RECUPERAÇAO DE EM PR ESAS U M A M Ú L TIT I P L A V I S Ã O D A N O V A LEI Lei 11.101/05 de 09.02.2005
FÁ TIM A B A Y M A DE OLIVEIR A
RECUPERAÇAO DE EMPRESAS UMAMÚLTIPL ÚLTIPLA A VIS VISÃO DANOVA LEI Lei 11.101/05 de 09.02.2005
P e a r s o n E d u c a t io io n
EMPRESA CIDADA
RECUPERAÇAO DE EMPRESAS UMAMÚLTIPL ÚLTIPLA A VIS VISÃO DANOVA LEI Lei 11.101/05 de 09.02.2005
P e a r s o n E d u c a t io io n
EMPRESA CIDADA
RECUPERAÇAO DE EMPRESAS UMAMÚL ÚLTI TIPL PLA A VIS VISÂO DA NOVALEI Lei 11.101/05de 09. 09.02.200 02.2005 5
Organizadora
FÁTIM FÁTIMABAYMADEOLIVEI OLIVEIRA RA
PEARSON
Prentice Hall São Paulo Brasil Brasil A rgentina rgentina C olômb ia Costa Rica Ch ile Espanha Espanha Guatem ala M éxico Peru Peru Porto Rico Venezu ela
°oorrnO
© 2006 by Pearson Education do Brasil
Todos os direitos reservados. Nenhum a parte desta pu blicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualqu er modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou m ecânico, incluindo fotocópia, g rava ção ou qualquer outro tipo de sistema de arma zenam ento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Pearson Education do Brasil. G ere nte editorial'. Rog er Trimer Co nsu ltor editorial: Eraldo Montenegro Editora de d esenvolvimento : Jo sie Rogero Editora de texto : Eugênia Pessotti Preparação: Márcio Delia Rosa Revisão: Maria Luiza Favret Capa: Alexandre Mieda Editoração eletrônica: Laser House
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Re cup eraç ão de em presa s : uma múltipla visão da nova l e i: Lei nQ11.101/05 de 09.02.2005 / organizadora Fá tima B aym a d e O liveira. — São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2006. Vários autores. Bibliografia. IS B N 85-7605-070-6 1. Falên cias - Leis e leg islação 2. Falê nc ias - Leis e legisla ção - Bras il 3. Rec up era ção judicial (Direito) - Leis e legislaç ão - Brasil I. Oliveira, Fátima Bayma de. II.Título. 06-0720________________________________________CDU-347.736(81 )(094.56) índices para catálogo sistem ático:
1. Brasil: Leis co mentad as: Falên cia: Direito comercial 347.736(81 )(094.56)
2006 Direitos exclusivos para a língua portuguesa ced idos à Pearson Education do Brasil, uma empresa do grupo Pearson Education Av. Ermano Marchetti, 1435 C E P 05038-001 - Lapa - São Paulo - S P Tel.: (11) 2178-8686 - Fax: 3611-0444 e-mail:
[email protected]
S u m á r io
A p re sen ta ção ..........................................................................................................................
vn
Prefác io .................................................................................................................................. Introdu ção ..............................................................................................................................
ix xi 1
CAPÍTULO C o n s t r u in d o
u m
r ef e r en c ia l
Um a reflexã o in ic ia l.................................................................................................. N
Lu
f w t o n d e
c c a
Pre ven çã o de crises e recu peraçã o de e m p re sa s ................................................... J o
r g f .
Q
r g e
Lo
21
bo
Responsabilidade dos administradores na nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas .............................................................................................................. A
7
u f ir o z
Recuperação judicial da em p res a ........................................................................... J o
2
dalblrto
S
imão
F i l h
25
o
Capítulo
31
Ref l ex õ e s a p ar t i r
d a
l ei
n
- 1 1 .1 OI / 0 5
O impacto econô m ico da nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas . . . A
l o ís io
Pe ss o a
d e A r a ú / o
e
Br
u n o
F u
n c h a l
A nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas — pe rsp ectiv as .................. A
n t o n io
C a
r l o s
E s
il v l s
T o
n t o n io
C a
r d o s o
T o
r l o s
H
46
r o
O pap el do pode r jud iciá rio na ap lica çã o da Lei 11.101/05 ............................... C a
43
r r l s
Recuperação de empresas: interesses e posicionamentos na negociação .......... A
32
e n r i q u e A b r ã o
51
vi
Sumário Reflexões sobre a nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas e sua racio na lida de ec on ôm ica ........................................................................................ Dan
K. G
ie l
o l d b ír g
A importância das novas regras de prioridade da falência para a go vernan ça dos credores ........................................................................................ E d
C
u a r d o
Lu
56
61
n d b l r c
67
a pít u l o
A p r ec ia n d o a
L ei C o m p l e m e n t a r
n
- 11 8 / 0 5
Lei com plem entar n ° 118/05 e seusreflexosna recuperação de empresas ......... O
68
s m a r S i m õ e s
Artigo 3fi da Lei Com plem entar n~ 118/05: prazo para pedir devo luçã o de tr ib u to ....................................................................................................................
71
C o n d o r c e t R e z e n d e
C a p ítulo J
k
_ 77
A b o r d a g en s e st r a t é g ic a s
Gestão das micro e pequenas empresas no Brasil: desafiose perspectivas ........... A
n d r (
S i l v a S p ín
78
o ia
Estresse empresarial no Brasil e a nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas ..............................................................................................................
84
/STVAN KA RO LY KA SZ NA R
Aspectos relevantes do instituto da recuperação judicial e necessária m ud an ça cu ltural ...................................................................................................... L u i z F e r
V a l e n t e
n a n d o
d e
Pa i v a
Fundos de investimen tos em empresas em re cu p era çã o ....................................... Luiz Leo
C a n
n a r d o
c ia n o
V i v e i r
ia
99
o s
O instituto da falên cia no novo regime brasileiro ................................................. F i a v
96
t id i a n o
A nova Lei de Falênc ia e Recu peraç ão de Empresas e a CLT — conflitos de in te rp re ta ção.............................................................................................................. Lu
89
S a r a i v a A y d
e
C is e l a P im e n
ta
C a d
101
e ih a
Pequenos negócios, empreendedorismo e a nova Lei de Falência e Rec upe raçã o de Empresas: cons ideraçõe s sobre o Brasil con tem porân eo ......... 105 F á t i m a B a y m a
e
F r
a n c is c o
M
arcelo
Da
r o n e
C a p ít u l o Es t u d o
11 3
d e
c a s o s
O cas o P a rm a la t........................................................................................................ J o
el
L l j í s T h
o m a z Ba st o s
Nova lei brasileira de Falência e Recuperação de Empresas: uma comparação com as normas internacionais ........................................................... G
o r d o n
114
W . J o
h n s o n
117
A pr es en t a ç ã o
ossibilitar aos profissionais do sistema p rodutivo as necessárias percepções para con duz ir a gestão dos seus negó cios em conson ância com as exigências da nova Lei de Falência e Recup eração de E m presas significa garantir os conh ecime ntos necessários para um a gestão mais com petente. Os questionamentos prom ovidos pelo aum ento da densidade de um regim e jurídico de insolvência são m uitos e comp lexos. O estabelecim ento de um sistem a norm ativo com reduzida simplicidad e, envo lvendo a interação finalística de diversas áreas do direito, traduz a existência de procedimentos operacionais que provocam intenso questionam ento quan to às melhores e mais justas soluções. Entende ndo que essa tem ática é relevante, na linha de sem inários asso ciado s aos instrumen tos legais que regem as em presas, a Fundação G etulio V argas, em parceria com a Federação das Indú strias do Estado d o Rio de Janeiro (Firjan), agiram proativam ente, garantindo a realização de evento v oltado para a falência e recupe ração de em presas. A associação da experiência acadêm ica da Fundação Getulio Vargas com o que pensam os mais ilustres profissionais da área permitiu que, durante dois dias, acontecesse o s e m i n á r i o n a c io n a l " N o v a L e i d e R e c u p e r a ç ã o d e E m p r e sa s : A s p e c t o s Ju r í d ic o s , G e s t ã o Em presarial e Turnro und". Exp lorando o m odelo o rganizacional já vitorioso, nesse sem inário, dos encontros orais foram gerad os, med iante gravação seguida de transcodificação, os textos que integram este livro. Um a comp reensão im ediata da lógicaestruturação que suporta a organização da obra pod e ser obtida pela leitura dos seus principais objetivos:
P
• conh ecer os conteú do s que definem o cenário no qual se aplicará a nova lei; • explora r aspectos diversos da nova lei, am pliando as percepções sobre sua impo rtância; • apre ciar a Lei C om plem enta r nü 118/05; • trabalha r variaçõ es estratég icas influen ciada s pela no va lei; • ap reciar casos concretos.
