico, quando comparado a outro não-bacteriúrico, não se sabendo ainda como correlacionar estes achados. Todos estes dados, já documentados na literatura, atestam a importância nosológica deste tipo de infecção, que deve ser bem conhecida pelo médico em geral, pela sua alta prevalência, e pela morbidade e mortalidade que pode trazer. A epidemiologia das infecções urinárias é bem conhecida: ocorre em, aproximadamente, 1% dos recém-nascidos, sendo mais freqüente, nessa fase, no sexo masculino que no feminino. Após essa fase a infecção urinária é mais freqüente no sexo feminino, aumentando a incidência a cada década, com acentuações ao início da atividade sexual e durante a gestação, até alcançar 10% a 15% aos 60-70 anos de idade. Também a bacteriúria assintomática é mais freqüente no sexo feminino, embora após os 60-65 anos haja aumento da prevalência no sexo masculino. Aliás, infecção urinária e bacteriúria assintomática são infreqüentes no sexo masculino, na ausência de fatores obstrutivos ou de instrumentações do trato urinário.
que justificam um número menor, na vigência da infecção: 1) uso de antibacterianos no período da urocultura, ou até 3 a 4 dias antes da urocultura; 2) presença de bactérias com menor poder de replicação (Gram-positivos, por exemplo); 3) hiperidratação do doente e colheita de amostra de urina pouco tempo depois de uma micção (menos de uma hora da última amostra); 4) contaminação da urina com detergente utilizado na limpeza da vagina e região periuretral. Em situações de uretrite bacteriana inespecífica, uma condição diagnosticada mais comumente na mulher (correspondendo a casos da chamada “síndrome uretral”), o número de bactérias na urina se situa geralmente entre 102 e 104 por ml. Estes doentes curam com o tratamento antibacteriano adequado, dirigido para estas bactérias, geralmente enterobactérias. Fala-se, freqüentemente, em infecção do trato urinário sintomática ou assintomática, na dependência da existência de sintomas e sinais clínicos acompanhando o diagnóstico bacteriológico; aguda ou recorrente, quando se está diante de um caso sintomático inicial (aguda) ou de outro com surtos repetidos (mais de três surtos no intervalo de um ano) e inequivocamente diagnosticado de infecção (recorrente); infecção alta, quando os rins estão envolvidos (pielonefrite), e infecção baixa, quando ela se atém à bexiga; infecção complicada, quando existe fator obstrutivo (orgânico ou funcional) no trato urinário, e não complicada, quando o trato urinário se apresenta normal à avaliação clínica rotineira. É importante que se tenha em mente não apenas o significado destes termos, mas, e sobretudo, a interação que existe entre eles, o que às vezes
AGUDA RECORRENTE
BACTERIÚRIA SIGNIFICANTE: PROBLEMAS DE NOMENCLATURA EM INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO Já é clássico aceitar-se 105 microrganismos/ml de urina como indicativo de infecção do trato urinário. De fato, a existência deste número de bactérias, quando a urina não foi contaminada na sua colheita, indica multiplicação bacteriana ao nível do trato urinário. Fala-se, neste caso, de existência de bacteriúria significante. A adoção inflexível de um limite rígido no número de bactérias na urina para indicar a ausência ou não de infecção é aspecto questionável, que deve ser interpretado levando em conta uma série de possíveis variáveis em cada caso. Existem situações que diminuem o número de bactérias na urina ou
SINTOMÁTICA ASSINTOMÁTICA
COMPLICADA NÃO COMPLICADA
INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO
ALTA BAIXA
Fig. 25.1 Interação das diversas formas clínicas de infecção do trato urinário.
492
Infecção do Trato Urinário
dificulta a caracterização mais definitiva do tipo de infecção apresentada pelo doente. A Fig. 25.1 mostra a complexa interação destas diversas formas de infecção do trato urinário.
Pontos-chave: • ITU é uma das infecções mais comuns na prática, ocorrendo mais freqüentemente no sexo feminino que no masculino • ITU está associada a elevada morbidade e mortalidade em gestantes, pacientes com processos obstrutivos do trato urinário, crianças e em idosos • ITU não complicada, embora associada a considerável morbidade, na maioria das vezes não causa lesão renal
DIAGNÓSTICO O diagnóstico de infecção do trato urinário exige a conjugação de dados clínicos e laboratoriais. Existem formas clínicas oligossintomáticas ou assintomáticas que só terão o diagnóstico se suspeitadas clinicamente em função da existência de uma associação entre o que o doente apresenta e uma alta prevalência de ITU. Em recém-nascidos e crianças até 2-3 anos de idade, as manifestações clínicas atribuíveis ao episódio de infecção do trato urinário pouco ou nada têm a ver com o aparelho urinário. Além disso, sintomatologia que sugere infecção urinária pode ocorrer na dependência de inúmeros outros fatores, principalmente na mulher, tais como colpites, vaginites, uretrites, herpes símplex vaginal, entre outros. Em contrapartida, pode haver infecção urinária sem piúria associada, particularmente em crianças. O mais comum, entretanto, é o encontro de piúria (mais freqüente em mulheres) sem infecção do trato urinário. Isto indica que devemos avaliar criteriosamente sintomas e sinais apresentados pelos doentes e ter o resultado de uma urocultura quantitativa, para firmarmos o diagnóstico definitivo de infecção do trato urinário.
Manifestações Clínicas É importante destacar que no recém-nascido e na criança no primeiro ano de vida, estas infecções se manifestam por sinais e sintomas inespecíficos para o trato urinário, tais como perda de apetite, febre, vômitos e/ou diarréia, irritabilidade, insônia, perda inexplicada de peso, palidez. Às vezes, a mãe observa alteração no ritmo urinário (freqüência maior de micções ou retenção urinária) ou no aspecto da urina, que se torna mais turva, com odor “forte” ou “diferente”. Após um ano de idade, com mais freqüência,
a criança exibe sinais como dor abdominal, aumento da freqüência de micções porém com pequeno volume urinário (polaciúria) e mal-estar ao urinar, ou disúria. Nesta fase, as infecções urinárias são bem mais freqüentes em meninas. As infecções baixas do trato urinário revelam, freqüentemente, disúria, aumento da freqüência de micções, dor ou mal-estar suprapúbico, urgência miccional; às vezes, ocorre dor forte e aguda no final da micção. A urina do doente se mostra habitualmente turva, às vezes com filamentos, e pode ocorrer hematúria terminal. Sem razão clara, poucos doentes (geralmente do sexo feminino) evidenciam hematúria franca transitória, habitualmente com sintomas e sinais sugestivos de infecção urinária baixa. Nos casos de infecção aguda do trato urinário alto, o doente manifesta dor lombar uni- ou bilateral (sensação de peso, dor à pressão ou à movimentação, às vezes dor à inspiração profunda), acompanhada geralmente de febre elevada (até 39-40°C) com calafrios. Esta dor é exacerbada à punho-percussão da região lombar (sinal de Giordano). Vale assinalar que em pacientes idosos, às vezes, mesmo frente a infecções agudas graves, inexistem febre e dor lombar; por outro lado, a freqüência de bacteriúria assintomática neste grupo etário é relativamente elevada. Também, vale assinalar que muitos doentes com infecção alta do trato urinário têm, concomitante ou precedente ao surto, manifestações de disúria, aumento da freqüência das micções, dor ou sensação de peso suprapúbico; outros, entretanto, nada evidenciam referente ao trato urinário baixo. Em doentes hospitalizados, com outras doenças graves associadas, alguns deles cateterizados, pode ocorrer séria infecção do trato urinário e o diagnóstico não ser feito. É que os sintomas e sinais podem estar camuflados pela importância da doença básica, e, nestes casos, mesmo com múltiplos abscessos de rins, eles não demonstram febre elevada e, muitas vezes, não têm condições de se queixar. A suspeita deve ser feita através de valorização da proteinúria (não-nefrótica), piúria e hematúria microscópica não explicadas pela doença básica do paciente.
Pontos-chave: • Na maioria das vezes a ITU se manifesta por disúria, aumento da freqüência das micções, dor ou mal-estar suprapúbico, urgência miccional, sem febre • Ainda que, muitas vezes, as manifestações clínicas e o sedimento urinário sejam sugestivos, o diagnóstico de ITU é feito pela urocultura • E. coli e outras enterobactérias são os microrganismos que mais freqüentemente causam ITU
493
capítulo 25
Existe um grupo grande de doentes que, apesar da existência de infecção do trato urinário, não apresentam queixas, ou apenas, quando inquiridos, referem-se a leve disúria, polaciúria e/ou noctúria. Estes casos oligossintomáticos, assim como os casos assintomáticos, são mais comuns em idosos, embora situação semelhante possa ocorrer em crianças e mulheres jovens, mesmo na presença de obstrução anatômica ou funcional do trato urinário.
Exames Complementares O exame sumário de urina é muito importante para a suspeita diagnóstica de uma infecção do trato urinário. A urina deve ser colhida após cuidadosa limpeza da região perineal, e, de preferência, deve ser examinado nestes casos o jato médio urinário. A presença de piúria (⬎ 8 leucócitos por campo de grande aumento na mulher, e ⬎ 5 leucócitos nos homens) sugere inflamação em algum ponto do trato urinário. Muito mais precisa e significante é a contagem de leucócitos por ml de urina. Acima de 8.000 leucócitos por ml de urina não centrifugada considera-se anormal. Este é o método preferencial para definição de piúria. Não esquecer que, apesar dos cuidados, o fluxo vaginal de mulheres pode contaminar a urina colhida e resultar disso alguma piúria; no homem, inflamação uretral também é uma causa comum de piúria, sem bacteriúria associada. Não nos devemos esquecer de que piúria tem sido relatada em cerca de 20% de pacientes sem haver infecção urinária; de outra parte, infecção urinária tem sido comprovada em, aproximadamente, 30% de casos, sem haver piúria concomitante, sendo esta última situação mais encontradiça em crianças. O encontro de cilindros leucocitários, presentes em aproximadamente 60% dos pacientes com infecção do parênquima renal, é inespecífico, pois indica a presença de inflamação intraparenquimatosa e está presente em doenças túbulo-intersticiais e, também, glomerulares. Hematúria é freqüente, ocorrendo em cerca da metade dos casos de infecções do trato urinário, e pode ser até macroscópica. Habitualmente é apenas microscópica, e desaparece com o tratamento. A sua persistência requer investigação urológica com o objetivo de afastar outras causas de hematúria. São também utilizados testes químicos que visam diagnosticar a presença de bacteriúria significante. O mais uti-
lizado é o teste do nitrito, que se baseia na conversão do nitrato dietético em nitrito pela enzima nitrato redutase, produzida pelas enterobacteriáceas e algumas bactérias Gram-negativas. Embora de alta especificidade, o resultado negativo não exclui a presença de infecção por serem necessárias 4 a 6 horas para a bactéria converter nitrato em nitrito, na urina intravesical, além de não detectar infecções por Pseudomonas, estafilococos e enterococos. São, ainda, empregados testes que detectam a presença de piúria, como o teste para identificação da esterase leucocitária; deve ser lembrado que ausência de piúria ocorre em um número razoável de pacientes com infecção urinária e piúria pode estar relacionada a outros processos inflamatórios ou a contaminação por fluxo vaginal. Um importante exame, pela simplicidade e pelo nível da informação que dá, é a coloração pelo Gram da urina não centrifugada. Nestes casos, a visualização de bactérias corresponde a elevado número de bactérias por ml de urina (a visualização de 1 ou mais bactérias em campo de aumento 1.000 ⫻ [imersão] em amostra não centrifugada de urina ou > 5 bactérias em amostra centrifugada corresponde a número igual ou superior a 105 unidades formadoras de colônias/ml), indicando a existência de infecção (Quadro 25.1). Além disso, informa se se trata de coco ou bastonete, Gram-negativo ou positivo. Este é um exame pouco realizado na prática, que poderá ser de grande ajuda mesmo em locais que não disponham de meios para a realização de uma urocultura. Urocultura quantitativa é o exame mais importante para o diagnóstico de uma infecção urinária porque não apenas indica a ocorrência de multiplicação bacteriana no trato urinário, mas permite o isolamento do agente causal e o estudo de sua sensibilidade frente aos antibacterianos. Habitualmente considera-se positiva a presença de número igual ou superior a 100.000 bactérias ou unidades formadoras de colônias por mililitro (⬎105 ufc/ml) de urina. É lógico que um limite tão demarcado para uma condição heterogênea, e com uma multiplicidade de variáveis, pode gerar distorções, se este exame não for interpretado no contexto de cada caso. A grande maioria de doentes com infecção do trato urinário, de fato, evidencia ⬎105 ufc/ml. Entretanto, aceita-se como positiva a urocultura com ⱖ102 ufc/ml em mulheres com disúria, freqüência miccional aumentada, desconforto suprapúbico e piúria (“síndrome uretral aguda”) ou ⱖ104
Quadro 25.1 Correlação entre a visualização direta de bactérias na urina e bacteriúria quantitativa Método de Preparação
Correlação*
Referência
1. 2. 3. 4.
⬎106/ml ⬎105/ml ⬎105/ml ⬎104/ml
KUNIN, C.M. New Eng. J. Med., 266:589-590, 1961. KASS, E.H. Tran. Ass. Amer. Physicians, 69:56-64, 1956. KUNIN, C.M. New Eng. J. Med., 266:589-590, 1961. SANFORD, J.P. et al. Amer. J. Med., 20:88-93, 1956.
Urina não centrifugada Urina não centrifugada, corada (imersão) Sedimento, não corado Sedimento corado (imersão)
*Visualização de uma ou mais bactérias ao microscópio.
494
Infecção do Trato Urinário
ufc/ml em pacientes com sintomatologia sugestiva de pielonefrite (febre, calafrios, dor lombar, com ou sem sintomatologia baixa). No período pós-tratamento ou durante o uso de antibacterianos, quando o germe é um Gram-positivo (Staphylococcus sp. ou Streptococcus sp.) ou Candida sp., em urina colhida duas horas ou menos após a micção anterior, em urina com baixo pH, quando a urina do jato médio na mulher carreia sabão ou anti-séptico da limpeza prévia ou em pacientes do sexo masculino, também pode haver ⬍105 ufc/ml na presença de infecção urinária. Na urina obtida através de cateterismo vesical (uma ocorrência excepcional, reservada apenas a doentes com impossibilidade de controle voluntário da micção), a interpretação dos resultados é semelhante à urina do jato médio, embora se tenha sugerido considerar positiva a urocultura com mais de 50.000 ufc/ml em crianças sintomáticas. Nos casos de punção suprapúbica, realizada mais freqüentemente em crianças quando se tem dúvida na interpretação de urina recolhida pelas técnicas usuais, a presença de mais de 1 bactéria por mililitro de urina sugere infecção urinária. Estima-se que 5 a 10% de urinas colhidas pela técnica do jato médio estejam contaminadas, evidenciando, geralmente, flora mista, incluindo patógenos não habituais do trato urinário. Esta cifra é bem mais elevada e pode oferecer maiores dificuldades de interpretação quando se utiliza o coletor plástico em crianças (20-30%). Nestes casos existe a necessidade de mais rigor e repetição mais freqüente de exames. Nos casos de doentes assintomáticos, sugere-se que a urocultura positiva seja repetida para confirmação diagnóstica. Urocultura deve ser sempre feita, quando existam condições. Mesmo quando se deseja iniciar o tratamento imediato, empírico, frente a sintomatologia altamente incômoda para os doentes, é possível recolher-se a urina em frasco estéril e colocar-se na geladeira, até que seja processada horas depois, antes de se iniciar o antibacteriano. A permanência da urina na geladeira por até 24 horas não altera significantemente o resultado de uma urocultura. Mais recentemente, vêm-se utilizando métodos semiautomatizados e que não envolvem a cultura da urina, que utilizam a bioluminescência, turbidimetria, fotometria, microcalimetria, impedância elétrica, entre outros. Embora permitam o diagnóstico de infecção do trato urinário mais rapidamente que a urocultura, a especificidade e a sensibilidade dos diversos métodos são variáveis, sem identificar o agente causal.
Estudo de Imagens do Aparelho Urinário; Outros Procedimentos Diagnósticos Estes estudos são de grande importância na detecção de fatores predisponentes e conseqüências de uma infecção do trato urinário. A ultra-sonografia, pela simplicidade e inocuidade de
sua realização, é um método prático e útil e de uso cada vez maior. Além de permitir verificar o tamanho, a forma e o contorno dos rins, indica a existência de fatores obstrutivos ao longo do aparelho urinário, assim como a presença de abscesso perinefrético ou intra-renal. A urografia excretora continua um importante exame para nos dar a imagem mais integrada das diversas partes do trato urinário (v. Cap. 17). Não apenas mostra bem o tamanho dos rins, a existência de cicatrizes, a presença de obstruções intra- e extra-renais do fluxo de urina no sistema coletor, como é um método que permite a análise da concomitância de uma cicatriz cortical contígua a dilatação e deformidade do conjunto pielocalicial adjacente, único aspecto considerado patognomônico de pielonefrite. A tomografia computadorizada (TC) (v. Cap. 17), entretanto, tem substituído a urografia excretora na avaliação da infecção urinária. Além da opção de poder ser usada com ou sem contraste radiológico, identifica anormalidades anatômicas, gerais ou focais, processos obstrutivos, presença de abscesso perinefrético e de alterações intraabdominais e retroperitoneais. Adicionalmente, complementa e aprofunda dados suspeitos e não bem caracterizados em sua extensão pela ultra-sonografia. A cistouretrografia revela alterações obstrutivas do andar inferior e médio do trato urinário. Em crianças, é mais usada pela maior prevalência de anomalias congênitas diagnosticadas nesta fase, particularmente quando existe infecção recorrente do trato urinário. É o método ainda mais usado para a detecção e, em parte, caracterização da intensidade do refluxo vésico-ureteral. Deve ser feito em toda criança com infecção urinária recorrente. A utilização de radioisótopos (v. Cap. 20) permite visualizar mais claramente a dinâmica dos rins, a forma e a existência de cicatrizes, assim como aspectos da sua funcionalidade. Não permite o diagnóstico seguro de infecção do trato urinário, mas ajuda muito na avaliação e acompanhamento de suas conseqüências. Os radioisótopos têm sido utilizados para seguimento de casos com cicatrizes resultantes de refluxo e permitem uma idéia da função de rins com processos obstrutivos, a exemplo das estenoses de junção pielo-ureteral. Têm sido também utilizados no estudo do refluxo vésico-ureteral. Embora ainda exista alguma discussão sobre quando e qual método de imagem deva ser utilizado na avaliação do paciente com infecção do trato urinário, algumas indicações estão definidas: 1) crianças do sexo masculino com infecção urinária ou crianças do sexo feminino com infecção recorrente ou complicada; 2) acompanhamento de crianças com cicatrizes renais; 3) pacientes do sexo masculino; 4) pacientes com suspeita de obstrução ou com resposta lenta ou ausente ao tratamento adequado; 5) mulheres com pielonefrite aguda.
capítulo 25
A uretrocistoscopia é reservada para casos de infecção recorrente do trato urinário, ou naqueles com hematúria freqüente inexplicada. Também, quando se suspeita da existência de válvulas, divertículos, ulcerações ou patologias outras que possam estar simulando as manifestações das infecções urinárias. Aplica-se mais à situação de dúvida diagnóstica, quando se presume a existência de lesão predisponente, ou quando se imagina que as manifestações de infecção urinária baixa decorrem de outra patologia que não infecção do trato urinário. A biópsia renal (v. Cap. 16) não é método de utilidade para o diagnóstico de pielonefrite. A doença é focal, e a probabilidade de se retirar fragmento que não permita diagnóstico é de 30-40%. Além do mais, as alterações histológicas verificadas num fragmento de tecido renal são geralmente inespecíficas.
Pontos-chave: • No recém-nascido e nas crianças nos primeiros anos de vida, as manifestações clínicas de ITU são inespecíficas, requerendo alto índice de suspeita clínica para o seu diagnóstico • Todas as crianças do sexo masculino e as crianças do sexo feminino com ITU recorrente ou complicada devem ter o trato urinário avaliado por imagem • ITU está associada a cicatrizes renais sobretudo em crianças menores de 5 anos • O retardo no início do tratamento da ITU pode associar-se a importantes lesões do parênquima renal
Testes de Localização de uma Infecção Urinária Na prática clínica, a idéia de localização de uma infecção urinária é dada pela sintomatologia e pelo tipo de doente que se observa. A ocorrência isolada de manifestações urinárias baixas (disúria, polaciúria, urgência miccional, peso ou dor suprapúbica no final da micção), sem febre e/ ou dor lombar, sugere uma localização baixa da infecção; se ocorre febre e dor lombar agravada pela punho-percussão, pensa-se em infecção alta do trato urinário. É natural que este exercício clínico, lógico e utilizável, não seja tão preciso. E muitos outros métodos complementares têm sido utilizados (Quadro 25.2). Em geral eles se baseiam nos seguintes fatos: uma inflamação do tecido renal, mais que a inflamação da superfície da bexiga, tem maiores possibilidades de determinar um aumento de proteínas da fase reativa aguda de uma inflamação, explicando a elevação
495
Quadro 25.2 Métodos para detecção de envolvimento renal em casos de ITU 1. Cateterismo ureteral. 2. Anticorpos contra antígenos O da bactéria infectante. 3. Lavagem da bexiga e colheita posterior de amostras repetidas. 4. Determinação de anticorpos recobrindo bactérias. 5. Proteína C reativa. 6. Determinação dos níveis séricos e urinários da Il-6. 7. Determinação de enzimas urinárias. 8. Presença de beta2-microglobulina. 9. Anticorpos (IgG e IgA) contra a proteína de TammHorsfall. 10. Anticorpos contra lípide A.
de proteína C reativa; também, tem mais possibilidade de lesar células tubulares renais (desde que a inflamação tem importante componente intersticial), podendo liberar, na urina, enzimas intracelulares múltiplas (LDH, -glucuronidase, N-acetil--D-glucosaminidase, leucino aminopeptidase, para citar algumas), assim como proteínas tubulares (beta2-microglobulina). De outra parte, oferece um ambiente para que bactérias presentes no processo inflamatório se recubram com anticorpos específicos, localmente fabricados ao nível do parênquima renal. Deste modo, bactérias provenientes do tecido renal seriam eliminadas na urina recobertas de anticorpos aderidos à sua superfície, em contraposição às bactérias provenientes da bexiga, que sairiam sem estarem recobertas de imunoglobulinas. Deste modo, um teste de imunofluorescência indireta poderia diferençar bactérias recobertas ou não de anticorpos na urina, servindo para diferençar uma infecção alta (imunofluorescência positiva) ou uma infecção baixa (imunofluorescência negativa). Este método ganhou muita popularidade pela relativa simplicidade de realização. Não oferece bons resultados em crianças; não se aplica à fase inicial de uma infecção urinária aguda; casos de prostatite, e também ocasionalmente de cistite, podem resultar em bactérias recobertas de anticorpos. Tudo isso serviu para diminuir a adoção deste método, de modo mais amplo, na prática médica. A inflamação tissular renal determina resposta de anticorpos mais significante contra as bactérias que infectam o doente, demonstrável através de técnicas sorológicas (hemaglutinação); além disso, anticorpos contra a proteína de Tamm-Horsfall indicariam a ocorrência de inflamação intersticial de rins, com penetração desta proteína na corrente sanguínea. Mais recentemente se tem proposto a determinação dos níveis séricos e urinários da interleucina-6 com o marcador não apenas de infecção aguda do parênquima renal, mas, também, como índice de gravidade da infecção. O estudo convencional de imagens do trato urinário (urografia excretora) já foi abandonado como método de
496
Infecção do Trato Urinário
localização da infecção, sendo substituído pela cintilografia com gálio e, preferentemente, por DMSA (v. Cap. 20). O percentual de falso-negativo e falso-positivo, entretanto, tem limitado o uso desses testes. Todos estes testes para localizar infecção do trato urinário têm sido utilizados por vários grupos de estudiosos, mas oferecem considerável número de resultados falsopositivos quando comparados com métodos mais diretos de localização. O cateterismo ureteral diferencial, com retirada de urina de cada um dos ureteres e a lavagem da bexiga, com colheitas repetidas de amostras em períodos subseqüentes, são os métodos considerados mais precisos. A presença de número crescente de bactérias na urina proveniente de um dos ureteres, ou na urina da bexiga depois da lavagem esterilizadora inicial, indicaria uma infecção alta, e, no caso de cateterismo diferencial de ureteres, qual o rim infectado naquele momento. Não esqueçamos que estes são métodos cruentos e, o mais das vezes, desnecessários para a condução de um caso clínico. Ainda são métodos para serem utilizados em situações especiais.
PATOGÊNESE Para o entendimento pleno do problema da infecção do trato urinário, é essencial que se conheçam a origem e os mecanismos de agressão dos agentes etiológicos, o modo como eles invadem o trato urinário do hospedeiro e, sobretudo, como o hospedeiro reage à penetração e à manutenção destes agentes infectantes. Somente assim poderemos entender melhor aspectos profiláticos, a história natural do processo, as recorrências e as perspectivas terapêuticas.
Agentes Etiológicos das ITU A E. coli e outras enterobactérias (Quadro 25.3) continuam sendo os agentes infectantes mais comuns do trato urinário. Em pacientes ambulatoriais com infecções agudas, mais de 80% das vezes E. coli é a bactéria isolada, sendo menos freqüente em pacientes hospitalizados. As cepas de E. coli que produzem infecção urinária provêm das fezes. A serotipagem 0 destas bactérias permitiu
Quadro 25.3 Bactérias mais freqüentemente isoladas em pacientes com infecção do trato urinário.* E. coli Klebsiella sp. Staphylococcus sp. Proteus sp. Enterobacter sp. *Laboratório de Bacteriologia/Nefrologia do Hospital Universitário Prof. Edgard Santos — UFBA.
evidenciar que elas colonizam o intestino inicialmente e, depois, a região perineal e o trato urinário dos indivíduos que se infectam. As cepas de E. coli mais freqüentes em infecções urinárias, e também encontradas nas fezes destes doentes, pertencem aos serotipos: 01, 04, 06, 08 e 075.
Fatores de Virulência É possível que a E. coli patogênica para o trato urinário se origine de, apenas, poucos clones, sendo portanto distinta das cepas encontradas comumente nas fezes. São apontados alguns marcadores de uropatogenicidade que caracterizam as cepas de E. coli: a) resistência ao soro sanguíneo; b) produção de hemolisinas; c) existência de determinados antígenos O e K; d) expressão de adesinas ou fímbrias tipo I (manose-sensível) e tipo II ou fímbria P (manose-resistentes); e) produção de aerobactin. Existem sugestões indicando que a presença de determinados antígenos O e K habilitam a E. coli a produzir mais freqüentemente pielonefrite. É possível que a produção de hemolisinas e a de certas fímbrias seja carreada no cromossomo; enquanto isso, resistência ao soro e produção de antígeno K1 são mediadas por plasmídeos. Cepas de E. coli sem estas características de virulência são as que geralmente provocam cistite e bacteriúria assintomática. Todas as cepas que infectam o trato urinário provavelmente possuem a fímbria tipo I, que permite colonização do períneo e bexiga. A fímbria tipo II, entretanto, está mais relacionada a infecção do parênquima renal e se constitui no mais importante fator de virulência bacteriana. A maioria das bactérias causadoras de infecção do trato urinário tem a capacidade de aderir a células do epitélio urinário ou à uromucóide. Este fenômeno está associado à existência de fímbrias, que são filamentos protéicos observados na superfície de bactérias Gram-negativas. Os receptores para estas fímbrias são glicoproteínas ou glicoesfingolípides. As glicoproteínas, que servem de receptáculos para fímbrias tipo I, são encontradas na proteína de Tamm-Horsfall, ou nos glucosaminoglicanos que recobrem a superfície da bexiga; os glicoesfingolípides servem de receptores para as fímbrias tipo II ou P. Como os glicosaminoglicanos recobrem as células da bexiga e se renovam continuamente, e a proteína de Tamm-Horsfall se encontra livre na urina da bexiga, a fixação de bactérias a estes elementos que são excretados na urina serve como mecanismo de defesa contra a persistência e a multiplicação de bactérias no trato urinário. De outra parte, entende-se que a destruição desta camada protetora de glicoproteínas pode facilitar a colonização e a multiplicação de bactérias na bexiga, favorecendo penetração no epitélio e conseqüente reação inflamatória.
capítulo 25
Também, tem-se mostrado que muitas espécies bacterianas sintetizam uma cápsula de polissacáride ou glicoprotéica (glicocálice) que pode favorecer o crescimento das bactérias sob a forma de microcolônias e de fixá-las à mucosa vesical. Este mecanismo de fixação ao trato urinário não está esclarecido plenamente. Desde que 95% das hemácias contêm o antígeno P, a aglutinação de eritrócitos em presença deste antígeno tem permitido afiançar a sua ocorrência. Estas fímbrias P podem ser encontradas em bactérias outras que não apenas E. coli, como é o caso do Proteus mirabilis; apenas o receptor para esta bactéria na célula é diferente daquele da E. coli. Outras bactérias que também aderem às células superficiais do trato urinário têm outros mecanismos de aderência ainda não plenamente conhecidos. Este é o caso da Klebsiella sp. (por fímbrias tipo I), Pseudomonas sp. e germes Gram-positivos. Parece que a combinação de genes marcando as células para a formação de fímbrias P, produção de hemolisinas e soro-resistência seja de fundamental importância para o exercício da patogenicidade. Interessante é que a maioria das E. coli de casos diagnosticados como pielonefrite aguda apresenta fímbrias P. Em crianças, por exemplo, a expressão de fímbrias P ocorre em 81 a 94% de cepas de E. coli de casos de pielonefrite aguda, enquanto que a freqüência é de apenas 19% nos casos de cistite e de 14% nos casos de bacteriúria assintomática. É importante assinalar que a quase totalidade das mulheres evidencia receptores às fímbrias P nas células ureterais (99%), e apesar disso poucas (cerca de 15-20%) evidenciam infecção do trato urinário em suas vidas. Dentre os motivos para este fato destacam-se: 1) colonização fecal é menos freqüente nos casos sem infecções urinárias; 2) existe maior número de receptores nas células uroteliais de casos que se infectam. Isso tem sido demonstrado através de várias técnicas. Vale destacar que E. coli com fímbrias P produz pielonefrite com freqüência, quando introduzida na bexiga de coelhos, ratos e macacos. Provavelmente contribui para isso o poder de multiplicação da bactéria colonizada, e, talvez, o efeito do lipopolissacáride bacteriano, bloqueando a mobilidade ureteral e propiciando a infecção.
Vias de Infecção A via mais comum de infecção do trato urinário é a ascendente. As bactérias da região periuretral adentram a uretra e colonizam as células vesicais. Daí, mesmo sem a existência de refluxo vésico-uretral, elas podem ascender pelo ureter, provavelmente na porção mais externa do fluxo de urina que desce pelos ureteres, onde ocorre turbulência, atingir os rins e determinar pielonefrite em alguns casos. A penetração de bactérias até a bexiga através da
497
uretra é fenômeno mais comum do que se imaginava, como se pode demonstrar após a utilização mais ampla da punção suprapúbica. A existência de fímbrias P pode propiciar a colonização da bactéria invasora e suas conseqüências; a inexistência destas adesinas resulta na eliminação mais fácil destas bactérias. A passagem de cateter pela uretra pode levar bactérias que colonizam a porção distal da uretra até a bexiga. É por isso que, mesmo após um único cateterismo, infecção urinária ocorre em 1-2%. O perigo de infecção cresce, entretanto, na dependência do tipo de doentes (hospitalizados, hipertensos, pacientes com uropatia obstrutiva) e da natureza do procedimento. Se o cateter é de permanência, mesmo com todos os rigores de assepsia, infecção urinária ocorre na maioria dos doentes após 7 a 10 dias. Quando o sistema de drenagem é aberto, infecção ocorre em mais de 90% após o 4.º ou 5.º dia. Havendo cateterismo de permanência, a bactéria pode também atingir a bexiga através da camada de exsudato em torno do cateter, ou ascender pelo lúmen do cateter, quando existe manipulação indevida do coletor de urina. Mesmo nos casos de drenagem fechada, e com todos os rigores de assepsia como se procede atualmente, infecção urinária surge após 8 a 10 dias e aumenta progressivamente, mesmo em doentes usando antimicrobianos. São inúmeras as demonstrações clínicas e experimentais da importância da via ascendente. Este fenômeno explica a grande diferença de suscetibilidade à infecção urinária entre meninas (com conduto uretral curto, próximo ao reto, mais colonizado por bactérias) e meninos (em que a situação é bem diversa e de maior proteção). A via hematogênica explica alguns casos de infecção do trato urinário. É esta a situação de abscessos múltiplos de rins no curso de uma septicemia estafilocócica. Também, infecção de rim pode ser ocasionalmente secundária a bacteremia por germes Gram-negativos de origem variada. Os rins se tornam mais suscetíveis a infecção quando existe obstrução extra- ou intra-renal do fluxo de urina. Este fato já foi muito bem documentado experimental e clinicamente, embora ainda não se saiba ao certo o motivo fundamental de aumento da suscetibilidade do rim obstruído. Nestes casos, infecção é importante fator de destruição do parênquima renal. Algumas bactérias podem, experimentalmente, infectar rins de animais após inoculação venosa mesmo sem obstrução. Este é o caso do St. faecalis, algumas cepas de Ps. aeruginosa, C. renale, e fungos do gênero Candida, além do Staphylococcus aureus. A via linfática é a de menos clara participação. Tudo indica que o refluxo pielolinfático é importante na disseminação intra-renal da infecção. É possível que a distribuição parenquimatosa renal da infecção tenha a ver com a via linfática. Entretanto, a condução através de linfáticos de bactérias do intestino ou do trato urinário baixo para os rins é assunto controverso, porque não suficientemente comprovado.
498
Infecção do Trato Urinário
Mecanismos de Defesa do Trato Urinário e Conseqüências da Infecção Renal A urina é um meio de cultura razoável para a maioria dos patógenos do trato urinário. A sua composição química permite a multiplicação bacteriana, e dificulta a ação de mecanismos humorais e celulares de defesa. Sua hiperosmolaridade inibe a fagocitose e a reatividade do complemento. Entretanto, a urina pode ser inibitória ou bactericida, devido aos seguintes fatores: a) elevada osmolalidade; b) pH baixo; c) elevada concentração de uréia; d) alta concentração de ácidos orgânicos; e) presença de secreção prostática no homem, que também pode ajudar o efeito antibacteriano da urina; f) finalmente, a proteína de Tamm-Horsfall, secretada pelas células tubulares e presente na urina, pode agir como elemento de defesa. Ela é rica em resíduos de manose, permitindo a ligação de fímbrias tipo I de E. coli, e se elimina na urina com a bactéria a ela fixada. A região periuretral parece ser de importância. As células desta região, em crianças com infecção recorrente do trato urinário, evidenciam sua capacidade maior de aderência a bactérias infectantes do trato urinário. O mesmo parece ocorrer em mulheres com infecção recorrente do trato urinário. Mais recentemente sugeriu-se a redução nos títulos de IgA, na secreção que recobre as células do intróito vaginal, como uma das causas de maior facilidade de colonização bacteriana. Estes fatos são ainda controversos na literatura. Finalmente, o baixo pH do líquido vaginal dificulta a fixação de uropatógenos desta região, mas é curioso assinalar que o pH vaginal é mais elevado nos casos de infecção recorrente do trato urinário. Na menopausa, a baixa de estradiol resulta em alterações da mucosa vaginal e perineal, decréscimo de L. acidophilus responsável pela diminuição do pH da área do vestíbulo vaginal e mais fácil colonização por Gram-negativos entéricos. Este achado se acompanha de infecção recorrente do trato urinário, que pode reverter com o uso tópico do hormônio e retorno da flora normal. Depois da colonização periuretral, as bactérias devem penetrar a bexiga para que haja infecção, mas a bexiga apresenta vários mecanismos que dificultam o desenvolvimento de uma infecção: 1) a micção é o mais eficaz mecanismo de defesa. O aumento do volume urinário e da diurese é capaz de reduzir grandemente, embora não completamente, o número de bactérias na bexiga. Este importante mecanismo de defesa é perdido em pacientes com distúrbios da urodinâmica;
2) a camada de glicosaminoglicanos, protegendo a superfície da bexiga e dificultando a fixação das bactérias às células uroteliais; como é renovável, as bactérias que a ela se fixam são também eliminadas; 3) os polimorfonucleares, que acorrem ao local da invasão do epitélio vesical; 4) a existência de agente ou fator antibacteriano produzido, talvez, pelas células do urotélio. Depois de atingida a bexiga, as bactérias ascendem aos rins, pela parte de turbilhão no fluxo ureteral da urina (porção mais externa). Lá, dependendo do inóculo e de condições propícias, pode instalar-se uma infecção. No rim, a medula é muito mais suscetível à infecção do que o córtex. A maior suscetibilidade da zona medular se relaciona à elevada concentração de amônia (que inativa o complemento), à elevada osmolaridade (que altera a quimiotaxia de polimorfonucleares), ao baixo pH e ao baixo fluxo sanguíneo (que alteram a função e o número de leucócitos na região). Nesta zona, as bactérias encontram mais facilidade para se multiplicar e iniciar o processo infeccioso. As cepas de E. coli que atingem os rins evidenciam várias características de virulência. Receptores para as fímbrias P se encontram distribuídos em todo o rim. As E. coli que infectam o tecido renal perdem as fímbrias tipo I, que facilitam a fagocitose, porque os leucócitos polimorfonucleares dispõem de receptores de manose. Os hospedeiros que são grupo P1 fenotípico negativo são menos suscetíveis porque suas células carecem do glicoesfin-golípide, que é receptor de fímbrias P1.
MECANISMOS DE AGRESSÃO RENAL Estudos realizados em macacos permitiram melhor entendimento das conseqüências renais do processo infeccioso. No caso da E. coli, a presença de lípide A bacteriano é um forte estímulo à quimiotaxia, com a atração de leucócitos polimorfonucleares e o resultante processo inflamatório e suas conseqüências previsíveis: liberação de enzimas proteolíticas, favorecendo a morte celular, e liberação de citocinas (IL 1 e 2, TNF). O edema local que se estabelece resulta em anoxia tissular, com aumento transitório de angiotensina II na veia renal, o que aumenta a isquemia e estimula os fatores relacionados à fibrose. A formação local de radicais livres ocorre e o efeito de prostaglandinas vasodilatadoras favorece a recirculação na área atingida, removendo e redistribuindo os produtos localmente formados. A área atingida, dependendo do grau da lesão e de sua extensão, vai sofrer deposição de fibronectina e de colágeno tipo III e pequenas quantidades de colágeno I e IV, com tendência a se transformar em área fibrótica, resultando em cicatriz maior ou menor.
499
capítulo 25
SITUAÇÕES CLÍNICAS ESPECIAIS Nos jovens, a infecção do trato urinário é 20 a 30 vezes mais freqüente na mulher que no homem. No idoso (paciente acima de 65 anos), este fato se modifica de modo drástico. Mulheres evidenciam bacteriúria em 20%, enquanto homens a apresentam em 10% de casos. As causas deste fato e da alta prevalência de infecção do trato urinário nesta faixa etária são: a) grande freqüência de uropatia obstrutiva, pelo aumento da próstata; b) perda da atividade bactericida do líquido prostático; c) dificuldade de esvaziamento da bexiga; d) aumento de contaminação com fezes da região periuretral, devido à incontinência fecal. Também nesta idade existe maior utilização de instrumentação urinária, em ambos os sexos. A existência de maior aderência de uropatógenos às células uroepiteliais nestes pacientes ainda é questionável.
Infecções Recorrentes do Trato Urinário É um dos problemas relativamente freqüentes e de difícil condução. Alguns doentes apresentam surtos repetidos de infecção do trato urinário, mais de 3 a 4 por ano. Estes surtos, geralmente sintomáticos, representam reinfecção na maioria dos casos (70 a 80% das vezes) e se concentram em determinados períodos. Existem, em alguns casos, motivos para esta suscetibilidade aumentada à infecção do trato urinário, sobretudo em mulheres que não respondem ao tratamento antimicrobiano adequado ou que experimentam recorrência da infecção imediatamente após o tratamento apropriado, ou que apresentam sintomas sugestivos de obstrução do trato urinário, conforme se pode ver no Quadro 25.4. Entretanto, no mínimo 50% de mulheres com infecção recorrente do trato urinário não evidenciam qualquer fator predisponente, clinicamente perceptível. Em muitas delas temos encontrado correlação de infecção do trato urinário e atividade sexual. À semelhança do que está relatado na literatura, as infecções nestes casos são mais freqüentes após atos sexuais demorados e/ou freqüentes, depois de período prolongado de abstinência. As razões destes surtos recorrentes têm sido buscadas em provável defeito de resistências do hospedeiro, ao nível da área de colonização das bactérias na região periuretral, e também, talvez, maior facilidade de aderência em função de maior densidade de receptores, além de fatores obstrutivos intra- e extra-renais. É recomendável que todo paciente com infecção recor-
Quadro 25.4 Algumas alterações radiológicas observadas em mulheres com ITU recorrentes 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.
Bifidez pieloureteral. Ureterocele. Ptose renal (acentuada). Divertículo de bexiga. Cistocele (pronunciada). Esvaziamento incompleto da bexiga. Cisto pielogênico. Estenose pieloureteral. Nefropatia (com ou sem urolitíase). Urolitíase.
rente do trato urinário seja submetido a exploração urológica, que compreende pelo menos ultra-sonografia do trato urinário e, em alguns casos, estudos mais aprofundados, incluindo urodinâmica. Somente a correção de um fator predisponente, quando viável, pode interromper o ciclo de infecções.
Pontos-chave: • ITU recorrente é relativamente freqüente, sobretudo em mulheres jovens • ITU recorrente pode ser causada pela persistência do mesmo agente infectante ou por reinfecção por outro microrganismo • No mínimo 50% das mulheres com ITU recorrente não evidenciam qualquer fator predisponente clinicamente perceptível • É recomendável que toda paciente com ITU recorrente seja submetida a exploração propedêutica do TU
COMPLICAÇÕES DAS INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO A importância clínica das infecções do trato urinário não decorre apenas de sua elevada prevalência mas, e sobretudo, das conseqüências e complicações que podem produzir. De modo geral, apresentam-se como processos infecciosos relativamente benignos e de curso clínico rápido, se se assestam em trato urinário normal. Esta evolução contrasta com a gravidade do processo quando a infecção ocorre em trato urinário obstruído. Nesta situação, em bom número de casos, podem advir ou resultar de complicações que devem ser bem conhecidas, para o manejo adequado dos doentes.
500
Infecção do Trato Urinário
Complicações Imediatas COMPLICAÇÕES SUPURATIVAS Em casos de pielonefrite aguda, como resultado do processo supurativo que se instala nos rins, formam-se abscessos tanto na região medular como na cortical. Abscessos corticais podem coalescer e formar um carbúnculo renal (principalmente em casos de infecções estafilocócicas), ou perfurar a cápsula renal drenando para a região perirrenal. Disso resulta um abscesso perirrenal. Nestes casos, habitualmente o doente evidencia febre elevada, dor lombar persistente e intensa (acentuada pela punho-percussão) do lado do abscesso, e a intensidade e localização da sintomatologia dependem do grau e do local para onde se distribui a supuração. O comum é o abscesso perinefrético desenvolver-se em rim obstruído que se infectou. As enterobactérias continuam sendo as mais comumente isoladas destes abscessos, se bem que cresce muito a importância, nestes casos, do Staphylococcus aureus. O tratamento nestas circunstâncias inclui, além do uso bem conduzido de antibacterianos adequados, o emprego de conduta cirúrgica, consistindo em ampla drenagem da coleção purulenta, nos casos que não respondem ao tratamento clínico. Embora nos processos pielonefríticos os dois rins freqüentemente estejam envolvidos, a intensidade do processo em cada rim é variável; às vezes, na vigência de obstrução intra- ou extra-renal do fluxo de urina, a infecção é unilateral. Geralmente estes abscessos são unilaterais. Em casos de infecção de rim hidronefrótico, pode advir uma pionefrose, complicação das mais temíveis, porque passível de provocar destruição grave e irreversível do rim em poucos dias ou semanas. E na abordagem cirúrgica destes casos, a nefrectomia é freqüentemente a única atitude terapêutica racional e efetiva. Embora incomum, alguns pacientes desenvolvem orquiepididimite no curso de uma infecção do trato urinário ou subseqüentemente a ela. Alguns destes doentes são jovens, com história compatível com processo de prostatite, não se sabendo se a infecção urinária foi uma conseqüência da infecção do tecido prostático. Curiosa tem sido a observação experimental de que próstata infectada em ratos pode determinar infecção urinária, com acometimento dos rins; localização e multiplicação de E. coli na próstata também tem sido observada em ratos subseqüente a pielonefrite experimental, particularmente se a próstata foi previamente lesada. A invasão do epidídimo e dos testículos pode ser conseqüência da extensão do processo do tecido epididimário, provavelmente por via canalicular, com envolvimento do testículo correspondente. O processo é habitualmente unilateral e se manifesta com forte dor ao nível da região escrotal, dor que se exacerba acentuadamente à palpação, com aumento de volume do epidídimo e do testículo, febre elevada e calafrios. O tratamento envolve
medidas gerais como o uso de analgésicos, repouso no leito, suspensório para maior proteção ao testículo envolvido e antibacterianos. Em geral, pela gravidade do caso, até que se conheça a flora infectante, usam-se aminoglicosídeos isolados ou associados a antibióticos beta-lactâmicos; outros preferem o uso de quinolônicos fluorados. O processo responde bem, não sendo necessário, habitualmente, drenagem complementar de algum processo purulento formado.
NECROSE DE PAPILAS RENAIS Pode ser uma complicação de pielonefrite em rim obstruído ou em rins de diabéticos, habitualmente já com vasculopatia evidente. Tem sido também observada em pacientes com anemia falciforme e em cirróticos. O tecido papilar de ambos os rins, habitualmente várias papilas do rim multipapilar do homem, vai sendo atingido, podendo resultar em desgarramento de fragmentos volumosos que podem obstruir os ureteres de um ou de ambos os lados, provocando uropatia obstrutiva de grau variável. A papila é a área menos irrigada dos rins e com baixa pressão parcial de oxigênio; os exuberantes plexos vasculares da área cortical começam a rarear na zona córticomedular, e apenas os vasa-recta são vistos descer na área interna da medula. Processos inflamatórios, com edema na zona da medula, podem resultar em obstrução vascular na área da papila, com necrose e desgarramento. No animal submetido a pielonefrite experimental não é incomum se encontrar necrose de tecido papilar. No rato, por exemplo, com infecção urinária por E. coli associada a corpo estranho na bexiga, a necrose papilar não é rara. Talvez seja esta uma das causas da hidronefrose que se desenvolve em animais com pielonefrite aguda sem obstrução provocada no trato urinário; é verdade que a urina purulenta, aliada a alterações da motilidade da pelve e ureteres, sejam, também, importantes fatores obstrutivos nestes casos. Esta é uma complicação grave das infecções urinárias. Existe, habitualmente, bacteremia nestes casos, e como o processo de necrose de papilas é, com freqüência, bilateral e acompanhado por obstrução, é comum o surgimento de uremia. O tratamento é feito preferencialmente com aminoglicosídeos associados a antibióticos beta-lactâmicos, em doses a serem ajustadas ao caso, se existe insuficiência renal. Em alguns pacientes a eliminação de tecido papilar necrótico resulta em obstrução urinária, com dor tipo cólica renal. Na vigência de diabetes mellitus, não raro se associa processo de acidemia que deve ser convenientemente manejado; no mínimo, existe necessidade de reajuste do regime hipoglicemiante.
BACTEREMIA O trato urinário infectado continua sendo uma das fontes mais importantes de bacteremia por germes Gram-
capítulo 25
negativos. Este fato tem sido observado e freqüentemente relatado na literatura. Como as infecções urinárias são as mais comuns infecções hospitalares de nossos dias, podese imaginar a importância deste tipo de complicações, não apenas como fonte de morbidade, mas de mortalidade. Bacteremia tem sido observada no curso de invasão do tecido renal, em doentes com cateter de permanência e em doentes infectados (ou não) submetidos a manipulação do trato urinário e, mesmo, a litotripsia. Principalmente em doentes idosos e em imunodeprimidos, bacteremia pode acompanhar-se de choque e, algumas vezes, de morte.
Pontos-chave: • Pielonefrite aguda se manifesta por febre, calafrios, dor lombar ou em flanco, disúria e aumento da freqüência urinária • No idoso, às vezes, falta febre e/ou dor lombar • Abscessos, renal e perirrenal, e mesmo necrose de papilas renais são complicações relacionadas à pielonefrite, sobretudo quando existe processo obstrutivo • Pielonefrite é uma importante causa de sepse • Pielonefrite é importante causa de cicatrizes renais em crianças
Complicações Tardias ATROFIA DO PARÊNQUIMA RENAL E INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA As lesões da pielonefrite destroem áreas do tecido renal e se formam cicatrizes. Em processos repetidos e freqüentes pode haver destruição considerável do tecido renal. Quando existe obstrução associada, o grau de infecção é bem maior, e ao lado da destruição resultante do aumento de pressão se associa a destruição tecidual pelo processo infeccioso. Como conseqüência, a estrutura anatômica e funcional de um ou de ambos os rins pode ser gravemente afetada ou destruída. Cumpre assinalar, entretanto, que é rara a ocorrência de uremia nestes casos sem haver obstrução urinária bilateral. Embora séries clínicas sobre as causas de insuficiência renal crônica se refiram à pielonefrite como uma causa importante, o diagnóstico baseou-se em dados histológicos, explicáveis pela presença de doenças que acometem a região túbulo-intersticial e sem documentação de infecção como causa primária da doença renal; em alguns desses casos a infecção parece ter tido um papel secundário. Os casos da assim chamada “pielonefrite atrófica bilateral”, sem bacteriúria, provavelmente representam, na maioria das vezes, a conseqüência
501
de refluxo vésico-ureteral ou, talvez, uma forma de agressão imunológica dos rins (nefrite intersticial imunológica), com destruição progressiva do parênquima renal. Tem sido muito difícil, no animal de experiência, induzir uremia crônica progressiva utilizando modelos diferentes de pielonefrite, mesmo introduzindo graus diferentes de uropatia obstrutiva. Interessante tem sido a observação experimental de que rins pielonefríticos perdem a capacidade de desenvolver hipertrofia compensadora quando se faz a nefrectomia contralateral, independente do grau de lesão do parênquima ou da existência de bactérias se multiplicando no tecido renal. A atrofia do parênquima renal na pielonefrite resulta não apenas do processo inflamatório intersticial, mas pode ser complicada pela obstrução vascular pelo processo infeccioso.
HIPERTENSÃO ARTERIAL Têm sido muito variáveis os índices de correlação entre bacteriúria e hipertensão arterial. Para muitos autores, hipertensos têm maior prevalência de bacteriúria do que controles não hipertensos. Este fato fica mais notório quando se seleciona o grupo hipertenso que à urografia excretora evidencia alterações passíveis de resultarem de pielonefrite. A correlação de bacteriúria e hipertensão arterial, entretanto, pode também refletir a maior suscetibilidade do hipertenso ao desenvolvimento de infecção do trato urinário, o que tem sido também destacado na literatura. Quanto à infecção urinária ser a causa da hipertensão arterial (v. Cap. 43), estudos de acompanhamento de grupos de pacientes a longo prazo têm demonstrado que o desenvolvimento de hipertensão arterial, nos casos de infecção urinária, é semelhante ao da população geral. Experimentalmente também tem sido difícil demonstrar que pielonefrite pode determinar hipertensão arterial. A variedade de raças de animais utilizados, o modo de indução da infecção renal, a duração do acompanhamento e a gravidade da infecção têm resultado em respostas muito contraditórias. Utilizando-se modelo de pielonefrite, através de inoculação direta de bactérias na medula renal de ambos os rins de ratos, ou de rins únicos em ratos Sprague-Dawley, demonstrou-se o desenvolvimento de hipertensão arterial até certo ponto relacionado ao grau de agressão e destruição do parênquima renal, em animais acompanhados por 3, 6 e 9 meses.
LITÍASE URINÁRIA De há muitos anos se conhecem as múltiplas facetas da interação entre infecção urinária e urolitíase (v. Cap. 33): 1) uma pode favorecer o surgimento da outra; 2) uma pode dificultar o controle da outra; 3) uma pode agravar as manifestações clínicas da outra. A infecção favorece o surgimento de litíase através de uma multiplicidade de mecanismos:
502
Infecção do Trato Urinário
a) degradação da uréia pelo agente bacteriano e elevação do pH urinário, facilitando agregação cristalina; b) lesão do parênquima renal, com alteração da mucosa pélvica, favorecendo o acúmulo de agregados cristalinos; c) a inflamação, com destruição de tecido renal, resulta em detritos celulares variegados, podendo formar núcleos de calcificação; d) diminuição de fatores estabilizadores na urina, entre outros. De qualquer modo, no animal de experiência, tem sido possível documentar a facilidade de formação de cálculos através de indução de diferentes modelos experimentais. Proteus sp., entretanto, mostra-se a raça bacteriana mais capaz de litogênese. Digno de nota, entretanto, tem sido a demonstração de que bactérias “infectam” cálculos e podem aí sobreviver, indenes aos efeitos de antimicrobianos, e daí saírem e reinfectarem o trato urinário. Este fato é significante porque indica, em casos de reinfecção em pacientes litiásicos, a necessidade de retirada do cálculo urinário como medida indispensável para aumentar as oportunidades de esterilização do trato urinário. Também reforça a necessidade de se fazer uso de antimicrobianos adequados no curso da litotripsia, pelo perigo da liberação de bactérias no trato urinário obstruído, durante o procedimento.
COMPLICAÇÕES NA GRAVIDEZ Sabe-se que a grávida é mais suscetível a desenvolver bacteriúria. É verdade, entretanto, que de 1 a 2% das bacteriúrias detectadas na gravidez provavelmente já estavam presentes antes da gestação, como resultado de infecção urinária adquirida na infância e não totalmente erradicada. Ocorre mais freqüentemente no segundo e no terceiro trimestre. A bacteriúria da gravidez deve ser erradicada ou supressa, sob pena de complicações. Pielonefrite aguda, por exemplo, desenvolve-se em 20 a 30% de grávidas bacteriúricas, no período da gestação ou no pós-parto imediato. Além disso, já se tem como aceita na literatura uma correlação entre bacteriúria não controlada e baixo peso ao nascer ou prematuridade. Este fato é muito importante porque prematuridade, per se, resulta em maior mortalidade perinatal e problemas de desenvolvimento do concepto. Alguns estudos sugerem, além disso, que bacteriúria pode facilitar a ocorrência da toxemia da gravidez, assim como acentuar a anemia observada no período da gestação. Mais grave, entretanto, embora não estabelecido, tem sido a sugestão de deficiência de desenvolvimento intelectual de recém-nascidos de mães bacteriúricas, quando comparados a grupos controle apropriados em acompanhamento a longo prazo.
AUMENTO DA MORTALIDADE Mais recentemente, tem-se sugerido que pacientes idosos com bacteriúria apresentam maior índice de mortali-
dade (morte súbita, inexplicada) do que um grupo comparável de idosos não-bacteriúricos. As razões deste achado, ainda não suficientemente documentado na literatura, não estão aparentes. Mostrou-se que bacteriúria no idoso pode ser um marcador de saúde mais comprometida.
Pontos-chave: • ITU é a infecção bacteriana mais comum na gravidez e pode manifestar-se como bacteriúria assintomática, ITU baixa ou pielonefrite • Os agentes infectantes são aqueles mesmos que causam ITU não complicada • ITU em gestação se correlaciona com abortamento, prematuridade e baixo peso; 20 a 30% das gestantes com bacteriúria desenvolvem pielonefrite • O tratamento previne as complicações relacionadas a ITU na gestação
TRATAMENTO DAS INFECÇÕES DO TRATO URINÁRIO O tratamento bem-sucedido das infecções do trato urinário depende essencialmente de: 1) diagnóstico clínico-bacteriológico correto; 2) escolha de agente antibacteriano adequado, que deve ser usado de modo próprio; 3) acompanhamento do doente para verificar a ocorrência de recidiva da infecção. Nestes casos, investigar a existência de fator predisponente, para a medida terapêutica adequada. Como as manifestações clínicas de infecções do trato urinário são múltiplas, ocorrendo em situações muito variadas, a atitude terapêutica também pode e deve ser variada, adequando-se à situação clínica.
Padrões de Resposta ao Tratamento É importante que se conheçam os padrões de resposta terapêutica, para melhor planejar a atitude a ser adotada. Existem quatro respostas possíveis à terapêutica: a. Cura: quando a urocultura se torna negativa e continua negativa pelo período de até seis meses (período convencional); b. Persistência: quando a mesma bactéria existente antes da terapêutica continua na urina, em número elevado ou em pequeno número por ml. Este fenômeno indica ineficácia do antibiótico usado, ou por causa de resistência do agente causal, ou pela concentração urinária ina-
capítulo 25
dequada do produto. A persistência às vezes reflete um defeito orgânico que torna a bactéria do trato urinário inatingível (existência de cálculo, prostatite, entre outros). c. Recaída: quando o mesmo organismo reaparece na urina do doente, depois de ter sido erradicado por uma terapia adequada. Está freqüentemente associada a infecção do parênquima renal e ocorre dentro de duas a três semanas do término da terapêutica. d. Reinfecção: quando desaparece a bactéria infectante e surge novo agente etiológico. Às vezes este fenômeno ocorre durante a terapêutica, mas o comum é ocorrer de 2 a 6 meses do tratamento inicial. Na maioria destes casos, a infecção é do trato urinário baixo. Quando existe recidiva com bactéria da mesma espécie, somente a serotipagem permite identificar se se trata de reinfecção ou recaída.
Esquemas Terapêuticos Propostos A infecção do trato urinário continua sendo tratada pelo método convencional, através do uso de antibacterianos, após a identificação do agente infectante e o conhecimento da sua sensibilidade aos antimicrobianos, considerando-se as peculiaridades do hospedeiro. O período do tratamento é variável, podendo ter a duração de 3 dias, 7 a 14 dias ou, excepcionalmente, ser em dose única. A natureza do tratamento convencional e empírico está explicitada no Quadro 25.5, não necessitando de maiores especificações.
DOSE ÚNICA VERSUS DOSE CONVENCIONAL Desde alguns anos se vem tentando verificar a eficácia terapêutica de doses únicas de antibacterianos em infecções do trato urinário. Resultados relativamente bons têm sido relatados por numerosos autores. Este tipo de tratamento não tem sido muito eficaz em crianças, em mulheres grávidas e em outras situações. As vantagens da dose única são as seguintes: 1) 2) 3) 4)
redução de custos; menor toxicidade; redução na emergência de resistência bacteriana; identificação mais precoce do doente que necessita de investigação urológica e tratamento mais prolongado.
Apesar dessas vantagens, a dose única não tem grande eficácia na erradicação das bactérias uropatogênicas que colonizam o trato digestivo e a vagina e, por isso, a recorrência é mais alta, muito superior ao observado com três dias de tratamento. Por esta razão, o tratamento por três dias tem sido preconizado. Deve ser chamada a atenção, entretanto, para que o tratamento de curta duração (dose única e por três dias) não seja aplicado em pacientes do sexo masculino ou com sintomatologia maior que sete dias, com pielonefrite aguda, com infecção urinária complicada ou em imunossuprimidos.
503
TRATAMENTO COADJUVANTE. Além das medidas terapêuticas mais diretas, doentes com infecção do trato urinário, na dependência das manifestações clínicas, são colocados em repouso relativo, com oferta ampla de líquidos. Existe valor na hiperidratação nestes casos? Parece que sim, embora existam argumentos favoráveis e desfavoráveis a este procedimento. Além do efeito de lavagem do aparelho urinário, existe diminuição no número de bactérias por ml de urina; decresce a hipertonicidade da papila renal, aumenta a migração leucocitária na medular dos rins, assim como a atividade do complemento. Em contraposição, a repleção exagerada da bexiga pode facilitar o refluxo vésico-ureteral e favorecer a diluição de antibacterianos na bexiga. De qualquer modo, parece-nos haver mais pronta resposta sintomática com a hidratação mais ampla do doente, sem haver aparente prejuízo da eficácia antibacteriana do tratamento. Em algumas situações, procura-se alterar o pH urinário para melhorar a eficácia de certos antibacterianos. A baixa do pH resulta em maior eficácia do ácido hipúrico, metenamina e nitrofurantoína; já o aumento favorece a eficácia de aminoglicosídeos e macrolídeos. Apesar de estes fatos já estarem comprovados, pouco se procura alterar o pH urinário, a não ser nas seguintes condições: a. nos cálculos de estruvita infectados (sobretudo com Proteus sp.) o pH urinário se eleva e favorece a mais rápida deposição de sais de cálcio. A baixa do pH se contrapõe a este efeito e à multiplicação bacteriana; b. nos casos de uropatia obstrutiva grave, não passíveis de correção anatômica e/ou fisiológica, podem-se evitar surtos repetidos de infecção urinária sintomática usando vitamina C (4 g ou mais/dia). Devemos lembrar que a baixa prolongada do pH com ácido ascórbico favorece a deposição de oxalatos; de outra parte, a acidificação favorece a deposição de ácido úrico. O uso de analgésicos e antiespasmódicos está indicado nos casos de dor lombar ou suprapúbica, muito incômoda em alguns casos.
QUIMIOPROFILAXIA PROLONGADA Nos casos de infecções repetidas (recaídas ou reinfecções ocorrendo mais de três vezes por ano), o doente deve ser estudado do ponto de vista urológico. O tratamento, nestes casos, envolve uma fase inicial, com doses habituais do antibacteriano escolhido para erradicar a bacteriúria; a manutenção da terapêutica é feita com um antibacteriano (preferentemente um quimioterápico), em dose menor, dado uma única vez ao dia, preferencialmente à noite. Os produtos mais usados para a quimioprofilaxia urinária são: sulfonamidas, SMZ/TMP, nitrofurantoína, quinolônicos ou menos comumente um beta-lactâmico de espectro mais reduzido, como a cefalexina. Na vigência de processo obstrutivo, o objetivo é manter a bacteriúria abaixo de 105ufc/ ml, o que interrompe o ciclo de infecções sintomáticas em
504
Infecção do Trato Urinário
Quadro 25.5 Tratamento das infecções do trato urinário (ITU) Natureza da infecção 1. ITU sintomática 1.1. Febril não complicada
Antimicrobiano
Duração e observações
Norfloxacina ou Fluorquinolonas* Cefalosporina de 2.ª ou 3.ª geração Aztreonan Aminoglicosídeos
10-14 dias
ou
1.2.
complicada
Fluorquinolona Cefalosporina de 3.ª geração Piperacilina/Tazobactan Ampicilina/Sulbactan Carbapenêmicos Aminoglicosídeos
No caso de suspeita de bacteremia, sobretudo em idosos, ou ITU complicada aconselha-se internamento hospitalar e tratamento parenteral. Na grande maioria dos casos o tratamento é ambulatorial.
Sem febre
Norfloxacina ou Fluorquinolonas Cefalosporina de 1.ª e 2.ª geração Nitrofurantoína STZ/TMP** Amoxacilina/Clavulanato (5-7 dias) Ampicilina/Sulbactan (5-7 dias)
3 dias Se existe história de ITU recorrente ou complicação do trato urinário (fator obstrutivo), tratar por 7 a 10 dias.
Cefalosporina de 1.ª ou 2.ª geração Quinolônicos Nitrofurantoína SMZ / TMP*
7-10 dias Tratar apenas mulheres grávidas, pacientes transplantados renais, pacientes neutropênicos e pacientes que irão se submeter a procedimentos urológicos invasivos ou a litotripsia.
2. ITU assintomática
3. ITU recorrente (mais de 3 surtos ao ano) 3.1. Não complicada (sem fator obstrutivo)
3.2.
Complicada (com fator obstrutivo)
Norfloxacina Fluorquinolônicos Cefalosporina de 1.ª ou 2.ª geração Nitrofurantoína SMZ/TMP*
7-10 dias na fase sintomática; manter 1/2 ou 1/4 da dose por 6-9 meses. Quando relacionada ou coito, usar dose do antimicrobiano após o ato sexual.
Tratar como ITU sintomática por 7 a 10 dias; continuar como em casos não complicados
*Moxifloxacina e trovafloxacina não alcançam níveis urinários adequados. **Com o aumento de resistência da flora infectante do trato urinário ao SMZ/TMP, o uso deste produto perdeu muito de sua eficácia.
alguns casos. Uma situação especial é a da mulher com infecção recorrente pós-coito. Nestes casos, uma dose de um destes antibacterianos após a relação sexual e o esvaziamento vesical tem-se mostrado bem eficiente. A duração do tratamento profilático nos casos recorrentes é variável, sendo geralmente inferior a 6-9 meses. Quando existe processo obstrutivo não passível de correção, o tratamento da infecção se prolonga por muitos anos.
Situações Terapêuticas Especiais 1) Existem alguns casos de bacteriúria significante que não devem ser tratados. Bacteriúria assintomática em mulheres não grávidas, por exemplo, não exige terapêutica. Em muitos casos a situação é transitória. Além disso, a mudança de uma cepa bacteriana por outra, com maiores características de virulência, pode conduzir ao
505
capítulo 25
2)
3)
4)
5)
surgimento de sintomas. E ainda se junta a isso o problema adicional de reações adversas ocasionais aos antibacterianos. Esta situação é mais freqüente em pacientes idosos. De outra parte, indivíduos muito sintomáticos, com piúria e ⬍105 ufc/ml, merecem tratamento se se diagnostica uma síndrome uretral aguda. Nestes casos, se a urocultura é negativa para Enterobacteriaceae, como ocorre na síndrome uretral, deve-se investigar a existência de Chlamydia, Ureaplasma ou Gonococcus. Crianças com refluxo vésico-ureteral devem ser tratadas até que o refluxo desapareça. Isso, às vezes, exige anos de quimioprofilaxia. As doses usadas na quimioprofilaxia são a 1/2 ou 1/4 da dose terapêutica usual. Em mulheres sexualmente ativas, o uso de uma dose de antibacteriano ao término do ato sexual associado ao esvaziamento da bexiga decresce a prevalência de infecção em alguns casos de infecção relacionada ao coito. No doente com cateter de permanência, infecção urinária é a regra. O uso do sistema fechado apenas retarda o início da infecção. Não se indica o uso de antibacterianos nestes casos, desde que a terapia, nestas circunstâncias, conduz à seleção de cepas bacterianas resistentes. Eles devem ser reservados para a situação logo após a retirada do cateter, quando então se procede a rigoroso tratamento, ou nos episódios sintomáticos febris que podem ocorrer.
Dificuldades para Erradicação da Bacteriúria Existem situações que dificultam a cura de uma infecção urinária, independente da eficácia do agente antibacteriano utilizado (Quadro 25.6). É que nestas situações as condições do hospedeiro, e sobretudo a situação anatômica e funcional do aparelho urinário, são fundamentais para uma boa resposta terapêutica.
Quadro 25.6 Dificuldades para erradicação de uma bacteriúria 1. Idade avançada 2. Doenças associadas • Diabetes mellitus • Nefroesclerose 3. Rins policísticos 4. Obstrução urinária • Urolitíase • Aumento da próstata • Válvulas anômalas 5. Bexiga neurogênica 6. Refluxo vésico-ureteral 7. Formas menos comuns de infecção renal • Pielonefrite xantogranulomatosa • Necrose de papilas renais
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BRAN, J.L.; LEVISON, M.E. & KAYE, D. Entrance of bacteria into the female urinary bladder. New Engl. J. Med., 286:626-629, 1972. BUCKLEY, R.M.; McGUKIN, M. & MacGREGOR, R.R. Urine bacterial counts following sexual intercourse. New Engl. J. Med., 298:321-324, 1978. FOWLEY, J.E. & PULASKI, E.T. Excretory urography, cystography and cystoscopy in the evaluation of women with urinary tract infection. New Engl. J. Med. 304:462-470, 1981. GRAHAN, J.C. & GALLOWAY, A. The laboratory diagnosis of urinary tract infection. J. Clin. Pathol., 54: 911-919, 2001. HANSON, L.A. Host parasite relationships in urinary tract infections. J. Infect. Dis., 127:726-730, 1973. HAMBER, M.J. & ASSCHER, A.W. Virulence of urinary pathogens. Kidney Int., 78:717-721, 1985. HOOTON, T.M.; SCHOLES, D.; STAPLETON, A.E.; ROBERTS, P.L.; WINTER, C.; GUPTA, K.; SAMADPOUR, M. & STAMM, W.E. A prospective study of asymptomatic bacteriuria in sexually active young women. New Eng. J. Med., 343:992-997, 2000. KÄLLENIUS, G.; SUENSON, S.B.; MÖLLBY, R. et al. Carbohydrate receptor structors recognized by uropathogenic E. coli. Scand. J. Infect. Dis., 33(Suppl):52-60, 1982. KAYE, D. Antibacterial activity of human urine. J. Clin. Invest., 47:2.3742.390, 1968. KUNIN, C.M. Urinary Tract Infection. Detection, Prevention, and Management. 5th Edition. Williams & Wilkins, Baltimore, 1997. LEFFLER, H. & SVANBORG-EDEN, C. Glycolipid receptor for urophatogenic Escherichia coli on human erythrocytes and uroepithelial cells. Infect. Immunity, 34:920-929, 1981. LOMBERG, H.; HANSON, L.A.; JACOBSSON, B.; JODAL, U.; LEFFLER, H. & SVANBORG-EDEN, C. Correlation of P blood group, vesicoureteral reflux, and bacterial attachment in patients with recurrent pyelonephritis. New Engl. J. Med., 308:1.189-1.192, 1983. MILLER, T.E. & NORTH, J.D. Host response in urinary tract infections. Kidney Internat., 5:179-186, 1974. MULHOLLAND, S.G. Lower urinary tract antibacterial defense mechanisms. Invest. Urol., 17:93-97, 1979. MURRAY, T. & GOLDBERG, M.J. Chronic interstitial nephritis: Etiologic factors. Ann. Intern. Med., 82:453-459, 1975. NICOLLÉ, L.E.; HARDING, G.K.M.; PREIKSITIS, J. et al. The association of urinary tract infection with sexual intercourse. J. Infect. Dis., 146:579583, 1982. OTTO, G.; BRACONIER, J.H.; ANDREASSON, A. & SVANBORG, C. Interleukin-6 and disease severity in patients with bacteremic and nonbacteremic urinary tract infection. J. Infect. Dis., 179:172-179, 1999. PARSONS, C.L.; GREENSPAN, C. & MULHOLLAND, S.G. The primary antibacterial defense mechanism of the bladder. Invest. Urol., 13:7276, 1975. PLATT, R.; POLK, B.F.; MURDOCK, B. et al. Mortality associated with nosocomial urinary tract infection. N. Engl. J. Med., 307:637-642, 1982. ROBERT, J.A. Urinary tract infections. Am. J. Kid. Dis., 4:103-117, 1984. ROBERTS, J.A. Etiology and pathology of pyelonephritis. Am. J. Kid. Dis., 17:1-99, 1991. ROCHA, H. Pathogenesis and clinical manifestations of urinary tract infection. In: Kaye, D. Urinary Tract Infection and Its Management. The C.V. Mosby Co., Saint Louis, Chapt. 2, p. 6-27, 1972. ROCHA, H. Epidemiology of urinary tract infection in adults. In: Kaye, D. Urinary Tract Infection and Its Management. The C.V. Mosby Co., Saint Louis, Chapt. 9, p. 142-155, 1972. SANTOS, W.L.C.; ANDRADE, Z.A. & ROCHA, H. Dynamics of connective matrix deposition in acute experimental E. coli pyelonephritis in rats. Exp. Toxic. Pathol., 46:63-69, 1994. STAMEY, T.A. The role of introital enterobacter in recurrent urinary tract infections. J. Urol., 128:414, 1982. STAMEY, T.A.; FAIR, W.R.; TIMOTHY, M.M. & CHONG, H.D. Antibacterial nature of prostatic fluid. Nature, 218:444-447, 1968.
506
Infecção do Trato Urinário
STAMM, W.E. Measurement of pyuria and its relation to bacteriuria. Am. J. Med., 75:53-58, 1983. STAMM, W.E.; COUNTS, G.W.; RONNING, K.R. Diagnosis of coliform infection in acutely dysuric women. N. Engl. J. Med., 307:463-468, 1982. STAMM, W.E. & HOOTON, T.M. Management of urinary tract infections in adults. New Engl. J. Med., 329:1328-1334, 1993. SILVERBLATT, F.S. Host parasite interaction in the rat renal pelvis: A possible role of pili in the pathogenesis of pyelonephritis. J. Exp. Med., 140:1696-1711, 1974. WARREN, J.W.; ABRUTYN, E.; HEBEL, J.R.; JOHNSON, J.R.; SCHOEFFER, A.J. & STAMM, W.E. Guidelines for antimicrobial therapy of uncomplicated acute bacterial cystitis and acute pyelonephritis in women. Clin. Infect. Dis., 29:745-758, 1999. WENNERSTRÖM, M.; HANSSON, S.; JODAL, U.; SIXT, R. & TOKLAND, E. Renal function 16 to 26 years after the first urinary tract infection in childhood. Arch. Pediatr. Adolesc., 154: 339-345, 2000. WINBERG, J.; BOLLGREN, I.; KÄLLENIUS, G. et al. Clinical pyelonephritis and focal renal carring. A selected review of pathogenesis, prevention and prognosis. Pediatr. Clin. North Am., 29:801-814, 1984.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Atlas of diseases of the kidney http:www.kidneyatlas.org/book2/adk2-07.pdf Renal Pathology Society http:www.renalpathsoc.org http:www.kumc.edu/instructio/medicine/pathology/ed/ch-16/ ch-16-nf.html The nephron information center http:www.nephron.com RenalNet http:www.renalnet.org
Capítulo
Nefropatia do Refluxo
26
Noemia Perli Goldraich
INTRODUÇÃO
Urografia excretória
SINONÍMIA
Ultra-sonografia
ETIOPATOGENIA
Ressonância magnética
Refluxo intra-renal
SEQÜELAS
Infecção urinária
Hipertensão arterial
Pressão intravesical
Insuficiência renal crônica
Displasia renal
Gravidez
Genética
Proteinúria
Fatores de risco para cicatrizes renais DIAGNÓSTICO
HISTÓRIA NATURAL PREVENÇÃO
Cintilografia renal com DMSA
INTRODUÇÃO Refluxo vesicoureteral primário (RVU) é uma anomalia congênita que consiste na passagem retrógrada de urina da bexiga para o ureter, na ausência de outras anormalidades obstrutivas ou neuromusculares no trato urinário. RVU é identificado em 30% das crianças investigadas por infecção urinária (IU).1 Em lactentes normais estima-se que ele ocorra em 1% a 2%.2 Nefropatia do refluxo é o conjunto de lesões renais dependentes de RVU, semelhantes em distribuição e intensidade àquelas descritas como as da pielonefrite crônica. Ela é definida in vivo por suas características morfológicas. Há sempre perda, focal ou difusa, irreversível, do parênquima renal. Caracteristicamente, as cicatrizes renais são mais freqüentes nos pólos renais, superiores e inferiores. O rim apresenta-se reduzido de tamanho e, mesmo nos casos bilaterais, o comprometimento é sempre assimétrico e de intensidade variável. O espectro é muito amplo, variando desde uma única papila comprometida num pólo até um rim contraído de estágio final.3,4 A nefropatia do refluxo é
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
responsável por 15% a 30% dos casos de insuficiência renal crônica (IRC) em crianças e em adultos.5-8 Em 1960, Hodson e Edwards9 estabeleceram uma relação causal entre RVU e a ocorrência de cicatrizes renais. Cicatrizes típicas de pielonefrite crônica são um fenômeno próprio do período de crescimento rápido do rim quando ele é mais vulnerável aos efeitos do RVU.3,10,11 A importância da combinação de RVU com infecção renal foi documentada experimentalmente, em miniporcos, por Ransley e colaboradores.12,13 Mais recentemente, estudos experimentais e clínicos nos quais se utilizou a cintilografia renal com ácido dimercaptossuccínico (DMSA) mostraram que cicatrizes renais podem ocorrer após quadro de IU febril, em pacientes nos quais não se conseguiu evidenciar a presença de RVU, chamando a atenção para o papel da virulência bacteriana e dos fatores de defesa do hospedeiro.14,15 Por outro lado, rins contraídos, com cicatrizes, também são identificados em recém-nascidos e em lactentes, nos quais foi feito o diagnóstico intra-útero de RVU e que não apresentaram IU no período pós-natal, caracterizando que elas dependem de displasia renal e não da combinação de RVU e IU.16-18
508
Nefropatia do Refluxo
Cicatrizes renais englobam tanto as alterações renais congênitas/embriológicas quanto as adquiridas/pós-natais.17-20 A maioria dos casos é identificada durante a avaliação de pacientes com IU e são atualmente classificadas em: (1) congênitas ou primárias: expressam-se por áreas focais ou difusas de displasia renal e resultam da ação de condições que atuam no período de desenvolvimento intra-útero do rim; (2) adquiridas: dependentes de IU febril, com ou sem RVU associado. A ocorrência de IU febril pode causar extensão das cicatrizes congênitas.18 Essa classificação etiopatogênica tem implicações práticas imediatas. As cicatrizes renais que se instalam como conseqüência de uma IU febril constituem uma causa prevenível de IRC em crianças e em adultos jovens. A responsabilidade médica do diagnóstico e da investigação de todos os lactentes com IU febril ultrapassa o reconhecimento de um processo infeccioso no parênquima renal.
Ponto-chave: • A classificação de cicatrizes renais em congênitas e adquiridas tem implicações práticas, já que as cicatrizes adquiridas estão relacionadas a infecções urinárias febris. Elas são uma causa prevenível de hipertensão arterial e de insuficiência renal crônica em crianças, em adolescentes e em adultos jovens
SINONÍMIA Os diversos nomes propostos para designar esta entidade evidenciam diferentes interpretações sobre qual o fator mais crítico na gênese das cicatrizes renais (v. Quadro 26.1). A denominação de pielonefrite crônica é inadequada, porque as cicatrizes renais não se associam, em geral, com infecção renal inativa. A substituição do termo pielonefrite crônica atrófica por nefropatia do refluxo, re-
Quadro 26.1 Nomes usados para designar cicatrizes renais relacionadas à ocorrência de infecção urinária e refluxo vesicoureteral primário ⇒ ⇒ ⇒ ⇒ ⇒
Pielonefrite crônica Pielonefrite atrófica não-obstrutiva Pielonefrite crônica atrófica Nefropatia do refluxo Cicatrizes renais associadas a infecção urinária
comendada por Bailey,4 enfatiza o fato de o RVU ser o principal responsável pelo aparecimento de cicatrizes renais, na ausência de obstrução. A demonstração, tanto experimental como em humanos, de que estas cicatrizes podem surgir quando há IU febril, na ausência de RVU, fez com que, atualmente, a denominação de cicatrizes renais associadas a IU passasse a ser empregada.14,15,21 Neste capítulo, nefropatia do refluxo, cicatrizes renais associadas a IU e cicatrizes renais são termos intercambiáveis.
ETIOPATOGENIA No Quadro 26.2 aparecem os fatores implicados na etiopatogenia das cicatrizes renais.
Refluxo Intra-renal Refluxo intra-renal é a presença de contraste no interior do parênquima renal, durante a realização de uretrocistografia miccional e que pode alcançar até os glomérulos. Corresponde a refluxo pielotubular. Permite reconhecer a via através da qual a urina atinge o parênquima renal, onde irá causar a lesão inicial. Há dois tipos de papilas renais: simples e compostas. As simples não permitem a ocorrência de refluxo intra-renal. As compostas resultam da fusão de duas ou três papilas adjacentes e possibilitam refluxo intra-renal franco, quando se atinge a pressão crítica. Estudos em humanos sugerem que um terço dos rins é totalmente imune a refluxo intra-renal e dois terços são suscetíveis bilateralmente. Esta variabilidade é que seria responsável pelas diferentes apresentações morfológicas da nefropatia do refluxo.12,22
Infecção Urinária As evidências de que a presença de IU e RVU são necessárias para o aparecimento de cicatrizes renais derivam tanto de estudos clínicos como experimentais. 1,13,18 Goldraich e Goldraich23 acompanharam prospectivamente 202 crianças, com RVU identificado durante a investigação de uma IU. Novas cicatrizes foram evidenciadas pela cintilografia renal com DMSA em sete (3,5%) pacientes. Em
Quadro 26.2 Fatores etiopatogênicos envolvidos na nefropatia do refluxo ⇒ ⇒ ⇒ ⇒ ⇒
Refluxo intra-renal Infecção urinária Pressão intravesical Displasia renal Genéticos
509
capítulo 26
todos eles, o aparecimento destas novas cicatrizes relacionou-se a IU febril. Relatos anteriores, baseados em achados de urografia excretora, enfatizaram a necessidade da concomitância de IU e RVU, para o aparecimento de cicatrizes, geralmente polares, especialmente nos cinco primeiros anos de vida, quando o rim é mais vulnerável aos efeitos combinados destes dois fatores.11,24 A cintilografia com DMSA permite acompanhar as alterações renais desde a fase inicial do processo inflamatório associado à IU até a fibrose, que leva ao aparecimento da cicatriz permanente da nefropatia do refluxo. Essas cicatrizes se desenvolvem exclusivamente nas áreas onde previamente foram identificadas anormalidades na captação do radiofármaco durante a IU febril14,15,21 (v. Fig. 26.1). Experimentalmente, mostrou-se que antibioticoterapia precoce (até uma semana após o início da IU) é capaz de reverter e até evitar a formação de cicatrizes em rins submetidos a RVU e IU.13 O conhecimento da interação entre a virulência bacteriana, a suscetibilidade e a resposta do hospedeiro foi outra etapa importante no estudo da gênese das cicatrizes renais.25-30 A habilidade de aderir a células do uroepitélio é o fator de virulência mais freqüentemente associado às bactérias pielonefritogênicas. As Escherichia coli possuem Pfimbriae para as quais há receptores específicos, localizados tanto em eritrócitos como em células do uroepitélio. Em macacos, demonstrou-se que as Escherichia coli que possuem P-fimbriae produzem ureterite, que causa alteração na mobilidade ureteral, originando uma situação de obstrução funcional do ureter. Há um aumento na pressão na pelve renal, o que facilita a instalação de pielonefrite aguda.27,31 O componente lipídico A da endotoxina e as Pfimbriae estão associados à reação inflamatória. A resposta do hospedeiro é crítica, tanto para curar a infecção, como no desenvolvimento de cicatrizes renais. Estudos a nível molecular indicam que o processo inflamatório per se, e não a multiplicação bacteriana, é o responsável pelo aparecimento de cicatrizes nos rins. O influxo de polimorfonuclea-
A
res é o efetor crítico da resposta do hospedeiro. As citoquinas, incluindo as interleucinas (IL-1b, IL-6 e IL-8), participam nessa resposta. Quando elas são dosadas na urina de crianças com pielonefrite aguda, verificam-se níveis muito elevados logo no começo, mas que diminuem significativamente logo após o início de antibioticoterapia.29 Quando se reduz o influxo de neutrófilos no parênquima renal através de diferentes mecanismos (colchicina, ciclofosfamida, veneno de cobra) a persistência de bactérias no parênquima aumenta, mas diminui a ocorrência de cicatrizes. Disfunções nos neutrófilos levam à pielonefrite aguda e às cicatrizes renais. Fatores genéticos também estão implicados nessas anormalidades imunológicas “inatas”. Esses estudos sugerem que o dano renal se instala precocemente quando há IU e reforçam a necessidade de diagnóstico e intervenção rápidos para prevenir a ocorrência de cicatrizes.26-30
Pressão Intravesical Quando há RVU, pressões anormalmente elevadas podem ser transmitidas à pelve e às papilas renais por períodos de tempo variáveis, dependendo do momento da micção no qual ocorre o refluxo. Há consenso, no momento, de que, embora cicatrizes renais possam resultar de RVU estéril, as condições urodinâmicas, nas quais elas são produzidas experimentalmente, indicam que seu significado clínico é limitado, estando restrito a situações de refluxo vesicoureteral secundário (válvula de uretra posterior e alguns tipos de bexiga neurogênica), que se acompanham freqüentemente de IU.10,32 Em crianças neurologicamente normais que apresentam RVU, pode haver concomitância da síndrome de disfunção das eliminações na qual há distúrbios funcionais da micção (hiperatividade do esfíncter, hiperatividade do detrusor) e constipação.33 Nesses pacientes há aumento na pressão intravesical. Naseer e Steinhardt34 ressaltam que a síndro-
B
26.1 A. Pielonefrite aguda: cintilografia renal na vigência de infecção urinária febril. Observam-se áreas de hipocaptação sem perda dos contornos renais no pólo superior do rim esquerdo e em ambos os pólos do rim direito. B. Nefropatia do refluxo: cintilografia renal com DMSA na mesma paciente, repetida quatro anos após. Uretrocistografia miccional mostrou refluxo vesicoureteral bilateral. Paciente mantida sob quimioprofilaxia e sem infecção urinária no período. No pólo superior do rim esquerdo, a área de hipocaptação evoluiu para cicatriz permanente. Resolução das áreas de hipocaptação de ambos os pólos do rim direito. Observar hipertrofia compensadora do rim direito.
510
Nefropatia do Refluxo
me de disfunção das eliminações é um fator de risco importante na gênese de novas cicatrizes em crianças com RVU, mesmo após os cinco anos.
Displasia Renal Displasia renal resulta de desenvolvimento anormal do broto ureteral.35,36 Ela é definida como uma diferenciação anormal do parênquima renal, caracterizada histologicamente por ductos coletores primitivos e metaplasia cartilaginosa. Pressão retrógrada, instalada precocemente na vida intra-uterina, produz displasia renal. Mackie e Stephens,37 em rins com duplicação ureteral completa, demonstraram uma associação muito significativa entre a posição do orifício ureteral e a presença ou não de lesões renais: quanto mais ectópico o orifício ureteral, mais anormal o rim. IU na infância simplesmente levaria ao diagnóstico desta condição e não estaria envolvida na patogenia das cicatrizes renais. Estudos, em crianças nas quais foi feito o diagnóstico antenatal de RVU e que foram investigadas por imagem logo após o parto e na ausência de IU, confirmam que displasia é um fator significativo na formação de cicatrizes renais.16,19,38 Entretanto, estes conhecimentos não podem ser extrapolados integralmente para a população geral com RVU. Lactentes com o diagnóstico antenatal de RVU constituem um grupo especial de pacientes, nos quais há predominância do sexo masculino e uma alta prevalência de RVU grave. Crianças com RVU detectado no período pósnatal são principalmente meninas, com RVU menos intenso e história de IU.
Genética Estudos mostraram que RVU e nefropatia do refluxo podem ocorrer em famílias, em prevalências que variam de 30% a 50% entre parentes de primeiro grau.1,39-41 Os padrões de herança sugeridos são autossômica dominante ou poligênica. Um locus no cromossoma 6p, associado a malformações renais e ureterais, e a mutação PAX2 no cromossoma 10q, responsável pela síndrome renal-coloboma, não foram identificados em pacientes com RVU e nefropatia do refluxo.19,41,42 Recentemente, os resultados da primeira pesquisa genômica de RVU e de nefropatia do refluxo sem associações sindrômicas indicam que estas duas condições estão ligadas à heterogeneidade de um locus do cromossoma 1. Doze outros loci adicionais também foram identificados. Portanto, esses dados sugerem que o modo de herança mais provável do RVU e da nefropatia do refluxo é o autossômico dominante, com diferentes genes atuando em diferentes famílias. 43 O uso de inibidores da enzima conversora de angiotensina em gestantes hipertensas ocasionou um índice elevado de mortes fetais e de anormalidades em recém-nasci-
dos (malformações renais, oligoidrâmnios e anúria), chamando a atenção para o papel do sistema renina-angiotensina na embriogêsese do trato urinário. Estudos com engenharia genética confirmaram que distúrbios genéticos desse sistema podem alterar o seu funcionamento e levar a anormalidades no desenvolvimento do trato urinário. Existem polimorfismos dos genes do sistema renina-angiotensina que modificam a sua atividade e alteram a progressão de uma nefropatia. Dos vários loci já identificados para a enzima conversora de angiotensina, o fragmento 287 bp no íntron 16 é o mais implicado na modulação de dano renal progressivo. Os indivíduos podem ser homozigotos para deleção (DD) ou inserção (II) ou podem ser heterozigotos (DI). O genótipo DD tem sido encontrado com uma prevalência significativamente maior em pacientes com nefropatia do refluxo nos quais se desenvolve dano renal significativo, independente da idade no diagnóstico, do grau de RVU e da demora na intervenção terapêutica.44-49 Por outro lado, os polimorfismos do gen da enzima conversora de angiotensina não estão envolvidos no aparecimento de RVU detectado em famílias.50 O conhecimento desses mecanismos que interferem no desenvolvimento do rim e do trato urinário abre novas perspectivas no entendimento dessas condições, assim como prenuncia uma ação mais efetiva na modificação de sua história natural, através de um tratamento mais específico.
Fatores de Risco para Cicatrizes Renais No Quadro 26.3 estão apresentados os fatores de risco para cicatrizes renais identificados em estudos clínicos.
DIAGNÓSTICO Cintilografia Renal com DMSA A cintilografia renal com DMSA, marcado com tecnécio (99mTc), é o padrão-ouro para o diagnóstico de nefropatia do refluxo.51-53 Atualmente, para se afirmar que um rim é normal num paciente com RVU é obrigatória a realização de cintilografia renal com DMSA. Diferentemente da cintilografia renal com ácido dietileno-triaminopenta-acetato
Quadro 26.3 Fatores de risco para cicatrizes renais ⇒ ⇒ ⇒ ⇒
Demora em iniciar tratamento antimicrobiano Baixa idade no início Infecções urinárias febris recorrentes Presença de refluxo vesicoureteral primário e de síndrome de disfunção das eliminações
511
capítulo 26
(DTPA), marcado com 99mTc, e da urografia excretória, a cintilografia renal com DMSA é um estudo estático, que não possibilita a visualização das vias excretoras (sistema pielocalicial e ureteres)15 (v. Cap. 20). Vantagens da cintilografia renal com DMSA sobre a urografia excretória, para o diagnóstico de cicatrizes renais: (i) não requer preparo intestinal e não é influenciada por gás intestinal (que é um fator de confusão significativo, especialmente em crianças pequenas — lactentes e pré-escolares); (ii) não há riscos inerentes ao uso de contrastes radiológicos iodados; (iii) permite uma melhor visualização dos contornos renais devido à combinação das imagens posteriores e oblíquas; (iv) a dose de radiação envolvida é significativamente menor que com a urografia excretória.15,52,53 Desvantagens da cintilografia renal com DMSA sobre a urografia excretória, para o diagnóstico de cicatrizes renais: (i) não fornece informações sobre o sistema pelvicalicial, exceto quando ele estiver muito dilatado. Nesta situação, ele aparece como áreas inespecíficas, com diminuição da captação do radiofármaco; (ii) não evidencia os ureteres; (iii) não permite o diagnóstico de cálculos, obstrução, rins duplicados ou ureteres dilatados; (iv) custo maior.15,53 Rins normais na cintilografia renal com DMSA têm tamanhos semelhantes. A captação cortical do radiofármaco é homogênea. Visualizam-se três áreas hipocaptantes, que correspondem ao sistema pielocalicial.15 Define-se cicatriz renal, na cintilografia renal com DMSA, como um defeito no contorno do rim, no qual há pouca ou nenhuma captação do radiofármaco. Identifica-se a ocorrência de nefropatia do refluxo pela presença de cicatrizes ou pela contração de todo o rim. Estas áreas hipocaptantes podem tornar-se mais evidentes pelo crescimento de tecido renal normal adjacente.15 Na pielonefrite aguda, áreas focais de isquemia e de disfunção tubular originam áreas hipocaptantes, que na grande maioria das vezes, quando tratamento adequado é instituído, são reversíveis.14 Diferentemente das anormalidades da pielonefrite aguda, as alterações da nefropatia do refluxo são permanentes. Para o diagnóstico de certeza de nefropatia do refluxo é necessário que o intervalo de tempo entre a realização da cintilografia renal com DMSA e o último episódio documentado de pielonefrite aguda seja de um ano. Novas cicatrizes são áreas hipocaptantes, que aparecem na cintilografia renal com DMSA durante o seguimento de portadores de nefropatia do refluxo e que persistem em exames posteriores. Novas cicatrizes podem instalar-se em rins previamente normais ou em rins que já apresentavam alterações prévias de nefropatia do refluxo.15,23 Classificação das alterações na cintilografia renal com DMSA. Goldraich e colaboradores52,53 propuseram uma classificação em quatro graus da intensidade das cicatrizes renais, de acordo com os achados na cintilografia renal com DMSA, que está sendo adotada internacionalmente:54,55 (i)
tipo 1, não mais que duas áreas com cicatrizes; (ii) tipo 2, mais que duas cicatrizes, com algumas áreas de parênquima renal normal entre elas; (iii) tipo 3, dano generalizado a todo o rim, semelhante à nefropatia obstrutiva, i.e., contração de todo o rim com poucas ou nenhuma cicatriz entre elas; (iv) tipo 4, rim de estágio final, contraído, com pouca ou nenhuma captação de DMSA, i.e., menos que 10% da função renal total.
Urografia Excretória O rim com nefropatia do refluxo é usualmente diagnosticado in vivo por seu aspecto radiológico. A alteração patognomônica é uma área de fibrose ou cicatriz, geralmente extensa, que compromete toda a espessura do parênquima renal e que está diretamente relacionada a cálices dilatados com perda das impressões papilares. Estas cicatrizes têm uma distribuição e combinação características: quando únicas, são preferentemente polares, superiores ou inferiores, mas a forma generalizada com cicatrizes múltiplas é a mais encontrada.3 Para o diagnóstico radiológico de cicatrizes renais é necessário que se obtenha, na urografia, uma visualização adequada dos contornos renais. O sinal mais precoce de comprometimento renal, em pacientes com RVU e IU, é a assimetria entre os dois rins, que resulta da parada no crescimento do rim lesado e que é acentuada pela hipertrofia compensadora do rim sadio. Mesmo nos casos bilaterais, há uma diminuição no crescimento de ambos os rins, que também não é simétrica.3,53,56 A cicatriz, produzida pela fibrose e acentuada pela hipertrofia compensadora dos tecidos normais adjacentes, não se produz de imediato, podendo demorar até dois anos para se desenvolver completamente. O prazo mínimo documentado para seu aparecimento num rim previamente normal é de 8 a 9 meses.1 As dificuldades inerentes ao uso da urografia excretória para o diagnóstico de cicatrizes renais dependem de: (i) visualização inadequada dos contornos renais, especialmente em lactentes e pré-escolares; (ii) período de latência necessário para a formação completa da cicatriz; (iii) interferência de vários fatores (movimentos respiratórios, posicionamento do paciente, distorção) em medidas seriadas do tamanho dos rins.15 O diagnóstico diferencial das cicatrizes renais inclui: lobulação fetal persistente; atrofia pós-obstrutiva que se desenvolve depois de obstrução urinária temporária ou intermitente; acidentes renovasculares, que ocorrem especialmente em recém-nascidos e lactentes; e a nefropatia dos analgésicos. A cicatriz adjacente a um cálice com alterações papilares é a lesão característica, mas não específica, de nefropatia do refluxo. A demonstração de RVU é o único critério de que se dispõe para o diagnóstico diferencial com as outras entidades.1,3,56 Vários estudos compararam a cintilografia renal com
512
Nefropatia do Refluxo
DMSA com a urografia excretória para o diagnóstico de nefropatia do refluxo, especialmente em crianças menores de cinco anos. A sensibilidade da urografia excretória para a detecção de cicatrizes renais é de 80% e a especificidade é de 98%. Em 297 rins com RVU em 202 crianças, Goldraich e colaboradores53 encontraram discrepâncias entre a urografia excretória e a cintilografia renal com DMSA em 37 rins de 31 pacientes, todos em lactentes e pré-escolares. Em 34 rins de 28 pacientes, a urografia foi normal, mas na cintilografia havia cicatrizes renais.
Ressonância Magnética Até o momento, a ressonância magnética não se mostrou superior à cintilografia renal com DMSA na identificação de cicatrizes renais.59,60 Uma limitação ao seu emprego em pacientes pediátricos é a necessidade de cooperação da criança para sua realização (v. Cap. 18-II).
SEQÜELAS
Ultra-sonografia
Hipertensão Arterial
A ultra-sonografia é um método não-invasivo, isento de complicações (v. Cap. 18-I). Entretanto, ela é totalmente dependente da experiência do observador. A ultra-sonografia apresenta uma sensibilidade menor que a urografia, deixando, muitas vezes, de identificar, em crianças, cicatrizes focais. Uma ultra-sonografia normal numa criança com IU e com idade menor que cinco anos não exclui a presença de cicatrizes renais. Em 34 lactentes com RVU com idades até seis meses, a ultra-sonografia mostrou anormalidades nos rins em apenas 7/17 (41%) dos pacientes nos quais a cintilografia com DMSA foi anormal.57 Dez radiologistas experientes examinaram, em um dia, 50 rins (30 normais e 20 com nefropatia do refluxo) de 25 crianças com idades entre 2 e 16 anos com IU. Os métodos de referência foram a urografia excretória e a cintilografia renal com DMSA. Para a presença de cicatrizes, a sensibilidade do ultra-som foi de 54% (especificidade de 80%). Quando se considerou também a diminuição no tamanho do rim como critério diagnóstico, a sensibilidade aumentou para 64% (especificidade de 79%). Houve grandes diferenças entre os observadores, com a sensibilidade variando entre 40% e 90% (especificidade: 94% a 65%).58 A partir dos cinco anos de idade, há uma perda progressiva na discriminação entre cintilografia renal com DMSA, urografia excretória e ultra-sonografia, para o diagnóstico de nefropatia do refluxo.
Há evidências de que a nefropatia do refluxo associa-se a um risco aumentado de desenvolver hipertensão arterial (HAS), que é uma complicação tardia (raramente aparece antes dos cinco anos de idade). Há risco aumentado de HAS na adolescência e em adultos jovens e no sexo masculino. Ela pode ser benigna e de fácil controle ou, menos freqüentemente, apresentar-se como HAS maligna. HAS ocorre tanto em pacientes com nefropatia do refluxo unilateral como bilateral, não sendo possível estabelecer uma relação linear entre a intensidade do comprometimento renal e a presença e a gravidade da HAS. Lesões vasculares isquêmicas e o sistema renina-angiotensina têm sido implicados em sua patogenia, mas o papel deste último continua controverso.1,7,61 Dillon e colaboradores62-65 acompanharam por 15 anos com intervalos de 5 anos, a partir de 1978, a atividade da renina periférica (PRA) de uma coorte de 100 crianças com IU, RVU e nefropatia do refluxo. Não observaram associação entre aumento de PRA e aparecimento de HAS. Pacientes que desenvolveram HAS apresentavam valores de PRA aumentados ou normais. Aumento da PRA também não se acompanhou do aparecimento de HAS, que ocorreu tanto em pacientes com PRA prévia, normal ou aumentada, indicando que, nesse grupo, a PRA não prediz a ocorrência de HAS. Wennerström e colaboradores66 relataram níveis significativamente mais elevados do peptídio natriurético atrial circulante em 53 pacientes com nefropatia do refluxo quando comparados com 47 controles pareados sem cicatrizes renais. A relação entre HAS e displasia renal passou a ser enfatizada, nos últimos anos. O diagnóstico diferencial entre hipoplasia e/ou displasia e cicatrizes renais é difícil. RVU pode fazer parte do quadro de displasia: assim como há displasia renal, o ureter também é displásico, tortuoso e permite a ocorrência de RVU.67 A prevalência de HAS, em pacientes com cicatrizes renais, é controvertida e de difícil interpretação. A revisão de várias séries publicadas evidencia que há, pelo menos, duas formas de lidar com este dado: (i) são incluídos pacientes com HAS de várias etiologias e estabelecida a proporção de hipertensos, que apresentam RVU e/ou cicatri-
Pontos-chave: • A cintilografia renal com DMSA é o padrãoouro para o diagnóstico de nefropatia do refluxo • O intervalo de tempo entre a infecção urinária febril e a realização da cintilografia renal com DMSA é crítico para o diagnóstico diferencial entre pielonefrite aguda e nefropatia do refluxo • Ultra-sonografia normal em uma criança com menos de cinco anos não exclui a presença de cicatrizes renais
513
capítulo 26
zes renais; (ii) a partir de pacientes com RVU, com ou sem cicatrizes renais ou com nefropatia do refluxo, estimamse quantos apresentam HAS. Além disso, as séries são constituídas somente por crianças ou por adultos ou incluem tanto crianças como adultos. Há diferentes riscos para o aparecimento de HAS, em diferentes grupos etários, o que pode explicar, pelo menos em parte, a variabilidade dos resultados. Também, nestes estudos, os métodos usados estão sujeitos a muitos vieses. Estes fatos inviabilizam a chance de estimar qual a verdadeira prevalência de HAS em pacientes com cicatrizes renais.67 Wolfish e colaboradores68 estudaram a pressão arterial de 146 crianças (idade média: 14,4 anos; limites: 5 meses a 21 meses) com o diagnóstico inicial de RVU, identificadas retrospectivamente. Havia cicatrizes renais em 34% delas. O período médio de seguimento foi de 9,6 anos. Nenhuma delas apresentava HAS, definida como uma pressão arterial acima do percentil 95 para a idade. O risco estimado de HAS, associada com RVU não complicado, foi de 2%. Os autores concluem, após um seguimento de 10 anos, que, em crianças, RVU não se associa com o desenvolvimento de HAS, independente do número de episódios documentados de IU, da duração e da gravidade do RVU, do tipo de tratamento, da presença de cicatrizes renais e da duração do seguimento. Prevalências de HAS, variando entre 0% e 28% em séries de crianças com cicatrizes renais e entre 16% e 38% dos adultos, foram relatadas. Kincaid-Smith e Becker7 observaram a presença de pressão diastólica acima de 90 mmHg, no momento do diagnóstico, em 21 de 55 adultos (38%) com cicatrizes renais. HAS grave (>180/120 mmHg) foi identificada em quatro, sendo o sinal de apresentação em dois. Köhler e colaboradores,69 num estudo retrospectivo de 115 adultos com diagnóstico de RVU na infância (101 com nefropatia do refluxo), encontraram HAS em 34% (37 com e 2 sem nefropatia do refluxo). Recentemente, foram publicados os resultados de estu-
dos prospectivos de acompanhamento, por períodos que variaram entre 15 e 35 anos, da pressão arterial de pacientes com RVU e cicatrizes renais identificadas na infância, após o diagnóstico de IU65,66,70,71 (v. Quadro 26.4). A comparação com as prevalências de HAS relatadas anteriormente sugere que supervisão médica continuada desde a infância de pacientes com nefropatia do refluxo parece associar-se com uma ocorrência menor de HAS na idade adulta.
Insuficiência Renal Crônica Há uma associação bem estabelecida entre nefropatia do refluxo e IRC terminal. A força desta associação, a relação com a intensidade do RVU, a existência de outras variáveis e a prevalência desta complicação em pacientes com RVU e/ou cicatrizes renais não estão corretamente estabelecidas.67 A maioria dos dados são de estudos retrospectivos, transversais. Tal como ocorre com a HAS, os relatos têm dupla origem: (i) em séries com IRC, estabelece-se a proporção daqueles cuja doença básica é a nefropatia do refluxo; (ii) entre portadores de nefropatia do refluxo identificam-se os com déficit de filtração glomerular. Bailey e Lynn8 estimaram que 0,3 a 0,4 criança/milhão de habitantes/ano evolui para IRC terminal antes dos 15 anos de idade devido a nefropatia do refluxo. Em adultos, Kincaid-Smith72 calculou que 5 a 10 mulheres/milhão de habitantes/ano desenvolvem IRC secundária a nefropatia do refluxo. Quando se consideram os pacientes com RVU, estima-se que 4% deles evoluem para IRC terminal.73 Estes cálculos podem subestimar os valores reais, porque muitas vezes é difícil reconhecer a associação entre IRC na idade adulta e RVU na infância. No adulto, o refluxo é, muitas vezes, secundário à disfunção vesical dependente de IRC avançada, à bexiga neurogênica adquirida e a condições tais como tumor, divertículos e hipertrofia prostática benigna, que afetam a junção ureterovesical direta ou
Quadro 26.4 Prevalência de HAS na idade adulta em pacientes com nefropatia do refluxo identificada durante investigação de infecção urinária na infância e mantidos sob supervisão médica
1
INÍCIO
SEGUIMENTO (mediana e limites) (anos)
IDADE (mediana e limites) (anos)
PREVALÊNCIA (%)
AUTOR
NÚMERO
Goonasekera65 (Inglaterra)
100
1978
15
27 (20-31)
18
Smellie71 (Inglaterra)
85
1955-1980
20,4 (10-35)
27 (18-44)
16,5
Martinell70 (Suécia)
541
1975-1983
15 (5,9-32,2)
222 e 20,63 (17-31)2 (16-33)3
5,5
Wennerström66 (Suécia)
53
1970-1979
22 (16-26)
25 (16-34)
9
só mulheres; ( ) limites; 2cicatrizes extensas; 3cicatrizes moderadas:
514
Nefropatia do Refluxo
indiretamente. Muitos casos são incluídos entre as doenças renais inespecíficas, assim como nas doenças obstrutivas, nas hipoplasias-displasias e até mesmo nas glomerulopatias. O diagnóstico diferencial entre cicatrizes renais congênitas e adquiridas, associadas a IU, é muitas vezes difícil. Jacobson e associados6 avaliaram, após 27 anos, 30 pacientes adultas nas quais o diagnóstico de nefropatia do refluxo foi feito na infância, após uma IU febril. Três (10%) apresentavam IRC e em outras duas, a filtração glomerular era ⬍ 65 ml/min/1,73 m2. Esses dados diferem substancialmente dos relatados, também na Suécia, por Martinell e colaboradores,70 que seguiram, por 15 anos, 54 mulheres com nefropatia do refluxo e observaram que a função renal estava bem preservada em todas. A filtração glomerular mais baixa foi 70 ml/min/1,73 m2. Smellie e associados71 avaliaram 162 pacientes adultos, 10 a 41 anos após o diagnóstico de nefropatia do refluxo feito na infância, e verificaram que a creatinina estava aumentada em 9 (5,5%) deles, incluindo três mulheres que haviam sido transplantadas ou morreram com IRC no período. Os resultados indicam que há necessidade de um seguimento a longo prazo (de até quatro décadas) antes que se possa saber quais as repercussões da nefropatia do refluxo na função renal. No Quadro 26.5 aparecem as prevalências de nefropatia do refluxo entre pacientes com idades até 21 anos, com IRC (definida como filtração glomerular ⬍ 30 ml/min/1,73 m2), relatadas na década de 90. Em todos esses trabalhos foi feita uma diferenciação nítida entre nefropatia do refluxo como definida neste capítulo e outras patologias do trato urinário, tais como refluxo vesicoureteral secundário (por exemplo, a válvula de uretra posterior ou a bexiga neurogênica), hipoplasia e/ou displasia renais, que costumavam ser incluídas em séries mais antigas. Observa-se grande variação nas prevalências, que pode refletir diferentes abordagens no diagnóstico e na investigação de IU febril nos primeiros dois anos de vida. Na Inglaterra, a idade média do diagnóstico de IU é quatro anos, enquanto na Suécia isso ocorre no primeiro ano de vida.74 Nesse país, que possui um programa
de diagnóstico de IU febril em lactentes modelar, a comparação de dados de 1978-1985 com os de 1986-1994 demonstra que a prevalência de nefropatia do refluxo como etiologia da IRC diminuiu de 6% para 0%.75,76
Gravidez Complicações durante a gravidez têm sido relatadas com freqüência em mulheres com cicatrizes renais.7,80,81 A gravidez também acelera a deterioração da função renal em pacientes com nefropatia do refluxo, que apresentam déficit funcional prévio.80 Kincaid-Smith e Becker7 revisaram os dados de 48 mulheres maiores de 16 anos com RVU e cicatrizes renais e verificaram que 13 delas (27%) haviam apresentado as primeiras manifestações durante a gravidez (10 apresentaram IU, uma HAS e duas edema e proteinúria no puerpério). Foram acompanhadas 85 gravidezes em 37 pacientes. Em 59 destas gravidezes ocorreram complicações (principalmente HAS, edema e IU). Becker e colaboradores80 seguiram 20 pacientes com cicatrizes renais com creatinina plasmática entre 2,3 e 4,5 mg/dl, que engravidaram. Em seis, a gravidez teve duração maior que 12 semanas, tendo-se associado à deterioração rápida da função renal em todas e resultado em IRC terminal em quatro delas, dois anos após o parto, apesar do controle satisfatório da pressão arterial. Das 14 pacientes restantes, quatro apresentaram HAS não controlada por períodos, relacionados à falta de aderência ao tratamento, evoluindo rapidamente para IRC terminal. As outras 10 apresentaram deterioração progressiva da função renal, no período de seguimento, que foi de 5 a 10 anos. Nenhuma evoluiu para IRC num período de sete anos. Concluíram que gravidez per se se associa a um mau prognóstico em pacientes com nefropatia do refluxo e déficit moderado de função renal, mesmo quando se consegue um controle adequado da pressão arterial. Este mesmo padrão de evolução ocorre em pacientes com outras nefropatias e graus comparáveis de déficit de função renal.
Quadro 26.5 Prevalência de nefropatia do refluxo em novos casos de insuficiência renal crônica (filtração glomerular ⬍ 30 ml/min/1,73 m2) diagnosticados na década de 90 Local Suécia76
População Estudada n Idade
Período do Diagnóstico da IRC
Prevalência (%)
118
6m-16a
1986-1994
0
166
⬍ 17a
1991-1999
16
1.725
⬍ 21a
1994-1996
17
Chile80
227
⬍ 18a
1996
17
Inglaterra74
85
⬍ 18a
1994-1997
30
77
Irã
América do Norte78*
*North American Pediatric Renal Transplant Cooperative Study — NAPRTCS: inclui dados dos Estados Unidos e Canadá.
515
capítulo 26
Sacks e colaboradores81 analisaram 16 gravidezes em 12 mulheres com cicatrizes renais (nove delas com RVU) e 36 gravidezes em 22 pacientes com rins normais (quatro delas com RVU), que haviam sido identificadas durante um estudo de rastreamento de bacteriúria assintomática na infância, realizado em Oxford e em Cardiff, Inglaterra, em 1972, e compararam com 52 gravidezes em 52 controles normais, pareados para idade, paridade e tabagismo. A pressão arterial e a proteinúria foram significativamente maiores em pacientes com cicatrizes renais. Pré-eclampsia ocorreu em 5/16 gravidezes de pacientes com nefropatia do refluxo, em 1/22 mulheres com bacteriúria prévia e com rins normais e em 1/52 casos-controle normais. Não foram encontradas diferenças significativas no prognóstico fetal entre os três grupos. Martinell e associados82 também compararam prospectivamente a evolução de 65 gravidezes em 41/111 mulheres, com ou sem cicatrizes renais dependentes de IU ocorrida na infância, identificadas retrospectivamente, com controles pareados para paridade, idade, consumo de cigarros e data do parto. A ocorrência de bacteriúria nas gravidezes foi significativamente maior em mulheres com (47%) e sem (27%) cicatrizes renais, quando comparadas aos controles (2%). IU sintomática ocorreu somente em pacientes com história prévia de IU: pielonefrite aguda em quatro pacientes com cicatrizes renais (três delas com RVU) e cistite em três. Uma mulher com rins normais apresentou pielonefrite aguda. A pressão arterial média foi significativamente maior em pacientes com cicatrizes renais graves, quando comparadas aos controles, antes e durante a gravidez. Não observaram diferenças significativas na prevalência de pré-eclampsia, parto cesáreo, prematuridade e peso dos recém-nascidos. Jungers e colaboradores83 estudaram 375 gravidezes em 158 mulheres com nefropatia do refluxo. Ocorreu morte fetal em 10,2%, mas houve tendência para sua diminuição no período de 1985 a 1994, quando comparado com o período anterior de 1965 a 1984 (8,4% versus 12,6%). Morte fetal se associou com a presença de HAS no momento da concepção e com déficit de filtração glomerular. Concluíram que a gravidez é bem-sucedida e sem complicações em mulheres com nefropatia do refluxo que têm a pressão arterial normal e a função renal preservada. Os conhecimentos atuais sugerem que o risco de complicações sérias durante a gravidez, mesmo na presença de cicatrizes renais graves, não está aumentado nestas pacientes, possivelmente devido a sua supervisão clínica continuada. Entretanto, ela pode associar-se a rápida progressão para IRC, naquelas mulheres com déficit moderado de função renal.
Proteinúria Proteinúria, quando aparece em pacientes com nefropatia do refluxo, é um sinal indicativo de má evolução. Em
pacientes com nefropatia do refluxo foram descritas duas alterações glomerulares em áreas do rim onde não há cicatrizes: (i) hipertrofia glomerular; (ii) glomerulosclerose focal. A primeira alteração é mais freqüente e é o resultado de hiperfiltração glomerular. A segunda é encontrada em pacientes com comprometimento renal mais grave.84 Uma vez detectada a sua presença, a progressão para IRC é gradual, mas inexorável, num período de 5 a 10 anos, podendo ser acelerada por gravidez ou HAS grave.7,72 Martinell e associados70 estudaram 54 mulheres com nefropatia do refluxo seguidas por 15 anos. Encontraram proteinúria maior que 100 mg/24 h em apenas três delas. Em duas havia cicatrizes extensas e na terceira, a biópsia renal demonstrou a presença de glomerulopatia por IgA. Entretanto, proteinúria não permitiu diferenciar entre pacientes com cicatrizes extensas e moderadas nem mesmo dos 57 controles pareados, com rins normais.
Ponto-chave: • Acompanhamento continuado, desde a infância até a idade adulta, de pacientes com nefropatia do refluxo é capaz de influenciar favoravelmente a prevalência de seqüelas tardias, tais como hipertensão arterial, insuficiência renal crônica e complicações durante a gravidez
HISTÓRIA NATURAL O RVU e as cicatrizes renais têm histórias naturais diferentes. O RVU evoluiu para a cura espontânea, enquanto as cicatrizes renais são uma nefropatia progressiva, que pode evoluir, mesmo após a cura, espontânea ou cirúrgica, do RVU. Supervisão médica continuada iniciada na infância, quando é feito o diagnóstico da nefropatia do refluxo e mantida por várias décadas, parece ser capaz de reduzir a ocorrência de HAS, IRC e complicações na gravidez,66,70,71,81,82 modificando sua história natural.
PREVENÇÃO Dados epidemiológicos da Suécia mostram que é possível erradicar a nefropatia do refluxo como causa de IRC em pacientes com idades até 16 anos.75,76 Em Buffalo, Estados Unidos, desenvolve-se há mais de duas décadas um programa muito ativo de rastreamento de crianças com IU e investigação de irmãos de portadores de RVU. Como há apenas um centro de referência de Nefrologia Pediátrica, foi possível identificar todos os casos novos de HAS e de IRC, atendidos entre 1982 e 1997. Nesses 122 pacientes
516
Nefropatia do Refluxo
havia nefropatia do refluxo em seis pacientes (5%). Destes seis, cinco foram diagnosticados na década de 80 e apenas um na década de 90. Os autores concluem que o diagnóstico de IU e de RVU é custo-efetivo, resultando em modificação favorável da epidemiologia da HAS e da IRC nesta comunidade.85 No Quadro 26.5 verifica-se que, no mesmo período, a nefropatia do refluxo foi responsável por 17% dos casos de IRC na América do Norte e no Chile. A maneira eficaz de evitar a ação dos fatores de risco para nefropatia do refluxo (v. Quadro 26.3) é através de: (i) diagnóstico e tratamento precoces de IU febril em lactentes. É necessário que, mesmo na presença de infecção respiratória, colha-se urina através de método confiável (a punção suprapúbica é o padrão-ouro) em crianças menores de dois anos;86-88 (ii) identificação de populações de risco para RVU (filhos e irmãos de portadores de RVU e recém-nascidos com malformações no trato urinário detectadas intra-útero) e instituição de medidas para evitar que eles apresentem IU febril; (iii) diagnóstico da síndrome de disfunção das eliminações e prescrição de medidas para sua correção. A nefropatia do refluxo é uma causa prevenível de IRC. Cabe aos nefrologistas a difusão desses conhecimentos na comunidade, assim como comprometer pediatras, obstetras e todos os profissionais que atuam no atendimento primário em programas para identificar e tratar esses fatores de risco.
Ponto-chave: • Há medidas eficazes, capazes de prevenir o desenvolvimento de nefropatia do refluxo, que precisam ser difundidas na comunidade
8.
9. 10.
11. 12. 13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22. 23.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 24. 1.
2.
3. 4.
5.
6.
7.
GOLDRAICH, N.P. & BARRATT, T.M. Vesicoureteric reflux and renal scarring. In: Holliday, M.A.; Vernier, R.L.; Barratt, T.M. (eds) Pediatric Nephrology, 2nd ed. Baltimore, Williams & Wilkins, 1987. pp. 647-666. BAILEY, R.R. Vesicoureteric reflux in healthy infants and children. In: Kincaid-Smith, P. & Hodson, J.C. (eds) Reflux Nephropathy. New York, Masson, 1979. pp. 59-61. HODSON, C.J. The radiological contribution toward the diagnosis of chronic pyelonephritis. Radiology, 88:857-861, 1967. BAILEY, R.R. The relationship of vesico-ureteric reflux to urinary tract infection and chronic pyelonephritis-reflux nephropathy. Clin. Nephrol., 1:132-141, 1973. HABIB, R.; BROYER, M.; BENMAIZ, J. Chronic renal failure in children: causes, rate of deterioration and survival data. Nephron, 11:209-220, 1973. JACOBSON, S.H.; EKLÖF, O.; ERIKSSON, C.G.; LINS, L.E.; TIDGREN, B.; WINBERG, J. Development of hypertension and uraemia after pyelonephritis in childhood: 27 year follow up. B.M.J., 299:703-706, 1989. KINCAID-SMITH, P. & BECKER, G.J. Reflux nephropathy in the adult. In: Kincaid-Smith, P. & Hodson, J.C. (eds) Reflux Nephropathy. New York, Masson, 1979. pp. 21-28.
25.
26.
27.
28.
29.
BAILEY, R.R. & LYNN, K.L. End-stage reflux nephropathy. In: Hodson, C.J.; Heptinstall, R.H.; Winberg, J. (eds) Reflux Nephropathy Update: 1983. Basel. Karger, 1984. pp. 102-110. HODSON, C.J. & EDWARDS, D. Chronic pyelonephritis and vesicoureteric reflux. Clin. Radiol., 2:219-231, 1960. HODSON, C.J.; MALING, T.M.J.; McMANAMON, P.J.; LEWIS, M.G. The pathogenesis of reflux nephropathy (chronic athrophic pyelonephritis). Br. J. Radiol. (suppl. 13), 1975. ROLLESTON, G.L.; SHANNON, F.T.; UTLEY, W.L.F. Follow-up of vesico-ureteric reflux in the newborn. Kidney Int., 8:S-59-64, 1975. RANSLEY, P.G. & RISDON, R.A. Reflux and renal scarring. Brit. J. Radiol. (Suppl. 14), 1978. RANSLEY, P.G. & RISDON R.A. Reflux nephropathy: effects of antimicrobial therapy on the evolution of the early pyelonephritic scar. Kidney Int., 20:733-742, 1981. RUSHTON, H.G.; MAJD, M.; JANTAUSCH, B.; WIEDERMANN, B.L.; BELMAN, A.B. Renal scarring following reflux and nonreflux pyelonephritis in children: evaluation with99mtechnetium-dimercaptosuccinic acid scintigraphy. J. Urol., 147:1327-1332, 1992. GOLDRAICH, N.P.; GOLDRAICH, I.H. Update on dimercaptosuccinic acid renal scanning in children with urinary tract infection. Pediatr. Nephrol., 9:221-226, 1995. POLITO, C.; LA MANNA, A.; RAMBALDI, P.F.; NAPPI, B.; MANSI, L.; DI TORO, R. High incidence of generally small kidney and primary vesicoureteral reflux. J. Urol., 164:479-482, 2000. PATTERSON, L.T.; STRIFE, C.F. Acquired versus congenital renal scarring after childhood urinary tract infection. J. Pediatr., 136:2-4, 2000. SWEENEY, B.; CASCIO, S.; VELAYUDHAM, M.; PURI, P. Reflux nephropathy in infancy: a comparison of infants presenting with and without urinary tract infection. J. Urol., 166:648-650, 2001. KAMIL, E.S. Recent advances in the understanding and management of primary vesicoureteral reflux and reflux nephropathy. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 9:139-42, 2000. WENNESTRÖM, M.; HANSSON, S.; JODAL, U.; STOCKLAND, E. Primary and acquired renal scarring in boys and girls with urinary tract infection. J. Pediatr., 136:30-34, 2000. RUSHTON, H.G.; MAJD, M.; CHANDRA, R.; YIM, D. Evaluation of 99mtechnetium-dimercapto-succinic acid renal scans in experimental acute pyelonephritis in piglets. J. Urol., 140:1169-1174, 1988. RANSLEY, P.G. & RISDON, R.A. Renal papillary morphology in infants and young children. Urol. Res., 3:111-113, 1975. GOLDRAICH, N.P. & GOLDRAICH, I.H. Follow-up of conservatively treated children with high and low grade vesicoureteral reflux: a prospective study. J. Urol., 148:1688-1692, 1992. SMELLIE, J.M.; RANSLEY, P.G.; NORMAND, I.C.S.; PRESCOD, N.; EDWARDS, D. Development of new renal scars: a collaborative study. BMJ, 2:1957-1960, 1985. GOLDRAICH, N.P. & GOLDRAICH, I.H. Infecção urinária na infância: patogenia. In: Cruz, J. et alii (eds). Atualidades em Nefrologia 2. São Paulo, Sarvier, 1992. pp. 105-13. SVANBORG-EDEN, C.; MAN, P.; JODAL, U.; LINDER, H.; LOMBERG, H. Host parasite interaction in urinary tract infection. Pediatr. Nephrol., 1:623-631, 1987. ROCHE, R.J. & MOXON, E.R. The molecular study of bacterial virulence: a review of current approaches, illustrated by the study of adhesion in uropathogenic Escherichia coli. Pediatr. Nephrol., 6:587596, 1992. SVANBORG, C.; BERGSTEN, G.; FISCHER, H.; FRENDEUS, B.; GODALY, G.; GUSTAFSSON, E.; HANG, L.; HEDLUND, M.; KARPMAN, D.; LUNDSTEDT, A.C.; SAMUELSSON, M.; SAMUELSSON, P.; SVENSSON, M.; WULLT, B. The ‘innate’ host response protects and damages the infected urinary tract. Ann. Med., 33:563-570, 2001. KASSIR, K.; VARGAS-SHIRAISHI, O.; ZALDIVAR, F.; BERMAN, M.; SINGH, J.; ARRIETA, A. Cytokine profiles of pediatric patients treated with antibiotics for pyelonephritis: potential therapeutic impact. Clin. Diagn. Lab. Immunol., 8:1060-1063, 2001.
capítulo 26
30.
31. 32. 33.
34.
35. 36. 37.
38.
39.
40.
41.
42.
43.
44.
45. 46.
47.
48.
49.
GDADEGESIN, R.A.; COTTON, S.A.; COUPES, B.M.; AWAN, A.; BRENCHLEY, P.E.C.; WEBB, N.J.A. Plasma and urinary soluble adhesion molecule expression is increased during first documented acute pyelonephritis. Arch. Dis. Child., 86:218-221, 2002. ROBERTS, J.A. Vesicoureteral reflux and pyelonephritis in the monkey: a review. J. Urol., 148:1721-1725, 1992. RISDON, R.A. The small scarred kidney in childhood. Pediatr. Nephrol., 7:361-364, 1993. KOFF, S.A.; WAGNER, T.T.; JAYANTHI, V.R. The relationship among dysfunctional elimination syndromes, primary vesicoureteral reflux and urinary tract infections in children. J. Urol., 160:10191022, 1998. NASEER, S.R.; STEINHARDT, G.F. New renal scars in children with urinary tract infections, vesicoureteral reflux and voiding dysfunction: a prospective evaluation. J. Urol., 158:566-568, 1997. ERICSSON, N.O. & IVEMARK, B.I. Renal dysplasia and pyelonephritis in infants and children. Part I. Arch. Pathol., 66:255-263, 1958. ERICSSON, N.O. & IVEMARK, B.I. Renal dysplasia and pyelonephritis in infants and children. Part II. Arch. Pathol., 66:264-269, 1958. MACKIE, G.G. & STEPHENS, F.D. Duplex kidneys: a correlation of renal dysplasia with position of the ureteral orifice. J. Urol., 114:274280, 1975. MARRA, G.; BARBIERI, G.; DELL’AGNOLA, C.A.; CACCAMO, M.L.; CASTELLANI, M.R.; ASSAEL, B.M. Congenital renal damage associated with primary vesicoureteral reflux detected prenatally in male infants. J. Pediatr., 124:726-730, 1994. NOE, H.N.; WYATT, R.J.; PEEDEN JR, J.N.; RIVAS, M.L. The transmission of vesicoureteral reflux from parent to child. J. Urol., 148:1869-1871, 1992. PURI, P.; CASCIO. S.; LAKSHMANDASS, G.; COLHOUN, E. Urinary tract infection and renal damage in sibling vesicoureteral reflux. J. Urol., 160:1028-1030, 1998. KLEMME, L.; FISH, A.J.; RICH, S.; GREENBERG, B.; SENSKE, B.; SEGALL, M. Familial ureteral abnormalities syndrome: genomic mapping, clinical findings. Pediatr. Nephrol., 12:349-356, 1998. SANYANUSIN, P.; SCHIMMENTI, L.A.; MCNOE, L.A.; MCNOE, L.A.; PIERPONT, M.E.A.; SULLIVAN, M.J.; DOBYNS, W.B.; ECCLES, M.R. Mutation of the PAX2 gene in a family with optic nerve coloboma, renal anomalies and vesicoureteral reflux. Nature Genet., 9:358-363, 1995. FEATHER, S.A.; MALCOLM, S.; WOOLF, A.S.; WRIGHT, V.; BLAYDON, D.; REID, C.J.D.; FLINTER, F.A.; PROESMANS, W.; DEVRIENDT, K.; CARTER, J.; WARWICKER, P.; GOODSHIP, T.H.J.; GOODSHIP, J.A. Primary, nonsyndromic vesicoureteric reflux and its nephropathy is genetically heterogeneous, with a locus on chromosome 1. Am. J. Hum. Genet., 66:1420-1425, 2000. BROCK III, J.W.; HUNLEY, T.E.; ADAMS, M.C.; KON, V. Role of the renin-angiotensin system in disorders of the urinary tract. J. Urol., 160:1812-1819, 1998. YOSIPIV, I.V.; EL-DAHR, S. Developmental biology of angiotensinconverting enzyme. Pediatr Nephrol., 12:72-79, 1998. BROCK III, J.W.; ADAMS, M.; HUNLEY, T.; WADA, A.; TRUSLER, L.; KON, V. Potential risk factors associated with progressive renal damage in childhood urological diseases: the role of angiotensinconverting enzyme gene polymorphism. J. Urol., 158:1308-1311, 1997. OZEN, S.; ALIKASOFOGLU, M.; SAATCI, U.; BAKKALOGLU, A.; BESBAS, N.; KARA, N.; KOCAB, H.; ERBAS, B.; UNSAL, I.; TUNCBILEK, E. Implications of certain genetic polymorphism in scarring in vesicoureteric reflux: importance of ACE polymorphism. Am. J. Kidney Dis., 34:140-145, 1999. HOHENFELLNER, K.; HUNLEY, T.E.; BREZINSKA, R.; BRODHAG, P.; SHYR, Y.; BRENNER, W.; HABERMEHL, P.; KON, V. ACE/ID gene polymorphism predicts renal damage in congenital uropathies. Pediatr Nephrol., 13:514-518, 1999. OHTOMO, Y.; NAGAOKA, R.; KANEKO, K.; FUKUDA, Y.; MIYANO, T.; YAMASHIRO, Y. Angiotensin converting enzyme gene polymorphism in primary vesicoureteral reflux. Pediatr. Nephrol., 16:648-652, 2001.
50.
51.
52.
53.
54.
55.
56.
57.
58.
59.
60.
61. 62.
63.
64.
65.
66.
67.
68.
69.
517 YONEDA, A.; OUE, T.; PURI, P. Angiotensin-converting enzyme genotype distribution in familial vesicoureteral reflux. Pediatr. Surg. Int., 17:308-311, 2001. RUSHTON, H.G. & BELMAN, A.B. Vesicoureteral reflux and renal scarring. In: Holliday, M.A.; Barratt, T.M.; Avner, E.D. (eds) Pediatric Nephrology, 3rd ed. Baltimore, Williams & Wilkins, 1994. pp. 963-986. GOLDRAICH, N.P.; GOLDRAICH, I.H.; ANSELMI, O.E.; RAMOS, O.L. Reflux nephropathy: the clinical picture in South Brazilian children. In: Hodson, C.J., Heptinstall, R.H., Winberg, J. (eds) Reflux Nephropathy Update: 1983. Basel, Karger, 1984. pp. 52-67. GOLDRAICH, N.P.; RAMOS, O.L.; GOLDRAICH, I.H. Urography versus DMSA scan in children with vesicoureteric reflux. Pediatr. Nephrol., 3:1-5, 1989. CRAIG, J.C.; IRWIG, L.M.; HOWMAN-GILES, R.B.; UREN, R.F.; BERNARD, E.J.; KNIGHT, J.F.; SURESHKUMAR, P.; ROY, L.P. Variability in the interpretation of dimercaptosuccinic acid scintigraphy after urinary tract infection in children. J. Nucl. Med., 39:14281432, 1998. MCILROY, P.J.; ABBOTT, G.D.; ANDERSON, N.G.; TURNER, J.G.; MOGRIDGE, N.; WELLS, J.E. Outcome of primary vesicoureteric reflux detected following fetal renal pelvic dilatation. J. Paediatr. Child Health, 36:569-573, 2000. SMELLIE, J.M. The intravenous urogram in the detection and evaluation of renal damage following urinary tract infection. Pediatr. Nephrol., 9:213-220, 1995. NGUYEN, H.T.; BAUER, S.B.; PETERS, C.A.; CONNOLLY, L.P.; GOBET, R.; BORER, J.G.; BARNEWOLT, C.E.; EPHRAIM, P.L.; TREVES, S.T.; RETIK, A.B. 99m Technetium dimercapto-succinic acid renal scintigraphy abnormalities in infants with sterile high grade vesicoureteral reflux. J. Urol., 164:1674-1679, 2000. STOKLAND, E.; HELLSTROM, M.; HANSSON, S.; JODAL, U.; ODEN, A.; JACOBSSON, B. Reliability of ultrasonography in identification of reflux nephropathy in children. BMJ, 309:235-239, 1994. RODRÍGUEZ, L.V.; SPIELMAN, D.; HERFKENS, R.J.; SHORTLIFFE, L.D. Magnetic resonance imaging for the evaluation of hydronephrosis, reflux and renal scarring in children. J. Urol., 166:1023-1027, 2001. CHAN, Y.L.; CHAN, K.W.; YEUNG, C.K.; ROEBUCK, D.J.; CHU, W.C.; LEE, K.H.; METREWELI, C. Potential utility of MRI in the evaluation of children at risk of renal scarring. Pediatr. Radiol., 29:856862, 1999. GOONASEKERA, C.D.; DILLON, M.J. Reflux nephropathy and hypertension. J. Hum. Hypertens., 12:497-504, 1998. SAVAGE, J.M.; DILLON, M.J.; SHAH, V.; BARRATT, T.M.; WILLIAMS, D.I. Renin and blood pressure in children with renal scarring and vesicoureteric reflux. Lancet, 2:441-444, 1978. SAVAGE, J.M.; KOH, C.T.; SHAH V.; BARRATT, T.M.; DILLON, M.J. Five years prospective study of plasma renin activity and blood pressure in patients with longstanding reflux nephropathy. Arch. Dis. Child., 62:678-682, 1987. JARDIM, H.; SHAH, V.; SAVAGE, J.M.; BARRATT, T.M.; DILLON, M.J. Prediction of blood pressure from plasma renin activity in reflux nephropathy. Arch. Dis. Child., 66:1213-1216, 1991. GOONASEKERA, C.D.A.; SHAH, V.; WADE, A.M.; BARRATT, T.M.; DILLON, M.J. 15-year follow-up of rennin and blood pressure in reflux nephropathy. Lancet, 347:640-643, 1996. WENNERSTRÖM, M.; HANSSON, S.; HEDNER, T.; HIMMELMANN, A.; JODAL, U. Ambulatory blood pressure 16-26 years after the first urinary tract infection in childhood. J. Hypertens., 18:485491, 2000. SHANON, A. & FELDMAN, W. Methodologic limitations in the literature on vesicoureteral reflux: a critical review. J. Pediatr., 117:171-178, 1990. WOLFISH, N.M.; DELBROUCK, N.F.; SHANON, A.; MATZINGER, M.A.; STENSTROM, R.; McLAINE, P.N. Prevalence of hypertension in children with primary vesicoureteral reflux. J. Pediatr., 123:559563, 1993. KÖHLER, J.; TENCER, J.; THYSELL, H.; FORSBERG, L. Vesicoure-
518
70.
71.
72. 73. 74. 75.
76.
77. 78.
79.
80.
Nefropatia do Refluxo
teral reflux diagnosed in adulthood. Incidence of urinary tract infections, hypertension, proteinuria, back pain and renal calculi. Nephrol. Dial. Transplant., 12:2580-2587, 1997. MARTINELL, J.; LIDIN-JANSON, G.; JAGENBURG, R.; SIVERTSSON, R.; CLAESSON, I., JODAL, U. Girls prone to urinary infections followed into adulthood. Indices of renal disease. Pediatr. Nephrol., 10:139-142, 1996. SMELLIE, J.M.; PRESCOD, N.P.; SHAW, P.J.; RISDON, R.A.; BRYANT, T.N. Childhood reflux and urinary infection: a follow-up of 10-41 years in 226 adults. Pediatr. Nephrol., 12:727-736, 1998. KINCAID-SMITH, P. Reflux nephropathy. B.M.J., 286:2002-2003, 1983. STEINHARDT, G.F. Reflux nephropathy. J. Urol., 134:855-859, 1985. VERRIER-JONES, K. Prognosis for vesicoureteric reflux. Arch. Dis. Child., 81:287-294, 1999. ESBJÖRNER, E.; ARONSON, S.; BERG, U.; JODAL, U.; LINNE, T. Children with chronic renal failure in Sweden 1978-1985. Pediatr. Nephrol., 4:249-252, 1990. ESBJÖRNER, E.; BERG, U.; HANSSON, S. Epidemiology of chronic renal failure in children: a report from Sweden 1986-1994. Pediatr. Nephrol., 11:438-442, 1997. MADANI, K.; OTOUKESH, H.; RASTEGAR, A.; WHY, S.V. Chronic renal failure in Iranian children. Pediatr. Nephrol., 16:140-144, 2001. FIVUST, B.A.; JABS, K.; NEU, A.M.; SULLIVAN, E.K.; FELD, L.; KOOHAUT, E.; FINE, R. Chronic renal insufficiency in children and adolescents: the 1996 annual report of NAPRTCS. Pediatr. Nephrol., 12:328-337, 1998. LAGOMARSIMO, E.; VALENZUELA, A.; CAVAGNARO, F.; SOLAR, E. Chronic renal failure in pediatrics 1996. Chilean survey. Pediatr. Nephrol., 13:288-291, 1999. BECKER, G.J.; FAIRLEY, K.F.; WHUTWORTH, J.A. Pregnancy exacerbates glomerular disease. Am. J. Kidney Dis., 6:266-272, 1985.
81. SACKS, S.H.; VERRIER JONES, K.; ROBERTS, R.; ASSCHER, A.W.; LEDINGHAM, J.G.G. Effects of symptomless bacteriuria in childhood on subsequent pregnancy. Lancet, 1:991-994, 1987. 82. MARTINELL, J.; JODAL, U.; LIDIN-JANSON, G. Pregnancies in women with and without renal scarring after urinary infections in childhood. B.M.J., 300:840-844, 1990. 83. JUNGERS, P.; HOUILLIER, P.; CHAUVEAU, D.; CHOUKROUN, G.; MOYNOT, A.; SKHIRI, H.; LABRUNIE, M.; DESCAMPSLATSCHA, B.; GRUNFELD, J.P. Pregnancy in women with reflux nephropathy. Kidney Int., 50:593-599, 1996. 84. TADA, M.; JIMI, S.; HISANO, S.; SASATOMI, Y.; OSHIMA, K.; MATSUOKA, H.; TAKEBAYASHI, S. Histopathological evidence of poor prognosis in patients with vesicoureteral reflux. Pediatr. Nephrol., 16:482-487, 2001. 85. VALLEE, J.P.; VALLEE, P.D.; GREENFIELD, S.P.; WAN, J.; SPRINGATE, J. Contemporary incidence of morbidity related to vesicoureteral reflux. Urology, 53:812-815, 1999. 86. Practice parameter: the diagnosis, treatment, and evaluation of the initial urinary tract infection in febrile infants and young children. American Academy of Pediatrics. Committee on Quality Improvement. Subcommittee on Urinary Tract Infection. Pediatrics, 103:843852, 1999. 87. SHAW, K.N.; GORELICK, M.; McGOWAN, K.L.; YAKSCOE, N.M.; SCHWARTZ, J.S. Prevalence of urinary tract infection in febrile young children in the emergency department. Pediatrics, 102:e16, 1998. http://www.pediatrics.org/cgi/content/full/102/ 2/e16 88. ROBERTS, K.B. The AAP practice parameter on urinary tract infections in febrile infants and young children. American Academy of Pediatrics. Am. Fam. Physician, 62:1815-1822, 2000.
Capítulo
Doenças Vasculares dos Rins
27
José H. Rocco Suassuna, Ricardo Augusto Faria e Carlos Perez Gomes
INTRODUÇÃO
Microangiopatias trombóticas
DOENÇAS DOS GRANDES VASOS Trombose e embolia das artérias renais Etiologia
Púrpura trombocitopênica trombótica e síndrome hemolítico-urêmica Nefrite por irradiação
Quadro clínico
Etiopatogenia
Diagnóstico
Manifestações clínicas e laboratoriais
Tratamento e prognóstico
Tratamento
Trombose das veias renais
Esclerodermia renal
Etiologia
Patologia
Manifestações clínicas e exames complementares
Manifestações clínicas e laboratoriais
Tratamento
Tratamento
DOENÇAS DAS ARTERÍOLAS Doença renal ateroembólica
Síndrome do anticorpo antifosfolipídio Etiopatogenia
Patologia e manifestações clínicas
Manifestações clínicas e laboratoriais
Diagnóstico, prognóstico e tratamento
Tratamento
Nefrosclerose hipertensiva arteriolar benigna Patologia
DOENÇAS DA MICROCIRCULAÇÃO Nefropatia da anemia falciforme
Epidemiologia
Etiopatogenia
Diagnóstico
Manifestações clínicas
Tratamento
Tratamento
Nefrosclerose maligna Patologia
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Quadro clínico Tratamento
INTRODUÇÃO Por ser a circulação arterial renal do tipo terminal, qualquer obstrução ao seu fluxo determina alterações isquêmicas no parênquima dependente. As anormalidades resultantes variam em função do diâmetro do vaso afetado, do grau de obstrução ao fluxo sangüíneo, da velocidade de instalação do processo de obstrução e da massa afetada total do parênquima renal. Por exemplo, uma oclusão total e súbita
da artéria renal resulta em infarto isquêmico, dor e perda total da função do rim. Por outro lado, a estenose progressiva causada pela doença renovascular não determina perda imediata da função renal, mas costuma acompanhar-se por outras manifestações, como a hipertensão arterial grave. Com o passar do tempo, a estenose se estreita e, eventualmente, também pode resultar em exclusão funcional do rim. Por conta dos mesmos fatores, as doenças dos vasos renais de menor calibre também podem apresentar
520
Doenças Vasculares dos Rins
Quadro 27.1 Principais doenças vasculares do rim 1. Doenças dos grandes vasos Embolia e trombose das artérias renais Doença renovascular (estenose da artéria renal) Trombose venosa 2. Doenças das arteríolas Vasculites renais Doença renal ateroembólica Nefrosclerose hipertensiva arteriolar benigna Nefrosclerose maligna Microangiopatias trombóticas Púrpura trombocitopênica trombótica e síndrome hemolítico-urêmica Nefrite por radiação Esclerodermia renal Síndrome do anticorpo antifosfolipídio 3. Doenças da microcirculação Nefropatia da anemia falciforme Glomerulonefrite rapidamente progressiva pauciimune
manifestações clínicas diversas, incluindo: insuficiência renal súbita ou lentamente progressiva, normo- ou hipertensão arterial, infartos distais ou fibrose progressiva, etc. Para facilitar a discussão das doenças vasculares renais, convém agregá-las em grupos (Quadro 27.1). Algumas (doença renovascular, vasculites e glomerulonefrites rapidamente progressivas pauciimunes) não serão discutidas, pois são abordadas em outros capítulos deste livro.
Pontos-chave: • A circulação arterial renal é terminal, o que significa que a oclusão de uma artéria ou arteríola acarreta isquemia em todo o território distal • A veias renais anastomosam-se amplamente, o que minimiza as conseqüências clínicas da obstrução venosa
DOENÇAS DOS GRANDES VASOS Trombose e Embolia das Artérias Renais ETIOLOGIA A embolização das artérias renais de maior calibre ocorre, em geral, a partir de trombos formados a distância, principalmente na parede do miocárdio, por conta de arritmias ou infarto, além de complicações de procedimentos vasculares.1 Condições menos comuns incluem os trombos formados nas vegetações valvares da endocardite bacteriana ou êmbolos relacionados a neoplasias.
A trombose da artéria renal está geralmente associada a uma lesão endotelial, que pode ser um ateroma preexistente ou um traumatismo na camada íntima do vaso (p. ex., colocação de próteses intra-arteriais por cateterismo e, em transplantes renais, inserção de cânulas de perfusão ou anastomose vascular). Outras causas incluem poliarterite nodosa, síndrome de anticorpo antifosfolipídio, sífilis, neoplasias, anemia falciforme e, mais recentemente, uso de drogas como cocaína, ciclosporina e anticorpo monoclonal OKT3.2-6
QUADRO CLÍNICO Na aterosclerose progressiva, a lesão irregular permite a manutenção de um fluxo de sangue para o setor vascular afetado. Dessa forma, quando a trombose do rim sobrevém, esta é acompanhada de poucos sintomas. Em contrapartida, a oclusão aguda, total ou segmentar, por um êmbolo ou por trombose sobre placa de ateroma produz infarto renal acompanhado de sintomatologia intensa. Além da dor lombar, hematúria, náuseas, vômitos e febre, podem-se observar sinais de embolia extra-renal (lesões na pele ou no sistema nervoso central).2-4,7
DIAGNÓSTICO Os exames laboratoriais podem revelar elevação da desidrogenase láctica sangüínea e urinária, leucocitose e, dependendo da massa renal afetada, elevação da creatinina sérica.8 A elevação da desidrogenase láctica em cinco vezes o seu valor normal, sem elevação concomitante das transaminases, é bastante sugestiva de infarto renal e ajuda o diagnóstico diferencial com infarto do miocárdio, hemólise ou rejeição de transplante renal. A hematúria macroscópica é observada em menor freqüência, provavelmente devido à diminuição da perfusão renal da área comprometida.7 A cintigrafia renal, por não necessitar de meio de contraste nefrotóxico e não ser invasiva como a arteriografia renal, ainda é o exame de escolha para demonstrar um déficit de perfusão segmentar ou generalizado. A ultrasonografia com doppler, mais simples e barata, vem substituindo a cintigrafia em muitos serviços. A menor sensibilidade do doppler para detectar infartos e tromboses segmentares pode ser um problema em algumas situações. A tomografia computadorizada pode ser útil para diagnóstico de infarto renal, mas utiliza contraste radiológico, o que pode, em pacientes de risco (diabetes, mieloma, disfunção renal prévia), agravar a insuficiência renal. A arteriografia renal ainda é o método diagnóstico definitivo.7
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO O tratamento de escolha da trombose ou embolia renal é a desobstrução precoce das artérias renais com trombolíticos, seguida de anticoagulação sistêmica. O uso locorregional de trombolíticos (cateterismo seletivo), com ou
521
capítulo 27
sem angioplastia, pode minimizar os efeitos hemorrágicos sistêmicos e melhorar o resultado da terapia.9-12 A introdução da trombólise resultou em melhora das taxas de recuperação funcional e menor mortalidade, em pacientes de alto risco, portadores de cardiopatias, doença isquêmica cerebral e insuficiência mesentérica.13 A grande indicação da intervenção cirúrgica é a embolia recente que ocorre no pós-operatório imediato de cirurgias vasculares ou como complicação da colocação de próteses vasculares (stents) por técnicas angiográficas. Também é indicada na falência da terapia trombolítica, principalmente em casos de rim único ou acometimento bilateral. A recuperação da função renal somente é possível quando a terapêutica se inicia num período de 90 a 180 minutos após obstrução. Infelizmente, na maioria das vezes, o diagnóstico somente é feito num intervalo de 3 a 6 dias após o início dos sintomas.7 Nesses casos, o tratamento é basicamente de suporte.13 Quando a obstrução renal é secundária a uma embolia, deve-se procurar identificar e tratar a causa subjacente, visando à prevenção de novos episódios, inclusive para outros territórios vasculares.
Pontos-chave: • Obstruções arteriais agudas causam infarto renal e sintomatologia florida • Obstruções arteriais progressivas causam hipertensão e disfunção renal, a trombose é um evento tardio que cursa com pouca sintomatologia
Trombose das Veias Renais ETIOLOGIA O principal fator de risco para a trombose das veias renais é a proteinúria maciça.14 O risco de trombose de veia renal é maior quando a proteinúria excede 10 g/dia e a albumina sérica é inferior a 2 g/dl.15 Essa associação é explicada pela existência de um estado de hipercoagulabilidade na síndrome nefrótica, aparentemente provocado pela perda urinária de proteínas envolvidas na anticoagulação natural do sangue (p. ex., antitrombina III) e pelo excesso de produção do fibrinogênio em conseqüência ao aumento da síntese protéica no fígado.16 Uma possibilidade etiológica mais remota seria um estímulo pró-coagulante sistêmico provocado pela inflamação glomerular de etiologia imunológica. Notadamente a maior incidência de trombose das veias renais ocorre na síndrome nefrótica provocada pela nefropatia membranosa e pela glomerulonefrite membrano-proliferativa, o que sustentaria a hipótese de mediação por fenômenos imunológicos.14
Atualmente, fatores genéticos como a mutação do fator V de Leiden e deficiências das proteínas C e S da coagulação têm sido implicados na trombose de veias renais, principalmente em recém-nascidos e em transplantes renais.17-20 Devem-se ainda considerar as neoplasias, especialmente o carcinoma de células renais.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E EXAMES COMPLEMENTARES Ao contrário da circulação arterial, a circulação venosa dos rins não é do tipo terminal. Existem anastomoses extensas entre as veias tributárias que se unem para formar a veia renal única que drena cada um dos rins. Assim, a trombose de uma veia segmentar não compromete a circulação do parênquima afetado. Por este motivo, as tromboses renais costumam ser assintomáticas. Disfunção renal significativa, mesmo assim em uma minoria dos casos, só é encontrada em casos com a trombose total da veia renal principal. A principal complicação da trombose da veia renal é a migração do trombo para a veia cava e daí para o pulmão, causando embolia pulmonar.3,16 O diagnóstico diferencial de manifestações pulmonares ou cardiovasculares agudas em pacientes com síndrome nefrótica deve incluir a possibilidade da migração de um trombo para o pulmão. O diagnóstico de certeza da trombose da veia renal é feito com venografia seletiva por cateterismo.3,16 Técnicas de eco-doppler com medida de fluxo também podem ser usadas, mais como triagem para pacientes de risco elevado.21
TRATAMENTO O tratamento baseia-se no combate à hipercoagulabilidade.3,16 A terapia imediata é a anticoagulação, recomendada nos casos com comprovação de trombose. Terapia trombolítica local deve ser considerada em situações específicas, considerando os riscos de sangramentos em outros sítios.22 É controverso o uso profilático de anticoagulantes em pacientes nefróticos do grupo de alto risco (p. ex., portadores de nefropatia membranosa com proteinúria maciça),23 mas há relatos de benefício do uso de aspirina em transplantados renais.24 A longo prazo procura-se tratar a doença glomerular, objetivando a melhora da perda protéica urinária e o controle da inflamação glomerular.
DOENÇAS DAS ARTERÍOLAS Doença Renal Ateroembólica A placa de ateroma é uma das principais lesões da aterosclerose. Uma placa de ateroma típica localiza-se na camada íntima dos vasos arteriais, sendo composta por uma capa fibrocelular que recobre uma lesão amorfa constituída por macrófagos diferenciados em células esponjosas,
522
Doenças Vasculares dos Rins
células musculares lisas, cristais de colesterol e debris necróticos.25 A placa de ateroma pode sofrer degeneração e produzir ulcerações e fissuras da camada íntima. As soluções de continuidade no revestimento endotelial favorecem a agregação e adesão de plaquetas e, eventualmente, dão origem a trombos murais. A embolização de cristais de colesterol ou ateroembolia é uma complicação da doença aterosclerótica da aorta, causada pelo desnudamento das placas de ateromas. Nesses casos, o conteúdo da placa destaca-se da parede vascular e migra pela corrente sangüínea até alojar-se em vasos arteriais distais de menor calibre. Por conta do elevado fluxo sangüíneo, a circulação renal é um dos territórios acometidos com maior freqüência. Pacientes com doença aterosclerótica grave podem apresentar ateroembolias espontâneas. No entanto, a maioria dos casos ocorre devido ao uso de anticoagulantes, incluindo heparina de baixo peso molecular,26,27 trombolíticos28-30 e, principalmente, após traumatismos da parede da aorta causados por cateteres angiográficos ou por manipulação cirúrgica.31,32 O acesso por via femoral está associado a uma maior freqüência de ateroembolias, talvez porque as placas de ateroma são mais freqüentes na aorta abdominal.33 Pacientes com doença renovascular submetidos à angiografia correm maior risco porque geralmente têm doença aterosclerótica concomitante na aorta. Estima-se que a ateroembolia pode ocorrer em até 2% do total de cateterismos cardíacos.34 A ateroembolia também pode acometer rins transplantados. Quando a fonte emboligênica é de origem do doador, a chance de perda de enxerto se agrava, talvez pelo maior trauma vascular durante a procura e a retirada do órgão.35
Fig. 27.1 Doença renal ateroembólica. Os cristais de colesterol em formato de agulha são removidos durante o processamento do tecido, restando apenas uma imagem negativa no lúmen da artéria interlobular onde eles se encontravam depositados. O processo inflamatório intravascular que se formou em torno dos cristais é constituído por macrófagos e células gigantes. (Cortesia da Dra. Maria Lucia Ribeiro Caldas. Universidade Federal Fluminense.)
(isquemia enteromesentérica) e retinianas (déficits visuais por isquemia retiniana).38 As manifestações cutâneas da ateroembolia incluem o aparecimento de livedo reticularis na pele das pernas (Fig. 27.2) ou do abdome, cianose de extremidades e úlceras dolorosas nos pés. A cianose dos dedos dos pés na presença de pulso pedioso palpável configura a “síndrome do dedo azul” (blue toe syndrome), quadro bastante sugestivo do diagnóstico.
PATOLOGIA E MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Nos primeiros dias, o quadro clínico da ateroembolia renal é relativamente pobre,37 mas pode ocorrer exacerbação da hipertensão arterial.36 Nesta fase, a oclusão vascular ainda é parcial, mas suficiente para estimular a liberação de renina. Após alguns dias, os cristais embolizados dão origem a um processo inflamatório endovascular caracterizado pelo acúmulo de macrófagos, eosinófilos e células gigantes multinucleadas. Esse processo reacional determina estreitamento progressivo da luz vascular que culmina com sua oclusão (Fig. 27.1). Por conta da isquemia progressiva em grandes áreas do parênquima renal, a principal manifestação clínica tardia é a insuficiência renal de curso subagudo, que se instala três a oito semanas após a embolização.32,33,37 Além da insuficiência renal, pacientes com embolização por cristais de colesterol podem apresentar manifestações relacionadas ao comprometimento de outros órgãos. Em ordem decrescente, ocorrem: manifestações cutâneas, neurológicas (acidente vascular isquêmico), gastrintestinais
Fig. 27.2 Extensa área de livedo reticularis nos membros inferiores de um paciente com ateroembolia após cateterismo cardíaco.
523
capítulo 27
Pacientes com doença renal ateroembólica podem apresentar eosinofilia e hipocomplementemia transitórias.37,39-41 Uma revisão de 129 casos com confirmação histológica documentou eosinofilia em 71% dos casos.38 O exame de elementos anormais e sedimento urinário (EAS) pode revelar hematúria, piúria e eosinofilúria.32,37,42 Geralmente detecta-se proteinúria inferior a 3 g/dia, embora alguns pacientes possam atingir níveis nefróticos.32,37
DIAGNÓSTICO, PROGNÓSTICO E TRATAMENTO O diagnóstico de certeza da ateroembolia depende da demonstração histológica da imagem negativa característica (um artefato da técnica histológica) dos cristais de colesterol na luz de vasos de pequeno calibre (Fig. 27.1).37 Em pacientes com manifestações cutâneas isto pode ser evidenciado em biópsias de pele. Em geral, a biópsia renal é o exame de escolha. Infelizmente, as lesões vasculares são focais e, com freqüência, são necessários cortes seriados cuidadosos para encontrar os cristais característicos.29,42 Infiltrado inflamatório com eosinófilos no rim de pacientes idosos com disfunção renal sugere embolia espontânea e indica a realização de cortes seriados adicionais visando à detecção dos cristais característicos.43 No contexto clínico apropriado, a confirmação histológica pode ser desnecessária.32 A presença de ateroembolia é praticamente certa em pacientes com insuficiência renal progressiva, história de procedimento angiográfico nos últimos dois meses, livedo reticularis em membros inferiores e a “síndrome do dedo azul”. A detecção de eosinofilia, diminuição do complemento sérico e eosinofilúria servem como confirmação adicional do diagnóstico. Recentemente, propôs-se que, na ausência de biópsia renal, a ateroembolia pode ser diagnosticada mediante o preenchimento dos critérios expostos no Quadro 27.2.44 Em pacientes submetidos a exames angiográficos, o diagnóstico diferencial da insuficiência renal inclui a nefrotoxicidade por contraste radiológico.33 Nesses casos, a elevação da creatinina é bem mais rápida, assim como a recuperação da função renal, que ocorre no máximo em três semanas. Já a oclusão vascular progressiva que se segue à
Quadro 27.2 Critérios para diagnóstico clínico da doença renal ateroembólica Documentação de doença ateroesclerótica difusa História de exposição a fator(es) precipitante(s) de ateroembolia, como: cateterização retrógrada da aorta, cirurgia cardíaca/vascular ou anticoagulação/terapia trombolítica por pelo menos 24 horas Insuficiência renal aguda definida por elevação da creatinina em mais de 50% sobre o basal Livedo reticular, necrose cutânea focal, “síndrome do dedo azul” ou ateroembolia retiniana
embolia por colesterol costuma causar lesão renal irreversível. Dependendo da extensão da massa renal comprometida, a disfunção renal pode estabilizar-se. No entanto, a maioria dos pacientes com manifestações características tende a evoluir para insuficiência renal dependente de suporte dialítico, sendo rara a reversão espontânea após algum tempo em diálise.32,37 Uma vez instalada, é muito difícil reverter a disfunção causada pela ateroembolia renal. Medidas profiláticas, como preferência pelo acesso braquial, uso de cateteres e guias mais maleáveis e uso criterioso de anticoagulantes, podem contribuir para diminuir sua ocorrência. A mortalidade global no primeiro ano é muito elevada, na ordem de aproximadamente 70%.32,45 Em observações não controladas, suporte intensivo precoce, associado ao emprego de corticosteróides, parece resultar em melhora do prognóstico.44,46
Pontos-chave: • Na fase aguda, o alojamento dos cristais de colesterol na microcirculação produz poucas manifestações renais • A disfunção renal na ateroembolia geralmente ocorre semanas após o evento causal, em virtude da reação inflamatória intravascular que se forma em torno dos cristais
Nefrosclerose Hipertensiva Arteriolar Benigna A nefrosclerose é uma alteração característica do envelhecimento, mas que sofre incremento pela associação com hipertensão arterial sustentada. Com o passar dos anos, a persistência de um regime de hipertensão arterial causa alterações estruturais progressivas nos pequenos vasos de diversos territórios vasculares. As arteríolas do rim estão entre as estruturas mais comprometidas. As alterações vasculares e a isquemia resultante promovem lesões glomerulares e túbulo-intersticiais e, geralmente, levam à progressão para insuficiência renal crônica.47 Sabe-se hoje que isso não acontece com a freqüência que se supunha no passado. Quando se estudam pacientes com diagnóstico de doença renal terminal presumivelmente causada por hipertensão, observa-se que um percentual significativo dos que chegam a necessitar de diálise apresenta substituição das estruturas do rim por colágeno (esclerose) conseqüente a uma doença renal bem definida, como estenose das artérias renais, vasculite ou glomerulonefrite primária.48-50 A diminuição da filtração glomerular associada ao envelhecimento caracteriza-se por lesões vasculares e escleróticas, mas não é suficiente para resul-
524
Doenças Vasculares dos Rins
tar em disfunção renal clinicamente significativa. Entretanto, a superposição da hipertensão arterial, mesmo moderada, parece acelerar o desenvolvimento dessas lesões.51 Principalmente na raça negra, isso pode resultar em doença renal significativa. A grande maioria dos pacientes com hipertensão arterial desenvolve nefrosclerose. Embora em alguns indivíduos o nível de creatinina possa elevar-se acima do valor normal, somente uma minoria apresenta comprometimento clinicamente significativo da filtração glomerular.
PATOLOGIA As características histopatológicas principais da nefrosclerose benigna são hipertrofia da camada muscular das artérias, duplicação da lâmina elástica interna e espessamento da camada íntima, algumas vezes com deposição de material hialino na região subintimal. Por conta do estreitamento da luz das arteríolas renais aferentes e eferentes, ocorre envolvimento glomerular e túbulo-intersticial.47,52,53 Especula-se que os depósitos hialinos sejam resultado do aumento da permeabilidade dos vasos sangüíneos. Como conseqüência, macromoléculas difundidas a partir do plasma se acumulariam na região subintimal. Essa seria a causa da deposição de imunoglobulinas que se observa nas paredes das arteríolas de pacientes com nefrosclerose benigna. Por outro lado, a exposição excessiva a fatores de crescimento oriundos da circulação também seria capaz de causar lesões proliferativas e hipertróficas.52 A resposta hipertrófica da camada íntima das artérias do rim pode representar uma tentativa de proteção contra os efeitos hemodinâmicos da pressão arterial sobre as arteríolas e capilares renais. Finalmente, a esclerose global ou focal pode ser conseqüente à isquemia glomerular. O comprometimento focal é acompanhado de hipertrofia glomerular que pode estar envolvida na natureza progressiva da doença renal. Este estágio da doença, que se associa com lesão tubulointersticial crônica, recebe o nome de nefrosclerose benigna descompensada. Em geral, a creatinina sérica supera 2 mg/dl e a sobrevida renal é pior do que nas glomerulopatias primárias.54
EPIDEMIOLOGIA Em grandes estudos populacionais observa-se que, em princípio, pacientes com hipertensão leve ou moderada não estão sujeitos a maior incidência de doença renal crônica progressiva.55 No entanto, alguns fatores de risco específicos para a progressão para insuficiência renal estão bem caracterizados. Os principais seriam a raça negra, a presença de co-morbidade (como diabetes mellitus ou doença renal parenquimatosa associada) e episódios repetidos de elevações acentuadas e sem controle da pressão arterial.47
Uma das características do fator de risco racial é a sua persistência, mesmo na situação de controle da pressão arterial. Isto quer dizer que, apesar do acesso ao tratamento, a evolução para falência renal é significativamente maior em pacientes da raça negra. 56 Uma hipótese explicativa seria a menor dotação de néfrons em recémnascidos de baixo peso, uma condição prevalente em pacientes de raça negra submetidos a condições sócio-econômicas inadequadas.57 É possível que fatores outros, como diferenças raciais no ritmo circadiano da pressão arterial e das oscilações da filtração glomerular (falta de diminuição fisiológica noturna), possam dificultar o controle da pressão arterial em negros e justificar o maior risco de doença renal.58,59
DIAGNÓSTICO A doença renal hipertensiva manifesta-se por elevação da creatinina sérica ou proteinúria, que, via de regra, é moderada. Uma das características da nefrosclerose benigna, que pode ser reflexo da diminuição do fluxo sangüíneo renal, é a elevação do ácido úrico independente do uso prévio de diuréticos.60 A proteinúria não costuma exceder 1 g em 24 horas. Pacientes com proteinúria são mais propensos a evoluir com perda da função renal, talvez como conseqüência da hiperfiltração glomerular. O diagnóstico da nefrosclerose benigna baseia-se na história e na evolução da doença. A hipertensão deve preceder a doença renal. A presença de retinopatia hipertensiva também auxilia no diagnóstico. A biópsia renal normalmente não é necessária, a não ser em pacientes sem antecedentes de doença hipertensiva.
TRATAMENTO O controle da pressão arterial tem um papel importante na prevenção da progressão para doença renal crônica terminal em pacientes com nefrosclerose benigna. Estudos comparativos demonstram que, independente das drogas utilizadas, pacientes com controle rigoroso apresentam, ao longo do tempo, menor deterioração funcional renal.61 Entretanto, em uma metanálise com aproximadamente 25.000 pacientes hipertensos sem nefropatia prévia, em uso de diuréticos e bloqueadores adrenérgicos, não houve diminuição do risco na progressão para IRC, apesar de ter ocorrido diminuição nos eventos cardiovasculares.62 O uso de drogas como inibidores da enzima conversora da angiotensina ou bloqueadores do receptor de angiotensina pode oferecer maior benefício em relação à proteção renal, mas ainda não existe comprovação em estudos populacionais. Apesar do tratamento dialítico, a mortalidade deste grupo é elevada, principalmente pela co-morbidade representada pela doença cardíaca hipertensiva e pela doença cérebro-vascular. Isto indica que a doença não se restringe aos rins mas, ao contrário, existe comprometimento sistêmico e progressivo.
capítulo 27
525
Pontos-chave: • A grande maioria dos pacientes com hipertensão arterial desenvolve nefrosclerose • As características histopatológicas principais da nefrosclerose benigna são hipertrofia da camada muscular das artérias, duplicação da lâmina elástica interna e espessamento da camada íntima • Os principais fatores de risco para a insuficiência renal seriam a raça negra, a presença de co-morbidade (como diabetes mellitus ou doença renal parenquimatosa associada) e episódios repetidos de elevações acentuadas e sem controle da pressão arterial • Apesar do acesso ao tratamento, a evolução para falência renal é significativamente maior em pacientes da raça negra • O controle da pressão arterial tem um papel importante na prevenção da progressão para doença renal crônica terminal em pacientes com nefrosclerose benigna
Nefrosclerose Maligna A elevação acentuada e sustentada da pressão arterial (hipertensão acelerada) acelera a progressão da doença renal, de tal sorte que a insuficiência renal crônica terminal sobrevém ao final de alguns poucos anos.47 Alguns autores separam a hipertensão acelerada da hipertensão maligna. Nesta última, o quadro clínico e as alterações histopatológicas decorrem de uma elevação acentuada e relativamente aguda da pressão arterial que determina sofrimento agudo dos órgãos-alvo da hipertensão (cérebro, retina, rins, coração e grandes vasos). Atualmente é comum não fazer distinção tão nítida entre os dois quadros.63
Fig. 27.3 Hipertensão arterial. Hiperplasia e fibrose da camada íntima resultando no aspecto de camadas concêntricas conhecido pelo nome de lesão em “bulbo de cebola”. (Cortesia da Dra. Maria Lucia Ribeiro Caldas. Universidade Federal Fluminense.)
na esclerose sistêmica progressiva e na síndrome hemolítico-urêmica.63 Em casos mais graves pode ocorrer necrose fibrinóide das artérias de menor calibre, das arteríolas e dos capilares renais (Fig. 27.4). Uma das possibilidades para explicar as alterações da nefrosclerose maligna seria a incapacidade da circulação em regular a perfusão arteriolar de forma adequada (perda da auto-regulação).64 Em condições normais, a circulação se protege dos picos de tensão arterial através da vasoconstrição arteriolar, com conseqüente queda da pressão no território vascular a jusante. Nos pacientes com hipertensão maligna haveria transmissão direta da tensão arterial para a parede desses vasos. As cifras de hipertensão em que esse fenômeno se instala podem variar conforme a patologia de base, mas, em geral,
PATOLOGIA A elevação exagerada e prolongada da pressão arterial se acompanha por hiperplasia e fibrose da camada íntima que termina por estreitar o lúmen arterial. Nos vasos de médio calibre ocorre estreitamento da luz vascular devido à grande expansão da camada íntima. O padrão de lesão intimal, juntamente com a duplicação da lâmina elástica interna, dá origem a um aspecto histopatológico concêntrico característico que recebe o nome de “bulbo de cebola” (Fig. 27.3). Essas alterações histológicas típicas são semelhantes, senão indistinguíveis, das lesões observadas
Fig. 27.4 Hipertensão arterial maligna. Necrose fibrinóide subintimal em artéria interlobular previamente acometida por hiperplasia intimal concêntrica. (Cortesia da Dra. Maria Lucia Ribeiro Caldas. Universidade Federal Fluminense.)
526
Doenças Vasculares dos Rins
ocorrem a partir da faixa de 130 mmHg de pressão diastólica sustentada.64
QUADRO CLÍNICO Com freqüência, em pacientes com níveis tensionais previamente elevados, a hipertensão maligna instala-se como uma complicação, alterando um curso anteriormente benigno. Nesses casos, deve-se procurar sempre um fator de agudização, como a doença renovascular aterosclerótica ou o uso insuficiente ou inapropriado de medicação. 63,65 Fatores genéticos, como polimorfismo do gene das ECA e HLA-DR3 (em indivíduos de raça negra), parecem aumentar o risco para transformação maligna da HAS.66,67 Ocasionalmente, observam-se situações onde a hipertensão maligna desenvolve-se em pacientes previamente hígidos (de novo), acometidos por uma elevação aguda e grave da pressão arterial (p. ex., na glomerulonefrite aguda, na eclâmpsia ou mesmo na hipertensão essencial). O prognóstico da hipertensão maligna em pacientes sem antecedentes de hipertensão não difere dos casos clássicos.68 Além da hipertensão e da piora gradativa da função renal, pacientes com nefrosclerose arteriolar maligna apresentam proteinúria, raramente em níveis nefróticos.63,69 Um quadro mais raro é a insuficiência renal aguda, que se instala ao longo de vários dias ou poucas semanas. Nesses pacientes, a ultra-sonografia renal revela rins de tamanho e ecogenicidade praticamente normais. A biópsia renal é a única forma de confirmar a hipertensão maligna como responsável pela disfunção renal aguda. Entretanto, existem duas limitações. Primeiramente, a hipertensão grave é uma contra-indicação para a execução da biópsia, que só poderá ser feita após o controle adequado da pressão arterial. O segundo problema é a semelhança histopatológica entre a hipertensão maligna e as microangiopatias trombóticas (discutidas a seguir). Muitas vezes é preciso conjugar dados da patologia com o quadro clínico-laboratorial, a fim de obter um diagnóstico definitivo. Os efeitos sistêmicos da hipertensão grave também se evidenciam pelo comprometimento dos vasos da retina.70 A retinopatia hipertensiva caracteriza-se por hemorragias retinianas, exsudatos de material plasmático extravasado e, nos casos com encefalopatia hipertensiva, edema da papila. Este último, quando presente, revela a gravidade do quadro hipertensivo agudo, mas não tem relação com o prognóstico do quadro geral. Clinicamente, o paciente com hipertensão maligna apresenta cefaléia e sinais neurológicos flutuantes.47,63 As complicações incluem convulsões, déficits neurológicos fixos, coma e, eventualmente, morte. Inicialmente, o comprometimento do cérebro resulta da elevação da pressão craniana (que pode evoluir para edema cerebral difuso)
e de isquemia focal. As complicações podem decorrer de acidentes vasculares encefálicos (AVE) isquêmicos (incluindo infartos lacunares) ou hemorrágicos. As características clínicas que ajudam a diferenciar a encefalopatia hipertensiva simples do quadro de AVE incluem a ausência de comprometimento focal, o início insidioso e os sintomas de comprometimento encefálico difuso (vômitos, cefaléia, perda da memória, etc.). A tomografia cerebral é o exame de escolha para afastar um AVE, com a ressalva de que são necessárias pelo menos 48 horas para que um acidente isquêmico seja revelado na tomografia.
TRATAMENTO Para que o fluxo cerebral possa ser mantido, nas primeiras 24 horas objetiva-se uma redução moderada da pressão arterial que deve estabilizar-se em níveis moderadamente elevados. Uma diminuição excessiva da pressão arterial pode trazê-la para valores médios inferiores à capacidade de auto-regulação do fluxo sangüíneo cerebral e resultar em dano isquêmico.64 O tratamento inicial de pacientes com hipertensão maligna depende da situação clínica. Quando o paciente apresenta comprometimento agudo da função dos órgãos-alvo (deterioração visual, encefalopatia, insuficiência renal aguda, edema agudo de pulmão), indica-se o tratamento com drogas de ação rápida por via intravenosa. No nosso meio, a droga de escolha é o nitroprussiato de sódio, que possui efeito imediato e correlação linear entre a dose infundida e o efeito anti-hipertensivo. Outra droga parenteral vasodilatadora, já aprovada pelo FDA para uso clínico, é o fenoldopam, um agonista seletivo do receptor dopaminérgico do tipo 1 (DA1). Esta droga tem a vantagem de possuir efeito natriurético e possível proteção renal, além de ser isenta do risco de intoxicação pelo cianeto e não ser fotossensível.71 Durante a retirada da infusão venosa ou em pacientes sem tanta gravidade, pode-se iniciar o tratamento com bloqueadores de canal de cálcio ou com inibidores da enzima conversora de ação rápida (p. ex., nifedipina e captopril). Muitos utilizam a via sublingual, para obter efeito imediato. Pelo menos, com relação à nifedipina, a via oral é igualmente eficaz. Após as primeiras 24/48 horas, inicia-se a terapia definitiva com drogas orais, que pode incluir os bloqueadores de canal de cálcio e inibidores da enzima conversora, eventualmente com meia-vida mais longa, juntamente com outras drogas hipotensoras. A sobrevida em 10 anos é de 45 a 50%, e em aproximadamente metade dos pacientes, independente da função renal basal, ocorre progressão para IRC.72 A longo prazo, o controle pressórico é o fator mais importante para impedir a progressão da nefropatia.
capítulo 27
Pontos-chave:
Quadro 27.3 Principais causas de PTT/SHU
• Com freqüência, em pacientes com níveis tensionais previamente elevados, a hipertensão maligna instala-se como uma complicação, alterando um curso anteriormente benigno • Deve-se procurar sempre um fator de agudização, como a doença renovascular aterosclerótica ou o uso insuficiente ou inapropriado de medicação • Clinicamente, o paciente com hipertensão maligna apresenta cefaléia e sinais neurológicos flutuantes • Quando o paciente apresenta comprometimento agudo da função dos órgãos-alvo (deterioração visual, encefalopatia, insuficiência renal aguda, edema agudo de pulmão), indica-se o tratamento com drogas de ação rápida por via intravenosa
Idiopática Familar Secundária • infantil associada à verotoxina e a outras toxinas bacterianas semelhantes • associada à gestação • associada ao câncer (primariamente ou induzida por quimioterapia) • associada aos imunossupressores (ciclosporina A e tacrolimus) • associada a infecções (pneumococos, SIDA)
Microangiopatias Trombóticas As microangiopatias trombóticas compreendem um grupo de doenças renais de etiologia variada que apresentam lesões histopatológicas renais semelhantes. As lesões renais das microangiopatias trombóticas estendem-se desde as artérias de pequeno calibre até os capilares glomerulares. Seu denominador comum é a presença de anemia hemolítica microangiopática. As principais microangiopatias trombóticas são as doenças do complexo púrpura trombocitopênica trombótica/síndrome hemolítico-urêmica.
PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA TROMBÓTICA E SÍNDROME HEMOLÍTICO-URÊMICA A púrpura trombocitopênica trombótica (PTT) foi descrita por Moschowitz na década de 20. Alguns anos depois, reconheceu-se em crianças uma doença semelhante que recebeu o nome de síndrome hemolítico-urêmica (SHU). Atualmente, ambas são consideradas como extremos de um espectro de doenças, cujo conjunto recebe o nome de púrpura trombocitopênica trombótica/síndrome hemolítico-urêmica (PTT/SHU).73 Um aspecto patogênico importante é a formação de trombos plaquetários na microcirculação. A oclusão das arteríolas e capilares, que pode ter um caráter flutuante, afeta preferencialmente órgãos com maior dependência da microcirculação (cérebro, coração, supra-renais e rins). O Quadro 27.3 relaciona os principais fatores causais e as associações nosológicas implicadas na PTT/SHU.
527
Manifestações Clínicas e Laboratoriais Quando ocorrem sintomas neurológicos e febre configura-se o extremo do espectro, que recebe o nome de púrpura trombocitopênica trombótica. Já a insuficiência renal aguda sem disfunção neurológica caracteriza os doentes com síndrome hemolítico-urêmica. A anemia hemolítica microangiopática é o elemento comum às várias etiologias da PTT/SHU. Como o nome indica, a anemia resulta predominantemente da fragmentação não-imunológica das hemácias na circulação, o que causa elevação dos níveis séricos da desidrogenase láctica e o aparecimento de hemácias dismórficas (esquistócitos) em esfregaços do sangue periférico.73 Além disso, por conta da agregação de plaquetas e do consumo intravascular, observa-se trombocitopenia e depleção dos fatores da coagulação. Os principais sintomas neurológicos da PTT são confusão mental, convulsões e déficits motores focais. O quadro renal é caracterizado por proteinúria, hematúria (micro- ou macroscópica) e hipertensão. A insuficiência renal aguda, com gravidade variável, ocorre em até 80% dos casos. Manifestações relacionadas aos distúrbios da coagulação são proeminentes e incluem púrpura, epistaxe, hematêmese e melena. Alguns pacientes apresentam artralgias e mialgias.
Etiopatogenia Durante muito tempo acreditou-se que a síndrome PTT/SHU fosse causada por distúrbios primários na agregação das plaquetas. Atualmente o interesse tem-se voltado para a disfunção do endotélio vascular. Todos os fatores implicados nas formas secundárias de PTT/SHU parecem ser, de alguma forma, tóxicos para as células endoteliais.74 Entre estes destacam-se as toxinas shigatoxina e verotoxinas, respectivamente produzidas pelas bactérias Shigella dysenteriae e Escherichia coli sorotipo O157:H7, que causam a síndrome hemolítica da infância.74 A lesão endotelial também justifica a microangiopatia trombótica nos casos de quimioterapia com a mitomicina C.75 Deficiência do fator H do complemento parece estar implicada em formas familiares (autossômica dominante) da SHU.76
528
Doenças Vasculares dos Rins
A presença no plasma de grandes multímeros do fator de von Willebrand, que normalmente não circulam mas são estocados nos corpos de Weibel-Palade existentes nas células endoteliais, é mais uma evidência que indica lesão endotelial.77
Patologia Na histopatologia renal, a microangiopatia trombótica da PTT/SHU se caracteriza pela formação de trombos arteriolares e intraglomerulares74 (Fig. 27.5). Os glomérulos afetados também podem exibir alargamento dos espaços subendoteliais que passam a ser ocupados por um material semilucente de aspecto “espumoso”.74 A cicatrização dessas lesões normalmente resulta em uma proliferação intimal do tipo bulbo de cebola, que é indistinguível das lesões encontradas na nefrosclerose maligna, na esclerodermia e na nefrite por radiação.
Diagnóstico O diagnóstico da SHU é relativamente simples por conta da presença de hemólise intravascular, trombocitopenia, insuficiência renal aguda e o eventual envolvimento de outros órgãos. A utilização da biópsia renal é limitada devido aos distúrbios da coagulação, embora ela possa ser feita imediatamente após reposição de concentrado de plaquetas. Em relação às toxinas, a caracterização etiológica específica pode ser feita através da detecção de anticorpos anti-Shiga78 e de verotoxina ligada a leucócitos polimorfonucleares.79
Tratamento Em crianças existe uma taxa relativamente alta de remissão espontânea. Por este motivo, é comum optar-se, de início, pelo tratamento conservador. É imperativo controlar a hipertensão e o metabolismo hidroeletrolítico e ácido-base. Pacientes com insuficiência renal devem receber tratamento dialítico quando apropriado. Em crianças, mesmo esses
Fig. 27.5 Síndrome hemolítico-urêmica experimental em coelho. Extensa trombose intraglomerular em síndrome hemolítico-urêmica experimental em coelho. (Cortesia do Dr. Paulo Roberto Faraco. Universidade do Estado do Rio de Janeiro.)
pacientes costumam remitir espontaneamente. As formas de PTT/SHU que acometem adultos possuem menor potencial para reversão. A utilização de aspirina, dextran, trombolíticos, imunossupressores e prostaciclina foi tentada no passado, com graus variáveis de sucesso. O tratamento mais consistente para a SHU é a infusão de plasma fresco congelado. Embora possa funcionar isoladamente, a utilização concomitante da plasmaférese permite, em teoria, a administração de maiores volumes de plasma e a eventual remoção de alguma substância agressora.74 A retirada de plasma pode ser feita através de plasmafiltração ou por centrifugação do plasma. Mais importante é o líquido de reposição, que deve ser o plasma fresco congelado.74 Alguns casos refratários respondem à infusão de criossobrenadante (plasma depletado do crioprecipitado que contém os multímeros do fator de von Willebrand). Quando não há resposta a nenhuma destas terapias, pode-se tentar a imunoablação seguida de transplante autólogo de células tronco obtidas de sangue periférico.80 A mortalidade global, com tratamento adequado, situa-se em torno de 10%.
Nefrite por Irradiação A nefrite por irradiação é uma doença caracterizada por inflamação, trombose e degeneração celular. Como o nome indica, ela é causada pela exposição à radiação ionizante. O quadro histopatológico é típico das microangiopatias trombóticas e indistinguível da fase crônica da síndrome hemolítico-urêmica. Na microscopia eletrônica observa-se alargamento dos espaços subendoteliais, que são parcialmente ocupados pela deposição de um material amorfo (Fig. 27.6).
Fig. 27.6 Nefrite por radiação. Duplicação da membrana basal glomerular (entre as setas) com alargamento do espaço subendotelial pela deposição de material amorfo de aspecto “espumoso” (asterisco). (Cortesia da Dra. Maria Lucia Ribeiro Caldas. Universidade Federal Fluminense.)
529
capítulo 27
A nefropatia pode desenvolver-se após a exposição direta dos rins a doses elevadas e repetidas de radiação. Este tipo de exposição, comum no passado, ocorria quando os rins eram incluídos no campo de radiação durante o tratamento de neoplasias extra-renais.81 Com a diminuição da dose cumulativa sobre o rim e a exclusão de pelo menos um terço do parênquima do campo de irradiação, esta doença tornou-se rara.82 Atualmente, a maioria dos casos de nefrite por radiação ocorre após irradiação corporal total no contexto do transplante de medula óssea.82,83 Embora a irradiação direta sobre o rim seja relativamente pequena, a ação sinérgica de drogas quimioterápicas (principalmente ciclofosfamida em altas doses) parece favorecer o aparecimento de nefropatia.84
tuma ser irreversível e muitos pacientes evoluem para diálise crônica.83 Não existe tratamento específico para a nefrite de radiação. O controle da hipertensão, talvez com inibidores da enzima de conversão da angiotensina, pode ser importante na diminuição da velocidade de progressão da doença renal. A nefrectomia pode curar o paciente, quando a hipertensão decorre da irradiação de apenas um dos rins.90 Diante da inexistência de terapias eficazes, as medidas profiláticas assumem um papel fundamental. A proteção das lojas renais durante a radioterapia parece diminuir a incidência da nefropatia.82 Outras medidas incluem o fracionamento da dose de radiação, a substituição da ciclofosfamida por outras drogas antineoplásicas e o cuidado na utilização de nefrotoxinas.83
ETIOPATOGENIA Ainda não se conhece o exato mecanismo responsável pela lesão renal. A semelhança clínico-patológica com a PTT/SHU e a sensibilidade endotelial à radiação85 apontam para a célula endotelial renal como o provável alvo primário. Além disso, a radiossensibilidade in vitro das células endoteliais é potenciada por drogas antineoplásicas como ciclofosfamida, bleomicina, adriamicina, actinomicina D e corticosteróides.86 A doença é mais comum em crianças, talvez indicando uma maior suscetibilidade do rim imaturo.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E LABORATORIAIS O quadro clínico da nefrite por radiação é composto por hipertensão, disfunção renal, edema, dispnéia e sinais neurológicos.83,87 A anemia hemolítica microangiopática é comum nos casos associados ao transplante de medula, mas pode faltar naqueles causados por irradiação renal direta.87 O sedimento urinário é pobre, mas a proteinúria é virtualmente universal. Na síndrome clássica a hematúria é ocasional, mas é freqüente nos quadros pós-transplante de medula óssea. Exames cintigráficos podem ser úteis na detecção de formas agudas de disfunção renal segmentar.88 Tipicamente o aparecimento da nefrite por radiação é tardio em relação ao momento da exposição. Na variedade chamada de nefrite por radiação “aguda”, as manifestações se iniciam entre 6 e 12 meses após a irradiação. Este tempo relativamente longo se explica pela lenta replicação das células endoteliais.89 A nefrite por radiação “crônica” corresponde a um quadro de proteinúria e deterioração funcional renal, em pacientes que não desenvolveram a forma aguda, manifesto pelo menos um ano após a irradiação. Também podem ocorrer formas de hipertensão arterial benigna ou maligna a longo prazo.
TRATAMENTO Com freqüência o quadro hematológico resolve-se espontaneamente. Uma vez instalada, a disfunção renal cos-
Esclerodermia Renal A esclerodermia ou esclerose sistêmica progressiva (ESP) é uma doença sistêmica caracterizada por instabilidade vasomotora (fenômeno de Raynaud) e lesões escleróticas e/ou fibróticas associadas a obliteração vascular em diversos tecidos. Os principais órgãos afetados são a pele, o trato gastrintestinal, os pulmões, os rins e o coração. Em casos de longa duração, o comprometimento renal é bastante comum, sendo encontrado em até 90% dos pacientes submetidos a necrópsia.90 Clinicamente, cerca de 45% dos pacientes com manifestações sistêmicas de esclerodermia apresentam algum tipo de comprometimento renal.91
PATOLOGIA O chamado “rim da esclerodermia” é caracterizado por duas variedades histopatológicas de lesão vascular.92 O aspecto mais típico são as lesões obliterativas características, encontradas, principalmente, nas artérias arqueadas e interlobulares. A lesão é causada pela proliferação das células musculares lisas da camada média e acúmulo de substância mucóide. Essas células rompem a lâmina elástica interna e migram para a íntima, onde produzem a proliferação concêntrica com morfologia em “bulbo de cebola” (Fig. 27.7). O outro tipo de lesão é a necrose fibrinóide mural ou subintimal que acomete as arteríolas pré-glomerulares. Essas alterações são virtualmente indistinguíveis das da hipertensão maligna. O espessamento da membrana basal glomerular, a glomerulosclerose progressiva e as lesões túbulo-intersticiais crônicas refletem o comprometimento da vascularização arterial renal.
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E LABORATORIAIS Nem todos os pacientes com esclerodermia renal apresentam envolvimento esofagiano, pulmonar ou cutâneo (esclerodermia sine esclerodermia). A hipertensão arterial e a disfunção renal de início insidioso são as principais
530
Doenças Vasculares dos Rins
Fig. 27.7 Esclerose sistêmica progressiva. Lesão obliterativa em artéria interlobular de pequeno calibre. Proliferação das células musculares lisas da camada média e acúmulo de substância mucóide entre as camadas. Existe grande semelhança com a lesão arterial da hipertensão arterial que é mostrada na Fig. 27.3.
manifestações renais da esclerodermia. A proteinúria é o achado laboratorial mais freqüente e pode ser detectada em até um terço dos pacientes com ESP.91 O sedimento urinário é pobre, refletindo a pouca atividade do processo inflamatório renal. Ocasionalmente a lesão glomerular isquêmica pode resultar em hematúria. Nos casos mais obscuros, as anormalidades imunológicas laboratoriais podem auxiliar o diagnóstico diferencial com hipertensão maligna. A pesquisa do fator antinúcleo (geralmente com padrão salpicado) é positiva em mais de 90% dos pacientes, enquanto os níveis de complemento são normais. Alguns auto-anticorpos são específicos para a esclerodermia e suas variantes clínicas. Os mais úteis são o anticentrômero, o anti-RNA uracila-específico e o antiDNA topoisomerase II (Scl-70).93,94 A mais temida complicação renal de pacientes com ESP é a crise de esclerodermia renal. Embora possa ocorrer em qualquer momento, essa emergência médica é mais comum durante os primeiros cinco anos após o diagnóstico.95 A crise de esclerodermia é mais freqüente nos pacientes de raça negra e nos indivíduos com comprometimento sistêmico.95 Fatores predisponentes à crise renal incluem ainda a exposição ao frio e, talvez, o uso de doses elevadas de corticosteróides no início do tratamento. Pacientes com esclerodermia sine esclerodermia, com doença mista do tecido conjuntivo e com lúpus eritematoso também podem apresentar crise de esclerodermia renal.96,97 Alguns pacientes com crise esclerodérmica apresentam exacerbação da doença cutânea nos meses precedentes. Na maioria dos casos, porém, o início é súbito. As manifestações clínicas, quase todas secundárias à hipertensão acelerada, surgem abruptamente.95 Os pacientes podem apresentar taquicardia, cefaléia, déficits visuais, convulsões e insuficiência ventricular esquerda. A insuficiência renal
instala-se rapidamente. Sem tratamento, o paciente evolui para anúria e morte por uremia em pouco mais de uma semana. Admite-se que a crise renal seja causada por um quadro funcional de vasoconstrição intensa intra-renal (fenômeno de Raynaud do rim), superposta às alterações vasculares crônicas.91 O aumento da atividade plasmática de renina é característico da crise de esclerodermia renal. Discute-se se esse é um fenômeno primário, envolvido na patogênese da complicação, ou apenas um fenômeno reativo à intensa vasoconstrição renal.98 Mesmo com esta última possibilidade, a intensa liberação de renina certamente contribui para ampliar o ciclo vicioso de vasoconstrição e dano renal. Recentemente, têm sido descritos casos de glomerulonefrite com perda rápida de função renal, associada a vasculite de pequenos vasos p-ANCA positivo, inclusive com presença de crescentes.99,100 Este quadro pode representar uma nova forma de acometimento renal na esclerodermia.
TRATAMENTO O tratamento indicado para a crise renal de esclerodermia é o controle da hipertensão arterial com medicamentos que não comprometam o fluxo plasmático renal. Até a década de 70 o prognóstico era sombrio.95 A introdução dos inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) causou uma profunda mudança nesse panorama.101,102 Com esses medicamentos é possível diminuir a ativação do sistema renina-angiotensina, combater a vasoconstrição renal e controlar a pressão arterial. A deterioração renal pode ser estabilizada ou revertida em mais de 80% dos casos. A melhora da crise renal também é observada em uma minoria de pacientes que apresentam insuficiência renal sem hipertensão arterial. Apesar da significativa melhora do prognóstico, ainda existe um grupo de não-respondedores que evoluem para insuficiência renal terminal dependente de diálise. Alguns desses pacientes, mantidos em tratamento com IECA, readquirem a função renal após alguns meses de diálise. Em casos inteiramente refratários, mesmo após a combinação com outras drogas (minoxidil, bloqueadores de canal de cálcio, etc.), pode ser preciso realizar nefrectomia bilateral a fim de permitir o controle da pressão arterial. O intenso vasoespasmo renal da crise esclerodérmica parece melhorar com a utilização de análogos da prostaciclina.103
Síndrome do Anticorpo Antifosfolipídio A presença de uma atividade anticoagulante, detectada no plasma de pacientes com lúpus eritematoso, é conhecida há mais de 40 anos. Logo após sua descoberta, observou-se que a contrapartida clínica da atividade anticoagulante detectada in vitro representava um paradoxo: ao invés de maior incidência de sangramento, a maioria dos pacientes demonstrava predisposição à trombose.
capítulo 27
A associação in vitro entre a atividade anticoagulante e testes falso-positivos para sífilis em pacientes com lúpus levou a que, na década de 80, fossem desenvolvidos ensaios para a detecção de auto-anticorpos que tinham a cardiolipina como substrato.104 Esses testes detectavam anticorpos dirigidos para a cardiolipina e também para uma variedade de outros fosfolipídios. A disponibilidade de um marcador específico permitiu a descrição de uma nova síndrome clínica, caracterizada por tromboses arteriais e venosas.104 Embora os estudos iniciais tivessem endereçado portadores de lúpus eritematoso sistêmico, com o passar dos anos tornou-se evidente que a maioria dos pacientes com fenômenos trombóticos associados a esses anticorpos não apresentava doenças auto-imunes ou qualquer outra patologia de base.105 Eventualmente a nova doença foi batizada de síndrome do anticorpo antifosfolipídio ou, simplesmente, síndrome antifosfolipídio. Pacientes sem doença auto-imune são considerados portadores da síndrome primária, enquanto pacientes com lúpus ou outra doença de base são referidos como portadores da síndrome antifosfolipídio secundária.104
ETIOPATOGENIA Atualmente acredita-se que os anticorpos causadores da síndrome antifosfolipídio não têm especificidade para os fosfolipídios, mas para um complexo formado entre estes e proteínas plasmáticas chamadas de 2-glicoproteína I (2GPI) e fosfatidilserina (esta proveniente de membranas celulares após apoptose). Existem quatro tipos principais de Ac antifosfolipídios: VDRL falso-positivo; anticoagulante lúpico (que causa alongamento do tempo de tromboplastina parcial ativado — PTTa); Ac anticardiolipina (principalmente IgG em altos títulos) e Ac anti-2-GPI. O mecanismo exato da indução à trombose ainda é desconhecido. Podem estar envolvidas ações sobre as plaquetas, sobre as células endoteliais e sobre as proteínas envolvidas na coagulação do sangue.104 Várias doenças auto-imunes (LES, PTI, esclerodermia, polimialgia reumática, Sjögren), drogas (fenotiazinas, hidralazina, interferon) e infecções (HIV, caxumba, malária) têm sido implicadas na formação de Ac antifosfolipídios.106
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS E LABORATORIAIS As principais manifestações clínicas da síndrome antifosfolipídio, resultante dos fenômenos trombóticos, incluem: acidentes vasculares encefálicos em jovens, ataques isquêmicos transitórios, enxaqueca, epilepsia, hipertensão pulmonar, livedo reticularis, abortos recorrentes, trombocitopenia, doença cardíaca valvular, disfunção renal, hipertensão arterial e uma grande variedade de tromboses periféricas.104 Pacientes com doença primária são menos suscetíveis à progressão para doença renal terminal e apresentam menor mortalidade.107
531
Os critérios diagnósticos propostos incluem: história de um ou mais episódios trombóticos (ou complicação obstétrica) associada à presença de altos títulos de anticorpos anticardiolipina (IgG ou IgM) e/ou anticoagulante lúpico. Os testes devem ser positivos em duas ocasiões diferentes, separadas por um mínimo de seis semanas.108 Do ponto de vista nefrológico, a síndrome antifosfolipídio causa manifestações, predominatemente trombóticas, em praticamente toda a circulação renal (Quadro 27.4). Podem ocorrer infartos renais, uni- ou bilaterais, por oclusão da artéria renal principal ou seus ramos.109,110 Trombose bilateral da veia renal também já foi observada.111 Estenose da artéria renal (Fig. 27.8), algumas vezes reversível após anticoagulação, é outra manifestação descrita recentemente.112,113 Alguns pacientes desenvolvem uma microangiopatia trombótica semelhante à síndrome hemolíticourêmica, onde lesões obliterativas arteriolares coexistem com trombose glomerular.114,115 Esses pacientes podem cursar com hipertensão grave e evoluir para a insuficiência renal crônica terminal. Pode ocorrer ainda proteinúria nefrótica, mas o substrato histopatológico dessa manifestação ainda não está bem definido.116,117 Pacientes com síndrome antifosfolipídio apresentam anemia, trombocitopenia e, obviamente, prolongamento dos testes de coagulação realizados in vitro.118 Uma pista para a existência de anticorpos antifosfolipídios é o alongamento do PTTa, que não é corrigido pela adição do plasma de indivíduos normais (que corrigiria qualquer deficiência de fatores da coagulação). É importante ressaltar que o PTTa, realizado de rotina, normalmente não possui a sensibilidade necessária para a detecção do anticoagulante lúpico.118 Uma vertente diferente de testes diagnósticos são os imunoensaios para a detecção de anticorpos anticardiolipina. Atualmente o método de escolha é o ELISA em fase sólida.118
TRATAMENTO Os anticorpos antifosfolipídios podem ser retirados com plasmaférese, mas recorrem logo a seguir. A resposta aos corticosteróides e imunossupressores também é pobre. Pacientes com manifestações trombóticas renais (assim como em qualquer outro órgão nobre) devem usar anticoagulantes orais (warfarina) para o resto da vida.104 A infor-
Quadro 27.4 Manifestações renais da síndrome antifosfolipídio Infarto renal por trombose da artéria renal ou de seus ramos Estenose de artéria renal Trombose de veia renal Microangiopatia trombótica Síndrome nefrótica
532
Doenças Vasculares dos Rins
B
A
Fig. 27.8 Síndrome antifosfolipídio primária. Estenose bilateral das artérias renais em uma paciente com infarto agudo do miocárdio aos 39 anos de idade.
mação disponível no presente indica que a anticoagulação deve ser suficiente para manter o INR acima de 3,0. Em um estudo retrospectivo, valores abaixo desse limite se associam a uma elevada incidência de tromboses,119 mas é possível que este grau de anticoagulação nem sempre seja necessário.120
Pontos-chave: • O diagnóstico laboratorial da síndrome do anticorpo antifosfolipídio baseia-se no alongamento dos testes de tromboplastina, sugerindo a presença de uma substância anticoagulante • Na situação in vivo observa-se o oposto, as principais manifestações clínicas são o desenvolvimento de tromboses em múltiplos territórios vasculares
DOENÇAS DA MICROCIRCULAÇÃO Nefropatia da Anemia Falciforme Pacientes homozigotos para a anemia falciforme (SS) e, em menor grau, os portadores do traço falcêmico (AS) podem apresentar comprometimento renal como parte do espectro de manifestações associadas a essa condição. A doença falcêmica renal também pode acometer pacientes com hemoglobina S e uma outra hemoglobina anormal (duplo heterozigoto). Os mais encontrados são pacientes com doença SC, cujas hemácias possuem 50% de hemoglobina S. Em pacientes com doença SC, a tendência ao afoiçamento e à gravidade do acometimento renal é intermediária entre os pacientes homozigotos (SS) e heterozigotos (AS).
ETIOPATOGENIA Tal como ocorre em outros territórios vasculares, a morbidade da nefropatia da anemia falciforme decorre de fenômenos trombóticos na microcirculação.121 A região mais acometida é a medula renal, onde a tendência trombótica é agravada pela baixa tensão de oxigênio e pelo aumento da osmolaridade. Nos vasa recta medulares, a desidratação das hemácias provoca aumento na concentração relativa da hemoglobina S, facilita o afoiçamento, obstrui a microcirculação e acaba por resultar em trombose. A doença microvascular renal da anemia falciforme pode causar esclerose ou necrose papilar. Pacientes homozigotos apresentam complicações a partir da segunda década de vida. Nos heterozigotos (SC e AS), as anormalidades desenvolvem-se mais tardiamente. Como esperado, estudos microrradiográficos122 confirmam que os indivíduos homozigotos (SS) apresentam maior comprometimento da vasculatura renal do que os portadores da doença SC e do traço falcêmico (AS). Os vasa recta radiados que convergem para a medula renal são praticamente ausentes nos doentes com anemia falciforme (SS) e bastante pobres nos pacientes heterozigotos (SC e AS).122
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A trombose dos vasa recta provoca alterações na função tubular, notadamente defeitos de concentração da urina e acidose renal do tipo distal.121,123 Graus variáveis de comprometimento da capacidade de concentração urinária são detectados em virtualmente todos os portadores da hemoglobina S. A maioria dos pacientes apresenta apenas poliúria e nictúria, mas alguns homozigotos chegam a desenvolver diabetes insipidus nefrogênico. Curiosamente, na anemia falciforme, a função do túbulo proximal é supranormal. Esses indivíduos apresentam aumento na absorção de fosfato (provocando hiperfosfatemia leve) e aumento na secreção de creatinina (elevando a concentração da creatinina urinária e alterando o cálculo da sua taxa de depuração). A causa do fenômeno é desconhecida.
capítulo 27
A alteração clínica mais comum em pacientes com hemoglobina S é a hematúria indolor, freqüentemente macroscópica.121,123 Nem todos os pacientes apresentam necrose de papila. Aparentemente, a intensa congestão nos capilares peritubulares pode levar ao extravasamento de sangue para os túbulos. Quando ocorre, a necrose da papila costuma ser unilateral e assintomática. Cerca de um terço dos pacientes com doença falcêmica desenvolvem proteinúria na faixa de 1 a 2 g/dia.123-125 A proteinúria em níveis nefróticos (maior que 3 g/dia) é mais rara. O substrato patológico em muitos desses casos é a glomerulosclerose, possivelmente associada ao hiperfluxo glomerular.121,124 Uma minoria apresenta glomerulopatia com depósitos imunes granulares. As lesões histopatológicas mais freqüentes são a nefropatia membranosa e a glomerulonefrite membrano-proliferativa. Esta última parece ser uma glomerulonefrite mediada por imunocomplexos. Os antígenos implicados seriam proteínas autólogas oriundas do epitélio tubular renal, possivelmente liberadas em conseqüência da isquemia medular que caracteriza a doença.125 Um relato recente descreve a ocorrência de glomerulopatia imunotactóide.126 Mesmo após a necrose de uma ou mais papilas renais, a filtração glomerular tende a permanecer na faixa normal. No entanto, com o passar do anos, pode ocorrer progressão da doença renal.123 Além da doença da microcirculação medular, a deterioração progressiva pode ser causada pela superposição da glomerulosclerose por hiperfluxo ou por uma glomerulopatia de origem imunológica. O carcinoma medular renal, neoplasia maligna raríssima, é quase exclusivo de pacientes SS ou AS.127
TRATAMENTO Pacientes com hematúria devem ser tratados inicialmente com repouso, transfusões para diminuir a concentração de hemoglobina S, hemodiluição com soluções hipotônicas e alcalinização urinária. A urina contém uroquinase, uma enzima fibrinolítica que dissolve os coágulos urinários e perpetua o sangramento. No passado, os casos refratários acabavam resultando em nefrectomia. Atualmente empregam-se substâncias antifibrinolíticas, como o ácido épsilon-aminocapróico (EACA). Por ser excretado em altas concentrações na urina, o EACA antagoniza a ação fibrinolítica da uroquinase.128 Raramente pacientes que recebem EACA podem desenvolver tromboses sistêmicas. Uma complicação mais comum é a obstrução do trato urinário por coágulos. Não existe tratamento efetivo para as glomerulopatias por imunocomplexo. Como os bloqueadores da enzima conversora da angiotensina podem ajudar a controlar a hiperfiltração glomerular, é possível que eles sejam úteis na prevenção da progressão para a insuficiência renal. A insuficiência renal terminal ocorre em cerca de 5% dos falcêmicos, sendo uma importante causa de morte em pacientes com doença de longa duração.129
533
O prognóstico de pacientes falcêmicos tratados com diálise aparenta ser semelhante ao de pacientes não-diabéticos.130 No curto prazo, a sobrevida após transplante é semelhante à de outros pacientes com insuficiência renal, mas decai ao longo dos anos.131 Apesar disso, o transplante propicia resultados superiores ao tratamento com diálise.132
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. RISPOLI, P.; CONFORTI, M.; MELLONI, C. et al. Superior mesenteric and renal artery embolism during PTA and re-stenting of infrarenal abdominal aorta. Report of a case and review of the literature. J. Cardiovasc. Surg. (Torino), 41: 763, 2000. 2. BLACK, R.M. Vascular diseases of the kidney. In Rose, B.D. Pathophysiology of Renal Disease. New York, McGraw-Hill, 1987, pp 353360. 3. HEPTINSTALL, R.H. Pathology of the Kidney. Boston, Little Brown, 1974, pp 221-272. 4. COSBY, R.L.; MILLER, P.D.; SCHRIER, R.W. Traumatic renal artery thrombosis. Am. J. Med., 81: 890, 1986. 5. RYSAVA, R.; ZABKA, J.; PEREGRIN, J.H. et al. Acute renal failure due to bilateral renal artery thrombosis associated with primary antiphospholipid syndrome. Nephrol. Dial. Transplant., 13: 2645, 1998. 6. SHANKAR, R.; BASTANI, B.; SALINAS-MADRIGAL, L. et al. Acute thrombosis of the renal transplant artery after a single dose of OKT3. Am. J. Nephrol., 21: 141, 2001. 7. LESSMAN, R.K.; JOHNSON, S.F.; COBURN, J.W. et al. Renal artery embolism: clinical features and long-term follow-up of 17 cases. Ann. Intern. Med., 89: 477, 1978. 8. LONDON, I.L.; HOFFSTEN, P.; PERKOFF, G.T. et al. Renal infarction. Elevation of serum and urinary lactic dehydrogenase (LDH). Arch. Intern. Med., 121: 87, 1968. 9. BLUM, U.; BILLMANN, P.; KRAUSE, T. et al. Effect of local low-dose thrombolysis on clinical outcome in acute embolic renal artery occlusion. Radiology, 189: 549, 1993. 10. ELLIS, D.; KAYE, R.D.; BONTEMPO, F.A. Aortic and renal artery thrombosis in a neonate: recovery with thrombolytic therapy. Pediatr. Nephrol., 11: 641, 1997. 11. EURVILAICHIT, C.; TIRAPANICH, W.; THONGBORISUTE, E. Renal artery embolism: therapy with intra-arterial streptokinase infusion. J. Med. Assoc. Thai., 82: 978, 1999. 12. STECKEL, A.; JOHNSTON, J.; FRALEY, D.S. et al. The use of streptokinase to treat renal artery thromboembolism. Am. J. Kidney Dis., 4: 166, 1984. 13. MOYER, J.D.; RAO, C.N.; WIDRICH, W.C. et al. Conservative management of renal artery embolus. J. Urol., 109: 138, 1973. 14. HARRINGTON, J.T.; KASSIRER, J.P. Renal vein thrombosis. Annu. Rev. Med., 33: 255, 1982. 15. RABELINK, T.J.; ZWAGINGA, J.J.; KOOMANS, H.A. et al. Thrombosis and hemostasis in renal disease. Kidney Int., 46: 287, 1994. 16. LLACH, F. Hypercoagulability, renal vein thrombosis, and other thrombotic complications of nephrotic syndrome. Kidney Int., 28: 429, 1985. 17. ALBITAR, S.; GENIN, R.; SERVEAUX, M.O. et al. Thrombose de la veine rénale et déficit constitutionnel en protéine S. Rev. Med. Interne, 17: 746, 1996. 18. IRISH, A.B. The factor V Leiden mutation and risk of renal vein thrombosis in patients with nephrotic syndrome. Nephrol. Dial. Transplant., 12: 1680, 1997. 19. IRISH, A.B.; GREEN, F.R.; GRAY, D.W. et al. The factor V Leiden (R506Q) mutation and risk of thrombosis in renal transplant recipients. Transplantation, 64: 604, 1997. 20. WUTHRICH, R.P. Factor V Leiden mutation: potential thrombogenic role in renal vein, dialysis graft and transplant vascular thrombosis. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 10: 409, 2001.
534
Doenças Vasculares dos Rins
21. AVASTHI, P.S.; GREENE, E.R.; SCHOLLER, C. et al. Noninvasive diagnosis of renal vein thrombosis by ultrasonic echo-Doppler flowmetry. Kidney Int., 23: 882, 1983. 22. LAM, K.K.; LUI, C.C. Successful treatment of acute inferior vena cava and unilateral renal vein thrombosis by local infusion of recombinant tissue plasminogen activator. Am. J. Kidney Dis., 32: 1075, 1998. 23. SARASIN, F.P.; SCHIFFERLI, J.A. Prophylactic oral anticoagulation in nephrotic patients with idiopathic membranous nephropathy. Kidney Int., 45: 578, 1994. 24. ROBERTSON, A.J.; NARGUND, V.; GRAY, D.W. et al. Low dose aspirin as prophylaxis against renal-vein thrombosis in renal-transplant recipients. Nephrol. Dial. Transplant., 15: 1865, 2000. 25. ROSS, R.; GLOMSET, J.A. The pathogenesis of atherosclerosis (first of two parts). N. Engl. J. Med., 295: 369, 1976. 26. HYMAN, B.T.; LANDAS, S.K.; ASHMAN, R.F. et al. Warfarin-related purple toes syndrome and cholesterol microembolization. Am. J. Med., 82: 1233, 1987. 27. CARRON, P.L.; FLOREA, A.; DUCLOUX, D. et al. Atheroembolic disease associated with the use of low-molecular-weight heparin during haemodialysis. Nephrol. Dial. Transplant., 14: 520, 1999. 28. GUPTA, B.K.; SPINOWITZ, B.S.; CHARYTAN, C. et al. Cholesterol crystal embolization-associated renal failure after therapy with recombinant tissue-type plasminogen activator. Am. J. Kidney Dis., 21: 659, 1993. 29. MANNESSE, C.K.; BLANKESTIJN, P.J.; MAN IN ‘T VELD, A.J. et al. Renal failure and cholesterol crystal embolization: a report of 4 surviving cases and a review of the literature. Clin. Nephrol., 36: 240, 1991. 30. MEYRIER, A.; BUCHET, P.; SIMON, P. et al. Atheromatous renal disease. Am. J. Med., 85: 139, 1988. 31. COLT, H.G.; BEGG, R.J.; SAPORITO, J.J. et al. Cholesterol emboli after cardiac catheterization. Eight cases and a review of the literature. Medicine (Baltimore), 67: 389, 1988. 32. THADHANI, R.I.; CAMARGO, JR, C.A.; XAVIER, R.J. et al. Atheroembolic renal failure after invasive procedures. Natural history based on 52 histologically proven cases. Medicine (Baltimore), 74: 350, 1995. 33. RUDNICK, M.R.; BERNS, J.S.; COHEN, R.M. et al. Nephrotoxic risks of renal angiography: contrast media-associated nephrotoxicity and atheroembolism — a critical review. Am. J. Kidney Dis., 24: 713, 1994. 34. SAKLAYEN, M.G.; GUPTA, S.; SURYAPRASAD, A. et al. Incidence of atheroembolic renal failure after coronary angiography. A prospective study. Angiology, 48: 609, 1997. 35. RIPPLE, M.G.; CHARNEY, D.; NADASDY, T. Cholesterol embolization in renal allografts. Transplantation, 69: 2221, 2000. 36. DALAKOS, T.G.; STREETEN, D.H.; JONES, D. et al. “Malignant” hypertension resulting from atheromatous embolization predominantly of one kidney. Am. J. Med., 57: 135, 1974. 37. SMITH, M.C.; GHOSE, M.K.; HENRY, A.R. The clinical spectrum of renal cholesterol embolization. Am. J. Med., 71: 174, 1981. 38. LYE, W.C.; CHEAH, J.S.; SINNIAH, R. Renal cholesterol embolic disease. Case report and review of the literature. Am. J. Nephrol., 13: 489, 1993. 39. COSIO, F.G.; ZAGER, R.A.; SHARMA, H.M. Atheroembolic renal disease causes hypocomplementaemia. Lancet., 2: 118, 1985. 40. KASINATH, B.S.; LEWIS, E.J. Eosinophilia as a clue to the diagnosis of atheroembolic renal disease. Arch. Intern. Med., 147: 1384, 1987. 41. RICHARDS, A.M.; ELIOT, R.S.; KANJUH, V.I. et al. Cholesterol embolism: a multiple-system disease masquerading as polyarteritis nodosa. Am. J. Cardiol., 15: 696, 1965. 42. WILSON, D.M.; SALAZER, T.L.; FARKOUH, M.E. Eosinophiluria in atheroembolic renal disease. Am. J. Med., 91: 186, 1991. 43. PRESTON, R.A.; STEMMER, C.L.; MATERSON, B.J. et al. Renal biopsy in patients 65 years of age or older. An analysis of the results of 334 biopsies. J. Am. Geriatr. Soc., 38: 669, 1990. 44. BELENFANT, X.; MEYRIER, A.; JACQUOT, C. Supportive treatment improves survival in multivisceral cholesterol crystal embolism. Am. J. Kidney Dis., 33: 840, 1999. 45. DAHLBERG, P.J.; FRECENTESE, D.F.; COGBILL, T.H. Cholesterol embolism: experience with 22 histologically proven cases. Surgery, 105: 737, 1989.
46. HASEGAWA, M.; KAWASHIMA, S.; SHIKANO, M. et al. The evaluation of corticosteroid therapy in conjunction with plasma exchange in the treatment of renal cholesterol embolic disease. A report of 5 cases. Am. J. Nephrol., 20: 263, 2000. 47. HEBERT, L.A.; CODY, R.J.; SLIVKA, A.P. et al. Hypertension-induced kidney, heart, and central nervous system disease. In Mandal, A.K. and Jennette, J.C. Diagnosis and Management of Renal Disease and Hypertension. Durham, Carolina Academic Press, 1994, pp 343-364. 48. FREEDMAN, B.I.; ISKANDAR, S.S.; APPEL, R.G. The link between hypertension and nephrosclerosis. Am. J. Kidney Dis., 25: 207, 1995. 49. SCHLESSINGER, S.D.; TANKERSLEY, M.R.; CURTIS, J.J. Clinical documentation of end-stage renal disease due to hypertension. Am. J. Kidney Dis., 23: 655, 1994. 50. ZUCCHELLI, P.; ZUCCALA, A. Primary hypertension — how does it cause renal failure? Nephrol. Dial. Transplant., 9: 223, 1994. 51. LINDEMAN, R.D.; TOBIN, J.D.; SHOCK, N.W. Association between blood pressure and the rate of decline in renal function with age. Kidney Int., 26: 861, 1984. 52. LUKE, R.C. Nephrosclerosis. In Schrier, R.W. and Gottschalk, C.W. Diseases of the Kidney. Boston, Little, Brown, and Company, 1984, pp 1573-1595. 53. RAZGA, Z.; IVANYI, B.; ZIDAR, N. et al. Quantitative ultrastructural study of afferent and efferent arterioles in IgA glomerulonephritis and benign nephrosclerosis. Virchows Arch., 429: 275, 1996. 54. WEHRMANN, M.; BOHLE, A. The long-term prognosis of benign nephrosclerosis accompanied by focal glomerulosclerosis and renal cortical interstitial fibrosis, designated so-called decompensated benign nephrosclerosis by Fahr, Bohle and Ratscheck. Pathol. Res. Pract., 194: 571, 1998. 55. UNITED STATES RENAL DATA SYSTEMS: USRDS 1992 Annual Data Report. Bethesda, MD, The National Institutes of Health, National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Diseases. U.S. Department of Health and Human Services, 1992. 56. PERNEGER, T.V.; KLAG, M.J.; WHELTON, P.K. Race and socioeconomic status in hypertension and renal disease. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 4: 235, 1995. 57. LOPES, A.A.; PORT, F.K. The low birth weight hypothesis as a plausible explanation for the black/white differences in hypertension, non-insulin-dependent diabetes, and end-stage renal disease. Am. J. Kidney Dis., 25: 350, 1995. 58. FUMO, M.T.; TEEGER, S.; LANG, R.M. et al. Diurnal blood pressure variation and cardiac mass in American blacks and whites and South African blacks. Am. J. Hypertens., 5: 111, 1992. 59. HARSHFIELD, G.A.; ALPERT, B.S.; PULLIAM, D.A. et al. Sodium excretion and racial differences in ambulatory blood pressure patterns. Hypertension, 18: 813, 1991. 60. MESSERLI, F.H.; FROHLICH, E.D.; DRESLINSKI, G.R. et al. Serum uric acid in essential hypertension: an indicator of renal vascular involvement. Ann. Intern. Med., 93: 817, 1980. 61. TOTO, R.D.; MITCHELL, H.C.; SMITH, R.D. et al. “Strict” blood pressure control and progression of renal disease in hypertensive nephrosclerosis. Kidney Int., 48: 851, 1995. 62. HSU, C.Y. Does treatment of non-malignant hypertension reduce the incidence of renal dysfunction? A meta-analysis of 10 randomised, controlled trials. J. Hum. Hypertens., 15: 99, 2001. 63. RAINE, A.E.G. Accelerated hypertension. In Cameron, S.; Davison, A.M.; Grünfeld, J.P. et al. Oxford Textbook of Clinical Nephrology. Oxford, Oxford University Press, 1992, pp 2124-2139. 64. STRANDGAARD, S.; PAULSON, O.B. Cerebral blood flow and its pathophysiology in hypertension. Am. J. Hypertens., 2: 486, 1989. 65. DAVIS, B.A.; CROOK, J.E.; VESTAL, R.E. et al. Prevalence of renovascular hypertension in patients with grade III or IV hypertensive retinopathy. N. Engl. J. Med., 301: 1273, 1979. 66. DE LIMA, M.G.; PAIVA, R.L.; BORTOLOTTO, L.A. et al. Human leukocyte antigens and malignant essential hypertension. Am. J. Hypertens., 11: 729, 1998. 67. STEFANSSON, B.; RICKSTEN, A.; RYMO, L. et al. Angiotensin-converting enzyme gene I/D polymorphism in malignant hypertension. Blood Press., 9: 104, 2000.
capítulo 27
68. LIO, G.Y.; BEEVERS, M.; BEEVERS, D.G. Do patients with de novo hypertension differ from patients with previously known hypertension when malignant phase hypertension occurs? Am. J. Hypertens., 13: 934, 2000. 69. KINCAID-SMITH, P.; MCMICHAEL, J.; MURPHY, E.A. Clinical course and pathology of hypertension with papilloedema. Quart. J. Med., 37: 117, 1958. 70. MCGREGOR, E.; ISLES, C.G.; JAY, J.L. et al. Retinal changes in malignant hypertension. Br. Med. J. (Clin. Res. Ed.), 292: 233, 1986. 71. MURPHY, M.B.; MURRAY, C.; SHORTEN, G.D. Fenoldopam: a selective peripheral dopamine-receptor agonist for the treatment of severe hypertension. N. Engl. J. Med., 345: 1548, 2001. 72. LIP, G.Y.; BEEVERS, M.; BEEVERS, D.G. Does renal function improve after diagnosis of malignant phase hypertension? J. Hypertens., 15: 1309, 1997. 73. REMUZZI, G. HUS and TTP: variable expression of a single entity. Kidney Int., 32: 292, 1987. 74. REMUZZI, G.; RUGGENENTI, P. The hemolytic uremic syndrome. Kidney Int., 48: 2, 1995. 75. CANTRELL, JR, J.E.; PHILLIPS, T.M.; SCHEIN, P.S. Carcinoma-associated hemolytic-uremic syndrome: a complication of mitomycin C chemotherapy. J. Clin. Oncol., 3: 723, 1985. 76. ZIPFEL, P.F.; SKERKA, C.; CAPRIOLI, J. et al. Complement factor H and hemolytic uremic syndrome. Int. Immunopharmacol., 1: 461, 2001. 77. MOAKE, J.L.; RUDY, C.K.; TROLL, J.H. et al. Unusually large plasma factor VIII: von Willebrand factor multimers in chronic relapsing thrombotic thrombocytopenic purpura. N. Engl. J. Med., 307: 1432, 1982. 78. LUDWIG, K.; KARMALI, M.A.; SARKIM, V. et al. Antibody response to Shiga toxins Stx2 and Stx1 in children with enteropathic hemolytic-uremic syndrome. J. Clin. Microbiol., 39: 2272, 2001. 79. TE LOO, D.M.; VAN HINSBERGH, V.W.; VAN DEN HEUVEL, L.P. et al. Detection of verocytotoxin bound to circulating polymorphonuclear leukocytes of patients with hemolytic uremic syndrome. J. Am. Soc. Nephrol., 12: 800, 2001. 80. MUSSO, M.; PORRETTO, F.; CRESCIMANNO, A. et al. Successful treatment of resistant thrombotic thrombocytopenic purpura/hemolytic uremic syndrome with autologous peripheral blood stem and progenitor (CD34⫹) cell transplantation. Bone Marrow Transplant., 24: 207, 1999. 81. KUNKLER, P.B.; LUXTON, R.W. The limit of renal tolerance to xrays. Br. J. Radiol., 25: 190, 1952. 82. LAWTON, C.A.; BARBER-DERUS, S.W.; MURRAY, K.J. et al. Influence of renal shielding on the incidence of late renal dysfunction associated with T-lymphocyte deplete bone marrow transplantation in adult patients. Int. J. Radiat. Oncol. Biol. Phys., 23: 681, 1992. 83. ZAGER, R.A. Acute renal failure in the setting of bone marrow transplantation. Kidney Int., 46: 1443, 1994. 84. BERGSTEIN, J.; ANDREOLI, S.P.; PROVISOR, A.J. et al. Radiation nephritis following total-body irradiation and cyclophosphamide in preparation for bone marrow transplantation. Transplantation, 41: 63, 1986. 85. DE GOWIN, R.L.; LEWIS, L.J.; HOAK, J.C. et al. Radiosensitivity of human endothelial cells in culture. J. Lab. Clin. Med., 84: 42, 1974. 86. MOULDER, J.E.; FISH, B.L. Influence of nephrotoxic drugs on the late renal toxicity associated with bone marrow transplant conditioning regimens. Int. J. Radiat. Oncol. Biol. Phys., 20: 333, 1991. 87. LUXTON, R.W. Radiation nephritis: a long-term study of 54 patients. Lancet., 2: 1221, 1961. 88. FLANAGAN, F.L.; DEHDASHTI, F. Case report: acute segmental radiation nephritis on bone scintigraphy. Br. J. Radiol., 69: 1175, 1996. 89. TANNOCK, I.F.; HAYASHI, S. The proliferation of capillary endothelial cells. Cancer Res., 32: 77, 1972. 90. DHALIWAL, R.S.; ADELMAN, R.D.; TURNER, E. et al. Radiation nephritis with hypertension and hyperreninemia following chemotherapy: cure by nephrectomy. J. Pediatr., 96: 68, 1980. 91. CANNON, P.J.; HASSAR, M.; CASE, D.B. et al. The relationship of hypertension and renal failure in scleroderma (progressive systemic
92.
93.
94. 95.
96.
97.
98.
99.
100.
101.
102.
103.
104. 105. 106. 107.
108.
109.
110.
111.
112. 113.
535 sclerosis) to structural and functional abnormalities of the renal cortical circulation. Medicine (Baltimore), 53: 1, 1974. D’ANGELO, W.A.; FRIES, J.F.; MASI, A.T. et al. Pathologic observations in systemic sclerosis (scleroderma). A study of fifty-eight autopsy cases and fifty-eight matched controls. Am. J. Med., 46: 428, 1969. HERRICK, A.L.; HEANEY, M.; HOLLIS, S. et al. Anticardiolipin, anticentromere and anti-Scl-70 antibodies in patients with systemic sclerosis and severe digital ischaemia. Ann. Rheum. Dis., 53: 540, 1994. NAKAMURA, R.M.; TAN, E.M. Autoantibodies to nonhistone nuclear antigens and their clinical significance. Hum. Pathol., 14: 392, 1983. TRAUB, Y.M.; SHAPIRO, A.P.; RODNAN, G.P. et al. Hypertension and renal failure (scleroderma renal crisis) in progressive systemic sclerosis. Review of a 25-year experience with 68 cases. Medicine (Baltimore), 62: 335, 1983. MOLINA, J.F.; ANAYA, J.M.; CABRERA, G.E. et al. Systemic sclerosis sine scleroderma: an unusual presentation in scleroderma renal crisis. J. Rheumatol., 22: 557, 1995. SATOH, K.; IMAI, H.; YASUDA, T. et al. Sclerodermatous renal crisis in a patient with mixed connective tissue disease. Am. J. Kidney Dis., 24: 215, 1994. CLEMENTS, P.J.; LACHENBRUCH, P.A.; FURST, D.E. et al. Abnormalities of renal physiology in systemic sclerosis. A prospective study with 10-year followup. Arthritis Rheum., 37: 67, 1994. KATRIB, A.; STURGESS, A.; BERTOUCH, J.V. Systemic sclerosis and antineutrophil cytoplasmic autoantibody-associated renal failure. Rheumatol. Int., 19: 61, 1999. MAES, B.; VAN MIEGHEM, A.; MESSIAEN, T. et al. Limited cutaneous systemic sclerosis associated with MPO-ANCA positive renal small vessel vasculitis of the microscopic polyangiitis type. Am. J. Kidney Dis., 36: E16, 2000. BECKETT, V.L.; DONADIO, JR, J.V.; BRENNAN, JR, L.A. et al. Use of captopril as early therapy for renal scleroderma: a prospective study. Mayo Clin. Proc., 60: 763, 1985. STEEN, V.D.; COSTANTINO, J.P.; SHAPIRO, A.P. et al. Outcome of renal crisis in systemic sclerosis: relation to availability of angiotensin converting enzyme (ACE) inhibitors. Ann. Intern. Med., 113: 352, 1990. SCORZA, R.; RIVOLTA, R.; MASCAGNI, B. et al. Effect of iloprost infusion on the resistance index of renal vessels of patients with systemic sclerosis. J. Rheumatol., 24: 1944, 1997. HUGHES, G.R. The antiphospholipid syndrome: ten years on. Lancet, 342: 341, 1993. HUGHES, G.R.; HARRIS, N.N.; GHARAVI, A.E. The anticardiolipin syndrome. J. Rheumatol., 13: 486, 1986. TRIPLETT, D.A. Many faces of lupus anticoagulants. Lupus, 7: S18, 1998. MOSS, K.E.; ISENBERG, D.A. Comparison of renal disease severity and outcome in patients with primary antiphospholipid syndrome, antiphospholipid syndrome secondary to systemic lupus erythematosus (SLE) and SLE alone. Rheumatology, 40: 863, 2001. WILSON, W.A.; GHARAVI, A.E.; KOIKE, T. et al. International consensus statement on preliminary classification criteria for definite antiphospholipid syndrome: report of an international workshop. Arthritis Rheum., 42: 1309, 1999. AMES, P.R.; CIANCIARUSO, B.; BELLIZZI, V. et al. Bilateral renal artery occlusion in a patient with primary antiphospholipid antibody syndrome: thrombosis, vasculitis or both? J. Rheumatol., 19: 1802, 1992. SONPAL, G.M.; SHARMA, A.; MILLER, A. Primary antiphospholipid antibody syndrome, renal infarction and hypertension. J. Rheumatol., 20: 1221, 1993. ASHERSON, R.A.; BUCHANAN, N.; BAGULEY, E. et al. Postpartum bilateral renal vein thrombosis in the primary antiphospholipid syndrome. J. Rheumatol., 20: 874, 1993. GODFREY, T.; KHAMASHTA, M.A.; HUGHES, G.R. Antiphospholipid syndrome and renal artery stenosis. Q. J. Med., 93: 127, 2000. REMONDINO, G.I.; MYSLER, E.; PISSANO, M.N. et al. A reversible bilateral renal artery stenosis in association with antiphospholipid syndrome. Lupus, 9: 65, 2000.
536
Doenças Vasculares dos Rins
114. AMIGO, M.C.; GARCIA-TORRES, R.; ROBLES, M. et al. Renal involvement in primary antiphospholipid syndrome. J. Rheumatol., 19: 1181, 1992. 115. KINCAID-SMITH, P.; FAIRLEY, K.F.; KLOSS, M. Lupus anticoagulant associated with renal thrombotic microangiopathy and pregnancy-related renal failure. Q. J. Med., 68: 795, 1988. 116. GRIFFITHS, M.H.; PAPADAKI, L.; NEILD, G.H. The renal pathology of primary antiphospholipid syndrome: a distinctive form of endothelial injury. Q. J. Med., 93: 457, 2000. 117. SA, H.; FREITAS, L.; MOTA, A. et al. Primary antiphospholipid syndrome presented by total infarction of right kidney with nephrotic syndrome. Clin. Nephrol., 52: 56, 1999. 118. BICK, R.L. The antiphospholipid-thrombosis syndromes. Fact, fiction, confusion, and controversy. Am. J. Clin. Pathol., 100: 477, 1993. 119. KHAMASHTA, M.A.; CUADRADO, M.J.; MUJIC, F. et al. The management of thrombosis in the antiphospholipid-antibody syndrome. N. Engl. J. Med., 332: 993, 1995. 120. PETRI, M. Management of thrombosis in antiphospholipid antibody syndrome. Rheum. Dis. Clin. North Am., 27: 633, 2001. 121. DE JONG, P.E.; STATIUS VAN EPS, L.W. Sickle cell nephropathy: new insights into its pathophysiology. Kidney Int., 27: 711, 1985. 122. STATIUS VAN EPS, L.W.; PINEDO-VEELS, C.; DE VRIES, G.H. et al. Nature of concentrating defect in sickle-cell nephropathy. Microradioangiographic studies. Lancet, 1: 450, 1970. 123. ALLON, M. Renal abnormalities in sickle cell disease. Arch. Intern. Med., 150: 501, 1990. 124. BHATHENA, D.B.; SONDHEIMER, J.H. The glomerulopathy of homozygous sickle hemoglobin (SS) disease: morphology and pathogenesis. J. Am. Soc. Nephrol., 1: 1241, 1991. 125. STRAUSS, J.; PARDO, V.; KOSS, M.N. et al. Nephropathy associated with sickle cell anemia: an autologous immune complex nephritis. I. Studies on nature of glomerular-bound antibody and antigen identification in a patient with sickle cell disease and immune deposit glomerulonephritis. Am. J. Med., 58: 382, 1975. 126. AVILES, D.H.; CRAVER, R.; WARRIER, R.P. Immunotactoid glomerulopathy in sickle cell anemia. Pediatr. Nephrol., 16: 82, 2001. 127. FIGENSHAU, R.S.; BASLER, J.W.; RITTER, J.H. et al. Renal medullary carcinoma. J. Urol., 159: 711, 1998. 128. BLACK, W.D.; HATCH, F.E.; ACCHIARDO, S. Aminocaproic acid in prolonged hematuria of patients with sicklemia. Arch. Intern. Med., 136: 678, 1976. 129. POWARS, D.R.; ELLIOTT-MILLS, D.D.; CHAN, L. et al. Chronic renal failure in sickle cell disease: risk factors, clinical course, and mortality. Ann. Intern. Med., 115: 614, 1991. 130. PHAM, P.T.; PHAM, P.C.; WILKINSON, A.H. et al. Renal abnormalities in sickle cell disease. Kidney Int., 57: 1, 2000. 131. OJO, A.O.; GOVAERTS, T.C.; SCHMOUDER, R.L. et al. Renal transplantation in end-stage sickle cell nephropathy. Transplantation, 67: 291, 1999. 132. CHATTERJEE, S.N. National study in natural history of renal allografts in sickle cell disease or trait: a second report. Transplant Proc., 19: 33, 1987.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Renal Vascular Disease http://www.outlinemed.com/demo/nephrol/9979.htm Trombose e Embolia das Artérias Renais THE MERCK MANUAL, Renal Artery Occlusion http://www.merck.com/pubs/mmanual/section17/ chapter228/228b.htm
Renal Embolism and Infarction http://www.froedtert.com/wellness/publications/ detail.jsp?id51069 Trombose das Veias Renais eMedicine — Renal Vein Thrombosis: Article by Gregory William Rutecki, MD http://www.emedicine.com/med/topic2005.htm Doença Renal Ateroembólica eMedicine — Cholesterol Embolism: Article by Lisa Kirkland, MD http://www.emedicine.com/med/topic651.htm Schrier’s Atlas of Kidney Diseases — Vascular Disorders Arthur H. Cohen & Richard J. Glassock http://www.kidneyatlas.org/book2/adk2_05.pdf Nefrosclerose Hipertensiva NHLBI, JNC VI Report http://www.nhlbi.nih.gov/guidelines/hypertension/ jncintro.htm Renal Parenchymal Disease and Hypertension Stephen C. Textor http://www.kidneyatlas.org/book3/adk3-02.QXD.pdf The Role of Hypertension in Progression of Chronic Renal Disease Lance D. Dworkin & Douglas G. Shemin http://www.kidneyatlas.org/book3/adk3-06.QXD.pdf Schrier’s Atlas of Kidney Diseases — Vascular Disorders Arthur H. Cohen & Richard J. Glassock http://www.kidneyatlas.org/book2/adk2_05.pdf Microangiopatias Trombóticas Schrier’s Atlas of Kidney Diseases — Vascular Disorders Arthur H. Cohen & Richard J. Glassock http://www.kidneyatlas.org/book2/adk2_05.pdf Nefrite por Irradiação eMedicine — Nephritis, Radiation: Article by Eric P Cohen, MD http://www.emedicine.com/med/topic1598.htm Esclerodermia Renal Schrier’s Atlas of Kidney Diseases — Renal Involvement in Collagen Vascular Diseases and Dysproteinemias Jo H.M. Berden & Karel J.M. Assmann http://www.kidneyatlas.org/book4/adk4-11.pdf Síndrome do Anticorpo Antifosfolipídio Revisão no JBN — Envolvimento renal na síndrome do anticorpo antifosfolípide Américo Lourenço Cuvello Neto http://www.sbn.org.br/JBN/20-1/v0e1p055.pdf eMedicine — Antiphospholipid Syndrome: Article by Amiel Tokayer, MD http://www.emedicine.com/med/topic2923.htm Nefropatia da Anemia Falciforme Sickle Cell Disease L.W. Statius van Eps http://www.kidneyatlas.org/book4/adk4-04.pdf RIELLA Cap 27 figuras 31/03/2002
Capítulo
28
Nefropatia e Gestação Istênio F. Pascoal, Emil Sabbaga e Décio Mion Jr.
INTRODUÇÃO
Microangiopatia trombótica
ALTERAÇÕES ANATÔMICAS E FUNCIONAIS DO TRATO
Necrose cortical renal bilateral
URINÁRIO
Pielonefrite aguda
Significância clínica DOENÇA RENAL E GRAVIDEZ Acompanhamento clínico Papel da insuficiência renal Papel da hipertensão arterial
Cálculo urinário Etiologia Diagnóstico Curso natural Tratamento
Nefropatia lúpica
BIÓPSIA RENAL NA GRAVIDEZ
Infecção do trato urinário
DIÁLISE E GRAVIDEZ
Bacteriúria assintomática
TRANSPLANTE RENAL E GRAVIDEZ
Infecção sintomática do trato urinário
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Insuficiência renal aguda
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Hemorragias
INTRODUÇÃO O aconselhamento sobre as chances e os riscos de concepção, ou de continuidade de uma gestação, em mulheres com doença renal preexistente ou receptoras de transplante renal constitui um desafio freqüente da prática nefrológica. Por sua vez, complicações renais e hipertensivas de uma gravidez já em curso requerem pronta intervenção. O tratamento de tais pacientes exige familiaridade com as modificações que ocorrem na função renal durante a gestação normal, por isso este capítulo revisará estes pacientes antes de examinar as influências recíprocas entre a gestação e as doenças renais em suas variadas formas e expressões.
ALTERAÇÕES ANATÔMICAS E FUNCIONAIS DO TRATO URINÁRIO Durante a gravidez ocorrem inúmeras alterações anatômicas e fisiológicas no trato urinário. O rim aumenta aproximadamente 1 cm durante a gestação, enquanto o cálice, a pelve e o ureter se dilatam progressivamente, em decorrência de efeitos hormonais e de obstrução mecânica exercida pelo útero gravídico.1 Estas alterações podem conduzir a erros nas provas de avaliação da função renal que requerem a coleta controlada de urina, devido à sua retenção no sistema coletor dilatado. Além disso, a estase urinária pode contribuir para a
538
Nefropatia e Gestação
maior propensão de mulheres grávidas com bacteriúria assintomática a desenvolverem pielonefrite aguda. O fluxo plasmático renal efetivo (FPRE) e o ritmo de filtração glomerular (RFG) aumentam significativamente durante a gravidez. O aumento no RFG pode ser demonstrado já no primeiro mês da concepção e alcança níveis aproximadamente 50% acima do controle pré-gravídico no segundo trimestre. No final do terceiro trimestre o RFG diminui cerca de 20%, retornando aos níveis pré-gestacionais nos primeiros três meses após o parto.2 Os mecanismos responsáveis por estas alterações funcionais ainda não estão completamente esclarecidos. O aumento do volume plasmático e dos níveis circulantes de aldosterona, desoxicorticosterona, progesterona e prolactina, bem como o aparecimento de lactogênio placentário e gonadotrofina coriônica, poderiam influenciar a hemodinâmica renal, embora não pareçam capazes de provocar, per se, as modificações na magnitude vistas durante a gravidez. Igualmente, a angiotensina II e o peptídeo natriurético atrial, cujas ações e concentrações se modificam durante a gravidez, poderiam influenciar a regulação tônica das arteríolas aferente e eferente e, assim, desempenhar algum papel funcional. Mais recentemente, o fator relaxante derivado do endotélio relacionado ao óxido nítrico tem sido também implicado.3
Pontos-chave: • A estase urinária pode contribuir para a maior propensão de mulheres grávidas com bacteriúria assintomática a desenvolverem pielonefrite aguda • O fluxo plasmático renal efetivo (FPRE) e o ritmo de filtração glomerular (RFG) aumentam significativamente durante a gravidez • A hiperfiltração glomerular gestacional resulta em redução dos níveis séricos de creatinina e uréia • A excreção urinária de proteína também aumenta na gravidez, provavelmente em decorrência da elevação do fluxo plasmático glomerular, sendo 300 mg/24 h considerado o limite superior da normalidade • Há diminuição dos níveis plasmáticos de ácido úrico. Valores superiores a 5,0 mg/dl são considerados anormais e podem constituir um sinal precoce de pré-eclâmpsia
Significância Clínica A hiperfiltração glomerular gestacional resulta em redução dos níveis séricos de creatinina e uréia para valores
tão baixos quanto 0,5 e 20 mg/dl, respectivamente. Níveis superiores a 0,9 e 30 mg/dl podem indicar a presença de nefropatia subjacente e requerem avaliação complementar. A excreção urinária de proteína também aumenta na gravidez, provavelmente em decorrência da elevação do fluxo plasmático glomerular, sendo 300 mg/24 h considerado o limite superior da normalidade.4 Também de interesse é a diminuição dos níveis plasmáticos de ácido úrico. Valores superiores a 5,0 mg/dl são considerados anormais e podem constituir um sinal precoce de pré-eclâmpsia.5 A pressão arterial (PA) diminui fisiologicamente durante a gestação. Este comportamento é observado tanto em gestantes normotensas, quanto naquelas com hipertensão arterial crônica. Na prática, valores de PA diastólica superiores a 75 mmHg no segundo trimestre e 85 mmHg no terceiro trimestre devem ser considerados anormais.
DOENÇA RENAL E GRAVIDEZ Permanece controverso qual a real influência que a gestação exerce sobre a história natural de uma nefropatia preexistente, bem como o efeito da nefropatia sobre a evolução obstétrica. A visão predominante, entretanto, é de que o grau de comprometimento funcional renal à concepção e a presença ou ausência de hipertensão arterial durante a gestação determinam tanto a evolução da gestação quanto o efeito desta sobre o curso da nefropatia. A gestação parece não causar qualquer deterioração, ou mesmo afetar a progressão de uma doença renal além do que seria esperado fora da gestação, se a função renal for normal ou apenas discretamente alterada antes da concepção e se a hipertensão arterial estiver ausente ou controlada durante a gravidez.6 A maioria destas pacientes apresenta elevação do RFG e do FPRE durante a gestação, à semelhança do que ocorre na gravidez normal. A presença de insuficiência renal e/ou hipertensão arterial, entretanto, associa-se à maior incidência de complicações, tanto maternas quanto fetais. Como a doença progride e a função renal declina com o tempo, o rigoroso controle da pressão arterial representa a única possibilidade de se intervir no trinômio nefropatia, hipertensão e gravidez e, assim, minimizar a influência negativa dessa associação sobre a história natural de uma doença renal preexistente, bem como sobre o curso da própria gestação.
Acompanhamento Clínico A avaliação clínica e laboratorial de gestantes com doença renal é praticamente semelhante àquela empregada fora da gestação. Excetuam-se os exames que utilizam radiação ionizante ou radioquímicos, os quais deveriam ser realizados depois do parto. O acompanhamento pré-natal
539
capítulo 28
requer visitas quinzenais até 32 semanas de gestação, e semanais a partir de então. Além da rotina laboratorial regularmente realizada no pré-natal, o clearance de creatinina, a proteinúria de 24 horas, o nível sérico de ácido úrico e a contagem de plaquetas (visando à detecção precoce de pré-eclâmpsia) devem ser aferidos mensalmente. A filtração glomerular, medida através do clearance de creatinina, deve aumentar pelo menos 30% acima dos valores obtidos antes da gravidez. A excreção de ácidos e a capacidade de concentração e diluição da urina não se modificam durante a gravidez.
PAPEL DA INSUFICIÊNCIA RENAL Na presença de insuficiência renal a capacidade reprodutiva diminui, mas tanto a evolução obstétrica quanto o prognóstico renal diferem em mulheres com diferentes graus de insuficiência renal. Quando os níveis de creatinina antes da gravidez são inferiores a 1,4 mg/dl, tanto a evolução obstétrica quanto o curso da nefropatia praticamente não são afetados. O prognóstico piora se a função renal estiver moderadamente comprometida (creatinina sérica entre 1,5 e 2,8 mg/dl). Nesta condição, pode ocorrer rápida deterioração da função renal. A situação se agrava ainda mais se a insuficiência renal já estiver avançada (creatinina acima de 2,8 mg/dl).7
PAPEL DA HIPERTENSÃO ARTERIAL Cerca de 10% de todas as gestações são complicadas por hipertensão arterial. Em 25% das vezes, a hipertensão é anterior à gestação (hipertensão crônica). Pré-eclâmpsia contribui com os 75% restantes. A presença de doença renal aumenta a suscetibilidade à pré-eclâmpsia, a qual pode ocorrer mais precocemente, constituindo um dos principais riscos da doença renal na gravidez. De interesse é que quando a hipertensão não é grave, a gestação exibe um efeito anti-hipertensivo, constituindo uma defesa que, per se, atenua as repercussões da própria hipertensão. A maioria dos autores não prescreve tratamento medicamentoso para pacientes com pressão arterial diastólica (PAD) ⬍ 95 mmHg no segundo trimestre ou ⬍ 100 mmHg no terceiro trimestre de uma gravidez normal, mas muitos tratariam mais agressivamente (PAD ⬎ 80 mmHg) na presença de nefropatia, acreditando que isto protege o rim. Modificações hemodinâmicas de padrão semelhante são observadas em diferentes espécies de animais de experimentação. A avaliação da hemodinâmica glomerular em ratas grávidas, através da técnica de micropunção, demonstra que a hiperfiltração glomerular gestacional é um fenômeno decorrente, exclusivamente, da elevação do fluxo plasmático glomerular. A pressão capilar glomerular, cuja elevação é potencialmente lesiva ao glomérulo, não se modifica na gestação, refletindo redução paralela e proporcional nas resistências das arteríolas aferente e eferente.8 Uma condição clínica intrigante é a presença de glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF) associada a
endoteliose capilar glomerular, lesão característica da préeclâmpsia, na biópsia renal pós-parto de algumas pacientes que desenvolvem pré-eclâmpsia, sem qualquer anormalidade renal ou hipertensiva anterior à gestação. Caracteristicamente, estas pacientes apresentam proteinúria nefrótica na vigência da pré-eclâmpsia. Ainda há controvérsias se GESF em mulheres pré-eclâmpticas representa uma doença glomerular preexistente ou se é uma variante de lesão renal da pré-eclâmpsia, mas o caráter autolimitado da lesão indica uma associação causal com a préeclâmpsia. A vasodilatação renal imposta pela gestação poderia permitir a transmissão da condição hipertensiva sistêmica (recém-desenvolvida) ao interior do glomérulo e, eventualmente, causar GESF. A evolução desta forma de lesão renal parece benigna, desaparecendo suas manifestações clínicas e laboratoriais com o desaparecimento do estímulo gerador, a própria gravidez.9
Pontos-chave: • O acompanhamento pré-natal requer visitas quinzenais até 32 semanas de gestação, e depois semanais • Clearance de creatinina, proteinúria de 24 horas, nível sérico de ácido úrico e contagem de plaquetas devem ser aferidos mensalmente • Níveis de creatinina antes da gravidez inferiores a 1,4 mg/dl não afetam a nefropatia e a evolução obstétrica • Níveis de creatinina de 1,5 a 2,8 mg/dl podem acarretar rápida deterioração da função renal. A situação se agrava ainda mais se a insuficiência renal já estiver avançada (creatinina acima de 2,8 mg/dl) • A vasodilatação renal imposta pela gestação poderia permitir a transmissão da condição hipertensiva sistêmica (recémdesenvolvida) ao interior do glomérulo e, eventualmente, causar GESF
Nefropatia Lúpica Gravidez em mulheres com nefropatia lúpica está associada a riscos de até 25% de perda fetal e de piora das manifestações renais e extra-renais. Estes achados podem ocorrer durante a gravidez ou nas primeiras oito semanas do puerpério.10 Pacientes com anticorpos anticardiolipina e anticoagulante lúpico apresentam maior risco;11 assim, em todas as gestantes com lúpus a atividade anticoagulante deve ser investigada. A freqüência de exacerbações ou persistência dos sintomas varia conforme o estado de ativi-
540
Nefropatia e Gestação
dade da doença, atingindo 60% das mulheres com doença ativa ao engravidarem, mas apenas 20% daquelas em remissão por pelo menos seis meses antes da concepção.12 Não está determinado, entretanto, se estas exacerbações são devidas à gravidez per se. Embora a incidência não seja alta, exacerbações renais graves podem ocorrer. Em conseqüência, mulheres com nefropatia lúpica deveriam ser encorajadas a retardar a gravidez até a doença estar inativa por pelo menos seis meses. As implicações prognósticas negativas da azotemia e da hipertensão preexistente referidas acima também se aplicam a pacientes lúpicas. Tem sido sugerido, mas não provado, que a freqüência de piora puerperal pode ser diminuída com o aumento da dose de corticosteróide por uma semana após o parto. O tratamento da nefropatia lúpica ativa no período puerperal não apresenta peculiaridades. Entretanto, a abordagem terapêutica durante a gravidez não está ainda bem definida. Prednisona oral (30 a 60 mg/dia) tem sido utilizada, embora com riscos de induzir ou exacerbar a hipertensão. Há pouca experiência com pulso de metil-prednisolona, e seus efeitos sobre o feto são desconhecidos. Ciclofosfamida deveria ser evitada durante a gravidez, mas azatioprina pode ser usada com relativa segurança, desde que a leucometria seja normal.
Infecção do Trato Urinário A infecção urinária é um dos problemas mais comuns da gestação, embora na maioria das vezes seja clinicamente silenciosa (bacteriúria assintomática). A localização do sítio de infecção no trato urinário (superior ou inferior) é bastante útil, como índice prognóstico ou como guia para o tratamento. Embora ainda não exista um método rápido disponível para distinguir estas duas possibilidades, a presença de cilindros leucocitários ou de bactérias recobertas por anticorpo na urina e a diminuição da capacidade de concentração urinária, após a privação de líquidos por 12 horas, indicam a presença de comprometimento parenquimatoso renal.
BACTERIÚRIA ASSINTOMÁTICA A incidência de bacteriúria assintomática é semelhante entre gestantes e mulheres não-grávidas sexualmente ativas (4 a 7%). Infecção urinária sintomática se desenvolve em 20 a 40% das gestantes com bacteriúria assintomática no início da gestação, contra 2% nas mulheres grávidas sem bacteriúria. Por esta razão, é importante investigar a presença de bacteriúria em todas as mulheres grávidas e tratar as que apresentam urocultura positiva. Escherichia coli é o microrganismo mais comum. A maioria das infecções está restrita à bexiga. O tratamento da bacteriúria assintomática diminui a incidência de infecção do trato urinário (ITU) subseqüente em cerca de 90% dos casos. Cultura de urina com antibiograma deve ser obtida na primeira
consulta pré-natal. Mulheres com cultura de urina positiva (acima de 100.000 col/ml) devem ser tratadas e mantidas sob vigilância para bacteriúria recorrente. O agente antimicrobiano deve ser escolhido segundo a sensibilidade do microrganismo e a ausência de efeitos colaterais para o feto. Um dos esquemas mais simples é a utilização de nitrofurantoína, 100 mg à noite por 10 dias, que tem provado ser tão efetivo quanto ampicilina, sulfonamidas ou cefalexinas, administradas 4 vezes ao dia. As quinolonas devem ser evitadas durante a gravidez. Independentemente da terapêutica escolhida, aproximadamente 30% das mulheres desenvolverão bacteriúria recorrente durante a mesma gestação. Na bacteriúria assintomática, aumento na incidência de prematuridade e óbito fetal têm sido relatados, particularmente quando localizada no trato urinário superior.
INFECÇÃO SINTOMÁTICA DO TRATO URINÁRIO ITU sintomática ocorre em 1 a 2% das mulheres gestantes, mas a vigilância e o tratamento das bacteriúrias assintomáticas podem reduzir esta incidência para 0,5%. E. coli é o germe mais freqüentemente encontrado. Pielonefrite aguda na gestação pode evoluir para choque séptico, deterioração transitória da função renal, crescimento intrauterino retardado, prematuridade, síndrome da angústia respiratória da infância, anormalidades congênitas e óbito fetal. Mulheres com cistite bacteriana sintomática respondem rapidamente a qualquer dos esquemas antimicrobianos descritos para bacteriúria assintomática, devendo a paciente ser monitorizada para bacteriúria recorrente. As mulheres grávidas com pielonefrite aguda devem ser hospitalizadas, devido à potencial gravidade, incluindo a incidência de 15-20% de concorrente bacteremia. O tratamento deve ser iniciado antes mesmo de se conhecerem os resultados das culturas. Gentamicina é uma excelente escolha para o tratamento de mulheres toxêmicas, embora aproximadamente 20% destas mulheres tenham significante disfunção renal, e as doses devem ser corrigidas, visando à prevenção de nefrotoxicidade e ototoxicidade tanto materna quanto fetal. Embora se venha observando crescente resistência da maioria dos uropatógenos à ampicilina, ela pode ser empregada inicialmente em associação com a gentamicina. As cefalosporinas constituem razoáveis alternativas. De acordo com o antibiograma, a antibioticoterapia será modificada ou mantida por 4 a 6 semanas.
Insuficiência Renal Aguda Todas as causas de insuficiência renal aguda (IRA) na população geral podem ocorrer durante a gravidez, mas algumas condições estão predominantemente associadas com IRA na primeira metade e outras na segunda metade da gestação. No início da gravidez, por exemplo, as causas de IRA mais comuns são doença pré-renal secundária
541
capítulo 28
a hiperêmese gravídica, e necrose tubular aguda devido a abortamento séptico. Diferentes condições induzem insuficiência renal aguda no final da gestação, particularmente as complicações hemorrágicas relacionadas ao parto, a síndrome pré-eclâmpsia/eclâmpsia e a síndrome hemolítico-urêmica pós-parto.
dos apresentam uma das complicações acima e desenvolvem oligoanúria, hematúria macroscópica, dor lombar e hipotensão. Nenhuma terapêutica específica tem sido mostrada efetiva nesta doença. Muitos pacientes requerem diálise, mas 20 a 40% recuperam parcialmente a função renal e o clearance de creatinina estabiliza entre 15 e 50 ml/min.17
HEMORRAGIAS
PIELONEFRITE AGUDA
Hipoperfusão renal, devida à hemorragia uterina, é a principal causa de IRA na gravidez avançada. Descolamento prematuro da placenta, principalmente em pacientes com pré-eclâmpsia nas quais a tumefação das células endoteliais seja suficientemente grave para obstruir inteiramente a luz capilar, é o modelo clínico mais freqüente de IRA na gravidez. A detecção precoce da hemorragia e a adequada reposição volêmica, através de transfusões, podem prevenir a IRA.
Mulheres grávidas são mais predispostas a desenvolver IRA secundária a pielonefrite aguda, principalmente na vigência de septicemia ou hipotensão arterial. A histologia renal pode revelar microabscessos focais e a recuperação após apropriada antibioticoterapia pode ser incompleta, devido a lesão irreversível.18
MICROANGIOPATIA TROMBÓTICA Insuficiência renal aguda associada à plaquetopenia no final da gestação requer um elaborado diagnóstico diferencial entre três principais condições: púrpura trombocitopênica trombótica (PTT), síndrome hemolítico-urêmica pós-parto (SHU) e síndrome HELLP. A distinção entre estas entidades é importante por razões terapêuticas e prognósticas. Entretanto, a apresentação clínica e histológica é tão semelhante que estabelecer o diagnóstico correto pode ser difícil. 1) A síndrome HELLP (hemolysis microangiopathic, elevated liver enzymes, low platelet), que é uma forma de pré-eclâmpsia grave, tipicamente se desenvolve no terceiro trimestre, com apenas poucos casos ocorrendo nos primeiros dois dias após o parto. Usualmente é precedida por hipertensão e proteinúria, mas insuficiência renal é rara, a menos que haja acentuado sangramento ou instabilidade hemodinâmica, e geralmente se resolve espontaneamente. 2) A PTT quase sempre ocorre durante a gravidez, com a maioria dos casos se iniciando antes da 24.ª semana. Caracteriza-se pela pêntade de anemia hemolítica microangiopática, plaquetopenia, insuficiência renal, febre e anormalidades neurológicas. Em geral, a disfunção renal é discreta, e o envolvimento neurológico associado à plaquetopenia, que são marcantes, freqüentemente remitem com plasmaférese e/ou infusão de plasma. 3) A SHU geralmente ocorre após o parto (quatro semanas, em média), sucedendo uma gravidez normal. O envolvimento renal é grave. Recuperação da função é rara, embora plasmaférese e/ou infusão de plasma tenham sido tentadas, devido à sua eficácia na TTP.
NECROSE CORTICAL RENAL BILATERAL Descolamento prematuro de placenta, placenta prévia, morte fetal intra-uterina prolongada e embolia amniótica podem induzir necrose cortical renal bilateral ou, nos casos menos graves, necrose tubular aguda. Os pacientes afeta-
Cálculo Urinário Sintomas decorrentes de cálculo renal constituem um evento raro na gravidez. Quando ocorrem, entretanto, freqüentemente estão associados com infecção do trato urinário13 e podem induzir trabalho de parto prematuro.14 Além disso, o diagnóstico e o tratamento são mais complicados do que na população não-grávida, uma vez que as intervenções comumente utilizadas nestes casos podem atingir o feto. Estima-se que 1 em cada 1.500 gestações seja complicada por cálculos renais,15,16 mas a incidência precisa é ainda desconhecida porque a maioria das pacientes são identificadas apenas quando seus cálculos se tornam sintomáticos.
ETIOLOGIA As alterações anatômicas e funcionais do trato urinário impostas pela gravidez normal predispõem à formação de cálculo renal. A excreção urinária de cálcio pode aumentar 1-2 vezes durante a gestação19,22 e a supersaturação — um reflexo da concentração e da solubilidade dos sais de cálcio — também aumenta expressivamente na gravidez.19-21,23 A hipercalciúria e a supersaturação deveriam, portanto, aumentar o desenvolvimento de cálculo renal durante a gravidez; entretanto, a incidência de calculose não muda. A proteção contra a formação e o crescimento de cálculos pode ser mediada pelo aumento simultâneo na excreção urinária de inibidores naturais, tais como magnésio e citrato. Também a nefrocalcina, uma glicoproteína ácida natural que inibe a formação de cálculo de oxalato de cálcio, tem tanto sua excreção quanto sua atividade aumentada significativamente durante a gravidez normal.22,24 Em síntese, nefrocalcina, citrato, magnésio e pH alcalino parecem contrabalançar o estado hipercalciúrico supersaturado da urina de uma grávida normal.
DIAGNÓSTICO Cólica renal é a causa mais comum de dor abdominal não-obstétrica que requer internação no curso da gravi-
542
Nefropatia e Gestação
dez.25 Os sinais e sintomas clínicos são semelhantes àqueles observados em mulheres não-grávidas e sua avaliação começa com a história clínica e o exame físico. Atenção especial deve ser dada à idade de início da doença, história familiar, dieta e medicações, infecções urinárias prévias, resultados de radiografias abdominais anteriores e outras complicações clínicas ou cirurgias pregressas. A ultrasonografia é o meio ideal para se iniciar a identificação de cálculos renais durante a gravidez porque não expõe o feto a radiação ionizante. Porém, como a maioria dos cálculos sintomáticos está localizada nos ureteres, há grandes limitações na sua visualização pela ultra-sonografia. Além disso, a dilatação fisiológica do sistema coletor que acompanha a gravidez normal confunde e dificulta a definição da obstrução ureteral. Uma radiografia simples de abdome aumenta significativamente a sensibilidade diagnóstica da ultra-sonografia. A ressonância magnética nuclear não expõe o feto a radiação ionizante e, por isso, tem sido crescentemente utilizada para avaliar a anatomia tanto materna quanto fetal. A urografia excretora durante a gravidez tem sua indicação restrita às seguintes circunstâncias: a) sintomas de cálculo não responsivos à terapêutica conservadora; b) diminuição da função renal em associação com sintomas de cálculo renal; c) pielonefrite sintomática e refratária à antibioticoterapia, especialmente em grávidas com passado de cálculos. Embora seja oportuno lembrar que estudos radiológicos realmente necessários para a adequada avaliação materna não devem deixar de ser realizados por temor da exposição fetal à radiação (especialmente na segunda metade da gravidez), convém radiografar apenas o lado afetado, a pelve materna deve ser protegida e o número de radiografias deve ser reduzido ao mínimo.26,27 Cerca de 2/ 3 dos cálculos sintomáticos durante a gravidez passam espontaneamente, mas o restante requer intervenção, seja ainda durante a gravidez ou após o parto.31,32
CURSO NATURAL O tratamento conservador resulta na passagem espontânea de pelo menos 60% dos cálculos sintomáticos durante a gravidez. Intervenções cirúrgicas e não-cirúrgicas são necessárias em cerca de 30% das pacientes. Nos 10% restantes os procedimentos podem ser postergados e realizados após o parto. Se um cálculo não é expelido espontaneamente, o passo seguinte é a cistoscopia para removê-lo ou desfazer a obstrução com passagem de um cateter ureteral. Se a cistoscopia não for possível, uma nefrostomia percutânea ou um procedimento aberto estão indicados. Em princípio, estes procedimentos devem ser realizados após o parto, se possível. Indicações específicas para intervenção durante a gravidez incluem: a) infecção persistente a montante da obstrução; b) dor intratável; c) cólica renal precipitando trabalho de parto prematuro refratário à terapêutica; d) piora da função renal com permanência da obstrução; e) obstrução de um rim solitário. A complicação não-obstétrica mais comum de cálculo renal durante a gravidez é a infecção do trato
urinário, que ocorre em até 20% dos casos.28 Antibioticoterapia oral geralmente é suficiente para tratar a infecção urinária baixa, porém pielonefrite requer hospitalização com administração de antibiótico sistêmico e possível intervenção para reverter a eventual obstrução.
TRATAMENTO Repouso no leito, hidratação e analgesia constituem as medidas iniciais indicadas para grávidas com cálculos sintomáticos. Apenas isto leva à passagem espontânea de pelo menos 50% dos cálculos urinários durante a gestação. Meperidina e morfina são analgésicos narcóticos úteis para tratar a cólica renal e têm sido usadas também durante a gravidez, embora atravessem a placenta rapidamente.29,30 Preparações orais contendo codeína têm sido associadas com malformações fetais e devem ser evitadas durante a gravidez.31 Os antiinflamatórios não-esteróides têm sido usados com sucesso para tratar cólica renal em mulheres não-grávidas, mas devem ser evitados durante a gestação, particularmente próximo ao termo, devido ao risco de fechamento precoce do ductus arteriosis.32,33 Ainda há poucos relatos sobre os efeitos e os riscos da litotripsia em mulheres grávidas, mas sua aplicação em animais de experimentação têm demonstrado congestão e múltiplas hemorragias focais em pulmão, fígado e rins de fetos expostos.34,35 Por outro lado, o emprego eventual da litotripsia em mulheres grávidas não tem sido associado a malformações fetais.36,37 Até o presente, entretanto, o uso de litotripsia durante a gravidez permanece formalmente contra-indicado, mas sua utilização inadvertida não constitui razão suficiente para a interrupção da gravidez. A avaliação metabólica da calculose renal deve ser retardada até pelo menos três meses após parto e lactação.
BIÓPSIA RENAL NA GRAVIDEZ A realização de biópsia renal durante a gestação é um procedimento pouco usual, principalmente porque as circunstâncias clínicas raramente justificam os riscos. Na maioria das vezes, a biópsia é postergada e realizada após o parto. Excetuam-se os casos nos quais deterioração súbita e inexplicável da função renal ocorre antes de 32 semanas de gestação, devido à possibilidade de algumas formas de glomerulonefrite rapidamente progressiva responderem a tratamento agressivo, tais como pulsoterapia com corticosteróides ou plasmaférese. A biópsia não deve ser realizada após a 32.ª semana, devendo, nestes casos, ser considerada a interrupção da gestação.
DIÁLISE E GRAVIDEZ A gravidez é excepcional em mulheres sob tratamento dialítico crônico. Estima-se que apenas 10% destas pacien-
capítulo 28
tes ovulam regularmente, 40% têm ciclos irregulares e 50% são amenorréicas. Além disso, na hipótese de concepção, menos de 50% das gestações evoluem até a viabilidade fetal. O esclarecimento sobre as chances de concepção e os riscos da continuação de uma gestação já iniciada deve ser uma atitude rotineira do nefrologista responsável pelo tratamento dialítico de mulheres em idade reprodutiva. Muitos autores desaconselham a gravidez se a creatinina sérica excede 1,4 mg/dl e/ou se a pressão arterial diastólica for superior a 90 mmHg. Tanto hemodiálise quanto diálise peritoneal ambulatorial contínua (CAPD) são utilizadas em mulheres grávidas requerendo tratamento dialítico. Uma possível vantagem da CAPD se basearia na manutenção de um ambiente intra-uterino constante (sem freqüente mudança de fluidos) e no melhor controle da pressão arterial, da acidemia e da anemia. Entretanto, o problema da prematuridade, da hipertensão e a incidência de sofrimento fetal não foram eliminados pelo uso da CAPD, além de aparentemente ter aumentado a incidência de outras complicações, tais como poliidrâmnio e diabetes gestacional, ambos atribuídos à excessiva e contínua oferta de glicose nos banhos de diálise. A opção ideal não está ainda claramente definida e deveria ser subordinada à experiência do centro de diálise envolvido. Em qualquer alternativa, esforços para manter o nível de uréia pré-diálise inferior a 100 mg/dl, níveis de hemoglobina acima de 7 mg/L e de pH e eletrólitos estáveis, além de evitar hipo- e hipertensão e restringir o uso de heparina, são indispensáveis.
TRANSPLANTE RENAL E GRAVIDEZ A fertilidade geralmente retorna após o transplante renal, e a possibilidade de gravidez excede 90% após seis meses. Há um discreto aumento na incidência de abortamento espontâneo, enquanto retardo de crescimento intrauterino e/ou prematuridade ocorrem em 50 a 70% dos casos. A gravidez não exerce influências específicas nas pacientes transplantadas e está limitada pelos mesmos fatores descritos acima em mulheres com qualquer forma de doença renal — creatinina sérica acima de 1,5 mg/dl e hipertensão que não possa ser facilmente controlada. As pacientes transplantadas geralmente são aconselhadas a esperar pelo menos um ano após receberem transplante de doador vivo e dois anos após transplante de doador cadáver. Nesta época, a dose de prednisona já está relativamente baixa e a dose de azatioprina estável, e nenhuma destas drogas parece ter efeitos adversos sobre o feto. Embora não recomendado, mulheres que engravidam nos primeiros seis a 12 meses pós-transplante também costumam evoluir relativamente bem. A segurança da ciclosporina ainda não está estabelecida na gravidez. A hipertensão pode ser induzida ou
543
agravada, por isso a dose deve ser limitada a 2-4 mg/kg/ dia. Entretanto, o metabolismo da ciclosporina parece estar aumentado durante a gravidez, e assim doses mais elevadas podem ser necessárias para manter níveis plasmáticos na faixa terapêutica. Na ausência de hipertensão grave, pode-se aumentar a dose de ciclosporina se a concentração plasmática se tornar consistentemente subterapêutica. Se uma receptora de transplante renal torna-se grávida, ela deve ser tratada como paciente de alto risco. O acompanhamento requer particular atenção para o controle da pressão arterial, da função renal, de possíveis infecções, bem como da monitorização fetal. Cerca de 40%
Pontos-chave: • A freqüência de exacerbações ou persistência dos sintomas na nefropatia lúpica varia conforme o estado de atividade da doença, atingindo 60% das mulheres com doença ativa ao engravidarem, mas apenas 20% daquelas em remissão por pelo menos seis meses antes da concepção • Infecção urinária sintomática se desenvolve em 20 a 40% das gestantes com bacteriúria assintomática no início da gestação, contra 2% nas mulheres grávidas sem bacteriúria • Hipoperfusão renal, devida a hemorragia uterina, é a principal causa de IRA na gravidez avançada • Insuficiência renal aguda associada a plaquetopenia no final da gestação requer um elaborado diagnóstico diferencial entre três principais condições: púrpura trombocitopênica trombótica (PTT), síndrome hemolítico-urêmica pós-parto (SHU) e síndrome HELLP • Descolamento prematuro de placenta, placenta prévia, morte fetal intra-uterina prolongada e embolia amniótica podem induzir necrose cortical renal bilateral ou, nos casos menos graves, necrose tubular aguda • Mulheres grávidas são mais predispostas a desenvolver IRA secundária à pielonefrite aguda, principalmente na vigência de septicemia ou hipotensão arterial • As alterações anatômicas e funcionais do trato urinário impostas pela gravidez normal predispõem à formação de cálculo renal
544
Nefropatia e Gestação
das gestações não vão além do primeiro trimestre, mas daquelas que ultrapassam este período, 90% terminam satisfatoriamente. Na maioria das pacientes, a hemodinâmica renal aumenta durante a gestação, embora comprometimento permanente da função renal ocorra em cerca de 15% das vezes. Aproximadamente 30% destas pacientes desenvolvem pré-eclâmpsia. A despeito da localização pélvica, o rim transplantado raramente causa distócia ou sofre qualquer trauma durante o parto vaginal. Assim, a operação cesariana deve ser realizada apenas por razões obstétricas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BAYLEY, R.R.; ROLLESTON, G.L. Kidney length and ureteric dilatation in the puerperium. J Obstet Gynecol Br Commw, 78:55-61, 1971. 2. BAYLIS, C.; RECKELHOFF, J.F. Renal hemodynamics in normal and hypertensive pregnancy: lessons from micropuncture. Am J Kidney Dis, 17:98-104, 1991. 3. PASCOAL, I.F.; LINDHEIMER, M.D.; NALBANTIAN-BRANDT, C.; UMANS, J.G. Contraction and endothelial relaxation in mesenteric microvessels from pregnant rats. Am J Physiol, 1996, in press. 4. BEETHAM, R.; DAWNAY, A.; MENABAWY, M.; SILVER, A. Urinary excretion of albumin and retinol binding protein during normal pregnancy. J Clin Pathol, 41:1089-1092, 1988. 5. REDMAN, C.W.G.; BEILIN, L.J.; BONNAR, J.; WILKINSON, R. Plasma urate measurements in predicting fetal death in hypertensive pregnancy. Lancet, 1:1370-1371, 1976. 6. KATZ, A.I.; DAVISON, J.M.; HAYSLETT, J.P.; SINSON, E.; LINDHEIMER, M.D. Pregnancy in women with kidney disease. Kidney Int, 18:192-206, 1980. 7. HOU, S. Frequency and outcome of pregnancy in women on dialysis. Am J Kidney Dis, 2:60-63, 1984. 8. BAYLIS, C. The mechanism of the increase in glomerular filtration rate in the twelve-day pregnant rat. J Physiol (London), 305:405-414, 1980. 9. GABER, L.W.; SPARGO, B.H. Pregnancy-induced nephropathy: the significance of focal segmental glomerulosclerosis. Am J Kidney Dis, 9:317-323, 1987. 10. LOCKSIN, M.D.; REINITZ, E.; DRUZIN, M.I. Lupus pregnancy: case-control perspective study demonstrating absence of lupus exacerbation during or after pregnancy. Am J Med, 77:893-898, 1984. 11. KINCAID-SMITH, P.; FAIRLEY, K.F.; KLOSS, M. Lupus anticoagulant associated with renal thrombotic microangiopathy and pregnancy associated with renal pregnancy. Q J Med, 258:795-815, 1988. 12. HAYSLETT, J.P. The effect of systemic lupus eritematosus on pregnancy and on pregnancy outcome. Am J Reprod Immunol, 28:199-204, 1992. 13. HENDRICKS, S.K.; ROSS, S.O.; KRIEGER, J.N. An algorithm for diagnosis and therapy of management and complications of urolithiasis during pregnancy. Surg Gynecol Obstet, 172:49-54, 1991. 14. DRAGO, J.R.; ROHNER, T.J. Jr, CHEZ, R.A. Management of urinary calculi in pregnancy. Urology, 20:578-581, 1982. 15. MILLER, R.D.; KAKKIS, J. Prognosis, management and outcome of obstructive renal disease in pregnancy. J Rep Med, 28:199-201, 1982. 16. RODRIGUEZ, P.N.; KLEIN, A.S. Management of urolithiasis during pregnancy. Sur Gynecol Obstet, 166:103-106, 1988. 17. KRIEGER, J.N. Complications of treatment of urinary tract infections during pregnancy. Urol Clin North Am, 13:685-693, 1986. 18. WALTZER, W.C. The urinary tract in pregnancy. J Urol, 125:271-276, 1981.
19.
20.
21.
22.
23.
24.
25. 26. 27. 28. 29. 30.
31. 32. 33.
34.
35. 36.
37.
MAIKRANZ, P.; PARKS, J.H.; HOLLEY, J.H.; COE, F.L. Gestational hypercalciuria causes pathological urine calcium oxalate supersaturations. Kidney Int, 36:108-113, 1989. LINDHEIMER, M.D.; KATZ, A.I. The kidney and hypertension in pregnancy. In Brenner, B. & Rector, F. (eds) The Kidney, 4th edition, pp 1551-1595. Philadelphia: WB Saunders. MAIKRANZ, P.; PARKS, J.H.; COE, F.L. Urinary calcium oxalate and calcium carbonate supersaturations increase in pregnancy. Kidney Int, 31:209, 1987. DAVISON, J.M.; NAKAGAWA, COE, F.L. Increases in both urinary inhibitor activity and excretion of an inhibitor of cristalluria in pregnancy: a defense against the hypercalciuria of normal gestation. Hypertens Preg, 12:23-35, 1993. KRISTENSEN, C.; ABRAHAM, P.A.; DAVIS, M. Hypercalciuria and risk factors for calcium nephrolithiasis during pregnancy. Kidney Int, 327:144, 1985. WABNER, C.; SIRIVONGS, D.; MAIKRANSZ, P. Evidence for increased excretion in pregnancy of nephrocalcin, a urinary inhibitor of crystal growth. Kidney Int, 31:359, 1987. FOLGER, G.K. Pain and pregnancy. Obstet Gynecol, 5:513-518, 1955. LATTANZI, D.R.; COOK, W.A. Urinary calculi in pregnancy. Obstet Gynecol, 56:462-466, 1980. JONES, W.A.; CORREA, R.J. Jr, ANSELL, J.S. Urolithiasis associated with pregnancy. J Urol, 122:333-335, 1978. COE, F.L.; PARKS, J.H.; LINDHEIMER, M.D. Nephrolithiasis during pregnancy. New Engl J Med, 298:324-326, 1978. CRAWFORD, J.S.; RUDOFSKY, S. The placenta transmission of pethidine. Br J Anesthes, 37:929-932, 1965. FISHER, D.E.; PATON, J.B. The effect of maternal anesthetic and analgesic drugs on the fetus and newborn. Clin Obstet Gynecol, 11:568-578, 1974. BRIGGS, G.G.; FREEMAN, K.; YAFFE, S.J. Drugs in Pregnancy and Lactation, 3rd edition, pp 154c-155. GRAY, M.J. Use and abuse of thiazides in pregnancy. Clin Obstet Gynecol, 7:511-518, 1968. SALOMON, L.; ABRAMS, G.; DINNER, M. Neonatal abnormalities associated with D-penicillamine treatment during pregnancy. New Eng J Med, 296:54-55, 1977. YALCIN, O.; TAHMAZ, L.; YUMBUL, Z.; BILGIC, I.; SAGLAM, R. Effects of shock waves on the rat foetus. Scand J Urol Nephrol, 32:16770, 1998. FRANKENSCHMIDT, A.; HEISLER, M. Fetotoxicity and teratogenesis of SWL treatment in the rabbit. J Endourol, 12:15-21,1998. FRANKENSCHMIDT, A.; SOMMERKAMP, H. Shock wave lithotripsy during pregnancy: a successful clinical experiment. J Urol, 159:501-2, 1998. ASGARI, M.A.; SAFARINEJAD, M.R.; HOSSEINI, S.Y.; DADKHAH, F. Extracorporeal shock wave lithotripsy of renal calculi during early pregnancy. BJU Int, 84:615-7, 1999.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.emedicine.com/med/topic3253.htm – Nefropatia e gravidez. http://renux.dmed.ed.ac.uk/EdREN/EdRenINFObits/ PregnancyLong.html – Gravidez e contracepção em nefropatia. http://merck.praxis.md/bpm/bpm.asp?page=CPM01NP276 – Gravidez e o rim. http://www.brooklynbirthingcenter.com/viewArticle?ID=9486 – Nefropatia e transplante renal durante a gravidez. http://212.199.79.240/imaj/feb00-28.htm – The Israel Medical Association Journal – Artigo: Resultado da gravidez em mulheres com nefropatia primária.
capítulo 28
http://www.niddk.nih.gov/fund/reports/womenrd/ meet.htm – Recomendações de uma reunião científica: Mulheres e Nefropatia. Setembro 1999. http://merck.praxis.md/index.asp?page=bpmindex&specialty=BPM01NP – Nephrology, por Saulo Klahr.
545
http://www.hopkins-arthritis.som.jhmi.edu/other/ lupus_pregnancy.html – Lúpus e gravidez. http://www.multi-med.com/pdtoday/pdt7/krane.html – Gravidez em pacientes em diálise.
Capítulo
29
Hipertensão na Mulher Istênio Fernandes Pascoal, Sandra Baleeiro Abrahão, Taís Tinnucci e Décio Mion Jr.
INTRODUÇÃO
Tratamento anti-hipertensivo
HIPERTENSÃO NA GESTAÇÃO Definição
Prevenção HIPERTENSÃO CRÔNICA
Classificação
Tratamento não-farmacológico
Pré-eclâmpsia/eclâmpsia
Tratamento anti-hipertensivo
Hipertensão crônica
HIPERTENSÃO E CONTRACEPTIVOS ORAIS
Hipertensão crônica com pré-eclâmpsia superajuntada
HIPERTENSÃO E TERAPIA DE REPOSIÇÃO HORMONAL
Hipertensão gestacional Pré-eclâmpsia
Fundamentos biológicos do papel do estrogênio na doença cardiovascular
Curso clínico
Menopausa, terapia de reposição hormonal e doença
Etiologia e fisiopatologia Propedêutica
cardiovascular DISFUNÇÃO SEXUAL E HIPERTENSÃO NA MULHER
TRATAMENTO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Pré-eclâmpsia
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO A hipertensão arterial é um importante fator de risco para doença cardiovascular, contribuindo expressivamente tanto para a morbidade quanto para a mortalidade gerais. Considerando-se a população geral, os homens têm níveis de pressão arterial diastólica mais elevados do que as mulheres, como têm também maior prevalência de hipertensão arterial, mas as incidências de hipertrofia ventricular esquerda, acidente vascular cerebral e disfunção renal são compartilhadas igualmente pelos dois sexos. Esta equivalência ocorre não obstante serem as mulheres relativamente protegidas de doenças cardiovasculares em geral, e de hipertensão arterial em particular, durante a fase reprodutiva. Após a menopausa, entretanto, a hipertensão arterial se torna progressivamente mais freqüente e mais intensa em mulheres do que em homens.
As razões para as diferenças relativas nos valores pressóricos e na incidência de hipertensão arterial entre os dois sexos ainda são especulativas. Tem sido sugerido, embora não provado, que os estrógenos naturais são responsáveis pelos níveis pressóricos mais baixos observados em mulheres jovens, assim como sua diminuição contribuiria para a maior incidência de hipertensão após a menopausa. Em contrapartida, estrógenos exógenos na forma de anticoncepcional oral são uma importante causa de hipertensão secundária na mulher, mesmo com o uso mais corrente de compostos com menor dosagem. A gravidez constitui uma fase da vida da mulher particularmente predisponente a complicações hipertensivas, as quais representam uma das principais causas de morbidade e de mortalidade tanto materna quanto fetal. Neste capítulo examinaremos as doenças hipertensivas da gravidez e as relações da hipertensão arterial sistêmica com o uso de anticoncepcionais orais e com a terapia de
capítulo 29
reposição hormonal, bem como as implicações da hipertensão e/ou de seu tratamento sobre a função sexual feminina.
HIPERTENSÃO NA GESTAÇÃO A gravidez pode ser complicada por quatro formas distintas de hipertensão:1 1) pré-eclâmpsia/eclâmpsia (doença hipertensiva específica da gravidez); 2) hipertensão crônica, de qualquer etiologia; 3) pré-eclâmpsia sobreposta a hipertensão crônica ou nefropatia; e 4) hipertensão gestacional (transitória). Avanços no conhecimento da fisiopatologia da hipertensão arterial têm proporcionado, também, uma melhor compreensão dos mecanismos que desencadeiam e agravam a hipertensão na gravidez, particularmente pré-eclâmpsia, embora ainda se desconheça sua etiologia. Esta melhor interpretação fisiopatogênica tem permitido bases terapêuticas mais eficazes. O diagnóstico precoce e o correto manuseio clínico destas pacientes evitará, em grande medida, o aparecimento de formas clínicas mais graves.
Definição O diagnóstico de hipertensão na gravidez é feito quando os níveis pressóricos são iguais ou superiores a 140/90 mmHg.
Classificação
547
HIPERTENSÃO CRÔNICA Hipertensão crônica se refere à presença de hipertensão antes da gravidez ou da 20.ª semana de gestação. Hipertensão diagnosticada em qualquer fase da gravidez, mas que persiste além de seis semanas após o parto, é também considerada hipertensão crônica.
HIPERTENSÃO CRÔNICA COM PRÉ-ECLÂMPSIA SUPERAJUNTADA A pré-eclâmpsia pode ocorrer em mulheres com hipertensão preexistente, e em tais casos o prognóstico para a mãe e o feto é pior do que qualquer uma das condições isoladamente. O diagnóstico é feito quando há aumento da pressão arterial (30 mmHg sistólica ou 15 mmHg diastólica) acompanhado de proteinúria ou edema, após a 20.ª semana de gestação.
HIPERTENSÃO GESTACIONAL O termo hipertensão gestacional define a circunstância em que ocorre elevação da pressão arterial sem proteinúria na segunda metade da gravidez. É um diagnóstico nãoespecífico e provisório que inclui pacientes com préeclâmpsia que ainda não tenham desenvolvido proteinúria, bem como pacientes sem pré-eclâmpsia, mas o diagnóstico diferencial só poderá ser feito no período pós-parto. Se a pré-eclâmpsia não se desenvolver e a pressão arterial voltar ao normal até 12 semanas após o parto, o diagnóstico de hipertensão transitória da gestação pode ser feito. Se a hipertensão persiste, caracteriza-se o diagnóstico de hipertensão crônica.
PRÉ-ECLÂMPSIA/ECLÂMPSIA
Pontos-chave:
Pré-eclâmpsia é uma doença hipertensiva peculiar à gravidez humana, que ocorre principalmente em primigestas após a 20.ª semana de gestação, mais freqüentemente próximo ao termo. Caracteriza-se pelo desenvolvimento gradual de hipertensão, proteinúria, edema generalizado e, às vezes, alterações da coagulação e da função hepática. A sobreveniência de convulsão define uma forma grave chamada eclâmpsia. Em mulheres nulíparas, a incidência de pré-eclâmpsia é de aproximadamente 6% nos países desenvolvidos e 2 ou 3 vezes maior em países subdesenvolvidos. O nível de proteinúria é considerado anormal quando superior a 300 mg/24 horas ou pelo menos 2+ em análise qualitativa. Na maioria das vezes a proteinúria é uma manifestação tardia da pré-eclâmpsia; portanto, uma abordagem clínica apropriada deve tratar como pré-eclâmpticas mulheres grávidas com hipertensão de novo, mesmo antes de a proteinúria desenvolver-se. Edema ocorre normalmente no curso da gravidez e sua presença isolada não é um critério diagnóstico útil de pré-eclâmpsia, embora a vasta maioria das mulheres com pré-eclâmpsia apresente edema, particularmente nas mãos e na face.
• A gravidez pode ser complicada por quatro formas distintas de hipertensão: 1) préeclâmpsia/eclâmpsia (doença hipertensiva específica da gravidez); 2) hipertensão crônica, de qualquer etiologia; 3) pré-eclâmpsia sobreposta a hipertensão crônica ou nefropatia; e 4) hipertensão gestacional (transitória) • O diagnóstico de hipertensão na gravidez é feito quando os níveis pressóricos são iguais ou superiores a 140/90 mmHg • Pré-eclâmpsia é uma doença hipertensiva peculiar à gravidez humana, que ocorre principalmente em primigestas após a 20.ª semana de gestação, mais freqüentemente próximo ao termo • Hipertensão crônica se refere à presença de hipertensão antes da gravidez ou da 20.ª semana de gestação
548
Hipertensão na Mulher
Pré-eclâmpsia CURSO CLÍNICO Pré-eclâmpsia, especialmente quando sobreposta a hipertensão crônica, é a forma de hipertensão na gravidez que mais ameaça a mãe e o feto. A evolução da pré-eclâmpsia é imprevisível, mesmo quando a pressão arterial está apenas discretamente elevada. Por isso, uma falha em reconhecê-la pode ter sérias conseqüências. A pré-eclâmpsia pode progredir para eclâmpsia (convulsão) ou para uma forma intermediária, chamada iminência de eclâmpsia, que é caracterizada por cefaléia intensa, distúrbio visual, hiper-reflexia, dor epigástrica e hemoconcentração. Algumas vezes, entretanto, as convulsões eclâmpticas ocorrem subitamente, sem aviso, em uma paciente aparentemente assintomática ou com discreta elevação da pressão arterial. Por isso, a pré-eclâmpsia — independentemente da gravidade aparente — representa sempre um risco potencial para a mãe e o feto. Uma variante da pré-eclâmpsia, denominada síndrome HELLP,2 constitui uma emergência que, na maioria das vezes, requer a interrupção da gravidez. Entretanto, em pacientes apresentando apenas discreta elevação da pressão arterial, pequena diminuição do número de plaquetas, modesta elevação das enzimas hepáticas e nenhuma alteração da função renal, uma conduta conservadora pode ser considerada, sabendo-se, entretanto, que esta forma de préeclâmpsia pode evoluir rapidamente para uma condição ameaçadora, com intensa hemólise, alterações da coagulação e elevação descomunal (⬎2000 UI) dos níveis de transaminases. A hipertensão pré-eclâmptica freqüentemente desaparece dentro de duas a seis semanas após o parto.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA A pré-eclâmpsia é uma doença de etiologia desconhecida, que envolve virtualmente cada órgão e sistema do organismo. Há grande aumento na resistência vascular periférica e hiper-reatividade a vasoconstritores, negando a vasodilatação e a refratariedade vascular próprias da gravidez normal.3 Alguns eventos fisiopatológicos, incluindo placentação anormal e hipersensibilidade vascular, podem ocorrer semanas ou meses antes do reconhecimento clínico da doença. O caráter sistêmico da pré-eclâmpsia pode ser causado por extensa disfunção endotelial, vasoespasmo e ativação variável dos mecanismos de coagulação. Efetivamente, existem evidências bioquímicas e morfológicas de que a pré-eclâmpsia é precedida e/ou acompanhada por lesão endotelial. O endotélio vascular elabora uma miríade de moléculas vasoativas, que contribuem criticamente para a regulação do tônus, permeabilidade e coagulação vasculares, e cujas ações ou concentrações tendem a se alterar em direções opostas durante a gravidez normal ou préeclâmpsia. Assim, a produção relativa de vasoconstritores mediados pelo endotélio, como endotelina e tromboxane
A2, parece aumentar durante a pré-eclâmpsia, enquanto a de vasodilatadores, como endothelium-derived relaxing factor (EDRF) e prostaciclina, parece diminuir, ambas comparadas com a gravidez normal, sugerindo que uma função endotelial alterada pode ser de significante importância fisiopatológica na pré-eclâmpsia.4 A lesão renal da pré-eclâmpsia pode ser responsável pela aumentada excreção protéica bem como pela diminuição na filtração glomerular e no clearance de ácido úrico, o último causando hiperuricemia. Desde que o ritmo de filtração glomerular e o clearance de ácido úrico aumentam normalmente durante a gravidez, níveis séricos de creatinina e ácido úrico superiores a 0,9 e 5 mg/dl, respectivamente, são considerados anormais em mulheres grávidas e requerem avaliação complementar.5 A excreção renal de sódio diminui na pré-eclâmpsia, causando retenção hidrossalina, embora formas graves da doença possam ocorrer na ausência de edema. A maior parte do fluido retido se localiza no espaço intersticial; assim, mesmo na presença de edema, pacientes préeclâmpticas apresentam diminuição do volume intravascular e hemoconcentração. Os níveis de albumina circulantes podem ser baixos, não devido à perda renal ou disfunção hepática, mas em decorrência do extravasamento de proteína para o interstício (capillary leak). Enquanto a maioria dos casos de edema agudo de pulmão observado em grávidas hipertensas se deve à sobrecarga de volume, algumas pré-eclâmpticas apresentam quadro semelhante à síndrome da angústia respiratória aguda, com pressão capilar pulmonar normal ou baixa, intensa diminuição da pressão oncótica plasmática e eventual comprometimento da extração de oxigênio.6 Diminuição do número de plaquetas e dos níveis de antitrombina III pode preceder a expressão clínica da pré-eclâmpsia. Há sugestões de que elevações súbitas nos níveis de ferro sérico ou carboxiemo-
Pontos-chave: • A pré-eclâmpsia pode progredir para eclâmpsia (convulsão) ou para uma forma intermediária, chamada iminência de eclâmpsia, que é caracterizada por cefaléia intensa, distúrbio visual, hiper-reflexia, dor epigástrica e hemoconcentração • Uma variante da pré-eclâmpsia, denominada síndrome HELLP, constitui uma emergência • Esta forma de pré-eclâmpsia pode evoluir rapidamente para uma condição ameaçadora, com intensa hemólise, alterações da coagulação e elevação descomunal (⬎2000 UI) dos níveis de transaminases
capítulo 29
globina circulantes podem ajudar na diferenciação entre pré-eclâmpsia e outras formas de hipertensão na gravidez.7 Pode-se concluir que a pré-eclâmpsia é, na realidade, uma doença generalizada, sendo a hipertensão apenas uma de suas manifestações. Observam-se lesões em vários órgãos, incluindo cérebro, fígado e coração. Há também diminuição na perfusão placentária, o que responde, em parte, pela aumentada incidência de retardo de crescimento intra-uterino e de perda fetal. A restrição ao fluxo placentário provavelmente se deve ao estreitamento dos vasos deciduais por uma lesão específica chamada aterose.8
PROPEDÊUTICA Avaliação Pré-concepcional Mulheres hipertensas que desejam engravidar devem ser cuidadosamente avaliadas antes da concepção. A possibilidade de hipertensão secundária deve ser investigada, porque pacientes com doença renal, feocromocitoma ou hipertensão renovascular têm maiores riscos de complicações durante a gravidez. Drogas anti-hipertensivas cujo uso não seja recomendado durante a gravidez, especialmente os inibidores da enzima conversora da angiotensina e os bloqueadores dos receptores da angiotensina II, devem ser suspensas. A evolução é favorável na maioria dos casos de hipertensão essencial leve a moderada, mas há riscos de pré-eclâmpsia superajuntada, e outras complicações, se doença renal, diabetes ou colagenose estiverem associadas. Em pacientes com doença renal acompanhada de hipertensão arterial, além da maior morbidade e mortalidade perinatal, a função renal materna pode deteriorar-se rápida e irreversivelmente.
Avaliação Durante a Gestação HIPERTENSÃO PRECOCE (ANTES DA 20.ª SEMANA DE GESTAÇÃO). A maioria das mulheres com hipertensão presente antes da 20.ª semana de gestação tem hipertensão crônica, primária na maioria das vezes. Algumas já terão sido avaliadas para hipertensão secundária antes da gravidez. Outras sequer sabiam ser hipertensas. A possibilidade de hipertensão secundária deve ser considerada, principalmente se a hipertensão é moderada ou grave. Desde que o feocromocitoma está associado com alta mortalidade materna quando não diagnosticado, sua presença deve ser avaliada, mesmo se a suspeição clínica for mínima. Doença renal, colagenose, aldosteronismo primário e feocromocitoma podem ser detectados em exames de sangue e urina. Hipertensão renovascular e síndrome de Cushing dificilmente são diagnosticadas durante a gravidez e, na maioria das vezes, são investigadas apenas após o parto. A avaliação basal da função renal e do número de plaquetas deve ser realizada precocemente no curso da gravidez, para que possa ser comparada com valores obtidos em fases posteriores da gestação e ajudar a determinar se
549
elevações da pressão arterial no terceiro trimestre representam o aumento fisiológico esperado ou o início de préeclâmpsia. Todas as pacientes hipertensas grávidas devem ser seguidas de perto. Na maioria delas, a pressão arterial diminuirá no segundo trimestre, devido à vasodilatação fisiológica da gravidez, e conseqüente redução na dose ou suspensão da medicação anti-hipertensiva pode ser necessária. A incidência de pré-eclâmpsia superajuntada se eleva exponencialmente, podendo acometer até 50% destas pacientes. Embora seja difícil prever quem desenvolverá préeclâmpsia, a ausência de redução da pressão arterial no segundo trimestre é um mau sinal prognóstico. HIPERTENSÃO TARDIA (APÓS A 20.ª SEMANA DE GESTAÇÃO). Quando a hipertensão surge após a 20.ª semana da gravidez, o diagnóstico pode ser pré-eclâmpsia, hipertensão transitória ou hipertensão crônica com ou sem pré-eclâmpsia superajuntada. Em mulheres com hipertensão crônica leve, a hipertensão pode não ser observada até o terceiro trimestre, quando a pressão arterial recupera os níveis pré-gestacionais. A hipertensão transitória e a hipertensão crônica não-complicada são situações relativamente benignas, em contraste com pré-eclâmpsia (pura ou superajuntada), que é potencialmente grave. A síndrome HELLP designa uma constelação de anormalidades laboratoriais indicativas de gravidade e, quando presente, a interrupção da gestação é desejável. É importante saber, entretanto, que estas alterações podem estar presentes a despeito de modestas cifras hipertensivas. Uma vez estabelecido o diagnóstico de pré-eclâmpsia, a paciente deve ser hospitalizada para monitorização das condições maternas e fetais. Se o diagnóstico for incerto, também é mais seguro internar a paciente, permitindo que as alterações clínicas e laboratoriais possam ser apreciadas antes de as condições clínicas deteriorarem.
Avaliação Após o Parto Embora a interrupção da gravidez seja considerada a única forma de “cura efetiva” da pré-eclâmpsia, a pressão arterial pode não se normalizar por dias ou semanas após o parto. Em geral, quanto mais intensa e duradoura a hipertensão antes do parto, mais tardiamente se dará a normalização. Em alguns casos, a pressão arterial pode ser mesmo mais alta na primeira semana do puerpério do que no período anterior ao parto. As alterações laboratoriais também podem demorar vários dias para reverter. Em alguns casos de síndrome HELLP, o número de plaquetas continua a diminuir nos primeiros dois dias após o parto, para, então, normalizar-se progressivamente. Embora raramente, a pré-eclâmpsia pode desenvolver-se no puerpério imediato ou ser diagnosticada durante o parto. Se a hipertensão persistir além de seis semanas após o parto, um diagnóstico de hipertensão crônica deve ser considerado.
550
Hipertensão na Mulher
Pontos-chave: • A maioria das mulheres com hipertensão presente antes da 20.ª semana de gestação tem hipertensão crônica, primária na maioria das vezes • A avaliação basal da função renal e do número de plaquetas deve ser realizada precocemente no curso da gravidez • A síndrome HELLP designa uma constelação de anormalidades laboratoriais indicativas de gravidade
dar o parto. Deve-se ter em mente, entretanto, que a préeclâmpsia não remite espontaneamente e, na maioria dos casos, a doença progride com o tempo. Assim, monitorização com vigilância materna e fetal diária é imperativa. Independentemente da idade gestacional, a interrupção da gestação deve ser considerada na presença de sofrimento fetal (incluindo crescimento intra-uterino retardado), ou sinais de risco materno, como hipertensão grave não controlada, hemólise, elevação de enzimas hepáticas e plaquetopenia (síndrome HELLP), evidência de deterioração da função renal, distúrbios visuais, dor epigástrica e hiperreflexia.
TRATAMENTO ANTI-HIPERTENSIVO
TRATAMENTO Pré-eclâmpsia O tratamento definitivo da pré-eclâmpsia consiste em interrupção da gravidez e prevenção das complicações maternas. Se não tratada, a pré-eclâmpsia se associa a maior risco de morte fetal e neonatal. Em pacientes que progridem para pré-eclâmpsia grave ou eclâmpsia (convulsões), morte materna pode ocorrer, devido, principalmente, a hemorragia intracerebral. Hipertensão grave persistente (diastólica acima de 110 mmHg), cefaléia, distúrbios visuais, deterioração da função renal e síndrome HELLP são outros sinais de doença grave que requerem a imediata interrupção da gravidez. O manuseio conservador em tais casos pode resultar em sérias complicações maternas. Em casos menos graves, entretanto, o retardamento do parto pode ser adotado para se obter maior maturidade fetal. Tal conduta deve ser considerada se a pré-eclâmpsia se desenvolve precocemente (antes da 32.ª semana) e a hipertensão é discreta/moderada, as funções renal e hepática são estáveis e não há distúrbios da coagulação ou sofrimento fetal. A abordagem terapêutica consiste em hospitalização com repouso no leito, controle da pressão arterial, profilaxia da convulsão (quando sinais de eclâmpsia iminente estão presentes) e o apropriado término da gestação. A intervenção terapêutica é paliativa e não altera a fisiopatologia da pré-eclâmpsia; quando muito, pode retardar sua progressão. Se já houver maturidade pulmonar fetal, a gravidez deve ser interrompida, uma vez que a préeclâmpsia é completamente reversível e começa a desaparecer com o parto. As dificuldades aumentam quando a pré-eclâmpsia se desenvolve antes da maturidade fetal, situação em que é difícil decidir a época adequada do parto. Se o feto for muito prematuro (<30 semanas), a pressão arterial for apenas moderadamente elevada e não houver outros sinais de gravidade materna, pode-se tentar retar-
O uso de medicação anti-hipertensiva na pré-eclâmpsia é controverso, devido à constatação de que o fluxo sangüíneo útero-placentário está diminuído na préeclâmpsia e o impacto da diminuição da pressão arterial sobre a perfusão placentária não é bem conhecido. Desde que a redução da pressão arterial não interfira na fisiopatologia da pré-eclâmpsia, o tratamento anti-hipertensivo deveria ser prescrito visando apenas à proteção materna. Há considerável desacordo sobre que níveis de pressão arterial deveriam ser tratados, mas em geral se inicia a terapêutica anti-hipertensiva quando a pressão arterial diastólica é igual ou superior a 105 mmHg (fase V de Korotkoff).1 Redução excessiva da pressão arterial deve ser evitada, para não comprometer o fluxo sangüíneo útero-placentário e, assim, predispor a complicações tais como o descolamento prematuro da placenta. Quando o parto é iminente, a droga de primeira escolha ainda é a hidralazina endovenosa, administrada na dose de 5 mg. Doses subseqüentes são ditadas pela resposta inicial e usadas a intervalos de 20 minutos. Se um total de 20 mg for administrado sem resposta terapêutica satisfatória, outros agentes devem ser considerados. A administração oral de bloqueadores de canais de cálcio tem sido utilizada na pré-eclâmpsia, e embora haja atrativos nesta opção, tais como a eficácia anti-hipertensiva, a facilidade da administração e o rápido início de ação, a experiência na gravidez ainda não é suficientemente ampla. Uma outra preocupação a respeito destes agentes é relacionada ao uso concomitante de sulfato de magnésio, que freqüentemente é utilizado para prevenir convulsões. Os inibidores da enzima conversora da angiotensina e os bloqueadores dos receptores da angiotensina II podem agravar a isquemia uterina e causar insuficiência renal no feto e são contra-indicados durante a gestação. Quando a decisão for contemporizar, um agente oral é preferível. Deve-se ter em mente que a terapêutica antihipertensiva visa, principalmente, ao benefício materno. A vantagem potencial para o feto é que o controle da pressão arterial pode permitir a continuidade da gravidez até
551
capítulo 29
um ponto onde haja maior maturidade fetal. A metildopa é considerada por muitos como a melhor opção, face à ampla experiência com esta droga.9 Se ela não for bem tolerada, beta-bloqueadores, alfa-beta-bloqueadores, bloqueadores de canais de cálcio e hidralazina são boas opções aditivas ou alternativas.
PREVENÇÃO A descoberta da prevenção da pré-eclâmpsia revolucionaria o acompanhamento pré-natal e salvaria muitas vidas maternas e fetais, principalmente em países subdesenvolvidos, onde as conseqüências da pré-eclâmpsia são devastadoras. No passado, a restrição dietética de sal e a administração profilática de diuréticos foram utilizadas com esta finalidade. Entretanto, não há evidências consistentes de que a limitação do sódio dietético modifique a incidência ou a intensidade da pré-eclâmpsia, e as orientações nutricionais atuais recomendam conteúdo normal de sal durante a gestação. Uma metaanálise de estudos randomizados de mais de 7.000 mulheres encontrou semelhante incidência de pré-eclâmpsia entre pacientes que receberam diurético profilático ou placebo. Duas outras tentativas de prevenir a pré-eclâmpsia são a dose baixa de aspirina (60 a 100 mg/dia, começando na 12.ª semana de gestação) e a suplementação dietética de cálcio (aproximadamente 2 g/dia) durante a gravidez. Revisões sistemáticas têm sugerido que a aspirina tem um pequeno efeito na prevenção de pré-eclâmpsia e que a suplementação oral de cálcio em pacientes de alto risco e com baixa ingesta dietética de cálcio também reduz a incidência de préeclâmpsia.
Pontos-chave: • O tratamento definitivo da pré-eclâmpsia consiste em interrupção da gravidez e prevenção das complicações maternas • A abordagem terapêutica consiste em hospitalização com repouso no leito, controle da pressão arterial, profilaxia da convulsão (quando sinais de eclâmpsia iminente estão presentes) e o apropriado término da gestação • Em geral se inicia a terapêutica antihipertensiva quando a pressão arterial diastólica é igual ou superior a 105 mmHg • Os inibidores da enzima conversora da angiotensina e os bloqueadores dos receptores da angiotensina II podem agravar a isquemia uterina e causar insuficiência renal no feto e são contraindicados durante a gestação
HIPERTENSÃO CRÔNICA A grande maioria das pacientes com hipertensão crônica na gravidez apresenta discreta ou moderada elevação da pressão arterial e, portanto, os riscos de complicações vasculares durante a gravidez são pequenos. Devido à vasodilatação fisiológica da gravidez, em muitas mulheres grávidas a medicação anti-hipertensiva pode ser reduzida, e em alguns casos retirada, desde que estas pacientes sejam cuidadosamente acompanhadas. Pacientes com hipertensão crônica têm maior chance de desenvolver pré-eclâmpsia superajuntada e há indícios de que o aumento da morbidade e da mortalidade perinatal associada com hipertensão crônica seja devido a esta complicação.10 Até o momento não existem evidências de que a terapêutica anti-hipertensiva reduza a incidência de préeclâmpsia superajuntada; portanto, nenhuma medicação deveria ser prescrita com esta finalidade. Com respeito ao bem-estar fetal, permanece controverso se há algum benefício do tratamento anti-hipertensivo. Redução excessiva da pressão arterial deve ser evitada. Se a pressão diastólica no primeiro trimestre estiver entre 90 e 100 mmHg, é razoável aguardar a queda fisiológica da pressão arterial no segundo trimestre, antes da utilização de anti-hipertensivos. Se a pressão diastólica for inferior a 90 mmHg em uma paciente já em uso de drogas no início da gravidez, a medicação pode ser diminuída, ou eventualmente suspensa. O tratamento anti-hipertensivo deve ser instituído ou reiniciado quando a pressão arterial diastólica estiver repetidamente maior do que 100 mmHg.
Tratamento Não-farmacológico Durante a gravidez, a abordagem não-farmacológica da hipertensão arterial consiste em restrição genérica das atividades. Estratégias como perda de peso e exercícios não são recomendadas durante a gravidez, mas se uma mulher é obesa e está planejando uma gravidez, redução de peso antes da gravidez é desejável. Restrição de sódio é recomendada apenas para aquelas mulheres que se têm beneficiado desta medida antes da gravidez. Desde que a supervisão médica seja estrita, a monitorização da pressão arterial em domicílio pode ajudar no seu efetivo controle.
Tratamento Anti-hipertensivo Se a decisão for diminuir a pressão arterial com medicação anti-hipertensiva, deve-se combinar a eficácia antihipertensiva com o mínimo de efeitos sobre o feto. Novamente, a droga mais amplamente utilizada na gravidez é a metildopa. Se a resposta à metildopa não for satisfatória, ou se a droga for mal tolerada, há várias alternativas aceitáveis. Beta-bloqueador e alfa-beta-bloqueador são rela-
552
Hipertensão na Mulher
tivamente seguros e eficazes durante a gravidez, mas estão associados com retardo de crescimento intra-uterino quando usados no início da gravidez. Como os bloqueadores de canais de cálcio ainda não foram estudados suficientemente na gravidez para serem recomendados como agentes de primeira linha, eles têm sido utilizados como drogas de segunda linha, em adição à metildopa ou betabloqueadores. Embora os diuréticos não sejam recomendados em mulheres com pré-eclâmpsia, se uma mulher grávida com hipertensão crônica vem sendo tratada satisfatoriamente com estes agentes antes da gravidez, não é necessário suspendê-los, mas, se possível, a dose deve ser reduzida. Os inibidores da ECA e os bloqueadores do receptores da angiotensina II devem ser evitados durante a gravidez. Embora não tenham sido observados efeitos teratogênicos em seres humanos, o uso destes agentes, no segundo e terceiro trimestres, tem sido associado à insuficiência renal aguda nos neonatos. Poucas informações são disponíveis a respeito dos efeitos da ingestão materna de drogas anti-hipertensivas sobre o aleitamento. Deve ser assumido que a maioria dos agentes será detectada no leite materno, embora não sejam conhecidos seus efeitos sobre o recém-nascido. Se a pressão arterial estiver apenas discretamente elevada, pode ser possível retirar a medicação por alguns meses. Se a hipertensão for mais grave, a medicação deve ser mantida, mas se múltiplos agentes forem necessários, o aleitamento materno não é recomendado.
HIPERTENSÃO E CONTRACEPTIVOS ORAIS Estima-se que 100 milhões de mulheres em todo o mundo utilizem contraceptivos orais.11 Apesar das inegáveis vantagens do emprego e de ser o método anticoncepcional reversível mais eficaz, alguns efeitos adversos têm sido relatados, como o risco aumentado de tromboembolismo venoso relacionado ao componente estrogênico e de sangramentos associados ao componente progestogênico dos contraceptivos orais,12 e, conseqüentemente, de acidente vascular cerebral e de infarto agudo do miocárdio,13 além do risco de desenvolver hipertensão arterial,14 embora com as formulações de baixas dosagens esses riscos tenham sido atenuados. Hipertensão arterial tem sido diagnosticada entre 1 e 6% das mulheres jovens. Se um contraceptivo oral é efetivo e bem tolerado, mas a pressão arterial da mulher torna-se elevada, continuar a utilizá-lo e iniciar o tratamento com anti-hipertensivos pode não estar contra-indicado, especialmente se não houver gravidez planejada ou outros métodos mais adequados não estiverem disponíveis ou forem considerados inaceitáveis, ou ainda se os riscos da gravidez foram maiores que os da hipertensão.15 Porém, se o uso
for suspenso, a pressão arterial retorna ao normal na maioria parte das vezes. Ainda que a grande maioria das usuárias dos contraceptivos orais contendo estrogênio mantenha-se normotensa, algumas podem apresentar elevação da pressão arterial, e seu uso parece estar associado à maior incidência de hipertensão arterial, ocorrendo em 5% daquelas que o tomam por cinco anos.16 Walsh et al. mostraram que o risco relativo de desenvolver hipertensão foi 50% maior entre as usuárias do que entre as não-usuárias, correspondendo a 41 casos por 10 mil mulheres/ano.17 Mulheres que tiveram pré-eclâmpsia parecem mais propensas a desenvolver hipertensão, assim como aquelas com hipertensão primária.18 As indicações e contra-indicações médicas para a prescrição de contraceptivos orais podem ser resumidas em quatro conceitos:19 1. Os contraceptivos orais são seguros e as formulações atualmente disponíveis, com estrogênios em baixa dose, tornaram muito pequeno o risco de induzir hipertensão. 2. A pacientes com histórico de hipertensão recomenda-se considerar o nível pressórico e o diagnóstico etiológico. Se a hipertensão for leve/moderada, o uso geralmente não é recomendado, a não ser que não se disponha de outro método anticoncepcional adequado. Para os casos de hipertensão grave ou doença vascular diagnosticada, o método é contra-indicado. 3. Usuárias de contraceptivos orais devem ter sua pressão arterial medida a cada seis meses. Se houver aumento significativo, a medicação deve ser suspensa, optando-se por outros métodos contraceptivos. O tratamento farmacológico deve ser considerado se a pressão não se normalizar três meses após a suspensão. Não havendo outra opção anticoncepcional, a terapia anti-hipertensiva deve ser instituída. 4. Os contraceptivos orais não devem ser prescritos a mulheres tabagistas acima de 35 anos ou com diagnóstico prévio de lúpus eritematoso ou doença tromboembólica. Podem ser utilizados em diabéticas, nas obesas, nas portadoras de anemia falciforme, e devese ter cautela naquelas com enxaqueca. Os mecanismos envolvidos na gênese da hipertensão arterial induzida pelos contraceptivos orais ainda não estão bem estabelecidos. Alterações no sistema renina-angiotensina-aldosterona, na sensibilidade à insulina e no transporte eritrócito-cátion têm sido imputados tanto ao componente estrogênico quanto ao progestogênico.19 Os contraceptivos orais com altas doses podem aumentar o peso corporal, o volume plasmático e o débito cardíaco. Além disso, os estrogênicos aumentam a síntese hepática do substrato da renina, induzindo a expressão do mRNA do angiotensinogênio,20 que se acompanha de um aumento da atividade total da renina.21 Porém, como não têm sido observadas diferenças significativas no grau dessas alterações
553
capítulo 29
do sistema renina-angiotensina-aldosterona entre mulheres que se mantêm normotensas e naquelas que desenvolvem hipertensão, não está evidente a sua contribuição na gênese da elevação da pressão arterial. Em resumo, apesar da baixa incidência de hipertensão arterial entre as usuárias de contraceptivos orais, a pronta identificação e conduta minimizam ou eliminam os eventuais efeitos deletérios sobre o sistema cardiovascular.
HIPERTENSÃO E TERAPIA DE REPOSIÇÃO HORMONAL Dados clínicos e epidemiológicos demonstram claramente um padrão de dismorfismo sexual no desenvolvimento da doença cardiovascular em humanos.29 A incidência de doença cardiovascular é baixa em mulheres prémenopausadas, mas aumenta acentuadamente após a menopausa. A doença coronariana é a principal causa de mortalidade e significante causa de morbidade entre as mulheres. A hipertensão arterial tem forte associação com doença coronariana tanto em homens quanto em mulheres e é um dos mais importantes fatores de risco modificáveis para doença coronariana. Os efeitos da terapia de reposição hormonal (TRH) sobre a pressão arterial não são tão claros quanto os efeitos dos contraceptivos orais. Uma associação entre reposição estrogênica (TRE) e hipertensão foi primeiro relatada nos anos 70 e até recentemente considerava-se a presença de hipertensão uma contra-indicação à TRH. Entretanto, dados de novos estudos sugerem que o risco de hipertensão devido à TRH é baixo, e alguns estudos têm mesmo documentado diminuição na pressão arterial na vigência de TRH.
Fundamentos Biológicos do Papel do Estrogênio na Doença Cardiovascular É sabido que células cardiovasculares, tecidos reprodutivos, ossos, fígado e cérebro expressam receptores alfa e beta de estrogênios. Estes receptores são importantes alvos para estrogênio endógeno, terapia de reposição estrogênica e agonistas farmacológicos do estrogênio. Os complexos estrogênio/receptores de estrogênio servem como fatores de transcrição que promovem a expressão dos genes com muitos efeitos vasculares, incluindo regulação do tônus vasomotor e resposta à lesão, que podem ser fatores protetores contra o desenvolvimento de aterosclerose e doenças isquêmicas. Os receptores de estrogênios em outros tecidos, tais como fígado, podem mediar tanto efeitos benéficos (tais como alterações na expressão gênica da apoproteína, que melhora os perfis lipídicos), como efeitos adversos (tais como aumento na expressão gênica das
proteínas da coagulação e/ou diminuição das proteínas fibrinolíticas). Dois efeitos vasculares mediados por estrogênio são reconhecidos: a) vasodilatação rápida, transitória, ocorre minutos após exposição ao estrogênio, independentemente de alterações na expressão gênica.30 Esta vasodilatação parece ser devida à ativação da enzima óxido nítrico sintetase endotelial, mediada pelo receptor estrogênico alfa, sem significado fisiológico estabelecido. b) os efeitos de longo prazo do estrogênio nos vasos, tais como os relacionados à limitação no desenvolvimento de lesões ateroscleróticas ou lesões vasculares, ocorrem horas a dias após tratamento estrogênico e têm representado as alterações fundamentais na expressão gênica vascular. É importante salientar que progesterona e outros receptores hormonais também são expressos nos vasos; no entanto seu papel no desenvolvimento da doença cardiovascular não está definido. Até o momento, a somatória de efeitos genômicos e não-genômicos de relevância clínica da TRH/TRE não é clara.
Menopausa, Terapia de Reposição Hormonal e Doença Cardiovascular Estudos experimentais e metaanálise de estudos observacionais mostram redução de até 50% no risco de doença cardiovascular em mulheres pós-menopausadas em uso de TRH.31 Entretanto, todos os estudos clínicos têm em comum sérias limitações, por apresentarem importantes vieses de seleção: mulheres em uso de TRH tendem a ser mais saudáveis, mais bem-educadas, mais atentas e aderentes a estratégias de mudanças de estilo de vida, para reduzir os riscos para doença cardiovascular e para terem melhores cuidados com sua saúde. O Postmenopausal Estrogen/Progestogen Interventions (PEPI) Trial32 é um estudo prospectivo, randomizado, duplo-cego, controlado com placebo, patrocinado pelos US National Institutes of Health, que avaliou as diferenças entre placebo, estrogênio não oposto (isolado), estrogênio/ progestogênio sobre fatores de risco selecionados para doença cardiovascular em mulheres pós-menopausadas saudáveis. Os objetivos primários foram pressão arterial sistólica, HDL-colesterol, insulina sérica e fibrinogênio. Após três anos de seguimento, o estrogênio isolado e em combinação com progestogênio aumentou os níveis de HDL, diminuiu os LDL e fibrinogênio, e houve elevação dos níveis de pressão arterial sistólica paralela ao aumento de peso em todos os grupos de tratamento, mas a pressão arterial diastólica se manteve nos mesmos níveis prétratamento. A ausência de efeito do tratamento sobre os níveis pressóricos nestas mulheres normotensas é consistente
554
Hipertensão na Mulher
com relatos anteriores de que a TRH não altera pressão arterial em mulheres pós-menopausadas com hipertensão.3335 Os resultados do estudo PEPI fornecem forte evidência de que estrogênio isolado ou associado a progestogênio tem efeito cardioprotetor em mulheres pós-menopausadas, particularmente naquelas com doença coronariana preexistente ou com alto risco para desenvolver doença coronária. O estudo Heart and Estrogen/Progestin Replacement (HERS)36 foi especificamente desenhado para testar a hipótese de que o tratamento com estrogênios conjugados eqüinos 0,625 mg/dia com acetato de medroxiprogesterona 2,5 mg/dia reduziria a incidência combinada de morte por infarto do miocárdio e morte por doença coronariana comparado a placebo em mulheres com história anterior de IM, revascularização coronariana ou com evidência angiográfica de doença coronariana (DC). Este foi o primeiro estudo clínico de grande escala, randomizado, a avaliar o efeito da TRH na prevenção de doença cardiovascular em mulheres pós-menopausadas. Após quatro anos de seguimento, não houve diferença significativa nos objetivos primários entre os dois grupos. Numerosas explicações foram propostas para a falta de efeito da TRH no estudo HERS e estas incluem duração inadequada de seguimento, reações adversas do progestogênio utilizado (medroxiprogesterona), efeito bidirecional do estrogênio utilizado (risco a curto prazo e benefício a longo prazo), idade alta da população estudada (média: 66,7 anos); preparação hormonal não adequada (conjugados eqüinos), acaso, etc. Apenas os dados de seguimento a longo prazo da coorte do estudo HERS poderão fornecer informações adicionais sobre o papel da TRH na prevenção secundária. O estudo Estrogen Replacement and Atherosclerosis (ERA) foi o primeiro estudo randomizado angiográfico a testar o efeito da TRH na progressão da aterosclerose em mulheres pós-menopausadas com estenose coronariana documentada e não demonstrou benefício da combinação conjugados eqüinos e acetato de medroxiprogesterona sobre a progressão da doença.37 A generalização destes achados tem sido questionada, devido à relevância dos objetivos angiográficos, esquema terapêutico utilizado, idade avançada das pacientes (média: 65,8 anos) e tempo entre menopausa e início da TRH (média: 23 anos). Tem sido sugerido que os resultados dos estudos de prevenção secundária podem não se aplicar a mulheres mais jovens; entretanto, é menos comum que eventos cardiovasculares ocorram antes dos 60 anos em mulheres. Também é possível que regimes terapêuticos de TRE/TRH diferentes dos testados (doses menores, diferentes preparações hormonais de estrogênio e progestogênio, ou diferentes vias de administração) possam ser benéficos para prevenção secundária da doença coronariana. Também existe a hipótese de que se a TRH for iniciada precocemente após a menopausa, exista a possibilidade de prevenir o desenvolvimento da doença coronariana mais facilmente do que prevenir sua progressão uma vez estabelecida.38
Pontos-chave: • A incidência de doença cardiovascular é baixa em mulheres pré-menopausadas, mas aumenta acentuadamente após a menopausa • Os complexos estrogênio/receptores de estrogênio servem como fatores de transcrição que promovem a expressão dos genes com muitos efeitos vasculares, incluindo regulação do tônus vasomotor e resposta à lesão, que podem ser fatores protetores contra o desenvolvimento de aterosclerose e doenças isquêmicas
DISFUNÇÃO SEXUAL E HIPERTENSÃO NA MULHER Um aspecto relevante na diferenciação epidemiológica entre homens e mulheres hipertensos é a potencial implicação da hipertensão arterial e/ou do seu tratamento sobre a função sexual. Fisiologicamente, o desempenho sexual está submetido à influência dos hormônios sexuais, da saúde emocional e física do indivíduo e de muitos outros fatores externos, tais como disponibilidade e atratividade do parceiro sexual. O impacto da hipertensão arterial sobre a função sexual masculina tem sido apreciado periodicamente na literatura médica, mas esta abordagem permanece pouco explorada em mulheres, embora elas correspondam a quase metade da população com hipertensão arterial sistêmica. Comprovadamente, a disfunção sexual constitui um dos grandes obstáculos para o sucesso da terapêutica anti-hipertensiva em homens, mas ainda há poucas evidências de sua participação em mulheres hipertensas. A escassez destes dados se deve, pelo menos em parte, à dificuldade para se definir e avaliar parâmetros objetivos da função sexual feminina.39 Pouco se sabe sobre a freqüência de disfunção sexual entre mulheres na população geral e menos ainda sobre a qualidade sexual naquelas com doenças crônicas, submetidas ou não a farmacoterapia contínua, mas tem sido aceito que a prevalência de disfunção sexual em uma população doente é maior do que a prevalência estimada dentro de uma população saudável.40 Permanece controverso se o pequeno conhecimento das influências da hipertensão arterial sobre a função sexual feminina pode ser atribuído à ausência de diminuição na qualidade da função sexual em mulheres hipertensas, se deve à deficiências metodológicas de investigação ou ainda se é decorrente da efetiva ausência de causa e efeito da hipertensão e da medicação. Uma revisão clínica, englobando dados a partir de 1970, revelou que os estudos sobre hipertensão e outras doenças crônicas freqüentemente negligenciam informações detalhadas de participantes femininas,
capítulo 29
raramente estudam apenas mulheres e envolvem relativamente poucas mulheres pesquisadoras.41 Só recentemente, uma importante avaliação sobre os efeitos da hipertensão e de seu tratamento sobre a qualidade da função sexual feminina foi publicada.42 É um estudo ambulatorial, caso-controle, que investigou a função sexual em mulheres hipertensas com ou sem tratamento farmacológico, comparando-as com mulheres normais sem qualquer outra história médica significativa. Para serem incluídas, as mulheres precisavam ser heterossexuais e estar em plena idade reprodutiva. Como a existência ou não do tratamento anti-hipertensivo não diferiu os resultados nas pacientes hipertensas quanto ao desempenho sexual, elas foram analisadas como um grupo único. Conclusivamente, em comparação com mulheres normais, as pacientes com hipertensão arterial relataram menor lubrificação vaginal, diminuição no número de orgasmos e maior freqüência de dores durante as relações sexuais. No mesmo estudo, os aspectos emocionais da função sexual em mulheres com hipertensão arterial não pareceram comprometidos. Um achado incidental mostrou menor êxito na obtenção de orgasmo entre fumantes, mas este achado não foi associado com a idade nem com a hipertensão. É possível que a maior incidência de dor e a menor freqüência de orgasmo sejam função da diminuição da lubrificação vaginal. Considerando-se que a lubrificação vaginal, como a ereção, ocorre na fase inicial da atividade sexual, a ausência de lubrificação em mulheres pode corresponder à disfunção erétil masculina, uma analogia biologicamente plausível. Por essa razão, mulheres hipertensas devem ser ativamente avaliadas quanto à presença de ressecamento vaginal, uma vez que este problema pode ser remediado pelo uso de agentes lubrificantes comercialmente disponíveis. Se a disfunção sexual se desenvolve ou se agrava após o início da terapia anti-hipertensiva, a droga deve ser suspensa ou substituída.
2. 3.
4.
5.
6.
7.
8. 9.
10.
11. 12. 13.
14. 15. 16.
17.
18.
Pontos-chave: • Pacientes com hipertensão arterial têm menor lubrificação vaginal, diminuição no número de orgasmos e maior freqüência de dores durante as relações sexuais • Mulheres hipertensas devem ser ativamente avaliadas quanto à presença de ressecamento vaginal
19.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
23.
1. Report of the National High Blood Pressure Education Program Working Group on High Blood Pressure in Pregnancy. Am J Obstet Gynecol, 2000; 183:S1-S22.
20.
21.
22.
23.
