REVISÃO SISTEMATIZAD SISTEMATIZADA A
Fisiopatologia da pré-eclâm pré-eclâmpsia: psia: aspectos atuais Physiopathology of pre-eclampsia: new insights
Mário Dias Corrêa Júnior 1 Regina Amélia Lopes Pessoa de Aguiar 2 Mário Dias Corrêa3 Palavras-chave Pré-eclâmpsia Hipertensão induzida pela gravidez Etiologia Fisiopatologia Mediadores da inflamação Inibidores da angiogênese Keywords Pre-eclampsia Hypertension, pregnancy-induced pregnancy-induced Etiology Physiopathology Inflammation mediators Angiogenesis inhibitors
Resumo
A pré-eclâmpsia, pré-eclâmpsia, principal causa de morte materna no mundo, é conhecida
como a doença das teorias. Nos últimos anos, diversos avanços na área médica permitiram aprofundar nossos conhecimentos sobre a sua etiopatogenia. Sabemos, atualmente, que fatores genéticos, como a interação entre HLA paterno e linfócitos NK maternos, estão envolvidos na origem da placentação deficiente, um dos principais fatores de risco da pré-eclâmpsia. Fatores imunológicos, como a f alha do estabelecimento da reação inflamatória tipo 2 na implantação do embrião, também poderiam dificultar a invasão trofoblástica. O conceito de que a pré-eclâmpsia não é uma doença única, mas um conjunto de doenças com manifestações clínicas comuns veio para ajudar na elucidação do problema. A pré-eclâmpsia é considerada, hoje em dia, um estado inflamatório com disfunção endotelial sistêmica. Nesta revisão, os autores compilam as teorias mais recentes sobre a fisiopatologia dessa doença tão intrigante.
Abstrac A bstract t
Pre-eclampsia, Pre-eclampsia, the leading cause of maternal death around the world, is also known as the disease of theories. Several developments in the last years allowed us to improve our knowledge over its etiopathogeny. It is known that genetic factors, as the interaction between paternal HLA antigens and maternal natural killer lynfocytes, are involved in the origin of incomplete placentation, one of the most powerful risk factors for the development of pre-eclampsia. Imunological factors, as the failure in the establishment of inflammatory Reaction type 2, at implantation time, could also difficult the trophoblastic invasion. The conception of pre-eclampsia as a group of diseases with a common set of clinical manifestations help us to further understand the problem. Pre-eclampsia is considered to be an inflammatory state with systemic endothelial dysfunction. In this review paper, the authors gather the most recent theories about the physiopathology of such intriguing disease.
1
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3
Professor adjunto do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); doutor em Medicina pela UFMG – Belo Horizonte (MG), Brasil Professora adjunta do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da UFMG; doutora em Medicina pela UFMG – Belo Horizonte (MG), Brasil Professor emérito do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais; professor titular do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (FCMMG); doutor em Medicina pela UFMG – Belo Horizonte (MG), Brasil
Corrêa Júnior MD, Aguiar RALP, Corrêa MD
Introdução
A hipótese da má adaptação imunológica
A pré-eclâmpsia continua ainda nos dias de hoje sendo a
Começando pela hipótese da má adaptação imunológica,
principal causa de morte materna e neonatal em todo o mundo.
é importante rever alguns dados epidemiológicos da préeclâmpsia: é mais comum em nulíparas (OR=2,42; IC95%=2,162,71)5 (B); é mais comum quando há mudança de parceiro e menor tempo de coabitação sexual entre os parceiros6 (B); o sexo oral e o sexo sem preservativo com o mesmo parceiro antes da concepção agem como fator de proteção7 (B); o risco é maior em gestações que ocorrem após inseminação artificial com sêmen de doador7(B).
Conhecida como a doença das teorias, faz com que a revisão da sua etiopatogenia seja sempre um desafio fundamental não apenas para estimular novas pesquisas, mas também para orientar as práticas clínicas. Assim, o objetivo desta revisão é discutir os aspectos atuais da etiologia e fisiopatologia da pré-eclâmpsia e suas possíveis implicações na prática clínica.
