Caso
prático
(1):
A sociedade A, com sede em Amesterdão, celebra com B, sociedade por quotas com sede em Portugal, um contrato de compra e venda de 2 toneladas de amendoins descascados destinados à actividade de transformação exercida por B. O referido contrato de compra e venda seguia se guia as condições dos vendedores contidas num clausulado geral designado “CONDIÇÕES GERAIS DE CONTRATAÇÃO” e de onde constava, para além da menção de que o contrato seria regido pela lei chilena, uma cláusula que estabelecia expressamente a exclusão da excepção de não cumprimento e da resolução por incumprimento. A referida cláusula de exclusão é perfeitamente legítima em face da lei chilena, embora proibida nos termos do art. 18.º, al. f), do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro (com alterações). Nos termos contratuais, o pagamento deveria realizar-se no momento da entrega dos amendoins e no porto de embarque (Roterdão). Tendo em conta o exposto, e considerando que os amendoins se encontravam completamente rançosos, para além de não estarem descascados, a sociedade B recusou-se a receber a mercadoria e a efectuar o pagamento. Terá sido legítima esta atitude? Em que termos e em face de que ordem jurídica? (Suponha, para efeito da aplicação do Regulamento Roma I, que o contrato é celebrado após 17 de Dezembro de 2009).
Resolução: Será aplicável o ROMA I? Âmbito temporal: 17 de Dezembro de 2009 - SIM!!! Âmbito espacial: aplicação universal e desde que a acção seja intentada perate um Estado Membro: Portugal - SIM!!! Âmbito material: obrigações contratuais internacionais (1º e 12º); O Roma I aplica-se somente a obrigações contratuais e não a efeitos reais. Será que A e B podiam escolher a Lei Chilena?? Artigo 3º/1- autonomia conflitutal das partes; A escolha da lei pode ser expressa ou tácita t ácita (deduz-se do comportamento das partes) mas nunca hipotética, ou seja lei que teria sido opção das partes se tivessem antecipado o problema, isto geraria insegurança juridica! Art. 3/1 in fine a escolha pode ser parcial, se não puser em causa a coerencia do contrato; Art.3/2 a escolha pode ser superveniente; Art.3/3 ver parágrafo 37 (normas imperativas NANI) A regra de conflitos designa uma lei. A regra de conflitos consta do ROMA I que se aplica universalmente (art.2 e 3); Eles podem escolher a Lei Chilena! Mas, aparentemente não há nenhum elemento de ligação com a lei chilena. Mas há, e esse elemento é a vontade das partes logo não há violação da não transactividade. Assim , as normas materiais Chilenas ganham competencia mas, á luz do 18/al. f do DL 446/85 Portugues - elas são proibidas! Estamos perante leis materiais conflituantes! O artigo 18º do diploma legal supra é uma norma imperativa (NANI), em situações puramente internas, logo não poderia ser afastado por vontade das partes (3/3 ROMA I) ---» mas não é isso que aqui temos, estamos perante uma situação absolutamente internacional. Em situação interna - normas imperativas (nao derrogaveis - ex. artigo 18º do DL 446/85 CCG);
Em situação internacional- normas de aplicação imediata - são também imediatamente aplicáveis (NANI); Se as partes escolhem a lei chilena, são as normas imperativas dessa lei e não as portuguesas que se devem aplicar. E o 23º do DL 446/85? (norma de reconhecimento) 23/1. - sempre que haja conexão estreita com Portugal, uma s ituação internacional e as partes escolherem outra lei, não podem afastar esta norma. Mas o artigo 23º do referido diploma só se aplica a consumidores finais, o que não é o caso! Aplicase a consumidores finais para a protecção da parte que é considerada mais fraca. No nosso caso temos A e B empresários (posição de igualdade); --> o artigo 23/1 não é relevante, não se aplica a empresários; --> as regras de conflitos apontam para a Lei Chilena (3/1 ROMA I); Aplicar-se-á a lei chilena? ou o 18 do DL 446/85? O artigo 18º alinea f será uma NANI? NANI( caracter implicito , deduz-se da norma; carácter explicito se a norma disser o ambito de aplicação no espaço); Será o 18º/f uma NANI de direito comunitário? Se sim, afastaria a lei chilena; Se não, a aplicação da lei chilena violaria um principio do direito português e poderia ser invocada a excepção de ordem pública internacional (verificando-se os pressupostos);
Caso 4 A e B, canadianos e residentes em Portugal, celebraram no Porto, em 1995,um contrato de mútuo. Alguns
meses depois casaram. Em 2001 divorciaram-se e o mutuante intentou em 2004, em Portugal, uma acção declarativa de condenação para pagamento da dívida. B alega a prescrição da dívida, invocando que, segundo o direito canadiano, o prazo de prescrição geral é de 5 anos, e que não existiria no Canadá qualquer causa de suspensão semelhante à do artigo 318.º, al. a), do CC português. Cfr. também o art. 309.º do CC. a) Quid iuris, tendo em conta o disposto no Regulamento Roma I (imaginando que este já seria temporalmente aplicável ao caso) e no art. 52.º do CC? b) Se adoptasse a posição relativa à qualificação, quer de Roberto Ago, quer de Arthur H. Robertson , como resolveria esta hipótese? c) Imagine agora que, no momento da celebração do contrato, A e B escolheram como aplicável a legislação canadiana; a sua resposta seria idêntica à da al. a)?
R: Identificar os ordenamentos em conexão: Ordenamento juridico Canadiano (Nacionalidade); Ordenamento juridico Português (Residencia, contrato); Estamos perante uma situação absolutamente internacional! Não nos basta o principio da não transactividade, teremos que mobilizar regras de conflitos.