viii
Apresentação
Este livro está dividido em cinco capítulos, nos q uais se acham inseridos os artigos de cada orador. Cada capítulo define um a com binação de tem ática entre os artigos nele alocados. A ssim, o Capítulo 1, intitulado "C on struind o um referencial", busca o ferecer ao leitor os elem entos que ajudam a com por o cenário pro du tivo, objeto da ap licação da nova lei. Oferecem v aliosa contribuição nesse capí tulo N ew ton de Lucca, Jorge Qu eiroz, Jorge Lobo e A dalberto Simã o Filho. O Cap ítulo 2, "Re flexõe s a partir da Lei nü 11.101/05", m ediante a seleção de aspectos distintos, possibilita obs ervar a aplicação da lei por diferentes óticas. Nesse capítulo, vam os apreciar a prestim osa colaboração de A loísio Pessoa de A raújo, Bruno Funchal, Antonio Carlos E steves Torres, A ntonio Ca rdoso Toro, Carlos H enrique Abrão , Daniel K. Goldberg e Eduardo Lund berg. O Cap ítulo 3, "A precian do a Lei Co m plem entar nü 118/ 05", objetiva apreciar aspectos específicos da Lei C om plemen tar nQ118/05 com as com petentes abordagens de O smar Simõ es e Co ndorcet Rezende. Um conjun to de diferentes aspectos de caráter estratégico mereceu d iferentes abordagens nos textos de André Silva Spínola, Istvan Karoly Kasznar, Luiz Fernando Valente de Paiva, Luiz Leon ardo C antidiano, L uciano V iveiros, Fia via Saraiva Ayd, Gisela Pimen ta Ga delha, Fátima Baym a e Francisco M arcelo Barone, integrando o Capítulo 4, " Abo rd agen s estratégicas". Finalmente, o Capítulo 5, "Estudo de casos", aborda situações concretas extraídas da realidade , nos com petentes textos de Joel Luís Thom az Bastos e Gordon W. Johnson . Cab enos destacar a ajuda incansável de F ernanda dos Santos Silva, Jane Lacerda Leo poldino e M arcelo Souza dos Santos p ara a realização dos serviços de redação de cartas, atendim ento telefônico, inscrição, redação e apoio no evento, a que m ag radecem os pela paciência e deno do em tornar real a conjun ção de tantas pessoas em tão pouco tem po. É também da maior relevância registrar que o seminário, e sobretudo este livro, não pod eriam existir sem o patrocínio e apoio generoso, aberto e destacado das im portantes organizações: Firjan, IBGT, Finep, Sebrae, Bradesco, Divulgar, Emerj, Varig, Pricewaterhouse Coopers, Pinheiro Neto Advo gados, OA BRJ, M otta Fernand es Adv ogados. Por fim, agradecem os a todos os que contribuíram de um a forma ou de outra para tornar esta obra um a realidade. D esejamo s a todos um a interessante e profícua leitura! Fátima Bayma
[email protected]
P r e f á c io
arantir a geração de riq uez as e prom over a criação de em pregos constituem os pilares de um em preendimen to produtivo.
G
Um dos grandes m éritos da nova Lei de Falência e Recu peração de Em presas é a prioridad e d ada à m anutenção da em presa e dos seus recursos produtivos. N esse sentido, a nova lei, ao sub stituir a conco rdata pela recuperação judicial ou extrajudicial, aum entou a abrangência e a flexibilidad e nos processos de recuperação de em presas, por meio d e alternativas para superação d as dificuldades eco nôm icas e financeiras pela empresa deve dora. Com o conseqüê ncia, os emp regos, os pagam entos aos credores e as dem ais funções sociais da em presa são preservado s. Assim, enquanto o Decretolei n2 7.661/45 tinha por objetivo primordial proteger os interesses envolvidos na relação credordeved or, a lei ora vigente possibilita que as em presas em crise voltem a tornarse com petitivas, de forma a contribuir para o desen volvim ento da eco nom ia, beneficiando a sociedade com o um todo. Outro aspecto introduzido pela nova lei, fundam ental para a econom ia do país, diz respeito à celeridade do pro cesso falimentar, possibilitand o até mesm o a den om inada 'realização do ativo antecipada'. No regime do decreto lei, o referido processo arrastavase por m uitos anos, provocand o a ruína do patrim ônio da em presa falida, a desistência por parte de investidores, enfim, enorme prejuízo social. Recuperação de empresas: um a m últipla visão da nova lei traz para o universo d os profissionais env olvidos o pronun ciamento de esp ecialistas que, a partir de seu conhecim ento e experiência, proporcionam a plena com preensão da nova Lei nQ11.101, de 9 de fevereiro de 2005. E d u a r d o E u g ê n i o G o u v ê a V i ei ra
Presidente da Firjan
PÁG INA EM BRANCO
In t r o d u ç ã o
pós longa tramitação no Cong resso Na cional, foi sancionad a e encon trase em plena vigência a Lei ny 11.101/2005, que cuida da recu peração d e em presas e sub stitui a antiga e ultrapassada Lei de Falências e Concord atas. A Fundação Getulio Vargas (FG V), em parceria, faz p ublicar o livro Recupera çã o de em presas: uma m últipla visão da nova lei, levando ao leitor as reflexões e com entários de um diversificado conjunto de pr ofessores e especialist as no tema, po sicionando s e a acad emia com o urna rastreadora atenta dos desafios que em ergem dos diversos segm entos da e c o n o m i a e o r g a n i za n d o , a r t ic u l a d a m e n t e , o s c o n te ú d o s q u e p o s s ib i li ta m a a m p l a c o m preensão dos nov os cenários, ao se unir aos nom es mais notáveis do segmen to considerado, prod uzindo com o resultado a con strução d e atividade s e textos de fo rte pod er didá ticoprofissional. N ão há d úvidas, no m eio emp resarial e acadêm ico, de que a Lei nc 11.101/2005 trouxe impo rtantes e m odern izantes nov idades que em m uito irão con tribuir para a redução do risco de crédito, para a adeq uad a p roteção do s direitos trabalhistas e credit órios, ao m esm o tempo viabilizando a recuperação de e mp resas e m d ificuldade s conjunturais. É nossa esperan ça qu e o livro seja nã o apenas esclarecedo r aos agentes que d ele farão uso — e m especial os integrantes do Pod er Judiciário, os empresários, os negociado res e os credores — com o também aos estudan tes de direito, econom ia e finanças.
A
Sérgio
F. Q u i n t e l l a
Vice-presidente Fundação Getu lio Vargas
C a pít u l o
1
C o n s t r u in d o UM
R E FE R E N C IA L
U m a r e f le le x ã o i n i c i a l
Newton de Lucca Prevenção de crises e recuperação de empresas
Jo rge rg e Q u ei ro z Recuperação judicial da empresa
jo rg e Lobo Lo bo Responsabilidade dos ad m inistrado es na n ov a Lei Lei de de Fa lênc ia e Recuperação de Empresas
Adalberto Simão Filho
U ma
r e f l e x ã o in ic ia l
Newton de Lucca
P
or mais inacreditável que possa parecer, parecer, foi dada à estam pa, em ed ição extra do Diário Oficial da União do União do dia 9 de fevereiro de 2005, a Lei nü11.101, nessa mesma data sancionada, reformando o combalido — e poderseia mesmo dizer, em tom de bla gue, gu e, falido — falido — direito falimentar brasileiro. Digo inacreditável porque, depois de numerosas iniciativas iniciativas malogradas ao longo de tanto tempo, mu ito poucos poderiam ter certeza de que o velho Decretolei nü7.661, de 1945, pudesse ser substituído pelo Projeto de Lei nü 4.376/93, de autoria do dep utado federal do Rio Grand e do Sul, Dr. Dr. Osvaldo Osvald o Biolchi, que já trami tra mitav tavaa havi ha viaa mais ma is de dez de z anos an os no Parla Pa rlam m ento en to Nacio Na ciona nal.l. Ninguém jamais pôs em dúvida o meritório esforço dos consagrados juristas nacionais que fizeram nascer aquele velho diploma. Com efeito, para a época em que veio a lume, o anteprojeto então elaborado pela Comissão de Notáveis, presidida pelo ministro interino da Justiça, Dr. Alexandre Marcondes Filho, e composta pelos eminentes professores Canuto Mendes de Almeida, Filadelfo Azevedo, Hahnemann Guim arães, Luís Lopes Coelho, Noé Azevedo e Sylvio Marcondes, significava grande avanço. Mas aquele texto envelhe cera muito rapidamente rapid amente em razão de v ários fatores que serão mostrados a seguir seguir.. Assim, era natural que o c lamor doutrinário no país — extremamente visível a partir da década de 1960 — , no sentido de que se fazia necessária a reforma de nosso direito falimentar, fosse ganhando cada vez mais corpo, embora tenha se revelado absolutamente inócuo, por prolongado período. Nem poderia ser de outra forma. Nossa doutrina jurídica, em que pesem os grandes nomes que a engalanaram e a engrandecem até hoje, nunca teve o condão de influir decisivamente nos movim entos reformistas de qualquer espécie. Sempre foram outros interesses mais fortes, muito bem representados pelas oligarquias dominantes — ou bem pelos poderes poderes político ou cultural detidos por algumas figuras espicaçadas pelo demônio da v aidade —, que impuseram a permanência ou a mudança de uma determinada disciplina normativa. M as a doutrina jamais logrou fazer isso... isso... Mesm o agora — é necessário que se diga, a bem da verdade —, a nova lei não foi o resultado de uma reivindicação doutrinária, fruto dos candentes apelos oriundos dos mais expressivos juristas nacionais, mas sim uma opção feita pelos dirigentes da política econômica do governo Lula. Não fosse isso, a subsistência do Decretolei nü7.661/45 por mais al
Um a reflex reflexão ão inicial
3