O papel da placentação
•
•
•
•
Desde o início do século 20, o papel da placenta é considerado
fundamental na etiologia da pré-eclâmpsia. Caracterizada como doença exclusiva da gestação humana, necessita da presença do trofoblasto, mas não necessariamente do feto, para se desenvolver,
exposição aos antígenos paternos aumentam o risco da doença.
uma vez que pode haver pré-eclâmpsia em gestações molares. Quanto
cobrir os mecanismos por meio dos quais essa má adaptação
mais massa placentária, maior o risco, fato que pode ser compro-
imunológica atua. Fazendo uma rápida revisão sobre os tipos de reação inflama-
vado pela maior frequência em gestações gemelares (OR=2,93; IC95%=2,04-4,21)1(B). Além disso, a única intervenção capaz
As pesquisas se voltaram, então, para a tentativa de des-
tória, é relevante lembrar que os linfócitos T estão envolvidos
de resolver a pré-eclâmpsia é a retirada da placenta. Esse dado
nas reações inflamatórias do tipo 1 e 2. Os linfócitos T CD4+
motivou alguns autores a propor a curetagem uterina rotineira em
são responsáveis pela reação inflamatória do tipo 2 que leva à
todos os casos de pré-eclâmpsia com o objetivo de eliminar todo
indução de imunidade humoral com formação de anticorpos e
o tecido trofoblástico o mais rapidamente possível 2 (B). Estudos da década de 1980 chamaram nossa atenção para a
à produção de vários tipos de interleucinas. Já os linfócitos T CD8+ serão responsáveis pela reação inflamatória do tipo 1 com
importância da invasão trofoblástica das arteríolas espiraladas na etiopatogênese da pré-eclâmpsia3-4(B). Durante a gestação
produção de interleucina 2, interferon gama, fator de necrose tumoral beta e imunidade celular8.
normal, as células do citotrofoblasto invadem as arteríolas espira-
Os linfócitos do tipo natural killer (NK) também são impor-
ladas, substituindo as células endoteliais, mimetizando um novo
tantes na gestação e serão abordados um pouco mais adiante.
endotélio e destruindo a musculatura da camada média dessas artérias. Essas modificações fazem com que a artéria aumente seu
Concentrando um pouco mais nas reações inflamatórias que ocorrem na gestação, Wegman et al ., em 1993, demonstraram
calibre e permita um maior aporte de sangue para a placenta. Na
que na gestação de evolução normal ocorre um predomínio da reação inflamatória do tipo 2 (RIt-2), que é responsável por
pré-eclâmpsia, essa invasão não vai ocorrer de maneira completa:
as artérias terão um calibre reduzido e o aporte sanguíneo para a placenta, consequentemente, será menor.
Mas porque a invasão trofoblástica ocorrerá de maneira deficiente nessas pacientes? Para responder a essa pergunta, foi realizada uma busca pelo PubMed por meio dos descritores: “pre-eclampsia”, “phisiology” e “phisiopathology”. Foram avaliados inicialmente os artigos de revisão publicados nos últimos cinco anos, num total de 189 artigos publicados na língua inglesa. As referências bibliográficas desses artigos também foram revistas em busca de outras publicações relevantes. A literatura atual aponta duas hipóteses principais para a implantação trofoblástica deficiente: má adaptação imunológica e incompatibilidade genética.
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Todas essas características sugerem que um tempo menor de
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estimular a invasão trofoblástica, sobre a reação tipo 1 (RIt-1), que tende a inibi-la. Já nas gestações de mulheres que desenvolveram pré-eclâmpsia, a reação inflamatória do tipo 1 foi a mais encontrada. Esses autores levantaram a hipótese que uma falha na mudança do perfil da reação inflamatória do tipo 1 para o tipo 2 poderia ser uma das origens das alterações que desencadeiam a pré-eclâmpsia9 (D). Pesquisas posteriores demonstraram que após a deposição
de sêmen na mucosa vaginal, ocorre uma reação pós-coital provocada pelo fator de crescimento β1, derivado da vesícula seminal, que gerará, por sua vez, uma reação inflamatória do tipo 210 (B). Esse fato levou Robertson et al . a concluírem que a reação inflamatória provocada pela deposição do sêmen na vagina
Fisiopatologia da pré-eclâmpsia: aspectos atuais
ou no trato gastrintestinal, no caso do sexo oral, programaria
Os NK representam 15% dos linfócitos circulantes, mas são
o organismo da mãe a reagir aos antígenos paternos com uma
70% dos linfócitos presentes na decídua no início da gravidez e na
reação inflamatória do tipo 2, o que contribuiria para limitar a
época em que ocorrem as ondas de invasão trofoblástica. No final da
reação do tipo 1 presente nas mulheres que desenvolvem préeclâmpsia11 (D).
