A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page I
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Português Curso Extensivo – A 3.a Série – Ensino Médio
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page II
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 1
Revisão MÓDULO
PORTUGUÊS
Sintaxe (I)
1. (FUVEST-2010)
2. (UNICAMP-2010)
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Uma nota diplomática* é semelhante a uma mulher da moda. Só depois de se despojar uma elegante de todas as fitas, rendas, joias, saias e corpetes, é que se encontra o exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher, conforme saiu dos prelos da natureza. É preciso desataviar uma nota diplomática de todas as frases, circunlocuções, desvios, adjetivos e advérbios, para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem.
Machado de Assis.
*Nota diplomática: comunicação escrita e oficial entre os governos de dois países, sobre assuntos do interesse de ambos. a) É correto afirmar que, segundo o texto, uma not a diplomática se parece com o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não. O texto estabelece semelhança entre o que seria a edição “aumentada e correta” da mulher e a nota diplomática, pois em ambas haveria excesso de adornos enganadores. Portanto, o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher” equivaleria à nota diplomática “desataviada” de seus excessos retóricos.
b) Tendo em vista o trecho “para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem”, indique um sinônimo da palavra “capital” que seja adequado ao contexto e identifique o referente do pronome “lhe”. RESOLUÇÃO: No contexto, capital significa “fundamental, principal, essencial”. O pronome pessoal oblíquo lhe retoma a expressão “nota diplomática”, funcionando como complemento nominal de “srcem” (“…dá srcem à nota diplomática”).
Retirada de www.eitapiula.net/2009/09/aurelio.jpg
Nessa propaganda do dicionário Aurélio, a expressão “bom pra burro” é polissêmica, e remete a uma representação de dicionário. a) Qual é essa representação? Ela é adequada ou inadequada? Justifique. RESOLUÇÃO: Trata-se da representação de dicionário contida na expressão “pai dos burros”. É evidente que se tra ta de uma representação inadequada, pois dicionários auxiliam quem deseja ou precisa co nhecer o sentido das palavras, não quem carece de inteligência, ou seja, quem é “burro”.
b) Explique como o uso da expressão “bom pra burro” produz humor nessa propaganda. RESOLUÇÃO: “Pra burro” é frequentemente associado à intensidade, quantidade, ao advérbio muito. Assim, a expressão “bom pra burro” significa “muito bom”. Ao vir junto à imagem de um dicionário, permite a associação à expressão “pai dos burros” (representação estabilizada de dicionário). O humor é provocado, portanto, pela convivência das duas associações no uso da expressão, colocando lado a lado a qualidade de ser muito bom e a imagem estereotipada de ser destinado a pessoas burras.
–1
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 2
Texto para a questão 3.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
A vida na fazenda se tornara difícil. Sinha Vitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desesperadas. Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a catinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos se torciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 3. (UNESP) – Certas expressões ganham sentidos diferentes, dependendo do contexto ou da situação em que ocor rem. Assim, os adjetivos secas ou torrados, de Vidas Secas, estão impregnados de uma conotação negativa, diferentemente de secas ou torrados em contextos como ameixas secas ou amendoins torrados, onde são positivos. Pensando nessas possibilidades, a) explique que sentido tem a expressão céu azul, para Fabiano, na frase: “No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido”. RESOLUÇÃO: A expressãocéu azul tem conotação negativa para Fabiano, pois indica que não haverá chuva e que a tão temida seca já é uma realidade inevitável.
b) construa uma frase em que o contexto atribua a essa mesma expressão uma conotação positiva. RESOLUÇÃO: “Após a tempestade, o céu azul brilhava com pro messa de bonança.”
Texto para a questão o4.cômico nasce de uma “percepção do contráPara Pirandello, rio”, como no famoso exemplo de uma velha já decrépita que se cobre de maquiagem, veste-se como uma moça e pinta os cabelos. Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso, que nasce da ruptura das expectativas, mas sobretudo do sentimento de superioridade. A “percepção do contrário” pode, porém, transformar-se num “sentimento do contrário” — quando aquele que ri procura entender as razões pelas quais a velha se mascara, na ilusão de reconquistar a juventude perdida. Nesse passo, a velha da anedota não mais está distante do sujeito que percebe, porque este pensa que também poderia estar no lugar da velha — e seu riso se mistura com a compreensão piedosa e se transforma num sorriso. Para passar da atitude cômica para a atitude humorística, é preciso renunciar ao distanciamento e ao sentimento de superioridade. (Adaptado de Elias Thomé Saliba, Raízes do riso)
ficação e à compaixão do observador, que geram humor e não propriamente comicidade.
b) “Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso (...).” Sem prejuízo para o sentido do trecho acima, rees creva-o, substituindo se perceber e produz-se por formas verbais cujo sujeito seja nós e é o oposto por não corresponde. Faça as adaptações necessárias. RESOLUÇÃO: Ao percebermos que aquela senhora velha não corresponde ao que uma respeitável velha senhora deveria ser, produzimos o riso (rimos).
Texto para a questão 5.
Em um piano distante, alguém estuda uma lição lenta, em notas graves. (...) Esses sons soltos, indecisos, teimosos e tristes, de uma lição elementar qualquer, têm uma grave monotonia. Deus sabe por que acordei hoje com tendência a filosofia de bairro; mas agora me ocorre que a vida de muita gente parece um pouco essa lição de piano. Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia. Começa a esboçar, com os pontos soltos de alguns sons, a curva de uma frase musical; mas logo se detém, e volta, e se perde numa incoerência monótona. Não tem ritmo nem cadência sensíveis. (Rubem Braga, O homem rouco) 5. (FUVEST) a) O autor estabelece uma associação poética entre a vida de muita gente e uma lição de piano. Esclareça o sentido que ganha, no contexto dessa associação, a frase: “Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia”.
RESOLUÇÃO: A frase, no contexto, significa que muitas pessoas não concluem aquilo a que se propõem ou não chegam a viver experiências que se integrem num conjunto articulado, como as palavras ou as notas musicais se integram no conjunto de uma frase linguística ou melódica, fazendo sentido ou compondo uma estrutura coerente.
4. (FUVEST)
b) “Deus sabe por que a cordei hoje com tendência a filosofia de bairro...” Reescreva a frase acima, substituindo a expressão sublinhada por outra de sentido equivalente.
a) Considerando que o atexto conceitua, qual a do diferença essencialo entre “percepção do explique contrário”brevemente e o “sentimento contrário”.
RESOLUÇÃO: Deus sabe por que acordei hoje com vontade de refletir sobre assuntos triviais (ou fatos prosaicos).
RESOLUÇÃO: A diferença essencial entre “percepção do contrário” e “sentimento do contrário” é que a primeira expressão sugere a ideia de distanciamento e superioridade do observador da cena cômica, e a segunda remete à identi-
2–
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 3
6. (FUVEST) – Considere as seguintes frases, extraídas de diferentes matérias jornalísticas, e responda ao que se pede. I. Nos últimos meses, o debate sobre o aquecimento global vem, com perdão do trocadilho, esquentando. II. Preso vigia acusado de matar empresário. a) Identifique, na frase I, o troc adilho a que se refere o redator e explique por que ele pede perdão por tê-lo produzido. RESOLUÇÃO: O trocadilho pelo qual o redator da frase se desculpa consiste no emprego do verbo esquentar no predicado de uma oração cujo sujeito é “o debate sobre o aquecimento global”. O tema em questão – o aquecimento global – associa-se, muito obviamente, à ideia de esquentar em sentido próprio (“aquecer-se”), daí derivando o emprego trocadilhesco desse verbo em
b) É correto afirmar que na frase II ocorre am biguidade? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Sim, é correto afirmar que a frase II é ambígua, porque ela pode ser entendida de duas formas, a saber: (1) foi preso o vigia acusado de matar empresário, e (2) um preso vigia o acusado de matar empresário.Vigia, na interpretação (1), é substantivo; na interpretação (2), é a terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo vigiar, complementado pelo objeto direto acusado. O par ticí pio preso tem força verbal em (1), funcionando, na fórmula sintética da manchete jornalística, como par te da locução da voz passiva “foi preso”; em (2), porém, o mesmo particípio tem sentido nominal, funcionando como adjetivo substantivado (o preso, um preso).
sentido figurado (“acirrar-se, A obviedade da associação aquecimento/esquentar – é queagravar-se”). seria responsável pelo retórico pedido de– desculpas.
MÓDULO
Sintaxe (II)
1. (UNICAMP-SP)
Matte a vontade. Matte Leão. Este enunciado faz parte de uma propaganda afixada em lugares nos quais se vende o chá Matte Leão. Observe as construções abaixo, feitas a partir do enunciado em questão: Matte à vontade. Mate a vontade. Mate à vontade. a) Complete cada uma das construções acima com palavras ou expressões que explicitem as leituras possíveisrelacionadas à propaganda. RESOLUÇÃO: Beba chá Matte (Leão) à vontade. Mate a vontade de tomar chá Matte (Leão). Beba (chá) mate à vontade. / Mate à vontade sua sede.
b) Retome a propaganda e explique o seu funcionamento, explicitando as relações morfológicas, sintáticas e semânticas envolvidas. RESOLUÇÃO: A propaganda explora justamente as diferentes possibilidades apresentadas no item a: • “Matte à vontade.” – O sentido é de haver chá da marca anunciada em grande quantidade, de forma a satisfazer quem desejar tomá-lo. Nessa frase, “à vontade” é locução adverbial e “Matte”, por seu duplo t, faz alusão à marca em questão. • “Mate a vontade.” – A frase, de teor conativo — imperativo ou exortativo —, conclama o receptor a satisfazer seu desejo. Aqui, “mate” é forma verbal do imperativo dematar, verbo usado como catacrese procedente de metáfora (matar = “satisfazer”); “a vontade” é um sintagma nominal que complementa o verbo (objeto direto). • “Mate à vontade”. Aqui a palavra “mate” é substantivo comum, e não se refere, portanto, à marca de chá. Poder-se-ia também entender “mate” como a forma verbal do imperativo do verbo matar (Mate sua sede à vontade com chá mate). Em ambas as interpretações, “à vontade” é locução adverbial.
–3
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 4
2. (UNICAMP-SP) – O Caderno “Aliás Debate” do Estado de S.Paulo, de 18/08/2006, apresenta uma matéria com o título: “Nas fres tas e brechas da segurança”. A matéria se inicia com o seguinte trecho:
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
3. (UFSCar) – Contemple a charge:
“Estamos nas frestas, procurando as brechas”. Esta boa frase, que circulou em manifesto atribuído ao PCC e ao seu líder (...), Marcola, resume bem o que pretende a organização criminosa que vem atacando a maior cidade brasileira. (p. 2) a) Como você interpreta “frestas” e “brechas” em “Estamos nas frestas, procurando as brechas”? RESOLUÇÃO: As frestas, no contexto, sugerem o espaço “estreito” representado pela prisão ou mesmo pela situação de quem “está à es preita” buscando “brechas”, ou seja, aberturas para contornar ou burlar as restrições do sistema prisional e do próprio Poder Judiciário.
(Correio Popular, 10/10/2006.) Trata-se de uma charge publicada por um jornal brasileiro por ocasião da eleição do sul-coreano Ban Ki-Moon, como presidente da ONU, e da realização de um teste nuclear a mando do ditador norte-coreano Kim Jong-il. a) Como a diferença de emprego sintático do verbo vencer modifica o sentido das duas frases? RESOLUÇÃO: Na primeira frase, o verbovencer é intransitivo e vem acompanhado de um adjunto adverbial de lugar, “na ONU”. Na segunda frase, o verbo vencer é transitivo direto e tem como objeto direto “ONU”. Ou seja: no primeiro caso, a vitória ocorreu na ONU; no segundo, a ONU foi derrotada.
b) Levando em consideração que “Nas frestas e brechas da segurança” é o título da matéria, como você interpreta esse enun ciado comparandoo à frase atribuída a Marcola? RESOLUÇÃO: No título da matéria, as palavras “frestas” e “brechas” conotam a fragilidade, a ineficácia do sistema de segurança pública, o qual dá muito espaço à ação criminosa. No enunciado de Marcola, a palavra brecha conota o espaço de ação possível para um presidiário. Pode-se mencionar, ainda, que, no título da matéria, “frestas” e “brechas” são quase como sinônimos.
b) “Reconstrua” as duas frases, de maneira que os sentidos sugeridos pelas imagens fiquem, também, explícitos no texto escrito. RESOLUÇÃO: A primeira frase ficaria: “Sul-coreano vence eleição para presidência da ONU”. A segunda poderia ser apresentada desta forma: “Norte-coreano vence confronto com a ONU”.
4–
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 5
4. (UNICAMP-2010)
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
5. (FUVEST)
Devemos misturar e alternar a solidão e a comunicação. Aquela nos incutirá o desejo do convívio social, esta, o desejo de nós mesmos; e uma será o remédio da outra: a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão. (Sêneca, Sobre a tranquilidade da alma, Trad. de J. R. Seabra Filho.) Quino, Toda Mafalda. São Paulo: Editora Martins Fontes, 6ª. Edição, 2003.
Nessa tirinha da famosa Mafalda do argentino Quino, o humor é construído fundamentalmente por um produtivo jogo de referência. a) Explicite como o termo ‘estrangeiro’ é entendido pela personagem Mafalda e pelo personagem Manolito. RESOLUÇÃO: Para Mafalda, estrangeiro é todo país que não seja o dela. Para Manolito, estrangeiro é todo país que não seja a pátria, ou seja, aquele em que a
a) Segundo Sêneca, a solidão e a comunicação devem ser vistas como complementares porque ambas satisfazem um mesmo desejo nosso. É correta essa interpretação do texto acima? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois solidão e comunicação correspondem a diferentes desejos do ser humano: a solidão supre a necessidade de isolamento, a comunicação satisfaz nossa carência de relacionamento social.
pessoa nasceu. O equívoco de Mafalda resulta em ela não entender que o seu país é estrangeiro para quem tenha nascido fora dele.
b) “(...) a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão.” Sem prejuízo para o sentido srcinal, reescreva o trecho acima, inician do-o com “Nossa aversão à multidão...” b) Identifique duas palavras que, nessa tirinha, contri buem para a construção desse jogo de referência, explicando o papel delas. RESOLUÇÃO: As palavras centrais no mencionado “jogo de referência” são os artigos o
RESOLUÇÃO: Nossa aversão à multidão será curada pela solidão; o tédio à solidão será curado pela multidão.
e um. Para sendo Mafalda, usa o estrangeiros. artigo definido, seu é o país estrangeiro, todosque os demais ParaoManolito, o paísnão de Mafalda é um país, estrangeiro para os que procedam de outros países. Há ainda outros referentes; para Manolito, “pátria dele” refere-se ao país de srcem de seu pai e cá (Argentina) indica o país de destino de seu pai. Para Mafalda, este refere-se à Argentina, sua pátria, que não é, portanto, um país estrangeiro.
–5
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 6
6. (FUVEST) a) “Se eu não tivesse atento e olhado o rótulo, o pa ciente teria morrido”, declarou o médico. Reescreva a frase acima, corrigindo a impropriedade gramatical que nela ocorre.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
RESOLUÇÃO: “Se eu não estivesse atento e não tivesse olhado o ró tulo, o paciente teria morrido”, declarou o médico. (A impropriedade estava no emprego do auxiliar ter, em vez de estar, com o particípio atento.)
MÓDULO
BRASI DE CIMA E BRASI DE BAXO
Inquanto o Brasi de Cima Fala de transformação, Industra, matéra prima, Descobertas e invenção, No Brasi de Baxo isiste O drama penoso e triste Da negra necissidade; É uma cousa sem jeito E o povo não tem dereito Nem de dizê a verdade. No Brasi de Baxo eu vejo Nas ponta das pobre rua O descontente cortejo De criança quage nua. Vai um grupo de garoto Faminto, doente e roto Mode caçá o que comê Onde os carro põe o lixo, Como se eles fosse bicho Sem direito de vivê.
6–
RESOLUÇÃO: “Os ambientalistas defendem a econologia – com binação de princípios da economia, sociologia e ecologia – como maneira de viabilizar as formas alternativas de desenvolvimento.” (Notar: 1. que há duas construções na voz passiva, uma analítica – “é defendida” –, outra sintética ou pronominal – “se viabilizarem”; 2. que é conveniente, na voz ativa, alternativa pontuação para separar o aposto – “combinação…” – e o predicativo do objeto – “como maneira…”).
Sintaxe (III)
Instrução: As questões de números 1 a 4 tomam por base um poema do repentista cearense Patativa do Assaré (1909-2002) e uma passagem do livro O discípulo de Emaús de Murilo Mendes (1901-1975):
[...]
b) “A econologia, combinação de princípios da economia, sociologia e ecologia, é defendida por ambientalistas como maneira de se viabilizarem formas alternativas de desenvolvimento.” Reescreva a frase acima, transpondo-a para a voz ativa.
Estas pequenas pessoa, Estes fio do abandono, Que veve vagando à toa Como objeto sem dono, De manêra que horroriza, Deitado pela marquiza, Dromindo aqui e aculá No mais penoso relaxo, É deste Brasi de Baxo A crasse dos marginá. Meu Brasi de Baxo, amigo, Pra onde é que você vai? Nesta vida do mendigo Que não tem mãe nem tem pai? Não se afrija, nem se afobe, O que com o tempo sobe, O tempo mesmo derruba; Tarvez ainda aconteça Que o Brasi de Cima desça E o Brasi de Baxo suba. Sofre o povo privação Mas não pode recramá, Ispondo suas razão Nas coluna do jorná. Mas, tudo na vida passa, Antes que a grande desgraça Deste povo que padece Se istenda, cresça e redrobe, O Brasi de Baxo sobe E o Brasi de Cima desce.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 7
Brasi de Baxo subindo, Vai havê transformação Para os que veve sintindo Abondono e sujeição. Se acaba a dura sentença E a liberdade de imprensa Vai sê legá e comum, Em vez deste grande apuro, Todos vão tê no futuro Um Brasi de cada um.
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Brasi de paz e prazê, De riqueza todo cheio, Mas, que o dono do podê
2. (UNESP-julho-2010) – Patativa do Assaré criou um discurso
Respeite o dereito aleio. Um grande e rico país Munto ditoso e feliz, Um Brasi dos brasilêro, Um Brasi de cada quá, Um Brasi nacioná Sem monopolo istrangêro.
poemático peculiar, fala próprias popular normas e rural. ortográficas, Por isso, ao escrever seus poemas,que usaestiliza tambéma suas bem como “regras” gramaticais desse linguajar do povo. Releia atentamente a terceira estrofe do poema e a reescreva em discurso considerado culto, sem se preocupar com a quebra do ritmo ou da rima.
(Patativa do Assaré [Antônio Gonçalves da Silva]. Cante lá que eu canto cá. 6.ª Ed. Crato: Vozes/Fundação Pe. Ibiapina/Instituto Cultural do Cariri. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1986.)
O DISCÍPULO DE EMAÚS
A harmonia da sociedade somente poderá ser atingida mediante a execução de um código espiritual e moral que atenda, não só ao bem coletivo, como ao bem de cada um. A conciliação da liberdade com a autoridade é, no plano político, um dos mais importantes problemas. A extensão das possibilidades de melhoria a todos os membros da sociedade, sem distinção de raças, credos religiosos, opiniões políticas, é um dos imperativos da justiça social, bem como a apropriação pelo Estado dos instrumentos de trabalho coletivo. (Murilo Mendes. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994.)
1. (UNESP-julho-2010)– Os dois fragmentos apresentados focalizam o mesmo tema de formas diferentes, em poesia e em prosa. Em seu poema, Patativa do Assaré reclama, entre outras coisas, da falta de liberdade sofrida pelo povo do Brasi de Baxo. No segundo período do fragmento de Murilo Mendes a mesma questão é abordada sob outro ponto de vista. Explique o que se fala nesse fragmento a respeito da liberdade. RESOLUÇÃO: A questão formulada em termos gerais, abstratos, por Murilo Mendes – “a conciliação da liberdade com a autoridade” – toca no problema nacional que motiva a indignação de Patativa do Assaré, seja nas recla mações sobre a falta de liberdade para o “Brasi de Baxo” exprimir suas justas reclamações e demandas, seja nas queixas sobre o abuso de quem detém a autoridade (o “dono do Podê”), que não respeita o “dereito aleio”. Murilo Mendes, no trecho referido, reconhece, em sentido amplo, que o problema é “dos mais importantes”, sem mais especificações e pare cendo associá-lo, em seguida, a um ideal amplo, coletivista e socializante de “justiça social”.
RESOLUÇÃO: Estas pequenas pessoas, Estes filhos do abandono, Que vivem vagando à toa Como objetos sem dono, Que causam horror Deitados sob marquises, Dormindo aqui e acolá No mais penoso abandono É deste Brasil de Baixo A classe dos marginais.
3. (UNESP-julho-2010) – Relendo o primeiro período do fragmento de Murilo, podemos até imaginá-lo como uma resposta à sexta estrofe do poema de Patativa. Compare ambas as passagens e, a seguir, explique o que Murilo sugere para que na sociedade se possa atingir, como diz um texto, Um Brasi de cada um, ou o outro texto, o bem de cada um. RESOLUÇÃO: Somente pode haver a transformação idealizada no texto de Patativa do Assaré (“Brasi de Baxo subindo”, “liberdade de imprensa”), ou seja, ascensão dos desfavorecidos e liberdade política, caso haja, segundo o texto de Murilo Mendes, a “execução de um código espiritual e moral” que atenda a todos os brasileiros, não apenas a um grupo de privilegiados.
–7
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 8
4. (UNESP-julho-2010) – Como Patativa imita o linguajar do povo, seu discurso poemático incorpora regras gramaticais desse linguajar, que não são as mesmas da norma culta. Estabeleça a diferença entre a concordância verbal utilizada pelo poeta nos versos Onde os carro põe o lixo, / Como se eles fosse bicho e a que se observa na norma culta.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
RESOLUÇÃO: Nesses versos, a concordância, conforme a variante popular, flexiona em número apenas o determinante (artigo) e o pronome, pois, segundo a gramática desse linguajar, a flexão de substantivos e verbos seria redundante. Trata-se de uma regra de economia linguística. Na norma culta, os verbos devem flexionar-se no plu ral, concordando com os sujeitos os carros e eles.
b) No trecho “...quando haviam no mundo mulheres como Vidinha”, ocorre uma construção tida como incorreta, pois está em desacordo com o uso culto da língua portuguesa. De que se trata? Corrija o erro. RESOLUÇÃO: O verbo haver, no sentido de “existir”, é impessoal, devendo permanecer na terceira pessoa do singular: “...quando havia no mundo...”.
6. (FUVEST) – Não tenho dúvidas de que a reportagem esteja à procura da verdade, mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita com base exclusivamente em documentos da polícia política. (O Estado de S.Paulo)
Texto para a questão 5.
[...] admirava-se ele de como é que havia podido incli nar-se por um só instante a Luisinha, menina sensaborona e esquisita, quando haviam no mundo mulheres como Vidinha. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 5. (FUVEST) a) Em “...admirava-se ele de como é que havia podido inclinar-se...”, o sujeito da locução verbal destacada é elíptico e está no singular ( ele). Se o sujeito fosse composto (com dois ou mais núcleos) ou plural, essa locução verbal sofreria uma alteração. Qual seria? Justifique. RESOLUÇÃO: O verbo haver deveria concordar com o sujeito plural:haviam podido. Nas locuções verbais, a flexão de número recai sobre o verbo auxiliar e, no trecho dado, o verbo haver foi empregado como auxiliar do verbopoder. Não se deve, portanto, confundir esse emprego com o caso em que tal verbo é usado na acepção de “existir”, o que obrigaria a concordância exclusiva com a terceira pessoa do singular.
8–
Das duas ocorrências de de que, no excerto acima, uma está correta e a outra não. a) Justifique a correta. RESOLUÇÃO: A primeira ocorrência é a correta. Em “Não tenho dúvidas de que a reportagem...”, o uso da preposiçãode, diante da conjunção subordinativa integrante que, é obrigatório, já que a aludida preposição é regida pelo substantivo dúvidas.
b) Corrija a incorreta, dizendo por quê. RESOLUÇÃO: “... mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita...” Está de. O verbo ressalvar incorreta porque não há termo regente de preposição é transitivo direto, não exigindo, pois, preposição em seu complemento.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 9
Sintaxe (IV)
MÓDULO 1. (UNICAMP-2010)
NÃO DIGA SANDICES, MEU JOVEM. PERCEBA A GRANDEZA DESSE MOMENTO.
SABIA QUE ACABA DE SER ASSINADO O
MAIS UM TROÇO INÚTIL, EMPURRADO GOELA ABAIXO!
ESTAMOS FALANDO DA UNIFICAÇÃO DO NOSSO IDIOMA ESCRITO. DA PADRONIZAÇÃO
DA LÍNGUA!
ESTE LIVRO, POR EXEMPLO,
HÚÚMM...
ESTÁ ADAPTADO. ..SAINDO DABICHA, ÉDE JÁPORTUGAL EPODE SER PUBLICADO POR AQUI FUI TOMAR UMABICA SEM MUDAR UMA ANTES DE IR COMPRAR UM PAR DE VÍRGULA PEÚGAS. ?! SEQUER. ´´
´´
BICA...? PEÚGAS...?
2. (UNICAMP) – Leia os seguintes artigos do Capítulo VIII do novo Código Civil (Lei no. 10.406, de 10 de janeiro de 2002): Art. 1.548. É nulo o casamento contraído: I. pelo enfermo mental sem o necessário discer nimento para os atos da vida civil; II. por infringência de im pedimento. (...) Art. 1.550. É anulável o casamento: I. de quem não completou a idade mínima para casar; (...) VI . por incompetência da autoridade celebrante.
ALÁ!! NÃO FALEI?! NÃO FALEI?!
Retirada de www.miriamsalles.info/wp/wp-content/uploads/acord
a) Os enunciados que introduzem os artigos 1.548 e 1.550 têm sentido diferente. Explique essa diferença, comparando, do ponto de vista morfológico, as palavras nulo e anulável. RESOLUÇÃO: Nulo significa, no contexto, “sem valor, sem efeito por falta de uma formalidade fundamental”; anulável significa “que pode ser tornado nulo”. Portanto, entende-se que, nos termos do artigo1.548,não tem efeito o casamento contraído por “enfermo mental sem discernimento para os atos da vida civil” ou por pessoa sob impedimento; nos termos do artigo 1.550, entende-se que podem ser anulados os casamentos contraídos por menores ou celebra dos por pessoa não autorizada. A diferença morfológica – e, em consequência, semântica – entre os adjetivos nulo e anulável está em que o último se forma por derivação sufixal, a partir do verbo anular – por isso com a raiz nul- acrescida do prefixo a-. O sufixo empregado, -vel , significa “passível de”.
a) Qual é o pressuposto da personagem que defende o acordo ortográfico entre os países de língua portuguesa? Por que esse pressuposto é inadequado? RESOLUÇÃO: O pressuposto é que o Acordo promoveria a uniformização do português escrito, permitindo que livros portugueses se publicassem no Brasil sem nenhuma alteração. Tal pressuposto é des mentido pela simples leitura de algumas linhas de um livro português, linhas nas quais avultam as diferenças entre o vocabulário português e o brasileiro.
b) Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), infringência vem de infringir (violar, transgredir, desrespeitar) +ência. Compare o processo de formação dessa palavra com o de incompetência, indicando eventuais diferenças e semelhanças.
b) Explique como, na tira acima, esse pressuposto é quebrado. RESOLUÇÃO: A grande diferença lexical, que a leiturarevela, entre o português lusitano e o brasileiro constitui, como sugere a historieta, um obstáculo muito mais grave à compreensão mútua do que as diferenças gráficas que o Acordo Ortográfico busca superar.
RESOLUÇÃO: Infringência significa “ato de infringir”; incompetência significa “falta de competência”. Em ambas as palavras encontram-se os mesmos pre fixo (in) e sufixo (-ência). Infringência , porém, forma-se por derivação sufixal, pois o prefixo faz parte do verbo, infringir (“desobedecer, descumprir”), a cujo radical se juntou o sufixo ência, formador de substantivo abstrato, ao passo que em incompetência ocorre derivação prefixal, pois o prefixo in-, de sentido negativo, se junta ao substantivo competência.
–9
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 10
3. (UNICAMP) – Reportagem da Folha de S. Paulo informa que o presidente do Brasil assinou decreto estabelecendo prazos para o País colocar em prática o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que unifica a ortografia nos países de língua portuguesa. Na matéria, o seguinte quadro comparativo mostra alterações na ortografia estabelecidas em diferentes datas: P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Após as reformas de 1931 e Êles estão tranqüilos, porque prova1943: velmente não crêem em fantasmas. Após as alterações de 1971:
b) O excerto transcrito apresenta uma ironia. Em que con siste essa ironia? Justifique. RESOLUÇÃO: A ironia do articulista refere-se à suposição, que fundamenta o Acordo, de que pequenas alterações ortográficas sejam suficientes para promover ou facilitar de maneira significativa o intercâmbio cultural entre os países lusófonos. Ao referir-se a lugares remotos e ignorados, o articulista, além de dar expressão a preconceitos sociais e culturais, pretende sugerir que o “atraso” – econômico, social, cultural – presumível em tais cidades seja o principal problema a travar as relações culturais entre os países envolvidos.
Eles estão tranqüilos, porque provavelmente não crêem em fantasmas.
Após o novo acordo, a vigorar Eles estão tranquilos, porque provaa partir de janeiro de 2009 velmente não creem em fantasmas. Sobre o acordo, a reportagem ainda informa:
As regras do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entram em vigor no Brasil a partir de janeiro de 2009, vão afetar principalmente o uso dos acentos agudo e circunflexo, do trema e do hífen. Cuidado: segundo elas, você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia. (...) (Adaptado de E. Simões, “Que língua é essa?”. Folha de S.Paulo, Ilustrada, p. 1, 28/09/2008.) a) O excerto acima supõe que alterações ortográficas modifiquem o modo de falar uma língua. Mostre a palavra utilizada que permite essa interpretação. Levando em consideração o quadro comparativo das mudanças ortográficas e a suposição expressa no excerto, explique o equívoco dessa suposição. RESOLUÇÃO: Ao concluir que “você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia”, o jornalista usou o verbo dizer em lugar de
escrever, induzindo o leitor em erro, ao sugerir que a reforma afetaria o modo de falar das pessoas. O quadro comparativo apresentado seria suficiente para desmentir a sugestão do jornalista, pois nele se vê que não houve alteração na pronúncia das palavras, mas apenas na sua grafia.
4. (FUVEST) – Leia o seguinte texto, extraído de uma biografia do compositor Carlos Gomes.
No ano seguinte [1860], com o objetivo de consolidar sua formação musical, [Carlos Gomes] mudou-se para o Rio de Janeiro, contra a vontade do pai, para iniciar os estudos no conservatório da cidade. “Uma ideia fixa me acompanha como o meu destino! Tenho culpa, porventura, por tal cousa, se foi vossemecê que me deu o gosto pela arte a que me dediquei e se seus esforços e sacrifícios fizeram-me ganhar ambição de glórias futuras?”, escreveu ao pai, aflito e cheio de remorso por tê-lo contrariado. “Não me culpe pelo passo que dei hoje. [...] Nada mais lhe posso dizer nesta ocasião, mas afirmo que as minhas intenções são puras e espero desassossegado a sua bênção e o seu perdão”, completou. (http://musicaclassica.folha.com.br) a) Sobre o advérbio “porventura”, presente na carta do compositor, o dicionário Houaiss informa: usa-se em frases interrogativas, especialmente em perguntas delicadas ou retóricas. Aplica-se ao texto da carta essa informação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A pergunta modulada pelo advérbioporventura é claramente retórica, ou seja, é uma afirmação sob a forma de pergunta, pois nela o autor sugere ter sido o próprio pai o “culpado” de seu “gosto pela arte”, um gosto que então o levaria a contrariar determinações paternas.
Ainda sobre a reforma ortográfica, Diogo Mainardi escreveu o se guinte:
Eu sou um ardoroso defensor da reforma ortográfica. A perspectiva de ser lido em Bafatá, no interior da Guiné-Bissau, da mesma maneira que sou lido em Carinhanha, no interior da Bahia, me enche de entusiasmo. Eu sempre soube que a maior barreira para o meu sucesso em Bafatá era o C mudo [como em facto na ortografia de Portugal] (...) (D. Mainardi, “Uma reforma mais radical”. Revista VEJA, p. 129, 8/10/2008.)
10 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 11
b) Cite duas palavras, também empregadas pelo com positor, que atestem, de maneira mais evidente, que, daquela época para hoje, a língua portuguesa sofreu modificações. RESOLUÇÃO: As formas cousa e vossemecê, hoje desusadas no Brasil, atestam a evolução da língua. As formas hoje correntes dessas palavras são coisa e você. (O mesmo não seria verdade para Portugal, onde também a língua evoluiu, evidentemente, no último século e meio, e onde também as referidas pala vras se transformaram, mas onde ainda são cor rentes, em certos dialetos, as duas formas mais antigas.)
5. (UNICAMP)
a) A primeira tira é uma tradução portuguesa e a segunda, uma tradução brasileira. Dê um exemplo de uma diferença sintática entre a tradução do português europeu e a do português brasileiro. Descreva essa diferença. RESOLUÇÃO: A fala da mãe de Calvin, no último quadrinho, sem fugir ao coloquial lusitano, corresponde à norma culta quanto ao emprego do pronome oblíquo o como objeto direto depôr e sujeito de comer. No português do Brasil, a construção “fazer ele comer” corresponde à variante coloquial popular, que discrepa da norma culta, pois apresentao pronome retoele em função de objeto direto defazer. Outra diferença sintática significativa entre a tradução portuguesa e a brasileira se encontra nas construções “que te transformará”/“que irá te transformar”, no segundo quadrinho. Na versão portuguesa ocorre próclise do pronome oblíquo átono em construção com o futuro. Tal próclise seria justificada, nos termos da gramática normativa, pela “atração” exercida pronomebrasileira, relativo que, impeditiva da mesóclise transformar-te-á . Napelo tradução a construção “que irá te transformar” desrespeitaria tanto a “regra” da atração do pronome oblíquo (cuja observância resultaria em “que te irá transformar”) quanto, segundo a análise convencional, a interdição de ênclise com o futuro. Em “irá te transformar”, porém, não ocorre a ênclise condenada irá-te, mas sim, de acordo com a tendência geral da linguagem coloquial brasileira, a próclise “te transformará”. Ainda no segundo quadrinho, uma diferença sintática expressiva pode ser notada no confronto entre a uniformidade do tratamento em segunda pessoa, que se observa na versão portuguesa (te e comeres), e a falta de uniformidade presente na versão brasileira, com a mistura de segunda e terceira pessoa nos pronomes e na flexão verbal (te e você comer). A diferença entre as construções com o verbo ter, regendo preposição ou conjunção com função prepositiva – “tem de” (versão portuguesa) e “tem que” (versão brasileira) –, não chega a ser uma diferença propriamente sintática nem é significativa da diferença entre o português dos dois países, pois ter que também se usa em Portugal. Observe-se, porém, que gramáticos mais empedernidamente autoritários em sua “defesa” da tradição linguística (Napoleão Mendes de Almeida, por exemplo) consideram que as duas construções não se equivalem e devem ser usadas em contextos linguísticos diversos e com sentidos diferentes.
b) Explique a diferença de sentido entre os verbos ter e haver em “Tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!”, na segunda tirinha. RESOLUÇÃO: A frase “tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!” apresenta o verbo ter com sentido de “dever” e haver com significado de “existir”, como é corrente no coloquial brasileiro.
– 11
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 12
MÓDULO
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Sintaxe (V)
1. (UNICAMP) – As gramáticas costumam definir os tempos verbais de forma simplificada. C. Cunha e L. Cintra, por exemplo, em suaNova Gramática do Português Contemporâneo , dizem que “o futuro designa um fato ocorrido após o momento em que se fala” . Observe como Bastos Tigre joga com essa noção de futuro para dar uma interpretação engraçada do sétimo mandamento.
Não furtarás – prega o Decálogo e cada homem deixa para amanhã a observância do sétimo mandamento. (citado por Mendes Fradique em sua Grammatica
b) Tanto sou como é são formas de presente do indicativo. Apesar disso, a visão de tempo que elas transmitem não é a mesma em uma e outra. Em que consiste essa diferença? RESOLUÇÃO: Sou tem o valor de presente propriamente dito: enuncia um fato contemporâneo, algo que ocorre no mesmo momento em que se dá a enunciação. Quanto a é, em “O que é uma coisa bela?”, seu valor é atemporal, pois enuncia algo que não se limita ao momento da enunciação. É o que se chamapresente durativo ou universal, por indicar ações e estados permanentes, como, por exemplo, uma verdade científica, um dogma, um artigo de lei etc.
Portugueza pelo Methodo Confuso, 1928) a) Qual a interpretação usual (feita, por exemplo, por um rabino, um pastor ou um padre) desse mandamento? RESOLUÇÃO: O homem não deve furtar em tempo algum. O futuro tem valor de imperativo.
b) Qual a interpretação feita por Bastos Tigre? RESOLUÇÃO: A interpretação é literal. O homem furta a todo momento, deixando a aplicação do mandamento para os dias vin douros.
2. (FUVEST) (...) O antropólogo Claude Lévi-Strauss detestou a Baía de Guanabara Pareceu-lhe uma boca banguela. E eu, menos a conhecera mais a amara? Sou cego de tanto vê-la, de tanto tê-la estrela O que é uma coisa bela? (Caetano Veloso,O Estrangeiro) a) Na linguagemliterária, muitas vezes,o mais-que-perfeito doindicativo substitui outras formas verbais, como no verso: “E eu, menos a conhecera mais a amara?”. Reescreva-o, usando as formas que o maisque-perfeito substituiu. RESOLUÇÃO: “E eu, menos a conhecesse mais a amaria? As formas do mais-que-perfeito do indicativo conhecera e amara substituem o imperfeito do subjuntivo conhecesse e o futuro do pretérito do indicativo amaria, respectivamente.
12 –
Leia o texto seguinte.
Desculpe-nos pela demora em responder a sua reclamação sobre a sua TV de plasma. Precisávamos ter a certeza de que a nossa matriz aqui no Brasil estaria nos enviando a referida peça. Na próxima semana, estaremos fazendo uma revisão geral no aparelho e vamos estar enviando ele para o senhor. Atenciosamente... (Texto do e-mail de uma empresa, justificando o atraso em consertar um aparelho eletrônico.) 3. (UFSCar) – Observa-se, nesse texto, um problema de estilo comum nas correspondências comerciais e nas comunicações de telemarketing e também um desvio da norma padrão do português do Brasil. a) Identifique o problema de estilo e redija o trecho em que ele ocorre, corrigindo-o. RESOLUÇÃO: O “problema de estilo” consiste no hábito corrente de substituir formas verbais simples por locuções com o verbo auxiliar estar seguido do gerúndio do verbo principal. Assim, no texto transcrito, “es taria… enviando” substitui “enviaria”; “estaremos fazendo” substitui “faremos” e “vamos estar enviando” substitui “vamos enviar”. Reescrito e melhorado em alguns pontos, o trecho em questão poderia assumir a seguinte forma: “Precisávamos ter certeza de que a nossa matriz no Brasil nos enviaria a referida peça. Na próxima semana,faremos uma revisão geral no aparelho e o enviaremos ao senhor”.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 13
5. (FUVEST) – Leia o excerto, observando as diferentes formas verbais.
b) Identifique o desvio e redija o trecho em que ele ocorre, corrigido. RESOLUÇÃO: O “desvio da norma padrão” do Português, não ape nas do Brasil, está no emprego do pronome retoele em função de objeto, na qual seria de regra o pronome oblíquo o: “vamos enviá-lo”.
Chegou. Pôs a cuia no chão, escorou-a com pedras, matou a sede da família. Em seguida acocorou-se, remexeu o aió, tirou o fuzil, acendeu as raízes de macambira, soprou-as, inchando as bochechas cavadas. Uma labareda tremeu, elevou-se, tingiu-lhe o rosto queimado, a barba ruiva, os olhos azuis. Minutos depois o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim. Eram todos felizes. Sinha Vitória vestiria uma saia larga de ramagens. A cara murcha de sinha Vitória remoçaria (...). (...) A fazenda renasceria – e ele, Fabiano, seria o vaqueiro, para bem dizer seria dono daquele mundo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) a) Considerando que no primeiro parágrafo predomina o pretérito perfeito, justifique o emprego do imperfeito em “... o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim”.
Texto para a questão 4.
RESOLUÇÃO: As formas do pretérito perfeito indicam ações pontuais, concluídas no passado; o imperfeito indica ação em decurso no passado. O efeito narrativo do imperfeito, no caso, é atribuir vivacidade à ação, apresentando-a em seu desdobramento.
No dia em que o país dispor de uma moeda mais competitiva, poderá se transformar em potência comercial porque finalmente aprendeu a desenvolver inteligência comercial. (Luís Nassif, Agência Dinheiro Vivo, www.luisnassif.com.br, 7/7/2010) 4. a) O texto acima apresenta um ponto em que se afasta da norma culta. Aponte-o, comente-o e corrija-o. RESOLUÇÃO: A forma verbal dispor, que deveria estar no futuro do subjuntivo, pois enuncia uma possibilidade futura, foi confundida com o infinitivo. A forma correta seria dispuser.
b) Explique o efeito de sentido produzido no excerto pelo emprego do futuro do pretérito. RESOLUÇÃO: O perfeito e o imperfeito relatam fatos; o futuro do pretérito registra desejos, aspirações, fantasias da personagem (sinalizando, portanto, discurso indireto livre).
b) Tal como está redi gido, o texto pare ce afirmar que o pa ís já aprendeu a “desenvolver inteligência comercial”. O sentido sugerido pelo contexto é, porém, outro: que o desenvolvimento de “inteligência comercial” só se dará quando o país contar com “uma moeda mais competitiva”. Para que se explicite com precisão este último sentido, como ficaria a redação da frase a partir de “... porque finalmente...”? RESOLUÇÃO: ... porque finalmente terá aprendido a desenvolver inteligência comercial.
– 13
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 14
Texto para a questão 6.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade. A obesidade não foge à regra. Na Idade Média, a sociedade considerava a hanseníase um castigo de Deus para punir os ímpios. No século 19, quando proliferaram os aglomerados urbanos e a tuberculose adquiriu características epidêmicas, dizia-se que a enfermidade acometia pessoas enfraqueci das pela vida devassa que levavam. Com a epidemia de Aids, a mesma história: apenas os promíscuos adquiririam o HIV. Coube à ciência demonstrar que são bactérias os agentes causadores de tuberculose e da hanseníase, que a Aids é transmitida por um vírus e que esses micro-organismos são alheios às virtudes e fraquezas humanas: infectam crianças, mulheres ou homens, não para puni-los ou vê-los sofrer, mas Tanto porquesepretendem e multiplicar-se como todos os seres vivos. lhes dá se crescer o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. (...) (Drauzio Varella,Folha de S.Paulo, 12/11/2005) 6. (FUVEST) a) Crie uma frase com a palavra “obesidade” que possa ser acres centada ao final do 2.° parágrafo sem quebra de coerência.
b) Fazendo as adaptações necessárias e respeitando a equivalência de sentido que a expressão “Tanto se lhes dá (...)” tem no texto, proponha uma frase, substituindo o pronome lhes pelo seu referente. RESOLUÇÃO: Pouco importa a esses micro-organismos se o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. A formulação deste quesito não é inteiramente precisa, pois não se esclarece se o pronome lhes deve ser substituído por seu referente em suas duas ocorrências na frase ou, o que parece mais razoável, apenas na primeira, na expressão cujo sentido se questiona. Outro defeito na formulação deste quesito se encontra no trecho “respeitando a equivalência de sentido que a expressão ‘Tanto se lhes dá (...)’ tem no texto”. Esse trecho deveria ser substituído por uma redação mais simples, direta e precisa: mantendo-se o sentido que a expressão “Tanto se lhes dá” tem no texto, pois não é a “equivalência de sentido que a expressão... tem no texto” que se quer respeitada.
RESOLUÇÃO: Nos nossos dias, é comum atribuir às pessoas obesas a culpa por sua obe sidade, como se sua condição fosse apenas resultado de seu descomedimento ao comer. A frase deve encaixar-se na série de exemplos contida no segundo pará grafo. Tais exemplos ilustram a primeira afirmação do texto: “Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade.” O caso da obesidade seria a ilustração da afirmação complementar do parágrafo inicial: “A obesidade não foge à regra.”
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (I)
1. (UNICAMP-SP) – Na seguinte cena do Auto da Barca do Inferno, o Corregedor e o Procurador dirigem-se à Barca da Glória, depois de se recusarem a entrar na Barca do Inferno.
Corregedor: Anjo:
Corregedor:
Ó arrais dos gloriosos, passai-nos neste batel! Ó pragas pera papel, pera as almas odiosos! Como vindes preciosos, sendo filhos da ciência! Ó! habeatis clemência e passai-nos como vossos!
para
tende
Hou, homens dos breviairos1, rapinastis coelhorum et pernis perdiguitorum2 e mijais nos campanairos! Corregedor: Ó! Não nos sejais contrairos, pois nom temos outra ponte! Joane (Parvo): Beleguinis ubi sunt3? Ego latinus macairos4. (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno. São Paulo, Ateliê Editorial, 1996, p. 107-109.) Joane (Parvo):
1 – Homens dos breviairos: homens de leis. 2 – Rapinastis coelhorum / et pernis perdiguitorum:Recebestes coelhos e pernas de perdiz como suborno. 3 – Beleguinis ubi sunt?: Onde estão os policiais? 4 – Ego latinus macairos: Eu falo latim macarrônico.
14 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 15
a) De que pecado o Parvo acusa o homem de leis (Corregedor)? Esse é o único pecado de que ele é acusado na peça? RESOLUÇÃO: Joane, o Parvo, acusa o Corregedor de se deixar subornar com as ofertas de coelhos e pernas de perdiz, sendo, desse modo, segundo o Diabo, um “santo descorregedor”, sentenciando com pouca honestidade (“ quia judicastis malitia”). Além disso, há referência ao desrespeito do Correge dor aos mortos, uma vez que urinara nas campas. Outro delito do qual o magistrado é acusado pelo Diabo é o de ter explorado os trabalhadores inocentes (“ignorantes do pecado”): “A largo modo adquiristis / sanguinis laboratorum, / ignorantes peccatorum”.
a) Por que o Cavaleiro chama a atenção do Diabo? RESOLUÇÃO: Porque o Cavaleiro sacrificou a vida para defender o Cristianismo e, assim, ter assegurado seu lugar na barca da Glória. O Diabo presume que o Cavaleiro é, como a maioria dos mortos chegados ao cais, um ser cheio de vícios e interpela-o. O Cavaleiro adverte o Diabo, distinguindo-se e evitando maior contato. S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
b) Onde e como morreram os dois Cavaleiros? b) Com que propósito o latim é empregado pelo Corregedor? E pelo Parvo? RESOLUÇÃO: O Corregedor emprega o latim de uso jurídico, que caracteriza o homem de leis, tipificando a personagem. O Parvo, por sua vez, vale-se do latim de maneira humorística e, consciente de seus erros, declara falar latim “macarrônico”, isto é, mistura de latim e português. Para o Corregedor, o latim é instrumento de autoridade; para o Parvo, ao contrário, é um meio de contestação da autoridade e de zombaria da pompa de que se reveste o discurso autoritário.
RESOLUÇÃO: Os Cavaleiros morreram numa Cruzada, em combate contra os “infiéis”. Observe-se que, na época da encenação do Auto da Barca do Inferno, as Cruzadas já eram coisa do passado.
c) Por que os dois passam pelo Diabo sem se dirigir a ele? 2. (UNICAMP-SP) – Leia o diálogo abaixo, do Auto da Barca do Inferno:
RESOLUÇÃO: Porque entendem que quem deu a vida numa Cruzada, em defesa do Cristianismo, tem assegurado um lugar na barca da Glória, estando livre da condenação ao inferno.
Diabo:
Cavaleiros, vós passais e não perguntais onde is? Cavaleiro 1: Vós, Satanás, presumis? Atentai com quem falais! Cavaleiro 2: Vós que nos demandais? Sequer conhece-nos bem. Morremos nas partes d’além, e não queirais saber mais. (Gil Vicente, “Auto da Barca do Inferno”, in Antologia do Teatro de Gil Vicente. Org. Cleonice Berardinelli, Rio de Janeiro, Nova Fronteira/Brasília, INL, 1984, p. 89.) – 15
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 16
3. (FUVEST-SP)
E, chegando à barca da Glória, diz ao Anjo:
Brísida: P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Anjo: Brísida:
Barqueiro, mano, meus olhos, prancha a Brísida Vaz! Eu não sei quem te cá traz... Peço-vo-lo de giolhos! Cuidais que trago piolhos, anjo de Deus, minha rosa? Eu sou Brísida, a preciosa, que dava as moças aos molhos.
4. Sobre o Auto da Barca do Inferno, afirmou Antônio José Saraiva:
O Parvo, que se convertera em uma espécie de comentador, independente da ação, punha à mostra, com os seus disparates, o ridículo das personagens convencidas do seu papel. Qual o motivo de o Anjo deixar o Parvo à espera para entrar no batel? RESOLUÇÃO: O Parvo observa os passageiros que pretendem embarcar para o Céu e comenta, jocosamente, a respeito deles.
A que criava as meninas para os cônegos da Sé... Passai-me, por vossa fé, meu amor, minhas boninas, olhos de perlinhas finas! (...) (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno – texto fixado por Segismundo Spina) a) No excerto, a maneira de tratar o Anjo empregada por Brísida Vaz relaciona-se à atividade que ela exercera em vida? Explique resumidamente. RESOLUÇÃO: Brísida Vaz, em vida, era alcoviteira, ou seja, agenciava mulheres para a prostituição. Assim, sua linguagem revela sua atividade, pois ela se utiliza de termos que procuram seduzir o Anjo, como “anjo de Deus”, “minha rosa”, “meu amor”, “minhas boninas”, “olhos de perlinhas finas”.
5. (PUC-SP) – Diabo, Companheiro do Diabo, Anjo, Fidalgo, Onzeneiro, Parvo, Sapateiro, Frade, Florença, Brísida Vaz, Judeu, Corregedor, Procurador, Enforcado e Quatro Cavaleiros são personagens do Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente. Analise as informações abaixo e selecione a alternativa incorreta, cujas características não descrevem adequadamente a personagem. a) O Onzeneiro idolatra o dinheiro; é agiota e usurário; de tudo o que juntara, nada leva para a morte, ou melhor, leva a bolsa vazia. b) O Frade representa o clero decadente e é subjugado por suas fraquezas: mulher e esporte; leva a amante e as armas de esgrima. c) O Diabo, capitão da barca do Inferno, é quem apressa o embarque dos condenados; é dissimulado e irônico. d) O Anjo, capitão da barca do Céu, é quem elogia a morte pela fé; é austero e inflexível. e) O Corregedor representa a justiça e luta pela apl icação íntegra e exata das leis; carrega papéis e processos.
b) No excerto, o trata mento que Brísid a Vaz dispensa ao Anjo é adequado à obtenção do que eladeseja —isto é, levar oAnjo a permitir que ela embarque? Por quê?
RESOLUÇÃO: O Auto da Barca do Inf erno apresenta personagens representativas da sociedade medieval portuguesa. Suas atitudes em vida as credenciam ao embarque para o Céu ou para o Inferno. O Corregedor aceitava “as peitas dos judeus”, propinas e suborno, convertendo-se no símbolo da justiça corrupta e da utilização do poder judiciário em proveito próprio e no de alguns privilegiados, em detrimento dos humildes e desvalidos. Vai para o Inferno, apesar de toda a retórica latinizante da vida forense, que o dramaturgo explora cômica e satiricamente, para compor os tipos carica tos do juiz venal e do procurador subserviente. Resposta: E
RESOLUÇÃO: O tratamento que Brísida Vaz dispensa ao Anjo é inadequado, pois revela apego ao universo pecaminoso da sedução e prostituição, ou seja, justamente àquilo que justifica sua condenação ao inferno.
16 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 17
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (II)
1. (UNICAMP-SP-2010) – No excerto abaixo, o romance Iracema é aproximado da narrativa bíblica:
Em Iracema, (...) a paisagem do Ceará fornece o cenário edênico para uma adaptação do mito da Gênese. Alencar aproveitou até o máximo as similaridades entre as tradições indígenas e a mitologia bíblica (...). Seu romance indianista (...) resumia a narrativa do casamento inter-racial, porém (...) dentro de um quadro estrutural pseudohistórico mais sofisticado, derivado de todo um complexo de mitos bíblicos, desde a Queda Edênica ao nascimento de um novo redentor. Exilados, Aliados, Rebeldes: (David Treece,indigenista o movimento indianista, a política e o Estado-Nação imperial. São Paulo, Nankin/Edusp, 2008, p. 226, 258-259.) Partindo desse comentário, responda às questões: a) Que associação se pode esta belecer entre os protagoni stas do romance e o mito da Queda com a consequente expulsão do Paraíso? RESOLUÇÃO: O mito da Queda, central na tradição judaico-cristã, corresponde à narrativa segundo a qual Adão e Eva, habitantes do Éden (Paraíso), teriam comido o fruto proibido. Por causa dessa falta, teriam tido como castigo a expulsão da morada paradisíaca e o mergulho de seus descendentes, o gênero humano, na dor e sofrimento (multiplicação da dor do parto, necessidade de “ganhar o pão com o suor do rosto”). Iracema aproveita vários elementos desse mito: o vinho da jurema assemelha-se ao fruto proibido; a perda da inocência de Adão e Eva equivale à união carnal entre Martim e Iracema; a descida que a protagonista faz do território tabajara para o pitiguara identifica-se com a perda do Paraíso. O caminho para baixo é percorrido após o sexto dia, que lembra o dia da criação do homem; a dor da heroína ao ver seus conterrâneos mortos em combate e, mais adiante, durante o seu parto, estabelece proximidade com os sofrimentos profetizados por Deus à espécie humana.
2. (UNICAMP-SP) – Leia, abaixo, a letra de uma canção de Chico Buarque inspirada no romance de José de Alencar, Iracema, lenda do Ceará: IRACEMA VOOU Iracema voou Para a América Leva roupa de lã E anda lépida Vê um filme de quando em vez Não domina o idioma inglês
Lavasaído chão ao numa Tem luarcasa de chá Com um mímico Ambiciona estudar Canto lírico Não dá mole pra polícia
Se puder, vai ficando por lá Tem saudade do Ceará Mas não muita Uns dias, afoita Me liga a cobrar: — É Iracema da América (Chico Buarque, As Cidades. Rio de Janeiro, Marola Edições Musicais Ltda.,1998.) a) Que papel desempenha Iracema no romance de José de Alencar? E na canção de Chico Buarque? RESOLUÇÃO: Iracema desempenha, no romance de Alencar, o papel de heroína romântica, mártir do amor. Ela é a sacerdotisa ou vestal dos Tabajaras, que detém o segredo da jurema. Além disso, ela pode ser considerada a própria representação da natureza virgem dos trópicos, que será possuída pelo colonizador europeu, o português Martim, com quem terá um filho. Na canção de Chico Buarque, Iracema desempenha o papel da brasileira exilada que, com astúcia “malandra”, consegue “se virar”, procurando “se dar bem” na América do Norte e preferindo viver lá , apesar das dificuldades e da saudade da terra natal.
b) Qual personagem poderia ser associada ao “novo redentor”? Por quê? RESOLUÇÃO: O “novo redentor” é Moacir, filho de Iracema com Martim. Assim como Cristo teria vindo ao mundo para redimir o gênero humano do pecado srcinal, levando-o a uma nova condição, o jovem mestiço daria srcem a um novo povo, o brasileiro, que, na visão de Alencar, ficaria no lugar do indígena.
– 17
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 18
b) Uma das interpretações para o nome da heroína do romance de José de Alencar é de que seja um anagrama de América. Isto é, o nome da heroína possui as mesmas letras deAmérica dispostas em outra ordem. Partindo dessa interpretação, explique o que distingue a referência à América no romance daquela que é feita na canção.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
RESOLUÇÃO: No romance Iracema, lenda do Ceará, o jogo anagramático com o nome da heroína é, evidentemente, uma referência ao Brasil ou, genericamente, à América do Sul. Já em Iracema voou, o anagrama funciona como refe rência à América do Norte ou, mais especificamente, aos Estados Unidos.
No trecho, Machado de Assis afirma que a narração de Iracema não parece ter sido feita por um “poeta moderno”, mas, sim, por um “bardo indígena”. Essa afirmação se justifica? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: A afirmação é pertinente, pois o estilo de Iracema procura incorporar a linguagem e a cosmovisão indígenas. A tentativa de simular a c osmovisão indígena é visível, por exemplo, na marcação temporal, que toma como parâmetro os ciclos da natureza. A apropriação da linguagem aborígine ocorre nos nomes próprios, nas aglutinações lexicais, nas perífrases e nas comparações com elementos da natureza.
3. (FUVEST-SP) – Considere os dois trechos de Machado de Assis, relacionados a Iracema e publicados na época em que apareceu esse romance de Alencar, e responda ao que se pede. a) A poesia americana está completamente nobilitada; os maus poetas já não podem conseguir o descrédito desse movimento, que venceu com o autor de “I-Juca-Pirama” e acaba de vencer com o autor de Iracema. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) Machado de Assis refere-se, nesse trecho, a um movimento literário chamado, na época, de “poesiaamericana”ou “escola americana”. Sob que outro nome veio a ser conhecido esse movimento? Quais eram seus principais objetivos? RESOLUÇÃO: Machado de Assis refere-se ao Indianismo, tendência romântica brasileira cujo objetivo central era nobilitar o passado nacional, associando-o a mitos heroicos elaborados por meio da idealização dos indígenas e de sua cultura, assimilados a padrões europeus de excelência física e moral.
b) Tudo em Iracema nos parece primitivo; a ingenuidade dos sentimentos, o pitoresco da linguagem, tudo, até a parte narrativa do livro, que nem parece obra de um poeta moderno, mas uma história de bardo1 indígena, contada aos irmãos, à porta da cabana, aos últimos raios do sol que se entristece. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) 1 – Bardo: poeta heroico, entre os celtas e gálios; por extensão, qualquer poeta, trovador etc.