guns anos seria absolutamente inevitável, consoante m ostrou a nossa história mais recente, recente, a despeito dos reclamos doutrinários em sentido contrário... Assim é que, já na década de 1970, 1970, dissera o eminente professor Fábio Konder Com parato, com a propriedade de sempre: O mínimo que se pode dizer nessa m atéria é que o dualismo no qual qual se encerrou o nosso Direito Falimentar — pr — prot oteg eger er o inter in teres esse se pess pe ssoa oall do deve de vedo dorr ou o inte in tere ress ssee dos credores — credores — não é de m olde a propiciar soluções soluções harmoniosas no plano geral da economia. economia. O legislador parece desconhecer totalmente a realidade da empresa, como com o centro de múltiplos interesses — interesses — do empresário, dos em pregados, dos sócios capitalistas, dos credores, do Fisco, da região, do mercado em geral — geral —,, desvinculandose da p essoa do empresário. empresário. De nossa parte, parte , consideramos que uma legislação moderna da falên cia deveria dar lugar à necessidade econômica da permanência da empresa. A vida econômica tem imperativos e dependências qu e o Direito não pode, nem deve, desconhecer. desconhecer. A continuidade e a permanência das empresas são um desses imperativos, por motivos de interesse tanto tanto social soc ial quanto econômico.1 Igualmente o saudoso professor Rubens Requião, um dos paladinos m aiores da reforma, numa num a conferência proferida no Instituto dos Advogad os Brasileiros Brasileiros,, no Rio de Janeiro, em 8 de março de 1974, destacara com idêntica precisão: Mui M uito to ma mais is que qu e o Códig Có digoo Civil Civ il e do que qu e o Código Cód igo de Proces Pro cesso, so, tanto tan to quanto qua nto,, sem dúvida, o Código Penal e o Código de Processo Penal, se evidencia e se impõe im põe a reforma da da lei falimentar. A falência falênc ia e a concordata, como institutos jurídicos jurídicos afins, na denúncia de empresários e de juristas, se transformaram em nosso país, país, pela obsolescência obsolescência de seus sistemas legais mais do que nunca, em instrumentos de perfídia perfídia e de fraud fra udee dos inescrupu inescrupu losos. losos. As autoridades perm anecem, infelizm ente, insensíveis a esse clamor, como se o país, em esplêndida explosão de sua atividade mercantil e capacidade empresarial, não necessitasse de modernos e funcionais funcio nais instrumentos instrumentos e mecanismos legais legais e técnicos técnicos adequados à tutela tutela do crédito, fato fa torr essencial para o seguro desenvolvimento econômico nacional nacional.. E, assim, continuará a viger, até o dia 9 de junho de 2005, o velho diploma normativo de 1945, calcado na figura do comerciante individual, inegavelmente meritório para a época em que foi editado, como já salientado,2mas inteiramente anacrônico para a realidade econômica do presente, na qual o papel da empresa moderna veio preponderar de forma definitiva sobre aquele que fora desempenhado pelo antigo comerciante. comerciante. Com efeito, ninguém que tivesse um mínimo de sintonia com a realidade da empresa — concebida como a atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços, tal como constara da definição do empresário no art. 2.082 do Código
1 Aspectos jurídicos da macroempresa macroempresa.. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1970, p. 102. : Razão assistiu, por certo, ao então ministro interino interi no da Justiça, Alexandre Marcondes Filho — em substituição ao titular daquela Pasta, o Dr. Francisco Campos —, ao afirmar, na Exposição de Motivos anexada ao texto do anteprojeto encaminhado ao presidente da República (e que se converteria mais tarde no Decretolei n“ 7.661/45), 7.661/45), estar certo de que, "decretando "de cretando uma lei elaborada por grandes valores jurídicos e após um longo período de consulta a todos os interessados, Vossa Excelência prestará inestimável serviço à vida econômica do país". Para a época em que foi editado, sem dúvida, terá prestado mesmo.
4
Capítulo 1
Construindo um referencial
Civil italiano, e como consta agora no art. 966 do nosso novo Código Civil de 2002 — poderia deixar de aplaudir o impulso reformista, fossem quais fossem as limitações e as eventuais impropriedades dos textos que já tramitaram no Congresso Nacional. Quero dizer, com tais considerações introdutórias, que o primeiro grande mérito do novo diploma legal que regula a recuperação ju dicia l a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária há de ser, com toda certeza — não obstante algumas de suas notáveis contradições —, a sua própria existência. A relevância do tema é deveras considerável, razão assistindo a Ascarelli, por certo, ao afirmar que "as normas sobre a insolvên cia do emjpresário comercial constituem um dos capítulos m ais importantes do direito comercial". Antes de encerrar estas breves considerações introdutórias, desejo justificar a minha afirmação no sentido de que a primeira virtude da Lei n~ 11.101/05 há de residir, sem dúvida, no próprio fato de sua existência. O instituto da falência é, na verdade, um dos mais importantes no âmbito do direito comercial, embora fosse exato dizer, com o nosso grande Carvalho de Mendonça,5 que ele extrapola os limites do direito mercantil, ainda que este tenha se tornado um direito empresarial, ultrapassando as nebulosas fronteiras do que se convencionou chamar de direito privado. Já em 1955, o gênio profético de Ascarelli houvera se apercebido da enorme defasagem dos vários institutos reguladores da crise econômica da empresa. No que se refere ao nosso Direito, as considerações do citado jurista não poderiam ser mais atuais e pertinentes. A influência marcadamente processualista de nossos institutos falimentares é por demais evidente, e a ela não terão ficado imunes nem mesmo juristas pátrios de renome, tais como C arvalho de Mendon ça, Miranda V alverde e Pontes de Miranda. Referida doutrina brasileira foi m uito influenciada pela visão de Salvatore Satta, um dos doutrinadores m áximos da índole processual da falência na Itália. No prefácio de sua famosa obra, entretanto, denominada Diritto Fallimentare, esse ilustre autor iria revelar, mais tarde, que aquela concepção rigidamente processualista da falência — que, antes, com tanto ardor, houvera defendido — foilhe parecendo, com o tempo, não correspondente à realidade. Convenceuse o grande jurista peninsular de que outros caminhos deveriam ser percorridos para o correto entendimento do instituto da falência, passando pelos seus fundamen tos econômicosociais e pela organização da sociedade em que o mesmo se in
Não difere muito, igualmente, a noção de empresa fornecida pelo Decretolei nu132, de 23 de abril de 1993, editado em Portugal, sobre os processos especiais de recuperação da empresa e de falência, conforme se pode ver no art. 2 desse texto: "Considerase empresa, para o efeito do disposto no presente diploma, toda a organização dos fatores de produção destinada ao exercício de qualquer atividade agrícola, comercial ou industrial ou de prestação de serviços". Corso di Diritto Commerciale. Milão, Giuffrè, 1962, p. 308. Tratado de direito comercial brasileiro, v. 7,5. ed., Livraria Freitas Bastos, 1954, p. 60, onde se lê: "Na verdade, o instituto da falência não se restringe aos domínios do direito comercial; penetra nos do direito público, do direito civil, do direito internacional público e privado, do direito criminal, do direito judiciário, em cada um dos quais vai buscar regras, preceitos e ensinamentos, tendo, muitas vezes, de modificálos, a fim de adaptálos ao grande meio de execução coletiva que trata de organizar. Inspirase ainda na ciência econômica, cujos fenômenos não lhe devem ser estranhos, na ciência financeira e na estatística, onde verifica a prova do resultado do seu funcionamento".
Um a reflexão inicial
5
sere. Era necessário, portanto, retomar os mo vimentos do conceito de empresa. São suas palavras: Per capire ilfaUimento io mi sono convinto che bisogna percorrere altre strade, ri salire aifondamenti economicosociali delVistituto, alYorganizzazione delia società in cui esso si inserisce: in una parola bisogna prendere le mosse dal concetto di impresa.6 Poderseia dizer, com efeito, com apoio na doutrina dominante, que uma análise crítica do conteúdo do nosso Decretolei nQ7.661, de 21.6.1945, ainda que singela, leva às seguintes conclusões sobre esse velho diploma: • não pôde ele refletir, em razão da época em que veio a lume, as conseq üências so cioeconômicas que o segundo conflito mundial provocou nas diversas economias do mundo; • dirigiuse fundamentalmente para o comerciante individual, descurando, quase completamente, da importância da empresa enquanto atividade economicamente organizada para a produção ou circulação de bens e de serviços; • não fez, pelo mesmo motivo do momento histórico em que foi editado, a necessária distinção entre empresário e empresa. Estabelecendo um esquema repressivo em relação ao primeiro, trouxe conseqüências desastrosas para a segunda, enquanto instituição social, com múltiplos interesses a serem preservados. As disposições constan tes dos artigos 140, inciso III, e 111 do texto legal são suficientes para demonstrar, por si sós, a evidência de tal assertiva;7 • voltouse, excessivamente, para regular a situação obrigacional entre devedores e credores, exacerbandose num processualismo tal que os formalismos estéreis e inconseqüentes culminaram por obnubilar quase que inteiramente a realidade econômica, de sorte que o próprio fim da lei — realização do direito dos credores — não logrou ser atingido; • subsistiu, na lei falimentar brasileira, em conseqüência das concepções anteriores, uma finalidade liquidatóriosolutória que é indisfarçável e que só deveria existir nos casos de completa inviabilidade da atividade empresarial. Exemplo: o sistema de impontualidade e não da insolvência (v. art. 1“ e art. 11, § 2Ü). A jurisprudência afirmara, inocuamente, que o processo falimentar não se constitui em meio de cobrança, mas
"Para compreender a falência, estou convencido de que é necessário percorrer outro caminho, voltar aos fundamentos socioeconômicos da instituição, à organização da sociedade em que ela se insere: em uma palavra, é necessário irse à origem do conceito de empresa/' Diz o inciso III do art. 140 do Decretolei nc 7.661 não poder impetrar concordata o devedor condenado por crime falimentar, furto, roubo, apropriação indébita, estelionato e outras fraudes, concorrência desleal, falsidade, peculato, contrabando, crime contra o privilégio de invenção ou marcas de indústria e comércio e crime contra a economia popular. O art. 111 desse mesmo diploma, por seu turno, estabelece que o recebimento da denúncia ou da queixa terá como condão obstar, até sentença penal definitiva, a concordata suspensiva da falência. Nesses dois exemplos citados, portanto, a punição ao empresário acarreta, por via oblíqua, uma sanção para a própria empresa. E como salientado, com a costumeira propriedade, pelo eminente e saudoso professor Nelson Abrão (Curso de direitofalimentar, 5. ed., 1997, p. 445): "Não há muita coerência num diploma que procura a responsabilização de ordem penal do empresário e de seus gerentes, uma vez que os delitos são estranhos à sorte da empresa, que deve seguir normalmente seu ritmo de atividade, provavelmente na diretriz de profissionais que exponham ao Juízo as dificuldades e o norte de eventual tendência recuperatória".
