COMO FAZER UM ARRANJO PARA INSTRUMENTOS DE SOPRO POR DAVI OLIVEIRA – POSTED ON 2 DE MARÇO DE 2009 PUBLICADO EM: HTTP://WWW.OUTROSVENTOS.COM.BR/PORTAL/BANDAS-ORQUESTRAS/COMOFAZER-UM-ARRANJO-PARA-INSTRUMENTOS-DE-SOPRO.HTML
Se você é pianista/tecladista/guitarrista, e se toca com alguém que improvise muito no sax (como é o meu caso) ou clarineta, já deve ter notado que, às vezes, eles ficam fazendo os cálculos do tom que irá tocar para que se “encaixe” ao seu, não é mesmo? Não basta somente dar o tom e ir adiante, pois o clarinetista / saxofonista que toca de improviso tem que “transpor” a
tonalidade original da música para a tonalidade adequada ao seu instrumento. Como dizia meu avô: “- Agora é que a jurupoca vai piá..!” (Vai complicar a
situação): Se você tivesse que escrever uma partitura para alguns instrumentos de sopro (flauta, sax alto, clarineta) daquilo que você está tocando no teclado/piano, para que seus amigos não ficassem transpondo de ouvido ou, pela sua grande capacidade e treino, lendo uma coisa e tocando outra, como você faria? Simples, né!?: “-Pego os instrumentistas e separo em dois grupos: os que tocam instrumentos agudos (sopranos e altos), para tocarem na clave de sol, e os que tocam instrumentos mais graves (tenores e baixos), para tocarem na clave de fá; escrevo a parte de cada um, copiando da partitura do piano, e pronto! Vamos tocar!”. Se esta foi a sua resposta, lamento informá-lo que, como dizia a minha avó, “Isso vai dar uma maçaroca só!” (vai dar tudo
errado). É de suma importância que se saiba que nem todos os instrumentos são afinados em uma mesma tonalidade. Quero dizer com isso que, ao pedirmos que alguns instrumentos (de sopro principalmente) toquem a nota Dó escrita em sua partitura, não iremos escutar a nota Dó que estamos acostumados a ouvir no piano, que tem a afinação chamada “afinação de concerto” ou, simplesmente, “afinado em Dó”.
Isto, em parte, é herança dos inventores dos instrumentos que temos atualmente, muitos dos quais proveem do século XIX e início do século XX sem muita alteração até hoje. Como, geralmente, o inventor criava uma “família”
inteira de instrumentos (desde sopranino até contrabaixo), como é o caso do saxofone e da clarineta, a forma mais fácil para que um músico passasse de um instrumento para o outro da mesma família, sem ter que aprender o dedilhado daquele novo instrumento, era a adequação da tonalidade do instrumento e, por conseguinte, da partitura. Assim, a nota escrita Sol, na segunda linha da clave de Sol, sempre terá a mesma posição para todos os saxofones, embora a altura do som possa variar. Eu sei que parece meio complicado a princípio, mas preparei o quadro abaixo com as principais tonalidades de instrumentos que, normalmente, poderão ser encontradas em um conjunto de sopros, sendo estes afinados em Dó, Sib, Mib e em Fá. Poderá, contudo, encontrar algumas afinações diferenciadas mais raras (Flauta contralto em Sol, Clarineta em Lá, etc.).
Em Dó
Em Sib
Em Mib
Em Fá
Dó
Ré
Lá
Sol
Dó#
Réb
Ré Ré#
Mib
Ré#
Mib
Lá#
Sib
Sol# Láb
Mi
Si
Lá
Fá
Dó
Lá#
Mi
Fá#
Fá
Sol
Ré
Sol# Láb
Ré#
Sol
Lá
Mi
Ré
Sol# Láb
Lá#
Fá
Ré#
Lá
Si
Fá#
Dó
Sol
Fá
Sol# Láb
Fá#
Fá#
Lá# Si
Solb
Sib
Dó#
Solb
Sib
Réb
Dó#
Réb
Sib
Si Dó
Mib
Solb
Dó#
Réb
Mib
Mi
Solb
A tabela acima servirá, também, como guia para armação (ou armadura) de escala (sinais de sustenidos ou bemóis no começo do pentagrama que indica a tonalidade da peça) quando tem que se escrever para um instrumento que não seja afinado em “Dó concerto”.