18 –
4. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo foi extraído de Iracema. Ele reproduz a reação e as últimas palavras de Batuiretê antes de morrer:
O velho soabriu as pesadas pálpebras e passou do neto ao estrangeiro um olhar baço. Depois o peito arquejou e os lábios murmuraram: — Tupã quisque estes olhos vissem, antes de se apagarem, o gavião branco junto da narceja. O abaeté derrubou a fronte aos peitos e não falou mais, nem mais se moveu. (José de Alencar,Iracema: lenda do Ceará. Rio de Janeiro, MEC/INL, 1965, p. 171-172.) a) Quem é Batuiretê? RESOLUÇÃO: Batuiretê fora grande guerreiro e líder dos pitiguaras. Em razão da idade, deixa de guerrear e transfere a liderança do grupo ao filho Jatobá, pai de Poti. Batuiretê torna-se então uma espécie de conse lheiro, sábio ou, melhor, oráculo de guerra para os de sua tribo. Daí o nome tupi com que a perso nagem é denominada: Maranguab, que, nas palavras do neto Poti (nesse mesmo capítulo), significa “o grande sabedor da guerra”.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 19
b) Identifique as personagens a quem ele se dirige e indique os papéis que desempenham no romance. RESOLUÇÃO: O “neto” referido no texto é o guerreir o pitiguara Poti , que é amigo e aliado do coprotagonista (Martim Soares Moreno) e o auxilia tanto no estabelecimento da civilização portuguesa no Ceará, como no episódio romanesco entre o guerreiro português e a virgem tabajara. Sob o nome de batismo de Antônio Felipe Camarão, transforma-se de personagem ficcional em personagem histórica, participante da luta pela expulsão dos holandeses. É o índio assimilado à civilização: Antônio (santo da devoção), Felipe (rei de Espanha, Felipe III, à época da União Ibérica, em que ocorre o romance, 1604-1611). O “estrangeiro”, referido em seguida, é Martim Soares Moreno, representante do Estado português, guerreiro branco e agente da civilização cristã na colonização do Ceará. É o elemento que, ao se introduzir no universo indígena e consorciar-se com a “virgem de Tupã”, contribui para a destruição da América primitiva.
MÓDULO
c) Explique o sentido da metá fora empregada por Batuiretê em sua fala. RESOLUÇÃO: Batuiretê refere-se, por meio da expressão “o gavião branco junto da narceja”, à dominação branca e à submissão do índio, numa premonição trágica do destino de seu povo.
Literatura e Análise de Textos Literários (III)
1. (FUVEST-SP) – Leia o trecho de abertura de Memórias de um Sargento de Milícias e responda ao que se pede.
Era no tempo do rei. Uma das quatro esquinas que formam as ruas do Ouvidor e da Quitanda, cortando-s e mutuamente, chamava-se nesse tempo — O canto dos meirinhos —; e bem lhe assentava o nome, porque era aí o lugar de encontro favorito de todos os indivíduos dessa classe (que gozava então de não pequena consideração). Os meirinhos de hoje não são mais do que a sombra caricata dos meirinhos do tempo do rei; esses eram gente temível e temida, respeitável e respeitada; formavam um dos extremos da formidável cadeia judiciária que envolvia todo o Rio de Janeiro no tempo em que a demanda era entre nós um elemento de vida: o extremo oposto eram os desembargadores. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) a) A frase “Era no tempo do rei” refere-se a um período histórico determinado e possui, também, uma conotação marcada pela indeterminação temporal. Identifique tanto o período histórico a que se refere a frase quanto a mencionada conotação que ela também apresenta.
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
b) No trecho aqui reproduzido, o narrador c ompara duas épocas diferentes: o seu próprio tempo e o tempo do rei. Esse procedimento é raro ou frequente no livro? Com que objetivo o narrador o adota? RESOLUÇÃO: Esse procedimento é frequente no livro, pois um dos objetivos do narrador é confrontar duas épocas — a sua (tempo da enunciação) e aquela em que ocorrem os fatos narrados (tempo do enunciado).
RESOLUÇÃO: O período histórico a que se refere a frase é o que se inicia com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808, sendo D. João VI o rei referido. A frase “Era no tempo do rei”, para além dessa referência histórica, associa-se à abertura formular de contos de fadas e semelhantes — “Era uma vez...” — e, nesse sentido, conota tempo e espaço indeterminados.
– 19
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 20
As questões de números 2 a 4 tomam por base um fragmento do livro Memórias de um Sargento de Milícias, escrito por Manuel Antônio de Almeida (1831-1861).
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Era a comadre uma mulher baixa, excessivamente gorda, bonachona, ingênua ou tola até um certo ponto, e finória até outro; vivia do ofício de parteira, que adotara por curiosidade, e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade. Era a folhinha mais exata de todas as festas religiosas que aqui se faziam; sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até o nome do padre; era pontual à ladainha, ao terço, à novena, ao setenário; não lhe escapava via-sacra, procissão, nem sermão; trazia o tempo habilmente distribuído e as horas combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e
3. (VUNESP-SP) – Ao referir-se ao fato de a comadre procurar o compadre, a fim de conversar sobre o afilhado, o enunciador fornece
achar já a missa no altar. De madrugada missa da aIdentifique mesma explicação dada à razão de ela abraçar de parteira. Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, e começava daí saindopela pilhava ainda essa explicação, relacionando-a com oosofício costumes da época, a das nove em Santo Antônio. O seu traje habitual era, como o de todas especialmente com o uso da mantilha pelas mulheres. RESOLUÇÃO: as mulheres da sua condição e esfera, uma saia de lila preta, que se Tanto o ofício de parteira que a Comadre adotara quanto a sua ida à casa vestia sobre um vestido qualquer, um lenço branco muito teso e do Compadre tinham o mesmo motivo: a curiosidade, ou seja, a engomado ao pescoço, outro na cabeça, um rosário pendurado no cós preocupação em buscar todos os detalhes sobre a vida alheia. Para isso, a da saia, um raminho de arruda atrás da orelha, tudo isto coberto por mantilha, peça do vestuário muito comum no tempo da narrativa e que uma clássica mantilha, junto à renda da qual se pregava uma pequena consistia em uma faixa de tecido que cobria como um véu o rosto das mulheres, permitia que elas vissem os outros sem serem vistas. É o que figa de ouro ou de osso. (...) (...) a mantilha era o traje mais conveniente aos costumes da época; pode ser confirmado no segundo parágrafo: “a mantilha era o traje mais sendo as ações dos outros o principal cuidado de quase todos, era muito conveniente aos costumes da época; sendo as ações dos outros o principal cuidado [preocupação] de quase todos, era muito necessário ver sem ser necessário ver sem ser visto. A mantilha para as mulheres estava na razão visto.” das rótulas para as casas; eram o observatório da vida alheia. (...) (...) Nesta ocasião levantava-se a Deus, e as duas beatas interromperam a conversa [sobre o afilhado da comadre] para bater nos peitos. Era uma delas a vizinha do compadre, que prognosticava mau fim ao menino e com quem ele prometera fazer uma estralada; a outra era uma das que tinham estado na função do batizado. A comadre, apenas ouviu isso, foi procurar o compadre; não se pense, porém, que a levara a isso outro interesse que não fosse a curio sidade; queria saber o caso com todos os menores detalhes; isso lhe dava longa matéria para a conversa na igreja e para entreter as partu rientes que se confiavam aos seus cuidados. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 4. (VUNESP-SP) – A comadre é apresentada, entre várias características, como uma mulher que cumpria rigorosamente os horários. 2. (VUNESP-SP) – O sincretismo religioso, isto é, a “fusão de Transcreva duas passagens do fragmento em que essa qualidade está diferentes cultos ou doutrinas religiosas” (cf. Dicionário Houaiss) era explícita, referindo-se à participação da personagem nas missas. RESOLUÇÃO: comum em nossa cultura, na época retratada na obra de Manuel Os trechos que comprovam a pontualidade da Comadre em relação a Antônio de Almeida. A descrição da comadre, feita com vivacidade pelo enunciador do texto, permite afirmar que ela é dada a essa prática? missas são os seguintes (todos retirados do primeiro parágrafo): (1) “sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até Justifique sua resposta, com base em uma passagem do texto. o nome do padre”; (2) “trazia o tempo habilmente distribuído e as horas RESOLUÇÃO: No trecho “...e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade” (primeiro parágrafo), percebe-se, na caracterização da Comadre, o sincretismo religioso, ou seja, a fusão de práticas religiosas diferentes, pois a personagem tanto fazia rezas para afastar supostas influências de espíritos malignos (“benzia de quebranto”), uma atividade que a ligava à feitiçaria, quanto frequentava com grande assiduidade as festas e os rituais ligados à Igreja Católica (missas, ladainhas, terços, novenas, via-sacra, procissão, sermão).
20 –
combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e achar já a missa no altar. De madrugada começava pela missa da Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, e daí saindo pilhava ainda a das nove em Santo Antônio.”
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 21
5. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo pertence ao capítulo XLV (“Empenhos”), de Memórias de um Sargento de Milícias.
Isto tudo vem para dizermos que Maria-Regalada tinha um verdadeiro amor ao Major Vidigal; o Major pagava-lho na mesma moeda. Ora, D. Maria era uma das camaradas mais do coração de MariaRegalada. Eis aí por que falando dela D. Maria e a comadre se mostraram tão esperançadas a respeito da sorte do Leonardo. Já naquele tempo (e dizem que é defeito do nosso) o empenho, o compadresco, era uma mola real de todo o movimento social. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias. Cotia, Ateliê Editorial, 2000, p. 319.)
b) Relacione o “defeito” com esse episódio, que envolveu o Major Vidigal e as três mulheres. RESOLUÇÃO: Preso pelo terrível Major Vidigal, chefe dos milicianos no Rio de Janeiro, Leonardo deveria ser, nos termos das leis e regulamentos, severamente punido. Intercedem em seu favor D. Maria, a Comadre e Maria-Regalada. As esperanças da tia de Luisinha e da madrinha estavam assentadas na percepção de que o Major Vidigal seria vulnerável ao apelo sensual de Maria-Regalada e ao “verdadeiro amor” que havia entre ambos. E, mais que isso, de que seria capaz de transgredir os seus deveres funcionais, não punindo Leonardo e, mais tarde, promovendo-o a sargento, para atender ao pleito da mulher qu e desejava. O “defeito ” que nisso se revela é a diluição da ordem, o “jeitinho”, a superposição da vida e dos interesses pessoais aos deveres e obrigações legais. O diálogo (no capítulo XLVI) que se abre com o trecho “—Ora, a lei... O que é a lei, se o Sr. Majorquiser?...” ilustra cabalmente o “defeito” em questão.
a) Explique o “defeito” a que o narrador se refere. RESOLUÇÃO: O “defeito” referido pelo narrador é a ausência de fronteiras nítidas entre o interesse público e a vida privada, é a “dialética da malandragem”, expressão que o crítico Antonio Candido consagrou como caracterizadora da diluição dos limites que separam o “mundo da ordem” e o “mundo da desordem”, a lei e a contravenção, o dever funcional e o interesse pessoal. Por “empenho”, pode-se entender a troca de favores, o clientelismo, e por “compadresco”, o nepotismo que era “uma mola real de todo o movimento social”, como diz o narrador.
MÓDULOS
E
Literatura e Análise de Textos Literários (IV) e ( V)
1. (UNICAMP-SP-2010) – Leia a seguir um trecho de A Cidade e as Serras:
— Sabes o que eu estava pensando, Jacinto?... Que te aconteceu aquela lenda de Santo Ambrósio... Não, não era Santo Ambrósio... Não me lembra o santo. Ainda não era mesmo santo, apenas um cavaleiro pecador, que se enamorara de uma mulher, pusera toda a sua alma nessa mulher, só por a avistar a distância na rua. Depois, uma tarde que a seguia, enlevado, ela entrou num portal de igreja, e aí, de repente, ergueu o véu, entreabriu o vestido e mostrou ao pobre cavaleiro o seio roído por uma chaga! Tu também andavas namorado da serra, sem a conhecer, só pela sua beleza de verão. E a serra, hoje, zás! de repente, descobre a sua grande chaga... É talvez a tua preparação para S. Jacinto. (Eça de Queirós, A Cidade e as Serras. São Paulo, Ateliê Editorial, 2007, p. 252.)
a) Explique a comparação feita por Zé Fernandes. Especifique a que chaga ele se refere. RESOLUÇÃO: Zé Fernandes compara a visão que Jacinto tem da serra à imagem que o santo ou cavaleiro pecador tem de uma mulher: há em ambas as situações o enlevo inicial e o choque com a descoberta de uma chaga. Deve-se entender, no caso de Jacinto, que chaga é uma metáfora que representa a fome, as doenças e a miséria que existiam na serra.
– 21
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 22
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
b) Que significado a descoberta dessa chaga tem para Jacinto e para a compreensão do romance?
Texto para as questões 3 e 4.
RESOLUÇÃO: A chaga é metáfora da pobreza, da má situação de vida dos camponeses lusos. Jacinto, ao descobrir essa “chaga”, procura resolver paternalistamente a situação social dos camponeses, torna-se o “pai dos pobres”, um “Dom Sebastião”, segundo João Torrado. Para a compreensão do romance, a descoberta dessa “chaga” indica a necessidade de melhorar as condições de vida no campo, mas sem afrontar a harmonia e a vitalidade da natureza.
No entanto Jacinto, desesperado com tantos desastres humilhadores — as torneiras que dessoldavam, os elevadores que emperravam, o vapor que se encolhia, a eletricidade que sumia, decidiu valorosamente vencer as resistências finais da matéria e da força por novas e mais poderosas acumulações de mecanismos. E nessas semanas de abril, enquanto as rosas desabrochavam, a nossa agitada casa, entre aquelas quietas casas dos Campos Elísios que preguiçavam ao sol, incessantemente tremeu, envolta num pó de caliça e de empreitada, com o bruto picar de pedra, o retininte martelar de ferro. 3. O trecho transcrito foi extraído do quinto ca pítulo de A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós, e se associa à crença que tem o protagonista, Jacinto, nos avanços técnicos como chave paranoa trecho felicidade. relação que a visão queirosiana apresentada tem Qual com oa famoso ideal humanista (já presente, por exemplo, no episódio de “O Gigante Adamastor”, em Os Lusíadas, de Camões), segundo o qual o Homem existe para dominar a Natureza?
2. (FUVEST-SP) – Os romances de Eça de Queirós costumam apresentar críticas a aspectos importantes da sociedade portuguesa, frequentemente acompanhadas de propostas (explícitas ou implícitas) de reforma social. Em A Cidade e as Serras, a) qual o aspecto que se critica nas elites portuguesas?
RESOLUÇÃO: Eça de Queirós mostra de maneira irônica o fracasso da civilização do século XIX, pois esta não conseguiu realizar o ideal humanista de domínio da Natureza, como fica evidente no trecho transcrito, em que se alude à ineficiência de alguns artefatos.
RESOLUÇÃO: Critica-se o abandono da terra natal, visto que essas elites se deixavam seduzir pela cultura francesa, pelo ócio endinheirado e por uma ideia de civilização como “armazenamento” de comodidades, para seu exclusivo benefício. Pode-se dizer que a crítica se dirige à alienação das elites portuguesas perante os problemas sociais em seu país.
b) qual é a relação, segundo preco niza o romance, que essas elites deveriam estabelecer com as classes subalternas? RESOLUÇÃO: A proposta do romance é uma reforma social, encabeçada pelos mais privilegiados, que promovesse a assistência social por meio do amparo e proteção aos menos favorecidos. Quando Jacinto, o protagonista do romance, teve seu apelido mudado de “Príncipe da Grã-Ventura” para “Pai dos Pobres”, esse caráter paternalista fica evidenciado, como se viu na resposta à questão 1, item b.
22 –
4. Na passagem transcrita, apesar de ela fazer parte da fase urbana da narrativa, a Natureza não deixa de, discretamente, estar presente, como em vários outros momentos do livro. Com base no excerto apresentado, explique como tal fato ocorre. RESOLUÇÃO: A Natureza está presente tanto na primeira parte (tese) como na segunda parte (antítese) de A Cidade e as Serras, nas descrições de ambientes, como se percebe, no trecho, em “enquanto as rosas desabrochavam”.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 23
Textos para as questões 5 e 6.
Texto I
Desde o berço, onde a avó espalhava funcho e âmbar para afugentar a Sorte-Ruim, Jacinto medrou com segurança, a rijeza, a seiva rica dum pinheiro das dunas. Não teve sarampo e não teve lombrigas. As letras, a Tabuada, o Latim entraram por ele tão facilmente como o sol por uma vidraça. Entre os camaradas, nos pátios dos colégios, erguendo a sua espada de lata e lançando um brado de comando, foi logo o vencedor, o rei que se adula e a quem se cede a fruta das merendas.
As questões de números 7 a 10 tomam por base um soneto do poeta neoclássico português Bocage (Manuel Maria Barbosa du Bocage, 1765-1805) e uma tira da escritora e quadrinista brasileira Ciça (Cecília Whitaker Vicente de Azevedo Alves Pinto).
LXIV CONTRASTE ENTRE A VIDA CAMPESTRE E A DAS CIDADES
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Nos campos o vilão sem sustos passa, Inquieto na corte o nobre mora; O que é ser infeliz aquele ignora, Este encontra nas pompas a desgraça:
Texto II
E nunca o meu Príncipe (que eu contemplava esticando os suspensórios) me pareceu tão corcovado, tão minguado, como gasto por uma lima que desde muito andasse fundamente limando. Assim viera findar, desfeita em Civilização, naquele super-requintado magricela sem músculo e sem energia, a raça fortíssima dos Jacintos! 5. É bastante conhecida a tese de Rousseau de que o Homem nasce bom, sendo a sociedade responsável por sua corrupção. Como essa afirmação pode ser associada aos excertos transcritos, extraídos de A Cidade e as Serras? RESOLUÇÃO: Os trechos mostram como Jacinto era em sua infância, fase mais próxima de sua essência primitiva, cheio de energia, de vida. Civilizando-se, ou seja, em contato mais intenso com a sociedade, perdeu sua vitalidade.
quele canta e ri;vãs nãoque se embaraça A Com essas coisas o mundo adora: Este (oh cega ambição!) mil vezes chora, Porque não acha bem que o satisfaça:
Aquele dorme em paz no chão deitado, Este no ebúrneo leito precioso Nutre, exaspera velador cuidado: Triste, sai do palácio majestoso; Se hás de ser cortesão, mas desgraçado, Antes ser camponês, e venturoso. (Bocage, Obras de Bocage. Porto, Lello & Irmão Editores, 1968.)
(Ciça, Tira. In Pagando o Pato. Porto Alegre, LP & M, 2006.)
6. Tendo em mente que a civilização, a sociedade, corrompe o que o Homem possui de mais puro, explique de que modo esse fenômeno ocorre em Iracema. RESOLUÇÃO: Enquanto vivia entre os tabajaras, Iracema tinha preservados, como numa situação edênica, seus valores primitivos. O contato com Martim, com a civilização (no caso, a europeia), provocou a corrupção, a “queda” da protagonista.
7. (VUNESP-SP-2010) – O tema do soneto apresentado, do neoclássico português Bocage, enquadra-se numa das linhas temáticas características do período literário denominado Neoclassicismo ou Arcadismo. Aponte essa linha temática, comprovando com elementos do próprio poema. RESOLUÇÃO: O soneto de Bocage desenvolve o tema do contraste entre a vida na cidade, vista como negativa, e a vida no campo, descrita como positiva. A depreciação da primeira é evidente em expressões como “inquieto na corte o nobre mora” e “este [o homem urbano] (...) mil vezes chora / porque não acha bem que o satisfaça”. A valorização da segunda encontra-se em expressões como “nos campos o vilão sem sustos passa”, “o que é ser infeliz aquele [o vilão] ignora” e “aquele canta e ri”.
– 23
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 24
8. (VUNESP-SP-2010) – A palavra vilão pode apresentar diferentes significados na Língua Portuguesa, alguns bastante distintos entre si. No soneto de Bocage, a própria sequência da leitura permite descobrir, em função do contexto, o significado que assume tal palavra, empregada no primeiro verso. Releia o poema e aponte esse significado.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
RESOLUÇÃO: In-qui-e-to-na-cor-teo-no-bre-mo(ra). (As sílabas fortes estão sublinhadas; a sílaba entre parênteses, a última postônica [= pós-tônica], não se conta.)
RESOLUÇÃO: No poema de Bocage, vilão é empregado no sentido inicial da palavra: “habitante de vila”, ou seja, morador de pequeno povoado rural, em oposição à corte, situada na cidade, a grande aglomeração urbana.
10. (VUNESP-SP-2010) – Na tira de Ciça, a troca de ser por ter ironiza uma das tendências do comportamento humano na sociedade moderna, altamente consumista. Isso considerado, releia a tira e o poema de Bocage e aponte em que consiste essa ironia e em que medida o soneto Bocage representa, com maistroca de dois séculos antecedência, umadedas possíveis respostas a essa de ser por terde. RESOLUÇÃO: A ironia está em considerar como mera atualização, ou seja, adaptação aos tempos atuais, a troca de ser por ter na célebre expressão shakespeariana. O soneto de Bocage pode ser tomado como “resposta” a essa perversão contemporânea, por exaltar a vida simples e feliz ser (o ), em oposição à vida de apego aos bens materiais e às aparências (o ter).
9. (VUNESP-SP-2010) – O soneto de Bocage apresenta-se de acordo com o modelo tradicional, com versos de dez sílabas métricas (decassílabos) distribuídos em duas quadras e dois tercetos. De posse dessa informação, apresente como resposta a divisão em sílabas métricas do segundo verso do poema, levando em conta que as sílabas tônicas são a terceira, a sexta, a oitava e a décima.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VI)
1. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte capítulo do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis:
CAPÍTULO XL UMA ÉGUA
Ficando só, refleti algum tempo e tive uma fantasia. Já conheceis as minhas fantasias. Contei-vos a da visita imperial; disse-vos a desta casa do Engenho Novo, reproduzindo a de Matacavalos... A imaginação foi a companheira de toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de empacar, as mais delas capaz de engolir campanhas e campanhas, correndo. Creio haver lido em Tácito que as éguas iberas concebiam pelo vento; se não foi nele, foi noutro autor antigo, que entendeu guardar essa crendice nos seus livros. Neste particular, a minha imaginação era uma grande égua ibera; a menor brisa lhe dava um potro, que saía logo cavalo de Alexandre; mas deixemos de metáforas atrevidas e impróprias dos meus quinze anos. Digamos o caso simplesmente. A fantasia daquela hora foi confessar a minha mãe os meus amores para lhe dizer que não tinha vocação eclesiástica. A conversa sobre vocação tornava-me agora toda inteira e, ao passo que me assustava, abria-me uma porta de saída. “Sim, é isto”, pensei; “vou dizer a mamãe que não tenho vocação e confesso o nosso namoro; se ela duvidar, conto-lhe o que se passou outro dia, o penteado e o resto...” (Dom Casmurro, in Machado de Assis, Obra Completa em Quatro Volumes.Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 2008, p. 975.) 24 –
a) Explique a metáfora empregada pelo narrador, nesse capítulo, para caracterizar sua imaginação. RESOLUÇÃO: A imaginação de Bentinho era muito fecunda, rápida e audaciosa, embora às vezes se mostrasse mais recolhida. A imagem das éguas iberas oferece diversos pontos de semelhança para sustentar a metáfora, sobretudo fertilidade, velocidade e arrojo.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 25
b) De que maneira a imaginação de Bentinho, assim caracterizada, se relaciona com a temática amorosa nesse capítulo? E no romance?
c) O episódio da xícara de café está diretamente relacionado com a redação do livro de memórias de Bento Santiago. Por quê?
RESOLUÇÃO: Nesse capítulo, Bentinho lembra que, quando adolescente, imaginou confessar à austera mãe, Dona Glória, o amor que ele tinha por Capitu, as primeiras carícias que trocara com ela e a falta de vocação que sentia em si para a vida eclesiástica. No romance, o fato de o narrador-personagem ter uma imaginação fértil coloca sob suspeita a sua versão dos fatos, fundada na crença de que Escobar se tornara amante de Capitu e que Ezequiel seria fruto desse adultério.
RESOLUÇÃO: As memórias de Bento Santiago, a sua autobiografia, configuram a modalidade do romance de confissão, na qual o eu-narrador recompõe o passado e o reinterpreta. Esta é, de início, a intenção do memorialista: “atar as duas pontas da vida”. Nesse sentido, a “procura do tempo perdido”, os atos falhos de suicídio e homicídio, a que se referem o texto e os quesitos anteriores, são instantes cruciais da tragédia emocional e conjugal do narrador, momento-limite entre o ser e o não ser, como ele confessa no início do parágrafo, e que condensam quase todos os recursos narrativos do vasto repertório de Dom Casmurro: a narração, a reflexão digressiva, o apelo ao leitor, o estilo ziguezagueante (“deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo”), característico de um narrador problemático e indeciso.
2. (UNICAMP-SP) – Leia a passagem abaixo, de Dom Casmurro:
Se eu não olhasse para Ezequiel, é provável que não estivesse aqui escrevendo este livro, porque o meu primeiro ímpeto foi correr ao café e bebê-lo. Cheguei a pegar na xícara, mas o pequeno beijava-me a mão, como de costume, e a vista dele, como o gesto, deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo. Chamem-me embora assassino; não serei eu que os desdiga ou contradiga; o meu segundo impulso foi criminoso. Inclinei-me e perguntei a Ezequiel se já tomara café. (Machado de Assis, Dom Casmurro, in Obra Completa. vol. 1, Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1979, p. 936.) a) Explique o “primeiro ímpeto” mencionado pelo narrador. RESOLUÇÃO: O “primeiro ímpeto” mencionado corresponde à sua vontade de suicidarse, bebendo o café envenenado.
b) Por que o narrador admite que seu “segundo impulso” foi cri minoso? RESOLUÇÃO: O “segundo impulso” foi criminoso porque o narrador, desistindo de suicidar-se, pensou em sugerir ao filho que tomasse o café envenenado, o que poderia justificar a sua designação de assassino.
3. (FUVEST-SP)
— Você janta comigo, Escobar? — Vim para isto mesmo. Minha mãe agradeceu-lhe a amizade que me tinha e ele respondeu com muita polidez, ainda que um tanto atado, como se carecesse de palavra pronta. (...) Todos ficaram gostando dele. Eu estava tão contente como se Escobar fosse invenção minha. José Dias desfechou-lhe dois superlativos, tio Cosme dois capotes e prima Justina não achou tacha que lhe pôr; depois, sim, no segundo ou terceiro domingo, veio ela confessarnos que o meu amigo Escobar era um tanto metediço e tinha uns olhos policiais a que não escapava nada. — São os olhos dele, expliquei. — Nem eu digo que sejam de outro. — São olhos refletidos, opinou tio Cosme. — Seguramente, acu diu José Dias; entr etanto, pode ser q ue a senhora D. Justina tenha alguma razão. A verdade é que uma coisa não impede outra, e a reflexão casa-se muito bem à curiosidade natural. Parece curioso, isso parece, mas... — A mim parece-me um mocinho muito sério, disse minha mãe. — Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela. Quando eu referi a Escobar aquela opinião de minha mãe (sem lhe contar as outras, naturalmente), vi que o prazer dele foi extraordinário. Agradeceu, dizendo que eram bondades, e elogiou também minha mãe, senhora grave, distinta e moça, muito moça... Que idade teria? (Machado de Assis, Dom Casmurro)
– 25
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 26
a) Um crítico afirma que, “examinada em suas relações, a população de Dom Casmurro compõe uma parentela, uma dessas grandes moléculas sociais do Brasil tradicional, no centro da qual está um proprietário mais considerável, cercado de figuras que podem incluir, entre outros, um ou mais agregados, vizinhos com obrigações, comensais, parentes pobres em graus diversos, conhecidos que aspiram à proteção (...).” (Adaptado de Roberto Schwarz, Duas Meninas) P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Identifique o papel que cada uma das personagens que aparecem no trecho de Dom Casmurro desempenha na composição da referida “parentela”. RESOLUÇÃO: Escobar: representa a categoria dos “conhecidos que aspiram à proteção (...)”. O fragmento deixa patente a intenção da personagem de agradar e bajular o amigo que fez no seminário e, especialmente, a mãe deste, como se observa no último parágrafo. D. Glória (mãe de Bentinho): representa o que Roberto Schwarz denomina o centro da parentela, o “proprietário mais considerável”. Era uma viúva rica, cujo patrimônio provinha de rendimentos das propriedades e de escravos, arrendados ou alugados. Na visão do crítico, D. Glória compõe, com o círculo de parentes, agregados e dependentes em diversos graus, um microcosmo da sociedade brasileira no Segundo Reinado. José Dias: é o agregado, figura característica da estrutura patriarcal. É o homem que, não sendo escravo nem empregado, não era também parente, mas vivia sob a proteção do “senhor”, ao qual devia obediência e favores, retribuídos com trabalhos diversos e uma subserviência constante. Personagem das mais interessantes da galeria machadiana, é o “homem dos superlativos”, que “sabia opinar, obedecendo” e que foi agregado à família pelo falecido pai de Bentinho, a quem se apresentou como “médico homeopata”, atribuindo a si mesmo algumas curas. Vivendo desde então com a família, faz da esperteza, da dissimulação, da perspicácia na observação das relações de poder e conveniência, uma forma de sobreviver, da maneira mais favorável, num meio ao qual não pertence propriamente. Tio Cosme: é, também viúvo, o parente que se coloca sob o teto e a proteção da matriarca. Prima Justina: representa uma situação semelhante à de tio Cosme, e cabe observar que a agregação de ambos à estrutura familiar de Dona Glória se prende à convenção de que, viúva, a matriarca não deveria viver sob o
b) Na conversação apresentada no trecho, as falas de José Dias refletem a posição social que ele ocupa nessa “parentela”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “— Seguramente, acudiu José Dias; entretanto, pode ser que a senhora D. Justina tenha alguma razão” e “— Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela.” Essas duas intervenções do agregado são exemplares de sua posição subserviente e sua habilidade em “opinar obedecendo”. No primeiro instante, parece dar razão à Prima Justina, que identifica o caráter “um tanto metediço” e os “olhos policiais” de Escobar. No instante seguinte, contradiz-se e concorda também com D. Glória, a quem Escobar parecia “um mocinho muito sério”.
mesmo teto com um homem solteiro, o agregado José Dias. Assim, convocados a se abrigar sob a proteção da viúva Santiago, serviam como “biombo”, que preservava o decoro e as aparências.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VII)
1. (FUVEST-SP-2010)
Gente que mamou leite romântico pode meter o dente no rosbife* naturalista; mas em lhe cheirando a teta gótica e oriental, deixa logo o melhor pedaço de carne para correr à bebida da infância. Oh! meu doce leite romântico! (Machado de Assis, Crônicas) *Rosbife: tipo de assado ou fritura de alcatra ou filé bovinos, bem tostado externamente e sangrante na parte central, servido em fatias.
a) A imagem do “rosbife naturalista” — empregada, com humor, por Machado de Assis, para evocar determinadas características do Naturalismo — poderia ser utilizada também para se referir a certos aspectos do romance O Cortiço? Justifique sua resposta.
26 –
RESOLUÇÃO: O Cortiço, como é de esperar de uma obra naturalista, apresenta preocupa ção de exibir, sem eufemismo, rodeio ou censura, os aspectos mais degradantes do ser humano, o que é compatível com a imagem do rosbife, que é sangrento.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 27
b) A imagem do “doce leite romântico”, que se refere a certos traços do Romantismo, pode remeter também a alguns aspectos do romance Iracema? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A expressão “doce leite romântico” refere-se à idealização da realidade, característica do Romantismo e presente em diversos aspectos de Iracema: a fidelidade extrema a um ideal de amor, a nobreza e a bravura dos guerreiros indígenas (que mais parecem cavaleiros medievais), o enaltecimento da natureza brasileira, o engrandecimento da amizade entre Martim e Poti, o convívio harmonioso entre portugueses e pitiguaras.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o seguinte comentário a respeito de O Cortiço, de Aluísio Azevedo:
Com efeito, o que há n’O Cortiço são formas primitivas de amealhamento*, a partir de muito pouco ou quase nada, exigindo uma espécie de rigoroso ascetismo inicial e a aceitação de modalidades diretas e brutais de exploração, incluindo o furto (...) como forma de ganho e a transformação da mulher escrava em companheiramáquina. (...) Aluísio foi, salvo erro meu, o primeiro dos nossos romancistas a descrever minuciosamente o mecanismo de formação da riqueza individual. (...) N’O Cortiço [o dinheiro] se torna implicitamente objeto central da narrativa, cujo ritmo acaba se ajustando ao ritmo da sua acumulação, tomada pela primeira vez no Brasil como eixo da composição ficcional. (Antonio Candido, “De Cortiço a Cortiço”, in O Discurso e a Cidade. São Paulo, Duas Cidades, 1993, p. 129-30.)
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
b) Identifique a “mulher escrava” e o modo como se dá sua transformação em “companheira-máquina”. RESOLUÇÃO: A “mulher escrava” é Bertoleza, que se torna “companheira-máquina” ao viver como amante de João Romão e como instrumento das vontades do vendeiro, já que ela não só trabalha durante o dia na venda, como sai à noite com o patrão para roubar materiais de construção.
Considere o trecho de O Cortiço, de Aluísio Azevedo: *Amealhar: acumular (riqueza), juntar (dinheiro) aos poucos.
a) Explique a que se referem o “rigoroso ascetismo inicial” da personagem em questão e as “modalidades diretas e brutais de exploração” que ela emprega. RESOLUÇÃO: O ascetismo a que se refere Antonio Candido é o esforço austero de acúmulo de dinheiro a que João Romão se entrega, deixando de lado veleidades de prazer, conforto e bem-estar. Em seu afã de enriquecimento, ele chegou a dormir no mesmo balcão em que atendia clientes, comia os piores legumes de sua horta para vender os melhores, não se preocupava com vestuário, aparência e amenidades da vida. Essa “febre de acumular”, como diz o narrador do romance, determinará no dono do cortiço um comportamento brutal deTalexploração da massamais animalizada dos moradores da estalagem. atitude se mostrará cruel em três momentos: quando rouba a garrafa cheia de dinheiro do velho Libório, quando lucra com a indenização do seguro por causa do incêndio que prejudicou imensamente os inquilinos e, o mais extremo, quando engana Bertoleza, usurpando suas economias, e mais tarde a descarta sem remorso em nome de um casamento de conveniência com Zulmira.
Uma aluvião de cenas, que ela [Pombinha] jamais tentara explicar e que até ali jaziam esquecidas nos meandros do seu passado, apresen tavam-se agora nítidas e transparentes. Compreendeu como era que certos velhos respeitáveis, cujas fotografias Léonie lhe mostrara no dia que passaram juntas, deixavam-se vilmente cavalgar pela loureira, cativos e submissos, pagando a escravidão com a honra, os bens e até com a própria vida, se a prostituta, depois de os ter esgotado, fechavalhes o corpo. E continuou a sorrir, desvanecida na sua superioridade sobre esse outro sexo, vaidoso e fanfarrão, que se julgava senhor e que, no entanto, fora posto no mundo simplesmente para servir ao feminino; escravo ridículo que, para gozar um pouco, precisava tirar da sua mesma ilusão a substância do seu gozo; ao passo que a mulher, a senhora, a dona dele, ia tranquilamente desfrutando o seu império, endeusada e querida, prodigalizando martírios que os miseráveis aceitavam contritos, a beijar os pés que os deprimiam e as implacáveis mãos que os estrangulavam. — Ah! homens! homens!... sussurrou ela de envolta com um suspiro. – 27
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 28
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
3. (UNIFESP-SP-2010 – modificado) – No texto, os pensamentos da personagem a) recuperam o princípio daprosa naturalista, que condenaos assuntos repulsivos e bestiais — sem amparo em teorias científicas — ligados ao homem, que põe em primeiro plano seus instintos animalescos. b) elucidam o princípiodo determinismo presente naprosa naturalista, revelando os homens e as mulheres conscientes dos seus instintos em função do meio em que vivem e, sobretudo, capazes de controlá-los. c) trazem uma crítica aos aspectos animalescos próprios dos homens, mas, por outro lado, revelam uma forma de Pombinha submeter-se a muitos deles para obter vantagens: eis aí um princípio do Realismo rechaçado no Naturalismo. d) constroem uma visão de mundo e do homem idealizada, o que, em certa medida, afronta o referencial em que se baseia a prosa naturalista,
4. “Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas.” Que figura de linguagem foi empregada no trecho acima? Explique. RESOLUÇÃO: Prosopopeia (personificação), pois foram atribuídas a um ser inanimado (o cortiço) características de um ser animado (a ação de acordar, abrir os olhos).
que define o homem como fruto do meio, marcado pelo apelo dos seus sentidos. e) consubstanciam a concepção naturalista de que o homem é um animal, preso aos instintos, e, no que diz respeito à sexualidade, vê-se que Pombinha considera a mulher superior ao homem; para ela, ter consciência dessa superioridade é uma forma de obter vantagens. RESOLUÇÃO: A alternativa e interpreta corretamente os pensamentos da personagem Pombinha, que reconhece no sexo uma força degradante, como é próprio do Naturalismo, capaz de subjugar “velhos respeitáveis”. Resposta: E
5. “No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas.”
Grasnar e cacarejar são palavras de sonoridade expressiva, chamadas onomatopeias. Por quê? Texto para as questões de 4 a 6.
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de chumbo. Como que se sentiam ainda na indolência 1 de neblina as derradeiras notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à luz loura e tenra2 da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia. A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros3, umedecia o ar e punha-lhe um farto acre4 de sabão ordinário. As pedras do chão, esbranquiçadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil, mostravam uma palidez grisalha e triste, feita de acumulações de espumas secas. Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar 5 das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os bons-dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de crianças que ainda não andam. No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam6, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas. De alguns quartos saíam mulheres que vinham pendurar cá fora, na parede, a gaiola do papagaio, e os louros, à semelhança dos donos, cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se7 à luz nova do dia. (Aluísio Azevedo, O Cortiço, cap. III) 1 – Indolência: preguiça. 2 – Tenro: brando. 3 – Coradouro: lugar onde se põe roupa a corar ao Sol. 4 – Farto acre: cheiro ácido. 5 – Marulhar: agitar. 6 – Altercar: debater. 7 –Espanejar-se: sacudir-se.
28 –
RESOLUÇÃO: Essas palavras são chamadas onomatopeias porque seus sons imitam ou sugerem os sons reais que representam.
6. Sinestesia é um tipo de metáfora em que se misturam sensações de diferentes órgãos dos sentidos. Exemplo: em “Avistava-se o grito das araras” (Guimarães Rosa), estabeleceu-se relação entre a percepção auditiva (“grito”) e a visual (“avistava-se”). É um tipo de metáfora por que, no caso, há comparação implícita entre um grito e um objeto visível. Considerando-se a explicação dada, há sinestesia em a) “um acordar alegre e farto”. b) “sete horas de chumbo”. c) “a roupa lavada (...) umedecia o ar”. d) “o cheiro quente do café”. e) “os louros (...) cumprimentavam-se ruidosamente”. RESOLUÇÃO: Há mistura das sensações olfativa e tátil em “o cheiro quente do café”. Resposta: D
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 29
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VIII)
1. (FUVEST-SP-2010) – Considere a seguinte relação de obras: Auto da Barca do Inferno, Memórias de um Sargento de Milícias, Dom Casmurro e Capitães da Areia. Entre elas, indique as duas que, de modo mais visível, apresentam intenção de doutrinar, ou seja, o propósito de transmitir princípios e diretivas que integram doutrinas determinadas. Divida sua resposta em duas partes: a), para a primeira obra escolhida, e b), para a segunda obra escolhida. Justifique sucintamente cada uma de suas escolhas. RESOLUÇÃO: a) O Auto da Barca do Inferno é informado por princípios da moral cristã, pelos quais são julgados os comportamentos dos mortos prestes a embarcar, no “cais das almas”, para o mundopost-mortem, em que serão punidos ou recompensados. b) Capitães da Areia é um romance em que se faz a apologia da revolução socialista como panaceia para as injustiças sociais decorrentes do regime capitalista. É uma obra que busca o engajamento na luta social, tendo sido por isso proibida durante o Estado Novo. A intenção de doutrinar politicamente o leitor é recorrente, como exemplifica o final: “E, apesar de que lá fora era o terror, qualquer daqueles lares era um lar que se abriria para Pedro Bala, fugitivo da polícia. Porque a revolução é uma pátria e uma família.”
todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música. Volta Seca não pensava com certeza em Lampião neste momento. Pedro Bala não pensava em ser um dia o chefe de todos os malandros da cidade. O Sem-Pernas em se jogar no mar, onde os sonhos são todos belos. Porque a música saía do bojo do velho carrossel só para eles e para o operário que parara. E era uma valsa velha e triste, já esquecida por todos os homens da cidade. (Jorge Amado, Capitães da Areia. São Paulo, Companhia das Letras, 2008, p. 68.) a) De que modo esse estabelece contraste com os demais do romance? Quais sãocapítulo os elementos desseumcontraste? RESOLUÇÃO: O contraste notável é entre a plenitude desse momento de enlevo e a situação de precariedade, carência e insatisfação da vida dos Capitães da Areia. Os elementos desse contraste são visíveis, por exemplo, no “rosto sombrio de Volta Seca”, que se “abria num sorriso”, e em “todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música”.
b) Qual a relação de tal contraste com o tema do livro? RESOLUÇÃO: O tema do livro é a delinquência de menores abandonados. No capítulo de que se extraiu o texto, relata-se um momento de êxtase dessas crianças, ao brincarem num velho carrossel. Depreende-se que, por mais marginali zados que sejam, aos Capitães da Areia resta ainda a condição essencial de crianças que se encantam. São crianças, ainda que castigadas pela injustiça social que as c onduz à marginalidade.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o trecho seguinte, do capítulo “As Luzes do Carrossel”, de Capitães da Areia:
(...) O sertanejo trepou no carrossel, deu corda na pianola e começou a música de uma valsa antiga. O rosto sombrio de Volta Seca se abria num sorriso. Espiava a pianola, espiava os meninos envoltos em alegria. Escutavam religiosamente aquela música que saía do bojo do carrossel na magia da noite da cidade da Bahia só para os ouvidos aventureiros e pobres dos Capitães da Areia. Todos estavam silenciosos. Um operário que vinha pela rua, vendo a aglomeração de meninos na praça, veio para o lado deles. E ficou também parado, escutando a velha música. Então a luz da lua se estendeu sobre todos, as estrelas brilharam ainda mais no céu, o mar ficou de todo manso (talvez que Iemanjá tivesse vindo também ouvir a música) e a cidade era como que um grande carrossel onde giravam em invisíveis cavalos os Capitães da Areia. Neste momento de música, eles sentiram-se donos da cidade. E amaram-se uns aos outros, se sentiram irmãos porque eram – 29
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 30
Texto para o teste 3.
Todos reconheceram os direitos de Pedro Bala à chefia, e foi desta época que a cidade começou a ouvir falar nos Capitães da Areia, crianças abandonadas que viviam do furto. Nunca ninguém soube o número exato de meninos que assim viviam. Eram bem uns cem e destes mais de quarenta dormiam nas ruínas do velho trapiche. P O R T U G U Ê S A – 3 a S
3. (PUC-SP-2010) – O trecho transcrito é do romance Capitães da Areia, que, escrito em 1937, se inscreve entre os “romances proletários” de Jorge Amado. Considerando-o como um todo, é correto afirmar que a) destaca e exalta o tema da infância abandonada e delinquente, incentivada pelos interesses da imprensa local e admitida pelas autoridades caracterizando cotidiano de ações marginais capazes policiais, de transtornar a sociedade um baiana da época. b) consubstancia o percurso de aprendizagem do herói que supera a condição de srcem e eleva o protagonista ao plano histórico do con fronto social e político. c) a mãe de santo e o padre progressista, personagens do romance, ainda que pudessem representar a convergência sincrética de forças protetoras e elementos capazes de minimizar a orfandade dos Capitães, nada conseguem porque não têm influência sobre o bando. d) a prisão e a tortura de Pedro Bala no reformatório, confinado no cubículo escuro da cafua, apenas intensificam seu instinto de violência e a necessidade de vingança contra a sociedade. e) Pedro Bala, líder dos Capitães, no final, se vê derrotado no intento de realizar seu sonho de transformação social e é abandonado pelos demais, pois Volta Seca se junta ao bando de Lampião, Professor vai ser artista na capital, Pirulito ingressa na vida religiosa, Boa-Vida se torna sambista e Gato adere à marginalidade em Ilhéus. RESOLUÇÃO: Na obra de Jorge Amado, principalmente nos “romances proletários”, é recorrente a transformação do protagonista, que, ao ganhar consciência política, supera a condição marginal de srcem e passa a lutar no plano histórico do confronto social e político. EmCapitães da Areia, o delinquente juvenil Pedro Bala e o grupo comandado por ele dei xam de ser apenas seres marginalizados para, no final da narrativa, participar da luta contra a sociedade de classes capitalista. Resposta: B
conheça. Quando se incorporou aos Capitães da Areia (o cais recémconstruído atraiu para as suas areias todas as crianças abandonadas da cidade), o chefe era Raimundo, o Caboclo, mulato avermelhado e forte. Não durou muito na chefia o caboclo Raimundo. Pedro Bala era muito mais ativo, sabia planejar os trabalhos, sabia tratar com os outros, trazia nos olhos e na voz a autoridade de chefe. Um dia brigaram. A desgraça de Raimundo foi puxar uma navalha e cortar o rosto de Pedro, um talho que ficou para o resto da vida. Os outros se meteram e como Pedro estava desarmado deram razão a ele e ficaram esperando a revanche, que não tardou. Uma noite, quando Raimundo quis surrar Barandão, Pedro tomou as dores do negrinho e rolaram na luta mais sensacional a que as areias do cais jamais assistiram. Raimundo era mais alto e mais velho. Porém Pedro Bala, o cabelo loiro a cicatriz vermelhadeixou no rosto, uma agilidade espan tosa evoando, desde esse dia Raimundo nãoera só de a chefia dos Capitães da Areia, como o próprio areal. Engajou tempos depois num navio. (Jorge Amado, Capitães da Areia. 50.a ed. Rio de Janeiro, Record, 1980, p. 26-27.) 4. (FAFICP-SP – modificado) – Pela leitura do texto, pode-se concluir que o romance pretende denunciar um problema a) cultural, a hierarquia nos grupos sociais. b) de identidade nacional. c) social, o desemprego na cidade de Sal vador. d) educacional, o alto índice de crianças analfabetas. e) social, a questão do menor abandonado. RESOLUÇÃO: Resposta: E
5. (FAFICP-SP – modificado) – Que características de Pedro Bala fizeram dele o líder do grupo? a) Sabia planejar e, por ser branco, as pessoas da cidade não o viam como um marginal, fato que o ajudava em seus furtos. b) Era ativo, sabia planejar e lidar com os outros; trazia na voz e nos olhos autoridade de chefe. c) Era mais novo que Raimundo, e o grupo precisava de alguém com mais vigor e com novas ideias. d) Era autoritário, rude, ativo, inteligente, características que convêm a um verdadeiro líder. e) Por ter físico avantajado, era mais ativo e mais ágil que Raimundo; essa característica era útil nas fugas do grupo. RESOLUÇÃO: Resposta: B
Texto para os testes de 4 a 6. O romance Capitães da Areia, de Jorge Amado, teve sua primeira edição (1937) apreendida e queimada em praça pública pouco depois de implantada a ditadura de Getúlio Vargas. No trecho a seguir, o narrador nos conta como Pedro Bala, aos quinze anos, assumiu a liderança de um grupo que dormia num velho armazém abandonado do cais do porto.
É aqui também que mora o chefe dos Capitães da Areia: Pedro Bala. Desde cedo foi chamado assim, desde seus cinco anos. Hoje tem quinze anos. Há dez que vagabundeia nas ruas da Bahia. Nunca soube de sua mãe, seu pai morrera de um balaço. Ele ficou sozinho e empregou anos em conhecer a cidade. Hoje sabe de todas as suas ruas e de todos os seus becos. Não há venda, quitanda, botequim que ele não 30 –
6. A exemplo do nome Pedro Bala, outras personagens também são nomeadas de acordo com um de seus traços físicos ou psicológicos, ou, ainda, de acordo com algo que lhes seja peculiar. É o que se vê em nomes como Sem-Pernas , Professor, Boa-Vida etc. A esse recurso usado pelo autor corresponde uma figura de linguagem. Trata-se da(o): a) comparação. b) eufemismo. c) ironia. d) metonímia. e) personificação. RESOLUÇÃO: O autor faz uso da metonímia, visto que se vale de uma parte (de algo que representa o todo) do aspecto físico ou psicológico das personagens para nomeá-las. Resposta: D
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 31
Para responder aos testes de números 7 e 8, leia o trecho extraído de Gabriela, Cravo e Canela, obra de Jorge Amado.
(...) O marinheiro sueco, um loiro de quase dois metros, entrou no bar, soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib e apontou com o dedo as garrafas de “Cana de Ilhéus”. Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível. Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão, servira cachaça de graça aos marinheiros. Passou o dedo indicador no polegar, a perguntar pelo dinheiro. Vasculhou os bolsos o loiro sueco, nem sinal de dinheiro. Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada. No balcão colocou a nórdica mãed’água, Iemanjá de Estocolmo. Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina por detrás da Igreja. Mirou a sereia, seu rabo de peixe. Assim era a anca de Gabriela. Mulher tão de fogo no mundo não havia, com aquele calor, aquela aqueles suspiros, aquele langor. Quanto mais dormia com ela,ternura, mais tinha vontade. Parecia feita de canto e dança, de sol e luar, era de cravo e canela. Nunca mais lhe dera um presente, uma tolice de feira. Tomou da garrafa de cachaça, encheu um copo grosso de vidro, o marinheiro suspendeu o braço, saudou em sueco, emborcou em dois tragos, cuspiu. Nacib guardou no bolso a sereia dourada, sorrindo. Gabriela riria contente, diria a gemer: “precisava não, moço bonito...” E aqui termina a história de Nacib e Gabriela, quando renasce a chama do amor de uma brasa dormida nas cinzas do peito. 7. (UFSCar-SP) – No texto, o autor relaciona a cultura nacional à estrangeira, buscando, por meio da comparação, estabelecer equiva lências entre elas. O trecho do texto que indica esse tipo de comparação é
MÓDULO
a) b) c) d) e)
“Passou o dedo indicador no polegar...” “...servira cachaça de graça aos marinheiros.” “No balcão colocou a nórdica mãe-d’água...” “...e apontou com o dedo as garrafas de ‘Cana de Ilhéus’.” “Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível.”
RESOLUÇÃO: No trecho transcrito, duas mitologias são aproximadas através das figuras da “sereia nórdica” representada no broche e da divindade afro-brasileira Iemanjá. Resposta: C
8. (UFSCar-SP) – Assinale a alternativa que contém um trecho em que o autor apresenta as informações numa linguagem altamente conotativa. a) “...soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib...” b) “Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina...” c) “Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão...” d) “Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada.” e) “Parecia feita de canto edança, de sol eluar, era decravo e canela.” RESOLUÇÃO: No trecho transcrito na alternativa a, “pesado”, em “bafo pesado”, é uma metáfora sinestésica, mas tal figura não faz que a linguagem da frase possa ser considerada “altamente conotativa”. A descrição contida na alternativa e é inteiramente vazada em linguagem figurada, conotativa, pois são metafóricos todos os predicados atribuídos a Gabriela. Resposta: E
Literatura e Análise de Textos Literários (IX)
Texto para a questão 1.
O pequeno sentou-se, acomodou nas pernas a cabeça da cachorra, pôs-se a contar-lhe baixinho uma história. Tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio que morrera no tempo da seca. Valia-se, pois, de exclamações e de gestos, e Baleia respondia com o rabo, com a língua, com movimentos fáceis de entender. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 1. (FUVEST-SP-2010) – Considere as seguintes afirmações sobre esse trecho de Vidas Secas, entendido no contexto da obra, e responda ao que se pede. a) No trecho, torna-se claro que a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para ampliar as diferenças que distinguem homens de animais. Você concorda com essa afirmação? Justifique, com base no trecho, sua resposta. RESOLUÇÃO: Essa afirmação não é procedente, pois, ao contrário, a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para diminuir as diferenças que distinguem homens de animais, como se evidencia tanto na passagem
b) Nesse trecho, como em outros do mesmo livro, é por exprimir suas emoções e sentimentos pessoais a respeito da pobreza sertaneja que o narrador obtém o efeito de contagiar o leitor, fazendo com que ele também se emocione. Você concorda com a afirmação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois o narrador de Vidas Secas não se envolve emocionalmente com as realidades que representa. Seu relato, conforme aos princípios realistas (o romance de Graciliano Ramos filia-se ao Neorrealismo que substituiu o experimentalismo modernista), é objetivo e explora uma neutralidade que, cedendo a palavra às personagens e — por assim dizer — aos fatos, em vez de diminuir, intensifica a reação do leitor ao quadro representado.
“tinha vocabulário quase tão como o do papagaio”, como fato de um o menino se comunicar porminguado meio de “exclamações e de gestos”, talno como a cadela que lhe abana o rabo.
– 31
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 32
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
2. (UNICAMP-SP-2010) – O excerto abaixo, de Vidas Secas, trata da personagem sinha Vitória:
b) Tendo em vista a condição e a trajetória de sinha Vitória, justifique a ironia contida no nome da personagem. Que outra personagem referida no excerto também revela uma ironia no nome?
(...) Calçada naquilo, trôpega, mexia-se como um papagaio, era ridícula. Sinha Vitória ofendera-se gravemente com a comparação, e se não fosse o respeito que Fabiano lhe inspirava, teria despropositado. Efetivamente os sapatos apertavam-lhe os dedos, faziam-lhe calos. Equilibrava-se mal, tropeçava, manquejava, trepada nos saltos de meio palmo. Devia ser ridícula, mas a opinião de Fabiano entristecera-a muito. Desfeitas essas nuvens, curtidos os dissabores, a cama de novo lhe aparecera no horizonte acanhado. Agora pensava nela de mau humor. Julgava-a inatingível e misturava-a às obrigações da casa.
RESOLUÇÃO: É irônico que uma personagem massacrada pela seca e pelas condições sociais injustas tenha como nome Vitória. E há também ironia no nome de Baleia, pois essa cachorra é extremamente magra e habita uma região carente de água, o que contraria radicalmente as ideias associadas ao mamífero de que seu nome fora emprestado.
(...) Um mormaço levantava-se da terra queimada. Estremeceu lembrando-se da seca (...). Diligenciou afastar a recordação, temendo que ela virasse realidade. (...) Agachou-se, atiçou o fogo, apanhou uma brasa com a colher, acendeu o cachimbo, pôs-se a chupar o canudo de taquari cheio de sarro. Jogou longe uma cusparada, que passou por cima da janela e foi cair no terreiro. Preparou-se para cuspir nova mente. Por uma extravagante associação, relacionou esse ato com a lembrança da cama. Se o cuspo alcançasse o terreiro, a cama seria comprada antes do fim do ano. Encheu a boca de saliva, inclinou-se — e não conseguiu o que esperava. Fez várias tentativas, inutilmente. (...) Olhou de novo os pés espalmados. Efetivamente não se acostumava a calçar sapatos, mas o remoque de Fabiano molestara-a. Pés de papagaio. Isso mesmo, sem dúvida, matuto anda assim. Para que fazer vergonha à gente? Arreliava-se com a comparação. Pobre do papagaio. Viajar com ela, na gaiola que balançava em cima do baú de folha. Gaguejava: — “Meu louro.” Era o que sabia dizer. Fora isso, aboiava arremedando Fabiano e latia como Baleia. Coitado. Sinha Vitória nem queria lembrar-se daquilo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. Rio de Janeiro/São Paulo, Record, 2007, p. 41-43.) a) Por que a comparação feita por Fabiano incomoda tanto sinha Vitória? Que lembrança evoca? RESOLUÇÃO: Sinha Vitória sente-se incomodada com a comparação feita por Fabiano — o andar dela, quando usava sapatos, assemelhava-se ao de um papagaio — porque, ridicularizando-a, fere a sua vaidade feminina. Além disso, traz à mente da mulher a lembrança do papagaio, o que a faz reviver um remorso, pois fora dela a ideia de usar a ave como alimento. O mal-estar é ainda maior, pois a lembrança desse episódio evoca o sofrimento que ela e sua família tiveram durante a seca.
32 –
3. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte trecho do capítulo “Contas”, de Vidas Secas:
(...) Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. Bem. Nascera com esse destino, ninguém tinha culpa de ele haver nascido com um destino ruim. Que fazer? Podia mudar a sorte? Se lhe dissessem que era possível melhorar de situação, espantar-se-ia. (...) Era sina. O pai vivera assim, o avô também. E para trás não existia família. Cortar mandacaru, ensebar látegos — aquilo estava no sangue. Conformava-se, não pretendia mais nada. Se lhe dessem o que era dele, estava certo. Não davam. Era um desgraçado, era como um cachorro, só recebia ossos. Por que seria que os homens ricos ainda lhe tomavam uma parte dos ossos? Fazia até nojo pessoas importantes se ocuparem com semelhantes porcarias. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. 103.a ed. Rio de Janeiro, Editora Record, 2007, p. 97.) a) Que visão Fabiano tem de sua própria condição? Justifique. RESOLUÇÃO: Fabiano é um dos “heróis problemá ticos” de Gracilian o Ramos, em permanente revolta contra si e c ontra o mundo. É personagem típica dos romances de tensão crítica (Lucien Goldman), nos quais se exibem as sequelas irreversíveis que as injustiças sociais, a opressão e a brutalidade impõem ao ser humano. Fabiano, fatalista a princípio — “Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. (…) Nascera com esse destino (…) Podia mudar a sorte? (…) Era sina. O pai vivera assim (…)” —, parece resignado com a condição de vaqueiro, de empregado, de homem permanentemente brutalizado pelo clima e pela sociedade. Sua revolta nasce da constatação de que, ainda assim, era roubado, prejudicado pelos “homens ricos”, que lhe tomavam até parte dos “ossos” que lhe cabiam pelo trabalho.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 33
b) Explique a referência que ele faz aos “homens ricos”, com base no enredo do livro. RESOLUÇÃO: Os “homens ricos” a que Fabiano se refere são os seus opressores, especialmente o “patrão”, latifundiário, que o oprime, impondo-lhe uma “meação” já em si injusta (ao patrão cabiam três de cada quatro bezerros e dois de cada três caprinos que Fabiano criasse), além da aplicação da tabela “price” aos débitos que o sertanejo ia acumulando. Não bastasse isso, o patrão ainda roubava nas contas. É o retrato brutal de uma sociedade arcaica, pré-capitalista, que acrescenta a onipotência do patronato coronelesco à prepotência do Estado e de seus órgãos policiais (o Soldado Amarelo) e fiscais (a prefeitura).