555 (http://www.nhlbi.nih.gov/health/prof/heart/hbp/hbp– preg.htm) http://hometown.aol.com/HELLP1995/hellp.html GANT, N.F.; DELAY, G.L.; CHAND, S.; WHALLEY, P.J.; Mac DONALD, P.C. A study of angiotensin II pressor response throughout primigravid pregnancy. J Clin Invest, 52:2682-2689, 1973. PASCOAL, I.F.; LINDHEIMER, M.D.; NALBANTIAN-BRANDT; UMANS, J.G. Contraction and relaxation abnormalities in resistance arteries of preeclamptic women. J Clin Invest, in press. FISHER, K.A.; LUGER, A.; SPARGO, B.H.; LINDHEIMER, M.D. Hypertension in pregnancy: clinical-pathological correlations and remote prognosis. Medicine, 60:267-276, 1981. WALLENBURG, H.C.S. Hemodynamics in hypertensive pregnancy. In: Ruben, P.C. (ed.) Handbook of Hypertension, vol. 10, Hypertension in Pregnancy. Amsterdam: Elsevier, 1988, pp. 66-101. WEINER, C.P.; KWAAN, H.C.; XU, C.; PAUL, M.; BURMEISTER, L.; HAUCK, W. Antitrombine III activity in women with hypertension during pregnancy. Obstet Gynecol, 65:301-305, 1985. PIJNEMBORG, R. Trophoblast invasion and placentation in the human: morphological aspects. Trophlobast Res, 1990; 4:33-37. COCKBURN, J.; MOAR, V.A.; OUNSTED, M.; REDMAN, C.W.G. Final report of study on hypertension during pregnancy: the effects of specific treatment on the growth and development of the children. Lancet, 1982; 1:647-649. SIBAI, B.M.; LINDHEIMER, M.D.; HAUTH, J.; CARITIS, S.; VANDORSTEN, P.; KLEBANOFF, M.; MacPHERSON, C.; LANDON, M.; MIODOVNIK, M.; PAUL, R.; MEIS, P.; DOMBROWSKI, M. Risk factors for preeclampsia, abruptio placentae, and adverse neonatal outcomes among women with chronic hypertension. N Engl J Med, 1998; 339:667-671. HANNAFORD, P. Health consequences of combined oral contraceptives. Br Med Bull, 2000; 56(3):749-60. MENDELSON, M.A. Gynecologic and obstetric issues in the adolescent with heart disease. Adolesc Med, 2001; 12(1):163-74. BUSH, T.L. The adverse effects of hormonal therapy — a risk for developing cardiovascular risk factors and adverse effects of risk factor reduction. Cardiology Clinics, 1986; 4(1):145-52. SPEROFF, L. The impact of oral contraception on cardiovascular disease. Cardiovasc Risk Factors, 1996; 6:84-93. MAGEE, L.A. Treating hypertension in women of childbearing age and during pregnancy. Drug Saf, 2001; 24(6):457-74. WHO collaborative study of cardiovascular disease and steroid hormone contraception. Acute myocardial infarction and combined oral contraceptives. Lancet, 1997; 349:1202-9. WALSH, B.W.; SACKS, F.M. Effects of low dose oral contraceptives on very low density lipoprotein metabolism. J Clin Invest, 1993; 91:2126-32. NARKIEWICZ, K.; GRANIERO, G.R.; DIESTE, D. Ambulatory blood pressure in mild hypertensive women taking oral contraceptives. Am J Hypertens, 1995; 8:249-53. ABRAHÃO, S.B.; MION Jr., D. Hipertensão arterial e contraceptivos orais. Rev Bras Hipertensão, 2000; 7(4):292-95. GORDON, M.S.; CLIN, W.W.; SHUPNIK, M.A. Regulation of angiotensinogen gen expression by estrogen. J Hypertens, 1992; 10:361-6. DERKX, F.H.M.; STUENKER, C.; SCHALEKAMP, M.P.A. Immunoreactive renin, prorenin and enzymatically active renin in plasma during pregnancy and in women taking oral contraceptives. J Clin Endocrinol, 1986; 63:1008-15. GODSLAND, I.F.; WYNN, V.; CROOK, D.; MILLER, N.E. Sex, plasma lipoproteins and atherosclerosis: Prevailing assumptions and outstanding questions. Am Heart J, 1987; 114:1467-1503. MENDELSOHN, M.E.; KARAS, R.H. The protective effects of estrogen on the cardiovascular system. N Engl J Med, 1999; 340:18011811. GRADY, D.; RUBIN, S.M.; PERITTI, D.B. et al. Hormone therapy prevent disease and prolongs life in postmenopausal women. Ann Intern Med, 1992; 117:1016-1037.
556 24.
25.
26.
27. 28.
29.
30.
31.
32. 33. 34.
Hipertensão na Mulher
PEPI Trial Writing Group: Effects of estrogen or estrogen/progestin regimens on heart disease risk factors in postmenopausal women. The postmenopausal estrogen/progestin interventions (PEPI) trial. JAMA, 1995; 3 :199-208. NABULSI, A.A.; FOLSOM, A.R.; WHITE, A. et al. Association of hormone replacement therapy with various cardiovascular risk factors in postmenopausal women. N Engl J Med, 1993; 328:1069-1075. WALSH, B.W.; SCHIFF, I.; ROSNER, B.; GREENBERG, I.; RAVNIKAR, V.; SACKS, F.M. Effects of postmenopausal estrogen replacement on the concentrations and metabolism of plasma lipoproteins. N Engl J Med, 1991; 325:1196-1204. PFEIFFER, R.I.; KUROSAKI, T.T.; CHARLTON, S.K. Estrogen use and blood pressure in later life. Am J Epidemiol, 1979; 110:469-478. HULLEY, S.; GRADY, D.; BUSH, T. et al. Randomized trial of estrogen plus progestin for secondary prevention of coronary heart disease in postmenopausal women: Heart and Estrogen/Progestin Replacement Study (HERS) Research Group. JAMA, 1998; 280:605613. PETITTI, D.B. Hormone replacement therapy and hearth disease prevention: experimentation trumps observation. JAMA, 1998; 280:650-652. Editorial. MOSCA, L., COLLINS, P., HERRINGTON, D.M. et al. Hormone Replacement Therapy and Cardiovascular Disease — A Statement for Healthcare Professionals from the American Heart Association. Circulation, 2001; 104:499-503. LEWIS, C.; DUNCAN, L.E.; BALLANCE, D.I.; PEARSON, T.A. Is sexual dysfunction in hypertensive women uncommon or understudied? Am J Hypertens, 11:733-735, 1998. OSBORNE, M.; HAWTON, K.; GATH, D. Sexual dysfunction among middle aged women in the Community. Br Med J, 296:959-962, 1988. FRANK, E.; ANDERSON, C.; RUBINSTEIN, D. Frequency of sexual dysfunction in normal couples. N Engl J Med, 299:111-115, 1978. DUNCAN, L.E.; LEWIS, C.; JENKINS, P.; PEARSON, T.A. Does hypertension and its pharmacotherapy affect the quality of sexual function in women? Am J Hypertens, 13:640-647, 2000.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.dekker.com/servlet/product/productid/ PRG — Hypertension in Pregnancy. The Official Journal of the International Society for the Study of Hypertension in Pregnancy. http://www.ahcpr.gov/clinic/epcsums/pregsum.htm — Evidence Report/Technology Assessment: Number 14 Management of Chronic Hypertension During Pregnancy. http://www.lifeclinic.com/focus/hypertension/default.asp — O site lifeclinic.com foi desenvolvido para fornecer uma extensa fonte de informações sobre condições clínicas da saúde e um serviço on-line para você monitorar sua saúde. http://www.emedicine.com/MED/topic3250.htm — Medicine foi instituído em 1996 e é no momento o maior e mais atualizado banco de dados clínicos disponível para médicos e profissionais da área de saúde. Mais de 10.000 médicos autores e editores contribuem para o site, que cobre 7.000 enfermidades. O conteúdo, baseado em evidências, proporciona guias práticos em 62 especialidades médicas e é mantido atualizado. http://matweb.hcuge.ch/endo/cours_4e_MREG/Preeclampsia_eclampsia.htm — Site da Maternidade de Genève. http://www.rcp.gov.bc.ca/Guidelines/Obstetrics/ Master%5B1%5D.OB11.Hypertension.May2000.pdf — British Columbia Reproductive Care Program. http://www.racp.edu.au/asshp/ — The Australasian Society for the Study of Hypertension in Pregnancy.
Capítulo
Tubulopatias Hereditárias
30
Daltro Zunino
INTRODUÇÃO
Raquitismo tipo II
CAUSAS DAS TUBULOPATIAS
Raquitismo hipofosfatêmico autossômico dominante
DIVISÕES FUNCIONAIS DO NEFRO EM RELAÇÃO ÀS
Hipercalciúria idiopática
TUBULOPATIAS
Doença de Dent
HIPERAMINOACIDÚRIAS Hiperaminoacidúrias catiônicas Cistinúria clássica
Pseudo-hipoparatireoidismo DISFUNÇÃO NO TRANSPORTE RENAL DE SÓDIO, POTÁSSIO, MAGNÉSIO E CÁLCIO
Intolerância lisinúrica protéica
Pseudo-hipoaldosteronismo tipo 1 e tipo 2
Hiperaminoacidúria dibásica tipo II
Síndrome de Bartter
Hiperaminoacidúrias neutras Doença de Hartnup Metioninúria
Síndrome de Liddle Mutações afetando o receptor extracelular sensível ao cálcio
Histidinúria
DIABETE INSÍPIDO NEFROGÊNICO
Iminoglicinúria
ACIDOSE TUBULAR RENAL
Hiperaminoacidúria dicarboxílica DISFUNÇÃO GENERALIZADA DO TÚBULO PROXIMAL Síndrome de Fanconi GLICOSÚRIA RENAL PRIMÁRIA DISFUNÇÃO NO TRANSPORTE DE FOSFATO
Acidose tubular renal tipo 1 (distal) Acidose tubular renal tipo 2 (proximal) Acidose tubular renal tipo 3 Acidose tubular renal distal (tipo 4) Subtipo 3
Raquitismo hipofosfatêmico hereditário com hipercalciúria
Subtipo 4
Raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo
Subtipo 5
Osteomalácia hipofosfatêmica oncogênica
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Raquitismo tipo I
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO As tubulopatias constituem um conjunto de afecções comprometendo em forma variada, quer isolada, quer generalizada, a função do túbulo renal na ausência de alteração primária da função glomerular. Nos últimos anos, o interesse nas tubulopatias hereditárias se estendeu além
da Pediatria, já que a morbidade e a mortalidade causadas por esses distúrbios diminuíram importantemente. Isto ocorreu por um melhor entendimento da fisiopatologia molecular, fornecendo novas formas de tratamento e prevenção tanto das doenças raras como das mais comuns. Assim, a suplementação de eletrólitos, altas doses de vitamina D, nutrição adequada, incluindo restrições dietéticas, drogas alterando o transporte tubular e, finalmente, o
558
Tubulopatias Hereditárias
transplante de órgãos. Com a evolução da doença que causa a lesão tubular, pode ocorrer comprometimento de todo o nefro, com o desenvolvimento de insuficiência renal crônica. O prognóstico final de algumas tubulopatias é determinado não somente pela diminuição da função renal, mas também pelas complicações extra-renais, especialmente esqueléticas, e o crescimento insuficiente. Existem três padrões principais de aumento de excreção urinária de uma substância:
1. Excreção Aumentada por Hiperfluxo A concentração da substância está aumentada no plasma e o excesso é excretado na urina. A excreção urinária reflete somente o excesso de uma substância no plasma, não ocorrendo, verdadeiramente, uma disfunção tubular. É o que acontece no diabete melito e na fenilcetonúria.
2. Excreção Aumentada em um Determinado Tempo de uma Substância por Unidade de Plasma (Depuração Renal Aumentada) A substância é encontrada em quantidades anormais na urina, enquanto sua concentração no plasma está normal ou discretamente diminuída, ocorrendo sintomas somente se existir perda exagerada de uma substância essencial, como pode ocorrer na glicosúria grave pelo envenenamento com floridzina, ou a excreção aumentada da substância produz efeitos secundários sobre o parênquima renal, como é o caso da litíase na cistinúria ou na acidose tubular renal tipo 1.
3. Aumento da Depuração Renal com Excreção Anormal da Substância na Unidade de Tempo Este tipo de defeito tubular é reconhecido pela análise do plasma, que mostra a concentração da substância anormalmente baixa. Ocorrerão sintomas somente se os níveis plasmáticos forem diretamente lesivos. Assim, o fósforo plasmático anormalmente baixo nas síndromes tubulares proximais, causando raquitismo ou osteomalácia; o potássio plasmático diminuído, originando fraqueza muscular ou paralisia periódica.
CAUSAS DAS TUBULOPATIAS Os defeitos de função tubular podem ser simples ou múltiplos, comprometendo uma ou várias funções tubulares, sendo por vezes primários e freqüentemente genéticos ou secundários a outros processos e potencialmente reversíveis. A análise da alteração tubular pode ser dificultada pelo fato de que um defeito pode não representar uma anormalidade específica primária, mas sim uma anormalidade específica secundária. Assim, um defeito de concentração pode ter como causa um déficit de potássio (v. Cap. 12).
Perda de potássio pela urina pode ter como origem o hipoaldosteronismo secundário, assim como hipercalciúria pode ser o resultado de acidose metabólica. Depuração aumentada de fosfato pode ser causada por hipoparatireoidismo e a glicosúria com hiperaminoacidúria pode ser encontrada temporariamente na síndrome nefrótica com o tipo histológico de esclerose segmentar e focal. A reversibilidade da anormalidade, quando a causa primária é corrigida, estabelece o defeito tubular como funcional. Mas nem sempre existem distinções evidentes entre defeitos funcionais e específicos. As causas de muitas tubulopatias são desconhecidas. Devem-se, no entanto, reconhecer dois grandes grupos: tubulopatias adquiridas e hereditárias. Ambas exercem efeitos “tóxicos” sobre o túbulo, podendo ser de origem exógena ou endógena. Muitas drogas nefrotóxicas em altas doses produzem necrose tubular proximal grave (cloreto de mercúrio, tetracloreto de carbono). Exemplos de intoxicações endógenas são os depósitos de cobre na doença de Wilson, a galactose-1-fosfato na galactosemia, etc. Vários mecanismos genéticos foram descritos como causadores de anormalidades em relação à excreção urinária de algumas substâncias: 1) bloqueio na cadeia metabólica extra-renal, levando a um aumento na concentração de um metabólito nos fluidos corporais e no plasma, sendo então excretadas em excesso. Este é um exemplo do tipo de hiperfluxo. Assim, a excreção aumentada de fenilalanina na fenilcetonúria, de glicose no diabete melito, de aminoácidos de cadeia ramificada na doença do xarope de bordo, etc.; 2) o defeito pode ter um efeito direto e específico sobre o transporte tubular da substância, na ausência de qualquer outro defeito. Embora sem comprovação atual, cita-se como exemplo a cistinúria, que apresenta ao mesmo tempo um defeito de transporte ao nível do jejuno; 3) defeitos específicos dos sistemas de transporte tanto nos túbulos renais como nos outros órgãos, como o exemplo citado da cistinúria, além da doença de Hartnup e alguns casos de prolinúria; 4) o defeito genético pode envolver uma enzima que não está diretamente relacionada com o transporte tubular mas altera a função celular normal, ocorrendo lesão que é evidenciada em alterações histopatológicas e em múltiplos defeitos do transporte tubular. Exemplos deste tipo são a síndrome de Fanconi no adulto, a variedade hereditária da acidose tubular distal tipo 1 e a síndrome de Lowe; 5) o traço hereditário pode causar bloqueio em uma cadeia metabólica extra-renal que, por sua vez, leva a uma concentração aumentada da substância no plasma ou a uma excreção aumentada na urina. Pode, também, ocorrer lesão tóxica agindo sobre os siste-
559
capítulo 30
mas de transporte tubular e atuando como um “veneno” endógeno. Exemplos típicos são a galactosemia e a doença de Wilson.
DIVISÕES FUNCIONAIS DO NEFRO EM RELAÇÃO ÀS TUBULOPATIAS Por vezes é muito difícil identificar um envolvimento tubular proximal ou distal, por existir um grande número de superposições. Assim, por exemplo, na síndrome de Fanconi, precocemente são evidentes as anormalidades de reabsorção do túbulo proximal, como as que envolvem a glicose, os aminoácidos, o fosfato, o ácido úrico, o bicarbonato, e posteriormente tanto as funções distais como as glomerulares estão lesadas. A água, o cloro e o sódio são reabsorvidos em toda a extensão do nefro, enquanto o potássio é reabsorvido proximalmente e secretado distalmente. O túbulo proximal reabsorve quase toda a glicose, aminoácidos, proteínas e uma grande fração do fósforo e do ácido úrico filtrados pelo glomérulo; somente traços destas substâncias podem ser detectados na urina normal. A maior parte da reabsorção de sódio, potássio e cálcio é realizada pelos túbulos proximais. A reabsorção distal de sódio e cálcio é que determina geralmente as quantidades que serão excretadas na urina final (v. Cap. 4). As excreções urinárias destes elementos são tão pequenas em relação às quantidades filtradas que a localização do sítio tubular responsável pelas alterações na reabsorção é raramente possível. O íon hidrogênio é secretado na luz tubular em toda a extensão do nefro, com a conseqüente reabsorção de bicarbonato e uma queda progressiva do pH do fluido tubular. A reabsorção e a excreção tubular de bicarbonato e fósforo possuem certas características em comum: ambos são completamente filtrados do plasma, sendo que a capacidade de reabsorção do túbulo proximal para estes elementos está próxima da quantidade filtrada. Por esta razão, uma discreta elevação em suas concentrações plasmáticas ou no volume filtrado pelo glomérulo pode dar mais substrato para os túbulos em relação ao que pode ser reabsorvido, aumentando, então, a excreção urinária. Também o paratormônio exerce uma ação direta sobre a reabsorção destas duas substâncias, ocorrendo um aumento da excreção com uma elevação deste hormônio, mas sem influenciar a acidificação tubular distal. O túbulo distal é da maior importância no ajuste final do pH urinário. A acidificação urinária máxima (na presença de um estímulo fisiológico adequado) depende da formação de um gradiente de pH adequado (cerca de 3 unidades entre o sangue (pH = 7,4), a célula tubular (pH = 7,0) e a urina (pH 4,0). Estes processos de acidificação são realizados através da eliminação de acidez titulável e amônia pela urina (v. Cap. 5). Tam-
bém a aldosterona apresenta ações importantes na regulação dos íons sódio, potássio e hidrogênio no túbulo distal, operando na reabsorção de sódio e secreção de hidrogênio e potássio. Assim, uma deficiência ou resistência tubular à aldosterona ocasionarão perda de sódio, hiponatremia, hipercalemia e acidose metabólica. Além do mais, a hipercalemia também afeta a acidificação renal, inibindo a síntese de amônia.
Ponto-chave: • As síndromes tubulares proximais são caracterizadas por excreções isoladas ou combinadas de aminoácidos, glicose, fosfato e ácido úrico, e as distais apresentam defeitos de acidificação, concentração e perda de sal Três segmentos — a alça de Henle, o túbulo contornado distal e os ductos coletores, que formam em conjunto o nefro distal — são os responsáveis pelos ajustes finais do volume urinário e da composição de eletrólitos, essenciais para manter a homeostase. O túbulo distal reabsorve aproximadamente um terço das quantidades de água e uréia que são filtradas. A reabsorção de ambas é passiva, com as quantidades precisas variando segundo os processos de concentração e diluição. A participação renal na regulação da pressão osmótica resulta de sua capacidade em variar a excreção de água, fazendo com que a urina se apresente hipo- ou hiperosmolar em relação ao plasma. Esta variabilidade é devida ao hormônio antidiurético, que exerce o efeito de aumentar a permeabilidade para a água das membranas que compõem os segmentos do nefro distal (v. Cap. 6). Em geral, os distúrbios têm sido classificados de acordo com as funções relacionadas aos túbulos proximal e/ ou distal. Tendo-se em conta as diversas funções citadas anteriormente, as síndromes tubulares proximais são, portanto, caracterizadas por excreções isoladas ou combinadas de aminoácidos, bicarbonato, glicose, fosfato, ácido úrico e cálcio. As tubulopatias distais apresentam defeitos de acidificação, concentração, perda de sal.
HIPERAMINOACIDÚRIAS A maioria das síndromes tubulares proximais inclui anormalidades da excreção dos aminoácidos. A pequena fração de aminoácidos presentes na urina final é considerada fisiológica, sendo chamada aminoacidúria, enquanto a excreção aumentada de um ou vários aminoácidos é denominada hiperaminoacidúria. Durante os primeiros meses de vida existe normalmente uma perda de aminoácidos secundária a alterações maturacionais nas membranas de vários sistemas de transporte.
560
Tubulopatias Hereditárias
A hiperaminoacidúria é um sinal proteiforme, dependente de inúmeras enfermidades. Com a determinação de índices de depuração e de reabsorção tubular de aminoácidos, as hiperaminoacidúrias podem ser diferenciadas em vários tipos. Atualmente se propõe uma classificação para as aminoacidúrias patológicas baseada nos mecanismos celulares que medeiam o transporte de aminoácidos associados a diferentes defeitos metabólicos ou de transporte atuando sobre a reabsorção tubular proximal: 1. saturação (hiperaminoacidúria de hiperfluxo, pré-renal), onde a carga filtrada dos aminoácidos excede a capacidade do seu sistema de absorção. Dependendo da afinidade do aminoácido para seu sistema de transporte, a aminoacidúria ocorrerá em maior ou menor quantidade. Assim, uma aminoacidúria com menor afinidade pode mostrar uma excreção exagerada sob condições de saturação, dependendo da capacidade do sistema; 2. competição (hiperaminoacidúria “combinada”), quando um aminoácido em concentrações elevadas, que é transportado pelo mesmo sistema, pode inibir o acoplamento e a reabsorção de outras substâncias no mesmo grupo, levando a uma aminoacidúria mais generalizada; 3. modificação do transportador (hiperaminoacidúria específica), quando o próprio carreador no plasma está alterado, levando a uma interferência no transporte através do túbulo renal, com diminuição da reabsorção e aumento da depuração renal. Neste caso, a aminoacidúria será específica para uma substância ou um grupo de compostos estruturalmente relacionados; 4. inibição da transferência do substrato (hiperaminoacidúria renal), ocorrendo quando o acoplamento da energia do transportador é alterado e o fluxo é diminuído, levando a uma alteração da integridade da membrana, envolvendo todos os grupos de aminoácidos, sendo, portanto, generalizada. Os aminoácidos são primariamente reabsorvidos da luz tubular por um transporte ativo através da membrana apical, em direção à membrana basolateral, dependente de um gradiente externo de sódio através da vesícula da membrana tubular proximal. Esta reabsorção ocorre por um cotransporte Na-aminoácidos originado pelos componentes de concentração e voltagem do gradiente eletroquímico de sódio da luz tubular para a célula. Esta energia é estabelecida pela ATPase Na-K-dependente. Assim, a dissipação rápida do gradiente eletroquímico ao longo da membrana luminal por qualquer motivo pode resultar em absorção diminuída de aminoácidos e hiperaminoacidúria. Algumas destas anomalias também envolvem anormalidade de transporte na membrana luminal das células epiteliais gastrintestinais. No Quadro 30.1 são apresentados os distúrbios metabólicos que podem, secundariamente, apresentar repercussão renal.
Ponto-chave: • Em algumas hiperaminoacidúrias, é fundamental o diagnóstico precoce, que para algumas pode ser realizado antes do nascimento, permitindo, assim, a prevenção de lesões renais A investigação laboratorial deve incluir a identificação dos aminoácidos individuais e a determinação quantitativa dos índices de excreção urinária. Para um diagnóstico mais específico, os aminoácidos devem ser determinados no sangue e calculados os índices de depuração e reabsorção tubulares. O diagnóstico é estabelecido com a combinação dos diversos sintomas e sinais, juntamente com os dados de laboratório. O tratamento é extremamente variável, dependendo da etiologia, do tempo de doença e das alterações bioquímicas presentes quando da realização do diagnóstico. O importante neste tipo de doença é o diagnóstico precoce que, para algumas delas, pode ser realizado antes do nascimento, juntamente com a prevenção das lesões renais. Estando estas últimas já presentes, devem ser tomadas medidas para evitar as complicações futuras. Em algumas doenças hereditárias como a galactosemia e a intolerância à frutose, a eliminação destes açúcares da alimentação reverte rapidamente as lesões renais. Como nem todos os aminoácidos possuem um sistema de transporte próprio, que permitiria classificar as hiperaminoacidúrias de acordo com a via de transporte grupoespecífica afetada, e já que grupos de aminoácidos são transportados por carreadores comuns, elas são mais apropriadamente classificadas de acordo com a carga dos aminoácidos afetados — neutras (sem carga), básicas (com carga positiva) ou ácidas (com carga negativa).
Hiperaminoacidúrias Catiônicas (Hiperaminoacidúrias Dibásicas) CISTINÚRIA CLÁSSICA A cistinúria clássica engloba um grupo de anormalidades do transporte tubular e, em alguns indivíduos, intestinal de cistina, levando à formação de cálculos urinários. Juntamente com as alterações para a cistina, ocorre uma excreção anormal, mas sem conseqüências clínicas, dos aminoácidos lisina, arginina e ornitina, na dependência de alterações nos sítios de transporte de baixa afinidade tanto no túbulo proximal, como no intestino. O defeito é transmitido como um traço autossômico recessivo, sendo descritas pelo menos três formas de cistinúria clássica, cada uma delas devido à homozigose de um alelo mutante particular no lócus 1. Na cistinúria I, o homozigoto excreta quantidades relativamente grandes de cistina, lisina, argi-
561
capítulo 30
Quadro 30.1 Distúrbios metabólicos com repercussão renal secundária Alteração
Achados Clínicos e Laboratoriais
Observações
Hipertirosinemia tipo I
Síndrome de Fanconi, retardo do crescimento, febre, diarréia, cirrose hepática. Usualmente fatal sem restrição da tirosina da dieta Por vezes aminoacidúria generalizada, hiperamoniemia inconstante, deterioração do SNC. Arginina e lisina presentes na urina Síndrome de Fanconi, desidratação, acidose, vômitos, distúrbios eletrolíticos; retardo do crescimento. Por vezes fotofobia, hipotireoidismo. Com a deposição de cristais no rim, evolução para insuficiência renal crônica
Defeito na hidroxilase fumaril acetoacetato. TG AR
Hiperargininemia
Cistinose I e II
Intolerância hereditária à frutose Galactosemia
Doença de Wilson Síndrome óculocérebro-renal de Lowe Glicoglicinúria Síndrome de LuderSheldon Síndrome de RowleyRosenberg Glicogenose I (doença de von Gierke)
Com início precoce, retardo do crescimento, hipoglicemia, fenômenos hemorrágicos, disfunção tubular. Com início tardio, sintomas menos graves ou assintomática. Responde à retirada da sucrose e da frutose Síndrome de Fanconi associada a retardo do crescimento, vômitos, intolerância ao leite, hepatomegalia, icterícia, catarata, retardo mental. Responde à retirada da galactose Síndrome de Fanconi, degeneração hepatolenticular. Responde à diminuição dos depósitos de cobre Síndrome de Fanconi com retardo mental, catarata, hidroftalmia. O tratamento dos defeitos tubulares não tem efeito na evolução clínica Assintomática Sintomas da síndrome de Fanconi observados nos probantes Retardo do crescimento, hipoplasia muscular, envolvimento pulmonar, hipertrofia do ventrículo direito Raramente síndrome de Fanconi, associada à hepatomegalia intensa, nefromegalia, proteinúria, esclerose glomerular, retardo do crescimento, fenômenos hemorrágicos, hipoglicemia
Defeito no sistema de transporte dibásico. TG AR Defeito no sistema de transporte dibásico. TG AR Defeito no sistema de transporte da cistina na membrana lisossomal, com deposição de cristais em vários órgãos. TG AR Defeito da frutose-1-fosfato aldolase, com efeitos secundários sobre o ATP celular. TG AR Galactose e galatitol na urina e no sangue. Galactose-1-fosfato nas hemácias. TG AR Defeito desconhecido. TG AR Defeito básico desconhecido. TG AR Glicosúria do tipo B. Heterozigose da síndrome de Fanconi? TG AD Defeito desconhecido. TG AD Defeito desconhecido. TG AR Deficiência de glicose-6-fosfatase e glicosidase. TG AR
TG transmissão genética; AR autossômica recessiva; AD autossômica dominante; X ligada ao sexo.
nina e ornitina na urina. A cistinúria II é incompletamente recessiva porque os heterozigotos apresentam um grau moderado de aminoacidúria, principalmente cistina e lisina. Na cistinúria III, o transporte intestinal de todos os aminoácidos dibásicos é mantido pelos heterozigotos e os homozigotos excretam discreto excesso de cistina. A cistinúria tipo I é causada por mutação no gen transportador do aminoácido SLC3A1 no cromossomo 2p, sendo desconhecida a proteína defeituosa nos outros tipos. As manifestações clínicas são decorrentes da extrema insolubilidade da cistina em soluções aquosas, com a for-
mação de cálculos radiopacos pouco densos. A litíase ocorre mais freqüentemente na segunda ou terceira décadas da vida, mas pode estar presente em qualquer período etário. As conseqüências da litíase, se não corrigidas, podem evoluir para a insuficiência renal crônica. Retardo mental e paraplegia espástica foram observados em alguns pacientes, embora a relação causa-efeito não seja evidente. O diagnóstico pode ser considerado a partir da história familial, com a presença, na urina de um paciente litiásico, dos típicos cristais hexagonais de cistina ou com o teste do cianeto-nitroprussiato. O teste definitivo é dado pela deter-
562
Tubulopatias Hereditárias
minação do conteúdo de cistina e aminoácidos dibásicos por cromatografia de troca iônica, eletroforese de alta voltagem ou pela análise de aminoácido em coluna de gel. A terapêutica da cistinúria exige tratamento por toda a vida. Na presença de cálculos, estes devem ser removidos com os meios disponíveis. No caso de insuficiência renal terminal, o transplante elimina o defeito de transporte. O manejo médico inclui medidas que procuram reduzir a excreção e aumentar a solubilidade da cistina na urina, que é de cerca de 300 mg/L, e assim, o propósito é manter a concentração abaixo destes níveis. O aumento considerável da ingesta líquida de até 4 L/d, durante o dia e a noite, eficaz e barata, é fundamental na tentativa de evitar a formação de cálculos, o que pode ser conseguido em mais de 50% dos pacientes. Dietas baixas em metionina, aminoácido essencial precursor da cistina, apresentam resultados extremamente variáveis. A restrição de sódio pode trazer algum benefício, já que o sódio aumenta a excreção da cistina. A alcalinização da urina (pH entre 7,5 e 8,0) aumenta a solubilidade da cistina, podendo ser realizada com bicarbonato ou citrato de potássio (3,0 a 4,0 mEq/kg/dia). Com pH superior a 8,0 existe o risco de precipitação de sais de cálcio. A administração de D-penicilamina (1,0 a 2,0 g/dia), convertendo a cistina em composto mais solúvel, pode reduzir substancialmente sua excreção. Por vezes, os efeitos colaterais freqüentes impedem a sua utilização prolongada. A associação à piridoxina pode ser necessária pela possível depleção deste fator. A terapêutica a longo prazo com a alfamercaptopropionilglicina (tiopronina, 1,2 mg/dia) é tão eficaz quanto com a D-penicilamina e com menor incidência de efeitos colaterais, sendo a medicação de escolha na cistinúria. Outros agentes, como o ácido ascórbico (possibilidade de precipitação de cristais de oxalato e hipocitratúria) e o captopril, eventualmente podem ser utilizados, principalmente este último, mas sem resultados consistentes.
INTOLERÂNCIA LISINÚRICA PROTÉICA (Hiperaminoacidúria Dibásica Tipo 2, Intolerância Protéica Familial) É uma anomalia rara do transporte da lisina, de caráter autossômico recessivo, onde a excreção e a depuração de todos os aminoácidos catiônicos, especialmente da lisina, estão aumentadas, sendo pouco absorvidos pelo intestino. O quadro clínico se caracteriza por episódios de hiperamoniemia, conseqüentes à deficiência hormonal da ornitina, a base do ciclo da uréia. Isto leva ao aparecimento de náuseas e vômitos e, com o tempo, aversão à alimentação rica em proteínas. Conseqüentemente, ocorre retardo do crescimento, sendo os sinais de desnutrição ainda mais agravados pela deficiência de lisina. Até a parada da alimentação ao seio, os pacientes são assintomáticos e a partir do desmame os sintomas se tornam aparentes, podendo evoluir até o coma, se alimentados com fórmulas ou leite ricos em proteína. Ao lado do retardo do crescimento, ocorrem hepatosplenome-
galia, cabelos ralos, hipotonia muscular. A osteoporose é predominante. São descritos pacientes com retardo mental, mas a maioria apresenta desenvolvimento normal. Há relato de quatro pacientes com alterações psicológicas periódicas. A estatura final é discretamente subnormal ou normal baixa. Na gravidez existe o risco de hemorragia intensa durante o parto. Uma complicação grave é a pneumopatia intersticial, sendo descrita, nos pacientes que evoluíram para o óbito, proteinose alveolar. Na descrição de uma paciente com esta patologia, o tratamento com prednisolona levou aparentemente à cura. Estes pacientes são predispostos à glomerulonefrite, sendo descritos caso de insuficiência renal, com achados histológicos de glomerulonefrite mediada por complexos imunes, associada à insuficiência hepática com degeneração gordurosa ou cirrose. As concentrações dos aminoácidos catiônicos no plasma estão subnormais ou normais baixas e as quantidades de glutamina, alanina, serina, prolina, citrulina e glicina estão elevadas. A lisina é excretada na urina em quantidades maciças, e ornitina e lisina, em quantidades moderadas. A excreção da cistina está normal ou discretamente elevada. A amônia sanguínea e a excreção de ácido orótico estão normais durante o jejum, mas elevadas após alimentação protéica. A uréia está baixa ou normal, e a desidrogenase lática, a ferritina e a tireoglobulina, elevadas. No hemograma notam-se anemia, plaquetopenia, leucopenia, anisopoiquilocitose, reticulocitose. A baixa concentração de arginina em relação à lisina nos fluidos corporais parece ser a responsável pela hiperamoniemia e síntese diminuída de uréia. A anomalia de transporte destes aminoácidos está expressa nos túbulos renais, intestino, cultura de fibroblastos e provavelmente nos hepatócitos, mas não nos eritrócitos maduros. O defeito está na proteína transportadora de aminoácidos dibásicos na membrana basolateral nas células epiteliais, codificada no gen SLC7A7 do cromossomo 14q. O tratamento da intolerância lisinúrica protéica consiste na restrição protéica e suplementação de citrulina oral (3,0 a 8,0 g/dia) durante as refeições. O sintoma mais grave é a hiperamoniemia, ocorrendo após refeições ricas em proteína, jejum prolongado ou infecções graves. Uma dieta na qual o conteúdo protéico foi moderadamente reduzido — 1,0 a 1,5 g/kg/d em crianças e 0,5 a 0,8 g/kg/d em adultos — forma a base do tratamento eficaz. A suplementação com ornitina e arginina tem sido moderadamente útil, mas a diminuição da absorção intestinal dos aminoácidos catiônicos diminui sua utilidade e muitas vezes causa diarréia osmótica. A citrulina foi comprovada clinicamente como tão eficaz como a arginina e ornitina na prevenção da hiperamoniemia. A dose varia de 2 a 8,5 g/kg/d, em 3 a 5 tomadas, durante as refeições. As crises de hiperamoniemia são tratadas com a retirada total da proteína e do nitrogênio da alimentação, sendo que a infusão de glicose como fonte energética deve ser encorajada. A infusão EV de arginina ou citrulina apresenta bons resultados. A administração de lisina a longo prazo não provou ser convincente na correção
563
capítulo 30
da desnutrição, além de ser mal absorvida pelo intestino e causar diarréia osmótica e dor abdominal. Recentemente foi demonstrada a possibilidade de diagnóstico pré-natal da intolerância lisinúrica protéica por análise de ligação.
HIPERAMINOACIDÚRIA DIBÁSICA TIPO II Parece estar limitada somente ao defeito da lisina, e a hiperamoniemia não é manifestação da doença. Os sintomas lembram os da intolerância lisinúrica protéica. Retardo de crescimento grave, convulsões e retardo mental são descritos na lisinúria isolada. Estes pacientes talvez representem uma mutação afetando o transporte dos aminoácidos catiônicos, sendo adequado denominá-la lisinúria isolada.
Hiperaminoacidúrias Neutras DOENÇA DE HARTNUP É uma anomalia familial rara, na qual coexistem má absorção intestinal ao nível do jejuno e aminoacidúria maciça (mais de 14 aminoácidos de determinados alfa-aminoácidos neutros). A perda destes aminoácidos leva à desnutrição em alguns pacientes. A transmissão genética apresenta um padrão autossômico recessivo, com uma incidência de 1:16.000 nascidos vivos. As manifestações clínicas — ataxia cerebelar intermitente, diarréia, distúrbios psiquiátricos como instabilidade emocional e delírio e uma erupção cutânea fotossensível — são muito semelhantes à deficiência dietética de triptofano (pelagra). Esta deficiência é devida à inadequada absorção intestinal de triptofano, combinada com uma perda excessiva de aminoácidos pela urina, ocasionando uma diminuição da utilização do triptofano para a síntese de niacina. Pode ocorrer também hipouricemia. A patogênese da enfermidade sugere um defeito em um dos múltiplos sistemas de transporte para o triptofano, tanto na borda em escova do epitélio tubular como no intestino. A terapêutica prolongada com 40,0 a 200,0 mg/d de nicotinamida é suficiente para a cura da doença. Alguns pacientes respondem a dietas hiperprotéicas ricas em triptofano, mas a natureza intermitente da doença torna difícil avaliar este manejo.
METIONINÚRIA Constitui-se em uma rara anomalia dos aminoácidos neutros, responsável por convulsões, retardo mental e episódios de hiperventilação, além de edema e urina de odor fétido. A dieta baixa em metionina melhorou acentuadamente o quadro clínico nos dois únicos pacientes descritos.
HISTIDINÚRIA É uma anomalia seletiva do sistema de transporte específico da histidina, com baixas concentrações no plasma, consistentes com diminuição da absorção intestinal e tubular renal. É descrita em associação com retardo mental
e convulsões, embora esta relação não esteja bem definida como causa e efeito. A transmissão genética é ainda indefinida, parecendo ocorrer como um traço autossômico recessivo, sendo todos os cinco casos descritos do sexo masculino. Há necessidade da realização do diagnóstico diferencial com a histidinemia, um distúrbio benigno na maioria dos pacientes.
IMINOGLICINÚRIA É uma anomalia familial benigna, com excreção anormal de glicina, prolina e hidroxiprolina, devida a um defeito da proteína transportadora na membrana tubular proximal e por vezes no intestino, ocorrendo de maneira fisiológica até os seis meses de idade. É uma desordem rara, com defeito na proteína transportadora dos aminoácidos neutros e modo de transmissão ainda desconhecido. Este distúrbio pode apresentar-se de várias formas, na dependência do defeito no sistema de transporte renal e intestinal ou renal isolado, o que evidencia uma heterogeneidade genética, manifestando-se por vezes como glicinúria isolada. Somente alguns homozigotos aparentes mostram um defeito na absorção intestinal de L-prolina e também alguns heterozigotos obrigatórios apresentam hiperglicinúria com sobrecarga de glicina. A iminoglicinúria isolada é uma condição benigna, sendo os pacientes assintomáticos, e que, por envolver aminoácidos não-essenciais, não requer tratamento.
Hiperaminoacidúria Dicarboxílica (Hiperaminoacidúria Acídica) É uma anomalia extremamente rara, envolvendo 1:29.000 nascidos vivos, de transmissão autossômica recessiva provável. Os aminoácidos dibásicos envolvidos (ácido glutâmico e ácido aspártico) apresentam um transportador comum do glutamato de alta afinidade (EAAC1) na borda em escova do túbulo proximal, responsável pela excreção anormal. A má absorção intestinal desta substância foi descrita em três crianças, não sendo descritas conseqüências clínicas devidas a este distúrbio benigno, sendo a relação com anormalidades neurológicas talvez circunstancial. Como estas aminoacidúrias são gliconeogênicas, existe a possibilidade de hipoglicemia, revertida com a administração do aminoácido.
DISFUNÇÃO GENERALIZADA DO TÚBULO PROXIMAL Síndrome de Fanconi A síndrome de Fanconi caracteriza-se por uma disfunção generalizada e não-seletiva do túbulo proximal, com diminuição da reabsorção de glicose, aminoácidos e fós-
564
Tubulopatias Hereditárias
foro e, em menor proporção, de bicarbonato, ácido úrico, potássio, cálcio e proteína do tipo tubular. Pode existir uma disfunção concomitante proximal e distal, que teria um papel na produção da aminoacidúria, fosfatúria e glicosúria. Em um determinado paciente esta disfunção pode ser isolada ou associada para as substâncias citadas. O defeito básico estaria relacionado à alteração no transporte tubular proximal para estas substâncias que não seria corrigido ao longo do túbulo distal, pela sua pequena capacidade reabsortiva.
Ponto-chave: • Pelo grande número de anormalidades de transporte observadas, é improvável alteração nos carreadores, sendo mais plausível um defeito da energia metabólica derivada do ATP Vários mecanismos podem levar à diminuição da reabsorção de solutos pelo túbulo proximal. As três principais categorias nas quais estes mecanismos podem ser classificados são: 1. alterações na função dos carreadores que transportam substâncias através da membrana luminal, 2. distúrbios no metabolismo energético celular e 3. alterações nas características de permeabilidade das membranas tubulares. A energia requerida para o transporte de solutos através da membrana apical das células tubulares proximais é suprida pela bomba de sódio, a adenosina trifosfatase (ATPase) Na-K-dependente, localizada na membrana basolateral. Dado o grande número de anormalidades de transporte observadas na síndrome de Fanconi, é improvável que elas sejam devidas a alterações nos carreadores, que são específicos para cada uma das substâncias reabsorvidas no túbulo proximal. Um defeito da energia metabólica derivada do ATP parece mais plausível. Nesta condição, qualquer processo que resulte na diminuição do nível de ATP levaria à diminuição do rendimento dos mecanismos secundários de transporte ativo, tais como os da glicose, fosfato ou aminoácidos. Evidências suportando esta hipótese podem ser observadas em uma variedade de modelos experimentais e formas clínicas da síndrome de Fanconi. Já evidências sustentando um papel para alterações na permeabilidade da membrana basal são limitadas. Um defeito no gradiente de sódio da luz tubular para a célula, devido à redução de energia metabólica derivada do ATP, seria o responsável pelos defeitos observados. A síndrome de Fanconi é o resultado de uma variedade de causas, algumas herdadas e algumas adquiridas (v. Quadro 29.2), sendo as mais comuns na criança a cistinose e no adulto a doença de Wilson, o mieloma múltiplo e to-
xinas renais. Uma forma primária de síndrome de Fanconi é o tipo adulto, também observado na criança, que em alguns pacientes evolui para a insuficiência renal crônica em um período de 10 a 30 anos. A maioria das doenças associadas com esta síndrome são herdadas em um padrão autossômico recessivo. A idade de início varia com a etiologia. Algumas das formas herdadas da síndrome de Fanconi, tais como a síndrome de Lowe, o raquitismo dependente de vitamina D e a forma infantil da cistinose, tornam-se evidentes durante o primeiro ano de vida; outras, tais como as formas tardias da cistinose, a doença de Wilson, a galactosemia e a doença de depósito de glicogênio, manifestam-se clinicamente em uma idade mais tardia, usualmente durante a infância. As formas adquiridas podem apresentar-se em qualquer idade, principalmente como resultado da exposição a agentes nocivos. Clinicamente a síndrome de Fanconi se apresenta na criança como raquitismo, ao lado de hipertermia, vômitos, retardo do crescimento e poliúria devido às conseqüências metabólicas da acidose crônica, da hipofosfatemia e da hipocalcemia. No adulto apresentam-se poliúria e síndromes clínicas associadas com hipocalemia e acidose. Osteomalácia e fraturas patológicas podem ser observadas. Menos freqüentemente as razões para a investigação são achados laboratoriais como proteinúria, hipocalemia, hipofosfatemia e acidose metabólica hiperclorêmica. Os achados físicos de algumas formas da síndrome são característicos, como a presença de cristais na córnea na cistinose, enquanto outros são comuns para várias doenças associadas com a síndrome de Fanconi, tais como a hepatomegalia, que pode ser encontrada na glicogenose, galactosemia e tirosinemia. O diagnóstico da síndrome de Fanconi é feito na base de testes que documentam a perda excessiva destas substâncias na urina, na ausência de concentrações plasmáticas elevadas. Testes mais elaborados são realizados para determinar o limiar renal para estas substâncias ou sua reabsorção fracionada. O tratamento na forma primária é dirigido à correção das anormalidades metabólicas de maneira semelhante ao raquitismo ligado ao sexo (v. adiante), incluindo a correção da acidose e a substituição das substâncias perdidas na urina, sendo que as perdas de glicose, aminoácidos e ácido úrico não são usualmente sintomáticas e não requerem substituição. Recentemente, a suplementação de carnitina na tentativa de aumentar a força muscular foi testada, com resultados variados. A acidose pode necessitar de altas doses de alcalinizantes (3,0 a 10,0 mEq/kg/d e mesmo mais), o que pode agravar a perda de potássio. A utilização de dieta hipossódica e hidroclorotiazida (1,0 a 2,0 mg/kg/dia), levando a uma contração do volume do espaço extracelular, pode diminuir a necessidade de álcalis. A suplementação de potássio é uma necessidade existindo hipocalemia, assim como durante a correção da acido-
565
capítulo 30
se metabólica. Nas formas secundárias, além da correção das anormalidades bioquímicas e ácido-básicas existentes, o tratamento da doença básica, quando possível, reverterá as anormalidades presentes. Assim, a eliminação de substâncias como a galactose, a frutose ou a tirosina (e fenilalanina) resulta no desaparecimento das manifestações renais da síndrome. No entretanto, algumas das anormalidades sistêmicas, tais como retardo do crescimento e da fala, assim como a disfunção ovariana na galactosemia ou a cirrose na tirosinemia, não parecem ser afetadas.
GLICOSÚRIA RENAL PRIMÁRIA É uma tubulopatia com excreção de quantidades anormais de glicose na urina, estando os níveis de glicemia normais, constituindo-se em defeito primário isolado, ao contrário da glicosúria, que ocorre em associação com defeitos múltiplos da reabsorção tubular proximal, resultante de inúmeras enfermidades adquiridas e hereditárias, freqüentemente associadas à síndrome de Fanconi. O padrão de herança é autossômico recessivo, embora dominância autossômica e mesmo ambos tenham sido relatados, sendo que os pacientes homozigotos excretam quantidades mais elevadas de glicose que os heterozigotos. A glicose é reabsorvida por um transporte de processo ativo mediado por carreador que é sódio-dependente e eliminada pela membrana basolateral por difusão facilitada por um transportador de glicose que é sódio-independente. O co-transportador de sódio-glicose faz parte do grupo SGLT 2, expresso no segmento S1 do túbulo proximal e localizado no cromossomo 6, e SGLT 1, presente no intestino humano e localizado no cromossomo 22. São descritos atualmente três tipos de glicosúria renal: • Tipo A, chamada glicosúria clássica, com redução tanto no limiar como no Tm da glicose. • Tipo B, com redução no limiar da glicose, taxa de reabsorção normal e elevado splay (perda da linearidade entre carga filtrada e transporte tubular). • Tipo O, caracterizado por uma ausência completa da reabsorção da glicose. Têm sido descritas famílias com glicosúria e uricosúria, na ausência de outros aspectos de disfunção tubular. A etiologia é idiopática, sendo uma condição benigna, detectada usualmente após os 10 anos de idade, que se prolonga por toda a vida. Excepcionalmente na gravidez, jejum prolongado ou grande atividade física, nos raros casos de quantidade extremamente elevada de glicosúria, glicose ou outro carboidrato podem ser necessários para evitar hipoglicemia, cetose ou depleção de volume, secundárias a perdas excessivas de sódio. Certos critérios devem ser obedecidos para a comprovação do diagnóstico: 1. glicosúria sem hiperglicemia;
2. glicosúria independente da dieta; 3. pouca influência da glicemia com a ingestão de carboidratos na alimentação; 4. o açúcar excretado na urina é a glicose e não outro açúcar; 5. a capacidade de armazenamento e utilização da glicose é normal; 6. não ocorre evolução para o diabete melito verdadeiro. O diagnóstico é feito pela presença da glicose em todas as amostras de urina, com glicemia normal, sendo que a excreção pode variar de 5 a 10 g/d e mesmo exceder 100 g/d. Apesar de ser um distúrbio permanente, não requer nenhum tipo de tratamento, a não ser nas condições excepcionais descritas acima. Raramente em crianças pode ocorrer uma má absorção de glicose e galactose, causando, desde o período neonatal, diarréia aquosa, ácida, que pode resultar em depleção grave. A associação de açúcares redutores nas fezes e glicosúria discreta estabelecem o diagnóstico. Estas crianças apresentam um defeito discreto na reabsorção de glicose do tipo B, causada por uma mutação na proteína transportadora a nível de membrana. A remoção da glicose e da galactose da dieta faz desaparecer o quadro clínico.
Pontos-chave: • A glicosúria não associada a outros defeitos do túbulo proximal, com glicemia normal em paciente assintomático, indica o diagnóstico de glicosúria renal primária • A glicosúria renal primária não evolui para o diabete melito
DISFUNÇÃO NO TRANSPORTE DE FOSFATO Além de sua presença predominante no osso (75% a 85%), o fósforo participa de inúmeros processos vitais, sendo o principal ânion intracelular. Sua atuação se dá principalmente no plasma como tampão transportador de energia através das ligações fosfato de alta energia de ATP e permutador molecular através dos processos de fosforilação e desfosforilação. Ao lado da ingesta dietética, o túbulo proximal é o principal sítio para a manutenção dos depósitos corporais de fosfato, principalmente sob influência negativa do PTH. O transporte do fosfato pelo túbulo proximal é influenciado por numerosos fatores hormonais — calcitonina, metabólitos da vitamina D, hormônio tireoidiano, hormônio do crescimento, glicocorticóides, insulina e estrogênio — e por fatores não-hormonais, incluindo glicose, aminoácidos e acidose. O PTH parece reduzir a reabsorção de fosfato através de processos dependentes da geração do AMPc.
566
Tubulopatias Hereditárias
Ponto-chave: • As síndromes incluindo alterações na excreção de fosfato, evoluem com raquitismo e/ou osteomalácia As síndromes fosfatúricas resultando em hipofosfatemia e mineralização deficiente do osteóide causam osteomalácia (mineralização anormal do osso após o fechamento das placas epifisárias) e raquitismo (mineralização anormal no osso em crescimento). Os vários estados clínicos a serem discutidos incluem a osteomalácia hipofosfatêmica oncogênica, cuja discussão, apesar de ela ser uma doença adquirida, é pertinente, pela similaridade com o raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo.
Ponto-chave: • Diagnóstico e tratamento precoces evitam e/ou corrigem crescimento inadequado e deformidades esqueléticas
Raquitismo Hipofosfatêmico Hereditário com Hipercalciúria É uma condição familial incomum, de transmissão autossômica recessiva, sendo a proteína transportadora de sódio-fosfato a possível responsável pelo defeito no transporte do fósforo na membrana apical, que é codificada no cromossomo 5. Apresenta-se com raquitismo e baixa estatura. Existe hipofosfatemia importante, com aumento da depuração renal de fosfato, hipercalciúria, redução do TmPO4/TFG, níveis elevados ou normais de PTH e AMPc, normocalcemia, fosfatase alcalina elevada e aumento da reabsorção intestinal de cálcio e fósforo, sem anormalidades no metabolismo da vitamina D. A patogênese da doença parece estar condicionada à fosfatúria e à conseqüente hipofosfatemia, estimulando a síntese de 1,25(HO)2D3. Esta por sua vez condiciona aumento da absorção intestinal de cálcio e supressão do PTH, com a resultante hipercalciúria. Parentes não afetados podem apresentar anormalidades bioquímicas mínimas, mas com hipercalciúria e, pouco freqüentemente, nefrolitíase, mas sem sinais de doença óssea. A terapêutica isolada com fosfato neutro na forma de solução de Joulie (136 g de fosfato dibásico anidro e 58,5 ml de ácido fosfórico 85% em 1 L de veículo edulcorante aromatizado, 1 ml contendo 3 mg de fósforo elementar), em torno de 1-3 g/d de fósforo elementar para adultos e 10 mg/kg/d para crianças com aumentos para manter a concentração de fosfato sérico acima de 4,5 mg/dl, parece reverter todos os defeitos bioquímicos em um período de seis meses, à exceção do TmPO4/TFG. Estes aumentos devem ser graduais, iniciando com 5 ml de 4/4 horas, sen-
do a dose das 22 h dobrada para permitir um período maior de repouso para a criança. O calcitriol não deve ser adicionado à terapêutica, já que os níveis estão normais ou elevados devidos à hipofosfatemia.
Raquitismo Hipofosfatêmico Ligado ao Sexo (Raquitismo Resistente à Vitamina D, Hipofosfatemia Ligada ao Sexo, Raquitismo Hipofosfatêmico Resistente à Vitamina D) É o distúrbio mais comum no transporte do fósforo, transmitido como uma anomalia ligada ao sexo, de traço dominante, sendo o gen mapeado no braço curto do cromossomo X na região xp22.1. O gen codifica uma proteína que possui semelhanças com a enzima conversora da endotelina, o antígeno Kell, e uma endopeptidase neutra. Daí o gen ser conhecido como PHEX (gen regulador do fosfato com semelhança às endopeptidases no cromossomo X), em que os pacientes homozigotos do sexo masculino são mais gravemente afetados que os heterozigotos do sexo feminino. A função desta proteína parece ser a de ativar um hormônio que promove a retenção de fósforo ou inativar um hormônio fosfatúrico. Este gen se expressa no osso, dentes, células osteoblásticas e provavelmente fígado, mas não no rim, um achado compatível com estudos experimentais que assinalam uma anormalidade extra-renal. Evidências da existência de um hormônio regulador do fosfato, denominado fosfatonina, são baseadas em estudos de pacientes com tumores mesenquimatosos que apresentam osteomalácia oncogênica hipofosfatêmica, com anormalidades metabólicas indistinguíveis daqueles pacientes com raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo. O defeito primário e mais importante é a diminuição da reabsorção tubular proximal de fósforo e diminuição na produção da 1,25(OH)2D3, levando a uma incapacidade, nos indivíduos afetados, em estabelecer uma ossificação normal. Este fenômeno é secundário a uma regulação defeituosa no co-transportador de sódio-fosfato (NPT2) na borda em escova da célula epitelial. Os níveis inadequados de fosfato inorgânico diminuem a função dos osteoblastos maduros (isto é, a ossificação da matriz óssea, porque a formação de osso maduro envolve a precipitação de cristais de apatita). Embora o tratamento com fosfato devesse melhorar o defeito, todas as tentativas falharam. Atualmente se sabe que a suplementação de fosfato inicia uma resposta do PTH à queda do cálcio sérico pelo aumento temporário na mineralização óssea induzida pelo fosfato. Seguindo-se a este aumento, ocorre um retorno imediato à situação inicial, porque o PTH diminui a reabsorção de fosfato no túbulo. Dados recentes sugerem que o hiperparatireoidismo possa ser uma parte da alteração clínica precedendo qualquer terapêu-
567
capítulo 30
tica. Existe também uma diminuição na reabsorção intestinal de cálcio e fósforo, embora sua relação direta com o raquitismo não seja clara. Os primeiros sinais da doença ocorrem entre os 6 e os 12 meses, com retardo do crescimento e deformidades esqueléticas, mais comumente genu varum e genu valgum, quando a criança começa a deambular, com evidências claras de raquitismo nas epífises e nanismo. Sem tratamento precoce e adequado, os sintomas de raquitismo e as deformidades ósseas são máximos na segunda infância, observando-se também alterações dentárias devido à hipoplasia do esmalte e formação espontânea de abscessos, ao lado de dentição tardia. A gravidade do raquitismo é variável de paciente para paciente, e em algumas crianças a doença não é evidente até a idade escolar. Após o fechamento das epífises e parada de crescimento dos ossos, cessa a atividade do raquitismo e a fosfatase alcalina atinge níveis normais ou discretamente elevados. Em alguns adultos o raquitismo pode ser assintomático, enquanto outros apresentam dores ósseas, fadiga e lesões degenerativas sem evidência de osteomalácia (pseudofraturas, osteopenia, fosfatase alcalina elevada). Laboratorialmente, além da hipofosfatemia (inferior 1,8 mg/dl, com valores normais na criança de 4,5 a 8,0 mg/dl e no adulto de 3,0 a 3,5 mg/dl) e diminuição na reabsorção tubular de fósforo, presentes mesmo na ausência de lesões ósseas demonstráveis, os níveis do cálcio estão normais ou discretamente diminuídos, com a 1,25(OH)2D3 normal, apesar da hipofosfatemia, um estimulador potente para a sua elevação. A fosfatase alcalina está geralmente elevada, refletindo a atividade das lesões ósseas, podendo estar normal nos adultos, quando as lesões ósseas se tornam menos evidentes. O PTH se encontra normal ou discretamente elevado. Todos os eletrólitos sanguíneos, assim como as funções glomerular e tubular, à exceção da fosfatúria, estão normais. Existe uma diminuição na reabsorção intestinal do cálcio frente a concentrações plasmáticas normais ou baixas de 1,25(OH)2D3. A ocorrência de glicosúria e aminoacidúria é rara. O regime terapêutico deve permitir a remineralização óssea sem causar hipercalcemia, intoxicação pela vitamina D e deposição metastática de cálcio, inclusive nos rins, ao lado de normalizar os níveis séricos de fósforo. Para a obtenção dos resultados esperados, o tratamento deve ser iniciado precocemente e mantido até o início da vida adulta. Atualmente o melhor tratamento se faz com o uso combinado de calcitriol e fosfato oral. Anteriormente se utilizavam doses altas de vitamina D, que não são úteis nesta patologia pela ausência significativa de atividade da 1-alfahidroxilase. Originalmente se administrava vitamina D entre 25.000 e 50.000 UI/d (no limite inferior da dosagem tóxica), chegando até a 150.000 UI/d, colocando o paciente em risco de episódios de hipercalcemia freqüentes. Estes problemas são diminuídos mas não evitados com o calcitriol, devendo-se iniciar na dose de 50 ng/kg/d, sem
alteração na dose até quatro semanas. Aumentos podem ser feitos em 5 ng/kg/d, não excedendo 65-70 ng/kg/d, observando-se as mesmas doses para crianças. A perda maciça de fosfato urinário é o problema fundamental. Para o adulto, 1-2 g/d de fosfato elementar VO, diluído em 75 ml de água, e para crianças, 10 mg/kg/d, com aumentos sucessivos para manter a concentração de fosfato sérico acima de 4,5 mg/dl (lactentes) e 2,0 mg/dl (crianças), diluídos em 75 ml de água. O amiloride e a hidroclorotiazida são administrados para aumentar a reabsorção de cálcio e reduzir o risco de nefrocalcinose, ou mesmo evitar sua progressão. A ação anticalciúrica dos diuréticos tiazídicos antagoniza a tendência de perda óssea, além de aumentar a concentração de bicarbonato sérico pela contração crônica do volume extracelular, o que é benéfico, já que crianças com esta patologia associada à nefrocalcinose podem apresentarse com acidose metabólica. Para o adulto, dose inicial de 25 mg/d, não excedendo 100 mg/d. Para crianças abaixo de seis meses, doses tão altas como 3 mg/kg/d podem ser necessárias; de seis meses a dois anos, 1-2 mg/kg/d, não excedendo 38 mg/d, e para crianças acima de dois anos, 1-2 mg/kg/d, não excedendo 100 mg/d. O amiloride, para minorar os riscos de hipocalemia dos tiazídicos, é utilizado na dose de 5 mg/d para adultos, não excedendo 20 mg/d, e 0,2 mg/kg/d para crianças, não excedendo 5 mg/d. Este regime permite a retomada do crescimento, com cura do raquitismo e normalização do fósforo. A dose adequada deve ser adaptada individualmente, pelo curso clínico do raquitismo e do desenvolvimento estatural. Os controles devem ser realizados inicialmente a cada semana por 2 a 3 meses para a detecção precoce de possíveis efeitos colaterais e também benéficos do tratamento. Por vezes ocorre hiperparatireoidismo pelo aumento transitório do fósforo com diminuição concomitante do cálcio e conseqüente estimulação da paratireóide. Este efeito pode ser manejado pela diminuição do fósforo ou pela elevação da vitamina D. Por vezes o hiperparatireoidismo secundário progride para o terciário, havendo necessidade de paratireoidectomia subtotal. Com a cura iniciada, que tipicamente ocorre entre 6 a 8 semanas do início do tratamento, a dose é reduzida à medida que a doença se torna menos ativa, o que ocorre na adolescência e na vida adulta. Alguns autores acham necessário o tratamento de adultos, pelas evidências de achados em biópsias ósseas e dados clínicos mínimos como fatigabilidade, dor óssea (não referida às articulações) e intolerância ao ortostatismo.
Osteomalácia Hipofosfatêmica Oncogênica É um raro distúrbio hipofosfatêmico associado a tumores originários do mesênquima, seja de tecidos moles ou de osso.
568
Tubulopatias Hereditárias
Estes tumores produziriam um fator circulante que inibe o transporte de fosfato nas células epiteliais renais, com níveis diminuídos de 1,25 (OH)2D, apesar da hipofosfatemia. Recentemente, o fator 23 de crescimento do fibroblasto foi associado aos tumores causando esta doença, sendo um forte candidato para ser a “fosfatonina”, o fator implicado como o agente causal da fosfatúria em pacientes com osteomalácia hipofosfatêmica oncogênica. Ocorre fraqueza muscular associada a dor óssea, fadiga, deformidades esqueléticas e, em crianças, retardo do crescimento e, dependendo da idade, raquitismo ou osteomalácia. Muito raramente pode estar associada a síndrome de Fanconi. A remoção do tumor leva ao desaparecimento das anormalidades. Se este não é localizado, pode-se tentar a terapêutica com uma combinação de fosfato neutro e 1,25(OH)2D (v. o exposto anteriormente), freqüentemente ineficazes. Esta anomalia pode raramente estar associada à displasia poliostótica fibrosa, neurofibromatose e síndrome do nevo epidérmico.
Raquitismo Tipo I (Deficiência Seletiva Hereditária de 1-␣-25(OH)D) É uma anomalia autossômica recessiva rara, com os achados clínicos de raquitismo iniciando-se entre os 2 e os 24 meses. Ocorre hipocalcemia com níveis elevados de PTH, hiperaminoacidúria, hipofosfatemia e hiperfosfatúria. Estas crianças apresentam níveis muito baixos de 1,25(OH)2D, porém com valores normais de 25(OH), existindo uma incapacidade em produzir calcitriol devido a uma mutação inativadora no gen da 1-hidroxilase. A terapêutica, mantida indefinidamente com doses moderadas de vitamina D (4.000 a 40.000 UI/d) e mesmo maiores, por vezes até 150.000 UI/d, ou doses fisiológicas de calcitriol (0,5 a 1,0 g/d), é curativa e sugere um defeito na enzima mitocondrial da célula tubular proximal.
Raquitismo Tipo II (Resistência Hereditária Generalizada à 1-␣-(OH)D) Apresenta as mesmas características do tipo anterior, sendo de transmissão autossômica recessiva. Alguns pacientes apresentam alopécia e outros defeitos ectodérmicos como oligodontia e erupção cutânea papular. Ao contrário da anomalia anterior, os níveis séricos de 1,25(OH)2D estão acentuadamente elevados. A anormalidade parece estar localizada no receptor intracelular para 1,25(OH)2D, ocorrendo uma resistência do órgão final ao calcitriol, devido a mutações no gen codificando o receptor da vitamina D. Pode ocorrer variação entre famílias, explicando a variação na resposta clínica à 1,25(OH)2D, geralmente utilizada em doses bastante levadas (2,0 a 6,0 g/d), associa-
da às altas doses de cálcio EV a longo prazo. A hipocalcemia acentuada nestes dois tipos de raquitismo permite a diferenciação fácil com as síndromes de raquitismo hipofosfatêmico primário.
Raquitismo Hipofosfatêmico Autossômico Dominante Vários relatos descrevem uma síndrome renal de perda de fosfato com raquitismo ou osteomalácia. O gen tem sido relacionado ao cromossomo 12p13, que codifica um novo membro da família do fator de crescimento do fibroblasto (FGF23), cujas mutações causam fosfatúria e hipofosfatemia. A superprodução do FGF23 é responsável por pelo menos alguns casos de osteomalácia hipofosfatêmica oncogênica. Duas apresentações têm sido observadas, caracterizando-se a primeira com fosfatúria na adolescência e vida adulta, apresentando-se com dor óssea, fraqueza e fraturas, sem deformidades nos membros inferiores e sem evidências radiológicas de raquitismo. Na segunda observamse fosfatúria, raquitismo e deformidades dos membros inferiores nas crianças; alguns deixam de apresentar o defeito fosfatúrico após a puberdade. O tratamento é feito de maneira similar ao exposto anteriormente para as várias formas de raquitismo hipofosfatêmico, na dependência dos achados laboratoriais e clínicos.
Hipercalciúria Idiopática A hipercalciúria idiopática, que é um fator de risco para a formação de litíase renal, é muitas vezes transmitida como um traço autossômico dominante e pode ser devida a um defeito no gen localizado na região 1q23q24. É definida por uma excreção urinária de cálcio nas 24 horas superior a 150 mg na mulher, 200 mg no homem e de 4,0 mg/ kg na criança com menos de 60 kg. Embora alguns autores definam a hipercalciúria na criança com excrecão 2,0 mg/kg/d.Em lactentes abaixo de 3 meses, 5,0 mg/kg é considerado o limite superior da excreção normal. A hipercalciúria idiopática, como o nome indica, não tem etiologia conhecida. Várias teorias têm sido propostas e alguns dados existem para sustentar estas teorias, que ainda não podem ser uniformemente aplicadas a uma grande população de pacientes. Estudos referentes ao balanço metabólico destes pacientes postulam que a perda tubular renal é o resultado de um defeito de mutação em um ou mais canais de íons. Outro mecanismo envolveria um desequilíbrio na deposição e reabsorção de cálcio nos ossos, que é independente do PTH ou vitamina D. A hipercalciúria idiopática é freqüentemente associada com elevação discreta a moderada da concentração plasmática de calcitriol, que seria conseqüente a uma perda de
569
capítulo 30
fosfato urinário, levando a uma discreta diminuição da concentração de fósforo plasmático, que estimularia, então, a síntese de calcitriol, podendo representar um defeito tubular proximal discreto.
Doença de Dent Nas últimas décadas algumas síndromes caracterizadas por várias combinações de disfunção do túbulo proximal, como proteinúria de baixo peso molecular, hipercalciúria, nefrocalcinose, insuficiência renal e raquitismo ou osteomalácia, foram descritas com várias denominações: doença de Dent, nefrolitíase recessiva ligada ao sexo com insuficiência renal, raquitismo hipofosfatêmico recessivo ligado ao sexo e proteinúria de baixo peso molecular com nefrocalcinose. Todas estas síndromes são associadas com mutações no canal do cloreto (C1C5), expresso no túbulo proximal, no ramo ascendente espesso da alça de Henle e nas células intercaladas tipo A dos túbulos coletores e codificado por um gen na posição xp 11.22. O C1C5 está localizado nos endossomos subapicais, envolvidos na captação e degradação de proteínas reabsorvidas, o que explicaria a proteinúria de baixo peso molecular, um achado consistente nos homens afetados e, em menor proporção, nos portadores femininos. Um quadro similar de hipercalciúria, nefrocalcinose e nefrolitíase tem sido descrito com hipomagnesiemia no lugar da hipofosfatemia. Esta síndrome resulta de mutações na proteína da junção estreita, a paracelina-1, que aparentemente medeia a reabsorção paracelular de cátions no ramo ascendente espesso da alça de Henle. A razão pela qual diferentes mutações produzem quadros fenotipicamente similares mas não idênticos não está clara, descrevendo-se dezenas de diferentes tipos de mutação no C1C5. Com relação ao quadro clínico, proteinúria de baixo peso molecular, hipercalciúria e hematúria, além de defeito de concentração, aminoacidúria e nefrocalcinose, são os achados mais freqüentes, e com menor incidência, mas em percentagem significativa, observam-se insuficiência renal, glicosúria, hipofosfatemia, nefrolitíase, raquitismo ou osteomalácia, hipocalemia e defeitos de acidificação. Laboratorialmente, o cálcio sérico é normal, com níveis normais ou baixos de PTH e calcitriol sérico normal ou discretamente elevado. A evolução para a insuficiência renal, entre os 30 e os 40 anos, observada em 2/3 dos pacientes a partir da adolescência, não mostra uma correlação consistente com a presença ou severidade da nefrocalcinose. Poderia estar relacionada ao desenvolvimento de esclerose glomerular ou possivelmente à presença, no túbulo, de hormônios bioativos de proteínas de baixo peso molecular, fatores de crescimento e citocinas. O tratamento é dirigido à normalização da calciúria e à melhora da doença óssea. A restrição de sódio (a ingesta aumentada promove a excreção de cálcio), associada a diuréticos tiazídicos (que promovem a reabsorção de cálcio no túbulo contornado distal), é o tratamento a ser ins-
tituído. Não se deve restringir o cálcio da alimentação, o que aumenta o risco da doença, e na população geral a baixa ingestão de cálcio está associada a incidência aumentada de litíase renal. Melhora da doença óssea tem sido relatada com fosfato VO e suplementação com vitamina D. Nos pacientes transplantados não existem registros de recorrência.
Pseudo-hipoparatireoidismo O pseudo-hipoparatireoidismo (PHP) é um distúrbio causado por hipocalcemia e hiperfosfatemia, apesar dos níveis elevados de PTH, configurando-se uma falta de resposta do órgão efetor, o rim, às ações deste hormônio. Estas se referem à homeostase do fósforo e do cálcio e à regulação da vitamina D. Assim, o resultado observado é: 1. retenção de fosfato e hiperfosfatemia conseqüente à deficiente excreção renal; 2. homeostase defeituosa do cálcio, incluindo fluxo inadequado de cálcio do osso para o fluido extracelular, má absorção intestinal e perda renal com hipocalcemia; e 3. diminuição da 1-hidroxilação de vitamina D. Dois tipos de PHP são descritos, assim como o pseudopseudo-hipoparatireoidismo (PPHP), e o gen codificando a proteína estimuladora Gs-alfa-1 do complexo adenilciclase (GNAS1) parece estar envolvido em todos os casos. O PHP tipo 1, mais freqüente, caracteriza-se pela produção deficiente ou ausência de excreção de AMPc após infusão do PTH. Os subtipos 1a e 1b apresentam, respectivamente, atividade normal e aparentemente normal, dependendo da função da proteína GsA. Como esta proteína está relacionada ao acoplamento de vários hormônios à adenilciclase, estes pacientes apresentam resposta alterada a alguns hormônios e são associados à resistência aos hormônios luteinizante, folículo-estimulante e TSH, sendo que os indivíduos afetados apresentam o fenótipo da osteodistrofia de Albright (FOA). O tipo 2 resulta de uma incapacidade do AMPc intracelular em iniciar as ações normais do PTH, apesar de sua elevação após a administração deste hormônio. O padrão de herança ainda é obscuro, dada à heterogeneidade típica da doença, mas aponta-se para uma herança autossômica dominante para o tipo 1a, desconhecendose o modo de transmissão dos tipos 1b e 2, com transmissão complexa. O início do quadro clínico está em torno dos oito anos. Dadas as ações do PTH, o quadro clínico se caracteriza por várias anomalias do desenvolvimento e distúrbios esqueléticos, fácies arredondada, baixa estatura, bradidactilia, calcificações ectópicas e anormalidades ectodérmicas, ao lado de algum grau de retardo mental. Pelas similaridades com o hipoparatireoidismo, este distúrbio recebeu o nome de PHP. Posteriormente se descreveram pacientes com o fenótipo de PHP tipo 1a, mas sem as anormalidades bioquímicas características, denominado PPHP, com FOA. Os dois
570
Tubulopatias Hereditárias
quadros podem estar presentes na mesma família e pesquisas recentes sugerem que o PHP e o PPHP são manifestações da fixação do defeito da proteína estimuladora localizada no braço do cromossomo 20q. O PPHP surge quando o defeito é herdado do pai e o PHP, quando herdado da mãe. A maioria dos sintomas deve-se à excitabilidade neuromuscular aumentada resultante da hipocalcemia, sendo as convulsões a manifestação que mais chama a atenção. O retardo mental é comum no tipo 1, não se sabendo se secundário à hipocalcemia ou a um defeito genético. Alterações mentais agudas como depressão, psicose, paranóia e demência têm sido relatadas, assim como a catarata subcapsular. Hipoplasia do esmalte e calcificações dos tecidos moles são achados comuns. Algum grau de alteração óssea, por vezes com desmineralização intensa e ocasionalmente raquitismo ou osteomalácia, é observado. Mais recentemente, diminuição da olfação e da capacidade para o gosto de substâncias ácidas e amargas foi relatada na maioria dos pacientes com o tipo 1, assim como anormalidades dermatoglíficas.
DISFUNÇÃO NO TRANSPORTE RENAL DE SÓDIO, POTÁSSIO, MAGNÉSIO E CÁLCIO Pseudo-hipoaldosteronismo Tipo 1 e Tipo 2 Ver Acidose tubular renal distal tipo 4.
Síndrome de Bartter É caracterizada por hipocalemia com alcalose metabólica, hiperaldosteronismo hiper-reninêmico com níveis tensionais diminuídos ou normais, sensibilidade diminuída à ação pressora da angiotensina II, aumento da produção de prostaglandina (PGE2) no sangue e na urina, além de níveis urinários elevados de calicreína e aumento dos níveis de bradicinina sérica e PGI1 circulante. Associa-se a uma nefropatia perdedora de sódio, cloro e potássio, com diminuição da capacidade de concentração e acidificação. Menos freqüentemente se observam hipomagnesiemia, hiperuricemia, hipercalciúria, síndrome de Fanconi, acidose tubular distal e nefrocalcinose. Mais raramente podem ser observadas policitemia e hipofosfatemia. Avanços recentes no diagnóstico molecular revelaram que a síndrome de Bartter é a expressão de uma de três entidades clínicas: síndrome de Bartter antenatal ou neonatal, também chamada de síndrome da hiperprostaglandina E, caracterizada por hipercalciúria, poliidrâmnio, prematuridade e desidratação ao nascimento, com dois genótipos identificados; a síndrome de Bartter clássica, que se apresenta em crianças freqüentemente como falha no crescimento; e uma variante com hipocalciúria-hipomagnesi-
emia, conhecida como síndrome de Gitelman, que freqüentemente se apresenta em adultos, constituindo-se em uma forma mais discreta da síndrome de Bartter, usualmente diagnosticada durante investigação de rotina. O padrão de herança para estas variantes tem sido relatado como autossômico recessivo, embora muitos casos pareçam ser esporádicos. Dados clínicos atuais sugerem que a síndrome de Bartter resulta de transporte transepitelial defeituoso no ramo ascendente espesso da alça de Henle. Os gens codificando as várias proteínas no ramo ascendente espesso foram clonados. No subgrupo de pacientes com síndrome de Bartter antenatal ou neonatal foram identificados dois genótipos. O tipo I resulta de mutações no gen co-transportador do sódio-cloro potássio-cloro (transportador sódio-cloro potássio-cloro sensível à bumetanide — NKCC2), e no tipo II no canal específico do potássio, na membrana apical, regulado pelo ATP (ROMK) e no canal do cloro específico do rim (ClC-Kb). Na síndrome de Bartter clássica o defeito na reabsorção de sódio parece resultar de mutações no gen do canal de cloro específico do rim, e na síndrome de Gitelman o defeito estaria no transportador de sódio-cloro sensível à tiazida (NCCT). Estes defeitos levariam a um estímulo na produção de renina e aldosterona pela contração do volume plasmático e liberação de cloreto de sódio em maior quantidade para o túbulo distal, explicando a hipocalemia na presença de hiperaldosteronismo, sendo que a hipocalemia estimularia a produção de PGE2, que teoricamente diminuiria ainda mais a reabsorção de cloreto. Além do mais, a deficiência de potássio seria a responsável pelas anormalidades relacionadas à bradicinina, calicreína e resposta pressora. As manifestações clínicas são predominantemente dependentes da hipocalemia. Os sinais e sintomas podem ocorrer logo após o nascimento, variando desde a infância até os 25 anos. Em lactentes e crianças pequenas observase retardo do crescimento, anorexia, obstipação, poliúria e polidipsia, e em crianças maiores, fraqueza muscular, inclusive tetania e paralisia. O retardo mental e a insuficiência renal crônica são incomuns. Foi relatada recentemente uma possível associação entre a síndrome de Bartter e a glomeruloesclerose segmentar e focal, que poderia explicar os relatos de insuficiência renal crônica pela estimulação do sistema renina-angiotensina-aldosterona levando a alterações escleróticas nos glomérulos, talvez dependentes da duração da doença e da hipocalemia, com a conseqüente atrofia tubular e fibrose intersticial.
Ponto-chave:
•
As mutações nos gens que codificam as várias proteínas transportadoras de eletrólitos (sódio, potássio, cloreto, cálcio e possivelmente magnésio) se expressam em vários segmentos do nefro
571
capítulo 30
Laboratorialmente, a alcalose metabólica é a anormalidade bioquímica predominante, acompanhada das alterações metabólicas plasmáticas e urinárias já citadas, embora, à exceção da caliúria, as outras anormalidades nem sempre estejam presentes. Defeitos de concentração e diluição são muito freqüentes, assim como a incapacidade em diminuir o pH urinário com a sobrecarga de NH4Cl. Um achado importante mas não fundamental é a hiperplasia do aparelho justaglomerular. O defeito tubular nestas síndromes não pode ser corrigido. Assim, o tratamento (para toda a vida) deve minimizar os efeitos da elevação na produção de prostaglandina e aldosterona. A hipocalemia é a preocupação terapêutica fundamental. O tratamento com suplementação de potássio (4,0-6,0 mEq/kg/d, 2-3/d e mesmo mais, para as crianças, e 50-100 mEq/d para o adulto) e magnésio (existindo hipomagnesiemia), associado a diuréticos poupadores de potássio como a espironolactona (2,0-4,0 mg/kg/d e 100,0-200,0 mg/d, para crianças e adultos, 2/d, respectivamente) ou triantereno (10,0 mg/kg/d), raramente resultam na normalização permanente das alterações laboratoriais e clínicas. Atualmente, os inibidores da produção de prostaglandinas têm sido relativamente eficazes no tratamento desta síndrome. A indometacina parece ser mais eficaz (embora de curta duração se utilizada isoladamente), na dose de 2,0 a 5,0 mg/kg/d, 3-4/d para crianças, e 25,0-50,0 mg/kg/d, 2-4/d para adultos, associada ou não à espironolactona. O ibuprofen (25,0 mg/kg/d, 3-4/d para crianças e 400,0-800,0 mg/dose, 3/d para adultos) parece ser uma alternativa útil. Recentemente, a utilização de inibidores da enzima de conversão da angiotensina, que diminui a produção de angiotensina II e aldosterona, foi relatada, com normalização de calemia a médio e longo prazos, embora alguns estudos não tenham observado os mesmos resultados.
Síndrome de Liddle A síndrome de Liddle é um raro distúrbio autossômico dominante, caracterizada por hipertensão precoce e freqüentemente severa, associada a hipocalemia e alcalose metabólica, atividade diminuída da renina plasmática e secreção suprimida da aldosterona. Esta anomalia se origina de uma mutação por ganho de função nas subunidades beta (símbolo genético SCNN1B) ou gama (símbolo genético SCNN1G) no canal epitelial do sódio no ducto coletor. O canal se comporta como se estivesse permanentemente aberto, e a reabsorção desordenada de sódio resulta em expansão do volume, inibição da secreção de renina e aldosterona e, em muitos casos, de potássio. A falta de regulação diminuída da atividade dos canais epiteliais de sódio pode estar na origem das formas mais comuns de hipertensão hiporreninêmica. O diagnóstico é estabelecido com os dados da tríade citada e o achado consistente da diminuição da excreção
urinária de aldosterona. Recentemente, a medida da diferença de potencial transnasal foi a primeira demonstração in vivo da atividade aumentada do canal de sódio na síndrome de Liddle e deve fornecer um teste clínico simples para o diagnóstico deste distúrbio. A terapêutica se baseia na utilização de amiloride e triantereno, antagonistas do canal epitelial do sódio no túbulo distal e na restrição sódica. A espironolactona não é indicada, já que o aumento da atividade do canal do sódio não é mediado pela aldosterona.
Mutações Afetando o Receptor Extracelular Sensível ao Cálcio Uma síndrome com hipercalcemia familial benigna associada à hipocalciúria foi descrita em 1972, sendo conhecida como hipercalcemia hipocalciúrica benigna, com hipermagnesiemia discreta e concentrações séricas de PTH normais ou discretamente elevadas, com transmissão autossômica dominante e alta penetrância. Em alguns lactentes nascidos de pais consangüíneos com hipercalcemia hipocalciúrica familial, desenvolve-se logo após o nascimento um hiperparatireoidismo severo, com hipercalcemia acentuada, déficit de crescimento, osteopenia e múltiplas fraturas. Posteriormente foi identificado o receptor extracelular do cálcio (CaR), um membro da família dos receptores acoplados à proteína G, expresso nas glândulas paratireóides, no rim e em outros órgãos. Naquelas, o CaR medeia a supressão extracelular da liberação do PTH pelo cálcio. No rim, o CaR é expresso na superfície basolateral das células do ramo ascendente espesso, na superfície luminal das células do ducto coletor papilar e em outros segmentos do nefro. Nestes locais, a hipercalcemia inibe a reabsorção de cloreto de sódio, cálcio e magnésio no ramo ascendente espesso e inibe o efeito hidrosmótico da vasopressina no ducto coletor. Evidências mostram que a ativação induzida pelo cálcio no CaR dificulta a capacidade de concentração. Agudamente, a redução mediada pelo CaR na capacidade de concentração permite a excreção aumentada no cálcio, enquanto minimiza o risco de cristalização dos sais de cálcio e a possível litíase. Cronicamente, pode ser responsável pelo diabete insípido nefrogênico associado com hipercalciúria familial na mesma região do cromossomo 3, igualmente em relação ao gen para o CaR, reforçando evidências de um papel potencial deste gen como causa desta patologia e do hiperparatireoidismo neonatal severo. Posteriormente, inúmeras mutações para o CaR foram descritas, associadas a perda (inativação) ou ganho (ativação) de função. As mutações com perda de função regulam a liberação do PTH e aumentam a absorção renal de cálcio. Pacientes com hipercalcemia hipocalciúrica familial autossômica dominante são heterozigotos para as mutações com perda de função do CaR. Alguns pacientes, no
572
Tubulopatias Hereditárias
entretanto, não apresentam defeitos no CaR. Em compensação, mutações com ganho de função do CaR dificultam a liberação fisiológica do PTH e diminuem a reabsorção urinária do cálcio. Estes pacientes apresentam hipocalcemia, com níveis de PTH normais ou baixos e excreção urinária de cálcio normal ou alta. Alguns desenvolvem nefrocalcinose e diminuição da função renal, com modo de transmissão autossômico dominante. O tratamento destas condições depende da severidade do fenótipo. Pacientes com hipercalcemia hipocalciúrica familial são usualmente assintomáticos e não requerem tratamento. Já os homozigotos para mutações com ganho de função requerem terapêutica para o hiperparatireoidismo severo, podendo ser necessária a paratireoidectomia nesses recém-nascidos. Em pacientes com mutações com ganho de função, portanto com hipercalcemia e hipercalciúria, o tratamento com diuréticos tiazídicos pode diminuir as perdas renais de cálcio. O tratamento com vitamina D ou suplementação de cálcio deve ser evitado, já que ambos aumentam a perda renal de cálcio e o risco de nefrocalcinose.
DIABETE INSÍPIDO NEFROGÊNICO O diabete insípido nefrogênico (DIN) congênito é uma doença rara, na qual a produção de arginina-vasopressina (hormônio antidiurético — HAD) é normal, ocorrendo uma insensibilidade das células dos ductos coletores ao hormônio com incapacidade em graus variáveis na reabsorção de água, acarretando poliúria e suas conseqüências. A doença se transmite mais freqüentemente como uma anomalia ligada ao sexo. As mulheres transmissoras são sadias e unicamente seus filhos são afetados, apresentandose por vezes poliúrias, embora em menor intensidade que os homens, respondendo parcialmente à vasopressina. A doença é causada por mutações no gen receptor V2 da arginina-vasopressina. Mutações no gen do canal da água, a aquaporina 2, são responsáveis pelas raras formas autossômicas recessivas e as raras dominantes, que atingem crianças de ambos os sexos. A descoberta de que mutações no gen da vasopressina-neurofisina II são responsáveis pela forma familial ou autossômica dominante do DIN oferece um mecanismo para identificar os membros assintomáticos de famílias afetadas que possuem o alelo suspeito. O início da doença manifesta-se logo após o nascimento, com irritabilidade, retardo do crescimento, febre recorrente (normalizada com a oferta de líquidos), vômitos, obstipação e episódios repetidos de depleção com hipertermia e hipostenúria. Inicialmente a poliúria e a polidipsia podem não ser aparentes, e se o estado de hidratação é adequado, a doença pode passar despercebida, sendo uma história familial uma boa orientação para o diagnóstico. O
retardo mental por lesão do SNC dependente dos vários episódios de depleção com hipertermia é comum. A bexiga nestes pacientes está freqüentemente aumentada presumivelmente secundária à poliúria persistente, podendo também ocorrer dilatação ureteral e mesmo hidronefrose na ausência de qualquer lesão obstrutiva. Nas crianças em torno dos 3 a 4 anos, a doença se resume a sede, poliúria e crescimento lento. A poliúria, em sua forma discreta, é relativamente comum, já que a maioria dos pacientes idosos ou com nefropatia subjacente apresentam uma redução na capacidade de concentração máxima. Este defeito, no entanto, não é importante o suficiente para produzir um aumento sintomático no débito urinário. A poliúria verdadeira, devido à resistência ao HAD, é observada primariamente em três situações: 1. DIN congênito na criança; 2. uso crônico de lítio; 3. hipercalcemia.
Pontos-chave: • A hipostenúria é o único achado laboratorial específico • Sódio plasmático baixo ( 137,0 mEq/L) usualmente indica polidipsia primária, e concentração plasmática normal/alta ( 142,0 mEq/L), diabete insípido O diagnóstico correto muitas vezes é sugerido tanto pela concentração de sódio plasmático como pela história. Assim, uma concentração de sódio plasmático baixa (inferior a 137 mEq/L devido à sobrecarga de água) é usualmente indicativo de polidipsia primária, enquanto uma concentração normal-alta (superior a 142 mEq/L devido à perda de água) indica diabete insípido. Hipernatremia acentuada não é vista habitualmente no DIN, porque a perda inicial de água estimula o mecanismo da sede para contrabalançar as perdas urinárias. Quanto ao dado de início da poliúria, esta é usualmente abrupta no diabete insípido central, mas gradual no DIN ou polidipsia primária. Com relação aos exames laboratoriais, é importante lembrar que a hipostenúria é o único achado laboratorial específico. Anormalidades plasmáticas como hipernatremia, hipercloremia e acidose metabólica são conseqüentes à depleção. Assim, hipostenúria com depleção hipernatrêmica deve sugerir o diagnóstico. O DIN deve ser diferenciado de duas outras condições: diabete insípido hipotalâmico e polidipsia primária. Para esta diferenciação os testes mais utilizados são a comparação das osmolaridades urinária e plasmática, normalmente realizada após privação de líquidos por 7 horas (o que deve ser evitado em pacientes com poliúria acentuada pelo risco de depleção de volume e hipernatremia, podendo este período ser di-
573
capítulo 30
Um possível método futuro para confirmar os resultados do teste de restrição hídrica é medir a excreção urinária de aquaporina 2. Nas pessoas normais sua concentração seria várias vezes maior comparada àquelas com DI central durante ingestão hídrica normal e após infusão de solução salina hipertônica, e também após a administração de ADH em pacientes normais e naqueles com DI central, mas sem elevação em pacientes com DIN. O mecanismo preciso da insensibilidade renal ao efeito antidiurético da vasopressina é controverso, já que o defeito genético envolve um número de diferentes mutações (ou deleções) no gen do receptor V2. No diagnóstico diferencial devem ser afastadas condições nas quais existe poliúria (v. Quadro 30.4).
Quadro 30.2 Etiologia da síndrome de Fanconi Herdada Idiopática Cistinose Doença de Wilson Síndrome de Lowe Galactosemia Tirosinemia Intolerância hereditária à frutose Adquirida Envenenamento com metais pesados: chumbo, cádmio, mercúrio, urânio Drogas: antibióticos (tetraciclina vencida, gentamicina, cefalosporina), estreptozotocina, cisplatina, azatioprina, ifosfamida Químicos: ácido maléico, nitrobenzeno, lisol Malignidade: mieloma múltiplo, gamopatias monoclonais, tumores mesenquimais Hiperparatireoidismo, deficiência de vitamina D Nefropatias: síndrome nefrótica (esclerose segmentar e focal), transplante renal, doença cística medular, nefropatia dos Balcãs Miscelânea: proteinúria de cadeia leve, amiloidose, síndrome de Sjögren, inalação de cola
Ponto-chave: • A poliúria é usualmente abrupta no diabete insípido central e gradual no diabete insípido nefrogênico ou polidipsia primária
minuído para 2 a 3 horas antes do início do teste) e após administração de vasopressina exógena, como se vê no Quadro 30.3. Alguns poucos pacientes com as formas central e nefrogênica podem apresentar um defeito apenas parcial na secreção ou ação da vasopressina plasmática, portanto com capacidade razoável de concentração após teste de privação. Nestes casos pode haver necessidade da dosagem da vasopressina plasmática, correlacionada às osmolaridades urinária e plasmática para estabelecer o diagnóstico correto. No diabete insípido central completo, os testes revelam atividade e níveis mínimos de ADH, com falha da urina em concentrar, apesar do soro excessivamente concentrado. Em resposta à vasopressina exógena, a osmolaridade urinária aumenta em mais de 50%. Já nos pacientes com DIN o nível de ADH é normal a elevado e ocorre falha em responder ao HAD exógeno durante o teste de privação de água. Outros achados laboratoriais podem ser a hipernatremia, por vezes grave, a hipercloremia e uréia e creatinina elevadas, que, conseqüentes à depleção, são reversíveis com hidratação adequada.
A substituição das perdas urinárias de água por suprimento adequado de líquidos é o componente mais importante da terapêutica, o que se torna muito difícil para a maioria dos lactentes. Uma maneira de reduzir a carga osmótica do regime alimentar é a dieta baixa em proteína (2 g/kg/d, com acompanhamento estrito, se implementada), podendo acarretar deficiências nutricionais e em sódio (1 mmol/kg/d). Prover para os lactentes dieta com leite materno para diminuir a carga de soluto. A proteína deve compreender 6% da ingesta calórica e o sódio deve ser reduzido para 0,7 mEq/kg/d. Para crianças jovens, prover 8% de ingesta calórica como proteína para permitir o crescimento normal, mantendo a ingesta de sódio em 0,7 mEq/ kg/d. Este manejo é raramente necessário no adulto, já que a depleção é evitada pelo acesso livre à água. À medida que a criança cresce, ela regulará sua própria ingestão de líquidos, como ocorre com o adulto. Além dos cuidados para evitar a desidratação, várias combinações de drogas podem ser utilizadas para diminuir a perda renal de água. A clorotiazida (10,0 a 30,0 mg/kg/d) ou a hidroclorotiazida (2,0 a 4,0 mg/kg/d), não excedendo 37,5 mg/d e 100,0 mg/d para crianças abaixo e acima de dois anos, respectivamen-
Quadro 30.3 Testes diagnósticos em pacientes com poliúria
Osmolaridade plasmática Osmolaridade U/P após restrição Aumento na osmolaridade urinária após vasopressina
Diabete insípido central
Poliúria primária
Diabete insípido nefrogênico
290 1 100
280 1 50
290 1 50
574
Tubulopatias Hereditárias
Quadro 30.4 Distúrbios associados com ATR-2 ATR isolada Primária Hereditária Esporádica ATR generalizada Primária (esporádica ou familiar) Erros inatos do metabolismo Cistinose Síndrome de Lowe Intolerância hereditária à frutose Tirosinemia Galactosemia Doença de Wilson Deficiência de piruvato carboxilase Leucodistrofia metacromática Glicogenose Estados disproteinêmicos Mieloma múltiplo Doença da cadeia leve Gamopatia monoclonal Amiloidose Deficiência, dependência ou resistência de vitamina D Nefropatias intersticiais Síndrome de Sjögren Doença medular cística Rejeição de transplante renal (precoce) Nefropatia dos Bálcãs Trombose crônica de veia renal Toxinas Tetraciclina vencida Chumbo Gentamicina Cádmio Ácido maléico Mercúrio Cumarínico Estreptozotocina Miscelânea Síndrome nefrótica Hemoglobinúria paroxística noturna Câncer Cardiopatia congênita
te, e para o adulto 25,0 a 50,0 mg/d, associados à dieta hipossódica, podem ser utilizadas na tentativa de reduzir o volume urinário pela redução do volume plasmático. Este regime pode ser utilizado por um período de 12 a 24 meses, suplementado com cloreto de potássio, até que o paciente mostre melhora espontânea com a idade. O ácido etacrínico e a espironolactona produzem efeitos similares e menos efeitos colaterais, assim como a associação amiloride (20,0 mg/1,73 m2/d) para crianças 2 a 3 /d e 5 a 10,0 mg/d para adulto e hidroclorotiazida. Os inibidores da produção das prostaglandinas como o AAS (30,0 a 100,0 mg/ kg/d) e a indometacina (2,0 mg/kg/d), associados ou não aos tiazídicos, também são agentes terapêuticos eficazes. Como a maioria dos pacientes com DIN apresentam resis-
tência parcial mais que completa ao HAD, é possível que alcançando níveis suprafisiológicos de hormônio possa ocorrer em aumento do efeito renal do hormônio para um grau clinicamente importante, fato já comprovado, embora em somente dois estudos. Assim, pode ser associado o dDAVP em pacientes com poliúria sintomática persistente após a implementação do esquema terapêutico acima. A utilização de qualquer destas drogas requer do médico cuidados adequados com relação aos possíveis efeitos colaterais, principalmente com os inibidores da síntese das prostaglandinas. Os episódios de depleção com hipernatremia devem ser manejados com soluções salinas hipotônicas, já que as soluções com dextrose produzem glicosúria, aumentando a excreção de água livre e agravando a depleção.
ACIDOSE TUBULAR RENAL A acidose tubular renal (ATR) é uma síndrome clínica caracterizada por acidose hiperclorêmica, com anion gap normal, secundária a uma anormalidade na acidificação renal. É uma condição na qual a função glomerular é normal ou comparativamente menos lesada que a função tubular. A acidificação renal ocorre se: 1. o túbulo proximal absorve quantidades adequadas de bicarbonato filtrado; 2. o túbulo distal responde a quantidades adequadas de aldosterona; 3. a capacidade intrínseca dos túbulos coletores para estabelecer um gradiente de íons H entre o sangue e o fluido peritubular está intacta e não é sobrepujada por quantidades excessivas de bicarbonato que escapam à reabsorção tubular proximal; 4. quantidades adequadas de sódio e tampão urinário estão presentes para manter a secreção de íons H e 5. a geração de amônia é normal. Existem três tipos de ATR: tipo 2 (proximal), tipo 1 (distal, clássica, síndrome de Buttler-Albright, forma adulta ou persistente), e tipo 4 (distal hipercalêmica).
Acidose Tubular Renal Proximal (Tipo 2) A acidose hiperclorêmica resulta de uma diminuição do limiar renal para o bicarbonato, durante acidose discreta ou moderada, causada pela reabsorção incompleta no túbulo proximal. À medida que a concentração de bicarbonato diminui, a carga filtrada diminui a um nível que o túbulo defeituoso pode reabsorver. Assim, a urina está isenta de bicarbonato e tem um pH ácido apropriado. Geralmente entre níveis plasmáticos de 15 e 18 mEq/L, o nefro distal pode adaptar-se à oferta proveniente do tú-
capítulo 30
bulo proximal, reabsorvendo totalmente o excesso. Assim, a bicarbonatúria desaparece, o pH urinário pode ser reduzido normalmente até 5,5 e a excreção de ácido é equivalente à sua produção endógena, o que sugere que o túbulo distal está intacto. No tipo primário, raro, ocorre perda isolada de bicarbonato, e no secundário, muito mais freqüente, coexistem outros defeitos da função tubular proximal, como glicosúria, aminoacidúria, fosfatúria, uricosúria, citratúria, lisozimúria e imunoglobinúria de cadeia leve, configurando a síndrome de Fanconi (v. Quadro 30.4). O defeito isolado de acidificação pode ser o resultado de: (1) disfunção seletiva na troca de Na/H, responsável pela secreção de H ; (2) anormalidades do co-transportador para o Na(HCO3)3; (3) atenuação do gradiente de concentração de Na da luz para a célula, normalmente mantida pela ATPase Na-K-dependente; e (4) inibição, deficiência ou alteração da atividade da anidrase carbônica. A capacidade em diminuir o PH urinário e excretar quantidades adequadas de acidez titulável e amônia explica a ausência de alterações secundárias encontradas na ATR tipo 1, como hipercalciúria, nefrocalcinose e nefrolitíase. No tipo primário não existem evidências para a transmissão genética do defeito ao nível do túbulo proximal, e a doença é usualmente autolimitada, desaparecendo na infância. A ATR tipo 2 ocorre esporadicamente, embora uma forma herdada tenha sido descrita recentemente. Mutações homozigóticas no co-transportador apical do Na/3HCO3 foram encontradas em duas famílias com ATP proximal, queratopatia, glaucoma e catarata. Uma forma de osteopetrose com retardo mental é associada com uma forma mista de ATR com características das formas proximal e distal (chamada tipo 3). O defeito misto é relacionado com a deficiência de anidrase carbônica (isoforma II da anidrase carbônica) normalmente encontrada no citosol das células tubulares proximais e células intercaladas no ducto coletor. Coexistindo outros defeitos ao nível do túbulo proximal, admite-se que este tipo possa ocorrer esporadicamente ou como uma forma incompleta de uma síndrome de Fanconi posterior. A forma mais comum de ATR tipo 2 no adulto é associada ao uso de inibidores da anidrase carbônica. Déficit de crescimento causado pelo estado de acidose persistente é praticamente a única manifestação clínica observada. Se não diagnosticada a tempo, a acidose evolui com anorexia, desnutrição e depleção do volume extracelular causada pela reabsorção diminuída de bicarbonato de sódio, com estimulação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, acarretando hipercalciúria e hipocalemia. Também dependentes da hipocalemia podem ser observadas fraqueza muscular, poliúria e polidipsia. Distúrbios do metabolismo do cálcio, fósforo, PTH e da vitamina D podem ocorrer, mas são raros e observados naqueles pacientes com ingesta inadequada de vitamina D ou cálcio. Os exames laboratoriais evidenciam uma acidose hi-
575
perclorêmica com anion gap normal, na ausência de alteração glomerular. Estes pacientes apresentam uma excreção fracionada de HCO3 inferior a 3% quando o bicarbonato é baixo. A perda urinária de 15% ou mais da quantidade de bicarbonato filtrado é patognomônica de ATR proximal. A determinação da acidez titulável e da amônia está normal ou diminuída, assim como é normal a capacidade de acidificar a urina, embora possa ocorrer urina alcalina, quando a quantidade de bicarbonato perdida é muito grande. Os exames realizados para o diagnóstico de ATR tipo 2 compreendem o teste de sobrecarga de bicarbonato, evidenciando uma excreção fracionada elevada, superior a 15%, com níveis de bicarbonato plasmático acima do seu limiar e próximos do normal, e a sobrecarga de cloreto de amônio, onde o pH diminui para menos de 5,5. Um dado que pode ser utilizado como um parâmetro deste tipo de acidose é a necessidade de quantidades maciças de bicarbonato para a sua correção. Um teste de triagem útil e fácil de ser realizado é a determinação do pH urinário da primeira micção da manhã, que, sendo igual ou inferior a 5,5, praticamente afasta a possibilidade de ATR tipo 1. O tratamento por vezes não é necessário, mas quando a acidose é intensa, a terapêutica deve compensar uma grande perda de bicarbonato para manter os níveis plasmáticos normais. Pacientes adultos devem receber a quantidade necessária para tamponar a carga ácida diária da dieta, o que usualmente é alcançado com uma dose de 1-3 mEq/ kg/d, para manter o bicarbonato sérico acima de 20 mEq/ L. Na criança, doses de até 4 a 10 mEq/kg/d e mesmo superiores podem ser necessárias para esta normalização. Em alguns pacientes a depleção de volume extracelular é comum, levando a um estado de hiperaldosteronismo que estimula a secreção de potássio pelo túbulo distal, o que, associado à presença neste local de grandes quantidades de bicarbonato, leva à perda obrigatória deste íon, trocado pelo sódio. Este fato deve ser levado em consideração na estratégia da terapêutica alcalina, que deve conter quantidades suficientes de potássio para a manutenção dos níveis normais. Se a perda de bicarbonato é muito grande, a utilização de hidroclorotiazida (2,0 a 4,0 mg/kg/d) juntamente com a restrição sódica, reduzindo o volume do fluido extracelular e aumentando a reabsorção de bicarbonato, diminui a dose requerida de alcalinizante. Isto pode agravar as perdas de potássio, sendo comum a necessidade de suplementação, podendo-se utilizar as formulações com citrato, lactato ou acetato de potássio, com a correção conjunta da acidose. Existindo evidências de deficiência de vitamina D, freqüente no tipo secundário, deve-se instituir o tratamento adequado.
Acidose Tubular Renal Distal (Tipo 1) Aqui, o defeito básico consiste na incapacidade em estabelecer gradientes adequados de íons H secretados pelas células intercaladas tipo A do ducto coletor, entre o
576
Tubulopatias Hereditárias
sangue e o fluido tubular, apesar dos baixos níveis de bicarbonato plasmático. A incapacidade em diminuir o pH urinário persistente abaixo de 5,3 é a alteração mais característica. O pH urinário é inapropriadamente alto tanto com acidose discreta como intensa, usualmente superior a 6,0, com excreção persistente de bicarbonato. Nos lactentes e crianças, ao contrário do que ocorre no adulto, a quantidade de bicarbonato excretada é consideravelmente maior, variando de 5 a 10%, enquanto no adulto é usualmente inferior a 5%. Estas crianças apresentam o que se chama de perda renal de bicarbonato, acarretando acidose intensa, com necessidade de altas doses de álcalis (5 a 14 mEq/ kg/d). A etiologia é desconhecida. As características fisiológicas da ATR tipo 1 são a conseqüência de uma taxa reduzida de secreção de íon H no túbulo coletor pela ATPase dependente de H e, em menor proporção, pela ATPase H-K-dependente. O H secretado é então excretado como íons livres (refletido pelo valor do pH urinário) ou titulado pelos tampões urinários, fosfato e NH3. Uma redução na quantidade de H secretado resulta em redução na sua concentração urinária (isto é, elevação no pH urinário) e uma redução no H total tamponado pelo fosfato e NH3 urinários. Este distúrbio resulta de um ou outro de três mecanismos: (1) defeito secretor responsável pela taxa reduzida de secreção ativa unidirecional de H da célula para a luz; (2) defeito na permeabilidade que permite um elevado fluxo passivo retrógrado de íon H+ secretado (da luz para a célula) ou ingresso luminal aumentado de bicarbonato ou OH ; e (3) defeito dependente de voltagem, onde o potencial de voltagem transepitelial alterado no túbulo distal diminui a secreção de íon H. Talvez a melhor evidência da alteração da função dos ductos coletores na ATR tipo 1 seja o achado de que a pCO2 na urina não se eleva a valores normalmente altos durante sobrecarga com bicarbonato de sódio. Em pessoas normais, tornadas bicarbonatúricas com a sobrecarga, a pCO2 excede a do sangue arterial por mais de 20 mmHg. Existem dois tipos de ATR tipo 1: a primária e a secundária, esta dependente de várias doenças hereditárias e adquiridas (v. Quadro 30.5). A ATR tipo 1 é, na maioria das vezes, esporádica, mas inúmeras famílias são descritas na literatura. As formas genéticas do tipo 1 podem ser autossômicas dominantes e recessivas. A forma dominante, com grau variável de expressão, maior nas mulheres, causa nefrocalcinose e osteomalácia. Nos membros de uma família podem ocorrer formas incompletas, caracterizando-se pela ausência de acidose franca, já que eles são capazes de manter excreção ácida, apesar do defeito de acidificação. O defeito primário poderia ser uma redução do pH intracelular das células no túbulo proximal. Na evolução, alguns pacientes com a forma incompleta de ATR tipo 1 progridem para a forma completa. A forma autossômica recessiva pode ocorrer com ou sem surdez neurossensorial. Mutações na forma recessiva de ATR distal que se apresen-
Quadro 30.5 Distúrbios associados com ATR-1 Primária Hereditária Idiopática Adquirida Disgamaglobulinemia Púrpura hiperglobulinêmica Crioglobulinemia Hipergamaglobulinemia Síndrome de Sjögren Tireoidite Fibrose pulmonar Hepatite crônica ativa Cirrose biliar primária Lúpus eritematoso sistêmico Anomalias causando hipercalciúria Hiperparatireoidismo primário Intoxicação por vitamina D Hipertireoidismo Hipercalciúria (hereditária, esporádica) Rim esponjoso medular Drogas e toxinas Anfotericina B Tolueno Ciclamato Analgésicos Lítio Mercúrio Doenças túbulo-intersticiais Nefropatia dos Bálcãs Pielonefrite crônica Uropatia obstrutiva Transplante renal Lepra Anastomose jejunoileal com hiperoxalúria Doenças sistêmicas de transmissão genética Síndrome de Ehlers-Danlos Eliptocitose hereditária Anemia falciforme Doença cística medular Doença de Wilson Doença de Fabry Síndrome de Marfan Hipercalciúria hereditária Deficiência de anidrase carbônica Surdez neurossensorial Miscelânea Cirrose hepática Osteoporose com deficiência de anidrase carbônica II
tam na infância com retardo do crescimento e nefrocalcinose podem evoluir para a insuficiência renal. O início dos sintomas ocorre geralmente após os dois anos de idade e freqüentemente só é aparente na vida adulta. No entanto, a enfermidade pode muitas vezes ser detectada desde a infância, com uma história de vômitos, anorexia, depleção, poliúria e retardo do crescimento. Raquitismo e osteomalácia estão presentes, e sintomas de dor óssea ou fraturas espontâneas podem ser as principais queixas em adultos. A nefrocalcinose é um achado muito
capítulo 30
freqüente e pode ser observada radiologicamente ou, mais precocemente, ecograficamente. A urolitíase é muito menos comum em crianças. Poliúria, pelo defeito de concentração, está quase sempre presente. Os exames laboratoriais caracteristicamente revelam uma acidose hiperclorêmica com pH urinário alcalino, geralmente acima de 6,0. Podem estar associadas hiponatremia e hipocalemia moderadas, com concentração de fósforo baixa e cálcio normal ou diminuído. A hipocalcemia, derivada tanto da hipercalciúria como da absorção intestinal alterada, e a hipofosfatemia são presumivelmente as causas do raquitismo e da osteomalácia, que ocorrem eventualmente, e da tetania (durante o tratamento com álcalis). A acidose metabólica crônica promove mobilização de cálcio do esqueleto e pode inibir a conversão renal da 24-OH vitamina D3 em 1,25(OH)2D3, o metabólito mais ativo da vitamina D3 com relação à absorção de cálcio, reabsorção óssea e cura do raquitismo. Nos pacientes não tratados, o PTH pode estar aumentando, o que poderia estar relacionado tanto à hipercalciúria quanto à hipocalcemia. A fosfatase alcalina pode estar aumentada se estão presentes lesões de raquitismo ou osteomalácia. A filtração glomerular está normal nas crianças adequadamente hidratadas, embora graus variáveis de insuficiência renal estejam presentes em pacientes com o diagnóstico tardio. O pH urinário está persistentemente elevado, acima de 6,0, existindo diminuição da excreção de acidez titulável e de amônia na urina, apesar da acidose metabólica presente e da hipocalemia. A depuração de fósforo está aumentada como conseqüência do hiperparatireoidismo secundário. Hipercalciúria é um achado constante, sendo também característica uma baixa excreção de citrato urinário, provavelmente secundária à acidose intracelular e à depleção de potássio. Defeitos de concentração devem levar à suspeita de doença túbulo-intersticial ou nefrocalcinose avançada. Na ATR distal secundária, inúmeras enfermidades e drogas podem levar a um déficit de acidificação distal, com suas conseqüências para a função renal. Embora nem todos os pacientes deste tipo desenvolvam o quadro completo descrito na forma primária, na maioria deles é possível detectar pelo menos um déficit de acidificação da urina. Quando a anormalidade de acidificação do túbulo distal não é aparente, a prova de sobrecarga de NH4C1 esclarece o defeito. Não ocorrendo queda do pH abaixo de 5,5, o diagnóstico provável é de ATR distal. Ocorrendo queda do pH, deve-se pensar em ATR proximal ou nas formas de ATR hipercalêmicas. Assim, existindo acidose hiperclorêmica com hipercalemia sem queda do pH abaixo de 5,5, o diagnóstico é ATR tipo 1 hipercalêmica, provavelmente secundária a uropatia obstrutiva, nefropatia diabética ou nefrite intersticial. Se o pH cai abaixo de 5,5 deve-se então considerar o diagnóstico de deficiência seletiva de aldosterona, insuficiência suprarenal ou resistência à aldosterona. A determinação do anion gap urinário pode facilitar o diagnóstico e na ATR distal clássica este é igual a zero ou positivo.
577
Na terapêutica da ATR tipo 1 devem ser repostas quantidades adequadas de bicarbonato ou citrato de sódio para contrabalançar o íon H produzido metabolicamente. Geralmente a perda de bicarbonato não é importante nestes pacientes, ao contrário do que ocorre no tipo 2. A administração de potássio pode ser necessária, os melhores resultados sendo obtidos com uma mistura de bicarbonato de sódio ou potássio, dependendo das necessidades destes elementos para o paciente individual. A maioria dos pacientes é capaz de excretar uma porção substancial de sua carga ácida com doses alcalinizantes de 1,0 a 3,0 mEq/ kg/d, divididas em 3 ou 4 tomadas. Crianças com a chamada perda renal de bicarbonato necessitam de doses mais elevadas, entre 5,0 e 14,0 mEq/kg/d. Por vezes, a necessidade de doses mais elevadas só se torna mais aparente após o início do tratamento. A terapêutica deve ser avaliada em cada caso de acordo com os níveis de pH e de bicarbonato plasmáticos, que devem ser mantidos normais, juntamente com a excreção urinária de cálcio que, com a normalização ácido-básica, deverá ser inferior a 2,0 mg/kg/d. Com a normalização da acidose cessam as perdas de sódio, potássio, aldosterona e cálcio, assim como a excreção de citrato volta ao normal. Exceto nos casos mais graves, ocorre uma melhora rápida das dores ósseas e, com o tempo, a cura. Em caso negativo, deve-se considerar a adição de cálcio e vitamina D, com os cuidados para evitar a hipercalciúria. Com o tratamento adequado e precoce pode ser evitada a nefrocalcinose, podendo ocorrer sua reabsorção, se discreta. A rara crise de ATR tipo 1, caracterizada por acidose metabólica intensa, hipocalemia e hipocalcemia, pode necessitar de tratamento imediato. O risco de desenvolver paralisia e depressão respiratórias faz com que a terapêutica com potássio seja necessária e sempre realizada antes da correção da acidose. A terapêutica estabelecida precocemente pode evitar as conseqüências da doença e, principalmente, a nefrocalcinose e possível nefrolitíase. Nos pacientes nos quais a ATR tipo 1 parece ser uma conseqüência tardia da lesão renal causada pela hipercalciúria hereditária e conseqüente nefrocalcinose, não se conhece ainda o efeito da terapêutica alcalinizante sobre a hipercalciúria, a excreção de citrato ou eliminação de cálculos. A correção da acidose leva à redução da excreção de potássio, sódio e aldosterona. Com a correção permanente da acidose, os balanços externos de potássio e sódio se tornam suficientemente positivos para corrigir a hipocalemia e a depleção de sódio. Naqueles pacientes que não toleram o bicarbonato pelas manifestações estomacais possíveis, pode ser utilizada a solução de Shohl (ácido cítrico: 140 g, citrato de sódio: 90 g, água: qsp 1.000 ml), cada ml da solução equivalendo a 1 mEq de bicarbonato. A alternância entre as fórmulas de substâncias alcalinizantes pode melhorar a aderência do paciente.
578
Tubulopatias Hereditárias
Ponto-chave: • Na ATR proximal tipo 1 primária, a capacidade em diminuir o pH urinário e excretar quantidades adequadas de acidez titulável e amônia explica a ausência de alterações secundárias, como hipercalciúria, nefrocalcinose e nefrolitíase, observadas na ATR distal tipo 2
Acidose Tubular Renal Tipo 3 Antigamente, este tipo era considerado como uma associação dos tipos 1 e 2, uma definição provavelmente equivocada, sendo que este termo não é mais utilizado.
Acidose Tubular Renal Distal (Tipo 4) É o tipo de ATR generalizada mais comum em crianças e adultos, ocorrendo na ausência de doença parenquimatosa difusa ou diminuição da taxa de filtração glomerular. Caracteriza-se por acidose hiperclorêmica, sem elevação do hiato aniônico urinário, hipercalemia e pH urinário alcalino (ácido durante períodos de acidose). A capacidade de acidificação parcialmente alterada é explicada pela diminuição da produção de amônia conseqüente à hipercalemia causada pelo hipoaldosteronismo e redução da secreção de íons H, diretamente relacionada à deficiência de aldosterona no seu efeito fisiológico sobre o rim. Atualmente são descritos cinco subtipos de ATR-4. O subtipo 1 resulta de uma deficiência hormonal primária de mineralocorticóides, como ocorre em pacientes com hiperplasia congênita da supra-renal, deficiência da 21-hidroxilase, em pacientes com insuficiência supra-renal bilateral ou ainda deficiência da metiloxidase corticosterona, um erro inato da biossíntese da aldosterona e finalmente na deficiência isolada da aldosterona secundária à deficiência congênita de renina. O subtipo 2 é associado a doenças crônicas do rim, resultando em lesão parenquimatosa difusa, principalmente diabete e doenças túbulo-intersticiais, com diminuição discreta a moderada da taxa de filtração glomerular (hipoaldosteronismo hiporreninêmico). Nestes tipos ocorre uma diminuição dos sítios sensíveis à aldosterona no túbulo distal. Os subtipos 3, 4 e 5 resultam de alterações primárias do túbulo distal.
SUBTIPO 3 (síndrome hipercalêmica do adolescente, shunt renal do cloreto, pseudo-hipoaldosteronismo tipo 2, síndrome de Gordon) É caracterizada por acidose metabólica discreta, hipertensão, hipervolemia e hipoaldosteronismo, mais freqüente em adolescentes, mas também observado em crianças e adultos. O defeito é transmitido como um traço autossô-
mico dominante. Existiria uma reabsorção excessiva de cloreto pelo túbulo distal, com redução do potencial negativo luminal, acarretando aumento da reabsorção de sódio, com as conseqüentes hipervolemia, hipertensão arterial e supressão secundária da produção de aldosterona. Qualquer destes processos causa redução da excreção de íons H e K e, portanto, acidose metabólica e hipercalemia. No tratamento é contra-indicado o uso de mineralocorticóides, que agravariam a hipertensão. A restrição na ingesta de sódio ou utilização de hidroclorotiazida e furosemide corrigem a hipercalemia e a acidose.
SUBTIPO 4 (pseudo-hipoaldosteronismo tipo 1, clássico) Neste tipo, dois modos de herança são descritos. Na forma autossômica recessiva a doença é permanente e ocasionada por um defeito no canal de sódio do túbulo distal (e outros órgãos alvo da aldosterona) com relativa falta de resposta às ações da aldosterona. Ocorre unicamente em lactentes, apresentando-se com nefropatia perdedora de sal, com tendência à hipotensão, acidose metabólica hiperclorêmica e hipercalemia. As concentrações de aldosterona e renina plasmáticas, assim como a concentração urinária de aldosterona, estão muito elevadas. Na forma autossômica dominante o defeito melhora com a idade, e em alguns casos envolve unicamente o rim. Nos lactentes, o quadro clínico é caracterizado por retardo do crescimento, depleção do espaço extracelular e hiponatremia causadas pela perda de sal e hipercalemia devido à retenção de potássio e acidose hiperclorêmica. Após os dois anos, se a criança é adequadamente tratada com bicarbonato e cloreto de sódio, a gravidade da disfunção renal é suficientemente diminuída para permitir a descontinuidade do tratamento. A restrição do cloreto de sódio da dieta leva à recorrência da doença, evidenciando a persistência da lesão renal. Este tipo foi descrito secundário à uropatia obstrutiva, à nefrite intersticial por meticilina, seguindo-se a transplantes renais e na doença medular cística, sendo corrigido com grandes quantidades de bicarbonato de sódio e cloreto de sódio.
SUBTIPO 5 (ATR precoce da infância) Aqui ocorre uma falta de resposta renal à aldosterona, afetando a excreção de íon H e do potássio, sendo normal a reabsorção de sódio, que resulta em acidose metabólica hipercalêmica com diminuição da excreção de H e K. A excreção urinária de sódio e sua concentração plasmática, assim como a pressão arterial, são normais. Estes pacientes, se não tratados precocemente, apresentam déficit pondoestatural. Com a terapêutica alcalinizante, normalizando a acidose, ocorre aceleração do crescimento. A maioria dos lactentes e crianças pequenas apresentam melhora espontânea gradual após vários anos, sem necessidade de prosseguir o tratamento, o que indicaria uma “imaturida-
579
capítulo 30
Quadro 30.6 Estudos diagnósticos na ATR Tipos de ATR Tipo 1 Achados Com acidose metabólica pH urinário mínimo Excreção de AT e NH4 K plasmático Excreção de citrato Hiato aniônico urinário Depuração renal de K Sem acidose metabólica Excreção de AT e NH4 Excreção fracionada de HCO3 Excreção de citrato K plasmático pCO2 urina/sangue Resposta à terapêutica Álcalis (mEq/k/d) Outras associações Nefrocalcinose Nefrolitíase Síndrome de Fanconi
Tipo 2
Tipo 4
Clássica
Perda de HCO3
5,5 앗 N ou 앗 앗 Pos 20
5,5 앗 N ou 앗 앗 Pos 20
5,5 N ou 앗 N ou 앗 앖 Pos ou ? 20
5,5 앗 앖 ? Pos 20
앗 3-5% N N 20 rápida 1-3
앗 5-10% N N 20 rápida 5-10
앗 >15% 앖 N ou 앗 20 lenta 5-20
앗 1-15% ? N ou 앖 20 lenta 15
comum comum não
comum comum não
rara rara sim
não não não
N normal; Pos positivo; AT acidez titulável; NH4 amônio.
de tubular”, com receptores para a aldosterona pouco desenvolvidos, devido aos túbulos distais curtos, característicos dos lactentes. No Quadro 30.6 estão incluídos os estudos diagnósticos nos vários tipos de ATR.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BETTINELLI, A.C.; CIARMATORI, S.; CESAREO, L.; TERESCHI, S. et al. Phenotypic variability in Bartter syndrome type I. Pediatr. Nephrol., 14:940-945, 2000. BONFANTE, L.; DAVIS, P.A.; SPINELLO, M.; D´ANGELO, D. et al. Cronic failure, end stage renal failure, and peritoneal dialisis in Gitelman s syndrome. Am. J. Kidney Dis., 38(1):165-168, 2001. CRUZ, D.N.; SHAER, A.J.; BIA, M.J.; LIFTON, R.P. et al. Gitelman´s syndrome revisited: an evaluation of symptoms and health-related quality of life. Kidney Int., 59:710-717, 2001. DELL, K.M. and GUAY-WOODFORD, L.M. Inherited tubular disorder. Sem. Nephrol., 19(4):364-373, 1999. DOMRONGKITCHAIPORN, S.; KHOSITSETH, S.; STTCHANTRAKUL, W.; TAPANEYA-OLARN, W. et al. Dosage of potassium citrate in the correction of urinary abnormalities in pediatric distal renal tubular acidosis patients. Am. J. Kidney Dis., 39(2):383-391, 2002.
FRIEDMAN, A.L. and CHESNEY, R.W. Isolated tubular disorders. In: Schrier, R.W. and Gottschalk, C.W. Diseases of the Kidney, 4th ed. Boston, Little, Brown and Co. Cap. 21, p. 663, 1988. HAFFNER, D.; WEINFURTH; SCHIMIDT, H.; BREMER, H.J.; and MEHLS, O. Long term outcome of pediatric patients with hereditary tubular disorders. Nephron, 83:250-260, 1999. HOLLIDAY, M.A.; BARRAT, T.M. and AVNER, E.D. Tubulopathies. In: Pediatric Nephrology, 3rd ed. Baltimore, Williams and Wilkins, p. 686, 1994. KNOERS, N.V.A.M. and DEEN, P.M.T. Molecular and cellular defects in nephrogenic diabetes insipidus. Pediatr. Nephrol., 16(12):1146-1152, 2001. MORRIS, C.R. and IVES, H.E. Inherited disorders of the renal tubules. In: Brenner, B.M. and Rector, F.C. The Kidney, 5th ed. Philadelphia, W.B. Saunders Co. Cap. 37, p. 1764, 1996. RODRIGUEZ-SORIANO, J. New insights into the pathogenesis of renal tubular acidosis — from functional to molecular studies. Pediatr. Nephrol., 14(12):1121-1136, 2000. SCRIVER, C.R.; BEAUDET, A.L.; SLY, W.S.; VALLE, D. The Metabolic Basis of Metabolic Disease. Highstown, McGraw-Hill, 5th ed., 1989.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Library of the National Medical Society http://www.emedicine.com/med/contents.htm http://www.emedicine.com/ped/contents.htm OMIM-On Line Mendelian Inheritance in Man http://www.ncbi.nlm.nih.gov/OMIM/
Capítulo
31
Doenças Císticas Renais Mauri Félix de Sousa e Gilvan Neiva Fonseca
INTRODUÇÃO
ABORDAGENS CIRÚRGICAS DOS CISTOS RENAIS
Cisto renal simples
Avaliação por técnicas de imagens
Doença renal policística autossômica recessiva
Classificação de Bosniak
Doença renal policística autossômica dominante
Cistos renais de interesse cirúrgico
Displasia renal cística
Tratamento cirúrgico
Doenças císticas da medula renal
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Doença renal cística adquirida
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO As doenças císticas renais constituem um grupo bastante heterogêneo quanto às características e causas dos cistos, tendo como similaridade a formação de cavidades delimitadas por epitélio e preenchidas por fluidos ou debris semisólidos. Constituem um importante capítulo devido à alta freqüência com que ocorrem, às complicações que podem causar e às dificuldades de diferenciação diagnóstica entre as doenças císticas e destas com os tumores renais. Quanto às características, embora apresentem aspectos comuns (proliferação celular, anormalidades da membrana basal, inversão do fluxo transepitelial de fluidos), os cistos podem ser corticais e/ou medulares, microscópicos ou chegarem a mais de 10 cm de diâmetro, de conteúdos diversos e delimitados por epitélio cubóide e/ou achatado, com formação de pólipos que se projetam na luz, ocorrendo na infância ou no adulto, silenciosos ou sintomáticos. Quanto às causas dos cistos, podem ser divididas em hereditárias e não-hereditárias. As não-hereditárias podem ser classificadas em adquiridas e por desordem de desenvolvimento. As hereditárias podem ser classificadas em autossômicas ou ligadas ao “X”. As autossômicas podem
ser dominantes ou recessivas. O Quadro 31.2 mostra uma classificação das doenças císticas dos rins. Os cistos renais podem complicar com hematúria, síndromes dolorosas, hipertensão arterial sistêmica, obstrução urinária e perda da função renal. No Brasil, de 44.943 pacientes em diálise crônica em dezembro de 2001, 1.073 (2,387%) tinham como causa doença cística renal (dados colhidos dos arquivos da “APAC”–DATASUS). A diferenciação entre as principais doenças císticas é apresentada nos Quadros 31.2 e 31.8.
Pontos-chave: • O cisto renal tem origem nas células epiteliais tubulares • As doenças císticas renais são causadas por doenças hereditárias, adquiridas ou do desenvolvimento
Cisto Renal Simples O cisto renal simples é o mais comum entre as doenças císticas renais. Caracteriza-se pelo aparecimento de cistos
581
capítulo 31
Quadro 31.1 Principais doenças císticas renais (Adaptado de Fick e Gabow1; Welling e Grantham2; Pirson, et al.3) DOENÇAS CÍSTICAS RENAIS Não-hereditárias
Hereditárias
Desordens adquiridas
Autossômica dominante
Doença cística adquirida em pacientes com insuficiência renal crônica
Doença renal policística autossômica dominante
Cisto renal simples (solitário ou múltiplo)
Complexo esclerose tuberosa
Cistos do seio renal (ou linfangiectasia peripélvica)
Doença de Von Hippel-Lindau
Cisto multilocular (nefroma cístico multilocular)
Doença cística medular
Cistos relacionados a hipocalemia
Doença renal glomerulocística
Desordens de desenvolvimento
Autossômica recessiva
Rim esponja medular
Doença renal policística autossômica recessiva
Rim com displasia multicística
Nefronoftise
Cisto pielocalicial
Ligada ao “X” Síndrome orofaciodigital tipo I
Quadro 31.2 Diferenciação das principais doenças císticas renais Característica
Cisto simples
DRPAD
DRPAR
Doença cística adquirida
Doença cística medular
Rim esponja medular
Modelo hereditário
Não
Autossômico dominante
Autossômico recessivo
Não
Freqüentemente presente; modelos variados
Não
Freqüência
Comum, aumentando com a idade
1/200 a 1/1.000
Rara
100% em pacientes em diálise por período longo
Rara
Comum
Idade de início
Adulto
Adulto, habitualmente
Neonatos, crianças
Usualmente adultos idosos
Adolescentes, adultos jovens
Adultos
Sintomas presentes
Achados acidentais, hematúria
Dor, hematúria, infecção do cisto, insuficiência renal
Massa abdominal, insuficiência renal, déficit no desenvolvimento
Hematúria
Poliúria, polidipsia, enurese, falência renal, déficit no desenvolvimento
Acidental, infecção do trato urinário, hematúria, cálculo renal
Hematúria
Ocorre
Comum
Ocorre
Ocorre
Rara
Comum
Infecção recorrente
Rara
Comum
Ocorre
Não
Rara
Comum
Cálculo renal
Não
Comum
Não
Não
Não
Comum
Hipertensão
Rara
Comum
Comum
Presente pela doença de base
Rara
Não
Método diagnóstico
Ultrasonografia
Ultrasonografia, análise de ligação de genes
Ultra-sonografia
Tomografia computadorizada, ultra-sonografia
Não
Urografia excretora
582
Doenças Císticas Renais
Quadro 31.2 Diferenciação das principais doenças císticas renais (cont.) Característica
Cisto simples
DRPAD
DRPAR
Doença cística adquirida
Doença cística medular
Rim esponja medular
Tamanho renal
Normal
Normal a muito grande
Inicialmente grande
Pequeno a normal, ocasionalmente grande
Pequeno
Normal
Patologia renal
Cistos múltiplos ou isolados, geralmente corticais, de tamanhos variados
Cistos de tamanhos variáveis em todos os segmentos dos néfrons, geralmente ⬎ 1 cm
As porções do ducto coletor envolvidas em 90%; forma infantil com envolvimento de 10-60%; formas tardias com cistos ⬍ 0,5 cm
Cistos corticais e medulares, que medem de 0,5 a 2 cm de diâmetro, com líquido claro, epitélio hiperplásico ou filamentoso, às vezes com cristais de oxalato de cálcio
Cistos na medula, principalmente na junção córticomedular, associados a atrofia tubular cortical significativa e fibrose intersticial
Múltiplas dilatações císticas dos ductos coletores na medula, ductos papilares dilatados, às vezes pequenos cistos de epitélio cubóide e às vezes transicional
Curso clínico
Benigno
Insuficiência renal em 50% dos casos aos 60 anos de idade
20% morrem de insuficiência respiratória no primeiro mês; IRC, hipertensão portal
Hemorragia, eritrocitose, neoplasia
Insuficiência renal
Benigno
Representação diagramática
de variados tamanhos (mais comumente 0,5 a 1 cm), pressão hidrostática de 1 a 42 mmHg (média ⫽ 15 mmHg), de limites precisos, paredes finas e lisas, esféricos, uniloculares, corticais, alterando o contorno renal ou medular. Sua freqüência observada à ultra-sonografia aumenta com a idade, indo de 5,1% na quarta até 36,1% na oitava década de vida. A proporção entre homens e mulheres é de 2:1. O aumento do tamanho dos cistos é em média de 2,82 mm anualmente, crescendo mais rapidamente nos pacientes com ⭐ 50 anos de idade ou nos cistos multiloculados.26 A freqüência de cistos é maior quando o método de observação é a ressonância nuclear magnética (RNM), a qual é mais sensível em cistos menores que 1 cm.27 O cisto simples pode ser assintomático na grande maioria dos casos ou cursar com dor, hematúria, infecção do trato urinário recorrente, obstrução pielocalicial, hipertensão arterial ou insuficiência renal.28 Se o cisto permanece assintomático e é homogêneo, com paredes sem espessamento e lisas, não acentuado por contraste intravenoso, a conduta é a observação. Se o cisto não obedece a esses critérios, investigação cirúrgica deve ser realizada. Se o cisto simples apresenta um volume ⬎ 500 ml, deve ser drenado cirurgicamente ou por aspiração por agulha.
Na presença de infecção resistente a tratamento com antibiótico, hipertensão arterial, obstrução piélica ou síndrome dolorosa atribuídas ao cisto, tratamento cirúrgico deve ser indicado.
Doença Renal Policística Autossômica Recessiva (DRPAR) A DRPAR é uma desordem grave, com incidência de 1:20.000. O quadro clínico típico se inicia no recém-nascido/lactente e é caracterizado por dilatação cística dos ductos coletores renais e disgenesia da árvore biliar. O grupo de estudos da DRPAR da América do Norte (EUA/Canadá) encontrou que a média do tempo de diagnóstico era 1 dia de idade (faziam diagnóstico mesmo intra-útero). As crianças não sobreviviam em 23,1% dos casos, sendo a média do tempo de vida destes casos 161 dias. A sobrevida geral foi de 85,6% aos 30 dias de idade, 77,8% com 1 ano de idade. Hipertensão se desenvolve em 62,6% (idade média 75 dias). A prevalência de insuficiência renal crônica foi de 58% (idade média ⫽ 119 dias). Hipertensão portal ocorreu em 14,2% (idade média ⫽ 2,2 anos). Embora
capítulo 31
583
com expressão fenotípica variável, ocorre por mutação herdada no cromossomo 6p21.1-p2 e se expressa de forma recessiva.24 O diagnóstico pode ser feito antes do nascimento por ultra-sonografia. Os critérios diagnósticos são: 1. rins hiperecogênicos sem cistos grosseiros; 2. evidência de fibrose biliar; 3. biópsia comprovando DRPAR em irmãos.
Doença Renal Policística Autossômica Dominante (DRPAD) A doença renal policística autossômica dominante se constitui em uma das doenças genéticas mais comuns em humanos, afetando 1 em cada 1.000 pessoas da população geral, podendo chegar a 1/400 em brancos. Caracteriza-se pelo aparecimento de cistos renais a partir de qualquer porção do néfron, estes aumentando em número e tamanho de acordo com o tempo de vida do indivíduo, e levando em 50% dos casos à insuficiência renal crônica naqueles que chegam aos 60 anos de idade.
Epitélio cubóide
Epitélio achatado
papila
debris
Fig. 31.1 Características de um cisto renal.
Fig. 31.2 Biópsia renal de um paciente com DRPAR, coloração pela HE (reproduzido com autorização de Luiz Fernando Menezes, PG da FM-USP).
Fig. 31.3 Rim da DRPAD (reproduzido com autorização do Departamento de Patologia da FM da USP).
FISIOPATOLOGIA. A doença renal policística autossômica dominante é causada pela mutação de dois diferentes genes, havendo a possibilidade de existir a mutação de um terceiro gene, como se observa no Quadro 31.6. PKD1 é o gene responsável por aproximadamente 85% dos pacientes com doença renal policística autossômica dominante (DRPAD), localizado no cromossomo 16. Ele codifica uma proteína de 460 kD, chamada policistina 1. Esta é uma proteína de 4.032 aminoácidos que se ancora na membrana celular através de sete domínios transmembrânicos (Fig. 31.4). A policistina 1 funciona como um receptor e transdutor de sinal, comunicando informações de fora para dentro da célula, interagindo com a policistina 2 (produzida por PKD2). Sabe-se que a primeira funciona como um ativador da proteína G e modula a atividade de canais de cálcio e potássio, mas obedecendo à regulação física da segunda.93 Esta função é crucial no desenvolvimento embriogênico tardio, e uma mutação poderia levar à alteração do processo de maturação da célula tubular, mantendo-a em estado de não-desenvolvimento. Isto levaria à manutenção da proliferação celular e à predominância de secreção tubular em relação à absorção, e, assim, à formação de cistos. O modelo hipotético para a formação de cistos na DRPAD baseia-se no mecanismo de um segundo golpe (mutação somática), permitindo a expressão do primeiro (mutação herdada). A observação de que somente uma minoria dos néfrons desenvolve cistos, apesar de cada célula tubular albergar a mutação germinativa em PKD1, é um dos principais argumentos para este modelo. Em adição à mutação germinativa, é necessária uma mutação somática (adquirida) envolvendo o alelo PKD1 normal para desencadear a formação do cisto (um mecanismo semelhante àquele demonstrado para genes supressores de
584
Doenças Císticas Renais
Ligantes extracelulares Domínio rico em cisteína NH2
Domínio rico em leucina Domínio de PKD1
13 14
Domínio de ligação à lecitina tipo C Domínio da lipoproteína A Domínio do receptor para geléia de ovo
15
Segmento transmembrânico Espiral enrolada
Extracelular
16 21
Ca⫹⫹
Membrana celular Intracelular
NH2
HOOC POLICISTINA 1
COOH POLICISTINA 2
Fig. 31.4 Policistina 1 e 2 e sua interação com a membrana celular. Os números (13, 14, 15, 16, 21) se referem aos exons do DNA que geraram aquela parte da proteína.
tumor na esclerose tuberosa e doença de von HippelLindau). Esta hipótese é secundada tanto por se apresentarem em clones, quanto pela perda da “heterosigozidade” na maioria das células dos cistos. A imaturidade da célula resultante da policistina que sofreu mutação levaria a crescimento descontrolado, elaboração de matriz extracelular anormal e acúmulo de fluidos. A presença de formações celulares aberrantes é demonstrada pela observação de micropólipos, identificação de fases mitóticas e expressão anormal de proto-oncogenes. Anormalidades da matriz extracelular são evidenciadas por espessamento e lamina-
ção da membrana basal tubular, sendo que este envolvimento poderia explicar a associação da DRPAD com aneurismas de artérias cerebrais. Como geralmente os cistos estão desconectados de seus túbulos, eles se expandem pelo fluxo de fluidos secretados para dentro do cisto, num sentido que é o inverso do fisiológico (Fig. 31.5). A nível molecular observa-se que a policistina 1 está associada às integrinas (␣2 e 1 integrinas). Estas últimas são responsáveis pela adesão e interação entre as células tubulares. Outras associações são com vinculina, paxilina, FAK, E-caderina, ␣,  e ␥-catenina. Estas associações se
O fluxo de fluido se inverte Acúmulo de fluido
As células tubulares apresentam genótipo heterozigoto para mutação em PKD1, sem alteração fenotípica
Algumas células tubulares apresentam mutação somática no alelo antes normal.
A célula duplamente alterada começa a se dividir — proliferação monoclonal.
Como resultado desta proliferação ocorre a formação de cistos. A inversão do fluxo de fluidos e a própria proliferação do epitélio levam à expansão do cisto.
Fig. 31.5 Mecanismo de dois golpes para a formação do cisto renal na DRPAD. (Adaptado de Pirson e Chauveau.5)
585
capítulo 31
diferenciam de acordo com os diferentes estados de maturação celular. A redução dos níveis de policistina poderia levar à perda da interação celular, defeitos nos receptores de adesão celular com conseqüente formação de cistos epiteliais. A redução dos níveis epiteliais de E-caderina poderia explicar o acréscimo da taxa de apoptose, pois ela é responsável por mecanismos de aderência celular e esta diminui a apoptose. A redução do seqüestro de -catenina pela E-caderina poderia levar a altas concentrações epiteliais de -catenina. Observou-se que camundongos que expressam grandes quantidades de -catenina truncada apresentam doença cística severa. QUADRO CLÍNICO. As manifestações clínicas se iniciam tipicamente da 3.ª à 4.ª décadas de vida, embora a doença possa manifestar-se na infância. No início os rins estão de tamanho normal com poucos cistos, e quando a doença se expressa completamente, cada rim pode estar de moderadamente aumentado até de tamanhos enormes, chegando mesmo a apresentar 8 kg de peso. Há variação fenotípica quanto ao tamanho dos rins entre um rim e outro do mesmo indivíduo e entre irmãos com a mesma carga genética. Isto mostra a participação importante de fatores ambientais que se somam ao genótipo, determinando o fenótipo. O acometimento é bilateral; quando isto não parecer ocorrer à ultra-sonografia, na tomografia computadorizada cistos menores poderão ser vistos do lado aparentemente não acometido. Quando o acometimento multicístico é realmente unilateral após os 30 anos de idade, o diagnóstico deve ser de doença cística unilateral, a qual não é hereditária e de bom prognóstico, apesar de muito rara.29 O aumento do tamanho renal é responsável pela maioria dos sintomas, tais como lombalgia, dor e desconforto abdominais, plenitude pós-prandial, meteorismo intestinal. Outros sintomas estão mais relacionados a complicações dos cistos renais, tais como hematúria, hipertensão arterial sistêmica, insuficiência renal, infecção urinária, nefrolitíase, distúrbio de concentração urinária. A hematúria ocorre subitamente por rompimento de um cisto e persiste macroscópica ou microscopicamente por vários dias. Mas pode ser causada também por urolitíase, neoplasia, infecção de cisto ou, menos freqüentemente, glomerulonefrite, a qual pode ocorrer incidentalmente na DRPAD. Infecção urinária é freqüente na DRPAD, notadamente em mulheres, sendo causada principalmente por Escherichia coli, Proteus vulgaris, Klebsiella, Pseudomonas, Streptococcus faecalis, Staphylococcus aureus e anaeróbios. A infecção urinária pode manifestar-se como cistite, pielonefrite ou infecção isolada de cisto. A cistite se manifesta classicamente por disúria, piúria, urgência miccional e dor suprapúbica, e a pielonefrite, por dor em flanco, febre, sedimento urinário com cilindros leucocitários e urocultura positiva, podendo estar presentes os sintomas de cistite. A infecção de cisto isolado pode não apresentar cilindros leucocitári-
os e a urocultura pode ser negativa, sendo suspeitada quando a infecção não responde a um curso adequado de antibioticoterapia. O diagnóstico é facilitado com tomografia computadorizada renal. A insuficiência renal se estabelece agudamente por obstrução urinária (compressão piélica, coágulos de hematúria franca) ou pode evoluir progressivamente por perda de massa renal funcionante e por fibrose intersticial. Os trabalhos são conflitantes quanto à relação entre o aumento dos rins e a perda de função renal.31 Isto mostra a participação importante da nefrite intersticial, além da compressão do parênquima pelos cistos na progressão da insuficiência renal. Nefrolitíase ocorre em 20% dos indivíduos com DRPAD. O diagnóstico necessita do auxílio de tomografia computadorizada. O cálculo é formado mais freqüentemente por ácido úrico e oxalato de cálcio. A nefrolitíase é causada por defeito distal de acidificação urinária, transporte anormal de NH4, pH urinário baixo e hipocitratúria. Pode ocorrer também nefrocalcinose. A hipertensão arterial se desenvolve em mais da metade dos pacientes e dados indicam que está relacionada à compressão de vasos pelos cistos com liberação de renina tecidual, num fenômeno localizado, como mostra a Fig. 31.6. A DRPAD, longe de ser uma doença restrita aos rins, como parece sugerir o seu nome, apresenta comprometimento em outros órgãos (sistêmico), tais como fígado, coração, encéfalo, etc., como é mostrado no Quadro 31.5. DIAGNÓSTICO. O diagnóstico da DRPAD é geralmente estabelecido por estudo de imagens: ultra-sonografia, tomografia computadorizada, ressonância nuclear magnética. O tamanho aumentado dos rins, com cistos renais múltiplos de tamanhos variados, é a apresentação mais freqüente. Os antecedentes familiares de doença renal cística, relatos de acometimentos de outros órgãos,
Mecanismo da hipertensão na DRPAD
Cistos renais
Renina Angiotensina II
Aldosterona
Retenção de sal e água
Resistência vascular
Crescimento celular
HIPERTENSÃO
Fig. 31.6 Mecanismo hipotético da hipertensão arterial na DRPAD.
586
Doenças Císticas Renais
Quadro 31.3 Incidência de cistos renais em 14.314 pacientes (Terada, J. Urol., volume 167(1). January 2002. pp. 21-23.) Idade
N.º homens/Total %
N.º mulheres/Total %
p (teste chi-quadrado)
N.º/Total %
16-29
0/40 (0)
0/26 (0)
30-39
60/1.038 (5,8)
26/774 (3,4)
0,0165
86/1.812 (4,7)
40-49
338/3.366 (10)
126/2.198 (5,7)
0,0002
464/5.564 (8,3)
50-59
543/3.138 (17,3)
183/2.007 (9,1)
⬍0,0001
726/5.145 (14,1)
60-69
281/995 (28,2)
70/521 (13,4)
⬍0,0001
351/1.516 (23,2)
⭓70
49/126 (38,9)
24/85 (28,2)
0,1106
73/211 (34,6)
Total
1.271/8.703 (14,6)
429/5.611 (7,6)
⬍0,0001
1.700/14.314 (11,9)
0/66 (0)
Quadro 31.4 Genética da DRPAD GENE
CROMOSSOMO
PRODUTO
% DE PACIENTES
PKD1
16p13.3
Policistina 1
80-90
PKD2
4q13q23
Policistina 2
10-20
PKD3
?
?
?
como aneurismas encefálicos, cistos hepáticos, podem ajudar no diagnóstico. O Quadro 31.6 mostra os critérios ultrasonográficos para DRPAD. Alguns trabalhos estabelecem auxílio diagnóstico através de provas de concentração urinária, que está alterada na DRPAD. Observou-se que, enquanto o clearance de água livre estava inalterado, a reabsorção máxima de água apresentava-se diminuída.34 O diagnóstico pré-sintomático da DRPAD é recomendado quando em planejamento familia e/ou quando este pode alterar o tratamento do indivíduo (aneurisma cerebral freqüente na família, doador de órgãos). Em crianças, até que um tratamento específico seja estabelecido, a investigação deve ser adiada. Este diagnóstico pode ser realizado por ultra-sonografia, mas a sensibilidade antes dos 21 anos é muito baixa. Outra opção é o exame de ligação (“linkage”) de genes. Até que teste genético direto para mutação de PKD1 e para PKD2 estejam disponíveis, o diagnóstico é estabelecido por probabilidade de ligação de genes. Esta análise requer a disponibilidade de outros familiares afetados e não afetados para estudo, preferivelmente de duas gerações. O uso de marcadores de ambos os lados dos genes testados é necessário para limitar erros potenciais causados por recombinação. O estudo de PKD1 deve ser feito primeiramente porque ele ocorre em 85% dos casos.
Pontos-chave: Diagnóstico da DRPAD • Ultra-sonografia • Tomografia computadorizada • Ressonância nuclear magnética • Ligação de genes
TRATAMENTO. O tratamento da DRPAD é baseado em suas complicações, não existindo ainda terapêutica específica para impedir o aparecimento e o desenvolvimento de cistos. Quando a insuficiência renal com uremia se estabelece, diálise e transplante renal devem ser indicados. O tratamento da hipertensão é uma das principais medidas a serem tomadas, evitando as complicações cardiovasculares, causas comuns de óbito destes pacientes. O controle da pressão arterial com inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) não provou ser efetivo também no retardo da perda de função renal. O uso de IECA em rins muito grandes está associado a hemorragia severa e a perda súbita da função renal. Os bloqueadores do canal de cálcio e os beta-bloqueadores são efetivos no controle da pressão arterial. Os antibióticos empregados na infecção urinária devem
capítulo 31
587
Quadro 31.5 Manifestações clínicas da DRPAD5,35 MANIFESTAÇÃO
PREVALÊNCIA
Renal Hipertensão
Aumenta com idade (80% se insuficiência renal crônica — IRC)
Dor (aguda ou crônica)
60%
Hematúria macroscópica
50%
Infecção do trato urinário
Homens 20%; mulheres 60%
Litíase renal
20%
Insuficiência renal
50% aos 60 anos de idade
30
Proteinúria ⬎ 1g
54% se apresenta IRC
Hepatobiliar Cistos assintomáticos
80% aos 60 anos
Doença policística hepática sintomática
Incomum (homem/mulher: 1/10)
Fibrose hepática congênita
Rara
Dilatação intra- ou extra-hepática do trato biliar
Muito rara
Colangiocarcinoma
Muito raro
Cardiovascular Anormalidade valvar
20%
Artérias intracranianas Aneurisma
8%
Dolicoectasia
2%
Dissecção de aorta ascendente
Rara
Aneurisma de artérias coronárias
Raro
Cisto pancreático
9%
Cisto aracnóide
8%
Hérnia
Inguinal ⫽13%; Umbilical ⫽ 7%
Divertículo de meninge espinhal
0,2%
Doença diverticular do colo
Associação comum
Quadro 31.6 Critérios ultra-sonográficos para diagnóstico de DRPAD. Ravine et al.11 IDADE
CISTOS
15-29
2 uni- ou bilateral
30-59
2 em cada rim
ⱖ 60
4 em cada rim
Número mínimo de cistos para estabelecer o diagnóstico de DRPAD em famílias com risco para PKD1.
ser lipossolúveis para penetrar nos cistos em concentrações adequadas. Estes são: ciprofloxacina, norfloxacina, trimetoprim e cloranfenicol. Punção do cisto com drenagem do
material purulento e até nefrectomia podem ser necessárias em casos com má resposta à antibioticoterapia. A presença de dor abdominal deve ser avaliada cuidadosamente, podendo representar várias complicações, requerendo tratamento específico: analgésicos e, em casos persistentes, cirurgia. A presença de hematúria macroscópica requer tratamento inicialmente clínico e, se não houver resposta, tratamento cirúrgico. A minicirurgia, equivalente à cirurgia laparoscópica, tem sido cada vez mais empregada. A redução dos cistos pela cirurgia poderia aliviar a dor, os sintomas compressivos, preservar a função renal, controlar a pressão arterial. Os avanços em Biologia Molecular e Genética nas últimas três décadas têm esclarecido os mecanismos da DRPAD,
588
Doenças Císticas Renais marcadores mutação
paciente afetado paciente não-afetado
Banda correspondente à doença (marcador)
Fig. 31.7 Explicação da análise de ligação de genes.
assim como fornecido as bases para terapias verdadeiramente efetivas. O conceito de que a doença cística não passa de uma neoplasia disfarçada tem ganhado terreno e determinado alguns tratamentos. Na Fig. 31.8 temos um esquema mostrando estas possibilidades. A observação de que citrato ou bicarbonato de sódio ou potássio atenuavam a formação de cistos em ratos Han: SPDRD (modelo de rato com doença renal policística autossômica dominante com penetração incompleta da trans-
Antimutagênicos: – Enzimas inibidoras da fase I (ex.: p-XSZ) – Enzimas indutoras Antioxidantes – ex.: vitamina E/ selênio, Probucol, NAC
formação renal policística) não foi confirmada em outros animais, podendo ser até prejudicial em camundongos (abstract; Qian Q, 33rd ASN Meeting, 2000). O tratamento de camundongo bpk com tyrosine kinase inhibitor EKI-785 mostrou-se efetivo em reduzir a formação de cistos.14 A secreção de cloro e fluido pelas células derivadas do cisto é estimulada por vários agonistas que estimulam a produção de cAMP, tais como vasopressina, secretina, peptídeo intestinal vasoativo, prostaglandina E1 e E2 e cyst activating factor (CAF), assim como testosterona. Se a inibição do co-transporte basolateral NKCC1/BSC2 por diurético de alça seria de valor terapêutico ainda não está determinado. A administração de um antagonista do receptor V2 da vasopressina reduz a severidade da doença cística e a insuficiência renal em camundongos cpk/cpk. Quando apresentar uremia, a diálise é indicada. A indicação de hemodiálise ou diálise peritoneal obedece aos princípios gerais, a não ser que os rins estejam com volume bastante aumentado e que a introdução de líquido na cavidade peritoneal venha a causar ainda maior desconforto. Os pacientes com DRPAD em diálise apresentam maior sobrevida que o grupo geral em diálise, por seu comprometimento sistêmico não ser tão importante como no diabetes mellitus, por exemplo. Nefrectomia de um dos rins é indicada antes do transplante, quando o volume dos rins é muito grande para dar espaço para o enxerto e porque os rins nativos costumam crescer bastante após o transplan-
- Fatores de crescimento (TGF-␣, EGF, PDGF, TGF-, aFGF, bFGF, IGF-1) Osteopontina Citocinas (FNT-␣, IL-1, IL-2, IL-6) ATP, cAMP Lipídios bioativos (CAF, lactosilceramida) MMPs,TIMPs e enzimas lisossômicas Renina, endotelina
Proliferação de célula epitelial Apoptose
Secreção de fluido Mutações somáticas
Inflamação intersticial Acumulação de matriz
Intervenções metabólicas: - Restrição protéica - Proteína de soja/semente de linho - Bicarbonato/citrato
Obstrução tubular
Angioesclerose
Moduladores do sinal de transdução: Inibidores ErbB TK Inibidores Rãs Inibidor PKA tipo 1 Outros efetores inibidores da quinase Retinóide e Vit. D
Moduladores hormonais/autacóides AVP-V2 antagonista - Somatostatina
Agentes antiinflamatórios - Glicocorticóides - Inibidores da COX-2 - Inibidores LOX - Inibidores TACE - Inibidores MMP
Inibidores da ECA Antagonistas AT1 Antagonistas da endotelina Óxido nítrico
Fig. 31.8 Possíveis tratamentos para a DRPAD. (Adaptado de Pirson e Chauveau.5)
589
capítulo 31
te. Nefrectomia é também indicada em casos de infecção de cisto e hemorragias freqüentes.
conduta.35 Quando bilateral, o paciente evolui com quadro de uremia.
Doenças Císticas da Medula Renal
Pontos-chave: Tratamento da DRPAD • Rim Hipertensão Hematúria macroscópica Infecção do trato urinário Urolitíase Diálise/Transplante • Outros Síndromes dolorosas Doença hepática sintomática Aneurisma intracraniano
Displasia Renal Cística A displasia renal cística é caracterizada pelo comprometimento unilateral ou bilateral dos rins pela formação de cistos múltiplos, desde microscópicos até com vários centímetros de diâmetro, revestidos de epitélio achatado. O que determina o diagnóstico é a presença de ilhas de mesênquima indiferenciado, freqüentemente com cartilagem e ductos coletores imaturos. Muitas vezes estão associadas a obstrução ureteropélvica, agenesia ou atresia ureteral e outras anomalias das vias urinárias inferiores. Clinicamente se apresenta, quando unilateral, com uma massa no flanco e às vezes hipertensão arterial. Existe o conceito de que quanto mais tarde é retirado o rim comprometido, menor a chance de resolução da hipertensão arterial, mas não existe evidência científica suficiente para padronizar esta
O complexo de nefronoftise e o rim em esponja medular (REM) são responsáveis pela maioria das doenças císticas medulares. O complexo de nefronoftise engloba um grupo de distúrbios renais que habitualmente surgem na infância e apresentam um variável número de cistos na medula, estando associado à desintegração da membrana basal tubular, atrofia tubular cortical importante, infiltrado e fibrose intersticial. A insuficiência renal ocorre pela fibrose intersticial. Existem quatro variantes, como mostra o Quadro 31.8. Este complexo se apresenta clinicamente na infância com poliúria e polidipsia. Isto reflete um defeito de concentração urinária. Ocorre também nefropatia perdedora de sal e acidose tubular renal, resultado da lesão inicial do túbulo distal e ducto coletor. A cintilografia pode mostrar o defeito de concentração urinária.34 Após 5 a 10 anos o paciente evolui para insuficiência renal crônica terminal. Nem sempre os cistos são visíveis à radiologia devido ao tamanho reduzido dos mesmos. Estes se encontram principalmente na junção córtico-medular. A biópsia renal mostra nefrite túbulo-intersticial crônica. Deve-se suspeitar da doença em crianças ou adolescentes com insuficiência renal crônica inexplicável, história familiar positiva e biópsia renal compatível. O REM ocorre comumente, atingindo 1 em cada 5.000 a 1 em cada 20.000 indivíduos. É caracterizado pelo aparecimento em adultos de dilatações císticas dos ductos coletores da medula renal. A patogenia é desconhecida. Clinicamente se apresenta com hematúria, urolitíase, infecção do trato urinário, hematúria recorrente. É uma alteração
Quadro 31.7 Causas específicas de dor abdominal na DRPAD Causa
Freqüência
Febre
Renal Sangramento do cisto
⫹⫹⫹⫹
Leve (⬍ 38ºC, máximo 2 dias) ou não
Litíase
⫹⫹
Com pionefrose
Infecção
⫹
Alta; prolongada se envolvimento de cisto
Infecção
Rara
Alta e prolongada
Sangramento
Muito raro
Leve (⬍ 38ºC, máximo 2 dias) ou não
Cisto hepático
Fratura de costela Plenitude pós-prandial Restrição pulmonar
590
Doenças Císticas Renais
Quadro 31.8 Tipos de nefronoftise Variantes
Hereditariedade
Esporádica não-familiar
Não
Nefronoftise juvenil familiar
Autossômica recessiva, 2q12-q13, por defeito no gene NPHP1.33 A forma infantil em 9q22-q31 (NPH2)
A causa genética mais comum de IRC em crianças
Displasia renal retiniana
Autossômica recessiva
Associada a retinite pigmentosa
Doença cística medular de início na idade adulta
Autossômica dominante em 1q21 e 16p12
Associada a hiperuricemia e gota
geralmente benigna, não levando por si à perda da função renal. O diagnóstico é feito pela urografia excretora, que mostra rins de tamanhos normais com ectasia dos ductos medulares, denominada de buquê de flores.
Doença Renal Cística Adquirida Doença renal cística adquirida é observada em pacientes com insuficiência renal crônica ou naqueles que permaneceram em diálise por vários anos, independentemente da causa da insuficiência renal. Parece estar relacionada à isquemia prolongada, efeito tóxico de substâncias urêmicas, elevação do oxalato. Os critérios diagnósticos para DRCA são: 1) Presença de pelo menos 1 a 5 cistos renais confirmados por ultra-sonografia ou tomografia computadorizada; 2) Patologicamente, os cistos envolvendo mais que 25% do parênquima renal. Os cistos têm diâmetro ⬍0,5 cm e os rins são de tamanho pequeno a normal. Raramente, os cistos são numerosos, com aumento do tamanho renal, dificultando o diagnóstico diferencial com DRPAD.32 O número de cistos se correlaciona com o tempo de diálise, sendo mais freqüente em homens que mulheres e mais em negros que caucasianos. As complicações são sangramento intracístico e pericístico, hematúria franca, ruptura com hemorragia retroperitoneal e maior risco de transformação maligna que o rim normal.
ABORDAGENS CIRÚRGICAS DOS CISTOS RENAIS Cistos renais são patologias urológicas, em geral benignas, podendo ser representantes de várias entidades patológicas. As análises clínicas evidenciam definições e novas facetas sobre as principais patologias renais que poderão levar à formação de cavidades com conteúdo líquido, principalmente com relação à etiologia. As lesões de aspecto
Características
benigno representam 80% das lesões císticas renais. Lesões secundárias às atividades inflamatórias em 6 a 12% dos casos, lesões pseudotumorais em 5 a 8% e lesões com histologia maligna em 3,5 a 5,5% dos casos. Apesar das características similares histológicas, a associação com patologias, o tamanho, a localização, os aspectos clínicos e as possibilidades de degeneração maligna são diferentes nas várias condições.38-40
Avaliação por Técnicas de Imagens Os avanços tecnológicos nas áreas de imagem, especialmente a Ressonância Nuclear Magnética, a Tomografia Computadorizada e a Ultra-sonografia Tridimensional, adaptados com hardware e software, são métodos que têm mostrado acurácia diagnóstica, melhorando a qualidade das imagens e possibilitando interpretações substancialmente seguras com elevada sensibilidade e especificidade.42,43 Estas novas técnicas e métodos não-invasivos têm possibilitado melhor resolução de imagens e contribuído com a utilização mais rotineira de técnicas cirúrgicas microinvasivas. As novas imagens computadorizadas e informatizadas possibilitaram novas classificações, interpretação crítica das possibilidades diagnósticas e melhores opções terapêuticas. A ultra-sonografia apresenta acurácia diagnóstica de 96%, aproximando-se de 100% quando combinada com a punção diagnóstica. A tomografia é útil para determinar análises detalhadas de massas suspeitas, localizações precisas, as margens e paredes císticas, a homogeneidade do conteúdo aquoso (0-20 Hounsfield U), heterogeneidade e principalmente para análises de cistos peripélvicos e sua relação com as estruturas vasculares do hilo renal.43,44 A angiografia poderá ser indicada em alguns casos. A utilização da classificação de Bosniak tem sobremaneira qualificado a interpretação e a abordagem urológicas. A tomografia computadorizada é relativamente fácil de ser realizada com rápida execução, isenta de riscos, independente da função renal, trazendo informações valiosas, com alta acurácia acerca de amplo espectro das anormalidades renais.
591
capítulo 31
As lesões renais identificadas com os modernos exames tomográficos podem ser císticas, mistas ou sólidas, benignas ou malignas, congênitas ou adquiridas, simples ou múltiplas e, em se considerando a possibilidade oncológica, primárias ou metastáticas.49,50
Classificação de Bosniak Tipo 1 — paredes finas, regulares, sem septações, ausência de calcificações ou irregularidades, sem aumento da densidade tomográfica após administração de contrastes. Tipo 2 — paredes finas, regulares, com presença de poucos, discretos e finos septos, sem aumento da densidade tomográfica após administração de contrastes. Tipo 3 — paredes pouco espessadas, irregulares, com maior presença de septações e calcificações, sem aumento da densidade tomográfica após administração de contrastes. Tipo 4 — paredes espessadas, bastante irregulares, septos numerosos, grosseiros e espessos, calcificações e aumento da densidade tomográfica após administração de contrastes. Esta classificação tem contribuído de maneira efetiva para o diagnóstico diferencial das lesões císticas do rim e as possibilidades de associações com neoplasias, oferecendo novas modalidades de alternativas terapêuticas recentemente introduzidas (Figs. 31.9 e 31.10).
Cistos Renais de Interesse Cirúrgico Relatos na literatura têm documentado que os patologistas encontram cistos renais em cerca de 3 a 15% das
Fig. 31.10 Tomografia — Aspectos tomográficos de cistos renais. Classificação Bosniak I.
autópsias de rotina. Outros relatam que um ou mais cistos estão presentes em cerca de 50% da população aos 50 anos. Um dos grandes dilemas é distinguir alguns cistos renais de neoplasias. As punções percutâneas aspirativas monitoradas com ultra-som ou tomografia computadorizada podem ser realizadas para análise histológica, citológica, bacteriológica e bioquímica dos conteúdos císticos. O paciente urológico portador de cistos renais pode apresentar, conforme a localização dos mesmos, além de dor e hematúria, a possibilidade de obstrução ou compressão da via excretora e destruição progressiva do parênquima renal.49,50,52,53 A combinação de investigação clínica e imagens é muito importante no sentido de identificar e caracterizar cistos simples, cistos complexos e atípicos ou as possibilidades de lesões neoplásicas não definidas, permitindo uma análise diagnóstica conclusiva e a estratégia da planificação terapêutica. O fluxograma apresentado (Fig. 31.11) poderá contribuir de maneira significativa no estudo dos cistos complexos e massas renais, contribuindo também com a eficiência dos propósitos terapêuticos.50,51,90
Tratamento Cirúrgico
Fig. 31.9 Tomografia — Aspectos tomográficos de cisto renal. Classificação Bosniak I.
A perfeita avaliação clínica e o estudo detalhado das imagens dos portadores de cistos renais contribui para o urologista realizar uma análise segura e selecionar os pacientes para utilização da melhor técnica e alternativa terapêuticas. As principais indicações para intervenções cirúrgicas nos cistos renais são: dor, infecção, hipertensão, hemorragia, obstrução do sistema coletor ou risco de malignidade.47,48,50,52,53,62 Nas últimas décadas, o tratamento dos cistos renais era realizado com abordagem cirúrgica clássica da região lom-
592
Doenças Císticas Renais Fluxograma Urografia com distorção
Ultra-som
Massa Cístico Cisto complexo
Massa sólida
Tomografia computadorizada Indeterminado
Massa sólida
Ressonância magnética Indeterminado Punção aspirativa Confirmado cisto
Células inflamatórias
Indeterminada ou sem aspiração
Células neoplásicas
Arteriografia Sem gordura Hipovascular
Cisto simples
Pielonefrite xantogranulomatosa Abscesso renal
Com gordura
Hipervascular
Carcinoma de células transicionais Adenocarcinoma renal Sarcoma Lesão metastática Cistoadenocarcinoma renal Adenocarcinoma renal
Angiomiolipoma
Fig. 31.11 Fluxograma para investigação e análise de processos expansivos e cistos complexos.
bar (lombotomia), acesso à loja renal, marsupialização dos cistos e/ou nefrectomias parciais, representando, para os pacientes, maiores riscos anestésico-cirúrgicos, maior perda sanguínea, dor e permanência maior no hospital. Atualmente, com o desenvolvimento tecnológico e as mudanças no espectro diagnóstico e terapêutico, o tratamento cirúrgico dos cistos renais envolve uma série de modalidades alternativas minimamente invasivas, contribuindo para o sucesso terapêutico, diminuição da morbidade e mortalidade e melhor qualidade de vida dos pacientes.67-69,72 O tratamento cirúrgico dos cistos renais sintomáticos e complicados obedece a várias opções utilizadas na prática urológica. Punção percutânea e escleroterapia (Fig. 31.1), realizada com o auxílio da ultra-sonografia e da tomografia computadorizada, técnicas que possibilitam o acesso percutâneo, evitando riscos e prevenindo complicações, principalmente com relação aos vasos renais. Esta modalidade permite aspirar o conteúdo do cisto e utilizar uma variedade de substâncias esclerosantes, como etanol absoluto, fenol, glicose hipertônica, tetraciclinas, fosfato de bismuto, lipidol, povidone-iodine. São procedimentos minimamente invasivos, representando hoje as abordagens de primeira linha no tratamento dos cistos simples e sintomáticos e são
realizados ambulatorialmente, com baixa morbidade e baixos custos. Estes procedimentos poderão ser repetidos para se obterem resultados definitivos e otimizados. As séries da literatura apresentam taxa de sucesso de 75 a 97% e pequenas complicações oscilando de 1,3 a 20%, representadas por coleções de urina e hematomas que podem ocorrer se houver pequenos acidentes com a via excretora e os vasos do hilo renal. O principal cuidado a ser observado é não introduzir o agente esclerosante na via excretora.60,62,70,71,73,85 Cirurgia percutânea, realizada após a punção do cisto, dilatação transcutânea do trajeto com balões dilatadores ou dilatadores faciais metálicos ou de poliuretano, estabelecendo com segurança uma via de acesso ao interior do cisto renal e realizando a escleroterapia com energia elétrica (eletrodos) ou fibras de laser (neodymium yag laser ou holmium laser). A esclerose percutânea apresenta maior morbidade com maiores períodos de internação hospitalar.47,48,61,85,86 Cirurgia videolaparoscópica (Figs. 31.12 a 31.14), procedimento emergente realizado sob anestesia geral, com o paciente bem posicionado na mesa cirúrgica, a região dos flancos com angulação de 30° com relação à base de apoio, cateterismo ureteral e introdução de corante índigo carmim para melhor identificação e visualização da via excretora. Procedemos à punção supra-umbilical com agulha de Ve-
capítulo 31
593
Fig. 31.12 Locais de inserções de trocarte para realização de procedimentos de esclerose de cistos. HC — FM — UFG. Fig. 31.14 Dissecção e marsupialização videolaparoscópica de cistos renais. HC — FM — UFG.
Fig. 31.13 Punção percutânea do rim para realização de procedimentos videolaparoscópicos à direita. HC — FM — UFG.
ress, ao estabelecimento do pneumoperitônio com CO2, com manutenção da pressão de 15 a 20 mmHg, e a seguir realizamos abordagem transperitoneal com trocarte de 12 mm no local da punção anterior e introdução da óptica para identificar as estruturas contidas no envelope peritoneal e orientar a introdução de mais dois trocartes de 5 ou 12 mm. Após o correto posicionamento dos portais, realiza-se um inventário da cavidade com identificação de todas as estruturas. A cirurgia inicia-se com a liberação do colo à direita ou à esquerda, dependendo da área a ser explorada. Seccionamos ao nível da linha peritoneal de Toldt e rebatemos o colo medialmente com exposição da fáscia de Gerota. Identificação do rim, vasos hilares e via excretora, inclusive o ureter, e identificação e análise da lesão cística. A hemostasia deve ser meticulosa. O cisto é identificado e
dissecado, e seu conteúdo é aspirado para estudos bioquímicos, citológicos e bacteriológicos. A seguir, dissecamos e abrimos a parede cística, que é ressecada ao nível de sua união com o parênquima renal. Tal dissecção pode ser realizada com a utilização de eletrocautério, fibras de laser ou o bisturi harmônico ultracision. Após o procedimento, retirada dos trocartes e fechamento em dois planos nos locais das punções. O procedimento videolaparoscópico pode ser realizado por via retroperitoneal, com pequena dilatação digital e introdução de balão expansor de 800 a 1.000 cc, que disseca o retroperitônio. A seguir são introduzidos, em locais adequados, mais dois ou três portais e realizada a cirurgia conforme descrição anterior. Atualmente, associados aos procedimentos videolaparoscópicos, poderemos introduzir para a cirurgia de pequenos tumores a crioablação e a radiofreqüência com controles de ultrasom. Os procedimentos são tecnicamente fáceis de executar, requerendo treinamento. As taxas de transfusões sanguíneas são em média de 3,2%. As complicações relatadas não representam gravidade: íleo prolongado (1%), hemorragias (3%), fístulas urinárias (2%), parestesias neurológicas temporárias (1%). Os pacientes são realimentados precocemente e recebem alta hospitalar em média com 24 horas. Enfatizamos que as modalidades técnicas recentemente padronizadas requerem treinamento e experiência dos cirurgiões, revolucionando a abordagem e o tratamento dos pacientes.76-86,89-94
Pontos-chave: Tratamento cirúrgico • Punção percutânea e escleroterapia • Cirurgia percutânea • Cirurgia videolaparoscópica
594
Doenças Císticas Renais
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. FICK, G.M.; GABOW, P.A. Hereditary and acquired cystic disease of the kidney. Kidney Int., 46:951-964, 1994. 2. WELLING, L.W.; GRANTHAM, J.J. Cystic and developmental diseases of the kidney. In: The Kidney. Editado por Brenner, M. Philadelphia: WB Saunders Company; 1996:1828-1863. 3. PIRSON, Y.; CHAUVEAU, D.; GRÜNFELD, J.P. Autosomal dominant policistic kidney disease. In: Oxford Texbook of Clinical Nephrology. Editado por Davison, A.M.; Cameron, J.S.; Grünfeld, J.P. et al. Oxford: Oxford University Press; 1998:2393-2415. 4. RAVID, D.; GIBSON, R.N.; DONLAN, J.; SHEFFIELD, L.J. An ultrasound renal cyst prevalence survey: Specificity data for inherited renal cystic diseases. Am. J. Kidney Dis., 22:803-807, 1993. 5. PIRSON, Y.; CHAUVEAU, D. Cystic Disease of the Kidney. In: Atlas of Diseases of The Kidney. Editado por Robert W. Schrier. Volume II (edited by Richard J. Glassock, Arthur H. Cohen and Jean Perre Grünfeld), Cap. 9: Edição eletrônica por ISN Informatics Commission e NKF cyberNephrology. 6. RUSSELL, E.S.; MCFARLAND, E.C. Cystic kidneys. Mouse Newsletter, 56:40-43, 1977. 7. MOYER, J.H.; LEE-TISCHLER, M.J.; KWON, H-Y.; SCHRICK, J.J.; WILKINSON, J.E.; AVNER, E.D.; SWEENY, W.E.; GODFREY, V.L.; CACHEIRO, N.L.A.; WOYCHIK, R.P. Candidate gene associated with a mutation causing recessive polycystic kidney disease in mice. Science, 264:1329-1333, 1994. 8. LU, W.; PEISSEL, B.; BABAKHANLOU, H.; PAVLOVA, A.; GENG, L.; FAN, X.; LARSON, C.; BRENT, G.; ZHOU, J. Perinatal lethality with kidney and pancreas defects in mice with a targetted PKD1 mutation. Nature Genet., 17:179-181, 1997. 9. LU, W.; FAN, X.; BASORA, N.; BABAKHANLOU, H.; LAW, T.; RIFAI, N.; HARRIS, P.C.; PEREZ-ATAYDE, A.R.; RENNKE, H.G.; ZHOU, J. Late onset of renal and hepatic cysts in Pkd1-targeted heterozygotes. Nat. Genet., 21:160-161, 1999. 10. NICKEL, C. et al. The polycystin-1 C-terminal fragment triggers branching morphogenesis and migration of tubular kidney epithelial cells. J. Clin. Inv., 109(4):281-489, 2002. 11. RAVINE, D.; GIBSON, R.N.; WALKER, R.G. et al. Evaluation of ultrasonographic diagnostic criteria for autosomal dominant policystic kidney disease 1. Lancet., 343:824-827, 1994. 12. GRANTHAM, J.J. Mechanisms of progression in autosomal dominant polycystic kidney disease. Kidney Int., 52, Sup 63: S-93-S-97, 1997. 13. QIAN, Q.; HARRIS, P.C.; TORRES, V.E. Treatment prospects for autosomal-dominant polycystic kidney disease. Kidney Int., 59(6):20052022, 2001. 14. SWEENEY, W.E.; JR; CHEN, Y.; NAKANISHI, K. et al. Treatment of polycystic kidney disease with a novel tyrosine kinase inhibitor. Kidney Int., 57:33–40, 2000. 15. YAMAGUCHI, R.; HIRANO, T.; ASAMI, S.; SUGITA, A.; KASAI, H. Increase in the 8-hydroxyguanine repair activity in the rat kidney after the administration of a renal carcinogen, ferric nitrilotriacetate. Environmental Health Perspectives, 104, Supplement 3, 651-653, May 1996. 16. TOYOKUNI, S.; TANAKA, T.; HATTORI, Y.; NISHIYAMA, Y.; YOSHIDA, A.; UCHIDA, K.; HIAI, H.; OCHI, H.; OSAWA, T. Quantitative immunohistochemical determination of 8 hydroxy-2'-deoxyguanosine by a monoclonal antibody N45.1: its application to ferric nitrilotriacetate-Induced renal carcinogenesis model. Laboratory Investigation, March 1997, v 77, n 3. 17. NOMOTO, M.; YAMAGUCHI, R.; KAWAMURA, M.; KOHNO, K.; KASAI, H. Analysis of 8-hydroxyguanine in rat kidney genomic DNA after administration of a renal carcinogen, ferric nitrilotriacetate. Carcinogenesis, v 20, n 5, 837-841, 1999. 18. MA, Y.; KAWABATA, T.; HAMAZAKI, S.; OGINO, T.; OKADA, S. Sex differences in oxidative damage in ddY mouse kidney treated with a renal carcinogen, iron nitrilotriacetate. Carcinogenesis, v 19, n 11, 1983-1988, 1998.
19. AWAI, M.; NASARAKI, M.; YAMANOI, Y.; SENO, S. Induction of diabetes in animals by parenteral administration of ferric nitrilotriacetate. Am. J. Pathol. 95: 663-674, 1979. 20. SHEPHERD, A.G.; MANSON, M.M.; BALL, H.W.L.; McLELLAN, L. I. Regulation of rat glutamate-cysteine ligase (␥-glutamylcysteine synthetase) subunits by chemopreventive agentes and in aflatoxin B1-induced preneoplasia. Carcinogenesis, v. 21, n 10, 18271834, 2000. 21. KIMOTO, T.; KOYA, S.; HINO, K.; YAMAMOTO, Y.; NOMURA, Y.; MICALLEF, M.J.; HANAYA, T.; IKEDA, M.; KURIMOTO, M. Renal carcinogenesis induced by ferric nitrilotriacetate in mice, and protetion from Brazilian propolis and Artepicillin C. Pathology International, v 50(9), 679-689, September, 2000. 22. YAMAGUCHI, R.; HIRANO, T.; ASAMI, S.; SUGITA, A.; KASAI, H. Increase in 8-hydrxyguanini repair activity in the rat kidney after the administration of a renal carcinogen, ferric nitrilotriacetate. Enviromental Health Perspectives, v. 104, suplement 3, May 1996. 23. AVNER, E.D; SWEENEY, W.E. Jr; FINEGOLD, D.N.; PIESCO, N.P.; ELLIS, D. Sodium-potassium ATPase activity mediates cystic formation in metanephric organ culture. Kidney International, 28:447455, 1985. 24. GUAY-WOODFORD, L.M. et al. Autossomal recessive polycystic kidney disease (ARPKD): The clinical experience in North America 1990-2000. J. Am. Soc. Nephrol., 11: 309A, 2000. 25. MUELLER, H.J. et al. Effects of antihypertensive treatment and renal volume on renal function in patients with autossomal dominant polycystic kidney disease (ADPKD). J. Am. Soc. Nephrol., 11:395-A, 2000. 26. TERADA, N. et al. The natural history of simple renal cysts. J. Urol. Jan;167(1):21-3, 2002. 27. NASCIMENTO, A.B. et al. Rapid MR imaging detection of renal cysts: age-based standards. Radiology, Dec;221(3):628-32, 2001. 28. ROBERTS, W.W. et al. Laparoscopic ablation of symptomatic parenchymal and peripelvic renal cysts. Urology, 58:165-169, 2001. 29. MAULL, C.D. et al. Unilateral Renal Cystic Disease. Urology, 53:122728, 1999. 30. HWANG, Y.H. et al. Clinical characteristics of end-stage renal disease in autosomal dominant polycystic kidney disease in koreans. J. Am. Soc. Nephrol., 11:392A, 2000. 31. MUELLER, H.J.; et al. Effects of antihypertensive treatment and renal volume on renal function in patients with autosomal dominant polycystic kidney disease (ADPKD) J. Am. Soc. Nephrol., 11:395A, 2000. 32. NEUREITER, D. et al. Dialysis-associated acquired cystic kidney disease imitating autosomal dominant polycystic kidney disease in a patient receiving long-term peritoneal dialysis. Nephrol. Dial. Transplant, 17:500-503, 2002. 33. HILDELBRANDT, F. et al. Establishing an algorithm for molecular genetic diagnostics in 127 families with juvenile nephronophthisis. Kidney Int., 59(2):434-435, 2001. 34. PABICO, R.C.; MCKENNA, B.A.; FREEMAN, R.B. Renal tubular dysfunction in patients with cystic disease of the kidneys. Urology, 51:156–160, 1998. 35. KONDA, R. et al. Renin containing cells are present predominantly in scarred areas but not in dysplastic regions in multicystic dysplastic kidney. The Journal of Urology, 166(5):1910-1914, 2001. 36. SESSA, A. et al. Autossomal dominant polycystic kidney disease: clinical and genetic aspects. Journal of Nephrology, 10(6):295-310, 1997. 37. STARNES, H.F. et al. Surgery for diverticulitis in renal failure. Dis. Colon Rectum, 28:827-832, 1985. 38. HILL, G.S. uropathology. Churchill Livingstone, New York, 1989. 39. LANG, E.K. Renal cyst puncture studies. Urol. Clin. North Am., 14:91, 1987. 40. KISSANE, J.M. Pathology of Infancy and Childhood, 2nd ed., CV Mosby, 1975. 41. HARTMAN, D.S. Renal cystic disease. AFIP Atlas of Radiologic-Pathologic Correlations. W.B. Saunders, Philadelphia, 1989.
capítulo 31
42. 43. 44. 45.
46.
47. 48.
49. 50. 51. 52. 53.
54.
55. 56.
57.
58.
59.
60.
61.
62. 63.
64.
65.
66. 67.
McHUGH, K.; STRINGER, D.A.; HEBERT, D. et al. Simple cyst in children. Diagnosis and follow-up in US. Radiology, 178:383, 1991. BOSNIAK, M.A. The current radiological approach to renal cysts. Radiology, 158:1-10, 1986. BOSNIAK, M.A. The small (⬍3.0cm) renal parenchymal tumor: detection, diagnosis, and controversies. Radiology, 179:307, 1991. REEDERS, S.T.; BREUNING, M.H.; DAVIES, K.E. et al. Two genetic markers closely linked to adult polycystic kidney disease on chromosome 16. Br. Med. J., 292:851, 1986. PETERS, D.J.M.; SPRUIT, L.; SARIS, J.J. et al. Chromosome 4 localization of a second gene for autosomal dominant polycystic kidney disease. Nature Genet., 5:359, 1993. HULBERT, J.C. et al. Percutaneous intrarenal marsupialization of a perirenal cyst collection-endocystolysis. J. Urol., 139:1039, 1988. CAMACHO, M.F. et al. Ureteropelvic junction obstruction resulting from percutaneous cyst puncture and intracystic isophendylate: an unusual complication. J. Urol., 124:713, 1980. DALTON, D.; NEIMAN, H.; GRAYBACK, J.T. The natural history of simple renal cysts. A preliminary study. J. Urol., 135:905, 1986. MONTIE, J.E. The incidental renal mass — management alternative. Urol. Clin. North. Am., 18:437, 1991. MURPHY, J.B. & MARSHALL, F.F. Renal cyst versus tumor: A continuing dilemma. J. Urol., 123:566, 1980. AMAR, A.D.; DAS, S. Surgical management of benign renal cysts causing obstruction of renal pelvis. Urol., 24:429-433, 1984. BARLOON, T.J.; VINCE, S.W. Caliceal obstruction owing to a large parapelvic cyst: Excretory urography, ultrasound, computerized tomography findings. J. Urol., 137:270-271, 1987. BENNETT, W.M.; ELZINGA, L.; GOLPER, T.A. et al. Reduction of cyst volume for symptomatic management of autosomal dominant polycystic kidney disease. J. Urol., 137:620-622, 1987. CLOIX, P.; MARTIN, X.; PANGAUD, C. et al. Surgical management of complex renal cysts: A series of 32 cases. J. Urol., 156:28-30, 1996. DALGAARD, O.Z. Bilateral polycystic disease of the kidneys: A follow-up of 284 patients and their families. Acta Med. Scand., Suppl 328:1-255, 1957. DUNN, M.; ELBAHNASY, A.; SHALHAV, A. et al. Laparoscopic nephrectomy in adult polycystic kidney disease patients with endstage renal disease. J. Endourol., 13 (suppl 1):A90, 1999. DUNN, M.; ELBAHNASY, A.; SHALHAV, A. et al. Laparoscopic cyst marsupialization for patients with autosomal dominant polycystic kidney disease. J. Endourol., 13(supp l):A125, 1999. GABOW, P.A.; IKLÉ, D.W.; HOLMES, J.H. Polycystic kidney disease: Prospective analysis of nonazotemic patients and family members. Ann. Intern. Med., 101:238-247, 1984. GARCIA, M.; BRU, C.; CAMPISTOL, J.M. et al. Effect of reduction of cystic volume by percutaneous cystic puncture on the renal function in polycystic kidney disease. Nephron, 56:459, 1990. HIGASHIHARA, E.; NUTAHARA, K.; MINOWADA, S. et al. Percutaneous reduction of cyst volume of polycystic kidney disease: Effects on renal function. J. Urol., 147:1482-1484, 1992. HINMAN, F. Jr. Obstructive renal cysts. J. Urol., 119:681-683,1978. KROPP, K.A.; GRAYHACK, J.T.; WENDEL, R.M. et al. Morbidity and mortality of renal exploration of cyst. Surg. Gynecol. Obstet., 125:803-806, 1967. PAPANICOLAU, N.; PFISTER, R.C.; YODER, I.C. Spontaneous and traumatic rupture of renal cysts: Diagnosis and outcome. Radiology, 160:99-103, 1986. ROCKSON, S.G.; STONE, R.A.; GUNNELS, J.C. Jr. Solitary renal cyst with segmental ischemia and hypertension. J. Urol., 112:550-552, 1974. VEERMAN, J.T.H.L.; TEN CATE, H.W. Infected solitary renal cyst. Neth. J. Surg., 32:59-61, 1980. HOENIG, D.M.; LEVEILLEE, R.J.; AMARAL, J.F. et al. Laparoscopic unroofing of symptomatic renal cysts: Three distinct surgical approaches. J. Endouro., 9:55-58, 1994.
68. 69. 70.
71. 72.
73.
74. 75. 76. 77. 78.
79.
80. 81.
82.
83. 84. 85.
86. 87.
88. 89. 90. 91. 92.
93.
595 HOENIG, D.M.; McDOUGALL, E.M.; SHALHAV, A.L. et al. Laparoscopic ablation of peripelvic renal cysts. J. Urol., 158:1345-1348, 1997. HULBERT, J.C. Laparoscopic management of renal cystic disease. Semin. Urol., 10:239-241, 1992. KINDER, P.W.; ROUS, S.N. Infected renal cyst from hematogenous seeding: a case report and review of the literature. J. Urol., 120:239240, 1978. LANG, E.K. Renal cyst puncture studies. Urol. Clin. North Am., 14:91102, 1987. LÜSCHER, T.F.; WANNER, C.; SIEGENNTHALER, W. et al. Simple renal cyst and hypertension: Cause or coincidence? Clin. Nephrol., 26:91-95, 1986. FONTANA, D.; PORPIGLIA, F.; MORRA, I. et al. Treatment of simple renal cysts by percutaneous drainage with three repeated alcohol injections. Urol., 53:904-907, 1999. HULBERT J.C. Laparoscopic management of renal disease. Sem. Urol., 10:239, 1992. GUAZZONI, G. et al. Laparoscopic unroofing of simple cysts. Urology, 43:154, 1994. NIEH, P.T.; BIHRLE, W. Laparoscopic marsupialization of massive renal cyst. J. Urol., 150:171, 1993. WINFIELD, H.N. et al. Laparoscopic renal cyst marsupialization. J. Urol., 147:204A, 1992. BENNET, W.M.; ELZINGA, L.; GOLPER, T.A.; BARRY, J.M. Reduction of cyst volume for symptomatic management of autosomal dominant polycistic kidney disease. J. Am. Soc. Nephrology, 2:1219, 1992. LIFSON, B.J.; TEICHMAN, J.M.H.; HULBERT, J. Role and long-term results of laparoscopic decortication in solitary cystic and autosomal dominant polycystic kidney disease. Urol., 159:702, 1998. HULBERT, J.C.; SHEPARD, T.G.; EVANS, R.M. Laparoscopic surgery for renal cystic disease. J. Urol., 147:433A, 1992. JAHNSEN, J.U.; SOLHAUG, J.H. Extirpation of benign renal cysts with laparoscopic technique. Tidsskr. Nor Laegeforen, 112:3552-3554, 1992. DÉNES, F.T.; CASTILHO, L.N.; MITRE, A.I.; ARAP, S. Nefrectomia videolaparoscópica em crianças: experiência com 12 casos. J. Bras., 24:84-87, 1998. MUNCHH, L.C.; GILL, I.S.; McROBERTS, J.W. Laparoscopic retroperitoneal renal cystectomy. J. Urol., 151:135, 1994. RADOVIC, N.; POPOVIC, D.; RIFAI, M. et al. Retroperitoneal marsupialization of renal cysts. Lijec Vjesn, 119:16-19, 1997. WAHLQVIST, L.; GRUUMSTEDT, B. Therapeutic effect of percutaneous puncture of simple renal cyst: Follow-up investigation of 50 patients. Acta Chirurgica Scandinavica, 132:340-347, 1966. PLAS, E.G.; HÜBNER, W.A. Percutaneous resection of renal cysts: A long-term follow-up. J. Urol., 149:703-705, 1993. GILL, I.S.; DESAI, M.M.; KAOUK, J.H.; MERANEY, A.M.; MURPHY, D.P.; SUNG, G.T.; NOVICK, A.C. Laparoscopic partial nephrectomy for renal tumor: Duplicating open surgical techniques. J. Urol., 167:469-476, 2002. MILLER, S.D.; Ng CS; STREEM, S.B.; GILL, I.S. Laparoscopic management of caliceal diverticular calculi. J. Urol., 167:1248-1252, 2002. CASTILHO, L.N. e cols. Laparoscopia Urológica, 1.ª ed. LPC Comunicações, 179-231, 2000. HERING, F.L.O.; SROUGI; M. Urologia, Diagnóstico e tratamento, 1.ª ed. Roca, 307-310, 1998. KAUOK, J.H.; BANKS, K.L.; DESAI, M.H. et al. Laparoscopic anatrophic nephrolithotomy. J. Urol., 165:376, abstract 1542, 2001. PORTIS, A.J.; YAN, Y.; LANDMAN, J.; CHEN, C.; BARRET, P.H.; FENTE, D.D.; ONO, Y.; McDOUGALL, E.M.; CLAYMAN, R.V. Long-term follow-up after laparoscopic radical nephrectomy. J. Urol., 167:1257-1262, 2002. DELMAS, P.; ZHOU, J. et al. Constitutive activation of G-proteins by polycystin-1 is antagonized by polycystin-2. J. Biol. Chem., 277(13):11276-11283, 2002.
596
Doenças Císticas Renais
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA Brenner and Rector’s The Kidney, sexta edição, 2000; Cap. 38. Diseases of the Kidney, sétima edição; Robert W. Schrier (Editor), Carl W. Gottschalk (Editor), 2001.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Revisões sobre DRP http://www.niddk.nih.gov/health/kidney/pubs/polycyst/ polycyst.htm http://www.nephrologychannel.com/polycystic/ PKD Foundation http://www.pkdcure.org/home.htm Teste de ligação de genes para PKD no Brasil http://www.genomic.com.br/siteantigo/inst/dna/ item06_02.htm
Capítulo
32
Nefropatia Diabética Jorge L. Gross, Sandra P. Silveiro, Luís H. Canani e Mirela J. de Azevedo
IMPORTÂNCIA DO PROBLEMA: EPIDEMIOLOGIA
Prevenção primária
ESTÁGIOS E CURSO CLÍNICO DA ND
Prevenção secundária
Fase de nefropatia incipiente
Dieta
Fase de nefropatia clínica
Controle metabólico: glicose e lipídios séricos
FATORES DE RISCO E PATOGÊNESE Fatores não-genéticos Fatores genéticos Outros fatores de risco DIAGNÓSTICO, MONITORIZAÇÃO E DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Tratamento da HAS Inibidores da enzima conversora da angiotensina e antagonistas dos receptores da angiotensina II CONCLUSÕES REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
TRATAMENTO
IMPORTÂNCIA DO PROBLEMA: EPIDEMIOLOGIA A nefropatia diabética (ND) é uma complicação crônica do diabete melito (DM) que acomete cerca de 35% dos pacientes com DM tipo 1, sendo a principal causa de morte neste grupo. Nos pacientes com DM tipo 2, sua prevalência varia de 10 a 40% e, neste grupo, a principal causa de morte é a doença cardiovascular. A ND está associada a um aumento da mortalidade de aproximadamente 100 vezes em pacientes com DM tipo 1 e de 5 vezes nos pacientes com DM tipo 2, sendo a principal causa de ingresso em programas de diálise em países desenvolvidos. Nos Estados Unidos, cerca de 40% dos pacientes em programa de substituição renal são portadores de DM.1 Já no Brasil, na Grande São Paulo, os pacientes diabéticos representam 10,9% dos pacientes em programas de diálise.2 No Rio Grande do Sul, no ano de 1992, a doença renal primária foi atribuída ao DM em 15% dos pacientes.3 Esta proporção vem aumentando, e em estudo
mais recente cerca de 26% dos pacientes em hemodiálise apresentaram o diagnóstico de ND, sendo a sobrevida média destes pacientes de apenas 26 meses.4
ESTÁGIOS E CURSO CLÍNICO DA ND A ND apresenta em seu curso clínico três etapas evolutivas: a fase de nefropatia incipiente, a fase de nefropatia clínica e a fase de insuficiência renal terminal. A fase final da ND, onde ocorre uremia e necessidade de diálise ou transplante, não será objetivo deste capítulo.
Fase de Nefropatia Incipiente Esta etapa é caracterizada por níveis aumentados de excreção urinária de albumina (EUA 20-200 g/min), definidos como microalbuminúria. O ponto de corte de EUA considerado como microalbuminúria, e até hoje ado-
598
Nefropatia Diabética
tado, foi definido em estudos prospectivos do início da década de 80, que estabeleceram quais os valores de EUA preditivos para o desenvolvimento de ND.5,6 A microalbuminúria ocorre em 30 a 45% dos pacientes com DM tipo 1, especialmente naqueles cuja doença já dura mais de 10 anos. Em pacientes com DM tipo 2, a prevalência de microalbuminúria varia de 13 a 26%, e, ao contrário dos pacientes com DM tipo 1, pode ocorrer em 20% dos pacientes na ocasião do diagnóstico do DM.7 A função renal medida pela taxa de filtração glomerular (TFG) usualmente se mantém estável nos pacientes microalbuminúricos até que a EUA atinja valores próximos aos da fase de nefropatia clínica. A EUA aumenta cerca de 20% ao ano em indivíduos que não realizam qualquer tipo de tratamento, de tal maneira que estes pacientes permanecem por 8-10 anos nesta fase da ND. No entanto, em alguns pacientes pode haver rápida progressão, provavelmente devido à presença de fatores como o mau controle glicêmico, os níveis tensionais elevados, dislipidemia e o hábito de fumar ou mesmo fatores genéticos. Estudos recentes têm demonstrado que a progressão para a proteinúria (ou fase de nefropatia clínica) ocorre em apenas 30 a 45% dos pacientes com DM tipo 1 microalbuminúricos, enquanto cerca de 30% podem regredir para normoalbuminúria e entre 25 a 40% podem permanecer microalbuminúricos por cerca de 10 anos. Resultados semelhantes foram observados em pacientes com DM tipo 2. 8 Os pacientes microalbuminúricos, à semelhança dos pacientes com nefropatia clínica, já apresentam associações que configuram um perfil aterogênico e, portanto, favorecem o aparecimento de cardiopatia isquêmica. Os níveis pressóricos estão aumentados nos pacientes microalbuminúricos, embora, em geral, ainda dentro dos limites da normalidade, podendo ocorrer um menor descenso noturno da pressão arterial.9 A presença de microalbuminúria está associada também à dislipidemia, alterações da função endotelial e dos fatores de coagulação. As alterações dos lipídios séricos descritas são: aumento do LDL colesterol e da apolipoproteína B1, triglicerídeos e diminuição do HDL2 colesterol.10 As alterações da função endotelial e disfunção hemostática caracterizam-se por aumento do fator plasmático VII, da atividade do inibidor-1 do ativador do plasminogênio e do fibrinogênio plasmático.11,12 Além disso, a microalbuminúria per se é um fator de risco independente para cardiopatia isquêmica e para aumento da mortalidade tanto em pacientes com DM tipo 1 quanto para o DM tipo 2.13 Finalmente, pacientes microalbuminúricos já apresentam alterações histopatológicas renais, como espessamento da membrana basal glomerular e aumento do volume do mesângio. Nos pacientes com DM tipo 2 e microalbuminúria tem sido descrita uma heterogeneidade nas alterações estruturais renais, desde ausência de anormalida-
des até presença de alterações compatíveis com glomerulopatia diabética típica.14
Fase de Nefropatia Clínica É definida por uma EUA 200 g/min ou proteinúria de 24 horas 500 mg. Esta etapa é também conhecida por fase de proteinúria ou de macroalbuminúria. Nesta fase da doença renal, os pacientes DM tipo 2 em geral apresentam idade avançada, obesidade, mais do que 10 anos de duração de DM, presença de hipertensão arterial (HAS), hipercolesterolemia e mau controle glicêmico.15,16 A presença de HAS ocorre em cerca de 73 a 90% dos pacientes e comumente estão presentes outras complicações crônicas do DM, como neuropatia periférica, neuropatia autonômica e retinopatia. Os pacientes com DM tipo 2 proteinúricos apresentam mais freqüentemente manifestações de macroangiopatia. Em pacientes DM tipo 2 com cardiopatia isquêmica, foi descrita uma associação de nefropatia clínica com a presença de cardiopatia isquêmica assintomática, caracterizada por ausência de angina pectoris e alterações eletrocardiográficas e/ou na cintilografia do miocárdio compatíveis com cardiopatia isquêmica.17 Nos pacientes com DM tipo 1, a partir do diagnóstico de nefropatia clínica, ocorre uma redução nos valores de TFG da ordem de 1 ml/min/mês. Embora possa haver uma grande variação interindividual, em um mesmo paciente esta perda costuma ser de mesma magnitude. A perda de função renal em pacientes com DM tipo 2 é mais heterogênea, podendo ocasionalmente ser mais lenta,18 com valor de declínio da TFG de aproximadamente 0,5 ml/ min/mês.19 Os principais determinantes da velocidade de declínio da TFG são os níveis de pressão arterial,20 os níveis de colesterol sérico,21 o hábito de fumar,22 o controle glicêmico,23 o nível de proteinúria ( 2 g de proteínas totais em 24 h) e o grau de lesão histopatológica renal.24 Fatores genéticos como polimorfismos do gene da enzima conversora da angiotensina (ECA) e da ectonucleotídeo pirofosfatase-fosfodiesterase 1 (ENPP1), previamente denominada PC-1, parecem estar envolvidos na velocidade de perda de função renal, determinando um pior prognóstico.25-27 Sem intervenção terapêutica específica, em cerca de 7 a 10 anos após o surgimento de proteinúria persistente os pacientes necessitarão de tratamento substitutivo da função renal. Embora ainda persista alguma controvérsia em relação ao papel do controle glicêmico na progressão da doença renal estabelecida (micro- e macroalbuminúria),28 existem evidências da associação de melhor controle com perda mais lenta de função renal.23 Reforçam esta observação os achados de que em pacientes DM tipo 1 as lesões histopatológicas renais da ND podem regredir a longo prazo após a reversão para o estado de normoglicemia através da realização de transplante de pâncreas.29
599
capítulo 32
Pontos-chave: • ND acomete cerca de 35% dos pacientes com DM tipo 1. Nos pacientes com DM tipo 2, sua prevalência varia de 10 a 40% • É a principal causa de ingresso em programas de diálise em países desenvolvidos • A ND apresenta em seu curso clínico três etapas evolutivas: a fase de nefropatia incipiente, a fase de nefropatia clínica e a fase de insuficiência renal terminal
FATORES DE RISCO E PATOGÊNESE Fatores genéticos e não-genéticos parecem concorrer para o desenvolvimento da ND. Entre os fatores não-genéticos, alguns têm sido mais bem estudados, como o mau controle glicêmico30 e pressórico,31 a hipercolesterolemia16,32 e outros fatores não tão bem estabelecidos, como o tabagismo,33 fatores alimentares34,35 e fatores hemodinâmicos, como a hiperfiltração glomerular e alterações da homeostase pressórica.36-39
Fatores Não-genéticos A hiperglicemia é um fator importante na gênese da ND. Entre os mecanismos relacionados à hiperglicemia crônica estão a glicação não-enzimática e as alterações na via dos polióis. Os produtos de glicação não-enzimática podem causar alterações quantitativas e qualitativas nos componentes da matriz extracelular, contribuindo para a ocorrência de oclusão glomerular. A hiperglicemia promove um aumento da atividade na via dos polióis. Nesta via, a glicose é reduzida à sorbitol, sob ação da aldose redutase. O acúmulo do sorbitol ocasionaria estresse hiperosmótico para as células, diminuição do mioinositol intracelular e redução da atividade da ATPase Na/K dependente, levando ao dano celular. Estudos prospectivos confirmam que a HAS é um fator de risco importante para o desenvolvimento da ND16,31,40 e também o fator promotor de progressão mais relevante. Nelson e colaboradores demonstraram que a pressão arterial inicial mais elevada relacionou-se ao aumento da EUA ao final do período de acompanhamento de índios pimas.41 Estudos de intervenção têm confirmado os benefícios do tratamento da HAS na prevenção das complicações microvasculares. No UKPDS 38, foi demonstrado que o controle rigoroso da pressão arterial em pacientes com DM tipo 2 promoveu uma diminuição do surgimento das complicações microvasculares.42
Fatores Genéticos A participação dos fatores genéticos é sugerida pela observação de que a ND afeta apenas uma proporção dos pacientes com DM. Entre os estudos que abordam os aspectos genéticos da ND estão os que analisam a predisposição genética como um elemento importante no desenvolvimento da ND. Nesta categoria estão incluídos os estudos epidemiológicos, os de família e os que utilizam a técnica de genoma wide scan (rastreamento do genoma). Um segundo tipo de estudo engloba aqueles que tentam identificar os respectivos genes envolvidos na predisposição propriamente dita, sendo que a técnica de genoma wide scan é aqui também utilizada. Os estudos epidemiológicos sugerem que, na presença de hiperglicemia, os indivíduos geneticamente susceptíveis para o desenvolvimento da ND irão desenvolvê-la nos primeiros 15-20 anos do início do DM. Após este período, os novos casos são raros e a incidência acumulada de ND atinge um platô.43 Os estudos de famílias podem ser divididos em estudos de irmãos diabéticos e estudos de extensos pedigrees (várias gerações em famílias). Os estudos de pares de irmãos (Quadro 32.1) avaliam o risco de um irmão diabético desenvolver ND quando na presença ou não de ND no paciente em estudo (caso índice). Apesar de utilizarem diferentes critérios para definição da ND, estes estudos demonstram que a presença de ND no caso índice pelo menos triplica a chance do irmão também apresentar ND. Este achado é semelhante tanto em pacientes com DM tipo 1 quanto com DM tipo 2. Outra abordagem utilizando famílias consiste no estudo do comportamento de determinado fenótipo em vários membros em diversas gerações de um mesmo pedigree. Foi demonstrado que a EUA tem um componente hereditário em indivíduos com ou sem DM, semelhante à hereditariedade observada em relação à pressão arterial.44 Os estudos que utilizam a técnica de genoma wide scan, que em um primeiro momento tenta identificar regiões cromossômicas associadas com a ND, são sensíveis para identificar genes com efeitos moderados ou maiores, não sendo capaz de identificar genes com efeitos menores.45 Existem dois estudos deste tipo publicados até o momento. O primeiro foi realizado nos índios pimas com DM tipo 2,46 onde quatro regiões foram identificadas como associadas à ND. A região com maior associação foi localizada no braço longo do cromossoma 7 (7q). Outros possíveis loci foram identificados nos cromossomas 3q, 9q e 20p. Em pacientes com DM tipo 1, resultados parciais identificaram a região do braço longo do cromossoma 3 como associada à ND.47 Três outros cromossomas, ainda em fase de análise, também apresentam associações positivas com a ND.45 Até o momento as tentativas de isolar os genes responsáveis por essas associações foram sem sucesso.45 Os estudos que têm por objetivo identificar os genes causadores da ND são os estudos de genes candidatos e os estudos de linkage (associação) que utilizam a técnica de ge-
600
Nefropatia Diabética
Quadro 32.1 Estudos de pares de irmãos e agregação de nefropatia diabética
População
Caso índice
Prevalência de ND no irmão (n.º de irmãos com DM)
Caucasianos EUA
Com IRT (n 26) Sem ND (n 11)
82% (29) 17% (12)
24 (4,04-145)
Borch-Johnsen et al.98
Caucasianos Dinamarca
Com ND (n 20) Sem DN (n 29)
33% (21) 10% (30)
4,9 (1,2-19,0)
Quinn et al.52
Caucasianos EUA
Com ND (n 38) Sem ND (n 72)
71,5% (44) 25% (81)
2,5 (1,3-8,0)
Caucasianos Itália
Com ND (n 56) Sem ND (n 78)
47,1% (74) 14,2% (113)
3,9 (1,93-9,01)
Brasil (Sul)
Com ND (n 41) Sem ND (n 49)
53,1% (49) 25,7% (58)
3,2 (1,34-7,95)
DM tipo 1 Seaquist et al.97
DM tipo 2 Faronatto et al.53 Canani et al.54
Razão de chance (IC 95%)
ND nefropatia diabética; IC 95% intervalo de confiança de 95%; IRT insuficiência renal terminal.
noma wide scan. A abordagem do genoma wide scan, já comentada anteriormente, não depende do conhecimento prévio das vias envolvidas na patogênese da ND e pode ser uma ferramenta útil na identificação de novos genes e possivelmente novas rotas envolvidas na gênese da ND.45 Isto abre oportunidades para novas terapias direcionadas para os mecanismos específicos que levam à lesão renal. Já a avaliação de genes candidatos, através de estudos que avaliam a associação de polimorfismos de genes de interesse previamente conhecidos e a presença de ND, leva em consideração o conhecimento de possíveis fatores envolvidos na patogênese da ND. Apesar deste tipo de estudo apresentar grande poder de análise e relativa facilidade de realização, a maioria inclui pequeno número de pacientes e não é reprodutível, representando possivelmente associações espúrias. Exemplos de estudos que encontraram resultados conflitantes foram os dos polimorfismos dos genes da ECA48 e os da paraoxonase 1 e 2 (PON1 e PON2)49,50 e da aldose redutase.45 Ainda dentro dos aspectos genéticos relacionados à ND, parece existir uma associação entre o desenvolvimento de ND e a predisposição genética para a HAS. Alguns autores descreveram a presença de níveis pressóricos mais elevados nos pais de pacientes com DM tipo 1 portadores de ND.51 Além de uma maior freqüência de história familiar de HAS e de ND, pacientes com ND apresentam também maior prevalência de história familiar de cardiopatia isquêmica.52 De fato, a associação de alterações na homeostase pressórica e desenvolvimento de ND parece ocorrer precocemente. Níveis mais elevados de pressão arterial (monitorização de pressão arterial em 24 horas) e de EUA foram observados nos pacientes DM tipo 1 normoalbuminúricos que evoluem para microalbuminúria.9 A atividade do sistema de contratransporte eritrocitário
de sódio-lítio é geneticamente determinada e, na população não-diabética, está associada ao risco de hipertensão essencial. Em pacientes com DM tipo 1 e nefropatia clínica, assim como em seus pais, e também nos pacientes com microalbuminúria, a atividade deste sistema está aumentada.51 Estas observações sugerem que a predisposição genética à ND esteja realmente relacionada à predisposição à HAS.
Outros Fatores de Risco Fatores alimentares também podem constituir fator de risco para o surgimento de ND. Pacientes com DM tipo 1 que relatam um consumo de proteínas inferior a 20% do valor energético total apresentam níveis de albuminúria inferiores aos daqueles com consumo protéico mais elevado.34 Foi demonstrado também que uma maior ingestão de proteína oriunda de peixe parece estar associada à redução do risco de desenvolver ND em pacientes com DM tipo 1.35 Outro possível marcador de predisposição para a ND é o aumento da TFG. A prevalência de hiperfiltração glomerular em pacientes com DM tipo 1 é de 25% e em pacientes com DM tipo 2 é de 20 a 40%. A hipótese hemodinâmica postula que a hiperfiltração glomerular ocasionaria dano direto à parede capilar, além de provocar um aumento na passagem de macromoléculas e depósito destas no mesângio. Estes eventos levariam a alterações na permeabilidade da membrana e, posteriormente, ao fechamento capilar glomerular, através da glomeruloesclerose. Os capilares menos afetados sofreriam uma hiperfiltração compensatória, fechando um círculo que favoreceria o dano glomerular progressivo.53 A favor de um papel da hiperfiltração no desenvolvimento da ND está a observação de que pacientes diabéticos com rim único, um modelo de marcada hiperfiltração glomerular, apresentam mais freqüentemente níveis
capítulo 32
elevados de EUA do que pacientes não-diabéticos também com rim único.21 Existem poucos estudos prospectivos de longa duração que avaliem a hiperfiltração glomerular como fator de risco para ND. Nestes, ou a hiperfiltração foi considerada um fator de risco,36 ou foi um determinante de aumento dos níveis pressóricos ao final do período de acompanhamento.37,54 Pacientes diabéticos tipo 1 e tipo 2 com hiperfiltração glomerular têm uma redução da TFG ao longo do tempo significativamente maior do que pacientes com TFG normal.37-39 Entretanto, o papel da TFG elevada no desenvolvimento da ND ainda não está totalmente esclarecido, podendo este risco estar relacionado à presença de alterações pressóricas. De fato, pacientes DM tipo 1 normoalbuminúricos e normotensos com TFG aumentada apresentam ausência de descenso noturno da pressão arterial.55 Níveis de albuminúria mais elevados, ainda que dentro da faixa de normoalbuminúria, também têm sido indicados como marcadores de risco para o desenvolvimento de ND. Estudos prospectivos de pacientes com DM tipo 232,56,57 e de pacientes com DM tipo 128,58 sugerem que mesmo níveis “normais altos” de EUA podem indicar risco de progressão para ND. Em estudo prospectivo de 10 anos, a análise multivariada demonstrou um risco 29 vezes maior de desenvolvimento de ND em pacientes com DM tipo 2 portadores de EUA acima de 10 g/min.56 Portanto, níveis de albuminúria abaixo do valor crítico de 20 g/min já poderiam ser preditivos de doença renal futura, identificando pacientes em risco e merecedores de tratamento intensivo dos outros fatores de risco associados, como mau controle glicêmico, pressórico e lipídico.
Pontos-chave: Fatores de risco à ND • Não-genéticos Hiperglicemia Hipertensão arterial Hipercolesterolemia ? Tabagismo ? Alimentação ? Hiperfiltração e alterações da homeostase pressórica • Genéticos Regiões cromossômicas associadas à ND Predisposição genética à HAS
DIAGNÓSTICO, MONITORIZAÇÃO E DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Raramente, a ND ocorre com pouco tempo de DM, devendo o rastreamento iniciar-se após cinco anos de dura-
601
ção em pacientes com DM tipo 1.59 Embora as complicações microvasculares sejam raras antes da puberdade, existem evidências de que a duração de DM pré-puberal possa ser importante no desenvolvimento destas complicações, como por exemplo para a retinopatia.60 Portanto, pacientes pré-púberes com longa duração de DM devem ser também avaliados para ND.59 Em pacientes com DM tipo 2, o rastreamento da ND deve ser feito por ocasião do diagnóstico de DM.59 Em pacientes com DM tipo 1 e tipo 2, o rastreamento deve ser repetido a intervalos de um ano. O rastreamento deve começar com a realização de exame comum de urina e urocultura em amostra casual de urina. Na ausência de hematúria e de infecção urinária e presença de proteínas no exame comum de urina, deve-se realizar dosagem de proteínas totais em urina de 24 horas, e na ausência de proteinúria, proceder à dosagem de albuminúria.59 Ao invés de utilizar a presença ou não de proteínas no exame comum de urina, recomendamos a medida da concentração de proteínas totais por método quantitativo na mesma amostra de urina casual.61 Valores 430 mg/L apresentam uma sensibilidade de 100% e especificidade de 79,6% para o diagnóstico de nefropatia clínica.62 Este diagnóstico deve ser confirmado com dosagem de proteínas totais em urina de 24 horas. Se o valor de proteínas totais na amostra casual de urina for 430 mg/L, deve-se realizar medida de albuminúria na mesma amostra de urina. Valores de albuminúria 17 mg/L são diagnósticos de microalbuminúria, e valores menores do que este são considerados normais.63 A presença de microalbuminúria deve ser também confirmada em urina de 24 horas, preferencialmente em coleta com tempo marcado. Portanto, o rastreamento da ND deve ser iniciado com a realização de medida quantitativa de proteínas em amostra casual de urina, utilizando os valores acima sugeridos, o que aumenta a acurácia do diagnóstico de nefropatia clínica, e seguida, quando indicado, da dosagem de albuminúria na mesma amostra, o que reduz o número de coletas de urina e o custo do rastreamento. No Quadro 32.2 estão descritos os valores de albuminúria e de proteinúria utilizados para o diagnóstico de ND. A dosagem de albumina na urina deve ser realizada através de técnica sensível e específica, sendo os métodos de medida por imunoturbidimetria ou por radioimunoensaio comparáveis. Devido à grande variabilidade biológica da EUA, o diagnóstico de microalbuminúria deve ser sempre confirmado em pelo menos 2 de 3 amostras com um intervalo de 3 a 6 meses.59 Além da variabilidade intra-individual, diferentes fatores interferem na medida da EUA.64 Tanto fatores fisiológicos quanto não-fisiológicos devem ser levados em consideração (Quadro 32.3). Nos pacientes com diagnóstico de micro- ou macroalbuminúria deve ser realizada a medida da TFG pelo menos anualmente para avaliação de perda de função renal ou de eficácia de intervenção terapêutica. Caso não seja possível utilizar método preciso (TFG medida pelo 51Cr EDTA ou por
602
Nefropatia Diabética
Quadro 32.2 Valores de albuminúria e de proteinúria utilizados no diagnóstico de nefropatia diabética Categoria Normal Albuminúria Nefropatia Incipiente Microalbuminúria Nefropatia Clínica Macroalbuminúria Proteinúria
Urina de 24 horas*
Amostra de urina casual**
20 g/min ( 30 mg)
17 mg/L
20 a 200 m/min (30-300 mg)
17 a 173 mg/L
200 g/min ( 300 mg)
174 mg/L
500 mg/24 h
430 mg/L
*American Diabetes Association.59 **Zelmanovitz T. et al.63 Zelmanovitz T. et al.62 Albuminúria: urina de 24 h com tempo marcado g/min; urina de 24 h sem tempo marcado mg.
Quadro 32.3 Fatores que aumentam os valores da albuminúria • • • • • • •
Mau controle metabólico Infecção do trato urinário Exercício físico Níveis pressóricos elevados Obesidade maciça Insuficiência cardíaca Doença aguda ou febre
Hematúria Ingestão protéica Ingestão de água Menstruação, leucorréia • Gestação
• • • •
aumento da EUA ou proteinúria em pacientes com DM tipo 1 (3 a 8%) ou com DM tipo 2 (12%).66 Neste sentido, são sugestivos de um diagnóstico alternativo: aparecimento de proteinúria com menos do que 10 anos de duração de DM, velocidade de queda da TFG maior do que a esperada, aparecimento súbito de síndrome nefrótica, presença de hematúria e elevação de creatinina sérica sem aumento concomitante de EUA ou proteinúria.
TRATAMENTO inulina), recomenda-se que seja utilizado o cálculo estimado da TFG através da fórmula de Cockroft e Gault [(140 – idade) peso/72 creatinina; em mulheres 0,85], que fornece uma avaliação acurada da função renal em pacientes com ND e tem melhor correlação com a TFG do que a medida da depuração de creatinina endógena.18,65 No diagnóstico diferencial da ND, deve ser lembrado que outras doenças renais podem ser responsáveis pelo
Pontos-chave: • Ao invés de utilizar a presença ou não de proteínas no exame comum de urina, recomendamos a medida da concentração de proteínas totais por método quantitativo na mesma amostra de urina casual • Nos pacientes com diagnóstico de micro- ou macroalbuminúria, deve ser realizada a medida da TFG pelo menos anualmente para avaliação de perda de função renal ou de eficácia de intervenção terapêutica
Prevenção Primária A prevenção primária consiste em evitar a instalação da ND através da remoção ou modificação dos fatores de risco conhecidos. Duas estratégias são amplamente comprovadas como eficazes: o controle intensivo dos níveis glicêmicos e da pressão arterial. Em pacientes com DM tipo 167 e com DM tipo 2,68 o controle glicêmico estrito, obtido com bombas de infusão subcutânea de insulina ou múltiplas injeções diárias, é capaz de reduzir de forma significativa a incidência de microalbuminúria e de macroalbuminúria. Ao ser instituído o controle metabólico intensivo, principalmente em pacientes com DM tipo 2, devido à faixa etária deste grupo, deve ser considerada a concomitância de complicações macrovasculares e a vulnerabilidade à hipoglicemia, principal paraefeito de insulinoterapia intensiva. Em um grande estudo multicêntrico europeu com pacientes DM tipo 2, o UKPDS, o controle glicêmico intensivo com medicamentos orais para o DM também se mostrou eficaz em reduzir o risco de complicações microvasculares, entre elas a microalbuminúria.69 O tratamento anti-hipertensivo, especialmente em pacientes com DM tipo 2, também é capaz de prevenir a ins-
capítulo 32
talação da ND. O controle estrito da pressão arterial reduz cerca de 30% o risco de aparecimento da microalbuminúria.42 Deve ser lembrado que para a obtenção de um controle pressórico adequado é necessário o uso de múltiplos agentes anti-hipertensivos. Esta observação foi recentemente demonstrada no UKPDS,42,70 onde mais de 50% dos pacientes sob tratamento intensivo da HAS utilizaram múltiplas drogas. Como possível estratégia alternativa na prevenção primária da ND está a utilização de agentes inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA), independente da presença de HAS. Em pacientes DM tipo 2 normoalbuminúricos e normotensos, o enalapril reduziu o aparecimento da ND.71,72 No entanto, confirmações adicionais fazem-se necessárias antes da recomendação formal do uso destes agentes para a prevenção da ND. Em pacientes com DM tipo 1 normoalbuminúricos foi demonstrado que a adoção de uma dieta à base de carne de galinha e peixe reduziu a hiperfiltração glomerular tanto quanto uma dieta hipoprotéica.55 Entretanto, o significado a longo prazo deste efeito não é conhecido e até o presente não existem evidências de que intervenções dietéticas evitem o surgimento da ND.
Prevenção Secundária O tratamento da ND visa normalizar os níveis de EUA retardando ou revertendo o processo evolutivo da ND. A efetividade das diferentes intervenções terapêuticas pode variar conforme o estágio da ND. Os pacientes com nefropatia clínica devem ser avaliados pelo menos a cada três meses e deve ser feito todo o esforço para a obtenção de um bom controle pressórico e glicêmico. Paralelamente, os fatores de risco cardiovascular e de progressão da ND modificáveis devem ser agressivamente tratados, como a dislipidemia e o tabagismo (Quadro 32.4). Deve ser enfatizado o uso de aspirina em pacientes micro- e macroalbuminúricos como estratégia de
Quadro 32.4 Intervenções recomendadas para retardar a progressão da nefropatia diabética Intervenção
Objetivos
Controle da pressão arterial Inibição do sistema reninaangiotensina Correção da dislipidemia
130/80 mmHg Proteinúria 0,3 g/24 h
Controle glicêmico Dieta hipoprotéica (0,8 g/kg) Suspensão do fumo e do álcool é recomendada Modificado de Remuzzi G. et al.87
Colesterol LDL 100 mg/dl Glico-hemoglobina 7% Proteinúria 0,3 g/24 h —
603
prevenção primária da doença cardiovascular.73 Além disso, é importante pesquisar e tratar adequadamente as demais complicações associadas à ND, como a retinopatia e a neuropatia periférica e autonômica.
DIETA Em pacientes com microalbuminúria e DM a adoção de uma dieta hipoprotéica reduz os níveis de EUA.74 Entretanto, não existem estudos em longo prazo que demonstrem que esse efeito seja persistente e que esses pacientes não evoluam para nefropatia clínica. A modificação do tipo de carne da dieta assim como a substituição da proteína animal pela proteína vegetal têm sido analisadas e sugeridas como possíveis alternativas para o tratamento da ND.75 Em pacientes com DM tipo 2 e microalbuminúricos, demonstrou-se que uma dieta normoprotéica à base de galinha reduziu mais a EUA do que uma dieta hipoprotéica, representando, talvez, uma medida terapêutica alternativa mais eficaz, sem custo adicional e paraefeitos, e de melhor adesão pelo paciente do que a dieta hipoprotéica. Além disso, a dieta à base de carne de galinha determinou uma redução dos níveis de colesterol total de cerca de 18%.76 Já em pacientes com nefropatia clínica, a redução do conteúdo protéico da dieta em longo prazo (cerca de três anos) diminuiu os níveis de EUA e a velocidade de redução da TFG, assim como a necessidade de tratamento substitutivo renal.77 O estado nutricional parece não ter sido afetado nos pacientes que seguiram esta dieta, apesar de não haver estudos delineados com esta finalidade em pacientes com DM. Já em fases avançadas da ND quando ocorre uremia, a redução de proteínas da dieta, apesar de promover alívio sintomático, não modifica a evolução para a terapia de substituição renal. A recomendação atual em relação a pacientes com nefropatia clínica é a prescrição de uma dieta com moderada restrição de proteínas, cerca de 0,8 g/kg/dia.59 Se esta dieta não diminuir a velocidade de declínio da TFG, sugerese a adoção de restrição mais intensa (0,6 g/kg/dia). Em pacientes com microalbuminúria, a redução de proteínas da dieta pode ser uma alternativa de tratamento especialmente útil nos pacientes macroalbuminúricos quando não for possível utilizar os inibidores da ECA ou os bloqueadores do receptor da angiotensina II (contra-indicações ou efeitos colaterais), ou quando a resposta ao seu uso for pobre. Entretanto, a adesão a este tipo de dieta é baixa.
CONTROLE METABÓLICO: GLICOSE E LIPÍDIOS SÉRICOS Existe uma associação entre mau controle metabólico e albuminúria nos pacientes com micro- e macroalbuminúria. Nos pacientes com nefropatia clínica, um melhor controle glicêmico associado a um controle estrito dos níveis pressóricos pode reduzir a perda de função renal.23 Em
604
Nefropatia Diabética
pacientes com DM tipo 1 e microalbuminúria, embora tenha sido demonstrado que um pior controle metabólico do DM relaciona-se com evolução desfavorável da ND,78 o controle glicêmico estrito não foi capaz de reduzir a progressão para fases mais avançadas.28,79 Portanto, no presente momento, existem ainda dúvidas em relação ao papel do controle metabólico intensivo na progressão da ND. Embora em animais exista a sugestão de que os lipídios séricos possam estar envolvidos na patogênese da ND,80 os resultados dos poucos estudos clínicos existentes são controversos. O uso de inibidores da HMG Coa redutase por períodos longos resultou em menor declínio da TFG em pacientes proteinúricos.81 Em pacientes com nefropatia incipiente pode ocorrer82 ou não83 redução da albuminúria.
TRATAMENTO DA HAS Os efeitos benéficos da redução da pressão arterial em pacientes com nefropatia clínica — diminuição significativa da taxa de declínio da TFG e da proteinúria — estão bem documentados.20,84,85 O tratamento anti-hipertensivo adequado comprovadamente aumenta a sobrevida dos pacientes portadores de nefropatia clínica. Dependendo da fase de ND, a HAS pode estar relacionada à própria nefropatia, como ocorre na fase de macroalbuminúria com perda de função renal e retenção de líquidos. Por outro lado, em pacientes com DM tipo 2 a HAS já está presente em cerca de 30% dos pacientes por ocasião do diagnóstico do DM, podendo estar relacionada à síndrome de resistência à insulina, à HAS essencial ou a causas secundárias, como por exemplo estenose de artéria renal. Estas considerações devem ser lembradas, assim como a presença de co-morbidades e de outras complicações crônicas do DM, ao ser instituído o tratamento anti-hipertensivo nestes pacientes. Os objetivos do tratamento anti-hipertensivo para os pacientes com ND são os mesmos para os pacientes com DM em geral: manter a pressão arterial sistólica 130 mmHg e a diastólica 80 mmHg.67 Tais valores estão de acordo com os resultados do estudo HOT, que teve como objetivo determinar o melhor nível pressórico para reduzir morbimortalidade em pacientes hipertensos.86 Nos pacientes diabéticos analisados neste estudo, níveis diastólicos 80 mmHg se associaram à maior redução na incidência de eventos cardiovasculares. Nos pacientes com hipertensão sistólica isolada e níveis de pressão 180 mmHg, o objetivo inicial é reduzir a pressão sistólica a níveis inferiores a 160 mmHg. Para aqueles pacientes com pressão sistólica entre 160 e 179 mmHg o objetivo é uma redução inicial de 20 mmHg. Uma vez alcançados estes objetivos e se o paciente tolerar, deve tentar-se uma maior redução dos níveis de pressão. Em pacientes com insuficiência renal, alguns autores preconizam níveis ainda mais baixos de pressão arterial como objetivo terapêutico, da ordem de 120/70 mmHg.87
No entanto, níveis de pressão arterial diastólica menores do que 70 mmHg devem ser evitados, pois nestes casos pode ocorrer perda do efeito benéfico da redução da pressão arterial.88
INIBIDORES DA ENZIMA CONVERSORA DA ANGIOTENSINA E ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES DA ANGIOTENSINA II O bloqueio do sistema renina-angiotensina tem-se mostrado útil no tratamento da ND, prevenindo a evolução da microalbuminúria para a macroalbuminúria e a progressão da macroalbuminúria, assim como reduzindo a mortalidade em geral. Os inibidores da ECA estão indicados para o tratamento da ND (micro- e macroalbuminúria) mesmo em indivíduos normotensos. Em pacientes com DM tipo 1 e microalbuminúria, ocorre redução nos níveis de EUA com o uso de inibidores da ECA, independente da redução dos níveis pressóricos.89 Nos pacientes DM tipo 2 microalbuminúricos ocorre estabilização ou redução dos níveis de EUA com o uso destas drogas. Também foi demonstrado que a progressão para nefropatia clínica é reduzida tanto em pacientes microalbuminúricos do tipo 1 quanto do tipo 2 que utilizaram inibidores da ECA.72,89-91 Nos pacientes diabéticos com nefropatia clínica, os inibidores da ECA, além de diminuir os níveis de proteinúria ( 30%), também são capazes de reduzir a velocidade de decaimento da TFG.92 Mais importante é a observação de que em pacientes com DM tipo 1 e nefropatia clínica e níveis de creatinina sérica 2,5 mg/dl, estas drogas (captopril) reduzem em 50% a necessidade de diálise ou de transplante renal ou de morte (risco combinado) em um período de quatro anos de uso.92 No entanto, não existe comprovação de redução de mortalidade isoladamente com o uso de inibidores da ECA em pacientes com ND. A favor de uma ação nefroprotetora específica dos inibidores da ECA está a observação de que, ao serem comparados com beta-bloqueadores (metoprolol), os inibidores da ECA (enalapril) causam uma maior redução dos níveis de proteinúria, para os mesmos níveis de redução da pressão arterial. Entretanto, estudos comparativos entre os inibidores da ECA e outros anti-hipertensivos, inclusive beta-bloqueadores, têm resultados diversos.93 A possível superioridade dos inibidores da ECA sobre outros agentes anti-hipertensivos não está definitivamente comprovada. Recentemente, foi também confirmada a eficácia dos antagonistas dos receptores da angiotensina II (irbesartan) em promover redução da incidência de macroalbuminúria em pacientes com DM tipo 2 microalbuminúricos.94 Finalmente, dois estudos multicêntricos com losartan e irbesartan,95,96 finalizados no mesmo período, corroboram o
capítulo 32
efeito benéfico do uso destes antagonistas em pacientes com DM tipo 2 em fase de proteinúria (macroalbuminúria). Nesses estudos, houve redução da incidência de duplicação dos valores de creatinina sérica e de insuficiência renal terminal, embora não tenha sido documentada redução da mortalidade. Além disso, a associação de inibidores da ECA com antagonistas dos receptores da angiotensina II, em pacientes com DM tipo 2 microalbuminúricos, promoveu efeito aditivo benéfico de redução da EUA e de controle da HAS. Portanto, com base nestes recentes grandes estudos randomizados, a Associação Americana de Diabetes recomenda o uso de antagonistas dos receptores da angiotensina II em pacientes com DM tipo 2 micro- ou macroalbuminúricos.59 No Quadro 32.4 estão relacionadas as principais intervenções recomendadas para retardar a progressão da ND assim como os objetivos relacionados a cada uma delas.87
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2.
3.
4.
5.
6.
7.
Pontos-chave: • Os pacientes com nefropatia clínica devem ser avaliados pelo menos a cada três meses e deve ser feito todo o esforço para a obtenção de um bom controle pressórico e glicêmico • Como possível estratégia alternativa na prevenção primária da ND está a utilização de agentes inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA), independente da presença de HAS • O tratamento da ND visa normalizar os níveis de EUA retardando ou revertendo o processo evolutivo da ND
8.
9.
10.
11.
12.
13.
CONCLUSÕES 14.
A detecção da ND é importante pela sua prevalência, morbidade e mortalidade associadas. A obtenção de um controle metabólico e pressórico estrito é até o momento a medida mais eficaz para prevenção de sua instalação. A microalbuminúria, que representa a fase mais precoce da doença renal diabética, é potencialmente reversível através do uso de inibidores da ECA e antagonistas dos receptores da angiotensina II e controle pressórico rigoroso. Nos pacientes com nefropatia clínica e HAS, a desaceleração da perda de função renal é possível através do tratamento anti-hipertensivo adequado. Além disso, independente da presença de HAS, os inibidores da ECA e os antagonistas dos receptores da angiotensina II estão indicados para o tratamento da ND. Finalmente, em especial na presença de nefropatia clínica, a restrição do conteúdo protéico da dieta está indicada.
605
15.
16.
17.
18.
19.
20.
IV. Patient characteristics at the start of ESRD: data from the HCFA medical evidence form. Am J Kidney Dis 1999; 34:S63-73. Comissão Regional de Nefrologia SP e Centro de Informática da EPM. Idade, sexo e diagnóstico dos pacientes em diálise na Grande São Paulo. J Bras Nefrol 1994; 16:83-86. GARCIA, V.D.; MATTOS, A.A.; GOLDANI, J.C. Diabetic nephropathy as cause of end-stage renal disease in the State of Rio Grande do Sul. II Simpósio Brasileiro de Nefropatia Diabética. Porto Alegre, 16-17 out, 1993. BRUNO, R.M.; GROSS, J.L. Prognostic factors in Brazilian diabetic patients starting dialysis: a 3.6-year follow-up study. J Diabetes Complications 2000; 14:266-71. MOGENSEN, C.E.; CHRISTENSEN, C.K. Predicting diabetic nephropathy in insulin-dependent patients. N Engl J Med 1984; 311:8993. VIBERTI, G.C.; HILL, R.D.; JARRETT, R.J.; ARGYROPOULOS, A.; MAHMUD, U.; KEEN, H. Microalbuminuria as a predictor of clinical nephropathy in insulin-dependent diabetes mellitus. Lancet 1982; 1:1430-2. PATRICK, A.W.; JEFFREY, R.F.; COLLIER, A.; CLARKE, B.F.; LEE, M.R. Relationship between urinary excretion of sodium and dopamine in type 1 diabetic patients with an without microalbuminuria. Diabet Med 1990; 7:53-6. CARAMORI, M.L.; FIORETTO, P.; MAUER, M. The need for early predictors of diabetic nephropathy risk: is albumin excretion rate sufficient? Diabetes 2000; 49:1399-408. POULSEN, P.L.; HANSEN, K.W.; MOGENSEN, C.E. Ambulatory blood pressure in the transition from normo- to microalbuminuria. A longitudinal study in IDDM patients. Diabetes 1994; 43:1248-53. JONES, S.L.; CLOSE, C.F.; MATTOCK, M.B.; JARRETT, R.J.; KEEN, H.; VIBERTI, G.C. Plasma lipid and coagulation factor concentrations in insulin dependent diabetics with microalbuminuria. Br Med J 1989; 298:487-90. GREAVES, M.; MALIA, R.G.; GOODFELLOW, K. et al. Fibrinogen and von Willebrand factor in IDDM: relationships to lipid vascular risk factors, blood pressure, glycaemic control and urinary albumin excretion rate: the EURODIAB IDDM Complications Study. Diabetologia 1997; 40:698-705. MORISHITA, E.; NAKAO, S.; ASAKURA, H. et al. Hypercoagulability and high lipoprotein(a) levels in patients with aplastic anemia receiving cyclosporine. Blood Coagul Fibrinolysis 1996; 7:609-14. MOGENSEN, C.E. Microalbuminuria predicts clinical proteinuria and early mortality in maturity-onset diabetes. N Engl J Med 1984; 310:356-60. BROCCO, E.; FIORETTO, P.; MAUER, M. et al. Renal structure and function in non-insulin dependent diabetic patients with microalbuminuria. Kidney Int Suppl 1997; 63:S40-4. GROSS, J.L.; STEIN, A.C.; BECK, M.O. et al. Risk factors for development of proteinuria by type II (non-insulin dependent) diabetic patients. Braz J Med Biol Res 1993; 26:1269-78. RAVID, M.; BROSH, D.; RAVID-SAFRAN, D.; LEVY, Z.; RACHMANI, R. Main risk factors for nephropathy in type 2 diabetes mellitus are plasma cholesterol levels, mean blood pressure, and hyperglycemia. Arch Intern Med 1998; 158:998-1004. BECK, M.O.; SILVEIRO, S.P.; FRIEDMAN, R.; CLAUSELL, N.; GROSS, J.L. Asymptomatic coronary artery disease is associated with cardiac autonomic neuropathy and diabetic nephropathy in type 2 diabetic patients. Diabetes Care 1999; 22:1745-7. FRIEDMAN, R.; de AZEVEDO, M.J.; GROSS, J.L. Is endogenous creatinine clearance still a reliable index of glomerular filtration rate in diabetic patients? Braz J Med Biol Res 1988; 21:941-4. GALL, M.A.; NIELSEN, F.S.; SMIDT, U.M.; PARVING, H.H. The course of kidney function in type 2 (non-insulin-dependent) diabetic patients with diabetic nephropathy. Diabetologia 1993; 36:1071-8. PARVING, H.H.; SMIDT, U.M.; HOMMEL, E. et al. Effective an-
606
21.
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33. 34.
35.
36.
37.
38.
39.
Nefropatia Diabética
tihypertensive treatment postpones renal insufficiency in diabetic nephropathy. Am J Kidney Dis 1993; 22:188-95. SMULDERS, Y.M.; RAKIC, M.; STEHOUWER, C.D.; WEIJERS, R.N.; SLAATS, E.H.; SILBERBUSCH, J. Determinants of progression of microalbuminuria in patients with NIDDM. A prospective study. Diabetes Care 1997; 20:999-1005. SAWICKI, P.T.; DIDJURGEIT, U.; MUHLHAUSER, I.; BENDER, R.; HEINEMANN, L.; BERGER, M. Smoking is associated with progression of diabetic nephropathy. Diabetes Care 1994; 17:126-31. ALAVERAS, A.E.; THOMAS, S.M.; SAGRIOTIS, A.; VIBERTI, G.C. Promoters of progression of diabetic nephropathy: the relative roles of blood glucose and blood pressure control. Nephrol Dial Transplant 1997; 12:71-4. RUGGENENTI, P.; GAMBARA, V.; PERNA, A.; BERTANI, T.; REMUZZI, G. The nephropathy of non-insulin-dependent diabetes: predictors of outcome relative to diverse patterns of renal injury. J Am Soc Nephrol 1998; 9:2336-43. PARVING, H.H.; JACOBSEN, P.; TARNOW, L. et al. Effect of deletion polymorphism of angiotensin converting enzyme gene on progression of diabetic nephropathy during inhibition of angiotensin converting enzyme: observational follow up study. Br Med J 1996; 313:591-4. YOSHIDA, H.; KURIYAMA, S.; ATSUMI, Y. et al. Angiotensin I converting enzyme gene polymorphism in non-insulin dependent diabetes mellitus. Kidney Int 1996; 50:657-64. De COSMO, S.; ARGIOLAS, A.; MISCIO, G. et al. A PC-1 amino acid variant (K121Q) is associated with faster progression of renal disease in patients with type 1 diabetes and albuminuria. Diabetes 2000; 49:521-4. Intensive therapy and progression to clinical albuminuria in patients with insulin dependent diabetes mellitus and microalbuminuria. Microalbuminuria Collaborative Study Group, United Kingdom. Br Med J 1995; 311:973-7. FIORETTO, P.; STEFFES, M.W.; SUTHERLAND, D.E.; GOETZ, F.C.; MAUER, M. Reversal of lesions of diabetic nephropathy after pancreas transplantation. N Engl J Med 1998; 339:69-75. STRATTON, I.M.; ADLER, A.I.; NEIL, H.A. et al. Association of glycaemia with macrovascular and microvascular complications of type 2 diabetes (UKPDS 35): prospective observational study. Br Med J 2000; 321:405-12. ADLER, A.I.; STRATTON, I.M.; NEIL, H.A. et al. Association of systolic blood pressure with macrovascular and microvascular complications of type 2 diabetes (UKPDS 36): prospective observational study. Br Med J 2000; 321:412-9. GALL, M.A.; HOUGAARD, P.; BORCH-JOHNSEN, K.; PARVING, H.H. Risk factors for development of incipient and overt diabetic nephropathy in patients with non-insulin dependent diabetes mellitus: prospective, observational study. Br Med J 1997; 314:783-8. ORTH, S.R.; RITZ, E.; SCHRIER, R.W. The renal risks of smoking. Kidney Int 1997; 51:1669-77. TOELLER, M.; BUYKEN, A.; HEITKAMP, G. et al. Protein intake and urinary albumin excretion rates in the EURODIAB IDDM Complications Study. Diabetologia 1997; 40:1219-26. MOLLSTEN, A.V.; DAHLQUIST, G.G.; STATTIN, E.L.; RUDBERG, S. Higher intakes of fish protein are related to a lower risk of microalbuminuria in young Swedish type 1 diabetic patients. Diabetes Care 2001; 24:805-10. RUDBERG, S.; PERSSON, B.; DAHLQUIST, G. Increased glomerular filtration rate as a predictor of diabetic nephropathy—an 8-year prospective study. Kidney Int 1992; 41:822-8. CARAMORI, M.L.; GROSS, J.L.; PECIS, M.; De AZEVEDO, M.J. Glomerular filtration rate, urinary albumin excretion rate, and blood pressure changes in normoalbuminuric normotensive type 1 diabetic patients: an 8-year follow-up study. Diabetes Care 1999; 22:1512-6. AZEVEDO, M.J.; GROSS, J.L. Follow-up of glomerular hyperfiltration in normoalbuminuric type 1 (insulin-dependent) diabetic patients. Diabetologia 1991; 34:611. SILVEIRO, S.P.; FRIEDMAN, R.; de AZEVEDO, M.J.; CANANI,
40.
41.
42.
43.
44.
45.
46.
47.
48.
49.
50.
51.
52.
53.
54.
55.
56.
57.
L.H.; GROSS, J.L. Five-year prospective study of glomerular filtration rate and albumin excretion rate in normofiltering and hyperfiltering normoalbuminuric NIDDM patients. Diabetes Care 1996; 19:171-4. PARK, J.Y.; KIM, H.K.; CHUNG, Y.E.; KIM, S.W.; HONG, S.K.; LEE, K.U. Incidence and determinants of microalbuminuria in Koreans with type 2 diabetes. Diabetes Care 1998; 21:530-4. NELSON, R.G.; BENNETT, P.H.; BECK, G.J. et al. Development and progression of renal disease in Pima Indians with non-insulin-dependent diabetes mellitus. Diabetic Renal Disease Study Group. N Engl J Med 1996; 335:1636-42. Tight blood pressure control and risk of macrovascular and microvascular complications in type 2 diabetes: UKPDS 38. UK Prospective Diabetes Study Group. Br Med J 1998; 317:703-13. KROLEWSKI, A.S.; WARRAM, J.H.; CHRISTLIEB, A.R.; BUSICK, E.J.; KAHN, C.R. The changing natural history of nephropathy in type I diabetes. Am J Med 1985; 78:785-94. FOGARTY, D.G.; RICH, S.S.; HANNA, L.; WARRAM, J.H.; KROLEWSKI, A.S. Urinary albumin excretion in families with type 2 diabetes is heritable and genetically correlated to blood pressure. Kidney Int 2000; 57:250-7. KROLEWSKI, A.S.; NG, D.P.; CANANI, L.H.; WARRAM, J.H. Genetics of diabetic nephropathy: how far are we from finding susceptibility genes? Adv Nephrol Necker Hosp 2001; 31:295-315. IMPERATORE, G.; HANSON, R.L.; PETTITT, D.J.; KOBES, S.; BENNETT, P.H.; KNOWLER, W.C. Sib-pair linkage analysis for susceptibility genes for microvascular complications among Pima Indians with type 2 diabetes. Pima Diabetes Genes Group. Diabetes 1998; 47:821-30. MOCZULSKI, D.K.; ROGUS, J.J.; ANTONELLIS, A.; WARRAM, J.H.; KROLEWSKI, A.S. Major susceptibility locus for nephropathy in type 1 diabetes on chromosome 3q: results of novel discordant sib-pair analysis. Diabetes 1998; 47:1164-9. FUJISAWA, T.; IKEGAMI, H.; KAWAGUCHI, Y. et al. Meta-analysis of association of insertion/deletion polymorphism of angiotensin I-converting enzyme gene with diabetic nephropathy and retinopathy. Diabetologia 1998; 41:47-53. PINIZZOTTO, M.; CASTILLO, E.; FIAUX, M.; TEMLER, E.; GAILLARD, R.C.; RUIZ, J. Paraoxonase 2 polymorphisms are associated with nephropathy in type II diabetes. Diabetologia 2001; 44:1047. CANANI, L.H.; ARAKI, S.; WARRAM, J.H.; KROLEWSKI, A.S. Comment to: Pinizzotto, M.; Castillo, E.; Fiaux. M.; Temler, E.; Gaillard, R.c.; Ruiz, J. (2001) Paraoxonase 2 polymorphisms are associated with diabetic nephropathy in type II diabetes. Diabetologia 2001; 44:104-107. Diabetologia 2001; 44:1062-4. KROLEWSKI, A.S.; CANESSA, M.; WARRAM, J.H. et al. Predisposition to hypertension and susceptibility to renal disease in insulindependent diabetes mellitus. N Engl J Med 1988; 318:140-5. CANANI, L.H.; GERCHMAN, F.; GROSS, J.L. Increased familial history of arterial hypertension, coronary heart disease, and renal disease in Brazilian type 2 diabetic patients with diabetic nephropathy. Diabetes Care 1998; 21:1545-50. BRENNER, B.M.; LAWLER, E.V.; MACKENZIE, H.S. The hyperfiltration theory: a paradigm shift in nephrology. Kidney Int 1996; 49:1774-7. YIP, J.W.; JONES, S.L.; WISEMAN, M.J.; HILL, C.; VIBERTI, G. Glomerular hyperfiltration in the prediction of nephropathy in IDDM: a 10-year follow-up study. Diabetes 1996; 45:1729-33. PECIS, M.; de AZEVEDO, M.J.; GROSS, J.L. Chicken and fish diet reduces glomerular hyperfiltration in IDDM patients. Diabetes Care 1994; 17:665-72. MURUSSI, M.; BAGLIO, P.; GROSS, J.L.; SILVEIRO, S.P. Risk factors for microalbuminuria and macroalbuminuria in type 2 diabetic patients: A 9-year follow-up study. Diabetes Care 2002; 25:1101-3. FORSBLOM, C.M.; GROOP, P.H.; EKSTRAND, A. et al. Predictors of progression from normoalbuminuria to microalbuminuria in NIDDM. Diabetes Care 1998; 21:1932-8.
capítulo 32
58.
59. 60.
61.
62.
63.
64.
65.
66.
67.
68.
69.
70.
71.
72.
73. 74.
75.
76.
77.
MATHIESEN, E.R.; RONN, B.; STORM, B.; FOGHT, H.; DECKERT, T. The natural course of microalbuminuria in insulin-dependent diabetes: a 10-year prospective study. Diabet Med 1995; 12:482-7. AMERICAN DIABETES ASSOCIATION. Diabetic nephropathy. Position Statement. Diabetes Care 2002; 25 (suppl 1):S85-S89. Porta M., Sjoelie A.K., Chaturvedi N. et al. Risk factors for progression to proliferative diabetic retinopathy in the EURODIAB Prospective Complications Study. Diabetologia 2001; 44:2203-9. GROSS, J.L.; ZELMANOVITZ, T.; OLIVEIRA, J.; de AZEVEDO, M.J. Screening for diabetic nephropathy: is measurement of urinary albumin-to-creatinine ratio worthwhile? Diabetes Care 1999; 22:1599600. ZELMANOVITZ, T.; GROSS, J.L.; OLIVEIRA, J.; de AZEVEDO, M.J. Proteinuria is still useful for the screening and diagnosis of overt diabetic nephropathy. Diabetes Care 1998; 21:1076-9. ZELMANOVITZ, T.; GROSS, J.L.; OLIVEIRA, J.R.; PAGGI, A.; TATSCH, M.; AZEVEDO, M.J. The receiver operating characteristics curve in the evaluation of a random urine specimen as a screening test for diabetic nephropathy. Diabetes Care 1997; 20:516-9. MOGENSEN, C.E.; VESTBO, E.; POULSEN, P.L. et al. Microalbuminuria and potential confounders. A review and some observations on variability of urinary albumin excretion. Diabetes Care 1995; 18:572-81. GROSS, J.L.; SILVEIRO, S.P.; de AZEVEDO, M.J.; PECIS, M.; FRIEDMAN, R. Estimated creatinine clearance is not an accurate index of glomerular filtration rate in normoalbuminuric diabetic patients. Diabetes Care 1993; 16:407-8. OLSEN, S.; MOGENSEN, C.E. How often is NIDDM complicated with non-diabetic renal disease? An analysis of renal biopsies and the literature. Diabetologia 1996; 39:1638-45. The sixth report of the Joint National Committee on prevention, detection, evaluation, and treatment of high blood pressure. Arch Intern Med 1997; 157:2413-46. SHICHIRI, M.; KISHIKAWA, H.; OHKUBO, Y.; WAKE, N. Longterm results of the Kumamoto Study on optimal diabetes control in type 2 diabetic patients. Diabetes Care 2000; 23 Suppl 2:B21-9. Intensive blood-glucose control with sulphonylureas or insulin compared with conventional treatment and risk of complications in patients with type 2 diabetes (UKPDS 33). UK Prospective Diabetes Study (UKPDS) Group. Lancet 1998; 352:837-53. Efficacy of atenolol and captopril in reducing risk of macrovascular and microvascular complications in type 2 diabetes: UKPDS 39. UK Prospective Diabetes Study Group. Br Med J 1998; 317:713-20. RAVID, M.; BROSH, D.; LEVI, Z.; BAR-DAYAN, Y.; RAVID, D.; RACHMANI, R. Use of enalapril to attenuate decline in renal function in normotensive, normoalbuminuric patients with type 2 diabetes mellitus. A randomized, controlled trial. Ann Intern Med 1998; 128:982-8. Effects of ramipril on cardiovascular and microvascular outcomes in people with diabetes mellitus: results of the HOPE study and MICRO-HOPE substudy. Heart Outcomes Prevention Evaluation Study Investigators. Lancet 2000; 355:253-9. Aspirin therapy in diabetes. Diabetes Care 2002; 25 Suppl 1:S78-79. COHEN, D.; DODDS, R.; VIBERTI, G. Effect of protein restriction in insulin dependent diabetics at risk of nephropathy. Br Med J (Clin Res Ed) 1987; 294:795-8. WHEELER, M.L. Nephropathy and Medical Nutrition Therapy. In: American Diabetes Association Guide to Medical Nutrition Therapy for Diabetes 1999; Clinical Education Series. American Diabetes Association, Virginia, 312-329. GROSS, J.L.; ZELMANOVITZ, T.; MOULIN, C.C. et al. Effect of a chicken-based diet on renal function and lipid profile in patients with type 2 diabetes: a randomized crossover trial. Diabetes Care 2002; 25:645-51. ZELLER, K.; WHITTAKER, E.; SULLIVAN, L.; RASKIN, P.; JACOBSON, H.R. Effect of restricting dietary protein on the progression of renal failure in patients with insulin-dependent diabetes mellitus. N Engl J Med 1991; 324:78-84.
607
78. MATHIESEN, E.R.; FELDT-RASMUSSEN, B.; HOMMEL, E.; DECKERT, T.; PARVING, H.H. Stable glomerular filtration rate in normotensive IDDM patients with stable microalbuminuria. A 5year prospective study. Diabetes Care 1997; 20:286-9. 79. Effect of intensive therapy on the development and progression of diabetic nephropathy in the Diabetes Control and Complications Trial. The Diabetes Control and Complications Trial (DCCT) Research Group. Kidney Int 1995; 47:1703-20. 80. KASISKE, B.L.; O’DONNELL, M.P.; CLEARY, M.P.; KEANE, W.F. Treatment of hyperlipidemia reduces glomerular injury in obese Zucker rats. Kidney Int 1988; 33:667-72. 81. LAM, K.S.; CHENG, I.K.; JANUS, E.D.; PANG, R.W. Cholesterollowering therapy may retard the progression of diabetic nephropathy. Diabetologia 1995; 38:604-9. 82. TONOLO, G.; CICCARESE, M.; BRIZZI, P. et al. Reduction of albumin excretion rate in normotensive microalbuminuric type 2 diabetic patients during long-term simvastatin treatment. Diabetes Care 1997; 20:1891-5. 83. NIELSEN, S.; SCHMITZ, O.; MOLLER, N. et al. Renal function and insulin sensitivity during simvastatin treatment in type 2 (noninsulin-dependent) diabetic patients with microalbuminuria. Diabetologia 1993; 36:1079-86. 84. BABA, T.; NEUGEBAUER, S.; WATANABE, T. Diabetic nephropathy. Its relationship to hypertension and means of pharmacological intervention. Drugs 1997; 54:197-234. 85. KASISKE, B.L.; KALIL, R.S.; MA, J.Z.; LIAO, M.; KEANE, W.F. Effect of antihypertensive therapy on the kidney in patients with diabetes: a meta-regression analysis. Ann Intern Med 1993; 118:129-38. 86. HANSSON, L.; ZANCHETTI, A.; CARRUTHERS, S.G. et al. Effects of intensive blood-pressure lowering and low-dose aspirin in patients with hypertension: principal results of the Hypertension Optimal Treatment (HOT) randomised trial. HOT Study Group. Lancet 1998; 351:1755-62. 87. REMUZZI, G.; SCHIEPPATI, A.; RUGGENENTI, P. Clinical practice. Nephropathy in patients with type 2 diabetes. N Engl J Med 2002; 346:1145-51. 88. SOMES, G.W.; PAHOR, M.; SHORR, R.I.; CUSHMAN, W.C.; APPLEGATE, W.B. The role of diastolic blood pressure when treating isolated systolic hypertension. Arch Intern Med 1999; 159:2004-9. 89. MATHIESEN, E.R.; HOMMEL, E.; HANSEN, H.P.; SMIDT, U.M.; PARVING, H.H. Randomised controlled trial of long term efficacy of captopril on preservation of kidney function in normotensive patients with insulin dependent diabetes and microalbuminuria. Br Med J 1999; 319:24-5. 90. RAVID, M.; LANG, R.; RACHMANI, R.; LISHNER, M. Long-term renoprotective effect of angiotensin-converting enzyme inhibition in non-insulin-dependent diabetes mellitus. A 7-year follow- up study. Arch Intern Med 1996; 156:286-9. 91. Should all patients with type 1 diabetes mellitus and microalbuminuria receive angiotensin-converting enzyme inhibitors? A metaanalysis of individual patient data. Ann Intern Med 2001; 134:370-9. 92. LEWIS, E.J.; HUNSICKER, L.G.; BAIN, R.P.; ROHDE, R.D. The effect of angiotensin-converting-enzyme inhibition on diabetic nephropathy. The Collaborative Study Group. N Engl J Med 1993; 329:145662. 93. NIELSEN, F.S.; ROSSING, P.; GALL, M.A.; SKOTT, P.; SMIDT, U.M.; PARVING, H.H. Long-term effect of lisinopril and atenolol on kidney function in hypertensive NIDDM subjects with diabetic nephropathy. Diabetes 1997; 46:1182-8. 94. PARVING, H.H.; LEHNERT, H.; BROCHNER-MORTENSEN, J.; GOMIS, R.; ANDERSEN, S.; ARNER, P. The effect of irbesartan on the development of diabetic nephropathy in patients with type 2 diabetes. N Engl J Med 2001; 345:870-8. 95. BRENNER, B.M.; COOPER, M.E.; de ZEEUW, D. et al. Effects of losartan on renal and cardiovascular outcomes in patients with type 2 diabetes and nephropathy. N Engl J Med 2001; 345:861-9. 96. LEWIS, E.J.; HUNSICKER, L.G.; CLARKE, W.R. et al. Renoprotective
608
Nefropatia Diabética
effect of the angiotensin-receptor antagonist irbesartan in patients with nephropathy due to type 2 diabetes. N Engl J Med 2001; 345:851-60. 97. SEAQUIST, E.R.; GOETZ, F.C.; RICH, S.; BARBOSA, J. Familial clustering of diabetic kidney disease. Evidence for genetic susceptibility to diabetic nephropathy. N Engl J Med 1989; 320:1161-5. 98. BORCH-JOHNSEN, K.; NORGAARD, K.; HOMMEL, E. et al. Is diabetic nephropathy an inherited complication? Kidney Int 1992; 41:719-22.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.nephron.com/dmprvnt.html The nephron information center Diabetic Nephropathy http://www.nephron.com/cgi-bin/Ultimate.cgi Nephroquest-centro de informações do nephron.com
http://www.citeline.com/C1SE/results?summaries on&enhanceon&kwdiabeticnephropathy Maximizing the value of the web–proporciona resultados de bancos de dados da web Outros sites de interesse: http://www.diabetic.org.uk http://www.geocites.com http://www.amedeo.com http://www.merck.com http://www.cdc.gov/diabetes http://www.niddk.nih.gov
Capítulo
33
Nefrolitíase Mauricio de Carvalho
INTRODUÇÃO
Deficiência de proteínas inibidoras da cristalização
EPIDEMIOLOGIA
Medicações
PATOGÊNESE DA NEFROLITÍASE Do cristal ao cálculo TIPOS DE CÁLCULOS FATORES DE RISCO
APRESENTAÇÃO CLÍNICA INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA TRATAMENTO Tratamento da cólica renal
Hipercalciúria
Tratamento do cálculo
Hiperoxalúria
Profilaxia e terapêutica da doença litiásica
Hiperuricosúria
Tratamento dietético
Hipocitratúria
Tratamento farmacológico
Infecção
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Cistinúria
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO A formação de cálculos no trato urinário pode ser entendida como uma forma de biomineralização.1 A nefrolitíase é, portanto, um processo de cristalização que ocorre em sistema biológico e é influenciada por ele. Nas suas diversas etapas, vários componentes e moduladores podem ser identificados. De modo simplificado, estes podem ser divididos em fatores físico-químicos, que influenciam a saturação urinária, nucleação, crescimento e agregação de partículas cristalinas, e fatores biológicos, relacionados primordialmente a macromoléculas urinárias que atuam como inibidoras da cristalização.2 Nas últimas décadas, grandes avanços foram feitos no diagnóstico e terapêutica da nefrolitíase. Atualmente, na maioria dos pacientes é possível detectar a causa da doença litiásica, e várias medicações estão disponíveis para profilaxia e tratamento. Além disto, os cálculos podem ser removidos mais facilmente e de maneira menos invasiva
com uso de litotripsia extracorpórea e procedimentos endourológicos.
EPIDEMIOLOGIA A nefrolitíase é uma das afecções mais comuns do trato urinário, registrando-se inclusive aumento da incidência nos últimos anos. Em países industrializados atinge 10 a 15% da população, com freqüência maior em homens, em uma proporção de 3:1, quando comparados às mulheres. A maior incidência ocorre entre a terceira e a quinta décadas, com taxas de recorrência, sem tratamento, de 10% em um ano, 50% em cinco anos e 75% em 20 anos.3 Nos Estados Unidos, foi responsável por 290.000 internações em 1999 (1% do total), com média de permanência hospitalar de três dias.4 A ocorrência da nefrolitíase apresenta acentuada variação sazonal e geográfica, muito provavelmente relacionada à combinação de fatores genéticos (raciais) e ambientais (cli-
610
Nefrolitíase
ma e dieta). Por exemplo, o risco de nefrolitíase parece ser menor na Ásia (1-5%) do que na Europa (5-9%) e América do Norte (12% no Canadá e 13% nos Estados Unidos). Na Arábia Saudita, taxas de risco de até 20% são relatadas.5
PATOGÊNESE DA NEFROLITÍASE Do Cristal ao Cálculo A Fig. 33.1 ilustra três condições gerais de uma solução contendo íons ou moléculas de materiais cristalinos solúveis, como a urina por exemplo. O diagrama demonstra aumento crescente de concentração, de baixo para cima. O produto de solubilidade (Kps) é o produto de concentração no qual existe equilíbrio entre a porção cristalina e a solvente, não havendo formação de novas partículas. O produto de formação (Kf) refere-se ao produto de concentração no qual haverá precipitação, em velocidade significativa, mesmo sem a inclusão de materiais pré-formados ou outras superfícies cristalinas. Soluções com concentrações abaixo do Kf não permitem a formação de cristais. Por outro lado, quando o produto de concentração torna-se maior que o Kf, inicia-se a nucleação, a primeira fase de formação de qualquer substância cristalina.6 Nesta situação, a energia livre presente é tão alta que a nucleação é praticamente inevitável, causando um rearranjo molecular e estabilização da solução. A região de maior interesse do ponto de vista químico, biológico e médico situa-se entre o Kps, abaixo do qual a cristalização não se inicia, e o Kf, acima do qual a cristalização é constante. Esta zona intermediária é denominada de metaestável.7 Possui grande importância na patogenia da nefrolitíase, já que a maioria dos produtos de concentração da urina de indivíduos normais e de portadores de cálculo renal situa-se nesta faixa.8 Além disto, os fatores inibidores da cristalização exercem seus efeitos principalmente dentro desses limites.9 Na zona metaestável, os produtos de concentração das diversas substâncias permitem o crescimento de cristais preexistentes, mas não a formação de novos núcleos.
Uma vez que o núcleo do cristal tenha atingido um tamanho crítico e a solução que o abrigue permaneça com valores acima do Kps novas camadas de componentes serão adicionadas. Este fenômeno é chamado de crescimento do cristal.6 O processo pelo qual cristais em solução juntam-se para formar uma partícula maior é chamado de agregação ou aglomeração.10 Como é necessária energia para haver desintegração de um sólido para a fase líquida, a agregação é um processo naturalmente favorecido. Embora a velocidade de agregação seja proporcional ao estado de saturação de uma solução, ela pode ocorrer em uma faixa ampla de condições.11 Além disso, a agregação per se é um processo muito rápido, permitindo a formação de partículas de tamanho considerável dentro de segundos. A passagem de cristais pela urina, denominada cristalúria, ocorre em portadores de doença litiásica, bem como em indivíduos normais.12 Alguns estudos, analisando a taxa de crescimento e agregação cristalina e ainda a velocidade do fluxo tubular renal, sugeriram que cristais formados durante o trânsito intranéfrico não alcançariam tamanho suficiente para ocluir a luz tubular. Conseqüentemente, a formação ulterior de cálculos urinários dependeria da retenção destas partículas.13 O ancoramento dos cristais é facilitado por interações com as células tubulares renais. Macromoléculas urinárias podem facilitar ou impedir esta adesão.14 Uma vez retido, haverá então condições de tempo para o crescimento cristalino, desde que mantidas as condições de saturação urinária. A atividade inibitória pode ser definida como a capacidade da urina em impedir a nucleação espontânea de cristais ou, se esta situação ocorrer, prevenir o crescimento e a agregação posteriores.15 Um inibidor da cristalização deve ser capaz de ligar-se à superfície de cristais em formação, inibindo seu crescimento ou agregação.16 Várias substâncias foram descritas como inibidoras da cristalização na urina. Podemos classificá-las em dois grandes grupos, como descrito no Quadro 33.1 — baixo peso molecular e macromoléculas, estas por definição com peso molecular acima de 6.000 dáltons. O principal argumento favorável à importância dos inibidores reside na observação de que, embora a urina da maioria da população seja supersaturada em relação a vários sais, apenas uma minoria forma cálculos.
Quadro 33.1 Inibidores da cristalização urinária
Fig. 33.1 Estados de saturação.
INIBIDORES DE BAIXO PESO MOLECULAR
INIBIDORES MACROMOLECULARES
Citrato Pirofosfato Magnésio
Glicosaminoglicanos Nefrocalcina Uropontina Bikunina Fragmento Urinário da Protrombina Proteína de Tamm-Horsfall
611
capítulo 33
• A nefrolitíase ocorre em 10-15% da população mundial, sendo sua etiologia multifatorial (fatores genéticos e ambientais) • A supersaturação é pré-requisito inicial para a formação de cálculos • Nucleação, crescimento, agregação e adesão são passos seqüenciais na formação cristalina • Inibidores podem atuar diminuindo a supersaturação urinária ou impedindo diretamente a cristalização
Cálculos de ácido úrico constituem aproximadamente 10% dos casos. Podem ser puros ou abrigar quantidades variáveis de cálcio. Caracteristicamente são radiotransparentes, não visíveis portanto na radiografia simples de abdome, e aparecem na urografia excretora como falhas de enchimento. Os cálculos de estruvita (assim chamados em homenagem ao barão H. C. G. von Struve, diplomata e naturalista russo que descreveu o cristal pela primeira vez) são formados de fosfato de amônio magnésio e representam 15% dos cálculos. São cálculos pouco radiodensos, grandes e caracteristicamente coraliformes. Cálculos de cistina constituem aproximadamente 1% do total. São pouco radiopacos, com aspecto de vidro moído (ground-glass) aos raios X.
TIPOS DE CÁLCULOS
FATORES DE RISCO
Atualmente, a maioria dos cálculos é de origem renal (Quadro 33.2). Cálculos vesicais são encontrados apenas em situações especiais, como na presença de obstrução uretral, corpo estranho intravesical ou bexiga neurogênica. Também são descritos em crianças de países em desenvolvimento, formados por urato de amônio e associados à desnutrição. Os cálculos formados por deposição de cálcio são os mais comuns, correspondendo a 70-75% dos casos. Na maioria das vezes são compostos por oxalato de cálcio. Eventualmente, em menos de 5% dos casos, podem ser de fosfato de cálcio (apatita ou brushita). Estes cálculos são formados na presença de urina alcalina, que aumenta a supersaturação do fosfato, podendo ser encontrados na acidose tubular renal distal ou hiperparatireoidismo primário. Os cálculos de cálcio são habitualmente arredondados, radiodensos e não costumam apresentar aspecto coraliforme.
A formação de cálculos no trato urinário requer a presença de um ou mais fatores de risco, determinados em sua maioria pela análise da bioquímica e do volume urinário. Estas condições causam aumento da supersaturação urinária em relação a determinado sal ou promovem diminuição da atividade inibidora da urina.18
Pontos-chave:
Hipercalciúria A hipercalciúria primária ou idiopática é conceituada como excreção urinária de cálcio maior que 4 mg/kg/dia, associada à normocalcemia e por vezes à hipofosfatemia. Afeta cerca de 5% da população normal e até 50% dos pacientes litiásicos.19 Apesar do mecanismo preciso da hipercalciúria não estar ainda estabelecido, existe consenso quanto à presença de algumas anormalidades fisiopatoló-
Quadro 33.2 Composição dos cálculos renais COMPOSIÇÃO
FREQÜÊNCIA
PREDOMINÂNCIA
RX
Oxalato de cálcio
70-75%
Homens
Redondos, radiodensos
Geralmente com núcleo de fosfato de cálcio
Fosfato de cálcio
5%
Mulheres
Redondos, radiodensos
Podem estar associados ao HPT e à ATR
Ácido úrico
10%
Homens
Radiotransparentes
Geralmente associados à gota ou diarréias crônicas
Estruvita
15%
Mulheres
Coraliformes, radiodensos /
Presença de ITU complicada
Cistina
1%
Ovais, dendríticos, radiodensos /
Cistinúria
HPT – Hiperparatireoidismo primário; ATR – Acidose tubular renal distal; ITU — Infecção do trato urinário. Adaptado de WASSERSTEIN, A.G. Nephrolithiasis: Acute Management and Prevention.17
OBSERVAÇÕES
612
Nefrolitíase
gicas: aumento primário na absorção intestinal de cálcio (por aumento dos níveis séricos de vitamina D ou aumento na densidade dos receptores intestinais); redução na reabsorção tubular de cálcio; perda renal de fosfato; aumento primário na reabsorção óssea.20 Até 40% dos pacientes com hipercalciúria idiopática apresentam história familiar positiva de cálculos renais. Evidências clínicas e experimentais indicam que a hipercalciúria é de herança genética complexa. Entre alguns dos genes possivelmente envolvidos, podemos citar o gene responsável pela expressão do receptor para a vitamina D, o gene para o receptor do sensor de cálcio (calcium-sensing receptor) e o gene responsável pela expressão dos canais de cloro ClC-5, associados à nefrolitíase ligada ao cromossomo X.21 As condições clínicas associadas à hipercalciúria hipercalcêmica compreendem 5% do total das hipercalciúrias e são representadas basicamente pelo hiperparatireoidismo primário (mais de 90% dos casos). Menos freqüentemente pode estar associada à sarcoidose, imobilização prolongada, intoxicação por vitamina D e hipertireoidismo.
tipo II — deficiência da desidrogenase d-glicerato/glioxilato redutase, doenças raras, de herança autossômica recessiva.24
Hiperuricosúria Excreção urinária maior que 800 mg/dia para homens e 750 mg/dia para mulheres. O ácido úrico é o produto final da degradação de purinas em humanos. Em pH urinário ácido, a forma não-dissociada do ácido úrico predomina e é pouco solúvel (apenas 96 mg/litro), podendo levar à cristalúria e à formação de cálculo renal, mesmo com taxas de excreção normais25 (Fig. 33.2). A hiperuricosúria, presente por exemplo na gota, e baixo volume urinário são também fatores de risco importantes. Níveis elevados de ácido úrico na urina podem contribuir também para a formação de cálculos de oxalato de cálcio. Várias teorias têm sido propostas para explicar o fato. Postula-se que os cristais de ácido úrico formariam um núcleo inicial para deposição de oxalato de cálcio ou que absorveriam inibidores da cristalização urinária.26
Hiperoxalúria
a) Dietética – Geralmente apresenta 40 a 60 mg/dia de oxalato na urina. Excesso de consumo de oxalato e baixa ingestão de cálcio são fatores de risco; b) Entérica – Oxalúria de 60 a 120 mg/dia. Pode ocorrer após ressecção intestinal, doença de Crohn, derivação intestinal para tratamento de obesidade e síndromes má-absortivas. Nestas situações clínicas acontece formação de complexos de cálcio com a gordura intestinal (saponificação) e hiperabsorção do oxalato livre (não conjugado com cálcio) através da mucosa colônica com permeabilidade alterada pelos ácidos graxos e sais biliares não absorvidos; c) Primária – Níveis de oxalato na urina acima de 120 mg/ dia. Acontece nas hiperoxalúrias hereditárias tipo I — deficiência e/ou localização extraperoxissomal da enzima hepática alanina/glioxilato aminotransferase, e
Hipocitratúria Definida como excreção de citrato menor que 320 mg/ dia. O citrato é um potente inibidor da cristalização.27 Forma sais solúveis com o cálcio, diminuindo a disponibilidade do mesmo para se combinar com o oxalato, por exemplo.28 Além deste efeito específico em diminuir a supersaturação urinária, o citrato inibe a cristalização do oxalato de cálcio. O número de partículas formadas diminui, assim como seu crescimento e capacidade de agregação. Mulheres normais apresentam uma relação citrato/cálcio urinário muito alta. Entretanto, em homens normais a relação se aproxima daquela de mulheres formadoras de cálculo.29 Esta talvez seja uma das explicações da elevada
Ácido úrico mg/litro
O oxalato é um ácido orgânico dicarboxílico, de baixa solubilidade, cujo interesse biológico é praticamente limitado à sua participação na formação de cálculos renais. Em indivíduos normais, a maioria do oxalato urinário provém do metabolismo endógeno (da glicina, glioxilato e ácido ascórbico), e apenas 10 a 20% são derivados da dieta. Três a 5% do oxalato ingerido são absorvidos, principalmente no cólon.22 Hiperoxalúria é definida pela excreção de oxalato maior que 40 mg/dia. Porém, a maioria dos portadores de nefrolitíase possui níveis normais de oxalato na urina. Entretanto, aumentos na excreção de oxalato elevam mais a supersaturação urinária do que aumentos proporcionais na excreção de cálcio.23 Provavelmente, a ligação do cálcio a outros íons (além do oxalato) o torna mais solúvel. Didaticamente, podemos dividir as causas de hiperoxalúria de acordo com o nível de excreção em:
Fig. 33.2 Quantidade de ácido úrico solubilizada na urina em diferentes condições de pH.
613
capítulo 33
prevalência de nefrolitíase em homens. Além disto, vários autores demonstraram uma menor excreção de citrato na urina de portadores de doença calculosa renal.30 A hipocitratúria essencial ou idiopática é encontrada em 10 a 40% dos portadores de nefrolitíase. Pode estar presente também em situações de acidose intracelular, como na hipocalemia, insuficiência renal, diarréias crônicas (por perda de álcalis) e uso de acetazolamida. A acidose tubular renal distal (ATRd) causa hipocitratúria acentuada, freqüentemente com níveis abaixo de 40 mg/dia. Além da hipocitratúria, a ATRd cursa com hipercalciúria e urina persistentemente alcalina, podendo levar à nefrolitíase de repetição, nefrocalcinose e insuficiência renal.
associadas à formação de cálculos, foram identificadas alterações quantitativas e qualitativas na excreção de nefrocalcina, proteína de Tamm-Horsfall (uromodulina),32 uropontina e bikunina, entre outras. Infelizmente, a purificação e a mensuração destas proteínas são complexas, estando restritas a laboratórios de pesquisa.
Medicações O uso de sulfato de indinavir para tratamento de infecção por HIV está associado à formação de cálculos em até 3% dos pacientes. Ingestão excessiva de vitaminas A e D, uso de triantereno, acetazolamida e sulfadiazina podem causar cristalúria e eventualmente nefrolitíase.17
Infecção Cálculos primariamente associados à infecção são formados por fosfato de amônio magnésio (estruvita) ou mais raramente por apatita (fosfato de cálcio). Estes cálculos possuem crescimento rápido, podem ocupar todo o sistema coletor (coraliformes) e causar infecções urinárias de repetição, abscessos perinefríticos, urossepse e insuficiência renal progressiva. A sua gênese está relacionada à infecção por bactérias produtoras de urease (usualmente do gênero Proteus, Providencia ou Klebsiella, quase nunca E. coli) que desdobram a uréia em amônia, tornando o pH urinário alcalino e favorecendo a cristalização com fosfato e magnésio para formar a estruvita.
Cistinúria Doença hereditária, autossômica recessiva, caracterizada por hiperabsorção de aminoácidos dibásicos (cistina, ornitina, lisina e arginina) nas microvilosidades do túbulo proximal e células epiteliais intestinais. A excreção urinária normal de cistina situa-se ao redor de 20 mg/dia e a formação de cálculos deve-se exclusivamente à sua baixa solubilidade em pH urinário normal. Ao redor da segunda década de vida, 50% dos pacientes já apresentaram pelo menos um episódio de cólica nefrética. Três tipos de herança são descritos: cistinúria tipo I, causada por mutações em um gene localizado no cromossomo 2, responsável pela síntese da proteína transportadora denominada carreadora de soluto 3A1 (SLC3A1), que na forma homozigótica apresenta excreção de cistina de até 1 g/dia; cistinúria dos tipos II e III, associadas a um segundo gene, localizado no braço curto do cromossomo 19, que codifica a proteína transportadora SLC 7A9.31
Deficiência de Proteínas Inibidoras da Cristalização Em estudos de populações selecionadas, portadoras de nefrolitíase recorrente e sem anormalidades metabólicas
Pontos-chave: Fatores de risco para nefrolitíase • Baixo volume urinário (menor que 1.500 ml/ dia) • Hiperoxalúria (maior que 40 mg/dia) • Hipercalciúria (maior que 4 mg/kg/dia) • Hiperuricosúria (maior que 750 mg/dia em mulheres e 800 mg/dia em homens) • Hipocitratúria (menor que 320 mg/dia) • pH urinário baixo (cálculos de ácido úrico) ou alto (cálculos de fosfato cálcico) • Estase urinária ou infecção
APRESENTAÇÃO CLÍNICA A nefrolitíase pode ser totalmente assintomática, com diagnóstico acidental através de exames de imagens. Entretanto, a apresentação característica é a da cólica nefrética. Usualmente inicia-se com dor localizada em região lombar, flanco ou fossa ilíaca, súbita, forte, geralmente unilateral, em cólica, não aliviada pelo repouso ou posição, irradiada para trajeto ureteral, região de bexiga e genitália externa.33 Pode haver disúria e hematúria macroscópica concomitante. Náuseas, vômitos e diarréia são comuns. Ao exame físico, nota-se freqüentemente taquicardia, palidez, sudorese, dor à palpação costo-vertebral e distensão abdominal leve, porém não associada a sinais de irritação peritoneal. O quadro clínico é bastante sugestivo, porém o diagnóstico diferencial deve ser feito com doenças gastrintestinais (apendicite aguda, diverticulite, colecistite), ginecológicas (cisto ovariano, anexite, gravidez ectópica), afecções vasculares (infarto intestinal, aneurisma de aorta abdominal) e algumas causas médicas (cetoacidose diabética, infarto agudo do miocárdio). Outras formas de exteriorização clínica da nefrolitíase devem ser enfatizadas. A hematúria isolada pode ser o
614
Nefrolitíase
primeiro sinal. Alguns pacientes, principalmente os portadores de nefrolitíase de repetição, podem apresentar eliminação espontânea de cálculos, sem dor ou hematúria macroscópica. Na presença de infecções urinárias de repetição, principalmente as causadas por bactérias do gênero Proteus, deve-se suspeitar de cálculos renais. Além disto, a combinação de dor lombar, febre, calafrios e sepse pode ser encontrada na pielonefrite obstrutiva calculosa, situação de elevada morbi-mortalidade.
INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA A
Na avaliação do paciente, além da caracterização do episódio agudo, dados da história mórbida pregressa e certas condições e hábitos são importantes. Ocorrências prévias, idade na primeira e última crise, conseqüências e intervenções (hidronefrose, hospitalização, remoção de cálculos por litotripsia, endoscopia ou cirurgia) e passagem espontânea de cálculos devem ser questionadas. Afecções como bexiga neurogênica, infecções urinárias de repetição, diarréia crônica ou gota possuem importância na patogênese da doença litiásica. Além disto, deve ser pesquisado se existe exposição excessiva ao sol, baixa ingestão de líquidos, restrição de leite ou derivados, uso de medicações sem prescrição médica (por exemplo, vitaminas, antiácidos e suplementos de cálcio) e história familiar positiva de nefrolitíase. Hematúria micro- ou macroscópica é a regra na cólica nefrética, presente em 80 a 90% dos casos. Leucócitos podem ser encontrados na urina tipo I, porém a presença de bactérias no exame do sedimento deve levantar a suspeita de infecção associada. Discreta leucocitose pode ser observada, geralmente sem bastonetose. A uréia e a creatinina plasmática são normais, exceto em situações de obstrução em rim único ou de ureter bilateralmente, cálculos gigantes de bexiga ou cálculos uretrais. Cristais de cistina (hexagonais) e de estruvita (em forma de tampa de caixão — coffin lid) são diagnósticos, enquanto a presença de cristais de oxalato de cálcio ou de ácido úrico em grande quantidade é sugestiva (Fig. 33.3). Deve-se também confirmar a presença do cálculo renal e sua localização. A realização de radiografias simples de abdome (rins, ureter e bexiga) baseia-se no fato de que 90% dos cálculos renais são radiopacos. Para ser visualizado, um cálculo precisa apresentar ao menos 2 mm em seu maior diâmetro. A limitação das radiografias simples reside na baixa sensibilidade para cálculos ureterais, em alguns trabalhos menor que 50%. A urografia excretora tem sido tradicionalmente utilizada na avaliação da calculose renal. É útil na avaliação anatômica dos rins, na detecção de hidronefrose e em fornecer uma idéia da função renal remanescente de um rim obstruído. Apresenta pouco valor na cólica renal aguda e é contra-indicada em casos de alergia a contraste iodado e insuficiência renal. O ultra-som permite detectar todos os tipos de cálculo, independente
B
C
Fig. 33.3 Tipos de cristais. A. Múltiplos cristais de oxalato de cálcio mono- e diidratados. B. Cristal de fosfato amoníaco magnésio (estruvita). C. Cristal de cistina.
da radiopacidade, e avalia a presença e o grau de hidronefrose. Pode ser usado na vigência de cólica nefrética e durante a gestação. A limitação do método consiste na baixa sensibilidade para cálculos ureterais e na sua dependência do binário instrumento/operador. Um avanço recente na imagenologia da nefrolitíase é a tomografia helicoidal sem contraste. Apresenta alta sensibilidade e especificidade (97 e 96%, respectivamente), permite o exame do abdome em poucos minutos, pode diagnosticar patologias não relacionadas ao cálculo e detectar praticamente todos os tipos de cálculo, radiopacos ou não (exceção feita aos cálculos de indinavir). Suas desvantagens são o custo do exame e a limitada disponibilidade do aparelho.34 Depois do episódio de cólica nefrética ou da passagem do cálculo, a avaliação metabólica dos fatores de risco deve ser postergada por pelo menos quatro semanas, permitindo normalização da dieta e da atividade física do paciente e também garantindo o retorno da função renal à sua plena normalidade. Obviamente, todo cálculo eliminado deve ser recuperado e submetido à análise. Esta pode ser feita por métodos químicos ou preferencialmente por espectrofotometria infravermelha ou por difração de raios X.35 A abordagem diagnóstica do paciente que formou o primeiro cálculo (único) é assunto controverso. Recomenda-se que em adultos a investigação consista ao menos de dosagens séricas de cálcio, fósforo, ácido úrico, creatinina, sódio, cloro, potássio e bicarbonato.36 Um parcial de urina deve ser requisitado, assim como radiografias simples de abdome. Entretanto, este julgamento deve ser individua-
615
capítulo 33
Quadro 33.3 Avaliação laboratorial de pacientes com nefrolitíase URINA 24 horas
SANGUE
Volume pH Creatinina Sódio Cálcio Ácido úrico Fósforo Citrato Oxalato Cistina Cultura
pH Bicarbonato Creatinina Sódio Cálcio Ácido úrico Fósforo Potássio Uréia PTH (se hipercalcemia)
lizado. Pacientes com atividades profissionais de risco, portadores de cálculo de grande diâmetro e idosos com episódio de cólica renal associado à elevada morbidade são mais vulneráveis aos efeitos adversos da crise aguda e necessitam de investigação adicional. A avaliação de pacientes com doença recorrente e calculose múltipla é feita de modo mais extenso. Nesta categoria incluem-se também as crianças e portadores de litíase em rim único. O Quadro 33.3 demonstra os principais exames requisitados. A diferenciação dos subtipos de hipercalciúria idiopática (em absortiva, renal, etc.), como proposta inicialmente por Pak,37 não é utilizada em nosso serviço. Esta atitude é baseada na distribuição contínua dos níveis de cálcio na urina, nos efeitos deletérios da restrição dietética de cálcio e na ausência de definição precisa entre os vários subtipos, em um mesmo paciente e entre grupos semelhantes. A Fig. 33.4 representa um fluxograma de investigação e manejo de pacientes com nefrolitíase.
TRATAMENTO Deve ser dividido em: tratamento da cólica renal; tratamento do cálculo e terapêutica da doença litiásica.
Tratamento da Cólica Renal A analgesia é feita com antiespasmódicos, como por exemplo o brometo de n-butilescopolamina (Buscopan®), por via intravenosa ou intramuscular ou com o emprego de antiinflamatórios não-hormonais (diclofenaco, indometacina, etc.) por via intramuscular. Em casos de dor mais intensa, análogos da morfina (como hidrocloreto de petidina) podem ser utilizados.38 A hidratação deve ser mantida por via oral ou com soluções intravenosas. Porém, a administração de grandes volumes de líquidos é controversa, porque no caso de ureter obstruído pode elevar a pressão hidrostática e aumentar a dor.
Suspeita de nefrolitíase (cólica nefrética, hematúria, etc.)
Estudo por imagem (RX, urografia excretora, ultra-som)
Ausência de cálculo
Cálculo confirmado
Complicações (infecção, obstrução, etc.)
NÃO
SIM
Encaminhar ao urologista
PRIMEIRO CÁLCULO Avaliação básica Excluir doenças sistêmicas Medidas gerais
NEFROLITÍASE RECORRENTE Avaliação completa Medidas gerais Terapia específica
Fig. 33.4 Fluxograma de avaliação e manejo de pacientes com nefrolitíase.
Tratamento do Cálculo A eliminação espontânea ocorre em até 80% dos cálculos menores que 5 mm. Para cálculos maiores que 7 mm a chance é bem menor, em torno de 25% para os localizados em ureter proximal, de 45% para aqueles em ureter médio e de 70% para cálculos de ureter distal.39 Consulta urológica visando remoção do cálculo ou drenagem do trato urinário está indicada em situações de dor refratária ao tratamento clínico, obstrução persistente com função renal alterada, infecção concomitante, risco de pionefrose ou urossepse, obstrução bilateral ou cálculo em rim único com hidronefrose. Hospitalização é recomendada quando houver necessidade de administração freqüente de analgésicos parenterais, ocorrerem vômitos persistentes, suspeita de pielonefrite aguda associada, elevação da uréia e creatinina plasmáticas e desenvolvimento de anúria ou oligúria.40 O Quadro 33.4 resume as principais modalidades terapêuticas para cálculos renais e ureterais. A litotripsia extracorpórea (LECO) utiliza ondas de choque geradas fora do corpo humano e as concentra no trato urinário, diretamente sobre o cálculo. Os pri-
616
Nefrolitíase
Quadro 33.4 Principais modalidades terapêuticas para cálculos reno-ureterais TRATAMENTO
INDICAÇÕES
VANTAGENS
LIMITAÇÕES
COMPLICAÇÕES
LECO
Cálculo renal menor que 2,5 cm; cálculo ureteral menor que 1 cm
Pouco invasiva Ambulatorial
Requer trato urinário livre para passagem de fragmentos; 60-75% de sucesso
Fragmentos de cálculos impactados (steinstrasse) Hematoma perinefrético Hipertensão arterial (?)
URETEROSCOPIA
Cálculos ureterais
Definitiva Ambulatorial
Invasiva Habitualmente requer stent ureteral póstratamento
Estenose ou perfuração de ureter
NEFROLITOTOMIA PERCUTÂNEA
Cálculos renais maiores que 2 cm; cálculo ureteral proximal maior que 1 cm
Definitiva
Invasiva
Sangramento Lesão de sistema coletor Lesão de estruturas adjacentes
CIRURGIA
Cálculos grandes, coraliformes
Definitiva
Invasiva
Recuperação prolongada, maior morbidade
Adaptado de PORTIS, A.J., SUNDARAM, C.P. Diagnosis and initial management of kidney stones. Am. Fam. Physician, 63:1329-38, 2001.
meiros litotriptores surgiram no início da década de 80. Consistem basicamente em uma fonte geradora de ondas (eletro-hidráulica, eletromagnética ou piezelétrica) e em um sistema de acoplamento e de localização de imagens (ultra-sônico e/ou radiográfico). Os pacientes são tratados ambulatorialmente, sob analgesia ou anestesia local.41 Avanços nas técnicas e nos instrumentos de ureteroscopia permitem que cálculos sejam tratados praticamente em todo o trajeto ureteral. A nefrolitotomia percutânea pode ser indicada isoladamente, para cálculos de grande volume ou seqüencialmente à LECO (técnica sanduíche). Novos métodos incluem a litotripsia percutânea ultra-sônica e a litotripsia a laser através de ureteroscópio. A cirurgia aberta (uretero- ou nefrolitotomia) é empregada atualmente em menos de 5% dos casos. Evidentemente, o julgamento e a experiência do urologista, associados à preferência do paciente, devem guiar o tratamento.
Pontos-chave: Indicações para remoção de cálculos • Dor intensa recidivante e refratária à medicação • Ausência de progressão de cálculos ureterais maiores que 5 mm • Obstrução urinária persistente • Presença de infecção concomitante
Profilaxia e Terapêutica da Doença Litiásica O primeiro episódio de nefrolitíase fornece uma boa oportunidade para aconselhar os pacientes sobre medidas preventivas e terapêuticas.42 As principais intervenções podem ser divididas em dietéticas e farmacológicas.
TRATAMENTO DIETÉTICO a) Aumento da ingestão líquida. Volumes urinários elevados reduzem a concentração dos sais excretados e conseqüentemente diminuem a supersaturação urinária. Estudos epidemiológicos revelam aumento acentuado na incidência de cálculos renais com volume urinário menor que 1.100 ml ao dia. Recomenda-se que a ingestão líquida seja suficiente para a produção de pelo menos 2.000 ml de urina diariamente.43 Água é a bebida mais recomendada, independente do conteúdo de cálcio ou magnésio. Sucos cítricos são também indicados. Chá e café também foram associados à redução no risco de formação de novos cálculos.44 b) Ingestão de cálcio, sal e proteína. Vários estudos recentes demonstraram que a ingestão reduzida de cálcio está associada a maior incidência de nefrolitíase.45 Postula-se que a baixa concentração de cálcio na luz intestinal causa maior absorção entérica de oxalato e conseqüentemente hiperoxalúria secundária. Além disto, a restrição dietética de cálcio pode levar a perda óssea em pacientes com cálculos e hipercalciúria.46 No Brasil este dado é ainda mais preocupante porque a
capítulo 33
ingestão média de cálcio situa-se bem abaixo dos 8001.000 mg recomendados ao dia.47 Dietas com alto teor de sódio diminuem a reabsorção tubular de cálcio e aumentam a calciúria. Da mesma forma, a ingestão excessiva de proteína animal resulta em leve acidose metabólica, estimulando a liberação de cálcio ósseo para tamponar o excesso de íons hidrogênio, o que acarreta aumento na excreção urinária de cálcio. Portanto, recomenda-se dieta com 0,8 a 1 g/kg/dia de proteína e ingestão de sódio limitada a 100-150 mEq/dia, principalmente nos casos de hipercalciúria associada à nefrolitíase recorrente. c) Outras medidas. Em pacientes com hiperoxalúria, recomenda-se evitar excessos na ingestão de espinafre, amendoim, chocolate e beterraba. Em portadores de hiperuricosúria, associada a cálculos puros de ácido úrico ou mistos de oxalato de cálcio, é aconselhável uma dieta com restrição em alimentos ricos em purina. Na cistinúria, a ingestão hídrica deve proporcionar volume urinário maior que 3 litros, utilizando-se liberalmente sucos cítricos, para aumentar a carga de álcalis e o pH urinário e proporcionar maior solubilidade da cistina.
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO a) Tiazídicos. São efetivos em situações de hipercalciúria associada à nefrolitíase recidivante. Agem aumentando a reabsorção tubular proximal de cálcio (associada à contração do espaço extracelular) e diretamente no túbulo distal, diminuindo a calciúria. Vários estudos relataram diminuição de até 25% no risco de formação de novos cálculos após três anos de tratamento.48 Deve-se estimular a restrição concomitante de sódio e evitar hipocalemia durante o tratamento com tiazídicos, pela conseqüente redução na excreção de citrato. Efeitos colaterais como hipotensão arterial, fadiga, impotência, dislipidemia e intolerância à glicose podem diminuir a adesão ao tratamento. b) Citrato. Indicado nos casos de hipocitratúria, primária ou secundária. Também diminui a saturação urinária em casos de hipercalciúria, ligando-se ao cálcio e formando complexos solúveis. Além disso, apresenta efeito alcalinizante, aumentando o pH urinário e a fração dissociada de ácido úrico, o que torna seu emprego recomendado na nefrolitíase úrica. Utiliza-se preferencialmente o citrato de potássio em dose suficiente para elevar o pH urinário acima de 6,5, nível associado com redução no tamanho e até com dissolução de cálculos puros de ácido úrico.49 Epigastralgia, pirose, diarréia e plenitude gástrica são queixas freqüentes e limitam a terapêutica com citrato. c) Alopurinol. Possui eficácia comprovada na nefrolitíase por oxalato de cálcio associada à hiperexcreção de ácido úrico e também em pacientes com hiperuricosúria associada a cálculos puros de ácido úrico.50 Entretanto, mes-
617
mo nesta última situação, deve-se concomitantemente manter o pH urinário alcalino, para obter maior solubilidade do ácido úrico. O alopurinol atua inibindo a enzima xantina-oxidase, responsável pela conversão de xantina em ácido úrico. Os efeitos colaterais associados são pouco freqüentes e incluem rash cutâneo, artralgias e muito raramente síndrome de Stevens-Johnson. d) Outras medicações. Em pacientes portadores de cistinúria, com concentração urinária de cistina acima de 500 mg/litro ou com formação de novos cálculos sob tratamento conservador, recomenda-se o uso de agentes queladores. Estas substâncias interrompem as pontes dissulfídicas da molécula de cistina, tornando-a mais solúvel. A mais efetiva é a penicilamina, porém apresenta vários efeitos colaterais graves, como agranulocitose, trombocitopenia, síndrome nefrótica e pênfigo, que levam à interrupção do tratamento na maioria das vezes. Alternativamente pode-se utilizar tiopronina ou, com resultados controversos, captopril.40 Os cálculos de estruvita devem ser removidos totalmente, principalmente os de grande volume, já que núcleos remanescentes podem causar recidivas precoces. Preconiza-se antibioticoterapia pós-remoção por 3-4 meses, acompanhada de uroculturas de vigilância. O ácido aceto-hidroxâmico pode diminuir a formação de estruvita em casos de impossibilidade de remoção ou retirada incompleta do cálculo. Entretanto, apresenta vários efeitos colaterais graves, que levam à interrupção do tratamento em até 70% dos casos.
Pontos-chave: Recomendações dietéticas • Ingesta líquida adequada para produzir 2-3 litros de urina ao dia • Evitar restrição de cálcio • Restringir excesso de sal e proteína animal • Consumo balanceado de cálcio e oxalato • Incentivar ingestão de sucos cítricos Agradecimentos: ao doutorando de medicina Leonardo V. Riella pela revisão do capítulo e valiosas sugestões..
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. MANN, S. Mineralization in biological systems. Struct. Bonding, 54:125-174, 1983. 2. ROBERTSON, W. ; PEACOCK, M. Calcium oxalate crystalluria and inhibitors of crystallization in recurrent renal stone formers. Clin. Sci. (Lond.), 43:499-506, 1972. 3. SUTHERLAND, J.; ARKS, J.; COE, F.L. Recurrence after a single renal stone in a community practice. Miner. Electr. Metab., 11:267-269, 1985. 4. 1999 National Hospital Discharge Survey: Annual Summary with
618
5.
6. 7. 8.
9.
10.
11.
12. 13.
14.
15.
16.
17. 18. 19. 20. 21. 22. 23.
24.
25. 26.
27.
28.
Nefrolitíase
Detailed Diagnoses and Procedures Data. Atlanta, GA: NCHS, CDC, DHHS; September 2001. Vital and Health Statistics. Series 13, n.151. ROBERTSON, W.G.; HUGHES, H. Epidemiology of urinary stone disease in Saudi Arabia. In: Ryall, R.; Bais, R.; Marshall V.R.; Rofe, A.M.; Smith, L.H.; Walker, V.R. Urolithiasis 2. Plenum Press: New York and London, 1994, p.453-455. FINLAYSON, B. Physicochemical aspects of urolithiasis. Kidney Int., 13:344-360, 1978. SMITH, L.H. The pathophysiology and medical treatment of urolithiasis. Semin. Nephrol., 10:31-52, 1990. COE, F.L.; PARKS, J.H. New insights into the pathophysiology and treatment of nephrolithiasis: New research venues. J. Bone Miner. Res., 12:522-533, 1997. MEYER, J.L. Physicochemistry of stone formation. In: Resnick, M.I.; Pak, C.Y.C. Urolithiasis: a Medical Surgical Reference. W.B. Saunders: Philadelphia, 1990, p.11-34. HESS, B.; KOK, D.J. Nucleation, growth and aggregation of stoneforming crystals. In: Coe, F.L.; Favus, M.J.; Pak, C.Y.C.; Parks, J.H.; Preminger, G.M. Kidney Stones: Medical and Surgical Management. Lippincot-Raven, Philadelphia, 1996, p.3-32. COE, F.L.; PARKS, J.H. Defenses of an unstable compromise: Crystallization inhibitors and the kidney’s role in mineral regulation. Kidney Int., 38:625-631, 1990. ELLIOT, J.S.; RABINOWITZ, I.N. Calcium oxalate crystalluria: Crystal size in urine. J. Urol., 123:324-327, 1980. BROWN, C.M.; PURICH, D.L. Strong inference in mechanistic urolithiasis: A tribute to Birdwell Finlayson’s biophysical contributions. Am. J. Kidney Dis., 17:451-457, 1991. LIESKE, J.C.; TOBACK, F.G. Interaction of urinary crystals with renal epithelial cells in the pathogenesis of nephrolithiasis. Semin. Nephrol., 16:458-473, 1996. GARDNER, G.L.; DOREMUS, R.H. Crystal growth inhibitors in human urine. Effect on calcium oxalate kinetics. Invest. Urol., 15:478485, 1978. MARANGELLA, M.; VITALE, C.; PETRARULO, M.; BAGNIS, C.; BRUNO, M.; RAMELLO, A. Renal stones: from metabolic to physicochemical abnormalities. How useful are inhibitors? J. Nephrol., 13 (suppl. 3):S51-S60, 2000. WASSERSTEIN, A.G. Nephrolithiasis: Acute management and prevention. Dis. Mon., 44:196-213, 1998. CARVALHO, M.; NAKAGAWA, Y. Supersaturação urinária e recorrência em nefrolitíase. J. Bras. Urol., 25:475-479, 1999. COE, F.L. Nephrolithiasis. In: Brenner, B.M.; Coe, F.L., Rector Jr., F.C. Clinical Nephrology. W.B. Saunders: Philadelphia, 1987, p.205-222. HEILBERG, I.P. In: Cruz, J., Barros, R.T., Cruz, H.M.M. Atualidades em Nefrologia, vol. 6. Sarvier, São Paulo, 2000, p.188-191. SCHEINMAN, S.J. Nephrolithiasis. Semin. Nephrol., 19:381-388, 1999. BALAJI, K.C.; MENSON, M. Mechanism of stone formation. Urol. Clin. North Am., 24:1-11, 1997. RODGERS, A. Aspects of calcium oxalate crystallization: theory, in vitro studies, and in vivo implementation. J. Am. Soc. Nephrol., 10:S351S354, 1999. MILLINER, D.S.; WILSON, D.M.; SMITH, L. Phenotypic expression of primary hyperoxaluria: Comparative features of types I and II. Kidney Int., 59:31-36, 2001. ASPLIN, J.R. Uric acid stones. Semin. Nephrol., 16:412-424, 1996. RYALL, R.L.; GROVER, P.K.; MARSHALL, V.R. Urate and calcium stones — Picking up a drop of mercury with one’s fingers? Am. J. Kidney Dis., 17:426-430, 1991. TISELIUS, H.G.; FORNANDER, A.M.; NILSSON, M.A. Effects of citrate and urinary macromolecules on crystal aggregation. In: Riall, R.L. Urolithiasis 2. Plenum Press, New York, 1994, p.213-214. PAK, C.Y.C. Citrate and renal calculi: An update. Miner. Electrolyte Metab., 20:371-377, 1994.
29. 30.
31. 32.
33. 34. 35.
36. 37. 38. 39.
40.
41. 42.
43.
44.
45.
46.
47.
48.
49.
50.
PARKS, J.H.; COE, F.L. A urinary calcium-citrate index for the evaluation of nephrolithiasis. Kidney Int., 30:85-90, 1986. RUDMAN, D.; KUTNER, M.H.; REDD, S.C.; WATERS, W.C.; GERRON, G.G.; BLEIER, J. Hypocitraturia in calcium nephrolithiasis. J. Clin. Endocrinol. Metab., 55:1052-1057, 1982. GOODYER, P.; BOUTROS, M.; ROZEN, R. The molecular basis of cystinuria: An update. Exp. Nephrol., 8:123-127, 2000. CARVALHO, M.; NAKAGAWA, Y.; ASPLIN, J.; COE, F.L. Effects of Tamm-Horsfall glycoprotein and Uromodulin on calcium oxalate crystal nucleation and aggregation. J. Am. Soc. Nephrol., 8:A2605, 1997. SHOKEIR, A.S. Renal colic: Pathophysiology, diagnosis and treatment. Eur. Urol., 39:241-249, 2001. OLDER, R.A., JENKINS, A.D. Stone disease. Urol. Clin. North Am., 27:215-231, 2000. MANDEL, G., MANDEL, N. Analysis of stones. In: Coe, F.L.; Favus, M.J.; Pak, C.Y.C.; Parks, J.H.; Preminger, G.M. Kidney Stones: Medical and Surgical Management. Lippincot-Raven, Philadelphia, 1996, p.323-335. MONK, R.D. Clinical approach to adults. Semin. Nephrol., 16:375-388, 1996. LEVY, F.L.; ADAM-HUET, B.; PAK, C.Y.C. Ambulatory evaluation of nephrolithiasis: an update from 1980. Am. J. Med., 98:50-59, 1995. HESSE, A.; TISELIUS, H. G.; JAHNEN, A. Urinary Stones – Diagnosis, Treatment and Prevention of Recurrence. Karger, Basel, 1996, p.18-29. GLOWACKI, L.S.; BEECROFT, M.L.; COOK, R.J.; PAHL, D.; CHURCHILL, D.N. The natural history of asymptomatic urolithiasis. J. Urol., 147:319-321, 1992. TISELIUS, H.G.; ACKERMANN, D.; ALKEN, P.; BUCK, C.; CONORT, P.; GALLUCCI, M. Guidelines on urolithiasis. Eur. Urol., 40:362-371, 2001. SUNDARAM, C.P.; SALTZMAN, B. Extracorporeal shock wave lithotripsy: A comprehensive review. Comp. Ther., 24:332-335, 1998. SILVA, J.A.M.; CORREIA, M.I.T.D. Nutrição e litíase renal. In: Riella, M.C.; Martins, C. Nutrição e o Rim. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2001, p.207-213. BORGHI, L.; MESCHI, T.; AMATO, F.; BRIGANTI, A.; NOVARINI, A.; GIANNINI, A. Urinary volume, water and recurrences in idiopathic calcium nephrolithiasis: a 5-year randomized prospective study. J. Urol., 155:839-43, 1996. CURHAM, G.C.; WILLETT, W.C.; SPEIZER, F.E.; STAMPFER, M.J. Beverage use and risk for kidney stones in women. Ann. Intern. Med., 128:534-40, 1998. BORGHI, L.; SCHIANCHI, T.; MESCHI, T.; GUERRA, A.; ALLEGRI, F.; MAGGIORE, U.; NOVARINI, A. Comparison of two diets for the prevention of recurrent stones in idiopathic hypercalciuria. N. Engl. J. Med., 346:77-84, 2002. HEILBERG, I.P. Update on dietary recommendations and medical treatment of renal stone disease. Nephrol. Dial. Transplant., 15:117123, 2000. SCHOR, N.; HEILBERG, I.P. Hipercalciúria idiopática. In: Schor, N.; Heilberg, I.P. Calculose Renal. Fisiopatologia, Diagnóstico e Tratamento. Sarvier, São Paulo, 1995, p.43-53. PEARLE, M.S.; ROEHRBORN, C.G.; PAK, C.Y.C. Meta-analysis of randomized trials for medical prevention of calcium oxalate nephrolithiasis. J. Endourol., 13:679-685, 1999. PAK, C.Y.C.; SAKHAEE, K.; FULLER, C. Successful management of uric acid nephrolithiasis with potassium citrate. Kidney Int., 30:422428, 1986. ETTINGER, B.; TANG, A.; CITRON, J.T.; LIVERMORE, B.; WILLIAMS, T. Randomized trial of allopurinol in the prevention of calcium oxalate calculi. N. Engl. J. Med., 315:1386-1389, 1986.
capítulo 33
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Conferência de Consenso sobre o tratamento da nefrolitíase, patrocinada pelo Instituto Nacional de Saúde Americano (NIH). http://odp.od.nih.gov/consensus/cons/067/067-intro.htm Diagnóstico e Tratamento da Nefrolitíase, com várias imagens radiológicas. http://www.radsci.ucla.edu:8000/gu/stones/kidneystone.html
Endereço com imagens de cristais e cálculos renais. http://www.herringlab.com/photos/ Discussão de patologias hereditárias associadas à nefrolitíase. http://www.hosppract.com/issues/2000/03/schein.htm Endereço da Fundação para Estudo da Oxalose e Hiperoxalúria. http://www.ohf.org/
619
Capítulo
34
Uropatia Obstrutiva Ronaldo Roberto Bérgamo e Eric Roger Wroclawski
INTRODUÇÃO
Renograma com diurético
INCIDÊNCIA E PREVALÊNCIA ETIOLOGIA
Pielografia anterógrada ou retrógrada FISIOPATOLOGIA
Congênitas
Hemodinâmica glomerular
Adquiridas
Função tubular
Intrínsecas
Reabsorção de sódio e água
Extrínsecas
Concentração urinária
ASPECTOS CLÍNICOS
Secreção de potássio e acidificação urinária
ASPECTOS LABORATORIAIS
Reabsorção de fósforo, cálcio e magnésio
DIAGNÓSTICO
Metabolismo renal
Radiografia simples do abdome
DIURESE PÓS-OBSTRUTIVA
Ultra-sonografia
FIBROSE INTERSTICIAL E LESÃO TUBULAR
Urografia excretora
IRREVERSÍVEL
Uretrocistografia retrógrada e miccional
TRATAMENTO
Tomografia computadorizada
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Ressonância magnética
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO Uropatia obstrutiva é a obstrução ao fluxo de urina em qualquer nível do trato urinário, da pelve renal até o meato uretral.1 Essa obstrução pode ser unilateral ou bilateral, parcial ou completa, aguda ou crônica, congênita ou adquirida. É uma doença passível de ser revertida no início, e a importância da reversão precoce é prevenir a atrofia tubular e a perda irreversível da função renal. O prognóstico dependerá da duração e da severidade da obstrução, além da presença de infecção urinária. Hidronefrose é a dilatação da pelve renal e cálices associada à atrofia renal, na maioria das vezes devido à obstrução ao fluxo urinário.1 O pintor e escultor Michelangelo (1475-1564) aspirou ilustrar um livro de anatomia do professor Realdo Colom-
bo (1516-1559), da Universidade de Pádua. Esta amizade surgiu quando Colombo diagnosticou, em Michelangelo, litíase urinária em 1549 e gota em 1555. De acordo com correspondências, Michelangelo apresentava cólica nefrética desde jovem e faleceu aos 89 anos com sintomas de hipervolemia, sugerindo nefropatia obstrutiva.2 Nefropatia obstrutiva consiste em alterações funcionais e patológicas nos rins, decorrentes do aumento de pressão na via excretora secundária à obstrução urinária.1
INCIDÊNCIA E PREVALÊNCIA De acordo com o United States Renal Data System — USRDS de 2001, a incidência de insuficiência renal crônica terminal no período de 1995 a 1999 foi de 406.310 pa-
621
capítulo 34
cientes, sendo 1.137 pacientes (0,3%) portadores de uropatia obstrutiva congênita.3 No período de 1989 a 1993, 2% dos pacientes que estavam em diálise nos Estados Unidos apresentavam uropatia obstrutiva.4 Segundo levantamento chileno, a obstrução do trato urinário é a etiologia mais prevalente (18,1%) de insuficiência renal crônica pediátrica.5 Percentagem semelhante foi encontrada na França (10,2%)6 e na Suécia (20,9%).7 Na população adulta na Índia, a prevalência de uropatia obstrutiva é de 2,1%.8 A incidência de hidronefrose encontrada em necrópsias é de 3,1%.9
ETIOLOGIA Uropatia obstrutiva é um problema comum na prática clínica e deve ser sempre lembrada em casos de perda de função renal, infecção urinária, distúrbio miccional, hematúria ou dor de origem gênito-urinária. Qualquer segmento do trato urinário pode ser local de processo obstrutivo, do túbulo renal ao meato uretral. Uma visão panorâmica, global, dos fatores causais de obstrução do trato urinário encontra-se na Fig. 34.1. Por questão de ordem didática, as causas de obstrução serão divididas em congênitas e adquiridas.
Congênitas Entre as congênitas, em forma descendente, estenose da junção ureteropiélica (JUP) é a causa mais comum de hi-
dronefrose desde o período pré-natal até a adolescência. Apesar disso, mais de um terço dos casos são diagnosticados no adulto. Em crianças, o achado mais freqüente é presença de massa abdominal e, nos adultos, dor em cólica lombar ou flanco. Pelve dilatada à ultra-sonografia não implica tratar-se de obstrução clinicamente significante. Dos casos suspeitos no período pré-natal, pelo menos 50% desaparecem ou permanecem assintomáticos. Pode ser bilateral em 10 a 30% dos casos. Vários fatores estão implicados na obstrução causada pela estenose de JUP, mas acredita-se que o mais relevante seja a presença de um segmento de ureter aperistáltico, com abundância de fibras colágenas, impedindo a progressão de urina. Por vezes, há o cruzamento da via excretora com um vaso hilar anômalo, levando à compressão da JUP. Particularmente em crianças, a presença de refluxo vésico-ureteral (RVU) maciço pode levar à dilatação da pelve renal, mimetizando estenose da JUP, razão pela qual, nesta idade, o diagnóstico de estenose da JUP, primário, só pode ser estabelecido após avaliação por imagem da presença ou não de RVU. O ureter pode ser sede de obstrução devido a pregas de mucosa, válvulas (pregas de mucosa com músculo liso) e pólipos fibroepiteliais benignos. Ureter retrocava é o nome de uma anomalia venosa na gênese da veia cava inferior onde o ureter, geralmente o direito, circunferencia a veia cava inferior, passando por trás da mesma. O achado urológico sugere um J invertido, mas o diagnóstico definitivo é dado pela tomografia abdominal. A estenose da junção ureterovesical (JUV) também pode ocorrer e está associada ao megaureter congênito.
OBSTRUÇÃO DO TRATO URINÁRIO Causas Congênitas
Anatômicas Junção Uretero-piélica
Causas Adquiridas
Funcionais Disfunções Vesicais Neurogênicas
Intrínsecas Anatômicas
Extrínsecas Funcionais
Rim
Neurogênica
Ureter
Miogênica
Bexiga
Drogas
Ureter Junção Uretero-vesical
Bexiga
Mulher
Homem
Aparelho Reprodutivo: Tumores Gestação Endometriose Abscessos
Aparelho Genital: H.P.B. Ca. de Próstata
Uretra Doenças do Trato Gastro-intestinal
Externas ao Meato Uretral
Problemas Vasculares Arteriais ou Venosos Doenças do Retroperitônio
Iatrogênicas
Fig. 34.1 Causas de uropatia obstrutiva.
622
Uropatia Obstrutiva
Ureterocele é a dilatação cística do ureter intramural e, por vezes, associada à estenose do meato ureteral. A presença de divertículo vesical, muitas vezes concomitante à duplicidade pielo-ureteral, pode ser causa de obstrução ureteral ou mesmo vesical. Ao nível uretral, a válvula de uretra posterior (VUP) é a afecção mais temida. Ocorre só no sexo masculino e na maioria das vezes é diagnosticada antes da idade adulta, através da cistouretrografia miccional. Apesar de não ser tão freqüente, por obstruir o esvaziamento vesical, nos casos severos compromete os rins, levando à insuficiência renal. Patologias externas ao meato uretral como fimose e fusão labial são possíveis, mas não muito freqüentes, causas de uropatia obstrutiva, identificáveis ao exame físico.
Adquiridas Entre a causas adquiridas de obstrução do trato urinário, há que distinguir as intrínsecas (intraluminal e intramural) e as extrínsecas.
INTRÍNSECAS Há os depósitos tubulares de cristais de ácido úrico (nefropatia úrica), indinavir e aciclovir. São de diagnóstico difícil por imagem. A história clínica e o antecedente de tratamento de neoplasia e AIDS são de fundamental importância. Entre as causas intrínsecas de uropatia obstrutiva, sem dúvida a mais prevalente é a litíase urinária, podendo obstruir desde o cálice até o meato uretral. Em geral é unilateral e atinge o sexo masculino preferencialmente (3:1). O cálculo urinário pode impactar-se no ureter, nos pontos mais estreitos como a JUP, o cruzamento com os vasos ilíacos e a JUV, levando a aumento agudo da pressão intraluminal, à montante, e distensão abrupta da pelve e cápsulas renais, causando dor. Outras causas de cólica lombar além de litíase são: coágulos oriundos de sangramento de lesões benignas ou malignas e a migração de papilas renais, como ocorre na papilite necrotizante resultante de abuso de analgésicos, anemia falciforme e diabetes mellitus. Tumores uroteliais, isto é, originários do epitélio de revestimento mucoso do trato urinário, podem também, ao crescer ou sangrar, promover a obstrução urinária. Processos infecciosos como tuberculose e esquistossomose urinária, por estreitamento inflamatório, e candidíase urinária, por fungus ball, podem também cursar com obstrução. Estenose de uretra em homens, pós-uretrite, trauma ou instrumentação urológica, e em mulheres, por exemplo, pós-radioterapia externa ou braquiterapia no tratamento de neoplasias ginecológicas, é situação que deve ser investigada sempre que houver Manifestações Urinárias do Trato Inferior (MUTI).
Não só problemas anatômicos podem causar uropatia obstrutiva. A bexiga, que tem duas funções, armazenamento e eliminação de urina, pode ter esta última prejudicada por etiologia neurogênica como lesão medular, miogênica como nas hiperdistensões prolongadas, e por ação de drogas, particularmente aquelas com ação anticolinérgica. Nestas circunstâncias poderá ocorrer retenção urinária e obstrução funcional.
EXTRÍNSECAS Entre as causas extrínsecas, algumas são próprias do gênero. No homem, a próstata é sede de hiperplasia benigna e maligna. Com o envelhecimento, aumentam as chances de aparecerem sintomas decorrentes destas afecções. Este conjunto de sintomas era conhecido anteriormente como prostatismo, designação não mais recomendada, pois não está relacionado exclusivamente a problemas prostáticos. Hoje é preferível empregar a expressão MUTI ou LUTS, em inglês, Lower Urinary Tract Symptoms. Na mulher, várias doenças do aparelho reprodutor, como neoplasia de ovário, útero e vagina, e seus tratamentos são causas extrínsecas de obstrução. Das doenças benignas destacam-se os abcessos tuboovarianos, a endometriose, o prolapso uterino e as iatrogenias cirúrgicas. A gravidez pode também ter efeito deletério sobre o trato urinário secundário à obstrução ureteral, principalmente à direita, podendo, entretanto, ser bilateral. Neoplasias e doenças inflamatórias, entre elas a doença de Crohn e a retocolite ulcerativa, podem levar à obstrução ureteral por contigüidade e extensão do processo inflamatório ou pela associação com litíase urinária. Pancreatite e abcesso periapendicular também são causas de obstrução do ureter direito. Algumas doenças vasculares, arteriais e venosas, devido à sua posição anatômica, podem comprometer o livre fluxo urinário. Aneurismas da aorta abdominal e das ilíacas, assim como iatrogênicas secundárias ao seu reparo cirúrgico, podem obstruir o trato urinário superior. Entre as obstruções devidas ao sistema venoso destacam-se a síndrome da veia ovariana, exclusiva do ureter direito, a tromboflebite puerperal da veia ovariana e o ureter retrocava ou circuncava. A fibrose retroperitoneal idiopática (doença de Ormond) é uma entidade que acomete ambos os sexos, sendo duas vezes mais freqüente em homens, e tem seu pico de incidência por volta da 5.ª e 6.ª décadas da vida. Acomete em geral o terço médio dos ureteres, podendo ser uni- ou bilateral. Apesar de idiopática, há situações clínicas associadas, como: uso crônico de metisergida para enxaqueca, presença de neoplasia maligna, arterite aórtica, colangite esclerosante, tromboflebites e doença de Crohn. Há também situações específicas em que ocorre obstrução ureteral por reação do retroperitônio.
623
capítulo 34
• Muitas causas congênitas de obstrução do trato urinário só irão manifestar-se clinicamente na idade adulta • Distúrbios funcionais da bexiga podem comportar-se como processo obstrutivo • Obstruções infravesicais são potencialmente mais graves por comprometerem bilateralmente os rins, causando insuficiência renal
sódio e água e aumento do volume extracelular (volumedependente). Nas obstruções completa ou parcial bilateral, podem-se observar também sinais e sintomas decorrentes da insuficiência renal: anorexia, náuseas, vômitos, palidez cutânea, fraqueza, perda da atenção/memória, sonolência, edema, dispnéia e insuficiência cardíaca congestiva. Polidipsia, poliúria, noctúria e sinais de acidose tubular renal, tais como dispnéia, náuseas e vômitos, podem ocorrer nos casos de obstrução crônica caracterizando alteração funcional e patológica renal, conhecida como nefropatia obstrutiva.
ASPECTOS CLÍNICOS
ASPECTOS LABORATORIAIS
Dor e alterações miccionais são os principais sintomas da uropatia obstrutiva. A dor é devida à distensão da pelve, cápsula renal ou bexiga (levando ao estiramento do peritônio que a recobre parcialmente). Quando ocorre obstrução proximal, como no cálculo ureteral, a dor é em cólica, geralmente de forte intensidade, na região lombar ou flanco, e pode irradiar-se para a fossa ilíaca ipisilateral, testículo ou lábio genital. Por outro lado, na estenose da junção ureteropiélica e neoplasia pélvica a dor pode ser mínima ou ausente, pois o processo obstrutivo ocorre lentamente. Na obstrução baixa, aguda, ocorre distensão vesical e dor hipogástrica. Na fase aguda do lesado medular, a distensão vesical pode ser indolor. Alterações miccionais como disúria, polaciúria e urgência miccional são comuns nas obstruções baixas (infravesicais). Os sintomas irritativos são ocasionados por contrações involuntárias do músculo detrusor e/ou infecção urinária secundária. É comum a associação entre obstrução e infecção urinária, principalmente nas obstruções baixas. São fatores determinantes o resíduo urinário e alterações na parede vesical que propiciam adesão e crescimento bacteriano, além de prejuízo dos mecanismos de defesa local. Litíase urinária é causa freqüente de uropatia obstrutiva, mas pode ser também complicação da própria obstrução. Na infecção urinária por Proteus e Klebsiella, bactérias produtoras de urease promovem degradação da uréia que, por hidrolisação, origina amônia e carbonato. A amônia alcaliniza a urina, que precipita os sais de fosfato, formando cálculo de estruvita (fosfato amônio magnesiano hexaidratado).10 Hipertensão arterial pode ocorrer em função da ativação do sistema renina-angiotensina, na obstrução aguda unilateral. Há elevação da atividade plasmática de renina na veia do rim obstruído, similar à encontrada na hipertensão reno-vascular. Por outro lado, em pacientes com obstrução bilateral, a hipertensão é devida à retenção de
Na obstrução bilateral observa-se elevação dos níveis plasmáticos de uréia e creatinina e redução na depuração de creatinina. A hipercalemia pode acompanhar a acidose metabólica hiperclorêmica e tornar-se um achado muito freqüente. O hemograma é importante para diagnóstico, pois a anemia é a principal conseqüência hematológica da insuficiência renal crônica e a leucocitose pode ser devida a infecção ou neoplasia hematológica. Na análise da urina pode-se observar hematúria na litíase ou neoplasia renal, leucocitúria na infecção urinária, e a proteinúria, quando presente, é menor que 2 gramas/dia. Na obstrução aguda os exames urinários são semelhantes aos encontrados na insuficiência pré-renal (sódio ⬍ 20 mEq/L, fração de excreção de sódio ⬍ 1% e osmolaridade ⬎ 500 mOsm/L). Por outro lado, na obstrução crônica os exames de urina assemelham-se à necrose tubular aguda (sódio ⬎ 20 mEq/L, fração de excreção de sódio ⬎ 1% e osmolaridade ⬍ 350 mOsm/L).11 Na obstrução crônica os testes para avaliar a concentração e a acidificação urinárias estão alterados.
Pontos-chave:
DIAGNÓSTICO Como vimos, o prejuízo da função renal está relacionado à intensidade e à duração da obstrução. Desta forma, o diagnóstico precoce e correto da causa da obstrução torna-se fundamental quando se pretende minimizar o dano renal. A história clínica, o exame físico e a bioquímica fornecem informações muito importantes e servem de guia para a escolha dos exames de imagem a empregar para estabelecer definitivamente o fator obstrutivo como agente etiológico e estimar sua repercussão sobre os rins. Na escolha do método de imagem, fatores como presença de dor, infecção e comprometimento de função renal devem ser valorizados, assim como a ocorrência de gestação ou diabetes, uma vez que todos os exames têm vanta-
624
Uropatia Obstrutiva
gens e riscos e sua indicação deve ser analisada individualmente caso a caso.
suspeitas de uropatia obstrutiva, a dissociação entre a hipótese clínica e o achado de exame exige a realização de outros procedimentos diagnósticos.
Radiografia Simples do Abdome É um exame simples que pode ser realizado na maioria dos locais de pronto atendimento. Pode ser útil na suspeita clínica de cólica renal evidenciando imagens radiopacas na projeção das vias excretoras. Permite visualizar o tamanho e o contorno dos rins informando sobre a possibilidade de hidronefrose, em obstruções crônicas.
Pontos-chave: • Anamnese e exame físico são muito úteis para diagnóstico da altura da obstrução do trato urinário • Ultra-sonografia é o primeiro exame na investigação da obstrução urinária • Ultra-som normal não exclui uropatia obstrutiva
Ultra-sonografia A ultra-sonografia é o método inicial de avaliação e triagem quando se suspeita de obstrução do trato urinário em função da sua eficiência e sensibilidade no diagnóstico da dilatação renal, ausência de uso de radiação ionizante, baixo custo, alta disponibilidade, e fundamental para acompanhamento evolutivo seqüencial. Este exame fornece informações sobre as conseqüências da obstrução: tamanho dos rins, magnitude da hidronefrose, espessura do parênquima renal (índice relativo de dano permanente) e, eventualmente, também sobre a causa da obstrução. Apesar de ter alta sensibilidade (probabilidade de que o teste seja positivo quando da existência da condição pesquisada),12 para o diagnóstico de hidronefrose há que se ter cuidado com sua interpretação clínica. Primeiramente, é um exame “operador-dependente”, isto é, a capacidade técnica de quem faz influencia, em muito, a obtenção das imagens e sua conseqüente análise. Além disso, a ultra-sonografia ocasionalmente pode mostrar tamanho e forma da via excretora sugerindo hidronefrose sem contudo mostrar o fator obstrutivo. Nestes casos fica difícil afirmar se se trata de uma simples variação anatômica com baixa pressão no sistema urinário ou a real repercussão do dano na drenagem da via excretora. Achados falso-positivos de hidronefrose ocorrem em casos de pelves extra-renais, megacalicose congênita, cistos renais, particularmente em paraplégicos, hiperidratação. A título de exemplo, uma boa parte dos pacientes submetidos à derivação urinária tipo conduto ileal apresentam pelve e ureter dilatados sem que contudo haja obstrução ao fluxo urinário. Podem ocorrer, também, falso-negativos em casos de obstrução. A ultra-sonografia, apesar de ter alta especificidade (probabilidade do resultado do teste ser negativo, na ausência da condição pesquisada) pode deixar de apontar pequenas dilatações em pelves intra-hilares, obstruções de curta duração ou se o paciente estiver desidratado. Além disso, o ultra-sonografista pode interpretar erroneamente a dilatação calicial como múltiplos cistos parenquimatosos. Apesar de ser uma ferramenta de triagem muito útil em
Urografia Excretora Até hoje, em alguns livros, lê-se que a urografia excretora é o primeiro e melhor exame a ser realizado quando se suspeita de uropatia obstrutiva. Esta certamente não é a posição aceita pela maioria dos especialistas. Apesar de muito útil, pois fornece dados definitivos sobre a anatomia do rim e vias excretoras, particularmente dos ureteres, e sugestões do grau de lesão renal, apresenta um grande número de restrições. Inicialmente, emprega radiação ionizante, o que restringe seu uso indiscriminado e repetido. Em gestantes, sua indicação deve ser rigorosamente analisada. O emprego de contraste iodado endovenoso pode prejudicar a função renal de pacientes de alto risco, como diabéticos e indivíduos já com função renal diminuída,13 além de causar mal-estar e alergias, algumas bastante graves. Em casos de obstrução com diminuição da filtração glomerular, somente as radiografias retardadas, após 12 a 24 horas da injeção de contraste, desenharão a via excretora até o local do obstáculo. Com o advento de modernos exames de imagem, o papel da urografia excretora no diagnóstico da uropatia obstrutiva está sendo redimensionado mas permanece como um importante e útil exame em função de sua disponibilidade e eficiência em diagnosticar a maioria das causas de obstrução e conseqüentemente orientar a terapêutica.
Uretrocistografia Retrógrada e Miccional Através da injeção de contraste iodado pelo meato uretral, de modo retrógrado, avalia-se a anatomia da uretra anterior (peniana e bulbar) principalmente. Quando o paciente urina o contraste acumulado na bexiga — cistouretrografia miccional — expõe-se a uretra prostática e membranosa (uretra posterior). É nesta fase que melhor se identificam as válvulas de uretra posterior. A realização deste exame na presença de infecção uri-
625
capítulo 34
nária pode ter repercussão sistêmica e só deve ser feito sob controle, com cobertura antimicrobiana.
Tomografia Computadorizada Tendo em vista sua alta sensibilidade, é um exame bastante eficiente no diagnóstico da uropatia obstrutiva e é uma opção válida e útil quando outros procedimentos, tais como ultra-sonografia e urografia excretora, falharam. A tomografia computadorizada, mesmo realizada sem contraste endovenoso, permite ver a via excretora particularmente se estiver dilatada. Além disso, fornece informações sobre o que está ocorrendo “em volta” nas proximidades da via excretora, sendo muito útil nos casos de obstrução extrínseca do ureter, identificando o fator causal. Desta forma, pode ser empregada em pacientes com contra-indicação ao uso de contrastes iodados endovenosos. A tomografia computadorizada espiral é particularmente eficiente no diagnóstico da litíase ureteral, tendo inclusive maior sensibilidade que a urografia excretora neste quesito.14
Ressonância Magnética Apesar de alguns pontos positivos, como não empregar contraste iodado nem radiação ionizante, trata-se de um método oneroso, com tempo de execução ao redor de 4060 minutos, bom para a visualização da dilatação mas pouco sensível na identificação da litíase ureteral, em casos agudos.15 Deve ser reservado, preferencialmente, para pacientes com alteração da função renal ou com alergia ao emprego de contraste iodado.