Exemplo1: Se você vai escrever uma partitura para flauta e oboé, não há problema maior, pois estes instrumentos são afinados “em Dó”, e o som escrito
será igual ao som que ouviremos. Exemplo2: Se formos escrever uma outra parte, onde a clarineta em Sib tocará o contralto, então esta parte terá que ser escrita um tom inteiro acima do original. Veja acima: Se a tonalidade para piano (em Dó) for Sol (maior ou menor), então a parte escrita para um instrumento em Sib deverá estar escrita em Lá. Se um sax alto (afinado em Mib) for tocar a mesma parte do contralto, esta parte deverá ser escrita em Mi. Quando falo “ser escrita” quero dizer, mais
precisamente, ser transposta, respeitando os intervalos da tonalidade (1-1-½-11-1-½, para tonalidade maior) da música original e na transposta. Além de ajudar a transposição da tonalidade em Dó, a tabela também ajudará a identificar o som “concerto” para uma determinada nota escrita para um
instrumento em outra afinação. Exemplo: Se tocarmos um Fa#/Solb em um clarinete alto (af inado em Mib), esta nota soará como a nota Lá “concerto”. Portanto, cuidado ao pedir: “Vamos afinar nossos instrumentos: Todos toquem a nota Lá.” Se você espera escutar um Lá no diapasão 440 hertz (ou 442, mais
modernamente), daí pode complicar, pois alguns instrumentos além de tocarem na tonalidade diferente, tocam em claves diferentes da que normalmente seria. Um ótimo exemplo para isso é o sax barítono, afinado em Mib, que toca na
clave sol, apesar dos sons graves que produz, pois o mais óbvio seria que tocasse na clave de fá, se for apenas pela intuição musical “normal”. Portanto
as três coisas básicas a se lembrar quando for transpor: A afinação do instrumento e sua respectiva escrita; em qual clave é executado o instrumento e qual o som que realmente soará o que esta sendo executado. Lembre-se de fazer sempre a relação: Nota de LeituraàPosição/DigitaçãoàSom Real. Se você tivesse tocando violão ou teclado, na tonalidade de Sib maior, e quisesse transpor um acorde de Fá7 (Fá com sétima menor) para diversos instrumentos de sopro, veja abaixo um exemplo de como isso ficaria:
Veja que interessante (além de enrolado): O sax alto, afinado em Mib, toca na tonalidade de Sol maior, e executa a nota Dó (3º espaço na clave de Sol), soando a nota Mib (1ª linha da clave de Sol), enquanto que o sax tenor, afinado em Sib, toca na tonalidade de Dó maior, e executa a nota Si (3ª linha da clave de Sol), soando a nota Lá (5ª linha da clave de Fá). Se pensarmos na afinação e escrita de “concerto”, estaríamos nos deparando com uma forte dissonância (dó e si, ou seja, meio tom apenas); porém, ao escutarmos os instrumentos tocando, veremos que (ou melhor, ouviremos), na verdade, o intervalo é de uma quinta.