6
Capítulo 1
Construindo um referencial *
é assim que tem sido. E verdade que o critério da impontualidade continuou adotado pela nova lei em exame, mas de forma atenuada, m inimizando o caráter típico de meio de cobrança atualmente existente. Ao fixar um valor mínimo para o requerimento da falência (40 salários mínimos, conforme o inciso I do art. 94) e propiciar que a falência não seja declarada caso o devedor apresente o pedido de recuperação judicial no prazo da contestação (dez dias, segundo o art. 98), de acordo com o disposto no inciso VII do art. 96, supõese que o pedido de requerimento da falência venha a perder um pouco de seu poder coercitivo. Tratase de meras conjecturas... O legislador terá sido um pouco tímido, infelizmente, nessa tentativa de coibir a utilização da falência como m eio de cobrança ao permitir que os credores, nos termos do § 1~ do art. 94 da nova lei, reúnamse em litisconsórcio a fim de perfazer o limite mínimo para o pedido de falência com base na impontualidade do devedor. De toda sorte, parece que alguma melh ora deverá ocorrer... • subsistiram, igualmente, excessivos privilégios estabelecidos em favor do Fisco, de tal sorte que nem mesmo os credores com garantia real se sentem seguros no momento de concordar com a concessão do crédito. A mudança ocorrida, nesse particular, foi substancial, com a inversão da posição entre os créditos com garantia real e os créditos tributários, passando estes a ocupar o terceiro lugar na ordem de classificação dos créditos, cedendo o segundo lugar para os chamados 'créditos financeiros', consoante os termos do art. 83 da nova lei (incisos II e III). Todas essas circunstâncias, ainda que sum ariamente expostas, parecem levar à conclusão de que a nova lei falimentar — independentemente de sua real motivação, e sejam quais forem as suas limitações — haverá de trazer muitos benefícios à sociedade brasileira.* Dirseá, com razão, não se tratar da lei dos nossos sonhos... Não é, pelo menos, a dos meus so nhos... Mas ela está aí e será com ela que precisaremos trabalhar. Acertos e erros, afinal de contas, fazem parte de toda obra humana...
B r e v e c u r r íc u l o Nevvton de Lucca Mestre, doutor, livredocente e adjunto pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Desembargador federal do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3à Região. Membro da Academia Paulista dos Magistrados. Membro da Academia Paulista de Direito. * Diznos a respeito o saudoso professor Nelson Abrão (op. cit.), que tanto contribuiu para que o projeto de reforma de nosso direito falimentar não ficasse adstrito ao mesmo espírito e à mesma letra da lei vigente: "Destarte, a commums opinio, de modo geral, sem divagações, orientouse favorável à radical alteração que norteia o diploma em vigor, retirando seu espírito excessivamente processualista, para dotálo de forma procedimental con sentânea com a viabilidade econômica da empresa, e os planos que pretendem preservála, sem grandes saltos de qualidade, mas com logicidade e racionalidade indispensáveis aos organismos que atravessam períodos de crise".
Prevenção
d e c r is e s e
RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
Jorge Queiroz
A
s palavras Turnaround1e crise tornaramse comuns no diaadia das organizações. Gestão na adversidade e turbulência é um novo paradigma nas empresas — que veio para ficar. Gestão de negócios consiste cada vez mais em vencer adversidades oriundas da globalização, de períodos de desaceleração e de incertezas, de crises internacionais e domésticas, de escassez de capital e crédito, de custo de capital elevado — uma nova era no mundo dos negócios. Para muitos, palavras como 'insolvência' e 'estrangulamento financeiro' são sinônimos de fim de linha; essa interpretação é equivocada, pois o correto seria perguntar: "S erá esta uma oportunidade para transformar ou reestruturar a empresa?" Existem inúmeras experiências de casos dados como sem solução ou inviáveis que foram solucionados com pleno êxito. A DISCIPLINA DA RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
Com a finalidade de aperfeiçoar o conhecimento e preparo dos profissionais para lidar com esse novo paradigma e evitar que a crise se instale, ou solucionar aquelas já in staladas, ou mesmo aproveitar as oportunidades delas oriundas, vem se desenvolvendo no Brasil, ainda que timidamente, a atividade de 'médico de empresas' ou gestor interino, re cuperador de empresas, atividade já bastante consolidada nos países mais desenvolvidos. Tratase de profissionais experientes, preparad os para atuar na prevenção e solução de crises, mediante diferentes técnicas e medidas adotadas nos distintos estágios em que a empresa se encontra em um determinado momento, tanto na esfera não judicial quanto no âm bito da nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas.
1 Turnaround: correção de rumo; reestruturação; recuperação de empresas.
8
Capítulo 1
Construindo um referencial
A RECUPERAÇÃO DA EMPRESA Quando falamos de recuperação, de preservação de valores, de prevenção de crise, falamos automaticamente da necessidade de uma abordagem holística, mais abrangente, de gestão e governança. Quan do a crise se instala na empresa, o fator mais crítico é o tempo, ou melhor, a falta dele. Devese atuar simultaneamente com celeridade e eficácia sobre uma vasta e complexa rede de questões financeiras, jurídicas, fiscais, trabalhistas, estratégicas, operacionais, mercadológicas, contratuais, patrimoniais, societárias e familiares. Na grande maioria das vezes, o nó está localizado no estrangulamento financeiro, que ataca fortemente todo o sistema nervoso da empresa, deteriorando de forma exponencial sua saúde operacional e econôm icofinanceira. Dessa forma, a recuperação e readequação passa obrigatoriamente pela otimização do capital empregado no giro e nos demais ativos da empresa. Contrariamente ao que muitos acionistas controladores pensam, a solução quase sempre está dentro da empresa — desde que ações sejam tomadas em tempo hábil; é necessário fazer o trabalho de casa, pois é muito fácil e tentador iludirse com justificativas perdedoras e irresponsáveis, im putando a terceiros, credores e governo, problemas essen cialmente de má gestão. Gestão é o cérebro de toda a atividade empresarial, do qual deriva toda a sorte da empresa. Incapacidade ou despreparo gerencial podem selar o fim do negócio. É essencial saber quando e onde buscar ajuda; períodos de turbulência demandam o apoio de profissionais especializados em solução de crises, além de dotados de boa reputação e credibilidade no mercado. A utilização de assistência especializada e gestão interina vem crescendo bastante no Brasil, principalmente em situações de desgaste e falta de credibilidade. A NECESSIDADE DE MUDANÇA CULTURAL
O mais puro dos tesouros que um hom em p ode ter, É uma reputação imaculada.
Shakespeare (15641616) A atividade de recuperação de empresas é uma nova e complexa disciplina no Brasil. Seu sucesso demanda uma mudança cultural — maior conscientização da necessidade de uma gestão estratégica e inteligente, orientada para a perenização da empresa; da permanente necessidade de sua modernização e fortalecimento; reinvestindo suas riquezas operacionais para aumentar seu diferencial comp etitivo, e não sangrála. Requer a adoção de uma consciência preditiva e preventiva, uma mudança de comportamento e atitude. Com efeito, a diferença entre as sociedades pobres e as ricas não é a idade, tampouco os recursos naturais disponíveis. China, índia e Egito têm mais de dois mil anos e estão entre as nações com os maiores índices de pobreza do mundo. Por outro lado, Canadá, Austrália e Nova Zelând ia, que há 150 anos eram países inexpressivos, hoje são ricos e desenvolvidos. O Japão possui uma tímida área geográfica, 80 por cento montanhosa, inadequada para a agricultura e pecuária, mas ostenta a posição de segunda economia m undial. A Suíça, em seu pequeno território, cria animais e cultiva o solo durante apenas quatro meses do ano. Não obstante, fabrica laticínios da melhor qualidade. Detém uma imagem de segurança, ordem e trabalho que a transformou no caixaforte do mundo.