gestação, a sua concentração no útero cai drasticamente 16 (B). Hiby et al . mostraram, em 2004, que quando um subtipo
A hipótese da incompatibilidade genética
específico dos NK, conhecido como AA, se ligava a um subtipo específico dos HLA-C, conhecido como C1, a produção das citocinas estimulatórias do trofoblasto era bem menor e essa
Quanto à hipótese da incompatibilidade genética, estudos epidemiológicos também mostram uma possível origem genética da pré-eclâmpsia: •
pacientes com história familiar positiva tem risco três vezes maior
de apresentar a doença (RR=3,4; IC95%=1,5-7,6) 12 (B); •
o risco de apresentar pré-eclâmpsia tem origem tanto materna quanto paterna, uma vez que o risco de uma paciente cuja mãe teve pré-eclâmpsia é três vezes maior (OR=3,3; IC95%=1,5-7,5) e o risco de quando o pai da gestação atual também nasceu de uma gestação com pré-eclâmpsia é duas vezes maior (OR=2,1; IC95%=1,0-4,3)13 (B);
•
existe também o chamado “homem de risco”. Se o cônjuge masculino já teve uma gestação anterior que resultou em PE, na gestação com nova parceira o risco de pré-eclâmpsia é 80% maior (RR=1,8; IC95%=1,2-2,6)14 (B). Vários genes já foram estudados na tentativa de identifi-
car pacientes com uma suscetibilidade maior a desenvolver
pré-eclâmpsia. Muitos desses genes mostraram, de fato, associação com a pré-eclâmpsia, mas a maioria deles é rara e o custo benefício de realização dessa pesquisa rotineiramente não compensaria. Para uma revisão sobre os genes envolvidos na etiologia da pré-eclâmpsia, os leitores interessados podem recorrer a Wilson et al .15 Pesquisas recentes apontam um possível envolvimento do sistema de reconhecimento de antígenos através dos antígenos leucocitários humanos ou HLA. Sabe-se que as células do nosso organismo apresentam esses antígenos em sua superfície, como parte do sistema de reconhecimento imunológico. Os três subtipos mais comumente expressados são os HLA A, B e D. As células do citotrofoblasto e do sinciciotrofoblasto não expressam os subtipos mais comuns, mas outros subtipos: o HLA C, G e E. Essa expressão diferenciada do HLA é fundamental para que a mãe não reconheça o feto como non-self e, dessa forma, não comece uma reação de rejeição aos tecidos f etais.16 Essas pesquisas mostraram que os linfócitos NK têm um papel fundamental na “aceitação” da gravidez. Eles se ligam aos HLA do citotrofoblasto e estimulam a produção de citocinas que, por sua vez, fornecerão a invasão trofoblástica 16 (B).
combinação específica de NK-AA e HLA-C1 era encontrada
mais frequentemente nas mulheres que desenvolviam préeclâmpsia. Como o gene que sintetiza o HLA é herdado do pai e o que sintetiza o NK é herdado da mãe, eles sugeriram que esse poderia ser um dos mecanismos envolvidos no padrão de herança genética da pré-eclâmpsia17 (B). Esses autores demonstraram, ainda, que os diferentes subtipos de HLA-C em combinação com os diferentes subtipos de NK poderiam estimular ou inibir a invasão trofoblástica em graus diferentes, reforçando a ideia de que a ocorrência da Pré-eclâmpsiadependerá também da compatibilidade genética do casal17 (B). Resumindo, a predisposição genética relacionada, principalmente, à interação entre os linfócitos NK da mãe e aos antígenos HLA do feto, assim como a má adaptação imune, relacionada ao pequeno tempo de coabitação sexual que influencia na baixa exposição materna a antígenos paternos, levando a uma falha na mudança de reação inflamatória do tipo 2 para o 1, induzem a uma invasão trofoblástica deficiente que será fundamental para estabelecer a sequência de eventos que culminarão em pré-eclâmpsia (Figura 1). O problema é que, como todos os que lidam com as gestantes no dia-a-dia sabem, a pré-eclâmpsia apresenta manifestações clínicas muito variáveis, desde uma doença grave com início precoce e acometimento fetal importante até uma doença leve de início tardio e sem comprometimento fetal significativo. Pré-disposição genética
Má adaptação imune
Mãe com NK tipo AA
Tempo pequeno de coabitação sexual
Feto com HLA tipo C2
Falha no balanço RIt-1 /RIt-2 Invasão trofoblástica deficiente
Pré-eclâmpsia
Figura 1 – Influência dos fatores genéticos e imunológicos na invasão trofoblástica
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Corrêa Júnior MD, Aguiar RALP, Corrêa MD
Além disso, a invasão trofoblástica deficiente, apesar de muito
Investigando quais seriam os fatores que poderiam levar
frequente, não é encontrada em todas as pacientes que apresen-
a essa reação inflamatória da gravidez, as pesquisas apontam
tam pré-eclâmpsia.