Texto para a questão 5.
Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras, clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados. De quando em quando estes se mexiam, porque o lume era fraco e apenas aquecia pedaços deles. Outros pedaços esfriavam recebendo o ar que entrava pelas rachaduras das paredes e pelas gretas da janela. Por isso não podiam dormir. Quando iam pegando no sono, arrepiavamse, tinhamdos precisão de era virar-se, chegavam-se à trempe ouviam a conversa pais. Não propriamente conversa: eramefrases soltas, espaçadas, com repetições e incongruências. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. São Paulo, Livraria Martins Editora, s/d., p. 66.)
a) Você concorda com essa afirmação? Justifique sucintamente sua resposta.
5. (FGV-SP) – “Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras, clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados.” a) As ações de Fabiano nesse primeiro trecho desencadearam outras ações com efeitos plásticos e semânticos no contexto. Partindo dessa afirmação, analise, nas orações destacadas em itálico, os sentidos criados pela sequência dos verbos, tanto sob o ponto de vista físico, quanto sob o ponto de vista simbólico, denunciando o estado das personagens.
RESOLUÇÃO: Não, pois a seca é apenas um dos fatores que afligem Fabiano e sua família e não explica todos os dramas da personagem. A secura em Vidas Secas
RESOLUÇÃO: No trecho em itálico, as orações, coordenadas assindéticas, articulam uma sucessão de imagens, especialmente no campo visual, que aludem a alguma
não se restringe ao clima e à paisagem; é, ainda, uma “secura” existencial, linguística e social, advinda de fatores políticos, econômicos e culturais. As aflições de Fabiano também derivam, por exemplo, da violência que sofre por parte do Soldado Amarelo (símbolo da autoridade opressora), assim como de sua incapacidade de comunicação.
luz, pouca e precária, mas que ilumina, afastando o medo e aquecendo. É a luz da madeira queimada que indicia a miséria dos que não têm nem mesmo um lampião a óleo ou querosene.
4. (FUVEST-SP) – Leia as afirmações seguintes e responda ao que se pede. I. A dureza do clima, que se manifesta principalmente nas grandes secas periódicas, explica todas as aflições de Fabiano, ao longo da narrativa de Vidas Secas, de Graciliano Ramos.
II. Apesar de quase atrofiadas na sua rusticidade, as personagens de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, conservam um filete de investigação da interioridade: cada uma delas se perscruta, reflete, tenta compre ender a si e ao mundo, ajustando-o à sua visão. b) Você considera essa afirmação correta? Justifique brevemente sua resposta.
b) Em “clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados”, Graciliano Ramos se vale de técnicas que se assemelham às do cinema, como se se tratasse do “olhar” de uma câmera. Explique esse mecanismo e contextualize seu efeito de sentido com base na obra lida. RESOLUÇÃO: travelling As imagens, justapostas por coordenação, movem-se como num cinematográfico: como se uma câmera se movesse e, emdireção da precária luminosidade, embig close, pusesse em foco as imagens sobre as quais incide a luz: pés, joelhos e os meninos deitados. O “efeito de sentido” refere-se, de novo, à pobreza e precariedade da vida representadas na obra.
RESOLUÇÃO: A afirmação pode ser considerada correta, pois esse “filete de investigação da interioridade” é um recurso de que se vale o narrador, por meio do uso do discurso indireto livre, para trazer à tona os dramas internos de Fabiano e de sua família.
– 33
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 34
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (X)
1. (FUVEST-SP-2010) – Leia este trecho do poema de Vinícius de Moraes: P O R T U G U Ê S A – 3 a S
MENSAGEM À POESIA
Não posso Não é possível Digam-lhe que é totalmente impossível Agora não pode ser É impossível Não posso. que estou tristíssimo, mas não posso ir esta noite ao seu Digam-lhe [encontro. 2. (UNICAMP-SP-2010) – O poeta Vinícius de Moraes, apesar de Contem-lhe que há milhões de corpos a enterrar modernista, explorou formas clássicas, como o soneto abaixo, em Muitas cidades a reerguer, muita pobreza pelo mundo. versos alexandrinos (12 sílabas) rimados: Contem-lhe que há uma criança chorando em alguma parte do mundo E as mulheres estão ficando loucas, e há legiões delas carpindo SONETO DE INTIMIDADE A saudade de seus homens; contem-lhe que há um vácuo Nos olhos dos párias, e sua magreza é extrema; contem-lhe Nas tardes de fazenda há muito azul demais. Que a vergonha, a desonra, o suicídio rondam os lares, e é preciso Eu saio às vezes, sigo pelo pasto, agora [reconquistar a vida. Mastigando um capim, o peito nu de fora Façam-lhe ver que é preciso eu estar alerta, voltado para todos os No pijama irreal de há três anos atrás. [caminhos Pronto a socorrer, a amar, a mentir, a morrer se for preciso. Desço o rio no vau dos pequenos canais (...) Para ir beber na fonte a água fria e sonora (Vinícius de Moraes,Antologia Poética) E se encontro no mato o rubro de uma amora Vou cuspindo-lhe o sangue em torno dos currais. a) No trecho, o poeta expõe alguns dos motivos que o impedem de ir Fico ali respirando o cheiro bom do estrume ao encontro da poesia. A partir da observação desses motivos, procure Entre as vacas e os bois que me olham sem ciúme deduzir a concepção dessa poesia ao encontro da qual o poeta não E quando por acaso uma mijada ferve poderá ir: como se define essa poesia? quais suas características principais? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: Seguida de um olhar não sem malícia e verve O poeta exprime rejeição à poesia que fuja do contato imediato com o Nós todos, animais, sem comoção nenhuma mundo e os seus problemas. Mijamos em comum numa festa de espuma. (Vinícius de Moraes,Antologia Poética. São Paulo, Companhia das Letras, 2001, p. 86.) a) Essa forma clássica tradicionalmente exigiu tema e linguagem elevados. O “Soneto de Intimidade” atende a essa exigência? Justifique. b) Na “Advertência”, que abre sua Antologia Poética, Vinícius de Moraes declarou haver “dois períodos distintos”, ou duas fases, em sua obra. Considerando-se as características dominantes do trecho, a qual desses períodos ele pertence? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “Mensagem à Poesia” pertence à segunda fase da obra de Vinícius de Moraes, pois há no texto a preocupação em fazer a poesia abandonar o inefávela eenterrar”, buscar o “criança cotidianochorando”, e as preocupações doreconquistar mundo (“milhões de corpos “é preciso a vida”).
34 –
RESOLUÇÃO: Nem o tema, nem a linguagem desse soneto são “elevados”. Com efeito, o tema é “baixo” (o congraçamento “fisiológico” com os animais) e a linguagem não evita o vulgar (“cheiro bom do estrume”) e chega a beirar o chulo (“uma mijada ferve”, “mijamos em comum numa festa de espuma”).
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 35
b) Como os quartetos anunciam a identificação do eu lírico com os animais? Como os tercetos a confirmam?
3. Destaque, no poema deVinícius de Moraes, otrecho que indica que ele teria sido influenciado pela poesia de Manuel Bandeira.
RESOLUÇÃO: Os quartetos exprimem a identificação do eu lírico com os animais, apresentando-o em ações mais comumente esperadas deles: mastigar capim (v. 3), andar sem roupa (v. 3), beber água na fonte dos rios (v. 6), comer amoras direto das árvores e cuspi-las em torno dos currais (vv. 78). A confirmação dessa identificação vem nos tercetos de forma inusitada, na menção ao congraçamento do eu lírico com os bois e as vacas na satisfação de uma necessidade fisiológica comum.
RESOLUÇÃO: “Não foste apenas um segredo / De poesia e de emoção / Foste uma estrela em meu degredo.”
4. Qual o refrão do poema de Vinícius? Comente as transformações que esse refrão sofre em suas repetições ao longo do poema. RESOLUÇÃO: O refrão é “Poeta, pai, áspero irmão”. Em cada uma das três vezes que esse refrão se repete no poema, destaca-se uma das três qualificações que Vinícius atribui a Bandeira: primeiro, pai vem seguido de ponto de exclamação; na segunda ocorrência, o ponto de exclamação vem depois de poeta; na terceira ocorrência, há um ponto de interrogação no fim do verso, ficando os três vocativos igualados na pergunta final.
Texto para as questões de 3 a 7.
SAUDADE DE MANUEL BANDEIRA
Não foste apenas um segredo De poesia e de emoção Foste uma estrela em meu degredo Poeta, pai! áspero irmão. Não me abraçaste só no peito Puseste a mão na minha mão Eu, pequenino — tu, eleito Poeta! pai, áspero irmão.
5. Explique por que o verso “Eu, pequenino — tu, eleito” contém uma antítese. RESOLUÇÃO: A antítese ocorre entrepequenino e eleito. Pequenino, no contexto, significa “poeta de pequeno valor”, ao passo que eleito significa o oposto: “grande poeta”, porque “eleito”, “escolhido” (na Antiguidade se imaginava que o poeta — o grande poeta — fosse o eleito dos deuses).
Lúcido, alto e ascético amigo De triste e claro coração Que sonhas tanto a sós contigo Poeta, pai, áspero irmão? (Vinícius de Moraes)
RESPOSTA A VINÍCIUS
Poeta sou; pai, pouco; irmão, mais. Lúcido, sim; eleito, não. E bem triste de tantos ais Que me enchem a imaginação. 6. Qual a outra expressão do poema de Vinícius cujo sentido pode ser aproximado de “áspero irmão”?
Com que sonho? Não sei bem não. Talvez com me bastar, feliz — Ah feliz como jamais fui! —, Arrancando do coração — Arrancando pela raiz — Este anseio infinito e vão De possuir o que me possui.
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
RESOLUÇÃO: “Ascético amigo.”
(Manuel Bandeira)
– 35
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 36
7. Explique o sentido da resposta de Bandeira à pergunta de Vinícius. RESOLUÇÃO: Bandeira responde que não sabe bem com o que sonha — sonharia talvez com a felicidade autossuficiente (“...talvez com me bastar, feliz”) e com a supressão do grande e inútil desejo (“anseio infinito e vão”) de assenhorear-se daquilo que o encanta e domina o seu desejo (“possuir o que me possui”). P O R T U G U Ê S A – 3 a S
8. (UFSCar-SP) – Nos dois primeiros quartetos do soneto de Vinícius de Moraes, delineia-se a ideia de que o poeta a) não acredita no amor como entrega total entre duas pessoas. b) acredita que, mesmo amando muito uma pessoa, é possível apaixonar-se por outra e trocar de amor. c) entende que somente a morte é capaz de findar com o amor de duas pessoas. d) concebe o amor como um sentimento intenso a ser compartilhado, tanto na alegria quanto na tristeza. e) vê, na angústia causada pela ideia da morte, o impedimento para as pessoas se entregarem ao amor. RESOLUÇÃO: A ideia de que o amor deve ser compartilhado tanto na alegria como na tristeza depreende-se dos dois últimos versos da segunda estrofe: “E rir meu riso e derramar meu pranto / Ao seu pesar ou seu contentamento.” Resposta: D
Textos para os testes 8 e 9.
SONETO DE FIDELIDADE
De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.
9. (UFSCar-SP) – Em “Por enquanto”, Renato Russo diz que “...o pra sempre / sempre acaba”. Essa ideia, no poema de Vinícius de Moraes, aparece no seguinte verso: a) “Mas que seja infinito enquanto dure.” b) “Quero vivê-lo em cada vão momento.” c) “Quem sabe a morte, angústia de quem vive.” d) “Quem sabe a solidão, fim de quem ama.” e) “Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto.”
Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento.
RESOLUÇÃO: O verso “Mas que seja infinito enquanto dure” implica a ideia de fim, de término (“enquanto dure” quer dizer que não durará sempre), e postula que, dentro de tal limite, o amor não conheça limites (“seja infinito”, isto é, não seja contido por nenhuma restrição). Os versos de Renato Russo — “o pra sempre / sempre acaba” — também afirmam a ideia de fim, em contraste com um projeto sem limite, sem fim (“o pra sempre”). O ponto comum entre os dois textos é, portanto, a ideia de que algo que se quer sem limites também está destinado a terminar. Resposta: A
E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa lhe dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. (Vinícius de Moraes)
POR ENQUANTO Mudaram as estações Nada mudou Mas eu sei que alguma coisa aconteceu Tá tudo assim, tão diferente Se lembra quando a gente Chegou um dia a acreditar Que tudo era pra sempre Sem saber Que o pra sempre Sempre acaba. (Renato Russo)
36 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 37
MÓDULO
Análise de Textos (I)
Textos para as questões de 1 a 6.
Texto 1
Como sempre acontece a quem tem muito onde escolher, o pequeno, a quem o padrinho queria fazer clérigo mandando-o a Coimbra, a quem a madrinha queria fazer artista metendo-o na Conceição, a quem D. Maria queria fazer rábula arranjando-o em algum cartório e a quem enfim cada conhecido ou amigo queria dar um destino que julgava mais conveniente às inclinações que nele descobria, o
3. No primeiro excerto, o narrador repete o sujeito “o pequeno”. Entre as duas ocorrências do termo, há intercalada uma série de orações sintaticamente semelhantes. Considerando essa informação, responda ao que se pede: a) O que há de comum en tre todas essas orações? RESOLUÇÃO: O que há de comum a todas as orações adjetivas que acom panham o termo “o pequeno” é o desejo ou a intenção que cada uma das personagens mencionadas (o padrinho, a madrinha, D. Maria etc.) tem em relação ao futuro do protagonista Leonardo.
pequeno, dizemos, tendo nem tantaspara coisas boas, escolheu pior possível; nem foi para Coimbra, a Conceição, nemapara cartório algum; não fez nenhuma destas coisas, nem também outra qualquer: constituiu-se um completo vadio, vadio-mestre, vadio-tipo. Texto 2
Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça: era alta, magra, pálida; andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo, cortado, dava-lhe apenas até o pescoço e, como andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, como uma viseira. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 1. No primeiro excerto, quem é o “pequeno”? RESOLUÇÃO: O “pequeno” é Leonardinho, o protagonista dasMemórias de um Sargento de Milícias.
b) Por que o narrador, no trecho 1, após a segunda ocorrência de “o pequeno”, utiliza o verbo “dizemos”? Qual é o sentido dessa forma verbal na passagem? RESOLUÇÃO: O narrador utiliza a forma “dizemos”, intercalada, porque, depois de apresentar pela primeira vez o sujeito — “o pequeno” —, interrompe o que dizia com a série de orações adjetivas, perdendo assim a sequência de seu pensamento. Para retomá-la, depois de repetir o sujeito, utiliza a forma verbal “dizemos”, que, na passagem, significa “como estávamos dizendo”, “como dizíamos” etc.
2. Como se chama a personagem descrita na segunda passagem? RESOLUÇÃO: Luisinha, sobrinha de D. Maria.
– 37
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 38
c) Em que consiste a ironia presente no trecho 1? RESOLUÇÃO: Consiste em que todos alimentavam pretensiosas expectativas quanto ao futuro de Leonardo (ser clérigo, artista, rábula...), porém ele frustrou a todos, constituindo-se um “completo vadio”.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
5. Na descrição da sobrinha de D. Maria, perce bem-se duas partes: uma em que o narrador a caracteriza sinteticamente e outra em que particulariza analiticamente seus traços e atitudes. Identifiquecada uma dessas partes, apontando as respectivas passagens. RESOLUÇÃO: Descrição sintética: “Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça”; Descrição analítica: “era alta, magra, pálida; andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo cortado dava-lhe apenas até o pescoço e, como andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, como uma viseira.”
4. (PUC-SP) – Tomando como ponto de partida a descrição das personagens a que se referem os trechos transcritos, e considerando o romance como um todo, justifique a afirmação do crítico Antonio Candido de que Memórias de um Sargento de Milícias, obra escrita no Romantismo, estava meio em descompasso com os padrões e o tom daquele momento. RESOLUÇÃO: A caracterização de Leonardo e Luisinha, nos fragmentos transcritos, evidencia que a obra de Manuel Antônio de Almeida se afasta da idealização e linearidade com quem os autores românticos brasileiros concebiam seus heróis e heroínas. Na caracterização de Leonardo, o autor constrói um anti-herói (“um completo vadio, vadio-mestre, vadio-tipo”); constrói um típico “malandro”, ancestral de Macunaíma, da obra homônima de Mário de Andrade, na linhagem do “herói sem nenhum caráter”, motivado mais pelo prazer, pelo medo, pela oportunidade do que por qualquer fundamento ético e qualquer ideal. Nesse mesmo sentido, toda a descrição de Luisinha aproxima-se da atitude realista, pela ênfase que dá aos aspectos banais e sem encantos da figura feminina, isto é, pela ausência de qualquer idealização: “andava com o queixo enterrado no peito”, “trazia a cabeça sempre baixa”.
Texto para a questão 6.
Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba; Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros; Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas. Onde vai a afouta jangada, que deixa rápida a costa cearense, aberta ao fresco terral a grande vela? Onde vai como branca alcíone, buscando o rochedo pátrio nas solidões do oceano? (José de Alencar,Iracema) 6. Releia os trechos de Memórias de um Sargento de Milícias e, comparando-os ao fragmento de Iracema acima transcrito, discorra sobre o estilo da linguagem de ambas as obras. RESOLUÇÃO: Em Memórias de um Sargento de Milícias , o estilo é irônico, coloquial e irreverente, ao passo que, em Iracema, ao contrário, o estilo é reverente, poético, mítico.
38 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 39
Análise de Textos (II)
MÓDULO Textos para as questões de 1 a 6.
LXXII UMA REFORMA DRAMÁTICA
Bentinho/D. Casmurro é Otelo, Capitu é Desdêmona, Escobar é Cássio, e a consciência atormentada do narrador é Iago, a espicaçar-lhe o mórbido ciúme. Como admitia o narrador, ele primeiro constituiu, como numa montagem operística, um duo terníssimo, depois um trio, depois um quatuor.
Nem eu, nem tu, nem ela, nem qualquer outra pessoa desta história poderia responder mais, tão certo é que o destino, como todos os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho. Eles chegam a seu tempo, até que o pano cai, apagam-se as luzes e os espectadores vão dormir. Nesse gênero há porventura alguma coisa que reformar, e eu proporia, como ensaio, que as peças começassem pelo fim. Otelo mataria a si e a Desdêmona no primeiro ato, os três seguintes seriam dados à ação lenta e decrescente do ciúme e o último ficaria só com as cenas iniciais da ameaça dos turcos, as explicações de Otelo e Desdêmona, e o bom conselho do fino Iago: “Mete dinheiro na bolsa.” Desta maneira, o espectador, por um lado, acharia no teatro a charada habitual que os periódicos lhe dão, porque os últimos atos explicariam o desfecho do primeiro, espécie de conceito, e, por outro lado, ia para a cama com uma boa impressão de ternura e de amor. CXXXV OTELO
Jantei fora. De noite fui ao teatro. Representava-se justamente Otelo, que eu não vira nem lera nunca; sabia apenas o assunto e estimei a coincidência. Vi as grandes raivas do mouro, por causa de um lenço — um simples lenço! —, e aqui dou matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros continentes, pois não me pude furtar à observação de que um lenço bastou a acender os ciúmes de Otelo e compor mais sublime tragédialençóis; deste mundo. lenços hoje sãoaprecisos os próprios algumaOsvez nem perderam-se, lençóis há, e valem só as camisas. Tais eram as ideias que me iam passando pela cabeça, vagas e turvas, à medida que o mouro rolava convulso, e Iago destilava a sua calúnia. Nos intervalos não me levantava da cadeira; não queria expor-me a encontrar algum conhecido. As senhoras ficavam quase todas nos camarotes, enquanto os homens iam fumar. Então eu perguntava a mim mesmo se alguma daquelas não teria amado alguém que jazesse agora no cemitério, e vinham outras incoerências, até que o pano subia e continuava a peça. O último ato mostrou-me que não eu, mas Capitu devia morrer. Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este lhe deu entre aplausos frenéticos do público.
b) Ele já tornara a peça assunto do capítulo LXXII, mas apenas agora tem ocasião de vê-la. Do ponto de vista da estrutura do romance, isso implicaria alguma contradição? Justificar, se for o caso. RESOLUÇÃO: Não há contradição. A ordem cronológica da ação do roman ce é truncada pelas digressões do narrador, que, posicionado no presente da narração, da escrita de suas memórias, interfere livremente no passado e na ação para comentá-los. A técnica impressionista de recompor o passado através de “manchas” de recordação permite, pela imposição do tempo psicológico, a fusão de presente e passado. O capítulo LXXII, de caráter metalin guístico, é uma reflexão do memorialista que interrompe e elucida a ação romanesca. O capítulo CXXXV integra a própria ação do romance, recapitulando o passado. Não há, portanto, qualquer contradição estrutural no fato de, no capítulo LXXII, o narrador revelar o conhecimento de uma peça que a personagem, na sequência da ação, só veria no capítulo CXXXV. Basta não confundir narrador e personagem.
1. (FUVEST-SP) – O narrador afirma, no capítulo CXXXV, que “não vira nem lera nunca” Otelo e que estimou a coincidência, ao chegar ao teatro. a) A que coincidência está se referindo? RESOLUÇÃO: Bentinho alude à coincidência entre o seu drama pessoal, centrado no ciúme doentio e na suposta traição de sua esposa, e o núcleo dramático de Otelo, de Shakespeare, tragédia que se desenvolve em torno do mesmo tema. O romance machadiano estabelece com a peça clássica uma constante relação de intertextualidade. Já a partir da teoria do velho tenor Marcolini, exposta no capítulo IX, de que “a vida é uma ópera”, e endossada pelo narrador no capítulo seguinte, evidencia-se o paralelo, às vezes desdobrado em paródia, entre o romance e a encenação dramática.
– 39
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 40
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
2. (FUVEST-SP) – “Os lenços perderam-se, hoje são precisos os próprios lençóis; alguma vez nem lençóis há, e valem só as camisas.” Por que o narrador contrapõe lençóis e camisas, de seu tempo, a lenços, do tempo da tragédia?
4. (FUVEST-SP) – “Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este lhe deu entre aplausos frenéticos do público.” O modo como o narrador vê a reação do público revela algo. De que se trata?
RESOLUÇÃO: Há, na contraposição entre os lenços do passado e os lençóis e camisas do presente, uma crítica à decadência dos costumes do tempo de enunciação de Dom Casmurro. Na época retratada por Shakespeare, bastavam indícios materiais para configurar o adultério; hoje (o presente da narração, da enunciação) são necessárias provas mais contun dentes: a exibição da intimidade dos amantes, dos “lençóis”, das “camisas” (= peças íntimas).
RESOLUÇÃO: O narrador, equivocadamente, interpreta os aplausos do público como aplausos ao ato de vingança de Otelo, como se o público estivesse assumindo o papel do príncipe mouro, solidário com sua ira. Na verdade, o público aplaudia o espetáculo, o desempenho dos atores, não a atitude do marido “traído”. É mais uma evidência da importância do foco narrativo na construção de Dom Casmurro.
3. (FUVEST-SP) – Como bom espectador, o narrador sabia que Desdêmona era inocente. Por que ele não se compadece da morte dela?
5. (FUVEST-SP) – Quando o narrador propõe a reforma dramática, no capítulo LXXII, ele compara o destino aos dramaturgos. a) O que seria de uma trag édia, caso o dramaturgo lhe invertesse a trama?
RESOLUÇÃO: A tragédia de Shakespeare deixa patente a inocência de Desdêmona, e a prova incriminatória, o fatídico lenço, não passou de um ardil de Iago, que materializou, na consciência atormentada de Otelo, a convicção do adultério. Bentinho, contudo, está tão envolvido nas teias do ciúme, e o narrador é tão solidário com Otelo, que a inocência de Desdêmona é irrelevante. O narrador-personagem identifica-se com Otelo e, como ele, assume o papel do marido que, supondo-se traído, exerce sua “justa” vingança. É um indício da subjetividade do ponto de vista.
40 –
RESOLUÇÃO: A solução ou a reforma aventada pelo narrador, invertendo-se o curso dos acontecimentos para que a ação desabasse em anticlímax, transfor maria a tragédia de Otelo em comédia, ou em ópera-bufa, e a ação homicida e suicida da personagem descam baria no prosaico conselho pecuniário de Iago: “Mete dinheiro na bolsa”, numa velada crítica ao pragmatismo contemporâneo.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 41
b) Na verdade, o que Bentinho buscaria reformar? RESOLUÇÃO: Ao propor sua reforma dramática, na qual a tragédia, satí rica e parodisticamente, terminasse emhappy end, o narrador-personagem, “pressentindo” sua tragédia pessoal, procuraria inver ter o curso dos acontecimentos, interferindo no próprio destino, no curso da vida. Continua, portanto, fiel ao princípio que acatou, a partir da teoria do velho tenor Marcolini: “A vida é uma ópera.” A reforma que propõe o narrador é uma premonição do desfecho, que ele já conhece, e imagina reverter pelo discurso, pela encenação.
Texto para a questão 7.
— Você é um grande prosa — disse tio Cosme, quando ele acabou. José Dias sorriu sem vexame. Padre Cabral confirmou os louvores do agregado, sem os seus superlativos; ao que este acrescentou que o Cardeal Mastai evidentemente fora talhado para a tiara desde o princípio dos tempos. E, piscando-me o olho, concluiu: — A vocação é tudo. O estado eclesiástico é perfeitíssimo, contanto que o sacerdote venha já destinado do berço. Não havendo vocação, falo de vocação sincera e real, um jovem pode muito bem estudar as letras humanas, que também são úteis e honradas. Padre Cabral retorquia: — A vocação é muito, mas o poder de Deus é soberano. Um homem pode não ter gosto à igreja e até persegui-la, e um dia a voz de Deus lhe— fala, sai apóstolo; vejaeuSão Paulo. Nãoe ele contesto, mas o que digo é outra coisa. O que eu digo é que se pode muito bem servir a Deus sem ser padre, cá fora; pode-se ou não se pode? — Pode-se. — Pois então! exclamou José Dias triunfalmente, olhando em volta de si. Sem vocação é que não há bom padre, e em qualquer profissão liberal se serve a Deus, como todos devemos. — Perfeitamente, mas vocação não é só do berço que se traz. (Machado de Assis, Dom Casmurro) 7) a) A discussão entre José Dias e Padre Cabral gira em torno de que tema?
6. (FUVEST-SP) – Ao comparar o destino humano ao destino das personagens de uma peça teatral, Machado retoma o tópos (lugarcomum literário) do Theatrum Mundi (o “teatro do mundo”, ou seja, o mundo como um teatro). Explique. RESOLUÇÃO: O tópos do mundo como um teatro é recorrente na literatura e remonta a Platão, que comparou o homem a um fantoche nas mãos de Deus. O mundo como um teatro significa que o homem não possui o controle total de seu próprio destino, assim como as personagens, manipuladas pelo dramaturgo, não podem alterar o desfecho a que são submetidas: “tão certo é que o destino, como todos os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho.”
RESOLUÇÃO: A discussão gira em torno da vocação para a vida reli giosa. (O que está em jogo é a ida ou não de Bentinho para o seminário.)
b) Qual a posição defendida por um e por outro? RESOLUÇÃO: José Dias defende que a vocação é condiçãosine qua non para o ingresso no sacerdócio e que ela deve vir do berço. Padre Cabral concorda que deve haver vocação, mas discorda de que ela deva ser uma condição dada desde o nascimento; segu ndo ele, alguém pode receber o chamado de Deus, mesmo depois de ter levado uma vida contrária à Igreja, como ocorreu com São Paulo.
– 41
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 42
MÓDULO
Análise de Textos (III)
As questões de números 1 a 4 tomam por base um fragmento do romance O Ateneu, de Raul Pompeia (1863-1895), em que o narrador comenta suas reações ao ensino que recebia no colégio: P O R T U G U Ê S A – 3 a S
O ATENEU
A doutrina cristã, anotada pela proficiência do explicador, foi ocasião de dobrado ensino que muito me interessou. Era o céu aberto, rodeado de altares, para todas as criações consagradas da fé. Curioso encarar a grandeza do Altíssimo; mas havia janelas para o purgatório aE que o Sanchestinha se debruçava comigo, cuja vista muito seduzia. o preceptor um tempero de unção na voz e nomais modo, uma sobranceria de diretor espiritual, que fala do pecado sem macular a boca. Expunha quase compungido, fincando o olhar no teto, fazendo estalar os dedos, num enlevo de abstração religiosa; expunha, demorando os incidentes, as mais cabeludas manifestações de Satanás no mundo. Nem ao menos dourava os chifres, que me não fizessem medo; pelo contrário, havia como que o capricho de surpreender com as fantasias do Mal e da Tentação, e, segundo o lineamento do Sanches, a cauda do demônio tinha talvez dois metros mais que na realidade. Insinuou-me, é certo, uma vez, que não é tão feio o dito, como o pintam. O catecismo começou a infundir-me o temor apavorado dos oráculos obscuros. Eu não acreditava inteiramente. Bem pensando, achava que metade daquilo era invenção malvada do Sanches. E quando ele se punha a contar histórias de castidade, sem atenção à parvidade da matéria do preceito teológico, mulher do próximo, Conceição da Virgem, terceiro-luxúria, brados ao céu pela sensualidade contra a natureza, vantagens morais do matrimônio, e porque a carne, a inocente carne, que eu só conhecia condenada pela quaresma e pelos monopolistas do bacalhau, a pobre carne do beef, era inimiga da alma; quando retificava o meu engano, que era outra a carne e guisada de modo especial e muito especialmente trinchada, eu mordia um pedacinho de indignação contra as calúnias à santa cartilha do meu devoto credo. Mas a coisa interessava e eu ia colhendo as informações para julgar por mim oportunamente. Na tabuada e no desenho linear, eu prescindia do colega mais velho; no desenho, porque achava graça em percorrer os caprichosos traços, divertindo-me a geometria miúda como um brinquedo; na tabuada e no sistema métrico, porque perdera as esperanças de passar de medíocre como ginasta de cálculos e resolvera deixar a Maurílio ou a quem quer que fosse o primado das cifras. Em dois meses tínhamos vencido por alto a matéria toda do curso; e, com este preparo, sorria-me o agouro de magnífico futuro, quando veio a fatalidade desandar a roda. (Raul Pompeia, O Ateneu. Rio de Janeiro, Biblioteca Universal Popular, 1963.) 1. (VUNESP-SP-2010) – Nesta passagem de O Ateneu, romance que a crítica literária ainda hesita em classificar dentro de um único estilo literário, a personagem narradora se refere ao ensino de religião cristã, desenho e matemática, mostrando atitudes diferentes com relação aos conteúdos de cada disciplina. Releia o texto e, a seguir, explique a razão de a personagem narradora declarar, no penúltimo parágrafo, que prescindia do colega mais velho no aprendizado de desenho.
42 –
RESOLUÇÃO: Diferentemente do que ocorria com o estudo da tabuada e do sistema métrico, matérias que já não seduziam o narrador, visto que ele se diz, nelas, um “medíocre” sem esperanças, o trabalho com o desenho o atraía e entretinha: “achava graça em percorrer os caprichosos traços, divertindo-me a geometria miúda como um brinquedo”. Este o motivo pelo qual, no caso, ele “prescindia do colega mais velho”, cujo auxílio lhe valia no estudo de religião e seria inútil no de matemática.
2. (VUNESP-SP-2010) – No primeiro parágrafo, a personagem Sanches, aluno mais velho que atuava como espécie de preceptor para os estudos de Sérgio, o mais novo, refere-se a duas entidades da religião cristã, contextualizando valores opostos a cada uma delas. Identifique as duas entidades e os valores a que estão respectivamente associadas. RESOLUÇÃO: As entidades referidas são Deus (“o Altíssimo”) e Satanás. Os valores a que estão associadas tais entidades são o Bem (a virtude), no caso de Deus, e o Mal, a Tentação (o pecado), no caso de Satanás.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 43
3. (VUNESP-SP-2010) – Embora no uso popular a palavra agouro apresente muitas vezes a acepção de “previsão ruim”, seu significado srcinal não tem essa marca pejorativa, mas, simplesmente, o de prognóstico, previsão, predição, augúrio. Leia atentamente o último parágrafo do fragmento de O Ateneu e, a seguir, explique, comprovando com base em elementos do contexto, em que sentido o narrador empre gou a palavra agouro. RESOLUÇÃO: O contexto em que se encontra a palavra agouro, núcleo do sujeito da oração, é enfaticamente positivo, seja no verbo metafórico — “sorria-me” — que constitui o seu predicado —, seja no complemento nominal que a acompanha — “de magnífico futuro”. Portanto, o sentido de agouro só pode ser “prognóstico, previsão”, sem qualquer traço negativo.
As questões de números 5 e 6 referem-se ao texto seguinte, de José de Alencar.
O trocano1 ribombou, derramando longe pela amplidão dos vales e pelos ecos das montanhas a pocema2 do triunfo. Os tacapes, vibrados pela mão pujante dos guerreiros, bateram nos largos escudos retinindo. Mas a voz possante da multidão dos guerreiros cobriu o imenso rumor, clamando: — Tu és Ubirajara, o senhor da lança, o vencedor de Pojucã, o maior guerreiro da nação tocantim. (...) Quando parou o estrondo da festa e cessou o canto dos guerreiros, avançou Camacã, o grande chefe dos araguaias. (...) falou o ancião: Assim — Ubirajara, senhor da lança, é tempo de empunhares o grande arco da nação araguaia, que deve estar na mão do mais possante. Camacã o conquistou no dia em que escolheu por esposa Jaçanã, a virgem dos olhos de fogo, em cujo seio te gerou seu primeiro sangue. Ainda hoje, apesar da velhice que lhe mirrou o corpo, nenhum guerreiro ousaria disputar o grande arco ao velho chefe, que não sofresse logo o castigo de sua audácia. Mas Tupã ordena que o ancião se curve para a terra, até desabar como o tronco carcomido; e que o mancebo se eleve para o céu como a árvore altaneira. Camacã revive em ti; a glória de ser o maior guerreiro cresce com a glória de ter gerado um guerreiro ainda maior do que ele. (José de Alencar, Ubirajara. 8.a ed. São Paulo, Ática, 1984, p. 31-32.)
4. (VUNESP-SP-2010) – Ao focalizar os pecados contra as virtudes estipuladas pela religião, no segundo parágrafo, o narrador de certo modo se diverte e faz um jogo de palavras com duas diferentes acepções de carne. Releia atentamente o parágrafo e explique esse jogo de palavras. RESOLUÇÃO: Quando se falava em “pecados da carne”, a ingenui dade do narrador o levava a pensar em carne bovina, que era a referência única da palavra em seu repertório infantil. Seu instrutor em matéria religiosa, que se enlevava na exposição das “mais cabeludas manifestações de Satanás no mundo”, corrigia-o pressurosamente, esclarecendo tratar-se de outra “carne”, que se prepara e come de outra maneira... Tais esclareci mentos eram para o menino, ao mesmo tempo, motivo de indignação e interesse.
1 – Trocano: espécie de tambor dos índios, feito de um pedaço de tronco oco com tampos de tábua furados ao meio, posto horizontalmente sobre forquilhas. 2 – Pocema: canto selvagem, clamor.
5. (UFSCar-SP) – Apresenta-se, no fragmento de Ubirajara , um cenário de exaltação ao herói. Logo, trata-se de um ritual grandiloquente para aquele que simboliza o poder na tribo, em valores que expressam o ideário romântico do qual participou Alencar. a) Por que se pode dizer que a oração “Tu és Ubirajara” sintetiza o discurso de exaltação ao herói? RESOLUÇÃO: A palavra indígenaUbirajara significa “senhor da lança” (Ubira = vara, lança; jara = senhor), sintetizando o discurso de exaltação, porque só o mais possante dos guerreiros poderia ser o chefe da tribo araguaia, empunhar o grande arco e ser chamado Ubirajara. O grande arco é a insígnia do chefe guerreiro.
– 43
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 44
b) Comente a visão romântica do índio brasileiro, expressa em Alencar, comparando-a com a visão do índio no Modernismo, valendo-se da figura de Macunaíma, de Mário de Andrade:
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma. (Mário de Andrade, Macunaíma, o herói sem nenhum caráter.
6. (UFSCar-SP) – O texto apresenta o índio num ritual, exaltando-se o guerreiro Ubirajara por vencer o rival, Pojucã. a) O que representa o discurso de Camacã para a vida na tribo? RESOLUÇÃO: O discurso de Camacã representa a troca de chefe. O guerreiro ancião Camacã passa o comando da tribo araguaia a seu filho, o jovem, forte, corajoso Ubirajara.
31.a ed. Belo Horizonte/Rio de Janeiro, Garnier, 2000, p. 13.) RESOLUÇÃO: A visão romântica do índio brasileiro, expressa em Alencar e autores dessa escola, é bastante idealizada. O código ético do aborígine aproxima-o da figura do cavaleiro das novelas medievalistas do Romantismo europeu: a honra acima de tudo. Já no Modernismo, não existe a idealização da personagem indígena, pois a “índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma”. Na visão antropofágica do Modernismo, o índio é o “mau selvagem”.
b) Quais as expressões, de sentido figurado, empregadas por Alencar para referir-se à velhice de Camacã? Que figura de linguagem está contida nessas expressões? RESOLUÇÃO: “Mas Tupã ordena que o ancião se curve para a terra, até desabar como o tronco carcomido.” A figura de linguagem que aparece nessa passagem é a comparação ou símile (“como o tronco carcomido”).
Análise de Textos (IV)
MÓDULO
As questões de números 1 a 4 tomam por base uma passagem da comédia As Casadas Solteiras , de Martins Pena (1815-1848), e uma passagem do romance Dona Flor e seus Dois Maridos, de Jorge Amado (1912-2001).
AS CASADAS SOLTEIRAS Cena IX Henriqueta e depois Jeremias
solteiro, ou, se é casado, viver bem longe da mulher.enquanto ( fala, Henriqueta vem-se aproximando dele pouco a pouco) Vivo como um lindo amor! Ora, já não posso aturar a minha cara-metade... O que me vale é Henriqueta, que a este tempo estar ela há mais de duzentas léguas de mim. ( está junto dele,agarra-lhe pela gola da casaca. Jeremias, assus tando-se) Quem é? (Henriqueta dá-lhe uma bofetada e o deixa. Jeremias, gritando) Ai, tragam luzes! São ladrões!aqui ( entra o criado com luzes)
Henriqueta É outra girândola, patife!
(sóalegre... ) Henriqueta Vens muito Mal sabes tu o que te espera. Canta, canta, que logo chiarás! (apaga a vela) Ah, meu tratante!
Jeremias Minha mulher!
Jeremias (entrando) Que diabo! É noite fechada e ainda não acenderam as velas!cha( mando) Tomás, Tomás, traze luz! Não há nada como estar o homem
Henriqueta Pensavas que te não havia de encontrar?
44 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 45
Jeremias Mulher do diabo!
Criado (entrando) Uma carta da Corte para o Sr. Jeremias.
Henriqueta Agora não te perderei de vista um só instante.
Jeremias Dá cá. (o criado entrega a carta e sai. Jeremias para Henriqueta) Não ter eu a fortuna, peste, que esta carta fosse a de convite para teu enterro...
Jeremias (para o criado) Vai-te embora. (o criado sai) Henriqueta Ah, não queres testemunhas? Jeremias Não, porque quero te matar!
Jeremias Não preciso da sua permissão. ( abre a carta e a lê em silêncio) Estou perdido! (deixa cair a carta no chão) Desgraçado de mim! (vai
cair sentado na cadeira)
Henriqueta Ah, ah, ah! Disso me rio eu.
Henriqueta O que é?
Jeremias (furioso) Ah, tens vontade de rir? Melhor; a morte será alegre. (tomando-a pelo braço) Tu és uma peste, e a peste se cura; és um demônio, e os demônios se exorcizam; és uma víbora, e as víboras se matam!
Jeremias Que infelicidade, ai!
Henriqueta E aos desavergonhados se ensinam! (levanta a mão para dar-lhe uma bofetada, e ele, deixando-a, recua) Ah, foges? Jeremias Fujo sim, porque da peste, dos demônios e das víboras se foge... Não quero mais te ver! ( fecha os olhos) Henriqueta
Henriqueta Jeremias! Jeremias Arruinado! Perdido! Henriqueta (corre e apanha a carta e a lê) “Sr. Jeremias, muito sinto dar-lhe tão desagradável notícia. O negociante a quem o senhor emprestou o resto de sua fortuna acaba de falir. Os credores não puderam haver nem 2 por cento do rateio. Tenha resignação...” — Que desgraça! Pobre Jeremias! (chegando-se para ele) Tende coragem.
Hás de ver-me e ouvir-me!
Jeremias Não quero mais te ouvir! (tapa os ouvidos com a mão) Henriqueta (tomando-o pelo braço) Pois hás de me sentir! Jeremias (saltando) Arreda! Henriqueta Agora não me arredarei mais do pé de ti, até o dia do Juízo...
Jeremias (chorando) Ter coragem! É bem fácil de dizer-se... Pobre, miserável... Ah! (levantando-se ) Henriqueta, tu que sempre me amaste, não me abandones agora... Mas não, tu me abandonarás; eu estou pobre... Henriqueta Injusto que tu és. Acaso amava eu o teu dinheiro, ou a ti? Jeremias Minha boa Henriqueta, minha querida mulher, agora que tudo perdi, só tu és o meu tesouro; só tu serás a consolação do pobre Jeremias.
Jeremias Pois agora também faço eu protesto solene a todas as nações, declaração formalíssima à face do universo inteiro, que hei de fugir de ti como o diabo foge da cruz; que hei de evitar-te como o devedor ao credor; que hei de odiar-te como as oposições odeiam as maiorias.
Henriqueta Abençoada seja a desgraça que me faz recobrar o teu amor! Trabalharemos para viver, e a vida junto de ti será para mim um paraíso...
Henriqueta E eu declaro que te hei de seguir como a sombra segue o corpo...
Jeremias Oh, nunca mais te deixarei! (Martins Pena, Comédias (1844-1845). As Casadas Solteiras: comédia em 3 atos. São Paulo, WMF Martins Fontes, 2007.)
Jeremias (com exclamação) Meu Deus, quem me livrará deste diabo encarnado?
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Henriqueta Não terá esse gostinho. Pode ler, não faça cerimônia.
– 45
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 46
DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Sempre fora considerada e se considerara dona Flor boa dona de casa, ordeira e pontual, cuidadosa. Boa dona de casa e boa diretora de sua Escola de Culinária, onde acumulava todos os cargos, contando apenas com a ajuda da empregada broca e esmorecida e a assistência amiga da pequena Marilda, curiosa de pratos e temperos. Nunca lhe ocorrera reclamação de aluna, incidente a toldar o sossego das aulas. A não ser, é claro, os acontecidos quando do primeiro esposo, pois o finado, como se está farto de saber, não era de ter consideração por horário, por trabalho alheio ou por melindres de alfenim; seus deboches com alunas por mais de uma vez criaram dificuldades e problemas para dona Flor, dores de cabeça, quando não enfeites de duro corno. Ah! Em verdade, Flor,em nãocasa possuía método, andava longeela, de dona ter ordem e na noção Escoladee, regra em suae existência, medida e pauta, como devera! Foi-lhe necessário viver com doutor Teodoro para dar-se conta de como sua ordem era anarquia, seus cuidados tacanhos e insuficientes, de como ia tudo mais ou menos ao deus-dará, a la vontê, sem lei e sem controle. Não decretou doutor Teodoro lei e controle de imediato e com severidade; nem sequer falou em tal. Sendo homem tranquilo e suspicaz, de educação cutuba, nada sabia impor e não impunha; no entanto tudo obtinha sem estardalhaço, sem que os demais se sentissem violentados; um fode-mansinho o nosso caro farmacêutico. Era preciso ver-se a casa um mês e meio depois da lua-de-mel, que diferença! Também dona Flor fazia diferença, buscando adaptar-se a seu marido, seu senhor, caber justa e certa em sua medida exata. Se nela a mudança era por dentro, mais sutil, menos visível, na casa fizera-se evidente, bastava olhar. (Jorge Amado, Dona Flor e seus Dois Maridos. São Paulo, Livraria Martins Editora, 1966.) 1. (VUNESP-SP-2010) – Nos dois fragmentos de texto citados, em que se colocam aspectos da relação entre marido e mulher no casamento, percebe-se que as esposas amam seus respectivos maridos, mas o modo de relacionamento é diferente. Tomando por base esse comentário, releia os dois fragmentos apresentados e demonstre que a atitude de Henriqueta diante de Jeremias é bastante diferente da que se percebe entre dona Flor e o doutor Teodoro. RESOLUÇÃO: Henriqueta suspeita, justificadamente, de Jeremias e o vigia; mostra-se agressiva quando se sabe enganada, parece impositiva, mas revela-se amorosa, fiel e desapegada quando o infortúnio se abate sobre seu marido. Dona Flor, ao contrário, não encara Teodoro com suspeita, mas com a admiração e o respeito que a levam a tomá-lo como modelo de ordenação da vida, procurando adaptar-se a ele, seja na organização da casa, seja em si mesma, “por dentro”, revelando-se dócil e submissa.
46 –
2. (VUNESP-SP-2010) – No terceiro parágrafo do texto de Jorge Amado, a expressão coloquialfode-mansinho, que poderia assumir um sentido de ordem sensual, é na verdade utilizada como metáfora que caracteriza outro aspecto da personalidade do doutor Teodoro. Releia o parágrafo e explique o que quer dizer o narrador ao afirmar que o doutor era um fode-mansinho. RESOLUÇÃO: A expressãofode-mansinho descreve a atitude dissimulada, manipuladora e sutil de Teodoro, que obtém das pessoas aquilo que deseja, sem que elas se sintam constrangidas ou forçadas.
3. (VUNESP-SP-2010) – No fragmento da peça de Martins Pena há palavras, expressões e frases que aparecem escritas em itálico e quase sempre entre parênteses. Trata-se de um recurso formal utilizado pelos autores em textos destinados a teatro, cinema e televisão. Partindo desse comentário, releia o texto e, a seguir, explique a função que apresenta esse recurso formal no fragmento apresentado. RESOLUÇÃO: Os trechos em itálico, as mais das vezes entre parênteses, não fazem parte do diálogo e sãorubricas teatrais, ou seja, instruções do autor para os atores e encenadores da peça, indicando detalhes de como e le concebe o com portamento das personagens, o cenário etc.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 47
4. (VUNESP-SP-2010) – Na peça de Martins Pena, Jeremias e Henriqueta usam em quase todo o diálogo o tratamento de segunda pessoa do singular (tu, te, ti, contigo e verbos com flexão correspon dente). Em certo momento, porém, há uma rápida troca de palavras em que os dois alteram a forma de tratamento, para em seguida voltarem ao de segunda pessoa. Localize a passagem que contém essa rápida troca de palavras e identifique a forma de tratamento que nela assumem marido e esposa. RESOLUÇÃO: Henriqueta e Jeremias passam a se tratar na terceira pessoa, de forma afetadamente mais distante e cerimoniosa, depois que ele, ao receber uma carta, exprime o desejo de que ela contivesse o convite para o enterro da esposa. Tal tratamento ocorre apenas em duas falas contíguas, uma de Henriqueta (“Não terá esse gostinho. Pode ler, não faça cerimônia.”) e outra de Jeremias (“Não preciso dasua permissão.”). Quando o infortúnio os reaproxima, o tratamento volta à segunda pessoa.
RESOLUÇÃO: O argumento da Farsa de Inês Pereira consiste no desenvolvimento do refrão popular “Mais quero asno que me carregue que cavalo que me derrube”. Inês, num primeiro momento, escolhe por marido Brás da Mata, um sujeito de boa aparência e bem-falante, que se pode associar à figura do cavalo. Porém, ela não é feliz com ele e, assim que possível, com a morte do marido, Inês reconsidera seus critérios de escolha (“Meu desejo eu retempero”) e opta por casar-se com o ingênuo — o asno — Pero Marques, que faz tudo para agradar à esposa. Desse modo, ela consegue tudo o que quer, tendo a seu lado um “asno” que a carrega, em vez de um “cavalo” que a derruba. O segundo marido, de tão tolo e servil, chega a carregar Inês nas costas, quando ela vai visitar um amante que se faz passar por um ermitão: — “Marido cuco [enganado] me levades. E mais duas lousas [chapas de pedra].” Pero — Pois assi se fazem as cousas. Inês
sabedes — “Bemvos quanto amo: vós, marido, sempre fostes percebido pera gamo [animal de chifres]. Carregado ides, noss’amo com duas lousas.” Pero — Pois assi se fazem as cousas. Inês — “Bem sabedes vós, marido, quanto vos quero. Sempre fostes percebido pera cervo. Agora vos tomou o demo com duas lousas.” Inês
Texto para a questão 5.
Inês
— Andar! Pero Marques seja! Quero tomar por esposo quem se tenha por ditoso de cada vez que me veja. Meu desejo eu retempero: asno que me leve quero, não cavalo valentão: antes lebre que leão, antes lavrador que Nero. (Gil Vicente, Farsa de Inês Pereira)
5. Os versos transcritos pertencem à Farsa de Inês Pereira (1523), de Gil Vicente. Nessa comédia de costumes, a protagonista Inês Pereira, moça leviana e namoradeira, para fugir da rígida disciplina que a mãe lhe impõe e ansiosa para livrar-se dos afazeres domésticos, casa-se com o galanteador e malandro Brás da Mata, que fingia ser escudeiro. Maltratada pelo marido, Inês tem seu caminho livre quando ele morre, ao fugir de uma batalha. A rapariga casa-se, então, com um antigo pretendente, Pero Marques, homem tolo e ingênuo, porém honesto e servil. Considerando-se o trecho transcrito e o que se acaba de afirmar a respeito da peça, explique de que modo o refrão popular “Mais quero asno que me carregue que cavalo que me derrube”, que motivou a criação da peça, se relaciona com seu enredo.
– 47
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 48
Análise de Textos (V)
MÓDULO
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
As questões de números 1 a 3 tomam por base um poema de Cecília Meireles (1901-1964), cujo tema é a natação, e um poema de Joaquim Cardozo (1897-1978) sobre as vitórias do atleta brasileiro Ademar Ferreira da Silva no salto tríplice (medalha de ouro nas Olimpíadas de Helsinque, em 1952, e de Melbourne, em 1956, entre outras vitórias).
NADADOR
Cecília e duas palavras ou expressões da primeira estrofe (primeiros quatro versos) do poema de Cardozo que exprimem noções relacionadas com o plano do ar. RESOLUÇÃO: As imagens aéreas, na primeira estrofe do poema de Cecília Meireles, são “linha alada” e “pássaro da água”; na primeira estrofe do poema de Joaquim Cardozo, são “curvas aéreas”, “voo abandonado” e “ asas de um pássaro”.
O que me encanta é a linha alada das tuas espáduas, e a curva que descreves, pássaro da água! É a tua fina, ágil cintura, e esse adeus da tua garganta para cemitérios de espuma!
É a despedida, que me encanta, quando te desprendes ao vento, fiel à queda, rápida e branda. E apenas por estar prevendo, longe, na eternidade da água, sobreviver teu movimento... (Cecília Meireles, “Jogos Olímpicos”, in Poesias Completas de Cecília Meireles – vol. IV. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1973, p. 44.)
O SALTO TRIPARTIDO
Havia um arco projetado no solo Para ser recomposto em três curvas aéreas, Havia um voo abandonado no chão À espera das asas de um pássaro; Havia três pontos incertos na pista Que seriam contatos de pés instantâneos. Três jatos de fonte, contudo, ainda secos, Três impulsos plantados querendo nascer. Era tudo assim expectativo e plano Tudo além somente perspectivo e inerte; Quando Ademar Ferreira, com perfeição olímpica, Executou, em relevo, o mais alto, — Em notas de arpejo — Em ritmo iâmbico O tripartido salto. (Joaquim Cardozo, Poesias Completas. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1971, p. 108.) 1. (VUNESP-SP) – Embora a natação seja um esporte da água e o salto tríplice um esporte do solo, envolvem também manobras no plano do ar (o salto de partida, na natação, e os três saltos seguidos, no salto tríplice), o que permite entender, nos poemas apresentados, a utilização de imagens que podem ser consideradas “aéreas”. Aponte duas palavras ou expressões da primeira estrofe (primeiros três versos) do poema de
48 –
2. (VUNESP-SP) – Os dois poemas divergem no que diz respeito ao ponto de vista utilizado pelo eu poemático para focalizar o tema. No poema de Joaquim Cardozo, as formas verbais surgem na terceira pessoa, o que cria um distanciamento entre o eu poemático e o evento narrado liricamente. Já no poema de Cecília Meireles, o eu poemático assume a primeira pessoa do singular. Aponte o efeito, em termos narrativos, dessa escolha de Cecília. RESOLUÇÃO: Admitindo-se que também no poema de Cecília Meireles se trate de narrativ a — como propõ e a questão —, a escolha da primeira pesso a intensifica a carga lírica texto por uma presença, e mesmo a participação , do do narrador — oimplicar eu lírico — na maior narrativa, pois em todas as estrofes há envolvimento entre a primeira e a segunda pessoa. Diferentemente do poema de Joaquim Cardozo, que celebra apenas a proeza do atleta, no de Cecília a beleza da performance do nadador celebrado é apresentada através das, e de permeio com, as emoções do eu lírico.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 49
3. (VUNESP-SP) – A abordagem da natação e do salto tríplice nos poemas apresentados se faz por meio de imagens e metáforas que nos apresentam de modo lírico os aspectos objetivos dos esportes focalizados. Com base nesse comentário, esclareça o que quer dizer o eu poemático no poema de Joaquim Cardozo, ao dizer que na pista havia “três pontos incertos”, “três jatos de fonte ainda secos” e “três impulsos plantados querendo nascer”. RESOLUÇÃO: As três imagens em questão descrevem as três etapas do salto como se fossem potencialidades à disposição ou à espera do grande atleta capaz de realizá-las, de levá-las à efetivação. Portanto, o feito do herói celebrado consistiria em explorar e tornar efetivas algumas virtualidades extremas da realidade, virtualidades que sem ele não chegariam à realização.
Porém o coração, feito valente Na escola da tortura repetida, E no uso do penar tornado crente, Respondeu: Desta altura vejo o Amor! Viver não foi em vão, se é isto a vida, Nem foi demais o desengano e a dor. (Antero de Quental, Os Sonetos Completos de Antero de Quental. Porto, Livraria Portuense de Lopes, 1886, p. 119; primeira edição, disponível na internet em: http://purl.pt/122/1/P160.html.) 1 – Solemnia verba: palavras solenes.
4. – de Os vista dois distintos, textos apresentados (VUNESP-SP) expressar, sob pontos a decepção identificam-se e o pessimismopor do homem com relação à vida e ao mundo. Diferenciam-se, todavia, na atitude final que apresentam ante essa decepção. Releia-os, atentamente, e explique essa diferença de atitude.
As questões de números 4 a 7 baseiam-se numa fala de personagem de uma peça de Millôr Fernandes (1923) e num soneto de Antero de Quental (1842-1891). ATRIZ (Rindo forçosamente depois que os atores saem.)
Tem gente que continua achando que a vida é uma piada. Ainda bem que tem gente que pensa que a vida é uma piada. Pior é a gente que pensa que o homem é o rei da criação. Rei da criação, eu, hein? Um assassino nato, usufruidor da miséria geral — se você come, alguém está deixando de comer, a comida não dá para todos, não — de que é que ele se ri? De que se ri a hiena? Se não for atropelado ficará no desemprego, se não ficar desempregado vai pegar um enfisema, será abandonado pela mulher que ama — mas ama, hein? —, arrebentado pelos filhos — pelos pais, se for filho —, mordido de cobra ou ficará impotente. E se escapar de tudo ficará velho, senil, babando num asilo. Piada, é? Pode ser que haja vida inteligente em outro planeta, neste, positivamente, não. O homem é o câncer da Terra. Estou me repetindo? Pois é: corrompe a natureza, fura túneis, empesta o ar, emporcalha as águas, apodrece tudo onde pisa. Fique tranquilo, amigo: o desaparecimento do ser humano não fará a mínima diferença à economia do cosmos. (Millôr Fernandes, Computa, Computador, Computa. 3.a ed. Rio de Janeiro, Nórdica, 1972, p. 85.) SOLEMNIA VERBA1
RESOLUÇÃO: No primeiro texto, Millôr Fernandes expressa uma atitude niilista, pois conclui que a espécie humana, extremamente agressiva, canalha e miserável, “não fará a mínima diferença à economia do cosmos” quando desaparecer. No segundo texto, Antero de Quental exprime uma postura orientada pela esperança, pois acredita que a dor constante da vida e a devastação gerada pelo homem são compensadas pela perspectiva final da existência, da qual se divisa o grande ideal do Amor.
5. (VUNESP-SP) – O soneto “Solemnia Verba” desenvolve-se como um diálogo entre duas personagens: o eu poemático e seu “coração”. O que simboliza, no poema, a personagem “coração”? RESOLUÇÃO: Em “Solemnia Verba”, o “coração” tem a função de servir como contraponto ao desencanto amargo do eu lírico. É, portanto, símbolo forte da esperança no amo r — o Amor mai usculiza do e entendido como força universal e esteio da existência, que consegue sobreviver até mesmo às situações mais inóspitas.