Para ajudar nesta questão toda, segue abaixo um resumo de tudo que tratamos, inclusive com uma abrangência de outros instrumentos, e com algumas dicas. INSTRUMENTO ou VOZ
AFINAÇÃO NOMINAL
CLAVES
EXTENSÃO DE ESCRITA
COMO SE ESCUTA
Dó central = Dó4
Dó central = Dó4
profissional: Ré4-Dó7
Dó: 1 oitava acima
amador: Sol4-Lá6
Réb: 1 nona menor acima
MADEIRAS Flautim
Dó, Réb
Sol
Note que em uma banda de jazz raramente você encontrará um flautim. Um saxofonista pode não ter ou não tocar flautim. Use com cuidado para não sobressair Flauta
Dó
Sol
profissional: Dó4-Ré7
conforme escrita
amador: Dó4-Dó7 Se você for escrever alguma parte para um flautista que na maioria das vezes é um saxofonista, tente evitar os extremos, principalmente as notas agudas, que podem vir a soar desafinadas, e as muito graves, que se tornam quase inaudíveis se tocas em grupo. Fluta contralto
Sol
Sol
Dó4-Dó7
uma quarta perfeita abaixo
Flauta baixo
Dó
Sol
Dó4-Dó6
uma oitava abaixo
Oboe
Dó
Sol
profissional: Sib3-Lá6
conforme escrita (alguns modelos de oboés podem não apresentar o Sib)
amador: Dó4-Mi6 Clarineta (exceto baixo)
Dó, Sib, Lá, Mib
Sol
profissional: Mi3-Dó7
Dó: conforme escrita
amador: Mi3-Fá6
La: 3ª menor abaixo Sib: um tom inteiro acima Mib: uma 3ª menor acima
Geralmente você encontrará as partes para clarineta escritas para instrumentos em Sib, o mais comum. O clarinetista que toque requinta (Eb) ou clarineta em Lá terá um t rabalho extra em tentar transportar esta parte, se for possível para a peça em questão. Dobrar naipes de clarinetas com saxofones ajuda a melhor as cores tonais e a atmosfera dos timbres Clarineta Baixo (ou clarone baixo)
Sib
Sol ou Fá
profissional: Dó3-Do7
uma nona abaixo;
amador: Do3-Ré6
um tom inteiro abaixo, quando escrito na clave de fá
A clarineta baixo pode ser substituída por um saxofone barítono. Tocado em conjunto, o sax barítono e a clarineta baixo formam um interessante ambiente sonoro Fagote
Dó
Fá ou de Dó tenor
profissional: Sib1-Mib5 amador: Sib1-Sib4
Saxofone (banda)
Sib, Mib
Sol
Sib3-Fá#6
Bb soprano: uma 2ª maior abaixo Mib alto: uma 6ª maior abaixo Sib tenor: uma 9ª maior abaixo Mib baritone: uma oitava + uma 6ª maior abaixo Sib baixo: uma oitava + uma 9ª maior abaixo
No sax soprano, alto, tenor e barítono, existem outras notas do registro agudo (escrita Sol6-Ré7) que dependem da habilidade do músico. Superagudos (Mib7-Sol7) não devem ser escritos sem consultar antes o músico. O sax barítono, no outro extremo, pode apresentar a nota Lá grave em alguns modelos, logo, recomenda-se não utilizá-la como padrão, uma vez que nem todos os instrumentos apresentam tal nota. Saxofone (sinfônico / Cmelody)
Dó ou Fá
Sol
Dó3-Sib6
Fá sopranino: 4ª perfeita acima (raríssimo) Dó soprano: Como escrito Dó tenor: Uma oitava abaixo do escrito Fá mezzo-soprano: Uma quinta perfeita abaixo (muito raro)
METAIS Trompa
Fá
Sol ou Fá
profissional: Fá#2-Dó6
Uma quinta perfeita abaixo
amador: Dó3-Sol5 Trompista especialista em agudos (escrita): Sol3-Dó6 Trompista especialista em grave (escrita): Fá2-Sol5 Notas de Pedal (escrita): Mi2, Mib2, Ré2, Réb2, Dó2 A armação da escala normalmente é omitida para a trompa. Escreve-se de acordo com a tessitura que será aplicada: Dó, Ré, Mib, Mi, Fá, Sol, Lá, Bb ou Si (muito raro) Trompete (exceto baixo em Bb)
Dó, Sib, Lá, Sol, Fá, Mi, Mib, Ré
Sol
profissional: Fá#3-Ré6
Dó: como escrito
amador: Lá3-Sib5
Baixo em Dó: Uma oitava abaixo Bb: uma segunda maior abaixo Lá: uma terça menor abaixo Sol: uma quinta perfeita acima Fá: uma quarta perfeita acima Mi: uma terça maior acima Mib: uma terça menor acima Ré: uma segunda maior acima Flugelhorn: uma segunda maior abaixo Baixo em Sib: uma nona maior abaixo
Para trompetes em Dó ou Sib, noteas de pedal (escrita): Dó3, Si2, Sib2, Lá2, Láb2, Sol2, Solb2 Trompete piccolo
Sib, Lá
Sol
Fa#3-Sol5
Sib: uma sétima menor acima Lá: uma sexta acima
Trombone alto
Mib
Dó alto
Lá2-Sol5 Extensão excluindo-se notas fundamentais e pedal
Trombone tenor Sib, Fá
Dó ou Fá
profissional: Mi2-F5
Sol
amador: Mi2-Sib4 Extensão excluindo-se notas fundamentais e pedal (Sol1-Sib1)
Uma nona abaixo quando escrita em clave de sol
As notas agudas são aproximadas, dependendo da habilidade do instrumentista. Muitos trombones de vara podem incluir uma extensão que baixa a nota fundamental do Si para o Fá Trombone baixo
Sib ou Fá
Fá
profissional: Sib1-Sib4 amador: Sib1-Fa4 Extensão excluindo-se notas fundamentais e pedal
As notas agudas são aproximadas, dependendo da habilidade do instrumentista. Tuba
Sib, Mib
Fá
profissional Sol0-Dó5 amador: Mi1-Do4
Tuba tenor /
Sib
Fá ou Sol
Euphonium
Na tradição inglesa, as partes das tubas em Mib e Sib são escritas na clave de sol. Tuba em Mib soa uma oitava e uma sexta abaixo da escrita. Tuba em Sib soa duas oitavas abaixo da escrita.
