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Capitalismo em Crise, Política Social e Direitos é uma obra fundamental na atualidade para todas as pessoas que lutam pela emancipação política, tendo como horizonte a emancipação humana nesses tempos de barbárie. A abordagem teórica da temática realizada pelos autores é importante para analisar a atual crise estrutural do capital, seus impactos no Brasil, na Política Social e na garantia de direitos, pois refuta as teorias que não levam em consideração a luta de classes como motor da história, colocando-se na contramão das tendências acadêmicas predominantes. 0 livro está apresentado em duas partes. A prime ira parte procura compreender a crise atual e desmistif icar as análises análises que fazem referências ao Bras il de forma idealista, como se a crise
Capitalis Capitalismo mo em crise, política social e direitos
Capitalismo em Crise, Política Social e Direitos é uma obra fundamental na atualidade para todas as pessoas que lutam pela emancipação política, tendo como horizonte a emancipação humana nesses tempos de barbárie. A abordagem teórica da temática realizada pelos autores é importante para analisar a atual crise estrutural do capital, seus impactos no Brasil, na Política Social e na garantia de direitos, pois refuta as teorias que não levam em consideração a luta de classes como motor da história, colocando-se na contramão das tendências acadêmicas predominantes. 0 livro está apresentado em duas partes. A prime ira parte procura compreender a crise atual e desmistif icar as análises análises que fazem referências ao Bras il de forma idealista, como se a crise
Capitalis Capitalismo mo em crise, política social e direitos
Conselho Editorial da
Ivanete Boschetti« Elaine Rossetti Behring Silvana Mara de Morais dos Santos • Regina Regina Célia Céli a Tamaso Tamaso Mioto (Orgs.)
área de Serviço Social
Ade mi r Alves da Silva Dilséa Adeodata Bonetti Elaine Rossetti Behring Maria Lúcia Carvalho da Silva Maria Lúcia Silva Barroco
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro , SP, SP, Brasil) Capit alism o cm crise, polític a social c direitos- Ivanete Boschctli. |ct al.| (ofgs,), São Paulo : C" orto /, 2010, 2010,
Capi Capita talilism smo o em crise, política política soci social al e direitos direitos
Outras organizad oras: Elaine Rossetti Behring, Silvana Mara dc Morais dos Santos, Regina Regina Célia Tamaso Tamaso Mio to Vários autores. Apoi o: C AVES/ C AVES/ 1'KOC 1'KOC AD, UnB. UnB. LI; KJ, KJ, LI KV LH SC . ISBN" ISBN" 978-85-249-166'M l. Capitalismo 2. Desigualdade social 3. Dinritos sociais 4. Politica social 5. TYabalho TYabalho e classes classes trabal hadora s I lioscl ietti , Ivanete. II. Behring, Elaine Rossetti. Ill Santos, Silvano Mara de Mor ais dm . IV. Miot o. Regina C ólia Tatnaso. Tatnaso.
Apo io CAPES/PROCAD
CDP-361 25
10-12(101 índices para catálogo sistemático: 1. Capita lismo e política social social 361.23 361.23 2. Politica social e capitalism o 361.23 361.23
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CAPITALISMO KM CRISE, POLÍTICA SOCIAL E DIREITOS tv.mck> lioschetti • Elaine Rossetti lkhring • Silvana Mara de Morais d05 Santos • Regina Cilia Tamaso Mioto (Orgs.) Cirpi: aeroestúdio Rcoixio: Ana Paula Lucrisano Linea Editora Ltda.
Sumário
Liii"uV'!.iy!Ín rt/ííer/r t/: Danilo A. Q. Morales
Apr ese nta ção
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PARTE I
Crise do capital, politica social e lutas sociais
Xenluima parle desta obra pode st>r ivpnxhizida ou duplicada sem autorização expressa dos autores o do editor •: 2010 by Organizadores Direitos para esta edição CORTEZ EDITORA
1. Crise do capital , fundo publico e valor Elaine Rossetti Behriitg
13
2. Crise do capital e o socorro do fundo público Evilásio Salvador
35
3. 0s custos da crise para a politica social tvanele Boschetti
64
4. 0 persistente estado de crise: nexos entre Estado, política social e cidadania no Brasil Álvaro André Amorim
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Rua Mont e Alegre, 1074 Perdizes 05014-001 - Sào Paulo Te! 111)38640111
SP
Fav (11>3864-42*)
n
5. Política social: universalidade versus focalização. Um olhar sobre a América Latina
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IJOSCHETTI • BEHRING • SANTOS • MIOTO
7. Sociedade civil e lutas sociais na América Latina: entre a harmonização das ciasses e as estratégias de resistência Ire te Simionatto
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PARTE II
Apresentação
A condição dos direitos no contexto da crise: questões teóricas e incidência s parti cular es
183
8. Politica social e diversidade humana: crítica à noção de igualdade de oportunidade Silvana Mara de Morais dos Santos
185
9. Política educacional e direitos sociais: reconfiguração do ensino superior no Brasil A lha Tereza ti. de Castro
195
10. As contradições da política de assistência social neoliberal Camila Poti/ara Pereira e Marcos César Alves Siqueira
211
11. Desigualdade social e concentração de riqueza: algumas aproximações a partir da realidade de Natal-RN íris Maria de Oliveira e Maria Regina de Avila Moreira
230
12. Relações e condições de trabalho no universo produtivo: escravidão contemporânea ou acumulação por espoliação? Sezvrina Garcia
254
13. As politicas de geração de emprego e renda no Brasil: o arcaico reatuatizado Marcela Soares
271
14. Feminismo, prostituição e direitos - um debate contemporâneo Marlene Teixeira Rodrigues
292
Qs textos aqui apresentados resultam de pesquisas e reflexões realizadas no âmbito do Programa Nacional de Cooperação Académica (Procad), que agregou, durante quatro anos, sete grupos de pesquisa da Universidade cie Brasília (UnB), Universidade do Hstado do Rio de Janeiro (UHRJ), Univer sidade Federal do Rio Grande do Nor te (UF RN) e Universidade I ederal de Santa C atarina (UFSC). Hste li vro final iza o projeto, iniciado em 2006, e se soma à primeira coletânea de textos publicada em 2008, intitul ada Política social no capitalismo: tendências contemporâneos. Diferentemente da anterior, esta obra reúne a produção de docentes e discentes dos programas de pós-graduação envolvidos no Procad/ ( apes, o que mostra a repercussão deste progr ama na formação de quadros de pesquisadores. Durante esse período, o apoio do Procad/Capes pe rm it iu con sti tui r uma rede de cooperação académica com 16 docentes c diversos estudantes ligados aos pesquisadores e aos grupos de pesquisa, ii que possibilitou a realização de seminários e debates conjuntos; a mobilização de docentes e pesquisadores entre os Programas; a particiI >ação em bancas de trabalhos científicos ; o desenvo lvi ment o de estudos, I>esquisas, pro duç ão e difusão de conhec iment o; a produção e divulg ação de conheci mentos inédi tos; a construç ão de mesas coordenadas nos eventos de pesquisa da área de Serviço Social; e a publicação de dois livros.
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BOSCHETTI • BEHRING • SANTOS . MIOTO
desigualdade, este livro, elaborado durante a irrupção de uma grave crise do cap ital, cujas proporções são analisadas em alg uns textos desta coletânea, demonstra, de modo inequívoco, a espantosa capacidade do capita lismo d e se apro pria r do f und o púb lico para assegurar seu incessante processo de reprodução e acumulação ampliados. Os capítulos da primeira parte articulam reflexões em torno da Crise do Capital , Política Social e Lutas Sociais, e desmist ific am compreensões que naturalizam a crise atual, sublinhando seu caráter endêmico e duradouro, bem como aquelas que afirmam que o Brasil estaria "imune" a seus efeitos. Os antídotos adotados pelo Brasil, seguindo tendências mun diai s, são amargos para o tra balho e doces para o capital, sobretudo para o capital portador de juros, maior beneficiário no contexto da financeirização. Nessa perspectiva, o fund o pú blico é analisado como parte do circuito do valor, azeitando os processos de rotação do capital e criando contr a tendênci as à que da da taxa de lucros. O mal-es tar da democ raci a burguesa e as potencialidades e limites das lutas sociais no contexto da crise também são elementos discutidos, procurando respostas teóricas e políticas para a grande questão que se coloca: a participação e mobilizaç ão de sujeitos políticos que coloquem na cena pública respostas para além do capital, realizando uma disputa social de destino que ultrapasse as respostas burguesas à crise. Na segunda parte do livro — intitulada A condição dos direitos no contexto da crise: questões teóricas e incidências partic ulare s— realiza-se o debate sobre os direitos, a parti r de mirante s de observação diversifi cados. Os capítulos enfrentam a questão teórica central da relação entre emancipação política e humana eo lugar dos direito s na agenda das lutas sociais e da esquerda em div ersos campos: da di versi dade sexual e sua importância nas lutas contemporâneas contra o preconceito; dos direitos sociais de segurid ade, com de staque para a assistência social; da educação e das políticas de ação afirmativa; da relação entre pobreza, riqueza e desigua ldade; da con dição das mulheres e sua luta por direit os, em espe-
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Trazemos a público, com muita satisfação, esta produção coletiva e c Duvida mos o(a) leitor(a) a mergul har nestas páginas em que certamente encontrará muitas pistas e sugestões de caminhos para a pesquisa e, submetidas às críticas, nossas tentativas de respostas em meio a este momento de inflexão histórica que já altera os rumos do século XXI. Brasília, agosto de 2010. A$ Orgnnizadoms
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PARTE I
Crise do capital, politica social e lutas sociais
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Crise do capital, fundo público e valor Elaine Rossetti Behring"
Introdução O presente texto é o resultado de um proj eto intelectual acalentado há tempos e adiado pelas inúmeras tarefas acadêmicas e políticas nas quais estive env olv ida nos últi mos a nas, e que finalm ente tive condições de realizar, em função do suporte do Procad/Capes: reler O capital, de * Este ensaio é um resultado do perí odo de estágio de pesquisa pôs-d milor al realiz ado no SER/ l íill, na condição cie professora pesquisadora colaboradora, por meio do Procad / Capes ecom apoio .!.> I SS/UF.RJ. através do lic ença sabática, entre os meses de març o e agosto de 2008 Nesse sentido , torno públicos meus agradecimento* aos professores do Departamento de Poiílica Social da FSS/ I I Ki e aoSEK/UriB, especialmenteaPotvara Pereira Pereira,coordenadora doN eppos /Unl leRos a Stein (Chefe do Departamento). Agradeço também aos estudantes do graduação e pós-graduaçáo que fazem parto do ÇOPSS/ L KR/, muitos sondo meus orientandos, e que compreenderam o apoiaram este meu rápido afastamento, além do serem interlocutores preciosos. Este agradecimento 6 extensiv o às(aos) companheira s do Cress 7' Região, que também fortaleceram esse projeto ao não contarem comigo nos primeiros meses da gestão {2008/2(111). Por fim. meu agradecimento muito
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BOSCHETTl . BEH RING • SANTOS • AM OTO
Karl Marx, na íntegra, de forma sequencial e sistemática. A necessidade dessa releitura decorreu de uma demanda objetiva dos caminhos da pesquisa que venho realizando acerca do papel do fundo público no capitalismo contemporâneo no âmbito do Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e da Seguridade Social (GOPSS/UERJ), realizando uma análise do orçamento público brasileiro, desde sua alocação até sua execução, cujos resultados vimos publicando em eventos científicos e profissionais, nacionais e internacionais. Trata-se agora de buscar e/ou apri mor ar a apreensão dos fundam entos na crítica marxist a da economia polític a para precisar a análise sobre o lugar estrutural do fun do públ ico no capitalismo. Tais aportes estão localizados principalmente nos volumes II e JíI, quando Marx trata do capitalismo em geral e da repartição da mais-valia socialmente produzida. Não existe, porém, nesse texto fundament al, um momento anal ítico sobre o fundo público e o Estado. Aliás, o termo fundo público aparece raríssimas vezes ao longo de todos os tomos. Afinal, nos tempos de Marx, este não tinha o mesmo peso quantitativo, ou seja, o Estado não extraía e transferia parcela tão significativa da mais-valia socialmente produzida e, ressaltamos desde já, não se apropriava do trabalho necessário como hoje s em se fazendo pela vi a tr ibut ária , especialmente na perifer ia do capital. O fundo público não possuía também nos tempos de Marx o papel qualitativo que passa a ler no capitalismo monopolista e imperialista, sobretudo com o keynesianismo após a Segunda Guerra Mundial. Na ve rdad e o que se observa e que o fun do púb li co assume tarefas o proporções cada vez maiores no capitalismo contemporâneo, diga-se, em sua fase madu ra e fortemente destruti va, com o predomí nio do neoliberalismo c da financeirização, nào obstante todas as odes puramente ideológicas em prol do listado mí nimo, ampl amente dif undi das desde os anos 80 do séc ulo XX. Basta obs erv ara reação capitalist a à crise de 2008/2009, uma nítida crise estrutural do sistema, com a injeção de trilhões de dóla-
CAPITALISMO EM CRISE, POLITICA SOCIAL E DIREITOS
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Cabe, portan to, à crítica marxis ta contemporânea apanha r o conjunto de determinações objetivas e subjetivas que operam no capitalismo madu ro e que impl icam nesta dinâmica da valorização do capital, na qual interfere o fun do públ ico. Qu al é o sentido de retomar Ma rx , se queremos compreender os processos atuais? Nossa intenção, partindo do suposto marxi ano de que o modo de produ ção capitalista é histórico, se modifica e complexifica, é buscar na crítica fundadora de Marx e na sua descoberta e sistematização da lei do valor e de seus desdobramentos na totalidade concreta da sociedade burguesa elementos para a compreensão do papel do fundo público, considerando que o capitalismo permanece orientado para a busca de superlucros, de valorização do capital e sua acumulação, por meio da produção de mais-valia, o que implica a permanência do valor-traha lho como determinação fundamental das relações sociais de produção e desenvolvi mento das forças produt ivas, c om fortes implicações para as condições gerais da luta de classes. Supondo a atualidade, ademais i mpressionante, de O capital, apesar ile elementos necessariamente situados historicamente, trata-se de afinar a análise sobre o tema que i nquieta e convoca: o signi fica do do crescimento do fundo público e sua relação com o processo de valorização do capital, nocontextò de uma crise sistêmica,estrutural, profunda eduradoura.