Renograma com Diurético Também conhecido como cintilografia renal com diurético (wash-out),16 é bastante empregado no diagnóstico e acompanhamento evolutivo de dilatações do trato urinário superior. Tem como vantagens não empregar injeção endovenosa de contraste iodado e expor o paciente à radiação bem menor do que na urografia excretora. Fornece boas informações sobre a função relativa de cada rim, de modo não-invasivo, em relação à função renal total. Há pontos extremamente importantes que devem ser levados em conta na análise final do exame, pois podem influenciá-la, como os níveis séricos da creatinina e da hiperidratação. Nestas condições, desidratação e insuficiência renal, os rins terão dificuldade na capacidade de gerar um fluxo urinário induzido pelo diurético capaz de evidenciar a eventual obstrução. Este teste tem sido bastante empregado também em
crianças, objetivando a distinção entre dilatação da via excretora com obstrução ao fluxo de urina de simples dilatação anatômica, sem obstrução (obstrução ⫻ dilatação). A administração endovenosa de diurético — furosemida — cerca de 20 minutos após a injeção endovenosa do radioisótopo serve para evidenciar este ponto. Caso não haja obstrução, o diurético promoverá diurese, acarretando queda da captação de radioatividade pela gamacâmera. Quando há obstrução, não ocorre o wash-out e os índices de radioatividade permanecerão inalterados, proximalmente ao ponto de obstrução. Como fornece informações sobre a função renal relativa, é empregado como mais um instrumento na tomada de decisão entre retirada ou preservação do rim obstruído e correção do fator obstrutivo. Serve também no acompanhamento pós-operatório de cirurgias reconstrutivas avaliando a recuperação da função renal.
Pielografia Anterógrada ou Retrógrada A visualização da pelve e ureter por injeção direta de contraste, por via anterógrada (punção renal)17 ou retrógrada (cateterização do meato ureteral), é um meio invasivo de obter informações sobre detalhes anatômicos da via excretora. Entretanto este pode fornecer a última palavra quando os exames anteriores falharem. Muitas vezes a pielografia é realizada na própria sala de cirurgia, imediatamente antes do procedimento cirúrgico visando corrigir a obstrução ou aliviar seus efeitos sobre o rim. Isso é particularmente verdade, pois a injeção de contraste acima do local obstruído pode acompanhar a introdução de microrganismos. Nestes casos têm-se uma infecção de difícil controle e erradicação.
Pontos-chave: • Evitar uretrocistografia na presença de infecção urinária • Cuidado com contraste iodado endovenoso na insuficiência renal (creatinina ⬎ 1,5 mgdL) • Tomografia computadorizada espiral sem contraste é o melhor método para o diagnóstico de litíase ureteral
FISIOPATOLOGIA A uropatia obstrutiva ocasiona alterações na hemodinâmica glomerular e na função tubular.18 Os trabalhos publicados estudaram o modelo animal com obstrução ure-
626
Uropatia Obstrutiva
teral completa e aguda (24 horas), pois nessa situação as alterações ficam mais evidentes.19
Hemodinâmica Glomerular A obstrução do trato urinário é marcada por uma redução do fluxo sangüíneo renal (FSR) e do ritmo de filtração glomerular (RFG). Apresenta comportamento diferente conforme o tipo de obstrução.20 Na obstrução ureteral unilateral aguda, podem-se observar três fases distintas.21 Na primeira fase, com duração de 2 horas, ocorre aumento da pressão ureteral e do FSR (vasodilatação da arteríola aferente). Essa hiperemia inicial é decorrente da redução da pressão da parede vascular, uma resposta miogênica reativa mediada por prostaglandinas.22 Na segunda fase, até 5 horas, observa-se que o aumento da pressão ureteral transmitida ao túbulo proximal proporciona aumento da pressão hidrostática da cápsula de Bowman. Apesar de ocorrer também aumento da pressão do capilar glomerular (vasoconstricção da arteríola eferente), a diferença entre as pressões hidrostáticas diminui, resultando em redução do ritmo de filtração glomerular. Na terceira fase, após seis horas de obstrução, inicia-se uma diminuição da pressão tubular proximal de tal monta que após 24 horas a pressão intratubular será igual ou menor que a pressão prévia à obstrução. A despeito dessa redução, ocorre uma diminuição do fluxo sangüíneo renal, da pressão no capilar glomerular e do ritmo de filtração glomerular devido à vasoconstricção (pré- e pós-glomerular) mediada pela angiotensina II,23 tromboxane A224 e hormônio antidiurético (HAD).25 Há evidências de redução na perfusão dos néfrons superficiais e aumento na perfusão dos néfrons justamedulares.26 Em outras palavras, nas fases iniciais o aumento da pressão tubular proximal contribui para a redução do ritmo de filtração glomerular. Nas fases mais tardias esta redução é perpetuada pela vasoconstricção. Na obstrução ureteral bilateral aguda, após 24 horas, ao contrário da obstrução unilateral, não ocorre redução da pressão intratubular. O FSR e o RFG estão reduzidos em decorrência da vasoconstrição e da persistente hipertensão intratubular.27 Na obstrução do trato urinário ocorre também infiltração de mononucleares no córtex e medula.28 Macrófago é o principal mononuclear que aparece quatro horas após a obstrução com pico máximo em 24 horas. O segundo tipo de célula é o linfócito T supressor (CD8).29 A proliferação intersticial coincide com a redução do fluxo sangüíneo renal e do ritmo de filtração glomerular, mostrando que os mononucleares poderiam, pelo menos em parte, causar estas alterações hemodinâmicas através da liberação de tromboxane A2.30 Na período pós-obstrutivo, a manutenção da vasoconstrição da arteríola aferente com redução da pressão do capilar glomerular é responsável pela permanência do RFG reduzido.31
Função Tubular A uropatia obstrutiva é marcada por alteração no transporte tubular. A deterioração desse transporte é dependente da duração e da severidade da obstrução. Esse defeito é mais proeminente nos segmentos distais e é devido a dois fatores: lesão intrínseca do epitélio tubular e ação hormonal extratubular.32 Na obstrução prolongada ocorrem lesões irreversíveis, tais como alterações inflamatórias crônicas do interstício e atrofia tubular. Por outro lado, na obstrução recente observa-se no túbulo proximal e porção espessa ascendente da alça de Henle edema mitocondrial e redução das interdigitações na membrana basolateral, e nos ductos coletores, achatamento do epitélio e ampliação do espaço intercelular.33 Podem-se observar diminuição na capacidade de concentração urinária, alterações na reabsorção ou secreção de sódio, potássio, fósforo, cálcio e magnésio e incapacidade de acidificar a urina.34 Essas alterações tubulares são diagnosticadas após a liberação da obstrução e podem ter comportamento diferente na obstrução ureteral unilateral e bilateral.
Reabsorção de Sódio e Água Ao liberar a obstrução unilateral, a fração de excreção de sódio é maior que no rim contralateral.35 Entretanto, a quantidade de sódio e água excretada é maior na pós-obstrução bilateral em comparação à unilateral (diurese pós-obstrutiva).36 Essa maior fração de excreção depende do nível plasmático de uréia e da expansão do volume extracelular. A obstrução bilateral apresenta também níveis plasmáticos elevados de peptídeo natriurético atrial (ANP),37 muito provavelmente pela hipervolemia. Ao estudar a reabsorção tubular de sódio ao longo do néfron, observa-se que no túbulo proximal dos néfrons superficiais ocorre aumento na obstrução unilateral38 e redução na bilateral.39 Por outro lado, a reabsorção de sódio e água no túbulo proximal dos néfrons justamedulares é reduzida após a liberação da obstrução unilateral e bilateral.40 Na porção espessa ascendente da alça de Henle, que é menos permeável à água, tanto na obstrução unilateral quanto na bilateral, a reabsorção de cloreto de sódio está diminuída, impondo uma redução na tonicidade do interstício medular, aumentando a excreção de água pela diminuição de reabsorção desta na porção fina descendente.41 A redução de reabsorção de sal na porção espessa pode ser devida ao decréscimo da atividade da Na⫹:K⫹: ATPase basolateral pela elevação da prostaglandina E2 (PGE2).42 Outros fatores que contribuem para hipotonicidade medular são: redução da reabsorção de uréia no ducto
627
capítulo 34
coletor e aumento do fluxo sangüíneo medular (lavagem de solutos).
Concentração Urinária A obstrução do trato urinário promove uma incapacidade na concentração urinária, que é produto da hipotonicidade do interstício medular,43 e diminuição da sensibilidade do ducto coletor cortical à ação do HAD para reabsorção de água. A infusão de vasopressina não concentra a urina.44 Essa menor sensibilidade pode ser decorrente da redução na expressão de aquaporina 2 — canal de água sensível ao HAD, localizado nas células principais dos ductos coletores.45 A resultante hidroeletrolítica dessa poliúria hipotônica é desidratação com hipernatremia.
Secreção de Potássio e Acidificação Urinária Em pacientes com uropatia obstrutiva, a fração de excreção de potássio é menor em comparação à observada em renais crônicos.46 Então é comum o aparecimento da acidose tubular renal distal (acidose hiperclorêmica, hipercalêmica, hiato aniônico normal e pH urinário alcalino). As causas plausíveis para explicá-la são: 1) redução na produção de renina (acidose tubular renal distal tipo 4 — hiporreninêmica e hipoaldosteronêmica); 2) diminuição da sensibilidade do túbulo distal à ação da aldosterona; 3) redução da secreção de íons H⫹ pelas células intercaladas do túbulo distal, por diminuição da produção de amônia no túbulo proximal e de secreção de ácido titulável (fosfato) no túbulo distal. É importante salientar que na liberação da obstrução bilateral pode ocorrer aumento da secreção de potássio pelo túbulo distal em virtude da diurese pós-obstrutiva.
Reabsorção de Fósforo, Cálcio e Magnésio Ocorre aumento na excreção urinária de fósforo após a liberação da obstrução ureteral bilateral. Esse aumento é diretamente proporcional ao acúmulo de fósforo plasmático no período obstrutivo.47 A excreção de cálcio pode estar aumentada ou diminuída, dependendo da espécie estudada ou do tipo de obstrução. A fração de excreção de cálcio no homem está aumentada após a liberação da obstrução bilateral.48 Em ratos a excreção não apresenta variação nesse tipo de obstrução. Por outro lado, a paratireoidectomia em ratos promove aumento na fração de excreção de cálcio.
Pode haver repercussão clínica devido ao aumento na excreção de magnésio decorrente da liberação da obstrução uni- ou bilateral.49
Metabolismo Renal A obstrução proporciona redução do consumo de oxigênio e da produção de dióxido de carbono, com aumento do quociente respiratório, configurando o metabolismo anaeróbio. A glicólise anaeróbica deve-se à lesão precoce da mitocôndria, estando os níveis de ATP reduzidos de 50 a 70%.50 O túbulo proximal reduz a gliconeogênese e a capacidade de produzir amônia a partir da glutamina (amoniogênese).51 Pode-se também constatar aumento da síntese de triglicérides por diminuição da oxidação de ácidos graxos e aumento da liberação de ácidos graxos dos fosfolípides por aumento da fosfolipase.52
Pontos-chave: • Obstrução urinária reduz o fluxo sangüíneo renal e o ritmo de filtração glomerular • Uropatia obstrutiva causa redução na concentração urinária
DIURESE PÓS-OBSTRUTIVA Poliúria (⬎ 125 ml/hora)53 ocorre após a liberação da obstrução bilateral, com excreção de grande quantidade de água e eletrólitos, podendo resultar em hipocalemia, hiponatremia ou hipernatremia e hipomagnesemia.54 É autolimitada, com duração de até uma semana. Para se avaliar a necessidade da reposição de água e eletrólitos, deve-se levar em conta peso, sinais vitais, volume urinário, grau de hidratação e nível plasmático dos íons. Vários mecanismos55 estão implicados para explicar essa diurese abundante: 1) expansão do volume extracelular; 2) acúmulo de uréia plasmática; 3) alteração da função tubular (diminuição da reabsorção de sódio e água/redução da capacidade de concentração urinária); 4) diminuição da sensibilidade do túbulo distal à ação da aldosterona e ducto coletor ao HAD; 5) aumento dos níveis plasmáticos de ANP.56
FIBROSE INTERSTICIAL E LESÃO TUBULAR IRREVERSÍVEL A fibrose intersticial tem início após três dias de obstrução. Várias citocinas são secretadas pelos macrófagos e lin-
628
Uropatia Obstrutiva
fócitos T supressores que estimulam a proliferação de fibroblastos, produzindo colágenos tipo I, III e IV. Os colágenos tipo I e III estão aumentados somente no interstício. O colágeno tipo IV está depositado em ambos: interstício e membrana basal tubular. Este aumento provavelmente contribui para as alterações na função tubular.57 A angiotensina II pode, além de seu efeito hemodinâmico, apresentar também ação pró-inflamatória e prófibrogênica. A administração de inibidor da enzima conversora da angiotensina I ou antagonista do receptor (AT1) da angiotensina II pode minimizar a fibrose intersticial em animais com obstrução unilateral.58 A lesão tubular irreversível pode ser decorrente de quatro fatores: 1) aumento da pressão intratubular; 2) isquemia proporcionada pela angiotensina II e tromboxane A2; 3) infiltração de macrófagos e linfócitos T, liberando proteases e radicais livres de oxigênio; 4) fibrose intersticial.
Pontos-chave: • Ocorre poliúria (⬎ 125 ml/hora) após liberação da obstrução bilateral • A diurese pós-obstrutiva pode ocasionar desidratação, hipocalemia, hipo- ou hipernatremia e hipomagnesemia
TRATAMENTO É extremamente ampla a gama de opções terapêuticas frente à uropatia obstrutiva. Vários são os aspectos a serem considerados (Fig. 34.2).
A idade do paciente por ocasião do diagnóstico da uropatia obstrutiva pode nos alertar sobre problemas associados. Por exemplo, em lactentes e crianças, a maioria das obstruções são causadas por malformações congênitas. Em obstruções intra-útero baixas, severas, como em casos de válvula de uretra posterior, existirá oligúria e oligoidrâmnio e conseqüente hipoplasia pulmonar. A cirurgia fetal tem raras indicações e é feita sob critérios muito rígidos, com indicação em menos de 1% dos casos de hidronefrose diagnosticada intra-útero. Às vezes, o sexo, masculino ou feminino, tem implicações no diagnóstico causal da obstrução. Tumores ginecológicos podem comprometer o fluxo urinário tanto em nível ureteral quanto uretral e o tratamento da obstrução deve considerar a doença de base, seu prognóstico e suas próprias perspectivas terapêuticas. O caráter da obstrução, se aguda ou crônica, tem repercussão direta sobre a intensidade da lesão, da nefropatia obstrutiva, e a espessura do parênquima remanescente, além da cintilografia renal, serão úteis para estimar, ainda que de modo impreciso, o potencial de recuperação renal. Lateralidade e intensidade da obstrução têm implicações diretas sobre a gravidade do quadro clínico. Obstruções bilaterais e completas associam-se a anúria e diminuição da função renal. O tempo para desobstrução nestes casos é vital. Por outro lado, obstrução unilateral, mesmo que total, pode cursar com função renal normal. Nesta situação, a menos que haja infecção, não há risco de morte, mas o montante da lesão renal é função do tempo de obstrução. Obstruções parciais, crônicas, associam-se a disfunção tubular e, ocasionalmente, perda excessiva de água (diabetes insípido nefrogênico), além de sódio, cloro e bicarbonato pela urina. As obstruções vesicais e infravesicais têm potencial de gravidade maior, pois repercutem nos dois rins. O cateterismo vesical de demora ou intermitente é solução eficiente
Idade e Sexo
Aguda ou Crônica
Potencial Risco de Vida Presença e Gravidade de Co-morbidades
Uni- ou Bilateral
Presença e Intensidade de Alt. Hidroeletrolíticas
Parcial ou Total
Lesão Renal Transitória ou Definitiva
Uropatia Obstrutiva
Nível da Obstrução
Função Renal Normal ou Diminuída
Intrínseca ou Extrínseca
Presença ou Ausência de Infecção
Anatômica ou Funcional Intensidade dos Sintomas
Fator Obstrutivo: Possibilidade e Melhor Momento
Fig. 34.2 Check List que precede o planejamento terapêutico da uropatia obstrutiva.
capítulo 34
mas nem sempre possível. Estenoses severas de uretra ou falsos trajetos conseqüentes a manobras inadequadas em tentativas de cateterização pregressas podem determinar a necessidade de derivação externa como cistostomia. A mais freqüente causa de obstrução intrínseca é a urolitíase, e seu tratamento, quando necessário, pode ser totalmente endoscópico, sem necessidade de incisões cutâneas. Outra alternativa muito pouco invasiva para estes casos é a LECO — Litotripsia Extracorpórea por Ondas de Choque. Ocasionalmente, em lesões extrínsecas tumorais metastáticas onde ações sobre o fator obstrutivo são inoportunas, pode-se obter a redução da pressão intraluminal acima do ponto da obstrução mediante a colocação de um cateter reno-vesical, interno, chamado cateter ureteral tipo duplo J ou “pig tail”. Este tubo multiperfurado transpõe a obstrução, garantindo a passagem de urina. Um lembrete bastante oportuno: os cateteres empregados para desobstruir o trato urinário também podem se obstruir! Às vezes, as condições clínicas do paciente, por exemplo, com infecção associada a hiperpotassemia e acidose grave, obrigam o urologista a apenas desobstruir o sistema urinário sem atuar sobre a causa. Manipulações prolongadas e que implicam aumento da pressão na via excretora obstruída, na vigência de infecção urinária, são muitas vezes catastróficas, causando urossepse e eventualmente o óbito. Cólica renal por litíase é um bom exemplo de obstrução aguda unilateral, portanto, na maioria das vezes, sem riscos graves de vida, mas que, por dor e desconforto intensos, exige vez por outra a desobstrução do ureter ou pelve renal. As obstruções ureterais crônicas progridem de forma insidiosa e, silenciosamente, podem levar à perda definitiva de função do rim comprometido. As obstruções infravesicais agudas são potencialmente muito dolorosas mas podem manifestar-se por incontinência paradoxal ou transbordamento. Infecção é uma complicação temida na vigência de obstrução. Os efeitos deletérios sobre o rim ficam potencializados, além dos riscos de septicemia e suas funestas conseqüências. Sua ocorrência deve ser sempre lembrada mesmo na ausência de manifestações febris, particularmente nos idosos. Sua concomitância com obstrução do trato urinário exige pronta atuação visando a descompressão da área acima do obstáculo. Seu tratamento é particularmente difícil enquanto não se obtiver a desobstrução do sistema. Função renal diminuída pode ser importante obstáculo para estabelecer-se a abordagem terapêutica, pois restringe os métodos diagnósticos de imagem que se valem da excreção renal do contraste. Esta diminuição pode deverse também à co-morbidades, não sendo exclusivamente conseqüência da obstrução. Em casos onde a função renal esteja definitivamente comprometida e extremamente reduzida, a melhor terapêutica pode ser, inclusive, a nefrectomia. Alterações hidroeletrolíticas e metabólicas podem ser conseqüências da disfunção renal e devem ser avaliadas e
629
corrigidas antes de qualquer intervenção. Quando associadas a co-morbidades, podem pôr a vida do paciente em risco. Em face do exposto, vemos que a tomada de decisão frente à uropatia obstrutiva é muitas vezes complexa e exige experiência e conhecimento das opções técnicas disponíveis, muitas das quais foram aqui apenas mencionadas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. 3. 4.
5.
6.
7.
8. 9. 10.
11.
12.
13.
14. 15. 16.
17.
18. 19.
20.
21.
22.
23.
KLAHR, S. Obstructive nephropathy. Intern Med, 39(5):355-361, 2000. EKNOYAN, G. Michelangelo: Art, anatomy, and the kidney. Kidney Int, 57:1190-1201, 2000. United States Renal Data System — USRDS: Annual data report. 2001. United States Renal Data System — USRDS: Annual data report. II. Incidence and prevalence of ESRD. Am J Kidney Dis, 18(2):S34-S47, 1996. LAGOMARSIMO, E.; VALENZUELA, A.; CAVAGNARO, F.; SOLAR, E. Chronic renal failure in pediatrics 1996 — Chilean survey. Pediatr Nephrol 13:288-291, 1999. DELEAU, J.; ANDRE, J.; BRIANCON, S.; MUSSE, J. Chronic renal failure in children: an epidemiological survey in Lorraine (France) 1975-1990. Pediatr Nephrol, 8:472-476, 1994. ESBJÖRNER, E.; BERG, U.; HANSSON, S. Epidemiology of chronic renal failure in children: a report from Sweden. Pediatr Nephrol 11:438-442, 1997. AGARWAL, S.K.; DASH, S.C. Spectrum of renal diseases in Indian adults. J Assoc Physicians India, 48(6):594-600, 2000. BELL, E.T. Renal diseases. Philadelphia, Lea & Febiger, 1950. PENA, C.J.M.; SCHOR, N. Uropatia obstrutiva. In Schor, N., Heilberg, I.P. (eds) Calculose Renal: fisiopatologia, diagnóstico e tratamento. Sarvier, São Paulo, 115-128, 1995. KLAHR, S.; BUERKERT, J.; MORRISON, A. Urinary tract obstruction. In Brenner, B.M.; Rector, F.C. (eds) The Kidney, 3rd ed. WB Saunders, Philadelphia, 1443-1490, 1986. RAO, K.G.; HACKLER, R.H.; WOODLIEF, R.M. Real-time renal sonography in spiral cord injury patients. Prospective comparison with excretory urography. J Urol, 135:72, 1986. PARFREY, P.S.; GRIFFITHS, S.M.; BARRETT, B.J. Contrast material-induced renal failure in patients with diabetes mellitus, renal insufficiency or both. N Engl J Med, 320:143-149, 1989. KAYE, A.D.; POLLACK, H.M. Diagnostic imaging approach to the patient with obstructive uropathy. Sem Nephrol, 2:55-73, 1982. ROY, C.; SAUSSINE, C.; GUTH, S. MR urography in the evaluation of urinary tract obstruction. Abdom Imaging, 23:27-34, 1998. ENGLISH, P.J.; TESTA, H.J.; LAWSON, R.S. Modified method of diuresis renography for the assessment of equivocal pelviureteric junction obstruction. Br J Urol, 59:10-14, 1987. DAVIDSON, A.J. Radiologic contrast studies. In O’Reilly, P.H.; George Jr, N.; Weiss, R.M. (eds) Diagnostic Techniques in Urology. WB Saunders, Philadelphia. 1-12, 1990. KLAHR, S.; HARRIS, K.P.G.; PURKERSON, M.L. Effects of obstruction on renal functions. Pediatr Nephrol, 2:34-42, 1988. KLAHR, S.; HARRIS, K.P.G. Obstructive uropathy. In Seldin, D.W.; Giebisch, G. (eds) The Kidney: Physiology and Pathophysiology, 2nd ed. Raven Press, New York, 3327-3369, 1992. GULMI, F.A.; FELSEN, D.; VAUGHAN, Jr. E.D. Pathophysiology of urinary tract obstruction. In Walsh, P.C.; Retik, A.B.; Vaughan Jr, E.D.; Wein, A.J. (eds) Campbell’s Urology, 7th ed. 342-385, 1998. MOODY, T.E.; VAUGHAN Jr, E.D.; GILLENWATER, J.Y. Relationship between renal blood flow and ureteral pressure during 18 hours of total unilateral ureteral occlusion. Invest Urol, 13: 246-251, 1975. FRANCISCO, L.L.; HOVERSTEN, L.G.; DiBONA, G.F. Renal nerves in the compensatory adaptation to ureteral occlusion. Am J Physiol, 238:229-234, 1980. YARGER, W.E.; SCHOCKEN, D.D.; HARRIS, R.H. Obstructive
630
24.
25.
26. 27.
28. 29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36. 37.
38. 39.
40.
41.
42.
43.
44.
45. 46.
Uropatia Obstrutiva
nephropathy in rat: possible roles for the renin-angiotensin system, prostaglandins and thromboxanes in postobstructive renal function. J Clin Invest, 65:400-412, 1980. PURKERSON, M.L.; KLAHR, S. Prior inhibition of vasoconstrictors normalizes GFR in postobstructed kidneys. Kidney Int, 35:1305-1314, 1989. REYES, A.A.; ROBERTSON, G.; KLAHR, S. Role of vasopressin in rats with bilateral ureteral obstruction. Proc Soc Exp Biol Med, 197: 49-55, 1991. HARRIS, R.H.; YARGER, W.E. Renal function after release of unilateral ureteral obstruction in rats. Am J Physiol, 227:806-815, 1974. GULMI, F.A.; MATHEWS, G.J.; MARION, D. Volume expansion enhances the recovery of renal function and prolongs the diuresis and natriuresis after release of bilateral ureteral obstruction. A possible role for atrial natriuretic peptide. J Urol, 153:1276-1283, 1995. KLAHR, S. Nephrology Forum: Obstructive nephropathy. Kidney Int, 54:286-300, 1998. SCHREINER, G.F.; HARRIS, K.P.G.; PURKERSON, M.L.; KLAHR, S. Immunological aspects of acute ureteral obstruction: Immune cell infiltrate in kidney. Kidney Int, 34:487-493, 1988. HARRIS, K.P.G.; SCHREINER, G.F.; KLAHR, S. Effect of leukocyte depletion on the function of the post-obstructed kidney in the rat. Kidney Int, 36:210-215, 1989. Dal CANTON, A.; CORRADI, A.; STANZIALE, R. Glomerular hemodynamics before and after release of 24-hour bilateral ureteral obstruction. Kidney Int, 17:491-496, 1980. CURHAN, G.C.; McDOUGAL, W.S.; ZEIDEL, M.L. Urinary tract obstruction. In Brenner, B.M.; Rector, F.C. (eds) The Kidney, 6th ed. WB Saunders, 1820-1843, 2000. McDOUGAL, W.S.; RHODES, R.S.; PERSKY, L. A histochemical and morphologic study of postobstructive diuresis in the rat. Invest Urol, 14:169-176, 1976. KLAHR, S. Obstructive nephropathy: Pathophysiology and management. In Schrier, R.W. (ed) Renal and Electrolyte Disorders. 5th ed. Lippincott-Raven, 544-589, 1977. BUERKERT, J.; MARTIN, D.; HEAD, M. Deep nephron function after release of acute unilateral ureteral obstruction in young rat. J Clin Invest, 62:1228-123, 1978. PETERSON, L.J.; YARGER, W.E.; SCHOCKEN, D.D. Post-obstructive diuresis. A varied syndrome. J Urol, 113:190-194, 1975. PURKERSON, M.L.; BLAINE, E.H.; STOKES, T.J. Role of atrial peptide in the natriuresis and diuresis that follows relief of obstruction in rats. Am J Physiol, 256:583-589, 1989. HARRIS, R.H.; YARGER, W.E. Renal function after release of unilateral ureteral obstruction in rats. Am J Physiol, 227:806-815, 1974. YARGER, W.E.; AYNEDJIAN, H.S.; BANK, N. A micropuncture study of postobstructive diuresis in the rat. J Clin Invest, 51: 625-637, 1972. BUERKERT, J.; HEAD, M.; KLAHR, S. Effects of acute bilateral ureteral obstruction on deep nephron and terminal collecting duct function in the young rat. J Clin Invest, 59:1055-1065, 1977. HANLEY, M.J.; DAVIDSON, K. Isolated nephron segments from rabbit models of obstructive nephropathy. J Clin Invest, 69:165-174, 1982. STOKES, J.B. Effect of prostaglandin E2 on chloride transport across the rabbit thick ascending limb of Henle: Selective inhibition of the medullary portion. J Clin Invest, 64:495-502, 1979. YARGER, W.E. Urinary tract obstruction. In Brenner, B.M.; Rector, F.C. (eds) The Kidney, 4th ed. WB Saunders, Philadelphia, 1768-1808, 1991. KNOWLAN, D.; CORRADO, M.; SCHREINER, G.E. Periureteral fibrosis, with a diabetes insipidus-like syndrome occuring with progressive partial obstruction of a ureter unilaterally. Am J Med, 28: 2231, 1960. ZEIDEL, M.L. Recent advances in water transport. Semin Nephrol, 18:167-178, 1998. BATLLE, D.C.; ARRUDA, J.A.L.; KURTZMAN, N.A. Hyperkalemic distal renal tubular acidosis associated with obstructive uropathy. N Engl J Med, 304:373-380, 1981.
47. 48.
49.
50.
51.
52.
53.
54.
55.
56.
57.
58.
BECK, N. Phosphaturia after release of bilateral ureteral obstruction in rats. Am J Physiol, 237:F14-F19, 1979. BETTER, O.S.; TUMA, S.; RICHTER-LEVIN, D. Intrarenal resetting of glomerulotubular balance in a patient with post-obstructive uropathy. Nephron, 9:131-145, 1973. PURKERSON, M.L.; SLATOPOLSKY, E.; KLAHR, S. Urinary excretion of magnesium, calcium and phosphate after release of unilateral ureteral obstruction in the rat. Miner Electrolyte Metab, 6:182-189, 1981. MIDDLETON, G.W.; BEAMON, C.R.; PANKO, W.B. Effect of ureteral on the renal metabolism of alfa-ketoglutarate and other substrates in vivo. Invest Urol, 14:255-262, 1977. BLONDIN, J.; PURKERSON, M.L.; ROLF, D. Renal function and metabolism after relief of unilateral ureteral obstruction. Proc Soc Exp Biol Med, 150:71, 1975. TANNENBAUM, J.; PURKERSON, M.L.; KLAHR, S. Effect of unilateral ureteral obstruction on metabolism of renal lipids in the rat. Am J Physiol, 245:254-262, 1983. COE, F.L. Alterations in urinary function. In Isselbacher, K.J.; Braunwald, E.; Wilson, J.D. (eds) Harrison’s Principles of Internal Medicine, 13th ed. New York: McGraw-Hill, 235-241, 1994. PETERSON, L.J.; YARGER, W.E.; SCHOCKEN, D.D.; GLENN, J.F. Post-obstructive diuresis: A varied syndrome. J Urol, 113:190-194, 1975. GONZALEZ, J.M.; SUKI, W.N. Polyuria and nocturia. In Massry, S.G.; Glassock, R.J. (eds) Textbook of Nephrology, 3rd ed. Baltimore, Williams & Wilkins, 547-552, 1995. GULMI, F.A.; MOOPPAN, U.M.M.; CHOU, S.Y.; KIM, H. Atrial natriuretic peptide in patients with obstructive uropathy. J Urol, 142:268-272, 1989. KANETO, H.; MORRISSEY, J.; McCRACKEN, R.; REYES, A.; KLAHR, S. Enalapril reduces collagen type IV synthesis and expansion of the interstitium in the obstructed rat kidney. Kidney Int, 45:1637-1647, 1994. KLAHR, S.; MORRISSEY, J.J. Comparative study of ACE inhibitors and angiotensin II receptor antagonists in interstitial scarring. Kidney Int, 63:S111-S114, 1997.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Obstructive nephropathy http://www.bcm.tmc.edu/lrc/OBSTNEPH/sld001.htm Obstructive uropathy — Overview http://www.iowaclinic.com/adam/ency/article/000507.shtml Obstructive uropathy http://rogbruce.home.texas.net/3aObstrucUropathy_files/ frame.htm PowerPoint Presentation http://www.kumc.edu/instruction/medicine/pathology/ed/ ch_16/Kidney-files/frame.htm#slide0001.htm Diseases Affecting Tubules and Interstitium http://www.nephrologychannel.com/crf/ Atlas of Kidney Diseases — Table of Contents http://www.kidneyatlas.org/toc.htm Campell’s Urology, 7th Ed http://www.hanilmed.com/division/titleimg/urology/ walsh.html Chronic Renal Failure (CRF) — nephrologychannel http://www.nephrologychannel.com/crf/ THE MERCK MANUAL, Sec. 17, Genitourinary Disorders http://www.merck.com/pubs/mmanual/section17/sec17.htm
Capítulo
35
Tumores Renais Fernando Meyer e Luiz Sergio Santos
TUMORES RENAIS BENIGNOS
Diagnóstico diferencial
Cistos simples
Estadiamento
Angiomiolipoma
Tratamento
Oncocitoma
Controle de cura
Adenoma
Prognóstico
TUMORES RENAIS MALIGNOS Carcinoma de células renais
Sarcomas Outros tumores renais
Epidemiologia
Tumores metastáticos
Etiologia
Tumor de Wilms
Patologia
Carcinoma de pelve renal
Biologia molecular e imunologia
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
História natural
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Diagnóstico
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Os tumores do rim representam cerca de 2 a 3% de todos os tumores no adulto. Com o advento e ampla utilização de novas técnicas de imagem, a freqüência no diagnóstico de massas renais tem aumentado significativamente. Estas podem ter origem parenquimatosa ou de via excretora (pelve renal), serem sólidas, císticas ou mistas (complexas); malignas ou benignas; primárias ou metastáticas; simples ou múltiplas, e uni- ou bilaterais. De uma maneira simplificada, os tumores renais podem ser classificados em benignos e malignos, como demonstrado no Quadro 35.1.
TUMORES RENAIS BENIGNOS Os tumores benignos do rim passaram a ser diagnosticados com maior freqüência após a introdução de novos métodos de imagem em nosso meio, principalmente a ultra-sonografia, a tomografia computadorizada (TC) e a
Quadro 35.1 Tumores renais — Classificação TUMORES BENIGNOS • • • • • • • • •
Cisto simples Angiomiolipoma Oncocitoma Adenoma Leiomioma Lipoma Hemangioma Fibroma Tumores justaglomerulares
TUMORES MALIGNOS • Carcinoma de células renais • Carcinoma de células claras • Carcinomas cromófilos • Carcinomas cromófobos • Carcinomas dos ductos coletores • Carcinomas nãoclassificáveis • Sarcomas • Tumor de Wilms • Carcinoma da pelve renal
632
Tumores Renais
ressonância nuclear magnética (RNM). Com a evolução tecnológica destes e de outros equipamentos de imagem, a sensibilidade no diagnóstico das massas renais tem aumentado significativamente. No entanto, em determinadas situações, sua diferenciação dos tumores malignos pode gerar dúvidas.1 Estes tumores podem originar-se de qualquer um dos múltiplos tipos celulares que compõem o rim. Os mais comuns são o cisto cortical simples, o angiomiolipoma, o oncocitoma e o adenoma, sendo raros o leiomioma, o lipoma, o hemangioma e os tumores das células justaglomerulares.
Cistos Simples Os cistos renais simples são, talvez, as lesões renais benignas mais comuns, ocorrendo em cerca de 25% da população. Aproximadamente 70% das massas renais incidentais são cistos simples e na sua maioria não têm significado clínico. Apresentam-se como uma cavidade em geral arredondada, de paredes finas e revestida por epitélio contendo no seu interior líquido seroso claro. Têm maior importância quando são volumosos, podendo causar sintomas clínicos como dor lombar, microematúria e massa palpável em flanco, ou quando são complexos, bocelados ou hemorrágicos, situações em que pode tornar-se difícil o diagnóstico diferencial com tumores renais malignos.2 Os cistos podem ser únicos ou múltiplos e unilaterais ou bilaterais. O diagnóstico, em geral realizado por meio de ultra-sonografia, tomografia computadorizada e eventualmente ressonância nuclear magnética, confirma a lesão em aproximadamente 98% dos casos (Figs. 35.1 a 35.3). A conduta é em geral expectante, com controle radiográfico
Fig. 35.2 TC — cisto cortical simples em rim esquerdo.
Fig. 35.3 RNM — pequeno cisto renal periférico.
anual. Por vezes, na presença de cistos complexos, a real natureza da lesão só é confirmada durante exploração cirúrgica.
Angiomiolipoma
Fig. 35.1 Cisto simples de pólo renal superior observado na ultra-sonografia.
Estes tumores, também denominados de hamartomas, são tumores mesenquimais benignos constituídos de tecido muscular liso, vasos sangüíneos e tecido adiposo e representam cerca de 3% dos tumores renais sólidos (Figs. 35.4 e 35.5). Acometem com maior freqüência mulheres entre a 5.ª e a 6.ª década da vida e tendem a ser solitários e unilaterais em 80% dos casos. Em cerca de 20% das vezes estão associados a esclerose tuberosa, doença de caráter familiar e hereditária, que se caracteriza por retardo mental, epilepsia e adenoma sebáceo.3 Nesta situação, apresentam-se
capítulo 35
633
Fig. 35.4 Angiomiolipoma — macroscopia.
geralmente como lesões multifocais, pequenas e bilaterais. A possibilidade de ocorrência simultânea com carcinoma de células renais deve ser sempre considerada, necessitando de acompanhamento cuidadoso destes pacientes. As manifestações clínicas da doença em geral são escassas, cursando eventualmente com quadro de dor lombar, massa palpável em flanco, hipertensão arterial e hematúria, observada em cerca de 30% dos casos. Na presença de tumores grandes, acima de 4 cm, a ruptura pode levar a profuso sangramento com formação de grande hematoma retroperitoneal e por vezes ao choque hipovolêmico.4 A grande maioria, no entanto, é assintomática e diagnosticada incidentalmente por meio de ultra-sonografia ou TC solicitadas por motivos outros que não a patologia renal. Estes exames de imagem revelam freqüentemente a natureza da lesão com bastante eficácia. A ultra-sonografia pode demonstrar área hiperecogênica e bem delimitada, enquanto a TC revela áreas hipodensas, representadas pelo alto teor de gordura característica dos angiomiolipomas (Figs. 35.6 e
Fig. 35.5 Microfotografia de angiomiolipoma constituído por músculo liso, adipócitos e vasos sangüíneos com paredes espessas (HE ⫻ 200).
Fig. 35.6 Área hiperecogênica demonstrada na ultra-sonografia correspondendo a angiomiolipoma renal.
35.7). Estes sinais radiológicos, no entanto, não são específicos e requerem cautela na sua interpretação. O tratamento destas lesões está diretamente relacionado ao tamanho do tumor e das suas manifestações clínicas. Os tumores pequenos tendem a causar menos sintomas e em geral são acompanhados clinicamente por meio de exames de imagem realizados anualmente. Nos tumores grandes, a possibilidade de sangramento e dor lombar pelo volume tumoral é maior e requerem com freqüência alguma forma de terapia. Em pacientes sintomáticos e na vigência de sangramento, empregam-se condutas mais agressivas através de embolização do tumor, nefrectomia parcial ou nefrectomia total. Na presença de lesões múltiplas e que não apresentam as características clássicas dos angiomiolipomas nos exames de imagem ou que conte-
Fig. 35.7 Angiomiolipoma observado por exame de TC evidenciando áreas hipodensas em superfície cortical do rim D.
634
Tumores Renais
nham calcificações no seu interior, a nefrectomia parece ser a conduta mais indicada.5
Pontos-chave: • Tumores benignos compostos por tecido muscular, adiposo e vasos sangüíneos • Predominantemente assintomáticos e não requerem tratamento • Tumores ⬍ 4 cm — Ecografia ou TC anualmente • Tumores ⬎ 4 cm e assintomáticos — Ecografia ou TC a cada seis meses
Oncocitoma Este tumor do córtex renal é comumente detectado de modo incidental em estudos radiográficos, representando cerca de 3 a 7% dos tumores renais sólidos.6 Normalmente unilaterais, podem, no entanto, acometer os dois rins. Em geral são pequenos e assintomáticos, porém hematúria, massa em flanco e dor abdominal podem estar presentes. Em mãos experientes algumas características radiológicas podem sugerir o diagnóstico, no entanto há vários aspectos que se sobrepõem ao carcinoma renal.2 Ecografia, TC, RNM e angiografia são freqüentemente empregadas na tentativa de detectar sinais sugestivos da lesão. Usualmente apresenta-se como uma massa bem delimitada, encapsulada, de ecogenicidade homogênea, podendo apresentar na TC imagem central de baixo padrão de atenuação que corresponde a uma área de fibrose com aparência de estrela conhecida como sinal da cicatriz. A fase arterial da angiografia pode revelar uma configuração típica dos vasos em “roda de raios” ou fístulas artério-venosas. Estes sinais, no entanto, não são patognomônicos dos oncocitomas e podem ser identificados também no carcinoma de células renais. O aspecto macroscópico dos oncocitomas é bastante característico. Apresentam-se em geral com coloração castanha-escura com cápsula fibrosa bem definida e por vezes uma pseudocápsula que preserva o parênquima renal adjacente. Não se evidenciam áreas de hemorragia ou necrose, porém bandas fibrosas densas de tecido cicatricial no centro da lesão são típicas7 (Fig. 35.8). Microscopicamente estes tumores são compostos de ninhos de células com citoplasma granular e eosinofílico com grande número de mitocôndrias8 (Fig. 35.9). A nefrectomia radical é ainda o método mais seguro de terapia para os oncocitomas renais, em virtude da dificuldade de diagnóstico preciso através de exames complementares. Nefrectomia parcial deve ser considerada em situações especiais onde a cirurgia radical está contra-indicada (rim único, função renal global prejudicada) ou em
Fig. 35.8 Macroscopia. Oncocitoma. Cortesia da Dra. Teresa Figueiredo.
Fig. 35.9 Microfotografia de oncocitoma — neoplasia com padrão alveolar constituída por células tendo citoplasma eosinofílico e núcleos arredondados, sem atipias (HE ⫻ 200).
tumores pequenos, bem delimitados, menores que 4 cm e confinados a um dos pólos do rim. Observação e acompanhamento clínico estão reservados para pacientes idosos ou com grandes riscos operatórios.
Pontos-chave: • Massa hipervascular com área de cicatriz central • Imagem em “roda de raios” na arteriografia • Difícil diferenciação com o carcinoma de células renais
Adenoma O adenoma cortical, um tumor renal sólido pouco freqüente, tem sido motivo de discussão quanto à sua real natureza e quanto ao seu comportamento. Alguns autores o
capítulo 35
consideram de natureza benigna, principalmente quando menores que 1 cm, embora se saiba que este não é um critério absoluto para descartar o potencial maligno da doença. Atualmente são consideradas como adenomas as neoplasias com padrão papilar e grau nuclear baixo. Sabe-se, no entanto, que estes tumores são raramente identificados quando pequenos e são observados principalmente em achados cirúrgicos ou estudos de necropsia. Os adenomas são também relativamente freqüentes em pacientes submetidos à hemodiálise. Raramente ocasionam sintomas, sendo a hematúria a manifestação clínica mais comum, ocorrendo principalmente devido à invasão tumoral do sistema coletor ou vasos adjacentes.2 Tumores de 1 a 3 cm são considerados carcinomas com baixo potencial de malignidade e representam um dilema quanto à sua abordagem. Ressecção parcial ou nefrectomia radical permanecem ainda como alternativas de tratamento, e suas indicações devem ser avaliadas individualmente. Quando maiores, são de difícil diferenciação com o adenocarcinoma renal, e nesta situação devem ser sempre tratados como tais.
TUMORES RENAIS MALIGNOS Carcinoma de Células Renais EPIDEMIOLOGIA O carcinoma de células renais (CCR), também chamado de adenocarcinoma de rim, carcinoma de rim, tumor de Grawitz e hipernefroma (termo errôneo e que não deve ser empregado), constitui cerca de 80 a 90% dos tumores renais malignos nos adultos, sendo raro na infância e adolescência (menos de 1%). A maior incidência ocorre entre os 50 e os 70 anos de idade e predominam no sexo masculino na proporção de 2:1. Nos Estados Unidos, constata-se a ocorrência anual de aproximadamente 28.000 novos casos e 11.000 mortes relacionadas a essa doença.9 Observou-se que o CCR é mais prevalente em pacientes de origem escandinava e norte-americana do que em pacientes de origem africana e asiática, e também que em 2-4% dos casos os tumores são bilaterais, ocorrendo de forma sincrônica ou metacrônica. Nos últimos anos, houve discreta diminuição na mortalidade, sugerindo que o tratamento tenha sido mais efetivo. Tem sido relatada a ocorrência de carcinoma de células renais familiar, afetando até cinco membros da mesma família. Os pacientes com doença de von Hippel-Lindau (VHL) apresentam alto risco de desenvolver tumores em vários sítios, como retina, cerebelo, medula, rim e adrenal. Os adenocarcinomas renais associados à VHL ocorrem em 45% dos casos e habitualmente são pequenos, multicêntricos, bilaterais e acometem indivíduos mais jovens (idade média: 40 anos).
635
Observou-se que cerca de 9% dos pacientes com insuficiência renal avançada tratados com hemodiálise ou transplante desenvolveram CCR e este evento é 2.500 vezes mais comum nestes casos do que em indivíduos com função renal normal. Esta tendência, que se associa com o aparecimento concomitante de cistos renais múltiplos em cerca de 45% dos casos, apresenta algumas peculiaridades que puderam ser identificadas10: 1) os tumores parecem originar-se de lesões inicialmente císticas; 2) estes tumores podem ter comportamento agressivo, com aparecimento de metástases em 6% dos casos; 3) os tumores tendem a ser múltiplos e bilaterais; 4) o diagnóstico da neoplasia é feito em pacientes submetidos a diálise por períodos que variam de 3 a 8 anos (média de 3,6 anos); 5) os cistos, e conseqüentemente os tumores, parecem originar-se de substâncias não-dialisáveis acumuladas após a instalação da insuficiência renal, o que pode favorecer, em futuro próximo, a identificação de fatores implicados com a gênese dos carcinomas renais. Igualmente, pacientes que apresentam doença renal policística autossômica dominante parecem ter predisposição para desenvolver carcinoma de células renais.
ETIOLOGIA O CCR tem origem nos túbulos contornados proximais, a mesma célula que origina os adenomas renais. Outra possibilidade mais remota é a de que estaria relacionado com disfunções hormonais. Estudos com ratos hamster machos tratados com estrógenos mostraram o desenvolvimento de tumores renais semelhantes ao CCR, e este fenômeno é inibido pela administração concomitante de progesterona. Esses experimentos serviram de base para o emprego clínico de progesterona em pacientes com carcinomas renais, mas dificilmente explicariam, por si sós, o aparecimento desses tumores. Outros fatores têm sido implicados com a etiologia dos CCR, como agentes químicos (nitrosaminas, cádmio, bromato), hereditariedade (doença de von Hippel-Lindau), vírus (LTV vírus), dieta rica em gorduras e deficiente em vitamina A, irradiação, tabagismo e abuso de certos analgésicos. Embora nenhuma relação definitiva tenha sido demonstrada entre esses fatores e o desenvolvimento de neoplasias renais, é possível que os mesmos não representem a causa, mas aumentem os riscos de aparecimento da doença.
PATOLOGIA Os carcinomas de células renais são normalmente arredondados, variando de tamanho desde poucos centímetros até o preenchimento quase completo do abdômen. Na maioria das vezes são sólidos, fazendo saliência na superfície do rim, usualmente num dos pólos (Fig. 35.10). Geralmente não apresentam uma cápsula histológica verdadeira, porém são envoltos por uma pseudocápsula com-
636
Tumores Renais
posta por parênquima comprimido e tecido fibroso. Após secção do tumor, encontram-se áreas de necrose e hemorragia interpostas por tecido de aspecto amarelado ou pálido (Fig. 35.10A). Múltiplos cistos são encontrados não raramente, provavelmente como resultado de necrose segmentar e reabsorção (Fig. 35.10B). O sistema coletor é geralmente deslocado, podendo ser invadido. A fáscia de Gerota parece exercer efeito protetor contra a disseminação local, porém eventualmente pode ser comprimida e invadida pelo tumor. Células de vários tipos podem ser encontradas num mesmo tumor, e as mais freqüentes apresentam citoplasma abundante (células claras) e núcleo excêntrico, lembrando túbulos renais; podem, todavia, ser completamente indiferenciadas. Em 1996 foi proposta uma nova classificação para os CCR, baseada na classificação de Thoenes de 1986, evi-
Fig. 35.10B Carcinoma de células renais — macroscopia. Peça cirúrgica.
denciando os aspectos morfológicos e citogenéticos. Os seguintes subtipos histológicos são reconhecidos: a. b. c. d. e.
Fig. 35.10 Carcinoma renal de células claras multicístico.
Fig. 35.10A Carcinoma de células renais — macroscopia.
Carcinomas de células claras (ou usuais) Carcinomas cromófilos (papilares) Carcinomas cromófobos Carcinomas dos ductos coletores (de Bellini) Carcinomas não-classificáveis
Os carcinomas de células claras representam cerca de 85% dos CCR e são caracterizados pela deleção do braço curto do cromossomo 3. A presença de características sarcomatóides correlaciona-se ao pior prognóstico (Figs. 35.11 e 35.12). O carcinoma cromófilo representa aproximadamente 14% dos CCR, sendo geralmente multifocal e bilateral, e apresentando-se como tumores pequenos e caracteristicamente sem deleção do braço curto do cromossomo 3. Normalmente são tumores de estádio baixo e prognóstico mais favorável que o carcinoma de células claras (Figs. 35.13 e 35.14).
Fig. 35.11 Macroscopia de carcinoma de células claras.
capítulo 35
637
O cromófobo representa 4% dos CCR e também não está relacionado à deleção do braço curto do cromossomo 3, tendo geralmente excelente prognóstico (Figs. 35.15 e 35.16). O carcinoma do sistema coletor é extremamente raro, porém muito agressivo.
Pontos-chave:
Fig. 35.12 Microfotografia de carcinoma de células claras onde se observam células com citoplasma amplo e claro (HE ⫻ 200). Cortesia da Dra. Teresa Figueiredo.
• O CCR tem origem nos túbulos contornados proximais • Carcinoma de células claras representa cerca de 85% dos CCR • Características sarcomatóides conferem maior gravidade à doença BIOLOGIA MOLECULAR E IMUNOLOGIA O CCR acontece em duas formas: uma forma esporádica e uma familiar ou hereditária, que é menos freqüente.
Fig. 35.13 Microfotografia representando carcinoma cromófilo (papilar) eosinófilo — neoplasia constituída por papilas revestidas por células com citoplasma eosinofílico granular, nos eixos conjuntivos, presença de macrófagos xantomatosos (HE ⫻ 200).
Fig. 35.14 Macroscopia de carcinoma papilar ou cromófilo. Cortesia da Dra. Teresa Figueiredo.
Fig. 35.15 Microfotografia de carcinoma de células cromófobas constituído por células com citoplasma eosinofílico, finamente granular (HE ⫻ 200).
Fig. 35.16 Macroscopia de carcinoma de células cromófobas.
638
Tumores Renais
Aproximadamente 4% dos carcinomas renais têm um componente hereditário.11 Assim como acontece no câncer de mama e no carcinoma colo-retal, o estudo dos mecanismos moleculares que fundamentam a hereditariedade do carcinoma de rim tem levado a avanços importantes na compreensão das bases genéticas da carcinogênese dos tumores esporádicos. Existem pelo menos três formas diferentes de carcinomas de rim com componente hereditário: a doença de von Hippel-Lindau, o carcinoma hereditário papilar e o carcinoma hereditário de células claras. O comportamento biológico do carcinoma renal apresenta duas características que devem ser destacadas. Em primeiro lugar, regressões espontâneas parciais ou completas têm sido relatadas. Isso sugere a existência de uma participação importante do sistema imune na gênese, no controle da evolução e na progressão desses tumores.12 Tais remissões são infreqüentes, mas têm motivado o estudo e o emprego de abordagens terapêuticas baseadas em várias formas de ativação do sistema imune. Outra característica que merece destaque é a quimiorresistência primária que identificamos nos pacientes com carcinoma renal. Existem evidências que sugerem expressão aumentada do gene MDR1 (multidrug resistance) e a conseqüente manifestação do fenótipo de resistência a múltiplos fármacos em uma porcentagem significativa de casos.13,14 O produto desse gene, a P-glicoproteína 170, tem a função de facilitar o transporte de fármacos e compostos tóxicos para o exterior da célula. A expressão aumentada da P-170 justificaria dessa forma a resistência dos tumores renais ao tratamento antineoplásico. As principais alterações cromossômicas observadas no CCR são deleção e translocação envolvendo o braço curto do cromossomo 3.15 Esta alteração ocorre somente nos carcinomas usuais ou de células claras; entretanto, nos papilares também são observadas alterações, sendo a mais freqüente a trissomia nos cromossomos 7 e 17, entre outras.
Pontos-chave: • O CCR representa 80-90% dos tumores renais malignos nos adultos • Pode apresentar regressão espontânea, porém é quimiorresistente • Alterações cromossômicas são observadas nos CCR HISTÓRIA NATURAL Cerca de 30% dos pacientes com CCR se apresentam com metástases a distância quando do diagnóstico. Esse comportamento relaciona-se com o tamanho do tumor. Metástases são encontradas em 8% dos casos com tumores de diâmetro igual ou menor que 5 cm e em 80% dos casos com tumores de mais de 10 cm de diâmetro.
O tempo de progressão do CCR é totalmente imprevisível e difere bastante em cada paciente. De maneira geral, esses tumores tendem a crescer lentamente, pelo grande tempo de duplicação de suas células. A sobrevida depende basicamente da extensão da doença no momento do diagnóstico e varia entre 60 e 80% nos tumores localizados e entre 0 e 10% nos tumores metastáticos (sobrevida de cinco anos). Os tumores maiores e mais agressivos podem causar invasão local, propagando-se diretamente às estruturas vizinhas como o duodeno e o diafragma. Pela via hematogênica atingem com maior freqüência os pulmões (40-60%), fígado (30%) e ossos longos (20-30%). Por via linfática podem comprometer os linfonodos lombares junto aos grandes vasos (20-35%). O crescimento do tumor no interior da veia renal não é raro (10-30%), podendo atingir a veia cava e até mesmo o coração.
DIAGNÓSTICO Quadro Clínico. Nas fases iniciais, o CCR não apresenta sintomas e sinais característicos, dificultando o diagnóstico precoce. Pode, inclusive, ser achado incidental em exame clínico de rotina, cirurgias abdominais ou exames para outras finalidades, como, por exemplo, o estudo do fígado, vias biliares e trato intestinal. Com o emprego crescente da ultra-sonografia e da tomografia computadorizada, este fato vem ocorrendo com freqüência cada vez maior (30%). A tríade clássica de dor, hematúria e massa no flanco é confiável, porém é encontrada em somente 10% dos casos e geralmente indica doença avançada. Hematúria, microscópica ou macroscópica, representa a principal manifestação clínica e é observada em 60% dos pacientes. Geralmente não é acompanhada de dor e outros sintomas miccionais. Pode ser contínua, mas, na maioria das vezes, é intermitente, levando, nos intervalos, à falsa impressão de cura do processo. Dor lombar ocorre em aproximadamente 40% dos casos e costuma ser tardia. A dor é sentida no ângulo costovertebral, sendo motivada pela distensão da cápsula renal, podendo haver quadro de cólica nefrética pela passagem, ao longo do ureter, de coágulos ou restos necróticos do tumor. Massa palpável no flanco é achado menos freqüente (2530%) e difícil de ser detectada, principalmente em pessoas obesas e quando o tumor encontra-se no pólo superior do rim. Emagrecimento também é um achado comum, ocorrendo em 28% dos pacientes. A varicocele aguda é encontrada em 2% dos casos e sua presença reveste-se de grande importância, pois indica extensão neoplásica e trombose da veia renal ou da veia cava inferior. Manifestações paraneoplásicas são encontradas em cerca de um terço dos casos de CCR e resultam da secreção de polipeptídios e fatores humorais pelo tumor. Estas alterações revertem-se com a remoção da neoplasia, de modo
capítulo 35
que a persistência ou o aparecimento posterior das mesmas, após a nefrectomia, indica presença de depósitos tumorais metastáticos. Anemia é o achado mais comum, ocorrendo em 40% dos pacientes. É do tipo normocítica e normocrômica e não é explicada pela hematúria, mas sim pela hemólise causada por hemolisinas produzidas pelo tumor e também por depressão da eritropoese. Febre ocorre em cerca de 15% dos pacientes em alguma fase da doença e é a única manifestação em cerca de 3% dos casos. Geralmente não está associada à infecção e é secundária à produção endógena de pirogênio pelo tumor. Hipertensão também é um achado comum (40%), estando associada, em muitos casos, à elaboração de renina pelo tumor. Hipotensão está relacionada à produção de prostaglandina. A hipercalcemia tem sido relatada em mais de 10% dos casos e é justificada pela produção do hormônio PTH-like e prostaglandinas pelo CCR. Amiloidose ocorre em 3% dos casos e indica mau prognóstico. Pode ocorrer também síndrome nefrótica e polineuropatia. Outras manifestações raras incluem: síndrome de Cushing, hipoglicemia, galactorréia, perda da libido, enteropatia e síndrome de Staufer, que é uma disfunção hepática não-metastática de causa desconhecida, apresentando-se com elevação dos testes de função hepática e áreas de necrose no fígado que se normalizam após a nefrectomia. Como vimos, as manifestações extra-renais podem ser as mais variadas possíveis e simular outras doenças. O conhecimento destes aspectos é fundamental para o diagnóstico precoce, que pode ser decisivo para o prognóstico do paciente.
Pontos-chave:
639
lulas neoplásicas tem pouco interesse, pois somente é positiva quando o tumor invade a via excretora. Exames de Imagem. Os exames de imagem adquiriram importância fundamental no diagnóstico precoce do CCR e, conseqüentemente, alteraram seu prognóstico. Devido à maior utilização da ultra-sonografia e da tomografia computadorizada de abdômen por outras indicações, ocorreu, nos últimos anos, um aumento na detecção de massas renais encontradas de forma incidental (incidentalomas). Atualmente, de 25 a 40% dos tumores são diagnosticados dessa forma.16 Radiografia simples do abdômen deve sempre preceder qualquer exame contrastado. Poderá mostrar imagem da sombra renal aumentada com eventual deformidade em seu contorno; a sombra do músculo psoas poderá estar obscurecida, o que não acontece com as massas císticas. Calcificações são observadas em 7% dos casos (Fig. 35.17). Embora a urografia excretora permaneça como exame de escolha na maioria das instituições e tenha grande utilidade na avaliação inicial de hematúria, o ultra-som e a TC de abdômen apresentam maior acurácia na detecção de massas renais. Na urografia, usualmente observamos uma lesão que ocupa espaço dentro do rim alterando a morfologia pielocalicial (Fig. 35.18). Quando o tumor invade os vasos do pedículo, não há eliminação do meio de contraste pelo órgão. A presença de hidronefrose pode significar invasão ou compressão do ureter pelo tumor. A arteriografia renal foi o principal método de imagem para detecção das neoplasias renais durante muitos anos. Porém, por ser método invasivo e sujeito a complicações como hemorragia, formação de pseudo-aneurisma no local da punção, embolia pulmonar e nefrotoxicidade, associado ao surgimento e desenvolvimento da tomografia computa-
• O diagnóstico incidental ocorre em aproximadamente 30% dos casos • A tríade clássica (dor, hematúria e massa palpável) ocorre em somente 10% dos casos • Hematúria, micro- ou macroscópica, é a principal manifestação clínica (60%) • Manifestações paraneoplásicas ocorrem em um terço dos CCR Exames Laboratoriais. Não existe nenhum exame que seja patognomônico e marcador tumoral, o que seria de grande utilidade não somente na identificação do tumor, como também parâmetro na avaliação da resposta terapêutica. O hemograma pode mostrar eritrocitose; anemia acentuada ocorre nas fases adiantadas da doença. O VHS encontra-se elevado em cerca de 75% dos casos. Hipercalcemia está geralmente associada à presença de metástases. Proteína C reativa e desidrogenase lática estão elevadas em cerca de 25 a 30% dos pacientes. O exame de sedimento urinário pode mostrar presença de hemácias, e a citologia urinária para a pesquisa de cé-
Fig. 35.17 Radiografia simples de abdômen demonstrando efeito de massa e apagamento do músculo psoas secundário a tumor em rim esquerdo.
640
Tumores Renais
Fig. 35.18 Urografia excretora evidenciando tumor em terço médio de rim direito com distorção de cálices e abaulamento do contorno renal.
dorizada, teve suas indicações restritas. Entretanto, há necessidade de sua realização naqueles pacientes com plano de nefrectomia parcial, por fornecer informações quanto à distribuição arterial renal e suas relações com o tumor. Com o advento da angiotomografia e angiorressonância, a arteriografia renal deverá deixar de ser indicada nos casos de CCR. A ultra-sonografia é método não-invasivo, pouco oneroso e útil para diferenciar lesões císticas das sólidas. Os critérios sonográficos para diagnóstico de cisto simples incluem ausência de ecogenicidade no interior, parede lisa e bem delimitada, e forma arredondada. Quando houver dúvida ou alguns desses dados não forem encontrados, deverá ser realizada TC para melhor avaliação da lesão. Exige experiência do examinador e, em mãos habilitadas, e com o auxílio do Doppler, pode excluir a presença de trombo na veia cava ou, quando presente, delimitar sua extensão. A TC de abdômen é o método de escolha para demonstrar a natureza da lesão expansiva e auxiliar no estadiamento do tumor, demonstrando eventual acometimento linfático, venoso e de estruturas vizinhas (Fig. 35.19). Sua precisão diagnóstica é bastante elevada, sendo capaz de identificar envolvimento da veia renal em 91% dos casos, presença de trombo na veia cava inferior em 97%, presença de linfonodos retroperitoneais em 87% e extensão a órgãos adjacentes em 96% dos pacientes. Quando comparada com a arteriografia renal, apresentou acurácia de 95% contra 85%, no diagnóstico de CCR. Os inconvenientes deste exame decorrem de seu elevado custo e da necessidade do uso de contraste iodado, o que confere ao método alguma morbidade. A punção percutânea da massa deve ser realizada quando a ultra-sonografia e a TC evidenciam a presença de lesão de natureza complexa, ou seja, lesões com áreas sólidas e líquidas concomitantes. A principal finalidade é excluir a presença de tumor necrosado com degeneração cística ou neoplasia localizada no interior de um cisto seroso. Com a punção pode-se estudar radiologicamente a mor-
Fig. 35.19 TC demonstrando volumoso processo expansivo em rim esquerdo.
fologia interna da lesão, e o líquido aspirado pode orientar na diferenciação do tipo de lesão. Líquido de aspecto sanguinolento, com citologia positiva e elevados níveis de desidrogenase lática (LDH), gordura e proteína caracterizam a presença de neoplasia no interior do cisto. A Ressonância Nuclear Magnética (RNM) não apresentou, até o momento, evidências de superioridade em relação à TC. Alguns estudos demonstraram que esse método seja menos sensível que a TC na detecção de tumores renais de pequeno volume. Sua importância deve-se principalmente à avaliação de invasão neoplásica da veia renal e da cava inferior (Fig. 35.20). Além disso, apresenta mai-
Fig. 35.20 RNM — tumor renal com invasão de gordura perirrenal e da veia renal.
641
capítulo 35
or precisão para detectar tumores de pólo superior do rim direito, onde a TC por vezes não define precisamente a existência de infiltração hepática. É utilizada também para estadiamento nos pacientes impossibilitados de submeterem-se à TC com contraste por apresentarem alergia ou déficit da função renal.
Pontos-chave: • Não há marcador tumoral para CCR • A ultra-sonografia é útil para diferenciar lesões císticas das sólidas • A TC abdominal é o método de escolha para determinar a natureza da lesão e auxiliar no estadiamento do tumor Baseado nos recursos descritos, pode-se utilizar o fluxograma para o diagnóstico de massas renais expansivas (Quadro 35. 2).
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL O principal diagnóstico diferencial é com o cisto seroso simples, que geralmente pode ser identificado com auxílio da ultra-sonografia. Como relatado anteriormente, nos
casos em que houver dúvida ou quando existirem calcificações na lesão, a tomografia computadorizada tem papel predominante. Abscesso intra-renal também pode simular tumor, porém neste caso há presença de febre, dor lombar e leucocitúria. Outras neoplasias, como: angiomiolipoma, linfoma de rim, carcinoma de via excretora, tumores de adrenal e metástases renais de tumores de outras localizações.
ESTADIAMENTO O estadiamento da lesão é útil para definir a extensão da neoplasia, sendo importante no planejamento terapêutico e no prognóstico do paciente. Para estadiamento clínico, além da anamnese, do exame físico e de TC de abdômen, devem-se solicitar radiografias de tórax, provas de função hepática e cálcio sérico. Nos pacientes que apresentam dores ósseas, elevação da fosfatase alcalina ou do cálcio sérico, é indicada a pesquisa de metástases ósseas por meio da cintilografia. A classificação mais comumente empregada é a de Flocks e Kadesky modificada por Robson (1969). • Estádio I: tumor limitado ao rim sem invasão da cápsula renal;
Quadro 35.2 Fluxograma para diagnóstico de massas renais expansivas MASSA RENAL
Sólida
Cística
Ultra-som
Cisto Simples
Tomografia Comp.
Trombo ???
Cisto Complexo
RNM
Observação
Punção
Cirurgia
642
Tumores Renais
• Estádio II: invasão da gordura perirrenal, porém confinado a fáscia perirrenal; • Estádio III: envolvimento dos nódulos linfáticos regionais ou veia cava/renal; • Estádio IV: tumor invadindo órgãos regionais ou com metástases a distância. A limitação desse sistema se torna óbvia quando se observa que a sobrevida de pacientes no estádio II é igual à daqueles do estádio III, indicando avaliação inapropriada dos fatores prognósticos. Está bem estabelecido que pacientes que apresentam CCR no estádio IIIa, com trombo na veia renal e/ou cava inferior, apresentam prognósticos comparáveis aos estádios I e II (sobrevida em 5 anos de 75% e 63%, respectivamente), quando realizada a ressecção completa da lesão. Entretanto, pacientes com tumores estádio IIIb, com linfonodos retroperitoneais comprometidos, apresentam sobrevida menor de 20% em 5 anos. Por isso, o método TNM de 1997,17 revisado pela UICC (União Internacional de Combate ao Câncer) em 1999, tem sido preferido, por classificar com maior precisão o acometimento tumoral (Quadro 35.3).
TRATAMENTO O planejamento terapêutico nos casos de CCR é feito principalmente em função do estadiamento clínico da lesão. Aproximadamente 70% desses casos apresentam-se inicialmente em estádios I, II e III e 30% em estádio IV. A cirurgia permanece como único método efetivo de tratamento do carcinoma renal primário, pois esses tumores são caracteristicamente resistentes à radioterapia e à quimioterapia, e o objetivo desse procedimento deve ser a excisão completa da lesão com margem cirúrgica adequada.
Nos tumores localizados ou localmente avançados (estádios I, II e III), o tratamento indicado é a nefrectomia radical, que inclui a ressecção em bloco do rim, gordura perirrenal, fáscia de Gerota e adrenal. Quando o tumor é de pequenas dimensões e localiza-se no pólo renal inferior, a retirada da adrenal pode ser dispensada, devido à pouca probabilidade de acometimento tumoral. Quanto à realização da linfadenectomia retroperitoneal associada à nefrectomia radical, existe certa divergência no que diz respeito a sua eficiência terapêutica. Algumas características da neoplasia, como a ocorrência freqüente de metástases hematogênicas e a distribuição imprevisível das metástases nodais (linfonodos supraclaviculares ou ilíacos podem estar comprometidos na ausência de lesões ao nível de linfonodos hilares), indicam que a linfadenectomia pouco contribui para melhorar o prognóstico desses pacientes.18 Entretanto, Golimbu e col. (1986) avaliaram pacientes com doença localizada submetidos à linfadenectomia e evidenciaram aumento de 10 a 15% na sobrevida em cinco anos naqueles com estádio clínico II.19 Isso se deve, provavelmente, à presença de micrometástases retroperitoneais não evidenciadas em exames de imagem pré-operatórios e que foram removidas com a linfadenectomia. Atualmente, o consenso é de se realizar linfadenectomia limitada à região do hilo renal e em torno do grande vaso isolateral, pois são removidos os principais linfonodos envolvidos, permitindo estadiamento adequado e ausência de riscos de uma cirurgia mais extensa. Do ponto de vista técnico, a nefrectomia radical pode ser realizada através de diferentes vias de acesso. A incisão varia de acordo com o tamanho e a localização do tumor, o tipo físico do paciente e a preferência do cirurgião. A lombotomia é utilizada quando a lesão tem menos de 5
Quadro 35.3 Estadiamento dos tumores renais (UICC, 1999) Tumores Primários
Linfonodos Regionais
Metástase a Distância
Tx Tumor primário não avaliado T0 Sem evidência de tumor primário T1 Tumor ⬍ 2,5 cm e limitado ao rim T2 Tumor ⬎ 2,5 cm e limitado ao rim T3 Tumor estendendo-se para a veia renal ou veia cava inferior, invasão de adrenal ou tecido perinéfrico, sem extensão além da fáscia de Gerota T3a Invasão da adrenal ou tecidos perinéfricos, sem extensão além da fáscia de Gerota T3b Extensão tumoral para a veia renal ou veia cava inferior T3c Extensão tumoral para veia cava inferior acima do diafragma T4 Invasão além da fáscia de Gerota
Nx Linfonodos não avaliados N0 Ausência de metástase N1 Metástase em um único linfonodo N2 ⬍ 2 cm Metástase em um único linfonodo N3 ⬎ 2 cm e ⬍ 5 cm ou vários linfonodos ⬍ 5 cm Metástase em linfonodo ⬎ 5 cm
Mx Presença de metástase a distância não avaliada M0 Ausência de metástase a distância M1 Presença de metástase a distância
capítulo 35
cm de diâmetro e nos pacientes com maior risco cirúrgico. A incisão transperitoneal anterior (mediana, subcostal ou Chevron) representa a melhor forma de abordar as neoplasias renais, pois permite a inspeção completa de todo o abdômen, bom campo cirúrgico para ligadura precoce da artéria e da veia renal, realização de linfadenectomia e remoção segura de um possível trombo na veia cava inferior. A toracofrenolaparotomia é indicada para lesões volumosas e/ou invadindo a veia cava inferior com extensão além das veias supra-hepáticas. Recentemente, tem-se empregado a nefrectomia radical videolaparoscópica com bons resultados.20 A nefrectomia parcial, isto é, ressecção apenas do tumor (<4 cm) com margens de 1 a 2 cm, vem sendo realizada em pacientes com CCR em rim único e CCR bilateral, pois em ambos os casos a preservação do parênquima renal é fundamental para evitar a diálise. Devido aos bons resultados, passou-se a indicar também a nefrectomia parcial para pacientes com CCR e perda da função renal global ou que apresentem doenças (diabetes, urolitíase, rins policísticos e estenose da artéria renal) que possam prejudicar a função renal no futuro. Este tipo de cirurgia também tem sido realizado por meio da videolaparoscopia, apresentando resultados encorajadores.21 Atualmente têm-se estudado as técnicas minimamente invasivas, como, por exemplo, a ablação percutânea por radiofreqüência,22 crioablação,23 ultra-som de alta freqüência e termoterapia com microondas.24 Apesar de ainda não termos resultados em longo prazo, são alternativas promissoras para o tratamento do carcinoma renal. A realização da nefrectomia na presença de metástases somente se justifica se esta for única e com possibilidade de ser removida (pulmão, ossos e fígado). Os dados atuais ainda não são conclusivos sobre a remoção do tumor com finalidade de citorredução e posterior utilização de imunoterapia. Para pacientes que apresentam doença avançada com massa ganglionar retroperitoneal, invasão de estruturas adjacentes ou metástases, o prognóstico é sombrio e pouco há a oferecer quanto ao aumento de sobrevida. Naqueles que apresentem sintomas locais, como hematúria e dor lombar intensa, pode-se realizar ressecção da massa tumoral ou injeção de substâncias embolizantes (coágulos, gelfoam, solução alcoólica, etc.) na artéria renal, apenas como método paliativo. Como o CCR é pouco sensível à radioterapia e à quimioterapia, a imunoterapia parece ser a grande esperança para obtenção de melhores resultados em estádios avançados, pois sua história natural é imprevisível, havendo alguns casos descritos com doença metastática e regressão espontânea. Essas circunstâncias sugerem que a agressividade e o prognóstico do tumor dependem da resposta imunológica de cada paciente. Várias pesquisas têm sido feitas com o uso de interferon, fator de transferência, BCG, RNA imune e interleucinas.
643
Atualmente, a única droga aprovada pelo FDA (Food and Drug Administration) para tratamento de CCR metastático é a interleucina 2 (IL-2) em altas doses. Apresenta resposta completa na regressão da neoplasia em torno de 5% e resposta parcial de 15%. No entanto, acarreta efeitos colaterais importantes, podendo ocasionar diminuição da resistência vascular periférica com conseqüente hipotensão e insuficiência renal, assim como aumento da permeabilidade capilar, resultando em insuficiência cardiopulmonar. A mortalidade relacionada ao uso de IL-2 em altas doses é inferior a 2%.25
Pontos-chave: • A cirurgia radical é o único método efetivo de tratamento do CCR • A nefrectomia radical inclui a retirada do rim, gordura perirrenal, fáscia de Gerota e glândula adrenal • A imunoterapia é a única alternativa para a doença avançada CONTROLE DE CURA Até o momento não foram identificados marcadores específicos para o CCR. Porém, em alguns pacientes surgem alterações como aumento dos valores de hemossedimentação, elevação dos níveis séricos de antígeno carcinoembriônico (CEA), de proteína C-reativa e de alguns hormônios (eritropoetina, renina) ou hipercalcemia. A remoção completa do tumor deve acompanhar-se de normalização dessas alterações, e dosagens pós-operatórias repetidas desses marcadores podem indicar precocemente persistência ou recorrência da doença. Os locais mais freqüentemente envolvidos por recorrência tumoral após o tratamento inicial são o pulmão, a loja renal, ossos, linfonodos mediastinais e fígado. Por isso, os pacientes tratados de CCR devem ser submetidos à avaliação semestral nos primeiros cinco anos e, posteriormente, à avaliação anual, realizando-se exames como radiografia de tórax, ecografia abdominal e dosagem de cálcio, hemograma, creatinina e VHS. A TAC de abdômen e a cintilografia óssea devem ser indicadas quando existe dor óssea, aumento da fosfatase alcalina e alteração na ecografia abdominal.
PROGNÓSTICO O comportamento do CCR é imprevisível, sendo um dos poucos carcinomas em que existem evidências objetivas de raros casos de regressão espontânea e cura aparente, devido a fatores relacionados com a competência imunológica do paciente. Entretanto, o aparecimento de metástases anos após a cirurgia pode ocorrer. A sobrevida de 5 anos é de 61% para todos os estágios, sendo de 89% em doença localizada, 62% em doença com extensão regional e de 9% em doença metastática.
644
Tumores Renais
Constituem fatores independentes de prognóstico o tipo histológico do tumor (cromófobos são menos agressivos), dimensão da lesão primária (favorável ⬍ 7 cm), estágio da doença (favorável ⬍ T2), grau histológico nuclear (favorável ⬍ grau II), invasão microvascular no tumor primário (sem invasão são menos agressivos) e apresentação clínica inicial (os incidentais são mais favoráveis que os sintomáticos). Observou-se também que quanto maior o intervalo entre o diagnóstico da doença primária e o aparecimento de metástases, melhor é a evolução do paciente. Quando este intervalo é menor que 24 meses, a sobrevida de cinco anos é de 25%, mas quando já existem metástases no momento do diagnóstico, este valor é praticamente zero.
Sarcomas Sarcomas constituem cerca de 2 a 3% dos tumores malignos do rim.1 Em geral originam-se do seio ou da cápsula renal, diferentemente dos carcinomas de células renais, que têm origem parenquimatosa. Entretanto, as manifestações clínicas podem ser bastante semelhantes entre estes tumores. Dor lombar, massa palpável em flanco e hematúria são sintomas freqüentemente observados. Os tipos histológicos mais freqüentes são o fibrossarcoma, lipossarcoma, hemangiopericitoma e leiomiossarcoma, cujo comportamento biológico destes tumores é, em geral, extremamente agressivo, de crescimento rápido e prognóstico reservado.26 A TC pode ser útil na avaliação se a massa renal tem origem no parênquima, na cápsula ou seio renal. A densidade de gordura pode ser observada nos lipossarcomas, porém com freqüência apresenta-se com densidade de tecidos moles. A ausência de linfonodomegalia retroperitoneal em paciente com grande massa renal é também mais sugestiva de sarcoma do que de carcinoma. A cirurgia radical é o único método potencialmente curativo de tratamento destes tumores. Embora recorrência local e a distância sejam comuns, significativa sobrevida pode ser conseguida somente com a ressecção completa desses tumores. Quimioterapia e radioterapia podem ser empregadas em situações bem definidas quando margens cirúrgicas positivas são detectadas, porém com resultados pobres.
neoplasia renal primária. O principal método de identificação é a TC, que é utilizada como guia para biópsias percutâneas na elucidação do tipo histológico do tumor. Neste exame a massa renal metastática apresenta-se em geral isodensa na fase pré-contraste.2 A ressecção da lesão por meio de nefrectomia parcial poderá ser útil quando esta for pequena, isolada e em região de pólo renal, e sua indicação dependerá da natureza e do prognóstico da lesão primária.
TUMOR DE WILMS Tumor de Wilms é a neoplasia do trato urinário mais comum na infância. Compreendem mais de 80% dos tumores gênito-urinários em jovens menores de 15 anos. A maioria ocorre em crianças em torno de 3 anos de idade e apresenta-se em geral como uma grande massa abdominal. Em 4 a 8% dos casos a lesão é bilateral.27 Descrito com detalhes por Max Wilms em 1899, esta patologia permanece associada ao seu nome até os dias atuais. Denominado também de embrioma renal, nefroblastoma e tumor misto do rim, desenvolve-se a partir de tecidos renais embrionários, compostos na maioria das vezes por três linhagens celulares, com elementos derivados do blastema metanéfrico, epitélio tubular e estroma (Fig. 35.21). Alterações cromossômicas específicas podem induzir a transformação maligna destas células.28 Geralmente apresentam-se como grandes massas abdominais, de superfície lisa e regular que não ultrapassam a linha média (Fig. 35.22). Dor abdominal e hematúria macroscópica estão presentes em 30% dos casos. Manifestações de dor aguda, febre, anemia, hipertensão arterial e perda de peso podem estar presentes. A disseminação destes tumores pode ser regional, invadindo o retroperitônio, veia cava e renal e linfáticos regionais, e a distância, comprometendo pulmões, fígado, ossos e cérebro.
Outros Tumores Renais TUMORES METASTÁTICOS O rim é sítio freqüente de metástases de uma variedade de tumores sólidos e doenças malignas hematológicas. O carcinoma primário de pulmão é o que mais comumente atinge o rim. Outros tumores que podem metastatizar para os rins são os de mama, ovários e intestino. Linfoma e linfoblastoma também acometem com freqüência os rins. Estes tumores usualmente aparecem como nódulos múltiplos, embora lesões únicas sejam também observadas. A urografia excretora (UIV) e a ultra-sonografia dificilmente conseguem distinguir os tumores metastáticos da
Fig. 35.21 Microfotografia de tumor de Wilms onde se observam componentes estromal (à direita) e epitelial, composto de estruturas tubulares (à esquerda) (HE ⫻ 100). Cortesia do Dr. Gilberto Antunes Sampaio.
capítulo 35
645
com nefropatia dos Bálcãs, infecções crônicas e cálculos renais está também presente.
Patologia
Fig. 35.22 Peça de autópsia — rins e bexiga. Tumor de Wilms à direita. Cortesia do Dr. Gilberto Antunes Sampaio.
O diagnóstico diferencial destas lesões deve ser feito com o neuroblastoma, a neoplasia abdominal mais comum na infância, e outros tumores renais, como rins policísticos, hidronefrose e linfomas. A UIV demonstra com freqüência um processo expansivo intra-renal e distorção dos cálices. O ultra-som auxilia na diferenciação das lesões císticas, invasão de veia cava e exploração da doença bilateral. A TC revela a natureza e a extensão regional da neoplasia.29 Outros exames, como a radiografia de tórax e a RNM, auxiliam na avaliação do comprometimento pulmonar e na invasão tumoral por trombo na veia cava. Os tumores de Wilms em geral respondem bem à cirurgia radical por meio da nefrectomia associada a quimioterapia e/ou radioterapia. A evolução destes tumores melhorou muito com a introdução da quimioterapia citotóxica na década de 50 e a radioterapia. O prognóstico depende efetivamente do volume tumoral, da extensão e do tipo histológico do tumor (histologia favorável ou desfavorável — anaplásico) e da idade da criança. Atualmente o índice de cura chega a 90% nos tumores localizados e a até 50% em tumores com metástases a distância.30
O carcinoma de células transicionais representa cerca de 90% dos tumores da pelve renal, e o carcinoma epidermóide, aproximadamente 7%. Outros tumores do trato urinário superior são extremamente raros e compreendem os adenocarcinomas e sarcomas. Os carcinomas de células transicionais disseminam-se geralmente pela via excretora por todo o urotélio, ocorrendo lesões concomitantes em ureter e bexiga em cerca de 30 a 75% dos pacientes.31 A disseminação pode também ser por contigüidade para parênquima renal e gordura perirrenal, via linfática para cadeia paraaórtica e linfonodos pélvicos e por via hematogênica, envolvendo geralmente ossos, fígado e pulmão.
Diagnóstico A hematúria é a manifestação clínica mais freqüente, sendo observada em 90% dos casos. Dor em flanco usualmente ocorre em virtude da dilatação pielocalicial pela obstrução da via excretora pelo tumor, e dor tipo cólica pode ocorrer pela passagem de coágulos pelo ureter. Massa palpável é infreqüente, sendo observada apenas em decorrência de hidronefrose acentuada ou em tumores avançados. A UIV é o exame de imagem de escolha na investigação destes tumores e em 50 a 75% dos pacientes um defeito de enchimento da pelve renal ou cálices é observado (Fig. 35.23). Entretanto, em pacientes com tumor em estádio
CARCINOMA DE PELVE RENAL Epidemiologia Representa entre 4 e 10% das neoplasias que atingem os rins e corresponde a menos de 2% dos tumores urogenitais. Acomete preferencialmente homens após a sexta década de vida na proporção de 3:1 em relação às mulheres. Estes tumores parecem estar relacionados ao tabagismo, exposição a agentes químicos e ocupacionais (indústria química e petroquímica) e ao uso excessivo de analgésicos do tipo fenacetina. A associação dos carcinomas de urotélio
Fig. 35.23 Falha de enchimento observado na UIV secundário à tumor de pelve renal esquerda.
646
Tumores Renais
avançado podem ocorrer obstrução e não-visualização da via excretora. Nestas situações a ureteropielografia retrógrada pode prover melhor visualização, além da possibilidade de coletar urina diretamente da pelve renal para exame citológico. A ultra-sonografia e a TC não superam a urografia no diagnóstico, mas podem ser úteis na diferenciação de uma falha de enchimento ocasionada por cálculos radiotransparentes e também no estadiamento da doença (Fig. 35.24). Atualmente, com a ampla utilização de materiais endoscópicos flexíveis, a ureterorrenoscopia tornou-se um armamento bastante utilizado na investigação de lesões do trato urinário superior. O diagnóstico dos tumores de via excretora superior chega a 92% de acurácia com este método, além de possibilitar a realização de biópsia das lesões.32 Devido à alta incidência de tumores vesicais em associação com carcinoma de pelve renal, a cistoscopia deve ser sempre empregada no estadiamento destes tumores. Finalmente, o exame citopatológico da urina emitida pode revelar a presença de células neoplásicas do urotélio, porém os resultados falso-negativos ainda são altos. Como alternativa, a coleta de urina diretamente do trato urinário superior por meio de cateter introduzido endoscopicamente, pelo qual se injeta soro fisiológico para lavar a pelve e coletar material potencialmente rico em células neoplásicas, aumenta a eficácia do método. A utilização de cateter com escova (brush biopsy), de caráter esfoliativo, pode também ser utilizada na obtenção de material para citologia.33 Assim como para o diagnóstico, cistoscopia, radiologia e citologia devem ser empregadas no seguimento periódico dos pacientes submetidos ao tratamento dos tumores de pelve renal, pela possibilidade de recorrência tumoral em bexiga ou estruturas adjacentes ao rim.
Estadiamento Atualmente a classificação mais utilizada para o estadiamento dos tumores de pelve renal é o TNM proposto pela UICC (revisado em 1999) (Quadro 35.4).
Tratamento Em casos de tumores localizados, a nefroureterectomia radical com remoção de segmento de parede vesical junto ao local de implante do ureter é a terapia preferencial. A indicação de remoção de todo o ureter e parte da parede da bexiga faz-se necessária em virtude da possibilidade de recidiva tumoral nestes locais, que pode chegar a 25-40% dos casos quando os tumores não são removidos. Em situações especiais, como em portadores de rim único, tumores bilaterais, tumores de baixo grau (estádio T1-T3, N0, M0), déficit de função renal e pacientes em más condições clínicas, uma abordagem mais conservadora, preservando-se o rim comprometido, pode ser adotada. Ressecção parcial da pelve, ressecção e/ou eletrofulguração endoscópica por meio de ureteroscopia com utilização de laser ou via percutânea com ressecção completa da lesão e irrigação local com BCG podem ser empregadas.34 Tumores localmente avançados (T4, N0, M0) podem ser tratados com nefroureterectomia seguida de quimioterapia sistêmica com M-VAC (Metotrexate, Vimblastina, Adriamicina e Cisplatina) em 4-6 ciclos. Eventualmente a cirurgia pode ser associada à radioterapia, embora estes tumores sejam em geral radiorresistentes. Tumores irressecáveis ou com lesões metastáticas devem ser tratados inicialmente com quimioterapia citotóxica com M-VAC 4-6 ciclos. Se a resposta for satisfatória, radioterapia ou ressecção cirúrgica das lesões residuais podem ser indicadas na seqüência em casos selecionados.35 A sobrevida está diretamente relacionada com o grau e estádio do tumor. Nos pacientes portadores de tumores localizados o prognóstico em geral é bom, com sobrevida de cinco anos chegando a 85% dos casos. Os carcinomas epidermóides da pelve renal apresentam em geral grande potencial de malignidade, sendo na maioria das vezes diagnosticados em estádio avançado. A única alternativa de tratamento é a cirurgia radical por meio de nefroureterectomia, visto que são tumores rádioe quimiorresistentes. Em virtude de suas características, apresentam, portanto, um pior prognóstico.
Pontos-chave:
Fig. 35.24 TC com contraste demonstrando processo expansivo no interior da pelve renal direita.
• 90% são carcinomas de células transicionais • Hematúria é a manifestação clínica mais freqüente • Nefroureterectomia radical com remoção de segmento de parede vesical é o tratamento preferencial para os tumores localizados
647
capítulo 35
Quadro 35.4 Estadiamento dos tumores de pelve renal (UICC, 1999) Tumor Primário (T)
Linfonodos Regionais (N)
Metástases a Distância (M)
Tx tumor não-classificado T0 sem tumor primário Ta carcinoma papilar nãoinvasivo Tis carcinoma in situ T1 invasão da submucosa T2 invasão muscular T3 invasão de gordura peripiélica ou parênquima renal T4 invasão de estruturas adjacentes à pelve ou ao rim
Nx linfonodos não-classificados N1 metástase em 1 linfonodo ⬍ 2 cm N2 metástase em 1 ou ⫹ linfonodos entre 2 e 5 cm N3 metástase em 1 ou ⫹ linfonodos maiores de 5 cm
Mx metástases não-classificadas M0 sem metástases a distância M1 metástase a distância
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
PANTUCK, A.J.; ZISMAN, A.; RAUCH, M.K.; BELLDEGRUN, A. Incidental renal tumors. Urology, 56(2): p.190-196, 2000. 2. BELLDEGRUN, A.; DEKERNION, J.B. Renal Tumors, cap. 76, p. 22832326. In Walsh, P.C. (et al.) Campbell’s Urology 7th ed. W.B. Saunders, 1998. 3. HERING, F.L.O. Massas renais, cap. 16, p. 307-310. In: Hering, F.L.O.; Srougi, M. (eds.) Urologia — diagnóstico e tratamento. Roca, 1998. 4. SINGER, A.J. Angiomyolipoma. Infect Urol, 14(4): p. 94-97, 2001. 5. TOLEDO, A.F.; DORNELLES NETO, E.J. Neoplasias benignas e malignas do rim. In: Barata, H.S.; Carvalhal, G.F.(eds.) Urologia — princípios e prática. Porto Alegre: Artmed, 1999, p. 333- 338. 6. BURGA, A.M.; COHEN, E.L.; UNGER, P. Kidney neoplasms — can renal oncocytoma be distinguished from renal cell carcinoma? Contemp Surgery, 57(2): p. 64-67, 2001. 7. LIEBER, M.M. Renal oncocytoma, p. 99-101. In: Seidmon, E.J.; HANNO, P.M. (eds.) Current urologic therapy, 3 ed. W.B. Saunders, 1994. 8. DIAZ, J.I.; MORA, L.B.; HAKAM, A. The main classification of renal cell tumors. Cancer Control, 6(6): p. 57-579, 1999. 9. WINGO, P.A.; TONG, T.; BOLDEN, S. Cancer statistics. Cancer, 45: p. 8, 1995. 10. BRETAN, P.N.; BUSH, M.P.; HRICAK, H. et al.: Chronic renal failure: a significant risk factor in development of adquired renal cyst and renal cell carcinoma. Cancer, 57: p. 871, 1986. 11. LINEHAM, W.M.; LERMAN, M.I.; ZBAR, B. Identification of the VHL gene: its role in renal carcinoma. JAMA, 273: p. 564, 1995. 12. DERIESE, W.; ALLHOFF, E.; KIRCHNER, H. et al. Complete spontaneous regression in metastatic renal cell carcinoma: an update and review. World J Urol, 9: p. 184, 1991. 13. FOJO, A.T.; SHEN, D.W.; MICKLEY, L.A.; PASTAN, I.; GOTTESMAN, M.M. Intrinsic drug resistance in human kidney cancer is associated with expression of a human multidrug-resistance gene. J Clin Oncol, 5(12): 1922-7, Dec 1987. 14. KAKEHI, Y.; KANAMRUIT, K.; YOSHIDA, O. et al. Measurement of the multidrug resistance messenger RNA in urogenital cancers: elevated expression in renal cell carcinoma is associated with intrinsic drug resistance. J Urol, 139: p. 862, 1988. 15. COHEN, A.J.; LI, F.P.; BERG, S. et al. Hereditary renal cell carcinoma associated with a chromosomal translocation. N Engl J Med, 301: p. 592, 1979. 16. KONNACK, J.W.; GROSSMAN, H.B. Renal cell carcinoma as an incidental finding. J Urol, 134: p. 1094-1096, 1995. 17. KOVACS, G.; AKHTR, M.; BECKWITH, B.J. et al. The Heidelberg
18.
19. 20.
21.
22.
23.
24. 25.
26.
27.
28. 29.
30. 31.
32.
33.
classification of renal cell tumors. J Pathol, 183:131-133, 1997. DEKERNION, J.B.; BELLDEGRUN, A. Renal tumors, cap. 27, p. 1053-1093. In: Walsh, P.C. (et al). Campbell’s Urology, 6th edition, W.B. Saunders Ed., 1992. GOLIMBU, M.; JOSHI, P.; SPERBER, A. et al. Renal cell carcinoma: survival and prognostic factors. Urology, 27: p. 291, 1986. SCHULAM, P.G.; DEKERNION, J.B. Laparoscopic nephrectomy for renal-cell carcinoma: the current situation. J Endourol, 15 (4): p. 375376, 2001. KOZLOWSKI, P.M.; WINFIELD, H.N. Laparoscopic partial nephrectomy and wedge resection for the treatment of renal malignancy. J Endourol, 15 (4): p. 369-374, 2001. PAVLOVICH, C.P.; WALTHER, M. M.; CHOYKE, P.L. et al. Percutaneous radio frequency ablation of small renal tumors: initial results. J Urol, 167 (1): p. 10-15, 2002. SHINGLETON, W.B.; SEWELL Jr., P.E. Percutaneous renal cryoablation of renal tumors in patients with Von Hippel-Lindau disease. J Urol, 167(3): p. 1268-1270, 2002. JOHNSON, D.B.; NAKADA, S.Y. Cryosurgery and needle ablation of renal lesions. J Endourol, 15 (4): p. 361-368, 2001. HAWKINS, M.J. Imunotherapy with high-dose interleukin 2. In: Vogeizang, N.; Scardino, P.; Shipley, W. et al. Comprehensive textbook of genitourinary oncology. Baltimore: Williams & Wilkins, 1996. p. 242-254. BRANDINA, L. Tumores renais, cap. 34, p. 440-449. In: Riella, M.C. (ed.) Princípios de nefrologia e distúrbios hidroeletrolíticos, 3.ª ed. Guanabara Koogan, 1996. PAYA, K.; HORCHER, E.; LAWRENZ, K.; REBHANDL, W.; ZOUBEK. Bilateral Wilm’s tumor — surgical aspects. Eur J Pediatr Surg, 11(2): p. 99-104, 2001. SROUGI, M. Tumor de Wilms, cap. 6, p. 123-141. In: Srougi, M.; Simon, D.D. (eds.) Câncer urológico. São Paulo. Marprint Editora, 1996. GOW, K.W.; ROBERTS, I.F.; JAMIESON, D.H.; BRAY, H.; MAGEE, J.F.; MURPHY, J.J. Local staging of Wilm’s tumor — computerized tomography correlation with histological findings. J Pediatr Surg, 35(5), p. 677-679, 2000. RAMSDEN, W.H. Imaging in diagnosis and staging of paediatric abdominal tumours. Imaging, 13, p. 262-271, 2001. POHAR, K.S.; SHEINFELD, J. When is partial ureterectomy acceptable for transicional-cell carcinoma of the ureter? J Endourol, 15(4), p. 405-408, 2001. HARA, I.; HARA, S.; MIYAKE, H.; NOMI, M.; GOTOH, A. et al. Usefulness of ureteropyeloscopy for diagnosis of upper urinary tract tumors. J Endourol, 15(6), p. 601-605, 2001. SOUTO, C.A.V. Neoplasias da pelve renal e de ureter. In: Barata, H.S.; Carvalhal, G.F. (eds.) Urologia — princípios e prática. Porto Alegre: Artmed, 1999. p. 339-343.
648 34.
35.
Tumores Renais
POTTER, S.R.; CHOW, G.K.; JARRET, T.W. Percutaneous endoscopic management of urothelial tumors of the renal pelvis. Urology, 58(3), p. 457-459, 2001. SROUGI, M.; DZIK, C. Câncer de pélvis renal, cap. 3, p. 13-17. In: Srougi, M.; Lima, S.V.C. (eds.) Manual de normatização — câncer urológico, 1.ª ed. São Paulo: BG Cultural, 2000.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA SROUGI, M.; SIMON, D.D. Câncer urológico. São Paulo, Marprint editora, 1996. (eds.) WALSH, P.C. Campbell’s Urology, 7th ed. W.B. Saunders, 1998. BARATA, H.S.; CARVALHAL, G.F. Urologia princípios e prática. Porto Alegre: Artmed, 1999. p. 333-338. (eds.)
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET American Journal of Kidney Diseases www.ajkd.org/ Digital Urology Journal www.duj.com Brazilian Journal of Urology www.brazjurol.com.br The Journal of Urology www.jurology.com Urology Network www.urologynet.org Medscape Urology www.medscape.com Urology Update http://epublications.vercomnet.com/urology/
Capítulo
Insuficiência Renal Crônica (IRC)
36
Roberto Zatz
INTRODUÇÃO
OS BALANÇOS DE POTÁSSIO E DE ÁCIDO NA IRC
A TEORIA DO “NÉFRON INTACTO”
OS BALANÇOS DE CÁLCIO E DE FOSFATO NA IRC — A
OS MECANISMOS DE ADAPTAÇÃO DO NÉFRON À PERDA PROGRESSIVA DE MASSA RENAL O CONCEITO DE BALANÇO E SUA MANUTENÇÃO NA IRC — O BALANÇO DE SÓDIO
OSTEODISTROFIA RENAL A NATUREZA PROGRESSIVA DA IRC: CONSEQÜÊNCIA DO “TRADE-OFF”? CONCLUSÕES
O MECANISMO DE “TRADE-OFF”
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
O BALANÇO DE ÁGUA
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO Pontos-chave: • Os rins são capazes de adaptar-se à perda crônica de néfrons • Na IRC, a homeostase é mantida até fases bastante avançadas da IRC Em meados do século XIX, Richard Bright, médico do Guy’s Hospital, em Londres, descreveu uma enfermidade até então desconhecida. Os pacientes apresentavam edema e a autópsia indicava a presença de vários achados que, sabemos hoje, representavam na verdade complicações da hipertensão arterial, tais como hipertrofia ventricular esquerda e hemorragias cerebrais. Além disso, seus rins tinham freqüentemente um aspecto “contraído e granular”, que hoje identificamos como o estádio terminal da IRC. Desde logo ficou claro que a história natural da doença de Bright, nome pelo qual a IRC foi designada durante mais de um século, era a de um processo extremamente insidioso, que podia evoluir sem grandes sintomas durante muitos anos, até que atingisse suas fases finais. Essa observação é um tanto sur-
preendente quando se considera a extrema importância dos rins para a sobrevivência do organismo. Além da óbvia função de eliminar os produtos indesejáveis do metabolismo, os rins são essenciais à manutenção, dentro de limites estreitos, das dimensões e da composição físico-química do organismo: mantêm constantes o volume extracelular (VEC), a concentração de eletrólitos, a acidez e a pressão osmótica do meio interno e provavelmente a pressão arterial, além de exercer as funções de uma verdadeira glândula endócrina, produzindo eritropoietina e a forma ativa da vitamina D. A importância dos rins fica ainda mais clara quando se observam as conseqüências de uma nefrectomia bilateral em um rato, por exemplo. O animal assim tratado retém uma quantidade enorme de excretas, tais como a uréia, acumula líquidos e desenvolve acidose e hiperpotassemia, não chegando a sobreviver mais do que 3 ou 4 dias. Conseqüências semelhantes são observadas em pacientes cujos rins deixam abruptamente de funcionar, como por exemplo após um choque hemorrágico prolongado (v. Cap. 21, Insuficiência Renal Aguda). Como explicar então que nas doenças renais crônicas o indivíduo siga assintomático durante anos, enquanto seus rins vão sendo paulatinamente destruídos? Sabemos hoje que uma das explicações para essa evolução tão arrastada repousa sobre uma propriedade fundamental do parênquima renal: embora os rins sejam in-
650
Insuficiência Renal Crônica (IRC)
dispensáveis à sobrevivência do organismo, sua capacidade funcional é vastamente superior ao mínimo necessário. Isso permite que seres humanos, cães e ratos possam manter-se vivos com 10% ou menos de sua função renal normal quando sua massa renal é drasticamente reduzida por processos mórbidos ou mesmo por retirada cirúrgica. A manutenção de níveis funcionais apropriados em face de uma redução considerável da massa renal deve-se ainda a uma outra propriedade básica do parênquima renal: os néfrons remanescentes são capazes de adaptar-se à nova condição biológica, multiplicando em várias vezes seu ritmo de trabalho. Isso fica bastante claro quando se analisa o comportamento da taxa de filtração glomerular por néfron (FPN) em face de reduções progressivas do parênquima renal em ratos.1 Enquanto a FPN normal é de cerca de 45 nl/min (45 ⫻ 10⫺9 litros) em ratos normais, seu valor sobe a ⬃60 nl/min em ratos submetidos a uninefrectomia, podendo chegar ao triplo do normal após a retirada de 5/
Fig. 36.1 Representação esquemática da elevação da taxa de filtração por néfron (FPN) em função da perda de néfrons.
6 do parênquima renal (Fig. 36.1). Esse aumento decorre de uma profunda alteração da dinâmica glomerular. Em ratos normais a pressão efetiva de ultrafiltração (correspondente à área compreendida entre as duas linhas azuis na Fig. 36.2) gira em torno de 10 mmHg, com um gradiente hidráulico de 40 mmHg e um fluxo plasmático glomerular inicial de 140 nl/min. Após a ablação de 5/6 do parênquima renal, o fluxo plasmático renal passa a 250 nl/min, enquanto o gradiente hidráulico vai a mais de 50 mmHg, fazendo com que a pressão efetiva de ultrafiltração ultrapasse 30 mmHg, ou três vezes o valor normal (Fig. 36.2).
A TEORIA DO “NÉFRON INTACTO” Pontos-chave: Na IRC: • Há uma enorme variação das taxas de filtração por néfron nas unidades remanescentes • O balanço glomérulo-tubular continua a existir em cada néfron remanescente, mas o equilíbrio se desloca em favor da atividade tubular • A atividade tubular dos néfrons remanescentes é proporcional às necessidades do organismo, variando com a ingestão de sódio e potássio, com a produção metabólica de ácido fixo etc.
Fig. 36.2 Representação esquemática da dinâmica glomerular em condições normais (linhas azul-claro) e após retirada de 85% do parênquima renal (linhas azul-escuro). As linhas superiores representam a diferença de pressão hidráulica transcapilar (⌬P), enquanto as linhas inferiores representam a pressão coloidosmótica intracapilar (). A área azul compreendida entre as duas curvas representa a pressão efetiva de ultrafiltração (PUF).
capítulo 36
Também a função tubular sofre adaptação intensa em indivíduos com IRC progressiva. Esse processo tornou-se mais claro a partir dos experimentos realizados por Bricker e colaboradores na década de 60.2,3 Esses investigadores utilizaram um modelo bastante engenhoso de lesão unilateral em cães, com três fases distintas (Fig. 36.3). Na primeira fase, ambos os rins estavam intactos, podendo a função de cada um ser estudada separadamente por meio de um artifício cirúrgico. Na segunda fase induzia-se no rim esquerdo uma nefropatia crônica. Nessa fase, o rim intacto arcava com as funções habitualmente desempenhadas pelos dois rins, cabendo ao rim doente apenas uma pequena parcela dessa tarefa. Na terceira fase, o rim normal era removido, passando a recair sobre o rim lesado a totalidade das funções de manutenção da homeostase. Quando se mediu a taxa de filtração glomerular em cada um dos rins, verificou-se que,
Fig. 36.3 Representação esquemática do procedimento adotado nos experimentos de Bricker. (Adaptado, com permissão, de Malnic, G. e Marcondes, M. Fisiologia Renal, EDART, São Paulo, 1972.)
651
conforme esperado, o rim lesado apresentava uma taxa de filtração glomerular bastante inferior à do rim controle2 (Fig. 36.4). Mediu-se também nesses animais a taxa de excreção de amônio, que funcionava como uma medida da função tubular desses rins.2 Também de acordo com as expectativas, a taxa de excreção de amônio era muito menor no rim doente. No entanto, quando se expressava a taxa de excreção de amônio como uma fração da taxa de filtração glomerular, encontravam-se valores bastante semelhantes nos dois rins. Esse achado sugeria que o rim lesado era capaz de ajustar-se à doença, mantendo uma proporção mais ou menos constante entre função glomerular e função tubular (balanço glomérulo-tubular). Isso ficou ainda mais claro quando se procedeu à retirada do rim normal (fase III). Nessas circunstâncias, observou-se que o RFG elevou-se em 50%, enquanto a taxa de excreção de amônio elevou-se em 100%, configurando uma intensificação desproporcional da função tubular em relação à função glomerular (quebra do balanço glomérulo-tubular). Esse achado indicava que o rim lesado se havia adaptado à nova situação, na qual se exigia de cada néfron uma taxa de excreção suficientemente alta para que, no conjunto, o tecido renal remanescente igualasse a taxa de produção de ácido fixo pelo organismo. Num primeiro momento, Bricker e colaboradores interpretaram esses achados de acordo com o seguinte raciocínio: 1) seria improvável que néfrons muito lesados pela doença crônica participassem de uma adaptação funcional tão vasta e tão complexa quanto a que haviam detectado; 2) os resultados obtidos em cães com nefropatia unilateral poderiam então estar indicando que somente os néfrons não atingidos pela doença contribuem para a função renal global, sendo desprezível a participação dos néfrons lesados. Em outras palavras, a notável adaptação observada nos cães com nefropatia unilateral constituiria, segundo Bricker, o resultado do ajuste, mais ou menos em uníssono, de uma reduzida po-
Fig. 36.4 Ritmo de filtração glomerular (RFG), excreção de amônio em valor absoluto (UNH4V) e fracionada pelo RFG (UNH4V/RFG) em cães com insuficiência renal crônica experimental. (Adaptado, com permissão, de Dorhout-Mees, E.J.; Machado, M.M.; Slatopolsky, E.; Klahr, S. e Bricker, N.S. J. Clin. Invest. 45:289, 1966.)
652
Insuficiência Renal Crônica (IRC)
pulação de néfrons poupados do processo mórbido. Essa teoria foi chamada de “teoria do néfron intacto”, sendo aceita durante alguns anos pela maioria dos investigadores nessa área. Após algum tempo, porém, a teoria do néfron intacto precisou ser revista. Embora seja verdade que nas doenças renais crônicas muitos néfrons estão excessivamente destruídos para poder contribuir para a função renal, é também perfeitamente possível uma participação, ainda que mais modesta, dos néfrons apenas parcialmente atingidos. Na verdade, alguns experimentos posteriores demonstraram que a indução de nefropatias crônicas leva a uma enorme variação das taxas de filtração glomerular por néfron. Não obstante, quando se estudaram néfrons individuais por micropunção, a atividade tubular (por exemplo a absorção proximal de sódio), e a FPN mantinham-se na mesma proporção: quando, por exemplo, a FPN caía a 10% do normal, também a taxa de absorção proximal de sódio se reduzia a 10%. Em néfrons com FPN duas vezes superior ao normal, a taxa de absorção de sódio também dobrava, e assim por diante.4 Por razões como essas, o próprio Bricker viria a modificar, já em fins da década de 60, o enunciado da hipótese que elaborara.5 De acordo com o novo enunciado, os néfrons que contribuem para a função renal comportam-se em sua maior parte, do ponto de vista do balanço glomérulo-tubular, como se fossem normais, mantendo a proporção entre carga excretada e carga filtrada mesmo em face de uma enorme heterogeneidade funcional. Em outras palavras, a própria denominação “teoria do néfron intacto” deixou de ser apropriada, embora tenha curiosamente sobrevivido até os dias de hoje. Bricker observava ainda que essa proporção entre glomérulo e túbulo (balanço glomérulo-tubular) pode alterar-se, “atendendo às mutáveis necessidades do organismo”. O que queria dizer isso? Voltemos ao modelo de nefropatia unilateral estudado por Bricker. Na fase III do modelo, após a retirada do rim são, a taxa de excreção de amônio elevava-se em desproporção à elevação do RFG. De acordo com o novo enunciado da teoria de Bricker, os néfrons remanescentes do rim lesado mantinham uma proporcionalidade entre função glomerular e tubular, mas a constante de proporcionalidade aumentava em favor dos túbulos, indicando que a sobrecarga funcional a estes últimos era maior. Qual seria a razão para esse comportamento? E o que teria isso a ver com as necessidades do organismo?
OS MECANISMOS DE ADAPTAÇÃO DO NÉFRON À PERDA PROGRESSIVA DE MASSA RENAL Vamos considerar em primeiro lugar o que acontece nos glomérulos. Conforme descrito acima (Fig. 36.1), a FPN aumenta nos modelos experimentais de insuficiên-
Pontos-chave: Para preservar a função renal em uma situação de perda crônica de néfrons: • A taxa de filtração por néfron aumenta até onde é fisicamente possível • A função tubular aumenta na medida exata necessária a atender às necessidades do organismo, até atingir o limite permitido pela capacidade funcional de suas células cia renal crônica, tais como a ablação de 5/6 do parênquima renal. Esse aumento ocorre à custa de uma elevação simultânea do fluxo plasmático glomerular e da diferença de pressão hidráulica transglomerular (⌬P). Ambas as alterações dependem de adaptações, tais como a dilatação das arteríolas glomerulares, devendo predominar a vasodilatação aferente. É evidente que a dilatação da arteríola aferente tem um limite máximo. Isso significa que tanto ⌬P como QA tendem a um valor máximo. Em outras palavras, o valor da FPN tem um teto, correspondente (no rato, onde tais medidas são possíveis) a cerca de três vezes o valor normal. E quanto à função tubular? Tomemos como exemplo a excreção de amônio. Como sabemos, o íon amônio (NH4⫹) é formado quando uma molécula de amônia (NH3), secretada pelos túbulos como parte do processo de acidificação de urina, liga-se a um próton (H⫹). A excreção de NH4⫹ deve necessariamente corresponder às necessidades do organismo, que gera ácido fixo continuamente e precisa eliminá-lo. A produção de ácido fixo pelo organismo não é afetada pelas doenças renais crônicas. Portanto, para que o organismo continue a eliminar a mesma quantidade de ácido dispondo de um número reduzido de néfrons, é necessário que em cada néfron remanescente os mecanismos de acidificação urinária, em especial a secreção de amônia, funcionem em ritmo superior ao normal.6 A taxa de excreção urinária de NH4⫹ por néfron aumenta na proporção necessária para que o tecido renal (isto é, o conjunto de néfrons sobreviventes) compense exatamente a produção de ácido fixo pelo organismo. Ou seja, é a necessidade deste, determinada por sua taxa metabólica, que vai ditar o ritmo de excreção urinária de NH4⫹. Portanto, enquanto a FPN aumenta até onde é fisicamente possível, a secreção de NH4⫹ por néfron remanescente vai aumentar na medida do necessário. É claro que aqui também existe um limite. Se a destruição de parênquima renal for suficientemente extensa, chegaremos a um ponto em que não mais será possível aumentar indefinidamente a secreção de NH3 e a excreção de NH4⫹, e o indivíduo passará a acumular H⫹. É por essa razão que, nas fases mais avançadas da IRC, os pacientes apresentam-se em acidose metabólica.
capítulo 36
653
O CONCEITO DE BALANÇO E SUA MANUTENÇÃO NA IRC — O BALANÇO DE SÓDIO Pontos-chave: • O balanço de sódio é mantido até as fases terminais da IRC • A fração excretada de sódio é inversamente proporcional ao RFG • Com frações de excreção de sódio baixas, a excreção de sódio pode ser ajustada exclusivamente no túbulo coletor • Frações de excreção de sódio mais altas exigem a participação de todos os segmentos do néfron na regulação da excreção de sódio Os conceitos discutidos acima com relação à secreção de NH4⫹ valem para praticamente todas as funções tubulares. No entanto, eles se tornam ainda mais claros quando consideramos a excreção de eletrólitos como sódio e potássio, cuja eliminação se faz quase exclusivamente através dos rins. Para compreender plenamente o que ocorre com esses íons na insuficiência renal crônica, é fundamental rever o conceito de balanço. Em uma situação estacionária, que é o que ocorre usualmente tanto em indivíduos sãos como nos pacientes com doença renal progressiva, a ingestão e a excreção desses íons devem equivaler-se, caso contrário haveria acúmulo ou depleção dos mesmos. Em outras palavras, o organismo mantém-se em balanço com relação a esses íons. Como em geral os hábitos alimentares variam muito pouco com o tempo, a ingestão desses íons tende a permanecer constante a longo prazo. Portanto, para que o balanço se mantenha, a excreção urinária (para simplificar, consideremos desprezível a excreção fecal ou através do suor) deve permanecer igual à ingestão, ainda que à custa de uma grande sobrecarga aos néfrons remanescentes. Em conseqüência, a fração excretada (ou seja, o quociente entre a taxa de excreção urinária e a carga filtrada)* de cada um dos solutos habitualmente eliminados pelo rim acaba sendo uma função inversa do RFG, conforme ilustrado na Fig. 36.5 (atenção: o RFG representa o ritmo de
*A carga filtrada (CF) é calculada como CF ⫽ RFG ⭈ [Na⫹], onde [Na⫹] é a concentração plasmática de sódio. Para uma [Na⫹] de 140 mEq/L e um RFG de 120 ml/min, a carga filtrada será de 120 ⭈ 140/1.000 ⫽ 16,8 mEq/ min ou ⬵ 24.000 mEq/dia. Em condições estacionárias, sem sudorese significativa, a carga excretada (CE) equivale à taxa de ingestão. Se esta for de 150 mEq/dia, a fração de excreção (FE%) será igual a 150/24.000 ⬵ 0,6%.
Fig. 36.5 A fração de excreção de qualquer soluto é uma função inversa do ritmo de filtração glomerular (RFG).
filtração dos rins como um todo. Ao contrário da FPN, o RFG cai progressivamente na insuficiência renal crônica), de tal modo que, com uma redução dessa taxa a 50% do normal, a fração excretada do soluto dobra; para uma redução a 10% do normal, a fração excretada eleva-se em 10 vezes, e assim por diante. Como o decréscimo do RFG corresponde a uma queda do número de néfrons, é evidente que, à proporção que a doença avança, aumenta a quantidade de cada soluto excretada por néfron, desde que, como é habitual, a taxa de ingestão desse soluto permaneça constante. Esse fenômeno tem importantes implicações fisiopatológicas. Consideremos por exemplo a regulação da excreção de sódio. Em um indivíduo normal, com dois rins, 2 ⫻ 106 néfrons e um RFG de 120 ml/min, uma taxa de ingestão de cloreto de sódio de 10 g/dia, equivalente a 150 mEq/dia do íon sódio, é perfeitamente balanceada por uma taxa de excreção urinária de igual valor, correspondente a uma fração de excreção muito baixa, de cerca de 0,6% (150 mEq/dia excretados para uma carga filtrada de 24.000 mEq/dia). Em condições normais, cerca de 90% da carga de sódio filtrada nos glomérulos são absorvidos no túbulo proximal (⬃65%) e na alça de Henle (⬃25%). Como o túbulo distal absorve outros 7%, restam apenas 3% da carga filtrada de sódio ao túbulo coletor. É no entanto esse segmento o principal responsável pelo ajuste fino da excreção de sódio,7 absorvendo 2,4% da carga filtrada e rejeitando os 0,6% restantes, que constituem precisamente a fração excretada de sódio no exemplo acima. Se o indivíduo passar a ingerir 20 g/dia (300 mEq de Na), uma taxa excessiva para os padrões habituais em nosso meio, o túbulo coletor ainda assim mantém o balanço de sódio simplesmente absorvendo 1,8% e excretando 1,2% da carga filtrada (300 mEq excretados para uma carga filtrada de
654
Insuficiência Renal Crônica (IRC)
24.000). Se a taxa de ingestão cair para 2 g/dia (30 mEq/ dia), a fração excretada de sódio cairá para 0,12% (30/ 24.000); para isso, o túbulo coletor precisa aumentar sua taxa de absorção para 2,88%. Esses ajustes finos requerem alterações sutis, praticamente imperceptíveis, do VEC. Em condições normais, esse mecanismo de sintonia fina dá conta de praticamente qualquer variação na ingestão de sódio, desde as exageradas, como em certas partes do Japão, onde pode chegar a 300 mEq/dia, até as baixíssimas, como a dos índios ianomâmis. Se no entanto o RFG sofrer uma queda muito acentuada, esse controle pode tornar-se problemático. Se por exemplo o RFG cair a 50% do normal (60/ml/min), mantendo-se a taxa de ingestão de sódio no valor habitual de 150 mEq/dia, a fração de excreção de sódio irá a 1,2% para manter o balanço (150 mEq/dia a serem excretados, enquanto a carga filtrada de sódio cai a 12.000 mEq/dia devido à queda do RFG). O túbulo coletor ainda é capaz de adaptar-se facilmente a essa situação, rejeitando 1,8% do sódio que lhe chega. Quedas ainda maiores do RFG, no entanto, tornam o funcionamento desse mecanismo cada vez mais difícil, até inviabilizá-lo.
O MECANISMO DE “TRADE-OFF” Pontos-chave: A manutenção do balanço de sódio na IRC tem um preço: • Há uma necessidade crescente de expandir o volume extracelular • Tanto a ingestão de sódio excessiva quanto a deficiente tendem a ser mal toleradas pelo organismo Se o processo de IRC estiver muito avançado, torna-se necessário elevar ainda mais a fração de excreção de sódio. Se o RFG já estiver reduzido, por exemplo, a 25% do normal, a FENa terá de subir a 2,4%. Isso exige que o túbulo coletor rejeite quase todo o seu aporte de sódio e pode deprimir a absorção de sódio em outros segmentos do néfron. Para que tal adaptação ocorra, é necessário que ocorra um certo grau de expansão, já clinicamente perceptível, do VEC. Quando o RFG se reduz ainda mais, o ajuste da taxa de excreção de sódio exclusivamente através do túbulo coletor torna-se evidentemente impossível, tornando necessária uma expansão cada vez mais acentuada do VEC, para forçar uma rejeição de sódio cada vez maior nas porções mais proximais do néfron. Na verdade, a expansão de VEC, com desenvolvimento de hipertensão e às vezes com formação de edema, é um preço que o organismo paga para manter o balanço de sódio em face de uma massa renal diminuída. Esse conceito de preço a pagar é
mais conhecido por sua designação em inglês, “trade-off” (que poderíamos traduzir por algo como “toma-lá-dá-cá” ou “negociação”). O “trade-off” é um dos mecanismos básicos de adaptação às nefropatias crônicas,8 aplicando-se não apenas ao processamento de sódio, mas ao de água e de vários outros íons, como veremos adiante. A relação inversa entre a fração de excreção de sódio e o RFG está representada pela linha sólida na Fig. 36.5. A situação pode agravar-se, com expansão ainda maior do VEC, se a ingestão de sódio for mais alta que o habitual, conforme ilustrado pela linha tracejada na Fig. 36.5. Por exemplo, um RFG de 20 ml/min exige uma fração de excreção de 4% para o sódio, o que já requer uma expansão considerável do VEC mesmo que a taxa de ingestão de sódio não ultrapasse 150 mEq/dia. Se essa taxa passar a 300 mEq/dia, será necessário elevar a fração de excreção de sódio a 8%, o que exige uma expansão muito maior do VEC, com graves conseqüências clínicas. Assim como a ingestão excessiva de sódio agrava a expansão do VEC na IRC, é possível facilitar a excreção de sódio reduzindo-se sua taxa de ingestão (linha pontilhada na Fig. 36.5). Na verdade, essa é uma das medidas terapêuticas adotadas nas fases mais avançadas da insuficiência renal crônica. No entanto, é preciso compreender que as alterações fisiopatológicas impostas pela redução crônica da massa renal terminam por limitar progressivamente a capacidade do rim de adaptar-se não apenas ao excesso, mas também à escassez de sódio, tal como ocorre em pacientes com diarréia e vômitos intensos, ou mesmo naqueles submetidos a tratamento prolongado com diuréticos. Em condições normais, o rim tem a capacidade de reduzir a quase zero, se necessário, a excreção urinária de sódio (como ocorre com os índios ianomâmis). Para economizar sódio a tal ponto, o néfron utiliza-se da capacidade do túbulo coletor de transportar solutos contra enormes gradientes eletroquímicos. Essa atividade é extremamente dificultada quando o túbulo coletor é inundado com a enorme sobrecarga de sódio decorrente do aumento da filtração por néfron e da rejeição de sódio nos segmentos anteriores do néfron (túbulo proximal e porção espessa da alça de Henle. Por essa razão, o paciente com IRC pode às vezes apresentar um aparente agravamento de sua condição em razão de um processo de desidratação que não ocorreria tão facilmente em um indivíduo normal. Essa inflexibilidade no processamento renal de sódio faz parte do preço a pagar pela manutenção da homeostase na IRC, constituindo-se portanto em um mecanismo de “trade-off”.
O BALANÇO DE ÁGUA A mesma disfunção que dificulta tanto aos rins adaptarse a variações na ingestão de sódio também leva a uma limitação importante na capacidade de concentrar a urina e de manter a tonicidade do meio interno. Para manter-se em
655
capítulo 36
Pontos-chave: • A capacidade de concentrar e a de diluir a urina diminuem progressivamente na IRC • Em conseqüência, a manutenção do balanço de água é dificultada, facilitando o estabelecimento de desidratação hipertônica ou de intoxicação hídrica em circunstâncias que seriam facilmente toleradas por indivíduos com função renal normal
funcionamento, o sistema de contracorrente medular, essencial à geração de urina hipertônica, exige um fluxo intratubular adequado, nem muito alto nem muito baixo.9 Como a taxa de filtração por néfron aumenta muito na IRC, e como a expansão do VEC deprime a absorção tubular de água e sódio, todos os segmentos do néfron acabam recebendo fluxos muito mais altos que o habitual, o que dificulta a manutenção do gradiente osmótico córtico-medular. Também contribui para limitar a concentração da urina a desorganização estrutural que acompanha a IRC, já que o sistema de contracorrente medular depende para o seu funcionamento de um arranjo anatômico preciso e altamente especializado. Em conseqüência dessa limitada capacidade de concentrar a urina, o paciente com IRC pode sofrer uma desidratação hipertônica em situações que seriam perfeitamente toleradas por um indivíduo normal, como por exemplo uma privação temporária de água em um dia muito quente. A capacidade renal de diluir a urina também torna-se limitada na IRC. É fácil entender a razão dessa limitação quando lembramos que o volume urinário máximo corresponde a cerca de 14% do RFG. Em um indivíduo normal, com um RFG de 120 ml/min, ou 170 L/dia, o volume urinário pode chegar, em condições extremas, a 170 ⫻ 0,14 ⬵ 24 L/dia, o que permite que até mesmo pacientes com distúrbios do centro da sede, que ingerem compulsivamente quantidades enormes de água, mantenham-se em balanço hídrico. Já em um paciente com IRC, com um RFG de 20 ml/min, por exemplo, o volume urinário máximo não ultrapassa 20 ⫻ 0,15 ⫽ 3 L/dia, o que pode levar a um balanço positivo de água e a uma intoxicação hídrica até mesmo com pequenos excessos na ingestão de líquidos. A limitação imposta pela IRC está ilustrada na Fig. 36.6, na qual a região cinzenta representa a faixa de osmolalidades (e fluxos) urinários tipicamente observada em pacientes com IRC avançada. É fácil perceber que tal paciente não poderá cometer grandes exageros em sua ingestão hídrica, mas também não poderá privar-se de líquidos por muito tempo. Voltamos novamente à questão do preço a se pagar: para atenuar a perda do RFG e manter o balanço de sódio, o rim é obrigado a sacrificar em parte sua capacidade de regular a excreção de água e manter o balanço hídrico.
Fig. 36.6 Representação esquemática da relação entre fluxo e concentração urinários. A área azul representa a faixa de osmolalidades urinárias (e de fluxos urinários) tipicamente observada em pacientes com IRC.
OS BALANÇOS DE POTÁSSIO E DE ÁCIDO NA IRC Pontos-chave: • O desenvolvimento de hiperpotassemia, transitória ou permanente, é necessário para a manutenção do balanço de potássio na IRC • A manutenção do balanço de ácido é possível enquanto os túbulos conseguem aumentar sua secreção de NH3 para compensar a perda de néfrons. Quando essa capacidade chega ao máximo, passa a ocorrer um balanço positivo de ácido fixo, que é tamponado pelos ossos, os quais se descalcificam lentamente Conforme observado anteriormente, o mecanismo de “trade-off” nas nefropatias crônicas estende-se a vários outros aspectos da função renal além da manutenção do balanço de sódio e de água. Por exemplo, a excreção de potássio fica limitada na IRC, uma vez que a excreção desse íon ocorre necessariamente por via renal. Os néfrons remanescentes são capazes de secretar e excretar quantidades enormes de potássio, que podem até mesmo superar a carga filtrada do íon. Para que isso ocorra, e para que se mantenha o balanço de potássio, é no entanto necessário que seus níveis séricos se elevem após uma refeição, especialmente se esta incluir quantidades apreciáveis de alimentos ricos em potássio, como frutas e verduras. Pequenas elevações da concentração plasmática de potássio
656
Insuficiência Renal Crônica (IRC)
são usualmente bem toleradas, mas elevações da ordem de 30% ou mais podem provocar conseqüências sérias, a mais importante das quais é o desenvolvimento de arritmias cardíacas. Ou seja, é necessário ao organismo correr o risco de uma disfunção cardíaca para manter o balanço de potássio, ilustrando mais uma vez o funcionamento do mecanismo de “trade-off”. A adaptação do organismo ao acúmulo de ácido fixo na IRC é outro exemplo do mecanismo de “trade-off”. Conforme observado acima, a excreção de NH4⫹ por néfron aumenta proporcionalmente à medida em que cai o número de néfrons.6 Há no entanto um limite para esse aumento, determinado pela disponibilidade de enzimas, substrato e cofatores necessários à biossíntese de NH3. Quando esse limite é atingido, qualquer queda ulterior no número de néfrons faz diminuir a eliminação renal de ácido fixo, levando assim a um acúmulo desse ácido no organismo. Na ausência de outra alternativa, o excesso de ácido fixo acaba sendo tamponado pelo tecido ósseo, que se vai descalcificando progressivamente. Esse processo de descalcificação, denominado osteomalácia, leva a um enfraquecimento ósseo, com conseqüente predisposição a fraturas. A osteomalácia é um dos preços a pagar na IRC para a manutenção da homeostase.
OS BALANÇOS DE CÁLCIO E DE FOSFATO NA IRC — A OSTEODISTROFIA RENAL Pontos-chave: • Na IRC avançada, há uma tendência à hipocalcemia devido a uma deficiência da forma ativa da vitamina D • A hipocalcemia leva a um hiperparatiroidismo secundário, que provoca descalcificação e destruição ósseas • Na fase terminal da IRC, e em pacientes já dependentes de diálise, a hiperfosfatemia agrava ainda mais o hiperparatiroidismo, além de facilitar a calcificação de tecido não-ósseo Infelizmente, a osteomalácia não é o único processo de agressão ao tecido ósseo a ocorrer na IRC. Conforme observado acima, o rim exerce algumas funções endócrinas, uma das quais é a biossíntese da forma ativa da vitamina D [1,25-(OH)2 vitamina D3] a partir de um precursor sintetizado no fígado. Na IRC, a perda progressiva de massa renal leva a uma queda dos níveis circulantes de 1,25-(OH)2 vitamina D3 e, portanto, a uma drástica redução da absor-
ção intestinal de cálcio. A tendência resultante à hipocalcemia leva ao estabelecimento de um quadro de hiperparatiroidismo secundário, que permite manter o cálcio plasmático em níveis normais ou pouco reduzidos à custa de uma mobilização das reservas ósseas e do estabelecimento de um balanço negativo de cálcio.10 Portanto, o preço dessa adaptação é uma progressiva descalcificação óssea, uma vez que o paratormônio (PTH) vai buscar no reservatório ósseo o cálcio que deveria provir da absorção intestinal. Para agravar ainda mais a situação, os pacientes com IRC avançada e, especialmente, aqueles já dependentes de diálise crônica apresentam grande retenção de fosfato (Fig. 36.7), porque a taxa de excreção desse íon é grosseiramente proporcional ao RFG, e também porque sua absorção intestinal é muito menos dependente de vitamina D do que a de cálcio. A elevação dos níveis séricos de fosfato faz aumentar o produto cálcio ⫻ fosfato acima do nível crítico de 70 mg/dl,2 o que tende a provocar uma queda recíproca na concentração plasmática de cálcio, estimulando ainda mais a secreção de PTH e agravando ainda mais o hiperparatiroidismo. A ação combinada desses mecanismos — a carência de vitamina D, o hiperparatiroidismo secundário, a acidose e a hiperfosfatemia — associada a alguns mecanismos intrínsecos ao próprio tecido ósseo, levam a uma osteopatia característica, denominada osteodistrofia renal. Em grande parte, portanto, a osteodistrofia renal resulta da ação de um mecanismo — ou de vários mecanismos combinados — de “trade-off”. Outra conseqüência do distúrbio do metabolismo de cálcio na IRC avançada ou terminal é a precipitação de fosfato de cálcio em tecidos não-ósseos, especialmente as paredes vasculares.11 Esse processo pode ter conseqüências graves, como por exemplo a obstrução coronariana. Quando a precipitação de fosfato de cálcio ocorre no próprio tecido renal, desenvolve-se um processo de nefrocalcinose, no qual a deposição de sais de cálcio associa-se a um
Fig. 36.7 Representação esquemática do comportamento na IRC das concentrações plasmáticas de cálcio ([Ca⫹⫹]), fosfato ([HPO4⫺⫺]) e paratormônio ([PTH]) conforme o RFG se vai reduzindo.
capítulo 36
processo inflamatório, que leva à destruição de parênquima e agrava ainda mais o próprio quadro de insuficiência renal crônica. A calcificação de tecidos não-ósseos é conseqüência da hiperfosfatemia, inevitável nesses pacientes, já que 1) é muito difícil restringir a ingestão de fosfato e 2) não há outra via para a eliminação do fosfato que não a renal. A hiperfosfatemia por si só não teria maiores conseqüências se a concentração sérica de cálcio pudesse baixar reciprocamente. Isso, no entanto, não pode ocorrer, uma vez que a concentração de cálcio deve ser mantida dentro de limites estreitos para que os tecidos excitáveis, principalmente o músculo cardíaco, funcionem adequadamente. Por essa razão, o PTH defende tenazmente a calcemia, ainda que à custa de descalcificação óssea e da manutenção de um produto cálcio ⫻ fosfato cronicamente elevado, mais uma vez em obediência ao mecanismo de “trade-off”. Até mesmo a atuação do médico, a quem se recomenda prescrever suplementação de cálcio e vitamina D a esses pacientes, pode acabar contribuindo para agravar a situação. Nos pacientes dependentes de diálise o quadro é ainda mais crítico, uma vez que a função renal é apenas residual e nenhuma das modalidades existentes de diálise é muito eficiente na remoção de fosfato do organismo.
A NATUREZA PROGRESSIVA DA IRC: CONSEQÜÊNCIA DO “TRADE-OFF”? Pontos-chave: • A hipertensão glomerular nos néfrons remanescentes tende a perpetuar a lesão renal crônica • O efeito da hipertensão glomerular requer a participação de vários eventos celulares e a liberação de citocinas, quimiocinas e fatores de crescimento • A progressão das nefropatias crônicas envolve a presença de uma série de eventos inflamatórios, como a infiltração por linfócitos, macrófagos e fibroblastos, e a produção anômala de matriz extracelular Os mecanismos de adaptação descritos acima permitem que o organismo resista admiravelmente e por muito tempo a reduções drásticas do número de néfrons. Infelizmente, essa situação não se mantém por tempo indefinido. Com maior ou menor rapidez, a totalidade dos pacientes com doença renal crônica acaba, a partir de um certo nível de destruição renal, progredindo à fase terminal, na qual se
657
torna necessário submeter o paciente a diálise crônica ou transplante renal. As razões para essa natureza progressiva da IRC ainda não estão claras. Uma série de evidências, no entanto, sugerem que essa progressão é na verdade, também ela, o preço a se pagar pela relativa preservação da função renal em face da progressiva destruição de néfrons. Conforme verificamos anteriormente, a elevação da taxa de filtração glomerular por néfron faz-se acompanhar (na verdade resulta) de elevações do fluxo plasmático glomerular e da diferença de pressão hidráulica transglomerular. Diversas evidências experimentais sugerem que essas alterações da dinâmica glomerular, particularmente a elevação da pressão hidráulica intraglomerular (Fig. 36.2), acabam lesando os glomérulos remanescentes, contribuindo assim para a progressão da doença renal. É possível que isso se deva a uma ação mecânica direta dessa hipertensão intracapilar sobre as delicadas paredes do glomérulo, aumentando a tensão mecânica a que são submetidas e dando início a uma série de fenômenos de natureza inflamatória. A agressão “mecânica” ao glomérulo pela hipertensão glomerular não é suficiente para explicar a lesão crônica do parênquima renal associada à IRC. Outros mecanismos não “mecânicos”, ou seja, não diretamente relacionados ao estiramento das paredes glomerulares, parecem essenciais à perpetuação e propagação desse processo. Incluem-se entre esses fatores: 1) Hipertrofia glomerular. O aumento das dimensões glomerulares é observado nos modelos experimentais de glomerulopatia com freqüência semelhante à da hipertensão glomerular. Essas observações levaram à hipótese de que é a hipertrofia glomerular, e não o aumento da pressão intracapilar, que leva ao desenvolvimento das glomerulopatias progressivas. Admite-se hoje que a hipertrofia glomerular também leva a uma lesão mecânica, aumentando a tensão na parede glomerular em obediência à lei de La Place, segundo a qual a tensão mecânica na parede de uma estrutura cilíndrica ou esférica é diretamente proporcional não somente à diferença de pressão hidráulica através de suas paredes, como também a seu raio. 2) Formação de microtrombos intracapilares. A idéia de que a progressiva cicatrização do glomérulo pode ser devida a um processo de coagulação intracapilar não é nova. Desde a década de 40 têm surgido estudos sugerindo que o tratamento de glomerulopatias crônicas com drogas anticoagulantes limita o desenvolvimento de lesões progressivas. Outros estudos chegaram a demonstrar a presença de agregados plaquetários em associação com o desenvolvimento de glomerulopatias progressivas. É possível que pelo menos em alguns casos a formação desses microtrombos resulte de uma elevação acentuada da pressão glomerular, com lesão endotelial, exposição de colágeno e ativação local de plaquetas. 3) Proliferação exagerada de células glomerulares. Novamente em analogia com a patogênese da aterosclerose, uma série de evidências sugere que as glomerulopatias progressivas acompanham-se de um aumen-
658
Insuficiência Renal Crônica (IRC)
to na taxa de proliferação de células mesangiais. É provável que uma série de fatores mitogênicos, tais como o fator de crescimento derivado de plaquetas (conhecido por seu acrônimo em inglês, PDGF), participe desse processo ativando a multiplicação celular. Em consistência com esse conceito, demonstrou-se recentemente que a transfecção de rins de rato com o gene que regula a produção do PDGF leva ao rápido desenvolvimento de uma glomerulosclerose caracterizada por grande proliferação mesangial. Aqui também pode ocorrer uma interação complexa entre vários dos fatores patogênicos aqui enumerados, uma vez que a formação de microtrombos (que por sua vez pode ser desencadeada pela hipertensão glomerular) pode acarretar a produção anômala de PDGF, levando à proliferação mesangial e à glomerulosclerose. 4) Produção excessiva de matriz mesangial. Em condições normais, a taxa de produção de matriz extracelular pelas células mesangiais equivale exatamente à sua taxa de catabolização. Nas glomerulopatias progressivas, a produção de matriz pode estar acentuadamente aumentada, levando ao seu acúmulo e à expansão da área mesangial. Vários investigadores acreditam ser esse um dos principais mecanismos que levam à esclerose glomerular e à obsolescência dos glomérulos. A expansão mesangial é por exemplo um dos achados mais freqüentes nas glomerulopatias diabéticas, podendo inclusive anteceder em vários anos o aparecimento das lesões características dessa enfermidade. A transfecção de rins de ratos com o TGF (sigla em inglês de Transforming Growth Factor ) leva ao desenvolvimento de um processo de glomerulosclerose difusa, com grande crescimento da área mesangial. De novo, pode ocorrer aqui uma interação entre vários fatores potencialmente lesivos ao glomérulo: há evidências de que a distensão anômala das paredes glomerulares pode estimular a produção de TGF, constituindo assim mais um mecanismo pelo qual a hipertensão glomerular pode iniciar uma glomerulopatia progressiva. 5) Deposição glomerular de lípides. A patogênese das glomerulopatias progressivas tem vários pontos em comum com a da aterosclerose. É possível demonstrar a presença de lípides em glomérulos esclerosados obtidos de ratos com diabetes mellitus ou remoção cirúrgica de massa renal, modelos experimentais caracterizados pelo desenvolvimento de glomerulopatia progressiva. Além disso, a hipercolesterolemia promove um agravamento dessas lesões, enquanto o tratamento com drogas hipolipemiantes as previne. É provável que o acúmulo glomerular de lípides, especialmente as lipoproteínas de baixa densidade (LDL), leve à ativação de macrófagos e, em conseqüência, à estimulação de leucócitos e à produção de interleucinas e fatores de crescimento. Outras evidências sugerem ainda que, de novo em analogia com a aterosclerose, ocorre no glomérulo uma forte interação entre a deposição glomerular de lípides e a hipertensão intracapilar. 6) Estiramento de células endoteliais e mesangiais. Na ablação de 5/6 da massa renal, um modelo experimental de IRC em que a pressão
hidráulica glomerular sofre grande elevação, demonstrouse que as células endoteliais produziam um excesso de TGF, angiotensinogênio, fibronectina e laminina várias semanas antes do aparecimento da glomerulosclerose. Esses achados sugerem que a hiperatividade das células endoteliais pode ser uma das pontes entre a agressão mecânica ao glomérulo e o processo inflamatório subseqüente. Outras evidências sugerem que também as células mesangiais respondem a estímulos mecânicos. O estiramento cíclico de células mesangiais cultivadas estimula sua multiplicação, bem como sua atividade metabólica, estimada pela biossíntese de prostaglandinas e pela produção de colágeno, fibronectina e laminina, componentes tipicamente associados à matriz mesangial. 7) Lesão de podócitos. Devido ao alto grau de diferenciação do podócito, sua capacidade proliferativa é limitada. Por essa razão, o epitélio glomerular pode ser incapaz de se adaptar à expansão do tufo glomerular (resultante da própria hipertrofia glomerular e da hipertensão intracapilar), podendo sofrer ruptura ou necrose, desprendendo-se da membrana basal e dando origem a pelo menos três conseqüências: a) Deposição de material protéico na região subendotelial. O descolamento do podócito pode acarretar um aumento localizado da taxa de ultrafiltração, que arrasta consigo grandes quantidades de moléculas protéicas. Na presença de uma membrana basal competente, no entanto, grande parte dessas moléculas pode ficar retida, acumulando-se no espaço subendotelial sob a forma de depósitos análogos aos observados em algumas glomerulonefrites de origem imunológica, podendo originar um processo inflamatório no glomérulo. b) Formação de sinéquias. Em certos modelos de glomerulosclerose focal e segmentar, a lesão glomerular propriamente dita é precedida por microaderências do tufo glomerular ao folheto parietal da cápsula de Bowman. Essas sinéquias podem ser uma conseqüência direta da ruptura de podócitos, sendo esta por sua vez resultante da incapacidade dessas células em regenerar-se quando submetidas a uma agressão. Esse processo evolui com a formação de aderências cada vez mais extensas, chegando à esclerose global do tufo glomerular. c) Atrofia glomerular. As sinéquias formadas em conseqüência da lesão podocítica descrita acima podem levar ao extravasamento do filtrado glomerular, através do “ponto fraco” assim formado, em direção ao interstício periglomerular. Esse extravasamento é limitado por uma reação inflamatória periglomerular e pela formação de uma “cápsula” fibrosa ao redor do túbulo. Esse processo inflamatório crônico pode fazer com que a pressão hidráulica peritubular se eleve o suficiente para comprimir o túbulo, resultando em uma obstrução daquele néfron e em uma progressiva atrofia glomerular. 8) Inflamação renal. Em sua quase totalidade, os mecanismos descritos convergem para uma infiltração de macrófagos, linfócitos, fibroblastos e miofibroblastos, com produção excessiva de colágeno e outros componentes da matriz extracelular, configurando a existência de um
659
capítulo 36
processo inflamatório crônico. A inflamação é um processo em princípio destinado a defender o organismo contra a invasão por microrganismos. Na grande maioria das vezes, esse processo é bem-sucedido e autolimitado, detendo-se assim que a infecção é debelada. Na doença renal progressiva, esses mesmos mecanismos de defesa são ativados de maneira anômala e não cessam espontaneamente. Isso pode ocorrer por um estímulo de natureza imune, como na nefropatia por IgA e na glomerulonefrite membrano-proliferativa, ou não-imune, como na esclerose segmentar e focal e na nefropatia diabética. Em qualquer caso, a infiltração do tecido renal por linfócitos e monócitos, a expressão aumentada de moléculas de adesão e a síntese exagerada de matriz extracelular constituem uma via comum, de natureza inflamatória, que contribui decisivamente para a destruição progressiva do parênquima renal. A caracterização das nefropatias progressivas como um processo inflamatório crônico pode auxiliar substancialmente na compreensão da patogênese da IRC e servir de base para a instituição de novos esquemas terapêuticos baseados no uso de antiinflamatórios. Alguns estudos experimentais e clínicos sugerem que o uso de drogas antilinfocíticas e antiproliferativas, como o micofenolato mofetil, pode atenuar significativamente a progressão das nefropatias crônicas. 9) Nefrocalcinose. Conforme observado acima, a manutenção de um produto cálcio ⫻ fosfato cronicamente elevado tende a promover a precipitação extra-óssea de fosfato de cálcio. No rim, isso pode dar início a um processo inflamatório que se soma ao engendrado pelos demais fatores de agressão, contribuindo assim para a progressão da nefropatia. 10) Proteinúria maciça. A perda parcial da função de barreira do glomérulo leva à filtração de uma quantidade de proteínas 2 ou 3 ordens de magnitude superior à habitual, obrigando as células do túbulo proximal a aumentar tanto quanto possível sua taxa de absorção. Essa intensa atividade, que envolve a formação de endossomas e a hidrólise das proteínas absorvidas, pode estimular a síntese de mediadores capazes de atrair linfócitos e macrófagos ao local, gerando ou agravando um processo inflamatório crônico. 11) Agravamento da sobrecarga aos néfrons remanescentes. A perda continuada de néfrons acarreta uma sobrecarga hemodinâmica às unidades restantes (Fig. 36.2), que devem compensar a ausência das que foram destruídas. Essa sobrecarga leva à destruição de mais néfrons, colocando em movimento um ciclo vicioso que culmina com a perda da maior parte do parênquima renal. Esse processo desenvolve-se até mesmo nas doenças renais de origem imunológica, nas quais, é claro, o número de néfrons também se reduz progressivamente. Sejam quais forem os mecanismos envolvidos na patogênese das glomerulopatias progressivas, tudo indica que se trata de um processo multifatorial e extremamente complexo, envolvendo numerosas interações entre os diferentes fatores que dele participam. A elucidação desses fatores e de suas interações é vital para que se compreendam
plenamente as nefropatias progressivas e se desenvolvam os meios adequados para detê-las.
CONCLUSÕES Nas doenças que acarretam uma perda progressiva de néfrons, as unidades remanescentes são capazes de adaptar-se de modo extremamente eficiente, continuando a manter a homeostase praticamente até os estádios terminais do processo. Essa adaptação tem no entanto um preço: para preservar cada um dos balanços pelos quais é responsável, o rim gera um desequilíbrio ou disfunção que, a longo prazo, contribui para debilitar o indivíduo e comprometer sua qualidade de vida. É possível que a própria natureza progressiva da IRC seja o preço a pagar pela surpreendente capacidade adaptativa dos néfrons remanescentes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
MACKENZIE, H.S.; TAAL, M.W.; LUYCKX, V.A.; BRENNER, B.M. Adaptation to nephron loss. In: Brenner & Rector’s The Kidney, 6th ed., 2000. W.B. Saunders Company, Philadelphia, Pensilvania, USA, pp. 1901-1929. 2. BRICKER, N.S.; KLAHR, S.; RIESELBACH, R. The functional adaptation of the diseased kidney. 1. Glomerular filtration rate. J. Clin. Invest. 1964; 43:1915. 3. DORHOUT MEES, E.J.; MACHADO, M.; SLATOPOLSKY, E.; KLAHR, S.; BRICKER, N.S. The functional adaptation of the diseased kidney. 3. Ammonium excretion. J. Clin. Invest. 1966; 45:289-96. 4. ICHIKAWA, I.; HOYER, J.R.; SEILER, M.W.; BRENNER, B.M. Mechanism of glomerulotubular balance in the setting of heterogeneous glomerular injury. Preservation of a close functional linkage between individual nephrons and surrounding microvasculature. J. Clin. Invest. 1982; 69:185-98. 5. BRICKER, N.S. On the meaning of the intact nephron hypothesis. Am. J. Med. 1969 Jan; 46:1-11. 6. ZATZ, R. Insuficiência renal crônica. In: Zatz, R. Fisiopatologia Clínica, vol 2: Fisiopatologia Renal, 2000. Atheneu, Rio de Janeiro, pp. 201-225. 7. STEIN, J.H.; KIRSCHENBAUM, M.A.; BAY, W.H.; OSGOOD, R.W.; FERRIS, T.F. Role of the collecting duct in the regulation of sodium balance. Circ. Res. 1975; 36:119-24. 8. BRICKER, N.S. On the pathogenesis of the uremic state. An exposition of the “trade-off hypothesis”. N. Engl. J. Med. 1972:1093-9. 9. SANDS, J.M.; KOKKO, J.P. Countercurrent system. Kidney Int. 1990; 38:695-9. 10. SLATOPOLSKY, E.; DELMEZ, J.A. Pathogenesis of secondary hyperparathyroidism. Nephrol. Dial. Transplant. 1996; 11 Suppl 3:130-5. 11. DAVIES, M.R.; HRUSKA, K.A. Pathophysiological mechanisms of vascular calcification in end-stage renal disease. Kidney Int. 2001; 60:472-9. 12. BRENNER, B.M. Nephron adaptation to renal injury or ablation. Am. J. Physiol. 1985; 249:F324-37. 13. ZATZ, R. e FUJIHARA, C.K. Mecanismos de progressão das glomerulopatias progressivas. In: Soares, V.; Alves, M.A.R. e Barros R.T. Glomerulopatias: patogenia, clínica e tratamento. Sarvier, 1999, pp. 250-260.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.niddk.nih.gov/fund/reports/womenrd/ poster12.htm
660
Insuficiência Renal Crônica (IRC)
National Institute of Diabetes and Digestive Kidney Diseases. National Institute of Health — pôsteres selecionados. http://www.outlinemed.com/demo/nephrol/11244.htm Overview. http://www.thekidney.com/crf.htm Site educativo para pacientes com insuficiência renal. http://www.merck.com/pubs/mmanual/section17/ chapter222/222c.htm Manual Merck. http://www.nephrologychannel.com/crf/treatment.shtml Nephrology Channel.
http://www.uninet.edu/cin2001/conf/basilia.en.html Conferência no Congresso Internacional de Nefrologia pela Internet. http://www.nephron.com/lowpro.html The Nephron Information Center. http://www.speedyvet.com/Learningcentre/course2/ 8_1crf.htm http://www.sin-italia.org/jnonline/sommw2.htm Journal of Nephrology — Itália. http://www.mdbrowse.com/Speciality/Medicine/ ChronicRenalFailure.htm
Capítulo
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
37
Miguel C. Riella e Roberto Pecoits-Filho
INTRODUÇÃO NOVOS CONCEITOS: CLASSIFICAÇÃO E ESTRATIFICAÇÃO Classificação de nefropatia crônica INCIDÊNCIA, PREVALÊNCIA E CAUSAS Incidência e prevalência Causas DESTRUIÇÃO DE NÉFRONS — CONSEQÜÊNCIAS
Moléculas médias 2-Microglobulina Hormônio paratireóideo Acidose metabólica Fosfatos orgânicos Novos componentes identificados como potenciais toxinas urêmicas Sinais e sintomas da uremia
A hipótese do néfron intacto Adaptações
Relacionados com distúrbios hidroeletrolíticos e ácidobásico
A hipótese trade-off: história e conceitos atuais Conceitos e interpretações atuais da teoria trade-off
Relacionados com toxinas urêmicas, distúrbios metabólicos e endócrinos
Adaptações intra-renais Função glomerular
Produtos nitrogenados Necessidades de nitrogênio na uremia
Função tubular Excreção de sódio
COMO INVESTIGAR O PACIENTE COM INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA
Limitações na excreção de sódio Excreção de água
MANEJO DO PACIENTE COM INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA
Ácido-básico Cálcio, fósforo e magnésio Potássio PROGRESSÃO DA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA A SÍNDROME URÊMICA Patogenia Toxinas urêmicas Uréia Guanidinas Sulfato de indoxil
Princípios gerais Manejo conservador do paciente com insuficiência renal crônica Controle da progressão da nefropatia Balanço hidroeletrolítico DIÁLISE — QUANDO INDICAR? TRANSPLANTE RENAL — QUANDO INDICAR? REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Mioinositol
INTRODUÇÃO Dentre as diversas enfermidades que acometem o rim, podemos observar que algumas comprometem a função renal rapidamente, enquanto outras o fazem de uma manei-
ra lenta, mas progressiva. Apesar das diferenças na progressão da insuficiência renal crônica (IRC), o resultado final são múltiplos sinais e sintomas comuns decorrentes da incapacidade do rim de manter a homeostasia interna. No início, quando a função renal está modestamente comprometida, o paciente apresenta-se assintomático, a
662
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
não ser que a causa básica produza sintomas evidentes de infecção urinária ou de comprometimento sistêmico. A uréia plasmática eleva-se, mas permanece ainda dentro da faixa de normalidade. Deve-se salientar que a uréia plasmática depende muito da ingesta protéica. Se a ingesta protéica for elevada, em face de uma redução moderada da função renal, já poderemos notar uma uréia plasmática acima da faixa de normalidade. Naturalmente, a creatinina plasmática é um indicador mais fiel da função renal residual, porém também pode variar dependendo da massa muscular de cada indivíduo. Se a creatinina plasmática inicial de determinado paciente for de 1 mg/100 ml, uma elevação desta para 2 mg/100 ml aproximadamente indica uma redução da função renal em 50%. Nesta primeira fase, de diminuição da função renal, embora haja uma redução da filtração glomerular (redução de 25%), não há habitualmente azotemia, e os balanços de sódio, potássio, cálcio, fósforo e ácido-básico são mantidos graças a um aumento do processo funcional adaptativo dos néfrons remanescentes. Acredita-se que nesta fase vários fatores interagem para produzir esclerose glomerular progressiva e fibrose intersticial: hipertensão intraglomerular (v. Cap. 36), deposição de lipídios, fatores de crescimento (fator de crescimento epidermal, fator de crescimento derivado de plaquetas, etc.), citocinas (interleucina-1, interleucina-6, fator α de necrose tumoral), hormônios (angiotensina II e endotelina). As alterações histológicas são acompanhadas de um aumento progressivo de proteinúria e azotemia. Numa segunda fase (renal insufficiency), há uma redução da função renal de até 75% e o rim já não é capaz de manter a homeostasia interna. O paciente apresenta nictúria, a qual reflete o distúrbio na concentração urinária; ocorre anemia e uma moderada elevação da uréia plasmática (azotemia).1 Numa terceira fase, as anormalidades do meio interno são mais persistentes: azotemia intensa, anemia, acidose metabólica, hiperfosfatemia, hipercalcemia e hiponatremia. A função renal geralmente está abaixo de 20% (renal failure). A quarta fase é a fase terminal, em que predominam os sintomas e sinais de uremia (síndrome urêmica), indicando a necessidade de uma terapia substitutiva na forma de diálise ou transplante.
NOVOS CONCEITOS: CLASSIFICAÇÃO E ESTRATIFICAÇÃO A National Kidney Foundation (NKF) lançou em 1995 o DOQI (Dialysis Outcomes Quality Initiatives — Resultados em Diálise, Iniciativas de Qualidade) que são orientações para a prática clínica dirigida a pacientes em diálise e profissionais da área da saúde. (http://www.kidney.org) As orientações foram publicadas em 1997 e tiveram um impacto significativo no cuidado e nos resultados de pacientes em diálise. As orientações DOQI foram traduzidas em mais de doze línguas e muitas estratégias de manejo foram adotadas em muitos países. Através destas orientações desenvolveram-se muitas medidas de performance clínica. Ficou logo evidente para a NKF que os resultados em diálise poderiam ser melhores, assim como de todos os pacientes com insuficiência renal crônica, nas diferentes fases, desde que a saúde dessa população pudesse ser melhorada. Em 1999 a NKF expandiu a iniciativa original numa nova fase, englobando todo o espectro de doença renal, quando intervenções precoces e medidas apropriadas poderiam evitar a perda de função renal em alguns, retardar a progressão em muitos outros e melhorar a disfunção orgânica e condições co-mórbidas naqueles pacientes que progridem para uma insuficiência renal terminal. O novo projeto passou a chamar-se K/DOQI (Kidney Disease Outcomes Quality Initiatives — Resultados em Nefropatia, Iniciativas de Qualidade). Há evidências recentes de que os maus resultados da nefropatia crônica, como a insuficiência renal, doença cardiovascular e morte prematura, podem ser prevenidos ou retardados. Fases precoces da insuficiência renal podem ser detectadas através de exames laboratoriais. O tratamento de fases iniciais da nefropatia crônica é efetivo no retardo da progressão para insuficiência renal. O tratamento de fatores de risco cardiovasculares nessas fases iniciais pode reduzir as complicações cardiovasculares antes e depois do aparecimento de insuficiência renal. Definição de nefropatia crônica
Pontos-chave: • A progressão da insuficiência renal ocorre de forma diversa, mas os sinais e sintomas são comuns e variam de acordo com a severidade da disfunção renal • Nas fases mais precoces, o organismo consegue adaptar-se e os sintomas são escassos, porém em fases mais tardias os sintomas são intensos
Critérios 1. Lesão renal por 3 ou mais meses, definida por anormalidades estruturais ou funcionais do rim, com ou sem diminuição da taxa de filtração glomerular e manifestada por: • Anormalidades patológicas; ou • Marcadores de lesão renal, incluindo anormalidades na composição do sangue ou urina, ou anormalidades nos testes de imagem. 2. TFG 60 mlminuto/1,73 m2 por 3 meses com ou sem lesão renal. TFG: taxa de filtração glomerular.
663
capítulo 37
Classificação de Nefropatia Crônica O quadro a seguir mostra os estádios de nefropatia crônica, incluindo a população sob risco de desenvolvê-la, e ações para evitar a evolução para nefropatia crônica e melhorar os resultados em cada estádio.
entram no programa dialítico por ano, é estimada em 70 por milhão, o que indicaria uma entrada de 11.900 pacientes novos por ano em tratamento dialítico. Estes dados revelam que no Brasil possivelmente um grande número de pacientes não está sendo identificado a tempo de receber o tratamento indicado.
Causas
Nefropatia crônica (NC): estádios e planos de ação Estádio Descrição Sob risco elevado
TFG (ml/min/1,73 m2) 90 (com fatores de risco para nefropatia crônica) 90
1
Lesão renal com TFG normal ou앖
2
Lesão renal com discreta앗TFG 앗TFG moderada
60-89
4
앗TFG grave
15-29
5
Insuficiência renal
15 ou diálise
3
30-59
Plano de ação Screening, redução do risco de NC
Diagnóstico e tratamento; tratamento de condições co-mórbidas; reduzindo a progressão; redução de risco cardiovascular. Estimando a progressão Avaliação e tratamento de complicações Preparando para a terapia renal substitutiva Terapia substitutiva (se uremia presente)
INCIDÊNCIA, PREVALÊNCIA E CAUSAS Incidência e Prevalência O Registro Americano revela uma incidência em 2001 de 308 pacientes por milhão de habitantes e uma prevalência (número de pacientes recebendo tratamento dialítico) de cerca de 1.200 pacientes/milhão. Estes números apresentam grande variação de acordo com o país. O Japão apresenta a maior prevalência de pacientes em tratamento dialítico, com cerca de quase 1.600 pacientes/milhão. Desde 1984, o crescimento anual de pacientes em diálise nos Estados Unidos tem sido de 8,7%. Infelizmente não há dados fidedignos no Brasil sobre a incidência e a prevalência de insuficiência renal crônica terminal. De acordo com o censo realizado pela Sociedade Brasileira de Nefrologia, cerca de 49.000 pacientes encontravam-se em tratamento dialítico no Brasil ao final do ano de 2001. Se considerarmos a população total estimada no censo de 2000 de 170 milhões de habitantes, o Brasil apresenta uma prevalência de 288 pacientes por milhão de habitantes. A incidência, ou seja, o número de pacientes que
Novamente não temos dados precisos sobre as principais causas de IRC no Brasil. De acordo com o Registro LatinoAmericano de Diálise e Transplante publicado em 1997, a principal causa de IRC no Brasil era a glomerulonefrite crônica (24%), seguida de hipertensão arterial (22%) e diabetes mellitus (15%).2 Dados do Registro Americano de 2001 indicam que nos Estados Unidos a principal causa de IRC terminal é o diabetes mellitus (43%), seguida de hipertensão arterial (26%) e glomerulonefrites (10%) (v. Quadro 37.1 ).
Pontos-chave: • A IRC é uma doença comum, com múltiplas causas, e com rápido crescimento na sua prevalência • Principalmente em países desenvolvidos, diabetes e hipertensão arterial passaram a ser as principais causas de IRC, aumentando a morbi-mortalidade dos pacientes
A maior incidência de glomerulonefrite crônica como causa de IRC terminal é típica de países subdesenvolvidos, afetando uma população mais jovem. Nos países desenvolvidos vemos que a média de idade dos diabéticos e hipertensos em diálise é significativamente maior.
Quadro 37.1 Principais nefropatias causadoras de IRC* Doença primária
Idade média (anos)
Diabete Hipertensão Glomerulonefrites (GN) Nefrite intersticial/pielonefrite Doenças císticas GN secundárias/vasculites Neoplasias/tumores Miscelânea Desconhecidas Sem informação *USRDS Data, 2002.
64 70 55 66 51 47 69 58 69 56
Percentual (%) 43,7 26,3 9,4 3,8 3,0 2,3 1,9 3,9 3,9 1,8
664
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
DESTRUIÇÃO DE NÉFRONS — CONSEQÜÊNCIAS A Hipótese do Néfron Intacto Quando ocorre uma enfermidade renal, néfrons normais são lesados, de forma que a homeostasia do meio interno depende da capacidade desta população heterogênea de néfrons (normais e lesados) em controlar a excreção de água e solutos. A hipótese do néfron intacto de Bricker se baseia em estudos experimentais de doença renal unilateral.3 Os achados sugeriram na época que o rim lesado era capaz de ajustar-se à doença de forma a manter uma proporção mais ou menos constante entre a função glomerular e a função tubular (balanço glomérulo-tubular) (v. também Cap. 36). Bricker na época achava que os néfrons lesados pela doença crônica não participavam na adaptação funcional e somente os néfrons normais contribuíam para a função renal global. Experimentos posteriores no entanto confirmaram que néfrons lesados contribuíam para a função renal, comportando-se do ponto de vista glomérulo-tubular como se fossem normais, isto é, mantendo a proporção entre carga excretada e filtrada.
Adaptações (v. também Cap. 36) Foi também Bricker quem sugeriu que os mecanismos de adaptação variam com a natureza do soluto.3,4 Assim, a excreção da uréia e da creatinina depende da concentra-
ção sérica e da filtração glomerular. A creatinina é filtrada e não sofre reabsorção tubular. Apenas com níveis plasmáticos elevados de creatinina ocorre secreção tubular, mas não o suficiente para manter a excreção em balanço com a produção. Com a destruição de néfrons, ocorre uma elevação plasmática, a qual acarreta um aumento na quantidade a ser filtrada pelos néfrons residuais. No entanto, não há nenhum mecanismo compensatório que aumente esta excreção acima do nível que mantém o balanço (produção excreção). Desta forma, a elevação na concentração plasmática persistirá.3 Outras substâncias, como fosfatos, uratos, possuem uma melhor adaptação. Por exemplo, no caso do fosfato, a adaptação é completa (portanto, sem elevação sérica) até que a filtração glomerular atinja 25-30% do normal. Antes disso, após a destruição de néfrons e elevação sérica dos fosfatos, há uma inibição progressiva na reabsorção tubular de fosfatos, normalizando a concentração sérica de fosfato. Outros solutos, como o sódio, o potássio e o magnésio, são mantidos em balanço até bem próximo à fase terminal de insuficiência crônica. Isto se deve basicamente a um exagerado aumento na quantidade filtrada por néfron residual. A Fig. 37.1 ilustra a adaptação que deve ocorrer na excreção de sódio em face de uma redução na população de néfrons. A figura compara o percentual de sódio filtrado que deve ser excretado para um indivíduo com uma filtração glomerular de 120 ml/min e outro com uma filtração glomerular de 4 ml/min. A adaptação é comparada alternando-se a ingesta de sal: de 3,5 g/dia para 7,0 g/dia. Observem que, em ambas as situações, os rins lesados pre-
Fig. 37.1 Adaptações na excreção de sódio. Observem o percentual do sódio filtrado, que é excretado quando a função renal é normal (RFG 120 ml/min) e quando a função renal está reduzida (RFG 4 ml/min), em duas situações distintas: ingesta de 3,5 g e 7,0 g de sal por dia. (Obtido de Bricker, N. S. et al.4)
capítulo 37
665
cisam excretar um percentual muito maior do sódio filtrado para manter o balanço de sódio. Outras substâncias, tais como aminoácidos, compostos fenólicos, indóis, guanidinas etc., são retidas no organismo. A concentração hidrogeniônica aumenta e a concentração do bicarbonato diminui, mas a acidose que se estabelece não é progressiva, havendo uma estabilização. A eficácia destes mecanismos de adaptação garante a vida do paciente, mesmo quando há apenas 10% de nefrons funcionantes. Não havendo alterações na dieta, a urina contém, no paciente urêmico e no sadio, a mesma quantidade de solutos nas 24 horas.
A Hipótese Trade-off: História e Conceitos Atuais Esta hipótese, formulada por Bricker, surgiu em torno das especulações sobre o preço que o organismo estaria pagando por estes mecanismos de adaptação capazes de manter a homeostasia.3,4 A hipótese baseia-se na premissa de que um ou mais dos estigmas da síndrome urêmica são conseqüências das adaptações que ocorreriam na função dos néfrons. Desta forma, o organismo trocaria (trade-off) a normalização de um setor à custa da elevação de substâncias em outros setores. Bricker sugeriu que pelo menos uma troca existiria em insuficiência renal crônica: toda vez que mais néfrons são destruídos, haveria uma retenção transitória de fosfatos na circulação. Esta elevação se acompanharia de uma redução recíproca na concentração de cálcio iônico. Aparentemente, esta redução do cálcio ocorreria pela precipitação, nos tecidos, de complexos de fosfato de cálcio devido à supersaturação do plasma ocorrida pela retenção de fósforo (hipótese não mais aceita, como veremos a seguir). A redução do cálcio iônico seria o estímulo para a síntese e secreção do paratormônio. O elevado nível circulante de paratormônio acarretaria um aumento na excreção de fósforo por néfron residual, normalizando a concentração plasmática de fósforo e permitindo ao cálcio iônico elevar-se. No entanto, esta normalização de cálcio e fósforo plasmático persistiria à custa de um alto nível circulante de paratormônio. A cada nova destruição de néfrons, a seqüência se repetiria e a concentração de paratormônio se elevaria ainda mais (Fig. 37.2). Estes altos níveis de paratormônio têm ações deletérias sistêmicas e, pelo menos em parte, seriam responsáveis pela osteodistrofia urêmica (v. a seguir). Se a quantidade de qualquer soluto excretado pelo rim fosse reduzida em igual proporção à redução da filtração glomerular, a quantidade excretada por néfron permaneceria constante. Isto pode ser alcançado alternando-se a dieta ou reduzindo-se a entrada de soluto no organismo, tornando-o não-absorvível. Exemplo: para o caso do fósforo, usando-se um gel como o hidróxido de alumínio, que é capaz de se ligar ao fósforo, diminuindo a sua absorção entérica.
Fig. 37.2 Hipótese trade-off. Com a redução do RFG, há uma retenção transitória de fosfato, supersaturando o plasma e precipitando, nos tecidos, complexos de fosfato de cálcio. A precipitação do cálcio reduz o cálcio iônico, estímulo para a liberação de paratormônio (PTH), o qual acarreta fosfatúria, normalizando o fósforo e o cálcio plasmático. Mas este estado de anormalidade se mantém à custa de um elevado nível circulante de PTH. A cada nova redução do RFG, o ciclo se repete. (Obtido de Bricker, N. S. et al.3)
CONCEITOS E INTERPRETAÇÕES ATUAIS DA TEORIA TRADE-OFF (V. TAMBÉM CAP. 40) Hipocalcemia é o Principal Fator no Aumento da Secreção de PTH Observações nas últimas duas décadas sugerem que outros fatores participam da gênese do hiperparatireoidismo.5 Primeiro, estudos de pacientes com insuficiência renal crônica em fase inicial tinham aumento de PTH sem hipocalcemia.6 Depois verificou-se que a hipercalcemia não evitou o hiperparatireoidismo em cães azotêmicos quando havia deficiência de calcitriol.7
Retenção de Fósforo Causa Hipocalcemia pela Teoria Trade-off Portanto, baseado nesta teoria e recapitulando o exposto anteriormente, com a redução da função renal ocorrem aumentos transitórios e indetectáveis de hiperfosfatemia, reduzindo temporariamente a concentração iônica de cálcio no sangue, a qual por sua vez estimularia a secreção de PTH. O aumento de PTH causaria fosfatúria e normalização do cálcio e fósforo séricos. A troca (trade-off) pela normalização foi um maior nível circulante de PTH. Estudos nas últimas duas décadas sugerem que hiperfosfatemia e retenção de fósforo não ocorrem na fase inicial de IRC.8 Aliás, níveis baixos de fósforo são constantemente encontrados. Determinações de fósforo sérico e concentração de PTH pós-prandial mostraram que não há uma hiperfosfatemia pós-prandial transitória, como se especulou.9 Entretanto, apesar desta ausência de retenção de fós-
666
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
foro, restrição de fósforo nesta fase inicial de IRC resulta numa redução dos níveis de PTH, sugerindo que o fósforo per se, através de mecanismos outros que não a retenção, pode reduzir o PTH. Com a progressão da IRC e diminuição da função renal, eventualmente ocorre retenção de fósforo. Como frisamos há pouco, a hipocalcemia era relacionada à hiperfosfatemia. Entretanto, um aumento da concentração in vitro dentro da faixa usualmente vista em pacientes em diálise não reduz a concentração de cálcio iônico. Em indivíduos normais, um grande aumento no fósforo sérico (2,2 mMol/L) é necessário para se reduzir o cálcio sérico em apenas 0,18 mMol/L.10 Hoje em dia se aceita que a retenção de fósforo causa hiperparatireoidismo por vários outros mecanismos. O excesso de fósforo inibe a atividade da enzima renal 1hidroxilase, a qual converte 25-(OH)D3 em seu metabólito ativo 1,25-(OH)2D3 (calcitriol) (v. Cap. 40). Além disto, a retenção de fósforo diminui a resposta calcêmica ao PTH e logo contribui para a hipocalcemia. Há vários estudos que mostram que a infusão de PTH causa um aumento da calcemia muito menor em pacientes com IRC do que em indivíduos normais. E esta resposta anormal ocorre cedo na IRC. Logo, níveis mais altos de PTH são necessários para se manter uma concentração normal de cálcio sérico no paciente urêmico. Os fatores envolvidos podem ser: retenção de fósforo, níveis baixos de calcitriol, downregulation de receptores de PTH, calcitonina e uremia .5
Efeito Direto do Fósforo Sobre as Paratireóides Finalmente, há dados recentes de que o fósforo tem um efeito direto sobre as paratireóides.11 Restrição de fósforo em cães com IRC avançada melhora o hiperparatireoidismo independentemente do cálcio sérico e calcitriol.12 Restrição moderada de fósforo em ratos com IRC reduz os níveis de PTH mRNA independentemente do cálcio sérico e calcitriol.13
Resposta Calcêmica ao PTH Há vários estudos que demonstram que a retenção de fósforo diminui a resposta calcêmica ao PTH. A melhora da resposta calcêmica com restrição de fósforo talvez seja mediada por níveis mais elevados de calcitriol.5 Os níveis baixos de calcitriol também podem comprometer a resposta calcêmica ao PTH na IRC. Em vários estudos, a administração de calcitriol melhorou ou corrigiu a resposta calcêmica ao PTH.5
Alteração do Metabolismo da Vitamina D e Resistência ao Calcitriol É provável que um papel fundamental no desenvolvimento de hiperparatireoidismo secundário na IRC seja a conversão anormal de vitamina D3 para sua forma ativa, o calcitriol. A absorção intestinal de cálcio está diminuída e
responde mal à administração de vitamina D. O rim tem um papel fundamental na conversão de 25-(OH)D3 para calcitriol. Ratos anéfricos não produzem calcitriol a partir de seu precursor. A absorção intestinal diminuída de cálcio é um reflexo dos níveis séricos reduzidos de calcitriol encontrados na IRC. A administração de calcitriol aumenta a absorção intestinal de cálcio. Uma redução de níveis séricos de calcitriol parece ocorrer precocemente na IRC (clearances de creatinina de 75-80 ml/min). Acredita-se que em estudos que mostraram níveis “normais” de calcitriol havia um aumento de níveis séricos de PTH, um potente estímulo à síntese de calcitriol. Tallon e cols. recentemente mostraram que em insuficiência renal moderada um PTH elevado mantém a produção de calcitriol e suplanta a ação inibitória da retenção de fósforo.14 Há também a sugestão de que a anormalidade estaria a nível de receptores nas paratireóides. A célula da paratireóide tem na superfície um mecanismo cálcio-sensível que regula a secreção de PTH.5
Causas da Síntese Reduzida de Calcitriol Como a 1-hidroxilase está presente nas células tubulares renais proximais, a síntese de calcitriol pode estar relacionada ao estado funcional destas células. Há dados que demonstram que uma redução da massa renal reduz a síntese de calcitriol. A concentração tubular renal proximal de fósforo pode ser importante na 1␣-hidroxilação. Há evidência de que a concentração intracelular de fósforo de células renais corticais é o principal mecanismo no controle da hidroxilação renal de 25-(OH)D3. Restrição de fósforo em pacientes reduz a excreção renal de fósforo, a absorção intestinal de cálcio aumenta e os níveis de PTH diminuem. E, mais importante, os níveis de calcitriol aumentam. Portanto, sugere-se que o aumento na concentração de calcitriol ocorre devido a uma diminuição na concentração tubular de fósforo, a qual estimula a 1-hidroxilase, a qual induz a síntese de calcitriol. Embora a hipótese seja atraente, não há dados experimentais que a corroborem (Fig. 37.3).
Calcitriol e Efeito Feedback Sobre as Paratireóides A conseqüência fisiopatológica mais importante da reduzida síntese de calcitriol é a ausência de um efeito inibitório modulador na síntese e secreção de PTH, levando ao hiperparatireoidismo secundário. Vários estudos mostram que o calcitriol exerce um feedback negativo nas glândulas paratireóides; parece inibir a transcrição de DNA, reduzindo a síntese de PTH disponível para secreção. Por outro lado, uma diminuição do nível de calcitriol aumenta a síntese e secreção de PTH pela célula paratireóidea. A evidência in vivo foi documentada por Slatopolski e cols.15 Administrando calcitriol endovenoso a pacientes em hemodiálise, houve uma redução
667
capítulo 37
Adaptações Intra-renais (v. Cap. 36) FUNÇÃO GLOMERULAR
Fig. 37.3 Representação esquemática do mecanismo hipotético através do qual o calcitriol pode diminuir em pacientes com insuficiência renal crônica em fase inicial.
dos níveis de PTH antes de uma alteração nos níveis de cálcio iônico. A ação biológica do calcitriol parece ser mediada por um complexo receptor hormonal citoplasmático. Este receptor de vitamina D é encontrado em vários tecidos, inclusive intestino e glândulas paratireóideas. Toxinas urêmicas podem reduzir a ação biológica do calcitriol, inibindo a síntese do receptor. Assim, a uremia per se pode ser um fator de resistência aos níveis fisiológicos de calcitriol. Em resumo, a hipótese trade-off foi uma tentativa intrigante de explicar certos aspectos da síndrome urêmica, entretanto baseando-se em inferências indiretas devido à incapacidade dos pesquisadores da época em identificar agentes efetores.
Pontos-chave: • Durante a perda da função renal, os néfrons remanescentes se adaptam para tentar manter a homeostase, que é variável de acordo com o soluto • Esta capacidade de adaptação mantém a vida do paciente mesmo com função renal bastante reduzida • A adaptação renal decorrente da perda de néfrons funcionantes pode resultar em trade-off, onde a normalização da concentração de uma substância gera desequilíbrio de outro sistema. O protótipo é o metabolismo cálcio/fósforo
Em face da destruição de néfrons, uma das adaptações intra-renais qualitativas é uma elevação da filtração e do fluxo sangüíneo glomerular. O aumento da perfusão resulta da diminuição da resistência das arteríolas aferentes e eferentes, sendo a redução da resistência arteriolar aferente maior que a eferente, de sorte que a pressão hidráulica do capilar glomerular se eleva. Com a elevação da pressão capilar glomerular, ocorre um aumento do gradiente de pressão transcapilar, responsável pelo aumento da filtração glomerular por néfron (SNGFR single nephron glomerular filtration rate). Desta forma, a capacidade excretora dos néfrons aumenta. Em glomérulos extensamente envolvidos, a filtração glomerular por néfron será normal ou diminuída. Os fatores responsáveis pelo aumento da SNGFR, o qual pode ser ampliado por uma ingesta protéica elevada, não são conhecidos, mas as possibilidades são: 1) produção aumentada de prostaglandina, causando dilatação arteriolar aferente; 2) nível tissular elevado de angiotensina II, causando constrição arteriolar eferente, e 3) elevação de fatores humorais ou de crescimento tecidual, como o fator de crescimento insuline-like (IGF). Estes mecanismos de adaptação que culminam com elevada SNGFR têm por objetivo aumentar a eliminação de toxinas. Entretanto, esta adaptação pode ser prejudicial, causando um processo de autoperpetuação de lesão glomerular, caracterizado patologicamente por esclerose glomerular, que evolui para insuficiência renal (v. Cap. 36 e a seguir). Este processo está bem documentado em modelos experimentais e parece reproduzir-se em humanos. Pacientes que nascem com um rim ou com hipoplasia renal freqüentemente desenvolvem mais tarde proteinúria e hipertensão, e a biópsia revela esclerose glomerular. A patogênese da esclerose glomerular tem sido objeto de intensos estudos. A hipertensão ou hiperfiltração glomerular tem sido incriminada. Esta resposta glomerular adaptativa inicial causaria lesão endotelial, elevação da permeabilidade capilar glomerular e elevada filtração de macromoléculas, o que resulta na ativação de células mesangiais e deposição aumentada de matriz mesangial. Intervenções experimentais que reduzem a pressão intraglomerular, como a restrição protéica ou a administração de inibidores da enzima de conversão, abortam ou atenuam a progressão da doença renal. As mesmas intervenções no homem parecem também retardar a progressão da doença renal. Uma outra adaptação intra-renal consiste na hipertrofia compensatória dos néfrons.4 O comprimento e a tortuosidade dos túbulos proximais aumentam, presumivelmente, devido a um aumento no número e no tamanho das células.
FUNÇÃO TUBULAR Quando a filtração glomerular por néfron aumenta ou diminui, a função tubular se altera para manter o balanço
668
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
tubuloglomerular. Este balanço é alcançado em parte por força física nos capilares peritubulares. Por exemplo, a queda de filtração glomerular se acompanha de uma queda na pressão oncótica do capilar peritubular, enquanto há um aumento da pressão hidrostática (v. Cap. 36). Estes acontecimentos causam uma redução na absorção tubular para contrabalançar a redução de filtração. Quando há um aumento da SNGFR, o túbulo proximal pode aumentar o transporte de água, sódio e fosfato. Da mesma forma, hipercalemia causa um aumento da secreção de K pelo túbulo coletor possivelmente via aldosterona, e, em resposta à acidose metabólica, a produção de NH3 aumenta (v. Cap. 11). Certas adaptações e alterações humorais podem ser prejudiciais. Por exemplo, a concentração aumentada de amônia no parênquima renal pode ser responsável por lesão tubulointersticial.
EXCREÇÃO DE SÓDIO Acredita-se que os elementos reguladores da excreção de sódio em nefropatia crônica sejam os mesmos que operam num ambiente sadio. Quando sódio é adicionado ao organismo, ocorre uma expansão do volume extracelular (v. Cap. 10). Existem elementos que detectam esta expansão e a transmitem a elementos integradores, possivelmente no sistema nervoso central, e forças natriuréticas são mobilizadas.4 Estas forças diminuem a reabsorção de sódio, excretando o sódio que foi adicionado. Desta forma, a atividade dessas forças natriuréticas aumenta ou diminui de acordo com a ingesta de sódio. Com a destruição de néfrons, haverá um período de retenção de sódio, associado a uma expansão de volume extracelular. Esta expansão será detectada e integrada por elementos específicos que aumentam a atividade das forças natriuréticas, aumentando a excreção de sódio nos néfrons residuais. A cada destruição de néfrons, o ciclo se repete (Fig. 37.4). No Cap. 10, indicamos os vários elementos (fatores natriuréticos) que participam do controle da excreção de sódio: filtração glomerular, atividade dos hormônios mineralocorticóides, fatores físicos e o hormônio natriurético. Como já dissemos, na nefropatia crônica há um aumento na filtração glomerular por néfron, embora pareça pouco provável ocorrer um aumento contínuo durante a progressão da nefropatia crônica que justifique a magnitude nas alterações da excreção de sódio. Assim sendo, mesmo que haja um comprometimento importante da função renal, o balanço de sódio pode ser mantido à custa de um aumento na excreção de sódio por néfron. Aparentemente os níveis da aldosterona não estão diminuídos em uremia, e alguns relatos descrevem níveis elevados. A administração, a pacientes urêmicos, de grande quantidade de hormônio mineralocorticóide não interfere com a regulação precisa do balanço de sódio quando se altera a ingesta de sódio. A aldosterona, embora participe, não é o principal elemento no controle biológico.
Fig. 37.4 Relação entre forças natriuréticas e o percentual do sódio filtrado que é excretado. Observem que, à medida que o RFG diminui, aumenta o percentual do sódio filtrado, que é excretado à custa de forças natriuréticas. (Obtido de Bricker, N. S. et al.4)
Com relação aos fatores físicos, os dados existentes estão relacionados com a reabsorção de sódio no túbulo proximal e com quase nenhum dado sobre o túbulo distal. Assim, o papel desses fatores físicos está por ser determinado. A expansão do volume extracelular após uma carga de sódio resulta num aumento apropriado na excreção urinária de sódio. Além da supressão do sistema renina-angiotensina-aldosterona e uma pequena elevação na taxa de filtração glomerular, hormônios natriuréticos contribuem para esta resposta.16 Peptídeo atrial natriurético (PAN) é liberado pelos átrios em resposta a expansão de volume, percebida através de uma distensão dos átrios. O PAN é um vasodilatador periférico, reduzindo portanto a pressão arterial sistêmica, e um hormônio diurético e natriurético (v. Caps. 4 e 10).
LIMITAÇÕES NA EXCREÇÃO DE SÓDIO Em uremia, a taxa máxima de excreção de sódio está reduzida e há uma perda obrigatória mesmo quando a ingesta de sódio é reduzida. A maior parte dos pacientes com nefropatia avançada não retém sódio numa ingesta normal de sódio de 7,0 a 8,0 g/dia. Ocasionalmente, a taxa máxima de excreção de sódio de um paciente se fará com uma ingesta de 5 g de sal por dia ou até menos. Existem alguns outros fatores que reduzem este nível máximo de excreção de sódio no urêmico: hipoalbuminemia, insuficiência cardíaca congestiva ou glomerulite aguda. Basicamente, todo nefropata crônico com uma filtração glomerular inferior a 20-25 ml/min terá uma excreção obrigatória de sódio de pelo menos 20-30 mEq/dia. Se a ingesta
capítulo 37
de sódio é reduzida rapidamente a níveis inferiores à excreção obrigatória, o paciente entra em balanço negativo de sódio, o qual causa uma contração do volume extracelular, contração que reduz a filtração glomerular, agravando a retenção nitrogenada, a retenção de potássio e ácidos metabólicos. Algumas vezes, a perda diária de sódio é elevada (100 a 200 mEq/dia) e costuma-se dizer que o paciente é portador de uma nefropatia perdedora de sódio. Acredita-se que, em parte, esta natriurese ocorra pela alta carga de soluto por néfron (diurese osmótica). É possível que a desorganização vascular na medula também seja responsável por essa natriurese, pois nefropatias com comprometimento renal predominantemente medular associam-se mais freqüentemente a altas perdas de sódio urinário: pielonefrite, nefropatia obstrutiva, doença medular cística, etc.
EXCREÇÃO DE ÁGUA Como já foi abordado no Cap. 16, uma anormalidade na capacidade de concentração urinária é um dos sinais mais precoces na insuficiência renal crônica, traduzida clinicamente pela nictúria. O nefropata crônico perde o padrão diurno de excreção de água, apresentando uma deficiência do mecanismo de concentração e diluição urinária. A anormalidade na capacidade de formar urina diluída parece ser atribuída a um aumento na excreção de solutos por néfron. Esta excreção elevada de solutos resulta primariamente do aumento da filtração por néfron e da supressão na reabsorção proximal de sódio. Além disso, o filtrado glomerular contém uma alta concentração de solutos pouco reabsorvíveis (uréia, sulfato, fósforo, etc.). Estes três fatores seriam responsáveis pela excreção excessiva de solutos através dos néfrons residuais presumivelmente normais. Quando se corrige o clearance de água livre para a taxa de filtração glomerular e excreção de soluto, verifica-se que a capacidade de diluição está preservada. Entretanto, a redução global na taxa de filtração glomerular compromete a capacidade do rim em excretar uma carga de água mesmo quando está normal a formação de água livre por néfron remanescente. Esta incapacidade renal de excretar água livre de soluto coloca o paciente em risco de uma intoxicação aquosa. Drogas freqüentemente utilizadas na insuficiência renal, para aumentar a excreção de sódio e tratar a hipertensão arterial, podem comprometer ainda mais a capacidade renal de excretar uma carga de água através da inibição da reabsorção de NaCl e diluição no ramo ascendente espesso da alça de Henle. Por outro lado, o distúrbio na capacidade de concentração não pode ser atribuído unicamente a esta diurese osmótica que ocorre por néfron. Se assim fosse, uma redução na excreção de solutos seria capaz de elevar a osmolalidade urinária máxima, o que não ocorre. Estes fatos indicam que outros fatores participam do distúrbio da concentração urinária. Uma das explicações mais aceitas é a de que alterações anatômicas na medula renal sejam res-
669
ponsáveis pelo defeito na concentração. O mecanismo de concentração da urina requer hipertonicidade do interstício medular. A alta carga de uréia e outros solutos por néfron explica em parte o defeito de concentração urinária. Além disto, a reabsorção de água no túbulo distal está comprometida pela limitada resposta do túbulo distal ao HAD. A razão pode estar na própria uremia ou no fluxo aumentado do líquido tubular.
ÁCIDO-BÁSICO Aproximadamente 1 mEq/kg de íons H são produzidos diariamente, oriundos de uma ingesta protéica. Estes íons H são tamponados pelo bicarbonato plasmático, e os rins deverão regenerar este bicarbonato consumido, além de excretar os íons H. Os processos envolvidos na reabsorção, regeneração de bicarbonato e excreção de H já foram discutidos nos Caps. 5 e 11. Habitualmente, no decurso de uma insuficiência renal crônica, a concentração plasmática de bicarbonato permanece normal até que haja uma redução da filtração glomerular acima de 50%. A partir de então, há uma redução do bicarbonato plasmático, do pH arterial e uma redução compensatória do pCO2. No entanto, a acidose permanece compensada mantendo concentrações plasmáticas de bicarbonato entre 12 e 15 mEq/litro, mesmo com filtração glomerular abaixo de 5-10 ml/min. Como não há evidência de perda de bicarbonato ou produção excessiva de íons H, conclui-se que a acidose que se desenvolve na uremia se deve a uma redução na excreção de íons H pelos rins. Os dois principais receptores (tampões) de íons H na urina são o fosfato e o NH3. Como o pH da urina na uremia geralmente está abaixo de 5,5, isto significa que ambos os tampões (fosfato e NH3) estão titulados ao máximo. A excreção de fosfato na evolução de uma nefropatia crônica não se altera muito, permanecendo igual à ingesta, mantendo assim o equilíbrio. Desta forma, uma regulação precisa do equilíbrio ácidobásico depende da síntese de NH3, que deve aumentar. Assim, uma redução na excreção de amônia (e conseqüente redução na quantidade de bicarbonato regenerado) parece ser o fator mais importante na gênese da acidose. As adaptações que ocorrem durante a evolução de insuficiência renal crônica poderiam ser assim descritas:4 com a destruição inicial de néfrons, haverá uma redução transitória na excreção de H e síntese de bicarbonato. Com a retenção de H ocorre uma redução do bicarbonato plasmático. O aparecimento de um nível mais elevado de hormônio paratireóideo acarreta um aumento na excreção de fósforo. Com isto, a excreção de íons H excretados como ácido titulável (íons H tamponados pelo fosfato) também aumenta até o nível original, mas só restaura parcialmente a excreção de H e a síntese de bicarbonato. Desta forma, a excreção de NH3 precisa aumentar. O aumento na excreção de NH3 eleva a excreção de H e a síntese de bicarbonato, atingindo uma compensação completa. Mas a
670
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
manutenção desta compensação se deve a uma excreção aumentada de fosfato e NH3 por néfron. Com nova destruição renal, o mesmo ciclo acima se repete. A acidez titulável permanecerá normal enquanto a ingesta de fosfato não for reduzida. Entretanto, a excreção total de NH3 diminui, apesar do aumento na produção de NH3 por néfron. Isto acarreta acidose metabólica que tem tendência a estabilizar-se, o que parece dever-se a um sistema-tampão auxiliar: reservas de carbonato no osso. No entanto, este tamponamento continuado acarreta descalcificação óssea que parece contribuir para a osteodistrofia urêmica (v. a seguir). Existem dados que indicam que os altos níveis circulantes de paratormônio inibem também a reabsorção de bicarbonato (além de inibirem a reabsorção proximal de fosfato) e contribuem dessa forma para a acidose.17
CÁLCIO, FÓSFORO E MAGNÉSIO Como vimos anteriormente, os níveis plasmáticos de cálcio e fósforo são mantidos normais até uma filtração glomerular de 25-30 ml/min, à custa de altos níveis de paratormônio circulante. A partir de então, o fósforo plasmático eleva-se, acompanhado de uma redução recíproca de cálcio plasmático. Os níveis plasmáticos de paratormônio continuarão elevados. Em insuficiência renal crônica, a absorção ativa de cálcio, no duodeno e jejuno superior, está comprometida. Em porções mais distais do intestino, a absorção passiva de cálcio parece estar intacta, pois urêmicos podem absorver cálcio normalmente quando a ingesta de cálcio é elevada a 4,0-10,0 g/dia. Tudo indica que a redução na produção de 1,25-(OH)2D3 pelo rim enfermo (v. também Cap. 40) seja responsável, pelo menos em parte, pela redução na absorção intestinal de cálcio. Habitualmente as alterações na absorção de cálcio são detectadas quando a creatinina do cálcio intestinal agrega novo insulto à homeostasia do cálcio, originando um estímulo adicional, a hiperplasia das paratireóides, elevação dos níveis de paratormônio e deterioração esquelética. Embora os estudos iniciais de Bricker tenham sugerido que a fosfatúria da IRC fosse secundária ao aumento do PTH, estudos posteriores mostraram que a elevada excreção fracional de fosfatos que acompanha a redução do número de néfrons não depende de aumento dos níveis de PTH ou de uma resposta tubular ao PTH. Em animais paratireoidectomizados, a elevada excreção fracional de fosfatos foi proporcional à redução da filtração glomerular. Atualmente não se sabe por que a reabsorção proximal de fosfato está diminuída na insuficiência renal. O magnésio sérico está geralmente elevado na insuficiência renal crônica, mas sem tradução clínica. No entanto, a administração de laxantes ou antiácidos que contêm magnésio pode causar uma hipermagnesemia grave, provocando náuseas, vômitos e depressão do sistema nervoso central. Níveis séricos extremos podem causar paralisia respiratória, coma e parada cardíaca.
POTÁSSIO A capacidade de excreção de potássio está relativamente bem preservada na insuficiência renal crônica. Isto se deve a um aumento na excreção de potássio por néfron. Geralmente a ingesta de potássio não diminui na insuficiência renal crônica, a não ser que a ingesta protéica seja reduzida. A excreção fecal de potássio em pacientes urêmicos aumenta muito pouco. Desta forma, sendo a excreção de potássio normal na insuficiência renal crônica, apesar da filtração glomerular reduzida, o aumento da excreção de potássio por néfron é resultante da atividade tubular. Na verdade, estudos experimentais mostram que a secreção de potássio nos segmentos distais do néfron é a responsável pela manutenção do balanço externo. O processo adaptativo responsável por secreção distal elevada de K parece ser por uma atividade aumentada da Na,KATPase e da área basolateral de células principais nos ductos coletores corticais. O aumento de excreção de potássio por néfron não parece depender da excreção simultânea de outros solutos, como, por exemplo, o sódio, o fósforo, etc. Há evidência de que níveis “normais” de aldosterona são necessários para facilitar a elevada secreção de potássio por néfron. Hipercalemia, freqüentemente associada à acidose metabólica, pode ocorrer relativamente cedo na insuficiência renal quando o nível plasmático de aldosterona for baixo. Furosemida facilita a secreção de K pelo aumento da oferta distal de NaCl e também por estimular a liberação de renina ao reduzir o volume extracelular. Verifica-se hipercalemia apenas nos estádios finais da insuficiência renal crônica associada a oligúria e a excessiva ingestão de potássio. Particular atenção deve ser dada ao uso de substitutos do sal e dietas ditas “saudáveis”, que contêm muita fruta e nozes.
Pontos-chave: • A diminuição de néfrons funcionantes resulta em aumento da filtração glomerular por néfron, desencadeando o fenômeno de agressão glomerular • A função tubular acompanha a hiperfiltração glomerular, ao menos em fases precoces da IRC • O balanço de sódio é mantido até fases tardias da IRC através de forças natriuréticas • A acidose metabólica que acompanha a IRC é causada principalmente pela diminuição na excreção de amônia • A hipercalemia dificilmente ocorre em IRC até a fase terminal
capítulo 37
PROGRESSÃO DA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA (V. TAMBÉM CAP. 36) É observação antiga que muitos pacientes portadores de nefropatia crônica evoluem inexoravelmente para insuficiência renal terminal. Naturalmente são conhecidos vários fatores que contribuem para a progressão da insuficiência renal crônica na ausência de atividade da enfermidade básica: infecções urinárias recorrentes, persistência de obstrução do trato urinário, hipertensão arterial não controlada, deposição intra-renal de sais de cálcio e uratos, etc. (Quadro 37.2). Entretanto, na ausência destes fatores, têmse procurado outros mecanismos capazes de justificar a destruição progressiva dos néfrons residuais numa nefropatia crônica.
Quadro 37.2 Possíveis causas de progressão da insuficiência renal crônica 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8.
Infecção urinária Obstrução Hipertensão arterial Distúrbios de cálcio e fósforo (hiperfosfatemia) Hiperuricemia Hiperfiltração glomerular Resposta imune Dislipidemia
671
Brenner et al. lançaram a hipótese de que isto ocorre devido a alterações hemodinâmicas do glomérulo: o aumento da filtração glomerular por néfron, interpretado como um mecanismo de adaptação face à destruição ou ablação de outros néfrons, pode eventualmente causar lesão dos néfrons residuais.18 Vários trabalhos experimentais têm tentado provar esta teoria. Assim sendo, nefrectomias parciais em ratos determinam, com o tempo, proteinúria e esclerose glomerular, inicialmente segmentar e depois global. Estas nefrectomias, quando removem 90-95% da massa renal, determinam um aumento da filtração e da pressão capilar glomerular dos néfrons residuais, podendo-se detectar alterações morfológicas nos glomérulos em duas semanas após a ablação. A evidência de que esta hiperfiltração glomerular e este aumento da pressão capilar glomerular iniciam a lesão glomerular provém de estudos em que a limitação da hiperfiltração e a prevenção da hipertensão glomerular preservaram a estrutura glomerular. Assim sendo, sabendo-se que a restrição protéica reduz a filtração glomerular em animais, vários experimentos demonstraram a prevenção de esclerose glomerular e proteinúria em ratos parcialmente nefrectomizados submetidos a dietas hipoprotéicas. Mais recentemente, demonstrou-se que o controle da hipertensão arterial sistêmica e da hipertensão capilar glomerular com inibidores da enzima de conversão (captopril, enalapril) limita a lesão glomerular, reduzindo a proteinúria e a esclerose glomerular. Os mecanismos participantes da progressão da nefropatia crônica, segundo Brenner et al., podem ser apreciados na Fig. 37.5. Em resumo, a condição básica inicial é a hiperfil-
Fig. 37.5 Esquema dos possíveis mecanismos atuantes na progressão da insuficiência renal.
672
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
tração e a hipertensão intraglomerular. Esta pode ser decorrente de uma redução da população de néfrons (por ablação ou doença), hipertensão arterial sistêmica transmitida ao leito capilar glomerular, dietas hiperprotéicas e diabetes mellitus. Paralelamente a estas alterações mecânicas, uma série de alterações imunológicas (infiltrado inflamatório, produção aumentada de matriz extracelular), fenômenos trombóticos e proliferação celular ocorrem no rim da insuficiência renal crônica, culminando em um processo inflamatório crônico que caracteriza o caráter progressivo das doenças renais. Estas alterações são discutidas em detalhe no capítulo anterior. Uma combinação destes mecanismos culmina na perda da função renal e no desenvolvimento da síndrome urêmica. Portanto, pacientes portadores de nefropatia crônica deverão sofrer uma redução da hiperfiltração e hipertensão glomerular na tentativa de se preservar a função renal residual. Pelo exposto, é óbvio que a redução da ingesta protéica deve ser instituída precocemente, e há vários estudos clínicos que demonstram o efeito benéfico desta conduta (v. Cap. 47). É possível no entanto que outras manipulações do fluxo e pressão capilar glomerular sejam mais eficazes que a restrição protéica.
Pontos-chave: • A IRC progride para fase terminal de forma inexorável, e a progressão pode ser agravada por HAS, infecções urinárias recorrentes, persistência de obstrução do trato urinário • Estratégias para reduzir a pressão intraglomerular (IECA, dieta hipoprotéica) diminuem o ritmo de progressão da IRC
A SÍNDROME URÊMICA Patogenia O termo uremia significa urina no sangue, indicando, portanto, que certas substâncias (como a uréia), normalmente excretadas na urina, são retidas na circulação. Sabemos, no entanto, que os sintomas de insuficiência renal não podem ser atribuídos unicamente à retenção de constituintes urinários. Há alterações endócrinas e metabólicas independentes dessa retenção. Preferimos utilizar o termo uremia para os pacientes que apresentam uma insuficiência renal grave (geralmente clearance de creatinina inferior a 10 ml/min) e cujos sintomas envolvem particularmente o trato gastrintestinal, nervoso e cardiopulmonar. As manifestações da uremia se assemelham a uma intoxicação sistêmica, daí o interesse de vários investigado-
res em achar uma toxina urêmica. Acredita-se que os sintomas urêmicos sejam causados por uma ou várias substâncias dialisáveis, pois os sintomas desaparecem com a diálise.
Toxinas Urêmicas De acordo com o conhecimento vigente, há indicações de que cada uma das alterações metabólicas e fisiológicas da uremia possam ser atribuídas à retenção de solutos como resultado da perda da função renal. Porém, alguns dos solutos acumulados podem ser apenas marcadores deste acúmulo, não sendo importantes no desenvolvimento da toxicidade urêmica. É importante salientar que moléculas com peso molecular de até 58 quilodaltons são filtradas através do glomérulo, e a perda da função renal gera o acúmulo de móleculas de variados pesos moleculares. Uma lista dos principais compostos orgânicos acumulados na insuficiência renal e sua presumida toxicidade serão discutidos a seguir.
URÉIA Classicamente, a uréia tem sido incriminada na gênese dos sintomas urêmicos. No entanto, numa experiência, vários pacientes foram submetidos à hemodiálise crônica, enquanto uréia foi adicionada ao dialisado, de forma que a concentração de uréia plasmática variou entre 181 e 600 mg/100 ml.19,20 A experiência mostrou que, quando a uréia plasmática era superior a 300 mg/100 ml, os pacientes apresentavam mal-estar, vômitos, sangramento e cefaléia. No entanto, os sintomas comumente detectados em urêmicos com níveis semelhantes de uréia (sonolência, depressão mental, asterixe, fasciculações musculares, etc.) não foram vistos nesses pacientes. Isto indica que não só a uréia é responsável pelos sintomas de uremia, mas também parece ser um bom marcador da uremia. De fato, o Estudo Nacional Cooperativo de Diálise mostrou uma correlação direta entre o turnover de uréia e morbidade, o que levou à adoção do modelo de cinética da uréia para se avaliar a ingesta protéica e a adequação da diálise.
GUANIDINAS Os níveis séricos de compostos guanidínicos aumentam na IRC. Estas substâncias contêm o grupo amidino NCNH, oriundo do metabolismo da arginina. Metilguanidina e ácido guanidinossuccínico são produzidos a partir do metabolismo de proteínas ingeridas ou da degradação protéica endógena. Metilguanidina causa gastrite e polineurite quando infundida em cães sadios, inibe in vitro a Na,K-ATPase cerebral de ratos urêmicos e diminui a contratilidade de células cardíacas de camundongos. Há evidência recente de que o ácido guanidinossuccínico inibe a 1α-hidroxilase renal in vitro e pode ser um dos fatores no soro urêmico que reduz a síntese de calcitriol.
capítulo 37
SULFATO DE INDOXIL O sulfato de indoxil tem sido responsabilizado por defeitos no transporte tubular de ácidos orgânicos e pela diminuição na ligação de diversas drogas a proteínas plasmáticas. A remoção deste composto está associada a redução do prurido urêmico e retardo na progressão da insuficiência renal.
MIOINOSITOL Mioinositol e outros polióis são fosfolípides, parte da estrutura e função do sistema nervoso. Estes são retidos na uremia e são uma possível causa de neuropatia periférica. Entretanto, níveis séricos e no líquido cefalorraquidiano não se correlacionam com condução nervosa ou grau de neuropatia clínica de pacientes em diálise.
MOLÉCULAS MÉDIAS Sugeriu-se a possibilidade de que algumas moléculas de peso molecular entre 300 e 1.500 (moléculas médias) fossem responsáveis pela toxicidade urêmica. Essa sugestão partiu de duas observações: primeiro, notou-se que pacientes em diálise peritoneal crônica estavam clinicamente melhores que aqueles em hemodiálise, sem neuropatia e osteodistrofia urêmica, apesar de níveis plasmáticos mais elevados de uréia e creatinina. Deduziu-se que a membrana peritoneal era mais eficiente na remoção de certas toxinas do que a membrana de celofane do rim artificial. O peritônio remove moléculas maiores mais rapidamente; segundo, notouse que a prevenção de neuropatia urêmica dependia de um número adequado de horas de diálise por semana e não da manutenção de certos níveis pré-diálise de uréia e creatinina. Como a uréia e a creatinina são moléculas pequenas, deduziu-se que a remoção de moléculas maiores necessitaria de mais tempo de diálise. Devido a esta preocupação com as moléculas médias, aumentou-se o tempo de diálise, construíram-se dialisadores com maior área de filtração e utilizaram-se membranas de maior permeabilidade. No entanto, até o momento não há provas conclusivas de que as moléculas médias sejam toxinas urêmicas.
2 -MICROGLOBULINA É uma proteína de cadeia leve normalmente filtrada pelo glomérulo e reabsorvida e degradada pelas células do túbulo proximal. O rim é o único órgão responsável pelo seu catabolismo. Ela se acumula na insuficiência renal, causando deposição de amilóide no túnel carpiano, membranas sinoviais e nas extremidades dos ossos longos, causando a síndrome do túnel carpiano, cistos ósseos e uma artropatia destrutiva. Hemodiálise com membranas bioincompatíveis pode acelerar a geração de β2-microglobulina através da ativação do complemento.
HORMÔNIO PARATIREÓIDEO É uma molécula média considerada uma importante toxina urêmica. Hiperparatireoidismo leva a um acúmulo de
673
cálcio intracelular, o qual inibe vias de oxidação mitocondrial e geração de ATP. O aumento intracelular de cálcio induzido pelo PTH pode afetar o cérebro, pâncreas, miocárdio e plaquetas. Avram e cols. relataram um estudo em que compararam os níveis séricos de paratormônio com velocidade de condução nervosa motora em pacientes urêmicos.21 O grupo com níveis mais elevados de paratormônio tinha a maior redução na velocidade de condução nervosa motora. Como os autores já haviam demonstrado uma melhora no hematócrito em urêmicos submetidos a paratireoidectomia subtotal, concluíram esse estudo sugerindo que o paratormônio é uma toxina urêmica.
ACIDOSE METABÓLICA A acidose metabólica crônica compromete o metabolismo protéico e ósseo e pode contribuir para a progressão da nefrite intersticial. Há dados experimentais que mostram que a acidose crônica acelera o metabolismo protéico, resultando num retardo de crescimento e balanço nitrogenado negativo. Há uma descarboxilação de aminoácidos de cadeia ramificada no músculo esquelético. Em pacientes, demonstrou-se uma correlação entre os níveis de valina intracelular e o grau de acidose metabólica. A acidose metabólica também afeta o osso de pacientes urêmicos, estimulando a secreção de PTH independente do nível sérico de cálcio iônico ou calcitriol e tamponando os íons H com liberação de apatita de cálcio e perda de osso cortical.
FOSFATOS ORGÂNICOS Níveis altos de fosfatos orgânicos são associados a prurido urêmico, além de estimular a secreção de PTH, como discutido anteriormente. Da mesma forma, calcificações vasculares e metastáticas têm sido atribuídas a este soluto.
NOVOS COMPONENTES IDENTIFICADOS COMO POTENCIAIS TOXINAS URÊMICAS A lista de toxinas urêmicas está em permanente crescimento, dado que uma única toxina não pode justificar a variedade de sintomas que caracterizam a uremia. Dentre os novos compostos associados a toxicidade urêmica está a homocisteína, um aminoácido sulfúrico que se acumula com o desenvolvimento da uremia e se associa a um maior risco de doença cardiovascular.22 Da mesma forma, o acúmulo de produtos finais da glicação avançada resultantes de reação não-enzimática de carboidratos com proteínas está associado a toxicidade urêmica, especialmente em relação ao desenvolvimento de aterosclerose, amiloidose e fibrose peritoneal.23 Alguns autores têm proposto que o acúmulo de citocinas pró-inflamatórias e marcadores de estresse oxidativo poderiam também estar relacionados ao desenvolvimento de toxicidade e portanto representarem toxinas urêmicas.24
674
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
Pontos-chave: • As manifestações da uremia se assemelham a uma intoxicação sistêmica • Os sintomas urêmicos são causados por uma ou várias substâncias dialisáveis, pois os sintomas desaparecem com a diálise
Sinais e Sintomas da Uremia RELACIONADOS COM DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS E ÁCIDO-BÁSICO Volume Circulante Habitualmente, o paciente urêmico apresenta um excesso de volume circulante à custa de um modesto aumento no sódio e água total. Geralmente, este excesso de volume não traz sintomas, embora, quando excessivo, se traduza por hipertensão arterial, edema e insuficiência cardíaca congestiva. A excessiva ingesta de sal é responsável pelo edema, hipertensão arterial, enquanto a excessiva ingesta de líquidos acarreta hiponatremia. Ambas estas anormalidades traduzem o distúrbio no metabolismo do sódio e água na insuficiência renal crônica. Cumpre relembrar que, na insuficiência renal crônica, há uma perda obrigatória de água imposta pela excreção de soluto e por um defeito no mecanismo de concentração urinária. Desta forma, se o paciente não ingere muito líquido ou apresenta perdas líquidas extra-renais, como vômitos, diarréia, etc., o volume urinário não diminui significativamente. Nesta eventualidade, pode ocorrer uma contração do volume extracelular, reduzindo ainda mais a filtração glomerular e agravando o quadro de uremia.
Potássio Como já frisamos, o balanço do potássio está relativamente preservado até o estádio terminal da insuficiência renal crônica. Hipocalemia pode ocorrer devido ao uso de diuréticos ou em certas tubulopatias, como a síndrome de Fanconi. Hipercalemia não é freqüente na insuficiência renal crônica, mas pode ocorrer nas seguintes circunstâncias: a) piora da nefropatia, acarretando oligúria intensa; b) ingesta excessiva de potássio através de medicamentos que contêm potássio ou substâncias que substituam o sal; c) estados hipercatabólicos que reduzem a capacidade do potássio (v. Cap. 12); administração de drogas retentoras de potássio, como a espironolactona e o triamterene.
Cálcio e Fósforo Hipercalcemia traduz-se pelos seus sinais e sintomas clássicos: anorexia, náuseas, vômitos, dor abdominal e constipação. Dependendo da gravidade, pode ocorrer alteração da personalidade, apatia, sonolência e confusão mental.
Pode ser decorrente do hiperparatireoidismo secundário à insuficiência renal crônica, porém mais comumente é iatrogênica: intoxicação por vitamina D, excessiva ingesta de cálcio (carbonato de cálcio) e alta concentração de cálcio no banho de diálise. Hipocalcemia já é mais freqüente, embora raramente sintomática. Tudo indica que a acidose urêmica protege os pacientes da tetania, pois a correção rápida da acidose é seguida freqüentemente de sinais de tetania. O mecanismo da hipocalcemia já foi abordado. Calcificações metastáticas ocorrem geralmente quando o produto da concentração plasmática do cálcio e do fósforo (Ca P) excede 75. Estas calcificações podem ocorrer na pele, vasos sangüíneos, articulações, olhos, pulmão, etc. O prurido do urêmico pode, às vezes, ser decorrente da deposição de cálcio na epiderme. Hipofosfatemia não é freqüente, pois, como já discutimos, na insuficiência renal crônica há uma tendência à hiperfosfatemia. No entanto, a administração de cálcio ou antiácido que se ligam ao fósforo no intestino pode causar hipofosfatemia, traduzindo-se por fraqueza muscular, anorexia e distúrbios neurológicos.
Acidose Sintomas decorrentes da acidose são infreqüentes, possivelmente porque a instalação é gradual. Assim sendo, a típica respiração de Kussmaul é infreqüente.
RELACIONADOS COM TOXINAS URÊMICAS, DISTÚRBIOS METABÓLICOS E ENDÓCRINOS Manifestações Gastrintestinais Os sintomas mais comuns são a anorexia, náuseas e vômitos. Náuseas pela manhã ou pós-prandiais é o habitual. Alguns se queixam de um gosto metálico e apresentam hálito amoniacal (hálito urêmico). Algumas vezes, o gosto metálico traduz hipercalemia. Náuseas, vômitos e diarréia em pacientes urêmicos caracterizam um quadro de gastroenterite urêmica. Pode ocorrer estomatite, gastrite, duodenite, ileíte, colite e proctite. Sangramento pode ocorrer a qualquer nível do trato gastrintestinal. A maior parte desses sintomas melhora com o tratamento dialítico. A mucosa gastrintestinal revela edema, hiperemia capilar, angiodisplasia, ulcerações superficiais e lesões necróticas e hemorrágicas. As lesões parecem estar relacionadas aos níveis de uréia plasmática. A uréia é difusível no lúmen do trato alimentar, onde é convertida em amônia e dióxido de carbono pela urease bacteriana. Acredita-se que 25% da uréia no organismo sofre hidrólise dentro do intestino. De uma maneira geral, há maior incidência de úlcera péptica em renais crônicos, apesar de, teoricamente, a alta concentração gástrica de amônia servir como tampão. A secreção ácida basal do estômago e mesmo após estimulação tem sido relatada como normal, alta e baixa. Secreção
675
capítulo 37
baixa foi atribuída à doença da mucosa gástrica ou ao efeito-tampão da amônia. Secreção alta foi relacionada ao hiperparatireoidismo secundário. A maioria dos pacientes tem níveis plasmáticos elevados de gastrina, mas não há uma boa correlação com a incidência de úlcera péptica. Como o rim é o principal local de inativação de gastrina, é possível que os níveis elevados de gastrina sejam devidos à redução do clearance renal. Muitas vezes a instituição do tratamento dialítico aumenta a secreção ácida do estômago, caracterizando um estado hipersecretor. Alguns pacientes em diálise crônica desenvolvem ascite. O líquido ascítico se acumula na ausência de processo infeccioso ou maligno intraperitoneal. A concentração de proteína no líquido é geralmente elevada. A princípio, acreditou-se que a diálise peritoneal prévia era condição predisponente, mas a análise de um maior número de pacientes em diálise, com ascite, eliminou esta possibilidade. Até o momento, desconhece-se a causa deste acúmulo de líquido intraperitoneal. É possível que isto seja tradução da polisserosite que acompanha os pacientes urêmicos (efusão pleural, pericardite e ascite). Há uma resolução completa em todos os pacientes submetidos a transplante renal. A presença de anorexia na uremia é amplamente reconhecida e pode estar associada aos sintomas gastrintestinais recém-descritos, mas também a distúrbios na homeostase da leptina, um hormônio envolvido na regulação do apetite (a nível central), bem como no gasto energético basal. Níveis elevados de leptina são encontrados no soro de pacientes urêmicos e estão associados à composição corpórea e a alterações no peso corporal.25
Manifestações Pleuropulmonares Pleurite detectada através de atrito pleural ou dor pleural ou dor pleurítica, com ou sem efusão pleural, pode ser encontrada no paciente gravemente urêmico. Em 1977, Berger e cols. descreveram 14 pacientes com insuficiência renal crônica e efusão pleural, atribuída à síndrome urêmica e não à congestão pulmonar.26 Em 10 dos 14 pacientes, o líquido pleural foi serossanguinolento ou hemorrágico e tinha característica de exsudato. Biópsia pleural ou análise da pleura na autópsia mostrou uma pleurite fibrinosa. Acredita-se que a efusão hemorrágica seja secundária ao uso de heparina durante a hemodiálise e que uma pleurite fibrosa com restrição pulmonar possa ocorrer a longo prazo. A existência de um pulmão urêmico é controvertida. Pulmão urêmico refere-se ao achado radiológico de uma opacificação (congestão) pulmonar bilateral que se estende do hilo para a periferia, poupando os ápices ou bases. A distribuição peri-hilar central das opacidades radiológicas poupando a periferia levou à terminologia de “asa de borboleta” ou “asa de morcego”. Alguns atribuem o achado a uma insuficiência ventricular esquerda. Mas, em alguns pacientes, não há sinais de insuficiência ventricular, e, para estes
casos, postula-se a existência de uma toxina urêmica que aumenta a permeabilidade capilar pulmonar, causando transudação de líquido. O tratamento dialítico com remoção de volume usualmente resolve o quadro. Possivelmente a uremia, hipoalbuminemia e excesso de volume participam do processo. A localização central do líquido pode ser secundária à acidose metabólica freqüentemente presente. A hiperventilação secundária à acidose expandiria preferencialmente os alvéolos periféricos e evitaria a coleção de líquido perifericamente. A acidose também pode levar à constrição das arteríolas periféricas do pulmão.
Manifestações Neurológicas (v. também Cap. 39) Entre as manifestações mais precoces da encefalopatia urêmica estão as alterações do estado de alerta e consciência do meio ambiente. Os pacientes parecem estar fatiga-
Quadro 37.3 Sintomas e sinais das principais anormalidades do complexo urêmico Neurológicas Alterações do sono Cefaléia Convulsões Irritabilidade Alterações eletroencefalográficas Irritabilidade muscular Coma Pulmonares Pulmão urêmico Pleurites Efusão pleural Gastrintestinais Anorexia Náusea, vômito Hálito urêmico Sangramento gastrintestinal Úlcera péptica Neuropatia periférica Parestesias Síndrome da perna irrequieta Condução nervosa prolongada Paralisia Hematológicas Anemia Sangramento Endócrinas Hiperparatireoidismo Anormalidade da tireóide Amenorréia Infertilidade Disfunção sexual
Psicológicas Depressão Ansiedade Psicose Oculares Retinopatia hipertensiva Depósitos de cálcio na conjuntiva e córnea Cardiovasculares Hipertensão arterial Insuficiência cardíaca Coronariopatia Pericardite Miocardite Dermatológicas Palidez Pigmentação Prurido, escoriações Equimoses, púrpura Alterações ungueais Depósitos de cálcio de cristais de uréia (orvalho urêmico) Metabólicas Intolerância aos carboidratos Hiperlipidemia Gota Musculoesqueléticas Fraqueza Osteodistrofia
676
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
dos, preocupados e apáticos. A capacidade de concentração está alterada e, por vezes, nota-se o mesmo com relação à memória, e até mudanças no comportamento, humor, sinais de irritabilidade e distúrbio do sono. Asterixe é um sinal quase sempre presente quando a função sensorial está deprimida no paciente urêmico. É um sinal que traduz apenas uma encefalopatia metabólica, sem especificar a etiologia. Pesquisa-se o sinal solicitando-se ao paciente manter os membros superiores esticados com hiperextensão dos cotovelos e punhos e com os dedos separados. Após alguns segundos, nota-se flexoextensão dos dedos e punhos a intervalos irregulares. São movimentos rápidos e arrítmicos. Com o agravamento do quadro de uremia, notam-se também tremores, fasciculações, espasmos musculares, etc. O paciente torna-se letárgico e evolui para um estado de estupor e coma, quase sempre acompanhado de convulsões. A patogênese da disfunção cerebral na uremia permanece obscura. Encontrou-se em pacientes urêmicos uma diminuição do fluxo sangüíneo cerebral e uma reduzida utilização de oxigênio pelo cérebro. Pelo menos 65% dos pacientes com insuficiência renal crônica que iniciam diálise apresentam evidência de neuropatia urêmica.27 Esta neuropatia é uma polineuropatia distal, simétrica, sensorial e motora, que afeta mais os membros inferiores. A neuropatia periférica afeta primeiro os membros inferiores, depois os superiores, e o envolvimento sensorial geralmente precede o componente motor. Estudos histológicos mostraram desmielinização segmentar, perda axonal, degeneração walleriana, proliferação de células de Schwann com formação de “bulbos de cebola” e remielinização. Exame histoquímico de biópsia muscular de pacientes urêmicos revela atrofia de fibras tipo II. Os sintomas de envolvimento muscular se traduzem por fadiga, fraqueza, atrofia, irritabilidade e cãibras. A síndrome da perna irrequieta (restless-leg syndrome) comumente ocorre em urêmicos e provavelmente indica comprometimento dos nervos periféricos pelo processo urêmico. Caracteriza-se por uma sensação de desconforto nos pés e pernas, sensação de prurido e picadas, pior à noite e aliviada pela movimentação freqüente dos membros. Queimação nos pés e cãibras musculares são outros sintomas que podem traduzir neuropatia urêmica. Os sinais usuais de neuropatia urêmica são: diminuição da sensibilidade vibratória nos membros inferiores e perda dos reflexos tendinosos profundos (primeiro aquíleo e, depois, patelar). A maioria dos pacientes tratados com hemodiálise crônica estabilizam ou melhoram lentamente a neuropatia.
Manifestações Hematológicas A anemia desenvolve-se invariavelmente à medida que a nefropatia crônica progride. Ela poderá ser percebida quando a função renal estiver abaixo de 50% do normal. O grau de anemia independe da natureza da nefropatia,
embora, em pacientes com rins policísticos, o grau de anemia seja menor. Não há uma relação entre o nível de azotemia e a anemia, mas, geralmente, com a progressão da destruição renal, a anemia agrava-se. Ela é quase sempre normocítica, normocrômica, traduzindo a natureza hipoproliferativa da eritropoese, resultante dos níveis reduzidos de eritropoetina, que, por sua vez, são conseqüentes à redução da massa renal. A introdução da eritropoetina recombinante humana mostrou que muitos pacientes com insuficiência renal crônica terminal apresentam deficiência de ferro, contribuindo para a anemia. Outros fatores que podem agravar esta anemia são: perda crônica de sangue nos dialisadores, deficiência de ácido fólico e hemólise. Além de fatores no plasma que podem ser responsáveis pela hemólise, a hipertensão arterial grave pode fragmentar os eritrócitos. Clinicamente, os pacientes apresentam palidez e queixam-se de fadiga ou de uma sensação de mal-estar. A disponibilidade de eritropoetina recombinante humana foi um marco e importante passo na correção da anemia dos renais crônicos. A outra importante anormalidade hematológica é o distúrbio de homeostasia. Percebe-se que pacientes urêmicos apresentam equimoses espontâneas e, algumas vezes, sangramento gastrintestinal, vaginal e em saco pericárdico. Há relatos também de hematomas subdurais espontâneos. O defeito hemostático é multifatorial. Algumas anormalidades estão localizadas nas plaquetas, na parede vascular, na interação plaquetas e parede vascular, e a anemia como fator adicional. Descreveu-se um defeito adquirido no armazenamento de ADP e serotonina e na produção de tromboxane A2. Há um excesso em urêmicos de fator relaxante derivado do endotélio (EDRF), o qual inibe a função plaquetária. Prostaciclina e óxido nítrico, potentes inibidores da concentração celular de L-arginina, contribuem para a anormalidade da função plaquetária. O fator VIII (von Willebrand) tem um papel importante na adesão e agregação plaquetária, e na uremia há alterações na estrutura multímera do fator VIII. Acredita-se que o distúrbio seja devido a uma função plaquetária anormal, conseqüente a uma alteração do fator plaquetário III. É possível que esta alteração plaquetária se deva aos níveis de ácido guanidinossuccínico, pois a remoção deste metabólito pela diálise corrige a anormalidade.
Manifestações Cardiovasculares Em 1971, Matalon e cols. relataram um sopro de insuficiência aórtica funcional em pacientes urêmicos.28 Os autores acreditam que a hipertensão arterial, anemia e congestão cardíaca são elementos que predispõem a uma insuficiência funcional transitória da aorta, e que a redução da pressão arterial e a remoção do excesso de volume circulante fazem desaparecer o sopro. Barrat e cols., no entanto, acreditam que um sopro diastólico em pacientes com insuficiência renal nem sempre
capítulo 37
é devido a incompetência aórtica e que pode ser de origem pericárdica, pois muitos desses pacientes apresentam pequenas efusões pericárdicas.29 Entretanto, Danahy e Ronan chamam a atenção para não se confundir um sopro funcional de regurgitação aórtica com o sopro venoso cervical, freqüente e intenso nos pacientes em diálise.30 Um sopro venoso cervical é comum em adultos normais, mas pode ser mais intenso nos pacientes em hemodiálise devido à anemia e à comunicação arteriovenosa interna ou externa. Hipertensão arterial invariavelmente ocorre nos estádios mais avançados da insuficiência renal crônica e, na grande maioria das vezes, é resultado de um volume circulante excessivo, podendo ser controlada com medidas que diminuem esse volume, tais como: redução da ingestão de sódio, diuréticos potentes e remoção de líquido pela diálise. A expansão do volume extracelular aumenta o débito cardíaco e causa hipertensão, mas também pode aumentar a resistência periférica, através do aumento da sensibilidade do leito vascular aos efeitos pressóricos da angiotensina II, alfa1-agonistas ou outros hormônios que aumentam o cálcio intracelular e o tônus do músculo liso vascular. Há evidência da existência de um hormônio natriurético que poderia aumentar o tônus muscular basal e a reatividade vascular aos hormônios pressóricos. Este fator seria produzido no hipotálamo em resposta a uma expansão de volume. Numa minoria de pacientes, a hipertensão arterial não responde à redução de volume e parece ser devida à participação do sistema renina-angiotensina-aldosterona. No entanto, esses pacientes respondem a drogas anti-hipertensivas. Um pequeno número de pacientes apresenta hipertensão arterial dita refratária, pois apesar de adequada redução do volume circulante e de múltiplas e potentes drogas anti-hipertensivas, continuam gravemente hipertensos, com perda de peso, graus variados de insuficiência cardíaca e alterações neurológicas. Este quadro costuma acompanhar-se de hiper-reninemia, e há uma boa resposta à nefrectomia bilateral. No entanto, mais recentemente, o aparecimento de drogas hipotensoras mais potentes tem controlado a pressão arterial com mais eficácia e evitado a nefrectomia bilateral. A hipertensão arterial é o principal fator de risco para o desenvolvimento de coronariopatia, insuficiência cardíaca congestiva e doença cerebrovascular. Insuficiência cardíaca congestiva e edema agudo de pulmão são quase sempre decorrentes do excesso de volume circulante. No entanto, outras anormalidades, como a pericardite e a miocardiopatia, são atribuídas ao quadro de uremia e relacionadas a toxinas urêmicas. A pericardite comumente acompanha a uremia terminal e, no passado, a sua presença era indicativa de morte iminente. Hoje em dia, a pericardite é encontrada em pacientes urêmicos submetidos a diálise crônica intermitente e quase sempre traduz um controle inadequado da uremia. Outras vezes, a peri-
677
cardite ocorre em doentes bem dialisados, e, para estes casos, tem-se sugerido uma origem infecciosa. Os sinais e sintomas de pericardite urêmica são os mesmos da pericardite não-urêmica: dor precordial, febre, atrito pericárdico e graus variados de efusão pericárdica, que, na grande maioria das vezes, é sanguinolenta. A existência de uma miocardiopatia urêmica é controvertida. Enquanto alguns grupos acreditam na sua existência, outros ponderam que a multitude de fatores etiológicos envolvidos (excesso de volume, arteriosclerose, pericardiopatia, etc.) torna difícil a individualização.31,32 A doença cardiovascular aterosclerótica é de extrema importância na síndrome urêmica, dada a acelerada aterogênese que é evidente em pacientes em IRC.33,34 Além disso, recentemente foi descrita a alta incidência de calcificação arterial em pacientes jovens em hemodiálise.35 Juntos, estes fatores contribuem para a alta taxa de mortalidade anual de pacientes em diálise (aproximadamente 9%), o que representa 10 a 20 vezes as taxas para a população geral, mesmo quando ajustadas para idade, sexo e presença de diabetes mellitus. É importante indicar que a doença cardiovascular aterosclerótica representa cerca de metade desta mortalidade. A patogênese da doença cardiovascular aterosclerótica está relacionada a múltiplos fatores, muitos dos quais já tiveram vínculo demonstrado com a aterosclerose, como dislipidemia, hipertrofia ventricular esquerda, diabetes, hipertensão arterial sistêmica e tabagismo. De forma intuitiva, mas não com o mesmo poder de evidência, podemos indicar que os mesmos fatores possam ser aplicáveis a pacientes em IRC. Entretanto, o estudo de Cheung et al., realizado em 936 pacientes em HD, mostrou que, ainda que tabagismo e diabetes estejam associados a doença cardiovascular, a mesma associação não se repete para colesterol total ou níveis pressóricos.36 De fato, há quase duas décadas, Degoulet et al.37 obtiveram resultados paradoxais mostrando que níveis mais altos de colesterol sérico previam melhor sobrevida para pacientes em diálise, e hoje é amplamente aceito o conceito de que baixas taxas de colesterol representam um marcador de desnutrição e fator de risco para morbi-mortalidade em pacientes portadores de IRC. Vários fatores de risco não tradicionais para doença cardiovascular estão comumente presentes na população urêmica, como hiper-homocisteinemia, estresse oxidativo, calcificação vascular, desnutrição e inflamação. Portanto, pode-se especular que estes representem a razão pela alta prevalência de doença aterosclerótica em pacientes em IRC, sendo possível que o impacto de fatores de risco não tradicionais seja tão importante que minimize o impacto da dislipidemia ou hipertensão na taxa de mortalidade destes pacientes.
Manifestações Dermatológicas A palidez do paciente urêmico traduz a anemia subjacente. Uma hiperpigmentação cutânea exacerbada pela luz solar também é comum e parece ser devida à deposição de
678
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
pigmentos lipossolúveis na epiderme e tecido adiposo subcutâneo. Além disso, altos níveis de hormônio melanotrófico têm sido detectados em insuficiência renal crônica e podem contribuir para a hiperpigmentação. A pele é geralmente seca. Prurido é uma manifestação freqüente na fase avançada da uremia ou no paciente em diálise crônica e tem sido atribuído aos elevados níveis circulantes de paratormônio ou a depósitos de cálcio na pele, ou ainda como manifestação precoce de uma neuropatia sensorial. O prurido pode ser tão intenso que o ato de coçar acarreta escoriações generalizadas. Quando em diálise, onde são submetidos à heparinização sistêmica, estas escoriações sangram com freqüência. No passado, quando se permitia um acúmulo extremo de uréia, antes de se instalar o tratamento dialítico, observava-se, com freqüência, a deposição de cristais de uréia na pele (uremic frost orvalho urêmico). Hoje em dia, com a instituição mais precoce do tratamento dialítico e com uma higiene mais cuidadosa, raramente se observa esse fenômeno. Cerca de 10% dos pacientes com insuficiência renal crônica apresentam alterações de unhas consideradas características: a metade proximal da unha é esbranquiçada, enquanto a metade distal é avermelhada ou, às vezes, apresenta um tom marrom (half and half nail of Lindsay).38 Alguns pacientes, sobretudo os gravemente urêmicos, apresentam equimoses nas superfícies extensoras dos membros e refletem a anormalidade no processo de coagulação. Queda de cabelo pode ocorrer em qualquer fase da insuficiência renal crônica e é usualmente reversível.
Alterações Ósseas e Articulares (v. também Cap. 40) Como o rim participa do metabolismo do cálcio, fósforo, paratormônio e vitamina D, não é surpresa o aparecimento de alterações ósseas e minerais com a destruição do parênquima renal. A hiperfosfatemia e a hipercalcemia inicial podem evoluir para a síndrome caracterizada por hiperparatireoidismo, dores, fraturas ósseas e calcificações cutâneas, articulares e viscerais. Estas manifestações não são comuns no paciente não-dialisado, mas o tratamento dialítico a longo prazo propiciou o aparecimento destes sinais e sintomas. LESÕES ÓSSEAS. As que aparecem em pacientes urêmicos variam muito de paciente para paciente. Isto se deve provavelmente a vários fatores: idade do paciente, duração da insuficiência renal, dieta, tratamento instituído e duração do tratamento dialítico.39 Hoje em dia o termo osteodistrofia renal engloba várias lesões ósseas: osteíte fibrosa (reflexo do hiperparatireoidismo secundário), osteomalacia (freqüentemente relacionada à toxicidade do alumínio) e doença óssea adinâmica. Em crianças podem ocorrer raquitismo e deformidades esqueléticas. Osteosclerose e osteoporose são menos encontradas. A osteíte fibrosa
é caracterizada por um alto turnover ósseo, enquanto a osteomalacia e a doença óssea adinâmica têm um baixo turnover ósseo. Em algumas partes do mundo, a osteomalacia (raquitismo na criança) é a principal lesão óssea em urêmicos e tem sido atribuída a uma menor ingestão de vitamina D e menor exposição solar. A osteomalacia traduz uma condição de inadequada mineralização do tecido osteóide normal. Apesar das observações de que os níveis plasmáticos de calcitriol estejam reduzidos em pacientes urêmicos e de que a absorção intestinal de cálcio esteja também reduzida, franca osteomalacia é raramente observada. Mesmo em pacientes anéfricos, a osteomalacia é rara. Há evidência de que o acúmulo de alumínio em pacientes urêmicos pode causar osteomalacia, hipercalcemia, encefalopatia e anemia microcítica hipocrômica (v. Cap. 40). Hoje em dia se reconhece que o alumínio administrado por via oral como quelante do fósforo é reabsorvido em quantidades significativas e que se acumula paulatinamente nos tecidos. Além do mais, a água utilizada na hemodiálise está freqüentemente contaminada por altas concentrações de alumínio e é talvez a principal fonte de contaminação crônica pelo alumínio. Clinicamente, os pacientes urêmicos com osteomalacia queixam-se de dores ósseas, sobretudo nos ombros, pélvis e coxas. Nas formas mais graves ocorrem fraturas traumáticas ou espontâneas. O único sinal radiológico diagnóstico é a visualização de lesões lineares radiotransparentes (zonas de Looser), também denominadas pseudofraturas. O diagnóstico é geralmente estabelecido através de biópsia óssea, observando-se um excesso de osteóide. No entanto, o diagnóstico mais preciso baseia-se na observação de um retardo de mineralização. Uma das características da osteomalacia relacionada ao alumínio é a não-resposta ao tratamento com vitamina D. Estes pacientes geralmente se apresentam com dor óssea, fraqueza muscular proximal e fraturas ósseas. A calcemia está normal ou elevada, assim como a fosfatemia. Alguns pacientes desenvolvem hipercalcemia espontânea quando recebem vitamina D ou cálcio por via oral. Alguns destes pacientes são submetidos desnecessariamente à paratireoidectomia. O alumínio no osso se deposita na zona de mineralização e parece impedir a mineralização do osso.40 Estudos recentes indicam que a doença óssea adinâmica (doença óssea aplástica) está se tornando a doença óssea mais comum. Na ausência de intoxicação pelo alumínio, certas condições predispõem à baixa atividade osteoblástica: hipoparatireoidismo pós-cirúrgico ou idiopático, corticosteróides, diabetes mellitus, hipogonadismo, hipotireoidismo, intoxicação pelo ferro e possivelmente acidose. Um outro processo que afeta o osso de urêmicos é o aumento da atividade osteoclástica, aumentando a reabsorção óssea e substituindo o tecido ósseo por tecido fibroso. Esta reabsorção óssea ocorre predominantemente na região subperióstea e endóstea. Observam-se invariavel-
capítulo 37
mente níveis circulantes elevados de paratormônio. O aspecto histológico patognomônico de osteíte fibrosa é uma fibrose peritrabecular. Sintomas clínicos, como dor óssea, são menos freqüentes. Deve-se salientar que raramente se encontra uma lesão óssea pura no urêmico. Quase sempre há uma mistura das duas lesões, com predominância de uma sobre a outra. Osteoporose, manifestada radiologicamente por uma diminuição da densidade óssea (osteopenia), é um achado freqüente. É provável que a imobilização, a deficiência de cálcio per se e a desnutrição protéica sejam a causa do componente osteoporótico da osteodistrofia renal. Osteoporose é uma diminuição da massa óssea normalmente mineralizada. Mais recentemente observou-se uma síndrome musculoesquelética em pacientes por longos anos em diálise e atribuída à amiloidose por beta2-microglobulina. Pelos sintomas e sinais radiológicos, pode ser confundida com algumas das doenças ósseas descritas. A primeira manifestação da doença é a síndrome do túnel carpiano, que tipicamente se desenvolve depois de 5 a 8 anos de diálise. Muitos pacientes em diálise queixam-se de artralgias, sintomas periarticulares, também conhecidas como “artropatia crônica da diálise”. Osteosclerose aparece radiologicamente como um aumento da densidade óssea. A lesão parece refletir uma predominância da formação óssea sobre a reabsorção óssea. Como o osso trabecular está mais afetado, a lesão é mais evidente nas vértebras, pélvis, costelas, clavículas e metáfise dos ossos longos. CALCIFICAÇÃO METASTÁTICA. Calcificações em partes moles ocorrem nas seguintes circunstâncias: produto iônico de cálcio fósforo elevado, hipercalcemia, lesão local do tecido e aumento local do pH. O fator mais importante parece ser, no entanto, o aumento do produto cálcio fósforo, geralmente acima de 75. Exemplo: calcemia 9 mg/dl e fosfatemia 10 mg/dl; 9 10 90. Entendese, portanto, a importância de controlar a hiperfosfatemia com drogas tipo carbonato, acetato de cálcio, que se ligam ao fósforo no intestino. Calcificação arterial aparece na radiografia, desenhando todo o trajeto arterial, e resulta da deposição de cálcio na membrana elástica média e interna. O lúmen geralmente não é envolvido, embora possa ocorrer calcificação de placas ateroscleróticas na íntima de grandes vasos. Calcificações periarticulares, sintomáticas ou não, são comuns em pacientes urêmicos e dialisados. Pode ocorrer tenossinovite ou tendinite. Às vezes, observam-se grandes massas tumorais periarticulares, que, embora não dolorosas, dificultam a mobilidade. Essas massas são encapsuladas e contêm líquido tipo cal ou em forma de pasta. Podem regredir com o controle da hiperfosfatemia, da calcemia e do hiperparatireoidismo secundário. Existem três processos articulares e periarticulares importantes que comumente dão origem a síndromes reumá-
679
ticas em pacientes dialisados: sinovite e/ou bursite devido à deposição de cristais, infecções piogênicas de articulações e osso, e necrose isquêmica do osso subcondral. A deposição peri- ou intra-articular de cristais de hidroxiapatita pode causar um quadro de artrite gotosa. Os pacientes com um produto de cálcio fósforo acima de 75 estão sujeitos a este tipo de complicação. Embora pacientes urêmicos, mesmo dialisados, tenham hiperuricemia, artrite gotosa não é freqüente, talvez porque a resposta inflamatória do urêmico esteja diminuída e também pela eliminação extra-renal do ácido, particularmente pelo intestino. Septicemia, osteomielite e artrite séptica são problemas do urêmico em diálise, sobretudo pela imunidade deficiente e pela utilização de shunts arteriovenosos externos que se constituem em porta de entrada para os germes. Necrose asséptica não-traumática da cabeça do fêmur pode ocorrer em urêmicos em diálise, sobretudo nos pacientes com hiperparatireoidismo secundário. No entanto, esta complicação é muito mais comum nos pacientes submetidos a transplante renal e que recebem corticosteróides. ALTERAÇÕES SEXUAIS. As anormalidades endócrinas ocorrem por disfunção do eixo hipotalâmico-pituitário-adrenal. São caracterizadas por níveis elevados de hormônio luteinizante (HL), hormônio folículo-estimulante, prolactina e hormônio liberador do HL, além de níveis baixos de testosterona no homem e progesterona na mulher. A investigação da capacidade reprodutiva de homens em diálise mostrou que a espermatogênese está comprometida. Geralmente há oligospermia e diminuição da mobilidade espermática. Os níveis plasmáticos de testosterona são baixos, refletindo uma disfunção das células intersticiais do testículo. Atrofia testicular clínica é freqüente. A função pituitária está intacta. Na mulher, aparecem irregularidades menstruais com o início dos sintomas urêmicos, e, nos estados mais avançados da uremia, amenorréia está presente. Algumas mulheres em diálise têm menstruações ocasionais, e outras, menstruações normais. A infertilidade e as alterações menstruais parecem estar relacionadas à falta de ovulação. Gravidez em mulheres com insuficiência renal crônica (uréia plasmática acima de 60 mg/100 ml) termina invariavelmente em aborto espontâneo. Há relatos, no entanto, de gravidez levada a termo durante o tratamento dialítico. Ginecomastia é descrita em insuficiência renal crônica, aparentemente exacerbada pela hemodiálise. Ela é vista usualmente no primeiro ano de hemodiálise, desaparecendo em seguida. Perda da potência sexual nos homens e perda da libido em ambos os sexos são ocorrências comuns em insuficiência renal crônica, melhorando com a instituição do tratamento dialítico. Naturalmente, outros fatores contribuem: anemia, drogas anti-hipertensivas, desnutrição, alterações psicológicas, etc.
680
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
FUNÇÃO TIREOIDIANA. A função tireoidiana tem sido muito investigada em pacientes com insuficiência renal crônica. Alguns relatam evidência bioquímica de hipertireoidismo e outros, de hipotireoidismo. Alguns sugerem que há sinais e sintomas de mixedema: baixa temperatura, intolerância ao frio, pele seca, letargia, fadiga, edema, hiporreflexia, pseudomiotonia, anorexia e hipercolesterolemia na vigência de síndrome nefrótica. Um grupo relatou uma alta incidência de bócio, fato não confirmado por outros grupos. As anormalidades tireoidianas podem ser interpretadas da seguinte maneira:41 1) há uma alta incidência de baixos níveis séricos de T3 em pacientes com nefropatia crônica. Nesses mesmos pacientes, o estado metabólico e a determinação do hormônio tireotrófico (TSH) e T4 livre são normais, caracterizando um estado de eutireoidismo; 2) os baixos níveis de T3 parecem não ser devidos a uma redução na proteína de transporte, mas talvez a uma diminuição da conversão periférica de T4 para T3. Portanto, na insuficiência renal crônica a função tireoidiana deve ser avaliada através de níveis séricos de T4 e TSH.41 DISTÚRBIOS IMUNOLÓGICOS. A principal causa de morte em insuficiência renal aguda é a infecção, mas, em pacientes em hemodiálise crônica, ela é responsável por apenas 17% das mortes. A imunidade celular está comprometida, pois a resposta a antígenos cutâneos está reduzida. A incidência de neoplasias malignas está aumentada, o que é atribuído a um
comprometimento da vigilância imunológica. Observamse ainda: linfopenia e hipoplasia do timo em renais crônicos; retardo de cicatrização de feridas cirúrgicas e diminuição da resposta inflamatória. Por outro lado, há crescente evidência de que uma atividade inflamatória sistêmica aumentada ocorra durante o desenvolvimento de insuficiência renal crônica, com diversas conseqüências. De fato, uma combinação entre desnutrição, inflamação e aterosclerose (síndrome MIA) é comum em IRC, e os seus componentes se relacionam entre si e com a alta mortalidade destes pacientes.42 Sinais de inflamação crônica são observados em pacientes portadores de doença renal mesmo antes do tratamento dialítico, e está sendo proposta a associação entre citocinas pró-inflamatórias e tanto desnutrição quanto doença cardiovascular (DCV).43 Também moléculas de adesão, hialuronan, lipoproteína A e proteína C-reativa representam marcadores de alta mortalidade em IRC. A síndrome MIA acarreta alto impacto na mortalidade de pacientes em programa dialítico, e inflamação sustentada e elevação dos níveis circulantes de citocinas pró-inflamatórias parecem representar o núcleo do problema. Portanto, uma situação imunológica paradoxal parece ocorrer durante a uremia, onde uma resposta inflamatória sustentada contrasta com um sistema de defesa ineficaz. Um esquema proposto para justificar a alta mortalidade de pacientes em IRC (e sua associação a toxicidade urêmica) está representado na Fig. 37.6.
Fig. 37.6 Representação esquemática dos mecanismos pelos quais a toxicidade urêmica leva a alta taxa de mortalidade em pacientes portadores de IRC.
capítulo 37
Pontos-chave: • Os sinais e sintomas da síndrome urêmica refletem a retenção de compostos específicos como o sódio (edema), potássio (manifestações musculares), cálcio/fósforo (prurido) ou compostos múltiplos ou não identificados (náuseas, serosite, distúrbios da hemostasia) • A doença cardiovascular (de causa multifatorial) é responsável por aproximadamente metade das mortes em IRC
681
Alguns investigadores relatam melhora desta intolerância à glicose com a hemodiálise crônica.
Metabolismo Protéico O quadro de uremia é caracterizado pelo acúmulo de produtos nitrogenados (uréia, creatinina, ácido úrico, etc.) oriundos do catabolismo da proteína da dieta e da destruição de reservas protéicas do organismo. Estes produtos nitrogenados são responsáveis pela maioria dos sintomas urêmicos, pois a redução desses produtos nitrogenados através de restrição protéica ou diálise é acompanhada de uma rápida melhora clínica. E é por isto que se tem afirmado que a uremia é um estado de intolerância protéica.45
PRODUTOS NITROGENADOS Metabolismo dos Lipídios Complicações ateroscleróticas de artérias coronárias e cerebrais são as principais causas de morte em pacientes submetidos a diálise crônica. Um dos fatores que aumentam a suscetibilidade à enfermidade cardiovascular é a elevação dos lipídios plasmáticos. Vários estudos mostram que grande número de pacientes com insuficiência renal crônica apresentam elevados níveis de triglicerídios e um tipo IV de hiperlipoproteinemia. Em um grupo de 100 pacientes com insuficiência renal crônica, não-dialisados, 43% apresentaram hipertrigliceridemia, 49% tinham um padrão lipoprotéico normal e 42% apresentaram um padrão tipo IV de hiperlipoproteinemia.44 Até o momento, estes achados são interpretados como oriundos de dois fatores: elevada produção endógena de triglicerídios e remoção anormal de triglicerídios, traduzidos por uma atividade lipolítica pós-heparina subnormal. Esta atividade lipolítica deve refletir os níveis tradicionais de lipase lipoprotéica, uma enzima importante na remoção de triglicerídios do plasma.
Metabolismo dos Carboidratos A maioria dos pacientes com insuficiência renal crônica avançada apresentam intolerância à glicose. A glicose em jejum é normal ou discretamente elevada. A curva glicêmica é idêntica à encontrada em diabéticos. A síntese e a liberação de insulina são normais, mas a vida-média está prolongada. Como o rim é o principal local de degradação da insulina, é possível que, num rim lesado, o metabolismo da insulina esteja reduzido, justificando uma vidamédia prolongada após um teste de tolerância à glicose. É possível, também, que o mesmo mecanismo explique a diminuição das necessidades diárias de insulina do diabético com insuficiência renal crônica, à medida que a função renal se deteriora. No entanto, estas considerações não explicam por que ocorre hiperglicemia após uma carga de glicose. Tudo indica que há um antagonismo periférico à ação da insulina.
Uréia O nitrogênio uréico é o principal componente que varia com a ingesta protéica porque o nitrogênio liberado durante a degradação de proteína e aminoácidos é quase inteiramente convertido em uréia. Portanto, a quantidade de uréia produzida diariamente reflete diretamente a quantidade de proteína da dieta (ou endógena) degradada cada dia. A uréia produzida tem dois destinos possíveis: uma parte é degradada por bactérias intestinais formando NH3 e CO2, os quais são recirculados para o fígado, e o restante da uréia é excretado pelo rim ou acumulado na água do organismo. RITMO DE APARECIMENTO DA URÉIA (UNA ⴝ UREA NITROGEN APPEARANCE RATE). A quantidade de uréia excretada acumulada é denominada aparecimento da uréia e é o mais importante índice fisiológico e nutricional de equilíbrio de nitrogênio. Além do mais, é o principal determinante do balanço nitrogenado. Como a uréia tem a mesma concentração nos vários compartimentos líquidos do organismo, o pool de uréia pode ser calculado através da água total do organismo (60% do peso corporal) e da concentração sérica de uréia. Assim sendo, o ritmo de aparecimento da uréia é calculado através da soma do acúmulo de nitrogênio uréico (que pode ser positivo ou negativo) e do nitrogênio uréico urinário excretado (determinado durante o mesmo período de análise). Naturalmente, se o peso corporal e a concentração sangüínea de uréia forem constantes, o aparecimento de uréia será igual à excreção de uréia. Esta quantidade de uréia assim obtida, quando multiplicada por 6,25 para conversão em equivalente protéico, tem sido denominada taxa de catabolismo protéico (PCR protein catabolic rate). Quando a taxa de aparecimento do nitrogênio uréico for elevada em pacientes com dietas hipoprotéicas, isto é indicativo de balanço nitrogenado negativo. A situação inversa pode traduzir uma ingesta inadequada de nitrogênio.46 DEGRADAÇÃO DE URÉIA. A parte de uréia produzida diariamente e degradada em NH3 e CO2 pelas ureases bacterianas na luz intestinal é uma fonte endógena de ni-
682
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
trogênio não-protéico ofertada diretamente ao fígado. Propôs-se que esta amônia podia ser utilizada na síntese de aminoácidos e proteína. Com a retenção de uréia no sangue de pacientes urêmicos, estimava-se que a degradação intestinal de uréia fosse elevadíssima e a possibilidade de síntese protéica através da NH3 permitiria a redução da ingesta protéica, mantendo-se o balanço nitrogenado. Entretanto, cuidadosos estudos indicaram que a quantidade de NH3 oriunda da degradação de uréia na luz intestinal não é, no paciente urêmico, diferente daquela no indivíduo normal. Na verdade, este clearance extra-renal de uréia está reduzido no urêmico crônico, talvez porque a uremia altere a mucosa intestinal, limitando o acesso de uréia a ureases bacterianas. Além do mais, quando se suprimiu a degradação de uréia através da administração de antibióticos por via oral, o aparecimento de uréia não se alterou. Se o nitrogênio derivado da degradação de uréia estivesse sendo utilizado na síntese de aminoácidos, a quantidade de uréia excretada na urina e acumulada na água do organismo deveria elevar-se durante a supressão da degradação. Logo, conclui-se que o nitrogênio uréico da degradação de uréia não é nutricionalmente importante para os renais crônicos.
Creatinina Creatinina provém da desidratação não-enzimática da creatina e creatina fosfato. A creatina está contida no músculo e pode originar-se da síntese endógena e da creatina pré-formada da dieta. Como o pool de creatina é proporcional à massa muscular, e como uma quantidade constante de creatina é convertida diariamente a creatinina, a quantidade de creatinina produzida é proporcional à massa muscular. O fator mais importante que afeta a excreção de creatinina em indivíduos normais, afora a quantidade de creatina e creatinina na dieta, é a massa muscular magra (lean body tissue) e a idade. O declínio na excreção de creatinina com o envelhecimento é desproporcional à perda de massa muscular. Isto indica que deve haver uma degradação de creatinina. O mesmo ocorre no renal crônico quando a creatinina excede 6 mg/dl: há uma progressiva redução na excreção de creatinina, fora de proporção para qualquer alteração da massa corporal magra. A importância fisiológica da degradação de creatina, assim como o declínio na excreção de creatinina que ocorre em indivíduos ingerindo uma dieta pobre em proteínas, é que a excreção de creatinina não pode ser usada como um índice de massa corporal magra em renais crônicos.
Outros Compostos Nitrogenados ÁCIDO ÚRICO. A concentração sérica de ácido úrico aumenta em pacientes com insuficiência renal porque o rim é a principal via de eliminação. Entretanto, como o ácido úrico sérico raramente está acima de 10 mg/dl, nestes pacientes significa uma redução na produção de
ácido úrico (através de redução da ingesta protéica) ou uma degradação extra-renal. Há evidência de que o ácido úrico também é degradado, como a uréia, por bactérias intestinais. Não há no entanto necessidade de se tratar a hiperuricemia do renal crônico, a não ser que a uricemia seja superior a 10 mg/dl na mulher e 13 mg/dl no homem. AMÔNIA. A amônia provém de duas fontes: catabolismo da glutamina pelo fígado, rim e intestino e degradação bacteriana da uréia. A amônia produzida é detoxificada pela conversão em uréia. Nos renais crônicos não parece haver nenhuma anormalidade na detoxificação hepática de amônia ou acúmulo anormal de amônia. O nitrogênio contido no ácido úrico, creatinina, etc., é denominado nitrogênio não-uréico, para distingui-lo do nitrogênio uréico, e corresponde em renais crônicos a mais ou menos 2,5 g de N/dia.
NECESSIDADES DE NITROGÊNIO NA UREMIA Estudos iniciais sugeriram que pacientes urêmicos necessitavam menos nitrogênio que indivíduos normais. Giordano, utilizando proteínas de alto valor biológico, concluiu que 85% dos pacientes alcançavam equilíbrio nitrogenado com 25 g de ingesta protéica por dia.47 Estudos posteriores não confirmaram esta e outras observações iniciais similares, e a conclusão atual é que as necessidades de nitrogênio de pacientes urêmicos não são diferentes das de indivíduos normais. Entretanto, alguns fatores podem aumentar as necessidades de nitrogênio na uremia: 1) perdas extra-renais de proteína (proteinúria, perdas fecais-sangramento gastrintestinal); 2) alterações eletrolíticas — a acidose estimula a produção de uréia e a hipo- e hipercalemia aumentam o catabolismo do nitrogênio; 3) anormalidades no metabolismo de carboidratos — a degradação muscular tem correlação direta com a falta de resposta à ação da insulina na incorporação muscular de glicose; hiperglucagonemia e hiperparatireoidismo, presentes na uremia, aumentam a excreção de uréia em indivíduos normais; 4) há evidência de um balanço anormal entre síntese e degradação protéica muscular na uremia.
Pontos-chave: • Um perfil lipídico pró-aterosclerótico é comum em IRC • Intolerância à glicose e resistência insulínica são características do metabolismo de carboidratos em IRC • A diminuição da taxa de filtração glomerular acarreta retenção de compostos nitrogenados, responsáveis por muitos dos sintomas urêmicos
capítulo 37
COMO INVESTIGAR O PACIENTE COM INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA A importância da detecção precoce de insuficiência renal crônica reside na possibilidade de ser secundária a uma causa reversível. Exemplo: correção de uma obstrução urinária, remoção de cálculos ou suspensão de drogas que possam estar lesando o rim. A história deve incluir uma pesquisa de todos os sintomas urinários prévios: sintomas de infecção urinária, cólica renal, eliminação de cálculos e ingesta de analgésicos, sobretudo os que contêm fenacetina. A história deve incluir dados sobre hipertensão arterial, diabetes mellitus, surdez, colagenoses, gota, etc. Dados de história que possam ser correlacionados com uma etiologia específica para a insuficiência renal crônica estão enumerados no Quadro 37.4. O exame físico deve seguir os princípios gerais de qualquer avaliação clínica. No entanto, certos sinais físicos sugerem nefropatia congênita: deformidade e implantação baixa das orelhas podem estar associadas a hipoplasia renal, duplicidade das vias excretoras ou nefrite intersticial congênita. Rins aumentados de volume e palpáveis podem ser devidos a doença policística ou hidronefrose congênita. O Quadro 37.5 também enumera os principais achados de exame físico capazes de sugerir uma etiologia específica para a insuficiência renal crônica.
Quando a nefropatia é adquirida, procuramos sinais, tais como hipertensão arterial, que pode ser primária, tendo sido a causa da nefropatia, ou secundária a uma nefropatia crônica. Muitas vezes, é impossível discernir o que apareceu primeiro, se a hipertensão arterial ou a nefropatia. Retinopatia diabética pode acompanhar uma nefropatia diabética. Muitas vezes, o exame físico é inteiramente normal, exceto pela presença de hipertensão arterial. O exame de uma amostra de urina matinal deve incluir: densidade urinária e um teste qualitativo para glicosúria e quantitativo para proteinúria. Numerosos cilindros celulares podem ser vistos nas glomerulonefrites, incluindo as secundárias a uma colagenose ou mesmo hipertensão arterial maligna. Já a pielonefrite crônica apresenta raros cilindros, mas pode apresentar um número elevado de leucócitos. Proteinúrias importantes ( 3 g/dia) são geralmente secundárias a glomerulonefrites, nefropatia diabética e amiloidose. Valores inferiores a esse são usualmente encontrados em pielonefrites crônicas, hipertensão arterial, uropatia obstrutiva, etc. Com a progressão da nefropatia crônica, geralmente há uma redução da proteinúria. Entretanto, em algumas eventualidades observamos proteinúria intensa, com função renal residual abaixo de 5 ml/min: nefropatia diabética, nefropatia membranosa e amiloidose. Hemograma e análise plasmática de uréia, creatinina, eletrólitos, cálcio, fósforo, fosfatase alcalina, ácido úrico e eletroforese de proteína devem ser solicitados. Anemia
Quadro 37.4 Dados de história que sugerem uma etiologia específica para a insuficiência renal crônica* Dados de história 1. Glomerulonefrite aguda 2. Enurese prolongada na infância 3. Cólica renal 4. Infecção urinária recorrente 5. Sintomas de prostatismo 6. Ingesta crônica de medicamentos a. Analgésicos b. Methysergide c. Vitamina D d. Diuréticos, sulfonamidas e. Antiácidos 7. História de sopro cardíaco 8. Hemorragia pulmonar 9. Infecção extra-renal crônica 10. Dor e edema articular 11. Comprometimento multissistêmico 12. História familiar de nefropatia 13. História familiar de diabetes mellitus *Obtido de Gulyassy, P.F. et al.37
683
Etiologia 1. Glomerulonefrite crônica 2. Obstrução uretral 3. Urolitíase primária Urolitíase secundária: gota, hiperparatireoidismo, hipercalcemia, cistinúria 4. Pielonefrite crônica, obstrução, hidronefrose, refluxo, cálculos 5. Obstrução prostática 6. a. Necrose papilar b. Fibrose periureteral c. Calcinose renal e extra-renal d. Nefrite intersticial e. Síndrome lactoalcalina 7. Nefrite pela endocardite 8. Síndrome de Goodpasture 9. Amiloidose 10. Gota, amiloidose, lúpus eritematoso 11. Colagenose 12. Doenças policísticas Nefrite hereditária Oxalose, cistinúria 13.Nefropatia diabética
684
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
Quadro 37.5 Achados de exame físico sugestivos de etiologia específica para a insuficiência renal crônica Achados de exame físico
Etiologia
Rash facial perinasal Microaneurismas no fundo de olho Telangiectasia bucal, esclerodactilia e retração dos lábios Adenomas sebáceos Surdez Sopro cardíaco, petéquias
Lúpus eritematoso Diabetes mellitus
Aumento irregular dos rins Sopro abdominal Dor e percussão lombar (sinal de Giordano positivo) Aumento da próstata Epididimite Lesões purpúricas Angioqueratomas Hipoplasia ou ausência de rótula e unhas hipoplásicas Tofos
Escleroderma Esclerose tuberosa Nefrite hereditária Endocardite com nefrite Rins policísticos Estenose de artéria renal Pielonefrite Hidronefrose Tuberculose renal Vasculite, SchönleinHenoch Doença de Fabry Síndrome unha-rótula Gota
Modificado de Gullyassy, P.F. et al.37
normocítica normocrômica, comumente detectada na insuficiência renal crônica, não nos diz se a insuficiência renal é aguda ou crônica. Tampouco a retenção nitrogenada (elevação de uréia e creatinina), hipocalcemia, hipofosfatemia, hiperuricemia, nos orientam. No entanto, os seguintes sinais sugerem um processo agudo: oligúria intensa ou anúria, ausência de anemia, retenção nitrogenada progressiva, fundo do olho normal e calcemia e fosfatemia normais. Os elementos que sugerem um processo crônico são a palidez palha do renal crônico, exsudatos antigos no fundo do olho, sinais radiológicos de osteodistrofia renal e presença de cilindros céreos e largos no sedimento. Um outro exame extremamente útil na diferenciação entre uma nefropatia aguda e crônica é a radiografia simples do abdômen ou ecografia renal (v. Cap. 17). A principal finalidade é revelar-nos o tamanho dos rins. Rins grandes são encontrados em uropatia obstrutiva ou doença policística. A presença de rins de tamanho normal e de insuficiência renal deve alertar para a possibilidade de insuficiência renal aguda e não-crônica, pois esta última, sobretudo na fase terminal, acompanha-se geralmente de rins pequenos, contraídos. No entanto, processos infiltrativos, como a amiloidose e glomerulonefrites rapidamente progressivas, podem lesar os rins, sem diminuir muito o seu tamanho. Alterações caliciais, necrose e calcificação de papila são sinais sugestivos de nefropatia por analgésicos.
Acidose hiperclorêmica sugere pielonefrite crônica, nefropatia por analgésico, acidose tubular renal ou doença policística. A eletroforese de proteínas pode indicar uma gamopatia monoclonal, e a pesquisa de proteínas de Bence-Jones na urina pode contribuir para o diagnóstico de mielomatose. Uma vez diagnosticada a nefropatia crônica, surge a pergunta: O que se pode fazer? Infelizmente, poucas são as enfermidades renais curáveis. Talvez a mais gratificante das enfermidades seja a obstrução urinária, pois a remoção de cálculos, tumor, fibrose ou compressão extrínseca corrige o problema básico. Podemos também corrigir o distúrbio renal através da suspensão de drogas nefrotóxicas, como analgésicos que contêm fenacetina, antibióticos, particularmente os aminoglicosídios, e controle de hipercalcemia, hipocalemia, hiperuricemia. Entre as nefropatias de origem imunológica e inflamatória, poucas são as controladas pela terapêutica: nefrite da endocardite bacteriana; granulomatose de Wegener e lúpus eritematoso. Entre os problemas vasculares, podemos citar o controle de hipertensão arterial maligna e a correção de estenose de artéria renal bilateral. Processos infecciosos tipo pielonefrite e tuberculose renal também são passíveis de tratamento. No entanto, a maior parte das glomerulopatias, responsáveis por mais da metade dos casos de insuficiência renal crônica, não responde a nenhuma terapêutica. O passo seguinte na investigação de um paciente com insuficiência renal crônica será a determinação da função residual. Os parâmetros comumente utilizados para avaliação da função excretora do rim são a uréia e a creatinina plasmática. Mas, como já foi frisado no Cap. 16, a uréia plasmática é influenciada pelo ritmo de filtração glomerular, ingesta protéica e grau de catabolismo, enquanto a creatinina plasmática é pouco influenciada pela ingesta protéica e depende basicamente da massa muscular. Alterações na creatinina plasmática refletem, portanto, alterações no ritmo de filtração glomerular e constituem-se no meio mais útil e prático de acompanhar a progressão de insuficiência renal. No entanto, o clearance endógeno de creatinina continua sendo um método mais preciso na determinação da função renal residual. Cumpre lembrar a necessidade de afastar a participação de fatores que estejam agravando a insuficiência renal crônica, como estados hipovolêmicos secundários a hemorragia, perdas gastrintestinais ou mesmo renais, variações abruptas de pressão arterial, infecção urinária, etc. Estes fatores muitas vezes transformam uma insuficiência renal crônica moderada num quadro francamente urêmico. A biópsia renal constitui-se, sem dúvida, em elemento importante no diagnóstico, prognóstico e seguimento da nefropatia crônica (v. Cap. 16). No entanto, na insuficiência renal crônica terminal, quando os rins já são pequenos e contraídos, ela tem pouca utilidade, ficando difícil reconhecer a patologia primária devido ao grau avançado de
capítulo 37
esclerose. Além disso, uremia e hipertensão arterial elevam o risco de sangramento renal pós-biópsia.
Ponto-chave: • A detecção precoce da insuficiência renal é importante para a intervenção em causas reversíveis e na implementação precoce de estratégias renoprotetoras (IECA, dieta hipoprotéica, controle rígido da glicemia, dislipidemia e HAS)
MANEJO DO PACIENTE COM INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA Princípios Gerais O manejo naturalmente implica o reconhecimento do distúrbio básico e seu tratamento específico. Infelizmente, como já frisamos, são poucas as enfermidades renais que respondem a um tratamento específico. Os pacientes portadores de nefropatia crônica progressiva, bem como seus familiares, aceitam muito mal a idéia de que não existe uma terapêutica específica para a nefropatia, e muitas vezes o nefrologista sente-se forçado a lançar mão de drogas potencialmente tóxicas e de benefício não comprovado. É importante lembrar que existem processos potencialmente reversíveis e que podem agravar a função renal de um nefropata crônico. O aparecimento de insuficiência cardíaca congestiva pode reduzir em muito a filtração glomerular, transformando um quadro de azotemia em uremia. O uso apropriado de cardiotônicos e diuréticos restaura rapidamente a função renal a níveis anteriores. Qualquer contração do volume extracelular reduz o ritmo de filtração glomerular e agrava a retenção nitrogenada. Elevações abruptas da pressão arterial em nefropatas crônicos podem deteriorar rapidamente a função renal, caracterizando um quadro de insuficiência renal aguda, que geralmente é reversível através de adequado controle das cifras tensionais. Drogas nefrotóxicas também podem levar a uma deterioração aguda da função renal. Lembrar da necessidade de ajustar a dose à função renal residual (v. Cap. 46). O uso de tetraciclinas em insuficiência renal, o abuso de analgésicos e obstruções agudas do trato urinário são condições capazes de determinar uma deterioração da função renal. Lembrar que o uso de inibidores da enzima de conversão pode causar elevações da creatinina em pacientes com estenose bilateral das artérias renais (geralmente por placas ateromatosas) ou em condições de hipofluxo renal, como na insuficiência cardíaca congestiva.
685
Manejo Conservador do Paciente com Insuficiência Renal Crônica (IRC) Independentemente da causa básica, a redução progressiva da função renal leva eventualmente à uremia. Na maioria dos pacientes os sintomas e sinais da uremia se tornam aparentes quando a taxa de filtração glomerular (GFR) atinge 15-20 ml/min. A estratégia de manejo do paciente com IRC envolve: 1. Controle da progressão da nefropatia: a) tratamento da hipertensão b) restrição dietética de proteína e fósforo c) redução da proteinúria d) manejo da hiperlipidemia 2. Evitar mais dano aos rins. 3. Manejo das complicações da uremia.
CONTROLE DA PROGRESSÃO DA NEFROPATIA Como já foi salientado, vários fatores têm sido implicados na glomerulosclerose e progressão da nefropatia: hipertensão sistêmica e glomerular, fósforo e proteína da dieta, proteinúria, hiperlipidemia e vários fatores de crescimento e citocinas.
Tratamento da Hipertensão Há ampla evidência de que hipertensão superimposta em nefropatia acelera o declínio da função renal e de que mais ou menos 85% dos nefropatas crônicos são hipertensos. A retenção de sódio e o aumento de atividade do sistema renina-angiotensina são importantes fatores etiológicos. Por outro lado, tratamento da hipertensão retarda a progressão da doença renal, possivelmente reduzindo a nefrosclerose arteriolar e a hipertensão intraglomerular. Em função do exposto, há necessidade de restrição na ingesta de sódio e freqüentemente o uso de drogas para controle da pressão arterial. Inibidores da enzima de conversão (IEC) são efetivos, pois reduzem a pressão intraglomerular através da redução da pressão arterial sistêmica e pela dilatação das arteríolas eferentes. Vários estudos clínicos documentam um retardo no declínio da função renal em pacientes renais crônicos em uso de IEC. Bloqueadores de canais de cálcio também são efetivos no controle da pressão arterial, mas não há evidência de um efeito renoprotetor como dos IEC. Diuréticos podem potencializar a ação de IEC.
Restrição Dietética de Proteína e Fósforo (v. também Cap. 47) A restrição protéica reduz a hiperfiltração e hipertensão glomerular e possivelmente a glomerulosclerose. Estudos em humanos indicam que a proteína animal e uma mistura de aminoácidos aumenta a filtração glomerular, enquanto proteínas vegetais e a clara do ovo produzem pouco ou nenhum efeito. Uma carga protéica aumenta a secreção de
686
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
glucagon (que tem um efeito renal vasodilatador) além de dois outros hormônios: fator de crescimento 1 insulin-like (IGF-1) e cininas que também aumentam a filtração glomerular. Estudos nutricionais em humanos com IRC indicam que é seguro reduzir a ingesta protéica a 0,6 g/kg/dia. Estas dietas também restringem fósforo, um fator adicional que pode contribuir para a progressão. Para que o paciente não entre em balanço nitrogenado negativo, um aporte calórico adequado é necessário e pelo menos 60% da proteína devem ser de alto valor biológico (v. Cap. 47).
Redução da Proteinúria Vários estudos demonstram uma correlação entre proteinúria e declínio da função renal. O próprio MDRD Study mostrou que pacientes com mais de 3 g de proteinúria por dia tinham um declínio mais rápido da função renal. Aparentemente o tráfico de proteínas pelo mesângio glomerular é prejudicial. IEC reduzem a proteinúria, particularmente em diabéticos, e reduzem o declínio da função renal. Dieta protéica e inibidores da enzima de conversão têm efeito aditivo na redução da proteinúria.
Manejo da Hiperlipidemia O objetivo do tratamento da hiperlipidemia na IRC é prevenir o aparecimento de aterosclerose. A dislipidemia mais comum na IRC é a hipertrigliceridemia, que tem uma pobre associação com aterosclerose. Modificação da dieta e exercícios são recomendados. Evita-se a intervenção farmacológica porque as drogas que reduzem os triglicerídios são eliminadas pelos rins e efeitos adversos são freqüentes. As drogas são usadas apenas nos casos de níveis muito elevados e risco de pancreatite. Hipercolesterolemia está presente na maioria dos pacientes nefróticos, e inibidores da HMG-CoA redutase, como a lovastatina, podem ser utilizados sem necessidade de ajuste da dose.
BALANÇO HIDROELETROLÍTICO Sódio À medida que a insuficiência renal crônica progride, o rim torna-se incapaz de variar a excreção de sódio em resposta a uma mudança do volume de líquido extracelular. Portanto, a excreção de sódio torna-se mais ou menos fixa.38 Isto é, com uma filtração renal inferior a 10-15 ml/min, existe uma perda obrigatória de sódio na urina.4 Estudos para determinação dos limites inferiores e superiores de ingesta de sal, dentro dos quais o renal crônico mantém o balanço de sódio, mostram que a maioria dos pacientes mantém o balanço com uma ingesta diária de sal entre 2 e 8 g.3 Portanto, a maioria está em balanço com uma dieta normal sem sal (aproximadamente 4 a 5 g de sal). É preciso lembrar que, no renal crônico, o déficit de sódio é muito mais prejudicial do que o excesso. Um déficit de sódio compromete ainda mais a função renal, muitas vezes de maneira irreversível. Um volume extracelular
adequado é, portanto, fundamental. Excesso de volume extracelular está associado à hipertensão arterial e, eventualmente, a uma sobrecarga cardiocirculatória, traduzindo-se por um edema pulmonar e diminuição da eficiência cardíaca. Ambas as conseqüências reduzem a filtração glomerular. Raramente há necessidade de suplementar a dieta com sal. Isto pode ocorrer, como já citamos, nos nefropatas perdedores de sódio. Se o paciente retém sódio numa dieta contendo 4 a 5 g de sal, há necessidade de reduzir ainda mais a ingesta de sal e, eventualmente, utilizar diuréticos potentes para remover o excesso de volume extracelular. Restrições de sal inferiores a 4 g são difíceis de seguir no ambiente domiciliar, além de os pacientes queixarem-se de falta de paladar. Na prática, contorna-se esta situação mantendo-se uma ingesta de sal tolerável e fácil de ser alcançada e associando-se um diurético potente, tipo furosemida ou bumetanida. Diuréticos de alça são os preferidos devido ao potente efeito natriurético. Na IRC há necessidade de doses maiores, pois a ação deles depende de secreção tubular proximal ativa. A infusão contínua de diurético de alça parece ser mais efetiva do que doses repetidas. Diuréticos tiazídicos isolados não são efetivos quando o clearance for menor que 20-30 ml/min, exceção feita ao melazone. Por outro lado, tiazídicos com diuréticos de alça têm ação sinergística.
Água Embora o mecanismo de concentração e diluição da urina esteja comprometido no nefropata crônico, o balanço de água está habitualmente preservado. Há apenas necessidade de o paciente estar alerta, com o centro da sede preservado e que tenha acesso à água. Excesso de água caracterizado por hiponatremia é visto apenas quando o ritmo de administração de água livre é muito rápido.
Potássio Já comentamos que o balanço de potássio está preservado até os estádios terminais da insuficiência renal crônica e citamos os principais fatores determinantes de um excesso de potássio. A restrição protéica e de alimentos ricos em potássio reduz o aporte de potássio. Mas, como frisamos, a dieta hipoprotéica pode determinar hipercalemia por um mecanismo intra-renal. Se a orientação dietética não é suficiente para controlar o potássio, o tratamento dialítico está indicado. Se este último não puder ser instituído imediatamente, podem-se utilizar resinas de troca, tipo kayexalate (v. Cap. 12).
Cálcio, Fósforo e Magnésio O controle do hiperparatireoidismo secundário requer a restrição de fósforo precocemente na IRC (GFR abaixo de
687
capítulo 37
50-60 ml/min). Carne e produtos derivados do leite são as principais fontes de fósforo na dieta. Quando o GFR cai abaixo de 30 ml/min e a hiperfosfatemia é mantida, quelantes orais de fósforo devem ser prescritos. Antiácidos contendo alumínio e carbonato ou acetato de cálcio são potentes quelantes do fósforo. Entretanto, a absorção de alumínio e suas conseqüências (demência, osteomalacia, anemia microcística, etc.) restringem o seu uso apenas para o início do tratamento, quando o produto cálcio fósforo é muito elevado, preferindo-se logo depois o carbonato ou acetato de cálcio. Mais recentemente foram introduzidos novos quelantes de fósforo, livres de cálcio e alumínio, trazendo novas perspectivas no controle da hiperfosfatemia. O de maior experiência clínica é o hidrocloreto de Sevelamer (Renagel ®), cuja vantagem adicional é sua capacidade em reduzir os níveis de colesterol. Pode ser usado na dose de 800 a 1.200 mg às refeições protéicas. Suplementos de vitamina D, geralmente na sua forma ativa 1,25-(OH)2D3, são geralmente prescritos. Doses elevadas de calcitriol por via endovenosa parecem suprimir diretamente a secreção de PTH. Os níveis séricos de magnésio podem ser mantidos evitando-se o uso de antiácidos que contêm magnésio.
Anemia O manejo da anemia na IRC mudou radicalmente com a introdução da eritropoetina recombinante humana. A administração de 50-150 unidades/kg, duas a três vezes por semana por via subcutânea, permite atingir hematócritos de 33-36%. Níveis mais elevados de hematócritos podem agravar a hipertensão e causar convulsões. Suplementos de ferro são geralmente necessários para se obter uma adequada resposta à eritropoetina. Há também necessidade de monitorar os níveis séricos de ferro, ferritina e capacidade de transporte (v. Cap. 38).
Ácido-básico Enquanto a filtração glomerular estiver acima de 15 a 20 ml/min, a acidose não é significativa. O bicarbonato plasmático permanece estável entre 16 e 20 mEq/litro. No entanto, estudos recentes em animais e humanos indicam que a acidose metabólica induz a um catabolismo protéico e pode contribuir para a desnutrição observada em pacientes renais crônicos terminais e/ou em diálise. Portanto, atualmente recomenda-se manter o bicarbonato plasmático em diálise próximo a 24 mmol/L através da suplementação de bicarbonato de sódio por via oral ou através de ajustes do banho de diálise.46 A primeira ação é a redução da ingesta protéica (0,6 g/kg/dia). Se o bicarbonato sérico cair abaixo de 15-17 mEq/L, há necessidade de se administrar um suplemento alcalino. O bicarbonato de sódio é comumente empregado, e 1,5 a 2,0 g são suficientes. É importante lembrar que, com o bicarbonato de sódio, estamos administrando sódio e há necessidade de reajustar o sal na dieta ou adicionar um diurético potente. Há dados que indicam que a retenção
de sódio através do bicarbonato de sódio é menor que com o cloreto de sódio. Alguns nefrologistas preferem usar a solução de Shohl no tratamento da acidose, argumentando que ela produz menos distensão abdominal. A solução contém 140 g de ácido cítrico e 98 g de citrato de sódio dissolvidos num volume final de 1 litro. Cada ml da solução contém 1 mEq de sódio, e aproximadamente 25 a 75 ml da solução por dia são suficientes.1
Prurido Muitas vezes é o sintoma mais perturbador. Felizmente, com o controle de cálcio e fósforo plasmático e com a instituição do tratamento dialítico, o prurido é geralmente controlado. Há relatos clínicos de desaparecimento do prurido após paratireoidectomia parcial. Além de antihistamínicos e fenotiazínicos, têm-se empregado lidocaína e colestiramina no controle do prurido. Mais recentemente, a fototerapia com luz ultravioleta foi utilizada em casos de prurido intenso e, aparentemente, mostrou ser uma forma de tratamento efetiva e barata.48
Inflamação Sistêmica A identificação de inflamação sistêmica tem-se tornado um ponto importante na prevenção de complicações especialmente nutricionais e cardiovasculares em IRC. Isto se deve ao fato de que vários marcadores de inflamação sistêmica (como proteína C-reativa e interleucina-6) foram identificados como fortes preditores independentes de mortalidade em ICR.42,49 Na identificação de inflamação sistêmica, a identificação e correção de fatores causais como infecções ocultas e sobrecarga de volume devem ser parte do manejo da IRC.
DIÁLISE — QUANDO INDICAR? É oportuno salientar que o tratamento de todo paciente portador de insuficiência renal crônica deve ser planificado. 1. Evitar desnutrição. A redução de proteína e sal da dieta, tornando-se muitas vezes sem paladar, e a anorexia que se estabelece, devido à retenção de produtos nitrogenados, podem levar a uma perda progressiva de peso e hipoproteinemia. Muitas vezes, a perda de peso não é evidente, devido ao gradual acúmulo de líquido decorrente da hipoproteinemia. Nas revisões periódicas de ambulatório, deve-se proceder a uma contagem calórica da ingesta diária de cada paciente. Não faz sentido manter o paciente numa rígida restrição protéica por tempo prolongado e iniciar o tratamento dialítico quando o quadro de desnutrição já é evidente.50 2. Excesso de volume extracelular. Quando, apesar da restrição de sal e do uso de diuréticos potentes, não for mais possível controlar o volume extracelular, traduzindo-se
688
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
este por hipertensão arterial grave e sinais de insuficiência cardíaca congestiva, é evidente que o tratamento dialítico deve ser iniciado visando à remoção deste volume em excesso. 3. Evidência de neuropatia periférica em paciente tratado conservadoramente é indicação de diálise. A instituição precoce do tratamento dialítico é capaz de evitar lesões nervosas muitas vezes irreversíveis, e deve basear-se nas funções sensoriais que geralmente precedem a lesão motora do nervo. 4. A presença de sintomas urêmicos com náuseas e vômitos e o aparecimento de pericardite indicam a necessidade de instituição da diálise. Os pacientes com IRC terminal devem iniciar alguma forma de diálise quando o Kt/Vuréia renal semanal estiver abaixo de 2,0 (v. Cap. 49 sobre o conceito de Kt/V). Um Kt/Vuréia renal de 2,0 aproxima-se a um clearance de uréia de 7 ml/min e a um clearance de creatinina que varia entre 9 e 14 ml/min/1,73 m2. O clearance de uréia deve ser normalizado para água corporal total e o clearance de creatinina deve ser expresso por 1,73 m2. A TFG que é estimada pela média aritmética dos clearances de uréia e creatinina será aproximadamente 10,5 ml/min/1,73 m2 quando o Kt/Vuréia estiver em torno de 2,0. Em pacientes com insuficiência renal crônica (TFG 1520 ml/min), o aparecimento de sinais de desnutrição protéico-calórica ou a persistência de desnutrição apesar de todos os esforços para combatê-la e não havendo outra causa para a desnutrição, deve-se iniciar a terapia renal substitutiva, através da diálise, ou o transplante renal.
TRANSPLANTE RENAL — QUANDO INDICAR? Diálise e transplante são tratamentos que não competem e, em verdade, se completam. A diálise pode servir de terapia de suporte durante a fase inicial de preparo para o transplante, no pós-operatório imediato, nos casos de rejeição aguda ou de necrose tubular aguda e, finalmente, nos casos de rejeição crônica, com retorno do paciente para o programa de diálise. Pode-se dizer que todo paciente portador de insuficiência renal terminal é um candidato, em potencial, a um transplante de rins. É interessante salientar que, nos últimos anos, a par dos progressos na área de imunologia, tem-se observado uma liberalização nos critérios de seleção de pacientes para transplante renal. Inicialmente eram considerados candidatos ideais os jovens (entre 15 e 45 anos), sem doença sistêmica e com um aparelho urinário inferior normal. A liberalização nos critérios de seleção mostrou que podem ser transplantados com sucesso: pacientes portadores de doença sistêmica, crianças acima de dois anos e pacientes mais idosos.
Contra-indicações absolutas a um transplante renal são poucas: incompatibilidade ABO, anticorpos citotóxicos contra antígenos do doador (100%), infecção em atividade e neoplasia sem controle. Ao se discutir a possibilidade de transplante renal com o paciente, deve-se considerar a preferência deste. Alguns se adaptam à qualidade de vida proporcionada pela diálise, e não desejam, conhecendo os riscos, submeter-se a um transplante renal. Para outros, diálise é inaceitável e optam pelo transplante renal, conhecendo os riscos e possíveis complicações. O tema Transplante Renal é abordado em detalhes nos Caps. 52, 53 e 54.
Pontos-chave: • Indicações para tratamento dialítico incluem sinais de desnutrição, sobrecarga de volume, neuropatia periférica e outros sintomas urêmicos que não podem ser revertidos com o tratamento conservador • Diálise e transplantes devem ser planejados como tratamentos complementares e integrados
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS PAPPER, S. In Chronic Renal Failure in Clinical Nephrology. Little Brown and Co, 1978; Cap. 4:93. 2. MAZZUCHI, N.; SCHWEDT, E.; FERNANDEZ, J.M.; CUSUMANO, A.M.; ANCAO, M.S.; POBLETE, H. et al. Latin American Registry of dialysis and renal transplantation: 1993 annual dialysis data report. Nephrol Dial Transplant 1997;12(12):2521-7. 3. BRICKER, N.S. The renal response to progressive nephron loss. In Brenner, B.M.; Rector-Jr. F.C. (eds) The Kidney, 1981. Saunders Co, p. 1056. 4. BRICKER, N.S. The kidney in chronic renal disease. In Clinical Disorders of Fluid and Electrolyte Metabolism. Maxwell, M.H.; Kleeman, C.R. (eds), 1972. McGraw-Hill Book Co, Cap. 18, p. 697. 5. LLACH, F. Secondary hyperparathyroidism in renal failute: the trade-off hypothesis revisited. Am J Kidney Dis 1995;25(5):663-79. 6. PITTS, T.O.; PIRAINO, B.H.; MITRO, R.; CHEN, T.C.; SEGRE, G.V.; GREENBERG, A. et al. Hyperparathyroidism and 1,25-dihydroxyvitamin D deficiency in mild, moderate, and severe renal failure. J Clin Endocrinol Metab 1988;67(5):876-81. 7. LOPEZ-HILKER, S.; GALCERAN, T.; CHAN, Y.L.; RAPP, N.; MARTIN, K.J.; SLATOPOLSKY, E. Hypocalcemia may not be essential for the development of secondary hyperparathyroidism in chronic renal failure. J Clin Invest 1986;78(4):1097-102. 8. LLACH, F.; MASSRY, S.G. On the mechanism of secondary hyperparathyroidism in moderate renal insufficiency. J Clin Endocrinol Metab 1985;61(4):601-6. 9. PORTALE, A.A.; BOOTH, B.E.; HALLORAN, B.P.; MORRIS, R.C. Jr. Effect of dietary phosphorus on circulating concentrations of 1,25dihydroxyvitamin D and immunoreactive parathyroid hormone in children with moderate renal insufficiency. J Clin Invest 1984; 73(6):1580-9. 10. HEBERT, L.A.; LEMAN, J. Jr., PETERSEN, J.R.; LENNON, E.J. Studies of the mechanism by which phosphate infusion lowers serum calcium concentration. J Clin Invest 1966;45(12):1886-94. 1.
689
capítulo 37
11.
LUCAS, P.A.; BROWN, R.C.; WOODHEAD, J.S.; COLES, G.A. 1,25dihydroxycholecalciferol and parathyroid hormone in advanced chronic renal failure: effects of simultaneous protein and phosphorus restriction. Clin Nephrol 1986;25(1):7-10. 12. LOPEZ-HILKER, S.; DUSSO, A.S.; RAPP, N.S.; MARTIN, K.J.; SLATOPOLSKY, E. Phosphorus restriction reverses hyperparathyroidism in uremia independent of changes in calcium and calcitriol. Am J Physiol 1990;259(3 Pt 2):F432-7. 13. YI, H.; FUKAGAWA, M.; YAMATO, H.; KUMAGAI, M.; WATANABE, T.; KUROKAWA, K. Prevention of enhanced parathyroid hormone secretion, synthesis and hyperplasia by mild dietary phosphorus restriction in early chronic renal failure in rats: possible direct role of phosphorus. Nephron 1995;70(2):242-8. 14. BRICKER, N.S.; SLATOPOLSKY, E.; REISS, E.; AVIOLI, L.V. Calcium, phosphorus, and bone in renal disease and transplantation. Arch Intern Med 1969;123(5):543-53. 15. SLATOPOLSKY, E.; WEERTS, C.; THIELAN, J.; HORST, R.; HARTER, H.; MARTIN, K.J. Marked suppression of secondary hyperparathyroidism by intravenous administration of 1,25-dihydroxy-cholecalciferol in uremic patients. J Clin Invest 1984;74(6):2136-43. 16. BOURGOIGNIE, J.; KLAHR, S.; BRICKER, N.S. Inhibition of transepithelial sodium transport in the frog skin by a low molecular weight fraction of uremic serum. J Clin Invest 1971;50(2):303-11. 17. PUSCHETT, J.B.; GOLDBERG, M. The relationship between the renal handling of phosphate and bicarbonate in man. J Lab Clin Med 1969;73(6):956-69. 18. BRENNER, B.M.; MEYER, T.W.; HOSTETTER, T.H. Dietary protein intake anf the progressive nature of kidney disease: the role of hemodynamically mediated glomerular injury in the pathogenesis of progressive glomerular sclerosis in aging, renal ablation, and intrinsic renal disease. N Engl J Med 1982;307(11):652-9. 19. JOHNSON, W.J.; HAGGE, W.W.; WAGONER, R.D.; DINAPOLI, R.P.; ROSEVEAR, J.W. Effects of urea loading in patients with faradvanced renal failure. Mayo Clin Proc 1972;47(1):21-9. 20. JONHSON, W. Toxicity arising from urea. Kidney Int Suppl 1975(3):288. 21. AVRAM, M.M.; FEINFELD, D.A.; HUATUCO, A.H. Search for uremic toxin. Decreased motor-nerve conduction velocity and elevated parathyroid hormone in uremia. N Engl J Med 1978;298(18):1000-3. 22. SULIMAN, M.E.; QURESHI, A.R.; BARANY, P.; STENVINKEL, P.; FILHO, J.C.; ANDERSTAM, B. et al. Hyperhomocysteinemia, nutritional status, and cardiovascular disease in hemodialysis patients. Kidney Int 2000;57(4):1727-35. 23. MIYATA, T.; SUGIYAMA, S.; SAITO, A.; KUROKAWA, K. Reactive carbonyl compounds related uremic toxicity (“carbonyl stress”). Kidney Int Suppl 2001;78:S25-31. 24. STENVINKEL, P. Inflammatory and atherosclerotic interactions in the depleted uremic patient. Blood Purif 2001;19:53-61. 25. STENVINKEL, P. Leptin and its clinical implications in chronic renal failure. Miner Electrolyte Metab 1999;25(4-6):298-302. 26. BERGER, H.W.; RAMMOHAN, G.; NEFF, M.S.; BUHAIN, W.J. Uremic pleural effusion. A study in 14 patients on chronic dialysis. Ann Intern Med 1975;82(3):362-4. 27. ROBSON, J.S. Uremic neuropathy, In: Robertson, R.F. (ed) Symposium: Some Aspects of Neurology (Royal College of Physicians), Edimburg, 1968. 28. MATALON, R.; MOUSSALLI, A.R.; NIDUS, B.D.; KATZ, L.A.; EISINGER, R.P. Functional aortic insufficiency. A feature of renal failure. N Engl J Med 1971;285(27):1522-3. 29. BARRATT, L.J.; ROBINSON, M.A.; WHITFORD, J.A.; LAWRENCE, J.R. The diastolic murmur of renal failure. N Engl J Med 1976;295 (3):121-4. 30. DANAHY, D.T.; RONAN, J.A. Jr. Cervical venous hums in patients on chronic hemodialysis. N Eng J Med 1974;291(5):237-9. 31. IANHEZ, L.E.; LOWEN, J.; SABBAGA, E. Uremic myocardiopathy. Nephron 1975;15(1):17-28. 32. GUERON, M.; BERLYNE, G.M.; NORD, E.; ARI, J.B. EDITORIAL: The case against the existence of a specific uraemic myocardiopathy. Nephron 1975;15(1):2-4.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
39.
40.
41.
42. 43.
44. 45.
46.
47.
48.
49.
50.
LINDNER, A.; CHARRA, B.; SHERRARD, D.J.; SCHRIBNER, B.H. Accelerated atherosclerosis in prolonged maintenance haemodialysis. N Engl J Med 1974;290:697-701. FOLEY, R.N.; PARFREY, P.S.; SARNAK, M.J. Epidemiology of cardiovascular disease in chronic renal disease. J Am Soc Nephrol 1998;9(12 Suppl):S16-23. GOODMAN, W.G.; GOLDIN, J.; KUIZON, B.D.; YOON, C.; GALES, B.; SIDER, D. et al. Coronary-artery calcification in young adults with end-stage renal disease who are undergoing dialysis. N Engl J Med 2000;342:1478-83. CHEUNG, A.K.; SARNAK, M.J.; YAN, G.; DWYER, J.T.; HEYKA, R.J.; ROCCO, M.V. et al. Atherosclerotic cardiovascular disease risks in chronic hemodialysis patients. Kidney Int 2000;58(1):353-62. DEGOULET, P.; LEGRAIN, M.; RÉACH, I. et al. Mortality risk factors in patients treated by chronic hemodialysis. Nephron 1982;31: 103-10. DANIEL, C.R., 3rd; BOWER, J.D.; DANIEL, C.R., Jr. The “half and half fingernail”: the most significant onychopathological indicator of chronic renal failure. J Miss State Med Assoc 1975;16(12):367-70. MASSRY, S.G.; BLUESTONE, R.; KLINENBERG, J.R.; COBURN, J.W. Abnormalities of the musculoskeletal system in hemodialysis patients. Semin Arthritis Rheum 1975;4(4):321-49. HODSMAN, A.B.; SHERRARD, D.J.; ALFREY, A.C.; OTT, S.; BRICKMAN, A.S.; MILLER, N.L. et al. Bone aluminum and histomorphometric features of renal osteodystrophy. J Clin Endocrinol Metab 1982;54(3):539-46. SPECTOR, D.A.; DAVIS, P.J.; HELDERMAN, J.H.; BELL, B.; UTIGER, R.D. Thyroid function and metabolic state in chronic renal failure. Ann Intern Med 1976;85(6):724-30. RIELLA, M.C. Malnutrition in dialysis: Malnourishement or uremic inflammatory response? Kidney Int 2000;57:1211-32. STENVINKEL, P.; BARANY, P.; HEIMBÜRGER, O.; PECOITS-FILHO, R.; LINDHOLM, B. Mortality, malnutrition, and atherosclerosis in ESRD: What is the role of interleukin-6? Kidney Int 2002;61 Suppl 80:103-8. WOCHOS, D.N.; ANDERSON, C.F.; MITCHELL, J.C., III. Serum lipids in chronic renal failure. Mayo Clin Proc 1976;51(10):660-4. MITCH, W.E.; WALSER, M. Therapy of the uremic patient. In Brenner, B.M.; Rector-Jr., F.C. (eds) The Kidney, 1986. Saunders Co, Ch.41, p.1759. MITCH, W. Nutrition in renal disease. Handbook of renal therapeutics, Martinez-Maldonado M (Ed), Plenum Medical Books, Cap. 16, p. 349, 1983. GIORDANO, C.E.R.; PASCALE, C.; de SANTO, N.G. Dietary treatment in renal failure. Proc 3rd International Congress of Nephrology 1967, vol 3, Karger Basel. GILCHREST, B.A.; ROWE, J.W.; BROWN, R.S.; STEINMAN, T.I.; ARNDT, K.A. Relief of uremic pruritus with ultraviolet phototherapy. N Engl J Med 1977;297(3):136-8. PECOITS-FILHO, R.; LINDHOLM, B.; HEIMBÜRGER, O.; STENVINKEL, P. Interleukin-6 is an independent predictor of mortality in patients starting dialysis treatment. Nephrol Dial Transplant 2002;17:142-6. WALSER, M. The conservative management of the uremic patient. In Brenner, B.M.; Rector-Jr., F.C. (eds) The Kidney, 1976. Saunders Co, Cap. 39, p. 1613.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BRICKER, N.S. et al. The renal response to progressive nephron loss. In: Brenner, B.M.; Rector Jr., F.C. (eds.) The Kidney. W.B. Saunders Co., Cap. 18, p. 703, 1976. DUBROW, A. and LEVIN, N.W. Biochemical and hormonal alterations in chronic renal failure. In The Principles and Practice of Nephrology (Eds. Jacobson, Striker, Klahr). Cap. 89, p. 596, 2nd ed. Mosby-Year Book Inc., 1995.
690
Insuficiência Renal Crônica: Fisiopatologia da Uremia
MASSRY, S.G. et al. Uremic toxicity. In Textbook of Nephrology (Eds. Massry and Glassock). Cap. 68, p. 1221-1278, 4th edition, 2001. MEYER, T.; BABOOLAL, K. and BRENNER, B.M. Nephron adaptation to renal injury. In The Kidney (Ed. Barry M. Brenner). Cap. 44, pp. 20112048. W.B. Saunders Co., 1996. SUKI, W.N. and EKNOYAN, G. Pathophysiology and clinical manifestations of chronic renal failure and the uremic syndrome. In The Principles and Practice of Nephrology (Eds. Jacobson, Striker, Klahr) Cap. 90, p. 603, 2nd ed. Mosby-Year Book Inc., 1995. VANHOLDER, R. The uremic syndrome. In Primer on Kidney Diseases, 2nd ed. (Ed A. Greemberg). Cap. 62, pp. 403-407.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.usrds.org/ — Site oficial do sistema de dados americanos relacionados a insuficiência renal crônica. Extremamente organizado, completo e atualizado freqüentemente, é uma excelente fonte de pesquisa epidemiológica em IRC.
www.sbn.org.br/Censo/censo01.htm — Parte do site da Sociedade Brasileira de Nefrologia, com informações sobre número de pacientes em diálise no Brasil, entre outras informações epidemiológicas de interesse em IRC. http://www.hdcn.com/ — Hipertensão, Diálise e Nefrologia Clínica. — Website popular entre nefrologistas, com novidades em doenças renais, atualizadas com freqüência. As seções relacionadas a uremia são bastante didáticas e informativas. http://kidney.gov.ph/services/diet/di.htm — Informações sobre o manejo dietético da insuficiência renal crônica. http://www.nephron.com — Site completo e ótima referência em insuficiência renal crônica: fisiopatologia, ilustrações, animações, etc.
Capítulo
38
Conseqüências Hematológicas da Uremia Maria de Fátima Santos Bandeira
INTRODUÇÃO
Administração de ERHu
Anemia da insuficiência renal crônica
Resposta inadequada
DEFICIÊNCIA DE ERITROPOETINA
Terapias adjuvantes
INIBIÇÃO DA ERITROPOESE
Efeitos adversos
DEFICIÊNCIA DE FERRO
Perspectivas
HIPERPARATIREOIDISMO SECUNDÁRIO
ERITROCITOSE
TOXICIDADE PELO ALUMÍNIO
ALTERAÇÕES DA HEMOSTASIA
OUTRAS CAUSAS
ALTERAÇÕES EM LEUCÓCITOS
Tratamento com eritropoetina recombinante humana
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Indicação
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Iniciando tratamento — avaliação dos estoques de ferro
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO A anemia, principal conseqüência hematológica da insuficiência renal, constitui o fator responsável pela limitação da capacidade física dos pacientes renais crônicos, contribuindo para a morbidade cardiovascular e para uma qualidade de vida insatisfatória. Ela se desenvolve quando a velocidade de filtração glomerular atinge 20-30 ml/min/1,73 m2 e acomete, de forma moderada ou grave, 75% dos pacientes renais crônicos adultos28 e a quase totalidade das crianças.83 Embora a associação entre anemia e insuficiência renal tenha sido descrita por Richard Bright há mais de 150 anos, somente com o avanço da biologia molecular e das técnicas de recombinação genética foi possível esclarecer o papel do rim e da eritropoetina (Epo) na fisiopatologia da anemia. As últimas duas décadas presenciaram o isolamento da Epo da urina humana, a reprodução do seu gene e a produção do hormônio recombinante em larga escala.51,62,68 A eritropoetina recombinante humana (ERHu) representou o maior avanço terapêutico para pacientes renais
crônicos desde o advento da fístula artério-venosa. Ela mudou radicalmente o tratamento da anemia não apenas na insuficiência renal crônica, como também nas doenças neoplásicas e na prematuridade. Sabe-se hoje que a Epo endógena é produzida quase totalmente no rim e é reconhecido seu papel central na eritropoese em resposta a estímulo hipóxico.52,53,59,66 Com a perda progressiva da massa renal, na doença crônica, ocorre menor produção de Epo e conseqüente falta de estímulo para a medula óssea, determinando a anemia hipoproliferativa.
Ponto-chave: • A eritropoetina endógena é reconhecida por seu papel central na eritropoese, e 90% dela é produzida no rim em resposta a um estímulo hipóxico Os primeiros estudos clínicos com ERHu em pacientes renais crônicos em hemodiálise foram realizados nos
692
Conseqüências Hematológicas da Uremia
EUA e Europa29,97 e vieram mudar de forma inconteste o tratamento da anemia da IRC. Inúmeros outros estudos foram realizados no mundo inteiro,1,27,33,55,74,83 em adultos e crianças, em tratamento dialítico, em fase pré-diálise e na rejeição do transplante renal, utilizando as vias subcutânea, endovenosa e intraperitoneal, com o objetivo de ampliar a experiência e obter a maior eficácia da medicação. O tratamento com ERHu possibilitou a redução na mortalidade e na morbidade, a melhora das funções cardíaca, cerebral e cognitiva e contribuiu para a melhor qualidade de vida de pacientes renais crônicos. A ERHu em pacientes em tratamento conservador posterga a entrada em diálise, demonstrando que a anemia, e não o acúmulo de toxinas urêmicas, é o principal fator responsável pela maioria dos sintomas urêmicos. A doença cardiovascular, principal causa de morte em pacientes renais crônicos, começa a se manifestar bem antes da necessidade de diálise, e a correção precoce da anemia evita a hipertrofia ventricular esquerda, reduzindo a morbidade cardiovascular. A manutenção de estoques adequados de ferro e uma boa diálise representam os principais fatores para a melhor resposta à ERHu. A suplementação de ferro via parenteral desempenha papel fundamental para os pacientes em hemodiálise, enquanto o ferro oral pode ser suficiente para aqueles em diálise peritoneal ou em tratamento conservador. A diálise inadequada, o hiperparatireoidismo e os estados inflamatórios contribuem para respostas insatisfatórias.
Ponto-chave: • O tratamento com ERHu possibilitou a redução na mortalidade e na morbidade, a melhoria das funções cardíaca, congnitiva cerebral e da qualidade de vida em pacientes renais crônicos
Anemia da Insuficiência Renal Crônica A anemia da insuficiência renal crônica, usualmente, é hipoproliferativa. O esfregaço de sangue periférico mostra hemácias de morfologia normal, normocrômicas e normocíticas, e ocasionalmente algumas hemácias crenadas. A contagem de reticulócitos corrigida para o grau de anemia é duas vezes menor que os valores normais. O mielograma mostra relação eritrócito-granulócito normal ou levemente diminuída, demonstrando que, apesar da anemia, não existe hiperplasia eritróide compensatória. A morfologia eritróide é normal. A patogênese é variada e envolve múltiplos fatores que atuam diminuindo a eritropoese ou levando à perda de eritrócitos.
DEFICIÊNCIA DE ERITROPOETINA O principal mecanismo da anemia renal é a deficiência de Epo.26,76,88 Em circunstâncias normais, níveis plasmáticos de Epo de 10-30 mU/ml são capazes de manter uma massa celular eritróide estável, porém níveis muito maiores são encontrados como resposta de um rim normal a alterações da oxigenação tissular.16 Em pacientes urêmicos os níveis de Epo são muito baixos para o grau da anemia, especialmente nos anéfricos.4,10,18,19,24 A eritropoetina é um hormônio glicoprotéico com peso molecular total de 30.500 dáltons. Sua seqüência peptídica contém 165 aminoácidos e a parte de carboidrato da molécula possui quatro cadeias complexas contendo altas quantidades de ácido siálico ligadas à proteína.56 A porção carboidrato é essencial para a atividade in vivo.36,37 O rim é o principal local de produção de Epo e as células produtoras foram localizadas no endotélio dos capilares peritubulares situados no córtex renal e medula externa52,59 e em fibroblastos intersticiais (células intersticiais tipo I).66 No fígado, as células sinusoidais produzem 10% da eritropoetina total.77 A hipóxia tissular é o principal estímulo para a produção de eritropoetina, e estados que levam à redução de oxigênio (O2) ou aumento da sua necessidade são acompanhados por aumento exponencial das células que expressam o RNA mensageiro da Epo e elevação dos níveis séricos.57 O mecanismo pelo qual a hipóxia leva a um aumento da expressão do gene da Epo envolve a participação de um sensor de O2 localizado no rim, provavelmente uma proteína heme, que captaria a diminuição do conteúdo de O2 e enviaria mensagem através de mediadores bioquímicos intracelulares, provavelmente as prostaglandinas e a adenosina.73 Koury e col. demonstraram que há pequenos focos de células produtoras espalhadas no córtex renal nas anemias leve e moderada, que vão aumentando à medida que a anemia se torna mais grave. Estes grupos de células sugerem a existência de áreas de hipóxia localizadas no rim de indivíduos anêmicos e que todas as células capazes de produzir Epo são recrutadas a fazê-lo como resposta ao estímulo hipóxico.53 Por outro lado, quando a oxigenação se normaliza, a produção de Epo retorna a níveis normais. Depois de liberada na circulação, a Epo liga-se a receptores específicos nas células precursoras eritróides, formando um complexo receptor-eritropoetina aumentando a produção de eritrócitos.21,38 Este aumento parece estar relacionado mais à ação antiapoptose da Epo nas células precursoras do que ao estímulo no crescimento e desenvolvimento do precursor eritróide.43,54,75 Na doença renal crônica, a diminuição da massa renal quebra este circuito, ocasionando anemia. Os receptores de Epo também estão expressos em células do rim e do sistema nervoso central, sugerindo que além da eritropoese a Epo possa desempenhar outros papéis, como proteção de órgãos contra danos isquêmicos.13
693
capítulo 38
INIBIÇÃO DA ERITROPOESE Durante anos foi postulado que a inibição da eritropoese seria a principal causa da anemia renal. Algumas linhas de evidência sustentavam que a eritropoese era bloqueada quando se acrescentava soro urêmico a células de medula óssea em animais de experimentação.15 Algumas substâncias presentes no soro urêmico, como paratormônio (PTH),35,67 espermina, espermidina78 e ribonuclease,58 foram implicadas no bloqueio à proliferação das células precursoras eritróides (CFU-E, colony unit forming erythroid). Em humanos, porém, comprovou-se que o PTH purificado, tanto a molécula intacta como seu radical amino-terminal, adicionado à cultura de células de medula óssea, não inibiu a eritropoese in vitro.28 Estudos realizados com culturas inteiramente autólogas puderam demonstrar que não houve qualquer inibição ao crescimento de colônias eritróides e não-eritróides da medula óssea, sob efeito de soro humano normal e urêmico.88 Eschbach estudou animais urêmicos e normais, após a administração de plasma rico em Epo, e posteriormente paciente renais crônicos e pessoas hígidas com ERHu, observando que a resposta hematopoética era semelhante entre os grupos, nos dois trabalhos, comprovando que a inibição da eritropoese, se existe, é apenas um fator coadjuvante na patogênese da anemia da IRC.30,31
DEFICIÊNCIA DE FERRO A síntese da hemoglobina requer incorporação de ferro em larga escala e implica mobilização de ferro do sistema reticuloendotelial e transporte pela transferrina, para atender à demanda da medula. Estoques adequados de ferro são pré-requisitos para uma eritropoese efetiva. A deficiência de ferro pode resultar de carência nutricional ou de perdas sanguíneas continuadas. A absorção de ferro pelo trato gastrintestinal pode estar normal ou diminuída em pacientes com insuficiência renal50 e parece mostrar correlação inversa aos estoques de ferro.26 À medida que a doença renal avança, os níveis séricos de Epo diminuem e o ferro, liberado do ciclo de sobrevida da hemácia, acumula-se no sistema reticuloendotelial, compensando uma possível deficiência de ferro causada pela anorexia.50 Quando o paciente inicia tratamento hemodialítico, este quadro muda e as constantes e inevitáveis perdas sanguíneas ocasionam perdas de 1.500 mg ferro/ano. Esta quantidade excede a capacidade de absorção e a anemia ferropriva se sobrepõe, agravando aquela já existente. Uma deficiência funcional de ferro ocorre em estados inflamatórios agudos ou crônicos onde há um bloqueio na liberação do ferro do sistema reticuloendotelial e no seu transporte pela transferrina, resultando em diminuição da eritropoese. Nestes casos, o ferro sérico e a saturação da transferrina diminu-
em, porém a ferritina sérica aumenta. Este bloqueio só é corrigido com a reversão do estado inflamatório.
HIPERPARATIREOIDISMO SECUNDÁRIO O aumento do PTH é uma complicação freqüente na insuficiência renal crônica. O hiperparatireoidismo tem sido associado à anemia em pessoas com função renal normal e pode agravar a existente em pacientes renais crônicos.35 A fibrose da medula óssea e conseqüente redução do compartimento precursor eritróide são responsáveis pela diminuição da eritropoese.79 Alguns trabalhos têm demonstrado melhora da anemia após paratireoidectomia, ou após tratamento com análogos da vitamina D, como calcitriol e alfacalcidol.9,40
TOXICIDADE PELO ALUMÍNIO A anemia microcítica em pacientes em tratamento dialítico é mais freqüente devido à deficiência de ferro, porém pode ser uma manifestação hematológica precoce de intoxicação pelo alumínio.2,3 Ela pode ocorrer, mesmo em pacientes com níveis séricos de alumínio moderadamente aumentados, e responde ao uso de substâncias quelantes de alumínio, como a desferoxamina.5,85 O mecanismo pelo qual o alumínio leva à anemia microcítica é pouco conhecido. Provavelmente, há uma diminuição da síntese da porção heme, por inibição de enzimas como a ferroquelatase e a uroporfirina descarboxilase, ou por competir com o ferro na sua ligação com a transferrina.22,69 Outra hipótese advoga que na osteomalácia induzida pelo alumínio ocorreria expansão óssea para o espaço medular, diminuindo o compartimento eritropoético.79 Anteriormente o uso de gel de alumínio para tratamento da hiperfosfatemia constituía uma das maiores causas de intoxicação, junto com a contaminação da água usada no tratamento dialítico.5,61 Atualmente, os quelantes de fósforo contendo sais de cálcio e outros não absorvidos, como o sevelamer (Renagel®), e os cuidados com a água da unidade (deionização/ osmose reversa) evitam a exposição ao alumínio e seu acúmulo no osso e no sistema nervoso central.
OUTRAS CAUSAS A diminuição da sobrevida da hemácia é comum na doença renal. A hemácia normal sobrevive em torno de 120 dias, porém, em pacientes urêmicos, fatores intra- e extracelulares atuam encurtando sua sobrevida em 30 a 50%. Os fatores intracelulares incluem resistência osmótica e oxidativa diminuída e os extracelulares são toxinas presentes
694
Conseqüências Hematológicas da Uremia
no soro urêmico ou introduzidas pelo tratamento dialítico.23 Esta hemólise continua a existir independente da modalidade dialítica utilizada, porém não compromete a boa resposta a ERHu. Os episódios de hemólise secundários à contaminação da água usada na hemodiálise por agentes oxidantes como nitratos, cobre e cloraminas têm-se tornado menos freqüentes com o melhor controle dos tratamentos de água. O formaldeído usado na esterilização de dialisadores foi substituído por outras substâncias mais seguras. As hemólises de causas mecânicas têm sido descritas devido a dobras ou estreitamentos nas linhas de sangue, porém constituem fatos infreqüentes. Significantes perdas sanguíneas ocorrem em pacientes renais crônicos, em estágio pré-terminal ou em fase dialítica, contribuindo para aumentar a anemia. A razão para esta tendência ao sangramento é um defeito qualitativo das plaquetas. As crianças apresentam maiores perdas, especialmente via gastrintestinal86 e pela hemodiálise (HD).45,82 Pacientes adultos em HD apresentam perda sanguínea aproximada de 10 ml/sessão ou 3 litros/ ano,26 conseqüentes ao volume sanguíneo residual do dialisador, amostras para análises laboratoriais, além de ocasionais rupturas em linhas ou filtros. A deficiência de folato precisa ser considerada em pacientes em IRC, com aumento do volume corpuscular médio (VCM). Embora as perdas de folato pela diálise sejam maiores que as excretadas pela urina, estas são facilmente balanceadas por uma dieta de 60 g de proteínas/dia.
Ponto-chave: • A deficiência de eritropoetina é o mecanismo preponderante na fisiopatogenia da anemia da IRC
Tratamento com Eritropoetina Recombinante Humana Nos últimos quinze anos, a ERHu conquistou seu lugar como principal terapêutica na correção da anemia, revolucionando o cuidado do paciente renal crônico. Durante este período mostrou-se eficaz em 95% dos pacientes tratados, reduzindo o risco relativo de mortalidade geral e cardiovascular em pacientes com hematócrito mais alto. A necessidade de transfusões sanguíneas diminuiu dramaticamente, entretanto grande parte dos pacientes ainda não usufrui a totalidade dos benefícios da ERHu. A imensa variedade de esquemas usados com resultados às vezes conflitantes tornou imperiosa a adoção de regras de melhores condutas, com base em evidências. Surgiram assim as recomendações: americana (DOQI Dialysis Outcomes Quality Initiative 1997/2000); européia (European Best Practice Guidelines), e as normas da Sociedade Brasileira
de Nefrologia (SBN). Sumarizamos aqui os principais aspectos abordados nestas diretrizes.
INDICAÇÃO A indicação para uso de ERHu inclui todos os pacientes renais crônicos, adultos ou crianças, em tratamento conservador ou dialítico que apresentem Hb igual ou inferior a 11 g/dl.32 As crianças nos primeiros anos de vida devem iniciar tratamento com Hb ⬍ 12 g/dl para evitar danos ao desenvolvimento neurológico. A quantificação da anemia deverá ser feita preferencialmente através da Hb e não do Ht, uma vez que este depende do VCM e da contagem total de eritrócitos e está mais sujeito a erros. A hiperglicemia aumenta o VCM. A amostra sanguínea estocada por mais de oito horas resulta em edema da hemácia, aumentando falsamente o hematócrito, enquanto a hemoglobina nas mesmas condições permanece constante. A avaliação clínica e laboratorial do paciente antes do tratamento com ERHu é imperativa e inclui a busca diagnóstica e o tratamento prévio de todos os fatores citados anteriormente como coadjuvantes na fisiopatogenia da anemia e que vão representar impedimentos à resposta plena à ERHu, como: deficiência de ferro, estados inflamatórios, infecções agudas, perdas sanguíneas, hiperparatireoidismo ou intoxicação pelo alumínio (Quadro 38.1) A anemia por deficiência de Epo ocorre quando o clearance de creatinina está abaixo de 30 ml/min, embora crianças e diabéticos apresentem anemia proporcionalmente mais acentuada que adultos com insuficiência renal de outras etiologias.48,86 Para os pacientes em hemodiálise a prescrição deve ser cuidadosamente revista e o KT/V (single pool) obtido deve ser igual ou maior que 1,2 ou o Índice de Redução de Uréia (IRU) superior a 65%. Em crianças sugere-se um KT/V de 1,4 e o IRU de 70%.49 Estudo comparativo entre dois gru-
Quadro 38.1 Avaliação clínica e laboratorial Avaliação clínica • Função renal • Adequação (KT/V) • Estado nutricional • Inflamação • Perda sanguínea/Parasitose • Hiperparatireoidismo/Intoxicação por Al • Malignidade Avaliação laboratorial • Hemograma com reticulócitos • Ferritina • Saturação da transferrina • PCR Se necessário • Exames para hemólise/hemoglobinopatias • Vit B12/Folato • Estudo da medula óssea
695
capítulo 38
Ferro Tratamento Inicial Paciente em HD que não está em uso de EPO outras causas de anemia excluídas
sim
não
Hb ⬍ 11 g/dl
Ferritina
•
⬍100 g/L
100-500 g/L
Fe I.V.
Fe I.V.
100 mg Fe sacarose no mínimo 1-8 ⫻ mês
•
Ferritina
⬍100g/L
⬎500 g/L
Fe V.O.
Não administrar Fe
100 mg Fe sacarose no mínimo 1-4 ⫻ mês
• Administrar EPO s.c.
Administrar EPO s.c.
•
Até completar 1.000 mg Procure Algoritmo
200 mg Sulfato ferroso 1-3 ⫻ dia ou 100 mg Fe sacarose no mínimo 1-2 ⫻ mês
Procure Algoritmo Iniciar EPO
Iniciar EPO
Monitorize
Monitorize
Hb: 1 ⫻ mês Ferritina: cada 3 meses
Hb: 1 ⫻ mês Ferritina: cada 2 meses
Hb 앖 mas Hb ⬍ 11 g/dl
Ferritina ⬍ 100 g/L
Continue a administrar Fe até que: ferritina 100-500 g/L
Ferritina 100-500 g/L ou Ferritina ⬎ 500 g/L
Considere a necessidade de EPO
Procure Algoritmo
EPO trat. inicial
Algoritmo 38.1
⬎100 g/L
Não administrar Fe
696
Conseqüências Hematológicas da Uremia
pos de adultos com KT/V de 1,2 e de 1,4 demonstrou que foram obtidos valores semelhantes de hematócrito (35% ⫾ 1,4) nos dois grupos, porém com doses menores de ERHu no grupo com maior KT/V (A ⫽ 183 ⫾ 95 U/kg/sem e B ⫽ 86 ⫾ 33 U/kg/sem).70 As recomendações do DOQI para adequação de pacientes em diálise peritoneal (CAPD) são KT/V ⬎ 2 (semanal) e/ou clearance creatinina ⬎ 60 L/sem/ 1,73 m2. Aproximadamente 10% dos pacientes renais crônicos prescindem do uso de ERHu, porém raros mantêm níveis normais de hematócrito e hemoglobina.
Pontos-chave: • A anemia deve ser quantificada pela Hb e não Ht • Pacientes com Hb ⬍ 11 g/dl (excluídas outras causas de anemia) devem receber ERHu • A diálise adequada melhora a resposta à ERHu
INICIANDO TRATAMENTO — AVALIAÇÃO DOS ESTOQUES DE FERRO A avaliação laboratorial dos estoques de ferro precede e acompanha todo o tratamento com ERHu. O Algoritmo 38.1 demonstra quais atitudes devem ser tomadas para manter estoques de ferro necessários à eritropoese. A síntese de Hb requer a incorporação de ferro em larga escala e implica mobilização de ferro do sistema reticuloendotelial e transporte pela transferrina para atender à demanda da medula óssea. Pacientes que apresentem valores de ferritina ⬍100 ng/ml e saturação da transferrina menor que 20% apresentam deficiência absoluta de ferro, o que exige reposição rápida por via endovenosa, duas vezes por semana. A ERHu não deverá ser iniciada neste momento. Ferritina entre 100 e 500 ng/ml e saturação da transferrina igual ou maior que 25% permitem iniciar tratamento com ERHu, porém mantendo ferro venoso uma vez por semana. A formulação parenteral do sacarato de ferro (Noripurum®) está disponível no mercado brasileiro em doses de 100 mg/5 ml. O ferro endovenoso deve ser suspenso quando a ferritina sérica ultrapassar 500 ng/ml (Algoritmo 38.1) ou 800 ng/ml (DOQI). A atenção deve estar voltada para monitorização da ferritina a cada dois meses quando a reposição for maior que 100 mg/sem e a cada três meses quando as reposições de ferro forem menores. Existem situações nas quais a ferritina encontra-se elevada, ⬎500 ng/ ml, porém com saturação de transferrina inferior a 25%, indicando deficiência funcional de ferro (mobilização inadequada do ferro em estoque). A conduta de aplicar ferro venoso nesta situação pode resultar em pronto aumento da Hb, mas os níveis de ferritina devem ser avaliados com mais freqüência. Alguns trabalhos têm citado os benefícios do ácido ascórbico nas situações de ferritina muito ele-
vada. Alguns autores recomendam ignorar as doses de ferritina e conduzir o tratamento com base somente na saturação da transferrina mantendo níveis de 25-40%. As amostras sanguíneas para dosar marcadores de ferro devem ser colhidas pelo menos uma semana após a aplicação do ferro endovenoso. Sugerimos que a administração do ferro venoso não ultrapasse 100 mg/aplicação e seja realizada em bolus, lentamente, após a sessão de diálise. Crianças com menos de 20 kg recebem 50 mg/aplicação. Na fase de manutenção, o tratamento com ferro venoso não deve exceder 200 mg/mês. A suplementação de ferro por via oral pode ser feita em pacientes em DP ou aqueles em tratamento conservador, embora possa ser ineficaz, por má absorção gastrintestinal ou intolerância. Nestes casos o ferro venoso pode ser administrado em veia periférica na dose de 1 ml para cada 20 ml de soro fisiológico (exclusivamente) em 30 minutos. As crianças em tratamento conservador recebem ferro via oral 4-6 mg/kg divididos em duas doses diárias. A análise quantitativa de hemácias hipocrômicas fornecida pela citometria de fluxo é um teste preciso para monitorizar o estoque de ferro, porém de realização pouco rotineira em nosso meio. A deficiência de ferro é comprovada quando o percentual de células hipocrômicas é ⬎10%.41 O número de reticulócitos hipocrômicos apresenta-se como o teste de melhor sensibilidade (100%) e especificidade (80%) para estimar a deficiência de ferro, porém exige aparelhagem específica.
Ponto-chave: • O estoque adequado de ferro é o principal determinante na resposta à ERHu. O uso apropriado por via endovenosa é seguro e fundamental para sucesso do tratamento
ADMINISTRAÇÃO DE ERHu A administração de ERHu pode ser feita por três vias: intravenosa (IV), subcutânea (SC) e intraperitoneal (IP). Vários estudos de farmacocinética evidenciaram uma maior duração da ação da ERHu utilizando a via SC12,18 e mesma eficiência, com doses 30-50% menores que as endovenosas. Outros estudos não demonstraram diferenças significativas entre as duas vias, especialmente quando a suplementação de ferro foi amplamente usada.6,32 Embora a via SC seja preferencial para pacientes em DP7,94 e em fase pré-diálise,87 a IV é a mais confortável para aqueles em HD. Os pacientes em HD apresentam resistência em utilizar a via SC, entretanto esta atitude deve ser vencida. A via SC tem sido colocada como via preferencial nas mais diversas recomendações (DOQI, SBN). A administração SC deve ser feita na região da coxa e no braço. Em alguns pacientes a dor no local da injeção é significativa e causa intolerância ao tratamento. A substituição do tampão usado em al-
capítulo 38
gumas formulações parece diminuir este problema. A via intraperitoneal tem raras indicações. A baixa disponibilidade exige doses semanais maiores e a medicação deve ser administrada com a cavidade intraperitoneal vazia, o que pode interferir na rotina da diálise. A freqüência de administração é variável: duas a três vezes por semana para pacientes em HD e uma a duas vezes por semana para aqueles em DP. Respostas idênticas foram observadas em pacientes em diálise peritoneal ambulatorial contínua (CAPD) que receberam a dose total semanal em uma única aplicação. Crianças menores em Diálise Peritoneal Automatizada (DPA) ou em CAPD recebem a medicação duas a três vezes por semana.39 Doses únicas semanais ou a cada 10 dias em adultos e crianças pré-diálise, ou naqueles com falência crônica do enxerto, estão associadas à correção da anemia. Quando a hemoglobina objetivada for alcançada e mantida, os intervalos de administração devem ser aumentados. O Algoritmo 38.2 demonstra a estratégia no tratamento inicial da ERHu em pacientes em tratamento conservador ou em diálise e considera que todas as etapas do Algoritmo 38.1 tenham sido cumpridas. As doses iniciais são de 6.000 a 8.000 U/semana e devem ser aumentadas na dependência do acréscimo mensal da Hb. Acréscimo de hemoglobina inferior a 0,7 g/dl no primeiro mês, na vigência de estoques adequados de ferro, indica a necessidade de aumento da dose de ERHu. Por outro lado, o uso de doses superiores a 12.000 U/sem com ferritina normal, sem aumento expressivo da Hb, leva a pensar em resposta inadequada e a investigar a causa de resistência. Na fase inicial do tratamento com ERHu, a ferritina deve ser dosada a cada dois meses. O aumento da Hb em 1 g/dl necessita de 150 mg de ferro e quanto maior o acréscimo mensal de Hb, mais rápido os estoques de ferro serão consumidos. Quando o aumento da Hb excede 2 g/dl/mês, as doses de ERHu podem ser reduzidas em 30%. As crianças necessitam de doses maiores de ERHu, uma vez que o clearance da droga é maior neste grupo etário. Doses semanais entre 150 e 300 U/kg foram reportadas em crianças em HD e em DP.7,39,79,84 A Hb objetivada neste algoritmo e na maioria das recomendações mundiais é igual ou superior a 11 g/dl, a ser atingida em dois a quatro meses. Embora não haja evidências claras sobre qual a ótima concentração de hemoglobina para pacientes renais crônicos, estudos têm demonstrado que os que apresentam Hb entre 11 e 12 g/dl melhoram a função cardíaca, apresentam melhor performance física e menor índice de hospitalizações. Não há benefícios comprovados em corrigir totalmente a anemia em pacientes com doença cardiovascular, e alguns trabalhos apontam episódios de trombose de acesso com hematócrito próximo ao índice normal. Há algumas exceções para este objetivo de Hb. Os pacientes com anemia falciforme devem manter Hb entre 7 e 8 g/dl. O tratamento com ERHu está disponível no nosso país, através de fornecimento pelos órgãos competentes, para a totalidade de pacientes que preencham os
697
critérios de indicação. É fundamental estabelecermos objetivos globais de boa resposta à ERHu atentando para o fato do alto custo da medicação. No nosso serviço o índice de qualidade estabelecido é que 85% dos pacientes recebendo ERHu atinjam Hb ⭓ 11 g/dl.