como possível responsável a apoptose das células da placenta
Os estudos epidemiológicos mais uma vez demonstraram que
com liberação na corrente sanguínea de microfragmentos de
mulheres que apresentaram algumas doenças prévias à gestação tinham um risco aumentado de desenvolver pré-eclâmpsia,
sinciciotrofoblasto, denominados pelos autores “debris placen-
independente de apresentarem invasão trofoblástica deficiente
tários”, que podem causar dano endotelial e podem ter também ação pró-inflamatória. Esses “debris”, que estão aumentados na
ou não, como no caso das diabéticas (RR=3,56; IC95%=2,544,99), das hipertensas (RR=2,37; IC95%=1,78-3,15), das
gestação normal e muito aumentados na pré-eclâmpsia, estimu-
obesas (RR=2,47; IC95%=1,66-3,67), das pacientes com SAAF
a elaboração de uma teoria que conectasse os dois tipos de pré-
(RR=9,7; IC95%=4,34-21,75)1 (B). Todas essas observações levaram Ness e Roberts a sugerirem,
eclâmpsia, a placentária e a materna.20 Segundo a hipótese dos “debris placentários”, a invasão
em 1996, que existiriam dois tipos de pré-eclâmpsia. Uma de origem placentária, que seria explicada pela invasão trofoblástica
trofoblástica deficiente e as doenças maternas com acometi-
deficiente, e uma de origem materna, que seria mais comum
então, promoveria uma destruição celular aumentada. Gesta-
em pacientes com doenças pré-existentes. Essas duas formas
ções com uma massa placentária aumentada, como gestações a
de pré-eclâmpsia teriam como mecanismo comum a indução
termo, gestações em mulheres diabéticas, gestações múltiplas
da hipóxia placentária e a disfunção endotelial sistêmica, que
e gestações molares, apresentariam, por sua vez, uma apoptose
18
levariam às manifestações clínicas da pré-eclâmpsia.
A hipótese da reação inflamatória exacerbada Em 1999, Redman, Sacks e Sargent, com base também nessas
observações concluíram que a invasão trofoblástica deficiente não era um fator fundamental para o desenvolvimento da préeclâmpsia, mas apenas um potencial fator de risco.19 Esse mesmo grupo propôs que o mecanismo que conectava as duas condições era a hipóxia placentária e a disfunção endotelial e que essas condições levariam às manifestações clínicas da pré-eclâmpsia por induzirem uma reação inflamatória sistêmica exacerbada. A reação inflamatória, por sua vez, contribuiria para a disfunção endotelial sistêmica, agravando ainda mais o quadro.19 Aprofundando um pouco mais nessa linha de pesquisa, esses pesquisadores foram capazes de demonstrar que tanto os granulócitos quanto os monócitos estavam muito aumentados nas mulheres com pré-eclâmpsia quando comparadas às gestações sem pré-eclâmpsia e às mulheres não grávidas. Além disso, os níveis desses leucócitos eram comparados aos de pacientes s épticos
lariam a reação inflamatória materna. Esses achados permitiram
mento vascular levariam à perfusão placentária reduzida, que,
maior das células placentárias em função do maior tamanho da placenta. Essas duas situações cursariam com maior liberação de “debris”, estimulando a resposta inflamatória sistêmica, a
disfunção endotelial e, consequentemente, a pré-eclâmpsia. Os casos que cursam com grave acometimento fetal poderiam, dentro dessa hipótese, ser explicados pelo estresse oxidativo placentário que ocorre na gestação com placentas de tamanho anormalmente pequeno.20 Ainda segundo essa hipótese de que a pré-eclâmpsia seria uma reação inflamatória exacerbada, alguns autores aproveitaram para sugerir que qualquer fator que contribuísse para desencadear a reação inflamatória poderia ser também o gatilho para o desenvolvimento da pré-eclâmpsia. Dessa forma, processos infecciosos poderiam ser a origem do estímulo que culminaria em pré-eclâmpsia, observação confirmada por estudos epidemiológicos que mostram risco aumentado de pré-eclâmpsia em pacientes com diversos tipos de infecção, tais como infecções do trato urinário (OR=2,5), infecção periodontal (OR=2,3), infecção por citomegalovírus (OR=3,89) e herpes (OR=3,57)21 (B).
A hipótese da disfunção endotelial sistêmica
que estavam internados em terapia intensiva. Eles demonstraram
que, mesmo na gestação sem pré-eclâmpsia, a concentração de
As hipóteses mais recentes classificam a pré-eclâmpsia como
células inflamatórias é superior às de mulheres não grávidas. Com isso, eles sugeriram que a gravidez, por si só, já é um
uma doença de duas etapas. A primeira etapa, pré-clínica, ocasionada pelos fatores mencionados anteriormente, e a etapa clínica, na qual as manifestações sistêmicas da doença levariam ao conjunto de sinais e sintomas conhecido como pré-eclâmpsia. O elo fundamental que liga essas duas etapas é a disfunção en-
estado inflamatório e que a pré-eclâmpsia poderia ser apenas uma reação exagerada, um extremo dessa reação inflamatória que ocorreria fisiologicamente na gestação.20
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Fisiopatologia da pré-eclâmpsia: aspectos atuais
dotelial sistêmica, e essa disfunção está intrinsecamente ligada a outra hipótese sobre a etiologia da pré-eclâmpsia: os fatores antiangiogênicos.22
•
Os fatores angiogênicos são secretados pelas células da placenta e pelos linfócitos NK na decídua materna. Os principais fatores envolvidos são o fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF) e o fator de crescimento placentário (PLGF). Esses fatores, além de estimularem o surgimento de novos vasos, terão o papel fundamental de manutenção da estabilidade do endotélio e de reparação de lesões endoteliais. Esses fatores
pré-eclâmpsia-like, com hipertensão e proteinúria em pacientes do sexo masculino; a nicotina diminui a produção do sFlt-1, o que poderia indicar o mecanismo pelo qual as fumantes apresentariam incidência menor de pré-eclâmpsia. O descobrimento dos fatores antiangiogênicos estimulou,
também, o surgimento de uma nova hipótese sobre a etiologi a da pré-eclâmpsia: a hipótese do conflito de interesses entre a mãe e o feto. Segundo essa hipótese, a perfusão placentária
exercerão suas funções através da ligação com receptores presentes
diminuída levaria à hipóxia fetal e à nutrição fetal deficien-
na superfície das células endoteliais, conhecidos como Flt-1 ou
te. O feto, por sua vez, ao tentar melhorar sua oxigenação e
23
fms-like tirosino kinase do tipo 1. Maynard et al . demonstraram, em 2003, que na pré-eclâmpsia,
nutrição, liberaria os fatores antiangiogênicos para provocar uma hipertensão na mãe, o que poderia melhorar a perfusão
apesar de a concentração dos fatores angiogênicos estar aumen-
placentária.16
tada, eles não se ligam aos receptores porque a concentração de
A disfunção endotelial sistêmica produz as manifestações
uma variedade do receptor, que é o receptor solúvel ou sFlt-1,
clínicas da pré-eclâmpsia. O aumento da permeabilidade endotelial levará ao surgimento do edema e da proteinúria. A agregação plaquetária aumentada estimulada pelo endotélio disfuncional levará a distúrbios de coagulação e à alteração na relação tromboxano-prostaciclina que, juntamente com a não perda da reatividade vascular e com o estímulo ao sistema renina-angiotensina, induzirá a hipertensão.25
está muito aumentada. Esses receptores solúveis se ligariam aos fatores angiogênicos, impedindo a sua ligação com os receptores endoteliais e diminuindo sua ação.23 Pesquisas subsequentes confirmaram uma concentração
aumentada dos fatores antiangiogênicos nas mulheres com pré-eclâmpsia, demonstrando que a concentração desses fatores era mais elevada nos casos de pré-eclâmpsia em gestações prétermo do que nos casos à termo e, também, que esses fatores já estavam elevados na corrente sanguínea algumas semanas antes do início da pré-eclâmpsia clínica. Assim, os autores sugeriram que tais fatores poderiam ser utilizados como preditores da pré-eclâmpsia.24 (A) Outro fator avaliado nesse mesmo estudo foi a endoglina solúvel (sEng), outro potente antiangiogênico que mostrou correlação semelhante à do sFlt-1. Essa pesquisa mostrou, ainda,
Conclusões As evidências atuais indicam que fatores genéticos, como a
interação HLA-NK, somados a fatores imunológicos, como a falha na mudança da reação inflamatória do tipo 1 para o tipo 2, possivelmente relacionada à baixa exposição aos antígenos paternos e à reação inflamatória pós-coital estimulada pelo fator de crescimento β1 derivado da vesícula seminal, assim
que, quando os dois fatores estavam presentes, o risco era 30
como doenças maternas pré-existentes e, até mesmo, infecções,
vezes maior do que quando apenas um deles era encontrado, o que mostra uma potencialização do efeito24 (A).
levarão a um processo de placentação deficiente e ou a uma hipóxia placentária. Essas alterações na placentação estimulam
Outros aspectos realçam a importância dos fatores angiogê-
uma reação inflamatória exacerbada e uma disfunção endoteli al
nicos e antiangiogênicos na pré-eclâmpsia: •
o VEGF induz a produção de óxido nítrico e prostaciclinas
•
que, por sua vez, diminuem o tônus vascular e a PA; estudos experimentais que utilizaram o sFlt-1 em ratas
•
induziram o surgimento de endoteliose glomerular, lesão característica da pré-eclâmpsia; o VEGF foi capaz de recuperar a endoteliose vascular, a lesão
sistêmica através da liberação de “debris placentários” e de fatores antiangiogênicos que resultam em manifestações clínicas reconhecidas como pré-eclâmpsia (Figura 2). Pontos principais e possíveis aplicações na prática clínica são: •
atualmente, as principais teorias envolvidas não são excludentes e parecem se complementar em uma tentativa
característica da pré-eclâmpsia, em estudos experimentais; •
inibidores do VEGF que foram utilizados em tratamentos experimentais para câncer por diminuírem a neovascularização, levaram ao surgimento de uma sintomatologia
a pré-eclâmpsia continua sendo a doença das teorias mas,
•
de compreensão da etiologia e da fisiopatologia dessa doença; a pré-eclâmpsia não é uma doença única, mas um grupo de doenças com manifestações clínicas comuns;
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Fatores
Fatores
Doenças
Placenta
genéticos
imunológicos
maternas
grande
Infecções
Invasão trofoblástica deficiente
CIUR
Hipóxia
Apoptose
placentária
aumentada
sFlt-1 e sEng
Debris
Reação inflamatória
Disfunção endotelial
sistêmica
Manifestações clínicas
Figura 2 – Fisiopatologia da pré-eclâmpsia
•
a invasão trofoblástica deficiente é um fator de risco importante, mas não condição indispensável;
•
o rastreamento sistemático e o tratamento precoce de infecções
durante a assistência pré-natal, principalmente infecções do
•
as incompatibilidades genética e imunológica estão envolvidas
trato urinário e periodontais podem ter impacto na redução da pré-eclâmpsia?
•
na etiologia da invasão trofoblástica deficiente; a reação inflamatória sistêmica e a disfunção endotelial gene-
•
•
avaliar a utilidade do rastreamento de pré-eclâmpsia em
ralizada estão envolvidas na fisiopatologia das manifestações
mulheres com doenças pré-existentes (diabetes, hipertensão e
clínicas; os fatores antiangiogênicos como o sFlt-1 e a sEng e os “debris
outras vasculopatias), considerando que a invasão trofoblástica
placentários” são os principais suspeitos nessa ativação endotelial
da pré-eclâmpsia, pois nesses casos a utilização do Doppler
e inflamatória sistêmicas que ocorrem na pré-eclâmpsia.
de artérias uterinas no segundo trimestre de gestação para
deficiente não é o único mecanismo de desencadeamento
identificar mulheres que se beneficiariam do uso de baixas Destacam-se algumas questões para futuras pesquisas:
doses de AAS não parece ser útil.
Leituras suplementares 1. 2.
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FEMINA | Maio 2009 | vol 37 | nº 5
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A Natureza no Alívio da TPM SERM Modulador Seletivo de Receptores Estrogênicos 8,10
Reduz os sintomas físicos e psíquicos da TPM Promove equilíbrio estrogênio-progesterona Modula os níveis de prolactina
4,5,6
1,2,3,9
2,3
4.500 mulheres com TPM e Irregularidades
Menstruais, tratadas com Vitex por 3 ciclos: 1
90 %
1 a i c n ê r e f e R a d o d a t p a d A : e t n o F
relataram melhora ou
alívio completo
dos sintomas físicos e psíquicos 1
Melhora
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