I. ". .. a caça apaixonada do valor..."2 e sua relação com o fundo público O volume I de O aipiUil (Ma rx, 1988) faz diversas alusões poéticas relacionando o valor a uma pulsao visceral do capital — como uma paixão que modifica a vida dos seres humanos incontrolavelmente* — para que se realize de forma plena o circuito D — M — D', ou seja, o ciclo de produção e realização do valor, e que e necessariamente mediado pela pro-
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BOSCHETTI . BEHRING • SANTOS . MIOTO
dução de mercadorias. Vamos resgatar brevemente aspectos que consideramos centrais desse processo, buscando cotejar algumas poucas, porém important es, alusões feitas por Ma rx acerca do lista do, fund o públi co e temas conexos neste trabalho maduro. O foco nesta primeira incursão é sistematizar o ponto de partida da análise marxtana, acompanhando seu movi ment o metodo lógico, de determinações mais simples para a totalidade concreta, ou, dito de outra maneira, de como a sociedade burguesa aparece na sua epiderm e e se chega ao concreto pensado: a lógica int erna do capital marcada pela busca desenfreada e aguerrida do valor. Mar x men ciona co mo a sociedade burguesa se mostra co mo um grand e arsenal de mercadorias, constit uindo- se esta a marca aparente por excelência desse modo de produção. O caminho de Marx para desvelar essa aparência é bastante conhecido: 4 ele mostra que a produção de mercadorias para o capital, se tem nos valores de uso e no trabalho concreto a sua base material, se orienta efetiva e contundentemente para a produção de valores de troca, ou seja, ao processo de valorização, no qual o trabalho humano comparece como trabalho abstrato, diga-se, como uma "gelatina indiferenciada" (1988, p. 67), como tempo de trabalho socialmente necessário, abstraindo-se as qualida des particu lares do tr abalh o concreto. O que o capital persegue apaixonadamente é o acréscimo de valo r que apenas a subsunção do trabalho ao capital e sua exploração no processo de produ ção, que conjuga a o mesmo tempo processo de trab alho e de valorização, podem concretizar. Para que capital e trabalho se defrontassem nas condições requeridas pelo mundo do capital - um processo de acumulação prévia de riquezas prontas para serem convertidas em forças produ tivas capitalistas e "trabalhadores livres como os pássaros" foi necessário um lo ngo processo históri co, const ituí do a ferro, fogo e sangue, como mostra o Capítulo XXIV, sobre "A assim chamada acumulação primitiva" (Marx, 1982). O núcleo central da contribuição marxiana para desvendar a essência da sociedade burguesa é, portan to, a lei do valor. Cria das as condições
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de oferta de força de trabalho e de sua exploração, o volume I, especialmente no t omo 1, revela os camin hos do processo de produç ão de mercadoria s e de valor. Assi m, tem-se que a força de traba lho (capit al vari ável), .10 movimentar os ineios de produção (capital constante fixo e circulante) o que é uma po tência exclusiva d o trabal ho no processo, mesmo quando a maquinaria é poupadora de força de trabalho" — e produzir um determinado qumitum de mercadorias, além de transferir o valor agregado em capital constante (fixo e circulante) e em capital variável (seu próprio salário) para o valor final das mercadorias, acresce a elas um valor a mais. A análise de Marx revela que o processo de valorização ocorre porque a força de trabalho não é remunerada pelo que produz, mas pelo cálculo so cial de suas necessidades de repro dução co mo tal , que variam historicamente com o desenvolvimento das forças produtivas, das necessidades sociais e da luta de classes, mas que estão abaixo do que as torças do trabalho transferiram e acrescentaram de valor ao produto final. 1'arte da jornada de trabalho é trabalho necessário, cobrindo as necessidades de reprodução da força de trabalho na forma de salários; outra parte é trabalho excedente, ou seja, mais-valia, valor acrescentado. A magnitude da exploração da força de trabalho no processo de produção está relacionada à luta de classes e ao dese nvol vime nto das forças pro dulivas, estas últimas implicando maior ou menor composição técnica e orgânica do ca pital. Esses dois elementos int erfer em em form as de extração de mais-vali a enunciadas por Ma rx - a extensão da jornada de trabalho, com ampliação da parle excedente a mais-valia absoluta — e/ ou do processo de trabalho, produzindo mais em menos tempo — a mais-valia r elativa . Segundo Mar x, "o v alor não traz escrito na testa o que 5. Pato que coloca em xeque as perspectivas, mesmo que diferenciadas, que apontam para o fim «11 centralidade do trabal ho no mom ento presente em fun ção dos avanços tecnológicos e da expulsão . le força He trabalho d» pnx.essO de produção, \ esse sentido, vale retomar Ma rx quando aponta: "a mais-valia não se origina das forças de trabalho que o capitalista substitui pela máquina, mas, pelo i ontr arui, das forças de trabalho que ocupa com eia" (Marx . t. II, v. I, p. 31), intensificand o a
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ele é" (1988, p. 72), sendo que sua natureza de produto do trabalho humano disfarçada sob o dinheiro é urna espécie de hieróglifo social a ser decifrado, ao lado da aparência de que se trata da relação entre coisas e não de uma relação social. Falamos aqui da importante referência marxiana ao fetichismo da mercadoria que marca a sociedade burguesa. Neste mundo pseudoconcreto, repleto de elaros-escuros de verdade e engano, como nos ensina Kosik (1986), uma tendência que se impõe a partir da busca desenfreada de valorização, e que não é visível e muitas vezes se mostra a partir de suas contra tendências/ é a da queda tendencial da taxa de lucros, resultante de um modo de produção que se move pela concorrência, fortemente fundada na introdução de tecnologias em busca do diferencial de produtividade do trabalho num mesmo ramo ou entre países (Mandel, 1982). Há, como uma tendência intrínseca à dinâmica deste modo de produção, segundo Marx (1982,1.1, v. 111, p. 164-165), uma progressiva tendência de queda das taxas de lucro em função do decréscimo relativo do capital variável em relação ao capital constante, gerando uma composição orgânica crescentemente superior ao capital global. Trata-se da "proporção decrescente da própria mais-valia em relação ao capital global adiantado e, por isso, é independente de qualquer divis ão que se faça dessa mais-valia em diferent es categorias". Ma rx quer alertar para o fato de que tal queda independe da repartição da mais-valia, já que opera no contexto de sua produção. Nosso autor também diferencia taxa de lucro e massa de lucro. A segunda pode estar em crescimento conjuntural apesar da operação da queda tendencial da taxa de lucros no médio prazo, gerando uma aparência de que este movimento essencial não ocorre. Na verdade , essa tendência não e mais cont unden te e profunda porque são desencadeadas "causas contrariantes", dentre as quais Marx destaca: a elevação do grau de exploração da força de trabalho; a introdução de novas tecnologias capital-intensivas, que impõem óbices imediatos pela intensa exploração da força de trabalho, mas operam
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o barateamento dos elementos do capital constante; o aumento da superpopulação relativa como pressão sobre os salários; e o comércio exterior. Vejamos a seguinte reflexão de Marx: "as mesmas causas que acarretam .i queda da taxa geral de lucro provocam efeitos contrários, que inibem, relardam e em parte paralisam essa queda. Eles não anulam a lei, mas deb ilit am seu efeito. Sem isso, seria incomp reensí vel não a queda da taxa >•«• ra l de lucro, mas, pelo cont rário, a relativa lentid ão dessa queda. As sim, .1 lei só opera como tendência cujos efeitos só se manifestam de forma contundente sob determinadas circunstâncias e no decorrer de períodos pro lon gad os" (1982,1.1, v. 111, p. 181). E, vale d izer, exist em do is elemenUis que também interferem nessa dinâmica: a resistência dos trabalhadores ã exploração e a ação do Estado, seja por meio de sua capacidad e de regulação, seja especialmente agin do sobre o processo de rotação do capital, considerando que o capitalismo é unidade entre produção e circulação para a realização do ciclo globa l, expresso em D— M — D'. O fato é que há uma tendência de queda do valor das mercadorias, n,i medida em que se expulsa força de trabalho com a introdução de tecnologias. Cont udo, os capitalistas individ uais permanecem trabalhando com preços médios, o que gera superlucros aos que partem na frente. ( Vorre que, na sequência, os demais buscam se recuperar nas relações concorrenciais adquirindo o novo padrão, equali/ando a taxa de lucro nu m pat amar de valo r mais baixo e criando novas e mais fortes contradições: "a produção capitalista procura constantemente superar essas barreiras que lhe são imanentes, mas só as supera po r meios que lhe antepõe nova ment e essas barreiras e em escala mais poderosa. A verdad eira barreira da produção capitalista é o próprio capital" (Marx, 1982, 1.1, v 111, p . 189). Os "dramas" permanentes do capital e que implicam a sua "luta heróica" (Harvey, 1993, p. 170), considerando suas tendências de desequilíbrio e crise, são principalmente dois. Em primeiro lugar, produzir
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pulaçã o rel ativa. Para que a mais-v alia se realize e a mercad oria acrescida de mais-valia se metamorfoseie em dinheiro (sendo ambos formas de valor), é necessário que haja a mudança de forma de M' para D', processo que ocorre na circulação, o que aliás gero u histori cament e a aparência de que a acumulação se produz nesse momento do ciclo, segundo a economia política clássica. Em segundo lugar, há a queda tendencial da taxa de lucros, referida anteriormente, sendo um processo que força a um conjunto de movimentos para que ela nâo se imponha como contradição nodal do mundo do capital. A est a al tu ra , o(a) le it or (a ) d eve estar se pe rg un ta nd o sobre a re laç ão destas categorias ontológicas da economia política capitalista com o fundo público. Vejamos. O fundo público se forma a partir de uma punção compulsória 7 — na forma de impostos, contribuições e taxas — da mais-valia socialmente produzida, ou seja, é parte do trabalho excedente que se metamorfoseou em lucro, juro ou renda da terra e que é apropriado pelo l istado para o desempenho de múltiplas funções. O fundo público atua na reprodução do capital, retomando, portanto, para seus segmentos especialmente nos momentos de crise; e na reprodução da força cie trabalho, a exemplo da implementação de políticas sociais. Hm vários momentos de O capital os impostos aparecem como subfõrmas da mais-valia (Ex.: M ar x, 1982, t. I, v. 111, p. 39). No ent anto , se esta apr oxi maç ão é pertinente nos tempos de Marx, ela é insuficiente para o contexto do capitalismo monopolista plenamente desenvolvido, considerando que o instrumento de punção é o sistema tributário, e que parte cada vez maior do fundo público é sustentada nos e pelos salários. Ou seja, o fundo público não se forma — especialmente no capitalismo monopolizado e maduro — apenas com o trabalho excedente metamorfoseado em valor, mas também com o trabalho necessário, na medida em que os trabalhadores pagam impostos direta e, sobretudo, indiretamente, por mei o do
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consu mo, onde os impos tos estão embu tid os nos preços das mercadorias. Vamos sustentar, pelo exposto, que a exploração do t rabal ho na produç ão e complementada pela exploração tributária crescente nesses temp os de intensa crise e metaboli smo do capital, form ando o f undo p úblico , especialme nte em espaços geopolít icos nos qu ais as lutas de classes não conseguiram historicamente i mpor barreiras a sistemas tribut ários regressivos. s E qua l é o papel do fu nd o púb li co na totali dade concreta, especialmente quando adquire proporções tão contundentes, como no período após a Segunda Guerra até os dias de hoje, contrariando os discursos ideológicos neoliberais em favor de um Estado mínimo? Sc retor narmos a Mar x para encontrar pistas, pode-se inferi r das suas reflexões que o fundo públic o atua constitu indo "causas contrariantes" à queda tendencial da taxa de lucros, interferindo no ritmo da circulação di' mercadorias e dinheiro, esti muland o a metamorfose de um em outro, enfim, intensificando e mediando os ritmos do metabolismo do capital. Ou seja, o fundo público participa do processo de rotação do capital, lend o em per spectiva o processo de reprod ução ca pi ta lista como um todo , especialmente em contextos de crise. Por outro lado, o fundo público realiza mediações na próp ria repar tição da mais-va lia - pelo que é disputado politicamente pelas várias facções burguesas, cada vez mais dependentes desta espécie de retorno medi ado po r um Estado, por sua vez, embebido do papel central de assegurar as condições gerais de produção (Mandel, 1982). No mesmo passo, participam também deste processo os trabalhadores retomando parte do trabalho necessário na forma de salái ios indiretos {políticas sociais) ou na forma de bens públicos de maneira geral, disputando sua repartição em condições desiguais, considerando a correlação de forças na sociedade e no Estado. Ressalta-se aqui a dimensão política deste processo, num contexto de hegemonia burguesa e de f< »rte e sofist icada instr ument ali zaçã o do Estado, em que pese não estarmos diante do "com itê executivo da burguesia" no sentido clássico. Quan do se fala em repartição da mais-valia socialmente produz ida,
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a repartição da mais-valia socialmente produzida (a substância que se esconde) se dá pela chamada fór mul a trini tária, entre l ucro, juro e renda da terra, ainda que Marx em várias passagens trate de outros segmentos que parti cipam da repartição, como o capital comercial e o própri o Estado. Marx refere-se ao capital industrial como o representante de todos os part icip antes do b ut im (1982,1.1, v. II, p. 151) aos que acrescenta os "prebendados do Estado" (1982,t.1, v. II, p. 175), com sua paixão pelo gasto, citando Malthus, ou em outro momento do texto "o governo e seus funcionários" (1982, v. II, p. 311), conforme Marx. Vale dizer que, em alguns momentos, o fundo público em Marx comparece como uma espécie de fundo perdido, necessário para funções bastante limitadas, ainda que fundament ais para a reprodução amplia da do capital nas condições específicas do século XIX. No contexto do capitalismo monopolista em sua fase madura e vivendo hoje uma profunda crise estrutural, o fundo público passou a se constituir como um elemento nem ex nnte, nem c.v po
( AIMIAUSMOEM CRISE,POLÍTICASOCIALt DIKtITOS plexa rede de relações público-privadas que se estabelece no capitalismo maduro, tendo em vista atuar no processo de rotação do capital, acelerando. interferindo nos ritmos da metamorfose D — M — D', num contexto de monopolização do capital, no qual os automatismos do mercado efetivamente não funcionam para amortecer as tendências de crise e quando muda o lugar estrutural do Estado (Netto e Braz, 2006; Behring, 1998). Voltemos a Marx para qualificar melhor a questão da rotação do « apit.il. Quando o capital fica imo bil iza do em uma de suas formas M ou I >, ele "nào atua nem co mo forma dor de produ to, nem como formado r de valor" (1982, v. 11, p. 35). Ao contrário, a velocidade maior ou menor dessa metamorfose interfere diretamente na escala da produção. A paralisação do ciclo, seja da prod ução ou da circulação de D — M ou M' — D' , leva necessariamente a um contexto de crise, considerando que não é possível a transformação de D em D' sem a mediação da produção, em i (tu- pese "as nações de pr oduç ão capital ista serem peri odic ament e assai i.ulas pela vertigem de querer fazer dinheiro sem a mediação do procesMi de pro duç ão" (1982, v. 11, p, 44). Nesse sentido, é um ob jeti vo centr al para a reprodução do processo como totalidade encurtar a rotação do v apitai. Segundo Marx, quanto mais curt o o período de rotação do capital — por tanto, quanto mais curtos forem os períodos em que sc renovam seus prazos de reprodução dura nte o ano — . tanto mais rapidame nte st- transf orma a parti? variá vel de seu capital, originalmente adiantada pelo capitalista em forma-dinheiro, em forma-dinheiro do produto-valor criado pelo trabalhador para repor esse capital v ariável (que além disso, incl ui mais-valia); tanto mais curto é, portanto, o tempo pelo qual o capitalista precisa adiantar dinheiro de seu próprio fundo, tanto menor (•, em proporção ao volume dado da escala de produção, o capital que ele adianta em geral; c tanto maior é relativamente nua furtivamente como modesto auxiliar da acumulação, lev.ir.do por fios invisíveis recurso® moiii-i.inos. dispersos em massas maiores ou menores pela superfície da sociedade, ãs màosdecapüa-
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a massa de mais-valia que, com dada taxa de mais-valia, ele extrai durante o ano, porque ele pode comprar ma is frequentemente o trabalh ador, sempre de novo com a for mo-dinheiro de seu própr io produto-val or, e colocar seu trabal ho em movi ment o (1982, v. 11, p. 232-233). A rot açã o do ca pi ta l, se gu nd o Ma rx , é esse m ov im en to que se rep ete, envolvendo produção e reprodução, ou seja, o ciclo global, e que envolve produção e circulação. Cada capital individual é uma espécie de fração do ciclo global (1982, v. II, p. 261), que abrange o tempo de produção e o tem po de cir culação. E esses tempos são determi nados pela base material do processo produtivo e reprodutivo, diga-se, uma operação mais longa na produção e circulação implica mais riscos, exigindo suportes de crédito maiores, sendo que o Estado pode cumprir importante papel, e efetivamente vem cumprindo desde a "revolução keynesiana", seja contratando essas operações, seja ofertando crédito, seja mediando complexas relações de crédito e débito, financiando a rotação por meio do endividamento público. Portanto, no ciclo do capital parte dele está sempre "em alqueive", seja na forma de capital monetário, de estoques de matéria-prima, de capital-mercadoria não vendido, de créditos não \ encidos, pr ont o para ser mo bil iza do. !_• a luta do capi tal pela sua perenidade é a luta pela dimi nuiç ão do tempo de rotação: "quanto mai s breve o tempo de rotação, tanto menor se torna essa parte em alqueive do capital, comparada com o todo; tanto maior se torna também, com as demai s circunstânc ias, a mais -valia apr opr iad a" (l lngels, 1982, t. I, v. 111, p. 55). Se o principal meio de redução do tempo de rotação do capital é o aumento da produtividade do trabalho, entram aí também: o progresso das comunicações; o incremento do comércio mundial; e acrescentamos à import ante contri buição de Engels neste momento de O capital o lugar estrutu ral do fu ndo púb lico como suporte à rotação mais rápida em contexto de ampliação dos riscos dos investimentos, pelos efeitos da compressão espaço-temporal pr oduzi da peia busca da dimi nuiçã o do t empo
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derando os processos especulativos e o caráter fictício que parte desses « reditos na forma de letras e papéis pode adquirir. Para finalizar esta seção — voltando a dizer que se trata de uma aproximação ainda parcial que pretendemos desenvolver num esforço de maior fôlego — cabem algumas palavras sobre o crescimento da importância do fundo público para a sustentação do modo de produção capitalista. A chave heurística para uma reflexão sobre o fundo público reside na seguinte afirmação de Marx: Mas cada forma histórica determinada desse processo desenvolve ulteriormente os funda mento s materiai s e .is fornias sociais do mesmo. Tendo uma vez chegado a certo grau de maturi dade, a forma histórica determinada é removida e dá lugar a uma mais elevada. Que o momento de tal crise tenha chligado mostra-se assim que a contradição e a oposição entre as relações de distribuiçã o c, por isso, também, por um lado, a configuração historicamente deter minad a das relações de produçã o que lhes correspondem, e por outro, as forças produtiv as, a capacidade de produção, e o desenvolvimento de seus agentes, ganhe em amplitude e profundidade. Surge então um confl ito entre o desenvolviment o material da produção e sua forma social (1982, t. II, v. Ill, p. 315). O crescimento e as funções cada vez mais centrais do fundo público no capitalismo contemporâneo denot am o acirramento do confl ito ao qual se refere Marx, socializando os custos cada vez mais elevados do capitalismo em sua fase madura, destrutiva e com confirmações factuais do esgotamento de sua capacidade civilizatória. Evidentemente, a remoção desta forma histórica não está relacionada a qualquer automatismo do d e s e n v o l v i m e n t o das forças produtivas. Como fato histórico com sua hemo rrag ia de sentid os (Bensaid, 1999), esse processo depende das relações sociais, ou seja, das incidências da luta de classes.
2. Crise do capital e hipocrisia: o lugar do fundo público revelado
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momento presente, desenvolvendo uma caracterização da crise que vem se apr of und and o desde 2008/2009. Essa inferê ncia visa esclarecer o quanto prevalece o prag mati smo burguês, qu ando se trata de sua sobrevida. Melhor dizendo, cabe revelar a hipocrisia do discurso da crise do ou no Estado que veio atravessando esses anos de contrarreforma do Estado e de, ao contrário do anunciado, crescimento exponencial do fundo público. Na verdade, observa-se uma redefinição do lugar do setor públi co e do fund o públ ico no contexto dos ajustes contrarreformistas e que implicaram o crescimento do seu lugar estrutural no processo infiux de produção e reprodução das relações sociais, conforme discutimos na seção anterior. O acomp anham ento das discussões sobre a crise de 2008-2009, cujos desdobr amento s estão longe de serem debelados, como r evelam os acontecimentos na Grécia, Port ugal, Espanha e Romênia, nos mostra discur sos sobre a crise, numa espécie de disput a de dest ino que se inst auro u desde a sua eclosão. De que crise eles falam? Para os intelectuai s libera l-bu rgue ses mais ortodoxos a crise é nitidamente uma espécie de "lipoaspi ração" do sistema capitalista, um ajuste inevitável advindo dos mecanismos naturais do mercado ao qual se sucederá a recuperação do equilíbrio, tendência na qual os liberais depositam sua fé inabalável desde a Lei de Sav. Para tanto, é fun dame nta l que haja redução de custos - nas empr esas e especialmente no Estado — e todos façam o seu dever de casa. Sim, porque a crise é de todos e a saíde exige o sacrifício de todos também, o que confirma as importantes teses de Mota (1995) acerca de uma cultura da crise. Temos então u ma di sfunç ão passageira, segund o essa tese, que ademais é o argumento de ferro dos liberais. Para os keynesianos — e "muitos governas, empresários e intelectuais orgânicos r 1a burguesia dormiram neoliberais e acordaram keynesianos após a falência do Lemon Brothers" (notas da inter venção de Valério Arcary, São
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Luis, 2(X>9), que foi uma espécie de catalisador desta crise recente, num verdadeiro processo de reconversão — a crise é de falta de regulação, como se a desregulamentação tivesse sido uma espécie de capricho, de ivvanche l iberal irresponsável. O processo de desregulamentação pe rmitiu n os últ imo s anos, com o ascenso dos neoliberais, a presença de investidores gananciosos e inescrupulosos, exponenciando o capi tal fi ctício e .1 concessão irresponsável de créditos, em especial os empréstimos sub prime — para casa própr ia de assalariados de baixa renda: as chamadas hipotecas tóxicas. Então, nessa perspectiva, a crise seria de excesso de ovdito sem escopo por parte dos devedores, gerando inadimplência e incapacidade dos bancos e instituiçõe s financeiras de sustentar essa grande oferta em condições de inadimplência. A saída da crise estaria, portanto, condi cion ada a fortes doses de regulação, o que Kat z (2008) chama ile "fantasia da regulação". A hi pó te se ex pl ic at iv a da cr is e qu e ofe rec emo s neste te xt o, nu m diálogo com vários analistas, parte da tradição marxista. Assim, a crise não é uma disfunção ou um problema de regulação, mas é parte constilutiva do movimento contraditório do capital. Nenhum automatismo do mercado leva à situação de equilíbrio, como insistem os liberais mais aguerridos numa atitude nitidamente ideológica; e mesmo a regulação kevnesiana tem grandes limites de estabelecer controles no capitalismo maduro, incontrolável,como nos diz Mészáros (2002). I larvey (2004) fala ile um processo de acumulação por espoliação avançando inclusive sua reflexão anterior sobre a acumulação flexível, apanhando determinações mais profundas desse momento histórico. A saída keynesiana da crise de 1929 propiciou os trinta "Anos Gloriosos" nas condições geopolíticas e econômicas específicas do pós-guerra, mas o deslocamento regressivo a partir dos anos 1970 mostrou claramente o esgotamento daquele período. A on da lo ng a ex pan si va não res ist iu aos mo vi me nt os de con cor rên ci a acir rados d iant e da queda da taxa de l ucros em fins dos anos 1960, quando se equali zam as taxas de lucro, engendrando um longo período com
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do sistema, mas em meio a uma tendência geral de baixo crescimento. Isso ocorre apesar da gran diosa reação burguesa desencadeada por meio da combinação entre reestruturação produti va acompanhada da quebra da espinha dorsal do movimento dos trabalhadores acima e abaixo da linha do Equador; neoliberalismo, com a contrarreforma do Estado por via dos chamados ajustes estruturais; e mundialização do capital, com a deslocalização de empresas, deslocamento do investimento externo direto, política concentradora de patentes, espraiar de relações capitalistas pelos antigos espaços do "socialismo real", a exemplo da China, o que alguns vêm chamando de restauração capitalista, entre outros intensos movimentos, como nos mostra o importante trabalho de Chesnais (1996), entre outros. Se essa reação burguesa p rop ici ou alguma retoma da das taxas de lucro, n ão houv e a retomada das taxas de crescimento, ou seja, não adentramos num ciclo virtuoso de crescimento do emprego e da renda. Por outr o lado, a retomada das taxas de lucro deu-se a part ir de uma d inâmica de excesso de liquidez de capitais, ou seja, azeitando as instituições financeiras, sem dúvida as que mais se beneficiaram desse processo. As estimativas que vêm das análises econômicas falam de um PIB mundial de aproximadamente 55 a 60 trilhões de dólares e de um volume de capitais fictícios que pode chegar a 550 trilhões de dólares. Isso nos diz da natureza dessa crise: uma crise de abundância de capitais, de superacumulação, em que grandes volumes de capitais não encontram caminh os de valorização, embora os busquem desesperadamente e com rentabilidade máxima no contexto de um capitalismo tóxico, nos termos de Husson (2(X)8), inclusive penetrando em territórios antes não tào mercantilizados, a exemplo da educação, da saúde e da previdência, fortemente mercantilizados neste últimos anos.1 Esses capitais encont ram refúg io na atividade financeira com a punção de capitais na forma de dinheiro, mas aí também passam a encont rar limit es, já que a expansão fictícia de capi-
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perar. Vale dizer que boa parte da população mundial encontra-se desempregada e desmonetarizada, o que leva também a uma situação de superprodução, atingindo duramente a chamada "economia real", em • |ue efetiv amente ocorre a pro duçã o de valor , especialmente os setores de b e n s duráveis: imóveis, automóveis, bens de consumo durável, móveis. I rata-se de uma lição acelerada de capitalis mo, co nfor me Katz (2008), no ápice de uma onda longa de tonalidade depressiva. Quando estourou a crise muitos analistas fizeram comparações com l l J29-|932. Não obstante a tentação seja grande, é importante chamar a atenção para o fato de que o contexto em que essa crise se desenvolve é bastante diferente daquele. Hoje há interdependência e entrelaçamento entre capitais bem maiores, bem como ocorre uma coordenação entre os bancos centrais dos Estados Unidos, Europa e Ásia que não existia no início do século XX. Os países tinham mais autonomia para estabelecer políticas protecionistas, o que a lógica da mundializ ação po uco permite atualmente, como mostra a situação da Grécia, amarrada na camisa de lorça do euro, o que expõe o projeto da União Europeia a uma forte crise. Kalz (2008), um dos analistas mais consistentes dessa crise do ponto de vista crít ico, chama a atenção para o fato de que uma confron tação bélica precede u e sucedeu a crise de 1929-1932, o que també m estabelece diferenças. As guerras localizadas tiveram o seu papel ao longo de todo o período de expansão (nesse caso a Guerra Fria cumprindo um papel fund ament al) e mant êm essa importân cia na estagnação (a "gue rra contra terror", hoje elogiada pela apologética de Hollywood). Contudo, não se vislumbrei nas melhores análises a queima de forças produtivas de forma tão contundente e abrangente em curtíssimo prazo, em que pese o quadro de médio e longo prazo não sugerir que essa hipótese deva ser descartada, pelo contrário. A e xpl ica ção mar xis ta da cris e, q ue nos o ri en ta nesta anál ise, a loca liza menos na fantasmagoria financeira, com seu fetichismo exponenciado ai nda qu e exista a superacumula çao e que ela seja seu elemento deto-
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tud o segue sendo vi rt ual . Poré m, quand o ele se faz valer, se descobre que está submeti do à lei do valor , o que consiste em dizer simplesme nte que nào se pode dist rib uir mais riqueza real do que a que foi prod uzid a". A base material mais prof und a da crise, portant o, está localizada na defasagem crescente entre um restr ito pode r de consumo, cent rado no consumo de luxo fort emente de strut ivo, frente a uma expansão crescente da produção, o que foi alimentado em um ambiente competitivo acirrado para incrementar as taxas de exploração. Falamos aqui da ofensiva sobre a força de trabalho, baixando o salário — na maior parte dos países caiu a renda do trabalho como proporção do PIB no contexto da reação burguesa —, desempregando massivamente e reconstituindo a superpopulação relativa ou exército industrial de reserva. Trata-se da redução de custos, o que tem impactos sobre o emprego, o salário e o consumo. Acresce nta-se a í ma is um pi la r d a cr ise qu e f oi o enc arec ime nto das m atérias-primas, processo este incentivado pelos especuladores, encarecendo o abastecimento básico, a exemplo dos alimentos, o que ameaça cerca de 1,3 bilhão de pessoas no mundo hoje, especialmente na periferia do capital (Katz, 2008). Nesse momento histórico em que superprodução e superacumulação encontram-se de forma combinada e explosiva, constituindo-se como o ápice de uma o nda longa com tonalidade d e estagnação, qual é o impacto sobre o fund o público? As instituições financeiras exigira m o socorro público para restaurar a confiança nos mercados, adquirindo títulos depreciados, para revalorizá-los e revende-los; imprimindo dinheiro — inclusive tornando a inflação um mal menor, diferentemente do discurso anterior à crise. Nos Estados Unidos, o governo Bush injetou, com ti primeir o pacote amplamen te di vul gad o na imprensa, US$ 700 bilhões para conter o pânico bancário desencadeado pela crise do crédito imob iliá rio. Mas fala-se em suportes da ordem de US$ 1 trilhão nos Estados Unidos. O governo do Japão injetou USS 10 bilhões e os governos da União Europeia seguiram pelo mesmo caminho, inclusive com a ampliação arris-
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as 20 maiores corporações agro indúst ria is — que dem iti ram cerca de 100 mil trabalhadores — para conter os efeitos da crise internacional, no mesmo passo em que assegurou apenas R$ 20 milhões em linhas de i rédito para os assentamentos de reforma agrária, como denunciava o VIS T no ano passado. Mas esses forani apenas os prime iros mov imen tos entre nós. n Façamos uma ref lexão ret omand o alguns elementos da seção anterior. Vi mos que o fundo pú blic o se forma a parti r de uma punção comp ulsória na forma de impostos, contribuições e taxas — da mais-valia socialmente pro duzi da, ou seja, é parte do trabalho excedente que se metamorloseou em lucro, juro ou renda da terra e que é apropriado pelo Estado para o desempenho de múl tipl as funções de reprodução do cap ital e da força de trabalho. O instrumento de punção essencialmente é o sistema 11 ibutár io, e parte mai or ou m enor do fun do pú blico , a depender da corr e l a ç ã o de forças entre as classes — que tem sido desfavorável ao campo do trabal ho é sustentada pelos salários. Ou seja, vim os também que o I und o púb lic o não se forma apenas com o trab alho excedente metamor foseado em mais-valia, mas também com o trabalho necessário. Nossos estudos e discussões no Grupo de Estudos e Pesquisas do Orçamento Público e da Seguridade Social (GOPSS/UERJ) vem indicando que a exploração ampliada do trabalho — com indicadores generalizados de queda da massa salarial como parte dos PIB dos países — na produção é complem entada pela exploração tributár ia crescente. No Brasil, por exemplo, a tributação pesa em mais de 60% sobre o trabalho, como nos mostra Salvador (2010, p. 205-229), sendo que desde o Plano Real a carga tributaria aumentou de 29% para 35% do PIB até 2007. Neste passo, observa-se que os impactos da crise do capital sobre o fundo público se dão em duas dimensões. Primeiro, na sua formação, implicando "reformas" tributárias regressivas, à medida que o fundo públ ico se toma v ita l numa perspectiva anticíclica, diga-se, de contenção tia crise, e implicando também o desencadeamento de mecanismos de
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renuncia fiscal para o empresariado, para "proteger o emprego". Segundo, na sua destinação. De que maneira? Adq ui ri ndo ativos das empresas "adoecidas" também sob o argument o de proteger o emprego, apropriando-se de recursos de reprodução do trabalho para sustentar essa movimentação; interferindo diretamente nos processos de rotação do capital, tendo em vista pr opici ar a sua valorização de for ma mai s acelerada, por meio de parcerias público-privadas (mecanismo fundamental que forma a base do Plano de Aceleração do Crescimento no Brasil), contratos e compras estatais; pelo fornecimento de crédito; dentre outros expedientes. Esses são movimentos que mostram que o fundo público tem um papel estrutural no circuito do valor, criando contratendências à queda das taxas de lucro, atua ndo permanent e e visceralmente na reprodução ampliada do capital. Os números da mais recente crise são contundentes, tanto quanto os indicadores do empobrecim ento generalizado das maiorias, especialmente na periferia do mundo do capital, além do desemprego em expansão em todas as quadras do m und o, i nclusive na China que vinha mantendo sua economia "aquecida".
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til uir como um elemento cada vez mais estrutural ecentral na reprodução do processo global, o fundo público mostra também que chegamos a uma . spécie de ponto sem volta, no qual a contradição entre o desenvolvimento das torças produtivas e as relações sociais de produção apresenta-se ila forma mais dramática, constituindo a sua alocação perversa para o « apitai em vez de uma destinação para a proteção das maiorias trabalha11<>ras, a expressão mais contundente deste drama. A crise em curso aprernta saídas capitalistas regressivas ebárbaras, socializando seus custos, .1 exemplo da forte ofensiva contra os salários e os direitos sociais, talvez ainda maior que a dos anos de emersão do neoliberalismo, especialmenle nos países onde esses direitos tiveram mais consistência e força em função da configuração da luta de classes. Esta última afirmação nos leva a concluir nossa contribuição neste texto: a disputa de destino engendrada pela crise do capital mais que nunca requisita a presença na cena pública e polít ica no senti do gramseiano da grande política — dos trabalhadores. A saída da crise só poderá ser civilizatória se o chamado dos trabalhadores gregos para os demais ressuscitar a velha toupeira: "Trabalhadores da Europa: levantem-se".
Pequena nota conclusiva Referências bibliográficas A pó s esse pe rc urs o, que ma is en un ci a ca mi nh os d e a pr of un da me nto da pesquisa do que propriamente oferece respostas conclusivas, é possível fazer algumas anotações finais. Salta aos olhos a atualidade dos aportes marxia nos, pont o de sustentação decisivo dos argumento s críticos enquanto per durar o capitalismo como relação econômico-social. Contudo, o te mpo presente exige que se apr ofu nde a pesquisa factual e teórica, para que possamos apanhar as mediações que atravessam a totalidade concreta, buscando-as com a poderosa bússola de Marx, mas indo além dele. Este é o caso do tema do fundo público que opera por uma gama ampla de ações de maior ou menor envergadura, incidindo sobre a rotação do capital, tanto no tempo de trabalho quanto no tempo de circulação,
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Evilásio Salvador*
Introdução O f und o públ ico ocupa um pape! relevante na articulação das poli liças sociais e na sua relação com reprodução do capital. A presença dos lun dus pú bli cos na reprod ução da força de trabalho e gastos sociais é uma questão estrutural do capitalismo (Oliveira, 1998). Existe urna miríade de formas de gastos sociais e de financiamento, incluindo a questão da manutenção e da valorização dos capitais pela via da dívida publica. A formação do capitalismo seria impensável sem a utilização de recursos públicos. No capitalismo contemporâneo, os juros da dívida pública pagos pelo fun do públ ico ou a conhecida despesa "serviço da dív id a" do orça-
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mento estatal (juros e amortização) são alimentadores do capital portador de juros por meio dos chamados "investidores instit ucionai s", que englobam os fundos de pensão, fundos coletivos de aplicação, sociedades de seguros, bancos que administram sociedades de investimentos. O capital portador de juros está localizado no centro das relações econômicas e sociais da atualidade e da atual crise financeira em curso no capitalismo contemporâneo. No Brasil, o serviço da dívida compromete uma parcela importante dos orçamentos da seguridade social e fiscal, seja na forma de juros e encargos da dívida, seja no pagamento de amortização da dívida para o setor financeiro da economia. A cr ise ec onô mi ca se ins tal a nov am en te pe lo mu nd o, oc or re ndo um a redução na produçã o mun di al e agravando a crise do capital, trazendo o desemprego em massa e afetando a vida de milhares de trabalhadores. Novamente, o Estado, por meio do fundo público, comparece no socorro do grande capital, especialmente das instituições financeiras. O objetivo deste capítulo é analisar a crise do capital a partir do socorro realizado pelo fu ndo pú bli co no contex to de financeir izaçâo da riquez a e alteração nas políticas sociais. Destaca, especialmente, na últ im a seção, as imp lic ações da crise sobre o fundo público da seguridade social no Brasil.
A financeirizaçao da riqueza e as mudanças na proteção social Entre o final dos anos 1960 e começo da década de 1970, o desenvolvimento fordista, as políticas kevnesianas e o projeto de listado Social, que vi gor ou nos países centrais, são postos em xeque, e consigo os direi tos derivados da relação salarial. A exploração sobre a força de trabalho, ju nt am en te co m as nov as téc nic as pr od ut iv as , el ev ou a ex tr açã o da mais-valia relativa sob a égide do Welfmv State, ainda que o Estado Social tenha assegurado avanços aos trabalhadores, com a redução do desemprego e a garantia de direitos sociais. A ofensiva do capital vai trazer
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sérios riscos à proteção social e às conquistas sociais do período pòs-Segunda Guerra. A nova fase de acumulação capitalista vai ser capitaneada pela esfera financeira, e no campo ideológico o velho liberalismo se vesle com a "nova" roupagem, rebatizado de neoliberalismo. O quadro revela as limitações das políticas kevnesianas diante da internacionalização do capital, com sinais de esgotamento do padr ão de hn.i ncia ment o das políti cas sociais e a reação do ca pital à queda das taxas ile lucro, na sua sanha pela acumulação e, portanto, por superlucros. Os capitalistas se armam para revogar as conquistas sociais do pacto so»i.il-democrata investindo contra os trabalhadores, em busca de restabelecer um novo padrão de acumulação para saída da crise. O desenvolvimento de novas tecnologias aumenta a composição orgânica do capital, reforçando a tendência decrescente da taxa de lucros. Para Mandel (1990), como a força de trabalho está reduzida em relai .io ci reprodução automatizada, ocorre um a queda no valor unitár io das mercadorias, desvalorizando o capital. Há uma superprodução global, .iiimentando o excedente, o que corrobora para a crise clássica do capitalismo, elevando a possibilidade de estagnação. Os novos investimentos para atender à demanda elevam a capacidade produtiva, chegando ao apogeu com a realização da produção. Mas o sistema capitalista não funciona em equilíbrio. Assim, quando a expansão se encerra e a capacidade ociosa surge, não há realização do consumo. A produção de mercadori as para alé m do seu val or de uso entra em choque com sua realização enquanto va lor de troca, gerando uma crise de superprodução. A cri se se man if es ta ju nt am en te co m a reação do ca pi ta l con tra o I siado Social. A onda de expansão do capitalismo expõe também a contradição do pró pri o sistema, e o avanço tecnológico com uso intens ivo de « apit ai vem acom panh ado de economia s com a força de trabalho, solapando o pacto dos anos de crescimento com pleno emprego e o arranjo da soeial-democr acia para as polític as sociais. A inflação a part ir do s anos
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A cris e é r esu lt ad o de um con ju nt o co mp le xo de elem ento s, não podendo ser reduzida a uma única causa, como a superprodução ou subconsumo. Mandel (1990) destaca a queda tendencial na taxa de lucros e o aumento da composição orgânica do capital como intensificação de uma crise com múltiplas dimensões. A busca pela expansão global de mercados aumenta a concorrência capitalista acentuando a redução nos preços e, portanto , no valo r das mercadorias, obri gando a intensificação da extração da mais-valia, que tem certos limites em função da redução do quantitativo de trabalhadores na produção. O baixo retorno dos investimentos pr oduti vos, ou seja, a queda na rentabilidade leva a uma fuga do capital do setor produtivo para a esfera financeira, agindo de forma especulativa. 2 Nesse quadro, há um redirecionamento de capitais para setores improdut ivos: mili tar e financeiro especulativo. Ma ndel (1990) ressalta que, na crise de superprodução, a queda na taxa média de lucros cria um ambiente propício para expansão e aprofundamento da especulação. O crédito incessante leva ao agravamento do endividamento das empresas, gera ndo resistência para ajustes tempes tivos de preços e de lucros, apesar de encargos financeiros crescentes combinados com queda na rentabilidade, o que produz uma "bomba" de efeito retardado. A expansão do crédito é a forma encontrada pelos bancos para evitar as bancarrotas em cadeia. Com isso, de acordo com Mandel, durante o boom do superaquecimento, lica mais encoberto, no curto prazo, o inexorável crftsli. A especu lação fin ance ira vai gan har nov os con tor nos a pa rt ir de meados da década de 1970, com a criação dos novos " pro dut os" financeiros. Convém relembrar que um aspecto relevante da instabilidade econômica mundial dos anos 1970, a questão financeira, tem a ver com os problemas financeiros experimentados na economia norte-americana: 2. De acordo com Agli etta (2004a), o conceito de especulação fui defi nido, em W39. pelo economista Nicholas Kaldor: "a compra (ou ver.da) do mercadorias tendo em vista untn revenda (ou re-
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"loi nos Estados Unidos, na década de 60, que nasceram os determinantes da instabilidade estrutural que tem atingido as economias nacionais • • inter nacion ais nas últ ima s década s" (Braga, 1993, p. 27). A econom ia americana conviv eu nesse período com um processo inflaci onário cerca»lo de incertezas financeiras, gerando uma instabilidade internacional das lavas de juros e de câmbio. Para Braga (2000), já estão presentes, nessa , use da economia americana, a ampliação da natureza financeira da riqueza no capitalismo, a busca da rentabilidade acelerada, o que se aplica tauto às corporações quanto à construção de posições por parte do sisteiii.i financeiro, na trajetória em direção à preponderância dos ativos líquidos e rentáveis. Nos anos 1960, quando os Estados Unidos passaram a conviver com inflaç ão ascendente ec om incertezas financei ras, que levaram à extinção da conversibilidade ouro do dólar e, por consequência, à explosão da instabil idade mun dial das taxas de juros e de câmbio, a moeda deixou de ser plenamente estável, mesmo nos países desenvolvidos. Com isso, os países do centro do capitalismo passaram a perseguir uma articulação e n l r e inovações financeiras e inovações técnico-produtivas que possibilitasse o crescimento com inflação controlada e a realização dos investimentos industriais (Braga, 1993 e 2000). Nío novo cenário econômico mundial, há uma busca irrestrita de mobilidade global por parte do capital para a qual a flexibilização e as políticas liberalizantes são imperativas. Um a das novidades no processo de globalização, no século XX, é a acentuação da esfera financeira no processo de acumulação capitalista, em que as alterações em curso t razem maior instabilidade econômica e taxas de crescimento medíocres ou negativas. Por outro lado, são realizadas com o aprofundame nto da globalização fina nceira (Fi ori e Tavares, 1993), evidente co m a crescente autonomia do capital financeiro relativamente ao setor produtivo industrial e «i maior dependência dos investimentos dos fluxos internacionais de i npitais, que se tornam mais voláteis e atomizados, trazendo sérias con-
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A aná lis e da ma cr oe co no mia fi nan ce ira fei ta po r Ag li et ta (2004a) revela que a partir dos anos 1980 ocorreu uma lorte expansão financeira, paralelamente a desaceleração do crescimento econômico nos países desenvolvidos. O novo ambiente financeiro foi propício para acumulação patrimonial das famílias mais ricas. Na análise do ciclo de vida e da transição demográfica, o autor explica que os adultos em idade madura (entre 40 e 60 anos), nos países que lograram uma sociedade salarial, pou pam bast ante para pagar suas dív ida s passadas e para acumu lar uma riqueza financeira e imobiliária visando à aposentadoria. Uma parcela crescente dessa poupan ça é aplicada em seguros de vida e nos fund os de pensão administrados pelos investidores institucionais. Para Agliett a (2004a, p. 2^): A desregulamentação das finanças abri u novas perspectivas para a p oupança, que saiu dc seus refúgios tradicion ais, nos bancos e nas cadernetas de poupança, rumo a mercados de títulos ea aquisições imobiliárias. Esse redireccionamento foi canalizado petos investidores institucionais (companhias de seguros e fundos de pensão) que foram forçados pela concorrência realizar administrações mais dinâmicas das carteiras que lhes eram confiadas. Ele também foi acelerado por novos intermediários do mercado, fundos de participação e negociadores de títu los de todos os tipos. A atração das famílias foi gara ntida pelas esperanças de ganhos de capital suscitados pelos mercados abertos, desregulamentados t» vitaminados por incentivo* fiscais (grifo nosso). Com isso, a liberalização financeira pavimentou o caminho para acumulação da riqueza privada de forma mais rápida que em outras épocas do capitalismo. Contudo, n "riqueza" não veio por meio da economia real, ou seja, pela pro dução de novos bens e serviços, já que a taxa de crescimento da produção decresceu sensivelmente a partir de meados dos anos 1970. A "'riqueza" foi resultado de uma inflação do preço dos
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Para Aglie tta (2004a), as finanças não são neutras, po is elas influenpriedade desenc orajam as apostas das empresas na inova ção e forçam a taxa de juros real a elevar-se acima do nível que torna o rendimento •.obre os créditos competitivos com o dos ativos especulativos" (p. 29). As tra nsf orm açõ es qu e vê m oc or re nd o no sis tem a fi na nc eir o int ernacional têm lev ado os bancos, a parti r dos anos 1980, a adotar estratégias que possam garantir formas de acumulação de capital num quadro de maior concorrência no setor bancário. Nesse contexto nascem os novos instrumen tos financeiros, como a securitização das dívidas e os derivat ivos. Esses produtos ganham agilidade com os avanços tecnológicos em informática e telecomunicações no sistema financeiro. Uma dimensão importante da liberalização financeira foi o desenvolvimento de novos produt os de mercado: tí tulos negociáveis, o contratos associados a esses títulos (instrumentos derivados). Pode-se considerar que eles influenciam positivamente o financiamento do investimento de três maneiras: trazendo novos meios dc aplicar a poupança, reduzindo o custo do capital, facilitando a diversificação dos riscos (Aglietta, 2004a, p. 29). O desenvolvimento desses mercados especulativos permitiu um enriquecimento priva do, sem encorajar o investimento prod utivo . Aglietta (2004a, p. 27) destaca que nos anos 1980 ocorre uma "orientação da I >< tu pança rum o aos investidores inst ituciona is, graças ao desenvolv imento de regimes de aposentadoria por capitalização em numerosos países, estimulado pelas perspectivas do envelhecimento demográfico". Por outro lado, a vulner abilida de do sistema financeiro pode levar .i existência do risco sistêmico, ocasionando a reestruturação global das instituições financeiras, dada a natureza especulativa da atuação destas,
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(2004b) chama atenção para a ausência de regulamentação e supervisão por parte do Estado dos mercados derivativos, que reforça o risco sistêmico, pois os instrumentos derivados estão fora dos balanços dos bancos, enquanto a regulamentação preventiva dos bancos centrais é focada nos balanços das instituições financeiras. A complex idade dos novos produ tos financeiros e as interdependências dinâmicas que eles têm entre si os fazem propagadores do risco global, em contexto de instabilidade macroeconômica. Historicamente, os recursos financeiros centralizados pela dívida sempre foram cativos dos mercados financeiros. Com a nova etapa da acumulação financeira, os divi dend os tornam-se também um mecanismo importante de transferência de riqueza e de acumulação. A pressão dos mercados sobre os grupos i ndustri ais i mpõe novas normas de rentabili dade e exigências de redução de custos salariais, aumento de produtividade e flexibilidade nas relações de trabalho. Conforme Chesnais (2005, p. 43) "os empréstimos às sociedades (empresas e bancos) mediante obrigações hipotecárias aos particulares com ple tam a panópl ia da apropria ção, cuja força últi ma se encontra na produção". Os empréstimos são mecanismos articulados com taxas de ju ro s i nt erb anc ári as bai xas e co m c ri açã o de cr éd it os , f or ma nd o a base da poli tica de estí mul o às despesas, que para o aut or ( p. 43) é "característ ica da macroeconomia do regime de acumulação financeirizada". A des re gu la me nt aç ão fi nan cei ra em vog a nos te mpo s ne ol ib er ai s também abriu espaço para a onda de fusões e aquisições de empresas, sob a ameaça de tomada de controle por parte de interesses financeiros externos. A doutrina neoliberal advoga que um dos benefícios das fusões e aquisições é o de aumentar o val or das empresas negociadas nas bolsas de valores, uma vez que a capitalização e a reestruturação implicariam elevação da produtividade global. As fusões e aquisições teriam, assim, o efeito inovador dos fundos de risco na criação de novas empresas guiadas e promovidas pelos mercados financeiros (Aglietta, 2004a).
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extraordi nária de fusões que varre a economia m und ia l na virada do • 'culo XXI tem objetivos diferentes que os de melhorar o bem-estar social por mei o de uma maior eficácia econômica". A pri vatização de empresas públicas, especialmente aquelas consideradas monopólios naturais (transportes aéreos, água, gás, eletr icida de, tel efone, ferrovi as, correios), desenvolvida sobre escombros do controle bancário não trouxe maior desenvolv iment o econô mico e social e mui to menos ganhos econômicos. Pelo i ontr ário , tro uxeram somente benefícios para os operadores dos mercados linançeiros. O corolário da liberalização financeira é a ressurreição de ciclos económicos, que são intensamente influenciados pelos preços dos ativos financeiros. Agl iet ta (2004a) observa qu e, no iníci o dos anos 1990, os países ila OCDi: sofreram uma recessão de duração inabitual que foi caracterizada por enormes problemas financeiros com repercussões sobre a economia real. A interligação entre a valorização dos ativos e o crédito é a lorça determinante do ciclo financeiro, pois a exposição ao risco provoca volat ilid ade do investi mento e ocorrem também novos arranjos patr imoniais orientados pela busca da liquidez. Assim, conclui o autor, quanto maior é a liberalização financeira, mais a instabilidade financeira afeta um número cada vez maior de economias. Com isso, o tamanho, a inten'.idade e o tempo da recessão estão diretamente relacionados com a desestabilização dos sistemas financeiros nos anos 1980. Ag li et ta (2004a) co mp ar a os 1950 anos ant eri ore s à Pr im ei ra Gu er ra Mundial, que foram marcados pela abertura financeira internacional e elevado desenvolvimento dos mercados financeiros, em contraponto ao período pós-depressão de 1930 até meados dos anos 19/0, que foram marcados por finanças administradas em estruturas nacionais.
Crise do capital e fundo público A
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Com crises financeiras recorrentes, a principal função dos bancos torna-se impos síve l, pois o efeito delas é exatamente a desorganização da intermediação financeira. Diante disso, os bancos não têm mais informações sobre seus devedores, o que leva ao estrangulamento do crédito, o qua l tem rebat imento sobre toda a economia, acarretando, po r consequência, a depressão econômica. A gliet ta (2004b), ao relatar as crises financeiras mais recentes, lembra que os bancos americanos passaram por dificuldade s em 1987, com aume nto do vol ume de créditos duvido sos. A reestruturação dos balanços dos bancos nos Estados Unidos, naquele período, d ur ou 18 meses e foi conduzi da pelas autoridades públicas. Os países escandinavos também vivenciaram crises financeiras no início da década de 1991), que o autor chama de "coquetel explosivo de liberalização financeira br utal" , os créditos aumentara m consideravelmente no setor imobiliário, sendo financiados no mercado monetário. A situação só foi resolvida por meio da intervenção governamental, com elevado custo social de resgate do sistema finan ceiro, poi s as perdas bancárias custaram 8"i. do PIB na Suécia e 15"-. na Finlândia. O socorro veio do fun do p úblic o: "u ma agência de Estado foi criada em cada um dos países escandinavos para gerenciar a assistência financeira liberada pelo parlamento do orçamento público" (Aglietta, 2001b, p. 22).
< l.t recessão econômica mundia l. Na nova c onjunt ura, os bancos redu ziram ns prazos para empréstimos, bem como sua emissão, agora então com laxas flutuantes e mais elevadas, aumentaram brutalmente o custo com < > serviço da dí vid a nesses países, ao mesmo tem po que as receitas com exportações estavam em declínio. O choque monetário transformou crises localizadas das dívidas nacionais em crises sistêmicas, tendo como marco a moratória mexicana de agosto de 1982. A crise da dívida vai promovei o FMI ao papel de tutor das políticas econômicas dos países em desenvolvimento. Após longo percurso objetivand o o aumento das receitas ve ando honrar os serviços da dívida, ou seja, o pagamento de juros e amortização, chega-se em 1989 ao plano Brady, que permite novamente «i acesso ao mercado de títulos dos países em desenvolvimento, após a nu nat ória do Méxi co. A abertura f inanceira ocorre justamente no momento em que as instituições financeiras estão desejosas de encontrar novos i lientes para compensar a perda de rentabilidade decorrente da crise imobiliária (início dos anos 1990) dos países desenvolvidos.
No mesmo caminho seguiram os países em desenvolvimento, agora rebatizados de "emerg entes" a partir da adesão ao Consenso de Washington. I.embrando que esses países tinham se endividado gravemente após os dois choques dó petróle o {1973 e 1978). O endiv ida ment o banc ário foi arquitetado por meio de sistemas dos grandes bancos internacionais no mercado interbancário do eurodólar, que reciclava os chamados petrodólares. O aumento do endividamento externo dos países da América Latina e do serviço da dívida em relação à capacidade de exportações deles marca a primeira onda de crises financeiras nesses países.
As si m, o a jus te es tr ut ur al fo i a c ar ti lha eco nôm ica associa da a lib elali/a çào financeira, conforme A gliett a (2004b, p. 12):
Na realidade, uma das razões para a crise financeira generalizada
I n tão, uma das prim eira s dimensões do processo de internac ionalização das finanças foi o arresto dos países devedores da periferia do caI>iialismo, inici ado a inda na década de 1960 e intensifica do nos anos 1970, culmi nand o com a introdução de regimes cambiais liberalizados.
\' a últ ima década do século XX, a liberalização financeira chegou aos países em desenvolvimento. Os governos das grandes potências que se debatiam com as sequelas da crise imo biliá ria 1990-1991 e as grandes instituições financeiras que buscavam novos terrenos de expansão elaboraram uma dout rina batizada de "Consenso de Washington". Por intermédio do FMI , tratava-se de persuadir os governos dos países em desenvolvimento c dos países desorientados pelo desabamento do comuni smo a sc engajarem rapidamente na liberalização financeira para uni ajuste estrutural rumo à
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Essa foi a origem das mais graves crises financeiras desde a grande depressão. O Méxic o no início de 1995, a Ásia na segunda metade de 1997, a Rússia em agosto de 1998 e o Brasil no final de 1998 foram os focos de crises violentas cujas repercussões internacionais foram extensas.
luições financeiras de poupança e empréstimos) norte-americanas; 1994, crise de debentures norte-americanas; 1997, primei ra fase da crise financeira internacional (Tailândia, Coreia, Hong Kong); 1998, segunda fase (Rússia, ISrasil); 2ÜÜ1-2Ü03, estouro da bolha da Internet. 1
O mundo cias finanças globalizadas tem sido marcado por uma sucessão de crises financeiras. A fragilidade sistêmica das crises, conforme Chesnais (2005), está no volume elevado de créditos sobre a produção futura que os detentores de ativos financeiros consideram pretender, assim como na busca de resultados das aplicações financeiras dos administradores de fundos de pensão. Km contexto de baixo crescimento econômico compa rativam ente aos capitais que buscam se valori zar nos mercados financeiros, as crises financeiras decorrentes da especulação e da instabilidade sistêmica são inevitáveis.
As crise s financ eira s nos anos 1990, nos cham ado s países emergentes (Uussia, México, Argentina, Brasil, Tailândia, Indonésia e Filipinas), são n•Miltadns diretos da liberalização e da desregulamentação comercial e pi ivati zação dos sistemas p rod uti vo s desses países. Para Chesnais (2005), • > • investidores insti tucionai s incorpor aram esses países à mundiali zação lin.meeira, mas também perceberam a submissão completa às políticas neoliberais para a captação dos fluxos de renda.
Chesnais (2005) observa que os investimentos financeiros podem inicialmente ter alguma base racional calcados, por exemplo, na produção ou na inovação tecnológica. Contudo, os especuladores se aventuram coletivamen te nas "tentativas para valori zar a diferença entre as possibilidades da economia e as expectativas dos mercados, que surgem da fantasmagoria própria ao dinhe iro, que se acredita dotado da capacidade de gerar lucr o por si só" (p. 63). Com o predom ínio da desintermediação financeira e da concorrência dos investidores institucionais, os bancos e as sociedades seguradoras desenvolveram compo rtam ento de alt o risco em operações com derivativos que são originárias exclusivamente da especulação. Com isso, as crises financeiras assumem, a pa rt ir da liber alização financeira, as características de crises simultâneas em vários mercados financeiros (câmbio, bônus do tesouro, ações) e no sistema bancário, Em seguida, de forma abrupta, contagia a produção. A li bera liz ação fina ncei ra tem s ido marcad a p or sucessivas crises; na realidade, como lembra Lordon (2007): Desde que ela se impôs, tem sido difícil passar mais de três anos seguidos
Com isso, a violência e a velocidade das crises nesses países que se propagaram em direção à produção e ao emprego revelaram não só in« ompetência dos governos locais que apostaram na liberalização finan• eira para a entrada na economia de mercado, como também mostrar am • 11 ie a propagação é decor rent e das políticas neoli berai s q ue enfraqueceram o Estado e o conjunto do sistema produtivo. Assim, assistiu-se à lormação de elevados déficits comerciais, à degradação do saldo de contas correntes, sob o efeito dos juros do serviço da dí vida , e ao aumenti» das remessas de lucro s e di vi de nd os para o exte rior rum o à mat riz i las empresas sediadas no centro do capitali smo. O s devotos do neoliberalism o omi tem quanto c ustou, aos assalariados, o pagamento da conta da embriaguez financeira em cada ocasião. Os abalos dos mercados financeiros atingem pri mei ro os bancos, em seguida o crédito, com isso os investim entos, p or fim , a conta sobra para ti crescimento da economia e 0 emprego (Lordon, 2007). 3. Kcfcrc-se aoestouro da Ixilhn especulativa a,is empresas "pontocom". Conforme Duménil e 1 evv (2008,1: ''A pósa s recessõesde 1990, oat ivi dade foi efetivament e sustentada pel oim pul ii miraculoso dás novas tecnologias, ditas 'da informação". I entair.ente no começo, mas de modo I MI lit ii lar mente t emu , o onda r ^ igant ou-se na segunda metade da década de 1 1|90: quatro anos do • '/ii, dur ant e os quai s os valores tecnológicos foram propelid os a alturas sem precedentes: a bolsa
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Em 2008, o mundo é novamente abalado por uma crise financeira de proporções ainda nào dimensionadas, mas para muitos comparada ao que o capital ismo v ivenc iou nos anos 1930. O cataclismo econômico tem como epicentro os Estados Unidos." 1 A crise teve origem nos empréstimos hipotecários norte-americanos se arrastando i nicial mente para os bancos de investimentos, as seguradoras e os mercados financeiros, enfim, a crise se espalhou rapidamente pela economia dos Estados Unidos e atinge, atualmente, a Europa e o Japão. Os desdobramentos são para a economia global, que deverá entrar em recessão.
vam escaldados pelo estouro da bolha da Internet, a procura de outras formas de investimentos, no caso imobil iár io, ta mbém serviu de atração. ( om as instituições financeiras ávidas por novos clientes, as linhas de i réd itos for am generaliz adas, ao mes mo tem po que os preços dos imóve is disparav am. A cri ativ idade do sistema fez com que surgissem as hipotei .is de segunda linha (s ubprini é mortgages) com beneficiários de duvidosa ».>l>acidade de pagamento. Mesmo que existam dificuldades de honrar i>s empréstimos, os tomadores e os emprestadores avaliam que o imóvel poderá ser vendido com valorização para uns e comissão para outros,
O mercado imobiliário nos Estados Unidos passou por uma fase acelerada de crescimento, após o estouro da bolha especulativa das empresas "pontocom", em 2001. O banco central norte-americano reduziu conside ravelme nte sua taxa de juros , até mesmo com jur os reais negativos, encorajando os empréstimos, financiamentos e consumo. O setor imobi liário, aliado ao mercado financeiro e os novos "produtos", foi um dos maiores beneficiados.
honra ndo assim o pagamento da hipoteca.
Lordon (2007) destaca o fato de a bolha especulativa nos mercados financeiros ser muito próxima à fraude, que requer a atração e a entrada constante de novos investidores para manter o mercado em alta e a ilusão de que ganharã o sempre.' O segr edo é a adesão especulati va por mei o de produtos financeiros de alta rentabilidade que atraem aplicadores cada vez mais com uns e numerosos, por ém, cada vez menos esclarecidos. Para prolongar o crescimento do mercado imobiliário norte-americano, se possível eternamente, era necessário que as famílias fossem levadas a procurar o mercado de empréstimos hipotecários, seduzidas pelo sonho norte-americano da propriedade. Como os cidadãos daquele país já esta4 Urna análise jornalística crítica da frise litu nceira do 2008 podo ser lida em ix Momlr I )iy!o"•VKiiiíc' (edição brasileira.!, car it a pelo jornalista Ant onio M arti ns com o título Tora compr eender a crise financeiro" , em ~ ou4.. 200S. Disponível em: . Acesso cm- 8 out. 2iX)S. 5. Assemelha-se no efeito Pon/j I,sobrenome de um estclionatáno americano da década de ISJ20).
A cr ia ti vi da de do me rc ado fi nan ce ir o para se des faz er do ris co aumentou consideravelmente com a liberalização financeira e a falta de regulamentação do mercado. Os bancos ficam com os lucros e socializam os possíveis prejuízos. Assim, os novos produtos financeiros, como os deriv ativos absolutamente sem regulação e controle do Estado —, le\ aram os bancos dos Estados Unidos a se livrar do problema de créditos • li- duvidosa liquidaç ão (empréstimos i mobiliár ios), que ficam registrados nos balanços, por meio da securitização das dívidas. Com o explic a I .ordon (2007, p. 3): Ag ra nd o vantagem dessa operação, adequadamente chamada de "securilização", é o fato dé que os títulos assim "fabricad os" podem ser vendidos nos mercados em pequenos lotes a múlti plos investidores (institucionais). C eis que, então, os créditos duvi dosos saem do balanço do banco. Compreende-se agora que ele os conceda com tanta facilidade: pode livrar-se deles assim que forem securitizados! Os investidores institucionais, entre eles os fundos de pensão que devem honrar o pagamento de aposentadorias, são um dos clientes desses produtos, que apesar do alto risco oferecem elevado retorno, obviamente quando tudo vai bem. Os investidores fazem isso por meio de I undos de investi mentos aplicados em diversos mercados, visando d imi -
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do financeir o globalizad o, encontrando-se nas mãos de inúmeros portadores. Porém o início da história está no mundo real, ou seja, nos créditos imobiliários que devem ser honrados. Enquanto o mercado imobiliário seguir em alta e as famílias continuarem honrando o pagamento dos empréstimos, sempre haverá interessados nos retornos espetaculares da jogatina global, com base nos ''produtos" inovadores. Lordon (2007) ressalta o fato de que os Itedge fumis leva ntam os fun dos de invest iment os a taxas mais baixas para aplicar em títulos de alto risco, que remuneram proporcionalmente muito. As si m, os lu cr os fa raô nic os mas car am os risc os obj et iv os , que ni ng ué m quer enxergar, para que a ciranda gire o maior tempo possível. O Banco Central dos Estados Unidos, para combatera inflação, vinha subi ndo lentamente os juros, sobretudo, no 1" trimestre/2007, encarecendo o crédit o e afastando os potenciais compradore s de imóveis, além de encarecer os empréstimos já tomados, aumentando a inadimplência. Com isso, menos pessoas se dispõem a entrar no mercado imobiliário e aqueles que estão veem suas dívidas multiplicadas. A consequência é que os preços dos imóveis nos Estados Unidos entram em rota descendente e a menor liquide/, tem impacto direto na economia. O primeiro sinal da crise foi dado pelo banco francês BNP Paribas, em agost o/2007 , que congelou f undos de invest imen tos (cerca de Ç 2 bilhões) lastreados nos empréstimos imobiliários da linha s ubprhnc nos Estados Unidos. O efeito foi devastador no mercado imobiliário norte-americano, levando à concordata uma das maiores empresas daquele país, a Ameri can I lome Mort gage (A HM ) e, em seguida, atingi ndo grupos financeir os com atuação global como Ci tig rou p, UBS, Bear Stearns e outr os que perderam bilhões com os títulos subprimc. A cri se fi nan cei ra se ins tal a pr im ei ro nos banc os; a pa rt ir di sso , há uma grande perda e o colapso tem seu início. Com a globalização financeira, a situação não se lim it a às fronteiras norte-amer icanas, uma vez que
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'«lesmancham no ar", chamem o Estado, ou melhor, o fundo públi co para socializar os prejuízos. I in 2008, o Tesouro americano socorre as grandes empresas hipolei «irias americanas, que respondiam por 50% dos USS12 trilhões em empréstimos habitacionais, injetando USS 200 bilhões de recursos públicos. \ | MI ! ir disso, os recursos do fu ndo públ ico do s Estados Unido s começam ,i ser canalizados no socorro a instituições financeiras, sociedades hipoIn «irias e seguradoras. Com a aprovação do plano de socorro pelo parlamento americano, em 3/ 10/2 008, as entidades financeiras de Wall Strccl poderão receber o montante de USS 700 bilhões e mais US$ 152 bilhões em incentivos fiscais. Além de instrumentos para os reguladores federais I idarem com a crescente crise econômica — o fundo público, nos Estados I li tidos , deverá fazer um aporte sup eri or a USS 1 tri lhão no mercado fin.meeiro, comprando ativos "podres" das instituições financeiras. Um conjunto de medidas para socializar os prejuízos das instituições finani eiras, com o din hei ro públ ico, sem proteger as famílias endiv idadas. Como a crise se alastrou para os cinco continentes, em diversos paíM",, o fundo público passou a introduzir dinheiro dos contribuintes no st H orr o ao sistema fina nceir o pri vad o. C omo foi o caso do Japão com U$ Hl bilhões, na Alemanha com € 50 bilhões, na Holanda, Bélgica e Luxembur go com injeção de € 6,4 bil hões na nacionali zação de bancos. Na Irlanda, com a garantia de 100% dos depósitos bancários por meio dos recursos do Tesouro local, evitando uma "corrida bancária". Na Inglaterra, o orçamento público vai injetar USS 88 bilhões para socorrer o sistema bancário. Na Islândia, os bancos foram estatizados, em decorrência da i rise de descofiança dos depositantes. Rapidamente o discurso da eficiência dos mercados parece ter sido esquecido: A esta al tur a, todas as análises sérias coinc idem em que não é possível prever nem a duração, nem a pr ofundi dade, n em as consequências da crise. Nos próximos meses, vai se abrir um período de fortes turbulências: eco-
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mercados são capazes do se autorregular, e que toda intervenção estatal sobre eles é contraproducente? Mas há uma imensa distância entre a queda do dogma e a construção de políticas de sentido inverso. Até o momento, tem prevalecido, entre os governos, uma postura um tanto curiosa: eles abandonam às pressas o discurso da excelência dos mercados, apenas para [...| desviar rios de dinheiro públic o às instituições dominantes destes mesmos mercados (Marti ns, 2008, p. 2). Para Dum éni l e Lévy (2008), o cerne dos mecanismos que cul mi nar am na crise econômica atual está além da ausência de regulamentação dos mercados financeiros. Trata-se da trajetória neoliberal da economia dos listados Unidos, iniciada nos primeiros anos da década de 1980. A desregulamentação financeira está casada na esfera ideológica com o neoliberalismo. No começo dos anos 1980, uma nova proposição econômica entrou em cena em substituição ao keynesianismo, orientada pelo neoliberalismo, ou seja, o liberalismo econômico revisitado e adaptado ao capitalismo globalizado e à produção flexível. Com forte oposição aos pilares do I stado Social (pleno empre go, serviços sociais unive rsais e proteção social básica garantida), os princípios da política de regulação econômica e social do pós-guerra são questionados (Pereira, 2001). No plano ideológico, o neoliberali smo traz a proposta de desregulamentação dos mercados financeiros, de produt os e do trabal ho. Co m isso, a dimensão financeira comanda as decisões das empresas a partir dos países centrais do capitalismo, enquanto os países periféricos passam a depender cada vez mais de sua capacidade de pagamento de investimentos e de empréstimos externos absorvidos domesticamente, listes ficam sujeitos à lógica dos países centrais que tem o poder de definir a circulação do capit al, sobre tudo a part ir das decisões das matrizes das empresas transnacionais. Para Navarro (1998), a política neoliberal acentuou o desemprego e
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aumento da desigualdade social caminhou conjuntamente com a redução ila progressividade fiscal na maioria dos países europeus. Na Europa, em t li versos países, hou ve u ma r edução do imp ost o de renda par a os salários mais elevados paralelamente ao aumento da carga de impostos indiretos, que reforçou as desigualdades sociais existentes.
A crise afeta o financiamento da seguridade social no Brasil O governo brasileiro, vislumbrando os primeiros efeitos da crise, lomou algumas medidas para liberar mais recursos ao sistema bancário, flexib ilizand o as exigências dos depósitos compul sórios das instituições I in.meeiras. Assim, em 7 de out ubr o de 2008, foi edit ada a Medida Provi.oria (MP ) n. 442 (convert ida na Lei n. 11.882, de 2008), que " dis põe sobre operações de redesconto pel o Banco Central do Brasil e autori za a emissão da Letra de Arrendamento Mercantil". Na prática, a MP é uma espécie de "cheque em branco" para autoridades monetárias assegurarem níveis adequados de liquidez no sistema financeiro, por meio de operações de redesconto em condi ções especiais aos bancos, aceitando como pagamento ativo das instituições financeiras, sendo os possíveis prejuízos apropriados no balanço do Bacen. A rapidez e a agilidade do fundo público l»i asilei ro usadas para socorrer o merca do f inanceiro são uma am ostra da influência dos bancos no domínio da agenda econômica do Brasil. I sse novo cenári o tamb ém imp lic a mudanças nas relações capital-trabalho, que trazem consequências para o financiamento de fundos p iib lii os da seguridade social, lima vez que as poupanças financeiras, ou melhor dizendo, as contribuições de empresas e empregados passam a ser canalizadas, por exemplo, para os fundos de pensão fora da órbita estatal. Assim como a compra de "saúde" no mercado implica uma canalização de recursos para seguradoras privadas que pertencem ao sistema
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trabalho contra o capital por melhores condições de vida e de trabalho e por proteção na velhice. Para a autora constitui uma estratégia do alargamento das bases de acumulação capitalista e de financeirização das lutas e dos direitos dos trabalhadores, reforçando uma "ari stocracia operário- trabalhadora" que passa a administrar partes do capital financeiro. Sauviat (2005) analisa os receptáculos da poupança financeira dos assalariados das grandes corporações e de famílias abastadas ao longo das décadas de 1980 e 1990, dest acan do que isso ocorre para lel amen te ao aumento das desigualdades de renda, sendo os fundos de pensão os principa is atores dos mercados financeiros, transforma ndo o tamanho, a estr utur a e o funci onam ent o desses mercados. O estudo da autora é sobre os países desenvolvidos, observando a mudança da proteção social com a criação de regimes de previdên cia por capi talização nos países anglo-saxòes (Estados Unidos, Canadá, Grã-Bretanha e Austrália) e vários países europeus (Holanda e Suíça, especialmente), firmemente apoiados por incentivos fiscais, nos quais os recursos das caixas de aposentadorias na forma de fundo de pensão são acumulados e v alorizados nos mercados financeiros. Lembr a a autora que essas reservas devem serv ir para pagar as aposentador ias dos assalariados, sendo a gestão dos fundo s de pensão pressionada a obter elevada rentabilidade no retorno dos ativos aplicados no mercado financeiro. A fi nan cei ri zaç ão im pl ic a pres são sobr e a po lí ti ca soci al, espe cia lmente as instituições da seguridade social, pois aí está o nicho dos produto s financeiros . Com isso, as propostas neol iberais i nclu em a transferência da proteção social do âmbito do Gstado para o mercado, a liberalização financeira passa pela privatização dos benefícios da seguridade social. É no mercado que dev e ser compr ado o benefício de aposentadoria, o seguro de saúde, que são setores dominantes nos investidores institucionais. Ou seja, benefícios da seguridade social são transformados em mais um " pro dut o" financeiro, alimentand o a especulação financeira, tornando as aposentadorias de milhares de trabalhadores reféns das cri-
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nanceiras fali das dura nte as crises bancárias, à custa dos impo stos p agos pelos cidadãos. Considerando as medidas de combate à crise, que não lèm impacto direto no caixa do governo, o montante de recursos que foi «Irspend ido alcançou RS 475 bilhões, confo rme o jor nal O Estudo S. Paula O abr. 2009). Nesse valor estão, sobret udo, as medidas adotadas no campo da política monetária, destacadamente, as mudanças nas regras do t lepósito compulsório, leilões com dólar e a linha de troca de moeda com «»I ederal Reserve (FED)/'que somaram RS 284 bilhões. Com isso, o Bant o C'entrai socorreu mais uma vez. os bancos. A flexibilização nas regras «los depósitos com puls ório s não signifi cou uma l iberação de recursos para is pessoas físicas, mas uma oportunidade para que algumas instituições linanceiras pudessem elevar os recursos que têm em caixa com a venda de ativos para bancos maiores. O fundo público no Brasil atuou no âmbito das políticas monetárias no sentido de liberar recursos paras as instituições financeiras, sem quaisquer contrapart idas no sentido de manutenção ou ampliação de postos de trabalhos e dos direitos sociais. No campo da política fiscal, as medidas adotadas pelo Brasil foram bem mais modestas. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) div iil gou, em març o/20 09, que o Brasil foi o país que teve em 2008 o menor r.asto relativo, entre os países que integram o G-20, em medidas para reduzi r o impac to da crise "fi nance ira" global. De acordo com a OIT (2009), 0 Brasil gastou o equivalente a 0,2% do PIB em incentivos fiscais, ficando 1 om o pior desempenho entre os 32 países que também anunciaram rei ursos. A OIT (2009) conclui, com base nas medidas anunciadas por 32 países contra a crise, que o montante destinado a pacotes de estímulo chegou a US$ 1,19 trilh ão, mas que apenas 1,8% do tot al foi inve stid o em ações de proteção social e somente 9,2% das despesas foram destinadas .i pro mov er o empre go. A OIT tam bém destaca que 93% dos desempregados brasilei ros não são benefic iados com os programas antic rise, sendo um dos países em que os desempregados têm menor proteção social, <> riin 29 de outub ro de 2008, o ILux o Centr al tio Brasil c o FEL) anunciaram o estabelecimento
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apesar de os mais atingidos pela crise serem os trabalhadores. Convém lembrar que no Brasil, nos três meses de maior impacto da crise, foram eliminados 756 mil postos de trabalhos/ revelando a fragilidade das relações de trabalho, ou seja, a pouca durabilidade de ocupações no nosso mercado de t rabalho (Salvador, 2009). Contud o, o país altero u de forma tímida e provisória o pagamento do seguro-desemprego por um período de cinco a sete meses, apenas para setores que fo ram mais afetados pe lo desemprego, decorrentes das demissões ocorridas no período de dezembro a fevereiro/2009. O agravante no Brasil é que as medidas de desonerações tributárias adotadas para combater a crise afetaram ainda mais o financiamento do orçamento da seguridade social, enfraquecendo as políticas sociais da previdência, saúde e assistência social. De acordo com a Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB), ao longo do ano de 2009, o desempenho da arrecadação trib utár ia em relação a esse ano encolheu 3,05%. Em termos reais, em valores deflacionados pelo IPCA, o equivalente a uma perda de RS 21,5 bilhões. Os trib utos que mais con trib uír am para essa queda de arrecadação foram a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e a Contribuição Social para o PIS/Pasep, que sào fontes importantes no financiamento da seguridade social brasileira, respondendo po r 49% do declínio da arrecadação tribut ária, em 2009 (Tabela 1). Essa queda na arrecadação da Cofins e do PIS/ Pasep é atribuíd a pela Receita Federal a uma conjunção de fatores relacionados, em grande parte, à crise econômica. Em decorrência da crise ocorreu uma piora dos indicadores macroeconômicos, que in fluencia ram d iretamente a arrecadação tributária, entre eles, a produção industrial, a lucratividade das empresas e a queda no vo lum e gera l de vendas no varejo no ano de 2009 em relação a 2008. E, destacadamente, as desonerações tributárias estimada em RS 24,9 bilhões. Entre as medidas provisórias (todas já convertidas em leis) de desonerações tributárias que reduziram os recolhimentos dos tributos que fi-
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TABELA T Arr ecad açã o da s Tut eitas a dmi ni str ari as peta SRFB I Vi !ml
(a)/(b) em%
Participação no total da diferença
-10.505.00
-6,46%
48,94% 38,74%
Diferenças Kereifas ( nflns/PIS-Pasep
2009 la)
20QS
152 108,00
162.61.3,0».)
(a> - (b)
II I (i>\rrto vinculado)
22,703,00
V| .018,00
8.315,00
-26,81%
IKI'1 i
131.129,00
137.648,1X1
-6.519,00
-4,74%
30,37" i.
19.559,00
21.692.00
-2.133,00
-9,83%
9,94%
4.8S4.00
6.363,00
-1.479.00
23,24".
6,89% 4,50%
IOF (, li le
Combust íveis
i 1'MT-
289.00
1.254,00
-965.00
-76,95%
IKPF
15.093,00
16.010.00
-912,00
-5.70%
4.25%
<)iiHos receitas administrada?
133.17.1,00
135.496.00
-2.323,1X1
-1.71%
10,82%
Subtotal ta)
478 943.00
312.1)94.00
33.131.t VI
-6,47%
154,43".
K«'i ri 1.1 providenciaria (b)
204.010,00
192.355,00
11.685,00
6.07%
-54/43 ,: ..
-2 1 .-166,00
-3.05".
100,00°..
liil.il lai - fbl i.ni,
SRFB
682.983/W 1 704.449,00
Análise d,\ Arrecadação das Receitas Federai s de/emb ro/20 tW.
I ei n. 12.111 /2009: autoriza a concessão de subvenção econômica ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em operações de financiamento destinadas à aquisição e produção de bens de capital e à inovação tecnológica. O governo justificou a medida em função das dificuldades enfrentadas pela indústria de bens de capital diante da desaceleração da economia global. Essa lei também prorrogou •\ redução a zero das alíquotas da contribuição para o PIS/Pasep e da ( oíins, incidentes sobre a receita bruta de venda no mercado interno e a importação de farinha de trigo, do trigo e do pão comum , e a Cofins sobre .1 receita bruta de venda no mercado interno de motocicletas.
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Lei n. 11.945/2009: altera legislação tributária federal, afastando temporariamente as exigências de regularidade fiscal nas operações de crédito realizadas com instituições financeiras públicas; essa lei incentivou as exportações brasileiras redu zind o a base de arrecadação tributá ria do IMS e da Cofin s. També m cau sou perdas na arrecadação dessas cont rib uições sociais devido às mudanças no tratamento tributário conferido à Zona Franca de Manaus. Al ém diss o, o Bras il é um bom negóc io p ara inv est ido res e especuladores estrangeiros. Os especuladores no mercado financeiro lucram com as elevadas laxas de juros e os investimentos produtivos são agraciados pelos elevados lucros e divi dend os das f iliais estrangeiras aqui instaladas. Tudo isso favorecido pela taxa de câmbio apreciada e pela política tributária, que isenta de imposto de renda a distribuição de lucros e divid endos e sua remessa para o exterior (Salvador, 2008). De acordo com Chesnais (1996), a nova dinâmica de acumulação de capital ocorre pelas formas de centralização de "gigantescos" capitais financeiros (fundos mútu os e fundos de pensão), cuja função ése valorizar no interior da esfera financeira. A esfera financeira passa a comandar cada vez mais a repartição e a destinação social da riqueza. A im por tânc ia da esfera financeira na acumulação de capital, sobretudo, a partir da década de 1980, é revelada pelo crescimento em rit mos quali tativ amente superiores aos dos índices de crescimento dos investimentos p rodu tivo s, do PIB e do com ércio exterior. Chesnais (1996, p. 15) afirma que essa nova dinâmica própria das finanças é alimentada por dois mecanismos: Os primeiros referem-se à "inflaç ão do val or dos at ivos", ou seja, à formação de "capital fictício". Os outros baseiam-se em transferências efetivas de riqueza para a esfera financeira, sendo o mecanismo mais importante o serviço da dívid a publica c as políticas monetári as associadas a este. Trata-se
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I ssa dinâ mic a se expressa no caso brasileir o, em que o orçam ento da • ty.wridade social continua perdendo recursos de suas fontes tributárias Vvclusivas" devido à transferência de recursos para o orçamento fiscal por meio da Desvinculação das Receitas da União (DRU). A DRU transforma < recursos destinad os ao fina ncia ment o da seguri dade social em recursos I isi «lis para a composição do superávit pr imá rio e, por consequência, a sua iiii li/a ção em pagamento de juros da dív ida (Boschetti e Salvador, 2006). (> "Relatório resumido da execução orçamentária do governo federal e o u l r o s demonstrativos" divulgado pela Secretaria do Tesouro Nacional, com dados até novembro de 2009, revela que a DRU desviou do Orçamento ila Seguridade Social para o Orçamento I iscai o montante de RS 35,5 bilhões. Desde a entrada em vigor da DRU, em 2000, já foram surrupiados ila Seguridade Social mais de RS 300 bilhões (Salvador, 2008). Mesmo diante da gravidade da situação econômica, o governo brasileiro insiste na realização de um elevado superávit primário, o que é HM ongiLiente com a crise atua l do c apit alis mo, que necessita de liberação ile recursos do fundo público, sobretudo para as políticas sociais. Estiiiia-se que o setor público encerrou 2009 com superávit primário de 2% do PIB, sendo que o país registrou em novembro/2009 o melhor resultado primário para o mês desde o início da série, em 2001, conforme dados do Banco Central, l-ssa política impende à ampliação dos gastos « om serviços sociais no país, que possi bilitar ia a renovação e ampliação de empregos nas áreas de saúde, previd ência , assistência social, educação, habitação e saneamento. Com a financeirização da riqueza, os mercados financeiros passam a disputar cada vez mais recursos do fundo público pressionando por destinação de elevados montantes de recursos para a esfera financeira, que passa pela remuneração dos títulos públicos emitidos pelas autoridades monetári as e negociados no mercado finance iro, os quais constituem impor tante fon te de rendimentos para os investidores institucionais. Além da transferência de recursos do orçamento público para o pagamento de
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públic o e com f ortes implicações soba 1 o orçamento das políticas sociais, particularmente, no caso brasileiro, sobre os recursos destinados à seguridade social.
Considerações finais Os interesses dentro do Estado capitalista são privados e, a partir da década de 1980, há um domínio hegemônico do capital financeiro. Sob o coma ndo das políticas neoliberais fo i esgarçada a liberalização financeira com o enfraquecimento do Estado e da proteção social, sob o eleito dos ju ro s do se rv iç o da dí vi da , po te nc ia li za nd o a cr ise es tr ut ur al do ca pi ta lismo. A proposta neoliberal inclui a passagem da proteção social para o mercado, transf ormando benefícios da seguridade social em "novos produtos" da especulação financeira. Os abalos das recorrentes crises financeiras têm custo elevado para os trabalhadores, que são atingidos nos seus empregos e sofrem perdas de rendas, pois a "conta" é repassada para a esfera produtiva. A principal característica de todas as crises financeiras dos últimos 30 anos ê a presença do fundo público no socorro das entidades do mercado financeiro com a socialização dos prejuízos à custa dos impostos pagos pelos cidadãos. Tempestivamente, o discurso da eficiência do mercado e da privatização desaparece, como estamos vivenciando com a "nova" crise do capital nos dias atuais. No caso brasileiro, juntamente com os efeitos da crise, as medidas de cunho fiscal tomadas pelo governo no socorro ao capital trouxeram consequências nefastas para o financiamento da seguridade social, como revelam os dados da arrecadação tributária. Somente o orçamento da seguridade social sofreu um abalo de quase R$ 70 bilhões entre o desvio de recursos por meio da DRU para o orçamento fiscal e os incentivos
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O que se percebe é que o fundo público no capitalismo participa indireta mente da reprodução geral do capit al, seja por mei o de subsídios, negociação de títulos e garantias de condições de financiamento dos inwstimentos dos capitalistas, seja como elemento presente e importante na reprodução da força de trabalho, única fonte de criação de valor na sociedade capitalista. No capitalismo contemporâneo, o fundo público é responsável por uma transferência de recursos sob a forma de juros e amortização da dívi da pública para o capital financeiro, em especial para as classes dos rentistas, o que foi reforçado na atual crise do capitalismo.
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