2. Coeficiente de difusão
O
objetivo deste capítulo, é apresentar as equações utilizadas para prever o valor dos coeficientes de difusão em gases, líquidos e sólidos. São apresentadas algumas equações utilizadas para estimar o coeficiente de difusão para gases, tendo como base a teoria cinética dos gases. Também são apresentadas equações para soluções líquidas, não eletrolíticas diluídas e concentradas e eletrolíticas diluídas. A estimativa da difusão em sólidos porosos por meio do mecanismo de Knudsen também é contemplada aqui. Equações para predição de sistemas multicomponentes finalizam o escopo do capítulo.
2.1. Introdução Este capítulo apresenta as equações disponíveis para prever os valores dos coeficientes de difusão em diversos meios. Para gases, em que as forças intermoleculares são reduzidas, exceto em altas pressões, a teoria cinética pode prever os coeficientes de difusão com acurácia para misturas binárias gasosas. Já para líquidos, em que as forças intermoleculares são mais intensas e o sistema é mais organizados, a lei de StokesEinstein representa uma aproximação mais grosseira do sistema em questão. Para sólidos, a densidade de energia coesiva é grande e, por isso, é mais difícil prever os valores do coeficiente de difusão, que são ainda menores do que nas duas outras fases. 2.2. Coeficientes de difusão para gases Pela teoria cinética dos gases, o coeficiente de difusão é diretamente proporcional à velocidade molecular média e ao caminho livre médio. Mas o caminho livre médio de um gás é randômico, inversamente proporcional à área da seção transversal das moléculas e também da densidade numérica. A densidade numérica das moléculas de um gás varia diretamente com a pressão e inversamente com a temperatura. Já a velocidade molecular média relaciona-se à temperatura e à massa molar da molécula 1/2 pela relação (T/M) , onde T é a temperatura e M é a massa molar. Então, para um sistema gasoso binário, a teoria cinética dos gases resulta na Equação 1:
= +
(1) 2
Onde DAB = coeficiente de difusão, [L / θ]; K’ = Constante de proporcionalidade; T = temperatura absoluta, [T]; MA, MB = massa molares dos gases A e B, em [M/mol]; [M/ mol]; 2 A = área da seção transversal média de ambas as moléculas, [L ]; 2 P = pressão do sistema, [M/L θ ]. A seguir, apresentam-se as equações semi-empíricas desenvolvidas a partir da teoria cinética dos gases (Equação 1).
EQM 036 – Transferência de Massa
a) Gilliland (1934) Tendo como base o comportamento do coeficiente de difusão em relação à temperatura, à massa molar dos gases e à pressão, Gilliland propôs a Equação 2 para predizer o valor do coeficiente de difusão de uma mistura gasosa binária:
, = +
(2)
2
Onde DAB = coeficiente de difusão da mistura gasosa binária, em m /s; T = temperatura absoluta, em Kelvin; MA, MB = massa molares dos gases A e B, em kg/kmol; 3 V = volume molar na temperatura normal de ebulição de A e B, em m /kmol; P = pressão total do sistema, em atm. Apresentam-se, na Tabela 1, os valores de volumes molares na temperatura normal de ebulição de alguns átomos e moléculas para a utilização da Equação 2. Tabela 1 – Volumes atômicos e moleculares na temperatura normal de ebulição de algumas espécies.
b) Fuller et al. (1966): Fuller e colaboradores propuseram uma outra equação, modificando a potência da temperatura e o modo de cálculo da área da seção transversal média das moléculas, conforme apresentado na Equação 3:
, , = +
(3)
8 Profa. Kátia Cecília de Souza Figueiredo
EQM 036 – Transferência de Massa
2
Onde DAB = coeficiente de difusão da mistura gasosa binária, em m /s; T = temperatura absoluta, em Kelvin; MA, MB = massa molares dos gases A e B, em kg/kmol; Σv = volumes de difusão, soma dos volumes atômicos de todos os elementos que 3 constituem uma molécula, em m /kmol; P = pressão total do sistema, em atm. Na Tabela 2, são apresentados os valores dos volumes de difusão para utilização na equação de Fuller e colaboradores. Tabela 2 – Volumes de difusão atômicos e moleculares mais simples.
