PRINCÍPIOS GERAIS DO DIAGNÓSTICO PSICOPATOLÓGICO - CAP.05
Discute-se muito sobre o valor e os limites do diagnóstico psiquiátrico. Pode se identificar, inclusive, duas posições extremas. A primeira afirma que o diagnostico em psiquiatria não tem valor algum, pois cada pessoa é uma realidade única e inclassificável. O diagnostico psiquiátrico só serviria para rotular as pessoas diferentes, excêntricas, permitindo e legitimando o poder médico, o controle social sobre o individuo desadaptado ou questionador. A segunda, em defesa do diagnostico psiquiátrico, sustenta que o valor e o lugar do diagnostico em psiquiatria são absolutamente são absolutamente semelhantes ao valor e ao lugar do diagnostico nas outras especialidades médicas. O diagnostico, nessa visão é o elemento principal e mais importante da pratica psiquiátrica. A posição deste autor é a de que apesar de ser absolutamente imprescindível considerar os aspectos pessoais, singulares de cada individuo, sem um diagnostico psicopatológico aprofundado não se pode nem compreender adequadamente o paciente e seu sofrimento nem escolher o tipo de estratégia terapêutica mais apropriada. Assim, há, no processo diagnóstico uma relação dialética permanente per manente entre o particular, individual (aquele paciente especifico, aquela pessoa em especial) e o geral, universal (categoria diagnóstica á qual essa pessoa pertence). Portanto não se deve esquecer: os diagnósticos são idéias (constructos), fundamentais para o trabalho cientifico, para o conhecimento do mundo, mas não objetos reais e concretos. Tanto na natureza como na esfera humana, podem-se distinguir três grupos de fenômenos em relação a possibilidade de classificação: 1. Aspectos e fenômenos encontrados em todos os seres humanos. humanos. 2. Aspectos e fenômenos fenômenos encontrados encontrados em algumas pessoas, mas não em todas. 3. Aspectos e fenômenos fenômenos encontrados encontrados em apenas apenas um ser humano humano em particular. Tais fenômenos embora de interesse para a compreensão do ser humano, são restritos demais e de difícil classificação e agrupamento, tendo maior interesse os seus aspectos antropológicos, existenciais e estéticos que propriamente taxonômicos.
De modo geral, pode-se afirmar que o diagnostico só é útil e valido se for visto como algo a mais que simplesmente rotular o paciente. Esse tipo de utilização do diagnostico psiquiátrico seria uma forma precária, questionável e não propriamente cientifica. Funcionaria apenas como estimulo a preconceitos que devem ser combatido. A legitimidade do diagnostico psiquiátrico sustenta-se na perspectiva de aprofundar o conhecimento tanto do individuo em particular como das entidades nosologicas utilizadas. Isso permite o avanço da ciência, a antevisão de um prognostico e o estabelecimento de ações terapêuticas e preventivas mais eficazes. Do ponto de vista clinico e especifico da psicopatologia, embora o processo diagnóstico em psiquiatria siga os princípios gerais das ciências medicas, há certamente alguns aspectos particulares que devem ser aqui apresentados: 1. O diagnostico de um transtorno psiquiátrico é quase sempre baseado preponderantemente nos dados clínicos. Dosagens laboratórios, exames de neuroimagem estrutural e funcional, mapeamento por EEG, etc., testes psicológicos ou neuropsicológicos auxiliam de forma muito importante, principalmente para o diagnostico diferencial entre um transtorno psiquiátrico primário (esquizofrenia, depressão primária, etc.). 2. O diagnostico psicopatológico, com exeçao dos quadros psicoorgânicos (delirium, demências, síndromes focais, etc.) não é de modo geral, baseado em possíveis mecanismos etiológicos supostos pelo entrevistador. Baseia-se principalmente no perfil de sinais e sintomas apresentado pelo paciente na historia da doença e no momento da entrevista. 3. De modo geral, não existem sinais ou sintomas psicopatológicos totalmente específicos de determinado transtorno mental. Alem disso, não há sintomas patognomonicos em psiquiatria, como afirma Emil Kraepelin [1913] (1996) : Infelizmentenãoexiste,nodomíniodosdistúrbios psíquicos, um único sintoma mórbido que seja totalmente característico de uma enfermidade [...] devemos evitar atribuirimportânciacaracterísticaaumúnicofenômenomórbido.[...]Oquequase nuncaéproduzidototalmentedeformaidênticapelosdiferentestranstornosmentaise oquadrototal,incluindoodesenvolvimentodossintomas,ocursoeodesenlacefinal dadoença.
Portanto, o diagnostico psicopatológico repousa sobre a totalidade dos dados clínicos, momentâneos (exame psíquico) e evolutivos (anamnese, historia dos sintomas e evolução do transtorno).
4. O diagnostico psicopatológico é em inúmeros casos, apenas possível com a observação do curso da doença. Dessa forma, o
padrão evolutivo de determinado quadro clinico obriga o psicopatólogo a repensar e refazer continuamente o seu diagnóstico.
5. Como salientou o psiquiatra brasileiro Jose Leme Lopes, em 1954 o diagnostico psiquiátrico deve ser sempre pluridimensional. Varias dimensões clinicas e psicossociais devem ser incluídas para uma formulação diagnostica completa: identifica-se um transtorno psiquiátrico como a esquizofrenia. 6. Confiabilidade e validade do diagnostico em psiquiatria. A confiabilidade (reliability) de um procedimento diagnostico (técnica de entrevista padronizada, escala, teste, diferentes entrevistadores, etc.) diz respeito á capacidade desse procedimento produzir, em relação a um mesmo individuo ou para pacientes de um mesmo grupo diagnostico, em circunstância diversas, o mesmo diagnostico.Ao mudar diferentes aspectos do processo de avaliação (avaliador ou momento de avaliação), o resultado final permanece o mesmo.
A validade (validity) diz respeito á capacidade de um procedimento diagnóstico conseguir captar, identificar ou medir aquilo que realmente se propõe a reconhecer. Para saber se um novo procedimento diagnóstico é valido, é preciso compará-lo com o outro procedimento diagnostico prévio (“padrão ouro”), que seja bem- aceito e reconhecido como mais acurado capaz de identificar satisfatoriamente o objeto pesquisado (de certo modo, mais próximo da” verdade”). A sensibilidade de um novo procedimento diagnostico esta relacionada a capacidade desse procedimento de detectar casos verdadeiros incluídos na categoria diagnostica. Já a especificidade do procedimento refere-se à capacidade de identificar verdadeiros” não-casos”em relação a categoria diagnostica que se pesquisa. Obviamente o ideal de um procedimento diagnóstico é que ele seja confiável (reprodutível), válido (o mais próximo possível da “verdade”diagnóstica), com alta sensibilidade e especificidade.