Prevenção de crises e recuperação de empresas
9
De igual forma, observamos que não há diferença intelectual e de capacidade de trabalho entre os executivos dos países mais e menos desenvolvidos. A etnia e a cor da pele tampouco são importantes, uma vez que im igrantes rotulados de preguiçosos em seus países de origem são a força produtiva em muitos países ricos. A diferença reside na atitude, nos princípios com portamentais, nos valores morais. Podemos citar algumas constatações que marcam essa diferença. As nações mais desenv olvidas cultivam os seguintes princípios de vida: • a ética, a verdade e a integridade como princípios básicos; • a observação ao princípio da interconectividade, da interdependência; • conduta responsável; respeito e aplicação das leis e regulamentos; respeito aos direitos de seus cidadãos; • o respeito aos princípios de igualdade, remunerando o trabalho mais e menos nobre com maior eqüidade; • o amor ao estudo, à pesquisa e ao trabalho; os Estados Unido s, sob forte influência do calvinismo, detinham já no século XVIII o invejável índice de alfabetização de 100 por cento, enquanto no Brasil este não chegava a 10 por cento; • o esforço pela poupança e pelo investimento; • o desejo de superação; • o repúdio à corrupção, à fraude, à impunidade e à ganância; • a estabilidade e clareza das regras; • impostos justos, com a devida contraprestação de serviços aos contribuintes pelo Estado;3 • fiscalização e cobrança de seus políticos; • estímulo à atividade produtiva; • respeito e preservação do meio ambiente. Mudança cultural inclui o entendimento do real sentido de riqueza, que reside na riqueza interior, de princípios e valores não monetizáveis. Da compreensão de que dicoto mias como zoinner takes ali (o vencedor leva tudo) e we are the champions, those are the losers (nós somos os vencedores, aqueles são os perdedores) são verdadeiras falácias. Existem fartas evidências que nos mostram que somos todos interdependentes, e que somos todos vencedores ou todos perdedores. A cultura da 'lei de levar vantagem em tudo' e do 'deixa pra
2 Apesar de ser um dos países mais ricos do mundo em recursos naturais, o Brasil ostenta um dos maiores índices de concentração de riqueza, de extrema desigualdade e exclusão social do planeta, onde quase a metade de toda a renda nacional (PIB — Produto Interno Bruto) está concentrada em apenas 10 por cento de seus 180 milhões de habitantes, conforme estudo do PNUD — Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Analisando os 20 por cento mais* pobres, o Brasil ficaria colocado na deplorável 115dcolocação entre os 177 países da pesquisa em termos de índice de Desenvolvimento Humano — IDH do PNUD. O indicador que mede a desigualdade é ainda pior e, por ele, o Brasil se encontra entre os piores do mundo, sendo o oitavo mais desigual do globo, na companhia de países em que existe grande miséria, como Namíbia, Lesoto e Suazilândia. 3 O Brasil possui a maior carga tributária do planeta, cuja participação em relação ao PIB dobrou nos últimos vinte anos, com a transferência do setor produtivo da economia para o improdutivo, chegando a 42 por cento do PIB.
10 Capítulo 1 i_« ■ ■ ■
Construindo um referencial
Hc
lá' condena um a empresa e uma sociedade ao fracasso. Só uma mudança comportamental nos fará preservar os negócios viáveis e contribuir para elevar o Brasil ao grupo das sociedades definidas como 'ricas/desenvolvidas'. A v a n ç o s d o n o v o in s t it u t o d a r e c u pe r a ç ã o j u d i c i a l
A nova Lei de Recuperação Judicial (Lei n* 11.101/05) introduz sem dúvida grandes avanços na esfera do direito concursal, acompanhan do uma tendência constatada principalmente na Europa e nos Estados Unidos de busca do equilíbrio entre a racionalidade econômica e a responsabilidade social, segregando a sorte da empresa da do empresário e priorizando a viabilização e continuidade do negócio. Esse novo diploma legal corrige uma grande distorção da lei anterior (Decretolei nü7.661/45) na medida em que os credores têm a partir de agora um papel m ais ativo nas decisões relativas ao processo recuperatório, incluindose o que tange à aprovação do plano de reabilitação e à escolha do administrador e do gestor judicial. Apesar de o primeiro ser inicialmente escolhido pelo juiz, este pode ser substituído pela assembléia de credores. Com efeito, os credores perdem a confiança no processo se há a participação de indivíduos vistos como tendo expertise ou independência limitadas. De igual forma, para desempenhar seu papel de maneira eficaz, é imperativo que o processo seja conduzid o com transparência e boa comunicação. Com a modernização do direito concursal brasileiro, o país afastase do injusto sistema patrimonialista, segundo o qual os fundadores ou acionistas controladores decidiam unilateralmente os desígnios da empresa. Em um semnúmero de ocasiões podiamse observar declarações do tipo "se me pressionarem, quebro a empresa". Sem dúvida, o legislador pátrio estava cônscio da necessidade de trabalhar em prol da justiça social e da empre gabilidade, mediante a preservação da atividade produtiva. A título ilustrativo, podemos citar o instituto da falência, disposto no C apítulo V da nova lei, que está agora subdividido em (i) afastamento do controlador com a continuidade do negócio, assegurandose assim a preservação da atividade econômica e de geração de empregos; e (ii) liquidação, que se dará naqueles casos em que o negócio não mais for viável. Contrariamente ao que muitos preconizam, a falência sob o novo ordenamento jurídico não corresponde à 'morte' da empresa. C o mit ê e a s s e mbl é ia d e c r e d o r e s
A nova lei introduz as im portantes figuras do com itê e da assembléia de credores. Além de facilitar o processo decisório, um comitê de credores eficaz irá exercer uma importante função na análise e negociação de um plano de reabilitação factível. A experiência demonstra que em circunstâncias nas quais existe um grande número de credores com interesses divergentes, um dos obstáculos mais críticos consiste na resolução de conflitos. A adoção de um único advisor financeiro facilita inequivocam ente a resolução de impasses. Uma das principais funções desse advisor é a de conseguir a adesão dos credores ao plano de recuperação. Adicionalmente, o comitê de credores pode auxiliar na melhoria do
Prevenção de crises e recuperação de empresas
11
fluxo de informações e em uma comunicação mais eficiente. As chances de sucesso de uma reabilitação aumentam conforme o plano de recuperação contemple os diferentes interesses econômicos dos credores. R ec u per a ç ã o ex t r a j u d ic ia l e ju d ic ia l
A nova lei introduz ainda a recuperação extrajudicial e judiciai, juntamente com um conjunto de diferentes meios e ferramentas recuperatórias. Existem vantagens e desvantagens estratégicas ejurídicofinanceiras nas diferentes alternativas. Estas devem ser analisadas criteriosamente e em tempo hábil, de sorte a evitar mais estragos. * E importante destacar que, apesar de a lei não impor nenhuma restrição de prazo ao plano de recuperação aprovado, para fins da mesma o devedor permanecerá em regime de recuperação judicial até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que vencerem até dois anos após a concessão da recuperação judicial. A d m in i s t r a d o r e g e s t o r j u d i c i a l
Outro importante avanço referese à criação das figuras do ad ministrador e do gestor judicial, que exigirão executivos seniores com qualificação e preparo distintos dos antigos comissários e síndicos. A d m in i s t r a d o r ju d ic ia l
O adm inistrador judicial atua tanto na recuperação judicial quanto na falência, e o gestor judicial, exclusivamente na recuperação judicial, quando do afastamento da adm inistração da empresa. Sem embargo, o devedor pode e deve contratar profissional ou empresa especializada em recuperação para assistilo na elaboração e execução do plano re cuperatório com o objetivo de demonstrar seu firme compromisso com a reabilitação da saúde da empresa e dar maior credibilidade ao processo, uma vez que a confiança dos credores em sua gestão na maioria das ocasiões está abalada. O perfil desses profissionais é o de gestor de crises, experientes na condução e solução de situações econômicofinanceiras adversas e complexas, dotados de sólida reputação e credibilidade. Esses profissionais conduzirão seus trabalhos com o apoio de outros profissionais, como advogados, contadores e outros que vierem a ser necessários. Na mesma linha, no que concerne ao administrador judicial, Fábio Ulhoa Coelho d estaca que [...] ele deve ser profissional com condições técnicas e experiência para bem desempenhar as atribuições cometidas por lei. Notese que o advogado não é necessariamente o pro fissional mais indicado para a função, visto que mintas das atribuições do administrador judicial dependem, para seu bom desempenho, mais de conhecimentos de administração de empresas do que jurídicos. O ideal é a escolha recair sobre pessoa com conhecimentos ou ex periência na administração de empresa do porte da devedora e, quando necessário, autorizar a contratação de advogado para assistilo ou à massa.4 1Fábio Ulhoa Coelho, Comentários à Nova Lei de Falências e de Recuperação de Empresas, p. 57.