profissional: Sib1-Fa5
Bb: uma segunda abaixo em clave de fá
amador: Mi2-Síb4
Uma nona abaixo se na clave de Fá
PERCUSSÃO Timpano
Diversas
Fá
20″: Fa3-Do4 23″: Re3-Lá3
26-25″: Sib2-Fa3 29-28″: Fa2-Do3 32-30″: Ré2-Lá2 Xilofone
Dó
Sol
Sol4-Do7
Marimba
Dó
Sol e Fá
profissional: (Dó2-Lá2)Dó7
Uma oitava acima
amador: Do3-Do7
TECLADOS Piano
Dó
Sol e Fá
Lá0-Dó8 (c/ variações)
Como escrito
Orgão
Dó
Sol e Fá
Dó2 – Dó7 (não de tubos)
Como escrito
Dó
Sol
profissional: Sol3-La7
Como escrito
CORDAS Violino
amador: Sol3-Sol6 Viola
Dó
Dó (Sol)
profissional: Dó3-Mi6
Como escrito
amador: Dó3-Dó6 Violoncello
Dó
Fá / Dó / Sol
profissional: Dó2-Dó6
Como escrito (na clave de sol: uma oitava abaixo)
amador: Dó2-Sol5 Contra baixo
Dó
Fá
Acustico
profissional: Dó2-Dó5
Uma oitava abaixo
amador: Mi2-Sol4
Violão/Guitarra
Dó
Sol
Mi3-Mi6
Uma oitava abaixo
Contra baixo – elétrico
Dó
Fá
Mi2-Mi5 (4 cordas)
Uma oitava abaixo
VOZES Soprano
Dó
Sol
coloratura: Dó4-Mib6
Como escrito
lírico: Sib3-Dó6 dramatico: Láb3-Dó6 Mezzo: Sol3-Sib5 amador: La3-Lá5 Contralto
Dó
Sol
contralto: Fá3-Fá#5
como escrito
amador: Fa3-Ré5 Tenor
Baritono
Dó
Dó
Sol (parte única)
contra-tenor: Sol3Fa#5
Uma oitava abaixo
Fá
lírico: Do3-Do5
como escrito
Fá
dramatico: Do3-Sib4
Fá
amador: Si3-Lá4
Fá
lírico: Lá2-Sol4
como escrito
dramático: Lá2-Sol4 baixo-baritono: Fa#2Mi4 amador: Sol2-Mi4 Baixo
Dó
Fá
cantante: Fa2-Fa4
como escrito
profundo: Réb2-Ré4 contrabass: Sib1-Dó4 amador: Mi2-Ré4
Abraço a todos! Orivaldo A. Hosti
Orivaldo Hosti é flautista e saxofonista, cursou música na Faculdade Teológica Batista de São Paulo. Fontes Dolmetsch – Online Blatter, A. (1997) Instrumentation and Orchestration New York: Schirmer www.wikipedia.org www.hpsymphony.org