Disse ao meu coração: Olha por quantos Caminhos vãos andamos! Considera Agora, desta altura fria e austera, Os ermos que regaram nossos prantos... Pó e cinzas, onde houve flor e encantos! E noite, onde foi luz de primavera! Olha a teus pés o mundo e desespera, Semeador de sombras e quebrantos! — – 49
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 50
6. (VUNESP-SP) – Se um estudante emprega, numa dissertação, o verbo ter no sentido de “existir”, numa frase como “Tem muitos alunos na escola”, é penalizado na correção pelo professor, que recomenda nesse caso o emprego do verbo haver. O mesmo professor considerará perfeitamente normal que a personagem feminina da peça de Millôr Fernandes empregue, por duas vezes: “Tem gente”. Justifique por que essas atitudes do professor não são contraditórias. P O R T U G U Ê S A – 3 a S
RESOLUÇÃO: As atitudes do professor não são contraditórias, pois se referem a contextos linguísticos diferentes. Quando, numa dissertação ou outro trabalho escolar, o professor condena o emprego do verboter no lugar de haver, ele está chamando a atenção do aluno para o fato de que o uso de ter, no sentido de “existir”, é popular e coloquial, só devendo ocorrer com propriedade em situações informais. Portanto, é perfeitamente aceitável, num contexto como o da peça teatral de Millôr Fernandes, que a personagem empregue a variante popular, porque esta condiz com o ambiente e a situação representados.
MÓDULO
7. (VUNESP-SP) – Ao focalizar as ações dos homens na Terra, a personagem da peça de Millôr Fernandes conclui: “Pode ser que haja vida inteligente em outro planeta, neste, positivamente, não.” Explique o que quer dizer a personagem, com essa afirmação, sobre a natureza do ser humano. RESOLUÇÃO: Ao afirmar que não há vida inteligente neste planeta, a personagem de Millôr Fernandes permite que se infira que o Homem é um ser tolo. Segundo ela, o ser humano — assassino, explorador, massacrado pelo sistema social , pela família e pelas próprias forças bioló gicas — erra grosseiramente ao se considerar “o rei da criação”.
Redação e Morfologia (I)
1. (FUVEST-SP) – Observe este anúncio.
a) Na composição do anúncio, qual é a relação de sentido existente entre a imagem e o trecho “quem é e o que pensa”, que faz parte da mensagem verbal? RESOLUÇÃO: A imagem apresenta um rosto alegre que se forma a partir de linhas da impressão digital em que se inscreve, como a sugerir a definição do sujeito e do objeto representados linguisticamente pelos pronomes indefini dos/interrogativos quem e que. Em outras palavras, a imagem promete a resposta às interrogações introduzidas por aqueles pronomes, pois o rosto que se forma com as linhas da impressão digital sugere a identificação do sujeito pelo qual se pergunta, assim c omo daquilo que ele pensa, uma vez que o rosto é representado com uma expressão denunciadora de seu estado de espírito.
(Folha de S. Paulo, 26/09/2008. Adaptado.)
50 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 51
b) Se os sujeitos dos verbos “descubra” e “pensa” estivessem no plural, como deveria ser redigida a frase utilizada no anúncio?
b) Qual a posição de Tolstói, quando analisa comparativamente ciência e ética?
RESOLUÇÃO: Descubram quem são e o que pensam os moradores de São Paulo.
RESOLUÇÃO: Tolstói considera que a ciência gera conhecimento, mas não gera valores. Estes dependem de “tradições, afetos e sentimentos” e são decisivos na orientação de nossas vidas. Portanto, as normas éticas que funcionem como reguladoras do exercício da ciência (e do emprego da tecnologia por ela gerada) devem ser buscadas fora da ciência. S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
2. (UNIFESP) – Leia o texto e responda.
No tocante à relação entre a ética, a ciência e a tecnologia, duas são as dificuldades. Do lado da ética, a dificuldade é ela gerar uma moral conforme as necessidades da ciência e da tecnologia, na medida em que toda ética implica sanções e interdições, e a ciência e a tecnologia si mesmas, em sua interna, não estão, de saída, dispostas aem aceitar proibições e alógica sacrificar a liberdade de conhecer e de engenhar. Do lado da ciência e da tecno logia, a dificuldade, como viu Tolstói a respeito da primeira, é que elas são impotentes para gerar valores, os quais deverão ser buscados e gerados alhures, em outras esferas da sociedade e da cultura. Não bastasse, ao contrário do que imaginava Bacon, que acreditava que o conhecimento, ou melhor, a ciência, além de gerar a técnica, deveria ser a norma da ação moral, a ciência e a tecnologia não têm a capacidade de instaurar tal norma, haja vista sua incapacidade de responder às duas questões que, segundo Tolstói, mais interessam em nos sas vidas: o que devemos fazer e como devemos viver? — talvez porque essas questões não tenham a ver com fatos, mas com valores, e os valores são algo mais do que uma cognição, dependendo de tradições, afetos e sentimentos. Daí não ser nada fácil a tarefa de ajustar a ética, a ciência e a tecnologia. Daí nosso temor de a grande e insistente reivindicação de mais ética, de pôr ética em tudo, gerar uma enorme e irremediável frustração. (Revista Kriterion, vol. 45, n.º 109, Belo Horizonte, Jan/Jun 2004.)
3. (UNICAMP-2010) – A propaganda abaixo explora a expressão idiomática ‘não leve gato por lebre’ para construir a imagem de seu produto:
NÃO LEVE GATO POR LEBRE SÓ BOM BRIL É BOM BRIL a) Explique a expressão idiomática por meio de duas paráfrases.
a) De que tipo de argumento se vale o autor para fun damentar seu ponto de vista? RESOLUÇÃO: A pergunta é vaga, pois não é claro o sentido da expressão “tipo de argumento”. Os argumentos podem ser classificados de muitas maneiras, conforme tipologias diversas. Portanto, os candidados ficam sem saber o que de fato se pede numa questão formulada tão imprecisamente. O que se pode responder, tentando-se adivinhar a intenção do examinador, é que o autor argumenta de formadialética, pois contrapõe perspectivas opostas (de um lado a ética, do outro a ciência e a tecnologia) e também recorre a argumentos de autoridade (ao invocar Tolstói e Bacon).
RESOLUÇÃO: “Não aceite um produto inferior em lugar do superior.” “Não se deixe enganar por produtos falsificados.” A resposta admite várias possibilidades de redação.
b) Mostre como a dupla ocorrência de BOM BRIL no slogan ‘SÓ BOM BRIL É BOM BRIL’, aliada à expressão idiomática, constrói a imagem do produto anunciado. RESOLUÇÃO: A tautologia “Só Bom Bril é Bom Bril” corres ponde à atribuição de uma qualidade única a um produto único. Todos os demais, ainda que apa rentemente similares, seriam meros “gatos” que rendo passar por “lebres”. Na primeira ocorrência, “Bom Bril” é nome próprio e significa “palha de aço”, ou seja, usa-se a marca pelo produto, o que configura uma meto nímia.
– 51
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 52
4. (FUVEST) – Examine a tirinha e responda ao que se pede.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
5. (FUVEST) – Leia a seguinte fala, extraída de uma peça teatral, e responda ao que se pede. Odorico — Povo sucupirano! Agoramente já investido no cargo de Prefeito, aqui estou para receber a confirmação, ratificação, a autenticação e, por que não dizer, a sagração do povo que me elegeu. (Dias Gomes, O Bem-Amado: farsa sociopolítico-patológica em 9 quadros) a) A linguagem utilizada por Odorico produ z efeitos humorísticos. Aponte um exemplo que comprove essa afirmação. Justifique sua escolha. (Quino, Mafalda 2. São Paulo: Martins Fontes, 2002.) a) O sentido do texto se faz com base na polissemia de uma palavra. Identifique essa palavra e explique por que a indicou. RESOLUÇÃO: Trata-se da palavraveículo, que pode significar (1) “qualquer meio usado para transportar ou conduzir pessoas, animais ou coisas, de um lugar para outro” ou (2) “qualquer coisa capaz de transmitir, propagar, difundir
RESOLUÇÃO: O emprego do neologismoagoramente produz efeito humorístico, já que, ao acrescentar o sufixo -mente ao vocábulo agora, Odorico cria outro advérbio, com a intenção de reforçar o tom persuasivo de seu discurso pretensamente solene. Outro exemplo pertinente seria a produção de eco por meio da repetição do sufixo -ção presente na enumeração “confirmação, satisfação, a autenticação e (…) a sagração”.
algo”. Na expressão “veículo de está cultura”, sentido toma de veículo é, claramente, (2). O humor da tirinha em queoMafalda a palavra no seu sentido (1).
b) O que leva Odorico a empregar a expressão “por que não dizer”, para introduzir o substantivo “sagração”?
b) A tirinha visa produzir não só efeito humorístico mas também efeito crítico. Você concorda com essa afirmação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: O sentido crítico depreensível da tirinha provém da associação entre os ruídosdaemanados do teleeviasor, sugerem não o conteúdo violento e “ape lativo” programação, ideiaque de cultura, no sentido antropológico da palavra (“conjunto de padrões de comportamento, crenças, conheci mentos, costumes etc. que distinguem um grupo social”), mas como sinônimo de “ilustração”, “cabedal de conhecimentos”. Longe de ser “veículo de cultura”, a televisão seria – sugere a tirinha – um veículo de barbárie.
52 –
RESOLUÇÃO: O substantivo sagração pode ser entendido como “ato ou efeito de sagrar rei, bispo etc. em cerimônia religiosa”. Ao empregar a expressão “por que não dizer” para introduzir tal substantivo, Odorico inten sifica a expressão de sua pretensão de homem público que se julga digno de receber todas as honras de seu povo.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 53
6. (UNIFESP) – Leia a charge.
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
b) Reescreva as falas das personagens, valendo-se da norma padrão da Língua Portuguesa. (www.chargeonline.com.br. Adaptado.) a) As personagens são vítimas de preconceitos e os expressam em suas falas. Explique quais são eles.
RESOLUÇÃO: Para prender ricos, a polícia cria nomes muito belos — não é verdade? Quando se trata de nós, o nome que dão é mesmo “operação tapa na orelha”.
RESOLUÇÃO: Segundo as personagens, a polícia trata pobres e ricos de maneiras diferentes. Para os pobres, como eles, não se usam os nomes pomposos das “operações” voltadas para ricos. Além disso, como in dicam os desenhos e o próprio nome da “operação” destinada aos pobres, estes são também vítimas de maus-tratos.
MÓDULO
Redação e Morfologia (II)
1. (UNICAMP-2010) – “Os turistas que visitam as favelas do Rio se dizem transformados, capazes de dar valor ao que realmente importa”, observa a socióloga Bianca Freire-Medeiros, autora da pesquisa “Para ver os pobres: a construção da favela carioca como destino turístico”. “Ao mesmo tempo, as vantagens, os confortos e os benefícios do lar são reforçados por meio da exposição à diferença e à escassez. Em um interessante paradoxo, o contato em primeira mão com aqueles a quem vários bens de consumo ainda são inacessíveis garante aos turistas seu aperfeiçoamento como consumidores.” No geral, o turista é visto como rude, grosseiro, invasivo, pouco interessado na vida da comunidade, preferindo visitar o espaço como se visita um zoológico e decidido a gastar o mínimo e levar o máximo. Conforme relata um guia, “O turismo na favela é um pouco invasivo, sabe? Porque você anda naquelas ruelas apertadas e as pessoas deixam as janelas abertas. E tem turista que não tem ‘desconfiômetro’: mete o carão dentro da casa das pessoas! Isso é realmente
a) Explique o que o autor identifica como “um interessante paradoxo”. RESOLUÇÃO: O “interessante paradoxo” consiste no fato de o contacto com a escassez, a precariedade e a pobreza não despertar nos turistas uma atitude crítica — ou melhor, autocrítica — em relação ao seu próprio consumismo, excessivo e superficial como todo consumismo. Ao contrário, tal contacto com os favelados produziu neles o seu “aperfeiçoamento como consumidores”, ou seja, reforçou o seu consumismo sem sequer colocá-lo em questão.
desagradável. Já aconteceu com outro guia. A moradora estava cozinhando e o fogão dela era do lado da janelinha; o turista passou, meteu a mão pela janela e abriu a tampa da panela. Ela ficou uma fera. Aí bateu na mão dele.” (Adaptado de Carlos Haag, Laje cheia de turista. Como funcionam os tours pelas favelas cariocas. Pesquisa FAPESP no. 165, 2009, p.90-93.)
– 53
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 54
b) O trecho em itálico, que reproduz em discurso direto a fala do guia, contém marcas típicas da linguagem coloquial oral. Reescreva a passagem em discurso indireto, adequando-a à linguagem escrita formal.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
RESOLUÇÃO: O guia relata que o turismo na favela tem um aspecto invasivo. Justifica informando que lá se anda em ruas apertadas e que as pessoas mantêm as janelas abertas, acrescentando que turistas insensíveis olham sem pudor para dentro das casas, criando situações desagradáveis, como a ocorrida com outro guia. Contou que uma mo radora cozinhava em seu fogão contíguo à janela e que um turista que passava chegou a enfiar a mão e destampar a panela, enfurecendo a mulher, que lhe golpeou o braço. Outra possibilidade de resposta dada pela Unicamp: O guia afirmou que o turismo na favela é um pouco invasivo. Anda-se em ruelas apertadas nas quais as janelas abertas expõem os moradores a turistas inconvenientes, que invadem a privacidade alheia, gerando mal-estar. A propósito, o guia
b) Indique uma cara cterística atribuída pela propag anda ao produto anunciado. Justifique. RESOLUÇÃO: O produto anunciado — um jornal — é apre sentado como avançado, ou seja, “muito moderno, inovador, que foge ao convencional e se alinha com o que há de mais arrojado”.
relatou o que foi presenciado pormão umpela colega de trabalho durante umaa visita: um turista introduziu sua janela de uma casa e abriu tampa da panela de uma moradora que cozinhava no momento. Irritada, a moradora o repreendeu com um tapa em sua mão.
2. (UNICAMP-2010) – Nessa propaganda, há uma interessante articulação entre palavras e imagens.
3. (FUVEST) (...) Num tempo Página infeliz da nossa história Passagem desbotada na memória Das nossas novas gerações Dormia A nossa pátria mãe tão distraída Sem perceber que era subtraída Em tenebrosas transações (...). (Chico Buarque e Francis Hime, Vai passar.) a) É correto afirmar que o verbo dormia tem uma conotação positiva, tendo em vista o contexto em que ele ocorre? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não. Do contexto depreende-se que a pátria encontrava-se em uma situação letárgica diante das “subtrações” ou “tenebrosas transações” de que era vítima.
Retirada de www.diariodapropaganda.blogspot.com a) Explique como as imagens ajudam a estabelecer as relações metafóricas no enunciado “Mesmo que o globo fosse quadrado, O GLOBO seria avançado”. RESOLUÇÃO: O anúncio joga com a antítese entre quadrado e avançado, significando a primeira palavra, em seu uso figurado, coloquial e informal, “pessoa antiquada, retrógrada, de mentalidade pouco evoluída”. Assim, a oposição entre as imagens do quadrado e do globo — ou, mais precisamente, do cubo e da esfera — funcionam como equivalentes de “antiquado” e “avançado”.
54 –
b) Identifique, nos três últimos versos, um recurso expressivo sonoro e indique o efeito de sentido que ele produz. (Não considere a rima distraída/subtraída.) RESOLUÇÃO: O “recurso expressivo sonoro” está na passagem “tenebrosas transações”. A aliteração da consoante linguodental surda t dá relevo à expressão e reforça a sugestão de soturnidade que a reveste.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 55
4. (FUVEST-2010) – Leia este texto.
b) Na segunda estrofe, substitua a palavra “viu” por outra que cumpra a mesma função comunicativa que ela tem no texto.
O ano nem sempre foi como nós o conhecemos agora. Por exemplo: no antigo calendário romano, abril era o segundo mês do ano. E na França, até meados do século XVI, abril era o primeiro mês. Como havia o hábito de dar presentes no começo de cada ano, o primeiro dia de abril era, para os franceses da época, o que o Natal é para nós hoje, um dia de alegrias, salvo para quem ganhava meias ou uma água-de-colônia barata. Com a introdução do calendário gregoriano, no século XVI, primeiro de janeiro passou a ser o primeiro dia do ano e, portanto, o dia dos presentes. E primeiro de abril passou a ser um falso Natal – o dia de não se ganhar mais nada. Por extensão, o dia de ser iludido. Por extensão, o Dia da Mentira. (Luis F. Verissimo,As mentiras que os homens contam. Adaptado.)
RESOLUÇÃO: O verbo ver, neste contexto, funciona apenas para chamar a atenção do ouvinte, na tentativa de manter a comunicação; por isso, tem função fática e pode ser substituído por outros marcadores conversacionais, como olhe, né, tá.
a) Tendo em vista o contexto, é correto afirmar que o trecho “meias ou uma água-de-colônia barata” deve ser entendido apenas em seu sentido literal? Justifique sua resposta.
RESOLUÇÃO: Além de rima e ritmo, a canção apre senta figuras de linguagem, como comparação (apontada na alternativa a), metáfora para o renascimento da vegetação (em “Quando o verde dos teus olhos / se espalhar na plantação”) e metonímia em “meu coração” (em que coração simboliza a amada).
RESOLUÇÃO: Não, ambas devem ser entendidas em se ntido figurado, pois conotam, por similaridade, objetos de pouco valor.
b) Crie uma frase que contenha um sinônimo da palavra “salvo” (L. 4), mantendo o sentido que ela tem no texto. RESOLUÇÃO: Empregada no texto como preposição, a palavra salvo significa “exceto, com exceção de”, como em: “Todos chegaram, exceto os noivos.”
c) Nessas estrofes, os únicos recursos poéticos utilizados são rima e ritmo? Justifique sua resposta.
6. (FUVEST) – Leia o seguinte texto: Os irmãos Villas Bôas não conseguiram criar, como queriam, outros parques indígenas em outras áreas. Mas o que criaram dura até hoje, neste país juncado de ruínas novas. a) Identifique o recurso expressivo de natureza semântica presente na expressão "ruínas novas".
5. (FUVEST-2010) – Leia estas duas estrofes da conhecida canção “Asa-Branca”, de Luís Gonzaga e Humberto Teixeira.
Quando olhei a terra ardendo Qual fogueira de São João, Eu perguntei a Deus do céu, ai Por que tamanha judiação. .......................................... Quando o verde dos teus olhos se espalhar na plantação, eu te asseguro, não chores não, viu, eu voltarei, viu, meu coração. a) Indique uma palavra ou expressão que possa substituir “Qual” (primeira estrofe), sem alterar o sentido do texto. RESOLUÇÃO: A conjunção comparativa qual pode ser substituída, sem alteração de sentido, por como ou pelos coloquialismos que nem, feito, igual.
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
RESOLUÇÃO: A expressão "ruínas novas" parece conter um paradoxo – ou, em outros termos, parece confirmar um oxímoro. Com efeito, ruínas é palavra que conota "antiguidade" ou, em outro registro, "velharia", o oposto do adjetivo nova. O oxímoro consiste, justamente, na relação contraditória entre palavras de sentido antitético ou conflitivo. Porém, a expressão pode ser entendida de outra forma, literal, pois uma ruína pode ser recente, nova, como foram as ruínas de Troia logo após a destruição da cidade pelos gregos e como são tantos prédios que embrutecem uma cidade como São Paulo.
b) Que prática brasileira é criticada no trecho "país juncado (= coberto) de ruínas novas"? RESOLUÇÃO: Critica-se, no texto, a incúria brasileira que não conserva o patrimônio material do país (edificações, monumentos, cidades inteiras) nem suas instituições.
– 55
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 56
MÓDULO
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Redação e Morfologia (III)
1. (FUVEST) – Conta-me Claúdio Mello e Souza. Estando em um café de Lisboa a conversar com dois amigos brasileiros, foram eles interrompidos pelo garçom, que perguntou, intrigado: — Que raio de língua é essa que estão aí a falar, que eu percebo (*) tudo? ______________________ (*) percebo = compreendo (Rubem Braga)
RESOLUÇÃO: O verbo acompanhar é responsável pelo efeito de humor, pois pode ser entendido de duas maneiras: o guarda o utilizou com o sentido de “ir junto”; já o músico ambulante, com o sentido de “tocar junto”.
a) A graça da fala do garçom reside num paradoxo. Des taque dessa fala as expressões que constituem esse paradoxo. Justifique. RESOLUÇÃO: As expressões são: “– Que raio de língua é essa... que eu percebo tudo?”. A interrogação “Que raio de língua é essa” indica que a personagem não entende a afirmação do interlocutor. Já a expressão “que eu percebo tudo” indica que ele compreende inteiramente o que lhe está sendo dito.
b) Reescreva o diálogo que compõe o texto, usando o discurso indireto. Comece com: O fiscal do “rapa” perguntou ao músico ... RESOLUÇÃO: O fiscal do “rapa” perguntou ao músico se ele tinha licença. O músico respondeu negativamente ao policial. Então, o policial pediu ao músico que o acompanhasse. O músico ambulante respondeu afirmativamente e perguntou que música o policial iria cantar.
b) Transponha a fala do garçom para o discurso indireto. Comece com: O garçom lhes perguntou, intrigado, que raio de língua.... RESOLUÇÃO: “... era aquela que estavam então a falar, que ele percebia tudo”.
2. (FUVEST-2010) – Leia o seguinte texto:
Um músico ambulante toca sua sanfoninha no viaduto do Chá, em São Paulo. Chega o “rapa”* e o interrompe: — Você tem licença? — Não, senhor. — Então me acompanhe. — Sim, senhor. E que música o senhor vai cantar? *rapa: carro de prefeitura municipal que conduz fiscais e policiais para apreender mercadorias de vendedores ambulantes não licenciados. Por extensão, o fiscal ou o policial do rapa. a) Para o efeito de humor dessa anedota, contribui, de maneira decisiva, um dos verbos do texto. De que verbo se trata? Justifique sua resposta.
56 –
3. (FUVEST) – Os trechos abaixo encontram-se em discurso indireto e discurso direto, respectivamente. Transforme em discurso direto o primeiro trecho e, em discurso indireto, o segundo. I. “(...) um cangaceiro encontrou uma Kodak e entregou ao chefe, que perguntou a quem ela pertencia.” II. “Quero que o senhor tire o meu retrato”, disparou o “rei do cangaço” (...). RESOLUÇÃO: I. … um cangaceiro encontrou uma Kodak e entregou ao chefe, que perguntou: – A quem ela pertence? II. O “rei do cangaço” disparou (disse) que queria que o homem tirasse o seu retrato.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 57
4. (FUVEST) Diálogo ultrarrápido — Eu queria propor-lhe uma troca de ideias ... — Deus me livre! (Mário Quintana) No diálogo acima, a personagem que responde: — Deus me livre! cria um efeito de humor com o sentido implícito de sua frase fulminante. a) Continue a frase — Deus me livre!, de modo que a personagem explicite o que estava implícito nessa frase. RESOLUÇÃO: Deus me livre de trocar minhas ideias pelas suas.
— O que quero dizer, senhor, é... o que é um presente de desaniversário? — Um presente oferecido quando não é seu aniversário, naturalmente. (...). Bem, isso demonstra que há trezentos e sessenta e quatro dias por ano em que você pode receber presentes de desaniversário. — Certamente — concordou Alice. — E somente um em que você consegue receber presentes de aniversário, percebe? Esta é que é a glória! (CARROLL, Lewis. Alice no país do espelho. Porto Alegre: L&PM, 2004. p. 115-117.) 5. (UEG) – Os quadrinhos e o texto acima apresentam palavras não dicionarizadas, mas que podem ser facilmente compreendidas por
b) Transforme o diálogo acima em um único período, utilizando apenas o discurso indireto e conservando o sentido do texto. RESOLUÇÃO: Disse-lhe que queria propor-lhe uma troca de ideias, ao que ele respondeu (pediu) que Deus o livrasse (daquilo).
qualquer falante português. Transcreva essasexemplos palavras edaexplique seu processo de de formação a partir de outros língua portuguesa. RESOLUÇÃO: As palavras são "sobremesariano" e "desaniversário". A primeira é formada a partir do processo morfológico de sufixaçãosobremesa ( + iano), como acontece em "vegetariano" (vegetal + iano). A segunda é formada pelo processo de prefixação ( des + aniversário), como em "desculpar" ( des + culpar), por exemplo.
Leia os quadrinhos e o texto para responder às questões 5 e 6.
6. (UEG) – Reescreva os dois primeiros quadrinhos da tirinha e as duas primeiras falas do texto, passando-os para o discurso indireto. RESOLUÇÃO: Reescrita dos dois primeiros quadrinhos: Calvin perguntou à sua mãe o que era aquilo e disse que lhe parecia horrível. A mãe de Calvin respondeu que era comida vegetariana e que era bom para ele. Reescrita das duas primeiras falas do texto: Humpty Dumpty exclamou que haviam dado a ele aquela bela gravata como um presente de desaniversário. Alice, sentindo-se muito confusa, pediu a Humpty Dumpty que a perdoasse.
(WATTERSON, Bill. Calvin e Haroldo. Disponível em: . Acesso em: 6 abr. 2009.)
— Deram-me esta bela gravata... como um presente de desaniversário! — Por favor, me perdoe... — disse Alice, muito confusa. — Não estou ofendido, e você não precisa se desculpar — disse Humpty Dumpty.
– 57
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 58
Redação e Morfologia (IV)
MÓDULO
1. (FUVEST-2010) – Leia o seguinte excerto de um artigo sobre o teólogo João Calvino. P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Foi preciso o destemor conceitual de um teólogo exigente feito ele para dar o passo racional necessário. Ousou: para salvar a onipotência de Deus, não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina. Antônio Flávio Pierucci, Folha de S. Paulo, 12/7/2009.
b) O exagero que o autor vê no emprego da palavra “delivery” se aplicaria também a “telepizza”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “Telepizza” é um neologismo formado com um empréstimo linguístico já há muito incorporado ao português (italianopizza) e o prefixo (grego)tele, corrente na língua. Portanto, não se trata do mesmo fenômeno de “capitulação” que se vê em delivery, pois aqui se substituiu uma palavra corrente na língua (“entrega”) por um es trangeirismo da moda.
a) O excerto está redigido em lin guagem que apresenta traços de informalidade. RESOLUÇÃO: Identifique dois exemplos dessa informalidade. São coloquialismos empregados no texto: “feito”, por como; “não dá”, por não é possível, e “um quê”, por algo ou uma pequena parcela.
b) Mantendo o seu sentido, reescreva o trecho “não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina”, sem empregar duas vezes a palavra “não”. RESOLUÇÃO: Não é possível deixar de sacrificar algo da bon dade divina.
Texto para a questão 2.
CAPITULAÇÃO Delivery Até pra telepizza É um exagero. Há quem negue? Um povo com vergonha Da própria língua Já está entregue. (Luis Fernando Verissimo) 2. (FUVEST) a) O título dado pelo autor está adequado, tendo em vista o conteúdo do poema? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: O título “Capitulação” é inteiramente adequado ao conteúdo do poema, que se refere à “invasão” de anglicismos (americanismos) na língua portuguesa corrente no Brasil.
3. (UNICAMP) – Jogos de imagens e palavras são característicos da linguagem de história em quadrinhos. Alguns desses jogos podem remeter a domínios específicos da linguagem a que temos acesso em nosso cotidiano, tais como a linguagem dos médicos, a linguagem dos economistas, a linguagem dos locutores de futebol, a linguagem dos surfistas, dentre outras. É o que ocorre na tira de Laerte, acima apresentada. a) Transcreva as passagens da tira que remetem a domínios específicos e explicite que domínios são esses. RESOLUÇÃO: As passagens são “perda total”, “reconstruíram meu corpo a partir do DNA” por e “molar cariado”. O primeiro segmento refere-se usada companhias de seguros, o segundo, à bioge nética, eàolinguagem terceiro, à odontologia.
58 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 59
b) Levando em consideração as relações entre ima gens e palavras, identifique um momento de humor na tira e explique como é produ zido. RESOLUÇÃO: O momento de humor instaura-se no último quadrinho, em que se estabelece uma relação de semelhança entre cárie e pedaços que faltam no corpo da personagem.
b) O trecho da resposta de Para ná: “...‘Le’ chamei e ‘le’ cha mo de novo ...” chama a atenção do leitor para a sintaxe da língua. Explique. RESOLUÇÃO: O le da fala de Paraná é uma variante (corruptela) do pronome lhe, adequadamente empregado com o verbo chamar no sentido de “qualifi car, tachar”. A construção admitiria também o objeto direto, que corresponderia, no caso, ao pronome o: chamei-o/lhe (de) veado. S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Texto para a questão 4.
Foi no tempo em que a Bandeirantes recém-inaugurara suas novas instalações no Morumbi. Não havia transporte público até o nosso local de trabalho, e a direção da casa organizou um serviço com viaturas próprias. (...) Paraná era um dos motoristas. (...) Numa das subidas para o Morumbi “fechou” sem nenhuma maldade um automóvel. O cidadão que o dirigia estava com os filhos, era diretor do São Paulo F.C., e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura. Logo depois que a perua chegou ao Morumbi, todo mundo de ponto batido, o automóvel para em frente da porta dos funcionários, e o seu condutor desce bufando: “Onde está o motorista dessa perua? (e lá vinha chegando o Paraná). Você me ofendeu na frente dos meus filhos. Não tem o direito de agir dessa forma, me chamar do nome que me chamou. Vou falar ao João Saad, que é meu amigo!” E o Paraná, já fuzilando, dedo em riste, tonitruou em seu sotaque mais que explícito: “Le” chamei e “le” chamo de novo... veado ... veado ... Não houve reação da parte ofendida. (ARAÚJO, Flávio. O rádio, o futebol e a vida. São Paulo: Editora Senac, 2001. pp. 50-1.) 4. (UNICAMP) a) Na sequência: “(...) e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura”, se trocarmos o ponto final que aparece depois de ‘Paraná’ por uma vírgula, ocorrem mudanças na leitura? Justifique.
c) Substitua tonitruou por outra palavra ou expressão. RESOLUÇÃO: Vociferou, gritou, clamou em altos brados, ou, em sentido figurado,trovejou.
5. (UNICAMP) – Em transmissão de um jornal noturno televisivo (RedeTV, 7/10/2008), um jornalista afirmou: “Não há uma só medida que o governo possa tomar.” a) Considerando que há duas possibilidades de interpretação do enunciado acima, construa uma paráfrase para cada sentido possível de modo a explicitá-los. RESOLUÇÃO: As duas possibilidades de paráfrase são: 1) Não existe uma única medida que o gove rno possa tomar, ou seja, o governo não poderá tomar nenhuma medida. 2) Não existe somente uma medida que o governo possa tomar, ou seja, há várias medidas que o governo poderia tomar.
RESOLUÇÃO: A vírgula, no caso, seria mais adequada que o ponto final, pois na verdade não ocorre o encerramento do período, visto que a última palavra da frase limitada pelo ponto (Paraná) é retomada pelo pronome relativo que, introdutor de uma oração adjetiva explicativa subordinada à oração anterior.
– 59
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 60
b) Compare o enunciado citado com: Não há uma medida que só o governo possa tomar . O termo ‘só’ tem papel fundamental na interpretação de um e outro enunciado. Descreva como funciona o termo em cada um dos enunciados. Explique.
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
RESOLUÇÃO: Em “Não há uma só medida que o governo possa tomar”, o adjetivo só tanto pode significar “única” quanto valer pelo advérbio apenas. Por isso, a frase pode significar que o governo não pode tomar nenhuma medida ou então que o governo tem a sua disposição diversas medidas. Quanto à frase “Não há uma medida que só o governo possa tomar”, nela o termo só significa somente ou sozinho, referindo-se a “governo”, e o sentido é que a medida não depende apenas do governo, não podendo ser tomada apenas por ele.
a) Há um duplo sentido trabalhado no poema. Em que palavra isso ocorre? RESOLUÇÃO: A ambiguidade ocorre na palavra “bandeira”.
b) Quais recursos linguísticos são utilizados na construção desse jogo de palavras? RESOLUÇÃO: O emprego de “nome” no início doverso provoca a ambiguidade, pois pode ser o sobrenome do poeta ou referir-se a um emblema, já que está em letra minúscula.
c) Que interpretação resulta desse jogo de palavra s? RESOLUÇÃO: O termo “bandeira” configura um metáfora que significa “modelo a ser imitado por um grupo”, no caso, os escritores.
Ontem, hoje, amanhã: a vida inteira Teu nome é para nós, Manuel, bandeira. (Carlos Drummond de Andrade) 6. (UNICAMP) – Levando em consideração o poema de Drummond, em que é feita uma homenagem a um poeta brasileiro, responda às seguintes questões:
Redação e Morfologia (V)
MÓDULO 1. (FUVEST) – Leia o seguinte texto:
VERÃO EXCESSIVO Eu sei que uma andorinha não faz verão, filosofou a andorinhade-barriga-branca. Está certo, mas agora nós somos tantas, no beiral, que faz um calor terrível, e eu não aguento mais! (Carlos Drummond de Andrade, Contos plausíveis) a) Com base na queixa da andorinha-de-barriga-branca, reformule o provérbio: “Uma andorinha não faz verão”. RESOLUÇÃO: Uma andorinha não faz verão; muitas, porém, produzem juntas um calor terrível.
60 –
b) Está adequado o emprego do verbo filosofou, tendo em vista que ele se refere ao provérbio citado no texto? Justifique sucintamente sua resposta. RESOLUÇÃO: O emprego do verbo filosofar se justifica por ter ele, no texto, o sentido coloquial de “meditar, raciocinar, formular uma reflexão de sentido geral” ou, para usar um brasileirismo, matutar. O provérbio citado exprime o conteúdo da reflexão da andorinha.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 61
2. (FUVEST) – Costuma-se exaltar a cabeça como fonte da razão e denunciar o coração como sede da insensatez, como músculo incapaz de ter autocrítica e de ser srcinal. Que seja assim. E daí? Nada pior do que uma ideia feita, mas nada melhor do que um sentimento usado. A cabeça pode gostar de novidade, mas o coração adora repetir o já provado. Se as ideias vivem da srcinalidade, os sentimentos gostam da redundância. Não é por acaso que o prazer procura repetição. (Zuenir Ventura,Crônicas de fim de século) a) Substitua a expressão “Que seja assim” por outra de sent ido equivalente, tendo em vista o contexto. RESOLUÇÃO: O sentido da frase “Que seja assim” equivale a “Admi tamos que isso seja verdade”, ou “Admitamos que essa ideia esteja correta”, ou “Mesmo que seja assim”.
Estanca ventura e voz Silêncio e desventura. Imóvel Garrote Algoz No corpo da tua água passará Tem passado Passa com a sua fina faca. (HILST, Hilda. “Da morte”. Odes mínimas. São Paulo: Globo, 2003. p. 72.) 3. (UNICAMP) a) Tendo em vista que esse poema faz parte de uma série intitulada “Tempo-morte”, indique associado de que maneira a primeira estrofe exprime certo sentido de absoluto ao título. RESOLUÇÃO: Na primeira estrofe, o verbo passar aparece no futuro do presente (Passará), pretérito perfeito composto do indicativo ( Tem passado) e presente do indicativo (Passa). O examinador quis que se relacionasse a abrangência do tempo (passado, presente e futuro) com certo sentido de absoluto associado ao título da série (“Tempo-morte”).
b) Explique por que o auto r considera que tanto a novidade quanto a redundância podem ser desejáveis. RESOLUÇÃO: A novidade é desejável no que se refere às ideias, pois lhes confere srcinalidade; a redundância, por sua vez, é desejável no âmbito dos sentimentos, pois estes tenderiam a reforçar-se ou a comprazer-se com a repetição. Nos termos do texto, “...o coração adora repetir o já provado.” e “...o prazer procura repetição”.
b) Nesse poema há pronomes de segunda e terceira pessoas. Transcreva uma estrofe em que constem ambas as pessoas pronominais e diga a que se referem. RESOLUÇÃO: Há pronomes de segunda e terceira pessoas na terceira e última estrofes. “Fecha feridas, é unguento. Mas pode abrir a tua mágoa Com a sua fina faca.” “No corpo da tua água passará Tem passado Passa com a sua fina faca.”
Considere o seguinte poema:
O pronome tua refere-se ao receptor (leitor) do texto; sua refere-se ao “Tempo-morte”.
Passará Tem passado Passa com a sua fina faca. Tem nome de ninguém. Não faz ruído. Não fala. Mas passa com a sua fina faca. Fecha feridas, é unguento. Mas pode abrir a tua mágoa Com a sua fina faca.
– 61
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 62
4. (FUVEST) I. Não deis aos cães o que é santo, nem atireis aos porcos as vossas pérolas (...). (Mateus, 7:6)
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
II. Você pode atirar pérolas aos porcos. Mas não adianta nada atirar pérolas aos gatos, aos cães ou às galinhas porque isso não tem nenhum significado estabelecido. (Millôr Fernandes, Millôr definitivo: a bíblia do caos)
5. (FUVEST) – Indique o sentido que esse provérbio assume, a) se for entendido como uma afirmação aceitável, que em princípio parece estar certa. RESOLUÇÃO: Em sentido positivo, o provérbio deve ser entendido como indicação de que cada pessoa deve reconhecer suas limitações e agir de acordo com elas, sem cometer exageros ou extrapolações deletérias. Outro entendimento positivo do provérbio implica a ideia de que cada um se limite à sua competência.
a) Considerando-se que o texto II tem como referência o texto I, qual é a expressão que, de acordo com Millôr Fernandes, tem um “significado estabelecido”? RESOLUÇÃO: Millôr Fernandes refere-se à expressão proverbial “atirar pérolas aos porcos”, utilizada correntemente no sentido de “desperdiçar esforços com quem não é digno deles ou não é capaz de se beneficiar com eles”.
b) se for entendido como uma afir mação autoritária, que impõe um fato consumado. RESOLUÇÃO: Como afirmação autoritária, o provérbio implica a ideia de que cada pessoa deve restringir-se ao âmbito de ação que lhe foi atribuído, numa divisão que pode ser injusta ou arbitrária, mas que não se quer discutir. Ou seja, o sentido autoritário é o de que cada um tem seu lugar e deve nele permanecer, não se questionando o princípio de tal atribuição.
b) No texto I, os significados dos segmentos “...Não deis aos cães o que é santo...” e “...nem atireis aos porcos as vossas pérolas” reforçamse mutuamente ou se contradizem? Justifique sucintamente sua resposta. RESOLUÇÃO: As duas injunções negativas se reforçam mutuamente, pois ambas significam que não se deve destinar um bem valioso a quem não é digno dele ou não tem condições de o apreciar.
6. (FUVEST) I. Desespero meu: leitura obrigatória de livro indicado... II. Uma surpresa: tão bom, aquele livro! III.Nenhum aborrecimento na leitura. Respeitando a sequência em que estão apresentadas as três frases acima, articule-as num único período. Empregue os verbos e os nexos oracionais necessários à clareza, à coesão e à coerência desse período.
Há certas expressões significativas: “Contra fato não há argumento”. Elas querem dizer que, diante da evidência do real, não cabem as argumentações em contrário, o que em princípio parece estar certo. Mas, na verdade, significam também coisas como “o que vale é a força” ou “ideia não resolve”. Assim, pregam o reconhecimento do fato consumado, a capitulação diante do que se impôs no terreno “prático”, negando o direito de discutir, de argumentar para mudar a realidade. E então se tornam sinistras. (Antonio Candido, Recortes) Entre as “expressões significativas”, a que se refere o autor do texto, podem-se incluir certos provérbios, como, por exemplo: “Cada macaco no seu galho.”
62 –
RESOLUÇÃO: Desespero meu : leitura obrigatória de livro indicado, no entanto (mas, porém, contudo, todavia) foi uma surpresa, pois era muito bom aquele livro, cuja leitura não causou nenhum aborrecimento.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 63
MÓDULO
Interpretação de Textos (I)
1. (FUVEST) – Ouvir alguém falar não é como tornar a ouvi-lo através de uma máquina: o que ouvimos, quando temos um rosto diante de nós, nunca é o que ouvimos, quando, diante de nós, há uma fita que gira. Um reluzir de olhos, um agitar de mãos, às vezes, torna aceitável a frase mais idiota. Mas sem aquelas mãos, sem aqueles olhos, a frase se desnuda em toda a sua desconcertante idiotice. (Oriana Fallaci, Os antipáticos)
RESOLUÇÃO: O autor do anúncio, um pretenso sedutor, esconde sua oferta de serviços sexuais atrás de uma linguagem forrada de pseudotecnicismos do mundo empresarial. Ele se apresenta, pois, como um empresá rio, dirigindo-se a interlocutores também do mundo empresarial.
a) Complete, mantendo o sentido do texto, o seg mento: A frase mais idiota torna-se, às vezes, aceitável, a não ser que .................. RESOLUÇÃO: A frase mais idiota torna-se, às vezes, aceitável, a não ser que, sem um reluzir de olhos ou um agitar de mãos, ela se desnude em toda a sua desconcertante idiotice.
b) Algumas passagens do anúncio impressionariam mal uma leitora pouco disposta a tolerar infrações à norma linguística culta. Transcreva três delas.
b) Termine a frase: A presença física de nosso interlocutor ................ com uma conclusão que sintetize o texto. RESOLUÇÃO: A presença física de nosso interlocutor empresta a suas palavras um sentido que, caso o interlocutor esteja ausente, pode faltar intei ramente.
RESOLUÇÃO: Mistura de pessoas pronominais diversas na referência ao interlocutor: “Quando ele te conheceu ele fazia você…”; uso de acento grave onde não há crase: “...equivalente à um salário…”; emprego descabido do pronome relativo: “...cujo ele só visita…”; pontuação absurda: “Eu casado sigiloso, cor clara, 28 anos. Procuro…” etc.
2. (UNICAMP) Em uma de suas edições de 1998, o Classline Regional daFolha de S. Paulo, que circula nas regiões de Campinas, Ribeirão Preto e Vale do Paraíba, trazia este curioso anúncio:
Alguma Casada – Quando ele te conheceu ele fazia você sentir-se uma Empresa Multinacional como fêmea, e você recebia como o equivalente à um salário de Diretora Executiva no seu salário de sexo, amor e carinho! Hoje, p/ ele você é uma Microempresa, cujo ele só visita quando ele vai pagar o seu salário mínimo sempre atrasado de sexo e amor! Faça como as grandes empresas, terceirize a mão de obra c/ gente qualificada que quer entregar satisfação completa sem nenhum tipo de cobrança. Eu casado sigiloso, cor clara, 28 anos. Procuro você s/ preconceito de peso ou altura de 18 a 45 anos. Posso viajar para sua cidade ou hospedá-la em local secreto e sigiloso em
c) Que comportamento socialmente discutível é proposto pelo anúncio por meio da metáfora da terceirização? RESOLUÇÃO: O que se propõe é uma relação adulterina com mulher insatisfeita com o marido.
São Paulo/Capital quando por aqui você estiver por passagem fazendo compras ou querendo me visitar CP1572. a) A linguagem do anúncio anterior faz pensar num tipo de autor. O produto oferecido seleciona um tipo de leitor. Considerando isso, caracterize o autor e o leitor representados pelo anúncio.
– 63
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 64
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
3. (FUVEST-SP) – Reduit é leite puro e saboroso. Reduit é saudável, pois nele quase toda gordura é retirada, permanecendo todas as outras qualidades nutricionais. Reduit é bom para jovens, adultos e dietas de baixas calorias. (Texto em uma embalagem de leite em pó)
4. (UFSCar) – Nesse trecho de crônica, Nélson Rodrigues compara, em sua visão infantil, a redação de um jornal com uma paisagem submarina. a) Destaque, desse texto, alguma palavra ou expressão empregada em sentido não literal.
a) No texto acima, a gordura pode ser entendida também como uma qualidade nutricional? Justifique sua resposta, transcrevendo do texto a expressão mais pertinente.
RESOLUÇÃO: Têm sentido figurado as seguintes palavras e ex pressões: subterrâneos (no sentido metafórico delocais ocultos), calças curtas(metonímia deinfância), halo intenso e lívido (metáfora para a forte impressão que as figuras do jornal causavam na criança), espectral (metáfora por ilusório, fantasmagórico) e submarinos (elemento de comparação).
RESOLUÇÃO: Sim, a gordura pode ser entendida também como uma qualidade nutricional, pois o texto afirma que, embora quase isento de gordura, o leite em questão conserva “todas as outras qualidades nutricionais”. A expressã o “outras qualidades nutriciona is” implica a ideia de que a gordura seja uma delas.
b) As qualidades nutricionais de um produto, segundo o texto, sempre fazem bem à saúde? Justifique sua resposta.
b) A que classe pertence a palavra submarinos na última linha do texto? De que maneira se deriva dessa palavra o nome do veículo naval submersível?
RESOLUÇÃO: O texto supõe a ideia de que há “qualidades nutricionais” que não são boas para a saúde, como seria o caso da gordura. Isso se infere da afirmação de que “Reduit é saudável, pois nele quase toda gordura é retirada”. A explicação de que o leite seja saudável é dada pela afirmação de que ele quase não contém gordura. Portanto, a gordura não seria saudável, embora, como se viu na resposta a, ela seja dada como uma das “qualidades nutricionais”.
RESOLUÇÃO: Submarinos é adjetivo, do qual, por derivaçã o imprópri a, srcina-se o substantivo que designa o veículo. A “maneira” pela qual se faz essa derivação é sintática, pois um adjetivo se transforma em substantivo quando determinado por um elemento subs tantivador (artigo, pronome demonstrativo, adjetivo, numeral), ou quando empregado como núcleo de um sintagma nominal de função substantiva (por exem plo, empregado como sujeito: submarinos foram vistos).
As questões de números 4 e 5 referem-se ao texto seguinte.
Vocês, que não conhecem os subterrâneos de jornal, não imaginam como uma redação é povoada de seres misteriosíssimos. Procurem visualizar uma paisagem submarina. Há peixes azuis, escamas cintilantes, águas jamais sonhadas. De vez em quando, sai de uma caverna um monstro de movimentos lerdos, pacientes etc. E passa um peixe sem olhos, que emana uma luz própria. Eis o que eu queria dizer: — quando entrei, pela primeira vez, numa redação, acabava de fazer dez anos. Com a trágica inocência das calças curtas, tive a sensação de que entrava numa outra realidade. As pessoas, as mesas, as cadeiras e até as palavras tinham um halo intenso e lívido. Era, sim, uma paisa gem tão fascinante e espectral como se redatores, mesas, cadeiras e contínuos fossem também submarinos. (Nélson Rodrigues, O Reacionário: Memórias e Confissões)
64 –
5. (UFSCar) – A palavra até, no trecho — “...até as palavras tinham um halo intenso e lívido.” —, não está empregada em sua fun ção própria de preposição. a) Qual a função estilística dessa palavra no trecho? RESOLUÇÃO: A palavra até tem função intensificadora ou enfatizadora.
b) Dê dois exemplos em que até seja empregado como preposição. RESOLUÇÃO: Vou até a praia. Amar-te-ei até o último sopro.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 65
6. (UNICAMP-SP) – L. F. Verissimo certamente ficaria satisfeito se você, mesmo nesta situação um pouco tensa, achasse graça na tira abaixo.
Para achar graça, você precisa perceber que a tira traz implícitas duas opiniões opostas relativas a uma prática institucional de nossa sociedade. a) Quais as duas opiniões contidas na tira? RESOLUÇÃO: As duas opiniões dizem respeito a casamento e felicidade. Deduz-se que há uma opinião favorável e outra contrária à instituição do casamento: no primeiro quadrinho o casamento é apresentado como desejável, mas no último ele é tido como incompatível com a felicidade.
7. (UNICAMP) – Em matéria recentemente publicada no Caderno Sinapse da Folha de S. Paulo, é apresentada uma definição de media training: ensinar profissionais a lidarem com a imprensa e se saí rem bem nas entrevistas. Na parte final da reportagem, o jornalista faz a seguinte ressalva:
O “media training” não se restringe a corporações. A Universidade X distribui para seus profissionais uma cartilha com dicas para que professores e médicos possam ter um bom relacionamento com a imprensa. Ironicamente intitulado de “Corra que a Imprensa vem aí”, o manual aponta gafes cometidas e dá dicas sobre a melhor forma de atender um repórter. (Adaptado de Vinícius Queiroz Galvão, “Treinamento antigafe”, Caderno Sinapse, 30/9/2003, p. 32). a) No trecho transcrito, as aspas são utilizadas em dois momentos diferentes. Transcreva as passagens entre aspas e explique seu uso em cada uma delas. RESOLUÇÃO: “Media Training”: expressão em língua estrangeira; “Corra que a Imprensa vem aí”: título de publicação.
b) Podemos relacionar o título da cartilha com o título em português da conhecida comédia norte-americana “Corra que a polícia vem aí”, que trata de um inspetor de polícia atrapalhado. Explicite os sentidos da palavra ‘correr’ nos títulos do filme e do manual. b) Qual dessas dua s opiniões pode se r considerada um argumento favorável à manutenção dessa prática institucional? RESOLUÇÃO: No primeiro quadrinho, formula-se o voto de que a personagem se case, o que implica uma opinião favorável ao casamento, embora em seguida, paradoxalmente, casamento e felicidade sejam apresentados como excludentes.
RESOLUÇÃO: No título do filme, “correr” significa “fugir”; trata-se, portanto, de “correr de”. No título do manual, depreende-se do contexto irônico que se trata do “correr” no sentido de “correr para”, referindo-se à preparação para “enfrentar” a imprensa.
– 65
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 66
MÓDULO
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
Interpretação de Textos (II)
1. (UNICAMP-SP) – Na sua coluna diária do Jornal Folha de S.Paulo de 17 de agosto de 2005, José Simão escreve: “No Brasil nem a esquerda é direita!”. a) Nessa afirmação, a polissemia da língua produz iron ia. Em que palavras está ancorada essa ironia?
2. (UNICAMP-SP) – Na capa do caderno Aliás do jornal O Estado de S.Paulo de 10 de julho de 2005, encontramos o seguinte conjunto de afirmações que também fazem referência à crise política do Governo Lula:
RESOLUÇÃO: A ironia está presente nas palavras “esquerda” e “direita”.
Getúlio tanto sabia que preparou a carta-testamento. Juscelino sabia que seria absolvido pela História. Jânio sabia que sua renúncia embutia um projeto autoritário. Jango sabia o tamanho da conspiração ao seu redor. Médici ia ao futebol, mas sabia de tudo. Geisel sabia que Golbery entendera o projeto de abertura. (...) a) Em todas as afirmações, há um padrão que se repete. Qual é esse padrão e como ele estabelece a relação com a crise política do atual governo?
b) Quais os sentidos de cada uma das palavras envolvidas na polissemia acima referida? RESOLUÇÃO: Esquerda significa “tendência política ligada a reivindicações populares, trabalhistas, socialistas ou comunistas”. Direita designa, como substantivo, “tendência política conservadora ou reacionária em relação às reformas sociais” e, como adjetivo, significa “correta, honesta”. A polissemia criada pelo autor ironiza os partidos de esquerda que não agem com honestidade, integridade, probidade.
RESOLUÇÃO: O padrão repetido é o de predicar o verbo saber para os sujeitos que são os diversos Presidentes da República alinhados no enunciado, numa afirmação que se pode resumir como “todos os presidentes sempre souberam”. O objeto de saber , em todos os casos, é a situação que envolvia o presidente mencionado. A ilação é que, também no caso de Lula, o presidente sabe.
c) Comparando a afirmação “No Brasil nem a esquerda é direita” com “No Brasil a esquerda não é direita”, qual a diferença de sentido estabelecida pela substituição de “nem” por “não”? RESOLUÇÃO: Nem, no contexto, expressa a ideia de adição e significa “inclusive não”, “também não”, ou seja, implica a ideia de que todos não agem com não é apenas de negação honestidade, inclusive a esquerda. Já o sentido de e entende-se que a esquerda não é honesta.
b) Apresente, por meio de paráfrases, duas interpretações para a palavra “tanto” na frase “Getúlio tanto sabia que preparou a cartatestamento”. RESOLUÇÃO: 1) Getúlio sab ia tão bem o que se passava, que, em consequência, preparou a carta-testamento. 2) É tão verdadeiro o fato de que Getúlio sabia, que…
66 –
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 67
3. (UNICAMP-SP) – Os quadrinhos a seguir fazem parte de um material publicado na Folha de S.Paulo em 17 de agosto de 2005, relativo à crise política brasileira, que teve início em maio do mesmo ano.
4. (UNICAMP-SP) – Alguém menos tolerante no que se refere a imprecisões de linguagem poderia dizer que a notícia abaixo (publicada no jornal Folha de S.Paulo de 26/5/2001) faz referência a alguma coisa impossível.
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Na tira de Angeli, observamos um jogo de associações entre a frasetítulo “O imundo animal” e a sequência de imagens. a) A frase-título “O imundo animal” nos reme te a uma outra frase. Indique-a e explicite as relações desentido entre as duas frases, fazendo referência ao conjunto da tira. RESOLUÇÃO: A frase-título remete à expressão “o mundo animal”, que designa o uni verso dos seres dotados de vida (animados). O trocadilho empregado como título da tira sugere que o “homem político”, confabulador e conspirador, é um animal imundo, ou seja, vicioso, moralmente condenável.
a) Que coisa é essa e por que é impossível? RESOLUÇÃO: Como o Everest é um monte do Himalaia, cordilheira situada na Ásia, não é possível “repetir o feito”, ou seja, escalar o dito monte, “em outros continentes”.
b) O que, provavelmente, a legenda da foto quer dizer?
b) A frase-título “O imundo animal” sugere um processo de prefixação. Explique.
RESOLUÇÃO: A legenda deve querer dizer que o alpinista a que se refere a notícia pretende, em outros continentes, realizar proezas semelhantes, ou seja, escalar montes altíssimos.
RESOLUÇÃO: A prefixação ocorre em imundo, cujo sentido é “sujo”. A palavra é for mada com a adição do prefixo negativoi- a -mundo, cujo sentido é “limpo, puro”.
– 67
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 68
5. (UNICAMP-SP) – Considere a tira abaixo:
P O R T U G U Ê S A – 3 a S
6. (VUNESP-SP) – Esta questão toma por base uma ilustração do cartunista brasileiro Jaguar (Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, 1932) para o livro A Completa Lei de Murphy.
Nesta tira, a crítica ao “estrategista militar” não é explí cita. Para compreender a tira, o leitor deve reconhecer uma alusão a um fato histórico e uma hipótese sobre transmissão genética. a) Qual é o fato histórico ao qual a tira faz alusão? RESOLUÇÃO: A tira faz alusão à Batalha de Waterloo, emque Napoleão foi vencidopelos ingleses.
Um atalho é a distância mais longa entre dois pontos. b) Qual é a explicação para as qualidades profissionais do estrategista? RESOLUÇÃO: Segundo a tirinha, as qualidades do estrategista teriam sido deter minadas pelo código genético.
(Arthur Bloch, A Completa Lei de Murphy. Traduzido e transubstanciado por Millôr Fernandes) Tomando por base que a ilustração de Jaguar se refere à chamada Lei de Murphy, cujo enunciado fundamental é “Se alguma coisa pode dar errado, dará”, a) estabeleça uma relação entre a Lei de Murphy, a legenda da ilustração e o princípio matemático que essa legenda parodia;
c) Explicite o raciocínio da personagem que critica o estrategista. RESOLUÇÃO: Para a personagem, a inépcia do e strategista poderia explicar-se a partir da herança genética que lhe teria advindo de um antepassado, responsável por uma das mais notáveis derrotas militares da história. Assim, seu raciocínio é: se qualidades como as habilidades de um estrategista são determinadas pelo código genético, então a inépcia deste estrategista pode ser explicada pelo fato de ele descender do estrategista de Napoleão em Waterloo.
68 –
RESOLUÇÃO: O princípio em questão é o de que a reta é a menor distância entre dois pontos. Um atalho deveria ser um caminho mais curto — e o atalho em questão é uma escada, correspondendo, portanto, a uma linha reta. Tal caminho, porém, é inviável para um automóvel. Daí que se possa invocar a “Lei de Murphy”, pois, embora haja atalho, ele é inútil: o que podia dar errado, deu.
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 69
b) demonstre em que medida os e lementos visuais da ilustração reafirmam o conteúdo da legenda. RESOLUÇÃO: Os elementos visuais da ilustração indicam que o caminho desejado se situa próximo, mas separado por um muro do caminho em que se en contra o automobilista, sendo uma escada o atalho, ou seja, o meio mais curto de chegar ao caminho pretendido. Porém, como a e scada é inviável para o automóvel, o atalho em questão torna-se inútil. Daí, contudo, não decorre a conclusão contida na legenda, segundo a qual “um atalho é a distância mais longa entre dois pontos”. Ou seja: os elementos visuais da ilustração não parecem “reafirmar” o conteúdo da legenda, a qual só seria de fato adequada se afirmasse que “o atalho em questão é, para um automóvel, um caminho impossível entre dois pontos” — o que eliminaria todo o humor que supostamente deveria haver na relação entre a situação representada e a legenda proposta.
MÓDULO
S 3 – A S Ê U G U T R O P
a
Interpretação de Textos (III)
Textos para as questões de 1 a 4.
Texto 1
Este livro e o meu estilo são como os ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, ameaçam o céu, escorregam e caem... (Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas) Texto 2
Agora que expliquei o título, passo a escrever o livro. Antes disso, porém, digamos os motivos que me põem a pena na mão. Vivo só, com um criado. A casa em que moro é própria; fi-la construir de propósito, levado de um desejo tão particular que me vexa imprimi-lo, mas vá lá. Um dia, há bastantes anos, lembrou-me reproduzir no Engenho Novo a casa em que me criei na antiga Rua de Matacavalos, dando-lhe o mesmo aspecto e economia daquela outra, que desapareceu. (Machado de Assis, Dom Casmurro)
2. O pronome demonstrativo ( este, esse, aquele e variações) é empregado para fazer referência a termos (pessoas, coisas etc.) já mencionados. Num texto escrito, o demonstrativo este retoma o termo mencionado por último, ao passo que o demonstrativo aquele retoma o termo mencionado primeiramente. O seguinte exemplo elucidará o que se acaba de dizer:
Pedro e Paulo foram despedid os: este [Paulo], por incomp etência, aquele [Pedro] porque faltava muito ao trabalho. Em relação ao texto 2, você diria que a explicação acima se aplica ao trecho: “Um dia, há bastantes anos, lembrou-me reproduzir no Engenho Novo a casa em que me criei na antiga Rua de Matacavalos, dando-lhe o mesmo aspecto e economia daquela”? RESOLUÇÃO: Não, pois no trecho de Machado de Assis, opronome demonstrativo aquela está se referindo à casa da Rua de Matacavalos, o último termo a ser mencionado. Nesse caso, o autor empregou o anafórico aquela para indicar uma distância no tempo.