Ponto-chave: • Quantificação da anemia pelo valor da Hb e não do Ht Objetivo: atingir Hb ⭓ 11 g/dl
RESPOSTA INADEQUADA A resposta inadequada é considerada quando pacientes adultos com doses de ERHu superiores a 300 U/kg/sem não obtêm a Hb desejada. A deficiência de ferro é a causa mais freqüente e deve ser tratada prontamente (Algoritmo 38.1). A experiência brasileira demonstrou que o emprego efetivo do ferro permitiu respostas adequadas com doses de ERHu menores que as empregadas em outros países. Trabalhos americanos têm demonstrado que o uso mais amplo do ferro venoso (gluconato) nos últimos anos implicou um aumento significativo no percentual de pacientes com Hb ⭓ 11 g/dl — 43% em 1997 para 68% em 1999.6,25,33,55 Alguns pacientes com mielodisplasia, mieloma múltiplo e oxalose podem receber ERHu em doses superiores a 12.000 U/sem com o benefício de reduzir a necessidade transfusional. A diálise inadequada é outra causa de diminuição da resposta à ERHu. A prescrição da diálise deve ser revista, procurando atingir os marcadores de qualidade já citados anteriormente. Outras modalidades dialíticas que melhoram a anemia, como diálise prolongada ou diálise diária, devem ser cogitadas. Alguns estudos usaram doses de ERHu menores em pacientes que utilizavam dialisadores de alto fluxo, conseguindo resultados excelentes e atribuindo o êxito à diálise mais efetiva e ao tipo de membrana; entretanto, Movilli e col. obtiveram resultados semelhantes com dialisadores comuns. A melhor resposta à ERHu em pacientes bem dialisados fala a favor de que alguns inibidores da eritropoese são substâncias dialisáveis de baixo ou médio peso molecular.47 O hiperparatireoidismo, complicação freqüente em pacientes em diálise, representa outra causa de resposta inadequada à ERHu. A fibrose da medula óssea reduz o compartimento precursor eritróide, interferindo na eritropoese e bloqueando a ação da ERHu. Rao e col., utilizando histomorfometria óssea, comprovaram a maior necessidade de ERHu, na dependência da gravidade do hiperparatireoidismo, da extensão da fibrose medular, do volume osteóide e da superfície ocupada por osteoclastos.79,96 Em nossa observação, crianças que apresentaram níveis de PTH molécula intacta superiores a 10 vezes os valores normais necessitaram de aumento progressivo da ERHu, e uma correlação linear significati-
698
Conseqüências Hematológicas da Uremia
EPO Tratamento Inicial Pacientes em IRC ou em diálise com estoque adequado de Fe
Hb sempre ⬍ 11 g/dl e outras causas de anemia excluídas
Monitorize não Hb mínima ⱖ 11 g/dl
Inicie EPO de preferência s.c. 6.000U / 8.000U Semanal
앖 Hb após 1 mês
Hb앖 ⬍ 0,7 g/dl
Hb앖 0,7-2,0 g/dl
앖 A dose EPO
Continue a dose EPO
9.000U / 12.000U Semanal
6.000U / 8.000U Semanal
Hb앖 ⬎ 2,0 g/dl 앗 Dose EPO
3.000U / 4.000U Semanal
Monitorize Hb: 1 ⫻ mês Ferritina: 2/2 meses
앖 Hb Em 1-2 Meses
Hb앖 ⬍ 1,4 g/dl
앖 A dose EPO 12.000U / 20.000U Semanal
Hb앖 1,4-3,5 g/dl
Hb앖 ⬎ 3,5 g/dl
Continue a dose de EPO
앗 a dose de EPO
6000U / 8000U Semanal
Possível Resistência à EPO
Mensal Monitorize Hb: Ferritina: Trimestral
Objetivo: individualizar Hb ⱖ 11g/dl em 2-4 meses, subindo a Hb ⫾ 1 g/dl por mês
Algoritmo 38.2
1000U / 2000U Semanal
699
capítulo 38
va pôde ser estabelecida entre níveis de PTH e doses de ERHu.11,39 Outros potenciais efeitos na eritropoese, mediados pelo PTH, incluem alterações intra- e extracelulares no metabolismo cálcio-fósforo e liberação de citoquinas pelo osso reabsorvido. A supressão química ou cirúrgica das glândulas paratireóides resulta em melhor resposta eritropoética nestes pacientes. A ação dos metabólitos ativos da vitamina D consiste em induzir proliferação e maturação das células precursoras eritróides in vitro e pode melhorar a anemia in vivo mesmo sem redução dos níveis de paratormônio.40 A intoxicação pelo alumínio também pode induzir resistência à ERHu, e isto foi demonstrado em animais de experimentação e em pacientes com níveis séricos de alumínio de 175 g/L e 225 g/L.44,84 A participação do alumínio, nesta resistência, ocorre pela competição com o ferro na ligação com a transferrina e inibição da síntese da hemoglobina.3,22,61 Os níveis de alumínio aceitáveis para pacientes em diálise são de 100 g/L, e desferoxamina (DFO), 5 mg/kg/semana durante três meses, deve ser utilizada em casos de toxicidade comprovada. Os processos infecciosos agudos e crônicos, estados inflamatórios, doenças auto-imunes e neoplásicas interferem na resposta à ERHu, por alterações no metabolismo do ferro (mobilização inadequada do ferro ligado à ferritina) e pelo aumento das citoquinas inflamatórias: fator de necrose tumoral (TNF) e interleucina-1 (IL1). A IL1 e o TNF liberam interferon alfa e beta, que inibem a eritropoese in vivo e in vitro.20 A proteína C reativa é um marcador de doença inflamatória e deve ser incluída entre testes rotineiros para detectar precocemente uma resposta inadequada à ERHu. Pacientes que apresentam proteína C reativa ⬎20 mg/L necessitam de doses de ERHu maiores.8 Episódios de infecção, como peritonites, ou procedimentos cirúrgicos são acompanhados por diminuição da Hb até que o fator causal seja corrigido. Na infecção pelo vírus da hepatite B, há um aumento na produção de Epo endógena, provavelmente pelos novos hepatócitos. Algumas drogas têm sido implicadas na diminuição da resposta à ERHu: inibidores da ECA e agentes imunossupressores. Os inibidores da ECA diminuem a síntese de Epo em pacientes com IRC provavelmente pelo aumento do fluxo sanguíneo renal, melhora da oxigenação e redução da produção de Epo. A ciclosporina parece reduzir a secreção de Epo e a azatioprina destrói eritrócitos recémformados dentro da medula óssea antes de sua maturação. Estas interferências, entretanto, têm pouca repercussão na resposta clínica, sendo compensadas por aumento das doses de ERHu.71 Outras causas que podem influir na resposta à ERHu incluem: desnutrição, deficiência de vitaminas (B6, B12), folato e de carnitina. A deficiência de vitaminas ocorre em pacientes renais crônicos pelas dietas inadequadas, absorção prejudicada por outras medicações e pelas perdas na diálise. A vitamina B6 está envolvida na biossíntese do he-
me e pode estar deficiente no eritrócito mesmo com níveis plasmáticos normais. Nestes casos, a suplementação, via oral, de 100-150 mg/sem é necessária. A deficiência de vitamina B12 é rara e decorre de perdas pela diálise, a longo prazo, especialmente em pacientes que usam membranas de alto fluxo. A deficiência de carnitina é observada em pacientes renais crônicos idosos e parece estar relacionada ao tempo em tratamento dialítico. A suplementação de L-carnitina aumenta a hemoglobina, corrige as anormalidades lipídicas e melhora a resposta à ERHu.17
Terapias Adjuvantes As medicações a seguir podem, em determinadas situações, melhorar a resposta à ERHu, permitindo alguma redução nas doses. Os andrógenos atuam na eritropoese de duas maneiras: aumentando a sensibilidade da célula progenitora à Epo e estimulando sua produção pelo tecido renal remanescente. A administração de decanoato de nandrolona está associada à melhora da anemia e ganho de peso em alguns pacientes adultos em diálise e parece potenciar o efeito da ERHu. Os efeitos colaterais incluem complicações no fígado e próstata e limitam o uso a homens com idade superior a 50 anos. O ácido ascórbico é um agente redutor capaz de liberar o ferro da ferritina e mobilizar do sistema reticuloendotelial para a transferrina. Doses endovenosas de 300 mg 3⫻/sem durante oito semanas foram efetivas em aumentar a Hb e a saturação da transferrina e reduzir a ferritina e a dose de ERHu. Os mecanismos pelos quais a L-carnitina melhora a resposta à ERHu são: estabilização da membrana do reticulócito e redução da fragilidade da membrana eritrocitária. Doses de 20 mg/ kg IV após a diálise por seis meses permitiram redução de 38% na dose de ERHu.89
Efeitos Adversos A hipertensão arterial relatada como o maior efeito adverso da ERHu nos primeiros trabalhos95,97 não representa hoje qualquer impedimento ao uso da medicação. Alguns fatores de risco incluem: hipertensão preexistente, rápida elevação do hematócrito e doses de ERHu muito elevadas. Os mecanismos envolvidos são: a diminuição da vasodilatação periférica compensatória, maior viscosidade sanguínea e efeitos vasculares diretos. Estudos em animais de experimentação comprovaram efeito pressor direto em artérias renais e mesentéricas, como resultado da entrada de cálcio através da membrana,46,72 e aumento da síntese de endotelina. É possível que a ERHu estimule a síntese de endotelina-1 somente em concentrações muito elevadas. Há evidências também de que ela possa atuar como fator angiogênico e como fator de crescimento de células da musculatura lisa.13 Algumas medidas são fundamentais para o controle da hipertensão: elevação gradual do he-
700
Conseqüências Hematológicas da Uremia
matócrito, utilização de doses baixas de ERHu, ultrafiltração rigorosa na diálise e introdução ou acréscimo de drogas anti-hipertensivas. Na fase de manutenção do tratamento observa-se que alguns pacientes prescindem de medicação anti-hipertensiva, provavelmente pela redução do débito cardíaco e adequação da resistência periférica alcançada após a correção da anemia. Os fenômenos trombóticos, especialmente no acesso vascular, representaram complicação significativa nos primeiros estudos com ERHu, porém posteriormente isto foi colocado sob questão. A incidência de trombose vascular não parece estar associada à resposta hematológica e depende do tipo de acesso usado, sendo mais freqüente em próteses. A administração de antiagregantes plaquetários (aspirina, dipiridamol, sulfinpirazona) diminui este problema.
Perspectivas Recentemente foi sintetizada a darbepoetina alfa ou NESP (novel erythropoiesis stimulating protein), análogo da ERHu alterado por técnica de recombinação do DNA. O acréscimo de duas cadeias de ácido siálico às já existentes aumenta a estabilidade e permite atividade biológica três vezes maior pela duração da ação nos agentes estimuladores da eritropoese. Estudos já publicados em pacientes com doenças neoplásicas e em renais crônicos demonstram resultados e efeitos secundários semelhantes aos da ERHu. Doses de 0,45 g/kg em pacientes renais crônicos e 2,25 g/kg em doentes com neoplasia mostraram-se efetivas.64 A NESP permite aplicação com intervalos semanais ou quinzenais e representa um triunfo na síntese de drogas pela tecnologia do DNA recombinante. A terapia genética agora estuda maneiras de suplantar a necessidade de administração continuada de ERHu. Em um trabalho experimental, em ratos urêmicos, a transferência do gene da Epo humana para mioblastos proporcionou a secreção permanente do hormônio e a correção da anemia.
Ponto-chave: • A NESP é um análogo da ERHu, com atividade biológica 3 vezes maior, e permite administração de doses semanais ou quinzenais
ERITROCITOSE A eritrocitose (hematócrito acima de 50%) pode ser definida como absoluta ou relativa e raramente ocorre em pacientes em tratamento dialítico. As condições associadas a eritrocitose incluem: doença cística adquirida, hidronefrose, pielonefrite, carcinoma de células renais, hepatites ou hepatoma.22 Nestes casos há uma excessiva e inapropri-
ada produção de Epo, porém o estímulo para este aumento de produção não está claro. A eritrocitose pós-transplante é uma condição multifatorial que pode ser encontrada em 20% dos pacientes após um a dois anos do transplante e afeta aqueles que apresentam fatores predisponentes à doença arterial isquêmica, como fumo ou diabetes. O tratamento inclui inibidores da ECA ou antagonista do receptor de angiotensina II.
ALTERAÇÕES DA HEMOSTASIA Os pacientes portadores de doença renal apresentam uma maior tendência a sangramento. Os fatores de coagulação não se alteram e o número de plaquetas é normal. A maioria dos problemas deve-se à disfunção plaquetária ou anormalidades da interação plaqueta-vaso.63 Esta disfunção prolonga o tempo de sangramento e impede a agregação plaquetária in vitro. Vários mecanismos contribuem para isto: diminuição da atividade do fator 3 plaquetário,60 diminuição dos níveis de tromboxano A280 e aumento do óxido nítrico (NO) (inibidor da agregação plaquetária derivado do endotélio vascular).81 A concentração do fator de von Willebrand e do fator VIII é normal na uremia, porém há alterações nos receptores de membrana plaquetários do fator de von Willebrand que resultam em anormalidades na interação plaqueta-vaso e tendência ao sangramento.91,93 Existe uma correlação direta entre a redução da adesividade plaquetária e o tempo de sangramento em pacientes urêmicos que melhora com o tratamento dialítico, na maioria dos casos. Alguns relatos referem que a CAPD corrige mais efetivamente a disfunção plaquetária provavelmente pelas características mais biocompatíveis da membrana peritoneal em relação às membranas artificiais da HD. O grau de anemia correlaciona-se estreitamente com o prolongamento do tempo de sangramento. Fatores reológicos representam um papel importante na relação entre anemia e disfunção plaquetária. No hematócrito superior a 30% as hemácias ocupam a parte central do vaso e as plaquetas acomodam-se em camadas junto à superfície endotelial vascular, favorecendo a aderência plaquetária na injúria endotelial. Com hematócrito mais baixo as plaquetas estão mais dispersas, impedindo esta aderência. A correção da anemia com ERHu normaliza o tempo de sangramento pela influência das hemácias na função plaquetária, promovendo aumento da agregação plaquetária espontânea e induzida pelo colágeno,93 e pelo aumento da adesão plaquetária à célula endotelial. A hemácia influencia as interações plaquetárias pela liberação de substâncias pró-agregantes, em particular adenosina difosfato (ADP), que constitui provavelmente o mais importante fator da agregação plaquetária espontânea.90 A ERHu pode ter efeito adicional direto melhorando a disfunção plaquetária pelo aumento no número de receptores glicoprotéicos (GPIIb-IIIa) na superfície plaquetária.34
capítulo 38
Outros tratamentos coadjuvantes para sangramento incluem: desmopressina (DDAVP), crioprecipitados e estrógenos.
9. 10.
ALTERAÇÕES EM LEUCÓCITOS 11.
As alterações na imunidade são em parte responsáveis pelo aumento da incidência de infecções que representam a segunda maior causa de mortalidade em pacientes em diálise. O número total de leucócitos é normal, porém a contagem diferencial mostra um aumento na proporção de neutrófilos para linfócitos. A atividade intracelular fagocítica e microbicida é normal. A leucopenia transitória, que ocorre durante a diálise por agregação e seqüestro pulmonar, pode estimular a liberação de neutrófilos imaturos e contribuir para alterações funcionais. As membranas dialisadoras sintéticas (polissulfona e policarbonato, poliacrilonitrila) são mais biocompatíveis, apresentam baixa ativação do complemento e reduzem a leucopenia. Os pacientes em diálise têm linfopenia relativa que pode estar relacionada à membrana, à desnutrição e à deficiência de zinco. Os efeitos da ERHu no sistema imune são conflitantes; alguns trabalhos têm mostrado inibição da proliferação das células T e B in vivo, embora os efeitos mais consistentes sejam representados pela diminuição de anticorpos reativos contra painel que poderia melhorar a resposta ao transplante renal.42
12.
13.
14.
15. 16.
17.
18.
19.
ALGORITMOS — Passlick-Deetjen, J.; Horl, W.; Macdougall, I.; Valderrabano, F.; Mann, J.; Carrera, F.; Marx, A. Reprodução autorizada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
2.
3. 4.
5. 6.
7.
8.
ABBUD FILHO, M.; YAMAKI, W.M.; RAMALHO, H.J.; BARBERATO, J.B.; SALGUEIRO, M.C.; ABDO, M.A.; MESQUITA, R.; BEZAS, A.G. Seis meses de experiência com uso de eritropoetina em pacientes hemodialisados. J. Bras. Nefrol., v. 14, pp. 161-165, 1992. ABREO, K.; BROWN, S.T.; SELLA, M. Correction of microcytosis following elimination of an occult source of aluminum contamination of dialysate. Am. J. Kidney Dis., v. XIII, n. 6, pp. 465-468, 1989. ACKRILL, P.; DAY, J.P.; AHMED, R. Aluminum and iron overload in chronic dialysis. Kidney Int., v. 33 (suppl. 24), pp. 163-167, 1988. AIKIONBARE, H.A.; WINTERBORN, M.W.; GYDE, O.H. Erythropoietin in children with chronic renal failure on dialytic and non dialytic therapy. The Int. J. Pediatr. Nephrol., v. 8, pp. 9-14, 1987. ALFREY, A.C. Aluminium intoxication. Editorial review. New Engl. J. Med, v. 310, pp. 113-114, 1984. BANDEIRA, M.F.S. Tratamento da anemia da Insuficiência Renal Crônica com Eritropoetina Recombinante Humana. Tese (Mestrado em Medicina). Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1993. BANDEIRA, M.F.S.; HOETTE, M.; RUZANY, F. Experiência clínica com eritropoetina recombinante humana. In: Cruz, J. Coordenação Editorial. Atualidades em Nefrologia 2, São Paulo: Sarvier, 1992, pp. 161-175. BARANY, P.; DIVINO FILHO, J.C.; BERGSTRON, J. High C-reacti-
20.
21.
22. 23. 24.
25. 26.
27.
28.
701 ve protein is a strong predictor of resistance to erythropoietin in hemodialysis patients. Am. J. Kidney Diseases v. 29, pp. 565-568,1997. BARBOUR, G.L. Effect of parathyroidectomy on anemia of chronic renal failure. Arch. Int. Med., v. 139, pp. 889-891, 1979. BECKMAN, B.S.; BROOKINS, J.W.; SHADDUCK, R.K.; MANGAN, K.F.; DEFTOS, L.F.; FISHER, J.W. Effect of different modes of dialysis on serum Erythropoietin levels in pediatric patients. Pediatr. Nephrol., v. 2, pp. 436-441, 1988. BELSHA, C.W.; BREWER, E.D.; BERRY, P.L. Better response to erythropoietin (Epo) in chronic pediatric PD vs. HD patients: subcutaneous (SC) route or lower serum parathyroid hormone (PTH) or both. Perit. Dial. Intern., v. 11, pp. 18a, 1991. BESARAB, A.; FLAHARTY, K.K.; ERSLEV, A.J. Clinical pharmacology and economics of recombinant human erythropoietin in endstage renal disease: The case for subcutaneous administration. J. Am. Soc. Nephrol., v. 2, pp. 1405-1416, 1992. BRINES, M.L. Erythropoietin crosses the blood-brain barrier to protect against experimental brain injury. Proc. Nat. Acad. Sci. USA v 97 pp 10526-10531 2000. CARLINI, R.; REYES, A.; ALVAREZ, U.I.; ROTHSTEIN, M. Human recombinant erythropoietin stimulates angiogenesis. J. Am. Soc. Nephrol., v. 4, p. 425 A, 1993. CARO, J. & ERSLEV, A.J. Uremic inhibitors of erythropoiesis. Sem. Nephrol., v. 5, pp. 128-132, 1985. CARO, J. & ERSLEV, A.J. Erythropoietin assays and their use in the study of anemias. In: Koch, K.M.; Kuhn, K.; Nonast-Daniel, B.; Scigalla, P. Contributions to Nephrology. Basel:Karger, 1988, v. 66, pp. 128-132, 1985. CARUSO, U.; LEONE, L.; NAVA, D. Effects of L-carnitine on anemia in aged hemodialysis patients treated with recombinant human erythropoietin: a pilot study. Dialysis & Transplantation, v. 27 pp. 498506. CHANDRA, M.; CLEMONS, G.K.; McVICAR, M.; WILKES, B.; BLUESTONE, P.A.; MAILLOUX, L.U.; MOSSEY, R.T. Serum erythropoietin levels and hematocrit in end-stage renal disease: influence of the mode of dialysis. Am. J. Kidney Dis., v. XII, n. 3, pp. 208-213, 1988. CHANDRA, M.; MILLER, M.E.; GARCIA, J.E.; MOSSEY, R.T.; McVICAR, M. Serum immunoreactive erythropoietin levels in patients with polycystic kidney disease as compared with other hemodialysis patients. Nephron, v. 39, pp. 26-29, 1985. CLIBON, U.; BONEWALD, L.; CARO, J.; ROODMAN, G.D. Erythropoietin fails to reverse the anemia in mice continuously exposed to tumor necrosis factor-alpha in vivo. Exp. Hematol, v. 18, pp. 438-441, 1990. D’ANDREA, A.D.; LODISH, H.F.; WYONG, G.G. Expression cloning of the murine erythropoietin receptor. Cell, v. 57, pp. 277285, 1989. DRUEKE, T. Aluminum toxicity in chronic renal failure. J. Nephrol., v. 1, pp. 49-57, 1989. EATON, J.W. & LEIDA, M.N. Hemolysis in chronic renal failure. Sem. Nephrol., v. 5, pp. 133-139, 1985. ESCHBACH, J.W. & ADAMSON, J.W. Hematologic consequences of renal failure. In: Brenner & Rector, The Kidney. Philadelphia. WB Saunders, 1991, pp. 2019-2036. ESCHBACH, J.W. Erythropoietin: The promise and the facts. Kidney Intern., v. 45, S44, pp. 70-76, 1994. ESCHBACH, J.W. The anemia of chronic renal failure: pathophysiology and the effects of Recombinant Erythropoietin. Kidney Int., v. 35, pp. 134-148, 1989. ESCHBACH, J.W.; ABDULHADI, M.H.; BROWNE, J.K.; DELANO, B.G.; DOWNING, M.R.; ADAMSON, J.W. Recombinant Human Erythropoietin in anemic patients with end-stage renal disease. Results of a phase III multicenter clinical trial. Annals Int. Med., v. 111, pp. 992-1000, 1989. ESCHBACH, J.W. & ADAMSON, J.W. Modern aspects of the pathophysiology of renal anemia. In: Koch, K.M.; Nonnast-Daniel, B.; Scigalla, P. Contributions to Nephrology. Basel:Karger, 1988, v. 66, pp. 63-65.
702 29.
30.
31.
32.
33.
34 .
35. 36.
37.
38.
39.
40.
41.
42.
43.
44.
45.
Conseqüências Hematológicas da Uremia
ESCHBACH, J.W.; EGRIE, J.C.; DOWNING, M.R.; BROWNE, J.K.; ADAMSON, J.W. Correction of the anemia of ESRD with rHuEpo. Results of combined Phase I and II clinical trial. New Engl. J. Med., v. 316, pp. 73-78, 1987. ESCHBACH, J.W.; HALEY, N.R., EGRIE, J.C.; ADAMSON, J.W. A comparison of the responses to recombinant human erythropoietin in normal and uremic subjects. Kidney Int., v. 42, pp. 407-416, 1992. ESCHBACH, J.W., MLADENOVIC, J.; GARCIA, J.F.; WAHL, P.W.; ADAMSON, J.W. The anemia of chronic renal failure in sheep. Response to Erythropoietin rich plasma in vivo. J. Clin. Invest., v. 74, pp. 434-441, 1984. ESCHBACH, J.W. The current concepts of management in chronic renal failure: impact NKF-DOQI. Semin Nephrol v. 20 pp. 320-29, 2000. FRANKENFIELD, D., for the ESRD CORE INDICATORS WORKGROUP. Anemia management of adult hemodialysis patients in the US: Results from the 1997 ESRD Core Indicators Project. Kidney Int., v. 57, pp. 578-589, 2000. FABRIS, F.; CORDIANO, I.; RANDI, M.L.; CASONATO, A.; MONTINI, G.; ZACCHELLO, G.; GIROLAMI, A. Effect of human recombinant erythropoietin on bleeding time, platelet number and function in children with end stage renal disease maintained by haemodialysis. Ped. Nephrol., v. 5, pp. 225-228, 1991. FEINFELD, D.A. The role of parathyroid hormone as a uremic toxin: current concepts. Sem. Dial., v. 5, pp. 48-53, 1992. FRITSCH, E.F. The molecular biology and biochemistry of erythropoietin. In: Garnick, M.B. Erythropoietin in Clinical Applications: an International Perspective. New York. Dekker Inc., 1990, cap. 2, pp. 3958. FUKUDA, M.; SASAKI, H.; FUKUDA, M.N. Erythropoietin metabolism and the influence of carbohydrate structure. In: Baldamus, C.A.; Scigalla, P. Erythropoietin: from Molecular Structure to Clinical Applications. Contributions of Nephrology, Basel:Karger, 1989, v. 76, pp. 78-89. GANSER, A.; BERGMANN, M.; VOLKERS, B.; GRUTZ-MACHER, P.; HOELZER, D. In vitro and in vivo effects of Recombinant Human Erythropoietin in human hemopoietic progenitor cells. In: Koch, K.M.; Nonnast-Daniel, B.; Scigalla, P. Contributions to Nephrology. Basel:Karger, 1988, v. 66, pp. 123-130. GARCIA, C.D.; UHLMANN, A.; PIRES, A.J.; LOSEKANN, A.; RUZANY, F.; CAMARGO, E.; ZAGURY, A.; BANDEIRA, M.F. Análise da resposta ao uso de eritropoetina recombinante humana (rHuEpo). Estudo clínico em crianças com insuficiência renal crônica. XVI Congresso Brasileiro de Nefrologia, Rio de Janeiro, 1992, Anais..., v. 1, pp. 12. GOICOECHEA, M.; VASQUEZ, M.I.; RUIZ, M.A. et al. Intravenous calcitriol improves anemia and reduces the needed for erythropoietin in hemodialysis patients. Nephron, v. 78, pp. 23-27. GOLAN, E.; RADNAY, J.; GOLDMANN, J. et al. Relationship between transferrin saturation index and red cell size and haemoglobin content in haemodialysis patients. Nephrol. Dial. Transplant, v. 9, pp. 1030-1034, 1994. GRIMM, P.C.; SINAI TRIEMAN, L.; SEKIDA, N.M.; ROBERTSON, L.S.; ROBINSON, B.J.; FINE, R.N.; ETTENGER, R. Effects of recombinant human erythropoietin on HLA sensitization and cell imunity. Kidney Int., v. 38, pp. 12-18, 1990. GROOPMAN, J.E.; MOLINA, J.M.; SCADDEN, D.T. Hematopoietic growth factors: biology and clinical applications. New Engl. J. Med., v. 321, pp. 1449-1459, 1989. GRUTZMACHER, P.; BERGMANN, M.; WEINREICH, T.; NATTERMANN, U.; REIMERS, E.; POLLOK, M. Beneficial and adverse effects of correction of anaemia by Recombinant Human Erythropoietin in patients on maintenance haemodialysis. In: Koch, K.M.; Nonnast-Daniel, B.; Scigalla, P. Contributions to Nephrology. Basel:Karger, 1988, v. 66, pp. 104-113. HARMON, W.E. & INGELFINGER, J.R. Dialytic management of end-stage renal disease. In: Tune, B.M.; Mendoza, S.; Brenner, B.M.; Stein, J.H. Pediatric Nephrology, New York. Churchill Livingstone, pp. 343, 1984.
46.
47.
48. 49.
50.
51.
52.
53.
54.
55.
56.
57.
58.
59.
60. 61. 62.
63. 64. 65.
66.
HEIDENREICH, S.; RAHN, K.H.; ZIDEK, W. Direct vasopressor effect of recombinant human erythropoietin on renal resistance vessels. Kidney Int., v. 39, pp. 259-265, 1991. IFUDU, O.; URIBARRIJ.; FRIEDMAN E. Adequacy of dialysis and differences in hematocrit among dialysis facilities. American Journal of Kidney Disease, v. 36, pp.1166-1174, 2000. ISHIMURA, E. Diabetes mellitus increases a severity of anemia in nondialyzed patients with renal failure. J. Nephrol. v.11, pp. 83-86, 1998. JABS, K.; HARMON, W.E. Recombinant human erythropoietin therapy in children on dialysis. Advances in Renal Replacement Therapy, v. 3, pp. 24-36,1996. JACOBS, A. Iron metabolism. In: Weatherall, D.J.; Ledingham, J.G.G., Warrel, D.A. Oxford Textbook of Medicine, 2 ed. Oxford. Oxford University Press, 1988, pp. 19-79, 1983. JACOBS, K.; SHOEMAKER, C.; RUDERSDORF, R.; NEILL, S.D.; KAUFMAN, R.J.; MUFSON, A.; SEEHRA, J.; JONES, S.S.; HEWICK, R.; FRITSCH, E.F.; HAWAKITA, M.; SHIMIZU, T.; MIYAKE, T. Isolation and characterization of genomic and cDNA clones of human erythropoietin. Nature, v. 313, pp. 806-810, 1985. KOURY, S.T.; BONDURANT, M.C.; KOURY, M.J. Localization of erythropoietin synthesizing cells in murine kidneys by in situ hybridization. Blood, v. 71, pp. 524-527, 1988. KOURY, M.J. The role of erythropoietin in the physiological response to anemia. Erythropoiesis: New Dimensions in the Treatment of Anemia v. 5, pp. 39-45, 1994. KRANTZ, S.B.; SAWYER, S.T.; SAWADA, K.I. The role of Erythropoietin in erythroid cell differentiation. In: Koch, K.M.; NonnastDaniel, B.; Scigalla, P. Contributions to Nephrology, Basel:Krager, 1988, v. 66, pp. 25-37. KREIS, H.; ZINS, B.; NARET, C.; CASADEVALL, N.; GOUREAU, Y.; PETERLONGO, F.; VARET, B.; NAJEAN, Y.; JACQUOT, C.; DRUEKE, T. Recombinant erythropoietin: personal experience with a new treatment for the anemia of chronic renal failure. Transpl. Proc., v. 21 (suppl. 2), n.º 6, pp. 55-61, 1989. KURTZ, A. Erythropoietin — structure, function, origin. In: Grunfeld, J.P.; Bach, J.F.; Crosnier, J.; Funck Bretano, J.L.; Maxwell, M.H. Advances in Nephrology, Chicago. Year Book Medical Publishers Inc., 1987, v. 16, pp. 371-378. KURTZ, A.; ECKARDT, K.; TANNAHILL, L.; BAUER, C. Regulation of Erythropoietin production. In: Koch, K.M., Nonnast-Daniel, B.; Scigalla, P. Contributions to Nephrology. Basel:Krager, 1988, v. 66, pp. 1-16. KUSHNER, D.S.; BECKMAN, B.; FISHER, J.W. Do polyamines play a role in the pathogenesis of the anemia of end-stage renal disease? Kidney Int., v. 36, pp. 171-174, 1989. LACOMBE, C.; DA SILVA, J.L.; BRUNEVAL, P.; CAMILLERI, J.P.; BARIETY, J.; TAMBOURIM, P., VARET, B. Identification of tissues and cells producing Erythropoietin in the anemic mouse. In: Koch, K.M.; Nonnast-Daniel, B.; Scigalla, P. Contributions to Nephrology. Basel:Karger, 1988, v. 6, pp. 17-24. LEWIS, J.H.; ZUCKER, M.B.; FERGUSON, J.H. Bleeding tendency in uremia. Blood, v. 11, pp. 1073-1076, 1956. LIMA, E.M. Alumínio na insuficiência renal crônica. Tese (Mestrado em Medicina). Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1988. LIN, F.K.; SUGGS, K.S.; LIN, C.H.; BROWNE, J.K.; SMALLING, R.; EGRIE, J.C.; CHEN, K.K.; FOX, G.M.; MARTIN, F.; STABINSKY, Z.; BADRAWI, S.M.; LAI, P.H.; GOLDWASSER, E. Cloning and expression of the human erythropoietin gene. Proc. Natl. Acad. Sci. USA, v. 82, pp. 7580-7584, 1985. LIVIO, M.; BENIGNI, A.; REMUZZI, G. Coagulation abnormalites in uremia. Sem. Nephrol., v. 5, pp. 82-90, 1985. MACDOUGAL, I.C. Novel erythropoiesis stimulating protein. Semin. Nephrol., v. 20, pp. 375-381, 2000. MACDOUGALL, I.C. Optimizing the use of erythropoietic agents — pharmacokinetic and pharmacodynamic considerations. Nephrol. Dial. Transplant, v. 17, Suppl 5, pp. 66-70. MAXWELL, P.H.; OSMOND, M.K.; PUGH, C.W. et al. Identification of the renal erythropoietin-producing cells using transgenic mice. Kidney Int., v. 44, pp. 1149-1153, 1993.
703
capítulo 38
67.
68. 69. 70.
71.
72.
73.
74.
75. 76.
77.
78.
79.
80.
81.
82.
83.
84.
85.
86.
87.
88.
MEYTES, D.; BOGIN, E.; MA, C.; DUKES, P.P.; MASSRY, S.E. Effects of PTH hormone on erythropoiesis. J. Clin. Invest., v. 67, pp. 12631269, 1981. MIYAKE, T.; KUNG, C.K.-H.; GOLDWASSER, E. Purification of Human Erythropoietin. J. Biol. Chem., v. 252, pp. 5558-5564, 1977. MLADENOVIC, J. Aluminium inhibits erythropoiesis in vitro. J. Clin., v. 81, pp. 1661-1665, 1988. MOVILLI, E.; CANCARINI, G.; ZANI, R. Adequacy of dialysis reduces the doses of recombinant erythropoetin independently from the use of biocompatible membranes in haemodialysis patients. Nephrol Dial Transplant, v. 16 pp. 111-114, 2001. MUIRHEAD, N.; CATTRAN, DC.; ZALTZMAN, J. Safety and efficacy of recombinant human erythropoietin in correcting the anemia of patients with chronic renal allograft dysfunction. J. Am. Soc. Nephrol., v. 5, pp. 1216-1222, 1994. MUNTZEL, M.; HANNEDOUCHE, T., DRUEKE, T.B. Erythropoietin increases blood pressure in normotensive and hypertensive rats. Nephron, v. 65, pp. 601-604, 1993. NAKASHIMA, J.; OHIGASHI, T.; BROOKINS, J.W. et al. Effects of 5´-N-ethylcarboxamida adenosine (NECA) on erythropoietin production. Kidney Int., v. 44, pp. 734-740, 1993. NISSENSON, A.R. National cooperative ERHu erythropoetin study in patients with chronic renal failure. A phase IV multicenter study. Am. J. Kidney Dis., v. XVIII, s. 1, pp. 24-33, 1991. ORKINS, S. Apoptosis cutting red cell production. Nature, v. 401, pp. 433-436, 1999. PAGANINI, E.P. Overview of anemia associated with chronic renal disease: primary and secondary mechanisms. Sem. Nephrol., v. 9 (suppl. 1), pp. 3-8, 1989. PAUL, P.; ROTHMANN, S.A.; McMAHAN, J.T.; GORDON, A.J. Erythropoietin secretion by isolated rat Kupffer cells. Exp. Hematol., v. 12, p. 825, 1984. RADTKE, H.W.; REGE, A.B.; La MARCHE, M.B.; BARTOS, D.; CAMPBELL, R.A.; FISHER, J.W. Identification of spermine as an inibitor of erythropoiesis in patients with chronic renal failure. J. Clin. Invest., v. 67, pp. 1623-1629, 1980. RAO, D.S.; SHIH, M.; MOHINI, R. Effect of serum parathyroid hormone and bone marrow fibrosis on the response to erythropoietin in uremia. New Engl. J. Med., v. 328, pp. 171-175, 1993. REMMUZZI, G.; BENIGNI, A.; DOSESINI, P. Reduced platelet thromboxane formation in uremia. Evidence for a functional cyclooxygenase defect. J. Clin. Invest., v. 71, pp. 762-768, 1983. REMMUZZI, G.; PERICO, N.; ZOJA, C. et al. Role of endotheliumderived nitric oxide in the bleeding tendency of uremia. J. Clin. Invest., v. 86, pp. 1768-1772, 1990. RIGDEN, S.P.A.; MONTINI, G.; MORRIS, M.; KLARK, K.G.A.; HAYCOCK, G.B.; CHANTLER, C.; HILL, R.C. Recombinant human erythropoietin therapy in children maintained by haemodialysis. Ped. Nephrol., v. 4., pp. 618-622, 1990. ROMÃO JUNIOR, J.E.; ABENSUR, H.; DRAIBE, S.A.; BANDEIRA, F.; RUZANY, F.; LOWEN, J.; RIELLA, M.C.; EVANGELISTA JUNIOR, J.B.; CAMPOS, H.; SABBAGA, E. Uso da eritropoetina recombinante humana no tratamento da anemia do paciente em hemodiálise: Um estudo multicêntrico. Rev. Assoc. Med. Bras., v. 38, n. 2, pp. 57-61, 1992. ROSENLOF, K.; FYLQUIRST, F.; TENHUNNEN, R. Erythropoietin, aluminum and anaemia in patients on hemodialysis. Lancet, v. 335, pp. 247-249, 1990. SANTOS, F.; MASSIE, D.M.; CHAN, J.C.M. Risk factors in aluminum toxicity in children with chronic renal failure. Nephron, v. 42, pp. 189-195, 1986. SCHARER, K. & MULLER WIEFEL, D. Hematological complications. In: Holliday, M.A.; Barrat, T.M.; Vernier, R.L. Pediatric Nephrology. Baltimore. Williams & Wilkins, 1987, pp. 880-887. SCHARER, K.; KLARE, B.; BRAUN, A. et al. Treatment of renal anemia by subcutaneous erythropoietin in children with preterminal chronic failure. Acta Paediatr., v. 82, pp. 953-958, 1993. SEGAL, G.M.; ESCHBACH, J.W.; EGRIE, J.C.; STUEVE, T.; ADAMSON, J.W. The anemia of end-stage renal disease hemato-
89.
90.
91.
92.
93.
94.
95.
96.
97.
poietic progenitor cell response. Kidney Int., v. 33, pp. 983-988, 1988. TARNG, D.C.; WEI, Y.H.; HUANG, T.P.; KUO, B.I.T.; YANG, W.C. Intravenous ascorbic acid as an adjuvant therapy for recombinant erythropoietin in hemodialysis patients with hyperferritinemia. Kidney International, v. 55, pp. 2477-2486, 1999. TAYLOR, J.E.; HENDERSON, I.S.; STEWART, W.K. Erythropoietin and spontaneous platelet aggregation in hemodialysis patients. Lancet, v. 338, pp. 1361-1362, 1991. TAYLOR, J.E.; BELCH, J.; McLAREN M.; STEWART W. Effect of Erythropoietin therapy and withdrawal on blood coagulation and fibrinolysis in hemodialysis patients. Kidney Intern., 44:182-190, 1993. TEEHAN, B.P.; SIGLER, M.H.; BROWN, J.M.; BENZ, R.L.; GILGORE, G.S.; SCHLEIFER, C.R.; MORGAN, C.M.; GABUZOA, T.G.; KELLY, J.J.; FIGUEROA, W.G.; PETERSON, D.D. Hematologic and physiologic studies during correction of anemia with Recombinant Human Erythropoietin in predialysis patients. Transpl. Proc., v. 21 (suppl. 2), pp. 63-66, 1989. VIGANO, G.; BENIGNI, A.; MENDOGNI, D. Recombinant human erythropoietin to corrrect uremic bleeding. Am. J. Kidney Dis., v. 18, pp. 44-49, 1991. WARADY, B.A.; SABATH, R.J.; SMITH, C.; ALON, U.; HELLERSTEIN. Recombinant Human Erythropoietin therapy in pediatric patients receiving long-term peritoneal dialysis. Ped. Nephrol., v. 5, pp. 718-723, 1991. WATSON, A.J. Adverse effects of therapy for the correction of anemia in hemodialysis patients. Sem. Nephrol., v. 9 (suppl. 1), pp. 3034, 1989. WINEARLS, C.G. Treatment of anemia in hemodialysis patients with Recombinant Erythropoietin. Nephron, v. 51 (suppl. 1), pp. 26-28, 1989. WINEARLS, C.G.; OLIVER, D.O.; PIPPARD, M.J.; REID, C.; DOWNING, M.R.; COTES, M.P. Effect of Human Erythropoietin derived from recombinant DNA on the anemia of patients maintained by chronic hemodialysis. The Lancet, v. 22, pp. 1175-1178, 1986.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA Dialysis Outcomes Quality Initiative: DOQI becomes K/DOQI and is Updated. American Journal of Kidney Diseases — v. 37, pp.179-194, 2001. DOQI Clinical practice guidelines. Nal Kidney Foundation Anemia Management, 1997. NKF-DOQI Clinical Practices Guidelines for Peritoneal Dialysis Adequacy. American Journal of Kidney Diseases — v. 30 (suppl. 2), pp. 88-89, 1997. Appendix I: European Best Practice Guidelines for the management of anemia in patients with chronic renal failure. Nephrol. Dial. Transplant., v. 14 (Suppl. 14), 1999. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Nefrologia para a condução da anemia na Insuficiencia Renal Crônica. Jornal Brasileiro de Nefrologia, v. 22 (Supl. 5), 2000.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Agency for Healthcare Research and Quality (formerly the Agency for Health Care Policy and Research—AHCPR), Evidence Report/Technology Assessment: Number 29. Use of Epoetin for Anemia in Chronic Renal Failure. The Evidence Report is available online at http://hstat.nlm. nih.gov/hq/Hquest/screen/DirectAccess/db/3667 or can be downloaded as a zipped file from http://www. ahrq.gov/clinic/evrptfiles.htm#epoetincrf. http://www.kidney.org/general/atoz/content/epo.html http://www.amgen.com/news/aranespmedia/crf.html http://www.kidney.org/professionals/doqi/guide-
704
Conseqüências Hematológicas da Uremia
lineindex.cfm — National Kidney Foundation. DOQI Guidelines. http://www.medscape.com/pages/editorial/ate/ public/index/470 http://www.orthobiotech.com/newsroom/nephrology.html
http://www.renalweb.com/topics/out-hematocrit/ hematocrit.htm http://www.hdcn.com/ http://www.anemiainstitute.org/general/resource-0107.htm
Capítulo
O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal
39
Edison Matos Nóvak e Lineu Cesar Werneck
INTRODUÇÃO
COMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTE RENAL E DA
COMPLICAÇÕES DA INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA E CRÔNICA
IMUNOSSUPRESSÃO Neoplasias
Encefalopatia urêmica
Infecções
Neuropatia urêmica
Mielinose pontina central
Miopatia urêmica
Doença vascular encefálica
COMPLICAÇÕES DA DIÁLISE
Neurotoxicidade por drogas
Mononeuropatia por fístula artério-venosa
Encefalopatia por rejeição
Síndrome do desequilíbrio
Neuropatias
Hematoma subdural
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Encefalopatia de Wernicke
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Síndrome diálise-demência Déficit cognitivo agudo
INTRODUÇÃO O Sistema Nervoso Central (SNC) e o Sistema Nervoso Periférico (SNP) são particularmente vulneráveis e comprometidos nos doentes portadores de Insuficiência Renal (IR), seja esta aguda (IRA) ou crônica (IRC), bem como sujeitos a várias complicações decorrentes dos diferentes tipos de tratamento. Várias das manifestações deste comprometimento se assemelham àquelas verificadas em outras condições mórbidas, especialmente as tóxicas e metabólicas. Observam-se quadros clínicos neurológicos precoces, e mesmo com conduta adequada o SNC e o SNP são afetados. Para os fins de abordagem clínica, é adequado dividir as complicações neurológicas em: RELACIONADAS À DOENÇA BÁSICA (URÊMICAS): Encefalopatia Neuropatia Miopatia
RELACIONADAS À DIÁLISE: Mononeuropatia por fístula artério-venosa Síndrome do desequilíbrio Hematoma subdural Encefalopatia de Wernicke Síndrome diálise-demência RELACIONADAS AO TRANSPLANTE RENAL E IMUNODEPRESSÃO:
Neoplasias do SNC Infecções do SNC Mielinose pontina central Doença vascular encefálica Neurotoxicidade por drogas Encefalopatia por rejeição Neuropatias periféricas Neste capítulo serão comentados os principais aspectos destas complicações e, ao seu final, estarão relacionados artigos e capítulos de livros que são úteis como leitura
706
O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal
adicional e complementar, mesmo que não utilizados na elaboração deste texto. Os eventos clínicos serão abordados conforme a classificação anterior, que os relaciona com a doença ou tratamento e não com o local de comprometimento.
Pontos-chave: • Vulnerabilidade acentuada do SNC e do SNP às modificações orgânicas da IR • Comprometimento dos dois sistemas, por vezes simultaneamente, com graduações diferentes e variação de intensidade • Formas diferentes de acometimento que, em algumas ocasiões, são detectadas apenas no exame clínico/neurológico
COMPLICAÇÕES DA INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA E CRÔNICA Encefalopatia Urêmica Trata-se de uma forma de encefalopatia metabólica polimórfica que ocorre nos portadores de IRA ou IRC e não é relacionada com o tratamento destas condições. Costuma ser mais grave e evoluir rapidamente nos doentes com a IRA, tendo apresentação variada, com flutuação dos sinais e sintomas na intensidade e freqüência em períodos de horas ou dias. Os sinais e sintomas, comuns a qualquer encefalopatia metabólica, podem ser subdivididos conforme a gravidade do dano encefálico, embora freqüentemen-
te ocorram interações entre os sintomas, que podem também ser dependentes de outras condições mórbidas prévias (Quadro 39.1). De qualquer forma, não devemos nos basear na distribuição destes sinais e sintomas para classificar a encefalopatia em sua maior ou menor gravidade, mas sim usá-los como indicadores de melhora ou piora de um determinado doente. É importante considerar a possibilidade de haver concomitância de outras doenças que podem também afetar o SNC e, associando-se com a IR, modificar a apresentação clínica da encefalopatia. Freqüentemente a evolução é mais rápida e os sintomas são mais insidiosos, pouco exuberantes, e costumam estar presentes na IRC. Sinais neurológicos focais podem estar presentes em qualquer das duas fases da IR, sejam devidos a lesões prévias (por exemplo, hemiparesia por infarto lacunar) ou por isquemia relativa da zona de fronteira. Com a estabilização e involução da IR, as manifestações neurológicas podem regredir totalmente, mas com velocidade e intensidade imprevisíveis. Os sintomas iniciais costumam ser pouco expressivos e comuns a uma grande série de condições clínicas, como fadiga desproporcional à atividade física ou mental, apatia, modificação da atenção e da memória, alterações comportamentais (inquietude, irritabilidade, transtornos do sono), tremores de mãos e anorexia. Com a progressão da encefalopatia, outras funções cognitivas passam a ficar alteradas, como a dificuldade do raciocínio abstrato, surgem sinais de envolvimento do lobo frontal (paratonia, reflexos palmo-mentoniano, glabelar não inibido, de sucção e nasolabial) e acentuam-se os sinais e sintomas previamente existentes. Em fases mais avançadas ocorre estado confusional, crises convulsivas, mioclonias, asteríxis e sinal de Babinski bilateral. Pode ocorrer meningismo com hiperproteinorraquia de níveis tão elevados quanto 1 g/ml e pleiocitose com predomínio de leucócitos monomorfonu-
Quadro 39.1 Divisão dos sinais e sintomas na encefalopatia urêmica LEVE Anorexia
MODERADA Vômitos
GRAVE Pruridos
Náuseas
Lentidão de movimentos
Desorientação têmporo-espacial
Insônia
Fadiga
Confusão mental
Inquietude
Sonolência
Comportamento bizarro
Tremor de extremidades
Inversão do ciclo de sono
Fala arrastada
Redução da atenção
Emotividade variável
Hipotermia
Redução do interesse sexual
Manifestações paranóides
Mioclonias
Incapacidade para organizar pensamentos
Redução das funções cognitivas
Asteríxis
Incapacidade de abstração
Convulsões
Redução do desempenho sexual
Torpor Coma
capítulo 39
cleares. Em torno de 45% dos doentes com esta encefalopatia apresentam hemiparesia alternante e outros sinais de disfunção dos tratos longos (hiper-reflexia, hipertonia, sinal de Babinski unilateral). Estupor e coma podem instalar-se em qualquer fase, podendo sofrer variação na intensidade no decurso de horas ou dias. Certos detalhes clínicos merecem destaque, como os sintomas psíquicos que não devem ser intempestivamente subvalorizados mas sim atentamente identificados e graduados para serem úteis no acompanhamento clínico. Entre os diagnósticos diferenciais, devemos lembrar a síndrome de desequilíbrio, síndrome diálise-demência, complicações do transplante renal e da diálise crônica, bem como outras doenças que também afetam o SNC. A importância da condição encefalopática estimula uma avaliação clínica sempre muito criteriosa e para tanto é útil comentar sobre alguns sinais cuja detecção permite um diagnóstico mais precoce: Tremor de Extremidades. Provavelmente um dos sinais mais precoces, precede o asteríxis, é grosseiro e irregular, ausente ao repouso, pode ser exacerbado pela hiperextensão dos braços, pela tensão quando se tenta escrever ou segurar objetos. Asteríxis. É freqüentemente detectável nas condições de envolvimento difuso do SNC como em qualquer encefalopatia metabólica e portanto não exclusivo das condições de uremia. Pode ser provocado nos membros superiores por meio da hiperflexão dorsal da mão com os dedos também estendidos, ocorrendo então movimentos alternantes de flexão-extensão da mão (flapping). Nos membros inferiores pode ser induzido através da semiflexão dos membros inferiores e mantendo-se os pés apoiados no leito; após alguns segundos se iniciam movimentos repetitivos de abdução/adução das coxas. Também pode desencadearse o reflexo através da flexão dorsal do pé, quando todo o membro inferior está estendido e é elevado a 30°-45°; ocorrem então movimentos de flexão plantar e dorsal alternados. A presença de asteríxis é tão importante que o seu surgimento pode sugerir a necessidade de diálise. Mioclonias. A mioclonia multifocal é também um indicador de encefalopatia metabólica e é caracterizada por abalos musculares bruscos, erráticos, de localizações variadas. Podem gradativamente ficar mais intensos e freqüentes, sendo mais habituais nos doentes em torpor ou coma. Convulsões. As crises convulsivas costumam ser generalizadas e quando surgem as do tipo focal deve-se suspeitar de lesão estrutural. Note-se que também surgem convulsões por desordens metabólicas (intoxicação hídrica, hipocalcemia, hipomagnesemia), encefalopatia hipertensiva ou síndrome do desequilíbrio. A fisiopatologia da encefalopatia urêmica ainda não está totalmente esclarecida, pois ela é multifatorial e complexa, sendo que os indicadores clínicos se relacionam com o índice de filtração glomerular abaixo de 10% do normal. Provavelmente há uma seqüência de eventos a
707
partir da disfunção da neurotransmissão mediada pela alteração do nível de cálcio no córtex cerebral, bloqueio dos canais de cloro pelo acúmulo de metabólitos (guanidina, ácido guanidinossuccínico e metilguanidina) e redução do consumo de oxigênio, determinando redução na atividade metabólica cortical. Experimentos com modificações do nível de cálcio cortical, por paratireoidectomia em animais com insuficiência renal, e a lentificação do ritmo cortical do eletroencefalograma induzida pelo paratormônio indicam um forte papel do mesmo na encefalopatia urêmica. Com o agravamento da disfunção renal entram em cena outros agentes neurotóxicos, como o alumínio, que, se somados aos já citados, podem provocar alterações histopatológicas como a formação de placas amilóides. Esta situação promove a irreversibilidade de alguns sinais e sintomas com a evolução e cronificação da doença de base. Os exames subsidiários algumas vezes são úteis apenas para auxiliar no diagnóstico diferencial e afastar outras encefalopatias metabólicas, hematoma subdural, hipoxemia por insuficiência cardíaca ou por broncopneumopatia e efeitos adversos de drogas. O nível de azotemia tem pouca relação com o grau do comprometimento neurológico, e outros exames laboratoriais devem ser realizados na investigação básica de uma encefalopatia. O eletroencefalograma vai mostrar modificações úteis no diagnóstico e acompanhamento, como a lentificação do ritmo cerebral, especialmente nas regiões frontais e com intensidade variável, onde predominam ondas delta e teta. Estas alterações são mais intensas na IRA e menos na IRC, tendo correlação entre o nível sérico de creatinina. A porcentagem de ondas lentas com menos de 7 Hz ocorre no distúrbio metabólico sobre o SNC, sendo possível encontrar complexos ponta-onda na ausência de sinais clínicos de atividade epiléptica em pequena porcentagem de casos. O exame do líquido cefalorraquiano pode mostrar dados sugerindo uma meningite asséptica, porém este exame só deve ser efetuado após exclusão de hipertensão intracraniana (hematoma subdural ou hemorragia cerebral intraparenquimatosa). Finalmente, os exames de imagem como a tomografia computorizada e a ressonância magnética podem nos auxiliar especialmente para a exclusão de lesões estruturais, mas devemos lembrar que podem ocorrer também alterações inespecíficas como a atrofia cerebral. A ressonância magnética também não traz alterações definidas e próprias da IR, podendo ser registradas alterações reversíveis nos núcleos da base, cápsula interna e substância branca periventricular. O tratamento desta condição implica duas abordagens fundamentais: a da doença básica com os meios mais indicados e da encefalopatia propriamente dita. Deve ser dada especial atenção para a correção lenta das anormalidades bioquímicas, já que o SNC possui uma labilidade significativa às alterações bruscas. Pode haver agravamento do quadro neurológico com dano potencial irreversível
708
O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal
com medidas intempestivas de correção acelerada das alterações metabólicas. Quando ocorrem crises convulsivas, recomenda-se o uso de medicamentos com metabolismo hepático, com a fenitoína, carbamazepina ou ácido valpróico, com uso menos freqüente de fenobarbital. Qualquer das drogas deve ter sua dose monitorada clínica e laboratorialmente, se necessário, e sugere-se o fracionamento da dose total diária. As manifestações clínicas costumam não regredir completamente mesmo com normalização da função renal. Os sintomas mais persistentes incluem aqueles relacionados com funções cognitivas, como apatia, déficit variável de memória, alterações do sono, da atenção e da retenção de informações.
Pontos-chave: • A encefalopatia urêmica tem representação clínica variável na ocorrência e intensidade dos sinais e sintomas, podendo modificar-se no espaço de horas ou poucos dias, nos moldes de uma encefalopatia metabólica de outra origem • Em aproximadamente 45% dos doentes poderão ocorrer sinais focais, como hemiparesia alternante • Os sinais e sintomas podem ser manifestação precoce da Insuficiência Renal, seja aguda ou crônica • Deve ser dada especial atenção à correção lenta das anormalidades metabólicas, para não agravar o dano no Sistema Nervoso Central
Neuropatia Urêmica Esta complicação é a mais freqüente da IR, ocorrendo em mais de 70% dos doentes adultos com a forma crônica, mas é pouco comum em crianças. O quadro clínico pode ser o motivo do atendimento médico, e a investigação da etiologia define a disfunção renal. A neuropatia urêmica já havia sido mencionada por Charcot em 1877 e por Osler em 1892, mas foram Sorel e Caffort que a definiram como entidade específica em 1936. Em 1962, HausmanowaPetrusewicz e colaboradores demonstraram a redução da velocidade de condução nervosa periférica nos pacientes com uremia, caracterizando então a existência de neuropatia subclínica. O primeiro estudo anátomo-patológico foi feito em 1963 por Asbury e colaboradores, caracterizando a lesão dos nervos periféricos, demonstrando desmielinização e destruição dos cilindros-eixo destes nervos. A análise morfológica dos nervos comprometidos mostra que há predileção por axônios de maior diâmetro, sendo relativamente
poupados os neurônios aferentes pouco mielinizados e as fibras amielínicas. A lesão axonal modifica o fluxo neurotrófico e há inviabilidade para a manutenção da integridade da bainha de mielina, apesar das células de Schwann manterem-se íntegras. Ocorrem modificações paranodais e retração da mielina, com formação de glóbulos (ovóides), deixando as bainhas de mielina mais estreitas e com distâncias internodais menores. Considerando a evidência de que a neuropatia periférica só vai ocorrer se houver índice de filtração glomerular abaixo de 12 ml/min, presume-se que provavelmente o acúmulo de moléculas neurotóxicas com peso molecular entre 300 e 2.000 dáltons (diálises mais lentas) seriam os agentes etiológicos desta neuropatia. A intensidade da neuropatia não pode ser relacionada, até o presente, com o nível sérico de qualquer substância. Exemplos destas substâncias são a guanitidina, as poliaminas, os derivados do fenol, o mioinositol e o paratormônio. A inibição enzimática de transcetolase e sódio/potássio ATPase vem sendo também estudada para se explicar a fisiopatologia destes eventos. A difusão dos procedimentos dialíticos na década de 1960 e conseqüente maior sobrevida dos doentes fez com que a neuropatia periférica se tornasse mais evidente e mais limitante na qualidade de vida destes doentes, tornando alguns deles incapacitados para deambulação. A suspeita de que a diálise pudesse exacerbar ou ser um fator predisponente para o surgimento da neuropatia não se confirmou e, pelo contrário, a intensificação na freqüência da diálise e conseqüente maior estabilização da IR foi acompanhada de regressão parcial da neuropatia. Também o aumento do número de transplantes renais, recuperação da função renal e normalização dos distúrbios metabólicos promove a gradativa recuperação dos sintomas desta neuropatia. A sintomatologia clínica dependerá da duração e etiologia da IR, assim como da existência de outras doenças associadas, como diabete e etilismo, que podem também provocar concomitante lesão de nervos periféricos por mecanismos diferentes. Ocasionalmente pode haver neuropatia autonômica e neuropatia craniana (alterações no facial e no vestíbulo-coclear, com perdas auditivas parciais ou totais e zumbidos). O comprometimento neuropático é evidenciado precocemente nos membros inferiores pela redução da sensibilidade vibratória distal e hiporreflexia aquiliana, que evolui para arreflexia aquiliana e hiporreflexia patelar, com maior comprometimento das modalidades vibratória, senso de posição e sensibilidade táctil. Surge astenia muscular predominando nos membros inferiores distalmente; dificuldade de marcha, atrofia muscular, alterações de fâneros e equilíbrio instável. Curiosamente os homens são mais afetados que as mulheres. O quadro clínico também vai depender de manejo clínico e do tratamento indicado (conservador, diálise peritoneal e hemodiálise ou na fase pós-transplante renal). Em síntese, clinicamente podemos considerar que a neuropatia periférica classicamente tem:
capítulo 39
1. Predomínio distal e nos membros inferiores, simétrica, sensitiva e motora. 2. No início há sensação de queimação nos pés, com predomínio noturno; fraqueza principalmente da flexão dorsal dos pés; hiporreflexia aquiliana; graus variáveis de hipoestesia táctil e hipoestesia vibratória. 3. A progressão está relacionada com a falta de controle de doença básica, que irá evoluir para paresia progressiva e ascendente até extrema fraqueza, sempre flácida e com arreflexia profunda; anestesia táctil e dolorosa e acentuada redução da sensibilidade profunda. A freqüência dos principais sinais e sintomas varia conforme a série de estudo, como o realizado no nosso meio (Quadro 39.2). Devido à relevância destes sinais e sintomas, cabe comentar algumas de suas peculiaridades: “Pés Queimantes”. É caracterizado por uma sensação bastante desconfortável de ardência nos pés, predominante à noite, durante o sono, buscando o doente aliviar o desconforto com imersão dos pés em água fria ou com outras medidas. Senso de Vibração. Esta modalidade de sensibilidade faz parte do grupo de propriocepção e é registrada a partir de receptores nas extremidades, com detecção de vibrações na faixa entre 30-50 e 800 Hz e transmissão através das fibras A para o cordão posterior da medula espinal. Assim, na prática pode ser pesquisada com diapasão com
Quadro 39.2 Freqüência de sinais e sintomas em pacientes com polineuropatia urêmica, conforme o tipo de tratamento (Werneck e cols., 1979, com permissão.) (Adaptado de Werneck L.C. e cols.) Sinal/Sintoma
Freqüência (%)
Redução do senso de vibração nos MI
79
Hipoestesia distal para tato
70
Câimbras
67
Parestesia distal nos membros inferiores
58
Redução da força muscular distal nos membros inferiores
58
Hipoestesia distal para dor
48
“Pernas inquietas”
39
Hiperestesia plantar dolorosa
33
“Pés queimantes”
33
Fasciculações
30
Hiporreflexia profunda nos membros inferiores
30
Redução do senso de posição nos membros inferiores
3
709
freqüência de 128 ou de 256 Hz e facilmente identifica-se esta alteração, freqüente e precoce da lesão de nervo periférico. A redução desta percepção é nitidamente maior nas porções distais dos membros inferiores, da mesma forma que todos os outros sinais da neuropatia. Sensibilidade Táctil. As alterações desta forma de sensibilidade, como sua redução (hipoestesia, queixa de amortecimento), modificação da qualidade (como parestesia, formigamentos, “pés queimantes”) e aumento na forma de hiperestesia plantar com dor, chamam muito a atenção, embora tenham etiologias múltiplas. A sensibilidade para o tato deve sempre ser pesquisada com algodão, cotonete ou pequenos pincéis. Sinais e Sintomas Motores. A fraqueza muscular distal nos membros inferiores se caracteriza precocemente pela queixa de tropeços freqüentes, pois a musculatura tibial anterior, responsável pela flexão dorsal dos pés, é a mais notadamente afetada. O doente tem também certa dificuldade para subir escadas pelo mesmo motivo. O grupamento muscular posterior das pernas é também comprometido, mas como há maior massa muscular, a fraqueza ocorre mais tarde. No entanto, a arreflexia aquiliana é uma evidência da alteração motora (via eferente do reflexo) conjugada com a sensitiva (via aferente). No exame físico encontra-se mais facilmente fraqueza do músculo extensor do hálux por seu menor volume, e com a evolução da neuropatia a fraqueza torna-se mais pronunciada também nos outros músculos. Há atrofia muscular distal, hiporreflexia patelar e naturalmente marcha neuropática. Outros Sintomas e Sinais. A redução do senso de posição, outra das modalidades de propriocepção, é responsável pela queixa de desequilíbrio à marcha e dificuldade para andar em ambiente com pouca luz (quando inquirido objetivamente, o doente diz evitar levantar à noite por sentir insegurança para andar e mesmo já ter tido quedas). O exame neurológico vai evidenciar a alteração objetiva desta sensação e com a pesquisa do equilíbrio (sinal de Romberg presente). A queixa de câimbras, freqüentemente noturnas e predominante nos membros inferiores, é devida mais a disfunções metabólicas da própria insuficiência renal, já que costuma regredir rapidamente com a correção destes distúrbios. As “pernas inquietas”, sensação de extremo desconforto nos membros inferiores que ocorre predominantemente à noite, obriga o doente a levantar-se e a andar para obter alívio temporário, sendo também relacionada com neuropatias periféricas em geral. O diagnóstico de neuropatia periférica é clínico e usualmente não é indicada investigação eletrofisiológica. Caso esta seja realizada, será constatada a presença dos seguintes elementos: Redução da Velocidade de Condução Nervosa Motora e Sensitiva. Existe uma relação direta da velocidade com o grau de comprometimento renal, melhorando e piorando conforme esta disfunção também se modifique. A velocidade de condução motora está alterada em 98% dos
710
O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal
casos no nervo fibular, em 85% no nervo mediano e em 83% no nervo ulnar. A velocidade de condução sensitiva também está reduzida, mas o nervo sural é o que mais evidencia a disfunção. Alterações Motoras. A eletromiografia mostra desinervação crônica (padrão neuropático) com a musculatura distal tendo maior grau de envolvimento, podendo ser identificadas fibrilações que indicam desinervação recente. Outros dados podem ser registrados, como a redução da amplitude do potencial de ação muscular, aumento da latência das ondas F e do reflexo H, com alterações do potencial evocado somatossensitivo. O exame do líquido cefalorraquiano raramente é realizado, pois costuma estar normal quando somente a neuropatia periférica estiver presente. Caso seja executado e estejam presentes alterações, estas provavelmente se relacionam à encefalopatia urêmica ou a outras complicações concomitantes do SNC. A biópsia de nervo periférico, especialmente do nervo sural ou de um fascículo do nervo fibular superficial, também não é rotineiramente feita, sendo reservada para situações de investigação muito restrita. O tratamento da neuropatia urêmica é sintomático para aqueles sintomas passíveis de melhora com intervenção terapêutica adicional aos da doença básica. A hiperestesia dolorosa, os “pés queimantes” e “pernas inquietas” podem ser aliviados com o uso de gabapentina, carbamazepina, fenitoína, ácido valpróico, valproato e divalproato de sódio, topiramato, amitriptilina e agonistas dopaminérgicos. Este último atualmente é a primeira escolha nas “pernas inquietas”, sendo que cada uma dessas medicações tem resposta variável conforme o paciente, devendo a dose ser ajustada individualmente. Deve ser lembrada a possibilidade de associação dos sintomas por déficit de vitamina B12 e, se confirmada a presença desta condição por dosagem da substância no sangue periférico, sua correção por administração parenteral auxiliará na melhora dos sintomas. As alterações motoras podem ser melhoradas com fisioterapia e uso de calçados apropriados. Todavia, pela relação direta da neuropatia com a IR e variabilidade dos sintomas conforme o nível da alteração renal, é fundamental o controle da insuficiência para a estabilização e melhora da neuropatia periférica. O início de diálise costumeiramente é acompanhado de melhora nos sintomas da neuropatia, embora permaneçam as alterações eletrofisiológicas. A hemodiálise e diálise peritoneal ambulatorial contínua (CAPD) têm a mesma eficácia neste controle. O transplante renal promove regressão total dos sintomas da neuropatia na grande maioria dos doentes, exceto naqueles em que as lesões dos nervos periféricos foram muito acentuadas. O grupo dos sintomas e sinais sensitivos habitualmente regride em dias ou semanas e os quadros motores regridem posteriormente. Nos três primeiros meses após o transplante há maior recuperação e nos 9 a 12 meses seguintes a regressão é mais lenta. As neuropatias autonômicas, menos relevantes e significativas que a po-
lineuropatia periférica, assim como a neuropatia do VIII par craniano (hipoacusia ou surdez), também costumam cessar em até dois anos após o transplante.
Pontos-chave: • A neuropatia periférica é a complicação mais freqüente da IRC, sendo muitas vezes subclínica e com variação na sintomatologia, que é sensitiva e motora principalmente com nítido predomínio nos membros inferiores e distalmente • Os sintomas e sinais sensitivos abrangem as queixas de ardência nos pés, parestesia e redução de sensibilidade superficial e profunda • Os sintomas e sinais motores incluem fraqueza muscular especialmente para flexão dorsal dos pés e dificuldade de marcha • A melhora da função renal é acompanhada de regressão em grau variável do quadro clínico da neuropatia. Medicamentos podem aliviar alguns sintomas
Miopatia Urêmica Esta é uma condição clínica menos freqüente que a neuropatia, sendo inclusive discutida a sua existência. A ocorrência aumentou com a maior sobrevida dos doentes pela evolução dos meios de tratamento, portanto sendo associada com a insuficiência renal crônica. A apresentação clínica é a de fraqueza muscular proximal especialmente nos membros, com o detalhe de ser associada com dor óssea e muscular, como ocorre no hiperparatireoidismo e na osteomalácia. Podem ocorrer sinais de hiperexcitabilidade muscular e não deve ser esperada atrofia muscular evidente como em outras miopatias. Quando ocorre, quase sempre está associada a neuropatia urêmica, ficando difícil imputar os sintomas unicamente ao envolvimento muscular primário. Os reflexos profundos estão normais ou até mesmo exaltados, se não estiver presente concomitantemente neuropatia periférica importante. Estes dados sugerem hiperexcitabilidade muscular pela modificação do metabolismo do cálcio. A fisiopatologia deste quadro também é complexa, com interações de fatores metabólicos que incluem hipocalcemia, hiperfosfatemia, redução nos níveis de 1,25-diidroxicolecalciferol, deficiência de carnitina nos dialisados e aumento do paratormônio. Este último aumenta a proteólise e diminui o aporte muscular de ATP, provocando redução da produção de energia e desgaste muscular.
711
capítulo 39
A investigação laboratorial mostra, além das alterações de cálcio, fósforo e paratormônio, que a creatinofosfoquinase e outras provas de destruição muscular estão normais na maioria dos casos. A eletromiografia não é específica, podendo ocorrer redução discreta da duração dos potenciais motores ou aumento, devido à concomitância de neuropatia. A biópsia muscular apresenta alterações pouco específicas, como atrofia de fibras tipo 2, fibras anguladas atróficas e aumento de lipídios nas fibras tipo 1 (possível deficiência de carnitina nos dialisados). Todos esses dados são inespecíficos, podendo ocorrer em um grande número de doenças, principalmente causados por imobilização, fatores metabólicos e fase inicial de desinervação. O tratamento desta miopatia pode incluir altas doses de vitamina D, útil em alguns casos, pois esta substância diminui a capacidade de ligação do cálcio ao complexo troponina e acelera a síntese protéica, aumentando a concentração de ATP no músculo. Além disto, o controle do hiperparatireodismo e a correção das alterações metabólicas provocadas por esta disfunção podem ser úteis. É importante citar que o uso de colchicina nestes portadores de IR crônica pode também provocar uma miopatia grave e portanto deve-se evitar este medicamento nesta condição.
Pontos-chave: • Condição menos freqüente que a neuropatia, é caracterizada por fraqueza muscular proximal, dor óssea e muscular, com reflexos profundos normais ou hiperativos • A correção do hiperparatireoidismo e dos seus efeitos metabólicos pode aliviar os sintomas
COMPLICAÇÕES DA DIÁLISE Mononeuropatia por Fístula Artério-Venosa A instalação de fístula artério-venosa para diálise pode provocar alterações nos nervos periféricos próximos. A diferença de pressão gerada pela fístula pode determinar síndrome de roubo sanguíneo nos nervos, embora estas estruturas sejam bastante resistentes à isquemia. O sintoma principal desta condição é parestesia na forma de queimação e excepcionalmente disfunções motoras limitadas à mão e ao antebraço. Outra complicação é síndrome do túnel do carpo secundária ao aumento da pressão venosa distal, com edema intersticial deste compartimento anatômico e compressão
do nervo mediano. Raramente isto pode ser encontrado nos doentes que fazem hemodiálise por muitos anos, devido ao acúmulo de material amilóide no túnel do carpo. Os sintomas são de parestesias no território de distribuição sensitiva do nervo mediano na mão.
Ponto-chave: • A mononeuropatia pela fístula artériovenosa e a síndrome do túnel do carpo podem ocorrer com parestesias principalmente e limitadas à mão
Síndrome do Desequilíbrio O equilíbrio da osmolaridade dos espaços intra- e extracelular encefálicos é muito frágil e a diálise pode determinar sintomas pelo acúmulo de água no parênquima. Este fenômeno já é reconhecido desde a década de 1960, com os sintomas ocorrendo principalmente nos doentes com IR em grau avançado e quando a diálise é efetuada rapidamente. A fisiopatologia, como indica o próprio nome da síndrome, implica a instalação de um gradiente osmótico pela mobilização da água, entre o interior dos capilares encefálicos e dos astrócitos. Ocorre mais em crianças e idosos e geralmente os sintomas se iniciam no final da diálise ou algumas horas após o seu término. O sintoma mais freqüente é cefaléia difusa e pulsátil, de intensidade variável. Os doentes que têm hemicrania sofrem agravamento de suas crises neste período de diálise. Pode ocorrer estado confusional leve, câimbras e náuseas, e se há maior gravidade surgem mioclonias, delirium, crises convulsivas generalizadas, papiledema, aumento da pressão intra-ocular e arritmias cardíacas, todos em decorrência da hipertensão intracraniana instalada. Este quadro clínico pode ser prevenido com as diálises mais lentas e, se um doente mesmo assim tiver redução do nível da consciência, deve ser excluída outra complicação, como hematoma subdural, acidente vascular cerebral ou infecções do SNC. A investigação complementar através de exames de imagem pode ser indicada para excluir outras patologias.
Pontos-chave: • Síndrome do desequilíbrio é muito facilmente identificável nos doentes nos quais é realizada diálise muito rapidamente • Os sintomas são de cefaléia, leve confusão mental, câimbras e náuseas e, num crescendo de gravidade, convulsões, mioclonias, papiledema e arritmias cardíacas
712
O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal
Hematoma Subdural A ocorrência de hematoma subdural nos doentes em hemodiálise pode ser registrada em 1,0% a 3,3%, sendo encontrado em todas as faixas etárias. Os fatores que contribuem para sua instalação são os distúrbios da coagulação relacionados à uremia e o uso de anticoagulantes durante o procedimento dialítico. É incomum a preexistência de traumas cranianos, sendo que 20% são hematomas bilaterais e os sintomas podem ser flutuantes e com variações diárias. Podem ocorrer sinais focais como hemiparesias, hemiplegias, ataxia, ou sintomas semelhantes aos da encefalopatia urêmica. O diagnóstico diferencial inclui a própria encefalopatia urêmica, síndrome do desequilíbrio e doença vascular encefálica. A confirmação do diagnóstico é feita com exames de imagem, especialmente tomografia computorizada do crânio, e o tratamento é cirúrgico, apesar da possibilidade de recorrência.
Pontos-chave: • Hematoma subdural pode ser devido a distúrbios de coagulação e uso de anticoagulantes • 20% são hematomas bilaterais e os sintomas podem ter flutuações diárias • A tomografia computadorizada do crânio deve ser feita para confirmação diagnóstica e exclusão de outras doenças que mimetizam este quadro
Encefalopatia de Wernicke A encefalopatia de Wernicke, provocada pela deficiência de tiamina e conseqüente bloqueio no ciclo de Krebs no encéfalo, tem sido relatada poucas vezes nos doentes com IR. A tiamina é solúvel em água e portanto facilmente dialisável, mas provavelmente sua extração e eliminação no dialisado não são maiores que a eliminação pela urina nas condições normais de funcionamento renal. Assim, deve haver reposição preventiva da tiamina por via parenteral, quando forem identificadas situações clínicas que predisponham o desencadeamento da síndrome, tais como síndromes disabsortivas, desnutrição por ingestão deficiente ou por anorexia, gastrectomia ou etilismo. As manifestações clínicas desta síndrome são oftalmoplegia, nistagmo, ataxia de tronco e delirium, mas nos doentes renais crônicos este quadro pode estar incompleto ou acrescido de outros sinais pela concomitância de encefalopatia urêmica, síndrome do desequilíbrio ou síndrome diálise-demência. O tratamento é feito com administração de tiamina e, se precoce, promove regressão total dos sinais neurológicos. A falta de tratamento pode determinar lesões irreversíveis no SNC.
Pontos-chave: • Esta lesão encefálica é provocada pela deficiência de tiamina e relaciona-se com condições predisponentes como síndromes disabsortivas, desnutrição por ingestão deficiente ou por anorexia, gastrectomia ou etilismo • Quadro clínico compreende oftalmoplegia, nistagmo, ataxia de tronco e delirium, e o tratamento com administração de tiamina promove regressão total dos sintomas
Síndrome Diálise-Demência A primeira descrição desta síndrome foi feita por Alfrey et al em 1972, sendo também encontradas as citações de encefalopatia de diálise, encefalopatia mioclônica progressiva por diálise e encefalopatia por hemodiálise. Sua prevalência varia conforme a origem dos casos, ocorrendo 600 casos para 100.000 diálises (0,6 a 1,0% dos pacientes dialisados). Ocorre quase exclusivamente nos doentes submetidos a diálise crônica, embora haja relatos de ocorrência em crianças sem diálise. Progride para a morte entre 6 e 9 meses após o início dos sintomas, se não for feito o diagnóstico e adequadamente tratada. A sua etiologia não está definida, mas há fortes indícios de que o acúmulo de alumínio no córtex cerebral seja o agente desencadeador do quadro, já que este elemento está com nível muito mais elevado no tecido cerebral dos doentes com a síndrome do que naqueles que não a desenvolvem, mesmo em diálise crônica. Estudos realizados nos últimos anos, baseados em uma distribuição geográfica diferenciada da ocorrência desta síndrome, mostram claramente que há um componente ambiental envolvido, já que 92% dos casos da síndrome diálise-demência ocorreram em situações quando foi utilizada água não tratada, contra apenas 6% nos ambientes com uso de água deionizada para a diálise (Associação Européia de Diálise e Transplante). Primeiramente foram registradas altas concentrações de estanho e rubídio no cérebro dos doentes com a síndrome e posteriormente de alumínio. As conclusões são de que a redução do teor de alumínio na água por osmose reversa, para menos de 20 g/ml, previne a doença. Apesar destes cuidados, esporadicamente podem ocorrer alguns casos e que são relacionados com a absorção cutânea do alumínio contido em preparações medicamentosas. Não se sabe qual o mecanismo fisiopatológico pelo qual o alumínio interfere nas funções neuronais, mas supõe-se que seja por interferência no metabolismo enzimático, redução de função microtubular, ligação com DNA ou modificação nas funções dos neurotransmissores. Independente do fator citado, pode-se supor que outros agentes
713
capítulo 39
estejam envolvidos na gênese deste quadro clínico, tais como infecções do SNC por vírus lentos e príons ou hidrocefalia de pressão normal. Há três formas de subdivisão desta entidade clínica: 1. forma esporádica, onde não se encontra relação direta com o alumínio, tendo distribuição mundial e nenhum tratamento estabelecido; 2. forma epidêmica, com aglomeração geográfica e freqüentemente relacionada com os níveis de alumínio e de outros metais, como zinco, manganês, cobalto, magnésio e ferro na água do dialisado; a epidemia geralmente cessa com a mudança no suprimento de água ou com a utilização de água deionizada; 3. forma infantil, sem relação definida com lesão do SNC especialmente por alumínio e que talvez seja decorrente de efeitos inespecíficos da uremia em cérebros imaturos. O quadro clínico se apresenta como uma encefalopatia, com disartria, apraxia de fala, voz arrastada, tartamudez e disgrafia em até 95% dos casos. Também no início o doente pode tornar-se apático e deprimido. Seguem-se alterações de raciocínio e de concentração, amnésia para fatos comuns, dificuldades nas tarefas rotineiras e piora acentuada da fala. Progredindo, aparecem alterações de personalidade, psicose, demência, abalos mioclônicos e crises. Os sinais, intermitentes em crescendo, pioram com as diálises e nos estádios finais o doente está afásico e imóvel. Para a investigação complementar, o exame mais útil é o eletroencefalograma, com alterações típicas que podem preceder em até seis meses os sinais clínicos. Estas alterações consistem em surtos de ondas lentas mescladas com ondas de potencial elevado, com projeção difusa e bilateral, predominando nas regiões anteriores do cérebro. Estes surtos duram entre 1 e 3 segundos, repetem-se freqüentemente e podem variar conforme a fase pré- ou pós-dialítica. O exame também se modifica com o tratamento precoce. Não é habitual a realização de exames de imagem ou de líquido cefalorraquiano, pois não contribuem para o diagnóstico. Eventualmente, tais exames podem ser indicados para diagnóstico diferencial com outras complicações da doença básica. A dosagem sérica do alumínio também não auxilia na confirmação do diagnóstico devido à ampla variação dos níveis deste elemento. O tratamento tem resultados variáveis conforme o estádio da doença e conforme a sua forma de apresentação, com a substituição da água de diálise, uso de diazepínicos e de quelantes, especialmente desferrioxamina. O alumínio liga-se avidamente a proteínas plasmáticas e portanto é difícil de dialisar. Para contornar este problema, é administrado dexferrioxamina, que possui grande afinidade pelo alumínio, formando um composto com peso molecular de 600, que é removido pela diálise. Este tratamento deve ser semanal, podendo durar até um ano para proporcionar uma recuperação clínica lenta. Outros agentes que-
lantes não são usados, pois podem inclusive piorar a condição clínica.
Pontos-chave: • A participação de metais pesados, especialmente alumínio, e eventuais infecções por vírus lentos, príons ou hidrocefalia podem fazer parte da gênese deste quadro • Há três formas clínicas reconhecidas, todas com quadro clínico de disartria, apraxia de fala, voz arrastada, tartamudez e disgrafia; apatia e depressão e com a evolução psicose, demência, abalos mioclônicos e crises convulsivas • O tratamento consiste na substituição da água de diálise, uso de diazepínicos e de quelantes, especialmente desferrioxamina. Este último faz com que o alumínio, formando um composto dialisável, reverta o quadro, mesmo necessitando do tratamento prolongado
Déficit Cognitivo Agudo Recentemente têm sido conduzidas pesquisas que mostram a ocorrência de déficit cognitivo agudo ou delirium, mensurado por testes específicos, que ocorrem durante ou imediatamente após a sessão de diálise. Estes sintomas estão relacionados com as alterações metabólicas e hemodinâmicas importantes que ocorrem durante a diálise, e doenças outras preexistentes, como diabete, microangiopatia cerebral e hipertensão arterial, podem contribuir para a sua instalação. Costuma ser reversível, mas existe risco de déficit cognitivo permanente devido à somatória dos
Pontos-chave: • As fístulas artério-venosas podem determinar lesões de nervos periféricos por alterações no fluxo sanguíneo dos nervos • As diálises determinam alterações metabólicas a curto prazo (síndrome do desequilíbrio, déficit cognitivo agudo, encefalopatia de Wernicke) e estruturais a longo prazo (hematoma subdural e síndrome diálise-demência) • O diagnóstico precoce evita déficits permanentes
714
O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal
danos ao SNC determinados pelas doenças citadas anteriormente. Foi identificado algum grau de déficit cognitivo leve persistente (35%) e demência (26%) nestes doentes, o que pode explicar mudanças comportamentais progressivas nas fases entre as diálises. No momento não existe tratamento definido ou forma de evitar tal processo.
Infecções As infecções que atingem o SNC nos receptores do transplante estão apresentadas em capítulo próprio desta obra. Cabe-nos comentar algumas peculiaridades em relação ao Sistema Nervoso:
Infecções Fúngicas
COMPLICAÇÕES DO TRANSPLANTE RENAL E DA IMUNOSSUPRESSÃO Aproximadamente 30% dos receptores de transplante renal poderão ter complicações neurológicas. Estas podem ser brandas e transitórias ou graves ao nível de letalidade pela complicação em si e não pela IR que motivou este tratamento. Entre estas encontramos:
Neoplasias A neoplasia mais importante a ser considerada é a linfoproliferativa. Existe incidência maior de linfomas nãoHodgkin do Sistema Nervoso Central nos receptores de transplante renal do que na população em geral. Podem desenvolver-se precocemente nos primeiros três meses após o transplante ou até o final do primeiro ano. Parecem originar-se nos linfócitos B, raramente nos linfócitos T, e têm aspecto histológico semelhante ao dos linfomas sistêmicos. Um terço a metade destes linfomas são cerebrais supratentoriais, com localização preferencial pelas áreas periventriculares e septais. Manifestam-se clinicamente por sintomas de hipertensão intracraniana associados com alterações cognitivas (memória) e distúrbios de comportamento. Em 40% dos casos há envolvimento meníngeo, com cefaléia e alterações liquóricas. Alguns poucos casos podem ter localização ocular e medular. A investigação complementar é feita com tomografia computadorizada ou ressonância magnética do crânio, ambas mostrando lesões hipodensas ou isodensas e que são ressaltadas com administração de contraste. A forma meníngea pode determinar aumento da proteína do liquor e hipercitose por linfócitos. A biópsia, preferentemente estereotáxica, das lesões nodulares confirma o diagnóstico. O tratamento com quimioterapia e radioterapia é paliativo, mas deve ser realizado especialmente para a forma meningítica, combinado com a instilação intratecal de quimioterápicos.
Ponto-chave: • A neoplasia mais comum é o linfoma, com manifestações de hipertensão intracraniana associadas com alterações cognitivas e de comportamento ou envolvimento meníngeo
A criptococose é a mais freqüente no nosso meio, podendo manifestar-se na forma meningítica ou meningoencefalítica. Predominam os sintomas de hipertensão intracraniana subaguda ou crônica. A aspergilose ocorre como a segunda forma mais freqüente e pode apresentar-se de forma aguda, como um evento circulatório do SNC pela invasão e oclusão vascular, ou de forma subaguda, em que o quadro clínico é o de hipertensão intracraniana, já que provoca abscessos únicos ou múltiplos. A candidíase no Sistema Nervoso geralmente faz parte de uma infecção generalizada e cursa clinicamente como meningite aguda ou subaguda, eventualmente com abscessos ou meningoencefalite.
Infecções Virais Os vírus imunomoduladores são responsáveis tanto por infecções do SNC como por reduzirem mais ainda a imunodepressão. Neste grupo se destacam o citomegalovírus, o herpes simples e o vírus de Epstein-Barr. Todos ocasionam meningoencefalite e podem favorecer outras infecções oportunistas por fungos ou bactérias.
Bactérias e Protozoários Eventualmente podem ser encontradas infecções por toxoplasmose no SNC e infecções bacterianas.
Mielinose Pontina Central Esta condição clínica grave não é encontrada somente no transplantado renal, mas em qualquer situação de hiponatremia acentuada (geralmente entre 90 e 120 mEq/L) cuja correção foi muito rápida. Trata-se de um processo de desmielinização aguda não-inflamatória na ponte, provocando alteração da consciência, tetraplegia e paralisia pseudobulbar. O diagnóstico é confirmado pela ressonância magnética do encéfalo, mostrando uma imagem com aspecto de asa de morcego na ponte e sendo poupadas as regiões laterais da mesma. Para evitar esta complicação, é recomendado que a correção da hiponatremia ocorra na razão de até 12 mEq/L nas primeiras 24 horas e até 20 mEq/L nas 48 horas seguintes. Se não for feito o diagnóstico a tempo e o paciente não for tratado, irá evoluir para uma síndrome de encarceramento. Nesta síndrome existe interrupção entre a medula espinhal e nervos cranianos,
715
capítulo 39
sendo preservados unicamente os da motilidade ocular e sensibilidade da face. O indivíduo recobra a consciência, mas não pode comunicar-se ou movimentar os membros. Responde só com os movimentos oculares.
Ponto-chave: • A mielinose pontina central é provocada pela correção rápida de hiponatremia acentuada. Ocorre alteração da consciência, tetraplegia e paralisia pseudobulbar. Ressonância magnética confirma um processo desmielinizante na ponte. O tratamento consiste sempre na correção lenta da hiponatremia
Doença Vascular Encefálica A ocorrência de doenças vasculares encefálicas, especialmente infartos de dimensões variadas, ocorre em 9,5% dos doentes que recebem transplante renal e estima-se que entre 3 e 12% dos óbitos nos transplantados decorra de eventos circulatórios do SNC. As suas causas mais comuns são a hipertensão arterial não controlada após o transplante, diabete, policitemia, dislipidemia, hiperviscosidade sérica e deficiência de antitrombina III devido à proteinúria. Algumas destas causas não têm relação direta com o transplante em si, mas com outros fatores de risco gerais para doença vascular. A conhecida associação de rim policístico com aneurisma cerebral pode ser geradora de hemorragia subaracnóidea por ruptura destes aneurismas. A sintomatologia é a habitual das doenças vasculares do SNC: instalação súbita de um déficit neurológico focal, com ou sem redução do nível de consciência, para os infartos. Cefaléia súbita, freqüentemente com náuseas/vômitos e redução do nível da consciência para a hemorragia subaracnóidea. O exame de eleição para a confirmação do diagnóstico é a tomografia computorizada do crânio, e o tratamento deve ser aquele preconizado pelos Grupos de Consenso.
Pontos-chave: • Pode ocorrer especialmente infarto cerebral numa incidência variável e pode ser a causa de óbito. O quadro clínico é o habitual dos acidentes vasculares de qualquer origem • São causas comuns hipertensão arterial, diabete, policitemia, dislipidemia, entre outras, e o tratamento é o convencional para esta condição
Neurotoxicidade por Drogas Os efeitos deletérios das drogas imunossupressoras sobre o Sistema Nervoso são considerados algumas das mais comuns complicações do transplante. Duas drogas em especial merecem algum detalhamento: Corticoesteróides. Esta substância pode provocar miopatia, sintomas psíquicos como psicose, ansiedade, estados confusionais e distimia, e a sua retirada pode promover síndrome composto de cefaléia, febre e lassidão. Ciclosporina. Este agente é o mais danoso, podendo determinar complicações neurológicas em 15 e 40% dos doentes. Há relação direta entre o nível sérico da substância e os agravos neurológicos e sabe-se que algumas circunstâncias podem favorecer o surgimento destes quadros: irradiação craniana prévia, hipocolesterolemia, hipomagnesemia, uso de antibióticos -lactâmicos, níveis elevados de alumínio, corticosteróides em altas doses, hipertensão arterial não controlada e uremia. O doente pode ter tremor de extremidades, convulsões, hemiparesia, paraparesia, tetraparesia ou neuropatia sensitiva. Mais recentemente tem sido descrito um quadro que foi denominado de encefalopatia posterior reversível, que surge em transplantados em geral que recebem ciclosporina ou tacrolima. Caracteriza-se pelo desencadeamento de cefaléia, vômitos, confusão mental, convulsões e cegueira cortical, a partir de elevação brusca e intensa da hipertensão arterial. A ressonância magnética do crânio mostra extensas áreas de edema nas regiões posteriores dos hemisférios cerebrais. O tratamento consiste na redução da dose do imunossupressor e tratamento decisivo da hipertensão arterial, e a recuperação é então muito boa. Críticos da existência deste quadro como uma entidade clínica distinta a comparam com a encefalopatia hipertensiva e a neurotoxicidade da ciclosporina, que trazem mesma sintomatologia.
Pontos-chave: • A ciclosporina é o mais importante agente de complicação neurológica, que ocorre em 15 a 40% dos doentes. Há fatores predisponentes e o quadro clínico poderá ser de tremor de extremidades, convulsões, déficits motores focais ou neuropatia sensitiva. Mais importante pela gravidade é a encefalopatia, clinicamente muito semelhante à encefalopatia hipertensiva • Corticosteróides podem provocar miopatia, alterações psíquicas e síndrome de retirada
716
O Sistema Nervoso na Insuficiência Renal
Encefalopatia por Rejeição Costuma ser mais freqüente em jovens e 80% dos casos ocorrem dentro de três meses do transplante, mas até dois anos após a cirurgia é possível registrá-la. Caracteriza-se clinicamente pelo surgimento de convulsões, cefaléia, confusão mental, junto com os sintomas sistêmicos da rejeição. Os exames subsidiários, úteis para excluir outras complicações, não mostram alterações específicas. Há provável relação dos sintomas com a liberação de citocinas no processo de rejeição. O prognóstico é bom, sendo necessário apenas tratamento sintomático para o quadro neurológico.
Ponto-chave: • O quadro clínico é o de convulsões, cefaléia, confusão mental e sintomas sistêmicos de rejeição. Há bom prognóstico, com tratamento sintomático do quadro neurológico
Neuropatias Podem ocorrer dois tipos de lesão de nervos periféricos relacionáveis ao transplante renal: Neuropatia por Compressão. Durante o ato cirúrgico pode haver compressão pelo instrumental médico ou por posicionamento prolongado, especialmente dos nervos femoral e cutâneo lateral da coxa. A recuperação é geralmente boa, independente de qualquer medida terapêutica. Neuropatia do Doente Crítico. Esta condição é vista em doentes graves e acamados por período prolongado, geralmente com infecções e síndrome disabsortiva. Há comprometimento especialmente motor, com atrofia muscular intensa e difusa.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ANTONIAZZI, A.L.; BIGAL, M.E.; BORDINI, C.A.; SPECIALI, J.G. Headaches in patients with chronic renal failure under hemodialysis treatment: a prospective study. Neurology 2002; 58 (supl 3): A 288. ADAMS, H.P.; DAWSON, G.; COFFMAN, T.J.; CORRY, R.J. Stroke in renal transplant recipients. Arch Neurol 1986; 43: 113-115. ALFREY, A.C.; LeGENDRE, G.R.; KAEHNY, W.D. The dialyses encephalopathy syndrome: possible aluminium intoxication. N Eng J Med 1976; 294: 184-188. BURN, D.J.; BATES, D. Neurology and the kidney. J Neurol Neurosurg and Psychiatry 1998; 65: 810-821. FRASER, C.L.; ARIEFF, A.I. Nervous system complications and uremia. Ann Intern Med 1988; 109: 143-153. GUISALDO, R.; ARIEFF, A.I.; MASSARI, S.G. Changes in the electroen-
cephalogram in acute uremia: effects of parathyroid hormone and brain electrolytes. J Clin Invest 1975; 55: 738-740. JAGADHA, V.; DECK, J.H.N.; HOLLIDAY, W.C.; SMYTH, H.S. Wernicke’s encephalopathy in patients on peritoneal dialysis or hemodialysis. Ann Neurol 1987; 21: 78-84. JACK, R.; RABIN, P.L.; McKINNEY, T.W. Dialysis encephalopathy: a review. Int J Psychiatry Med 1984; 13: 309-326. LOOKWOOD, A.H. Neurologic complications of renal disease. Neurol Clin 1989; 7: 617-627. MURRAY, A.M.; TUPPER, D.E.; MILLER, W.; HOCHHALTER, A. Acute variation in cognitive function in dialysis patients. Neurology 2002; 58 (supl 3): A 183. NÓVAK, E.M.; de QUADROS, A.; HEINIG, M.E. Manifestações neurológicas na insuficiência renal. Ver Bras Neurol 2000; 36(4): 97-102. PAOLA, D.; WERNECK, L.C.; MULINARI, A.S.; LAFITTE, A. Diálisedemência. Arq Neuropsiquiat 1980; 28: 278. PATCHELL, R.A. Neurological complications of organs transplantation. Ann Neurol 1994; 36: 600-703. RASKIN, N.H.; FRISHMAN, R.A. Neurologic disorders of renal failure II. N Eng J Med 1976; 294: 204-210. RAO, V.K. Posttransplant medical complications. Surg Clin North Am 1998; 78: 113-132. THADANI, R.; PASCUAL, M.; BONVENTRE, J.V. Acute renal failure. N Engl J Med 1996; 334: 1448-1460. WERNECK, L.C.; NÓVAK, E.M. Manifestações neurológicas da insuficiência renal. In: Riella, M.C. Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos, 3.ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1996, p. 487493. WERNECK, L.C.; MULINARI, A.S.; LAFFITE, A.; KESIKOWSKI, L.B. Uremic polyneuropathy: clinico-eletroneurographic study of 36 cases. Arq Neuropsiquiatr 1979; Dec. 37(4):356-72.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.aan.com — Página da American Academy of Neurology. http://www.neurology.org/ — Revista oficial da American Academy of Neurology. http://archneur.ama-assn.org/ — Revista Archives of Neurology. http://neuro-www.mgh.harvard.edu/ — Página do Serviço de Neurologia do Massachusetts General Hospital em Boston (USA). http://neuro-www.mgh.harvard.edu/forum/ — Forum em Neurologia do Mass General, Boston, Harvard Medical School, USA. http://www.ion.ucl.ac.uk/ — Instituto de Neurologia, Inglaterra. http://jnnp.bmjjournals.com/ — Journal of Neurology, Neurosurgery & Psychiatry. http://www.uic.edu/depts/mcne/founders/ — Founders of Neurology, University of Illinois, Chicago,USA. http://www.emedicine.com/neuro/cover.htm — eMedicine-Neurology. http://link.springer.de/link/service/journals/00415/ — Official Journal of The European Neurological Society. http://www.co-neurology.com/ — Current Opinion in Neurology.
Capítulo
40
Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal Aluizio Barbosa de Carvalho e Vanda Jorgetti
INTRODUÇÃO
RADIOLOGIA E OUTROS MÉTODOS DE IMAGEM
Classificação da osteodistrofia renal FISIOPATOLOGIA DO HIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIO
Radiologia Ultra-sonografia Cintilografia
Distúrbios do cálcio Déficit de vitamina D Distúrbios do fósforo Resistência óssea ao PTH Citocinas e osteodistrofia renal FISIOPATOLOGIA DA OSTEOMALÁCIA Defeito de mineralização óssea FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA ADINÂMICA Etiopatogenia da doença adinâmica FISIOPATOLOGIA DA INTOXICAÇÃO ALUMÍNICA Toxicidade nos tecidos-alvo QUADRO CLÍNICO-LABORATORIAL Laboratório na osteodistrofia renal
INTRODUÇÃO A osteodistrofia renal (OR) pode ser considerada uma das mais graves complicações entre as que acometem pacientes com insuficiência renal crônica (IRC). O termo OR é utilizado de forma genérica para definir as desordens esqueléticas secundárias às alterações do metabolismo do cálcio e do fósforo, bem como aos distúrbios da remodelação óssea, caracterizados pelo desacoplamento do processo fisiológico contínuo de reabsorção e formação do tecido ósseo. A associação entre insuficiência renal e doença óssea, conhecida desde o final do século XIX, pôde ser melhor compreendida nos últimos 40 anos, quando o tratamento
Tomografia computadorizada Ressonância nuclear magnética HISTOLOGIA Tipos histológicos da osteodistrofia renal PREVENÇÃO E TRATAMENTO DA OSTEODISTROFIA RENAL Quelantes de fósforo Análogos da vitamina D Calcimiméticos Paratiroidectomia Deferoxamina REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
dialítico e o transplante renal prolongaram, de maneira expressiva, a sobrevida do paciente com IRC. Este aumento de sobrevida permitiu que se observasse a doença óssea em toda a exuberância de sua manifestação. O conhecimento das alterações bioquímicas e hormonais da osteodistrofia revelou a relação complexa entre o paratormônio (PTH), o metabólito ativo da vitamina D (calcitriol) e o metabolismo do cálcio e fósforo. A elevação dos níveis de PTH e o déficit de calcitriol são detectados já nas fases incipientes da IRC. No decorrer da IRC, distúrbios metabólicos, como hiperfosfatemia e hipocalcemia, podem ser observados conjuntamente àquelas alterações hormonais. Durante o tratamento dialítico, esses distúrbios são mais evidentes, podendo sofrer a interferência de intoxicações por metais como alumínio, ferro e estrôncio. O
718
Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal
melhor entendimento dos mecanismos de ação do PTH e calcitriol, tanto a nível celular como molecular, tornou-se possível graças à descoberta de receptores desses hormônios presentes em células-alvo. Recentemente, a clonagem de um receptor de membrana sensível ao cálcio, presente na glândula paratiróide e em outros tecidos, possibilitou um enorme avanço na compreensão da fisiopatologia da osteodistrofia renal, assim como na terapêutica dessa patologia. A fisiopatologia da OR é bastante complexa, e as alterações clássicas do metabolismo do cálcio e fósforo, bem como do PTH e calcitriol, não explicam completamente todos os achados encontrados nessa patologia. Assim sendo, outros fatores decorrentes da IRC e que atuam na remodelação óssea têm sido descritos. As conhecidas alterações do sistema citocinas, presentes na IRC, trouxeram novas perspectivas para o entendimento da fisiopatologia da OR. Inicialmente conhecidas como moléculas regulatórias da resposta imunológica, com atividades anti- e pró-inflamatórias, as citocinas também atuam no processo de remodelação óssea. Assim, agem na proliferação, diferenciação e ativação das principais células do tecido ósseo, o osteoblasto e o osteoclasto, responsáveis, respectivamente, pela formação e reabsorção ósseas. Dessa forma, em estados patológicos como na OR, essas citocinas podem participar dos distúrbios da remodelação óssea presentes nessa patologia.
FISIOPATOLOGIA DO HIPERPARATIROIDISMO SECUNDÁRIO O hiperparatiroidismo secundário é uma complicação freqüente em pacientes com IRC, que se caracteriza pela hiperplasia das glândulas paratiróides e hipersecreção de PTH. O hiperparatiroidismo secundário é causa da principal desordem esquelética — a osteíte fibrosa — que ocorre na IRC. Sua prevalência tem aumentado nos últimos anos, graças ao maior controle da intoxicação alumínica. Além disso, devido à melhora da qualidade de diálise e, conseqüentemente, ao maior tempo de permanência dos pacientes nesse tipo de tratamento, formas mais graves da doença têm ocorrido, contribuindo para o aumento da morbi-mortalidade do tratamento dialítico. O desenvolvimento do hiperparatiroidismo secundário inicia-se precocemente no curso da IRC, sendo resultante basicamente do déficit de vitamina D e das anormalidades nos receptores de cálcio e calcitriol das paratiróides. Com o avançar da IRC, a hiperfosfatemia torna-se um importante fator adicional no desenvolvimento da doença. A complexa inter-relação desses fatores conduz à hipocalcemia, que é o principal determinante da hipersecreção do PTH e da proliferação de células das paratiróides.
Classificação da Osteodistrofia Renal
Distúrbios do Cálcio
O diagnóstico da OR baseia-se nos achados clínicos e laboratoriais. A biópsia óssea é considerada o método diagnóstico de certeza, além de possibilitar a diferenciação entre os diversos tipos de OR. A taxa de formação óssea, parâmetro obtido da análise histomorfométrica, permite classificar a OR em doença de alta e baixa remodelação óssea. A doença óssea de alta remodelação é representada pela osteíte fibrosa, secundária ao hiperparatiroidismo, e a de baixa remodelação, pela osteomalácia e doença adinâmica. Um estado intermediário entre a alta e a baixa remodelação é conhecido como doença mista. A chamada osteopatia por alumínio, decorrente da intoxicação por esse metal, está mais comumente associada aos estados de baixa remodelação, embora depósitos ósseos de alumínio também possam ocorrer em quaisquer dos tipos de OR.
O receptor de cálcio, presente nas paratiróides, ocorre também em outros órgãos como rins, intestino e sistema nervoso central. As alterações na concentração extracelular do cálcio são detectadas por este receptor, com conseqüente estímulo ou inibição da produção de PTH, via RNA-mensageiro. No hiperparatiroidismo secundário, anormalidades na expressão do receptor de cálcio têm sido responsabilizadas pela hiperplasia e pela conhecida disfunção das células paratiroidianas em detectar as variações do cálcio extracelular. Embora se acredite que a hiperplasia das paratiróides seja inicialmente causada por uma hiporregulação (downregulation) dos receptores de cálcio, parece que a hiperplasia precede as anormalidades do receptor. Independentemente da seqüência desses fatos, está bem estabelecida a reduzida expressão dos receptores de cálcio nas células paratiroidianas de pacientes com hiperparatiroidismo secundário, quando comparadas às de indivíduos normais. Essa hiporregulação mostrou-se mais acentuada nas glândulas com hiperplasia do tipo nodular que do tipo difusa. O desenvolvimento da hiperplasia nodular têm sido atribuído a anomalias genéticas. A perda de um alelo do cromossoma 11, em paratiróides de pacientes em diálise, acarretaria a inativação de um gene supressor tumoral e, como conseqüência, a proliferação tumoral autônoma dessas glândulas.
Pontos-chave: Classificação da osteodistrofia renal • Alta remodelação Hiperparatiroidismo secundário • Baixa remodelação Osteomalácia e doença adinâmica • Osteopatia alumínica
719
capítulo 40
Déficit de Vitamina D Outro fator responsável pela gênese do hiperparatiroidismo secundário é o déficit de vitamina D, particularmente do calcitriol, seu metabólito mais ativo. Nas glândulas paratiróides, o calcitriol pode agir de forma direta, ligando-se a seus receptores presentes na superfície das células, inibindo a transcrição do RNAm do PTH. Essa ação acarreta tanto a redução da síntese hormonal como da proliferação celular. Assim como para os receptores de cálcio, tem sido observada uma reduzida expressão do receptor de calcitriol nas paratiróides de pacientes com hiperparatiroidismo secundário, principalmente nas áreas de proliferação nodular, quando comparadas às áreas de proliferação difusa. Estas alterações parecem ser fundamentais na gênese do hiperparatiroidismo secundário e podem explicar a relativa ineficácia do tratamento com calcitriol, particularmente naqueles pacientes com hiperplasia nodular. Essa situação caracteriza os quadros de hiperparatiroidismo secundário autônomo, no qual continua ocorrendo hipersecreção de PTH, mesmo na vigência de níveis normais, ou até mesmo elevados, de cálcio e calcitriol. De forma indireta, o calcitriol altera a secreção de PTH via hipocalcemia. O déficit de calcitriol, presente na IRC, ao diminuir a absorção intestinal de cálcio, causa hipocalcemia e hipersecreção de PTH.
Distúrbios do Fósforo O controle da hiperfosfatemia tem sido de fundamental importância no manuseio do hiperparatiroidismo secundário, uma vez que, na presença de níveis elevados de fósforo, a terapia com calcitriol está contra-indicada. Além disso, a hiperfosfatemia tem sido implicada como importante fator de risco na mortalidade cárdio-vascular de indivíduos em diálise. O fósforo tem ação direta e indireta sobre a secreção do PTH. Sua ação indireta se dá via hipocalcemia. A retenção de fósforo poderia induzir a hipocalcemia através de mecanismos puramente físicoquímicos e/ou por inibição da atividade da 1-alfa-hidroxilase, responsável pela conversão renal do metabólito hepático da vitamina D em calcitriol. Além disso, a hiperfosfatemia, por aumentar a resistência óssea ao PTH (v. adiante), também acarretaria redução dos níveis de cálcio. Por outro lado, a hiperfosfatemia pode ter um efeito direto na secreção de PTH, como também na proliferação das células paratiroidianas, via mecanismo pós-transcripcional. Embora o efeito direto do fósforo sobre a glândula esteja bem estabelecido, até o momento não se identificou um receptor específico desse mineral nas células paratiroidianas. Entretanto, a hiperfosfatemia pode também reduzir a expressão dos receptores de cálcio e calcitriol e, dessa forma, dificultar o tratamento do hiperparatiroidismo secundário.
Pontos-chave: • O hiperparatiroidismo secundário é causa da principal desordem esquelética — a osteíte fibrosa — que ocorre na IRC • O desenvolvimento do hiperparatiroidismo secundário inicia-se precocemente no curso da IRC, sendo resultante basicamente do déficit de vitamina D e das anormalidades nos receptores de cálcio e calcitriol das paratiróides • No hiperparatiroidismo secundário, anormalidades na expressão do receptor de cálcio têm sido responsabilizadas pela hiperplasia e pela conhecida disfunção das células paratiroidianas em detectar as variações do cálcio extracelular • Outro fator responsável pela gênese do hiperparatiroidismo secundário é o déficit de vitamina D, particularmente do calcitriol, seu metabólito mais ativo • O déficit de calcitriol, presente na IRC, ao diminuir a absorção intestinal de cálcio, causa hipocalcemia e hipersecreção de PTH • A retenção de fósforo poderia induzir a hipocalcemia através de mecanismos puramente físico-químicos e/ou por inibição da atividade da 1-alfa-hidroxilase, responsável pela conversão renal do metabólito hepático da vitamina D em calcitriol • Por outro lado, a hiperfosfatemia pode ter um efeito direto na secreção de PTH
Resistência Óssea ao PTH Além dos já citados, outro fator que pode participar de forma indireta na patogênese do hiperparatiroidismo secundário é a resistência óssea à ação calcêmica do PTH. Nessa situação, frente a elevações do PTH não são observados incrementos proporcionais na calcemia. É a resistência óssea ao PTH que explica a necessidade de maiores níveis do hormônio para a manutenção da remodelação óssea normal. Uma provável causa para a resistência óssea do paciente urêmico baseia-se na presença de uma hiporregulação de receptores de PTH nas células ósseas, basicamente nos osteoblastos, como conseqüência da retenção de fósforo e de toxinas urêmicas. Recentemente, a real presença da resistência óssea ao PTH tem sido questionada, após o advento de novos ensaios capazes de determinar especificamente a se-
720
Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal
qüência 1-84 do PTH, chamado de whole-PTH. Uma molécula biologicamente inativa, provavelmente o fragmento PTH 7-84, estaria sendo determinada, juntamente com o PTH 1-84, pela maioria dos radioimunoensaios já existentes. Dessa forma, não haveria uma resistência óssea ao PTH e sim valores superestimados do hormônio, medidos pelos ensaios do tipo “intacto”. No entanto, parece que tal molécula inativa tem a capacidade de se ligar aos receptores de PTH nos osteoblastos, impedindo, assim, a ação da molécula ativa do hormônio no tecido ósseo. Essa seria então uma nova teoria a respeito da resistência óssea ao PTH.
Citocinas e Osteodistrofia Renal Outros fatores, fora da via fisiopatológica clássica, são algumas citocinas que atuam nas paratiróides ou diretamente no tecido ósseo, contribuindo para o desenvolvimento do hiperparatiroidismo secundário. Algumas dessas citocinas encontram-se elevadas no plasma, secundariamente à própria IRC. Vale citar alguns fatores de crescimento como o FGF (fator de crescimento de fibroblasto), o TGF␣ (fator de crescimento transformador) e o EGF (fator de crescimento epidérmico), relacionados com a proliferação das células paratiroidianas. Outros, como as interleucinas IL1 e IL6, aumentam a proliferação e a atividade dos osteoblastos. Já o TGF␣, o EGF e a IL11 estimulam a formação de osteoclastos e a reabsorção óssea. Finalmente, fatores como a alteração do set point de cálcio nas paratiróides, a diminuição do catabolismo renal do PTH e a acidose metabólica também contribuem com um importante papel no desenvolvimento do hiperparatiroidismo secundário.
Pontos-chave: Hiperparatiroidismo secundário • Hipocalcemia, hiperfosfatemia e déficit de calcitriol • Resistência óssea ao PTH • Hiporregulação de receptores de cálcio e calcitriol • Citocinas
FISIOPATOLOGIA DA OSTEOMALÁCIA A osteomalácia caracteriza-se por um defeito grave na mineralização óssea com conseqüente lentidão da deposição de cálcio e/ou fósforo na matriz osteóide. Sua forma clássica exibe, portanto, um grande acúmulo de osteóide. A patogênese do defeito de mineralização óssea observado em pacientes com IRC não está totalmente elucidada;
vários fatores, como o déficit de vitamina D, a hipofosfatemia, a acidose metabólica, a retenção de fatores inibitórios da mineralização e a intoxicação pelo alumínio e estrôncio, podem estar implicados no defeito de mineralização.
Defeito de Mineralização Óssea O mecanismo pelo qual o déficit de vitamina D provoca defeito na mineralização óssea é pouco compreendido. Ainda há dúvida se o calcitriol estimula diretamente a mineralização óssea ou conduz à deposição mineral através do aumento dos níveis de cálcio e fósforo no fluido extracelular circundante ao osso. Embora os níveis de calcitriol estejam reduzidos na IRC avançada, a osteomalácia ocorre em pequena porcentagem de pacientes, podendo estar ausente mesmo em indivíduos anéfricos. Assim como o calcitriol, o déficit do metabólito hepático da vitamina D, o calcidiol, poderia atuar de maneira independente como um fator de risco para o defeito de mineralização. Deve-se citar também a ocorrência de osteomalácia em pacientes com síndrome nefrótica, cujos níveis de calcidiol estão reduzidos, devido à perda urinária de sua proteína carreadora. Outro fator etiológico é a depleção de fósforo que, induzida por restrição dietética excessiva ou pelo uso de quelantes, pode conduzir ao aparecimento da osteomalácia, mesmo em pacientes com função renal normal. Assim como a matriz orgânica, a formação e o crescimento dos cristais ósseos podem estar comprometidos por fatores inibitórios da mineralização óssea, como o alto conteúdo de magnésio e pirofosfato no osso urêmico. A acidose metabólica é considerada outro importante fator etiológico de osteomalácia, por utilizar o carbonato do osso como tampão dos íons H⫹, provocando a desmineralização óssea. O acúmulo de íons H⫹ na frente de mineralização pode também interferir em importantes reações enzimáticas e no processo de formação da hidroxiapatita. Pacientes portadores de acidose tubular renal e com função renal preservada podem desenvolver osteomalácia, que pode melhorar somente com o tratamento isolado da acidose. Na IRC avançada, porém, há pouca evidência de que o tratamento da acidose isoladamente possa melhorar a osteomalácia. Outros fatores etiológicos importantes na fase dialítica são as intoxicações pelo alumínio e estrôncio, que serão abordadas adiante. A incidência de osteomalácia na IRC é variável, sendo rara nos países desenvolvidos (cerca de 4%). No nosso meio representa cerca de 12%.
Pontos-chave: Osteomalácia • Déficit de vitamina D • Hipofosfatemia • Acidose metabólica • Alumínio e estrôncio
721
capítulo 40
FISIOPATOLOGIA DA DOENÇA ADINÂMICA A doença adinâmica ou aplástica foi descrita em 1983, em pacientes dialisados que apresentavam fraturas e hipercalcemia e cuja biópsia óssea não demonstrava os achados clássicos da osteíte fibrosa ou da osteomalácia. Os achados anátomo-patológicos demonstravam que a quantidade de matriz osteóide estava normal ou reduzida, o mesmo ocorrendo com o número de osteoblastos e osteoclastos. A medula óssea praticamente não apresentava fibrose, e a taxa de formação óssea estava muito reduzida. Uma vez que todos os pacientes apresentavam coloração positiva para alumínio, a doença adinâmica teve como única causa a intoxicação por aquele metal. Posteriormente, a doença adinâmica foi observada também em pacientes assintomáticos, sem intoxicação alumínica. Essa mesma patologia foi demonstrada em pacientes com IRC em tratamento conservador, revelando que ela pode estar presente em todas as fases da IRC, independentemente da intoxicação pelo alumínio. A incidência da doença adinâmica varia, na literatura, de 15% a 60%. Na nossa experiência é o diagnóstico de cerca de 20% dos pacientes com sintomas ósteo-articulares submetidos à biópsia óssea. A fisiopatologia da doença adinâmica é controversa, embora a maioria dos estudos sejam unânimes acerca da associação entre doença adinâmica e níveis de PTH menores (hipoparatiroidismo relativo) do que os observados nos outros tipos de OR.
Etiopatogenia da Doença Adinâmica Diferentes fatores associam-se a um maior risco de doença adinâmica e alguns desses são conhecidos por diminuir a função paratiroidiana. Dentre esses, sabemos que o alumínio suprime a secreção de PTH, o que reduziria a remodelação óssea, propiciando a deposição tecidual do metal. O uso de calcitriol reduz a síntese de PTH e melhora o hiperparatiroidismo secundário. No entanto, quando empregado de forma excessiva, pode levar ao hipoparatiroidismo e à doença adinâmica. Além disso, o calcitriol acarreta uma hiporregulação dos receptores de PTH nos osteoblastos e, conseqüentemente, reduz a ação do PTH na remodelação óssea. O emprego de doses elevadas de sais de cálcio como quelantes de fósforo também tem sido apontado como um fator desencadeante da doença adinâmica, pois altos níveis de cálcio sérico suprimem a atividade das células das paratiróides. A doença adinâmica tem sido associada ao diabetes mellitus. A associação entre diabetes mellitus e anormalidades do metabolismo ósseo e mineral é conhecida há vários
anos. A deficiência de insulina interfere no metabolismo ósseo através da diminuição de hormônios sistêmicos e locais como o PTH, o hormônio de crescimento e a IGF1 (fator de crescimento insulina-símile), responsáveis pelo recrutamento de osteoblastos, acarretando uma redução do número dessas células. A deficiência de insulina também pode alterar o metabolismo do calcitriol, quer diminuindo a atividade da 1-alfa hidroxilase renal, quer diminuindo a ação periférica do calcitriol, caracterizando um quadro de resistência à vitamina D. Outros efeitos dessa deficiência são a hipercalciúria e o aumento da glicosilação do colágeno. Dessa forma, a interação de todos esses fatores contribuiria para a diminuição da taxa de formação óssea e a osteopenia freqüentemente observada em pacientes diabéticos. Pacientes submetidos à corticoterapia prolongada poderiam apresentar redução da taxa de formação óssea e, conseqüentemente, osteoporose e doença adinâmica. Um exemplo disso são pacientes urêmicos que reiniciam diálise após perda do enxerto renal e que apresentam maior risco de desenvolver doença adinâmica. Em relação ao tipo de tratamento dialítico, a doença adinâmica é o tipo de OR mais freqüentemente observado nos pacientes em diálise peritoneal. Alguns fatores contribuem para esse achado, como o permanente balanço positivo de cálcio e o maior número de pacientes diabéticos e idosos dirigidos para essa modalidade dialítica. Com relação a esses últimos, sabe-se que a idade avançada é, por si só, um fator de risco para o desenvolvimento de doença adinâmica. Recentemente a doença adinâmica tem sido associada à desnutrição, cujos mecanismos não são conhecidos. A diminuição da atividade osteoblástica, independentemente dos níveis de PTH, também foi observada in vitro, através da diminuição da síntese de DNA observada em osteoblastos de pacientes com doença adinâmica, quando comparados aos de indivíduos normais.
Pontos-chave: Doença adinâmica • Diabetes mellitus • Indivíduos idosos • CAPD • Sobrecarga de cálcio e vitamina D • Desnutrição • Alumínio
FISIOPATOLOGIA DA INTOXICAÇÃO ALUMÍNICA A intoxicação alumínica pode ser observada em pacientes com IRC, nos quais provoca quadros de doença óssea, encefalopatia e anemia microcítica. Duas são as vias de
722
Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal
intoxicação por esse metal: a utilização de água para hemodiálise, inadequadamente tratada, e o uso de quelantes de fósforo à base de alumínio. A clássica descrição de intoxicação alumínica com encefalopatia e fraturas ósseas é atualmente rara. Contudo, na nossa experiência, nos últimos 10 anos, aproximadamente 50% das biópsias ósseas, realizadas em pacientes em diálise, ainda apresentam depósitos ósseos de alumínio.
transporte do alumínio pela transferrina aos tecidos-alvo, mesmo quando os níveis séricos do metal estão pouco elevados. Outro metal, o estrôncio, tem sido implicado no desenvolvimento de osteomalácia. Semelhantemente ao alumínio, o metal deposita-se na frente de mineralização. Suas fontes de contaminação seriam a água de diálise, além de alimentos provenientes de solos com alto conteúdo de estrôncio.
Toxicidade nos Tecidos-alvo Os mecanismos fisiopatológicos da intoxicação alumínica não estão completamente esclarecidos. Estudos têm demonstrado que a retenção celular de alumínio ocorre através da ligação do complexo alumínio-transferrina aos receptores de transferrina presentes na superfície das células de diferentes órgãos-alvo. Uma vez internalizado por endocitose, o alumínio passa a interferir no crescimento e na função celular provocando alterações na atividade enzimática e na transcrição gênica. O acúmulo de alumínio no osso está associado às doenças de baixa remodelação, particularmente a osteomalácia. O metal é encontrado principalmente na interface do osso mineralizado com o osteóide, na região conhecida como frente de mineralização, onde os depósitos podem ser identificados por métodos histoquímicos e microanalíticos. A diminuição da taxa de formação do tecido ósseo de pacientes intoxicados sugere uma interferência do alumínio no processo de mineralização da matriz óssea. Sua toxicidade também se evidencia pelo fato de reduzir a formação e o crescimento dos cristais de hidroxiapatita após incubação in vitro. O alumínio, por si só, afeta diretamente a função da glândula paratiroidiana, o que pode ser constatado pelos reduzidos níveis de PTH presentes nos pacientes intoxicados. In vitro, as células paratiroidianas, na presença do alumínio, diminuem sua resposta diante de baixas concentrações de cálcio. Dessa forma, por alterar o funcionamento da paratiróide, o alumínio influi indiretamente no tecido ósseo. No sistema nervoso central, o alumínio inibe enzimas como a acetilcolina-transferase, a acetil-colinesterase e a monoamino-oxidase, além de interferir na glicólise mitocondrial e aumentar a permeabilidade da barreira hematoencefálica. O mecanismo pelo qual a intoxicação alumínica leva à anemia microcítica é pouco conhecido. Sabe-se que o alumínio diminui a síntese do heme, provavelmente por inibir enzimas que atuam em tal síntese, como a ferroquelatase ou a uroporfirinogênio-descarboxilase. O alumínio também interfere no metabolismo do ferro e da ferritina. Apesar da osteopatia alumínica ser menos freqüente nos dias atuais, o advento do uso da eritropoetina humana recombinante (EPO) pode estar propiciando o aparecimento de novos casos de intoxicação alumínica. A relativa deficiência de ferro induzida pelo uso da EPO favorece o
Pontos-chave: Intoxicação alumínica • Fontes de intoxicação Água de diálise Quelantes • Osteopatia incapacitante Fraturas • Anemia Interferência no metabolismo do ferro
QUADRO CLÍNICOLABORATORIAL Pacientes com IRC leve ou moderada raramente apresentam manifestações clínicas decorrentes da OR. Os problemas clínicos se revelam após o início do programa de diálise e se agravam naqueles pacientes submetidos a tratamento dialítico a longo prazo. Aproximadamente 20% dos pacientes dialisados apresentam dores ósseas que geralmente são difusas, progressivas, muitas vezes localizadas na coluna, joelhos, tornozelos e coxas, podendo ser tão intensas a ponto de levar à imobilidade. Dor e fraqueza muscular ocorrem de maneira isolada ou associadas com dores ósseas. A miopatia é freqüentemente atribuída ao déficit de vitamina D, podendo ser intensa nos pacientes intoxicados por alumínio. As calcificações vasculares, de tecidos moles e pele (calcifilaxia ou arteriopatia urêmica calcificante — AUC) são condições graves, que põem em risco a vida dos pacientes, sendo a septicemia sua principal causa de morte. A prevalência exata da AUC é difícil de se determinar e aparentemente vem se elevando nesta última década. A ocorrência de AUC varia de 1 a 4% e seus principais fatores de risco são: sexo feminino, hipoalbuminemia, hiperfosfatemia, níveis elevados de fosfatase alcalina, aumento do produto cálcio ⫻ fósforo e o uso de EPO em doses elevadas. Além disso, pacientes com AUC apresentam risco de óbito muito superior ao de outros indivíduos com IRC. A apresentação clínica é geralmente aguda, com o aparecimento de áreas dolorosas, livedo reticular e nódulos violáceos superficiais envolvendo dedos dos pés ou das mãos,
capítulo 40
tornozelos, coxas ou nádegas. Com a evolução, a lesão torna-se hemorrágica, com necrose isquêmica seca, desenvolvendo posteriormente gangrena. A dor intensa é característica, assim como a distribuição simétrica das lesões, que têm localização superficial. Embora seja uma patologia do sistema vascular, os pulsos distais costumam estar presentes. A análise histológica da área lesada mostra hipertrofia da íntima e depósitos de fosfato de cálcio na camada média da parede de pequenas artérias da pele e músculo, além de necrose lobular da gordura, calcificação, infiltrado de neutrófilos, macrófagos, linfócitos e trombose de pequenos vasos. A chamada “síndrome dos olhos vermelhos”, resultante da reação inflamatória das conjuntivas, devido à deposição de cálcio, chega a ser observada em cerca de 10% dos pacientes com hiperparatiroidismo secundário grave. Prurido intratável, calcificações periarticulares e ruptura de tendões são também achados freqüentes nesses pacientes. Fraturas espontâneas podem ocorrer nos casos mais graves de hiperparatiroidismo secundário e de osteomalácia, sendo mais comuns nesta última. Artralgias são mais freqüentes na cintura pélvica, joelhos e tornozelos e são mais observadas no hiperparatiroidismo secundário que na osteomalácia. Quadros de encefalopatia grave, raramente observada nos dias atuais, estão associados à intoxicação alumínica. A OR em crianças urêmicas apresenta variações em relação ao adulto, principalmente pelo grave comprometimento do crescimento e pela presença de importantes deformidades esqueléticas.
Laboratório na Osteodistrofia Renal Os parâmetros bioquímicos são pouco sensíveis no estabelecimento do diagnóstico diferencial entre os tipos de OR. O grau de gravidade da doença, em geral, não guarda correlação com os parâmetros bioquímicos. O cálcio sérico é variável, e a presença de hipercalcemia pode ser observada tanto em pacientes com hiperparatiroidismo secundário grave e doença adinâmica, quanto em pacientes intoxicados por alumínio. No nosso meio, a incidência de hipercalcemia tem-se elevado nos últimos anos, graças ao uso excessivo de sais de cálcio e vitamina D no tratamento do hiperparatiroidismo secundário. O melhor controle da intoxicação alumínica tem propiciado o aparecimento de um maior número de casos de hiperparatiroidismo secundário grave com conseqüente hipercalcemia. As concentrações de fósforo sérico também não se correlacionam com os diferentes tipos de OR. Porém, pacientes com hiperparatiroidismo secundário tendem a apresentar níveis persistentemente elevados de fósforo, decorrentes da dieta e da constante retirada do elemento do tecido ósseo, devido à alta taxa de remodelação existente. Isso poderia explicar a dificuldade de controle da hiperfosfatemia, mesmo com uso de altas doses de quelantes de fósforo.
723
A interpretação dos níveis séricos de fosfatase alcalina total também é limitada, uma vez que ela é a somatória de várias isoenzimas originárias do fígado, ossos, intestino e placenta. Nos indivíduos saudáveis, a contribuição das duas últimas frações, para o pool da fosfatase alcalina total, é desprezível. Já nos indivíduos urêmicos, as frações óssea, intestinal e hepática podem estar mais elevadas que o normal unicamente pelo aumento da meia-vida da enzima ou, também, pela presença de doença hepática crônica. Assim, a dosagem da isoenzima óssea parece ser mais precisa do que a da fosfatase alcalina total. Na nossa experiência, a fração óssea tem melhor se associado aos diferentes tipos de OR que a fosfatase alcalina total. De todas as dosagens bioquímicas, a análise do PTH intacto é a que melhor se associa aos diferentes tipos de OR. Assim, de maneira prática, pode-se dizer que o hormônio está elevado nos pacientes com hiperparatiroidismo secundário, e normal ou diminuído nos pacientes com doença adinâmica e/ou intoxicados por alumínio. No entanto, entendem-se por níveis normais de PTH intacto valores 2 a 3 vezes o limite superior do método, pois é nesta faixa que se encontram os pacientes em diálise com remodelação óssea normal. A explicação para tal fato baseia-se no conceito da resistência óssea ao PTH presente na IRC, ou seja, seriam necessários níveis mais altos do hormônio para vencer a tal resistência e manter a remodelação óssea normal. Esses valores “normais” de PTH intacto têm sido questionados, pois talvez possam ser deletérios para outros tecidos, como, por exemplo, o miocárdio. Recentemente, demonstrou-se que os ensaios de PTH intacto detectam não só sua fração ativa (1-84), como também a inativa (7-84). Assim, foi desenvolvido um novo ensaio, o PTH CAP (cyclase activating PTH), capaz de identificar isoladamente a fração 1-84 do hormônio. Mostrouse que a relação PTH 1-84/7-84 pode auxiliar no diagnóstico diferencial entre as doenças ósseas de alta e baixa remodelação. Uma relação ⬎ 1 exclui a doença de baixa remodelação (sensibilidade ⫽ 100%) e uma relação ⬍ 1 indica baixa remodelação em 87,5% dos casos. Outras dosagens bioquímicas que podem auxiliar o diagnóstico da OR são utilizadas principalmente em estudos científicos, devido ao seu alto custo e à dificuldade de laboratórios equipados para o processamento destes ensaios. A deoxipiridinolina, que é um produto da degradação do colágeno, é liberada do tecido ósseo durante o processo de reabsorção, e níveis sangüíneos elevados podem refletir aumento da reabsorção óssea. O diagnóstico bioquímico da intoxicação alumínica inclui dosagens plasmáticas seriadas de alumínio e o teste à deferoxamina (Desferal). A determinação sérica de alumínio requer metodologia de coleta e análise adequada, através da espectrofotometria de absorção atômica com forno de grafite. Pacientes em hemodiálise não devem apresentar níveis séricos basais de alumínio acima de 30 g/L. Para tanto, seus níveis de alumínio devem ser determinados pelo menos três vezes ao ano, ou mais, caso
724
Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal
excedam aquele limite especificado. Na interpretação adequada dos níveis séricos de alumínio devem ser levados em conta os estoques de ferro (ferro sérico, ferritina e saturação de transferrina), pois sua deficiência propicia a maior ligação do alumínio à transferrina, favorecendo o transporte deste aos tecidos. Os níveis de PTH também podem influenciar a interpretação dos níveis séricos de alumínio, pois, frente a valores elevados de PTH (⬎ 650 pg/ml), admite-se que haja maior liberação do alumínio ósseo, devido à maior taxa de remodelação. De fato, pacientes com níveis elevados de alumínio e PTH podem apresentar sobrecarga do metal, sem que o mesmo, contudo, esteja exercendo seus efeitos tóxicos no tecido ósseo. Nessa situação, o alumínio está difusamente depositado no tecido e não na frente de mineralização, região crítica aos efeitos tóxicos do alumínio. Pacientes com níveis menores de PTH devem ser submetidos ao Teste ao Desferal. O Teste ao Desferal tem por objetivo determinar o incremento do alumínio em relação a seu valor basal, após a infusão endovenosa de 5 mg/kg de peso da droga. O teste implica a dosagem de alumínio pré-diálise, seguido pela infusão da deferoxamina no final dessa sessão de diálise e nova determinação do alumínio sérico 44 horas após a infusão, ou seja, imediatamente antes da próxima diálise. A positividade do teste, analisada isoladamente, não garante
a certeza de intoxicação alumínica, devendo-se, para tal, considerar o quadro clínico e laboratorial. O teste é considerado positivo quando o incremento de alumínio for maior que 50 g/l e, caso o paciente apresente sintomas, o mesmo deve ser tratado. Nos pacientes assintomáticos, com teste positivo, devem ser observados os níveis de PTH intacto. Se o PTH estiver acima de 650 pg/ml, deve-se administrar a deferoxamina antes de pulsoterapia com vitamina D ou paratiroidectomia. Se o PTH for menor que 150 pg/ml, proceder à biópsia óssea e instituir o tratamento conforme o resultado. O diagnóstico de certeza da intoxicação óssea pelo alumínio é fornecido somente pela biópsia óssea. As principais diferenças clínicas e bioquímicas entre os diferentes tipos de OR encontram-se resumidas no Quadro 40.1.
RADIOLOGIA E OUTROS MÉTODOS DE IMAGEM Radiologia Os métodos de estudo radiológico da OR, embora largamente empregados na prática diária, são pouco sensíveis no diagnóstico dessa patologia, uma vez que as alte-
Quadro 40.1 Diagnóstico diferencial da osteodistrofia renal — aspectos clínicos e laboratoriais HP2.º
OM
DA
Int. Al
⫹⫹⫹ ⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹
⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹ ⫹ ⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹
⫹ ⫹ ⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹ ?
⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹
nl, 앗, 앖 앖 nl, 앖 앖 앖
앗 앗 nl 앖 앖
nl, 앖 앖 앖 nl 앗
앖 앖 앖 nl 앗
Clínico
1. Dor óssea 2. Fraqueza muscular 3. Prurido cutâneo 4. Calcificação extra-óssea 5. Anemia/Resistência à EPO 6. Deformidades ósseas 7. Fraturas
Laboratorial
1. Cálcio 2. Fósforo 3. Ca ⫻ P 4. Fosfatase alcalina 5. PTH-intacto
Radiológico
1. “Sal e pimenta” (crânio) 2. Acrosteólise (mãos) 3. Zonas de Looser (costelas)
⫹⫹⫹ ⫹⫹⫹ ⫺
⫺ ⫺ ⫹⫹⫹
⫺ ⫺ ⫺
⫺ ⫺ ⫺
Densitométrico
Densidade óssea
nl, 앗
앗
앗
앖
Ultra-sonográfico
Paratiróide (detecção)
⫹⫹⫹
⫺
⫺
⫺
Cintilográfico
Paratiróide (detecção)
⫹⫹⫹
⫺
⫺
⫺
HP2.º: hiperparatiroidismo secundário; OM: osteomalácia; DA: doença adinâmica; Int.Al: Intoxicação alumínica; EPO: eritropoetina ⫹⫹⫹: muito freqüente; ⫹⫹: freqüente; ⫹: pouco freqüente nl: dentro do limite de normalidade; 앖: acima da normalidade; 앗: abaixo da normalidade Ca ⫻ P: produto cálcio e fósforo
725
capítulo 40
rações radiológicas só ocorrem nas fases mais avançadas da doença. O exame radiológico do hiperparatiroidismo secundário caracteriza-se por sinais relativos à reabsorção óssea, revelados pela presença de reabsorção nos tufos das falanges distais (acrosteólise), reabsorção subperiosteal nas falanges médias das mãos, lesão em “sal e pimenta” no crânio e pseudo-alargamento da sínfise púbica. Formações císticas (tumor marrom), de tamanho e localização variados, podem ser encontradas nos pacientes com formas mais graves da doença. Calcificações vasculares e de partes moles, principalmente as de caráter tumoral, são facilmente visualizadas através do exame radiológico. A osteomalácia apresenta como único sinal radiológico patognomônico as chamadas zonas de Looser, erroneamente ditas pseudofraturas, caracterizadas por linhas radiopacas encontradas principalmente em arcos costais e bacia. As doenças mista e adinâmica não apresentam sinais radiológicos específicos.
Ultra-sonografia A ultra-sonografia de paratiróides é um método utilizado no diagnóstico das características morfológicas e da localização das glândulas. Dessa forma, tem indicação precisa nos casos de HP2.º moderado e grave. Trata-se de um método não-invasivo, de fácil realização e baixo custo. Apresenta uma sensibilidade que varia de 43 a 78% e especificidade de 73 a 96%. Essa variação deve-se provavelmente à diferença na sensibilidade de detecção dos aparelhos e na interpretação dos observadores.
Cintilografia A cintilografia de paratiróides com o radioisótopo 99mTcsestamibi (MIBI) tem sido empregada na localização e função das paratiróides e apresenta altos índices de especificidade e sensibilidade. Esta técnica consiste na obtenção de duas séries de imagens, sendo a primeira aos 10-15 minutos (fase da tiróide) e a segunda 2-3 horas após a injeção do radiotraçador (fase da paratiróide). Ela tem por base os diferentes tempos de depuração do MIBI pelos tecidos tiroidiano e paratiroidiano. A atividade do MIBI decai rapidamente na tiróide, permanecendo um tempo maior e relativamente constante, de até 3 horas, no tecido paratiroidiano alterado. Sabe-se que este radioisótopo tem alta afinidade pelas mitocôndrias abundantes nas células oxifílicas, predominantes nas glândulas hiperplasiadas. As glândulas paratiroidianas são consideradas anormais quando, na fase tardia, persistem uma ou mais áreas de captação, cuja intensidade é relativamente maior quando comparadas às da tiróide. Sua vantagem sobre a ultra-sonografia é detectar a presença de glândulas ectópicas. A
cintilografia com MIBI pode ser complementada com a tomografia, técnica conhecida como spect. A tomografia é realizada na fase tardia da cintilografia, quando são obtidas imagens de maior profundidade, proporcionando a análise tridimensional das glândulas, sendo útil na localização de glândulas ectópicas.
Tomografia Computadorizada A tomografia para a detecção de paratiróides, como um procedimento isolado, é pouco utilizada, devido ao alto custo, necessidade do uso de contrastes e por não apresentar resultados superiores aos observados com os demais métodos. A vantagem da tomografia em relação à ultrasonografia é a detecção de glândulas ectópicas, especialmente na região do mediastino. Esta seria, então, a principal indicação do método, especialmente nos casos de reintervenção cirúrgica, nos quais é importante confirmar a localização das paratiróides.
Ressonância Nuclear Magnética A vantagem desta técnica é a obtenção de imagens nos planos sagital, coronal e transaxial, sem o uso de contraste e com excelente resolução. Porém, seu alto custo não justifica utilizá-la como exame de rotina. Semelhante à tomografia, sua principal indicação é a localização de glândulas paratiroidianas ectópicas.
HISTOLOGIA A biópsia óssea é realizada preferencialmente na crista ilíaca através de trocarte, sendo o de Bordier o mais comumente empregado. O estudo do tecido ósseo não-descalcificado, seguido de análise histomorfométrica, contribuiu sobremaneira para o melhor conhecimento da OR e é, até hoje, considerado o padrão-ouro para o diagnóstico de seus tipos histológicos. É de fundamental importância, para a interpretação da remodelação óssea, a prévia marcação do tecido pela tetraciclina. A característica desse antibiótico de se tornar fluorescente, quando exposto à luz ultravioleta, e de se fixar nas áreas de mineralização torna-o um marcador da formação óssea. Administrado em dois momentos distintos, previamente à biópsia óssea, permite observar duas linhas paralelas de tonalidade esverdeada (fluorescente) que delimitam a quantidade de tecido ósseo neoformado no intervalo de tempo entre as administrações da droga. A distância entre as duas linhas representa a taxa de mineralização que, em situações de equilíbrio da remodelação óssea, nada mais é que sua taxa de formação. É com base na taxa de formação que se pode estabelecer o conceito de alta e baixa remodelação e, dessa forma, a classi-
726
Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal
ficação dos principais tipos histológicos da OR. A doença óssea de alta remodelação é representada pela osteíte fibrosa, e a de baixa remodelação, pela osteomalácia e doença adinâmica. Um estado intermediário entre a alta e a baixa remodelação é conhecido como doença mista. A chamada osteopatia por alumínio, decorrente da intoxicação por esse metal, está mais comumente associada aos estados de baixa remodelação, embora depósitos ósseos de alumínio também possam ocorrer em quaisquer dos tipos de OR.
Tipos Histológicos da Osteodistrofia Renal A osteíte fibrosa caracteriza-se por um aumento do volume, superfície e espessura da matriz osteóide (matriz colágena, não calcificada), associados ao aumento da reabsorção óssea, do número de células — osteoblastos e osteoclastos — e à presença de fibrose medular. Através da marcação pela tetraciclina, pode-se detectar a presença de uma remodelação óssea aumentada. A osteomalácia também apresenta aumento de matriz osteóide, porém em grau maior, quando comparada à osteíte fibrosa. Há aumento de reabsorção óssea, do número de células e ocorrência de fibrose medular (hiperparatiroidismo reacional), quando sua causa decorre de déficit de vitamina D, e ausência desses sinais quando decorre de intoxicação alumínica. O sinal característico da osteomalácia é a redução acentuada da taxa de formação óssea. A doença adinâmica apresenta as mesmas características da osteomalácia, exceto em relação à matriz osteóide, que está muito reduzida nessa patologia. Finalmente, a doença mista caracteriza-se pela ocorrência concomitante dos sinais de osteíte fibrosa e dos sinais de osteomalácia.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO DA OSTEODISTROFIA RENAL Quelantes de Fósforo Em condições normais um homem adulto ingere cerca de 800 a 1.500 mg/dia de fósforo. O fósforo é eliminado pela via gastrintestinal e pelo rim, sendo este órgão o principal responsável pelo controle da excreção do mesmo. Indivíduos adultos encontram-se geralmente em balanço zero ou negativo de fósforo. O balanço positivo de fósforo, presente na uremia, pode ser prevenido ou controlado se a carga de fósforo absorvida diminuir proporcionalmente à redução da taxa de filtração glomerular. A ingestão de fósforo pode ser reduzida a cerca de 500 mg/dia. Porém, essa dieta é dificilmente tolerada pela maioria dos pacientes, principalmente quando utilizada por longo período. Compostos que impeçam a absorção intestinal de fósforo
(quelantes) podem ser utilizados no controle da hiperfosfatemia. Os sais de cálcio — carbonato ou acetato — são os quelantes de fósforo mais utilizados (Quadro 40.2). O carbonato de cálcio contém 40% de cálcio elemento, e 200 mg do composto têm a capacidade de quelar cerca de 9 mg de fósforo. Comparativamente, o acetato tem o dobro do poder quelante do carbonato, uma vez que 200 mg do acetato quelam 17 mg de fósforo. Além disso, o acetato tem a vantagem adicional de conter em sua fórmula menor quantidade (25%) de cálcio elemento. O principal efeito colateral dessas drogas, além dos distúrbios gastrintestinais, é a hipercalcemia. Esta é dependente da dose de quelante utilizado, principalmente quando associado à vitamina D. Além da hipercalcemia, o uso abusivo de sais de cálcio pode acarretar elevação do produto cálcio ⫻ fósforo, propiciando o aparecimento de calcificações metastáticas. Outros sais de cálcio, como o citrato e o cloreto, devem ser evitados. O primeiro, por aumentar a absorção intestinal de alumínio, e o segundo, por ser acidificante. Além dos sais de alumínio e cálcio, os sais de magnésio (hidróxido e carbonato de magnésio) são bons quelantes do fósforo. Entretanto, devem ser evitados nos pacientes urêmicos, pois podem levar à hipermagnesemia. Estudos in vitro e in vivo são unânimes quanto ao horário do uso de quelantes de fósforo. Tais quelantes devem ser tomados juntos ou imediatamente após as refeições. Outro fator deve ser considerado, como a individualização da dose e o modo de administração para cada paciente, preferindo-se uma dose maior de quelante naquela refeição onde haja maior quantidade de proteína. Os níveis ideais de fósforo devem ser mantidos entre 4,5 e 5,5 mg/dl. Os compostos de alumínio são considerados os mais potentes quelantes de fósforo. Em uma refeição de um indivíduo normal, cerca de 70% do fósforo ingerido é absorvido. A absorção do fósforo é reduzida à metade quando o hidróxido de alumínio é utilizado concomitantemente. Devido à toxicidade do alumínio, este quelante teve sua indicação reduzida na prática clínica diária. Recentemente, o advento de novos quelantes de fósforo, livres de cálcio e alumínio, trouxe novas perspectivas no controle da hiperfosfatemia. O de maior experiência clínica é o hidrocloreto de sevelamer (Renagel®), cuja vantagem adicional é sua capacidade em reduzir os níveis de colesterol. Pode ser usado na dose de 800 a 1.200 mg às refeições protéicas. Outros quelantes, como o cloreto de lantânio e os sais trivalentes de ferro, estão sendo estudados.
Análogos da Vitamina D O derivado de vitamina D mais utilizado é o calcitriol. As doses preconizadas variam de 0,25 a 0,5 g/dia, sendo que boa parte dos pacientes responde a doses de 0,5 g/ dia. O uso do calcitriol nem sempre é desprovido de riscos, e hipercalcemia, hiperfosfatemia, elevação do produ-
capítulo 40
727
Quadro 40.2 Tratamento da osteodistrofia renal Hiperparatiroidismo secundário a. Suplementação oral de cálcio Carbonato de cálcio: 1-2 g, 3⫻/dia, longe das refeições Acetato de cálcio: 0,7-1,4 g, 3⫻/dia, longe das refeições b. Dieta: restrição protéica c. Quelantes de fósforo Acetato de cálcio: 0,7-1,4 g, durante as refeições protéicas Carbonato de cálcio: 1-2 g, durante as refeições protéicas Sevelamer: 800-1.200 mg, durante as refeições protéicas d. Incremento da dose de diálise: se hiperfosfatemia persistente e. Pulsoterapia oral ou endovenosa com vitamina D (calcitriol ou alfa-calcidol) Pré-requisito: PTH-intacto > 400 pg/ml Cálcio normal ou baixo Fósforo ⬍ 5,5 mg/dl Ca ⫻ P ⬍ 55 Modo de administração: Após hemodiálise ou 3⫻/semana em diálise peritoneal Dose inicial de acordo com o PTH-i: 400 | 600 pg/ml: 1 g/dose 600 | 1.200 pg/ml: 2 g/dose ⬎ 1.200 pg/ml: 3 g/dose incremento de 0,5 g/dose a cada 4 semanas Objetivo: PTH-i aproximadamente 3⫻ o limite superior do método f. Paratiroidectomia Indicação: HPT autônomo (hipercalcemia persistente) HPT grave (deformidades ósseas, fraturas) Tipo: Total com auto-implante em antebraço ou pré-esternal Pós-operatório (“fome óssea”): Gluconato de cálcio, 2-4 mg/kg/hora nas 1.as 72 h Associar: calcitriol ou alfa-calcidol, 1,0 g 3⫻/dia carbonato de cálcio oral, 1 g 3⫻/dia Monitorização: cálcio iônico 2⫻/dia Osteomalácia a. Suplementação oral de cálcio Carbonato de cálcio: 1-2 g, 3⫻/dia, longe das refeições Acetato de cálcio: 0,7-1,4 g, 3⫻/dia, longe das refeições b. Suplementação oral de calcitriol ou alfa-calcidol: 0,25-1,0 µg/dia c. Correção de acidose metabólica Bicarbonato de sódio, 500 mg 2⫻/dia Doença óssea adinâmica a. Sais de cálcio e vitamina D: evitar ou descontinuar o uso b. Sevelamer: 800-1.200 mg, durante as refeições protéicas c. Incremento da dose de diálise: se hiperfosfatemia persistente d. Concentração de cálcio no dialisato: ⱕ 2,5 mEq/l (se hipercalcemia) Intoxicação alumínica a. Prevenção: tratamento da água de diálise por osmose reversa evitar quelantes de fósforo contendo alumínio b. Tratamento: deferoxamina (Desferal) Hemodiálise: 5-10 mg/kg/semana, endovenosa, após a 1.ª e 2.ª diálise da semana, por 6 meses Diálise peritoneal: CAPD: 250-500 mg intraperitoneal (última bolsa) APD: 5-10 mg/kg/semana, endovenosa, pelo menos 5 h antes do início da diálise
to cálcio ⫻ fósforo e calcificações metastáticas podem ser observadas. Entretanto, tais complicações não ocorrem sistematicamente, pois o uso do calcitriol pode frear a secreção de PTH pela glândula paratiroidiana, reduzindo a ação do hormônio no osso, com menor liberação de cálcio e fósforo teciduais. A redução excessiva dos níveis de PTH associados à ação óssea do calcitriol pode favorecer o desenvolvimento de doença adinâmica.
O uso de calcitriol é recomendado como medida profilática do hiperparatiroidismo secundário, em pacientes na fase pré-dialítica. O conceito de que tal uso favoreceria a deterioração da função renal, devido a hipercalcemia e hipercalciúria, não foi devidamente confirmado. Na fase pré-dialítica, as doses de calcitriol associadas à suplementação de cálcio devem ser monitorizadas através da calciúria. Nos pacientes em diálise, com níveis de PTH-i acima
728
Fisiopatologia, Clínica e Tratamento da Osteodistrofia Renal
de 400 pg/ml, preconiza-se o uso de doses elevadas de calcitriol, dadas de forma intermitente, 2 ou 3 vezes por semana — a pulsoterapia. A via de administração pode ser oral ou endovenosa. Tal procedimento terapêutico baseiase no fato de que altas doses de calcitriol inibem a síntese de PTH pelas glândulas paratiroidianas. As doses devem ser adaptadas a cada paciente dependendo da gravidade do quadro. O período de tratamento é variável e a monitorização dos níveis de PTH devem ser constantes, com o intuito de mantê-los em torno de 3 vezes o limite superior da normalidade. Novos análogos da vitamina D, como por exemplo o alfa-calcidol, paricalcitol e o oxacalcitriol, foram desenvolvidos visando a menor ocorrência de efeitos colaterais, como a hipercalcemia e a hiperfosfatemia. Esses análogos possuem menor afinidade pelas proteínas carreadoras e, portanto, além de estarem mais acessíveis aos órgãos-alvo, são mais rapidamente metabolizados.
Calcimiméticos A identificação do receptor extracelular de cálcio nas paratiróides foi um dos grandes avanços científicos na última década, contribuindo para a melhor compreensão do metabolismo do cálcio. A ativação desse receptor, através de pequenas modificações do cálcio extracelular, altera de maneira inversa os níveis de PTH. Esse receptor não é exclusivo das células paratiroidianas, ocorrendo também nos rins, intestino e sistema nervoso central. O conhecimento desse receptor proporcionou, recentemente, o desenvolvimento de um grupo de compostos, conhecidos como calcimiméticos, cujo mecanismo de ação reside na capacidade de aumentar a afinidade do receptor de cálcio pelo próprio cálcio, promovendo assim a redução da secreção de PTH. Como já citado, a hiporregulação do receptor de cálcio no tecido paratiroidiano hiperplasiado é um dos principais fatores responsáveis pelo desenvolvimento do hiperparatiroidismo. Assim, essa classe de drogas tornase um promissor arsenal terapêutico no controle do hiperparatiroidismo secundário, principalmente nos casos mais avançados, nos quais, devido à hipercalcemia, está contraindicado o uso de sais de cálcio e vitamina D.
Paratiroidectomia As indicações de paratiroidectomia são a hipercalcemia e a elevação do produto cálcio ⫻ fósforo (maior que 55) persistentes, prurido intratável, calcificações ectópicas, dores ósseas intensas e constantes, fraturas e calcifilaxia. A paratiroidectomia pode ser subtotal, total ou total seguida de auto-implante. Na subtotal, são retiradas as maiores glândulas, conservando-se metade da glândula cujo aspecto macroscópico seja mais próximo do normal. Na total, são retiradas todas as glândulas, acreditando-se que a mani-
pulação cirúrgica propicie o implante de tecido paratiroidiano na região cervical, o que seria suficiente para a manutenção de níveis adequados de PTH a longo prazo. Na total, seguida de auto-implante, todas as glândulas são retiradas e fragmentos das mesmas são implantados no antebraço ou na região pré-esternal. Após a paratiroidectomia, os níveis de cálcio e fósforo devem ser rigorosamente monitorizados, pois o fenômeno de “fome óssea” (hipocalcemia acompanhada de hipofosfatemia) está, na maioria das vezes, presente, podendo persistir por várias semanas ou meses. A suplementação de cálcio através de infusões de gluconato de cálcio, associadas a altas doses de calcitriol, é muitas vezes necessária para evitar-se tetania e mesmo convulsões.
Deferoxamina Mais do que tratar, a intoxicação alumínica deve ser prevenida. Para tanto, o controle adequado da água de diálise e a descontinuidade do uso de quelantes de fósforo contendo alumínio devem ser observados. Uma vez estabelecida a intoxicação, preconiza-se o uso de deferoxamina (Desferal), na dose de 5-10 mg/kg, uma vez por semana, durante cerca de seis meses. A deferoxamina deve ser administrada na primeira ou, se necessário, na segunda diálise da semana e sempre após o término da sessão. Os efeitos colaterais incluem hipotensão, exacerbação ou precipitação da encefalopatia da diálise, neurotoxicidade auditiva e visual e rash cutâneo. O uso de deferoxamina, principalmente em altas doses, tem também se associado a uma maior freqüência de infecções por germes oportunistas, como a Yersinia enterolitica e a mucormicose. Uma forma de minimizar os efeitos colaterais, principalmente naqueles pacientes com intoxicações maciças, seria administrar a droga pelo menos 5 horas antes da diálise. Tal procedimento permite que grande parte do complexo alumíniodeferoxamina formado seja removida do plasma imediatamente naquela diálise, ao invés de permanecer na circulação por 44 horas, como na administração convencional. Um resumo do tratamento da osteodistrofia renal encontra-se no Quadro 39.2.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BOUILLON, R. Diabetic bone disease. Calcif Tissue Int, 49:155-160, 1991. BROWN, A.J. Therapeutic use of vitamin D analogues. Am J Kidney Dis, 38(S5):S3-S19, 2001. CHERTOW, G.M.; BURKE, S.K.; RAGGI, P. Treat to Goal Working Group. Sevelamer attenuates the progression of coronary and aortic calcification in hemodialysis patients. Kidney Int, 62:245-252, 2002. D’HAESE, P.C.; COUTTENYE, M.M.; De BROE, M.E. Diagnostic and treatment of aluminum bone disease. Nephrol Dial Transplant, 11(S3):7479, 1996. DE FRANCISCO, A.L.M.; FRESNEDO, G.F.; RODRIGO, E.; PIÑERA, C.; AMADO, J.A.; ARIAS, M. Parathyroidectomy in dialysis patients. Kidney Int, 61(S80):S161-S166, 2002.
729
capítulo 40
DRÜEKE, T.B. Adynamic bone disease, anaemia, resistance to erythropoietin and iron-aluminum interaction. Nephrol Dial Transplant, 8 (S1):12-16, 1993. DRÜEKE, T.B. Cell biology of parathyroid gland hyperplasia in chronic renal failure. J Am Soc Nephrol, 11:1141-1152, 2000. FRAZÃO, J.M.; MARTINS, P.; COBURN, J.W. The calcimimetics agents: Perspectives for treatment. Kidney Int, 61(S80):S149-S154, 2002. FUKUDA, N.; TANAKA, H.; TOMINAGA, Y.; FUYAGAWA, M.; KUROKAWA, S.; SEINO, Y. Decreased 1,25-dihydroxyvitamin D3 receptor density is associated with a more severe form of parathyroid hyperplasia in chronic uremic patients. J Clin Invest, 92:1436-1442, 1993. GONZÁLEZ, E.A. The role of cytokines in skeletal remodelling: possible consequences for renal osteodystrophy. Nephrol Dial Transplant, 15:945-945, 2000. GOODMAN, W.G. Coronary-artery calcification in young patients with end-stage renal disease who are undergoing dialysis. N Engl J Med, 342:1478-1483, 2000. GOODMAN, W.G. Recent developments in the management of secondary hyperparathyroidism. Kidney Int, 59:1187-1201, 2001. LLACH, F. Calcific uremic arteriolopathy (calciphylaxis): an envolving entity? Am J Kidney Dis, 32:514-518, 1998. LOCATELLI, F.; CANNATA-ANDIA, J.B.; DRUEKE, T.B.; HORL, W.H.; FOUQUE, D.; HEIMBURGER, O.; RITZ, E. Management of disturbances of calcium and phosphate metabolism in chronic renal insufficiency, with emphasis on the control of hyperphosphatemia. Nephrol Dial Transplant, 17:723-731, 2002. MALLUCHE, H.; FAUGERE, M.C. Renal bone disease 1990: an unmet challenge for the nephrologist. Kidney Int, 38:193-211, 1990 [Editorial]. MARTIN, K.J.; GONZÁLEZ, E.A. Strategies to minimize bone disease in renal failure. Am J Kidney Dis, 38(6):1430-1436, 2001. MAZHAR, A.R.; JOHNSON, R.J.; GILLEN, D.; STIVELMAN, J.C.; RYAN, M.J.; DAVIS, C.L.; STEHMAN-BREEN, C.O. Risk factors and mortality associated with calciphylaxis in end-stage renal disease. Kidney Int, 60:324-332, 2001. MENDONÇA, D.U.; LOBÃO, R.R.S. e CARVALHO, A.B. Revisão: Hiperparatiroidismo secundário — visão atual de aspectos fisiopatológicos e clínicos. J Bras Nefrol, 24(1):48-55, 2002. RAMSAY, C.R.; CAMPBELL, M.K.; CANTAROVICH, D.; CATTO, G.; CODY, J.; DALY, C.; DELACROIX, C.; EDWARD, N.; GRIMSHAW, J.M.; van HAMERSVELT, H.W.; HENDERSON, I.S.; KHAN, I.H.; KOENE, R.A.; PAPADIMITROU, M.; RITZ, E.; TSAKIRIS, D.; MacLEOD, A.M. Evaluation of clinical guidelines for the management of end-stage renal disease in europe: the EU BIOMED 1 study. Nephrol Dial Transplant, 15(9):1284-1287, 2000.
RODRIGUEZ, M.; CANALEJO, A.; GARFIA, B.; AGUILERA, E.; ALMADEN, Y. Pathogenesis of refractory secondary hyperparathyroidism. Kidney Int, 61(S80):S155-S160, 2002. SHERRARD, D.J.; HERCZ, G.; PEY, Y.; MALONEY, N.A.; GREENWOOD, C.; MANUEL, A.; SAIPHOO, C.; FENTON, S.S.; SEGRE, G.V. The spectrum of bone disease in end-stage renal failure — An evolving disorder. Kidney Int, 43:436-442, 1993. SLATOPOLSKY, E. A novel mechanism for skeletal resistance in uremia. Kidney Int, 58(2):753-761, 2000. SLATOPOLSKY, E.; BURKE, S.K.; DILLON, M.A. RenaGel, a nonabsorbed calcium and aluminum-free phosphate binder, lowers serum phosphorus and parathyroid hormone. Kidney Int, 55:299-307, 1999. SLATOPOLSKY, E.; DUSSO, A.; BROWN, A.J. Control of uremic bone disease: Role of vitamin D analogs. Kidney Int, 61(S80):S143-S148, 2002. VIEIRA, I.O.; GRACIOLLI, F.G.; REIS, L.M.; MOYSÉS, R.M.A. e JORGETTI, V. Atualização em Nefrologia Clínica: citocinas e osteodistrofia renal. J Bras Nefrol, 23(4):224-229, 2001. VIEIRA, P.; DE VERNEJOUL, M.C. Circulating biochemical markers of bone remodelling in uremic patients. Kidney Int, 55:2141-2156, 1999.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA Advances in Renal Osteodystrophy. Nephrol Dial Transplant, 13(S3):3-104, 1997. Renal Bone Disease. Kidney Int, 56(S73):S2-S98, 1999. Biópsia e Histomorfometria óssea. Carvalho, A.B.; Reis, L.M. e Jorgetti, V. In: Osteoporose — Diagnóstico e Tratamento. Szejnfeld, V.L. (ed). 1.ª edição, São Paulo, Sarvier, 2000, pg. 259.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://srvhosting3.actio.com.br/Genzyme/ http://courses.washington.edu/bonephys/opmovies.html http://www.med.harvard.edu:80/JPNM/BoneTF/ Case21/WriteUp21.html http://www.hdcn.com/ http://www.ciclosporinasigmapharma.com.br (acessar Serviços)
Capítulo
41
Hipertensão Arterial Primária Fernando Antonio de Almeida e Cibele Isaac Saad Rodrigues
CONCEITO E DEFINIÇÕES DETERMINAÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL PREVALÊNCIA E SIGNIFICADO DA ELEVAÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL MECANISMOS REGULADORES DA PRESSÃO ARTERIAL — FISIOPATOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL Excesso de sódio e volume O sistema nervoso autonômico O sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA)
Fatores de risco da hipertensão arterial primária Hipertensão arterial secundária CONSEQÜÊNCIAS DA HIPERTENSÃO ARTERIAL Comprometimento cerebral da hipertensão arterial Comprometimento cardíaco da hipertensão arterial Comprometimento renal da hipertensão arterial RETINOPATIA HIPERTENSIVA Comprometimento arterial periférico
O sistema calicreína-cininas (SCC)
CLASSIFICAÇÃO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL
O sistema das prostaglandinas (PG)
AVALIAÇÃO CLÍNICA E LABORATORIAL DO PACIENTE
Peptídeos natriuréticos
HIPERTENSO
A vasopressina ou hormônio antidiurético
EMERGÊNCIAS HIPERTENSIVAS
O endotélio e seu hormônio natural (endotelina)
PREVENÇÃO PRIMÁRIA E TRATAMENTO
Fator relaxante derivado do endotélio (EDRF) ou óxido nítrico (NO) Resistência insulínica ETIOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL
NÃO-FARMACOLÓGICO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL Tratamento não-farmacológico da hipertensão BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Hipertensão arterial primária ou essencial
CONCEITO E DEFINIÇÕES Hipertensão arterial é a elevação permanente da pressão arterial acima de certos limites considerados normais, quando a medida pressórica é tomada em condições e por métodos apropriados. A própria conceituação de pressão arterial normal tem-se modificado nos últimos anos em função do conhecimento de que mesmo pequenos aumentos pressóricos já se associam a maior risco de complicações cardiovasculares, principalmente aquelas relacionadas à aterosclerose. Hoje se considera hipertensão arterial qualquer valor de pres-
são sistólica igual ou superior a 140 mmHg ou de pressão diastólica igual ou superior a 90 mmHg. Nos últimos anos o Joint National Committee, um comitê de especialistas americanos que se reúne a cada quatro anos para padronizar o diagnóstico, a avaliação e o tratamento da hipertensão, a Organização Mundial de Saúde, a Sociedade Internacional de Hipertensão e muitos comitês em diferentes países, inclusive no Brasil, consideram que, em indivíduos com 18 anos ou mais, os valores normais da pressão arterial devam ser inferiores a 130/85 mmHg. Classificam ainda como normal “limítrofe” os valores de pressão sistólica entre 130 e 139 mmHg e diastólica entre 85 e 89 mmHg (v. Quadro 41.7).
731
capítulo 41
Esta é uma das razões para que se recomende, do ponto de vista clínico, só rotularmos um indivíduo de hipertenso após pelo menos três determinações da pressão arterial em momentos e circunstâncias diferentes e de acordo com as recomendações que vêm a seguir. Obviamente se ao avaliarmos um paciente encontramos a pressão arterial em níveis muito superiores ao normal e já havendo comprometimento sistêmico determinado pela hipertensão, não há razões para protelarmos o diagnóstico de hipertensão arterial.
Hipertensão sistólica isolada corresponde a valores de pressão sistólica igual ou superior a 140 mmHg em indivíduos com pressão diastólica abaixo de 90 mmHg. Em pessoas idosas, devido à maior rigidez das grandes artérias, é comum se observarem valores muito elevados da pressão sistólica com diastólica normal. Desde já é importante frisar que, embora seja um achado comum no envelhecimento, os riscos da hipertensão sistólica isolada são semelhantes ou superiores aos da elevação da pressão sistólica e diastólica. O conceito de hipertensão lábil tem sido cada vez menos utilizado, pois naqueles indivíduos cujos níveis pressóricos oscilam entre a faixa elevada e a considerada normal habitualmente tem-se constatado o “efeito do avental branco” ou hipertensão de consultório, ou seja, a hipertensão arterial na presença do médico não confirmada pela monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA), realizada por 24 horas com aparelhos automáticos. Há evidências de que este achado não seja totalmente benigno e possa correlacionar-se com acometimento de órgãos-alvo e eventos cardiovasculares. A MAPA vem demonstrando claramente que a pressão arterial, tanto em normotensos como em hipertensos, sofre variações dentro de uma faixa relativamente ampla durante o período em que estamos acordados em atividade. Apresenta um certo “ritmo circadiano”: eleva-se pela manhã logo ao acordarmos, tende a reduzir-se após as refeições e sofre um decréscimo durante as horas de sono de 10 a 20 mmHg nas pressões sistólica e diastólica. Veja na Fig. 41.1 o exemplo de monitorização da pressão arterial de um indivíduo com valores pressóricos próximos dos limites da normalidade.
Pontos-chave: • Denomina-se hipertensão arterial primária ou essencial aquela na qual, após a investigação clínica e laboratorial cuidadosa, excluíram-se todas as possíveis causas de hipertensão secundária • Em indivíduos com 18 anos ou mais, os valores normais da pressão arterial devem ser inferiores a 130/85 mmHg • Os riscos da hipertensão sistólica isolada são semelhantes ou superiores aos da elevação da pressão sistólica e diastólica • Só rotulamos um indivíduo de hipertenso após pelo menos três determinações da pressão arterial em momentos e circunstâncias diferentes
FC (bpm)
Pressão Arterial (mmHg)
MONITORIZAÇÃO AMBULATORIAL DA PRESSÃO ARTERIAL 260 240 220 200 180
25a M HA limítrofe
160 140 120 100 80 60 40 20 200 180 160 140 120 100 80 60 40 20 8
10
12
14
16
18
20
22
0
2
4
6
8
Tempo (horas)
Fig. 41.1 Monitorização ambulatorial da pressão arterial e da freqüência cardíaca determinadas a cada 15 minutos em homem de 25 anos com pressão arterial próxima ao limite da normalidade. Observe a variação pressórica e o descenso noturno.
732
Hipertensão Arterial Primária
Denomina-se hipertensão arterial primária ou essencial aquela na qual, após a investigação clínica e laboratorial cuidadosa, excluíram-se todas as possíveis causas de hipertensão secundária. Há, porém, como iremos detalhar adiante, vários elementos que reforçam a hipótese de hipertensão essencial: a existência de antecedentes familiares de hipertensão, idade superior a 40 anos, sexo, grupo étnico e a presença de outros fatores de risco individuais, como a obesidade, o sedentarismo e o uso excessivo de sal e bebidas alcoólicas.
DETERMINAÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL A medida da pressão sanguínea no território arterial pode ser realizada por métodos diretos e indiretos. Para se determinar a pressão arterial de forma direta é necessário que se introduza um cateter ou agulha de grosso calibre na luz arterial. Procedimento tão invasivo só se justifica em condições experimentais de pesquisa clínica ou em casos especiais onde a monitorização pressórica contínua seja absolutamente necessária (por exemplo em UTI). A determinação da pressão arterial pode ser realizada por qualquer profissional da área da saúde, ou mesmo por leigos, desde que devidamente treinados. A aferição cuidadosa evita os freqüentes erros observados na prática. Assim, deve ser precedida de esclarecimentos e preparo adequado do paciente, o observador que realizará a medida necessita estar devidamente treinado, e reveste-se de grande importância a prévia verificação das condições do aparelho que será utilizado. Nem sempre temos as condições ideais, mas buscá-las deve ser a meta. Isso significa que: o paciente deve ser colocado em ambiente calmo, com temperatura agradável, para permitir seu relaxamento. Não pode estar com a bexiga cheia; não deve ter ingerido café, bebidas alcoólicas ou alimentos 30 minutos antes da medida e preferencialmente não deve estar sob tensão, dor ou ansiedade. É também necessário informá-lo de que não deverá falar durante a verificação ou cruzar os membros inferiores. A determinação indireta da pressão arterial se faz por técnica auscultatória, após 5 a 10 minutos de repouso, com o auxílio de esfigmomanômetros. Estes aparelhos possuem uma câmara inflável ajustável ao redor do braço (manguito). O manguito de tamanho adequado ao braço deve ocupar 2/3 de seu comprimento, ser colocado 2 a 3 cm acima da prega do cotovelo e sua parte inflável deve ser colocada sobre a artéria braquial (Quadro 41.1). A câmara inflável é conectada a uma coluna de mercúrio graduada em milímetros ou a um manômetro, que consiste em um mostrador ligado a uma mola espiralada (aneróide). Tanto a coluna de mercúrio quanto o aneróide devem estar posicionados na altura do coração e ambos são movimenta-
Quadro 41.1 Correção dos valores da pressão arterial em função da circunferência braquial. Câmara inflável padrão (23 13 cm) Circunferência do braço (cm)
Pressão sistólica (mmHg)
Pressão diastólica (mmHg)
15-20 21-26 27-32 32-37 38-43 43
5 3 Leitura obtida 5 10 15
Sem correção 2 3 5 8 10
dos pelo aumento da pressão no manguito. O esfigmomanômetro de coluna de mercúrio sofre pequenas variações com o tempo, enquanto o aneróide deve ser recalibrado pelo menos a cada 6 meses. O observador deve palpar o pulso radial e inflar rapidamente o manguito, de 10 em 10 mmHg, até ultrapassar 20 a 30 mmHg o seu desaparecimento, para estimar a pressão sistólica, desinflando-o a seguir. Então, deve posicionar adequadamente o estetoscópio, e preferencialmente a campânula, na fossa antecubital sobre a artéria braquial, de modo suave, evitando compressão excessiva. Ao inflar novamente o manguito, a pressão imposta é transmitida para o tecido que circunda a artéria braquial, que é comprimida contra o úmero. Quando a pressão exercida externamente ultrapassa a pressão dentro da luz arterial, ela é ocluída e o fluxo sanguíneo interrompido, o que pode ser percebido pelo desaparecimento do pulso. A seguir, devese proceder à redução vagarosa da pressão no manguito (2 mmHg/segundo), permitindo a reperfusão arterial e gerando uma seqüência de fenômenos auscultatórios que podem ser ouvidos com o auxílio de um estetoscópio colocado sobre a artéria braquial, ligeiramente acima da prega do cotovelo. Korotkoff descreveu cinco fases auscultatórias as quais, nem sempre, estão todas presentes. A primeira fase corresponde à pressão sistólica e é o momento do aparecimento do primeiro som, seguido de batidas regulares. Na segunda e terceira fases os sons sofrem mudanças de intensidade; na quarta sofrem um abafamento ou mudança de timbre e na quinta fase desaparecem. Considera-se a pressão diastólica aquela correspondente à quinta fase, ou seja, no desaparecimento completo dos sons. A ausculta deve ser efetuada por mais 20 a 30 mmHg abaixo do último som, para confirmação do resultado encontrado, procedendo posteriormente à deflação rápida e completa. Em alguns estados hiperdinâmicos normais ou patológicos (insuficiência aórtica, anemia intensa, hipertireoidismo, gestantes e crianças), pode-se continuar ouvindo os batimentos arteriais até valores próximos ou iguais a zero. Nestes casos, deve-se registrar a quarta fase de
733
capítulo 41
Korotkoff, assim como o valor zero. Durante o esvaziamento do manguito deve-se proceder às leituras com precisão de 2/2 mmHg, por exemplo, 148/86 mmHg, e não apenas 14/8 ou 15/9. Anotar sempre a posição do paciente, o tamanho do manguito utilizado e o membro superior onde foram realizadas as medidas. Esperar cerca de 1 a 2 minutos para novas aferições no mesmo membro. Quando a massa de tecido muscular ou adiposo do braço é muito volumosa, a pressão do manguito necessária para ocluir a artéria radial é maior, levando-nos a superestimar a pressão arterial. O contrário ocorre com braços muito magros ou de crianças. Assim, idealmente, deveríamos sempre utilizar manguitos adequados à circunferência braquial. Quando usamos manguitos adequados, que ocupem efetivamente 2/3 da extensão do braço, a correção não é necessária. Caso nenhuma das alternativas anteriores seja possível, podemos determinar a pressão arterial no antebraço auscultando a artéria radial. Porém, este artifício aumenta a chance de erros. Similarmente, em crianças, devem-se utilizar manguitos menores, que ocupem 2/3 do comprimento do braço. Para fins de diagnóstico e tratamento, é aconselhável que se utilize a média de três determinações da pressão arterial, realizadas na posição sentada. Além disso, como algumas condições clínicas (diabetes mellitus, envelhecimento, hipovolemia) e várias drogas anti-hipertensivas podem provocar hipotensão ao se assumir a posição ortostática, deve-se também determinar a pressão após 2 a 3 minutos nesta posição. Na maioria das vezes o ajuste medicamentoso baseia-se em valores pressóricos determinados pelo médico em consultório ou ambulatório. Entretanto, propicia um número reduzido de leituras e erros por influência do observador. Assim, é sempre aconselhável que o próprio paciente ou familiar sejam treinados para determinar sua pressão arterial em diferentes situações de seu cotidiano. Este procedimento é conhecido como Medida Residencial da Pressão Arterial (MRPA) e teve suas diretrizes recentemente publicadas. Com o desenvolvimento de aparelhos automáticos validados cientificamente a preços acessíveis, a medida doméstica tornou-se confiável, permitindo seu uso em ensaios clínicos e na prática médica. São exemplos úteis: o diagnóstico de hipertensão de consultório ou do avental branco, a avaliação da eficácia terapêutica e do prognóstico do hipertenso. Os aparelhos oscilométricos digitais automáticos dispensam o uso de estetoscópio, facilitando seu uso por pacientes não habituados a determinar a pressão, mas devem ser testados contra aparelhos de coluna de mercúrio, pelo menos, anualmente. Entretanto, só alguns destes aparelhos foram validados segundo as normas da British Hypertension Society e da Association for Advancement of Medical Instruments ou outros critérios aceitos pela comunidade científica internacional. A monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA), durante 24 horas, com aparelhos automáticos cujos registros são analisados por software próprio, tem as seguintes indicações, segundo as III Diretrizes para uso da MAPA: hipertensão de consultório ou do avental branco,
avaliação da hipertensão arterial resistente ou episódica, na suspeita de episódios de hipotensão arterial sintomática e, finalmente, para se avaliar a eficácia e o ajuste de medicamentos anti-hipertensivos. As principais limitações são: presença de arritmias cardíacas, hipercinesia, braços que não permitam o perfeito ajuste do manguito e hiato auscultatório (v. Fig. 41.1).
Pontos-chave: • Ao se determinar a pressão arterial, o manguito de tamanho adequado ao braço deve ocupar 2/3 de seu comprimento, ser colocado 2 a 3 cm acima da prega do cotovelo e sua parte inflável deve ser colocada sobre a artéria braquial • Quando a massa de tecido muscular ou adiposo do braço é muito volumosa, a pressão do manguito necessária para ocluir a artéria radial é maior, levando-nos a superestimar a pressão arterial • Lembrar as indicações de monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA), durante 24 horas: hipertensão de consultório ou do avental branco, avaliação da hipertensão arterial resistente ou episódica, na suspeita de episódios de hipotensão arterial sintomática e, finalmente, para se avaliar a eficácia e o ajuste de medicamentos anti-hipertensivos
PREVALÊNCIA E SIGNIFICADO DA ELEVAÇÃO DA PRESSÃO ARTERIAL Para entendermos a distribuição dos valores da pressão arterial na população e o significado a longo prazo de sua elevação, iremos recorrer à Fig. 41.2 e ao Quadro 41.2. A Fig. 41.2 mostra a distribuição dos valores de pressão sistólica e diastólica em um grande levantamento da população adulta nos EUA (35 a 57 anos). Observe no gráfico de barras que a pressão arterial distribui-se de forma “normal”, ou seja, segundo uma “curva de Gauss”. Se levarmos em conta o valor de corte de 140 mmHg para a pressão sistólica ou de 90 mmHg para a pressão diastólica, aproximadamente 25% da população adulta americana é portadora de hipertensão arterial (HA). Os estudos brasileiros realizados em amostras populacionais mais restritas sugerem que estes dados possam ser superponíveis à popula-
734
Hipertensão Arterial Primária
Quadro 41.2 Redução da esperança de vida em função da pressão arterial Pressão arterial (mmHg)
Esperança de vida
Redução observada
120/80 130/90 140/95 150/100
41,5 anos 37,5 anos 32,5 anos 25,0 anos
referência 10% 22% 40%
Dados retativos ao estudo de Holzgreve.
Distribuição da Pressão Sistólica e o Risco Cardiovascular 30
5 4
20 3
15 10
2
5
1
0
Risco Relativo
Porcentagem de Homens
25
0 < 110
A
110-119 120-129 130-139 140-149 150-159
160
Pressão Sistólica (mmHg)
25
3
20
2,5 2
15 1,5 10 1 5
0,5
0
0 < 70
B
Risco Relativo
Porcentagem de Homens
Distribuição da Pressão Diastólica e o Risco Cardiovascular
70-74 75-79
80-84
85-89
90-94
95-99
ção brasileira. Isto significa que devemos ter de 25 a 30 milhões de indivíduos hipertensos em nosso país. Até recentemente, quando se falava em hipertensão arterial usava-se com mais freqüência a pressão diastólica como referência. Entretanto, este conceito mudou, pois o risco cardiovascular está associado à elevação da pressão sistólica, diastólica e da pressão diferencial ou pressão de pulso. Para crianças os valores de referência são diferentes e baseiam-se em parâmetros de normalidade da população americana, pois não temos dados brasileiros. Considera-se que se deva intervir com medidas higieno-dietéticas quando a criança tiver pressão arterial acima da linha correspondente ao 95.º percentil (linha abaixo da qual estão situadas as pressões arteriais de 95% das crianças em determinada idade). Quais as conseqüências de se ter pressão arterial elevada? A resposta a esta pergunta foi dada já na década de 70, quando estudos retrospectivos realizados por companhias de seguro e os primeiros resultados dos estudos prospectivos realizados na cidade de Framingham mostraram haver evidente aumento da mortalidade por doenças cardiovasculares à medida que a pressão arterial se eleva. Acompanhe no Quadro 41.2 a relação entre os valores de pressão arterial e a esperança de vida (anos). Há redução importante na esperança de vida mesmo para os indivíduos com discretas elevações na pressão arterial quando comparados àqueles com pressão de 120/80 mmHg. Observe, por exemplo, que ter valores pressóricos de 140/95 mmHg significa uma redução de nove anos (22%) na expectativa de vida, ou ter 150/100 mmHg uma redução de 40%. Esta redução se deve à alta taxa de morbidade e mortalidade por complicações cardiovasculares (v. Fig. 41.2). Estes estudos mostram que elevações da pressão arterial diastólica acima de 85 mmHg e da pressão sistólica acima de 130 já são acompanhadas de maiores taxas de complicações cardiovasculares, e esta tendência torna-se cada vez mais acentuada à medida que se elevam os níveis pressóricos, não havendo um limiar muito evidente de normalidade. Estudos recentes e reanálises de dados anteriores do Estudo de Framingham mostram que a pressão diferencial ou de pulso (sistólica–diastólica) tem melhor correlação com o risco cardiovascular que a pressão sistólica ou diastólica (v. Fig. 41.3). As maiores pressões de pulso são vistas em indivíduo com hipertensão sistólica isolada, portanto os de maior risco cardiovascular.
100
Pressão Diastólica (mmHg)
Fig. 41.2 A. Porcentagem de distribuição da pressão arterial sistólica (barras azuis) e o risco relativo de mortalidade cardiovascular (linha negra) nos próximos 12 anos (ajustado para idade, grupo étnico, colesterol total, número de cigarros fumados por dia, diabetes mellitus e renda familiar) em amostra populacional de indivíduos do sexo masculino com idade entre 35 e 57 anos, sem história prévia de doença coronária. B. O mesmo em relação à pressão diastólica (n 356.222 indivíduos). MRFIT Research Group. Arch. Intern. Med., 152:56-64, 1992.
MECANISMOS REGULADORES DA PRESSÃO ARTERIAL — FISIOPATOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL A manutenção da pressão arterial dentro de certos limites considerados normais visa essencialmente manter o flu-
735
capítulo 41
Incidência de Doença Cardiovascular Nº Eventos/1.000 indivíduos/ano
15 Pressão Sistólica
Pressão Diastólica
Pressão de Pulso
10
5
0
59
4 10
+
+ 60
45
5 <4
5 10
90
0 <9
0+ 16
59 -1
40
0 14
<1
Pressão Arterial (mmHg) Fig. 41.3 Incidência de complicações cardiovasculares em função do aumento da pressão sistólica, diastólica e pressão de pulso. Adaptado de Alderman, M.H. e cols. J. Hypertens., 16:761-769, 1998.
xo sanguíneo constante para os diferentes territórios vasculares. Isto só é possível graças à interação de mecanismos bastante complexos que envolvem: débito cardíaco e volume circulante; sistema nervoso central e autonômico e diversos sistemas hormonais vasoconstritores e vasodilatadores, cujas ações locais e sistêmicas regulam a resistência periférica. A pressão arterial (PA) depende do débito cardíaco (DC) e da resistência periférica (RP), sendo regida pela seguinte fórmula: PA ⴝ DC ⴛ RP, onde DC é o resultado do volume sistólico vezes a freqüência cardíaca e a RP é representada pelo tônus das artérias de pequeno calibre e, principalmente, arteríolas, cuja regulação é feita pelo sistema nervoso simpático (vasoconstritor) e pelos sistemas hormonais vasoconstritores e vasodilatadores. Na imensa maioria dos estados hipertensivos a RP é que se encontra aumentada e, raramente, é o DC que se eleva. Por esta razão, tem-se dado maior ênfase ao estudo das causas do aumento da RP como mecanismo responsável pelo aumento da pressão arterial. O Quadro 41.3 apresenta de forma resumida os principais sistemas envolvidos na regulação da pressão arterial. A pressão arterial pode elevar-se por diferentes motivos. Dependendo do momento, das características fisiopatológicas de cada estado hipertensivo e até mesmo de fatores individuais, um ou mais destes mecanismos poderão estar estimulados (sistemas vasoconstritores) ou deprimidos (sistemas vasodilatadores). Quanto mais se conhece cada um destes sistemas, mais se confirma que eles têm estreita interação, ora um agindo sobre ou através de outro, ora um estimulando ou inibindo as ações de outro. Veja na Fig. 41.4 uma representação gráfica da interação dos vários mecanismos reguladores da pressão arterial incluindo o coração, rins, supra-renais, volume extracelular, sistema nervoso,
Quadro 41.3 Mecanismos envolvidos na regulação da pressão arterial SÓDIO E VOLUME EXTRACELULAR SISTEMA NERVOSO — Sistema Nervoso Central — Sistema Nervoso Simpático (tônus arteriolar) — Sistema Nervoso Parassimpático (n. vago — coração) — Sistema Barorreceptor (ajuste pressórico imediato) SISTEMAS HORMONAIS VASOCONSTRITORES — Sistema Renina-Angiotensina-Aldosterona — Catecolaminas — Prostaglandinas Vasoconstritoras (PGF2, TxA2) —Vasopressina (ADH) — Endotelinas — Outros (importância clínica não comprovada) SISTEMAS HORMONAIS VASODILATADORES — Calicreína-Cininas — Prostaglandinas Vasodilatadoras (PGI2, PGE2) — Peptídeos Natriuréticos (ANP, BNP, CNP e outros) — Óxido Nítrico (EDRF) — Outros (importância clínica não comprovada)
sistemas hormonais vasoconstritores (renina-angiotensinaaldosterona e endotelina) e vasodilatadores (sistema calicreína-cininas, prostaglandinas e óxido nítrico).
Excesso de Sódio e Volume Quando o sódio é ingerido acima das necessidades diárias (1 grama/dia), parte dele é retido juntamente com a
736
Hipertensão Arterial Primária
Controle da Pressão Arterial
2
NTS 2 Barorreceptores
1 SNS
Vago
Noradrenalina
CVM
SNS
RPT
Aldosterona
Endotélio
Retenção Na+ / Volume Fluxo Renal
PA = DC ⴛ RPT
AII ECA
AI
Vasoconstritores All (Receptores AT1) ET, TBX Vasodilatadores NO, BK, PGI2 All (Receptores AT2)
Renina Angiotensinogênio (Fígado)
Fig. 41.4 Visão geral dos mecanismos reguladores da pressão arterial. NTS — núcleo do trato solitário; CVM—centro vasomotor; RPT — resistência periférica total; AI — angiotensina I; AII — angiotensina II; ECA — enzima conversora da angiotensina; AT1 — receptor tipo 1 da angiotensina II; AT2 — receptor tipo 2 da angiotensina II; ET — endotelina; TBx — tromboxane; NO — óxido nítrico; BK — bradicinina; PGI2 — prostaciclina.
água, promovendo um discreto aumento do volume extracelular (VEC). O excesso do sódio corporal total e o aumento do VEC podem ser responsáveis pela elevação da pressão arterial por estimular um ou mais dos seguintes mecanismos: 1. aumento da atividade do sistema nervoso simpático; 2. aumento da reatividade (resposta) arteriolar às diferentes substâncias vasoconstritoras; ou 3. aumento do débito cardíaco. Não existe um limiar de ingestão de sódio a partir do qual isto aconteça. Hoje se recomenda que a dieta de indivíduos predispostos geneticamente a ter hipertensão não deva ultrapassar 6 gramas de cloreto de sódio por dia, lembrando que, em uma dieta habitual, os alimentos em sua forma natural já contêm aproximadamente 2 gramas de sal. Porém, há dados recentes do estudo DASH (Dietary Approach to Stop Hypertension), mostrando que dieta com aproximadamente 4 gramas de cloreto de sódio por dia reduz a pressão arterial de hipertensos e normotensos em maior intensidade que dietas com 6 gramas de sal por dia. Há muitos estudos demonstrando que os hipertensos não se comportam uniformemente em relação ao sal. Alguns são mais “sensíveis” e outros mais “resistentes” quando submetidos experimentalmente a dietas ricas em sódio. Porém, do ponto de vista prático, é quase impossível saber como cada indivíduo se comportaria diante de tal estímulo, principalmente a longo prazo. Na realidade, estudos populacionais onde não foi levado em conta tal fator individual mostraram que a restrição de sal é benéfica para controlar a pressão arterial da maioria dos hipertensos. Por isso, recomenda-se a restrição de sal
moderada (máximo 6 gramas por dia) indistintamente a todos os hipertensos.
Pontos-chave: • A pressão arterial (PA) depende do débito cardíaco (DC) e da resistência periférica (RP), sendo regida pela seguinte fórmula: PA ⴝ DC ⴛ RP • Na imensa maioria dos estados hipertensivos a RP é que se encontra aumentada e, raramente, é o DC que se eleva • Há muitos estudos demonstrando que os hipertensos não se comportam uniformemente em relação ao sal. Alguns são mais “sensíveis” e outros mais “resistentes” quando submetidos experimentalmente a dietas ricas em sódio • Recomenda-se a restrição de sal moderada (máximo 6 gramas por dia) indistintamente a todos os hipertensos
O Sistema Nervoso Autonômico O sistema nervoso simpático (SNS), através da liberação de noradrenalina na junção neuromuscular, é um dos principais responsáveis pela manutenção do tônus arteri-
737
capítulo 41
olar de base. Existem, porém, muitas evidências clínicas e experimentais de que a hiperatividade do SNS provoca vasoconstrição exagerada e elevação da pressão arterial. O SNS sofre influências do sistema barorreceptor (v. descrição adiante) e do sistema nervoso central, através de estímulos corticais e subcorticais, modulando a atividade simpática, cujo efeito final se fará sobre o tônus vascular periférico e a pressão arterial. O núcleo do trato solitário (NTS), localizado no tronco cerebral, recebe aferências de receptores de pressão (barorreceptores) presentes na parede da aorta e das carótidas. Veja na Fig. 41.4 que estas informações integradas àquelas provenientes de níveis superiores regulam a atividade do “centro vasomotor” de onde se originam as eferências simpáticas (dirigidas aos vasos sanguíneos) e parassimpáticas (dirigidas ao coração), que terão influência, respectivamente, sobre o tônus arteriolar e a freqüência cardíaca (FC). O NTS exerce uma ação inibidora sobre o centro vasomotor. Este conjunto de estruturas, conhecido como sistema barorreceptor arterial, tem como principal tarefa os ajustes pressóricos imediatos em resposta às mudanças posturais e às variações da própria pressão arterial “sentida” pelos barorreceptores. Acompanhe na Fig. 41.4 o seguinte exemplo: ao passarmos da posição deitada para a ortostática, a pressão arterial, ainda que momentaneamente, tende a cair. Neste instante os barorreceptores da parede arterial são menos estimulados, enviam menos impulsos ao NTS que, por sua vez, deixa de inibir o centro vasomotor liberando o sistema nervoso simpático (aumento do tônus vascular) e re-
duzindo a eferência parassimpática (vagal) sobre o coração (aumento da FC). Estas duas respostas (aumento do tônus simpático e da FC) funcionam no sentido de restabelecer a pressão arterial aos seus níveis anteriores. Por outro lado, quando ocorre elevação da pressão arterial, os barorreceptores são mais estimulados, aumentando a aferência ao NTS, que exerce maior inibição sobre o centro vasomotor (diminuindo a atividade simpática). Ao mesmo tempo ocorre aumento da eferência parassimpática (diminuindo a FC). Portanto, em resposta à elevação da PA, o sistema barorreceptor diminui a atividade simpática e a FC no sentido de reduzir a PA.
O Sistema Renina-AngiotensinaAldosterona (SRAA) A Fig. 41.5 nos dá uma idéia da interação de vários sistemas hormonais importantes na regulação da pressão arterial. O sistema renina-angiotensina-aldosterona e as endotelinas têm efeito vasoconstritor, enquanto o sistema calicreína-cininas, prostaglandinas (PGI2) e o óxido nítrico (NO) são vasodilatadores. Embora a angiotensina II (vasoconstritora) e a bradicinina (vasodilatadora) sejam os efetores mais conhecidos, todas estas substâncias são muito potentes e interferem na regulação do tônus da musculatura lisa vascular. A endotelina (ET), por exemplo, em concentrações eqüimolares, é 10 vezes mais potente que a angiotensina II. A bradicinina, conhecida como um dos va-
Estresse de Estiramento AII Renina
AGT
ET-1
Estímulo – lesão PGI2
Ach
AI
AVP
ECE
ECA
BK B2
Big - ET
AI
AII
AA
AT2
Célula Endotelial L-Arginina
Ciclooxigenase ET-1
NO-Sintase
ET-1
AII AT1
ETA
ETB
CONTRAÇÃO
TBXA2
PGI2 PGH2
(Óxido Nítrico) NO
TBX
AMPc GMPc Célula Muscular Lisa RELAXAMENTO
Fig. 41.5 Representação esquemática do endotélio e células musculares lisas vasculares e a interação dos vários sistemas hormonais vasoconstritores e vasodilatadores que atuam neste local. AGT — angiotensinogênio; AI — angiotensina I; AII — angiotensina II; ECA — enzima conversora da angiotensina; AT1 — receptor tipo 1 da angiotensina II; AT2 — receptor tipo 2 da angiotensina II; BigET — precursor da endotelina; ET-1 — endotelina 1; ECE — enzima conversora da endotelina; ETA — receptor tipo A da endotelina; ETB — receptor tipo B da endotelina; AVP — arginina vasopressina; Ach — acetilcolina; AA — ácido araquidônico; PGI2 — prostaciclina; BK — bradicinina; B2 — receptor tipo 2 da bradicinina; TbxA2 — tromboxane A2; PGH2 — prostaglandina H2; AMPc — monofosfato cíclico de adenosina; GMPc — monofosfato cíclico de guanosina; NO — óxido nítrico.
738
Hipertensão Arterial Primária
sodilatadores mais potentes, exerce sua ação através de uma prostaglandina (PGI2). Os efetores finais do SRAA são a angiotensina II e a aldosterona. A angiotensina II, além de promover a liberação de aldosterona, tem muitos outros efeitos. Entre eles, os mais importantes para a regulação da pressão arterial são: vasoconstrição direta, aumento do inotropismo, aumento da absorção de sódio e água pelos rins e intestino e ação cerebral ativando o SNS. Já a aldosterona, agindo nos túbulos distais e coletores corticais, é responsável pela retenção de sódio e água e excreção de potássio. Embora os efetores finais do SRAA sejam a angiotensina II e a aldosterona, a atividade sistêmica do SRAA é regulada pelos rins através da secreção de renina. Os estímulos mais importantes para a liberação de renina pelas células justaglomerulares são: queda na pressão de perfusão renal, redução do conteúdo total de sódio/volume intravascular e o aumento do transporte de sódio pela mácula densa. As células justaglomerulares recebem também um estímulo tônico (-adrenérgico) do SNS. Assim, os efeitos fisiológicos do SRAA são todos direcionados no sentido de conservar sódio e volume e aumentar a pressão arterial. A relação entre o conteúdo total de sódio/volume intravascular e a atividade do SRAA é inversa, ou seja, quando há déficit de volume circulante ocorre grande liberação de renina, que aumenta a produção de angiotensina II e aldosterona no sentido de manter a pressão arterial e reabsorver sódio/ água para restabelecer o volume circulante. Já quando existe aumento do volume circulante, como acontece quando se ingere quantidade excessiva de sal/água, cai a secreção de renina pelas células justaglomerulares e a liberação de angiotensina II e aldosterona, o que facilita a excreção de sódio e água pelos rins. Do ponto de vista prático, é possível demonstrar a existência de vários estados hipertensivos nos quais se detecta a hiperatividade do SRAA como sendo a principal responsável pela elevação da pressão arterial. São exemplos: hipertensão renovascular, hipertensão grave e maligna e mesmo uma pequena parcela de hipertensos primários. Além destes efeitos fisiológicos mencionados, a angiotensina II é também capaz de promover alterações estruturais ao estimular o crescimento e a proliferação celular, devendo ser um dos responsáveis pelo aumento da massa muscular do ventrículo esquerdo e pelo espessamento da parede arteriolar, ambos “marca registrada” das conseqüências da hipertensão arterial sobre o coração e os vasos sanguíneos. Este aumento da relação entre a espessura da parede arteriolar e sua luz contribui para aumentar ainda mais a resistência periférica, pois qualquer estímulo contrátil encontrará o raio interno reduzido, amplificando o efeito contrátil sobre a luz arteriolar e aumentando a resistência periférica. Lembrar que a resistência ao fluxo sanguíneo ou resistência vascular periférica varia em função do inverso do raio interno arteriolar elevado à 4.ª potência (RP ⬃ 1/R4).
Todas estas ações mencionadas resultam da interação da angiotensina II com os receptores AT1 localizados na superfície da membrana celular, que, por sua vez, ativam mecanismos intracelulares mediados por proteínas e citocinas consideradas mensageiros intermediários de seus efeitos. Já os receptores AT2 da angiotensina II, presentes em menor quantidade na superfície celular em condições fisiológicas, liberam bradicinina, PGI2 e óxido nítrico, todos vasodilatadores. É provável que os recepores AT2 sejam também responsáveis pela modulação do crescimento e proliferação celular e induzam apoptose. Tais receptores da angiotensina II tiveram sua importância clínica ampliada a partir do momento em que antagonistas seletivos dos receptores AT1 passaram a estar disponíveis como uma nova classse de agentes anti-hipertensivos com efeitos benéficos adicionais, protegendo o sistema cardiovascular e os rins das ações deletérias da angiotensina II (v. Fig. 41.5).
Pontos-chave: • O sistema renina-angiotensina-aldosterona e as endotelinas têm efeito vasoconstritor, enquanto o sistema calicreína-cininas, prostaglandinas (PGI2) e o óxido nítrico (NO) são vasodilatadores • Os efetores finais do SRAA são a angiotensina II e a aldosterona • A angiotensina II promove a liberação de aldosterona, tem ação de vasoconstrição direta, aumenta o inotropismo, aumenta a absorção de sódio e água pelos rins e intestino e tem ação cerebral ativando o SNS • A aldosterona age nos túbulos distais e coletores corticais, onde é responsável pela retenção de sódio e água e excreção de potássio • Os estímulos mais importantes para a liberação de renina pelas células justaglomerulares são: queda na pressão de perfusão renal, redução do conteúdo total de sódio/volume intravascular e o aumento do transporte de sódio pela mácula densa • Angiotensina II é também capaz de promover alterações estruturais ao estimular o crescimento e a proliferação celular, devendo ser um dos responsáveis pelo aumento da massa muscular do ventrículo esquerdo e pelo espessamento da parede arteriolar, ambos “marca registrada” das conseqüências da hipertensão arterial sobre o coração e os vasos sanguíneos
739
capítulo 41
O Sistema Calicreína-Cininas (SCC) Da mesma forma que o SRAA, o SCC é modulado por reações enzimáticas sobre proteínas e peptídeos, tendo a bradicinina como principal efetor (v. Fig. 41.5). A bradicinina, além de ser um potente vasodilatador, também regula a excreção de sódio e, ao contrário da angiotensina, inibe o crescimento e a proliferação celular. A ação vasodilatadora da bradicinina se faz através das células endoteliais, produzindo a prostaciclina (PGI2), que por sua vez estimula a produção de óxido nítrico (NO). O SCC e o SRAA têm um outro ponto muito importante em comum, a enzima conversora da angiotensina (ECA), também conhecida como cininase II por ser a principal responsável pela degradação da bradicinina. A ECA está amplamente distribuída em todo o endotélio, principalmente o pulmonar. Esta localização impede que toda a bradicinina produzida tenha acesso à circulação sistêmica, pois, sendo um potente vasodilatador, poderia provocar hipotensão. A exemplo do que ocorre com o SRAA, existem também indícios de que certos estados hipertensivos podem caracterizar-se pela falha do sistema vasodilatador calicreína-cininas. Um exemplo neste sentido são os pacientes com HA maligna nos quais os níveis do cininogênio plasmático, o precursor inativo do sistema, estão bastante diminuídos. Nos últimos anos, o uso dos inibidores da ECA como agentes anti-hipertensivos veio demonstrar que estes dois sistemas vasoativos são muito importantes na gênese e nas conseqüências a longo prazo da HA. Estas drogas, ao bloquearem a ação da ECA, impedem a formação de angiotensina e aumentam o tempo de ação da bradicinina. A soma destes efeitos, além de reduzir a pressão arterial, a médio e longo prazos modifica também estruturalmente a musculatura cardíaca (reduzindo a hipertrofia ventricular esquerda) e arteriolar (promovendo a involução do espessamento da parede arteriolar). Da mesma forma como foi mencionado para os antagonistas seletivos dos receptores AT1 da angiotensina II, os inibidores da ECA têm efeito protetor renal, reduzem a progressão da aterosclerose e a incidência de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral e a mortalidade cardiovascular. Está surgindo uma nova classe de agentes anti-hipertensivos, os inibidores da vasopeptidase, substâncias que ao mesmo tempo inibem a ECA e a endopeptidase neutra, enzima responsável pela degradação da bradicinina, peptídeos natriuréticos atriais e outros peptídeos vasodilatadores. Por tais efeitos combinados, estas substâncias parecem ser mais potentes que os agentes anti-hipertensivos hoje disponíveis, devem ter efeito protetor cardiovascular superior aos inibidores da ECA e, por estes motivos, são aguardadas com grande expectativa pela classe médica.
Pontos-chave: • A bradicinina, além de ser um potente vasodilatador, também regula a excreção de sódio e, ao contrário da angiotensina, inibe o crescimento e a proliferação celular • Da mesma forma como foi mencionado para os antagonistas seletivos dos receptores AT1 da angiotensina II, os inibidores da ECA têm efeito protetor renal, reduzem a progressão da aterosclerose e a incidência de infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral e a mortalidade cardiovascular • Está surgindo uma nova classe de agentes anti-hipertensivos, os inibidores da vasopeptidase, substâncias que ao mesmo tempo inibem a ECA e a endopeptidase neutra, enzima responsável pela degradação da bradicinina, peptídeos natriuréticos atriais e outros peptídeos vasodilatadores
O Sistema das Prostaglandinas (PG) Este sistema é formado por vários componentes cujos efetores finais podem ser tanto vasoconstritores como vasodilatadores. Para se ter uma idéia mais geral do sistema, reporte-se ao Cap. 7 (Peptídeos Vasoativos e o Rim. A principal PG vasodilatadora é a prostaciclina (PGI2). Ela também tem ação antiagregante plaquetária e participa da regulação da hemodinâmica renal (aumenta o fluxo sanguíneo renal) e do manuseio de sódio (natriurese). As prostaglandinas do grupo E (PGE2) têm efeitos semelhantes, porém não agem sobre as plaquetas. Já a PGF2 e o tromboxane (TxA2) têm efeito vascular vasoconstritor e retentor de sódio a nível renal. O TxA2 promove também a agregação plaquetária, estimulando a coagulação. As PGs (PGI2, PGE2 e PGD2) estimulam ou têm ação permissiva sobre a secreção de renina. As PGs participam também do processo inflamatório por aumentar o fluxo sanguíneo regional, a permeabilidade vascular e a migração de leucócitos. Estas substâncias são formadas em todas as células a partir de um precursor comum (fosfolipídios presentes na membrana celular) através de uma série de reações enzimáticas, liberando as PGs ativas. As enzimas responsáveis por estas reações e que interferem em toda a “cascata” das PGs são as ciclo-oxigenases (COX-1 e COX-2), cuja importância clínica está em poder ser inibida por drogas muito utilizadas e prescritas, tais como o ácido acetil-salicílico, todos os antiinflamatórios não-hormonais e os corticóides. É por isso que estes agentes podem
740
Hipertensão Arterial Primária
promover a retenção de sódio e água e elevar a pressão arterial. A COX-2 tem maior expressão em tecidos com injúria, daí o efeito antiinflamatório dos seus inibidores que, embora tenham menos efeitos adversos sobre a mucosa do tudo digestivo, têm efeitos semelhantes sobre o sistema cardiovascular e a pressão arterial. Já a aspirina em doses baixas (75 a 100 mg/dia), por inibir seletivamente a produção de TxA2, reduz a adesividade plaquetária e a ocorrência de obstrução arterial, resultando em menor incidência de infarto do miocárdio e de acidente vascular cerebral. Como as cininas, as prostaglandinas produzidas em diferentes territórios são rapidamente destruídas na circulação (principalmente no leito vascular pulmonar), tendo suas ações sistêmicas limitadas. Entretanto, a maioria dos pesquisadores acredita que devam ser importantes para a regulação do fluxo sanguíneo local e regional. Existem alguns estados hipertensivos nos quais se consegue demonstrar o predomínio da formação das prostaglandinas vasoconstritoras em relação às vasodilatadoras. Um exemplo é a doença hipertensiva específica da gestação, onde existem maiores níveis circulantes de TxA 2 (vasoconstritor e agregante plaquetário) do que de prostaciclina (PGI2 – vasodilatadora e antiagregante plaquetária).
Peptídeos Natriuréticos Formam uma outra família de peptídeos capazes de interferir na regulação da PA por diferentes mecanismos de ação. O primeiro destes peptídeos, conhecido como fator natriurético atrial (ANF) e, posteriormente, peptídeo natriurético atrial (ANP), foi isolado no início dos anos 80. É produzido nos miócitos atriais (principalmente átrio direito) sendo liberado na circulação quando a pressão atrial se eleva (aumento do volume circulante). Apresenta múltiplas ações sobre o sistema cardiovascular e renal e age também sobre outros sistemas hormonais, em particular sobre o SRAA, inibindo a liberação de renina e de aldosterona e antagonizando as ações periféricas da angiotensina. Estes peptídeos podem reduzir a pressão arterial porque aumentam a excreção de sódio, têm efeito vasodilatador direto, reduzem o volume circulante promovendo diurese, natriurese e translocando líquido do compartimento intravascular para o espaço extravascular e, finalmente, antagonizam as ações de vários sistemas hormonais vasoconstritores: o SRAA, catecolaminas, vasopressina e endotelina. Mais recentemente foram descritos outros peptídeos da mesma família (BNP-peptídeo natriurético cerebral e CNP-peptídeo natriurético C) com ações semelhantes, porém, produzidos em maior quantidade em outros locais do organismo, como o ventrículo (BNP) ou o endotélio (CNP), e tendo mecanismos reguladores diferentes do ANP. O BNP tem sido considerado um marcador da função e da estrutura ventriculares, tem efeito vasodilatador e reduz a proliferação celular. Desta forma, esta família de peptídeos deve participar da regulação da pressão arteri-
al, da manutenção do volume circulante e da modulação das alterações estruturais do coração, artérias e arteríolas.
A Vasopressina ou Hormônio Antidiurético É um peptídeo com efeito sistêmico vasoconstritor cuja ação renal é aumentar a permeabilidade dos dutos coletores à água, concentrando a urina. Alguns estudos têm demonstrado que a vasopressina tem papel importante na manutenção da pressão arterial quando ocorre falha ou depressão de outros sistemas vasoconstritores, como o SRAA e o sistema nervoso autonômico (p.ex., em pacientes diabéticos com neuropatia ao assumirem a posição ereta).
O Endotélio e seu Hormônio Natural (Endotelina) O endotélio é considerado o maior órgão do corpo humano. Funciona como um órgão endócrino, pois produz substâncias que circulam e têm ação a distância; parácrino, liberando substâncias com ações locais, e intrácrino, gerando substâncias com ações na própria célula. Veja na Fig. 41.5 as principais substâncias produzidas pelo endotélio ou que têm ações sobre o endotélio vascular e as células musculares lisas subjacentes. O sistema renina-angiotensina é um bom exemplo de produção parácrina, pois todos os seus elementos são encontrados na superfície ou no interior das células endoteliais. O mesmo ocorre com outros sistemas hormonais circulantes (calicreína-cininas e prostaglandinas). Já as endotelinas (ET) são seus hormônios naturais destas células. As endotelinas são peptídeos identificados no final da década de 80, cujo efeito vasoconstritor sobrepuja até mesmo o das catecolaminas e da angiotensina II. São produzidos em grande quantidade pelas células endoteliais, podendo ter ações locais (célula muscular lisa subjacente) ou sistêmicas (quando atingem a corrente sanguínea). Embora tenham efeito vasoconstritor bem definido, seu papel na gênese e manutenção da hipertensão arterial não está ainda completamente estabelecido. A administração, ainda experimental, de bloqueadores competitivos da endotelina reduz a pressão arterial em indivíduos hipertensos e melhora a função cardíaca em pacientes com insuficiência cardíaca. Por esta razão é provável que venham a constituir uma nova classe de agentes terapêuticos. Entretanto, os estudos são preliminares e tais drogas não estão ainda disponíveis comercialmente.
Fator Relaxante Derivado do Endotélio (EDRF) ou Óxido Nítrico (NO) Muitas substâncias com efeito vasodilatador (p.ex., acetilcolina, bradicinina) agem sobre a musculatura lisa vas-
741
capítulo 41
cular através da liberação de NO pelas células endoteliais. Sua existência foi comprovada em experimentos nos quais, ao se retirar a camada endotelial de artérias em preparações isoladas, estes vasodilatadores deixavam de agir. Daí o seu nome de fator relaxante derivado do endotélio (EDRF). Posteriormente, identificou-se esta substância como sendo o óxido nítrico (NO), cujo potente efeito vasodilatador se faz através da geração de GMP cíclico no interior das células musculares lisas vasculares. Embora se acredite que sua ação se restrinja à regulação do fluxo sangüíneo local ou regional, parece ter um papel importante na manutenção da PA em níveis normais. Em ratos, por exemplo, a administração crônica de substâncias que impedem a formação de NO promove elevação sustentada da PA, à semelhança do que ocorre na hipertensão arterial primária. A tentativa de produzir um medicamento antihipertensivo que inibisse a degradação do NO acabou desenvolvendo uma droga muito utilizada em indivíduos com disfunção erétil, o sildenafil (Viagra). A melhora do fluxo sangüíneo regional induzida pela ação mais duradoura do NO facilita a ereção peniana. Outras substâncias com ações vasoconstritoras ou vasodilatadoras podem estar envolvidas no controle da pressão arterial. Porém, foge ao objetivo deste texto descrever mecanismos reguladores da pressão arterial não universalmente reconhecidos como de importância clínica. De forma simplificada, poder-se-ia entender a hipertensão arterial primária ou essencial como sendo multifatorial, ou seja, resulta do desbalanço da interação de vários elementos, tais como: conteúdo de sódio total e volume extracelular, sistema nervoso central e autonômico e sistemas vasoconstritores (excesso) e vasodilatadores (deprimido). Em alguns indivíduos e em determinados estados hipertensivos podem prevalecer os mecanismos vasoconstritores, enquanto, em outros, predominaria a hipoatividade dos sistemas vasodilatadores.
Resistência Insulínica A resistência insulínica é um achado freqüente entre os indivíduos hipertensos. Embora não ocorra em todos, muitos pesquisadores consideram-na como um fator importante na gênese da hipertensão arterial primária e na manutenção dos níveis pressóricos elevados em muitos estados hipertensivos, em particular em obesos e portadores de diabetes mellitus tipo 2, que se manifesta em adultos, não havendo necessidade absoluta de insulina para controlar os níveis glicêmicos. A resistência à ação periférica da insulina faz com que se necessite de maiores níveis sanguíneos deste hormônio para metabolizar a glicose (v. Fig. 41.6). A hiperinsulinemia promove retenção de sódio e água, ativação do sistema nervoso simpático e mudanças na atividade de bombas que regulam a concentração de sódio intracelular (bomba de Na/K e Na/H). O aumento do sódio intracelu-
lar aumenta a resposta vasoconstritora do tecido muscular liso. O conjunto destas alterações leva ao aumento da pressão arterial e às seguintes alterações no perfil lipêmico comum nos indivíduos com hipertensão primária: aumento do colesterol total, do LDL-colesterol e dos triglicerídeos e redução do HDL-colesterol — “protetor”. Um grupo de pesquisadores, entretanto, não acredita que a hipertensão arterial seja conseqüência da resistência insulínica, mas o inverso. Nesta interpretação a alteração básica da hipertensão seria a hiperatividade simpática, que teria como conseqüência a modificação na composição das células musculares esqueléticas, que passariam a ser menos sensíveis à insulina, ou seja, a resistência à insulina seria conseqüência da hipertensão e não sua causa. Independentemente do mecanismo, a resistência insulínica e hiperinsulinemia podem estar presentes em parte dos indivíduos com hipertensão arterial primária e parecem ser responsáveis, pelo menos em parte, por elevar a pressão arterial e induzir às alterações lipêmicas freqüentes nestes indivíduos. Os indivíduos com hipertensão, obesidade e dislipidemia são exemplos clínicos típicos da atuação destes mecanismos. Nestes, a redução da ingesta calórica e exercícios físicos regulares melhoram a resistência insulínica e revertem tais alterações, ou seja, há redução da glicemia, da insulinemia, do colesterol e da pressão arterial. Reaven, ao identificar que a associação destas anormalidades estava presente em uma parcela considerável da população de hipertensos (10 a 15%), chamou de “síndrome X” à seguinte combinação de fatores: hipertensão primária, hiperinsulinemia, obesidade, dislipemia e aterosclerose (principalmente manifesta por doença coronária). Hoje este quadro é mais apropriadamente chamado de síndrome de resistência insulínica ou síndrome plurimetabólica.
ETIOLOGIA DA HIPERTENSÃO ARTERIAL Hipertensão Arterial Primária ou Essencial Chama-se hipertensão primária ou essencial aquela na qual, mesmo após uma investigação clínica e laboratorial detalhada, não se consegue encontrar qualquer doença ou outra causa para explicar a elevação dos níveis pressóricos. Contrapõe-se a este conceito o de hipertensão secundária, onde a elevação da pressão arterial é apenas um dos sinais de uma doença ou anormalidade subjacente. O Quadro 41.4 apresenta a classificação etiológica da hipertensão arterial. A rigor, só devemos considerar a hipertensão como sendo de caráter primário ou essencial quando todas as causas de hipertensão secundária foram exaustivamente pesquisadas e excluídas (v. a seguir). Porém, do ponto de vis-
742
Hipertensão Arterial Primária
Obesidade, diabetes mellitus tipo II, hipertensão, envelhecimento, fumo etc.
Alteração do transporte celular de eletrólitos
RESISTÊNCIA AOS EFEITOS PERIFÉRICOS DA INSULINA
앗 Na/K ATPase 앗 Ca ATPase 앖 Na/H ATPase
Reatividade vascular
Retenção de Sódio
HIPERINSULINEMIA
HIPERTENSÃO ARTERIAL
Ativação do S.N. simpático Dislipidemia Colesterol total HDL-colesterol
Estímulo da proliferação celular
Triglicerídeos LDL-colesterol? VLDL-colesterol?
ATEROSCLEROSE
Fig. 41.6 Possível papel da resistência insulínica e hiperinsulinemia sobre a regulação da pressão arterial, o metabolismo lipídico e a aterosclerose.
ta prático isto nem sempre é possível. Por isso, a presença de elementos que se traduzam em “fatores de risco” para a elevação da pressão arterial revestem-se de especial importância, pois reforçam a hipótese diagnóstica de hipertensão arterial primária.
FATORES DE RISCO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL PRIMÁRIA São chamados de “fatores de risco” para se desenvolver hipertensão arterial certos elementos que tendem a aumentar a probabilidade individual ou populacional de elevar a pressão arterial. Quando falamos em “fatores de risco”, estamos nos referindo especialmente à hipertensão arterial primária ou essencial, ou seja, aquela não relacionada a qualquer doença renal ou de outros sistemas capazes de elevar a pressão. O Quadro 41.5 relaciona os principais “fatores de risco” para o aparecimento de hipertensão arterial primária. Embora não de forma absoluta, eles são apresentados em ordem de importância. Um primeiro grupo de fatores de risco está relacionado a elementos pessoais nos quais é impossível intervir, ou
seja, envolvem hereditariedade, etnia, idade e sexo. A hipertensão arterial apresenta uma evidente agregação familiar, não sendo raro encontrarem-se vários membros de uma mesma família acometidos pela doença. Esta predisposição genética parece ser determinada por herança multigênica com penetrância variável. Os indivíduos negros e miscigenados têm maior tendência a desenvolver hipertensão arterial e, segundo alguns estudos, cursam com as formas mais graves da moléstia, podendo ter maior risco de complicações, como é o caso de insuficiência renal. A prevalência da hipertensão arterial aumenta com a idade, apresentando o pico de incidência entre os 60 e os 70 anos (v. Fig. 41.7). As mulheres em idade procriativa apresentam menor incidência da doença se comparadas aos homens da mesma idade e mesmo grupo étnico. Porém, após a menopausa, a incidência de hipertensão em mulheres é semelhante ou até superior àquela encontrada nos homens. Um outro grupo de fatores de risco está relacionado às condições de vida dos indivíduos acometidos e, nestes sim, temos possibilidades de intervir. O consumo exagerado de sal está relacionado ao aparecimen-
743
capítulo 41
Quadro 41.4 Classificação etiológica da hipertensão arterial
Quadro 41.5 Fatores de risco para o desenvolvimento da hipertensão arterial
HIPERTENSÃO ARTERIAL PRIMÁRIA OU ESSENCIAL (90 A 95%)
HEREDITARIEDADE — Agregação familiar evidente (herança multigênica) IDADE — Aos 20 anos prevalência de ⬃10%, aos 50 anos ⬃40%, após os 70 anos 60% SEXO — Mais freqüente nos homens, inverte-se após a menopausa ETNIA — Maior prevalência em negros/mulatos, que também têm as formas mais graves OBESIDADE — duas a três vezes mais freqüente em obesos EXCESSO DE SAL — Quanto maior a ingesta de sódio, maior a prevalência EXCESSO DE ÁLCOOL — Consumo superior a 40 ml de álcool por dia aumenta o risco VIDA SEDENTÁRIA — Predispõe à obesidade e à hipertensão ESTRESSE — Indivíduos com predisposição familiar têm maior elevação pressórica frente ao estresse FUMO — Fumantes têm pressão arterial mais elevada durante o dia
HIPERTENSÃO ARTERIAL SECUNDÁRIA — Renal: glomerulonefrites agudas e crônicas, pielonefrite crônica, nefrite intersticial, nefropatia de refluxo, rins policísticos e hidronefrose. —Renovascular: aterosclerose, displasia fibromuscular, poliarterite nodosa, doença de Takayasu, fístula arteriovenosa, compressões. — Endócrina: Tireóide — hipertireoidismo, hipotireoidismo. Supra-renal — Síndrome de Cushing, hiperaldosteronismo primário, feocromocitoma, deficiência enzimática (11 -hidroxilase e 17hidroxilase). — Coarctação da Aorta — Medicamentosa: Anticoncepcionais, corticóides, antiinflamatórios não-hormonais, antidepressivos tricíclicos. — Doença Hipertensiva Específica da Gravidez — Outras: Hiperparatireoidismo, tumores produtores de renina ou aminas simpatomiméticas, acromegalia, outras causas de hiperandrogenismo.
to e agravamento da hipertensão arterial principalmente naqueles que já apresentem predisposição genética. Existem muitos estudos realizados em populações primitivas isoladas nas quais não existe o hábito de
adicionar cloreto de sódio ao se prepararem os alimentos. Nestas, a prevalência de hipertensão arterial é praticamente nula, a pressão arterial não se eleva com a idade e a incidência de doenças cardiovasculares é desprezível. Um outro aspecto interessante é aquele
100
Prevalência de Hipertensão Arterial em Relação a Idade, Sexo e Grupo Étnico Homens Negros
Homens Brancos
20
40
60
Mulheres Brancas
0
Porcentagem de Hipertensos*
80
Mulheres Negras
18-24
25-34
35-44
45-54
55-64
65-74
Idade (anos) *Pressão arterial igual ou superior a 140/90 mmHg
Fig. 41.7 Prevalência de hipertensão arterial segundo a idade, o sexo e o grupo étnico. Dados provenientes do National Health and Nutritional Survey, EUA (1976-1980). Hypertension, 7:457-468, 1985.
744
Hipertensão Arterial Primária
relacionado à sensibilidade individual ao sal. Estudos têm mostrado que nem todos os indivíduos comportamse da mesma maneira em relação ao sal. Alguns são considerados “sensíveis”, pois apresentam elevação pressórica quando ingerem excesso de sódio, e outros, “resistentes”, pois elevam muito pouco ou nada a pressão arterial em resposta à sobrecarga de sal. O inverso também ocorre, ou seja, indivíduos “sensíveis” apresentam redução pressórica mais acentuada quando se restringe a ingesta de sódio e os “resistentes” têm menor benefício. Embora estas subpopulações possam ser identificadas em estudos de curta duração (semanas), não existem estudos demonstrando este efeito a longo prazo (anos). Por outro lado, existem estudos de longa duração realizados com amostras populacionais bastante diversas e representativas demonstrando o benefício da restrição de sal no controle da hipertensão arterial. Por isso, recomenda-se indistintamente a restrição de sódio para os indivíduos com hipertensão arterial. A obesidade é outro importante fator de risco relacionado às condições de vida do hipertenso. Muitos estudos têm sugerido que o excesso de insulina ou a resistência à ação periférica da insulina (freqüentemente observada em obesos e diabéticos do tipo 2) deve ter um papel importante na gênese e/ou manutenção da hipertensão arterial nestes indivíduos. Há várias evidências de que os indivíduos com índice de massa corporal (IMC Peso/Altura2) superior a 25 kg/m2 estão mais sujeitos à elevação da PA. Em nossa experiência, o excesso de peso é o principal fator associado à hipertensão arterial em jovens. O IMC correlaciona-se também de forma positiva com a maior incidência de doenças cardiovasculares, em particular com a obstrução coronária, que predispõe à angina e ao infarto do miocárdio. Por outro lado, a redução do peso é uma das formas de intervenção mais eficazes para reduzir a pressão arterial. Vários estudos relacionam também o consumo excessivo de bebidas alcoólicas com maior prevalência de hipertensão arterial. O consumo de álcool etílico em quantidades superiores a 30 ml/dia (equivalente a duas doses de destilados ou dois copos de vinho ou duas cervejas) associa-se à elevação da pressão arterial. Assim, da mesma forma que em relação à obesidade e ao sal, a retirada deste fator de risco é um importante elemento auxiliar no controle da hipertensão. Vida sedentária, estresse e fumo parecem estar relacionados à hipertensão arterial. Porém, os estudos nestas áreas são ainda inconclusivos quanto à relação causal destes fatores. Embora possa ainda haver dúvidas de que o sedentarismo seja um fator de risco para a hipertensão, o inverso, ou seja, exercícios físicos aeróbicos realizados regularmente, comprovadamente contribuem para reduzir a pressão arterial em hipertensos e normotensos. O estresse (reação de defesa do organismo a qualquer estímulo externo ou interno) provoca as seguintes alterações hemodinâmicas: aumento da freqüência cardíaca, do
débito cardíaco e da pressão arterial. Indivíduos com predisposição genética à hipertensão respondem de forma mais acentuada ao estresse. Situações de catástrofes associam-se à maior prevalência de hipertensão. Não se sabe, entretanto, se a sobrecarga do dia-a-dia à qual habitualmente nos submetemos é suficiente para causar a elevação sustentada da PA. Alguns estudos sugerem que condições de trabalho ou da vida diária onde o indivíduo não tem possibilidade ou não tem poder de decisão suficiente para controlar situações de conflito e tensão associam-se com elevação da pressão arterial. Há estudos que apontam a existência de uma relação causal entre fumo e hipertensão e outros que a negam. Um recente levantamento, utilizando monitorização da pressão arterial por dois dias consecutivos, detectou que fumantes têm PA mais elevada do que não-fumantes no período em que fumam (durante o dia). Realmente, os efeitos agudos sobre o sistema cardiovascular observados ao se fumar um cigarro incluem a elevação da FC, da PA e vasoconstrição, que duram de 20 a 30 minutos. Independentemente de predispor ou não à HA, o fumo é um dos mais importantes fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares (AVC, doença coronária e obstrução arterial periférica). Portanto, deve ser banido dos hábitos de indivíduos hipertensos.
Hipertensão Arterial Secundária Entre as hipertensões secundárias as de causa renal, renovascular e a doença hipertensiva específica da gravidez, seja pela freqüência ou importância clínica, merecem capítulo específico neste livro. Entretanto, apenas no sentido de não perdermos a visão geral do assunto, vale a pena ressaltar alguns aspectos clínicos que nos levam a pensar na existência de uma destas causas de hipertensão (v. Quadro 41.4). A existência de história anterior de doença renal, edema ou alterações urinárias; a ausência de hipertensão na família; a presença de edema e anemia (ao exame físico), de proteinúria/hematúria (no exame de urina tipo I) e de creatinina plasmática elevada são dados sugestivos de doença renal primária como causa da hipertensão. As doenças que mais comumente provocam tais alterações são as glomerulonefrites crônicas, pielonefrites crônicas, doenças túbulo-intersticiais, incluindo nefropatia de refluxo e rins policísticos. São indícios de que a hipertensão possa ter causa renovascular (v. Cap 42): paciente jovem com hipertensão muito grave (principalmente mulheres); ausência de história familiar de hipertensão; presença de sopro abdominal ou pulsos alterados; queda pressórica muito acentuada com o uso de inibidores da ECA ou antagonistas da angiotensina II e piora abrupta de uma hipertensão que era estável, esta mais comum em indivíduos idosos. As causas mais freqüentes de estenose da artéria renal são a aterosclerose (em homens e mulheres depois da menopausa) e a
capítulo 41
displasia fibromuscular (mais comum em mulheres jovens). A comprovação diagnóstica da hipertensão renovascular segue rotinas de investigação que dependem das características e disponibilidades de cada centro, mas, geralmente, incluem: 1. teste com um inibidor da ECA (captopril — 50 mg VO) — quando promove queda da pressão diastólica (após 90 a 120 minutos) de 20 mmHg ou mais é considerado positivo e indica que a hipertensão é mantida por hiperatividade do sistema renina-angiotensina, devendo-se, portanto, prosseguir na investigação; 2. a comprovação morfológica da isquemia renal pode ser feita, preferencialmente, pela ultra-sonografia com doppler ou outro método por imagem (quando mostram diferença de pelo menos 1,5 cm entre as massas renais direita e esquerda, isto sugere isquemia crônica), e a cintilografia renal ou urografia excretora, esta pouco utilizada hoje, podem mostrar, além da diferença de tamanho, retardo na chegada e na excreção do contraste em um dos rins; 3. a arteriografia renal ou a angiorressonância são indispensáveis para se comprovar a presença de estenose de uma (mais freqüente) ou ambas as artérias renais, podendo também (a arteriografia) ser usada como tratamento (dilatação intraluminal e colocação de stent); 4. coleta e dosagem de renina em separado nas veias renais e cava (abaixo e acima das veias renais) para investigar se há ou não lateralização da produção de renina, que pode ser um importante elemento em relação ao diagnóstico causal e ao prognóstico de cura, quando se corrige a estenose eventualmente presente. Entre as causas endócrinas de hipertensão arterial, as alterações da glândula tireóide (principalmente o hipertireoidismo), o hipercortisolismo (síndrome de Cushing) e o hiperandrogenismo (tumores virilizantes da supra-renal e deficiências enzimáticas congênitas — 11-hidroxilase ou 17-hidroxilase) costumam ter quadro clínico evidente, despertando, quase sempre, a atenção do médico para a hipótese de hipertensão secundária a estas doenças. Isto, porém, não ocorre com o hipotireoidismo, hiperaldosteronismo primário e com parte dos casos de feocromocitoma. Por isso, é importante que se tenha(m) algum(ns) elemento(s) para fazermos a triagem destas endocrinopatias. O hiperaldosteronismo primário tem um bom marcador: a hipopotassemia. Esta resulta da ação da aldosterona sobre o túbulo distal promovendo a reabsorção de sódio (causa mais importante da hipertensão) e a excreção de potássio. Lembre-se de que as causas mais comuns de hipopotassemia são a ingesta deficiente, o uso de diuréticos e a diarréia. Na ausência destes fatores causais mais freqüentes, a existência de hipopotassemia (K 3,5 mEq/L) com potássio na urina de 24 horas 30 mEq são elementos sugestivos para o diagnóstico de hiperaldosteronismo, devendose prosseguir na investigação desta causa. Quando o indivíduo tem ingesta deficiente ou toma diurético, devemos suspendê-lo e suplementar a dieta com cloreto de potássio (VO) por um período mínimo de 1 mês (30 a 40 mEq/ dia) antes de colher novo potássio plasmático e na urina
745
de 24 horas. Algumas vezes o K plasmático pode chegar a valores menores que 2,5 mEq/L. A confirmação diagnóstica de hiperaldosteronismo primário se faz com a dosagem plasmática concomitante de aldosterona (elevada) e renina (diminuída) que não respondem ao estímulo postural (não se elevando após duas horas em pé, como na resposta fisiológica normal). Os tumores ou a hiperplasia das células da zona glomerulosa da(s) supra-renal(is) podem ser os responsáveis por este quadro, que corresponde a menos de 1% dos casos de hipertensão. A tomografia das glândulas adrenais pode mostrar a presença destas alterações morfológicas. Embora pouco prevalente, o fato de ser uma forma de hipertensão potencialmente curável torna o seu diagnóstico importante. O mesmo se pode dizer em relação ao feocromocitoma. O feocromocitoma é um tumor originado das células cromafins e está localizado na medula da supra-renal em 85% dos casos. Porém, como este tecido é originado da ectoderme, pode haver resquícios em qualquer local do tórax ou abdome junto à coluna vertebral. Produz grande quantidade de catecolaminas que elevam a pressão arterial. É também uma causa rara de hipertensão. Perto da metade dos casos de feocromocitoma evoluem em “crises” de descarga de catecolaminas que provocam aumentos repentinos da pressão arterial ou grande labilidade pressórica que são acompanhados de cefaléia, taquicardia, palidez, piloereção, tontura e outros sintomas adrenérgicos. Evidentemente, a presença destes sintomas sugere o diagnóstico de feocromocitoma. Entretanto, a outra metade dos casos não apresenta qualquer sinal sugestivo de liberação adrenérgica, comportando-se como se fosse hipertensão primária. A dosagem da metanefrina urinária (catabólito das catecolaminas) é o principal exame para se pesquisar a presença de feocromocitoma. Ela pode ser determinada em amostra isolada de urina, e o resultado é fornecido em relação à excreção de creatinina ou de modo absoluto na urina de 24 horas. Quando elevada indica hiperatividade adrenérgica. Se puder ser suprimida com 0,400 mg de clonidina por via oral (um simpatolítico de ação central — v. Drogas anti-hipertensivas), isto significa que a origem da hiperatividade adrenérgica está no próprio sistema nervoso simpático. Os tumores produtores de catecolaminas não são sensíveis à clonidina e a metanefrina na urina continua elevada. A dosagem do ácido vanilmandélico (VMA) é desaconselhável, pois, sendo determinado por método colorimétrico, exige dieta especial (sem qualquer corante) por três dias e necessita ser quantificado na urina de 24 horas. Já a dosagem de metanefrina pode ser realizada em amostra isolada de urina colhida em meio ácido. Alguns medicamentos de uso muito amplo podem causar elevação da pressão arterial. Entre eles, os corticóides e os antidepressivos tricíclicos costumam ser prescritos por médicos e com indicação precisa. Porém, isto não ocorre em relação aos antiinflamatórios não-hormonais (AINH) e os anticoncepcionais. Os AINH são as drogas mais prescritas
746
Hipertensão Arterial Primária
pelos médicos. Entretanto, a venda indiscriminada em farmácias e a automedicação são ainda maiores. Como vimos, podem aumentar a pressão por reter sódio e água e por impedir a produção das prostaglandinas vasodilatadoras. Portanto, seu uso deve ser o mais restrito possível em hipertensos. Com os anticoncepcionais ocorre o mesmo fenômeno: são usados, na maioria das vezes, sem qualquer controle médico. Estas drogas elevam a pressão na maioria das mulheres que delas se utilizam. Em muitas delas este efeito não é suficiente para chegar à faixa de pressão considerada como hipertensão, porém, sabemos que mesmo pequenos aumentos da pressão arterial, ainda que na faixa da normalidade, fazem crescer o risco de doenças cardiovasculares (v. Fig. 41.2). Este risco é ainda maior em mulheres que fumam. Os anticoncepcionais geralmente são combinações de estrogênios e progestágenos sintéticos. Os estrogênios elevam a pressão por ativar o SRAA e os progestágenos têm efeito mineralocorticóide (semelhante à aldosterona). A interrupção dos anticoncepcionais costuma reverter ou melhorar o processo hipertensivo na maioria das mulheres após 2 ou 3 meses. Evidentemente os indivíduos com outros fatores predisponentes são os mais sujeitos a terem hipertensão com o uso destas drogas. Porém, não é raro vermos o desaparecimento da hipertensão após a sua retirada.
Pontos-chave: Causas endócrinas de hipertensão arterial • As alterações da glândula tireóide (principalmente o hipertireoidismo), o hipercortisolismo (síndrome de Cushing) e o hiperandrogenismo (tumores virilizantes da supra-renal e deficiências enzimáticas congênitas — 11-hidroxilase ou 17hidroxilase) — quadro clínico evidente • Hipotireoidismo, hiperaldosteronismo primário e parte dos casos de feocromocitoma — quadro clínico pode não ser evidente • Perto da metade dos casos de feocromocitoma evoluem em “crises” de descarga de catecolaminas que provocam aumentos repentinos da pressão arterial ou grande labilidade pressórica que são acompanhados de cefaléia, taquicardia, palidez, piloereção, tontura e outros sintomas adrenérgicos • O hiperaldosteronismo primário tem um bom marcador: a hipopotassemia, mas lembre-se de que as causas mais comuns de hipopotassemia são a ingesta deficiente, o uso de diuréticos e a diarréia
CONSEQÜÊNCIAS DA HIPERTENSÃO ARTERIAL Como a hipertensão arterial tem, na maioria das vezes, instalação lenta e gradual, vão ocorrendo várias adaptações, principalmente no sistema cardiovascular, em resposta à elevação pressórica. Algumas destas adaptações não trazem conseqüências clínicas de imediato. A longo prazo, porém, implicam sérios riscos de morbidade e mortalidade cardiovascular. De forma geral, pode-se dizer que o indivíduo hipertenso irá apresentar mais precocemente e em grau mais acentuado a doença aterosclerótica e todas as suas possíveis conseqüências. Além da aterosclerose (comprometendo as artérias de maior calibre), a hipertensão lesa também as pequenas artérias e arteríolas. O espessamento da parede vascular (hipertrofia e hiperplasia da camada muscular e replicação da lâmina elástica interna) é a “marca registrada” da hipertensão sobre as arteríolas (arteriolesclerose). Este espessamento da parede arteriolar, além de contribuir para aumentar a resistência periférica, perpetuando o processo hipertensivo, pode ser tão grave a ponto de comprometer o fluxo sanguíneo para órgãos importantes como os rins e a musculatura cardíaca. O Quadro 41.6 resume as principais conseqüências da hipertensão arterial. Como se observa, a maioria delas ocorre no sistema cardiovascular.
Comprometimento Cerebral da Hipertensão Arterial As complicações cerebrais não fogem à regra. Invariavelmente decorrem do comprometimento da circulação cerebral. Como mostra a Fig. 41.8, o fluxo sanguíneo para o cérebro, assim como para outros territórios vasculares mais nobres (coronário e renal), é mantido constante mesmo quando ocorrem grandes variações da pressão arterial. Esta auto-regulação da perfusão cerebral existe graças a mecanismos nervosos, hormonais e a um efeito miogênico local que, em conjunto, promovem vasoconstrição quando a pressão arterial se eleva e vasodilatação quando esta se reduz. Observe, entretanto, que é um mecanismo limitado, ou seja, quedas acentuadas da pressão arterial reduzem o fluxo sanguíneo cerebral, enquanto elevações pressóricas extremas irão produzir hiperfluxo e conseqüente edema cerebral. Este mecanismo de autoregulação é mais facilmente rompido quando as variações pressóricas são mais bruscas. Assim, quando a hipertensão é muito grave ou se instala de forma abrupta, a auto-regulação é quebrada, sobrevindo o edema cerebral, que poderá provocar diferentes manifestações clínicas dependendo da intensidade e das áreas atingidas. Estes casos são conhecidos como encefalopatia hipertensiva e freqüentemente são acompanhados por um ou mais dos seguintes sinais de hipertensão intracraniana: cefaléia intensa, náuseas, vômitos, comprometimento
747
capítulo 41
Quadro 41.6 Conseqüências clínicas da hipertensão arterial CEREBRAIS — Encefalopatia hipertensiva — Acidente vascular cerebral — Isquêmico ou trombótico — Hemorrágico — Lacunar — Episódio isquêmico transitório CARDÍACAS — Miocárdicas — Hipertrofia ventricular esquerda (HVE) — Figrose e dilatação — Insuficiência cardíaca — Edema agudo de pulmão — Coronárias — Angina e infarto do miocárdio — Arritmias (associadas à HVE) — Extra-sístoles ventriculares isoladas — Arritmias ventriculares complexas — Fibrilação ventricular — Morte súbita RENAIS — Arterial — Placa aterosclerótica — Hipertensão renovascular — Arteriolar — Arteriolesclerose — Nefrosclerose “benigna” — Necrose fibrinóide e endarterite proliferativa (hipertensão maligna) — Glomerular — Glomerulesclerose progressiva — Insuficiência renal crônca RETINIANAS — Retinopatia hipertensiva — Trombose venosa OUTRAS LESÕES ARTERIAIS — Obstrução arterial periférica — Território aorto-ilíaco-femoral — Claudicação intermitente — Outros territórios — carotídeo e mesentérico — Aneurismas — Território aorto-ilíaco-femoral — Aneurisma dissecante da aorta — Úlceras hipertensivas (isquemia distal)
do nível de consciência (desde sonolência e obnubilação até o coma profundo), e podem, em certos casos, coexistir sinais de comprometimento motor transitório e até convulsões. O exame do fundo de olho, que reflete uma parte do leito vascular cerebral, mostrará com freqüência as seguintes alterações agudas: edema de retina (brilho aumentado), eventualmente edema de papila (edema cerebral), e poderão ser observadas hemorragias retinianas e exsudatos algodonosos, correspondendo, respectivamente, à lesão da parede arteriolar e à isquemia da retina. Outras alterações anatômicas (crônicas) poderão estar presentes. Nem sempre se conseguem identificar os mecanismos responsáveis por estas elevações
pressóricas a ponto de causar tal dano cerebral. Porém, com freqüência se trata de pacientes que, tendo hipertensão muito grave, abandonam o tratamento por completo ou o fazem irregularmente. A suspensão abrupta da clonidina (v. Drogas anti-hipertensivas) pode também provocar a liberação adrenérgica com crise hipertensiva grave. O acidente vascular cerebral (AVC) é 5 a 7 vezes mais freqüente em hipertensos que em normotensos. Na maioria das vezes os hipertensos são vítimas do AVC isquêmico ou trombótico, ou seja, ocorre a obstrução completa de uma artéria já acometida por placa aterosclerótica, sobrevindo a morte do tecido cerebral por ela irrigado. Nestes casos as conseqüências mais importantes são o comprometimento motor unilateral acompanhado de disfasia ou afasia (lesão do sistema piramidal) e liberação extrapiramidal (hipertonia). Geralmente coexistem alterações da sensibilidade do mesmo lado da hemiplegia. O quadro costuma ser de instalação abrupta, e o edema cerebral que geralmente o acompanha provoca também comprometimento da consciência (sonolência ou coma). O AVC hemorrágico (ruptura de pequenas artérias perfurantes com “inundação” de parte do parênquima cerebral) é mais raro, porém mais dramático e de pior prognóstico. A apresentação clínica é semelhante à do AVC isquêmico, porém, como o edema cerebral é mais intenso, há maior comprometimento da consciência (coma profundo) e de funções cerebrais vitais, como o centro respiratório e o controle da pressão arterial, que fica mais instável. Já o AVC do tipo lacunar, cuja ocorrência é quase exclusiva de indivíduos hipertensos, devese ao rompimento ou obstrução de vasos muito pequenos formando “lacunas” no parênquima cerebral, cujas conseqüências são mais tardias à medida que vários deles se sucedem. Na fase aguda pode simular um episódio isquêmico transitório. Chamamos de episódio isquêmico transitório (EIT) o comprometimento parcial ou total da função motora unilateral e/ou da fala que apresente recuperação completa (ou quase completa) em horas ou em poucos dias. Acredita-se que ocorram pela formação de “êmbolos” plaquetários que reduzem a irrigação cerebral temporariamente e, a seguir, se desfazem. Os episódios isquêmicos transitórios são indicativos de grave comprometimento da circulação cerebral e freqüentemente são seguidos por AVC isquêmico. Por isso devem-se utilizar antiadesivos plaquetários nestes casos. Quadros deste tipo podem também corresponder a edema cerebral por hiperfluxo (elevação muito acentuada ou muito abrupta da pressão arterial – encefalopatia hipertensiva), com sofrimento mais intenso de uma área específica do cérebro que melhora após a redução pressórica.
Comprometimento Cardíaco da Hipertensão Arterial O coração pode ser comprometido pela hipertensão em sua função motora, circulação coronária e indução de ar-
748
Hipertensão Arterial Primária
Relação entre a Pressão Arterial e o Fluxo Sanguíneo Cerebral
Normotensos
Fluxo Sanguíneo Cerebral
Hipertensos
5
20
40
60
80
100
120
140
160
180
200
220
Pressão Arterial Média
Fig. 41.8 Esquema da auto-regulação do fluxo sangüíneo para o território cerebral.
ritmias. A resposta da massa muscular cardíaca frente à elevação da pressão sistêmica é a hipertrofia ventricular esquerda (HVE). Esta hipertrofia é do tipo concêntrica, pois o crescimento da massa muscular se faz para o interior do ventrículo esquerdo (VE). Acredita-se que decorra de uma maior carga imposta ao VE (a própria elevação pressórica — fator físico) e também de fatores humorais que estimulam o crescimento e a proliferação das células musculares (angiotensina, catecolaminas e insulina) e de fibroblastos (aldosterona). Embora a HVE seja uma adaptação à elevação da pressão arterial, ela reduz a complacência do VE (prejudicando sua função diastólica) e predispõe à fibrose (e dilatação do VE) e a arritmias. Em repouso o coração do hipertenso com HVE não difere funcionalmente do daqueles sem hipertrofia, porém, em situações em que é solicitado a ter um maior desempenho, sua capacidade máxima de resposta aos estímulos empregados é reduzida. Estudos muito bem controlados mostram que a presença de HVE detectada tanto pelo eletrocardiograma (ECG) como pelo ecocardiograma (mais precoce) constitui-se no maior fator de risco isolado para a ocorrência de complicações cardíacas (infarto do miocárdio, arritmias graves e morte súbita). Do ponto de vista estrutural, a evolução natural da HVE parece ser a fibrose e a dilatação cardíaca, sobrevindo a insuficiência cardíaca. Os sintomas clínicos mais freqüentes e precoces referem-se à insuficiência cardíaca esquerda, que podem progredir para a insuficiência cardíaca congestiva. O edema agudo de pulmão, caso extremo de insuficiência cardíaca, ocorre com maior freqüência em pacientes que já tenham menor reserva cardíaca e que apresentem elevações abruptas da pressão arterial.
A aterosclerose que se instala no território das artérias coronárias tem, na hipertensão, um importante fator de risco. A insuficiência coronária manifesta-se por episódios de angina e infarto do miocárdio. A presença de placas ateroscleróticas instáveis (com lesão endotelial) parece ser o principal fator precipitante da obstrução coronária em hipertensos. Daí o papel protetor de pequenas doses diárias de aspirina (75 a 100 mg) em indivíduos hipertensos. Estudos eletrofisiológicos e a monitorização do ECG por 24 a 48 horas forneceram os subsídios para se demonstrar que as principais arritmias cardíacas que ocorrem em hipertensos estão associadas à HVE. As extra-sístoles ventriculares isoladas são as mais freqüentes. As arritmias ventriculares complexas (duas ou mais extra-sístoles acopladas) predispõem à fibrilação ventricular e conseqüente morte súbita.
Comprometimento Renal da Hipertensão Arterial Para se ter uma idéia da importância deste problema, basta sabermos que perto de 25% dos pacientes que são submetidos à diálise crônica e que necessitam de transplante renal têm como única causa da insuficiência renal a hipertensão arterial. Estes dados adquirem ainda maior importância quando a hipertensão está associada ao diabetes mellitus. A hipertensão arterial compromete principalmente as estruturas vasculares renais (artérias, arteríolas e capilares glomerulares). A instalação de placa aterosclerótica nas artérias renais pode ser complicação e também um agravante da hipertensão que, às vezes, adquire caráter
749
capítulo 41
renovascular (desde que a obstrução seja suficiente para causar isquemia renal). Entretanto, são nas arteríolas e glomérulos que ocorrem as conseqüências mais sérias da hipertensão arterial sobre os rins. A parede das arteríolas renais sofre espessamento das camadas muscular e elástica, reduzindo o fluxo efetivo para as estruturas a jusante. Esta isquemia promove a liberação de renina, agravando ainda mais a hipertensão e comprometendo a filtração glomerular. Do ponto de vista estrutural glomerular, a esclerose progressiva dos glomérulos é um achado característico da hipertensão. O aumento da pressão intraglomerular e o hiperfluxo promovem a esclerose parcial ou total dos glomérulos, por mecanismos não completamente identificados, mas que incluem a formação intra-renal de angiotensina II. A conseqüência das lesões arteriolares e glomerulares é a queda lenta e progressiva da filtração glomerular e a correspondente perda da função renal (insuficiência renal crônica). Este quadro é conhecido como nefrosclerose e costuma acompanhar os casos de hipertensão “benigna”, ou melhor, sem caráter maligno. Na hipertensão maligna, além do quadro anterior, ocorre também necrose fibrinóide das arteríolas, cujo processo de regeneração freqüentemente leva à endarterite proliferativa com caráter obliterante (proliferação em casca de cebola). A elevação extrema da pressão arterial, como ocorre na hipertensão maligna, provoca lesão direta dos capilares glomerulares (ruptura), pois há quebra completa dos mecanismos de proteção renal (auto-regulação). Nestes casos, a insuficiência renal aguda ou a “agudização” de uma insuficiência renal preexistente é comum.
RETINOPATIA HIPERTENSIVA As lesões retinianas provocadas pela hipertensão podem ser de natureza aguda ou crônica. As alterações crônicas são as mais comuns. Correspondem ao comprometimento arteriolar como em qualquer outro território vascular. A arteriolesclerose pode ser visualizada no exame de fundo de olho em diversas fases de seu processo. No início ocorre apenas aumento do reflexo central das arteríolas e tortuosidade. Posteriormente pode ocorrer compressão venosa no local de cruzamento, que é denominado “cruzamento patológico”. Em estágio mais avançado de esclerose as arteríolas podem refletir completamente a luz incidente, conferindo-lhes o aspecto comparável ao “fio de cobre”. Mais tarde, quando ocorre interrupção total do fluxo sanguíneo, suas paredes brilham como “fios de prata”. A elevação abrupta da pressão arterial provoca vasoconstrição generalizada nas arteríolas, reduzindo a relação entre o diâmetro arteríolo-venular (normal 2/3). As lesões de caráter agudo que comprometem o tecido retiniano provocam edema superficial da retina (que se torna mais brilhante) e a formação de exsudatos e hemorragias. A isquemia da camada nervosa da retina forma edema localizado chamado de
“exsudato algodonoso” ou “exsudatos moles”. As hemorragias retinianas são mais freqüentemente vistas junto às arteríolas e significam lesão da parede arteriolar (necrose fibrinóide). Os “exsudatos duros” são vistos como manchas muito refringentes (brilhantes) na retina e correspondem a restos antigos de lipídios provenientes do extravasamento sanguíneo ou transudação. A classificação destes achados está apresentada no exame do fundo de olho (Quadro 41.9). O descolamento da retina e a trombose venosa são complicações infreqüentes da hipertensão arterial.
Comprometimento Arterial Periférico A aterosclerose mais precoce e mais intensa que acompanha a hipertensão arterial leva a obstruções e formação de aneurismas no sistema arterial periférico. O território mais comprometido é aquele compreendido entre a aorta abdominal e as artérias femorais. Porém, obstruções mais distais também ocorrem. Estas lesões são agravadas por outros fatores de risco que estejam associados, tais como fumo, diabetes mellitus, dislipidemia e fatores familiares. As manifestações clínicas mais freqüentes são: claudicação intermitente, trombose arterial de membros inferiores e úlceras cutâneas (extremidades). O aneurisma dissecante da aorta, presente quase exclusivamente em hipertensos, é uma emergência. Nestes casos, a redução da pressão arterial é indispensável para interromper a dissecção da parede da aorta.
Pontos-chave: • A presença de HVE detectada tanto pelo eletrocardiograma (ECG) como pelo ecocardiograma (mais precoce) constitui-se no maior fator de risco isolado para a ocorrência de complicações cardíacas (infarto do miocárdio, arritmias graves e morte súbita) • As principais arritmias cardíacas que ocorrem em hipertensos estão associadas à HVE • Cerca de 25% dos pacientes que são submetidos à diálise crônica e que necessitam de transplante renal têm como única causa da insuficiência renal a hipertensão arterial
CLASSIFICAÇÃO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL Existem muitas classificações da hipertensão arterial. Recentemente, as classificações mais conhecidas e uni-
750
Hipertensão Arterial Primária
versalmente aceitas foram unificadas e correspondem à classificação proposta no VI relatório do Joint National Committee on Detection, Evaluation and Treatment of High Blood Pressure (JNC VI), na última versão das diretrizes da Organização Mundial de Saúde em conjunto com a Sociedade Internacional de Hipertensão e adotada também na IV edição das Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial (ver Quadro 41.7). Esta classificação leva em consideração os níveis de pressão arterial. Porém a decisão terapêutica considera também o grau de comprometimento sistêmico da hipertensão e outros fatores de risco cardiovascular associados (v. Quadro 41.8). Daí a posição da classificação nesta parte do texto e não no ínício, como é habitual. Observe que nesta classificação valorizam-se os níveis pressóricos iguais ou inferiores a 120/80 mmHg, denominando-os como “ótimos”. Ressalta também os valores “normais limítrofes”, chamando nossa atenção para esta condição pré-hipertensiva e obrigando-nos a pensar em prevenção primária da doença. Já a decisão terapêutica baseia-se nos níveis pressóricos e na presença de lesões em órgãos-alvo e de outros fatores de risco cardiovascular associados (v. Quadro 41.8). Desta forma, em indivíduos com hipertensão estágio 1 sem comprometimento sistêmico ou fatores de risco maiores associados, devemos estabelecer medidas terapêuticas nãofarmacológicas por um período de até 12 meses. Se houver fatores de risco maiores associados, como fumo, dislipidemia, idade superior a 60 anos, homens ou mulheres na menopausa ou história familiar de doença cardiovascular precoce em indivíduos com hipertensão estágio 1 (PA
140/90 mmHg), deve-se iniciar com modificações no estilo de vida por um período de até seis meses. Valores pressóricos 160/100 mmHg (estágio 2 ou 3), mesmo que isoladamente, ou hipertensão arterial no estágio 1 acom-
Quadro 41.7 Classificação da pressão arterial para adultos maiores de 18 anos segundo a IV edição das Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial
Categoria Ótima Normal Normal Limítrofe Hipertensão Arterial Estágio 1 (leve) Estágio 2 (moderada) Estágio 3 (grave) Hipertensão Sistólica Isolada
Pressão sistólica (mmHg)
Pressão diastólica (mmHg)
120 130 130-139
80 85 85-89
140-159 160-179
180
140
90-99 100-109
110 90
Notas: 1. Esta mesma classificação é adotada pela Organização Mundial de Saúde, Sociedade Internacional de Hipertensão e VI Joint National Committee (EUA). 2. Quando as pressões sistólica e diastólica estiverem em faixas de valores diferentes, considera-se a mais elevada. 3. Além da classificação em “estágios”, o médico deve registrar se existem outros fatores de riscos para doença cardiovascular, tais como, a idade (60 anos), a ocorrência de doença cardiovascular precoce em familiares diretos, diabetes mellitus, dislipidemia e fumo e a presença de lesões próprias da hipertensão arterial em órgãosalvo como coração, cérebro, rins, grandes artérias e no fundo de olho. Esta especificação é importante para a estratificação do risco e o manuseio clínico-terapêutico.
panhada de lesões em órgãos-alvo indicam o início imediato de medicamentos anti-hipertensivos. Tendo em vista o alto risco de morbidade e mortalidade, a presença de insuficiência cardíaca, insuficiência renal ou a associação com o diabetes mellitus indicam o início imediato do trata-
Quadro 41.8 Decisão terapêutica baseada na estratificação de risco e nos níveis de pressão segundo a IV Edição das Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial Pressão Arterial Normal limítrofe (130-139 / 85-89 mmHg)
Grupo A*
Grupo B**
Grupo C***
Modificações no estilo de vida
Modificações no estilo de vida
Modificações no estilo de vida1
Modificações no estilo de vida (até 12 meses) Terapia Medicamentosa
Modificações no estilo de vida (até 6 meses) Terapia Medicamentosa
Terapia Medicamentosa
Hipertensão leve (estágio 1) (140-159 / 90-99 mmHg) Hipertensão moderada e grave (estágios 2 e 3) ( 160 / 100 mmHg)
Terapia Medicamentosa
*Grupo A Sem fatores de risco e sem lesões em órgãos-alvo. **Grupo B Sem lesões em órgãos-alvo e presença de fatores de risco (fumo, dislipidemia, 60anos, homens ou mulheres na menopausa, história familiar de doença cardiovascular precoce) *** Grupo C Presença de diabetes mellitus ou lesões em órgãos-alvo (coração-HVE, angina ou infarto, revascularização, insuficiência cardíaca; cérebroAVC ou EIT; rins- insuficiência renal ou proteinúria; obstrução arterial periférica ou retinopatia hipertensiva) 1 — Terapia medicamentosa deve ser iniciada de imediato se estiver associado diabetes mellitus, insuficiência cardíaca ou insuficiência renal
capítulo 41
mento com medicamentos, mesmo com valores pressóricos limítrofes ( 130/85 mmHg). O comprometimento sistêmico da hipertensão arterial costuma ser proporcional ao tempo de evolução e aos valores pressóricos. Entretanto, é comum encontrarem-se indivíduos com hipertensão arterial estágio 1 já apresentando lesões em órgãos-alvo.
AVALIAÇÃO CLÍNICA E LABORATORIAL DO PACIENTE HIPERTENSO Na avaliação do paciente com hipertensão arterial três pontos principais devem ser o centro de nossa atenção: 1. Determinar através de história, exame clínico e exames complementares o grau de comprometimento sistêmico que a moléstia possa ter causado; 2. identificar outras doenças e/ou fatores de risco para doenças cardiovasculares que possam estar associados; e, finalmente, 3. identificar os elementos epidemiológicos e clínicos que caracterizam a hipertensão como primária ou secundária, estabelecen-
751
do também os exames necessários para afastar ou confirmar a hipótese eventual de hipertensão secundária. O Quadro 41.9 resume os principais elementos clínicos a serem investigados, enquanto o Quadro 41.10 apresenta a rotina laboratorial que habitualmente solicitamos com esta finalidade. Do ponto de vista clínico, é muito importante ressaltar que na maioria dos indivíduos a hipertensão arterial é absolutamente assintomática. Mesmo aqueles com comprometimento discreto dos órgãos-alvos não procuram o médico por não terem nenhum sintoma que os incomode. Por isso, só a determinação sistemática da pressão arterial irá possibilitar o diagnóstico e o tratamento precoces, evitando suas complicações. Quando fazemos uma observação clínica pormenorizada freqüentemente detectamos, mesmo em indivíduos aparentemente assintomáticos, alguns indícios de comprometimento sistêmico da doença. Observe no Quadro 41.9 os principais pontos a serem investigados na história clínica e no exame físico do paciente hipertenso. Quando estes elementos são sistematicamente pesquisados, teremos, ao final do exame físico, uma idéia bastante precisa do estado clínico do paciente, do grau de com-
Quadro 41.9 Roteiro para a avaliação clínica do paciente com hipertensão arterial HISTÓRIA: Tempo e idade de conhecimento da hipertensão; ganho de peso recente; Queixa de dispnéia, nictúria, edema, palpitação, síncope e dor precordial; Claudicação intermitente ou dor abdominal pós-prandial; Paralisias, dificuldade para andar, alterações visuais (turvação ou borramento); “Crises” de cefaléia, palpitação (taquicardia), palidez e sudorese; História anterior de doença renal ou alterações urinárias: hematúria, disúria, etc.; Outras doenças associadas: diabetes, gota, dislipidemia, bronquite ou asma, alterações hepáticas, gástricas ou intestinais, artrites, anemia, enxaqueca; Antecedentes familiares de hipertensão, acidente vascular cerebral, infarto do miocárdio, diabetes, amputações; Idade e causa de falecimento dos pais e/ou irmãos (caso tenha ocorrido); Hábitos pessoais: Fumo (tempo e quantidade), etilismo (tempo e quantidade); exercícios (tipo, tempo e freqüência), lazer habitual (regularidade); Hábitos alimentares (sal, carboidratos, gorduras, proteínas e vegetais); Medicação em uso: anticoncepcionais, antiinflamatórios, corticóides, antidepressivos; Medicação anti-hipertensiva em uso, regularidade e adesão ao tratamento. EXAME FÍSICO: Idade, sexo, grupo étnico, peso, altura, índice de massa corporal, relação da circunferência cintura/ quadril, pele e mucosas (anemia?); Pressão arterial (realizar de 2 ou 3 determinações) após 5 a 10 minutos de repouso deitado (ou sentado) e na posição ortostática; Exame cardiovascular completo: Estase jugular?, características do ictus cordis, freqüência cardíaca, presença de 3.ª ou 4.ª bulha, arritmias, intensidade dos ruídos (A2 ou M1 hiperfonéticos?), sopros?, ausculta pulmonar (estertores de bases?), palpação comparativa de todos os pulsos — há alterações? Abdome: Presença de hepatomegalia? sopros ou tumorações pulsáteis?, massas renais palpáveis? Extremidades: Edema, lesões tróficas de pele, alterações ungueais, outros sinais de isquemia? EXAME DO FUNDO DE OLHO: Observar e descrever com detalhes as papilas, vasos retinianos, aspecto e alterações retinianas. Classificação de Keith-Wagener: Grau 0 — Fundo de olho normal Grau 1 — Esclerose arteriolar discreta (tortuosidade e brilho central das arteríolas aumentado e relação A/V 2/3) Grau 2 — Esclerose arteriolar grave (cruzamentos patológicos, arteríola em “fio de cobre” ou “fio de prata”) e lesões retinianas antigas (exsudatos duros — brilhantes) Grau 3 — Anteriores lesões recentes: Exsudatos algodonosos e hemorragias Grau 4 — Anteriores edema de papila (hipertensão intracraniana)
752
Hipertensão Arterial Primária
Quadro 41.10 Roteiro para a avaliação laboratorial do paciente hipertenso Hemograma (quando se suspeita de anemia) Glicemia de jejum (diabetes mellitus?) Creatinina (insuficiência renal?) Urina I (doença renal prévia ou lesão pela hipertensão: proteinúria e/ou hematúria?) Potássio (hipopotassemia: diurético, hiperaldosteronismo ou hiperpotassemia: insuficiência renal) Ácido úrico (gota, marcador de risco?) Colesterol total (quando disponível: LDL-colesterol e HDL-colesterol) — dislipemia? Triglicerídeos (dislipidemia?) RX de tórax (aorta, área cardíaca e estase pulmonar) Eletrocardiograma (arritmias, HVE, bloqueios, alterações da repolarização ventricular) Ecocardiograma (quando disponível: HVE, disfunção diastólica ou sistólica, dilatação) Ultra-sonografia renal (somente em casos de suspeita de doença renal) Metanefrina urinária (somente em caso de suspeita de feocromocitoma) Teste de captopril (somente em caso de suspeita de hipertensão renovascular) Aldosterona e renina (somente em caso de suspeita de hiperaldosteronismo)
prometimento sistêmico e se há indícios de que a hipertensão possa ser primária ou secundária. Indivíduos com hipertensão arterial primária ou essencial freqüentemente apresentam antecedentes familiares de hipertensão e/ou de doenças cardiovasculares, encontram-se na faixa etária mais prevalente e não costumam apresentar sinais ou sintomas clínicos de quaisquer doenças que possam causar a hipertensão. O exame de fundo de olho é um importante subsídio para a avaliação do comprometimento vascular periférico, da gravidade e da duração da hipertensão. Segundo a classificação de Keith-Wagener (v. Quadro 41.9), a presença de alterações de grau 1 ou grau 2 indicam a duração e a gravidade anterior da hipertensão (esclerose arteriolar), enquanto as de graus 3 e 4 nos dizem se há ou não lesões sugestivas de agravo recente da hipertensão (exsudatos, hemorragias e edema de papila). O conhecimento dos hábitos pessoais (alimentares, fumo, álcool, regularidade com que faz exercícios, etc.) irá nos fornecer elementos para a orientação e posterior tratamento do paciente. A presença de sinais e sintomas sugestivos de comprometimento sistêmico (insuficiência cardíaca, renal, coronária, vascular cerebral ou periférica) nos orientará na estratégia de tratamento. Alguns dos riscos associados à hipertensão que também poderão influenciar na maneira de tratarmos cada indivíduo só serão conhecidos após a realização da rotina laboratorial proposta no Quadro 41.10. Quaisquer desvios nestes exames que venham significar risco adicional devem ser levados em conta. Não basta simplesmente controlar a pressão arterial, é preciso ter conhecimento dos fatores de risco associados e combatêlos em sua totalidade. Todo médico deve saber como fazêlo. O pior que pode acontecer a um paciente hipertenso com vários riscos associados é ter que freqüentar três ou quatro “especialistas” para se “tratar”. Invariavelmente acabará ficando entre orientações contraditórias, aumentando sua ansiedade e insatisfação e abandonando o trata-
mento. É preferível que os colegas discutam entre si e apenas um médico seja responsável pelo paciente, colocando-se à disposição sempre que qualquer orientação se faça necessária. Mas, para isso, é preciso que o médico esteja preparado. A associação da hipertensão arterial com quaisquer outros fatores de risco, tais como diabetes mellitus, dislipidemia, fumo e HVE, aumenta assustadoramente a probabilidade de ocorrência de complicações cardiovasculares. Por isso, é essencial que saibamos como manipular estas associações minimizando seus efeitos. É fundamental que o médico se esforce no sentido de informar e orientar o paciente quanto aos riscos da própria hipertensão e também de outras condições clínicas que possam estar associadas, e não apenas reduzir sua pressão com um medicamento qualquer e considerar sua tarefa realizada. Com relação especificamente aos medicamentos antihipertensivos, o clínico deve saber que muitos deles podem interferir nos fatores de risco de caráter metabólico de forma favorável (melhorando) ou desfavorável (veja os capítulos específicos sobre diuréticos e drogas anti-hipertensivas). No final do Quadro 41.10 são também listados alguns exames que fazem parte da rotina diagnóstica das causas mais freqüentes de hipertensão secundária. Maiores detalhes sobre estas rotinas estão contidos no item Etiologia da hipertensão arterial (v. anteriormente) e nos dois capítulos subseqüentes.
EMERGÊNCIAS HIPERTENSIVAS O Quadro 41.11 lista as principais condições clínicas que devem ser consideradas como crises hipertensivas, que é a denominação genérica dada à elevação rápida e sintomática da pressão arterial, que cursa com risco de deterioração aguda dos órgãos-alvo e, conseqüentemente, risco de vida imediato ou potencial.
753
capítulo 41
Quadro 41.11 Emergências hipertensivas 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11.
Encefalopatia Hipertensiva Hipertensão Arterial Maligna Acidente Vascular Cerebral com Hipertensão Grave Hemorragia Cerebral Edema Agudo de Pulmão Infarto do Miocárdio com Hipertensão Grave Aneurisma Dissecante de Aorta Crise de Feocromocitoma Glomerulonefrite Aguda Uso de Drogas Simpatomiméticas (cocaína) Hipertensão Grave Associada a Condições Cirúrgicas (pré- e pós-operatório) 12. Eclâmpsia ou Eclâmpsia Iminente
A primeira conduta frente a um paciente com níveis pressóricos muito elevados é descartar pseudocrise hipertensiva, ou seja, há hipertensão arterial grave (PAD 120 mmHg), geralmente desencadeada por dor, desconforto, ansiedade ou abandono do tratamento. Nestas circunstâncias não há sinais de lesões agudas em órgãos-alvo e o tratamento deve ser feito apenas com sintomáticos e medicação de uso crônico, com seguimento ambulatorial. De acordo com o I Encontro Multicêntrico Sobre Crises Hipertensivas, as emergências são aquelas com risco iminente de morte ou deterioração rápida da função dos órgãos-alvo, que requerem redução imediata da pressão arterial em minutos, ou em algumas horas, diferentemente das urgências hipertensivas, onde o risco de morte ou de lesão funcional rápida é remoto, e devemos reduzir a pressão de forma mais lenta e gradual, em cerca de 24 horas. Na prática clínica são freqüentes as dúvidas nas caracterizações de uma ou outra situação, devendo o médico ser cuidadoso e proceder a inúmeras avaliações posteriores à inicial para um melhor atendimento ao paciente. Não é o objetivo deste texto discorrer sobre uso e doses de medicamentos para cada caso específico, mas sim chamar a atenção para algumas peculiaridades clínicas destas emergências. Em muitas delas, a simples redução da pressão arterial com drogas de ação rápida é suficiente para retirar o indivíduo do quadro de emergência, como por exemplo a encefalopatia hipertensiva, hipertensão maligna com papiledema, hemorragias cerebrais, dissecção aguda de aorta, edema agudo pulmonar hipertensivo, infarto agudo do miocárdio com hipertensão, crise de feocromocitoma, eclampsia e crises adrenérgicas por overdose de drogas ilícitas. É fato que em todos esses casos a pressão arterial precisa ser reduzida, porém de forma cuidadosa, para que não se provoque hipofluxo sangüíneo para territórios nobres. A redução inicial não deve ser superior a 20 ou 25% dos níveis da pressão arterial média. Um critério prático e seguro é não reduzir de imediato os níveis tensionais diastólicos para valores inferiores a 100 ou 110 mmHg. Des-
te modo podemos evitar complicações sérias em pacientes com hipertensão grave, por quebra da auto-regulação em órgãos vitais como coração, cérebro e rins. Convém lembrar que o indivíduo com hipertensão grave apresenta desvio para a direita da curva de auto-regulação da perfusão tecidual devido às modificações estruturais impostas pela doença ao sistema vascular e que a diminuição pressórica abrupta e intensa pode ser mais deletéria do que a própria hipertensão. São aspectos de extrema relevância, que devem ser considerados: idade, presença de vasculopatias, estados de hipovolemia, medicações em uso, associação de co-morbidades, entre outros. Nas emergências devemos sempre utilizar drogas injetáveis, se possível com bombas de infusão contínua em ambiente hospitalar apropriado. O paciente deve ser avaliado clinicamente através de anamnese e exame físico completos, incluindo fundoscopia. São considerados exames complementares indispensáveis inicialmente: urina tipo I, glicemia, sódio, potássio, creatinina, hematócrito, hemoglobina, radiografia de tórax e eletrocardiograma.
PREVENÇÃO PRIMÁRIA E TRATAMENTO NÃO-FARMACOLÓGICO DA HIPERTENSÃO ARTERIAL A forma mais correta e efetiva de se controlar qualquer doença é a prevenção primária, ou seja, combatê-la antes que apareça. Em relação à hipertensão, a prevenção primária pode ser feita através de estratégias populacionais e individuais. As estratégias populacionais incluem campanhas de esclarecimento nos grandes meios de comunicação, formação de professores que transmitam desde os bancos escolares do primeiro grau noções higieno-dietéticas e de saúde, envolvimento da classe médica nesta tarefa. Em resumo, medidas que possam ter grande abrangência populacional. Existe um objetivo teoricamente atingível que é alcançar o comportamento pressórico observado em populações isoladas onde a pressão arterial, ao contrário do que é visto em todo o mundo “ocidentalizado”, não se eleva com a idade. Este fenômeno não parece ser um mero produto do envelhecimento, mas deve estar relacionado às condições gerais de vida, à ingesta de sódio muitas vezes acima das necessidades diárias, à obesidade, à inatividade física, ao excesso de ingestão alcoólica e outros. Do ponto de vista individual, a estratégia deve abranger os grupos considerados de risco para desenvolver hipertensão. São eles: indivíduos com níveis pressóricos situados na faixa considerada normal limítrofe (pressão sistólica entre 130 e 139 e diastólica entre 85 e 89), estes têm 3 a 4 vezes mais chance de se tornarem hipertensos em futuro próximo; indivíduos obesos; com antecedentes fami-
754
Hipertensão Arterial Primária
liares de hipertensão e doenças cardiovasculares precoces; negros e mulatos; indivíduos com vida sedentária e os consumidores de sal e álcool em excesso. Promover mudanças nos hábitos de vida realmente não é tarefa fácil, porém, apenas para se ter uma idéia do impacto de medidas deste tipo, se toda a população tivesse uma redução pressórica de apenas 2 mmHg, isto iria significar a redução de 5 a 6% na mortalidade anual por doenças cardiovasculares. A prevenção secundária procura minimizar as conseqüências da doença já instalada, ou seja, tudo de que tratamos neste capítulo. No sentido da prevenção secundária, nós, médicos, e a “Saúde Pública” temos ainda uma tarefa árdua pela frente, pois menos de 50% dos indivíduos hipertensos têm conhecimento da doença. Mesmo sendo assintomática, é inadmissível que uma doença cujo diagnóstico seja tão fácil escape entre nossos dedos, ou melhor, escape de nossas “consultas”. Toda consulta médica, de qualquer “especialidade”, deve incluir a determinação da pressão arterial.
Tratamento Não-farmacológico da Hipertensão As medidas não-farmacológicas destinadas a reduzir a pressão arterial correspondem fundamentalmente a mudanças no estilo de vida. O Quadro 41.12 resume as medidas comprovadamente eficazes e as de eficácia discutível. Entre as do primeiro grupo, a redução de peso nos hipertensos obesos tem sido demonstrada como a de maior impacto. De uma forma grosseira, poderíamos dizer que para cada quilograma de peso perdido ocorrerá a redução de 1 mmHg na pressão sistólica e diastólica. A redução de peso é conseguida através de dietas com reduzido teor
Quadro 41.12 Tratamento não-farmacológico da hipertensão arterial MEDIDAS COMPROVADAMENTE EFICAZES — Redução do peso — Redução do sódio e aumento do potássio na dieta — Redução da ingesta de álcool — Atividade física regular — Interrupção do fumo — Evitar o uso de medicamentos potencialmente hipertensores MEDIDAS DE EFICÁCIA DISCUTÍVEL — Controle do estresse — Suplementação de cálcio — Suplementação de magnésio — Dieta rica em fibras — Dieta rica em óleo de peixe
calórico (pobres em carboidratos e gorduras) e rica em fibras e vegetais. O exercício físico regular, além de contribuir por si só para reduzir a pressão, auxilia a perder peso. A redução do sódio e o aumento do potássio na dieta devem ser recomendados a todos os hipertensos. O limite máximo de ingestão de sal recomendado é de 6 gramas por dia. Porém, está demonstrado em diferentes populações que quanto menor a ingestão de sódio, menor é o incremento pressórico anual. Publicações recentes também sugerem que reduções na ingestão de sal para próximo de 4 g/dia são ainda mais efetivas em reduzir a PA de indivíduos hipertensos e normotensos. Do ponto de vista prático, o paciente deve saber que a alimentação em sua forma natural já contém aproximadamente dois gramas de sal, suficientes para suas necessidades diárias. Se todo alimento fosse preparado sem sal, poder-se-iam adicionar a ele até 4 gramas de sal por dia (2 colheres das de café rasas de sal). Como é muito difícil conseguir tal empenho, todos os dias, do paciente e de sua família, recomendamos que o hipertenso evite alimentos que contenham sal em excesso (industrializados, embutidos, salgadinhos tipo chips, amendoim, etc.) e que, progressivamente, vá retirando o sal de sua alimentação. Esta é a maneira mais fácil de o hipertenso e sua família adaptarem-se à baixa ingestão de sódio, conseguindo-se maior adesão. Lembre-os de que, sendo a hipertensão uma doença familiar, estarão fazendo prevenção primária em relação aos seus filhos e a outros membros da família que sejam normotensos. O aumento na ingesta de potássio é alcançado com consumo de frutas e verduras frescas. A substituição do cloreto de sódio pela mistura de cloreto de sódio e cloreto de potássio, conhecido como “sal diet” ou “sal light” pode ser benéfica nos indivíduos com função renal normal, pois diminui a ingesta de sódio e aumenta o aporte de potássio. O consumo exagerado de álcool deve ser evitado, porém, a ingestão de até 30 ml de álcool etílico por dia (duas doses de destilados) parece ter um papel protetor sobre o sistema cardiovascular, não interfere na ação dos medicamentos anti-hipertensivos e facilita a integração do hipertenso ao seu meio social. O exercício físico aeróbico ou isotônico regular é capaz de reduzir a pressão arterial. Tais exercícios devem ser realizados pelo menos três vezes por semana por um período mínimo de 40 minutos. Andar, correr, nadar, andar de bicicleta e praticar esportes coletivos (futebol, basquete, etc.) são altamente recomendáveis. Pacientes com suspeita de doença coronária ou com idade superior a 50 anos devem ser, preliminarmente, submetidos a teste ergométrico. Caso contrário, devem apenas andar. Os exercícios chamados isométricos, ou seja, que desenvolvem grande força muscular sem movimentação dos membros (por exemplo, halteres) elevam a pressão sistólica e diastólica, não sendo os mais recomendados. A interrupção do fumo é fundamental para que se consiga o pleno efeito das outras medidas destinadas a con-
755
capítulo 41
trolar a pressão e a impedir a progressão da aterosclerose. Mesmo o efeito de medicamentos não é máximo se o indivíduo não deixar de fumar. Evitar o uso de medicamentos potencialmente capazes de elevar a pressão arterial é uma medida óbvia. O médico deve discutir com a paciente hipertensa em idade fértil que esteja deixando de usar a pílula anticoncepcional a adoção de um método contraceptivo seguro para se evitar uma gestação indesejável. Os antiinflamatórios não-hormonais só devem ser usados em casos de indicação absoluta. Já os analgésicos comuns, como a dipirona e o acetaminofen, podem ser utilizados sem riscos. A aspirina em dose suficiente apenas para funcionar como antiagregante plaquetário (75 a 100 mg/dia) pode ser utilizada sem riscos. Em doses analgésicas (500 mg ou superiores), produz os mesmos efeitos dos antiinflamatórios sobre o sistema das prostaglandinas e, portanto, deve ser evitada. Como já foi dito anteriormente, controlar o estresse requer interação extremamente complexa e demorada com o paciente e os resultados não são universalmente aceitos como benéficos. O médico, porém, deve envolver-se com o paciente buscando sua cura. Habitualmente recomendase que o paciente não tenha vida tão cheia de afazeres, não imponha a si próprio objetivos impossíveis ou muito difíceis de serem alcançados, tenha momentos de lazer e de relaxamento regularmente e faça exercícios relaxantes. Ansiolíticos não agem como anti-hipertensivos e, em muitos, podem causar depressão reativa. Por isso só devem ser usados com indicação precisa. A suplementação de alguns eletrólitos como sais de cálcio e magnésio, embora possa ter um certo respaldo teórico para sua utilização, na prática tem-se mostrado pouco efetiva. Já as dietas ricas em fibras vegetais, farelo de trigo e de aveia, contribuem para redução do peso e do colesterol sanguíneo, auxiliando também na regularização do ritmo intestinal. Porém, seu efeito em reduzir a pressão arterial não foi comprovado. Muitos casos de hipertensão leve (estágio 1) e moderada (estágio 2 — pressão diastólica 110 mmHg) podem ser controlados apenas com estas medidas não-farmacológicas. Desde que não haja indicação clínica para se instituir o tratamento medicamentoso de imediato (comprometimento de órgãosalvos ou outros fatores de risco associados), o médico e o indivíduo hipertenso devem ser pacientes para aguardar o melhor efeito desta abordagem não-farmacológica multifatorial. Freqüentemente o efeito máximo destas medidas que alteram os hábitos de vida só ocorrerá meses após a sua instituição. Lembre-se: com esta abordagem você estará tratando a causa e não apenas o efeito (pressão elevada). O risco, quase invariavelmente, não está só na pressão arterial elevada. Cabe ao médico orientar e tranqüilizar o paciente e não se contentarem, ambos, com um número pressórico inferior ao inicial tão-somente à custa de medicamentos. Como se verá mais adiante neste livro, temos hoje à disposição uma série enorme de drogas anti-hipertensivas muito potentes com diferentes mecanismos de ação, porém com efeitos colaterais
os mais diversos. Ainda que uma ou mais drogas anti-hipertensivas venham a ser necessárias ao tratamento, estas devem ser usadas em associação com as medidas não-farmacológicas, pois certamente irão potencializar suas ações.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ALDERMAN, M.H. Non-pharmacological treatment of hypertension. Lancet, 344:307-311, 1994. ALDERMAN, M.H e cols. Distribution and determinants of cardiovascular events during 20 years of successful antihypertensive treatment. J. Hypertens., 16:761-769, 1998. ALMEIDA, F.A. e cols. Malignant hypertension: A syndrome associated with low plasma kininogen and kinin potentiating factor. Hypertension, 3 (supplII):II – 46-II – 49, 1981. ALMEIDA, F.A. Fator natriurético atrial na hipertensão arterial. In: Atualidades em Nefrologia, Vol. 2. eds: Cruz, J.; David Neto, E.; Burdmann, E.A.; Alves, M.A.V.F.R.; Salgado Filho, N.; Magalhães, R.L.; Barros, R.T. Sarvier, São Paulo, 1992, pp. 49-58. Australian National Health and Medical Research Council Dietary Salt Study Management Committee. Fall in blood pressure with modest reduction in dietary salt intake in mild hypertension. Lancet, i:399-402, 1989. BURT, V.L. e cols. Trends in the prevalence, awareness, treatment, and control of hypertension in the US population: data from health examination surveys, 1960 to 1991. Hypertension, 26: 60-69, 1995. COLLINS, R. e cols. Blood pressure, stroke, and coronary heart disease: part 2, short-term reductions in blood pressure: overview of randomized drug trials in their epidemiologic context. Lancet, 335:827-38, 1990. D’ÁVILA, R. e cols. Sobrevida de pacientes renais crônicos em diálise peritoneal e hemodiálise. J. Bras. Nefrol., 21:13-21, 1999. III Diretrizes para uso da monitorização ambulatorial da pressão arterial. I Diretrizes para uso da monitorização residencial da pressão arterial. Hipertensão, 4:6-19, 2001. IV Diretrizes Brasileiras sobre Hipertensão Arterial. Sociedade Brasileira de Hipertensão, Sociedade Brasileira de Nefrologia e Sociedade Brasileira de Cardiologia. Campos do Jordão, 2002. DOLLERY, C. e BRENNAN, P.J. The Medical Research Council Hypertension Trial: The smoking patients. Am. Heart J., 115:276-281, 1988. DOUGLAS, W.W. Polypeptides — angiotensin, plasma kinins, and others. The Farmacological Basis of Therapeutics. Gilman, A.G.; Goodman, L.S.; Rall, T.W. e Murad, F. (eds). Macmillan Publishing Company, New York, 1985, Cap 27, pp. 639-659. I Encontro Multicêntrico Sobre Crises Hipertensivas. Relatório e Recomendações. Hipertensão, 4:23-41, 2001. FACCHINI, F.S. e cols. Insulin resistance and cigarette smoking. Lancet, 339:1128-1130, 1992. FRANKLIN, S.S. e cols. Is pulse pressure useful in predicting risk for coronary heart disease? The Framingham Heart Study. Circulation, 100:354-360, 1999. Guidelines Subcommittee, World Health Organization—International Society of Hypertension Guidelines for the management of hypertension. J. Hypertens., 17:151-183, 1999. HALL, J.E. e cols. Resistance to metabolic actions of insulin and its role in hypertension. Am. J. Hypertens., 7:772-788, 1994. HAFFNER, S.M. e cols. Prospective analysis of the insulin-resistance syndrome (Syndrome X). Diabetes, 41:715-722, 1992. HOLZGREVE, H. Die Frühbehandlung der leichten Hypertonie. Internist, 14:313, 1973. INTERSALT Cooperative Research Group. An international study of electrolyte excretion and blood pressure: results for 24 hours urinary sodium and potassium excretion. Br. Med. J., 297:319-328, 1988. KAPLAN, N.M. Management of hypertensive emergencies. Lancet, 344:1335-1338, 1994. LARAGH, J.H. e BRENNER, B.M. Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis, and Management, 2nd ed. New York, Raven Press, 1995.
756
Hipertensão Arterial Primária
MacGREGOR, G.A. e cols. Double-blind study of three sodium intakes and long-term effects of sodium restriction in essential hypertension. Lancet, ii:1244-1247, 1989. MacMAHON, S. e cols. Blood pressure, stroke, and coronary heart disease. Part 1, prolonged differences in blood pressure: prospective observational studies corrected for the regression dilution bias. Lancet, 335:765-774,1990. MONCADA, S. e cols. Prostaglandins, prostacyclin, tromboxane A2, and leukotrienes. The Farmacological Basis of Therapeutics. Gilman, A.G.; Goodman, L.S.; Rall, T.W. e Murad, F. (eds). Macmillan Publishing Company, New York, 1985, Cap. 28, pp. 660-673. National High Blood Pressure Education Program Working Group report on primary prevention of hypertension. Arch. Intern. Med., 153:186208, 1993. National High Blood Pressure Education Program Working Group report on hypertension in diabetes. Hypertension, 23:145-158, 1994. NEATON, J.D. e WENTWORTH, D. Serum cholesterol, blood pressure, cigarette smoking, and death from coronary heart disease: overall findings and differences by ages for 316 099 white men: Multiple Risk Factor Intervention Trial (MRFIT). Arch. Intern. Med., 152:56-64, 1992. OLIVER, W.J. COHEN, E.L., NEEL, J.V. e col. Blood pressure, sodium intake, and sodion related hormones in the Yanomano indians, a “nosalt” culture. Circulation, 52:146-151, 1975. PANZA, J.A. e cols. Role of endothelium-derived nitric oxide in the abnormal endothelium-dependent vascular relaxation of patients with essential hypertension. Circulation, 87:1468-1474, 1993. PICKERING, T.G. Blood pressure measurement and detection of hypertension. Lancet, 344:31-35, 1994. REAVEN, G.M. Role of insulin-resistance in human disease. Diabetes, 37:1595-1607, 1988.
SACKS, F.M. e cols. Effects on blood pressure of reduced dietary sodium and the dietary approaches to stop hypertension (DASH) diet. N. Engl. J. Med., 344:3-10, 2001. SEALS, D.R. e HAGBERG, J.M. The effect of exercise training on human hypertension: a review. Med. Sci. Sports Exerc., 16:207-215, 1984. STOKES III, J. e cols. Blood pressure as a risk factor for cardiovascular disease. The Framingham Study — 30 years of follow-up. Hypertension, 13(suppl I):I–13-I—18, 1989. The Sixth Report of the Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure. Arch. Intern. Med., 157:2413-46, 1997. VASAN, R.S. e cols. Impact of high-normal blood pressure on the risk of cardiovascular disease. N. Engl. J. Med., 345: 1291-1297, 2001. WHELTON, P.K. e KLAG, M.J. Hypertension as a risk factor for renal disease. Review of clinical and epidemiological evidence. Hypertension, 13(suppl I):I—19-I—27, 1989. WYLSON, P.W.F. Established risk factors and coronary artery disease: The Framingham Study. Am. J. Hypertens., 7:7S-12S, 1994.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.sbh.org.br — Sociedade Brasileira de Hipertensão. http://www.ash.org — American Society of Hypertension. http://www.usrds.org — United States Renal Data System – Dados sobre diálise e transplante renal nos EUA. http://www.amedeo.com/ — Literatura médica e caminhos para PUBMED e MEDLINE. Há necessidade de registro.
Capítulo
42
Hipertensão Renovascular Décio Mion Jr., Luiz A. Bortolotto, José N. Praxedes e Antonio Marmo Lucon
DEFINIÇÃO
TRATAMENTO
EPIDEMIOLOGIA
TRATAMENTO CIRÚRGICO
FISIOPATOGÊNESE
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
DIAGNÓSTICO
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
DEFINIÇÃO Hipertensão renovascular é uma forma de hipertensão secundária à estenose uni- ou bilateral da artéria renal ou de seus ramos principais, desencadeada e mantida por isquemia do tecido renal. A definição de hipertensão renovascular exige a presença de hipertensão arterial e de estenose da artéria renal superior a 70%. No entanto, a lesão da artéria renal nem sempre é causa da hipertensão. Ela pode instalar-se, por exemplo, como uma placa de ateroma na artéria de um paciente previamente hipertenso e não ser hemodinamicamente importante para produzir isquemia renal adicional e gerar hipertensão, mas pode piorar
uma hipertensão previamente de fácil controle e inclusive contribuir para o desenvolvimento de hipertensão acelerada. O esquema da Fig. 42.1 mostra a inter-relação entre estenose da artéria renal, hipertensão arterial e insuficiência renal crônica. A estenose pode ocorrer isoladamente (estenose anatômica de artéria renal isolada) ou em combinação com hipertensão (hipertensão essencial ou renovascular), insuficiência renal (nefropatia isquêmica), ou ambas. Em pacientes com estenose da artéria renal e hipertensão, a revascularização pode melhorar o controle da pressão, ou até mesmo curar a hipertensão, sobretudo em pacientes com fibrodisplasia. Em pacientes com estenose de artéria renal e insuficiência renal crônica, a revascularização pode melhorar ou estabilizar a função renal. Vários estu-
Fig. 42.1 Inter-relação entre estenose de artéria renal (EAR), hipertensão (HA) e insuficiência renal crônica (IRC).
758
Hipertensão Renovascular
dos angiográficos mostram que, em cerca de 30% dos casos, a estenose da artéria renal ocorre em normotensos. Portanto, é importante diferenciar a doença renovascular da hipertensão renovascular. A definição rigorosa de hipertensão renovascular exigiria a presença de três critérios: estenose significativa da artéria renal; hipertensão arterial, e desaparecimento da hipertensão com a correção da lesão. Entretanto, este último critério não é considerado obrigatório para definir a hipertensão renovascular, pois pacientes com estenose da artéria renal aterosclerótica podem ter hipertensão essencial e apresentar piora da hipertensão pela presença de uma estenose da artéria renal superajuntada.
duzindo a pressão de perfusão e o fluxo sanguíneo renal. A principal causa de doença intrínseca da artéria é a placa de ateroma, seguida dos diferentes tipos de fibrodisplasia, principalmente da camada média (Quadro 42.1). Em nosso meio se verifica também elevada prevalência de lesões por arterite de Takayasu. Além das lesões estenosantes, os aneurismas e as fístulas arteriovenosas podem, raramente, produzir isquemia renal e gerar hipertensão renovascular devido a fenômenos de turbulência ou roubo de fluxo. Lesões extrínsecas tais como tumores, fibrose, hematomas, gânglios etc. também podem, raramente, por compressão, gerar isquemia renal e hipertensão renovascular.
FISIOPATOGÊNESE
EPIDEMIOLOGIA Prevalência. A hipertensão renovascular acomete cerca de 1% da população de pacientes hipertensos. É considerada a segunda causa mais freqüente de hipertensão secundária, sendo menos freqüente que as doenças parenquimatosas. A incidência é mais elevada, atingindo até 10%, em hipertensos malignos ou resistentes ao tratamento e baixa, cerca de 0,25%, em hipertensos de raça negra. Nos diabéticos é muito maior a incidência de doença renovascular do que a de hipertensão renovascular. Avaliação recente baseada em estudos de necrópsia e achado concomitante em arteriografias periféricas e angiografias coronarianas demonstram que efetivamente a doença renovascular é, de fato, subdiagnosticada, podendo atingir 25 a 30% em pacientes hipertensos ateropatas. Causas. Na maioria dos casos a isquemia do tecido renal é ocasionada por doença intrínseca da artéria renal que provoca estenose de uma ou ambas as artérias renais, re-
Trabalhos experimentais mostram que reduções da luz da artéria renal de até 50% não provocam diminuições na pressão de perfusão ou no fluxo sanguíneo renal. Reduções da ordem de 70% induzem diminuições na pressão de perfusão, mas, devido à auto-regulação, não alteram o fluxo sanguíneo. Estenoses que determinem redução da luz arterial de 75 a 80% são consideradas críticas, pois, além de produzirem queda imediata da pressão de perfusão e do fluxo renal, levam a quedas muito acentuadas destes parâmetros quando ocorrem pequenas reduções adicionais da luz da artéria. Os mecanismos que provocam hipertensão arterial quando atingido o nível crítico de estenose que determina isquemia renal ainda não estão totalmente elucidados, apesar do grande número de trabalhos experimentais e clínicos realizados a partir dos estudos pioneiros de Goldblatt e Scott. Do ponto de vista clínico, a dificuldade em estabelecer o mecanismo predominante está na grande
Quadro 42.1 Características clínicas e anatômicas das principais lesões estenosantes da artéria renal Tipo de lesão
Incidência
Idade (anos)
Características anatômicas
História natural
Aterosclerose
68%
50
Proximal Extensão 120 mm
Progressão em 50%. Oclusão total freqüentemente
Displasia fibromuscular da íntima
1-2%
Crianças e adultos jovens
Terço médio de artéria renal e/ou de seus ramos
Progressão na maioria dos casos. Dissecção e trombose freqüentes
Displasia fibromuscular da média
15%
25-30
Terço médio de artéria renal e/ou de seus ramos
Progressão em 33%. Dissecção e trombose raras
Displasia fibromuscular da adventícia
1-2%
15-30
Terço médio ou distal da artéria renal ou de seus ramos
Progressão na maioria dos casos. Dissecção e trombose freqüentes
Arterite
12
8-35
Proximal. Lesões bilaterais e aórticas freqüentes
Trombose freqüente. Dissecção rara
759
capítulo 42
variabilidade de situações determinada por vários fatores, tais como diferentes graus de estenoses, comprometimento renal uni- ou bilateral, presença e intensidade da circulação colateral, presença de lesões concomitantes de ramos segmentares da artéria renal, comprometimento secundário da microcirculação renal e sistêmica e intensidade das alterações do parênquima e da função renal. No entanto, dois mecanismos básicos acionados pela isquemia do parênquima renal interagem, atuando sobre o débito cardíaco e a resistência periférica, gerando e mantendo o estado hipertensivo: a) sistema renina-angiotensina; e b) retenção renal de sódio e água. Atuando paralelamente e modulando estes mecanismos principais estão o hiperaldosteronismo secundário, as prostaciclinas, o tromboxane, o sistema nervoso simpático, o sistema calicreína-cininas, a vasopressina, o fator atrial natriurético e outros. A análise dos mecanismos envolvidos na estenose unilateral envolve três fases de interação dos mecanismos principais, em função da duração e da intensidade da isquemia renal e da hipertensão sistêmica. A fase I ou de hiperatividade do sistema renina-angiotensina ocorre precocemente. Nesta fase, a isquemia renal ou a menor excreção de sódio detectadas por receptores do aparelho justaglomerular e da mácula densa provocam liberação exagerada do lado do rim estenótico, provocando hipertensão sistêmica por vasoconstrição periférica produzida pela angiotensina II. A retenção de sódio ocorrida no rim isquêmico pela ação da aldosterona e do simpático é compensada por maior natriurese pressórica no rim contralateral, que passa a ter sua produção de renina suprimida. Não há, portanto, hipervolemia e a hipertensão se mantém apenas pela hiperatividade do sistema renina-angiotensina no rim isquêmico. Nesta fase, o uso de inibidores da enzima conversora da angiotensina para fins de diagnóstico ou tratamento revela alta sensibilidade e eficácia. A remoção da estenose por angioplastia ou cirurgia resulta no desaparecimento completo e imediato da hipertensão e na cura do paciente. Na fase II, que no modelo experimental em ratos se inicia após o terceiro mês e, no ser humano, aproximadamente entre 3 e 5 anos de instalação da hipertensão, ocorre retenção de sódio e água, levando a hipervolemia, elevação do débito cardíaco e aumento adicional da resistência vascular periférica por vasoconstrição compensatória e aumento da sensibilidade dos vasos à angiotensina II. Esta retenção de sódio e água é conseqüência de alterações microvasculares no rim contralateral produzidas pela hipertensão prolongada, reduzindo a natriuresse pressórica que anteriormente compensava os mecanismos retentores do rim isquêmico. Como conseqüência dessa expansão, há redução acentuada da atividade do sistema renina-angiotensina que, entretanto, pode permanecer inapropriadamente “normal” e não suprimida. Em vista disso, os inibidores da enzima conversora da angiotensina passam a ter baixa sensibilidade diagnóstica e menor eficácia terapêutica. A remoção da estenose resulta em reversão incompleta
e lenta da hipertensão arterial. Finalmente, na fase III a hiperatividade do sistema renina-angiotensina está completamente abolida e os inibidores da enzima conversora da angiotensina perdem sua sensibilidade diagnóstica e eficácia terapêutica. A remoção da estenose resulta em pouco ou nenhum efeito sobre a hipertensão arterial. Nesta fase, instalada de 6 meses a 1 ano no rato e de 8 a 12 anos no ser humano, as alterações microvasculares sistêmicas e renais levam a espessamento da parede e redução da luz das pequenas artérias e arteríolas, que, associados a maior reatividade vasoconstritora por disfunção endotelial, seriam responsáveis pelo aumento mantido e autônomo da resistência vascular periférica e renal, resultando também em retenção renal de sódio e água. Tais alterações podem ter caráter irreversível, perpetuando o estado hipertensivo, mesmo após corrigida a estenose. Na estenose bilateral, assim como na coartação da aorta acima das artérias renais ou na estenose em rim único ou em rim transplantado, a diferença fundamental é que todo o tecido renal está isquêmico e não há natriuresse pressórica compensatória. Assim, já na fase I, ocorre retenção de sódio e água, hipervolemia e supressão do sistema renina-angiotensina. As fases seqüenciais II e III se assemelham às da estenose unilateral. Portanto, na estenose bilateral ocorre uma interação entre a expansão volêmica e a atividade do sistema renina-angiotensina na gênese da hipertensão. Se houver liberação na ingesta de sódio e água predomina a expansão volêmica com supressão do sistema renina-angiotensina. Se houver restrição de sódio ou uso de diuréticos, diminui a expansão e predomina a ativação do sistema renina-angiotensina.
Pontos-chave: • Vários estudos angiográficos mostram que em cerca de 30% dos casos a estenose da artéria renal ocorre em normotensos. Portanto, é importante diferenciar a doença renovascular da hipertensão renovascular • Nos diabéticos é muito maior a incidência de doença renovascular do que a de hipertensão renovascular • Dois mecanismos básicos geram e mantêm o estado hipertensivo: a) sistema reninaangiotensina; e b) retenção renal de sódio e água
DIAGNÓSTICO O diagnóstico da doença renovascular é dado pela demonstração da estenose da artéria renal pela arteriografia intra-arterial. Já os diagnósticos de hipertensão renovas-
760
Hipertensão Renovascular
cular ou nefropatia isquêmica são feitos de forma definitiva pelo resultado de um procedimento bem-sucedido de revascularização renal na pressão arterial ou na função renal. Na detecção dos portadores de doença ou hipertensão renovascular, considerando a baixa prevalência nos hipertensos em geral, o rastreamento dos casos suspeitos deve ser conduzido no sentido de otimizar a relação custo/benefício da investigação. Neste aspecto, dados clínicos obtidos na anamnese e no exame físico devem ser muito valorizados, pois, em conjunto, podem estabelecer índices de suspeição de possíveis portadores que podem indicar e orientar o rastreamento dos casos suspeitos. O Quadro 42.2 resume essa abordagem clínica com sugestões de métodos de rastreamento. Embora seja a arteriografia renal intra-arterial o método diagnóstico de referência, ainda é considerado um exame que envolve riscos por ser invasivo e por utilizar radiocontrastes nefrotóxicos. Por isso, em muitos casos a decisão de realizar a arteriografia é orientada por métodos nãoinvasivos de triagem que ajudam na detecção dos possíveis portadores. Estes métodos se baseiam no rastreamento morfológico da estenose ou nos seus efeitos hemodinâmicos e funcionais. O Quadro 42.3 mostra o potencial diagnóstico des-
tes métodos através de suas sensibilidades e especificidades. A seguir, para fins didáticos, descrevemos alguns destes métodos, com aspectos práticos de realização e interpretação. Atividade da Renina Plasmática (ARP) Periférica. Isoladamente, a medida da atividade da renina plasmática periférica tem baixa sensibilidade e especificidade (Quadro 42.3). São considerados positivos valores acima de 2,8 ng/ml/h em pacientes não recebendo medicação anti-hipertensiva e sem restrição de sódio, sendo a amostra colhida em decúbito horizontal em condições basais (antes de levantar pela manhã) ou após repouso de pelo menos 30 minutos. A seringa e os tubos de coleta devem ser refrigerados, os tubos devem conter anticoagulante (EDTA) e após a coleta a amostra deve ser conservada no gelo e imediatamente centrifugada, a baixa temperatura, em centrífuga refrigerada, para separação do plasma, que será guardado em freezer até o dia da dosagem, que deve ser feita com técnica de radioimunoensaio. Considerando que apenas pouco mais de 50% dos hipertensos renovasculares apresentam ARP periférica elevada, em função das diferentes fases de evolução e pelo comprometimento bilateral, e que, além disso, cerca de 30% dos
Quadro 42.2 Hipertensão renovascular, indicadores clínicos de probabilidade e proposta de investigação Indicadores Clínicos de Probabilidade
Recomendação Acompanhamento clínico. Tratar fatores de risco
Baixa (0,2%) • Hipertensão limítrofe • Leve ou • Moderada não-complicada
Alta (25%) • Hipertensão severa ou refratária com insuficiência renal progressiva • Hipertensão acelerada/maligna • Hipercreatininemia induzida por inibidores de ECA • Assimetria de tamanho ou função renal
• Urografia excretora • Ultra-som com Doppler de artérias renais • Cintilografia renal com captopril • Angiorressonância com gadolínio ou • Tomografia helicoidal
䉱
Estenose de artéria renal evidente ou sugestiva Não compatíveis com estenose de artéria renal 䉱
Média (5% a 15%) • Hipertensão severa ou refratária • Hipertensão recente abaixo dos 30 ou acima dos 50 anos • Presença de sopros abdominais ou lombares • Assimetria de pulsos • Tabagistas, diabéticos ou doença ateromatosa evidente (coronária, carótida, etc.) • Déficit de função renal não definido por outras causas • Disfunção cardíaca congestiva inexplicada • Resposta pressórica exagerada aos IECA
Arteriografia com ou sem intervenção
Adaptado de Mann, S. e Pickering, T.G. (1992) e Safian, R.D. e Textor, S.C. (2001).
761
capítulo 42
Quadro 42.3 Sensibilidade e especificidade dos testes preliminares para detecção de hipertensão renovascular Tipo de Teste Renina periférica Renina periférica estimulada com captopril Urografia excretora seqüenciada Renograma radioisotópico Renograma com captopril Renina de veias renais Ultra-sonografia com Doppler Angiorressonância nuclear magnética Tomografia helicoidal
Sensibilidade (%)
Especificidade (%)
57 73-100 74-100 74 92-94 62-80 90 88 88-99
66 72-100 86-88 77 95-97 60-100 95-97 90 93-98
Adaptado de Pickering, T.G. (1991)
hipertensos essenciais apresentam ARP periférica elevada, desaconselhamos a realização deste teste como triagem. Havendo disponibilidade para dosagem de renina, sugerimos medir a ARP periférica estimulada, que apresenta valor diagnóstico muito maior com baixo custo adicional. ARP Periférica Estimulada. Estimular a renina periférica tem sido uma prática usual para aumentar seu poder diagnóstico. Diversas manobras têm sido tentadas, tais como posição ortostática, deambulação, uso de diuréticos, restrição de sal, etc. Entretanto, os melhores resultados têm sido verificados com a utilização de um inibidor da ECA de ação rápida — o captopril — que, bloqueando a geração de angiotensina II, provoca, através de feedback negativo, acentuada elevação reativa de renina nos portadores de hipertensão renovascular e menor nos hipertensos essenciais, aumentando de maneira considerável o valor diagnóstico da renina periférica, tanto em sensibilidade quanto em especificidade. Na prática, o teste pode ser realizado ambulatorialmente, no consultório ou no próprio laboratório clínico, após uma a três semanas de suspensão dos anti-hipertensivos. Recebido o paciente, ele é colocado deitado e sua pressão arterial é medida imediatamente. Após repouso de 30 minutos, nova medida de pressão arterial é realizada e uma amostra de sangue (colhida em duplicata) é obtida de veia periférica, se possível sem garroteamento durante a coleta. Administra-se, então, 25 mg de captopril por via oral e a seguir a pressão arterial é medida a cada 15 minutos até completar uma hora. Nova amostra de sangue é obtida obedecendo as mesmas técnicas de coleta de renina (tubos refrigerados etc.). A medida de pressão a cada 15 minutos é mantida por mais de 1 hora. Na interpretação, considera-se o valor da queda da pressão arterial diastólica (positivo quando 10 mmHg) que, entretanto, tem baixo valor diagnóstico. Por outro lado, os valores da renina, após a administração do captopril, apresentam alta sensibilidade e especificidade quando obedecidos os seguintes critérios:
1. Valor absoluto da renina estimulada (pós-captopril) ⱖ 12 ng/ml/h. 2. Incremento ⱖ 10 ng/ml/h após a administração do captopril em relação aos valores basais (pré-captopril). 3. Aumento percentual após o captopril, de 150% se renina basal ⬎ 3 ng/ml/h, ou de 400% se renina basal ⱕ 3 ng/ml/h. Se não for possível a retirada de toda a medicação antihipertensiva, o teste pode ser feito na vigência de bloqueadores do cálcio ou simpatolíticos com dieta hipossódica, porém nunca na vigência de inibidores da ECA. Urografia Excretora (UE) Seqüenciada. Apesar de pouco usada atualmente, a UE, quando realizadas imagens seqüenciais nos tempos precoces de um, dois, três e cinco minutos e após o wash-out tardio (20 minutos) com furosemida, apresenta valor diagnóstico superior à renina periférica não estimulada e ao renograma radioisotópico convencional. Considerando-se sua disponibilidade, baixo custo e baixo risco, é um teste de triagem aceitável nos locais que não disponham de métodos mais sofisticados. O procedimento é o mesmo para outras finalidades diagnósticas, recomendando-se, contudo, não desidratar previamente em excesso o paciente para não mascarar assimetrias de concentração do contraste. Estruturalmente, o exame revela assimetrias de tamanho e alterações do parênquima renal e das vias urinárias, diferenciando as causas parenquimatosas (pielonefrite, tuberculose, cálculo renal, hidronefrose etc.) das causas vasculares. Entretanto, são as assimetrias funcionais como o retardo de aparecimento do contraste nos tempos iniciais (um, dois, três e cinco minutos), assim como a hiperconcentração e o retardo de eliminação do contraste nos tempos tardios (20 e 30 minutos), exacerbado pelo wash-out, no lado comprometido, que apresentam maior sensibilidade como critérios de probabilidade de hipertensão renovascular. Sinais específicos, como compressão e irregularidades
762
Hipertensão Renovascular
na via urinária extra-renal (pelve e ureter), provocados por colaterais, embora pouco freqüentes, são de grande especificidade diagnóstica. Renograma Radioisotópico. O renograma radioisotópico, se realizado da maneira convencional, pode revelar assimetria renal morfológica e funcional, observadas como alterações nos tempos máximo e médio (Tmáx e T1/2) da curva de captação da radiação do isótopo indicando dificuldade na chegada e na eliminação do marcador, relacionada com alterações no fluxo, na filtração e na secreção tubular renal. Estas características do exame lhe conferem um valor preditivo de hipertensão renovascular, porém com baixa especificidade na diferenciação com doenças parenquimatosas e obstrução urinária. Entretanto, utilizando-se a inibição da angiotensina II com o captopril, o exame adquire um considerável poder diagnóstico, sendo por isso um método bastante indicado para triagem de hipertensão renovascular devido à sua disponibilidade e à alta sensibilidade e especificidade diagnóstica, além de excelente valor preditivo de resultado terapêutico, com pouca dependência do operador. Tal fato decorre da intensa dependência do rim em relação à angiotensina II na preservação da filtração glomerular em condições de hipofluxo. Graças à vasoconstrição eferente produzida pela angiotensina II, que aumenta a pressão hidrostática no capilar glomerular, reduzida pela estenose, verifica-se uma recuperação, mesmo que parcial, na filtração glomerular com aumento na fração de filtração. Ao se inibir a angiotensina II, reduz-se, acentuadamente, a vasoconstrição eferente, a pressão de ultrafiltração cai e, conseqüentemente, cai também a filtração glomerular. No renograma, estas alterações resultam em uma acentuada diminuição na curva de captação e eliminação renal do marcador. Observam-se, então, alongamentos nos tempos máximo e médio no lado da estenose, enquanto nenhuma redução ocorre no rim normal. Na estenose bilateral, as alterações aparecem em ambos os rins quando comparados os exames com e sem captopril. Na prática, após pelo menos uma semana sem medicação (principalmente os inibidores da ECA e os diuréticos), submete-se o paciente a um renograma convencional e após 48 a 72 horas realiza-se um segundo exame, com o mesmo marcador, uma hora após a ingestão via oral de 25 mg de captopril. A pressão arterial deve ser medida antes da administração do captopril e a cada 15 minutos até o final do exame. A rigor, deve-se preferir como marcador o DTPA (ácido dietileno triaminopentacético) marcado com o isótopo tecnécio-99, pelo fato de que sua eliminação renal se dá, predominantemente, por filtração glomerular. Entretanto, o uso do ortoiodo-hipurato marcado com iodo131, de eliminação renal mista (secreção tubular e filtração glomerular), também fornece bons resultados. Em especial, nos pacientes com função renal reduzida deve-se preferir o ortoiodo-hipurato, cuja fração de extração (60%) é superior ao DTPA (20%).
Como opção ao ortoiodo-hipurato, existe a mercaptoacetilglicina (MAG3), marcada com tecnécio-99, a qual proporciona melhores imagens cintilográficas com menos radiação para o rim, mas com custo mais elevado e menor disponibilidade. Os principais critérios de interpretação do renograma estimulado com captopril são: 1 — Redução da função global ⱖ 20% após captopril (filtração glomerular com DTPA ou fluxo plasmático renal efetivo com ortoiodo-hipurato). 2 — Aumento do tempo máximo (Tmáx) para seis minutos e prolongamento ou abolição da fase excretora no lado da lesão ou bilateralmente em relação ao basal nas estenoses bilaterais. Quanto à função relativa, deve ocorrer uma queda no percentual de função do rim comprometido e aumento da relação rim normal/rim isquêmico acima de 1,5. Ultra-sonografia com Doppler. Este método combina a ultra-sonografia bidimensional com o Doppler pulsado colorido, permitindo visualizar os vasos renais e ao mesmo tempo determinar a curva de velocidade do fluxo sanguíneo e, desta forma, analisar indiretamente alterações hemodinâmicas produzidas por estenoses críticas. Sua aplicação no estudo da artéria renal tem como obstáculos a obesidade e o excesso de gases intestinais, considerando-se a localização retroperitoneal do rim e a abordagem do exame pela face anterior do abdome, que freqüentemente dificultam a identificação e o estudo da artéria renal em toda a sua extensão. Os principais critérios para o diagnóstico de estenose da artéria renal, estudando-se a curva de velocidade do fluxo no tronco da artéria, são: 1 — Pico de velocidade do fluxo renal ⱖ 180 cm/s. 2 — Relação dos picos de velocidade na artéria renal e na aorta (relação AR/Ao) ⱖ 3,0. Utilizando-se estes critérios, é possível identificar uma estenose igual ou superior a 60% com sensibilidade de 88% e especificidade de 95%. Além disso, a ultra-sonografia fornece informações quanto a dimensões, estrutura, alterações de parênquima, hidronefrose e assimetrias renais. Dificuldades para identificar o ponto de estenose na artéria renal e assim avaliar as alterações de velocidade do fluxo renal têm sido responsáveis por resultados falso-negativos que reduzem a sensibilidade do método, tornando-o excessivamente operador-dependente. O Doppler colorido fornece imagens em “mosaico” (mistura de diferentes tonalidades de azul e vermelho) indicativo de fluxo turbulento pós-estenótico e também permite analisar alterações intra-renais do fluxo sanguíneo em artérias segmentares ou interlobares, efetuadas a montante de prováveis estenoses, melhorando a sensibilidade do método. A avaliação do fluxo renal nestes locais permite ainda uma abordagem póstero-lateral, evitando a in-
763
capítulo 42
terferência do excesso de gases intestinais. Os critérios utilizados são: 1 — Tempo de aceleração aumentado (retardo para atingir o pico sistólico de velocidade — fluxo parvus et tardus). 2 — Índice de aceleração diminuído (pico de aceleração inferior a 3 m/s2). Considerando o caráter não-invasivo do método, a nãoutilização de contraste iodado e de radiação, a alta disponibilidade e o custo relativamente baixo, a ultra-sonografia com Doppler realizada por mãos experientes coloca-se como um dos mais convenientes métodos de avaliação preliminar de hipertensão renovascular. Angiorressonância Nuclear Magnética e Tomografia Helicoidal. A angiorressonância é um método eficiente e seguro, já que, sem ser invasivo, pode gerar imagens vasculares bi- e tridimensionais a partir da análise do campo magnético dos prótons móveis do fluxo sanguíneo, sem o uso de contraste iodado ou radiação. Apesar do grande e rápido desenvolvimento técnico observado recentemente, ainda pode apresentar resultados falso-positivos e, mais raramente, falso-negativos. Além disso, ainda há certa dificuldade na avaliação de artérias polares e segmentares. Entretanto, é um método com enorme potencial que vem evoluindo a cada dia, tendo ainda como obstáculo o seu custo elevado como um método de rastreamento, já que a arteriografia intra-arterial segue sendo o “gold-standard” no diagnóstico final. Contudo, na prática temos utilizado a angiografia por ressonância para um diagnóstico preliminar, reservando a angiografia intra-arterial para a confirmação diagnóstica, já em condições de realizar o tratamento endovascular no mesmo procedimento. Quanto à tomografia helicoidal, é um método moderno, não-invasivo, mas que utiliza contraste iodado e radiação (raios X). Produz imagens das artérias renais e de alguns ramos segmentares com boa definição mas não dos ramos menores e do parênquima renal. Estudo recente, utilizando metaanálise, comparou alguns destes métodos mais utilizados, especificamente renina estimulada com captopril, renograma com captopril, ultra-sonografia com Doppler, angiografia por ressonância magnética e angiografia por tomografia helicoidal. Este estudo, analisando a acurácia dos diferentes métodos com curvas ROC (receiver-operating-characteristic) e computando as áreas sob as curvas de cada método, detectou possíveis vantagens dos métodos morfológicos como a angiografia por tomografia helicoidal e por ressonância magnética, seguidas de perto pelos métodos hemodinâmicos (Doppler), vindo depois os métodos funcionais que envolvem a participação do sistema renina-angiotensina, ou seja, renograma com captopril e por último a renina estimulada com captopril. Na prática, entretanto, deve-se levar em conta: o custo, a experiência da equipe ou do profissional e a disponibilida-
de, lembrando que a capacidade diagnóstica aumenta quando se usa mais de um método, o que aumenta também o custo, podendo equivaler a uma arteriografia digital.
Pontos-chave: • O diagnóstico da doença renovascular é dado pela demonstração da estenose da artéria renal pela arteriografia intra-arterial • Os diagnósticos de hipertensão renovascular ou nefropatia isquêmica são feitos de forma definitiva pelo resultado de um procedimento bem-sucedido de revascularização renal na pressão arterial ou na função renal • Apenas pouco mais de 50% dos hipertensos renovasculares apresentam ARP periférica elevada • Cerca de 30% dos hipertensos essenciais apresentam ARP periférica elevada • Renograma radioisotópico assocido à inibição da angiotensina II com o captopril, método bastante indicado para triagem de hipertensão renovascular devido à sua disponibilidade e à alta sensibilidade e especificidade diagnóstica, além de excelente valor preditivo do resultado terapêutico • Arteriografia intra-arterial continua sendo o “gold-standard” no diagnóstico final da estenose da artéria renal
TRATAMENTO Estratégia. Após a identificação da lesão à artéria renal e a comprovação de que é funcionalmente significante, deve-se escolher o tratamento adequado ao caso, dentre os três tipos possíveis: a) clínico-farmacológico; b) angioplastia transluminal percutânea da artéria renal com ou sem implante de stent; e c) revascularização cirúrgica. O tratamento de uma lesão renovascular procura atender a dois objetivos: o controle adequado da pressão arterial e a preservação da função renal. Quanto à hipertensão arterial, pode-se obter a cura do paciente e livrá-lo dos riscos da hipertensão crônica e do uso contínuo de anti-hipertensivos ou pode-se tornar a hipertensão de controle mais fácil com o uso de menor número ou doses de drogas. No que se refere à recuperação da função renal, o resultado pode ser a retirada de um paciente do tratamento dialítico, ou pode ser de menor impacto inicial, melhorando a longo prazo, pelo efeito do controle pressórico na microcircula-
764
Hipertensão Renovascular
ção renal. Tratar a hipertensão renovascular significa, em última análise, remover a isquemia renal pela correção da estenose (revascularização por angioplastia com ou sem stent ou cirurgia) ou pela retirada do tecido renal isquêmico (nefrectomia). Como se trata, em geral, de um procedimento invasivo, é importante que se tenham, além do diagnóstico, informações que permitam estabelecer a relação risco/benefício e decidir a estratégia do tratamento. Então, o conhecimento do grau de estenose, duração e gravidade da hipertensão arterial, tamanho e função residual do rim comprometido e situação do rim contralateral, além do estado de hiperatividade do sistema renina-angiotensina e a situação dos órgãos-alvo, fornecem dados importantes nesta etapa. O tratamento deve ser individualizado com base nos fatores clínicos, tais como idade, etiologia, condições clínicas existentes, o risco envolvido nos procedimentos invasivos e a probabilidade de que a correção da estenose da artéria renal melhore o controle da pressão arterial e a função renal. A etiologia é um dos fatores mais importantes na determinação da resposta ao tratamento intervencionista da hipertensão renovascular. Está bem definido que os pacientes portadores de estenose da artéria por displasia fibromuscular e por arterite da Takayasu devem ser tratados por terapêutica intervencionista, quer seja por tratamento percutâneo ou por revascularização cirúrgica. No caso da displasia fibromuscular os resultados mostram cura ou melhora da hipertensão em cerca de 90% (Quadro 42.4) dos casos com o tratamento intervencionista por cirurgia ou por angioplastia. Em geral, os pacientes com displasia fibromuscular são mais jovens e têm pouco comprometimento dos órgãos-alvo da hipertensão arterial, explicando em parte o resultado satisfatório neste grupo. Os resultados da angioplastia transluminal percutânea nestes pacientes têm sido bons e semelhantes aos obtidos com a revascularização cirúrgica. Desta forma, atualmente, a angioplastia é o tratamento mais indicado para a displasia fibromuscular, sendo reservado o tratamento cirúrgi-
co como primeira escolha apenas para os pacientes com lesões em ramos de artérias renais ou obstrução total de artéria renal, o que corresponde a menos de 10% destes pacientes. O tratamento clínico é indicado apenas quando os procedimentos não são passíveis de serem realizados devido à presença de lesões muito extensas ou quando a estenose atinge ramos intra-hilares dificultando a abordagem. Em contrapartida, em pacientes com estenose da artéria renal por aterosclerose, os resultados do tratamento intervencionista não são tão consistentes quanto os demonstrados em portadores de fibrodisplasia, principalmente se o procedimento for a angioplastia primária: há um baixo índice de cura da hipertensão, um índice de melhora em torno de 50-60% (Quadro 42.4), e uma porcentagem considerável de pacientes não apresenta melhora do controle pressórico ou da função renal. Nestes pacientes, a resposta ao tratamento cirúrgico tem mostrado melhores resultados. No entanto, estes pacientes são em geral mais idosos e com maior prevalência de lesões extra-renais associadas, como carotídeas ou coronarianas, o que tornaria o risco cirúrgico mais elevado. No entanto, a possibilidade de novas técnicas cirúrgicas e a melhor abordagem prévia das lesões extra-renais mudaram a população de pacientes com hipertensão renovascular aterosclerótica submetidos à cirurgia nos últimos 15 anos, incluindo casos mais graves, com doença difusa, estenoses bilaterais, oclusão total de artéria ou uremia. Ao lado disso, nas últimas décadas, com o advento de novas classes de medicamentos anti-hipertensivos, como inibidores de enzima conversora e antagonistas de cálcio, permitiu-se um acompanhamento e seguimento clínico mais adequado e a melhor observação da evolução destes pacientes ateroscleróticos. Recentemente, os resultados do estudo DRASTIC suscitaram grande discussão sobre os benefícios da angioplastia no controle da pressão arterial de pacientes com estenose de artéria renal aterosclerótica. Neste estudo comparativo entre angioplastia e tratamento medicamentoso, demonstrou-se que
Quadro 42.4 Resultados de séries cirúrgicas e de angioplastia para o tratamento de hipertensão renovascular ETIOLOGIA
ATEROSCLEROSE
DISPLASIA FIBROMUSCULAR
Tratamento
Angioplastia
Cirurgia
Angioplastia
Cirurgia
Pacientes (n.º)
391
1.310
175
486
Cura
19
45
50
64 (56-81)
Melhora
52
29
42
23 (5-40)
Falha
30
24
9
11 (0-25)
Resposta da pressão arterial (%)
Adaptado de Hollemberg, N.K. Hypertension: Mechanisms and therapy. In: Atlas of Heart Diseases. 1995, vol. 1, p. 3-14.
765
capítulo 42
a angioplastia não fora mais eficaz que o tratamento medicamentoso anti-hipertensivo isolado após um ano de tratamento. No entanto, os resultados deste estudo não devem desencorajar o procedimento, pois um grupo importante de pacientes considerados previamente para tratamento clínico necessitaram de intervenção por angioplastia no decorrer do estudo, devido a refratariedade ao tratamento clínico, e apresentaram melhor controle após o procedimento, embora não tivessem atingido níveis considerados normais. Assim, o tratamento intervencionista, embora ainda seja o tratamento de escolha na hipertensão renovascular por lesão aterosclerótica, deve ser indicado com mais cautela, levando-se em conta a idade, as lesões ateroscleróticas extra-renais associadas, a dificuldade do controle pressórico e as condições clínicas do paciente. A técnica de revascularização a ser usada depende da presença ou ausência de doença aorto-ilíaca associada. Como vimos anteriomente, a angioplastia primária não apresenta resultados satisfatórios em lesões ateroscleróticas, mas, como será visto adiante, o implante de stent mostra melhores resultados para estenose unilateral não associada a doença de aorta, principalmente nas lesões ostiais. Para os casos complicados de estenose da artéria renal com aneurisma de aorta ou oclusão total da artéria, a revascularização cirúrgica é a mais indicada. Para pacientes com doença renal avançada, a revascularização de ambas as artérias renais ou de uma em pacientes com rim único funcional deve ser considerada, mas a decisão para intervir é fortemente dependente de outras. Sendo assim, a presença de nefropatia diabética grave, proteinúria importante e circulação pobre do córtex renal poderia ser um argumento contra a possibilidade da nefropatia isquêmica ser reversível. Por outro lado, a presença de estenose unilateral e grave insuficiência renal indica doença parenquimatosa avançada e nessa situação o risco da revascularização pode contra-indicar o tratamento intervencionista. Tratamento Clínico. O tratamento clínico continuado tem sido reservado para as situações de controle inicial satisfatório com o tratamento clínico convencional, nos casos de impossibilidade técnica de abordagem por cirurgia, angioplastia ou por stent, quando há alto risco para o procedimento intervencionista, ou pela recusa do paciente. Nestas situações e no período pré-intervenção, a medicação mais efetiva é na maioria das vezes o inibidor de enzima conversora da angiotensina, devendo-se ter cautela em lesões bilaterais da artéria renal, onde o uso crônico deve ser evitado, pois quase sempre há piora reversível da função renal por queda de filtração glomerular produzida pela vasodilatação eferente por inibição da angiotensina II. Os betabloqueadores adrenérgicos, por sua ação inibidora da produção de renina pelas células justaglomerulares, os diuréticos tiazídicos e os antagonistas de canais de cálcio são drogas que podem ser utilizadas e são eficazes no controle da pressão arterial nestes pacientes.
Angioplastia Transluminal Percutânea da Artéria Renal. A técnica de angioplastia da artéria renal foi introduzida por Dotter e Judkins em 1964 e modificada por Gruntzig em 1970. Através da punção da artéria femoral, via de acesso preferencial, introduz-se o cateter para angioplastia com balão inflável de diâmetro igual ao do vaso normal. Recomenda-se que a dilatação do balão seja realizada pelo menos duas vezes durante 2 minutos cada, com pressão intraluminal de 5 a 10 atm., proporcionado distensão de 30% a 60% acima do diâmetro da porção normal do vaso. Do ponto de vista anatomopatológico, a angioplastia transluminal percutânea provoca ruptura da cama da íntima, da placa aterosclerótica e da túnica média, além de fragmentação da membrana elástica interna e da lamela elástica média. A angioplastia de artéria renal é indicada para lesões causadas por displasia fibromuscular da artéria renal principal e lesões ateroscleróticas não-ostiais. Apesar de ser procedimento menos invasivo e com menores riscos que a cirurgia, podem ocorrer complicações em cerca de 9% dos casos, sendo as mais freqüentes dissecção de placa, trombose ou oclusão total da artéria, infarto renal e hematoma. Implante de Endoprótese Vascular (stent) (Figura 42.2). A colocação de stent tem-se mostrado uma boa opção para o tratamento intervencionista da estenose da artéria renal aterosclerótica ostial, onde a angioplastia isolada tem um alto índice de falha e a maioria dos pacientes necessitam de intervenção cirúrgica. Além disso, a taxa de reestenose é menor com o stent do que com angioplastia. O stent mais utilizado para o tratamento da estenose de artéria renal é o Palmaz-Schatz, embora, em algumas artérias renais de menor calibre, stents coronarianos possam ser utilizados. Os resultados de várias das mais recentes séries sobre colocação de stent de artéria renal mostram um sucesso técnico de quase 100%, melhor controle da hipertensão em cerca de 60% e melhora ou estabilização da função renal em 70% dos pacientes após stent. Foram observadas complicações mais graves em 10% dos pacientes e observouse uma taxa de reestenose de 17% em até um ano de seguimento.
TRATAMENTO CIRÚRGICO Dentre as diferentes técnicas cirúrgicas para revascularizar os rins, podemos citar aquelas que manipulam diretamente a aorta, como, por exemplo, endarterectomia, ressecção da lesão e anastomose, e pontes ou enxertos aortorrenais utilizando a veia safena, a artéria hipogástrica (ou ilíaca interna) e materiais sintéticos. A endarterectomia geralmente é realizada em casos de placas de ateroma ostiais ou proximais e pode ser executada simultaneamente em ambas as artérias renais com uma única incisão na aorta, na altura da emergência das artérias renais. A ressec-
766
Hipertensão Renovascular
A
B
C
D
Fig. 42.2 Aspecto angiográfico de estenose de artéria renal por aterosclerose, envolvendo o terço proximal da artéria renal direita (80%) (A). Após angioplastia com implante de stent Palmaz (B e C), observando-se melhora significativa do diâmetro, com irregularidades residuais (D).
ção da lesão com anastomose término-terminal ou reimplante do colo distal na aorta pode ser feita em lesões anulares ou curtas que permitam, após sua ressecção, uma anastomose livre de tensões. Os enxertos ou as pontes podem ser unilaterais ou bilaterais. O material mais utilizado é a veia safena, pela disponibilidade e facilidade de retirada, mas devido à ocorrência de dilatações aneurismáticas no enxerto, por ser o rim um órgão de alto fluxo e a veia um vaso de paredes pouco resistentes, alguns preferem a artéria ilíaca interna, de paredes mais resistentes que evitam esse inconveniente, além de facilitar, com sua bifurcação, a revascularização de artérias renais duplas ou polares, ou a reconstrução da artéria renal, no caso de lesões hilares, após a ramificação da artéria. Os materiais sintéticos (dracon, teflon, etc.) são utilizados para enxertos longos, mas são suscetíveis de trombose e infecção. Recentemente têm sido usadas próteses de PTFE, porém ainda sem avaliação definitiva.