12
IK —ÁM ■
Capítulo 1
Construindo um referencial
Destaca ainda que [...] o Administrador Judicial (que pode ser pessoa física ou jurídica) é o agente auxiliar do juiz que, em nome próprio (portanto, com responsabilidade), deve cumprir com as funções cometidas pela lei. Além de auxiliar o juiz na administração da falência, o administrador judicial é também representante da comunhão de interesses dos credores (massa falid a subjetiva) na falência. Exclusivamente para fin s penais, o administrador judicial é considerado funcion ário público. Para os demais efeitos, no plano dos direitos civil e administrativo, ele é agente externo colaborador da justiça, da pessoal e direta confiança do juiz que o investiu na fun ção.5 O administrador judicial supervisiona a operação do negócio, tecendo recomendações quanto à viabilidade do plano recuperacional, podendo em certas circunstâncias elaborar o plano, o que requer experiência em gestão e finanças. Para assegurar o conhecimento, preparo e integridade adequados por parte dos gestores, empresas em dificuldades, recuperadores de empresas e administradores e gestores judiciais, dando maior subsídio ao Judiciário e aos credores, os países desenvolvidos possuem uma entidade certificadora; no Brasil, o Instituto Brasileiro de Gestão e Turnaround (IBGT) está desenvolvendo essa certificação, denominada Certificado de Recuperador de Empresas (CRE). G est o r ju d ic ia l
Em casos de excesso, má gestão, fraude, ou também se fizer parte do plano de recuperação judicial, o juiz determinará a destituição da administração da empresa e convocará a assembléia dos credores para deliberar sobre a eleição do gestor judicial que assumirá a gestão da empresa, que estará sujeito a todas as normas sobre deveres, impedimentos e remuneração do administrador judicial: Ao gestor judicial compete dirigir a atividade econômica e implementar o plano de recuperação, após sua aprovação. Ele passa a ser o representante legal da sociedade deve dora nos atos relativos à gestão da empresa (assinatura de cheques, contratação de serviços, compra de insumos, prática de atos societários etc J . 6 O autor entende que [. ..] o gestor não se torna, porém, o representante da sociedade em recuperação para todos os fins. Nos atos relativos à tramitação do processo de recuperação judicial, a sociedade devedora continuará sendo representada nos termos de seus atos constitutivos. Assim, destituídos, por exemplo, todos os diretores, caberá aos sócios da limitada ou ór gão competente da anônima (Assembléia Geral de Acionistas ou Conselho de Adm inistração) a eleição dos substitutos. A esses competirá, por exemplo, apresentar o plano de recuperação (se ainda não havia sido apresentado), prestar informações ao administrador judicial ou ao juiz, apresentar os relatórios etc.
' Op. cit., p. 58. Fabio Ulhoa Coelho, op. cit., p. 178.
Prevenção de crises e recuperação de empresas
13
R em u n e r a ç ã o d o a d m in is t r a d o r ju d ic ia l
A questão da remuneração do administrador judicial foi outro avanço importante introduzido, uma vez que regulamenta claramente a questão. Dispõe que o juiz fixará o seu respectivo valor e forma de pagamento, observados a capacidade de pagam ento do devedor, o grau de complexidade do trabalho e os valores praticados no mercado para o desempenho de atividades semelhantes, até o máximo de 5 por cento do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou do valor dos bens na falência. O Decretolei n* 7.661/45 deixava muito a desejar a esse respeito. R es po n s a bil iz a ç ã o
O novo ordenamento jurídico recuperacional e falimentar dispõe que o adm inistrador judicial e os membros do comitê responderão pelos prejuízos causados à massa falida, ao devedor ou aos credores por dolo ou culpa, devendo o dissidente em deliberação do comitê consignar sua discordância em ata para eximirse da responsabilidade. Via de regra, esse dispositivo referese a atos de negligência, e deverá levar em consideração as difíceis circunstâncias em que o adm inistrador judicial se encontra no desempenho de seus deveres. Um padrão mais rígido tornaria difícil atrair profissionais qualificados para o exercício dessa complexa atividade. É importante ressaltar que os riscos legais do administrador judicial podem ser substancialmente reduzidos mediante a obtenção de aprovação prévia formal dos credores quanto aos principais atos a serem implementados. A PREVENÇÃO DE CRISES A despeito dos avanços introduzidos com a nov a lei, ela não deve ser vista como a cura de todos os males. Na verdade, todo o empenho deve ser feito para ficar fora dela — é como uma UTI: quem entra não sabe se vai sair vivo —, pois além de toda a morosidade gerada por um ambiente conflituoso, não se pode olvidar que os custos são bastante elevados e as conseqüências, negativas para o negócio. Existe ainda um grande estigma e preconceito com relação a empresas em dificuldades; ainda são tratadas como portadoras de doença contagiosa. Portanto, é inquestionável a necessid ade de agir preventivam ente e estar atento aos sinais de alerta, pedindo ajuda em tempo hábil, uma vez que é a alternativa mais eficaz e econômica. Um dos maiores pecados capitais dos empresários é pedir ajuda quando já é tarde demais. A experiência brasileira demonstra que recuperações na esfera judicial não são muito animadoras. Apesar dos avanços introduzidos com a nova Lei r r 11.101/05, esta corresponde a um instrumento jurídico de intenções; sua eficácia irá depender dos operadores da justiça e do direito, além das partes envolvidas. Sua eficácia demandará sem dúvida uma mudança cultural, na linha até aqui exposta. F u n d a m e n t o s d a r e c u p e r a ç ã o d e e mpr e s a s
Existem três desafios cruciais que devem ser observado s nos processos de reabilitação. São eles:
14
Capítulo 1
Construindo um referencial
• análise e definição do tipo de estrutura de recuperação mais adequada ao equacio namento do problema; • identificação das barreiras a serem superadas para permitir a obtenção da máxima criação de valor e equipe, devidam ente dotada de experiência em turnaround e de capacidade de execução; • definição de um plano de comunicação eficaz, envolvendo todos os stakeholders. Para tal é necessário: • • • • • • • • •
capacidade de identificar o problema; entender as causas fundamentais da crise da empresa; conhecer o objetivo estratégico do negócio; saber quando soar o alarme e pedir ajuda; saber se o problema pode ser sanado; entender que o desafio está nos detalhes; conhecer as medidas necessárias para realizar o turnaround; conhecer a competência da administração; conhecer os custos relacionados à execução do turnaround; entender as alternativas ao turnaround e os custos; • entender os objetivos dos diferentes stakeholders (credores, investidores etc.); • entender o valor a ser obtido de um processo de turnaround, incluindo a análise da venda parcial ou total do negócio ou mesmo sua liquidação. ✓
E igualmente importante entender que a recuperação da empresa via de regra produz mais efeito sob a gestão de um novo profissional com experiência em processos de turnaround, que além de possuir maior credibilidade não carrega laços ou barreiras emocionais. Entender que, se alguém colocou a empresa em dificuldades, não tem condições emocionais de liderar seu processo de recuperação; que os funcionários não seguirão seus passos com entusiasmo; que o conselho de administração, se houver, não permitirá; e que os stakeholders não o apoiarão. Entender que, quando um n egócio acumula déficits, credores, bancos e investidores assum em o direito de intervir no processo. Por seu lado, os especialistas em recuperação devem certificarse quanto à seriedade de propósitos e integridade dos controladores; de que possuem o apoio dos stakeholders; de que os controladores e stakeholders apoiarão a tomada de medidas radicais. No processo de recuperação de uma empresa, gerenciar é mais im portante que liderar. Gestão é trabalho hands on, escutar e identificar problemas. É estar na linha de frente. É ouvir mais que falar. Há que ter cuidad o com os x/es men, que concordam com tudo. Só gestão gera resultados. F a t o r e s a s e r e m c o n s id e r a d o s n a e s c o l h a d o t ip o d e
RECUPERAÇÃO Entre os aspectos mais importantes que devem ser analisados estão:
Prevenção de crises e recuperação de empresas
15
• g ravid ade da cris e : liquidez, grau de asfixia, natureza dos problemas do endivid amento financeiro e sua gravidade, existência de fraude, grau de exigüidade de tempo; • obrigações fiduciárias para com todas as partes envolvidas: nível e perfil do endividamento, liquidez e potenciais problemas legais; • eficácia da recuperação pretendida : injeção de capital, empréstimos, venda parcial ou total do negócio ou reestruturação; • cnsto da implementação da reestruturação sob as diferentes alternativas: continuidade do negócio, venda; • natureza ou tipos de passivo; • possibilidade de que a resolução de litígios pendentes ou propostos possa afetar a viabilidade da empresa em d ificuldade; • impacto nos negócios; • se a empresa tem ou terá caixa suficiente para fazer frente aos custos das diferentes alternativas; O S INTERESSES CONFLITANTES Nos processos recuperatórios existe um conflito de interesses impressionante; trava se uma verdadeira batalha jurídica com um número infindável de medidas protelatórias. As partes não têm consciência, ou têm mas não aceitam, de que a recuperação é um processo de minimização de perdas. Por diferentes razões, a intransigência é a palavra de ordem. Todos estão munidos do seu 'arsena l de guerra' e algumas artimanhas. Geralmente, em seu lado do pêndulo, o devedor apresenta condições irrealistas para solução de seus problemas, querendo que seus credores assumam a maior parte do ônus por seus erros gerenciais, e na outra extremidade os credores querem receber a totalidade de seus créditos nas condições originalmente contratadas. A situação tornase bastante mais crítica naqueles não raros casos em que o devedor omite ou apresenta informações 'maquiadas', falsas, em que há a falta de transparência. Como resultado, o tempo vai se exaurindo, e a empresa perde seu vigor, reduzindo acen tuadamente sua atividade op eracional a cada dia que passa, culminando m uitas vezes em paralisação. O Brasil necessita desenvolv er essa nova cultura, para que o diploma legal vigente desde 2005 produza os efeitos desejados. A VIABILIDADE RECUPERACIONAL DO NEGÓCIO
Um princípio universal do direito, da economia e das ciências sociais é o de que o único núcleo de desenvolvimento econômico e social que existe é a empresa. Tudo o mais possui natureza assistencial, que não preserva um dos maiores tesouros do ser humano: sua mente trabalhando. O assistencialismo tem seu foco principal na alimentação. Aquele cuja mente não trabalha está vivo, mas em estado vegetativo. O assistencialismo possui im portância legítima, está na moda; o mais importante, porém, é preservar a dignidade humana mediante a manutenção da empregabilidade, alcançada com a preservação da célula social, bem público caracterizado sob a forma de empresa.