Analisar os conceitos quadro das regras de conflito: Neste caso temos ausência de escolha de lei pelas partes, o que fazer? O artigo 40º do ROMA I dá-nos a resposta. Se o contrato não se incluir no 4º/1 ou se for um contrato misto, aplicamos o 4º/2 "prestação caracteristica do contrato"* *Em cada contrato é possivel identificar uma prestação que permite apontar a função económico-social daquele tipo contratual. Artigo 4º/3: se ainda assim houver conexão mais estreita com outro País, aplicar-se-á a sua Lei. O artigo 4º/3 é uma cláusula de excepção - confia ao juiz a f aculdade de, no caso concreto, poder escolher uma lei que tenha maior conexão com outro Estado. Artigo 4º/4: quando não se consiga definir a lei aplicável pelo artigo 4º/1 ou 4/2 aplicamos o 4º/4. Estamos perante um principio de conexão mais estreita (principio da conexão mais estreita ou principio da maior proximidade) O principio da maior proximidade é um nome pouco usado... Exemplo: Contrato de permuta: A (troca a coisa x com b) ----------------------------------------> B (troca a coisa y com A) 1. Qual a prestação caracteristica se ambos têm exactamente o mesmo conteúdo? É impossivel saber... ... logo, aplicaremos o artigo 4º/4 do ROMA I. No nosso caso, "encaixamos" o mútuo no artigo 4º/2; Qual a prestação caracteristica do contrato?
Mútuo: só existirá a partir do momento em que alguém entrega o dinheiro. A partir daí, o mutuário fica obrigado a restituir o mesmo montante (ou o montante mais j uros). O mútuo existe para financiamento (concessão de crédito) logo, se este é o objectivo do contrato, é a prestação caracteristica do mutuante que releva. Este problema não se põe, ambos residem em Portugal, logo esta lei não se aplica. E o artigo 52º do CC? Relação entre os conjugues - manda aplicar a lei da nacionalidade comum: que é a lei canadiana. Qual aplicar?? 4º ROMA 1 ------> Lei Portuguesa 52º CC------------> Lei Canadiana Estatuto:
4º ROMA I : Estatuto obrigacional 52º CC: Estatuto familiar/matrimonial
3. Subsunção das regras materiais: Artigo x da Lei Canadiana (prevê a prescrição de 5 anos - tem estatuto obrigacional). Subsume-se no artigo 4 Roma I - mas o artigo 4º Roma I designa como competente a Lei Portuguesa. O artigo x da Lei Canadiana não se aplica. Artigo 318º/a do nosso CC "prescrição (...) conjugues (...)" || est.obrg. est.fam/matrimonial Como qualificar??? É necessário analisar a ratio da norma: protecção da paz familiar - assim, tem estatuto matrimonial. Artigo 52º manda aplicar a Lei Canadiana; Artigo 4ºRoma I manda aplicar a Lei Portuguesa; Lei Canadiana subsume-se no 4º ROMA I - não se aplica porque o artigo 4º do Roma I manda aplicar a lei Portuguesa; Lei Portuguesa subsume-se no 52º do CC - ambos têm estatuto matrimonial, mas o 52º não se aplica porque manda aplicar a lei canadiana. E o artigo 309 CC? Tem estatuto obrigacional. Subsume-se no ROMA I Aplica-se!!! Prazo geral de 20 anos (não há suspensão durante o casamento pois não é o 318º que se aplica). Regra material = 309CC --------------> Regra conflito 4ºRoma I.
B) Se adoptasse a posição relativa à qualificação, quer de Roberto Ago, quer de Robertson, como resolveria esta hipótese? Se adoptássemos a posição destes dois autores teriamos dois momentos diferentes de qualificação.
1º Qualificação primária: Devemos olhar os factos e (tal como se fosse uma situaçao interna) encontrar as regras materiais a aplicar. Logo, o artigo 318º/a Cc. Assim, devemos encontrar depois a norma de confl itos a que reconduz a norma material. Logo o artigo 52º CC. A Lei aplicável será a designada pela regra de conflitos. Logo, a Lei Canadiana.
2º Qualificação secundária/material: Encontrar na lei designada (Canadiana) as leis materiais que resolvam o caso. Aqui temos duas diferenças entre Ago e Robertson: Ago: ocorre agora o chamamento indiscriminado: chamamos todas as normas do ordenamento juridico. Robertson: á ordem juridica só vamos buscar as normas que se reconduzem à categoria normativa da regra de conflito.
Como ficava resolvido!? Segundo AGO: Lei aplicável lei x da lei Canadiana (teoria errada!!! partimos da norma de estatuto familiar de um ordenamento para chegar a aplicar normas de estatuto obrigacional de outro ordenamento!!!! Segundo Robertson: segundo o caso na lei Canadiana não existe (norma), estamos perante um vácuo juridico! (esta teoria falha. Parte da qualificaçção primária e falha por isso. Senão poderia ser interessante e semelhante ao que usamos actualmente).
c)Imagine agora que, no momento da celebração do contrato, A e B escolheram como aplicável a legislação Canadiana, a sua resposta seria a idêntica à da alinea a)? Imaginemos que havia escolha de lei. Lei Canadiana e Lei Portuguesa são as leis em contacto com o caso. Mas A e B escolheram a lei Canadiana. Ver o artigo 3º do ROMA I. Quer se aplique, no caso, um estatuto obrigacional, quer um estatuto matrimonial, as regras materiais serão sempre as da Lei Canadiana. Art X Lei Canadiana ----------subsume-se na regra ROMA I (art3º), tem estatuto obrigacional* (presciçao 5anos) * Na Lei Canadiana procuramos: - Lei com estatuto matrimonial - não há - Lei com estatuto obrigacional - norma x (esta).