Nas técnicas que não abordam a aorta diretamente, a revascularização pode ser anatômica, mantendo-se o rim in situ e utilizando-se artérias regionais como a hepática, à direita, a esplênica, à esquerda, ou a mesentérica. Ou pode ser realizada uma revascularização extra-anatômica, como o autotransplante, que transfere o rim para a fossa ilíaca e utiliza a artéria e a veia hipogástricas, com o inconveniente de destruir a circulação colateral. O autotransplante é uma técnica que, eventualmente, conta com a experiência do cirurgião em transplante renal, com a vantagem de, na maioria das vezes, não ser manipulado o ureter. Entretanto, convém lembrar que no transplante renal do nefropata crônico as artérias em geral são normais, enquanto na hipertensão renovascular as condições patológicas da doença da artéria renal e, às vezes, aorto-ilíaca exigem do cirurgião maior habilidade e experiência. Em nosso serviço, ao lado das técnicas habituais, o autotransplante renal tem sido praticado com bons resulta-
capítulo 42
dos, principalmente por permitir a reconstrução da artéria renal utilizando-se ramos da artéria hipogástrica, em lesões distais ou hilares ou na presença de aneurismas. Técnicas anatômicas, como a anastomose esplenorrenal e o enxerto hepatorrenal (veia safena e ramo gastroduodenal da artéria hepática), têm sido úteis em situações complexas com lesões graves nas artérias ilíacas ou na aorta. Freqüentemente, a cirurgia e a angioplastia são usadas em combinação para obter os melhores resultados para o paciente.
Pontos-chave: • Portadores de estenose da artéria por displasia fibromuscular e por arterite de Takayasu devem ser tratados por terapêutica intervencionista • Em pacientes com estenose da artéria renal por aterosclerose, os resultados do tratamento intervencionista não são tão consistentes • O tratamento clínico convencional continuado tem sido reservado para as situações de controle inicial satisfatório, nos casos de impossibilidade técnica de abordagem por cirurgia, angioplastia ou por stent, quando há alto risco para o procedimento intervencionista, ou pela recusa do paciente • A colocação de stent tem-se mostrado uma boa opção para o tratamento intervencionista da estenose da artéria renal aterosclerótica ostial, onde a angioplastia isolada tem um alto índice de falha e a maioria dos pacientes necessitam de intervenção cirúrgica
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ANDERSON, G.H.; BLAKEMAN, M.; STREETEN, D.H.P. The effects of age on prevalence of secondary forms of hypertension in 4429 consecutively referred patients. H. Hypertens. 1994; 12:609-615. BODEWIJNG, V.C.; NELEMANS, P.J.; KESSELS, A.G.H.; KROON, A.A.; LEEUW, P.W.; van ENGELSHOVEN, J.M.A. Diagnostic tests for renal artery stenosis in patients suspected of having renovascular hypertension: A meta-analysis. An. Intern. Med., 2001; 135:401-411. DEAN, R.H.; ENGLUND, R.; DUPONT, W.D.; MEACHA, P.W.; PLUMMER JR., W.D.; PIERCE, T.; EZELL, C.; GOES, G.M.; LUCON, A.M. Renal autotransplantation in the treatment of hypertensive disease associated to unilateral renal artery stenosis. J. Urol., 1981; 176:14. KAPLAN, N.M. Clinical Hypertension. William & Wilkins, 1994. LEERTOUWER, T.C.; GUSSENHOVEN, E.J.; BOSCH, J.L.; Van JAARR-
767
VELD, B.C.; Van DIJK, L.C.; DEINUM, J.; MAN In´t VELD, A.J. Stent placement for renal arterial stenosis: where do we stand? A metaanalysis. Radiology, 2000;216(1)78-85. MANN, S.; PICKERING, T.G. Detection of renovascular hypertension. Ann. Intern. Med., 1992; 117:845-853. MARTINEZ-MALDONADO, M. Pathophysiology of renovascular hypertension. Hypertension, 1991; 17:707-719. MION Jr., D.; DICHTCHEKENIAN, V.; SILVA, H.B.; MARCONDES, M. Captopril test in patients with essential hypertension (EH) and renovascular hypertension (RVH). Fifth Scientific Meeting of the InterAmerican Society of Hypertension, 1983. São Paulo. NOVICK, A.C.; POHL, M.A.; SCHREIBER, M.; GIFFORD Jr., R.W.; VIDT, D.G. Revascularization for preservation of renal function in patients with atherosclerotic renovascular disease. Urol. Clin. North Am., 1984; 11:477. PICKERING, T.G. Diagnosis and evaluations of renovascular hypertension. Circulation, 83(Suppl. I):1991; 1147-1153. PRAXEDES, J.N.; SANTELLO, J.L.; MARTINS, V.M.; FRATEZZI, A.C. e LUCON, A.M. Hipertensão arterial renovascular. Ars Curandi, 1999; 32:14-31. Retrieval of Renal Function by Renovascularization: Study of Preoperative Outcome Predictor. Ann. Surg., 1985; 202-367. SAFIAN, R.D.; TEXTOR, S.C. Renal artery stenosis. N. Engl. J. Med., 2001; 344:431-442. SILVA, H.B.; FRIMM, C.C.; BORTOLOTTO, L.A.; ESTEVES, A.; KAJITA, L.; ARIÊ, A.; MARINO, J.C.; LANGER, B.; LUCON, A.M.; BELLOTTI, G.; PILLEGGI, F. Angioplastia percutânea e revascularização cirúrgica em hipertensão renovascular. Experiência no tratamento e seguimento de longo prazo em 124 pacientes. Arq. Bras. Cardiol., 1994; 62(6):417-23. SILVA, H.B.; GIORGI, D.M.A.; MION Jr., D.; FRIMM, C.C.; PAOLINI, R.; LUCON, A.M.; MARCONDES, M.; BELOTTI, G.; PILLEGGI, F. Renovascular hypertension: outcome of kidney autotransplantation and percutaneous transluminal angioplasty. J. Hypertens., 1988; 6(Suppl. 4). 1988; S727. SILVA, H.B.; MION Jr., D.; GONÇALVES, R.N.; ALBERTS, M.V.; LUCON, A.M.; PAOLINI, R.M. Tratamento não farmacológico da hipertensão arterial. Rev. Bras. Méd. (Cardiologia), 1984; 3(4):202-205. SOS, T.A.; PICKERING, T.G.; SNIDERMAN, K. Percutaneous transluminal renal angioplasty in renovascular hypertension due to atheroma or fibromuscular dysplasia. N. Eng. J. Med., 1983; 309(5):275-279. TEXTOR, S.C.; Epidemiology and clinical presentation. Seminars in Nephrology, Vol. 20 (5). 2000; 426-431. Van JAARSVELD, B.C.; KRIJNEN, P.; PIETERMAN, H.; DERKX, F.H.; DEINUM, J.; POSTMA, C.T.; DEES, A.; WOITTIEZ, A.J.; BARTELINK, A.K.; MANN In´t VELD, A.J.; SCHALEKAMP, M.A. The effect of baloon angioplasty on hypertension in atherosclerotic renal artery stenosis. N. Engl. J. Med., 2000; 342:1007-14.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.emedicine.com/ http://www.snm.org/pdf/renal2.pdf — Society of Nuclear Medicine — Guidelines for diagnosis of renovascular hypertension. http://blueprint.bluecrossmn.com/topic/topic100587401 — Blue Print for Health — Health Topics A-z\ http://www.hmc.psu.edu/healthinfo/r/renovascular hypertension.htm — PennState Medical Center. http://www.nscardiology.com/4ub-sp9702.htm — North Suburban Cardiology Group. http://www.kidneyatlas.org/book3/adk3-03.QXD.pdf — Renovascular hypertension and ischemic nephropathy. http://www.eshonline.org/newsletter/2001/esh-2001-2No05.pdf — European Society of Hypertension — Scien-
768
Hipertensão Renovascular
tific Newsletter — How to handle renovascular hypertension. http://www.iowaclinic.com/adam/ENCY/ARTICLE/ 000204.shtml — Overview.
http://www.bcm.tmc.edu/pathology/Dept/researchs/ lieberman/festschrift/Goldblatt/goldb.html — Renovascular hypertension — review. The Goldblatt Kidney.
Capítulo
43
Hipertensão Arterial e Doença Renal Parenquimatosa Edna Regina Silva Pereira, Istênio F. Pascoal e Décio Mion Jr.
INTRODUÇÃO
Eritropoetina
INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA MECANISMOS FISIOPATOGÊNICOS
O PAPEL DA HIPERTENSÃO NA PROGRESSÃO DA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA NEFROPATIA DIABÉTICA
Retenção de sódio e água
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Sistema nervoso simpático
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Sistema renina-angiotensina
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Endotélio vascular
INTRODUÇÃO
INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA
Richard Bright, em 1836, no Guy’s Hospital de Londres, foi o primeiro a associar hipertensão arterial e doença renal, notando que em necropsias era comum o achado de rins com pequenas granulações e coração aumentado de volume. A partir destas observações ele definiu o rim como o causador da hipertrofia ventricular esquerda. Por sua vez, Mahomed, em 1879, defendeu a possibilidade de ser a hipertensão arterial a causa dos rins contraídos descritos por Bright. Com a descoberta da renina por Tigerstedt e Bergman, em 1898, e a subseqüente demonstração de Goldblatt, em 1934, da influência da constrição de artérias renais na gênese de hipertensão experimental, era óbvia a importância do rim na hipertensão arterial. Na realidade, o rim e a hipertensão arterial interagem de maneira íntima e complexa, tornando muitas vezes difícil, na prática clínica diária, identificar se a hipertensão é causa ou conseqüência do dano renal. Neste capítulo, abordaremos a etiologia e os mecanismos fisiopatológicos envolvidos na hipertensão causada por doença renal parenquimatosa bilateral. A hipertensão renovascular será abordada em capítulo especial.
A ocorrência de hipertensão arterial no decurso de insuficiência renal aguda é ao redor de 39%, variando de 73% em grupos com insuficiência renal aguda de causa glomerular (glomerulonefrites agudas) a 15% nos casos de necrose tubular aguda.1 O mecanismo principal é a retenção de sódio e água, causando expansão do volume de fluido extracelular. Com balanço negativo de sódio e volume, evolui com controle da hipertensão.
INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA As doenças crônicas do parênquima renal são a causa mais comum de hipertensão secundária, ocorrendo em 2 a 5% de todos os pacientes hipertensos. Por outro lado, hipertensão arterial é muito freqüente em pacientes com insuficiência renal crônica. Buckalew e colaboradores observaram uma prevalência de 85% de hipertensão arterial em uma série de 1.795 pacientes, não-diabéticos, portado-
770
Hipertensão Arterial e Doença Renal Parenquimatosa
Quadro 43.1 Prevalência de hipertensão arterial sistêmica nas doenças renais parenquimatosas mais comuns Doença Glomeruloesclerose segmentar e focal Glomerulonefrite membranoproliferativa Nefropatia diabética Glomerulonefrite membranosa Glomerulonefrite proliferativa mesangial Glomerulonefrite por IgA Glomerulonefrite de lesões mínimas Doença renal policística Nefropatia intersticial crônica
Porcentagem de hipertensão 75-80%
Quadro 43.2 Diagnóstico histológico principal em pacientes hipertensos com insuficiência renal crônica DIAGNÓSTICO
n (%)
Nefroesclerose hipertensiva Benigna Maligna
53 (65%) 18 (22) 35 (43)
Doença primária renal Glomeruloesclerose focal Nefropatia IgA Glomerulopatia membranosa Glomerulonefrite membranoproliferativa Nefrite intersticial crônica
28 (35%) 15 (19) 9 (11) 2 (03) 1 (01)
TOTAL
81 (100)
65-70% 65-70% 40-50% 35-40% 30% 25-30% 60% 35%
1 (01)
The Kidney, Brenner & Rector. W.B. Saunders Company, 1992.
res de insuficiência renal crônica, que participaram do estudo MDRD (Modification of Diet in Renal Disease).2 A prevalência de hipertensão arterial varia conforme o tipo de doença renal, ocorrendo com maior freqüência nas doenças glomerulares do que em rins policísticos ou nefrite intersticial crônica. Entre as glomerulopatias primárias a freqüência de hipertensão arterial difere conforme o tipo histológico. É maior na glomeruloesclerose segmentar e focal e glomerulonefrite membranoproliferativa tipos I e II do que na nefropatia por IgA e glomerulonefrite membranosa (Quadro 43.1). Todas as formas de doença renal parenquimatosa podem causar ou agravar a intensidade da hipertensão preexistente e, por seu turno, a hipertensão pode contribuir para a progressão da própria doença renal. A principal repercussão morfológica renal da hipertensão arterial é, genericamente, denominada nefroesclerose, que pode ser caracterizada como benigna ou maligna. Na nefroesclerose benigna ocorre espessamento da parede das artérias por deposição de matriz extracelular, hiperplasia das células musculares lisas da média ou hipertrofia da média. Na nefroesclerose maligna existe proliferação exuberante das células musculares lisas alternando com deposição de matriz (endarterite obliterante), e nos quadros mais graves, deposição de fibrina e necrose das células musculares lisas (necrose fibrinóide). Enquanto a progressão da insuficiência renal é dramaticamente rápida em pacientes com hipertensão arterial maligna não tratada, o curso do envolvimento renal na hipertensão benigna é muito variável, embora quanto mais intensa e duradoura a hipertensão, tanto mais grave a lesão e conseqüente impacto sobre a função renal. Alguns estudos evidenciam que a nefroesclerose benigna é causa freqüente de insuficiência renal, porém muitos pacientes podem ter diagnóstico de nefroesclerose, quando na verdade teriam glomerulo-
nefrites crônicas não diagnosticadas. Recentemente reportamos estudo clínico de biópsia renal em 81 pacientes hipertensos com insuficiência renal crônica e verificamos como diagnóstico histológico para a insuficiência renal: nefroesclerose em 65% dos pacientes e doença primária renal em 35%3 (Quadro 43.2). As vias pelas quais a hipertensão lesa o rim ainda não são bem conhecidas. São mecanismos aceitos o aumento
Pontos-chave: • As doenças crônicas do parênquima renal são a causa mais comum de hipertensão secundária, ocorrendo em 2 a 5% de todos os pacientes hipertensos • A prevalência de hipertensão arterial varia conforme o tipo de doença renal, ocorrendo com maior freqüência nas doenças glomerulares do que em rins policísticos ou nefrite intersticial crônica • A principal repercussão morfológica renal da hipertensão arterial é, genericamente, denominada nefroesclerose • As vias pelas quais a hipertensão lesa o rim ainda não são bem conhecidas. São mecanismos aceitos: aumento da espessura da parede arteriolar com diminuição do lúmen, levando a isquemia e glomeruloesclerose, e aumento da pressão intraglomerular. Fibrose túbulo-intersticial induzida pela isquemia crônica também é fundamental na diminuição progressiva da função renal em hipertensos
771
capítulo 43
da espessura da parede arteriolar com diminuição do lúmen, levando a isquemia e glomeruloesclerose, e o aumento da pressão intraglomerular, que também pode levar à glomeruloesclerose. Além das alterações glomerulares, novas evidências apontam a participação da fibrose túbulo-intersticial induzida pela isquemia crônica como fundamental na diminuição progressiva da função renal em hipertensos.4 Vale ressaltar que a evolução da doença renal é acelerada na vigência de hipertensão arterial.
MECANISMOS FISIOPATOGÊNICOS Os inúmeros mecanismos envolvidos na gênese e manutenção da hipertensão arterial se expressam, fundamentalmente, por expansão do volume extracelular e vasoconstrição. Existem situações nas quais encontraremos claro predomínio de um fator sobre o outro, porém na maioria das vezes a hipertensão arterial é conseqüência de sobreposição de vários fatores, os quais serão detalhados a seguir.
mais, com 30% da função renal inicial, desenvolvem hipertensão arterial quando recebem dieta rica em sal e permanecem normotensos quando recebem dieta pobre em sódio. Com a redução da função renal ocorre expansão do volume extracelular e aumento do débito cardíaco. Além disso, existem evidências de que o aumento do sódio corporal aumentaria a reatividade vascular, provocando elevação da pressão arterial também por aumento da resistência periférica5 (Fig. 43.1). A presença de uma substância endógena digitalis-like liberada em situação de expansão de volume e identificada no plasma de pacientes renais crônicos6 aponta o envolvimento desta na gênese da hipertensão na insuficiência renal crônica. Esta substância age inibindo a bomba Na-K-ATPase universalmente. É uma tentativa do organismo em normalizar a volemia através da inibição da reabsorção de sódio em túbulos renais. Porém a inibição da Na-K-ATPase em músculo liso aumenta a concentração de cálcio citosólico, resultando em vasoconstrição e aumento da reatividade vascular. Na clínica, observa-se melhor controle da pressão arterial nos pacientes normovolêmicos sob tratamento dialítico crônico.
Sistema Nervoso Simpático
Retenção de Sódio e Água A diminuição do ritmo de filtração glomerular decorrente da lesão renal provoca diminuição da capacidade renal em excretar sódio e água. O modelo experimental utilizado para estudo desta situação é o de ablação renal em ratos, com retirada de 5/6 da massa renal. Esses ani-
Fatores neurogênicos, em especial o sistema nervoso simpático, contribuem de maneira importante na regulação da pressão arterial. A ativação deste sistema age diretamente aumentando o débito cardíaco e a resistência periférica. Além disso, a atividade eferente do sistema nervoso simpático provoca maior reabsorção de sódio e água no túbulo
Doença Renal Parenquimatosa
Diminuição da Taxa de Filtração Glomerular
Angiotensina II, Aldosterona, Norepinefrina
Débito Cardíaco Resistência Periférica Normal
Sódio,
Volume Extracelular
Resistência Periférica Débito Cardíaco Normal
Débito Cardíaco Resistência Periférica Normal
Débito Cardíaco Normal Resistência Periférica
Hipertensão Arterial
Fig. 43.1 Esquema do papel do sódio na gênese e manutenção da hipertensão arterial sistêmica nas doenças renais parenquimatosas. Hypertension. Laragh & Brenner. Raven Press. Ltd., 1995.
772
Hipertensão Arterial e Doença Renal Parenquimatosa
proximal e diminui a taxa de filtração glomerular e o fluxo sanguíneo renal. Na maioria dos pacientes renais crônicos encontramos níveis plasmáticos elevados de norepinefrina, o que confirma sua participação. Nos pacientes em fase dialítica, devido à freqüência encontrada de neuropatia (decorrente da própria uremia), é mais difícil determinar a existência e importância dessa ativação. Porém, os estudos de registro direto da atividade simpática periférica em humanos com microneurografia têm evidenciado que os pacientes com hipertensão e insuficiência renal crônica não-dialítica, assim como aqueles em hemodiálise, apresentam hiperatividade do sistema nervoso simpático.7
Sistema Renina-angiotensina Em alguns pacientes com insuficiência renal crônica leve ou moderada é possível demonstrar a ativação do sistema renina-angiotensina através do aumento nos níveis de renina e angiotensina II. Nos pacientes em fase avançada de insuficiência renal, em diálise, às vezes encontramos níveis de renina dentro de limites normais, porém inapropriados frente à situação de expansão volêmica. Na maioria dos pacientes em diálise, a manutenção do peso seco mantém a hipertensão sob controle. No entanto, em 10 a 20% dos pacientes existe claramente uma hipertensão renina-dependente. A resposta eficiente ao uso de bloqueadores da enzima de conversão da angiotensina e bloqueadores da angiotensina II, ou, mesmo antes do advento dessas drogas, a resposta de normotensão à nefrectomia bilateral, prova que realmente o sistema renina-angiotensina tem seu papel neste grupo de pacientes.
Endotélio Vascular A hipótese da hipertensão na insuficiência renal ser decorrente de disfunção do endotélio vascular, por aumento da produção de substâncias vasoconstritoras como endotelina e/ou diminuição de substâncias vasodilatadoras (óxido nítrico), é bastante atrativa. A endotelina é um potente vasoconstritor que, experimentalmente, provoca hipertensão, diminuição da filtração glomerular e aumento na reabsorção tubular de sódio e água. Encontra-se elevada em pacientes em hemodiálise, porém uma correlação entre esses níveis e a pressão elevada não foi descrita.8 Em renais crônicos, a atividade vasodilatadora do óxido nítrico (NO) pode estar bloqueada por um inibidor da síntese de NO, causando aumento da resistência periférica e, conseqüentemente, hipertensão.9
Eritropoetina O uso da eritropoetina recombinante humana no tratamento da anemia da insuficiência renal crônica está associado a aumento da pressão arterial, sendo mais evidente
naqueles já previamente hipertensos. Estudos multicêntricos têm demonstrado uma prevalência de 33% de hipertensão quando o hematócrito excede 30%. Os mecanismos de ação responsabilizados são: aumento dos níveis de endotelina, norepinefrina, aumento de resistência vascular periférica secundário à maior oferta de oxigênio pelo aumento da hemoglobina e débito cardíaco aumentado mesmo com a correção da anemia.
O PAPEL DA HIPERTENSÃO NA PROGRESSÃO DA INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA Tem sido demonstrado que a hipertensão arterial é o fator de risco mais importante para a perda progressiva da função renal em portadores de doença renal parenquimatosa crônica, antecipando o início do tratamento dialítico. Por sua vez, o controle da hipertensão é a intervenção clínica mais importante em retardar a progressão para insuficiência renal crônica terminal. O importante estudo MDRD (Modification of Diet in Renal Disease)10 demonstrou claramente um menor declínio na taxa de filtração glomerular no grupo de pacientes com pressão arterial média mais baixa. O benefício foi maior no grupo de pacientes com proteinúria 1 g e 3 g/24 h. Portanto, a recomendação atual é que em pacientes portadores de nefropatias a pressão arterial alvo seja 130/80 mmHg, e naqueles com proteinúria 3 g/24 h, a pressão arterial alvo seja ainda mais baixa ( 120/80 mmHg). Evidências atuais apontadas pelos estudos de Maschio e colaboradores11 e do estudo REIN (Ramipril Efficacy in Nephropathy)12 recomendam a utilização dos inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA) como os anti-hipertensivos de escolha, por sua ação renoprotetora adicional à redução da pressão arterial. Este efeito renoprotetor é atribuído à diminuição na resistência da arteríola eferente e conseqüente diminuição da pressão intraglomerular, um dos fatores envolvidos na progressão da doença renal. Outro mecanismo pelo qual os IECA exercem sua ação renoprotetora é através da inibição da angiotensina II e de seus efeitos proliferativos e fibróticos. Por extensão, acredita-se que os bloqueadores de receptores de angiotensina II apresentem os mesmos efeitos benéficos dos IECA e são recomendados em pacientes com efeito colateral aos IECA. São aguardados estudos prospectivos que possam definir o papel exato dos bloqueadores de receptores da angiotensina II na progressão da insuficiência renal crônica. É importante lembrar do risco de piora da função renal e hiperpotassemia com o uso dos IECA e bloqueadores de receptores de angiotensina II; logo, recomenda-se cautela e controle da creatinina e potássio sérico em pacientes com creatinina sérica 3 mg/dl.13
773
capítulo 43
Os mecanismos pelos quais a hipertensão pode agravar o rim lesado são múltiplos. Estudos experimentais de ablação de massa renal demonstram diminuição da resistência da arteríola aferente, aumento da pressão no capilar glomerular e conseqüente esclerose glomerular com perda progressiva dos néfrons funcionantes. A hipertensão arterial agrava a hipertensão intraglomerular acelerando o processo de esclerose glomerular. Várias substâncias
Pontos-chave: • Hipertensão arterial é o fator de risco mais importante para a perda progressiva da função renal em portadores de doença renal parenquimatosa crônica • Estudos recentes recomendam a utilização dos inibidores da enzima conversora da angiotensina (IECA) como os antihipertensivos de escolha, por sua ação renoprotetora adicional à redução da pressão arterial • Este efeito renoprotetor é atribuído à diminuição na resistência da arteríola eferente e conseqüente diminuição da pressão intraglomerular, um dos fatores envolvidos na progressão da doença renal • Outro mecanismo pelo qual os IECA exercem sua ação renoprotetora é através da inibição da angiotensina II e de seus efeitos proliferativos e fibróticos • Lembrar do risco de piora da função renal e hiperpotassemia com o uso dos IECA e bloqueadores de receptores de angiotensina II
vasoativas tais como angiotensina II, endotelina e óxido nítrico, envolvidas na patogênese da hipertensão arterial, também participam na progressão das doenças renais, seja por uma ação direta ou mediada por fatores de crescimento, como TGF e PDGF.14
NEFROPATIA DIABÉTICA A nefropatia diabética, apesar de ser uma doença renal parenquimatosa bilateral, merece ser estudada à parte, não só pela sua grande incidência, que vem aumentando nas últimas décadas, mas também por algumas características que a diferenciam das demais. O diabetes mellitus é causa freqüente de doença renal parenquimatosa, sendo listada nos Estados Unidos como a mais freqüente, responsável, em alguns locais, por até 30% dos casos de insuficiência renal crônica. A incidência de hipertensão arterial no diabetes varia, conforme a faixa etária e o tempo de evolução da doença, de 30 a 80%, sendo duas vezes mais prevalente em diabéticos do que na população normal. Cabe diferenciar que enquanto a hipertensão no diabetes tipo 2 pode ocorrer como um epifenômeno, não necessariamente relacionado à nefropatia, no diabetes tipo 1 a presença de hipertensão praticamente se restringe aos pacientes que desenvolvem nefropatia, funcionando como um marcador do início da nefropatia, correlacionando-se fortemente com o aparecimento da proteinúria. A prevalência de insuficiência renal crônica situa-se entre 20 e 40% em diabéticos tipo 1 e entre 10 e 20% em diabéticos tipo 2. Recentemente, tem sido explorada a possibilidade de que a resistência periférica à insulina seja a mediadora da hipertensão por aumento de reabsorção de sódio e água, aumento da atividade simpática ou aumento na disponibilidade do cálcio intracelular. Na nefropatia diabética observamos que, a partir do
% do valor inicial de 100/cr
105 IECA n = 49 100 95 90 Placebo n = 45 85 80 75 0
1
2
3
4
5
Anos
Fig. 43.2 Evolução da perda de função renal expressa em porcentagem do valor inicial da creatinina sérica, em cinco anos, de pacientes diabéticos nefropatas submetidos a tratamento com inibidor de enzima de conversão da angiotensina (IECA) versus placebo. Verifica-se que o IECA manteve a função renal estável durante o período de observação, ao passo que com o placebo houve piora progressiva da função renal (p 0,05 para 2 e 3 anos e p 0,02 para 4 e 5 anos, com IECA versus placebo).
774
Hipertensão Arterial e Doença Renal Parenquimatosa
início da fase caracterizada por diminuição do ritmo de filtração glomerular, ocorre, sem tratamento, queda de até 1 ml/minuto de depuração de creatinina por mês. Nesta fase é fundamental o controle pressórico, e apesar de qualquer hipotensor que controle a pressão ter ação benéfica, estudos em diabéticos tipo 1 demonstram claramente que a inibição do sistema renina-angiotensina com IECA diminui a progressão da insuficiência renal crônica (Fig. 43.2). Em diabéticos tipo 2, estes resultados não tinham sido confirmados. Entretanto o importante estudo RENAAL,15 recentemente publicado, demonstrou que o uso de losartan, um bloqueador de receptor de angiotensina II, em diabéticos tipo 2 e nefropatia, conferiu significativo benefício de proteção renal, uma redução de 35% na proteinúria e diminuição de 28% no risco de insuficiência renal crônica terminal (IRCT). Além deste, o estudo IRMA 2 demonstrou uma redução de 70% no risco de desenvolver nefropatia clínica em paciente com microalbuminúria.16 Ainda neste sentido o estudo IDNT demonstrou uma redução de 23% no risco de desenvolver IRCT quando comparado a placebo e amlodipina.17 Portanto, estes estudos demonstram que o bloqueio do sistema renina-angiotensina com bloqueadores de receptores (AT1) da angiotensina II são efetivos em retardar a progressão para IRCT em diabéticos tipo 2, efeito este adicional ao controle da pressão arterial.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2.
3.
4.
5.
6.
BONOMINI, V.; CAMPIERI, C.; SCOLARI, M.P. Long-term patient and renal prognosis in acute renal failure. Nefron, 36:169, 1984. BUCKALEW, V. Jr.; BERG, R.L.; WANG, S.L.; PORUSH, J.G.; RAUCH, S.; SCHULMAN, G. Prevalence of hypertension in 1,795 subjects with chronic renal disease: the modification of diet in renal disease study baseline cohort. Am. J. Kidney Dis., 28:811-21, 1996. CAETANO, E.R.S.P.; ZATZ, R.; SALDANHA, L.B.; PRAXEDES, J.N. Hypertensive nephrosclerosis as a relevant cause of chronic renal disease. Hypertension, 38:171-176, 2001. LUKE, R.G. Hypertensive nephrosclerosis: pathogenesis and prevalence. Essential hypertension is an important cause of end-stage renal disease. Nephrol. Dial. Transplant, 14:2271-8, 1999. SMITH, M.C.; DUNN, M.J. Hypertension in renal parenchymal disease. In: Laragh, J.H.; Brenner B.M. (eds.) Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd ed. New York: Raven Press, 2081-98, 1995. GLATTER, K.A.; GRAVES, S.W.; HOLLENBERG, N.K. et al. Sustained volume expansion and Na K ATPase inhibition in chronic renal failure. Am. J. Hypertens., 7:1016-25, 1994.
TINUCCI, T.; ABRAHÃO, S.B.; SANTELLO, J.L.; MION, D. Jr. Mild chronic renal insufficiency induces sympathetic overactivity. J. Hum. Hypertens., 15:401-406, 2001. VAJO, Z.; MOFFITT, R.A.; PARVATHALA, S. et al. Elevated endothelin-1 levels and persistent stage IV hypertension in a nonvolume overload anephric patient. Am. J. Hypertens., 9:935-7, 1996. BRENNER, B.M.; YU, A.S.L. Uremic syndrome revisited: a pathogenetic role for retained endogenous inhibitors of nitric oxide synthesis. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 1:3-7, 1992. KLAHR; LEVEY, A.S.; BECK, G.J. et al. Modification of Diet in Renal Disease Study Group. The effect of dietary protein restriction and blood-pressure control on the progression of chronic renal disease. N. Engl. J. Med., 330:877-84, 1994. MASCHIO, G.; ALBERTI, D.; JANIN, G. et al. Effect of the angiotensin-converting-enzyme inhibitor benazepril on the progression of chronic renal disease. N. Engl. J. Med., 334:939-45, 1996. The GISEN Group: Randomized placebo-controlled trial of effect of ramipril on decline in glomerular filtration rate and risk of terminal renal failure in proteinuric, non diabetic nephropathy. Lancet, 349:1857-63, 1997. The Sixth Report of the Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation and Treatment of Hight Blood Pressure. Arch. Inter. Med., 157:2413-45, 1997. ZATZ, R. Haemodynamically mediated glomerular injury: the end of a 15-year-old controversy? Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 5:468475, 1996. BRENNER, B.M.; COOPER, M.E.; de ZEEUW, D. et al. Effects of losartan on renal and cardiovascular outcomes in patients with type 2 diabetes and nephropathy. N. Engl. J. Med., 345:861-9, 2001. PARVING, H.H.; LEHNERT, H.; BROCHNER-MORTENSEN. J.; GOMIS, R.; ANDERSEN, S.; ARNER, P. The effect of irbesartan on the development of diabetic nephropathy in patients with type 2 diabetes. N. Engl. J. Med., 345:870-8, 2001. LEWIS, E.; HUNSICKER, L.G.; CLARKE, W.R.; BERL, T.; POHL, M.A.; LEWIS, J.B.; RITZ, E.; ATKINS, R.D.; ROHDE, R.; RAZ, I. Renoprotective effect of the angiotensin-receptor antagonist irbesartan in patients with nephropathy due to type 2 diabetes. N. Engl. J. Med., 345:851-60, 2001.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BRENNER, B.M. & RECTOR, F.C. (eds.) The Kidney, 6th ed. WB Saunders Company, 2000. KAPLAN, N.M. Clinical Hypertension, 7nd ed., 1998. LARAGH, J.H.; BRENNER, B.M. (eds.) Hypertension: Pathophysiology, Diagnosis and Management, 2nd ed. New York: Raven Press, 2081-98, 1995.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Hypertension, Dialysis, and Clinical Nephrology (HDCN): Renal Disease Electronic Journal/ Hypertension, Dialysis, Nephrology Information Server. http://www.hdcn.com MD Consult: Clinical Information for Physicians. http:// www.mdconsult.com
Capítulo
Diuréticos. Mecanismos de Ação e Uso Clínico
44
Cesar Costa e Roberto C. Manfro
INTRODUÇÃO
EFEITOS COLATERAIS E REAÇÕES ADVERSAS
MECANISMOS DE AÇÃO USO CLÍNICO
Interações com outros fármacos Diuréticos de ação prolongada
Doenças edematosas Edema cardíaco
Diuréticos de alça Diuréticos poupadores de potássio
Edema renal
RESISTÊNCIA E TOLERÂNCIA AO USO DE DIURÉTICOS
Edema hepático
CONTROVÉRSIAS NO USO DE DIURÉTICOS
Doenças não-edematosas Hipertensão arterial sistêmica (HAS) Diabete insípido nefrogênico, acidose tubular renal e hipercalciúria idiopática
Reposição de potássio Diuréticos e/ou betabloqueadores no tratamento inicial das HAS leves e moderadas Uso em grávidas
Hipercalcemias
Uso em edema idiopático
Síndrome de secreção inadequada de hormônio
Diuréticos e câncer
antidiurético Outras indicações e vias de administração
O FUTURO BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO Os diuréticos são substâncias que aumentam o fluxo urinário. Determinam, ao nível de néfron, redução da capacidade tubular de reabsorção de sódio e água e, em algumas circunstâncias, incremento da taxa de filtração glomerular. Sua história teve início efetivo na primeira clínica médica universitária de Viena, a Clínica Wenckebach, em 1919. Alfred Vogl, em depoimento informal publicado em 1950, relata a seqüência de acasos, erros e coincidências que culminou na descoberta das propriedades diuréticas dos organomercuriais, usados na época para o tratamento da sífilis. Os personagens centrais desta epopéia foram o próprio Vogl, então terceiranista de medicina, uma paciente
com sífilis congênita, chamada Joana, e um grupo de enfermeiras cujo orgulho consistia em “fazer prontuários bonitos, com tudo registrado e listado em várias cores”, inclusive a diurese de 24 horas de todos os pacientes. Por volta de 1938, foi constatado que a sulfanilamida possuía propriedades natriuréticas, basicamente por inibição da anidrase carbônica tubular. Pesquisas subseqüentes nesta área resultaram na identificação de outros diuréticos, entre os quais a acetazolamida, a benzolamida e, finalmente, em 1957, os benzotiazídicos. A estes acrescentaram-se, posteriormente, inúmeros fármacos, hoje conhecidos genericamente como “derivados sulfamídicos correlatos” ou nãotiazídicos: clortalidona, furosemida, bumetanida, torazemida, metolazona, piretanida, indapamida etc. Entre 1960 e 1966 surgiu um grupo de diuréticos que, ao contrário dos demais, não espolia o organismo de po-
776
Diuréticos. Mecanismos de Ação e Uso Clínico
tássio: espironolactona (antagonista da aldosterona), triamterene (derivado da pteridina) e amilorida (derivado da pirazina). Atualmente, os benzotiazídicos e derivados sulfamídicos correlatos, os novos diuréticos, encontram-se entre os fármacos mais prescritos em todo o mundo. Outros, como os mercuriais, a acetazolamida, as xantinas e os diuréticos osmóticos, os velhos diuréticos, caíram em desuso, sendo utilizados somente em situações especiais.
MECANISMOS DE AÇÃO Os diuréticos possuem ações renais e extra-renais. Aqui serão analisadas prioritariamente as primeiras. Embora eles interfiram, em maior ou menor grau, numa série de funções do néfron, a presente análise de seu mecanismo de ação considerará somente as modificações mais relevantes. O Quadro 44.1 classifica os diuréticos de acordo com seu principal local de ação ao longo do néfron, e o Quadro 44.2 sumariza os principais aspectos farmacocinéticos destas drogas. Estes conhecimentos são importantes na medida em que o local de ação do diurético no néfron, é um dos fatores determinantes da sua potência. Os diuréticos com ação predominante no glomérulo e/ou túbulo proximal constituem um grupo heterogêneo de substâncias. O manitol é um diurético osmótico que aumenta a filtração glomerular e o fluxo tubular, permitindo, como conseqüência, a excreção urinária de 5 a 10% do sódio contido no filtrado glomerular. Como todos os diuréticos osmóticos, causa maior eliminação de água que de sódio e, por isso, seu uso freqüente ou intensivo pode ter como conseqüência depleção hídrica hipernatrêmica.
Quadro 44.1 Diuréticos Local de Ação A. Glomérulo e túbulo proximal Manitol Albumina humana concentrada Aminofilina Acetazolamida B. Alça de Henle Furosemida Bumetanida Ácido etacrínico Piretanida Torazemida Azosemida C. Túbulos distal e coletor Espoliadores de potássio: benzotiazídicos e derivados sulfamídicos correlatos Poupadores de potássio: espironolactona triamterene amilorida
A ação diurética da albumina humana concentrada resulta do aumento da volemia e da filtração glomerular, da redução da reabsorção tubular de sódio por hiperfluxo e, finalmente, da natriurese. A aminofilina é o único derivado xantínico usado, ocasionalmente, como diurético. Seu mecanismo de ação é múltiplo: aumenta o rendimento cardíaco e o fluxo sanguíneo renal e reduz a reabsorção de sódio e de água no túbulo proximal. A acetazolamida inibe a reabsorção de bicarbonato e, em decorrência, de sódio e de água, mais marcadamente no túbulo proximal. Sabe-se que ao nível do túbulo proximal, 70 a 75% do filtrado glomerular são reabsorvidos, que a reabsorção de sódio é ativa e a de cloro passiva e que pelo menos 25% da reabsorção do bicarbonato são catalisados pela anidrase carbônica. Sendo a acetazolamida um inibidor da anidrase carbônica, sua ação final é de aumento da bicarbonatúria e da natriúria. Tais ações são, no entanto, limitadas pela redução do bicarbonato sérico e por mecanismos de compensação nos segmentos distais do néfron. O ramo ascendente de alça da Henle é o local de ação dos mais rápidos e potentes diuréticos conhecidos na atualidade, ou seja, a furosemida, a bumetanida, a piretanida e o ácido etacrínico; os três primeiros são derivados da sulfanilamida e o último, do ácido ariloxiacético. Os diuréticos de alça, como genericamente se denominam, são excretados ao nível dos túbulos proximais pelos mesmos mecanismos de transporte que servem à eliminação de ácidos orgânicos. Por esta razão são ativos mesmo nos casos em que ocorre redução importante na taxa de filtração glomerular. Causam uma diurese de solutos e interferem no mecanismo fisiológico de concentração urinária, agindo nas porções medular e cortical do ramo espesso ascendente por competição pelo sítio de ligação do cloro no carreador Na-K-2Cl, tornando-o inativo. Outro membro deste grupo chama-se torazemida e difere dos demais por ser eliminado 80% pelo fígado e 20% pelos rins. Os diuréticos com ação predominante nas porções distais do néfron são divididos em espoliadores e poupadores de potássio. Os primeiros, os benzotiazídicos, são excretados no túbulo proximal pelo mesmo mecanismo mencionado para os diuréticos de alça e inibem a reabsorção ativa de sódio no túbulo distal; adicionalmente, possuem moderada capacidade inibitória sobre a anidrase carbônica e não interferem no processo de reabsorção ativa do cloro e nos mecanismos tubulares de concentração urinária. Os tiazídicos agem por competição pelo sítio de ligação do cloro nos co-transportadores (Na-Cl, Na-H e ClHCO) que promovem a entrada de sódio, sensível aos tiazídicos, no néfron distal. Seu uso crônico, por induzir diminuição do volume líquido extracelular, resulta em aumento da reabsorção proximal de água e de alguns solutos (bicarbonato, cálcio, ácido úrico etc.). O protótipo dos benzotiazídicos, que são diuréticos de ação prolongada, é a clorotiazida. A ação prolongada dos benzotiazídicos e
777
capítulo 44
Quadro 44.2 Farmacocinética dos principais diuréticos.* Diurético
Disponibilidade Oral (%)
Meia-Vida de Eliminação (horas)
Via de Eliminação
Indivíduo Normal
Insuficiência Renal
Cirrose Hepática
Insuficiência Cardíaca
De Alça Furosemida Bumetanida Torasemida
10–100 80–100 80–100
1,5–2 1 3–4
2,8 1,6 4–5
2,5 2,3 8
2,7 1,3 6
Renal 50% Hepática 80% Hepática
Tiazídicos Clortalidona Clorotiazida Hidroclorotiazida Indapamida
64 30–50 65–75 93
24–55 1,5 2,5 15–25
ND ND Aumentada ND
ND ND ND ND
ND ND ND ND
Renal Renal Renal Hepática
Distais Amilorida Triamterene Espironolactona
? (⬎ 80) ?
17–26 (2–5) 1,5 (⬎15)
100 (Aumentada) A
A A A
ND ND ND
Renal Rim/Fígado** Complexa***
*Modificado de Brater, DC; ( ) valores referentes a metabólitos ativos; ND ⫽ não determinado; A ⫽ aumentado; **metabólito hepático ativo secretado pelo rim; ***diversos metabólitos ativos.
derivados deve-se, como regra, à sua boa solubilidade em lipídios e, conseqüentemente, maior distribuição pelo organismo; no caso da clortalidona, existe uma ligação preferencial e prolongada ao próprio tecido renal e, no da metolazona, às proteínas plasmáticas. Os diuréticos poupadores de potássio agem nas células principais do túbulo coletor cortical, inibindo a reabsorção de íons sódio e impedindo que se estabeleça um gradiente eletroquímico para a troca com íons potássio e hidrogênio. A entrada de sódio nestes sítios ocorre através de canais de sódio sensíveis à aldosterona. A amilorida e o triamterene produzem fechamento destes canais, portanto com ação independe da aldosterona, e a espironolactona atua por competição inibitória do efeito da aldosterona. Estes diuréticos têm capacidade natriurética e podem levar ao desenvolvimento de hiperpotassemia e acidose metabólica. Em suma, os diuréticos de alça são os mais rápidos e potentes: eliminam 20-25% da carga filtrada de sódio pelos glomérulos. Os de ação predominante ao nível dos túbulos distal e coletor ou têm uma posição intermediária, eliminando 3-5% (espoliadores do potássio), ou são fracos, atingindo apenas a cifra de 1-2% (poupadores de potássio). Em outras palavras, os diuréticos atuam, basicamente, reduzindo a atividade dos sistemas de transporte transcelular do bicarbonato nos túbulos proximais e do sódio nos demais segmentos tubulares; sua ação se dá pela presença no fluido tubular, exceto pela espironolactona que atua sobre os receptores citosólicos de aldosterona, sem passar para a luz tubular. As características farmacológicas dos diuréticos de alça são similares; por isso, a ausência de resposta adequada a
uma determinada droga sugere que o mesmo ocorrerá com outra da mesma classe. A farmacocinética dos tiazídicos é menos conhecida e os principais aspectos farmacocinéticos dos diuréticos estão sumarizados no Quadro 44.2. A farmacodinâmica dos mesmos é determinada pela relação entre a sua chegada ao local de ação e a resposta natriurética. Assim sendo, a resposta máxima de um indivíduo a cada diurético de alça ou tiazídico é a mesma. Desta forma, a dose deve ser titulada para cada indivíduo de maneira a se alcançar a quantidade efetiva do fármaco na luz tubular para que se obtenha um determinado efeito clínico. Adicionalmente deve-se determinar a dose mais baixa para que se alcance a resposta máxima e esta dose não deve ser excedida.
Ponto-chave: • A resposta máxima de um indivíduo a cada diurético de alça ou tiazídico é a mesma; desta forma, a dose deve ser titulada para cada indivíduo
USO CLÍNICO Do ponto de vista de estrutura química, de local de ação no néfron e da farmacodinâmica, os diuréticos constituem um grupo heterogêneo de substâncias. Por esta razão, para agrupá-los de maneira mais uniforme e útil ao médico
778
Diuréticos. Mecanismos de Ação e Uso Clínico
Quadro 44.3 Diuréticos
Quadro 44.5 Diuréticos
Classificação Clínica
Indicações para Uso Clínico
A. De ação prolongada Benzotiazídicos e derivados sulfamídicos correlatos: clorotiazida e similares clortalidona xipamida metolazona* B. De ação rápida ou de alça Furosemida Bumetanida Ácido etacrínico Piretanida Torazemida* Azosemida* C. Poupadores de potássio Espironolactona Triamterene Amilorida D. Outros Manitol Albumina humana Aminofilina
Doenças edematosas Edema cardíaco Edema renal Edema hepático Doenças não-edematosas Hipertensão arterial sistêmica Hipercalciúria idiopática Urolitíase recorrente sem hipercalciúria Hipercalcemia Acidose tubular renal proximal Diabete insípido nefrogênico Síndrome de secreção inadequada de hormônio antidiurético Outras Síndrome de tensão pré-menstrual Glaucoma Cistinúria Hiperuricosúria Intoxicações por salicilatos ou fenobarbital Alcaloses pós-hipercapnéica e pós-perda de conteúdo gástrico
*Não disponível no Brasil.
Doenças Edematosas prático, usa-se uma classificação clínica (Quadro 44.3). O Quadro 44.4 especifica a posologia e a duração total de ação dos principais diuréticos disponíveis no Brasil. Os diuréticos de ação prolongada e os de alça são os mais eficazes e mais amplamente prescritos. Os demais têm ação e uso limitados: empregam-se, via de regra, em associação com os acima citados ou isoladamente, em circunstâncias especiais. Os diuréticos têm amplas indicações no tratamento de doenças edematosas e não-edematosas (Quadro 44.5).
Quadro 44.4 Diuréticos – Posologia e duração de ação Nome
Dose Via Oral (mg/dia)
Duração (horas)
Hidroclorotiazida Clortalidona Xipamida Indapamida Metolazona
12,5–100 12,5–50 10–20 2,5–5 2,5–20
6–12 24–72 12 24-36 12–24
Furosemida Bumetanida Ácido etacrínico Piretanida
20–80 0,5–2 25–100 6–12
3–6 3–6 3–6
Espironolactona Triamterene Amilorida
25–200 50–200 5–10
72 9 24
O uso de diuréticos em pacientes edematosos é mais proveitoso e seguro se obedecidos alguns princípios gerais, entre os quais os seguintes: • antes de iniciar o tratamento (e após, conforme evolução) solicitar a determinação das taxas sanguíneas de eletrólitos (Na, K, Cl, Ca, P e Mg), creatinina, glicose, ácido úrico, hematócrito e albumina plasmática; • determinar dose efetiva e administrá-la tão freqüentemente quanto necessário para obter resposta máxima; em caso de insucesso, associar diuréticos em doses ajustadas para a função renal do paciente; • iniciar o tratamento com dose pequena, exceto quando se tratar de uma emergência ou quando houver insuficiência renal associada; • medir, diariamente, a diurese, o peso e as variações posturais de pulso e pressão arterial; • controlar para que não ocorram reduções de peso superiores a 1-2 kg/dia; perdas superiores resultam, com freqüência, em hipovolemia; • evitar, sempre que possível, o uso associado com fármacos retentores de sódio.
EDEMA CARDÍACO Os diuréticos de ação prolongada são os mais comumente usados em casos de insuficiência cardíaca congestiva, leve ou moderada. Reduzem a volemia e eliminam os sintomas e sinais congestivos. Não devem, obviamente, ser
capítulo 44
utilizados desacompanhados de outras providências terapêuticas (variáveis conforme as circunstâncias: dieta hipossódica, cardiotônicos, inibidores da ECA etc.). Nos portadores de insuficiência ventricular esquerda aguda (edema agudo de pulmão) ou grave, os diuréticos de escolha são os de alça, por via endovenosa. Reduzem a volemia, aumentam a capacitância venosa (precedendo o efeito diurético) e diminuem o retorno venoso e a pressão de enchimento do ventrículo direito. O resultado final de todas essas ações é a diminuição do volume de sangue na vasculatura pulmonar. Se, no entanto, o resultado for insatisfatório, um tiazídico deve ser acrescido ao esquema terapêutico. Como regra geral, as associações de diuréticos de alça com tiazídicos devem receber monitorização cuidadosa, no início; em alguns casos, pode haver poliúria acentuada com risco de hipovolemia, hiponatremia e/ ou hipopotassemia. Vale acrescentar que nos insuficientes cardíacos com função renal normal, embora a absorção do diurético seja mais lenta, tal fato não compromete a concentração tubular do mesmo; por isso, não há necessidade do uso de grandes doses; aconselha-se ministrar doses freqüentes. Não há justificativa para o uso isolado dos diuréticos poupadores de potássio nos edemas de origem cardíaca. Seu uso porém tem sido sugerido naqueles pacientes que apresentam concentrações baixas de sódio e elevadas de potássio, na urina; neles, o sódio está sendo trocado por potássio nos túbulos distais e os poupadores de potássio podem induzir aumento da natriurese. Adicionalmente, tem sido preconizado seu uso em pacientes sob tratamento com digoxina e nos com graves disfunções ventriculares com tendência a hipopotassemia e que tenham função renal normal. Alguns autores sugerem também o uso rotineiro de espironolactona nos esquemas para tratamento de insuficiência cardíaca congestiva, em pacientes com creatininemia inferior a 2,5 mg%, com o argumento de que reduziriam a mortalidade dos mesmos.
EDEMA RENAL Em alguns pacientes com síndrome nefrótica, especialmente aqueles portadores de glomerulopatia por lesões mínimas, ocorre diminuição da volemia, aumento acentuado do volume líquido extracelular e hiperaldosteronismo secundário; noutros, onde não parece haver hipovolemia, mecanismos relacionados com a resistência à ação do peptídeo atrial natriurético parecem ser os responsáveis pela formação do edema, pelo menos até que a pressão oncótica intravascular se torne muito baixa em função da perda acentuada de albumina (v. Cap. 10). O uso de diuréticos deve ser feito com cautela, e associado a outras medidas terapêuticas, de modo a não desencadear hipovolemias que comprometam ainda mais a perfusão tecidual e induzam ou agravem a insuficiência renal. Inúmeros fatores tendem a reduzir o efeito dos diuréticos em pacientes nefróticos, entre os quais se pode salientar: hipoalbuminemia, difu-
779
são do diurético para o líquido extracelular com redução de sua concentração nos túbulos renais bem como sua fixação às proteínas ali presentes; o resultado final é redução da fração livre, ativa, do fármaco. De modo geral, nos casos sem insuficiência renal, inicia-se o tratamento com diuréticos de ação prolongada. Em casos refratários ou com insuficiência renal, pode ser necessária a prescrição de diurético de alça oral ou intravenoso, associado ou não a tiazídicos. Nestas circunstâncias, os esquemas terapêuticos sugeridos são idênticos aos propostos para casos com insuficiência renal. Os diuréticos de alça podem também ser associados a albumina humana concentrada (em casos com hipoalbuminemia inferior a 2,0 g%), aminofilina ou metolazona (não disponível no Brasil); os resultados são, via de regra, modestos. Um dos esquemas propostos usa 60 mg de furosemida mais 200 ml de uma solução de albumina humana a 20%, infundidos intravenosamente em 60 minutos. Seu efeito natriurético ocorreria por aumento do fluxo sanguíneo renal e não por aumento da filtração glomerular. Finalmente, deve-se salientar que o uso associado de espironolactona pode ser útil naqueles nefróticos não portadores de insuficiência renal, por sua ação antialdosterona, em doses de até 400 mg ao dia. O edema da insuficiência renal crônica é decorrente da incapacidade dos rins de excretar água, sal e outros solutos em quantidades adequadas às necessidades orgânicas. Desaconselha-se o uso de diuréticos de ação prolongada, pois a resposta se reduz à medida que a depuração de creatinina endógena cai abaixo de 50 ml/min. A ação se torna insignificante quando a depuração atinge valores em torno de 10 ml/min. Os poupadores de potássio devem ser evitados pelo risco de induzir hiperpotassemia. Os urêmicos, como se sabe, são pacientes com tendência progressiva para acidose metabólica e hiperpotassemia. Nestas circunstâncias, indica-se o uso de diuréticos de alça e em doses mais elevadas que as habituais, para que possam vencer a competição, ao nível dos mecanismos tubulares de transporte, com os ácidos orgânicos acumulados em decorrência da própria insuficiência renal. Assim, por exemplo, em pacientes com depuração de creatinina endógena de 15 ml/ min, apenas 1/5 ou 1/10 da quantidade administrada do diurético de alça é secretada para a luz tubular em comparação com indivíduos normais; a resposta das células tubulares, no entanto, é idêntica à de células normais, demonstrando que o problema é o acesso do fármaco às áreas celulares onde atua. Doses elevadas, porém, aumentam o risco de efeitos colaterais indesejáveis, em especial ototoxicidade. Recomenda-se, inicialmente, o uso de furosemida via oral; sua dose eficaz é imprevisível e deve ser estabelecida em cada caso. De modo geral, as doses são elevadas e podem atingir valores de 100-200 mg/dia. Nos casos que apresentam hipertensão arterial grave e/ou acentuada congestão pulmonar e/ou não responsivos à via oral, usase a via intravenosa, servindo a dose inicial empírica de 40
780
Diuréticos. Mecanismos de Ação e Uso Clínico
mg para testar a resposta do paciente. Como regra, a resposta natriurética máxima ocorre quando se usa de 160 a 200 mg de furosemida IV, infundida num período de 2030 minutos; doses maiores, em geral, não dão melhores resultados. Para obtenção de resultados semelhantes, as doses orais se situam entre 160 e 400 mg/dia. Nos casos não responsivos aos esquemas intermitentes, pode-se tentar infusão IV contínua: inicia-se com uma dose de ataque de 40 mg seguida de 20 mg/hora (e após, 40 mg/hora, se necessário) para depurações de creatinina endógena abaixo de 25 ml/min ou 10-20 mg/hora para as acima deste valor. Se não houver resposta na primeira hora, repetir a dose de ataque e aumentar a taxa de infusão. Vale mencionar um comentário sobre o uso da associação diurético de alça-tiazídicos. Aos esquemas acima mencionados, podem-se adicionar tiazídicos orais, em doses variáveis conforme as depurações de creatinina: se menores que 20 ml/ min, entre 20-50 ml/min e maiores que 50 ml/min, dar 100200 mg/dia, 50-100 mg/dia e 25-50 mg/dia de hidroclorotiazida, respectivamente. Se todas as tentativas mencionadas fracassarem, deve-se recorrer aos métodos dialíticos. É necessário salientar, como já feito anteriormente, que o uso de diuréticos no tratamento dos edemas não deve ser isolado, mas associado a outras providências terapêuticas. Na insuficiência renal aguda, os diuréticos são habitualmente prescritos apenas com o intuito de facilitar o restabelecimento do equilíbrio hidrossalino; o mais usado é a furosemida intravenosa. O objetivo buscado é o de transformar uma insuficiência renal aguda oligúrica em nãooligúrica. Estudos controlados têm tornado evidente que o uso de diuréticos não afeta a duração da insuficiência renal aguda, sua taxa de mortalidade nem o número de diálises necessárias para seu tratamento.
Ponto-chave: • Uso de diuréticos na insuficiência renal crônica é especialmente indicado quando o edema se associa a hipertensão arterial sistêmica e/ou a congestão circulatória
na dose inicial de 100 mg/dia, com a alimentação; conforme os resultados obtidos, aumentos semanais de 100 mg podem ser prescritos até uma dose máxima de 400 mg/dia ou aparecimento de efeitos colaterais indesejáveis; recomenda-se que a perda de peso não seja superior a 1,0 kg/ dia, nos pacientes com edema, e de 0,5 kg/dia nos sem edema. Caso não se obtenha resultado, diuréticos de ação prolongada ou de alça, em doses pequenas e progressivamente elevadas, isolados ou em associação com albumina humana concentrada, aminofilina ou betabloqueadores e isossorbida (que reduz a pressão porta), podem ser tentados. Os esquemas acima propostos, mais dieta e eventual drenagem de alívio, têm resultados positivos em cerca de 90% dos casos. É importante que se acentue que não se devem usar diuréticos em casos de edema hepático não associado a hipertensão porta.
Doenças Não-edematosas HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA (HAS) Os diuréticos são amplamente utilizados, como monoterapia inicial, na HAS leve ou moderada, especialmente em negros, idosos, obesos e hipervolêmicos. Têm capacidade de, isoladamente, normalizar as cifras tensionais de aproximadamente 70% dos portadores de HAS leve ou moderada, e sua ação anti-hipertensiva parece decorrer de vários mecanismos, ainda controvertidos. Reduzem o volume plasmático e o volume líquido extracelular, durante as primeiras semanas de sua ação. Esta negatividade inicial do balanço hidrossalino volta, no entanto, ao equilíbrio pré-tratamento com a continuação do uso, embora existam estudos que afirmem que ela se mantém por até dois anos. Postula-se também que tais medicamentos possuem ação vasodilatadora direta, à semelhança do diazóxido, que é uma benzotiadiazina sem o grupo sulfamoil. Finalmente, estudos experimentais mostram que os diuréticos induzem uma “hiporreatividade no sistema vascular”, ou seja, reduzem a reatividade arteriolar às substâncias pressoras em circulação.
EDEMA HEPÁTICO
Pontos-chave:
Nos edemas cuja causa é insuficiência hepática, associados a hipoproteinemia e hipertensão portal, existe diminuição do volume circulatório efetivo, ascite e hiperaldosteronismo secundário (v. Cap. 10). O maior cuidado que se deve ter, nestes casos, é o de promover uma remoção lenta e gradual do excesso de líquido extracelular. Uma diurese abrupta pode desencadear grave hipoperfusão tecidual, aumentar a concentração de amônia na veia renal ou forçar a sua transferência da barreira hematoencefálica, causando hipopotassemia grave; encefalopatia hepática ou síndrome hepatorrenal podem ocorrer. Por todas as razões referidas, recomenda-se o uso de espironolactona
• Os diuréticos são utilizados, como monoterapia inicial, na HAS leve ou moderada, especialmente em negros, idosos, obesos e hipervolêmicos • Eles têm capacidade de, isoladamente, normalizar as cifras tensionais de aproximadamente 70% dos portadores de HAS leve ou moderada Os diuréticos têm sua ação potencializada pela restrição concomitante da ingestão de sal e atingem efeito anti-hi-
781
capítulo 44
pertensivo máximo após duas a três semanas de uso. A possibilidade de sua prescrição em dose única diária, ou em dias alternados, facilita a adesão dos pacientes ao tratamento. Os diuréticos mais utilizados são os de ação prolongada; os de alça são reservados para situações agudas (crises hipertensivas e/ou edema agudo de pulmão e casos associados a insuficiência renal avançada). É importante que se tenha em mente que o efeito anti-hipertensivo dos diuréticos de ação prolongada não aumenta quando as doses habitualmente prescritas são progressivamente elevadas. Além disso, o uso clínico tem demonstrado que, nos hipertensos com função renal normal, os diuréticos de alça não oferecem vantagens sobre os de ação prolongada quanto ao controle das cifras tensionais. O uso crônico de anti-hipertensivos não-diuréticos, ou seja, betabloqueadores, simpaticolíticos, vasodilatadores, inibidores da enzima conversora e antagonistas dos receptores de angiotensina II, promove retenção hidrossalina. Tal efeito anula a ação anti-hipertensiva (pseudotolerância) e exige o uso associado de diuréticos. Nestas circunstâncias, eles são de grande valia: potencializam o efeito antihipertensivo dos fármacos mencionados, tornando-o mais contínuo e previsível, permitem o uso de menores doses e, em função disto, diminuem a ocorrência de efeitos colaterais e reações adversas. Alguns hipertensos primários desenvolvem hipopotassemia após uso crônico de diuréticos de ação prolongada. Levanta-se freqüentemente, com relação a eles, a suspeita diagnóstica de hiperaldosteronismo primário. Para afastá-la ou confirmá-la, é recomendável a interrupção do tratamento e a ingestão de dieta livre durante 10 a 14 dias; repete-se, então, a dosagem do potássio sérico e, adicionalmente, determina-se a taxa de sódio e potássio na urina de 24 horas. Se houver elevação ou normalização do potássio sérico e se, na urina, o sódio for de, pelo menos, 100 mEq/dia e o potássio menor que 30 mEq/dia, é quase certo que a hipopotassemia se deva ao uso do diurético; se ela persistir e o potássio urinário for superior a 30 mEq/dia, deve-se prosseguir na investigação sobre hiperaldosteronismo primário. O VI Joint National Committee recomenda que, exceto quando haja indicações obrigatórias (“compelling”), o tratamento inicial da HAS deva ser feito com diuréticos e/ou betabloqueadores. Outras diretrizes incluem: tratamento individualizado; uso obrigatório de diuréticos em casos de HAS sistólica isolada e a associada a insuficiência cardíaca congestiva; evitar doses altas em diabéticos, dislipidêmicos e gotosos; doses baixas podem ser usadas em diabéticos tipo II e são benéficas para pacientes portadores de osteoporose.
DIABETE INSÍPIDO NEFROGÊNICO, ACIDOSE TUBULAR RENAL E HIPERCALCIÚRIA IDIOPÁTICA Nestas três patologias, os diuréticos de ação prolongada têm sido usados devido à depleção de volume que acar-
retam, com conseqüente maior reabsorção de água e diferentes solutos ao nível dos túbulos proximais. No diabete insípido, tais medicamentos induzem uma maior reabsorção de água, com apreciável redução na diurese; nos casos de acidose tubular renal proximal (tipo II) e de hipercalciúria idiopática, aumentam a reabsorção de bicarbonatos e de cálcio, respectivamente. Nas três doenças citadas, para o sucesso terapêutico, é de fundamental importância que se restrinja a ingestão de sódio. No caso específico de hipercalciúria idiopática, o uso de 25-50 mg/dia de hidroclorotiazida, ou similar, resultará em significativa redução da calciúria e da formação de novos cálculos (Cap. 33). Na poliúria induzida pelo uso crônico do carbonato de lítio, que ocorre em 20-30% dos pacientes, a amilorida, através do bloqueio dos canais luminais de sódio, pode em muitos casos melhorar a poliúria, apesar da continuidade do tratamento.
HIPERCALCEMIAS Os diuréticos de alça, ao contrário dos de ação prolongada, produzem significativo aumento na excreção urinária do cálcio; têm, por esta razão, sido indicados no tratamento agudo de hipercalcemias. Quando usados nestes casos, é importante que as perdas urinárias de água e eletrólitos (Na, Cl, K e Mg) sejam repostas, pois induzem hipovolemia que, por sua vez, condicionará maior reabsorção proximal de água e solutos (inclusive cálcio), o que se contrapõe ao objetivo básico do tratamento. As doses de furosemida intravenosa situam-se entre 40 e 80 mg, cada 2 ou 3 horas.
SÍNDROME DE SECREÇÃO INADEQUADA DE HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO Os diuréticos de alça podem ser usados em casos de secreção inadequada de hormônio antidiurético, no sentido de produzir um balanço negativo de água. Para um bom resultado terapêutico, as perdas hidroeletrolíticas urinárias devem ser repostas sob forma de soluções hipertônicas. As doses usuais são de 40-80 mg/dia ou 50-100 mg/dia, via oral, de furosemida ou ácido etacrínico, respectivamente.
Outras Indicações e Vias de Administração Os diuréticos têm tido seu uso proposto para o tratamento de várias patologias, além de suas indicações clássicas, descritas acima: osteoporose pós-menopáusica (tiazidas ⫹ vitamina D), por induzir balanço positivo de cálcio; doença de Ménière (tiazidas), pelo fato de reduzirem a perda neurossensorial progressiva da audição; asma brônquica (furosemida), por uma ação “broncoprotetora” e preventiva; síndrome de hiperestimulação ovariana grave (furosemida), para tratamento de ascite. Além disso, a acetazolamida, por sua ação vasodilatadora cerebral, tem sido
782
Diuréticos. Mecanismos de Ação e Uso Clínico
usada para avaliar o grau de reserva perfusional cerebral de pacientes com oclusão da artéria carótida interna e artérias regionais. Além das vias tradicionais (oral, intramuscular e intravenosa intermitente ou contínua), os diuréticos têm sido testados em inalações (furosemida), por via sublingual (furosemida) e retal (bumetanida), com relativo sucesso. A acetazolamida tem atualmente uso limitado, restrito aos seguintes casos: no glaucoma, em situações nas quais seja útil a elevação do pH urinário (cistinúria, hiperuricosúrias, intoxicações por salicilatos e fenobarbital) e nas alcaloses pós-hipercapnéica e pós-perdas de conteúdo gástrico. Os organomercuriais estão hoje praticamente em desuso. São tão natriuréticos quanto os diuréticos de alça, porém menos espoliadores de potássio. Por esta peculiaridade, teriam boa indicação em casos em que se requer diurese profusa e rápida, porém sem riscos de hipopotassemia, como em insuficiências cardíacas congestivas graves.
EFEITOS COLATERAIS E REAÇÕES ADVERSAS Os diuréticos de ação prolongada e os de alça encontram-se entre os fármacos mais úteis e seguros postos à disposição do médico prático. Embora a listagem de seus paraefeitos seja longa, a experiência clínica tem demonstrado que a grande maioria deles é de caráter leve a benigno. Seria tedioso analisar todos os paraefeitos referidos no Quadro 44.6. Por isso, serão feitos apenas comentários gerais sobre alguns tópicos de interesse clínico. Os efeitos colaterais dependem, basicamente, da ação diurética e incluem: distúrbios eletrolíticos, desequilíbrios ácido-base, perturbações metabólicas, depleção do volume intravascular, diminuição do rendimento cardíaco e hipoperfusão arterial periférica. As reações adversas, por outro lado, independem da ação diurética e decorrem de características do próprio paciente: pancreatite, pancitopenia, reações cutâneas de hipersensibilidade, nefrite intersticial aguda etc. Os diuréticos devem ser usados com cautela em pacientes geriátricos, os mais propensos aos paraefeitos, em especial aos distúrbios hidroeletrolíticos; por isso, recomenda-se o uso de diuréticos menos potentes e em doses menores que as usuais. As recomendações feitas para os idosos são também válidas para pacientes que habitam zonas de clima quente. Deve-se evitar a prescrição de diuréticos de ação prolongada a portadores de síndromes hipercalcêmicas ou em associação com vitamina D, pois, como mencionado anteriormente, eles reduzem a excreção urinária de cálcio. Nestas circunstâncias, os de alça são mais indicados por aumentarem a calciúria.
Quadro 44.6 Diuréticos Principais Efeitos Colaterais e Reações Adversas Comuns a todos os diuréticos Boca seca, gosto desagradável, astenia, sonolência, tonturas, cãibras, distúrbios gastrintestinais, parestesias, hipertensão postural Diuréticos de ação prolongada Hiponatremia, hipovolemia, hipopotassemia, hipomagnesemia, hipofosfatemia, hipercalcemia, hiperglicemia, hiperazotemia, hiperuricemia, hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia, hiperreninemia, alcalose metabólica, disfunção hepática, icterícia, pancreatite, leucopenia, anemia, trombocitopenia, púrpura, reações cutâneas de hipersensibilidade, angiites necrosantes, fotossensibilidade, nefrite intersticial aguda Diuréticos de alça Mesmos que os de ação prolongada, exceto hipercalcemia Ototoxicidade, alcalose metabólica hipoclorêmica Diuréticos poupadores de potássio Espironolactona Hirsutismo, distúrbios menstruais, ginecomastia, hiperpotassemia, hiponatremia Triamterene Urolitíase, hiperpotassemia, hiponatremia, hiperazotemia, dermatite, fotossensibilidade Amilorida Hiperpotassemia, hiponatremia, hiperazotemia, dermatite
Embora causem hiperglicemia, os diuréticos não estão contra-indicados em pacientes diabéticos. Raramente induzem elevações importantes nas taxas de glicemia, embora existam relatos de terem precipitado quadros de coma hiperosmolar hiperglicêmico, não-cetótico. Quando prescritos cronicamente, exigem, via de regra, pequenos reajustes na dieta e/ou na posologia dos medicamentos antidiabéticos regularmente usados pelos pacientes. Os diuréticos causam hiperuricemia e podem precipitar, em indivíduos propensos, crises de gota. Nos gotosos com função renal normal, é aconselhável o uso associado de um uricosúrico toda vez que a uricemia atingir níveis de 8,0 mg% ou mais. Nos não-gotosos, o mesmo deve ser feito quando as taxas forem de 10,0 mg% ou mais. Com relação ao triamterene, duas observações podem ser relevantes para o clínico: não deve ser prescrito a urolitiásicos, pois existem evidências de que possui potencial litogênico; desaconselha-se, ainda, seu emprego associado a tiazidas, pelo risco de causar nefrite intersticial aguda.
Interações com Outros Fármacos Os diuréticos interagem com inúmeros fármacos. Em certas circunstâncias, tal fato pode ser usado com finalidade
783
capítulo 44
terapêutica, como ocorre, por exemplo, na associação com drogas anti-hipertensivas; em outras, a interação resulta em aumento de toxicidade e/ou diminuição de eficácia. As principais interações medicamentosas dos diuréticos estão apresentadas no Quadro 44.7.
Pontos-chave: • A interação dos diuréticos com inúmeros fármacos pode ser usada com finalidades terapêuticas, como ocorre, por exemplo, na associação com drogas anti-hipertensivas • Outras vezes a interação resulta em aumento de toxicidade e/ou diminuição de eficácia DIURÉTICOS DE AÇÃO PROLONGADA Tais medicamentos aumentam a toxicidade do lítio, do alopurinol e dos digitálicos, bem como o efeito redutor de
Quadro 44.7 Principais interações medicamentosas dos diuréticos Diuréticos De ação prolongada
De ação rápida
Poupadores de K
Drogas com Potenciais Interações Alopurinol, antiácidos e cálcio, antidepressivos tricíclicos, antiinflamatórios não-esteróides, betabloqueadores, bloqueadores neuromusculares, ciclopropano, ciclosporina, colestiramina, corticosteróides, diazóxido, enflurano, estrógenos, glicosídios cardiotônicos, halotano, hipoglicemiantes, isoflurano, lítio, óxido nitroso. Aminoglicosídeos, antiinflamatórios nãoesteróides, bloqueadores neuromusculares, cefalosporinas, corticosteróides, éter, fenobarbital, fenitoína, glicosídios cardiotônicos, halotano, isoflurano, lítio, óxido nitroso, salicilatos. Antiinflamatórios nãoesteróides, bloqueadores do receptor da angiotensina, ciclosporina, colestiramina, inibidores da enzima conversora da angiotensina, quinidina, salicilatos.
cifras tensionais dos anti-hipertensivos e anestésicos gerais. Ampliam a eficácia dos bloqueadores neuromusculares. Quando associados a drogas antiinflamatórias não-esteróides, que reduzem a síntese de prostaglandinas, perdem parte do efeito natriurético e anti-hipertensivo; adicionalmente, o efeito hiperglicemiante dos diuréticos pode ser aumentado na concomitância destes diuréticos. Gota e toxicidade renal podem ocorrer com o uso concomitante de tiazídicos e ciclosporina. Os diuréticos de ação prolongada têm sua absorção intestinal diminuída quando usados simultaneamente com colestiramina; se usados com antiácidos e cálcio, podem induzir hipercalcemias importantes.
DIURÉTICOS DE ALÇA A associação de furosemida ou ácido etacrínico com aminoglicosídios e cefalosporinas resulta em aumento do risco de nefro- e ototoxicidade. Os diuréticos de alça diminuem a depuração renal do lítio, elevando seus níveis séricos e as possibilidades de efeitos tóxicos. Quando associados a drogas antiinflamatórias não-esteróides, têm seus efeitos natriuréticos e anti-hipertensivos reduzidos, e, quando usados com hidrato de cloral, podem induzir instabilidade vasomotora. O ácido etacrínico potencia a ação dos anticoagulantes orais e, assim como a bumetamida, pode ter o risco de ototoxicidade aumentado quando usado conjuntamente com outras drogas também ototóxicas, tais como aminoglicosídeos e cisplatina.
DIURÉTICOS POUPADORES DE POTÁSSIO A associação a antiinflamatórios não-esteróides, inibidores da enzima de conversão da angiotensina e trimetoprim pode levar à hiperpotassemia. A espironolactona pode diminuir a excreção renal da furosemida e diminuir o efeito inotrópico positivo da digoxina. Amilorida associada à quinidina pode induzir arritmias graves; devendo ser evitada.
RESISTÊNCIA E TOLERÂNCIA AO USO DE DIURÉTICOS A resistência à terapêutica diurética pode decorrer de vários fatores, entre os quais cardiopatia, nefropatia e/ou hepatopatia graves, ingesta hidrossalina excessiva, posologia inadequada etc. Ocorre em pacientes gravemente hipoalbuminêmicos, em especial nefróticos; em portadores de cirrose hepática, insuficiência cardíaca ou renal, devido a hipoperfusão renal ou a substâncias tais como ânions orgânicos ou ácidos biliares que se acumulam na insuficiência renal ou hepática, dificultando a secreção tubular dos diuréticos; em casos de insuficiência renal terminal, nos quais ocorre diminuição de nefrônios funcionantes. Outras circunstâncias de má resposta são: aumento das taxas de
784
Diuréticos. Mecanismos de Ação e Uso Clínico
angiotensina II, aldosterona e/ou norepinefrina presentes na insuficiência cardíaca e na cirrose hepática; hipertrofia tubular distal, secundária ao uso crônico de diuréticos de alça, com reabsorção aumentada do sódio intraluminal. A tolerância ao uso de diuréticos pode apresentar-se de duas formas: na primeira ela ocorre precocemente e se refere ao fato de que ocorre uma diminuição na resposta aos diuréticos após a primeira dose; este tipo de tolerância pode ser revertido pela reposição do volume perdido e propicia a proteção do volume intravascular; na segunda, com o uso crônico de diuréticos de alça predominantemente, ocorre hipertrofia tubular distal, secundária ao uso crônico de diuréticos de alça, com reabsorção aumentada do sódio intraluminal nos segmentos distais e diminuição da diurese. Os diuréticos tiazídicos bloqueiam os locais do néfron onde ocorre a hipertrofia e propiciam uma resposta aditiva ao uso dos diuréticos de alça. As opções terapêuticas genéricas sugeridas para casos de resistência aos diuréticos são as seguintes: repouso no leito (aumenta o fluxo sanguíneo renal), uso das doses máximas dos fármacos nos esquemas propostos, isolados ou em combinações, administrados antes das refeições (quando por via oral).
Pontos-chave: • A tolerância ao uso de diuréticos pode apresentar-se precocemente após as primeiras doses. Esta pode ser revertida pela reposição do volume intravascular • Tardiamente a tolerância é devida ao uso crônico de diuréticos de alça, levando à hipertrofia tubular distal com reabsorção aumentada do sódio e diminuição da diurese. Esta forma pode ser revertida pelo uso associado de tiazídicos
CONTROVÉRSIAS NO USO DE DIURÉTICOS Nos últimos anos, inúmeros tópicos polêmicos têm sido levantados com relação ao uso clínico dos diuréticos. Dentre eles, podem ser citados os seguintes: necessidade de reposição das perdas urinárias de potássio, diuréticos e/ou betabloqueadores no tratamento farmacológico inicial de casos de HAS leve ou moderada, prescrição em grávidas e em casos de edema idiopático e diuréticos como causa de neoplasias.
Reposição de Potássio Dentre os efeitos colaterais dos diuréticos, a hipopotassemia é talvez o mais extensivamente discutido. É mais
comum nos casos em que se usam diuréticos de ação prolongada e nos portadores de doenças edematosas; nestes, como se sabe, é freqüente a ocorrência de hiperaldosteronismo secundário. Nos pacientes não-edematosos, como regra, existe uma redução inferior a 10% no potássio total do organismo, nas primeiras semanas de diureticoterapia; ocorre compensação espontânea, na maioria dos casos, nos cinco a 12 meses subseqüentes de tratamento; mesmo assim, cerca de 17% dos hipertensos primários que recebem diuréticos cronicamente apresentam potássio plasmático igual ou inferior a 3,0 mEq/L. A hipopotassemia pode causar fraqueza e paralisias musculares, tubulopatia dutal, dislipidemia, intolerância à glicose, aumento da toxicidade digitálica e arritmias ventriculares. Mais recentemente, surgiram especulações quanto à sua influência na redução do efeito hipotensor dos diuréticos. Estudos experimentais têm colocado em evidência uma “ação anti-hipertensiva” do potássio via redução de catecolaminas plasmáticas, ação vasodilatadora direta ou diminuição da reatividade do sistema nervoso central. A experiência clínica acumulada nos últimos anos indica ser dispensável a suplementação rotineira de potássio em pacientes sob diureticoterapia. Constituem exceção os casos sob terapêutica digitálica, os com alterações eletrocardiográficas e extra-sistolia supraventricular ou ventricular, os taquiarrítmicos, os com infarto miocárdico recente, os suscetíveis a coma hepático e os com potassemia inferior a 3,0 mEq/L. Quando indicada, a reposição pode ser feita por meio de dieta, líquidos, xaropes, comprimidos ou drágeas. As dietas são pouco práticas e as preparações citadas não estão isentas de efeitos indesejáveis: os líquidos e xaropes têm gosto não apreciado por importante parcela de pacientes, e as drágeas de liberação entérica podem não ser absorvidas ou causar, segundo alguns, ulcerações, estenoses, perfurações ou obstruções do intestino delgado. Outra maneira de tratar as hipopotassemias induzidas por diuréticos é o uso associado de poupadores de potássio. A prescrição indiscriminada de suplementação de potássio e/ou de poupadores de potássio pode resultar em elevações perigosas dos níveis plasmáticos de K, em especial nos portadores de insuficiência renal e/ou diabete, nos sob tratamento com betabloqueadores, indometacina ou captopril, e nos idosos (v. também Cap. 12).
Diuréticos e/ou Betabloqueadores no Tratamento Inicial das HAS Leves e Moderadas Um número apreciável de ensaios terapêuticos randomizados, controlados e de longa duração, com diuréticos e betabloqueadores, tem demonstrado que ambos reduzem as complicações clínicas cardiovasculares da HAS — exceto aquelas decorrentes de cardiopatia isquêmica (angi-
785
capítulo 44
na, infarto e morte súbita) — e têm ação anti-hipertensiva equivalente. Demonstraram também que os dois grupos de fármacos causam alterações importantes nos lipídios plasmáticos: os diuréticos elevam o colesterol, os triglicerídios e as lipoproteínas de baixa ou muito baixa densidade, além de diminuírem as lipoproteínas de alta densidade; os betabloqueadores diferem apenas pelo fato de não elevarem as taxas de colesterolemia. Adicionalmente, numerosos estudos recentes, experimentais e alguns clínicos, têm demonstrado que diuréticos e betabloqueadores não possuem efeitos benéficos específicos sobre anormalidades da microcirculação dos hipertensos (estrutura dos vasos e densidade da rede capilar), consideradas fatores básicos no dano de órgãos-alvo como rins, coração e cérebro. Em contrapartida, outros estudos têm posto em evidência que os novos anti-hipertensivos (bloqueadores dos canais de cálcio, inibidores da ECA e antagonistas dos receptores de angiotensina II) possuem potencial considerável de melhora das alterações de microcirculação, levantando por isso a possibilidade (a ser provada a longo prazo) de redução de danos a órgãos-alvo e conseqüente queda da morbidade e da mortalidade de hipertensos. Os defensores do uso dos diuréticos mencionam, como argumento a seu favor, o baixo custo, a possibilidade de dose única e a benignidade dos paraefeitos, todos favorecedores da adesão do paciente ao tratamento. Os partidários dos betabloqueadores afirmam que, embora mais caros e de uso mais seletivo, possuem vantagens sobre os diuréticos: têm ações inotrópica e cronotrópica negativas, bem como limitam as elevações da tensão arterial durante esforço físico, o que resulta em ação “cardioprotetora”; não induzem hipopotassemia, reduzem as taxas plasmáticas de renina e são antiarrítmicos. Tem-se afirmado que o uso de diuréticos aumenta a ocorrência de extra-sistolia. Estudos usando monitorização com Holter, em pacientes hipopotassêmicos sob diureticoterapia, mostraram que a freqüência de extra-sístoles supraventriculares e ventriculares não se modifica após reposição das perdas de potássio.
Uso em Grávidas Existem publicações que afirmam que o número de natimortos e a taxa de mortalidade perinatal são maiores nas grávidas que fazem uso de diuréticos. Tais publicações, no entanto, incluem, em sua maior parte, relato de casos ou estudos não-controlados. Uma revisão recente de estudos randomizados sobre o assunto, observadas mais de 10.000 mulheres, permite as seguintes conclusões sobre os diuréticos: • não influem na mortalidade perinatal; • reduzem a incidência de pré-eclâmpsia somente naqueles estudos em que o edema foi incluído como critério diagnóstico;
• devem ser considerados como potencialmente perigosos, tanto para as mães como para os fetos, levando-se em conta que hipovolemia é fator sempre presente na história natural das pré-eclâmpsias progressivas, e que pode ser agravada pelo uso de diuréticos.
Uso em Edema Idiopático Parece que a opinião mais aceita é a de que devam ser evitados, pois apesar da melhora inicial que proporcionam, sua eficácia diminui com o uso crônico; sua suspensão induz fenômeno de rebote (v. também Cap. 10).
Diuréticos e Câncer A relação entre uso de diuréticos e ocorrência de câncer vem sendo discutida nos últimos anos. As evidências acumuladas sugerem que o uso crônico de diuréticos pode estar associado ao aparecimento de carcinoma de células renais, especialmente em mulheres. Editoriais de importantes publicações médicas, mesmo reconhecendo a relevância do problema, ponderam que se trata de uma possibilidade cujas evidências atuais não estão isentas de críticas metodológicas. Assim sendo, acham que novos estudos e pesquisas devem ser feitos, a longo prazo, para testar o que qualificam de “esta hipótese”.
O FUTURO Numa visão panorâmica do progresso farmacológico ocorrido nos últimos anos, percebe-se que as novidades na área dos diuréticos foram escassas se comparadas, por exemplo, com as dos fármacos psicoativos, dos anti-hipertensivos não-diuréticos, dos antiinflamatórios, dos imunossupressores etc. Mesmo assim, alguns aspectos de interesse para o futuro podem ser mencionados: • Estudos em animais e humanos demonstraram que o bloqueio dos receptores de adenosina A1 induz diurese rápida com efeitos mínimos sobre o metabolismo do potássio; tal fato decorreria da inibição da adenilciclase dos receptores A1 no túbulo proximal com conseqüente aumento do AMP cíclico e diminuição do co-transportador Na⫹-HCO3⫺. • Os canais de água dos túbulos proximais (Aquaporin 1) e dos ductos coletores (Aquaporin 2, 3 e 4) já foram clonados. Quando se dispuser de inibidores específicos de aquaporinas, haverá a possibilidade de induzir diurese via redução da reabsorção de sódio nos túbulos proximais e de água nos ductos coletores. • Os canais apicais de potássio (ROMK) estão sendo alvos moleculares para o desenvolvimento de fármacos poupadores de potássio.
786
Diuréticos. Mecanismos de Ação e Uso Clínico
• Ao longo dos últimos dez anos, na área dos anti-hipertensivos, parece estar ocorrendo uma tendência no sentido de um menor uso de diuréticos, betabloqueadores e bloqueadores dos canais de cálcio e uma maior prescrição de inibidores da ECA e de antagonistas dos receptores de AII, em especial em pacientes geriátricos. Tal tendência, multifatorial, parece contrariar evidências claras, farmacoeconômicas, que favorecem o uso dos diuréticos.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BRATER, D.C. Diuretic therapy. N. E. J. Med., 339:387-395, 1998. BRATER, D.C. Resistance to diuretics: mechanisms and clinical implications. Adv. Nephrol. Necker Hosp., 22:349–69, 1993. FAGARD, R.; BIELEN, E.; STAESSEN, J.; THISS, L.; AMERY, A. Response of ambulatory blood pressure to antihypertensive therapy guided by clinic pressure. Am. J. Hypertens., 6:648–53, 1993. FLISER, D.; ZURBRUGGEN, I.; MUTSCHLER, E. et al. Coadministration of albumin and furosemide in patients with the nephrotic syndrome. Kidney Int., 55:629-634, 1999. GIEBISCH, C. Diuretic action of potassium channel blockers. Eur. J. Clin. Pharmacol., 44(suppl 1):S3-S5, 1993.
GREGER, R.; LOHRMANN, E.; SCHLATTER, E. Action of diuretics at the cellular level. Clinical Nephrology, 38 (suppl):S64–S68, 1992. GROSSMAN, E.; MESSERLI, F.H. e GOLDBOURT, U. Does diuretic therapy increase the risk of renal cell carcinoma? Am. J. Cardiol. 83:10901093, 1999. HUMPHREYS, M.H. Mechanisms and management of nephrotic edema. Kidney Int., 45:266–81, 1994. LEVI, B.I.; AMBROSIO, G.; PRIES, A.R. et al. Microcirculation in hypertension: a new target for treatment? Circulation, 104:735-740, 2002. MANSON, L. Future goals for the treatment of hypertension in the elderly with reference to STOP-Hypertension, SHEP and the MRC trial in older adults. Am. J. Hypertens., 6:40S–43S, 1993. ONDER, G.; GAMBASSI, G.; LANDI, F. et al. Trends in antihypertensive drugs in the elderly: the decline of thiazides. J. Hum. Hypertension, 15:291-297, 2001. REYES, A.J.; LEARY, W.P. Clinicopharmacological reappraisal of the potency of diuretics. Cardiovasc. Drugs Ther., 71(suppl 1):23–28, 1993. ROHDES, K. Diuretics in clinical practice. The Practitioner, 237:49–52, 1993. ROSE, B.D. Diuretics. Kidney Int., 39:336–52, 1991.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Hypertension, Dialysis, and Clinical Nephrology; Renal Disease Electronic Journal. http://www.hdcn.com/ UptoDate. http://www.uptodate.com
Capítulo
45
Drogas Anti-hipertensivas Abrahão Salomão e Lúcio Silva
INTRODUÇÃO
ANTAGONISTAS DO CÁLCIO
BLOQUEADORES DOS RECEPTORES
ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES DA ANGIOTENSINA II
BETA-ADRENÉRGICOS
VASODILATADORES DE AÇÃO DIRETA
AGENTES ANTIADRENÉRGICOS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
INIBIDORES DA ECA
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO Em 1945, no balneário russo de Yalta, o presidente americano Franklin Delano Roosevelt negociou, com Joseph Stalin e Winston Churchil, o futuro da Europa depois da Segunda Guerra Mundial. Sua pressão arterial era de 230/ 130 mmHg. Não havia, na época, drogas disponíveis para tratar hipertensão de tal magnitude. Dois meses depois, ele morria de hemorragia cerebral. Atualmente, existem mais de 60 drogas, com mecanismos definidos de ação, disponíveis para tais tratamentos. É óbvio que o médico se tornou mais hábil para controlar esta enfermidade, mas é difícil que se lembre, sem vacilar, do nome químico, do nome comercial, das diversas formulações de cada produto, do seu preço e, principalmente, dos seus efeitos colaterais e de suas precisas indicações. Preste atenção e tente lembrar-se de quantos produtos existem no mercando usando, por exemplo, enalapril (um dos mais utilizados anti-hipertensivos do mundo, só para simplificar o desafio), quais são as suas apresentações, se há diferenças expressivas de preço entre os diversos fabricantes, quais as situações ideais em que se deve usá-lo, e que efeitos colaterais mais indesejáveis pode causar. Convenhamos, se o expositor conseguir ordenar todos esses aspectos, poderia simplificar o receituário destinado a este significativo grupo de pacientes, os que padecem dessa “epidemia” nos léxicos denominada hipertensão arterial.
Tentando atingir este objetivo, os diversos agentes antihipertensivos disponíveis serão classificados de acordo com suas propriedades farmacológicas (Quadro 45.1). No Cap. 44 desta edição já se abordou o primeiro desses grupos, o dos diuréticos.
Quadro 45.1 Classes de drogas anti-hipertensivas Diuréticos Bloqueadores beta-adrenérgicos Agentes antiadrenérgicos de ação central e periférica Inibidores da ECA Bloqueadores dos receptores da angiotensina II Antagonistas dos canais de cálcio Vasodilatadores diretos
BLOQUEADORES DOS RECEPTORES BETA-ADRENÉRGICOS Os inibidores adrenérgicos, ou bloqueadores beta-adrenérgicos, englobam drogas que inibem os efeitos das catecolaminas via beta-receptores. São drogas que se antepõem aos efeitos inotrópicos e cronotrópicos positivos da epinefrina e norepinefrina.
788
Drogas Anti-hipertensivas
Diversos beta-bloqueadores, como o atenolol e o metoprolol, são denominados cardiosseletivos. Isto equivale a dizer que só bloqueiam os receptores do tipo beta-1, não inibindo, em doses baixas, os receptores vasculares e traqueais, do tipo beta-2. Esta cardiosseletividade é irrelevante quanto à eficácia anti-hipertensiva, mas tem importância quando se consideram efeitos colaterais. Diminuem o débito cardíaco e a atividade de renina plasmática (ARP); aumentam a resistência vascular sistêmica (RVS). Não se deve postular que possam ser usados nos asmáticos de modo irrestrito, visto que podem intensificar as crises. Os bloqueadores beta não-seletivos e os beta-1-seletivos apresentam efeitos metabólicos adversos, como moderada elevação na glicose plasmática, aumento na resistência à insulina, redução na fração HDL do colesterol e elevação nos triglicérides.22,23 Alguns beta-bloqueadores são lipossolúveis, permitindo rápido metabolismo hepático e maior penetração na
Quadro 45.2 Bloqueadores -adrenérgicos -BLOQUEADORES CARDIOSSELETIVOS ATENOLOL BETAXOLOL METOPROLOL NÃO-CARDIOSSELETIVOS NADOLOL PROPRANOLOL TIMOLOL COM ATIVIDADE SIMPATOMIMÉTICA INTRÍNSECA ACEBUTOLOL CARTEOLOL PENBUTOLOL PINDOLOL ␣ e -BLOQUEADORES LABETALOL
barreira hematoencefálica, o que pode provocar insônia e mudanças de temperamento. O propranolol e o timolol são drogas com este perfil. O metoprolol pode reduzir a morbidade e a mortalidade após o infarto do miocárdio. Tem sido proposto também que os inibidores da atividade simpática, se comparados aos inibidores da ECA, podem levar à redução na qualidade de vida do paciente, com o aparecimento de fadiga, depressão ou redução na capacidade de exercícios,24 proposição não confirmada por outros estudos. Outro critério que individualiza alguns beta-bloqueadores é a ”atividade simpatomimética intrínseca” (ASI) (Quadro 45.3). Os que a possuem exercem atividade agonista parcial, estimulando beta-receptores. Portanto, é menor a queda do débito cardíaco, da freqüência cardíaca e dos níveis de renina, e há uma conseqüente queda na resistência vascular periférica. Pindolol e oxprenolol poderiam ser prescritos a pacientes que necessitem terapia beta-bloqueadora mas que são bradicárdicos, portadores de disfunção sistólica ou de vasculopatia periférica. Os beta-bloqueadores podem ser utilizados como drogas de primeira linha na terapêutica anti-hipertensiva principalmente nos seguintes tipos de pacientes: com infarto do miocárdio anterior, taquicardia de repouso (normalmente refletindo um aumento na atividade adrenérgica), insuficiência cardíaca congestiva por disfunção diastólica e em alguns casos de disfunção sistólica, enxaqueca, glaucoma,25 nos portadores de miocardiopatia hipertrófica, nos que têm ARP elevada, nos que possuem arritmias e nos portadores de transtorno de ansiedade. Não deveriam ser prescritos aos deprimidos, bradicárdicos, havendo bloqueio AV de 2.º e 3.º graus, na presença de doenças pulmonares obstrutivas, ou de doença arterial obstrutiva periférica. Os antiinflamatórios não-esteróides podem reduzir o efeito anti-hipertensivo dos beta-bloqueadores. A cimeti-
Quadro 45.3 Características dos principais bloqueadores beta-adrenérgicos disponíveis no Brasil Agente Atenolol Metoprolol Betaxolol Nadolol Propranolol Timolol Acebutolol Carteolol Penbutolol Pindolol Carvedilol*
Dose (adulto) 50–100 mg/dia 50–100 mg BID 10–40 mg/dia 40–320 mg/dia 40–160 mg BID 10–60 mg/dia 400–1.200 mg/dia 2,5–10 mg/dia 20–80 mg/dia 5–20 mg BID 12,5–50 mg/dia
*Bloqueio de receptores alfa- e beta-adrenérgicos. **ASI: atividade simpatomimética intrínseca.
ASI**
Beta-1-seletividade
Meia-vida plasmática
⫺ ⫺ ⫺ ⫺ ⫺ ⫺ ⫹ ⫹ ⫹ ⫹ ⫺
⫹ ⫹ ⫹ ⫺ ⫺ ⫺ ⫹ ⫺ ⫺ ⫺ ⫺
6a8h 3a4h 16 a 20 h 14 a 18 h 3a5h 4h 3a4h 5a6h 20 h 3a4h 4a7h
789
capítulo 45
dina pode elevar seus níveis séricos e o fenobarbital pode reduzi-los. O bloqueio dos adrenorreceptores beta-2 pode ocasionar redução na glicogenólise muscular e predispor hipoglicemia nos diabéticos insulino-dependentes, nos urêmicos desnutridos, ou nos pacientes com insuficiência hepática. Além disso, podem mascarar os sintomas da hipoglicemia, retardando, assim, intervenções terapêuticas aplicáveis para corrigi-la. O relatório do VI Joint National Committee endossa, novamente, o uso dos diuréticos e beta-bloqueadores como agentes de primeira linha na terapêutica da hipertensão, pela sua reconhecida eficácia em reduzir a incidência de acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca congestiva e, em menor extensão, eventos cardíacos isquêmicos. Existe atualmente uma nova classe de beta-bloqueadores, a do Carvedilol, que tem atividade beta-bloqueadora não-seletiva associada a bloqueio dos receptores alfa. Esta classe de medicamentos pode ser usada no tratamento de hipertensão, nas formas leves a moderadas de insuficiência cardíaca congestiva (NYHA Class 2-3) em algumas formas de angina e nas arritmias. Para encerrar a abordagem dos beta-bloqueadores como drogas benéficas para o tratamento da hipertensão, cita-se
Pontos-chave: • Beta-bloqueadores cardiosseletivos: só bloqueiam os receptores do tipo beta-1, não inibindo, em doses baixas, os receptores vasculares e traqueais, do tipo beta-2. Esta cardiosseletividade é irrelevante quanto à eficácia anti-hipertensiva, mas tem importância quando se consideram efeitos colaterais • Os bloqueadores beta não-seletivos e os beta-1-seletivos apresentam efeitos metabólicos adversos, como moderada elevação na glicose plasmática, aumento na resistência à insulina, redução na fração HDL do colesterol e elevação nos triglicérides • Outro critério que individualiza alguns beta-bloqueadores é a ”atividade simpatomimética intrínseca” • Beta-bloqueadores não deveriam ser prescritos aos deprimidos, bradicárdicos, havendo bloqueio AV de 2.º e 3.º graus, na presença de doenças pulmonares obstrutivas, ou de doença arterial obstrutiva periférica
um paciente real para quem tais produtos são considerados adequados: adulto do sexo masculino, com PA 180/ 100 mmHg, freqüência cardíaca de 100 bpm, branco. Não é portador de diabetes, não tem dislipidemia. É calmo e dorme bem. Nunca teve asma nem outras doenças pulmonares. A função renal é normal. Não se aconselharia, porém, o uso destas drogas neste outro paciente: adulto do sexo feminino, com 60 anos, com PA 230/120 mmHg, freqüência cardíaca de 68 bpm, negra. Longa história de diabetes e níveis glicêmicos muito flutuantes. Função renal rebaixada (sem, porém, atingir níveis de diálise), desnutrida, pulsos periféricos com amplitude reduzida e disfunção sistólica incipiente.
AGENTES ANTIADRENÉRGICOS Este grupo de drogas, em conjunto, é muito usado no tratamento da hipertensão. O mecanismo de ação dos agentes de atuação central se dá pelo estímulo dos receptores alfa-2-adrenérgicos no tronco encefálico, provocando inibição da atividade simpática eferente. Pertencem a esse grupo: alfa-metildopa, clonidina, guanabenz e guanfacina. Estas drogas provocam redução na RVS (resistência vascular sistêmica) e não têm efeitos adversos sobre o metabolismo de lípides e carboidratos. Entretanto, não são bem tolerados: causam sedação, boca seca, hipotensão postural e prejudicam a atividade sexual. Sua retirada intempestiva pode causar crises hipertensivas. A alfa-metildopa pode causar hepatite crônica ativa. O uso corrente destas drogas é relativamente limitado, particularmente como terapêutica de primeira linha, devido à incidência relativamente alta desses efeitos colaterais. A clonidina tem ação mais rápida e é eleita por muitos, na dose oral de 0,3 mg, quando se precisa de redução urgente dos níveis pressóricos. A alfa-metildopa tornou-se
Quadro 45.4 Agentes antiadrenérgicos de ação central e periférica ATUAÇÃO CENTRAL ␣-Metildopa Clonidina Guanabenz Guanfacina ATUAÇÃO PERIFÉRICA Guanadrel Guanetidina Reserpina BLOQUEADORES DOS RECEPTORES ␣1 Doxazosin Prazosin Terazosin
790
Drogas Anti-hipertensivas
agente de escolha na gravidez, por sua apregoada ausência de efeitos fetais adversos. Porém, as pacientes podem desenvolver teste direto de Coombs positivo, embora só ocorra hemólise clinicamente aparente em proporção mínima.
Pontos-chave: Agentes antiadrenérgicos • Provocam redução na RVS (resistência vascular sistêmica) e não têm efeitos adversos sobre o metabolismo de lípides e carboidratos • Causam sedação, boca seca, hipotensão postural e prejudicam a atividade sexual. Sua retirada intempestiva pode causar crises hipertensivas • Uso corrente dessas drogas é relativamente limitado, particularmente como terapêutica de primeira linha, devido à incidência relativamente alta desses efeitos colaterais • A alfa-metildopa tornou-se agente de escolha na gravidez, por sua apregoada ausência de efeitos fetais adversos Ressalte-se que são drogas de moderada intensidade de ação, atuando tanto em hipertensos jovens quanto nos mais idosos. Nestes últimos, a sedação que ocasionam deve ser sempre lembrada, ao se prescrevê-las, evitando utilizá-las em indivíduos que desempenhem atividades que exijam atenção e estado de vigília.
Apesar do surgimento de novas classes de drogas antihipertensivas, os simpaticolíticos de ação central permanecem como um grupo de medicamentos de valor no tratamento da hipertensão. Entre suas qualidades estão: sua eficácia, suas relativamente limitadas contra-indicações, ausência da maioria dos efeitos colaterais metabólicos graves; seus efeitos hemodinâmicos favoráveis; seu custo relativamente baixo, sua capacidade em reverter hipertrofia ventricular esquerda e sua utilização adequada no idoso, na hipertensão sistólica isolada e em pacientes com várias condições concomitantes, como o diabetes mellitus.26 Rilmenidina e moxonidina são bloqueadores simpáticos com características peculiares. São compostos oxazolínicos, com maior seletividade aos receptores imidazolínicos I1 do que aos receptores ␣-2-adrenérgicos, distinguindo-se dos agonistas ␣-2 de referência. Os agentes antiadrenérgicos de atuação periférica são pouco utilizados. A guanetidina inibe a liberação de noradrenalina das terminações nervosas simpáticas. Freqüentemente, provoca hipotensão ortostática e até lipotímia; igualmente incômoda é a disfunção sexual. Sua ação é muito mais pronunciada que a da reserpina. O início de ação pode ocorrer em poucas horas, mas pode levar até três dias para se completar. Tem prolongada duração de ação; seus efeitos podem persistir por uma semana, uma vez interrompida. Este tempo pode ser mais prolongado com a reserpina. No glaucoma, reduz a pressão intra-ocular. Aumenta a motilidade gastrointestinal, por depleção de serotonina. Se associada a inibidores da MAO, forma uma combinação potencialmente letal. Aumenta a resposta pressora de simpatomiméticos de ação direta. Doses superiores a 50 mg exigem muita cautela, mas podem ser to-
Quadro 45.5 Características dos principais agentes antiadrenérgicos de ação central e periférica Ação central Droga Dose (dia) Alfa-metildopa 250–1.500 mg Clonidina 0,1–0,6 mg Guanabenz 4–64 mg Guanfacina 1–3 mg Rilmenidina 1–2 mg Moxonidina 200–600 mg Ação periférica Droga Dose (dia) Guanadrel 20–75 mg Guanetidina 20–50 mg Reserpina 250–500 µg Bloqueadores dos receptores alfa-1 Droga Dose (dia) Prazosin 2–20 mg Terazosin 1–20 mg Doxazosin 2–16 mg Bloqueador dos receptores alfa-1 e agonista serotoninérgico Droga Dose (dia) Urapidil 60–80 mg
Número de tomadas 2 2 2 1 1–2 1 Número de tomadas 2 ou mais 1 1 Número de tomadas 2 1 1 Número de tomadas 2
791
capítulo 45
madas uma vez por dia. Se já é pouco utilizada, a reserpina pode ser ignorada. O urapidil é uma droga de ação dupla: bloqueia receptores periféricos alfa-1-adrenérgicos e tem outra ação, central: estimula receptores serotoninérgicos no sistema nervoso central, diminuindo a atividade simpática. É bem tolerado em doses a partir de 30 mg duas vezes ao dia. Os bloqueadores alfa-1-seletivos (prazosin, terazosin e doxazosin) representam a única classe de agentes anti-hipertensivos que podem ter o efeito combinado de reduzir o LDLcolesterol, aumentar os níveis de HDL-colesterol e melhorar a sensibilidade à insulina. Estão, entretanto, associados a alguns efeitos colaterais desagradáveis, como vertigens (raramente síncope), cefaléia e fraqueza.27 Estes agentes podem desencadear o chamado “efeito de primeira dose”, 30 a 90 minutos após a administração oral, razão de se prescrever a primeira dose em ingestão noturna, com o paciente já deitado. Em estudos multicêntricos, são drogas úteis, de média eficácia, atuando em qualquer raça ou faixa etária. Notadamente, o doxazosin pode melhorar a resistência periférica à insulina, no hipertenso com diabetes não-insulino-dependente, talvez por aumentar o fluxo sangüíneo periférico aos músculos esqueléticos; pode também interferir com a produção hepática de glicose. A titulagem da dose efetiva pode ser exaustiva, mas reduções são desnecessárias na insuficiência renal. Não reduzem o débito nem a freqüência cardíaca. Os bloqueadores alfa-1 não devem ser usados como antihipertensivos de primeira linha. Uma exceção seria um homem idoso com hiperplasia prostática benigna, em que um bloqueador alfa-1 pode levar a uma melhora nos sintomas urológicos. Eis o perfil de um paciente a quem a droga poderia ser recomendada isoladamente ou em combinação: adulto jovem, levemente obeso, diabético controlado com dieta e sulfonamida, pardo, sem disautonomia, operador de máquinas pesadas, com PA 170/105 mmHg, com colesterol total e fração LDL elevados, creatinina sérica de 2 mg/dl.
Pontos-chave: Simpaticolíticos — qualidades • Eficácia • Limitadas contra-indicações • Ausência da maioria dos efeitos colaterais metabólicos graves • Efeitos hemodinâmicos favoráveis • Custo relativamente baixo • Capacidade em reverter hipertrofia ventricular esquerda • Utilização adequada no idoso, na hipertensão sistólica isolada e em pacientes com várias condições concomitantes, como o diabetes mellitus
INIBIDORES DA ECA Os efeitos da angiotensina II no rim incluem a modulação do fluxo sangüíneo, da taxa de filtração glomerular, da reabsorção tubular de sódio e água e, finalmente, a inibição da liberação de renina. Na cortical da adrenal estimula a biossíntese de aldosterona pela zona glomerulosa. No sistema nervoso central, o peptídeo age mediando uma resposta pressora direta, aumentando a atividade simpática aferente, tem um efeito dipsogênico e estimula a secreção de vasopressina e ACTH. Atua ainda no sistema nervoso autônomo periférico (em nível ganglionar) e facilita a liberação de catecolaminas.10 O efeito dos inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) na função renal e no paciente hipertenso está relacionado tanto às ações da angiotensina II quanto ao mecanismo de auto-regulação da taxa de filtração glomerular.28 Os IECA bloqueiam a conversão da angiotensina I (AI) em angiotensina II (AII). O declínio da pressão arterial deve-se, portanto, à redução da formação de angiotensina II. A enzima conversora da angiotensina é também uma cininase, e sua inibição pode levar a um aumento nos níveis de cininas (bradicininas, p. ex.). Isto pode contribuir para a resposta hipotensora, tanto por vasodilatação direta quanto por aumento na produção de prostaglandinas vasodilatadoras. Os IECA produzem redução da concentração de aldosterona e da resistência vascular sistêmica (RVS) e não atuam sobre o débito cardíaco. A elevação plasmática de potássio é o maior estímulo para a liberação de aldosterona. A ação inibitória dos IECA sobre a produção de aldosterona pode levar ao risco de hipercalemia, se estas drogas forem utilizadas nos renais crônicos ou nos portadores de hipoparatireoidismo, ou se associadas a diuréticos poupadores de potássio, bem como a antiinflamatórios não-esteróides.29 Entre seus principais efeitos colaterais estão aqueles relacionados direta ou indiretamente à redução na formação da angiotensina II: hipotensão, insuficiência renal aguda, hipercalemia e problemas durante a gravidez. Outras complicações estariam relacionadas ao aumento nas cininas: tosse, edema angioneurótico e reações anafilactóides.30 As alterações hemodinâmicas que produzem dentro dos capilares glomerulares causam insuficiência renal aguda ou
Quadro 45.6 Os agentes que bloqueiam a enzima conversora de angiotensina BENAZEPRIL CAPTOPRIL CILAZAPRIL ENALAPRIL SPIRAPRIL
FOSINOPRIL RAMIPRIL LISINOPRIL QUINAPRIL PERINDOPRIL
792
Drogas Anti-hipertensivas
agravam a insuficiência renal crônica nos pacientes com estenose bilateral de artérias renais, estenose arterial em rim único e havendo grave insuficiência cardíaca congestiva. Os inibidores da ECA que contêm grupamento carboxila (enalapril, benazepril) são pré-drogas, ou seja, são convertidas in vivo no metabólito ativo. A exceção é o lisinopril, que tem, entretanto, baixa disponibilidade oral. Outra classe dos inibidores da ECA é a dos que contêm grupamentos fosforila (fosinopril). Estes não se acumulam em vigência de insuficiência renal, sendo parcialmente eliminados pelo fígado. Concorda-se que sejam mais eficazes nos hipertensos com atividade de renina plasmática (APR) elevada, embora possam também diminuir efetivamente a PA em pacientes com APR reduzida. A população de idosos hipertensos pode beneficiar-se dos inibidores da ECA, sempre tendo-se em conta que, neste grupamento, a simples determinação de creatinina pode não retratar a real função renal (em termos de filtração glomerular): eles têm massa muscular total reduzida e, portanto, geram menos creatinina. Podem, assim, ser portadores de insuficiência renal com níveis normais de creatinina. Os inibidores da ECA não alteram de modo significativo os níveis plasmáticos de lipídios. Também são reduzidos alguns efeitos indesejáveis comuns a outros anti-hipertensivos, como hipotensão postural, cansaço e disfunção sexual. Estudos recentes sugerem uma intrigante relação entre o sistema renina-angiotensina e a resposta antiproteinúrica à inibição da ECA. Pacientes com polimorfismo DD (deletion/deletion) do gene da enzima conversora da angiotensina parecem apresentar progressão mais rápida para doença renal e também melhor resposta antiproteinúrica aos inibidores da ECA. Por outro lado, a excreção de proteína tende a permanecer estável após inibição da ECA naqueles pacientes com polimorfismo ID (insertion/deletion) ou genótipo II (insertion/insertion). A inibição da ECA estaria associada a menor redução na taxa de filtração glomerular e a retardo da progressão para doença renal terminal em homens (mas não em mulheres) com genótipo DD. No entanto, não foram observados efeitos benéficos em homens com genótipo ID ou II.31
Um aspecto muito importante deste grupo de drogas é o potencial de redução da microalbuminúria e da proteinúria nos diabéticos, numa gama de glomerulonefrites e na hipertensão essencial. Estudos multicêntricos têm dado suporte a tal afirmativa. O estudo REIN (Ramipril Efficacy in Nephropathy) mostrou efeitos positivos do ramipril na redução da taxa de progressão da insuficiência renal e da necessidade de diálise em pacientes com glomerulonefrite crônica não-diabética.32 O estudo HOPE (Heart Outcomes Prevention Evaluation), que avaliou pacientes de alto risco portadores de coronariopatias, doenças vasculares, diabetes e insuficiência renal, demonstrou redução na incidência de eventos cardiovasculares com o ramipril.34 O estudo com benazepril mostrou importante redução na proteinúria, nos níveis pressóricos e na progressão para doença renal terminal.35 Ignora-se se a redução da microalbuminúria na hipertensão essencial prenuncia redução de risco de progresso da doença renal. Na glomerulonefrite diabética tal dúvida não parece existir. A hipertensão é claramente um marcador de doença cardiovascular, renal e oftálmica nos diabéticos. Em alguns diabéticos, a microalbuminúria é considerada um marcador de nefropatia; revertê-la com inibidor da ECA parece justificado, ainda que o paciente seja normotenso e que não possa ser dito que “o inibidor da ECA é renoprotetor pelo controle pressórico”. Pelo que se sabe até a presente data, os inibidores da ECA não conseguiram evitar que novos casos de insuficiência renal terminal continuassem a ocorrer, apesar da redução nas taxas de progressão da doença renal conseguida com estes medicamentos. A progressão da nefropatia foi atenuada com inibidores da ECA em um grupo comparado com outro que recebeu anti-hipertensivos convencionais. A A II é capaz de aumentar a síntese protéica, induzindo proto-oncogênese e estimulando gens de fatores de crescimento. São tantos hoje os fatores estimulantes de crescimento de células musculares lisas que não se sabe exatamente a primazia que a A II ocupa entre eles. Não obstante, especula-se muito sobre o benefício de se inibir a A II por tais razões. O uso dos inibidores da ECA tornou-se recomendado pelo VI Joint National Committee para o tratamento da
Quadro 45.7 Características dos principais inibidores da ECA Droga Benazepril Captopril Cilazapril Enalapril Fonisopril Lisinopril Ramipril Perindopril
Início de ação
Duração
Excreção
Dose diária máxima
30 min <30 min 60 min 60 min 60-120 min 120 min 60-120 min 60 min
24 h 6h 24 h Até 24 h 24 h 24-36 h 24 h 24 h
Renal/hepática Renal Renal Renal Renal/hepática Renal Renal Renal
30 mg ⬍150 mg 5 mg 30 mg 30 mg 30 mg 20 mg 8 mg
793
capítulo 45
nefropatia diabética, da disfunção sistólica e, associados a diuréticos, na insuficiência cardíaca congestiva.36 Podem ser prescritos como monoterapia, com controle pressórico em torno de 40% dos casos, preferencialmente em indivíduos da raça branca. Em alguns casos, a tosse se torna um fator limitante ao uso dos inibidores da ECA. Ela é atribuída à hiper-reatividade brônquica, ao acúmulo de cininas, substância P, tromboxane ou prostaglandinas. Curiosamente, o seu uso em asmáticos com acentuada hiper-reatividade a histamina e bradicinina não produziu tosse ou broncoespasmo. Os inibidores da ECA não são anti-hipertensivos muito potentes, embora o seu efeito se acentue em vigência de dieta hipossódica ou em associação com diuréticos e antagonistas de canais de cálcio. São usados em ambos os sexos, em qualquer idade, sendo menos eficientes em negros. Não são recomendados em mulheres grávidas.
Pontos-chave: • Os IECA bloqueiam a conversão da angiotensina I (AI) em angiotensina II (AII), reduzindo a pressão arterial • A enzima conversora da angiotensina é também uma cininase, e sua inibição pode levar a um aumento nos níveis de cininas (bradicininas, p. ex.), contribuindo para a resposta hipotensora, tanto por vasodilatação direta quanto por aumento na produção de prostaglandinas vasodilatadoras • A ação inibitória dos IECA sobre a produção de aldosterona pode levar ao risco de hipercalemia, se estas drogas forem utilizadas nos renais crônicos ou nos portadores de hipoparatireoidismo, ou se associadas a diuréticos poupadores de potássio, bem como a antiinflamatórios não-esteróides • Os IECA podem causar (por alterações hemodinâmicas) insuficiência renal aguda ou agravar a insuficiência renal crônica nos pacientes com estenose bilateral de artérias renais, estenose arterial em rim único e havendo grave insuficiência cardíaca congestiva • Tosse pode tornar-se um fator limitante ao uso dos inibidores da ECA • Os inibidores da ECA não são antihipertensivos muito potentes, embora o seu efeito se acentue em vigência de dieta hipossódica
ANTAGONISTAS DO CÁLCIO O cálcio intracelular é muito importante no sistema cardiovascular, regulando a mecânica excitação-contração, a atividade do marcapasso cardíaco e a condução átrio-ventricular. Regula a secreção de diversos hormônios pressores ou depressores, como catecolaminas, renina, aldosterona e prostaglandinas. O fluxo de cálcio do espaço extracelular (EC) para o intracelular (IC) é regulado por diversos canais de membrana. Os antagonistas dos canais de cálcio (ACC) inibem a entrada do íon primariamente nos canais que dependem de voltagem e, em menor escala, nos canais operados por receptores adrenérgicos que estão ao seu redor. A contração muscular depende do aporte de cálcio ao compartimento IC: ou migrando do compartimento EC pelos canais lentos (responsáveis pela contratilidade do miocárdio e do músculo liso vascular, alterando também a condução elétrica e a excitabilidade das células do marcapasso), ou sendo liberado do retículo citoplasmático. Com a elevação da concentração IC, o cálcio se liga à calmodulina, aproxima as fibras contráteis e, com isto, desencadeia a contração muscular. Os antagonistas do cálcio inibem a entrada do cálcio para a célula, impedindo a ativação das proteínas contráteis musculares. São ativos e de média potência como agentes anti-hipertensivos devido ao relaxamento muscular liso, o que explica sua eficiência em reduzir a RVS. A última década consagrou os antagonistas do cálcio no tratamento da hipertensão arterial. Contudo, são diferentes quanto a seletividade e farmacocinética, razão pela qual serão estudados separadamente. Os antagonistas do cálcio, ou bloqueadores de canais de cálcio, atualmente disponíveis, são divididos em duas categorias principais, baseadas em seus efeitos fisiológicos predominantes: as diidropiridinas (antagonistas do tipo I), que bloqueiam preferencialmente os canais de cálcio tipo lentos, e os derivados de benzodiazepinas e papaverina (verapamil e diltiazem), ou antagonistas do tipo II. Pelo menos in vitro, as diidropiridinas só atuam sobre as células do músculo liso de vasos, enquanto o verapamil é uma fenilalquilamina cujos efeitos predominam sobre o coração, diminuindo o cronotropismo e o dromotropismo. Os antagonistas do tipo I bloqueiam a entrada de cálcio nas células musculares lisas, causando vasodilatação e reduzindo a RVP. São os mais potentes e têm pequeno ou nenhum efeito sobre a contratilidade e a condução cardíacas. Podem causar cefaléia, tonturas, fotofobia, taquicardia, enrubescimento e edema periférico e hiperplasia de gengiva.37 Os antagonistas do cálcio do tipo II reduzem a freqüência cardíaca e podem causar bloqueios de condução, principalmente se combinados com beta-bloqueadores.
794
Drogas Anti-hipertensivas
Quadro 45.8 Os antagonistas do cálcio TIPO I (DIIDROPIRIDINAS) Nifedipina Amlodipina Felodipina Nicardipina Nitrendipina Isradipina TIPO II (DERIVADOS DE BENZODIAZEPINAS E PAPAVERINA) Diltiazem Verapamil
Em resumo: as diidropiridinas (como a nifedipina, a nicardipina ou a isradipina) são vasodilatadores potentes; o verapamil tem atividade depressora cardíaca e o diltiazem tem menos atividade vasodilatadora que a nifedipina e menos atividade depressora cardíaca que o verapamil. O efeito hipotensor das diidropiridinas é parcialmente atenuado pela ativação reflexa do sistema nervoso simpático e do sistema renina-angiotensina. Estas drogas tendem a aumentar discretamente a excreção de sal, e, por isso, podem baixar a pressão arterial, em parte, por um mecanismo semelhante ao dos diuréticos. São as drogas preferenciais para pacientes em uso de antiinflamatórios nãoesteróides (AINE), que diminuem a produção de prostaglandinas vasodilatadoras.37 Qual seria a razão da popularidade de que estas drogas passaram a desfrutar no tratamento da hipertensão? São várias: reduzem a RVP (que não se mantém forçosamente pelo tempo afora); contribuem para regredir hipertrofia de VE (o que é compreensível, à luz da correlação entre o hormônio da paratireóide e a hipertrofia de VE); são metabolicamente neutros; seus efeitos colaterais, quando existem, são limitados e não ameaçadores, tendendo a desaparecer; aumentam o fluxo sangüíneo muscular e auxiliam no controle da angina. É controversa sua maior atuação em pacientes mais idosos. Já que melhoram a circulação periférica, são indicados aos hipertensos que executam tarefas extenuantes, ou nos que têm inequívoca coronariopatia. Podem ser associados a outros anti-hipertensivos, entre os quais os beta-bloqueadores são os preferidos. A nifedipina se tornou a droga de escolha para o tratamento oral das emergências hipertensivas. Entretanto, a imprevisibilidade da magnitude da resposta observada sobre a pressão arterial não permite sua recomendação nessa circunstância. Por outro lado, são incapazes de reduzir a variabilidade da pressão sangüínea. Outros aspectos estimulantes ao uso destas drogas são sua segurança e eficácia em hipertensos diabéticos e dislipidêmicos.
Duas diidropiridinas (isradipina e nitrendipina), foram associadas à aspirina, tendo-se obtido um efeito benéfico no aumento do ritmo circadiano da atividade plaquetária. Os antagonistas do cálcio são eficazes e muito bem tolerados por pacientes em diálise, particularmente naqueles onde existe um claro componente de volume.42 Quanto aos efeitos antiateroscleróticos dos antagonistas do cálcio, eles existem, embora sejam observados com doses muito superiores às usadas na clínica. Com os antagonistas de segunda geração, este efeito deve ocorrer com doses semelhantes às de uso rotineiro. Sabe-se hoje que estas drogas têm efeito benéfico mínimo ou nulo no perfil lipídico. Existem recursos de monitorização ultra-sonográficos sofisticados que permitem medir, com precisão, a espessura da parede das artérias. Só o futuro definirá claramente se as diidropiridinas poderão evitar ou mesmo regredir as placas ateroscleróticas no homem. Considerando-se que a combinação de diabetes (principalmente do tipo II) e hipertensão contribuiu para o enorme aumento da doença renal terminal nos últimos anos, inúmeros autores tentaram confrontar os benefícios dos antagonistas do cálcio contra os do inibidores da ECA quanto à progressão da doença renal. Recente revisão de vários estudos clínicos que comparam inibidores da ECA e antagonistas do cálcio mostra que ambas as classes de drogas têm efeito antiproteinúrico na nefropatia diabética, com um predomínio dos inibidores da ECA. Além disto, os antagonistas do cálcio podem potencializar a queda da excreção protéica induzida pelos inibidores da ECA, nesta situação.28 Entretanto, têm menor atividade antiproteinúrica nos pacientes com doença renal não-diabética.28 Observou-se que o efeito da redução da proteinúria pode ser parcialmente independente da redução da PA. Documentando como é polêmico tal assunto, o único estudo prospectivo que comparou captopril e nifedipina em doença renal não relacionada ao diabetes não exibiu diferença significativa entre as duas drogas quanto ao declínio da função renal. Outro estudo mostrou que, em nefropatia diabética incipiente (com PA normal na maioria dos pacientes), a administração de um inibidor da ECA reduziu a microalbuminúria, enquanto a nifedipina aumentou-a em 40%. A regressão de hipertrofia de VE em pacientes tratados com antagonistas do cálcio já foi documentada em períodos de tratamento de 6 a 12 meses. A hipertensão arterial que se segue ao transplante renal tem várias causas, entre elas o controverso papel vasoconstritor da ciclosporina (efeito similar seria visto também com o tacrolimus). Em estudo que abrangeu 212 receptores, ao final de um ano a prevalência de hipertensão foi de 81,6%. Alguns médicos têm recomendado o uso do verapamil ou diltiazem no pós-transplante como terapêutica anti-hipertensiva preferencial, o que, inclusive, permitiria reduzir a dose da ciclosporina, visto que estes antagonistas do cálcio, assim como nicardipina e, em menor escala, amlodipina, inibem o metabolismo da ciclosporina.39
795
capítulo 45
Quadro 45.9 Características dos principais antagonistas do cálcio Droga Verapamil Verapamil AP Verapamil R Diltiazem Diltiazem AP Nifedipina Nifedipina R Nifedipina Oros Amlodipina Felodipina Isradipina Isradipina SRO Nitrendipina
Dose (mg/dia)
N.º tomadas/dia
Dose máxima
80-480 mg 120-480 mg 240 mg 90-360 mg 120-360 mg 30-120 mg 20-40 mg 30-120 mg 2,5-10 mg 5-20 mg 2,5-10 mg 5-10 mg 20-80 mg
2 1 1 3 2 3 1-2 1 1 1-2 2 1 1-2
480 mg 480 mg 480 mg 360 mg 360 mg 80-120 mg 80 mg 120 mg 10 mg 20 mg 10 mg 10 mg 80 mg
Estas drogas raramente causam impotência, não afetam os lipídios nem a sensibilidade à insulina, e raramente causam hipotensão ortostática. Não causam efeitos sobre o sistema nervoso central. Não há restrições para usá-las em negros. Em grandes estudos populacionais usando-se monoterapia para tratar hipertensão, o diltiazem, antagonista do cálcio eventualmente selecionado, mostrou-se menos eficaz em jovens brancos que em negros. Há efeitos colaterais seletivos que podem limitar o seu uso. Seu emprego em pós-infartados deve ser muito cuidadoso. Entre as interações medicamentosas que devem ser evitadas, devem-se citar: verapamil e beta-bloqueadores ou digitálicos; verapamil e antiarrítmicos ou digitálicos; nifedipina e beta-bloqueadores. Podem também interagir com as sulfoniluréias, agravando o diabetes tipo II. A felodipina é metabolizada pelo citocromo hepático P-450, que é inibido pela cimetidina. Por fim, observa-se o perfil de um paciente com boa indicação para tratamento com antagonistas do cálcio: in-
Pontos-chave: • Os antagonistas do cálcio do tipo I bloqueiam a entrada de cálcio nas células musculares lisas, causando vasodilatação e reduzindo a RVP • Os antagonistas do cálcio do tipo II reduzem a freqüência cardíaca e podem causar bloqueios de condução, principalmente se combinados com beta-bloqueadores • Os antagonistas do cálcio são eficazes e muito bem tolerados por pacientes em diálise, particularmente naqueles onde existe um claro componente de volume
divíduo negro, com 45 anos, com PA 170/110 mmHg, um pouco obeso, com elevado nível de colesterol (300 mg/dl), atividade física exaustiva, com ligeiro aumento da massa cardíaca e leves distúrbios da repolarização ventricular. Deve-se salientar que jovens negros respondem muito bem a antagonistas do cálcio. Contrapõe-se outra situação onde se deveria evitar o uso dos antagonistas do cálcio: adulto jovem, branco, 40 anos, usando cimetidina para dispepsia, e com BAV de 2.º grau.
ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES DA ANGIOTENSINA II Este grupo de medicamentos representa a terceira classe de antagonistas do sistema renina-angiotensina-aldosterona. A primeira classe, dos beta-bloqueadores, reduz a liberação de renina por inibição da estimulação dos receptores beta-1. A segunda, dos inibidores da ECA, bloqueia a conversão da forma inativa angiotensina I na forma ativa angiotensina II. Há dois tipos de receptores para AII: AT1 e AT2. O receptor AT1 tem grande afinidade pelo Losartan; ele pare-
Quadro 45.10 Antagonistas dos receptores da angiotensina II Droga
Dose (dia)
Número de tomadas
Candesartan Irbesartan Losartan Telmisartan Valsartan
8–16 mg 150–300 mg 50–100 mg 40–80 mg 80–160 mg
1 1 1 1 1
796
Drogas Anti-hipertensivas
ce bloquear as respostas à AII. Em nível experimental, análogos da AII com maior afinidade por tais receptores, como a saralasina, já foram utilizados. Infelizmente, a resposta hipotensora dependia do nível de ARP: se esta era baixa, os receptores não estavam ocupados, e o agonista podia agir até mesmo elevando a PA. Existem duas diferenças principais entre os inibidores da ECA e os antagonistas dos receptores da AII: quanto aos receptores afetados e quanto ao efeito sobre as cininas. Os inibidores da ECA, por impedirem a formação da AII, diminuem a atividade de ambos os subtipos de receptores, AT1 e AT2. Ao contrário, os antagonistas dos receptores da angiotensina II diminuem somente a atividade AT1. A enzima conversora da angiotensina é também uma cininase. Assim, seu bloqueio com um inibidor da ECA leva a aumento nos níveis de cininas, efeito inexistente com os antagonistas dos receptores da AII. Presume-se que a ausência de acúmulo de cininas seja responsável pela não-ocorrência de tosse nesta classe de medicamentos, ao contrário do que se observa com os inibidores da ECA. A potência anti-hipertensiva dos antagonistas dos receptores da AII é maior em pacientes com atividade de renina plasmática basal elevada.40 Uma discreta queda nos níveis plasmáticos de ácido úrico ocorre com Losartan, mas não com outros antagonistas dos receptores da AII. Este efeito pode ser atribuído a maior excreção do ácido úrico. Da mesma forma que os inibidores da ECA, os antagonistas dos receptores da AII parecem minimizar a hipocalemia e hiperuricemia induzida pelo uso de diuréticos.41,42 Com respeito à nefropatia diabética, grandes estudos têm demonstrado clara evidência de renoproteção com os antagonistas dos receptores da AII em pacientes com diabetes tipo 2.43,44 São drogas bem toleradas. Seus principais efeitos colaterais são semelhantes aos dos inibidores da ECA, como, por exemplo, aumento na incidência de hipercalemia e de insuficiência renal aguda na hipertensão renovascular e na depleção de volume circulante efetivo.45,46 A exceção são os efeitos mediados pelas cininas, particularmente a tosse.41,42 Os antagonistas dos receptores da AII são contra-indicados na gravidez. O bloqueio dos receptores AT1 resulta em maior formação de angiotensina II por atuação da renina e aumento da formação de todos os peptídeos. Estes peptídeos podem ativar o AT2, que tem grande atuação no feto.47 Em suma, estes medicamentos podem fornecer um melhor meio de contornar os efeitos adversos do sistema renina-angiotensina. É amplo o leque de possíveis indicações: hipertensão, insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral, doenças renais, prevenção de aterosclerose e de hipertrofia cardíaca.
Pontos-chave: • Há dois tipos de receptores para AII: AT1 e AT2 • Os inibidores da ECA, por impedirem a formação da AII, diminuem a atividade de ambos os subtipos de receptores, AT1 e AT2 • Os antagonistas dos receptores da angiotensina II diminuem somente a atividade AT1 • A potência anti-hipertensiva dos antagonistas dos receptores da AII é maior em pacientes com atividade de renina plasmática basal elevada • Há evidência de renoproteção com os antagonistas dos receptores da AII em pacientes com diabetes tipo 2
VASODILATADORES DE AÇÃO DIRETA Promovem relaxamento direto das células musculares lisas, causam vasodilatação arteriolar, diminuem a RVP e elevam o débito cardíaco. Têm pouco efeito sobre os vasos de capacitância. Portanto, reduzem quase exclusivamente a pós-carga com mínimo impacto sobre a pré-carga. Não se recomenda que sejam usados de modo isolado, pois, devido à retenção líquida e taquicardia reflexa, sua eficácia fica limitada. Só existem dois produtos disponíveis para uso oral: a hidralazina e o minoxidil, ambos devendo ser combinados a diuréticos e beta-bloqueadores. O minoxidil é o mais potente anti-hipertensivo disponível. Pode ser usado em uma só tomada. Sugere-se dose inicial de 2,5 mg, embora se possa chegar a 40 e até mesmo 60 mg por dia. Já a hidralazina, de manuseio mais fácil, deve ser administrada em 3 doses diárias, totalizando de 50 a 200 mg. Efeitos colaterais comuns: cefaléia, taquicardia e retenção hidrossalina. Nos pacientes portadores de coronariopatia, podem desencadear angina e infarto do miocárdio. A hidralazina, em casos raros e em doses elevadas, causa uma síndrome que se assemelha ao lúpus. O minoxidil, nos pacientes com avançada insuficiência renal ou com cardiomiopatia, pode induzir grave retenção hidrossalina com eventual expansão de volume e insuficiência cardíaca congestiva. Torna-se óbvio que diuréticos potentes podem fazer-se necessários, e até mesmo diálise pode ser requerida para remoção líquida. O metabolismo é hepático, tornando-se liberado o uso nos renais crônicos. Causa comum de recusa do paciente em se manter medicado com minoxidil é a hipertricose.
capítulo 45
Na prática, com o advento dos antagonistas do cálcio, os vasodilatadores de ação direta ficam reservados para terapêutica das formas mais graves (acelerada, maligna) de hipertensão arterial ou nos casos de acentuada resistência a outros agentes anti-hipertensivos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2.
3.
4. 5.
6.
7.
8. 9. 10. 11.
12.
13.
14.
15.
16.
17. 18.
19.
20. 21.
BAUER; J.H.; REAMS, G.P. Short and long-term effects of calcium entry blockers on the kidney. Am. J. Cardiol., 59:66A-71A, 1987. BAKRIS, G.L. Blood pressure control and progression of diabetic nephropathy: are all anti-hypertensive drugs created equal? Kidney, 3(2):61-62, 1994. BERNINI, F.; SOMA, M.R.; CORSINI, A.; PAOLETTI, R. Experimental and clinical effects of isradipine relevant to atherosclerosis. Am. J. Hypertens., 7:30S-34S, 1994. CLEMENT, D.L.; De BUYZERE, M.; DUPREZ, D. Antihypertensive effects of calcium antagonists. Am. J. Hypertens., 7:16S- 22S, 1994. De CESARIS, R.; RANIERI, G.; FILITTI, V. et al. Effects of atenolol and enalapril on kidney function on hypertensive diabetic patients. J. Cardiovas. Pharmacol., 22:208-214, 1993. EBERHARDT, R.T.; KEVAK, R.M.; KANG, P.M.; FRISHMAN, W.H. A II receptor blockade: An innovative approach to cardiovascular pharmacotherapy. J. Clin. Pharmacol., 33:1023-1038, 1993. FARSANG, C.; KAPOCSI, J.; KISS, I. et al. Hungarian isradipine study: long-term effects on blood pressure and plasma lipids. Am. J. Hypertens., 7:56S-60S, 1994. HOLLENBERG, N.H.; RAIJ, L. Angiotensin converting enzyme inhibition and renal protection. Arch. Intern. Med., 153:2426-2435, 1993. Joint National Committee V. Arch. Intern. Med., 153:154-183, 1993. KAPLAN, N.M. Clinical Hypertension, 6th ed. Williams & Wilkins, Baltimore, 1994. KASISKE, B.L.; KALIL, R.S.N.; MA, J.Z. et al. Effect of antihypertensive therapy on the kidney in patients with diabetes: A metaregression analysis. Ann. Intern. Med., 118:129-138, 1993. MASSRY, S.; GLASSOCK, R.J. Clinical aspects and management of essential hypertension. Textbook of Nephrology, 3rd edition, 62:11861217, Williams & Wilkins, Baltimore, 1995. MATERSON, B.J. Single-drug therapy for hypertension in men: A comparison of six anti-hypertensive agents with placebo. N. Eng. J. Med., 328:914-921, 1993. MIMRAN, A. e RIBSTEIN, J. Angiotensin-converting enzyme inhibitors versus calcium antagonists in the progression of renal diseases. Am. J. Hyperten., 7:73S-81S, 1994. OVERLACK, A.; MULLER, B.; SCHMIDT, L. et al. Airway responsiveness and cough induced by angiotensin converting enzyme inhibition. J. Hum. Hypertens., 6:387-392, 1992. OGIHARA, T.; RAKUGI, H.; MASUO, K. et al. Anti-hypertensive effects of the neutral endopeptidase inhibitor 5CH 42495 in essential hypertension. Am. J. Hyperten., 7:943-947, 1994. PONTICELLI, C.; MONTAGNINO, G.; AROLDI, A. et al. Hypertension after renal transplantation. Am. J. Hypert., 21:73-78, 1993. TENTSCH, S., NEWMAN, J., EGGERS, P. The problem of diabetic renal failure in the United States: an overview. Am. J. Kidney Dis., 13:11-13, 1989. TISON, P.; ULICNA, L.; JAKUBOVSKA, Z. et al. Effects of dihydropyridines and their combination with aspirin on blood pressure and circadian plateled activity in patients with essential hypertension. Am. J. Hyperten., 7:46S-49S, 1994. TOBIAN, L.; LARAGH, J.H. Editorials on Government Guidelines. Am. J. Hyperten., 7:857-858, 1994. WETZCHEWALD, D.; KLAUS, D.; GARANIN, G. et al. Regression of left ventricular hypertrophy during long-term antihypertensive treatment — a comparison between felodipine and the combination of felodipine and metoprolol. J. Intern. Med., 231:303-308, 1992.
22. 23.
24.
25.
26.
27. 28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36. 37.
38. 39. 40.
41.
42.
43.
797 AMES, R.P. Anthypertensive drugs and lipid profiles. Am. J. Hypertens., 1:421, 1988. POLLARE, T.; LITHELL, H.; MORLIN, C. et al. Metabolic effects of diltiazem and atenolol: Results of a randomized, double-blind study with parallel groups. J. Hypertens., 7:551, 1989. BOISSEL, J.P.; COLLET, J.P.; LION, et al. A randomized comparison effect of four antihypertensive monotherapies on the subjective quality of life in previously untreated assymptomatic patients: Field trail in general practice. J. Hypertens., 13:1059, 1995. KENDALL, M.J.; LYNCH, K.P.; MJALMARSON, A.; KJEKSHUS, J. Beta-blockers and sudden cardiac death. Ann. Intern. Med., 123:358, 1995. OSTER J.R.; EPSTEIN, M. Use of centrally acting sympatholytic agents in the management of hypertension. Arch. Intern. Med., 8:1638, 1991. KHOURY, A.F.; KAPLAN, N.M. Alpha-blocker therapy of hypertension. JAMA, 266:394, 1991. BRAAM, B.; KOOMANS, H.A. Renal responses to antagonist of the renin–angiotensin system. Curr. Opin. Nephrol. Hypertens., 1:89, 1996. KIFOR, I.; MOORE, T.J.; FALLO, F. et al. Potassium-stimulated angiotensin release from superfused adrenal capsules and enzymatically digested cells of the zona glomerulosa. Endocrinology, 129:823, 1991. ISRAILI, Z.H.; HALL, W.D. Cough and angioneurotic edema associated with angiotensin-converting enzyme inhibitor therapy. A review of the literature and pathophysiology. Ann. Intern. Med., 117:234, 1992. VAN ESSEN, G.G.; RENSMA, P.L.; DE ZEEUW, D.; SLUITER, W.J.; SCHEFFER, H.; APPERLOO, A.J.; DE JONG, P.E. Association between angiotensin-converting-enzyme gene polymorphism and failure of renoprotective therapy. Lancet, 13:347, 1996. Renal function and requirement for dialysis in chronic nephropathy patients on long-term ramipril: REIN follow-up trial. Lancet, 17:352, 1998. Renal insufficiency as a predictor of cardiovascular outcomes and the impact of ramipril: the HOPE randomized trial. Ann. Intern. Med., 134:629, 2001. Effect of the angiotensin-converting-enzyme inhibitor benazepril on the progression of chronic renal insufficiency. The AngiotensinConverting-Enzyme Inhibition in Progressive Renal Insufficiency Study Group. N. Engl. Med., 334:939, 1996. The sixth report of the Joint National Committee on prevention, detection, evaluation, and treatment of high blood pressure. Arch. Intern. Med., 157:2413, 1997. ABERNETHY, D.R.; SCHWARTZ, J.B. Calcium-antagonist drugs. N. Engl. Med., 341:1447, 1999. SAHLOUL, M.Z.; AL-KIEK, R.; IVANOVICH, P.; MUJAIS, S.K. Nonsteroidal antiinflamatory drugs and antihypertensives. Nephron, 56:345, 1990. BURNIER, M.; BRUNNER, H.R. Angiotensin II receptor antagonists. Lancet, 355:637, 2000. LAKE, K.D. Management of drug interactions with cyclosporine. Pharmacotherapy, 11:110S, 1991. GROSSMAN, E.; PELEZ, E.; CARROL, J.; SHAMISS, A.; ROSENTHAL, T. Hemodynamic and humoral effects of the angiotensin II antagonist losartan in essential hypertension. Am. J. Hypertens., Dec; 7(12):1041-4, 1994. TIKKANEN, I.; OMVIK, P.; JENSEN, H. A for the scandinavian study group. Comparison of the angiotensin II antagonist losartan with the ACE inibitor, enalapril, in patients with essential hypertension. J. Hypertens, 13:1343, 1995. SOFFER, B.A.; WRIGTH, J.T. JR.; PRATT, J.H. et al. Effects of losartan on a background of hydrochlorothiazide in patients with hypertension. Hypertension, 26:112, 1995. LEWIS, E.J.; HUNSICKER, L.J.; CLARKE, W.R. et al. Renal protective effect of the angiotensin-receptor antagonist ibesartan in patients with nephropathy due to type 2 diabetes. N. Engl. J. Med., 345:85, 2001.
798
Drogas Anti-hipertensivas
BRENNER, B.M.; COOPER, M.E.; DE ZEEUW, D. et al. Effects of losartan on renal and cardiovascular outcomes in patients with type 2 diabetes and nephropathy. N. Eng. J. Med., 345:861, 2001. 45. BAKRIS, G.L.; SIOMOS, M.; DEJURAN, R. et al. ACE inhibition or angiotensin receptor blockade: impact on potassium in renal failure. Kidney Int., 58:2084, 2000. 46. LEE, H.Y.; KIM, C.H. Acute oliguric renal failure associated with angiotensin II receptor antagonist. Am. J. Med., 111:162, 2001. 47. SAJI, H.; YAMANAKA, HAGIWARA, A.; IGIRI, R. Losartan and fetal toxic effects. Lancet, 357:363, 2001. 44.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.sbh.org.br/ — Sociedade Brasileira de Hipertensão. http://www.ash-us.org/ — American Society of Hypertension.
http://www.americanheart.org/presenter.jhtml?identifier ⫽1115 — American Heart Association Council for High Blood Pressure Research (CHBPR). http://www.mco.edu/org/whl/ — World Hypertension League. http://www.nathypertension.org/ — National Hypertension Association. http://www.fromatoa.org/ — National Alliance to Raise Hypertension Awareness. http://www.hypertensionfoundation.org/ — Hypertension Education Foundation. http://www.chs.md/ — The Canadian Hypertension Society.
Capítulo
46
Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal E. Barsanulfo Pereira
INTRODUÇÃO
Classificação das drogas quanto à eliminação
PARÂMETROS FARMACOCINÉTICOS Biodisponibilidade Volume aparente de distribuição Eliminação
AJUSTE DE DOSES DE MEDICAMENTOS EM INSUFICIÊNCIA RENAL Etapas do ajuste Método D
Metabolização hepática
Método I
Excreção renal
Método D/I
Diálise, hemofiltração e hemoperfusão
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
Clearance corporal das drogas
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Meia-vida biológica e constante fracional de eliminação
INTRODUÇÃO Um número substancial de medicamentos usados na prática clínica é constituído por drogas que apresentam a peculiaridade de serem eliminadas do organismo através dos rins, por meio de seus próprios princípios ativos ou de seus produtos de metabolização. Em situações de déficit das funções renais, o balanço corporal dessas substâncias pode alterar-se, resultando em quadros clínicos de intoxicação medicamentosa. Os rins, por suas características funcionais, apresentam vulnerabilidade especial às drogas. Recebem a cada minuto cerca de 20% do débito cardíaco e assim estão sujeitos a um fluxo alto de sangue que pode conter substâncias tóxicas. Estas, após serem filtradas nos glomérulos, poderão atingir elevadas concentrações intratubulares, com risco de lesões estruturais. A nefrotoxicidade, com seus vários padrões de desarranjo estrutural, freqüentemente resulta em alterações funcionais, principalmente a redução da velocidade de filtração glomerular, contribuindo para o acúmulo corporal das drogas, as quais, nes-
sas condições, poderão atingir concentrações sanguíneas cada vez mais altas. As alterações homeostáticas decorrentes da insuficiência renal têm o risco inerente de provocar mudanças na disponibilidade das drogas no organismo humano, de tal modo que concentrações sanguíneas eficazes em outras condições poderão resultar em efeitos indesejáveis em situações tais como as da uremia. As técnicas dialíticas, ao provocarem a depuração corporal de certas drogas, podem interferir sobre suas concentrações sanguíneas. Daí ser inevitável a sua reposição através de doses suplementares, objetivando restaurar os níveis terapêuticos. Depreende-se destas considerações preliminares que a prescrição racional e segura de medicamentos a qualquer paciente, principalmente aos portadores de insuficiência renal, deve objetivar a individualização terapêutica, e portanto basear-se em parâmetros farmacocinéticos. Assim, o escopo fundamental deste capítulo será a adequação da prescrição de medicamentos a pacientes nefropatas, tendo como instrumento básico e primordial a utilização desses parâmetros.
800
Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
PARÂMETROS FARMACOCINÉTICOS
ao redor de 100, 200 ou mais litros, a droga está distribuída em tecidos profundos do compartimento periférico.
Pontos-chave:
Biodisponibilidade Biodisponibilidade (F %) é a percentagem da dose administrada de um medicamento que atinge a circulação sistêmica do paciente. Depende da intensidade da absorção e da metabolização pré-sistêmica, hepática ou pulmonar, das drogas (efeito de primeira passagem). Quando são administradas por via parenteral, considera-se F 100%.
Ponto-chave: Causas mais significativas de redução da biodisponibilidade de medicamentos na insuficiência renal: • Alterações da motilidade e da absorção gastrintestinal. As primeiras, decorrentes das náuseas, vômitos e diarréia, comuns na uremia, e as segundas, devido ao aumento do pH gástrico (por maior produção de amônia devido à ação da urease) e do edema da parede intestinal. O efeito de primeira passagem, isto é, a perda de uma certa parcela de droga por metabolização após a absorção, pode alterar-se na insuficiência renal grave. Deste modo, a biodisponibilidade pode elevar-se para determinadas drogas, em conseqüência de redução intrínseca da metabolização hepática. Para outras, pode estar diminuída, quando houver maior facilidade de captação hepática, decorrente da reduzida ligação dessas drogas às proteínas plasmáticas, como na uremia.
Volume Aparente de Distribuição O volume aparente de distribuição (Vd L/kg) é um volume teórico ocupado pelas drogas, caso se dissolvessem homogeneamente pelo corpo e as suas concentrações em todas as partes fossem iguais às encontradas no plasma. Matematicamente é calculado pela divisão da dose biodisponível do medicamento pela sua concentração plasmática (Vd Dose/Cp). Depende do grau de ligação das drogas aos tecidos e proteínas e da sua lipossolubilidade. As drogas lipossolúveis ou que se ligam amplamente aos tecidos corporais geralmente possuem grandes volumes de distribuição. As drogas que se ligam às proteínas plasmáticas têm Vd menores. No indivíduo adulto, pode-se estimar, grosso modo, a extensão da disponibilidade dos fármacos no corpo. Quando os volumes de distribuição apresentam valores em torno de 5 litros, considera-se que estejam distribuídos no sistema circulatório. De 10 a 20 litros, no espaço extracelular; 20 a 30 litros, no líquido intracelular; e em torno de 40 litros, em todos os fluidos corporais. Quando o volume fica
• O volume de distribuição poderá elevar-se na insuficiência renal em decorrência de edema e ascite, principalmente quando forem drogas hidrossolúveis. • A depleção do espaço extracelular levará a efeito oposto. De qualquer modo, como o Vd é inversamente proporcional à concentração sanguínea das drogas, essas alterações poderão resultar em níveis sanguíneos inadequados. Além disso, a hipoproteinemia e o deslocamento das drogas das suas ligações protéicas poderão ocorrer na uremia, fazendo com que as doses de certos medicamentos resultem em frações livres farmacologicamente tóxicas.
Eliminação Eliminação de drogas é o desaparecimento de suas formas ativas do volume em que se distribui. Faz-se fundamentalmente pela metabolização hepática e pela excreção renal.
METABOLIZAÇÃO HEPÁTICA No fígado, a biotransformação ocorre no retículo endoplasmático dos hepatócitos, através de enzimas que promovem oxidação, redução, hidrólise, acetilação, glicuronidação, sulfatação e degradação das drogas.
Pontos-chave: • A metabolização hepática das drogas pode estar diminuída na uremia, especialmente a redução, a acetilação e a hidrólise. • Oxidação, glicuronidação e sulfatação costumam estar normais. • Muitos metabólitos ativos ou tóxicos são eliminados pelos rins. • Na insuficiência renal é mais freqüente o aparecimento de reações tóxicas a uma série de drogas.
EXCREÇÃO RENAL A excreção dos fármacos pelos rins se faz através dos processos de filtração glomerular, secreção tubular e reabsorção tubular ativa e passiva. A magnitude da eliminação dependerá do nível da velocidade de filtração glomerular e do grau de união das drogas às proteínas plasmáticas, desde que apenas as suas frações livres são submetidas à filtração.
801
capítulo 46
Ponto-chave: • Na presença de insuficiência renal ocorrerá acúmulo corporal das drogas que são excretadas predominantemente pelos rins. Concomitantemente à filtração, pode ocorrer a secreção tubular ativa, a qual acontece, de modo geral, na porção reta do túbulo proximal. A ligação das drogas às proteínas plasmáticas não influi sobre a quantidade secretada, porque há rápida dissociação do complexo droga-proteínas, nesse local. Após serem filtradas, determinadas drogas são reabsorvidas ativamente pelos túbulos renais. Outras estão sujeitas aos processos de reabsorção tubular passiva, cuja intensidade dependerá da sua concentração intratubular e da difusão retrógrada não-iônica.
Pontos-chave: A manipulação do pH urinário, ao alterar a proporção entre as frações iônica/não-iônica, pode ser usada para aumentar a excreção renal de certas drogas. • As fracamente ácidas serão mais facilmente excretadas quando se alcalinizar a urina. • As fracamente básicas, na urina mais ácida.
Diálise, Hemofiltração e Hemoperfusão Os processos dialíticos, a hemofiltração e a hemoperfusão através de cápsulas de carvão ativado podem contribuir para a remoção dos fármacos e seus metabólitos do organismo. Nos dois primeiros, apenas a fração livre das drogas, isto é, a porção não ligada às proteínas plasmáticas, é passível de ser eliminada do corpo. Na hemoperfusão, até mesmo as substâncias ligadas às proteínas podem ser removidas.
Clearance Não-renal. O clearance não-renal ou metabólico é efetuado predominantemente pela biotransformação hepática das drogas através de diversos sistemas enzimáticos. Entretanto, até hoje não se conseguiu determiná-lo. A descrição dos processos de metabolização pode ser feita, contudo, pela equação de Michaelis-Menten [2dD/dt Vm/(1 Km/D)], sendo D a dose corporal total da droga, Vm a velocidade máxima do processo metabólico e Km uma constante que se torna igual à quantidade da droga processada quando Vm é 50% do seu valor máximo. Clearance Renal e Dialítico. Os clearances renal e dialítico das drogas possuem a mesma descrição matemática dos clearances usualmente calculados para fins clínicos, como os da uréia e da creatinina. Deve-se salientar que drogas eliminadas quase totalmente pelos rins, como os antibióticos aminoglicosídeos, possuem um clearance renal que se proporciona diretamente com o da creatinina.
Meia-vida Biológica e Constante Fracional de Eliminação Outros parâmetros utilizados para a verificação da intensidade de eliminação dos fármacos são a meia-vida biológica (t1/2 ) e a constante fracional de eliminação (K). A meia-vida biológica (t1/2 horas) é o tempo decorrido para que haja uma redução de 50% na concentração plasmática de uma droga. Quando houver diminuição da eliminação corporal de um medicamento, obviamente o t1/2 prolongar-se-á. A constante fracional de eliminação (K hora, dia) é aquela fração do volume de distribuição que se depura de uma droga a cada hora ou a cada dia, sendo portanto calculada pela razão do clearance plasmático pelo volume de distribuição (K Clp/ Vd). Como t1/2 0,693/K, pode-se estabelecer a relação matemática com outras variáveis farmacocinéticas, chegando-se à seguinte equação geral: t1/2 0,693Vd/(Clr Clnr Cld).
Ponto-chave:
Pontos-chave:
• Quando a diálise ou a hemofiltração removerem mais que 20% do conteúdo corporal total de um medicamento, uma dose suplementar deverá ser administrada imediatamente após o término do procedimento, para restaurar os níveis sanguíneos terapêuticos.
Causas de prolongamento da meia-vida biológica de fármacos: • Aumento do seu volume de distribuição. • Redução de seus clearances renal e/ou não-renal.
Clearance Corporal das Drogas A intensidade de eliminação dos fármacos pode ser avaliada pela determinação do seu clearance corporal, o qual é definido como aquele volume virtual de líquido do organismo que se vê livre, a cada minuto, de uma certa massa de droga. O clearance corporal, usualmente representado pelo clearance plasmático (Clp), nada mais é que o somatório dos clearances não-renal, renal e da diálise (Clp Clnr Clr Cld).
Classificação das Drogas Quanto à Eliminação Em decorrência do que foi anteriormente exposto, as drogas podem ser classificadas segundo a sua via preponderante de eliminação em: • Drogas de eliminação renal (R). • Drogas de eliminação renal e não-renal (RNR). • Drogas de eliminação não-renal (NR).
802
Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
Clp (ml/min)
Cloxacilina (RNR)
240 200 160 120
Gentamicina (R)
80 40
Doxiciclina (NR)
20
40
60
80 100 120 Clcr (ml/min)
Fig. 46.1
A relação entre o nível de função renal através do clearance da creatinina e a magnitude da eliminação corporal por meio do seu clearance plasmático para as drogas cloxacilina, doxiciclina e gentamicina está representada na Fig. 46.1. A gentamicina é o protótipo das drogas de eliminação renal e seu clearance plasmático é diretamente proporcional ao clearance da creatinina. A doxiciclina é uma substância eliminada exclusivamente por via não-renal, tendo clearance plasmático de 40 ml/min. Finalmente, a cloxacilina apresenta um clearance plasmático de cerca de 110 ml/min, devido à excreção não-renal, e daí por diante seu clearance plasmático é diretamente proporcional à velocidade de filtração glomerular.
AJUSTE DE DOSES DE MEDICAMENTOS NA INSUFICIÊNCIA RENAL A insuficiência renal reduz o clearance plasmático dos medicamentos cujos mecanismos de eliminação dependem da integridade funcional dos rins. Nessa situação, podem acumular-se no organismo se forem administrados em suas doses usuais. É necessário que se faça, após a dose de ataque, um ajuste ao nível da função renal do paciente.
Etapas do Ajuste 1. Cálculo da velocidade de filtração glomerular (VFG). Caso não se disponha do clearance da creatinina determinado laboratorialmente, e a função renal seja estável, pode-se estimar a VFG através da fórmula:
Sexo masculino: Clcr [(140 – idade) (peso corporal em kg)]/(72 creatinina plasmática) Sexo feminino: 15% do valor estimado Em situação de função renal instável, dispõe-se desta fórmula: Sexo masculino: Clcr = {[293 – 2,03 idade] [1,035 0,01685(cr1 cr2)] 49(cr1 cr2)/dias}/cr1 cr2 Sexo feminino: 15% do valor estimado
Pontos-chave: Estas fórmulas não serão válidas nas seguintes condições: • Pacientes submetidos à diálise. • Anormalidades da massa muscular como caquexia, distrofias musculares, trauma e rabdomiólise. 2. Determinação da dose de ataque. A dose de ataque, ou dose corporal total, deve ser administrada normalmente, como no paciente sem déficit de função renal. Devese salientar, entretanto, que os medicamentos hidrossolúveis, prescritos a pacientes obesos, devem ter doses baseadas no seu peso ideal. Quando se pretende atingir uma determinada concentração plasmática alvo (Cp), sabendo-se previamente o valor do volume de distribuição (Vd) do medicamento, usa-se a fórmula: Dose de ataque Cp desejada Vd(L/kg). Por exemplo: uso de gentamicina para um paciente com 70 kg de peso corporal, Cp alvo 6 mg/L, Vd 0,25 L/kg 17,5 L. Dose de ataque: 17,5 L 6 mg/L 105 mg. Os antibióticos aminoglicosídeos, quando administrados por via endovenosa, deverão se-lo por infusão contínua, diluídos em 50 ml de soro glicosado a 5% ou solução salina isotônica, durante 30 minutos, para que as concentrações sanguíneas, imediatamente após as doses, não atinjam níveis tóxicos.
capítulo 46
3. Escolha do método de manutenção. Podemos utilizar três métodos para o ajuste de posologia de medicamentos em insuficiência renal: • Método D: redução da dose, mantendo-se o intervalo usual de administração. • Método I: prolongamento do intervalo de administração, mantendo-se a dose usual. • Método D/I: associação dos métodos D e I.
Método D Tende a resultar em concentrações terapêuticas máximas baixas e concentrações mínimas mais altas, nos pacientes com insuficiência renal. Ao evitar grandes flutuações da concentração sérica, é um método muito bom para a prescrição de drogas antiarrítmicas e digitálicos. Uma dose de ataque é sempre necessária para evitar concentrações subterapêuticas no início do tratamento.
Método I Provê concentrações máximas pós-dose e concentrações médias nos pacientes com insuficiência renal semelhantes às obtidas nos pacientes normais. Entretanto, pode resultar em níveis subterapêuticos prolongados antes da próxima dose, devido a concentrações mínimas baixas. Tem sido considerado o método mais seguro para a prescrição dos antibióticos aminoglicosídeos, ao diminuir o risco de ototoxicidade das concentrações pósdose e nefrotoxicidade relacionada às concentrações mínimas altas.
Método D/I Resulta em concentrações médias mais estáveis e evita baixas concentrações plasmáticas mínimas pré-dose. Quando se usa a via endovenosa, o modo de administração (in bolus, ou sob infusão) das doses de manutenção dos antibióticos aminoglicosídeos varia conforme o método utilizado. No método I, a administração deve ser sempre através de infusão durante 30 minutos, como salientado na etapa 2. O modo de administração, no método D, dependerá do nível da função renal do paciente e portanto da meia-vida biológica do aminoglicosídeo. Quando 1/8 do t1/2 deste antibiótico for menor que o tempo de infusão (usualmente 30 minutos), significa que a administração deve ser efetuada através de infusão. Conseqüentemente, quando 1/8 do t1/2 for maior que o tempo de infusão, a administração in bolus pode ser realizada. Em outras palavras: com Clcr 50 ml/min ⇒ infusão, com Clcr 50 ml/ min ⇒ bolus. Qualquer que seja o método de ajuste, o seu objetivo primordial é conseguir eficácia terapêutica sem toxicidade. Para tanto, a monitorização da concentração sanguínea das drogas, quando possível, é um recurso fundamental.
803
4. Consulta ao Quadro 46.1. Nele iremos encontrar 12 colunas, contendo, as seis primeiras, informações sobre as características farmacocinéticas das drogas, e as restantes, orientações sobre a prescrição dos medicamentos em condições normais e na presença de insuficiência renal. Da esquerda para a direita, encontraremos, respectivamente: a biodisponibilidade sistêmica oral; a percentagem de ligação das drogas às proteínas plasmáticas; o seu volume aparente de distribuição; a meia-vida biológica normal; a meia-vida biológica na insuficiência renal terminal; as suas maiores vias de eliminação; as doses posológicas normais; os métodos de ajuste das doses de manutenção (D, I e D/ I); o esquema de ajuste conforme estes métodos, para os níveis de filtração glomerular: 50, 10-50 e 10 ml/ min; informações sobre a necessidade de reposição de doses após a hemodiálise, diálise peritoneal ambulatorial contínua (CAPD) e hemofiltração arteriovenosa contínua (CAVH); e finalmente, na última coluna, os cuidados especiais quanto à toxicidade, interações e as alterações farmacocinéticas relevantes na presença de insuficiência renal. 5. Monitorização dos níveis séricos dos medicamentos. Ainda que o acompanhamento clínico cuidadoso e a verificação da resposta terapêutica às drogas, escudados no conhecimento das suas características farmacocinéticas, sejam essenciais em todos os tratamentos, há situações nas quais a verificação da concentração sanguínea dos medicamentos é de fundamental importância. Na presença de insuficiência renal, os fármacos eliminados predominantemente pelos rins poderão atingir níveis tóxicos. Drogas com baixo índice terapêutico, resposta terapêutica inadequada, suspeita de toxicidade, interação de drogas e insuficiência hepática são outras indicações da necessidade de monitorização. Os métodos laboratoriais utilizados para esse fim são: fotometria de chama, espectrofotometria, radioimunoensaio, cromatografia de coluna gasosa, cromatografia líquida de alta pressão e fluorescência polarizada. Alguns deles são de custo relativamente alto e não disponíveis na maioria dos hospitais, em nosso meio. As determinações devem ser efetuadas em momentos específicos durante os cursos terapêuticos. São de interesse as concentrações máximas pós-dose (pico) e as mínimas prépróxima dose (vale). Assim sendo, as coletas de sangue para as dosagens devem ser realizadas 1 a 2 horas após a dose oral ou 30 minutos a 1 hora após a dose parenteral e imediatamente antes da próxima dose. Algumas drogas, que se distribuem mais lentamente, terão o ponto ideal de coleta várias horas após serem administradas. Os níveis séricos terapêuticos de algumas drogas e os momentos ideais de coleta do sangue encontram-se no Quadro 46.2. A monitorização da concentração sérica de medicamentos, em especial dos antibióticos ami-
20-30
Acetaminofen
65-90
15
Acetoexamida
Aciclovir
15-30
70-90
Acetazolamida
70-90
26
80-90
68 3
AAS
Acebutolol 37
Ligação às proteínas (%)
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
0,800,87
0,21
0,2
0,9-1,0
1,2
0,1-0,2
1,5-3,3
6-8
1,7-5,8
1,9-2,5
3
2-4,5 H(R)
Maiores vias de excreção
R
20 R(H)
prolon- H(R) gada
?
1,9-2,5 H
inalt., R(H) diacetolol
2-4,5
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
I
I
I
D
I
Método
5 mg/kg D de 8-8/h I
250-1.500 mg/dia
250 mg/ 6-6 ou 12-12 h
650 mg de 4-4 h
400-600 mg/dia ou de 12-12 h
500 mg de 4-4 h
Dose normal
Quadro 46.1
100% 8h
12
6h
4h
100%
4h
100% 12-24 h
evitar
12 h
6h
50%
4-6 h
HD: 1 dose
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
50% 24 h
evitar
evitar
8h
HD: 1 dose, CAPD: como VFG 10/min, CAVH: 3,5 mg/kg/dia
N
N
N
30-50% N
4-6 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Neurotoxicidade na IRT, nefrotoxicidade
Hipoglicemia, falso aumento da creatinina
Acidose metabólica, hipopotassemia, nefrolitíase
Metabólitos podem se acumular na IRT, nefrotóxico em altas doses
Metabólitos ativos
Nefrotoxicidade, excreção aumentada na urina alcalina
Cuidados especiais
804 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
3
Ácido tranexâmico
90
Ácido nalidíxico
?
alta
Ácido mefenâmico
Ácido nicotínico
99
Ácido meclofenâmico
95
90
Ácido etacrínico
30
45-75
Ácido clavulânico
Ligação às proteínas (%)
?
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Ácido acetohidroxâmico
Droga
?
?
0,250,35
?
?
0,1
0,3
?
1-5
0,51,0
6
3-4
3
2-4
1
3,5-5
H
R (NR)
R
Maiores vias de excreção
?
?
21
R
H(R)
R(H)
inalH terada
inalH terada
?
3-4
15-23
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg) Método
I
D
D
D
25 mg/ D kg/8-8 a 6-6 h
1-2 g/ 8-8 h
1 g/6-6 h
250 mg/ 12-12 h
50-100 D mg/6-6 a 8-8 h
50 mg/ 8-8 h
100-200 D mg/4-4 a 12-12 h
10-15 D mg/kg/ dia
Dose normal
50%
100%
100%
100%
100%
8-12 h
100%
100%
50-75%
evitar
25%
50%
evitar
100%
100%
10%
25%
evitar
100%
100%
8-12 h evitar
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
?
N
N
N
N
HD: 1 dose normal, CAPD e CAVH: dose como para VFG 10 ml/min
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Reações tóxicas freqüentes na IRT
Acidose metabólica, acúmulo de metabólitos
Nefrotoxicidade
Nefrotoxicidade
Ototoxicidade
Usado em combinação com amoxacilina e ticarcilina
Pode acumular na IRT
Cuidados especiais
capítulo 46
805
96
20-65
Amiodarona
60
30-40
100
Amantadina
80
Amiloride 50
8,6 5,5
Alprenolol
70-80
5
80
Alprazolam
5
Amicacina
67-81
Alopurinol
88-95
Alfentanil
Ligação às proteínas (%)
40
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Alcurônio
Droga
12
2-9
9,5-19
2-8
1-3
3-3,5
70-140
5-5,2
14-120 dias
6-8
0,22-0,29 1,4-2,3
4-5
3
0,9-1,3
0,5
0,3-1
0,28-0,36 R
Maiores vias de excreção
R(H)
R
H
H
inalte- H rada
10-144 R(H)
86
500
?
inalterada
prolon- R gada
inalH terada
16
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg) D
Método
8002.000 mg 200600 mg/ dia
5 mg de 2424 h
5 mg/kg 8-8 h
100 mg de 1212 h
6-8 h
0,250,5 mg/ 8-8 h
300 mg/ dia
D
D
D I
I
D
D
D
individua- D lizada
?
Dose normal
48-72 h
100%
100%
50%
100%
evitar
168 h
100%
100%
25%
100%
evitar
100%
100%
100%
50%
100%
evitar
60-90% 30-70% 20-30% 12 h 12-18 24-48 h h
24 h
100%
100%
75%
100%
evitar
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
N
HD: 2/3 dose usual; CAPD:1520 mg/L· dia, CAVH: 20 mg/L· dia
N
N
?
HD:1/2 dose
N
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Hepatotoxicidade, disfunção tireoidiana, neuropatia periférica, fibrose pulmonar, metabólitos ativos
Hipercalemia, acidose metabólica
Nefrotoxicidade, ototoxicidade, potencialização do efeito curare
Neurotoxicidade central
Metabólitos ativos
Metabólitos ativos, nefrolitíase, nefrite intersticial
Cuidados especiais
806 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
15-25
50-80
30-60
Amoxicilina
Ampicilina
95
20-40
Anlodipina 52-88
Anrinona
5
Atenolol
57
97
Astemizol
93
90
Anfotericina B
8-20
90
Amoxapina
Ligação às proteínas (%)
96
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Amitriptilina
Droga
0,7
?
1,3-1,6
21
4
0,170,31
0,26
?
6-36
R(H)
R(H)
H
H
?
50 H(R)
H
inalte- NR rada
7-20
5-10
?
9-46
Maiores vias de excreção
6-9
15-35
R
20 dias inalte- H rada
2,6-8,3
35-50
24
0,8-1,5
0,9-2,3
8
9-46
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
I
I
I
D
D
Método
D 50-100 D mg/dia I
10 mg/ dia
5-10 g/ D kgmin ( 10 mg/ kg·dia)
5 mg/dia D
20-40 mg cada 24 h
2502.000 mg de 6-6 h
250-500 mg de 8-8 h
75-200 mg/ dia
25 mg/ 8-8 h
Dose normal
100% 24 h
100%
100%
100%
24 h
6h
8h
100%
100% 100%
100%
50% 48 h
100%
100%
100%
24 h
30-50% 96 h
100%
50-75%
100%
24-36 h
6-12 h 12-24 h
8-12 h 24 h
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
Sódio: 2,6 mEq/g
Metabólito ativo 8-hidroxiamoxapina: t1/2 30 horas
Metabólitos ativos
Cuidados especiais
HD: 25-50 mg
?
?
N
N
Acumula na IRT
Trombocitopenia, hepatotoxicidade, perturbação gastrintestinal
Nefrotoxicidade, acidose tubular renal, diabetes insipidus nefrogênico, nefropatia perdedora de potássio
Sódio: 3 mEq/g HD: 1 dose, CAPD: 250 mg de 1212 h, CAVH: 50 mg/L
HD: 1 dose, CAPD: 250 mg de 12-12 h, CAVH: 50 mg/L
?
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
capítulo 46
807
55
Aztreonam
65
95
5
Betametasona
Bezafibrato 90
Bleomicina 5
18-25
30
Azlocilina
88-98
20
Azatioprina 60
Bacampicilina
60
Aurofina
Ligação às proteínas (%)
82
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Atracúrio
Droga
0,3
0,240,35
1,4
0,170,31
0,1-2
0,180,27
0,550,8
?
0,150,18
?
inalterada
(horas)
t1/2 IRT1
H(R)
H
9
2,1
5,5
0,8-1,5
1,7-2,9
0,8-1,5
20
7,8
?
6-20
6-8
5-6
R
R
H
R(H)
R(H)
R(H)
Método
D
10-20 U/m2
200 mg/ 8-8 h
0,5-9 mg/dia
400-800 mg 1212 h
1-2 g/8-8 ou 1212 h
2-3 g d/4-4 h
D
D
D
D/I
D
I
1,5-2,5 mg/ D kg.dia
6 mg/dia
0,4-0,5 D mg/kg, depois; 0,08-0,1 mg/kg/ 15-15 a 25-25 min
Maio- Dose res normal vias de excreção
0,2 (6-MP: 0,2 (6H 0,5-1,0) MP: 0,75)
70-80 dias
0,3-0,4
Volu- t1/2 me de normal distribuição (horas) (L/kg)
100%
70%
100%
100%
100%
4-6 h
100%
50%
100%
8h
50%
evitar
100%
75%
50%
100%
50%/ 12 h
50%
25%
100%
50%/ 12-24 h
50-75% 25%
6-8 h
75%
evitar
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
Metabólito ativo: 6-mercaptopurina
Nefrotoxicidade; síndrome nefrótica
Cuidados especiais
HD: N, CAPD e CAVH:?
?
?
HD: 0,5 g, CAPD: dose como para VFG, 10 ml/min, CAVH: 50 mg/L·dia
Hipertensão arterial, fibrose pulmonar
Sódio: 2,7 mEq/g; HD: 1 dose, CAPD: acidose metabólica como hipocalêmica VFG 10 ml/min, CAVH: 100 mg/L·dia
HD: sim
N
?
Reposição pó s-HD2 CAPD3 e CAVH4
808 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
9-11
0,190,23
96
75-85
95
?
80
50-90
?
Bumetanida 95
Bupropion
Buspirona
Bussulfan
Butorfanol
Canamicina
Capreomicina
?
1
5
27-36
0,2-0,5
12
?
3,4
8,2
Bronfeniramina
6
2
1,8-5
2-4
2,5
2-3
10
1,2-1,5
25
3
6-13,6
?
40-96
?
?
5,8
?
1,5
?
?
16-32
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
90-96
23
Bretílio
Ligação às proteínas (%)
Bromocrip- 6 tina
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
R
R
H
H
H
H
R(H)
H
H
R(NR)
Maiores vias de excreção
D
D
D
D
D
D
D
D
Método
1 g/dia
I
5 mg/kg/ D 8-8 h I
2 mg/3-3 ou 4-4 h
4-8 mg/ dia
5 mg/ 8-8 h
100 mg/ 8-8 h
1-2 mg/ 8-8 ou 12-12 h
4 mg/ 4-4 a 6-6 h
1,25 mg/ 12-12 h
Ataque: 5-30 mg/kg depois: 5-10 mg/ 6-6 h
Dose normal
24 h
6090% 8-12 h
100%
100%
100%
100%
100%
?
100%
100%
50%
100%
100%
100%
100%
?
100%
24 h
48 h
30-70% 20-30% 12 h 24-48 h
75%
100%
100%
100%
100%
?
100%
25-50% 25%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
Sedação excessiva, depressão do SNC
Cistite hemorrágica
Extenso efeito de primeira passagem, acúmulo de metabólitos ativos
Metabólito ativo: t1/2 21 horas
Ototoxicidade quando em associação a aminoglicosídeos
Hipotensão ortostática
Hipotensão, metabólitos ativos
Cuidados especiais
N
Nefrotoxicidade, potencializa o efeito dos bloqueadores neuromusculares
HD: 2/3 da Nefrotoxicidade, dose normal, ototoxicidade CAPD: 15-20 mg/L·dia, CAVH: 20 mg/L·dia
?
?
HD: N, CAPD e CAVH: ?
?
N
?
?
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
capítulo 46
809
90
Carboplatina
20
15
Cefalexina 73-100
25
Cefaclor
Cefadroxil 89-93
?
Carteolol
53
?
Carmustina
5
?
75
Carbidopa
70
Carbamazepina
25-30
50-60
60-75
Captopril
Ligação às proteínas (%)
Carbenici- 30-40 lina
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
0,180,33
0,31
0,240,35
4
3,3
0,25
?
0,120,20
0,8-1,8
0,7-3,0
0,9
1,4
1
7
1-5
3
2
1,5
10-20
1,9
H(R)
R(H)
H(R)
R(H)
Maiores vias de excreção
20-40
22
3
33
?
R
R
R(H)
R
H(R)
prolon- R gada
?
10-20
?
21-32
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg) D I
Método
D I
250-500 mg/ 6-6 h
0,5-1,0 g/ 12-12 h
250-500 mg/ 8-8 h
0,5-10 mg/dia
150-200 mg/m2
I
I
D
D
D
360 mg/ D m2/4-4 semanas
25 mg/1-8 D vezes/dia
50-500 mg/kg/ dia cada 4-6 h
200 mg/ D 12-12 h até 1.200 mg/dia
25 mg/ 8-8 h
Dose normal
100% 100%
6h
12 h
100%
100%
?
100%
100% 100%
25%
?
6h
8-12 h
12-24 h 24-48 h
50-100% 50%
50%
?
55-70% evitar
100%
75% 50% 25% 8-12 h 12-24 h 24-48 h
100%
100% 75% 50% 8-12 h 12-18 h 24 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50
Quadro 46.1 (Continuação)
HD: 250 mg, CAPD: 250 mg/8-8 h, CAVH: N
HD: 0,5-1,0 g, CAPD: 0,5 g/dia
HD: 250 mg, CAPD: 250 mg/8-8 a 12-12 h
?
?
?
HD: 2 g, CAPD: 2 g de 12-12 h
N
HD: 25-35%, CAPD: N, CAVH: ?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4 10-50
Nefrotoxicidade e hepatotoxicidade
Leucopenia, plaquetopenia
Sódio: 4,7 mEq/g, alcalose metabólica hipocalêmica
Secreção inapropriada de hormônio antidiurético
Proteinúria, síndrome nefrótica, hipercalemia, leucopenia
10
Cuidados especiais
810 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
96
90
Cefonicida
Cefoperazona
65
Cefixima
43-75
80
Cefazolina
Cefmenoxima
45-60
Cefapirina
50
75
Cefamandole
Ligação às proteínas (%)
65
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Cefalotina
Droga
0,140,20
0,090,18
0,270,37
0,6-1,1
0,130,22
0,22
0,160,25
0,26
1,6-2,5
4
0,8-1,3
3,5
2
0,7
1
0,5-1
2,9
17-59
6-12
8-13
40-70
2,5
6-11
3-18
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
NR
R
R
R(NR)
R
R(H)
R
R(H)
Maiores vias de excreção
1-2 g/ 12-12 h
1 g/dia
1 g/6-6 h
200 mg/ 12-12 h
0,5-1,5 g/ 6-6 h
0,5-2,0 g/ 6-6 h
0,5-1,0 g/ 4-4 a 8-8 h
0,5-2,0 g/ 6-6 h
Dose normal
D
D
D I
D
I
I
I
I
Método
100%
100%
100% 6h
100%
8h
6h
6h
6h
75% 12 h
50%
24-48 h
12 h
12 h
12 h
100%
100%
25-50% 10-25%
75% 8h
75%
12 h
6-8 h
6-8 h
6-8 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50
Quadro 46.1 (Continuação)
HD: 1 g, CAPD e CAVH: N
N
HD: 0,75 g, CAPD: 0,75 g 12-12 h, CAVH: 50 mg/L·dia
HD: 300 mg, CAPD: 200 mg/dia, CAVH: N
HD: 0,5-1 g, CAPD: 0,5 g/ 12-12 h, CAVH: 30 mg/ L·dia
HD: 1 dose, CAPD: 1,0 g/ 12-12 h, CAVH: 30-50 mg/L·dia
HD: 0,5-1,0 g CAPD: 0,51,0 g/12-12 h, CAVH: 30 mg/L·dia
HD: 1 dose, CAPD: 1 g/ 12-12 h, CAVH: 30-50 mg/ L·dia
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4 10-50
Reduzir 50% da dose na icterícia, prolongamento do TAP
Sódio: 2,5 mEq/g, interação nefrotóxica com aminoglicosídeos, falso aumento da creatinina
10
Cuidados especiais
capítulo 46
811
15
17
28-50
Cefsulodina
Ceftazidima
Ceftizoxima
10
Cefradina
10
41-70
Cefoxitina
Cefroxadina
85
Cefotetan
90-100
37
Cefotaxima
Ligação às proteínas (%)
80
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Ceforanida
Droga
0,260,42
0,280,40
0,220,31
0,200,30
0,250,33
0,130,39
0,15
0,150,55
0,17
1,4
1,2
1,7-2
0,8-1
0,7-1,3
I
3,5
1
3
35
13-25
13
40
6-15
13-23
13-25
15
25
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
R
R
R
R
R
R
R
R(H)
R
Maiores vias de excreção
1-2 g/8-8 ou 1212 h
1 g/8-8 ou 1212 h
4-6 h
0,25-2 g/ 6-6 h
1-2 g/6-6 ou 8-8 h
1-2 g/ 12-12 h
1 g/6-6 h
0,5-1 g/ 12-12 h
Dose normal
I
I
D
D
D
I
D
I
I
Método
15-50%
15-65%
50%
8-12 h
50%
8-12 h
24-48 h
48-72 h
10-15%
10-15%
25%
24-48 h
25%
24 h
48-72 h
8-12 h 36-48 h 48-72 h
8-12 h 24-48 h
50100%
65100%
100%
8h
100%
6h
12 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação) Cuidados especiais
Falso aumento da creatinina
HD: 1 g, CAPD: 0,5-1 g/dia, CAVH: 30 mg/L·dia
HD: 1 g, CAPD: Volume de 0,5 g/dia, distribuição CAVH: 30 aumenta com mg/L·dia infecção
HD: 1 dose, CAPD: como para VFG 10, CAVH: 50100 mg/L·dia
HD: 1 g, CAPD: 1 g/ dia, CAVH: 50 mg/L·dia
HD: 1 g, CAPD: 1 g/dia, CAVH: 10-30 mg/L·dia
HD: 1 g, CAPD: Metabólitos 1 g/dia, ativos na CAVH; IRT, reduzir 30-50 mg/L· dose na dia insuficiência hepática IRT
HD: 0,5-1 g, CAPD: N, CAVH: 25 mg/L·dia
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
812 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
?
96-99
Cicloserina
Ciclosporina
44
14
Ciclofosfa- 75-80 mida
Cilastatina
20-25
Ciclacilina 40-60
4-50
99
99
Cetoconazole
Cetoprofeno
93
Cetrizina
50-76
?
Cetamina
33
40-50
Cefuroxima
Ligação às proteínas (%)
90
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Ceftriaxona
Droga
0,22
3,5-7,4
0,110,26
0,64
0,250,35
0,11
1,9-3,6
?
1,8-3,1
0,130,18
0,120,18
1
6-13
0,5
4-7,5
0,5
1,5
1,5-3,3
8
2-3,5
1,2
7-9
R
R(H)
H
R
7
16
?
10
8-10
R
H
R
H
R(H)
inalte- H rada
3,3
?
c/imipenem
3-10 mg/ kg·dia
250 mg/ 12-12 h
1-5 mg/ kg·dia
6-6 h
25-75 mg/ 8-8 h
200 mg/ 24-24 h
10 mg/dia
1-4,5 mg/ kg
0,75-1,5 g/ 8-8 h
0,25-1 g/ 12-12 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
17
12-24
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
D
D
I
D
I
D
D
D
D
I
D
Método
100%
100%
12 h
100%
6h
100%
100%
100%
100%
8h
100%
75%
12-24 h
100%
100%
?
100%
24 h
100%
50%
100%
evitar
100%
12-24 h 24 h
100%
6-12 h
100%
100%
?
100%
8-12 h
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10 10-50
Quadro 46.1 (Continuação)
Evitar
N
N
HD: 1/2 dose, CAPD, CAVH: ?
HD
N
N
?
HD: 1 dose, CAPD: 1 dose/dia, CAVH: 750 mg/12-12 h
HD: 1 dose, CAPD: 750 mg/12-12 h, CAVH: 10 mg/L·dia
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade, hipertensão arterial
Toxicidade para o SNC
Cistite hemorrágica, secreção inapropriada de HAD
Nefrotoxicidade
Metabólito ativo da hidroxizina
Cuidados especiais
capítulo 46
813
20-40
Ciprofloxacin
60-95
50
95
82-98
Clindamicina
Clofibrate
Clonazepam
?
20-40
Clonidina
47
Clorazepam
80
13
Citosinaarabinosídeo
92-97
90
Cisplatina 5
50-85
63
Cinoxacin
Ligação às proteínas (%)
20
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Cimetidina 62
Droga
3-6
1,3
1,5-4,5
0,14
0,6-1,2
2-3
0,5
2,1
0,25
0,8-1,3
6-23
39-85
18-50
6-25
2-4
0,5-3
: 0,5 : 30
3-6
1,2
1,5-2
R
R
R
Maiores vias de excreção
39-42
36
?
100
3-5
0,5-3
R(H)
H(R)
H
H(R)
H(R)
NR(R)
proR(NR) longada
6-9
12
5
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
0,1-0,6 mg/ 12-12 h
15-60 mg/dia
1,5 mg/ dia
0,5-1 g/ 12-12 h
150-300 mg/ 6-6 h
100-200 mg/m2
20-50 mg/ m2·dia
500-750 mg/ 12-12 h
0,5 g/ 12-12 h
400-800 mg/ 12-12 h
Dose normal
D
D
D
I
D
D
D
D
D
D
Método
100%
100%
100%
12 h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50%
33%
evitar
25%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
12-24 h 24-48 h
100%
100%
75%
50%
50%
50%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50
Quadro 46.1 (Continuação)
N
?
HD: N, CAPD e CAVH: ?
N
N
?
HD
HD e CAPD: 250 mg/1212 h, CAVH: 250 mg/8-8 a 12-12 h
Evitar
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4 10-50
Hipertensão rebote
Metabólitos ativos
Retenção de água, miosite
Interação nefrotóxica com aminoglicosídeos, hepatotoxicidade
Nefrotoxicidade, perda renal de Mg
Aumento da creatinina sérica
10
Cuidados especiais
814 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
91-99
Clorpromazina
50-65
90
64
50
40-70
Cloroquina
Clortalidona
Cloxacilina
Codeína
7
88-96
76-90
88-96
Clorpropamida
32
72
Clorfeniramina
60
94-97
75-90
Cloranfenicol
Ligação às proteínas (%)
Clordiaze- 100 póxido
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
1/2
3-4
0,140,21
3,9
132
0,090,27
8-160
6-12
0,3-0,5
0,6-1
2,5-3,5
0,4-0,9
44-80
2-4 dias
24-42
11-42
14-24
5-30
1,6-3,3 H(R)
R(H)
R(H)
inalte- H rada
2,3
?
R(H)
50-200 R
5-50 dias
15-100 mg/dia
30-60 mg 4-4 ou 6-6 h
0,25-1 g/ 6-6 h
25 mg/ dia
1,5 g em 3 dias
100-500 mg/dia
300-800 mg/dia
H(R 4 mg/ 7%) 4-4 ou 6-6 h
inalte- H rada
?
Método
D
D
I
D
I
D
D
D
12,5 D mg/kg/ 6-6 h
Dose normal
100%
100%
24 h
100%
24 h
100%
100%
100%
100%
75%
100%
24 h
100%
evitar
100%
100%
100%
100%
50%
100%
evitar
50%
evitar
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50
Quadro 46.1 (Continuação) Maiores vias de excreção
inalte- H rada
3-7
Volu- t t me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
1/2
?
N
N
N
CAPD: N, HD e CAVH: ?
HD, CAPD: N, CAVH: ?
HD: N, CAPD e CAVH: ?
HD: N, CAPD e CAVH: ?
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4 10-50
Excreção aumentada na urina alcalina
Retenção hídrica, hipoglicemia na IRT
Efeito anticolinérgico: retenção urinária
Metabólitos ativos
Sódio: 2,3 mEq/g, acúmulo de metabólitos na IRT, mielotoxicidade
10
Cuidados especiais
capítulo 46
815
0
Colestiramina
?
?
?
90
Daunorrubicina
Deferoxamina
Desipramina
-
28-60
2-2,5
?
90
-
?
2,2
12-54
6
18-27
0,5-2
-
-
3-8
19
?
?N
?
3,5
-
-
10-20
40
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
Cortisona
68
-
0
Colestipol
-
75
Colestimetato
Ligação às proteínas (%)
31
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Colchicina
Droga
H
R
H
H
-
-
R
H(R)
Maiores vias de excreção Método
D
D
D
D
75-150 mg/dia
D
Agudo: D 1 g, depois: 0,5 g/ 4-4 a1212 h; crônico: 0,51 g/dia
30-45 mg/m2
25-500 mg/dia
4 g/4-4 a 6-6 h
13-30 g/dia
2,5-5 mg/ D kg·dia
crônica: D 0,5-1 mg/dia; aguda: 0,5 mg/ 6-6 h
Dose normal
100%
100%
100%
100%
100%
100%
75%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
25%
50%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50
Quadro 46.1 (Continuação)
N
?
?
N
N
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4 10-50
Metabólitos ativos
Hiperuricemia
Hipercatabolismo, retenção de sódio
Acidose metabólica hiperclorêmica
Acidose metabólica hiperclorêmica
Acidose metabólica
10
Cuidados especiais
816 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
90
99
95
Diazóxido 90
Diclofenaco
Dicloxacilina
90
Difenilidantoína
99
alta
90
Diflunisal
Digitoxina
94
3
Difilina
90
80
Difenidra- 72 mina
37-74
94-98
Diazepam 100
Ligação às proteínas (%)
70
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Dexametasona
Droga
0,6
0,10
0,8
1,0
3,3-6,8
0,16
0,120,17
0,2-0,3
0,7-3,4
0,8-1 H
H(R)
H
R(H)
R
H(R)
inalte- R rada
12
inalte- H rada
?
1-2
inalte- NR rada
30-60
0,1-0,2 mg/dia
250-500 mg/ 12-12 h
15 mg/ kg/dia
Ataque: 1 g. Depois: 300-400 mg/dia
25 mg/ 6-6 ou 8-8 h
0,250,50 g/ 6-6 h
25-75 mg/ 12-12 h
150-300 mg in bolus
5-40 mg/ dia
4-16 mg/ dia
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
?
144-200 210
5-20
1,8-1,3
24
3,4-9,3
0,7
1-2
17-31
20-90
3-4
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
D
D
D
D
D
D
D
D
D
D
Método
100%
100%
75%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50-75%
evitar
25%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
N
HD: 1/2 dose, CAPD e CAVH: ?
N
N
N
N
N
N
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Conversão à digoxina na IRT, VD na uremia
Nefrite intersticial, risco de hemorragia
Ligação protéica e Vd na IRT, nefrite intersticial, déficit de folato
Retenção urinária: efeito anticolinérgico
Nefrotoxicidade
Retenção de sódio e água
Hipercatabolismo, retenção de sódio
Cuidados especiais
capítulo 46
817
27-66
70-85
Dipiridamol
Disopiramida
98
95
80-93
90-100
5
Doxazosin
Doxepin
Doxiciclina
Doxorrubicina
80-85
?
Dobutamina
54-81
99
98
40-90
Diltiazem
20-30
75
75
Digoxina
Ligação às proteínas (%)
Dilevalol
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
21,5
0,75
9-33
1-1,7
0,25
0,8-2,6
2,4
3-5
25
5-8
10-18
?
3,5
19-30
35
15-24
8-25
9,512,5
R(H)
H
H
inalte- H rada
18-25
10-30
13
H
R(H)
H
H(R)
H
60-75 mg/ m2/dia
100 mg/ 24-24 h
25 mg/ 8-8 h
1-15 mg/dia
2,5-1,5
g/ kg·min
100-200 mg/ 6-6 h
50 mg/ 8-8 h
90 mg/ 8-8 h
400-600 mg/ 12-12 h
Impregnação 1-1,5 mg. Depois 0,250,5/dia
Maio- Dose res normal vias de excreção
80-120 R(H)
2 mi? nutos
5-8
12
2-8
8-12
36-44
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
D
D
D
D
D
I
D
D
D
D I
Método
100%
100%
100%
100%
100%
8h
100%
100%
100%
100% 24 h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
12-24 h 24-40 h
100%
100%
100%
25-75% 10-25% 36 h 48 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
HD: N, CAPD e CAVH:?
N
N
N
?
N
?
N
N
HD e CAPD: N, CAVH: 0,5 mg/ 12-12 h
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Insuficiência renal aguda, síndrome nefrótica
Ligação protéica na IRT
Nefropatas são sensíveis a pequenas doses
Retenção urinária. Vd na IRT
Metabólitos ativos
VD na uremia. impregnação em 50% na IRT.
Cuidados especiais
818 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
7-82
Encainide
35
?
?
Estreptoquinase
Estreptozocina
98
Espironolactona
Estreptomicina
5-20
Espectinomicina
? (25: canrenona)
55
60-95
Eritromicina
Esmolol
25-60
Enoxacin
18-45
50-60
36-44
Enalapril
75-81
Ligação às proteínas (%)
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
0,5
0,016
0,26
14(1,8: canrenona)
0,25
3
0,78
2,1-3,3
2-2,7
1
0,5
1-1,5
2,5
10-35
1,6
7-15 min
1,4
3-8
3-9
11-24
H
R
R
R
Maiores vias de excreção
R
?
?
100
R
NR
R
inalte- H rada
16-29
inalte- H rada
5-6
11
1,5-9
34-60
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
I
I
D
D
D
D
D
D
Método
500 mg/ m2/ dia
D
250.000 D U, depois: 100.000 U/hora
1 g/dia
25 mg/ 6-6 ou 8-8 h
2-4 g (dose única)
50-150
g/ kg/min
250-500 mg/ 6-6 ou 12-12 h
200-400 mg/ 12-12 h
25 mg/ 8-8 h a 50 mg/ 6-6 h
5-10 mg/ 12-12 h
Dose normal
100%
100%
100%
50%
75%
100%
100%
24 h
75%
100%
24-72 h
50%
100%
72-96 h
evitar
100%
100%
50-75%
50%
50%
75-100% 50%
6-12 h 12-24 h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
N
HD: 0,5 g, CAPD e CAVH: 20-40 mg/L·dia
H
N
N
N
HD e CAVH: N, CAPD: dose como VFG 10 ml/min
N
HD: 20-25%
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade, proteinúria, acidose tubular renal
Nefrotoxicidade, ototoxicidade
Hipercalemia em VFG 30 ml/ minuto
Acúmulo de metabólitos inativos
Sódio: 3 mEq/250 mg, ototoxicidade na IRT com altas doses, Vd na IRT
Encefalopatia, t1/2 longo em desmetiladores lentos, metabólitos ativos
Enaprilato: metabólito ativo
Cuidados especiais
capítulo 46
819
30
Etionamida
99
?
Fenazopiridina
15-22
43
Famotidina
Felodipina 15
10
100
Etossuximide
17
74-94
25-75
Etopósido
Fazadínio
75
Etomidato
80
35-50
Etclorvinol
Ligação às proteínas (%)
10-30
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Etambutol 75-80
Droga
?
9-7
0,180,23
0,8-1,4
0,7
0,170,5
2-4,5
?
3-4
1,6-2,3
2-3
10-14
1
2,5-4
35-55
4-8
4-5
2,1
10-20
4
H
H
R
R
R
?
21 R
H
inalte- NR rada
12-19
inalte- H(R) rada
?
200 mg/ 8-8 h
10 mg/ 12-12 h
?
20-40 mg/dia
0,5-1,5 g/dia
35-100 mg/ m2/dia
0,2-0,6 mg/kg
250-500 mg/ 12-12 h
0,5-1 g/ dia
15 mg/ kg/ 24-24 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
?
?
7-15
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
I
D
D
D
D
D
D
D
D
I
Método
8-16 h
100%
100%
50%
100%
100%
100%
100%
100%
24 h
evitar
100%
100%
25%
100%
75%
100%
100%
evitar
evitar
100%
100%
10%
100%
50%
100%
50%
evitar
24-36 h 48 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
N
?
N
N
HD: N, CAPD e CAVH: ?
?
N
N
HD: 1 dose, CAPD: como VFG 10 ml/ min, CAVH: 1 dose cada 24-36 h
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade, hepatotoxicidade
Mielotoxicidade e neurotoxicidade
Hipertensão arterial: prevenida por pré-anestésico
Neurite periférica, acuidade visual
Cuidados especiais
820 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
80-84
52
20
10
Flecainide 90
85-90
85
Fentanil
Fleroxacin
Flucitosina
Fluconazol
12
99
Fenoprofeno
40-60
Fenobarbital
100
99
Fenilbutazona
Ligação às proteínas (%)
?
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Fenelzine
Droga
2-7
2-3
60-150
5-100
1,5-4
0,7
0,6
22
3-6
1,1-2,4 13
8,4-9,5 12-19,5
2-4
0,10
0,7-1
0,090,17
?
?
75-200
18
19-26
?
inalterada
117160
inalterada
?
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
R
R
R
H(R)
H
H
H(R)
H
H
Maiores vias de excreção
D
I
D
D
Método
100-200 mg/ 24-24 h
0,5-1 g/ 6-6 h
400 mg/ 12-12 h
100-400 mg/ 12-12 h
I
I
D
D
2-50 g/kg D
300-600 mg/6-6 h
50-100 mg/1212 ou 8-8 h
100 mg/ 6-6 ou 8-8 h
45-75 mg/dia
Dose normal
24 h
6-8 h
24-48 h
12-24 h
100% 50%
100% 100%
100% 75%
100% 100%
8-12 h 8-12 h
100% 100%
100% 100%
48-72 h
24-48 h
50%
50-75%
50%
100%
12-16 h
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
Excreção aumentada em urina ácida
Nefrotoxicidade
Aumento de excreção na urina alcalina
Nefrotoxicidade
Crise hipertensiva com simpaticomiméticos e/ou tiramina
Cuidados especiais
HD: 200 mg, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/min
HD: 1 dose, Disfunção hepática, CAPD e CAVH: mielotoxicidade na 0,5-1 g/dia IRT
HD, CAPD e CAVH: 400 mg/dia
N
N
N
HD e CAVH: 1 dose, CAPD: 1/2 dose
N
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
capítulo 46
821
95
3.070
?
Furosemi- 50-100 de
Galamina
Ganciclovir
0,47
0,210,24
97-98
Fosinopril
baixa
0,070,2
10
Fosfomicina
0,10
99
3,4
20-42
0,250,5
43-78
3,6
2,3-2,7
0,5-1,1
11,5
1,5-2
3-5
47-100
24-72
0,1
17-18 dias H(R)
30
6-20
2-4
R
R
R(H)
R(H)
prolon- R gada
inalte- H(R) rada
inalte- H rada
inalte- H rada
2,5 mg/ kg/8-8 h
0,5-1,5 mg/kg
40-80 mg/ 12-12 h
10 mg/dia
1-2 g/6-6 ou 8-8 h
100 mg/ 8-8 ou 12-12 h
15-30 mg/dia
20 mg/ dia
12 mg/ kg·dia
10 mg/ 12-12h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H(R) rada
?
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
Flurbiprofeno
?
Flurazepam
boa
94,5
Fluoxetina
10
0-100
Fluorouracil
Ligação às proteínas (%)
99
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Flunarizina
Droga
I
D
D
D
D
D
D
D
D
D
Método
12 h
100%
100%
100%
50100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
24 h
evitar
100%
100%
48-96 h
evitar
100%
100%
25-50% 10-25%
100%
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
HD: 1 dose, CAPD: como VFG 10 ml/min, CAVH: 2,5 mg/kg·dia
N
N
HD
N
HD: ? CAPD e CAVH: ?
?
HD
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Mielotoxicidade
Recurarização tardia, dialisável
Ototoxicidade com aminoglicosídeos
Sódio: 14,5 mEq/g, cardio- e neurotoxicidade central
Nefrotoxicidade
Metabólitos ativos
Cuidados especiais
822 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
99
94
85-95
97
54
variável
25-70
Glibenclamida
Glibomurida
Gliclazida
Glipizida
Glutetimide
Griseofulvina
20
5
Guanadrel
Guanetidina
3-50
90
Guanabenz 75%
?
5
Gentamicina
Ligação às proteínas (%)
97-99
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Genfibrozil
Droga
?
11,5
10-12
1,6
2,7
0,130,16
0,24
0,26
0,160,3
0,230,26
?
120140
4-10
12-14
14
5-22
3,7
8-11
8,5
1,4-2,9
1,8
6-7
H
H
H
H(R)
R
?
19
?
20
R(H)
R
H
H
inalte- H rada
?
?
?
?
20-60
I
D
D
D
D
D I
D
Método
10-100 mg/dia
10-50 mg/ 12-12 h
8-16 mg/ 12-12 h
I
I
D
125-250 D mg/6-6 h
250-500 mg/dia
2,5-15 mg/dia
160-320 mg/dia
12-24 h
1,25-5 mg/dia
1 mg/kg/ 8-8 h
600 mg/ 12-12 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- R rada
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
24 h
12 h
100%
100%
24 h
100%
?
100%
100%
60-90% 8-12 h
100% 100%
100%
100%
evitar
100%
?
100%
evitar
24 h
24-36 h
12-24 h 24-48 h
100%
100%
evitar
100%
?
100%
evitar
30-70% 20-30% 12 h 24-48 h
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
?
?
N
N
?
?
N
N
HD: 2/3 da dose normal, CAPD: 3-4 mg/L·dia, CAVH: 4 mg/L·dia
HD: N, CAPD e CAVH: ?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Hipotensão ortostática
Nefrotoxicidade, hepatotoxicidade
Hipoglicemia
Nefrotoxicidade, ototoxicidade, acentuação do efeito curare
Cuidados especiais
capítulo 46
823
10-30
100
60-80
Hidralazina
Hidrato de cloral
Hidroclorotiazida
?
Hidroxizina
99
?
Hidroxiuréia
Ibuprofeno
90
64
70-80
Hidrocortisona
80
65
90
Hexobarbital
87
90
Heparina
0,15
19,5
0,5
?
0,8
0,6
0,5-0,9
1,1
0,060,1
14-21
90-92
Haloperidol
2-2,5
14-20
?
1,5-2
2-3
7-14
2-4,5
3,5-4
0,3-2
10-36
12-23
H
H(R)
H
H
H
R(H)
inalterada
?
?
?
H(R)
R(H)
R
H
800 mg/ 8-8 h
50-100 mg/6-6 h
20-30 mg/ kg·dia
50-500 mg/dia
25-100 mg/dia
250 mg/ 8-8 h
25-50 mg/ 8-8 h
?
75 U/kg, depois: 0,5 U/ kg·min
1-2 mg/ 12-12 ou 8-8 h
1-2 mg/dia
Maio- Dose res normal vias de excreção
prolon- R gada
?
7-16
?
inalterada
?
15-25
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
4-6,5
Ligação às proteínas (%)
65
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Guanfacina
Droga
D
D
D
D
D
D
I
D
D
D
D
Método
100%
100%
100%
100%
100%
100%
8h
100%
100%
100%
100%
100%
?
50%
100%
100%
evitar
8h
100%
100%
100%
100%
100%
?
20%
100%
evitar
evitar
8-16 h
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
?
?
?
N
N
N
N
N
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade
Metabólito ativo: cetirizina
Hipercatabolismo
Metabólitos ativos, sedação excessiva
Síndrome like lupus
t1/2 aumenta com a dose
Hipotensão, sedação excessiva
Cuidados especiais
824 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
13-21
96
76-79
99
5
?
?
?
Imipenem
Imiprami- 47 21 na
Indapamida
Indometa- 98 cina
Insulina
Interferon
Interferon
Ipratrópio
Ligação às proteínas (%)
20
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Ifosfamida 90-100
Droga
4,6
?
0,4
0,15
0,12
0,3-1,3
9-15
0,170,3
0,75
1,6
?
H
H
H
R(H)
H(R)
?
?
H
R
R
prolon- H(R) gada
inalterada
inalterada
?
4
?
D
D
D
Método
2 inalações/ 6-6 h
1-3 milhões U/dia
3-36 milhões U/dia
variável
D
D
D
D
25-50 mg/ D 8-8 h
2,5-5 mg/ D dia
25 mg/ 8-8 h
0,25-1 g/ 6-6 h
50-60 mg/dia
Maio- Dose res normal vias de (horas) excreção
t1/2 IRT1
3,5-8,5 ?
2-4
4-12
14-18
6-20
1
4-30
Volu- t1/2 me de normal distribuição (horas) (L/kg)
?
?
?
100% 100%
?
100% 75%
100% 100%
100% 100%
100% 100%
100% 50%
100% reduzir (?)
?
100%
?
50%
100%
evitar
100%
25%
reduzir (?)
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
N
?
N
N
N
N
HD: 1 dose/ dia, CAPD: dose como VFG 10 ml/min, CAVH: 20 mg/L·dia
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade: IRA, síndrome nefrótica
Nefrotoxicidade: IRA, síndrome nefrótica
Hipoglicemia
Nefrotoxicidade
Ineficaz na IRT
Metabólitos ativos
Convulsões na IRT, nefrotoxicidade com cilastatina
Cistite hemorrágica
Cuidados especiais
capítulo 46
825
72
60-66
70-80
Lidocaína
Lincomicina
5-8
Levodopa
60-90
40-60
Lamotrigina
50
99
Itraconazol 100
20-38
?
Isradipina 15-24
Labetalol
?
Isoxicam
22-30
Isossorbitol
Ligação às proteínas (%)
10
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Isoniazida 90
Droga
1,9-4,8
10-54
0,150,5
0,7-4
2-2,2
0,8-1,6
24
3-9
0,31-0,6 4-5
1,3-2,2
0,9-1,6
1,2
5,6
grande 21
3-4
0,20
1,5-4
0,6
H
H(R)
NR(R)
H
10-20
1,3-3
?
H(R)
H
H
inalte- H rada
inalte- H rada
25
10-11
0,5 g/6-6 h
50-100 mg IV/2-3 min. Depois: 1-4 mg/min
250-500 mg/1212 até 8 g/dia
50-200 mg/ 12-12 h
200-600 12-12 h
100-200 mg/ 12-12 h
5-10 mg/ dia
?
10-20 mg/ 8-8 h
5 mg/ kg·dia
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
4
8-17
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
I
D
D
D
D
D
D
D
D
D
Método
6h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50-100%
100%
100%
100%
50%
6-12 h 12-24 h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
N
?
?
N
HD, CAPD e CAVH: 100 mg/12-12 a 24-24 h
N
N
HD: 10-20 mg
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/min
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade
Metabólitos ativos
Acetilação nos acetiladores lentos na IRT
Cuidados especiais
826 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
97
60-80
Mebendazol
?
?
?
Maprotilina
5-10
?
95
?
40
40-50
?
48
1,1-1,7
H
H
H
R
R
Maiores vias de excreção
?
? H
H
inalte- H rada
32-70
8 (nor- ? lorcainide: 27)
0,9-1,3 5-10
10
7-14
0,5-0,9 14-28
1,3-1,5 12,6
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
Lovastatina
93
87
40
Loperamida
0
Lorazepam
100
Lítio (carbonato)
0-10
80-85
30
Lisinopril
Ligação às proteínas (%)
Lorcainide baixa
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
100 mg/ 12-12 h/ 3 dias
75 mg/dia
20-80 mg/dia
1-2 mg/ 12-12 ou 8-8 h
100 mg/ 12-12 h
Inicial: 2-4 mg, depois: 1-2 mg/6-6 a 8-8 h
0,9-1,2 g/dia
5-10 mg/ dia
Dose normal
D
D
D
D
D
D
D
D
Método
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50-75% 25-50%
50-75% 25-50%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
?
?
N
?
?
HD: 1 dose
HD: 20%
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Efeito de primeira passagem intenso, metabólito ativo: norlorcainide
Nefrotoxicidade: diabetes insipidus nefrogênico, síndrome nefrótica, acidose tubular renal, fibrose intersticial
Cuidados especiais
capítulo 46
827
100
Metaqualona
Metilprednisolona
40-60
15
25
Metildopa
45-50
Metotrexate
35-60
?
Metimazol
Meticilina
?
Metenamina
16-95
60-90
92
Metadona
80
0-30
Meprobamato
70
48-53
Meperidina
Ligação às proteínas (%)
90
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Melfalan
Droga
1,2-1,5
0,5
0,31
0,76
0,6
0,56
5-8
3-6
0,5-0,8
4-5
0,60,75
1,9-6
1,5-6
0,5-1
8-12
4-6
4
10-43
13-58
9-11
2-7
1,111,4
H(R)
R
H
H
H(R)
H(R)
R(NR)
Maiores vias de excreção
inalterada
6-16
4
H
R(H)
R(H)
prolon- R(H) gada
inalterada
?
inalterada
?
inalterada
7-32
4-6
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg) Método
125-500 mg/6-6 h
250-500 mg/8-8 h
D
I
I
D
12 g/m2 para câncer 1-2 g/ 4-4 h
D
D
I
D
I
D
5-20 mg/ 8-8 h
1 g/6-6 h
150-300 mg/dia
2,5-10 mg/6-6 ou 8-8 h
1,2-1,6 g/dia
50-100 mg 3-3 ou 4-4 h
6-8 mg/m2· D dia/4 dias
Dose normal
100%
8h
4-6 h
100%
100%
100%
24 h
100%
6h
100%
100% 50%
50%
8-12 h
evitar
100%
evitar
evitar
50-75%
100%
100%
8-12 h 12-24 h
6-8 h
50%
100%
evitar
evitar
100%
9-12 h 12-18 h
75%
75%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
HD
HD: 250 mg
N
N
?
N
N
HD: N, CAPD e CCAVH: ?
N
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Falso aumento da creatinina sérica
Sódio: 3,9 mEq/g. Nefrite intersticial
Nefrotoxicidade prevenida por diurese alcalina e forçada
Eliminação fecal na IRT
Excreção com diurese forçada
Metabólito ativo: normeperidina pode causar convulsões na IRT, ligação às proteínas na IRT
Leucopenia, vasculite
Cuidados especiais
828 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
8
38
90
Metoprolol
Metronidazol
90
Miconazole
93-96
20-46
Mezlocilina
Midazolam
70-75
Mexiletine
45-55
95
Metolazona
20
70
Metocurina
Ligação às proteínas (%)
40
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Metoclopramida
Droga
1-6,6
2,1
0,18
5,5-6,6
0,250,85
5,5
1,6
0,420,57
2-3,4
1,212,3
20-24
0,6-1,2
8-13
6-14
3,5
4-20
3,5-5,8
2,5-4
R
R
R(H)
Maiores vias de excreção
H(R)
H(R)
inalte- H rada
inalte- H rada
2,6-5,4 R(H)
16
7-21
2,5-4,5 H
?
elevada
14-15
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
I
D
D
D
D
D
D
Método
7,5-15 mg/ dia V.O.
D
200-1.200 D mg/ 8-8 h
1,5-4 g/ 4-4 a 6-6 h
100-300 mg/ 6-6 a 12-12 h
7,5 mg/ kg/ 6-6 h
50-100 mg/ 12-12 h
5-10 mg/ dia
0,2-0,4 mg/kg
10-15 mg/ 6-6 h
Dose normal
100%
100%
4-6 h
100%
100%
100%
100%
75%
100%
100%
100%
6-8 h
100%
100%
100%
100%
evitar
75%
100%
100%
8h
50-75%
50%
100%
100%
evitar
50%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
N
N
N
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/min
HD: 50 mg, CAPD: N, CAVH: ?
N
?
HD: N, CAPD e CAVH: ?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Ligação protéica diminui na IRT
Sódio: 1,9 mEq/g
Excreção aumentada em urina ácida
Metabólitos ativos acumulam-se na IRT
Sinais extrapiramidais na IRT
Cuidados especiais
capítulo 46
829
54
baixa
20-30
2
99
Mitomicina C
Morfina
Naloxone
Naproxeno
5
15-25
Neostigmina
Netilmicina
?
99
?
Neomicina
1-2
20-30
100
Minoxidil
0
65
90-100
Minociclina
Ligação às proteínas (%)
?
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Milrinona
Droga
0,160,30
0,5-1
?
0,10
3
3,5
0,5
2-3
0,121,5
0,250,35
1-3
1,3
2
12-15
1-1,5
1-4
0,5-1
2,8-4,2
12-16
1
H
R
H
H
35-72
3
12-24
R
R
R
inalte- H rada
?
inalte- H rada
?
Método
5 mg/kg/ 8-8 h
15 mg cada 3-4 h
2-4 g/dia
0,5 g/ 12-12 h
2 mg
20-25 mg/ 4-4 h
20 mg/ m2/6-6 a 8-8 h
5-30 mg/ 12-12 h
100 mg/ 12-12 h
D I
D
I
D
D
D
D
D
D
15-75 g/ D kg I.V., depois: 2,515 mg/66 h V.O.
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H(R) rada
12-18
1,5-3
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
50-90% 8-12 h
100%
6h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50%
100%
100%
100%
50-75%
25%
20-60% 10-20% 12 h 24-48 h
50%
12-18 h 18-24 h
100%
100%
75%
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
HD: 2/3 dose normal, CAPD: 3-4 mg/L·dia, CAVH: 4 mg/ L·dia
?
N
N
N
HD: N
?
N
N
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade e ototoxicidade
Nefrotoxicidade
Nefrotoxicidade
Efeito exacerbado na IRT
Nefrotoxicidade, síndrome hemolítico-urêmica
Retenção hídrica, derrame pericárdico
Cuidados especiais
830 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
99
?
99
60
Nisoldipina
Nitrazepam
Nitrendipina
Nitrofurantoína
?
0
?
Nitroglice- 1 rina
Nitroprussiato
Nitrosuréia
boa, variável
98
Nimodipina
98-99
97
19-38
Nicardipina
Ligação às proteínas (%)
Nifedipina 45
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
?
0,2
2-3
0,3-0,7
6,6
?
2,3-7,1
0,9-2,3
1,4
0,8
H
H
H
H
1 H(R)
3,3-5,8 H
?
6,8-9,7 H
22
5-7
5-7
5
10 min ?
10 min R
H(R)
D
D
D
D
D
D
Método
Variável
0,25-8 g/ kg·min
variável
D
D
D
50-100 D mg/6-6 h
20 mg/ 12-12 h
5-10 mg/dia
10 mg/ 12/12 h
30 mg/ 8-8 h
10-20 mg/ 6-6 a 8-8 h
20-30 mg/ 8-8 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
2-4 min inalte- H rada
0,5
4,6
18-36
6,6-7,9
1-2,8
4-5,5
5
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
75%
100%
100%
evitar
100%
100%
100%
100%
100%
100%
25-50%
100%
100%
evitar
100%
100%
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
HD: N, CAPD e CAVH: ?
N
?
Evitar
N
?
N
N
N
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Toxicidade irreversível com dose 1.500 mg/m2
Metabólitos tóxicos, acúmulo de tiocianato
Hepatotoxicidade, neurotoxicidade
Efeito acentuado na IRT
Ligação às proteínas na IRT
Cuidados especiais
capítulo 46
831
14
95
25
30-40
51 5
95
70
Norfloxacin
Nortriptilina
Ofloxacin
Omeprazol
?
40
Orfenadrina
Ouabaína
95
60
Nomifensine
Ligação às proteínas (%)
28
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Nizatidina
Droga
?
?
?
2,5
15-23
0,5
8-9
1,1-1,3
21
16
0,5-1,5
5-8
25-38
3,5-6,5
3-4
1,3-1,6
60-70
?
?
28-37
15-66
8
1,5-46
R(H)
H
H
R
H
R(NR)
R
D
D
D
D
I
D
D
Método
ImpregnaI ção: 0,25 mg, manutenção: 0,1 mg/ 12-12 h
100 mg/ 12-12 h
20-60 mg/dia
200-400 mg/ 12-12 h
25 mg/6-6 a 8-8 h
400 mg/ 12-12 h
100-200 mg/dia
150-300 mg/dia
Maio- Dose res normal vias de excreção
5,3-8,5 R
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
12-24 h
100%
100%
100%
100%
12 h
100%
75% evitar
25%
100%
100%
25-50%
100%
24-36 h 36-48 h
100%
100%
50%
100%
12-24 h evitar
50%
50%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
?
?
HD: 100 mg/ 12-12 h, CAPD: como VFG 10 ml/min, CAVH: 300 mg/dia
HD, CAPD: N CAVH: ?
Evitar
HD: N, CAPD e CAVH: ?
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Abortivo, absorção de ampicilina e cetoconazol, metabolização de anticoagulantes, diazepam e fenitoína
Cuidados especiais
832 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
50
Penicilina G
?
80
Penicilamina
Pentamidina
20-30
Pefloxacin 95
15-30
15-50
PAS
3
0,30,42
?
1,7
0,110,24
0,150,38
70-85
Pancurônio
dias
0,5
1,3-3
12
0,75
1,7-2,2
0,6-1,6 5-10
97
20
Oxazepam 90
?
0,40,9
250 dias
91
0,190,41
5-9
R(H)
R(H)
H
H
H(R)
R
?
6-20
R
R
prolon- R gada
4 mg/kg· dia
0,5-4 milhões U/6-6 h
0,25-1 g/ dia
400 mg/ 12-12 h
50 mg/kg/ 8-8 h
0,04-0,1 mg/kg
30-120 mg/dia
?
0,5-2 g/ 4-4 ou 6-6 h
25-50 mg/ semana, dose total de 0,8 a 1 g
Maio- Dose res normal vias de excreção
prolon- H(R) gada
23
4,3-8,2
25-90
?
1
?
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
Oxatomide
85-94
33
Oxacilina
Ligação às proteínas (%)
95
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Ouro (tiomalato Na)
Droga
I
D
D
D
D
D
D
D
D
D
Método
24 h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
50%
evitar
100%
100%
100%
evitar
20-50%
evitar
50%
24-36 h 48 h
75%
evitar
100%
50-75% 50%
50%
100%
100%
100%
evitar
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/ minuto
HD: 1/3 da dose
HD: N
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/min
?
HD: N, CAPD e CAVH: ?
N
N
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade, hipercalemia
Potássio: 1,7 mEq/ milhão U, altas doses convulsões na IRT
Síndrome nefrótica
Sobrecarga de sódio
Recurarização tardia
Metabólitos , ligação protéica e Vd na IRT
Sódio: 2,5 mEq/g, hepatotoxicidade, nefrotoxicidade
Nefrotoxicidade: proteinúria, glomerulonefrite membranosa
Cuidados especiais
capítulo 46
833
?
94
?
27
Pirazinamida
Piretanida
Piridostig- 10-20 mina
Pirimetamina
99
Baixa
Piroxican
Plicamicina
alta
30
Piperacilina
50
75
60-70
Pindolol
100
Pentobarbital
50-75
0
47
Pentazocina
Ligação às proteínas (%)
Pentoxifilina
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
?
0,120,15
2,9
0,8-1,4
0,3
?
0,180,30
1,2
2,4
1
5
2
45-55
80
1,5-2
1,4
9
0,8-1,5
2,5-4
0,8
18-48
2-5 H
H(R)
R
R
? R
inalte- R(H) rada
inalte- H(R) rada
6
1,6-3,4 R
?
3,3-5,1 R(H)
3-4
inalte- H(R) rada
25-30 g/ kg·dia
20 mg/dia
50-75 mg/ dia
30-60 mg/3-3 a 4-4 h
6-12 mg/ dia
10 mg/kg/ 8-8 h
3-4 g/ 4-4 h
10-40 mg/ 12-12 h
400 mg/ 8-8 h
20 mg/6-6 a 8-8 h
50 mg/ 4-4 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
?
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
D
D
D
D
D
D
I
D
D
D
D
Método
100%
100%
100%
50%
100%
100%
4-6 h
100%
100%
100%
100%
75%
100%
100%
35%
100%
evitar
6-8 h
100%
100%
100%
75%
50%
100%
100%
20%
100%
evitar
8h
100%
100%
100%
50%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
N
N
?
N
Evitar
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/min
N
?
HD: N, CAPD e CAVH: ?
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Nefrotoxicidade, IRA Ca, K e PO4
Nefrotoxicidade
A dose citada é para toxoplasmose
Excreção renal por drogas básicas
Hipocalemia, hiperglicemia e hiperuricemia, ototoxicidade
Inibe a excreção de urato, podendo precipitar gota
Sódio: 1,9 mEq/g
Ligação protéica na IRT
Cuidados especiais
834 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
75-95
Procainamida
15
85-95
80
50-90
100
Probenecide
20
Propiltiouracil
100
Primidona
70
95
80 11
Prednisona
70-95
20
85-99
Prednisolona
?
Propafenone
51 5
Prazepam
97
?
57
Prasozin
Ligação às proteínas (%)
Prometazina
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
2,5-4,9
5-8
5-15
2,5-3,5
2,5-3,5
50-100
2-3
0,3-0,4
3
1-2
5
grande 9-12
2,2
0,15
0,6
2,2
2,2
?
1,2-1,5 H(R)
H
H
H
inalte- H rada
?
?
5,3-5,9 R(H)
inalte- H rada
inalte- H rada
inalte- H rada
100 mg/ 8-8 h
150-300 mg/8-8 h
20-100 mg/dia
350-400 mg/3-3 ou 4-4 h
500 mg/ 12-12 h
250-500 mg/8-8 h
5-60 mg/ dia
5-60 mg/ dia
20-60 mg/ dia
1-15 mg/ 12-12 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
?
2-3
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
D
D
D
I
D
I
D
D
D
D
Método
100%
100%
100%
4h
100%
8h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
evitar
100%
100%
100%
100%
100%
100%
6-12 h 8-24 h
evitar
8-12 h 12-24 h
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
N
?
HD: 200 mg, CAPD: N, CAVH: baseada nos níveis séricos
?
HD: 1/3 dose
HD: N, CAPD e CAVH: ?
HD
?
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
t1/2 acetilador fenótipo-dependente, intenso efeito de primeira passagem
Sedação excessiva, efeito anticolinérgico: retenção urinária
Metabólito ativo: n-acetilprocainamida, síndrome like lupus, t1/2 nos acetiladores lentos, hemofiltração é útil na intoxicação
Conversão parcial a fenobarbital, deficiência de folato
Metabólito ativo: desmetildiazepam
Hipotensão grave após a 1.ª dose
Cuidados especiais
capítulo 46
835
92
?
55-70
15
96
0
60-90
Ramipril
Ranitidina 52
Reserpina
Ribavirina 45
Rifampicina
0,9
9-15
?
1,1-1,9
0,7-3,7
70
90
Quinina
2-3,5
70-95
15-31
2,8
16
1,5-5
30-60
46-168
1,5-3
5-8
5-16
6
54-98
2-6
9-15
H
H
H
H
R
R(NR)
1,8-11
?
H
R(NR)
87-323 H
6-9
15
600 mg/ 6-6 h
200 mg/ 8-8 h
0,05-0,25 mg/dia
150-300 mg/dia
10-20 mg/ dia
650 mg/ 8-8 h
200-400 mg/4-4 a 6-6 h
15-60 mg/dia
80-160 mg/ 12-12 h
65 mg/6-6 ou 8-8 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
4-14
?
1-6
12-20
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
Quinidina 70-75
77-93
Protriptilina
78
93
baixa
Propoxifeno
Ligação às proteínas (%)
Proprano- 36 lol
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
D
D
D
D
D
I
D
D
D
D
Método
100%
100%
100%
75%
100%
8h
100%
100%
100%
100%
24 h
75%
100%
100%
evitar
100%
100%
100%
50%
100%
50%
evitar
25%
50-75% 25-50%
8-12 h
100%
100%
100%
100%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/min
N
HD: 1/2 dose, CAPD: N, CAVH: ?
HD: 20%
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: como VFG 10 ml/min
HD: 100-200 mg, CAPD: N, CAVH: ?
N
N
N
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Metabólitos ativos, nefrite intersticial aguda, tubulopatia com perda de potássio
Hemorragia digestiva, sedação excessiva
Cuidados iguais aos da quinidina
Metabólitos ativos, níveis séricos de digoxina e digitoxina, excreção em urina ácida, HD é útil na intoxicação
Hipoglicemia na IRT
Norpropoxifeno acumula-se na IRT
Cuidados especiais
836 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
90
Salsalate (ácido salicilsalicílico)
95
50
Sulfametoxazol
Sulfimpirazona
29
Sulbactam
90-100
?
Succinilcolina
1
Sotalol
90
44
Secobarbital
100
0,06
0,280,38
0,250,50
?
1,3
1,5-2,5
?
?
?
Salmeterol
2,2-5
10
1
3
7,5-15
20-35
2,5-20
?
inalterada
20-50
10-21
?
56
?
inalterada
?
R
R(H)
R
NR
R
H
R(H)
H
D
Método
D
D
D
200 mg/ 12-12 h
800 mg/ 12-12 h
0,75-1,5 g/6-6 ou 8-8 h
D
I
I
0,3-1,1 mg/ D kg, depois: 0,04-0,07 mg/kg se necessário
160 mg/ dia
30-50 mg/ 6-6 a 8-8 h
1 g/8-8 h
50-100 D
g/12-12 h
2-4 mg/ 6-6 a 8-8 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
aumen- R(H) tada
2-2,5
7
Salbutamol
4
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Ligação às proteínas (%)
Droga
100%
12 h
6-8 h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
15-30%
100%
100%
100%
50%
100%
18 h
evitar
24 h
12-24 h 24-48 h
100%
30%
100%
100%
100%
75%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
HD, CAPD e CAVH: 800 mg/dia
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: 0,75-1,5 g/ 24-24 h
?
HD: 80 mg, CAPD: N, CAVH: ?
N
?
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Insuficiência renal aguda, efeito uricosúrico com redução da VFG
Ligação protéica na IRT
Inibidor da lactamase combinado com ampicilina
Hiperpotassemia na IRT
Os mesmos do AAS
Agente inalatório
Cuidados especiais
capítulo 46
837
?
20-30
Tamoxifen
55
96
90
Teofilina
Terazosin
55-90
Tetraciclina
40
97
Terfenadina
Tiazídicos
25
Terbutalina
77-80
99
Tenoxicam
90-94
99
96
Temazepam
Teniposide
10-40
Teicoplanin
100
95
90
Sulindac
85
90-100
Sulfixazol
Ligação às proteínas (%)
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Droga
3
0,7
?
0,94
0,5-0,9
0,3-0,7
?
0,2-0,7
1,3-1,5
0,5-1,2
?
?
0,140,28
6-8
6-10
16-22
3
9-12
4-12
72
6-10
4-10
33-190
18
8-16
3-7 R
Maiores vias de excreção
H
H
H
H
H
R(H)
H
12-20 R
57-108 R(H)
?
?
8-12
inalte- H rada
?
?
?
62-230 R
?
inalte- H rada
6-12
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
25-50 mg/ 12-12 h
250-500 mg/6-6 h
60 mg/ 12-12 h
2,5-5 mg/ 8-8 h
1-20 mg/ dia
6 mg/kg, depois: 9 mg/kg· dia
20 mg/dia
50-250 mg/m2
30 mg/dia
6 mg/kg· dia
10-20 mg/ 12-12 h
200 mg/ 12-12 h
1-2 g/ 6-6 h
Dose normal
D
I
D
D
D
D
D
D
D
I
D
D
I
Método
100%
8-12 h
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
24 h
100%
100%
6h
100%
evitar
100%
100%
100%
100%
100%
72 h
100%
100%
12-24 h
100%
evitar
12-24 h 24 h
100%
50%
100%
100%
100%
100%
100%
48 h
100%
100%
8-12 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
N
N
N
?
?
HD: 1/2 dose, CAPD e CAVH: ?
N
N
N
N
?
N
HD: 2 g, CAPD: 3 g/ dia
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Hiperuricemia, inefetivos com VFG 30 ml/ minuto
Evitar na IRT, hipercatabolismo
Exacerbação dos sintomas digestivos da uremia
Nefrotoxicidade
Mielotoxicidade
Ligação protéica na IRT
Nefro- e ototoxicidade
Metabólitos ativos
Metabólitos ativos
Ligação protéica na IRT
Cuidados especiais
838 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
?
Triprolidina
30-70
Trimetoprim
?
99
Tolmetin
Tripelenamina
96-97
Tolbutamida
85-90
94
10-20
Tocainide
Tolazamida
5
Tobramicina
100
72-86
Tiopental
60
Timolol
50
?
Ticlopidina
Ligação às proteínas (%)
40-60
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Ticarcilina
Droga
?
10
1-2,2
0,100,14
0,100,15
?
1,5-4
0,220,33
1-1,5
1,7
?
0,140,21
5
3-4,5
9-13
1-1,5
4-6
4-7
14
2,5
4
2,7
24-33
1,2
H
H(R)
R
H
H(R)
H
R
?
?
20-49
?
?
R(H)
inalte- H rada
D/I
Método
D
D
D
D
D I
D
D
2,5 mg/4-4 a 6-6 h
25-50 mg/ 6-6 a 8-8 h
D
D
80-160 mg/ I 12-12 h
400 mg/ 8-8 h
1-2 g/dia
100-200 mg/dia
200-400 mg/6-6 a 4-4 h
1 mg/kg/ 8-8 h
3-5 mg/kg (indução)
10-20 mg/ 12-12 h
250 mg/dia D ou até de 12-12 h
3 g/4-4 h
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H rada
?
22-27
27-60
6-18
4
?
11-16
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
100%
100%
100%
75%
100%
100%
1 g/ 12-12 h
?
?
12 h
100%
100%
100%
100%
?
?
18 h
100%
100%
100%
100%
?
?
24 h
100%
100%
100%
50%
75-100% 50-75% 25-50% 8-12 h 12-24 h 24-48 h
100%
100%
100%
1-2 g/ 1-2 g/ 4-4 h 8-8 h
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Quadro 46.1 (Continuação)
?
?
HD: 1 dose, CAPD e CAVH: 1 dose cada 12 h
N
N
?
HD: 200 mg, CAPD: N CAVH: ?
HD: 2/3 dose normal, CAPD e CAVH: 4 mg/L·dia
N
N
?
HD: 3 g, CAPD e CAVH: 1 g/ 12-12 h
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
Efeito antidiuréitco
Efeito diurético
Excreção reduzida em urina alcalina
Nefrotoxicidade, uso simultâneo de penicilinas pode resultar em níveis subterapêuticos de aminoglicosídeos
Sódio: 5,2 mEq/g
Cuidados especiais
capítulo 46
839
2
1
75
75
Vimblastina
Vincristina
30
Insuficiência Renal Terminal Pós-hemodiálise
Zidovudi- 52-75 na
99
0
Vigabatrina
100
25
Vidarabina
Warfarin
83-93
Verapamil 20
10-50
30
10
Vancomicina
89-93
30-50
Ligação às proteínas (%)
Vecurônio
100
Biodisponibilidade sistêmica oral (%)
Valproato de sódio
Tubocurarina
Droga
1,4-3
0,15
5-11
13-40
?
0,7
3-6
0,180,27
0,471,1
0,140,23
0,220,39
1,1-1,4
35-45
1-2,5
1-1,5
7
1,5
3-7
0,5-1,3
6-8
6-16
0,5-4
R
H(R)
R
H
H
R
R(H)
H(R)
1,4-3 R(H)
inalte- H rada
?
?
?
?
2,4-4
D
1,4 mg/m2
200 mg/ 4-4 h
4
3
100%
50% 75%
evitar ?
?
Reposição pós-HD2 CAPD3 e CAVH4
100%
100%
100%
100%
?
100%
100%
100%
100%
100%
100%
100%
?
100%
100%
100%
50%
100%
100%
100%
?
75%
100%
100%
HD: 100 mg, CAPD: como VFG 10 ml/ min, CAVH: 100 mg/4-4 h
N
?
?
?
HD: infusão após a diálise CAPD: como VFG 10, CAVH: como VFG 10-50 ml/min
N
?
500 125-250 0,5-1 g/ HD e CAPD: mg/ mg/ 4-7 dias 0,5-1 g/4-7 6-12 h 12-24 h dias; CAVH: 20 mg/L de filtrado
100%
75%
Ajuste (velocidade de filtração glomerular) (ml/min) 50 10-50 10
Diálise Peritoneal Ambulatorial Contínua Hemofiltração Arteriovenosa Contínua
D
D
D
3,7 mg/m2
10-15 mg, depois: 2-10 mg/dia
D
D
D
D
D/I
D
D
Método
2-4 g/dia
15 mg/kg/ 24 h
80 mg/ 8-8 h
0,08-0,1 mg/kg, depois: 0,01-0,05 mg/kg
500 mg/ 6-6 h
15-60 mg/dia
0,1-0,2 mg/kg
Maio- Dose res normal vias de excreção
inalte- H(R) rada
200250
?
5,5
Volu- t1/2 t1/2 me de normal IRT1 distribuição (horas) (horas) (L/kg)
Quadro 46.1 (Continuação)
Aplasia de medula
Hemorragia
Secreção inapropriada de HAD
Doses menores quando a VFG 60 ml/ min, sedação excessiva, confusão mental
Metabólitos ativos excretados pelos rins
Metabólitos ativos
Nefrotoxicidade e ototoxicidade
da ligação protéica na uremia
Recurarização tardia
Cuidados especiais
840 Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
841
capítulo 46
Quadro 46.2 Níveis séricos terapêuticos de drogas Droga Acetaminofen Ácido acetilsalicílico Ácido valpróico Amicacina Amitriptilina Canamicina Carbamazepina Ciclosporina Cloranfenicol Desipramina Difenilidantoína Digitoxina Digoxina Disopiramida Etossuximide Fenobarbital Gentamicina Imipramina Lidocaína Lítio Netilmicina Nortriptilina Primidona Procainamida Propranolol Quinidina Teofilina Tobramicina
Concentração terapêutica
Momento de coleta de sangue
10-20 mg/L 150-300 mg/L (antiinflamatório) 1,1-2,2 mmol/L (salicilato) 50-100 mg/L Pico: 15-25 mg/L Vale: 5 mg/L 120-250 mg/L (Ami Nortriptilina) Pico: 15-25 mg/L Vale: 5 mg/L 4-10 mg/L 1.as semanas: 150-200 ng/ml (plasma) Após 3 meses: 50-150 ng/ml (plasma) Pico: 10-25 mg/L Vale: 5 mg/L 75-160 mg/L 10-20 mg/L 13-25 mg/L 0,9-2,2 mg/L 2-5 mg/L 40-100 mg/L 15-40 mg/L Pico: 5-12 mg/L Vale: 2 mg/L 150-200 mg/L 1,5-5 mg/L 0,3-1,3 mEq/L Pico: 5-12 mg/L Vale: 2 mg/L 50-150 mg/L 5-15 mg/L 4-10 mg/L 50-100 mg/L 2-5 mg/L 8-20 mg/L
1 hora
Pico: 5-12 mg/L Vale: 2 mg/L Pico: 20-40 mg/L Vale: 5-10 mg/L
Vancomicina
1-3 horas pré-dose 0,5-1 hora* pré-dose pré-dose 0,5-1 hora* pré-dose pré-dose pré-dose I.V.: 2 horas, oral: 2-3 horas pré-dose pré-dose I.V.: 2-4 horas 8-24 horas 12 horas pré-dose pré-dose 4-24 horas 0,5-1 hora* pré-dose pré-dose durante infusão 12 horas 0,5-1 hora* pré-dose pré-dose pré-dose 1 hora/4-6 horas pré-dose pré-dose durante infusão oral: 1 hora/6 horas 0,5-1 hora* pré-dose 30 minutos** pré-dose
*Após 30 minutos de infusão endovenosa. **Após 1 hora de infusão endovenosa.
Quadro 46.3 Monitorização de níveis séricos de drogas
Dose de manutenção (métodos D, I ou D/I) Depois de 3-4 doses, determinar concentração: Pico e/ou Vale Níveis: subterapêuticos ou tóxicos Nível terapêutico Ajustar a dose pela fórmula: Monitorizar a VFG *DN DA CD/CA 10-12 dias** final do tratamento *DN dose nova, DV dose anterior, CD concentração desejada, CV concentração anterior. **Aminoglicosídeos.
noglicosídeos, em pacientes de alto risco, está delineada no Quadro 46.3.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ARONOFF, G.R.; BERNS, J.S.; BRIER, M.C.; GOLPER, T.A.; MORRISON, G.; SINGER, I.; SWAN, S.K. & BENNETT, W.M. Drug Prescribing in Renal Failure: Dosing Guidelines for Adults. American College Physicians, Philadelphia, PA, 4th ed. 1999, 176 p. BARSANULFO PEREIRA, E. Rim e Drogas: Manual Baseado em Princípios Farmacocinéticos. Robe Ed., São Paulo, 1988, 220 p. DE BROE, M.E. Prevention of aminoglycoside nephrotoxicity. Proc. EDTA-ERA, 22:959-973, 1985. DI GREGORIO, G.; BARBIERI, E.J.; KENNEDY, M.C. & FERKO, A.P. Handbook of Commonly Prescribed Geriatric Drugs. Medical Surveillance Inc., West Chester, PA, USA, 1993, 334 p. Drug Evaluations, 6th ed. American Medical Association, 1986, 1654 p.
842
Uso de Medicamentos na Insuficiência Renal
EVANS, W.E. & OELLERICH, M. Therapeutic Drug Monitoring: Clinical Guide, 2nd ed. Abbott Diagnostics Division, Wiesbaden Delkenheim, 1987, 108 p. FRIEDMAN, H. & GREENBLATT, D.J. Rational therapeutic drug monitoring. JAMA, 256(16):2227-2233, 1986. GIBALDI, M. Biopharmaceutics and Clinical Pharmacokinetics, 3rd ed., Lea & Febiger, Philadelphia, PA, USA, 1984, 330 p. GOODMAN & GILMAN’S: The Pharmacologic Basis of Therapeutics, 10th McGraw-Hill N.Y., 2001, 2148 p. GORDAN, P.A.; CARVALHO, S.M. & MATNI, A. O emprego de drogas em insuficiência renal. In: Riella, M.C. Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos, Guanabara Koogan, 622-636, 1980. GRAHL RAMOS, J.M.; DE LEON, J.F., SIEBURGER COSTA, F.; SAN MARTIN, S.P. & CONCEIÇÃO, S.C. O uso de medicamentos na insuficiência renal. In: Riella, M.C. Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos, 2ª ed. Guanabara Koogan, 509-527, 1988. GUGLER, R. & AZARNOFF, D.L. The clinical use of plasma drug concentrations. Rational Drug Therapy, 10(11):1-7, 1976. KAUFFMAN, R.E. The clinical interpretation and application of drug concentration data. Pediatric Clinics of North America, 28(1):35-45, 1981. KOCH-WESER, J. Serum drug concentrations as therapeutic guides. N. Eng. J. Med., 287(5):227-231, 1975. McCOY, H.G. & CIPOLLE, R.J. Toward optimal drug therapy: Benefits of therapeutic drug monitoring. Postgraduate Medicine, 74(4):121-134, 1983. SCHRIER, R.W. & GAMBERTOGLIO, J.G. Handbook of Drug Therapy in Liver and Kidney Disease, 1st ed., Little, Brown Co., Boston, Mass., 1991, 388 p. WIDDOP, B. Therapeutic Drug Monitoring. Churchill Livingstone, Edinburgh, 1985, 359 p. WINTER, M.E. Basic Clinical Pharmacokinetics, 2nd ed., Applied Therapeutics, Inc., Vancouver, Washington, 1992, 416 p.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET A First Course in Pharmacokinetics and Biopharmaceutics – David Bourne http://www.boomer.org/c/p1/ University of Pennsylvania Medical Center Guidelines for Antibiotic Use http://www.uphs.upenn.edu/bugdrug /antibiotic - manual/ renal.htm 2002 Dialysis of Drugs – Nephrology Pharmacy Associates http://www.nephrologypharmacy.com/downloads/ DialysisDrugs2002.pdf Uso de drogas em insuficiência renal – E. Barsanulfo Pereira http://www.medonline.com.br/med - ed/med2/drogas.htm The Drug Monitor – Nasr Anaizi http://home.eznet.net/~webtent/drugmonitor.html The Renal Drug Book – Aronoff, G. & Brier, M. (2001) http://www.kdp-baptist.louisville.edu/renalbook/
Capítulo
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
47
Cristina Martins e Miguel C. Riella
INTRODUÇÃO
Transplante renal
INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA Recomendações nutricionais INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA Tratamento conservador Recomendações nutricionais Hemodiálise
Período pré-transplante Período pós-transplante imediato Período pós-transplante tardio Rejeição crônica Recomendações nutricionais CONCLUSÃO
Recomendações nutricionais Diálise peritoneal
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Recomendações nutricionais
INTRODUÇÃO A doença renal é acompanhada de alterações orgânicas significativas, resultando em distúrbios no metabolismo de todos os nutrientes. Como conseqüência, esses pacientes estão propensos à desnutrição em suas mais diversas formas. É provável que existam fatores catabólicos distintos para os diferentes tipos e estágios da insuficiência renal. Podem contribuir para as alterações nutricionais desses pacientes as anormalidades nos níveis corporais de aminoácidos, a presença de acidose metabólica, os distúrbios endócrinos, a insuficiência cardíaca, a inflamação, a infecção e a anemia, entre outros. Além da influência orgânica na desnutrição, vários fatores sociais e psicológicos também contribuem para o problema.
A mortalidade do paciente com IRA parece estar mais relacionada a complicações básicas como infecção, hemorragia ou eventos cardiopulmonares do que à uremia per se. Desta forma, os efeitos adversos da desnutrição protéico-calórica podem ser implicados como possíveis fatores influenciando os resultados desses pacientes. A nutrição na IRA é objeto crescente de controvérsia pelo fato de não existirem evidências claras de que a instituição de suporte nutricional altera a morbidade e a mortalidade nesta condição. Por outro lado, ignorar as necessidades nutricionais desses pacientes, particularmente daqueles hipercatabólicos e incapazes de se alimentar, pode ter conseqüências desastrosas.
RECOMENDAÇÕES NUTRICIONAIS Quilocalorias
INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA A forma de insuficiência renal aguda (IRA) de maior preocupação nutricional é a pós-cirúrgica, que traz uma alta taxa de mortalidade.
O gasto energético depende principalmente da doença básica. Dados indicam que na IRA, quando a uremia é bem controlada pela diálise, existe pouca, ou nenhuma, mudança no gasto energético, e uma tendência maior para um gasto energético diminuído do que aumentado.1 Infecção pós-operatória com subseqüente falência de múltiplos ór-
844
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
gãos, incluindo IRA, pode ser um estado altamente catabólico. Estes achados poderiam ser explicados pelo metabolismo renal suprimido após o dano renal, dado que os rins contam com aproximadamente 8% do gasto energético do corpo em estado normal.2 Em pacientes com IRA, as necessidades energéticas são determinadas pela doença básica e, como mencionado previamente, a IRA per se reduz o consumo energético. Pacientes com injúria e sépticos são hipercatabólicos, mas parece que este hipercatabolismo não é tão acentuado como se pensou no passado. O aumento médio na taxa metabólica varia entre 12% e 14%.3
Proteínas Várias causas têm sido descritas como contribuintes para o aumento do catabolismo protéico nos pacientes com IRA, com ou sem falência de múltiplos órgãos associada (Quadro 47.1). Mediadores inflamatórios tais como interleucinas e fator de necrose tumoral parecem ativar as enzimas proteolíticas nas células musculares.4 Esta proteólise extensa no músculo esquelético pode ser crítica para a sobrevivência do hospedeiro. Aminoácidos de cadeia ramificada são liberados durante a proteólise e podem ser metabolizados dentro das células musculares como fonte imediata de energia.Devido à liberação acelerada e ao clearance anormal de aminoácidos (derivados do músculo esquelético) na IRA, as concentrações plasmáticas de aminoácidos podem aumentar, conduzindo a um padrão plasmático atípico.5 Existe, também, evidência de que a síntese protéica deficiente na uremia pode contribuir para a redução da massa corporal magra. A insulina é um hormônio anabólico que melhora o transporte de aminoácidos e estimula a síntese protéica. O metabolismo da glicose mediado pela insulina pode estar deficiente em indivíduos urêmicos. Na insuficiência renal,
Quadro 47.1 Causas de desnutrição na insuficiência renal aguda Ingestão nutricional inadequada Catabolismo aumentado Hormônios Glucagon Cortisol Hormônio da paratireóide Resistência à insulina Proteases Problemas médicos associados ou procedimentos cirúrgicos Diálise Perdas protéicas (diálise peritoneal) Perdas de aminoácidos (hemodiálise e diálise peritoneal) Catabolismo associado com a biocompatibilidade do dialisador (hemodiálise)
o metabolismo protéico e de aminoácidos também pode ser afetado pela secreção aumentada do hormônio da paratireóide, níveis altos de catecolaminas, glucagon, corticosteróides, acidose metabólica e outros fatores hormonais. O processo de hemodiálise per se é considerado um processo catabólico devido às perdas de aminoácidos no dialisado, devido à liberação de proteases e citocinas após contato do sangue com membranas pouco biocompatíveis.6 Em IRA, as necessidades protéicas ótimas obviamente dependem da natureza da doença básica, do grau de catabolismo e da necessidade para diálise. Em indivíduos com injúria, a excreção nitrogenada aumenta em proporção ao aumento da taxa metabólica, indicando que proteína parece tornar-se uma fonte importante de energia. A utilização protéica tem sido estimada com a observação da proteína e energia exigidas para produzir um balanço nitrogenado. No passado se pensava que a hiperalimentação poderia reverter o balanço nitrogenado negativo de pacientes hipercatabólicos, mas evidências recentes sugerem que isto foi um erro de julgamento. O estudo de Macias et al.7 objetivou identificar a influência de diferentes aportes de energia e proteínas no catabolismo protéico e balanço nitrogenado dos pacientes com IRA. Os resultados mostraram que os pacientes que receberam menos de 1,0 g de proteína por quilograma de peso por dia apresentaram um maior déficit nitrogenado (8,4 4,9 g N/dia), comparado com aqueles que receberam mais de 1 grama por quilograma por dia (3,5 4,2 g N/ dia). Quando estratificado, nesse estudo, somente aqueles pacientes que alcançaram balanço nitrogenado positivo, foi observado que eles apresentaram uma tendência a receber menos quilocalorias não-protéicas/dia. Conclui-se, então, que com uma administração protéica maior que 1,0 g/kg/ dia, o aporte de menos quilocalorias está associado a uma menor taxa de aparecimento da uréia. A maioria do nitrogênio derivado dos aminoácidos durante a degradação protéica é convertida em uréia. O grau de catabolismo protéico pode ser avaliado com mais precisão através do cálculo da taxa do aparecimento do nitrogênio uréico (urea nitrogen appearance — UNA). Baseado na taxa da UNA, os pacientes podem ser agrupados em três categorias: Grupo 1: Taxa baixa de UNA ( 5 g/dia). Se estes pacientes não estão emagrecidos e não estão em hemodiálise, pode ser vantajoso aconselhar um aporte nutricional com 2030 g de aminoácidos essenciais ou 0,6 g/kg/dia de proteína. Este regime pode ser usado por curto período, não excedendo duas semanas. O balanço nitrogenado poderia ser neutro ou levemente negativo, e a diálise poderia ser evitada. Grupo 2: Taxa moderada de UNA (5-10 g/dia). Estes pacientes moderadamente catabólicos devem fazer uso de aminoácidos essenciais e não-essenciais (0,8 a 1,2 g/kg/ dia). É importante manter em mente que, durante este regime nutricional, os pacientes continuarão em balanço ni-
capítulo 47
trogenado negativo até que o hipercatabolismo seja controlado clinicamente. Grupo 3: Taxa alta de UNA (10 g/dia). Estes pacientes estão mais enfermos, com injúria grave ou sepse, usualmente submetidos a sessões freqüentes de diálise ou mesmo à terapia de reposição renal contínua (TRRC). A administração de proteína deve ser um pouco mais alta (1,2-1,5 g/kg/dia) para minimizar a degradação protéica e perdas na diálise (Quadro 47.2). Uma questão que permanece é se pacientes com IRA devem receber aminoácidos essenciais isolados ou uma mistura de aminoácidos essenciais e não-essenciais.
Pontos-chave: • A forma de insuficiência renal aguda (IRA) de maior preocupação nutricional é a póscirúrgica, que traz uma alta taxa de mortalidade • Na IRA, as necessidades energéticas são determinadas pela doença básica, pois a IRA per se reduz o consumo energético • Na IRA com injúria ou sepse, o aumento médio na taxa metabólica varia entre 12% e 14% • Em indivíduos com injúria, a excreção nitrogenada aumenta em proporção ao aumento da taxa metabólica, indicando que proteína parece tornar-se uma fonte importante de energia • A maioria do nitrogênio derivado dos aminoácidos durante a degradação protéica é convertida em uréia Aminoácidos essenciais deveriam ser reservados para situações de muito baixo catabolismo protéico, sem necessidade de diálise, emagrecimento, e períodos curtos (duas semanas no máximo).
Lipídios e Carboidratos O conteúdo de triglicerídeos de lipoproteínas plasmáticas está aumentado. O colesterol total e, em particular, lipoproteínas de alta densidade estão diminuídos em pacientes com IRA.8 A atividade de ambas, lipase lipoprotéica periférica e lipase hepática, é menor que 50% do normal.9 Triglicerídeos de cadeia longa (TCLs) ou de cadeia média (TCMs) têm sido utilizados. Uma dose de 1 g/kg/dia não aumenta substancialmente os triglicerídeos plasmáticos, e 20% a 25% das necessidades energéticas podem ser satisfeitas.8,9,10 O clearance de triglicerídeos está marcadamente reduzido em pacientes com IRA e aparentemente não existe vantagem em usar TCMs ao invés de TCLs.10 Lipídios TCM possuem afinidade maior para a lipase lipoprotéica e não exigem carnitina para seu metabolismo, podendo ser utilizados mais facilmente que lipídios TCL. Teoricamente este tipo de lipídio poderia ser vantajoso na insuficiência renal, onde o metabolismo de gorduras encontra-se alterado.11 Glicose é a fonte energética preferida. Deveria ser lembrado que a IRA altera a tolerância à glicose e hiperglicemia não é incomum nestes pacientes. Insulina é freqüentemente necessária para controlar a glicemia.
Vitaminas, Eletrólitos e Minerais Necessidades vitamínicas não estão bem definidas para pacientes com IRA, e as recomendações para ingestão são principalmente derivadas de estudos em pacientes com insuficiência renal crônica (IRC). A perda da função excretora do rim conduz a anormalidades eletrolíticas, mas estas são fortemente influenciadas pela natureza do processo básico que causou a IRA. Pacientes altamente catabólicos tendem a ter concentrações séricas mais altas de elementos intracelulares, tais como potássio e fósforo, particularmente pacientes com trauma muscular associado. Porém, poucos pacientes com IRA possuem níveis séricos altos de potássio e de fósforo na internação.1 Eletrólitos devem ser administrados conforme as necessidades. Atenção particular deve ser dada para o potássio e o fósforo, principalmente naqueles pacientes em fase de realimentação após jejum prolongado. Eletrólitos (p.ex.,
Quadro 47.2 Recomendações nutricionais na IRA Quilocalorias Proteína/aminoácido Pacientes não dialisados Hemodiálise intermitente, CAVH/CAVHD Lipídios Líquido Vitaminas Eletrólitos Minerais
845
30-45 kcal/kg/dia 0,6 g/kg/dia de proteína ou aminoácidos mistos 1,2-1,5 g/kg/dia de proteína ou aminoácidos mistos até 30% do total de quilocalorias individualizado não definido — segue recomendação IRC não definido — segue recomendação IRC não definido — segue recomendação IRC
846
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
magnésio) e elementos-traço (p.ex., cromo, zinco, selênio), que dependem primariamente da excreção renal, podem necessitar de restrição.
INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA
Portanto, os objetivos do manejo nutricional na progressão da IRC pré-diálise são reduzir a toxicidade urêmica, retardar a progressão da doença e prevenir a desnutrição. A avaliação e o manejo cuidadosos são essenciais para garantir o máximo de retardo da progressão da doença, ao mesmo tempo que assegura o estado nutricional adequado dos pacientes.
RECOMENDAÇÕES NUTRICIONAIS
Tratamento Conservador
Quilocalorias
Tipicamente, a insuficiência renal crônica (IRC) pré-diálise ou em tratamento conservador progride até que seja necessária a diálise ou o transplante renal. Os pacientes nessa fase podem estar em grande risco nutricional. Sinais precoces de desnutrição, como a redução do peso corporal e declínio significativo na excreção urinária de creatinina, foram observados conforme a função renal dos pacientes declinava.12 Com o avanço da IRC, podem ocorrer grandes reduções na concentração de vários aminoácidos plasmáticos essenciais e totais.13 Também, vários índices nutricionais, como a ingestão alimentar, a transferrina, o colesterol e o IGF-1 séricos, assim como o peso corporal, diminuíram quando a função renal se deteriorou.14 Nesses estudos, entretanto, os pacientes foram avaliados antes de receberem qualquer tipo de intervenção nutricional. Existe, também, boa evidência sugerindo que o estado nutricional dos pacientes com IRC pré-diálise afeta os resultados de taxa de mortalidade após o início da diálise de manutenção.15
As necessidades energéticas dos pacientes em tratamento conservador aparentemente não são diferentes da população em geral. O balanço nitrogenado neutro ou positivo tem sido observado com um aporte de aproximadamente 35 kcal/kg/dia.16 Para os pacientes obesos, podem ser recomendados níveis mais baixos de quilocalorias. Por outro lado, os pacientes hipercatabólicos, fisicamente muito ativos ou desnutridos, podem necessitar de um aporte energético maior (v. Quadro 47.3). Conforme a IRC progride, a ingestão calórica desses pacientes tende a diminuir,17 e pode ser indicada uma suplementação para manter o estado nutricional adequado.
Proteínas — Quantidade Vários estudos em pacientes com IRC sugerem que a ingestão protéica pode ser reduzida com segurança para 0,6 g/kg/dia, ou mesmo para 0,3 g/kg/dia se suplementada com uma mistura de aminoácidos essenciais ou cetoácidos.18,19,20 Os aminoácidos essenciais e os cetoácidos es-
Quadro 47.3 Recomendações nutricionais diárias no tratamento conservador (pré-diálise) Quilocalorias (kcal/kg) • Repleção de peso • Manutenção • Redução Proteína (g/kg) • Repleção e diabéticos com IRC • Manutenção
35-45 35 25-30 0,8-1,0 0,6-0,8 (60-80% AVB) ou 0,3 suplementação com aminoácidos essenciais (0,3) ou 0,3 suplementação com cetoácidos (0,3)
Carboidratos (oral)
50-65% do total de quilocalorias
Lipídios
25-35% ou o restante das quilocalorias estimadas
Sódio (g)
1-3 (individualizado para pressão arterial e edema)
Potássio (g)
Individualizado, usualmente sem necessidade de restrição
Líquido
Normalmente sem necessidade de restrição
Fósforo (mg)
800 ou 10 mg/kg/dia
Cálcio (mg)
1.000-1.500
Fonte: Riella, M.C.; Martins, C. Nutrição na Progressão da Insuficiência Renal Crônica. In: M.C. Riella, C. Martins. Nutrição e o Rim. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 91-102, 2001.
capítulo 47
tão disponíveis no mercado (p.ex.: cetoácidos Ketosteril, Fresenius Kabi), porém o custo de ambos ainda é uma grande limitação. Para se evitar um balanço nitrogenado negativo, um aporte energético adequado é necessário, sendo pelo menos 60% da proteína ingerida de alto valor biológico. Quanto à recomendação protéica, três alternativas têm sido habitualmente utilizadas:16,21 • Dieta hipoprotéica convencional (alimentos mistos), com 0,6 g/kg de peso ideal por dia de proteína. Os pacientes na fase pré-diálise da IRC necessitam em torno de 0,6 g/kg/dia de proteína para manter o balanço nitrogenado. Para assegurar um bom aporte de aminoácidos essenciais, 2/3 da proteína ingerida deve ser de alto valor biológico (ovos, carne, etc.). No passado se acreditava que as dietas poderiam ser mais hipoprotéicas, e que o nitrogênio proveniente da degradação da uréia poderia ser reutilizado na síntese de aminoácidos. Sabe-se hoje em dia que o nitrogênio proveniente da uréia não contribui significativamente para a síntese protéica na uremia.16 • Dieta muito hipoprotéica, contendo 0,3 g/kg/dia de proteína predominantemente vegetal, e suplementada com uma mistura de aminoácidos essenciais (AAE). Vários estudos avaliaram a eficácia e a aceitação de uma dieta muito hipoprotéica (0,3 g/kg/dia), suplementada com aminoácidos essenciais.16 Há correção dos sintomas urêmicos, manutenção do estado nutricional e balanço nitrogenado positivo por longos períodos, mas se acredita que estas dietas, baseadas nas necessidades de indivíduos normais, não são adequadas para pacientes com insuficiência renal. Isto porque alguns aminoácidos se tornam condicionalmente essenciais na uremia. Por exemplo, a tirosina, que não é um aminoácido essencial, tem a sua síntese, a partir da fenilalanina, alterada na uremia, sugerindo a necessidade de suplementação. O mesmo se aplica à histidina. A sua falta na uremia acarreta um balanço nitrogenado negativo, além de malestar e rash cutâneo. Da mesma forma, a serina, sintetizada basicamente no rim, deve ser suplementada, já que está habitualmente reduzida nos urêmicos.16 • Dieta muito hipoprotéica, contendo 0,3 g/kg/dia de proteína predominantemente vegetal, e suplementada com uma mistura de AAE e cetoácidos (análogos dos aminoácidos sem nitrogênio) (v. Quadro 47.3). Vários estudos também comprovam a eficácia desta dieta, reduzindo sintomas urêmicos e mantendo os parâmetros nutricionais e o balanço nitrogenado adequados. Também, estas dietas hipoprotéicas melhoram a acidose metabólica, porque geram menos íons H. Melhorando a acidose metabólica, ocorre uma diminuição do catabolismo protéico e melhora do balanço nitrogenado. Adicionalmente, as dietas suplementadas com cetoácidos parecem melhorar a tolerância à glicose.
847
É importante lembrar que esta suplementação de aminoácidos essenciais ou cetoácidos só funciona se o paciente aderir à dieta restrita em proteínas (0,3 g/kg/dia). No caso de uma ingestão protéica maior, os suplementos são simplesmente oxidados.16
Pontos-chave: • Os objetivos do manejo nutricional na progressão da IRC pré-diálise são reduzir a toxicidade urêmica, retardar a progressão da doença e prevenir a desnutrição • O balanço nitrogenado neutro ou positivo tem sido observado com um aporte de aproximadamente 35 kcal/kg/dia • Quanto à recomendação protéica, três alternativas têm sido habitualmente utilizadas: 1. Dieta hipoprotéica convencional (alimentos mistos), com 0,6 g/kg de peso ideal por dia de proteína 2. Dieta muito hipoprotéica, contendo 0,3 g/ kg/dia de proteína predominantemente vegetal, e suplementada com uma mistura de aminoácidos essenciais (AAE) 3. Dieta muito hipoprotéica, contendo 0,3 g/ kg/dia de proteína predominantemente vegetal, e suplementada com uma mistura de AAE e cetoácidos (análogos dos aminoácidos sem nitrogênio) Estudo MDRD (The Modification of Diet in Renal Disease Study) O MDRD é um estudo histórico objetivando avaliar a influência de dietas hipoprotéicas na progressão da IR. O estudo teve caráter multicêntrico e randomizado. Os critérios levados em consideração foram dois níveis de pressão arterial: pressão arterial média de 107 mmHg, ou em torno de 140/90 mmHg, e pressão arterial média de 92 mmHg, ou em torno de 125/75 mmHg. Os diabéticos foram excluídos do estudo, e as drogas anti-hipertensivas, inclusive os inibidores da enzima conversora, foram utilizadas.22 No grupo A, com 585 pacientes e taxa de filtração glomerular entre 25 e 55 ml/minuto, os pacientes foram aleatoriamente designados para uma dieta hipoprotéica convencional (0,58 g/kg/dia) ou uma dieta usual contendo 1,3 g/kg/dia de proteína. No grupo B ficaram 255 pacientes com taxa de filtração glomerular entre 13 e 24 ml/minuto. Nesse grupo, os pacientes foram aleatoriamente colocados em uma dieta hipoprotéica convencional (0,58 g/kg/dia) ou muito hipoprotéica (0,28 g/kg/dia), suplementada com cetoácidos.
848
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
Os pacientes foram acompanhados em média por 2,2 anos, e a cada quatro meses foram determinadas a taxa de filtração glomerular por 125I-iotalamato e a ingestão protéica. Os resultados mostraram uma aderência razoavelmente boa à dieta: no grupo A, ingestão de 1,1 0,19 versus 0,73 0,15 recomendada, e no grupo B, 0,69 0,12 versus 0,46 0,15 g de proteína recomendada/kg/dia (média DP aos dois anos de acompanhamento). A análise dos resultados mostrou que o declínio da função renal não variou entre os grupos (considerando dieta e pressão arterial). Os autores concluíram que no grupo com IRC moderada (grupo A) houve um declínio mais lento da função renal após o quarto mês de instituição da dieta hipoprotéica. No grupo com IRC avançada (grupo B), não houve diferença das duas dietas sobre o declínio da função renal. Porém, neste grupo não houve grupo-controle. A interpretação dos dados deste estudo é complicada pelos seguintes fatores: 23 • Não se exigiu previamente prova de progressão da IRC, e no grupo A, 15% dos pacientes não apresentaram nenhum declínio da função renal no período de estudo. • A progressão da IRC foi mais ou menos 30% mais lenta do que a esperada. • Aproximadamente 20% dos pacientes tinham doença renal policística e esta enfermidade parece não sofrer influência da dieta ou controle agressivo da pressão arterial. • A inclusão de anti-hipertensivos do grupo dos inibidores da enzima conversora torna mais difícil detectar o benefício da dieta hipoprotéica. • A mistura de cetoácidos foi diferente daquela utilizada no estudo que relatou retardo na progressão da IRC. • O tempo de seguimento foi curto, especialmente se considerado o declínio inicial da função renal no quarto mês após instituída a dieta hipoprotéica. Apesar disto, algumas tendências: • Houve um retardo significativo na progressão quando a pressão arterial foi vigorosamente controlada em pacientes com proteinúria 1 g/dia. • A função renal de negros deteriorou-se mais rapidamente. No grupo B (IRC avançada), como citado anteriormente, a ingestão protéica variou muito, sendo que alguns pacientes ingeriram quantidades similares àquelas do grupo A. Numa análise secundária do estudo MDRD, foram feitas correlações entre a quantidade de proteína ingerida e a taxa de declínio da função renal.24,25 O resultado dessa análise revelou que uma redução da ingestão protéica de 0,2 g/kg/d ou mais foi associada com um declínio mais lento da taxa de filtração glomerular (TFG) (1,15 ml/minuto ou 29% da queda média da TFG no grupo B ou 4 ml/ minuto/ano). Isto significa que um paciente com um declínio da TFG 29% mais lento prolongaria em 41% o tem-
po para entrar em diálise. Portanto, haveria um benefício da dieta hipoprotéica em pacientes com IRC avançada (25 ml/minuto), mas não com a suplementação de cetoácidos. Portanto, através do estudo MDRD não ficam bem esclarecidos os benefícios de uma dieta hipoprotéica em torno de 0,6-0,7 g/kg/dia. Não há dúvida de que se possa retardar a diálise por vários anos, mas isso pode significar um grande esforço principalmente do paciente.
Pontos-chave: • O MDRD é um estudo histórico objetivando avaliar a influência de dietas hipoprotéicas na progressão da IR • A análise dos resultados mostrou que o declínio da função renal não variou entre os grupos (considerando dieta e pressão arterial) • Portanto, através do estudo MDRD não ficam bem esclarecidos os benefícios de uma dieta hipoprotéica em torno de 0,6-0,7 g/kg/dia Em estudos de metanálise, Pedrini et al.26 avaliaram apenas pesquisas randomizadas, controladas e com acompanhamento superior a um ano. O ponto final era a morte ou a insuficiência renal terminal. A análise incluiu 1.413 pacientes com IRC não-diabética e 108 pacientes com IRC diabética insulino-dependente. Em pacientes não-diabéticos e submetidos a uma dieta hipoprotéica (0,4-0,6 g/kg/ dia de proteína prescrita), houve uma redução de 33% no risco de morte ou insuficiência renal terminal. Nos pacientes diabéticos, a dieta reduziu o risco de progressão da lesão renal (queda do clearance de creatinina ou TFG, ou um aumento na proteinúria) em 46% (p 0,001). Também, em outra metanálise, Kasiske et al.27 analisaram 1.919 pacientes de 13 estudos randomizados e encontraram uma discreta redução na taxa de declínio da função renal (0,53 ml/ minuto/ano). Fouque et al.28 analisaram seis estudos que incluíram 890 pacientes não-diabéticos, randomizados e seguidos por um ano. Em cinco dos seis estudos, o número de mortes “renais” foi menor no grupo com dieta hipoprotéica, quando comparado com o grupo-controle (61 versus 95). No grupo da dieta hipoprotéica, a chance de morte “renal” foi de 0,54, ou seja, 46% a menos de chance de desenvolver a insuficiência renal. Por outro lado, embora os resultados das dietas hipoprotéicas sejam mais evidentes na nefropatia diabética, os inibidores da enzima conversora, que retardam significativamente a progressão da IRC, não foram utilizados nos estudos que mostraram efeito significativo da dieta hipoprotéica.29
capítulo 47
E quando iniciar a dieta hipoprotéica? Essa recomendação é baseada nos seguintes critérios:16 • • • •
Grau da IRC. Presença de progressão da IRC. Grau de proteinúria. Uso ou não de glicocorticóides.
Insuficiência Renal Crônica Discreta (TFG 60 ml/minuto). Estes pacientes geralmente apresentam uma creatinina sérica em torno de 2 mg/dl. Não é recomendada redução na ingestão protéica, a não ser que haja sinais de progressão da IRC. O objetivo nesta fase é controlar a pressão arterial e outros fatores, como a hiperlipidemia. Insuficiência Renal Crônica Moderada (TFG 25-60 ml/minuto). É geralmente recomendado iniciar uma dieta com 0,6-0,8 g/kg/dia de proteínas, sendo 2/3 de alto valor biológico (carne, peixe e ovos), juntamente com um controle rigoroso da pressão arterial. Para aqueles diabéticos com IRC, é recomendada uma ingestão protéica de 0,8-1,0 g/kg/dia de proteína de alto valor biológico. No caso de progressão da IRC na vigência dessa dieta hipoprotéica convencional em torno de 0,6 g/kg/dia, pode ser recomendada uma dieta vegetariana (0,3 g/kg/dia), suplementada com aminoácidos essenciais ou cetoácidos. A restrição de fósforo é essencial, mas felizmente isto se consegue facilmente com a restrição protéica. Insuficiência Renal Crônica Avançada (TFG 5-25 ml/minuto). Ambas as dietas recomendadas para a IRC moderada podem ser indicadas nesta fase. Ambas reduzem os sintomas urêmicos e as complicações metabólicas da uremia, e pode haver um retardo no declínio da função renal residual. É importante lembrar que os pacientes com 10 ml/min de TFG estão mais sujeitos à desnutrição.
Proteína — Qualidade (Animal ou Vegetal?) Além da quantidade de proteína recomendada, a fonte pode também ser importante para a progressão da IRC. Um estudo em diabéticos avaliou as respostas renal, metabólica e hormonal da ingestão protéica animal versus vegetal.30 Os indivíduos receberam principalmente proteínas de origem animal (1,1 g/kg/dia; 70% animal e 30% vegetal) durante quatro semanas, e depois passaram para outro período de quatro semanas com uma ingestão protéica exclusivamente vegetal (0,95 g/kg/dia). O RFG e o fluxo plasmático renal foram significativamente mais baixos com a proteína vegetal. As proteínas animais parecem influenciar adversamente o RFG e a progressão da doença renal. Em um estudo em nosso Centro (Hospital Universitário Evangélico de Curitiba), foi avaliado o efeito hemodinâmico renal com diferentes cargas protéicas sobre o RFG de indivíduos normais.31 O RFG dos indivíduos, medido pelo clearance de creatinina, foi avaliado antes da carga protéica (70 g) e após, durante 180 minutos. As fontes protéicas estudadas foram
849
a carne vermelha (gado), o frango, o peixe, a albumina do ovo e a soja. Os resultados mostraram que a carne vermelha teve um aumento significativo no clearance de creatinina, quando comparado o início com os períodos pós-ingestão. Também, a carne vermelha teve clearances de creatinina renal elevados por tempo mais prolongado do que os demais tipos de proteínas utilizados. A soja foi a única fonte protéica que não teve aumento estatisticamente significativo no clearance de creatinina nesses indivíduos. Um outro estudo, agora em ratos que sofreram nefrectomia subtotal, avaliou os efeitos da qualidade de proteínas (caseína e soja) sobre a função renal.32 Os animais submetidos à dieta à base de soja melhoraram a sobrevida, com menor proteinúria, menor hipertrofia, menor dano renal histológico dos néfrons remanescentes, associado a um melhor perfil lipídico sérico. Os mecanismos envolvidos no fato da proteína influenciar na função renal normal e na progressão da IRC ainda não estão bem esclarecidos. Tem sido sugerido que a composição de aminoácidos da proteína pode estar envolvida nesta resposta. A infusão de lisina em humanos, por exemplo, exerce um efeito inibitório sobre a reabsorção tubular de proteínas, gerando aumento da excreção de albumina.33 Esse efeito tem sido atribuído a aminoácidos, como a valina, histidina, glicina e lisina, que possuem um grupo amina com carga positiva na sua cadeia terminal. Isso tornaos hábeis a interferir no processo de reabsorção tubular da proteína. De outra forma, o triptofano, que é um aminoácido neutro, parece interferir na ação de aminoácidos de carga elétrica positiva (p.ex., arginina, histidina, lisina), inibindo a proteinúria.34 Existem muitas limitações quanto às metodologias utilizadas avaliando o papel de diferentes proteínas no desenvolvimento e progressão da IRC. Pelo fato dos estudos terem mantido a quantidade da proteína próxima ao “usual”, ainda não está claro se uma redução na sua quantidade total teria o mesmo efeito. A soja tem sido sugerida como fonte protéica que parece melhor retardar a progressão da doença renal. Mantém-se, portanto, a questão se realmente é a quantidade ou também a qualidade da proteína que possui menor influência na progressão da IRC. De qualquer forma, uma dieta vegetariana, se adequadamente implementada, pode ser uma alternativa segura e viável em substituição à dieta contendo proteína animal. Maiores pesquisas ainda são necessárias nessa área.
Carboidratos e Lipídios É usualmente recomendado que os pacientes em tratamento conservador façam uma dieta rica em carboidratos (aproximadamente 50 a 60% do total de quilocalorias). Os lipídios são recomendados geralmente entre 30 e 40% do total das quilocalorias, sendo ricos em mono- e poliinsaturados. O uso desses ácidos graxos é recomendado para minimizar o risco de hiperlipidemia principalmente dos pacientes diabéticos em IRC.
850
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
Sódio, Potássio e Líquidos Como visto anteriormente, a hipertensão é um dos fatores de risco para o desenvolvimento e progressão da IRC. A hipertensão aumenta conforme a função renal se deteriora. A redução da ingestão de sódio pode auxiliar no controle da hipertensão, assim como nos sintomas de retenção hídrica (edema). Os indivíduos diferem em sua sensibilidade ao sal, e é recomendada uma ingestão máxima de 3.000 mg/dia de sódio, sendo o ideal entre 1.000 e 2.000 mg/dia. O potássio não é normalmente restringido, até que haja uma perda significativa da função renal (RFG 5 ml/minuto). Enquanto existe em média um volume urinário de 1.000 ml/dia (usualmente os pacientes recebem diuréticos), o potássio não necessita de restrição. Alguns medicamentos anti-hipertensivos (p.ex., inibidores da enzima conversora), entretanto, podem elevar precocemente os níveis séricos de potássio, necessitando de restrição alimentar do mineral. O aumento persistente do potássio sérico do paciente que está recebendo uma dieta hipoprotéica e restrita no mineral é uma indicação para o início da diálise. Os líquidos também não necessitam de restrição na dieta, até que ocorra uma perda significativa da função renal (p.ex., RFG 5 ml/minuto). O monitoramento cuidadoso do peso corporal e do volume de excreção urinária auxilia no manejo hídrico.
Cálcio e Fósforo A absorção intestinal de cálcio parece diminuir precocemente no curso da progressão da IRC, devido ao metabolismo alterado da vitamina D. As dietas pobres em fósforo também são geralmente pobres em cálcio. Portanto, pode ser necessária a suplementação do mineral, assim como da vitamina D ativa. Pelo fato de que os níveis elevados de fósforo estão ligados à progressão da IRC, assim como ao desenvolvimento do hiperparatireoidismo secundário, é importante o controle da ingestão do mineral. Em geral, a dieta deve conter 5-10 mg/kg/dia de fósforo. As dietas hipoprotéicas automaticamente já são pobres em fósforo, porém somente as dietas muito pobres em proteínas e com suplementação de aminoácidos essenciais ou cetoácidos poderiam alcançar os níveis recomendados. Uma restrição em torno de 10 a 12 mg/kg/dia é mais fácil de ser alcançada. Conforme a IRC progride, pode ser necessária a utilização de quelantes de fósforo, em adição à restrição alimentar do mineral, para manter o seu nível sérico adequado.
Vitaminas e Oligoelementos As exigências de vitaminas de pacientes com IRC em tratamento conservador não estão bem definidas. Parece haver evidência de deficiência de piridoxina. As reservas de vitamina A estão aparentemente aumentadas já nesta fase da IRC, e portanto deve ser evitada. As recomendações de vitaminas hidrossolúveis são próximas ao recomendado para a população em geral.
As exigências de oligoelementos para esses pacientes não estão bem definidas, e também são próximas do recomendado à população em geral. A suplementação de ferro pode ser necessária para alguns pacientes, especialmente em conjunto com a terapia com eritropoietina.
Pontos-chave: • É usualmente recomendado que os pacientes em tratamento conservador façam uma dieta rica em carboidratos (aproximadamente 50 a 60% do total de quilocalorias) • Os lipídios são recomendados geralmente entre 30 e 40% do total das quilocalorias, sendo ricos em mono- e poliinsaturados • Os indivíduos diferem em sua sensibilidade ao sal, e é recomendada uma ingestão máxima de 3.000 mg/dia de sódio, sendo o ideal entre 1.000 e 2.000 mg/dia • O potássio não é normalmente restringido, até que haja uma perda significativa da função renal (RFG 5 ml/minuto) • Os líquidos também não necessitam de restrição na dieta, até que ocorra uma perda significativa da função renal (p.ex., RFG 5 ml/minuto)
Hemodiálise A desnutrição protéico-calórica é comum em pacientes em hemodiálise (HD) crônica.35 As causas da desnutrição incluem ingestão alimentar reduzida, distúrbios hormonais e gastrintestinais, restrições severas na dieta, medicamentos que podem influenciar na absorção de nutrientes e presença constante de enfermidades intercorrentes. Além disso, o procedimento de HD per se é catabólico e está associado com perdas de nutrientes no dialisado. A desnutrição aumenta significativamente a taxa de morbidade e mortalidade em HD. Os maiores determinantes de morbidade e mortalidade, tem-se demonstrado, são a adequação da diálise36,37 e o estado nutricional dos pacientes.38 Pacientes dialisados adequadamente sentem-se melhor e, conseqüentemente, comem melhor. Em HD as recomendações de vários nutrientes são severamente restritivas. A desnutrição pode ser um problema maior do que a necessidade de restrições na dieta. Portanto, em muitos casos, uma nutrição adequada é mais importante e pode necessitar sobrepor-se a outros objetivos. A detecção e o tratamento precoces da desnutrição podem reduzir o risco de infecções e outras complicações em
851
capítulo 47
pacientes em HD.39 A desnutrição em HD possui, provavelmente, causas multifatoriais. Alguns dos fatores são mostrados no Quadro 47.4. Pacientes com diabetes têm mais probabilidade de serem desnutridos. Isto pode estar relacionado com as enfermidades associadas, tais como síndrome nefrótica e insuficiência cardíaca congestiva, ocorrência freqüente de gastroparesia e diarréia, e a incidência alta de cegueira e neuropatia periférica nestes pacientes. São comuns as disfunções gastrintestinais, como náuseas, vômitos, gastrite, diarréia, obstipação e outras, que podem afetar a ingestão, digestão e absorção de nutrientes. Fadiga pós-diálise, episódios hipotensivos intradialíticos e necessidade freqüente de hospitalizações por problemas intercorrentes podem prevenir uma ingestão alimentar adequada. Restrições financeiras e condição de pobreza, comuns nesta população, podem dificultar diretamente a aquisição de alimentos. O uso crônico de múltiplos medicamentos pode conduzir à obstipação, motilidade gastrintestinal reduzida e interações droga-nutriente. Outro grande problema é a alta taxa de não-aderência às recomendações nutricionais que esta população apresenta.40 O tratamento de diálise envolve mudanças no estilo de vida e ajustes em todos os aspectos da vida do paciente. A identificação da desnutrição é muitas vezes difícil. Vários estudos têm demonstrado que a albumina sérica é um fator preditor independente e forte da mortalidade destes pacientes, e quanto mais baixo o nível sérico, maior o risco de morte.35,38 A anorexia parece ser um dos fatores mais significativos da desnutrição de pacientes em HD.41 Ela pode ocorrer devido à toxicidade urêmica, efeitos debilitantes da doença crônica, depressão emocional e efeitos de enfermidades adicionais, como infecções, que podem tanto redu-
zir o apetite quanto aumentar o catabolismo do paciente. A anorexia tem também sido atribuída a alterações na acuidade gustativa, talvez causadas pela deficiência de zinco, por restrições severas de sódio, potássio e líquidos, tornando a dieta pouco palatável e de difícil aderência, e devido ao uso crônico de medicamentos, que pode competir com a ingestão alimentar e/ou promover redução do apetite. Um avanço que parece melhorar o estado nutricional de pacientes em HD é o uso da eritropoietina. Parece que a eritropoietina melhora o padrão de aminoácidos plasmáticos. Isto pode ser resultado de um aumento do suprimento de oxigênio a diferentes tecidos, como músculos e cérebro. Pode, também e por outro lado, ser resultado da melhora da ingestão alimentar, secundária à melhora do apetite e bem-estar observados.42,43
RECOMENDAÇÕES NUTRICIONAIS As recomendações nutricionais em HD crônica estão apresentadas no Quadro 47.5.
Quilocalorias Diferente do que se pensava no passado, vários estudos têm demonstrado que pacientes em HD não possuem gasto energético maior do que indivíduos normais, medido através da calorimetria indireta.44 Embora pareça que os métodos atuais de estimativa de gasto energético não sejam representativos do gasto atual desta população,45 nenhuma nova recomendação foi ainda estabelecida.
Proteínas A etiologia para os distúrbios de aminoácidos na uremia não está claramente entendida. A desnutrição pode ser
Quadro 47.5 Recomendações nutricionais na hemodiálise Quadro 47.4 Causas de desnutrição em hemodiálise Ingestão alimentar insuficiente Anorexia diálise inadequada depressão dietas muito restritas medicamentos efeitos debilitantes da doença crônica Limitações financeiras Disfunções gastrintestinais Catabolismo aumentado Perdas de aminoácidos e vitaminas na diálise Proteólise aumentada pelo contato do sangue com as membranas dialíticas Alterações hormonais Resistência à insulina Hiperglucagonemia Hiperparatireoidismo
Quilocalorias Proteína Carboidratos Lipídios Sódio Potássio Líquido Fósforo Cálcio Vitaminas Complexo B e vit. C Ácido ascórbico Ácido fólico Piridoxina (B6) Riboflavina (B2) Niacina Tiamina Ácido pantotênico Ferro
30-35 kcal/kg/dia 1 a 1,2 g/kg/dia (50-80% AVB) 50-60% do total de quilocalorias 25-35% do total de quilocalorias 1 a 3 g/dia 1 a 3 g/dia 500 ml vol. urinário de 24 h 800 a 1.200 mg/dia 1.000 a 1.200 mg/dia 60-100 mg 1,0 mg 5-10 mg 1,8 mg 20 mg 1,5 mg 5,0 mg Suplementação individualizada
852
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
um fator contribuinte para estes distúrbios, ou a desnutrição pode ocorrer devido ao metabolismo alterado de aminoácidos não-essenciais.41 Os rins têm papel maior na síntese, degradação e excreção de aminoácidos. O excesso de toxinas urêmicas, por outro lado, pode influenciar complexos enzimáticos envolvidos no metabolismo e transporte de aminoácidos específicos. Ocorrem, também, perdas de aminoácidos em cada sessão de HD (5 a 8 g de aminoácidos livres e 4 a 5 g de aminoácidos ligados),41 contribuindo para a desnutrição. Na uremia, tipicamente, são encontradas concentrações plasmáticas e musculares baixas de alguns aminoácidos essenciais, e concentrações altas de vários aminoácidos não-essenciais. O catabolismo protéico pode também estar aumentado, dependendo da biocompatibilidade das membranas artificiais do dialisador.46 Outro fator adicional é a acidose metabólica, que, quando controlada em pacientes urêmicos, leva a uma diminuição do catabolismo protéico, com melhora do balanço nitrogenado.47 A uréia sangüínea possui relação direta com a ingestão protéica ou com a quebra endógena de proteínas (catabolismo), ou combinação de ambos. A recomendação em HD é de 1,0 a 1,2 g/kg/dia (alguns autores consideram até 1,4 g/kg/dia).48,49 As necessidades protéicas podem ser mais altas, dependendo do nível de estresse e necessidades metabólicas aumentadas. O cálculo da PNA (protein equivalent nitrogen appearance rate — taxa de aparecimento do nitrogênio protéico), a partir da geração da uréia, é utilizado para determinar as necessidades protéicas em pacientes estáveis. Valores inferiores às recomendações sugerem uma ingestão protéica baixa.
Lipídios e Carboidratos Uma ingestão equilibrada de carboidratos e lipídios é necessária para suprir a necessidade calórica total, caso contrário, as proteínas ingeridas são utilizadas como fonte energética. Para pacientes com níveis elevados de triglicerídeos séricos, recomenda-se redução na ingestão de carboidratos e aumento na ingestão de lipídios. Em caso de nível elevado de colesterol sérico, recomenda-se redução na ingestão de lipídios saturados e colesterol. Estas são recomendações baseadas em estudos em indivíduos hiperlipidêmicos, porém não nefropatas. A evidência do papel da dieta na melhora dos níveis dislipidêmicos em HD ainda não está clara.50 Para pacientes apresentando problemas de obstipação intestinal, são recomendadas fontes de carboidratos ricos em fibras, porém com atenção especial ao conteúdo de potássio destas fontes.
Sódio e Potássio A recomendação de sódio e potássio é individualizada, dependendo do volume e de perdas urinárias. Para ambos,
a recomendação diária varia de 1 a 3 g. Para pacientes sem manifestações clínicas de sobrecarga hídrica e com ingestão calórica baixa devido principalmente à anorexia, uma ingestão normal de sódio, principalmente na última refeição, antes da sessão de diálise (7 a 9 horas antes), pode ser recomendada. Pacientes com volume urinário igual ou maior que 1.000 ml/dia em geral não necessitam de restrição de potássio na dieta. Níveis sangüíneos de potássio são monitorados para a avaliação da necessidade de restrição.
Líquidos O volume de excreção urinária é um bom guia para a recomendação da ingestão de líquidos. Normalmente a recomendação diária é de 500 ml mais o volume de urina de 24 horas. Em caso de clima muito quente (transpiração excessiva), febre e diarréia, recomenda-se aumentar a ingestão hídrica. A recomendação atual de líquido corresponde a um ganho de peso desejável de até 2 kg no período interdialítico, para HD 3 vezes por semana. Esta recomendação, entretanto, pode não ser realista para todos os pacientes. Provavelmente a recomendação quanto ao ganho de peso interdialítico deva ser em termos relativos (p.ex., porcentagem do peso seco), para considerar diferenças individuais na estrutura física.
Cálcio e Fósforo A recomendação de cálcio é de 1.000 a 1.200 mg por dia.48,49 Cálcio usualmente requer suplementação devido à absorção intestinal diminuída e devido à restrição usual de produtos de laticínio (ricos em fósforo) na dieta. A restrição usual de fósforo é de 800 a 1.200 mg por dia.48,49 O controle do fósforo sérico não é usualmente possível somente com a dieta; é necessário o uso de quelantes, que se ligam ao fósforo da dieta e são excretados via intestinal. As doses de quelantes prescritos devem ser de acordo com a quantidade de fósforo presente na refeição.
Vitaminas A homocisteína é um potente agente aterosclerótico. Hiper-homocisteinemia tem sido correlacionada com doença vascular precoce.51 Pacientes renais crônicos têm risco reconhecido e altas taxas de morbidade e mortalidade devido à aterosclerose. Concentrações de homocisteína são geralmente elevadas em pacientes renais crônicos.52 As vitaminas B12, B6 e ácido fólico funcionam como co-fatores nestas reações enzimáticas. Em pacientes renais crônicos, vitaminas hidrossolúveis são perdidas durante a diálise, além de a ingestão alimentar poder estar diminuída. Em doses farmacológicas, a suplementação diária destas vitaminas reduz as concentrações plasmáticas de homocisteína em indivíduos com função renal normal51 e em indivíduos com insuficiência re-
capítulo 47
nal crônica,53 e parece ter efeitos benéficos no risco de doenças cardiovasculares. LIPOSSOLÚVEIS. As vitaminas lipossolúveis usualmente não exigem suplementação, exceto a vitamina D, com indicação individualizada, de acordo com os níveis sangüíneos de cálcio e fósforo. HIDROSSOLÚVEIS. A necessidade de suplementação de vitaminas hidrossolúveis é individualizada e depende da avaliação nutricional completa e periódica. Vitaminas hidrossolúveis são dialisáveis e a suplementação é usualmente recomendada, principalmente complexo B (ácido fólico e piridoxina) e vitamina C.
Ferro A recomendação de suplementação de ferro varia de acordo com o uso ou não de eritropoietina (EPO). Pacientes não recebendo EPO usualmente não necessitam de suplementação de ferro, porém aqueles recebendo EPO normalmente necessitam da suplementação de rotina.
Diálise Peritoneal O estado nutricional e as necessidades nutricionais de pacientes em CAPD (continuous ambulatory peritoneal dialysis) são afetados por vários fatores, mas principalmente: perda de proteínas, aminoácidos e vitaminas através do líquido de diálise, absorção de quantidade significativa de glicose deste líquido, e diálise inadequada. A desnutrição tem sido uma preocupação em diálise peritoneal, pois é um fator de risco independente para a morbidade (peritonite, taxa de hospitalização) e mortalidade.54,55 Por outro lado, mesmo apresentando reservas protéicas baixas (p.ex., hipoalbuminemia), muitos pacientes em CAPD ganham peso com o tempo. Independente dos métodos utilizados para avaliar o estado nutricional, existe uma incidência alta de desnutrição nesta população. Estudos indicam que a desnutrição leve a moderada ocorre em 30-35%, e a desnutrição grave ocorre em 8-10% dos pacientes em CAPD.56,57 A ingestão alimentar diminuída (devido principalmente à anorexia), as grandes quantidades de proteínas, aminoácidos e vitaminas perdidas no dialisado, e episódios de peritonite, estão entre as principais causas de desnutrição nestes pacientes. O Quadro 47.6 mostra um resumo dos principais mecanismos de desnutrição em CAPD. A anorexia na CAPD pode ocorrer devido à presença e absorção constante de glicose através da membrana peritoneal. A distensão abdominal, com conseqüente desconforto e sensação de plenitude gástrica devido ao volume contínuo de líquido infundido na cavidade peritoneal, pode dificultar uma ingestão adequada nestes pacientes. A absorção constante de glicose pode, também, promover sensação de saciedade precoce, freqüentemente relatada nesta população. Náuseas, vômitos, desenvolvimento de enfermidades intercorrentes, afetando o apetite, e episódios de peritoni-
853
Quadro 47.6 Causas de desnutrição em CAPD50 Ingestão diminuída Anorexia Pressão intraperitoneal aumentada Diálise inadequada/perda da função renal residual Sobrecarga hídrica Doença gastrintestinal coexistente (refluxo, úlcera péptica, gastroparesia) Co-morbidade coexistente (insuficiência cardíaca, doença pulmonar crônica) Medicamentos Absorção constante de glicose Restrições financeiras Iatrogenia Restrições dietéticas excessivas ou inapropriadas Perdas aumentadas Perda peritoneal de proteínas e vitaminas Peritonite Metabolismo alterado Acidose metabólica Diálise inadequada Atividade física reduzida Doenças intercorrentes Peritonite Hiperparatireoidismo
te58 podem ser fatores adicionais à desnutrição. Correlações diretas têm sido demonstradas entre desnutrição e taxa de peritonite,59 e entre hipoalbuminemia, incidência aumentada de peritonite e tempo de hospitalização.60
RECOMENDAÇÕES NUTRICIONAIS O Quadro 47.7 mostra o resumo das recomendações nutricionais na CAPD.
Quilocalorias A quantidade de glicose absorvida através da cavidade peritoneal varia consideravelmente entre pacientes devido a diferenças na permeabilidade da membrana.58 Em torno de 60-80% da glicose do dialisado é absorvida via peritoneal.61 São absorvidas em torno de 100-150 g/dia de glicose em programa padrão de CAPD.62 A absorção de glicose pode aumentar significativamente durante a peritonite.56 Pacientes em CAPD apresentam peso significativamente mais alto do que os pacientes em hemodiálise, e parece aumentar com o tempo em CAPD. Ocorre, entretanto, ao longo do tempo, uma redução gradual de nitrogênio corporal total, refletindo uma perda de massa corporal magra e proteína corporal nestes pacientes.63,64 As necessidades energéticas na CAPD não têm sido sistematicamente avaliadas. Estudos preliminares, utilizando a calorimetria indireta, indicam que pacientes em CAPD possuem gasto energético significativamente mais baixo do
854
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
Quadro 47.7 Recomendações nutricionais na CAPD Calorias kcal/kg/dia (incluindo a glicose do dialisado) repleção de peso 35-50 manutenção 25-35 redução 20-25 Proteína (g/kg/dia) repleção e peritonite 1,4-1,6 manutenção 1,2-1,3* Carboidratos (oral) 35% das kcal Fibras (g/dia) 20-25 Lipídios Restante das kcal estimadas Sódio (g/dia) Individualizado para pressão arterial e retenção hídrica Potássio (g/dia) Não restringido, exceto se o nível sérico estiver alto Líquido Pode não ser restringido, depende da pressão arterial e retenção hídrica Fósforo (mg/dia) 1.000-1.200 Cálcio (mg/dia) 1.000-1.200 Vitaminas lipossolúveis vitamina D individualizado vitamina K individualizado vitaminas A e E nenhuma Vitaminas hidrossolúveis ácido ascórbico 100 mg piridoxina (B6) 10 mg ácido fólico 1 mg outras hidrossolúveis RDA Ferro individualizado *Como já citado no texto, há evidência atual de que pacientes em CAPD não atingem estes valores de ingestão protéica e, no entanto, mantêm-se em balanço nitrogenado. Talvez o maior aporte calórico beneficiado pela absorção peritoneal de glicose seja o principal fator.
que pacientes em hemodiálise,65,66 podendo contribuir para o ganho de peso nesta população. Outros fatores de risco para o ganho de peso e desenvolvimento de obesidade são o excesso de ingestão calórica vinda da glicose do dialisado, atividade física limitada, hiperinsulinismo e dieta mais liberal. A recomendação calórica usual total (dieta dialisado) é de 30-35 kcal/kg/dia.67 As recomendações calóricas em diálise peritoneal devem considerar a absorção constante de glicose através do dialisado, e a ingestão calórica pode ser diminuída para prevenir ganho excessivo de peso e obesidade. Em geral, a quantidade de glicose absorvida é estimada em 20% a 30% da ingestão calórica usual do paciente.
apresentam diferenças individuais58 e variam de 5 a 15 g de proteínas e de 2 a 4 g/dia de aminoácidos. Durante um episódio de peritonite, as perdas protéicas podem aumentar consideravelmente, em 50 a 100%.69 Episódios recorrentes de peritonite também adicionam efeitos importantes, como perda de apetite e aumento do catabolismo corporal, devido aos efeitos da infecção e da dor. Vários estudos indicam a albumina sérica como o melhor parâmetro preditor de morbidade e mortalidade nesta população. Níveis abaixo de 3,5 mg/dl estão associados com taxas aumentadas de morbidade e mortalidade.70,71 Devido a perdas constantes de proteínas e aminoácidos no dialisado, uma ingestão alimentar adequada é essencial para pacientes em diálise peritoneal. A recomendação protéica em diálise peritoneal é de 1,21,3 g/kg/dia.72,73 Parece que nem todos os pacientes necessitam deste nível de ingestão protéica, e um balanço nitrogenado positivo pode ser encontrado com uma ingestão protéica de até 0,7 g/kg/dia.74 A necessidade mais baixa de proteína pode ser dependente da ingestão calórica, tipo de proteína consumida e massa muscular.54 A qualidade da proteína é de importância, recomendando-se no mínimo 50% de proteínas de alto valor biológico. As necessidades protéicas podem ser mais altas, dependendo do nível de estresse e necessidades metabólicas aumentadas.
Lipídios e Carboidratos Uma ingestão equilibrada de carboidratos e lipídios é necessária para suprir a necessidade calórica total, caso contrário, as proteínas ingeridas são utilizadas como fonte energética. A ingestão oral de carboidratos deve ser predominantemente de complexos e prover aproximadamente 35% do total de quilocalorias estimadas para o dia, devido à absorção constante de glicose pelo dialisado.72,73 Esta, entretanto, é uma recomendação difícil de ser seguida pela maioria dos pacientes.
Fibras Obstipação em diálise peritoneal pode resultar em aumento do desconforto abdominal. Obstipação intestinal em pacientes em diálise peritoneal é freqüentemente causada por uma baixa ingestão de fibras na dieta, pouca atividade física, suplementação oral de ferro e uso de quelantes de fósforo. A recomendação diária de fibras é 20-25 g.72,73 Estimular o aumento da atividade física é de grande importância para aliviar a obstipação.
Proteínas
Sódio e Potássio
A perda protéica é a maior desvantagem da diálise peritoneal.58 Perdas protéicas variam de indivíduo para indivíduo, mas são regularmente consistentes. Dentro das proteínas perdidas, aproximadamente 60% é albumina.68 As perdas diárias durante um regime usual de CAPD
O balanço de sódio e a pressão sangüínea podem ser bem controlados em CAPD. Para necessidades de sódio, cada paciente deve ser individualmente avaliado para parâmetros como peso, pressão sangüínea, respiração curta, edema e outros sinais. Muitos pacientes têm boa respos-
855
capítulo 47
ta com pouca ou nenhuma restrição de sódio, entretanto, sódio pode ser restringido em pacientes que usam poucas trocas de glicose hipertônica. Em caso de ganho excessivo de peso e hipertrigliceridemia, a restrição de sódio é recomendada com o objetivo de diminuir o número de trocas com altas concentrações de glicose. Em caso de hipercalemia, faz-se necessária uma melhor investigação quanto à adequação da diálise, e recomenda-se restrição de potássio na dieta. Deve-se verificar, também, o uso concomitante de beta-bloqueadores e inibidores da enzima de conversão usados no manejo da hipertensão arterial. Se a hipocalemia ocorre, o paciente deve ser encorajado para aumentar a ingestão de potássio na dieta.
Líquidos Líquido não é geralmente restringido na CAPD, mas os pacientes devem ser monitorizados para peso e pressão sangüínea.
Fósforo e Cálcio Na CAPD existe remoção substancial de fósforo, mas não o suficiente para prevenir o uso de quelantes. O fósforo da dieta pode necessitar ser restringido, porém, devido às necessidades aumentadas de proteínas, é difícil uma restrição com menos de 1.000-1.200 mg por dia.72,73 A dose de quelantes de fósforo prescrita deve ser de acordo com a quantidade de fósforo presente na refeição. A recomendação de cálcio é de 1.000 a 1.200 mg por dia.72,73 O líquido de diálise contém cálcio. Existe um fluxo de cálcio através da membrana peritoneal, e isto depende da concentração sérica de cálcio ionizado. Há evidência recente de que o balanço positivo do cálcio pode suprimir a secreção do hormônio paratireóideo (PTH) e causar uma doença óssea adinâmica. Em virtude disto, surgiram no mercado soluções de diálise com concentrações mais baixas de cálcio (2,5 mEq/L). Monitorar os níveis séricos de PTH também é importante.
Vitaminas LIPOSSOLÚVEIS. Vitaminas lipossolúveis A e E usualmente não exigem suplementação. A vitamina D, com indicação individualizada, é suplementada de acordo com os níveis sangüíneos de cálcio, fósforo e PTH. A suplementação, quando recomendada, é de 0,25 a 1 mg/dia. Suplementação de vitamina K é recomendada quando o paciente não está comendo suficientemente e está em uso prolongado de antibióticos. HIDROSSOLÚVEIS. Vitaminas hidrossolúveis são perdidas na diálise peritoneal. Outros fatores importantes para a deficiência são a ingestão baixa, metabolismo possivelmente alterado e interação com medicamentos. A recomendação é individualizada e depende da avaliação nutricional completa e periódica. Depleção vitamínica é mais provável em pacientes com episódios freqüentes de peritonite, quando a perda no dialisado é maior, e a inges-
tão está usualmente inadequada. Piridoxina, ácido fólico e ácido ascórbico são provavelmente as únicas vitaminas que necessitam ser suplementadas.
Ferro Pacientes em CAPD geralmente necessitam de suplementação de ferro, usualmente na forma de sulfato ferroso, a menos que haja evidência de sobrecarga de ferro. Ferro dextran pode ser administrado parenteralmente em base intermitente, quando o suplemento de ferro via oral não é bem tolerado ou bem absorvido via enteral. A necessidade de suplementação de ferro varia de acordo com o uso ou não da eritropoietina e depende da avaliação das reservas corporais de ferro, melhor observada através dos níveis de ferritina sérica.
Transplante Renal O transplante (tx) renal não é isento de problemas e riscos nutricionais. Atenção deve ser dada no período pré-tx aos fatores prognósticos cirúrgicos, incluindo o estado nutricional dos candidatos. A avaliação nutricional identifica o estado nutricional e os riscos potenciais de complicações relacionadas à nutrição. Correção de déficits nutricionais preexistentes (desnutrição) e prevenção de obesidade (ou tratamento, em caso de obesidade prévia) são os objetivos básicos do cuidado nutricional nesta fase. No pós-tx renal imediato, os efeitos metabólicos são conseqüência principalmente do estresse da cirurgia e do uso de altas doses de imunossupressores. O período pós-tx tardio é freqüentemente marcado por uma variedade de problemas nutricionais. A terapia imunossupressora está associada com múltiplos efeitos colaterais, incluindo hipercatabolismo protéico, obesidade, dislipidemias, intolerância à glicose, hipertensão, hipercalemia e alteração no metabolismo e ação da vitamina D.75 Morbidade cardiovascular (aterosclerose) permanece como o maior risco de complicação no receptor de tx renal,76,77 sendo sua incidência quatro vezes maior do que o esperado na população geral.77
PERÍODO PRÉ-TRANSPLANTE A presença de desnutrição tem sido associada com morbidade e mortalidade pós-cirúrgica, incluindo fatores tais como cicatrização insuficiente da ferida operatória e risco aumentado para infecção. A incidência de obesidade no período pré-tx varia de 15% 78 a 21%.79 A obesidade pode aumentar o risco operatório, tempo de hospitalização, cicatrização da ferida, além de ser um fator de risco para perda do enxerto e de aumento da taxa de mortalidade.79,80,81 Parece prudente, entretanto, que pacientes obesos devam ser encorajados para redução de peso antes da cirurgia de tx renal.
856
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
Pacientes com insuficiência renal crônica apresentamse geralmente dislipidêmicos, usualmente hipertrigliceridêmicos, com LDL e VLDL aumentadas e HDL diminuída, além de certas anormalidades nas apolipoproteínas séricas. Estas anormalidades são consideradas fatores de risco potencial para aterosclerose. A hiperlipidemia deveria ser tratada no candidato a tx renal.
PERÍODO PÓS-TRANSPLANTE IMEDIATO Catabolismo Protéico O estresse cirúrgico e as altas doses de corticosteróides podem conduzir a um catabolismo protéico intenso. Um dos efeitos metabólicos dos corticosteróides é o aumento da gliconeogênese hepática, a qual está associada com catabolismo aumentado de proteínas e aminoácidos e com anabolismo protéico diminuído. Este efeito pode ser exacerbado no paciente já desnutrido anteriormente. O catabolismo aumentado pode conduzir a um excesso de produção de uréia. O hipercatabolismo protéico pode ser ainda acelerado pelo tratamento da rejeição aguda com doses mais altas de corticosteróides. O catabolismo protéico alto, combinado com possíveis depleções protéicas preexistentes, pode adicionar problemas substanciais, como cicatrização lenta da ferida operatória e maior suscetibilidade à infecção. O grau de catabolismo protéico pode ser avaliado pela medida da taxa da UNA.
Gasto Energético O gasto energético de pacientes submetidos a transplante de rim ainda não foi estabelecido na literatura. Em um estudo em nosso centro (Hospital Evangélico de Curitiba), o gasto energético de repouso (GER) de pacientes transplantados vem sendo avaliado através da calorimetria indireta (Delta Trek, USA) durante o primeiro mês pós-tx. Nossos resultados preliminares em sete transplantados, comparados com indivíduos saudáveis, demonstram que houve diferença no GER por quilograma de peso entre os grupos. Pacientes transplantados tiveram um GER médio de 27,6 2,5 kcal/kg versus 23,7 2,7 kcal/kg no controle. Um número maior de amostras é necessário para confirmar estes resultados, porém, nossas conclusões são de que pacientes no pós-tx imediato provavelmente gastam um total em torno de 33-35 kcal/dia.
Rejeição Aguda Na rejeição aguda, altas doses de esteróides produzem um aumento na taxa de catabolismo protéico. Com o aumento dos níveis sangüíneos de uréia e creatinina, o pensamento mais comum poderia ser o de restringir a ingestão protéica. Entretanto, a restrição protéica neste quadro pode conduzir a um catabolismo intenso. Recomenda-se, nesta fase, uma dieta hiperprotéica e hipercalórica.
PERÍODO PÓS-TRANSPLANTE TARDIO Obesidade A obesidade é um achado comum em pacientes transplantados. A obesidade pós-tx renal pode ser atribuída a diversos fatores, incluindo: melhora repentina da sensação de bem-estar após um tx bem-sucedido, com aumento concomitante da ingestão alimentar; ingestão alta de quilocalorias, prescrita usualmente na fase pós-tx imediata; sentimento de libertação das restrições alimentares recomendadas nas fases de insuficiência renal progressiva e diálise; estímulo do apetite (hiperfagia) induzido pelo uso de doses altas de corticosteróides; presença de doença óssea, que pode limitar a atividade física e diminuir o gasto energético; estilo de vida sedentário, ao qual o paciente torna-se acostumado no período de diálise. Um estudo retrospectivo em nosso centro (Hospital Evangélico de Curitiba) em 142 pacientes, do período imediato até quatro anos pós-tx, confirmou o aumento significativo no peso até o primeiro ano pós-tx e estabilização após este período. Foi observado em nossa população, porém, que este ganho de peso não levou a obesidade significativa. Nossa conclusão é de que o peso pré-tx influencia na magnitude do ganho de peso pós-tx, confirmando resultados de outro estudo.78
Hiperlipidemia A prevalência de hiperlipidemias nesta população é alta.77,82-84 A hipercolesterolemia pós-tx é um fator de risco para o desenvolvimento de complicações cardiovasculares. Aproximadamente 60% dos receptores renais apresentam hiperlipidemia.75 Níveis de colesterol sérico estão elevados imediatamente após o tx e são freqüentemente acompanhados por níveis baixos de HDL e hipertrigliceridemia.85 A maioria desta população experimenta hipertrigliceridemia e hipercolesterolemia isoladas ou combinadas. O ganho de peso é um forte fator predisponente de dislipidemia em pacientes recebendo imunossupressão.86 A modificação da dieta é a intervenção inicial para pacientes com hiperlipidemia. Não relacionada à causa, a hiperlipidemia associada ao tx é freqüentemente amenizada pela terapia nutricional.85,87 Redução significativa de peso em transplantados renais tem mostrado melhorar o nível de triglicerídeos e colesterol.85,88 O uso de agentes farmacológicos para a redução dos níveis de colesterol está normalmente associado com efeitos adversos, e parece mais apropriado permitir um teste de aproximadamente três meses somente com a dietoterapia antes de aventar a possibilidade do uso destas drogas. Outro achado interessante quanto ao colesterol sérico é a demonstração de que reduções transitórias são comuns durante o primeiro ano pós-tx. Um estudo89 evidencia o colesterol como um fator preditor de rejeição aguda ou infecção por citomegalovírus, já que seu nível encontrouse reduzido em um período de seis semanas que antecederam ou sucederam um dos dois episódios.
857
capítulo 47
Minerais e Vitaminas O metabolismo de cálcio, fósforo e vitamina D é influenciado por vários fatores interligados resultantes do período prévio de insuficiência renal, da terapia imunossupressora e da restauração incompleta da função renal pelo tx. Hiperparatireoidismo e doença óssea podem persistir mesmo após restauração da função renal. O uso de ciclosporina também está associado com incidência substancial de hipercalemia, aparentemente causada por supressão de níveis de renina e aldosterona.90 Isto é mais freqüentemente visto no período pós-tx imediato, quando as doses de ciclosporina são mais altas. O tratamento de hipertensão com agentes beta-bloqueadores ou inibidores da enzima de conversão pode também exacerbar a hipercalemia. Com isto, pacientes podem exigir restrição dietética de potássio.
REJEIÇÃO CRÔNICA É ainda controverso o efeito deletério do excesso de proteínas versus o efeito do catabolismo protéico decorrente da terapia a longo prazo com corticosteróides. Há necessidade de estudos a longo prazo, com populações maiores, avaliando a progressão da rejeição crônica, e principalmente as conseqüências nutricionais de uma dieta hipoprotéica, assim como níveis seguros de restrição protéica nestes pacientes. Em resumo, na rejeição crônica (40-50 ml/min de RFG), uma restrição protéica moderada pode ser benéfica, desde que não sobreponha a necessidade de manutenção de um estado nutricional adequado destes pacientes a longo prazo. Outro aspecto importante da rejeição crônica é a hiperlipidemia. Em pacientes com rejeição vascular crônica (RVC) foi demonstrado existirem distúrbios nas lipoproteínas quando comparados com pacientes com função normal do enxerto.91 Nesta investigação, pacientes com RVC tiveram níveis de VLDL, LDL, colesterol e triglicerídeos totais mais altos, concluindo que o controle da hiperlipidemia pode ter um papel crucial na progressão da RVC.
Quadro 47.8 Recomendações nutricionais diárias no transplante renal Períodos: 1. Pós-transplante Imediato e na Rejeição Aguda: Quilocalorias 30-35 kcal/kg Proteína 1,3-1,5 g/kg Lipídios 30-35% do total das quilocalorias 2. Período Pós-transplante Tardio: Quilocalorias 25-30% do total das quilocalorias ou suficiente para alcançar/manter o peso ideal Proteína 1 g/kg/dia Lipídios 30% do total de quilocalorias Colesterol 300 mg 3. Em qualquer fase: Carboidratos Fibras Sódio Potássio Fósforo Cálcio Ferro Vitamina D3
50% do total de quilocalorias 20-25 g Restrição (2-4 g) somente se hipertensão, retenção hídrica, ou oligúria Restrição (1-3 g) somente se hipercalemia e/ou oligúria 1.200-1.500 mg/dia 1.200-1.500 mg/dia Suplementação depende das reservas corporais 1 a 2 g/dia, se necessário
atual/dia, e no pós-tx tardio, 25-30 kcal/kg/dia. Em pacientes obesos ou em risco de obesidade deve-se iniciar um programa de controle/redução de peso baseado na restrição calórica (20-25 kcal/kg/dia), aumento da atividade física, mudança de comportamento alimentar e apoio psicológico. As necessidades calóricas estão provavelmente aumentadas na presença de febre, infecção ou estresse (35-45 kcal/ kg/dia).
RECOMENDAÇÕES NUTRICIONAIS O objetivo do aporte nutricional é prover nutrientes adequados para promover anabolismo e prevenir infecção. As necessidades nutricionais no transplantado renal não estão bem definidas e as recomendações são normalmente baseadas em implicações metabólicas encontradas nestes pacientes e/ou extrapoladas de outras populações. O Quadro 47.8 mostra recomendações nutricionais usuais nos vários períodos pós-tx.
Quilocalorias A recomendação calórica é estabelecida para manter ou alcançar um peso adequado e determinada pelo ganho ou perda de peso. A recomendação no pós-tx imediato e em episódios de rejeição aguda é de 30-35 kcal/kg de peso
Proteínas No pós-tx imediato e na rejeição aguda, a recomendação protéica é de 1,3-1,5 g/kg para o peso atual/dia.75 Uma dieta hiperprotéica e pobre em carboidratos parece diminuir os efeitos colaterais cushingóides decorrentes da terapia com corticosteróides. Estes níveis parecem ser suficientes também àqueles pacientes que continuam exigindo hemodiálise ou diálise peritoneal pós-tx. A ingestão protéica deve somente ser controlada na presença de necrose tubular aguda com sintomas urêmicos associados, ou no evento de insuficiência renal. A recomendação protéica no pós-tx tardio é de 1,0 g/ kg/dia. Restrição protéica de 0,6-0,8 g/kg/dia (com no mínimo 75% de alto valor biológico) pode ser considerada
858
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
para aqueles pacientes com função renal anormal (rejeição crônica), se a ingestão calórica estiver adequada ( 25 kcal/ kg/dia),92 já que isto pode minimizar a proteinúria e a diminuição da taxa de filtração glomerular.93 Entretanto, o estado nutricional destes pacientes deve ser rigorosamente monitorizado.
tenha sido bem estudado. Se o paciente continua temporariamente em hemodiálise ou diálise peritoneal, deve-se continuar a reposição das vitaminas hidrossolúveis. Pacientes com rejeição crônica e em dieta hipoprotéica podem necessitar de suplemento multivitamínico.
CONCLUSÃO
Lipídios e Carboidratos A quantidade e a composição dos lipídios provavelmente não afetam os resultados no pós-tx imediato. Neste período são recomendados 30-35% do total de quilocalorias na forma de lipídios. No pós-tx imediato e tardio, os carboidratos são recomendados em torno de 50% do total de quilocalorias, com minimização de fontes de carboidratos simples (podem contribuir para hiperglicemia e hipertrigliceridemia) e ênfase nos carboidratos complexos.94
Sódio e Potássio O sódio da dieta pode ser limitado (2-4 g/dia) em caso de hipertensão ou retenção hídrica.99 Há pouca evidência sobre a eficácia da restrição de sódio para a maioria dos casos de hipertensão pós-tx. Uma recomendação prudente de restrição de sódio pode ser útil. Se o paciente está em hemodiálise, a restrição de sódio pode necessitar ser continuada nos níveis prescritos pré-tx, até que a diálise não seja mais necessária. A recomendação de potássio na dieta é individualizada, de acordo com os valores séricos do paciente. Em caso de hipercalemia ou oligúria, restrição de potássio da dieta pode ser necessária (1-2 g/dia).
Cálcio, Fósforo e Vitamina D O cálcio é recomendado em 1.200-1.500 mg/dia, exceto se contra-indicado devido à preexistência de hipercalcemia ou elevação do fósforo sérico. Uso de suplemento de cálcio pode ser indicado se a ingestão através da dieta não alcança os níveis recomendados.75 A recomendação da ingestão diária de fósforo é individualizada, de acordo com os níveis séricos do paciente. A recomendação geral é de 1.200-1.500 mg/dia. Alguns pacientes podem exigir suplementação de fosfato, em caso de hipofosfatemia. Em caso de rejeição crônica, restrição de fósforo (aproximadamente 800 mg/dia) é prudente quando a taxa de filtração glomerular estiver 50 ml/min. Terapia com quelantes de fósforo pode também ser necessária nesta fase. Suplementação com vitamina D3 (forma ativa) deve ser considerada em caso de hipocalcemia persistente, porém deve-se tomar cuidado para não promover hipercalcemia.
Vitaminas Hidrossolúveis Pacientes com tx bem-sucedido geralmente não exigem suplementos vitamínicos, embora este assunto ainda não
A insuficiência renal é um processo dinâmico, com várias alterações metabólicas, hormonais e bioquímicas. Cada fase da insuficiência renal demanda diferentes recomendações nutricionais. Essas recomendações dependem de vários fatores, entre eles o grau da insuficiência renal e o tipo da terapia dialítica. Por exemplo, o controle protéico na pré-diálise pode ser essencial para retardar a progressão da doença, enquanto o aumento significativo das necessidades protéicas pode ser uma das causas da desnutrição em diálise. Enfim, as alterações no metabolismo de todos os nutrientes que acompanham a doença e a insuficiência renal podem contribuir para a desnutrição e outros distúrbios nutricionais, influenciando significativamente nas taxas de morbidade e mortalidade desses pacientes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1.
DRUML, W. Nutritional support in acute renal failure. In: Mitch, W.E.; Klahr, S. (eds). Nutrition and the Kidney, 3rd ed. Philadelphia, Lippincott-Raven, p. 213-236, 1998. 2. SILVA, P. Renal fuel utilization, energy requirements and functions. Kidney Int., 32 (suppl 22):9, 1987. 3. ROULET, M.; DETSKY, A.S.; MARLISS, E.B. et al. A controlled trial of the effect of parenteral nutritional support on patients with respiratory failure and sepsis. Clin. Nutr., 2:97-105, 1983. 4. WILMORE, D.W. Catabolic illness strategies for enhancing recovery. N. England J. Med., 325:695, 1991. 5. DRUML, W. et al. Elimination of amino acids in acute renal failure. Nephron, 42:62, 1986. 6. HORL, W.H.; HEIDLAND. Evidence for the participation of granulocyte proteinases on intradialytic catabolism. Clin. Nephrol., 21:314322, 1984. 7. MACIAS, W.L.; ALAKA, K.J.; MURPHY, M.H. et al. Impact of the nutritional regimen on protein catabolism and nitrogen balance in patients with acute renal failure. JPEN, 20:56-62, 1996. 8. DRUML, W. et al. Lipid metabolism in acute renal failure. Kidney Int., 16 (suppl):139, 1983. 9. DRUML, W. et al. Acute renal failure in the elderly. J. Am. Soc. Nephrol., 1:32, 1990. 10. DRUML, W.; FISHER, M.; SERTL, S. et al. Fat elimination in acute renal failure: long-chain versus medium-chain triglycerides. Am. J. Clin. Nutr., 55:468-472, 1992. 11. CACH, A.C.; STORCK, D.; MERAIHI, Z. Medium-chain triglyceridebased fat emulsions: an alternative energy supply in stress and sepsis. JPEN, 12:825-885, 1988. 12. KOPPLE, J.D.; BERG., R.; HOUSER, H.; et al. Nutritional status of patients with different levels of chronic renal failure. Kidney Int., 36 (Suppl. 27):S184-S194, 1989. 13. LAIDLAW, S.A.; BERG, R.L.; KOPPLE, J.D. et al. Patterns of fasting plasma amino acid levels in chronic renal insufficiency: Results from
capítulo 47
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
23. 24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
the feasibility phase of the Modification of Diet in Renal Disease Study. Am. J. Kidney Dis., 23:504-513, 1994. ANDERSON, S.; MEYER, T.W.; RENNKE, H.G.; BRENNER, B.M. Control of glomerular hypertension limits glomerular injury in rats with reduced renal mass. J. Clin. Invest., 76:612-619, 1985. KHAN, H.L.; CATTO, G.R.; EDWARDS, N. et al. Death during the first ninety days of dialysis: a case control study. Am. J. Kidney Dis., 25:276-280, 1995. MARONI, B.J. Requirements of protein, calories and fat in the predialysis patient. In: Handbook of Nutrition and the Kidney. Mitch, W.E.; Klahr, S. (eds). Philadelphia: Lippincott-Raven, 1993, pp.144200. KOPPLE, J.D.; GREENE, T.; CHUMLEA, C. et al. Relationship between nutritional status and the glomerular filtration rate: results from the MDRD study. Kidney Int., 57:1688-1703, 2000. MITCH, W.E. Dietary protein restriction in chronic renal failure: Nutritional efficacy, compliance, and progression of renal insufficiency. J. Am. Soc. Nephrol., 2:823-831, 1991. KOPPLE, J.D.; LEVEY, A.S.; GREENE, T. et al. Effect of dietary protein restriction on nutritional status in the Modification of Diet in Renal Disease Study. Kidney Int., 52:778-791, 1997. WALSER, M.; MITCH, W.E.; MARONI, B.J.; KOPPLE, J.D. Should protein intake be restricted in predialysis patients? Kidney Int., 55:771-777, 1999. MITCH, W.E. Nutritional therapy and progression of renal disease. In: Handbook of Nutrition and the Kidney. Mitch, W.E.; Klahr, S. (eds). Philadelphia: Lippincott-Raven, 1993, pp. 237-252. KLAHR, S.; BEVEY, A.S.; BECK, G.J. et al. The effects of dietary protein restriction and blood-pressure control on the progression of chronic renal disease. N. Engl. J. Med., 330:877-884, 1994. MITCH, W.E. Dietary therapy in uremia. The impact on nutrition and progressive renal disease. Kidney Int., 57(Suppl 75):S38-S43, 2000. LEVEY, A.S.; ADLER, S.; CAGGIULA, A.W. et al. Effects of dietary protein restriction on the progression of advanced renal disease in the Modification of Diet in Renal Disease Study. Am. J. Kidney Dis., 27:652-663, 1996. LEVEY, A.S.; GREENE, T.; BECK, G.J. et al. Dietary protein restriction and the progression of chronic renal disease: what have all of the results of the MDRD study shown? Modification of Diet in Renal Disease Study group. J. Am. Soc. Nephrol., 10:2426-2439, 1999. PEDRINI, M.T.; LEVEY, A.S.; LAU, J. et al. The effect of dietary protein restriction on the progression of diabetic and nondiabetic renal diseases: a meta-analysis. Ann. Intern. Med., 124:627-632, 1996. KASISKE, B.L.; KALATUA, J.D.A.; MA, J.Z.; LOUIS, T.A. A metaanalysis of the effects of dietary protein restriction on the rate of decline in renal function. Am. J. Kidney Dis., 31:954-961, 1998. FOUQUE, D.; LAVILLE, M.; BOISSEL, J.P. et al. Controlled low protein diets in chronic renal insufficiency: meta-analysis. Br. Med. J., 304:216-220, 1992. ROSE, B.D. Secondary factors and progression of renal failure, and protein restriction and progression of renal failure. In: UpToDate®, Inc Wellesley, MA, 8(1), 2000. KONTESSIS, P.S.; TREVISAN, R.; BOSSINAKOU, I. et al. Renal, metabolic, and hormonal responses to proteins of different origin in normotensive, nonproteinuric type 1 diabetic patients. Diabetes Care, 18:1233-1240, 1995. RIELLA, M.C.; MARTINS, C.; EMED, S.; LOWEN, J. Effect of different dietary protein loads on glomerular filtration rate in normal subject (abstract). Kidney Int., 36 (suppl. 27):301, 1989. WALLS, J.; WILLIAMS, A.J. Influence of soya protein on the natural history of a remnant kidney model in the rat. Contr. Nephrol., 60:179-187, 1988. MOGENSEN, C.E.; SOLLING, K. Studies on renal tubular protein reabsorption: partial and near complete inhibition by certain amino acids. Scand. J. Clin. Lab. Invest., 37:126-134, 1988. KAYSEN, G.A.; KROPP, J. Dietary tryptophan supplementation prevents proteinuria in the seven-eights nephrectomized rat. Kidney Int., 23:473-479, 1983.
35.
36.
37.
38.
39.
40. 41. 42.
43.
44.
45.
46.
47.
48.
49.
50.
51.
52. 53.
54. 55. 56.
859 KAMINSKI, M.; LOWRIE E.; ROSENBLATT, S. et al. Malnutrition is lethal, diagnosable, and treatable in ESRD patients. Transplant Proc., 23:1810-1815, 1991. HELD, P.; LEVEN, N.; BOUBERG, R.; PAULY, M.; DIAMOND, L. Mortality and duration of hemodialysis treatment. JAMA, 257:645650, 1991. OWEN, W.; LWE, N.; LUI, Y.; LOWRIE, E.; LAZARUS, J. The urea reduction ratio and serum albumin concentration as predictors of mortality in patients undergoing hemodialysis. N. Engl. J. Med., 329:1001-1006, 1993. LOWRIE, E.G.; LEW, N.L. Death risk in hemodialysis patients: The predictive value of commonly measured variable and an evaluation of death rate differences between facilities. Am. J. Kidney Dis., 15:458-482, 1990. JACOB, V.; CARPENTIER, J.; SALZANO, S. et al. IGF-I, a marker of undernutrition in hemodialysis patients. Am. J. Clin. Nutr., 52:39-44, 1990. CHAN, C.; GREENE, G. Dietary compliance among young hemodialysis patients. Dial. Transpl., 23:184-189, 1994. ALVESTRAND, A. Protein metabolism and nutrition in hemodialysis patients. Contr. Nephrol., 78:102-118, 1990. ACCHIARDO, S.; QUINN, P.; MOORE, L. et al. Evaluation of hemodialysis patients treated with erythropoietin. Am. J. Kidney Dis., 17:290-294, 1991. RIEDEL, E.; HAMPL, H.; SCIGALLA, P. et al. Correction of amino acid metabolism by recombinant human erythropoietin therapy in hemodialysis patients. Kidney Int., 36:S216-S221, 1989. SCHNEEWEISS, B.; GRANINGER, W.; STOCKENHUBER, F. et al. Energy metabolism in acute and chronic renal failure. Am. J. Clin. Nutr., 52:596-601, 1990. OLEVITCH, L.; BOWERS, B.; DEOREO, P. Measurement of resting energy expenditure via indirect calorimetry among adult hemodialysis patients. J. Renal. Nutr., 4:192-197, 1994. GUTIERREZ, A.; ALVESTRAND, A.; WAHREN, J. et al. Effect of in vivo contact between blood and dialysis membranes on protein catabolism in humans. Kidney Int., 38:487-494, 1990. MITCH, W.; MAY, R.; MARONI, B.; DRUML, W. Protein and amino acid metabolism in uremia: Influence of metabolic acidosis. Kidney Int., 36:S205-S207, 1989. AHMAD, K.R.; KOPPLE, J.D. Nutrition in maintenance hemodialysis patients. In: Kopple, J.D. e Massry, S.G. (eds.) Nutritional Management of Renal Disease. New York: Williams & Wilkins, 1997, p. 563-593. IKIZLER, T.A.; HAKIM, R.M. Nutritional requirements of hemodialysis patients. In: Mitch, W.E.; Klahr, S. (eds.) Handbook of Nutrition and the Kidney, 3rd. Philadelphia: Lippincot-Raven, 1998, p. 253-268. VRIES, P.; FOLKERS, H.; FIJTER, C. et al. Adipose tissue fatty acid composition and its relation to diet and plasma lipid concentrations in hemodialysis patients. Am. J. Clin. Nutr., 53:469-473, 1991. BRATTSTROM, L.; ISRAELSSON, B.; NORRVING, B.; BERGQVIST, D.; THORNE, J.; HULTBERG, B.; HAMFELT, A. Impaired homocysteine metabolism in early-onset cerebral and peripheral occlusive arterial disease effects of pyridoxine and folic acid treatment. Atherosclerosis, 81:51-60, 1990. HULTBERG, B.; ANDERSON, A.; STERNER, G. Plasma homocysteine in renal failure. Clin. Nephrol., 40:230-234, 1993. ARNADOTTIR, M.; BRATTSTROM, L.; SIMONSEN, O.; THYSELL, H.; HULTBERG, B.; ANDERSSON, A.; NILSSON-EHLE. The effect of high-dose pyridoxine and folic acid supplementation on serum lipid and plasma homocysteine concentration in dialysis patients. Clin. Nephrol., 40:236-240, 1993. HARTY, J.; GOKAL, R. Nutritional status in peritoneal dialysis. J. Renal Nutr., 5:2-10, 1995. KESHAVIAH, P.; CHURCHILL, D.; THORPE, K. et al. Impact of nutrition on CAPD mortality. J. Am. Nephrol. Soc. 5, 494(abstr), 1994. YOUNG, G.; KOPPLE, J.; LINDHOLM, B. et al. Nutritional assessment of continuous ambulatory peritoneal dialysis patients: An international study. Am. J. Kidney Dis., 17:462-471, 1991.