16
Capítulo 1
Construindo um referencial
Outro aspecto de grande relevância é que toda empresa — se o negócio em que ela estiver envolvida for viável — é recuperável. Não obstante e lamentavelmente, a morosidade, perda do timing, pode levála a sucumbir. A Varig tornouse um clássico exemplo. A procrastinação do processo recuperatório agravou sobremaneira o ciclo predatório e de d estruição de valor da empresa. A despeito de seu grandioso valor, na hipótese de os responsáveis e demais partes envolvidas não executarem peremptoriamente as medidas exigidas, ela continuará seu processo degenerativo, perdendo fôlego e competitividade, participação de mercado, fidelidade de seus clientes, sem capital para modernização de sua frota, atrasando o pagamento de seus milhares de funcionários. Morrendo aos poucos. O CARTESIANISMO PREDOMINANTE Na grande m aioria das situações de crise empresarial observase a predominância da racionalidade econômica pura, e, graças à atuação do Poder Judiciário, a responsabilidade social vem crescentemente sendo inserida no contexto da recuperação da empresa. Seus integrantes, além de serem dotados de ampla cultura, possuem grande consciência social — entendem as agruras sociais que o Brasil vive. Seria fácil com uma simples 'canelada' sentenciar a lacração e liquidação de um determinado estabelecimento. Com efeito, o novo diploma legal irá produzir operadores do direito com mentalidade mais moderna. Os antigos e denominados falencistas irão desaparecer. E fato que não existem beneficiários em empresas que encerram suas atividades, só perdedores. Cabe observar que, se o negócio for bom, vale muito mais do que o valor dos ativos da empresa. Nunca é demais salientar a importância de uma postura preditiva e preventiva por parte de todas as peças da chamada 'célula social' que é a empresa. A medida de maior efeito na prevenção de crises é inquestionavelmente a gestão. Como não existe 'bola de cristal', a administração da empresa tem de estar técnica e financeiramente preparada nos casos de turbulência. Deve saber o que fazer quando se encontra diante de um tsunami e como se recompor dos estragos causados por ele. Caso a administração não esteja devidamente habilitada, pode não sobreviver a uma determinada tormenta. A empresa deve estar equipada com os mecanismos de alerta. Os agentes que devem acionar esses mecanismos são a administração e a governança da empresa. Os bancos credores são igualmente agentes desse processo e exercem um papel de extrema importância na prevenção e na solução dos problemas que se impõem pa ra as empresas suas clientes. Possuem um corpo profissional especializado e mais bem preparado na identificação dos sinais de alerta. Podem ajudar muito na prevenção de problemas, interagindo com seus clientes de forma proativa, exigindo das empresasclientes a confecção periódica de diagnósticos independentes. Com efeito, algumas instituições já estão aderindo a essa prática salutar como forma de preservar a saúde das empresas, solicitando a apresentação de diagnósticos para permitir a renovação ou ampliação de uma determinada linha de crédito. Entendem que a melhor garantia de uma operação de crédito é o fluxo de caixa da empresa, que a garantia de crédito de menor risco é sinal de uma empresa sadia, bem ad ministrada. O tempo conspira contra a reabilitação da empresa. Assim, é crucial que haja celeridade, diligência na identificação e execução das medidas de correção de rumo. A isso se chama 'gestão'.
Prevenção de crises e recuperação de empresas
17
Da mesma forma é necessário entender que, na grande maioria dos casos de empresas viáveis, a opção pela manutenção da normalidade operacional da empresa, de seu nível de atividade, da continuidade dos negócios, ainda que seja necessário afastar seus administradores, produz um retomo econômicofinanceiro bastante superior, não podendo ser descartada a idéia de negociar algum tipo de deságio no valor da dívida, que seguramente é menor que os ganhos de eficiência obtidos para todas as partes. Existem diferentes formas de instrumentalizar essas soluções de forma a ca pturar os respectivos benefícios e ganhos de eficiência. Para tal, fazse necessário abolir o cartesianismo no tratamento das empresas em dificuldades. O caso Varig enquadrase nessa situação. Os problemas não são solucionados num pedaço de papel; é necessário aferir se o negócio é viável ou não, o que não é ciência nuclear. Está constatado que a Varig é uma empresa viável. Sem embargo, o cartesianismo adotado e a lentidão do processo estão imputando incalculáveis perdas ao valor do negócio. Outra constatação é que nestes tempos difíceis os executivos dos bancos e demais credores temem por seu emprego; desta feita, agem politicamente, dizendo o que seu acionista quer ouvir. Para estes, muitas vezes é mais cômodo permanecer na zona de conforto, optar por sua segurança e sobrevivência pessoal, do que agir segundo suas convicções, mostrando a viabilidade do negócio. Não raro preferem adotar medidas protelatórias, deixando que um negócio, apesar de viável, entre em processo de autofagia ou falimentar. Dessa forma não se comprometem, não correm riscos pessoais. Assim funciona uma parte do sistema financeiro, o sistema do fantasma do medo da demissão. P o s i ç ã o n o c ic l o d e v i d a
É muito importante que a empresa e todos os demais agentes — seja um fornecedor, seja um credor de qualquer natureza — entendam em que posição no ciclo de v ida esta se encontra. Ao atingir a maturidade, a empresa defrontase com o conceito dos 5 R 's desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Gestão e Turnaround (IBGT). Normalmente vemos que, ao atingir o estágio de maturidade, muitas empresas se calcificam, vivendo das glórias do passado. Suas 'articulações' já não têm a mesma lubrificação, tornamse mais lentas. A empresa dotada de visão estratégica está permanentem ente no topo, inquieta, permanentemente se reinventando, se transformando. Aperfeiçoase de acordo com as mudanças e exigências dos mercados. Aproveita as janelas de oportunidade e tem consciência dos curtos tempos de vida de determinados produtos. Existem também aquelas empresas que, ao apresentarem os primeiros sintomas de declínio — por motivos endógenos ou exógenos — , entram no estágio da renovação. São empresas bemsucedidas e preparadas, que sabem lidar com a adversidade, dotadas de uma cultura de permanente estado de renovação, de sorte a evitar seu declínio. As empresas menos preparadas que por diferentes motivos não identificam ou agem sobre os sinais de alerta se aprofundam nos diferentes níveis de declínio e dificuldades, demandando medidas crescentemente m ais duras nos distintos processos de revigoramento (terceiro estágio), de recuperação (quarto) e por último, de ressurreição (quinto). Existe uma grande quantidad e de empresas que não consegue reverter o processo degenerativo. Ingressam assim na perigosa zona de insolvência. Esse fenômeno se deve ao fato de a curva de declínio não ser linear, mas sim exponencial e acelerada. A empresa avança celere mente para o colapso, ou seja, colide a toda velocidade com um paredão de concreto.
18
Capítulo 1
Construindo um referencial
Não há outra opção: ou a empresa se revitaliza em tempo hábil, identifica os problemas e toma as duras medidas necessárias, com o apoio externo ou não, ou se tornará rapidamente insolvente, podendo sua recuperação tornarse inviável. P r io r id a d e s d o s c r e d o r e s n a c r is e
Nas em presas em dificuldade, aos credores interessa: • aferir o grau de confiabilidade dos administradores e controladores da empresa; • estudar a necessidade de recomendar a contratação de um especialista em recuperação; • assegurar que o administrador judicial possua o perfil e a experiência adequada; • aferir se o negócio é viável; • certificar a viabilidade do planejamento estratégico e sua execução; • avaliar o programa de reestruturação do passivo e garantias; • definir e acompanhar a implementação do plano de recuperação e respectivos resultados; e • concluir o projeto de reabilitação e recuperar o máximo de créditos em aberto. P r io r id a d e s d o s d e v e d o r e s n a c r is e
O devedor tem igualmente uma série de prioridades, sendo uma das principais a transparência e a confiabilidade dos dados financeiros e operacionais. Política a ser adotada não apenas quando a empresa estiver atravessando dificuldades, mas sempre! Tratar bem seus parceiros, tratar bem os bancos; o executivo do banco é um profissional como qualquer outro, é um profissional que tem obrigação de zelar pelo capital empregado pelo banco. A administração da empresa deve manter uma relação correta, transparente e franca com essa instituição. Outras questões imprescindíveis a serem observadas pela administração da empresa nas situações de crise são: • ter como palavraschave a negociação, a nãoprocrastinação e a nãonegação; • entender que, quando uma empresa acumula déficits, credores, bancos e investidores assumem o direito de intervir no processo; • entender que a gestão interina ou uma assessoria especializada pode ser a solução para salvar a empresa, minimizar os impasses e resolver os problemas de credibilidade; • entender que a crise decorreu de problemas de gestão; • entender que incremento de vendas necessariamente não resolve o problema principal, pode até mesmo agraválo; • buscar reconquistar a credibilidade do mercado, a normalização das operações e o acesso a crédito de curto prazo; • adotar uma conduta austera, iniciandose pela redução do prólabore e retiradas dos controladores; • transmitir segurança aos credores de que o controlador não irá cometer 'excessos'.