A Equação 3 apresenta desvios de até 7% em relação aos valores experimentais e pode ser usada tanto para gases polares quanto apolares. c) Chapman-Enskog (1954) Estes autores utilizaram a função potencial de Lennard-Jones para relacionar as forças atrativas e repulsivas entre os átomos em função da distância entre eles. Apresenta-se, na Equação 4, o modelo obtido:
, = +
(4) 2
Onde DAB = coeficiente de difusão da mistura gasosa binária, em m /s; 9 Profa. Kátia Cecília de Souza Figueiredo
EQM 036 – Transferência de Massa
T = temperatura absoluta, em Kelvin; MA, MB = massa molares dos gases A e B, em kg/kmol; P = pressão total do sistema, em atm; σAB = diâmetro de colisão, em m; ΩD = integral de colisão. A função potencial de Lennard-Jones é apresentada na Equação 5:
= 4 +
(5)
Onde φAB (r) = energia potencial; εAB = energia de atração máxima; σAB = diâmetro de colisão; r = distância de separação entre as moléculas. Para um sistema binário, σAB e εAB são avaliados a partir dos componentes puros, usando as Equações 6 e 7:
= =
(6)
(7) -23
Onde k é a constante de Boltzmann (1,38066 x 10 J/K) Os valores de σi e ε i/k são apresentados na Tabela 3. Tabela 3 – Diâmetros de colisão e parâmetros de energia da equação de Lennard Jones.
Quando o diâmetro de colisão e o parâmetro de energia não estão disponíveis, eles podem ser estimados pelas Equações 8 a 11: 10 Profa. Kátia Cecília de Souza Figueiredo
EQM 036 – Transferência de Massa
= 8,33 = 11,8 = 0,75 = 1,21
(8)
(9)
(10)
(11) 3
Onde VC = volume crítico, em m /kmol; TC = temperatura crítica, em Kelvin; 3 V = volume molar no ponto normal de ebulição, em m /kmol; Tb = temperatura normal de ebulição, em Kelvin; σ = diâmetro de colisão, 10 -10 m. Os valores da integral de colisão são apresentados na Tabela 4. Tabela 4 – Valores da integral de colisão ΩD baseados na equação potencial de Lennard Jones.
11 Profa. Kátia Cecília de Souza Figueiredo
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Para pressões moderadas, a equação de Chapman-Enskog pode ser extrapolada utilizando a Equação 12. Para pressões elevadas, não existem equações preditivas e o coeficiente de difusão não depende do inverso da pressão.
,, = ,,
(12)
2.3.Coeficientes de difusão para líquidos No caso dos líquidos, falta um modelo estrutural teórico preciso para estimação do coeficiente de difusão. A melhor aproximação é obtida pela equação de Stokes-Einstein, que considera que o soluto é constituído por esferas rígidas que se movimentam com velocidade uniforme em um contínuo, sob a ação de uma força F. 2.3.1. Soluções não eletrolíticas diluídas a) Wilke e Chang (1955) Os autores utilizaram a equação de Stokes-Einstein como ponto de partida para predizer as difusividades em soluções diluídas de não eletrólitos. A Equação 13 apresenta o resultado obtido.
, = ,
(13)
0
2
Onde DAB = coeficiente de interdifusão em soluções diluídas, m /s; µ = viscosidade da solução, cP (10 -3kg/ms ou mPa.s); 3 VA = volume molar do soluto na temperatura normal de ebulição, m /kmol; MB = massa molar do solvente, kg/kmol; T = temperatura absoluta, em Kelvin; ξB = fator de associação do solvente B. Os valores recomendados para ξB são 1,0 para solventes não polares como o benzeno, éter e hidrocarbonetos alifáticos, 1,5 para etanol, 1,9 para metanol e 2,6 para a água. A equação de Wilke e Chang não é adequada para uso quando água é o soluto, com desvios maiores que 200%. b) Sitaraman et al. (1963) O modelo desenvolvido por Sitaraman e colaboradores, apresentado na Equação 14, é recomendada quando o soluto é a água.
= 16,7910
,
,
(14)
0
2
Onde DAB = coeficiente de interdifusão em soluções diluídas, m /s; µΒ = viscosidade do solvente, cP (10 -3kg/ms ou mPa.s); 3 VA = volume molar do soluto na temperatura normal de ebulição, m /kmol; MB = massa molar do solvente, kg/kmol; T = temperatura absoluta, em Kelvin;
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∆HA, ∆HB
= calores latentes de vaporização do soluto e do solvente nas temperaturas normais de ebulição, em J/kg. 2.3.2. Soluções não eletrolíticas concentradas Os coeficientes de difusão para líquidos são muito dependentes da concentração. Como soluções concentradas frequentemente são não ideais, espera-se que este comportamento não ideal seja parcialmente responsável pelo forte efeito da concentração na difusividade. a) Equação de Vignes (1966) Vignes propôs uma relação empírica, apresentada na Equação 15, com bons ajustes aos dados experimentais tanto para soluções ideais como não ideais:
= 1+
(15)
Onde DAB = coeficiente de difusão para soluções não eletrolíticas binárias 2 concentradas, em m /s; 0 2 DAB = Coeficiente de difusão à diluição infinita de A em B, em m /s; 0 2 DBA = Coeficiente de difusão à diluição infinita de B em A, em m /s; xA, xB = fração molar de A e de B na solução binária. γ A= coeficiente de atividade de A. De acordo com a Equação 15, é necessário que haja um modelo termodinâmico para estabelecer a relação matemática entre γ A e xA. b) Equação de Leffler e Cullinan (1970) Leffler e Cullinan modificaram a equação de Vignes usando a viscosidade para obter melhor ajuste aos dados experimentais. Quando dados de viscosidade estão disponíveis, a Equação 16, equação de Leffler e Cullinan, deve ser usada para predizer o coeficiente de difusão em soluções concentradas.
= 1+
(16)
Onde DAB = coeficiente de difusão para soluções não eletrolíticas binárias 2 concentradas, em m /s; 0 2 DAB = Coeficiente de difusão à diluição infinita de A em B, em m /s; 0 2 DBA = Coeficiente de difusão à diluição infinita de B em A, em m /s; µm, µA, µB = viscosidades da mistura, de A e de B, respectivamente, em cP; xA, xB = fração molar de A e de B na solução binária. γ A= coeficiente de atividade de A. 2.3.3. Soluções eletrolíticas diluídas Nernst (1888) desenvolveu a primeira equação para predizer o coeficiente de difusão em soluções eletrolíticas relacionando a difusividade com as condutividades elétricas. A Equação 17 é aplicável para soluções diluídas: 13 Profa. Kátia Cecília de Souza Figueiredo
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= 8,93110
(17)
0
2
Onde: DAB = Coeficiente de difusão eletrolítica à diluição infinita de A em B, em m /s; T = temperatura absoluta, em Kelvin; λ+0 = condutância catiônica à diluição infinita, (A/cm 2)(cm/V)(cm3 /gequiv); λ-0 = condutância aniônica à diluição infinita, (A/cm 2)(cm/V)(cm3 /gequiv); λ+0 + λ-0 = condutância do eletrólito à diluição infinita; Z+ = valência do cátion; Z- = valência do ânion. 2.4.Coeficientes de difusão para sistemas multicomponentes Para um sistema gasoso ideal multicomponente, Maxwell desenvolveu a Equação 18:
= −
(18)
Dim varia com a composição e é difícil de ser calculado. Uma aproximação é assumir que i se difunde em uma mistura estagnada (N j = 0). Fazendo a mistura ser composta por A, B, C e D, com i = A, temos que a Equação 18 se resume à Equação 19:
=
(19)
Para líquidos, a equação de Leffler e Cullinan pode ser adaptada, conforme apresentado na Equação 20:
=
(20)
Onde µABC = viscosidade da solução, em cP.
2.5. Difusão em sólidos 2.5.1. Transporte em cristais Um dos mecanismos mais favoráveis para a difusão em cristais envolve a presença de vacâncias na rede cristalina regular. Não é necessária uma grande energia de ligação para este mecanismo. Outros métodos envolvem a difusão intersticial. 2.5.2. Transporte em sólidos porosos Na difusão ordinária, o diâmetro do poro do material é grande em comparação com o caminho livre médio das moléculas do gás. Na difusão de Knudsen, o transporte molecular ocorre por meio de poros pequenos em comparação com o caminho livre médio das moléculas do gás. Já no caso da difusão na superfície, moléculas são adsorvidas na superfície do material e transportadas em seguida, de um sítio a outro, no sentido da diminuição da concentração.
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EQM 036 – Transferência de Massa
A difusão de Knudsen para poros não tortuosos circulares é apresentada pela Equação 21:
, = 97,0
(21)
onde
r = raio do poro, m; T = temperatura, em Kelvin; 2 DA,K = coeficiente de difusão de Knudsen, m /s; MA = massa molar do componente A, kg/kmol. Para considerar o caminho tortuoso da molécula e a porosidade do material, a difusividade efetiva de Knudsen é calculada por meio da Equação 22:
,, = , onde
(22) 2
DA,K,e = coeficiente de difusão efetiva de Knudsen, m /s; ε = porosidade do sólido; τ = tortuosidade do poro.
A difusão ordinária também contribui para o transporte molecular total através dos poros. Assim, apresenta-se, na Equação 23, o efeito da porosidade e da tortuosidade do material na difusividade ordinária efetiva:
, =
(23)
Para a autodifusão ou transferência equimolar, a difusividade efetiva do material pode ser escrita conforme a Equação 24:
= + , ,, ,
(24)
Onde DA,e é o coeficiente de difusão efetivo de A no sólido poroso. 2.6. Coeficientes de transporte em membranas Consideremos o transporte do soluto i através da membrana densa mostrado na Figura 1 (BAKER, 2012).
Figura 1 – Transporte difusivo de i através de uma membrana densa.
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Pela lei de Fick, podemos escrever o fluxo difusivo através da membrana conforme apresentado na Equação 25: Di S i ( pi 0 − pil ) G
J i =
(25)
l 2
Onde Ji = fluxo de i através da membrana, em mol/L θ; 2 Di = coeficiente de difusão de i pela membrana, L / θ; G 2 2 Si = é o coeficiente de sorção de i no material da membrana, mol θ /ML . pi0 e pil = pressões parciais de i na interface alimentação/membrana e 2 membrana/permeado, em M/ θ L. l = espessura da membrana, L. Mas o produto do coeficiente de difusão pelo coeficiente de sorção é conhecido como permeabilidade da membrana, conforme apresentado na Equação 26: Pi G = Di S i
G
(26) G
3
o
A permeabilidade, Pi , é definida como o volume (cm ) do gás, a 0 C e 1 atm que se 2 difunde por segundo através de uma membrana de 1 cm de área e 1 cm de espessura, devido a um gradiente de pressão de 1 atm. Referências bibliográficas BAKER, R. W., Membrane Technology and Applications . 3rd ed. New York, John Wiley & Sons, Ltd (2012). HINES, A. L., MADDOX, R. N., Mass transfer: fundamentals and applications. New Jersey: Prentice Hall, (1985).
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