860 57.
58. 59. 60.
61. 62.
63.
64.
65.
66.
67.
68.
69.
70.
71.
72.
73.
74.
75. 76. 77. 78.
Manejo e Terapia Nutricional do Urêmico
HARTY, J.; BOULTON, H.; CURWELL, J. et al. The normalised protein catabolic rate is a flawed marker of nutrition in CAPD patients. Kidney Int., 45:103-109, 1994. LINDHOLM, B.; BERGSTROM, J. Nutritional aspects on peritoneal dialysis. Kidney Int., 38:S165-171, 1992. LEE, H.; KIN, Y.; KANG, S. et al. Influence of nutritional status on CAPD peritonitis. Yonsei Med. J., 31:65-70, 1990. YOUNG, G.; YOUNG, J.; YOUNG, S. et al. Nutrition and delayed hypersensitivity during continuous ambulatory peritoneal dialysis in relation to peritonitis. Nephron, 43:177-186, 1986. GAHL, G.; HAIN, H. Nutrition and metabolism in continuous ambulatory peritoneal dialysis. Contrib. Nephrol., 84:36-44, 1990. GRODSTEIN, G.; BLUMENKRANTZ, M.; KOPPLE, J. et al. Glucose absorption during continuous ambulatory peritoneal dialysis. Kidney Int., 19:564-567, 1981. POLLOCK, C.; ALLEN, B.; WARDEN, R. et al. Total-body nitrogen by neutron activation in maintenance dialysis. Am. J. Kidney Dis., 16:38-45, 1990. BROOKS, M.; BRANDES, J. Changes in lean body mass in chronic peritoneal dialysis patients. J. Am. Soc. Nephrol., 5:488 (abstr), 1994. KRAPT, R.; ZABETAKIS, P.; GLEIM, G. et al. Reduced resting metabolic rate (RMR) in a risk factor for obesity in peritoneal dialysis (PD) patients. Perit. Dial. Int., 12:S73(abstr), 1992. ZABETAKIS, P.; PARK, W.; GLEIM, G. et al. Resting energy expenditure is reduced in patients on peritoneal dialysis and does not change with time on dialysis. J. Am. Soc. Nephrol., 5:506(abstr), 1994. KOPPLE, J.; BLUMENKRANTZ, M. Nutritional requirements for patients undergoing continuous ambulatory peritoneal dialysis. Kidney Int., S16:295-302, 1983. YOUNG, G.; BROWNJOHN, A.; PARSONS, F. Protein losses in patients receiving continuous ambulatory peritoneal dialysis. Nephron, 45:196-201, 1987. LINDHOLM, B.; BERGSTROM, J. Protein and amino acid metabolism in patients undergoing continuous ambulatory peritoneal dialysis (CAPD). Clin. Nephrol., 30:S59-63, 1988. BLAKE, P.; FLOWERDEW, G.; BLAKE, R. et al. Serum albumin in patients on continuous ambulatory peritoneal dialysis — Predictors and correlation with outcome. J. Am. Soc. Nephrol., 3:1501-1507, 1993. SPIEGEL, D.; ANDERSON, M.; CAMPBELL, V. et al. Serum albumin: A marker for morbidity in peritoneal dialysis patients. Am. J. Kidney Dis., 21:26-30, 1993. GOKAL, R.; HARTY, J. Nutrition and peritoneal dialysis. In: Mitch, W.E.; Klahr, S. Handbook of Nutrition and the Kidney, 3.ª ed. LippincotRaven, Philadelphia, 1998, p.269-293. HEIMBÜRGER, O.; LINDHOLM, B.; BERGSTRÖM, J. Nutritional effects and nutritional management of chronic peritoneal dialysis. In: Kopple, J.D.; Massry, S.G. Nutritional Management of Renal Disease. Williams & Wilkins, New York, 1997, p. 619-668. BERGSTROM, J.; FURST, P.; ALVESTRAND, A. et al. Protein and energy intake, nitrogen balance and nitrogen losses in patients treated with continuous ambulatory peritoneal dialysis. Kidney Int., 44:1048-1057, 1993. PAGENKEMPER, J.; FOULKS, C. Nutritional management of the adult renal transplant patient. J. Renal Nutr., 1:119-124, 1991. MATAS, A.J. Where do we go from here? Long-term kidney transplant outcome. Contemp. Dial. Nephr., August:18-21, 1991. KASISKE, B. Risk factors for accelerated atherosclerosis in renal transplant recipients. Am. J. Med., 84:985-992, 1988. MERION, R.; TWORK, A.; ROSENBERG, L. et al. Obesity and renal transplantation. Surg. Gyn. Obst., 172:367-376, 1991.
79.
80.
81.
82. 83.
84.
85.
86.
87.
88.
89. 90. 91.
92.
93.
94.
JOHNSON, C.; GALLAGHER-LEPAK, S.; ZHU, Y.; PORTH, C.; KELBER, S.; ROZA, A.; ADAMS, M. Factors influencing weight gain after renal transplantation. Transplantation, 56:822-827, 1993. GILL, I.; HODGE, E.; NOVICK, A.; STEINMULLER, D.; GARRED, D. Impact of obesity on renal transplantation. Transpl. Proc., 25:10471048, 1993. HOLLEY, J.; SHAPIRO, R.; LOPATIN, W. et al. Obesity as a risk factor following cadaveric renal transplantation. Transplantation, 49:387389, 1990. DIVAKER, D.; BAILEY, R.; FRAMPTON, C. et al. Hyperlipidemia instable renal transplant recipients. Nephron, 59:423-428, 1991. CASSANDER, M.; RUIU, G.; GAMBINO, R. et al. Lipoprotein apolipoprotein changes in renal transplant recipients: a 2-year follow up. Metabolism, 40:922-925, 1991. ISONIEMI, H.; TIKKANEN, M.; HAYRY, P. et al. Lipid profiles with triple drug immunosupressive therapy and with double drug combinations after renal transplantation and stable graft function. Transpl. Proc., 23:1029-1031, 1991. NELSON, J.; BEAUREGARD, H.; GELINAS, M.; ST-LOUIS, G.; DALOZE, P.; SMEESTERS, C.; CORMAN, J. Rapid improvement of hyperlipidemia in kidney transplant patients with a multifactorial hypolipidemic diet. Transplant Proc., 20:1264-1270, 1988. VATHASALA, A.; WEINBERG, R.; SCHOENBERG, L. et al. Lipid abnormalities in cyclosporine-prednisone treated renal transplant recipients. Transplantation, 48:37-40, 1989. KASISKE, B.; TORTORICE, K.; HEIM-DUTHOY, K.; GORYANCE, J.; RAO, V. Lovastatin treatment of hypercholesterolemia in renal transplant recipients. Transplantation, 49:95-100, 1990. MOORE, R.; CALLAHAN, M.; CODY, M. et al. The effect of the American Heart Association Step One Diet on hyperlipidemia following renal transplantation. Transplantation, 49:60-62, 1990. KASISKE, B.; HEIM-DUTHOY, K. Transient reductions in serum cholesterol after renal transplantation. Am. J. Kidney Dis., 20:387-393, 1992. ADU, D.; TURNEY, J.; MICHAEL, J. et al. Hypercalaemia in cyclosporine-treated renal allograft recipients. Lancet, 2:370-372, 1983. DIMÉNY, E.; FELLSTRÖM, B.; LARSSON, E.; TUFVESON, G.; LITHELL, H. Chronic vascular rejection and hyperlipoproteinemia in renal transplant patients. Clin. Transplantation, 7:482-490, 1993. WINDUS, D.; LACSON, S.; DELMEZ, J. The short-term effects of a low-protein diet in stable renal transplant recipients. Am. J. Kidney Dis., 17:693-699, 1991. SALAHUDEEN, A.K.; HOSTETTER, T.H.; RAATZ, S.K. et al. Effect of dietary protein in patients with chronic renal transplant rejection. Kidney Int., 41:183-190, 1992. EDWARDS, M.; DOSTER, S. Renal transplant diet recommendations: results of a survey of renal dietitians in the United States. J. Am. Diet. Assoc., 90:843-846, 1990.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET www.kidney.org/professionals/doqi/guidelines/ doqi_nut.html — Guia prático de orientação nutricional da National Kidney Foundation — DOQI Guidelines www.kidneyatlas.org/book1/adk1 — Nutrição e metabolismo na Insuficiência Renal Aguda www.nephron.com — Centro de Informações www.kidney.org — National Kidney Foundation www.hdcn.com — Hipertensão, diálise e nefrologia clínica www.jrnjournal.org — Journal of Renal Nutrition
Capítulo
48
Nutrição Parenteral Intradialítica Cristina Martins e Miguel C. Riella
INTRODUÇÃO
EFEITOS COLATERAIS E CUIDADOS
HISTÓRICO
CONCLUSÃO
INDICAÇÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
VANTAGENS E BENEFÍCIOS NUTRICIONAIS
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
COMPOSIÇÃO DAS SOLUÇÕES E ADMINISTRAÇÃO
INTRODUÇÃO A desnutrição é um grande problema da insuficiência renal crônica, principalmente de pacientes em hemodiálise (HD).1-4 A maior relevância desse fato é que as taxas de morbidade e mortalidade são mais altas em desnutridos.3-7 As causas da desnutrição são múltiplas nesta população. Ela pode ocorrer devido a ingestão alimentar insuficiente, assimilação deficiente de nutrientes, e/ou devido às perdas nutricionais aumentadas durante o procedimento dialítico. A presença da acidose metabólica pode contribuir de maneira significativa para a degradação do tecido muscular corporal. Também, o contato do sangue com a membrana e outros aparatos dialíticos pode gerar reação inflamatória crônica e aumentar os desequilíbrios nutricionais. Portanto, o objetivo primário para estes pacientes é alcançar e manter um estado nutricional adequado. A primeira via de alimentação é, sem dúvida, a oral, e a principal fonte são os alimentos. Entretanto, principalmente devido à anorexia, os alimentos através da via oral podem não ser suficientes para a manutenção ou melhora do estado nutricional desses pacientes. Em caso de insucesso através da dieta normal, o suporte nutricional deve ser indicado. A Fig. 48.1 mostra uma árvore de decisão para a indicação do suporte nutricional em pacientes dialisados. Infelizmente o uso de suplementos orais pode não ser bemsucedido devido também principalmente à anorexia. A
alimentação através de sondas, por sua vez, pode não ser bem tolerada devido a náuseas, vômitos e distúrbios gastrointestinais, além de exercer efeito psicológico negativo na imagem corporal já distorcida desses pacientes. Na rotina, é provável que a maioria dos pacientes ambulatoriais em HD recusem a colocação de sondas para alimentação. A nutrição parenteral é, então, a última alternativa para prover um suporte nutricional adequado. A administração da nutrição parenteral através de um cateter central é mais indicada para pacientes hospitalizados e por curto prazo. Como alternativa específica à HD está a nutrição parenteral intradialítica (NPID). A NPID é um método de suporte nutricional que é realizado durante o procedimento dialítico. Nesse caso, uma solução nutritiva é colocada, através de uma agulha, dentro da câmara de gotejamento do fluxo venoso, saindo do dialisador. A solução nutritiva parenteral pode fornecer glicose hipertônica, aminoácidos, lipídios, vitaminas e minerais desejados. Embora com indicações precisas, a NPID tem sido mostrada de grande benefício nutricional e útil na recuperação de indivíduos desnutridos em HD.
HISTÓRICO Noree e cols.,8 em 1971, publicaram um dos estudos mais antigos descrevendo a administração endovenosa de aminoácidos essenciais durante sessões de HD. Os autores
862
Nutrição Parenteral Intradialítica
AVALIAÇÃO NUTRICIONAL
N Avaliação e aconselhamento contínuo
Desnutrição?
S
Diálise eficiente?
S N
앖Dose de diálise
앖Parâmetros nutricionais?
N
S
Disfunção GI presente?
N S
S
Nutrição Parenteral
• hospitalar • domiciliar • ID/IP
N
Retorno da função GI?
Consumo VO adequado? S
N
Avaliação e aconselhamento contínuo
S
• Reforçar VO • Avaliar liberação • Avaliar suplementação
앖 Parâmetros nutricionais? N Nutrição por sonda
앖 Parâmetros nutricionais?
Avaliação e aconselhamento contínuo
S
Retirada da Sonda
Reforço das orientações VO
N
Reavaliar/Reajustar Nutrição por Sonda
VO = Via Oral ID = Intradialítica IP = Intraperitoneal
Considerar outros fatores
• Doença sistêmica • Infecção, trauma, cirurgia • Desordem hormonal • Limitação física • Problema psicossocial • Interação droga-nutriente
Diagnóstico e tratamento do problema
Fig. 48.1 Manejo Nutricional na diálise. Fonte: Martins, C. Suporte nutricional na diálise crônica. In: M.C. Riella, C. Martins. Nutrição e o Rim. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 190-206, 2001.
capítulo 48
mostraram melhora do balanço nitrogenado e contrabalanço das perdas de aminoácidos durante a diálise. Em 1975, Heidland e Kult publicaram o primeiro estudo a longo prazo (60 semanas) com NPID.9 Nessa pesquisa foram administrados, durante os últimos 90 minutos da sessão de HD, aminoácidos essenciais e histidina, incluindo também carboidratos (sorbitol e xilitol). Mesmo tendo-se fornecido menos de 100 kcal e aproximadamente 12 g de aminoácidos, houve melhora no peso, no apetite e nas proteínas séricas (albumina e transferrina) dos 18 pacientes estudados. No estudo, entretanto, os pacientes recebiam também uma suplementação oral de calorias e proteínas, conturbando os resultados quanto aos efeitos específicos da NPID. Em 1977, Hecking e cols., em dois estudos,10,11 sugeriram que os efeitos benéficos da suplementação parenteral intradialítica com aminoácidos essenciais e cetoácidos ocorrem somente em pacientes catabólicos, não demonstrando benefícios adicionais na infusão de aproximadamente 17 g de aminoácidos essenciais durante os últimos 90 minutos de HD, por um período de seis meses. A população desse estudo, entretanto, era composta de pacientes estáveis, sem evidência de desnutrição, e aparentemente aderentes a uma dieta adequada em quilocalorias e proteínas. A conclusão de que pacientes urêmicos com dieta adequada não necessitam de suplementação de aminoácidos essenciais ou cetoácidos também foi dada por Neuhauser e cols.,12 em 1977. Nos anos 80 e adiante, os estudos continuaram, e o foco de interesse da administração intravenosa durante a sessão de HD foram as soluções nutritivas com composições variadas.
INDICAÇÃO A NPID é indicada para pacientes desnutridos em HD após insucesso das intervenções convencionais (nutrição oral/enteral malsucedida, inadequada ou contra-indicada).13 A decisão de quando iniciar a NPID requer avaliação clínica astuta e julgamento que integre informações nutricionais objetivas e subjetivas. Embora exista um grande número de estudos sobre a avaliação nutricional de pacientes renais, padrões clínicos mais adequados e precisos para a seleção de pacientes para uso da NPID ainda não estão estabelecidos. O guia mais comum e simples, e adotado pelo sistema de saúde americano (Medicare) para reembolso da terapia, avalia albumina sérica e peso, além de problemas de digestão e absorção. Também requer documentação de insucesso dos meios convencionais de suplementação nutricional com tentativa de, no mínimo, um mês. Neste protocolo, o paciente deve apresentar dois ou mais dos critérios abaixo para ser qualificado para a NPID:
863
1. O paciente não consegue manter o estado nutricional adequado: • albumina sérica menor que 3,5 g/dl • peso igual ou abaixo de 90% do ideal • perda de peso não intencional maior que 10% durante um período igual ou menor que 6 meses. 2. A nutrição enteral não foi bem-sucedida, é inadequada ou contra-indicada. 3. Existe deficiência funcional do trato gastrointestinal, ou seja, o paciente tem uma condição que interfere com a ingestão, digestão e absorção de nutrientes a ponto de causar perda de peso. Esta anormalidade deve ser crônica, sendo esperado que o paciente necessite da NPID por, no mínimo, três meses. 4. Todos os modos de suporte nutricional, exceto a nutrição parenteral total, foram tentados, e os resultados do insucesso documentados. A NPID deve ser a terapia de última escolha, e utilizada somente se todos os outros métodos já tenham sido usados, sem resultados positivos. 5. A NPID não é suplementar. Isto significa que a NPID não pode ser usada para corrigir um problema nutricional que pode ser tratado mais eficientemente pela via enteral. Ela não pode ser usada para simplesmente acelerar o ganho de peso de um paciente que apresenta o estado nutricional estável e recebe alimentação via enteral.
Pontos-chave: • A nutrição parenteral é a última alternativa para prover um suporte nutricional adequado • A NPID é indicada para pacientes desnutridos em HD após insucesso das intervenções convencionais (nutrição oral/ enteral malsucedida, inadequada ou contraindicada) • A NPID é um método de suporte nutricional que é realizado durante o procedimento dialítico • A NPID influencia positivamente na taxa de mortalidade de pacientes desnutridos em HD Diagnósticos aceitáveis de elegibilidade para a NPID são mostrados no Quadro 48.1. A descontinuação da terapia pode ocorrer quando os objetivos nutricionais forem encontrados, com evidência de balanço nitrogenado positivo. A reiniciação é apropriada quando, no paciente estável (não-catabólico), houver reversão na melhora nutricional após um mês de tentativas de suplementação nutricional oral.
864
Nutrição Parenteral Intradialítica
Quadro 48.1 Condições para indicação da NPID Má-absorção urêmica Síndrome de má-absorção Gastroparesia diabética ou urêmica Pancreatite crônica recorrente Doença hepática Obstrução gastrointestinal parcial Enterite por radiação Doença inflamatória intestinal Síndrome do intestino curto Diarréia crônica Náuseas e vômitos incoercíveis
VANTAGENS E BENEFÍCIOS NUTRICIONAIS A NPID apresenta uma série de vantagens. Algumas são: 1. Administração de nutrientes concentrados. Aproximadamente 50-60 g de proteínas e 1.000-1.300 quilocalorias podem ser providos por infusão. A NPID tem a vantagem de suprir o paciente com energia e proteínas em quantidades substanciais, sem a adição de líquidos e minerais não desejados. 2. Taxa alta de retenção, com redução de perdas de nutrientes. A taxa de retenção de aminoácidos através da NPID é de aproximadamente 90%.14 Considerando as perdas usuais de aminoácidos através do dialisado, aproximadamente 68% dos aminoácidos da NPID são retidos.14 Com isso, a NPID pode prevenir a queda das concentrações plasmáticas de aminoácidos e de glicose, com perdas menores no dialisado,14,15 conduzindo a um balanço nitrogenado positivo. 3. Remoção concomitante de líquidos, minimizando o risco de sobrecarga hídrica. A restrição hídrica oral do paciente não é afetada. A pressão transmembrana da máquina de diálise é ajustada para remover, através da ultrafiltração, o líquido adicional (solução de NPID) que o paciente recebe. 4. Segurança ao paciente. A terapia é administrada sob supervisão clínica. A NPID foi demonstrada ser segura em mais de 300 procedimentos hemodialíticos em pacientes gravemente desnutridos.16 5. Acesso mais conveniente. A NPID dispensa o acesso endovenoso adicional (cateter central ou acesso periférico). Na terapia, os nutrientes são infundidos no acesso de diálise, na câmara de gotejamento da linha de retorno venoso. 6. Mais facilidade ao paciente. A NPID dispensa cuidado domiciliar com cateter, infusão de soluções e equipamentos, caso indicada a nutrição parenteral.17 7. Possibilidade de correção de níveis anormais de aminoácidos plasmáticos, usualmente encontrados em HD.
Soluções especiais de NPID podem ser utilizadas para suprir deficiências de aminoácidos específicos e, conseqüentemente, melhorar o apetite do paciente.18,19
Pontos-chave: Vantagens da NPID • Administração de nutrientes concentrados. Aproximadamente 50-60 g de proteínas e 1.000-1.300 quilocalorias podem ser providos por infusão • Alta taxa de retenção, com redução de perdas de nutrientes. A taxa de retenção de aminoácidos através da NPID é de aproximadamente 90% • Remoção concomitante de líquidos, minimizando o risco de sobrecarga hídrica • Acesso mais conveniente. A NPID dispensa o acesso endovenoso adicional (cateter central ou acesso periférico) Embora as vantagens sejam muitas, a NPID não tem intenção de ser a fonte única de suporte nutricional. Como benefício nutricional, ela é somente bem-sucedida quando a ingestão alimentar oral diária é suficiente para, combinada com a NPID, manter o paciente em balanço nitrogenado positivo. Aliás, um fator de confusão em todos os estudos publicados é a dificuldade em avaliar o valor da NPID em pacientes que também estão consumindo alimentos. Embora a terapia possa ter melhorado o estado nutricional até certo ponto, é difícil separar a melhora devido à NPID daquela secundária ao aumento da ingestão alimentar. Estudos preliminares não demonstraram efeitos conclusivos no estado nutricional dos pacientes com NPID. Isto deve-se, principalmente, ao fato de estes estudos terem sido conduzidos em pacientes sem evidência de desnutrição. Seria difícil, senão impossível, demonstrar benefícios em um grupo de pacientes bem nutridos com esta ou qualquer outra terapia de suporte nutricional. Não existem muitos estudos controlados sobre a NPID. A maioria dos estudos apresentam amostras pequenas e são retrospectivos. Grande parte destes estudos demonstram resposta nutricional positiva com a NPID. A aplicação bem-sucedida da NPID em pacientes cronicamente desnutridos resulta na prevenção da perda ou do ganho de peso.20-23 A NPID só não foi eficaz na reversão da perda de peso em pacientes com doença óssea avançada secundária ao hiperparatireoidismo.13 Estudos sobre a NPID também têm demonstrado aumento nas proteínas viscerais,20,21,23,24 balanço nitrogenado positivo14 e melhora de outros parâmetros nutricionais bioquímicos.13,20,21,23 O aumento da sensação de bem-estar e do apetite,16,20-22 e conseqüentemente a melhora da ingestão alimentar, pode ter
865
capítulo 48
efeito benéfico no estado nutricional destes pacientes. A melhora do perfil de aminoácidos plasmáticos pode também ser um efeito positivo da NPID.13,14 A NPID também influencia positivamente na taxa de mortalidade de pacientes desnutridos em HD. Um estudo com 1.679 pacientes recebendo NPID sugere vantagem da terapia na melhora da taxa de mortalidade quando a albumina sérica inicial for menor que 3,3 g/dl.25 Capelli e cols. também demonstraram melhora na taxa de sobrevivência (64% vs 52%) nos pacientes recebendo NPID26 devido, provavelmente, ao aumento nos níveis de albumina sérica. Os resultados de estudos em pacientes diabéticos têm sido usualmente positivos, mas não tão impressionantes. Um estudo mostrou um aumento pequeno, porém significativo, nos níveis de albumina em todos os pacientes.24 De maneira geral, a NPID parece melhor utilizada em pacientes desnutridos que são capazes de manter a ingestão oral ou a absorção intestinal de pelo menos 70% de suas necessidades calóricas e pelo menos 40% de suas necesidades protéicas.27 O tempo de duração da terapia que demonstra benefícios nutricionais é de, no mínimo, dois meses.20
COMPOSIÇÃO DAS SOLUÇÕES E ADMINISTRAÇÃO Várias fórmulas podem ser utilizadas nas soluções de NPID. A preferência é iniciar com fórmulas contendo quantidades menores de glicose e maiores de aminoácidos. A partir da tolerância, são recomendados aumentos graduais no conteúdo de nutrientes, baseados nas necessidades individuais. Em geral, as soluções de NPID contêm uma mistura de aminoácidos e uma fonte calórica, e não possuem eletrólitos. A fonte calórica pode ser somente a glicose, ou uma combinação de glicose e lipídios. Diferentes composições de soluções e métodos de administração têm sido demonstrados na literatura.13,28 Usualmente são fornecidos até 200 g de glicose/litro, quando o dialisado não possui glicose, e até 150 g/litro, quando o dialisado contém glicose.27 O paciente recebe usualmente 1.000 ml de solução parenteral durante cada sessão de HD. Os aminoácidos mistos (essenciais e não-essenciais) são os de uso mais comum, embora alguns estudos tenham utilizado formulações especiais, contendo somente aminoácidos essenciais. Em um período de 20 semanas, uma solução composta de glicose e uma mistura de aminoácidos essenciais e não-essenciais resultou em um aminograma plasmático mais normal do que uma solução de glicose com somente aminoácidos essenciais.13 A provisão de somente aminoácidos essenciais para esta população pode não ser eficiente para restaurar o perfil de aminoácidos plasmáticos e celulares. Isso porque a produção endógena de aminoácidos não-essenciais pode não ser suficiente para as
necessidades. O desenvolvimento de soluções de aminoácidos mais adequadas às necessidades dos pacientes em HD pode ser superior em eficácia. O estudo de Toigo e cols.18 demonstrou melhor efeito na síntese protéica com uma solução desenvolvida para reverter as anormalidades de aminoácidos de pacientes urêmicos. Esta solução continha histidina, porcentagem maior de valina e treonina, e menor de fenilalanina e metionina, em comparação às soluções comuns. A adição de lipídios, até 250 ml em concentração a 20%, também tem sido uma prática comum. Os lipídios, além de fornecerem ácidos graxos essenciais, também provêem quilocalorias adicionais. O uso de emulsões lipídicas como fonte calórica possui várias vantagens, como: 1. as reservas lipídicas são preferencialmente oxidadas como energia, em pacientes em HD, após jejum noturno;29 2. a resistência à insulina e a intolerância à glicose são comuns na insuficiência renal crônica; 3. a deficiência de ácidos graxos essenciais ocorre nesta população;30 4. as emulsões lipídicas possuem alta densidade calórica e são isosmolares, facilitando a tolerância da infusão; 5. a infusão de lipídios não parece alterar a eficácia da diálise. Na maioria dos casos, a emulsão lipídica é misturada diretamente à glicose e aos aminoácidos no mesmo frasco, simplificando a administração da NPID. Assim como a glicose, a quantidade de lipídios utilizada pode requerer ajustes individuais. O Quadro 48.2 mostra alguns exemplos de soluções de uso rotineiro em NPID. Todas as soluções inicialmente não contêm aditivos. As vitaminas, os eletrólitos, os minerais, oligoelementos e certos medicamentos são normalmente
Quadro 48.2 Soluções e composição de nutrição parenteral intradialítica Fórmula
Composição
Solução 1 250 ml aminoácidos* 250 ml gliclose Total: 500 ml
10% 50%
25 g proteína 125 g glicose Total: 525 kcal
Solução 2 500 ml aminoácidos* 250 ml glicose Total: 750 ml
10% 50%
50 g proteína 125 g glicose Total: 625 kcal
Solução 3 500 ml aminoácidos* 250 ml glicose 250 ml lipídios Total: 1.000 ml
10% 50% 20%
50 g proteína 125 g glicose 50 g lipídios Total: 1.075 kcal
Solução 4 500 ml aminoácidos* 400 ml glicose Total: 900 ml
10% 50%
50 g proteína 200 g glicose Total: 880 kcal
*aminoácidos mistos (essenciais e não-essenciais) Nota: 1 g de glicose ⫽ 3,4 kcal.
866
Nutrição Parenteral Intradialítica
eliminados da NPID, porém podem ser adicionados nos frascos, se indicado. A insulina pode ser adicionada à solução,26 porém a maioria dos estudos prefere a inclusão dela somente na presença de hiperglicemia. É indicado iniciar com as soluções 1 ou 2 durante a primeira semana, para avaliar a tolerância da infusão e a resposta quanto aos eletrólitos e à glicose sanguíneos. No caso de a solução 1 ou 2 ser bem tolerada, é indicado progredir para a solução 3. Esta é usada em todo o período de manutenção. Em casos de reação a lipídios, presença de hipertrigliceridemia ou outra razão para a necessidade de restrição lipídica (p. ex., insuficiência hepática), a solução 4 pode ser utilizada. As variações nas formulações podem ser feitas após a fase de teste para tolerância. Por exemplo, pode-se aumentar o volume da solução de aminoácidos ou utilizar soluções mais concentradas, ou aumentar o volume ou a concentração de glicose (p. ex., 70%). A solução deve ser administrada, de preferência, durante todo o período da sessão de HD, em taxa constante de infusão. A taxa de infusão recomendada para NPID é, no máximo, 350 ml/h,27 porém existe escassez de estudos comparando diferentes taxas de infusão. A taxa de infusão é determinada dividindo o total do volume da solução pelo tempo da sessão de HD. Pelo fato de a solução de NPID ser hipertônica e alta em glicose, o uso de bomba de infusão é recomendado.
EFEITOS COLATERAIS E CUIDADOS Em geral, a NPID não apresenta efeitos adversos significativos13,14,20 e não parece interferir com o procedimento de HD. O monitoramento cuidadoso para os problemas em potencial assegura um resultado mais positivo ao paciente e a possibilidade de alcançar os objetivos nutricionais. Os principais riscos do procedimento são: hiperglicemia, hipoglicemia reativa após o término da infusão, possibilidade de contaminação da solução durante a infusão, reações agudas às emulsões de lipídios, desequilíbrios eletrolíticos e aumento da uremia. Dor e cãibras no braço da fístula durante a infusão também têm sido citadas.31 A infusão rápida da glicose pode resultar em hiperglicemia. Por esta razão, é necessário cuidado principalmente durante a primeira semana de infusão da NPID. A glicemia periférica deve ser verificada imediatamente pré-infusão, no meio do período e no término da sessão de HD. Para pacientes não-diabéticos, que não apresentaram nenhum problema de intolerância à glicose, a glicemia periférica pode ser reavaliada quinzenalmente. Para aqueles diabéticos, porém, é recomendado continuar com os testes glicêmicos pré-, no meio do período e pós-diálise. Em caso de a glicemia estar maior que 300 mg/dl no meio do período de infusão, uma dose pequena de insulina (p. ex., 20 U/litro) pode ser adicionada à solução remanescente, ou, preferencialmente, admi-
nistrada em bolo intravenoso (iniciar com 5 U e aumentar de 2 a 5 U, dependendo da resposta do paciente). No caso de a administração de insulina ser necessária, a glicemia deve ser verificada a cada 30 minutos, até que o nível esteja estabilizado. Por outro lado, doses altas de insulina na tentativa de normalizar a glicemia podem resultar em hipoglicemia. Para pacientes diabéticos já com uso rotineiro de insulina, é preferida a aplicação e o controle subcutâneo. Não tem sido comum a descrição de hiperglicemia importante durante a NPID.27 Parece razoável e desejável a glicemia entre 200-300 mg/dl no período pós-HD com NPID.32 Porém, concentrações pósdiálise de 325-375 mg/dl em pacientes não-diabéticos e 400500 mg/dl em diabéticos também podem ser consideradas aceitáveis se forem assintomáticas. A elevação da glicemia não é usualmente considerada um problema clínico pelo fato de ser transitória. Em caso de glicemia ⬎400 mg/dl no meio do período de administração, a taxa de infusão deve ser reduzida em 50%. Se a glicemia estiver abaixo de 200 mg/dl neste período, é recomendado o consumo de 30 a 60 g de carboidrato simples.14 Isso pode significar duas fatias de pão com geléia, seis crackers ou aproximadamente 120 ml de suco de fruta com uma colher de açúcar refinado. Entretanto, para proteger o paciente de um evento de hipoglicemia reativa, o mais indicado pode ser essa ingestão de carboidratos logo após o término da sessão de HD. Todos os pacientes devem, também, ser encorajados a ingerir um lanche ou refeição dentro de uma hora após a sessão. Caso o paciente não possa comer, a taxa de infusão da NPID deve ser reduzida em 50% durante os últimos 30 minutos de diálise. Ao término da primeira infusão, o paciente deve permanecer na Unidade de Diálise por aproximadamente 60 minutos, para melhor possibilitar a observação da ocorrência de hipoglicemia. A partir daí, os pacientes e acompanhantes devem ser instruídos para os sinais de hipoglicemia e para as medidas corretivas. Pacientes recebendo emulsão lipídica podem apresentar intolerância a lipídios.20 A infusão de lipídios começa normalmente após duas semanas do início da terapia com NPID. As emulsões de lipídios são usualmente bem toleradas quando administradas em um período de quatro horas. Para monitorar reações agudas a lipídios, o cuidado deve concentrar-se na primeira infusão da solução de NPID contendo lipídio. Para testar reação alérgica, é recomendada taxa de infusão de 1 ml/min durante os primeiros 15-30 minutos para emulsão a 10%, ou 0,5 ml/min para emulsão a 20%. No caso de nenhuma reação ocorrer, a solução remanescente pode, então, ser infundida na taxa máxima usual ou em incrementos de 50 ml/h, até que o volume total de lipídios seja completado.28 Infusões de lipídios não devem ser maiores que 12,5 g/h.27 As reações a lipídios são raras. Alguns dos sinais descritos incluem: rash cutâneo, dor no peito e nas costas, aumento da temperatura corporal, náuseas, vômitos, dispnéia, sudorese excessiva, cefaléia, tontura e hipersensibilidade no local da infusão.27 No caso de alguns destes efeitos colaterais ocorrerem, as emulsões lipídicas devem ser descontinuadas. Além disso, para avaliação do clearance
867
capítulo 48
hepático, os níveis de triglicerídeos séricos devem ser verificados antes do início do uso das emulsões lipídicas. Pacientes com níveis ⬎250 mg/dl de triglicerídeos plasmáticos pré-infusão não devem receber emulsões lipídicas de rotina.28 No caso de os triglicerídeos séricos estarem em nível maior do que 300 mg/dl após o início da administração de lipídios, a infusão deve ser diminuída até que sejam novamente alcançados os valores basais ou normais. Para avaliar a tolerância a longo prazo do uso das emulsões lipídicas, níveis plasmáticos de triglicerídeos, colesterol e testes de função hepática devem ser verificados mensalmente. Um estudo investigando o uso dessas emulsões na NPID durante um mês não demonstrou nenhum efeito negativo no metabolismo de lipídios;33 pelo contrário, a lipoproteína (a) diminuiu, sugerindo redução no risco relacionado de aterosclerose. Outro estudo anterior também demonstrou que a NPID com lipídios não alterou os níveis de colesterol, triglicerídeos e fosfolipídios em pacientes desnutridos em HD.22 Os efeitos crônicos da intolerância a lipídios podem incluir hepatomegalia, icterícia, leucopenia, testes anormais de função hepática, esplenomegalia e outros. O monitoramento de eletrólitos é realizado obtendo-se principalmente níveis séricos pós-diálise de fósforo, potássio e magnésio no primeiro dia da infusão de NPID. Após esse período, esses devem ser acompanhados mensalmente para o paciente estável, e mais freqüentemente para aquele apresentando estado nutricional depletado. Um paciente desnutrido, que apresenta níveis séricos baixos ou normais de potássio, fósforo e magnésio antes de iniciar a NPID pode experimentar uma diminuição rápida destes eletrólitos, como resultado da realimentação. O aumento da uremia com a NPID também não parece ser um problema. O nitrogênio uréico sérico usualmente aumenta com a NPID, porém não em níveis inaceitáveis. No paciente anorético, incapaz de consumir suas necessidades protéicas através da via oral, parece improvável que os aminoácidos providos pela NPID resultem em elevação significativa e acima do recomendado nos níveis de uréia e outros metabólitos nitrogenados.
Pontos-chave: Riscos do procedimento • Hiperglicemia • Hipoglicemia reativa após o término da infusão • Possibilidade de contaminação da solução durante a infusão • Reações agudas às emulsões de lipídios • Desequilíbrios eletrolíticos e aumento da uremia • Dor e cãibras no braço da fístula durante a infusão
CONCLUSÃO A melhora do estado nutricional, com a correção de déficits nutricionais graves, é essencial e pode reduzir a morbidade, melhorar o prognóstico, a longevidade e a qualidade de vida destes pacientes. O primeiro objetivo deve ser a prevenção da desnutrição. Todo paciente em HD deve ter seu estado nutricional avaliado no início do tratamento e periodicamente. As intervenções para corrigir anormalidades devem ser instituídas precocemente, já que a desnutrição pode tornar-se um ciclo vicioso, conduzindo à anorexia, a qual compromete ainda mais o estado nutricional. As intervenções devem incluir dietas mais liberais para aqueles pacientes anoréticos, com atenção a preferências alimentares. No caso de a ingestão alimentar ser ainda insuficiente, os suplementos nutricionais orais devem ser iniciados. A alimentação através de sondas pode ser tentada para aqueles com anorexia grave. Entretanto, a taxa de aderência e sucesso com essa terapia é pequena. Por fim, a NPID pode ser indicada para pacientes desnutridos em HD crônica, após insucesso das intervenções nutricionais anteriores. Nos estudos, na maioria de curto prazo, retrospectivos e com amostras pequenas, os resultados demonstram melhora em vários parâmetros nutricionais importantes. Porém, parece claro que nem todos os pacientes conseguem se beneficiar dessa terapia. Ela deve ser reservada somente àqueles desnutridos, que não estão se recuperando de uma enfermidade aguda e que não respondem ao aconselhamento nutricional intensivo. Quanto à tolerância, a NPID parece ser bem tolerada e, em geral, não apresenta efeitos adversos. A administração e o monitoramento parecem esclarecidos, porém outras perguntas difíceis quanto à sua eficácia nutricional e ao custo/benefício ainda permanecem sem respostas conclusivas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. THUNBERG, B.; SWAMY, A.; CESTERO, R. Cross-sectional and longitudinal nutritional measurements in maintenance hemodialysis patients. Am. J. Clin. Nutr., 34:2005-2012, 1981. 2. YOUNG, G.; SWANEPOEL, C.; CROFT, M. et al. Anthropometry and plasma valine, amino acids, and proteins in the nutritional assessment of hemodialysis patients. Kidney Int., 21:492-499, 1982. 3. WOLFSON, M.; STRONG, C.; MINTURN, D. et al. Nutritional status and lymphocytic function in maintenance hemodialysis patients. Am. J. Clin. Nutr., 37:547-555, 1984. 4. MARKMANN, P. Nutritional status of patients on hemodialysis and peritoneal dialysis. Clin. Nephrol., 29:75-78, 1988. 5. ACCHIARDO, S.; MOORE, L.; LATOUR, P. Malnutrition as the main factor in morbidity and mortality of hemodialysis patients. Kidney Int., 24:S199-203, 1983. 6. LOWRIE, E.; LEW, N. Death risk in hemodialysis patients: The predictive value of commonly measured variable and an evaluation of death rate differences between facilities. Am. J. Kidney Dis., 15:458-482, 1990. 7. KAMINSKI, M.; LOWRIE, E.; ROSENBLATT, S. et al. Malnutrition is lethal, diagnosable, and treatable in ESRD patients. Transplant Proc., 23:1810-1815, 1991.
868
Nutrição Parenteral Intradialítica
8. NOREE, L.; BERGSTROM, J.; FURST, P. et al. The effect of essential amino acid administration on nitrogen metabolism during dialysis. Proc. Eur. Dial. Transplant. Assoc., 8:182-188, 1971. 9. HEIDLAND, A.; KULT, J. Long-term effects of essential amino acid supplementation in patients on regular dialysis treatment. Clin. Nephrol., 3:234-239, 1975. 10. HECKING, E.; KOHLER, H.; ZOBEL, R. et al. Is parenteral or oral administration of essential amino acids beneficial in patients on chronic haemodialysis? Proc. Eur. Dial. Transplant. Assoc., 14:577-580, 1977. 11. HECKING, E.; PORT, F.; BREHM, R. et al. A controlled study on the value of oral supplementation with essential amino acids and keto analogues in chronic haemodialysis. Proc. Clin. Dial. Transplant. Forum., 7:157-161, 1977. 12. NEUHAUSER, M.; ULM, A.; LEBER H. et al. Influence of essential amino and keto acids on protein metabolism and the anaemia of patients on chronic intermittent haemodialysis. Proc. Eur. Dial. Transplant. Assoc., 14:577-561, 1977. 13. PIRAINO, A.; FIRPO, J.; POWERS, D. Prolonged hyperalimentation in catabolic chronic dialysis therapy patients. J. P. E. N., 5:463477, 1981. 14. WOLFSON, M.; JONES, M.; KOPPLE, J. Amino acid losses during hemodialysis with infusion of amino acid and glucose. Kidney Int., 21:500-506, 1982. 15. ABITBOL, C.; MROZINKA, K.; MANDEL, S. et al. Effects of amino acid additives during hemodialysis of children. J.P.E.N., 8:25-29, 1984. 16. THUNBERG, B.; JAIN, V.; PATTERSON, P. et al. Nutritional measurements and urea kinetics to guide intradialytic hyperalimentation. Proc. Dial. Transplant. For., 10:22-28, 1980. 17. HOLMES, J. Intradialytic parenteral nutrition. Cont. Dial. Nephrol., 4:51-54, 1990. 18. TOIGO, G.; SITULIN, R.; TAMARO, G. et al. Effect of intravenous supplementation of a new essential amino acid formulation in hemodialysis patients. Kidney Int., 36:S-278-281, 1989. 19. SKEIE, B.; MANNER, T.; LYNN, R. et al. Intradialytic parenteral nutrition. Dial. Transplant., 20:551-552, 1991. 20. OLSHAN, A.; BRUCE, J.; SHWARTZ, A. Intradialytic parenteral nutrition administration during outpatient hemodialysis. Dial. Transplant., 16:495-496, 1987. 21. BILBREY, G.; COHEN, T. Identification and treatment of protein calorie malnutrition in chronic hemodialysis patients. Dial. Transplant., 18:669-678, 1989. 22. CANO, N.; LABATIE-COEYREHOURCQ, J.; LACOMBE, P. Pedialytic parenteral nutrition with lipids and amino acids in malnourished hemodialysis patients. Am. J. Clin. Nutr., 52:726-730, 1990.
23. PALMISANO, R. Effectiveness of intradialytic parenteral nutrition in treating malnourished hemodialysis patients. Cont. Dial. Nephrol., July:20-23, 1992. 24. MADIGAN, K.; OLSHAN, A.; YINGLING, D. Effectiveness of intradialytic parenteral nutrition in diabetic patients with end-stage renal disease. J. Am. Diet. Assoc., 90:861-863, 1990. 25. CHERTOW, G.; LING, J.; LEW, N. et al. The association of intradialytic parenteral nutrition administration with survival in hemodialysis patients. Am. J. Kidney Dis., 24:912-920, 1994. 26. CAPELLI, J.; KUSHNER, H.; CAMISCIOLI, T. et al. Effect of intradialytic parenteral nutrition on mortality rates in end-stage renal disease care. Am. J. Kidney Dis., 23:808-816, 1994. 27. GOLDSTEIN, J.; STROM, J. Intradialytic parenteral nutrition: evolution and current concepts. J. Renal Nutr., 1:9-22, 1991. 28. POWERS, D. Considerations in the use of 3:1 intradialytic parenteral nutrition solutions containing long-chain triglyceride. Contr. Dial. Nephrol., 11:29-36, 1990. 29. SCHNEEWEISS, B.; GRANINGER, W.; STOCKENHUBER, F. et al. Energy metabolism in acute and chronic renal failure. Am. J. Clin. Nutr., 52:596-601, 1990. 30. CHAN, M.; VARGHESE, Z.; PERSAUND, J. et al. Hyperlipidemia in patients on maintenance hemo and peritoneal dialysis: the relative roles of triglycerides production and triglyceride removal. Clin. Nephrol., 17:183-190, 1982. 31. WOLFSON, M. IDPN is of no proven benefit in hemodialysis patients. Semin. Dial., 6:170-173, 1993. 32. FOULKS, C.; GOLDSTEIN, J.; KELLY, M. et al. Indications for the use of intradialytic parenteral nutrition in the malnourished hemodialysis patient. J. Renal Nutr., 1:23-33, 1991. 33. CANO, N.; LUC, G.; STROUMZA, P. et al. Serum lipoprotein changes after prolonged intralipid infusion in malnourished haemodialysis patients. Clin. Nutr., 13:111-115, 1994.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.nutritioncare.org/ — Site da American Society for Parenteral and Enteral Nutrition. www.espen.org/ — ESPEN European Society of Parenteral and Enteral Nutrition. http://www.nephrologypharmacy.com/current–kidney.html — Nephrology Pharmacy Associates Website.
Capítulo
Hemodiálise
49
Jocemir Ronaldo Lugon, Jorge Paulo Strogoff e Matos e Elias Assad Warrak
INTRODUÇÃO
Local de inserção
HISTÓRICO
Complicações e manuseio
INICIAÇÃO EM DIÁLISE Urgência
ANTICOAGULAÇÃO PRESCRIÇÃO E ADEQUAÇÃO DA DIÁLISE
Hiperpotassemia
Esquemas de hemodiálise
Hipervolemia
Esquemas de três vezes por semana
Pericardite urêmica
Outros esquemas
Sinais e sintomas urêmicos Eletivas
Adequação de diálise e cinética da uréia Uréia média
Taxa de filtração glomerular
Equivalente protéico do nitrogênio gerado
Estado nutricional
Implicações clínicas da adequação de diálise
Quadro clínico
Limitações do método
PRINCÍPIOS DE TROCA EM DIÁLISE
Perspectivas
ÁGUA PARA HEMODIÁLISE
REÚSO DOS DIALISADORES
MATERIAL E EQUIPAMENTOS
INTERCORRÊNCIAS DURANTE AS SESSÕES DE DIÁLISE
Solução de troca Membranas e dialisadores Máquinas
Complicações relacionadas à “fisiologia” da diálise: desequilíbrio, hipotensão e cãibras Reações a materiais componentes do processo dialítico
ACESSO VASCULAR
Outras complicações
Acessos vasculares definitivos
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Acessos vasculares temporários
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
INTRODUÇÃO A aplicação clínica da hemodiálise teve início há mais de meio século. Quando do seu surgimento, era indicada apenas para o tratamento da insuficiência renal aguda, com o intuito de manter o paciente vivo o tempo suficiente para a recuperação da função renal. A hemodiálise como tratamento da uremia crônica difundiu-se a partir da década de 60, mudando o curso natural de uma doen-
ça até então inexoravelmente letal. A popularização da hemodiálise se deveu a avanços tecnológicos que incluem o aprimoramento de máquinas e a fabricação de dialisadores mais eficientes e seguros, e, também, ao desenvolvimento de técnicas cirúrgicas de confecção de acessos vasculares permanentes. Hoje, mais de um milhão de pessoas no mundo têm sua vida mantida na ausência de um órgão vital, graças à terapia renal substitutiva.169 Além disso, o tratamento dialítico propicia as condições clínicas necessárias àqueles que aguardam pelo transplante
870
Hemodiálise
renal. No entanto, seja pela escassez de órgãos ou por razões clínicas, apenas uma pequena minoria dos pacientes em diálise chegará a transplantar.304 Assim, a hemodiálise deve ser vista como uma modalidade terapêutica capaz de proporcionar uma melhor qualidade de vida, maior longevidade e uma freqüência cada vez menor de complicações. Neste capítulo, serão abordados a história do desenvolvimento da hemodiálise, as indicações para se iniciar a terapia renal substitutiva, os princípios básicos do tratamento e suas peculiaridades técnicas, os acessos vasculares, a avaliação da adequação do tratamento e, finalmente, as principais intercorrências clínicas relacionadas ao procedimento.
HISTÓRICO Atribui-se ao químico escocês Thomas Graham (18051869) a criação do termo diálise, que utilizou para descrever o fenômeno por ele observado em 1854 no qual, utilizando uma membrana semipermeável constituída de material vegetal, demonstrou a separação de substâncias colóides e cristalóides. Mais de 50 anos se passaram, até que, em 1913, John J. Abel e col. descreveram suas experiências com um método em que o sangue retirado de um cachorro era submetido a uma sessão de diálise extracorpórea e, no final do procedimento, retornava à sua circulação, sem qualquer prejuízo ao animal. Utilizando um aparelho constituído por oito tubos de material similar ao empregado na fabricação de salsichas, no interior dos quais circulava o sangue anticoagulado com hirudina (extraída de sanguessugas), banhados por uma solução de troca dentro de um cilindro de vidro, os autores comprovaram a eficácia do método na remoção de solutos. Logo perceberam a necessidade de aparelhos com maior superfície de troca, que pudessem ser viáveis para tratar seres humanos. No entanto, com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, suas pesquisas foram interrompidas.179,65 Georg Haas de Gieszen, Alemanha, envolvido no desenvolvimento de novas membranas e com experiências de diálise em cães, realizou em 1924 o que se considera a primeira sessão de hemodiálise em seres humanos. Vendo-se impotente diante de um paciente com uremia terminal, submeteu-o a uma sessão de diálise, que teve a duração de 15 minutos. Embora sem um resultado prático, a diálise transcorreu sem qualquer anormalidade e demonstrou, pela primeira vez, ser possível a purificação do sangue de um ser humano. Nos anos seguintes, duas inovações viriam a contribuir significativamente para o futuro sucesso da hemodiálise: a descoberta da heparina e o início da fabricação em escala industrial do celofane, utilizado na confecção das membranas. 179,65
O Dr. Willem Kolff já havia enfrentado uma grande frustração em 1930 quando, ainda um jovem médico iniciando seus trabalhos no Hospital de Groningen, Holanda, assistiu um paciente de 22 anos, urêmico, falecer, sem qualquer perspectiva de tratamento. Desde então passou a se dedicar firmemente à idéia de descobrir uma maneira de substituir a função renal e assim prolongar a vida desses pacientes. Só mais tarde, pôde Kolff desenvolver seu dialisador, um marco na história da hemodiálise. Este dialisador utilizava cilindros de celofane, em cujo interior circulava o sangue, enrolados de forma helicoidal em torno de um tambor rotatório, que ficava mergulhado até metade de sua altura em um tanque banhado pela solução de troca, de cerca de 100 litros, que era renovada sempre que saturava. Em fevereiro de 1943, vendo-se diante de um paciente em franca uremia, Kolff finalmente colocou em prática seu invento, embora sem ter visto um benefício claro naquela ocasião. Um mês após, voltaria a utilizar seu dialisador, desta vez em uma mulher de 29 anos com insuficiência renal crônica por nefrosclerose maligna. Após várias sessões e tendo esgotado todos os acessos vasculares, a paciente veio a falecer no 26.º dia de tratamento devido à falta de acesso vascular. Posteriormente, o Dr. Kolff, juntamente com uma equipe de engenheiros do hospital Peter Bent Brigham, Boston, EUA, construíram uma nova versão desse rim artificial, que passou a ser conhecida como modelo Kolff-Brigham (Fig. 49.1), utilizada pela primeira vez nos EUA em 1948.179,65 O primeiro rim artificial do modelo Kolff-Brigham a desembarcar no Brasil foi utilizado no Hospital Pedro Ernesto, Rio de Janeiro, em 1955.50 No entanto, a primeira sessão de hemodiálise no Brasil foi realizada em maio de 1949 pelo Dr. Tito Ribeiro de Almeida (1913-1998), em São Paulo.263,239 Após tomar conhecimento da técnica utilizada pelo Dr. Murray, no Canadá, que também desenvolvera um rim artificial,181 o Dr. Tito desenvolveu um modelo semelhante, no qual o cilindro contendo os tubos de celofane era estacionário e colocado em posição vertical, enquanto a solução de troca era agitada (ao contrário do modelo de Kolff).239 O desenvolvimento de técnicas para a confecção de acessos vasculares permanentes teve um papel determinante para que fosse iniciada uma nova era no tratamento dos pacientes com insuficiência renal crônica. Até então, somente os pacientes com chances de recuperação da função renal eram submetidos à diálise, através de sucessivas dissecções arteriais. Em 1960, em Seattle, o Dr. Belding Scribner, juntamente com Dillard e Quinton, criaram o shunt arteriovenoso externo, uma prótese com peças de silastic e teflon, que passou a permitir o acesso à circulação de forma mais prolongada.231 Utilizando tal dispositivo, um maquinista de 39 anos viria a se tornar o primeiro paciente com uremia terminal a ser submetido à hemodiálise crônica.179,65 A confecção de uma fístula ar-
871
capítulo 49
Fig. 49.1 Máquina de hemodiálise modelo Kolff-Brigham, chegada ao Brasil em 1956 para o Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. (Gentileza da Clínica de Doenças Renais, Niterói-RJ.)
teriovenosa, através da anastomose de uma veia cefálica à artéria radial por Cimino e Brescia, em 1966,23 veio estabelecer definitivamente a hemodiálise como terapia de substituição da função renal na insuficiência renal crônica terminal. Nesta época, entretanto, ainda eram escassos os recursos financeiros e o número disponível de equipamentos não atendia perfeitamente à demanda, ficando o acesso a esta terapia restrito às pessoas julgadas mais relevantes para a sociedade.59 Um acontecimento marcante para a universalização do acesso à hemodiálise, inicialmente nos EUA, mas que posteriormente teve grande repercussão também em vários outros países, foi a aprovação pelo Congresso Americano, em 1973, de uma lei que permitiu o livre acesso de todo cidadão americano ao tratamento dialítico. Desde então, o número de centros de diálise e de pacientes em tratamento cresceu de forma vertiginosa em todo o mundo. Por exemplo, nos EUA, a incidência de pacientes em terapia renal substitutiva quadruplicou ao longo das duas últimas décadas.308,71 Hoje esta incidência gira em torno de 300 casos por milhão com uma prevalência de 340 mil pacientes, taxa de crescimento de 5 a 10% ao ano e uma prevalência projetada de 520 mil pacientes em 2010.71 No Brasil, atualmente existem mais de 500 centros de diálise, distribuídos em todas as unidades da federação, atendendo uma população estimada em cerca de 50 mil pacientes.
Pontos-chave: • 1854: Thomas Graham criou o termo diálise para a separação de colóides dos cristalóides • 1924: George Haas realizou a primeira sessão de diálise em seres humanos • 1948: Realizada a primeira sessão de diálise nos EUA, utilizando o dialisador de Kolff • 1949: Dr. Tito Ribeiro de Almeida realiza a primeira sessão de hemodiálise no Brasil • 1960: Scribner e Quinton criam o shunt arteriovenoso • 1966: Cimino e Brescia idealizam a fístula arteriovenosa primária • 1973: Aprovada a lei que permitia o livre acesso de todo cidadão americano à diálise
INICIAÇÃO EM DIÁLISE As indicações para se iniciar a terapia substitutiva renal podem ser divididas entre as consideradas como urgência e aquelas eletivas. Estas últimas, por sua vez, podem ser determinadas pelo nível de função renal, por
872
Hemodiálise
parâmetros nutricionais ou pela presença de sintomas urêmicos.
Urgência As condições clínicas consideradas como indicação para se iniciar tratamento dialítico em caráter de urgência são bastante consensuais: hiperpotassemia ou hipervolemia refratárias às medidas clínicas prévias ou quando há risco iminente de vida, pericardite e encefalopatia urêmica.
HIPERPOTASSEMIA A decisão para se indicar tratamento dialítico de urgência por hiperpotassemia a um paciente com diagnóstico de insuficiência renal crônica deve apoiar-se não apenas no exame laboratorial, mas também na análise das circunstâncias que propiciaram a elevação do potássio, buscando identificar fatores reversíveis, principalmente se, com base nos demais exames laboratoriais e quadro clínico, ainda não houver indicação para diálise. Dois exemplos distintos são apresentados a seguir. Primeiro, um paciente com IRC recém-diagnosticada cuja TFG era de 20 ml/ min, K 6,8 mEq/L, fazia uso regular de inibidor da ECA e beta-bloqueador, e ainda não tinha orientação nutricional. Um segundo paciente fazia acompanhamento com nefrologista, teve sua fístula arteriovenosa confeccionada em momento adequado, seguia fielmente as orientações nutricionais, usava, para controle de sua pressão arterial, apenas bloqueador de canal de cálcio e diuréticos, porém, na sua última avaliação laboratorial, apresentava TFG de 8 ml/min e K 6,3 mEq/L. Apesar do K sérico estar mais elevado no primeiro paciente, este seria mais apropriadamente tratado com medidas conservadoras, uma vez que diversas medidas clínicas para tratar a hiperpotassemia ainda podem ser adotadas (beta-agonistas, resina de troca, diuréticos, orientação nutricional etc.) e não haveria outra indicação para diálise por ora. Para o segundo paciente, ao contrário, a melhor opção seria iniciar imediatamente o tratamento dialítico, uma vez que medidas para evitar a hiperpotassemia já haviam sido adotadas. Ressalte-se que, com acesso vascular confeccionado e TFG em níveis que per se constituiriam indicação eletiva para entrada em diálise, não haveria justificativa para tentar protelar tal decisão.
HIPERVOLEMIA O surgimento de hipervolemia em um paciente com IRC caracteriza uma indicação para início imediato de tratamento dialítico. O início da diálise, com ultrafiltração, reverte prontamente os sintomas decorrentes da hipervolemia. Eventualmente, quando os sintomas são incipientes, apenas com desconforto ao decúbito, o aumento da dose de diuréticos ou o melhor controle da pressão arterial podem atenuar este quadro. Deve-se ressaltar que não há uma
correlação direta entre o quadro de hipervolemia e a percepção clínica de edema. Muitos pacientes apresentam franca anasarca e poucos sintomas respiratórios (pacientes com acentuada hipoproteinemia), enquanto outros têm discreto edema periférico e quadro respiratório exuberante (pacientes com expansão do espaço extracelular).
PERICARDITE URÊMICA Pelo risco de desenvolvimento de derrame pericárdico e conseqüente tamponamento cardíaco, a pericardite urêmica é considerada uma indicação de urgência para início do tratamento dialítico. Geralmente, esta complicação surge somente na fase terminal da doença renal, quando já coexistem outras indicações para se iniciar a diálise. O paciente queixa-se freqüentemente de desconforto precordial, às vezes acompanhado de febre, e o diagnóstico clínico dá-se pela constatação de atrito pericárdico à ausculta. Caracteristicamente não ocorre elevação do segmento ST ao eletrocardiograma, o que é útil no diagnóstico diferencial com outras formas de pericardite. Este quadro é rapidamente revertido à medida que o tratamento dialítico é iniciado. Pelo risco de precipitar ou aumentar efusão hemorrágica no espaço pericárdico, deve-se evitar o uso de heparina durante a hemodiálise.243,11,95
SINAIS E SINTOMAS URÊMICOS A presença de sinais e sintomas urêmicos, como desorientação, redução do nível de consciência, flapping, soluços persistentes, anorexia, náuseas e vômitos caracterizam a doença renal em seu estágio terminal, sendo indicação para início imediato do tratamento dialítico. Não apenas estes sinais e sintomas são por si sós indicação para diálise, como também, nesta fase, torna-se provável o surgimento de outras complicações potencialmente fatais, como hiperpotassemia, pericardite e complicações hemorrágicas.
Eletivas Mais controversa seria a definição do momento adequado para se iniciar eletivamente a terapia substitutiva renal. Na falta de estudos clínicos prospectivos controlados para definir este momento com um razoável nível de evidência, grande parte das orientações aqui expostas reproduzem as diretrizes da National Kidney Foundation/Dialysis Outcome Quality Initiatives (NKF/DOQI).204,205 Três critérios, que muitas vezes se sobrepõem, norteiam a decisão de instituir o tratamento dialítico: 1) o nível de deterioração da função renal, 2) o estado nutricional e 3) o surgimento de sinais ou sintomas urêmicos.
TAXA DE FILTRAÇÃO GLOMERULAR Uma indicação para se iniciar eletivamente a terapia renal substitutiva seria quando se constata um grau muito acentuado de deterioração da função renal. Quando isso ocorre, não
capítulo 49
mais faz sentido protelar a entrada em diálise, visto que o agravamento do quadro clínico é iminente. Mais prudente seria programar o início da diálise antes que surjam as comorbidades associadas a um maior risco de mortalidade após o início do tratamento, principalmente desnutrição.152,13 Na falta de um método para a avaliação da TFG que possa ser usado rotineiramente na prática clínica e que tenha a precisão das técnicas consideradas padrão-ouro, como o clearance de inulina ou de marcadores radioisotópicos (51Cr-EDTA, 99Tc-DTPA ou 125I-iotalamato), uréia e creatinina continuam a ser os marcadores mais usados para avaliação da função renal. Além do baixo custo, facilidade técnica e familiaridade dos médicos com estes parâmetros laboratoriais, esses marcadores corroboram também na avaliação do estado nutricional do paciente.144 À medida que a função renal se deteriora, o clearance de creatinina passa progressivamente a superestimar a TFG, devido à sua secreção tubular.290 Por outro lado, o clearance de uréia tende a subestimar a TFG, pois é parcialmente reabsorvida pelos túbulos. Assim, muitos têm advogado a avaliação da TFG nos pacientes com doença renal avançada através da determinação da média aritmética do clearance de uréia e de creatinina,18,150 ou seja, TFG (clearance de creatinina clearance de uréia) / 2. Usualmente, o início da diálise está indicado quando a TGF, calculada por este método, atinge 10 ml/min/1,73 m2.150 Eventualmente, baseado em outros parâmetros, clínicos ou laboratoriais, este início de diálise poderá ser antecipado ou retardado. Por menos familiar que possa parecer, um novo conceito de avaliação da função renal e critério para definir o momento de entrada em diálise foi adotado pela NKF/ DOQI: o Kt/V semanal de uréia. O Kt/V de uréia é definido como a fração do volume de distribuição deste soluto que é depurado em determinado intervalo de tempo (para maiores detalhes acerca de Kt/V, veja adiante, em adequação de diálise). A escolha deste método baseia-se no fato de que, nos pacientes em diálise peritoneal, um Kt/V semanal de uréia abaixo de 2,0 está associado a pior evolução clínica,27 portanto, não faria sentido manter um paciente em fase pré-dialítica com um Kt/V menor que este. Para o cálculo do Kt/V semanal de uréia, deve-se determinar o clearance de uréia e seu volume de distribuição. Como exemplo: paciente de 65 kg (volume de distribuição de uréia estimado em 40 litros), com uréia sérica de 150 mg/dl, excreção urinária de uréia de 450 mg/dl e débito urinário de 2.000 ml/dia. Seu Kt/V semanal será de 1,05, pois K 4,16 ml/min, t 10.080 min (1.440 min 7) e V 40.000 ml. Neste exemplo, o paciente preenche critério para iniciar tratamento dialítico e sua uréia sérica só não está mais elevada devido à baixa ingestão protéica. Como veremos adiante, este método apresenta uma vantagem adicional, que seria a medida do catabolismo protéico, outro importante critério para a avaliação do estado nutricional. As diretrizes da NKF/DOQI204 preconizam que todo paciente aguardando a entrada em diálise deva fazê-
873
lo quando o Kt/V semanal de uréia estiver abaixo de 2,0. Isso equivale a um clearance de creatinina entre 9 e 14 ml/ min/1,73 m2 e a um clearance de uréia de aproximadamente 7 ml/min/1,73 m2 (média aritmética de ambos de cerca de 10,5 ml/min/1,73 m2). No entanto, esta entrada pode ser retardada quando o paciente encontra-se totalmente livre de sintomas urêmicos e apresenta bom estado nutricional (e sem sinais de deterioração do mesmo). Cabe ressaltar que estes critérios sugerem uma entrada em diálise bem mais precoce do que historicamente tem ocorrido nos EUA, onde entre mais de 90 mil pacientes que iniciaram tratamento dialítico, entre 1995 e 1997, a TGF média estimada era de 7,1 ml/min/1,73 m2.205 O impacto favorável esperado com um início da terapia renal substitutiva relativamente precoce tem sido contestado. Um estudo prospectivo conduzido na Holanda (Netherlands Cooperative Study on the Adequacy of Dialysis) foi incapaz de constatar redução do risco de mortalidade ou melhor qualidade de vida nos pacientes que iniciaram diálise com TFG em torno de 11 ml/min/1,73 m2 em comparação aos pacientes que o fizeram quando tinham TFG de cerca de 5 ml/min/1,73 m2.145,146 Além disso, dados desse estudo contestam a equivalência entre o Kt/V renal de uréia nos pacientes em fase pré-dialítica e o Kt/V peritoneal.121 Por ora, na falta de estudos prospectivos controlados e randomizados concebidos para este fim, julgamos prudente, como mencionado acima, seguir as diretrizes sugeridas pela NKF/DOQI.204,205
ESTADO NUTRICIONAL Um outro critério para se iniciar o tratamento dialítico seria a piora do estado nutricional do paciente. Dados do estudo multicêntrico MDRD (Modification of Diet in Renal Disease) demonstraram uma relação inversa entre o nível de função renal e a ingestão de proteína já a partir de uma TFG de 50 ml/min/1,73 m2.144,115 Assim, é bastante comum que os pacientes com acentuada redução da função renal encontrem-se desnutridos.13 O estado nutricional ao iniciar o tratamento dialítico é um dos mais importantes determinantes da evolução clínica subseqüente.152,13 Apesar da falta de estudos prospectivos, espera-se que a entrada do paciente em diálise antes da deterioração do seu estado nutricional implique redução dos riscos de morbidade e mortalidade. As diretrizes da NKF/DOQI204 sugerem o início do tratamento dialítico dos pacientes com TFG abaixo de 20 ml/min/1,73 m2 se surgir ou persistir desnutrição calórico-protéica apesar dos esforços para reverter este quadro através da dieta (uma vez excluídas outras causas, além da uremia, que justificassem a desnutrição). Uma dieta com 0,6 a 0,75 g/kg/dia de proteína geralmente é suficiente para evitar a desnutrição, desde que um consumo energético adequado seja mantido (35 kcal/kg/ dia para pacientes abaixo de 60 anos e 30 a 35 kcal/kg/dia para os mais idosos).144,140,221 Os pacientes diabéticos são particularmente susceptíveis ao desenvolvimento precoce de desnutrição, quando a TFG ainda está acima de 10 ml/
874
Hemodiálise
min/1,73 m2.205 O início do tratamento dialítico deve ser considerado se um dos seguintes indicadores de deterioração do estado nutricional estiver presente: 1) redução involuntária do peso usual, sem edema, acima de 6% (ou para menos de 90% do peso padrão) em menos de 6 meses; 2) queda da albumina sérica maior do que 0,3 g/dl e para valores inferiores a 4,0 g/dl (confirmada e na ausência de outra causa que a justifique); e 3) redução da avaliação global subjetiva do estado nutricional para uma categoria inferior (divididas em três categorias: normal, desnutrição leve a moderada, desnutrição grave).204
QUADRO CLÍNICO A decisão de encaminhar um paciente para início da terapia renal substitutiva apóia-se em critérios objetivos e subjetivos. Além do grau de deterioração da função renal e dos parâmetros nutricionais, devem-se considerar também aspectos clínicos. Esta decisão pode também ser influenciada por outros fatores, como a presença de um acesso vascular maduro. Por exemplo, num paciente com Kt/V semanal de uréia um pouco abaixo de 2,0, porém assintomático e com desnutrição leve, talvez a melhor alternativa fosse a imediata confecção de um acesso vascular (ou peritoneal) definitivo, retardando a sua entrada em diálise por algumas semanas até maturação do seu acesso. Já para um paciente que começa a apresentar sintomas urêmicos, como náuseas, perda de apetite, muitas vezes acompanhados de emagrecimento ou que subjetivamente sente progressiva queda de seu bem-estar, não raro com sua capacidade cognitiva comprometida, a melhor opção seria iniciar logo o tratamento dialítico. Enfim, embora esta decisão deva apoiar-se nas indicações preestabelecidas, dentro do contexto de cada caso, faz-se necessário ponderar a relação risco/benefício para melhor definir o momento de iniciação da terapia regular de substituição da função renal.
Pontos-chave: • O momento para se iniciar a terapia renal substitutiva é geralmente determinado pelas avaliações da taxa de filtração glomerular e do estado nutricional • Desnutrição calórico-protéica, refratária à dieta, pode ser uma indicação para se iniciar diálise quando a TFG ainda estiver acima de 10 ml/min • Os benefícios clínicos de se iniciar diálise quando o Kt/V renal semanal 2,0, conforme diretriz da NKF/DOQI, ainda não foram provados
PRINCÍPIOS DE TROCA EM DIÁLISE O processo da extração de solutos e solventes através de uma membrana semipermeável obedece a princípios físicos relativamente simples. No conceito químico estrito, a membrana semipermeável ideal permite passagem exclusiva do solvente. Este tipo de membrana está mais próxima das utilizadas em preparação de água purificada nos sistemas de osmose reversa (v. adiante). Nos filtros de hemodiálise, as membranas têm porosidade variável mas permitem passagem do solvente e, também, de solutos de peso molecular até 500 a 50.000 na dependência do tipo empregado.198 Quando duas soluções estão separadas por membrana semipermeável do tipo da empregada nos filtros de hemodiálise, há um movimento bidirecional, através da membrana, das partículas dos solutos que são capazes de atravessar seus poros. Se há diferença de concentração entre as soluções, o número de partículas que atravessam a membrana oriundas do lado de concentração mais alta é maior. A resultante é um saldo positivo de transferência de solutos a partir do lado de maior concentração no sentido do de menor concentração até o estabelecimento do equilíbrio das concentrações. Este movimento de solutos é denominado de difusão e sofre influência da diferença de concentração, mas, também, de diversos outros fatores, como, por exemplo, tamanho, forma e natureza elétrica dos solutos, da temperatura das soluções e da área e porosidade da membrana.109 A presença de um soluto dotado de carga elétrica em uma das soluções cujo tamanho não permita sua passagem pela membrana pode alterar as concentrações finais de equilíbrio entre as soluções, fenômeno conhecido como Efeito GibbsDonnan.105 No caso da hemodiálise, por exemplo, de um lado da membrana encontra-se o plasma rico em proteínas carregadas negativamente, em concentração de aproximadamente 16 mEq/L,101,175 que não atravessam a membrana. Como resultado, a concentração de sódio de equilíbrio na solução de hemodiálise, à semelhança do que ocorre com o fluido da cápsula de Bowman, seria cerca de 4% menor do que a concentração do sódio na água do plasma.101 Concomitante ao movimento dos solutos, há sempre um movimento (também bilateral) do solvente (nos fluidos biológicos, a água) através da membrana. Havendo diferença de osmolaridade entre as soluções, o movimento é maior a partir do lado onde as moléculas de água são mais numerosas (lado da solução menos concentrada) em direção ao lado onde elas são menos numerosas (lado da solução mais concentrada), resultando um saldo positivo de transferência de água da solução com menor osmolaridade em direção àquela com maior osmolaridade, até que se estabeleça o equilíbrio entre as osmolaridades. Este movimento é denominado de convecção. Neste tipo de movimento, os solutos que atravessam a membrana são carreados pelo solvente, na mesma concentração em que se en-
875
capítulo 49
contram na solução de onde são oriundos. Conclui-se que, quando lidando com membranas empregadas nos filtros de hemodiálise, o movimento convectivo também movimenta solutos, fenômeno usualmente referido como efeito de draga do solvente. À semelhança do que ocorre quando há gradiente osmolar entre duas soluções, a presença de diferenças de pressão hidráulica entre dois compartimentos separados por uma membrana semipermeável também determina movimento convectivo entre os compartimentos, princípio bastante utilizado no contexto clínico (no caso da hemodiálise, o transporte convectivo é determinado de forma muito mais relevante pela diferença de pressão hidráulica entre os compartimentos). Em resumo, o maior determinante da difusão é o gradiente de concentração de solutos, e o da convecção é o gradiente de pressão hidráulica. Utiliza-se a denominação diálise para o processo onde predomina a difusão, e ultrafiltração para o processo onde predomina a convecção. A caracterização de um filtro de hemodiálise no presente, portanto, requer especificação não somente de sua capacidade convectiva, expressada pelo coeficiente de ultrafiltração (KUF), mas também de sua capacidade de transferência de massa, que depende principalmente de sua capacidade difusiva. Em geral, o coeficiente de transferência de massa (KoA) é calculado in vitro, sob condições padronizadas, empregando a uréia como soluto padrão (v. adiante, em dialisadores). Finalmente, um comentário deve ser feito acerca de um outro princípio de retirada de solutos pelos filtros de hemodiálise, a adsorção. Quando o sangue entra em contato com uma superfície não-biológica, como a das membranas empregadas em hemodiálise, há uma aposição de macromoléculas, no caso, principalmente proteínas, na superfície da mesma.277 Este fenômeno é sempre autolimitado na medida em que o filme protéico depositado previne ulterior contato do sangue com a membrana artificial e subseqüente deposição de macromoléculas. Portanto, para que este mecanismo pudesse ser clinicamente significante no que concerne à remoção de substâncias, os filtros de diálise teriam que ser trocados freqüentemente, implicando naturais limitações técnicas e econômicas.
Pontos-chave: Em hemodiálise • Difusão movimenta solutos principalmente na dependência de um gradiente de concentração • Convecção movimenta água e solutos sem alterar sua concentração; seu principal determinante é um gradiente de pressão hidráulica • Adsorção retira moléculas maiores mas é um mecanismo saturável, a menos que se troque o dialisador
ÁGUA PARA HEMODIÁLISE O consumo habitual de água está em torno de 10 litros/ semana ou 40 litros/mês. Ao contrário da população normal, os pacientes tratados por hemodiálise regular são expostos a um volume de água substancial. Considerando-se o esquema mais tradicional de 12 horas semanais de hemodiálise com um fluxo de banho da ordem de 500 ml/ min, obtém-se um valor de 360 litros de água por semana ou aproximadamente 1 tonelada e meia por mês. Nos primórdios da hemodiálise, a água utilizada era aquela idealizada para consumo oral, ou seja, água potável. O grande inconveniente é que os recursos utilizados pelos sistemas públicos de tratamento de água no sentido de torná-la adequada para consumo adicionam fatores potencialmente tóxicos aos hemodialisados. Por exemplo, o sulfato de alumínio usado para floculação pode causar anemia, encefalopatia e osteomalácia;3,286,247,219 a cloramina, empregada como desinfetante, pode causar hemólise;138 e o flúor, usado na prevenção de cáries dentárias, pode provocar osteomalácia e fluorose.125,160 A composição da água utilizada para consumo é bastante variável na dependência de sua origem, e alguns dos seus componentes “normais” podem ser tóxicos aos pacientes em hemodiálise. Como exemplo, uma água rica em cálcio e magnésio pode causar a “síndrome da água dura”80 e concentrações elevadas de sódio podem causar distúrbios osmolares.201 Além disso, a presença de contaminantes eventuais, como os microrganismos e seus produtos, pode causar febre, mal-estar, hipotensão e, mais raramente, complicações mais graves, como choque, insuficiência hepática e óbito.123 Por todas essas razões, a água utilizada para hemodiálise no presente deve ser adicionalmente tratada na clínica de diálise empregando-se um sistema de tratamento. A escolha do equipamento mais apropriado depende de uma análise da água que chega ao centro de diálise oriunda da rede pública. De um modo breve, os equipamentos que compõem um tratamento de água são fundamentalmente: 1) um sistema inicial de eliminação de partículas (em geral, um filtro de membrana e um filtro de sedimentação com areia em granulação progressiva); 2) um dispositivo para retirada de cloro e cloraminas e que também se presta a reduzir os contaminantes orgânicos (o recomendável são dois filtros de carvão ativado colocados seqüencialmente); 3) um sistema para remoção de íons (referido como abrandador se efetivo exclusivamente para cátions, ou como deionizador, se misto, isto é, efetivo para cátions e ânions); 4) um sistema eliminador de partículas após passagem pelo carvão e resinas (para retenção de eventuais escapes desses materiais), e 5) um equipamento de osmose reversa (Fig. 49.2). Este último componente, na maioria das vezes, representa o alicerce dos sistemas de tratamento de água para hemodiálise. O princípio de seu funcionamento consiste em aplicar uma pressão hidraúlica em um
876
Hemodiálise
osmose reserva
areia
carvão 1
carvão 2
resina de troca iônica
rejeito produto
estoque de água tratada
bomba filtro de membrana máquina de diálise
Fig. 49.2 Modelo esquemático do tratamento de água para hemodiálise, incluindo um módulo de osmose reversa.
compartimento, cuja parede é uma membrana semipermeável, em um nível suficiente para superar a pressão osmótica da solução e induzir passagem de água pela membrana, a partir de uma solução mais concentrada na direção de uma menos concentrada, justificando a denominação osmose reversa. À semelhança do que ocorre nos filtros de hemodiálise, a solução que entra (no caso, a água) desdobra-se em dois componentes: 1) a água que atravessou a membrana (aqui referida como produção ou permeado, correspondente ao ultrafiltrado da hemodiálise) e 2) a água que não foi filtrada e que teve a concentração de seus componentes aumentada (aqui referida como rejeito e que poderia ser comparada ao sangue que deixa o filtro em uma sessão de ultrafiltração isolada). A produção é usualmente referida como um percentual relativo à água de alimentação do sistema. Quanto maior a produção, pior o permeado e menor a durabilidade da membrana. De um modo geral, a produção deve ficar na ordem de 30 a 50%.internet,1,2 A água produzida é então estocada em tanques limpos e enviada às máquinas de diálise através de um sistema de canalização em alça fechada e sem pontos mortos, que permite o retorno da água não usada ao tanque de estocagem, em um sistema de reciclagem constante. Tal estratégia visa prevenir a estagnação da água, que favoreceria a
proliferação bacteriana, especialmente em água muito pura, isenta dos elementos defensivos adicionados durante o processo de produção de água potável e, portanto, mais vulnerável. Em alguns centros mais avançados, a água estocada é ainda ultrafiltrada antes de alimentar a máquina, como uma maneira de produzir uma solução de diálise “ultrapura”.141 As membranas utilizadas em osmose reversa são constituídas de celulose ou polímeros sintéticos e têm uma porosidade que, segundo os fabricantes, permite reduzir a carga iônica em 90-99% além, naturalmente, de remover substâncias orgânicas, partículas e bactérias.265,285 Sua eficiência deve ser monitorada por uma medida da condutividade da água produzida. Se os valores aumentarem para níveis inaceitáveis, as membranas devem ser limpas ou trocadas. A água produzida para diálise deve ser monitorada periodicamente no que concerne às suas propriedades organolépticas, físico-químicas e microbiológicas. No Brasil, a portaria 82 do Ministério da Saúde, de 3 de janeiro de 2000,189 baseada nas sugestões da AAMI (The Association for the Advancement of Medical Instrumentation),9 regulamenta a periodicidade deste monitoramento e informa os níveis aceitos para cada componente a ser dosado. No que concerne à microbiologia, a água que chega a uma
877
capítulo 49
máquina de hemodiálise pode ter até 200 unidades formadoras de colônia de bactérias heterotróficas por mililitro e o efluente da máquina, até 2.000 CFU por ml.
Pontos-chave: • Carvão retira cloro e substâncias orgânicas • Abrandador é um extrator de cátions • Deionizador é um extrator de cátions e ânions • Osmose reversa retira 90-99% da carga iônica, além, naturalmente, de remover substâncias orgânicas, partículas e bactérias
MATERIAL E EQUIPAMENTOS Solução de Troca A solução de troca em hemodiálise é habitualmente referida no jargão nefrológico como banho de diálise. Seu preparo envolve a mistura de uma solução concentrada, o concentrado para hemodiálise, com água previamente tratada. Nas máquinas mais antigas, todo o volume de banho necessário a uma sessão de diálise era preparado imediatamente antes do seu início através da adição de partes prédeterminadas do concentrado e água tratada em um grande recipiente (tanque da máquina de hemodiálise). Pelas desvantagens, principalmente relacionadas ao tempo e trabalho envolvidos com o procedimento, mas também ao maior risco de contaminação bacteriana, essa concepção inicial foi virtualmente abandonada. Nas máquinas mais modernas, utilizadas no presente, a preparação do banho de diálise é feita de modo contínuo, ao longo da sessão de diálise, através de um sistema de mistura proporcional (v. adiante em máquinas para hemodiálise). No que concerne a solutos, procura-se, em uma sessão de hemodiálise, retirar aqueles acumulados em decorrência de função renal deficiente ao mesmo tempo em que se visa preservar e/ou restaurar os componentes normais do sangue. Conceitualmente, os solutos a serem retirados, na solução de troca, devem estar ausentes ou em concentração inferior à do plasma, enquanto aqueles que se quer preservar ou oferecer, em concentrações similares ou superiores à do plasma. Um dos pontos críticos na formulação de um banho de diálise ideal foi a escolha do tampão a ser utilizado para manter o equilíbrio ácido-básico. Em soluções com altas concentrações de cálcio e magnésio (como no concentrado para hemodiálise), a adição de bicarbonato pode resultar em formação de carbonatos e precipitação. Para contornar tal dificuldade, o tampão mais empregado inicialmente foi o acetato, um composto que sofre biotransformação, principalmente nos músculos, gerando bicarbonato em uma
seqüência de reações químicas que consome CO2.30 Sessões de hemodiálise com acetato como tampão podem ser acompanhadas de substancial elevação do nível de acetato no sangue. No presente, o acetato foi virtualmente abandonado pela sua associação com náuseas e vômitos, cefaléia, acidose metabólica (devido à perda de bicarbonato para o banho de diálise), instabilidade hemodinâmica (decorrente de suas propriedades vasodilatadoras) e hipóxia (resultante da inibição do centro respiratório pela queda do CO2 plasmático, secundária tanto à perda para o banho de diálise, quanto ao seu consumo).30 As dificuldades para utilização do bicarbonato foram contornadas pela preparação do concentrado de hemodiálise em duas frações separadas: uma dita básica, que contém o bicarbonato de sódio e, opcionalmente, um pouco de cloreto de sódio, e uma dita ácida, que contém uma pequena quantidade de um ácido orgânico (acético, láctico ou cítrico) e os demais componentes. Durante a sessão de diálise, estas duas frações são continuamente aspiradas e misturadas com a água tratada para constituir o banho de diálise, mais diluído e com um pH em torno de 6,8-7,3, onde não há precipitação. Em um outro tipo de sistema, a solução básica é substituída por bicarbonato em pó, acondicionado em cartuchos, na tentativa de reduzir a contaminação bacteriana da solução básica e os custos de armazenagem e transporte. Está para ser lançado no mercado brasileiro um granulado (referido como “concentrado seco”) que contém todos os componentes necessários à preparação do banho de diálise e que poderá ser reconstituído no momento da realização da sessão de hemodiálise. O Quadro 49.1 ilustra os componentes mais comuns de um banho de hemodiálise que utiliza tampão bicarbonato. Embora nos primórdios da hemodiálise fossem utilizados valores de sódio no banho mais baixos (até 132 mEq/L), tais valores foram associados a uma maior freqüência de náuseas, vômitos, cãibras, cefaléia, hipotensão e, também, à síndrome de desequilíbrio e edema cerebral. A tendência atual é a de utilizar concentrações de base mais altas, em torno de 138-140 mEq/L, que, em máquinas mais modernas, podem ainda ser ajustadas para valores maiores ou
Quadro 49.1 Composição do banho de hemodiálise (tampão bicarbonato) Componente Sódio (mEq/L) Potássio (mEq/L) Cálcio (mEq/L) Magnésio (mEq/L) Cloreto (mEq/L) Acetato (mEq/L) Bicarbonato (mEq/L) Glicose (mg/dl) pCO2 (mmHg)
Concentração 136-140 0-4,0 2,5-3,5 0,5-1,0 98-124 2-4 30-40 0-200 40-110
878
Hemodiálise
menores na dependência da necessidade clínica do paciente. Concentrações de sódio mais elevadas podem associar-se a maiores ganhos no intervalo dialítico84 e hiperpotassemia.202 No que concerne às concentrações de potássio, os valores de 1,5-2,0 mEq/L são habitualmente utilizados. Valores próximos aos limites superiores são recomendados para pacientes predispostos a arritmias e para aqueles que fazem uso crônico de digitálicos. O cálcio iônico no plasma de pacientes necessitando de hemodiálise corresponde a aproximadamente 60% do cálcio total.302 De um valor médio de 10 mg/dl no plasma, por exemplo, apenas 6 mg/dl (ou 3 mEq/L) estão ionizados e representam o cálcio difusível. Em outras palavras, valores de cálcio de 3 mEq/L no banho de diálise equilibram com o plasma para um valor de aproximadamente 10 mg/ dl. Quando se utilizam banhos com concentrações de cálcio da ordem de 3,5 mEq/L (correspondente a um cálcio sérico total de aproximadamente 12 mg/dl), o resultado é um balanço positivo de cálcio na maioria das sessões de hemodiálise. O nível ideal de cálcio no banho de diálise ainda é controverso, porém, valores próximos de 2,5 mEq/L têm sido recomendados com a finalidade de permitir maior liberdade no manuseio de sais de cálcio como quelantes de fósforo, especialmente para pacientes com doença óssea adinâmica que, com freqüência, mantêm cálcio sérico elevado e níveis séricos de PTH abaixo do desejável.110 A quantidade de equivalentes alcalinos no banho de diálise deve ser suficiente para garantir um nível de bicarbonato superior a 20 mEq/L ao início da sessão seguinte na medida em que a acidose tem sido associada a aumento do catabolismo protéico e desnutrição.79,167 Para tal, recomenda-se que os limites superiores sejam empregados. Em tais circunstâncias, a preocupação com a chamada “maré alcalina” pós-diálise não encontrou eco em um estudo controlado.102 De certa forma surpreendente, a última portaria que regulamenta a diálise no Brasil189 não menciona a necessidade de se dosar a reserva alcalina (ou o bicarbonato) nas rotinas laboratoriais. A glicose tem sido um componente opcional (especialmente pelo seu custo) nos banhos de diálise. A diálise sem glicose está associada a perda de glicose (e estímulo à cetogênese e gliconeogênese),21 maior redução na osmolaridade plasmática durante a diálise234 e, eventualmente, sinais clínicos de hipoglicemia (especialmente em pacientes diabéticos ou que utilizam betabloqueadores do tipo propranolol.90 Apesar da ausência de dados conclusivos, a diálise contra níveis de glicose próximos aos valores normais é intuitivamente mais fisiológica. Finalmente, deve ser comentado que, embora os concentrados sejam preparados de forma padronizada e a maioria dos pacientes suporte essa fórmula geral sem maiores problemas, os progressos tecnológicos talvez possam vir a permitir sua individualização e oferecer maior conforto e segurança.215
Pontos-chave: • As soluções de troca com tampão bicarbonato associam-se a sessões menos sintomáticas • A tendência atual é a de utilizar concentrações de sódio mais altas, em torno de 138-140 mEq/L • Têm sido recomendados banhos com Ca em 2,5 mEq/L com a finalidade de permitir maior liberdade no manuseio de sais de cálcio, especialmente para pacientes com doença óssea adinâmica • A diálise contra níveis de glicose próximos aos valores normais é intuitivamente mais fisiológica
Membranas e Dialisadores Os dialisadores consistem em dois compartimentos divididos por uma membrana semipermeável. Em um dos compartimentos flui o sangue, enquanto no outro, em contracorrente, passa a solução de diálise. Através da membrana, ocorrem as trocas entre o sangue e o banho de diálise, propiciadas pelas diferenças de concentração e de pressão entre os dois compartimentos. Os dialisadores diferenciam-se quanto à conformação geométrica e às características de suas membranas. Dialisadores com membranas em placas paralelas são usados há décadas, principalmente na Europa, mas representam pequena parcela do mercado. Até os anos 80, os dialisadores com as fibras em espiral (tipo coil) eram bastante populares. Esses dialisadores tipo coil saíram de mercado com a chegada dos dialisadores com fibras ocas, de diâmetro quase microscópico, que, por isso, foram denominados popularmente, no Brasil, como dialisadores do tipo capilar. A imensa maioria dos dialisadores usados atualmente são de fibras ocas. Estes dialisadores são formados por milhares de fibras capilares dispostas paralelamente e juntas formam uma superfície interna que, na dependência do modelo do dialisador, pode ultrapassar 2 m2. As fibras são separadas entre si, para que haja espaço onde deve fluir o banho de diálise, em contracorrente ao sangue que flui na luz das fibras (Fig. 49.3). As características funcionais dos dialisadores são estabelecidas através da determinação da sua capacidade convectiva (coeficiente de ultrafiltração, KUF) e de sua capacidade difusiva avaliada através do seu clearance e coeficiente de transferência de massa (KoA). Em analogia com a avaliação da taxa de filtração glomerular, a taxa de depuração da uréia de um dialisador representa qual o volume de sangue que está sendo depurado num intervalo de tempo.96 Esta determinação é
capítulo 49
entrada do sangue
saída do banho de diálise
fibras
entrada do banho de diálise
saída do sangue
Fig. 49.3 Desenho esquemático de um dialisador de fibras ocas. Os fluxos de sangue e banho de diálise estão em contracorrente. O sangue flui pela luz de milhares de fibras enquanto a parede externa dessas fibras é banhada pela solução de troca.
feita através da multiplicação do percentual de redução da concentração de uréia (diferença das concentrações plasmáticas na entrada e na saída do dialisador) pelo fluxo de sangue que passa pelo dialisador. Por exemplo, um paciente está sendo submetido a HD com fluxo de sangue de 400 ml/min e tem concentração plasmática de uréia em determinado momento de 200 mg/dl na linha arterial e de 60 mg/dl na linha venosa. Como nestas circunstâncias 70% do sangue que passa pelo dialisador é depurado (e considerando-se a concentração plasmática da uréia igual à do sangue total, já que este soluto cruza facilmente a membrana celular), sua taxa de depuração será 0,7 400 280 ml/min. Os fabricantes dos dialisadores geralmente informam sua taxa de depuração de uréia, mas muitas vezes com base apenas em dados in vitro. Neste caso, devese multiplicar por 0,8 para cálculos in vivo. O KoA de uréia seria o potencial de transporte difusivo, ou seja, o maior valor de depuração de uréia que se poderia obter com aquele dialisador se, hipoteticamente, este fosse submetido a uma diálise com fluxos máximos de sangue e banho de diálise. Assim, a taxa de depuração da uréia depende tanto do KoA do dialisador, como dos fluxos de sangue e dialisado. O Quadro 49.2 relaciona alguns dos dialisadores de fibras ocas comercializados no país, assim como suas principais características.
879
As membranas são classificadas em relação ao seu constituinte principal e à sua permeabilidade. Inicialmente, as membranas dos dialisadores de fibras ocas eram constituídas de celulose regenerada. Devido aos radicais hidroxila na sua superfície, essas membranas mostraram ter pouca biocompatibilidade.220 Entende-se por biocompatibilidade a capacidade de uma membrana artificial ser biologicamente inerte.164 A interação do sangue com membranas menos biocompatíveis pode desencadear agudamente uma série de manifestações clínicas e alterações laboratoriais durante a sessão34,67,182 e, a longo prazo, em conseqüência de um estado de inflamação subclínica crônica pela exposição continuada a essas membranas, pode estar associada a um aumento no risco de morbidade e mortalidade.98,217 Para contornar essa questão, novas membranas foram desenvolvidas: as sintéticas (polissulfona, poliacrilonitrila, polimetilmetacrilato, poliamida e policarbonato, entre outras) e as de celulose modificada. As membranas de celulose modificada, por sua vez, são classificadas em celulose substituída, que têm sua superfície modificada através da substituição dos radicais hidroxila (acetato de celulose, diacetato de celulose e triacetato de celulose), e semisintéticas, que são formadas a partir da adição de um material sintético à celulose liquefeita, ainda durante a sua formação, por exemplo, dietilaminoetil (Hemophan).220,294 Embora essas novas membranas sejam habitualmente designadas como biocompatíveis, sabemos que ficam longe do ideal de uma membrana realmente biocompatível, que seria representada pelo endotélio. Segundo sua capacidade de ativação do sistema complemento e de indução de leucopenia durante a diálise, as membranas poderiam ser classificadas na seguinte ordem crescente de biocompatibilidade: celulose regenerada (que são denominadas bioincompatíveis), celulose substituída, celulose semi-sintética e polímeros sintéticos.74,93,100 No que refere a outros parâmetros de biocompatibilidade, também importantes, como a síntese de -2 microglobulina ou a redução da imunidade celular, as membranas sintéticas parecem não apresentar vantagens em relação às de celulose modificada.57,177,299 Tanto as membranas sintéticas quanto as de celulose modificada parecem ter impacto positivo sobre a morbidade e a mortalidade, quando comparadas às membranas de celulose regenerada.98,217 No entanto, poucos benefícios clínicos das membranas sintéticas sobre as de celulose modificada têm sido demonstrados. Talvez a queda da função renal residual nos pacientes em hemodiálise seja maior entre aqueles usando membrana de acetato de celulose do que entre aqueles com polissulfona.180 As membranas são classificadas também quanto à sua permeabilidade (também referida como fluxo) e, por conseguinte, ao desempenho. Inicialmente, os dialisadores com membrana de celulose tinham invariavelmente pequeno coeficiente de ultrafiltração (KUF) e reduzida capacidade de transferência de massa (KoA), sendo chamados de baixa permeabilidade, enquanto aqueles com membra-
880
Hemodiálise
Quadro 49.2 Relação de alguns dos dialisadores mais utilizados no Brasil. Os dialisadores estão ordenados a partir do material constituinte das membranas MEMBRANA
DIALISADOR (Nome comercial)
FABRICANTE
SUPERFÍCIE (m2)
KoA
KUF (ml/h/mmHg)
CF-23 CF-25 T-150 T-175 T-220
Baxter Baxter Terumo Terumo Terumo
1,2 1,6 1,5 1,7 2,2
534 730 730 930 1130
5,2 6,5 5,4 6,0 8,0
CA-110 CA-150 CA-170 CA-210
Baxter Baxter Baxter Baxter
1,1 1,5 1,7 2,1
490 675 780 990
4,8 6,8 7,9 9,3
FB-130T FB-150T FB-170T FB-210T
Nipro Nipro Nipro Nipro
1,3 1,5 1,7 2,1
618 690 780 955
5,6 6,4 7,3 9,0
CT-190G*
Baxter
1,9
1220
36
Fresenius Fresenius Fresenius Fresenius
1,6 1,8 1,2 1,8
720 800 760 945
6,4 8,1 40 60
Celulose
Acetato de celulose
Diacetato de celulose
Triacetato de celulose Polissulfona F7 F8 F-60* F-80* *Dialisadores de alta permeabilidade.
nas sintéticas tinham elevados KUF e KoA, e eram denominados como de alta permeabilidade.42 Atualmente, tanto existem dialisadores com membranas sintéticas de baixa permeabilidade (polissulfona de baixa permeabilidade, por exemplo), como aqueles com membranas celulósicas de alta permeabilidade (cupramônio de alta permeabilidade e triacetato de celulose).42,93,209 Não existe critério consensual para classificar um dialisador em relação à permeabilidade de sua membrana. Alguns o definem através do KUF ou do KoA, outros, pela depuração de -2 microglobulina (Collins 1994). O grupo de estudo NIH HEMO (National Institutes of Health — Hemodialysis Study Group) classifica como dialisador de alta permeabilidade aquele capaz de propiciar uma depuração de -2 microglobulina acima de 20 ml/minuto e que tenha um KUF acima de 14 ml/h/mmHg.39 Os dialisadores de baixo fluxo têm depuração de -2 microglobulina abaixo de 10 ml/min e um KUF geralmente abaixo de 8 ml/h/ mmHg. Os dialisadores que têm valores intermediários de KUF e depuração de -2 microglobulina são freqüentemente referidos como dialisadores de alta eficiência, mas a denominação mais adequada seria dialisadores de média permeabilidade.
Do ponto de vista clínico, a opção por membrana de alta permeabilidade é norteada pela sua capacidade de depuração de moléculas de maior peso molecular, na medida em que o KUF passou a ser menos relevante com a adoção universal de máquinas com controle automatizado de ultrafiltração (dialisadores de alta permeabilidade não devem ser utilizados na ausência deste dispositivo). Benefícios clínicos são esperados com o uso de dialisadores de alta permeabilidade, como conseqüência da depuração mais efetiva de moléculas de maior peso molecular, incluindo aí inúmeras toxinas urêmicas não mensuráveis. Já foi demonstrada a redução na incidência da síndrome do túnel do carpo, atribuída à maior depuração de -2 microglobulina.143 Em diversos estudos retrospectivos, o uso de dialisadores de alta permeabilidade foi associado a uma significativa redução no risco de mortalidade.143,230,306 Porém, contrariando as expectativas, resultados preliminares do primeiro grande estudo prospectivo comparando grupos de pacientes dialisados com membranas de alta ou baixa permeabilidade sugerem não haver diferenças significativas nos riscos de hospitalização ou mortalidade associadas à permeabilidade das membranas (comunicação antecipada pelo NIH de dados do Estudo HEMO e ainda não publicados).
capítulo 49
Pontos-chave: • Membranas sintéticas e as de celulose modificada são mais biocompatíveis do que aquelas de celulose não-substituída • Não há evidência de que as membranas sintéticas sejam superiores às de celulose modificada, ou vice-versa • Dialisadores de alta permeabilidade provavelmente são associados a menor risco de mortalidade
Máquinas Paralelo ao grande avanço ocorrido no desenvolvimento dos acessos vasculares e dos dialisadores, o aprimoramento tecnológico nas máquinas de hemodiálise contribuiu substancialmente para tornar este tratamento mais confortável e seguro. Uma máquina de hemodiálise é constituída, basicamente, de uma bomba que promove a circulação sanguínea extracorpórea e de um sistema paralelo responsável pelo fluxo da solução de troca que banha as membranas do dialisador. Além disso, uma máquina deve ser capaz de promover e controlar a retirada de líquido do organismo, manter aquecido o sangue em circulação extracorpórea e ser dotada de sensores de segurança para as falhas técnicas e intercorrências relacionadas ao procedimento. O sangue passa pelo circuito extracorpóreo sem contato direto com a máquina. Uma bomba do tipo “rolete” colocada antes do dialisador propicia a chegada do sangue até este ponto por pressão negativa. Daí em diante, o sangue segue por pressão positiva. Um segmento da linha arterial, geralmente com diâmetro de 1 a 1,5 cm e cerca de 30 cm de comprimento, é especialmente manufaturado para adaptar-se à bomba “rolete”. O fluxo de sangue é proporcional ao diâmetro do segmento de linha comprimido pelo rolete e à velocidade de rotação da bomba. No interior do dialisador, o sangue em circulação extracorpórea sofre passivamente as alterações dependentes do circuito paralelo. O circuito da solução de diálise e os aparatos agregados, além de proverem o banho que chega ao dialisador para que ocorram as trocas com o sangue, controlam ativamente os demais parâmetros da diálise, como a temperatura, a concentração de sódio e a velocidade de ultrafiltração.218 No nosso meio, as máquinas poderiam ser classificadas em dois tipos, baseados na forma como a solução hidroeletrolítica é preparada: as do tipo “tanque” e as de proporção. Nas máquinas do tipo “tanque”, o volume de solução de diálise suficiente para uma sessão é preparado de uma só vez, através da mistura de água, concentrado de solução eletrolítica e tampão bicarbonato, fican-
881
do armazenado em um reservatório para uso ao longo da sessão. A estase da solução no reservatório e a forma como esta é manipulada propiciam a proliferação bacteriana, aumentando o risco de exposição às endotoxinas. Estas máquinas estão progressivamente sendo abandonadas. As máquinas de proporção tendem a ser adotadas universalmente. Estas são assim denominadas porque preparam e liberam, de forma constante e em tempo real, a solução de troca que é enviada ao dialisador (Fig. 49.4). A água ao chegar à máquina é misturada instantaneamente ao concentrado eletrolítico em partes proporcionais. Para que não haja precipitação de sais de cálcio no concentrado eletrolítico, este é dividido em dois recipientes distintos, um contendo o tampão bicarbonato (fração básica), ficando o cálcio, demais eletrólitos e a glicose no outro recipiente (fração ácida). No momento da diálise, partes de cada uma dessas frações são aspiradas e misturadas à água na proporção adequada. A monitorização da condutividade na solução eletrolítica após a mistura e os mecanismos de salva-guarda contra possíveis falhas tornam esta técnica segura. A concentração de sódio na solução de diálise pode ser individualizada através da variação da proporção de concentrado eletrolítico para o volume de água. A maioria dos pacientes dialisa com concentração de sódio entre 138 e 140 mEq/L. Alguns pacientes mais propensos à hipotensão intradialítica apresentam menos sintomas quando dialisados com concentração mais elevada de sódio ou esquemas que modulam a concentração do sódio ao longo da sessão.207 Porém, o aumento da sede e conseqüente elevação do ganho de peso no intervalo interdialítico minimizam o benefício destas estratégias ao longo das sessões subseqüentes. O fluxo da solução de troca também é dependente de uma bomba. As máquinas são habitualmente dotadas de controle ajustável do fluxo de solução, por exemplo, entre 300 e 800 ml/min. O aumento do fluxo do banho é uma estratégia que eventualmente pode ser adotada para maximizar a eficiência da diálise.103 A solução chega ao dialisador através de um tubo plástico flexível que nele se encaixa. Por outro tubo, o banho de diálise que retorna do dialisador para a máquina é drenado como dejeto. Ao contrário do sistema por onde circula o sangue, esses tubos não são individuais, mas componentes da máquina. Por esta razão, as máquinas atuais são dotadas de um sistema de auto-esterilização deste circuito no intervalo entre as sessões. Para não causar hipotermia, a solução de diálise que chega ao dialisador deve estar pré-aquecida. As máquinas atuais permitem um ajuste bastante preciso da temperatura. A maioria dos pacientes sente-se confortável com a temperatura em torno de 37oC. Recentemente, a redução da temperatura da solução de diálise, por exemplo, para 35,5oC tem sido usada como uma estratégia para melhorar a estabilidade hemodinâmica durante a diálise em pacientes mais predispostos à hipotensão.112
882
Hemodiálise
expurgo
câmara de mistura proporcional trava de segurança
detector de hemoglobina
monitor de pressão
detector de ar
monitor de condutividade
balança de saída
monitor de temperatura
balança de entrada
válvula para controle de pressão
bomba propulsora
cata-bolhas
bomba de ultrafiltração
Fig. 49.4 Esquematização simplificada do funcionamento de uma máquina de proporção. A área pontilhada corresponde às partes internas da máquina.
O controle da ultrafiltração é feito através do ajuste da pressão no compartimento do banho de diálise. Este compartimento tem a pressão habitualmente negativa em relação à pressão no compartimento sanguíneo. O controle do gradiente de pressão entre os dois compartimentos determina a velocidade de ultrafiltração. Um sistema integrado de duas câmaras de pesagem (uma no início do circuito e outra próxima à saída da máquina) assegura que os volumes de solução de diálise na entrada e na saída sejam semelhantes, não considerando o volume de ultrafiltração programado. A precisão da ultrafiltração é assegurada por uma bomba colocada antes da câmara de balança da saída, num circuito em bypass. Algumas das vantagens da ultrafiltração controlada seriam (1) a redução de complicações intradialíticas, como hipotensão e cãibras, (2) a melhor previsibilidade do peso de saída do paciente, (3) a possibilidade de dialisar, sem maiores intercorrências, os pacientes com elevada resistência venosa (pois a pressão no compartimento da solução de diálise eleva-se automaticamente, contrapondo-se à pressão positiva no compartimento sanguíneo) e (4) a liberdade para se utilizar qualquer dialisador não importando seu KUF. Uma inovação tecnológica de relevância inestimável foi a incorporação às máquinas dos sensores de segurança. Com adoção desses sensores, integrados a um sistema de
interrupção automática da diálise em caso de anormalidades, complicações graves relacionadas ao procedimento, como embolia gasosa e hemólise maciça, tornaram-se eventos raros. As máquinas geralmente dispõem de monitores para os seguintes parâmetros: (1) condutividade na solução de diálise, (2) temperatura, (3) pressão sanguínea na linha arterial (nem todas as linhas têm derivação para este monitor), (4) pressão sanguínea na linha venosa (os monitores de pressão são separados do sangue por isoladores descartáveis), (5) presença de ar no sangue que retorna ao paciente e (6) indício de hemoglobina na solução de diálise pós-dialisador.218 Algumas máquinas mais modernas são dotadas de um sistema capaz de estimar em tempo real a quantidade de uréia removida durante a diálise. Com isso, pode-se determinar o Kt/V ao longo de sucessivas sessões, deixando de ser esta uma avaliação pontual.86,158
Ponto-chave: • Uma máquina de hemodiálise deve ser capaz de propiciar as condições para a depuração do sangue, controlar a ultrafiltração e ser tecnicamente segura
capítulo 49
ACESSO VASCULAR Desde os primórdios da diálise a limitação das opções de acesso vascular já representava motivo de grande preocupação. Apesar dos avanços no tratamento da insuficiência crônica terminal, ainda hoje o acesso vascular continua sendo considerado por muitos o “calcanhar de Aquiles” do nefrologista. Em 1960, Quinton e Scribner utilizaram um dispositivo de material sintético flexível que consistia em dois ramos, um colocado na artéria radial e outro, na veia umeral.231 Os segmentos externos desses dois ramos eram anastomosados entre si através de um conector mantendo uma fístula arteriovenosa acessível. No momento da diálise, este conector era retirado e o ramo da artéria radial, usado para alimentar o circuito enquanto a devolução era feita no ramo da veia umeral. Esse shunt arteriovenoso externo permitiu que pacientes urêmicos passassem a ser tratados cronicamente. Em 1966, Brescia e Cimino, através da anastomose interna de uma artéria a uma veia, criaram aquele que é considerado até hoje o melhor acesso vascular para pacientes em hemodiálise, a fístula arteriovenosa primária ou nativa.23 Em situações nas quais não é possível a anastomose a partir dos vasos do próprio paciente, a fístula AV interna pode ser confeccionada utilizando-se enxertos autólogos, heterólogos ou sintéticos. A fístula, entretanto, requer um intervalo entre sua confecção e utilização, necessário à sua maturação (desenvolvimento do seu leito venoso). Nos pacientes sem acesso vascular demandando diálise de urgência se faz necessária a provisão de um acesso temporário até a confecção e maturação da fístula AV. Durante algum tempo, este acesso temporário era representado exclusivamente pelo shunt de Scribner. Em meados dos anos 70 começaram a surgir no mercado os cateteres que viriam a ter seu uso consolidado nesse contexto.289 No presente, os acessos vasculares para hemodiálise podem ser classificados como definitivos e temporários.
Acessos Vasculares Definitivos Serão abordados sob este título as fístulas AV nativas e as anastomoses arteriovenosas que envolvem a utilização de enxertos tais como veia safena autóloga, enxertos heterólogos ou material sintético, como o politetrafluoretileno (PTFE). Um acesso vascular adequado deve: 1) oferecer um fluxo sanguíneo satisfatório, 2) ter uma meia-vida longa e 3) apresentar baixo índice de complicações. A fístula AV nativa é a que parece melhor preencher estes critérios.253 Realizada em ambiente cirúrgico e na maioria das vezes sob anestesia local, a fístula AV pode ser confeccionada através da anastomose entre a artéria radial e a veia cefálica, a braquial e a cefálica ou a braquial e a basílica, preferencialmente no membro não-dominante. Embora a fístula con-
883
feccionada no antebraço possa apresentar fluxo sanguíneo menor que no braço, em média 938 ml/min contra 1.247 ml/min,64 o local recomendado inicialmente é o mais distal, de preferência em tabaqueira, poupando-se os vasos proximais. Assim, em caso de falência, precoce ou tardia, a fístula poderá ser reconstruída mais acima. Nos últimos anos vários trabalhos têm sido publicados associando menores doses de diálise, avaliadas através de medidas como PRU ou Kt/V, com maior morbi-mortalidade.88,99,278 Como a eficiência da diálise depende de um fluxo sanguíneo adequado, a preocupação com o desempenho do acesso vascular passou a ser uma prioridade. Dentre os acessos vasculares, a fístula AV nativa é a que tem apresentado melhores resultados a médio e longo prazos, com uma patência em cerca de 71% em 1 ano e 57% em 5 anos, contra 54% e 0% da fístula com PTFE, respectivamente, estando, ainda, associada a um menor índice de complicações.301 Entretanto, sua escolha como primeira opção de acesso vascular mostra uma distribuição irregular. Enquanto no Brasil e na Europa é considerada como primeira opção de acesso vascular definitivo e utilizada por cerca de 80 a 90% dos pacientes em programa de hemodiálise,194,256 nos EUA, onde os gastos com acesso vascular chegam a representar 25% dos recursos destinados à terapia renal substitutiva, somente 20 a 30% dos pacientes são dialisados através de uma fístula AV nativa.63,228 Em conformidade com as diretrizes estabelecidas pelo DOQI, tem sido observado um incremento na indicação de fístula AV nativa nos EUA77 que, em alguns centros, chega a representar 70% dos acessos confeccionados a partir de 1996.85 Trabalhos que avaliam o impacto desta mudança sugerem uma progressiva diminuição no número de complicações e também dos custos com acesso vascular.271 As principais complicações da fístula AV nativa são a falência primária, em que o mau funcionamento é detectado antes mesmo de ser utilizada, a estenose e a trombose secundária, todas levando a redução parcial ou total do seu fluxo.14 A falência primária ou secundária da fístula é observada com maior freqüência em pacientes idosos e diabéticos. Sua avaliação periódica, pela medida e acompanhamento da pressão negativa da linha arterial prébomba durante a diálise, pela ultra-sonografia com Doppler ou através da técnica de termodiluição, pode detectar eventuais diminuições de fluxo, possibilitando sua correção preventiva.6,178,270,273,284 Outras complicações incluem o aneurisma, o pseudo-aneurisma e a infecção. As duas primeiras são diagnosticadas através do exame físico e ultra-sonográfico e sua correção é cirúrgica, através de aneurismectomia ou ligadura da fístula AV. O Staphylococcus aureus é o agente etiológico responsável pela maioria das infecções.153,267 Se a infecção for local, pode-se empregar uma cefalosporina de primeira geração ou, se a infecção atingir planos mais profundos, ciprofloxacina, ambas por via oral. Em caso de repercussão sistêmica, após
884
Hemodiálise
coleta de sangue para hemocultura, devem-se imediatamente iniciar antibióticos com espectro de ação contra germes Gram-positivos e, especialmente em imunodeprimidos, também para Gram-negativos.2,196 A associação de vancomicina a um aminoglicosídeo ou a uma cefalosporina de segunda ou terceira geração, além de cobertura contra os germes mais comuns, oferece a comodidade da administração a cada sete dias, no caso da vancomicina, ou após cada 48 h, no caso dos aminoglicosídeos. A cefazolina tem sido indicada nos casos de enterobactérias resistentes à vancomicina.283 Às vezes, após uma intercorrência, como por exemplo um quadro hipotensivo, uma fístula que vinha apresentando um bom desempenho pára subitamente de funcionar. Nestes casos, devem-se utilizar trombolíticos ou lançar mão de manobras para desobstrução não-cirúrgica, ambos com bons resultados.127,287,297 Na trombose da fístula AV nativa, súbita ou não, a pronta intervenção do cirurgião vascular pode propiciar a confecção de uma nova fístula aproveitando o leito vascular previamente dilatado, o que pode dispensar o intervalo para maturação da fístula e a instalação de um acesso provisório. A opção pela fístula utilizando prótese, quase sempre o enxerto com PTFE, é, geralmente, reservada aos pacientes nos quais tentativas de confecção de uma fístula AV nativa foram malsucedidas ou quando este insucesso é antecipado pela conformação desfavorável do leito vascular, o que é mais freqüente em idosos, obesos ou diabéticos.4,186 Geralmente, a prótese é implantada no membro superior, formando uma alça na dobra do cotovelo ou ligando a artéria radial à veia basílica, sendo a própria prótese utilizada como sítio de punção. Em casos especiais, um segmento de PTFE pode ser utilizado somente como ponte ligando dois vasos cuja distância não permite sua anastomose direta. Nessas circunstâncias, a veia, uma vez madura, é que será puncionada. Excepcionalmente, o enxerto pode ser implantado no membro inferior, como uma alça, ligando a artéria à veia femoral.147 Comparado com a fístula AV nativa, o enxerto tem um custo cerca de quatro vezes maior, menor sobrevida e maior risco de infecção.187,214 A menor sobrevida é devida em geral a estenose ou trombose, cujo manuseio é semelhante àquele preconizado para a fístula AV nativa. Há relatos comprovando aumento significativo da sua sobrevida com administração oral de óleo de peixe.249 A infecção, quando local, também pode ser tratada com antibiótico oral, mas quando acompanhada de repercussões sistêmicas requer antibioticoterapia venosa, quase sempre junto com a retirada do enxerto. Quando a infecção está restrita a um segmento da prótese, pode ser tentada a retirada parcial do enxerto.58 Entretanto, a adoção desta medida mais conservadora pode implicar um maior risco de complicações infecciosas tardias, como abscesso espinhal, osteomielite e endocardite. Também têm sido relatados casos de infecção silenciosa em enxertos trombosados.195
Pontos-chave: • Acesso vascular de escolha é a fístula arteriovenosa nativa, confeccionada o mais distal possível • Fluxo sanguíneo adequado é um dos principais determinantes na adequação da diálise • A avaliação rotineira da FAV e a detecção de queda em seu rendimento podem indicar intervenção precoce, evitando trombose futura • S. aureus é o responsável pela maioria das infecções, tanto em FAV nativas quanto em próteses
Acessos Vasculares Temporários A partir da década de 70, uma ampla gama de cateteres venosos foi colocada no mercado. Quando rígidos e de luz única, seu uso, mais freqüentemente, requeria a punção de dois vasos sanguíneos. Às vezes, um só cateter com uma máquina cicladora (ora aspirando, ora impulsionando o sangue) era empregado. Com o passar do tempo, os cateteres foram incorporando uma série de melhorias, sendo oferecidos com dupla ou tripla luz, em variados tamanhos e calibres e com material mais maleável que se molda à anatomia quando em contato com a temperatura do corpo humano.75,93 Mais tarde receberam um cuff (segmento almofadado de Dacron) que, implantado no subcutâneo, permite uma melhor fixação do cateter e torna mais difícil a penetração de microrganismos a partir da pele (genericamente designados como cateteres com cuff ou tunelizáveis). Nos últimos anos, também tem sido relatado o uso de cateteres inteiramente isolados do contato com o exterior, conectados a um pórtico que fica implantado no subcutâneo, só acessados no momento da diálise através da canulização transcutânea.28,104
LOCAL DE INSERÇÃO Os cateteres podem ser implantados nas veias subclávias, jugulares internas e femorais, havendo ainda eventuais relatos de acesso translombar e jugular externo.225 Tradicionalmente o acesso pela veia subclávia era o mais escolhido. Seu uso diminuiu na medida em que várias publicações associaram seu cateterismo à trombose venosa.111 Na atualidade, o acesso de eleição é a veia jugular interna, preferencialmente à direita.191 Entre as razões que explicam a preferência pelo lado direito encontram-se a comodidade do executor, posição mais baixa da cúpula pleural e ausência de dutos linfáticos. A jugular pode ser acessada por via anterior (cerca de 1 cm abaixo do cruza-
capítulo 49
mento da jugular externa com a carótida), posterior (cerca de 1 cm abaixo do cruzamento da veia jugular externa com o esternocleidomastóideo) e central, no ângulo formado pelos ramos esternal e clavicular do esternocleidomastóideo. O acesso central, pela maior proximidade com a pleura, é o que apresenta o maior risco de complicações. A via posterior, embora tecnicamente mais difícil, é bastante útil nos pacientes obesos, brevilíneos ou com dificuldade de rotação do pescoço. Em nossa experiência, a via anterior é a que melhor parece conciliar maior chance da punção venosa com menor risco. A experiência do médico com a técnica, entretanto, é que determina o acesso preferencial. O acesso pela veia femoral, descrito como de curta permanência (2-4 dias) e reservado aos pacientes acamados, graças à segurança e facilidade de punção que oferece, tem sido cada vez mais utilizado em caráter ambulatorial e com tempo de permanência mais prolongado.159 Ao se optar por esta via, devem-se empregar cateteres de maior comprimento (pelo menos 18 cm) para que se alcance a cava inferior, onde seu desempenho será melhor. Utilizando-se a técnica de Seldinger, o cateter pode ser implantado à beira do leito, pelo próprio nefrologista. Esta técnica consiste na punção de uma veia de grosso calibre com uma cânula que permita a passagem por seu interior de um fio metálico flexível que funcionará como guia. Uma vez puncionado o vaso, introduz-se o fio guia e retira-se a cânula. Após pequena dilatação do trajeto, o cateter é introduzido na veia (passando-se o fio guia por dentro da luz do cateter), até que este esteja devidamente posicionado e ancorado dentro do vaso para ser então fixado externamente. Quando se utiliza o cateter com cuff, é necessária ainda a confecção de um túnel subcutâneo de mais ou menos 5 cm (destinado a abrigar o cuff), que se estenderá do sítio da punção venosa até o local de saída do cateter na pele.307 Nos pacientes com IRC, os cateteres temporários são utilizados principalmente naqueles com indicação de diálise, muitas vezes em caráter de urgência, que não tiveram um acesso definitivo confeccionado previamente, fato comum nos pacientes referenciados tardiamente ao nefrologista. Podem ser necessários também naqueles pacientes com fístula AV ainda em fase de maturação, naqueles em programa de hemodiálise que apresentaram alguma complicação no acesso vascular ou nos pacientes em diálise peritoneal com intercorrência que impeça a utilização do peritônio. Em nosso meio, os cateteres semi-rígidos são os mais utlizados como acesso provisório, sendo incomum o uso dos cateteres tunelizáveis para este fim. Crianças ou pacientes sem acesso vascular definitivo e com perspectivas de transplante a curto prazo também podem configurar uma boa indicação para o uso de cateteres tunelizáveis.41,168,208,237
COMPLICAÇÕES E MANUSEIO As complicações relativas à instalação dos cateteres variam conforme seu local de inserção. Na veia jugular interna, por exemplo, pode ocorrer lesão do nervo larín-
885
geo recorrente, da traquéia, da carótida e do duto torácico (se à esquerda). Hematomas volumosos podem ocasionar desconforto respiratório. Na veia subclávia, pode haver lesão de artéria subclávia, pneumotórax, hemotórax ou ambos. Em qualquer acesso venoso alto pode ocorrer perfuração do átrio ou tamponamento pericárdico quando o guia, o dilatador ou o cateter ultrapassam a câmara cardíaca. Na veia femoral, pode ocorrer dissecção do vaso, fístula arteriovenosa ou formação de hematoma subcutâneo ou retroperitoneal. Qualquer que seja o sítio, a punção guiada por ultra-som, cada vez mais preconizada, está associada a um número de complicações substancialmente menor.8,279 As complicações decorrentes do mau funcionamento do cateter podem ser precoces ou tardias. Quando precoces devem-se, quase sempre, à posição do cateter em relação à parede do vaso. Podem ser manuseadas pela rotação ou exteriorização parcial do cateter. O objetivo destas manobras é o deslocamento de uma eventual aderência do cateter à parede do vaso. Pode ser necessária sua troca com guia ou mudança do sítio de punção. O controle radiológico pode ser útil na avaliação do melhor posicionamento do cateter. Recomenda-se que sua ponta fique localizada dentro do átrio direito, onde seu funcionamento é melhor.252 Entretanto, trombos têm sido relatados em associação à presença de cateteres dentro da cavidade atrial.137 O mau funcionamento tardio pode ser provocado por estenose ou trombose do cateter ou ainda por formação de um material gelatinoso em torno do cateter que obstrui o orifício de entrada do cateter durante a aspiração do sangue na diálise, em um mecanismo valvular.48 Vários protocolos têm preconizado o uso de trombolíticos na estenose ou trombose do cateter, com resultados animadores.68,293 Devido ao alto custo dos trombolíticos, seu uso tem sido mais comum nas obstruções de cateteres tunelizáveis ou naqueles casos em que a troca do cateter é antecipada como problemática.15,263 Com o uso disseminado dos cateteres, complicações decorrentes de erro na fabricação ou má qualidade do material empregado podem ocorrer, como nos casos relatados de fratura de cateter, com implantação do segmento distal no pulmão, átrio e veia femoral.37 Uma outra complicação, mais associada ao acesso por via subclávia, é a trombose venosa central. Tem maior incidência nos casos de infecção prévia ou uso de cateteres rígidos.22 Seu diagnóstico pode ser suspeitado pelo aumento do volume do membro homolateral, a montante do sítio de punção. A venografia é o método definitivo para sua confirmação, mas o doppler pode fornecer indícios seguros de sua presença.16 O tratamento é realizado através de anticoagulação com heparina, mas poderá requerer a ligadura da fístula AV ipsilateral, com o objetivo de diminuir a pressão venosa e o edema. O tratamento definitivo, entretanto, quase sempre envolve a colocação de um stent combinado com angioplastia. A recorrência do processo
886
Hemodiálise
pode demandar implantação de um enxerto para transpor a área afetada.33,184 Finalmente, uma complicação comum com o uso dos cateteres é a infecção do orifício de saída e/ou do túnel subcutâneo. As infecções relacionadas aos cateteres são tratadas de forma diferente conforme o tipo do cateter e da infecção. A exemplo da infecção de fístula, aqui também o principal agente etiológico é o Staphylococcus aureus.257 No caso de cateter provisório e com simples hiperemia mas sem secreção purulenta, pode-se administrar um curso de 1-2 semanas de antibiótico por via oral. Se houver secreção purulenta, recomenda-se a retirada do cateter com antibioticoterapia oral ou venosa por duas semanas. Na presença de febre associada a qualquer dos sinais acima ou na ausência de um foco que permita excluir o cateter como causa de infecção, preconiza-se a realização de hemocultura, com coleta inclusive de sangue pelo cateter, sua retirada com envio da ponta para cultura e antibioticoterapia, preferencialmente venosa, com cobertura para Staphylococcus aureus por 2 a 3 semanas. Quando possível, deve-se aguardar um intervalo de 48 horas até a instalação de um novo cateter. Não sendo possível este intervalo, parece mais recomendável que sua troca (com mudança do sítio) seja feita antes da sessão de diálise.26,183,244,281 Eventualmente, em um paciente com fístula ainda em fase de maturação poder-se-á, na dependência do julgamento clínico, antecipar sua utilização evitando a instalação de um novo cateter. O cateter permanente é muitas vezes utilizado como opção à falta de outro acesso venoso. Por esta razão, embora, em linhas gerais, o manuseio da infecção seja semelhante ao do cateter de uso temporário, pode ser feita uma tentativa de salvamento do cateter nos casos de bacteremia,
Pontos-chave: • O implante de cateteres com o auxílio de ultra-sonografia, mais seguro, tem sido cada vez mais recomendado • Em caso de infecção por cateter e necessidade urgente de diálise, parece mais recomendável a troca do cateter antes da diálise • Em caso de trombose do cateter, bons resultados podem ser obtidos com trombolíticos • A tentativa de preservar cateteres em casos de infecção com repercussões sistêmicas pode associar-se a complicações tardias, como abcesso espinhal e osteomielite • Pacientes com cateter e dificuldade crônica de acesso podem ficar subdialisados
com antibioticoterapia venosa antes da sua retirada. Em caso de êxito, o que só costuma ocorrer em 32% dos casos,173 o cateter poderá ser mantido no local ou, se não, trocado com auxílio de um guia metálico. Mesmo quando seu manuseio parece bem-sucedido, as complicações das infecções associadas ao cateter não parecem extinguir-se com o tratamento do evento inicial. Têm sido relatados casos de endocardite, osteomielite, tromboflebite supurativa e abscesso espinhal em pacientes com história prévia de infecção por cateter e retardo no tratamento.196
ANTICOAGULAÇÃO A hemodiálise é um procedimento durante o qual há necessariamente um íntimo e contínuo contato do sangue com as paredes do circuito extracorpóreo. Por mais que se atribuam qualidades referentes à biocompatibilidade do material utilizado para a manufatura das linhas e dialisadores, estes ainda são trombogênicos, capazes, muitas vezes, de induzir a formação de coágulos dentro do circuito em questão de minutos.157 Assim, a anticoagulação, salvo contra-indicações clínicas, deve ser prescrita a todos os pacientes submetidos a hemodiálise. A anticoagulação visa não apenas evitar a obstrução do circuito, mas também reduzir a perda do volume interno das fibras dos dialisadores, ajudando a manter a eficiência destes, mesmo após sucessivos reúsos.211,269 Quanto maior o tempo de contato do sangue com as paredes do circuito, maior a ativação da cascata de coagulação. Por isso, o risco de coagulação é inversamente proporcional ao fluxo de sangue. Conseqüentemente, os pontos mais críticos do circuito são o interior das fibras dos dialisadores e o cata-bolhas, onde o sangue passa mais lentamente devido ao maior diâmetro. Além disso, no interior do cata-bolhas, o sangue entra em contato com o ar, favorecendo a coagulação.32,136,268 O anticoagulante mais utilizado na hemodiálise crônica é a heparina não-fracionada. Suas vantagens são o baixo custo, a comodidade posológica, a meia-vida curta e a possibilidade de neutralizá-la. Nas primeiras sessões de hemodiálise, os pacientes geralmente usam doses padronizadas de heparina, mas que posteriormente devem ser individualizadas.211,296 A monitorização e a avaliação da anticoagulação devem ser feitas através do tempo de coagulação. Para isso, amostras de sangue devem ser colhidas antes da anticoagulação e, a partir daí, de hora em hora, sempre na linha arterial. Como o tempo de coagulação estará propositalmente aumentado, são preferíveis os métodos que empregam reagentes de aceleração da coagulação, como o tempo parcial de tromboplastina, ou o tempo de coagulação ativada usando-se actina FS ou silício, respectivamente.296 No entanto, como essas técnicas nem sempre estão disponíveis
capítulo 49
no centro de diálise, a avaliação do tempo de coagulação, feita de forma manual e sem reagente acelerador, continua a ser largamente utilizada. O tempo de coagulação por essa técnica é muito dependente da forma como é realizada, variando o padrão de normalidade de centro para centro. Sugerimos colocar uma amostra de 1 ml de sangue em um tubo de vidro, deixando em temperatura ambiente e invertendo o tubo a cada minuto, até que o coágulo se forme. O importante é que cada centro de diálise, dentro de sua rotina, faça isso de forma padronizada e tenha sua própria referência de normalidade. Uma anticoagulação adequada deve ser capaz de manter o tempo parcial de tromboplastina ou o tempo de coagulação ativada entre 1,5 e 2 vezes o valor basal durante a maior parte da sessão.211,258 Naturalmente, os pacientes que já apresentam um tempo de coagulação alargado antes da heparinização terão uma meta menor. Já se a monitorização for feita através do tempo de coagulação sem reagente acelerador, o aumento deverá ser significativamente maior.258 Existem diversos esquemas de heparinização, sendo os mais descritos na literatura a infusão contínua, após pequena dose inicial em bolus, e a administração em bolus repetida, isto é, uma dose maior inicialmente seguida de mais uma ou duas doses menores ao longo da sessão.188,296 No esquema de infusão contínua, administra-se geralmente dose inicial de 2.000 U em bolus seguida de manutenção, individualizada, que pode chegar a 3.000 U/hora. A infusão deve ser encerrada entre 30 e 60 minutos antes do término da sessão, para facilitar a hemostasia após a retirada das agulhas. O tempo de coagulação deve retornar para próximo do normal no momento de encerramento da sessão. As máquinas atuais vêm dotadas de sistema de infusão contínua, mas seu uso requer seringa especial e demanda para o preparo da solução, implicando aumento de custo. A princípio, este método parece o mais apropriado, pois o grau de anticoagulação é mais regular ao longo da sessão, evitando a alternância de períodos ora com anticoagulação excessiva, ora insuficiente, como ocorre com as técnicas de administração em bolus.296 Para o esquema de administração repetida da heparina em bolus, podem-se usar inicialmente 2/3 da dose total e o 1/3 restante com 2 horas de hemodiálise, como, por exemplo, 4.000 U 2.000 U. Outro método muito usado em diversos centros de diálise no Brasil há vários anos, embora escassamente descrito na literatura,94,300 é a administração da heparina em bolus, dose única, no início da sessão. Nossa experiência neste caso é usar uma dose próxima a 80-100 U/kg, visando manter o tempo de coagulação acima de 20 minutos até a metade da sessão e abaixo de 10 minutos ao seu final. Qualquer que seja o esquema de administração adotado, o tempo de coagulação deve ser reavaliado, e a prescrição de heparina, revista sempre que houver suspeita de que a anticoagulação esteja sendo insuficiente (excesso de
887
sangue retido no circuito, baixo número de reúso do dialisador, etc.) ou excessiva (demora na hemostasia após a retirada das agulhas, fenômenos hemorrágicos, etc.) Uma alternativa à heparina não-fracionada é o emprego de heparina de baixo peso molecular, que é administrada em dose única no início da sessão.245,246 No entanto, seu elevado custo limita o uso rotineiro na hemodiálise crônica, pelo menos em nosso meio. No Quadro 49.3, citamos as situações clínicas mais comuns, nas quais há contra-indicação relativa ou absoluta para a heparinização. No contexto de cada caso, a prescrição da heparina poderá ser eventualmente mais conservadora ou flexível. Em situações onde há contra-indicação relativa para a anticoagulação, isto é, quando há baixo ou moderado risco de sangramento, pode-se empregar heparina de baixo peso molecular ou usar doses menores de heparina nãofracionada.154,275 Outra opção seria empregar a heparinização regional, antagonizando a heparina através da infusão contínua e simultânea de 1 ml de protamina (na linha venosa) para cada 1.000 U de heparina (na linha arterial).280 No entanto, parece não haver qualquer vantagem da heparinização regional em comparação ao uso de heparina em baixa dose.275 Quando se pretende antagonizar a heparina residual ao final de uma sessão de hemodiálise, a quantidade de protamina a ser administrada será menor, pois grande parte da heparina já terá sido metabolizada. Outra forma de anticoagulação regional emprega citrato de sódio como anticoagulante e cálcio como antagonista,70,122 porém, a técnica nos parece por demais trabalhosa para justificar seu uso em hemodiálise convencional. Quando a contra-indicação para anticoagulação for absoluta, isto é, houver alto risco de sangramento ou suas conseqüências forem potencialmente catastróficas, a melhor opção seria dialisar sem heparina.254 Neste caso, dialisador e linhas devem ser lavados com solução salina heparinizada antes do início da diálise. Além disso, o circui-
Quadro 49.3 Contra-indicações para heparinização Contra-indicações relativas (dose reduzida de heparina) Pós-operatório recente de cirurgia de baixo risco Pré-operatório imediato de cirurgia de baixo risco Pericardite Mulheres durante o período menstrual Contra-indicações absolutas (sem heparina) Sangramento ativo Discrasia sanguínea Acidente vascular cerebral (diagnosticado ou suspeita) Pós-operatório recente de cirurgia de grande porte Pós-operatório recente de cirurgia oftalmológica Pré-operatório imediato de cirurgia de alto risco
888
Hemodiálise
to deve ser lavado periodicamente com solução salina ao longo da sessão, por exemplo, 200 ml a cada 20 minutos. O volume total de solução salina a ser administrado deve ser estipulado e adicionado ao volume de ultrafiltração programado. Caso a resistência venosa aumente, sugerindo risco iminente de coagulação, o sistema deve ser inspecionado, e volume extra de solução salina pode ser necessário. O aumento do fluxo de sangue parece também reduzir o risco de coagulação do sistema.136
Pontos-chave: • Heparinização deve ser prescrita para todo paciente em hemodiálise, salvo contraindicações clínicas • Heparinização reduz o risco de coagulação do circuito extracorpóreo e ajuda a preservar a eficiência dos dialisadores reusados
PRESCRIÇÃO E ADEQUAÇÃO DA DIÁLISE A duração das sessões de hemodiálise, assim como a sua freqüência semanal, foram estabelecidas de forma empírica, buscando-se conciliar a necessidade de reversão da uremia com um tratamento que fosse socialmente aceitável pelo paciente. O entendimento do que vem a ser uma diálise adequada vem sofrendo mudanças ao longo dos anos. Se nos primórdios da diálise poderia ser razoável ter como objetivo evitar a morte por hipervolemia ou hiperpotassemia,106 hoje o tratamento dialítico busca a reversão dos sintomas urêmicos, a redução das complicações a longo prazo, a diminuição do risco de mortalidade, a melhoria da qualidade de vida e a reintegração social do paciente. Uma vez atingidos esses objetivos, a próxima meta seria a elevação da expectativa de vida desses pacientes para próximo daquela esperada para a população geral. Nessa direção, a diálise prescrita deixou de ser a mínima aceitável para ser a melhor que se consegue atingir. No presente, a aplicação da diálise tende a ser vista como a de qualquer recurso terapêutico onde se busca a dose e o intervalo corretos de administração. Dentro desta ótica, serão discutidos, a seguir, os esquemas de hemodiálise e o desenvolvimento do conceito de adequação de diálise até chegarmos ao modelo atual, baseado na cinética da uréia.
Esquemas de Hemodiálise A grande maioria dos pacientes portadores de IRC terminal é tratada em unidades de hemodiálise, localizadas dentro de hospitais ou estabelecidas como clínicas indepen-
dentes. Em geral, o tratamento desses pacientes obedece a uma prescrição relativamente fixa no que se refere à freqüência e à duração das sessões de diálise. Uma pequena proporção, entretanto, é tratada em sua residência e tem maior flexibilidade para programar suas sessões de diálise segundo sua conveniência e necessidade. A hemodiálise domiciliar, apesar de oferecer uma qualidade de vida superior, esbarra em dificuldades para sua expansão, especialmente relacionadas ao seu custo e execução. Em parte por essas razões, ao contrário do que vem ocorrendo com os métodos domiciliares de diálise peritoneal, o número de pacientes em hemodiálise domiciliar nos Estados Unidos vem declinando.71 No presente, o nefrologista se depara com diversas propostas no que se refere à duração e à freqüência das sessões de hemodiálise. Algumas opções serão discutidas a seguir, aglutinadas inicialmente de acordo com a freqüência de sessões na semana.
ESQUEMAS DE TRÊS VEZES POR SEMANA Entre as dificuldades experimentadas por todos os esquemas de três sessões semanais de diálise, sobressai o fato de que sua distribuição na semana é assimétrica, deixando um intervalo sem diálise de aproximadamente 68 horas no fim de semana, quando o convívio social dos pacientes é maior e sua demanda por ingestão de fluidos, com freqüência, está aumentada. Em decorrência desta característica, o número de complicações nos dois primeiros dias da semana é substancialmente maior do que nos restantes.19,132 Até um passado recente, o termo hemodiálise convencional referia-se a um esquema de três sessões semanais de cerca de 4 horas onde dialisadores hoje referidos como de baixa permeabilidade e de pequena área (0,8-1,3 m2) eram empregados. Neste esquema, o fluxo da bomba de sangue, em geral, situa-se na ordem de 250300 ml/min, e o do banho de diálise, em cerca de 500 ml/ min. Ainda hoje, em diferentes partes do mundo, muitos pacientes são tratados neste esquema. Uma variante desta modalidade, praticada em alguns centros na Europa e divulgada principalmente a partir das publicações originadas de Tassin, França, é a hemodiálise de longa duração. Aqui, cada sessão dura de 6 a 8 horas, sendo o fluxo sanguíneo mantido em valores ao redor de 200-220 ml/min, portanto, mais baixos do que na hemodiálise convencional, e o do banho de diálise, em 500 ml/min. Em termos de sobrevida dos pacientes e controle da hipertensão, os resultados desta última estratégia são substancialmente melhores que os demais resultados da literatura.36,116 Na década de 80, uma corrente de conhecimento, principalmente nos Estados Unidos, desenvolveu o conceito de otimização das sessões de diálise, inicialmente com o objetivo de reduzir o tempo de cada sessão de tratamento mantendo sua eficácia (medida através da cinética de uréia).73,172,185,240,261
889
capítulo 49
A vertente mais simples desta hemodiálise otimizada, denominada de hemodiálise de alta eficiência,172,261 simplesmente investiu em melhores acessos vasculares e aumento dos fluxos da bomba de sangue para cerca de 500 ml/ min e do banho de diálise para 700-800 ml/min, enquanto continuava empregando dialisadores de baixa ou média permeabilidade, porém com maior superfície (de 1,52,2 m2). Uma segunda vertente, denominada de hemodiálise de alto fluxo,73,185,240 passou a empregar dialisadores que, além de maior área, tinham membranas mais permeáveis com valores de KUF superiores a 20 ml/mmHg/h. Para tal, tornou-se indispensável o uso de máquinas dotadas de um dispositivo controlador de ultrafiltração (já recomendado para hemodiálise de alta eficiência), cuja ausência colocava em risco a vida dos pacientes pela alta probabilidade de ocorrência de hipotensão. Além disso, a alta permeabilidade dos filtros aumenta o risco de retrofiltração e a passagem de contaminantes para o sangue, requerendo controle mais estrito da qualidade da água utilizada na diálise. É questionável se os esquemas de três sessões por semana representam a melhor alternativa para o tratamento hemodialítico regular. Entretanto, eles continuam como os esquemas de hemodiálise mais empregados no mundo.
OUTROS ESQUEMAS Um dos esquemas propostos como alternativa ao tratamento de três sessões semanais é a hemodiálise diária de curta duração, idealizada por Buonchristiani (Perugia, Itália).24,25 Muitos dos pacientes neste esquema eram tratados no seu domicílio,288 mas experiências recentes demonstram que ele também é exeqüível nas unidades de diálise.165 Trata-se de um esquema simples e de implantação relativamente fácil. À exceção dos domingos, os pacientes são hemodialisados diariamente por 2-2,5 horas. A experiência inicial com este esquema utilizava material, equipamento e estratégia semelhantes à hemodiálise convencional, mas nos relatos mais recentes a tecnologia da hemodiálise de alto fluxo já foi incorporada. Sua aplicação tem sido associada a um menor custo e melhoras do estado nutricional, hipertensão, anemia, controle do fósforo, histologia óssea e qualidade de vida.24,163,165,190 Trata-se de um esquema que vem sendo adotado de modo crescente no mundo.139 Uma outra modalidade que teve grande repercussão é a hemodiálise noturna. Sua concepção inicial, por Pierratos226 (Toronto, Canadá), foi a de um método de hemodiálise que agregaria três benefícios: diálise domiciliar, diária e de longa duração. Embora a prescrição seja variável, um esquema típico compreenderia 6 sessões semanais de 8 horas por noite, com a maioria dos pacientes utilizando dialisadores de alta permeabilidade, fluxo da bomba de sangue variando de 180 a 400 ml/min e do banho de diálise (que tem características especiais), de 300 a 400 ml/min.227 Os benefícios deste esquema são inquestionáveis. Foram relatados níveis de escórias nitrogenadas próximos ao
normal e redução dos níveis séricos de beta-2 microglobulina, além de melhora da anemia, hipertensão, nutrição, disposição física e do balanço de cálcio e fósforo, havendo necessidade de suspensão dos quelantes de fósforo e adição de sais de fosfato ao banho pelo aparecimento de hipofosfatemia. Seu impacto na sobrevida ainda não pode ser adequadamente avaliado em razão da experiência com tal modalidade de diálise ser recente. Trata-se, entretanto, de um esquema com um custo inicial de implantação significativo, cuja adoção depende de treinamento prévio e incorporação de avanços tecnológicos mais recentes. Iniciativas (ainda não publicadas) no sentido de propiciar os benefícios observados com os esquemas diários de hemodiálise sem modificações substanciais no esquema mais tradicional têm sido feitas através do incremento do número de sessões semanais de três para quatro ou cinco.
Adequação de Diálise e Cinética da Uréia É antiga a preocupação com a avaliação do tratamento dialítico oferecido. A primeira equação desenvolvida para se prescrever a hemodiálise foi a fórmula do m2 hora, baseada na superfície da membrana do dialisador e no número de horas semanais de diálise.10 Por exemplo, paciente dialisando 6 horas, 3 vezes por semana com dialisador de 1,2 m2 de superfície: 6 3 1,2 21,6 m2 hora. Nesses primórdios, o nível plasmático de uréia pré-dialítica norteava a avaliação da eficácia do tratamento, isto é, se estivesse baixa, a quantidade de diálise provavelmente era adequada; se estivesse alta, possivelmente o paciente estava subdialisado. Porém, a concentração de uréia é dependente não apenas de sua depuração, mas também de sua taxa de geração, que, por sua vez, é diretamente proporcional à ingestão protéica.20,46 Assim, pacientes desnutridos, com baixa ingestão protéica, poderiam ter uréia prédialítica baixa, a despeito de uma diálise inadequada. Por outro lado, pacientes com elevado consumo protéico poderiam ter uréia elevada, mesmo se dialisados satisfatoriamente.162 Por essas limitações, a dosagem isolada da uréia pré-dialítica não se mostrou um parâmetro adequado, persistindo a necessidade de um índice que refletisse a real eficácia do tratamento e que tivesse correlação com o risco de complicações e mortalidade. O primeiro estudo clínico prospectivo visando correlacionar parâmetros laboratoriais da hemodiálise com a evolução clínica dos pacientes foi o National Cooperative Dialysis Study.161 Originalmente, este estudo se prendeu à avaliação da uréia média e da taxa de catabolismo protéico. Somente em 1985, Gotch e Sargent,89 ao revisarem os dados do NCDS, observaram que aqueles pacientes com menores taxas de redução da concentração de uréia durante a sessão de HD tinham elevado risco de mortalidade e desenvolveram o conceito de avaliação cinética da uréia, em contraposição à
890
Hemodiálise
avaliação estática pré-dialítica, prevalente até então. Essa avaliação cinética era dependente de três variáveis, passando a ser denominada como Kt/V da uréia; onde K taxa de depuração da uréia (ml/min), t duração da sessão (min) e V volume de distribuição da uréia (ml). O volume de distribuição da uréia equivale aproximadamente ao volume total de água corporal, que pode ser calculado por diversas fórmulas,113,298 como a de Watson,* ou simplesmente considerando como 58% do peso.46 Exemplo: Um paciente de 60 kg (V 34,8 litros), submetido a HD de 240 min, com depuração de uréia de 210 ml/min, terá um Kt/V estimado de 1,45. Em suma, o Kt/V expressa quantas vezes o volume de distribuição da uréia foi depurado. Neste caso, a depuração foi de uma vez e meia o volume de distribuição. Poderíamos pensar que se houve depuração de um volume maior que o próprio volume de distribuição da uréia, então a concentração plasmática da uréia seria desprezível. No entanto, o sangue já depurado volta à circulação, misturando-se ao sangue não depurado, gerando uma curva de decaimento que não atinge zero. Como dois dos três parâmetros que definem o Kt/V são apenas presumidos, a real dose de diálise recebida pode ser bem inferior àquela estimada. Diversos fatores contribuem para isso, tais como os problemas relacionados ao acesso vascular, com fluxo de sangue baixo, o não cumprimento integral do tempo prescrito e a redução da eficácia dos dialisadores pelo reúso.83,255 Por isso, o cálculo do Kt/V, baseado nesta equação (Kt/V depuração tempo / volume de distribuição), não deve ser empregado para se medir a eficácia da hemodiálise. Esta fórmula pode ser utilizada, entretanto, para se fazer a prescrição inicial do tempo de diálise. Exemplo: Paciente de 90 kg será dialisado com dialisador que tem depuração in vivo estimada de 230 ml/min (com fluxo de sangue e dialisado de 400 ml/min e 500 ml/ min, respectivamente), tendo como objetivo um Kt/V 1,2. A água corporal total é estimada em 52 litros (58% do peso). Como se almeja um Kt/V 1,2, então, t 1,2 × V/K. Esse paciente deve ser inicialmente dialisado por 4 horas e 30 minutos (t 1,2 52.000 / 230; isto é, t 270 min). Posteriormente, Daugirdas et al.53,55,56 desenvolveram as fórmulas atuais de cálculo da cinética de uréia, baseadas na taxa de redução de uréia e em outros determinantes (Quadro 49.4). A taxa de redução da uréia (TRU), definida como TRU (1 R) 100, onde R relação uréia pós-HD/uréia pré-HD, é uma medida direta da efetividade do tratamento, isto é, quanto maior for seu decaimento plasmático, mais eficaz terá sido a diálise.213 Existe uma correlação exponencial entre R e o Kt/V, que é descrita como Kt/V ln(R). No entanto, alguns ajustes devem ser feitos para contemplar variáveis que interferem no Kt/V, como a uréia gerada no *Fórmula de Watson para cálculo do volume de distribuição de uréia: Homens: V (litros) 2,447 [0,09516 idade (anos)] [0,1074 altura (cm)] [0,3362 peso (kg)]. Mulheres: V (litros) 2,097 [0,1069 altura (cm)] [0,2466 peso (kg)].
Quadro 49.4 Equações para avaliação da adequação da hemodiálise, desenvolvidas a partir da cinética da uréia Equação 1: TRU (l R) 100 Equação 2: spKt/V ln(R 0,008 t) (4 3,5 R) UF/P Equação 3: eKt/V spKt/V 0,6 (spKt/V)/t 0,03 Equação 4: eKt/V spKt/V 0,47 (spKt/V)/t 0,02 TRU taxa de redução da uréia; R relação uréia pós-HD/uréia préHD; t duração da sessão; UF ultrafiltração; P peso pós-HD; spKt/ V Kt/V unicompartimental; eKt/V Kt/V equilibrado. Quando coleta de sangue é feita 20 segundos após HD, utilizar equação 3 (Ref. 60). Pacientes dialisando através de cateter ou se a coleta de sangue é feita 2 minutos após HD, utilizar equação 4 (Ref. 55).
período intradialítico, o volume de ultrafiltração (transporte convectivo) e o rebote de uréia após a diálise. A taxa de geração de uréia eleva sua concentração em aproximadamente 0,8% por hora. Por isso, após o ajuste para a geração de uréia, a fórmula passa a ser Kt/V ln(R 0,008 t), onde t duração da sessão (horas). Visto que o ultrafiltrado tem virtualmente a mesma concentração de uréia do plasma, todo este volume deverá ser considerado como integralmente depurado de uréia, acrescentando-o ao Kt/V. Uma ultrafiltração elevada pode aumentar substancialmente o Kt/V, mesmo se a TRU for mantida inalterada (Fig. 49.5). A fórmula, levando em conta
eKt/V
UF (litros)
1,8 5 1,7 3 1,6
1
1,5 1,4 1,3 1,2 1,1 1,0 0,9 0,8 60
65
70 TRU (%)
75
80
Fig. 49.5 Influência do volume de ultrafiltração (UF) sobre o eKt/ V. Neste exemplo, um paciente de 70 kg é submetido a 4 horas de diálise. O eKt/V correspondente à TRU varia de acordo com o volume de UF. Os dados são derivados da equação de Daugirdas (Quadro 49.4, equação 3).
891
capítulo 49
a ultrafiltração, passa a ser Kt/V ln(R – 0,008 t) (4 3,5 R) UF/P, onde UF volume ultrafiltrado (litros) e P peso pós-HD (kg). Esta equação considera o volume de distribuição da uréia um compartimento único, sendo chamado Kt/V unicompartimental, ou spKt/V (do inglês, single-pool).56 O modelo unicompartimental superestima o Kt/V real, já que ocorre habitualmente uma súbita elevação da concentração plasmática de uréia após o término da diálise, mais acentuada nos primeiros 30 minutos (fenômeno de rebote).62 Este rebote se dá em três etapas. (1) Nos primeiros segundos após o encerramento da diálise pode ocorrer uma rápida elevação da uréia devido ao fim da recirculação local. (2) Até os dois minutos seguintes, a uréia continua a elevar-se na medida em que se atenua a aumentada recirculação cardiopulmonar presente durante a sessão de hemodiálise (em decorrência do retorno do volume de sangue depurado para o átrio direito, que volta a ser impulsionado para os pulmões sem ter passado pela circulação sistêmica). (3) Pelos 60 minutos seguintes, principalmente na primeira meia hora, a uréia plasmática continuará a elevar-se, decorrente do reequilíbrio da concentração de uréia entre os vários tecidos. Possivelmente, há uma má perfusão relativa dos músculos durante a diálise, fazendo com que a queda da concentração de uréia nesses tecidos seja retardada.51,62,250 Este é o modelo bicompartimental, e o cálculo do Kt/V, considerando esta característica, é chamado Kt/V equilibrado (eKt/V).54 Do ponto de vista prático, é inviável aguardar rotineiramente o tempo de equilíbrio da uréia para a coleta da amostra de sangue pós-HD, por isso, o usual é se calcular o spKT/V e converter para eKt/V através de fórmulas de correlação previamente estabelecidas: eKt/V spKt/V 0,6 (spKt/V)/t 0,03 (quando o sangue é coletado 20 segundos após o término da diálise)60 ou eKt/V spKt/V 0,47 (spKt/ V)/t 0,02 (quando o paciente dialisa através de cateter ou o sangue é coletado 2 minutos após o término da diálise, pois não considera a recirculação cardiopulmonar).55 Quanto mais rápida for a queda da uréia, maior será o rebote. Portanto, quanto mais prolongada for a sessão, menores serão as diferenças entre spKT/V e eKt/V. Na Fig. 49.6, pode ser observado o impacto da duração da diálise sobre o eKt/V. Dentro de parâmetros habituais de diálise, o spKT/V superestima o valor absoluto do eKt/V em aproximadamente 0,2 (eKt/V spKT/V 0,2).52 Diante do amplo acesso atual a softwares que podem ser programados para calcular o Kt/V, o emprego de fórmulas lineares mais simplificadas tem sido cada vez menos usual.
eKt/V
Tempo
1,8
5
1,7 4 1,6 3
1,5 1,4 1,3 1,2 1,1 1,0 0,9 0,8 60
65
70
75
80
TRU (%)
Fig. 49.6 Influência do tempo de diálise sobre o eKt/V. Neste exemplo, um paciente de 70 kg é submetido a diálise com 3 litros de UF. O eKt/V correspondente à TRU varia de acordo com a duração da sessão. Os dados são derivados da equação de Daugirdas (Quadro 49.4, equação 3).
toxicidade,124 a real relevância clínica deste parâmetro laboratorial é questionável. Dados iniciais do NCDS apontavam para uma associação entre valores elevados de uréia média e pior evolução clínica.161 No entanto, a revisão posterior destes dados sugeriu que isso se devia ao Kt/V mais baixo, sendo os valores elevados de uréia apenas um epifenômeno de uma diálise inadequada. Por outro lado, valores baixos da uréia média podem decorrer de uma ingestão protéica inadequada. Deve-se, ainda, estar atento para a possibilidade de uma contribuição da função renal residual na redução da uréia média, sobretudo quando o paciente ainda apresenta débito urinário significativo. Para um cálculo acurado da uréia média, considerando a variação da uréia tanto no período interdialítico quanto durante a diálise, pode-se empregar a seguinte fórmula: Uréia média [Td (C1 C2) Id (C2 C3)] / 2(Td Id), onde Td é o tempo de duração da sessão, Id é o intervalo interdialítico, C1 e C2 são as concentrações de uréia pré- e pós-HD, respectivamente, e C3 é a concentração de uréia após a diálise seguinte.161
URÉIA MÉDIA
EQUIVALENTE PROTÉICO DO NITROGÊNIO GERADO
A concentração média de uréia reflete o grau de exposição do paciente a este soluto, que corresponde à área sob a curva de sua concentração plasmática ao longo da semana. Sendo a uréia um soluto que, isoladamente, tem baixa
Em um estado de equilíbrio, a taxa de geração de uréia em determinado intervalo de tempo, como produto de degradação das proteínas, é proporcional à ingestão protéica. Assim, o equivalente protéico do nitrogênio gerado
892
Hemodiálise
(protein nitrogen appearance — PNA) é tido como um importante parâmetro laboratorial na avaliação nutricional do paciente em hemodiálise.5,262 PNA é uma expressão que passou a ser adotada mais recentemente, em substituição à denominação, corrente até então, de taxa de catabolismo protéico (protein catabolic rate — PCR). Embora PNA e PCR sejam sinônimos, tem-se sugerido o abandono desta última expressão, dado o seu caráter ambíguo.203 Pacientes com reduzido PNA são ou estão predispostos ao desenvolvimento de desnutrição e suas conseqüências, enquanto pacientes com PNA elevado são potencialmente mais bem nutridos.161 Naturalmente, este conceito não se aplica aos pacientes instáveis, na vigência de situações comórbidas, onde há um incremento do catabolismo protéico endógeno. Num paciente sem função renal residual, a taxa de geração de uréia (G) será determinada pela sua elevação no plasma e pelo seu volume de distribuição, podendo ser calculada pela fórmula G [(V3 C3) (V2 C2)] / t, onde V2 seria o volume de distribuição ao final da diálise, C2 seria a concentração plasmática ao final da diálise, V3 e C3 seriam o volume de distribuição e a concentração plasmática antes da diálise seguinte, respectivamente, e t seria o intervalo de tempo deste período interdialítico.161 Exemplo, um paciente de 40 anos de idade, 175 cm de altura, pesando 72 kg e com concentração plasmática de uréia de 50 mg/dl (500 mg/L) ao final de uma diálise, chega à diálise seguinte, 44 horas mais tarde, com 76 kg e concentração plasmática de 160 mg/dl (1.600 mg/L). Consideremos como volume de distribuição da uréia 58% do peso. Sua taxa de geração de uréia será G [(44 1.600) (42 500)] / 44, G 1.120 mg/h, que, convertido para nitrogênio uréico (dividir por 2,14), G 525 mg/h ou 12,6 g/dia. Conhecendo-se o percentual da proteína catabolizada que é convertida em nitrogênio uréico (cerca de 15,4%) e sabendo-se que aproximadamente 1,7 grama deste nitrogênio uréico gerado é eliminado diariamente pelas fezes, podemos, através de diversas fórmulas, estimar a taxa de aparecimento do nitrogênio protéico a partir da medida da uréia gerada. Borah et al.20 validaram uma fórmula para o cálculo do PNA, que se mostrou mais preciso quando corrigido pelo volume de distribuição da uréia e expresso em grama/kg de peso/dia, sendo denominado PNA normalizado (nPNA). Por essa fórmula, nPNA (g/kg/dia) (6,49 G 0,294 V) 0,58/V, onde G seria o nitrogênio uréico gerado (g/dia) e V seria o volume de distribuição da uréia (litros) calculada a partir da fórmula de Watson. No exemplo anterior, se 12,6 g/dia de nitrogênio uréico são gerados por um paciente com V estimado em 41,6 litros, então nPNA 1,31 g/kg/dia [(6,49 12,6 0,294 41,6) 0,58/41,6 1,31]. Usando o mesmo exemplo, porém empregando outra fórmula, de Cottini et al. 46 (nPNA (g/kg/dia) 5.420 G/V 0,17), onde G seria expresso em mg/min e V, estimado como 58% do peso corporal, em ml, teríamos: se 12,6 g/dia (8,74 mg/min) de
nitrogênio uréico são gerados por um paciente de 72 kg (V 41.760 ml), então nPNA 1,3 g/kg/dia (5.420 8,74/41.760 0,17 1,3). Nos pacientes que ainda têm função renal residual, parte da uréia gerada é eliminada pela urina, fazendo com que o real nAPN seja subestimado.272 Assim, eventualmente, a quantificação da uréia urinária pode ser solicitada, principalmente, quando um paciente apresenta nPNA e uréia média abaixo do esperado, de acordo com seu estado nutricional e o inquérito alimentar. O inconveniente da medida direta do nPNA é a necessidade de coleta de sangue em duas sessões consecutivas. Porém, o nPNA pode também ser estimado através de diversas fórmulas, baseadas na cinética de uréia numa única sessão.61,81,82 Dessas, a fórmula desenvolvida por Depner e Daugirdas61 mostrou ter uma estreita correlação com a medida direta do nPNA (com erro menor que 10%), sendo sugerida pelo DOQI.204 Por esta fórmula (Quadro 49.5), a nPNA é calculada a partir do spKt/V, do valor do nitrogênio uréico pré-HD do início da semana e do uso de constantes específicas para o dia da diálise, ou seja, se a primeira, segunda ou última sessão da semana. No Quadro 49.5, colocamos adicionalmente a fórmula de Daugirdas e Depner com as constantes modificadas para que o nPNA pudesse ser calculado utilizando diretamente a uréia préHD, que é nosso padrão laboratorial, em substituição ao nitrogênio uréico. Alternativamente, pode-se estimar o nPNA cruzando-se valores conhecidos do spKt/V e da uréia pré-HD, em gráficos desenvolvidos a partir dessas fórmulas (Figs. 49.7 e 49.8).
Fig. 49.7 Pode-se estimar o nPNA (ordenada) a partir de valores conhecidos do spKt/V (retas) e da uréia pré-HD (abscissa), quando esta avaliação for feita na primeira HD da semana. Este gráfico foi elaborado a partir da equação 3 descrita no Quadro 49.4, desenvolvida por Depner e Daugirdas, modificada para uréia em substituição ao nitrogênio uréico empregado na fórmula original.
893
capítulo 49
mente pelo natural vínculo matemático com o Kt/V (os dois parâmetros são determinados utilizando as mesmas variáveis), a relevância da medida do nPNA tem sido questionada. Outros parâmetros laboratoriais, como a creatinina ou a albumina sérica, parecem mais precisos no diagnóstico da desnutrição e na capacidade em antecipar desfechos clínicos.45,162
IMPLICAÇÕES CLÍNICAS DA ADEQUAÇÃO DE DIÁLISE
Fig. 49.8 Pode-se estimar o nPNA (ordenada) a partir de valores conhecidos do spKt/V (retas) e da uréia pré-HD (abscissa), quando esta avaliação for feita na segunda HD da semana. Este gráfico foi elaborado a partir da equação 3 descrita no Quadro 49.4, desenvolvida por Depner e Daugirdas, modificada para uréia em substituição ao nitrogênio uréico empregado na fórmula original.
Visando evitar a desnutrição, recomenda-se manter nPNA acima de 1,0 g/kg/dia.204 Como nPNA oscila muito no dia-a-dia, refletindo o perfil dietético recente, devese analisar o conjunto de várias medidas.142 Valores discrepantes isolados devem ser vistos com reserva. Especial-
Como mencionado, o primeiro estudo clínico prospectivo visando correlacionar parâmetros laboratoriais da hemodiálise com a evolução clínica dos pacientes foi o NCDS.161 Nesse estudo, uréia média mais baixa e taxa de catabolismo protéico mais alta antecipavam menor risco de hospitalização. Naturalmente, pacientes que têm uréia média mais baixa, apesar de uma maior taxa de geração, devem ter uma depuração de uréia mais efetiva. Na revisão desses dados, Gotch e Sargent 89 observaram um grande aumento no risco de mortalidade entre aqueles pacientes com Kt/V abaixo de 0,9. Posteriormente, em um estudo epidemiológico baseado em dados do United States Renal Data System, Held et al.107 encontraram uma redução de 7% no risco de mortalidade para cada 0,1 de aumento no Kt/V. O impacto do Kt/V sobre a mortalidade tem uma aparente curva em J, no entanto, pacientes de baixo peso, isto é, em piores condições clínicas, atingem mais facilmente Kt/V mais elevado, fazendo com que o impacto positivo do Kt/V sobre a mortalidade seja subestimado.38,303
Quadro 49.5 Cálculo do nPNA a partir dos valores do spKt/V e nitrogênio uréico (ou uréia) pré-HD considerando o dia da avaliação C0 nEPN
0,168 [a (b spKt/V) (c spKt/V)]
Primeira sessão da semana (2.ª ou 3.ª-feira) a: 36,3 a: 77,8
b: 5,48 b: 11,74
c: 53,5 c: 114,6
(Nitrogênio uréico) (Uréia)
Segunda sessão da semana (4.ª ou 5.ª-feira) a: 25,8 a: 55,3
b: 1,15 b: 2,46
c: 56,4 c: 120,9
(Nitrogênio uréico) (Uréia)
Terceira sessão da semana (6.ª ou sábado) a: 16,3 a: 34,9
b: 4,30 b: 9,21
c: 56,6 c: 121,3
(Nitrogênio uréico) (Uréia)
Fórmula desenvolvida por Depner e Daugirdas (Ref. 61). nPNA Equivalente protéico do nitrogênio gerado; C0 Nitrogênio uréico ou uréia pré-HD; spKt/V Kt/V unicompartimental; a, b e c são constantes a serem empregadas, de acordo com o dia da semana em que a avaliação é feita. As constantes encontradas na linha inferior para cada dia da sessão foram modificadas da fórmula original para se fazer o cálculo a partir da uréia.
894
Hemodiálise
Com base nos dados do NCDS, inicialmente foi recomendado um Kt/V mínimo de 1,0 (TRU 60%).89 No entanto, com base em estudos epidemiológicos posteriores, a diretriz da National Kidney Foundation, Dialysis Outcome Quality Initiatives (NKF/DOQI)204 estabeleceu uma TRU 65% (spKt/V 1,2 ou eKt/V 1,05) como a quantidade mínima de diálise a ser atingida. Para assegurar esta meta na maioria das sessões, foi recomendada a prescrição de uma TRU 70% (spKt/V 1,3). Deve-se ressaltar que a capacidade em se atingir uma TRU elevada é inversamente proporcional ao volume de distribuição da uréia. Pacientes de maior peso corporal, principalmente adultos do sexo masculino, têm grande dificuldade para atingir metas mais elevadas.151 Estes são valores mínimos a serem atingidos, não havendo ainda definição do Kt/V ideal. Um estudo prospectivo, o Hemodialysis Study Group (HEMO), está sendo conduzido pelo National Institute of Health (NIH)60 para se avaliar o impacto do Kt/V sobre a taxa de mortalidade em cinco anos. Os pacientes, ao iniciarem hemodiálise, foram randomizados para ter um eKt/V de cerca de 1,05 (TRU 65%) ou maior ou igual a 1,45 (TRU 75%). Resultados preliminares deste estudo, ainda não publicados (Comunicação antecipada pelo NIH), indicam não haver benefícios com a intensificação da diálise.
LIMITAÇÕES DO MÉTODO Os estudos epidemiológicos que estabelecem uma relação inversa entre Kt/V e mortalidade baseiam-se em dados anteriores ao paradigma atual de se buscar pelo menos um Kt/V mínimo. Assim, um Kt/V satisfatório pode, em parte, ser apenas um indicador de diálise adequada, em seu sentido mais amplo, com depuração de moléculas médias, de solutos preferencialmente intracelulares, como o fosfato, e maior redução do espaço extracelular. Estas variáveis são em parte dependentes do tempo de diálise.43,134,233 O real impacto de se atingir uma meta de Kt/V, através de estratégias que priorizem um aumento do K, muitas vezes em detrimento do t, sobre o risco de mortalidade ainda não foi bem estabelecido. Por exemplo, não se pode afirmar que são equivalentes a longo prazo, em termos de risco de mortalidade, um paciente submetido a três sessões semanais de HD, com duração de 4 horas e 30 minutos cada, passar a ser dialisado durante 3 horas, utilizando-se um dialisador de maior superfície e elevados fluxos de sangue e de banho, mesmo que seja mantido o mesmo Kt/V. Charra et al.35 têm a taxa de mortalidade mais baixa descrita na literatura. Esse grupo de Tassin, França, dialisa seus pacientes por 8 horas, 3 vezes por semana, utilizando dialisadores de baixo fluxo. Curiosamente, a prescrição de diálise continua a ser feita pela antiga fórmula do m2 hora. O Kt/V médio desses pacientes é de 1,67. Quase todos tornam-se normotensos, apresentam um excelente controle do fosfato sérico e têm uma baixa prevalência de anemia. A sobrevida desses pacientes após 10 e 20 anos de
hemodiálise era de 75% e 43%, respectivamente. Ainda não está definido se a busca de um Kt/V próximo a este, numa hemodiálise com duração mais curta, poderia propiciar semelhante aumento da sobrevida. Porém, dados preliminares, ainda não publicados, do HEMO sugerem que, numa diálise relativamente curta, haveria um limite para os benefícios clínicos do Kt/V de uréia (não houve diferença no risco de mortalidade entre os grupos de pacientes que receberam eKt/V de 1,05 ou 1,45, respectivamente). Assim, é plausível supor que a maior sobrevida observada em Tassin se deva ao impacto favorável do esquema de diálise adotado sobre outros parâmetros clínicos e laboratoriais, como a normalização da pressão, pela redução do volume extracelular, ou o controle da hiperfosfatemia, que são mais facilmente alcançados com diálises mais prolongadas ou freqüentes.35,226
PERSPECTIVAS O emprego da cinética de uréia como índice de adequação da retirada de solutos em diálise tem naturais limitações. Em primeiro lugar, porque qualquer conclusão extraída a partir dos índices derivados deste conceito é inerentemente restrita à retirada de moléculas de baixo peso molecular. Em segundo lugar, e talvez mais importante, os números utilizados no seu cálculo são derivados de análises bioquímicas realizadas em amostras do compartimento sanguíneo, portanto, intravascular, sendo extrapolado para o restante do corpo através de ilações matemáticas, na maioria das vezes ignorando as inevitáveis particularidades regionais de fluxo sanguíneo durante uma sessão de hemodiálise. Se o problema reside em saber o quê e quanto uma sessão de diálise retirou do corpo, ressalvadas as dificuldades técnicas, a melhor abordagem seria medir o que sai no banho de diálise. Nos últimos anos, esforços têm sido feitos no sentido do desenvolvimento de dispositivos para mensuração da extração de solutos on-line. Recentemente, foi criada a expectativa de que medidas da condutividade da solução de diálise antes e após o filtro de diálise possam vir a ser úteis neste particular.86,158
Pontos-chave: • Kt/V corresponde a quanto do volume de distribuição da uréia foi depurado • Existe estreita correlação entre Kt/V e risco de mortalidade • Diálise com eKt/V reduzido ( 1,2) não pode ser considerada adequada
REÚSO DOS DIALISADORES O reúso de dialisadores é um procedimento amplamente utilizado e respaldado pela legislação vigente.189 Seu
capítulo 49
principal objetivo tem sido a redução de custos da hemodiálise.282 Quando, na hemodiálise, se utilizavam largamente dialisadores com membranas de celulose não-modificada, essa prática pressupunha oferecer uma vantagem: o aumento da biocompatibilidade das membranas.67 Desde os primórdios da utilização de dialisadores com fibras ocas de cuprofano há mais de duas décadas, já foram descritos os efeitos adversos da interação sangue-membrana, tais como ativação de complemento, neutropenia transitória, reações anafilactóides, precordialgia e hipoxemia durante o procedimento da diálise.57,117 Tais alterações são habitualmente mais graves e freqüentes com as membranas de celulose, principalmente no seu primeiro uso, tendendo a atenuar-se nos usos subseqüentes.34,67 Por esse motivo, a ocorrência de tais eventos foi denominada “síndrome do primeiro uso”. O mecanismo pelo qual essas membranas reusadas desencadeiam menos reações adversas do que as novas parece depender da exposição da membrana ao sangue, o que estaria associado à deposição de uma camada constituída de proteínas, como fibrina e imunocomplexos, na parede interna da membrana, tornando-a mais biocompatível.200,216 Com a utilização cada vez menor de dialisadores de celulose regenerada a partir da chegada ao mercado de dialisadores com membranas mais biocompatíveis, à base de celulose modificada ou de polímeros sintéticos, argumentos em favor do benefício clínico do reúso perderam seu significado, uma vez que não há qualquer evidência de aumento da biocompatibilidade propiciado pelo reprocessamento dessas membranas.40,224 Hoje, a continuidade da prática de reúso dos dialisadores só se justifica por razões econômicas, visto que o tratamento dialítico crônico é bastante oneroso, sendo o reúso uma estratégia válida para redução de custos, mesmo em vários países desenvolvidos.264 Enquanto o reúso é praticado na imensa maioria dos centros de diálise nos Estados Unidos,72 ele é adotado por cerca de 10% dos centros europeus, variando essa taxa entre os diversos países, sendo que em vários deles, à semelhança do que ocorre no Japão, o reúso também não é permitido.170 Contra o reúso, os principais argumentos seriam de que aumentaria as chances de contaminação bacteriana e de transmissão de doenças virais, levaria à exposição dos pacientes e funcionários ao germicida e reduziria a eficiência da diálise.87,212,242,248,274 Para o reprocessamento dos dialisadores, normas e parâmetros de segurança desenvolvidos pela AAMI (Association for the Advancement of Medical Instrumentation) devem ser seguidos.9 As diretrizes da National Kidney Foundation — Dialysis Outcomes Quality Initiative (DOQI) endossam todas as orientações da AAMI e, além disso, recomendam que o priming (volume do compartimento interno) de cada dialisador seja medido antes de seu primeiro uso.203 A legislação brasileira que estabelece as
895
normas para a prática do reúso se enquadra, com poucas exceções, nas normas da AAMI. Ao contrário da recomendação da AAMI, a nossa legislação é clara na definição de um número máximo de usos por dialisador, que foi, aleatoriamente, estabelecido em 12 vezes para reúso manual e 20 vezes se automatizado.189 Os dialisadores podem ser reprocessados de forma automatizada, em aparelhos desenvolvidos exclusivamente para esse fim. Estes reprocessadores são dotados de sensores para medir o priming e detectar ruptura na membrana. O reúso pode também ser feito manualmente, executando passo a passo cada etapa do procedimento.251 Alguns estudos epidemiológicos têm apontado menor morbidade com o reúso automatizado em relação ao manual.76,108 O reúso no Brasil ainda é largamente executado de forma manual, porém, o reúso automatizado vem se popularizando nos últimos anos. Como no Brasil as linhas são habitualmente reprocessadas, essa parte do procedimento deve ser feita manualmente. O reprocessamento manual dos dialisadores consiste basicamente na lavagem do compartimento interno das fibras com solução salina no ato de encerramento da sessão de diálise, quando o sangue em circulação extracorpórea é devolvido ao paciente. O dialisador é enviado à sala de reúso imediatamente após o término da hemodiálise, onde é submetido a lavagem com água pós-tratamento. Essa lavagem tem por finalidade a remoção de resíduos de sangue no interior das fibras. Inicialmente lava-se o compartimento interno das fibras e, posteriormente, o compartimento do dialisado, submetendo as membranas a uma ultrafiltração reversa por alguns minutos. A seguir, o priming é aferido. O dialisador deve ser desprezado se o priming ficar abaixo de 80% de seu volume inicial, tendo como referência a medida individualizada de cada dialisador antes do primeiro uso.203 Procede-se então à sua esterilização através do preenchimento de seu volume interno com germicida líquido, sendo mantido assim até o próximo uso. Cada dialisador é identificado com o nome do paciente gravado com tinta não-removível e armazenado isoladamente. Imediatamente antes do uso seguinte, já com o dialisador acoplado à máquina, o interior das fibras é lavado exaustivamente com solução salina (simultaneamente à lavagem do compartimento externo com água pós-tratamento), até não haver mais vestígios do germicida, ficando finalmente em condições de ser usado novamente. Dialisador e linhas reusados devem ser minuciosamente inspecionados antes de serem levados ao paciente e desprezados se houver alguma anormalidade estética. Deve-se também certificar se o nome gravado no dialisador corresponde ao respectivo paciente. O reúso dos dialisadores com formaldeído, que era o germicida mais utilizado até a década de 80, foi perdendo espaço para a mistura de ácido acético, ácido peracético e peróxido de hidrogênio (AC/AP/H2O2), que é o germicida mais empregado atualmente.72 Uma das desvantagens
896
Hemodiálise
do reúso com formaldeído seria o risco da exposição ambiental dos profissionais e pacientes. O formaldeído, além de causar manifestações agudas decorrentes do contato com a pele e mucosas ou da inalação de seu vapor, é potencialmente carcinogênico. Ainda não são conhecidos seus efeitos sobre os pacientes em hemodiálise, onde o contato pode dar-se por via parenteral. O formaldeído é apontado como causa de anemia hemolítica, por induzir a formação de anticorpos anti-Nform.199 O tempo mínimo de exposição do dialisador ao formaldeído a 4%, em temperatura ambiente, para assegurar esterilização é de 24 horas. Seu emprego em concentrações inferiores a 4% está associado ao risco de desenvolvimento de micobactérias atípicas.118 O AC/AP/H2O2 é um produto estável e de fácil manipulação. O tempo mínimo de exposição recomendada para garantir esterilização é de 8 horas.9 Com esse germicida, as reduções do priming e do Kt/V de uréia são modestas, mesmo após múltiplos reúsos, e o aspecto estético do dialisador é preservado.83,212 Porém, dados obtidos em âmbito nacional nos EUA, relativos ao ano de 1989, mostraram que o reúso com este germicida estava associado a um aumento no risco relativo de mortalidade de 13%.108 Em outro estudo epidemiológico mais recente, o reúso não foi associado a um aumento da mortalidade.44 Deve-se considerar, entretanto, que os pacientes submetidos ao uso único são geralmente dialisados com dialisadores de menores fluxo e superfície do que aqueles cujos dialisadores são reusados.206 Este viés poderia estar subestimando um impacto negativo do reúso. O hipoclorito de sódio é muitas vezes usado em associação com os outros germicidas, principalmente com o formaldeído, por propiciar a remoção de coágulos ou da camada protéica formada na superfície das membranas. Essa prática, se por um lado preserva o priming e a capacidade de remoção de toxinas pelo dialisador, por outro pode comprometer a integridade da membrana.131 O tempo de exposição dos dialisadores ao hipoclorito de sódio não deve exceder 5 minutos, para evitar danos à membrana. Outros germicidas menos utilizados são o glutaraldeído e o calor através da lavagem do dialisador com água a 100°C ou solução de ácido cítrico a 95°C por um período de 20 horas.155 O reprocessamento feito com ácido cítrico tem-se mostrado promissor, preservando as propriedades das membranas. Entretanto, por ter um custo mais elevado que outras formas de reúso, sua adoção em larga escala torna-se pouco provável, justamente por se contrapor à principal justificativa do reúso na atualidade, que é reduzir custos da diálise. O reúso, quando efetuado rigorosamente dentro de normas preestabelecidas, oferece segurança contra contaminação bacteriana, porém, esporadicamente são descritos surtos de bacteremia e/ou reações pirogênicas relacionados a esse procedimento.87,120,242 Pacientes em uso de dialisadores de alto fluxo estariam mais propensos à ocorrência de reações pirogênicas, devido à passagem re-
trógrada de endotoxinas da solução de diálise para o sangue.274 Finalmente, a qualidade da água na sala de reúso (utilizada para o reprocessamento do dialisador e diluição do germicida) é fundamental para minimizar o risco de bacteremia e/ou pirogenia.87 Na maioria dos casos descritos de surto de bacteremia, a causa foi atribuída à qualidade da água ou à concentração inadequada do germicida. Outro ponto controverso do reúso seria o risco de transmissão de doenças virais entre pacientes, principalmente da hepatite C. A incidência de hepatite C é menor nas unidades que não reúsam seus dialisadores ou naquelas que adotaram o reúso separado dos pacientes soropositivos.248 O CDC (Center for Disease Control, Atlanta, EUA) não obriga uso único ou mesmo reúso separado de dialisadores dos pacientes com sorologias positivas para HCV ou HIV, desde que respeitados princípios universais de assepsia. Recomenda, entretanto, não reusar dialisadores de pacientes com sorologia positiva para hepatite B devido à sua alta infectividade. Pela legislação brasileira, não é permitido o reúso dos pacientes portadores do HIV, enquanto pacientes portadores de hepatites C ou B podem ter seus dialisadores reprocessados, desde que isso seja feito em salas de reúso específicas.189 No que concerne à capacidade de troca das membranas, as alterações relacionadas ao reúso mais freqüentemente descritas são a redução do Kt/V de uréia, a diminuição da depuração de -2 microglobulina e a perda de proteína para o dialisado. O reúso é apontado como fator isolado para redução do Kt/V de uréia e essa possibilidade de redução seria diretamente proporcional ao número de reúsos por dialisador, mas também dependeria do germicida empregado e da forma de reúso.260 Além disso, o reúso manual prolongado dos dialisadores com membranas de baixo fluxo pode levar a significativa queda da filtração de moléculas médias. Como exemplo, foi demonstrado que após 12 reúsos com AC/AP/H2O2, as membranas de polissulfona de baixo fluxo haviam se tornado praticamente impermeáveis à vitamina B12 (1.355 D).176 O reprocessamento das membranas de alto fluxo com AC/AP/H2O2 que parece não reduzir de forma significativa o Kt/V, mesmo após múltiplos reúsos, leva, entretanto, à queda da depuração de -2 microglobulina.39,156,212 O reúso dos dialisadores com membranas de alto fluxo, quando feito com hipoclorito de sódio, ao contrário do reúso com AC/AP/H2O2, não altera, ou mesmo aumenta, a depuração de -2 microglobulina após usos sucessivos. Contudo, devido ao seu potente efeito corrosivo, o hipoclorito de sódio seria capaz de promover alterações na estrutura das membranas, que facilitariam a ultrafiltração reversa de toxinas bacterianas do dialisado, propiciando a ocorrência de reações pirogênicas e aumento da perda de aminoácidos e proteínas para o dialisado, que pode chegar a mais de 20 gramas por sessão de diálise.114,131,274
capítulo 49
Resultados do estudo multicêntrico HEMO, conduzido pelo NIH desde 1995, são esperados ainda para este ano, onde, entre outros parâmetros, está sendo avaliado o impacto do reúso de diversos tipos de dialisadores, com vários germicidas, sobre a mortalidade e a morbidade.39 Espera-se que, a partir dos dados deste estudo, as reais implicações clínicas do reúso sejam conhecidas.
Pontos-chave: • A prática do reúso dá-se por razões econômicas • Esta prática viabiliza o uso de dialisadores de maiores eficiência e biocompatibilidade
INTERCORRÊNCIAS DURANTE AS SESSÕES DE DIÁLISE As sessões de hemodiálise podem ser acompanhadas de diversos tipos de intercorrências clínicas. Algumas que estão diretamente relacionadas com o processo dialítico serão aqui discutidas.
Complicações Relacionadas à “Fisiologia” da Diálise: Desequilíbrio, Hipotensão e Cãibras Sua gênese está ligada a um trinômio que envolve por um lado os objetivos maiores de uma sessão de hemodiálise (retirada de solutos urêmicos, água e eletrólitos), por outro, a individualidade da resposta do paciente a essas modificações, e, por último, um cortejo conhecido de fatores que podem influenciar a resposta do paciente. A retirada de solutos por difusão durante uma sessão de hemodiálise tende a reduzir a osmolalidade plasmática.266 A magnitude desta redução é diretamente proporcional à concentração das escórias ao início da sessão e à eficiência da diálise, sendo inversamente proporcional à concentração de Na no banho de diálise. Reduções significativas da osmolalidade podem ser acompanhadas de uma transferência intercompartimental de fluido determinada por gradiente osmolar que é mal adaptativa: a água movese do intravascular para o intersticial e intracelular. Como resultado, pode haver redução da volemia e manifestações de edema cerebral, como, por exemplo, cefaléia e náuseas, além de, nos casos mais graves, hipertensão, convulsões e coma. A forma mais grave dessa complicação é conhecida como síndrome do desequilíbrio da diálise ou síndrome inversa, podendo ocorrer durante a sessão ou após a mesma.7 Seu diagnóstico diferencial inclui afecções neurológicas primárias, como acidentes vasculares e hematomas
897
intracranianos, que podem ocorrer durante as sessões de diálise, e mesmo epilepsia. A prevenção do desequilíbrio em diálise requer a adoção de uma estratégia de retirada mais lenta de solutos e emprego de uma concentração de Na no banho de diálise de 138-140 mEq/L ou superior.229 Em pacientes de maior risco, podem ser empregadas outras soluções hiperosmolares como manitol ou glicose,238 raramente justificáveis no presente. Alterações no pH intracelular também foram implicadas, porém de forma menos consistente, na gênese desta condição.7 A retirada de água e sal, como discutida em sessões anteriores, é basicamente realizada através de ultrafiltração (convecção). O cálculo da quantidade a ser retirada em uma sessão baseia-se em uma medida pouco precisa, o peso seco.* A falta de dados objetivos para definir tal parâmetro estimulou o aparecimento de alternativas mais concretas para sua determinação, como, por exemplo, a aplicação de métodos de bioimpedância,133 medida do diâmetro de grandes leitos venosos como a cava e as veias supra-hepáticas através de ultra-sonografia135,149 e dosagens séricas de fator atrial natriurético e cGMP.148,305 A adoção de tais práticas, entretanto, ainda não é rotineira e tem resultado questionável. Se o peso seco de um paciente for superestimado (o peso ideal do paciente é maior do que a estimativa da equipe de saúde), haverá hipotensão por retirada excessiva de fluidos corporais. A retirada de água e eletrólitos do intravascular (mas não proteínas) por ultrafiltração resulta em redução da pressão hidráulica e elevação da pressão oncótica deste compartimento. Como resultado, há movimento de fluido do intracelular e intersticial para o intravascular, em um processo de reenchimento do intravascular. Se a velocidade de retirada é mais rápida do que a de reenchimento, pode haver redução crítica da volemia e hipotensão arterial em um contexto em que o “peso seco” do paciente ainda não foi alcançado. Os valores máximos do ritmo de reenchimento vascular descrito para processos de ultrafiltração isolada (1,5 L/h) não são alcançados em hemodiálise regular.241 A adaptação à diminuição da volemia envolve modificações hemodinâmicas que são dependentes do sistema nervoso autônomo, especialmente do ramo simpático, e que compreendem, pelo menos, ajuste da complacência venosa, modificações do débito cardíaco e vasoconstrição periférica. Pacientes portadores de doença cardiovascular (restrição sistólica ou diastólica)232 e neuropatia autonômica (condição ainda freqüente em hemodialisados)166 são potencialmente mais predispostos à hipotensão. Uma maior produção de óxido nítrico durante a diálise também parece predispor ao aparecimento de hipotensão.130 Pacientes em hemodiálise freqüentemente necessitam de anti-hipertensivos. Muitas das drogas empregadas po-
*Pode ser conceituado como o menor peso em que o paciente em hemodiálise encontra-se livre de edema, sente-se bem e não tem hipotensão.
898
Hemodiálise
dem perturbar a adaptação à retirada de volume e predispor à hipotensão. Além disso, a padronização da temperatura do banho de diálise em 37°C pode associar-se a vasodilatação e predispor à hipotensão, especialmente em alguns subgrupos de pacientes, cuja temperatura corporal é baixa.78 Outros fatores que podem influenciar o aparecimento de hipotensão incluem: refeição durante o procedimento12 e os níveis de cálcio1,259 na solução de troca. Com tantas variáveis envolvidas com seu aparecimento, não chega a surpreender que a incidência de hipotensão sintomática chegue a alcançar 15 a 50% das sessões de diálise.210 O tratamento da hipotensão em diálise envolve duas situações: 1. o tratamento de um episódio hipotensivo e 2. a prevenção de hipotensão recorrente em pacientes predispostos a esta complicação. Excluídas outras possibilidades associadas a hipotensão durante hemodiálise, tais como sepse, infarto agudo do miocárdio ou tamponamento pericárdico, o tratamento do episódio hipotensivo, na maioria das vezes, é simples e direto. As medidas consistem em colocar o paciente na posição de Trendelenburg, interromper a ultrafiltração e administrar salina isotônica, inicialmente, 200 ml. Alternativamente, especialmente quando se julga que a hipotensão ocorreu antes de alcançado o peso seco, pode-se empregar salina hipertônica, em geral NaCl a 20%, 10 ml. Casos mais graves podem necessitar de expansores volêmicos mais efetivos69,292 ou encerramento da sessão. A ocorrência de hipotensão não deve ser negligenciada e uma política de sua redução ao mínimo deve ser adotada. Para isto, recomenda-se: 1. reavaliar freqüentemente o peso seco; 2. desencorajar grandes ganhos ponderais interdialíticos; 3. reduzir o uso de anti-hipertensivos imediatamente antes da sessão, quando possível; 4. evitar refeições durante a sessão; 5. não hesitar em prolongar a duração da sessão quando necessário, e 6. aumentar o número de sessões por semana. Casos com hipotensão recorrente podem ainda ser manuseados com estratégias outras, como, por exemplo: 1. elevação do sódio do banho; 2. redução da temperatura do banho; 3. modulação do sódio ao longo da sessão de diálise; 4. emprego de tratamento seqüencial (ultrafiltração isolada precedendo a diálise com ultrafiltração), e 5. uso de midodrina. Um estudo recente que avaliou prospectivamente as alternativas não-farmacológicas elegeu a modulação do sódio do banho ([Na] em 152 mEq/L reduzido para 140 mEq/L na última meia hora da sessão) ou o resfriamento do banho (35,5°C) como as mais eficazes. O uso de sódio elevado no banho (144 mE/L) ficaria como segunda opção, principalmente porque se associa a um aumento de ganho ponderal interdialítico e hipertensão. Seus resultados com o tratamento seqüencial não encorajam seu emprego com tal finalidade. Em pacientes dialisados com [Ca] baixo (2,0-2,5 mEq/L), melhora tem sido relatada com sua elevação.1 Midodrina, uma ca-
tecolamina absorvida pela via oral (10 mg 15-30 min antes da sessão), mostrou-se eficaz em diversos estudos.49,112,192,223 As cãibras em hemodiálise têm uma fisiopatologia semelhante à hipotensão na medida em que parecem decorrer, principalmente, de hipoperfusão da musculatura. Os episódios de cãibras podem ser tratados com estiramento passivo da musculatura afetada e soluções hiperosmolares de glicose a 50% (50 ml), NaCl a 20% (10 ml) ou manitol a 25% (100 ml).29 Quando em associação com hipotensão, a melhor opção pode ser salina isotônica, que é benéfica às duas condições. Cãibras recorrentes ou que ocorrem fora da sessão de diálise, uma vez excluído que o paciente se encontre abaixo do peso seco, podem ser manuseadas com quinina 129 ou vitamina E.235
Ponto-chave: • Complicações ligadas à “fisiologia da diálise” podem ser evitadas por uma diálise mais lenta e uso de solução de troca com sódio em 138-140 mEq/L
Reações a Materiais Componentes do Processo Dialítico Uma gama variada de sinais e sintomas que incluem mal-estar, rubor, prurido, cefaléia, náuseas, vômitos, dor lombar ou torácica, tosse, sibilos, dispnéia, elevação ou redução da pressão arterial e, mesmo, parada cardiorrespiratória pode acometer pacientes ao início da sessão de diálise. O quadro clínico pode decorrer da ação tóxica direta de algum produto ou da ativação de mediadores plasmáticos em resposta a contato com substâncias estranhas. Se o quadro inicia-se imediatamente após o início da sessão e não se reveste de uma gravidade maior, especialmente se há sintomas no local da punção do acesso vascular, a maior possibilidade, apesar de freqüentemente refutada pela equipe de saúde, é de que o desinfetante utilizado no reprocessamento dos dialisadores (formaldeído, ácido peracético etc.) não tenha sido adequadamente removido. Neste caso, a melhor conduta é a interrupção da sessão, procedendo-se à limpeza adicional do dialisador com banho de diálise para que seja concluída a remoção do desinfetante enquanto se mantém o sangue circulando em alça fechada. Também precoce, porém potencialmente mais grave, é a reação anafilática que pode ocorrer com o uso de um dialisador novo no qual tenha sido empregado óxido de etileno para sua esterilização no seu processo de produção. A fisiopatologia deste quadro, mediado por IgE e acompanhado por eosinofilia, parece depender de exposições prévias e formação de antígenos novos pela modificação da molécula de albumina pelo óxido de etileno, sendo mais
capítulo 49
comum em pacientes com história de fenômenos alérgicos.91,174 Testes cutâneos que permitem seu diagnóstico foram desenvolvidos.92 A gravidade do quadro é variável mas seu tratamento envolve interrupção da diálise sem devolução do sangue do circuito extracorpóreo e uso de adrenalina, anti-histamínicos, esteróides e oxigênio, sendo, alguns casos, melhor manuseados em unidades de terapia intensiva. Sua profilaxia pode ser feita pela remoção do óxido de etileno dos dialisadores novos através de perfusão com salina e banho de diálise antes do seu uso ou pelo emprego de dialisadores esterilizados por irradiação gama. Quadros anafilactóides também têm sido relatados em pacientes que utilizam inibidores da enzima de conversão da angiotensina por ocasião do uso de dialisadores com membrana de poliacrilonitrila. O quadro clínico é semelhante ao anterior mas sua fisiopatologia parece envolver grandes elevações nos níveis séricos de bradicinina propiciados pela combinação de dois elementos: 1. estímulo à sua produção pela membrana de poliacrilonitrila e 2. redução de sua metabolização decorrente da inibição da cininase II pelos inibidores da enzima de conversão da angiotensina.126,309 O reúso parece contribuir para esse quadro.222 Pacientes dialisados com menores concentrações de cálcio no banho também parecem mais suscetíveis.291 Casos semelhantes, porém menos freqüentes, têm sido relatados com outras membranas.222 Alguns pacientes dialisados com membrana de celulose apresentam mal-estar, precordialgia, dispnéia, sibilos e hipotensão que podem iniciar-se nos primeiros minutos de diálise. Trata-se de um quadro geralmente benigno que, com freqüência, melhora com o decorrer da sessão após uso de anti-histamínicos e antipiréticos e que ocorre, principalmente, no primeiro uso do dialisador, razão pela qual foi denominada “síndrome do primeiro uso”.47,97 Sua fisiopatologia está ligada à ativação da via alternada do complemento por essas membranas, que são ricas em hidroxilas. Como conseqüência, há ativação de leucócitos e leucopenia decorrente de seu seqüestro no pulmão, o que pode ser acompanhado de hipóxia. O reúso, quando não emprega hipoclorito de sódio (que retira o filme protéico que se deposita na membrana após seu uso), previne essa reação.
Outras Complicações As sessões de diálise podem associar-se a diversas outras complicações que incluem, por exemplo, hemorragias, trombose, desordens osmolares e arritmias. Serão abordados de forma um pouco mais detalhada apenas o “choque pirogênico”, a embolia gasosa e a hemólise. Febre, calafrios, precordialgia, dispnéia e hipotensão em diálise podem ser precipitadas por bactérias ou produtos bacterianos cuja origem pode estar na água, no reúso, ou mesmo nas soluções de infusão venosa. Ge-
899
ralmente, o tratamento oferecido consiste em antipiréticos e, após coletas de amostras para hemoculturas, antibióticos. A embolia gasosa pode decorrer de uma falha no equipamento ou humana. Era mais freqüente quando se empregavam máquinas mais antigas, sem o dispositivo detector de bolhas, um instrumento valioso para a segurança dos pacientes. No presente, essa complicação só ocorre quando, por qualquer razão, o detector de bolhas encontra-se desativado (especialmente durante a devolução do sangue do circuito extracorpóreo ao fim da sessão) ou durante a manipulação de cateteres venosos profundos.295 Neste segundo caso, o evento é facilmente prevenido pelo clampeamento regular antes da abertura do cateter ou através da adoção de táticas que assegurem pressão venosa positiva no cateter por ocasião de sua abertura, como, por exemplo, colocação do paciente em posição de Trendelenburg ou solicitação ao paciente que execute uma manobra de Valsalva. A hemólise durante a hemodiálise pode decorrer de superaquecimento do banho de diálise,17 distúrbios osmolares, problemas mecânicos e, ainda, da presença de compostos na água utilizada para diálise. Os distúrbios osmolares eram mais freqüentes quando as soluções de troca eram preparadas manualmente e as máquinas não eram dotadas de medidor de condutividade on line. A hemólise mecânica, quase sempre, é ocasionada por estrangulamentos ou dobras nas linhas de sangue não raramente adquiridos durante a estocagem das mesmas após o reúso276 ou por linhas de má qualidade.66 Entre os contaminantes da água que foram associados à hemólise encontram-se as cloraminas,138 o cobre 171,197 e nitratos.31 Além dos problemas relacionados ao evento hemolítico agudo (mal-estar, dor precordial, dispnéia, hipotensão etc.), complicações como pancreatite aguda foram relatadas a médio prazo, após a resolução inicial do quadro.119 Finalmente, o uso de formaldeído foi associado a uma forma de anemia hemolítica auto-imune.128
Pontos-chave: Estratégia para minimizar hipotensão em hemodiálise • Máquinas com controle de ultrafiltração • Reavaliação freqüente de peso seco • Desencorajar grandes ganhos ponderais interdialíticos • Aumentar o tempo de diálise nos casos necessários • Evitar drogas anti-hipertensivas imediatamente antes das sessões • Abolir refeições durante a sessão
900
Hemodiálise
Agradecimento: Os autores agradecem a Julia Viana Lugon, responsável pelas ilustrações deste capítulo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ALAPPAN, R.; CRUZ, D.; ABU-ALFA, A.K.; MAHNENSMITH, R.; PERAZELLA, M.A. Treatment of severe intradialytic hypotension with the addition of high dialysate calcium concentration to midodrine and/or cool dialysate. Am J Kidney Dis, 37:294-9, 2001. 2. ALBERS, F. Clinical considerations in hemodialysis access infection. Adv Ren Replace Ther, 3:208-17, 1996. 3. ALFREY, A.C. Aluminum intoxication. N Engl J Med, 310:1113-4, 1984. 4. ALLON, M.; ORNT, D.B.; SCHWAB, S.J.; RASMUSSEN, C.; DELMEZ, J.A.; GREENE, T.; KUSEK, J.W.; MARTIN, A.A.; MINDA, S. for the Hemodialysis (HEMO) Study Group. Factors associated with the prevalence of arteriovenous fistulas in hemodialysis patients in the HEMO Study. Kidney Int, 58:2178-85, 2000. 5. APARICIO, M.; CANO, N.; CHAUVEAU, P.; AZAR, R.; CANAUD, B.; FLORY, A.; LAVILLE, M.; LEVERVE, X. Nutritional status of haemodialysis patients: a French national cooperative study. French Study Group for Nutrition in Dialysis. Nephrol Dial Transplant, 14:1679-86, 1999. 6. ARBAB-ZADEH, A.; MEHTA, R.L.; ZIEGLER, T.W.; OGLEVIE, S.B.; MULLANEY, S.; MAHMUD, E.; DEMARIA, N.A.; BHARGAVA,V. Hemodialysis access assessment with intravascular ultrasound. Am J Kidney Dis, 39:813-23, 2002. 7. ARIEFF, A.I. Dialysis disequilibrium syndrome: current concepts on pathogenesis and prevention [editorial]. Kidney Int, 45:629-35,1994. 8. ASLAM, N.; PALEVSKY, P.M. Real-time ultrasound for placement of dialysis catheter: A new standard of care. Semin Dial, 12:1-4, 1999. 9. Association for the Advancement of Medical Instrumentation: AAMI Standards and Recommended Practices. Volume 3: Dialysis 1-332, 1993. American National Standards Institute, Arlington, EUA. 10. BABB, A.L.; STRAND, M.J.; UVELLI, D.A.; MILUTINOVIC, J.; SCRIBNER, B.H. Quantitative description of dialysis treatment: a dialysis index. Kidney Int, 7(Suppl):23-9, 1975. 11. BALDWIN, J.J.; EDWARDS, J.E. Uremic pericarditis as a cause of cardiac tamponade. Circulation, 53:896-901, 1976. 12. BARAKAT, M.M.; NAWAB, Z.M.; YU, A.W.; LAU, A.H.; ING, T.S.; DAUGIRDAS, J.T. Hemodynamic effects of intradialytic food ingestion and the effects of caffeine. J Am Soc Nephrol, 3:1813-18, 1993. 13. BARRETT ,B.J.; PARFREY, P.S.; MORGAN, J.; BARRE, P.; FINE, A.; GOLDSTEIN, M.B.; HANDA, S.P.; JINDAL, K.K.; KJELLSTRAND, C.M.; LEVIN, A.; MANDIN, H.; MUIRHEAD, N.; RICHARDSON, R.M. Prediction of early death in end-stage renal disease patients starting dialysis. Am J Kidney Dis, 29:214-22, 1997. 14. BEATHARD, G.A.; SETTLE, S.M, Shields MW. Salvage of the nonfunctioning arteriovenous fistula. Am J Kidney Dis, 33:910-6, 1999. 15. BEATHARD, G.A. Catheter thrombosis. Semin Dial, 14: 441-5, 2001. 16. BEATHARD, G.A. Management of bacteremia associated with tunneled-cuffed hemodialysis catheter. J Am Soc Nephrol, 10:1045-9, 1999. 17. BERKES, S.L.; KAHN, I.S.; CHAZEN, J.A.; GARELLA, S. Prolonged hemolysis from overheated dialysate. Ann Intern Med, 83:363-4, 1975. 18. BHATLA, B.; MOORE, H.L.; NOLPH, K.D. Modification of creatinine clearance by estimation of residual urinary creatinine and urea clearance in CAPD patients. Adv Perit Dial, 11:101-5, 1995. 19. BLEYER, A.J.; RUSSELL, G.B.; SATKO, S.G. Sudden and cardiac death rates in hemodialysis patients. Kidney Int, 55:1553-9, 1999. 20. BORAH, M.F.; SCHOENFELD, P.Y.; GOTCH, F.A.; SARGENT, J.A.; WOLFSEN, M.; HUMPHREYS, M.H.; BORAH M.F., SCHOENFELD P.Y., GOTCH F.A., SARGENT J.A., WOLFSEN M., HUMPHREYS M.H. Nitrogen balance during intermittent dialysis therapy of uremia. Kidney Int, Nov 14:491-500, 1978.
21. BOUFFARD, Y.; TISSOT, S.; DELAFOSSE, B.; VIALE, J.P.; ANNAT, G. BERTRAND, O.; MOTIN, J. Metabolic effects of hemodialysis with and without glucose in the dialysate. Kidney Int, 43:1086-90, 1993. 22. BOUR, E.S.; WEAVER, A.S.; YANG, H.C.; GIFFORD, R.R.M. Experience with the double lumen Silastic catheter for hemoaccess. Surg Gynecol Obstet, 171:33-39, 1990. 23. BRESCIA, M.J.; CIMINO, J.E.; APPEL, K.; HURWICH, B.J. Chronic hemodialysis using venipuncture and a surgical created arteriovenous fistula. N Engl J Med, 275:1089-92, 1966. 24. BUONCRISTIANIM, U.; QUINTALIANI, G.; COZZARI, M.; GIOMBINI, L.; RAGAIOLO, M. Daily dialysis: Long-term clinical metabolic results. Kidney Int, 33 (Suppl):137-40, 1988. 25. BUONCRISTIANI, U. Fifteen years of clinical experience with daily haemodialysis. Nephrol Dial Transplant, 13:148-51, 1998. 26. BUTTERLY, D.W.; SCHWAB, S.J. Dialysis access infections. Curr Opin Nephrol Hypertens, 9:631-5, 2000. 27. Canada-USA (CANUSA) Peritoneal Dialysis Study Group. Adequacy of dialysis and nutrition in continuous peritoneal dialysis: association with clinical outcomes. J Am Soc Nephrol, 7:198-207, 1996. 28. CANAUD, B.; MY, H.; MORENA, M.; LAMY-LACAVALERIE, B.; LERAY-MORAGUES, H.; BOSC, J.-Y.; FLAVIER, J.-L.; CHOMEL, P.Y.; POLASCHEGG, H.D.; PROSL, F.R.; MEGERMAN, J. Dialock: a new vascular access: device for extracorporeal renal replacement therapy. Preliminary clinical results. Nephrol Dial Transplant ,14:69298, 1999. 29. CANZANELLO, V.J.; HYLANDER-ROSSNER, B.; SANDS, R.E.; MORGAN, T.M.; JORDAN, J.; BURKART, J.M. Comparison of 50% dextrose water, 25% mannitol, and 23.5% saline for the treatment of hemodialysis-associated muscle cramps. ASAIO J, 37:649, 1991. 30. CARDOSO, M.; VINAY, P.; VINET, B.; LEVEILLEE, M.; PRUD’ HOMME, M.; TEJEDOR, A.; COURTEAU, M.; GOUGOUX, A.; STLOUIS, G.; LAPIERRE, L. Hypoxemia during hemodialysis: a critical review of the facts. Am J Kidney Dis, 11:281-97, 1988. 31. CARLSON, D.J.; SHAPIRO, F.L. Methemoglobinemia from well water nitrates: A complication of home dialysis. Ann Intern Med, 73:757-9, 1970. 32. CASATI, S.; MOIA, M.; GRAZIANI, G.; CANTALUPPI, A.; CITTERIO, A.; MANNUCCI, P.M.; PONTICELLI, C. Hemodialysis without anticoagulants: efficiency and hemostatic aspects. Clin Nephrol, 21:102-5, 1984. 33. CHANDLER, N.M.; MISTRY, B.M.; GARVIN, P.J. Surgical bypass for subclavian vein occlusion in hemodialysis patients. J Am Coll Surg, 194:416-21, 2002. 34. CHAROENPANICH, R.; POLLAK, V.E.; KANT, K.S.; ROBSON, M.D.; CATHEY, M. Effect of first and subsequent use of hemodialyzers on patient well-being: the rise and fall of a syndrome associated with new dialyzer use. Artif Organs, 11:123-127, 1987. 35. CHARRA, B.; CALEMARD, E.; RUFFET, M.; CHAZOT, C.; TERRAT, J.C.; VANEL, T.; LAURENT, G. Survival as an index of adequacy of dialysis. Kidney Int, 41:1286-91, 1992. 36. CHARRA, B.; HUROT, J.M.; CHAZOT, C.; VOVAN, C.; JEAN, G.; TERRAT, J.C.; VANEL, T.; RUFFET, M.; LAURENT, G. Comparison of survival data. Kidney Int, 58:901-2, 2000. 37. CHAWLA, L.S.; CHEGINI, S.; THOMAS, J.W.; GUZMAN, N.J. Hemodialysis central venous catheter tip fracture with embolization into the pulmonary artery. Am J Kidney Dis, 38:1311-15, 2001. 38. CHERTOW, G.M.; OWEN, W.F.; LAZARUS, J.M.; LEW, N.L.; LOWRIE, E.G. Exploring the reverse J-shaped curve between urea reduction ratio and mortality. Kidney Int, 56:1872-8, 1999. 39. CHEUNG, A.K.; AGODOA, L.Y.; DAUGIRDAS, J.T.; DEPNER, T.A.; GOTCH, F.A.; GREENE, T, LEVIN, N.W.; LEYPOLDT, J.K. Effects of hemodialyzer reuse on clearances of urea and beta2-microglobulin. The Hemodialysis (HEMO) Study Group. J Am Soc Nephrol, 10:117-27, 1999. 40. CHEUNG, A.K.; DALPIAS, D.; EMMERSON, R.; LEYPOLDT, J.K. A prospective study on intradialytic symptoms associated with reuse of hemodialyzers. Am J Nephrol, 11:397-401, 1991.
capítulo 49
41. CHOW, K.M.; SZETO, C.C.; LEUNG, C.B.; WONG, T.Y.; LI, P.K. Cuffed-tunneled femoral catheter for long term hemodialysis. Int J Artif Organs, 24:443-46, 2001. 42. CLARK, W.R.; HAMBURGER, R.J.; LYSAGHT, M.J. Effect of membrane composition and structure on solute removal and biocompatibility in hemodialysis. Kidney Int, 56:2005-15, 1999. 43. CLARK, W.R.; LEYPOLDT, J.K.; HENDERSON, L.W.; MUELLER, B.A.; SCOTT, M.K.; VONESH, E.F. Quantifying the effect of changes in the hemodialysis prescription on effective solute removal with a mathematical model. J Am Soc Nephrol, 10:601-9, 1999. 44. COLLINS, A.J.; MA, J.Z.; CONSTANTINI, E.G.; EVERSON, S.E. Dialysis unit and patient characteristics associated with reuse practices and mortality: 1989-1993. J Am Soc Nephrol, 9:2108-17, 1998. 45. COMBE, C.; CHAUVEAU, P.; LAVILLE, M.; FOUQUE, D.; AZAR, R.; CANO, N.; CANAUD, B.; ROTH, H.; LEVERVE, X.; APARICIO, M. Influence of nutritional factors and hemodialysis adequacy on the survival of 1,610 French patients. Am J Kidney Dis, 37(Suppl 2):818, 2001. 46. COTTINI, E.P.; GALLINA, D.L.; DOMINGUEZ, J.M. Urea excretion in adult humans with varying degrees of kidney malfunction fed milk, egg or an amino acid mixture: assessment of nitrogen balance. J Nutr, 103:11-9, 1973. 47. CRADDOCK, P.R.; FEHR, J.; DALMASSO, A.P.; BRIGHAN, K.L.; JACOB, H.S. Hemodialysis leukopenia: Pulmonary vascular leukostasis resulting from complement activation by dialyzer cellophane membranes. J Clin Invest, 59:879-88, 1977. 48. CRAIN, M.R.; MEWISSEN, M.W.; OSTROWSKI, G.J.; PAZFUMAGALLI, R.; BERES, R.A.; WERTZ, R.A. Fibrin sleeve stripping for salvage of failing hemodialysis catheters: Technique and initial results. Radiology, 198:41-44, 1996. 49. CRUZ, D.N.; MAHNENSMITH, R.L.; BRICKEL, H.M.; PERAZELLA, M.A. Midodrine and cool dialysate are effective therapies for symptomatic intradialytic hypotension. Am J Kidney Dis, 33:920-6, 1999. 50. D’AVILA, D.O.; FIGUEIREDO, A.E. Métodos de depuração extrarenal: hemodiálise, diálise peritoneal e novas técnicas. In: Riella, M.C (Ed.) Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos, 3.ª ed. Guanabara Koogan, 1996. p. 607-645. 51. DAUGIRDAS, J.T.; BURKE, M.S.; BALTER, P.; PRIESTER-COARY, A.; MAJKA, T. Screening for extreme postdialysis urea rebound using the Smye method: patients with access recirculation identified when a slow flow method is not used to draw the postdialysis blood. Am J Kidney Dis, 28:727-31, 1996. 52. DAUGIRDAS, J.T.; DEPNER, T.A.; GOTCH, F.A.; GREENE, T.; KESHAVIAH, P.; LEVIN, N.W.; SCHULMAN, G. Comparison of methods to predict equilibrated Kt/V in the HEMO Pilot Study. Kidney Int, 52:1395-405, 1997. 53. DAUGIRDAS, J.T.; DEPNER, T.A. A nomogram approach to hemodialysis urea modeling. Am J Kidney Dis, 23:33-40, 1994. 54. DAUGIRDAS, J.T.; GREENE, T.; DEPNER, T.A.; GOTCH, F.A.; STAR, R.A. Relationship between apparent (single-pool) and true (doublepool) urea distribution volume. Kidney Int, 56:1928-33, 1999. 55. DAUGIRDAS, J.T.; SCHNEDITZ, D. Overestimation of hemodialysis dose depends on dialysis efficiency by regional blood flow but not by conventional two pool urea kinetic analysis. ASAIO J, 41:M719-24, 1995. 56. DAUGIRDAS, J.T. Second generation logarithmic estimates of single-pool variable volume Kt/V: An analysis of error. J Am Soc Nephrol, 4:1205-13, 1993. 57. DEGIANNIS. D.; CZARNECKI, M.; DONATI, D.; HOMER, L.; EISINGER, R.P.; RASKA, K. JR; RASKOVA, J. Normal T lymphocyte function in patients with end-stage renal disease hemodialyzed with “high-flux” polysulfone membranes. Am J Nephrol, 10:276-282, 1990. 58. DENEUVILLE, M. Infection of PTFE grafts used to create arteriovenous fistulas for hemodialysis access. Ann Vasc Surg, 14:473-479, 2000. 59. DENKER, B.M.; CHERTOW, G.M.; OWEN Jr, W.F. Hemodialysis. In: Brenner, B.M.; Levine, A.S. (eds) Brenner & Rector’s: The Kidney, 6th Ed. W.B. Saunders Company, 2000. p. 2373-2453.
901
60. DEPNER, T.A.; BECK, G.; DAUGIRDAS, J.; KUSEK, J.; EKNOYAN, G. Lessons from the Hemodialysis (HEMO) Study: an improved measure of the actual hemodialysis dose. Am J Kidney Dis, 33:142-9, 1999. 61. DEPNER, T.A.; DAUGIRDAS, J.T. Equations for normalized protein catabolic rate based on two-point modeling of hemodialysis urea kinetics. J Am Soc Nephrol, 7:780-5, 1996. 62. DEPNER, T.A. Assessing the adequacy of hemodialysis: Urea modeling. Kidney Int, 45:1522-35, 1994. 63. DHINGRA, R.K.; YOUNG, E.W.; HULBERT-SHEARON, T.E.; LEAVEY, S.F.; PORT, F.K. Type of vascular access and mortality in U. S. hemodialysis patients. Kidney Int, 60:1443-51, 2001. 64. DIXON, B.S.; NOVAK, L.; FANGMAN, J. Hemodialysis vascular access survival: upper-arm native arteriovenous fistula. Am J Kidney Dis, 39:92-101, 2002. 65. DRUKKER, W. Haemodialysis: a historical review. In: Drukker, W, Parsons, F.M. and Maher, J.F. (eds). Replacement of Renal Function by Dialysis: A Textbook of Dialysis, 2nd ed. Kluwer Academic Publisher, 1983. p. 3-52. 66. DUFFY, R.; TOMASHEK, K.; SPANGENBERG, M.; SPRY, L.; DWYER, D.; SAFRANEK, T.J.; YING, C.; PORTESI, D.; DIVAN, H.; KOBRENSKI, J.; ARDUINO, M.; TOKARS, J.; JARVIS, W. Multistate outbreak of hemolysis in hemodialysis patients traced to faulty blood tubing sets. Kidney Int, 57:1668-74, 2000. 67. DUMLER, F.; ZASUWA, G.; LEVIN, N.W. Effect of dialyzer reprocessing methods on complement activation and hemodialyzerrelated symptoms. Artif Organs, 11:128-31, 1987. 68. DUSZAK, R. JR.; SACKS, D. Dialysis graft declotting with very low dose urokinase: is it feasible to use “less and wait?” J Vasc Interv Radiol, 10:123-8, 1999. 69. EMILI, S.; BLACK, N.A.; PAUL, R.V.; REXING, C.J.; ULLIAN, M.E. A protocol-based treatment for intradialytic hypotension in hospitalized hemodialysis patients. Am J Kidney Dis, 33:1107-14, 1999. 70. EVENEPOEL, P.; MAES, B.; VANWALLEGHEM, J.; KUYPERS, D.; MESSIAEN, T.; VANRENTERGHEM, Y. Regional citrate anticoagulation for hemodialysis using a conventional calcium-containing dialysate. Am J Kidney Dis, 39:315-23, 2002. 71. Excerpts From the United States Renal Data System 2001 Annual Data Report: Atlas of End-Stage Renal Disease in the United States. Am J Kidney Dis, 38:S37-238, 2001. 72. Excerpts from United States Renal Data System 1997 Annual Data Report. Am J Kidney Dis, 30:S21-213, 1997. 73. FABRIS, A.; LA GRECA, G.; CHIARAMONTE, S.; FERIANI, M.; BRENDOLAN, A.; BRAGANTINI, L.; MILAN, M.; PELLANDA, M.V.; CREPALDI, C.; RONCO, C. Total solute excretion versus clearance on the evaluation of standard and short hemodialysis. Trans Am Soc Artif Intern Organs, 34:627-29, 1988. 74. FALKENHAGEN, D.; BOSH, T.; KLIKMAN, H. A clinical study on different cellulosic dialysis membranes. Nephrol Dial Transplant, 2:537-45, 1987. 75. FAN, P.Y. Acute vascular access: New advances. Adv Renal Replace Ther, 1:90-98, 1994. 76. FELDMAN, H.I.; KINOSIAN, M.; BILKER, W.B.; SIMMONS, C.; HOLMES, J.H.; PAULY, M.V.; ESCARCE, J.J. Effect of dialyzer reuse on survival of patients treated with hemodialysis. JAMA, 276(8):620625, 1996. 77. FELDMAN, H.I.; KOBRIN, S.; WASSERSTEIN, A. Hemodialysis vascular access morbidity. J Am Soc Nephrol, 7:523-35, 1996. 78. FINE, A.; PENNER, B. The protective effect of cool dialysate is dependent on patients’ predialysis temperature. Am J Kidney Dis, 28:262-5, 1996. 79. FRANCH, H.A.; MITCH, W.E. Catabolism in uremia: the impact of metabolic acidosis. J Am Soc Nephrol, 9 (12 Suppl):78-81, 1998. 80. FREEMAN, R.M.; LAWTON, R.L.; CHAMBERLAIN, M.A. Hardwater syndrome. N Engl J Med, 276:1113-8, 1967. 81. GARRED, L.J.; BARICHELLO, D.L.; CANAUD, B.C.; McCREADY, W.G. Simple equations for protein catabolic rate determination from
902
82.
83.
84.
85.
86.
87.
88.
89. 90.
91.
92.
93.
94.
95. 96.
97.
98.
99. 100.
101.
Hemodiálise
pre dialysis and post dialysis blood urea nitrogen. ASAIO J, 41:88995, 1995. GARRED, L.J.; CANAUD, B.; ARGILES, A.; FLAVIER, J.L.; MION, C. Protein catabolic rate determination from a single measurement of dialyzed urea. ASAIO J, 41:M804-9, 1995. GARRED, L.J.; CANAUD, B.; FLAVIER, J.L.; POUX, C.; POLITOBOULOUX, C.; MION, C. Effect of reuse on dialyzer efficacy. Artif Organs, 14:80-4, 1990. GELENS, M.; LUIK, A.J.; KLEFFENS, M.; VAN DER SANDE, F.M.; KOOMAN, J.P. A dialysate sodium concentration of 140 mmol/l may lead to net diffusive sodium gain. Blood Purif, 20:190, 2002. GIBSON, K.D.; CAPS, M.T.; KOHLER, T.R.; HATSUKAMI, T.S.; GILLEN, D.L.; ALDASSY, M.; SHERRARD, D.J.; STEHMAN-BREEN, C.O. Assessment of a policy to reduce placement of prosthetic hemodialysis access. Kidney Int, 59:2335-45, 2001. GOLDAU, R.; KUHLMANN, U.; SAMADI, N.; GROSS, M.; GRAF, T.; ORLANDINI, G.; MARCELLI, D.; LANGE, H. Ionic dialysance measurement is urea distribution volume dependent: a new approach to better results. Artif Organs, Apr 26:321-32, 2002. GORDON, S.M.; TIPPLE, M.; BLAND, L.A.; JARVIS, W.R. Pyrogenic reactions associated with the reuse of disposable hollow-fiber hemodialyzers. JAMA, 260:2077-81, 1988. GOTCH, F.A.; LEVIN, N.W.; PORT, F.K.; WOLFE, R.A.; UEHLINGER, D.E. Clinical outcome relative to the dose of dialysis is not what you think: The fallacy of the mean. Am J Kidney Dis, 30:1-15, 1997. GOTCH, F.A.; SARGENT, J.A. A mechanistic analysis of the National Cooperative Dialysis Study (NCDS). Kidney Int, 28:526-34, 1985. GRAJOWER, M.M.; WALTER, L.; ALBIN, J. Hypoglycemia in chronic hemodialysis patients: Association with propranolol use. Nephron, 26:126-9, 1980. GRAMMER, L.C.; ROBERTS, M.; NICHOLLS, A.J.; PLATTS, M.M.; PATTERSON, R. IgE against ethylene oxide-altered human serum albumin in patients who have had acute dialysis reactions. J Allergy Clin Immunol, 74:544-6, 1984. GRAMMER, L.C.; ROBERTS, M.; WIGGINS, C.A.; FITZSIMONS, R.R.; IVANOVICH, P.T.; ROXE, D.M.; PATTERSON, R. A comparison of cutaneous testing and ELISA for assessing reactivity to ethylene oxide-human serum albumin in hemodialysis patients with anaphylactic reactions. J Allergy Clin Immunol, 87:674-6, 1991. GROOTEMAN, M.P.; NUBE, M.J.; VAN LIMBEEK, J.; VAN HOUTE, A.J.; DAHA, M.R.; VAN GEELEN, J.A. Biocompatibility and performance of a modified cellulosic and synthetic high flux dialyzer: a randomized crossover comparison between cellulose triacetate and polysulphon. ASAIO J, 41:215-20, 1995. GUNNARSSON, B.; ASABA, H.; DAWIDSON, S.; WILHELMSSON, S.; BERGSTROM, J. The effects of three different heparin regimes on heparin concentrations in plasma and fibrin formation in dialyzers. Clin Nephrol, 15:135-42, 1981. GUNUKULA, S.R.; SPODICK, D.H. Pericardial disease in renal patients. Semin Nephrol, 21:52-6, 2001. HABACH, G.; PORT, F.K. Dialyzers, dialysate and delivery systems. In: Massry, S.G. & Glassock, R.J. (eds) Textbook of Nephrology, 3rd ed. Williams & Wilkins, Baltimore, Maryland, USA, 1995, p. 1525-31. HAKIM, R.M.; BREILLATT, J.; LAZARUS, J.M.; PORT, F.K. Complement activation and hypersensitivity reactions to dialysis membranes. N Engl J Med, 311:878-82, 1984. HAKIM, R.M.; HELD, P.J.; STANNARD, D.C.; WOLFE, R.A.; PORT, F.K.; DAUGIRDAS, J.T.; AGODOA, L. Effect of the dialysis membrane on mortality of chronic hemodialysis patients. Kidney Int, 50:566-70, 1996. HAKIM, R.M.; HIMMELFARB, J. Hemodialysis access failure: A call to action. Kidney Int, 54:1029-1040, 1998. HAKIM, R.M.; WINGARD, R.L.; HUSNI, L.; PARKER, R.A.; PARKER, T.F. 3rd. The effect of membrane biocompatibility on plasma beta-2 microglobulin levels in chronic hemodialysis patients. J Am Soc Nephrol, 7:472-8, 1996. HALJAMAE, H.; LINDE, A.; AMUNDSON, B. Comparative analysis of capsular fluid and interstitial fluid. Am J Physiol, 227:1199-205, 1977.
102. HARRIS, D.C.; YUILL, E.; CHESHER, D.W. Correcting acidosis in hemodialysis: effect on phosphate clearance and calcification risk. J Am Soc Nephrol, 6:1607-12, 1995. 103. HAUK, M.; KUHLMANN, M.K.; RIEGEL, W.; KOHLER, H. In vivo effects of dialysate flow rate on Kt/V in maintenance hemodialysis patients. Am J Kidney Dis, 35:105-11, 2000. 104. HAYNES, B.J.; QUARLES, A.W.; VAVRINCHIK, J.; WHITE, J.; PEDAN, A. The LifeSite hemodialysis access system: implications for the nephrology nurse. Nephrol Nurs J, 29:27-33, 2001. 105. HAYS, R.M. Dynamics of body water and electrolytes. In: Maxwell, M.H. Kleeman, C.R. (eds.) Clinical Disorder of Fluid and Electrolyte Metabolism, 3rd ed. McGraw Hill, Inc., United States of America, 1980, p.1-36. 106. HEGSTROM, R.M.; QUINTON, W.E.; DILLARD, D.H. One year’s experience with the use of indwelling teflon cannulas and bypass. Trans Am Soc Artif Intern Organs, 7:47, 1961. 107. HELD, P.J.; PORT, F.K.; WOLFE, R.A.; STANNARD, D.C.; CARROLL, C.E.; DAUGIRDAS, J.T.; BLOEMBERGEN, W.E.; GREER, J.W.; HAKIM, R.M. The dose of hemodialysis and patient mortality. Kidney Int, 50:550-6, 1996. 108. HELD, P.J.; WOLFE, R.A.; GAYLIN, D.S.; PORT, F.K.; LEVIN, N.W.; TURENNE. M.N. Analysis of the association of dialyzer reuse practices and patient outcomes. Am J Kidney Dis, 23:692-708, 1994. 109. HENDERSON, L.W. Hemodialysis: rationale and physical principles. In: The Kidney by Brenner, B.M. & Rector, F.C. Jr. (eds), 1st ed, pp. 1643-1704. W.B. Saunders Co., Philadelphia, PA, USA, 1976. 110. HERCZ, G.; PEI, Y.; GREENWOOD, C.; MANUEL, A.; SAIPHOO, C.; GOODMAN, W.G.; SEGRE, G.V.; FENTON, S.; SHERRARD, D.J. Aplastic osteodystrophy without aluminum: the role of “suppressed” parathyroid function. Kidney Int, 44:860-6, 1993. 111. HERNANDEZ, D.; DIAZ, F.; RUFINO, M.; LORENZO, V.; PEREZ, T.; RODRIGUEZ, A.; De BONIS, E.; LOZADA, M.; GONZALESPOSADA, J.M.; TORRES. Subclavian vascular access stenosis in dialysis patients: Natural history and risk factors. J Am Soc Nephrol, 9:1507-10, 1998. 112. HOEBEN, H.; ABU-ALFA, A.K.; MAHNENSMITH, R.; PERAZELLA, M.A. Hemodynamics in patients with intradialytic hypotension treated with cool dialysate or midodrine. Am J Kidney Dis, 39:102-7, 2002. 113. HUME, R.; WEYERS, E. Relationship between total body water and surface area in normal and obese subjects. J Clin Pathol, 24:234-38, 1971. 114. IKIZLER, T.A.; FLAKOLL, P.J.; PARKER, R.A.; HAKIM, R.M. Amino acid and albumin losses during hemodialysis. Kidney Int, 46:8307, 1994. 115. IKIZLER, T.A.; GREENE, J.H.; WINGARD, R.L.; PARKER, R.A.; HAKIM, R.M. Spontaneous dietary protein intake during progression of chronic renal failure. J Am Soc Nephrol, 6:1386-91, 1995. 116. INNES, A.; CHARRA, B.; BURDEN, R.P.; MORGAN, A.G.; LAURENT, G. The effect of long, slow haemodialysis on patient survival. Nephrol Dial Transplant, 14:919-22, 1999. 117. INNES, A.; FARRELL, A.M.; BURDEN, R.P.; MORGAN, A.G.; POWELL, R.J. Complement activation by cellulosic dialysis membranes. J Clin Pathol, 47:155-8, 1994. 118. ISMAIL, N.; BECKER, B.N.; HAKIM, R.M. Water treatment for hemodialysis. Am J Nephrol, 16:60-72, 1996. 119. IVANOVICH, P.; MANZLER, A.; DRAKE, R. Acute hemolysis following hemodialysis. Trans Am Soc Artif Intern Organs, 15:316-20, 1969. 120. JACKSON, B.M.; BECK-SAGUE, C.M.; BLAND, L.A.; ARDUINO, M.J.; MEYER, L.; JARVIS, W.R. Outbreak of pyrogenic reactions and gram-negative bacteremia in a hemodialysis center. Am J Nephrol, 14:85-9, 1994. 121. JANSEN, M.A.; KOREVAAR, J.C.; DEKKER, F.W.; JAGER, K.J.; BOESCHOTEN, E.W.; KREDIET, R.T.; NECOSAD Study Group. Netherlands Cooperative Study on the Adequacy of Dialysis. The relationship between Kt/V(urea) and nPNA in anuric peritoneal dialysis patients: a comparison with predialysis patients. Perit Dial Int, 21:509-15, 2001.
capítulo 49
122. JANSSEN, M.J.; DEEGENS, J.K.; KAPINGA, T.H.; BEUKHOF, J.R.; HUIJGENS, P.C.; VAN LOENEN, A.C.; VAN DER MEULEN, J. Citrate compared to low molecular weight heparin anticoagulation in chronic hemodialysis patients. Kidney Int, 49:806-13, 1996. 123. JOCHIMSEN, E.M.; CARMICHAEL, W.W.; AN, J.S.; CARDO, D.M.; COOKSON, S.T.; HOLMES, C.E.; ANTUNES, M.B.; DE MELO FILHO, D.A.; LYRA, T.M.; BARRETO, V.S.; AZEVEDO, S.M.; JARVIS, W.R. Liver failure and death after exposure to microcystins at a hemodialysis center in Brazil. N Engl J Med, 339:139, 1998. 124. JOHNSON, W.J.; HAGGE, W.W.; WAGONER, R.D.; DINAPOLI, R.P.; ROSEVEAR, J.W. Effects of urea loading in patients with faradvanced renal failure. Mayo Clin Proc, 47:21-9, 1972. 125. JOHNSON, W.J.; TAVES, D.R. Exposure to excessive fluoride during hemodialysis. Kidney Int, 5:451-4, 1974. 126. JOHNSTON, C.I.; CLAPPISON, B.H.; ANDERSON, W.P.; YASUJIMA, M. Effect of angiotensin-converting enzyme inhibition on circulating and local kinin levels. Am J Cardiol, 49:1401-4, 1982. 127. JOSEPH, S.; ADLER, S. Vascular access problems in dialysis patients: pathogenesis and strategies for management. Heart Dis, 3:242-7, 2001. 128. KAEHNY, W.D.; MILLER, G.E.; WHITE, W.L. Relationship between dialyzer reuse and the presence of anti-N-like antibodies in chronic hemodialysis patients. Kidney Int, 12:59, 1977. 129. KAJI, D.M.; ACKAD, A.; NOTTAGE, W.G.; STERN, R.M. Prevention of muscle cramps in haemodialysis patients by quinine sulfate. Lancet, 2:66, 1976. 130. KANG, E.S.; TEVLIN, M.T.; WANG, Y.B.; CHIANG, T.M.; CARDENAS, R.; MYERS, L.K.; ACCHIARDO, S.R. Hemodialysis hypotension: interaction of inhibitors, iNOS, and the interdialytic period. Am J Med Sci, 317:9-21, 1999. 131. KAPLAN, A.A.; HALLEY, S.E.; LAPKIN, L.A.; GRAEBER, C.W. Dialysate protein losses with bleach processed polysulfone dialyzers. Kidney Int, 47:573-8, 1995. 132. KARNIK, J.A.; YOUNG, B.S.; LEW, N.L.; HERGET, M.; DUBINSKY, C.; LAZARUS, J.M.; CHERTOW, G.M. Cardiac arrest and sudden death in dialysis units. Kidney Int, 60:350-7, 2001. 133. KATZARSKI, K.S.; CHARRA, B.; LAURENT, G.; LOPOT, F.; DIVINO-FILHO, J.C.; NISELL, J.; BERGSTROM, J. Multifrequency bioimpedance in assessment of dry weight in haemodialysis. Nephrol Dial Transplant, 11(Suppl 2):20-3, 1996. 134. KATZARSKI, K.S.; CHARRA, B.; LUIK, A.J.; NISELL, J.; DIVINO FILHO, J.C.; LEYPOLDT, J.K.; LEUNISSEN, K.M.; LAURENT, G.; BERGSTROM, J. Fluid state and blood pressure control in patients treated with long and short haemodialysis. Nephrol Dial Transplant, 14:369-75, 1999. 135. KATZARSKI, K.S.; NISELL, J.; RANDMAA, I.; DANIELSSON, A.; FREYSCHUSS, U.; BERGSTROM, J. A critical evaluation of ultrasound measurement of inferior vena cava diameter in assessing dry weight in normotensive and hypertensive hemodialysis patients. Am J Kidney Dis, 30:459-65, 1997. 136. KELLER, F.; SEEMANN, J.; PREUSCHOF, L.; OFFERMANN, G. Risk factors of system clotting in heparin-free haemodialysis. Nephrol Dial Transplant, 5:802-7, 1990. 137. KINGDON, E.J.; HOLT, S.G.; DAVAR, J.; PENNELL, D.; BAILLOD, R.A.; BURNS, A.; SWENY, P.; DAVENPORT, A. Atrial thrombus and central venous dialysis catheter. Am J Kidney Dis, 38: 631-9, 2001. 138. KJELLSTRAND, C.M.; EATON, J.W.; YAWATA, Y.; SWOFFORD, H.; KOLPIN, C.F.; BUSELMEIER, T.J.; VON HARTITZSCH, B.; JACOB, H.S. Hemolysis in dialized patients caused by chloramines. Nephron, 13:427-33, 1974. 139. KJELLSTRAND, C.M.; TING, G. Daily hemodialysis: dialysis for the next century. Adv Ren Replace Ther, 5:267-74, 1998. 140. KLAHR, S.; LEVEY, A.S.; BECK, G.J.; CAGGIULA, A.W.; HUNSICKER, L.; KUSEK, J.W.; STRIKER, G. The effects of dietary protein restriction and blood-pressure control on the progression of chronic renal disease. Modification of Diet in Renal Disease Study Group. N Engl J Med, 330:877-84, 1994. 141. KLEOPHAS, W.; HAASTERT, B.; BACKUS, G.; HILGERS, P.; WESTHOFF, A.; VAN ENDERT, G. Long-term experience with an
142.
143.
144.
145.
146.
147.
148.
149.
150.
151.
152.
153.
154.
155.
156.
157.
903 ultrapure individual dialysis fluid with a batch type machine. Nephrol Dial Transplant, 13:3118-25, 1998. KLOPPENBURG, W.D.; STEGEMAN, C.A.; HOOYSCHUUR, M.; VAN DER VEN, J.; DE JONG, P.E.; HUISMAN, R.M. Assessing dialysis adequacy and dietary intake in the individual hemodialysis patient. Kidney Int, 55:1961-9, 1999. KODA, Y.; NISHI, S.; MIYAZAKI, S.; HAGINOSHITA, S.; SAKURABAYASHI, T.; SUZUKI, M.; SAKAI, S.; YUASA, Y.; HIRASAWA, Y.; NISH, T. Switch from conventional to high-flux membrane reduces the risk of carpal tunnel syndrome and mortality of hemodialysis patients. Kidney Int, 52:1096-101, 1995. KOPPLE, J.D.; GREENE, T.; CHUMLEA, W.C.; HOLLINGER, D.; MARONI, B.J.; MERRILL, D.; SCHERCH, L.K.; SCHULMAN, G.; WANG, S.R.; ZIMMER, G.S. Relationship between nutritional status and the glomerular filtration rate: results from the MDRD study. Kidney Int, 57:1688-703, 2000. KOREVAAR, J.C.; JANSEN, M.A.; DEKKER, F.W.; BOESCHOTEN, E.W.; BOSSUYT, P.M.; KREDIET, R.T.; NECOSAD Study Group. Netherlands Cooperative Study on the Adequacy of Dialysis-2. Evaluation of DOQI guidelines: early start of dialysis treatment is not associated with better health-related quality of life. National Kidney Foundation-Dialysis Outcomes Quality Initiative. Am J Kidney Dis, 39:108-15, 2002. KOREVAAR, J.C.; JANSEN, M.A.; DEKKER, F.W.; JAGER, K.J.; BOESCHOTEN, E.W.; KREDIET, R.T.; BOSSUYT, P.M. Netherlands Cooperative Study on the Adequacy of Dialysis Study Group. When to initiate dialysis: effect of proposed US guidelines on survival. Lancet, 358:1046-50, 2001. KORZETS, A.; ORI, Y.; BAYTNER, S.; ZEVIN, D.; CHGNAC, A.; WEINSTEIN, T.; HERMAN, M.; AGMON, M.; GAFTER, U. The femoral artery-femoral vein polytetrafluoroethylene graft: A 14-year retrospective study. Nephrol Dial Transplant, 13:1215-20, 1998. KOUW, P.M.; KOOMAN, J.P.; CHERIEX, E.C.; OLTHOF, C.G.; DE VRIES, P.M.; LEUNISSEN, K.M. Assessment of postdialysis dry weight: a comparison of techniques. J Am Soc Nephrol, 4:98-104, 1993. KRAUSE, I.; BIRK, E.; DAVIDOVITS, M.; CLEPER, R.; BLIEDEN, L.; PINHAS, L.; GAMZO, Z.; EISENSTEIN, B. Inferior vena cava diameter: a useful method for estimation of fluid status in children on haemodialysis. Nephrol Dial Transplant, 16:1203-6, 2001. KUHLMANN, M.K.; HECKMANN, M.; RIEGEL, W.; KOHLER, H. Evaluation of renal Kt/V as a marker of renal function in predialysis patients. Kidney Int, 60:1540-6, 2001. KUHLMANN, M.K.; KONIG, J.; RIEGEL, W.; KOHLER, H. Genderspecific differences in dialysis quality (Kt/V): ‘big men’ are at risk of inadequate haemodialysis treatment. Nephrol Dial Transplant, 14:147-53, 1999. LEAVEY, S.F.; STRAWDERMAN, R.L.; JONES, C.A.; PORT, F.K.; HELD, P.J. Simple nutritional indicators as independent predictors of mortality in hemodialysis patients. Am J Kidney Dis, 31:997-1006, 1998. LENTINO, J.R.; BADDOUR, L.M.; WRAY, M.; WONG, E.S.; YU, V.L. Staphylococcus aureus and other bacteremias in hemodialysis patients: antibiotic therapy and surgical removal of access site. Infection, 28:355-60, 2000. LEU, J.G.; CHIANG, S.S.; LIN, S.M.; PAI, J.K.; JIANG, W.W. Low molecular weight heparin in hemodialysis patients with a bleeding tendency. Nephron, 86:499-501, 2000. LEVIN, N.W.; PARNELL, S.L.; PRINCE, H.N.; GOTCH, F.; POLASCHEGG, H.D.; LEVIN, R.; ALTO, A.; KAUFMAN, A.M. The use of heated citric acid for dialyzer reprocessing. J Am Soc Nephrol, 6:1578-85, 1995. LEYPOLDT, J.K.; CHEUNG, A.K.; DEETER, R.B. Effects of hemodialyzer reuse: dissociation between clearances of small and large solutes. Am J Kidney Dis, 32:295-301, 1998. LINDHOUT, T. Biocompatibility of extracorporeal blood treatment. Selection of haemostatic parameters. Nephrol Dial Transplant, 9(Suppl 2):83-9, 1994.
904
Hemodiálise
158. LINDSAY, R.M.; STERNBY, J. Future directions in dialysis quantification. Semin Dial, 14:300-7, 2001. 159. LITTLE, M.A.; CONLON, P.J.; WALSHE, J.J. Access recirculation in temporary hemodialysis catheters as measured by the saline dilution technique. Am J Kidney Dis, 36:1135-9, 2000. 160. LOUGH, J.; NOONAN, R.; GAGNON, R.; KAYE, M. Effects of fluoride on bone in chronic renal failure. Arch Pathol, 99:484, 1975. 161. LOWRIE, E.G.; LAIRD, N.M.; PARKER, T.F.; SARGENT, J.A. Effect of the hemodialysis prescription of patient morbidity: report from the National Cooperative Dialysis Study. N Engl J Med, 305:1176-81, 1981. 162. LOWRIE, E.G.; LEW, N.L. Death risk in hemodialysis patients: the predictive value of commonly measured variables and an evaluation of death rate differences between facilities. Am J Kidney Dis, 15:458-82, 1990. 163. LUGON, J.R.; ANDRÉ, M.B.; DUARTE, M.E.L.; REMBOLD, S.M.; CRUZ, E.A.S. Effects of in-center daily hemodialysis upon mineral metabolism and bone disease in end-stage renal disease patients. São Paulo Med J, 119:110-3, 2001. 164. LUGON, J.R.; GRACIANO, M.L. Insuficiência renal aguda na sepse. In: Homsi E, editor. Insuficiência Renal Aguda em UTI. Atheneu, 1998, p. 83-105. 165. LUGON, J.R.; REMBOLD, S.M.; PEREIRA, C.M.; SOLARI, H.P.; RIÇA, R.; FRANÇA, F.B.; ANDRÉ, M.B. Improvements in dialysis adequacy and quality of life by in-center daily hemodialysis. J Am Soc Nephrol, 8(Abstr):165A, 1997. 166. LUGON, J.R.; WARRAK, E.A.; LUGON, A.S.; MATTOS, F.C.; SALVADOR, B.A.; NÓBREGA, A.C.L. Revisiting autonomic disfunction in hemodialysis patients. J Amer Soc Nephrol 12 (Abstr):224A, 2001. 167. LUGON, J.R. Efeitos adversos da acidose metabólica crônica em hemodialisados. J Bras Nefrol, 19:95-7, 1997. 168. LUMSDEN, A.B.; MACDONALD, M.J.; ALLEN, R.C.; DODSON, T.F. Hemodialysis access in the pediatric patient population. Am J Surg, 168:197-201, 1994. 169. LYSAGHT, M.J. Maintenance dialysis population dynamics: current trends and long-term implications. J Am Soc Nephrol, 13:S37-40, 2002. 170. MAIDMENT, H.J.; PETERSEN, J. The dialisys prescription: reuse. Am J Nephrol, 16:52-9, 1996. 171. MANZLER, A.L.; SCHREINER, A.W. Copper-induced hemolytic anemia: A new complication of hemodialysis. Ann Intern Med, 73:409, 1970. 172. MARANGONI, R.; SAVINO, R.; COLOMBO, R.; CIMINO, R.; CIVARDI, F. Short time treatment with high-efficiency paired filtration dialysis for chronic renal failure. Artif Organs, 16:547-52, 1992. 173. MARR, K.A.; SEXTON, D.J.; CONLON, P.J.; COREY, G.R.; SCHWAB, KIRKLAND, K.B. Catheter-related bacteremia and outcome of attempted catheter salvage in patients undergoing hemodialysis. Ann Intern Med, 127:275-80, 1997. 174. MARSHALL, C.P.; PEARSON, F.C.; SAGONA, M.A.; LEE, W.; WATHEN, R.L.; WARD, R.A.; DOLOVICH, J. Reactions during hemodialysis caused by allergy to ethylene oxide gas sterilization. J Allergy Clin Immunol, 75:563, 1985. 175. MARTINS, O.J.F.; LUGON, J.R. Estimativa dos ânions não-medidos: inserção da albumina no cálculo do hiato aniônico. J Bras Nefrol, 19:439-41, 1997. 176. MATOS, J.P.; ANDRE, M.B.; REMBOLD, S.M.; CALDEIRA, F.E.; LUGON, JR. Effects of dialyzer reuse on the permeability of lowflux membranes. Am J Kidney Dis, 35:839-44, 2000. 177. MAYER, G.; THUM, J.; WOLOSZCZUK, W.; GRAF, H. Beta-2-microglobulin in hemodialysis patients: effects of different dialyzers and different dialysis procedures. Am J Nephrol, 8:280-4, 1988. 178. Mc CARLEY, P.; WINGARD, R.L.; SHYR, Y.; PETTUS, W.; HAKIM, R.M.; IKIZLER, T.A. Vascular access blood flow monitoring reduces access morbidity and costs. Kidney Int, 60:1164-72, 2001. 179. McBRIDE, P. The Development of Hemo- and Peritoneal Dialysis. In: Nissenson, A.R.; Fine, R.N.;and Gentile, D.E. (eds) Clinical Dialysis. Publishing Division of Prentice-Hall Inc., 1984, p. 1-28. 180. McCARTHY, J.T.; JENSON, B.M.; SQUILLACE, D.P.; WILLIAMS, A.W. Improved preservation of residual renal function on chronic
181. 182.
183.
184.
185.
186.
187.
188.
189. 190.
191. 192.
193.
194.
195. 196. 197.
198.
199.
200.
201.
hemodialysis patients using polysulfone dialyzers. Am J Kidney Dis, 29:576-83, 1997. McKELLAR, S. Gordon Murray and the artificial kidney in Canada. Nephrol Dial Transplant, 14:2766-70, 1999. MEMOLI, B.; POSTIGLIONE, L.; CIANCIARUSO, B.; BISESTI, V.; CIMMARUTA, C.; MARZANO, L.; MINUTOLO, R.; CUOMO, V.; GUIDA, B.; ANDREUCCI, M.; ROSSI, G. Role of different dialysis membranes in the release of interleukin-6-soluble receptor in uremic patients. Kidney Int, 58:417-24, 2000. MERMEL, L.A.; FARR, B.M.; SHERERTZ, R.J.; RAAD, I.I.; O’GRADY, N.; HARRIS, J.S.; CRAVEN, D.E. Guidelines for the management of intravascular catheter-related infections. J Intraven Nurs, 24:180-205, 2001. MICKLEY, V.; GORICH, J.; RILINGER, N.; STORCK, M.; ABENDROTH, D. Stenting of central venous stenoses in hemodialysis patients: Long term results. Kidney Int, 51:277-80, 1997. MILLER, J.H.; VON ALBERTINI, B.; GARDNER, P.W.; SHINABERG, J.H. Technical aspects of high-flux hemodiafiltration for adequate short (under 2 hours) treatment. Trans Am Soc Artif Intern Organs, 30:377-81, 1984. MILLER, P.E.; CARLTON, D.; DEIERHOI, M.H.; REDDEN, D.T.; ALLON, M. Natural history of arteriovenous graft in hemodialysis patients. Am J Kidney Dis, 36:68-74, 2000. MINGA, T.E.; FLANAGAN, K.H.; ALLON, M. Clinical consequences of infected arteriovenous grafts in hemodialysis patients. Am J Kidney Dis, 38:975-78, 2001. MINGARDI, G.; PERICO, N.; PUSINERI, F.; MASSAZZA, M.; MARCHESI, E.; MECCA, G.; REMUZZI, G.; DONATI, M.B. Heparin for hemodialysis: practical guidelines for administration and monitoring. Int J Artif Organs, 7:269-74, 1984. Ministério da Saúde. Diário Oficial da União, Portaria n.º 82, de 3 de janeiro de 2000. MOHR, P.E.; NEUMANN, P.J.; FRANCO, S.J., MARAINEN, J.; LOCKRIDGE, R.; TING, G. The case for daily dialysis: its impact on costs and quality of life. Am J Kidney Dis, 37:777-89, 2001. MOINAT, A.; TREGUER, H.; WEHBE, B. Tunneled femoral catheters of long duration. Nephrologie, 8:429-30, 2001. MONTAGNAC, R.; CLAVEL, P.; DELHOTAL-LANDES, B.; FLOUVAT, B.; POULAIN, S.; SCHLLINGER, F. Use of midodrine (Gutron) to treat permanent hypotension in a chronic hemodialysis patient. Clin Nephrol, 56:162-8, 2001. MOSS, A.H.; VASILAKIS, C.; HOLLEY, J.L.; FOULKS, C.J.; PILLAI, K.; Mc DOWELL, D.E. Use of a silicone dual-lumen catheter with a dacron cuff as a long term vascular access for hemodialysis patients. Am J Kidney Dis, 16:211-15, 1990. NASCIMENTO, M.M.; RIELLA, M.C. e Grupo Colaborativo. Avaliação de acesso vascular em hemodiálise: um estudo multicêntrico. J Bras Nefrol, 21:22-9, 1999. NASSAR, G.M.; AYUS, K.C. Clotted arteriovenous graft: a silent source of infection. Semin Dial, 13:1-3, 2000. NASSAR, G.M.; AYUS, K.C. Infectious complications of the hemodialysis access. Kidney Int, 60:1-13, 2001. NATTER, B.J.; PEDERSON, J.; PSIMENOS, G.; LINDEMAN, R.D. Lethal copper intoxication in hemodialysis. Trans Am Soc Artif Intern Organs, 15:309, 1969. NENSEL, U.; ROCKEL, A.; HILLENBRAND, T.; BARTEL, J. Dialyzer permeability for low-molecular weight proteins. Comparison between polysulfone, polyamide and cuprammonium-rayon dialyzers. Blood Purif, 12:128-34, 1994. NG, Y.Y.; CHOW, M.P.; LYOU, J.Y.; HU, H.Y.; YUNG, C.H.; FAN, C.D.; HUANG, T.P. Resistence to erythropoietin: imunohemolytic anemia induced by residual formaldeyde in dialyzers. Am J Kidney Dis, 21:213-6, 1993. NG, Y.Y.; YANG, A.H.; WONG, K.C.; LAN, H.Y.; HUNG, T.L.; KERR, P.G.; HUANG, T.P. Dialyzer reuse: interaction between dialyzer membrane, disinfectant (Formalin), and blood during dialyzer reprocessing. Artif Organs, 20:53-68, 1996. NICKEY, W.A.; CHINITZ, V.L.; KIM, K.E.; ONESTY, G.; SWARTZ,
capítulo 49
202.
203. 204. 205.
206.
207.
208. 209.
210.
211.
212.
213.
214.
215. 216.
217.
218. 219.
220.
221.
222.
C. Hypernatremia from water softener and malfunction during home dialysis. JAMA, 214:915, 1970. NICOLA, L.; BELLIZI, V.; MINUTOLO, R.; CIOFFI, M.; GIANNATTASIO, P.; TERRACCIANO, V.; IODICE, C.; UCCELLO, F.; MEMOLI, B.; DI IORIO, B.R.; CONTE, G. Effect of Dialysate Sodium Concentration on Interdialytic Increase of Potassium. J Am Soc Nephrol, 11:2337-43, 2000. NKF/DOQI adult guidelines. Am J Kidney Dis, 35 (Suppl 2):17-104, 2000. NKF-K/DOQI clinical practice guidelines for hemodialysis Adequacy: update 2000. Am J Kidney Dis, 37(Suppl1):7-64, 2001. OBRADOR, G.T.; ARORA, P.; KAUSZ, A.T.; RUTHAZER, R.; PEREIRA, B.J.; LEVEY, A.S. Level of renal function at the initiation of dialysis in the U.S. end-stage renal disease population. Kidney Int, 56:2227-35, 1999. OKECHUKWU, C.N.; ORZOL, S.M.; HELD, P.J.; PEREIRA, B.J.; AGODOA, L.Y.; WOLFE, R.A.; PORT, F.K. Characteristics and treatment of patients not reusing dialyzers in reuse units. Am J Kidney Dis, 36:991-9, 2000. OLIVER, M.J.; EDWARDS, L.J.; CHURCHILL, D.N. Impact of sodium and ultrafiltration profiling on hemodialysis-related symptoms. J Am Soc Nephrol, 12:151-6, 2001. OLIVER, M.J. Acute dialysis catheters. Semin Dial, 14:432-5, 2001. OPATRNY, K. Jr; SULKOVA, S.; LOPOT, F.; VIT, L.; VALEK, A.; OPATRNY, K. Clinical study of high-flux cuprammonium rayon hemodialysis membranes. Artif Organs, 17:971-6, 1993. OROFINO, L.; MARCEN, R.; QUEREDA, C.; VILLAFRUELA, J.J.; SABATER, J.; MATESANZ, R.; PASCUAL, J.; ORTUNO, J. Epidemiology of symptomatic hypotension in hemodialysis: is cool dialysate beneficial for all patients? Am J Nephrol, 10:177-80, 1990. OUSEPH, R.; BRIER, M.E.; WARD, R.A. Improved dialyzer reuse after use of a population pharmacodynamic model to determine heparin doses. Am J Kidney Dis, Jan 35(1):89-94, 2000. OUSEPH, R.; SMITH, B.P.; WARD, R.A. Maintaining blood compartment volume in dialyzers reprocessed with peracetic acid maintains Kt/V but not beta 2-microglobulin removal. Am J Kidney Dis, 30(4):501-506, 1997. OWEN, W.F. Jr; LEW, N.L.; LIU, Y.; LOWRIE, E.G.; LAZARUS, J.M. The urea reduction ratio and serum albumin concentration as predictors of mortality in patients undergoing hemodialysis. N Engl J Med, 329:1001-6, 1993. PALDER, S.B.; KIRKMAN, R.L.; WHITTEMORE, A.D.; RAKIM, R.M.; LAZARUS, J.M.; TILNEY, N.L. Vascular access for hemodialysis: Patency rates and results of revision. Ann Surg, 202:235-9, 1985. PALMER, B.F. Individualizing the dialysate in the hemodialysis patient. Semin Dial, 14:41-9, 2001. PANICHI, V.; CASAROSA, L.; GATTAI, V.; BIANCHI, A.M.; ANDREINI, B.; MIGLIORI, M.; DE PIETRO, S.; GIOVANNINI, L.; PALLA, R. Protein layer on hemodialysis membranes: a new imuno histochemistry technique. Int J Artif Organs, 18:305-8, 1995. PARKER, T.F. 3rd; WINGARD, R.L.; HUSNI, L.; IKZLER, T.A.; PARKER, R.A.; HAKIM, R.M. Effect of the membrane biocompatibility on nutritional parameters in chronic hemodialysis patients. Kidney Int, 49:551-6, 1996. PARKER, T.F. 3rd. Technical advances in hemodialysis therapy. Semin Dial, 13:372-7, 2000. PARKINSON, I.S.; WARD, M.K.; KERR, D.N. Dialysis encephalopathy, bone disease and anaemia: the aluminum intoxication syndrome during regular haemodialysis. J Clin Pathol, 34:1285-94, 1981. PAUL, D.; MALSCH, G.; FALKENHAGEN, D. Chemical modification of cellulosic membranes and their blood compatibility. Artif Organs, 14:122-5, 1990. PEDRINI, M.T.; LEVEY, A.S.; LAU, J.; CHALMERS, T.C.; WANG, P.H. The effect of dietary protein restriction on the progression of diabetic and nondiabetic renal diseases: A meta-analysis. Ann Intern Med, 124:627-32, 1996. PEGUES, D.A.; BECK-SAGUE, C.M.; WOOLLEN, S.W.; GREENS-
223. 224.
225.
226.
227. 228.
229.
230.
231. 232. 233.
234.
235.
236. 237.
238.
239. 240.
241.
242.
243.
905 PAN, B.; BURNS, S.M.; BLAND, L.A.; ARDUINO, M.J.; FAVERO, M.S.; MACKOW, R.C.; JARVIS, W.R. Anaphylactoid reactions associated with reuse of hollow-fiber hemodialyzers and ACE inhibitors. Kidney Int, 42:1232-7, 1992. PERAZELLA, M.A. Pharmacologic options available to treat symptomatic intradialytic hypotension. Am J Kidney Dis, 38:S26-36, 2001. PEREIRA, B.J.; NATOV, S.N.; SUNDARAM, S.; SCHMID, C.H.; TRABELSI, F.R.; STROM, J.A.; KING, A.J. Impact of single use versus reuse of cellulose dialyzers on clinical parameters and indices of biocompatibility. J Am Soc Nephrol, 7:861-70, 1996. PETITJEAN, P.; BOERIU, S.; ISMER, M.; KUNZ, K.; HANNEDOUCHE, T. The dilemma of the last vascular access. Nephrologie, 22: 4614, 2001. PIERRATOS, A.; OUWENDYK, M.; FRANCOEUR, R.; VAS, S.; RAJ, D.S.; ECCLESTONE, A.M.; LANGOS, V.; ULDALL, R. Nocturnal hemodialysis: three-year experience. J Am Soc Nephrol, 9:859-68, 1998. PIERRATOS, A. Nocturnal home haemodialysis: an update on a 5year experience. Nephrol Dial Transplant, 14:2835-40, 1999. PISONI, R.L.; YOUNG, E.W.; DYKSTRA, D.M.; GREENWOOD, R.N.; HECKING, E.; GILLEPSIE, B.; WOLFE, R.A.; GOODKIN, D.A.; HELD, P.J. Vascular access use in Europe and the United States: Results from the DOPPS. Kidney Int, 61:305-16, 2002. PORT, F.K.; JOHNSON, W.J.; KLASS, D.W. Prevention of dialysis disequilibrium syndrome by use of high sodium concentration in the dialysate. Kidney Int, 3:327-33, 1973. PORT, F.K.; WOLFE, R.A.; HULBERT-SHEARON, T.E.; DAUGIRDAS, J.T.; AGODOA, L.Y.; JONES, C.; ORZOL, S.M.; HELD, P.J. Mortality risk by hemodialyzer reuse practice and dialyzer membrane characteristics: Results from the USRDS dialysis morbidity and mortality study. Am J Kidney Dis, 37:276-86, 2001. QUINTON, W.; DILLARD, D.; SCRIBNER, B.H. Cannulation of blood vessels for prolonged hemodialysis. Trans ASAIO, 6:104, 1960. RAINE, A.E. The susceptible patient. Nephrol Dial Transplant, 11(Supl 2):6-10, 1996. RAJ, D.S.; CHARRA, B.; PIERRATOS, A.; WORK, J. In search of ideal hemodialysis: is prolonged frequent dialysis the answer? Am J Kidney Dis, 34:597-610, 1999. RAMIREZ, G.; BERCAW, B.L.; BUTCHER, D.E.; MATHIS, H.L.; BRUEGGEMEYER, C.; NEWTON, J.L. The role of glucose in hemodialysis: The effects of glucose-free dialysate. Am J Kidney Dis, 7:41320, 1986. ROCA, A.O.; JARJOURA, D.; BLEND, D.; CUGINO, A.; RUTECKI, G.W. NUCHIKAT, P.S.; WHITTIER, P.C. Dialysis leg cramps. Efficacy of quinine versus vitamin E. ASAIO J, 38:M481-5, 1992. ROCHA, H. A Nefrologia no Brasil: alguns aspectos de sua evolução histórica. J Bras Nefrol, 15:107-125, 1993. ROCKLIN, M.A.; DWIGHT, C.A.; CALLEN, L.J.; BISPHAM, B.Z.; SPIEGEL, D.M. Comparison of cuffed tunneled hemodialysis catheter survival. Am J Kidney Dis, 37:557-563, 2001. RODRIGO, F.; SHIDEMAN, J.; MCHUGH, R.; BUSELMEIER, T.; KJELLSTRAND, C. Osmolality changes during hemodialysis. Natural history, clinical correlations, and influence of dialysate glucose and intravenous mannitol. Ann Intern Med, 86:554-61, 1977. ROMÃO, Jr, J.E.; MION Jr, D. Primórdios da hemodiálise no Brasil. J Bras Nefrol, 16:192-194, 1994. RONCO, C.; FABRIS, A.; CHIARAMONTE, S. et al. Comparison of four different short dialysis techniques. Int J Artif Organs, 11:169-74, 1988. ROUBY, J.J.; ROTTEMBOURG, J.; DURANDE, J.P.; BASSET, J.Y.; LEGRAIN, M. Importance of the plasma refilling rate in the genesis of hypovolaemic hypotension during regular dialysis and controlled sequential ultrafiltration-haemodialysis. Proc Eur Dial Transplant Assoc, 15:239-44, 1978. RUDNICK, J.R.; ARDUINO, M.J.; JARVIS, W.R. et al. An outbreak of pyrogenic reactions in chronic hemodialysis patients associated with hemodialyzer reuse. Artif Organs, 19:289-94, 1995. RUSTKY, E.A.; ROSTAND, S.G. Treatment of uremic pericarditis and pericardial effusion. Am J Kidney Dis, 10:2-8, 1987.
906
Hemodiálise
244. SAAD, T.F. Central venous dialysis catheters: Catheter-associated infection. Semin Dial, 14:446-51, 2001. 245. SAGEDAL, S.; HARTMANN, A.; SUNDSTROM, K.; BJORNSEN, S.; FAUCHALD, P.; BROSSTAD, F. A single dose of dalteparin effectively prevents clotting during haemodialysis. Nephrol Dial Transplant, 14:1943-7, 1999. 246. SALTISSI, D.; MORGAN, C.; WESTHUYZEN, J.; HEALY, H. Comparison of low-molecular-weight heparin (enoxaparin sodium) and standard unfractionated heparin for haemodialysis anticoagulation. Nephrol Dial Transplant ,14:2698-703, 1999. 247. SALUSKY, I.B.; FOLEY, J.; NELSON, P.; GOODMAN, W.G. Aluminum accumulation during treatment with aluminum hydroxide and dialysis in children and young adults with chronic renal disease. N Engl J Med, 324:527-31, 1991. 248. SANTOS, J.P.; LOUREIRO, A.; CENDOROGLO NETO, M.; PEREIRA, B.J. Impact of dialysis room and reuse strategies on the incidence of hepatitis C virus in haemodialysis units. Nephrol Dial Transplant ,11:2017-22, 1996. 249. SCHMITZ, P.G.; Mc CLOUD, L.K.; REIKIS, S.T.; LEONARD, C.L.; GELLENS, M.E. Prophylaxis of hemodialysis graft thrombosis with fish oil: Double-blind, randomized, prospective trial. J Am Soc Nephrol, 13:184-90, 2002. 250. SCHNEDITZ, D.; KAUFMAN, A.M.; POLASCHEGG, H.D.; LEVIN, N.W.; DAUGIRDAS, J.T. Cardiopulmonary recirculation during hemodialysis. Kidney Int, 42:1450-6, 1992. 251. SCHOENFELD, P.Y. The technology of dialyzer reuse. Sem Nephrol, 17:321-30, 1997. 252. SCHWAB, S.J.; BEATHARD, G. The hemodialysis catheter conundrum: Hate living with them, can’t live without them. Kidney Int, 561-17, 1999. 253. SCHWAB, S.J.; OLIVER, M.J.; SUHOCKI, P.; McCANN, R. Hemodialysis arteriovenous access: Detection of stenosis and response to treatment by vascular access blood flow. Kidney Int, 59:358-62, 2001. 254. SCHWAB, S.J.; ONORATO, J.J.; SHARAR, L.R.; DENNIS, P.A. Hemodialysis without anticoagulation. One-year prospective trial in hospitalized patients at risk for bleeding. Am J Med, 83:405-10, 1987. 255. SEHGAL, A.; SNOW, R.J.; SINDER, M.E.; AMINI, S.B.; DEOREO, P.B.; SILVER, M.R.; CEBUL, R.D. Barriers to adequate delivery of hemodialysis. Am J Kidney Dis, 31:593-601, 1998. 256. SESSO, R. Inquérito epidemiológico em unidades de diálise no Brasil. J Bras Nefrol, 22:S23-26, 2000. 257. SEXTON, D.J. Vascular access infections in patients undergoing dialysis with special emphasis on the role and treatment of Staphylococus aureus. Infect Dis Clin North Am, 15:731-42, 2001. 258. SHAPIRO, W.B.; FAUBERT, P.F.; PORUSH, J.G.; CHOU, S.Y. Lowdose heparin in routine hemodialysis monitored by activated partial thromboplastin time. Artif Organs, 3:73-7, 1979. 259. SHERMAN, R.A.; BIALY, G.B.; GAZINSKI, B.; BERNHOLC, A.S.; EISINGER, R.P. The effect of dialysate calcium levels on blood pressure during hemodialysis. Am J Kidney Dis, 8:244-7, 1986. 260. SHERMAN, R.A.; CODY, R.P.; ROGERS, M.E.; SOLANCHICK, J.C. The Effect of dialyzer reuse on dialysis delivery. Am J Kidney Dis, 24:924-6, 1994. 261. SHIMIZU, A.G.; TAYLOR, D.W.; SACKETT, D.L.; SMITH, E.K.; BARNES, C.C.; HODA, P.; LENNOX, G.; MARTIN, J.; MCNEANEY, H.; MUKHERJEE, J. Reducing patient morbidity from highefficiency hemodialysis: A double-blind crossover trial. Trans Am Soc Artif Intern Organs, 29:666-8, 1983. 262. SHINZATO, T.; NAKAI, S.; AKIBA, T.; YAMAZAKI, C.; SASAKI, R.; KITAOKA, T.; KUBO, K.; SHINODA, T.; KUROKAWA, K.; MARUMO, F.; SATO, T.; MAEDA, K. Survival in long-term haemodialysis patients: Results from the annual survey of the Japanese Society for Dialysis Therapy. Nephrol Dial Transplant, 12:884-8, 1997. 263. SHRIVASTAVA, D.; LUNDIN, A.P.; DOSUNMU, B.; RAO, T.K.; BEYER, M.M.; FRIEDMAN, E.A. Salvage of clotted jugular vein hemodialysis catheters. Nephron, 68:77-9, 1994. 264. SHUSTERMAN, N.H.; FELDMAN, H.I.; STROM, B.L. et al.
265. 266.
267.
268.
269.
270.
271.
272.
273. 274.
275.
276.
277. 278.
279.
280. 281.
282.
283.
284.
Reprocessing of hemodialyzers: A critical apprasail. Am J Kidney Dis, 14:81-91, 1989. SILVA, A.M.M.; MARTINS, C.T.B.; FERRABOLI, R.; JORGETTE, W.; ROMÃO Jr, J.E. Água para hemodiálise. J Bras Nefrol, 18:180-8, 1996. SILVER, S.M.; De SIMONE, J.A. JR; SMITH, D.A.; STERNS, R.H. Dialysis disequilibrium syndrome (DDS) in the rat: Role of the “reverse urea effect”. Kidney Int, 42:161-6, 1992. SMITS, J.H.M.; VAN DER LINDEN, L.; HAGEN, E.C.; MODDERKOLK-CAMMERAAT, E.C.; FEITH, G.W.; KOOMANS, H.A.; VAN DER DORPEL, M.A.; BLANKESTIJN, P.J. Graft surveillance: Venous pressure, access flow, or the combination? Kidney Int, 59:1551-8, 2001. SPERSCHNEIDER, H.; DEPPISCH, R.; BECK, W.; WOLF, H.; STEIN, G. Impact of membrane choice and blood flow pattern on coagulation and heparin requirement—potential consequences on lipid concentrations. Nephrol Dial Transplant, 12:2638-46, 1997. SRIDHAR, N.R.; FERRAND, K.; REGER, D.; HAYES, P.; PINNAVAIA, L.; BUTTS, D.; KOHLI, R.; PAPANDENATOS, G. Urea kinetics with dialyzer reuse: A prospective study. Am J Nephrol, 19:668-73, 1999. STEUER, R.R.; MILLER, D.R.; ZHANG, S.; BELL, D.A.; LEYPOLDT, J.K. Noninvasive transcutaneous determination of access blood flow rate. Kidney Int, 60:284-91, 2001. STEVENSON, K.B.; HANNAH, E.L.; LOWDER, C.A.; ADCOX, M.J.; DAVIDSON, R.L.; MALLEA, M.C.; NARASIMHAN, N.; WAGNILD, J.P. Epidemiology of hemodialysis vascular access infections from longitudinal infections surveillance data: Predicting the impact of NKF-DOQI clinical practice guidelines for vascular access. Am J Kidney Dis, 39:549-55, 2002. SUDA, T.; HIROSHIGE, K.; OHTA, T.; WATANABE, Y.; IWAMOTO, M.; KANEGAE, K.; OHTANI, A.; NAKASHIMA, Y. The contribution of residual renal function to overall nutritional status in chronic haemodialysis patients. Nephrol Dial Transplant, 15:396401, 2000. SUKHATME, V.P. Vascular access stenosis: Prospects for prevention and therapy. Kidney Int, 49:1161-74, 1996. SUNDARAM, S.; BARRETT, T.W.; MEYER, K.B.; PERRELLA, C.; NETO, M.C.; KING, A.J.; PEREIRA, B.J. Transmembrane passage of cytokine-inducing bacterial. J Am Soc Nephrol, 7:2183-91, 1996. SWARTZ, R.D.; PORT, F.K. Preventing hemorrhage in high-risk hemodialysis: Regional versus low-dose heparin. Kidney Int, 16:5138, 1979. SWEET, S.J.; MCCARTHY, S.; STEINGART, R.; CALLAHAN, T. Hemolytic reactions mechanically induced by kinked hemodialysis lines. Am J Kidney Dis, 27:262-6, 1996. SWINFORD, R.D.; BAID, S.; PASCUAL, M. Dialysis membrane adsorption during CRRT. Am J Kidney Dis, 30:S32-7, 1997. SZCZECH, L.A.; LOWRIE, E.G.; LI, Z.; LEW, N.L.; LAZARUS, J.M.; OWEN, Jr, W.F. Changing hemodialysis thresholds for optimal survival. Kidney Int, 59:738-45, 2001. SZNAJDER, J.I.; ZVEIBIL, F.R.; BITTERMAN, H.; WEINER, P.; BURSZTEIN, S. Central vein catheterization. Failure and complication rates by three percutaneous approaches. Arch Intern Med, 146:259-61, 1986. TALSTAD, I.; KJELBY, K. Analysis of heparinization methods during hemodialysis. Am J Clin Pathol, 84:317-22, 1985. TANRIOVER, B.; CARLTON, D.; SADDEKNI, S.; HAMRICK, K.; OSER, R.; WESTFALL, A.O.; ALLON, M. Bacteremia asociated with tunneled dialysis catheters: Comparison of two treatment strategies. Kidney Int, 57:2151-5, 2000. Task Force on Reuse of Dialyzers, Council on Dialysis. National Kidney Foundation report on dialyzer reuse. Am J Kidney Dis, 30:85987, 1997. TOKARS, J.I.; GEHR, T.; JARVIS, W.R.; ANDERSON, J.; ARMISTEAD, N.; MILLER, E.R.; PARRISH, J.; QAIYUMI, S.; ARDUINO, M.; HOLT, S.C.; TENOVER, F.C.; WESTBROOK, G.; LIGHT, P. Vancomycin-resistant enterococci colonization in patients at seven hemodialysis centers. Kidney Int, 60:1511-6, 2001. TONELLI, M.; JINDAL, K.; HIRSCH, D.; TAYLOR, S.; KANE, C.;
capítulo 49
285. 286.
287.
288. 289.
290.
291.
292.
293.
294.
295. 296. 297.
298.
299.
300.
301.
HENBREY, S. Screening for subclinical stenosis in native vessel arteriovenous fistula. J Am Soc Nephrol, 12:1729-33, 2001. TONG, M.K.H.; WANG, W.; KWAN, T.H.; CHAN, L.; AU, TC. Water treatment for hemodialysis. Hong Kong J Nephrol, 3:7-14, 2001. TOUAM, M.; MARTINEZ, F.; LACOUR, B.; BOURDON, R.; ZINGRAFF, J.; DI GIULIO, S.; DRUEKE, T. Aluminum-induced, reversible microcytic anemia in chronic renal failure: Clinical and experimental studies. Clin Nephrol, 19:295-8, 1983. TURMEL-RODRIGUEZ, L.; PENGLOAN, J.; RODRIGUE, H.; BRILLET, G.; LATASTE, A.; PIERRE, D.; JOURDAN, J.L.; BLANCHARD, D. Treatment of failed native arteriovenous fistula for hemodialysis by interventional radiology. Kidney Int, 57:1124-40, 2000. TWARDOWSKY, Z.J. Daily home hemodialysis: A hybrid of hemodialysis and peritoneal dialysis. Adv Renal Replace Ther, 3:124-32, 1995. ULDALL, P.R.; WOODS, F.; BIRD, M.; DYCK, R. Subclavian cannula for temporary haemodialysis. Proc Clin Dial Transplant Forum, 9:26872, 1979. VAN ACKER, B.A.; KOOMEN, G.C.; KOOPMAN, M.G.; DE WAART, D.R.; ARISZ, L. Creatinine clearance during cimetidine administration for measurement of glomerular filtration rate. Lancet, 340:1326-9, 1992. VAN DER NIEPEN, P.; SENNESAEL, J.S.; VERBEELEN, D.L Prevention of anaphylactoid reactions to high-flux membrane dialysis and ACE inhibitors by calcium. Nephrol Dial Transplant, 9:87-9, 1994. VAN DER SANDE, F.M.; LUIK, A.J.; KOOMAN, J.P.; VERSTAPPEN, V.; LEUNISSEN, K.M. Effect of intravenous fluids on blood pressure course during hemodialysis in hypotensive-prone patients. J Am Soc Nephrol, 11:550-5, 2000. VERNHET, H.; DOGAS, G.; SENAC, J.P. Dysfonctionnements des cathéters veineux centraux: rôle du radiologue. Nephrologie, 22:4257, 2001. VIENKEN, J.; DIAMANTOGLOU, M.; HAHN, C.; KAMUSEWITZ, H.; PAUL, D. Considerations on developmental aspects of biocompatible membranes. Artif Organs, 19:398-404, 1995. WARD, M.K.; SHADFORTH, M.; HILL, A.V.L.; KER, D.N.S. Air embolism during haemodialysis. Br Med J, 3:74-8 , 1971. WARD, R.A. Heparinization for routine hemodialysis. Adv Ren Replace Ther, 2:362-70, 1995. WARRAK, E.A.; VIANA, P.C.F.; COUTINHO, N.P.; VASCONCELLOS, M.S.F. Desobstrução não cirúrgica de fístula artério-venosa (Abstr). Anais do XVI Congresso Brasileiro de Nefrologia (Rio de Janeiro) 1:6, 1992. WATSON, P.E.; WATSON, I.D.; BATT, R.D. Total body water volumes for adult males and females estimated from simple anthropometric measurements. Am J Clin Nutr, 33:27-39, 1980. WESTHUYZEN, J.; FOREMAN, K.; FLEMING, S.J. et al. Effect of dialyzer reprocessing with Renalin on beta-2 microglobulin and complement activation in hemodialysis patients. Am J Nephrol, 12:2936, 1992. WILHELMSSON, S.; LINS, L.E. Whole-blood activated coagulation time for evaluation of heparin activity during hemodialysis: A comparison of administration by single-dose and by infusion. Clin Nephrol, 19:82-6, 1983. WINDUS, D.W. Permanent vascular access: A nephrologist’s view. Am J Kidney Dis, 21:457-71, 1993.
907
302. WING, A.J. Optimum calcium concentration of dialysis fluid for hemodialysis. Br Med J, 4:145-9, 1968. 303. WOLFE, R.A.; ASHBY, V.B.; DAUGIRDAS, J.T.; AGODOA, L.Y.; JONES, C.A.; PORT, F.K. Body size, dose of hemodialysis, and mortality. Am J Kidney Dis, 35:80-8, 2000. 304. WOLFE, R.A.; HELD, P.J.; HULBERT-SHEARON, T.E.; AGODOA, L.Y.; PORT, F.K. A critical examination of trends in outcomes over the last decade. Am J Kidney Dis, 32:S9-15, 1998. 305. WOLFRAM, G.; SITTER, T.; GOTTSMANN, M.; GERZER, R.; SCHIFFL, H. Assessment of dry weight in haemodialysis patients by the volume markers ANP and cGMP. Nephrol Dial Transplant, 11:S28-30, 1996. 306. WOODS, H.F.; NANDAKUMAR, M. Improved outcome for haemodialysis patients treated with high-flux membranes. Nephrol Dial Transplant, 15:S36-42, 2000. 307. WORK, J. Chronic catheter placement. Semin Dial, 14:436-40, 2001. 308. XUE, J.L.; MA, J.Z.; LOUIS, T.A.; COLLINS, A.J. Forecast of the number of patients with end-stage renal disease in the United States to the year 2010. J Am Soc Nephrol, 12:2753-2758, 2001. 309. ZUSMAN, R.M. Effects of converting-enzyme inhibitors on the renin-angiotensin-aldosterone, bradykinin, and arachidonic acidprostaglandin systems: Correlation of chemical structure and biologic activity. Am J Kidney Dis, 10(Suppl 1):S13-23, 1987.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Palestra de Água para Hemodiálise http://www.wramc.amedd.army.mil/departments/medicine/ Nephrology/education/Lectures/hemodialysis-water-talkJun-1998 Ward R. The do’s and Dont’s in Water Treatment for Hemodialysis. http://www.hdcn.com/symp/00asn/ward/ward1.htm ABCDT: Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante http://www.abcdt.org.br SBN: Sociedade Brasileira de Nefrologia http://www.sbn.org.br Hypertension, Dialysis, and Clinical Nephrology www.hdcn.com National Institutes of Health / National Institute of Diabetes and Digestive and Kidney Disease www.niddk.nih.gov United States Renal Data System www.usrds.org National Kidney Foundation / Kidney Disease Outcomes Quality Initiative www.kidney.org/professionals/ Center for Disease Control and Prevention www.cdc.gov
Capítulo
50
Métodos Hemodialíticos Contínuos para Tratamento da Insuficiência Renal Aguda Maristela Carvalho da Costa, Américo Lourenço Cuvello Neto e Luis Yu
INTRODUÇÃO
ESCOLHA DO TRATAMENTO DIALÍTICO NA IRA
HISTÓRICO
ADEQUAÇÃO DE DIÁLISE
MECANISMOS DE TRANSPORTE DE SOLUTOS
MÉTODOS CONTÍNUOS VERSUS HEMODIÁLISE INTERMITENTE
NOMENCLATURA ACESSO VASCULAR
INDICAÇÕES NÃO-RENAIS DOS MÉTODOS CONTÍNUOS
ASPECTOS TÉCNICOS DOS MÉTODOS HEMODIALÍTICOS
CONSIDERAÇÕES FINAIS BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
CONTÍNUOS ANTICOAGULAÇÃO
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
SOLUÇÃO DE REPOSIÇÃO
INTRODUÇÃO Os estudos epidemiológicos sobre insuficiência renal aguda (IRA) revelam que a maioria dos casos atuais ocorre nas unidades de terapia intensiva (UTI), onde a incidência pode chegar a 30%, ao contrário de uma incidência hospitalar geral de 3-5%. Atualmente, os pacientes portadores de IRA são mais idosos e freqüentemente apresentam outras comorbidades, tais como doenças cardiovasculares. A mortalidade destes pacientes tem permanecido inalterada ao longo dos últimos anos, variando entre 40% e 90%, a despeito dos enormes avanços nas terapêuticas intensiva e dialítica. Cerca de 50% dos pacientes portadores de IRA necessitam de suporte dialítico. Para exemplificar esta situação, a casuística do Grupo de Insuficiência Renal Aguda do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Grupo IRA — HCFMUSP), nos últimos cinco anos com aproximadamente 5.000 pacientes, demonstra que 37% deles encontravamse em unidades de terapia intensiva, sendo que 54% destes pacientes necessitaram de tratamento dialítico. A mortalidade global foi de 50%, porém, no grupo de pacientes oriundos das UTI, a mortalidade foi de cerca de 80%.
O tratamento dialítico da IRA inclui os métodos convencionais: hemodiálise intermitente (HD) e diálise peritoneal (DP), discutidos em capítulo anterior (v. Caps. 49 e 51), e, mais recentemente, os métodos hemodialíticos contínuos, que vêm sendo cada vez mais utilizados, principalmente nas unidades de terapia intensiva. Esta tendência está sendo observada no Grupo IRA-HCFMUSP (Fig. 50.1).
HISTÓRICO A primeira técnica a ser utilizada como método dialítico contínuo foi a hemofiltração artério-venosa (CAVH), descrita por Peter Kramer em 1977. A CAVH foi rapidamente aceita como método de tratamento para a insuficiência renal em decorrência de sua simplicidade técnica. Entretanto, a eficiência mostrou-se limitada quando comparada à hemodiálise intermitente, principalmente em pacientes hipercatabólicos. Além disto, o volume de ultrafiltrado, obtido apenas pela pressão arterial, era freqüentemente insuficiente. A manufatura de cateteres vasculares com duplo-lúmen e a colocação de uma bomba peristáltica no sistema permitiram a obtenção de controles volêmico e metabólico mais adequados atra-
909
capítulo 50
Fig. 50.1 Métodos dialíticos realizados pelo Grupo IRAHCFMUSP no período de 1997 a 2000. CRRT: terapia contínua de substituição renal; DP: diálise peritoneal; HDI: hemodiálise intermitente.
vés da hemofiltração veno-venosa (CVVH). A eficácia do método foi aumentada ao se criar uma entrada adicional no hemofiltro, pela qual passou-se banho de diálise (dialisato), elaborando-se, desta maneira, a hemodiafiltração artério-venosa contínua (CAVHDF).
MECANISMOS DE TRANSPORTE DE SOLUTOS Para melhor compreensão dos métodos hemodialíticos contínuos, alguns conceitos sobre os princípios físicos que regem o transporte de solutos serão revisados: DIFUSÃO. Corresponde à passagem de soluto por uma membrana semipermeável através de um gradiente de concentração. Além da diferença de concentração, depende diretamente da temperatura, da área da superfície de troca e da difusibilidade do soluto através da membrana, sendo inversamente proporcional à espessura desta. CONVECÇÃO. Transporte de soluto através de uma membrana semipermeável junto ao solvente e, portanto, subordinado ao gradiente de pressão transmembrana (PTM). Depende da taxa de ultrafiltração, da permeabilidade da membrana e da concentração plasmática do soluto. ULTRAFILTRAÇÃO. Separação de plasma do sangue total pela passagem através de uma membrana semipermeável a favor de um gradiente pressórico. ADSORÇÃO. Separação do soluto em decorrência de sua ligação a sítios presentes na membrana semipermeável. Estes sítios de ligação tornam-se saturados durante o procedimento.
permitindo a escolha entre diferentes tipos com diversas propriedades em relação a difusão, convecção e adsorção. As publicações nesta área continuaram a descrever as diferentes técnicas com denominações e abreviações diferentes, criando dificuldades na compreensão e na elaboração de estudos multicêntricos. Não há, ainda, consenso em relação à nomenclatura utilizada para especificar estes métodos dialíticos. A nomenclatura utilizada neste capítulo baseia-se nas características operacionais de cada método, com ênfase nas forças primárias para a remoção de líquidos e solutos, não se considerando a descrição de seus componentes. As siglas empregadas são as mesmas do original em língua inglesa. TERAPIA DE SUBSTITUIÇÃO RENAL CONTÍNUA. Qualquer circuito extracorpóreo para substituir a função renal durante um período prolongado, normalmente em torno de 24 h/dia (Fig. 50.2). CAVH — HEMOFILTRAÇÃO ARTÉRIO-VENOSA CONTÍNUA. São implantados dois cateteres, arterial e venoso, com o sangue sendo impulsionado pela pressão arterial do paciente por um circuito extracorpóreo com filtro de membrana altamente permeável. O ultrafiltrado produzido é reposto, parcial ou totalmente, com solução balanceada. Os solutos são retirados por convecção. CVVH — HEMOFILTRAÇÃO VENO-VENOSA CONTÍNUA. Utiliza-se cateter venoso com duplo-lúmen, havendo necessidade de bomba-rolete para a circulação do sangue. O filtro tem alta permeabilidade e é necessária a reposição de fluidos. A retirada de solutos ocorre por convecção. SCUF — ULTRAFILTRAÇÃO LENTA CONTÍNUA. Esta modalidade pode ser realizada por acesso artériovenoso ou veno-venoso com bomba-rolete. A membrana normalmente tem alta permeabilidade e não há passagem de dialisato ou necessidade de reposição. O mecanismo básico é a convecção.
Reposição pré-dilucional
Qba
Dialisato
Reposição pós-dilucional
Qbv
Bomba-rolete Efluente
NOMENCLATURA Os métodos hemodialíticos contínuos vêm sendo utilizados no tratamento de pacientes críticos com insuficiência renal há mais de 15 anos. Neste período, muitas técnicas se desenvolveram e membranas foram aperfeiçoadas,
Fig. 50.2 Representação esquemática de um circuito extracorpóreo de substituição renal contínua. As linhas tracejadas indicam componentes que variam de acordo com a modalidade escolhida (Qba: fluxo de sangue arterial; Qbv: fluxo de sangue venoso).
910
Métodos Hemodialíticos Contínuos para Tratamento da Insuficiência Renal Aguda
CAVHDF — HEMODIAFILTRAÇÃO ARTÉRIO-VENOSA CONTÍNUA. O circuito da CAVH é modificado pela adição de dialisato em contracorrente ao fluxo de sangue. A remoção de solutos se faz por convecção e difusão, com aumento significante da eficiência do procedimento. CVVHDF — HEMODIAFILTRAÇÃO VENO-VENOSA CONTÍNUA. Semelhante à CAVHDF, com exceção da via de acesso (veno-venosa) e da necessidade de bomba-rolete. CAVHD — HEMODIÁLISE ARTÉRIO-VENOSA CONTÍNUA. A membrana usada é de baixa permeabilidade, não havendo necessidade de reposição de fluidos. Passa-se o dialisato em sentido contracorrente ao fluxo de sangue, ocorrendo o transporte de solutos predominantemente por difusão. CVVHD — HEMODIÁLISE VENO-VENOSA CONTÍNUA (“HEMOLENTA”). É o método mais utilizado pela simplicidade dos equipamentos, podendo ser realizado apenas com uma bomba-rolete e filtro de baixa permeabilidade hidráulica, não havendo necessidade de reposição. O clearance de solutos pode ser aumentado pela administração de maiores volumes de dialisato (2 a 3 L/h). CHFD — DIÁLISE DE ALTO FLUXO CONTÍNUA. A remoção dos solutos é dependente do tipo de membrana utilizada. No caso de membranas de alto fluxo, os solutos são removidos por convecção e difusão. A taxa de ultrafiltração é limitada por um sistema de controle com ultrafiltração retrógrada, sem necessidade de reposição pós-dilucional. EDD OU SLED — DIÁLISE DIÁRIA ESTENDIDA OU DIÁLISE SUSTENTADA DE BAIXA EFICIÊNCIA. Este método utiliza máquinas de hemodiálise convencionais, de proporção, com controle de ultrafiltração e filtros com membrana de baixa permeabilidade, sendo os fluxos de sangue (Qb) e de dialisato (Qd) menores do que aqueles empregados na hemodiálise intermitente (Qb 200 ml/ min e Qd 100-300 ml/min). O acesso é veno-venoso e a duração de 6 a 8 horas. O clearance de solutos acontece principalmente por difusão. Constitui-se em terapêutica híbrida, onde os princípios dos métodos contínuos e intermi-
tentes se mesclam e, portanto, têm eficiência intermediária, uma vez que os baixos fluxos são compensados pela freqüência diária. O equipamento é o mesmo utilizado pelos pacientes em programa de diálise crônica, resultando em maior facilidade técnica e menor custo. Outra vantagem é a possibilidade de sua execução no período noturno, permitindo a mobilização do paciente durante o dia para fisioterapia e realização de exames complementares. Kumar e cols. estudaram 42 pacientes com IRA e compararam EDD (n 25) e CVVH (n 17). Os dois grupos não apresentavam diferenças quanto à gravidade, ao percentual de hipotensão arterial e ao volume de ultrafiltrado retirado. Todavia, a dose de heparina foi menor nos pacientes submetidos à EDD, resultando em menor incidência de sangramentos. As características operacionais dos métodos hemodialíticos estão resumidas no Quadro 50.1.
Pontos-chave: • A maioria dos casos atuais ocorre nas unidades de terapia intensiva • Os pacientes portadores de IRA são mais idosos e freqüentemente apresentam outras comorbidades • A mortalidade destes pacientes tem permanecido inalterada ao longo dos últimos anos, variando entre 40% e 90% • Cerca de 50% dos pacientes portadores de IRA necessitam de suporte dialítico • O tratamento dialítico da IRA inclui os métodos convencionais: hemodiálise intermitente (HD) e diálise peritoneal (DP), e, mais recentemente, os métodos hemodialíticos contínuos que vêm sendo cada vez mais utilizados
Quadro 50.1 Características operacionais dos métodos hemodialíticos contínuos MÉTODO
ACESSO
BOMBAROLETE
MEMBRANA (permeabilidade)
DIALISATO
REPOSIÇÃO
CLEARANCE
CAVH CVVH SCUF CAVHDF
artério-venoso veno-venoso AV / VV artério-venoso
não sim não / sim não
alta alta alta alta
não não não sim
sim sim não sim
CVVHDF
veno-venoso
sim
alta
sim
sim
artério-venoso veno-venoso veno-venoso
não sim sim
baixa baixa alta
sim sim sim
não não não
convectivo convectivo convectivo convectivo e difusional convectivo e difusional difusional difusional difusional
CAVHD CVVHD EDD/SLED
911
capítulo 50
ACESSO VASCULAR Os métodos hemodialíticos contínuos necessitam obrigatoriamente de uma via de acesso vascular. Os cateteres são, preferencialmente, feitos de material biocompatível, flexíveis, resistentes à invasão bacteriana e fáceis de manusear. Aqueles com único lúmen são utilizados para os métodos artério-venosos (CAVH, CAVHD, CAVHDF, SCUF). A hemodiálise clássica, CVVH, CVVHD, CVVHDF e EDD necessitam, para sua realização, de cateteres de duplo-lúmen, uma vez que o sangue é impulsionado através de bomba-rolete. Para pacientes agudos, utilizam-se cateteres semi-rígidos, sendo a maioria de poliuretano, material que tem sido referido como pouco trombogênico. O comprimento do cateter é variável. Cateteres de curta permanência, sem túnel, para inserção em veia subclávia direita ou jugular interna, não devem ter mais do que 15 cm, enquanto aqueles colocados no lado esquerdo devem ter de 19 a 20 cm e os posicionados em veia femoral podem ter 24 cm ou mais (cateteres mais curtos apresentam maior recirculação com menor eficiência dialítica). Em relação às complicações decorrentes da colocação dos acessos vasculares, estas podem ser imediatas ou tardias: • Imediatas — a principal complicação é o sangramento descontrolado. Uma vez que os pacientes críticos comumente apresentam coagulopatias, plaquetopenia, alterações hepáticas e distúrbios de coagulação causados por drogas, tornam-se os de maior risco para a passagem de cateteres. A inserção femoral é a mais indicada quando da existência destas alterações, pois, em casos de acidentes de punção, o sangramento nesta região é de mais fácil controle. Entretanto, é importante lembrar que uma lesão femoral grave pode causar um grande sangramento e dissecção do hematoma até o espaço retroperitoneal, podendo ser necessário intervenção cirúrgica. O Grupo IRA-HCFMUSP tem optado por esta via também para os pacientes com quadros respiratórios graves que se encontram em ventilação mecânica, usando altas pressões expiratórias, potencializando assim o risco de pneumotórax com os acessos cervicais. A incidência de pneumotórax após punção de subclávia ou jugular é pequena (2%), porém depende da experiência do profissional que realiza o procedimento. Para uma passagem de cateteres vasculares mais segura, alguns centros dispõem de um aparelho portátil de ultra-sonografia, o qual é capaz de guiar a punção corretamente. Outras complicações imediatas mais raras são embolia gasosa, fístula para a carótida comum, trombo em átrio direito, tamponamento pericárdico e arritmias. • Tardias — as principais complicações tardias são as infecções. Nestes casos, é obrigatória a retirada do cateter. O uso de antibióticos após a retirada dependerá do estado clínico do paciente e da existência de hemoculturas posi-
tivas para crescimento bacteriano. A estenose venosa é mais comum em cateteres colocados na veia subclávia.
ASPECTOS TÉCNICOS DOS MÉTODOS HEMODIALÍTICOS CONTÍNUOS A necessidade de cateterização arterial e o clearance de solutos reduzido (10-12 ml/min para pequenos solutos como, por exemplo, a uréia) representaram limitações ao uso da CAVH. As modificações técnicas iniciais, tais como a infusão da solução de reposição antes do filtro (pré-diluição), melhoraram o clearance de uréia, porém o avanço técnico mais significativo foi a passagem de banho de diálise pelo sistema, resultando em um clearance adicional decorrente da difusão de solutos (CAVHDF). Com o advento da CAVHDF, a hemodiálise intermitente passou a ser menos utilizada, uma vez que o controle da uremia poderia ser atingido em todos os pacientes, independentemente do peso corpóreo ou do estado catabólico, simplesmente pelo aumento do fluxo de dialisato para 1,5 a 2 L/h. As técnicas artério-venosas, com a vantagem de não necessitarem de uma bomba peristáltica, apresentam morbidade associada à canulização arterial. Por esta razão, as técnicas veno-venosas são as mais seguras e utilizadas. Quando o tratamento veno-venoso é instituído, o fluxo de sangue é controlado pela bomba-rolete e são instalados detectores de ar apropriados e monitores de pressão. Em determinadas situações, tanto a CVVH quanto a CVVHDF podem ser escolhidas, pois ambas conferem controle adequado da uremia. Os métodos contínuos se diferenciam por quatro características: tipo de membrana; mecanismo de transporte de soluto; passagem ou não de dialisato e tipo de acesso vascular. As membranas podem ser de alta ou baixa permeabilidade hidráulica, sendo as últimas constituídas por celulose ou celulose modificada. Estas são utilizadas principalmente para difusão. Assim, o dialisato é instalado em sentido contracorrente ao fluxo de sangue, de forma a otimizar o transporte de soluto (CVVHD). Esta técnica é eficiente para a remoção de uréia e de outras moléculas pequenas. Para a retirada de moléculas médias, as membranas sintéticas, com alta permeabilidade hidráulica, são as de primeira escolha. Neste caso, o transporte poderá ser unicamente convectivo (CVVH) ou misto (CVVHDF), pela passagem de dialisato. Na CVVH, o clearance é limitado pela quantidade de ultrafiltrado produzido, diferentemente da CVVHDF, onde a passagem de dialisato permite uma melhor combinação para a retirada de moléculas pequenas e médias. Novos equipamentos têm sido manufaturados com o intuito de tornar os métodos contínuos mais seguros e eficientes. Assim, controle refinado de ultrafiltração, permeabilidades hidráulicas elevadas, infusão da solução de reposição pré- e pós-filtro, fluxos de sangue e de banho otimizados são controláveis nas máquinas atuais.
912
Métodos Hemodialíticos Contínuos para Tratamento da Insuficiência Renal Aguda
Na experiência do Grupo IRA, o uso destes equipamentos para realização de terapêutica dialítica contínua tem resultado em melhor manuseio do paciente e maior disposição da equipe de enfermagem para execução dos procedimentos hemodialíticos, pois estes tornam-se mais seguros e menos trabalhosos. Entretanto, vale ressaltar que os custos destes procedimentos ainda permanecem elevados quando comparados aos métodos hemodialíticos convencionais.
ANTICOAGULAÇÃO Na realização dos métodos hemodialíticos, a anticoagulação é obrigatória, interferindo diretamente na eficiência e na durabilidade da terapêutica dialítica. Vários métodos de anticoagulação encontram-se disponíveis para uso em sistemas hemodialíticos (Quadro 50.2), a heparina continua sendo o agente anticoagulante mais utilizado. No Grupo IRA, 70% dos procedimentos dialíticos contínuos são realizados com heparinização. O método ideal de anticoagulação corresponde àquele que oferece melhor patência dos filtros dialisadores sem, no entanto, aumentar o risco de hemorragias ou comprometer o equilíbrio metabólico dos pacientes. A técnica de avaliação do efeito anticoagulante deve ser simples e segura, existindo, idealmente, um antídoto à disposição. Na seleção do melhor método de anticoagulação, alguns fatores devem ser considerados: a técnica hemodialítica utilizada, o quadro clínico do paciente, a familiaridade com a droga disponível e a infra-estrutura para o ajuste de sua dose. As técnicas veno-venosas têm sido mais utilizadas por sua facilidade em requerer apenas uma única punção ve-
nosa e por propiciar uma depuração mais constante de solutos. Entretanto, os procedimentos veno-venosos apresentam ultrafiltração maior, resultando em maior viscosidade sanguínea, facilitando os mecanismos de coagulação. Bellomo e cols. compararam várias modalidades de terapia hemodialítica contínua e observaram maior patência dos filtros nos métodos artério-venosos. Por isso, grandes quantidades de volume, retiradas rapidamente, produzem aumento da coagulação dos dialisadores e menor eficiência dialítica. Em outro estudo, verificou-se que o nível do hematócrito (Ht) influencia a hemostasia de pacientes em CVVH. No grupo de pacientes com Ht 30% não houve aumento da coagulação, porém, naqueles com Ht 35%, ocorreu maior perda de patência dos filtros. Mau posicionamento ou dobras dos cateteres de duplo lúmen para hemodiálise representam fatores desencadeantes de coagulação do sistema. A escolha do agente anticoagulante deve ser individualizada para cada paciente e relacionada ao caso clínico. Assim, em hepatopatas, em pacientes com coagulação intravascular disseminada e no pós-operatório de grandes cirurgias, é imperativa a investigação de possíveis sangramentos espontâneos, bem como a determinação do número de plaquetas e dos tempos de coagulação para determinação do risco de anticoagulação (Quadro 50.3). Nestes grupos, os procedimentos sem anticoagulação ou com esquemas regionais trazem benefícios e menor incidência de complicações. Sabe-se que a anticoagulação pode interferir na eficiência dos métodos dialíticos, uma vez que a manutenção do sistema patente resulta em melhores taxas de redução de uréia. Para as membranas de alta permeabilidade hidráuli-
Quadro 50.2 Métodos de anticoagulação utilizados nas técnicas hemodialíticas contínuas Método
Priming do Filtro
Dose de Ataque
Manutenção
Monitoração
SF 0,9%
2L
150-250 ml pré-filtro
100-200 ml pré-filtro cada 15-20’
Visual
1 L SF 2.500 a 5.000 UI heparina
10-15 UI/kg
3-12 UI/kg/h
TCA 180-220” TTPA 1,5-2 o valor basal
1 L SF 0,9%
40 mg
10-40 mg
Anti-FXa 0,2-0,4 UI/ml
Heparina regional
1 L SF 2.500 a 5.000 UI heparina
10-15 UI/kg heparina
3-12 UI/kg/h protamina pós-filtro
TCA 180-220” TTPA 1,5-2 pós-filtro
Citrato regional
1 L SF 2.500 a 5.000 UI heparina
Citrato a 2,5% 180 a 200 ml/h
Citrato a 2,5% 180 a 200 ml/h gluconato de Ca2
TCA 180-220” Cálcio 1 a 1,2 mmol/l
Prostaciclina
1 L SF 2.500 a 5.000 UI heparina
Heparina 2-4 UI/kg 4-8 ng/min
4-8 ng/kg/min
Tromboelastograma, agregação plaquetária
Nafamostato
1 L SF 0,9%
-
0,1 mg/kg/min
TCA 180-220”
Hirudina
1 L SF 0,9%
-
0,04-0,08 mg/kg/dia
TTPA 1,5-2 o valor basal
Heparina
Heparina BPM
Heparina BPM = heparina de baixo peso molecular; TCA = tempo de coagulação ativado; TTPA = tempo de tromboplastina parcial ativado; FXa = fator X ativado
913
capítulo 50
Quadro 50.3 Critérios de alto risco para anticoagulação Contagem de plaquetas 60.000/ml Tempo parcial de tromboplastina ativado (TTPa) 60 segundos International normalized ratio (INR) para protrombina 2 Coagulação intravascular disseminada Insuficiência hepática grave Pós-operatório imediato
ca, pode-se usar a relação uréia do ultrafiltrado sobre a uréia plasmática. Valores menores que 0,6 traduzem baixa eficiência dialítica, indicando a necessidade de troca do filtro. Nos procedimentos que utilizam membranas de baixa permeabilidade hidráulica, o controle pode ser realizado pelo volume de ultrafiltrado: a diminuição deste por mais de três horas consecutivas e/ou a produção de volumes inferiores a 150 ou 200 ml/h, sem instabilidade hemodinâmica, podem significar coagulação do filtro e redução da eficiência. Entretanto, apesar de toda a monitoração, existem pacientes que coagulam o sistema extracorpóreo em pouco tempo. Estados de hipercoagulabilidade podem ser responsáveis por estas intercorrências. Outros fatores, tais como número de plaquetas maior que 250.000/ ml, antitrombina III 50% e fibrinogênio maior que 600 mg/dl, estão relacionados à diminuição da patência dos filtros. O Quadro 50.4 resume as vantagens e desvantagens dos diferentes métodos de anticoagulação.
Pontos-chave: Complicações decorrentes da colocação dos acessos vasculares • Imediatas — a principal complicação é o sangramento descontrolado • Tardias — as principais complicações tardias são as infecções • A estenose venosa é mais comum em cateteres colocados na veia subclávia • Os métodos contínuos se diferenciam por quatro características: tipo de membrana; mecanismo de transporte de soluto; passagem ou não de dialisato e tipo de acesso vascular • Na seleção do melhor método de anticoagulação, alguns fatores devem ser considerados: a técnica hemodialítica utilizada, o quadro clínico do paciente, a familiaridade com a droga disponível e a infra-estrutura para o ajuste de sua dose.
SOLUÇÃO DE REPOSIÇÃO O uso de membranas de alta permeabilidade e coeficiente de ultrafiltração elevado (acima de 25 ml/mmHg/h) resulta na retirada de 2.000 a 3.000 ml/h de água e solutos, principalmente bicarbonato, em pacientes submetidos a hemofiltração e hemodiafiltração. Parte deste volume deve ser reposto para evitar-se instabilidade hemodinâmica, distúrbios hidroeletrolíticos e do equilíbrio ácido-básico. A solução de reposição utilizada pelo Grupo IRAHCFMUSP tem a seguinte composição: Soro fisiológico 0,9% ............................................ Soro glicosado 5% ................................................ KCl 19,1% .............................................................. MgSO4 10% ............................................................ NaHCO3 10% ........................................................
700 ml 250 ml 1,5 ml 1,0 ml 30 ml
As concentrações eletrolíticas finais são (mEq/L): Na 140; K 3,75; Cl 105; HCO3 36; Mg 1. Nos pacientes diabéticos e em crianças, o soro glicosado deve ser substituído por água bidestilada. Outras modificações podem ser realizadas de acordo com as alterações eletrolíticas apresentadas pelo paciente. A reposição de cálcio se faz por outra via intravenosa através de infusão de gluconato de cálcio continuamente a cada 6 horas: Gluconato de cálcio 10% ..................................... 40 ml Soro glicosado 5% ................................................ 60 ml A reposição de fósforo é realizada de acordo com o nível sérico e monitorada uma vez ao dia. Todos os demais eletrólitos devem ser dosados pelo menos 3 vezes ao dia. A solução de reposição pode ser infundida antes do filtro (pré-dilucional) ou após o filtro (pós-dilucional). A reposição pré-dilucional apresenta como vantagem a maior patência dos hemofiltros, porém ocorre diminuição da depuração por difusão. Na reposição pós-dilucional, não existe a perda da eficiência da remoção de solutos, mas a patência dos filtros é menor. Atualmente, preconiza-se a reposição combinada, onde 1/3 da solução é infundida prédilucional e 2/3 pós-dilucional.
ESCOLHA DO TRATAMENTO DIALÍTICO NA IRA Na escolha do método dialítico, os seguintes aspectos devem ser analisados: eficiência dialítica, volume de ultrafiltração, vias de acesso e o método de anticoagulação. No Quadro 50.5, podem-se comparar os principais parâmetros dialíticos dos métodos contínuos. Além destas características, a escolha do método dialítico ideal deve considerar as condições clínicas dos pacientes portadores de IRA, sendo fundamentais o estado hemodinâmico e o grau de catabolismo. Embora não haja
914
Métodos Hemodialíticos Contínuos para Tratamento da Insuficiência Renal Aguda
Quadro 50.4 Vantagens e desvantagens dos métodos de anticoagulação MÉTODO
VANTAGENS
DESVANTAGENS
Solução salina
Sem uso de anticoagulante.
Pobre patência dos filtros.
Heparina
Método melhor estudado, fácil e barato.
Risco de sangramento, trombocitopenia.
Heparina BPM
Redução dos sangramentos e da trombocitopenia.
Custo alto, monitoração não disponível.
Heparina regional
Redução dos sangramentos.
Complexo, trombocitopenia e efeitos da protamina.
Citrato regional
Redução dos sangramentos e da trombocitopenia, melhor patência dos filtros.
Monitoração complexa, hipernatremia e alcalose metabólica.
Prostaciclina
Redução dos sangramentos e da trombocitopenia.
Monitoração complexa, hipotensão.
Nafamostato
Sem uso de heparina.
Pouca experiência.
Hirudina
Redução dos sangramentos e da trombocitopenia.
Pouca experiência.
ADEQUAÇÃO DE DIÁLISE
Quadro 50.5 Valores médios dos métodos dialíticos contínuos SCUF
CVVH
Ultrafiltrado (ml/h)
100
2.000
100
2.000
Ultrafiltrado (L/dia)
2,4
48
2,4
48
Dialisato (ml/h)
0
0
2.000
2.000
Reposição (L/dia)
0
46
0
46
1,7
32
36
56
Depuração de uréia (ml/min)
CVVHD CVVHDF
consenso sobre as indicações dos diferentes métodos dialíticos disponíveis para o tratamento da IRA, o Quadro 50.6 mostra algumas das principais indicações dialíticas em IRA.
O resultado final do tratamento dialítico depende diretamente da eficiência do método utilizado. A adequação de diálise em pacientes portadores de IRA é pouco estudada, apesar de sua importância no sucesso da terapêutica dialítica. A maior parte dos conhecimentos a respeito da dose de diálise foi extrapolada dos estudos em pacientes submetidos a hemodiálise crônica. Um dos índices mais utilizados é o KT/V (K clearance do dialisador, T tempo de diálise e V volume de distribuição da uréia). Nestes pacientes, está estabelecido que o aumento da dose de diálise resulta em menor morbidade e maiores taxas de sobrevida em programas de hemodiálise. No entanto, a população em que os métodos contínuos são indicados difere bastante dos pacientes renais crônicos. A taxa de catabolismo protéico e a geração de uréia são, em média, duas vezes maiores nos pacientes em IRA do que nos portadores de insuficiência renal crônica (IRC). Clark e cols. demonstraram que pacientes em IRA pesando 70 quilos necessitavam de 25 ml/min de clearance de uréia durante
Quadro 50.6 Indicações clínicas preferenciais dos métodos dialíticos INDICAÇÃO
CONDIÇÃO CLÍNICA
MÉTODO PREFERENCIAL
IRA não-complicada Sobrecarga de volume Hipercatabolismo
nefrotoxicidade choque cardiogênico sepse, SDRA, grande queimado, rabdomiólise AVC, síndrome hepatorrenal hiperpotassemia grave uremia barbitúricos, lítio, teofilina
DP, HD SCUF, CVVH, DP, CVVHD CVVHD, CVVHDF, HD, EDD
Hipertensão intracraniana Alterações eletrolíticas IRA na gravidez Intoxicações
SDRA síndrome do desconforto respiratório agudo; AVC acidente vascular cerebral
CVVH, CVVHD, DP, EDD CVVHD, CVVHDF, HD DP, HD HD, CVVHD, CVVHDF
915
capítulo 50
a CVVH para manter a uréia plasmática menor que 100 mg/dl. Por outro lado, estes pacientes necessitavam de seis sessões de hemodiálise intermitente com 180 ml/min de clearance de uréia em 4 horas para manter níveis plasmáticos de uréia semelhantes. Os métodos contínuos, apesar da menor eficiência por unidade de tempo, resultam em níveis de controle de azotemia melhores do que o esquema clássico de hemodiálise intermitente de três vezes por semana. Outra dificuldade para se aplicar o KT/V em pacientes com IRA é a alta freqüência de hipervolemia, que resulta na retirada de maiores volumes de ultrafiltrado, interferindo na quantificação do clearance. A dose de diálise é fundamental para os controles hidroeletrolítico, ácido-básico e metabólico. Entretanto, ainda não está determinado se uma dose adequada de diálise realmente interfere na redução da mortalidade da IRA. Estudo recente mostrou que pacientes com IRA submetidos à hemodiálise diária com KT/V semanal de 5,8 tiveram mortalidade menor do que pacientes dialisados de forma intermitente com KT/V semanal de 3,0. Neste estudo, demonstrou-se também que o tempo de recuperação da IRA foi menor nos pacientes que realizaram hemodiálise diária (9 2 dias) comparados aos pacientes submetidos à hemodiálise intermitente (16 6 dias). Ronco e cols., estudando pacientes com IRA submetidos à hemofiltração, observaram que clearances convectivos maiores tiveram impacto favorável na sobrevida destes pacientes. Os autores estudaram três grupos de pacientes com volumes de ultrafiltrado de 20, 35 e 45 ml/kg/h e encontraram mortalidade menor nos dois últimos grupos após 15 dias do início do tratamento dialítico. Outro fator importante para adequação da diálise é assegurar-se de que a dose prescrita esteja sendo efetivamente ofertada aos pacientes. Evanson e cols. observaram que o KT/V oferecido aos pacientes em IRA era pelo menos 20% menor do que o KT/V prescrito. Esta diferença ocorreu principalmente nos pacientes com maior peso, nos mais jovens e naqueles com menor taxa de anticoagulação. Os pacientes com peso acima de 90 quilos apresentavam volume de distribuição de uréia maior, o que reduzia o KT/ V. A diálise sem anticoagulação acarreta menor patência dos dialisadores, reduzindo a depuração de uréia. Little e cols. estudaram a taxa de recirculação do sangue em cateteres de dupla luz para hemodiálise. Os cateteres na veia jugular interna apresentavam recirculação de 0,4%, interferindo muito pouco na eficiência da diálise. Entretanto, cateteres com menos de 20 cm implantados na veia femoral apresentavam 26,3% de recirculação, comprometendo a dose ofertada de diálise. Assim, os dados atuais sobre adequação de diálise em IRA sugerem haver correlação entre dose de diálise e sobrevida de pacientes críticos portadores de IRA. No momento, não há método bem estabelecido para mensurar a adequação dialítica em IRA, de modo a permitir uma avaliação precisa da terapêutica ofertada e corrigir eventuais
alterações que estejam interferindo na eficiência do método empregado.
MÉTODOS CONTÍNUOS VERSUS HEMODIÁLISE INTERMITENTE Na escolha do melhor método para substituição renal, a maneira mais adequada seria analisar a técnica capaz de mimetizar a função renal na fisiologia corpórea. Os rins, além da remoção de água e solutos, metabolizam mediadores inflamatórios e são responsáveis pelo catabolismo e excreção de várias drogas. A capacidade dos métodos dialíticos contínuos e intermitentes em desempenhar estas funções constitui-se em critério fundamental na escolha do método dialítico ideal para um determinado paciente, naquele momento de sua evolução clínica. Hemodinâmica. A manutenção do estado hemodinâmico do paciente durante a realização de qualquer procedimento dialítico é de fundamental importância, principalmente para aqueles que já apresentam algum grau de comprometimento. Na hemodiálise intermitente, o fluxo de sangue adequado encontra-se ao redor de 300 a 350 ml/ min, podendo causar instabilidade hemodinâmica ou agravar um quadro de choque já instalado. Por outro lado, nas técnicas contínuas, a utilização de fluxos sanguíneos menores (100-200 ml/min) e a retirada lenta e gradual de fluidos permitem a manutenção dos níveis pressóricos, mesmo quando quantidades significantes de aminas vasoativas estão sendo utilizadas. Assim, o estado hemodinâmico do paciente é um dos principais determinantes na escolha entre métodos contínuos e intermitentes. Remoção de Solutos. A eficiência dos métodos dialíticos contínuos em pacientes hipercatabólicos tem sido questionada, uma vez que são utilizados fluxos de sangue e de dialisato bem menores do que aqueles prescritos na hemodiálise clássica. Entretanto, as características dos métodos contínuos têm apresentado constantes mudanças, podendo-se obter clearances de solutos bastante satisfatórios, principalmente na hemodiafiltração (Quadro 50.5), suficientes para controles metabólico e hidroeletrolítico adequados. Eliminação de Drogas. Os rins, normalmente, são responsáveis pela eliminação de uma série de drogas não ligadas a proteínas e seus metabólitos, sendo a posologia ajustada de acordo com a função renal. Em princípio, os métodos contínuos desempenham esta função de maneira mais semelhante ao estado fisiológico. Embora, até o momento, seja maior o número de informações a respeito da retirada de drogas em pacientes portadores de insuficiência renal crônica em programa de hemodiálise intermitente, uma lista crescente de trabalhos vem sendo realizada para a determinação do clearance de drogas pelos métodos contínuos. Além do ajuste correto das medicações, fundamental para os pacientes críticos, a possibilidade de
916
Métodos Hemodialíticos Contínuos para Tratamento da Insuficiência Renal Aguda
retirada destas substâncias torna-se muito importante nos quadros de intoxicações exógenas. Remoção de Mediadores Inflamatórios. Os estudos experimentais e humanos em sepse suportam a evidência de que esta representa uma forma de resposta inflamatória sistêmica severa, secundária aos efeitos locais e sistêmicos de mediadores pró-inflamatórios, produzidos em resposta a constituintes estruturais de bactérias Grampositivas e negativas e fungos. Muitos mediadores têm sido implicados na patogênese da síndrome de resposta sistêmica inflamatória (SIRS)/sepse. Estes incluem um grupo principal de moléculas de tamanho médio (5-30 kDa) denominadas citocinas. Outros agentes também desempenham papel na fisiopatologia da SIRS/sepse, tais como moléculas de adesão, cininas, trombina, substâncias depressoras do miocárdio, -endorfinas e heat shock proteins. Inibidores da produção local de alguns destes mediadores são necessários para a adequação da resposta imunológica. Este é o caso do sistema complemento, que aumenta a atividade fagocítica (opsonização), do fator de necrose tumoral- (TNF- ) e da interleucina-1 (IL1 ), que ativam células aferentes e eferentes do sistema imunológico. O uso de filtros com permeabilidades hidráulicas elevadas nas terapêuticas contínuas permite a remoção de quantidades mensuráveis de citocinas (Quadro 50.7). Assim, a retirada de TNF- e IL-1, sabidamente implicados na fisiopatologia da sepse, pode ter impacto na sobrevida de pacientes sépticos. Demonstrou-se que a remoção de volumes de ultrafiltrado ao redor de 35 ml/ kg/h pode diminuir a mortalidade deste grupo de pacientes.
Quadro 50.8 Vantagens e desvantagens dos métodos intermitentes Métodos Intermitentes Vantagens 䊏 Maior domínio 䊏
䊏 䊏 䊏
da técnica Maior eficiência por unidade de tempo Menor custo Mobilização mais fácil Não há necessidade de anticoagulação contínua
Desvantagens 䊏 Maior intolerância
ao estado hemodinâmico 䊏 Restrição à retirada de líquidos 䊏 Processo menos fisiológico 䊏 Flutuação no nível de metabólitos
Os Quadros 50.8 e 50.9 resumem as principais vantagens e desvantagens dos métodos intermitentes e contínuos. A escolha do método dialítico ideal deve considerar estas características.
INDICAÇÕES NÃO-RENAIS DOS MÉTODOS CONTÍNUOS Nos últimos 20 anos, tem ocorrido uma mudança do perfil de pacientes críticos. A faixa etária da população é mais elevada, graças ao controle de comorbidades, tais
Quadro 50.7 Mecanismos de retirada por membranas de alta permeabilidade de mediadores na sepse/SIRS MEDIADOR
PESO MOLECULAR (kDa)
MECANISMO DE RETIRADA
LPS
⬃1
adsorção
TNF-␣
17
adsorção/filtração
sTNFR I
55-60
adsorção (?)
sTNFR II
75-80
adsorção (?)
17
adsorção/filtração
IL-6
22-29
adsorção/filtração (?)
IL-8
8-9
adsorção/filtração (?)
IL-10
18
filtração (?)
IL-1Ra
14
filtração
C3a desArg
2,5
adsorção/filtração
C5a desArg
2,8
adsorção/filtração
PAF
0,55
adsorção
IL-1
LPS lipopolissacarídeo; sTNFR receptor solúvel do fator de necrose tumoral; C3a e C5a desArg produtos ativados derivados do complemento e desarginados; PAF fator ativador de plaquetas.
917
capítulo 50
Quadro 50.9 Vantagens e desvantagens dos métodos contínuos Métodos Contínuos Vantagens 䊏 Processo mais 䊏 䊏 䊏
䊏
fisiológico Maior tolerância hemodinâmica Maior clearance cumulativo Maior capacidade de remoção de fluidos Remoção de mediadores inflamatórios
Desvantagens 䊏 Imobilização prolongada 䊏 Anticoagulação contínua 䊏 Maior risco de
coagulação do sistema 䊏 Hipotermia 䊏 Alto custo, enfermagem
especializada 䊏 Punção arterial
como hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus e hipercolesterolemia. As vítimas de acidentes graves têm a sobrevida aumentada pela melhora nos sistemas de atendimento primário e de transporte. A maioria dos pacientes graves que morrem após respostas adequadas à terapêutica inicial é acometida por insuficiência de múltiplos órgãos progressiva, que culmina com falência cardiovascular irreversível, decorrente de uma resposta inflamatória sistêmica. As indicações dialíticas não-renais baseiam-se na retirada dos mediadores inflamatórios presentes na SIRS, na sepse, na síndrome do desconforto respiratório agudo, bem
Pontos-chave: • A manutenção do estado hemodinâmico do paciente durante a realização de qualquer procedimento dialítico é de fundamental importância • Ainda não está determinado se uma dose adequada de diálise realmente interfere na redução da mortalidade da IRA • As indicações dialíticas não-renais baseiamse na retirada dos mediadores inflamatórios presentes na SIRS, na sepse, na síndrome do desconforto respiratório agudo, bem como na remoção de fluidos e de toxinas endógenas como o ácido láctico, pigmentos e produtos de lise tumoral • A melhor técnica operacional de hemofiltração sugerida é aquela onde grandes volumes de ultrafiltrado (35 a 45 ml/kg/h) são removidos
como na remoção de fluidos e de toxinas endógenas, como o ácido láctico, pigmentos e produtos de lise tumoral. Embora a retirada de mediadores pró-inflamatórios ainda não tenha uma forte evidência de aplicação clínica, a hemofiltração pode trazer alguns efeitos benéficos em pacientes portadores de SIRS/sepse. O mecanismo destes efeitos, entretanto, não se encontra totalmente estabelecido. Alguns estudos têm demonstrado que a eliminação de mediadores por adsorção é o principal mecanismo. Outros evidenciam melhora hemodinâmica secundária à retirada de grandes volumes de ultrafiltrado. Estes achados podem ser conciliados pela demonstração de que altas taxas de ultrafiltração aumentam a adsorção. No momento, a melhor técnica operacional de hemofiltração sugerida é aquela onde grandes volumes de ultrafiltrado (35 a 45 ml/kg/h) são removidos. Os resultados favoráveis da hemofiltração em pacientes sépticos e/ou com insuficiência de múltiplos órgãos devem ser vistos com critério antes que a indicação deste procedimento extrapole as indicações na insuficiência renal aguda.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Atualmente, dispõe-se de inúmeros métodos dialíticos para o tratamento da insuficiência renal aguda. A escolha do melhor tratamento deve, obrigatoriamente, considerar as condições clínicas do paciente naquele momento, a disponibilidade de equipamentos e a experiência da equipe médica e de enfermagem que assiste o paciente. Não existem, ainda, um consenso e uma padronização de condutas para pacientes portadores de IRA dialítica. No entanto, deve-se indicar o tratamento dialítico que ofereça a melhor eficiência e intensidade com os menores riscos de complicações, a fim de permitir o melhor controle metabólico e hidroeletrolítico dos pacientes portadores de IRA, na tentativa de diminuir as altas taxas de mortalidade ainda causadas por esta síndrome.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA CLARK, W.R.; MUELLER, B.A.; KRAUS, M.A.; MACIAS, W.L. Extracorporeal therapy requirements for patients with acute renal failure. J. Am. Soc. Nephrol., 8 (5):804-812, 1997. CLARK, W.R.; RONCO, C. CRRT efficiency and efficacy in relation to solute size. Kidney Int., 56(Suppl. 72):S3-S7, 1999. COSTA, M.C.; CUVELLO NETO, A.L.; ÁVILA, M.O.N.; MONTEIRO, J.L.; ABDULKADER, R.C.R.M.; BURDMANN, E.A.; MACHADO, M.M.; YU, L. Medicina Intensiva Nefrológica: uma nova subespecialidade. In: Atualidades em Nefrologia 6, editado por Cruz, J.; Barros, R.T.; Cruz, H.M.M. São Paulo, Sarvier, pp. 197-203. CRITICAL CARE NEPHROLOGY editado por Ronco, C. e Bellomo, R. Dordrecht/Boston/London, Kluwer Academic Publishers, 1998. CUVELLO NETO, A.L.; YU, L. Anticoagulação na terapia renal substitutiva contínua. In: Atualidades em Nefrologia 6, editado por Cruz, J.; Barros, R.T.; Cruz, H.M.M. São Paulo, Sarvier, pp. 204-213. EVANSON, J.A.; HIMMELFARB, J.; WINGARD, R.; KNIGHTS, S.; SHYR,
918
Métodos Hemodialíticos Contínuos para Tratamento da Insuficiência Renal Aguda
Y.; SCHULMAN, G.; IKIZLER, T.A.; HAKIM, R.M. Prescribed versus delivered dialysis in acute renal failure patients: retrospective study. Am. J. Kidney Dis., 32(5):731-738, 1998. KUMAR, V.A.; CRAIG, M.; DEPNER, T.A.; YEUN, J.Y. Extended daily dialysis: a new approach to renal replacement for acute renal failure in the intensive care unit. Am. J. Kidney Dis., 36:294-300, 2000. LITTLE, M.A.; CONLON, P.J.; WALSHE, J.J. Access recirculation in temporary hemodialysis catheters as measured by saline dilution technique. Am. J. Kidney Dis., 36(6):1135-1139, 2000. MARSHALL, M.R.; GOLPER, T.A.; SHAVER, M.J.; ALAM, M.G.; CHATOTH, D. Sustained low-efficiency dialysis for critically ill patients requiring renal replacement therapy. Kidney Int., 60:777-785, 2001. METHA, R.L.; McDONALD, B.; GABBAI, F.B.; PAHL, M.; PASCUAL, M.T.A.; FARKAS, A.; KAPLAN, R.M. A randomized clinical trial of continuous versus intermittent dialysis for acute renal failure. Kidney Int., 60:1154-1163, 2001. RONCO, C.; BELLOMO, R.; HOMEL, P.; BRENDOLAN, A.; DAN, M.; PICCINNI, P.; LaGRECA, G. Effects of different doses in continuous veno-venous haemofiltration on outcome of acute renal failure: a prospective randomised trial. Lancet., 356:26-30, 2000. RONCO, C.; BELLOMO, R.; RICCI, Z. Continuous renal replacement therapy in critically ill patients. Nephrol. Dial. Transplant, 16(Suppl. 5):67-72, 2001.