Prevenção de crises e recuperação de empresas
19
O b s t á c u l o s e d e s a f i o s c r u c ia i s
O endêmico e gravíssimo problema da impunidade conspira sobremaneira contra o sucesso da recuperação das empresas no Brasil. A ineficácia e irresponsabilidade dos representantes dos poderes constituídos no cumprimento de sua obrigação magna de aplicar com rigor a lei na punição dos crimes de responsabilidade não desestimula ou impede a contínua prática de fraudes e outros crimes financeiros. Conforme já citado, é vital dissociar a sorte da empresa e a do empresário, como fez a Parmalat, na Itália, que interveio abruptamente na empresa, nomeando um interventor governamental, agindo com celeridade na aplicação da lei e colocando vários de seus dirigentes na cadeia. Inexplicável e lamentavelmente, o Brasil ainda não atingiu o grau de seriedade digno de um país desenvolvido na aplicação de suas leis, da maneira como pudemos observar nos conhecidos escândalos internacionais. Nas empresas em crise existe uma grande quantidade de casos em que atos ilícitos — como fraude, desvios de recursos, até mesmo para o exterior — foram praticados. Esses casos, além de constituírem crime, resultam na total quebra da confiança e credibilidad e, podendo inviabilizar a recuperação do negócio, salvo se houver o afastamento e punição rigorosa dos responsáveis. Entre os casos nacionais de conhecimento público em que o Juízo apontou irregularidades encontramse a Encol/ Chapecó,8 Mappin e importantes instituições financeiras. Existe ainda o agravante de que os recursos desviados não são recuperados. Outro aspecto relevante e atual são aqueles casos em que existe algum tipo de cumplicidade ou relacionamento promíscuo entre a empresa e seus credores, em que as fraudes envolvem outros agentes, como instituições financeiras e auditores. Nas grandes fraudes recentes observamos que o em presário não atuou sozinho. Com efeito, o Poder Judiciário constatou a existência de instituições que com pactuaram com aquelas práticas delituosas, tomando as enérgicas medidas punitivas previstas na lei, incluindo as pecuniárias. Como exemplo, temos casos como Parmalat, Enron e Worldcom. Conclusão
É obrigação dos mais preparados liderar o processo recuperatório, evitando o naufrágio da célula social. Nem todos são tão preparados para lidar com a adversidade. Cabe aos primeiros preservar a Vida' dos seus companheiros, ainda que debilitados. É obrigação dos mais fortes, não 'ficar com tudo ', mas sim trabalhar em prol do bem comum da sociedade, representada pela célula social. Por não observar o princípio universal da interconectividade, da interdependência, o Brasil adentrou um agudo processo degenerativo, mais acentuadamente a partir do início A Encol sucumbiu imputando perdas diretas avaliadas em 3,5 bilhões de dólares a um contingente de mais de 54 mil pessoas. O Ministério Público detectou inúmeras irregularidades e crimes falimentares, até mesmo na concordata e na falência. O processo criminal envolveu 70 exdirigentes. Apesar da auditoria forense realizada, os recursos desviados não retomaram à massa falida. * A Chapecó, após duas concordatas (1998 e 2004), teve sua falência decretada em abril de 2005, deixando um rombo aproximado de 1 bilhão de reais, além de perdas a milhares de camponeses e trabalhadores. Irregularidades foram apontadas pela CPI das carnes, envolvendo o sistema BNDES, acionista integrante do bloco de controle e maior credor da empresa.
20
Capítulo 1
Construindo um referencial
da década de 1980, atingindo o anacrônico caos atual de ruptura dos frágeis tecidos sociais, jam ais visto em toda sua história. Está claro que a paciência da sociedade chegou ao limite; ela dá seu ultimato: a palavra 'basta7grita incessante e silenciosamente em seu coração. Sa bedora de que todo o poder emana do povo, exige que a ganância, a irresponsabilidade, a impunidade e a corrupção sejam extirpadas em definitivo de seu meio, para que seja interrompido o avanço dessa perniciosa destruição que sufoca o Estado e a sociedade brasileira, e para que tenha acesso ao exercício de seu legítimo direito de bemestar e justiça social, assim como a maiores níveis de 'rea l' desenvolvimento. É imprescindível buscar o equilíbrio entre a racionalidade econômica e a responsabilidade social. Só o trabalho produ z riquezas. A missão principal de todo executivo e dirigente é solucionar problemas. Deve entender que cada problema tem seu próprio DNA, e há que ser resolvido de forma individualizada. Administrar é uma arte; não existem saídas fáceis ou soluções de prateleira. É falacioso imaginar, por exemplo, que seja eficaz um plano monolítico amparado na demissão coletiva (o conhecido 'down sizing' adotado mundialm ente, uma verdadeira onda preconizada por muitos gurus da adm inistração internacional e aplicado cegamente por uma grande quantidade de seus seguidores), sem estudar tecnicamente, de forma holística, criativa e responsável as diferentes e possíveis alternativas viáveis. Jogar inescrupulosamente — se ja por deficiência de conhecimento técnico, seja por falta de coragem de convicção, insegurança, fazendose o que todos fazem — os colaboradores da empresa na rua aumenta de forma exponencial as seqüelas sociais. É um processo que funciona em círculo, como a tra jetória de um bumerangue: seu funcionário ficará sem emprego, o filho dele também; na verdade, possivelmente nem sequer ingressará no mercado de trabalho ou terá direito a uma cidadania digna. Na falta de um melhor papel na sociedade, expurgado desta, irá encontrar seu espaço nas drogas, na violência, na prostituição. Ou seja, esse cidadão d esempregado e seus entes queridos (assim como outros membros da sociedade) não irão escapar incólumes; estarão certamente entre os perdedores. O que dizer dos totalmente excluídos, abandonados, da população de moradores de rua, apenas sobrevivendo, em estado v egetativo, com suas mentes aparentemente atrofiadas, sem nenhuma autoestima, sem direito algum, sem cidadania, apenas aguardando a morte. A melhor forma de reverter esse processo é lutar pela moralização e reforma do Estado, pelo exercício dos direitos do cidadão, pela permanente cobrança e vigilância dos órgãos dos três Poderes e, enfim, pela manutenção das empresas vivas. Resta lembrar que a empresa é o único núcleo de d esenvolvimento econôm ico e social que existe.
B r e v e c u r r íc u l o Jo rg e Q ueiroz Presidente do Co nselho do Instituto Brasileiro de Gestão e Turnaround (IBGT). Reconhecido expert em recuperação de empresas. Adm inistrador e gestor interino e judicial e perito. Um dos pioneiros do segmento de turnaround e workout no B rasil, com mais de vinte anos de experiência em reestruturação e recuperação de em presas no país e no exterior. Coo rdenador do Curso Executivo Avançado de Recuperação de E mpresas do IBGT. Autor de diversas obras sobre reabilitação de empresas em dificuldade, entre as quais Turnaround corporativo: navegando em períodos de turbulência.
Recuperação
j u d ic ia l
d a e m pr es a
Jorge Lobo
reservar o caráter competitivo do negócio exige do gestor um con junto de ações que possibilitam garantir os indicadores projetados. Conh ecendo os aspectos inerentes à recuperação judicial, a ação gerencial se fortalece e se ajusta às d ecisões para mom entos mais difíceis. A recuperação judicial do empresário e da sociedade empresária é um instituto de direito privado, de direito público ou de direito econômico? Para os privatistas, a recuperação judicial é um instituto de direito privado devido à sua natureza eminentem ente contratual, pois o devedor e seus credores celebram, nos autos da ação de recuperação, um negócio jurídico plu rilateral, que ao juiz só resta homologar; se, por deliberação da assembléia geral de credores, o acordo não se consumar, ao magistrado cumpre decretar de imediato a falência do devedor. A recuperação judicial não é um contrato porque o contrato só vincula, obriga e produz efeitos em relação àqueles que a ele aderiram, tácita ou expressamente, o que não ocorre na recuperação judicial; eis que a decisão dos credores em assembléia:
P
• obriga os credores ausentes, os que se abstiveram de votar e até mesmo os dissidentes, vencidos durante o conclave; • renova as obrigações e dívidas, com sacrifício dos direitos e interesses dos credores, embora sob protestos; • mesmo não havendo unanimidade na votação das classes, o juiz pode hom ologar o plano, impondoo à coletividade de credores, se preenchidos os requisitos do art. 58; • ainda que contra a vontade dos credores, suspende as ações e execuções em curso etc. Para os publicistas, a recuperação judicial, tal qual a falência, é um instituto de direito processual, portanto de direito público; eis que a nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas garante ao devedor que preencher os requisitos formais do art. 51 e os materiais do art. 48 o direito de propor a ação de recuperação judicial. A recuperação judicial não é instituto de direito processual, porque: