A identidade cultural na pós-modernidade HALL, Stuart. 11a ed. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2006. Título original: The question of cultural identity
A identidade cultural na pós-modernidade, escrito em 1992 por Stuart Hall, chama a atenção para a discussão em torno da chamada “crise de identidade” que vem fazendo com que o sujeito tido como unificado se apresente deslocado por conta das transformações societárias ocorridas em escala global. O livro tem seis capítulos, com poucas páginas cada. Nos dois primeiros, Hall introduz o leitor a três concepções básicas do sujeito na História (levando em conta apenas a partir do momento que ele sai da sombra religiosa): o sujeito do Iluminismo, o sujeito sociológico e o sujeito pós-moderno. O sujeito do iluminismo traz a concepção de alguém centrado, racional, unificado, "o centro do eu". Ou seja, uma concepção individualista, e sempre citada no masculino. Na noção de sujeito sociológico, o centro do “eu” passou a ser formado na relação com outras pessoas. A identidade é formada através da interação entre o eu e a sociedade. A concepção sociológica de sujeito pós-moderno aponta para alguém sem identidade fixa. Varia de acordo com as formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam.
O sujeito assume identidades de acordo com a ocasião e o momento. Não há um “eu” coerente, nossa identidade é contraditória. A multiplicidade de sistemas de representação possibilitou a multiplicação das identidades possíveis. “O sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e estável, está se tornado fragmentado; composto não de uma única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias ou não resolvidas", diz o autor. O próprio processo de identificação, através do qual nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático. No capítulo 3, Hall apresenta os conceitos de nação, cultura nacional e identidade nacional, partindo do ponto de que as culturas nacionais são comunidades imaginárias. Há uma relação de interdependência aqui: o indivíduo busca sua pertinência na imagem do povo nacional e ela necessita da unificação desses indivíduos para ter o sentido que a coletividade fantasia ter. Ao tratar as culturas nacionais como comunidades imaginadas, Hall ilustra o sujeito fragmentado e suas identidades culturais. De acordo com o autor, nação pode ser entendida como um sistema e representação cultural
que extrapola a noção de legitimidade do ser social, pois as pessoas não são apenas cidadãs, já que partilham uma gama de significados (narrativas, estratégias discursivas, mitos fundacionais). Deste modo, os diferentes membros das culturas nacionais, independendo sua raça, classe e gênero seriam unificados numa única identidade cultural. Stuart Hall questiona esta noção unificadora da cultura nacional, afirmando que grande parte das nações foram formadas por um processo violento de conquista de diferentes povos, de diversas classes sociais, assim como diversas etnias e gêneros. Um ponto importante tratado pelo autor refere-se à raça. Segundo Hall, raça não é uma categoria biológica, logo não tem validade científica. No entanto, é uma categoria discursiva que abarca formas de falar, práticas sociais, características físicas etc. Se a grande maioria das nações é formada por diversos povos é um equívoco dizermos que raça determina a nacionalidade. Daí, Stuart Hall coloca que as identidades nacionais são passíveis do jogo de poder e das contradições internas, já que contam com significante diversidade em suas composições. "Em vez de pensar as culturas nacionais como unificadas, deveríamos pensá-las como constituindo um dispositivo discursivo que representa a diferença como unidade ou identidade", diz um trecho deste
capítulo. Nos capítulos 4, 5 e 6 o autor trata da Globalização e como ela afeta a relação entre o sujeito e sua fabricada identidade nacional. A globalização pode ocasionar o efeito inverso, ou seja, algumas comunidades regionais estão reforçando suas identidades para resistirem ao processo de globalização. “Todas as identidades estão localizadas no espaço e nos tempos simbólicos” p. 71. Ao falar de fundamentalismo, diáspora (dispersão de grandes massas populacionais) e hibridismo (mistura), o autor nos apresenta as contradições inerentes a estes fatos. De um lado, alguns crêem que hibridismo e sincretismo são importantes fontes criadoras de novas culturas. Outros, afirmam que o relativismo que envolve o hibridismo tem seus custos e quanto ao fundamentalismo, Hall traz à tona o fato da tentativa de reconstrução de identidades purificadas baseadas no aprofundamento da tradição. Deste modo, Hall encerra sua obra colocando que a globalização produz deslocamentos variados e contraditórios e que, embora de forma paulatina, a globalização pode estar contribuindo para o descentramento do Ocidente. A contribuição trazida por Stuart Hall neste livro é de tamanha importância para refletirmos como a globalização influencia na formação das identidades culturais. O conceito de descentramento pode ser
apropriado por vários campos do conhecimento.