SCHETZ, M. Non-renal indications for continuous renal replacement therapy. Kidney Int., 56(Suppl. 72):S88-S94, 1999. SCHIFFL, H.; LANG, S.M.; FISCHER, R. Daily hemodialysis and the outcome of acute renal failure. N. Engl. J. Med., 346:305-310, 2002.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.crrtonline.com/ — Página da Conferência Internacional sobre CRRT — Terapia renal substitutiva contínua. http://www.airt.it/Piemonte/ — Centro Regionali di Referimento per i Trapianti, Itália. http://www.gambrohealthcare.com/gambro/crrt.cfm — Página da Gambro que vende produtos relacionados. http://www.karger.com/multimedia/crr02/crr02.htm — A Editora Karger compila e publica um multimedia das conferências da reunião CRRT 2002. http://sympa.invivo.net/wws/info/crrt — Um site
[email protected]
Capítulo
51
Diálise Peritoneal Roberto Pecoits-Filho
INTRODUÇÃO/HISTÓRICO A MEMBRANA PERITONEAL Anatomia do peritônio Fisiologia do peritônio durante a DP Patofisiologia do peritônio durante a DP
COMPLICAÇÕES Complicações infecciosas Peritonite Infecção de saída de cateter Falha de ultrafiltração
SELEÇÃO, INDICAÇÕES E CONTRA-INDICAÇÕES
Complicações mecânicas
CATETERES, IMPLANTE E PERÍODO DE ADAPTAÇÃO
Complicações metabólicas
Implante do cateter Preparo pré-implante Período pós-implante Período de adaptação MODALIDADES DE DP
GRUPOS ESPECIAIS DE PACIENTES NOVAS SOLUÇÕES DE DIÁLISE PERITONEAL E PERSPECTIVAS FUTURAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
ADEQUACIDADE
INTRODUÇÃO/HISTÓRICO A Diálise Peritoneal Ambulatorial Contínua (DPAC) é um método de diálise que usa o peritônio como membrana semipermeável para a depuração de toxinas urêmicas variadas. A diálise peritoneal (DP) adequada mantém o paciente portador de insuficiência renal crônica sem sintomas através da reposição parcial da função desempenhada pelos rins saudáveis. A diálise peritoneal remove solutos acumulados no sangue, como uréia, creatinina, potássio, fosfato e água, para o dialisado infundido na cavidade peritoneal. A membrana peritoneal, funcionando como um equivalente “natural” do capilar de hemodiálise, regula a troca de água e solutos entre os capilares do interstício peritoneal e o líquido de diálise infundido na cavidade peritoneal. A experiência inicial no tratamento da uremia pela diálise peritoneal ocorreu em 1923 com a instilação na cavi-
dade peritoneal de uma solução salina para manejo de um paciente com insuficiência renal aguda. Foi, no entanto, apenas em 1962 que Boen e cols., em Seattle, relataram a tentativa de uso da diálise peritoneal no manejo da insuficiência renal crônica. Peritonites e aderências que bloqueavam a via de introdução do cateter foram responsáveis pelo insucesso do programa. Em 1976, Popovich e cols. submeteram à American Society for Artificial and Internal Organs um resumo da “diálise peritoneal equilibrada”, denominação modificada em 1978 para “diálise peritoneal ambulatorial contínua” ou DPAC. Inicialmente aplicouse nos Estados Unidos a técnica utilizando-se frascos de vidro, mas Oreopoulos e cols. em 1978, através da disponibilidade da solução de diálise em bolsas plásticas no Canadá, que tornaram a técnica mais fácil e com menor incidência de peritonites. A história da DPAC foi recentemente revisada por Oreopoulos.1 Atualmente, a DPAC é considerada um método dialítico equivalente à hemodiálise, além de representar uma alternativa de tratamento.2
920
Diálise Peritoneal
Estima-se que cerca de 110.000 pacientes se beneficiem deste tratamento em todo o mundo, representando cerca de 20% da população em diálise. Atualmente, no Brasil, o número de pacientes em CAPD chega a 3.800, o que representa 13% da população dialítica.3
A MEMBRANA PERITONEAL Anatomia do Peritônio O peritônio é uma membrana serosa que recobre as vísceras, forma o mesentério que fixa as alças intestinais e estende-se pela parede abdominal, cobrindo-a totalmente. Delimita um espaço fechado que em condições fisiológicas contém 100 ml de um líquido lubrificador. Uma camada única de células mesoteliais, tecido conjuntivo, vasos sanguíneos e linfáticos forma a estrutura da membrana, que possui uma área total no adulto equivalente à superfície cutânea. Um corte sagital da cavidade peritoneal é mostrado na Fig. 51.1.
Fisiologia do Peritônio Durante a DP Existem dois mecanismos de transporte peritoneal de água e solutos: a difusão e a ultrafiltração. A difusão é um processo de transporte de soluto induzido pelo seu gradiente de concentração através da membrana peritoneal. A ultrafiltração é um processo de transporte de solvente induzido, no caso da diálise peritoneal, pelo gradiente osmótico gerado pela alta concentração de glicose na solução de diálise. O processo de ultrafiltração é acompanhado pela convecção, que consiste no “arraste” de soluto enquanto o solvente é transportado. Portanto, na DP a água é trans-
Fígado
Cavidade peritoneal
Intestino
Cateter de diálise Solução de diálise
Bexiga
Fig. 51.1 Configuração anatômica simplificada da cavidade peritoneal com a presença de cateter e solução de diálise.
portada pelo processo de ultrafiltração osmótica e os solutos, por difusão e convecção.4 O processo de diálise peritoneal inicia-se com a infusão do líquido de diálise, sendo que pequenas moléculas se difundem mais rapidamente que moléculas maiores, como as proteínas. A membrana peritoneal tem poros de diferentes tamanhos, e à medida que aumenta o tamanho molecular do soluto, diminui a permeabilidade peritoneal. Existem poros grandes (200 a 300 Å), em pequena quantidade, que permitem fluxo unidirecional de macromoléculas (e fluido) do sangue para a cavidade peritoneal. A maior parte seria constituída de poros pequenos (40 a 55 Å), que são o principal caminho para troca de solutos pequenos hidrofílicos e água.5 De acordo com a teoria dos três poros, existem ainda poros transcelulares ultrapequenos (3 a 5 Å), que permitem o transporte de água, mas não de solutos.6 Os equivalentes morfológicos destes componentes são os espaços interendoteliais das vênulas pós-capilares (poros grandes) e áreas de escape intercelulares (poros pequenos).7 As aquaporinas seriam equivalentes morfológicos dos poros ultrapequenos. A membrana peritoneal é composta por vasos, interstício e mesotélio. Do ponto de vista de membrana de diálise, o mesotélio parece não apresentar barreira importante à passagem de solutos. O valor do interstício no transporte de soluto ainda é incerto, principalmente no aspecto da seletividade pelo tamanho da molécula.8 Portanto, o capilar peritoneal parece ser o mais importante componente do peritônio como membrana de diálise, agindo como barreira seletiva.9 A permeabilidade peritoneal possui dois componentes: área de superfície efetiva (número de poros disponíveis para troca de solutos) e permeabilidade intrínseca (seletividade dependente do tamanho da molécula).4 A área de superfície efetiva é a parte do peritônio envolvida mais efetivamente no transporte de solutos.9 Estima-se que representa muito menos que a área de superfície anatômica do peritônio. Depende do fluxo e volume esplâncnico de sangue, número de capilares perfundidos e contato com o mesotélio.10 Portanto, podemos afirmar que a área de superfície efetiva não apresenta um valor constante. Vários estudos têm mostrado a variabilidade intra- e interindividual deste valor.11 Para determinar o padrão de transporte de pequenos solutos podemos usar o PET (do inglês Peritoneal Equilibrium Test).12 Na prática clínica este teste se mostrou valioso na avaliação inicial da permeabilidade da membrana peritoneal, auxiliando na prescrição inicial e escolha da modalidade de DP. Recomendamos que este teste seja realizado após um mês de tratamento e que a prescrição seja ajustada a partir dos resultados. O teste deve ser repetido quando os parâmetros de adequação ou ultrafiltração se alterem. Neste momento, os resultados do teste auxiliam na investigação destas alterações. O teste consiste na determinação da razão entre as concentrações da creatinina, sódio e glicose no plasma e na solução de diálise e plasmática após 1, 2 e 4 horas de permanência da solução de diálise na cavidade peritoneal. Os
921
capítulo 51
passos para a realização de uma adaptação do teste que recomendamos atualmente estão resumidos no Quadro 51.1. A diferença entre a descrição original e a recomendada atualmente consiste no uso de solução hipertônica e na inclusão de uma coleta de dialisato após uma hora para a determinação da concentração de sódio. A análise do sódio pode contribuir para o diagnóstico de falhas de ultrafiltração relacionadas a aquaporinas. Como este é um problema raro, na prática clínica recomendamos o uso do fastPET,13 que segue os mesmos passos, excluindo as coletas de 1 e 2 horas. A aplicação prática deste teste na escolha da modalidade de DP e no manejo da falha de ultrafiltração será comentada posteriormente.
Patofisiologia do Peritônio Durante a DP A aplicação da técnica de diálise peritoneal por períodos prolongados representa desafio para clínicos e pesquisadores. Nesta modalidade dialítica, a membrana peritoneal é continuamente exposta à solução de diálise bioincompatível, contendo altas concentrações de glicose, produtos de degradação da glicose, baixo pH e alta osmolalidade. Apesar da evidente redução dos índices de peritonites, infecção ainda representa agressão adicional à membrana peritoneal.14
Quadro 51.1 Passos para a realização do teste de equilíbrio peritoneal (PET) modificado 1. Na véspera, o paciente deve realizar uma troca normal em casa (8 a 12 horas de permanência na cavidade). 2. Ao chegar ao centro de diálise, o paciente em posição supina drena o efluente de diálise durante 20 minutos. Uma amostra de dialisato é colhida para a dosagem de glicose e creatinina que pode ser usada para a realização do cálculo do volume residual. 3. Infundir 2,0 L de solução a 4,25% por 10 minutos com o paciente deitado. O paciente deve rolar de um lado para o outro a cada 400 ml de infusão. 4. O momento em que a infusão termina deve ser anotado como tempo zero. 5. Nos tempos 0, 1 hora e 2 horas: • Drenar 200 ml de dialisato. • Misturar o conteúdo drenado invertendo a bolsa 3 vezes. • Usando técnica asséptica, colher 10 ml de dialisato. • Reinfundir o restante do volume drenado. 6. No tempo 2 horas colher amostra de sangue para sódio, creatinina e glicose. 7. No tempo 4 horas: • Drenar o volume total da troca em 20 minutos. • Misturar o conteúdo drenado invertendo a bolsa 3 vezes. • Usando técnica asséptica, colher 10 ml de dialisato. • Medir o volume drenado. 8. Encaminhar a amostra ao laboratório para a dosagem de creatinina, sódio e glicose.
Um dos mais importantes problemas relacionados à terapia substitutiva da função renal através de DPAC por longos períodos é o desenvolvimento de elevada permeabilidade da membrana peritoneal a pequenos solutos, resultando em ultrafiltração inadequada,15 principalmente quando o tempo de permanência na cavidade da solução de diálise é mais prolongado. Nesta situação ocorre até mesmo inadequacidade dialítica, devido ao menor volume drenado de dialisato.16 O padrão alto de transporte peritoneal de solutos definido por valores elevados de D/Pcreat vem sendo identificado como a causa mais freqüente de falha da técnica de DPAC.17 Além do mais, alta permeabilidade a pequenos solutos representa um fator de risco independente para mortalidade em DPAC, por razões ainda indeterminadas.15,18 Ao longo do tempo em diálise peritoneal, além das alterações funcionais, ocorrem concomitantemente mudanças na morfologia peritoneal. As principais alterações do peritônio de pacientes em DPAC incluem um espessamento do espaço submesotelial e alterações na estrutura capilar.19 A neoangiogênese e o espessamento da parede vascular por deposição de colágeno do tipo IV, observada após longos períodos em DPAC, são semelhantes à microangiopatia induzida pela glicose em altas concentrações. Aumento de vascularização20,21 e aumento da camada fibrosa submesotelial22 são descritos em pacientes com padrão de transporte alto para pequenos solutos. Finalmente, alterações de características inflamatórias são freqüentemente identificadas na membrana peritoneal.23,24
Pontos-chave: • O peritônio é uma membrana serosa que envolve as visceras na cavidade abdominal • Durante a diálise peritoneal, o peritônio funciona como uma membrana semipermeável para a depuração de toxinas urêmicas através de difusão de solutos e ultrafiltração induzida por agentes osmóticos • Através do tempo em tratamento, a membrana peritoneal sofre alterações morfológicas e funcionais que devem ser monitorizadas para otimização do tratamento
SELEÇÃO, INDICAÇÕES E CONTRA-INDICAÇÕES Por se tratar de tratamento que necessita de dedicação do paciente e familiares ao método, preferencialmente deve haver uma decisão conjunta entre a equipe médica, o pa-
922
Diálise Peritoneal
ciente e familiares. Condições de educação, higiene e moradia devem ser avaliadas por equipe multidisciplinar e serão determinantes no sucesso do tratamento. A preparação para o início do tratamento deve ser precoce, e o implante do cateter deve preceder o início do tratamento para propiciar boa cicatrização e adaptação do paciente. Respeito ao estilo de vida do paciente e familiares e condição de alcançar adequação dialítica fazem parte da decisão de se tratar um paciente com DP. A distância da moradia do paciente ao centro de diálise pode ser um fator determinante, e em país de dimensões como o Brasil representa vantagem da técnica para populações afastadas dos centros urbanos. O Quadro 51.2 mostra as principais indicações e contra-indicações de DP.
CATETERES, IMPLANTE E PERÍODO DE ADAPTAÇÃO Os cateteres para DP são compostos de um tubo de borracha siliconizada e anéis de dacron para a aderência no tecido subcutâneo. Após o implante, o cateter possui três segmentos funcionais distintos: (a) intraperitoneal, com vários furos para permitir a infusão e drenagem de dialisado; (b) intramural, consistindo em anéis ao longo do túnel que impedirão vazamentos e propagação de infecção; (c) externo, com fácil
Quadro 51.2 Indicações e contra-indicações de DP Indicações • Paciente que prefere DP a hemodiálise (HD) • Pacientes que não toleram HD (insuficiência cardíaca e coronariana, dificuldade de acesso vascular) Contra-indicações absolutas • Perda documentada da função peritoneal • Aderências que limitem o implante ou o fluxo do dialisato • Na ausência de assistente, incapacidade física ou mental de realizar trocas • Defeitos mecânicos não passíveis de correção que aumentem o risco de infecção ou impeçam DP efetiva (hérnia abdominal ou diafragmática irreparável, extrusão de bexiga) Contra-indicações relativas • Corpo estranho intra-abdominal implantado recentemente (prótese vascular, shunt ventrículoperitoneal) • Vazamentos peritoneais • Intolerância a volumes necessários para alcançar adequação • Doença intestinal inflamatória ou isquêmica • Infecção de pele ou parede abdominal • Obesidade mórbida • Desnutrição severa • Diverticulite freqüente Adaptado do Dialysis Outcomes Quality Initiative – DOQI, 1997
conexão ao sistema de infusão de solução. Vários modelos de cateter têm sido desenvolvidos, na tentativa de se alcançar a mais adequada cicatrização do orifício de saída, mínimos problemas de deslocamento, obstrução ou vazamento. Em nosso centro temos utilizado com bons resultados o Swan Neck Missouri, com dois anéis de dacron (sendo o interno acompanhado de um disco e esfera plástica que propiciam menor índice de vazamentos). O segmento intramural é curvo, direcionando o segmento intraperitoneal caudalmente (evitando deslocamentos) e voltando o orifício de saída para baixo (facilitando a drenagem de secreções e depósitos).
Implante do Cateter Para cateteres de longa permanência temos preferido a colocação em ambiente cirúrgico. A técnica de inserção é variável de acordo com o centro e é influenciada de maneira importante pela prática cirúrgica local. Um cirurgião experiente ou nefrologista com formação e especial interesse em implantação de cateter são grandes trunfos de um programa de DP.
PREPARO PRÉ-IMPLANTE O local de inserção e localização do túnel devem ser definidos antes da cirurgia, levando em conta tamanho e forma do abdômen, cicatrizes, linha da cintura e preferência do paciente. Hérnias devem ser reparadas no mesmo momento cirúrgico se o início da diálise não for eminente. Antibioticoterapia profilática deve ser instituída. Usamos uma cefalosporina de segunda geração uma hora antes do implante em uma única dose. Esvaziamento vesical e preparo intestinal são realizados antes da cirurgia. Anestesia local, com ou sem benzodiazepínicos via oral (para diminuir a ansiedade do paciente em relação ao procedimento, garantindo boa condição cirúrgica), é recomendada.
PERÍODO PÓS-IMPLANTE Irrigação com líquido de diálise é feita ainda no centro cirúrgico, até o clareamento do drenado. Uma radiografia de rotina deve ser realizada para documentar o posicionamento. Obstipação pode promover dificuldades de drenagem e deve ser combatida com laxantes, logo ao primeiro sinal de ocorrência. Uso profilático de laxantes leves pode ser útil no período pós-operatório.
PERÍODO DE ADAPTAÇÃO Durante este período ocorre a cicatrização da ferida e selamento da cavidade peritoneal, sendo portanto um período crítico para o prognóstico do cateter. De preferência, evita-se diálise nos primeiros 10-15 dias, prevenindo mobilização precoce do cateter e vazamentos. O curativo cirúrgico, a não ser que molhado ou sanguinolento, deve ser mantido até o sétimo dia, quando é trocado pelo enfermeiro de DPAC. Até o início da diálise, procede-se a irrigações semanais.
923
capítulo 51
Pontos-chave:
Quadro 51.3 Modalidades de DP
• A seleção de pacientes para diferentes modalidades dialíticas deve ser feita de acordo com a avaliação de vários parâmetros, como condições clínicas, sócioeconômicas e de qualidade de vida • Implante do cateter de DP deve ser realizado de acordo com técnica padronizada, e sempre que possível deve ser realizado no mínimo duas semanas antes do início do tratamento dialítico
Modalidades Intermitentes
MODALIDADES DE DP As técnicas atuais de diálise peritoneal utilizam infusão e, após períodos variados, drenagem da solução pelo cateter intraperitoneal. A prescrição de diálise inclui o método (manual ou automatizado), regime (intermitente ou contínuo), volume de dialisado e dose de diálise. A automatização da DP foi um avanço na área por proporcionar melhor qualidade de vida e conforto, bem como propiciar melhores clearances, sem aumento do tempo dedicado às trocas. Por propiciar flexibilidade de prescrição de trocas freqüentes (especialmente à noite), beneficia especialmente os altos transportadores. A cicladora (Fig. 51.2) realiza trocas seguindo a programação baseada nas necessidades dos pacientes, tornando possível a diálise automatizada noturna. Outra opção recente (porém ainda não disponível no Brasil) é o mecanismo de troca noturna (Quantum), pequena máquina que realiza uma troca extra no meio da noite, totalmente automática. O volume de solução usado está entre 2 e 3 litros por troca. A dose varia entre 48 e 105 litros por semana. Como observamos na nossa experiência de vários anos, a maior parte dos nossos pacientes parece alcançar diálise adequada com DPAC à base de 4 trocas de 2,5 litros, totalizando 70 litros por semana.25 O Quadro 51.3 traz as modalidades de DP mais utilizadas.
• Diálise Peritoneal Ambulatorial Diária (DPAD): o tratamento é dado com trocas freqüentes durante o dia a cada 3 ou 4 horas. Antes de dormir, o dialisato é drenado para evitar o longo tempo de permanência da noite. É indicada para pacientes com dificuldade de ultrafiltração por alta permeabilidade determinada pelo PET. • Diálise Peritoneal Intermitente (DPI): o tratamento é dado durante cerca de 24 horas, em ambiente hospitalar, com trocas a cada 1-2 horas, duas vezes por semana (40 a 60 litros). No período entre as diálises, fica o abdômen seco. Indicada para paciente com alta permeabilidade de membrana e função renal residual significativa. • Diálise Peritoneal Noturna (DPN): a diálise é realizada através de uma cicladora enquanto o paciente dorme, em um período entre 8 e 12 horas. Durante o dia o abdômen fica vazio. Para pacientes com área de superfície corporal alta e sem função renal residual, pode ser necessária uma ou duas trocas durante o dia. Modalidades Contínuas • Diálise Peritoneal Ambulatorial Contínua (DPAC): três trocas durante o dia e uma antes de deitar, feitas manualmente. O volume e a concentração de glicose são definidos pelas necessidades específicas de cada paciente. Adequada para a maior parte dos pacientes em diálise. • Diálise Peritoneal Automatizada Contínua (DPA): trocas feitas pela cicladora durante a noite se seguem de um longo ciclo durante o dia. Bom método para pacientes que necessitam estar em cicladora, mas não têm como realizar trocas durante o dia. • Outras modalidades: recentemente foi desenvolvido um mecanismo automático para realização de uma troca extra no meio da noite. Também iniciou o uso de trocas extras durante o dia com auxílio da mesma máquina que realiza trocas noturnas, sempre visando alcançar maior depuração e ultrafiltração. Uma outra opção de tratamento para grupos especiais é o uso de tidal com o auxílio de cicladora.
ADEQUACIDADE
Fig. 51.2 Cicladora de diálise peritoneal para a realização de trocas automáticas.
O principal objetivo da diálise deve ser o de manter o paciente sem sintomas e prevenir complicações da uremia, provendo tanto mais diálise quanto possível de acordo com parâmetros econômicos e de estilo de vida. Adequação dialítica, apesar da ênfase dada a índices baseados em clearances de solutos pequenos no decorrer dos últimos 20 anos, deve ser vista de maneira holística. O bem-estar do paciente deve ser o principal objetivo, e todos os parâmetros listados no Quadro 51.3 devem ser avaliados em conjunto pelo médico do paciente. Com as informações recen-
924
Diálise Peritoneal
Quadro 51.4 Índices clínicos e laboratoriais de diálise adequada Clínicos • Paciente se sente bem • Pressão arterial controlada • Bom balanço hídrico • Ausência de perda de peso, apetite, sono, disposição Laboratoriais • Creatinina sérica entre 12 e 15 mg/dl • Cálcio, fósforo e magnésio normais • Velocidade de condução nervosa normal • Albumina sérica normal Índices de adequacidade • Clearance de creatinina peritoneal acima de 60 L/sem • Kt/V acima de 2,0
tes em perspectiva,26 os índices de adequação dialítica baseados em clearances de pequenos solutos deverão ser reavaliados, e os objetivos deverão passar por mudanças. Apesar disto, tanto clearance de creatinina semanal quanto KT/V continuam sendo os índices de adequação utilizados na prática clínica. As fórmulas para o cálculo dos índices estão no Quadro 51.4.
Pontos-chave: • Várias modalidades de DP são disponíveis e devem ser escolhidas visando otimizar resultados clínicos, como adequada depuração de solutos, ultrafiltração necessária para evitar sobrecarga de volume, e também propiciar incremento na qualidade de vida do paciente • Adequacidade dialítica deve ser avaliada de forma holística, tendo como objetivos o alcance de índices baseados em depuração de pequenos solutos, parâmetros de estado nutricional, normalização do estado volêmico, correção de distúrbios metabólicos e hematológicos, sempre visando o bem-estar do paciente.
COMPLICAÇÕES O implante e a manutenção do cateter na cavidade peritoneal, a presença de uma solução bioincompatível (hiperosmolar e com pH ácido) e o uso do peritônio como membrana semipermeável podem propiciar o aparecimento de complicações infecciosas, mecânicas e metabólicas, que discutiremos a seguir.
Complicações Infecciosas São as complicações mais freqüentes e causas comuns de retirada de cateter, transferência de pacientes para a hemodiálise, óbitos e uso de antibióticos.
PERITONITE É a mais comum das complicações infecciosas. O diagnóstico é feito a partir dos dados clínicos de dor abdominal, líquido turvo, contagem de células do dialisado acima de 100 leucócitos/l com predomínio de polimorfonucleares e demonstração de bactéria por bacterioscopia. A cultura positiva é outro dado para o diagnóstico, porém a presença de pelo menos dois dos critérios acima determina o diagnóstico. Outros sinais e sintomas que podem estar presentes são febre, calafrios, mal-estar, leucocitose e irritação peritoneal. Porém, dificilmente poderemos esperar o resultado da cultura para iniciarmos o tratamento. Com o início dos sintomas, deve-se encaminhar o líquido de diálise para contagem diferencial de células. Com a confirmação de diagnóstico, iniciamos o tratamento empiricamente, tentando uma cobertura antibiótica para germes Gram-positivos e negativos. O ponto mais importante para a determinação do esquema de tratamento mais eficaz para cada serviço de diálise peritoneal é a determinação do padrão de incidência local de peritonites, germes causadores, sensibilidade e outros fatores, como condição sócio-econômica da população (determinando a possibilidade de fornecimento de antibióticos ou aquisição pelo paciente) e características de aderência de cada população. Em nosso centro de diálise, o germe mais comumente encontrado em culturas foi o Staphylococcus aureus, seguido pelo Staphylococcus epidermidis.27 Também são encontrados Enterobacter, Streptococcus, Klebsiella, Serratia, Pseudomonas, fungos e micobactérias. Os aminoglicosídeos têm-se mostrado eficazes como tratamento das infecções por Gram-negativos. Já a escolha de um antibiótico para Gram-positivo é mais difícil. A vancomicina foi usada por muito tempo por sua comodidade posológica e eficiência, mas o aparecimento crescente de bactérias resistentes a este antibiótico tem causado preocupação. Atualmente recomenda-se que a vancomicina seja reservada a casos em que haja resistência às cefalosporinas de primeira geração, que são consideradas a primeira escolha. Após o resultado da cultura, mantém-se o antibiótico sensível por 7 a 10 dias e descontinua-se o outro. A ausência de resposta clínica após 72 horas requer nova contagem de células. Se o tratamento não surtir efeito em 96 horas, a retirada do cateter deve ser questionada. Pode ocorrer recorrência da peritonite pelo mesmo germe causador (retorno de sinais e sintomas dentro de quatro semanas). Neste caso, é comum a formação de uma película de fibrina com bactérias (biofilme), que causa resistência ao tratamento. A Fig. 51.3 mostra um exemplo de fluxograma para o manejo de peritonites. Ajustes devem ser feitos no esquema dependendo de fatores locais.
925
capítulo 51
Fig. 51.3 Algoritmo de abordagem e tratamento de peritonites relacionadas a DPAC.
INFECÇÃO DE SAÍDA DE CATETER As infecções do local de saída do cateter e túnel são também bastante freqüentes. Ao contrário das peritonites, os índices não mostram uma mudança importante com o desenvolvimento de novos cateteres e técnicas, mantendo-se em nossa experiênca ao redor de 0,6 episódio/paciente-ano. Para a redução das infecções, três pontos são importantes. • O desenho do cateter deve oferecer boa adaptação intra- e extra-abdominal. • Cuidados na implantação, principalmente a hemostasia meticulosa, evitam a colonização bacteriana e garantem boa cicatrização. • Cuidados no período de cicatrização. Infecções entéricas por Pseudomonas não são incomuns e estão associadas com alta morbidade. Como primeira escolha usamos cefalosporinas de primeira geração, sendo a ciprofloxacina uma boa opção. Após o resultado da cultura, o antibiótico é ajustado se necessário. Em caso de má resposta ao tratamento após duas semanas, a raspagem da banda externa ou troca do cateter deve ser considerada.
Falha de Ultrafiltração Com o aumento do tempo em DPAC propiciado principalmente pela redução dos índices de peritonite, a falha de ultrafiltração vem crescendo como complicação da diálise peritoneal.28 Por seu caráter contínuo, o controle do estado de hidratação sempre representou uma clara vantagem da DPAC, pela remoção constante de líquido sem alteração dos níveis pressóricos. Porém, o desenvolvimento de alta permeabilidade da membrana a pequenos solutos e a progressão para anúria19 levam a uma mudança nos objetivos de ultrafiltração que não podem ser esquecidos pelo nefrologista. Portanto, a monitoração preventiva do peso seco e do padrão de ultrafiltração do paciente deve ser parte da avaliação mensal de pacientes em DPAC. Recomendamos que o paciente traga para a consulta mensal dados de drenagem de 24 horas (duas
avaliações feitas pelo próprio paciente pesando as bolsas drenadas ao mês) e o exame físico para detecção de sinais de sobrecarga de volume, como edema e descontrole da pressão arterial. Se disponível, a avaliação por bioimpedância ou análise do diâmetro de veia cava podem ser úteis, mas não são imprescindíveis. Na identificação do problema, recomendamos a seqüência de investigação resumida no fluxograma representado na Fig. 51.4. Um PET modificado informa ainda sem resultados laboratoriais se a falha de ultrafiltração é verdadeira. Se a drenagem após 4 horas com a bolsa a 4,25% for maior que 2.400 ml, outros problemas, como a ingesta excessiva de sal ou água e a falta de aderência ao tratamento ou prescrição, devem ser avaliados. Se o volume for inferior a 2.400 ml, aguardamos a análise do padrão de transporte de solutos. Se o paciente houver se tornado um alto transportador (D/Pcreat ⬎ 0,81), esta é a possível causa de falha de ultrafiltração, que pode estar relacionada a peritonite recente (podendo melhorar com o tempo), ou o aumento do D/Pcreat relacionado a alterações histológicas da membrana peritoneal, como hipervascularização ou inflamação local. Neste caso, tempo menor de permanência na cavidade (como em diálise noturna com cicladora ou trocas mais freqüentes durante o dia) pode resolver o problema. Quando disponível no Brasil, o uso de icodextrina como agente osmótico representará uma ótima alternativa. Se o transporte de solutos estiver estável (em relação à avaliação inicial), outras causas como a má posição do cateter ou extravasamento para o subcutâneo devem ser consideradas. Nesta situação uma radiografia de abdômen com (má posição) ou sem (extravasamento) contraste pode demonstrar o problema. Correção cirúrgica deve ser então considerada. Na negativa da avaliação acima, a dosagem do sódio na primeira hora pode diagnosticar a falha de ultrafiltração relacionada a aquaporinas.
Complicações Mecânicas a. Hérnias: causadas pelo aumento da pressão intra-abdominal. Era uma complicação infreqüente, mas sua
926
Diálise Peritoneal
Fig. 51.4 Abordagem da falha de ultrafiltração em DPAC.
incidência deve aumentar com o uso de volumes maiores para alcançar os novos índices de adequacidade. Hérnias diafragmáticas podem causar hidrotórax. b. Dor abdominal: queixa freqüente de pacientes em DPAC durante o início do tratamento. Provavelmente relacionada ao pH ácido da solução e hipertonicidade. Dor em ombro pode ser referida e deve ser reflexa da parede diafragmática. Dor lombar é geralmente relacionada às mudanças de postura relacionada à sobrecarga de peso no abdômen. c. Drenagem inadequada: representa deslocamento do cateter para flancos ou hipocôndrios e obstrução da via de saída (por fibrina, omento e loculação da cavidade). O uso de laxativos pode recolocar o cateter em posição sem necessidade de procedimento cirúrgico. Estreptoquinase pode remover trombos de fibrina.
Complicações Metabólicas a. Hiperglicemia: complicação freqüente, causada pelo uso da glicose como agente osmótico. Há absorção de glicose para a circulação, e muito aumentada durante os episódios de peritonite. Em diabéticos o controle merece especial atenção. Insulina intraperitoneal pode ser usada para o manejo de hiperglicemia. b. Obesidade: comum entre os pacientes de DPAC, pela absorção de calorias (500 a 600 kcal/dia) do banho de diálise. A dieta deve ser manejada para evitar o ganho excessivo de peso. c. Hipertrigliceridemia: dislipidemia mais comum dos pacientes, também relacionada a absorção exagerada de glicídios. Orientação dietética e agentes hipolipidemiantes em doses ajustadas (gemfibrozil) podem ser usados. Se houver hipercolesterolemia coadjuvante, a melhor opção são as estatinas.
d. Osteodistrofia: suplementação de cálcio deve ser mantida para a prevenção de hiperparatireoidismo secundário. Banhos com baixa concentração de cálcio podem evitar a hipercalcemia, comum em DPAC. Outra alteração comum é a doença óssea adinâmica, com níveis baixos de PTHi.
Pontos-chave: • Peritonites representam ainda a principal complicação da DP em nosso meio, e o tratamento deve ser precoce e baseado em características microbiológicas de cada centro • A falha de ultrafiltração é uma importante complicação tardia e geralmente é conseqüência de alterações estruturais da membrana peritoneal
GRUPOS ESPECIAIS DE PACIENTES Crianças Diálise peritoneal é uma ótima opção para o tratamento de crianças em insuficiência renal aguda ou crônica, pela possibilidade de tratar crianças em casa, sem a necessidade de punção venosa e com as vantagens de maior estabilidade cardiovascular e de eletrólitos. Em recém-natos a possibilidade de confecção de um acesso venoso é problemática, a circulação extracorpórea é difícil e a DP se torna o método de escolha. O volume de dialisato deve ser baseado no peso corporal, e 10 ml de solução/kg de peso ge-
capítulo 51
ralmente são bem tolerados. Após alguns dias o volume pode geralmente ser aumentado para 30 ou 40 ml/kg. O uso de métodos automatizados de DP aumenta as vantagens, propiciando aos familiares maior liberdade e à criança a possibilidade de adaptar-se aos horários de atividades escolares sem problemas, reduzindo o impacto sócio-psicológico do tratamento. Na impossibilidade de se alcançar adequação dialítica ou na presença de muitas complicações, a transferência para hemodiálise não deve ser postergada, para evitar impacto negativo no crescimento e resultados clínicos futuros. A dose de diálise ideal não está bem definida como em adultos, porém observamos que um KT/V maior que o recomendado em adultos talvez seja necessário.29
ICC Insuficiência cardíaca congestiva refratária ao tratamento convencional pode ser uma indicação para DPAC. Nestes pacientes a terapia substitutiva da função renal pode ser iniciada mais precocemente, oferecendo melhora dos sintomas relacionados a sobrecarga de volume. Pacientes na fila de transplante de coração podem beneficiar-se de DP, e muitas vezes apenas 1 ou 2 trocas ao dia podem ser suficientes. A ultrafiltração deve ser concentrada no período da noite, quando a reabsorção do edema acontece.
NOVAS SOLUÇÕES DE DIÁLISE PERITONEAL E PERSPECTIVAS FUTURAS A partir do início dos anos 90, os primeiros relatos clínicos de uso de uma nova geração de soluções de DPAC começaram a ser publicados. Soluções contendo icodextrina como agente osmótico demonstram aumento de ultrafiltração em tempos de permanência longos.30 Soluções à base de aminoácidos permitem suplementação nutricional enquanto agem como agente osmótico alternativo.31 Soluções contendo bicarbonato como tampão no lugar de lactato permitem o uso de soluções de glicose em um pH neutro, implementando a biocompatibilidade.32 Apesar de disponíveis em vários países, no Brasil ainda não dispomos destas soluções, porém elas representam indiscutível evolução no tratamento de pacientes em DP. Adicionalmente, estratégias que poderão ser aplicadas para o aumento dos clearances (como o uso de diálise peritoneal de fluxo contínuo) e redução de complicações como peritonites e falha de ultrafiltração representam perspectivas de evolução do método com importante impacto na sobrevida dos pacientes e da técnica. Somados os benefícios em relação à qualidade de vida em grupos especiais e as vantagens farmacoeconômicas do método, a diálise peritoneal representa uma ótima opção de tratamento substitutivo da função renal para o futuro.
927
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. OREOPOULOS, D.G. Peritoneal dialysis in the past 20 years: an exciting journey. Perit. Dial. Int., 19 Suppl 3:S6-8, 1999. 2. KESHAVIAH, P.; COLLIN, A.J.; MA, J.Z.; CHURCHILL, D.N.; THORPE, K.E. Survival comparison between hemodialysis and peritoenal dialysis based on matched doses of delivered therapy. J. Am. Soc. Nephrol., 13 Suppl 1:S48-52, 2002. 3. NORONHA, I.L.; SCHOR, N.; COELHO, S.N.; JORGETTI, V.; ROMAO JUNIOR, J.E.; ZATZ, R.; BURDMANN, E.A. Nephrology, dialysis and transplantation in Brazil. Nephrol. Dial. Transplant, 12:2234-2243, 1997. 4. KHANNA, R.; NOLPH, K.D. The physiology of peritoneal dialysis. Am. J. Nephrol., 9:504-512, 1989. 5. LEYPOLDT, J.K. Evaluation of peritoneal membrane pore moldels. Blood Purif., 10:227-238, 1992. 6. RIPPE, B. A three-pore model of peritoneal transport. Perit. Dial. Int., 13 Suppl 2:S35-38, 1993. 7. RIPPE, B.; ROSENBERG, B.I.; VENTUROLI, D. The peritoneal microcirculation in peritoneal dialysis. Microcirculation, 8:303-320, 2001. 8. FLESSNER, M.F. Changes in the peritoneal interstitium and their effect on peritoneal transport. Perit. Dial. Int., 19 Suppl 2:S77-82, 1999. 9. WANIEWSKI, J.; WERYNSKI, A.; LINDHOLM, B. Effect of blood perfusion on diffusive transport in peritoneal dialysis. Kidney Int., 56:707-713, 1999. 10. FLESSNER, M.F. Osmotic barrier of the parietal peritoneum. Am. J. Physiol., 267:F861-870, 1994. 11. KREDIET, R.T.; IMHOLZ, A.L.; ZEMEL, D.; STRUIJK, D.G.; KOOMEN, G.C. Clinical significance and detection of individual differences and changes in transperitoneal transport. Blood Purif., 12:221-232, 1994. 12. TWARDOWSKI, Z.J.; NOLPH, K.D.; KHANNA, R. Peritoneal equilibration test. Perit. Dial. Bull., 7:138-147, 1987. 13. TWARDOWSKI, Z.J.; PET — a simpler approach for determining prescriptions for adequate dialysis therapy. Adv. Perit. Dial., 6:186191, 1990. 14. KEANE, W.F.; BAILIE, G.R.; BOESCHOTEN, E.; GOKAL, R.; GOLPER, T.A.; HOLMES, C.J.; KAWAGUCHI, Y.; PIRAINO, B.; RIELLA, M.; VAS, S. Adult peritoneal dialysis-related peritonitis treatment recomendations: 2000 update. Perit. Dial. Int., 20:396-411, 2000. 15. CHUNG, S.H.; CHU, W.S.; LEE, H.A.; KIM, Y.H.; LEE, I.S.; LINDHOLM, B.; LEE, H.B. Peritoneal transport characteristics, comorbid dieases and survival in CAPD patients. Perit. Dial. Int., 20:541-547, 2000. 16. WANG, T.; HEIMBURGER, O.; WANIEWSKI, J.; BERGSTROM, J.; LINDHOLM, B. Increased peritoneal permeability is associated with decreased fluid and small-solute removal and higher mortality in CAPD patients. Nephrol. Dial. Transplant., 13:1242-1249, 1998. 17. CHURCHILL, D.N.; THORPE, K.E.; NOLPH, K.D.; KESHAVIAH, P.R.; OREOPOULOS, D.G.; PAGE, D. Increased peritoneal membrane transport is associated with decreased patient and technique survival for continuous peritoneal dialysis patients. The CanadaUSA (CANUSA) Peritoneal Dialysis Study Group. J. Am. Soc. Nephrol.; 9:1285-1292, 1998. 18. CUETO-MANZANO, A.M.; CORREA-ROTTER, R. Is high peritoneal transport rate an independent risk factor for CAPD mortality? Kidney Int., 57:314-320, 2000. 19. COLES, G.A.; TOPLEY, N. Long-term peritoneal membrane changes. Adv. Ren. Replace Ther., 7:289-301, 2000. 20. COMBET, S.; MIYATA, T.; MOULIN, P.; POUTHIER, D.; GOFFIN, E.; DEVUYST, O. Vascular proliferation and enhanced expression of endothelial nitric oxide synthase in human peritoneum exposed to long-term peritoneal dialysis. J. Am. Soc. Nephrol., 11:717-728, 2000. 21. KREDIET, R.T.; ZWEERS, M.M.; van der WAL, A.C.; STRUIJK, D.G. Neoangiogenesis in the peritoneal membrane. Perit. Dial. Int., 20:S1925, 2000.
928 22.
23.
24. 25.
26.
27.
28.
29.
30.
Diálise Peritoneal
PLUM, J.; HERMANN, S.; FUSSHOLLER, A.; SCHOENICKE, G.; DONNER, A.; ROHRBORN, A.; GRABENSEE, B. Peritoneal sclerosis in peritoneal dialysis patients related to dialysis settings and peritoneal transport properties. Kidney Int., 59 Suppl 78:S42-47, 2001. PECOITS-FILHO, R.F.S.; ARAUJO, M.R.T.; LINDHOLM, B.; STENVINKEL, P.; NUMATA, M.; ABENSUR, H.; NORONHA, I. Interleukin-6: a possible link between inflammation and increased peritoneal solute transport rate in CAPD patients? J. Am. Soc. Nephrol., 12:438-A, 2001. Di PAOLO, N.; SACCHI, G. Atlas of peritoneal histology. Perit. Dial. Int., 20:S5-96, 2000. PECOITS-FILHO, R.F.S.; NASCIMENTO, M.M. An evaluation of body surface area, PET results, and predicted creatinine clearances of CAPD patients in a brazilian center: are our smaller patients better CAPD candidates? Abstract for the XVth International Congress of Nephrology — Buenos Aires, Argentina, 1999. PANIAGUA, R.A.D.; VONESH, E.; CORREA-ROTTER, R.; RAMOS, A.; MORAN, J.; MUJAIS, S. Effect of increased peritoneal clearances on mortality in peritoneal dialysis: ADEMEX, a prospective randomized controlled trial. JASN, in press, 2002. PECOITS-FILHO, R.F.S.; PASQUAL, D.; RIELLA, M.C. DPAC: 15 anos de Experiência em Curitiba. Jornal Brasileiro de Nefrologia, XX:2230, 1998. SELGAS, R.; FERNANDEZ-REYES, M.J.; BOSQUE, E.; BAJO, M.A.; BORREGO, F.; JIMENEZ, C.; Del PESO, G.; De ALVARO, F. Functional longevity of the human peritoneum: how long is continuous peritoneal dialysis possible? Results of a prospective medium longterm study. Am. J. Kidney Dis., 23:64-73, 1994. ARANDA, R.A.; PECOITS-FILHO, R.F.; ROMAO, J.E.; Jr., KAKEHASHI, E.; SABBAGA, E.; MARCONDES, M.; ABENSUR, H. Kt/V in children on CAPD: how much is enough? Perit. Dial. Int., 19:588-590, 1999. MISTRY, C.D.; GOKAL, R.; PEERS, E. A randomized multicenter clinical trial comparing isosmolar icodextrin with hyperosmolar glucose solutions in CAPD. MIDAS Study Group. Multicenter Investigation of Icodextrin in Ambulatory Peritoneal Dialysis. Kidney Int., 46:496-503, 1994.
31. KOPPLE, J.D.; BERNARD, D.; MESSANA, J.; SWARTZ, R.; BERGSTROM, J.; LINDHOLM, B.; LIM, V.; BRUNORI, G.; LEISEROWITZ, M.; BIER, D.M. et al. Treatment of malnourished CAPD patients with an amino acid based dialysate. Kidney International, 47:11481157, 1995. 32. FERIANI, M. Bicarbonate-buffered CAPD solutions: from clinical trials to clinical practice. [Review] [30 refs]. Peritoneal Dialysis International, 17 Suppl 2:S51-55, 1997.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.ispd.org/guidelines/articles.php3 — Site oficial da International Society of Peritoneal Dialysis. Excelentes revisões realizadas por comitês da Sociedade referentes a peritonites, ultrafiltração, adequação, tratamento em grupos especiais e dislipidemia. http://www.hdcn.com/ch/perit/ — Extenso site de nefrologia, com especial seção dedicada à diálise peritoneal (acesso restrito em certas áreas). http://www.kidney.org/professionals/doqi/guidelines/ doqiuppd-v.htm e http://www.kidney.org/professionals/ doqi/guidelines/doqiuppd-iv.html — Recomendações relacionadas a seleção de pacientes, adequação e nutrição em diálise peritoneal de comitê organizado pela National Kidney Foundation. http://www.pdiconnect.com/ — Site da revista Peritoneal Dialysis International, principal publicação mensal da área. http://www.ispd.org/atlas.php3 — Site organizado pela International Society of Peritoneal Dialysis, contendo extenso arquivo de histologia do peritônio relacionada a diálise peritoneal.
Capítulo
52
Imunologia do Transplante Renal Jorge Kalil e Nicolas Panajotopoulos
HISTÓRICO
Antimetabólicos
TIPOS DE TRANSPLANTES
Ciclosporina
SISTEMA HLA
Agentes biológicos
REJEIÇÃO
GLOBULINA ANTILINFOCITÁRIA E GLOBULINA
HISTOCOMPATIBILIDADE
ANTITIMOCITÁRIA
Reatividade contra painel
ANTICORPOS MONOCLONAIS
Prova cruzada
PERSPECTIVAS
Compatibilidade HLA
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA
IMUNOSSUPRESSÃO
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Drogas antiinflamatórias hormonais
HISTÓRICO A idéia de transplante de órgãos é muito antiga na humanidade. Muitas são as esculturas e pinturas em que quimeras são representadas. Dentre as mais famosas lendas com transplantes está aquela que teria ocorrido no século XIII envolvendo São Cosme e São Damião. Os santos teriam aparecido a um sacristão que tinha perdido sua perna e colocaram uma outra proveniente de um etíope recém-morto. O doente recuperado voltou a caminhar. No entanto, o transplante de órgãos passou da fantasia à possibilidade quando no início do século XX se aprimoraram as técnicas cirúrgicas que permitiram efetivamente a realização de enxertos. Alexis Carrel descreveu a anastomose de vasos sanguíneos permitindo a transposição de órgãos vascularizados. Após estes estudos, realizou com Ulmann os primeiros transplantes em animais. Devido à importância dos seus trabalhos, Alexis Carrel foi agraciado com o Prêmio Nobel de Medicina em 1912. Entretanto, não houve progresso na primeira metade do século em transplante humano, apesar dos avanços cirúrgicos experimentais.
O transplante de pele era e ainda é a terapia de escolha em grandes queimaduras; no entanto, a rejeição rápida do enxerto não permitia sua utilização generalizada. O problema passou a ser dramático durante a Segunda Guerra Mundial, quando as queimaduras eram responsáveis por grande número de mortos, sobretudo entre os aviadores. A Real Força Aérea solicitou então ao pesquisador Peter Medawar, um médico de origem libanesa nascido no Brasil e trabalhando na Inglaterra, para investigar este tema. Realizando pesquisas com enxertos de pele em coelhos, Sir Medawar, Prêmio Nobel de 1960, descreveu as leis de transplante. Sucintamente, ele verificou que a rejeição de enxertos entre indivíduos geneticamente distintos seguia as leis da resposta imune com especificidade e memória. Nos anos 60, as tentativas de transplante renal começaram em Paris e em Boston, graças aos esforços dos Drs. Hamburger e Merrill. Por uma feliz coincidência, os Drs. Murray (Nobel de Medicina de 1991) e Merrill transplantaram, com sucesso, o rim de uma vítima fatal de acidente em seu irmão gêmeo univitelino. Este foi o primeiro transplante renal com boa evolução a longo prazo e abriu as portas para que novos experimentos fossem feitos.
930
Imunologia do Transplante Renal
Independente destes trabalhos, no começo dos anos 50 em Paris, pesquisando no Centro Nacional de Transfusão Sanguínea, o Prof. Jean Dausset descreveu as bases de um sistema antigênico expresso na superfície das células denominado HLA — Antígenos Leucocitários Humanos (do inglês Human Leukocyte Antigens). Mais tarde, verificouse ser este o sistema principal de histocompatibilidade no homem. O Prof. Dausset, Prêmio Nobel de Medicina de 1980, trabalhando com um cirurgião chamado Felix Rappaport, mostrou a influência do HLA em transplante de pele em humanos. Nestes experimentos, o próprio Prof. Dausset foi transplantado no antebraço. A identificação molecular do principal alvo da rejeição passou a ser fundamental na compreensão de todos os mecanismos de rejeição de órgãos. Com o advento das drogas imunossupressoras, os transplantes passaram da simples experimentação para a prática médica. Grande avanço foi ainda obtido a partir dos anos 80, quando um cientista chamado Jacques Borel, pesquisando antibióticos no Laboratório Sandoz, na Suíça, descobriu a ciclosporina. Os primeiros ensaios mostraram o efeito imunossupressor da ciclosporina, e logo esta droga passou a ser utilizada em todo o mundo com excelentes resultados. Recentemente, vários outros imunossupressores foram lançados, ampliando o arsenal e as possibilidades terapêuticas. Apesar dos sucessos obtidos, a tão sonhada e desejada imunossupressão específica para um determinado doador ainda não foi alcançada.
TIPOS DE TRANSPLANTES Tendo em vista a origem do enxerto e seu receptor, os transplantes podem ser classificados em: 1) auto-enxerto — transplante onde doador e receptor são a mesma pessoa. Como exemplo estão os transplantes de pele. 2) isoenxerto — transplante realizado entre indivíduos geneticamente idênticos, como por exemplo o transplante entre gêmeos univitelinos. 3) aloenxerto — transplante onde doador e receptor são da mesma espécie mas geneticamente distintos. Neste tipo se enquadra a grande maioria dos transplantes realizados em seres humanos. 4) xenoenxerto — transplante em que doador e receptor são de espécies distintas, como por exemplo transplante onde o doador é um macaco babuíno e o receptor, o homem. Clinicamente os transplantes renais realizados se classificam, quanto à relação doador/receptor, em três tipos, a saber:
1) doador vivo parente — neste transplante o doador está geneticamente relacionado ao receptor, como é o caso de doadores irmãos, pais ou filhos que possuem metade de seu material genético em comum com o receptor. 2) doador vivo não-parente — trata-se de doador sem relação genética com o receptor. Enquadra-se aqui o doador cônjuge que, apesar do laço afetivo, não é relacionado geneticamente. 3) doador cadáver — é o doador em morte encefálica decorrente de traumatismo ou acidente vascular craniano, que do ponto de vista ético seria o doador de órgãos ideal para todo tipo de transplantes. É o único doador possível para órgãos vitais, como coração. No caso do transplante renal, sua utilização tem sido crescente no nosso meio. Neste tipo de transplante não há parentesco com o receptor e é possível graças aos esforços das equipes multidisciplinares de captação de órgãos. No Brasil, número expressivo de transplantes renais são ainda realizados com doadores vivos parentes, diferentemente de outros países desenvolvidos, cuja fonte de órgãos é, preferencialmente, o doador cadáver. Através de organizações de sociedades civis, como a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), organizaram-se programas de captação de órgãos com o auxílio dos governos estaduais. Com isto, tem-se elevado em muito o número de transplantes cadavéricos. Segundo dados da ABTO, há 145 centros de transplante renal cadastrados no país. Em 2001 foram realizados 3.099 transplantes renais, dos quais 1.256 (40,5%) com doador cadáver e 1.843 (59,5%) com doador vivo. Há 15 anos a proporção era 15% cadáver para 85% doador vivo.
SISTEMA HLA A primeira barreira ao transplante de órgãos é a incompatibilidade no sistema sanguíneo ABO. Depois seguemse, em importância, a compatibilidade HLA e aquela dos chamados sistemas secundários de histocompatibilidade. Assim, num transplante renal ABO compatível, os antígenos tissulares que compõem o sistema HLA são o principal alvo molecular da rejeição. Existem duas classes de antígenos HLA expressos na superfície das células. Os de classe I, que têm uma distribuição ubiqüitária nas células nucleadas do organismo, com exceção das hemácias. Existem três antígenos de classe I codificados por três loci distintos e expressos na membrana das células, chamados HLA A, B e C. Esses antígenos têm estrutura bioquímica semelhante (Fig. 52.1). Eles são compostos de uma glicoproteína de 45 kDa que se insere na membrana citoplasmática tendo uma porção
931
capítulo 52 CLASSE I
CLASSE II
CADEIAS GLICOSILADAS
NH2
NH2
NH2
CADEIAS GLICOSILADAS
S
S ␣2
␣1
␣1
1
S
S NH2
S
S
S
S
S
␣3
S
␣2
2m
2 S
S
COOH MEMBRANA CITOPLASMÁTICA
MEMBRANA CITOPLASMÁTICA
PO4 COOH
Fig. 52.1 A molécula tem três domínios extramembranários associados à 2-microglobulina. As regiões polimórficas estão nos domínios ␣1 e ␣2.
intramembranária, uma porção hidrofóbica transmembranária e três domínios protéicos extracelulares. Esta molécula é associada de uma maneira não covalente com a 2microglobulina, uma proteína de 12 kDa que por sua vez não se insere na membrana. Nos dois domínios mais externos da molécula, chamados de ␣1 ␣2, existem sítios onde há substituições de aminoácidos dando origem às diferentes especificidades antigênicas detectadas por reações sorológicas. Além dos antígenos HLA A, B e C existem vários outros antígenos de classe I de estrutura química semelhante mas cuja expressão celular e polimorfismo são bem menos conhecidos. Os antígenos de classe II são, por sua vez, compostos de duas cadeias. A cadeia alfa, de peso molecular 34 kDa, e a cadeia beta, de peso molecular 29 kDa (Fig. 52.2). A distribuição destes antígenos é bem mais restrita que aquela dos antígenos de classe I, pois se encontram constitucionalmente apenas em linfócitos B, em células da linhagem monócito/macrófago e em linfócitos T ativados. Outras células, quando ativadas por algumas citocinas como o interferongama, podem expressá-los. Existem igualmente três antígenos de classe II bem definidos e conhecidos, chamados HLA-DR, DQ e DP. Tanto os antígenos de classe I como os de classe II são codificados na mesma região do genoma, situada no braço curto do cromossoma 6 humano (Fig. 52.3). Trata-se de uma das regiões mais bem conhecidas de todo o nosso material genético e é denominada de Complexo Principal
PO4
COOH
COOH
Fig. 52.2 A molécula é composta por duas cadeias fixadas na membrana celular, cada uma com dois domínios extramembranários.
de Histocompatibilidade (CPH). A 2-microglobulina, no entanto, é codificada no cromossoma 15 humano. O mapa físico dos genes do CPH coloca os loci codificando para os antígenos de classe I em região telomérica (mais distante do centrômero), enquanto os de classe II em região mais centromérica (mais perto do centrômero). Entre a região de classe I e classe II encontra-se a região chamada de classe III. Aí são codificadas outras proteínas importantes para a resposta imune, mas que não são antígenos de membrana celular e não são polimórficas, a saber: proteínas do choque térmico (HSP7O), proteínas do complemento (C2 e C4), proteínas do Fator de Necrose Tumoral (TNF), proteínas que codificam para as proteínas TAP1 e TAP2, que são responsáveis pelo transporte dos peptídeos que vão se incrustar dentro da molécula HLA de classe I, como veremos um pouco mais adiante, entre outras. Na região HLA de classe I, além dos genes A, B e C foram identificados mais sete outros (HLA E, F, G, H, I, J e K) cuja expressão celular e funções biológicas restam ser definidas. HLA-G tem expressão exclusiva nos vários trofoblastos placentários com possíveis funções na relação materno-fetal. Os antígenos de classe II têm suas duas cadeias alfa e beta codificadas no CPH por genes A e B cujos produtos se combinaram para formar as moléculas expressas na
932
Imunologia do Transplante Renal
CLASSE II DR DP
GLO-1
B1
TAP 1 e 2
DQ
A1
B1
CLASSE III
B1
B3
B4
B5
A
CLASSE I Hsp 70
21 C4 21 C4 OH B OH A
A1
BF
TNF
C2
B
C
A
Fig. 52.3 Mapa de localização dos genes do Complexo Principal de Histocompatibilidade no braço curto do cromossoma 6 humano. Somente os genes do CPH que se expressam estão representados. Observe que para as moléculas DR há um gene A que codifica para a única cadeia alfa e que pode associar-se com as diferentes cadeias beta codificadas pelos diversos genes B (B1, B3, B4 e B5). (Adaptada de Campbell & Trowsdale 1993.)
membrana. A região de classe II contém 23 genes dos quais nove são funcionais. São eles HLA-DRA, DRB1, DRB3, DRB4, DRB5, DQA1, DQB1, DPA1 e DPB1, todos relevantes nos transplantes de órgãos. A combinação do gene DRA como DRB1 determina os antígenos HLA-DR de especificidades sorológicas definidas de DR1 a DR18. Por exemplo, a combinação dos produtos dos genes DRA e DRB3 forma a molécula HLA DR52, DRA e DRB4 compõem HLA DR53 e DRA com DRB5 produz DR51. As especificidades sorológicas de DQ1 a 9 são definidas pela associação dos produtos gênicos de DQA1 e DQB1, enquanto as especificidades de HLA-DP, normalmente reconhecidas por métodos celulares e mal definidas por métodos sorológicos, são formadas pela associação dos produtos gênicos DPA1 com DPB1. Tanto os genes de classe I como os de classe II são muito polimórficos, ou seja, apresentam variação de indivíduo para indivíduo, variação esta que pode ser detectada tanto por métodos sorológicos (utilizando anticorpos), como por métodos celulares (reações linfocitárias mistas). As diferentes especificidades HLA, classificadas pela OMS, estão apresentadas no Quadro 52.1. Mais recentemente, ao se utilizarem métodos de biologia molecular, foi possível expandir estas noções de polimorfismo a nível de DNA. Com isto, o número de alelos aumentou bastante e passou de 25 especificidades para o locus A para 209 alelos. Das 52 especificidades sorológicas HLA-B, conhecem-se hoje
414 alelos, e 101 alelos para o locus C, anteriormente nove especificidades. Da mesma forma, os antígenos da classe II tiveram o conhecimento de seu polimorfismo expandido pelo mesmo princípio. Como descrito anteriormente, os diferentes loci HLA estão alinhados nos dois cromossomas de n.º 6, um herdado do pai e outro da mãe. Assim, em cada locus há um alelo herdado. A combinação presente em um cromossoma, herdada em bloco de um progenitor, chama-se haplótipo. É raro haver recombinação dentro do CPH; há assim, em uma família, quatro haplótipos HLA cuja combinação dois a dois dará origem a quatro possíveis genótipos (Fig. 52.3). A distribuição populacional dos diferentes alelos varia, podendo ser característica de um determinado grupo étnico. É, assim, de grande importância sabermos qual a freqüência dos distintos alelos dentro de uma determinada população, se quisermos utilizar critérios imunogenéticos para a distribuição de órgãos. Há dados referentes à distribuição dos alelos HLA na população caucasóide e negróide do estado de São Paulo, mas pouca informação em outros estados da Federação. Normalmente, em um laboratório de histocompatibilidade, a definição dos antígenos, seja de classe I ou classe II, é feita sorologicamente. Mais de 140 soros reconhecendo especificidades HLA de classe I são utilizados para a definição fenotípica de um determinado indivíduo, em um teste de microlinfocitotoxicidade. Na identificação dos
933
capítulo 52
Quadro 52.1 Especificidades HLA determinadas sorologicamente HLA-A
HLA-B
A1 A2 A3 A9 A23 A24 A10 A25 A26 A34 A66 A11 A19 A29 A30 A31 A33 A32 A74 A28 A68 A69 A36 A43 A80
B5 B51 B52 B7 B8 B12 B44 B45 B13 B14 B64 B65 B15 B62 B63 B75 B77 B76 B16 B38 B39 B17 B57 B58 B18 B21 B49 B50
B22 B54 B55 B56 B27 B35 B37 B40 B60 B61 B41 B42 B46 B47 B48 B53 B67 B59 B70 B71 B72 B73 B78
HLA-C
HLA-DR
HLA-DQ
HLA-DP
Cw1 Cw2 Cw3 Cw4 Cw5 Cw6 Cw7 Cw8 Cw12 Cw13 Cw14 Cw15 Cw16 Cw17
DR1 DR2 DR15 DR16 DR3 DR17 DR18 DR4 DR5 DR11 DR12 DR6 DR13 DR14 DR7 DR8 DR10 DR9
DQ1 DQ5 DQ6 DQ2 DQ3 DQ7 DQ8 DQ9 DQ4
DP1 DP2 DP3 DP4 DP5 DP6
DR51 DR52 DR53
As especificidades em negrito são as originalmente definidas. As em padrão normal são divisões (splits) da anterior em negrito.
antígenos de classe II, um quase igual número de reações são necessárias utilizando-se o mesmo em uma população celular enriquecida em linfócitos B. No entanto, cada vez mais se têm utilizado métodos moleculares na definição dos antígenos de classe II, pois, por serem mais precisos, permitem uma melhor resolução dos diferentes alelos. Alguns laboratórios no Brasil já utilizam esse tipo de metodologia baseada fundamentalmente na amplificação do gene de classe II a ser determinado pelo método de PCR (Reação da Polimerase em Cadeia). A função biológica das moléculas HLA começou a ser definida há aproximadamente 20 anos, através de experimentos do grupo de Zinkarnagel. Ele mostrou que células citotóxicas contra o vírus da coriomeningite, geradas em camundongo de uma determinada linhagem, reconheciam e matavam células infectadas pelo vírus, quando estas células eram provenientes da mesma linhagem de camundongo, mas não de outra. Ele logo determinou que deveria haver uma compatibilidade a nível das moléculas do CPH de classe I para que houvesse essa lise, fenômeno que foi chamado de restrição alogênica. Sabe-se hoje que todo processo de reconhecimento imunológico se faz através da interação do receptor para an-
tígeno do linfócito T com moléculas do CPH que apresentam o fragmento de uma proteína (peptídeo). Assim, a função auxiliadora helper exercida pelos linfócitos T CD4⫹ se faz através do reconhecimento da molécula de classe II que apresenta um peptídeo pelo receptor da célula T. Esse peptídeo é colocado numa fenda que se forma por ocasião da síntese da molécula de classe II, sendo proveniente do processamento de proteínas endocitadas por células apresentadoras de antígenos, normalmente da linhagem monocitária (Fig. 52.4). A ativação da célula T com funções auxiliares tem vários efeitos, seja através do auxílio para que os linfócitos B se multipliquem e se diferenciem para a produção de anticorpos, ou através do auxílio dos linfócitos T precursores de células citotóxicas para que adquiram suas capacidades efetoras. Além disto, o auxílio pode ser dado a outros linfócitos T CD4⫹ responsáveis pelo fenômeno de hipersensibilidade retardada. Os linfócitos T com funções citotóxicas CD8⫹ reconhecem, através do seu receptor, a molécula de classe I igualmente apresentando um peptídeo, sendo este, em geral, originário do citoplasma da célula. Além do complexo trimolecular — HLA, peptídeo, receptor da célula T — interferem moléculas acessórias que
934
Imunologia do Transplante Renal
Linfócito T
ICAM-1 TCR/CD3
ICAM-1
LFA-1
CD2 CD4 ou CD8
Peptídeo
LFA-1
fócito T. Este depois passaria a reconhecer antígenos próprios do indivíduo devido ao que se denomina mimetismo molecular. Como exemplo disto, estão nossos estudos que demonstraram que, em nosso meio, pessoas com HLA DR7 são mais propensas a desenvolver febre reumática após infecção por estreptococo. Clones de células T cultivadas a partir de biópsias miocárdicas reconhecem simultaneamente peptídeos derivados da proteína M do estreptococo e extratos protéicos cardíacos.
Pontos-chave: LFA-3
MHC II/I
APC/Cél. alvo
Fig. 52.4 A molécula do CPH (MHC em inglês) e o peptídeo incrustado em seu interior são reconhecidos concomitantemente pelo receptor da célula T (TCR), que sempre está associado ao complexo CD3. Como coadjuvantes estão a molécula CD4, quando a interação for com classe II, ou CD8, se a molécula do CPH for de classe I. Outras moléculas de adesão ajudam na estabilização do complexo. Aqui representadas estão LFA-1/ICAM-I e CD2/LFA-3.
são importantes para o segundo sinal de ativação, do qual dependerá a ativação ou não (anergia), e que será retomada mais adiante. Desta forma, o papel principal do sistema HLA em humanos é apresentar peptídeos processados para que sejam reconhecidos pelo receptor da célula T nas diferentes funções imunológicas. Como esse reconhecimento se faz concomitantemente do peptídeo e da molécula HLA, pequenas variações em um destes dois componentes levam ao reconhecimento imunológico e desencadeamento de ativação celular e resposta específica. Entende-se, assim, por que as moléculas estão diretamente implicadas no controle genético da resposta imunológica. Sabe-se que indivíduos não reconhecem ou reconhecem mal um determinado antígeno dependendo da molécula HLA que o apresenta. Em modelo que estudamos recentemente, mostramos que indivíduos HLA DR4 produziam baixos níveis de anticorpos quando imunizados com uma vacina sintética para a malária, desenvolvida na Colômbia. A interpretação é que estes sujeitos reconhecem mal esta vacina quando apresentada pelas moléculas DR4. Por outro lado, sabemos também que alguns alelos HLA estão associados com o desenvolvimento de doenças autoimunes. Uma possível explicação para este fenômeno seria que a associação deste antígeno HLA com peptídeo derivado de agente infeccioso desencadeante da doença seria reconhecida de forma anômala pelo receptor de lin-
• Num transplante renal ABO compatível, os antígenos tissulares que compõem o sistema HLA são o principal alvo molecular da rejeição • Existem duas classes de antígenos HLA expressos na superfície das células • Existem três antígenos de classe I codificados por três loci distintos e expressos na membrana das células, chamados HLA A, B e C • Existem igualmente três antígenos de classe II bem definidos e conhecidos chamados HLA-DR, DQ e DP • Normalmente em um laboratório de histocompatibilidade, a definição dos antígenos, seja de classe I ou classe II, é feita sorologicamente
REJEIÇÃO A rejeição do aloenxerto renal é mediada imunologicamente e envolve tanto a resposta humoral quanto a celular. Nas rejeições humorais, destaca-se a rejeição hiperaguda mediada por anticorpos pré-formados oriundos de sensibilização prévia contra antígenos do doador. A primeira barreira a ser evitada para este tipo de rejeição é a incompatibilidade ABO e, depois, anticorpos contra as moléculas HLA. A pré-sensibilização contra estas últimas geralmente ocorre por transfusões sanguíneas, gravidez ou transplantes prévios. Este tipo de rejeição tem péssimo prognóstico, difícil tratamento e normalmente ocorre nas primeiras 24 h. Classicamente, a rejeição hiperaguda ocorre com alto título de anticorpos, imediatamente após a reperfusão do órgão. Neste tipo de rejeição, os anticorpos reagem com células endoteliais dos vasos do enxerto, ativam os sistemas do complemento e da coagulação, fazem migrar polimorfonucleares, há a criação de trombo, gerando destruição do endotélio, e obstrução vascular, culminando com perda irremediável do enxerto. As rejeições hiperagudas são preveníveis com a utilização de boa pro-
capítulo 52
va cruzada pré-transplante. Pacientes a risco são aqueles que têm uma alta sensibilização com altos títulos de anticorpos circulantes contra HLA. Mais recentemente, foi descrita a rejeição humoral tardia em que o receptor tem anticorpos em baixo título, não detectados por prova cruzada, mas com a reexposição aos antígenos presentes no enxerto ocorre elevação do título destes anticorpos, tendo como conseqüência a rejeição no primeiro mês pós-transplante. Freqüentemente nestes casos, a biópsia mostra anticorpos e complemento fixados no endotélio do órgão enxertado. Este tipo de rejeição também é relativamente raro e o tratamento, bastante ineficaz. As rejeições agudas que ocorrem com freqüência nos primeiros três meses pós-transplante são normalmente detectadas pelo quadro clínico característico (v. próximo capítulo) e por deterioração da função renal avaliada pelo aumento de creatinina sanguínea. Normalmente, o componente celular é mais importante que o humoral, e a instituição rápida de tratamento normalmente reverte esta situação. Estas rejeições são primeiramente tratadas com pulsoterapia de corticóide, e na falta de resposta terapêutica são utilizados agentes biológicos, ou seja, anticorpos específicos contra linfócitos. As rejeições agudas não pressupõem uma pré-sensibilização do doador contra o receptor. Normalmente se iniciam quando o sistema imune do receptor através dos linfócitos T entra em contato com os antígenos do doador no processo chamado alorreconheci-
935
mento, ou reconhecimento dos antígenos do outro (alós, do grego). Neste processo, o receptor para o antígeno da célula T interage e reconhece moléculas do CPH do doador. Este fenômeno pode dar-se direta ou indiretamente (Fig. 52.5). No modelo 1, alorreconhecimento direto, as células T alorreativas reconheceriam diretamente os motivos polimórficos do CPH alogênico do doador através de uma célula apresentadora de antígeno do doador ou de alguma outra célula do doador cumprindo este papel. Nesta proposta, o receptor de célula interagiria concomitantemente com peptídeo mais molécula do CPH, cujo conjunto desencadearia a resposta imune. Neste modelo também é importante a figura do leucócito passageiro, ou seja, células sanguíneas que estariam de passagem no órgão, quando do momento da retirada para o transplante, e que apresentariam antígenos do doador deflagrando a resposta aloespecífica. Note-se que nesta hipótese a célula apresentadora é de origem do doador. O sistema imune do receptor pode estar reconhecendo, como estranho, a molécula HLA, o peptídeo que está sendo apresentado, ou ambos. O outro modelo chama-se a via indireta do alorreconhecimento. Nesta, as células T reativas reconheceriam peptídeos polimórficos do doador, aí incluídas moléculas do CPH apresentadas por células apresentadoras de antígeno do próprio receptor. Essa hipótese do alorreconhecimento, apesar de mais recentemente valorizada como re-
Fig. 52.5 O reconhecimento dos antígenos do doador pelo linfócito T do receptor podem ser feitos através de apresentação por célula do próprio doador (via direta) ou por célula do receptor (via indireta). No primeiro caso, o leucócito passageiro presente no órgão transplantado apresenta antígeno próprio, e o complexo peptídeo mais molécula do CPH será reconhecido como estranho. No segundo caso, a molécula do CPH do doador processada por célula apresentadora de antígeno do receptor é apresentada ao linfócito do receptor (linfócito alorreativo).
936
Imunologia do Transplante Renal
levante, tem tido muito suporte experimental. Neste modelo há também a possibilidade de apresentação de qualquer sistema polimórfico do doador para reconhecimento imunológico, abrindo-se a possibilidade, assim, para o estabelecimento de resposta contra antígenos de diferentes sistemas secundários, ou tecido-específicos. Tanto a via direta como a indireta não são excludentes entre si e, muito provavelmente, os dois mecanismos operam no alorreconhecimento, no desencadeamento da resposta imune e conseqüentemente na rejeição de órgãos. Alguns autores acreditam que a via direta do alorreconhecimento é responsável pela rejeição aguda, enquanto a via indireta estaria envolvida na rejeição crônica. A primeira hipótese seria sustentada pelo fato que, em modelos experimentais, a rejeição aguda é evitada após terem sido eliminados do enxerto — antes do implante — os leucócitos passageiros. É importante salientar que o sinal gerado através do receptor da célula T durante o alorreconhecimento (sinal 1) não é suficiente para a completa ativação dos linfócitos T. Um sinal co-estimulatório adicional (sinal 2), antígenoinespecífico, produzido por moléculas particulares na superfície dos linfócitos T, é requerido para a produção de IL-2, proliferação das células e diferenciação para funções efetoras. A interação da molécula CD28, uma glicoproteína homodimérica presente na célula T, com a molécula B7 presente nas células apresentadoras de antígeno fornece o mais importante sinal de co-estimulação. Uma outra via de co-estimulação muito estudada recentemente é aquela que envolve a interação da molécula CD40 das células apresentadoras de antígeno e seu ligante, gp39 (CD40L), um membro da família do fator de necrose tumoral, nos linfócitos T. A presença dos sinais 1 e 2 é indispensável para fornecer estímulo à diferenciação dos linfócitos CD4⫹ com funções auxiliadoras, os quais irão influenciar nas diversas funções efetoras do sistema, e de linfócitos CD8⫹ com função efetora de citotoxicidade (Fig. 52.6). Com o aprendizado do manejo das etapas iniciais do transplante, a rejeição crônica passou a ter um papel de extrema importância no prognóstico do transplante. Não se conhecem as bases moleculares que levam ao desencadeamento da rejeição crônica, mas sabe-se que há vários coadjuvantes nesta intercorrência. Esta rejeição leva a uma progressiva perda da função do enxerto devido principalmente ao espessamento vascular, processo este denominado arterosclerose do enxerto. No entanto, diferentemente da arterosclerose clássica, esta não é pontual e sim disseminada em toda a árvore vascular do órgão enxertado. Entre os fatores que predispõem ao aparecimento da rejeição crônica, incluem-se o tempo de isquemia fria, o número de episódios de rejeição, o número de incompatibilidade HLA e a infecção por citomegalovírus. Alguns grupos têm determinado que existe uma reação específica antiendotélio, mas falta ainda comprovação experimental. Outros acre-
Pontos-chave: • Nas rejeições humorais, destaca-se a rejeição hiperaguda mediada por anticorpos préformados oriundos de sensibilização prévia contra antígenos do doador • Neste tipo de rejeição, os anticorpos reagem com células endoteliais dos vasos do enxerto, ativam os sistemas do complemento e da coagulação, fazem migrar polimorfonucleares, há a criação de trombo, gerando destruição do endotélio, e obstrução vascular • As rejeições agudas ocorrem com freqüência nos primeiros três meses pós-transplante • Rejeição aguda celular se inicia quando o sistema imune do receptor, através dos linfócitos T, entra em contato com os antígenos do doador no processo chamado alorreconhecimento, ou reconhecimento dos antígenos do outro (alós, do grego) • É importante salientar que o sinal gerado através do receptor da célula T durante o alorreconhecimento (sinal 1) não é suficiente para a completa ativação dos linfócitos T. Um sinal co-estimulatório adicional (sinal 2), antígeno-inespecífico, produzido por moléculas particulares na superfície dos linfócitos T, é requerido para a produção de IL-2, proliferação das células e diferenciação para funções efetoras
ditam que se deva a resposta humoral e celular dirigida às moléculas do CPH.
HISTOCOMPATIBILIDADE Reatividade Contra Painel A sensibilização contra antígenos HLA é detectada pela assim chamada reatividade contra painel (do inglês PRA). Neste exame, o soro do receptor é testado contra certo número de células de indivíduos normais que poderiam eventualmente ser doadores de órgãos. Este painel é selecionado para representar a distribuição dos antígenos HLA da população local, e, por conseguinte, a positividade contra esse painel reflete a reatividade contra a população. Definem-se, assim, os graus de sensibilização de um receptor, que será considerado não-sensibilizado quando a rea-
capítulo 52
A
B
Fig. 52.6 A presença dos sinais 1 e 2 é indispensável para a produção de IL-2, proliferação das células e diferenciação para funções efetoras (A). Em caso de ausências de sinal 2, a célula encontra anergia e morte celular.
tividade é abaixo de 10%, sensibilizado quando de 10% a 50% e hipersensibilizado quando a reatividade é acima de 50%. Essa definição pode variar de centro para centro transplantador, sendo em alguns lugares definido como hipersensibilizado aquele que reage com mais de 70 ou 80% das células do painel.
Prova Cruzada Independentemente do grau de sensibilização do receptor, o teste fundamental para verificar se o receptor tem anticorpos pré-formados contra o doador é a prova cruzada pré-transplante. Instituída por Terasaki nos anos 60, essa prova foi responsável pela diminuição dramática no número de rejeições hiperagudas. No início, essa prova era realizada com soro do receptor e linfócitos periféricos do doador. O teste utilizado é aquele da microlinfocitotoxicidade dependente de complemento. Assim, nem toda prova cruzada positiva impede a realização de transplante, sendo necessário identificar a especificidade e o isótipo do anticorpo positivo. Sabemos hoje que a contra-indicação formal para a realização do transplante é a presença de IgG anti-HLA de classe I do doador no soro do receptor. Na experiência acumulada em nosso serviço, positividade devida a anticorpos IgM é normalmente dirigida contra auto-antígenos. No entanto, anticorpos IgM aloespecíficos, em nossa experiência, não são deletérios ao enxerto. Para detectar se a reatividade positiva apresentada na prova cruzada é devida a anticorpos IgM, adiciona-se DTT à prova cruzada.
937
Desta forma, uma prova que é positiva sem DTT e negativa após DTT é devida a anticorpos IgM, e este enxerto pode ser realizado. Observamos igualmente que anticorpos específicos contra linfócitos B, normalmente dirigidos contra antígenos HLA de classe II, não são deletérios ao enxerto. Relatos antigos mostravam que anticorpos pré-formados contra linfócitos B poderiam causar rejeição. De acordo com a literatura e dados de nosso laboratório, pode-se depreender que muitas vezes estes anticorpos eram dirigidos contra antígenos de classe I em baixo título, e só detectados na prova contra B, mais sensível. Mostramos que anticorpos contra antígenos HLA-DR não são contra-indicação para transplante. A inclusão das técnicas de lavagem após incubação do soro do receptor com célula do doador eliminou a detecção dos anticorpos de baixo título, freqüentemente dirigidos contra auto-antígenos sem importância clínica. A utilização de antiimunoglobulina humana proporcionou uma maior sensibilidade do teste de detecção de anticorpos de baixo título, diminuindo grandemente o número de rejeições devido a anticorpos pré-formados, e é hoje o teste de escolha. No entanto, apesar dos avanços na prova cruzada, a literatura e também a nossa experiência mostram que há por volta de 6 a 7% de rejeições devido a anticorpos não detectados por prova cruzada. Na busca de possíveis alvos moleculares nessas rejeições, vários grupos, inclusive o nosso, estudaram reatividade específica antiendotélio. Mostramos que em 80% dos soros de receptores com rejeição humoral e com prova cruzada negativa, é possível detectar reatividade antiendotélio. Em casos de indivíduos HLA idênticos, mostra-se inclusive que pode haver anticorpos antiendotélio responsáveis por rejeições precoces. Em estudo recente de nosso laboratório, realizando provas cruzadas que utilizam soro do receptor e pele do doador, detectamos anticorpos, provavelmente antiendotélio, que se fixavam nos queratinócitos do doador. A presença destes anticorpos mostrou-se acuradamente preditiva da perda precoce do enxerto em pacientes que anteriormente rejeitaram um outro enxerto renal. Em outro estudo mais recente, nosso grupo pesquisou o envolvimento de anticorpos antiendotélio na perda do enxerto em 22 eluatos obtidos de rins nefrectomizados após perderem a funcionalidade por causa de diferentes tipos de rejeição. As provas cruzadas com amostras de soro prétransplante, pré-nefrectomia, uma e duas semanas pósnefrectomia foram negativas, excluindo assim a presença de anticorpos anti-HLA contra o doador. Os eluatos foram testados contra um painel de células endoteliais. Em oito casos foram detectados anticorpos que se ligavam às células endoteliais, ativando-as, como mostrou o aumento significativo da expressão das moléculas de adesão (VCAM-1, ELAM-1 e ICAM-1). Sete desses oito eluatos eram obtidos de rins que sofreram rejeição vascu-
938
Imunologia do Transplante Renal
lar aguda, enquanto nenhum provinha dos nove casos de rejeição crônica. Este dado mostra pela primeira vez uma fortíssima correlação entre anticorpo não-anti-HLA (provavelmente antiendotélio) e rejeição vascular aguda e ausência de correlação com a rejeição crônica, como muitos autores suspeitam.
Pontos-chave: • Independentemente do grau de sensibilização do receptor, o teste fundamental para verificar se o receptor tem anticorpos pré-formados contra o doador é a prova cruzada pré-transplante. O teste utilizado é aquele da microlinfocitotoxicidade dependente de complemento • A contra-indicação formal para a realização do transplante é a presença de IgG antiHLA de classe I do doador no soro do receptor • Em 80% dos soros de receptores com rejeição humoral e com prova cruzada negativa, é possível detectar reatividade antiendotélio
Nos últimos anos, tem sido utilizada em vários centros a detecção de anticorpos por citometria de fluxo. Neste tipo de metodologia bastante sofisticada, a reação de anticorpo do receptor com célula do doador é verificada por imunofluorescência utilizando o citômetro de fluxo, cujo funcionamento é baseado na excitação do fluorocromo por um raio laser no qual a emissão luminosa é detectada posteriormente. Esse tipo de prova é bastante sensível, mas diminui a especificidade, na medida em que alguns anticorpos não deletérios ao enxerto podem ser detectados.
Compatibilidade HLA O papel da sobrevida do transplante renal e a compatibilidade HLA restam como um tema de discussões há muitos anos. Se ela é fundamental para a realização do transplante de medula óssea, o seu papel determinante da sobrevida do enxerto renal tendo em vista as condições atuais da imunossupressão é alvo de debates apaixonados. Incontestavelmente, receptor de doador vivo parente com HLA idêntico tem sobrevida de enxerto muito melhor que qualquer outro tipo de relação doador-receptor. Doadores vivos haploidênticos vêm a seguir. A situação não é de análise tão simples no caso dos doadores cadáver, que compreendem a grande massa de doadores hoje utilizados no transplante renal (Fig. 52.7).
PRIMEIRO TRANSPLANTE 100
% DE SOBREVIDA DO ENXERTO
90
IRMÃO HLA IDÊNTICO N = 4117
80
70
HAPLOIDÊNTICO N = 13413
60
CADÁVER N = 89664
50
0
0
1
2
3
4
5
ANOS Fig. 52.7 Doador do CTS comparando o sucesso do primeiro transplante de rim em receptores que receberam órgão de irmão HLA idêntico, haplo- ou semi-idêntico e doador cadáver. É evidente o ganho de sobrevida do enxerto com a melhor compatibilidade HLA. (Adaptada de Opelz, 1994.) CTS ⫽ Collaborative Transplant Study.
939
capítulo 52
No início, grande parte da controvérsia era gerada porque poucas especificidades HLA eram conhecidas e conseqüentemente as tipagens eram de má qualidade, tendo como resultado uma compatibilidade doador-receptor pobre. Atualmente, graças à imunossupressão eficaz com a utilização de ciclosporina e de anticorpos específicos para linfócitos, o efeito da compatibilidade HLA pode ficar escondido. Analisando dados publicados pela UNOS (United Network for Organ Sharing) dos EUA — confirmados por centros europeus reagrupados no Eurotransplant ou mundialmente através dos estudos do CTS (Collaborative Transplant Study) de Heildelberg, Alemanha — podemos observar um maior impacto da compatibilidade HLA na sobrevida do enxerto aos 10 anos, a três níveis: enxertos de doadores vivos parentes HLA idênticos, vivos parentes semi-idênticos e cadavéricos com diferentes graus de compatibilidade. O resultado mais notável (65% de sobrevida aos 10 anos) é aquele referido à compatibilidade de seis antígenos entre receptor e doador cadáver. Este efeito é menos evidente no caso de enxertos provenientes de doador cadáver com diferentes graus de compatibilidade com o receptor, reduzindo a sobrevida do enxerto a 34%-45% aos 10 anos (Quadro 52.2). Em 1995 Terasaki et al. relataram resultados surpreendentes quanto à sobrevida de enxertos provenientes de doadores vivos não-parentes, geralmente cônjuges, os quais são comparáveis àqueles obtidos com doador vivo parente semi-idêntico. Dados posteriores provenientes da UTR-HC (Unidade de Transplante Renal do Hospital das Clínicas da FMUSP) confirmaram estes resultados no nosso meio. Mais recentemente, o mesmo Terasaki relatou dados sobre 1.381 transplantes realizados nos EUA com doadores vivos não-parentes. A sobrevida do enxerto a 1 e 3 anos para os 1.251 primeiros transplantes era de 92% e 87%, respectivamente. Estes excelentes resultados eram comparáveis aos observados em 2.594 pacientes que receberam
durante este período enxertos HLA compatíveis de doadores cadavéricos (90% e 81%) e foram confirmados em 114 retransplantes e 21 transplantes realizados em pacientes sensibilizados. Como era de esperar, nenhum dos enxertos era HLA compatível ao receptor e 93% apresentavam três ou mais incompatibilidades HLA-A, B, DR. Os excelentes resultados observados com doadores vivos não-parentes, apesar dos altos níveis de incompatibilidade HLA, poderiam ser explicados com a falta de lesão dos rins em conseqüência da morte encefálica e da prolongada isquemia fria que acompanham a doação cadavérica. A inflamação, conseqüente da lesão do enxerto, levaria ao aumento de expressão dos antígenos HLA, aumento este crucial no processo de alorreconhecimento e ativação das células T, explicando desta forma os notáveis resultados obtidos com enxertos cadavéricos HLA totalmente compatíveis, assim como aqueles muito inferiores mesmo na presença de uma única incompatibilidade HLA. Para que realmente se consiga obter uma boa compatibilidade, são necessárias listas de espera de receptor bastante amplas que permitam esta escolha. Assim, em um centro que tenha 500 pacientes em lista de espera ativa, a probabilidade de se encontrar um receptor com seis antígenos HLA idênticos aos do doador é de apenas 2%. Neste ponto nascem as controvérsias. A pesquisa de compatibilidade HLA é demorada e custosa. Considerando que seu benefício é relevante somente quando receptor e doador compartilham os seis antígenos HLA, objetivo dificilmente alcançado, muitos pesquisadores questionam o uso da compatibilidade HLA como critério de distribuição dos órgãos. Recentemente, foi introduzida no Brasil a instituição da compatibilidade HLA como regra na distribuição de órgãos, regra essa que vai permitir não só uma distribuição mais justa, mas também a obtenção de dados do próprio país sobre o impacto da compatibilidade HLA no transplante renal. Com relação ao problema de escolha do par doadorreceptor, voltemos a analisar o transplante com doador
Quadro 52.2 Efeito da compatibilidade HLA na sobrevida do enxerto renal Doador
N.º MMa
Sobrevida aos 10 anos
DVPb
0 (idêntico)
74%
CADc
0 (6 antígenos compatíveis)
65%
DVP
3 (semi-idêntico ⫽ 3 MM)
54%
CAD
TOTAL
40%
CAD
1-2 MM
45%
CAD
3-4 MM
38%
CAD
5-6 MM
34%
a: Incompatibilidades (mismatches, em inglês). b: Doador Vivo Parente. c: Doador Cadáver. (Adaptado de CARPENTER, 1995.)
940
Imunologia do Transplante Renal
vivo parente. Van Rood recentemente apresentou dados sobre incompatibilidades HLA permissíveis em pacientes hipersensibilizados. Segundo ele, para estes pacientes existe uma maior probabilidade de se encontrarem doadores com prova cruzada negativa quando os antígenos HLA incompatíveis do doador são idênticos àqueles dos antígenos HLA maternos não herdados pelo paciente. Partindo destes dados, ele avançou uma teoria de que existiria tolerância materno-fetal. Se isto fosse verdade, quando comparássemos transplantes em que a mãe ou o pai são doadores, o transplante com doador mãe deveria apresentar resultados melhores. Dados de nosso centro transplantador, UTR-HC, não confirmam esta hipótese. A sobrevida em 2, 3 ou 4 anos, bem como a função renal do enxerto, são bem melhores quando se utiliza o pai como doador. Depois de nossos achados, vários outros autores publicaram dados semelhantes.
IMUNOSSUPRESSÃO O sucesso dos transplantes hoje em dia é devido em grande parte ao arsenal terapêutico disponível. Cabe ao clínico experiente a correta utilização das drogas após uma criteriosa seleção. Além de drogas tradicionais usadas desde a década de 60, a ciclosporina e os agentes biológicos utilizados nos últimos anos foram uma grande aquisição na área de imunossupressão do transplante. Há, atualmente, um grande número de drogas em ensaios clínicos e que parecem ter um futuro bastante promissor. O tratamento imunossupressor ideal deveria promover a aceitação do enxerto sem interferir nas outras ações do sistema imunológico, tais como a defesa contra as infecções e o patrulhamento anticâncer. Apesar de não se ter chegado a este estágio, muito se avançou neste sentido. Assim, o tratamento imunossupressor busca, em primeiro lugar, prevenir o desencadeamento da resposta imune do receptor contra o enxerto e, em segundo lugar, conter quando necessário o processo de rejeição já instalado. Dentre as drogas utilizadas correntemente estão aquelas que têm uma ação antiinflamatória hormonal, aquelas que interferem na multiplicação celular e conseqüentemente linfocitária, aquelas de ação específica na ativação do sistema imune e, por último, aquelas que vão especificamente destruir o linfócito, eliminando-o em processo de rejeição já instalado.
Drogas Antiinflamatórias Hormonais Os glicocorticóides são utilizados como coadjuvantes importantes nas terapias imunossupressoras. Suas funções são múltiplas no sistema imunitário. Tanto neutrófilos como monócitos têm seu deslocamento diminuído para áreas inflamatórias. A estabilização dos lisossomas mono-
citários diminui a digestão dos antígenos e sua apresentação pelos macrófagos. Acredita-se que muitas de suas funções estejam relacionadas à alteração da produção de IL1. Dentre as ações sobre os linfócitos estão a indução de morte celular e a redistribuição no sangue e líquido extracelular. Existem tentativas clínicas de retirada de corticóide em alguns casos de transplantados, como em criança para evitar retardo de crescimento, e em paciente diabético pelos seus efeitos hiperglicemiantes. Nem sempre esta retirada é feita com sucesso. Além do tratamento de manutenção de imunossupressor, estes corticóides são utilizados em doses maciças nos casos de rejeição aguda celular. Na assim chamada pulsoterapia com corticóide, muitas vezes se consegue abortar o processo de rejeição. Acredita-se que nesses casos exista uma ação lítica direta dos linfoblastos.
Antimetabólicos As primeiras drogas imunossupressoras que surgiram foram os antimetabólicos. Destes, sem dúvida o mais utilizado é a azatioprina. Análogo e antagonista das purinas, a azatioprina inibe a síntese de DNA e com isso a multiplicação celular. Assim, esta droga tem ação em todas as células em multiplicação no organismo, não atuando exclusivamente na divisão linfocitária. Como conseqüência, existem riscos de diminuição de produção de outras células do sistema hematológico causando pancitopenia. Até há pouco tempo, era a droga imunossupressora de escolha, apesar dos problemas advindos da sua utilização. Há 15 anos, com a instituição da ciclosporina houve queda de seu uso como imunossupressor de escolha. Hoje, a azatioprina é muito usada conjuntamente com corticóide e ciclosporina no chamado esquema tríplice.
Ciclosporina A ciclosporina foi encontrada por acaso quando se buscava um antibiótico. Ela é produto do fungo Tricodermapolysporum. Sua utilização clínica começou nos anos 80, apesar de os primeiros relatos mostrarem muita toxicidade. Trata-se de um peptídeo hidrofóbico de 11 aminoácidos. Seu papel, sabe-se hoje, é incluído na categoria das drogas chamadas imunofilinas. Outra droga já em ensaio clínico com atividade biológica semelhante é a FK5O6. Essas drogas agem através de um receptor de membrana e ligam-se a proteínas citoplasmáticas chamadas imunofilinas. O complexo atua diretamente no núcleo das células no promotor de alguns genes. O gene mais importante no qual interfere é o da interleucina-2 (IL-2). Tendo em vista o papel fundamental desta interleucina no processo imunológico, a droga tem pronunciado efeito imunossupressor sem interferir em outros metabolismos celulares. Por inibir a
941
capítulo 52
transcrição do gene, leva à diminuição de IL-2 e também à diminuição de seu receptor. Os ensaios clínicos mostraram que a droga não favorece tanto à infecção como a azatioprina. No entanto, foram relatados problemas ligados à nefrotoxicidade e à indução de proliferações malignas principalmente do sistema linfóide. Sua utilização foi a grande responsável pelo enorme aumento do número de transplantes ocorridos na década de 80, principalmente transplante de coração, fígado e medula óssea. O transplante de rim também beneficiou-se bastante em sobrevida e diminuição de morbidade. No nosso meio, foi utilizada primeiramente no transplante com doador cadáver, e hoje em dia também em transplantes com doadores vivos. A experiência na utilização clínica tem feito com que as doses venham diminuindo com os anos, evitando-se assim a toxicidade. A absorção a nível intestinal varia muito de indivíduo a outro, e por isso são solicitadas dosagens da droga no sangue para ajustes de posologia. Outras apresentações da droga em que o problema de absorção intestinal seja minimizado estão atualmente em estudo.
Agentes Biológicos Além do arsenal químico, a imunossupressão dispõe de agentes biológicos utilizados para debelar processos de rejeição instalados. Trata-se de anticorpos policlonais e monoclonais que vão agir especificamente sobre os linfócitos T.
GLOBULINA ANTILINFOCITÁRIA E GLOBULINA ANTITIMOCITÁRIA Instituída já há muito anos, a globulina antilinfocitária é obtida através da imunização de coelhos ou cavalos com linfócitos ou timócitos humanos. É um potente agente imunossupressor e sua utilização é restrita ao uso hospitalar. Sua utilização clínica é fundamentalmente no tratamento de rejeições celulares agudas refratárias à pulsoterapia. Existem também ensaios clínicos de utilização da droga na profilaxia de rejeições com resultados clínicos variando de centro para centro. Após sua administração, observa-se uma queda no número de linfócitos T circulantes do paciente. Com isto, diminui toda a atividade imunológica do indivíduo e conseqüentemente a rejeição ao enxerto. Normalmente, o tratamento é feito com a administração da droga durante 15 dias, e a chance de sucesso é elevada. O grande inconveniente desse tipo de tratamento é o risco de infecções e de doenças linfoproliferativas. Por se tratar de proteína de origem animal, podem ser observadas eventualmente re-
ações alérgicas, e caso seja necessária a administração de grande quantidade de globulina para deter o processo de rejeição, pode ocorrer doença do soro. Nosso laboratório, junto com o Instituto Butantã, têm produzido em cavalos uma globulina antitimocitária que está sendo utilizada por diversos centros transplantadores de todo o país. Há igualmente produtos importados que estão à disposição da utilização médica. Para o melhor ajuste individual da dose administrada, é necessária a monitoração do tratamento através da verificação da linfopenia, que é feita por hemograma, associada à determinação de linfócitos T por citometria de fluxo. O número de linfócitos CD3/mm3 de sangue para uma imunossupressão adequada não é uniforme na literatura. Alguns centros trabalham com valores de 100, outros de 20 até 0 células/mm3. Em nosso laboratório consideramos adequado o número de 100 linfócitos por mm3, durante o tratamento.
ANTICORPOS MONOCLONAIS A tecnologia de anticorpos monoclonais desenvolvida há 20 anos vem revolucionando toda a utilização de soros e de anticorpos. Assim, a evolução normal da globulina antilinfocitária seria a produção de anticorpos monoclonais específicos para linfócitos T. Foi desenvolvido comercialmente o anticorpo OKT3 na metade dos anos 80, que vem sendo utilizado em todo o mundo. Esse anticorpo reconhece a molécula CD3 presente nos linfócitos T periféricos maduros. A grande vantagem da utilização desse anticorpo é a grande especificidade para linfócitos T e a necessidade da utilização de pequena quantidade de proteína animal. Observa-se a rápida diminuição dos linfócitos T periféricos após a administração de uma simples dose de anti-CD3. Sua utilização tem alguns inconvenientes, como reações febris, reação alérgica e sobretudo a sensibilização do paciente contra a parte ativa do anticorpo, formação dos chamados anticorpos antiidiotípicos. Esses anticorpos podem impedir uma segunda utilização desta droga. Nosso laboratório, juntamente com o Instituto Butantã, produz também um anti-CD3, por sofisticados métodos de cultura celular em massa. Os resultados clínicos são excelentes. Exemplo de acompanhamento por citometria de fluxo do nível de linfócitos T maduros no sangue periférico em paciente tratado com anti-CD3 é apresentado na Fig. 52.8. Além do anti-CD3, vários outros anticorpos estão sendo testados em todo o mundo, seja com a função de reversão do processo de rejeição já instalado, seja na indução de tolerância específica. Exemplos desse tipo de anticorpo são o anti-LFA1 (CD18 ou CD11), o anti-CD25 (receptor de IL2) e o anti-CD54, moléculas acessórias no reconhecimento linfocitário (Fig. 52.4).
Imunologia do Transplante Renal
FL1-H/FL1-Altura
FL1-H/FL1-Altura
FL1-H/FL1-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL1-H/FL1-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL1-H/FL1-Altura
FL1-H/FL1-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL1-H/FL1-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL2-H/FL2-Altura
FL2-H/FL2-Altura
942
FL1-H/FL1-Altura
FL1-H/FL1-Altura
Fig. 52.8 Dados de citometria de fluxo no acompanhamento e ajuste de dose de anti-CD3 Butantã/Incor no tratamento de rejeição celular aguda. Acima da linha horizontal estão os linfócitos T. Observe que um dia antes e imediatamente pré-tratamento há número elevado de células que cai drasticamente com a administração da droga. Com a diminuição da dose, há aumento de células que prontamente respondem às variações da quantidade de medicamentos.
PERSPECTIVAS É difícil prever-se o avanço científico nessa área em que a realidade muitas vezes vai além da imaginação. No entanto, há muita expectativa relacionada com a utilização de órgãos a partir de doadores animais, nos assim chamados xenotransplantes. Outra grande esperança está no estabelecimento das condições que levem à imunossupressão específica do doador sem nenhuma interferência nos processos imunológicos normais. No que se refere ao xenotransplante, há experimentos tanto em transplantes discordantes, em que a distância entre a espécie de doador e receptor é muito grande, como por exemplo rim de porco sendo transplantado em chipanzé, como em transplantes concordantes, entre espécies semelhantes, como por exemplo coração de camundongo para rato. A grande barreira nos transplantes discordantes é a imunidade natural contra antígenos da espécie e que leva a uma rejeição hiperaguda devido a anticorpos pré-formados. Os transplantes concordantes
têm tido avanços importantes no sistema murino. Em humanos há tentativas desesperadas, como o transplante de fígado de babuínos para humanos. A grande vantagem desta combinação é que, neste caso específico, o fígado de babuíno não se infecta pelo vírus da hepatite humana, impedindo recidiva da doença primária. Recentemente o porco atraiu a atenção dos pesquisadores porque a fisiologia dos órgãos deste animal não é muito diferente da dos humanos. A criação de porcos transgênicos, que expressam inibidores para o complemento humano, é muito estimulante. Os tecidos destes animais são resistentes à destruição mediada por complemento do sangue humano, seja in vitro, seja in vivo. A indução de tolerância é o principal alvo da biologia do transplante. Muito embora a indução de tolerância a aloantígenos tenha sido atingida em modelos experimentais utilizando roedores, são poucos os casos descritos em animais de grande porte e no homem. Mesmo assim, alguns pacientes que interromperam a terapia imunossupressora, por causa de toxicidade severa ou câncer, mantiveram o enxerto funcionante. Este fato, mais freqüente no transplante hepático, sugere que a tolerância pode ser adquirida também no homem e encoraja a continuação das pesquisas em busca de protocolos que permitam a indução de tolerância aos aloenxertos. Agentes que bloqueiam as vias de coestimulação CD28/ B7 e CD40/CD40L se mostraram particularmente eficazes em prolongar a sobrevida do enxerto no transplante experimental. Resta determinar como estes poderiam ser integrados nos protocolos de imunossupressão utilizados no transplante clínico. Muitas abordagens de indução de tolerância envolvem o pré-tratamento ou tratamento durante o transplante do receptor com antígenos do doador de uma forma ou de outra. Destaca-se aqui a injeção de antígenos do doador no timo do receptor, que permite a realização com sucesso de um transplante do mesmo doador apesar da total incompatibilidade MHC e geralmente sem necessidade de imunossupressão. Os notáveis avanços constantemente alcançados no campo da imunobiologia do transplante nos deixam confiantes em acreditar que protocolos de indução de tolerância serão aplicados no transplante clínico com o começo deste novo século.
BIBLIOGRAFIA SELECIONADA BARDLEY, J.A.; MOWAT, A. & BOLTON, E.M. Processed MHC class I alloantigen as the stimulus for CD4⫹ T cell dependent antibodymediated graft rejection. Immunol. Today, 13(11):434-438,1992. BENICHOU, G.; TATIZAWA, P.A.; OLSON, C.A.; McMILLAN, M & SECARZ, E.E. Donor major histocompatibility complex (MHC) peptides are presented by recipient MHC molecules during graft rejection. J. Exp. Med., 175:305-308, 1992. BJORKMAN, P.J.; SAPER, M.A.; SAMRAQUI, B.; BENNET, W.S.; STROMINGER, J.L. & WILEY, D.C. Structure of the human class I histocompatibility antigen HLA-A2. Nature, 329:506-12, 1987.
capítulo 52
BODMER, J.G.; MARSH, S.G.E.; ALBERTE, D.; BODMER, W.F.; DUPONT, D.; ERLICH, H.A.; MACH, B.; MAYR, W.R.; PARHAM, P.; SASAZUKI, T.; SCHREUDER, G.M.Th.; STROMINGER, J.L.; SVEJGAARD, A. & TERASAKI, P.I. Nomenclature for factors of the HLA system 1994. Tissue Antigens, 44:1-18, 1994. CAMPBELL, D. & TOWSDALE, J. Map of the human major histocompatibility complex. Immunol. Today, 14(7),1993. CARPENTER, C.B. Long-term failure of renal transplants: adding insult to injury. Kidney Intern. 48, suppl. 50, s40-s44, 1995. CLASS, F.H.J.; GIJBELS, Y.; VAN DER VELDEN-DE-MUNCK, J. & VAN ROOD, J.J. Induction of B cell unresponsiveness to noninherited maternal HLA antigens during fetal life. Science, 241:1815, 1988. COLOMBANI, J. HLA Functions Immunitaires et Applications Médicales. Ed. John Libbey Eurotex p. 285, Paris-França, 1993. DAUSSET, J. & PLA, M. HLA — Complexe Majeur d’Histocompatibilité de l´Homme. Ed. Flammarion Médicine — Sciences p. 414, Paris-França, 1989. FERGUSON, R. For the Transplant Information Share Group (TISG): A multicenter experience with sequencial ALG/Cyclosporine therapy in renal transplantation. Clin. Transplant, 2:285,1988. GJERTSON. D.W. & TERASAKI, P.I. The large variation in halflives of kidney transplants. Transplantation, 52:357,1992. HOGG, N. & Cols. In: Leukocyte Adhesion Molecules. T.A. Springer e cols. Spring Verlag, New York, 1988. KALIL, J.; GUILHERME, L.; NEUMANN, J.; ROSALES, C.; MARIN, M.; SALDANHA, L.; CHOCAIR, P.; IANHEZ, L. & SABBAGA, E. Humoral rejection in two cases of HLA identical living related donors kidney transplants. Transplant. Proc., 21(1):711-713, 1989. KIRKPATRICK, C.H. Transplantation immunology. JAMA, 258(20):29933000, 1987. LECHLER, R. & LOMBARDI, G. Structural aspects of allorecognition. Current Opinion in Immunology, 3:715-721, 1991. LUCCHIARI, N.; PANAJOTOPOULOS, N.; XU, C.; RODRIGUES, H.; IANHEZ, L.E.; KALIL, J. & GLOTZ, D. Antibodies eluted from acutely rejected renal allografts bind to and activate human endothelial cells. Human Immunology, 61:518-527, 2000. MATAS, A.J.; SUTHERLAND, D.E.R. & NAJARIAN, J.S. The impact of HLA matching on graft survival. Transplantation, 54-568, 1992. MONTEIRO, F.; BUELOW, R.; MINEIRO, C.; RODRIGUES, H. & KALIL, J. Identification of patients at high risk of graft loss by pre- and posttransplant monitoring of anti-HLA class I IgG antibodies by ELISA. Transplantation, 63(4):542-546, 1997. MYLTILINEOS, J.; SCHERER, S.; DUNCKLEY, H.; TREJAUT, J.; CHAMPMAN, J.; FISCHER, G.; FAE, I.; MIDDLETON, D.; SAVAGE, D.; BIGNON, J.D.; BENSA, J.C.; NOREEN, H.; ALBERT, E. & OPELZ, G. DNA HLA-DR typing results of 4000 kidney transplants. Transplantation, 55(4):778, 1993. OPELZ, G. Success rate and impact of HLA matching on kidney graft survival in highly immunized recipients. Transplant Int., 5(suppl. 1): 601-603,1992. PANAJOTOPOULOS, N.; RODRIGUES, H.; MARIN, M.L.; VIGGIANI, C.; PAULA, F.J.; IANHEZ, L.E.; SABBAGA, E. & KALIL, J. Relevance of positive B-cell crossmatch in renal transplantation. Human Immunology, 40(suppl. 1):40,1994. PANAJOTOPOULOS, N.; IANHEZ, L.E.; NEUMANN, J.; SABBAGA, E. & KALIL, J. Immunological tolerance in human transplantation. The possible existence of a maternal effect. Transplantation, 50(3):443-445, 1990. PANAJOTOPOULOS, N.; IANHEZ, L.E.; NEUMANN, J.; ROSALES, C.; SABBAGA, E. & KALIL, J. A successful second renal allograft across
943
positive B-cell crossmatch due to IgG anti-HLA-DR5 antibody. Clin. Transplantation, 6:196-198, 1992. PANAJOTOPOULOS, N.; SILVA, R.A.; RODRIGUES, H.; OLIVEIRA, Z.N.P.; FUKUMORI, L.M.I.; IANHEZ, L.E.; NAHAS, W. & KALIL, J. Clinical significance of skin crossmatch in kidney transplantation. Transplant. Proc., 31:2982-3, 1999. ROSALES, T.; GUILHERME, L.; CHIARELLA, J.; MARIN, M.L.; ROSALES, C.; MELLO, C.P.; GOLDBERG, A.C. & KALIL, J. Human leukocyte A and B antigen, gene and haplotype frequencies in the population of the city of São Paulo in Brazil. Brazilian J. Med. Biol. Res., 25:39-47, 1992. SAYEGH, T.N.M.; HEEMELS, M.T.; NEEFJES, J.J.; KAST, W.M.; MELIEF, C.J.M. & PLOEGH, H. Direct binding of peptide to empty MHC class I molecules on intact cells and in vitro. Cell, 62:363-7, 1990. TAKEMOTO, S.; TERASAKI, P.I.; CECKA, J.M.; CHO, Y.W. & GJERTSON, D.W. Survival of nationally shared, HLA-matched kidney transplants from cadaveric donors. N. Engl. J. Med., 327(12):834. 1992. TERASAKI, P.I.; CECKA, J.M.; GJERTSON, D.W. et al. A ten year prediction for kidney transplant. In: Terasaki, P.I.; Cecka, J.M. Clinical Transplants, 1992. Los Angeles UCLA Tissue Typing Laboratory, 501, 1993. TERASAKI, P.I.; CECKA, J.M.; GJERTSON, D.W.; TAKEMOTO, S. High survival rates of kidney transplants from spousal and living unrelated donors. N. Engl. J. Med., 333:333-6, 1995. TUDER, R.M.; WEINBERG, A.; PANAJOTOPOULOS, N. & KALIL, J. Cytomegalovirus enhances PBML binding and HLA class I expression on cultured endothelial cells. Transp. Proc., 23(1):91-92, 1991. TUDER, R.M.; WEINBERG, A.; PANAJOTOPOULOS, N. & KALIL, J. Cytomegalovirus infection amplifies class I major histocompatibility complex expression on cultured human endhothelial cells. J. Heart Lung Transplantation, 13(1):129-138,1994. WECKER, H. & AUCHINCLOOS Jr. Cellular mechanisms of rejection. Current Opinion in Immunology, 4:561-566,1992.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET Sociedade Americana de Transplante http://www.transplantation-soc.org/ Livro de Imunologia on-line http://www.med.sc.edu:85/book/immunol-sta.htm Revista Current Opinion in Organ Transplantation http://www.co-transplantation.com/ Associação Brasileira de Transplante de Órgãos www.abto.com.br Sociedade Canadense de Transplante http://transplant.medical.org/ MedScape’s Transplantation http://www.medscape.com/transplantationhome Immune Tolerance Network http://itn-pub.wwteam.com/ Sociedade Americana de Histocompatibilidade e Imunogenética ASHI http://www.ashi-hla.org/ Revista Transplantation http://www.transplantjournal.com/
Capítulo
53
Manejo Clínico do Transplante Renal Luiz Estevam Ianhez
Globulina antitimocítica (GAT)
INTRODUÇÃO
Orthoclone OKT3
ESCOLHA DO DOADOR CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO DE DOADORES
MANEJO DAS COMPLICAÇÕES IMEDIATAS DO TRANSPLANTE RENAL
Idade e peso Patologias prévias
Insuficiência renal aguda (IRA)
Infecção
Trombose de artéria renal (TAR)
Condição hemodinâmica
Trombose de veia renal
Neoplasias
Fístula urinária
AVALIAÇÃO E PREPARO DOS RECEPTORES Em algumas situações o receptor não é aceito PERÍODO DE INTERNAÇÃO DO RECEPTOR DE DOADOR
Obstrução urinária Hematoma de loja renal Ruptura renal Ruptura da anastomose arterial
VIVO MANUSEIO DO DOADOR E DO RECEPTOR NO ATO
Estenose da artéria renal Linfocele
CIRÚRGICO CUIDADOS PÓS-OPERATÓRIOS IMEDIATOS MEDICAÇÃO IMUNOSSUPRESSORA
COMPLICAÇÕES CLÍNICAS NÃO-INFECCIOSAS DO TRANSPLANTE RENAL
Prednisona
Hipertensão arterial
Ciclosporina
Dislipidemia
Micofenolato mofetil (MMF)
Catarata
Azatioprina
Distúrbio do crescimento Obesidade
Tacrolimus
OUTRAS COMPLICAÇÕES CLÍNICAS NÃO-INFECCIOSAS
Globulina antitimocítica (GAT)
Diabetes mellitus
Orthoclone (OKT3) Basiliximab (Simulect®)
Poliglobulia
®
Daclizumab (Zenapax )
Trombose venosa profunda
Sirolimus (Rapamicina®)
Depressão medular
DROGAS IMUNOSSUPRESSORAS, MECANISMO DE AÇÃO E EFEITOS COLATERAIS
Hiperparatireoidismo pós-transplante Necrose asséptica e osteoporose
Azatioprina
Doença cardiovascular
Corticosteróides
Complicações digestivas pós-transplante renal
Ciclosporina
Pancreatite ®
Micofenolato mofetil (Cell Cept )
Complicações gastrointestinais
Tacrolimus
Hiperuricemia
Sirolimus — Rapamicina®
Recidiva da doença primária
Inibidores dos receptores da interleucina II
Rejeição
945
capítulo 53
Rejeição humoral
ENXERTO SEM FUNÇÃO NO RECEPTOR
Rejeição celular aguda (RCA)
FÍSTULA ARTERIOVENOSA PARA HEMODIÁLISES
Rejeição crônica
CONSIDERAÇÕES GERAIS
Neoplasias malignas Neoplasia maligna pré-transplante renal
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
Neoplasia maligna transplantada com o enxerto Neoplasia maligna de novo pós-transplante
INTRODUÇÃO
ESCOLHA DO DOADOR
O transplante renal é, atualmente, a melhor opção terapêutica para o paciente com insuficiência renal crônica, tanto do ponto de vista médico, quanto social ou econômico. Ele está indicado quando houver insuficiência renal crônica em fase terminal, estando o paciente em diálise ou mesmo em fase prédialítica. Existem, contudo, exceções a esta norma: pacientes devem ser transplantados quando a creatinina sérica estiver por volta de 6 e 7 mg% (depuração de creatinina por volta de 10 ml/min), como nos portadores de nefropatia diabética, para reduzir a incidência de complicações vasculares, cardíacas, oculares e neurológicas próprias desta doença, e em crianças com idade inferior a 10 anos, para se evitar prejuízo no crescimento, osteodistrofia renal e, principalmente, pelas dificuldades dialíticas. Em nossa experiência, a realização do transplante renal na fase pré-dialítica não traz nenhum problema para o paciente ou para o enxerto, advindo somente benefícios, inclusive os de natureza econômica. Poucas são, nos dias de hoje, as contra-indicações para transplante renal. A idade do paciente já não constitui contra-indicação, como ocorria até alguns anos atrás, pois já se transplantaram recém-nascidos, inclusive prematuros, e se faz transplante em pacientes selecionados com idade superior a 70 anos. Os pacientes com doenças renais agudas ou em atividade, como a glomerulonefrite rapidamente progressiva, nefropatia lúpica, nefropatia das vasculites, ou portadores de glomeruloesclerose focal de evolução rápida, devem ser transplantados numa fase de inatividade da doença, devido à possível recidiva no enxerto.1 Oxalose é uma doença metabólica que sempre recidiva no enxerto, mas existem esquemas terapêuticos profiláticos ou mesmo a associação com transplante hepático com bons resultados.2 Neoplasia renal não constitui contra-indicação absoluta para o transplante. A conduta, nestes casos, deve ser tratar o tumor e aguardar dois anos.3 Se não houver recidiva, pode-se transplantar sem maiores riscos. As complicações decorrentes da uremia por si mesmas não constituem empecilho ao transplante renal, seja qual for sua gravidade.
O doador pode ser vivo parente, vivo não-parente ou cadáver. A vantagem do doador vivo parente é a melhor sobrevida do paciente e do enxerto. O uso do doador cadáver, além das dificuldades na obtenção do órgão, oferece uma sobrevida bem menor, quer para o enxerto, quer para o paciente. Os resultados com doador vivo não-parente são melhores que com o doador cadáver, e comparáveis aos resultados com doador parente haploidêntico. O doador vivo deve ser adulto, idade superior a 21 anos, dando-se preferência para doadores acima de 30 anos; a idade máxima não deve ser superior a 70 anos. O doador deve ser normal do ponto de vista clínico e emocional. O doador vivo deve ser compatível quanto à tipagem sangüínea ABO; o fator RH não interfere. Quando o doador é vivo parente, sempre é necessária a realização da tipagem HLA A B DR, pois sempre se deve escolher o doador com a melhor compatibilidade. No caso de doador cadáver a chance de se encontrar um doador com alta compatibilidade vai depender do numero de receptores testados. O grau de compatibilidade imunológica tem alguma importância na escolha do esquema imunossupressor. As outras provas imunológicas necessárias são a prova cruzada e a reatividade contra painel, que traduz o grau de sensibilização contra a população de doadores. Quando a positividade é superior a 40 ou 50%, na escolha do esquema imunossupressor deve-se incluir a indução com anticorpos mono- ou policlonais ou inibidores dos receptores de interleucina II, como será discutido adiante. O doador vivo deve ter função renal normal, avaliada através da depuração da creatinina, exame de urina e proteinúria de 24 horas. Outros exames que realizamos são: cálcio, fósforo, ácido úrico, enzimas hepáticas, coagulograma, glicemia, hemograma e sorologia para: Chagas, toxoplasmose, citomegalovírus, mononucleose, hepatite B e C e HIV. Ultra-sonografia abdominal sempre é necessária, e avaliação cardiológica, raramente. Para completar o estudo realizamos a arteriografia renal não-seletiva, seguida da urografia excretora no mesmo ato, ou então pode ser feita
946
Manejo Clínico do Transplante Renal
a urografia antes da arteriografia. Com a experiência da equipe cirúrgica, muito raramente um doador é recusado devido a artérias renais múltiplas. Atualmente a arteriografia pode perfeitamente ser substituída pela angiorressonância com gadolínio, que oferece uma imagem comparável à arteriografia, sem os inconvenientes desta e com um custo 60% menor, dispensando também o uso da urografia excretora.4 Em doadores parentes de pacientes portadores de doença renal policística, a tomografia renal é necessária, principalmente se o doador for jovem. A retirada de órgãos de doadores cadáver deve obedecer às normas da lei vigente n.º 10211, de 23 de março de 2001, Diário Oficial n.º 58 A-E, de 24 de março de 2001, assim como nos casos de doador vivo não-relacionado. Há necessidade de uma avaliação clínica dos antecedentes do possível doador cadáver, incluindo sorologia negativa para HIV, hepatite B e C e conhecermos o perfil sorológico para citomegalovírus e toxoplasmose, não podendo ser IgM-positivo. A positividade para doença de Chagas não é contra-indicação absoluta. O paciente deve estar com diurese, e a creatinina sérica não necessariamente necessita ser normal; já se usou doador com creatinina até 5 mg%.
CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO DE DOADORES Idade e Peso • Doadores com peso inferior a 7 kg ou idade inferior a 1 ano serão recusados. • Crianças com peso entre 7 e 15 kg; após avaliação e discussão clínica cirúrgica, levando-se em conta a disponibilidade de receptores, condições técnicas de realização e de interesse científico, poderão ser utilizadas. • Doadores com idade superior a 65 anos, após avaliação clínica adequada que inclua o conhecimento de patologias prévias associadas sistêmicas e/ou renais, poderão ser utilizados.
Patologias Prévias • Diabetes mellitus (DM): doadores portadores de DM, que não apresentem, previamente à condição de morte encefálica, insuficiência renal caracterizada por creatinina superior a 1,5 mg/dl, poderão ser utilizados. • Hipertensão arterial sistêmica (HAS): doadores com história pregressa de HAS, que não apresentem, previamente à condição de morte encefálica, insuficiência renal caracterizada por creatinina superior a 1,5 mg/dl, poderão ser utilizados, independentemente de a causa da morte ser diretamente relacionada como AVCI ou AVCH.
• Anormalidades ou lesões anatômicas: doadores portadores de anormalidades anatômicas renais, vasculares e urológicas congênitas, ou de lesões renais, vasculares e urológicas adquiridas no ato da retirada de órgãos, poderão ser utilizados, desde que as análises clínica e cirúrgica posteriores não impeçam a sua utilização.
Infecção • Infecção bacteriana: doadores portadores de processo séptico infeccioso sistêmico em uso de antibioticoterapia com drogas nefrotóxicas e com insuficiência renal não serão utilizados. Outros doadores com processos infecciosos localizados que não sejam de origem primária renal, incluindo-se infecção do SNC, após coleta de secreções para cultura (urina, sangue, pulmonar e outras), poderão ser utilizados. • Outras infecções: 1. Doadores portadores de sorologia positiva para o vírus B da hepatite (HbsAg) podem ser utilizados para receptores sorologicamente semelhantes ou anti-HbsAg-positivos, devendo receber por um período mínimo de três meses no pós-transplante lamivudina na dose de 150 mg/dia VO e um booster de vacinação para os antiHbsAg-positivos, após discussão e assinatura de um consentimento pós-informado. 2. Doadores portadores de sorologia positiva para vírus C da hepatite (anti-HCV) poderão ser utilizados para receptores HCV positivos após discussão e assinatura de um consentimento pós-informado. 3. Doadores portadores de sorologia positiva para tripanossomíase sul-americana poderão ser utilizados. 4. Doadores portadores de sorologia positiva para citomegalovírus poderão ser utilizados. 5. Doadores sorologicamente positivos para HIV, assim como doadores de risco (presidiários, homossexuais e toxicômanos), serão recusados, apesar da sorologia.
Condição Hemodinâmica • Doadores que se apresentem com choque persistente por mais de 12 horas, não responsível às medidas de reposição volêmica e ao uso de drogas vasoativas (altas doses e com uso de noradrenalina), com história de PCR e anúricos, com creatinina superior a 2,5 mg/dl, não serão utilizados. • Todos os demais estados de instabilidade hemodinâmica transitória ou persistente, qualquer que seja o valor de creatinina, desde que com função renal prévia inicial adequada e sem a condição hemodinâmica inicialmente descrita, após avaliação clínica, poderão ser utilizados.
947
capítulo 53
Neoplasias • Doadores portadores de neoplasias de pele localizadas e de baixa morbidade e de tumores primários do SNC, não meduloblastoma ou glioblastoma e não operados, serão utilizados. Todos os demais tumores serão recusados, embora dados recentes mostrem que em outras situações estes doadores podem ser usados.5
Pontos-chave: • O doador vivo deve ser adulto, idade superior a 21 anos, dando-se preferência para doadores acima de 30 anos; a idade máxima não deve ser superior a 70 anos • Quando o doador é vivo parente sempre é necessária a realização da tipagem HLA A B DR • As outras provas imunológicas necessárias são a prova cruzada e a reatividade contra painel, que traduz o grau de sensibilização contra a população de doadores • Atualmente a arteriografia pode perfeitamente ser substituída pela angiorressonância com gadolínio, que oferece uma imagem comparável à arteriografia, sem os inconvenientes desta e com um custo 60% menor
AVALIAÇÃO E PREPARO DOS RECEPTORES O paciente deve ter uma avaliação clínica e laboratorial adequada. Achamos fundamental o conhecimento da sorologia para citomegalovírus, HIV e hepatite B e C; no momento, sorologia positiva para HIV é contra-indicação para transplante. Há necessidade de três exames de fezes negativos; mesmo assim, em pacientes de nível sócio-econômico baixo, usamos albendazol no pré-transplante ou no pós-operatório imediato. Nos casos de hepatopatia B ou C ou B⫹C, há necessidade de se avaliar o estado do fígado. Na Fig. 53.1 resumimos a conduta em relação à hepatopatia pelo vírus C. Nos casos de hepatite pelo vírus B o paciente deve ser previamente tratado pela lamivudina e desde que não tenha cirrose pode ser transplantado, pois essa droga não interfere na evolução do transplante.6 A avaliação da parte cardiológica é importante para pacientes sintomáticos e diabéticos com idade superior a 45 anos, sendo a cinecoronariografia o exame mais adequado, embora os testes ergométricos com MIBI ou a cintilo-
grafia miocárdica com MIBI ⫹ dipiridamol sejam exames menos invasivos e úteis no diagnóstico de coronariopatias,7 que devem ser tratadas no pré-transplante. A seguir resumimos a avaliação cardíaca (Quadro 53.1 e Fig. 53.2). Não indicamos, de rotina, endoscopia digestiva, a não ser em casos muito sintomáticos. A ultra-sonografia abdominal é sempre necessária, assim como a avaliação do trato urinário inferior, com uretrocistografia miccional e, em casos de suspeita de bexiga neurogênica, a urodinâmica. Radiografia de tórax é sempre necessária. Em pacientes idosos ou diabéticos é útil a radiografia do abdome para avaliação das possíveis calcificações arteriais, que não são contra-indicação para a cirurgia, embora a tornem mais difícil. A feitura do ecodoppler das artérias ilíacas é muito importante nestes pacientes, para planejamento cirúrgico adequado. A nefrectomia bilateral dos rins primitivos é indicada em poucas situações: calculose, refluxo vésico-ureteral importante, neoplasia renal, nos casos de portadores de doença renal policística, quando os rins são volumosos, impedindo a colocação do enxerto, ou nos casos de sangramento ou infecção dos rins. Na atualidade a nefrectomia bilateral para controle de hipertensão arterial está praticamente abolida. Nos casos de crianças com refluxo vésico-ureteral bilateral, uma conduta adotada é a remoção do ureter e do rim do lado do transplante por ocasião da colocação do enxerto e a retirada do outro rim pós-transplante. Pacientes portadores de bexiga neurogênica, ou aqueles com bexiga pequena, principalmente conseqüente a tuberculose renal, devem ser submetidos a ampliação vesical ou feitura de neobexigas continentes com alça intestinal.8
Em Algumas Situações o Receptor Não É Aceito 1. Crianças com idade inferior a 1 ano ou peso inferior a 7 kg serão recusadas. Crianças com peso entre 7 e 15 kg serão aceitas após estudo clínico e cirúrgico de cada caso. Todas as demais faixas etárias serão aceitas a princípio, ocorrendo a recusa apenas após estudo clínico e cirúrgico que o contra-indique. 2. Pacientes portadores de doença cardiovascular grave passível de tratamento cirúrgico ou intervencionista ou sem indicação de tratamento cirúrgico ou intervencionista. 3. Pacientes portadores de vasculopatia periférica grave, com sinais clínicos evidentes de insuficiência vascular periférica secundária a doença aterosclerótica sistêmica primária ou secundária ao diabetes mellitus ou com estudo de Doppler mostrando lesões graves de artérias ilíacas, serão recusados.
948
Manejo Clínico do Transplante Renal
Fig 53.1 Conduta no manejo do paciente HCV-positivo no pré-transplante renal.
Quadro 53.1 Manuseio do paciente urêmico com doença coronariana pré-TX 1. AVALIAÇÃO LABORATORIAL 2. AVALIAÇÃO CLÍNICA: História — Sintomas — Pressão arterial Fumante Diabetes mellitus RX tórax ECG repouso Ecodopplercardiograma
4. Pacientes portadores de neoplasias ou já tratados com menos de dois anos de seguimento. 5. Pacientes portadores de doença pulmonar crônica. 6. Pacientes portadores de cirrose hepática. 7. Pacientes portadores de sorologia positiva para HIV. 8. Pacientes portadores de tuberculose em atividade ou com tratamento incompleto. 9. Pacientes portadores de doença psiquiátrica. 10. Pacientes portadores de glomerulonefrites ou vasculites em atividade.
PERÍODO DE INTERNAÇÃO DO RECEPTOR DE DOADOR VIVO Procurando diminuir os custos hospitalares, tomamos a seguinte conduta para a internação do receptor: este é avaliado no consultório uma semana antes e iniciamos a medicação imunossupressora cinco dias antes do transplante. Programamos sua última diálise no seu centro para o dia imediato pré-cirurgia e ele é internado neste dia, já dialisado e recebendo a imunossupressão.
MANUSEIO DO DOADOR E DO RECEPTOR NO ATO CIRÚRGICO O doador vivo deve ser hidratado no pré-operatório imediato. Usamos, nas 2 horas que antecedem o início da cirurgia, solução fisiológica 500 ml mais solução glicosada 5% 500 ml e, durante o ato cirúrgico, solução fisiológica ou ringer lactado para mantê-lo com diurese alta. Sempre usamos 250 ml de manitol a 20% na fase pré-remoção
949
capítulo 53
Fig. 53.2 Conduta na avaliação cardiológica de pacientes de acordo com o risco cardiovascular.
do rim. O doador vivo deve receber laxante no dia anterior à cirurgia e ser bem hidratado pela boca até 18 horas pré-cirurgia. O doador cadáver também deve ser adequadamente hidratado durante a remoção dos rins. O uso de quatro frascos de albumina endovenosa durante a implantação dos rins de doador cadáver tem efeito benéfico na diminuição da necrose tubular aguda póstransplante renal. Após a nefrectomia, o rim deve ser perfundido, e as soluções de perfusão mais usadas são a Euro Colins e a solução de Belzer.9 Depois disso o rim deve ser mantido em geladeira a 0°C-4°C. O paciente a ser transplantado deve ser dialisado de véspera, nos casos de doador vivo, ou no mesmo dia, nos casos de doador cadáver, se necessário. Deve-se cuidar para que o paciente não fique hipovolêmico. Alguns exames são fundamentais no pré-operatório imediato: sódio, potássio, pH e bicarbonato venoso, que devem estar dentro da normalidade (v. Quadro 53.2). O hematócrito, de preferência, não deve ser inferior a 25%. Caso esteja menor, o paciente deve ser transfundido durante o ato cirúrgico. Hematócrito acima de 35% predispõe a trombose renal (arterial ou venosa). É importante o valor da creatinina sérica pré-operatória para avaliação da
função renal no pós-operatório. Usamos, de rotina, laxante no pré-operatório. Durante o ato cirúrgico o paciente deve ser expandido com solução fisiológica, e o uso de cateter venoso central pode ser útil nos casos de doador cadáver. É muito importante o receptor criança ter uma veia para infusão rápida de volume no momento do desclampeamento dos vasos. No nosso serviço é rotina a administração de 40 mg de furosemida endovenosa e manitol 25% 250 ml após o término das anastomoses vasculares. A anestesia pode ser a peridural ou, mais comumente, a anestesia geral, tomando o cuidado de não usar drogas de excreção renal.
Quadro 53.2 Exames laboratoriais no pré-transplante imediato • • • • •
Creatinina Sódio Potássio PH e bicarbonato venoso Hematócrito entre 25% e 35%*
*25% Transfusão em paciente idoso ou coronariopatia. 35% Sangria.
950
Manejo Clínico do Transplante Renal
Muito importante no pré-operatório do transplante renal é o conhecimento do medicamento de que o paciente fazia uso. Os inibidores da enzima conversora da angiotensina, IECA, interferem com os anestésicos gerais ou peridurais e podem levar à hipotensão arterial, freqüentemente associada com bradicardia devida à diminuição da resistência vascular sistêmica e do volume sistólico pelo menor enchimento ventricular esquerdo. Corrige-se esta complicação aumentando a volêmica com cristalóides e utilizando efedrina. Os IECA de meia-vida curta, como o captopril, devem ser suspensos na véspera, e os de meia-vida longa, 48 horas antes da cirurgia.10 Quanto aos bloqueadores do canal de cálcio, não necessitam ser suspensos no pré-operatório, lembrando que a associação de verapamil-halotane e, sobretudo, verapamilinflurano pode causar bradicardia e depressão miocárdica, enquanto nifedipina, nicardipina com influrano, hipotensão por diminuição da resistência periférica. Os betabloqueadores não devem ser suspensos e até estão indicados como protetores de problemas cardíacos em pacientes com cardiopatias.11
CUIDADOS PÓS-OPERATÓRIOS IMEDIATOS Nos casos de doador vivo, a diurese deve ocorrer entre 5 e 30 minutos após o desclampeamento dos vasos. Esta costuma ser alta nas primeiras 12 horas pós-transplante, geralmente superior a 200 a 300 ml por hora, devido à expansão que estes pacientes apresentam, ao uso do manitol, do diurético, à diurese osmótica e a uma possível disfunção tubular. É evidente que a reposição desse volume não deve ser feita totalmente, e sim, basear-se em dados clínicos usuais: pulso, pressão arterial, câimbras e sede. Empregamos, como hidratação imediata, solução fisiológica 1.000 ml a cada 6 horas, e o paciente passa a tomar água ou sucos pela boca após 4 horas do término da cirurgia. Em algumas ocasiões de diurese muito alta é necessária infusão rápida de solução fisiológica, 500 ml ou 1.000 ml em 30 ou 60 minutos. As vezes é necessário o uso de albumina humana. É importante manter o paciente com pressão arterial normal ou mesmo pouco aumentada. Sempre usamos antibióticos profiláticos iniciados uma hora antes da cirurgia e mantidos por mais quatro dias. Usamos a cefazolina na dose de 2 g no pré-operatório imediato e, após, 1,0 g a cada 8 horas até a retirada da sonda vesical. Nos casos de reoperação, nos primeiros dias do transplante, usamos novo esquema de antibiótico profilático associando a vancomicina ⫹ cefalosporina de terceira geração.
Quadro 53.3 Exames pós-transplante imediato • • • • •
Sódio Potássio PH e bicarbonato venoso Hematócrito Se oligúria ou anúria — Ecodoppler do rim transplantado
Nos casos de ausência de diurese imediata adequada, a hidratação deve ser restrita, o que será comentado adiante. A cirurgia do transplante causa pouca dor, quase sempre controlada com dipirona. Não usamos, de rotina, inibidor da secreção gástrica, nem antiácidos. Devido ao efeito estimulante do corticóide, às vezes é necessário uso de diazepínicos ou hipnóticos. A única avaliação laboratorial que fazemos no pós-operatório imediato é o hematócrito, sódio, potássio, pH e bicarbonato venoso (v. Quadro 53.3). Quando a evolução é normal, raramente temos necessidade de corrigir os níveis do potássio ou a gasometria. No paciente que não urina no pós-operatório imediato, a avaliação do nível de potássio é fundamental, pois pode haver hiperpotassemia severa, necessitando de terapêutica urgente. Quando a evolução do transplante é normal, a creatinina sérica no primeiro dia pós-operatório cai para o valor abaixo de 50% daquele pré-operatório. No segundo dia está dentro dos níveis normais. O volume urinário se normaliza no segundo e terceiro dias pós-operatórios, e às vezes a urina é hematúrica nas primeiras 24 ou 48 horas, levando mesmo à obstrução da sonda vesical. Por isso a observação do fluxo urinário pela enfermagem é importante, principalmente quando existe hematúria macroscópica. Nos primeiros dois dias ocorre proteinúria entre 2 e 3 g/dia, tornando-se inferior a 1,0 g/ dia a partir do quinto dia PO, e permanece por volta de 0,5 g/dia, desaparecendo após o primeiro mês (Quadro 53.4).
Quadro 53.4 Freqüência da consulta ambulatorial e o tempo pós-transplante 1.º ao 3.º mês — semanal* 4.º ao 6.º mês — quinzenal 7.º ao 9.º mês — mensal 9.º ao 12.º mês — cada 2 meses 12.º ao 24.º mês — cada 3 meses Acima de 2 anos — semestral *Naqueles casos de evolução normal este prazo pode ser prolongado ou então exames semanais e consultas quinzenais. Sempre que houver alteração importante no regime de imunossupressão as consultas deverão ser mais freqüentes, independente do tempo póstransplante.
951
capítulo 53
MEDICAÇÃO IMUNOSSUPRESSORA Com o surgimento de novas drogas imunossupressoras, com diferentes indicações e diferentes efeitos colaterais, fica difícil escolher o melhor esquema imunossupressor para cada paciente. O objetivo desta parte é apontar os mais adequados esquemas imunossupressores com as drogas disponíveis no mercado nacional (Quadros 53.5 a 53.7). I Doador vivo HLA idêntico: O melhor esquema é a associação de ciclosporina (CsA), azatioprina e prednisona, ou o tacrolimus no lugar da CsA, se houver contra-indicação para este. A CsA deve ser suspensa após seis meses, se não ocorrer nenhum episódio de rejeição. Tal esquema pode ser alterado na presença de hepatopatia B ou C, ou nas contra-indicações da ciclosporina. II Doador vivo parente não-idêntico, doador vivo não-relacionado, adultos, raça branca, não-sensibilizado e primeiro transplante: azatioprina, CsA e prednisona. III Pacientes adolescentes e mulheres, com doador cadáver, devem receber tacrolimus, dada a ausência dos
Quadro 53.5 Drogas de manutenção Ciclosporina — Sandimmun Neoral®, Gengraf® e Sigmasporin Microoral® Micofenolato mofetil — Cell Cept® Azatioprina — Imuran®, Furp e Cristalia Tacrolimus — Prograf® Prednisona — Meticorten® e vários similares Sirolimus — Rapamune®
efeitos cosméticos da ciclosporina, associando o micofenolato mofetil (MMF) e prednisona. IV Pacientes adolescentes e mulheres, com doador vivo, devem receber tacrolimus, azatioprina e prednisona. V Crianças com doador vivo ou cadáver devem receber indução com Simulect® (basiliximab) ou Zenapax® (daclizumab), MMF, tacrolimus e prednisona; procurar suspender o corticóide após seis meses. VI Receptores idosos (⬎ 60 anos): O esquema imunossupressor nestes casos é a CsA Neo, azatioprina e prednisona. Se houver indicação de indução (v. Quadro 53.5), como será discutido adiante, não usar OKT3 ou GAT, e sim Zenapax® (daclizumab) ou Simulect® (basiliximab). VII Pacientes hepatopatas B ou C com hepatite crônica ativa em tratamento ou sem tratamento (sem cirrose): CsA Neo em dose menor, por volta de 2 mg/kg, ou tacrolimus, MMF e prednisona. VIII Pacientes com doador cadáver, não-sensibilizados, raça branca adulta, sem disfunção aguda do enxerto: A imunossupressão deve ser MMF, CSA Neo e prednisona; consideramos as contra-indicações para mulheres e adolescentes. IX Pacientes da raça negra com doador vivo ou cadáver: Indução com GAT ou OKT3, MMF, tacrolimus e prednisona. GAT ou OKT3 pode ser substituído por Simulect® (basiliximab) ou Zenapax® (daclizumab). X Pacientes sensibilizados ⬎ 40%, retransplante, perda precoce do enxerto por causa imunológica: indução com OKT3 ou ATG, MMF, tacrolimus, prednisona. Ver adiante. A seguir daremos nossa conduta quanto ao manuseio das diversas drogas.
Prednisona Quadro 53.6 Drogas de indução Globulina Antitimocítica — Thimoglobuline® Muromonab CD3 — Orthoclone OKT3® Basiliximab — Simulect® Daclizumab — Zenapax®
Quadro 53.7 Drogas usadas no tratamento de rejeição Metilprednisolona Globulina antitimocítica Muromonab — CD3 Imunoglobulina humana Rituximab Conversão para outra droga de manutenção
A prednisona é o corticóide utilizado, na dose inicial de 1 mg/kg/dia, iniciado no dia do transplante em uma única dose pela manhã. No dia do transplante e no 1.º PO, deve-se usar a hidrocortisona endovenosa. No pré-transplante imediato usamos metilprednisolona, 500 mg, dissolvida em solução glicosada endovenosa em 1 hora. Quando a tipagem é boa, em paciente muito idoso deve-se usar dose menor. O esquema de corticóide para criança é diferente: no 1.º dia, metilprednisolona, 10 mg/kg por via endovenosa, depois, prednisona, 60 mg/m2 na 1.ªsemana, 30 mg/m2 na 2.ª semana, 15 mg/m2 na 3.ª semana, 12,5 mg/ m2 na 4.ª semana, 10 mg/m2 na 5.ª semana, 7,5 mg/m2 na 6.ª semana e 5 mg/m2 na 7.ª semana. No paciente adulto a dose é diminuída semanalmente de maneira que no início do terceiro mês deve estar por volta de 0,10 a 0,15 mg/kg/dia.
952
Manejo Clínico do Transplante Renal
Em pacientes com boa tipagem e sem rejeição e principalmente recebendo micofenolato mofetil e/ou tacrolimus, pode-se cogitar da suspensão da prednisona após 12 meses.12
Ciclosporina Deve ser iniciada cinco dias antes do transplante no caso de doador vivo e no dia seguinte ao transplante, no doador cadáver, quando houver indicação. A dose inicial é de 8 mg/kg/dia em duas tomadas a cada 12 horas, nos adultos. Nos últimos dois anos tem-se estudado muito a melhor maneira de monitorar o nível sangüíneo (valor de pico, área sob a curva). Achamos que o nível basal (12 horas após ser tomada a droga) ainda é adequado em cerca de 70% dos pacientes; deve ser mantido entre 250 e 350 ng/ ml nos primeiros três meses e a longo prazo, entre 100 e 150 ng/ml. Outro parâmetro fácil de usar na prática clinica é o valor de pico, isto é, aquele valor colhido 2 horas após a tomada da droga. Tal valor ainda não está muito bem estabelecido, mas entre 1.400 e 1.700 ng/ml nos primeiros três meses e níveis inferiores a 1.000 ng/ml após o terceiro mês parecem ser os mais adequados. Deve-se considerar que o valor do pico adequado é dependente de vários fatores: tipagem imunológica, presença de indução, uso do MMF e, possivelmente, outros ainda não esclarecidos. Um parâmetro importante no manuseio da dose da ciclosporina é o acompanhamento do nível de creatinina. Se esta estiver normal apesar de níveis da hora zero ou picos aumentados, pode-se manter a dose, pois quanto maior o nível, menor a chance de rejeição. A observação de tremores de extremidades está quase sempre associada a dose alta.13 Pacientes hepatopatas necessitam de dose menor, ou seja, 2 a 4 mg/kg/dia, e rim de doador idoso é mais sensível a nefrotoxicidade. Nos pacientes com rim de cadáver com indução por função renal retardada, costumamos iniciar a ciclosporina quando o paciente já não está em diálise e com duas quedas sucessivas do nível de creatinina. Nas situações da impossibilidade do uso da via oral, existe a forma injetável, que deve ser dissolvida em solução glicosada, endovenosa, em 2 horas, a cada 12 horas, e a dose deve ser 1/3 da dose oral.
Micofenolato Mofetil (MMF) A dose inicial varia entre 1,5 g e 2,5 g, cerca de 25 a 30 mg/kg, e deve ser ajustada de acordo com a função renal e os efeitos colaterais mais freqüentes: diarréia e depleção de medula (principalmente leucopenia). Costumamos usar o MMF a cada 12 horas. Nos casos de diarréia, deve-se dividir a dose em 3 ou 4 vezes ao dia.
Futuramente vamos dispor da medida do nível sangüíneo da droga, o que vai auxiliar no acerto da dose.14 Pacientes de raça negra necessitam de dose maior. Nas crianças a dose é de 600 mg/m2 da superfície corpórea a cada 12 horas. Nos casos de doador vivo a droga deve ser iniciada cinco dias antes e, no caso de doador cadáver, no pré-transplante imediato.
Azatioprina A dose inicial da azatioprina é de 5 mg/kg/dia em uma única tomada, iniciando cinco dias antes da cirurgia, e no pré-transplante imediato nos casos de doador cadáver; logo após o transplante a dose deve ser por volta de 1,8 a 2,2 mg/kg/dia, sendo mostrado recentemente que a melhor sobrevida do enxerto se correlaciona com maior dose de azatioprina.15 A dose da azatioprina deve ser diminuída nos casos de insuficiência renal, ou quando existir depleção de medula, principalmente leucopenia, e quando se usa OKT3 ou GAT.
Tacrolimus O tacrolimus é administrado inicialmente em dose média de 0,2 a 0,3 mg/kg/dia, em duas tomadas a cada 12 horas. Deve-se tomar o cuidado de ingerir a droga com o estômago vazio (em jejum) e tomar o café da manhã uma hora depois. À noite, ela deve ser ingerida uma hora antes ou 2 horas após o jantar, dependendo do hábito do paciente. Muito importante é a medida do nível sangüíneo, que deve ser feita 12 horas após a última tomada, e o nível recomendado é 15 a 20 ng/ml no 1.º mês, 10 a 15 ng/ml do 1.º ao 3.º mês e 5 a 12 ng/ml após o 3.º mês. Após quatro a
Pontos-chave: Ciclosporina • Pacientes hepatopatas necessitam de dose menor, ou seja, 2 a 4 mg/kg/dia, e rim de doador idoso é mais sensível a nefrotoxicidade Micofenolato mofetil • Pacientes de raça negra necessitam de dose maior Azatioprina • A dose da azatioprina deve ser diminuída nos casos de insuficiência renal
953
capítulo 53
cinco dias do início da droga, já podemos avaliar o nível sangüíneo. As observações de efeitos colaterais (tremores, nefrotoxicidade, hiperglicemia) também são dados que ajudam a manusear a dose desse medicamento. O nível sangüíneo sugerido quando se faz conversão (substituição da ciclosporina por tacrolimus) por rejeição é de 15 a 25 ng/ml, e quando for feita por nefrotoxicidade é de 5 a 15 ng/ml. Crianças necessitam de dose maior, e hepatopatas, dose menor.16
se de rejeição deve ser alterado, e esta mudança não obedece a nenhuma regra fixa. A dose da ciclosporina e do tacrolimus deve ser reduzida e a da azatioprina e do MMF também deve ser reduzida, e, se houver tendência à leucopenia, as drogas devem ser suspensas. Quando o paciente estiver em anúria ou oligúria, a ciclosporina e o tacrolimus devem ser suspensos no período do uso de OKT3 ou GAT.
Globulina Antitimocítica (GAT)
Basiliximab (Simulect®)
A GAT mais utilizada no Brasil é a Thymoglobuline Imtix Sangstat (ampolas com 25 mg). A dose indicada para uso profilático é de 1,0 a 1,25 mg/kg, e para tratamento de crise de rejeição a dose é de 2,5 mg/kg. Deve ser dissolvida em solução fisiológica e administrada em veia periférica no espaço de 6 horas, estando indicada, antes da 1.ª dose, a administração de 200 mg de hidrocortisona endovenosa e um anti-histamínico. É muito importante o acompanhamento do número dos linfócitos CD3, que devem ser mantidos abaixo de 30 células por mm3, e assim, após dois a três dias, a dose preconizada quase sempre pode ser diminuída, mantendo-se a mesma depleção dos linfócitos. Na impossibilidade de determinar o número de linfócitos CD3, a contagem dos linfócitos no hemograma pode ser empregada, mantendo-os abaixo de 250 células por mm3. O tempo de utilização da GAT é de 10 dias, quer profilático, quer para tratamento. A depleção linfocitária dura vários dias pós-suspensão da mesma. Usamos sempre ganciclovir endovenoso para profilaxia de infecção por-citomegalovírus durante e após o uso da GAT.
É um anticorpo monoclonal quimérico que atua bloqueando os receptores de interleucina II. É usado como profilático, administrado na dose de 20 mg (1 ampola) endovenoso no pré-transplante imediato e repetido no 4.º dia após o transplante. A dose para crianças é de 12 mg/m2.18
Orthoclone (OKT3) Também como a GAT, o OKT3 pode ser usado como profilático ou no tratamento de crises de rejeição. A dose é de 5 mg/dia (1 ampola) ou 2,5 mg/dia, dependendo da intensidade da depleção dos linfócitos CD3 durante o uso de GAT. Na primeira dose a droga deve ser dissolvida em 250 ml de solução glicosada a 5% endovenosa em 2 horas. A partir da 2.ª dose deve ser feita em bolo.17 O paciente deve estar em seu peso seco. Uma hora antes da aplicação do OKT3 damos 500 mg de metilprednisolona ao adulto e 250 mg à criança, dissolvendo, em 100 ou 200 ml de solução glicosada 5% endovenosa em 1 hora, 500 mg de dipirona ou de paracetamol e uma dose de qualquer anti-histamínico. O tempo de tratamento é de 10 dias e também usamos ganciclovir profilático. O uso concomitante dos outros imunossupressores durante o emprego de GAT ou OKT3 para tratamento da cri-
Daclizumab (Zenapax®) É um anticorpo monoclonal humanizado bloqueador da cadeia alfa do receptor de interleucina II (CD25), também usado como profilático. A dose inicial preconizada era 1,0 mg/kg/dia endovenoso em bolo (cada ampola contém 25 mg) e repetido a cada semana, completando cinco doses no total.19 Dados recentes mostram que o outro esquema pode ser utilizado com a mesma eficiência e maior facilidade — 2 mg/kg no pré-transplante e 1 mg/ kg entre o 7.º e 10.º dia pós-transplante.20,21 Esses dados sugerem que essa droga teria as mesmas indicações profiláticas do OKT3 e ATG. A experiência da Unidade de Transplante Renal do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo usando o Simulect® tem igual conclusão.
Sirolimus (Rapamicina®) Uma nova droga imunossupressora que foi introduzida no mercado nacional no ano 2000 é a rapamicina (Rapamune) apresentada em fórmula líquida oral — 1 mg/ ml. Ela age sem inibir a calcineurina e não causa nefrotoxicidade. Essa droga pode ser usada associada à prednisona, à CsA Neo, ao tacrolimus, ao MMF ou à azatioprina; pode também ser empregado sem o corticóide.22 Ainda não sabemos qual é a melhor associação e seu manuseio correto. A dose recomendada é de 6 mg, dada nas primeiras 48 horas pós-transplante, seguida de 2 mg/ dia. Recomenda-se que a dose seja dada 4 horas após a ingestão da ciclosporina, quando associada a esta. A dosagem do nível sangüíneo é muito importante para aumentar sua eficiência e diminuir os efeitos colaterais. Muito importante para o transplantador, com a disponibilidade destas várias drogas, é proceder à conversão de uma para outra, quer por efeitos colaterais, quer por inefi-
954
Manejo Clínico do Transplante Renal
ciência. Assim, se houver rejeição resistente apesar de uso e indicação corretos da azatioprina, esta deve ser substituída pelo MMF.23 E também, se o paciente está com a indicação correta e dose eficiente da CsA Neo e não vai bem, esta deve ser substituída pelo tacrolimus; se estiver associada à azatioprina, esta deve ser substituída pelo MMF e a dose de CsA Neo, diminuída.24 As mudanças para outros esquemas também podem ser feitas por efeitos colaterais dessas diversas drogas, quase sempre com sucesso. Muito importante é que, quando procedemos a uma mudança no esquema terapêutico, o paciente deve ser seguido com mais cuidado, com visitas e avaliações laboratoriais mais freqüentes. Muito importante no manuseio do paciente transplantado é avaliar as conseqüências da ação da imunossupressão na morbidade e mortalidade dos pacientes. A idade do paciente é um fator muito importante. Assim, a criança tem uma resposta imunológica mais intensa e, portanto, necessita de uma imunossupressão mais pesada, ao contrário do idoso, que necessita de uma imunossupressão leve, pois tem maior morbilidade e mortalidade conseqüente à mesma.25 Outro ponto que deve ser lembrado, e já comentado anteriormente, é o seguinte: quando vamos mudar a imunossupressão por perda funcional, quer por rejeição crônica, quer por nefrotoxicidade, é importante avaliar o grau de comprometimento funcional renal e a intensidade das alterações histológicas renais. Quase sempre vamos usar uma droga mais potente e também com maiores efeitos colaterais, principalmente quando existe comprometimento importante da função renal. O binômio insuficiência renal e imunossupressão pesada é igual, quase sempre, a óbito do paciente. Acredito que um paciente com creatinina sérica superior a 4 ou 5 mg sem aumento rápido, acompanhado de uma nefropatia crônica do enxerto grave na classificação de Banff, deve ter a sua imunossupressão diminuída e ser preparado para reiniciar diálise ou receber outro transplante.
DROGAS IMUNOSSUPRESSORAS, MECANISMO DE AÇÃO E EFEITOS COLATERAIS Azatioprina A azatioprina deve ser iniciada cinco dias antes do transplante, nos casos de doador vivo, ou no mesmo dia, nos casos de doador cadáver. A dose inicial é de 5 mg/ kg por dia, em uma única tomada, e a dose de manutenção deve ser de 2 mg/kg/dia. Esta dose deve ser maior quando o receptor for criança, e menor quando existe queda de função renal ou quando o número de leucócitos é inferior a 4.000.
A tolerância à azatioprina é muito individual, por isso nas primeiras semanas de uso o acompanhamento do número de leucócitos no hemograma é muito importante. Pacientes idosos são muito sensíveis à azatioprina, pacientes de raça negra se comportam ao contrário e pacientes com hepatopatia também toleram mal a azatioprina, como veremos adiante. O efeito colateral mais freqüente é a depressão medular, sendo a série leucocitária a mais atingida, seguida da série vermelha e plaquetária. A suspensão temporária ou a redução da dose da azatioprina sempre corrige tal efeito. Outro efeito colateral é a hepatotoxicidade, que na maioria dos casos ocorre após tempo prolongado de dose superior a 2,5 mg/kg/dia, ou então naqueles pacientes portadores de hepatopatia viral.26 A associação da azatioprina com a rifampicina e a hidrazida favorece a hepatotoxicidade. A manifestação bioquímica é do tipo colestático, sendo característico o grande aumento da gamaglutamiltransferase; o quadro histológico não é muito característico. Também está implicada na gênese de duas entidades hepáticas muito raras: doença hepática venoclusiva e hepatite nodular regenerativa. O efeito colateral mais importante está na predisposição a infecção e neoplasia. A dose de azatioprina sempre deve ser diminuída ou mesmo suspensa na vigência de processo infeccioso grave. Esta droga nunca deve ser associada à dose normal de alopurinol.
Corticosteróides Os efeitos colaterais da prednisona são bem conhecidos. Dados recentes sugerem que o deflazacort, um novo tipo de corticóide, não tem os efeitos colaterais da prednisona e mantém os efeitos terapêuticos.27
Ciclosporina Uma série de medicamentos aumenta os níveis sangüíneos da ciclosporina, os mais usados destes são: diltiazen, eritromicina, cetoconazol, metilprednisolona, contraceptivos orais, fluconazol, itraconazol. Outros diminuem o nível sangüíneo: rifampicina, carbamazepina, fenobarbital, fenitoína e ácido valpróico.28 Os efeitos colaterais da ciclosporina são freqüentes, embora não haja uma correlação direta entre estes e os níveis sangüíneos. A experiência clínica mostra que níveis altos, acima de 300 ng/ml (método monoclonal específico), não devem ser mantidos por tempo prolongado. A nefrotoxicidade é o mais importante dos efeitos colaterais, podendo ser aguda ou crônica, sendo esta a mais importante. O quadro histológico da nefrotoxicidade crônica caracteriza-se por uma arteriopatia que acomete mais artérias de pequeno calibre acompanhada de fibrose intersticial, às vezes em faixa. A diminuição da dose pode estabilizar as lesões e proteger a função renal.
955
capítulo 53
É importante que o patologista faça a distinção com rejeição crônica, onde a conduta de diminuir a dose pode ser maléfica.29 Esclerose mesangial do glomérulo é também uma lesão descrita recentemente. Uma outra manifestação da nefrotoxicidade da ciclosporina, muito raramente observada em transplante renal, é a microangiopatia trombótica, possivelmente relacionada ao bloqueio da ação da prostaciclina do endotélio vascular. Algumas drogas potencializam a nefrotoxicidade da ciclosporina: aminoglicosídeos, anfotericina, sulfonamidas. O uso de ciclosporina no período imediato pós-transplante renal com doador cadáver em pacientes que evoluem com insuficiência renal aguda por necrose tubular aguda ainda é um assunto discutido. A nossa conduta é usar indução com OKT3, GAT, Simulect® (basiliximab) ou Zenapax® (daclizumab), conforme discutido anteriormente. Uma situação muito rara, que apenas observamos em três pacientes, é a persistência de insuficiência renal prolongada pós-transplante, quer com doador vivo, quer com doador cadáver, com o uso da ciclosporina, com níveis sangüíneos adequados, e que se recupera imediatamente após a suspensão da ciclosporina. Hipertensão arterial é outro efeito colateral da ciclosporina, apesar da metade dos pacientes transplantados terem hipertensão arterial independentemente do seu uso. Uma conduta adequada no controle da hipertensão arterial em pacientes recebendo ciclosporina é o uso da nifedipina.30 Hipertrofia gengival é uma ocorrência rara, às vezes necessitando de tratamento cirúrgico. A hipertrofia gengival está aumentando com o uso concomitante dos hipotensores inibidores do canal de cálcio. A terapêutica desta complicação, além da suspensão dos inibidores do canal de cálcio, é o uso da azitromicina, 500 mg no 1.º dia e 250 mg/dia por cinco dias. Pilosidade aumentada é uma complicação bastante desagradável para crianças e mulheres. Tremores finos de extremidades podem ser observados e, dependendo da profissão do paciente, são importantes. O uso de propanolol em dose pequena pode controlar esta manifestação. Essas duas complicações estão diretamente relacionadas com área sob a curva alta,31 portanto a redução da dose da ciclosporina tem efeito benéfico na correção dessas complicações. Estes três últimos efeitos tendem a diminuir com o tempo pós-transplante.32 Alterações hepáticas com o uso de ciclosporina foram descritas nos primeiros relatos do seu uso e foram decorrentes da dose alta inicialmente empregada. Hoje não observamos essas alterações. Distúrbio do metabolismo glicídico, embora presente,33 não tem importância clínica. Devido à ação renal da droga, pode-se observar hiperuricemia com manifestações clínicas, hiperpotassemia e, mais raramente, hipomagnesemia. A ciclosporina pode ser usada em gestantes transplantadas. Não tem ocorrido interferência da droga na evolu-
ção da gestação ou no produto do concepto. A dose da droga deve ser aumentada, devido à sua metabolização pelo fígado do feto, principalmente no último trimestre.34
Micofenolato Mofetil (Cell Cept®) Micofenolato mofetil, que é convertido no organismo na sua forma ativa, o ácido micofenólico, é uma droga antiproliferativa que age na biossíntese das purinas.35 É um importante inibidor da enzima inosina monofosfato desidrogenase (IMPDH), que é uma enzima-chave na via de novo da biossíntese das purinas. Tal droga veio para substituir a azatioprina e, nos diversos ensaios clínicos realizados, é mais potente que a azatioprina. Foi mostrado recentemente que o MMF reduz a perda tardia do enxerto independente de rejeição aguda.36 Os dois principais efeitos colaterais são a diarréia, que quase sempre se resolve com a diminuição da dose e/ou dividindo a dose a cada 8 horas, e a leucopenia, outro efeito colateral importante, que pode ser contornado com a diminuição da dose. Existem algumas evidências, embora não aceitas por todos, de que pode facilitar a incidência de infecções virais, e um fato verificado é que não existe infecção por Pneumocistis carinii em pacientes que recebem o micofenolato mofetil. O seu uso também está indicado no tratamento de rejeição aguda resistente a corticóide, anticorpos mono- ou policlonais e no tratamento de rejeição crônica ou nefrotoxicidade por ciclosporina.23,24,37,38
Tacrolimus O tacrolimus (Prograf®), comercializado no Brasil pela Fujisawa Healthcare e anteriormente denominado FK-506, é um macrolídeo isolado do fungo Streptomyces tsukobaensis. Sua atividade imunossupressora tem as mesmas vias que a ciclosporina, inibindo a formação de linfócitos citotóxicos.16,39,40 Os efeitos colaterais mais importantes são neurológicos, nefrotoxicidade e aumento da incidência de diabetes mellitus. O tacrolimus, além de ser empregado como imunossupressão inicial, associado à azatioprina ou micofenolato mofetil com prednisona, pode também ser empregado em substituição à ciclosporina nos casos de rejeição resistente às medidas habituais ou nos casos de efeito colateral da ciclosporina.16,39-41 O uso do tacrolimus possibilita a suspensão do corticóide, principalmente nos casos de associação ao micofenolato mofetil.40 Achamos que é uma droga útil no manuseio dos diversos tipos de transplante de órgãos, que bem utilizada é um agente importante no aumento da sobrevida dos enxertos.
956
Manejo Clínico do Transplante Renal
Sirolimus — Rapamicina® A rapamicina, denominada sirolimus, é um potente imunossupressor macrolídeo, já em estudo multicêntrico em vários países, usado em associação com a ciclosporina e corticóide.22 Temos pequena experiência com essa droga. Dois efeitos colaterais importantes são alteração do metabolismo lipídico e depressão medular.
Inibidores dos Receptores da Interleucina II Duas novas drogas lançadas no mercado nos dois últimos anos são anticorpos monoclonais e inibidores dos receptores da interleucina II. O basiliximab (Simulect®), que é um anticorpo monoclonal quimérico e atua bloqueando os receptores da interleucina II, leva a uma diminuição significativa das crises de rejeição no primeiro ano de transplante, quando associado a ciclosporina e azatioprina.18 Os efeitos colaterais são inexistentes. A outra droga semelhante à anteriormente descrita é o daclizumab (Zenapax®), que é um anticorpo monoclonal humanizado bloqueador da cadeia alfa do receptor de interleucina II (CD 25). Usado como profilático associado a ciclosporina, azatioprina e corticóide, também diminui a incidência de rejeição celular aguda,19 sem efeitos colaterais.
Globulina Antitimocítica (GAT) Os efeitos colaterais que podem ocorrer são febrícula, urticária e queda de plaquetas ou hemoglobina. Muito raramente, após o término do tratamento, pode ocorrer doença de soro, quase sempre de intensidade pequena.42
Orthoclone OKT3 Também como a GAT, o OKT3 pode ser usado como profilático ou no tratamento de crises de rejeição. Um fato freqüente é a piora da função renal, induzida pelas interleucinas liberadas. Às vezes a função renal é pior no final do tratamento, comparada com aquela do início; pode também ocorrer, muito raramente, um quadro de meningite asséptica.42-44 Um efeito colateral muito importante e freqüente com o uso da GAT ou do OKT3 é a maior predisposição às infecções, principalmente as virais, e, entre os vírus, principalmente o citomegalovírus. Em certas situações, como receptores CMV-negativos e doadores CMV-positivos ou na vigência de rejeição grave, pode-se indicar o uso concomitante de ganciclovir. A maior incidência de tumores, principalmente da doença linfoproliferativa, está associada à dose alta de OKT3 e GAT.
O uso concomitante dos outros imunossupressores durante o emprego de GAT ou OKT3 para tratamento de crise de rejeição deve ser alterado, e esta mudança não obedece a nenhuma regra fixa. Nós costumamos reduzir pela metade a dose da ciclosporina e do prograf, e também da azatioprina ou MMF, e se houver tendência à leucopenia estas devem ser suspensas. Quando existe oligúria, a ciclosporina deve ser sempre suspensa.
MANEJO DAS COMPLICAÇÕES IMEDIATAS DO TRANSPLANTE RENAL Consideramos complicações imediatas pós-transplante renal aquelas que ocorrem após o término do ato cirúrgico até a alta hospitalar. Podemos dividir essas complicações em clínicas: necrose tubular aguda, rejeição hiperaguda e rejeição celular aguda; e cirúrgicas: fístula urinária, obstrução urinária, trombose da artéria renal, estenose da artéria renal, ruptura da anastomose arterial, hematoma de loja, ruptura renal e trombose venosa renal (Quadro 53.8).
Insuficiência Renal Aguda (IRA) Das complicações clínicas, a mais freqüente é a IRA por necrose tubular aguda (NTA), que deveria ocorrer unicamente após transplante com doador cadáver. Na vigência de IRA com doador vivo, deve-se procurar saber como foi o preparo do doador e como ocorreu o ato cirúrgico no doador e no receptor (doador obeso, hidratação inadequada, não-uso do manitol, dificuldade na perfusão, anastomose difícil, necessidade de clampeamento da artéria renal). Essas são situações que podem explicar a ocorrência de tal complicação no doador vivo. A incidência é por volta de 5%. A IRA pós-transplante de doador cadáver ocorre em cerca de 20 a 60% dos casos, sendo os fatores implicados o estado pré-agônico do doador (comportamento hemodi-
Quadro 53.8 Complicações clínicas e cirúrgicas imediatas Insuficiência renal aguda (função do enxerto retardada) Trombose da artéria renal Trombose da veia renal Fístula urinária Obstrução urinária Hematoma de loja renal Ruptura renal Ruptura da anastomose arterial Estenose da artéria renal linfocele
957
capítulo 53
Quadro 53.9 Causas da IRA no pós-transplante (função retardada do enxerto) • • • • • • •
Necrose tubular aguda Rejeição medida por anticorpos Rim inviável Microangiopatia trombótica Nefrotoxidade aguda Recorrência fulminante Associação de causas
Quadro 53.10 Fatores predisponentes — IRA Doador idoso Tempo de isquemia fria prolongado Condições hemodinâmicas do doador Causa da morte do doador Qualidade da preservação Tempo de isquemia quente Grau de sensibilização do receptor Hemodinâmica do receptor
nâmico), a creatinina sérica pré-remoção do órgão, o tempo de perfusão e o tempo de isquemia quente e fria. A NTA pode apresentar-se sob a forma anúrica, oligúrica ou não-oligúrica. Na forma não-oligúrica não ocorre queda da creatinina sérica maior do que 50% nas primeiras 20 horas pós-transplante. Os níveis séricos da DHL estão moderadamente aumentados em cerca de 70 a 80% dos casos, embora em alguns casos possam atingir níveis superiores a 1.500u. O diagnóstico diferencial (v. Quadro 53.11) deve ser feito com rejeição humoral, obstrução urinária, trombose vascular, estenose da artéria renal e rim inviável. O ecodoppler e a citologia aspirativa são os métodos de diagnóstico adequados. Os índices de pulsatilidade e de resistividade podem estar normais ou aumentados, e a citologia aspirativa só mostra sinais de degeneração celular. A presença de necrose tubular aguda aumenta a incidência de rejeição celular aguda, cujo tratamento aumenta a mortalidade e a morbilidade por infecção, e, além disso, episódios repetidos de rejeição aguda estão relacionados com uma maior perda do enxerto por rejeição crônica. Todo empenho é necessário para prevenção da necrose tubular aguda.
Quadro 53.11 Diagnóstico diferencial — IRA • • • •
Estenose de artéria renal Trombose vascular Obstrução urinária Hematoma de loja
Um fato mostrado recentemente sugere que deve ser usada membrana biocompatível para hemodiálise nesses pacientes, para proteção renal.45
Trombose de Artéria Renal (TAR) Tal complicação tornou-se raridade com a maior experiência e treino técnico dos cirurgiões. Anúria súbita, febre alta, grande aumento da DHL sérica (acima de 2.000u), diminuição do tamanho do rim à palpação e ausência de fluxo arterial renal ao ecodoppler são dados para o diagnóstico. O diagnóstico diferencial deve ser feito com RH, NTA e obstrução urinária. A reoperação precoce (antes de 12 horas da instalação do quadro) pode salvar o enxerto. A profilaxia consiste na anastomose em artéria com boas condições, podendo-se usar a ilíaca comum com anastomose término-lateral, quando a artéria hipogástrica estiver muito comprometida. O nível alto do hematócrito no pré-operatório, o uso de doador com menos de cinco anos e anormalidades no processo de coagulação são fatores predisponentes para tal complicação.
Trombose de Veia Renal Trombose aguda de veia renal é uma ocorrência rara e de diagnóstico muito difícil. Aumento do rim e presença de proteinúria são dados sugestivos, mas podem ocorrer em situações de compressão da veia por hematoma ou linfocele, ou falta de espaço adequado para colocação do enxerto quando o doador é adulto e o receptor, criança de baixo peso. No ecodoppler observamos grande aumento dos índices com ausência de fluxo diastólico, mas esses dados também podem ocorrer em casos de NTA ou rejeição grave. Quando a exploração cirúrgica é precoce, podese salvar o enxerto.
Fístula Urinária O vazamento urinário, quando ocorrer para a pele através da incisão cirúrgica, não oferece dificuldade diagnóstica. Contudo, quando ocorrer para o retroperitônio, ou mesmo para a cavidade peritoneal conseqüente a lesão do peritônio durante o ato cirúrgico, ou se coletar em volta do enxerto, cria dificuldade diagnóstica. Quando o vazamento pela incisão é pequeno pode ser confundido com vazamento linfático, situação em que a dosagem de uréia, creatinina, potássio e sódio nesse líquido faz o diagnóstico diferencial entre linfa e urina. Nos casos de vazamento de linfa costuma ocorrer edema do membro inferior do lado do transplante. A fístula urinária pode ocorrer por problema na implantação uretero-vesical ou por necrose do ureter, geralmen-
958
Manejo Clínico do Transplante Renal
te puntiforme e causada por isquemia. No primeiro caso, a manifestação é geralmente mais precoce, na primeira semana, enquanto na perfuração do ureter costuma ocorrer na segunda ou terceira semana. O diagnóstico é confirmado pela ultra-sonografia, urografia excretora e uretrocistografia miccional e tomografia. Quando o diagnóstico é confirmado nas primeiras 24 horas ou, melhor ainda, nas primeiras 12 horas, o tratamento deve ser a cirurgia imediata reimplante nos casos de ureter preservado ou ligadura do ureter e anastomose do ureter do rim antigo na pélvis do enxerto. Quando a cirurgia é feita após alguns dias do vazamento, a melhor opção terapêutica é a ligadura do ureter, sutura da bexiga e nefrostomia, e após um mês se faz a cirurgia definitiva. Quando a fístula é vesical, ainda não existe uma conduta programada. Nas fístulas pequenas a manutenção de sonda vesical por longo tempo pode resolver. Outras vezes, se as condições locais não forem ideais, pode ser indicada nefrostomia e cirurgia definitiva um mês mais tarde.
Obstrução Urinária Obstrução urinária por coágulos, torção do ureter, estenose na implantação por erro técnico ou por edema local é uma ocorrência rara e de difícil diagnóstico precoce. Deve ser feito diagnóstico diferencial com NTA e rejeição humoral. A ultra-sonografia é o elemento fundamental no diagnóstico, embora os dados sugestivos de obstrução só apareçam após 48 ou 60 horas da instalação do processo. Tomografia com contraste também pode ser útil no diagnóstico. Curiosa é a observação de que, em casos de obstrução, pode ocorrer diurese normal nas primeiras 24 ou 48 horas.
Hematoma de Loja Renal O hematoma de loja costuma ocorrer quase sempre nas primeiras horas do pós-operatório e não é de difícil diagnóstico. Dor local muito intensa é um dado muito importante, pois a cirurgia do transplante é pouco dolorosa. Aumento da loja, anúria ou oligúria, sinais periféricos de sangramento e queda do hematócrito são os dados clínicos e laboratoriais mais importantes. A ultra-sonografia confirma o diagnóstico. Faz-se o diagnóstico diferencial com ruptura renal ou ruptura parcial da anastomose arterial. O hematoma deve ser imediatamente drenado, pois pode trazer conseqüências importantes: compressão de veia renal ou ureter, neste caso podendo levar a fístula urinária; insuficiência renal aguda por mecanismos provavelmente neurológicos e supuração. A profilaxia do hematoma deve ser feita no ato cirúrgico, através de ligadura cuidadosa dos vasos com pressão arterial normal. Se tal processo não corrigir o san-
gramento, o uso de crioprecipitado de plasma pode estar indicado.
Ruptura Renal Complicação extremamente rara, dando um quadro muito parecido com o do hematoma de loja, só que surge mais tardiamente, após a primeira semana; costuma associar-se com rejeição grave, com necrose tubular aguda, trombose venosa ou obstrução urinária. O diagnóstico, suspeitado clinicamente e através de ultra-sonografia, deve ser confirmado por cirurgia de urgência. Deve-se procurar preservar o rim, a não ser que haja rejeição humoral importante.47
Ruptura da Anastomose Arterial Complicação muito rara e extremamente grave, ocorre por infecção na zona da anastomose arterial conseqüente à fístula urinária, hematoma infectado, ou, menos freqüentemente, por localização, na zona da sutura arterial, de agente infeccioso da corrente sangüínea. O quadro clínico é dramático: sinais de choque hemorrágico, associados a aumento da loja renal ou sangramento da incisão cirúrgica. Os casos menos graves podem ser confundidos com hematoma de loja ou ruptura renal. A indicação é cirurgia imediata, e a remoção do enxerto é quase sempre necessária. As complicações da loja após a cirurgia são freqüentes, dadas as condições da cirurgia de emergência.47
Estenose da Artéria Renal A estenose da artéria renal é causa de hipertensão arterial e/ou perda funcional do transplante renal. Múltiplas são as causas, como: trauma da íntima no ato cirúrgico, erro técnico, artéria do receptor com grau elevado de arteriosclerose e rejeição crônica. A incidência varia de 1 a 10% dos diferentes centros, e o diagnóstico é suspeitado pelo aumento da velocidade do fluxo sangüíneo no ecodoppler46 e confirmado pela arteriografia renal, ou pela angiorressonância magnética com gadolínio.4 A conduta terapêutica que se propõe atualmente é a dilatação intraluminar com balão, com colocação de stent, pois a cirurgia de reanastomose provoca grande incidência de trombose arterial (cerca de 50% dos casos).
Linfocele Coleção de linfa junto ao enxerto renal é uma complicação extremamente rara, que costuma ocorrer algumas semanas após a alta hospitalar ou mesmo mais raramente anos após o transplante. A manifestação clínica pode ser através de obstrução do ureter ou pelve, por dificuldade de retorno linfático, levan-
959
capítulo 53
do a edema do membro inferior do lado do transplante, ou por infecção da coleção, às vezes associada a infecção urinária concomitante. O diagnóstico é suspeitado pela ultra-sonografia e urografia excretora e confirmado pela análise bioquímica da coleção, obtida com o auxílio da ultra-sonografia. Os níveis de sódio, potássio, creatinina e uréia na linfa são iguais aos do plasma. O tratamento consta de drenagem cirúrgica, que pode ser feita por via laparoscópica, com excelentes resultados.
COMPLICAÇÕES CLÍNICAS NÃO-INFECCIOSAS DO TRANSPLANTE RENAL Muitas são as complicações que ocorrem na fase tardia do transplante renal. Hipertensão arterial, dislipidemia, catarata, distúrbio do crescimento e obesidade são as mais freqüentes (Quadro 53.12).
Hipertensão Arterial A hipertensão arterial ocorre em mais da metade dos pacientes transplantados. Múltiplas são as causas (Quadro 53.13): presença dos rins primitivos, hipertensão maligna prévia, estenose da artéria renal, rejeição crônica, recidiva da doença renal primária, obesidade, corticóide e ciclosporina.47,48 A remoção dos rins primitivos deve ser feita se houver suspeita de hipertensão maligna primária ou secundária como doença primária. Um teste útil para se avaliar a importância do rim primitivo como causa de hipertensão arterial pós-transplante é o teste do captopril com dosagem de renina, seguindo os critérios de Laragh.49 Quando este teste for positivo, a probabilidade de que a
Quadro 53.12 Complicações clínicas não-infecciosas Hipertensão arterial Dislipidemia Catarata Distúrbio do crescimento Obesidade Diabetes mellitus Poliglobulia Trombose venosa Depressão medular Hiperparatireoidismo Necrose asséptica e osteoporose Doença cardiovascular Pancreatite Úlcera gastroduodenal Hiperuricemia Recidiva da doença primária
Quadro 53.13 Causas de hipertensão arterial (HA) • • • • • • • •
HA prévia Efeito de drogas: corticóide, CsA, FK Rejeição Recidiva da doença de base Estenose da artéria renal Fístula artéria-venosa renal Dieta rica em sal Presença de rins primitivos
presença dos rins primitivos seja a causa da hipertensão arterial é grande.49 O controle da hipertensão arterial pós-transplante renal é muito importante, pois é sabido que ela favorece a progressão para insuficiência renal. Também temos observado raros casos de nefroesclerose maligna de novo no rim transplantado, com perda do enxerto. Existem algumas normas para a escolha dos hipotensores: quando o paciente está recebendo ciclosporina, preferimos o uso da nifedipina, que é de liberação lenta, ao invés dos bloqueadores de canais de cálcio; deve-se tomar cuidado no uso do diltiazen, pois esta droga aumenta os níveis sangüíneos da ciclosporina; nos pacientes jovens e com rim primitivo in situ, preferimos os beta-bloqueadores; nos pacientes com perda de função renal, os diuréticos são os mais indicados, e bloqueadores de enzima de conversão ou bloqueadores do receptor de angiotensina II são indicados quando a hipertensão estiver associada à poliglobulia.50 Fato de observação freqüente é a alta prevalência da hipertensão só observada no consultório, que pode ser confirmada com a medida ambulatorial da pressão arterial.
Dislipidemia Dislipidemia ocorre com grande freqüência. Observamos aumento de triglicérides, colesterol, LDL colesterol, este dois últimos os mais importantes, e diminuição do HDL colesterol, em menor número de casos.51 Os fatores etiológicos são múltiplos: dieta, corticosteróide, diuréticos e predisposição individual. A terapêutica deve ser primariamente dietética e a atividade física, programada. Devido à implicação destes distúrbios com doença arteriosclerótica e piora da evolução da rejeição crônica, indicamos o tratamento com as estatinas, que têm efeito terapêutico eficiente sem interferência na função renal e nos níveis da ciclosporina.51 Na nossa experiência51 o uso da sinvastatina na dose de 10 a 20 mg por dia, tomada à noite, é bastante eficiente. Naqueles casos resistentes à estatina, a atorvastatina na dose de 10 a 40 mg/dia é eficiente na totalidade dos casos e tem indicação absoluta quando existe aumento significativo dos triglicérides. A ocorrência de alterações hepáticas e/ou musculares é extremamente rara.
960
Manejo Clínico do Transplante Renal
Quando no esquema de imunossupressão entra a rapamicina, a ocorrência e a gravidade da dislipidemia estão significativamente aumentadas.22
Catarata Catarata causada pelo corticosteróide é bastante freqüente, chegando até a 33% dos casos, quando pesquisada eletivamente.47,52 Tende a diminuir com a diminuição da dose do corticóide, e muitos casos necessitam de cirurgia.
Distúrbio do Crescimento Crianças transplantadas com idade óssea acima de 12 anos que requerem dose alta de corticosteróide ou que tenham comprometimento da função renal têm o crescimento prejudicado, causando grande distúrbio emocional. Quando o transplante é feito em idade menor, se a função renal é normal e se consegue usar dose pequena de corticóide ou não usá-lo, o crescimento pode ser normal, como já comentado anteriormente. Possivelmente o uso de hormônio de crescimento deverá contornar este problema. Hoje, com o emprego do tacrolimus e do micofenolato mofetil, o corticóide pode ser suspenso ou administrado em dose pequena com maior segurança, evitando esta importante complicação a crianças e adolescentes que recebem transplante.12,16,53
Obesidade O aumento de peso corpóreo sempre ocorre no póstransplante. Contudo, em certa percentagem de casos, surge obesidade que pode ser de difícil controle, sendo um fator agravante da hipertensão arterial, de necrose asséptica da cabeça do fêmur e de distúrbios emocionais. O manuseio da obesidade já é um problema importante na população normal, e no transplantado, mais difícil ainda. Quanto ao orlistat — Xenical®, nova droga empregada no tratamento da obesidade — ainda não está comprovado que possa ser usado em transplantados que tomam ciclosporina. Não indicamos esta droga nestes pacientes, pois pode levar a diminuição significativa da absorção da ciclosporina, e não há dados sobre a influência na absorção do tacrolimus.
OUTRAS COMPLICAÇÕES CLÍNICAS NÃO-INFECCIOSAS
primeiros seis meses pós-cirurgia e 29%, após dois anos do transplante. Cerca de 1/3 dos casos necessita de insulina, temporariamente ou para sempre; outros são controladas só com dieta ou dieta mais medicação hipoglicemiante oral.47 O surgimento de diabetes tem múltiplas causas: corticóide, diurético, pancreatite, predisposição individual, raça negra, idade avançada ou então, mais raramente, destruição das ilhotas de Langerhans pelo citomegalovírus. O uso do tacrolimus aumenta a incidência do diabetes pós-transplante.16 Em cerca da metade dos doentes há remissão com o tempo pós-transplante. O controle não adequado do diabetes pode levar ao desenvolvimento de glomeruloesclerose diabética no enxerto. O surgimento de diabetes mellitus pós-transplante renal traz uma significativa interferência na morbidade e mortalidade destes pacientes. Todo esforço deve ser feito para manter os níveis de glicemia sob controle, quer com insulina, metformina, os antigos hipoglicemiantes, quer com as novas drogas hipoglicemiantes que surgiram nos últimos anos.
Poliglobulia Poliglobulia conseqüente à produção exagerada de eritropoetina pelos rins primitivos é observada em aproximadamente 10% dos pacientes. Demonstramos que a taxa de hemoglobina é maior nos pacientes transplantados que têm o rim primitivo in situ, quando comparados com aqueles sem os rins primitivos.54 Deve-se fazer o diagnóstico correto da poliglobulia, pois os aumentos dos níveis de hemoglobina e hematócrito podem ser conseqüentes ao uso de diurético. O diagnóstico correto se faz com a determinação da massa eritrocitária total, que está aumentada. O controle da poliglobulia pode ser medicamentoso, sendo que os medicamentos mais eficientes e mais bem tolerados são os inibidores da enzima de conversão (25 a 100 mg de captopril ou 10 a 20 mg de enalapril).55 Podem também ser usados os bloqueadores da angiotensina II.50 Não observamos interferência dessas drogas na função do enxerto. Outro esquema recomendado é o uso de 600 mg ao dia de aminofilina, cuja ação está no bloqueio da ação da eritropoetina; essa droga tem como efeito colateral freqüente náuseas e vômitos, tornando difícil o seu uso.56 Sangria repetida é uma medida útil, quando não for possível usar drogas, ou mesmo pode ser a primeira conduta empregada. A nefrectomia dos rins primitivos sempre leva à cura da poliglobulia, mas é uma conduta raramente seguida.54 Poliglobulia pode levar à trombose venosa e, em pacientes idosos, à isquemia cerebral ou miocárdica.
Diabetes Mellitus
Trombose Venosa Profunda
O diabetes mellitus ocorre em cerca de 8 a 30% dos pacientes transplantados. Cerca de 26% dos casos surgem nos
Trombose venosa profunda, principalmente de membros inferiores, ocorre mais freqüentemente no primeiro
961
capítulo 53
ano pós-transplante. Sua causa está relacionada ao uso do corticóide, que aumenta o número de plaquetas e exacerba a coagulação e a presença de proteinúria importante.57 O tratamento é o habitual: heparina seguida de warfarina sódica — Marevan® — por via oral; raramente pode levar a quadro de embolia pulmonar severa. A trombose venosa pode atingir o rim transplantado, surgindo dificuldade no diagnóstico com outras causas de síndrome nefrótica ou proteinúria.
Depressão Medular A depressão medular com tradução periférica em qualquer das três séries, vermelha, branca ou plaquetária, em conjunto ou isoladamente, pode ocorrer no pós-transplante. O manuseio adequado da dose de azatioprina e do micofenolato mofetil faz com que essa complicação seja muito rara. A anemia ocorre em cerca de 8% dos casos de transplante por múltiplas causas: intolerância à azatioprina, ao micofenolato mofetil, anemia ferropriva, ausência dos rins primitivos e certos graus de insuficiência renal. O ajuste da dose da azatioprina e do MMF e administração de ferro são as medidas terapêuticas. Leucopenia está presente numa percentagem pequena de pacientes, isolada ou associada às outras séries. A conduta terapêutica já foi discutida anteriormente. Naqueles casos onde existe uma função retardada do enxerto, a anemia pode tornar-se um problema importante, e o uso da eritropoetina é eficiente, evitando transfusão, que pode piorar o grau de sensibilização contra painel.58 Outra causa de anemia pós-transplante descrita recentemente é a infecção por poliomavírus, analisado em outro capítulo; infecção por citomegalovírus pode desencadear depressão medular importante. Na ocorrência de insuficiência renal, quer por rejeição aguda ou rejeição crônica, os efeitos na depressão medular, induzidos pela azatioprina e pelo micofenolato mofetil, estão aumentados, devendo-se ajustar adequadamente a dose destas drogas. Um dos efeitos colaterais mais importantes da rapamicina é a plaquetopenia. O uso dos anticorpos policlonais leva com freqüência à depressão medular, que é contornada pelo ajuste da dose.
Hiperparatireoidismo Pós-transplante A ocorrência de hipofosfatemia é freqüente no póstransplante, principalmente nos primeiros meses; hipercalcemia esporádica pode ocorrer em qualquer fase, mais freqüentemente na precoce, às vezes acompanhada de hipercalciúria. O aumento dos níveis de paratormônio está presente nos primeiros meses pós-transplante, tendendo a normalizar-se com o passar do tempo. Assim, o quadro de
hiperfunção das paratireóides decorrente da uremia tende a desaparecer espontaneamente com o tempo pós-transplante.59 Naqueles casos de doença óssea grave pré-transplante, na ocorrência de hipercalcemia e hipofosfatemia está indicada a administração de carbonato de cálcio e Rocaltrol® (calcitriol). O aumento da fosfatase alcalina (fração óssea) no adulto traduz formação óssea nesses pacientes. Naqueles casos de hipercalcemia importante acompanhada de hipofosfatemia, hipercalciúria e níveis aumentados de paratormônio, com ou sem piora das lesões ósseas preexistentes, está indicada a avaliação das glândulas paratireóides com ultra-sonografia, tomografia ou mapeamento com radioisótopo específico. Dois tipos de patologia podem ser encontrados: hiperplasia difusa das quatro glândulas ou formação adenomatosa de uma delas. Dois são os procedimentos cirúrgicos: paratireoidectomia subtotal, deixando in situ fragmento de uma glândula, ou paratireoidectomia total e reimplante de parte de uma das glândulas no músculo do antebraço, conservando os demais em nitrogênio líquido para possível uso posterior, se necessário.60 A necessidade de paratireoidectomia pós-transplante é muito rara. No manuseio de mais de 1.500 pacientes com mais de um ano de evolução, esta cirurgia só foi feita em 20 casos no nosso serviço.
Necrose Asséptica e Osteoporose Necrose asséptica, principalmente de cabeça de fêmur, é uma rara ocorrência nos dias atuais. Sua causa é o corticosteróide mais a lesão da osteodistrofia renal da fase de uremia. Outras articulações acometidas são a cabeça da tíbia e úmero. O quadro doloroso e a limitação funcional da articulação são as manifestações clínicas, e o aspecto radiológico é típico. O tratamento pode ser sintomático, mais o repouso de articulação; em muitos casos está indicada a troca da cabeça do fêmur por prótese, que dá bom resultado.59 O uso prolongado do corticosteróide, principalmente em pacientes idosos e já com outros fatores predisponentes, leva a quadros graves de osteoporose, com fraturas patológicas e desabamento de vértebras, com implicações clínicas importantes. Além de se procurar usar a dose menor de prednisona, ou mesmo suspendê-la em alguns casos, devemos usar as medidas habituais do tratamento da osteoporose: sais de cálcio, Rocaltrol® (calcitriol), calcitonina e mesmo reposição de estrógenos após a menopausa.
Doença Cardiovascular Infarto do miocárdio tem maior prevalência que na população normal; a causa predisponente mais importante é a coronariopatia severa do período urêmico, tendo a hiper-
962
Manejo Clínico do Transplante Renal
tensão arterial como fator mais importante, principalmente a hipertensão arterial maligna.47 A dislipidemia, a hipertensão arterial, a hipertrofia ventricular esquerda e o aumento da homocisteína61 são outros fatores implicados na fase pós-transplante (Quadro 53.14). Como prevenção da doença coronariana pós-transplante é importante a feitura de ecocardiograma. Se houver hipertrofia miocárdica, tratar com beta-bloqueadores ou inibidores de canais de cálcio. Na investigação da angina no pós-transplante, o teste ergométrico pode dar alta incidência de falso-positivo, e os exames mais adequados são a cintilografia miocárdica com esforço ⫹ MIBI ou cintilografia com MIBI ⫹ dipiridamol ou a cinecoronariografia. Nestes pacientes é freqüente o achado de coronárias normais, sempre associado à hipertrofia miocárdica. Naqueles casos de coronariopatia de indicação cirúrgica, o risco operatório não está aumentando na maioria dos pacientes, embora atualmente a angioplastia com colocação de stent seja um método menos agressivo e eficiente. Acidente vascular cerebral (AVC) é menos freqüente que o infarto do miocárdio e tem as mesmas etiologias, acrescentando que pacientes portadores de doença renal policística têm maior freqüência de malformações vasculares cerebrais.47 Vasculopatia periférica ocorre em diabéticos transplantados, levando com freqüência à necessidade de amputação de dedos ou membros. O acompanhamento dos diabéticos transplantados por médico vascular é muito importante, pois em muitas situações pode-se indicar cirurgia vascular antes do aparecimento de lesões isquêmicas. A avaliação criteriosa da irrigação dos membros inferiores, através da angiografia, leva à indicação de cirurgias de revascularização com alto índice de sucesso, evitando as desastrosas amputações. É muito importante que as medidas profiláticas sejam bastante enfatizadas nesses pacientes: evitar o fumo, uso de aspirina, controle dos níveis de colesterol e triglicérides, controle adequado do diabetes, perda de peso, exercício físico programado e controle dos níveis de homocisteína, que podem estar aumentados nestes pacientes com a prescrição da associação de ácido fólico 5 mg, vitamina B6 50 mg e vitamina B12 0,5 mg.61
Quadro 53.14 Doença cardiovascular — fatores predisponentes Hipertensão arterial Hipertrofia do ventrículo esquerdo Dislipidemia Diabetes mellitus Homocisteína Hábito de fumar Hiperfosfatemia
Muito importante é o diagnóstico da coronariopatia na fase pré-transplante e sua correção nessa ocasião, conforme foi discutido anteriormente.
Complicações Digestivas Pós-transplante Renal As complicações digestivas pós-transplante devem ser tratadas separadamente, pois são multifatoriais, tendo causas infecciosas e não-infecciosas.
PANCREATITE Pancreatite aguda pós-transplante ocorre em aproximadamente 2% dos casos, sendo a medicação corticosteróide a principal causa desencadeante. Pode variar de simples pancreatite edematosa até quadros graves de pancreatite necro-hemorrágica. Além do corticosteróide, a azatioprina tem provável efeito maléfico no pâncreas, e também a infecção por citomegalovírus está implicada.47 A evolução dos casos de pancreatite edematosa é boa, mas casos de pancreatite necro-hemorrágica levam ao óbito com grande freqüência. Diabetes mellitus como conseqüência de pancreatite já foi antes comentado, e formação de cisto pancreático também pode ocorrer.
COMPLICAÇÕES GASTROINTESTINAIS Atualmente com as facilidades diagnósticas e o uso de drogas inibidoras de secreção gástrica, como o omeprazol, a importância dessas complicações foi reduzida. Não usamos rotineiramente a investigação através da endoscopia digestiva alta em pacientes assintomáticos, nem usamos inibidores de secreção gástrica e/ou antiácidos profilaticamente. Nos casos sintomáticos os métodos diagnósticos e terapêuticos são os habituais. Dois comentários devem ser feitos. Primeiro: esses pacientes devem manter o hábito intestinal normal, quer com medidas dietéticas ou com laxantes, principalmente no pós-operatório imediato. Segundo: o sangramento digestivo alto ou baixo é a maior ocorrência nesses pacientes de telangiectasias, provavelmente relacionadas à uremia prévia e de difícil diagnóstico. Deve-se acrescentar que lesões esofágicas graves podem ser decorrentes de infecções virais ou fúngicas e úlceras cólicas, gástricas ou duodenais por citomegalovírus (CMV), ou de herpes simples, cujo diagnóstico é dado pela biópsia e antigenemia para CMV ou sorologia.
Hiperuricemia Aumento dos níveis sangüíneos do ácido úrico ocorre em transplantados, principalmente naqueles usando ciclosporina. Contudo, conseqüências desta hiperuricemia, como crise de gota e cálculo por uratos, são muito pouco freqüentes no nosso meio.
963
capítulo 53
Deve-se lembrar que nunca podemos associar o alopurinol com azatioprina; naqueles casos em que está indicado o uso de alopurinol, a azatioprina deve ser suspensa ou substituída pelo micofenolato mofetil. A perda funcional do enxerto, associada ao uso de diuréticos, é também uma causa de hiperuricemia.
Recidiva da Doença Primária A real incidência da recidiva da doença renal primária é de difícil avaliação, pois nem sempre se tem o diagnóstico original. Em 1.000 transplantes observamos 42 casos de recidiva de glomerulonefrites. As que mais freqüentemente recidivam são as glomerulopatias, em particular a glomeruloesclerose segmentar e focal, a glomerulonefrite membranosa-proliferativa, membranosa, nefropatia por IgA e proliferativas.1,47,62 Outras patologias em que se observa recidiva são a oxalose, amiloidose, nefropatia diabética, síndrome hemolítico-urêmica e nefropatia lúpica.1,47,62 A doença recidivada pode ter as mais variadas expressões clínicas, com ou sem perda funcional importante; a proteinúria está sempre presente e às vezes a síndrome nefrótica pode ocorrer com tal intensidade que exige a remoção do rim transplantado. O diagnóstico deve ser feito pela biópsia renal e deve ser diferenciado de rejeição crônica e glomerulonefrite de novo, nos casos de recidiva de glomerulonefrite. A forma mais freqüente de recidiva na qual se pode adotar algumas medidas terapêuticas é a glomeruloesclerose segmentar e focal. A terapêutica mais indicada é a associação de plasmaférese com altas doses de ciclosporina (até 20 mg/kg/dia); o número de sessões de plasmaférese é variável, sendo seis sessões o número mínimo.62,63 A plasmaférese poderia ser feita também no pré-transplante.64 Outra medida indicada é a substituição de azatioprina por ciclofosfamida.65 Outras medidas que agem diminuindo a proteinúria podem ser empregadas, como uso de inibidores da enzima de conversão. Nas outras formas de glomerulonefrites primárias, os únicos cuidados são aqueles empregados para diminuição da progressão da doença renal crônica. A nefropatia lúpica deve ser tratada com pulsoterapia ou uso de ciclofosfamida. O uso de inibidores da enzima de conversão está indicado na nefropatia diabética. A colchicina poderia ter algum efeito na amiloidose e, na síndrome hemolítico-urêmica, pode haver indicação de alguma terapêutica, dependendo da etiopatogenia da mesma. Uma terapia feita na nossa Unidade de Transplante Renal, empregando a plasmaférese uma semana antes do transplante e seguindo por mais duas semanas pós-transplante no total de nove sessões, associado ao esquema imunossupressor micofenolato mofetil, ciclosporina neoral
e prednisona, mostrou-se ineficiente na prevenção da recidiva da glomeruloesclerose segmentar e focal, uma vez que dos 10 casos assim tratados, nove tiveram recidiva, comprovada histologicamente.66 Importante na escolha do doador vivo parente, em casos de glomeruloesclerose segmentar e focal, é a verificação da existência de outros membros da família com a doença, pois a doença pode ocorrer após a doação do rim.67 Naqueles casos em que ocorreu perda do enxerto por recidiva da GEF com doador vivo parente, está contra-indicado o uso desse tipo de doador no retransplante.
Rejeição Após mais de quatro décadas do início dos transplantes renais, a rejeição ainda continua sendo o maior problema para o sucesso dessa terapêutica. Rejeição é a maior causa de perda do enxerto e o uso das drogas imunossupressoras para evitar ou tratar a rejeição continua sendo a maior causa de morbidade e mortalidade dos pacientes submetidos a transplante renal.68 Três são os tipos de rejeição: rejeição humoral, rejeição celular aguda e rejeição crônica.
REJEIÇÃO HUMORAL Esse tipo de rejeição está se tornando pouco freqüente nos dias atuais, em conseqüência das técnicas da prova cruzada e dos esquemas imunossupressores, mas ainda é um problema importante. Na Unidade de Transplante Renal do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, de janeiro de 1986 a junho de 1990, observamos 31 (6,4%) casos de rejeição humoral (RH) com prova cruzada negativa e perda do enxerto antes do final do segundo mês pós-transplante.69 Do ponto de vista clínico e anatomopatológico, dividimos a RH em três tipos distintos: rejeição vascular aguda ou vasculopatia aguda do transplante (RVA), rejeição humoral tardia (RHT) e rejeição humoral imediata (RHI). A descrição detalhada desses casos por nós observados encontra-se a seguir. A rejeição vascular aguda (RVA) — 11 casos — caracteriza-se por ter uma função inicial do enxerto em mais da metade dos casos, podendo mesmo ter-se uma normalização da função renal. Por outro lado, pode, desde o início, manter o paciente em diálise, tornando difícil o diagnóstico diferencial com insuficiência renal aguda isquêmica. No quadro anatomopatológico, o processo fundamental é uma proliferação fibromuscular da íntima das arteríolas e, mais freqüentemente, das artérias arqueadas, sendo que poucas vezes aparecem os fenômenos trombóticos, traduzindo-se, do ponto de vista clínico, pela ausência de função renal em certa percentagem de casos e pelo pequeno aumento dos
964
Manejo Clínico do Transplante Renal
níveis de DHL sangüíneo. Freqüentemente, estão associados à rejeição celular aguda e à necrose tubular aguda. O que chama a atenção é a presença de necrose tubular aguda prolongada, não-evolutiva; quando na biópsia renal não estão representadas artérias arqueadas, o diagnóstico de RVA pode ser suspeitado. Observa-se, nesse tipo de rejeição, baixa freqüência de positividade na imunofluorescência (38%), e tal fato teria duas explicações: a lesão vascular não estava relacionada com anticorpo tipo IgM, presente nesses casos por mecanismo físico (seqüestração de IgM), ou seria a lesão endotelial mediada por outros fatores que não o anticorpo.
Rejeição Humoral Tardia (RHT): 11 casos O segundo tipo de rejeição humoral bem caracterizada é a RHT, que, do ponto de vista clínico, apresenta-se com função renal normal em quase todos os casos na fase inicial, seguida por quadro abrupto de perda da função durante o primeiro mês pós-transplante. Pode também instalar-se no mesmo período, mas precedido de um ou dois episódios típicos de rejeição celular aguda, ou então rejeição celular aguda resistente a pulsoterapia com corticóide. No quadro anatomopatológico, predominam os processos de trombose, com exsudação de neutrófilos e necrose total do parênquima, traduzido laboratorialmente pelo nível alto de DHL sangüíneo. A imunofluorescência não é positiva em todos os casos (66%); isso poderia dever-se ao fato de o parênquima renal estar necrótico, com conseqüente desnaturação das imunoglobulinas, fibrogênio e frações do complemento.
Rejeição Humoral Imediata (RHI): 9 casos Não apresenta muita dificuldade diagnóstica do ponto de vista anatomopatológico. Consiste fundamentalmente em fenômenos trombóticos e exsudativos, seguidos de necrose total do parênquima. Do ponto vista clínico, caracteriza-se por ausência de função renal imediata e grande aumento dos níveis de DHL. Nos casos de doador cadáver que evoluem com insuficiência renal aguda, pode haver certa dificuldade com o diagnóstico de RHT, pois o quadro histológico pode ser semelhante e a falta de função renal inicial poderia ser conseqüente à NTA, o que justificou a maior freqüência desse tipo de RH nos casos com doador cadáver. A imunofluorescência nos casos de RHI foi positiva em todos eles, possivelmente pelo fato de o parênquima renal ainda não estar necrótico, permitindo que os anticorpos específicos reconheçam seus antígenos. Em nem todos os casos de RVA o enxerto é perdido. Com os diversos esquemas de imunossupressão, uma percentagem desses rins pode manter função renal por longo tempo.70 A conduta na rejeição humoral até há pouco era a remoção do enxerto, contudo duas publicações recentes mostraram que, quando se repetia a prova cruzada no pós-transplante, e esta se tornando positiva, a indicação de plasmaférese isolada ou associada com o uso da globulina hiperi-
mune na dose de 25 mg/kg/dia pode reverter tal quadro. A introdução de micofenolato mofetil e tacrolimus foi feita em todos os casos.71,72 Do ponto de vista prático, naqueles pacientes que têm alto grau de sensibilização e que recebem rim de doador cadáver com prova cruzada negativa somente para o soro atual, podendo, portanto, ter prova cruzada histórica positiva, deve ser feito o acompanhamento com biópsia renal semanal, associado à observação dos outros dados laboratoriais de tal tipo de rejeição. A introdução precoce da plasmaférese pode reverter este quadro. Não existe um consenso exato sobre o número de sessões de plasmaférese, mas o número de seis sessões é o recomendado, ideal seria até a negativação da prova cruzada. Também não existe um dado fixo do número de dias de aplicação da globulina hiperimune. A explicação para tal tipo de rejeição seria uma prova cruzada histórica positiva ou a presença de anticorpos antiendotélio.68,73 A primeira situação é muito rara nos dias atuais, com a alta eficiência da prova cruzada e o cuidado de se verificar o grau de sensibilização do paciente, pois, se for alto, deve-se sempre fazer indução com anticorpos poli- ou monoclonais ou com os bloqueadores dos receptores de interleucina II. Trabalho do Laboratório de Imunologia, Instituto do Coração, em colaboração com a Unidade de Transplante Renal (v. Cap. 52) mostrou que anticorpos obtidos por eluato, destes enxertos perdidos por rejeição humoral, eram capazes de ativar células endoteliais humanas, caracterizando os denominados anticorpos antiendotélio, diferentes dos anti-HLA.73 O papel desses anticorpos antiendotélio foi já visto por nós em tal tipo de rejeição em receptores HLA idênticos74 e também mostrado em outros trabalhos.75
REJEIÇÃO CELULAR AGUDA (RCA) A RCA é uma complicação clínica mais freqüente no transplante renal e sua incidência depende de múltiplos fatores: tipo de doador, compatibilidade, HLA A B DR, tipo e dose dos imunossupressores, presença ou não da função renal imediata. A definição da rejeição celular aguda não é tão simples. Isto foi discutido em um recente consenso.76 O quadro histológico da rejeição aguda foi classificado por um grupo de patologistas, nefrologistas e cirurgiões de transplante em múltiplos encontros em Banff, Canadá, a partir de 1991, com o objetivo de padronizar o diagnóstico das lesões renais.77,78,79 De uma maneira geral, na classificação de Banff, a rejeição aguda caracteriza-se pela presença de tubulite e arterite intimal, sendo a tubulite mais sensível e menos específica e a arterite, menos sensível e mais específica. A qualidade da biopsia é importante para a aplicação dessa classificação: deve possuir pelo menos 2 artérias e 10
capítulo 53
ou mais glomérulos nos cortes, e 7 lâminas com as colorações: 3HE, 3PAS ou prata e tricrômio. Tubulite é a infiltração de epitélio tubular por células leucocitárias, principalmente linfócitos, e a gravidade é dada pelo número de células. Inflamação do interstício é a presença de linfócitos, monócitos, eosinófilos, neutrófilos polimorfonucleares ou plasmócitos no interstício. A gravidade é dada pela percentagem do parênquima infiltrado. Glomerulite é caracterizada por infiltrado de células inflamatórias e/ou proliferação das células que compõem o glomérulo. Também a gravidade é dada pela percentagem de glomérulos acometidos. Arterite intimal é caracterizada pelo espessamento da camada íntima, com diferentes graus de inflamação subendotelial, podendo haver também depósito de fibrina, plaquetas e até necrose da túnica muscular. A lesão arterial é a mais grave e tem importância na escolha da droga imunossupressora. Venulite, que é um achado não-freqüente em casos de rejeição aguda, não é considerada nessa classificação, embora alguns autores dêem importância a ela. A rejeição de caráter humoral não foi bem analisada nessa classificação e já foi comentada anteriormente. Em resumo, temos os seguintes diagnósticos: quadro 1) rim normal; 2) rejeição borderline que não preenche os critérios para rejeição, mas que deve ser tratada de acordo com o quadro clínico e laboratorial; 3) rejeição tipo IA e IB, onde o acometimento é somente túbulo-intersticial; 4) rejeição tipo IIA e IIB, em que a lesão é arteriolar, podendo também ser acompanhada por lesões túbulo-intersticiais; 5) rejeição tipo III, em que existe necrose da arteríola, com infiltrado e hemorragia intersticial; é o grau mais grave, sendo o componente humoral importante na sua gênese (Quadro 53.15). Os episódios de RCA podem ser únicos ou múltiplos, e essa diferenciação também não é fácil. Somente o acompanhamento com biópsia renal pós-tratamento faz o diagnóstico correto. O diagnóstico de RCA no paciente que já teve queda significativa da creatinina sérica e aumento do nível de creatinina acima de 20% do valor basal, sem outras causas, é o melhor parâmetro.
Quadro 53.15 Rejeição aguda — Classificação de Banff Rim normal Rejeição borderline Tipo I A Tipo II A Tipo I B Tipo II B Tipo III B
965
Outros dados de importância para o diagnóstico por nós observados em um grupo de pacientes foram aumento de peso em 85% dos casos, febre (temperatura superior a 37°C) em 54%, diminuição da diurese em 52%, aumento da pressão arterial em 40% e eosonofilia em 55%; além do mais, pode haver discreta diminuição de hemoglobina e alterações discretas do exame de urina, como pequena proteinúria, hematúria ou leucocitúria. Dor no local do enxerto pode ser também observada. Quando a rejeição é leve, esses dados associados ao aumento da creatinina são suficientes para se fazer o diagnóstico, devendo-se iniciar o tratamento com metilprednisolona. Usamos 1,0 g por três dias. Embora trabalho recente feito na Unidade de Transplante Renal não tenha mostrado diferença entre o uso de 1,0 g de metilprednisolona (MP), comparado com 0,5 g desta droga,80 achamos que devemos calcular a dose de MP pelo peso — usando 8 ou 16 mg/kg. Quase sempre esse tipo de rejeição é IA ou IB da classificação de Banff. Naqueles casos raros onde ocorre oligúria e perda importante da função renal, o diagnóstico diferencial deve ser feito com rejeição humoral tardia, obstrução urinária ou trombose vascular (arterial ou venosa). Nesses casos a ultra-sonografia e o ecodoppler podem ser úteis, e a biópsia renal é o método diagnóstico imprescindível. Outra situação em que a biópsia é fundamental no diagnóstico da rejeição é quando existe queda lenta da creatinina, conseqüente à necrose tubular aguda. Nesses casos está indicada biópsia na segunda semana pós-transplante, mesmo sem nenhum outro dado que sugira rejeição (Quadro 53.16). Após o tratamento da primeira crise de rejeição, que sempre deve ser feito com metilprednisolona, três situações podem ocorrer (Quadro 53.17). A mais freqüente é a queda da creatinina 1 a 3 dias após o término da terapêutica, com desaparecimento das manifestações clínicas (ausência de febre, queda de peso, aumento de diurese, desaparecimento da dor no enxerto). A segunda possibilidade é a queda mais lenta da creatinina ou sua estabilização por alguns dias em nível não muito alto, com diurese, queda de peso e ausência de febre; nessa situação, a persistência da perda funcional pode ser decorrente da necrose tubular aguda associada à rejeição, ou a nível elevado de ciclosporina ou tacrolimus ou da rejeição corticóideresistente; após uma semana do término do tratamento, se essa situação persistir, está indicada biópsia renal. A terceira hipótese é a falta de resposta ao tratamento inicial. Nesses casos achamos que está indicada a biópsia renal imediatamente, pois se houver ainda quadro de rejeição celular aguda, neste caso é definida como rejeição corticóide-resistente, quase sempre Banff IIB ou III. Nessa condição o tratamento deve ser feito com OKT3, GAT, plasmaférese ou globulina hiperimune, conforme comentamos anteriormente.71,72 Nesses casos de rejeição grave resistente à metilprednisolona, OKT3 e GAT, se o paciente estiver no esquema de
966
Manejo Clínico do Transplante Renal
Quadro 53.16 Rejeição e função retardada do enxerto (necessidade de diálise na 1.ª sem.) Indução com ATG/OKT3 10 dias
Indução com bloqueadores IL2 Anúria — Bx 8.º dia
Anúria — Bx 15.º dia
Diurese Bx cada 10 dias
Bx cada 10 dias
Queda da creatinina
Sem queda da creatinina
Dados clínicos e laboratoriais
Bx cada 10 dias
Quadro 53.17 Primeiro RCA pós-tratamento com MP
1.º Queda da creatinina 1 a 3 dias pós-tratamento ⴙ desaparecimento dos sintomas clínicos
2.º Queda mais lenta ou estabilização, mas com diurese, perda de peso e sem febre 3.º Falta resposta ao tratamento Biopsia imediata 1 — Aguardar 2 — Bx 5-7 dias se a função não normalizar
Normalização da FR em 5-7 dias NTA Aguardar
ciclosporina, azatioprina e prednisona, tem indicação a substituição da ciclosporina pelo tacrolimus81 ou substituição da azatioprina pelo micofenolato mofetil.82 Uma publicação recente mostra a eficiência de uma nova droga, rituximab, que é um anticorpo contra linfócitos B na rejeição resistente a todas as terapêuticas anteriormente referidas.83 A agressão vascular na rejeição é um dado prognóstico muito importante na resposta às medidas terapêuticas.70,84,85 A conduta na segunda ou terceira crise de rejeição é a repetição da pulsoterapia com metilprednisolona nos casos em que houve resposta ao tratamento anterior e uso de anticorpo mono- ou policlonal nos casos sem resposta.
Rejeição de caráter humoral 1 — ATG ou OKT3 2 — Plasmaférese 3 — Globulina hiperimune 4 — Introdução FK/MMF 5 — Rituxumab
A análise criteriosa da biópsia renal por patologista experimentado é fundamental para a conduta médica. Alguns dados da microscopia são indicativos de mau prognóstico. Eles são: presença de endarterite obliterante (vasculopatia aguda do transplante), fenômenos trombóticos de vasos ou glomérulos Banff IIB e III e infiltrado intersticial com predomínio de plasmócitos.70,85 Problema ainda não totalmente esclarecido é o tratamento da rejeição celular aguda, diagnosticada por ocasião da biópsia renal, em casos com função renal normal ou nos casos associados com necrose tubular aguda inicial. Discute-se se esses episódios de rejeição sem manifestação clínica não estariam implicados com a maior incidência de
capítulo 53
rejeição crônica.86 Deve-se considerar que pulsoterapia repetida com o uso de OKT3 ou GAT, principalmente na vigência da insuficiência renal, aumenta muito a morbidade e a mortalidade dos pacientes. No entanto, dados atuais com biópsias renais programadas mostraram que o tratamento de rejeição só diagnosticada por dados de ordem histológica tem efeito benéfico na função do enxerto em longo prazo.86 Um dado de ordem clínica importante como prognóstico de boa evolução em longo prazo é a normalização da creatinina e da depuração da creatinina pós-término do tratamento de rejeição.87 Essa conduta terapêutica no manuseio da RCA é a que adotamos, embora outras possam ser recomendadas pela literatura, conforme publicação recente em um consenso dos maiores centros de transplante, que pode ser analisada.88,89,90 A feitura de ecodoppler seriado pré- e pós-tratamento da RCA é método útil. As persistências de altos índices de IR e IP e a diástole reversa são dados sugestivos de rejeição grave em casos sem necrose tubular aguda prévia. Situação mais complicada é o manuseio de RCA na vigência de enxerto com função renal retardada. Nesses casos, muito importante é a feitura do ecodoppler nas primeiras 24 horas pós-transplante para afastarmos qualquer outro diagnóstico. Quando se usa como indução anticorpo monoclonal ou policlonal, RCA não ocorre durante o seu uso adequado (mantendo-se nível de CD3 abaixo de 50 células), contudo, quando se usa como indução Zenapax® (daclizumab) ou Simulect® (basiliximab), pode ocorrer rejeição. Nossa conduta nesses casos é a realização de biópsia renal após sete dias nos casos de uso dos inibidores de receptor de interleucina II e uma semana após o término de uso dos anticorpos mono- ou policlonais. O tratamento da rejeição vai depender do tipo, observando que, se houver indicação de OKT3 ou GAT, devese obedecer à seguinte rotina: se a indução foi feita pelo OKT3, usamos o GAT para tratamento da rejeição e viceversa. Fato muito importante no tratamento de rejeição é o acompanhamento da histologia do enxerto, como foi já anteriormente comentado. Em situações nas quais já existe acometimento vascular grave (vasculopatia aguda do enxerto) com necrose tubular aguda sem sinais de regeneração, em paciente dependendo de diálise, sem que haja outros fatores concomitantes, é indicado suspender a imunossupressão, desistir do enxerto e salvar o paciente.
REJEIÇÃO CRÔNICA O processo de rejeição é muito complexo, sendo os mecanismos envolvidos muito dependentes do tipo de associação de drogas imunossupressoras que está sendo empregado. Em algumas situações o componente humoral está associado ao componente celular, ficando difícil
967
saber qual é mais importante. A classificação da rejeição pelos critérios de Banff tenta equacionar esse problema. Os critérios para a classificação de Banff para caracterização da rejeição crônica, em suma, são os seguintes:79 1. Fibrose intersticial é a fibrose intersticial crônica que acomete mais de 5% da área cortical, podendo atingir até mais de 50% dela. 2. Atrofia tubular, caracterizada pelo espessamento da membrana basal ou redução de mais de 50% da luz, sendo que a percentagem de túbulos acometidos dá a gravidade da lesão. 3. Espessamento fibroso da íntima arterial caracteriza-se por espessamento fibroso da íntima arterial com delaminação e descontinuidade da membrana elástica interna. O grau de redução da luz arterial caracteriza maior gravidade. 4. Aumento da matriz mesangial, caracterizado pela expansão do espaço entre dois capilares glomerulares adjacentes maior do que duas células mesangiais, em pelo menos dois lóbulos glomerulares. A percentagem de glomérulos não esclerosados com aumento moderado da matriz é que dá a gravidade da lesão. 5. Glomerulopatia crônica do transplante, caracterizada por proliferação mesangial devido a proliferação celular, expansão da matriz e espessamento da membrana basal com interposição mesangial periférica (duplo contorno). Com freqüência pode haver crescentes celulares. A gravidade é dada pelo número de glomérulos esclerosados e principalmente pela percentagem de “duplo contorno” das alças capilares de glomérulos não esclerosados. É classificada em grau I (leve), grau II (moderada) e grau III (acentuada). As lesões glomerulares, às vezes, são de difícil diagnóstico diferencial, com a recidiva da doença glomerular primária ou de lesões que vieram do doador. O conhecimento desses dois dados pré-transplante é importante, bem como dos dados de microscopia com imunofluorescência e mesmo eletrônica. Deve-se entender que nem sempre é fácil responsabilizar o processo imunológico do enxerto por essas lesões crônicas. Há lesão pelas drogas imunossupressoras (ciclosporina e tacrolimus), efeito da hipertensão arterial, lesões renais preexistentes no doador, lesões conseqüentes a massa renal reduzida, recidiva de doença primária e outras; por isso, prefere-se denominar esse quadro de nefropatia crônica do enxerto. A rejeição crônica é a conseqüência de episódios de rejeição aguda celular isolada ou associada a rejeição vascular aguda, parcialmente controlada pelas drogas potentes hoje disponíveis.91 Deve-se observar que nessa situação não existe uma boa correlação entre dados histológicos e de função renal, e às vezes é difícil diferenciar rejeição crônica de nefrotoxicidade por ciclosporina ou tacrolimus. Como comentamos
968
Manejo Clínico do Transplante Renal
anteriormente, a intensificação da imunossupressão deve ser avaliada com muito critério. Um dado de histologia mostrado recentemente ao nosso serviço foi que atrofia tubular focal e fibrose intersticial intensas são fatores de pior prognóstico. Usando técnicas de imuno-histoquímica a marcação por alfa-actina-miosina e por TGF, independentemente dos dois dados da MO, é também indicador de pior prognóstico. Recentes dados da literatura confirmam esses dados.92 Os fatores implicados na origem e progressão da rejeição crônica já são bem conhecidos, portanto devemos tentar atuar em todo esse complexo problema. O acerto da medicação imunossupressora é de fundamental importância, tentando os mais variados esquemas imunossupressores, já comentados, mas observando todos os cuidados necessários (Quadro 53.18). A dieta hipoprotéica tem sua indicação conforme há longo tempo é conhecido.93 O tratamento da hipertensão arterial deve ser rigoroso, devendo o paciente permanecer normotenso e sempre procurar corrigir as causas secundárias da hipertensão. As escolhas das drogas devem basear-se no grau de disfunção renal, evitando o uso de inibidores da ECA se a creatinina estiver superior a 3 mg/ml. O tratamento da dislipidemia deve ser rigoroso, e as estatinas são drogas muito eficientes, conforme comentamos anteriormente. Dados recentes mostram que hipercolesterolemia é um fator de risco importante para a rejeição crônica em homens,94 o que sugere que as mulheres devem também ter sua reposição hormonal quando necessária.95 Teoricamente os inibidores da ECA ou inibidores da angiotensina II devem ser empregados quando o nível de creatinina não estiver acima de 3 mg/dl. Além do efeito hemodinâmico na prevenção do hiperfluxo, podem agir também através de sua atividade antiproliferativa e na diminuição da proteinúria, que pode ser uma manifestação da rejeição crônica. Naqueles pacientes com diabetes mellitus, quer como doença primária ou secundária ao transplante, o controle adequado dos níveis glicêmicos é de fundamental importância. Em muitas situações de rejeição crônica, o mais importante são essas medidas terapêuticas e não o aumento das drogas imunossupressoras, que podem estar contribuin-
Quadro 53.18 Conduta na rejeição crônica • • • • • •
Ajustar a imunossupressão Dieta hipoprotéica Tratar a HAS Corrigir a dislipidemia Corrigir a hiperuricemia Uso de inibidores da ECA ou Angio II
do para a perda da função renal e para os diversos efeitos metabólicos.96
Neoplasias Malignas As neoplasias malignas constituem uma das mais importantes complicações no pós-transplante renal. Com uma incidência muito maior que na população não transplantada, acabam por acarretar uma série de implicações de ordem clínica, etiológica, diagnóstica e de conduta. A literatura mundial descreve como alta e significativa a incidência dessa complicação no pós-transplante renal, observando uma incidência variável entre 1 e 16% nos diferentes relatos.97,98,99,100,101,102 Na minha experiência103 com um grupo de 1.511 pacientes com transplante renal, observamos 105 casos de neoplasias malignas (6,9%) em 94 pacientes (6,2%), ocorrendo em 11 pacientes duas neoplasias diferentes. Entre os vários fatores responsáveis por essa variabilidade, acreditamos que o tempo da análise pós-transplante seja um dos mais importantes para explicar tal variação. Outro fator a ser considerado que atua diretamente na maior ou menor incidência desse tipo de complicação no paciente transplantado, como também na população normal, é a intensidade de exposição aos raios ultravioleta.104,105 Quanto maior a exposição ao sol, maior a incidência de neoplasias cutâneas, o que torna os países de clima tropical os de maior incidência. Entre os muitos fatores presentes na fase pós-transplante capazes de induzir uma maior incidência dessa complicação estão as alterações da imunidade induzidas pelo uso crônico de agentes imunossupressores, que acarretam distúrbios da vigilância imunológica, da estimulação antigênica crônica e da imunorregulação.97,100,106-109
Pontos-chave: • Neoplasias cutâneas: quanto maior a exposição ao sol, maior a incidência de neoplasias cutâneas, o que torna os países de clima tropical os de maior incidência • Origem das neoplasias: alterações da imunidade induzidas pelo uso crônico de agentes imunossupressores, que acarretam distúrbios da vigilância imunológica, da estimulação antigênica crônica e da imunorregulação NEOPLASIA MALIGNA PRÉ-TRANSPLANTE RENAL Devido às diversas alterações imunológicas induzidas pela uremia, existe uma prevalência maior de neoplasia maligna em pacientes urêmicos, que devem ter a neopla-
969
capítulo 53
sia diagnosticada na fase pré-transplante, pois caso contrário contribuirá para a maior incidência de neoplasia maligna pós-transplante renal.110,111
trália e Nova Zelândia, que reproduzimos no Quadro 53.19, excluídos os de pele.112
NEOPLASIA MALIGNA TRANSPLANTADA COM O ENXERTO
ENXERTO SEM FUNÇÃO NO RECEPTOR
Essa situação, embora rara, pode ser uma causa de neoplasia. O transplante de um rim com tumor maligno não diagnosticado previamente pode acarretar a disseminação do tumor no pós-transplante, disseminação esta que poderá ser controlada com a retirada do enxerto e da imunossupressão.112,113 Os únicos doadores com tumor maligno que podem ser usados são aqueles com tumor de pele localizado e de baixa morbidade ou com tumores primários do sistema nervoso central, não meduloblastoma ou glioblastoma e não operados.114,115
Uma percentagem de pacientes que apresentam perda total da função do rim transplantado, principalmente por rejeição, pode permanecer com o enxerto in situ sem que haja problema. Em alguns casos, entretanto, tal não sucede, ocorrendo complicações como infecção ou rejeição hiperaguda, coincidindo com a suspensão da medicação imunossupressora, sendo necessário proceder-se à remoção do enxerto.116
FÍSTULA ARTERIOVENOSA PARA HEMODIÁLISES
NEOPLASIA MALIGNA DE NOVO PÓS-TRANSPLANTE Esse é o grande problema do paciente com transplante, sendo relatado na literatura que sua incidência é muito variável e depende fundamentalmente do tempo póstransplante, da região geográfica e da intensidade da imunossupressão, variando entre 1,6% e 16%.97,101,103,112
Incidência e Prevalência Na nossa experiência a incidência acumulativa de neoplasia maligna pós-transplante renal foi de 6,94%,103 sendo no primeiro ano pós-transplante renal de apenas 1,05%, e superior a 6% após o 10.º ano de transplante. A prevalência de tumores malignos em pacientes com transplante renal é cerca de 3,4 vezes maior se comparada com a população normal, sendo esta prevalência variável de acordo com o tipo de tumor. A melhor casuística que analisa tais dados considera os relatados por Sheil na Aus-
Em muitos pacientes pós-transplante imediato ocorre a oclusão espontânea do acesso vascular para hemodiálise. Quando o doador é vivo e a função renal é normal no pósoperatório imediato, isso não traz nenhum problema. Contudo, quanto o doador é cadáver e na ausência de função inicial do enxerto, é necessária a correção imediata da trombose da fístula AV. Na grande maioria dos casos a anastomose da artéria à veia mais proximal ao local da primeira leva à recuperação imediata da fístula, permitindo o uso imediato. Naqueles casos em que há normalização da função renal do enxerto e a fístula permanece funcionando, a nossa conduta é mantê-la, pois se o doador for cadáver, a sobrevida do enxerto não é para sempre, e estudo da repercussão da persistência da FAV não mostrou malefício para o coração em nossa experiência.117
Quadro 53.19 Incidência e risco relativo dos diversos tipos de cânceres não cutâneos observados em 6.596 receptores de transplante renal na Austrália e Nova Zelândia TIPO DE CÂNCER
TRANSPLANTADOS
NÃO TRANSPLANTADOS
RISCO RELATIVO
Genito-urinário Trato digestivo Linfoma SNC Não-Hodgkin difuso Trato respiratório Leucemia Mama Sarcoma de Kaposi Endócrino Miscelânea
156 (34%) 90 (20%) 54 (12%) 16 38 40 (9%) 22 (5%) 26 (6%) 14 (3%) 9 (2%) 48 (10%)
35,9 35,8 0 0 5,1 19,9 3,9 20,6 0 0 10,5
4,3 2,5 ⬎ 1000 10,6 7,4 2,0 5,6 1,3 ⬎ 1000 289 4,6
459
131,7
3,5
TOTAL
970
Manejo Clínico do Transplante Renal
CONSIDERAÇÕES GERAIS O seguimento de um paciente transplantado exige algumas rotinas estabelecidas após muitos anos de experiência. O paciente que tem evolução inicial normal, como foi anteriormente descrito, necessita de dosagem diária da creatinina sérica, até esta atingir seu valor normal, que ocorre no segundo dia pós-operatório, pois a primeira crise de rejeição ocorre por volta do sexto dia pós-transplante. Em pacientes que recebem azatioprina e micofenolato mofetil, é necessário hemograma ⫹ plaquetas a cada três dias. Uma vez por semana, durante o período de internação, são necessários os seguintes exames: TGP; gama GT, cálcio, fósforo, glicemia, urina I, cultura de urina e dosagem de ciclosporina ou tacrolimus. Antes da alta hospitalar são necessários um ecodoppler e ultra-sonografia do rim transplantado. Pacientes sem rejeição na fase inicial estão em condições de alta por volta do oitavo dia PO. Quando ocorre uma crise de rejeição, esse tempo é aumentado para o 15.º PO, em média. Os pacientes que evoluem em IRA diálise-dependente não necessitam de controle da creatinina diária, apenas dosagem de sódio, potássio e uréia uma ou duas vezes por semana para avaliação da quantidade de diálise. Para os outros exames o mesmo esquema deve ser mantido. Determinação de DHL é útil, pois na presença de NTA isquêmica raramente os valores ultrapassam 1.500U; contudo, já observamos casos com valores superiores a 2.000U.118 O paciente que não urina no pós-transplante é aquele de mais difícil controle. Tem indicação absoluta de realização de ecodoppler. Se mostrar fluxo presente, mesmo com os índices aumentados, é indicativo de NTA; se observarmos velocidade de fluxo aumentada quando a anastomose arterial é do tipo término-terminal, isso indica estenose da artéria renal. O diagnóstico de rejeição é bastante difícil. Deve basear-se nos métodos auxiliares, embora nenhum deles seja ideal, uma vez que a biópsia é fundamental. Percentagem variável de falsos positivos e falsos negativos é observada, dependendo da publicação.46 Após a alta hospitalar o paciente deve ser visto nos próximos três meses uma vez por semana, sendo necessária a avaliação de creatinina sérica, urina I e hemograma, se estiver usando azatioprina ou MMF e dosagem de ciclosporina ou FK a cada 3 a 4 semanas. Nessa fase pelo menos uma vez por mês é necessário determinação de TGP e gama GT, cálcio e fósforo. Do quarto ao sexto mês pós-transplante as consultas devem ser duas vezes por mês e após esse período, mensais. Após um ano podemos controlar os pacientes a cada três meses e após dois anos, a cada quatro a seis meses. Na fase tardia pós-transplante pode ocorrer rejeição, e nessas situações é comum a não-aderência à imunossupres-
são,119,120 principalmente em jovens e pessoas de classe sócio-econômica baixa. Esse é um fator importante de perda do enxerto em longo prazo, e todo esforço deve ser feito para evitá-lo; além das orientações, (pela enfermagem e pelos médicos) os pacientes, durante a fase de internação recebem um manual em que, em termos simples e compreensíveis, procuramos passar todos os cuidados e condutas que ele deve obedecer. No seguimento do paciente a longo prazo pós-transplante, este deve ser visto de uma maneira global, pois existem problemas que exigem medidas terapêuticas profiláticas. Avaliação cardiológica pelo ecocardiodoppler deve ser feita, e a hipertrofia miocárdica, se presente, deve ser tratada. Avaliação dos níveis de triglicérides, colesterol e frações é importante, pois além da implicação na gênese da arteriosclerose, esses níveis estão também relacionados à rejeição crônica. As ultra-sonografias dos rins transplantados e dos rins primitivos são necessárias, pois podemos diagnosticar obstrução sem comprometimento funcional, e ainda existe possibilidade do surgimento de tumor maligno nos rins primitivos. Avaliação das enzimas hepáticas e sorologia para hepatite são necessárias, pois pode ocorrer contaminação na fase de internação, e podem ser usadas também para seguimento das alterações já presentes. Avaliação do esqueleto através da densitometria óssea é necessária, principalmente em pacientes mais idosos.
Pontos-chave: • O paciente que tem evolução inicial normal necessita de dosagem diária da creatinina sérica até esta atingir seu valor normal, que ocorre no segundo dia pós-operatório • A primeira crise de rejeição ocorre por volta do sexto dia pós-transplante • Em pacientes que recebem azatioprina e micofenolato mofetil é necessário hemograma ⫹ plaquetas a cada três dias • Pacientes sem rejeição na fase inicial estão em condições de alta por volta do oitavo dia PO • Na fase tardia pós-transplante pode ocorrer rejeição, e nessas situações é comum a nãoaderência à imunossupressão • Nos pacientes que são transplantados em diálise peritoneal, com cateter de Tenckhoff, este deve ser removido na segunda semana pós-transplante, quando a evolução for normal
capítulo 53
Nos pacientes que são transplantados em diálise peritoneal, com cateter de Tenckhoff, este deve ser removido na segunda semana pós-transplante, quando a evolução for normal. O fechamento da fístula arteriovenosa não é necessário, a não ser nos raros casos de fístula de braço e com alto fluxo, com repercussão cardíaca.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. RAMOS, E.L. Recurrent diseases in the renal allograft. J Am Soc Nephrol, 2:109-121, 1991. 2. SCHEIMMAN, J.I.; NAJARIAN, J.S.; MAUER, S.M. Successfull strategies for renal transplantation in primary oxalosis. Kidney Int, 25:804-811, 1984. 3. PENN, I. The effect of immunosuppression on pre-existing concers. Transplantation, 55:742-747, 1993. 4. BUZZAS, G.R.; SHIELD III, C.F.; PAY, N.T. et al. Use of gadoliniumenhanced, ultrafast, three-dimensional, spoiled gradient-echo magnetic resonance angiography in the preoperative evaluation of living renal allograft donors. Transplantation, 64:1734-1737, 1997. 5. KAUFFMAN, H.M.; McBRIDE, M.A.; DELMONICO, F.L. First report of the united network for organ sharing transplant tumor registry: donors with a history of cancer. Transplantation, 70:17471751, 2000. 6. IANHEZ, L.E.; MACHADO, D.J.B. Hepatopatia e transplante renal. In Ianhez, L.E. (ed) Transplante Renal – Aspectos Clínicos e Práticos. São Paulo. Laboratório Roche. Cap. III pp. 95-116, 2001. 7. FUSTER, D.; MAGRINÁ, J.; RICART, M.J. et al. Noninvasive assessment of cardiac risk in type I diabetic patients being evaluated for combined pancreas-kidney transplantation using dipyridamoleMIBI perfusion tomographic scintigraphy. Transpl Int, 13:327-332, 2000. 8. NAHAS, W.C. Efeito da enterocistoplastia na evolução do paciente submetido a transplante renal. Tese de Livre-Docência, FMUSP, 1998. 9. BELZER, F.O.; SOUTHARD, J.H. Principles of solid-organ preservation by cold storage. Transplantation, 45:673-676, 1988. 10. IANHEZ, L.E.; CHOCAIR, P.R. Cuidados pré-operatórios em pacientes nefropatas. J Bras Nefrol, 21:171-176, 1999. 11. LEE, T.H. Editorial. Reducing cardiac risk in non-cardiac surgery. N Engl J Med, 341:1838-1840, 1999. 12. KASISKE, B.A.; CHAKKERA, H.A.; LOUIS, T.A. et al. A meta-analysis of immunosupression withdrawal trials in renal transplantation. J Am Soc Nephrol, 11:1910-1917, 2000. 13. DAVID-NETO, E.; FURUSAWA, E.A.; SCHWARTZMAN, B.S. et al. Correlação entre parâmetros da farmacocinética da ciclosporina neoral e seus efeitos adversos em transplante renal pediátrico. J Bras Nefrol, 20:186, 1998. 14. YAMANI, M.H.; STARLING, R.C.; GOORMASTIC, M. et al. The impact of routine mycophenolate mofetil drug monitoring on the treatment of cardiac allograft rejection. Transplantation, 69:2326-2330, 2000. 15. OPELZ, G. and DÖHLER, B. Critical threshold of azathioprine dosage for maintenance immunosupression in kidney graft recipients. Transplantation, 69:818-821, 2000. 16. SHAPIRO, R. Tacrolimus in renal transplantation. A review. Graft, 3:64-80, 2000. 17. BUYSMANN, S.; HACK, C.E.; DIEPEN, F.N.J.V. et al. Administration of OKT3 as a two-hour infusion attenuates first-dose side effects. Transplantation, 64:1620-1623, 1997. 18. KAHAN, B.D.; RAJAGOPALAN, P.R.; HALL, M. Reduction of the occurrence of acute cellular rejection among renal allograft recipients treated with basilimab, a chimeric anti-interleukin-2-receptor monoclonal antibody. Transplantation, 67:276-284, 1999.
971
19. NASHAN, B.; LIGHT, S.; HARDIE, I.R. Reduction of acute renal allograft rejection by daclizumab. Transplantation, 67:110-115, 1999. 20. GOLLONDA, M.S.; RAYHILL, S.C.; HUMSICKEM, L.G. Daclizumab permits delayed introduction of calcioneurin inhibitors in renal transplant recipients at risk for delayed graft function. Transplantation, 69:158, 2000. 21. MICAN, N.; PAVLAKIS, M.; ACTREY, E. et al. A two-dose regimen of Daclizumab (Zenapax®) in high-risk renal transplant recipients. Abstracts AST Eighteenth Anual Meeting. Chicago: 311, 1999. 22. SAUNDERS, R.N.; METCALFE, M.S. and NICHOLSON, M.L. Rapamycin in transplantation: a review of the evidence. Kid Inter, 59:3-16, 2001. 23. DAVID-NETO, E.; PEREIRA, B.J.; LEMOS, F.B.C. et al. Introdução de micofenolato mofetil (MMF) e diminuição da dose de ciclosporina melhora a função renal na nefropatia crônica do transplante (NxTx). J Bras Nefrol, 20:187, 1998. 24. DAVID-NETO, E.; ARAÚJO, L.M.P.; LEMOS, F.B.C. et al. Mycophenolate mofetil and cyclosporin-a dose reduction for children with chronic transplantation nephropathy. Pediatric Transplantation, 2000; no prelo. 25. KRIESCHE, H.U.M.; OJO, A.; HANSON, J. et al. Increased immunosuppressive vulnerability in elderly renal transplant recipients. Transplantation, 69:885-889, 2000. 26. DAVID-NETO, E.; FONSECA, J.A.; PAULA, F.J. et al. Is azathioprine harmful to chronic viral hepatitis in renal transplantation? A longterm study on azathioprine withdrawal. Transpl Proc, 31: 1149-1150, 1998. 27. ELLI, A.; RIVOLTA, R.; PALO, F.Q. et al. A randomized trial of deflazacort versus 6. Metilprednisolona in renal transplantation. Immunosuppressive activity and side effects. Transplantation, 55:209211, 1993. 28. KAHAN, B.D. Cyclosporine. N Engl J Med, 321:1725-1738, 1989. 29. MOROZUMI, K.; THIEL, G.; ALBERT, F.W. et al. Studies on morphological outcome of cyclosporine associated arteriopathy after discontinuation of cyclosporine in renal allograft. Clin Nephrology, 38:1-8, 1992. 30. LODEFOGED, S.D.; ANDERSEN, C.B. Calcium channel blockers in kidney transplantation. Clin Transplantation, 8:128-133, 1994. 31. DAVID-NETO, E.; FURUSAWA, E.A.; SCHWARTZMAN, B.S. et al. Correlação entre parâmetros da farmacocinética da ciclosporina neoral e seus efeitos adversos em transplante renal pediátrico. J Bras Nefrol, 20:186; 1998. 32. COCKBURN, I.T.R.; KRUPP, P. An appraisal of drug interaction with sandimmun. Transpl Proc, 21:3845-3850, 1989. 33. MENEGAZZO, L.A.; URSICH, M.J.M.; FUKUI, R.T. et al. Mechanism of the diabetogenic action of cyclosporin A. Horm Metab Res, 30:663667, 1998. 34. BUNGARDNER, G.L.; MATAS, A.J. Transplantation pregnancy. Transplant Rev, 6:139-145, 1992. 35. NORONHA, I.L.; OLIVEIRA, A.C.; ARAÚJO, M.R.T. et al. Micofenolato mofetil (MMF) em transplante de órgãos. J Bras Nefrol, 19:398406, 1997. 36. OJO, A.O.; MEIER-KRIESCHE, H.U.; HANSON, J.A. et al. Mycophenolate mofetil reduces late renal allograft loss independent of acute rejection. Transplantation, 69:2405-2409; 2000. 37. The mycophenolate mofetil renal refractory rejection study group. Mycophenolate mofetil for the treatment of refractory acute cellular renal transplant rejection. Transplantation, 61:722-727, 1996. 38. HUESO, M.; BOVER, J.; SERÓN, D. et al. Low-dose cyclosporine and mycophenolate mofetil in renal allograft recipients with suboptimal renal function. Transplantation, 66:1727-1731, 1998. 39. SHAPIRO, R.; JORDAN, M.L.; SCANTLEBURY, V.P. et al. A prospective, randomized trial of tacrolimus/prednisone versus tacrolimus/prednisone/mycophenolate mofetil in renal transplant recipients. Transplantation, 67:411-415, 1999. 40. LASKOW, D.A.; NEYLAN, J.F.; SHAPIRO, R.S. et al. The role of tacrolimus in adult kidney transplantation: a review. Clin Transplantation, 12:489-503, 1998.
972
Manejo Clínico do Transplante Renal
41. WITZKE, O.; BECKER, G.; ERHARD, J. et al. Tacrolimus rescue therapy in patients with rejection and long-term dialysis after kidney transplantation. Clinical Nephrology, 49:24-27, 1998. 42. POWELSON, J.A.; COSIMI, A.B. Antilymphocyte globuline and monoclonal antibodies. In Morris, P.J. Kidney Transplantation Principles and Practice. London, WB Saunders Company, 4:215-232, 1994. 43. CHATENOUD, L.; BACH, J.F. Selective immunosupression with anti-cell monoclonal antibodies. Clinical Nephrology, 38 suppl 1:553560, 1992. 44. ALLOWAY, R.; KOTB, M.; HATHAWAY, D. et al. The pharmacokinetic profile of standard and low-dose OKT3 induction immunosuppression in renal transplant recipients. Transplantation, 58:249-253, 1994. 45. HAKIM, R.M.; WINGARD, R.L.; PARKER, R.A. Effect of the dialisis membrane in the treatment of patients with acute renal failure. N Engl J Med, 331:1338-1342, 1994. 46. DANTAS, M.; COSTA, R.S.; FERRAZ, A.S. Monitorização do transplante renal: revisão dos métodos de investigação da disfunção do enxerto. J Bras Nefrol, 16:161-169, 1994. 47. SABBAGA, E. 1000 transplantes renais: vinte anos de experiência. Tese. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, SP: 1987. 48. CURTIS, J.J. Hypertension and kidney transplantation. Am J Kidney Dis, 7:181-196, 1986. 49. TEIXEIRA, M.B.C.; NAHAS, W.C.; MAZZUCCHI, E. et al. Role of the peripheral renin profile in predicting blood pressure control after bilateral nephrectomy in renal-transplant patients. Nephrol Dial Transpl, 13:2092-2097, 1998. 50. NAVARRO, J.F.; GARCÍA, J.; GARCÍA, M. et al. Effects of losartan on the treatment of posttransplant erythrocytosis. Clinical Nephrology, 49:370-372, 1998. 51. IANHEZ, L.E.; PAULA, F.J. Alta prevalência de dislipemia póstransplante renal e seu tratamento. J Bras Nefrol, 20:Supl I 81, 1998. 52. RODRIGUES ALVES, C.A.; SABBAGA, E.; CHOCAIR, P.R. Ophtalmological fundings in renal transplant patients. Rev Bras Oftal, 35:205-209, 1976. 53. BIRKELAND, S.A. Steroid-free immunosuppression after kidney transplantation with antithymocyte globulin induction and cyclosporine and mycophenolate mofetil maintenance therapy. Transplantation, 66:1207-1210, 1998. 54. IANHEZ, L.E.; FONSECA, J.A.; CHOCAIR, P.R. et al. Polycythemia after kidney transplantion. Clin Urol, 32:382-386, 1977. 55. TORREGROSA, J.V.; CAMPISTOL, J.M.; MONTESSINOS, M. et al. Efficacy of captopril on post transplant erythocytoses. Transplantation, 58:311-314, 1994. 56. BAKIS, G.L.; SAUTER, E.R.; HUSSEYS, J.L. Effects of theophylin on erythropoietin prodution in normal subjects and in patients with erythrocytosis after renal transplantation. N Engl J Med, 86:323-329, 1990. 57. BIESENBACH, G.; JANKO, O.; HUBMAN, R. et al. The incidence of thorombovenous and thromboembolic complications in kidney transplant patients with recurrent glomerulonephritis is dependent on the occurrence of severe proteinuria. Clinical Nephrology, 54:382387, 2000. 58. VAN LOO, A.; VANHOLDER, R.; BERNAERT, P. et al. Recombinant human erythropoietin corrects anaemia during the first weeks after renal transplantation: a randomized prospective study. Nephrol Dial Transplant, 11: 1815-1821, 1996. 59. JULIAN, B.A.; QUARIES, L.D.; NIEMANN, W. Musculoskeletal complications after renal transplantation: Pathogenesis and treatment. Am J Kidney Dis, 19:99-120, 1992. 60, D’ALESSANDRO, A.M.; MELZER, J.S.; PIRSCH, J.D. et al. Tertiary hiperparathyroidism after renal transplantation: operative indications. Surgery, 106:1049-1055; 1989. 61. MACHADO, D.J.B.; PAULA, F.J.; SABBAGA, E. et al. Hyperhomocysteinemia in chronic stable renal transplant patients. Rev Hosp Clín, Fac Med S Paulo, 55:161-168, 2000. 62. DANTAL, J.; GIRAL, M.; HOORMANT, M. et al. Glomerulonephritis recurrences after kidney transplantation. Current Opinion in Nephrology and Hypertension, 4:146-154, 1995.
63. INGULLI, E.; TEJAN, A.; BUTT, K.M.H. High dose cyclosporine therapy in recurrent nephrotic syndrome following renal transplantation. Transplantation, 49:219-221, 1990. 64. KAWAGUCHI, H.; HATTORI, M.; ITO, K. et al. Recurrence of focal glomerulosclerosis of allograft in children: The efficacy of intensive plasma exchange therapy before and after renal transplantation. Transplant Proc, 26:7-8, 1994. 65. KERHAW, D.B.; SEDMAN, A.B.; KELSDI, R.C. et al. Recurrent focal segmental glomerulosclerosis in pediatric renal transplant recipients: successful treatment with oral cyclophosfamide. Clin Transplantation, 8:546-549, 1994. 66. CHOCAIR, P.R.; TZANO-MARTINS, C.; SILVA, R.N.C. et al. Does plasmapheresis plus triplex therapy with mycophenolate mofetil play a role in focal segmental glomerulosclerosis (FSGS) prophylaxis in renal allografts? No prelo. 67. WINN, M.P.; ALKUHUNAIZI, A.M.; BENNETT, W.M. et al. Focal segmental glomerulosclerosis: a need for caution in live-related renal transplantation. Am J Kidney Dis, 33:970-974, 1999. 68. IANHEZ, L.E.; PAULA, F.J.; NAHAS, W.C. et al. Análise das causas de perda do enxerto e do óbito de 881 transplantes renais de 1983 a 1990 na Universidade de São Paulo, Brasil. Nefrologia Latinoamericana, 2:244-250, 1995. 69. IANHEZ, L.E.; PAULA, F.J.; SALDANHA, L.B. et al. Rejeição humoral com prova cruzada negativa: análise de 31 casos. J Bras Nefrol, 13:159-165, 1991. 70. CASTRO, M.C.R.; DAVID, D.S.R.; SALDANHA, L.B. et al. Acute vascular rejection: a clinical and morphological study. Transpl Int, 11:15-18, 1998. 71. PASCUAL, M.; SAIDMAN, S.; TOLKOFF-RUBIN, N. et al. Plasma exchange and tacrolimus/mycophenolate rescue for acute humoral rejection in kidney transplantation. Transplantation, 66:1460-1464, 1998. 72. SCHWEITZER, E.J.; WILSON, J.S.; FERNANDEZ-VINA, M. et al. A high panel-reactive antibody rescue protocol for cross-matchpositive live donor kidney transplants. Transplantation, 70:1531-1536, 2000. 73. LUCCHIARI, N.; PANAJOTOPOULOS, N.; XU, C. et al. Antibodies eluted from acutely rejected renal allografts bind to and activate human endotelial cells. Human Immunology, 61:518-527, 2000. 74. KALIL, J.; GUILHERME, L.; NEUMANN, J. et al. Humoral rejection in two HLA identical living related donor kidney transplants. Transplant Proc, 21:711, 1989. 75. YARD, B.; SRUYT-GERRITSE, M.; CLAAS et al. The clinical significance of allospecific antibodies against endothelial cells detected with an antibody-dependent cellular cytotoxicity assay for vascular rejection and graft loss after renal transplantation. Transplantation, 55:1287-1293, 1993. 76. GUTTMANN, R.D.; SOULILOU, J.P. Definitions of acute rejection and controlled clinical trials in the medical literature. Am J Kidney Dis, 31:3-6, 1998. 77. SOLEZ, K.; AXELSEN, R.A.; BENEDIKTSSON, H. et al. International standardization of criteria for the histologic diagnosis of renal allograft rejection: the Banff working classification of kidney transplant pathology. Kidney Int, 44:411-422, 1993. 78. SOLEZ, K.; BENEDIKTSSON, H.; CAVALLO, T. et al. Report of the third Banff conference on allograft pathology on classification and lesion scoring in renal allograft pathology. Transplant Proc, 28:441444, 1996. 79. RACUSEN, L.C.; SOLEZ, K.; COLVIN, R.B. et al. The Banff 97 working classification of renal allograft pathology. Kidney Int, 55:713723, 1999. 80. MAZZUCCHI, E.; LUCON, A.M.; NAHAS, W.C. et al. Histological outcome of acute cellular rejection in kidney transplantation after treatment with methylprednisolone. Transplantation, 67:430-434, 1999. 81. WITZKE, O.; BECKER, G.; ERHARD, J. et al. Tacrolimus rescue therapy in patients with rejection and long-term dialysis after kidney transplantation. Clinical Nephrology, 49:24-27, 1998.
capítulo 53
82. The Mycophenolate Mofetil acute renal rejection study group: Mycophenolate Mofetil for the treatment of a first acute renal allograft rejection. Transplantation, 65:235-241, 1998. 83. BECKER, T.; BECKER, B.M.; KENECHTLE, S.J. et al. Treatment of steroid resistent rejection with a novel anti B-Cell preparation, Rituximab. Transplantation, 69:362, 2000. 84. NICKELEIT, V.; VAMVAKAS, E.C.; PASCUAL, M. et al. The prognostic significance of specific arterial lesions in acute renal allograft rejection. J Am Soc Nephrol, 9:1301-1308, 1998. 85. PELLETIER, R.P.; MITCHELL, F.C.; GINNY, L.H. et al. Acute rejection following renal transplantation. Evidence that severity is the best predictor of subsequent graft survival time. Clin Transplantation, 12:543-552, 1998. 86. RUSH, C.; NICKERSON, P.; GOUGH, J. et al. Beneficial effects of treatment of early subclinical rejection: a randomized study. J Am Soc Nephrol, 9:2129-2134, 1998. 87. VEREERSTRAETEN, P.; ABRAMOWICZ, D.; PAUW, L. et al. Absence of deleterious effect on long-term kidney graft survival of rejection episodes with complete functional recovery. Transplantation, 63:1739-1743, 1997. 88. CANTAROVICH, D.; SOULILOU, J.P. Efficacy endpoints conference on acute rejection in kidney transplantation: review of the conference questionnaire. Am J Kidney Dis, 31:26-30, 1998. 89. GUTTMANN, R.D.; SOULILOU, J.P.; MOORE, L.W. et al. Proposed consensus for definitions and endpoints for clinical trials of acute kidney transplant rejection. Am J Kidney Dis, 31:40-46, 1998. 90. GABER, A.O.; MOORE, L.W.; SCHROEDER, T.J. Observations on recovery of renal function following treatment for acute rejection. Am J Kidney Dis, 31:47-59, 1998. 91. IANHEZ, L.E.; MARTIN, L.Q.; SALDANHA, L.B. et al. Rejeição crônica como causa de perda do enxerto renal. J Bras Nefrol, 15:59-65, 1993. 92. PILMORE, H.L.; PAINTE, D.M.; BISHOP, G.A. et al. Early up-regulation of macrophages and myofibroblasts. Transplantation, 69:26582669, 2000. 93. KASISKE, B.L.; LAKATUA, D.A.; MA, J.Z. et al. A meta-analysis of the effects of dietary protein restriction on the rate of decline in renal function. Am J Kidney Dis, 31:954-961, 1998. 94. WISSING, K.M.; ABRAMOWICZ, D.; BROEDERS, N. et al. Hypercholesterolemia is associated with increased kidney graft loss caused by chronic rejection in male patients with previous acute rejection. Transplantation, 70:464-472, 2000. 95. TUFVESON, G.; JOHNSSON, C. Hypercholesterolemia is associated with increased kidney graft loss caused by chronic rejection in male patients with previous acute rejection. Transplantation, 70:412413, 2000. 96. DANOVITCH, G.M. Immunosuppressant induced metabolic toxicities. Transplantation Reviews, 14:65-81, 2000. 97. PENN, I. Neoplasms in the allograft recipient. In Milford, E.L.; Brenner, B.M.; Stein, J.H. (eds.) Renal Transplantation, New York, Churchill Livingstone, 181-195, 1989. 98. IANHEZ, L.E. Pacientes com mais de dez anos de transplante renal: uma análise clínica, laboratorial e histológica. Tese de LivreDocência. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, 1987. 99. BIRHKELAND, A.S. Cancer in transplanted patients. The scandiatransplant material. Transplant. Proc., 15:1071-1078, 1983. 100. PENN, I. Malignances associated with immunosuppressive or cytotoxic therapy. Surgery, 83:492-502, 1978. 101. SHEIL, A.G.R.; MALNONEY, J.F.; HORVATH, J.S. et al. Cancer following cadaveric donor renal transplantation. Transplant Proc, 13:733-735, 1981. 102. SHEIL, A.G.R.; DISNEY, A.P.S.; MATHEW, T.G. et al. Malignancy following renal transplant. Transplant Proc, 24:1946-1947, 1992.
973
103. IANHEZ, L.E.; DE PAULA, F.J. Neoplasias malignas e transplante renal. In IANHEZ, L.E. (ed.) Transplante Renal – Aspectos Clínicos e Práticos. São Paulo. Laboratórios Roche. Cap. IV; 117-144, 2001. 104. BOYLE, J.; BRIGGS, J.D.; MOC KIE, R.M. et al. Cancer, waits, and sunshine in renal transplant patients. Lancet, 1:702-705, 1984. 105. PESTON, D.S.; STERN, R.S. Medical progress: on melanoma cancer of the skin. N Engl J Med, 327:1649-1662, 1992. 106. FUKUDA, M.; AIKAWA, I.; OHMORI, Y. Chromosome aberration in kidney transplant, recipient. Transplant. Proc., 19:2245-2247, 1987. 107. MALESNIK, M.A.; MAKOUCKEA, L.; STORGE, E. The diagnosis and treatment of post transplant lymphoproliferative disorders. Curr Prob Surg, 25:371-377, 1988. 108. PENN, I. Imunosuppression — a contributory factor in lymphoma formation. Clin Transplant, 6:214-219, 1992. 109. POCK, E.; OPPSEENHEIN, F.; RIO, R. et al. Reinstitution of imunosuppressive after remission of Kaposi sarcoma. Transplantation, 54:162-163, 1992. 110. SHEIL, A.G.R.; FLOVEL, S.; DISNEY, A.P.S. et al. Cancer development in patients progressing to dialysis and renal transplantation. Transplant Proc, 18:1685-1689, 1985. 111. SUTHERLAND, G.A.; GLASS, J.; GABRIEL, R. Increased index of malignancy in chronic renal failure. Nephrol, 18:182-18, 1977. 112. SHEIL, A.G.R. Cancer in dialysis and transplant patients. In Morris, P.J. (ed.) Kidney Transplantation, 4th ed. Philadelphia, W.B. Saunders Company, 390-400, 1977. 113. WILSON, R.E.; HAGER, E.B.; HAMPERS, C.L. et al. Immunology rejection of human cancer transplanted with a renal allograft. N Engl J Med, 278:479-481, 1968. 114. COLQUHOUN, S.D.; ROBERT, M.E.; SHAKED, A. et al. Transmission of CNS malignancy by organ transplantation. Transplantation, 7:970-978, 1994. 115. DETRY, O.; HOMORE, P.; MEURISSE, M. et al. Malignancy transplantation with graft: do patients with primary central nervous system tumours have to be excluded from donor pool? Transplant Int, 10:83-84, 1997. 116. MAZZUCCHI, E.; NAHAS, W.C. and MACHADO, M.G. et al. Allograft nephrectomy: evaluation of 70 cases. Brazilian Journal of Urology, 26:163-170, 2000. 117. DE LIMA, J.J.G.; VIEIRA, M.L.C.; MOLNAR, L.J. et al. Cardiac effects of persistent hemodialysis arteriovenous access in recipients of functional renal allograft. Cardiology, 92:236-239, 1999. 118. PAULA, F.J.; IANHEZ, L.E. Desidrogenase láctica (DHL) e evolução imediata do transplante renal com doador cadáver. JBT, 109-113, 1998. 119. KILY, D.J.; LAM, C.S.; PALLAK, R. A study of treatment compliance following kidney transplantation. Transplantation, 55:51-56, 1993. 120. FRAZIER, P.; DAVIS-ALI, S.; DAHIL, K. Correlates of monocompliance among renal transplant recipients. Clin Transplantation, 8:550557, 1994.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET http://www.transweb.org/qa/qa-txp/faq-kidney.html — Perguntas freqüentes sobre transplante de rim. http://www.nlm.nih.gov/medlineplus/kidneytransplantation.html — MEDLINE plus Health Information on Kidney Transplantation. http://www.niddk.nih.gov/health/kidney/summary/transpla/ transpla.htm — National Kidney and Urologic Diseases Information Clearinghouse. http://www.kidney.ca/trns-e.htm — National Kidney Foundation of Canada. http://www.abto.com.br/ — Associação Brasileira de Transplante de Órgãos.
Capítulo
54
Infecções em Transplante Renal Henry de H. Campos, Mário Abbud Filho, Christophe Legendre e Henri Kreis
INTRODUÇÃO
A nefropatia por poliomavírus. Outros vírus
FATORES QUE FAVORECEM A INFECÇÃO A intensidade do estado de imunossupressão Agentes patógenos, infecções oportunistas A CRONOLOGIA DAS INFECÇÕES APÓS TRANSPLANTE
AS INFECÇÕES BACTERIANAS As infecções urinárias As infecções por micobactérias As infecções por Nocardia Outras bactérias
RENAL Infecções no primeiro mês pós-transplante
AS INFECÇÕES FÚNGICAS
Entre 1 e 4 meses pós-transplante
AS INFECÇÕES PARASITÁRIAS
Após o sexto mês pós-transplante AS INFECÇÕES VIRAIS A infecção pelo citomegalovírus (CMV)
Pneumocystis carinii Strongyloides stercoralis Toxoplasma gondii
A infecção pelo vírus Epstein-Barr (EBV)
CONCLUSÃO
Outros vírus do grupo Herpesviridae
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
As hepatites virais B e C
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET
A infecção pelo vírus HIV
INTRODUÇÃO Nas últimas três décadas o transplante renal evoluiu da condição de procedimento cirúrgico experimental à situação de tratamento consagrado da insuficiência renal crônica terminal, com notável melhora na sobrevida de órgãos transplantados e de receptores.1 Essa evolução deve-se, sobretudo, ao advento de novos agentes imunossupressores e à sua utilização mais racional, bem como ao melhor tratamento e prevenção das complicações infecciosas.2 Apesar do considerável progresso no seu controle entre receptores de transplante renal, os episódios de infecção continuam a ser observados em mais de dois terços dos pacientes,3,4 sendo uma das causas primordiais de morbidade,5 mortalidade6 e perda de enxertos.7 Nessa população as infecções são, freqüentemente, eventos de alta complexidade e envolvem múltiplos agen-
tes patógenos. Como veremos no decorrer deste capítulo, muitas particularidades definem o risco de infecção no receptor de transplante renal. O tratamento imunossupressor é um elo inseparável entre infecção e rejeição. Medidas que reduzam a incidência de infecções permitem a utilização mais segura de imunossupressão mais intensa para prevenir ou tratar a rejeição. De modo análogo, qualquer estratégia que diminua a incidência e a gravidade da rejeição permite que uma menor imunossupressão seja utilizada, o que se associa a menores taxas de infecção. Como será demonstrado nesta exposição, cerca de 70% das infecções graves em receptores de transplante renal ocorrem nos três primeiros meses após o transplante, sendo possível delinear-se, tendo em vista os atuais protocolos de imunossupressão, a cronologia na qual essas infecções tendem a ocorrer. Tal fato, juntamente com outras peculiaridades, deve ser considerado no desenvolvimento de estratégias de prevenção das complicações infeccio-
capítulo 54
sas, o que pode contribuir significativamente para que se obtenham melhores sobrevidas de órgãos transplantados e de seus receptores.
Pontos-chave: • Os episódios de infecção continuam a ser observados em mais de dois terços dos pacientes, sendo uma das causas primordiais de morbidade, mortalidade e perda de enxertos • Qualquer estratégia que diminua a incidência e a gravidade da rejeição permite que uma menor imunossupressão seja utilizada, o que se associa a menores taxas de infecção • Cerca de 70% das infecções graves em receptores de transplante renal ocorrem nos três primeiros meses após o transplante A adoção de medidas preventivas contra a infecção deve nortear todas as etapas de realização de um transplante renal já a partir da seleção de receptores, em que há de levar-se em conta fatores sócio-econômicos como determinantes de futuros episódios infecciosos.8 O preparo adequado dos receptores pode exigir intervenções prévias ao transplante para erradicação de possíveis focos infecciosos,9 e um screening rigoroso deve afastar, ou permitir prever, o desenvolvimento de uma infecção transmitida pelo órgão transplantado. No planejamento de um programa de transplante devem ser consideradas peculiaridades regionais,10,11 o que pode determinar a necessidade de medidas especiais de seguimento12 e avaliações periódicas de epidemiologia local.13
FATORES QUE FAVORECEM A INFECÇÃO Os principais fatores que favorecem a ocorrência de infecções nos receptores de transplante renal são a intensidade do estado de imunossupressão alcançada e, por outro lado, a exposição aos agentes patógenos da comunidade ou nosocomiais.
A Intensidade do Estado de Imunossupressão Embora resulte principalmente do tratamento imunossupressor recebido para prevenção ou tratamento da rejeição, o grau de imunossupressão também depende de vá-
975
rios outros fatores. A insuficiência renal crônica induz profundas alterações das respostas imunes humoral e mediada por células,14 não sendo a maioria dessas alterações corrigida pelo tratamento dialítico, o que torna esses pacientes particularmente sensíveis a vários agentes infecciosos, particularmente micobactérias e vírus. Freqüentemente esses pacientes são anérgicos, respondem mal à vacinação contra antígenos timo-dependentes, e a não-resposta de pacientes urêmicos à vacina contra a hepatite pelo vírus B constitui motivo de séria preocupação.15,16 A maioria desses pacientes, antes de utilizar qualquer medicação imunossupressora, apresenta linfopenia e resposta de linfócitos in vitro diminuída frente a vários estímulos.17,18 Estado nutricional deficiente ou idade avançada contribuem para intensificar a imunodepressão induzida pela uremia, o que se reflete em maior incidência de infecções após o transplante.19 Tem sido sugerido que características genéticas possam influenciar a tolerância à imunossupressão, em determinados grupos, como americanos de descendência africana, que apresentariam menor risco de morte em decorrência de infecções.20 Parece indiscutível que a incidência de infecções associa-se ao aumento do total de doses e do número de drogas utilizadas nos episódios repetidos de rejeição.21,22 Observa-se igualmente que a utilização de soros policlonais ou de anticorpos monoclonais encontra-se associada a uma maior prevalência, notadamente de infecções virais, seja quando esses agentes são usados nos protocolos seqüenciais de indução23,24 ou em tratamentos de rejeição.25 Já que essas situações configuram um risco máximo de desenvolvimento de doença clinicamente importante, recomendase a adoção de medidas preventivas em tais casos, como discutiremos oportunamente. Embora não tenha sido ainda revelado que nenhum dos agentes imunossupressores introduzidos mais recentemente na prática clínica — anticorpos anti-receptor da IL2, micofenolato mofetil, tacrolimus, sirolimus — possam ser responsabilizados isoladamente por aumentos na incidência de infecções, deve-se guardar em mente que o refinamento e a precisão que levaram à descoberta e emprego desses novos agentes favorecem a adoção de associações mais potentes nos três primeiros meses pós-transplante, o que pode alterar significativamente a prevalência de infecções. Ainda não está claro se essa imunossupressão deve ser também fortemente reduzida a longo prazo e que combinação de drogas deve ser mantida, principalmente se considerarmos o aumento na incidência de tumores em receptores de transplante e o potencial oncogênico de algumas infecções, notadamente as virais.26 Outros fatores metabólicos como uremia e, talvez, hiperglicemia também podem estar associados a uma maior ocorrência de infecções. Pode ser implicado ainda, como fator determinante da intensidade do estado de imunossupressão, o efeito imunomodulador das infecções virais, em particular o citomegalovírus (CMV) (Quadro 54.1).
976
Infecções em Transplante Renal
Quadro 54.1 Fatores que contribuem para o estado de imunossupressão do receptor de transplante renal* • Dose, duração e seqüência temporal de administração de agentes imunossupressores • Presença de granulocitopenia, lesão de superfícies mucocutâneas • Fatores metabólicos como desnutrição, uremia e, talvez, hiperglicemia • Presença de infecção viral imunomoduladora devida a CMV, vírus Epstein-Barr, vírus da deficiência imune humana adquirida e/ou vírus das hepatites *Segundo Rubin, N.E. & Rubin, R.H., 1992.
Pontos-chave: • Parece indiscutível que a incidência de infecções associa-se ao aumento do total de doses e do número de drogas utilizadas nos episódios repetidos de rejeição • A utilização de soros policlonais ou de anticorpos monoclonais encontra-se associada a uma maior prevalência, notadamente de infecções virais • Fator determinante da intensidade do estado de imunossupressão é o efeito imunomodulador das infecções virais • Outro fator determinante do risco de infecção é a exposição dos receptores de transplante a agentes patógenos de origem comunitária
Agentes Patógenos, Infecções Oportunistas Além do grau de imunossupressão a que está condicionado o paciente, outro fator determinante do risco de infecção é a exposição dos receptores de transplante a agentes patógenos de origem comunitária, como pode ocorrer nas epidemias e na reativação de germes latentes favorecida pelo tratamento imunossupressor, ou agentes de origem nosocomial, numa mesma unidade ou em diferentes unidades de hospitalização. Outra particularidade das infecções nos receptores de transplante é a ocorrência freqüente de infecções oportunistas. Segundo Rubin,27 essas infecções enquadram-se em uma das duas seguintes características: 1. invasão tecidual devida a microrganismos freqüentemente ubiqüitários no ambiente, e que são incapazes de causar mais do que uma colonização mucocutânea no hospedeiro normal; e 2. infecção disseminada, de um tipo e gravidade desconhe-
cidos no hospedeiro normal, embora o agente em questão possa produzir doença autolimitada ou localizada no indivíduo imunocompetente. Na primeira categoria enquadram-se a pneumonia por Pneumocystis carinii, a aspergilose invasiva e a meningite criptocócica. Na segunda definição encontram-se a candidíase e a histoplasmose disseminadas e a infecção disseminada por micobactérias. Ainda segundo o mesmo autor,27 no grupo de patógenos de origem comunitária capazes de determinar infecções oportunistas estão aqueles responsáveis por micoses geograficamente restritas (Blastomyces dermatitidis, Coccidioides immitis e Histoplasma capsulatum), o Mycobacterium tuberculosis (cepas sensíveis e cepas resistentes), o Strongyloides stercoralis, os vírus das hepatites B e C, o vírus da deficiência imune adquirida (HIV) e vírus respiratórios, particularmente o vírus da influenza. São bem conhecidas epidemias nosocomiais causadas por Aspergillus spp (freqüentemente associadas com construções), por Legionella spp (freqüentemente associadas com fontes de água contaminadas) e por Pseudomonas aeruginosa. Vale ainda ressaltar que, nessa população de receptores de transplante, são comuns as infecções bacterianas oportunistas por Listeria monocytogenes e por Nocardia asteroides.
A CRONOLOGIA DAS INFECÇÕES APÓS TRANSPLANTE RENAL A natureza dos agentes patógenos observados após o transplante renal varia em função do tempo, sendo possível, em função do tratamento imunossupressor utilizado, estabelecer uma cronologia dessas infecções. A Fig. 54.1 representa uma visão da cronologia proposta por Rubin,28 que continua sendo útil, mesmo em vigência de novos esquemas de imunossupressão.
Infecções no Primeiro Mês Pós-transplante Durante o primeiro mês pós-transplante são observadas, sobretudo, as infecções pós-operatórias “clássicas”, que podem assumir maior gravidade em razão da imunossupressão — infecções bacterianas ou por Candida, da ferida operatória, pulmões, cateteres venosos, bexiga, como ocorre freqüentemente em cirurgias de porte comparável em indivíduos imunocompetentes. Um fator determinante da incidência dessas infecções é o manuseio técnico inadequado da sonda endotraqueal, cateteres e linhas endovenosas, e drenos. Insuficiência renal prolongada, longos períodos de cateterização vesical, presença de hematoma pós-operatório têm sido identificados como fatores predisponentes a infecções urinárias e infecções de ferida operatória no
977
capítulo 54
CONVENCIONAIS
OPORTUNISTAS Coriorretinite por CMV
CMV VIRAIS HSV EBV, VZV, Papova, Adenovírus Hepatites B e C HHV-6, HIV, HTLV? BACTERIANAS Parede Cateter Pulmão
Listeria
Nocardia Micobactérias Infecções urinárias
Pneumocystis FÚNGICAS
Aspergillus, Cand ida, Mucormicose
1 2 TRANSPLANTE
3
4
5
Criptococo
6
Meses
Fig. 54.1 Cronologia das infecções observadas após transplante renal.
primeiro mês pós-transplante.29 História pré-operatória prévia de infecção urinária também pode ser um fator predisponente para que o episódio infeccioso se repita após o transplante.30 Há alguns anos constitui prática corrente a utilização de antibioticoterapia peroperatória, o que certamente contribuiu de modo determinante para reduzir a prevalência dessas infecções precoces. Numa enquete realizada entre 101 centros europeus de transplante renal31 verificou-se que metade deles utiliza como único antibiótico uma cefalosporina de segunda ou de terceira geração, geralmente por menos de três dias. Uma minoria desses centros mostrou utilizar uma combinação tripla de três antibióticos, sendo a combinação mais popular aquela que reúne um aminoglicosídeo, uma penicilina penicilinaseresistente e ampicilina ou um de seus derivados, administrados por apenas um dia. Infecções de duas outras origens ainda podem ser observadas nesse período inicial pós-transplante: aquelas presentes no receptor antes do transplante e que podem ser exacerbadas pela imunossupressão, e infecções envolvendo microrganismos transmitidos por um órgão contaminado, geralmente causadas por infecção do doador, já que são menos freqüentes as contaminações registradas durante a retirada ou preservação de órgãos.
Entre 1 e 4 Meses Pós-transplante Este intervalo corresponde ao período de imunossupressão máxima, sendo observadas, essencialmente, as infecções oportunistas. Entre as causas predominantes encontram-se os vírus imunomoduladores, notadamente o CMV. Além de poderem causar doença clinicamente sintomática, esses agentes virais contribuem para um estado de maior imunodepressão, o que favorece o surgimento de
superinfecções por germes oportunistas, como Pneumocystis carinii, Listeria monocytogenes e fungos.
Após o Sexto Mês Pós-transplante Um determinante importante da prevalência de infecções após o sexto mês pós-transplante é a situação funcional do enxerto. Pacientes com função renal dominuída são habitualmente aqueles que receberam maior número de tratamentos visando obter o controle do processo de rejeição. Ao efeito imunossupressor dos tratamentos múltiplos, somam-se os inconvenientes da rejeição crônica e função renal alterada, o que torna esses pacientes mais expostos à ação de vírus imunomoduladores e com risco acentuado de desenvolverem infecções oportunistas graves causadas por Cryptococcus neoformans, Pneumocystis carinii, Listeria monocytogenes e Nocardia asteroides. Diante do risco infeccioso considerável, devem-se avaliar, individualmente em pacientes com essas características, a redução da imunossupressão e o retorno à diálise. Neste grupo de pacientes é ainda mais justificada a adoção de tratamento profilático anti-Pneumocystis e anti-Cryptococcus.32-34 A maioria dos pacientes encontra-se, após o sexto mês pós-transplante, num esquema de imunossupressão mínima, com boa função renal, sem evidência de infecção viral crônica, sendo acometidos pelos mesmos tipos de infecção que atingem a população geral. A evolução do grupo de pacientes portadores crônicos de infecções virais pode ser marcada pela ocorrência de complicações graves, como a coriorretinite por CMV;35 progressão da doença hepática pelos vírus da hepatite B e da hepatite C;36-39 tumores e doenças linfoproliferativas;40,41 síndrome de deficiência imune adquirida, pelo HIV.42
978
Infecções em Transplante Renal
Deve merecer atenção especial a ocorrência de manifestações cutâneas, ligadas a fatores iatrogênicos, agentes patógenos múltiplos, podendo ser freqüentemente identificada a associação papilomavírus-lesões neoplásicas ou pré-neoplásicas.43-48
Pontos-chave: • Uma particularidade das infecções nos receptores de transplante é a ocorrência freqüente de infecções oportunistas • Durante o primeiro mês pós-transplante são observadas, sobretudo, as infecções pósoperatórias “clássicas” • Entre 1 e 4 meses pós-transplante, este intervalo corresponde ao período de imunossupressão máxima, sendo observadas, essencialmente, as infecções oportunistas • Um determinante importante da prevalência de infecções após o sexto mês pós-transplante é a situação funcional do enxerto • A maioria dos pacientes encontra-se, após o sexto mês pós-transplante, num esquema de imunossupressão mínima, com boa função renal, sem evidência de infecção viral crônica, sendo acometidos pelos mesmos tipos de infecção que atingem a população geral
AS INFECÇÕES VIRAIS As infecções virais vêm sendo descritas com freqüência crescente; novos agentes vêm sendo identificados, como os poliomavírus BK e JC, e fica bem estabelecido o potencial oncogênico de alguns agentes, como o vírus Epstein-Barr. Os vírus do grupo Herpesviridae são os responsáveis pelas infecções que constituem a principal causa isolada de morbidade e mortalidade entre receptores de transplante. CMV, vírus Epstein-Barr (EBV), vírus da varicela zoster (VZV), vírus Herpes simplex (HSV-1, HSV-2) e, provavelmente, os vírus Herpes humanos 6, 7 e 8 (HHV-6, HHV-7, HHV-8) possuem algumas características comuns que podem justificar a sua patogenicidade. Tais características dizem respeito à sua capacidade de latência, propriedade de associação celular e oncogenicidade. Como já citamos anteriormente, a capacidade de latência permite que, em ausência de replicação viral ativa, o indivíduo mantenha a condição de infecção crônica, latente. A introdução do tratamento imunossupressor desestabi-
liza esse estado de latência, favorecendo a replicação viral, que pode traduzir-se clinicamente por ocasião da reativação. A capacidade de transmissão através de contato direto de célula a célula, sob controle da imunidade mediada por células, especificamente células citotóxicas restritas ao sistema principal de histocompatibilidade (MHC), confere a esses agentes uma maior patogenicidade. O potencial oncogênico desses vírus, como também já frisado anteriormente, deve ser igualmente considerado, sendo as síndromes linfoproliferativas pós-transplante associadas ao EBV a melhor evidência clínica de que dispomos.
Pontos-chave: • Os vírus do grupo Herpesviridae são os responsáveis pelas infecções que constituem a principal causa isolada de morbidade e mortalidade entre receptores de transplante • A capacidade de latência permite que, em ausência de replicação viral ativa, o indivíduo mantenha a condição de infecção crônica, latente. A introdução do tratamento imunossupressor desestabiliza esse estado de latência, favorecendo a replicação viral
A Infecção pelo Citomegalovírus (CMV) Critérios bem definidos confirmam a patogenicidade do CMV para o homem: a demonstração de sua presença no órgão lesado, em ausência de outros patógenos; a ocorrência de doença nos indivíduos com títulos mais altos de vírus; a supressão da doença através de terapia antiviral efetiva; a reprodução da doença em modelos animais; a possível modificação da doença pela imunidade ao vírus.49 Encontram-se evidências de infecção por CMV em cerca de dois terços dos receptores de transplantes, embora a doença com manifestações clínicas não ocorra em todos os pacientes infectados.50 Parece pouco discutível atualmente que, em receptores de transplante renal, idêntico risco de infecção é observado, independente de ser o receptor ou o doador o portador do CMV.51 Observamos, por conseguinte, três tipos de infecção por CMV: primo-infecção — as células de um doador CMV soropositivo, infectadas de modo latente pelo vírus, são transmitidas a um receptor CMV soronegativo, mais comumente através do enxerto e, mais raramente, de sangue e seus derivados; reativação viral — os pacientes CMV soropositivos reativam o seu próprio vírus após o transplante; superinfecção viral — os pacientes CMV soropositivos não reativam o seu próprio vírus, mas desenvolvem uma “primo-infecção” a um outro sorotipo viral transmitido pelo doador. A prevalência da infecção por CMV pode ser influenciada pelo tratamento imunossu-
capítulo 54
pressor, notadamente com o emprego de soros policlonais e anticorpos monoclonais.52,53 O CMV pode infectar vários órgãos e tecidos, não sendo observado, ou sendo discutível em alguns deles, como glândulas salivares e rim, se o vírus causa doença local.54,55 É bem estabelecida a capacidade do CMV de atuar no pulmão como patógeno,53 bem como no fígado, retina, intestino, cérebro.54 As manifestações clínicas são diversas: mais freqüentemente, trata-se de uma febre, evocadora pelo seu aspecto e regularidade, acompanhada de cefaléia, leucopenia, trombocitopenia, citólise hepática; algumas vezes a sintomatologia é dominada pelo quadro de pneumopatia alvéolo-intersticial hipoxemiante difusa; mais raramente as manifestações digestivas estão em primeiro plano — esofagite, colite, pancreatite. Na infecção pelo CMV, associada a uma infiltração de leucócitos nos vários órgãos, também ocorre uma maior liberação de quimoquinas como IL8, MCP1, MIP-1-alfa e de moléculas de adesão, como VCAM-1, ICAM-1 e L-selectina. 56,57 O diagnóstico da infecção pelo CMV baseia-se no momento atual na detecção precoce dos antígenos virais na superfície das células infectadas — antigenemia, lavado bronquíolo-alveolar;58 na demonstração do efeito citopatogênico do vírus em fragmentos de biópsia, ou em culturas de células sanguíneas.59 Os estudos sorológicos constituem apenas métodos de apoio.60-63 A detecção do genoma viral através da reação da cadeia de polimerase, com variantes técnicas, é amplamente utilizada.64-71 A determinação da antigenemia pela detecção e quantificação do antígeno pp65 pode ser útil também para a instalação de tratamento precoce da infecção por CMV e para o seu seguimento.72 A quantificação do DNA viral, por sua vez, pode ser uma medida útil para o diagnóstico de infecção ativa por CMV em populações soro-endêmicas.73 O tratamento da infecção por CMV é, ao mesmo tempo, curativo, com ganciclovir ou valaciclovir, e, a cada dia mais, também preventivo. A utilização do ganciclovir tem proporcionado percentuais elevados de controle da infecção, sendo habitualmente obtidas concentrações plasmáticas amplamente superiores àquelas necessárias para inibir a replicação viral in vitro. A meia-vida do produto depende do grau da insuficiência renal, sendo necessários ajustes posológicos em função da taxa de filtração glomerular. Os efeitos secundários mais comumente observados são leucopenia, trombopenia e, mais raramente, dor abdominal.74-79 A elevada prevalência da infecção por CMV entre os receptores de transplante e as suas conseqüências diretas indicam a necessidade de que se desenvolva uma estratégia de prevenção nessa população de pacientes.80 As conseqüências diretas a curto prazo da infecção sintomática por citomegalovírus são: aumento da morbidade, em razão da necessidade de hospitalizar o paciente, de recorrer a exames complementares desconfortáveis e potencialmente perigosos (como a lavagem bronquíolo-alve-
979
olar), e de utilizar os medicamentos antivirais administrados por via parenteral e não desprovidos de efeitos secundários; uma mortalidade elevada, particularmente quando existe localização pulmonar (especialmente quando a ventilação mecânica torna-se indispensável), ou, mais raramente, localização pancreática ou comprometimento plurivisceral;81 enfim, um aumento do custo do transplante em razão das hospitalizações prolongadas, dos tratamentos antivirais, dos testes virológicos, cuja avaliação precisa no transplante renal ainda não está definida. A curto prazo a infecção por CMV tem também conseqüências indiretas: a indução de um estado de imunossupressão inespecífica, acompanhada de alterações tais como a diminuição da função dos macrófagos, o que explica provavelmente a associação entre infecção sintomática por CMV e pneumonia por Pneumocystis carinii, e o favorecimento à colonização das vias aéreas superiores por bacilos Gram-negativos, o que leva a um aumento das pneumonias por bacilos Gram-negativos. As relações entre o CMV e a rejeição aguda do aloenxerto continuam sujeitas a discussões: desde 1970 é evocada a possibilidade de que a rejeição possa ser desencadeada pela infecção por CMV,82 sendo também descrita uma relação temporal entre os dois eventos, o que possibilitaria a interconversão dos mesmos.83 Embora homologias de seqüência tenham sido identificadas no homem entre a cadeia beta das moléculas de histocompatibilidade de classe II e um antígeno precoce do citomegalovírus humano, o dilema das inter-relações CMV-rejeição não está ainda esclarecido.84,85 As conseqüências a médio e longo prazo da infecção por CMV, no transplante renal, ao contrário do que ocorre nos transplantes de medula86,87 e de coração,88 ainda não foram estabelecidas, notadamente quanto a uma possível participação no processo de rejeição crônica. Uma vez identificada a necessidade de estabelecer uma estratégia de prevenção, ter-se-ão como objetivos minimizar tanto quanto possível as manifestações clínicas da infecção, da doença por CMV, e reduzir ao máximo a prevalência de infecção pelo vírus. Nessa estratégia definem-se medidas de prevenção sistemática, aplicáveis a todos os receptores suscetíveis de desenvolver uma infecção por CMV, e medidas de prevenção dirigida, destinadas a uma população alvo de pacientes que apresentam risco particularmente elevado de desenvolver infecção ou doença citomegálica, como detalhado na Fig. 54.2. Em resumo, no que se refere à adoção de medidas preventivas para os receptores CMV soropositivos, várias possibilidades são oferecidas: aciclovir em altas doses, 800 mg duas a quatro vezes ao dia, de acordo com a função renal, por via oral — eficaz e bem tolerado;89 provavelmente, a utilização de protocolos imunossupressores sem anticorpos antilinfocitários poli- ou monoclonais; e, com grandes reservas quanto à indução de rejeições irreversíveis, o interferon alfa.90 Em relação aos receptores CMV soronegativos, podem ser adotadas as seguintes medidas: evitar
980
Infecções em Transplante Renal
Prevenção da transmissão Escolha dos imunossupressores PREVENÇÃO SISTEMÁTICA
Vacinação anti-CMV
Quimioprofilaxia Pacientes de risco PREVENÇÃO DIRIGIDA
acompanhado de tratamento concomitante de prevenção contra a infecção pelo CMV.72
A Infecção pelo Vírus Epstein-Barr (EBV)
Interferon alfa
Gamaglobulinas
ESTRATÉGIA DE PREVENÇÃO
Rim Sangue e derivados
Anti-CMV Standard Aciclovir Ganciclovir Combinações Previsão do risco
Aumento da As situações imunossupressão de risco Prevenção das recidivas
Fig. 54.2 Estratégia de prevenção da infecção por citomegalovírus em transplante renal.
Pontos-chave: • Encontram-se evidências de infecção por CMV em cerca de dois terços dos receptores de transplantes, embora a doença com manifestações clínicas não ocorra em todos os pacientes infectados • Observamos três tipos de infecção por CMV: primo-infecção; reativação viral e superinfecção viral • A prevalência da infecção por CMV pode ser influenciada pelo tratamento imunossupressor, notadamente com o emprego de soros policlonais e anticorpos monoclonais utilização de órgãos provenientes de doadores CMV soropositivos, mas a preço de pior compatibilidade HLA e aumento do tempo de espera; sempre, a utilização de derivados sanguíneos filtrados ou provenientes de doadores CMV soronegativos; sobretudo, a utilização de gamaglobulinas standard ou hiperimunes anti-CMV;91-93 discutível, a vacinação anti-CMV.94,95 A prevenção dirigida pode ser aplicada a pacientes que se encontram em situações de tal risco que o aumento da imunossupressão terá grandes chances de induzir o aparecimento da infecção sintomática por CMV. A utilização sistemática de ganciclovir em pacientes CMV soropositivos tem permitido reduzir significativamente a incidência de infecções sintomáticas nesse subgrupo de pacientes, por exemplo. É provável que uma apreciação precisa da “carga viral” possa ser útil na definição mais acurada das situações em que o aumento da imunossupressão deva ser
A infecção pelo EBV causa uma síndrome mononucleósica, clinicamente semelhante àquela produzida pelo CMV. Ao contrário do que ocorre no hospedeiro imunocompetente, nos receptores de transplante a faringite e a esplenomegalia são raras, sendo o quadro clínico mais comum caracterizado por febre, leucopenia, linfocitose atípica, hepatite. O aspecto mais relevante da infecção pelo EBV é a sua associação com a doença linfoproliferativa pós-transplante (PTLD).41 O vírus EBV prolifera nas células epiteliais do epitélio da faringe e secundariamente infecta os linfócitos B via o receptor C3d do sistema de complemento. No indivíduo imunocompetente, células T citotóxicas restritas ao MHC e com atividade específica anti-EBV são responsáveis pela destruição das células B imortalizadas, interrompendo assim o processo oncogênico.96 Esse mecanismo de vigilância imunológica, que normalmente elimina as células B transformadas, é bloqueado pela ação dos imunossupressores. Já nos pacientes tratados com soros antilinfocitários policlonais ou anticorpos monoclonais depletantes de células T, o mecanismo favorecedor parece ser uma maior proliferação do EBV na orofaringe, o que aumenta a probabilidade de infecção secundária das células B.97 Outros mecanismos e vias podem também favorecer a infecção, incluindo-se aí a estimulação antigênica crônica através do enxerto.98,99 As síndromes linfoproliferativas relacionadas à infecção pelo EBV têm gravidade variável, indo da proliferação policlonal benigna até o linfoma maligno, passando por múltiplas formas intermediárias. Aspectos marcantes dessas síndromes linfoproliferativas são o aumento da sua incidência, a precocidade da sua instalação — geralmente no primeiro ano pós-transplante, a freqüente localização no enxerto e no cérebro, a gravidade das formas que não respondem à interrupção dos imunossupressores e utilização de aciclovir.100 A incidência de PTLD é maior em crianças e não parece ter sido influenciada pelo surgimento de novas drogas da era pós-ciclosporina.101 O envolvimento preferencial do enxerto renal determina com freqüência a realização da nefrectomia, e, recentemente, o tratamento com rituximab, um anticorpo monoclonal humanizado dirigido contra o determinante CD-20 de linfócitos B, tem mostrado resultados promissores.102-105
Outros Vírus do Grupo Herpesviridae A varicela, doença comum da infância, costuma ser, na criança normal, uma infecção benigna. O vírus da varicela
981
capítulo 54
é endêmico na maioria das comunidades, com epidemias sazonais e uma taxa de ataque próxima a 90% em crianças suscetíveis. Na criança imunodeprimida a infecção pode disseminar-se com comprometimento visceral, causando morbidade e mortalidade elevadas, como pode ocorrer nos receptores de transplantes.106,107 Embora a utilização de gamaglobulina hiperimune específica e aciclovir possa atenuar a gravidade da doença, não fornece proteção completa, especialmente nas situações de comprometimento visceral, devendo a vacinação ser administrada às crianças suscetíveis, preferencialmente antes do transplante.108-110 A infecção por reativação do VZV é mais freqüente que a infecção primária e raramente resulta em infecção disseminada. Além dessa incidência aumentada de reativações, observa-se no zoster um comprometimento de um a três dermatomas, sendo pouco freqüentes as algias pószosterianas, sendo a regressão das lesões favorecida pelo emprego do aciclovir. O Herpes simplex (HSV), habitualmente de localização periorificial, teve sua prevalência drasticamente reduzida com a utilização profilática de aciclovir, 400 mg por dia durante três meses. As infecções, reativações recorrentes de HSV-I e HSV-II, costumam ser mais freqüentes nos receptores submetidos a tratamento com anticorpos antilinfócitos mono- ou policlonais. A exemplo da reativação assintomática que se pode observar com outros vírus do grupo Herpesviridae, o mesmo tem sido descrito em relação aos vírus Herpes humano 6 (HHV-6), Herpes humano 7 (HHV-7) e Herpes humano 8 (HHV-8). Até o momento nenhuma associação clínica significativa tem sido descrita com o HHV-7, embora tenha sido descrito recentemente como co-fator na infecção pelo CMV.111 Em relação ao HHV-6, sabe-se que a primo-infecção causa exantema súbito (roseola infantum) em crianças, sendo também associado com síndromes mononucleósicas e hepatite aguda em adultos.112-114 O espectro clínico da infecção pelo HHV-6 em receptores de transplante ainda não está bem definido, sendo controversos os dados sobre uma possível correlação entre infecção pelo HHV-6, tratamento imunossupressor e ocorrência de rejeição.115-118 Já o vírus 8 do mesmo grupo (HHV-8) tem sido associado à ocorrência de sarcoma de Kaposi em receptores de transplante renal. 119
As Hepatites Virais B e C Já nos referimos anteriormente neste capítulo à evolutividade das hepatites virais B e C nos receptores de transplante renal. As duas entidades apresentam nesses pacientes alguns pontos em comum: infecção inaugural durante o período de hemodiálise; prevalência elevada — pelo menos 25% dos pacientes possuem anticorpos antiHCV positivos e a maioria destes têm viremia positiva; risco aumentado de progressão para a cronicidade, de praticamente 100%, enquanto na população geral esse ris-
co é de 10% para a hepatite B e no máximo de 50% para a hepatite C; freqüentemente, há ausência de sintomas clínicos e biológicos; uma análise de marcadores virais às vezes inconclusiva — essa dissociação anatomoclínica impõe como conseqüência que se recorra freqüentemente à biópsia hepática, único instrumento preciso de diagnóstico.36-39 O tratamento dessas hepatites deve basear-se sobretudo em medidas preventivas, através de vacinação, no caso da hepatite B, ou medidas de isolamento, no caso da hepatite C. Em ambos os casos observam-se particularidades e/ou controvérsias. No caso da vacinação contra a hepatite B, pode-se observar um percentual considerável de nãoresposta entre os pacientes urêmicos, sendo provável que determinantes genéticos desempenhem um papel relevante nessa não-resposta.120 Ainda são controversas as opiniões quanto à utilização, em transplantes, de órgãos provenientes de doadores infectados pelo vírus da hepatite C.121 Ainda se faz necessária uma melhor avaliação dos tratamentos antivirais em termos de eficácia e tolerância, embora os primeiros ensaios com agentes como ARA-AMP e interferon alfa sugiram uma eficácia relativa semelhante à observada em pacientes não-imunodeprimidos. Um aspecto que deve merecer atenção especial é a possibilidade de indução de insuficiência renal aguda ou rejeição associada ao interferon alfa.122-124 A superinfecção pelo vírus delta (HDV) tem sido registrada muito raramente em receptores de transplante renal.125,126
A Infecção pelo Vírus HIV O problema maior que se coloca atualmente em relação ao vírus da deficiência imune adquirida é quanto à atitude a adotar em relação aos pacientes hemodialisados HIVsoropositivos assintomáticos e que desejam submeter-se a um transplante. Os dados disponíveis no momento atual incitam a não submeter esses pacientes ao transplante, embora seja impossível estabelecer um risco individual para cada paciente. As diretrizes de prevenção da transmissão são bem definidas, devendo ser enfatizada a necessidade de assegurar-se a sorologia HIV negativa do doador, algumas vezes negligenciada.127
A Nefropatia por Poliomavírus. Outros Vírus Embora menos bem estudados, outros agentes virais também podem acometer os receptores de transplantes renais: rotavírus, poliomavírus, adenovírus, influenza A.128-131 A infecção pelo poliomavírus BK vem sendo descrita recentemente como de ocorrência freqüente, caracterizada por um infiltrado linfocítico intersticial que mimetiza rejeição aguda, com número aumentado de linfócitos B
982
Infecções em Transplante Renal
(CD-20) no enxerto renal e redução de células T citotóxicas, podendo ser evidenciada a presença de inclusões virais no transplante por métodos imunoenzimáticos ou do vírus no sangue, pelas técnica de amplificação de DNA ou RNA mensageiro. A detecção do poliomavírus JC também tem sido relatada em pacientes que apresentam esse quadro. Alguns relatos sugerem que a nefropatia por poliomavírus esteja associada ao desenvolvimento da disfunção crônica do enxerto, e embora esses dados careçam de confirmação, algumas equipes de transplante recomendam a redução do tratamento imunossupressor, visando minimizar a infecção e suas conseqüências.132-137 O parvovírus humano B19, implicado na etiologia da anemia aplástica em pacientes imunossuprimidos, pode ser causa de anemia no pós-transplante e determinar microangiopatia trombótica do enxerto.138,139 A infecção por adenovírus ou pelo vírus da influenza A, geralmente de curso benigno ou de moderada gravidade em indivíduos imunocompetentes, pode ter curso fatal em receptores de transplante ou contribuir para a síndrome hemolítico-urêmica.140,141
podem ser responsáveis por cistites banais ou uretrites, mas também por pielonefrites no rim transplantado, graves porque pouco sintomáticas e em particular indolores, ou por septicemias. A conduta diante de uma infecção urinária num receptor de transplante renal consiste em: • procurar sistematicamente sinais de pielonefrite — febre, calafrios, insuficiência renal aguda, recorrendo em casos de dúvida a uma tomodensitometria, ou até mesmo a uma biópsia renal; • pesquisar com precaução toda anomalia urológica (o refluxo vésico-ureteral, em particular) ou ginecológica, capaz de explicar ou favorecer as recidivas; • considerar sistematicamente a responsabilidade potencial dos rins nativos na gênese das recidivas; • eliminar, na medida do possível, o cateterismo uretral, fonte de prostatites; • tratar apenas as infecções urinárias sintomáticas, adaptando o tratamento aos dados do antibiograma.
As Infecções por Micobactérias Pontos-chave: • O aspecto mais relevante da infecção pelo EBV é a sua associação com a doença linfoproliferativa pós-transplante (PTLD) • A incidência de PTLD é maior em crianças e não parece ter sido influenciada pelo surgimento de novas drogas da era pósciclosporina • Embora menos bem estudados, outros agentes virais também podem acometer os receptores de transplantes renais: rotavírus, poliomavírus, adenovírus, influenza A
AS INFECÇÕES BACTERIANAS A antibioticoterapia profilática pré-operatória é de grande importância. Não serão objeto de nossa exposição as infecções convencionais registradas no período pós-operatório imediato. Ressaltamos, no entanto, a importância determinante da antibioticoterapia profilática pré-operatória, em geral ativa contra S. aureus e os bacilos Gram-negativos, que reduziu drasticamente, ao final dos anos 70, a incidência de infecções de parede, fontes de morbidade e de hospitalizações prolongadas.
As Infecções Urinárias As infecções bacterianas observadas com maior freqüência em transplante renal são as infecções urinárias. Elas
As infecções por micobactérias são cerca de 100 vezes mais freqüentes nos receptores de transplante que na população geral. Trata-se geralmente de infecções por Mycobacterium tuberculosis, podendo às vezes ser devidas a M. chelonei, marinum, haemophilum, ou M. gastri.46,142,143 Na maioria das situações a apresentação clínica e o diagnóstico das infecções pelo M. tuberculosis não diferem do que é visto nos pacientes não-imunodeprimidos. No entanto, podem ocorrer manifestações particulares,144 sendo descritos surtos hospitalares entre receptores de transplante.145,146 Procedimentos invasivos podem ser indispensáveis ao diagnóstico nos casos de tuberculose disseminada, valendo ressaltar-se ainda a coexistência freqüente de outras infecções.147 O órgão transplantado pode ser uma fonte importante de infecção.148 A introdução do tratamento específico complica o tratamento imunossupressor, o que pode resultar em maior índice de rejeições.148 Não há consenso quanto à utilização de esquemas profiláticos.
As Infecções por Nocardia Descrita como evento raro entre receptores de transplante renal em outros países, no Brasil a infecção por Nocardia assume grande importância, como assinalado pelo grupo do Hospital das Clínicas da USP — Ribeirão Preto, descrevendo uma série de nove infecções num grupo de 500 transplantes, com mortalidade de 77%.149 Não há um quadro clínico específico da infecção, sendo freqüente o comprometimento pulmonar, que pode estar associado a outros agentes ou apresentar-se em recorrência.150,151 A infecção por Nocardia asteroides pode também determinar um comprometimento sistêmico.152
983
capítulo 54
Outras Bactérias São ainda freqüentes as infecções por Streptococcus pneumoniae. Infecções por Salmonella não-tifóide não são raras, estando relacionadas a hábitos alimentares ou fatores predisponentes.153 Infecção por Legionella spp tem sido descrita em surtos e correlacionada à má qualidade da água.154
AS INFECÇÕES FÚNGICAS Embora menos freqüentes entre receptores de transplante renal em comparação com transplantes de outros órgãos, as infecções fúngicas assumem especial importância pela alta mortalidade que as acompanha. A maioria das infecções fúngicas é descrita como sendo causadas por Candida spp e Aspergillus spp.155 Numa série de 1.000 transplantes realizados no Hospital das Clínicas de São Paulo — USP, Sabbaga relata a ocorrência de 88 casos de micoses profundas, o que corresponde a uma prevalência de 8,8% daquelas infecções.156 Naquela série o agente mais freqüentemente encontrado foi o Cryptococcus neoformans (44%), seguido de Candida spp (41%), Histoplasma capsulatum (5 casos), mucormicose (5 casos) e Aspergillus spp (4 casos). Nas infecções fúngicas vale ressaltar as dificuldades diagnósticas freqüentes, sendo evidentes as necessidades de avanços técnicos na área. Recentemente surgiram alternativas terapêuticas à anfotericina B, que por sua vez aparece também em novas preparações.
AS INFECÇÕES PARASITÁRIAS Vários parasitas têm sido identificados como responsáveis por infecções após transplante renal. A distribuição desses agentes é variável, sobretudo em função de determinantes sócio-econômicos. Mais uma vez observa-se também o caráter devastador que tais infecções causam no indivíduo imunodeprimido.
mento profilático durante três meses com a associação já mencionada ou com pirimetamina-sulfadoxina. Situações especiais de transmissão têm sido descritas em unidades de transplante.157
Strongyloides stercoralis Embora possa ser muito variável a apresentação clínica da estrongiloidíase em receptores de transplante renal, ela é mais comumente encontrada sob duas formas: exacerbação dos sintomas usuais da estrongiloidíase intestinal, incluindo dor abdominal intensa, diarréia, distensão abdominal, náuseas e vômitos, podendo ocorrer em menor freqüência íleo adinâmico ou obstrução intestinal, ou hemorragia gastrointestinal; a segunda apresentação ocorre sob forma de infecção pulmonar grave e progressiva ou síndrome de angústia respiratória do adulto, onde se pode observar: taquipnéia progressiva, dispnéia, tosse, escarros hemoptóicos e insuficiência respiratória. Larvas filariformes ou rabditiformes do nematódio podem ser identificadas nas fezes ou no escarro. O tiabendazol é o tratamento de escolha, sendo preconizado o seu emprego profilático prolongado em áreas de alta endemicidade. A infecção associa-se a uma alta mortalidade nos pacientes imunodeprimidos, sendo possível a recorrência sob forma grave após vários anos.158
Toxoplasma gondii Este protozoário intracelular infecta em proporções variáveis de um país a outro os indivíduos, permanecendo sob forma cística quiescente em vários tecidos. Em circunstâncias favorecidas pela imunodepressão, formas ativas do parasita são liberadas, sendo preferencial o acometimento cerebral e/ou ocular nos receptores de transplante renal.156,159 A toxoplasmose determina nesses pacientes uma morbidade acentuada e mortalidade considerável, que pode ultrapassar 50% dos indivíduos acometidos. Vários esquemas terapêuticos são utilizados, entre eles a associação sulfadiazina-pirimetamina, clindamicina, azitromicina, atovaquona e cotrimoxazol, em uso profilático.
Pneumocystis carinii Este agente é responsável por até 5-10% das pneumopatias observadas após transplante renal, habitualmente nos primeiros meses pós-transplante, período de imunossupressão mais intensa. Essa pneumopatia, que freqüentemente complica uma infecção sintomática por citomegalovírus, traduz-se por febre, tosse seca, imagem radiológica intersticial e hipoxemia. O diagnóstico baseia-se na presença do agente patógeno no material obtido de lavagem bronquíolo-alveolar. O tratamento de referência é trimetoprim-sulfametoxazol, cuja posologia será adaptada à função renal. A maioria das equipes utiliza hoje um trata-
CONCLUSÃO As infecções, qualquer que seja a sua natureza, origem, localização, são um fenômeno onipresente durante a evolução de um transplante renal. O fato de essas infecções obedecerem a uma cronologia razoavelmente bem estabelecida, em função dos protocolos de imunossupressão utilizados, tem facilitado a adoção de medidas de prevenção de um grande número dessas infecções. Os maiores objetivos das equipes de transplante renal são, hoje, o combate eficaz ao processo de rejeição crônica
984
Infecções em Transplante Renal
e o aumento da sobrevida de transplantes e de receptores. As infecções continuam sendo uma causa importante de morbidade e mortalidade nesses pacientes, e assim tornase imperativo que nos orientemos cada vez mais por uma política de prevenção e profilaxia de infecções, que deve nortear todas as etapas de um transplante renal. Com a utilização cada dia mais frequente de novos e potentes imunossupressores e a perspectiva futura de indução de situações de tolerância ao enxerto, é provável que o diagnóstico e tratamento das infecções em receptores de transplante assumam ainda maior importância, sobretudo em decorrência do potencial oncogênico de algumas dessas infecções.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. SCHWEITZER, E.J. et al. Causes of renal allograft loss. Progress in the 1980s, challenges for the 1990s. Ann. Surg., 214(6): 679-688, 1991. 2. HILL, M.N. et al. Changes in causes of death after renal transplantation, 1966 to 1987. Am. J. Kidney Dis., 17(5):512-518, 1991. 3. HIBBERD, P.L. and RUBIN, R.H. Renal transplantation and related infections. Sem. Resp. Inf., 8(3): 216-224, 1993. 4. BASS, M. Infection in renal transplantation. The first six months. Crit. Care Nurs. Clin. North Am., 2(1): 133-138, 1990. 5. PETERSON, P.K. et al. Infectious diseases in hospitalized renal transplant recipients: A prospective study of a complex and evolving problem. Medicine, 61(6): 360-372, 1982. 6. NIZZE, H. et al. Infektiose Todesursachen bei Nierentransplantationpatienten. Eine klinisch-pathologische Autopsiestudie. Verh. Dtsch. Ges. Path., 75: 218-223, 1991. 7. LANGER, K. et al. Langzeitergebnisse nach Nierentransplantation. Eine empirische Analyse von 467 allogenen Nierentransplantationen über den Einfluss klinischer und immunologischer Variablen auf die Transplantatfunktion. Med. Klin., 85(11): 637642, 1991. 8. IANHEZ, L.E. et al. Influência da condição sócio-econômica na infecção pós-transplante renal. Rev. Ass. Med. Brasil., 39(1): 33-36, 1990. 9. DARBY, C.R.; CRANSTON, D.; RAINE, A.E.; MORRIS, P.J. Bilateral nephrectomy before transplantation: Indications, surgical approach, morbidity and mortality. Br. J. Surg., 78: 305-307, 1991. 10. SANTIAGO-DELPIN, E.A. and MORALES, A.H. Infections in kidney transplantation in Latin America. Transp. Proc., 24(5): 17911793, 1992. 11. PORTOLÉS, J. et al. Visceral leishmaniasis: A cause of opportunistic infection in renal transplant patients in endemic areas. Transplantation, 57(11): 1677-1679, 1994. 12. FIGUEIREDO, J.F.C. et al. Longitudinal study of the indirect immunofluorescence and complement fixation tests for diagnosis of Chagas’ disease in immunosuppressed patients submitted to renal transplantation. Rev. Soc. Bras. Med. Trop., 26(4): 211-214, 1993. 13. PRODINGER, W.M. et al. Legionella pneumoniae in transplant recipients: A cluster of cases of eight years’ duration. J. Hosp. Infec. 26: 191-202, 1994. 14. CHATENOUD, L. Effects of chronic renal failure on the immune response. In Cameron, S.; Davison, A.M.; Grunfeld, J.P.; Kerr, D. and Ritz, E. (eds.) Oxford Textbook of Clinical Nephrology, 1992. Oxford. Oxford University Press, vol. 2: 1312-1317. 15. CROSNIER, J. et al. Randomised placebo-controlled trial of hepatitis B surface antigen vaccine in french hemodialysis units. Lancet, 797-800, 1981. 16. STEVENS, C.E. et al. Hepatitis B vaccine in patients receiving hemodialysis. Immunogenicity and efficacy. New Eng. J. Med., 311: 496, 1984.
17. CHATENOUD, L. et al. Presence of preactivated cells in hemodialyzed patients: Their possible role in altered immunity. Proc. Nat. Acad. Sci. USA, 83: 7457-7461, 1986. 18. REVILLARD, J.P. Imunological alterations in chronic renal insufficiency. In Hamburger, J.; Crosnier, J.; Grunfeld, J.P.; Maxwell, M.H. (eds.) Advances in Nephrology, 1979. Chicago. Year Book Medical Publishers, vol. 8: 365-382. 19. SHAH, B. et al. Current experience with renal transplantation in older patients. Am. J. Kidney Dis., 12(6): 516-523, 1988. 20. MEIER-KRIESCHE, H.U. et al. African-American renal transplant recipients experience decreased risk of death due to infection: possible implications for immunosuppressive strategies. Transplantation, 70(2): 375-379, 2000. 21. BARRY, J.M. Immunosuppressive drugs in renal transplantation. A review of the regimens. Drugs, 44(4): 554-566, 1992. 22. VAN DORP, W.T. et al. The effects of a maintenance immunosuppressive protocol after renal transplantation on infectious complications, comparing cyclosporine/prednisone, cyclosporine/ azathioprine/prednisone, and conversion. Transplantation, 51(1): 193-197, 1991. 23. HANCKE, E. et al. Infektionen nach Nierentransplantation unter dreifacher oder vierfacher immunsuppressiver Behandlung. Dtsch. Med. Wschr., 115: 443-446, 1990. 24. THAYER, C. et al. Increased septic complications with three-drug sequential immunosuppression for cadaver renal transplants. Am. J. Surg., 160: 614-617, 1990. 25. MAYES, J.T. et al. Re-exposure to OKT3 in renal allograft recipients. Transplantation, 46: 523-529, 1988. 26. SOULILLOU, J.P. and GIRAL, M. Clinical immunosuppression 2000. Transpl Int, 13[Suppl 1]: S20-S23, 2000. 27. TOLKOFF-RUBIN, N.E. and RUBIN, R.H. Opportunistic fungal and bacterial infection in the renal transplant recipient. J. Am. Soc. Nephrol., 2: S264-S269, 1992. 28. RUBIN, R.H. Infectious disease complications of renal transplantation. Kidney Int., 44: 221-236, 1993. 29. LAPCHIK, M.S. et al. Risk factors for nosocomial urinary tract and post-operative wound infections in renal transplant patients: A matched pair-case control study. J. Urol., 147: 994-998, 1992. 30. RENOULT, E. et al. Infections urinaires du premier mois posttransplantation rénale. Agressologie, 33(3): 147-150, 1992. 31. GOODMAN, C.M. and HARGREAVE, T.B. Survey of antibiotic prophylaxis in european renal transplantation practice. Int. Urol. Nephrol., 22(2): 173-179, 1990. 32. ELINDER, C.G. et al. Effectiveness of low-dose cotrimoxazole prophylaxis against Pneumocystis carinii pneumonia after renal and/ or pancreas transplantation. Transp. Int., 5: 81-84, 1992. 33. FOX, B. et al. Prospective, randomized, double-blind study of trimethoprim-sulfamethoxazole for prophylaxis of infection in renal transplantation: Clinical efficacy, absorption of trimethoprimsulfamethoxazole, effects on the microflora, and the cost-benefit of prophylaxis. Am. J. Med., 89: 255-274, 1990. 34. HARMON, W.E. Opportunistic infections in children following renal transplantation. Pediatr. Nephrol., 5: 118-125, 1991. 35. CHONG, G. et al. Chorio-rétinite à cytomégalovirus: Complication rare et grave chez le transplanté rénal. Intérêt du diagnostic précoce et du traitement prolongé. Néphrologie, 11: 255-258, 1990. 36. DEBURE, A. et al. Liver diseases and hepatic complications in renal transplant patients. Adv. Nephrol., 17: 375-400, 1988. 37. FAIRLEY, C.K. et al. The increased risk of fatal liver disease in renal transplant patients who are hepatitis b antigen and/or HBV DNA Positive. Transplantation, 52(3): 497-500, 1991. 38. POL, S. et al. Hepatitis C virus in kidney recipients: Epidemiology and impact on renal transplantation. J. Hepatol., 15: 202-206, 1992. 39. POL, S. Hepatites virales C chez les hemodialysés et les transplantés rénaux. In Funck-Brentano, J.L.; Bach, J.F.; Kreis, H.; Grunfeld, J.P. (eds.) Actualités Néphrologiques Jean Hamburger, 1994. Paris. Flammarion Médécine-Sciences: 291-306. 40. SIEGAL, B. et al. Kaposi’s sarcoma in immunosuppression. Possibly the result of a dual viral infection. Cancer, 65: 492-498, 1990.
capítulo 54
41. GARNIER, J.L., et al. Epstein-Barr virus-associated lymphoproliferative diseases (B cell lymphoma) after transplantation. Nephrol. Dial. Transplant, 4: 818-823, 1989. 42. GLASSOCK, R.J. et al. Human immunodeficiency virus (HIV) infection and the kidney. Ann. Int. Med., 112(1): 35-49, 1990. 43. LA PAROLA, I.L. et al. Manifestazioni cutanee in 140 trapianti renali. Recenti Progressi in Medicina, 83: 61-63, 1992. 44. JOPP-McKAY, A.G. and RANDELL, P. Sporotrichoid cutaneous infection due to Mycobacterium chelonei in a renal transplant patient. Austral. J. Dermatol., 31: 105-109, 1990. 45. OGUNBIYI, O.A. et al. Prevalence of anal human papillomavirus infection and intraepithelial neoplasia in renal allograft recipients. Br. J. Surg., 81: 365-367, 1994. 46. SASSOLAS, B. et al. Infection cutanée à papillomavirus de type II associée à un carcinome spinocellulaire chez un greffé renal. La Presse Médicale, 20(12): 563-564, 1991. 47. SMITH, S.E. et al. Absence of human papillomavirus in squamous cell carcinomas of nongenital skin from immunocompromised renal transplant patients. Arch. Dermatol., 129: 1585-1588, 1993. 48. DYALL-SMITH, D. et al. Benign human papillomavirus infection in renal transplant recipients. Int. J. Dermatol., 30(11): 785-789, 1991. 49. GRUNDY, J.E. Virologic and pathogenetic aspects of cytomegalovirus infection. Rev. Infect. Dis., 12: S711-S719, 1990. 50. RUBIN, R.H. Impact of cytomegalovirus infection on organ transplant recipients. Rev. Infect. Dis., 12: S754-S766, 1990. 51. ROCHA, E. et al. Cytomegalovirus infections after kidney transplantation: Identical risk whether donor or recipient is the virus carrier. Transpl. Proc., 23: 2638-2640, 1991. 52. MORRIS, D.J. et al. Donor seropositivity and prednisolone therapy as risk factors for cytomegalovirus infection and disease in cyclosporin-treated renal allograft recipients. Quarterly J. Med., 283: 1165-1173, 1990. 53. HIBBERD, P.L. et al. Symptomatic cytomegalovirus disease in the cytomegalovirus antibody seropositive renal transplant recipient treated with OKT3. Transplantation, 53: 68-72, 1991. 54. GRIFFITHS, P.D. and GRUNDY, J.E. The status of CMV as a human pathogen. Epidemiol. Infect., 100: 1-15, 1988. 55. LONING, T.H. et al. Cytomegalovirus detection in kidney transplants: Results obtained from the polymerase chain reaction. Clin. Nephrol., 37(2): 78-83, 1992. 56. NORDOY, I. et al. Chemokines and soluble adhesion molecules in renal transplant recipients with cytomegalovirus infection. Clin. Exp. Immunol., 120(2): 333-337, 2000. 57. KLOOVER, J.S. et al. Rat cytomegalovirus infection in kidney allograft recipients is associated with increased expression of intracellular adhesion molecule-1, vascular adhesion molecule-1, and their ligands leukocyte function antigen-1 and very late antigen-4 in the graft. Transplantation, 69(12): 2641-2647, 2000. 58. GÓMEZ, E. et al. A prospective study of the usefulness of rapid diagnostic tests in monitoring cytomegalovirus infection in renal transplants. Transpl. Proc., 24(6): 2631-2633, 1992. 59. MARSANO, L. et al. Comparison of culture and serology for the diagnosis of cytomegalovirus infection in kidney and liver transplant recipients. J. Infect. Dis., 161(3): 454-461, 1990. 60. HÄUFIGKEIT und prognostische Wertigkeit von Cytomegalievirus-spezifischen Antikorpen der Klasse IgM bei Nierentransplantatempfangern. Z. Urol. Nephrol., 83: 425-429, 1990. 61. MERLINO, C. et al. CMV-Specific polymeric and monomeric IgA antibodies in serum of renal transplant patients. Panminerva Med., 33: 173-179, 1991. 62. WEBER, B. et al. Improvement of serological diagnosis of human cytomegalovirus infection in renal transplant recipients by testing for specific immunoglobulin E by ELISA. Infection, 21(3): 158-163, 1993. 63. WEBER, B. et al. Human cytomegalovirus (HCMV)-specific immunoglobulin E as a serologic marker for HCMV infection in immunocompromised hosts. Clin. Investig., 70: 497-502, 1992.
985
64. ROWLEY, A.H. et al. Rapid detection of cytomegalovirus DNA and RNA in blood of renal transplant patients by in vitro enzymatic amplification. Transplantation, 51 (5): 1028-1033, 1991. 65. CHEN, Y.T. et al. Cytomegalovirus infection of renal allografts. Detection by polymerase chain reaction. Transplantation, 53(1): 99102, 1992. 66. VAN DORP, W.T. et al. The polymerase chain reaction, a sensitive and rapid technique for detecting cytomegalovirus infection after renal transplantation. Transplantation, 54(4): 661-664, 1992. 67. BITSCH, A. et al. Cytomegalovirus transcripts in peripheral blood leukocytes in actively infected transplant patients detected by reverse transcription-polymerase chain reaction. J. Infect. Dis., 167: 740-743, 1993. 68. BITSCH, A. et al. The long persistence of CMV DNA in the blood of renal transplant patients after recovery from CMV infection. Transplantation, 56(1): 108-113, 1993. 69. LORINO et al. Cytomegalovirus infection follow-up in renal transplant patients by the polymerase chain reaction. Transpl. Proc., 25(3): 2280-2281, 1993. 70. LASSNER, D. et al. Diagnosis and monitoring of acute cytomegalovirus infection in peripheral blood in transplant recipients by nested reverse transcriptase polymerase chain reaction (RT-PCR). Transpl. Int., 13[Suppl 1]: S366-S371, 2000. 71. AQUINO, V.H. and FIGUEIREDO, L.T. Cytomegalovirus infection in renal transplant recipients diagnosed by nested-PCR. Braz. J. Med. Biol. Res., 34(1): 93-101, 2001. 72. CHIARAMONTE, S. et al. Role of antigenemia assay in the early diagnosis and treatment of CMV infection in renal transplant patients. Clin. Nephrol., 53(4): 10-12, 2000. 73. RAO, M. et al. Cytomegalovirus infection in a seroendemic renal transplant population: a longitudinal study of virological markers. Nephron, 84(4): 367-373, 2000. 74. NICHOLSON, M.L. et al. Treatment of renal transplant-associated cytomegalovirus infection with ganciclovir. Transpl. Proc., 22(4): 1811-1812, 1990. 75. RONDEAU, E. et al. Traitement des infections à cytomégalovirus par le ganciclovir chez les transplantés rénaux. Étude clinique et pharmacocinétique. Presse Méd., 20(40): 2030-2032, 1991. 76. RONDEAU, E. et al. Le traitement des infections à cytomégalovirus chez le transplanté rénal. Néphrologie, 12(4): 189-192, 1991. 77. JACQZ-AIGRAIN, E. et al. Pharmacokinetics of ganciclovir in renal transplant children. Pediatr. Nephrol., 6: 194-196, 1992. 78. RONDEAU, E. et al. Effect of prophylactic ganciclovir on cytomegalovirus infection in renal transplant recipients. Nephrol. Dial. Transplant, 8: 858-862, 1993. 79. LE MEUR, Y. et al. The renal safety of high doses of valacyclovir for prevention of cytomegalovirus infection after renal transplantation. Nephrol. Dial. Transplant., 15(3): 442, 2000. 80. LEGENDRE, C. et al. Stratégie de prévention de l’infection à cytomegalovirus en transplantation rénale. In Funck-Brentano, J.L.; Bach, J.F.; Kreis, H.; Grunfeld, J.P. (eds.) Actualités Néphrologiques Jean Hamburger, 1993. Paris. Flammarion Médécine-Sciences: 263277. 81. PETERSON, P.K. et al. Cytomegalovirus disease in renal allograft recipients: A prospective study of the clinical features, risk factors and impact on renal transplantation. Medicine, 59: 283-299, 1980. 82. SIMMONS, R.L. et al. Do mild infections trigger the rejection of renal allografts? Transpl. Proc., 2: 419-423, 1970. 83. LOPEZ, C. et al. Association of renal allograft rejection with virus infection. Am. J. Med., 56: 280-289, 1974. 84. DICKENMANN, M.J. et al. Cytomegalovirus infection and graft rejection in renal transplantation. Transplantation, 71(6): 764-767, 2001. 85. GERSTENKORN, C. et al. The impact of cytomegalovirus serology for 7-year graft survival in cadaveric kidney transplantation — the Newcastle experience. Transpl. Int. 13[Suppl.1]: S372-S374, 2000. 86. GOODRICH, J.M. et al. Early treatment with ganciclovir to prevent cytomegalovirus disease after allogeneic bone marrow transplantation. N. Engl. J. Med., 325: 1601-1607, 1991.
986
Infecções em Transplante Renal
87. EMMANUEL, D. et al. Cytomegalovirus pneumonia after bone marrow transplantation successfully treated with the combination of ganciclovir and high-dose intravenous immune globulin. Ann. Intern. Med., 109: 777-782, 1988. 88. GRATTAN, M.T. et al. Cytomegalovirus infection is associated with cardiac allograft rejection and atherosclerosis. JAMA, 261: 3561-3566, 1989. 89. LEGENDRE, C. et al. Acyclovir in preventing cytomegalovirus infection in kidney transplant recipients: A case-controlled study. J. Med. Virol., Supp 1: 118-122, 1993. 90. KRAMER, P. et al. Recombinant leukocyte interferon A induces steroid-resistant acute vascular rejection episodes in renal transplant recipients. Lancet, i: 989-990, 1984. 91. SNYDMAN, D.R. et al. Use of cytomegalovirus immune globulin to prevent Cytomegalovirus disease in renal-transplant recipients. N. Engl. J. Med., 317: 1049-1054, 1987. 92. SNYDMAN, D.R. et al. Final analysis of primary cytomegalovirus disease prevention in renal transplant recipients with a cytomegalovirus-immune globulin: Comparison of the randomized and openlabel trials. Transpl. Proc., 23: 1357-1360, 1991. 93. SCHNEEBERGER, H. et al. Hyperimmunoglobulin prophylaxis, monitoring and preemptive ganciclovir treatment eliminate the risk of CMV infection to improve patient and renal allograft survival. Transpl. Int., 13[Suppl.1]: S354-S358, 2000. 94. BALFOUR, H.H. et al. Cytomegalovirus vaccine in renal transplant candidates: Progress report of a randomized, placebo-controlled, double-blind trial. Birth Defects, 20: 289-304, 1984. 95. PLOTKIN, S.A. et al. Vaccines for the prevention of human cytomegalovirus infection. Rev. Infect. Dis., 12: S827-S838, 1990. 96. YAO, Q.Y. et al. In vitro analysis of the Epstein-Barr virus: Host balance in long-term renal allograft recipients. Int. J. Cancer, 35: 4349, 1985. 97. PREIKSAITIS, J.K. et al. Quantitative oropharyngeal Epstein-Barr virus shedding in renal and cardiac transplant recipients. Relationship to immunosuppressive therapy, serological responses, and the risk of post-transplant lymphoproliferative disorders. J. Infect. Dis., 166: 986-994, 1992. 98. MERLINO, C. et al. Infezione da virus di Epstein-Barr ed anomalie immunoglobuliniche nei portatori di trapianto renale. Minerva Urol. Nefrol., 44: 143-146, 1992. 99. JARDINE, D.L. et al. Epstein-Barr virus infection acquired from a cadaveric renal transplant. Nephron, 58: 359-361, 1991. 100. CAILLARD, S. et al. Posttransplant lymphoproliferative disorders in renal allograt recipients: report of 53 cases of a French multicenter study. Transpl. Int., 13[Suppl.1]: S388-S393, 2000. 101. FUNCH, D. et al. Recent incidence, characteristics, and one-year survival associated with post-transplant lymphoproliferative disorder in renal transplant patients in the US. Amer. J. Transpl. , 2[Suppl.3]: 151, 2002. 102. TROFE, J. et al. Renal allograft involvement by post-transplant lymphoproliferative disorder: clinical implications. Amer. J. Transpl., 2[Suppl.3]: 151, 2002. 103. VASUNDHARA, G. et al. Humanized anti CD20 monoclonal antibody (rituximab) therapy for post-transplant lymphoproliferative disorder in solid organ transplant recipients. Amer. J. Transpl., 2[Suppl.3]: 151, 2002. 104. HOULE, A.M. et al. Rapid development of an immunoblastic lymphoma and death in children following cadaveric renal transplantation. J. Ped. Surg., 27(5): 626-628, 1992. 105. HO, M. et al. The frequency of EBV infection and associated lymphoproliferative syndrome after transplantation and its manifestations in children. Transplantation, 45: 719-727, 1988. 106. LYNFIELD, R. et al. Varicella in pediatric renal transplant recipients. Pediatrics, 90(2): 216-220, 1992. 107. GENTILE, G. et al. Infezioni virali in bambini con trapianto di rene e di cuore. La Clinica Terapeutica, 140(2): 137-147, 1992. 108. TAKAHASHI, M. Clinical overview of varicella vaccine: Development and early studies. Pediatrics, 78: S736-S741, 1986.
109. BROYER, M. and BOUDAILLEZ, B. Varicella vaccine in children with chronic renal insufficiency. Postgrad. Med. J., 61(suppl 4): 103106, 1985. 110. O’NEILL, H.J. and SHIRODARIA, P.V. Virus-specific antibodies to Epstein-Barr virus, varicella-zoster virus and rubella virus in renal transplant patients with cytomegalovirus infection. J. Infect., 24: 301-309, 1992. 111. KIDD, I.M. et al. Prospective study of human betaherpesvirus after renal transplantation: association of human herpesvirus 7 and cytomegalovirus co-infection with cytomegalovirus disease and increased rejection. Transplantation, 69(11): 2400-2404, 2000. 112. YAMANISHI, K. et al. Identification of human herpesvirus-6 as a causal agent for exanthem subitum. Lancet, i: 1065-1067, 1988. 113. NIEDERMAN, J.C. et al. Clinical and serological features of human herpesvirus-6 infection in 3 adults. Lancet, ii: 817-818, 1988. 114. DUBEDAT, S. and KAPPAGODA, N. Hepatitis due to human herpesvirus-6. Lancet, ii: 1463-1465, 1989. 115. YOSHIKAWA, T. et al. A prospective study of human herpes-virus-6 infection in renal transplantation. Transplantation, 54(5): 879883, 1992. 116. OKUNO, T. et al. Human herpesvirus-6 infection in renal transplantation. Transplantation, 49(3): 519-522. 117. MERLINO, C. et al. Infezione da virus erpetico humano di tipo 6 (HHV-6) e trapianto di rene. Minerva Urol. Nefrol., 44: 147-153, 1992. 118. YALCIN, S. et al. Human herpesvirus-6 and human herpesvirus7 infections in renal transplant recipients and healthy adults in Turkey. Arch. Virol., 136: 183-190, 1994. 119. DIOCIAIUTI, A. et al. HHV8 in renal transplant recipients. Transpl. Int., 13[Suppl.1]: S419-S412, 2000. 120. POL, S. et al. Genetic basis of nonresponse to hepatitis B vaccine in hemodialyzed patients. J. Hepatol., 11: 385-387, 1990. 121. KIBERD, B.A. Should hepatitis C-infected kidneys be transplanted in the United States? Transplantation, 57(7): 1068-1072, 1994. 122. THERVET, E. et al. Low-dose recombinant interferon-alpha treatment of hepatitis C viral infection in renal transplant recipients. A pilot study. Transplantation, 58(5): 1994. 123. KRAMER, P. et al. Recombinant leukocyte interferon A induces steroid-resistant acute vascular rejection episodes in renal transplantation. Lancet, i: 989-990, 1984. 124. KOVARIK, J. et al. Adverse effect of low-dose prophylactic human recombinant leukocyte interferon-alpha treatment in renal transplant recipients. Transplantation, 45: 402-405, 1988. 125. POL, S. et al. Absence of hepatitis delta virus infection in chronic hemodialysis and kidney transplant recipients in France. Transplantation, 54(6): 1096-1097, 1992. 126. KHARSA, G. et al. Fulminant hepatitis in renal transplant recipients: The role of the delta agent. Transplantation, 44: 221-222, 1987. 127. HOOI, L.S. Human immunodeficiency virus infection in recipients of living unrelated donor renal transplants — A report of 4 cases. Med. J. Malaysia, 48(2): 232-235, 1993. 128. PEIGUE-LAFEUILLE, H. et al. Nosocomial rotavirus in adult renal transplant recipients. J. Hosp. Infect., 18: 67-70, 1991. 129. FLAEGSTAD, T. et al. Antibodies against BK virus in renal transplant recipient sera: Results with five different methods indicate frequent reactivations. Scand. J. Infect. Dis., 23: 287-291, 1991. 130. BLOHMÉ, I. et al. Adenovirus infection in a renal transplant patient. Transpl. Proc., 24(1): 295, 1992. 131. LJUNGMAN, P. et al. Influenza A in immunocompromised patients. Clin. Infect. Dis., 17: 244-247, 1993. 132. AHUJA, M. et al. Polyoma virus infection after renal transplantation. Use of immunostaining as a guide to diagnosis. Transplantation, 71(7): 896-899, 2001. 133. RANDHAWA, P.S. et al. Quantitation of BK virus DNA in renal allograft biopsies with viral nephritis, acute cellular rejection and chronic allograft nephropathy. Amer. J. Transpl., 2[Suppl.3]: 261, 2002. 134. HAMZE, O. et al. Prospective study of the incidence of polyoma virus (PV) in the early post-transplantation period. Amer. J. Transpl., 2[Suppl.3]: 261, 2002.
capítulo 54
135. LOERTSCHER, R. et al. Deliberate reduction of immunosuppression benefits patients with polyoma BK virus infection in kidney allografts. Amer. J. Transpl., 2[Suppl.3]: 262, 2002. 136. DING, R. et al. Accurate and non-invasive diagnosis of BK virus nephropathy. Amer. J. Transpl., 2[Suppl.3]: 224, 2002. 137. TROFE, J. et al. Polyoma virus in kidney and kidney-pancreas transplantation: minimizing renal allograft injury/loss by defined immunosuppression reduction and histologic monitoring. Amer. J. Transpl., 2[Suppl.3]: 292, 2002. 138. MURER, L. et al. Thrombotic microangiopathy associated with parvovirus B 19 infection after renal transplantation. J. Am. Soc. Nephrol. , 11(6): 1132-1137, 2000. 139. PAMIDI, S. et al. Human parvovirus B 19 infection presenting as persistent anemia in renal transplant recipients. Transplantation, 69(12): 2666-2669, 2000. 140. ASAKA, M. et al. Hemolytic uremic syndrome associated with influenza virus infection in an adult renal allograft recipient: case report and review of the literature. Nephron, 84(3): 258-266, 2000. 141. ARDEHALI, H. et al. Fatal disseminated adenoviral infection in a renal transplant recipient. Transplantation, 71(7): 898-899, 2001. 142. KRISTJANSSON, M. et al. Mycobacterium haemophilum infection in immunocompromised patients: Case report and review of the literature. Rev. Infect. Dis., 13: 906-910, 1991. 143. PERANDONES, C.E. et al. Mycobacterium gastri arthritis: Septic arthritis due to Mycobacterium gastri in a patient with a renal transplant. J. Rheumat., 18(5): 777-778, 1991. 144. INUDHARA, R. et al. Tuberculous pyomyositis in a renal transplant recipient. Tubercle and Lung Disease, 73: 239-241, 1992. 145. JEREB, J.A. et al. Nosocomial outbreak of tuberculosis in a renal transplant unit: Application of a new technique for restriction fragment length polymorphism analysis of Mycobacterium tuberculosis isolates. JID, 168: 1219-1224, 1993. 146. SUNDBERG, R. et al. A tuberculosis outbreak in a renal transplant program. Transpl. Proc., 23(6): 3091-3092, 1991. 147. QUNIBI, W.Y. et al. Mycobacterial infection after renal transplantation — Report of 14 cases and review of the literature. Quarterly J. Med., 282: 1039-1060, 1990. 148. HIGGINS, R.M. et al. Mycobacterial infections after renal transplantation. Quarterly J. Med., 286: 145-153, 1991. 149. SANTA MARIA SABER, I.T. et al. Nocardia infection in renal transplant recipient. Rev. Inst. Med. Trop. São Paulo, 35(5): 417-421, 1993.
987
150. CARTER, J.M. et al. Pulmonary cavitation with nocardia and aspergillus in a renal transplant patient. J. Nat. Med. Ass., 82(7): 527531. 151. KING, C.T. et al. Recurrent nocardiosis in a renal transplant recipient. Southern Med. J., 86(2): 225-228, 1993. 152. PERAL PRIETO, V. et al. Nocardiosis sistémica con abscesos cerebrales en paciente con trasplante renal. Anales de Medicina Interna, 8(4): 190-191, 1990. 153. DHAR, J.M. et al. Non-typhoid Salmonella in renal transplant recipients: A report of twenty cases and review of the literature. Quarterly J. Med., 287: 235-250, 1991. 154. LEVIN, A.S.S. et al. An outbreak of nosocomial legionnaires’ disease in a renal transplant unit in São Paulo, Brazil, J. Hosp. Infect., 18: 243-248, 1991. 155. PAYA, C.V. Fungal infections in solid-organ transplantation. CID, 16: 677-688, 1993. 156. SABBAGA, E. 1000 Transplantes renais. Vinte anos de experiência. Tese Livre-Docência FMUSP São Paulo, 1987; 236 pp. 157. CHAVE, J.P. et al. Transmission of Pneumocystis carinii from AIDS patients to other immunosuppressed patients: A cluster of Pneumocystis carinii pneumonia in renal transplant recipients. AIDS, 5: 927-932, 1991. 158. DEVAULT Jr, G.A. et al. Opportunistic infections with Strongyloides stercoralis in renal transplantation. Rev. Infect. Dis., 12(4): 653671, 1990. 159. CUNHA, S. et al. Toxoplasmose cerebral em transplantado renal. Caso clínico e revisão da literatura. Acta Med. Port., 6: 157-163, 1993.
ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET www.kidneyatlas.org/book5/adk5-10.pdf — Infecções pós-transplante. www.cdc.gov/mmwr/preview/mmwrhtml/rr4910a1.htm — Orientações para prevenção de infecções oportunistas. www.pasteur.fr/infosci/conf/CRC/Risk factors.rtf — Fatores de risco para infecções fúngicas invasivas em transplante de órgãos sólidos. www.hdcn.com — Hipertensão, Diálise e Nefrologia Clínica.
Índice Alfabético
A AAS - ajuste de dose na doença renal, 804 - cuidados especiais, 804 - dose normal do, 804 - farmacocinética do, 804 - para diabete insípido nefrogênico, 574 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 804 - - hemodiálise, 804 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 804 Abscesso - do SNC, síndrome da secreção inadequada do HAD e, 123 - edema no, 150 - perirrenal e pielonefrite, 500, 501 - pulmonar, síndrome da secreção inapropiada de HAD e, 123 - renal - - complicando pielonefrite, 500, 501 - - radiologia no, 308 - - ultra-sonografia para, 305 Acebutolol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 804 - características do, 788 - cuidados especiais, 804 - dose normal do, 804 - farmacocinética do, 804 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 804 - - hemodiálise, 804 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 804 Acetaminofen - ajuste de dose na doença renal, 804 - cuidados especiais, 804 - dose normal do, 804 - farmacocinética do, 804 - nível sérico terapêutico do, 841 - para diabetes insipidus central, 116 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 804 - - hemodiálise, 804 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 804 Acetato de cálcio, 726, 727 Acetazolamida - ajuste de dose na doença renal, 804 - considerações, 776 - cuidados especiais, 804 - dose normal da, 804 - farmacocinética da, 804 - hipocalemia por uso de, 200 - mecanismo de ação da, 776 - para alcalose metabólica, 181 - para glaucoma, 782 - para hiperfosfatemia, 231 - para intoxicação - - por fenobarbital, 782 - - por salicilato, 782 - para oclusão de artéria carótida, 782 - pós-hipercapnéica, 782 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 804 - - hemodiálise, 804
- - hemofiltração arteriovenosa contínua, 804 Acetoexamida - ajuste de dose na doença renal, 804 - cuidados especiais, 804 - dose normal da, 804 - farmacocinética da, 804 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 804 - - hemodiálise, 804 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 804 Aciclovir - ajuste de dose na doença renal, 804 - cuidados especiais, 804 - dose normal do, 804 - farmacocinética do, 804 - insuficiência renal aguda por, 389 - nefrite intersticial por, 470 - nefrotoxicidade do, 458 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 804 - - hemodiálise, 804 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 804 Acidemia, 164 Acidente vascular cerebral, 526 - alcalose respiratória e, 183 - hipertensão e, 747 - pós-transplante, 962 - síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 Acidez titulável, 170 Ácido - acetilsalicílico, 173 - - intoxicação pelo, 173 - - nível sérico terapêutico do, 841 - aceto-hidroxâmico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - acetoacético, 173 - aminossalicílico, nefrite intersticial por, 470 - araquidônico, metabólitos do, 28 - ascórbico - - e potencialização do efeito da eritropoetina, 699 - - para cistinúria clássica, 562 - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - - para paciente sob hemodiálise, 851 - beta-hidroxibutírico, 173 - carbônico, 169 - clavulânico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - clorídrico, 181 - conceito de, 163 - epoxieicotrienóico, 28
- épsilon-aminocapróico, 533 - etacrínico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - hipocalemia por uso de, 200 - - interação farmacológica do, 783 - - mecanismo de ação do, 776 - - para diabete insípido nefrogênico, 574 - - para síndrome de secreção inadequada de HAD, 781 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - excreção renal de, 49 - fixo, 164 - fólico - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - - para paciente sob hemodiálise, 851 - fórmico, 164, 173 - fosfomórfico, 231 - guanílico, 240 - hidroxieicosatetraenóico, 28 - inosínico, 240 - láctico, 164, 172 - maléico - - acidose tubular renal associada a, 574 - - síndrome de Fanconi por, 573 - meclofenâmico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - mefenâmico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - nefrotoxicidade do, 464 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - nalidíxico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - não-volátil, 164 - nicotínico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - hiperuricemia e uso de, 243
Índice Alfabético
- - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - oxálico, 164, 173 - pantotênico, 851 - produção endógena de, 164 - redução na excreção renal de, 173 - salicil-salicílico - - ajuste de dose na doença renal, 837 - - cuidados especiais, 837 - - dose normal do, 837 - - farmacocinética do, 837 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - - hemodiálise, 837 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 - salicílico, 164, 173 - titulável - - excreção de, 52, 170 - - formação de, 52 - tranexâmico - - ajuste de dose na doença renal, 805 - - cuidados especiais, 805 - - dose normal do, 805 - - farmacocinética do, 805 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 805 - - - hemodiálise, 805 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 805 - úrico, 238, 612 - - cálculos de, 611 - - diminuição na produção de, 251 - - exame de, no doador de transplante, 945 - - excreção de, 240 - - - aumentada, 251, 612 - - - gastrintestinal, 240 - - - renal, 240 - - na nefrosclerose hipertensiva benigna, 524 - - nefrolitíase por, 480 - - nefropatia aguda pelo, 249, 480 - - níveis de - - - na gota, 245 - - - pós-transplante, 962 - - plasmático na insuficiência renal crônica, 683 - - produção de, 240 - - - endógena, 240 - - - exógena, 240 - - redução dos níveis séricos de, 249 - - sérico - - - durante a gravidez, 539 - - - na insuficiência renal, 682 - - síntese do, 239 - valpróico - - nível sérico terapêutico do, 841 - - para neuropatia urêmica, 710 - volátil, 164 Acidose, 164 - dilucional, 173 - distribuição transcelular de potássio na, 192 - doença óssea adinâmica e, 678 - e secreção - - de fósforo, 225, 226 - - de H, 55 - e síntese de amônia, 55 - e transporte do fosfato, 565 - láctica, 172 - - hiperuricemia secundária à, 243 - metabólica, 164, 172 - - achados laboratoriais, 174 - - ácido nalidíxico e, 805 - - amiloride e, 806 - - causas de, 172 - - - correlação com os níveis de potássio, anion gap, 176 - - - de acordo com o hiato iônico, 176 - - - diminuição na excreção renal de ácido, 172, 173 - - - perda de bicarbonato, 172, 173 - - - produção aumentada de ácido, 172 - - colestimetato e, 816 - - colestipol e, 816 - - colestiramina e, 816 - - com acetazolamida, 804 - - e uremia, 673 - - manifestações clínicas, 174 - - na nefrite intersticial crônica, 478 - - na uremia, 852 - - roteiro de diagnóstico de, 184 - - tratamento da, 176 - - - da doença de base, 176
- na cistinose, 561 - respiratória, 165, 182 - - causas de, 182 - - conseqüências - - - clínicas, 182 - - - fisiológicas, 182 - - roteiro de diagnóstico de, 184 - - tratamento, 183 - tubular renal, 173, 574 - - cálculo urinário na, 301 - - com anfotericina B, 807 - - distal, 575 - - - subtipos, 578 - - distúrbios associados com, 574, 576 - - diurético para, 781 - - estudos diagnósticos na, 579 - - hipomagnesemia e, 234 - - na hipercalcemia, 222 - - na nefrite intersticial crônica, 478 - - na síndrome de Bartter, 570 - - na uropatia obstrutiva, 623 - - pelo lítio, 478 - - por uso de anfotericina B, 458 - - proximal, 574 Acromegalia - hiperfosfatemia e, 230 - hipertensão causada por, 743 Adenocarcinoma renal, 635 Adenoma renal, 634 Adenosina - e secreção de renina, 73 - trifosfato - - fósforo na formação da, 226 - - IRA isquêmica e depleção de, 390 Adrenomedulina, 87 Agenesia renal, 6, 317, 344 - ressonância magnética na, 329, 330 Agonista dopaminérgico, 710 Água - alterações no balanço de, na IRA, 392 - controle da correção do balanço de, na IRC, 686 - distúrbios do balanço de, 146 - do organismo, 90 - - distribuição entre compartimentos, 95 - - total, 92 - - - determinação da, 93 - - - distribuição da, num adulto jovem, 94 - - unidades de medida de, 90 - ingesta de, no edema, 159 - intoxicação aguda pela, 122 - mecanismo renal de regulação da, 104 - - concentração da urina, 105 - - considerações anatômicas, 104 - - diluição da urina, 109 - - vascularização da medula renal, 105 - metabolismo da (v. metabolismo da água) - para hemodiálise, 875 - - tratamento da, 875, 876 - plano de administração da, 260 - reabsorção de - - na alça de Henle, 142 - - pelo túbulo proximal, 140 - retenção de - - com clofibrate, 814 - - com clorpropamida, 815 - - com diazóxido, 817 - - com minoxidil, 830 - transporte de, 37 - - na alça de Henle, 45 - - no ducto coletor, 47 - - no túbulo - - - distal final, 47 - - - proximal, 38, 42, 43 AIDS, 445, 481 Albumina - a 5%, solução de - - composição da, 263 - - expansão inicial de volume com, 264 - a 25%, solução de - - composição da, 263 - - expansão inicial de volume com, 264 - ação tamponante da, 166 - e permeabilidade glomerular, 33, 35 - humana - - para edema - - - hepático, 780 - - - renal, 779 - - pós-transplante renal, 950 - para depleção do volume extracelular, 149
989 - sérica na síndrome nefrótica, 404 Albuminúria - na doença renal policística, 346 - na nefropatia - - crônica pelo ácido úrico, 246 - - diabética, 601 - - - valores de, 602 Albuterol para hipercalemia, 208 Alça de Henle, 2, 8, 14, 45 - reabsorção na - - de magnésio, 232 - - de sódio, 142 - - do cálcio, 214 - - do fósforo, 226 - transporte de potássio na, 194 Alcalemia, 164 Alcalose, 164 - distribuição transcelular de potássio na, 192 - e secreção - - de fósforo, 225, 226 - - de H, 55 - e síntese de amônia, 55 - metabólica, 164, 178 - - causas de, 178, 179 - - classificação da, 179 - - com diurético - - - de ação prolongada, 782 - - - de alça, 782 - - dados laboratoriais, 180 - - geração da, 178 - - - adição de bicarbonato ao líquido extracelular, 178 - - - perda de hidrogênio, 178 - - - perda de líquido contendo grandes quantidades de cloro, 179 - - manifestações clínicas, 180 - - manutenção da, 179 - - - deficiência de cloro, 179 - - - depleção de potássio, 180 - - - hipercapnia, 180 - - - hipoventilação, 180 - - - volume extracelular, 179 - - mecanismo de defesa do pH na, 180 - - - compensação respiratória, 180 - - - correção renal, 180 - - - sistema tampão, 180 - - na hipomagnesemia, 234 - - na síndrome - - - de Bartter, 201, 571 - - - de Liddle, 571 - - roteiro de diagnóstico de, 184 - - tratamento, 181 - respiratória, 165, 183 - - causas de, 183 - - conseqüências - - - clínicas, 183 - - - fisiológicas, 183 - - hipocalcemia na, 217 - - hipofosfatemia associada a, 227 - - roteiro de diagnóstico de, 184 - - tratamento, 183 Álcool, excesso de, 743, 744 Alcurônio - ajuste de dose na doença renal, 806 - cuidados especiais, 806 - dose normal do, 806 - farmacocinética do, 806 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Aldosterona - e acidificação urinária, 55 - e distribuição transcelular de potássio, 192 - e reabsorção de sódio, 47 - e secreção - - de potássio, 47 - - de sódio, 143 - na homeostasia do potássio, 196 - na síndrome de Liddle, 571 - para avaliação de hipertensão, 752 Aleitamento, drogas anti-hipertensivas e, 552 Alfa-calcidol, 728 Alfa-mercaptopropionilglicina, 562 Alfa-metildopa - dose da, 790 - efeitos adversos, 789 - mecanismo de ação, 789 - na gravidez, 790 - número de tomadas, 790
990 Alfa1-antitripsina, deficiência de, 431 - glomerulopatia e doença hepática associada a, 445 Alfentanil - ajuste de dose na doença renal, 806 - cuidados especiais, 806 - dose normal do, 806 - farmacocinética do, 806 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Aloenxerto, 930 Alopurinol - hipouricemia e uso de, 251 - insuficiência renal aguda induzida por, 389 - interação farmacológica do, 783 - nefrite intersticial causada por, 470 - para hiperuricemia, 248, 249 - - no transplante renal, 251 - para nefrolitíase, 617 - - pelo ácido úrico, 250 - vasculite sistêmica causada por, 431 Alprazolam - ajuste de dose na doença renal, 806 - cuidados especiais, 806 - dose normal do, 806 - farmacocinética do, 806 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Alprenolol - ajuste de dose na doença renal, 806 - cuidados especiais, 806 - dose normal do, 804 - farmacocinética do, 806 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Alucinação na hipocalcemia, 218 Alumínio - compostos de, 726 - doença óssea adinâmica pelo, 678 - intoxicação pelo - - diagnóstico bioquímico, 723 - - fisiopatologia da, 721 - - pontos-chave, 722 - - prevenção, 728 - - síndrome diálise-demência e, 712 - - tratamento, 727 - osteomalácia relacionada ao, 678 Amantadina - ajuste de dose na doença renal, 806 - cuidados especiais, 806 - dose normal da, 806 - farmacocinética da, 806 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Amenorréia na uremia, 675 Amicacina - ajuste de dose na doença renal, 806 - cuidados especiais, 806 - dose normal da, 806 - farmacocinética da, 806 - nefrotoxicidade da, 452 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Amido hidroxietílico, 149 Amiloidose, 441 - acidose tubular renal e, 574 - e insuficiência renal crônica, 683 - na lepra, 448 - nefropatia tubulointersticial na, 481 - pontos-chave, 442 - primária, 441 - recidiva de, pós-transplante, 963 - renal hereditária, 442 - secundária, 442 - síndrome de Fanconi e, 573 Amilorida(e) - ajuste de dose na doença renal, 806 - considerações, 776 - cuidados especiais, 806
Índice Alfabético
- dose normal do, 806 - efeitos colaterais, 782 - farmacocinética, 777, 806 - hipercalemia causada por, 206 - interação farmacológica da, 783 - mecanismo de ação, 777 - na síndrome de Liddle, 571 - nefrite intersticial, 470 - para acidose tubular renal, 781 - para diabete insípido nefrogênico, 574, 781 - para hipercalciúria idiopática, 781 - para raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Aminoácido - ação tamponante do, 166 - anormalidades de excreção do, 559 - e transporte do fosfato, 565 - na urina, 559 - reabsorção de, no túbulo contornado proximal, 139 Aminoacidúria, 559 - na glomerulosclerose focal e segmentar, 416 - na hiperargininemia, 561 Aminofilina - hipercalcemia causada por, 221 - mecanismo de ação da, 776 - para edema - - hepático, 780 - - renal, 779 - para poliglobulia, 960 Aminoglicosídeo - hipomagnesemia e uso de, 233 - interação farmacológica do, 783 - nefrite intersticial por, 470 - nefrotoxicidade do, 452 - - fatores de risco, 453 - para infecção do trato urinário, 504 - para peritonite durante diálise, 924 Amiodarona - ajuste de dose na doença renal, 806 - cuidados especiais, 806 - dose normal da, 806 - farmacocinética da, 806 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 806 - - hemodiálise, 806 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 806 Amitriptilina - ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807 - dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - nível sérico terapêutico da, 841 - para neuropatia urêmica, 710 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Amlodipina, 794 - características da, 795 - interação farmacológica da, 467 - na inibição do metabolismo da ciclosporina, 794 - nefrite intersticial causada por, 470 Amônia - e homeostase do potássio, 197 - excreção renal da, 53 - manipulação renal da, 54 - secreção de, nos ductos coletores, 171 - síntese da, 53 - - renal, 53, 54 - transformação em NH4, 172 Amônio - excreção de, 170 - produção proximal e secreção de, 170 Amoxacilina/clavulanato, 504 Amoxapina - ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807 - dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Amoxicilina - ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807
- dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Ampicilina - ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807 - dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - para bacteriúria na gravidez, 540 - para infecção urinária na gravidez, 540 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 - sulbactan para infecção do trato urinário, 504 Analgésico - acidose tubular renal associada a, 576 - carcinoma - - de células renais e, 635 - - de pelve renal e uso de, 645 - insuficiência renal crônica associada a, 683 - para gota, 249 Anatomia renal, 1-17, 340 - circulação linfática, 5 - embriologia, 5 - inervação, 5 - interstício, 16 - macroscopia, 1 - néfron, 8 - pontos-chave, 3, 5, 6, 12 - relações com a estrutura músculo-esquelética, 2 - rim direito seccionado em planos, 2 - vascularização, 4, 21 - - pontos-chave, 23 ANCA - e doença infecciosa, 433 - e enterocolopatia inflamatória, 433 - e vasculite renal, 432 Andrógeno e eritropoese, 699 Anemia - alcalose respiratória e, 183 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - edema associado a, 151 - falciforme - - acidose tubular renal e, 576 - - diabetes insipidus nefrogênico causado por, 115 - - nefropatia da, 532 - - - tubulointersticial, 480, 481 - - trombose da artéria renal associada a, 520 - ferropriva, 437 - hemolítica, microangiopática, 527 - hipocalemia no tratamento de, 200 - na insuficiência renal, 676, 691, 692 - - crônica, manejo da, 687 - - deficiência - - - de eritropoetina, 692 - - - de ferro, 693 - - eritropoetina recombinante humana para, 694 - - - efeitos adversos, 699 - - - indicação, 694 - - - iniciando o tratamento, 696 - - - perspectivas, 700 - - - resposta inadequada, 697 - - - terapias adjuvantes, 699 - - - vias de administração de, 696 - - hiperparatireoidismo, 693 - - inibição da eritropoese, 693 - - toxicidade pelo alumínio, 693 - na intoxicação pelo alumínio, 722 - na síndrome do anticorpo antifosfolipídio, 531 - na uremia, 675, 676, 691 - na vasculite renal, 433 - no carcinoma de células renais, 639 - no lúpus eritematoso sistêmico, 425 - perniciosa, 243 - pós-transplante, 961 Aneurisma - da aorta - - abdominal, 622 - - hipertensão e, 747, 749 - diabetes insipidus pituitário e, 113 - hipertensão renovascular e, 758 - intracraniano na doença policística renal, 587 - síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123
Índice Alfabético
Anfotericina B - acidose tubular renal associada a, 576 - ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807 - dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - hipocalemia induzida por, 201 - hipomagnesemia e uso de, 233 - insuficiência renal aguda causada por, 389 - nefrotoxicidade da, 457 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Angeíte cutânea leucocitoclástica, 431 Angiite necrosante com diurético - de ação prolongada, 782 - de alça, 782 Angina de peito pós-transplante, 962 Angiografia, 294, 298 - nefrotoxicidade do meio de contraste na, 460 - para cisto renal, 590 - para hipertensão renovascular, 763 - para oncocitoma, 634 - para transplante renal, 313 - por ressonância magnética, 334 Angiomiolipoma - radiologia no, 308 - renal, 633 - - à tomografia computadorizada para, 309, 633 - - à ultra-sonografia, 633 - - características do, 310 - - microfotografia de, 633 Angioplastia - de artéria renal, para hipertensão renovascular, 312, 765 - transluminal percutânea da artéria renal, 763 Angiorressonância nuclear magnética, 763 Angiotensina, 1-7, 67 - excreção de sódio e, 144 - II, 74 - - ações - - - na vasculatura, 74 - - - no crescimento celular, 74 - - - no sistema nervoso central, 74 - - - renais, 74 - - - supra-renal, 74 - - e a sede, 101 - - e regulação da filtração glomerular, 32 - - e secreção de renina, 73 - - mecanismo de ação celular da, 75 - - reabsorção de bicarbonato de sódio e, 143 - - receptores para, 74 - peptídeos derivados da, 76 - - ang-(1-7), 76 - - angIII, 76 - - angIV, 76 Angiotensinase, 75 Angiotensinogênio, 71 Anidrase carbônica, 49, 52, 169, 576 Ânions, 91 Anlodipina - ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807 - dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Anomalia(s) - congênita(s) - - anorretal, 342 - - da bexiga, 354 - - - complexo extrofia-epispádia, 354 - - - divertículo, 354 - - - duplicação, 354 - - - úraco, 354 - - da coluna lombossacra, 342 - - da genitália externa, 342 - - da uretra, 355 - - - divertículo, 357 - - - duplicidade, 357 - - - hipospádias, 357 - - - válvulas uretrais, 355 - - do aparelho urinário, 344 - - - agenesia, 344 - - - cisto multilocular, 346 - - - cisto simples, 345 - - - de fusão do rim, 349
- - - de rotação, 347 - - - do ureter, 349 - - - doença cística renal, 345 - - - doença policística, 346 - - - ectopia renal, 347 - - - hipoplasia, 344 - - - megaureter, 352 - - - obstrução da junção pieloureteral, 352 - - - rim multicístico displásico, 345 - - - ureterocele, 350 - - - vasculares, 347 - - renal, 6, 317 - - - ressonância magnética para, 329 - - - uropatia obstrutiva e, 320 - - urografia excretora na, 343 Anorexia, 675 - na diálise peritoneal ambulatorial contínua, 853 - na encefalopatia urêmica, 706, 707 - na hipercalcemia, 222 - na hiponatremia, 124 - na síndrome de Bartter, 570 - na uremia, 674, 675 - por depleção de volume extracelular, 146 Anrinona - ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807 - dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Ansiedade - alcalose respiratória e, 183 - na uremia, 675 - pelo corticosteróide, 715 Anti-hipertensivo, 752, 787-798 - antagonista - - do cálcio, 793 - - do receptor da angiotensina II, 795 - antiadrenérgico, 789 - bloqueador beta-adrenérgico, 787 - diurético, 775 - durante a gravidez, 551 - edema associado a, 151, 158 - endereços na internet, 798 - inibidor da enzima de conversão da angiotensina, 791 - interação farmacológica do, 783 - para glomerulonefrite pós-estreptocócica, 407 - para hipertensão sistêmica, 781 - para nefropatia diabética, 602, 604 - para pré-eclâmpsia, 550 - referências bibliográficas, 797 - vasodilatador de ação direta, 796 Anti-retroviral para nefropatia do HIV, 447 Antiácido - abuso de - - hipermagnesemia causada por, 235 - - hipofosfatemia associada a, 227 - - insuficiência renal crônica associada a, 683 - interação farmacológica com diurético de ação prolongada, 783 Antiadrenérgico - bloqueador do receptor alfa-1, 791 - características do, 790 - de ação central, 789 - de atuação periférica, 790 - para hipertensão, 789 - pontos-chave, 790 Antibacteriano - nefrotoxicidade do, 452 - para infecção do trato urinário, 503 - - dose única versus dose convencional, 503 - - quimioprofilaxia prolongada, 503 Antibiótico - aminoglicosídico, insuficiência renal aguda por, 389 - para doença renal policística, 586 - profilático pós-transplante renal, 950 - síndrome de Fanconi associada a, 573 Anticoagulação para hemodiálise contínua, 886, 912 - vantagens e desvantagens, 914 Anticoagulante - para ateroembolia renal, 523 - para síndrome do anticorpo antifosfolipídio, 531 - para trombose de veia renal, 521 Anticoncepcional oral - edema associado a, 151, 158 - hipertensão e, 552, 743, 745 Anticonvulsivante, 216
991 Anticorpo - monoclonal - - para transplante renal, 941 - - para vasculite renal, 435 - - trombose de artéria renal associada a, 520 - policlonal - - depressão medular e, 961 - - para transplante renal, 941 Antidepressivo tricíclico - hipertensão causada por, 743, 745 - interação farmacológica do HAD e, 783 - síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 Antidiurese, conceituação de, 100 Antiemético para alcalose metabólica, 181 Antiespasmódico para cólica renal, 615 Antiestrógeno, hipercalcemia por, 221 Antifibrinolítico, 533 Antifúngico, nefrotoxicidade do, 457 Antiinfeccioso, nefrotoxicidade do, 452 Antiinflamatório não-esteróide - edema causado por, 158 - hipercalemia por, 206 - hipertensão por, 743, 745 - insuficiência renal aguda por, 389 - interação farmacológica - - com beta-bloqueador, 788 - - com diurético - - - de ação prolongada, 783 - - - de ação rápida, 783 - - - poupador de potássio, 783 - nefrite intersticial induzida pelo, 17, 470, 476 - nefrotoxicidade do, 462 - - fatores de risco, 465 - - hipercalemia, 464 - - hipertensão, 465 - - insuficiência renal aguda - - - com dor lombar e hematúria, 464 - - - hemodinamicamente mediada, 462 - - - necrose cortical, 464 - - - nefrite intersticial aguda com síndrome nefrótica, 463 - - insuficiência renal crônica, 464 - - pontos-chave, 465 - - síndrome nefrótica sem IRA, 464 - - sódio, retenção de, 464 - para cólica renal, 615 - para diabetes insipidus, 116, 117 - para gota, 248, 249 - para hiperuricemia pós-transplante renal, 250 - para proteinúria, 404 Antimetabólito para transplante renal, 940 Antiviral, nefrotoxicidade do, 458 Anúria na glomerulonefrite crescêntica, 407 Aorta Angio-CT da, 298 Aparelho - justaglomerular, 8, 12 - - diagrama do, 12 - - estrutura do, 71 - urinário, investigação por imagem do - - na criança, 336-371 - - - bibliografia selecionada, 371 - - - cintilografia, 338 - - - considerações anatômicas, 340 - - - endereços na internet, 371 - - - indicações para investigação radiológica, 342 - - - na bexiga neurogênica, 305 - - - na hidronefrose, 357 - - - na infecção urinária, 365 - - - na nefrite, 368 - - - na trombose da veia renal, 370 - - - nas anomalias congênitas da bexiga, 354 - - - nas anomalias congênitas da uretra, 355 - - - nas anomalias congênitas do aparelho urinário, 344 - - - no refluxo, 361 - - - no tumor de Wilms, 369 - - - radiografia simples do abdome, 337 - - - ressonância magnética, 339 - - - tomografia computadorizada, 338 - - - ultra-sonografia, 337 - - - uretrocistografia miccional, 338 - - - urografia excretora, 337 - - no adulto, 294-314 - - - anatomia radiológica, 299 - - - angiografia, 298 - - - bibliografia selecionada, 313 - - - endereços na internet, 314 - - - introdução aos métodos de diagnóstico, 294 - - - na hipertensão arterial renovascular, 311 - - - na infecção urinária, 304 - - - na insuficiência renal, 313
992 - - - na litíase urinária, 300 - - - na massa expansiva renal, 308 - - - na papilite necrosante, 307 - - - na pielonefrite aguda, 304 - - - na pielonefrite crônica, 306 - - - na pielonefrite enfisematosa, 306 - - - na pielonefrite xantogranulomatosa, 306 - - - na síndrome de imunodeficiência adquirida, 308 - - - na trombose de veia renal, 313 - - - na tuberculose renal, 306 - - - nefrotomografia, 297 - - - no transplante renal, 313 - - - pielografia anterógrada, 298 - - - pielografia ascendente, 298 - - - radiografia simples do abdome, 296 - - - ressonância magnética, 299 - - - tomografia computadorizada, 298 - - - ultra-sonografia, 299, 315, 316 - - - urografia, 296 Apolipoproteína, 441 AQP, 64 Aquaporina, 64, 103 Arginina - mono-hidrocloreto para alcalose metabólica, 181 - urinária na hiperargininemia, 561 - vasopressina, 65 Arritmia cardíaca - hipertensão e, 747 - na hipermagnesemia, 236 - na hipocalcemia, 218 - na hipomagnesemia, 234 - na síndrome do desequilíbrio, 711 Arsênico, nefrotoxicidade do, 479 Artéria - ilíaca, 3 - renal, 4, 21 - - acessória, 5 - - aneurismas da, 334, 758 - - Angio-CT para, 298 - - arterite de Takayasu e lesões na, 758 - - embolia da, 520 - - estenose da, 17, 333, 758 - - - causas, 334 - - - imageamento, 334 - - fístula arteriovenosa, 758 - - interlobar, 21 - - interlobular, 21 - - oclusão da, 519, 520 - - pontos-chave, 5 - - trombose da, 520 - uterina, 3 Arteriografia - para carcinoma de células renais, 639 - para doador de transplante renal, 945 - para estenose da artéria renal, 745 - para hipertensão renovascular, 311, 760 - para trombose arterial renal, 520 - para tumor de Wilms, 369 Arteríola - aferente, 21, 23 - eferente, 21 - - esquema demonstrando a heterogeneidade da, 22 Arteriopatia urêmica calcificante, 722 Arterite - de Takayasu, 431 - - hipertensão renovascular e, 758 - reumatóide, proteína sérica amilóide na, 442 - temporal, 431 Articulação, uremia, manifestações na, 678 Artrite - gotosa, 245 - - em paciente transplantado, 250 - na vasculite necrotizante sistêmica, 433 - no lúpus eritematoso sistêmico, 425 - piogênica, 245 - reumatóide, 245 - séptica do urêmico sob diálise, 679 Artrópode peçonhento, 474 Ascite - em paciente sob diálise, 675 - peptídeo natriurético atrial na, 83 Aspergilose pós-transplante renal, 976, 983 Aspirina - agravamento da hiperuricemia pela, 249 - hipercalcemia causada por, 221 - litíase por ácido úrico e, 246 - para glomerulonefrite membranoproliferativa, 414 - para síndrome hemolítico-urêmica, 528 Astemizol
Índice Alfabético
- ajuste de dose na doença renal, 807 - cuidados especiais, 807 - dose normal da, 807 - farmacocinética da, 807 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Asterixe - na encefalopatia urêmica, 706 - na insuficiência renal aguda, 393 - na uremia, 676 Ataque isquêmico transitório, 531 Ataxia cerebelar - na doença de Hartnup, 563 - na encefalopatia de Wernicke, 712 Atenolol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 807 - características do, 788 - cardiosseletividade do, 788 - cuidados especiais, 807 - dose normal do, 807 - farmacocinética do, 807 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 807 - - hemodiálise, 807 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 807 Ateroembolia renal, 521 - dignóstico, 523 - manifestações clínicas, 522 - patologia, 522 - prognóstico, 523 - tratamento, 523 Ateroma, 521 Aterosclerose - e transplante renal, 855 - estenose da artéria renal e, 744 - hipertensão, 748 - - renovascular e, 743 Atorvastatina pós-transplante, 959 Atracúrio - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal do, 808 - farmacocinética do, 808 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808 Atrofia renal, 317 Aurofina - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal da, 808 - farmacocinética da, 808 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808 Auto-enxerto, 930 Azatioprina - ajuste de dose na doença renal, 808 - alopurinol em pacientes que usam, 251 - cuidados especiais, 808 - dose normal da, 808 - e resposta a terapia com eritropoetina, 699 - farmacocinética da, 808 - pancreatite e, 962 - para nefropatia lúpica na gravidez, 540 - para transplante renal, 940, 952 - - dose, 952 - - efeitos colaterais, 954 - - mecanismo de ação, 954 - para vasculite renal, 434 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808 - síndrome de Fanconi causada por, 573 Azitromicina, nefrite intersticial por, 470 Azlocilina - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal da, 808 - farmacocinética da, 808 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808
Aztreonam - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal do, 808 - farmacocinética do, 808 - nefrotoxicidade do, 454, 455 - para infecção do trato urinário, 504 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808
B Bacampicilina - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal da, 808 - farmacocinética da, 808 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808 Bacteremia na infecção do trato urinário, 500 Bactéria - infecção por, pós-transplante, 982 - na infecção do trato urinário, 496 - vasculite sistêmica causada por, 431 Bacteriúria na gravidez - assintomática, 540 - da gravidez, 502 - dificuldades para irradiação da, 505 - na infecção urinária, 492 - que não deve ser tratada, 504 - significante, 491 - testes para, 493 Balanço - de água, 146 - - na insuficiência renal crônica, 654 - - no organismo, 65 - de fosfato na insuficiência renal crônica, 656, 666 - de magnésio, 232 - de potássio - - excreção, 193 - - ingesta, 193 - - na insuficiência renal crônica, 655 - - transporte tubular renal, 193 - - - canais de K, 193 - - - no ramo ascendente da alça de Henle, 194 - - - no ramo descendente da alça de Henle, 194 - - - no túbulo distal, 194 - - - no túbulo proximal, 193 - - - reciclagem medular, 194 - de sódio, 133, 134 - - na insuficiência renal crônica, 653 - do cálcio, 214 - - na insuficiência renal crônica, 656, 666 - do fósforo, 225 - glomérulo-tubular, 137 - hídrico, 65 Barbitúrico - antidiurese induzida por, 67 - interação com ciclosporina, 467 - síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Bário, nefrotoxicidade do, 479 Base, conceito de, 163 Basiliximab para transplante renal, 953 - dose, 953 - efeito colateral, 956 Benazepril, 791 - características do, 792 - pré-droga, 792 Beribéri, edema associado a, 151 Beta-microglobulina, 441 - e uremia, 673 Betametasona - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal da, 808 - farmacocinética da, 808 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808 Betaxolol, 788 Bexiga - considerações anatômicas, 341 - duplicação da, 354
993
Índice Alfabético
- exposição da, a radiofármacos, 373 - neurogênica, 365, 366 - - bacteriúria em presença de, 505 - - incontinência urinária por, 268 - - retenção urinária na, 268 - - uropatia obstrutiva e, 320 - urinária, 3 Bezafibrato - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal do, 808 - farmacocinética do, 808 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808 Bicarbonato - aumento de concentração de, 178 - de sódio para hipercalemia, 208 - na alcalose metabólica, 178 - no líquido extracelular, 94, 95 - para acidose metabólica, 177 - para nefrolitíase pelo ácido úrico, 250 - perda de, 173 - - e acidose metabólica, 172 - reabsorção renal de, 139, 167, 168, 169 Bifosfonato - hiperfosfatemia causada por, 230 - para hipercalcemia, 224 Bikunina, 610, 613 Bilirrubina, 273 Biodisponibilidade de drogas, 800, 804-840 Biópsia - de nervo periférico na neuropatia urêmica, 710 - de pele na púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - de reto na nefropatia esquisossomática, 447 - muscular na miopatia urêmica, 711 - óssea na osteodistrofia renal, 725 - renal, 288, 322 - - complicações, 290, 323 - - contra-indicações, 288, 323 - - indicações, 288, 323 - - material necessário, 289 - - na doença renal policística, 583 - - na gravidez, 542 - - na hipertensão maligna, 526 - - na infecção do trato urinário, 495 - - na insuficiência renal aguda, 395 - - na nefrite intersticial aguda, 477 - - na nefropatia crônica, 684 - - na nefrosclerose hipertensiva benigna, 524 - - na púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - - na vasculite sistêmica necrotizante, 432 - - preparo do paciente, 289 - - técnica, 289, 323 Bismuto, nefrotoxicidade do, 479 Blastoma metanéfrico, 369 Blastomyces dermatitidis, 976 Bleomicina - ajuste de dose na doença renal, 808 - cuidados especiais, 808 - dose normal da, 808 - farmacocinética da, 808 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 808 - - hemodiálise, 808 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 808 Bloqueador(es) - beta-adrenérgico, 787 - - atividade simpaticomimética intrínseca do, 788 - - cardiosseletivos, 788 - - com atividade simpaticomimética intrínseca, 788 - - contra-indicações, 789 - - durante a gravidez, 551 - - hipercalemia associada da, 205, 857 - - indicações, 789 - - interação farmacológica do, 783 - - misto, 788 - - não-cardiosseletivos, 788 - - para doença renal policística, 586 - - para edema hepático, 780 - - para hipertensão - - - pós-transplante renal, 959 - - - renovascular, 765 - - para nefropatia diabética, 604 - do canal de cálcio, 793 - - derivados de benzodiazepina e papaverina, 793, 794 - - diidropiridina, 793, 794 - - durante a gravidez, 552
- - mecanismo de ação do, 793 - - para doença renal policística autossômica dominante, 586 - - para esclerodermia renal, 530 - - para hipertensão, 794 - - - maligna, 526 - - - pós-transplante renal, 959 - - - renovascular, 765 - - para pré-eclâmpsia, 550 - do receptor de angiotensina II, 795 - - contra-indicação na gravidez, 550, 552 - - efeito renoprotetor do, 772 - - interação farmacológica do, 783 - - nefrotoxicidade do, 465 - - para eritrocitose, 700 - - para hipertensão - - - pós-transplante renal, 959 - - - sistêmica, 781 - - para nefropatia diabética, 604, 774 - - para nefrosclerose hipertensiva benigna, 524 - - para poliglobulia, 960 - neuromuscular, interação farmacológica com diurético, 783 Bothrops, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473, 474 Bradicardia na hipermagnesemia, 236 Bradicinina, 78 Bretílio - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal do, 809 - farmacocinética do, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Bromocriptina - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal da, 809 - farmacocinética da, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Broncoespasmo, 182 Bronfeniramina - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal da, 809 - farmacocinética da, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Bumetanida - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal da, 809 - farmacocinética da, 777, 809 - interação farmacológica da, 783 - mecanismo de ação da, 776 - por via retal, 782 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Bupropion - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal do, 809 - farmacocinética do, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Buscopan, 615 Buspirona - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal da, 809 - farmacocinética da, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Bussulfan - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal do, 809
- farmacocinética do, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Butorfanol - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal do, 809 - farmacocinética do, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809
C Cádmio - intoxicação por - - acidose tubular renal, 574 - - síndrome de Fanconi, 573 - nefropatia tubulointersticial pelo, 479 Cafeína, interação com AINHs, 464 Caiçara, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Cãibra - na hiponatremia, 124 - na nutrição parenteral intradialítica, 866 - na síndrome do desequilíbrio, 711 - na uremia, 676 Calcificação metastática, 679 - arterial, 679 - periarticular, 679 Cálcio - absorção do, 214 - alterações no balanço de, na IRA, 392 - antagonistas do, 793 - controle da correção do balanço de, na IRC, 686 - disfunção no transporte de, 570 - distribuição do, 214 - distúrbios do, e progressão de insuficiência renal crônica, 671 - e secreção de renina, 73 - e vasoconstrição renal, 390 - exame de, no doador de transplante, 945 - excreção do, 214 - filtração renal do, 214 - funções no organismo, 215 - interação farmacológica do, 783 - intracelular, funções do, 793 - metabolismo de pós-transplante renal, 857 - necessidades pós-transplante renal, 858 - nefrite tubulointersticial crônica e, 480 - no líquido - - extracelular, 94 - - intracelular, 94, 95 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - para doença óssea adinâmica, 727 - para hipercalemia, 208 - para hipocalcemia, 218 - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - plasmático na IRC, 683 - reabsorção do, 214 - receptor extracelular do, 571 - sérico na osteodistrofia renal, 723 - uremia e distúrbios do, 674 Calcitonina - e amiloidogênese, 441 - e transporte do fosfato, 565 - na excreção de fósforo, 225, 226 - para hipercalcemia, 224 Calcitriol - e homeostase do cálcio, 215 - na insuficiência renal crônica, 666 - para hiperparatireoidismo secundário, 727 - para osteodistrofia renal, 726, 727 - para raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 Cálculo(s) - de indinavir, 459 - de ureter, 333 - exame de escolha para, 294 - hematúria assintomática por, 291 - no trato urinário, 609 - - do cristal ao, 610 - - tipos de, 611 - - tratamento do, 615 - renal, 3, 321 - - na doença cística renal, 581 - urinário(s)
994 - - causas de, 301 - - coraliforme, 301 - - de ácido úrico, 301 - - na gravidez, 541 - - - curso natural, 542 - - - diagnóstico, 541 - - - etiologia, 541 - - - tratamento, 542 - - radiografia para, 301 - - radiologia no, 300 - - radiopacos, 301 - - radiotransparente, 301 - uropatia obstrutiva por, 320 Cálice renal, 3 - maior, 2 - menor, 2 Calicreína, 77 Calidina, 78 Calor, edema associado a, 151 Canal de potássio, 193 Canamicina - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal da, 809 - farmacocinética da, 809 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Câncer - acidose tubular renal e, 574 - da tireóide, 216 - de bexiga, 320 - de cabeça e pescoço, 220 - de colo uterino, 320 - de mama - - hipercalcemia por, 220 - - hipocalcemia por, 217 - de próstata - - hipercalcemia por, 220 - - hipocalcemia por, 217 - - uropatia obstrutiva e, 320 - de pulmão, 220 - de rim, 220 - uso de diurético no, 785 Candesartan, 795 Candidíase - hipercalcemia na, 220 - nefropatia tubulointersticial associada a, 482 - pós-transplante renal, 976, 983 Capilar glomerular, 8, 9 Capreomicina - ajuste de dose na doença renal, 809 - cuidados especiais, 809 - dose normal da, 809 - farmacocinética da, 809 - interação farmacológica da, 809 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 809 - - hemodiálise, 809 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 809 Cápsula renal, 1 - de Bowman, 8 - - estrutura da, 8 - - imagem de microscopia eletrônica da, 11 Captopril, 791 - ajuste de dose na doença renal, 810 - características do, 792 - cuidados especiais, 810 - dose normal do, 810 - farmacocinética do, 810 - na avaliação de hipertensão renovascular, 378 - nefrite intersticial causada por, 470 - nefrotoxicidade do, 466 - no controle da pressão intraglomerular, 671 - para cistinúria clássica, 562 - para hipertensão maligna, 526 - para nefrolitíase, 617 - para poliglobulia, 960 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 - teste de, para avaliação de hipertensão, 752 Carbamazepina - ajuste de dose na doença renal, 810 - antidiurese induzida por, 67 - cuidados especiais, 810
Índice Alfabético
- dose normal da, 810 - farmacocinética da, 810 - interação com ciclosporina, 467 - nível sérico terapêutico da, 841 - para diabetes insipidus central, 117 - para neuropatia urêmica, 710 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 - síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 Carbapenem, nefrotoxicidade do, 454, 455 Carbenicilina - ajuste de dose na doença renal, 810 - cuidados especiais, 810 - dose normal da, 810 - farmacocinética da, 810 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 Carbidopa - ajuste de dose na doença renal, 810 - cuidados especiais, 810 - dose normal da, 810 - farmacocinética da, 810 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 Carboidrato - necessidades - - na insuficiência renal - - - aguda, 845 - - - crônica, 849 - - pós-transplante renal, 858 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854 - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 Carbonato de cálcio - para hiperfosfatemia, 231 - para osteodistrofia renal, 726, 727 Carboplatina, nefrotoxicidade da, 472 Carcinoma - das vias urinárias, 385 - de células renais, 321, 635 - - biologia molecular, 637 - - claras, 636 - - controle de cura, 643 - - cromófobas, 636 - - diagnóstico, 638 - - - diferencial, 641 - - - exames de imagem, 639 - - - exames laboratoriais, 639 - - - quadro clínico, 638 - - e trombose de veia renal, 521 - - epidemiologia, 635 - - estadiamento, 641 - - etiologia, 635 - - história natural, 638 - - imunologia, 637 - - macroscopia de, 636 - - multicístico, 636 - - patologia, 635 - - prognóstico, 643 - - ressonância magnética no, 331 - - sinais e sintomas, 321 - - tratamento, 642 - - ultra-sonografia para, 321 - de pelve renal, 645 - - diagnóstico, 645 - - epidemiologia, 645 - - estadiamento, 646 - - patologia, 645 - - tratamento, 646 - de próstata, 385 - de rim - - cintilografia do esqueleto no, 385 - - urografia excretora no, 308 - hiperuricemia secundária ao, 243 Cardiopatia - congênita, acidose tubular renal e, 574 - edema na, 150 Cardiotoxicidade da fosfomicina, 822 Carmustina - ajuste de dose na doença renal, 810 - cuidados especiais, 810 - dose normal da, 810 - farmacocinética da, 810 - reposição após
- - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 Carnitina, 699 Carteolol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 810 - características do, 788 - cuidados especiais, 810 - dose normal do, 810 - farmacocinética do, 810 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 Carvedilol - atividade alfa- e beta-bloqueadora, 789 - características do, 788 Cascavel, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Catarata - na galactosemia, 561 - na síndrome óculo-cérebro-renal de Lowe, 561 - pós-transplante renal, 960 Catecolamina - e excreção de água, 103 - na homeostasia do potássio, 196 Cátions, 91 CAVH, 908, 909 CAVHD, 910 CAVHDF, 909, 910 Caxumba, 531 Cefaclor - ajuste de dose na doença renal, 810 - cuidados especiais, 810 - dose normal do, 810 - farmacocinética do, 810 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 Cefadroxil - ajuste de dose na doença renal, 810 - cuidados especiais, 810 - dose normal do, 810 - farmacocinética do, 810 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 Cefaléia - na hipercalcemia, 222 - na hipertensão maligna, 526 - na hiponatremia, 124 - na síndrome do desequilíbrio, 711 - na uremia, 675 - por rejeição de transplante, 716 Cefalexina - ajuste de dose na doença renal, 810 - cuidados especiais, 810 - dose normal da, 810 - farmacocinética da, 810 - para bacteriúria na gravidez, 540 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 810 - - hemodiálise, 810 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 810 Cefaloglicina, nefrotoxicidade da, 454 Cefaloridina, nefrotoxicidade da, 454 Cefalosporina - insuficiência renal aguda induzida por, 389 - interação farmacológica da, 783 - nefrite intersticial causada por, 470, 476 - nefrotoxicidade da, 454 - para infecção do trato urinário, 504 - - na gravidez, 540 - pós-transplante renal, 950 - síndrome de Fanconi associada a, 573 Cefalotina - ajuste de dose na doença renal, 811 - cuidados especiais, 811 - dose normal da, 811 - farmacocinética da, 811 - interação farmacológica da, 811 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 811 - - hemodiálise, 811 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 811 Cefamandole - ajuste de dose na doença renal, 811 - cuidados especiais, 811
Índice Alfabético
- dose normal do, 811 - farmacocinética do, 811 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 811 - - hemodiálise, 811 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 811 Cefapirina - ajuste de dose na doença renal, 811 - cuidados especiais, 811 - dose normal da, 811 - farmacocinética da, 811 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 811 - - hemodiálise, 811 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 811 Cefazolina, 950 Cefixima - ajuste de dose na doença renal, 811 - cuidados especiais, 811 - dose normal da, 811 - farmacocinética da, 811 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 811 - - hemodiálise, 811 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 811 Cefmenoxima - ajuste de dose na doença renal, 811 - cuidados especiais, 811 - dose normal da, 811 - farmacocinética da, 811 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 811 - - hemodiálise, 811 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 811 Cefonicida - ajuste de dose na doença renal, 811 - cuidados especiais, 811 - dose normal da, 811 - farmacocinética da, 811 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 811 - - hemodiálise, 811 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 811 Cefoperazona - ajuste de dose - - na doença renal, 811 - - na icterícia, 811 - cuidados especiais, 811 - dose normal da, 811 - farmacocinética da, 811 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 811 - - hemodiálise, 811 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 811 Ceforanida - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Cefotaxima - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Cefotetan - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal do, 812 - farmacocinética do, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Cefoxitina - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812
- - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Cefradina - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Cefroxadina - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Cefsulodina - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Ceftazidina - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Ceftizoxima - ajuste de dose na doença renal, 812 - cuidados especiais, 812 - dose normal da, 812 - farmacocinética da, 812 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 812 - - hemodiálise, 812 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 812 Ceftriaxona - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Cefuroxima - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Célula - endotelial, 10, 20, 21 - epitelial - - parietal, 12 - - visceral, 11 - mesangial, 10, 21 - peripolar, 13 Celulite, 245 Cephalosporum acremonium, 454 Cérebro, hipertensão, comprometimento do, 746 Cetamina - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Cetoacidose - diabética, 173 - - hipermagnesemia causada por, 235 - - hiperuricemia secundária à, 243 - - tratamento, 176 - do etilismo, 173
995 - - tratamento, 176 - por jejum prolongado, 173 Cetoconazol - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal do, 813 - farmacocinética do, 813 - hipocalcemia causada por, 216 - para hipercalcemia, 225 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Cetoprofeno - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal do, 813 - farmacocinética do, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Cetrizina - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 CHFD, 910 Choque, acidose láctica no, 173 Chumbo - intoxicação por - - acidose tubular renal, 574 - - síndrome de Fanconi, 573 - nefropatia tubulointersticial pelo, 479 Cicatriz renal, 508 - associada a infecção urinária, 508 - hipertensão arterial e, 512, 513 - vs. acidente renovascular em recém-nascido e lactente, 511 - vs. atrofia pós-obstrutiva após obstrução urinária, 511 - vs. lobulação fetal persistente, 511 Ciclacilina - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Ciclamato, nefrotoxicidade do, 576 Ciclofosfamida - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - para glomerulonefrite - - crescêntica, 409 - - de lesões mínimas, 416 - - membranoproliferativa, 414 - - membranosa, 419 - para glomerulosclerose focal e segmentar, 417 - para nefrite intersticial aguda, 477 - para nefropatia lúpica na gravidez, 540 - para púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - para síndrome de Goodpasture, 438 - para vasculite renal, 434 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Ciclooxigenase, 28 Ciclopropano, interação farmacológica do, 783 Cicloserina - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Ciclosporina, 466 - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813
996 - dose normal da, 813 - drogas que interferem com o metabolismo da, 467 - e resposta a terapia com eritropoetina, 699 - efeitos adversos sobre o sistema nervoso, 715 - endotelina e uso de, 86 - estrutura da, 466 - farmacocinética da, 813 - filtração glomerular e uso de, 33 - hipercalemia pela, 857 - hiperuricemia causada por, 243 - hipomagnesemia e uso de, 233 - insuficiência renal aguda causada por, 389 - interação farmacológica com diurético - - de ação prolongada, 783 - - poupador de potássio, 783 - nefrotoxicidade da, 466, 467, 469 - - aguda, 467 - - crônica, 469 - nível sérico terapêutico da, 841 - para glomerulonefrite de lesões mínimas, 416 - para glomerulosclerose focal e segmentar, 417 - para nefropatia do HIV, 447 - para transplante renal, 940, 952 - - dose, 952 - - efeitos colaterais, 954 - - mecanismo de ação, 954 - propriedades da, 466 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 - sulfinpirazona e redução dos níveis de, 251 - trombose da artéria renal associada a, 520 Cidofovir, nefrotoxicidade do, 459 Cifoescoliose, acidose respiratória causada por, 182 Cilastatina - ajuste de dose na doença renal, 813 - cuidados especiais, 813 - dose normal da, 813 - farmacocinética da, 813 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 813 - - hemodiálise, 813 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 813 Cilazapril, 791, 792 Cilindrúria - na vasculite sistêmica necrotizante, 432 - por uso - - de anfotericina B, 458 - - de pentamidina, 457 Cimetidina - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal da, 814 - farmacocinética da, 814 - insuficiência renal aguda induzida por, 389 - interação farmacológica com beta-bloqueador, 789 - nefrite intersticial, 470, 476 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Cinina, 77 - e secreção de renina, 73 - receptores para, 78 Cininase, 77 - II, 78 Cininogênio, 77 Cinoxacin - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal do, 814 - farmacocinética do, 814 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Cintilografia - com diurético para uropatia obstrutiva, 625 - estática para pielonefrite crônica, 306 - na agenesia renal, 344 - na criança, 338 - na doença inflamatória renal, 321 - na estenose da artéria renal, 745 - na mielomeningocele, 342 - na nefrite intersticial aguda, 477 - na nefropatia do refluxo, 507, 510 - na osteodistrofia renal, 725 - na pielonefrite aguda, 305
Índice Alfabético
- na trombose - - arterial renal, 520 - - de veia renal, 370 - para válvula uretral, 355 - renal - - estática, 383 - - - indicações da, 384 - - - interpretação da, 384 - - - metodologia, 383 - - para avaliação do rim transplantado, 382 - - para insuficiência renal aguda, 395 - - para refluxo vésico-ureteral, 381 Ciprofloxacina - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal da, 814 - farmacocinética da, 814 - insuficiência renal aguda induzida por, 389 - nefrotoxicidade da, 457 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Circulação - arterial renal, 519 - linfática, 5 - renal, 20-28 - - anatomia da, 21 - - - esquema demostrando a morfologia das arteríolas eferentes, 22 - - - pontos-chave, 23 - - - representação da organização do rim de cão, 23 - - diagrama ilustrando a, 4 - - distribuição intra-renal do fluxo sangüíneo, 25 - - - cortical, 25 - - - medular, 25 - - - regulação da, 26 - - introdução, 20 - - medidas do fluxo sangüíneo renal, 24 - - - fluxo sangüíneo renal total, 24 - - - métodos de medida, 24 - - pontos-chave, 5, 28 - - regulação da - - - auto-regulação do fluxo sangüíneo renal, 26 - - - inervação renal, 26 - - - mecanismos de ativação em resposta a estímulo, 28 - - - regulação parácrina da microcirculação renal, 27 - - - teoria do feedback túbulo-glomerular, 27 - - - teoria miogênica, 27 Cirrose - biliar, 576 - hepática - - acidose tubular renal e, 576 - - edema associado a, 151, 154 - - - função renal, 155 - - - prostaglandinas, 155 - - - renina-angiotensina-aldosterona, 155 - - glomerulopatia e, 444 - - na hipertirosinemia, 561 - - peptídeo natriurético atrial na, 83 - - sistema calicreína-cinina na, 80 - hiponatremia na, 125 Cirurgia - hipercalemia pós, 205 - hipomagnesemia pós, 233 - para cisto renal, 590 - para hipertensão renovascular, 765 - para trombose arterial renal, 521 Cisplatina - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal da, 814 - farmacocinética da, 814 - hipocalemia induzida por, 201 - hipomagnesemia e uso de, 233 - insuficiência renal aguda causada por, 389 - nefrotoxicidade da, 471 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 - síndrome de Fanconi causada por, 573 Cistatina, 36 - e amiloidogênese, 441 - plasmática, 284 Cistina, 480 Cistinose, 480 - achados clínicos, 561 - acidose tubular renal e, 574
- dados laboratoriais, 561 - diagnóstico, 480 - envolvimento renal na, 480 - observações, 561 - síndrome de Fanconi por, 573 Cistinúria, 613 - acetazolamida para, 782 - clássica, 560 - - manifestações clínicas, 561 - - terapêutica da, 562 - e insuficiência renal crônica, 683 Cistite - bacteriana na gravidez, 540 - hemorrágica - - bussulfan e, 809 - - com ciclofosfamida, 813 - - com ifosfamida, 825 Cisto - aracnóide na doença policística renal, 587 - de pâncreas na doença policística renal, 587 - diabetes insipidus pituitário e, 113 - periférico, diagnóstico falso-positivo de uropatia obstrutiva e, 320 - renal, 345, 580 - - adquirido, 345 - - angiografia no, 299 - - características de um, 583 - - complicado, 309, 310 - - cortical, 345 - - do seio renal, 581 - - exame de escolha para, 294 - - multilocular, 346 - - na criança, 345 - - - multilocular, 346 - - pielocalicial, 581 - - punção de, 324 - - radiologia no, 308 - - relacionado a hipocalemia, 581 - - ressonância magnética no, 329, 330 - - simples, 345, 580, 581, 632 - - - à tomografia computadorizada, 632 - - - à ultra-sonografia, 632 - - - características do, 581 - - solitário, 345 - - tomografia computadorizada para, 309 - - ultra-sonografia no, 310 - - urografia excretora no, 308 - umbilical, 354 Cistocintilografia, 381, 382 Cistoscopia, 395 Cistouretrografia - miccional para refluxo vésico-ureteral, 381 - para infecção do trato urinário, 494 Citocina - e osteodistrofia renal, 720 - e uremia, 673 Citocromo P-450, 28 Citomegalovírus, infecção por - cidofovir para, 459 - glomerulonefrite, 448 - glomerulopatia, 448 - pancreatite por, 962 - - pós-transplante renal, 978, 980 Citoprofen, nefrotoxicidade do, 464 Citosina arabinosídeo - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal da, 814 - farmacocinética da, 814 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Citotóxico - hiperuricemia e uso de, 243 - para glomerulonefrite - - crescêntica, 409 - - membranosa, 419 - para glomerulosclerose focal e segmentar, 417 - para nefrite intersticial aguda, 477 - para nefropatia por IgA, 411 Citrato - anticoagulação na hemodiálise contínua com, 912 - de cálcio para hipocalcemia, 218 - de potássio para nefrolitíase, 250 - para nefrolitíase, 617 Clearance - da uréia, 284 - de água livre, 110
997
Índice Alfabético
- de creatinina, 281 - - durante a gravidez, 539 - - fórmula para cálculo do, 281 - - média do, 284 - - técnica para determinação do, 283 - do ácido úrico, 241 - osmolar, 110 Clindamicina - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal da, 814 - farmacocinética da, 814 - interação farmacológica da, 814 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Clofibrato - ajuste de dose na doença renal, 814 - antidiurese induzida por, 67 - cuidados especiais, 814 - dose normal do, 814 - farmacocinética do, 814 - para diabetes insipidus, 117 - - central, 116, 117 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 - síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Clonazepam - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal do, 814 - farmacocinética do, 814 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Clonidina - ajuste de dose na doença renal, 814 - características da, 790 - cuidados especiais, 814 - dose da, 790 - - normal, 814 - edema causado por, 158 - efeitos adversos, 789 - farmacocinética da, 814 - mecanismo de ação, 789 - número de tomadas, 790 - para hipertensão, 789 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Clorambucil - para glomerulonefrite membranosa, 419 - para glomerulosclerose focal e segmentar, 417 Cloranfenicol - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal do, 815 - farmacocinética do, 815 - nível sérico terapêutico do, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Clorazepam - ajuste de dose na doença renal, 814 - cuidados especiais, 814 - dose normal do, 814 - farmacocinética do, 814 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 814 - - hemodiálise, 814 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 814 Clordiazepóxido - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal do, 815 - farmacocinética do, 815 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Cloreto - de amônio para alcalose metabólica, 181 - de cálcio para hipocalcemia, 218
- de lantânio, 726 - de sódio, reabsorção de - - na alça de Henle, 142 - - no túbulo contornado distal, 142 Clorfeniramina - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal da, 815 - farmacocinética da, 815 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Cloro - cálculo da necessidade básica de, 256 - no líquido - - extracelular, 94 - - intracelular, 94, 95 - reabsorção de, no túbulo contornado proximal, 139 - transporte do - - na alça de Henle, 45 - - no túbulo - - - contornado distal, 46 - - - de conexão, 46 - - - proximal, 42, 43 - urinário na depleção de volume extracelular, 148 Cloroquina - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal da, 815 - farmacocinética da, 815 - hipocalemia causada por, 200 - para hipercalcemia, 225 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Clorotiazida - farmacocinética da, 777 - mecanismo de ação da, 776 - para diabete insípido nefrogênico, 573 Clorpromazina - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal da, 815 - farmacocinética da, 815 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Clorpropamida - ajuste de dose na doença renal, 815 - antidiurese induzida por, 67 - cuidados especiais, 815 - dose normal da, 815 - farmacocinética da, 815 - para diabetes - - insipidus central, 116, 117 - - mellitus, 116 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 - síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Clortalidona - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal da, 815 - farmacocinética da, 777, 815 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Clostridium difficile, diarréia por, 455 Cloxacilina - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal da, 815 - farmacocinética da, 815 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Clozapina, nefrite intersticial por, 470 CO2 - eliminação do, 164 - na acidose respiratória, 182 - na alcalose respiratória, 183 - produção diária de, 164
Coarctação da aorta, 743 Cobre, nefrotoxicidade do, 479 Cocaína - insuficiência renal aguda causada por, 389 - trombose da artéria renal associada a, 520 Coccidioides immitis após transplante renal, 976 Coccidioidomicose, hipercalcemia na, 220 Codeína - ajuste de dose na doença renal, 815 - cuidados especiais, 815 - dose normal da, 815 - farmacocinética da, 815 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 815 - - hemodiálise, 815 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 815 Colágeno da membrana basal, 9 - tipo IV, 9 - tipo V, 10 Colagenose e insuficiência renal crônica, 683 Colangiocarcinoma na doença renal policística, 587 Colchicina - administração de - - ciclosporina, 250 - - tacrolimus, 250 - ajuste de dose na doença renal, 816 - cuidados especiais, 816 - dose normal da, 816 - farmacocinética da, 816 - hipocalcemia e, 216 - para gota, 248, 249 - para hiperuricemia no transplante renal, 250 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 816 - - hemodiálise, 816 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 816 Cólera, 191 Colesterol - na insuficiência renal aguda, 845 - para avaliação de hipertensão, 752 Colestiramina - ajuste de dose na doença renal, 816 - com diurético - - de ação prolongada, 783 - - poupador de potássio, 783 - cuidados especiais, 816 - dose normal da, 816 - farmacocinética da, 816 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 816 - - hemodiálise, 816 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 816 Cólica - nefrítica, 613, 614 - renal - - durante a gravidez, 541 - - - tratamento, 542 - - na criança, 343 - - - em menino de nove anos de idade, 344 - - tomografia computadorizada na, 304 - - tratamento da, 615 Colite ulcerativa, 191 Coma - na acidose respiratória, 182 - na hipercalcemia, 222 - na hipernatremia, 118 - na hipertensão maligna, 526 - na hiponatremia, 124 - na uremia, 675 Complemento, alterações do, 412, 414 Comportamento, distúrbio do, na encefalopatia urêmica, 706 Concentração - molal, 91 - molar, 91 Condrocalcinose, 245 Confusão mental - na acidose respiratória, 182 - na hipercalcemia, 222 - na síndrome do desequilíbrio, 711 - por rejeição de transplante, 716 Constipação - na hipercalcemia, 222 - na hipocalcemia, 218 Contraste radiológico - insuficiência renal aguda causada por, 389 - na ressonância magnética, 299, 329 - na urografia excretora, 297 - nefrotoxicidade do, 460
998 - uricosúria induzida por, 252 Convulsão - na encefalopatia urêmica, 706, 707 - na glomerulonefrite pós-estreptocócica, 405, 407 - na hipernatremia, 118 - na hipertensão maligna, 526 - na hipocalcemia, 217 - na hipomagnesemia, 234 - na hiponatremia, 124 - na histidinúria, 563 - na insuficiência renal aguda, 393 - na metioninúria, 563 - na pré-eclâmpsia, 550 - na síndrome - - da secreção inapropriada de HAD, 123 - - do desequilíbrio, 711 - na uremia, 675 - na vasculite sistêmica necrotizante, 433 - por rejeição de transplante, 716 - por uso de ciclosporina, 715 Coração, hipertensão, comprometimento do, 747 Cordão nefrogênico, 5 Coriocarcinoma, 472 Coronariopatia - na uremia, 675 - pós-transplante, 962 Corpo(s) - cetônicos, 273 - estranho de vias aéreas, 182 Córtex renal, 2, 3 Corticosteróide - efeitos adversos sobre o sistema nervoso, 715 - hipertensão causada por, 745 - interação farmacológica com diurético de ação - - prolongada, 783 - - rápida, 783 - litíase pelo ácido úrico e, 247 - na excreção de fósforo, 225, 226 - pancreatite e, 962 - para ateroembolia renal, 523 - para crioglobulinemia, 441 - para edema, 159 - para glomerulonefrite - - crescêntica, 409 - - membranoproliferativa, 414 - - membranosa, 419 - - por lesões mínimas, 415 - - por vírus C, 444 - para glomerulosclerose focal e segmentar, 417 - para gota, 249 - para hipercalcemia, 223 - para hiperuricemia no transplante renal, 251 - para nefrite intersticial aguda, 477 - para nefropatia - - do HIV, 447 - - por IgA, 411 - para síndrome - - de Goodpasture, 438 - - do anticorpo antifosfolipídio, 531 - para transplante renal, 940, 951 - - dose, 951 - - efeito colateral, 954 - para vasculite renal, 434 Cortisol e desnutrição na IRC, 844 Cortisona - ajuste de dose na doença renal, 816 - cuidados especiais, 816 - dose normal da, 816 - farmacocinética da, 816 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 816 - - hemodiálise, 816 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 816 Craniofaringioma, 113 Creatinina, 682 - clearance da, 36, 281 - - relação com a idade, 283 - - técnica para determinação do, 283 - excreção de, 281 - - no idoso, 682 - - no renal crônico, 682 - na depleção de volume extracelular, 147 - no diabete insípido nefrogênico, 573 - plasmática - - elevada e risco de hipertensão, 744 - - na glomerulonefrite - - - crescêntica, 407 - - - membranosa, 418 - - - por lesões mínimas, 415
Índice Alfabético
- - na insuficiência renal crônica, 683 - - no diagnóstico diferencial de glomerulonefrites, 420 - - no início da IRC, 662 - - para avaliação de hipertensão, 752 - produção de, 281 - sérica, 281 - - durante a gravidez, 539 - - e uso - - - de ciclosporina, 467 - - - de cidofovir, 459 - - na lesão renal nefrotóxica, 451 - - na nefrolitíase, 614 - - na nefrosclerose hipertensiva benigna, 524 - - na trombose de artéria renal, 520 - - na vasculite - - - renal, 435 - - - sistêmica necrotizante, 432 Crescimento, distúrbio de, pós-transplante renal, 960 Crioglobulinemia, 441 - acidose tubular renal associada a, 576 - envolvimento renal na, 441 - nefropatia tubulointersticial na, 481 - pontos-chave, 441 Crise - de feocromocitoma, 753 - hipertensiva, 752 - - com retirada intempestiva de antiadrenérgicos, 789 - - fenelzine e, 821 Cristalúria, 610 Cromo na insuficiência renal aguda, 846 Crotalus, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Cryptococcus neoformans pós-transplante renal, 983 Cumarínico, nefrotoxicidade do, 574 CVVH, 909 CVVHD, 910 CVVHDF, 910
D Daclizumab para transplante renal, 953 - dose, 953 - efeito colateral, 956 Dapsona, nefrotoxicidade da, 457 Darbepoetina alfa, 700 Daunorrubicina - ajuste de dose na doença renal, 816 - cuidados especiais, 816 - dose normal da, 816 - farmacocinética da, 816 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 816 - - hemodiálise, 816 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 816 Deferoxamina, 728 - ajuste de dose na doença renal, 816 - cuidados especiais, 816 - dose normal da, 816 - farmacocinética da, 816 - para intoxicação pelo alumínio, 727 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 816 - - hemodiálise, 816 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 816 Delírio na encefalopatia de Wernicke, 712 Demeclociclina, nefrotoxicidade da, 456 Densidade urinária, 273 Depressão - medular pós-transplante, 961 - na hipocalcemia, 218 - na uremia, 675 Dermatite - com amilorida, 782 - com trianterene, 782 Derrame periférico na IRA, 393 Desidratação, 146 - e risco de nefrotoxicidade por contraste, 461 - na cistinose, 561 Desidrogenase láctica na trombose de artéria renal, 520 Desipramina - ajuste de dose na doença renal, 816 - cuidados especiais, 816 - dose normal da, 816 - farmacocinética da, 816 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 816 - - hemodiálise, 816 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 816
Desmopressina - apresentação da, 116 - doses da, 116 - para diabetes insipidus central, 116 Desnutrição - e resposta a terapia com eritropoetina, 699 - edema associado a, 151 - em paciente sob hemodiálise, 850 - linfopenia durante diálise e, 701 - na doença renal, 843 - na intolerância lisinúrica protéica, 562 - no transplante renal, 855 Dexametasona - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal da, 817 - farmacocinética da, 817 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Dextran - e permeabilidade glomerular, 33 - neutro, clearance fracional do, 34 - para síndrome hemolítico-urêmica, 528 - quarenta, 266 - setenta, 266 - - composição do, 263 - sulfato, clearance fracional do, 34 Diabetes - insipidus - - central, 113 - - - causas de, 113 - - - diagnóstico, 115 - - - familiar, 113 - - - manifestações clínicas, 115 - - - tratamento do, 116 - - hipernatremia no, 113 - - hiperuricemia secundária ao, 243 - - nefrogênico, 114, 572 - - - causas de, 114 - - - com anfotericina B, 807 - - - diagnóstico de, 115 - - - diurético para, 781 - - - manifestações clínicas, 115 - - - na nefropatia da anemia falciforme, 532 - - - pelo lítio, 478 - - - pontos-chave, 572 - - - tratamento do, 117 - - pituitário, 113 - - sede no, 101 - - uropatia obstrutiva e, 320 - mellitus - - alterações ortostática de pressão arterial no, 147 - - bacteriúria em presença de, 505 - - biópsia renal no, 288 - - cetoácidos formados no, 164 - - doença - - - óssea adinâmica pelo, 678 - - - vascular encefálica pós-transplante renal, 715 - - e risco de nefrotoxicidade por contraste, 461 - - edema associado ao, 151 - - eritrocitose pós-transplante e, 700 - - hiperfiltração glomerular no, 35 - - hiperglicemia sem glicosúria no, 117 - - hipertensão e, 748, 749 - - hipofosfatemia e, 227 - - insuficiência crônica renal causada por, 663, 683, 684 - - microangiopatia capilar do, 158 - - necrose papilar renal no, 500 - - nefropatia do, 270, 597, 773 (v.tb. nefropatia diabética) - - nictúria por, 268 - - osmolalidade do soluto no, 92 - - pielonefrite - - - aguda e, 304 - - - enfisematosa e, 306 - - pós-transplante renal, 960 - - sede no, 101 - - tonicidade do soluto no, 92 Dialisador, 878 - de fibras ocas, desenho de um, 879 - reúso de, 894 - utilizado no Brasil, 880 Diálise - acesso vascular à, 883 - - complicações, 885 - antagonista do cálcio em paciente sob, 794 - complicações da - - ateroscleróticas, 681
999
Índice Alfabético
- - arritmia, 899 - - choque pirogênico, 899 - - embolia gasosa, 899 - - hemólise, 899 - - hemorragia, 899 - - no sistema nervoso, 711 - - - déficit cognitivo agudo, 713 - - - encefalopatia de Wernicke, 712 - - - hematoma subdural, 712 - - - mononeuropatia por fístula artério-venosa, 711 - - - síndrome diálise-demência, 712 - - - síndrome do desequilíbrio, 711 - - pancreatite, 899 - - por reação a material componente do processo, 898 - - relacionadas a fisiologia, 897 - - trombose, 899 - de alto fluxo contínua, 910 - de urgência, 872 - diária estendida, 910 - e cisto renal, 580 - eletiva, 872 - escolha do método de, 400 - hemólise em pacientes sob, 694 - incidência de pacientes em tratamento de, 663 - indicação de, 687 - iniciação em, 871 - manejo nutricional na, 862 - moléculas médias e, 673 - na doença - - óssea adinâmica, 727 - - renal policística autossômica dominante, 588 - na gravidez, 542, 543 - na vasculite renal, 435 - orientações para a prática de, 662 - osteodistrofia renal e, 722 - para alcalose metabólica, 181 - para edema renal, 780 - para esclerodermia renal, 530 - para glomerulonefrite - - crescêntica, 408 - - pós-estreptocócica, 407 - para hipercalcemia, 225 - para hipercalemia, 210 - para insuficiência renal aguda, 396 - para nefropatia - - crônica pelo ácido úrico, 250 - - da anemia falciforme, 533 - - diabética, 597 - - do HIV, 447 - para nefrosclerose hipertensiva arteriolar benigna, 524 - perdas de folato pela, 694 - peritoneal, 919-928 - - adequacidade da, 923 - - - índices clínicos e laboratoriais, 924 - - ambulatorial contínua, 923 - - - causas de desnutrição em, 853 - - - necessidades nutricionais de paciente sob, 853, 854, 855 - - - para neuropatia urêmica, 710 - - - reposição de dose, de drogas após, 804-840 - - ambulatorial diária, 923 - - automatizada contínua, 923 - - cateter para, 922 - - - implante do, 922 - - - período de adaptação, 922 - - complicações, 924 - - - falha de ultrafiltração, 925 - - - infecciosas, 924 - - - mecânicas, 925 - - - metabólicas, 926 - - contra-indicação de, 922 - - endereços na internet, 928 - - grupos especiais de pacientes, 926 - - hiperosmolalidade e, 117 - - histórico, 919 - - indicação de, 921, 922 - - intermitente, 923 - - membrana peritoneal - - - anatomia, 920 - - - fisiologia, 920 - - - patofisiologia, 921 - - modalidades de, 923 - - noturna, 923 - - novas soluções de, 927 - - para intoxicação pelo alumínio, 727 - - perspectivas futuras, 927 - - referências bibliográficas, 927 - - seleção, 921, 923 - prevalência de pacientes em tratamento de, 663
- princípios de troca em, 874 - síndrome musculoesquelética e, 679 - sustentada de baixa eficiência, 910 Diarréia - depleção - - de potássio na, 191 - - de sódio causada por, 146 - hipocalemia causada por, 200 - hipofosfatemia e, 227 - hipomagnesemia e, 233 - litíase por ácido úrico e, 246 - na doença de Hartnup, 563 - na hipertirosinemia, 561 - na hipocalcemia, 218 - na infecção urinária, 492 - na nefrolitíase, 613 - na uremia, 674, 675 - perda de sódio na, 133 - por depleção de volume extracelular, 146 - sede e, 101 Diazepam - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal do, 817 - farmacocinética do, 817 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Diazóxido - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal do, 817 - edema causado por, 158 - farmacocinética do, 817 - interação farmacológica do, 783 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Diclofenaco - nefrotoxicidade do, 464 - para cólica renal, 615 Dicloxacilina - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal da, 817 - farmacocinética da, 817 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Dieta - carcinoma de células renais e, 635 - hiperuricemia secundária ao uso de, 242, 243 - hipocalemia causada por, 200 - intolerância lisinúrica protéica, 562 - para cistinúria, 562 - para diabetes insipidus, 117 - - nefrogênico, 573 - para distúrbio hidroeletrolítico na insuficiência renal, 686 - para doença - - de Dent, 569 - - de Hartnup, 563 - para edema, 159 - - hepático, 780 - para glomerulonefrite pós-estreptocócica, 407 - para gota, 249 - para hiperfosfatemia na IRC, 687 - para insuficiência renal, 847 - - crônica, 685 - - estudo MDRD, 847 - para metioninúria, 563 - para nefropatia - - diabética, 600, 603 - - por IgA, 411 - para osteodistrofia renal, 727 - para profilaxia de cálculo urinário, 616 - para proteinúria, 405 - para redução de proteinúria, 686 - para rejeição de transplante, 968 - para síndrome de Fanconi, 564 - purina da, 248 - sem purina, 240 Difenidramina - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal da, 817
- farmacocinética da, 817 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Difenilidantoína - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal da, 817 - farmacocinética da, 817 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Difilina - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal da, 817 - farmacocinética da, 817 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Diflunisal - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal do, 817 - farmacocinética do, 817 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Difteria, nefrite intersticial aguda na, 476 Difusão, 91 Digital, intoxicação pelo - hipercalemia associada a, 205 Digitoxina - ajuste de dose na doença renal, 817 - cuidados especiais, 817 - dose normal da, 817 - farmacocinética da, 817 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 817 - - hemodiálise, 817 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 817 Digoxina - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal da, 818 - farmacocinética da, 818 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Dilevalol - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal do, 818 - farmacocinética do, 818 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Diltiazem - ajuste de dose na doença renal, 818 - características do, 795 - cuidados especiais, 818 - dose normal do, 818 - farmacocinética do, 818 - interação com ciclosporina, 467, 794, 959 - nefrite intersticial causada por, 470 - para hipertensão pós-transplante renal, 959 - pós-transplante, 794 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Dimetilclortetraciclina, diabetes insipidus por, 115 Dipiridamol - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal do, 818 - farmacocinética do, 818 - para glomerulonefrite membranoproliferativa, 414 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818
1000 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Discrasia de células plasmáticas, 481 Disfagia na hipofosfatemia, 228 Disfunção sexual na uremia, 675, 679 Dislipidemia - e doença vascular encefálica, 715 - e progressão de insuficiência renal crônica, 671 - em paciente sob diálise, 926 - hiperuricemia e, 242 - pós-transplante renal, 959 Disopiramida - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal da, 818 - farmacocinética da, 818 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Displasia - fibromuscular, 334 - - estenose da artéria renal e, 745 - - hipertensão renovascular e, 743 - renal, 510 - - hipertensão arterial e, 512 Disproteinemia, 439 Distúrbio - ácido-básico na IRC, controle do, 687 - eletrolítico na cistinose, 561 - psíquico - - na doença de Hartnup, 563 - - na encefalopatia urêmica, 707 - - na uremia, 675 - - pelo corticosteróide, 715 Disúria, 267 - na nefrolitíase, 613 - na nefropatia por IgA, 410 - na uropatia obstrutiva, 623 - por infecção urinária, 291, 492 Diurese - concentração de, 100 - pós-obstrutiva, 627 Diurético, 775-786 - ação do, no metabolismo do potássio, 199 - bibliografia selecionada, 786 - classificação clínica do, 778 - controvérsia no uso de, 784 - - na gravidez, 785 - - no câncer, 785 - - no edema idiopático, 785 - - no tratamento inicial de HAS leve, 784 - - reposição de potássio, 784 - de ação prolongada, 778 - - efeitos colaterais do, 782 - - interação farmacológica do, 783 - - para acidose tubular renal, 781 - - para diabete insípido nefrogênico, 781 - - para edema - - - hepático, 780 - - - renal, 779 - - para hipercalciúria idiopática, 781 - - para hipertensão sistêmica, 781 - - para insuficiência cardíaca, 778 - de alça - - efeitos colaterais do, 782 - - excreção de magnésio e, 233 - - farmacocinética do, 777 - - farmacologia do, 777 - - hipercalcemia causada por, 221 - - hiperuricemia causada por, 243 - - interação farmacológica do, 783 - - mecanismo de ação do, 776, 777 - - para edema - - - hepático, 780 - - - renal, 779 - - para glomerulonefrite, 405 - - - pós-estreptocócica, 407 - - para hipercalcemia, 781 - - para hipertensão sistêmica, 781 - - para insuficiência ventricular esquerda, 779 - - para síndrome de secreção inadequada de HAD, 781 - - uso clínico do, 778 - edema cíclico idiopático e uso de, 158 - efeitos colaterais, 782 - endereços na internet, 786 - histórico, 775 - insuficiência renal crônica associada a, 683
Índice Alfabético
- interação farmacológica do, 782, 783 - local de ação do, 776 - mecanismo de ação do, 776 - mercurial - - considerações, 776 - - indicações clínicas do, 782 - na excreção de fósforo, 225, 226 - o futuro do, 785 - osmótico - - considerações, 776 - - excreção de magnésio e, 233 - - hipocalemia e uso de, 201 - - mecanismo de ação do, 776 - para edema, 159 - para hipertensão pós-transplante renal, 959 - poupador de potássio, 776 - - efeitos colaterais do, 782 - - hipercalemia causada por, 206 - - hipermagnesemia causada por, 235 - - interação farmacológica do, 783 - - mecanismo de ação do, 776, 777 - - para alcalose metabólica, 182 - - para edema - - - cardíaco, 779 - - - renal, 779 - - para síndrome de Bartter, 571 - reações adversas, 782 - resistência ao uso de, 783 - tiazídico - - considerações, 776 - - depleção de sódio associada a, 146 - - excreção de magnésio e, 233 - - farmacocinética do, 777 - - farmacologia do, 777 - - hipercalcemia por, 221 - - hiperuricemia por, 243 - - hipocalemia por, 200 - - mecanismo de ação do, 776 - - para diabetes insipidus, 117 - - - central, 116 - - para doença - - - de Dent, 569 - - - de Ménière, 781 - - para edema renal, 779, 780 - - para hipertensão renovascular, 765 - - para insuficiência ventricular esquerda, 779 - - para osteoporose pós-menopáusica, 781 - - para raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - tolerância ao uso de, 783 - uso clínico do, 777 - - alcalose - - - pós-hipercapnéica, 782 - - - pós-perda de conteúdo gástrico, 782 - - cistinúria, 782 - - doença edematosa, 778 - - - cardíaca, 778 - - - hepática, 780 - - - renal, 779 - - doença não-edematosa, 780 - - - acidose tubular renal proximal, 781 - - - diabete insípido nefrogênico, 781 - - - hipercalcemia, 781 - - - hipercalciúria idiopática, 781 - - - hipertensão arterial sistêmica, 780 - - - síndrome de secreção inadequada de HAD, 781 - - - urolitíase recorrente, 781 - - glaucoma, 782 - - hiperuricosúria, 782 - - intoxicação por - - - fenobarbital, 782 - - - salicilato, 782 - - síndrome de tensão pré-menstrual, 781 - xantínico, 776 Divalproato de sódio, 710 Divertículo - da uretra anterior, 357 - de meninge espinhal, 587 - vesical, 354, 355 Dobutamina - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal da, 818 - farmacocinética da, 818 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Doença - aterosclerótica na síndrome urêmica, 677
- auto-imune - - e interferência na terapia com eritropoetina, 699 - - insuficiência renal aguda causada por, 389 - - tacrolimus para, 470 - cardiovascular pós-transplante, 961 - cística renal, 345, 580-596 - - abordagens cirúrgicas, 590 - - adquirida, 581, 590 - - - características da, 581 - - bibliografia selecionada, 596 - - cisto renal simples, 580 - - classificação da, 345 - - da medula, 589 - - - características da, 581 - - diferenciação das principais, 581, 582 - - displasia renal cística, 589 - - doença renal policística, 582, 583 - - endereços na internet, 596 - - hereditária, 580 - - insuficiência crônica renal e, 663 - - referências bibliográficas, 594 - - ressonância magnética na, 329 - - ultra-sonografia na, 318 - - - diagnóstico diferencial, 320 - - - pontos-chave, 318 - de Addison - - antidiurese na, 67 - - hipercalcemia na, 221 - de Berger, 435 - de Bright, 649 - de cadeias leves, 439 - - acidose tubular renal e, 574 - de Chagas, 945 - de Conradi, 345 - de Crohn, 622 - de Dent, 569 - de Fabry - - acidose tubular renal e, 576 - - e insuficiência renal crônica, 684 - de Graves, 216 - de Hand-Schüller-Christian, 245 - de Hartnup, 563 - de Hodgkin, 443 - de Kawasaki, 431 - de Ménière, 781 - de Ormond, 622 - de Takayasu, 743 - de von Gierke, 561 - de von Hippel-Lindau, 635 - de Wilson - - achados clínicos, 561 - - acidose tubular renal e, 574, 576 - - dados laboratoriais, 561 - - observações, 561 - - síndrome de Fanconi por, 573 - diverticular do colo, 587 - do armazenamento de glicogênio, 243 - dos processos podálicos, 415 - glomerular - - manifestações clínicas da, 332 - - ressonância magnética na, 332 - granulomatosa - - hipercalcemia na, 220 - - nefropatia tubulointersticial e, 482 - hematopoiética e nefropatia tubulointersticial, 480 - hepática - - e risco de nefrotoxicidade por contraste, 461 - - glomerulopatia em, 443 - hipertensiva específica da gravidez, 547 - imunológica e nefropatia tubulointersticial, 481 - infecciosa, glomerulopatia e, 445 - - citomegalovírus, 448 - - endocardite infecciosa, 445 - - esquistossomose, 447 - - Klebsiella, 448 - - Mycobacterium leprae, 448 - - Plasmodium malariae, 448 - - Pneumococcus, 448 - - sarampo, 448 - - Staphylococcus, 448 - - Treponema pallidum, 448 - - varicela, 448 - - vírus HIV, 445 - linfoproliferativa - - e nefropatia tubulointersticial, 481 - - hiperuricemia e, 243 - maligna - - acidose láctica na, 173 - - glomerulonefrite associada a, 443
1001
Índice Alfabético
- - hipercalcemia por, 219, 220 - - - causas, 220 - - - incidência, 220 - - hiperuricemia e, 243 - - hipocalcemia associada a, 216, 217 - - uropatia obstrutiva por, 320 - medular cística - - acidose tubular renal e, 574, 576 - - depleção de sódio associado a, 146 - - síndrome de Fanconi e, 573 - metabólica, nefropatia tubulointersticial por, 480 - mieloproliferativa - - hiperuricemia e, 243 - - litíase por ácido úrico e, 246 - óssea adinâmica, 678, 721 - - característica histológica da, 726 - - etiopatogenia, 721 - - pontos-chave, 721 - - radiologia para, 725 - - tratamento da, 727 - policística renal, 6, 319, 345 - - aspecto sonográfico da, 319 - - autossômica dominante, 583 - - - características da, 581 - - - carcinoma de células renais associado a, 635 - - - causas de dor abdominal na, 589 - - - genética da, 586 - - - pontos-chave, 589 - - - quadro clínico, 585, 587 - - - rim da, 583 - - - tratamento, 586, 588 - - - ultra-sonografia na, 581, 587 - - autossômica recessiva, 582 - - - características da, 581 - - em adulto, 345, 346 - - infantil, 345, 346 - - juvenil, 345 - - ressonância magnética na, 330 - pulmonar - - intersticial, 182 - - obstrutiva crônica, 182 - renal - - ateroembólica, biópsia renal na, 288 - - hiperuricemia secundária à, 243 - - inflamatória, IRM na, 333 - - métodos de diagnóstico por imagem da, 294 - - parenquimatosa difusa, IRM na, 332 - - peptídeo natriurético atrial na, 82 - - vascular (v. doença vascular renal) - tubular, 216, 217 - - intersticial, 477 - - - hipertensão e, 744 - - - progressiva pelo lítio, 478 - - - ressonância magnética na, 332 - - renal, 216, 217 - vascular encefálica pós-transplante renal, 715 - vascular renal, 519-536, 759 - - da microcirculação, 532 - - - endereços na internet, 536 - - - nefropatia da anemia falciforme, 532 - - das arteríolas, 521 - - - doença ateroembólica, 521 - - - esclerodermia renal, 529 - - - microangiopatia trombótica, 527 - - - nefrite por irradiação, 528 - - - nefrosclerose hipertensiva benigna, 523 - - - nefrosclerose maligna, 525 - - - síndrome do anticorpo antifosfolipídio, 530 - - diagnóstico de, 759, 763 - - doppler na, 324 - - dos grandes vasos, 520 - - - trombose de veia renal, 521 - - - trombose e embolia de artéria renal, 520 - - IRM na, 333 - - no diabético, 758 - - renovascular, 759 - - - diagnóstico de, 759, 763 - - - no diabético, 758 Doppler - na doença vascular renal, 324 - no transplante renal, 325 Dopplerfluxometria, 324 Dopplermetria, 324 Dopplervelocimetria, 324 Dor - abdominal - - em diálise peritoneal, 926 - - na hipocalcemia, 218 - - na infecção urinária, 492
- alcalose respiratória e, 183 - articular na glomerulonefrite crescêntica, 407 - lombar - - na glomerulonefrite pós-estreptocócica, 405, 407 - - na infecção urinária, 291, 492 - - na nefrite intersticial aguda, 476 - - na trombose de artéria renal, 520 - - no carcinoma de células renais, 638 - - no sarcoma renal, 644 - - por uso de antiiflamatório não-esteróide, 462 - muscular - - na glomerulonefrite crescêntica, 407 - - na nefropatia por IgA, 410 - na doença policística autossômica dominante, 587 - na nefrolitíase, 613 - na nutrição parenteral intradialítica, 866 - na uropatia obstrutiva, 623 - óssea na uremia, 678 - por cisto renal, 580 - renal, 269 Doxazosin - ajuste de dose na doença renal, 818 - características do, 791 - cuidados especiais, 818 - dose diária do, 790 - dose normal do, 818 - farmacocinética do, 818 - número de tomadas, 790 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Doxepin - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal do, 818 - farmacocinética do, 818 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Doxiciclina - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal da, 818 - farmacocinética da, 818 - nefrotoxicidade da, 456 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Doxorrubicina - ajuste de dose na doença renal, 818 - cuidados especiais, 818 - dose normal da, 818 - farmacocinética da, 818 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 818 - - hemodiálise, 818 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 818 Droga - acidose - - respiratória causada por, 182 - - tubular renal associada a, 574, 576 - ajuste de dose na insuficiência renal, 802 - alteração de pressão arterial por uso de, 147 - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - biodisponibilidade de, 800, 804-840 - clearance corporal da, 801 - diabetes insipidus nefrogênico por, 115 - diálise para remoção de, 801 - edema associado a, 151, 158 - eliminação de, 800, 804-840 - hemofiltração para remoção de, 801 - hemoglobinúria associada a, 269 - hemoperfusão para remoção de, 801 - hipercalcemia por, 221 - hiperfosfatemia por, 230 - hiperuricemia por, 242, 243 - hipocalcemia por, 216 - hipouricemia por, 251 - insuficiência renal aguda por, 389 - meia-vida biológica da, 801 - - na insuficiência renal terminal, 804-840 - - normal, 804-840 - nefrite intersticial por, 470, 476 - níveis séricos de, 803, 841 - - monitorização, 803, 841 - púrpura de Henoch-Schönlein associada a, 435
- síndrome - - da secreção inapropriada de HAD e, 123 - - de Fanconi associada a, 573 - trombose da artéria renal associada a, 520 - tubulopatia associada a, 558 - vasculite sistêmica por, 431 Ducto coletor, 2, 3, 15, 47 - importância do, 17 - microscopia óptica do, 15 - produção de amônio nas células intercaladas alfa do, 171 - reabsorção - - de sódio no, 143 - - do fósforo no, 226 Duplex-Doppler, 324, 325
E ECA, 73 Eclâmpsia, 547 - iminência de, 548 - insuficiência renal aguda na, 541 Ecocardiograma para hipertensão arterial, 752 Ecografia - na diferenciação entre nefropatia aguda e crônica, 684 - no oncocitoma, 634 Ecstasy, síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Ectopia - renal, 347 - - bilateral, 347 - - cintilografia renal estática para, 383 - - cruzada, 347, 348 - - ressonância magnética na, 329 - - simples, 347 - ureteral, 349 EDD, 910 Edema, 146, 150 - agudo do pulmão, hipertensão e, 748 - causas diversas de, 158 - - hipocalemia crônica, 150 - - medicamentos, 158 - - microangiopatia capilar, 158 - - síndrome da permeabilidade capilar elevada, 158 - cíclico idiopático, 158 - conceituação de, 150 - de glomerulonefrite, 405 - de laringe, 182 - duro, 150 - em nefropatia, 269 - exsudação, 150 - fatores que contribuem para a formação do, 151 - fisiopatologia do, 150, 151 - - na cirrose hepática, 154 - - na glomerulonefrite aguda, 156 - - na gravidez, 157 - - na insuficiência cardíaca congestiva, 151 - - na síndrome nefrótica, 155 - generalizado, 150 - - causas de, 151 - localizado, 150 - mole, 150 - na glomerulonefrite pós-estreptocócica, 405, 407 - na metioninúria, 563 - na nefropatia do HIV, 446 - na pré-eclâmpsia, 547 - na púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - pré-menstrual, 158 - princípios gerais no tratamento do, 159 - - adequação da ingesta de sal e água, 159 - - da doença básica, 159 - - indução de balanço negativo de sódio, 159 - - mobilização do edema, 159 - pulmonar - - acidose respiratória causada por, 182 - - cardiogênico, 150 - transudação, 150 Eicosanóides, 28 - relação com o sistema calicreína-cinina, 79 Eletrocardiograma - na hipercalcemia, 222 - na hipercalemia, 207, 208 - na hipertensão arterial, 752 - na hipocalcemia, 218 - na hipocalemia, 201 Eletroencefalograma - alterações no, na uremia, 675 - para encefalopatia urêmica, 707 Eletroforese de proteína, 683
1002 Eletrólitos - análise plasmática na insuficiência renal crônica, 683 - conteúdo de, dos fluidos corporais, 257 - excreção urinária de, 287 - necessidade na insuficiência renal - - aguda, 845 - - crônica, 850 - perdas de, gastrintestinais, 257 Eletroneutralidade, 164 Eliptocitose hereditária, 576 ELISA, 531 Embolia - pulmonar, 182 - renal, 520 - - etiologia, 520 - - quadro clínico, 520 - - tratamento, 520 Embriologia renal, 5 - mesonefro, 6 - metanefro, 6 - pronefro, 5 Emergência hipertensiva, 752 - nifedipina para, 794 Enalapril, 791 - ajuste de dose na doença renal, 819 - características do, 792 - cuidados especiais, 819 - dose normal do, 819 - farmacocinética do, 819 - nefrotoxicidade do, 466 - no controle da pressão intraglomerular, 671 - para nefropatia diabética, 603, 604 - para poliglobulia, 960 - pré-droga, 792 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Enalaprilato, 378 Encainide - ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal do, 819 - farmacocinética do, 819 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Encefalite - diabetes insipidus pituitário e, 113 - síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 Encefalopatia - de Wernicke na insuficiência renal, 712 - hipertensiva, 746, 747 - na vasculite sistêmica necrotizante, 433 - por rejeição de transplante, 716 - por uso de ciclosporina, 715 - urêmica, 675, 705, 706 - - diagnóstico, 707 - - na insuficiência renal aguda, 393 - - pontos-chave, 708 - - sinais e sintomas na, 706 - - tratamento, 707 Endocardite - bacteriana, glomerulonefrite da, 445 - comprometimento renal na, 270 Endocitose, 40, 42 Endotelina, 85 - ações no rim, 85 - biossíntese da, 85 - e regulação - - da circulação renal, 20 - - da filtração glomerular, 32 - - da pressão arterial, 737 - efeitos da, 86 - em situações fisiopatológicas, 86 - - doença glomerular, 86 - - fibrose renal, 86 - - hipertensão arterial, 86 - - insuficiência renal - - - aguda, 86 - - - crônica, 86 - estrutura da, 85 - no metabolismo do sódio, 145 - receptores para, 85 Endotélio e regulação da pressão arterial, 740 Enema, abuso de, 230 Enflurano, 783 Enoxacin
Índice Alfabético
- ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal do, 819 - farmacocinética do, 819 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Entactina, 10 Enterobacter - abscesso renal e infecção por, 500 - e peritonite durante diálise, 924 - infecção urinária por, 304, 496 Enxaqueca, 531 Enzima - conversora de angiotensina, 73 - - distribuição tecidual, 74 - - inibidor da, 75 - - propriedades bioquímicas, 73 - hepática - - exame de, no doador de transplante, 945 - - na síndrome HELLP, 548, 550 Eosinofilia - na nefrite intersticial aguda, 476 - na vasculite renal, 433 Eosinofilúria - na glomerulonefrite rapidamente progressiva, 477 - na infecção urinária, 477 - na nefrite intersticial aguda, 477 - na prostatite, 477 - no câncer de bexiga, 477 Epilepsia, 531 Epinefrina - e alteração na distribuição transcelular de potássio, 192 - para hipercalemia, 209 Episclerite, 433 Equação - de Henderson-Hasselbalch, 164 - para excreção renal de ácido, 49 - para indicação dos fatores causadores de alterações no peso, 259 - para medida do fluxo sangüíneo renal, 24 - para o ritmo de ultrafiltração glomerular, 30 Equimose na uremia, 675, 676, 678 Equivalente eletroquímico, 91 Eritrocitose, 700 Eritromicina - ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal da, 819 - farmacocinética da, 819 - interação com ciclosporina, 467 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Eritropoietina - endógena, produção de, 691 - para paciente em hemodiálise, 851 - recombinante humana, 691 - - para anemia, 691, 694 - - - avaliação dos estoques de ferro, 696 - - - efeitos adversos, 699 - - - indicação, 694 - - - resposta inadequada, 697 - - - terapias adjuvantes, 699 - - - tratamento inicial com, 696, 698 - - - vias de administração, 696 Erro inato do metabolismo, 574 Ertapenem, 455 Escherichia coli - bacteriúria por, na gravidez, 540 - e síndrome PTT/SHU, 527 - infecção urinária por, 304, 496 - na próstata e infecção urinária, 500 - pielonefrite enfisematosa pela, 306 Esclerodermia, 529 - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - comprometimento renal na, 270 - e insuficiência renal crônica, 684 - renal, 529 - - dados laboratoriais, 529 - - manifestações clínicas, 529 - - patologia, 529 - - tratamento, 530 - - vs. hipertensão maligna, 530 Esclerose - glomerular
- - inibidor da enzima de conversão da angiotensina no controle de, 671 - - na glicogenose I, 561 - nodular, 10 - sistêmica progressiva, 529 - - comprometimento renal na, 529 - tuberosa - - angiomiolipoma na, 632 - - cisto renal da, 345 - - e insuficiência renal crônica, 684 Esmagamento - depleção de sódio causada por, 146 - hipercalemia e, 205 Esmolol - ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal do, 819 - farmacocinética do, 819 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Espasmo de laringe, 182 Espectinomicina - ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal da, 819 - farmacocinética da, 819 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Espironolactona - ajuste de dose na doença renal, 819 - considerações, 776 - cuidados especiais, 819 - dose normal da, 819 - efeitos colaterais da, 782 - farmacocinética da, 777, 819 - hipercalemia causada por, 206 - interação farmacológica da, 783 - para alcalose metabólica, 182 - para diabete insípido nefrogênico, 573 - para edema - - hepático, 780 - - renal, 779 - para insuficiência cardíaca congestiva, 779 - para síndrome - - de Bartter, 571 - - de Liddle, 571 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Esplenomegalia - na intolerância lisinúrica protéica, 562 - na nefropatia esquisossomática, 447 Esquistossomose - nefropatia da, 447 - urinária, 622 Estado - de hiperuricemia, 242 - de hipouricemia, 251 - hiperosmolar, 111 - - causas de, 112 - - manifestações clínicas de um, 117 - hiposmolar, 120 Estatina para dislipidemia pós-transplante, 959 Esteatorréia - depleção de potássio na, 191 - hipomagnesemia e, 233 Estenose - da junção ureteropiélica, 621 - de artéria renal, 758 - - angiografia na, 766 - - características das lesões na, 758 - - causas de, 744 - - cintilografia renal estática para, 383 - - e insuficiência renal crônica, 684 - - hipocalemia por, 201 - - inter-relação com - - - hipertensão, 757 - - - insuficiência renal crônica, 757 - - na síndrome antifosfolipídio, 531, 532 - - pós-transplante, 956, 958 - - ressonância magnética na, 333 - do meato ureteral, 622 - pilórica, depleção de potássio na, 191 Estreptomicina
Índice Alfabético
- ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal da, 819 - farmacocinética da, 819 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Estreptoquinase - ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal da, 819 - farmacocinética da, 819 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 Estreptozotocina - acidose tubular renal associada a, 574 - ajuste de dose na doença renal, 819 - cuidados especiais, 819 - dose normal da, 819 - farmacocinética da, 819 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 819 - - hemodiálise, 819 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 819 - síndrome de Fanconi associada a, 573 Estresse e risco de hipertensão, 743, 744 Estrogênio - e transporte do fosfato, 565 - edema associado ao, 151, 158 - hipertensão e, 746 Estrógeno - hipercalcemia causada por, 221, 224 - interação farmacológica do, 783 - litíase pelo ácido úrico e, 247 Etambutol - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal do, 820 - farmacocinética do, 820 - hiperuricemia causada por, 243 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Etanol - hiperuricemia causada por, 243 - insuficiência renal aguda causada por, 389 Etclorvinol - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal do, 820 - farmacocinética do, 820 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Éter, interação farmacológica do, 783 Etidronato para hipercalcemia, 224 Etilenoglicol, 173 - insuficiência renal aguda causada por, 389 - toxicidade do, 173, 176 Etilismo - acidose láctica no, 173 - cetoacidose no, 173 - hiperuricemia e, 242 - hipofosfatemia e, 226, 228 - hipomagnesemia e, 233, 234 Etionamida - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal da, 820 - farmacocinética da, 820 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Etomidato - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal do, 820 - farmacocinética do, 820 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820
- - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Etopósido - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal do, 820 - farmacocinética do, 820 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Etossuximide - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal do, 820 - farmacocinética do, 820 - nível sérico terapêutico do, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Exercício físico - aumento dos valores de albuminúria no, 602 - hipercalemia associada a, 205 - intenso, hipernatremia no, 113 - na prevenção de hipertensão, 754 Exocitose, 41
F Fadiga na encefalopatia urêmica, 706 Fagocitose, 40 Famotidina - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal da, 820 - farmacocinética da, 820 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Fáscia renal, 3 Fator - atrial natriurético, 32 - - e amiloidogênese, 441 - de crescimento - - e secreção de renina, 72, 73 - de necrose tumoral - - e secreção de renina, 73 - - lesão renal causada por, 471 - de relaxamento do endotélio, 32 - - e regulação da pressão arterial, 740 - - na uremia, 676 - - no metabolismo do sódio, 145 - hiperpolarizante derivado do endotélio, 20 - natriurético - - atrial, 17, 144, 145 - - cerebral, 145 Fazadínio - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal do, 820 - farmacocinética do, 820 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Febre - aumento dos valores de albuminúria na, 602 - hipernatremia na, 113 - na glomerulonefrite crescêntica, 407 - na gota, 245 - na hipertirosinemia, 561 - na nefrite intersticial aguda, 476 - no carcinoma de células renais, 639 - no diabete insípido nefrogênico, 572 - perda líquida pela, 256 - por infecção urinária, 291, 492 - por trombose de artéria renal, 520 Felodipina, 794 - ajuste de dose na doença renal, 820 - características da, 795 - cuidados especiais, 820 - dose normal da, 820 - farmacocinética da, 820 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820
1003 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 Fenacetina, carcinoma renal e, 645 Fenazopiridina - ajuste de dose na doença renal, 820 - cuidados especiais, 820 - dose normal da, 820 - farmacocinética da, 820 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 820 - - hemodiálise, 820 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 820 - urina vermelha associada a, 273 Fenelzine - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal do, 821 - farmacocinética do, 821 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Fenilbutazona - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal da, 821 - farmacocinética da, 821 - nefrotoxicidade da, 464 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Fenitoína - interação farmacológica - - com ciclosporina, 467 - - com diurético de ação rápida, 783 - nefrite intersticial causada por, 470, 476 - para nefropatia por IgA, 411 - para neuropatia urêmica, 710 Fenobarbital - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal do, 821 - farmacocinética do, 821 - interação farmacológica - - com beta-bloqueador, 789 - - com diurético de ação rápida, 783 - intoxicação por, 782 - nefrite intersticial causada por, 470 - nível sérico terapêutico do, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Fenoldopam, 526 Fenoprofeno - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal do, 821 - farmacocinética do, 821 - nefrotoxicidade do, 464 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Fenotiazina, anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 Fentanil - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal do, 821 - farmacocinética do, 821 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Feocromocitoma - hipertensão e, 743, 745, 746 - radiofármacos na localização de, 385 Ferro - intoxicação pelo, 678 - necessidade na insuficiência renal crônica, 850 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 855 - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 Fezes, exame de, 447 Fibra para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854 Fibronectina, 10 Fibrose - hepática na doença renal policística, 587 - intersticial na uropatia obstrutiva, 628 - miointimal, sistema calicreína-cinina na, 80 - pulmonar
1004 - - acidose renal associada a, 576 - - bleomicina e, 808 - - com amiodarona, 806 - renal, endotelina na, 86 - retroperitoneal - - idiopática, 622 - - uropatia obstrutiva e, 320 Fibrossarcoma renal, 644 Filariose, glomerulopatia na, 448 Filtração glomerular, 30-36 - alterações na, e balanço do sódio, 136 - de cloreto de sódio ao longo do néfron, 48 - determinantes da, 30 - efeito das alterações da resistência das arteríolas sobre a, 26 - hiperfiltração glomerular, 35 - - endereço relevante na internet, 36 - - medida da, 35 - micrografia eletrônica da barreira de, 9 - permeabilidade seletiva glomerular, 33 - por nefro, 31 - queda de, na glomerulonefrite, 402, 403 - regulação hormonal da, 32 - vasoconstritores e regulação da, 70 - vasodilatadores e regulação da, 70 Fimose, 622 Fisioterapia para neuropatia urêmica, 710 Fístula - arteriovenosa - - edema associado a, 151 - - hipertensão renovascular e, 743, 758 - - mononeuropatia por, 711 - - para hemodiálise, 969 - urinária pós-transplante, 956, 957 Flecainide - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal do, 821 - farmacocinética do, 821 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Fleroxacin - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal do, 821 - farmacocinética do, 821 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Flucitosina - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal da, 821 - farmacocinética da, 821 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Fluconazol - ajuste de dose na doença renal, 821 - cuidados especiais, 821 - dose normal do, 821 - farmacocinética do, 821 - interação com ciclosporina, 467 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 821 - - hemodiálise, 821 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 821 Fludrocortisona, 210 Flunarizina - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - dose normal da, 822 - farmacocinética da, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Fluorouracil - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - dose normal do, 822 - farmacocinética do, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822
Índice Alfabético
- - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Fluorquinolona, 504 Fluoxetina - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - dose normal da, 822 - farmacocinética da, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 - síndrome da secreção inadequada de hormônio antidiurético e, 123 Flurazepam - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - dose normal do, 822 - farmacocinética do, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Flurbiprofeno - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - dose normal do, 822 - farmacocinética do, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Fluxo sangüíneo renal, 24 - auto-regulação do, 26 - distribuição intra-renal do, 25 - - cortical, 25 - - - método das microesferas marcadas com isótopos radioativos, 25 - - - técnica dos gases inertes, 25 - - medular, 25 - - - Doppler, 26 - efeito das alterações da resistência das arteríolas sobre o, 26 - métodos de medida do, 24 - - das microesferas radioativas, 24 - - fluxômetro eletromagnético, 24 - - processamento de imagem, 25 - total, 24 Fluxômetro eletromagnético, 24 Foscarnet - hipomagnesemia e uso de, 233 - nefrotoxicidade do, 459 Fosfatase alcalina - na insuficiência renal crônica, 683 - na osteodistrofia renal, 723 Fosfato - disfunção no transporte de, 565 - - doença de Dendt, 569 - - hipercalciúria idiopática, 568 - - pseudo-hipoparatireoidismo, 569 - - raquitismo - - - hipofosfatêmico autossômico dominante, 568 - - - hipofosfatêmico hereditário com hipercalciúria, 566 - - - hipofosfatêmico ligado ao sexo, 566 - - - tipo I, 568 - - - tipo II, 568 - e uremia, 673 - no líquido - - extracelular, 94 - - intracelular, 94, 95 - oral - - para doença de Dent, 569 - - para raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - reabsorção de, no túbulo contornado proximal, 139 Fosfatúria, 459 Fosfomicina - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - dose normal da, 822 - farmacocinética da, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Fósforo, 225 - ações do, 565 - alterações no balanço de, na IRA, 392 - controle da correção do balanço de, na IRC, 686 - distúrbios do, e insuficiência renal crônica, 671 - exame de, no doador de transplante, 945
- fração excretora de, 228 - homeostase do, 225 - - absorção, 225 - - balanço interno, 225 - - distribuição, 225 - - excreção, 225 - - - fatores reguladores, 225, 226 - - funções, 226 - - transporte, 226 - metabolismo de, pós-transplante renal, 857 - necessidade - - na insuficiência renal - - - aguda, 845 - - - crônica, 850 - - pós-transplante renal, 858 - no osso, 565 - oral para hipercalcemia, 224 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - plasmático na insuficiência renal crônica, 683 - quelantes de, 726 - reposição de, na hipofosfatemia, 228, 229 - - formas de apresentação, 229 - - - intravenosa, 229 - - - oral, 229 - sérico na osteodistrofia renal, 723 - uremia e distúrbios do, 674 Fosinopril, 791 - ajuste de dose na doença renal, 822 - características do, 792 - cuidados especiais, 822 - dose normal do, 822 - farmacocinética do, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Fotofobia na cistinose, 561 Fotossensibilidade - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - com trianterene, 782 Fraqueza muscular - na miopatia urêmica, 710 - na neuropatia urêmica, 709 - na uremia, 675 Fratura - depleção de sódio causada por, 146 - na uremia, 678 Função renal - avaliação clínica e laboratorial da, 267-293 - - biópsia renal, 288 - - - complicações, 290 - - - contra-indicações, 288 - - - indicações, 288 - - - preparo do paciente, 289 - - - técnica, 289 - - dados objetivos, 270 - - - aparelho cardiopulmonar, 272 - - - exame dos rins, 272 - - - exame microscópico da urina, 278 - - - fundo de olho, 271 - - - hálito, 270 - - - pele, 270 - - - pressão arterial, 271 - - - sedimento urinário, 276 - - - unha, 271 - - - urinálise, 272 - - dados subjetivos, 267 - - - alteração da micção, 267 - - - alteração do volume urinário, 268 - - - alteração na cor da urina, 268 - - - dor renal, 269 - - - edema, 269 - - diagnóstico de uma nefropatia, 290 - - - anormalidades urinárias assintomáticas, 291 - - - hipertensão arterial, 292 - - - infecção urinária, 291 - - - insuficiência renal aguda, 290 - - - insuficiência renal crônica, 291 - - - nefrolitíase, 292 - - - obstrução do trato urinário, 292 - - - síndrome nefrítica aguda, 291 - - - síndrome nefrótica, 291 - - - síndrome renal tubular, 292 - - história familial, 270 - - procedência e história progressiva, 269 - - - cirurgia prévia, 270
Índice Alfabético
- - - distúrbio bioquímico, 270 - - - doença sistêmica, 270 - - - hipertensão arterial, 269 - - - infecção, 270 - - - traumatismo, 270 - cintilografia para avaliação da, 338, 344 - provas de, 281 - - avaliação da função glomerular, 281 - - - cistatina C plasmática, 284 - - - clearance da creatinina endógena, 281 - - - clearance da uréia, 284 - - - creatinina plasmática, 284 - - - inulina, 285 - - - meios de contraste, 285 - - - radioisótopos, 285 - - - uréia plasmática, 284 - - avaliação da função tubular, 285 - - - concentração urinária, 285 - - - diluição da urina, 286 - - - excreção de alfa-1-microglobulina, 288 - - - excreção de beta-2-microglobulina, 288 - - - excreção de eletrólitos, 287 - - - excreção de N-acetil-beta-glicosaminidase, 288 - - - excreção de proteína ligadora do retinol, 288 - - - prova de acidificação urinária, 286 Função sexual, efeitos da hipertensão na, 554 Função tubular, 37-48 - avaliação da, 285 - - concentração urinária, 285 - - diluição urinária, 286 - - excreção - - - de alfa-1-microglobulina, 288 - - - de aminoácidos, 288 - - - de beta-2-microglobulina, 288 - - - de eletrólitos, 287, 288 - - - de proteína ligadora do retinol, 288 - - provas de acidificação urinária, 286 - endereços na internet, 48 - transporte - - ao longo do néfron, 42 - - - alça de Henle, 45 - - - ducto coletor, 47 - - - túbulo contornado distal, 46 - - - túbulo de conexão, 46 - - - túbulo proximal, 42 - - através da membrana epitelial, 39 - - processos reguladores de, 41 Fungo e peritonite durante diálise, 924 Furosemida - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - depleção de sódio associado a, 146 - dose normal da, 822 - em inalações, 782 - farmacocinética da, 777, 822 - hipocalcemia e, 216 - hipocalemia por uso de, 200 - insuficiência renal aguda induzida por, 389 - interação farmacológica da, 783 - mecanismo de ação da, 776 - nefrite intersticial causada por, 470 - no diagnóstico com radioisótopos, 380 - para acidose tubular renal, 578 - para doença de Ménière, 781 - para edema renal, 779 - para hipercalcemia, 223, 781 - para síndrome - - de hiperestimulação ovariana, 781 - - de secreção inadequada de hormônio antidiurético, 781 - por via sublingual, 782 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822
G Gabapentina para neuropatia urêmica, 710 Galactorréia, 639 Galactosemia - achados clínicos, 561 - acidose tubular renal e, 574 - dados laboratoriais, 561 - observações, 561 - síndrome de Fanconi associada a, 573 Galamina - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822
- dose normal da, 822 - farmacocinética da, 822 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Gamaglobulina - para púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - para vasculite renal, 435 Gamopatia monoclonal - acidose tubular renal e, 574 - síndrome de Fanconi causada por, 573 Ganciclovir - ajuste de dose na doença renal, 822 - cuidados especiais, 822 - dose normal do, 822 - farmacocinética do, 822 - nefrotoxicidade do, 458 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 822 - - hemodiálise, 822 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 822 Gasometria - valores normais em sangue arterial e venoso, 184 - venosa na hipocalemia, 204 Gastrite, 433 Gastroenterite - depleção de potássio na, 191 - urêmica, 674 Gastroenteropatia perdedora de proteína, 151 Gelsolina, 441 Genfibrozil - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal do, 823 - farmacocinética do, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Gentamicina - acidose tubular renal associada a, 574 - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - filtração glomerular e uso de, 33 - hipocalcemia causada por, 216 - hipocalemia induzida por, 201 - nefrotoxicidade da, 452 - nível sérico terapêutico da, 841 - para infecção urinária na gravidez, 540 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 - síndrome de Fanconi associada a, 573 Genu - valgum no raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - varum no raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 Ginecomastia - com espironolactona, 782 - no paciente sob hemodiálise, 679 Glaucoma - acetazolamida para, 782 - guanetidina para, 790 Glibenclamida - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Glibomurida - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Glicemia - exame de, no doador de transplante renal, 945 - para hipertensão arterial, 752 Gliclazida - ajuste de dose na doença renal, 823
1005 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Glicocorticóide - e regulação da filtração glomerular, 32 - e transporte do fosfato, 565 - para transplante renal, 940 Glicogenose - achados clínicos, 561 - acidose tubular renal e, 574 - dados laboratoriais, 561 - observações, 561 Glicoglicinúria - achados clínicos, 561 - dados laboratoriais, 561 - observações, 561 Glicose - e transporte do fosfato, 565 - na insuficiência renal aguda, 845 - para hipercalemia, 209 - para hipermagnesemia, 236 - reabsorção de, no túbulo contornado proximal, 139 - urinária, 273 Glicosídeo cardíaco, interação farmacológica do, 783 Glicosúria - na doença de Dent, 569 - na glomerulosclerose focal e segmentar, 416 - renal primária, 565 Glipizida - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Globulina - antilinfocitária para transplante renal, 941 - antitimocítica, 953 - - para rejeição de transplante, 951, 964, 967 - - para transplante renal, 941, 953 - - - dose, 953 - - - efeitos colaterais, 956 Glomérulo, 8, 21 - corte transversal ao nível central do, 9 - estrutura do, 8 - micrografia eletrônica da barreira de filtração pelo, 9 - permeabilidade seletiva do, 33 Glomerulonefrite, 12 - aguda - - edema associado a, 151, 156 - - - alterações na função tubular renal, 157 - - - comprometimento do coeficiente de ultrafiltração, 157 - - - insuficiência cardíaca, 157 - - hipertensão e, 743 - - imageamento na, 368 - - infecção estreptocócica e, 270 - antimembrana basal glomerular, 437 - - diagnóstico diferencial, 437 - - tratamento, 438 - crescêntica, 403, 407 - - anatomia patológica, 408 - - celular em forma de semilua no portador de, 408 - - comparação entre dados clínicos e laboratoriais na, 420 - - e transplante, 409 - - etiopatogenia, 408 - - idiopática, 431 - - pauciimune, 407, 431 - - pontos-chave, 409 - - tratamento, 409 - crônica - - cálculo urinário na, 301 - - hipertensão e, 743, 744 - - imageamento na, 368 - da endocardite bacteriana, 445 - - pontos-chave, 445 - de novo, 405, 420 - diagnóstico diferencial de, 420 - endotelina na, 86 - epimembranosa, 417 - esclerosante no lúpus eritematoso sistêmico, 427 - fibrilar, 442 - - notando-se área de esclerose mensangial, 443 - fisiopatologia dos sinais e sintomas, 403
1006 - - alterações metabólicas, 404 - - diagnóstico, 405 - - hematúria, 403 - - proteinúria, 403 - - queda da filtração glomerular, 403 - - retenção de sódio, 404 - - tratamento inespecífico, 404 - hipocomplementêmica, 411 - insuficiência crônica renal causada por, 663, 683 - lobular, 411 - membranoproliferativa, 411 - - acentuação da lobulação glomerular na, 412 - - anatomia patológica, 412 - - comparação entre dados clínicos e laboratoriais na, 420 - - deposição granular de IgG em portador de, 413 - - e crioglobulinemia, 441 - - e transplante renal, 414 - - etiopatogenia, 414 - - focos de duplicação da membrana basal glomerular em portador de, 412 - - na cirrose hepática, 445 - - na nefropatia esquistossomática, 447 - - pontos-chave, 415 - - por vírus - - - B, 444 - - - C, 444 - - tratamento da, 414 - membranosa, 417 - - anatomia patológica, 418 - - comparação entre dados clínicos e laboratoriais na, 420 - - depósito - - - granular de IgG na membrana basal glomerular na, 419 - - - subepitelial de material elétron-denso na, 419 - - e transplante, 419 - - espessamento difuso da membrana basal capilar na, 418 - - etiopatogenia, 418 - - na cirrose hepática, 445 - - na sífilis, 448 - - no lúpus eritematoso sistêmico, 427, 428, 429 - - pontos-chave, 420 - - por vírus - - - B, 444 - - - C, 444 - - recidiva de, pós-transplante, 963 - - tratamento, 419 - mesangial crônica, 411 - mesangiocapilar, 411 - na intolerância lisinúrica protéica, 562 - parietoproliferativa, 411 - perimembranosa, 417 - por deposição de imunocomplexo circulante, 407 - - mediada por anticorpo antimembrana basal, 407 - por IgA - - comparação entre dados clínicos e laboratoriais na, 420 - por lesões mínimas, 415 - - anatomia patológica, 415 - - comparação entre dados clínicos e laboratoriais na, 420 - - etiopatogenia, 415 - - pontos-chave, 416 - - tratamento, 415 - pós-estreptocócica, 405 - - anatomia patológica, 406 - - deposição de complemento em paciente com, 407 - - etiopatogenia, 406 - - grande depósito subepitelial em forma de corcova em paciente com, 406 - - pontos-chave, 403 - - tratamento, 407 - proliferativa - - difusa no lúpus eritematoso sistêmico, 427, 429 - - extracapilar, 407 - - mesangial - - - na nefropatia esquistossomática, 447 - - - por vírus C, 444 - - por imunocomplexo associada ao HIV, 446 - rapidamente progressiva, 12, 403, 407 - - biópsia renal na, 288 - - recidiva no enxerto, 945 - recidiva de, pós-transplante, 963 - segmentar e focal - - em paciente com poliangeíte microscópica, 433 - - no lúpus eritematoso sistêmico, 426 Glomerulopatia - em doença hepática, 443 - membranosa, 417 - secundária, 424-449 - - à disproteinemia, 439 - - à doença hepática, 443 - - - cirrose, 444
Índice Alfabético
- - - por vírus B, 444 - - - por vírus C, 443 - - à doença infecciosa, 445 - - - endocardite bacteriana, 445 - - - esquistossomose, 447 - - - parasitária, 448 - - - por citomegalovírus, 448 - - - por Klebsiella, 448 - - - por Mycobacterium leprae, 448 - - - por Plasmodium malariae, 448 - - - por Pneumococos, 448 - - - por Staphylococcus, 448 - - - por Treponema pallidum, 448 - - - sarampo, 448 - - - varicela, 448 - - - vírus da imunodeficiência humana, 445 - - à neoplasia, 443 - - à paraproteinemia, 439 - - à púrpura de Henoch-Schönlein, 435 - - à síndrome de Goodpasture, 437 - - à vasculite sistêmica necrotizante, 431 - - ao lúpus eritematoso sistêmico, 424 - - bibliografia selecionada, 448 - - endereços na internet, 449 Glomerulosclerose - cirrótica, 445 - - vs. amiloidose, 445 - - vs. diabetes, 445 - - vs. nefropatia de cadeia leve, 445 - focal, recidiva no enxerto, 945 - segmentar e focal, 12, 416 - - anatomia patológica, 416 - - com interferon, 470 - - comparação entre dados clínicos e laboratoriais na, 420 - - e transplante, 417 - - etiopatogenia, 417 - - na infecção pelo HIV, 446 - - na nefropatia esquistossomática, 447 - - na síndrome de Bartter, 570 - - pontos-chave, 417 - - recidiva de, pós-transplante, 963 - - tratamento, 417 Glucagon - e desnutrição na IRC, 844 - na excreção de fósforo, 225, 226 - na homeostasia do potássio, 196 Gluconato de cálcio - para hipermagnesemia, 236 - para hipocalcemia, 218 Glutetimida - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Gordura perirrenal, 3 Gota, 244 - deformidade articular, 244 - deterioração da função renal na, 244 - diagnóstico - - diferencial, 245 - - laboratorial, 245 - - por imagem, 245 - diurético na, 782 - insuficiência renal na, 480 - - crônica, 684 - na uremia, 675 - pirazinamida e precipitação de, 834 - quadro clínico, 245 - tofo da, 244 - tratamento da, 248 - - considerações gerais, 248 - - farmacológico do período intercrise, 249 - - - antiinflamatório não-esteróide, 249 - - - colchicina, 249 - - - dieta, 249 - - - evitar hiperuricemiantes, 249 - - farmacológico do quadro agudo, 248 - - - analgésico, 249 - - - antiinflamatório não-esteróide, 248 - - - colchicina, 248 - - - corticosteróide, 249 - - redução dos níveis séricos de ácido úrico, 249 - - - agentes uricosúricos, 249 - - - alopurinol, 249 Granulomatose de Wegener, 431
- eosinofilia na, 433 - infiltrado periglomerular com células gigantes na, 434 - nefropatia tubulointersticial associada a, 482 - patologia da, 434 - tratamento da, 435 Gravidez - alfa-metildopa durante a, 790 - aumento dos valores da albuminúria na, 602 - cicatriz renal, complicações durante a, 514 - edema associado a, 151, 157 - - possíveis fatores, 158 - hipertensão e, 546 - - crônica, 547 - - - com pré-eclâmpsia superajuntada, 547 - - eclâmpsia, 547 - - especificada, 744 - - pré-eclâmpsia, 547 - - tratamento, 550 - infecção do trato urinário na, 492, 502 - inibidor da enzima de conversão da angiotensina na, 793 - insuficiência renal crônica e, 679 - nefropatia e, 537-545 - - acompanhamento clínico, 538 - - - papel da hipertensão, 539 - - - papel da insuficiência renal, 539 - - alterações anatômicas e funcionais do trato urinário, 537 - - biópsia renal, 542 - - cálculo urinário, 541 - - diálise, 542 - - endereços na internet, 544 - - infecção do trato urinário, 540 - - - bacteriúria assintomática, 540 - - - sintomática, 540 - - insuficiência renal aguda, 540 - - - hemorragias, 541 - - - microangiopatia trombótica, 541 - - - necrose cortical bilateral, 541 - - - pielonefrite aguda, 541 - - introdução, 537 - - nefropatia lúpica, 539 - - referências bibliográficas, 544 - - transplante renal, 542 - obstrução do trato urinário por, 622 - ultra-sonografia renal na, 337 - uropatia obstrutiva e, 320 - uso de diurético na, 785 Griseofulvina - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Guanabenz - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose do, 790 - dose normal do, 823 - efeitos adversos, 789 - farmacocinética do, 823 - mecanismo de ação, 789 - número de tomadas, 790 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Guanadrel - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose diária do, 790 - dose normal do, 823 - farmacocinética do, 823 - número de tomadas, 790 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Guanetidina - ajuste de dose na doença renal, 823 - características da, 790 - cuidados especiais, 823 - dose diária da, 790 - dose normal da, 823 - edema causado por, 158 - farmacocinética da, 823 - número de tomadas, 790 - reposição após
Índice Alfabético
- - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Guanfacina - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose da, 790, 823 - efeitos adversos, 789 - farmacocinética da, 823 - mecanismo de ação, 789 - número de tomadas, 790 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Guanidina, uremia e, 672
H H, K-ATPase, 47 H, secreção de, 49 - no túbulo - - distal, 51 - - proximal, 50 Haemacel, 266 Haemophilus, púrpura de Henoch-Schönlein associada a, 435 Hálito urêmico, 674, 675 Haloperidol - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal do, 823 - farmacocinética do, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Halotano, interação farmacológica do, 783 Hamartoma renal, 632 - tomografia computadorizada para, 309 HCO3 - manutenção normal da concentração plasmática de, 49 - na acidose metabólica, 164 - na alcalose metabólica, 163, 178 - reabsorção de, no túbulo contornado - - distal, 51 - - proximal, 50, 139 Hemangiopericitoma, 644 Hematócrito - na depleção de volume extracelular, 147 - pós-transplante renal, 950 Hematoma - de loja renal - - pós-transplante, 956, 958 - - - vs. ruptura parcial da anastomose arterial, 958 - - - vs. ruptura renal, 958 - - vs. ruptura parcial da anastomose arterial, 958 - - vs. ruptura renal, 958 - hipertensão renovascular e, 758 - subdural por hemodiálise, 712 - - vs. doença vascular encefálica, 712 - - vs. encefalopatia urêmica, 712 - - vs. síndrome do desequilíbrio, 712 Hematúria, 269, 493 - angiografia na, 299 - aumento dos valores de albuminúria na, 602 - diagnóstico de, 291 - e risco de hipertensão, 744 - exame de escolha para, 294 - microscópica, 269 - na criança, imageamento, 342 - na crioglobulinemia, 441 - na doença - - de Dent, 569 - - renal - - - cística, 581 - - - policística autossômica dominante, 585, 587 - na glomerulonefrite, 402, 403 - - da endocardite bacteriana, 445 - - fibrilar, 442 - - membranosa, 418 - - pós-estreptocócica, 405, 407 - na glomerulosclerose focal e segmentar, 416 - na infecção urinária, 492 - na insuficiência renal aguda, 395 - na nefrite intersticial aguda, 477 - na nefrolitíase, 613 - na nefropatia
- - diabética, 601 - - do HIV, 446 - - esquistossomática, 447 - - por IgA, 410 - na púrpura - - de Henoch-Schönlein, 436 - - trombocitopênica trombótica, 527 - na síndrome de Goodpasture, 437 - na trombose - - de artéria renal, 520 - - de veia renal, 370 - na vasculite sistêmica necrotizante, 432 - no adenoma, 635 - no carcinoma - - de células renais, 638 - - de pelve renal, 645 - no cisto renal, 580 - no lúpus eritematoso sistêmico, 428 - no sarcoma renal, 644 - por uso - - de anfotericina B, 458 - - de antiinflamatório não-esteróide, 462 - - de pentamidina, 457 Hemodiafiltração - artério-venosa contínua, 909, 910 - arteriovenosa contínua, 399 - veno-venosa contínua, 910 - venovenosa contínua, 400 Hemodiálise, 869-907 - acesso vascular, 883 - - complicações, 885 - - definitivo, 883 - - local de inserção, 884 - - manuseio, 885 - - temporário, 884 - adenoma em paciente sob, 635 - adequação e cinética da uréia, 889 - - equivalente protéico do nitrogênio gerado, 891 - - implicações clínicas, 893 - - limitações do método, 894 - - perspectivas, 894 - - uréia média, 891 - água para, 875 - anticoagulação, 886 - artério-venosa contínua, 910 - calcificação arterial em pacientes sob, 677 - carcinoma de células renais associado a, 635 - composição do banho de, 877 - desnutrição em pacientes sob, 850 - - causas de, 851 - - recomendações nutricionais, 851 - - - cálcio, 851, 852 - - - carboidrato, 851, 852 - - - fósforo, 851, 852 - - - lipídio, 851, 852 - - - líquidos, 851, 852 - - - potássio, 851, 852 - - - proteína, 851 - - - quilocalorias, 851 - - - sódio, 851, 852 - - - vitamina, 851, 852 - endereços na internet, 907 - hematoma subdural em doentes sob, 712 - hemolenta, 910 - hemólise em pacientes sob, 694 - hipermagnesemia em pacientes sob, 235 - histórico, 870 - iniciação em diálise, 871 - - eletiva, 872 - - - estado nutricional, 873 - - - quadro clínico, 874 - - - taxa de filtração glomerular, 872 - - urgência, 872 - - - hiperpotassemia, 872 - - - hipervolemia, 872 - - - pericardite urêmica, 872 - - - sinais e sintomas urêmicos, 872 - intercorrências durante as sessões - - arritmia, 899 - - choque pirogênico, 899 - - complicações relacionadas à fisiologia da diálise, 897 - - - cãibra, 897 - - - desequilíbrio, 897 - - - hipotensão, 897 - - embolia gasosa, 899 - - hemólise, 899 - - hemorragia, 899 - - reações a materiais e componentes do processo dialítico, 898
1007 - - trombose, 899 - intermitente, 908 - - versus métodos contínuos, 915 - introdução, 869 - material e equipamentos, 877 - - dialisadores, 878 - - máquinas, 871, 881 - - membranas, 878 - - solução de troca, 877 - métodos contínuos de, 908-918 - - acesso vascular, 911 - - adequação de diálise, 914 - - anticoagulação, 912 - - aspectos técnicos, 911 - - bibliografia selecionada, 917 - - características operacionais, 910 - - considerações finais, 917 - - endereços na internet, 918 - - escolha do tratamento na IRA, 913 - - histórico, 908 - - indicações - - - clínicas preferenciais, 914 - - - não-renais, 916 - - mecanismos de transporte de solutos, 909 - - nomenclatura, 909 - - - diálise de alto fluxo contínua, 910 - - - diálise diária estendida, 910 - - - diálise sustentada de baixa eficiência, 910 - - - hemodiafiltração artério-venosa contínua, 910 - - - hemodiafiltração veno-venosa contínua, 910 - - - hemodiálise artério-venosa contínua, 910 - - - hemodiálise veno-venosa contínua, 910 - - - hemofiltração artério-venosa contínua, 909 - - - hemofiltração veno-venosa contínua, 909 - - - terapia de substituição renal contínua, 909 - - - ultrafiltração lenta contínua, 909 - - solução de reposição, 913 - - vantagens e desvantagens, 917 - - versus hemodiálise intermitente, 915 - na doença renal policística autossômica dominante, 588 - na gravidez, 543 - na insuficiência renal aguda, 396 - na intoxicação pelo alumínio, 727 - na nefropatia - - crônica pelo ácido úrico, 250 - - diabética, 597 - na neuropatia urêmica, 710 - prescrição, 888 - - esquemas, 888 - - - de três vezes por semana, 888 - - - diária de curta duração, 889 - - - noturno, 889 - princípios de troca em diálise, 874 - recomendações nutricionais, ferro, 851, 853 - referências bibliográficas, 900 - reposição de dose, de drogas após, 804-840 - reúso dos dialisadores, 894 - sangramento em pacientes sob, 694 - veno-venosa contínua, 910 Hemofiltração - arteriovenosa contínua, 399, 908, 909 - - reposição de dose, de drogas após, 804-840 - veno-venosa contínua, 909 Hemoglobina - na urina, 273 - tamponamento plasmático pela, 167 Hemoglobinúria, 269, 273 - paroxística noturna, 481 - - acidose tubular renal e, 574 Hemograma - exame de, no doador de transplante renal, 945 - na uropatia obstrutiva, 623 - no carcinoma de células renais, 639 - para hipertensão arterial, 752 - para insuficiência renal crônica, 683 Hemólise - hiperuricemia e, 243 - intravascular, hemoglobinúria associada a, 269 - maciça, hipercalemia e, 205 - na hipofosfatemia, 228 - no paciente sob diálise, 676 Hemoptise na vasculite sistêmica necrotizante, 432 Hemorragia - pulmonar - - na granulomatose de Wegener, 437 - - na púrpura de Henoch-Schönlein, 437 - - na síndrome de Goodpasture, 437 - - no lúpus eritematoso sistêmico, 437 - sede e, 101
1008 - subaracnóide, síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 - subdural, síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 Hemostasia, alterações da, na doença renal, 700 Heparina - ajuste de dose na doença renal, 823 - anticoagulação na hemodiálise contínua com, 912 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - na hemodiálise, 886 - - contra-indicações para, 887 - para glomerulonefrite membranoproliferativa, 414 - para trombose venosa pós-transplante, 961 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Hepatite -B - - após transplante renal, 976, 981 - - exame de, no doador de transplante renal, 945 - - glomerulonefrite associada a, 444 -C - - após transplante renal, 976, 981 - - e vasculite associada a glomerulonefrite, 441 - - exame de, no doador de transplante renal, 945 - - glomerulonefrite associada a, 443 - crônica ativa - - acidose tubular renal associada a, 576 - - com alfa-metildopa, 789 Hepatomegalia - na galactosemia, 561 - na glicogenose I, 561 - na intolerância lisinúrica protéica, 562 - na nefropatia esquistossomática, 447 Hepatopatia - edema na, 150 - hipocalcemia na, 217 - hipouricemia e, 251 - nictúria por, 268 Hepatotoxicidade - da amiodarona, 806 - da anrinona, 807 - da carmustina, 810 - da clindamicina, 814 - da fenazopiridina, 820 - da griseofulvina, 823 - da nitrofurantoína, 831 Hérnia - e diálise peritoneal, 925 - na doença policística renal, 587 Herpes - genital, 459 - simples - - aciclovir para, 459 - - e infecção pós-transplante renal, 978, 981 - zoster, 459 Herpesviridae pós-transplante renal, 978, 980 Hexobarbital - ajuste de dose na doença renal, 824 - cuidados especiais, 824 - dose normal do, 824 - farmacocinética do, 824 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 824 - - hemodiálise, 824 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 824 Hidralazina, 796 - ajuste de dose na doença renal, 823 - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - edema causado por, 158 - farmacocinética da, 823 - para pré-eclâmpsia, 550 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 - vasculite sistêmica causada por, 431 Hidratação pós-transplante renal, 950 Hidrato de cloral - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal do, 823 - farmacocinética do, 823 - reposição após
Índice Alfabético
- - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Hidrocalicose, 345 Hidrocloreto de Sevelamer, 687 Hidroclorotiazida - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 777, 823 - para acidose tubular renal, 578, 781 - para diabetes insipidus, 117 - - nefrogênico, 781 - para edema renal, 780 - para hipercalciúria idiopática, 781 - para raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Hidrocortisona - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Hidroftalmia, 561 Hidrogênio íon - na acidose metabólica, 164 - na alcalose metabólica, 163, 178 - perda de, na alcalose metabólica, 178 - secreção de - - tubular, 168 - - - distal, 51 - - - proximal, 50 Hidronefrose, 357 - achados radiológicos, 358 - aumento de volume do rim na, 369 - causas de, 320, 621 - com cálculo na pelve renal, 321 - definição de, 620 - e insuficiência renal crônica, 683 - em menina de seis meses, 353 - exame de escolha para, 294 - hipertensão e, 743 - incidência de, 621 - no diabete insípido nefrogênico, 572 - no rim ectópico, 347 - por anomalia de rotação, 347 Hidróxido de alumínio, 231 Hidroxietil-amido, 266 - composição do, 263 Hidroxiuréia - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Hidroxizina - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal da, 823 - farmacocinética da, 823 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Hiper-reninemia - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - na síndrome de Bartter, 201 Hiperaldosteronismo - hipertensão e, 743, 745, 746 - hipocalemia por, 201 - na síndrome de Bartter, 201 Hiperaminoacidúria, 559 - acídica, 563 - catiônica, 560 - - cistinúria clássica, 560 - - dibásica pelo tipo II, 563 - - intolerância lisinúrica protéica, 562 - dibásica tipo 2, 562, 563
- dicarboxílica, 563 - neutra, 563 - - doença de Hartnup, 563 - - histidinúria, 563 - - iminoglicinúria, 563 - - metioninúria, 563 Hiperamoniemia - na hiperargininemia, 561 - na intolerância lisinúrica protéica, 562 Hiperandrogenismo, hipertensão no, 745, 746 Hiperargininemia - achados clínicos, 561 - dados laboratoriais, 561 - observações, 561 Hiperazotemia - com amilorida, 782 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - com triamterene, 782 Hipercalcemia, 219 - cálculo urinário na, 301 - causas de, 219 - - doença - - - de Addison, 221 - - - granulomatosa, 220 - - - maligna, 220 - - drogas, 221 - - hiperparatireoidismo primário, 219 - - imobilização, 220 - - insuficiência renal - - - aguda, 221 - - - crônica, 221 - - intoxicação por - - - vitamina A, 221 - - - vitamina D, 220 - - pseudo-hipercalcemia, 222 - - síndrome álcali-leite, 221 - - tireotoxicose, 220 - definição de, 219 - diabetes insipidus nefrogênico causado por, 115 - diagnóstico, 222 - diurético para, 781 - hipocalciúrica - - benigna, 571 - - familiar, 221 - na excreção - - de fósforo, 225, 226 - - de magnésio, 232 - na osteodistrofia renal, 723 - na sarcoidose, 482 - na uremia, 674 - nefrite intersticial e, 270 - nefrolitíase e, 270 - nefropatia tubulointersticial por, 480 - no mieloma múltiplo, 439 - pós-transplante renal, 961 - proteinúria na, 291 - quadro clínico, 222 - - sintomas gerais, 222 - - sistemas afetados, 222 - - - cardiovascular, 222 - - - gastrintestinal, 222 - - - hematológico, 222 - - - nervoso, 222 - - - ocular, 222 - - - renal, 222 - resposta adaptativa a, 219 - sede na, 101 - tratamento, 223 - - bifosfonatos, 224 - - calcitonina, 224 - - cetoconazol, 225 - - cloroquina, 225 - - corticosteróides, 223 - - diálise, 225 - - estrógenos, 224 - - fósforo oral, 224 - - furosemida, 223 - - mitramicina, 224 - - solução salina, 223 Hipercalciúria - acidose tubular renal associada a, 576 - cálculo urinário na, 301 - e risco de nefrolitíase, 611 - hereditária, acidose tubular renal e, 576 - idiopática, 568, 611, 612 - - diurético para, 781 - na doença de Dent, 569
Índice Alfabético
- na sarcoidose, 482 - na síndrome de Bartter, 201, 570 - no mieloma múltiplo, 439 - pós-transplante renal, 961 - primária, 612 - secundária, 612 Hipercalemia, 205 - causas de, 205 - - diurético poupador de potássio, 206 - - insuficiência - - - adrenal, 206 - - - renal aguda, 205 - - medicamentos, 206 - - pseudo-hipercalemia, 205 - - ureterojejunostomia, 206 - com amiloride, 806 - com captopril, 810 - com tacrolimus, 470 - diagnóstico da, 210 - - diferencial, 206 - manifestações clínicas, 207 - - cardiovasculares, 207 - - hormonais, 208 - - neuromusculares, 207 - - renais, 208 - na insuficiência renal aguda, 392 - na uremia, 674 - por uso de antiinflamatório não-esteróide, 462 - tratamento, 208 - - agonista beta-adrenérgico, 208 - - bicarbonato de sódio, 208 - - cálcio, 208 - - diálise, 210 - - infusão de glicose-insulina, 209 - - mineralocorticóides, 210 - - resinas de troca, 209 Hipercolesterolemia - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - em paciente sob diálise, 926 - na glomerulonefrite, 405 - na nefropatia diabética, 598 - na síndrome nefrótica, 155 - na uremia, 680 - pós-transplante renal, 856, 959 Hipercortisolismo, hipertensão e, 745, 746 Hiperfiltração glomerular, 35 Hiperfosfatemia, 229 - causas de, 229 - hipocalcemia por, 216 - introdução, 229 - na insuficiência renal - - aguda, 392 - - crônica, 657 - - - controle da, 687 - na síndrome de lise tumoral, 230 - no pseudo-hipoparatireoidismo, 569 - quadro clínico, 230 - tratamento, 230 Hipergamaglobulinemia - acidose tubular renal associada a, 576 Hiperglicemia - com diurético, 782 - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - em paciente sob diálise, 926 - na gênese de nefropatia diabética, 599 - na insuficiência renal aguda, 845 - na nutrição parenteral intradialítica, 866 Hiperidratação, 320 Hiperlipidemia - na glomerulonefrite por lesões mínimas, 415 - na rejeição de transplante, 857 - na uremia, 675 - pós-transplante renal, 856 Hiperlipoproteinemia, 681 Hipermagnesemia, 235 - causas de, 235 - definição de, 235 - excreção de magnésio na, 232 - quadro clínico, 236 - tratamento, 236 Hipernatremia, 111 - cálculo do déficit de água, 119 - causas de, 112 - com hipervolemia, 112 - com hipovolemia, 112 - com volemia aparentemente normal, 113
- diagnóstico da, 111 - - diferencial, 126 - evolução da, 120 - fluido a ser infundido, 119 - hiperosmolalidade na, 111 - manejo do paciente com, 118, 119 - manifestações clínicas de, 117 - no diabetes insipidus, 115 - ritmo de correção na, 120 Hipernefroma, 635 Hiperosmolaridade, 111 Hiperoxalúria, 480, 612 - causas de, 612 - e risco de nefrolitíase, 612 - primária, 480 - secundária, 480 Hiperparatireoidismo - acidose tubular renal associada a, 576 - cálculo urinário no, 301 - hipercalciúria e, 612 - hipermagnesemia causada por, 235 - hipertensão causada por, 743 - hiperuricemia secundária a, 243 - hipofosfatêmico e, 227, 228 - - ligado ao sexo, 567 - miopatia urêmica e, 711 - na insuficiência renal crônica, 656, 666 - - controle do, 686 - na uremia, 675 - pós-transplante, 961 - primário, 219 - - causas, 219 - - diagnóstico, 220 - - incidência, 219 - - tratamento, 220 - secundário, 718 - - fisiopatologia do, 718 - - - distúrbios da vitamina D, 719 - - - distúrbios do cálcio, 718 - - - distúrbios do fósforo, 719 - - - resistência óssea ao PTH, 719 - - laboratório, exames de, 723 - - quadro clínico, 723 - síndrome de Fanconi causada por, 573 - vs. gota, 245 Hiperplasia da próstata, 622 - benigna, uropatia obstrutiva por, 320 - incontinência urinária por, 268 - retenção urinária na, 268 Hiperpnéia na hipernatremia, 118 Hiperpotassemia - com amilorida, 782 - com espironolactona, 782 - com triamterene, 782 - diálise de urgência por, 872 - na hipermagnesemia, 236 - na nefrite intersticial crônica, 478 - na síndrome de lise tumoral, 230 Hipertensão - acelerada, 525 - adrenomedulina na, 87 - agentes antiadrenérgicos na, 789 - avaliação do paciente com - - clínica, 751 - - laboratorial, 751, 752 - bacteriana e, 501 - beta-bloqueador adrenérgico na, 789 - bibliografia selecionada, 755 - bleomicina e, 808 - classificação da, 749 - clonidina e, 814 - com ciclosporina, 813 - conceito, 730 - conseqüências da, 746 - - cardíaca, 747 - - cerebral, 746 - - no sistema arterial periférico, 749 - - renal, 748 - - retiniana, 749 - definição, 730, 731 - determinação da pressão arterial, 732 - diagnóstico de, 292 - e nefropatia, 270 - - do refluxo, 512 - e progressão de insuficiência renal crônica, 671 - e uso de antiinflamatório não-esteróide, 465 - emergência hipertensiva, 752 - endereços na internet, 756 - endotelina na, 86
1009 - essencial, 730, 731, 743 - - etiologia da, 741 - - fatores de risco da, 742 - etiologia da, 741 - exame de escolha para, 294 - fisiopatologia da, 734 - - endotélio, 740 - - - fator relaxante derivado do, 740 - - - hormônio natural do, 740 - - - resistência insulínica, 741 - - excesso de sódio e volume, 735 - - o sistema - - - calicreína-cinina, 739 - - - das prostaglandinas, 739 - - - nervoso autônomo, 736 - - - renina-angiotensina-aldosterona, 737 - - peptídeo natriurético, 740 - - vasopressina, 740 - gestacional, 547 - hiperuricemia e, 242 - hipomagnesemia e, 234 - insuficiência crônica renal causada por, 663 - maligna, 525 - - quadro clínico, 526 - - tratamento, 526 - mecanismos reguladores da pressão arterial, 734 - monitorização ambulatorial da pressão arterial, 731 - na alcalose metabólica, 178 - na crioglobulinemia, 441 - na doença - - cística renal, 581 - - renal policística, 346, 585, 587 - - renovascular, 519 - - vascular encefálica pós-transplante renal, 715 - na glomerulonefrite, 405 - - fibrilar, 442 - - membranoproliferativa, 411 - - membranosa, 418 - - por lesões mínimas, 415 - - pós-estreptocócica, 405, 407 - na glomerulosclerose focal e segmentar, 416 - na gravidez, 539 - na hipercalcemia, 222 - na mulher, 546-556 - - crônica, 551 - - - tratamento anti-hipertensivo, 551 - - - tratamento não-farmacológico, 551 - - e contraceptivo oral, 552 - - e disfunção sexual, 554 - - e terapia de reposição hormonal, 553 - - - doença cardiovascular, 553 - - - fundamentos do papel do estrogênio na doença cardiovascular, 553 - - - menopausa, 553 - - endereços na internet, 556 - - na gestação, 547 - - - classificação, 547 - - - definição, 547 - - - pré-eclâmpsia, 548 - - referências bibliográficas, 555 - - tratamento, 550 - - - anti-hipertensivo, 550 - - - da pré-eclâmpsia, 550 - - - preventivo, 551 - na nefrite intersticial aguda, 477 - na nefropatia - - diabética, 598 - - por IgA, 410 - na púrpura - - de Henoch-Shönlein, 436 - - trombocitopênica trombótica, 527 - na síndrome - - de Goodpasture, 437 - - de Liddle, 571 - - do anticorpo antifosfolipídio, 531 - na terapia com eritropoetina recombinante humana, 699 - na trombose de veia renal, 371 - na uremia, 675-677 - na uropatia obstrutiva, 623 - na vasculite sistêmica necrotizante, 432 - nefrosclerose e, 523, 524 - no carcinoma de células renais, 639 - no lúpus eritematoso sistêmico, 428 - peptídeo natriurético atrial na, 82 - por cisto renal, 580 - por doença renal parenquimatosa, 769-774 - - bibliografia selecionada, 774 - - endereços na internet, 774 - - insuficiência renal
1010 - - - aguda, 769 - - - crônica, 769 - - mecanismos fisiopatogênicos, 771 - - - endotélio vascular, 772 - - - eritropoetina, 772 - - - retenção de sódio e água, 771 - - - sistema nervoso simpático, 771 - - - sistema renina-anagiotensina, 772 - - nefropatia diabética, 773 - - papel na progressão da IRC, 772 - - prevalência, 770 - - referências bibliográficas, 774 - por uso de antiinflamatório não-esteróide, 462 - portal na nefropatia esquistossomática, 447 - pós-transplante renal, 959 - - causas de, 959 - - hipotensores na, 959 - prevalência da elevação da pressão arterial, 733 - prevenção primária da, 753 - primária, 730-756 - - etiologia da, 741, 743 - - fatores de risco da, 742 - renovascular, 311, 377, 744, 757-768 - - angiografia na, 299 - - angioplastia de artéria renal, 312 - - arteriografia convencional, 311 - - bibliografia selecionada, 767 - - cintilografia renal com IECA na, 378 - - - metodologia, 378 - - dados que levam a suspeita de, 311 - - definição de, 378, 757 - - diagnóstico de, 745, 759, 760, 763 - - - angiorresonância magnética, 763 - - - atividade da renina plasmática periférica, 760 - - - renograma radioisotópico, 762 - - - tomografia helicoidal, 763 - - - ultra-sonografia com Doppler, 762 - - - urografia excretora, 761 - - dosagem de renina, 312 - - endereços na internet, 767 - - epidemiologia, 758 - - etiologia da, 743 - - fisiopatogênese, 758 - - renograma radioisotópico na, 376 - - ressonância magnética, 312 - - tomografia computadorizada, 312 - - tratamento, 763 - - - angioplastia transluminal percutânea da artéria renal, 765 - - - cirúrgico, 765 - - - clínico, 763 - - - estratégia, 763 - - urografia excretora para, 311 - secundária, 743, 744 - - à acromegalia, 743 - - à coarctação da aorta, 743 - - à doença renal, 743, 744 - - à endocrinopatia, 743, 745, 746 - - à gravidez, 743, 744 - - a tumor produtor de renina, 743 - - ao hiperparatireoidismo, 743 - - ao uso de medicamentos, 743, 745 - significado da elevação da pressão arterial, 733 - sistema - - calicreína-cinina na, 80 - - renina-angiotensina na, 75 - sistêmica, diuréticos na, 780 - tratamento não-farmacológico da, 754 Hipertermia - na síndrome de Fanconi, 564 - no diabete insípido nefrogênico, 572 Hipertireoidismo - acidose tubular renal associada a, 576 - hipercalciúria e, 612 - hiperfosfatemia e, 230 - hipertensão e, 743, 745, 746 - na uremia, 680 - secundário, 720 Hipertirosinemia - achados clínicos, 561 - dados laboratoriais, 561 - observações, 561 Hipertrigliceridemia - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - em paciente sob diálise, 926 - na glomerulonefrite, 405 - na insuficiência renal crônica, 681
Índice Alfabético
- pós-transplante renal, 959 Hipertrofia - da próstata, nictúria por, 268 - ventricular esquerda, hipertensão e, 748, 769 Hiperuricemia, 242 - apresentação clínica, 244 - - gota, 244 - - nefrolitíase pelo ácido úrico, 246 - - nefropatia - - - aguda pelo ácido úrico, 245, 249 - - - crônica pelo ácido úrico, 246, 250 - - - hiperuricêmica familiar, 246, 250 - assintomática, 242 - - considerações gerais, 247 - - tratamento farmacológico, 248 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - daunorrubicina e, 816 - definição de, 242 - e progressão de insuficiência renal crônica, 671 - e risco de nefrotoxicidade por contraste, 461 - epidemiologia, 244 - gota, 244, 248 - idiopática, 243 - lesão renal da, 480 - manejo clínico e farmacológico da, 247 - na síndrome - - de Bartter, 570 - - de lise tumoral, 230 - nefrite intersticial e, 270 - nefrolitíase e, 270 - - pelo ácido úrico, 246, 250 - no mieloma múltiplo, 439 - no transplante renal, 247, 250 - - alopurinol para, 251 - - antiinflamatório não-esteróide para, 250 - - colchina para, 250 - - corticosteróides para, 251 - - tratamento, 250 - - uricosúricos para, 251 - piretanida e, 834 - pós-transplante, 962 - primária, 242 - secundária, 242 - - causas de, 243 - tiazídico e, 838 Hiperuricosúria, 612 Hipervolemia, diálise de urgência por, 872 Hipoalbuminemia - com interleucina II, 470 - na glomerulonefrite membranosa, 420 - na síndrome nefrótica, 155, 404 Hipocalcemia - causas de, 216 - - alcalose respiratória, 217 - - anticonvulsivante, 216 - - disfunção tubular, 217 - - doença maligna, 217 - - drogas, 216 - - hepatopatia crônica, 217 - - hiperfosfatemia, 216 - - hipomagnesemia, 216 - - insuficiência renal crônica, 217 - - má absorção, 216 - - pancreatite aguda, 217 - - raquitismo dependente de vitamina D, 217 - - síndrome - - - do choque tóxico, 217 - - - nefrótica, 217 - definição de, 215 - diagnóstico de, 217 - excreção de magnésio na, 232 - na hipermagnesemia, 236 - na hipomagnesemia, 234 - na insuficiência renal - - aguda, 392 - - crônica, 656 - na síndrome - - de lise tumoral, 230 - - nefrótica, 404 - na uremia, 674 - no pseudo-hipoparatireoidismo, 569 - pré-natal, 217 - quadro clínico, 217, 218 - tratamento, 218 Hipocalemia, 199 - cálculo do déficit de K, 204 - causas de, 199
- - gastrintestinais, 191, 199, 200 - - renais, 199, 200 - diabetes insipidus nefrogênico causado por, 115 - diagnóstico da, 209 - - diferencial, 203 - edema associado a, 151, 158 - manifestações clínicas, 201 - - cardiovasculares, 201 - - digestivas, 203 - - metabólicas, 201 - - neuromusculares, 202 - - renais, 203 - na doença de Dent, 569 - na síndrome - - de Bartter, 570 - - de Liddle, 571 - na uremia, 674 - por uso de anfotericina B, 458 - reposição de K em situações especiais, 205 - sede na, 101 - tratamento da, 204 Hipocitratúria, 612 Hipodipsia, 101 Hipofosfatemia, 226 - causas de, 227 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - considerações, 226 - defeitos da mineralização óssea na, 225 - diagnóstico, 228 - ligada ao sexo, 566 - na doença de Dent, 569 - na síndrome de Bartter, 570 - na uremia, 674 - no hipoparatireoidismo, 216 - no raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - por uso de aciclovir, 459 - pós-transplante renal, 961 - quadro químico, 228 Hipoglicemia - com acetoexamida, 804 - com insulina, 825 - glibenclamida e, 823 - na glicogenose I, 561 - na intolerância hereditária à frutose, 561 - na nutrição parenteral intradialítica, 866 - no carcinoma de células renais, 639 Hipoglicemiante, interação farmacológica do, 783 Hipogonadismo, 678 Hipomagnesemia - causas de, 233 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - com tacrolimus, 470 - diagnóstico, 234 - excreção de magnésio na, 232 - hipocalcemia por, 216 - na hipocalemia, 201 - na síndrome - - de Bartter, 201, 570 - - de Gitelman, 201 - no hipoparatireoidismo, 216 - por uso de anfotericina B, 458 - quadro clínico, 234 - tratamento, 234 Hiponatremia, 120 - aguda, 121, 122 - causas de, 121 - - intoxicação aguda pela água, 122 - - pseudo-hiponatremia, 121 - - redistribuição de água, 121 - com amilorida, 782 - com aumento de sódio corporal, 122 - com diminuição de sódio corporal, 122 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - com espironolactona, 782 - com hipertonicidade, 121 - com sódio corporal aparentemente normal, 123 - com triamterene, 782 - diagnóstico da, 124 - - diferencial, 126 - dilucional, 120 - hiperosmolar, 121 - hipertônica, 121 - hipotônica, 120
Índice Alfabético
- isosmolar, 121 - isotônica, 121 - manifestações clínicas de, 124 - real, 120 - sintomática, tratamento da, 127 - situações clínicas associadas a, 120, 121 - tratamento da, 124 - - com base na duração e nos sintomas, 128 - - complicações, 128 Hipoparatireoidismo, 216 - doença óssea adinâmica pelo, 678 - hiperfosfatemia e, 230 - idiopático, 216 - pós-cirúrgico, 216 Hipoplasia renal, 6, 317, 333, 344 - ressonância magnética na, 329 - vs. seqüelas de nefropatia de refluxo, 345 Hipopotassemia - com acetazolamida, 804 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - na hipomagnesemia, 234 - na nefrite intersticial crônica, 478 - nefropatia tubulointersticial por, 480 - por uso de diuréticos, 785 Hipoproteinemia, edema na, 150 Hipospádia, 357 Hipostenúria, 572 Hipotensão - arterial na hipermagnesemia, 236 - bretílio e, 809 - bromocriptina e, 809 - com guanetidina, 823 - com haloperidol, 824 - com prasozin, 835 - na hipocalcemia, 218 Hipotermia - hipocalemia na, 200 - na hiponatremia, 124 Hipotireoidismo - doença óssea adinâmica e, 678 - edema associado a, 151 - hipertensão e, 743, 746 - hiperuricemia secundária à, 243 - na cistinose, 561 - na uremia, 680 Hipouricemia, 251 - definição de, 251 - na doença de Hartnup, 563 - por diminuição na produção de ácido úrico, 251 - por excreção aumentada de ácido úrico, 251 Hipovolemia com diurético - de ação prolongada, 782 - de alça, 782 Hirsutismo com espironolactona, 782 Hirudina, 912 Hisocel, 266 Histerectomia, atenção com, 3 Histidinúria, 563 Histiocitose, 113 Histoplasma capsulatum após transplante renal, 976 Histoplasmose - hipercalcemia na, 220 - pós-transplante renal, 976, 983 HIV após transplante renal, 976, 981 Homeostase - do cálcio, 214 - - fatores que regulam a, 215 - - - PTH, 215 - - - vitamina D, 215 - do fósforo, 225 - do magnésio, 231 - dos fluidos, 135 Homocisteína e uremia, 673 Hormônio - adrenocortical - - e secreção de HAD, 104 - antidiurético, 17, 32, 47, 61, 101 - - ação do, 61 - - e regulação da pressão arterial, 740 - - e secreção de renina, 73 - - mecanismo de ação do, 103 - - para diabetes insipidus central, 116 - - secreção de, 65 - da paratireóide - - e acidificação urinária, 55 - - e desnutrição na IRC, 844 - do crescimento e transporte do fosfato, 565
- e acidificação urinária, 55 - e regulação da filtração glomerular, 32 - natriurético - - excreção de sódio e, 144 - - origem do, 144 - paratireóideo e uremia, 673 - tireoidiano - - e excreção de água, 103 - - e transporte do fosfato, 565 Humor, distúrbios do, 676
I Ibuprofeno - ajuste de dose na doença renal, 823 - cuidados especiais, 823 - dose normal do, 823 - farmacocinética do, 823 - nefrotoxicidade do, 464 - para síndrome de Bartter, 571 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 823 - - hemodiálise, 823 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 823 Icterícia - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - na galactosemia, 561 Ifosfamida - ajuste de dose na doença renal, 825 - cuidados especiais, 825 - dose normal da, 825 - farmacocinética da, 825 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - hemodiálise, 825 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 - síndrome de Fanconi causada por, 573 Iminoglicinúria, 563 Imipenem - ajuste de dose na doença renal, 825 - com cilastatina, nefrotoxicidade do, 825 - cuidados especiais, 825 - dose normal do, 825 - farmacocinética do, 825 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - hemodiálise, 825 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 Imipramina - ajuste de dose na doença renal, 825 - cuidados especiais, 825 - dose normal da, 825 - farmacocinética da, 825 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - hemodiálise, 825 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 Imobilização, hipercalcemia e, 220 Imunoglobulina - G para nefropatia por IgA, 411 - humana para rejeição de transplante, 951 Imunomodulador, nefrotoxicidade do, 466 Imunossupressão - e resposta a terapia com eritropoetina, 699 - efeitos deletérios dos agentes sobre o sistema nervoso, 715 - nefrotoxicidade dos agentes para, 466 - para glomerulonefrite - - crescêntica, 409 - - por vírus C, 444 - para púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - para rejeição de transplante, 963 - para síndrome - - do anticorpo antifosfolipídio, 531 - - hemolítico-urêmica, 528 - para transplante renal, 940, 951 - - anticorpo monoclonal, 956 - - azatioprina, 952, 954 - - basiliximab, 953 - - ciclosporina, 952, 954 - - daclizumab, 953 - - de indução, 951 - - de manutenção, 951 - - globulina antitimocítica, 953, 956 - - inibidor do receptor da interleucina II, 956 - - micofenolato mofetil, 952, 955
1011 - - na rejeição, 951 - - orthoclone, 953, 956 - - prednisona, 951 - - sirolimus, 953, 956 - - tacrolimus, 952, 955 Incontinência urinária, 268 Indapamida - ajuste de dose na doença renal, 825 - cuidados especiais, 825 - dose normal da, 825 - farmacocinética da, 777, 825 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - hemodiálise, 825 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 Indinavir - nefrite intersticial causada por, 470 - nefrotoxicidade do, 459 Indometacina - ajuste de dose na doença renal, 825 - cuidados especiais, 825 - dose normal da, 825 - farmacocinética da, 825 - nefrotoxicidade da, 464 - para cólica renal, 615 - para diabete insípido nefrogênico, 574 - para gota, 248, 249 - para síndrome de Bartter, 571 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - hemodiálise, 825 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 Inervação renal, 5 - e regulação da circulação renal, 26 Infarto - do miocárdio - - hipertensão e, 748 - - pós-transplante, 962 - - sistema calicreína-cinina no, 80 - renal, 519 - - dignóstico de, 520 - - exame de escolha para, 294 - - na síndrome antifosfolipídio, 531 - - radiologia no, 308 Infecção - amiloidose secundária à, 442 - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - após transplante renal, 974 - das vias aéreas superiores na glomerulonefrite, 411 - do trato urinário, 490-506 (v.tb. Trato urinário, infecção do) - - interação das diversas formas clínicas, 491 - - sem piúria, 492 - - sintomatologia sugestiva de, 492 - e interferência na terapia com eritropoetina, 699 - mioglobinúria por, 269 - na insuficiência renal aguda, 393, 680 - na nefropatia tubulointersticial, 476, 481 - na síndrome nefrótica, 404 - por cateter na diálise, 886 - urinária, 304, 365 - - aumento dos valores da albuminúria na, 602 - - cintilografia estática para, 383 - - diagnóstico de, 291 - - e progressão de insuficiência renal crônica, 671 - - e risco de nefrolitíase, 613 - - em menina - - - de cinco anos, 362 - - - de oito anos, 364 - - investigação por imagem na, 304 - - na criança, imageamento para, 342 - - na doença renal policística, 585 - - na nefropatia diabética, 601 - - na síndrome da imunodeficiência adquirida, 308 - - no adulto, 304 - - no mieloma múltiplo, 439 - - pós-transplante renal, 982 - - radiologia na, 304 - - ressonância magnética na, 305 - - testes de localização de uma, 495 - - tomografia computadorizada na, 304, 305 - - ultra-sonografia na, 305 - - urografia excretora na, 305 Infertilidade na uremia, 675 Inflamação - e interferência na terapia com eritropoetina, 699 - edema associado a, 151 - na nefropatia tubulointersticial, 476 - sistêmica na IRC, controle da, 687
1012 Influenza vírus pós-transplante renal, 976 Inibidor - da anidrase carbônica, hipocalemia por uso de, 200 - da COX-2 para gota, 248 - da cristalização urinária, 610 - - deficiência de, 613 - da enzima conversora da angiotensina, 791 - - associado a diurético na insuficiência cardíaca, 793 - - características do, 792 - - cintilografia renal com, 378 - - contra-indicação na gravidez, 550, 552 - - e resposta a terapia com eritropoetina, 699 - - efeitos do, 791 - - - colaterais, 791 - - - renoprotetor, 772 - - hipercalemia exacerbada pelo, 857 - - insuficiência renal aguda causada por, 389 - - interação farmacológica do, 783 - - na fibrose miointimal, 80 - - nefrotoxicidade do, 465 - - para disfunção sistólica, 793 - - para doença renal policística autossômica dominante, 586 - - para eritrocitose, 700 - - para esclerodermia renal, 530 - - para hipertensão - - - arterial, 80 - - - pós-transplante renal, 959 - - - sistêmica, 781 - - para infarto do miocárdio, 80 - - para nefropatia - - - da anemia falciforme, 533 - - - diabética, 603, 604, 774, 793 - - - por HIV, 447 - - para nefrosclerose hipertensiva benigna, 524 - - para poliglobulia, 960 - - para proteinúria, 404 - - para síndrome de Bartter, 571 - da protease, nefrotoxicidade do, 459 - seletivo da recaptação de serotonina, 123 Insônia - na hipernatremia, 118 - na infecção urinária, 492 Insuficiência cardíaca - aumento dos valores da albuminúria na, 602 - congestiva - - adrenomedulina na, 87 - - alcalose respiratória e, 183 - - edema associado a, 151 - - - fator natriurético, 153 - - - papel do rim na retenção de sódio, 152 - - - prostaglandinas, 153 - - - sistema renina-angiotensina-aldosterona, 153 - - - volume sangüíneo arterial efetivo, 152 - - fator natriurético atrial na, 145 - - na uremia, 675, 677 - - nictúria por, 268 - - peptídeo natriurético atrial na, 82 - e risco de nefrotoxicidade por contraste, 461 - edema da, 150 - hiponatremia na, 125 - na glomerulonefrite aguda, 157 - na hipofosfatemia, 228 Insuficiência hepática, 562 Insuficiência renal - aguda, 388-401 - - alterações hidroeletrolíticas, 392 - - - balanço de água, 392 - - - balanço de cálcio, 392 - - - balanço de fósforo, 392 - - - balanço de potássio, 392 - - - balanço de sódio, 392 - - bibliografia selecionada, 400 - - catabolismo protéico na, 844 - - causas de desnutrição na, 844 - - com acidente ofídico, 473 - - com aminoglicosídeo, 453 - - com cefalosporina, 454 - - com interferon, 470 - - com metotrexato, 472 - - com pentamidina, 457 - - com rifampicina, 456 - - com sulfadiazina, 456 - - com sulfonamida, 456 - - com trimetoprim-sulfametoxazol, 457 - - complicações - - - cardiovasculares, 393 - - - gastrointestinais, 393 - - - neurológicas, 393
Índice Alfabético
- - diagnóstico de, 291, 394 - - - avaliação clínica inicial, 394 - - - biópsia renal, 395 - - - laboratorial, 394 - - - por imagem, 395 - - doxorrubicina e, 818 - - edema associado a, 151 - - endereços na internet, 401 - - escolha do tratamento diabético na, 913 - - etiologia, 388 - - fator natriurético atrial na, 145 - - fisiopatologia, 389 - - - curso clínico, 391 - - - fatores hemodinâmicos, 390 - - - fatores vasculares, 390 - - - lesão tubular, 390 - - hipercalcemia na, 221 - - hipercalemia e, 205 - - hipertensão arterial no decurso de, 769 - - incidência, 391 - - infecções, 393 - - manifestações extra-renais, 392 - - na gravidez, 540 - - na nefrite intersticial aguda, 476 - - nutrição na, 843 - - patologia, 393 - - pelo lítio, 478 - - por aciclovir, 459 - - por antiinflamatório não-esteróide, 462 - - por bloqueador do receptor AT1 de angiotensina II, 465 - - por ciclosporina, 467 - - por contraste radiológico, 461 - - por fator de necrose tumoral, 471 - - por foscarnet, 459 - - por inibidor da enzima de conversão da angiotensina, 465 - - por picada de abelha, 474 - - pós-transplante renal, 956 - - - causas da, 957 - - - fatores predisponentes, 957 - - - vs. estenose de artéria renal, 957 - - - vs. hematoma de loja, 957 - - - vs. obstrução urinária, 957 - - - vs. trombose vascular, 957 - - recomendações nutricionais na, 843 - - - carboidratos, 845 - - - eletrólitos, 845 - - - lipídios, 845 - - - minerais, 845 - - - proteínas, 844 - - - quilocalorias, 843 - - - vitaminas, 845 - - sistema nervoso na, 705 - - terapia contínua de reposição renal, 397, 399 - - - acesso vascular, 397 - - - anticoagulação, 398 - - - dialisador, 397 - - - escolha do método dialítico, 400 - - - força motriz do sangue, 397 - - - hemodiafiltração arteriovenosa contínua, 399 - - - hemodiafiltração venovenosa contínua, 400 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 399 - - - solução de diálise, 398 - - - solução de reposição, 398 - - - ultrafiltração lenta contínua, 399 - - tratamento, 395 - - - da pré-renal, 395 - - - da renal, 396 - - - pontos-chave, 397 - crônica, 649-659 - - achados de exame físico sugestivos de etiologia para, 684 - - adaptação do néfron à perda de massa renal, 652 - - adrenomedulina na, 87 - - alteração ortostática de pressão arterial no, 147 - - balanço - - - de ácido, 655 - - - de água, 654 - - - de cálcio, 656 - - - de fosfato, 656 - - - de potássio, 655 - - - de sódio, 653 - - dados de história que sugerem uma etiologia para, 683 - - diagnóstico de, 291 - - e infecção do trato urinário, 501 - - edema associado a, 151 - - endereços na internet, 659 - - fator natriurético atrial na, 145 - - fisiopatologia da uremia, 661-690
- - - bibliografia selecionada, 689 - - - causas, 663 - - - classificação e estratificação, 662 - - - como investigar o paciente com insuficiência renal crônica, 683 - - - diálise, indicação da, 687 - - - distribuição de néfron, 664 - - - endereços na internet, 690 - - - incidência, 663 - - - manejo do paciente, 685 - - - prevalência, 663 - - - progressão da IRC, 671 - - - referências bibliográficas, 688 - - - síndrome urêmica, 672 - - - transplante renal, indicação do, 688 - - hipercalcemia na, 221 - - hipercalemia na, 206 - - hipertensão no decurso de, 769 - - hiperuricemia secundária à, 243, 246 - - hipomagnesemia e, 234 - - introdução, 649 - - na cistinose, 561 - - na síndrome de Bartter, 570 - - natureza progressiva da, 657 - - nefropatia do refluxo e, 507, 513 - - no lúpus eritematoso sistêmico, 429 - - osteodistrofia renal, 656 - - por uso de antiinflamatório não-esteróide, 462 - - progressão da, 652, 661, 662, 671 - - - causas de, 671 - - recomendações nutricionais na, 846 - - - cálcio, 850 - - - carboidrato, 849 - - - fósforo, 850 - - - lipídio, 849 - - - líquidos, 850 - - - oligoelementos, 850 - - - potássio, 850 - - - proteína, 846, 849 - - - quilocalorias, 846 - - - sódio, 850 - - - vitaminas, 850 - - referências bibliográficas, 659 - - sistema nervoso na, 705 - - teoria do “néfron intacto”, 650, 664 - endotelina na, 86 - exame de escolha para, 294 - hiperfosfatemia e, 230 - hipermagnesemia causada por, 235 - hipocalcemia por, 216, 217 - hiponatremia na, 125 - homeostasia do potássio na, 198 - imageamento para, 313 - na criança, imageamento na, 343 - na doença - - de Dent, 569 - - renal policística autossômica dominante, 585, 587 - na glomerulonefrite - - fibrilar, 442 - - membranoproliferativa, 411 - na glomerulosclerose focal e segmentar, 416 - na gravidez, 539 - na hipercalcemia, 222 - na intolerância lisinúrica protéica, 562 - na nefrite intersticial crônica, 478 - na nefropatia - - do HIV, 446 - - esquistossomática, 447 - na síndrome de Goodpasture, 437 - na uropatia obstrutiva, 623 - radiologia na, 313 - terminal - - acúmulo - - - de ácido aceto-hidroxâmico na, 805 - - - de atenolol na, 807 - - - de metabólitos de cloranfenicol na, 815 - - - de metabólitos de metronidazol na, 829 - - conversão de digitoxina na, 817 - - convulsão - - - com imipenem na, 825 - - - com meperidina na, 828 - - efeito exacerbado - - - da morfina na, 830 - - - da nimodipina na, 831 - - eliminação fecal da metaqualona na, 828 - - hiperpotassemia com succinil colina na, 837 - - hipoglicemia - - - com clorpropamida na, 815 - - - com propranolol na, 836
1013
Índice Alfabético
- - impregnação de digoxina na, 818 - - ineficácia da indapamida na, 825 - - ligação protéica - - - da nifedipina na, 831 - - - de doxepin na, 818 - - - do midazolam na, 829 - - - do oxazepam na, 833 - - - do pentobarbital na, 834 - - - do sulfametoxazol na, 837 - - - do sulfixazol na, 838 - - - do temazepam na, 838 - - meia-vida biológica de drogas na, 804-840 - - metabólitos ativos de cefotaxima na, 812 - - mielotoxicidade da flucitosina na, 821 - - ototoxicidade da eritromicina na, 819 - - sinais extrapiramidais com metoclopramida na, 829 - - toxicidade do ácido nicotínico na, 805 - uso de medicamentos na, 799-842 - - ajuste de doses, 802 - - introdução, 799 - - monitorização de níveis séricos de drogas, 841 - - níveis séricos terapêuticos de drogas, 841 - - parâmetros farmacocinéticos, 800 - - - biodisponibilidade, 800 - - - classificação das drogas quanto à eliminação, 801 - - - clearance corporal das drogas, 801 - - - diálise, 801 - - - eliminação, 800 - - - hemofiltração, 801 - - - hemoperfusão, 801 - - - meia-vida biológica, 801 - - - volume aparente de distribuição, 800 Insuficiência respiratória, 228 Insuficiência supra-renal, 235 Insulina - ajuste de dose na doença renal, 825 - cuidados especiais, 825 - dose normal da, 825 - e alteração na distribuição transcelular de potássio, 192 - e hipocalemia, 200 - e secreção - - de fósforo, 225, 226 - - de renina, 73 - e transporte do fosfato, 565 - farmacocinética da, 825 - na homeostasia do potássio, 195 - para hipercalemia, 209 - para hipermagnesemia, 236 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - hemodiálise, 825 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 Interferon, 470 - alfa - - ajuste de dose na doença renal, 825 - - cuidados especiais, 825 - - dose normal do, 825 - - farmacocinética do, 825 - - para glomerulonefrite por vírus C, 444 - - para nefropatia por vírus B, 444 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - - hemodiálise, 825 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - beta - - ajuste de dose na doença renal, 825 - - cuidados especiais, 825 - - dose normal do, 825 - - farmacocinética do, 825 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - - hemodiálise, 825 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 - nefrite intersticial causada por, 470 - nefrotoxicidade do, 470 - usos do, 470 Interleucina - e secreção de renina, 73 - II - - nefrotoxicidade da, 470 - - usos da, 470 - nefrite intersticial causada por, 470 Interstício renal, 16 Intolerância - à glicose na insuficiência renal crônica, 681 - ao leite na intolerância hereditária à frutose, 561 - aos carboidratos na uremia, 675
- hereditária - - à frutose - - - acidose tubular renal e, 574 - - - síndrome de Fanconi associada a, 573 - - à glicose - - - achados clínicos, 561 - - - dados laboratoriais, 561 - - - observações, 561 - lisinúrica protéica, 562 - protéica familial, 562 Intoxicação endógena e tubulopatia, 558 Inulina, 285 - clearance da, 35 - para determinação da taxa de filtração glomerular, 285 Ipratrópio - ajuste de dose na doença renal, 825 - cuidados especiais, 825 - dose normal do, 825 - farmacocinética do, 825 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 825 - - hemodiálise, 825 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 825 Irbesartan, 795 - para nefropatia diabética, 604 Isoenxerto, 930 Isoflurano, interação farmacológica com diurético de ação - prolongada, 783 - rápida, 783 Isoniazida - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal da, 826 - farmacocinética da, 826 - hipocalcemia causada por, 216 - interação com ciclosporina, 467 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Isossorbida - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal da, 826 - farmacocinética da, 826 - para edema hepático, 780 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Isoxicam - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal do, 826 - farmacocinética do, 826 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Isradipina, 794 - ajuste de dose na doença renal, 826 - associada a aspirina, 794 - características da, 795 - cuidados especiais, 826 - dose normal da, 826 - farmacocinética da, 826 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Itraconazol - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal do, 826 - farmacocinética do, 826 - interação com ciclosporina, 467 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826
J Jararaca, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Jararacuçu, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Jejum, hipofosfatemia no, 227 Junção pieloureteral, obstrução da, 352
K Ketoconazole, 467 Klebsiella - e peritonite durante diálise, 924 - glomerulonefrite na infecção por, 448 - infecção do trato urinário por, 304, 496, 497, 613
L Labetalol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal do, 826 - farmacocinética do, 826 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Laboratório, dados de - antes do tratamento com eritropoetina recombinante humana, 694 - durante a gravidez, 539 - na acidose - - metabólica, 174 - - tubular renal, 577, 579 - na alcalose metabólica, 180 - na cistinose, 561 - na depleção de sódio, 147 - na doença - - de Dent, 569 - - de Wilson, 561 - na esclerodermia renal, 530 - na galactosemia, 561 - na glicogenose I, 561 - na glicoglicinúria, 561 - na glomerulonefrite - - de lesões mínimas, 416 - - membranosa, 420 - na glomerulosclerose segmentar e focal, 417 - na gota, 245 - na hiperaminoacidúria, 560 - na hiperargininemia, 561 - na hipercalcemia, 223 - na hipertensão arterial, 752 - na hipertirosinemia tipo I, 561 - na insuficiência renal aguda, 394 - na intolerância hereditária à frutose, 561 - na investigação de insuficiência renal crônica, 683 - na nefrite - - intersticial - - - aguda, 477 - - - crônica, 478 - - por irradiação, 529 - na nefrolitíase, 614, 615 - - pelo ácido úrico, 247 - na nefropatia - - aguda pelo ácido úrico, 246 - - crônica pelo ácido úrico, 246 - - diabética, 601 - na osteodistrofia renal, 723 - na púrpura - - de Henoch-Shönlein, 436 - - trombocitopênica trombótica, 527 - na realização de biópsia renal, 323 - na síndrome - - de Bartter, 571 - - de Luder-Sheldon, 561 - - de Rowley-Rosemberg, 561 - - do anticorpo antifosfolipídio, 531, 532 - - HELLP, 548, 550 - - hemolítico-urêmica, 527 - - óculo-cérebro-renal de Lowe, 561 - na trombose de artéria renal, 520 - na uropatia obstrutiva, 623 - na vasculite renal, 433, 435 - no carcinoma de células renais, 639 - no diabetes insípido nefrogênico, 572 - no doador de transplante renal, 945, 949 - no lúpus eritematoso sistêmico, 429 - no raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - para iniciar tratamento com diuréticos, 778 - pós-transplante - - imediato, 950 - - renal, 950 - provas de função renal, 281 - - avaliação da função glomerular, 281 - - - cistatina C plasmática, 284
1014 - - - clearance da creatinina endógena, 281 - - - clearance da uréia, 284 - - - creatinina plasmática, 281 - - - inulina, 285 - - - meios de contraste, 285 - - - radioisótopos, 285 - - - uréia plasmática, 284 - - avaliação da função tubular - - - concentração urinária, 285 - - - diluição da urina, 286 - - - dosagem de alfa-1-microglobulina, 288 - - - dosagem de aminoácidos, 288 - - - dosagem de beta-2-microglobulina, 288 - - - dosagem de N-acetil-beta-glicosaminidase, 288 - - - dosagem de proteína ligadora do retinol, 288 - - - excreção de eletrólitos, 287 - - - prova de acidificação urinária, 286 - urinálise, 272 - - bilirrubina, 273 - - corpos cetônicos, 273 - - densidade, 273 - - esterase leucocitária, 273 - - exame microscópico, 278 - - glicose, 273 - - hemoglobina, 273 - - mioglobina, 273 - - nitrito, 273 - - pH, 273 - - proteinúria, 274 - - sedimento urinário, 276 - - - células, 276 - - - cilindros, 276 - - - cristais, 278 - - urobilinogênio, 273 Lachesis, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Lagarta, acidente com, 474 Laminina, 10 Lamotrigina - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal da, 826 - farmacocinética da, 826 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Laxativo, abuso de - hiperfosfatemia causada por, 230 - hipermagnesemia causada por, 235 - hiperuricemia causada por, 243 - hipomagnesemia e, 233 Legionella pós-transplante renal, 976, 983 Lei de ação das massas, 163 Leiomiossarcoma renal, 644 Lepra - acidose tubular renal associada a, 576 - glomerulopatia da, 448 Letargia - na hipercalcemia, 222 - na hipernatremia, 118 - na hiponatremia, 124 Leucemia - aguda, hipocalcemia por, 217 - envolvimento renal na, 481 - linfocítica aguda, metotrexato para, 472 Leucocitose - na nefrolitíase, 614 - na trombose de artéria renal, 520 - na vasculite renal, 433 Leucocitúria, 493 - na nefrite intersticial aguda, 477 - na uropatia obstrutiva, 623 - por uso - - de anfotericina B, 458 - - de pentamidina, 457 Leucodistrofia metacromática, 574 Leucopenia - com captopril, 810 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - com melfalan, 828 - durante a diálise, 701 - no lúpus eritematoso sistêmico, 425 - pós-transplante, 961 Leucose, hipofosfatemia associada a, 227 Levodopa - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826
Índice Alfabético
- dose normal da, 826 - farmacocinética da, 826 - hiperuricemia causada por, 243 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Levofloxacin, nefrotoxicidade do, 457 Lidocaína - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal da, 826 - farmacocinética da, 826 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Ligamento - lombocostal, 2 - oliolombar, 2 Lincomicina - ajuste de dose na doença renal, 826 - cuidados especiais, 826 - dose normal da, 826 - farmacocinética da, 826 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 826 - - hemodiálise, 826 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 826 Linfático renal, 5 Linfocele pós-transplante, 956, 958 Linfoma - não-Hodgkin - - envolvimento renal no, 481 - - metotrexato para, 472 - renal, radiologia no, 308 Linfopenia durante a diálise, 701 Lipídio, necessidades de - na diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854 - na insuficiência renal - - aguda, 845 - - crônica, 849 - no paciente sob hemodiálise, 851, 852 - pós-transplante renal, 858 Lipooxigenase, 28 Lipossarcoma renal, 644 Líquido - cefalorraquidiano - - exame do, para encefalopatia urêmica, 707, 710 - - na hipernatremia, 118 - extracelular, composição eletrolítica do, 94 - intersticial, 94 - - composição iônica do, 95 - - pressão oncótica do, 97 - intracelular, 94 - - composição iônica do, 95 - necessidade na insuficiência renal crônica, 850 - orgânico, 90-99 - - água total do organismo, 92 - - - determinação da, 93 - - compartimentos do, 93 - - - composição eletrolítica, 94 - - - determinação do volume dos subcompartimentos extracelulares, 93 - - - determinação do volume extracelular, 93 - - - determinação do volume intracelular, 94 - - difusão, 91 - - distribuição da água entre compartimentos, 95 - - - adição de água, 96 - - - adição de solução hipertônica de NaCl, 96 - - - adição de solução hipotônica, 96 - - - adição de solução isotônica de NaCl, 97 - - endereços na internet, 98 - - exercícios, 98, 99 - - osmolalidade e tonicidade, 92 - - - solução hiperosmótica, 92 - - - solução hipertônica, 92 - - - solução hiposmótica, 92 - - - solução hipotônica, 92 - - - solução isosmótica, 92 - - - solução isotônica, 92 - - osmose, 91 - - referências bibliográficas, 98 - - trocas líquidas entre plasma e interstício, 97 - - unidades de medida de água e eletrólitos, 90 - - - concentração molal, 91 - - - concentração molar, 91 - - - equivalente eletroquímico, 91
- - - miliosmol, 91 - - - osmol, 91 - - - peso atômico, 91 - - - peso molecular, 91 - - - pressão osmótica, 91 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 Lisina - urinária na hiperargininemia, 561 - vasopressina, 66 Lisinopril - ajuste de dose na doença renal, 827 - baixa disponibilidade oral do, 792 - cuidados especiais, 827 - dose normal do, 827 - farmacocinética do, 827 - nefrotoxicidade do, 466 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Listeria monocytogenes pós-transplante renal, 976 Litíase - na cistinúria, 561 - por ácido úrico, 246 - renal, 321 - - na doença renal policística autossômica dominante, 587 - - na hipercalcemia, 222 - - visualização de, 321 - renoureteral em menino de dez anos, 343 - urinária, 622 - - infecção urinária e, 501 - - na uropatia obstrutiva, 623 - - radiologia na, 300 - - - radiografia simples, 301 - - - ressonância magnética, 304 - - - tomografia computadorizada, 304 - - - tomografia linear, 301 - - - ultra-sonografia, 303 - - - urografia excretora, 305 - - tratamento, 250 - urografia excretora na, 343 Lítio - acidose tubular renal associada a, 576 - ajuste de dose na doença renal, 827 - cuidados especiais, 827 - diabetes insipidus nefrogênico induzido por, 115 - dose normal do, 827 - farmacocinética do, 827 - hipercalcemia causada por, 221 - hipermagnesemia causada por, 235 - interação farmacológica com diurético de ação - - prolongada, 783 - - rápida, 783 - nefropatia tubulointersticial crônica pelo, 478 - nível sérico terapêutico do, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Litotripsia - a laser, 616 - durante a gravidez, 542 - extracorpórea, 250, 300, 301 - - para cálculo urinário, 615 - - para nefrolitíase, 609 - - para uropatia obstrutiva, 629 - - por ondas de choque, 324 - percutânea ultra-sônica, 616 Livedo reticularis, 522, 523 - na síndrome do anticorpo antifosfolipídio, 531 Lóbulo renal, 3 Lonomia, acidente com, 474 Loperamida - ajuste de dose na doença renal, 827 - cuidados especiais, 827 - dose normal da, 827 - farmacocinética da, 827 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Lorazepam - ajuste de dose na doença renal, 827 - cuidados especiais, 827 - dose normal do, 827 - farmacocinética do, 827 - reposição após
Índice Alfabético
- - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Lorcainide - ajuste de dose na doença renal, 827 - cuidados especiais, 827 - dose normal da, 827 - farmacocinética da, 827 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Losartan, 247, 795 - para nefropatia diabética, 604, 774 - uricosúria induzida por, 252 Lovastatina - ajuste de dose na doença renal, 827 - cuidados especiais, 827 - dose normal da, 827 - farmacocinética da, 827 - insuficiência renal aguda causada por, 389 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Loxosceles, acidente com, 475 Lúpus eritematoso sistêmico - acidose tubular renal associada a, 576 - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - avaliação laboratorial, 429 - biópsia renal no, 288 - com hidralazina, 824 - comprometimento renal no, 270 - critérios da American Rheumatism Association para classificação do, 425 - durante a gravidez, 539 - insuficiência renal - - aguda causada por, 389 - - crônica, 683, 684 - manifestações clínicas, 428 - nefrite intersticial aguda no, 476 - nefropatia no, 424 - - prognóstico, 430 - - tratamento, 430 - - tubulointersticial, 481 - patogênese, 425 - patologia, 426 - - classes histológicas da, 426, 429 - - índices de atividade e cronicidade do, 428 - pontos-chave, 429
M Macroglobulinemia de Waldenström, 440 Macroscopia renal, 1 Magnésio, 231 - absorção do, 232 - controle da correção do balanço de, 686 - disfunção no transporte de, 570 - distribuição do, 231 - distúrbios do metabolismo do - - hipermagnesemia, 235 - - hipomagnesemia, 233 - e secreção de renina, 73 - excreção do, 232 - - fatores que influenciam a, 232 - funções do, 233 - na insuficiência renal aguda, 846 - no líquido - - extracelular, 94 - - intracelular, 94, 95 - reposição de, 234 - unidade de medida do, 232 Malária - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - glomerulopatia da, 448 Malformação renal, 6, 7 Manitol - depleção de sódio associado ao, 146 - hipocalemia e uso de, 201 - mecanismo de ação do, 776 MAPA, 731, 733 Maprotilina - ajuste de dose na doença renal, 827 - cuidados especiais, 827 - dose normal da, 827 - farmacocinética da, 827 - reposição após
- - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Marevan, 961 Massa - abdominal na criança, 342 - - imageamento, 342 - renal - - diagnóstico diferencial de, 322 - - exame de escolha para, 294 - - expansiva, radiologia na, 308 - - - angiografia, 310 - - - radiografia simples do abdome, 308 - - - ressonância magnética, 310 - - - tomografia computadorizada, 309 - - - ultra-sonografia, 310 - - - urografia excretora, 308 MDRD, 847 - pontos-chave, 848 Mebendazol - ajuste de dose na doença renal, 827 - cuidados especiais, 827 - dose normal do, 827 - farmacocinética do, 827 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 827 - - hemodiálise, 827 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 827 Medicamento, hipertensão e, 743, 745 Medicina nuclear, 294, 372 - equipamentos, 374 - radiofármacos, 372 - tipos de exames, 374 - - análise e interpretação do renograma, 377 - - medidas de clearance, 374 - - renograma radioisotópico, 376 Medula renal, 2 - hipertônica, 58 Megacalicose congênita, 320 Megaureter, 352, 621 Melfalan - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal do, 828 - farmacocinética do, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Membrana - apical, 37 - basal - - do capilar glomerular, 9 - - glomerular, estrutura da, 438 - basolateral, 37 - epitelial, transporte através da, 39 - luminal, 37 - peritoneal, 920 Memória, distúrbios da - na encefalopatia urêmica, 706 - na uremia, 676 Meningite - criptocócica pós-transplante renal, 976, 983 - diabetes insipidus pituitário e, 113 - síndrome da secreção inapropiada de HAD e, 123 Menstruação - aumento dos valores de albuminúria na, 602 - distúrbio da, na uremia, 679 Meperidina - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal da, 828 - farmacocinética da, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Meprobamato - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal do, 828 - farmacocinética do, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Mercúrio - intoxicação por - - acidose tubular renal associada a, 574, 576
1015 - - síndrome de Fanconi na, 573 - nefropatia tubulointersticial pelo, 479 Meropenem, 455 Mesalazina, nefrotoxicidade da, 470 Mesângio, 10 Mesonefro, 6 Metabolismo - ácido-básico, 162-188 - - conceitos, 163 - - - ácido, 163 - - - base, 163 - - - pH, 163 - - - sistema tampão, 163 - - controle renal do, 167 - - - excreção de acidez titulável, 170 - - - excreção de amônio, 170 - - - fatores que influenciam na reabsorção do bicarbonato filtrado, 169 - - - gradiente intersticial corticopapilar para NH4 / NH 3 , 171 - - - produção proximal e secreção de NH4 , 170 - - - reabsorção tubular do bicarbonato filtrado, 168 - - - secreção de amônia nos ductos coletores, 171 - - - secreção tubular de H, 168 - - controle respiratório da PCO2, 167 - - distúrbios clínicos do, 172 - - - acidose metabólica, 172 - - - acidose respiratória, 182 - - - alcalose metabólica, 178 - - - alcalose respiratória, 183 - - - diagnóstico, 183 - - - mistos, 183 - - endereços na internet, 188 - - exercícios, 187, 188 - - princípios químicos, 163, 164 - - - eletroneutralidade, 164 - - - equação de Henderson-Hasselbach, 164 - - - lei da ação das massas, 163 - - referências bibliográficas, 187 - - roteiro para interpretação do, 184 - - sistema tampão, 165 - - - ácido carbônico-bicarbonato, 165 - - - hemoglobina, 167 - - - proteína plasmática, 166 - - - tamponamento nos ossos, 167 - da água, 100-131 - - aquaporina, 103 - - catecolaminas, 103 - - déficit de água, 111 - - - cálculo do, 119 - - - estado hiperosmolar, 111 - - - hipernatremia, 111 - - distúrbios clínicos do, 111 - - excesso de água, 120 - - - cálculo do, 127 - - - estado hiposmolar, 120 - - - hiponatremia, 120 - - exercícios, 129, 131 - - hormônio - - - adrenocortical, 104 - - - tireoidiano, 103 - - mecanismo da sede, 101 - - mecanismo renal de regulação da água, 104 - - - concentração da urina, 105 - - - considerações anatômicas, 104 - - - diluição da urina, 109 - - - vascularização da medula renal, 105 - - referências bibliográficas, 129 - - sistema renina-angiotensina, 104 - - vasopressina, 101 - - - mecanismo de ação da, 103 - de cálcio, 214-225 - - endereços na internet, 237 - - hipercalcemia, 219 - - hipocalcemia, 215 - - referências bibliográficas, 236 - de magnésio, 231-236 - - endereços na internet, 237 - - hipermagnesemia, 235 - - hipomagnesemia, 233 - - homeostase, 231 - - referências bibliográficas, 236 - distúrbios do, com repercussão renal secundária, 561 - do ácido úrico, 238-253 - - endereços na internet, 253 - - estado - - - de hiperuricemia, 242 - - - de hipouricemia, 251 - - referências bibliográficas, 252
1016 - do fósforo, 225-231 - - endereços na internet, 237 - - hiperfosfatemia, 229 - - hipofosfatemia, 226 - - homeostase, 225 - - pseudo-hiperfosfatemia, 230 - - referências bibliográficas, 236 - do potássio, 189-212 - - ação dos diuréticos, 199 - - adaptação a níveis elevados de K, 197 - - - extra-renal, 197 - - - renal, 197 - - balanço, 193 - - - excreção, 193 - - - ingesta, 193 - - - transporte tubular, 193 - - distribuição no organismo, 190 - - distúrbios clínicos do, 199 - - - hipercalemia, 205 - - - hipocalemia, 199 - - endereços na internet, 212 - - exercícios, 210, 212 - - fatores que afetam a distribuição transcelular de K, 192 - - homeostasia na insuficiência renal, 198 - - - excreção gastrintestinal de K, 199 - - - papel do sistema renina-angiotensina-aldosterona, 198 - - - tolerância celular ao K, 199 - - interpretação do K plasmático, 191 - - métodos de avaliação da quantidade de potássio no organismo, 190 - - - análise tissular, 191 - - - concentração plasmática, 190 - - - determinação do K intracelular em eritrócitos e leucócitos, 191 - - - determinação do K total, 190 - - - determinação do K trocável, 191 - - papel do balanço ácido-básico, 197 - - referências bibliográficas, 211 - - sistemas hormonais atuantes na homeostasia do K, 195 - - - aldosterona, 197 - - - catecolaminas, 196 - - - glucagon, 196 - - - hormônio adrenocortical, 196 - - - insulina, 195 - do sódio, 132-161 - - auto-regulação renal, 136 - - balanço de sódio, 133 - - distúrbios clínicos do, 146 - - - depleção de sódio, 146 - - - depleção do volume extracelular, 146 - - endereços na internet, 161 - - excesso de volume extracelular, 150 - - - edema generalizado, 150 - - - edema localizado, 150 - - - fisiopatologia do edema, 150, 151 - - exercícios, 159, 161 - - outros fatores que regulam a excreção de sódio, 143 - - - aldosterona, 143 - - - angiotensina II, 143 - - - derivados do endotélio, 145 - - - diurese pressórica, 145 - - - fator natriurético atrial, 144 - - - físicos, 144 - - - hormônio natriurético, 144 - - - prostaglandina, 145 - - - redistribuição do filtrado glomerular, 143 - - - sistema nervoso simpático, 145 - - percepção e regulação das alterações do volume extracelular, 135 - - reabsorção nos diferentes segmentos do nefro, 139 - - - ducto coletor, 143 - - - segmento ascendente espesso da alça de Henle, 142 - - - segmento delgado da alça de Henle, 142 - - - túbulo contornado distal, 142 - - - túbulo contornado proximal, 139 - - referências bibliográficas, 160 - - regulação intra-renal da excreção de sódio, 136 - - - reabsorção e propriedades físicas no capilar peritubular, 137 - - resposta do rim às alterações na ingesta de sódio, 134 - - tipos de transporte, 138 Metabólito ativo - da amiodarona, 806 - da amitriptilina, 807 - da amoxicilina, 807 - da azatioprina, 808 - da cetrizina, 813 - da desipramina, 816 - da hidroxizina, 824
Índice Alfabético
- da imipramina, 825 - da isossorbida, 826 - da meperidina, 828 - da procainamida, 835 - da quinidina, 836 - da rifampicina, 836 - da vidarabina, 840 - do acebutolol, 804 - do alopurinol, 806 - do alprenolol, 806 - do bupropion, 809 - do clorazepam, 814 - do clordiazepóxido, 815 - do diltiazem, 818 - do enalapril, 819 - do flurazepam, 822 - do hidrato de cloral, 824 - do lorcainide, 827 - do metronidazol, 829 - do prazepam, 835 - do sulindac, 838 - do tamoxifen, 838 - do verapamil, 840 Metadona - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal da, 828 - farmacocinética da, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Metal pesado - insuficiência renal aguda causada por, 389 - intoxicação por - - síndrome - - - de Fanconi na, 573 - - - diálise-demência e, 712 - nefropatia tubulointersticial pelo, 479 Metanefrina urinária para avaliação de hipertensão, 752 Metanefro, 6 Metanefroblastoma, 369 Metanol, intoxicação pelo, 173, 176 Metaqualona - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal da, 828 - farmacocinética da, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Metenamina - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal da, 828 - farmacocinética da, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Metformin, 172 Meticilina - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal da, 828 - farmacocinética da, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Metildopa - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal da, 828 - durante a gravidez, 551 - edema causado por, 158 - farmacocinética da, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Metilprednisolona - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal da, 828 - farmacocinética da, 828 - para glomerulonefrite crescêntica, 409 - para gota, 249
- para nefropatia lúpica na gravidez, 540 - para rejeição de transplante, 951, 964 - para síndrome de Goodpasture, 438 - para vasculite renal, 434 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Metimazol - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal do, 828 - farmacocinética do, 828 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Methysergide, insuficiência renal pela, 683 Metioninúria, 563 Metoclopramida - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal da, 829 - farmacocinética da, 829 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Metocurina - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal da, 829 - farmacocinética da, 829 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Metolazona - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal da, 829 - farmacocinética da, 829 - para edema renal, 779 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Metomicina, insuficiência renal pela, 389 Metoprolol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 829 - após infarto do miocárdio, 788 - características do, 788 - cardiosseletividade do, 788 - cuidados especiais, 829 - dose normal do, 829 - farmacocinética do, 829 - para nefropatia diabética, 604 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Metotrexato - ajuste de dose na doença renal, 828 - cuidados especiais, 828 - dose normal do, 828 - farmacocinética do, 828 - nefrotoxicidade do, 472 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 828 - - hemodiálise, 828 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 828 Metoxifluorano, diabetes insipidus induzido por, 115 Metronidazol - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal do, 829 - farmacocinética do, 829 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Mexiletine - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal do, 829 - farmacocinética do, 829 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829
Índice Alfabético
- - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Mezlocilina - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal da, 829 - farmacocinética da, 829 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Miastenia gravis, 182 Micção, alterações na, 267 Micobactéria, 435 Micofenolato mofetil - para transplante renal, 952 - - dose, 952 - - efeitos colaterais, 955 - - mecanismo de ação, 955 - para vasculite renal, 434 Miconazole - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal do, 829 - farmacocinética do, 829 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Microangiopatia trombótica, 527 - na gravidez, 541 - na síndrome antifosfolipídio, 531 Micrurus, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Mictúria, 267 Midazolam - ajuste de dose na doença renal, 829 - cuidados especiais, 829 - dose normal do, 829 - farmacocinética do, 829 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 829 - - hemodiálise, 829 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 829 Mieloma - e risco de nefrotoxicidade por contraste, 461 - múltiplo, 439 - - acidose tubular renal e, 574 - - albuminúria elevada em, 275 - - excreção de globulina no, 275 - - glomerulopatia secundária ao, 439 - - síndrome de Fanconi causada por, 573 - - vs. gota, 245 Mielomeningocele, imageamento na, 342 Mielotoxicidade - do etopósido, 820 - do ganciclovir, 822 Milimol, 91 Miliosmol, 91 Milrinona - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal da, 830 - farmacocinética da, 830 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Mineral, metabolismo de, pós-transplante renal, 857 Mineralocorticóide - excesso de - - e alcalose metabólica, 178 - - edema associado a, 151 - para hipercalemia, 210 Minociclina - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal da, 830 - farmacocinética da, 830 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Minoxidil, 796 - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal do, 830 - edema causado por, 158 - farmacocinética do, 830 - para esclerodermia renal, 530
- reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Miocardite na uremia, 675, 677 Mioclonia - na encefalopatia urêmica, 706, 707 - na hipomagnesemia, 234 - na insuficiência renal aguda, 393 - na síndrome do desequilíbrio, 711 Mioglobinúria, 269, 273 - na insuficiência renal aguda, 395 Mioinositol, 673 Miopatia - na hipofosfatemia, 228 - pelo corticosteróide, 715 - urêmica, 710 - - pontos-chave, 711 - - tratamento, 711 Miosite - com clofibrate, 814 - na vasculite necrotizante sistêmica, 433 Mitomicina C - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal da, 830 - farmacocinética da, 830 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Mitramicina - hipocalcemia e, 216 - para hipercalcemia, 224 Mixedema - antidiurese no, 67 - na uremia, 680 - síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 Mol, 91 Molalidade, 91 Molaridade, 91 Mononucleose, exame de, no doador de transplante renal, 945 Morfina - ajuste de dose na doença renal, 830 - antidiurese induzida por, 67 - cuidados especiais, 830 - dose normal da, 830 - farmacocinética da, 830 - para cólica renal, 615 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Moxonidina - características da, 790 - dose da, 790 - número de tomadas, 790 Mucormicose pós-transplante renal, 983 Muromonab para transplante renal, 951 Músculo - eretor da espinha, 2 - glúteo, 2 - grande dorsal, 2 - oblíquo - - externo do abdome, 2 - - interno do abdome, 2 - psoas maior, 2 - quadrado lombar, 2 - serrátil, 2 - transverso do abdome, 2 Mycobacterium - avium-intracellulare e AIDS, 308 - leprae, glomerulonefrite e, 448 - tuberculosis pós-transplante renal, 976, 982
N Na, K-ATPase, 37 - estrutura da, 39 Nadolol, 788 Nafamostato, 912 Naloxone - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal do, 830 - farmacocinética do, 830 - reposição após
1017 - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Nandrolona, 699 Nanismo, 567 Naproxeno - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal do, 830 - farmacocinética do, 830 - nefrotoxicidade do, 464 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Náusea - na hipercalcemia, 222 - na nefrolitíase, 613 - na síndrome do desequilíbrio, 711 - na uremia, 674, 675 - por depleção de volume extracelular, 146 - por trombose de artéria renal, 520 Necrose - asséptica, 961 - - do fêmur - - - do urêmico sob diálise, 679 - - - pós-transplante renal, 679 - - pós-transplante, 961 - - tratamento, 961 - cortical renal na gravidez, 541 - papilar renal, 500 - - bacteriúria e, 505 - - na nefropatia da anemia falciforme, 531 - tubular aguda, 390 - - com acidente ofídico, 473 - - com carbapenem, 455 - - com interferon, 470 - - com metotrexato, 472 - - depleção de sódio associado a, 146 - - diagnóstico de, 290 - - fases da, 391 - - na glomerulonefrite pós-estreptocócica, 405, 407 - - pós-transplante, 956 Nefrectomia - para carcinoma de células renais, 639, 642 - para esclerodermia renal, 530 - para nefrite por radiação, 529 - para oncocitoma renal, 634 - para sarcoma, 644 - para tumor de Wilms, 645 Nefrite - de Heymann, 476 - de radiação, 482 - hereditária e insuficiência renal crônica, 683, 684 - imageamento na, 368 - intersticial, 17, 477 - - aguda, 476 - - - com antiinflamatório não-esteróide, 463 - - - com aztreonam, 455 - - - com diurético de ação prolongada, 782 - - - com diurético de alça, 782 - - - com interferon, 470 - - - com penicilina, 454 - - - com sulfadiazina, 456 - - - com teicoplamin, 456 - - - com tetraciclina, 456 - - - com vancomicina, 455 - - - histórico, 475 - - - idiopática, 476 - - - manifestações clínicas, 476 - - - patologia, 477 - - - tratamento, 477 - - alopurinol e, 806 - - com acidente ofídico, 473 - - com meticilina, 828 - - crônica, 477 - - - patologia, 477 - - - por doença granulomatosa, 482 - - - por doença imunológica, 481 - - - por doença metabólica, 480 - - - por drogas, 478 - - - por infecção, 481 - - - por lítio, 478 - - - por metal pesado, 470 - - - por nefrite por radiação, 482 - - - por nefropatia endêmica dos bálcãs, 482 - - - por obstrução do trato urinário, 482 - - - por sarcoidose, 482 - - - quadro clínico, 478
1018 - - - quadro laboratorial, 478 - - depleção de sódio associado a, 146 - - diflunisal e, 817 - - hipertensão e, 743 - - hipomagnesemia e, 234 - - insuficiência crônica renal causada por, 663 - - no lúpus eritematoso sistêmico, 427 - - por uso de antiinflamatório não-esteróide, 462 - - proteinúria na, 291 - lúpica, 425, 427 - - classes histológicas na, 429 - - quadro clínico-laboratorial da, 429 - na púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - nefrotóxica auto-imune de Masugi, 438 - por irradiação, 528 - - etiopatogenia, 529 - - manifestações - - - clínicas, 529 - - - laboratoriais, 529 - - tratamento, 529 - tubulointersticial, 477 Nefro - cortical, 143 - divisões funcionais do, em relação à tubulopatia, 559 - justamedular, 143 - reabsorção tubular de potássio nos segmentos do, 194 Nefrocalcina, 610 - alterações na excreção de, 613 Nefrocalcinose, 301, 480 - causas de, 301 - na doença de Dent, 569 - na insuficiência renal crônica, 656 - na síndrome de Bartter, 570 Nefrolitíase, 301, 609-619 - apresentação clínica, 613 - com acetazolamida, 804 - diagnóstico de, 292 - e alopurinol, 806 - epidemiologia, 609 - fatores de risco, 611 - - cistinúria, 613 - - deficiência de proteínas inibidoras da cristalização, 613 - - hipercalciúria, 611 - - hiperoxalúria, 612 - - hiperuricosúria, 612 - - hipocitratúria, 612 - - infecção, 613 - - medicamentos, 613 - investigação diagnóstica, 614 - na doença - - de Dent, 569 - - renal policística autossômica dominante, 585 - patogênese da, 610 - pelo ácido úrico, 246 - - tratamento, 250 - recessiva ligada ao sexo, 569 - tipos de cálculos, 611 - tratamento, 615 - - agente quelador, 617 - - alopurinol, 617 - - citrato, 617 - - da cólica renal, 615 - - dietético, 616 - - do cálculo, 615, 616 - - preventivo, 616 - - tiazídicos, 617 - vs. aneurisma da aorta abdominal, 613 - vs. anexite, 613 - vs. apendicite aguda, 613 - vs. cetoacidose diabética, 613 - vs. cisto ovariano, 613 - vs. colecistite, 613 - vs. diverticulite, 613 - vs. gravidez ectópica, 613 - vs. infarto agudo do miocárdio, 613 - vs. infarto intestinal, 613 Nefrolitotomia, 616 Nefroma - benigno, 346 - cístico - - multilocular, 345, 346, 581 - - policístico, 345 - - ressonância magnética no, 331 Néfron, 8, 37 - alça de Henle, 14 - célula - - endotelial, 8, 10 - - epitelial - - - parietal, 12
Índice Alfabético
- - - visceral, 11 - - mesangial, 10 - - peripolar, 13 - ducto coletor, 15 - esquema da ultra-estrutura celular de segmentos do, 13 - glomérulo, 8 - intacto, teoria do, 650, 664 - mecanismos de adaptação do, à perda progressiva de massa renal, 652, 664 - - hipótese do néfron intacto, 650 664, 665 - - intra-renais, 667 - - - ácido-básico, 669 - - - balanço de potássio, 670 - - - cálcio plasmático, 670 - - - excreção de água, 669 - - - excreção de sódio, 668 - - - fósforo plasmático, 670 - - - função glomerular, 667 - - - função tubular, 667 - - - magnésio sérico, 670 - relações com córtex e medula renal, 3 - transporte ao longo do, 42 - túbulo - - distal, 15 - - proximal, 13 Nefronoftise, 581 - juvenil, 345 - - familiar, 590 Nefropatia(s) - aguda pelo ácido úrico, 245 - - diagnóstico laboratorial, 246 - - quadro clínico, 245 - causadoras de IRC, 663 - crônica - - classificação de, 663 - - definição de, 662 - - depleção de sódio associado a, 146 - - pelo ácido úrico, 246, 250 - - sistema renina-angiotensina na, 75 - da anemia falciforme, 532 - - etiopatogenia, 532 - - manifestações clínicas, 532 - - tratamento, 533 - de Berger, 410 - de refluxo, hipertensão e, 743, 744 - diabética, 270, 597-608, 773 - - curso clínico da, 598 - - diagnóstico de, 601 - - - diferencial, 602 - - endereços na internet, 608 - - epidemiologia, 597 - - estágios da, 597 - - estudo de pares de irmãos e agregação de, 600 - - fatores de risco, 599 - - intervenções recomendadas para retardar a progressão da, 603 - - patogênese, 599 - - recidiva de, pós-transplante, 963 - - referências bibliográficas, 605 - - ressonância magnética na, 332 - - sistema renina-angiotensina na, 75 - - tratamento, 602 - - - anti-hipertensivo, 604 - - - controle metabólico, 603 - - - dieta, 603 - - - prevenção primária, 603 - - - prevenção secundária, 603 - diagnóstico de uma, 290 - - anormalidades urinárias assintomáticas, 291 - - hipertensão arterial, 292 - - infecção urinária, 291 - - insuficiência renal - - - aguda, 290 - - - crônica, 291 - - nefrolitíase, 292 - - obstrução do trato urinário, 292 - - síndrome - - - nefrítica aguda, 291 - - - nefrótica, 291 - - - renal tubular, 292 - do HIV, 445 - - patogênese, 446 - - pontos-chave, 447 - - quadro clínico, 446 - - tratamento, 447 - do refluxo, 507-518 - - diagnóstico, 510 - - - cintilografia renal com DMSA, 510 - - - ressonância magnética, 512
- - - ultra-sonografia, 512 - - - urografia excretora, 511 - - etiopatogenia, 508 - - - displasia renal, 510 - - - fator de risco para cicatriz renal, 510 - - - genética, 510 - - - infecção urinária, 508 - - - pressão intravesical, 509 - - - refluxo intra-renal, 508 - - história natural, 515 - - introdução à, 507 - - prevalência de, 514 - - prevenção, 515 - - referências bibliográficas, 516 - - seqüelas, 512 - - - hipertensão arterial, 512 - - - insuficiência renal crônica, 512 - - - na gravidez, 514 - - - proteinúria, 515 - - sinonímia, 508 - dos Bálcãs - - acidose tubular renal associada a, 574, 576 - - síndrome de Fanconi causada por, 573 - dos dependentes de heroína, 482 - e gravidez, 537 - e vasculite, recidiva no enxerto, 945 - edema na, 150 - endêmica dos Bálcãs, 482 - esquistossomática, 447 - - patologia, 447 - - pontos-chave, 448 - - quadro clínico, 447 - - tratamento, 448 - hereditária associada a hiperuricemia, 243 - hiperuricêmica familiar, 246 - isquêmica, 760, 763 - lúpica - - e gravidez, 539 - - recidiva de - - - no enxerto, 945 - - - pós-transplante, 963 - membranosa, 417 - obstrutiva, 620 - perdedora de potássio com anfotericina B, 807 - por chumbo, hiperuricemia secundária à, 243 - por contraste radiológico, 460 - - prevenção da, 461 - por IgA, 12, 410 - - anatomia patológica, 410 - - deposição mesangial de IgA em portador de, 410 - - e transplante renal, 411 - - etiopatogenia, 410 - - nefropatia tubulointersticial na, 481 - - pontos-chave, 411 - - recidiva de, pós-transplante, 963 - - semelhança com púrpura de Henoch-Schönlein, 435 - - tratamento, 411 - por vírus C, 443 - sedimento urinário em, 280 - síndrome de Fanconi causada por, 573 - tóxica, 451-475 - - bibliografia selecionada, 482 - - diagnóstico da lesão renal, 451 - - endereços na internet, 489 - - pontos-chave, 451 - - por agente imunossupressor, 466 - - por antibacterianos, 452 - - - aminoglicosídeos, 452 - - - aztreonam, 455 - - - carbapenem, 455 - - - cefalosporina, 454 - - - dapsona, 457 - - - glicopeptídeos, 455 - - - penicilina, 454 - - - polimixina, 457 - - - quinolona, 457 - - - sulfadiazina, 456 - - - teicoplamin, 456 - - - tetraciclina, 456 - - - trimetoprim-sulfametoxazol, 456 - - - vancomicina, 455 - - por anticancerígeno, 471 - - - carboplatina, 472 - - - cisplatina, 471 - - - metotrexato, 472 - - por antifúngico, 457 - - - anfotericina B, 457 - - por antiinflamatório não-hormonal, 462 - - - alterações eletrolíticas, 464
1019
Índice Alfabético
- - - hipertensão, 465 - - - insuficiência renal crônica, 464 - - - IRA com dor lombar e hematúria, 464 - - - IRA hemodinamicamente mediada, 462 - - - IRA por necrose cortical, 464 - - - IRA por nefrite intersticial aguda com síndrome nefrótica, 463 - - - síndrome nefrótica sem IRA, 464 - - por antiviral - - - aciclovir, 458 - - - cidofovir, 459 - - - foscarnet, 459 - - - ganciclovir, 459 - - - inibidor da protease, 459 - - por bloqueador do receptor de angiotensina II, 465 - - por imunomodulador, 466 - - por inibidor da enzima de conversão da angiotensina, 465 - - por meio de contraste radiológico, 461 - - - fatores de risco, 461 - - - prevenção, 461 - - por peçonhas animais, 472 - - - artrópode, 474 - - - serpente, 472 - tubulointersticial, 475-482 - - bibliografia selecionada da, 482 - - crônica, 477 - - - causas, 478 - - - patologia, 477 - - - quadro clínico, 478 - - - quadro laboratorial, 478 - - endereços na internet, 489 - - mecanismos da lesão, 476 - - nefrite intersticial aguda, 476 Nefrosclerose, 523 - bacteriúria em presença de, 505 - hipertensiva arteriolar benigna, 523, 525 - - diagnóstico, 524 - - epidemiologia, 524 - - patologia, 524, 525 - - pontos-chave, 527 - - quadro clínico, 526 - - tratamento, 524, 526 - proteinúria na, 291 Nefrose lipoídica, 12, 415 Nefrostomia percutânea, 322 - contra-indicações, 322 - para obstrução urinária, 322 Nefrotomografia, 297 - indicações, 298 - para carcinoma de rim, 308 Nefrotoxicidade - da amicacina, 806 - da anfotericina B, 807 - da aurofina, 808 - da canamicina, 809 - da capreomicina, 809 - da carmustina, 810 - da ciclosporina, 813 - da cisplatina, 814 - da estreptozocina, 819 - da fenazopiridina, 820 - da fenilbutazona, 821 - da gentamicina, 823 - da griseofulvina, 823 - da indometacina, 825 - da mitomicina C, 830 - da neomicina, 830 - da netilmicina, 830 - da oxacilina, 833 - da pentamidina, 833 - da plicamicina, 834 - da tobramicina, 839 - da vancomicina, 840 - de agentes antiinfecciosos, 452 - - antibacterianos, 452 - - - aminoglicosídeos, 452 - - - aztreonam, 455 - - - carbapenem, 455 - - - cefalosporinas, 454 - - - dapsona, 457 - - - penicilinas, 454 - - - pentamidina, 457 - - - polimixinas, 457 - - - quinolonas, 457 - - - rifampicina, 456 - - - sulfadiazina, 456 - - - sulfonamidas, 456 - - - teicoplamin, 456
- - - tetraciclinas, 456 - - - trimetoprim-sulfametoxazol, 456 - - - vancomicina, 455 - - antifúngicos, 457 - - - anfotericina B, 457 - - antivirais, 458 - - - aciclovir, 458 - - - cidofovir, 459 - - - foscarnet, 459 - - - ganciclovir, 458 - - - inibidor da protease, 459 - de anticancerígeno, 471 - diagnóstico de, 451 - do AAS, 804 - do acetaminofeno, 804 - do aciclovir, 804 - do ácido - - meclofenâmico, 805 - - mefenâmico, 805 - do cetoprofeno, 813 - do diclofenaco, 817 - do fenoprofeno, 821 - do flurbiprofeno, 822 - do ibuprofeno, 824 - do interferon - - alfa, 825 - - beta, 825 - do isoxicam, 826 - do lítio, 827 - do metotrexate, 828 - do naproxeno, 830 - do ouro, 833 - do piroxicam, 834 - do teicoplanin, 838 - do tenoxicam, 838 - pontos-chave, 452 Nefrotoxina, 389, 450 Nelfinavir, nefrotoxicidade do, 459 Neomicina - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal da, 830 - farmacocinética da, 830 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Neoplasia - amiloidose secundária à, 442 - da próstata, 268 - da vagina, 622 - de ovário, 622 - do útero, 622 - e interferência na terapia com eritropoetina, 699 - glomerulonefrite associada a, 443 - insuficiência crônica renal causada por, 663 - maligna - - de novo pós-transplante, 969 - - pós-transplante renal, 968 - - transplantada com o enxerto, 969 - renal - - detecção de, 321 - - e transplante, 945 - - e trombose - - - de artéria renal, 520 - - - veia renal, 521 Neostigmina - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal do, 830 - farmacocinética do, 830 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Nervo - ílio-hipogástrico, 2 - ílio-inguinal, 2 NESP, 700 Netilmicina - ajuste de dose na doença renal, 830 - cuidados especiais, 830 - dose normal da, 830 - farmacocinética da, 830 - nefrotoxicidade da, 452 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 830 - - hemodiálise, 830
- - hemofiltração arteriovenosa contínua, 830 Neurite periférica, 820 Neuro-hipófise, 66 Neuroblastoma - da adrenal esquerda, 343 - de supra-renal, 340 Neuropatia - periférica - - com amiodarona, 806 - - na uremia, 675 - pós-transplante renal, 716 - sensitiva por uso de ciclosporina, 715 - urêmica, 676, 708 - - freqüência de sinais e sintomas, 709 - - pontos-chave, 710 - - sintomatologia, 708 - - tratamento, 710 Neurotoxicidade - da amantadina, 806 - da cicloserina, 813 - da ciclosporina, 715 - da fosfomicina, 822 - da nitrofurantoína, 831 - da penicilina G, 454 - da polimixina, 457 - do acetoexamida, 804 - do carbapenem, 455 - do corticosteróide, 715 - do etopósido, 820 - do tacrolimus, 470 Niacina para paciente sob hemodiálise, 851 Nicardipina, 794 - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - interação com ciclosporina, 467, 794 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nicotina, síndrome de secreção inapropriada de HAD e, 123 Nicotinamida para doença de Hartnup, 563 Nictúria - na hipercalcemia, 222 - na nefropatia da anemia falciforme, 532 Nidógeno, 10 Nifedipina, 794 - ajuste de dose na doença renal, 831 - características da, 795 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - para hipertensão - - maligna, 526 - - pós-transplante renal, 959 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nimodipina - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nisoldipina - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nistagmo na encefalopatia de Wernicke, 712 Nitrato de gálio, 225 Nitrazepam - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal do, 831 - farmacocinética do, 831 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831
1020 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nitrendipina, 794 - ajuste de dose na doença renal, 831 - associada a aspirina, 794 - características da, 795 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nitrobenzeno, síndrome de Fanconi por, 573 Nitrofurantoína - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - nefrite intersticial causada por, 470 - para bacteriúria na gravidez, 540 - para infecção do trato urinário, 504 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nitrogênio - não-uréico, 682 - necessidade de, na uremia, 682 - uréico - - na nutrição parenteral intradialítica, 867 - - taxa de, 844 Nitroglicerina - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nitroprussiato de sódio - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal do, 831 - farmacocinética do, 831 - para hipertensão maligna, 526 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nitrosuréia - ajuste de dose na doença renal, 831 - cuidados especiais, 831 - dose normal da, 831 - farmacocinética da, 831 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 831 - - hemodiálise, 831 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 831 Nizatidina - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal da, 832 - farmacocinética da, 832 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Nocardia asteroides, 976, 982 Noctúria - e infecção do trato urinário, 493 - na uropatia obstrutiva, 623 Nomifensine - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal do, 832 - farmacocinética do, 832 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Norfloxacin - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal do, 832 - farmacocinética do, 832 - nefrotoxicidade do, 457 - para infecção do trato urinário, 504 - reposição após
Índice Alfabético
- - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Nortriptilina - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal da, 832 - farmacocinética da, 832 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Nutrição - enteral, hipofosfatemia na, 227, 228 - parenteral - - hipofosfatemia na, 227, 228 - - hipomagnesemia e, 235 - - intradialítica, 861-868 - - - composição das soluções, 865 - - - conclusão, 867 - - - cuidados, 866 - - - efeitos colaterais, 866 - - - endereços na internet, 868 - - - histórico, 861 - - - referências bibliográficas, 867 - - - vantagens e benefícios, 864 - piora do estado de, e iniciação à diálise, 873
O Obesidade - aumento dos valores da albuminúria na, 602 - em paciente sob diálise, 926 - hiperuricemia, 242 - - secundária à, 243 - pós-transplante renal, 960 - risco de hipertensão e, 743 - transplante renal e, 855, 856 Obnubilação na hipercalcemia, 222 Obstipação - em diálise peritoneal, 854 - na síndrome de Bartter, 570 - no diabetes insípido nefrogênico, 572 Obstrução - do trato urinário e progressão de insuficiência renal crônica, 671 - urinária pós-transplante, 956, 958 - - vs. necrose tubular aguda, 958 - - vs. rejeição humoral, 958 Ocitocina, excreção de sódio e, 144 Ofloxacin - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal do, 832 - farmacocinética do, 832 - nefrotoxicidade do, 457 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Oftalmoplegia na encefalopatia de Wernicke, 712 OKT3, 471 - lesão renal causada por, 471 - para rejeição de transplante, 964, 967 - para transplante renal, 951, 953 - - dose, 953 - - efeito colateral, 956 - trombose da artéria renal associada a, 520 Óleo de peixe, 411 Oligoelementos, necessidades na insuficiência renal, 846, 850 Oligúria - na depleção do volume extracelular, 148 - na glomerulonefrite crescêntica, 407 - na síndrome de Goodpasture, 437 Omeprazol - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal do, 832 - farmacocinética do, 832 - interação farmacologia com - - ampicilina, 832 - - anticoagulante, 832 - - cetoconazol, 832 - - diazepam, 832 - nefrite intersticial causada por, 470, 476 - para alcalose metabólica, 181
- reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Oncocitoma renal, 634 - macroscopia de, 634 - microfotografia de, 634 Opiáceo - para gota, 249 - síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Orfenadrina - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal da, 832 - farmacocinética da, 832 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Orquiepididimite, 500 Orthoclone para transplante renal, 953, 964, 967 - dose, 953 - efeito colateral, 956 Osmol, 91 Osmolalidade, 92 - plasmática, 96 Osmose, 39, 91, 92 Osso - fósforo e mineralização do, 225 - tamponamento no, 167 - uremia, manifestações no, 678 Osteíte fibrosa - características histológicas da, 726 - na uremia, 678 Osteoclerose na uremia, 678, 679 Osteodistrofia - em paciente sob diálise, 926 - hereditária de Albright, 216 - na uremia, 675 - renal, 656 - - bibliografia selecionada, 729 - - classificação da, 718 - - definição de, 717 - - diagnóstico diferencial de, 724 - - endereços na internet, 729 - - fisiopatologia, 718 - - - da doença adinâmica, 721 - - - da intoxicação alumínica, 721 - - - da osteomalácia, 720 - - - do hiperparatireoidismo secundário, 718 - - histologia, 725 - - imageamento na, 724 - - - cintilografia, 725 - - - radiologia, 725 - - - ressonância magnética, 725 - - - tomografia computadorizada, 725 - - - ultra-sonografia, 725 - - laboratório na, 723 - - na uremia, 678 - - nefrite e, 369 - - prevenção da, 726 - - quadro clínico, 722 - - referências bibliográficas, 728 - - tratamento da, 726 - - - calcimimético, 728 - - - deferoxamina, 728 - - - paratireoidectomia, 728 Osteomalácia, 566 - características histológicas da, 726 - fisiopatologia da, 720 - - defeito de mineralização óssea, 720 - hipofosfatêmica e, 227, 228 - - oncogênica, 566, 567 - na doença de Dent, 569 - na insuficiência renal crônica, 656 - na uremia, 678 - radiologia na, 725 - relacionada ao alumínio, 678 - tratamento da, 727 Osteomielite do urêmico sob diálise, 679 Osteoporose - acidose tubular renal e, 576 - diurético para, 781 - na intolerância lisinúrica protéica, 562 - na uremia, 678, 679 - pós-transplante, 961 Otite média na vasculite necrotizante, 432 Ototoxicidade - da amicacina, 806
Índice Alfabético
- da bumetanida, 809 - da canamicina, 809 - da eritromicina, 819 - da estreptomicina, 819 - da furosemida, 822 - da gentamicina, 823 - da netilmicina, 830 - da piretanida, 834 - da vancomicina, 840 - do ácido etacrínico, 805 - do diurético de alça, 782 Ouabaína - ajuste de dose na doença renal, 832 - cuidados especiais, 832 - dose normal da, 832 - farmacocinética da, 832 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 832 - - hemodiálise, 832 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 832 Ouro - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal do, 833 - farmacocinética do, 833 - nefropatia tubulointersticial pelo, 479 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 Ovário, exposição do, a radiofármacos, 373 Oxacalcitriol, 728 Oxacilina - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal da, 833 - farmacocinética da, 833 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 Oxalato, 480 Oxalose - e insuficiência renal crônica, 683 - recidiva de - - no enxerto, 945 - - pós-transplante, 963 Oxatomide - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal do, 833 - farmacocinética do, 833 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 Oxazepam - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal do, 833 - farmacocinética do, 833 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 Óxido - nítrico - - e regulação - - - da circulação renal, 20, 28 - - - da filtração glomerular, 32 - - - da pressão arterial, 740 - - e secreção de renina, 73 - - no metabolismo do sódio, 145 - - relação com o sistema calicreína-cinina, 80 - nitroso, interação farmacológica com diurético de ação - - prolongada, 783 - - rápida, 783 Oxprenolol no paciente bradicárdico, 788
P Palidez na uremia, 677, 684 Pamidronato, 224 Pancreatite - aguda - - depleção de sódio causada por, 146 - - hipocalcemia por, 216, 217 - - hipomagnesemia e, 233
- - na vasculite sistêmica necrotizante, 433 - - pós-transplante, 962 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 Pancurônio - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal do, 833 - farmacocinética do, 833 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 Papila renal, 3 Papiledema na síndrome do desequilíbrio, 711 Papilite necrosante, 307, 622 - causas de, 307 - na tuberculose renal, 307 - radiologia na, 308 - vs. cisto pielogênico, 308 - vs. pielonefrite crônica, 308 - vs. rim espongio medular, 308 - vs. tuberculose, 308 Paracentese, depleção de sódio causada por, 146 Paracetamol, nefrite intersticial por, 470 Paralisia - na síndrome de Bartter, 570 - na uremia, 675 - periódica hipocalêmica, 200 - pseudobulbar na hiponatremia, 124 - respiratória na hipermagnesemia, 236 Paraparesia por uso de ciclosporina, 715 Paraplegia na cistinúria, 561 Paraproteinemia, 439 Paratiroidectomia, 728 Paratormônio - dosagem de, na osteodistrofia renal, 723 - e acidificação urinária, 55 - e homeostase - - do cálcio, 215 - - do fósforo, 225, 226 - excreção de magnésio e, 233 - para hiperfosfatemia, 231 Parênquima renal, 2 - atrofia do, por infecção do trato urinário, 501 - cintilografia renal estática para estudo do, 383, 384 - hipertensão e doença do, 769 - imageamento para doenças do, 360 - lesão do, na IRC, 657 - na vasculite sistêmica, 433 Parestesia na uremia, 675 Paricalcitol, 728 Parvovírus e infecção pós-transplante, 982 PAS - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal da, 833 - farmacocinética da, 833 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 PCO2 - controle respiratório da, 167 - na acidose respiratória, 165, 182 - na alcalose - - metabólica, 178 - - respiratória, 165, 183 Pefloxacin - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal do, 833 - farmacocinética do, 833 - nefrotoxicidade do, 457 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 Pele - sinais na, nefrite intersticial aguda, 476 - sintomas na, uremia, 675 Pelve renal, 2, 3 - carcinoma de, 645 Penbutolol, 788 Penicilamina - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal da, 833
1021 - farmacocinética da, 833 - para cistinúria clássica, 562 - para nefrolitíase, 617 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 - vasculite sistêmica causada por, 431 Penicilina -G - - ajuste de dose na doença renal, 833 - - cuidados especiais, 833 - - dose normal da, 833 - - farmacocinética da, 833 - - reposição após - - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - - hemodiálise, 833 - - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 - insuficiência renal aguda induzida por, 389 - nefrite intersticial induzida pela, 17, 470, 476 - nefrotoxicidade da, 454 Pentamidina - ajuste de dose na doença renal, 833 - cuidados especiais, 833 - dose normal da, 833 - farmacocinética da, 833 - hipomagnesemia e uso de, 233 - insuficiência renal aguda causada por, 389 - nefrotoxicidade da, 457 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 833 - - hemodiálise, 833 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 833 Pentazocina - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Pentobarbital - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Pentoxifilina - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Peptídeo - natriurético, 80 - - atrial, 80, 145 - - - ações do, 82 - - - e secreção de renina, 73 - - - efeitos na endotelina, 82 - - - efeitos na hemodinâmica renal, 82 - - - efeitos na indução da natriurese, 82 - - - efeitos na vasculatura, 82 - - - efeitos na vasopressina, 82 - - - efeitos no sistema renina-angiotensina-aldosterona, 82 - - - estrutura, 81 - - - na cirrose hepática, 83 - - - na doença renal, 83 - - - na hipertensão arterial, 82 - - - na insuficiência cardíaca congestiva, 82 - - - na taquicardia surpraventricular, 82 - - - receptores para, 81 - - - regulação da secreção do, 81 - - - relação com o sistema calicreína-cinina, 80 - - - síntese, 81 - - cerebral, 83 - - - do tipo C, 83 - - e regulação da pressão arterial, 740 - - estrutura do, 84 - vasoativo e o rim, 69-89 - - adrenomedulina, 87 - - angiotensina II, 74 - - angiotensinase, 75
1022 - - controle da secreção da renina, 71 - - derivado da angiotensina, 76 - - - ang-(1-7), 76 - - - ang III, 76 - - - ang IV, 76 - - endereços na internet, 89 - - endotelina, 85 - - - na fibrose renal, 86 - - - na hipertensão arterial, 86 - - - na insuficiência renal aguda, 86 - - - na insuficiência renal crônica, 86 - - estrutura do aparelho justaglomerular, 71 - - natriurético, 80 (v.tb.Peptídeo natriurético) - - quantificação da atividade da renina, 73 - - referências bibliográficas, 87 - - sistema renal calicreína-cinina, 77 - - - ações do, 78 - - - componentes do, 77, 78 - - - efeitos na excreção de sódio e água, 79 - - - efeitos na hemodinâmica renal, 78 - - - inter-relações com outros sistemas, 75 - - - na cirrose hepática, 80 - - - na fibrose miointimal, 80 - - - na hipertensão arterial, 80 - - - no infarto do miocárdio, 80 - - sistema renina-angiotensina, 70 - - - na hipertensão arterial, 75 - - - na nefropatia crônica, 75 - - - na nefropatia diabética, 75 - - urodilatina, 84 Pericardite - na insuficiência renal aguda, 393 - na uremia, 675, 677 - no lúpus eritematoso sistêmico, 425 - urêmica, diálise de urgência por, 872 Peridoxina, 562 Perindopril, 791 - características do, 792 Peritônio - anatomia do, 920 - fisiologia do, durante a diálise peritoneal, 920 - passos para realização do teste de equilíbrio peritoneal, 921 - patofisiologia durante a diálise peritoneal, 921 Peritonite e diálise peritoneal, 924 - algoritmo de abordagem e tratamento, 925 - ambulatorial contínua, 853 Peso - atômico, 91 - molecular, 91 Petidina para cólica renal, 615 pH - arterial normal, 163 - conceito de, 163 - fisiológico, 164 - na alcalose metabólica, 178 - sangüíneo, limites de, compatível com a vida, 163 - urinário, 163, 164, 273 Pielografia - anterógrada, 298 - ascendente, 298 - - na pielonefrite xantogranulomatosa, 306 - - para insuficiência renal aguda, 395 - para uropatia obstrutiva, 625 - retrógrada, para obstrução do trato urinário, 292 Pielonefrite - aguda, 304, 481 - - abscesso renal na, 500 - - cintilografia renal estática para, 383 - - diagnóstico falso-positivo de uropatia obstrutiva e, 320 - - manifestações de, 501 - - na gravidez, 540, 541 - - radiologia na, 304 - - - ressonância magnética, 305, 333 - - - tomografia computadorizada, 305 - - - ultra-sonografia, 305 - - - urografia excretora, 305 - atrófica - - bilateral, 501 - - não-obstrutiva, 508 - crônica, 306, 481, 508 - - acidose tubular renal associada a, 576 - - atrófica, 508 - - cicatriz renal na, 507 - - hipertensão e, 743, 744 - - radiologia na, 306 - enfisematosa, 306 - - radiologia na, 306 - focal à tomografia computadorizada, 305
Índice Alfabético
- hipocalemia e, 203 - insuficiência crônica renal causada por, 663, 683 - nefropatia tubulointersticial na, 482 - obstrutiva calculosa, 614 - proteinúria na, 291 - xantogranulomatosa, 306 - - bacteriúria e, 505 - - nefropatia tubulointersticial associada a, 482 - - radiologia na, 306 - - ressonância magnética na, 333 Pigmentação na uremia, 675, 677 Pindolol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 834 - características do, 788 - cuidados especiais, 834 - dose normal do, 834 - farmacocinética do, 834 - no paciente bradicárdico, 788 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Pinealoma, 113 Pinocitose, 40 Pionefrose, 500 - ressonância magnética na, 333 - ultra-sonografia na, 303 Piperacilina - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - nefrite intersticial causada por, 470 - para infecção do trato urinário, 504 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Pirazinamida - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - hiperuricemia causada por, 243 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Piretanida - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - mecanismo de ação da, 776 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Piridostigmina - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Piridoxina para paciente sob hemodiálise, 851 Pirimetamina - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Piroxicam - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal do, 834 - farmacocinética do, 834 - nefrotoxicidade do, 464 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Piúria - definição de, 493
- diagnóstico de, 291 - sem infecção urinária, 492 Placenta - descolamento prematuro da - - e IRA na gravidez, 541 - - e necrose cortical renal bilateral, 541 - prévia e necrose cortical renal bilateral, 541 Plaquetopenia - com rapamicina, 961 - na síndrome HELLP, 548, 550 - no lúpus eritematoso sistêmico, 425 Plasma - cálculo de correções para reposição de, 260 - composição iônica do, 95 - de hemácias, expansão inicial de volume com, 264 - e interstício, trocas líquidas, 97 - fresco - - composição do, 263 - - congelado para síndrome hemolítico-urêmica, 528 - para depleção do volume extracelular, 149 Plasmaférese - para crioglobulinemia, 441 - para glomerulonefrite crescêntica, 409 - para recidiva de glomerulosclerose pós-transplante, 963 - para rejeição de transplante, 964 - para síndrome - - de Goodpasture, 438 - - do anticorpo antifosfolipídio, 531 - - hemolítico-urêmica, 528 - para vasculite renal, 434 Plasmodium malariae, 448 Pleura, 2 Pleurite - na uremia, 675 - no lúpus eritematoso sistêmico, 425 Plicamicina - ajuste de dose na doença renal, 834 - cuidados especiais, 834 - dose normal da, 834 - farmacocinética da, 834 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 834 - - hemodiálise, 834 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 834 Pneumococcus, glomerulopatia na infecção por, 448 Pneumocystis carinii - dapsona para, 457 - na síndrome de imunodeficiência adquirida, 308 - pentamidina para, 457 - pós-transplante renal, 976, 983 - trimetoprim-sulfametoxazol para, 456 Pneumonia - acidose respiratória causada por, 182 - síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Pneumotórax, 182 Podócito, 11, 21 Polaciúria, 267 - na uropatia obstrutiva, 623 - por infecção do trato urinário, 291, 493 Poliangeíte microscópica, 431 Poliarterite nodosa - comprometimento renal na, 270 - hipertensão renovascular e, 743 - trombose da artéria renal associada a, 520 Policitemia - na doença - - renal policística, 346 - - vascular encefálica pós-transplante renal, 715 - na síndrome de Bartter, 570 Polidipsia - na síndrome de Bartter, 201, 570 - na uropatia obstrutiva, 623 - no diabetes insipidus, 115 - - nefrogênico, 572 - - pituitário, 113 - psicogênica, 122 Polietileno-glicol-uricase, 250 Poliglobulia pós-transplante renal, 960 Polimialgia reumática, 531 Polimixina - B, 457 - E, 457 - nefrotoxicidade da, 457 Polineuropatia - no carcinoma de células renais, 639 - urêmica, 676 Poliomavírus e infecção pós-transplante, 981 Poliúria - na anorexia nervosa, 114
Índice Alfabético
- na hipercalcemia, 222 - na nefropatia da anemia falciforme, 532 - na síndrome - - de Bartter, 201, 570 - - de Fanconi, 564 - na uropatia obstrutiva, 623 - no diabetes insipidus, 115 - - nefrogênico, 572 - - pituitário, 113 - por depleção de volume extracelular, 146 - por uso - - de aciclovir, 459 - - de anfotericina B, 458 - pós-uropatia obstrutiva, 627 - testes diagnósticos em pacientes com, 573 Porfiria, 273 Potássio - ação dos diuréticos na secreção de, 199 - adaptação a níveis elevados de, 197 - - extra-renal, 197 - - renal, 197 - alterações no balanço de, na IRA, 392 - cálculo - - da necessidade básica de, 256 - - de correções para reposição de, 260 - capacidade total do, 191 - concentração - - de potássio intra- e extracelular, 190, 192 - - plasmática de, e síntese da amônia, 55 - controle da correção do balanço de, na IRC, 686 - depleção de, 199 - - causas, 199 - - - gastrintestinais, 191, 199, 200 - - definição, 191 - - nefropatia tubulointersticial por, 480 - disfunção no transporte de, 570 - distribuição do, no organismo, 190 - e liberação de renina, 73 - excesso de, 205 - - definição, 192, 205 - fatores que afetam a distribuição transcelular de, 192 - homeostasia do - - balanço ácido-básico e, 197 - - na insuficiência renal, 198 - - - excreção gastrintestinal, 199 - - - papel do sistema renina-angiotensina-aldosterona, 198 - - - tolerância celular ao K, 199 - - sistemas hormonais atuantes na, 195 - - - aldosterona, 197 - - - catecolamina, 196 - - - glucagon, 196 - - - hormônio adrenocorticotrópico, 196 - - - insulina, 195 - métodos de avaliação da quantidade no organismo, 190 - - análise tissular, 191 - - com potássio radioativo, 190 - - concentração plasmática, 190 - - determinação do K trocável, 191 - necessidade - - na insuficiência renal - - - aguda, 845 - - - crônica, 850 - - pós-transplante renal, 858 - nefrite tubulointersticial crônica por alterações metabólicas do, 480 - no líquido - - extracelular, 94 - - intracelular, 94, 95 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854 - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - perda urinária e fecal diária de, 256 - plano de administração do, 261 - plasmático, interpretação do, 191 - reposição de, na hipocalemia, 204, 205 - secreção de, no ducto coletor, 47 - transporte de, no túbulo proximal, 43 - uremia e distúrbios do, 674 Prazepam - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal do, 835 - farmacocinética do, 835 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Prazosin - ajuste de dose na doença renal, 835 - características do, 791
- cuidados especiais, 835 - dose diária do, 790, 835 - farmacocinética do, 835 - número de tomadas, 790 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Pré-eclâmpsia, 547 - curso clínico da, 548 - etiologia, 548 - fisiopatologia, 548 - hiperuricemia secundária à, 243 - insuficiência renal aguda na, 541 - pontos-chave, 548 - propedêutica, 549 - - avaliação - - - após o parto, 549 - - - durante a gestação, 549 - - - pré-concepcional, 549 - tratamento, 550 - - anti-hipertensivo, 550 - - preventivo, 551 Prednisona - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal da, 835 - farmacocinética da, 835 - para glomerulonefrite - - crescêntica, 409 - - de lesões mínimas, 416 - - membranosa, 419 - para gota, 249 - para hiperuricemia no transplante renal, 251 - para nefrite intersticial aguda, 477 - para nefropatia lúpica na gravidez, 540 - para púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - para síndrome de Goodpasture, 438 - para transplante renal, 951 - - dose, 951 - - efeitos colaterais, 954 - para vasculite renal, 434 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Pressão - arterial - - conceituação de, 730 - - correção de valores da, em função da circunferência braquial, 732 - - determinação da, 732 - - mecanismos reguladores da, 734 - - - endotélio, 735, 740 - - - peptídeo natriurético, 740 - - - resistência insulínica, 741 - - - sistema barorreceptor, 735, 737 - - - sistema calicreína-cinina, 735, 739 - - - sistema de prostaglandinas, 735, 739 - - - sistema nervoso central, 735 - - - sistema nervoso simpático, 735, 736 - - - sistema renina-angiotensina-aldosterona, 735, 737 - - - sódio e volume extracelular, 735 - - - vasopressina, 735, 740 - - - visão geral, 736 - - monitorização ambulatorial da, 731, 733 - - na depleção de volume extracelular, 147 - - normal, 730 - - prevalência e significado da elevação da, 733 - - redução da esperança de vida em função da, 734 - capilar glomerular, 30 - de filtração glomerular, 31 - - desequilíbrio da, 32 - - equilíbrio da, 31 - de ultrafiltração glomerular, 31 - hidrostática, 97 - - no capilar peritubular, 137 - intratubular, 30 - oncótica - - do capilar glomerular, 30 - - peritubular, 137 - osmótica, 91 - venosa central - - controle respiratória da, 167 - - na depleção de volume extracelular, 147 Primidona - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal da, 835
1023 - farmacocinética da, 835 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Probenecide - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal da, 835 - farmacocinética da, 835 - litíase por ácido úrico e, 246 - para hiperuricemia, 249 - - no transplante renal, 251 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Procainamida - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal da, 835 - farmacocinética da, 835 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Prometazina - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal da, 835 - farmacocinética da, 835 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Pronefro, 5 - topografia do, 7 Propafenone - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal do, 835 - farmacocinética do, 835 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Propiltiouracil - ajuste de dose na doença renal, 835 - cuidados especiais, 835 - dose normal do, 835 - farmacocinética do, 835 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 835 - - hemodiálise, 835 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 835 Propoxifeno - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836 - dose normal do, 836 - farmacocinética do, 836 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Propranolol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 836 - características do, 788 - cuidados especiais, 836 - dose normal do, 836 - farmacocinética do, 836 - lipossolubilidade do, 788 - nível sérico terapêutico do, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Prostaciclina - anticoagulação na hemodiálise contínua com, 912 - e regulação da filtração glomerular, 32 - no metabolismo do sódio, 145 - para esclerodermia renal, 530 - para síndrome hemolítico-urêmica, 528 Prostaglandina - e regulação - - da circulação renal, 20 - - parácrina da microcirculação renal, 28
1024 - e secreção de renina, 73 - na cirrose hepática, 155 - na insuficiência cardíaca congestiva, 153 - na síndrome de Bartter, 570 - no metabolismo do sódio, 145 Prostatite, uropatia obstrutiva por, 320 Proteína - ação tamponante da, 166 - C reativa na vasculite renal, 433, 435 - de Bence Jones na amiloidose primária, 442 - de Tamm-Horsfall, 446, 476, 495, 496, 610 - envolvida na amiloidogênese, 441 - hipercatabolismo de, no transplante renal, 856 - metabolismo de, na uremia, 681 - necessidade na insuficiência renal - - aguda, 844 - - crônica, 846 - no líquido intracelular, 94, 95 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854 - para paciente sob hemodiálise, 851 - plasmática na depleção de volume extracelular, 147 - recomendações no transplante renal, 857 - Scrapie, 441 - síntese deficiente de, na uremia, 844 Proteinúria, 11, 274 - cidofovir e, 459 - com captopril, 810 - com interferon, 470 - de hiperfluxo, 275 - determinação da - - qualitativa, 275 - - quantitativa, 275 - diagnóstico de, 291 - e risco - - de hipertensão, 744 - - de nefrotoxicidade por contraste, 461 - - de trombose de veia renal, 521 - exame de escolha para, 294 - glomerular, 275 - inibidor da enzima de conversão da angiotensina no controle de, 671 - mecanismo de, 274 - na crioglobulinemia, 441 - na doença - - de Dent, 569 - - renal policística autossômica dominante, 587 - na esclerodermia renal, 530 - na glicogenose I, 561 - na glomerulonefrite, 402, 403 - - da endocardite bacteriana, 445 - - fibrilar, 442 - - membranosa, 418, 420 - - por lesões mínimas, 415 - - pós-estreptocócica, 405 - na glomerulosclerose focal e segmentar, 416 - na infecção do trato urinário, 492 - na insuficiência renal aguda, 395 - na malária, 448 - na nefrite intersticial aguda, 477 - na nefropatia - - diabética, 601, 602 - - do HIV, 446 - - do refluxo, 515 - - esquistossomática, 447 - - por vírus B, 444 - na nefrosclerose arteriolar maligna, 526 - na nefrosclerose hipertensiva benigna, 524 - na pré-eclâmpsia, 547 - na púrpura trombocitopênica trombótica, 527 - na síndrome - - de Goodpasture, 437 - - nefrótica, 155 - na uropatia obstrutiva, 623 - na vasculite - - renal, 435 - - sistêmica necrotizante, 432 - no lúpus eritematoso sistêmico, 425, 428 - por uso - - de anfotericina B, 458 - - de pentamidina, 457 - pós-transplante renal, 950 - puromicina e, 33 - tubular, 275 Proteus - infecção do trato urinário por, 496, 613 - mirabilis, infecção urinária por, 304 Protriptilina - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836
Índice Alfabético
- dose normal da, 836 - farmacocinética da, 836 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Providência, infecção urinária por, 613 Prurido - urêmico, 675, 678 - - manejo do paciente com, 687 Pseudo-hipercalcemia, 222 Pseudo-hipercalemia, 205 Pseudo-hiperfosfatemia, 230 Pseudo-hipoaldosteronismo, 570, 578 Pseudo-hiponatremia, 121 Pseudo-hipoparatireoidismo, 216, 569 Pseudo-pseudo-hipoparatireoidismo, 569 Pseudofratura na uremia, 678 Pseudomonas - aeruginosa pós-transplante renal, 976 - e peritonite durante diálise, 924 - infecção urinária por, 304 - polimixinas para, 457 Pseudotumor renal, 308 Psicose - na uremia, 675 - pelo corticosteróide, 715 Psoríase, hiperuricemia e, 243 PTH (v.tb. Paratormônio) - e homeostase do cálcio, 215 Pulmão urêmico, 675 Purina - conteúdo de, nos alimentos, 248 - metabolismo da, 239 Púrpura - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - de Henoch-Schönlein, 411, 431 - - alterações laboratoriais, 436 - - definição da, 435 - - etiologia, 435 - - manifestações clínicas, 436 - - patogênese, 435 - - patologia, 436 - - pontos-chave, 437 - - prevalência, 435 - - prognóstico, 436 - - tratamento, 436 - - vs. crioglobulinemia mista, 436 - - vs. glomerulonefrite pós-estreptocócica, 436 - hiperglobulinêmica, acidose tubular renal associada a, 576 - na uremia, 675 - trombocitopênica trombótica, 527 - - manifestações clínicas de, 527 - - na gravidez, 541 - - síndrome semelhante no LES, 427
Q Queimadura - depleção de sódio causada por, 146 - edema na, 150 - hipernatremia na, 113 - mioglobinúria por, 269 Quilocaloria - necessidades na insuficiência renal - - aguda, 843 - - crônica, 846 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 853 - para paciente sob hemodiálise, 851 - recomendações no transplante renal, 857 Quimioterapia, IRA causada por, 389 Quinidina - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836 - dose normal da, 836 - farmacocinética da, 836 - interação farmacológica com diurético poupador de potássio, 783 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Quinina - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836
- dose normal da, 836 - farmacocinética da, 836 - insuficiência renal aguda induzida por, 389 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Quinolona - nefrite intersticial causada por, 470, 476 - nefrotoxicidade da, 457 - para bacteriúria na gravidez, 540 - para infecção do trato urinário, 504
R Rabdomiólise na hipofosfatemia, 228, 229 Radiofármacos em nefrourologia, 372, 373 Radiografia - do abdome - - na criança, 337 - - na diferenciação entre nefropatia aguda e crônica, 684 - - na doença renal, 296 - - - após descompressão abdominal, 297 - - - obtida após injeção rápida de 40ml de contraste, 297 - - na hidronefrose, 358 - - na nefrolitíase, 614 - - na uropatia obstrutiva, 624 - - no adulto, 296 - - no cálculo - - - renal na gravidez, 542 - - - urinário, 301 - - no carcinoma de células renais, 639 - - para massa renal, 308 - - para pielonefrite enfisematosa, 306 - do tórax - - para hipertensão arterial, 752 - - para tumor de Wilms, 645 - para gota, 245 Radioisótopos em nefrourologia, 372-387 - aplicações clínicas, 377 - - avaliação - - - do rim transplantado, 382 - - - urodinâmica, 379 - - hipertensão renovascular, 377 - - refluxo vésico-ureteral, 381 - cintilografia renal estática, 383 - endereços na internet, 387 - novas perspectivas, 384 - princípios de medicina nuclear, 372 - referências bibliográficas, 385 Radiologia - na osteodistrofia renal, 724 - na osteomalácia, 725 - no hiperparatireoidismo secundário, 725 Ramipril, 791 - ajuste de dose na doença renal, 836 - características do, 792 - cuidados especiais, 836 - dose normal do, 836 - farmacocinética do, 836 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Ranitidina - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836 - dose normal da, 836 - farmacocinética da, 836 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Rapamicina para transplante renal, 953 - dose, 953 - efeitos colaterais, 956 Raquitismo - dependente de vitamina D, 217 - hipofosfatêmico e, 227, 228, 566 - - autossômico dominante, 568 - - hereditário com hipercalciúria, 566 - - ligado ao sexo, 566 - - resistente à vitamina D, 566 - na doença de Dent, 569 - na síndrome de Fanconi, 564 - na uremia, 678
1025
Índice Alfabético
- tipo I, 568 - tipo II, 568 Reabsorção tubular, 37 - de cloreto de sódio ao longo do néfron, 48 Reação alérgica, edema associado a, 151 Refluxo - intra-renal, 361 - uretro-ureteral, 350 - vésico-ureteral, 361, 381, 621 - - bacteriúria em presença de, 505 - - cistocintilografia para, 381 - - cistouretrografia miccional para, 381 - - classificação do, 363 - - definição de, 507 - - diagnóstico falso-positivo de uropatia obstrutiva e, 320 - - hidronefrose por, 357 - - ultra-sonografia e, 321 - - uretrocistografia miccional no, 338 Rejeição de transplante - imunossupressão na, 951 - renal, 934, 963 - - celular aguda, 956, 964 - - crônica, 967 - - - conduta na, 968 - - hiperaguda, 956 - - humoral, 963 - - - imediata, 964 - - - tardia, 935, 964 Renina - biossíntese da, 71 - controle da secreção de, 71 - expressão de, em arteríola aferente, 72 - liberação de, pelo aparelho justaglomerular, 13 - para avaliação de hipertensão, 752 - plasmática periférica, medida da atividade da, 760 - quantificação da atividade da, 73 Renograma - com captopril, 378 - com diurético para uropatia obstrutiva, 625 - interpretação de um, 382 - radioisotópico, 376 - - análise e interpretação do, 377 - - indicações do, 376 - - para hipertensão renovascular, 762 - sem captopril, 379 Reposição hidroeletrolítica - folha de, 258 - soluções utilizadas para, 263 Reserpina - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836 - dose diária da, 790 - dose normal da, 836 - farmacocinética da, 836 - número de tomadas, 790 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Resina de troca - para hipercalemia, 209 Ressonância magnética, 294, 299 - contrastes, 329 - do núcleo, 327 - indicações, 329, 335 - - anomalias congênitas, 329 - - doença - - - cística, 329 - - - difusa, 332 - - - inflamatória, 333 - - - vascular, 333 - - transplante renal, 334 - - tumor renal, 331 - - uropatia obstrutiva, 333 - na criança, 339 - para cálculo renal na gravidez, 542 - para carcinoma de células renais, 640 - para cisto renal, 590 - - simples, 632 - para complicações da hiponatremia, 129 - para doença renal policística autossômica dominante, 585 - para encefalopatia urêmica, 707 - para hipertensão arterial renovascular, 312 - para litíase urinária, 304 - para massa renal, 310 - para nefropatia do refluxo, 512 - para oncocitoma, 634 - para osteodistrofia renal, 725 - para pielonefrite aguda, 305
- para tumor de Wilms, 645 - para uropatia obstrutiva, 625 - pontos-chave, 329 - princípios físicos, 326 - relaxamento T1 e T2, 327 - renal, 299 Retardo - de crescimento - - na cistinose, 561 - - na galactosemia, 561 - - na glicogenose I, 561 - - na hipertirosinemia, 561 - - na intolerância - - - hereditária à frutose, 561 - - - lisinúrica protéica, 562 - - na síndrome - - - de Bartter, 570 - - - de Fanconi, 564 - - no diabete insípido nefrogênico, 572 - - no raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - mental - - na cistinúria, 561 - - na galactosemia, 561 - - na histidinúria, 563 - - na intolerância lisinúrica protéica, 562 - - na metioninúria, 563 - - na síndrome - - - de Bartter, 570 - - - óculo-cérebro-renal de Lowe, 561 - - no diabete insípido nefrogênico, 572 Retenção urinária, 268 - com prometazina, 835 - difenidramina e, 817 - disopiramida e, 818 Retinopatia hipertensiva, 526, 749 - na uremia, 675 Retocolite ulcerativa, 622 Ribavirina - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836 - dose normal da, 836 - farmacocinética da, 836 - para glomerulonefrite por vírus C, 444 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 Riboflavina - deficiência de, e acidose láctica, 173 - para paciente sob hemodiálise, 851 Rifampicina - ajuste de dose na doença renal, 836 - cuidados especiais, 836 - dose normal da, 836 - farmacocinética da, 836 - hipocalcemia causada por, 216 - interação com ciclosporina, 467 - nefrite intersticial causada por, 470, 476 - nefrotoxicidade da, 456 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 836 - - hemodiálise, 836 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 836 - vasculite sistêmica causada por, 431 Rilmenidina - características da, 790 - dose da, 790 - número de tomadas, 790 Rim - anatomia radiológica do, 299 - - contornos renais, 300 - - esquema demonstrativo das dimensões do, 300 - angiotensina II, ações sobre o, 74 - anomalias congênitas do, 317 - Ask-Upmark, 7 - com displasia multicística, 581 - direito seccionado em planos, 2 - do mieloma, 439, 481 - em ferradura, 6, 7 - - à ultra-sonografia, 317 - - cintilografia renal estática para, 383 - - ressonância magnética no, 329, 330 - - vs. linfonodomegalias, 317 - - vs. massa pancreática, 317 - esponjoso-medular, 345, 581 - - acidose tubular renal associada a, 576 - - cálculo urinário no, 301 - - características do, 581 - - ressonância magnética no, 331
- exame do, 272 - - ausculta, 272 - - palpação, 272 - - percussão, 272 - exposição do, a radiofármacos, 373 - hipercalcemia, sinais no, 222 - hiperplásico, 333 - hipertensão, comprometimento do, 747, 748 - hipoplásico, 333 - multicístico - - cintilografia renal estática para, 383 - - displásico, 345 - - - vs. hidronefrose, 345 - permanente, 5 - policístico - - bacteriúria em presença de, 505 - - cintilografia renal estática para, 383 - - e insuficiência renal crônica, 684 - - hipertensão e, 743, 744 - radioisótopos e o, 290 - supranumerário, 7 - vicariante, 333 Rinorréia na vasculite necrotizante, 432 Ritonavir, nefrotoxicidade do, 459 Rituximab para rejeição de transplante, 951 Ruptura - da anastomose arterial pós-transplante, 956, 958 - renal pós-transplante, 956, 958
S Salbutamol - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal do, 837 - farmacocinética do, 837 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Salicilato - alcalose respiratória e, 183 - hiperuricemia causada por, 243 - interação farmacológica com diurético - - de ação rápida, 783 - - poupador de potássio, 783 - intoxicação por acetazolamida para, 782 - uricosúria induzida por, 252 Salmeterol - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal do, 837 - farmacocinética do, 837 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Salmonella pós-transplante renal, 983 Salsalate - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal do, 837 - farmacocinética do, 837 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Sangramento na uremia, 675, 676 Sangue - cálculo de correções para reposição de, 260 - exame de, na insuficiência renal aguda, 394 - para depleção do volume extracelular, 149 - total, expansão inicial de volume com, 264 Saquinavir, nefrotoxicidade do, 459 Sarampo, glomerulopatia no, 448 Sarcoidose - cálculo urinário na, 301 - diabetes insipidus pituitário e, 113 - hipercalcemia na, 220 - hipercalciúria e, 612 - hiperuricemia secundária à, 243 - nefrite intersticial aguda na, 476 - nefropatia tubulointersticial e, 482 - vs. gota, 245 Sarcoma - hiperuricemia secundária a, 243 - metotrexato para, 472 - renal, 644
1026 Schistosoma - haematobium, 447 - japonicum, 447 - mansoni, 447 SCUF, 909 Secobarbital - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal do, 837 - farmacocinética do, 837 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Secreção - inapropriada de hormônio antidiurético - - depleção de sódio associado a, 146 - tubular, 37 Sede, mecanismo da, 67, 101 - na hipernatremia, 118 Sedimento urinário, 276 - interpretação do, em nefropatias, 280 - na esclerodermia renal, 530 - na infecção do trato urinário, 492 - na vasculite renal, 435 - no carcinoma de células renais, 639 - principais elementos formados no, 277 Selênio na insuficiência renal aguda, 846 Sépse, edema associado a, 151 Septicemia do urêmico sob diálise, 679 Serosite no LES, 425 Serpentes, nefrotoxicidade de peçonhas de, 472 Serratia e peritonite durante diálise, 924 Sertralina, síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Sevelamer - para doença óssea adinâmica, 727 - para hiperfosfatemia, 231 - para hiperparatireoidismo secundário, 727 Shigella dysenteriae, 527 Sífilis - glomerulopatia da, 448 - trombose da artéria renal associada a, 520 Silicone, nefropatia pelo, 479 Silindac, nefrotoxicidade do, 464 Simulect para transplante renal, 953 - dose, 953 - efeito colateral, 956 Sinal - de Babinski, 706 - de Chvostek, 217, 234 - de Giordano, 492, 684 - de Romberg, 709 - de Trousseau, 217, 234 - do cacifo, 151 Síncope por depleção de volume extracelular, 146 Síndrome - álcali-leite - - hipercalcemia na, 221 - - hipermagnesemia causada por, 235 - da imunodeficiência adquirida - - acidose láctica na, 173 - - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - - hiponatremia em paciente com, 123 - - hipouricemia associada a, 251 - - nefropatia tubulointersticial na, 481 - - rim na, 308 - da permeabilidade capilar elevada, 158 - da perna inquieta na uremia, 675, 676 - da veia ovariana, 622 - de Alport, 10 - de anticorpo antifosfolipídio, 530 - - dados laboratoriais, 531 - - etiopatogenia, 531 - - manifestações clínicas, 531 - - tratamento, 531 - - trombose da artéria renal associada a, 520 - de Bartter, 182, 570 - - hiperuricemia secundária à, 243 - - hipocalemia por, 201 - - hipomagnesemia e, 233, 234 - de Buttler-Albright, 574 - de Churg-Strauss, 431, 432 - - eosinofilia na, 433 - de Cushing - - hipertensão e, 743, 745 - - no carcinoma de células renais, 639 - de Down, 243 - de Ehlers-Danlos, 576
Índice Alfabético
- de Fanconi, 17, 563 - - cidofovir e, 459 - - etiologia da, 573 - - hipofosfatemia e, 227, 228 - - hipouricemia associada a, 251 - - na cistinose, 561 - - na doença de Wilson, 561 - - na galactosemia, 561 - - na glicogenose I, 561 - - na hipertirosinemia, 561 - - na síndrome - - - de Bartter, 570 - - - de Luder-Sheldon, 561 - - quadro clínico, 564 - - tratamento, 564 - de Gitelman, 182 - - hipocalemia por, 201 - de Goodpasture - - diagnóstico diferencial, 437, 439 - - e insuficiência renal crônica, 683 - - notando-se o padrão linear à imunofluorescência, 439 - - patogênese, 438 - - patologia, 437 - - pontos-chave, 439 - - prognóstico, 438 - - quadro clínico, 437 - - tratamento, 438 - de Guillain-Barré - - acidose respiratória causada por, 182 - - diabetes insipidus pituitário e, 113 - de hiperestimulação ovariana, diurético para, 781 - de Lesch-Nyhan, 243 - de Liddle, 571 - de lise tumoral, 230, 231, 249 - de Lowe - - acidose tubular renal e, 574 - - síndrome de Fanconi por, 573 - de Marfan, 576 - de Muckle-Wells, 441 - de Pickwick, 182 - de Potter, 344 - de resistência insulínica, 741 - de secreção inapropriada de hormônio antidiurético, 67, 121 - - com carbamazepina, 810 - - com ciclofosfamida, 813 - - com vimblastina, 840 - - diurético para, 781 - - hiponatremia com sódio corporal aparentemente normal e, 123 - - situações clínicas associadas com, 123 - de Sheehan, 113, 114 - de Sjögren - - acidose tubular renal e, 574, 576 - - anticorpo antifosfolipídio associado a, 531 - - nefrite intersticial aguda na, 476 - - nefropatia tubulointersticial na, 481 - - síndrome de Fanconi causada por, 573 - de tensão pré-menstrual, edema associado a, 151 - de Turner, 345 - de Zellweger, 345 - de Zollinger-Ellison, 191 - diálise-demência, 712 - - quadro clínico, 713 - do choque tóxico - - hipocalcemia na, 217 - - neonatal, hipocalcemia por, 216 - do dedo azul, 522, 523 - do desequilíbrio, 711 - do intestino curto, 233 - do osso faminto - - hipofosfatemia associada a, 227 - - hipomagnesemia e, 233, 234 - do túnel do carpo, 711 - fosfatúrica, 566 - HELLP, 541, 548 - - interrupção da gravidez na, 550 - hemolítico-urêmica, 527 - - com acidente ofídico, 473 - - com interferon, 470 - - com mitomicina C, 830 - - com tacrolimus, 470 - - diagnóstico, 528 - - etiopatogenia, 527 - - por uso de ciclosporina, 468 - - pós-parto, 541 - - recidiva pós-transplante, 963 - - tratamento, 528 - hepatorrenal
- - fator natriurético atrial na, 145 - - sistema calicreína-cinina na, 80 - hipercalêmica do adolescente, 578 - MIA, 680 - nefrítica, 402 - - aguda, diagnóstico de, 291 - - na crioglobulinemia, 441 - - na glomerulonefrite - - - da endocardite bacteriana, 445 - - - membranoproliferativa, 411 - nefrótica, 402 - - acidose tubular renal e, 574 - - aurofina e, 808 - - biópsia renal na, 288 - - captopril e, 810 - - com acidente ofídico, 473 - - com captopril, 810 - - com interferon, 470 - - com proteinúria maciça, 12 - - diagnóstico de, 291 - - diuréticos para, 779 - - doxorrubicina e, 818 - - edema associado a, 151, 155, 156 - - exame de escolha para, 294 - - hipocalcemia na, 217 - - hiponatremia na, 125 - - imageamento na, 368 - - interferon e, 825 - - lítio e, 827 - - na amiloidose, 442 - - na glomerulonefrite - - - membranoproliferativa, 411 - - - membranosa, 418 - - - por lesões mínimas, 415 - - na glomerulosclerose focal e segmentar, 416 - - na lepra, 448 - - na malária, 448 - - na nefropatia - - - do HIV, 446 - - - esquistossomática, 447 - - - por IgA, 410 - - - por vírus B, 444 - - na púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - - na sífilis, 448 - - na síndrome - - - antifosfolipídio, 531 - - - de Fanconi, 573 - - - de Goodpasture, 437 - - no carcinoma de células renais, 639 - - penicilamina e, 833 - - por uso de antiiflamatório não-esteróide, 462, 464 - - tratamento da, 405 - - trombose de veia renal na, 521 - plurimetabólica, 741 - pré-menstrual, edema na, 158 - PTT/SHU, 527 - - causas de, 527 - - dados laboratoriais, 527 - - diagnóstico, 528 - - manifestações clínicas, 527 - - patologia, 528 - - tratamento, 528 - renal tubular, 292 - reumática em paciente sob diálise, 679 - tubular - - distal, 559 - - proximal, 559 - unha-rótula e insuficiência renal crônica, 684 - urêmica, 662 - - patogenia da, 672 - - sinais e sintomas, 674 - - toxinas urêmicas, 672 Sinusite na vasculite necrotizante, 432 Sinvastatina, 959 Sirenomelia, 344 Sirolimus para transplante renal, 953 - dose, 953 - efeitos colaterais, 956 Sistema calicreína-cinina, 77 - ações no rim, 78 - - na excreção de sódio e água, 79 - - na hemodinâmica renal, 78 - e regulação da pressão arterial, 737, 739 - interrelações com outros sistemas, 79 - - eicosanóides, 79 - - óxido nítrico, 80 - - peptídeo natriurético atrial, 80 - - renina-angiotensina, 79 - localização renal dos componentes do, 78
Índice Alfabético
Sistema cardiopulmonar, 228 Sistema cardiovascular - hipercalcemia, sinais no, 222 - hipermagnesemia, sinais no, 236 - hipomagnesemia, sinais no, 234 - na IRA aguda, 393 - na nefrite, 369 - na uremia, 675, 676 Sistema das prostaglandinas, 737, 739 Sistema endócrino, 675 Sistema gastrintestinal - hipercalcemia, sinais no, 222 - na IRA aguda, 393 - uremia, sinais no, 674, 675 Sistema hematológico - eritrocitose, 700 - hemostasia, alterações da, 700 - hipercalcemia, sinais no, 222 - hiperparatireoidismo, sinais no, 693 - hipofosfatemia, sinais no, 228 - inibição da eritropoese, 693 - leucócitos, alterações dos, 701 - toxicidade pelo alumínio, sinais no, 693 - uremia, conseqüências no, 675, 676, 691-704 - - anemia, 691, 692 - - deficiência de - - - eritropoietina, 692 - - - ferro, 693 Sistema imunológico, 701 Sistema músculo-esquelético - hipofosfatemia, sinais no, 228 - uremia, sinais no, 675, 676 - vasculite necrotizante, sinais no, 433 Sistema nervoso - autônomo e pressão arterial, 736 - central - - angiotensina II, ações sobre o, 74 - - hipercalcemia, sinais no, 222 - - hipernatremia, sinais no, 118 - - hipofosfatemia, sinais no, 228 - - hiponatremia, sinais no, 124 - - intoxicação pelo alumínio, sinais no, 722 - - vasculite necrotizante, sinais no, 433 - insuficiência renal, sinais no, 393, 705-716 - - complicações da diálise, 711 - - - déficit cognitivo agudo, 713 - - - hematoma subdural, 712 - - - mononeuropatia por fístula artério-venosa, 711 - - - síndrome diálise-demência, 712 - - - síndrome do desequilíbrio, 711 - - complicações do transplante renal, 714 - - - doença vascular encefálica, 715 - - - encefalopatia por rejeição, 716 - - - infecção, 714 - - - mielinose pontina central, 714 - - - neoplasia, 714 - - - neuropatia, 716 - - - neurotoxicidade de drogas, 715 - - complicações relacionadas à doença básica, 705, 706 - - - encefalopatia urêmica, 710 - - - miopatia urêmica, 710 - - - neuropatia urêmica, 708 - periférico, vasculite necrotizante do, 433 - simpático - - e metabolismo do sódio, 145 - - na depleção da pressão arterial, 771 - uremia, manifestações no, 675 Sistema ocular, vasculite necrotizante no, 433 Sistema ósseo, sinais de hipofosfatemia, 228 Sistema renina-angiotensina, 70 - aldosterona, 17 - - edema da cirrose hepática e, 155 - - edema da ICC e, 153 - - homeostasia do potássio e, 198 - - regulação da pressão arterial e, 737 - componentes do, 70, 71 - em situações fisiopatológicas, 75 - - hipertensão arterial, 75 - - hipertensão na doença renal parenquimatosa, 772 - - nefropatia crônica, 75 - - nefropatia diabética, 75 - - relação com o sistema calicreína-cinina, 79 - secreção de HAD e, 104 Sistema tampão, 163, 165 - ácido carbônico-bicarbonato, 165 Sistema urinário, desenvolvimento do, 5, 6 SLED, 910 Sódio - alterações no balanço de, na IRA, 392
- cálculo - - da necessidade básica de, 256 - - de correções para reposição do, 258 - concentração plasmática de, 133, 135 - controle da correção do balanço na IRC, 686 - depleção de, 146 - disfunção no transporte de, 570 - distúrbios do equilíbrio do, 146 - filtração e excreção diária de, 133, 134 - ingesta de - - média diária, 256 - - no edema, 159 - metabolismo do (v. Metabolismo do sódio) - necessidade - - na insuficiência renal crônica, 850 - - pós-transplante renal, 858 - no líquido extracelular, 94 - papel do, na hipertensão na doença renal parenquimatosa, 771 - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854 - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - perda de, na nefrite intersticial crônica, 478 - plano de administração do, 260 - reabsorção de - - na alça de Henle, 142 - - no ducto coletor, 47 - - no túbulo contornado proximal, 139 - regulação intra-renal da excreção de, 136 - resposta renal às alterações na ingesta de, 134 - retenção de, na glomerulopatia, 402, 404 - transporte de, 138, 139 - - através da célula tubular proximal, 139, 141 - - na alça de Henle, 45 - - no túbulo - - - contornado distal, 46 - - - de conexão, 46 - - - proximal, 42, 44 - urinário na depleção de volume extracelular, 148 Solução - colóide, 265 - - albumina humana a 20%, 265 - - dextran, 266 - - gelatina, 266 - - hidroxietil-amido, 266 - - para depleção do volume extracelular, 149 - cristalóide, 265 - de bicarbonato de sódio a 8,4%, 266 - de Joulie, 566 - de KCl a 19,1%, 266 - de reposição usada na terapia contínua de reposição renal, 399 - de Ringer lactato, 265 - - composição da, 263 - - expansão inicial de volume com, 264 - - para depleção de volume extracelular, 148 - de Shohl, 687 - de sódio isotônico, 148 - de troca em hemodiálise, 877 - hiperosmótica, 92 - hipertônica, 92 - - de NaCl, 96 - hiposmótica, 92 - hipotônica, 92, 96 - isosmótica, 92 - isotônica, 92 - - de NaCl, 97 - para diálise peritoneal, 923 - - nova, 927 - para hemodiálise contínua, 913 - para nutrição parenteral intradialítica, 865 - salina - - a 0,9%, 265 - - - composição da, 263 - - - expansão inicial de volume com, 264 - - a 3%, 265 - - - composição da, 263 - - - expansão inicial de volume com, 264 - - isotônica para hipomagnesemia, 235 - - para hipercalcemia, 223 Sono, distúrbio do, 675 Soro glicosado a 5%, 265 - composição do, 263 - expansão inicial de volume com, 264 Sotalol - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal do, 837 - farmacocinética do, 837 - reposição após
1027 - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Spirapril, 791 Staphylococcus - aureus - - abscesso renal e infecção por, 500 - - e peritonite durante diálise, 924 - - glomerulonefrite e infecção por, 445 - epidermidis - - e peritonite durante diálise, 924 - - glomerulonefrite e infecção por, 445 - glomerulonefrite e infecção por, 445, 448 - glomerulopatia na infecção por, 448 - infecção do trato urinário por, 496 - púrpura de Henoch-Schönlein associada a, 435 - viridans, glomerulonefrite e infecção por, 445 Stent para estenose da artéria renal, 765 Streptococcus - beta-hemolítico, púrpura de Henoch-Schönlein e, 435 - e peritonite durante diálise, 924 - glomerulonefrite na infecção por, 448 - nefrite intersticial aguda e infecção por, 476 - pneumoniae pós-transplante renal, 983 Streptomyces - nodosus, 457 - tsukubaensis, 470 Strongyloides stercoralis pós-transplante renal, 976, 983 Succinilcolina - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal da, 837 - farmacocinética da, 837 - hipercalemia associada a, 205 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Sudorese - depleção de sódio causada por, 146 - na nefrolitíase, 613 - perda líquida pela, 256 - por depleção de volume extracelular, 146 Sulbactam - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal do, 837 - farmacocinética do, 837 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Sulfa, vasculite sistêmica causada por, 431 Sulfadiazina, nefrotoxicidade da, 456 Sulfametoxazol - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal do, 837 - farmacocinética do, 837 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Sulfato - de indoxil, 673 - de magnésio, 235 - no líquido - - extracelular, 94 - - intracelular, 94, 95 - reabsorção de, no túbulo contornado proximal, 139 Sulfimpirazona - ajuste de dose na doença renal, 837 - cuidados especiais, 837 - dose normal da, 837 - farmacocinética da, 837 - para hiperuricemia, 249 - - no transplante renal, 251 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 837 - - hemodiálise, 837 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 837 Sulfixazol - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal do, 838 - farmacocinética do, 838 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838
1028 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Sulfonamida - insuficiência renal aguda causada por, 389, 683 - nefrite intersticial causada por, 470, 476 - nefrotoxicidade da, 456 - para bacteriúria na gravidez, 540 Sulfoniluréia - diabetes insipidus nefrogênico induzido por, 115 - síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 Sulindac - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal do, 838 - farmacocinética do, 838 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Supra-renal, angiotensina II, ações sobre a, 74 Suprofen, nefrotoxicidade do, 464 Surdez neurossensorial, 576
T Tabagismo - carcinoma - - de células renais e, 635 - - de pelve renal e, 645 - eritrocitose pós-transplante e, 700 - nefropatia diabética e, 600, 603 - risco de hipertensão e, 743, 744 Tacrolimus, 470 - nefrotoxicidade do, 470 - propriedades do, 470 - usos do, 470 Tagamet, 297 Tamoxifen - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal do, 838 - farmacocinética do, 838 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Taquicardia - na depleção do volume extracelular, 148 - na nefrolitíase, 613 - supraventricular, peptídeo natriurético atrial na, 82 Taquipnéia, hipernatremia na, 113 Taxa - de filtração glomerular - - avaliação da, e início da diálise, 872 - - inulina para determinação da, 285 - - medida com marcador radioisotópico, 285 - - na nefropatia diabética, 598, 600 - de mortalidade na necrose tubular aguda, 391 Tazobactan, 504 Tegretol, 116 Teicoplamin - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal do, 838 - farmacocinética do, 838 - nefrite intersticial causada por, 470 - nefrotoxicidade do, 456 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Teldane na urografia excretora, 297 Telmisartan, 795 Temazepam - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal do, 838 - farmacocinética do, 838 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Teniposide - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal da, 838 - farmacocinética da, 838 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838
Índice Alfabético
- - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Tenoxicam - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal do, 838 - farmacocinética do, 838 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Teofilina - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal da, 838 - farmacocinética da, 838 - intoxicação por, hipocalemia na, 200 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Teoria - do feedback túbulo-glomerular, 27 - miogênica, 27 Terapia - contínua de reposição renal, 397 - - composição de soluções de reposição utilizadas em, 399 - - condições básicas para a, 397 - - - acesso vascular, 397 - - - anticoagulação, 398 - - - dialisador, 397 - - - força motriz do sangue, 397 - - - solução - - escolha do método dialítico, 400 - - hemodiafiltração arteriovenosa contínua, 399 - - hemodiafiltração venovenosa contínua, 400 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 399 - - solução - - - de diálise, 398 - - - de reposição, 398 - - ultrafiltração lenta contínua, 399 - de reposição hormonal e doença cardiovascular, 553 - nutricional do urêmico, 843-860 - - conclusão, 858 - - endereços na internet, 860 - - insuficiência renal aguda, 843 - - - recomendações nutricionais, 843 - - insuficiência renal crônica, 846 - - - diálise peritoneal, 853 - - - hemodiálise, 850 - - - transplante renal, 855 - - - tratamento conservador, 846 - - introdução, 843 - - referências bibliográficas, 858 - parenteral, 254-266 - - apêndice, 265 - - - solução colóide, 265 - - - solução cristalóide, 265 - - - solução de bicarbonato de sódio, 266 - - - solução de KCl a 19,1%, 266 - - cálculo da necessidade básica, 255 - - - perdas gastrintestinais, 256, 257 - - - perdas urinárias, 255, 256 - - - perdas urinárias de cloro, 256 - - - perdas urinárias sensível e insensível, 256 - - cálculo das correções, 257 - - - ácido-básico, 260 - - - para água, 257 - - - para o plasma, 260 - - - para o potássio, 260 - - - para o sangue, 260 - - - para sódio, 258 - - exemplos, 261 - - formulação de plano diário para, 255 - - plano de administração, 260 - - - de água, 260 - - - de potássio, 261 - - - de sódio, 260 - - prescrição médica, 261 - - princípios gerais do plano parenteral, 260 - - referências bibliográficas, 266 Terazosin - ajuste de dose na doença renal, 838 - características do, 791 - cuidados especiais, 838 - dose diária do, 790 - dose normal do, 838
- farmacocinética do, 838 - número de tomadas, 790 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Terbutalina - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal da, 838 - farmacocinética da, 838 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 Teste de equilíbrio peritoneal, 920, 921 Testículo, exposição do, a radiofármacos, 373 Tetania - na hipocalcemia, 217 - na hipomagnesemia, 234 - na síndrome - - de Bartter, 570 - - de Gitelman, 201 Tetraciclina - acidose tubular renal associada a, 574 - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal da, 838 - farmacocinética da, 838 - nefrite intersticial causada por, 470 - nefrotoxicidade da, 456 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 - síndrome de Fanconi associada a, 573 Thymoglobuline Imtix Sangstat, 953 Tiamina para paciente sob hemodiálise, 851 Tiazídico - ajuste de dose na doença renal, 838 - cuidados especiais, 838 - dose normal do, 838 - farmacocinética do, 838 - hipercalcemia causada por, 221 - hiperuricemia por uso de, 247 - nefrite intersticial causada por, 470 - para hipocalcemia, 218, 219 - para nefrolitíase, 617 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 838 - - hemodiálise, 838 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 838 - síndrome da secreção inadequada de HAD e, 123 Ticarcilina - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal da, 839 - farmacocinética da, 839 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Ticlopidina - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal da, 839 - farmacocinética da, 839 - nefrite intersticial causada por, 470 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Timolol, 788 - ajuste de dose na doença renal, 839 - características do, 788 - cuidados especiais, 839 - dose normal do, 839 - farmacocinética do, 839 - lipossolubilidade do, 788 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Tiopental - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal do, 839 - farmacocinética do, 839 - reposição após
1029
Índice Alfabético
- - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Tiopronina para nefrolitíase, 617 Tireóide - distúrbios da - - com amiodarona, 806 - - hipertensão e, 743 - - na uremia, 674, 680 - exposição da, a radiofármacos, 373 Tireoidite, acidose tubular renal na, 576 Tireotoxicose - edema associado a, 151 - hipercalcemia na, 220 Tirosinemia - acidose tubular renal e, 574 - síndrome de Fanconi associada a, 573 Tobramicina - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal da, 839 - farmacocinética da, 839 - nefrotoxicidade da, 452 - nível sérico terapêutico da, 841 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Tocainide - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal do, 839 - farmacocinética do, 839 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Tofo gotoso, 244, 245 Tolazamida - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal da, 839 - farmacocinética da, 839 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Tolbutamida - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal da, 839 - farmacocinética da, 839 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 - síndrome da secreção inapropriada de hormônio antidiurético e, 123 Tolmetin - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal do, 839 - farmacocinética do, 839 - nefrotoxicidade do, 464 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Tolueno, acidose tubular renal associada a, 576 Tolypocladium inflatum, 466 Tomografia - computadorizada, 294 - - indicações da, 304 - - na criança, 338 - - nefrotoxicidade do meio de contraste na, 460 - - para angiomiolipoma renal, 633 - - para cálculo, 294 - - - urinário, 301, 304 - - para carcinoma de células renais, 639, 640 - - para cisto - - - multilocular, 246 - - - renal, 294, 345, 590, 591, 632 - - para complicações da hiponatremia, 129 - - para doença cística renal, 581 - - para doença renal policística, 346 - - - autossômica dominante, 585 - - para encefalopatia urêmica, 707 - - para fístula urinária, 958 - - para hematoma subdural, 712
- - para hipertensão arterial renovascular, 312 - - para infarto renal, 294 - - para infecção do trato urinário, 494 - - - na SIDA, 308 - - para insuficiência renal, 313 - - para litíase renal, 321 - - para massa renal, 294 - - para nefrolitíase pelo ácido úrico, 247 - - para obstrução - - - do trato urinário, 292 - - - urinária pós-transplante, 958 - - para oncocitoma, 634 - - para osteodistrofia renal, 725 - - para pielonefrite - - - aguda, 305 - - - enfisematosa, 306 - - - xantogranulomatosa, 306 - - para sarcoma renal, 644 - - para transporte renal, 313 - - para traumatismo abdominal na criança, 342 - - para trombose - - - arterial renal, 520 - - - de veia renal, 313 - - para tuberculose renal, 307 - - para tumor de Wilms, 369, 370, 645 - - para uropatia obstrutiva, 625 - - renal, 298 - - - mostrando áreas de hipoatenuação nítida no pólo inferior renal, 299 - helicoidal para hipertensão renovascular, 763 - por emissão de pósitrons, 294 Tonicidade, 92 Topiramato para neuropatia urêmica, 710 Toracocentese, 146 Torasemida, farmacocinética da, 777 Tórax instável, 182 Torazemida, 776 Toxemia gravídica, 158 - edema associado a, 151 Toxina - acidose tubular renal associada a, 574, 576 - edema associado a, 151 - hiperuricemia secundária ao uso de, 242, 243 - tubulopatia associada a, 558 - urêmica, 672 - - acidose metabólica, 673 - - beta-microglobulina, 673 - - citocinas, 673 - - fosfatos orgânicos, 673 - - guanidina, 672 - - homocisteína, 673 - - hormônio paratireóide, 673 - - marcadores de estresse oxidativo, 673 - - moléculas médias, 673 - - sulfato de indoxil, 673 - - uréia, 672 Toxoplasma - encefalite por, 456 - glomerulonefrite na infecção por, 448 - gondii pós-transplante renal, 983 Toxoplasmose - exame de, no doador de transplante renal, 945 - glomerulopatia na, 448 Tracrolimus para transplante renal, 952 - doses, 952 - efeitos colaterais, 955 - mecanismo de ação, 955 Trade-off, mecanismo de, 654 - conceitos atuais, 665 - história, 665 Transaminase na síndrome HELLP, 548, 550 Transfusão de sangue incompatível, 269 Transplante renal - acidose tubular renal associada a, 576 - carcinoma de células renais associado a, 635 - ciclosporina e, 467 - cintilografia para avaliação do rim transplantado, 382 - complicações do, 325, 714 - - doença vascular encefálica, 715 - - encefalopatia por rejeição, 716 - - infecção, 714 - - mielinose pontina central, 714 - - neoplasia, 714 - - neuropatia, 716 - - neurotoxicidade por drogas, 715 - contra-indicação do, 688 - disfunção pós-biópsia renal no, 288 - e gravidez, 543 - eritrocitose pós-, 700
- glomerulonefrite e, 405 - - crescêntica, 409 - - membranoproliferativa, 414 - - membranosa, 419 - glomerulosclerose focal e segmentar e, 417 - hiperuricemia no, 247, 250 - hipomagnesemia e, 233 - histórico, 929 - imageamento para, 313 - imunologia do, 929-943 - - anticorpo monoclonal, 941 - - bibliografia selecionada, 942 - - endereços na internet, 9443 - - globulina - - - antilinfocitária, 941 - - - antitimocitária, 941 - - histocompatibilidade, 936 - - - compatibilidade HLA, 938, 939 - - - prova cruzada, 937 - - - reatividade contra painel, 936 - - imunossupressão, 940 - - - agente biológico, 941 - - - antiinflamatório hormonal, 940 - - - antimetabólito, 940 - - - ciclosporina, 940 - - perspectivas, 942 - - rejeição, 934 - - sistema HLA, 930 - indicação do, 688 - infecção em, 974-987 - - cronologia, 976 - - - após o sexto mês de transplante, 977 - - - de um a quatro meses pós-transplante, 977 - - - no primeiro mês pós-transplante, 976 - - endereços na internet, 987 - - fatores que favorecem a ocorrência de, 975 - - introdução, 974 - - por bactéria, 982 - - - Legionella, 983 - - - micobactéria, 982 - - - Nocardia, 982 - - - Salmonella, 983 - - - Streptococcus pneumoniae, 983 - - - urinária, 982 - - por fungos, 983 - - por parasitos, 983 - - - Pneumocystis carinii, 983 - - - Strongyloides stercoralis, 983 - - - Toxoplasma gondii, 983 - - por vírus, 978 - - - citomegalovírus, 978 - - - Epstein-Barr, 980 - - - hepatite B, 981 - - - hepatite C, 981 - - - herpesviridae, 980 - - - HIV, 981 - - - parvovírus, 982 - - - poliomavírus, 981 - - referências bibliográficas, 984 - manejo clínico do, 944-973 - - avaliação e preparo do receptor, 947 - - considerações gerais, 970 - - critérios de exclusão de doadores, 946 - - cuidados pós-operatórios imediatos, 950 - - das complicações imediatas, 956 - - - estenose da artéria renal, 958 - - - fístula urinária, 957 - - - hematoma de loja renal, 958 - - - insuficiência renal aguda, 956 - - - linfocele, 958 - - - obstrução urinária, 958 - - - ruptura da anastomose arterial, 958 - - - ruptura renal, 958 - - - trombose de artéria renal, 957 - - - trombose de veia renal, 957 - - das complicações não-infecciosas, 959 - - - catarata, 960 - - - depressão medular, 961 - - - diabetes mellitus, 960 - - - digestivas, 962 - - - dislipidemia, 959 - - - distúrbio do crescimento, 960 - - - doença cardiovascular, 961 - - - hiperparatireoidismo, 961 - - - hipertensão arterial, 959 - - - hiperuricemia, 962 - - - necrose asséptica, 961 - - - neoplasia maligna, 968 - - - obesidade, 960
1030 - - - osteoporose, 961 - - - poliglobulia, 960 - - - recidiva da doença primária, 963 - - - rejeição, 963 - - - trombose venosa profunda, 960 - - endereços na internet, 973 - - enxerto sem função no receptor, 969 - - escolha do doador, 945 - - fístula arteriovenosa para hemodiálise, 969 - - imunossupressão, 951 - - - azatioprina, 952, 954 - - - basiliximab, 953 - - - ciclosporina, 952 - - - daclizumab, 953 - - - efeitos colaterais, 954 - - - globulina antitimocítica, 953, 956 - - - mecanismo de ação, 954 - - - micofenolato mofetil, 952, 955 - - - orghoclone, 953, 956 - - - prednisona, 951 - - - sirolimus, 953, 956 - - - tacrolimus, 952, 955 - - introdução, 945 - - manuseio do doador e do receptor no ato cirúrgico, 948 - - período de internação do receptor de doador vivo, 948 - - referências bibliográficas, 971 - na cistinose, 480 - na doença renal policística autossômica dominante, 588 - na síndrome - - de Fanconi, 573 - - de Goodpasture, 438 - necrose asséptica da cabeça do fêmur e, 679 - no lúpus eritematoso sistêmico, 429 - nutrição e, 855 - - na rejeição crônica, 857 - - no pós-transplante, 856 - - - imediato, 856 - - - tardio, 856 - - no pré-transplante, 855 - - recomendações, 857 - para cistinúria clássica, 562 - para nefropatia - - do HIV, 447 - - por IgA e, 411 - para neuropatia urêmica, 710 - para púrpura de Henoch-Schönlein, 436 - radiologia no, 313 - rejeição de, acidose tubular renal e, 574 - renograma radioisotópico no, 376 - ressonância magnética no, 334 - tipos de, 930 - trombose da artéria renal associada a, 520 - ultra-sonografia no, 324 Transporte através da membrana epitelial, 39 Transtiretina, 441 Trato urinário - alterações anatômicas e funcionais na gravidez, 537 - infecção do, 490-506 - - aspectos gerais, 490 - - bacteriúria significante, 491 - - bibliografia selecionada, 505 - - complicações, 499 - - - imediatas, 500 - - - tardias, 501 - - diagnóstico, 492 - - - exames complementares, 493 - - - imageamento, 494 - - - manifestações clínicas, 492 - - - testes de localização da infecção urinária, 495 - - endereços na internet, 506 - - mecanismos de agressão renal, 498 - - métodos para detecção de envolvimento renal, 495 - - na gravidez, 540 - - nictúria por, 268 - - patogênese, 496 - - - agentes etiológicos, 496 - - - conseqüências, 498 - - - fatores de virulência, 496 - - - mecanismos de defesa do trato urinário, 498 - - - vias de infecção, 497 - - problemas de nomenclatura, 491 - - situações clínicas especiais, 499 - - - infecção recorrente, 499 - - tratamento, 502 - - - dificuldades para erradicação da bacteriúria, 505 - - - esquemas terapêuticos propostos, 503 - - - padrões de resposta ao, 502 - - - situações terapêuticas especiais, 504 - obstrução do, 620 (v.tb. Uropatia obstrutiva)
Índice Alfabético
- - diagnóstico de, 292 - - e doença tubulointersticial, 482 - - por cisto renal, 580 Traumatismo - abdominal na criança, imageamento, 342 - cintilografia renal estática para, 383 - craniano, diabetes insipidus pituitário e, 113 - edema no, 150, 151 - hipercalemia e, 205 - renal na criança, 342, 343 Tremor - na acidose respiratória, 182 - na encefalopatia urêmica, 706, 707 - na hipomagnesemia, 234 - na insuficiência renal aguda, 393 - por uso de ciclosporina, 715 Treponema pallidum, 448 Triantereno - considerações, 776 - efeitos colaterais do, 782 - farmacocinética do, 777 - hipercalemia causada por, 206 - mecanismo de ação do, 777 - observações para uso de, 782 - para síndrome - - de Bartter, 571 - - de Liddle, 571 Tricodermapolysporum, 940 Triglicerídio - na insuficiência renal aguda, 845 - para avaliação de hipertensão, 752 Trimetoprim - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal do, 839 - farmacocinética do, 839 - hipercalemia causada por, 206 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 - sulfametoxazol - - nefrotoxicidade do, 456 - - para infecção do trato urinário, 504 - - para vasculite renal, 435 - - uricosúria induzida por, 252 Tripelenamina - ajuste de dose na doença renal, 839 - cuidados especiais, 839 - dose normal da, 839 - farmacocinética da, 839 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 839 - - hemodiálise, 839 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 839 Trombocitopenia - com anrinona, 807 - com carboplatina, 472 - com diurético - - de ação prolongada, 782 - - de alça, 782 - na hipofosfatemia, 228 - na síndrome do anticorpo antifosfolipídio, 531 Trombocitose na vasculite renal, 433 Tromboflebite, edema associado a, 151 Trombolítico - para síndrome hemolítico-urêmica, 528 - para trombose renal, 520, 521 Trombose - associada ao acesso subclávio para diálise, 885 - da artéria renal, 520 - - diagnóstico, 520 - - pós-transplante renal, 956, 957 - - - vs. necrose tubular aguda, 957 - - - vs. obstrução urinária, 957 - - prognóstico, 520 - - quadro clínico, 520 - - tratamento, 520 - - vs. hemólise, 520 - - vs. infarto do miocárdio, 520 - - vs. rejeição de transplante renal, 520 - de veia renal, 370, 521 - - acidose tubular renal e, 574 - - etiologia, 521 - - exames complementares, 521 - - imageamento para, 313 - - manifestações clínicas, 521 - - na glomerulonefrite membranosa, 418 - - na síndrome antifosfolipídio, 531
- - no lúpus eritematoso sistêmico, 429 - - pós-transplante, 956, 957 - - radiologia na, 313 - - tratamento, 521 - diabetes insipidus pituitário e, 113 - na síndrome nefrótica, 404 - na terapia com eritropoetina recombinante humana, 700 - venosa profunda pós-transplante renal, 960 Tromboxane e regulação - da circulação renal, 20 - da filtração glomerular, 32 Tuberculose - diabetes insipidus pituitário e, 113 - hematúria assintomática por, 291 - hipercalcemia na, 220 - nefropatia tubulointersticial associada a, 482 - renal, 306 - - e insuficiência renal crônica, 684 - - radiologia na, 307 - síndrome da secreção inapropriada de HAD e, 123 - urinária, 622 Tubocurarina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Túbulo - coletor, 3, 13 - contornado - - distal, 46 - - - reabsorção de sódio no, 142 - - - reabsorção do cálcio no, 214 - - - reabsorção do fósforo no, 226 - - proximal, 43, 139 - - - reabsorção de sódio no, 139 - - - reabsorção do cálcio no, 214 - - - reabsorção do fósforo no, 226 - distal, 3, 13, 15 - - absorção do magnésio no, 232 - - inicial, 46 - - transporte de potássio no, 194 - proximal, 3, 13, 42, 139 - - absorção do magnésio no, 232 - - disfunção generalizada da, 563 - - membrana - - - luminal, 139 - - - peritubular, 139 - - microscopia eletrônica do, 14 - - pars recta do, 139 - - reabsorção - - - de ácido úrico no, 241 - - - de líquido no, 139 - - - de sódio no, 139 - - secreção de ácido úrico no, 242 - - transporte de potássio no, 193 Tubulopatia - adquirida, 558 - hereditária, 557-579 - - acidose tubular renal, 574 - - - tipo 1, 575 - - - tipo 2, 574 - - - tipo 3, 578 - - - tipo 4, 578 - - - tipo 5, 578 - - bibliografia selecionada, 579 - - causas de, 558 - - disfunção generalizada do túbulo proximal, 563 - - - síndrome de Fanconi, 563 - - disfunção no transporte de fosfato, 565 - - - doença de Dent, 569 - - - hipercalciúria idiopática, 568 - - - osteomalácia hipofosfatêmico oncogênica, 567 - - - pseudo-hipoparatireoidismo, 569 - - - raquitismo hipofosfatêmico dominante, 568 - - - raquitismo hipofosfatêmico hereditário com hipercalciúria, 566 - - - raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 566 - - - raquitismo tipo I, 568 - - - raquitismo tipo II, 568 - - disfunção no transporte renal de sódio, potássio, magnésio e cálcio, 570 - - - mutações afetando o receptor extracelular sensível ao cálcio, 571 - - - pseudo-hipoaldosteronismo, 570 - - - síndrome de Bartter, 570
Índice Alfabético
- - - síndrome de Liddle, 571 - - divisões funcionais do nefro em relação à, 559 - - endereços na internet, 579 - - glicosúria renal primária, 565 - - hiperaminoacidúria, 559 - - introdução, 557 Tubulorrexe, 394 Tumor - cerebral, alcalose respiratória e, 183 - da supra-renal, hipertensão secundária ao, 745 - de bexiga - - cisplatina para, 471 - - metotrexato para, 472 - de cabeça e pescoço - - cisplatina para, 471 - - metotrexato para, 472 - de Grawitz, 635 - de mama - - diabetes insipidus pituitário e, 113 - - metotrexato para, 472 - de ovário, cisplatina para, 471 - de pelve renal, 631, 645 - - estadiamento do, 647 - de pulmão, cisplatina para, 471 - de testículo, cisplatina para, 471 - de Wilms, 346, 369, 644 - - achados radiológicos, 369 - - microfotografia de, 644 - - ressonância magnética no, 331 - - vs. nefroma mesoblástico, 369 - - vs. neuroblastoma, 369 - - vs. teratoma, 369 - do sistema nervoso central, 123 - hematúria assintomática por, 291 - hipertensão renovascular e, 758 - insuficiência crônica renal causada por, 663 - mesenquimal, síndrome de Fanconi causada por, 573 - produtor - - de peptídeo relacionado ao paratormônio, 220 - - de renina, hipertensão causada por, 743 - renal, 631-648 - - angiografia no, 299 - - benigno, 631 - - - adenoma, 634 - - - angiomiolipoma, 632 - - - cisto simples, 632 - - - oncocitoma, 634 - - de Wilms, 644 - - endereços na internet, 648 - - maligno, 635 - - - carcinoma de células renais, 635 - - - carcinoma de pelve renal, 645 - - - sarcoma, 644 - - metastático, 644 - - obstrução da veia renal por, 370 - - radiologia no, 308 - - referências bibliográficas, 647 - - ressonância magnética para, 310, 331, 332 - - tomografia computadorizada para, 298, 309, 321 - - ultra-sonografia para, 321, 322 - - urografia excretora no, 308 - supra-selar, diabetes insipidus pituitário e, 113 - urotelial, 622 - vs. hidronefrose, 645 - vs. linfoma, 645 - vs. neuroblastoma, 645 - vs. rim policístico, 645
U Úlcera - duodenal na hipercalcemia, 222 - nasal na vasculite sistêmica necrotizante, 432 - oral no lúpus eritematoso sistêmico, 425 - péptica na uremia, 674, 675 Ultra-sonografia, 294, 299, 315-325 - aplicações avançadas, 322 - - biópsia renal, 322 - - litotripsia extracorpórea por ondas de choque, 324 - - na doença vascular — Doppler, 324 - - nefrostomia percutânea, 322 - - no transplante renal, 324 - - punção de cistos renais, 324 - aspectos, 316 - - ultra-sonográficos, 316 - bibliografia selecionada, 325 - como guia - - de biópsia renal, 323
- - de punção de cisto renal, 324 - - na litotripsia extracorpórea, 324 - dimensões do rim, 316 - Doppler, 294 - endereços na internet, 325 - integridade cortical e medular, 317 - limitações do método, 316 - mais radiografia simples na hematúria, 294 - para agenesia renal, 317, 344, 345 - para angiomiolipoma renal, 633 - para anomalia congênita, 317 - para avaliação de hipertensão, 752 - para cálculo - - renal na gravidez, 542 - - urinário, 302, 303 - para carcinoma de células renais, 639, 640 - para cisto - - multilocular, 346 - - renal, 310, 345, 581, 590 - - - simples, 632 - para criança, 337 - para deficiência renal crônica, 291 - para doador de transplante renal, 945 - para doença - - cística, 318, 345 - - - renal adquirida, 581 - - inflamatória, 321 - - renal policística, 346 - - - autossômica dominante, 581, 585, 587 - - - autossômica recessiva, 581 - para ectopia renal, 347 - para estenose da artéria renal, 745 - para estudo anatômico do rim, 340 - para fístula urinária, 958 - para glomerulonefrite, 369 - para hematoma de loja renal, 958 - para hematúria na criança, 342 - para hipertensão renovascular, 762 - para hipoplasia renal, 345 - para infecção do trato urinário, 494 - para insuficiência renal, 294, 313 - - aguda, 395 - para linfocele, 959 - para litíase renal, 321 - para mielomeningocele, 342 - para nefrite intersticial aguda, 477 - para nefrolitíase pelo ácido úrico, 247 - para nefrolitíase, 614 - para nefropatia - - do HIV, 446 - - do refluxo, 512 - para obstrução - - do trato urinário, 292 - - urinária pós-transplante, 958 - para osteodistrofia renal, 725 - para pielonefrite - - aguda, 305 - - enfisematosa, 306 - - xantogranulomatosa, 306 - para rim esponjoso medular, 581 - para síndrome nefrótica, 294 - para trombose - - arterial renal, 520 - - de veia renal, 370 - para tuberculose, 307 - para tumor - - de Wilms, 369, 370, 645 - - renal, 321 - para ureterocele, 351 - para uropatia obstrutiva, 320, 624 - pontos-chave, 317 - preparo do paciente, 316 - princípios, 315 Ultrafiltração lenta contínua, 399, 909 Unha, alterações na uremia, 675, 678 Úraco, 354 Urânio, intoxicação por, 573 Urapidil - características do, 791 - dose diária do, 790 - número de tomadas, 790 Urato - lesão renal pelo, 480 - nefrite tubulointersticial crônica pelo, 480 - oxidase, 250 Uréia, 64 - adequação de diálise e cinética da, 889 - clearance da, 284 - destino da produção de, no organismo, 681
1031 - - degradação, 681 - - ritmo de aparecimento, 681 - e osmolalidade, 92, 96 - e volume dos compartimentos líquidos, 117 - na depleção extracelular, 147 - na nefrolitíase, 614 - no diabete insípido nefrogênico, 573 - papel da, no mecanismo da concentração urinária, 60 - plasmática, 284 - - e ingesta protéica, 662 - - no início da IRC, 661 - - para insuficiência renal crônica, 683 - reabsorção de, na alça de Henle, 142 - recirculação da, 60 Uremia - aumento da, com nutrição parenteral intradialítica, 867 - conceituação do termo, 672 - diálise de urgência por, 872 - distúrbios de aminoácidos na, 851 - hormônio paratireóideo, 673 - manifestações de, 672 - na nefropatia do HIV, 446 - necessidades de nitrogênio na, 682 - recomendações nutricionais na, 843 - sinais e sintomas, 674 - - relacionados com distúrbios endócrinos, 674 - - relacionados com distúrbios hidroeletrolíticos e ácidobásico, 674 - - - acidose, 674 - - - cálcio, 674 - - - fósforo, 674 - - - potássio, 674 - - - volume circulante, 674 - - relacionados com distúrbios metabólicos, 674 - - relacionados com toxinas urêmicas, 674 - síntese protéica deficiente na, 844 - toxina urêmica, 672 - - acidose metabólica, 673 - - beta-microglobulina, 673 - - fosfatos orgânicos, 673 - - guanidina, 672 - - hormônio paratireóideo, 673 - - mioinositol, 673 - - moléculas médias, 673 - - potenciais, 673 - - sulfato de indoxil, 673 - - uréia, 672 - transplante renal e, 945 Ureter, 2, 3 - anomalias do, 344 - - duplicação, 349, 351 - - ectopia, 349 - - megaureter, 352 - - obstrução da junção pieloureteral, 352 - - ureterocele, 350 - considerações anatômicas, 341 - retrocava, 621 - - uropatia obstrutiva por, 622 Ureterite, uropatia obstrutiva e, 320 Ureterocele, 350, 622 Ureterojejunostomia, 206 Ureterossigmoidostomia, 200 Uretra - anterior, divertículo da, 357 - considerações anatômicas, 341 - duplicidade da, 357 - estenose da, 268 - obstrução da, 268 Uretrite, uropatia obstrutiva e, 320 Uretrocistografia retrógrada miccional - feminina normal, 341 - masculina normal, 342 - na criança, 296, 338 - para divertículo da bexiga, 354 - para doença inflamatória renal, 321 - para fístula urinária, 958 - para megaureter, 354 - para mielomeningocele, 342 - para pielonefrite crônica, 306 - para ureterocele, 351 - para uropatia obstrutiva, 624 - para válvula uretral, 355 Uretrocistoscopia, 495 Urgência miccional, 267 - na uropatia obstrutiva, 623 Uricase, 250 Uricosúrico para hiperuricemia, 249, 251 Urina - ácida, excreção de mexiletine na, 829
1032 - acidificação da, 49-57 - - endereços na internet, 57 - - formação e excreção de ácido titulável, 52 - - futuros estudos, 56 - - pontos-chave, 55 - - reabsorção de HCO3 - - - no túbulo distal, 51 - - - no túbulo proximal, 50 - - referências bibliográficas, 56 - - regulação, 54 - - resumo, 56 - - secreção de H - - - no túbulo distal, 51 - - - no túbulo proximal, 50 - - síntese e excreção renal de amônia, 53 - alcalina, excreção de - - AAS na, 804 - - cloroquina na, 815 - - fenobarbital e, 821 - - tocainide e, 839 - alcalinização da - - na nefrolitíase pelo ácido úrico, 250 - - na nefropatia pelo ácido úrico, 249 - - na síndrome de Fanconi, 564 - - para cistinúria clássica, 562 - alteração - - na cor da, 268 - - no volume da, 268 - avermelhada, 260, 269 - composição da, 47 - concentração da, 8, 285 - - alça de Henle na, 17 - densidade da, na depleção de volume extracelular, 148 - diluição da, 286 - exame de, 272 - - bilirrubina, 273 - - corpos cetônicos, 273 - - densidade, 273 - - esterase leucocitária, 273 - - glicose, 273 - - hemoglobina, 273 - - microscópico, 278 - - mioglobina, 273 - - na glomerulonefrite, 405 - - - pós-estreptocócica, 406 - - na infecção do trato urinário, 493 - - na insuficiência renal aguda, 394 - - na nefrite intersticial aguda, 477 - - na nefropatia - - - diabética, 601 - - - esquistossomática, 447 - - na uropatia obstrutiva, 623 - - nitrito, 273 - - no doador de transplante, 945 - - para hipertensão arterial, 752 - - pH, 273 - - proteinúria, 274 - - urobilinogênio, 273 - formação da, 24, 37, 48 - mecanismo de concentração e de diluição da, 58-68 - - balanço hídrico, 65 - - bibliografia selecionada, 68 - - endereço relevante na internet, 68 - - formação da medula hipertônica, 58 - - hormônio antidiurético - - - ação do, 61 - - - secreção do, 65 - - introdução, 58 - - mecanismo da sede, 67 - - regulação da ingesta, 67 - provas de acidificação da, 286 - turva, 268 - volume de, para indivíduo normal, 255 Urinoma, 304 Urobilinogênio, 273 Urocultura, 492 - na infecção do trato urinário, 492 - na nefropatia diabética, 601 - quantitativa, 493 Urodilatina, 84, 85 Urografia excretora, 296 - contra-indicações da, 303 - durante a gravidez, 542 - fisiologia do contraste, 297 - na criança, 337 - - normal, 337 - na hematúria, 294 - na hidronefrose, 361 - na hiperplasia renal, 345
Índice Alfabético
- na nefrolitíase, 614 - na ureterocele, 351 - na uropatia obstrutiva, 624 - no adulto, 296 - no cálculo, 294 - - urinário, 302 - no estudo anatômico do rim, 624 - para carcinoma - - de células renais, 639 - - de pelve renal, 645 - para doador de transplante renal, 945 - para doença inflamatória renal, 321 - para ectopia renal, 347 - para estenose da artéria renal, 745 - para fístula urinária, 958 - para hipertensão renovascular, 311, 761 - para infecção do trato urinário, 494 - para insuficiência renal, 313 - para linfocele, 959 - para massa renal, 308 - para mielomeningocele, 342 - para nefrolitíase pelo ácido úrico, 247 - para nefropatia do refluxo, 511 - para pielonefrite - - aguda, 305 - - xantogranulomatosa, 306 - para rim esponjoso medular, 581 - para tumor - - de Wilms, 645 - - renal metastático, 644 Urolitíase - bacteriúria em presença de, 505 - com triamterene, 782 - e insuficiência renal crônica, 683 - infecção urinária e, 501 Uromodulina, alterações na excreção de, 613 Uropatia obstrutiva, 620-630 - acidose tubular renal associada a, 576 - anatomia renal na, 300 - aspectos clínicos, 623 - dados laboratoriais, 623 - diagnóstico, 623 - - pielografia, 625 - - radiografia do abdome, 624 - - renograma com diurético, 625 - - ressonância magnética, 625 - - tomografia computadorizada, 625 - - ultra-sonografia, 624 - - urografia excretora, 624 - - urotrocistografia retrógrada e miccional, 624 - diurese pós-obstrutiva, 627 - endereços na internet, 630 - estudo por imagem na, 300, 320 - etiologia, 621 - fibrose intersticial, 627 - fisiopatologia, 625 - - concentração urinária, 627 - - função tubular, 626 - - hemodinâmica glomerular, 626 - - metabolismo renal, 627 - - reabsorção - - - de cálcio, 627 - - - de fósforo, 627 - - - de magnésio, 627 - - - de sódio e água, 626 - - secreção de K e acidificação urinária, 627 - incidência, 620 - lesão tubular irreversível, 628 - prevalência, 620 - referências bibliográficas, 629 - tratamento, 628 Uropontina, 610 - alterações na excreção de, 613 Urutu, nefrotoxicidade de peçonhas de, 473 Uveíte - e nefrite intersticial, 476 - na vasculite sistêmica necrotizante, 433
V Valproato de sódio - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal do, 840 - farmacocinética do, 840 - para neuropatia urêmica, 710 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840
- - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Valsartan, 795 - na avaliação de hipertensão renovascular, 378 Válvula uretral, 355 Vancomicina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - nefrite intersticial causada por, 470 - nefrotoxicidade da, 455 - nível sérico terapêutico da, 841 - para peritonite durante diálise, 924 - pós-transplante renal, 950 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Varicela - aciclovir para, 459 - glomerulopatia na, 448 - zoster pós-transplante, 981 Varicocele no carcinoma de células renais, 638 Vasa recta, 2, 22, 23 Vascularização renal, 4 - corte longitudinal da, 4 Vasculite - com melfalan, 828 - da crioglobulinemia, 431 - de grandes vasos, 431 - de pequenos vasos, 431 - de vasos de médio calibre, 431 - insuficiência crônica renal causada por, 663 - por quinolonas, 457 - renal, 431 - - necrosante aguda de artéria de pequeno calibre, 434 - - tratamento, 434 - sistêmica necrotizante, 431 - - associada ao ANCA, 431 - - diagnóstico diferencial, 433 - - etiologia, 431 - - patogênese, 431 - - patologia, 433 - - pontos-chave, 435 - - prevalência, 431 - - quadro clínico, 432 - - tratamento, 434 Vasculopatia no LES, 427 Vasoconstrição na depleção do volume extracelular, 148 Vasopressina, 101 (v.tb. Hormônio antidiurético) - e regulação da pressão arterial, 740 - excreção de sódio e, 144 Vecurônio - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal do, 840 - farmacocinética do, 840 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Veia - renal, 5, 24, 521 - - arqueada, 24 - - cortical superficial, 24 - - interlobar, 24 - - interlobular, 24 - - principal, 24 Velocidade de hemossedimentação - na gota, 245 - na vasculite renal, 433, 435 Ventilação mecânica, 182 Verapamil - ajuste de dose na doença renal, 840 - características do, 795 - cuidados especiais, 840 - dose normal do, 840 - farmacocinética do, 840 - interação com ciclosporina, 467 - na inibição do metabolismo da ciclosporina, 794 - pós-transplante, 794 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Vias urinárias, obstrução das - radioisótopos para, 380 - renograma radioisotópico na, 376
1033
Índice Alfabético
Vidarabina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Vigabatrina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Vimblastina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 - síndrome da secreção inadequada de hormônio antidiurético e, 123 Vincristina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 - síndrome da secreção inadequada de hormônio antidiurético e, 123 Vipera russeli, peçonha de, 473 Vírus - da imunodeficiência - - adquirida após transplante renal, 976 - - humana, nefropatia associada ao, 445 - Epstein Barr - - e infecção pós-transplante renal, 978, 980 - - nefrite intersticial aguda por infecção por, 476 - infecção por, pós-transplante, 978 - púrpura de Henoch-Schönlein associada a, 435 - vasculite sistêmica causada por, 431 Vitamina -A - - intoxicação por - - - hipercalcemia na, 221 - - necessidade na insuficiência renal crônica, 850 - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - B2 para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - B6 - - deficiência de, e resposta a terapia com eritropoetina, 699
- - necessidade na insuficiência renal crônica, 850 - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - B12 - - deficiência de, e resposta a terapia com eritropoetina, 699 - - hiperuricemia associada a, 243 -C - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 -D - - deficiência de, síndrome de Fanconi e, 573 - - intoxicação por - - - acidose tubular renal associada a, 576 - - - hipercalcemia e, 220 - - - hipercalciúria e, 612 - - na homeostase - - - do cálcio, 215 - - - do fósforo, 225, 226 - - na insuficiência renal crônica, 666, 683 - - necessidades pós-transplante renal, 858 - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - - para doença - - - de Dent, 569 - - - óssea adinâmica, 727 - - para hipocalcemia, 218, 219 - - para miopatia urêmica, 711 - - para osteodistrofia renal, 726, 727 - - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - - para raquitismo hipofosfatêmico ligado ao sexo, 567 - do complexo B, para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - E para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - hidrossolúvel - - necessidades pós-transplante renal, 858 - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 855 - - para insuficiência renal crônica, 850 - - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - K para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 854, 855 - lipossolúvel - - para diálise peritoneal ambulatorial contínua, 855 - - para paciente sob hemodiálise, 851, 852 - metabolismo de pós-transplante renal, 857 - necessidade na insuficiência renal - - aguda, 845 - - crônica, 850 Volume - dos líquidos transcelulares, 94 - dos subcompartimentos extracelulares, 93 - extracelular - - alterações no, 135 - - depleção do, 146 - - - conseqüências, 148 - - - dados laboratoriais, 147 - - - diagnóstico, 146 - - - sinais e sintomas, 146, 147 - - - tratamento, 148 - - determinação do, 93 - - excesso do, 146, 150 - intersticial-linfático, 94 - plasmático, 93 Vômito
- depleção de sódio causada por, 146 - hipocalemia causada por, 200 - na cistinose, 561 - na galactosemia, 561 - na hipercalcemia, 222 - na infecção urinária, 492 - na intolerância hereditária à frutose, 561 - na nefrolitíase, 613 - na síndrome de Fanconi, 564 - na uremia, 674, 675 - no diabete insípido nefrogênico, 572 - por depleção de volume extracelular, 146 - por trombose de artéria renal, 520 - sede e, 101
W Warfarina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - hiperuricemia e uso de, 243 - para síndrome do anticorpo antifosfolipídio, 531 - para trombose venosa pós-transplante, 961 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840
X Xantinúria hereditária, 251 Xenoenxerto, 930
Y Yersinia, púrpura de Henoch-Schönlein por, 435
Z Zenapax para transplante renal, 953 - dose, 953 - efeito colateral, 956 Zidovudina - ajuste de dose na doença renal, 840 - cuidados especiais, 840 - dose normal da, 840 - farmacocinética da, 840 - miopatia pela, 173 - reposição após - - diálise peritoneal ambulatorial contínua, 840 - - hemodiálise, 840 - - hemofiltração arteriovenosa contínua, 840 Zinco - deficiência de, linfopenia durante diálise e, 701 - na insuficiência renal aguda, 846
Serviços de impressão e acabamento executados, a partir de filmes fornecidos, nas oficinas gráficas da EDITORA SANTUÁRIO Fone: (0XX12) 3104-2000 - Fax (0XX12) 3104-2016 http://www.redemptor.com.br - Aparecida-SP 1
2
3
4
5
6
7
8
9
10