1. Por que se pode afirmar que os textos 1 e 2 são metalinguísticos? RESOLUÇÃO: Porque em ambos os fragmentos o narrador fala da obra que está escrevendo. No texto 1, extraído do capítulo “O Senão do Livro”, o narrador, ao comentar seu estilo, faz referência às frequentes digressões que permeiam a narrativa. No texto 2, o narrador Bentinho, após haver explicado de que modo se srcinou o título do romance — Dom Casmurro —, faz referência à própria narrativa. Portanto, em ambos os fragmentos há metalinguagem.
3. Na frase “Vivo só, com um criado”, há uma aparente contradição. Explique-a. RESOLUÇÃO: O narrador afirma viver só, mas na companhia de um cria do. Ou seja: ele não vive só, mas assim o considera por não contar com a companhia de parentes, amigos etc.
– 69
A_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 08/10/10 14:03 Page 70
4. “A casa em que moro é própria; fi-la construir de propósito, levado de um desejo tão particular que me vexa imprimi-lo.” No trecho acima, sem alterar o sentido srcinal, substitua as palavras própria e de, destacadas, por um pronome e por outra preposição, respectivamente. P O R T U G U Ê S A – 3 a S
c) “...tinha a cabeça aritmética do pai.” – No contexto da fala do narrador, quem era o “pai”? RESOLUÇÃO: No contexto da fala do narrador, o pai era Escobar.
RESOLUÇÃO: A casa em que moro éminha; fi-la construir de propósito, levado por um desejo tão particular que me vexa imprimi-lo.
6.
Texto para as questões 5 e 6.
Estendeu o copo ao vinho que eu lhe oferecia, bebeu um gole e continuou a comer. Escobar comia assim também, com a cara metida no prato. Contou-me a vida na Europa, os estudos, particularmente os de arqueologia, que era a sua paixão. Falava da antiguidade com amor, contava o Egito e os seus milhares de séculos, sem se perder nos algarismos; tinha a cabeça aritmética do pai. Eu, posto que a ideia da paternidade do outro me estivesse já familiar, não gostava da ressurreição. Às vezes, fechava os olhos para não ver gestos nem nada, mas o diabrete falava e ria, e o defunto falava e ria por ele. (...) Se fosse vivo José Dias, acharia nele a minha própria pessoa. Prima Justina quis vê-lo, mas, estando enfer ma, pediu-me que o levasse lá. Conhecia aquela parenta. (Machado de Assis, Dom Casmurro) 5. a) No trecho transcrito, o narrador nos fala de um reenc ontro. Com quem ele se reencontra? RESOLUÇÃO: No trecho, o narrador, Bento Santiago — o “Dom Cas murro” — reencontra Ezequiel, o filho que “encarna” a suspeita do narrador a respeito da infidelidade de Capitu e do amigo Escobar.
a) “Eu, posto paternidade –doReescreva outro me estivesse já que a ideia familiar, não gostava da da ressurreição.” o período, substituindo tão somente a expressão destacada por outra que mantenha o sentido srcinal da frase. RESOLUÇÃO: Eu, embora (ainda que, mesmo que...) a ideia da pater nidade do outro me estivesse já familiar, não gostava da ressurreição.
b) “Prima Justina quis vê-lo, mas, estando enferma, pediu-me que o levasse lá.” – Substitua a oração reduzida destacada por uma desenvolvida, preservando o sentido srcinal. RESOLUÇÃO: Prima Justina quis vê-lo, mas, porque (visto que, já que, uma vez que...) estava enferma, pediu-me que o levasse lá.
b) Extraia do texto uma frase em que haja ironia. RESOLUÇÃO: “Se fosse vivo José Dias, acharia nele a minha própria pessoa.”
70 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page I
B S Ê U G U T R O P
Português Curso Extensivo – B
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page II
P O R T U G U Ê S B
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 1
Revisão MÓDULO
PORTUGUÊS
Sintaxe (I)
1. (FUVEST-2010)
2. (UNICAMP-2010) B S Ê U G U T R O P
Uma nota diplomática* é semelhante a uma mulher da moda. Só depois de se despojar uma elegante de todas as fitas, rendas, joias, saias e corpetes, é que se encontra o exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher, conforme saiu dos prelos da natureza. É preciso desataviar uma nota diplomática de todas as frases, circunlocuções, desvios, adjetivos e advérbios, para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem.
Machado de Assis.
*Nota diplomática: comunicação escrita e oficial entre os governos de dois países, sobre assuntos do interesse de ambos. a) É correto afirmar que, segundo o texto, uma not a diplomática se parece com o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não. O texto estabelece semelhança entre o que seria a edição “aumentada e correta” da mulher e a nota diplomática, pois em ambas haveria excesso de adornos enganadores. Portanto, o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher” equivaleria à nota diplomática “desataviada” de seus excessos retóricos.
b) Tendo em vista o trecho “para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem”, indique um sinônimo da palavra “capital” que seja adequado ao contexto e identifique o referente do pronome “lhe”. RESOLUÇÃO: No contexto, capital significa “fundamental, principal, essencial”. O pronome pessoal oblíquo lhe retoma a expressão “nota diplomática”, funcionando como complemento nominal de “srcem” (“…dá srcem à nota diplomática”).
Retirada de www.eitapiula.net/2009/09/aurelio.jpg
Nessa propaganda do dicionário Aurélio, a expressão “bom pra burro” é polissêmica, e remete a uma representação de dicionário. a) Qual é essa representação? Ela é adequada ou inadequada? Justifique. RESOLUÇÃO: Trata-se da representação de dicionário contida na expressão “pai dos burros”. É evidente que se tra ta de uma representação inadequada, pois dicionários auxiliam quem deseja ou precisa co nhecer o sentido das palavras, não quem carece de inteligência, ou seja, quem é “burro”.
b) Explique como o uso da expressão “bom pra burro” produz humor nessa propaganda. RESOLUÇÃO: “Pra burro” é frequentemente associado à intensidade, quantidade, ao advérbio muito. Assim, a expressão “bom pra burro” significa “muito bom”. Ao vir junto à imagem de um dicionário, permite a associação à expressão “pai dos burros” (representação estabilizada de dicionário). O humor é provocado, portanto, pela convivência das duas associações no uso da expressão, colocando lado a lado a qualidade de ser muito bom e a imagem estereotipada de ser destinado a pessoas burras.
–1
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 2
Texto para a questão 3.
P O R T U G U Ê S B
A vida na fazenda se tornara difícil. Sinha Vitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desesperadas. Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a catinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos se torciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 3. (UNESP) – Certas expressões ganham sentidos diferentes, dependendo do contexto ou da situação em que ocor rem. Assim, os adjetivos secas ou torrados, de Vidas Secas, estão impregnados de uma conotação negativa, diferentemente de secas ou torrados em contextos como ameixas secas ou amendoins torrados, onde são positivos. Pensando nessas possibilidades, a) explique que sentido tem a expressão céu azul, para Fabiano, na frase: “No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido”. RESOLUÇÃO: A expressãocéu azul tem conotação negativa para Fabiano, pois indica que não haverá chuva e que a tão temida seca já é uma realidade inevitável.
b) construa uma frase em que o contexto atribua a essa mesma expressão uma conotação positiva. RESOLUÇÃO: “Após a tempestade, o céu azul brilhava com pro messa de bonança.”
Texto para a questão o4.cômico nasce de uma “percepção do contráPara Pirandello, rio”, como no famoso exemplo de uma velha já decrépita que se cobre de maquiagem, veste-se como uma moça e pinta os cabelos. Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso, que nasce da ruptura das expectativas, mas sobretudo do sentimento de superioridade. A “percepção do contrário” pode, porém, transformar-se num “sentimento do contrário” — quando aquele que ri procura entender as razões pelas quais a velha se mascara, na ilusão de reconquistar a juventude perdida. Nesse passo, a velha da anedota não mais está distante do sujeito que percebe, porque este pensa que também poderia estar no lugar da velha — e seu riso se mistura com a compreensão piedosa e se transforma num sorriso. Para passar da atitude cômica para a atitude humorística, é preciso renunciar ao distanciamento e ao sentimento de superioridade. (Adaptado de Elias Thomé Saliba, Raízes do riso)
ficação e à compaixão do observador, que geram humor e não propriamente comicidade.
b) “Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso (...).” Sem prejuízo para o sentido do trecho acima, rees creva-o, substituindo se perceber e produz-se por formas verbais cujo sujeito seja nós e é o oposto por não corresponde. Faça as adaptações necessárias. RESOLUÇÃO: Ao percebermos que aquela senhora velha não corresponde ao que uma respeitável velha senhora deveria ser, produzimos o riso (rimos).
Texto para a questão 5.
Em um piano distante, alguém estuda uma lição lenta, em notas graves. (...) Esses sons soltos, indecisos, teimosos e tristes, de uma lição elementar qualquer, têm uma grave monotonia. Deus sabe por que acordei hoje com tendência a filosofia de bairro; mas agora me ocorre que a vida de muita gente parece um pouco essa lição de piano. Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia. Começa a esboçar, com os pontos soltos de alguns sons, a curva de uma frase musical; mas logo se detém, e volta, e se perde numa incoerência monótona. Não tem ritmo nem cadência sensíveis. (Rubem Braga, O homem rouco) 5. (FUVEST) a) O autor estabelece uma associação poética entre a vida de muita gente e uma lição de piano. Esclareça o sentido que ganha, no contexto dessa associação, a frase: “Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia”.
RESOLUÇÃO: A frase, no contexto, significa que muitas pessoas não concluem aquilo a que se propõem ou não chegam a viver experiências que se integrem num conjunto articulado, como as palavras ou as notas musicais se integram no conjunto de uma frase linguística ou melódica, fazendo sentido ou compondo uma estrutura coerente.
4. (FUVEST)
b) “Deus sabe por que a cordei hoje com tendência a filosofia de bairro...” Reescreva a frase acima, substituindo a expressão sublinhada por outra de sentido equivalente.
a) Considerando que o atexto conceitua, qual a do diferença essencialo entre “percepção do explique contrário”brevemente e o “sentimento contrário”.
RESOLUÇÃO: Deus sabe por que acordei hoje com vontade de refletir sobre assuntos triviais (ou fatos prosaicos).
RESOLUÇÃO: A diferença essencial entre “percepção do contrário” e “sentimento do contrário” é que a primeira expressão sugere a ideia de distanciamento e superioridade do observador da cena cômica, e a segunda remete à identi-
2–
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 3
6. (FUVEST) – Considere as seguintes frases, extraídas de diferentes matérias jornalísticas, e responda ao que se pede. I. Nos últimos meses, o debate sobre o aquecimento global vem, com perdão do trocadilho, esquentando. II. Preso vigia acusado de matar empresário. a) Identifique, na frase I, o troc adilho a que se refere o redator e explique por que ele pede perdão por tê-lo produzido. RESOLUÇÃO: O trocadilho pelo qual o redator da frase se desculpa consiste no emprego do verbo esquentar no predicado de uma oração cujo sujeito é “o debate sobre o aquecimento global”. O tema em questão – o aquecimento global – associa-se, muito obviamente, à ideia de esquentar em sentido próprio (“aquecer-se”), daí derivando o emprego trocadilhesco desse verbo em
b) É correto afirmar que na frase II ocorre am biguidade? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Sim, é correto afirmar que a frase II é ambígua, porque ela pode ser entendida de duas formas, a saber: (1) foi preso o vigia acusado de matar empresário, e (2) um preso vigia o acusado de matar empresário.Vigia, na interpretação (1), é substantivo; na interpretação (2), é a terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo vigiar, complementado pelo objeto direto acusado. O par ticí pio preso tem força verbal em (1), funcionando, na fórmula sintética da manchete jornalística, como par te da locução da voz passiva “foi preso”; em (2), porém, o mesmo particípio tem sentido nominal, funcionando como adjetivo substantivado (o preso, um preso).
sentido figurado (“acirrar-se, A obviedade da associação aquecimento/esquentar – é queagravar-se”). seria responsável pelo retórico pedido de– desculpas.
MÓDULO
Sintaxe (II)
1. (UNICAMP-SP)
Matte a vontade. Matte Leão. Este enunciado faz parte de uma propaganda afixada em lugares nos quais se vende o chá Matte Leão. Observe as construções abaixo, feitas a partir do enunciado em questão: Matte à vontade. Mate a vontade. Mate à vontade. a) Complete cada uma das construções acima com palavras ou expressões que explicitem as leituras possíveisrelacionadas à propaganda. RESOLUÇÃO: Beba chá Matte (Leão) à vontade. Mate a vontade de tomar chá Matte (Leão). Beba (chá) mate à vontade. / Mate à vontade sua sede.
b) Retome a propaganda e explique o seu funcionamento, explicitando as relações morfológicas, sintáticas e semânticas envolvidas. RESOLUÇÃO: A propaganda explora justamente as diferentes possibilidades apresentadas no item a: • “Matte à vontade.” – O sentido é de haver chá da marca anunciada em grande quantidade, de forma a satisfazer quem desejar tomá-lo. Nessa frase, “à vontade” é locução adverbial e “Matte”, por seu duplo t, faz alusão à marca em questão. • “Mate a vontade.” – A frase, de teor conativo — imperativo ou exortativo —, conclama o receptor a satisfazer seu desejo. Aqui, “mate” é forma verbal do imperativo dematar, verbo usado como catacrese procedente de metáfora (matar = “satisfazer”); “a vontade” é um sintagma nominal que complementa o verbo (objeto direto). • “Mate à vontade”. Aqui a palavra “mate” é substantivo comum, e não se refere, portanto, à marca de chá. Poder-se-ia também entender “mate” como a forma verbal do imperativo do verbo matar (Mate sua sede à vontade com chá mate). Em ambas as interpretações, “à vontade” é locução adverbial.
–3
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 4
2. (UNICAMP-SP) – O Caderno “Aliás Debate” do Estado de S.Paulo, de 18/08/2006, apresenta uma matéria com o título: “Nas fres tas e brechas da segurança”. A matéria se inicia com o seguinte trecho:
3. (UFSCar) – Contemple a charge:
“Estamos nas frestas, procurando as brechas”. Esta boa frase, que circulou em manifesto atribuído ao PCC e ao seu líder (...), Marcola, resume bem o que pretende a organização criminosa que vem atacando a maior cidade brasileira. (p. 2) P O R T U G U Ê S B
a) Como você interpreta “frestas” e “brechas” em “Estamos nas frestas, procurando as brechas”? RESOLUÇÃO: As frestas, no contexto, sugerem o espaço “estreito” representado pela prisão ou mesmo pela situação de quem “está à es preita” buscando “brechas”, ou seja, aberturas para contornar ou burlar as restrições do sistema prisional e do próprio Poder Judiciário.
(Correio Popular, 10/10/2006.) Trata-se de uma charge publicada por um jornal brasileiro por ocasião da eleição do sul-coreano Ban Ki-Moon, como presidente da ONU, e da realização de um teste nuclear a mando do ditador norte-coreano Kim Jong-il. a) Como a diferença de emprego sintático do verbo vencer modifica o sentido das duas frases? RESOLUÇÃO: Na primeira frase, o verbovencer é intransitivo e vem acompanhado de um adjunto adverbial de lugar, “na ONU”. Na segunda frase, o verbo vencer é transitivo direto e tem como objeto direto “ONU”. Ou seja: no primeiro caso, a vitória ocorreu na ONU; no segundo, a ONU foi derrotada.
b) Levando em consideração que “Nas frestas e brechas da segurança” é o título da matéria, como você interpreta esse enun ciado comparandoo à frase atribuída a Marcola? RESOLUÇÃO: No título da matéria, as palavras “frestas” e “brechas” conotam a fragilidade, a ineficácia do sistema de segurança pública, o qual dá muito espaço à ação criminosa. No enunciado de Marcola, a palavra brecha conota o espaço de ação possível para um presidiário. Pode-se mencionar, ainda, que, no título da matéria, “frestas” e “brechas” são quase como sinônimos.
b) “Reconstrua” as duas frases, de maneira que os sentidos sugeridos pelas imagens fiquem, também, explícitos no texto escrito. RESOLUÇÃO: A primeira frase ficaria: “Sul-coreano vence eleição para presidência da ONU”. A segunda poderia ser apresentada desta forma: “Norte-coreano vence confronto com a ONU”.
4–
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 5
4. (UNICAMP-2010)
B S Ê U G U T R O P
5. (FUVEST)
Devemos misturar e alternar a solidão e a comunicação. Aquela nos incutirá o desejo do convívio social, esta, o desejo de nós mesmos; e uma será o remédio da outra: a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão. (Sêneca, Sobre a tranquilidade da alma, Trad. de J. R. Seabra Filho.) Quino, Toda Mafalda. São Paulo: Editora Martins Fontes, 6ª. Edição, 2003.
Nessa tirinha da famosa Mafalda do argentino Quino, o humor é construído fundamentalmente por um produtivo jogo de referência. a) Explicite como o termo ‘estrangeiro’ é entendido pela personagem Mafalda e pelo personagem Manolito. RESOLUÇÃO: Para Mafalda, estrangeiro é todo país que não seja o dela. Para Manolito, estrangeiro é todo país que não seja a pátria, ou seja, aquele em que a
a) Segundo Sêneca, a solidão e a comunicação devem ser vistas como complementares porque ambas satisfazem um mesmo desejo nosso. É correta essa interpretação do texto acima? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois solidão e comunicação correspondem a diferentes desejos do ser humano: a solidão supre a necessidade de isolamento, a comunicação satisfaz nossa carência de relacionamento social.
pessoa nasceu. O equívoco de Mafalda resulta em ela não entender que o seu país é estrangeiro para quem tenha nascido fora dele.
b) “(...) a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão.” Sem prejuízo para o sentido srcinal, reescreva o trecho acima, inician do-o com “Nossa aversão à multidão...” b) Identifique duas palavras que, nessa tirinha, contri buem para a construção desse jogo de referência, explicando o papel delas. RESOLUÇÃO: As palavras centrais no mencionado “jogo de referência” são os artigos o
RESOLUÇÃO: Nossa aversão à multidão será curada pela solidão; o tédio à solidão será curado pela multidão.
e um. Para sendo Mafalda, usa o estrangeiros. artigo definido, seu é o país estrangeiro, todosque os demais ParaoManolito, o paísnão de Mafalda é um país, estrangeiro para os que procedam de outros países. Há ainda outros referentes; para Manolito, “pátria dele” refere-se ao país de srcem de seu pai e cá (Argentina) indica o país de destino de seu pai. Para Mafalda, este refere-se à Argentina, sua pátria, que não é, portanto, um país estrangeiro.
–5
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 6
6. (FUVEST) a) “Se eu não tivesse atento e olhado o rótulo, o pa ciente teria morrido”, declarou o médico. Reescreva a frase acima, corrigindo a impropriedade gramatical que nela ocorre.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: “Se eu não estivesse atento e não tivesse olhado o ró tulo, o paciente teria morrido”, declarou o médico. (A impropriedade estava no emprego do auxiliar ter, em vez de estar, com o particípio atento.)
MÓDULO
BRASI DE CIMA E BRASI DE BAXO
Inquanto o Brasi de Cima Fala de transformação, Industra, matéra prima, Descobertas e invenção, No Brasi de Baxo isiste O drama penoso e triste Da negra necissidade; É uma cousa sem jeito E o povo não tem dereito Nem de dizê a verdade. No Brasi de Baxo eu vejo Nas ponta das pobre rua O descontente cortejo De criança quage nua. Vai um grupo de garoto Faminto, doente e roto Mode caçá o que comê Onde os carro põe o lixo, Como se eles fosse bicho Sem direito de vivê.
6–
RESOLUÇÃO: “Os ambientalistas defendem a econologia – com binação de princípios da economia, sociologia e ecologia – como maneira de viabilizar as formas alternativas de desenvolvimento.” (Notar: 1. que há duas construções na voz passiva, uma analítica – “é defendida” –, outra sintética ou pronominal – “se viabilizarem”; 2. que é conveniente, na voz ativa, alternativa pontuação para separar o aposto – “combinação…” – e o predicativo do objeto – “como maneira…”).
Sintaxe (III)
Instrução: As questões de números 1 a 4 tomam por base um poema do repentista cearense Patativa do Assaré (1909-2002) e uma passagem do livro O discípulo de Emaús de Murilo Mendes (1901-1975):
[...]
b) “A econologia, combinação de princípios da economia, sociologia e ecologia, é defendida por ambientalistas como maneira de se viabilizarem formas alternativas de desenvolvimento.” Reescreva a frase acima, transpondo-a para a voz ativa.
Estas pequenas pessoa, Estes fio do abandono, Que veve vagando à toa Como objeto sem dono, De manêra que horroriza, Deitado pela marquiza, Dromindo aqui e aculá No mais penoso relaxo, É deste Brasi de Baxo A crasse dos marginá. Meu Brasi de Baxo, amigo, Pra onde é que você vai? Nesta vida do mendigo Que não tem mãe nem tem pai? Não se afrija, nem se afobe, O que com o tempo sobe, O tempo mesmo derruba; Tarvez ainda aconteça Que o Brasi de Cima desça E o Brasi de Baxo suba. Sofre o povo privação Mas não pode recramá, Ispondo suas razão Nas coluna do jorná. Mas, tudo na vida passa, Antes que a grande desgraça Deste povo que padece Se istenda, cresça e redrobe, O Brasi de Baxo sobe E o Brasi de Cima desce.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 7
Brasi de Baxo subindo, Vai havê transformação Para os que veve sintindo Abondono e sujeição. Se acaba a dura sentença E a liberdade de imprensa Vai sê legá e comum, Em vez deste grande apuro, Todos vão tê no futuro Um Brasi de cada um.
B S Ê U G U T R O P
Brasi de paz e prazê, De riqueza todo cheio, Mas, que o dono do podê
2. (UNESP-julho-2010) – Patativa do Assaré criou um discurso
Respeite o dereito aleio. Um grande e rico país Munto ditoso e feliz, Um Brasi dos brasilêro, Um Brasi de cada quá, Um Brasi nacioná Sem monopolo istrangêro.
poemático peculiar, fala próprias popular normas e rural. ortográficas, Por isso, ao escrever seus poemas,que usaestiliza tambéma suas bem como “regras” gramaticais desse linguajar do povo. Releia atentamente a terceira estrofe do poema e a reescreva em discurso considerado culto, sem se preocupar com a quebra do ritmo ou da rima.
(Patativa do Assaré [Antônio Gonçalves da Silva]. Cante lá que eu canto cá. 6.ª Ed. Crato: Vozes/Fundação Pe. Ibiapina/Instituto Cultural do Cariri. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1986.)
O DISCÍPULO DE EMAÚS
A harmonia da sociedade somente poderá ser atingida mediante a execução de um código espiritual e moral que atenda, não só ao bem coletivo, como ao bem de cada um. A conciliação da liberdade com a autoridade é, no plano político, um dos mais importantes problemas. A extensão das possibilidades de melhoria a todos os membros da sociedade, sem distinção de raças, credos religiosos, opiniões políticas, é um dos imperativos da justiça social, bem como a apropriação pelo Estado dos instrumentos de trabalho coletivo. (Murilo Mendes. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994.)
1. (UNESP-julho-2010)– Os dois fragmentos apresentados focalizam o mesmo tema de formas diferentes, em poesia e em prosa. Em seu poema, Patativa do Assaré reclama, entre outras coisas, da falta de liberdade sofrida pelo povo do Brasi de Baxo. No segundo período do fragmento de Murilo Mendes a mesma questão é abordada sob outro ponto de vista. Explique o que se fala nesse fragmento a respeito da liberdade. RESOLUÇÃO: A questão formulada em termos gerais, abstratos, por Murilo Mendes – “a conciliação da liberdade com a autoridade” – toca no problema nacional que motiva a indignação de Patativa do Assaré, seja nas recla mações sobre a falta de liberdade para o “Brasi de Baxo” exprimir suas justas reclamações e demandas, seja nas queixas sobre o abuso de quem detém a autoridade (o “dono do Podê”), que não respeita o “dereito aleio”. Murilo Mendes, no trecho referido, reconhece, em sentido amplo, que o problema é “dos mais importantes”, sem mais especificações e pare cendo associá-lo, em seguida, a um ideal amplo, coletivista e socializante de “justiça social”.
RESOLUÇÃO: Estas pequenas pessoas, Estes filhos do abandono, Que vivem vagando à toa Como objetos sem dono, Que causam horror Deitados sob marquises, Dormindo aqui e acolá No mais penoso abandono É deste Brasil de Baixo A classe dos marginais.
3. (UNESP-julho-2010) – Relendo o primeiro período do fragmento de Murilo, podemos até imaginá-lo como uma resposta à sexta estrofe do poema de Patativa. Compare ambas as passagens e, a seguir, explique o que Murilo sugere para que na sociedade se possa atingir, como diz um texto, Um Brasi de cada um, ou o outro texto, o bem de cada um. RESOLUÇÃO: Somente pode haver a transformação idealizada no texto de Patativa do Assaré (“Brasi de Baxo subindo”, “liberdade de imprensa”), ou seja, ascensão dos desfavorecidos e liberdade política, caso haja, segundo o texto de Murilo Mendes, a “execução de um código espiritual e moral” que atenda a todos os brasileiros, não apenas a um grupo de privilegiados.
–7
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 8
4. (UNESP-julho-2010) – Como Patativa imita o linguajar do povo, seu discurso poemático incorpora regras gramaticais desse linguajar, que não são as mesmas da norma culta. Estabeleça a diferença entre a concordância verbal utilizada pelo poeta nos versos Onde os carro põe o lixo, / Como se eles fosse bicho e a que se observa na norma culta.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: Nesses versos, a concordância, conforme a variante popular, flexiona em número apenas o determinante (artigo) e o pronome, pois, segundo a gramática desse linguajar, a flexão de substantivos e verbos seria redundante. Trata-se de uma regra de economia linguística. Na norma culta, os verbos devem flexionar-se no plu ral, concordando com os sujeitos os carros e eles.
b) No trecho “...quando haviam no mundo mulheres como Vidinha”, ocorre uma construção tida como incorreta, pois está em desacordo com o uso culto da língua portuguesa. De que se trata? Corrija o erro. RESOLUÇÃO: O verbo haver, no sentido de “existir”, é impessoal, devendo permanecer na terceira pessoa do singular: “...quando havia no mundo...”.
6. (FUVEST) – Não tenho dúvidas de que a reportagem esteja à procura da verdade, mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita com base exclusivamente em documentos da polícia política. (O Estado de S.Paulo)
Texto para a questão 5.
[...] admirava-se ele de como é que havia podido incli nar-se por um só instante a Luisinha, menina sensaborona e esquisita, quando haviam no mundo mulheres como Vidinha. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 5. (FUVEST) a) Em “...admirava-se ele de como é que havia podido inclinar-se...”, o sujeito da locução verbal destacada é elíptico e está no singular ( ele). Se o sujeito fosse composto (com dois ou mais núcleos) ou plural, essa locução verbal sofreria uma alteração. Qual seria? Justifique. RESOLUÇÃO: O verbo haver deveria concordar com o sujeito plural:haviam podido. Nas locuções verbais, a flexão de número recai sobre o verbo auxiliar e, no trecho dado, o verbo haver foi empregado como auxiliar do verbopoder. Não se deve, portanto, confundir esse emprego com o caso em que tal verbo é usado na acepção de “existir”, o que obrigaria a concordância exclusiva com a terceira pessoa do singular.
8–
Das duas ocorrências de de que, no excerto acima, uma está correta e a outra não. a) Justifique a correta. RESOLUÇÃO: A primeira ocorrência é a correta. Em “Não tenho dúvidas de que a reportagem...”, o uso da preposiçãode, diante da conjunção subordinativa integrante que, é obrigatório, já que a aludida preposição é regida pelo substantivo dúvidas.
b) Corrija a incorreta, dizendo por quê. RESOLUÇÃO: “... mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita...” Está de. O verbo ressalvar incorreta porque não há termo regente de preposição é transitivo direto, não exigindo, pois, preposição em seu complemento.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 9
Sintaxe (IV)
MÓDULO 1. (UNICAMP-2010)
NÃO DIGA SANDICES, MEU JOVEM. PERCEBA A GRANDEZA DESSE MOMENTO.
SABIA QUE ACABA DE SER ASSINADO O
MAIS UM TROÇO INÚTIL, EMPURRADO GOELA ABAIXO!
ESTAMOS FALANDO DA UNIFICAÇÃO DO NOSSO IDIOMA ESCRITO. DA PADRONIZAÇÃO
DA LÍNGUA!
ESTE LIVRO, POR EXEMPLO,
HÚÚMM...
ESTÁ ADAPTADO. ..SAINDO DABICHA, ÉDE JÁPORTUGAL EPODE SER PUBLICADO POR AQUI FUI TOMAR UMABICA SEM MUDAR UMA ANTES DE IR COMPRAR UM PAR DE VÍRGULA PEÚGAS. ?! SEQUER. ´´
´´
BICA...? PEÚGAS...?
2. (UNICAMP) – Leia os seguintes artigos do Capítulo VIII do novo Código Civil (Lei no. 10.406, de 10 de janeiro de 2002): Art. 1.548. É nulo o casamento contraído: I. pelo enfermo mental sem o necessário discer nimento para os atos da vida civil; II. por infringência de im pedimento. (...) Art. 1.550. É anulável o casamento: I. de quem não completou a idade mínima para casar; (...) VI . por incompetência da autoridade celebrante.
ALÁ!! NÃO FALEI?! NÃO FALEI?!
Retirada de www.miriamsalles.info/wp/wp-content/uploads/acord
a) Os enunciados que introduzem os artigos 1.548 e 1.550 têm sentido diferente. Explique essa diferença, comparando, do ponto de vista morfológico, as palavras nulo e anulável. RESOLUÇÃO: Nulo significa, no contexto, “sem valor, sem efeito por falta de uma formalidade fundamental”; anulável significa “que pode ser tornado nulo”. Portanto, entende-se que, nos termos do artigo1.548,não tem efeito o casamento contraído por “enfermo mental sem discernimento para os atos da vida civil” ou por pessoa sob impedimento; nos termos do artigo 1.550, entende-se que podem ser anulados os casamentos contraídos por menores ou celebra dos por pessoa não autorizada. A diferença morfológica – e, em consequência, semântica – entre os adjetivos nulo e anulável está em que o último se forma por derivação sufixal, a partir do verbo anular – por isso com a raiz nul- acrescida do prefixo a-. O sufixo empregado, -vel , significa “passível de”.
a) Qual é o pressuposto da personagem que defende o acordo ortográfico entre os países de língua portuguesa? Por que esse pressuposto é inadequado? RESOLUÇÃO: O pressuposto é que o Acordo promoveria a uniformização do português escrito, permitindo que livros portugueses se publicassem no Brasil sem nenhuma alteração. Tal pressuposto é des mentido pela simples leitura de algumas linhas de um livro português, linhas nas quais avultam as diferenças entre o vocabulário português e o brasileiro.
b) Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), infringência vem de infringir (violar, transgredir, desrespeitar) +ência. Compare o processo de formação dessa palavra com o de incompetência, indicando eventuais diferenças e semelhanças.
b) Explique como, na tira acima, esse pressuposto é quebrado. RESOLUÇÃO: A grande diferença lexical, que a leiturarevela, entre o português lusitano e o brasileiro constitui, como sugere a historieta, um obstáculo muito mais grave à compreensão mútua do que as diferenças gráficas que o Acordo Ortográfico busca superar.
RESOLUÇÃO: Infringência significa “ato de infringir”; incompetência significa “falta de competência”. Em ambas as palavras encontram-se os mesmos pre fixo (in) e sufixo (-ência). Infringência , porém, forma-se por derivação sufixal, pois o prefixo faz parte do verbo, infringir (“desobedecer, descumprir”), a cujo radical se juntou o sufixo ência, formador de substantivo abstrato, ao passo que em incompetência ocorre derivação prefixal, pois o prefixo in-, de sentido negativo, se junta ao substantivo competência.
–9
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 10
3. (UNICAMP) – Reportagem da Folha de S. Paulo informa que o presidente do Brasil assinou decreto estabelecendo prazos para o País colocar em prática o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que unifica a ortografia nos países de língua portuguesa. Na matéria, o seguinte quadro comparativo mostra alterações na ortografia estabelecidas em diferentes datas: P O R T U G U Ê S B
Após as reformas de 1931 e Êles estão tranqüilos, porque prova1943: velmente não crêem em fantasmas. Após as alterações de 1971:
b) O excerto transcrito apresenta uma ironia. Em que con siste essa ironia? Justifique. RESOLUÇÃO: A ironia do articulista refere-se à suposição, que fundamenta o Acordo, de que pequenas alterações ortográficas sejam suficientes para promover ou facilitar de maneira significativa o intercâmbio cultural entre os países lusófonos. Ao referir-se a lugares remotos e ignorados, o articulista, além de dar expressão a preconceitos sociais e culturais, pretende sugerir que o “atraso” – econômico, social, cultural – presumível em tais cidades seja o principal problema a travar as relações culturais entre os países envolvidos.
Eles estão tranqüilos, porque provavelmente não crêem em fantasmas.
Após o novo acordo, a vigorar Eles estão tranquilos, porque provaa partir de janeiro de 2009 velmente não creem em fantasmas. Sobre o acordo, a reportagem ainda informa:
As regras do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entram em vigor no Brasil a partir de janeiro de 2009, vão afetar principalmente o uso dos acentos agudo e circunflexo, do trema e do hífen. Cuidado: segundo elas, você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia. (...) (Adaptado de E. Simões, “Que língua é essa?”. Folha de S.Paulo, Ilustrada, p. 1, 28/09/2008.) a) O excerto acima supõe que alterações ortográficas modifiquem o modo de falar uma língua. Mostre a palavra utilizada que permite essa interpretação. Levando em consideração o quadro comparativo das mudanças ortográficas e a suposição expressa no excerto, explique o equívoco dessa suposição. RESOLUÇÃO: Ao concluir que “você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia”, o jornalista usou o verbo dizer em lugar de
escrever, induzindo o leitor em erro, ao sugerir que a reforma afetaria o modo de falar das pessoas. O quadro comparativo apresentado seria suficiente para desmentir a sugestão do jornalista, pois nele se vê que não houve alteração na pronúncia das palavras, mas apenas na sua grafia.
4. (FUVEST) – Leia o seguinte texto, extraído de uma biografia do compositor Carlos Gomes.
No ano seguinte [1860], com o objetivo de consolidar sua formação musical, [Carlos Gomes] mudou-se para o Rio de Janeiro, contra a vontade do pai, para iniciar os estudos no conservatório da cidade. “Uma ideia fixa me acompanha como o meu destino! Tenho culpa, porventura, por tal cousa, se foi vossemecê que me deu o gosto pela arte a que me dediquei e se seus esforços e sacrifícios fizeram-me ganhar ambição de glórias futuras?”, escreveu ao pai, aflito e cheio de remorso por tê-lo contrariado. “Não me culpe pelo passo que dei hoje. [...] Nada mais lhe posso dizer nesta ocasião, mas afirmo que as minhas intenções são puras e espero desassossegado a sua bênção e o seu perdão”, completou. (http://musicaclassica.folha.com.br) a) Sobre o advérbio “porventura”, presente na carta do compositor, o dicionário Houaiss informa: usa-se em frases interrogativas, especialmente em perguntas delicadas ou retóricas. Aplica-se ao texto da carta essa informação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A pergunta modulada pelo advérbioporventura é claramente retórica, ou seja, é uma afirmação sob a forma de pergunta, pois nela o autor sugere ter sido o próprio pai o “culpado” de seu “gosto pela arte”, um gosto que então o levaria a contrariar determinações paternas.
Ainda sobre a reforma ortográfica, Diogo Mainardi escreveu o se guinte:
Eu sou um ardoroso defensor da reforma ortográfica. A perspectiva de ser lido em Bafatá, no interior da Guiné-Bissau, da mesma maneira que sou lido em Carinhanha, no interior da Bahia, me enche de entusiasmo. Eu sempre soube que a maior barreira para o meu sucesso em Bafatá era o C mudo [como em facto na ortografia de Portugal] (...) (D. Mainardi, “Uma reforma mais radical”. Revista VEJA, p. 129, 8/10/2008.)
10 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 11
b) Cite duas palavras, também empregadas pelo com positor, que atestem, de maneira mais evidente, que, daquela época para hoje, a língua portuguesa sofreu modificações. RESOLUÇÃO: As formas cousa e vossemecê, hoje desusadas no Brasil, atestam a evolução da língua. As formas hoje correntes dessas palavras são coisa e você. (O mesmo não seria verdade para Portugal, onde também a língua evoluiu, evidentemente, no último século e meio, e onde também as referidas pala vras se transformaram, mas onde ainda são cor rentes, em certos dialetos, as duas formas mais antigas.)
5. (UNICAMP)
a) A primeira tira é uma tradução portuguesa e a segunda, uma tradução brasileira. Dê um exemplo de uma diferença sintática entre a tradução do português europeu e a do português brasileiro. Descreva essa diferença. RESOLUÇÃO: A fala da mãe de Calvin, no último quadrinho, sem fugir ao coloquial lusitano, corresponde à norma culta quanto ao emprego do pronome oblíquo o como objeto direto depôr e sujeito de comer. No português do Brasil, a construção “fazer ele comer” corresponde à variante coloquial popular, que discrepa da norma culta, pois apresentao pronome retoele em função de objeto direto defazer. Outra diferença sintática significativa entre a tradução portuguesa e a brasileira se encontra nas construções “que te transformará”/“que irá te transformar”, no segundo quadrinho. Na versão portuguesa ocorre próclise do pronome oblíquo átono em construção com o futuro. Tal próclise seria justificada, nos termos da gramática normativa, pela “atração” exercida pronomebrasileira, relativo que, impeditiva da mesóclise transformar-te-á . Napelo tradução a construção “que irá te transformar” desrespeitaria tanto a “regra” da atração do pronome oblíquo (cuja observância resultaria em “que te irá transformar”) quanto, segundo a análise convencional, a interdição de ênclise com o futuro. Em “irá te transformar”, porém, não ocorre a ênclise condenada irá-te, mas sim, de acordo com a tendência geral da linguagem coloquial brasileira, a próclise “te transformará”. Ainda no segundo quadrinho, uma diferença sintática expressiva pode ser notada no confronto entre a uniformidade do tratamento em segunda pessoa, que se observa na versão portuguesa (te e comeres), e a falta de uniformidade presente na versão brasileira, com a mistura de segunda e terceira pessoa nos pronomes e na flexão verbal (te e você comer). A diferença entre as construções com o verbo ter, regendo preposição ou conjunção com função prepositiva – “tem de” (versão portuguesa) e “tem que” (versão brasileira) –, não chega a ser uma diferença propriamente sintática nem é significativa da diferença entre o português dos dois países, pois ter que também se usa em Portugal. Observe-se, porém, que gramáticos mais empedernidamente autoritários em sua “defesa” da tradição linguística (Napoleão Mendes de Almeida, por exemplo) consideram que as duas construções não se equivalem e devem ser usadas em contextos linguísticos diversos e com sentidos diferentes.
b) Explique a diferença de sentido entre os verbos ter e haver em “Tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!”, na segunda tirinha. RESOLUÇÃO: A frase “tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!” apresenta o verbo ter com sentido de “dever” e haver com significado de “existir”, como é corrente no coloquial brasileiro.
– 11
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 12
MÓDULO
P O R T U G U Ê S B
Sintaxe (V)
1. (UNICAMP) – As gramáticas costumam definir os tempos verbais de forma simplificada. C. Cunha e L. Cintra, por exemplo, em suaNova Gramática do Português Contemporâneo , dizem que “o futuro designa um fato ocorrido após o momento em que se fala” . Observe como Bastos Tigre joga com essa noção de futuro para dar uma interpretação engraçada do sétimo mandamento.
Não furtarás – prega o Decálogo e cada homem deixa para amanhã a observância do sétimo mandamento. (citado por Mendes Fradique em sua Grammatica
b) Tanto sou como é são formas de presente do indicativo. Apesar disso, a visão de tempo que elas transmitem não é a mesma em uma e outra. Em que consiste essa diferença? RESOLUÇÃO: Sou tem o valor de presente propriamente dito: enuncia um fato contemporâneo, algo que ocorre no mesmo momento em que se dá a enunciação. Quanto a é, em “O que é uma coisa bela?”, seu valor é atemporal, pois enuncia algo que não se limita ao momento da enunciação. É o que se chamapresente durativo ou universal, por indicar ações e estados permanentes, como, por exemplo, uma verdade científica, um dogma, um artigo de lei etc.
Portugueza pelo Methodo Confuso, 1928) a) Qual a interpretação usual (feita, por exemplo, por um rabino, um pastor ou um padre) desse mandamento? RESOLUÇÃO: O homem não deve furtar em tempo algum. O futuro tem valor de imperativo.
b) Qual a interpretação feita por Bastos Tigre? RESOLUÇÃO: A interpretação é literal. O homem furta a todo momento, deixando a aplicação do mandamento para os dias vin douros.
2. (FUVEST) (...) O antropólogo Claude Lévi-Strauss detestou a Baía de Guanabara Pareceu-lhe uma boca banguela. E eu, menos a conhecera mais a amara? Sou cego de tanto vê-la, de tanto tê-la estrela O que é uma coisa bela? (Caetano Veloso,O Estrangeiro) a) Na linguagemliterária, muitas vezes,o mais-que-perfeito doindicativo substitui outras formas verbais, como no verso: “E eu, menos a conhecera mais a amara?”. Reescreva-o, usando as formas que o maisque-perfeito substituiu. RESOLUÇÃO: “E eu, menos a conhecesse mais a amaria? As formas do mais-que-perfeito do indicativo conhecera e amara substituem o imperfeito do subjuntivo conhecesse e o futuro do pretérito do indicativo amaria, respectivamente.
12 –
Leia o texto seguinte.
Desculpe-nos pela demora em responder a sua reclamação sobre a sua TV de plasma. Precisávamos ter a certeza de que a nossa matriz aqui no Brasil estaria nos enviando a referida peça. Na próxima semana, estaremos fazendo uma revisão geral no aparelho e vamos estar enviando ele para o senhor. Atenciosamente... (Texto do e-mail de uma empresa, justificando o atraso em consertar um aparelho eletrônico.) 3. (UFSCar) – Observa-se, nesse texto, um problema de estilo comum nas correspondências comerciais e nas comunicações de telemarketing e também um desvio da norma padrão do português do Brasil. a) Identifique o problema de estilo e redija o trecho em que ele ocorre, corrigindo-o. RESOLUÇÃO: O “problema de estilo” consiste no hábito corrente de substituir formas verbais simples por locuções com o verbo auxiliar estar seguido do gerúndio do verbo principal. Assim, no texto transcrito, “es taria… enviando” substitui “enviaria”; “estaremos fazendo” substitui “faremos” e “vamos estar enviando” substitui “vamos enviar”. Reescrito e melhorado em alguns pontos, o trecho em questão poderia assumir a seguinte forma: “Precisávamos ter certeza de que a nossa matriz no Brasil nos enviaria a referida peça. Na próxima semana,faremos uma revisão geral no aparelho e o enviaremos ao senhor”.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 13
5. (FUVEST) – Leia o excerto, observando as diferentes formas verbais.
b) Identifique o desvio e redija o trecho em que ele ocorre, corrigido. RESOLUÇÃO: O “desvio da norma padrão” do Português, não ape nas do Brasil, está no emprego do pronome retoele em função de objeto, na qual seria de regra o pronome oblíquo o: “vamos enviá-lo”.
Chegou. Pôs a cuia no chão, escorou-a com pedras, matou a sede da família. Em seguida acocorou-se, remexeu o aió, tirou o fuzil, acendeu as raízes de macambira, soprou-as, inchando as bochechas cavadas. Uma labareda tremeu, elevou-se, tingiu-lhe o rosto queimado, a barba ruiva, os olhos azuis. Minutos depois o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim. Eram todos felizes. Sinha Vitória vestiria uma saia larga de ramagens. A cara murcha de sinha Vitória remoçaria (...). (...) A fazenda renasceria – e ele, Fabiano, seria o vaqueiro, para bem dizer seria dono daquele mundo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) a) Considerando que no primeiro parágrafo predomina o pretérito perfeito, justifique o emprego do imperfeito em “... o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim”.
Texto para a questão 4.
RESOLUÇÃO: As formas do pretérito perfeito indicam ações pontuais, concluídas no passado; o imperfeito indica ação em decurso no passado. O efeito narrativo do imperfeito, no caso, é atribuir vivacidade à ação, apresentando-a em seu desdobramento.
No dia em que o país dispor de uma moeda mais competitiva, poderá se transformar em potência comercial porque finalmente aprendeu a desenvolver inteligência comercial. (Luís Nassif, Agência Dinheiro Vivo, www.luisnassif.com.br, 7/7/2010) 4. a) O texto acima apresenta um ponto em que se afasta da norma culta. Aponte-o, comente-o e corrija-o. RESOLUÇÃO: A forma verbal dispor, que deveria estar no futuro do subjuntivo, pois enuncia uma possibilidade futura, foi confundida com o infinitivo. A forma correta seria dispuser.
b) Explique o efeito de sentido produzido no excerto pelo emprego do futuro do pretérito. RESOLUÇÃO: O perfeito e o imperfeito relatam fatos; o futuro do pretérito registra desejos, aspirações, fantasias da personagem (sinalizando, portanto, discurso indireto livre).
b) Tal como está redi gido, o texto pare ce afirmar que o pa ís já aprendeu a “desenvolver inteligência comercial”. O sentido sugerido pelo contexto é, porém, outro: que o desenvolvimento de “inteligência comercial” só se dará quando o país contar com “uma moeda mais competitiva”. Para que se explicite com precisão este último sentido, como ficaria a redação da frase a partir de “... porque finalmente...”? RESOLUÇÃO: ... porque finalmente terá aprendido a desenvolver inteligência comercial.
– 13
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 14
Texto para a questão 6.
P O R T U G U Ê S B
Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade. A obesidade não foge à regra. Na Idade Média, a sociedade considerava a hanseníase um castigo de Deus para punir os ímpios. No século 19, quando proliferaram os aglomerados urbanos e a tuberculose adquiriu características epidêmicas, dizia-se que a enfermidade acometia pessoas enfraqueci das pela vida devassa que levavam. Com a epidemia de Aids, a mesma história: apenas os promíscuos adquiririam o HIV. Coube à ciência demonstrar que são bactérias os agentes causadores de tuberculose e da hanseníase, que a Aids é transmitida por um vírus e que esses micro-organismos são alheios às virtudes e fraquezas humanas: infectam crianças, mulheres ou homens, não para puni-los ou vê-los sofrer, mas Tanto porquesepretendem e multiplicar-se como todos os seres vivos. lhes dá se crescer o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. (...) (Drauzio Varella,Folha de S.Paulo, 12/11/2005) 6. (FUVEST) a) Crie uma frase com a palavra “obesidade” que possa ser acres centada ao final do 2.° parágrafo sem quebra de coerência.
b) Fazendo as adaptações necessárias e respeitando a equivalência de sentido que a expressão “Tanto se lhes dá (...)” tem no texto, proponha uma frase, substituindo o pronome lhes pelo seu referente. RESOLUÇÃO: Pouco importa a esses micro-organismos se o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. A formulação deste quesito não é inteiramente precisa, pois não se esclarece se o pronome lhes deve ser substituído por seu referente em suas duas ocorrências na frase ou, o que parece mais razoável, apenas na primeira, na expressão cujo sentido se questiona. Outro defeito na formulação deste quesito se encontra no trecho “respeitando a equivalência de sentido que a expressão ‘Tanto se lhes dá (...)’ tem no texto”. Esse trecho deveria ser substituído por uma redação mais simples, direta e precisa: mantendo-se o sentido que a expressão “Tanto se lhes dá” tem no texto, pois não é a “equivalência de sentido que a expressão... tem no texto” que se quer respeitada.
RESOLUÇÃO: Nos nossos dias, é comum atribuir às pessoas obesas a culpa por sua obe sidade, como se sua condição fosse apenas resultado de seu descomedimento ao comer. A frase deve encaixar-se na série de exemplos contida no segundo pará grafo. Tais exemplos ilustram a primeira afirmação do texto: “Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade.” O caso da obesidade seria a ilustração da afirmação complementar do parágrafo inicial: “A obesidade não foge à regra.”
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (I)
1. (UNICAMP-SP) – Na seguinte cena do Auto da Barca do Inferno, o Corregedor e o Procurador dirigem-se à Barca da Glória, depois de se recusarem a entrar na Barca do Inferno.
Corregedor: Anjo:
Corregedor:
Ó arrais dos gloriosos, passai-nos neste batel! Ó pragas pera papel, pera as almas odiosos! Como vindes preciosos, sendo filhos da ciência! Ó! habeatis clemência e passai-nos como vossos!
para
tende
Hou, homens dos breviairos1, rapinastis coelhorum et pernis perdiguitorum2 e mijais nos campanairos! Corregedor: Ó! Não nos sejais contrairos, pois nom temos outra ponte! Joane (Parvo): Beleguinis ubi sunt3? Ego latinus macairos4. (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno. São Paulo, Ateliê Editorial, 1996, p. 107-109.) Joane (Parvo):
1 – Homens dos breviairos: homens de leis. 2 – Rapinastis coelhorum / et pernis perdiguitorum:Recebestes coelhos e pernas de perdiz como suborno. 3 – Beleguinis ubi sunt?: Onde estão os policiais? 4 – Ego latinus macairos: Eu falo latim macarrônico.
14 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 15
a) De que pecado o Parvo acusa o homem de leis (Corregedor)? Esse é o único pecado de que ele é acusado na peça? RESOLUÇÃO: Joane, o Parvo, acusa o Corregedor de se deixar subornar com as ofertas de coelhos e pernas de perdiz, sendo, desse modo, segundo o Diabo, um “santo descorregedor”, sentenciando com pouca honestidade (“ quia judicastis malitia”). Além disso, há referência ao desrespeito do Correge dor aos mortos, uma vez que urinara nas campas. Outro delito do qual o magistrado é acusado pelo Diabo é o de ter explorado os trabalhadores inocentes (“ignorantes do pecado”): “A largo modo adquiristis / sanguinis laboratorum, / ignorantes peccatorum”.
a) Por que o Cavaleiro chama a atenção do Diabo? RESOLUÇÃO: Porque o Cavaleiro sacrificou a vida para defender o Cristianismo e, assim, ter assegurado seu lugar na barca da Glória. O Diabo presume que o Cavaleiro é, como a maioria dos mortos chegados ao cais, um ser cheio de vícios e interpela-o. O Cavaleiro adverte o Diabo, distinguindo-se e evitando maior contato. B S Ê U G U T R O P
b) Onde e como morreram os dois Cavaleiros? b) Com que propósito o latim é empregado pelo Corregedor? E pelo Parvo? RESOLUÇÃO: O Corregedor emprega o latim de uso jurídico, que caracteriza o homem de leis, tipificando a personagem. O Parvo, por sua vez, vale-se do latim de maneira humorística e, consciente de seus erros, declara falar latim “macarrônico”, isto é, mistura de latim e português. Para o Corregedor, o latim é instrumento de autoridade; para o Parvo, ao contrário, é um meio de contestação da autoridade e de zombaria da pompa de que se reveste o discurso autoritário.
RESOLUÇÃO: Os Cavaleiros morreram numa Cruzada, em combate contra os “infiéis”. Observe-se que, na época da encenação do Auto da Barca do Inferno, as Cruzadas já eram coisa do passado.
c) Por que os dois passam pelo Diabo sem se dirigir a ele? 2. (UNICAMP-SP) – Leia o diálogo abaixo, do Auto da Barca do Inferno:
RESOLUÇÃO: Porque entendem que quem deu a vida numa Cruzada, em defesa do Cristianismo, tem assegurado um lugar na barca da Glória, estando livre da condenação ao inferno.
Diabo:
Cavaleiros, vós passais e não perguntais onde is? Cavaleiro 1: Vós, Satanás, presumis? Atentai com quem falais! Cavaleiro 2: Vós que nos demandais? Sequer conhece-nos bem. Morremos nas partes d’além, e não queirais saber mais. (Gil Vicente, “Auto da Barca do Inferno”, in Antologia do Teatro de Gil Vicente. Org. Cleonice Berardinelli, Rio de Janeiro, Nova Fronteira/Brasília, INL, 1984, p. 89.) – 15
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 16
3. (FUVEST-SP)
E, chegando à barca da Glória, diz ao Anjo:
Brísida: Anjo: Brísida: P O R T U G U Ê S B
Barqueiro, mano, meus olhos, prancha a Brísida Vaz! Eu não sei quem te cá traz... Peço-vo-lo de giolhos! Cuidais que trago piolhos, anjo de Deus, minha rosa? Eu sou Brísida, a preciosa, que dava as moças aos molhos.
4. Sobre o Auto da Barca do Inferno, afirmou Antônio José Saraiva:
O Parvo, que se convertera em uma espécie de comentador, independente da ação, punha à mostra, com os seus disparates, o ridículo das personagens convencidas do seu papel. Qual o motivo de o Anjo deixar o Parvo à espera para entrar no batel? RESOLUÇÃO: O Parvo observa os passageiros que pretendem embarcar para o Céu e comenta, jocosamente, a respeito deles.
A que criava as meninas para os cônegos da Sé... Passai-me, por vossa fé, meu amor, minhas boninas, olhos de perlinhas finas! (...) (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno – texto fixado por Segismundo Spina) a) No excerto, a maneira de tratar o Anjo empregada por Brísida Vaz relaciona-se à atividade que ela exercera em vida? Explique resumidamente. RESOLUÇÃO: Brísida Vaz, em vida, era alcoviteira, ou seja, agenciava mulheres para a prostituição. Assim, sua linguagem revela sua atividade, pois ela se utiliza de termos que procuram seduzir o Anjo, como “anjo de Deus”, “minha rosa”, “meu amor”, “minhas boninas”, “olhos de perlinhas finas”.
5. (PUC-SP) – Diabo, Companheiro do Diabo, Anjo, Fidalgo, Onzeneiro, Parvo, Sapateiro, Frade, Florença, Brísida Vaz, Judeu, Corregedor, Procurador, Enforcado e Quatro Cavaleiros são personagens do Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente. Analise as informações abaixo e selecione a alternativa incorreta, cujas características não descrevem adequadamente a personagem. a) O Onzeneiro idolatra o dinheiro; é agiota e usurário; de tudo o que juntara, nada leva para a morte, ou melhor, leva a bolsa vazia. b) O Frade representa o clero decadente e é subjugado por suas fraquezas: mulher e esporte; leva a amante e as armas de esgrima. c) O Diabo, capitão da barca do Inferno, é quem apressa o embarque dos condenados; é dissimulado e irônico. d) O Anjo, capitão da barca do Céu, é quem elogia a morte pela fé; é austero e inflexível. e) O Corregedor representa a justiça e luta pela apl icação íntegra e exata das leis; carrega papéis e processos.
b) No excerto, o trata mento que Brísid a Vaz dispensa ao Anjo é adequado à obtenção do que eladeseja —isto é, levar oAnjo a permitir que ela embarque? Por quê?
RESOLUÇÃO: O Auto da Barca do Inf erno apresenta personagens representativas da sociedade medieval portuguesa. Suas atitudes em vida as credenciam ao embarque para o Céu ou para o Inferno. O Corregedor aceitava “as peitas dos judeus”, propinas e suborno, convertendo-se no símbolo da justiça corrupta e da utilização do poder judiciário em proveito próprio e no de alguns privilegiados, em detrimento dos humildes e desvalidos. Vai para o Inferno, apesar de toda a retórica latinizante da vida forense, que o dramaturgo explora cômica e satiricamente, para compor os tipos carica tos do juiz venal e do procurador subserviente. Resposta: E
RESOLUÇÃO: O tratamento que Brísida Vaz dispensa ao Anjo é inadequado, pois revela apego ao universo pecaminoso da sedução e prostituição, ou seja, justamente àquilo que justifica sua condenação ao inferno.
16 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 17
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (II)
1. (UNICAMP-SP-2010) – No excerto abaixo, o romance Iracema é aproximado da narrativa bíblica:
Em Iracema, (...) a paisagem do Ceará fornece o cenário edênico para uma adaptação do mito da Gênese. Alencar aproveitou até o máximo as similaridades entre as tradições indígenas e a mitologia bíblica (...). Seu romance indianista (...) resumia a narrativa do casamento inter-racial, porém (...) dentro de um quadro estrutural pseudohistórico mais sofisticado, derivado de todo um complexo de mitos bíblicos, desde a Queda Edênica ao nascimento de um novo redentor. Exilados, Aliados, Rebeldes: (David Treece,indigenista o movimento indianista, a política e o Estado-Nação imperial. São Paulo, Nankin/Edusp, 2008, p. 226, 258-259.) Partindo desse comentário, responda às questões: a) Que associação se pode esta belecer entre os protagoni stas do romance e o mito da Queda com a consequente expulsão do Paraíso? RESOLUÇÃO: O mito da Queda, central na tradição judaico-cristã, corresponde à narrativa segundo a qual Adão e Eva, habitantes do Éden (Paraíso), teriam comido o fruto proibido. Por causa dessa falta, teriam tido como castigo a expulsão da morada paradisíaca e o mergulho de seus descendentes, o gênero humano, na dor e sofrimento (multiplicação da dor do parto, necessidade de “ganhar o pão com o suor do rosto”). Iracema aproveita vários elementos desse mito: o vinho da jurema assemelha-se ao fruto proibido; a perda da inocência de Adão e Eva equivale à união carnal entre Martim e Iracema; a descida que a protagonista faz do território tabajara para o pitiguara identifica-se com a perda do Paraíso. O caminho para baixo é percorrido após o sexto dia, que lembra o dia da criação do homem; a dor da heroína ao ver seus conterrâneos mortos em combate e, mais adiante, durante o seu parto, estabelece proximidade com os sofrimentos profetizados por Deus à espécie humana.
2. (UNICAMP-SP) – Leia, abaixo, a letra de uma canção de Chico Buarque inspirada no romance de José de Alencar, Iracema, lenda do Ceará: IRACEMA VOOU Iracema voou Para a América Leva roupa de lã E anda lépida Vê um filme de quando em vez Não domina o idioma inglês
Lavasaído chão ao numa Tem luarcasa de chá Com um mímico Ambiciona estudar Canto lírico Não dá mole pra polícia
Se puder, vai ficando por lá Tem saudade do Ceará Mas não muita Uns dias, afoita Me liga a cobrar: — É Iracema da América (Chico Buarque, As Cidades. Rio de Janeiro, Marola Edições Musicais Ltda.,1998.) a) Que papel desempenha Iracema no romance de José de Alencar? E na canção de Chico Buarque? RESOLUÇÃO: Iracema desempenha, no romance de Alencar, o papel de heroína romântica, mártir do amor. Ela é a sacerdotisa ou vestal dos Tabajaras, que detém o segredo da jurema. Além disso, ela pode ser considerada a própria representação da natureza virgem dos trópicos, que será possuída pelo colonizador europeu, o português Martim, com quem terá um filho. Na canção de Chico Buarque, Iracema desempenha o papel da brasileira exilada que, com astúcia “malandra”, consegue “se virar”, procurando “se dar bem” na América do Norte e preferindo viver lá , apesar das dificuldades e da saudade da terra natal.
b) Qual personagem poderia ser associada ao “novo redentor”? Por quê? RESOLUÇÃO: O “novo redentor” é Moacir, filho de Iracema com Martim. Assim como Cristo teria vindo ao mundo para redimir o gênero humano do pecado srcinal, levando-o a uma nova condição, o jovem mestiço daria srcem a um novo povo, o brasileiro, que, na visão de Alencar, ficaria no lugar do indígena.
– 17
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 18
b) Uma das interpretações para o nome da heroína do romance de José de Alencar é de que seja um anagrama de América. Isto é, o nome da heroína possui as mesmas letras deAmérica dispostas em outra ordem. Partindo dessa interpretação, explique o que distingue a referência à América no romance daquela que é feita na canção.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: No romance Iracema, lenda do Ceará, o jogo anagramático com o nome da heroína é, evidentemente, uma referência ao Brasil ou, genericamente, à América do Sul. Já em Iracema voou, o anagrama funciona como refe rência à América do Norte ou, mais especificamente, aos Estados Unidos.
No trecho, Machado de Assis afirma que a narração de Iracema não parece ter sido feita por um “poeta moderno”, mas, sim, por um “bardo indígena”. Essa afirmação se justifica? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: A afirmação é pertinente, pois o estilo de Iracema procura incorporar a linguagem e a cosmovisão indígenas. A tentativa de simular a c osmovisão indígena é visível, por exemplo, na marcação temporal, que toma como parâmetro os ciclos da natureza. A apropriação da linguagem aborígine ocorre nos nomes próprios, nas aglutinações lexicais, nas perífrases e nas comparações com elementos da natureza.
3. (FUVEST-SP) – Considere os dois trechos de Machado de Assis, relacionados a Iracema e publicados na época em que apareceu esse romance de Alencar, e responda ao que se pede. a) A poesia americana está completamente nobilitada; os maus poetas já não podem conseguir o descrédito desse movimento, que venceu com o autor de “I-Juca-Pirama” e acaba de vencer com o autor de Iracema. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) Machado de Assis refere-se, nesse trecho, a um movimento literário chamado, na época, de “poesiaamericana”ou “escola americana”. Sob que outro nome veio a ser conhecido esse movimento? Quais eram seus principais objetivos? RESOLUÇÃO: Machado de Assis refere-se ao Indianismo, tendência romântica brasileira cujo objetivo central era nobilitar o passado nacional, associando-o a mitos heroicos elaborados por meio da idealização dos indígenas e de sua cultura, assimilados a padrões europeus de excelência física e moral.
b) Tudo em Iracema nos parece primitivo; a ingenuidade dos sentimentos, o pitoresco da linguagem, tudo, até a parte narrativa do livro, que nem parece obra de um poeta moderno, mas uma história de bardo1 indígena, contada aos irmãos, à porta da cabana, aos últimos raios do sol que se entristece. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) 1 – Bardo: poeta heroico, entre os celtas e gálios; por extensão, qualquer poeta, trovador etc.
18 –
4. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo foi extraído de Iracema. Ele reproduz a reação e as últimas palavras de Batuiretê antes de morrer:
O velho soabriu as pesadas pálpebras e passou do neto ao estrangeiro um olhar baço. Depois o peito arquejou e os lábios murmuraram: — Tupã quisque estes olhos vissem, antes de se apagarem, o gavião branco junto da narceja. O abaeté derrubou a fronte aos peitos e não falou mais, nem mais se moveu. (José de Alencar,Iracema: lenda do Ceará. Rio de Janeiro, MEC/INL, 1965, p. 171-172.) a) Quem é Batuiretê? RESOLUÇÃO: Batuiretê fora grande guerreiro e líder dos pitiguaras. Em razão da idade, deixa de guerrear e transfere a liderança do grupo ao filho Jatobá, pai de Poti. Batuiretê torna-se então uma espécie de conse lheiro, sábio ou, melhor, oráculo de guerra para os de sua tribo. Daí o nome tupi com que a perso nagem é denominada: Maranguab, que, nas palavras do neto Poti (nesse mesmo capítulo), significa “o grande sabedor da guerra”.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 19
b) Identifique as personagens a quem ele se dirige e indique os papéis que desempenham no romance. RESOLUÇÃO: O “neto” referido no texto é o guerreir o pitiguara Poti , que é amigo e aliado do coprotagonista (Martim Soares Moreno) e o auxilia tanto no estabelecimento da civilização portuguesa no Ceará, como no episódio romanesco entre o guerreiro português e a virgem tabajara. Sob o nome de batismo de Antônio Felipe Camarão, transforma-se de personagem ficcional em personagem histórica, participante da luta pela expulsão dos holandeses. É o índio assimilado à civilização: Antônio (santo da devoção), Felipe (rei de Espanha, Felipe III, à época da União Ibérica, em que ocorre o romance, 1604-1611). O “estrangeiro”, referido em seguida, é Martim Soares Moreno, representante do Estado português, guerreiro branco e agente da civilização cristã na colonização do Ceará. É o elemento que, ao se introduzir no universo indígena e consorciar-se com a “virgem de Tupã”, contribui para a destruição da América primitiva.
MÓDULO
c) Explique o sentido da metá fora empregada por Batuiretê em sua fala. RESOLUÇÃO: Batuiretê refere-se, por meio da expressão “o gavião branco junto da narceja”, à dominação branca e à submissão do índio, numa premonição trágica do destino de seu povo.
Literatura e Análise de Textos Literários (III)
1. (FUVEST-SP) – Leia o trecho de abertura de Memórias de um Sargento de Milícias e responda ao que se pede.
Era no tempo do rei. Uma das quatro esquinas que formam as ruas do Ouvidor e da Quitanda, cortando-s e mutuamente, chamava-se nesse tempo — O canto dos meirinhos —; e bem lhe assentava o nome, porque era aí o lugar de encontro favorito de todos os indivíduos dessa classe (que gozava então de não pequena consideração). Os meirinhos de hoje não são mais do que a sombra caricata dos meirinhos do tempo do rei; esses eram gente temível e temida, respeitável e respeitada; formavam um dos extremos da formidável cadeia judiciária que envolvia todo o Rio de Janeiro no tempo em que a demanda era entre nós um elemento de vida: o extremo oposto eram os desembargadores. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) a) A frase “Era no tempo do rei” refere-se a um período histórico determinado e possui, também, uma conotação marcada pela indeterminação temporal. Identifique tanto o período histórico a que se refere a frase quanto a mencionada conotação que ela também apresenta.
b) No trecho aqui reproduzido, o narrador c ompara duas épocas diferentes: o seu próprio tempo e o tempo do rei. Esse procedimento é raro ou frequente no livro? Com que objetivo o narrador o adota? RESOLUÇÃO: Esse procedimento é frequente no livro, pois um dos objetivos do narrador é confrontar duas épocas — a sua (tempo da enunciação) e aquela em que ocorrem os fatos narrados (tempo do enunciado).
RESOLUÇÃO: O período histórico a que se refere a frase é o que se inicia com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808, sendo D. João VI o rei referido. A frase “Era no tempo do rei”, para além dessa referência histórica, associa-se à abertura formular de contos de fadas e semelhantes — “Era uma vez...” — e, nesse sentido, conota tempo e espaço indeterminados.
– 19
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 20
As questões de números 2 a 4 tomam por base um fragmento do livro Memórias de um Sargento de Milícias, escrito por Manuel Antônio de Almeida (1831-1861).
P O R T U G U Ê S B
Era a comadre uma mulher baixa, excessivamente gorda, bonachona, ingênua ou tola até um certo ponto, e finória até outro; vivia do ofício de parteira, que adotara por curiosidade, e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade. Era a folhinha mais exata de todas as festas religiosas que aqui se faziam; sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até o nome do padre; era pontual à ladainha, ao terço, à novena, ao setenário; não lhe escapava via-sacra, procissão, nem sermão; trazia o tempo habilmente distribuído e as horas combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e
3. (VUNESP-SP) – Ao referir-se ao fato de a comadre procurar o compadre, a fim de conversar sobre o afilhado, o enunciador fornece
achar já a missa no altar. De madrugada missa da aIdentifique mesma explicação dada à razão de ela abraçar de parteira. Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, e começava daí saindopela pilhava ainda essa explicação, relacionando-a com oosofício costumes da época, a das nove em Santo Antônio. O seu traje habitual era, como o de todas especialmente com o uso da mantilha pelas mulheres. RESOLUÇÃO: as mulheres da sua condição e esfera, uma saia de lila preta, que se Tanto o ofício de parteira que a Comadre adotara quanto a sua ida à casa vestia sobre um vestido qualquer, um lenço branco muito teso e do Compadre tinham o mesmo motivo: a curiosidade, ou seja, a engomado ao pescoço, outro na cabeça, um rosário pendurado no cós preocupação em buscar todos os detalhes sobre a vida alheia. Para isso, a da saia, um raminho de arruda atrás da orelha, tudo isto coberto por mantilha, peça do vestuário muito comum no tempo da narrativa e que uma clássica mantilha, junto à renda da qual se pregava uma pequena consistia em uma faixa de tecido que cobria como um véu o rosto das mulheres, permitia que elas vissem os outros sem serem vistas. É o que figa de ouro ou de osso. (...) (...) a mantilha era o traje mais conveniente aos costumes da época; pode ser confirmado no segundo parágrafo: “a mantilha era o traje mais sendo as ações dos outros o principal cuidado de quase todos, era muito conveniente aos costumes da época; sendo as ações dos outros o principal cuidado [preocupação] de quase todos, era muito necessário ver sem ser necessário ver sem ser visto. A mantilha para as mulheres estava na razão visto.” das rótulas para as casas; eram o observatório da vida alheia. (...) (...) Nesta ocasião levantava-se a Deus, e as duas beatas interromperam a conversa [sobre o afilhado da comadre] para bater nos peitos. Era uma delas a vizinha do compadre, que prognosticava mau fim ao menino e com quem ele prometera fazer uma estralada; a outra era uma das que tinham estado na função do batizado. A comadre, apenas ouviu isso, foi procurar o compadre; não se pense, porém, que a levara a isso outro interesse que não fosse a curio sidade; queria saber o caso com todos os menores detalhes; isso lhe dava longa matéria para a conversa na igreja e para entreter as partu rientes que se confiavam aos seus cuidados. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 4. (VUNESP-SP) – A comadre é apresentada, entre várias características, como uma mulher que cumpria rigorosamente os horários. 2. (VUNESP-SP) – O sincretismo religioso, isto é, a “fusão de Transcreva duas passagens do fragmento em que essa qualidade está diferentes cultos ou doutrinas religiosas” (cf. Dicionário Houaiss) era explícita, referindo-se à participação da personagem nas missas. RESOLUÇÃO: comum em nossa cultura, na época retratada na obra de Manuel Os trechos que comprovam a pontualidade da Comadre em relação a Antônio de Almeida. A descrição da comadre, feita com vivacidade pelo enunciador do texto, permite afirmar que ela é dada a essa prática? missas são os seguintes (todos retirados do primeiro parágrafo): (1) “sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até Justifique sua resposta, com base em uma passagem do texto. o nome do padre”; (2) “trazia o tempo habilmente distribuído e as horas RESOLUÇÃO: No trecho “...e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade” (primeiro parágrafo), percebe-se, na caracterização da Comadre, o sincretismo religioso, ou seja, a fusão de práticas religiosas diferentes, pois a personagem tanto fazia rezas para afastar supostas influências de espíritos malignos (“benzia de quebranto”), uma atividade que a ligava à feitiçaria, quanto frequentava com grande assiduidade as festas e os rituais ligados à Igreja Católica (missas, ladainhas, terços, novenas, via-sacra, procissão, sermão).
20 –
combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e achar já a missa no altar. De madrugada começava pela missa da Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, e daí saindo pilhava ainda a das nove em Santo Antônio.”
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 21
5. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo pertence ao capítulo XLV (“Empenhos”), de Memórias de um Sargento de Milícias.
Isto tudo vem para dizermos que Maria-Regalada tinha um verdadeiro amor ao Major Vidigal; o Major pagava-lho na mesma moeda. Ora, D. Maria era uma das camaradas mais do coração de MariaRegalada. Eis aí por que falando dela D. Maria e a comadre se mostraram tão esperançadas a respeito da sorte do Leonardo. Já naquele tempo (e dizem que é defeito do nosso) o empenho, o compadresco, era uma mola real de todo o movimento social. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias. Cotia, Ateliê Editorial, 2000, p. 319.)
b) Relacione o “defeito” com esse episódio, que envolveu o Major Vidigal e as três mulheres. RESOLUÇÃO: Preso pelo terrível Major Vidigal, chefe dos milicianos no Rio de Janeiro, Leonardo deveria ser, nos termos das leis e regulamentos, severamente punido. Intercedem em seu favor D. Maria, a Comadre e Maria-Regalada. As esperanças da tia de Luisinha e da madrinha estavam assentadas na percepção de que o Major Vidigal seria vulnerável ao apelo sensual de Maria-Regalada e ao “verdadeiro amor” que havia entre ambos. E, mais que isso, de que seria capaz de transgredir os seus deveres funcionais, não punindo Leonardo e, mais tarde, promovendo-o a sargento, para atender ao pleito da mulher qu e desejava. O “defeito ” que nisso se revela é a diluição da ordem, o “jeitinho”, a superposição da vida e dos interesses pessoais aos deveres e obrigações legais. O diálogo (no capítulo XLVI) que se abre com o trecho “—Ora, a lei... O que é a lei, se o Sr. Majorquiser?...” ilustra cabalmente o “defeito” em questão.
a) Explique o “defeito” a que o narrador se refere. RESOLUÇÃO: O “defeito” referido pelo narrador é a ausência de fronteiras nítidas entre o interesse público e a vida privada, é a “dialética da malandragem”, expressão que o crítico Antonio Candido consagrou como caracterizadora da diluição dos limites que separam o “mundo da ordem” e o “mundo da desordem”, a lei e a contravenção, o dever funcional e o interesse pessoal. Por “empenho”, pode-se entender a troca de favores, o clientelismo, e por “compadresco”, o nepotismo que era “uma mola real de todo o movimento social”, como diz o narrador.
MÓDULOS
E
Literatura e Análise de Textos Literários (IV) e ( V)
1. (UNICAMP-SP-2010) – Leia a seguir um trecho de A Cidade e as Serras:
— Sabes o que eu estava pensando, Jacinto?... Que te aconteceu aquela lenda de Santo Ambrósio... Não, não era Santo Ambrósio... Não me lembra o santo. Ainda não era mesmo santo, apenas um cavaleiro pecador, que se enamorara de uma mulher, pusera toda a sua alma nessa mulher, só por a avistar a distância na rua. Depois, uma tarde que a seguia, enlevado, ela entrou num portal de igreja, e aí, de repente, ergueu o véu, entreabriu o vestido e mostrou ao pobre cavaleiro o seio roído por uma chaga! Tu também andavas namorado da serra, sem a conhecer, só pela sua beleza de verão. E a serra, hoje, zás! de repente, descobre a sua grande chaga... É talvez a tua preparação para S. Jacinto. (Eça de Queirós, A Cidade e as Serras. São Paulo, Ateliê Editorial, 2007, p. 252.)
a) Explique a comparação feita por Zé Fernandes. Especifique a que chaga ele se refere. RESOLUÇÃO: Zé Fernandes compara a visão que Jacinto tem da serra à imagem que o santo ou cavaleiro pecador tem de uma mulher: há em ambas as situações o enlevo inicial e o choque com a descoberta de uma chaga. Deve-se entender, no caso de Jacinto, que chaga é uma metáfora que representa a fome, as doenças e a miséria que existiam na serra.
– 21
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 22
P O R T U G U Ê S B
b) Que significado a descoberta dessa chaga tem para Jacinto e para a compreensão do romance?
Texto para as questões 3 e 4.
RESOLUÇÃO: A chaga é metáfora da pobreza, da má situação de vida dos camponeses lusos. Jacinto, ao descobrir essa “chaga”, procura resolver paternalistamente a situação social dos camponeses, torna-se o “pai dos pobres”, um “Dom Sebastião”, segundo João Torrado. Para a compreensão do romance, a descoberta dessa “chaga” indica a necessidade de melhorar as condições de vida no campo, mas sem afrontar a harmonia e a vitalidade da natureza.
No entanto Jacinto, desesperado com tantos desastres humilhadores — as torneiras que dessoldavam, os elevadores que emperravam, o vapor que se encolhia, a eletricidade que sumia, decidiu valorosamente vencer as resistências finais da matéria e da força por novas e mais poderosas acumulações de mecanismos. E nessas semanas de abril, enquanto as rosas desabrochavam, a nossa agitada casa, entre aquelas quietas casas dos Campos Elísios que preguiçavam ao sol, incessantemente tremeu, envolta num pó de caliça e de empreitada, com o bruto picar de pedra, o retininte martelar de ferro. 3. O trecho transcrito foi extraído do quinto ca pítulo de A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós, e se associa à crença que tem o protagonista, Jacinto, nos avanços técnicos como chave paranoa trecho felicidade. relação que a visão queirosiana apresentada tem Qual com oa famoso ideal humanista (já presente, por exemplo, no episódio de “O Gigante Adamastor”, em Os Lusíadas, de Camões), segundo o qual o Homem existe para dominar a Natureza?
2. (FUVEST-SP) – Os romances de Eça de Queirós costumam apresentar críticas a aspectos importantes da sociedade portuguesa, frequentemente acompanhadas de propostas (explícitas ou implícitas) de reforma social. Em A Cidade e as Serras, a) qual o aspecto que se critica nas elites portuguesas?
RESOLUÇÃO: Eça de Queirós mostra de maneira irônica o fracasso da civilização do século XIX, pois esta não conseguiu realizar o ideal humanista de domínio da Natureza, como fica evidente no trecho transcrito, em que se alude à ineficiência de alguns artefatos.
RESOLUÇÃO: Critica-se o abandono da terra natal, visto que essas elites se deixavam seduzir pela cultura francesa, pelo ócio endinheirado e por uma ideia de civilização como “armazenamento” de comodidades, para seu exclusivo benefício. Pode-se dizer que a crítica se dirige à alienação das elites portuguesas perante os problemas sociais em seu país.
b) qual é a relação, segundo preco niza o romance, que essas elites deveriam estabelecer com as classes subalternas? RESOLUÇÃO: A proposta do romance é uma reforma social, encabeçada pelos mais privilegiados, que promovesse a assistência social por meio do amparo e proteção aos menos favorecidos. Quando Jacinto, o protagonista do romance, teve seu apelido mudado de “Príncipe da Grã-Ventura” para “Pai dos Pobres”, esse caráter paternalista fica evidenciado, como se viu na resposta à questão 1, item b.
22 –
4. Na passagem transcrita, apesar de ela fazer parte da fase urbana da narrativa, a Natureza não deixa de, discretamente, estar presente, como em vários outros momentos do livro. Com base no excerto apresentado, explique como tal fato ocorre. RESOLUÇÃO: A Natureza está presente tanto na primeira parte (tese) como na segunda parte (antítese) de A Cidade e as Serras, nas descrições de ambientes, como se percebe, no trecho, em “enquanto as rosas desabrochavam”.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 23
Textos para as questões 5 e 6.
Texto I
Desde o berço, onde a avó espalhava funcho e âmbar para afugentar a Sorte-Ruim, Jacinto medrou com segurança, a rijeza, a seiva rica dum pinheiro das dunas. Não teve sarampo e não teve lombrigas. As letras, a Tabuada, o Latim entraram por ele tão facilmente como o sol por uma vidraça. Entre os camaradas, nos pátios dos colégios, erguendo a sua espada de lata e lançando um brado de comando, foi logo o vencedor, o rei que se adula e a quem se cede a fruta das merendas.
As questões de números 7 a 10 tomam por base um soneto do poeta neoclássico português Bocage (Manuel Maria Barbosa du Bocage, 1765-1805) e uma tira da escritora e quadrinista brasileira Ciça (Cecília Whitaker Vicente de Azevedo Alves Pinto).
LXIV CONTRASTE ENTRE A VIDA CAMPESTRE E A DAS CIDADES B S Ê U G U T R O P
Nos campos o vilão sem sustos passa, Inquieto na corte o nobre mora; O que é ser infeliz aquele ignora, Este encontra nas pompas a desgraça:
Texto II
E nunca o meu Príncipe (que eu contemplava esticando os suspensórios) me pareceu tão corcovado, tão minguado, como gasto por uma lima que desde muito andasse fundamente limando. Assim viera findar, desfeita em Civilização, naquele super-requintado magricela sem músculo e sem energia, a raça fortíssima dos Jacintos! 5. É bastante conhecida a tese de Rousseau de que o Homem nasce bom, sendo a sociedade responsável por sua corrupção. Como essa afirmação pode ser associada aos excertos transcritos, extraídos de A Cidade e as Serras? RESOLUÇÃO: Os trechos mostram como Jacinto era em sua infância, fase mais próxima de sua essência primitiva, cheio de energia, de vida. Civilizando-se, ou seja, em contato mais intenso com a sociedade, perdeu sua vitalidade.
quele canta e ri;vãs nãoque se embaraça A Com essas coisas o mundo adora: Este (oh cega ambição!) mil vezes chora, Porque não acha bem que o satisfaça:
Aquele dorme em paz no chão deitado, Este no ebúrneo leito precioso Nutre, exaspera velador cuidado: Triste, sai do palácio majestoso; Se hás de ser cortesão, mas desgraçado, Antes ser camponês, e venturoso. (Bocage, Obras de Bocage. Porto, Lello & Irmão Editores, 1968.)
(Ciça, Tira. In Pagando o Pato. Porto Alegre, LP & M, 2006.)
6. Tendo em mente que a civilização, a sociedade, corrompe o que o Homem possui de mais puro, explique de que modo esse fenômeno ocorre em Iracema. RESOLUÇÃO: Enquanto vivia entre os tabajaras, Iracema tinha preservados, como numa situação edênica, seus valores primitivos. O contato com Martim, com a civilização (no caso, a europeia), provocou a corrupção, a “queda” da protagonista.
7. (VUNESP-SP-2010) – O tema do soneto apresentado, do neoclássico português Bocage, enquadra-se numa das linhas temáticas características do período literário denominado Neoclassicismo ou Arcadismo. Aponte essa linha temática, comprovando com elementos do próprio poema. RESOLUÇÃO: O soneto de Bocage desenvolve o tema do contraste entre a vida na cidade, vista como negativa, e a vida no campo, descrita como positiva. A depreciação da primeira é evidente em expressões como “inquieto na corte o nobre mora” e “este [o homem urbano] (...) mil vezes chora / porque não acha bem que o satisfaça”. A valorização da segunda encontra-se em expressões como “nos campos o vilão sem sustos passa”, “o que é ser infeliz aquele [o vilão] ignora” e “aquele canta e ri”.
– 23
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 24
8. (VUNESP-SP-2010) – A palavra vilão pode apresentar diferentes significados na Língua Portuguesa, alguns bastante distintos entre si. No soneto de Bocage, a própria sequência da leitura permite descobrir, em função do contexto, o significado que assume tal palavra, empregada no primeiro verso. Releia o poema e aponte esse significado.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: In-qui-e-to-na-cor-teo-no-bre-mo(ra). (As sílabas fortes estão sublinhadas; a sílaba entre parênteses, a última postônica [= pós-tônica], não se conta.)
RESOLUÇÃO: No poema de Bocage, vilão é empregado no sentido inicial da palavra: “habitante de vila”, ou seja, morador de pequeno povoado rural, em oposição à corte, situada na cidade, a grande aglomeração urbana.
10. (VUNESP-SP-2010) – Na tira de Ciça, a troca de ser por ter ironiza uma das tendências do comportamento humano na sociedade moderna, altamente consumista. Isso considerado, releia a tira e o poema de Bocage e aponte em que consiste essa ironia e em que medida o soneto Bocage representa, com maistroca de dois séculos antecedência, umadedas possíveis respostas a essa de ser por terde. RESOLUÇÃO: A ironia está em considerar como mera atualização, ou seja, adaptação aos tempos atuais, a troca de ser por ter na célebre expressão shakespeariana. O soneto de Bocage pode ser tomado como “resposta” a essa perversão contemporânea, por exaltar a vida simples e feliz ser (o ), em oposição à vida de apego aos bens materiais e às aparências (o ter).
9. (VUNESP-SP-2010) – O soneto de Bocage apresenta-se de acordo com o modelo tradicional, com versos de dez sílabas métricas (decassílabos) distribuídos em duas quadras e dois tercetos. De posse dessa informação, apresente como resposta a divisão em sílabas métricas do segundo verso do poema, levando em conta que as sílabas tônicas são a terceira, a sexta, a oitava e a décima.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VI)
1. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte capítulo do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis:
CAPÍTULO XL UMA ÉGUA
Ficando só, refleti algum tempo e tive uma fantasia. Já conheceis as minhas fantasias. Contei-vos a da visita imperial; disse-vos a desta casa do Engenho Novo, reproduzindo a de Matacavalos... A imaginação foi a companheira de toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de empacar, as mais delas capaz de engolir campanhas e campanhas, correndo. Creio haver lido em Tácito que as éguas iberas concebiam pelo vento; se não foi nele, foi noutro autor antigo, que entendeu guardar essa crendice nos seus livros. Neste particular, a minha imaginação era uma grande égua ibera; a menor brisa lhe dava um potro, que saía logo cavalo de Alexandre; mas deixemos de metáforas atrevidas e impróprias dos meus quinze anos. Digamos o caso simplesmente. A fantasia daquela hora foi confessar a minha mãe os meus amores para lhe dizer que não tinha vocação eclesiástica. A conversa sobre vocação tornava-me agora toda inteira e, ao passo que me assustava, abria-me uma porta de saída. “Sim, é isto”, pensei; “vou dizer a mamãe que não tenho vocação e confesso o nosso namoro; se ela duvidar, conto-lhe o que se passou outro dia, o penteado e o resto...” (Dom Casmurro, in Machado de Assis, Obra Completa em Quatro Volumes.Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 2008, p. 975.) 24 –
a) Explique a metáfora empregada pelo narrador, nesse capítulo, para caracterizar sua imaginação. RESOLUÇÃO: A imaginação de Bentinho era muito fecunda, rápida e audaciosa, embora às vezes se mostrasse mais recolhida. A imagem das éguas iberas oferece diversos pontos de semelhança para sustentar a metáfora, sobretudo fertilidade, velocidade e arrojo.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 25
b) De que maneira a imaginação de Bentinho, assim caracterizada, se relaciona com a temática amorosa nesse capítulo? E no romance?
c) O episódio da xícara de café está diretamente relacionado com a redação do livro de memórias de Bento Santiago. Por quê?
RESOLUÇÃO: Nesse capítulo, Bentinho lembra que, quando adolescente, imaginou confessar à austera mãe, Dona Glória, o amor que ele tinha por Capitu, as primeiras carícias que trocara com ela e a falta de vocação que sentia em si para a vida eclesiástica. No romance, o fato de o narrador-personagem ter uma imaginação fértil coloca sob suspeita a sua versão dos fatos, fundada na crença de que Escobar se tornara amante de Capitu e que Ezequiel seria fruto desse adultério.
RESOLUÇÃO: As memórias de Bento Santiago, a sua autobiografia, configuram a modalidade do romance de confissão, na qual o eu-narrador recompõe o passado e o reinterpreta. Esta é, de início, a intenção do memorialista: “atar as duas pontas da vida”. Nesse sentido, a “procura do tempo perdido”, os atos falhos de suicídio e homicídio, a que se referem o texto e os quesitos anteriores, são instantes cruciais da tragédia emocional e conjugal do narrador, momento-limite entre o ser e o não ser, como ele confessa no início do parágrafo, e que condensam quase todos os recursos narrativos do vasto repertório de Dom Casmurro: a narração, a reflexão digressiva, o apelo ao leitor, o estilo ziguezagueante (“deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo”), característico de um narrador problemático e indeciso.
2. (UNICAMP-SP) – Leia a passagem abaixo, de Dom Casmurro:
Se eu não olhasse para Ezequiel, é provável que não estivesse aqui escrevendo este livro, porque o meu primeiro ímpeto foi correr ao café e bebê-lo. Cheguei a pegar na xícara, mas o pequeno beijava-me a mão, como de costume, e a vista dele, como o gesto, deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo. Chamem-me embora assassino; não serei eu que os desdiga ou contradiga; o meu segundo impulso foi criminoso. Inclinei-me e perguntei a Ezequiel se já tomara café. (Machado de Assis, Dom Casmurro, in Obra Completa. vol. 1, Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1979, p. 936.) a) Explique o “primeiro ímpeto” mencionado pelo narrador. RESOLUÇÃO: O “primeiro ímpeto” mencionado corresponde à sua vontade de suicidarse, bebendo o café envenenado.
b) Por que o narrador admite que seu “segundo impulso” foi cri minoso? RESOLUÇÃO: O “segundo impulso” foi criminoso porque o narrador, desistindo de suicidar-se, pensou em sugerir ao filho que tomasse o café envenenado, o que poderia justificar a sua designação de assassino.
3. (FUVEST-SP)
— Você janta comigo, Escobar? — Vim para isto mesmo. Minha mãe agradeceu-lhe a amizade que me tinha e ele respondeu com muita polidez, ainda que um tanto atado, como se carecesse de palavra pronta. (...) Todos ficaram gostando dele. Eu estava tão contente como se Escobar fosse invenção minha. José Dias desfechou-lhe dois superlativos, tio Cosme dois capotes e prima Justina não achou tacha que lhe pôr; depois, sim, no segundo ou terceiro domingo, veio ela confessarnos que o meu amigo Escobar era um tanto metediço e tinha uns olhos policiais a que não escapava nada. — São os olhos dele, expliquei. — Nem eu digo que sejam de outro. — São olhos refletidos, opinou tio Cosme. — Seguramente, acu diu José Dias; entr etanto, pode ser q ue a senhora D. Justina tenha alguma razão. A verdade é que uma coisa não impede outra, e a reflexão casa-se muito bem à curiosidade natural. Parece curioso, isso parece, mas... — A mim parece-me um mocinho muito sério, disse minha mãe. — Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela. Quando eu referi a Escobar aquela opinião de minha mãe (sem lhe contar as outras, naturalmente), vi que o prazer dele foi extraordinário. Agradeceu, dizendo que eram bondades, e elogiou também minha mãe, senhora grave, distinta e moça, muito moça... Que idade teria? (Machado de Assis, Dom Casmurro)
– 25
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 26
a) Um crítico afirma que, “examinada em suas relações, a população de Dom Casmurro compõe uma parentela, uma dessas grandes moléculas sociais do Brasil tradicional, no centro da qual está um proprietário mais considerável, cercado de figuras que podem incluir, entre outros, um ou mais agregados, vizinhos com obrigações, comensais, parentes pobres em graus diversos, conhecidos que aspiram à proteção (...).” (Adaptado de Roberto Schwarz, Duas Meninas) P O R T U G U Ê S B
Identifique o papel que cada uma das personagens que aparecem no trecho de Dom Casmurro desempenha na composição da referida “parentela”. RESOLUÇÃO: Escobar: representa a categoria dos “conhecidos que aspiram à proteção (...)”. O fragmento deixa patente a intenção da personagem de agradar e bajular o amigo que fez no seminário e, especialmente, a mãe deste, como se observa no último parágrafo. D. Glória (mãe de Bentinho): representa o que Roberto Schwarz denomina o centro da parentela, o “proprietário mais considerável”. Era uma viúva rica, cujo patrimônio provinha de rendimentos das propriedades e de escravos, arrendados ou alugados. Na visão do crítico, D. Glória compõe, com o círculo de parentes, agregados e dependentes em diversos graus, um microcosmo da sociedade brasileira no Segundo Reinado. José Dias: é o agregado, figura característica da estrutura patriarcal. É o homem que, não sendo escravo nem empregado, não era também parente, mas vivia sob a proteção do “senhor”, ao qual devia obediência e favores, retribuídos com trabalhos diversos e uma subserviência constante. Personagem das mais interessantes da galeria machadiana, é o “homem dos superlativos”, que “sabia opinar, obedecendo” e que foi agregado à família pelo falecido pai de Bentinho, a quem se apresentou como “médico homeopata”, atribuindo a si mesmo algumas curas. Vivendo desde então com a família, faz da esperteza, da dissimulação, da perspicácia na observação das relações de poder e conveniência, uma forma de sobreviver, da maneira mais favorável, num meio ao qual não pertence propriamente. Tio Cosme: é, também viúvo, o parente que se coloca sob o teto e a proteção da matriarca. Prima Justina: representa uma situação semelhante à de tio Cosme, e cabe observar que a agregação de ambos à estrutura familiar de Dona Glória se prende à convenção de que, viúva, a matriarca não deveria viver sob o
b) Na conversação apresentada no trecho, as falas de José Dias refletem a posição social que ele ocupa nessa “parentela”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “— Seguramente, acudiu José Dias; entretanto, pode ser que a senhora D. Justina tenha alguma razão” e “— Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela.” Essas duas intervenções do agregado são exemplares de sua posição subserviente e sua habilidade em “opinar obedecendo”. No primeiro instante, parece dar razão à Prima Justina, que identifica o caráter “um tanto metediço” e os “olhos policiais” de Escobar. No instante seguinte, contradiz-se e concorda também com D. Glória, a quem Escobar parecia “um mocinho muito sério”.
mesmo teto com um homem solteiro, o agregado José Dias. Assim, convocados a se abrigar sob a proteção da viúva Santiago, serviam como “biombo”, que preservava o decoro e as aparências.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VII)
1. (FUVEST-SP-2010)
Gente que mamou leite romântico pode meter o dente no rosbife* naturalista; mas em lhe cheirando a teta gótica e oriental, deixa logo o melhor pedaço de carne para correr à bebida da infância. Oh! meu doce leite romântico! (Machado de Assis, Crônicas) *Rosbife: tipo de assado ou fritura de alcatra ou filé bovinos, bem tostado externamente e sangrante na parte central, servido em fatias.
a) A imagem do “rosbife naturalista” — empregada, com humor, por Machado de Assis, para evocar determinadas características do Naturalismo — poderia ser utilizada também para se referir a certos aspectos do romance O Cortiço? Justifique sua resposta.
26 –
RESOLUÇÃO: O Cortiço, como é de esperar de uma obra naturalista, apresenta preocupa ção de exibir, sem eufemismo, rodeio ou censura, os aspectos mais degradantes do ser humano, o que é compatível com a imagem do rosbife, que é sangrento.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 27
b) A imagem do “doce leite romântico”, que se refere a certos traços do Romantismo, pode remeter também a alguns aspectos do romance Iracema? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A expressão “doce leite romântico” refere-se à idealização da realidade, característica do Romantismo e presente em diversos aspectos de Iracema: a fidelidade extrema a um ideal de amor, a nobreza e a bravura dos guerreiros indígenas (que mais parecem cavaleiros medievais), o enaltecimento da natureza brasileira, o engrandecimento da amizade entre Martim e Poti, o convívio harmonioso entre portugueses e pitiguaras.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o seguinte comentário a respeito de O Cortiço, de Aluísio Azevedo:
Com efeito, o que há n’O Cortiço são formas primitivas de amealhamento*, a partir de muito pouco ou quase nada, exigindo uma espécie de rigoroso ascetismo inicial e a aceitação de modalidades diretas e brutais de exploração, incluindo o furto (...) como forma de ganho e a transformação da mulher escrava em companheiramáquina. (...) Aluísio foi, salvo erro meu, o primeiro dos nossos romancistas a descrever minuciosamente o mecanismo de formação da riqueza individual. (...) N’O Cortiço [o dinheiro] se torna implicitamente objeto central da narrativa, cujo ritmo acaba se ajustando ao ritmo da sua acumulação, tomada pela primeira vez no Brasil como eixo da composição ficcional. (Antonio Candido, “De Cortiço a Cortiço”, in O Discurso e a Cidade. São Paulo, Duas Cidades, 1993, p. 129-30.)
B S Ê U G U T R O P
b) Identifique a “mulher escrava” e o modo como se dá sua transformação em “companheira-máquina”. RESOLUÇÃO: A “mulher escrava” é Bertoleza, que se torna “companheira-máquina” ao viver como amante de João Romão e como instrumento das vontades do vendeiro, já que ela não só trabalha durante o dia na venda, como sai à noite com o patrão para roubar materiais de construção.
Considere o trecho de O Cortiço, de Aluísio Azevedo: *Amealhar: acumular (riqueza), juntar (dinheiro) aos poucos.
a) Explique a que se referem o “rigoroso ascetismo inicial” da personagem em questão e as “modalidades diretas e brutais de exploração” que ela emprega. RESOLUÇÃO: O ascetismo a que se refere Antonio Candido é o esforço austero de acúmulo de dinheiro a que João Romão se entrega, deixando de lado veleidades de prazer, conforto e bem-estar. Em seu afã de enriquecimento, ele chegou a dormir no mesmo balcão em que atendia clientes, comia os piores legumes de sua horta para vender os melhores, não se preocupava com vestuário, aparência e amenidades da vida. Essa “febre de acumular”, como diz o narrador do romance, determinará no dono do cortiço um comportamento brutal deTalexploração da massamais animalizada dos moradores da estalagem. atitude se mostrará cruel em três momentos: quando rouba a garrafa cheia de dinheiro do velho Libório, quando lucra com a indenização do seguro por causa do incêndio que prejudicou imensamente os inquilinos e, o mais extremo, quando engana Bertoleza, usurpando suas economias, e mais tarde a descarta sem remorso em nome de um casamento de conveniência com Zulmira.
Uma aluvião de cenas, que ela [Pombinha] jamais tentara explicar e que até ali jaziam esquecidas nos meandros do seu passado, apresen tavam-se agora nítidas e transparentes. Compreendeu como era que certos velhos respeitáveis, cujas fotografias Léonie lhe mostrara no dia que passaram juntas, deixavam-se vilmente cavalgar pela loureira, cativos e submissos, pagando a escravidão com a honra, os bens e até com a própria vida, se a prostituta, depois de os ter esgotado, fechavalhes o corpo. E continuou a sorrir, desvanecida na sua superioridade sobre esse outro sexo, vaidoso e fanfarrão, que se julgava senhor e que, no entanto, fora posto no mundo simplesmente para servir ao feminino; escravo ridículo que, para gozar um pouco, precisava tirar da sua mesma ilusão a substância do seu gozo; ao passo que a mulher, a senhora, a dona dele, ia tranquilamente desfrutando o seu império, endeusada e querida, prodigalizando martírios que os miseráveis aceitavam contritos, a beijar os pés que os deprimiam e as implacáveis mãos que os estrangulavam. — Ah! homens! homens!... sussurrou ela de envolta com um suspiro. – 27
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 28
P O R T U G U Ê S B
3. (UNIFESP-SP-2010 – modificado) – No texto, os pensamentos da personagem a) recuperam o princípio daprosa naturalista, que condenaos assuntos repulsivos e bestiais — sem amparo em teorias científicas — ligados ao homem, que põe em primeiro plano seus instintos animalescos. b) elucidam o princípiodo determinismo presente naprosa naturalista, revelando os homens e as mulheres conscientes dos seus instintos em função do meio em que vivem e, sobretudo, capazes de controlá-los. c) trazem uma crítica aos aspectos animalescos próprios dos homens, mas, por outro lado, revelam uma forma de Pombinha submeter-se a muitos deles para obter vantagens: eis aí um princípio do Realismo rechaçado no Naturalismo. d) constroem uma visão de mundo e do homem idealizada, o que, em certa medida, afronta o referencial em que se baseia a prosa naturalista,
4. “Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas.” Que figura de linguagem foi empregada no trecho acima? Explique. RESOLUÇÃO: Prosopopeia (personificação), pois foram atribuídas a um ser inanimado (o cortiço) características de um ser animado (a ação de acordar, abrir os olhos).
que define o homem como fruto do meio, marcado pelo apelo dos seus sentidos. e) consubstanciam a concepção naturalista de que o homem é um animal, preso aos instintos, e, no que diz respeito à sexualidade, vê-se que Pombinha considera a mulher superior ao homem; para ela, ter consciência dessa superioridade é uma forma de obter vantagens. RESOLUÇÃO: A alternativa e interpreta corretamente os pensamentos da personagem Pombinha, que reconhece no sexo uma força degradante, como é próprio do Naturalismo, capaz de subjugar “velhos respeitáveis”. Resposta: E
5. “No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas.”
Grasnar e cacarejar são palavras de sonoridade expressiva, chamadas onomatopeias. Por quê? Texto para as questões de 4 a 6.
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de chumbo. Como que se sentiam ainda na indolência 1 de neblina as derradeiras notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à luz loura e tenra2 da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia. A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros3, umedecia o ar e punha-lhe um farto acre4 de sabão ordinário. As pedras do chão, esbranquiçadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil, mostravam uma palidez grisalha e triste, feita de acumulações de espumas secas. Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar 5 das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os bons-dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de crianças que ainda não andam. No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam6, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas. De alguns quartos saíam mulheres que vinham pendurar cá fora, na parede, a gaiola do papagaio, e os louros, à semelhança dos donos, cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se7 à luz nova do dia. (Aluísio Azevedo, O Cortiço, cap. III) 1 – Indolência: preguiça. 2 – Tenro: brando. 3 – Coradouro: lugar onde se põe roupa a corar ao Sol. 4 – Farto acre: cheiro ácido. 5 – Marulhar: agitar. 6 – Altercar: debater. 7 –Espanejar-se: sacudir-se.
28 –
RESOLUÇÃO: Essas palavras são chamadas onomatopeias porque seus sons imitam ou sugerem os sons reais que representam.
6. Sinestesia é um tipo de metáfora em que se misturam sensações de diferentes órgãos dos sentidos. Exemplo: em “Avistava-se o grito das araras” (Guimarães Rosa), estabeleceu-se relação entre a percepção auditiva (“grito”) e a visual (“avistava-se”). É um tipo de metáfora por que, no caso, há comparação implícita entre um grito e um objeto visível. Considerando-se a explicação dada, há sinestesia em a) “um acordar alegre e farto”. b) “sete horas de chumbo”. c) “a roupa lavada (...) umedecia o ar”. d) “o cheiro quente do café”. e) “os louros (...) cumprimentavam-se ruidosamente”. RESOLUÇÃO: Há mistura das sensações olfativa e tátil em “o cheiro quente do café”. Resposta: D
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 29
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VIII)
1. (FUVEST-SP-2010) – Considere a seguinte relação de obras: Auto da Barca do Inferno, Memórias de um Sargento de Milícias, Dom Casmurro e Capitães da Areia. Entre elas, indique as duas que, de modo mais visível, apresentam intenção de doutrinar, ou seja, o propósito de transmitir princípios e diretivas que integram doutrinas determinadas. Divida sua resposta em duas partes: a), para a primeira obra escolhida, e b), para a segunda obra escolhida. Justifique sucintamente cada uma de suas escolhas. RESOLUÇÃO: a) O Auto da Barca do Inferno é informado por princípios da moral cristã, pelos quais são julgados os comportamentos dos mortos prestes a embarcar, no “cais das almas”, para o mundopost-mortem, em que serão punidos ou recompensados. b) Capitães da Areia é um romance em que se faz a apologia da revolução socialista como panaceia para as injustiças sociais decorrentes do regime capitalista. É uma obra que busca o engajamento na luta social, tendo sido por isso proibida durante o Estado Novo. A intenção de doutrinar politicamente o leitor é recorrente, como exemplifica o final: “E, apesar de que lá fora era o terror, qualquer daqueles lares era um lar que se abriria para Pedro Bala, fugitivo da polícia. Porque a revolução é uma pátria e uma família.”
todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música. Volta Seca não pensava com certeza em Lampião neste momento. Pedro Bala não pensava em ser um dia o chefe de todos os malandros da cidade. O Sem-Pernas em se jogar no mar, onde os sonhos são todos belos. Porque a música saía do bojo do velho carrossel só para eles e para o operário que parara. E era uma valsa velha e triste, já esquecida por todos os homens da cidade. (Jorge Amado, Capitães da Areia. São Paulo, Companhia das Letras, 2008, p. 68.) a) De que modo esse estabelece contraste com os demais do romance? Quais sãocapítulo os elementos desseumcontraste? RESOLUÇÃO: O contraste notável é entre a plenitude desse momento de enlevo e a situação de precariedade, carência e insatisfação da vida dos Capitães da Areia. Os elementos desse contraste são visíveis, por exemplo, no “rosto sombrio de Volta Seca”, que se “abria num sorriso”, e em “todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música”.
b) Qual a relação de tal contraste com o tema do livro? RESOLUÇÃO: O tema do livro é a delinquência de menores abandonados. No capítulo de que se extraiu o texto, relata-se um momento de êxtase dessas crianças, ao brincarem num velho carrossel. Depreende-se que, por mais marginali zados que sejam, aos Capitães da Areia resta ainda a condição essencial de crianças que se encantam. São crianças, ainda que castigadas pela injustiça social que as c onduz à marginalidade.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o trecho seguinte, do capítulo “As Luzes do Carrossel”, de Capitães da Areia:
(...) O sertanejo trepou no carrossel, deu corda na pianola e começou a música de uma valsa antiga. O rosto sombrio de Volta Seca se abria num sorriso. Espiava a pianola, espiava os meninos envoltos em alegria. Escutavam religiosamente aquela música que saía do bojo do carrossel na magia da noite da cidade da Bahia só para os ouvidos aventureiros e pobres dos Capitães da Areia. Todos estavam silenciosos. Um operário que vinha pela rua, vendo a aglomeração de meninos na praça, veio para o lado deles. E ficou também parado, escutando a velha música. Então a luz da lua se estendeu sobre todos, as estrelas brilharam ainda mais no céu, o mar ficou de todo manso (talvez que Iemanjá tivesse vindo também ouvir a música) e a cidade era como que um grande carrossel onde giravam em invisíveis cavalos os Capitães da Areia. Neste momento de música, eles sentiram-se donos da cidade. E amaram-se uns aos outros, se sentiram irmãos porque eram – 29
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 30
Texto para o teste 3.
Todos reconheceram os direitos de Pedro Bala à chefia, e foi desta época que a cidade começou a ouvir falar nos Capitães da Areia, crianças abandonadas que viviam do furto. Nunca ninguém soube o número exato de meninos que assim viviam. Eram bem uns cem e destes mais de quarenta dormiam nas ruínas do velho trapiche. P O R T U G U Ê S B
3. (PUC-SP-2010) – O trecho transcrito é do romance Capitães da Areia, que, escrito em 1937, se inscreve entre os “romances proletários” de Jorge Amado. Considerando-o como um todo, é correto afirmar que a) destaca e exalta o tema da infância abandonada e delinquente, incentivada pelos interesses da imprensa local e admitida pelas autoridades caracterizando cotidiano de ações marginais capazes policiais, de transtornar a sociedade um baiana da época. b) consubstancia o percurso de aprendizagem do herói que supera a condição de srcem e eleva o protagonista ao plano histórico do con fronto social e político. c) a mãe de santo e o padre progressista, personagens do romance, ainda que pudessem representar a convergência sincrética de forças protetoras e elementos capazes de minimizar a orfandade dos Capitães, nada conseguem porque não têm influência sobre o bando. d) a prisão e a tortura de Pedro Bala no reformatório, confinado no cubículo escuro da cafua, apenas intensificam seu instinto de violência e a necessidade de vingança contra a sociedade. e) Pedro Bala, líder dos Capitães, no final, se vê derrotado no intento de realizar seu sonho de transformação social e é abandonado pelos demais, pois Volta Seca se junta ao bando de Lampião, Professor vai ser artista na capital, Pirulito ingressa na vida religiosa, Boa-Vida se torna sambista e Gato adere à marginalidade em Ilhéus. RESOLUÇÃO: Na obra de Jorge Amado, principalmente nos “romances proletários”, é recorrente a transformação do protagonista, que, ao ganhar consciência política, supera a condição marginal de srcem e passa a lutar no plano histórico do confronto social e político. EmCapitães da Areia, o delinquente juvenil Pedro Bala e o grupo comandado por ele dei xam de ser apenas seres marginalizados para, no final da narrativa, participar da luta contra a sociedade de classes capitalista. Resposta: B
conheça. Quando se incorporou aos Capitães da Areia (o cais recémconstruído atraiu para as suas areias todas as crianças abandonadas da cidade), o chefe era Raimundo, o Caboclo, mulato avermelhado e forte. Não durou muito na chefia o caboclo Raimundo. Pedro Bala era muito mais ativo, sabia planejar os trabalhos, sabia tratar com os outros, trazia nos olhos e na voz a autoridade de chefe. Um dia brigaram. A desgraça de Raimundo foi puxar uma navalha e cortar o rosto de Pedro, um talho que ficou para o resto da vida. Os outros se meteram e como Pedro estava desarmado deram razão a ele e ficaram esperando a revanche, que não tardou. Uma noite, quando Raimundo quis surrar Barandão, Pedro tomou as dores do negrinho e rolaram na luta mais sensacional a que as areias do cais jamais assistiram. Raimundo era mais alto e mais velho. Porém Pedro Bala, o cabelo loiro a cicatriz vermelhadeixou no rosto, uma agilidade espan tosa evoando, desde esse dia Raimundo nãoera só de a chefia dos Capitães da Areia, como o próprio areal. Engajou tempos depois num navio. (Jorge Amado, Capitães da Areia. 50.a ed. Rio de Janeiro, Record, 1980, p. 26-27.) 4. (FAFICP-SP – modificado) – Pela leitura do texto, pode-se concluir que o romance pretende denunciar um problema a) cultural, a hierarquia nos grupos sociais. b) de identidade nacional. c) social, o desemprego na cidade de Sal vador. d) educacional, o alto índice de crianças analfabetas. e) social, a questão do menor abandonado. RESOLUÇÃO: Resposta: E
5. (FAFICP-SP – modificado) – Que características de Pedro Bala fizeram dele o líder do grupo? a) Sabia planejar e, por ser branco, as pessoas da cidade não o viam como um marginal, fato que o ajudava em seus furtos. b) Era ativo, sabia planejar e lidar com os outros; trazia na voz e nos olhos autoridade de chefe. c) Era mais novo que Raimundo, e o grupo precisava de alguém com mais vigor e com novas ideias. d) Era autoritário, rude, ativo, inteligente, características que convêm a um verdadeiro líder. e) Por ter físico avantajado, era mais ativo e mais ágil que Raimundo; essa característica era útil nas fugas do grupo. RESOLUÇÃO: Resposta: B
Texto para os testes de 4 a 6. O romance Capitães da Areia, de Jorge Amado, teve sua primeira edição (1937) apreendida e queimada em praça pública pouco depois de implantada a ditadura de Getúlio Vargas. No trecho a seguir, o narrador nos conta como Pedro Bala, aos quinze anos, assumiu a liderança de um grupo que dormia num velho armazém abandonado do cais do porto.
É aqui também que mora o chefe dos Capitães da Areia: Pedro Bala. Desde cedo foi chamado assim, desde seus cinco anos. Hoje tem quinze anos. Há dez que vagabundeia nas ruas da Bahia. Nunca soube de sua mãe, seu pai morrera de um balaço. Ele ficou sozinho e empregou anos em conhecer a cidade. Hoje sabe de todas as suas ruas e de todos os seus becos. Não há venda, quitanda, botequim que ele não 30 –
6. A exemplo do nome Pedro Bala, outras personagens também são nomeadas de acordo com um de seus traços físicos ou psicológicos, ou, ainda, de acordo com algo que lhes seja peculiar. É o que se vê em nomes como Sem-Pernas , Professor, Boa-Vida etc. A esse recurso usado pelo autor corresponde uma figura de linguagem. Trata-se da(o): a) comparação. b) eufemismo. c) ironia. d) metonímia. e) personificação. RESOLUÇÃO: O autor faz uso da metonímia, visto que se vale de uma parte (de algo que representa o todo) do aspecto físico ou psicológico das personagens para nomeá-las. Resposta: D
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 31
Para responder aos testes de números 7 e 8, leia o trecho extraído de Gabriela, Cravo e Canela, obra de Jorge Amado.
(...) O marinheiro sueco, um loiro de quase dois metros, entrou no bar, soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib e apontou com o dedo as garrafas de “Cana de Ilhéus”. Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível. Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão, servira cachaça de graça aos marinheiros. Passou o dedo indicador no polegar, a perguntar pelo dinheiro. Vasculhou os bolsos o loiro sueco, nem sinal de dinheiro. Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada. No balcão colocou a nórdica mãed’água, Iemanjá de Estocolmo. Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina por detrás da Igreja. Mirou a sereia, seu rabo de peixe. Assim era a anca de Gabriela. Mulher tão de fogo no mundo não havia, com aquele calor, aquela aqueles suspiros, aquele langor. Quanto mais dormia com ela,ternura, mais tinha vontade. Parecia feita de canto e dança, de sol e luar, era de cravo e canela. Nunca mais lhe dera um presente, uma tolice de feira. Tomou da garrafa de cachaça, encheu um copo grosso de vidro, o marinheiro suspendeu o braço, saudou em sueco, emborcou em dois tragos, cuspiu. Nacib guardou no bolso a sereia dourada, sorrindo. Gabriela riria contente, diria a gemer: “precisava não, moço bonito...” E aqui termina a história de Nacib e Gabriela, quando renasce a chama do amor de uma brasa dormida nas cinzas do peito. 7. (UFSCar-SP) – No texto, o autor relaciona a cultura nacional à estrangeira, buscando, por meio da comparação, estabelecer equiva lências entre elas. O trecho do texto que indica esse tipo de comparação é
MÓDULO
a) b) c) d) e)
“Passou o dedo indicador no polegar...” “...servira cachaça de graça aos marinheiros.” “No balcão colocou a nórdica mãe-d’água...” “...e apontou com o dedo as garrafas de ‘Cana de Ilhéus’.” “Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível.”
RESOLUÇÃO: No trecho transcrito, duas mitologias são aproximadas através das figuras da “sereia nórdica” representada no broche e da divindade afro-brasileira Iemanjá. Resposta: C
8. (UFSCar-SP) – Assinale a alternativa que contém um trecho em que o autor apresenta as informações numa linguagem altamente conotativa. a) “...soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib...” b) “Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina...” c) “Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão...” d) “Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada.” e) “Parecia feita de canto edança, de sol eluar, era decravo e canela.” RESOLUÇÃO: No trecho transcrito na alternativa a, “pesado”, em “bafo pesado”, é uma metáfora sinestésica, mas tal figura não faz que a linguagem da frase possa ser considerada “altamente conotativa”. A descrição contida na alternativa e é inteiramente vazada em linguagem figurada, conotativa, pois são metafóricos todos os predicados atribuídos a Gabriela. Resposta: E
Literatura e Análise de Textos Literários (IX)
Texto para a questão 1.
O pequeno sentou-se, acomodou nas pernas a cabeça da cachorra, pôs-se a contar-lhe baixinho uma história. Tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio que morrera no tempo da seca. Valia-se, pois, de exclamações e de gestos, e Baleia respondia com o rabo, com a língua, com movimentos fáceis de entender. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 1. (FUVEST-SP-2010) – Considere as seguintes afirmações sobre esse trecho de Vidas Secas, entendido no contexto da obra, e responda ao que se pede. a) No trecho, torna-se claro que a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para ampliar as diferenças que distinguem homens de animais. Você concorda com essa afirmação? Justifique, com base no trecho, sua resposta. RESOLUÇÃO: Essa afirmação não é procedente, pois, ao contrário, a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para diminuir as diferenças que distinguem homens de animais, como se evidencia tanto na passagem
b) Nesse trecho, como em outros do mesmo livro, é por exprimir suas emoções e sentimentos pessoais a respeito da pobreza sertaneja que o narrador obtém o efeito de contagiar o leitor, fazendo com que ele também se emocione. Você concorda com a afirmação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois o narrador de Vidas Secas não se envolve emocionalmente com as realidades que representa. Seu relato, conforme aos princípios realistas (o romance de Graciliano Ramos filia-se ao Neorrealismo que substituiu o experimentalismo modernista), é objetivo e explora uma neutralidade que, cedendo a palavra às personagens e — por assim dizer — aos fatos, em vez de diminuir, intensifica a reação do leitor ao quadro representado.
“tinha vocabulário quase tão como o do papagaio”, como fato de um o menino se comunicar porminguado meio de “exclamações e de gestos”, talno como a cadela que lhe abana o rabo.
– 31
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 32
P O R T U G U Ê S B
2. (UNICAMP-SP-2010) – O excerto abaixo, de Vidas Secas, trata da personagem sinha Vitória:
b) Tendo em vista a condição e a trajetória de sinha Vitória, justifique a ironia contida no nome da personagem. Que outra personagem referida no excerto também revela uma ironia no nome?
(...) Calçada naquilo, trôpega, mexia-se como um papagaio, era ridícula. Sinha Vitória ofendera-se gravemente com a comparação, e se não fosse o respeito que Fabiano lhe inspirava, teria despropositado. Efetivamente os sapatos apertavam-lhe os dedos, faziam-lhe calos. Equilibrava-se mal, tropeçava, manquejava, trepada nos saltos de meio palmo. Devia ser ridícula, mas a opinião de Fabiano entristecera-a muito. Desfeitas essas nuvens, curtidos os dissabores, a cama de novo lhe aparecera no horizonte acanhado. Agora pensava nela de mau humor. Julgava-a inatingível e misturava-a às obrigações da casa.
RESOLUÇÃO: É irônico que uma personagem massacrada pela seca e pelas condições sociais injustas tenha como nome Vitória. E há também ironia no nome de Baleia, pois essa cachorra é extremamente magra e habita uma região carente de água, o que contraria radicalmente as ideias associadas ao mamífero de que seu nome fora emprestado.
(...) Um mormaço levantava-se da terra queimada. Estremeceu lembrando-se da seca (...). Diligenciou afastar a recordação, temendo que ela virasse realidade. (...) Agachou-se, atiçou o fogo, apanhou uma brasa com a colher, acendeu o cachimbo, pôs-se a chupar o canudo de taquari cheio de sarro. Jogou longe uma cusparada, que passou por cima da janela e foi cair no terreiro. Preparou-se para cuspir nova mente. Por uma extravagante associação, relacionou esse ato com a lembrança da cama. Se o cuspo alcançasse o terreiro, a cama seria comprada antes do fim do ano. Encheu a boca de saliva, inclinou-se — e não conseguiu o que esperava. Fez várias tentativas, inutilmente. (...) Olhou de novo os pés espalmados. Efetivamente não se acostumava a calçar sapatos, mas o remoque de Fabiano molestara-a. Pés de papagaio. Isso mesmo, sem dúvida, matuto anda assim. Para que fazer vergonha à gente? Arreliava-se com a comparação. Pobre do papagaio. Viajar com ela, na gaiola que balançava em cima do baú de folha. Gaguejava: — “Meu louro.” Era o que sabia dizer. Fora isso, aboiava arremedando Fabiano e latia como Baleia. Coitado. Sinha Vitória nem queria lembrar-se daquilo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. Rio de Janeiro/São Paulo, Record, 2007, p. 41-43.) a) Por que a comparação feita por Fabiano incomoda tanto sinha Vitória? Que lembrança evoca? RESOLUÇÃO: Sinha Vitória sente-se incomodada com a comparação feita por Fabiano — o andar dela, quando usava sapatos, assemelhava-se ao de um papagaio — porque, ridicularizando-a, fere a sua vaidade feminina. Além disso, traz à mente da mulher a lembrança do papagaio, o que a faz reviver um remorso, pois fora dela a ideia de usar a ave como alimento. O mal-estar é ainda maior, pois a lembrança desse episódio evoca o sofrimento que ela e sua família tiveram durante a seca.
32 –
3. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte trecho do capítulo “Contas”, de Vidas Secas:
(...) Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. Bem. Nascera com esse destino, ninguém tinha culpa de ele haver nascido com um destino ruim. Que fazer? Podia mudar a sorte? Se lhe dissessem que era possível melhorar de situação, espantar-se-ia. (...) Era sina. O pai vivera assim, o avô também. E para trás não existia família. Cortar mandacaru, ensebar látegos — aquilo estava no sangue. Conformava-se, não pretendia mais nada. Se lhe dessem o que era dele, estava certo. Não davam. Era um desgraçado, era como um cachorro, só recebia ossos. Por que seria que os homens ricos ainda lhe tomavam uma parte dos ossos? Fazia até nojo pessoas importantes se ocuparem com semelhantes porcarias. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. 103.a ed. Rio de Janeiro, Editora Record, 2007, p. 97.) a) Que visão Fabiano tem de sua própria condição? Justifique. RESOLUÇÃO: Fabiano é um dos “heróis problemá ticos” de Gracilian o Ramos, em permanente revolta contra si e c ontra o mundo. É personagem típica dos romances de tensão crítica (Lucien Goldman), nos quais se exibem as sequelas irreversíveis que as injustiças sociais, a opressão e a brutalidade impõem ao ser humano. Fabiano, fatalista a princípio — “Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. (…) Nascera com esse destino (…) Podia mudar a sorte? (…) Era sina. O pai vivera assim (…)” —, parece resignado com a condição de vaqueiro, de empregado, de homem permanentemente brutalizado pelo clima e pela sociedade. Sua revolta nasce da constatação de que, ainda assim, era roubado, prejudicado pelos “homens ricos”, que lhe tomavam até parte dos “ossos” que lhe cabiam pelo trabalho.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 33
b) Explique a referência que ele faz aos “homens ricos”, com base no enredo do livro. RESOLUÇÃO: Os “homens ricos” a que Fabiano se refere são os seus opressores, especialmente o “patrão”, latifundiário, que o oprime, impondo-lhe uma “meação” já em si injusta (ao patrão cabiam três de cada quatro bezerros e dois de cada três caprinos que Fabiano criasse), além da aplicação da tabela “price” aos débitos que o sertanejo ia acumulando. Não bastasse isso, o patrão ainda roubava nas contas. É o retrato brutal de uma sociedade arcaica, pré-capitalista, que acrescenta a onipotência do patronato coronelesco à prepotência do Estado e de seus órgãos policiais (o Soldado Amarelo) e fiscais (a prefeitura).
Texto para a questão 5.
Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras, clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados. De quando em quando estes se mexiam, porque o lume era fraco e apenas aquecia pedaços deles. Outros pedaços esfriavam recebendo o ar que entrava pelas rachaduras das paredes e pelas gretas da janela. Por isso não podiam dormir. Quando iam pegando no sono, arrepiavamse, tinhamdos precisão de era virar-se, chegavam-se à trempe ouviam a conversa pais. Não propriamente conversa: eramefrases soltas, espaçadas, com repetições e incongruências. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. São Paulo, Livraria Martins Editora, s/d., p. 66.)
a) Você concorda com essa afirmação? Justifique sucintamente sua resposta.
5. (FGV-SP) – “Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras, clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados.” a) As ações de Fabiano nesse primeiro trecho desencadearam outras ações com efeitos plásticos e semânticos no contexto. Partindo dessa afirmação, analise, nas orações destacadas em itálico, os sentidos criados pela sequência dos verbos, tanto sob o ponto de vista físico, quanto sob o ponto de vista simbólico, denunciando o estado das personagens.
RESOLUÇÃO: Não, pois a seca é apenas um dos fatores que afligem Fabiano e sua família e não explica todos os dramas da personagem. A secura em Vidas Secas
RESOLUÇÃO: No trecho em itálico, as orações, coordenadas assindéticas, articulam uma sucessão de imagens, especialmente no campo visual, que aludem a alguma
não se restringe ao clima e à paisagem; é, ainda, uma “secura” existencial, linguística e social, advinda de fatores políticos, econômicos e culturais. As aflições de Fabiano também derivam, por exemplo, da violência que sofre por parte do Soldado Amarelo (símbolo da autoridade opressora), assim como de sua incapacidade de comunicação.
luz, pouca e precária, mas que ilumina, afastando o medo e aquecendo. É a luz da madeira queimada que indicia a miséria dos que não têm nem mesmo um lampião a óleo ou querosene.
4. (FUVEST-SP) – Leia as afirmações seguintes e responda ao que se pede. I. A dureza do clima, que se manifesta principalmente nas grandes secas periódicas, explica todas as aflições de Fabiano, ao longo da narrativa de Vidas Secas, de Graciliano Ramos.
II. Apesar de quase atrofiadas na sua rusticidade, as personagens de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, conservam um filete de investigação da interioridade: cada uma delas se perscruta, reflete, tenta compre ender a si e ao mundo, ajustando-o à sua visão. b) Você considera essa afirmação correta? Justifique brevemente sua resposta.
b) Em “clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados”, Graciliano Ramos se vale de técnicas que se assemelham às do cinema, como se se tratasse do “olhar” de uma câmera. Explique esse mecanismo e contextualize seu efeito de sentido com base na obra lida. RESOLUÇÃO: travelling As imagens, justapostas por coordenação, movem-se como num cinematográfico: como se uma câmera se movesse e, emdireção da precária luminosidade, embig close, pusesse em foco as imagens sobre as quais incide a luz: pés, joelhos e os meninos deitados. O “efeito de sentido” refere-se, de novo, à pobreza e precariedade da vida representadas na obra.
RESOLUÇÃO: A afirmação pode ser considerada correta, pois esse “filete de investigação da interioridade” é um recurso de que se vale o narrador, por meio do uso do discurso indireto livre, para trazer à tona os dramas internos de Fabiano e de sua família.
– 33
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 34
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (X)
1. (FUVEST-SP-2010) – Leia este trecho do poema de Vinícius de Moraes:
MENSAGEM À POESIA P O R T U G U Ê S B
Não posso Não é possível Digam-lhe que é totalmente impossível Agora não pode ser É impossível Não posso. que estou tristíssimo, mas não posso ir esta noite ao seu Digam-lhe [encontro. 2. (UNICAMP-SP-2010) – O poeta Vinícius de Moraes, apesar de Contem-lhe que há milhões de corpos a enterrar modernista, explorou formas clássicas, como o soneto abaixo, em Muitas cidades a reerguer, muita pobreza pelo mundo. versos alexandrinos (12 sílabas) rimados: Contem-lhe que há uma criança chorando em alguma parte do mundo E as mulheres estão ficando loucas, e há legiões delas carpindo SONETO DE INTIMIDADE A saudade de seus homens; contem-lhe que há um vácuo Nos olhos dos párias, e sua magreza é extrema; contem-lhe Nas tardes de fazenda há muito azul demais. Que a vergonha, a desonra, o suicídio rondam os lares, e é preciso Eu saio às vezes, sigo pelo pasto, agora [reconquistar a vida. Mastigando um capim, o peito nu de fora Façam-lhe ver que é preciso eu estar alerta, voltado para todos os No pijama irreal de há três anos atrás. [caminhos Pronto a socorrer, a amar, a mentir, a morrer se for preciso. Desço o rio no vau dos pequenos canais (...) Para ir beber na fonte a água fria e sonora (Vinícius de Moraes,Antologia Poética) E se encontro no mato o rubro de uma amora Vou cuspindo-lhe o sangue em torno dos currais. a) No trecho, o poeta expõe alguns dos motivos que o impedem de ir Fico ali respirando o cheiro bom do estrume ao encontro da poesia. A partir da observação desses motivos, procure Entre as vacas e os bois que me olham sem ciúme deduzir a concepção dessa poesia ao encontro da qual o poeta não E quando por acaso uma mijada ferve poderá ir: como se define essa poesia? quais suas características principais? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: Seguida de um olhar não sem malícia e verve O poeta exprime rejeição à poesia que fuja do contato imediato com o Nós todos, animais, sem comoção nenhuma mundo e os seus problemas. Mijamos em comum numa festa de espuma. (Vinícius de Moraes,Antologia Poética. São Paulo, Companhia das Letras, 2001, p. 86.) a) Essa forma clássica tradicionalmente exigiu tema e linguagem elevados. O “Soneto de Intimidade” atende a essa exigência? Justifique. b) Na “Advertência”, que abre sua Antologia Poética, Vinícius de Moraes declarou haver “dois períodos distintos”, ou duas fases, em sua obra. Considerando-se as características dominantes do trecho, a qual desses períodos ele pertence? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “Mensagem à Poesia” pertence à segunda fase da obra de Vinícius de Moraes, pois há no texto a preocupação em fazer a poesia abandonar o inefávela eenterrar”, buscar o “criança cotidianochorando”, e as preocupações doreconquistar mundo (“milhões de corpos “é preciso a vida”).
34 –
RESOLUÇÃO: Nem o tema, nem a linguagem desse soneto são “elevados”. Com efeito, o tema é “baixo” (o congraçamento “fisiológico” com os animais) e a linguagem não evita o vulgar (“cheiro bom do estrume”) e chega a beirar o chulo (“uma mijada ferve”, “mijamos em comum numa festa de espuma”).
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 35
b) Como os quartetos anunciam a identificação do eu lírico com os animais? Como os tercetos a confirmam?
3. Destaque, no poema deVinícius de Moraes, otrecho que indica que ele teria sido influenciado pela poesia de Manuel Bandeira.
RESOLUÇÃO: Os quartetos exprimem a identificação do eu lírico com os animais, apresentando-o em ações mais comumente esperadas deles: mastigar capim (v. 3), andar sem roupa (v. 3), beber água na fonte dos rios (v. 6), comer amoras direto das árvores e cuspi-las em torno dos currais (vv. 78). A confirmação dessa identificação vem nos tercetos de forma inusitada, na menção ao congraçamento do eu lírico com os bois e as vacas na satisfação de uma necessidade fisiológica comum.
RESOLUÇÃO: “Não foste apenas um segredo / De poesia e de emoção / Foste uma estrela em meu degredo.”
4. Qual o refrão do poema de Vinícius? Comente as transformações que esse refrão sofre em suas repetições ao longo do poema. RESOLUÇÃO: O refrão é “Poeta, pai, áspero irmão”. Em cada uma das três vezes que esse refrão se repete no poema, destaca-se uma das três qualificações que Vinícius atribui a Bandeira: primeiro, pai vem seguido de ponto de exclamação; na segunda ocorrência, o ponto de exclamação vem depois de poeta; na terceira ocorrência, há um ponto de interrogação no fim do verso, ficando os três vocativos igualados na pergunta final.
Texto para as questões de 3 a 7.
SAUDADE DE MANUEL BANDEIRA
Não foste apenas um segredo De poesia e de emoção Foste uma estrela em meu degredo Poeta, pai! áspero irmão. Não me abraçaste só no peito Puseste a mão na minha mão Eu, pequenino — tu, eleito Poeta! pai, áspero irmão.
5. Explique por que o verso “Eu, pequenino — tu, eleito” contém uma antítese. RESOLUÇÃO: A antítese ocorre entrepequenino e eleito. Pequenino, no contexto, significa “poeta de pequeno valor”, ao passo que eleito significa o oposto: “grande poeta”, porque “eleito”, “escolhido” (na Antiguidade se imaginava que o poeta — o grande poeta — fosse o eleito dos deuses).
Lúcido, alto e ascético amigo De triste e claro coração Que sonhas tanto a sós contigo Poeta, pai, áspero irmão? (Vinícius de Moraes)
RESPOSTA A VINÍCIUS
Poeta sou; pai, pouco; irmão, mais. Lúcido, sim; eleito, não. E bem triste de tantos ais Que me enchem a imaginação. 6. Qual a outra expressão do poema de Vinícius cujo sentido pode ser aproximado de “áspero irmão”?
Com que sonho? Não sei bem não. Talvez com me bastar, feliz — Ah feliz como jamais fui! —, Arrancando do coração — Arrancando pela raiz — Este anseio infinito e vão De possuir o que me possui.
RESOLUÇÃO: “Ascético amigo.”
(Manuel Bandeira)
– 35
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 36
7. Explique o sentido da resposta de Bandeira à pergunta de Vinícius. RESOLUÇÃO: Bandeira responde que não sabe bem com o que sonha — sonharia talvez com a felicidade autossuficiente (“...talvez com me bastar, feliz”) e com a supressão do grande e inútil desejo (“anseio infinito e vão”) de assenhorear-se daquilo que o encanta e domina o seu desejo (“possuir o que me possui”). P O R T U G U Ê S B
8. (UFSCar-SP) – Nos dois primeiros quartetos do soneto de Vinícius de Moraes, delineia-se a ideia de que o poeta a) não acredita no amor como entrega total entre duas pessoas. b) acredita que, mesmo amando muito uma pessoa, é possível apaixonar-se por outra e trocar de amor. c) entende que somente a morte é capaz de findar com o amor de duas pessoas. d) concebe o amor como um sentimento intenso a ser compartilhado, tanto na alegria quanto na tristeza. e) vê, na angústia causada pela ideia da morte, o impedimento para as pessoas se entregarem ao amor. RESOLUÇÃO: A ideia de que o amor deve ser compartilhado tanto na alegria como na tristeza depreende-se dos dois últimos versos da segunda estrofe: “E rir meu riso e derramar meu pranto / Ao seu pesar ou seu contentamento.” Resposta: D
Textos para os testes 8 e 9.
SONETO DE FIDELIDADE
De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.
9. (UFSCar-SP) – Em “Por enquanto”, Renato Russo diz que “...o pra sempre / sempre acaba”. Essa ideia, no poema de Vinícius de Moraes, aparece no seguinte verso: a) “Mas que seja infinito enquanto dure.” b) “Quero vivê-lo em cada vão momento.” c) “Quem sabe a morte, angústia de quem vive.” d) “Quem sabe a solidão, fim de quem ama.” e) “Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto.”
Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento.
RESOLUÇÃO: O verso “Mas que seja infinito enquanto dure” implica a ideia de fim, de término (“enquanto dure” quer dizer que não durará sempre), e postula que, dentro de tal limite, o amor não conheça limites (“seja infinito”, isto é, não seja contido por nenhuma restrição). Os versos de Renato Russo — “o pra sempre / sempre acaba” — também afirmam a ideia de fim, em contraste com um projeto sem limite, sem fim (“o pra sempre”). O ponto comum entre os dois textos é, portanto, a ideia de que algo que se quer sem limites também está destinado a terminar. Resposta: A
E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa lhe dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. (Vinícius de Moraes)
POR ENQUANTO Mudaram as estações Nada mudou Mas eu sei que alguma coisa aconteceu Tá tudo assim, tão diferente Se lembra quando a gente Chegou um dia a acreditar Que tudo era pra sempre Sem saber Que o pra sempre Sempre acaba. (Renato Russo)
36 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 37
MÓDULO
Análise de Textos (I)
Textos para as questões de 1 a 6.
Texto 1
Como sempre acontece a quem tem muito onde escolher, o pequeno, a quem o padrinho queria fazer clérigo mandando-o a Coimbra, a quem a madrinha queria fazer artista metendo-o na Conceição, a quem D. Maria queria fazer rábula arranjando-o em algum cartório e a quem enfim cada conhecido ou amigo queria dar um destino que julgava mais conveniente às inclinações que nele descobria, o
3. No primeiro excerto, o narrador repete o sujeito “o pequeno”. Entre as duas ocorrências do termo, há intercalada uma série de orações sintaticamente semelhantes. Considerando essa informação, responda ao que se pede: a) O que há de comum en tre todas essas orações? RESOLUÇÃO: O que há de comum a todas as orações adjetivas que acom panham o termo “o pequeno” é o desejo ou a intenção que cada uma das personagens mencionadas (o padrinho, a madrinha, D. Maria etc.) tem em relação ao futuro do protagonista Leonardo.
pequeno, dizemos, tendo nem tantaspara coisas boas, escolheu pior possível; nem foi para Coimbra, a Conceição, nemapara cartório algum; não fez nenhuma destas coisas, nem também outra qualquer: constituiu-se um completo vadio, vadio-mestre, vadio-tipo. Texto 2
Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça: era alta, magra, pálida; andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo, cortado, dava-lhe apenas até o pescoço e, como andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, como uma viseira. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 1. No primeiro excerto, quem é o “pequeno”? RESOLUÇÃO: O “pequeno” é Leonardinho, o protagonista dasMemórias de um Sargento de Milícias.
b) Por que o narrador, no trecho 1, após a segunda ocorrência de “o pequeno”, utiliza o verbo “dizemos”? Qual é o sentido dessa forma verbal na passagem? RESOLUÇÃO: O narrador utiliza a forma “dizemos”, intercalada, porque, depois de apresentar pela primeira vez o sujeito — “o pequeno” —, interrompe o que dizia com a série de orações adjetivas, perdendo assim a sequência de seu pensamento. Para retomá-la, depois de repetir o sujeito, utiliza a forma verbal “dizemos”, que, na passagem, significa “como estávamos dizendo”, “como dizíamos” etc.
2. Como se chama a personagem descrita na segunda passagem? RESOLUÇÃO: Luisinha, sobrinha de D. Maria.
– 37
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 38
c) Em que consiste a ironia presente no trecho 1? RESOLUÇÃO: Consiste em que todos alimentavam pretensiosas expectativas quanto ao futuro de Leonardo (ser clérigo, artista, rábula...), porém ele frustrou a todos, constituindo-se um “completo vadio”.
P O R T U G U Ê S B
5. Na descrição da sobrinha de D. Maria, perce bem-se duas partes: uma em que o narrador a caracteriza sinteticamente e outra em que particulariza analiticamente seus traços e atitudes. Identifiquecada uma dessas partes, apontando as respectivas passagens. RESOLUÇÃO: Descrição sintética: “Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça”; Descrição analítica: “era alta, magra, pálida; andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo cortado dava-lhe apenas até o pescoço e, como andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, como uma viseira.”
4. (PUC-SP) – Tomando como ponto de partida a descrição das personagens a que se referem os trechos transcritos, e considerando o romance como um todo, justifique a afirmação do crítico Antonio Candido de que Memórias de um Sargento de Milícias, obra escrita no Romantismo, estava meio em descompasso com os padrões e o tom daquele momento. RESOLUÇÃO: A caracterização de Leonardo e Luisinha, nos fragmentos transcritos, evidencia que a obra de Manuel Antônio de Almeida se afasta da idealização e linearidade com quem os autores românticos brasileiros concebiam seus heróis e heroínas. Na caracterização de Leonardo, o autor constrói um anti-herói (“um completo vadio, vadio-mestre, vadio-tipo”); constrói um típico “malandro”, ancestral de Macunaíma, da obra homônima de Mário de Andrade, na linhagem do “herói sem nenhum caráter”, motivado mais pelo prazer, pelo medo, pela oportunidade do que por qualquer fundamento ético e qualquer ideal. Nesse mesmo sentido, toda a descrição de Luisinha aproxima-se da atitude realista, pela ênfase que dá aos aspectos banais e sem encantos da figura feminina, isto é, pela ausência de qualquer idealização: “andava com o queixo enterrado no peito”, “trazia a cabeça sempre baixa”.
Texto para a questão 6.
Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba; Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros; Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas. Onde vai a afouta jangada, que deixa rápida a costa cearense, aberta ao fresco terral a grande vela? Onde vai como branca alcíone, buscando o rochedo pátrio nas solidões do oceano? (José de Alencar,Iracema) 6. Releia os trechos de Memórias de um Sargento de Milícias e, comparando-os ao fragmento de Iracema acima transcrito, discorra sobre o estilo da linguagem de ambas as obras. RESOLUÇÃO: Em Memórias de um Sargento de Milícias , o estilo é irônico, coloquial e irreverente, ao passo que, em Iracema, ao contrário, o estilo é reverente, poético, mítico.
38 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 39
Análise de Textos (II)
MÓDULO Textos para as questões de 1 a 6.
LXXII UMA REFORMA DRAMÁTICA
Bentinho/D. Casmurro é Otelo, Capitu é Desdêmona, Escobar é Cássio, e a consciência atormentada do narrador é Iago, a espicaçar-lhe o mórbido ciúme. Como admitia o narrador, ele primeiro constituiu, como numa montagem operística, um duo terníssimo, depois um trio, depois um quatuor.
Nem eu, nem tu, nem ela, nem qualquer outra pessoa desta história poderia responder mais, tão certo é que o destino, como todos os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho. Eles chegam a seu tempo, até que o pano cai, apagam-se as luzes e os espectadores vão dormir. Nesse gênero há porventura alguma coisa que reformar, e eu proporia, como ensaio, que as peças começassem pelo fim. Otelo mataria a si e a Desdêmona no primeiro ato, os três seguintes seriam dados à ação lenta e decrescente do ciúme e o último ficaria só com as cenas iniciais da ameaça dos turcos, as explicações de Otelo e Desdêmona, e o bom conselho do fino Iago: “Mete dinheiro na bolsa.” Desta maneira, o espectador, por um lado, acharia no teatro a charada habitual que os periódicos lhe dão, porque os últimos atos explicariam o desfecho do primeiro, espécie de conceito, e, por outro lado, ia para a cama com uma boa impressão de ternura e de amor. CXXXV OTELO
Jantei fora. De noite fui ao teatro. Representava-se justamente Otelo, que eu não vira nem lera nunca; sabia apenas o assunto e estimei a coincidência. Vi as grandes raivas do mouro, por causa de um lenço — um simples lenço! —, e aqui dou matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros continentes, pois não me pude furtar à observação de que um lenço bastou a acender os ciúmes de Otelo e compor mais sublime tragédialençóis; deste mundo. lenços hoje sãoaprecisos os próprios algumaOsvez nem perderam-se, lençóis há, e valem só as camisas. Tais eram as ideias que me iam passando pela cabeça, vagas e turvas, à medida que o mouro rolava convulso, e Iago destilava a sua calúnia. Nos intervalos não me levantava da cadeira; não queria expor-me a encontrar algum conhecido. As senhoras ficavam quase todas nos camarotes, enquanto os homens iam fumar. Então eu perguntava a mim mesmo se alguma daquelas não teria amado alguém que jazesse agora no cemitério, e vinham outras incoerências, até que o pano subia e continuava a peça. O último ato mostrou-me que não eu, mas Capitu devia morrer. Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este lhe deu entre aplausos frenéticos do público.
b) Ele já tornara a peça assunto do capítulo LXXII, mas apenas agora tem ocasião de vê-la. Do ponto de vista da estrutura do romance, isso implicaria alguma contradição? Justificar, se for o caso. RESOLUÇÃO: Não há contradição. A ordem cronológica da ação do roman ce é truncada pelas digressões do narrador, que, posicionado no presente da narração, da escrita de suas memórias, interfere livremente no passado e na ação para comentá-los. A técnica impressionista de recompor o passado através de “manchas” de recordação permite, pela imposição do tempo psicológico, a fusão de presente e passado. O capítulo LXXII, de caráter metalin guístico, é uma reflexão do memorialista que interrompe e elucida a ação romanesca. O capítulo CXXXV integra a própria ação do romance, recapitulando o passado. Não há, portanto, qualquer contradição estrutural no fato de, no capítulo LXXII, o narrador revelar o conhecimento de uma peça que a personagem, na sequência da ação, só veria no capítulo CXXXV. Basta não confundir narrador e personagem.
1. (FUVEST-SP) – O narrador afirma, no capítulo CXXXV, que “não vira nem lera nunca” Otelo e que estimou a coincidência, ao chegar ao teatro. a) A que coincidência está se referindo? RESOLUÇÃO: Bentinho alude à coincidência entre o seu drama pessoal, centrado no ciúme doentio e na suposta traição de sua esposa, e o núcleo dramático de Otelo, de Shakespeare, tragédia que se desenvolve em torno do mesmo tema. O romance machadiano estabelece com a peça clássica uma constante relação de intertextualidade. Já a partir da teoria do velho tenor Marcolini, exposta no capítulo IX, de que “a vida é uma ópera”, e endossada pelo narrador no capítulo seguinte, evidencia-se o paralelo, às vezes desdobrado em paródia, entre o romance e a encenação dramática.
– 39
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 40
P O R T U G U Ê S B
2. (FUVEST-SP) – “Os lenços perderam-se, hoje são precisos os próprios lençóis; alguma vez nem lençóis há, e valem só as camisas.” Por que o narrador contrapõe lençóis e camisas, de seu tempo, a lenços, do tempo da tragédia?
4. (FUVEST-SP) – “Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este lhe deu entre aplausos frenéticos do público.” O modo como o narrador vê a reação do público revela algo. De que se trata?
RESOLUÇÃO: Há, na contraposição entre os lenços do passado e os lençóis e camisas do presente, uma crítica à decadência dos costumes do tempo de enunciação de Dom Casmurro. Na época retratada por Shakespeare, bastavam indícios materiais para configurar o adultério; hoje (o presente da narração, da enunciação) são necessárias provas mais contun dentes: a exibição da intimidade dos amantes, dos “lençóis”, das “camisas” (= peças íntimas).
RESOLUÇÃO: O narrador, equivocadamente, interpreta os aplausos do público como aplausos ao ato de vingança de Otelo, como se o público estivesse assumindo o papel do príncipe mouro, solidário com sua ira. Na verdade, o público aplaudia o espetáculo, o desempenho dos atores, não a atitude do marido “traído”. É mais uma evidência da importância do foco narrativo na construção de Dom Casmurro.
3. (FUVEST-SP) – Como bom espectador, o narrador sabia que Desdêmona era inocente. Por que ele não se compadece da morte dela?
5. (FUVEST-SP) – Quando o narrador propõe a reforma dramática, no capítulo LXXII, ele compara o destino aos dramaturgos. a) O que seria de uma trag édia, caso o dramaturgo lhe invertesse a trama?
RESOLUÇÃO: A tragédia de Shakespeare deixa patente a inocência de Desdêmona, e a prova incriminatória, o fatídico lenço, não passou de um ardil de Iago, que materializou, na consciência atormentada de Otelo, a convicção do adultério. Bentinho, contudo, está tão envolvido nas teias do ciúme, e o narrador é tão solidário com Otelo, que a inocência de Desdêmona é irrelevante. O narrador-personagem identifica-se com Otelo e, como ele, assume o papel do marido que, supondo-se traído, exerce sua “justa” vingança. É um indício da subjetividade do ponto de vista.
40 –
RESOLUÇÃO: A solução ou a reforma aventada pelo narrador, invertendo-se o curso dos acontecimentos para que a ação desabasse em anticlímax, transfor maria a tragédia de Otelo em comédia, ou em ópera-bufa, e a ação homicida e suicida da personagem descam baria no prosaico conselho pecuniário de Iago: “Mete dinheiro na bolsa”, numa velada crítica ao pragmatismo contemporâneo.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 41
b) Na verdade, o que Bentinho buscaria reformar? RESOLUÇÃO: Ao propor sua reforma dramática, na qual a tragédia, satí rica e parodisticamente, terminasse emhappy end, o narrador-personagem, “pressentindo” sua tragédia pessoal, procuraria inver ter o curso dos acontecimentos, interferindo no próprio destino, no curso da vida. Continua, portanto, fiel ao princípio que acatou, a partir da teoria do velho tenor Marcolini: “A vida é uma ópera.” A reforma que propõe o narrador é uma premonição do desfecho, que ele já conhece, e imagina reverter pelo discurso, pela encenação.
Texto para a questão 7.
— Você é um grande prosa — disse tio Cosme, quando ele acabou. José Dias sorriu sem vexame. Padre Cabral confirmou os louvores do agregado, sem os seus superlativos; ao que este acrescentou que o Cardeal Mastai evidentemente fora talhado para a tiara desde o princípio dos tempos. E, piscando-me o olho, concluiu: — A vocação é tudo. O estado eclesiástico é perfeitíssimo, contanto que o sacerdote venha já destinado do berço. Não havendo vocação, falo de vocação sincera e real, um jovem pode muito bem estudar as letras humanas, que também são úteis e honradas. Padre Cabral retorquia: — A vocação é muito, mas o poder de Deus é soberano. Um homem pode não ter gosto à igreja e até persegui-la, e um dia a voz de Deus lhe— fala, sai apóstolo; vejaeuSão Paulo. Nãoe ele contesto, mas o que digo é outra coisa. O que eu digo é que se pode muito bem servir a Deus sem ser padre, cá fora; pode-se ou não se pode? — Pode-se. — Pois então! exclamou José Dias triunfalmente, olhando em volta de si. Sem vocação é que não há bom padre, e em qualquer profissão liberal se serve a Deus, como todos devemos. — Perfeitamente, mas vocação não é só do berço que se traz. (Machado de Assis, Dom Casmurro) 7) a) A discussão entre José Dias e Padre Cabral gira em torno de que tema?
6. (FUVEST-SP) – Ao comparar o destino humano ao destino das personagens de uma peça teatral, Machado retoma o tópos (lugarcomum literário) do Theatrum Mundi (o “teatro do mundo”, ou seja, o mundo como um teatro). Explique. RESOLUÇÃO: O tópos do mundo como um teatro é recorrente na literatura e remonta a Platão, que comparou o homem a um fantoche nas mãos de Deus. O mundo como um teatro significa que o homem não possui o controle total de seu próprio destino, assim como as personagens, manipuladas pelo dramaturgo, não podem alterar o desfecho a que são submetidas: “tão certo é que o destino, como todos os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho.”
RESOLUÇÃO: A discussão gira em torno da vocação para a vida reli giosa. (O que está em jogo é a ida ou não de Bentinho para o seminário.)
b) Qual a posição defendida por um e por outro? RESOLUÇÃO: José Dias defende que a vocação é condiçãosine qua non para o ingresso no sacerdócio e que ela deve vir do berço. Padre Cabral concorda que deve haver vocação, mas discorda de que ela deva ser uma condição dada desde o nascimento; segu ndo ele, alguém pode receber o chamado de Deus, mesmo depois de ter levado uma vida contrária à Igreja, como ocorreu com São Paulo.
– 41
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 42
MÓDULO
Análise de Textos (III)
As questões de números 1 a 4 tomam por base um fragmento do romance O Ateneu, de Raul Pompeia (1863-1895), em que o narrador comenta suas reações ao ensino que recebia no colégio: P O R T U G U Ê S B
O ATENEU
A doutrina cristã, anotada pela proficiência do explicador, foi ocasião de dobrado ensino que muito me interessou. Era o céu aberto, rodeado de altares, para todas as criações consagradas da fé. Curioso encarar a grandeza do Altíssimo; mas havia janelas para o purgatório aE que o Sanchestinha se debruçava comigo, cuja vista muito seduzia. o preceptor um tempero de unção na voz e nomais modo, uma sobranceria de diretor espiritual, que fala do pecado sem macular a boca. Expunha quase compungido, fincando o olhar no teto, fazendo estalar os dedos, num enlevo de abstração religiosa; expunha, demorando os incidentes, as mais cabeludas manifestações de Satanás no mundo. Nem ao menos dourava os chifres, que me não fizessem medo; pelo contrário, havia como que o capricho de surpreender com as fantasias do Mal e da Tentação, e, segundo o lineamento do Sanches, a cauda do demônio tinha talvez dois metros mais que na realidade. Insinuou-me, é certo, uma vez, que não é tão feio o dito, como o pintam. O catecismo começou a infundir-me o temor apavorado dos oráculos obscuros. Eu não acreditava inteiramente. Bem pensando, achava que metade daquilo era invenção malvada do Sanches. E quando ele se punha a contar histórias de castidade, sem atenção à parvidade da matéria do preceito teológico, mulher do próximo, Conceição da Virgem, terceiro-luxúria, brados ao céu pela sensualidade contra a natureza, vantagens morais do matrimônio, e porque a carne, a inocente carne, que eu só conhecia condenada pela quaresma e pelos monopolistas do bacalhau, a pobre carne do beef, era inimiga da alma; quando retificava o meu engano, que era outra a carne e guisada de modo especial e muito especialmente trinchada, eu mordia um pedacinho de indignação contra as calúnias à santa cartilha do meu devoto credo. Mas a coisa interessava e eu ia colhendo as informações para julgar por mim oportunamente. Na tabuada e no desenho linear, eu prescindia do colega mais velho; no desenho, porque achava graça em percorrer os caprichosos traços, divertindo-me a geometria miúda como um brinquedo; na tabuada e no sistema métrico, porque perdera as esperanças de passar de medíocre como ginasta de cálculos e resolvera deixar a Maurílio ou a quem quer que fosse o primado das cifras. Em dois meses tínhamos vencido por alto a matéria toda do curso; e, com este preparo, sorria-me o agouro de magnífico futuro, quando veio a fatalidade desandar a roda. (Raul Pompeia, O Ateneu. Rio de Janeiro, Biblioteca Universal Popular, 1963.) 1. (VUNESP-SP-2010) – Nesta passagem de O Ateneu, romance que a crítica literária ainda hesita em classificar dentro de um único estilo literário, a personagem narradora se refere ao ensino de religião cristã, desenho e matemática, mostrando atitudes diferentes com relação aos conteúdos de cada disciplina. Releia o texto e, a seguir, explique a razão de a personagem narradora declarar, no penúltimo parágrafo, que prescindia do colega mais velho no aprendizado de desenho.
42 –
RESOLUÇÃO: Diferentemente do que ocorria com o estudo da tabuada e do sistema métrico, matérias que já não seduziam o narrador, visto que ele se diz, nelas, um “medíocre” sem esperanças, o trabalho com o desenho o atraía e entretinha: “achava graça em percorrer os caprichosos traços, divertindo-me a geometria miúda como um brinquedo”. Este o motivo pelo qual, no caso, ele “prescindia do colega mais velho”, cujo auxílio lhe valia no estudo de religião e seria inútil no de matemática.
2. (VUNESP-SP-2010) – No primeiro parágrafo, a personagem Sanches, aluno mais velho que atuava como espécie de preceptor para os estudos de Sérgio, o mais novo, refere-se a duas entidades da religião cristã, contextualizando valores opostos a cada uma delas. Identifique as duas entidades e os valores a que estão respectivamente associadas. RESOLUÇÃO: As entidades referidas são Deus (“o Altíssimo”) e Satanás. Os valores a que estão associadas tais entidades são o Bem (a virtude), no caso de Deus, e o Mal, a Tentação (o pecado), no caso de Satanás.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 43
3. (VUNESP-SP-2010) – Embora no uso popular a palavra agouro apresente muitas vezes a acepção de “previsão ruim”, seu significado srcinal não tem essa marca pejorativa, mas, simplesmente, o de prognóstico, previsão, predição, augúrio. Leia atentamente o último parágrafo do fragmento de O Ateneu e, a seguir, explique, comprovando com base em elementos do contexto, em que sentido o narrador empre gou a palavra agouro. RESOLUÇÃO: O contexto em que se encontra a palavra agouro, núcleo do sujeito da oração, é enfaticamente positivo, seja no verbo metafórico — “sorria-me” — que constitui o seu predicado —, seja no complemento nominal que a acompanha — “de magnífico futuro”. Portanto, o sentido de agouro só pode ser “prognóstico, previsão”, sem qualquer traço negativo.
As questões de números 5 e 6 referem-se ao texto seguinte, de José de Alencar.
O trocano1 ribombou, derramando longe pela amplidão dos vales e pelos ecos das montanhas a pocema2 do triunfo. Os tacapes, vibrados pela mão pujante dos guerreiros, bateram nos largos escudos retinindo. Mas a voz possante da multidão dos guerreiros cobriu o imenso rumor, clamando: — Tu és Ubirajara, o senhor da lança, o vencedor de Pojucã, o maior guerreiro da nação tocantim. (...) Quando parou o estrondo da festa e cessou o canto dos guerreiros, avançou Camacã, o grande chefe dos araguaias. (...) falou o ancião: Assim — Ubirajara, senhor da lança, é tempo de empunhares o grande arco da nação araguaia, que deve estar na mão do mais possante. Camacã o conquistou no dia em que escolheu por esposa Jaçanã, a virgem dos olhos de fogo, em cujo seio te gerou seu primeiro sangue. Ainda hoje, apesar da velhice que lhe mirrou o corpo, nenhum guerreiro ousaria disputar o grande arco ao velho chefe, que não sofresse logo o castigo de sua audácia. Mas Tupã ordena que o ancião se curve para a terra, até desabar como o tronco carcomido; e que o mancebo se eleve para o céu como a árvore altaneira. Camacã revive em ti; a glória de ser o maior guerreiro cresce com a glória de ter gerado um guerreiro ainda maior do que ele. (José de Alencar, Ubirajara. 8.a ed. São Paulo, Ática, 1984, p. 31-32.)
4. (VUNESP-SP-2010) – Ao focalizar os pecados contra as virtudes estipuladas pela religião, no segundo parágrafo, o narrador de certo modo se diverte e faz um jogo de palavras com duas diferentes acepções de carne. Releia atentamente o parágrafo e explique esse jogo de palavras. RESOLUÇÃO: Quando se falava em “pecados da carne”, a ingenui dade do narrador o levava a pensar em carne bovina, que era a referência única da palavra em seu repertório infantil. Seu instrutor em matéria religiosa, que se enlevava na exposição das “mais cabeludas manifestações de Satanás no mundo”, corrigia-o pressurosamente, esclarecendo tratar-se de outra “carne”, que se prepara e come de outra maneira... Tais esclareci mentos eram para o menino, ao mesmo tempo, motivo de indignação e interesse.
1 – Trocano: espécie de tambor dos índios, feito de um pedaço de tronco oco com tampos de tábua furados ao meio, posto horizontalmente sobre forquilhas. 2 – Pocema: canto selvagem, clamor.
5. (UFSCar-SP) – Apresenta-se, no fragmento de Ubirajara , um cenário de exaltação ao herói. Logo, trata-se de um ritual grandiloquente para aquele que simboliza o poder na tribo, em valores que expressam o ideário romântico do qual participou Alencar. a) Por que se pode dizer que a oração “Tu és Ubirajara” sintetiza o discurso de exaltação ao herói? RESOLUÇÃO: A palavra indígenaUbirajara significa “senhor da lança” (Ubira = vara, lança; jara = senhor), sintetizando o discurso de exaltação, porque só o mais possante dos guerreiros poderia ser o chefe da tribo araguaia, empunhar o grande arco e ser chamado Ubirajara. O grande arco é a insígnia do chefe guerreiro.
– 43
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 44
b) Comente a visão romântica do índio brasileiro, expressa em Alencar, comparando-a com a visão do índio no Modernismo, valendo-se da figura de Macunaíma, de Mário de Andrade:
P O R T U G U Ê S B
No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma. (Mário de Andrade, Macunaíma, o herói sem nenhum caráter.
6. (UFSCar-SP) – O texto apresenta o índio num ritual, exaltando-se o guerreiro Ubirajara por vencer o rival, Pojucã. a) O que representa o discurso de Camacã para a vida na tribo? RESOLUÇÃO: O discurso de Camacã representa a troca de chefe. O guerreiro ancião Camacã passa o comando da tribo araguaia a seu filho, o jovem, forte, corajoso Ubirajara.
31.a ed. Belo Horizonte/Rio de Janeiro, Garnier, 2000, p. 13.) RESOLUÇÃO: A visão romântica do índio brasileiro, expressa em Alencar e autores dessa escola, é bastante idealizada. O código ético do aborígine aproxima-o da figura do cavaleiro das novelas medievalistas do Romantismo europeu: a honra acima de tudo. Já no Modernismo, não existe a idealização da personagem indígena, pois a “índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma”. Na visão antropofágica do Modernismo, o índio é o “mau selvagem”.
b) Quais as expressões, de sentido figurado, empregadas por Alencar para referir-se à velhice de Camacã? Que figura de linguagem está contida nessas expressões? RESOLUÇÃO: “Mas Tupã ordena que o ancião se curve para a terra, até desabar como o tronco carcomido.” A figura de linguagem que aparece nessa passagem é a comparação ou símile (“como o tronco carcomido”).
Análise de Textos (IV)
MÓDULO
As questões de números 1 a 4 tomam por base uma passagem da comédia As Casadas Solteiras , de Martins Pena (1815-1848), e uma passagem do romance Dona Flor e seus Dois Maridos, de Jorge Amado (1912-2001).
AS CASADAS SOLTEIRAS Cena IX Henriqueta e depois Jeremias
solteiro, ou, se é casado, viver bem longe da mulher.enquanto ( fala, Henriqueta vem-se aproximando dele pouco a pouco) Vivo como um lindo amor! Ora, já não posso aturar a minha cara-metade... O que me vale é Henriqueta, que a este tempo estar ela há mais de duzentas léguas de mim. ( está junto dele,agarra-lhe pela gola da casaca. Jeremias, assus tando-se) Quem é? (Henriqueta dá-lhe uma bofetada e o deixa. Jeremias, gritando) Ai, tragam luzes! São ladrões!aqui ( entra o criado com luzes)
Henriqueta É outra girândola, patife!
(sóalegre... ) Henriqueta Vens muito Mal sabes tu o que te espera. Canta, canta, que logo chiarás! (apaga a vela) Ah, meu tratante!
Jeremias Minha mulher!
Jeremias (entrando) Que diabo! É noite fechada e ainda não acenderam as velas!cha( mando) Tomás, Tomás, traze luz! Não há nada como estar o homem
Henriqueta Pensavas que te não havia de encontrar?
44 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 45
Jeremias Mulher do diabo!
Criado (entrando) Uma carta da Corte para o Sr. Jeremias.
Henriqueta Agora não te perderei de vista um só instante.
Jeremias Dá cá. (o criado entrega a carta e sai. Jeremias para Henriqueta) Não ter eu a fortuna, peste, que esta carta fosse a de convite para teu enterro...
Jeremias (para o criado) Vai-te embora. (o criado sai) Henriqueta Ah, não queres testemunhas? Jeremias Não, porque quero te matar!
Henriqueta Não terá esse gostinho. Pode ler, não faça cerimônia. Jeremias Não preciso da sua permissão. ( abre a carta e a lê em silêncio) Estou perdido! (deixa cair a carta no chão) Desgraçado de mim! (vai
cair sentado na cadeira)
Henriqueta Ah, ah, ah! Disso me rio eu.
Henriqueta O que é?
Jeremias (furioso) Ah, tens vontade de rir? Melhor; a morte será alegre. (tomando-a pelo braço) Tu és uma peste, e a peste se cura; és um demônio, e os demônios se exorcizam; és uma víbora, e as víboras se matam!
Jeremias Que infelicidade, ai!
Henriqueta E aos desavergonhados se ensinam! (levanta a mão para dar-lhe uma bofetada, e ele, deixando-a, recua) Ah, foges? Jeremias Fujo sim, porque da peste, dos demônios e das víboras se foge... Não quero mais te ver! ( fecha os olhos) Henriqueta
Henriqueta Jeremias! Jeremias Arruinado! Perdido! Henriqueta (corre e apanha a carta e a lê) “Sr. Jeremias, muito sinto dar-lhe tão desagradável notícia. O negociante a quem o senhor emprestou o resto de sua fortuna acaba de falir. Os credores não puderam haver nem 2 por cento do rateio. Tenha resignação...” — Que desgraça! Pobre Jeremias! (chegando-se para ele) Tende coragem.
Hás de ver-me e ouvir-me!
Jeremias Não quero mais te ouvir! (tapa os ouvidos com a mão) Henriqueta (tomando-o pelo braço) Pois hás de me sentir! Jeremias (saltando) Arreda! Henriqueta Agora não me arredarei mais do pé de ti, até o dia do Juízo...
Jeremias (chorando) Ter coragem! É bem fácil de dizer-se... Pobre, miserável... Ah! (levantando-se ) Henriqueta, tu que sempre me amaste, não me abandones agora... Mas não, tu me abandonarás; eu estou pobre... Henriqueta Injusto que tu és. Acaso amava eu o teu dinheiro, ou a ti? Jeremias Minha boa Henriqueta, minha querida mulher, agora que tudo perdi, só tu és o meu tesouro; só tu serás a consolação do pobre Jeremias.
Jeremias Pois agora também faço eu protesto solene a todas as nações, declaração formalíssima à face do universo inteiro, que hei de fugir de ti como o diabo foge da cruz; que hei de evitar-te como o devedor ao credor; que hei de odiar-te como as oposições odeiam as maiorias.
Henriqueta Abençoada seja a desgraça que me faz recobrar o teu amor! Trabalharemos para viver, e a vida junto de ti será para mim um paraíso...
Henriqueta E eu declaro que te hei de seguir como a sombra segue o corpo...
Jeremias Oh, nunca mais te deixarei! (Martins Pena, Comédias (1844-1845). As Casadas Solteiras: comédia em 3 atos. São Paulo, WMF Martins Fontes, 2007.)
Jeremias (com exclamação) Meu Deus, quem me livrará deste diabo encarnado?
– 45
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 46
DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS
P O R T U G U Ê S B
Sempre fora considerada e se considerara dona Flor boa dona de casa, ordeira e pontual, cuidadosa. Boa dona de casa e boa diretora de sua Escola de Culinária, onde acumulava todos os cargos, contando apenas com a ajuda da empregada broca e esmorecida e a assistência amiga da pequena Marilda, curiosa de pratos e temperos. Nunca lhe ocorrera reclamação de aluna, incidente a toldar o sossego das aulas. A não ser, é claro, os acontecidos quando do primeiro esposo, pois o finado, como se está farto de saber, não era de ter consideração por horário, por trabalho alheio ou por melindres de alfenim; seus deboches com alunas por mais de uma vez criaram dificuldades e problemas para dona Flor, dores de cabeça, quando não enfeites de duro corno. Ah! Em verdade, Flor,em nãocasa possuía método, andava longeela, de dona ter ordem e na noção Escoladee, regra em suae existência, medida e pauta, como devera! Foi-lhe necessário viver com doutor Teodoro para dar-se conta de como sua ordem era anarquia, seus cuidados tacanhos e insuficientes, de como ia tudo mais ou menos ao deus-dará, a la vontê, sem lei e sem controle. Não decretou doutor Teodoro lei e controle de imediato e com severidade; nem sequer falou em tal. Sendo homem tranquilo e suspicaz, de educação cutuba, nada sabia impor e não impunha; no entanto tudo obtinha sem estardalhaço, sem que os demais se sentissem violentados; um fode-mansinho o nosso caro farmacêutico. Era preciso ver-se a casa um mês e meio depois da lua-de-mel, que diferença! Também dona Flor fazia diferença, buscando adaptar-se a seu marido, seu senhor, caber justa e certa em sua medida exata. Se nela a mudança era por dentro, mais sutil, menos visível, na casa fizera-se evidente, bastava olhar. (Jorge Amado, Dona Flor e seus Dois Maridos. São Paulo, Livraria Martins Editora, 1966.) 1. (VUNESP-SP-2010) – Nos dois fragmentos de texto citados, em que se colocam aspectos da relação entre marido e mulher no casamento, percebe-se que as esposas amam seus respectivos maridos, mas o modo de relacionamento é diferente. Tomando por base esse comentário, releia os dois fragmentos apresentados e demonstre que a atitude de Henriqueta diante de Jeremias é bastante diferente da que se percebe entre dona Flor e o doutor Teodoro. RESOLUÇÃO: Henriqueta suspeita, justificadamente, de Jeremias e o vigia; mostra-se agressiva quando se sabe enganada, parece impositiva, mas revela-se amorosa, fiel e desapegada quando o infortúnio se abate sobre seu marido. Dona Flor, ao contrário, não encara Teodoro com suspeita, mas com a admiração e o respeito que a levam a tomá-lo como modelo de ordenação da vida, procurando adaptar-se a ele, seja na organização da casa, seja em si mesma, “por dentro”, revelando-se dócil e submissa.
46 –
2. (VUNESP-SP-2010) – No terceiro parágrafo do texto de Jorge Amado, a expressão coloquialfode-mansinho, que poderia assumir um sentido de ordem sensual, é na verdade utilizada como metáfora que caracteriza outro aspecto da personalidade do doutor Teodoro. Releia o parágrafo e explique o que quer dizer o narrador ao afirmar que o doutor era um fode-mansinho. RESOLUÇÃO: A expressãofode-mansinho descreve a atitude dissimulada, manipuladora e sutil de Teodoro, que obtém das pessoas aquilo que deseja, sem que elas se sintam constrangidas ou forçadas.
3. (VUNESP-SP-2010) – No fragmento da peça de Martins Pena há palavras, expressões e frases que aparecem escritas em itálico e quase sempre entre parênteses. Trata-se de um recurso formal utilizado pelos autores em textos destinados a teatro, cinema e televisão. Partindo desse comentário, releia o texto e, a seguir, explique a função que apresenta esse recurso formal no fragmento apresentado. RESOLUÇÃO: Os trechos em itálico, as mais das vezes entre parênteses, não fazem parte do diálogo e sãorubricas teatrais, ou seja, instruções do autor para os atores e encenadores da peça, indicando detalhes de como e le concebe o com portamento das personagens, o cenário etc.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 47
4. (VUNESP-SP-2010) – Na peça de Martins Pena, Jeremias e Henriqueta usam em quase todo o diálogo o tratamento de segunda pessoa do singular (tu, te, ti, contigo e verbos com flexão correspon dente). Em certo momento, porém, há uma rápida troca de palavras em que os dois alteram a forma de tratamento, para em seguida voltarem ao de segunda pessoa. Localize a passagem que contém essa rápida troca de palavras e identifique a forma de tratamento que nela assumem marido e esposa. RESOLUÇÃO: Henriqueta e Jeremias passam a se tratar na terceira pessoa, de forma afetadamente mais distante e cerimoniosa, depois que ele, ao receber uma carta, exprime o desejo de que ela contivesse o convite para o enterro da esposa. Tal tratamento ocorre apenas em duas falas contíguas, uma de Henriqueta (“Não terá esse gostinho. Pode ler, não faça cerimônia.”) e outra de Jeremias (“Não preciso dasua permissão.”). Quando o infortúnio os reaproxima, o tratamento volta à segunda pessoa.
RESOLUÇÃO: O argumento da Farsa de Inês Pereira consiste no desenvolvimento do refrão popular “Mais quero asno que me carregue que cavalo que me derrube”. Inês, num primeiro momento, escolhe por marido Brás da Mata, um sujeito de boa aparência e bem-falante, que se pode associar à figura do cavalo. Porém, ela não é feliz com ele e, assim que possível, com a morte do marido, Inês reconsidera seus critérios de escolha (“Meu desejo eu retempero”) e opta por casar-se com o ingênuo — o asno — Pero Marques, que faz tudo para agradar à esposa. Desse modo, ela consegue tudo o que quer, tendo a seu lado um “asno” que a carrega, em vez de um “cavalo” que a derruba. O segundo marido, de tão tolo e servil, chega a carregar Inês nas costas, quando ela vai visitar um amante que se faz passar por um ermitão: — “Marido cuco [enganado] me levades. E mais duas lousas [chapas de pedra].” Pero — Pois assi se fazem as cousas. Inês
sabedes — “Bemvos quanto amo: vós, marido, sempre fostes percebido pera gamo [animal de chifres]. Carregado ides, noss’amo com duas lousas.” Pero — Pois assi se fazem as cousas. Inês — “Bem sabedes vós, marido, quanto vos quero. Sempre fostes percebido pera cervo. Agora vos tomou o demo com duas lousas.” Inês
Texto para a questão 5.
Inês
— Andar! Pero Marques seja! Quero tomar por esposo quem se tenha por ditoso de cada vez que me veja. Meu desejo eu retempero: asno que me leve quero, não cavalo valentão: antes lebre que leão, antes lavrador que Nero. (Gil Vicente, Farsa de Inês Pereira)
5. Os versos transcritos pertencem à Farsa de Inês Pereira (1523), de Gil Vicente. Nessa comédia de costumes, a protagonista Inês Pereira, moça leviana e namoradeira, para fugir da rígida disciplina que a mãe lhe impõe e ansiosa para livrar-se dos afazeres domésticos, casa-se com o galanteador e malandro Brás da Mata, que fingia ser escudeiro. Maltratada pelo marido, Inês tem seu caminho livre quando ele morre, ao fugir de uma batalha. A rapariga casa-se, então, com um antigo pretendente, Pero Marques, homem tolo e ingênuo, porém honesto e servil. Considerando-se o trecho transcrito e o que se acaba de afirmar a respeito da peça, explique de que modo o refrão popular “Mais quero asno que me carregue que cavalo que me derrube”, que motivou a criação da peça, se relaciona com seu enredo.
– 47
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 48
Análise de Textos (V)
MÓDULO
P O R T U G U Ê S B
As questões de números 1 a 3 tomam por base um poema de Cecília Meireles (1901-1964), cujo tema é a natação, e um poema de Joaquim Cardozo (1897-1978) sobre as vitórias do atleta brasileiro Ademar Ferreira da Silva no salto tríplice (medalha de ouro nas Olimpíadas de Helsinque, em 1952, e de Melbourne, em 1956, entre outras vitórias).
NADADOR
Cecília e duas palavras ou expressões da primeira estrofe (primeiros quatro versos) do poema de Cardozo que exprimem noções relacionadas com o plano do ar. RESOLUÇÃO: As imagens aéreas, na primeira estrofe do poema de Cecília Meireles, são “linha alada” e “pássaro da água”; na primeira estrofe do poema de Joaquim Cardozo, são “curvas aéreas”, “voo abandonado” e “ asas de um pássaro”.
O que me encanta é a linha alada das tuas espáduas, e a curva que descreves, pássaro da água! É a tua fina, ágil cintura, e esse adeus da tua garganta para cemitérios de espuma!
É a despedida, que me encanta, quando te desprendes ao vento, fiel à queda, rápida e branda. E apenas por estar prevendo, longe, na eternidade da água, sobreviver teu movimento... (Cecília Meireles, “Jogos Olímpicos”, in Poesias Completas de Cecília Meireles – vol. IV. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1973, p. 44.)
O SALTO TRIPARTIDO
Havia um arco projetado no solo Para ser recomposto em três curvas aéreas, Havia um voo abandonado no chão À espera das asas de um pássaro; Havia três pontos incertos na pista Que seriam contatos de pés instantâneos. Três jatos de fonte, contudo, ainda secos, Três impulsos plantados querendo nascer. Era tudo assim expectativo e plano Tudo além somente perspectivo e inerte; Quando Ademar Ferreira, com perfeição olímpica, Executou, em relevo, o mais alto, — Em notas de arpejo — Em ritmo iâmbico O tripartido salto. (Joaquim Cardozo, Poesias Completas. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1971, p. 108.) 1. (VUNESP-SP) – Embora a natação seja um esporte da água e o salto tríplice um esporte do solo, envolvem também manobras no plano do ar (o salto de partida, na natação, e os três saltos seguidos, no salto tríplice), o que permite entender, nos poemas apresentados, a utilização de imagens que podem ser consideradas “aéreas”. Aponte duas palavras ou expressões da primeira estrofe (primeiros três versos) do poema de
48 –
2. (VUNESP-SP) – Os dois poemas divergem no que diz respeito ao ponto de vista utilizado pelo eu poemático para focalizar o tema. No poema de Joaquim Cardozo, as formas verbais surgem na terceira pessoa, o que cria um distanciamento entre o eu poemático e o evento narrado liricamente. Já no poema de Cecília Meireles, o eu poemático assume a primeira pessoa do singular. Aponte o efeito, em termos narrativos, dessa escolha de Cecília. RESOLUÇÃO: Admitindo-se que também no poema de Cecília Meireles se trate de narrativ a — como propõ e a questão —, a escolha da primeira pesso a intensifica a carga lírica texto por uma presença, e mesmo a participação , do do narrador — oimplicar eu lírico — na maior narrativa, pois em todas as estrofes há envolvimento entre a primeira e a segunda pessoa. Diferentemente do poema de Joaquim Cardozo, que celebra apenas a proeza do atleta, no de Cecília a beleza da performance do nadador celebrado é apresentada através das, e de permeio com, as emoções do eu lírico.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 49
3. (VUNESP-SP) – A abordagem da natação e do salto tríplice nos poemas apresentados se faz por meio de imagens e metáforas que nos apresentam de modo lírico os aspectos objetivos dos esportes focalizados. Com base nesse comentário, esclareça o que quer dizer o eu poemático no poema de Joaquim Cardozo, ao dizer que na pista havia “três pontos incertos”, “três jatos de fonte ainda secos” e “três impulsos plantados querendo nascer”. RESOLUÇÃO: As três imagens em questão descrevem as três etapas do salto como se fossem potencialidades à disposição ou à espera do grande atleta capaz de realizá-las, de levá-las à efetivação. Portanto, o feito do herói celebrado consistiria em explorar e tornar efetivas algumas virtualidades extremas da realidade, virtualidades que sem ele não chegariam à realização.
Porém o coração, feito valente Na escola da tortura repetida, E no uso do penar tornado crente, Respondeu: Desta altura vejo o Amor! Viver não foi em vão, se é isto a vida, Nem foi demais o desengano e a dor. (Antero de Quental, Os Sonetos Completos de Antero de Quental. Porto, Livraria Portuense de Lopes, 1886, p. 119; primeira edição, disponível na internet em: http://purl.pt/122/1/P160.html.) 1 – Solemnia verba: palavras solenes.
4. – de Os vista dois distintos, textos apresentados (VUNESP-SP) expressar, sob pontos a decepção identificam-se e o pessimismopor do homem com relação à vida e ao mundo. Diferenciam-se, todavia, na atitude final que apresentam ante essa decepção. Releia-os, atentamente, e explique essa diferença de atitude.
As questões de números 4 a 7 baseiam-se numa fala de personagem de uma peça de Millôr Fernandes (1923) e num soneto de Antero de Quental (1842-1891). ATRIZ (Rindo forçosamente depois que os atores saem.)
Tem gente que continua achando que a vida é uma piada. Ainda bem que tem gente que pensa que a vida é uma piada. Pior é a gente que pensa que o homem é o rei da criação. Rei da criação, eu, hein? Um assassino nato, usufruidor da miséria geral — se você come, alguém está deixando de comer, a comida não dá para todos, não — de que é que ele se ri? De que se ri a hiena? Se não for atropelado ficará no desemprego, se não ficar desempregado vai pegar um enfisema, será abandonado pela mulher que ama — mas ama, hein? —, arrebentado pelos filhos — pelos pais, se for filho —, mordido de cobra ou ficará impotente. E se escapar de tudo ficará velho, senil, babando num asilo. Piada, é? Pode ser que haja vida inteligente em outro planeta, neste, positivamente, não. O homem é o câncer da Terra. Estou me repetindo? Pois é: corrompe a natureza, fura túneis, empesta o ar, emporcalha as águas, apodrece tudo onde pisa. Fique tranquilo, amigo: o desaparecimento do ser humano não fará a mínima diferença à economia do cosmos. (Millôr Fernandes, Computa, Computador, Computa. 3.a ed. Rio de Janeiro, Nórdica, 1972, p. 85.) SOLEMNIA VERBA1
RESOLUÇÃO: No primeiro texto, Millôr Fernandes expressa uma atitude niilista, pois conclui que a espécie humana, extremamente agressiva, canalha e miserável, “não fará a mínima diferença à economia do cosmos” quando desaparecer. No segundo texto, Antero de Quental exprime uma postura orientada pela esperança, pois acredita que a dor constante da vida e a devastação gerada pelo homem são compensadas pela perspectiva final da existência, da qual se divisa o grande ideal do Amor.
5. (VUNESP-SP) – O soneto “Solemnia Verba” desenvolve-se como um diálogo entre duas personagens: o eu poemático e seu “coração”. O que simboliza, no poema, a personagem “coração”? RESOLUÇÃO: Em “Solemnia Verba”, o “coração” tem a função de servir como contraponto ao desencanto amargo do eu lírico. É, portanto, símbolo forte da esperança no amo r — o Amor mai usculiza do e entendido como força universal e esteio da existência, que consegue sobreviver até mesmo às situações mais inóspitas.
Disse ao meu coração: Olha por quantos Caminhos vãos andamos! Considera Agora, desta altura fria e austera, Os ermos que regaram nossos prantos... Pó e cinzas, onde houve flor e encantos! E noite, onde foi luz de primavera! Olha a teus pés o mundo e desespera, Semeador de sombras e quebrantos! — – 49
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 50
6. (VUNESP-SP) – Se um estudante emprega, numa dissertação, o verbo ter no sentido de “existir”, numa frase como “Tem muitos alunos na escola”, é penalizado na correção pelo professor, que recomenda nesse caso o emprego do verbo haver. O mesmo professor considerará perfeitamente normal que a personagem feminina da peça de Millôr Fernandes empregue, por duas vezes: “Tem gente”. Justifique por que essas atitudes do professor não são contraditórias. P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: As atitudes do professor não são contraditórias, pois se referem a contextos linguísticos diferentes. Quando, numa dissertação ou outro trabalho escolar, o professor condena o emprego do verboter no lugar de haver, ele está chamando a atenção do aluno para o fato de que o uso de ter, no sentido de “existir”, é popular e coloquial, só devendo ocorrer com propriedade em situações informais. Portanto, é perfeitamente aceitável, num contexto como o da peça teatral de Millôr Fernandes, que a personagem empregue a variante popular, porque esta condiz com o ambiente e a situação representados.
MÓDULO
7. (VUNESP-SP) – Ao focalizar as ações dos homens na Terra, a personagem da peça de Millôr Fernandes conclui: “Pode ser que haja vida inteligente em outro planeta, neste, positivamente, não.” Explique o que quer dizer a personagem, com essa afirmação, sobre a natureza do ser humano. RESOLUÇÃO: Ao afirmar que não há vida inteligente neste planeta, a personagem de Millôr Fernandes permite que se infira que o Homem é um ser tolo. Segundo ela, o ser humano — assassino, explorador, massacrado pelo sistema social , pela família e pelas próprias forças bioló gicas — erra grosseiramente ao se considerar “o rei da criação”.
Redação e Morfologia (I)
1. (FUVEST-SP) – Observe este anúncio.
a) Na composição do anúncio, qual é a relação de sentido existente entre a imagem e o trecho “quem é e o que pensa”, que faz parte da mensagem verbal? RESOLUÇÃO: A imagem apresenta um rosto alegre que se forma a partir de linhas da impressão digital em que se inscreve, como a sugerir a definição do sujeito e do objeto representados linguisticamente pelos pronomes indefini dos/interrogativos quem e que. Em outras palavras, a imagem promete a resposta às interrogações introduzidas por aqueles pronomes, pois o rosto que se forma com as linhas da impressão digital sugere a identificação do sujeito pelo qual se pergunta, assim c omo daquilo que ele pensa, uma vez que o rosto é representado com uma expressão denunciadora de seu estado de espírito.
(Folha de S. Paulo, 26/09/2008. Adaptado.)
50 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 51
b) Se os sujeitos dos verbos “descubra” e “pensa” estivessem no plural, como deveria ser redigida a frase utilizada no anúncio?
b) Qual a posição de Tolstói, quando analisa comparativamente ciência e ética?
RESOLUÇÃO: Descubram quem são e o que pensam os moradores de São Paulo.
RESOLUÇÃO: Tolstói considera que a ciência gera conhecimento, mas não gera valores. Estes dependem de “tradições, afetos e sentimentos” e são decisivos na orientação de nossas vidas. Portanto, as normas éticas que funcionem como reguladoras do exercício da ciência (e do emprego da tecnologia por ela gerada) devem ser buscadas fora da ciência. B S Ê U G U T R O P
2. (UNIFESP) – Leia o texto e responda.
No tocante à relação entre a ética, a ciência e a tecnologia, duas são as dificuldades. Do lado da ética, a dificuldade é ela gerar uma moral conforme as necessidades da ciência e da tecnologia, na medida em que toda ética implica sanções e interdições, e a ciência e a tecnologia si mesmas, em sua interna, não estão, de saída, dispostas aem aceitar proibições e alógica sacrificar a liberdade de conhecer e de engenhar. Do lado da ciência e da tecno logia, a dificuldade, como viu Tolstói a respeito da primeira, é que elas são impotentes para gerar valores, os quais deverão ser buscados e gerados alhures, em outras esferas da sociedade e da cultura. Não bastasse, ao contrário do que imaginava Bacon, que acreditava que o conhecimento, ou melhor, a ciência, além de gerar a técnica, deveria ser a norma da ação moral, a ciência e a tecnologia não têm a capacidade de instaurar tal norma, haja vista sua incapacidade de responder às duas questões que, segundo Tolstói, mais interessam em nos sas vidas: o que devemos fazer e como devemos viver? — talvez porque essas questões não tenham a ver com fatos, mas com valores, e os valores são algo mais do que uma cognição, dependendo de tradições, afetos e sentimentos. Daí não ser nada fácil a tarefa de ajustar a ética, a ciência e a tecnologia. Daí nosso temor de a grande e insistente reivindicação de mais ética, de pôr ética em tudo, gerar uma enorme e irremediável frustração. (Revista Kriterion, vol. 45, n.º 109, Belo Horizonte, Jan/Jun 2004.)
3. (UNICAMP-2010) – A propaganda abaixo explora a expressão idiomática ‘não leve gato por lebre’ para construir a imagem de seu produto:
NÃO LEVE GATO POR LEBRE SÓ BOM BRIL É BOM BRIL a) Explique a expressão idiomática por meio de duas paráfrases.
a) De que tipo de argumento se vale o autor para fun damentar seu ponto de vista? RESOLUÇÃO: A pergunta é vaga, pois não é claro o sentido da expressão “tipo de argumento”. Os argumentos podem ser classificados de muitas maneiras, conforme tipologias diversas. Portanto, os candidados ficam sem saber o que de fato se pede numa questão formulada tão imprecisamente. O que se pode responder, tentando-se adivinhar a intenção do examinador, é que o autor argumenta de formadialética, pois contrapõe perspectivas opostas (de um lado a ética, do outro a ciência e a tecnologia) e também recorre a argumentos de autoridade (ao invocar Tolstói e Bacon).
RESOLUÇÃO: “Não aceite um produto inferior em lugar do superior.” “Não se deixe enganar por produtos falsificados.” A resposta admite várias possibilidades de redação.
b) Mostre como a dupla ocorrência de BOM BRIL no slogan ‘SÓ BOM BRIL É BOM BRIL’, aliada à expressão idiomática, constrói a imagem do produto anunciado. RESOLUÇÃO: A tautologia “Só Bom Bril é Bom Bril” corres ponde à atribuição de uma qualidade única a um produto único. Todos os demais, ainda que apa rentemente similares, seriam meros “gatos” que rendo passar por “lebres”. Na primeira ocorrência, “Bom Bril” é nome próprio e significa “palha de aço”, ou seja, usa-se a marca pelo produto, o que configura uma meto nímia.
– 51
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 52
4. (FUVEST) – Examine a tirinha e responda ao que se pede.
P O R T U G U Ê S B
5. (FUVEST) – Leia a seguinte fala, extraída de uma peça teatral, e responda ao que se pede. Odorico — Povo sucupirano! Agoramente já investido no cargo de Prefeito, aqui estou para receber a confirmação, ratificação, a autenticação e, por que não dizer, a sagração do povo que me elegeu. (Dias Gomes, O Bem-Amado: farsa sociopolítico-patológica em 9 quadros) a) A linguagem utilizada por Odorico produ z efeitos humorísticos. Aponte um exemplo que comprove essa afirmação. Justifique sua escolha. (Quino, Mafalda 2. São Paulo: Martins Fontes, 2002.) a) O sentido do texto se faz com base na polissemia de uma palavra. Identifique essa palavra e explique por que a indicou. RESOLUÇÃO: Trata-se da palavraveículo, que pode significar (1) “qualquer meio usado para transportar ou conduzir pessoas, animais ou coisas, de um lugar para outro” ou (2) “qualquer coisa capaz de transmitir, propagar, difundir
RESOLUÇÃO: O emprego do neologismoagoramente produz efeito humorístico, já que, ao acrescentar o sufixo -mente ao vocábulo agora, Odorico cria outro advérbio, com a intenção de reforçar o tom persuasivo de seu discurso pretensamente solene. Outro exemplo pertinente seria a produção de eco por meio da repetição do sufixo -ção presente na enumeração “confirmação, satisfação, a autenticação e (…) a sagração”.
algo”. Na expressão “veículo de está cultura”, sentido toma de veículo é, claramente, (2). O humor da tirinha em queoMafalda a palavra no seu sentido (1).
b) O que leva Odorico a empregar a expressão “por que não dizer”, para introduzir o substantivo “sagração”?
b) A tirinha visa produzir não só efeito humorístico mas também efeito crítico. Você concorda com essa afirmação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: O sentido crítico depreensível da tirinha provém da associação entre os ruídosdaemanados do teleeviasor, sugerem não o conteúdo violento e “ape lativo” programação, ideiaque de cultura, no sentido antropológico da palavra (“conjunto de padrões de comportamento, crenças, conheci mentos, costumes etc. que distinguem um grupo social”), mas como sinônimo de “ilustração”, “cabedal de conhecimentos”. Longe de ser “veículo de cultura”, a televisão seria – sugere a tirinha – um veículo de barbárie.
52 –
RESOLUÇÃO: O substantivo sagração pode ser entendido como “ato ou efeito de sagrar rei, bispo etc. em cerimônia religiosa”. Ao empregar a expressão “por que não dizer” para introduzir tal substantivo, Odorico inten sifica a expressão de sua pretensão de homem público que se julga digno de receber todas as honras de seu povo.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 53
6. (UNIFESP) – Leia a charge.
B S Ê U G U T R O P
b) Reescreva as falas das personagens, valendo-se da norma padrão da Língua Portuguesa. (www.chargeonline.com.br. Adaptado.) a) As personagens são vítimas de preconceitos e os expressam em suas falas. Explique quais são eles.
RESOLUÇÃO: Para prender ricos, a polícia cria nomes muito belos — não é verdade? Quando se trata de nós, o nome que dão é mesmo “operação tapa na orelha”.
RESOLUÇÃO: Segundo as personagens, a polícia trata pobres e ricos de maneiras diferentes. Para os pobres, como eles, não se usam os nomes pomposos das “operações” voltadas para ricos. Além disso, como in dicam os desenhos e o próprio nome da “operação” destinada aos pobres, estes são também vítimas de maus-tratos.
MÓDULO
Redação e Morfologia (II)
1. (UNICAMP-2010) – “Os turistas que visitam as favelas do Rio se dizem transformados, capazes de dar valor ao que realmente importa”, observa a socióloga Bianca Freire-Medeiros, autora da pesquisa “Para ver os pobres: a construção da favela carioca como destino turístico”. “Ao mesmo tempo, as vantagens, os confortos e os benefícios do lar são reforçados por meio da exposição à diferença e à escassez. Em um interessante paradoxo, o contato em primeira mão com aqueles a quem vários bens de consumo ainda são inacessíveis garante aos turistas seu aperfeiçoamento como consumidores.” No geral, o turista é visto como rude, grosseiro, invasivo, pouco interessado na vida da comunidade, preferindo visitar o espaço como se visita um zoológico e decidido a gastar o mínimo e levar o máximo. Conforme relata um guia, “O turismo na favela é um pouco invasivo, sabe? Porque você anda naquelas ruelas apertadas e as pessoas deixam as janelas abertas. E tem turista que não tem ‘desconfiômetro’: mete o carão dentro da casa das pessoas! Isso é realmente
a) Explique o que o autor identifica como “um interessante paradoxo”. RESOLUÇÃO: O “interessante paradoxo” consiste no fato de o contacto com a escassez, a precariedade e a pobreza não despertar nos turistas uma atitude crítica — ou melhor, autocrítica — em relação ao seu próprio consumismo, excessivo e superficial como todo consumismo. Ao contrário, tal contacto com os favelados produziu neles o seu “aperfeiçoamento como consumidores”, ou seja, reforçou o seu consumismo sem sequer colocá-lo em questão.
desagradável. Já aconteceu com outro guia. A moradora estava cozinhando e o fogão dela era do lado da janelinha; o turista passou, meteu a mão pela janela e abriu a tampa da panela. Ela ficou uma fera. Aí bateu na mão dele.” (Adaptado de Carlos Haag, Laje cheia de turista. Como funcionam os tours pelas favelas cariocas. Pesquisa FAPESP no. 165, 2009, p.90-93.)
– 53
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 54
b) O trecho em itálico, que reproduz em discurso direto a fala do guia, contém marcas típicas da linguagem coloquial oral. Reescreva a passagem em discurso indireto, adequando-a à linguagem escrita formal.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: O guia relata que o turismo na favela tem um aspecto invasivo. Justifica informando que lá se anda em ruas apertadas e que as pessoas mantêm as janelas abertas, acrescentando que turistas insensíveis olham sem pudor para dentro das casas, criando situações desagradáveis, como a ocorrida com outro guia. Contou que uma mo radora cozinhava em seu fogão contíguo à janela e que um turista que passava chegou a enfiar a mão e destampar a panela, enfurecendo a mulher, que lhe golpeou o braço. Outra possibilidade de resposta dada pela Unicamp: O guia afirmou que o turismo na favela é um pouco invasivo. Anda-se em ruelas apertadas nas quais as janelas abertas expõem os moradores a turistas inconvenientes, que invadem a privacidade alheia, gerando mal-estar. A propósito, o guia
b) Indique uma cara cterística atribuída pela propag anda ao produto anunciado. Justifique. RESOLUÇÃO: O produto anunciado — um jornal — é apre sentado como avançado, ou seja, “muito moderno, inovador, que foge ao convencional e se alinha com o que há de mais arrojado”.
relatou o que foi presenciado pormão umpela colega de trabalho durante umaa visita: um turista introduziu sua janela de uma casa e abriu tampa da panela de uma moradora que cozinhava no momento. Irritada, a moradora o repreendeu com um tapa em sua mão.
2. (UNICAMP-2010) – Nessa propaganda, há uma interessante articulação entre palavras e imagens.
3. (FUVEST) (...) Num tempo Página infeliz da nossa história Passagem desbotada na memória Das nossas novas gerações Dormia A nossa pátria mãe tão distraída Sem perceber que era subtraída Em tenebrosas transações (...). (Chico Buarque e Francis Hime, Vai passar.) a) É correto afirmar que o verbo dormia tem uma conotação positiva, tendo em vista o contexto em que ele ocorre? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não. Do contexto depreende-se que a pátria encontrava-se em uma situação letárgica diante das “subtrações” ou “tenebrosas transações” de que era vítima.
Retirada de www.diariodapropaganda.blogspot.com a) Explique como as imagens ajudam a estabelecer as relações metafóricas no enunciado “Mesmo que o globo fosse quadrado, O GLOBO seria avançado”. RESOLUÇÃO: O anúncio joga com a antítese entre quadrado e avançado, significando a primeira palavra, em seu uso figurado, coloquial e informal, “pessoa antiquada, retrógrada, de mentalidade pouco evoluída”. Assim, a oposição entre as imagens do quadrado e do globo — ou, mais precisamente, do cubo e da esfera — funcionam como equivalentes de “antiquado” e “avançado”.
54 –
b) Identifique, nos três últimos versos, um recurso expressivo sonoro e indique o efeito de sentido que ele produz. (Não considere a rima distraída/subtraída.) RESOLUÇÃO: O “recurso expressivo sonoro” está na passagem “tenebrosas transações”. A aliteração da consoante linguodental surda t dá relevo à expressão e reforça a sugestão de soturnidade que a reveste.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 55
4. (FUVEST-2010) – Leia este texto.
b) Na segunda estrofe, substitua a palavra “viu” por outra que cumpra a mesma função comunicativa que ela tem no texto.
O ano nem sempre foi como nós o conhecemos agora. Por exemplo: no antigo calendário romano, abril era o segundo mês do ano. E na França, até meados do século XVI, abril era o primeiro mês. Como havia o hábito de dar presentes no começo de cada ano, o primeiro dia de abril era, para os franceses da época, o que o Natal é para nós hoje, um dia de alegrias, salvo para quem ganhava meias ou uma água-de-colônia barata. Com a introdução do calendário gregoriano, no século XVI, primeiro de janeiro passou a ser o primeiro dia do ano e, portanto, o dia dos presentes. E primeiro de abril passou a ser um falso Natal – o dia de não se ganhar mais nada. Por extensão, o dia de ser iludido. Por extensão, o Dia da Mentira. (Luis F. Verissimo,As mentiras que os homens contam. Adaptado.)
RESOLUÇÃO: O verbo ver, neste contexto, funciona apenas para chamar a atenção do ouvinte, na tentativa de manter a comunicação; por isso, tem função fática e pode ser substituído por outros marcadores conversacionais, como olhe, né, tá.
a) Tendo em vista o contexto, é correto afirmar que o trecho “meias ou uma água-de-colônia barata” deve ser entendido apenas em seu sentido literal? Justifique sua resposta.
RESOLUÇÃO: Além de rima e ritmo, a canção apre senta figuras de linguagem, como comparação (apontada na alternativa a), metáfora para o renascimento da vegetação (em “Quando o verde dos teus olhos / se espalhar na plantação”) e metonímia em “meu coração” (em que coração simboliza a amada).
RESOLUÇÃO: Não, ambas devem ser entendidas em se ntido figurado, pois conotam, por similaridade, objetos de pouco valor.
b) Crie uma frase que contenha um sinônimo da palavra “salvo” (L. 4), mantendo o sentido que ela tem no texto. RESOLUÇÃO: Empregada no texto como preposição, a palavra salvo significa “exceto, com exceção de”, como em: “Todos chegaram, exceto os noivos.”
c) Nessas estrofes, os únicos recursos poéticos utilizados são rima e ritmo? Justifique sua resposta.
6. (FUVEST) – Leia o seguinte texto: Os irmãos Villas Bôas não conseguiram criar, como queriam, outros parques indígenas em outras áreas. Mas o que criaram dura até hoje, neste país juncado de ruínas novas. a) Identifique o recurso expressivo de natureza semântica presente na expressão "ruínas novas".
5. (FUVEST-2010) – Leia estas duas estrofes da conhecida canção “Asa-Branca”, de Luís Gonzaga e Humberto Teixeira.
Quando olhei a terra ardendo Qual fogueira de São João, Eu perguntei a Deus do céu, ai Por que tamanha judiação. .......................................... Quando o verde dos teus olhos se espalhar na plantação, eu te asseguro, não chores não, viu, eu voltarei, viu, meu coração. a) Indique uma palavra ou expressão que possa substituir “Qual” (primeira estrofe), sem alterar o sentido do texto. RESOLUÇÃO: A conjunção comparativa qual pode ser substituída, sem alteração de sentido, por como ou pelos coloquialismos que nem, feito, igual.
RESOLUÇÃO: A expressão "ruínas novas" parece conter um paradoxo – ou, em outros termos, parece confirmar um oxímoro. Com efeito, ruínas é palavra que conota "antiguidade" ou, em outro registro, "velharia", o oposto do adjetivo nova. O oxímoro consiste, justamente, na relação contraditória entre palavras de sentido antitético ou conflitivo. Porém, a expressão pode ser entendida de outra forma, literal, pois uma ruína pode ser recente, nova, como foram as ruínas de Troia logo após a destruição da cidade pelos gregos e como são tantos prédios que embrutecem uma cidade como São Paulo.
b) Que prática brasileira é criticada no trecho "país juncado (= coberto) de ruínas novas"? RESOLUÇÃO: Critica-se, no texto, a incúria brasileira que não conserva o patrimônio material do país (edificações, monumentos, cidades inteiras) nem suas instituições.
– 55
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 56
MÓDULO
P O R T U G U Ê S B
Redação e Morfologia (III)
1. (FUVEST) – Conta-me Claúdio Mello e Souza. Estando em um café de Lisboa a conversar com dois amigos brasileiros, foram eles interrompidos pelo garçom, que perguntou, intrigado: — Que raio de língua é essa que estão aí a falar, que eu percebo (*) tudo? ______________________ (*) percebo = compreendo (Rubem Braga)
RESOLUÇÃO: O verbo acompanhar é responsável pelo efeito de humor, pois pode ser entendido de duas maneiras: o guarda o utilizou com o sentido de “ir junto”; já o músico ambulante, com o sentido de “tocar junto”.
a) A graça da fala do garçom reside num paradoxo. Des taque dessa fala as expressões que constituem esse paradoxo. Justifique. RESOLUÇÃO: As expressões são: “– Que raio de língua é essa... que eu percebo tudo?”. A interrogação “Que raio de língua é essa” indica que a personagem não entende a afirmação do interlocutor. Já a expressão “que eu percebo tudo” indica que ele compreende inteiramente o que lhe está sendo dito.
b) Reescreva o diálogo que compõe o texto, usando o discurso indireto. Comece com: O fiscal do “rapa” perguntou ao músico ... RESOLUÇÃO: O fiscal do “rapa” perguntou ao músico se ele tinha licença. O músico respondeu negativamente ao policial. Então, o policial pediu ao músico que o acompanhasse. O músico ambulante respondeu afirmativamente e perguntou que música o policial iria cantar.
b) Transponha a fala do garçom para o discurso indireto. Comece com: O garçom lhes perguntou, intrigado, que raio de língua.... RESOLUÇÃO: “... era aquela que estavam então a falar, que ele percebia tudo”.
2. (FUVEST-2010) – Leia o seguinte texto:
Um músico ambulante toca sua sanfoninha no viaduto do Chá, em São Paulo. Chega o “rapa”* e o interrompe: — Você tem licença? — Não, senhor. — Então me acompanhe. — Sim, senhor. E que música o senhor vai cantar? *rapa: carro de prefeitura municipal que conduz fiscais e policiais para apreender mercadorias de vendedores ambulantes não licenciados. Por extensão, o fiscal ou o policial do rapa. a) Para o efeito de humor dessa anedota, contribui, de maneira decisiva, um dos verbos do texto. De que verbo se trata? Justifique sua resposta.
56 –
3. (FUVEST) – Os trechos abaixo encontram-se em discurso indireto e discurso direto, respectivamente. Transforme em discurso direto o primeiro trecho e, em discurso indireto, o segundo. I. “(...) um cangaceiro encontrou uma Kodak e entregou ao chefe, que perguntou a quem ela pertencia.” II. “Quero que o senhor tire o meu retrato”, disparou o “rei do cangaço” (...). RESOLUÇÃO: I. … um cangaceiro encontrou uma Kodak e entregou ao chefe, que perguntou: – A quem ela pertence? II. O “rei do cangaço” disparou (disse) que queria que o homem tirasse o seu retrato.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 57
4. (FUVEST) Diálogo ultrarrápido — Eu queria propor-lhe uma troca de ideias ... — Deus me livre! (Mário Quintana) No diálogo acima, a personagem que responde: — Deus me livre! cria um efeito de humor com o sentido implícito de sua frase fulminante. a) Continue a frase — Deus me livre!, de modo que a personagem explicite o que estava implícito nessa frase. RESOLUÇÃO: Deus me livre de trocar minhas ideias pelas suas.
— O que quero dizer, senhor, é... o que é um presente de desaniversário? — Um presente oferecido quando não é seu aniversário, naturalmente. (...). Bem, isso demonstra que há trezentos e sessenta e quatro dias por ano em que você pode receber presentes de desaniversário. — Certamente — concordou Alice. — E somente um em que você consegue receber presentes de aniversário, percebe? Esta é que é a glória! (CARROLL, Lewis. Alice no país do espelho. Porto Alegre: L&PM, 2004. p. 115-117.) 5. (UEG) – Os quadrinhos e o texto acima apresentam palavras não dicionarizadas, mas que podem ser facilmente compreendidas por
b) Transforme o diálogo acima em um único período, utilizando apenas o discurso indireto e conservando o sentido do texto. RESOLUÇÃO: Disse-lhe que queria propor-lhe uma troca de ideias, ao que ele respondeu (pediu) que Deus o livrasse (daquilo).
qualquer falante português. Transcreva essasexemplos palavras edaexplique seu processo de de formação a partir de outros língua portuguesa. RESOLUÇÃO: As palavras são "sobremesariano" e "desaniversário". A primeira é formada a partir do processo morfológico de sufixaçãosobremesa ( + iano), como acontece em "vegetariano" (vegetal + iano). A segunda é formada pelo processo de prefixação ( des + aniversário), como em "desculpar" ( des + culpar), por exemplo.
Leia os quadrinhos e o texto para responder às questões 5 e 6.
6. (UEG) – Reescreva os dois primeiros quadrinhos da tirinha e as duas primeiras falas do texto, passando-os para o discurso indireto. RESOLUÇÃO: Reescrita dos dois primeiros quadrinhos: Calvin perguntou à sua mãe o que era aquilo e disse que lhe parecia horrível. A mãe de Calvin respondeu que era comida vegetariana e que era bom para ele. Reescrita das duas primeiras falas do texto: Humpty Dumpty exclamou que haviam dado a ele aquela bela gravata como um presente de desaniversário. Alice, sentindo-se muito confusa, pediu a Humpty Dumpty que a perdoasse.
(WATTERSON, Bill. Calvin e Haroldo. Disponível em: . Acesso em: 6 abr. 2009.)
— Deram-me esta bela gravata... como um presente de desaniversário! — Por favor, me perdoe... — disse Alice, muito confusa. — Não estou ofendido, e você não precisa se desculpar — disse Humpty Dumpty.
– 57
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 58
Redação e Morfologia (IV)
MÓDULO
1. (FUVEST-2010) – Leia o seguinte excerto de um artigo sobre o teólogo João Calvino. P O R T U G U Ê S B
Foi preciso o destemor conceitual de um teólogo exigente feito ele para dar o passo racional necessário. Ousou: para salvar a onipotência de Deus, não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina. Antônio Flávio Pierucci, Folha de S. Paulo, 12/7/2009.
b) O exagero que o autor vê no emprego da palavra “delivery” se aplicaria também a “telepizza”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “Telepizza” é um neologismo formado com um empréstimo linguístico já há muito incorporado ao português (italianopizza) e o prefixo (grego)tele, corrente na língua. Portanto, não se trata do mesmo fenômeno de “capitulação” que se vê em delivery, pois aqui se substituiu uma palavra corrente na língua (“entrega”) por um es trangeirismo da moda.
a) O excerto está redigido em lin guagem que apresenta traços de informalidade. RESOLUÇÃO: Identifique dois exemplos dessa informalidade. São coloquialismos empregados no texto: “feito”, por como; “não dá”, por não é possível, e “um quê”, por algo ou uma pequena parcela.
b) Mantendo o seu sentido, reescreva o trecho “não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina”, sem empregar duas vezes a palavra “não”. RESOLUÇÃO: Não é possível deixar de sacrificar algo da bon dade divina.
Texto para a questão 2.
CAPITULAÇÃO Delivery Até pra telepizza É um exagero. Há quem negue? Um povo com vergonha Da própria língua Já está entregue. (Luis Fernando Verissimo) 2. (FUVEST) a) O título dado pelo autor está adequado, tendo em vista o conteúdo do poema? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: O título “Capitulação” é inteiramente adequado ao conteúdo do poema, que se refere à “invasão” de anglicismos (americanismos) na língua portuguesa corrente no Brasil.
3. (UNICAMP) – Jogos de imagens e palavras são característicos da linguagem de história em quadrinhos. Alguns desses jogos podem remeter a domínios específicos da linguagem a que temos acesso em nosso cotidiano, tais como a linguagem dos médicos, a linguagem dos economistas, a linguagem dos locutores de futebol, a linguagem dos surfistas, dentre outras. É o que ocorre na tira de Laerte, acima apresentada. a) Transcreva as passagens da tira que remetem a domínios específicos e explicite que domínios são esses. RESOLUÇÃO: As passagens são “perda total”, “reconstruíram meu corpo a partir do DNA” por e “molar cariado”. O primeiro segmento refere-se usada companhias de seguros, o segundo, à bioge nética, eàolinguagem terceiro, à odontologia.
58 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 59
b) Levando em consideração as relações entre ima gens e palavras, identifique um momento de humor na tira e explique como é produ zido. RESOLUÇÃO: O momento de humor instaura-se no último quadrinho, em que se estabelece uma relação de semelhança entre cárie e pedaços que faltam no corpo da personagem.
b) O trecho da resposta de Para ná: “...‘Le’ chamei e ‘le’ cha mo de novo ...” chama a atenção do leitor para a sintaxe da língua. Explique. RESOLUÇÃO: O le da fala de Paraná é uma variante (corruptela) do pronome lhe, adequadamente empregado com o verbo chamar no sentido de “qualifi car, tachar”. A construção admitiria também o objeto direto, que corresponderia, no caso, ao pronome o: chamei-o/lhe (de) veado. B S Ê U G U T R O P
Texto para a questão 4.
Foi no tempo em que a Bandeirantes recém-inaugurara suas novas instalações no Morumbi. Não havia transporte público até o nosso local de trabalho, e a direção da casa organizou um serviço com viaturas próprias. (...) Paraná era um dos motoristas. (...) Numa das subidas para o Morumbi “fechou” sem nenhuma maldade um automóvel. O cidadão que o dirigia estava com os filhos, era diretor do São Paulo F.C., e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura. Logo depois que a perua chegou ao Morumbi, todo mundo de ponto batido, o automóvel para em frente da porta dos funcionários, e o seu condutor desce bufando: “Onde está o motorista dessa perua? (e lá vinha chegando o Paraná). Você me ofendeu na frente dos meus filhos. Não tem o direito de agir dessa forma, me chamar do nome que me chamou. Vou falar ao João Saad, que é meu amigo!” E o Paraná, já fuzilando, dedo em riste, tonitruou em seu sotaque mais que explícito: “Le” chamei e “le” chamo de novo... veado ... veado ... Não houve reação da parte ofendida. (ARAÚJO, Flávio. O rádio, o futebol e a vida. São Paulo: Editora Senac, 2001. pp. 50-1.) 4. (UNICAMP) a) Na sequência: “(...) e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura”, se trocarmos o ponto final que aparece depois de ‘Paraná’ por uma vírgula, ocorrem mudanças na leitura? Justifique.
c) Substitua tonitruou por outra palavra ou expressão. RESOLUÇÃO: Vociferou, gritou, clamou em altos brados, ou, em sentido figurado,trovejou.
5. (UNICAMP) – Em transmissão de um jornal noturno televisivo (RedeTV, 7/10/2008), um jornalista afirmou: “Não há uma só medida que o governo possa tomar.” a) Considerando que há duas possibilidades de interpretação do enunciado acima, construa uma paráfrase para cada sentido possível de modo a explicitá-los. RESOLUÇÃO: As duas possibilidades de paráfrase são: 1) Não existe uma única medida que o gove rno possa tomar, ou seja, o governo não poderá tomar nenhuma medida. 2) Não existe somente uma medida que o governo possa tomar, ou seja, há várias medidas que o governo poderia tomar.
RESOLUÇÃO: A vírgula, no caso, seria mais adequada que o ponto final, pois na verdade não ocorre o encerramento do período, visto que a última palavra da frase limitada pelo ponto (Paraná) é retomada pelo pronome relativo que, introdutor de uma oração adjetiva explicativa subordinada à oração anterior.
– 59
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 60
b) Compare o enunciado citado com: Não há uma medida que só o governo possa tomar . O termo ‘só’ tem papel fundamental na interpretação de um e outro enunciado. Descreva como funciona o termo em cada um dos enunciados. Explique.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: Em “Não há uma só medida que o governo possa tomar”, o adjetivo só tanto pode significar “única” quanto valer pelo advérbio apenas. Por isso, a frase pode significar que o governo não pode tomar nenhuma medida ou então que o governo tem a sua disposição diversas medidas. Quanto à frase “Não há uma medida que só o governo possa tomar”, nela o termo só significa somente ou sozinho, referindo-se a “governo”, e o sentido é que a medida não depende apenas do governo, não podendo ser tomada apenas por ele.
a) Há um duplo sentido trabalhado no poema. Em que palavra isso ocorre? RESOLUÇÃO: A ambiguidade ocorre na palavra “bandeira”.
b) Quais recursos linguísticos são utilizados na construção desse jogo de palavras? RESOLUÇÃO: O emprego de “nome” no início doverso provoca a ambiguidade, pois pode ser o sobrenome do poeta ou referir-se a um emblema, já que está em letra minúscula.
c) Que interpretação resulta desse jogo de palavra s? RESOLUÇÃO: O termo “bandeira” configura um metáfora que significa “modelo a ser imitado por um grupo”, no caso, os escritores.
Ontem, hoje, amanhã: a vida inteira Teu nome é para nós, Manuel, bandeira. (Carlos Drummond de Andrade) 6. (UNICAMP) – Levando em consideração o poema de Drummond, em que é feita uma homenagem a um poeta brasileiro, responda às seguintes questões:
Redação e Morfologia (V)
MÓDULO 1. (FUVEST) – Leia o seguinte texto:
VERÃO EXCESSIVO Eu sei que uma andorinha não faz verão, filosofou a andorinhade-barriga-branca. Está certo, mas agora nós somos tantas, no beiral, que faz um calor terrível, e eu não aguento mais! (Carlos Drummond de Andrade, Contos plausíveis) a) Com base na queixa da andorinha-de-barriga-branca, reformule o provérbio: “Uma andorinha não faz verão”. RESOLUÇÃO: Uma andorinha não faz verão; muitas, porém, produzem juntas um calor terrível.
60 –
b) Está adequado o emprego do verbo filosofou, tendo em vista que ele se refere ao provérbio citado no texto? Justifique sucintamente sua resposta. RESOLUÇÃO: O emprego do verbo filosofar se justifica por ter ele, no texto, o sentido coloquial de “meditar, raciocinar, formular uma reflexão de sentido geral” ou, para usar um brasileirismo, matutar. O provérbio citado exprime o conteúdo da reflexão da andorinha.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 61
2. (FUVEST) – Costuma-se exaltar a cabeça como fonte da razão e denunciar o coração como sede da insensatez, como músculo incapaz de ter autocrítica e de ser srcinal. Que seja assim. E daí? Nada pior do que uma ideia feita, mas nada melhor do que um sentimento usado. A cabeça pode gostar de novidade, mas o coração adora repetir o já provado. Se as ideias vivem da srcinalidade, os sentimentos gostam da redundância. Não é por acaso que o prazer procura repetição. (Zuenir Ventura,Crônicas de fim de século) a) Substitua a expressão “Que seja assim” por outra de sent ido equivalente, tendo em vista o contexto. RESOLUÇÃO: O sentido da frase “Que seja assim” equivale a “Admi tamos que isso seja verdade”, ou “Admitamos que essa ideia esteja correta”, ou “Mesmo que seja assim”.
Estanca ventura e voz Silêncio e desventura. Imóvel Garrote Algoz No corpo da tua água passará Tem passado Passa com a sua fina faca. (HILST, Hilda. “Da morte”. Odes mínimas. São Paulo: Globo, 2003. p. 72.) 3. (UNICAMP) a) Tendo em vista que esse poema faz parte de uma série intitulada “Tempo-morte”, indique associado de que maneira a primeira estrofe exprime certo sentido de absoluto ao título. RESOLUÇÃO: Na primeira estrofe, o verbo passar aparece no futuro do presente (Passará), pretérito perfeito composto do indicativo ( Tem passado) e presente do indicativo (Passa). O examinador quis que se relacionasse a abrangência do tempo (passado, presente e futuro) com certo sentido de absoluto associado ao título da série (“Tempo-morte”).
b) Explique por que o auto r considera que tanto a novidade quanto a redundância podem ser desejáveis. RESOLUÇÃO: A novidade é desejável no que se refere às ideias, pois lhes confere srcinalidade; a redundância, por sua vez, é desejável no âmbito dos sentimentos, pois estes tenderiam a reforçar-se ou a comprazer-se com a repetição. Nos termos do texto, “...o coração adora repetir o já provado.” e “...o prazer procura repetição”.
b) Nesse poema há pronomes de segunda e terceira pessoas. Transcreva uma estrofe em que constem ambas as pessoas pronominais e diga a que se referem. RESOLUÇÃO: Há pronomes de segunda e terceira pessoas na terceira e última estrofes. “Fecha feridas, é unguento. Mas pode abrir a tua mágoa Com a sua fina faca.” “No corpo da tua água passará Tem passado Passa com a sua fina faca.”
Considere o seguinte poema:
O pronome tua refere-se ao receptor (leitor) do texto; sua refere-se ao “Tempo-morte”.
Passará Tem passado Passa com a sua fina faca. Tem nome de ninguém. Não faz ruído. Não fala. Mas passa com a sua fina faca. Fecha feridas, é unguento. Mas pode abrir a tua mágoa Com a sua fina faca.
– 61
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 62
4. (FUVEST) I. Não deis aos cães o que é santo, nem atireis aos porcos as vossas pérolas (...). (Mateus, 7:6)
P O R T U G U Ê S B
II. Você pode atirar pérolas aos porcos. Mas não adianta nada atirar pérolas aos gatos, aos cães ou às galinhas porque isso não tem nenhum significado estabelecido. (Millôr Fernandes, Millôr definitivo: a bíblia do caos)
5. (FUVEST) – Indique o sentido que esse provérbio assume, a) se for entendido como uma afirmação aceitável, que em princípio parece estar certa. RESOLUÇÃO: Em sentido positivo, o provérbio deve ser entendido como indicação de que cada pessoa deve reconhecer suas limitações e agir de acordo com elas, sem cometer exageros ou extrapolações deletérias. Outro entendimento positivo do provérbio implica a ideia de que cada um se limite à sua competência.
a) Considerando-se que o texto II tem como referência o texto I, qual é a expressão que, de acordo com Millôr Fernandes, tem um “significado estabelecido”? RESOLUÇÃO: Millôr Fernandes refere-se à expressão proverbial “atirar pérolas aos porcos”, utilizada correntemente no sentido de “desperdiçar esforços com quem não é digno deles ou não é capaz de se beneficiar com eles”.
b) se for entendido como uma afir mação autoritária, que impõe um fato consumado. RESOLUÇÃO: Como afirmação autoritária, o provérbio implica a ideia de que cada pessoa deve restringir-se ao âmbito de ação que lhe foi atribuído, numa divisão que pode ser injusta ou arbitrária, mas que não se quer discutir. Ou seja, o sentido autoritário é o de que cada um tem seu lugar e deve nele permanecer, não se questionando o princípio de tal atribuição.
b) No texto I, os significados dos segmentos “...Não deis aos cães o que é santo...” e “...nem atireis aos porcos as vossas pérolas” reforçamse mutuamente ou se contradizem? Justifique sucintamente sua resposta. RESOLUÇÃO: As duas injunções negativas se reforçam mutuamente, pois ambas significam que não se deve destinar um bem valioso a quem não é digno dele ou não tem condições de o apreciar.
6. (FUVEST) I. Desespero meu: leitura obrigatória de livro indicado... II. Uma surpresa: tão bom, aquele livro! III.Nenhum aborrecimento na leitura. Respeitando a sequência em que estão apresentadas as três frases acima, articule-as num único período. Empregue os verbos e os nexos oracionais necessários à clareza, à coesão e à coerência desse período.
Há certas expressões significativas: “Contra fato não há argumento”. Elas querem dizer que, diante da evidência do real, não cabem as argumentações em contrário, o que em princípio parece estar certo. Mas, na verdade, significam também coisas como “o que vale é a força” ou “ideia não resolve”. Assim, pregam o reconhecimento do fato consumado, a capitulação diante do que se impôs no terreno “prático”, negando o direito de discutir, de argumentar para mudar a realidade. E então se tornam sinistras. (Antonio Candido, Recortes) Entre as “expressões significativas”, a que se refere o autor do texto, podem-se incluir certos provérbios, como, por exemplo: “Cada macaco no seu galho.”
62 –
RESOLUÇÃO: Desespero meu : leitura obrigatória de livro indicado, no entanto (mas, porém, contudo, todavia) foi uma surpresa, pois era muito bom aquele livro, cuja leitura não causou nenhum aborrecimento.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 63
MÓDULO
Interpretação de Textos (I)
Naquele tempo, os aviões se chamavam aeroplanos. Era só passar um avião e eu saía no meio da molecada, em algazarra pela rua, apontando o céu e gritando: – Aeroplano! Aeroplano! Ouvindo a gritaria, os mais velhos se debruçavam nas janelas e olhavam para cima, procurando ver também. Não eram aviões grandes nem de metal como os de hoje, mas tecotecos de madeira e lona, duas asas de cada lado, uma em cima da
vendo palavras inteiras. A certa altura dois aviões passaram a voar juntinhos, um em cima do outro, quase se esbarrando. Então um dos aviadores do que estava embaixo realizou a proeza máxima, eu não podia acreditar no que meus olhos viam: saiu do seu buraquinho no avião e foi se agarrando pelo lado de fora, subiu na asa e se dependurou nas rodas do outro! Depois montou no eixo como se estivesse fazendo ginástica numa barra, pernas para o ar, passou para a asa de baixo, agarrado na de cima, e foi assim que voltou à terra, triunfante, até o avião pousar. Fizeram mil outras façanhas de encher os olhos.
outra, presaspodia com ver, arames cruzados.deNele cabiam dois de aviadores que a gente a cabecinha fora,sócom um gorro couro e óculos tapando os olhos para não entrar poeira. Uma vez papai nos levou ao campo de aviação do Prado para ver as acrobacias. Eu mal conseguia pronunciar essa palavra, quanto mais saber o que ela significava. Foi um deslumbramento. Eram dois ou três aviõezinhos: levantavam voo como se fossem de brinquedo e faziam piruetas, voavam de cabeça para baixo, desciam, quase se arrastavam no chão e tornavam a subir. Um deles começou a soltar fumaça, fazendo letras no ar, escre-
a multidão assistia espetáculo dentro foraDedorepente, campo de pouso do que Prado, soltouaoum grito: umaéreo, dos aviões quee acabara de passar baixinho em cima de nossas cabeças não conseguiu ganhar altura e foi cair lá fora, no descampado, para os lados do Calafate. Um caminhão partiu em disparada para o local. Em pouco voltava, trazendo os destroços do avião e os dois pilotos, um deles bastante machucado (pude vê-lo encolhido ao lado do motorista, com o rosto ensanguentado). Os mais velhos diziam ao redor, sacudindo a cabeça, admirados, que ele tinha nascido de novo. (Fernando Sabino, O menino no espelho)
1. (UNESP) – No texto, o enunciador revela duas dificuldades que sentia, ao ouvir a palavra acrobacias, utilizada por seu pai, ao levá-lo para ver os aeroplanos, no campo de aviação do Prado. Identifique e comente ambas as dificuldades, demonstrando qual era a maior, do ponto de vista do menino.
2. (UNESP) – O enunciador do texto inscreve o episódio narrado num tempo distanciado do momento em que escreve ( Naquele tempo), representado primeiramente pela designação dos aparelhos em destaque – os aeroplanos. Que outras duas palavras do fragmento seriam hoje menos usuais e exemplificam o vocabulário dessa época passada?
RESOLUÇÃO: As duas dificuldades do narrador, quando menino, com a palavra acrobacias são: 1) de pronúncia, ou seja, relativa à realização fonética do
RESOLUÇÃO: Da mesma área semântica de aeroplanos, encontram-se no texto teco-tecos e aviadores , que são palavras “hoje menos usuais” e “exemplificam o
significante (“Eu mal conseguia pronunciar essa palavra...”), e 2) de entendimento, ou seja, relativa à compreensão do significado (“...quanto mais saber o que ela significava”). A maior dificuldade era a segunda, como indica a correlação “...mal... quanto mais...” – ou seja: ele a pronunciava, embora mal, mas não chegava a entendê-la.
vocabulário (daquela) época passada”. Em lugar de teco-teco e aviador, usam-se os equivalentes aviãozinho e piloto.
Leia o texto seguinte e responda às questões de números 1 e 2.
– 63
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 64
Leia o texto seguinte e responda às questões de números 3 e 4.
O GRANDE DESASTRE AÉREO DE ONTEM Para Portinari
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: A palavra que marca a distinção entre a certeza e os indícios é o verbo vejo para enumerar declarativopresumo. O enunciador utiliza a forma verbal os fatos do desastre de que temrazoável certeza, porém utilizapresumo para expressar a suposição do que teria acontecido com a “...moça adormecida na cabine...”, como se a morte fosse um prolongamento de seu sono.
Vejo sangue no ar, vejo o piloto que levava uma flor para a noiva, abraçado com a hélice. E o violinista em que a morte acentuou a palidez, despenhar-se com sua cabeleira negra e seu estradivárius. Há mãos e pernas de dançarinas arremessadas na explosão. Corpos irreconhecíveis identificados pelo Grande Reconhecedor. Vejo sangue no ar, vejo chuva de sangue caindo nas nuvens batizadas pelo sangue dos poetas mártires. Vejo a nadadora belíssima, no seu último salto de banhista, mais rápida porque vem sem vida. Vejo três meninas caindo rápidas, enfunadas, como se dançassem ainda. E vejo a louca abraçada aocom ramalhete rosas que ela pensou riscando ser o paraquedas, ea prima-dona a longadecauda de lantejoulas o céu como um cometa. E o sino que ia para uma capela do oeste, vir dobrando finados pelos pobres mortos. Presumo que a moça adormecida na cabine ainda vem dormindo, tão tranquila e cega! Ó amigos, o paralítico vem com extrema rapidez, vem como uma estrela cadente, vem com as pernas do vento. Chove sangue sobre as nuvens de Deus. E há poetas míopes que pensam que é o arrebol. (Jorge de Lima, A túnica inconsútil, 1974 [1938]) 3. (UNESP) – Jorge de Lima, conhecido por seu poema Essa negra Fulô (1928) e pela obra Invenção de Orfeu (1952), tem sua produção caracterizada por uma fase religiosa, de que é exemplo, além do último livro citado, a obra A túnica inconsútil . Levando em conta essa explicação, transcreva quatro expressões do texto que ilustram essa fase religiosa do escritor modernista. RESOLUÇÃO: É evidente o conteúdo religioso da antonomásia “Grande Reconhecedor” (Deus), único ser capaz de distinguir os “corpos irreconhecíveis”. Há fundo religioso também nas referências a sino, finados, capela e, evidentemente,
Deus – palavras que compõem um campo de significação que remete ao catolicismo.
Leia o texto seguinte e responda às questões de números 5 e 6.
A QUEDA DO FOKKER DA TAM Há sinais de que os passageiros do Fokker se prepararam para um pouso de emergência que nunca houve. Não ficou nenhuma testemunha para descrever o que aconteceu com os noventa passageiros do voo 402 da TAM durante os 25 segundos em que eles viajaram da pista de Congonhas, em São Paulo, para uma explosão no solo, 2 quilômetros adiante. Mas há elementos para afirmar com certa dose de certeza que os ocupantes do Fokker 100, todos mortos no desastre de quinta-feira, estavam se preparando para o pior. Entre os corpos levados ao Instituto Médico Legal de São Paulo, a maior parte mantinha uma posição parecida. Os corpos estavam inclinados para a frente, com os braços esticados e as pernas cruzadas. Suspeita-se que os passageiros possam ter sido orientados a se posicionar para um pouso de emergência. É aquele momento em que cada um dobra o tronco sobre os joelhos, envolve a cabeça com as mãos, fecha os olhos e se prepara para o pior. Como os corpos foram carbonizados, eles teriam fixado a posição inclinada, característica da emergência, disseram os médicos do IML. (Veja, 6/11/1996) 5. (UNESP) – Ao relatar detalhes do desastre com o avião da TAM, o texto caracteriza-se por um grande cuidado em não fazer afirmações categóricas ou definitivas, empregando artifícios diversos, como o futuro do pretérito ( teriam fixado) e certas construções sintáticas apropriadas para esse fim. Transcreva duas passagens em que se procura explicar a posição dos mortos, tratando os fatos enfocados como meras probabilidades. RESOLUÇÃO: A primeira passagem é: “Mas há elementos para afirmar com certa dose de certeza que os ocupantes do Fokker 100, todos mortos no desastre de quinta-feira, estavam se preparando para o pior”. Nela, a probabilidade é formulada por meio da expressão “certa dose de certeza”. Na segunda passagem — “Suspeita-se que os passageiros possam ter sido orientados a se posicionar para um pouso de emergência” —, o verbo suspeitar relativiza, cautelosamente, a informação prestada.
4. (UNESP) – Ao enumerar os fatos focalizados no texto, tendo em vista as diferentes personagens do desastre, o enunciador demonstra um grau razoável de certeza e de objetividade, exceto quanto ao que teria ocorrido com a “...moça adormecida na cabine...” Transcreva a palavra que desencadeia essa distinção e explique seu sentido, no contexto em que ocorre.
64 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 65
6. (UNESP) – Dependendo do gênero em que são escritos, os textos podem apresentar diferenças relevantes. Comparando o texto de Veja e o fragmento de Jorge de Lima, indique as marcas linguísticas presentes em cada texto e o que os diferencia, quanto ao gênero (literário-ficcional/ jornalístico-informativo). RESOLUÇÃO: O texto de Jorge de Lima se propõe como poema (em prosa) lírico já na imposição do eu contida em sua primeira palavra: “Vejo...”. Juntamente com a instauração do eu lírico, instala-se um espaço típico da ficção poética, neste caso, admite o inverossímil e mesmo o fantástico e surreal. Outras marcas linguísticas características da estruturação literária do texto são as anáforas (“Vejo... Vejo...”) e outros paralelismos sintáticos, a abundância de imagens de elaboração complexa e forte expressividade etc. O texto de Veja, ao contrário, ostenta claramente seu propósito referencial, não expressivo: não admite nenhuma subjetividade (nenhum verbo ou pronome na primeira pessoa) e procura restringir-se, rigorosamente, ao
B S Ê U G U T R O P
relato objetivo e impessoal dos fatos.
MÓDULO
Interpretação de Textos (II)
Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha: — Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo? — Deixe-me, senhora. — Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável? Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça. — Que cabeça, senhora? A senhora não é alfinete, é agulha. Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros. — Mas você é orgulhosa. — Decerto que sou. — Mas por quê? — É boa! Porque coso. Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu? — Você? Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu, e muito eu? — Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados... — Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás, obedecendo ao que eu faço e mando... — Também os batedores vão adiante do imperador. — Você imperador? — Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subal-
linha na agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana – para dar a isto uma cor poética. E dizia a agulha: — Então senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco? Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima... A linha não respondia nada; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta da costura; não se ouvia mais que o plic-plic-plicplic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura para o dia seguinte; continuou ainda nesse e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile. Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava a um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha, para mofar da agulha, perguntou-lhe: — Ora, agora, diga-me, quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá. Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha: – Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai
terno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto... Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a
gozar a vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico. Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça: – Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária! (Machado de Assis, Várias Histórias.)
Leia o texto seguinte e responda às questões de números 1 e 2.
UM APÓLOGO
– 65
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 66
1. (UNESP) – Tomando por base o texto de Machado, responda: a) O que significa a palavra “apólogo” que dá título ao conto? Qual a relação da história contada com seu título? RESOLUÇÃO: Apólogo é uma fábula, ou seja, uma narrativa que encerra uma lição moral. No caso do texto transcrito, a “moral da história” é claramente explicitada no penúltimo parágrafo, fazendo que a narrativa corresponda adequadamente a seu título.
b) Identifique no texto de Ma chado um exemplo de onomatopeia e explique sua função. RESOLUÇÃO: A onomatopeia ocorre em “… não se ouvia mais que o plic-plic-plic-plic da agulha no pano”. Sua função é sugerir, com meios linguísticos, o ruído produzido pela ação relatada.
P O R T U G U Ê S B
b) Qual é o argumento final apresentado pela linha para falar de sua superioridade em relação à agulha? RESOLUÇÃO: A linha gaba-se de acompanhar o vestido (e sua dona, naturalmente) ao baile, participando da elegância e da festa, enquanto a agulha fica triste mente em seu canto, “a caixinha da costureira”, antes de ser rebaixada ao “balaio das mucamas”.
3. (UNICAMP) – Quando o treinador Leão foi escolhido para dirigir a seleção brasileira de futebol, o jornal Correio Popular publicou um texto com muitas imprecisões, do qual consta a seguinte passagem: “Durante sua carreira de goleiro, iniciada no Comercial de Ribeirão Preto, sua terra natal, Leão, de 51 anos, sempre impôs seu estilo ao mesmo tempo arredio e disciplinado. Por outro lado, costumava ficar horas aprimorando seus defeitos após os treinos. Ao chegar à seleção brasileira em 1970, quando fez parte do grupo que conquistou o tricampeonato mundial, Leão não dava um passo em falso. Cada atitude e cada declaração eram pensadas com um racionalismo típico de sua família, já que seus outros dois irmãos, Edmílson, 53 anos, e Édson, 58, são médicos.” (Correio Popular, Campinas, 20/10/2000.) a) O que aconteceria com Leão se ele, efetivamente, ficasse “aprimorando seus defeitos”? Reescreva o trecho de maneira a eliminar o equívoco.
2. (UNESP) – A respeito dos usos linguísticos eleitos para construção do texto de Machado de Assis: a) Observe a frase de Machado: Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser. Explique a regência do verbo pegar e de que maneira essa frase pode ser escrita numa modalidade de língua portuguesa mais comum nos dias de hoje. RESOLUÇÃO: O verbo pegar, transitivo direto, aparece com seu complemento acompanhado da preposição de (trata-se, pois, de objeto direto preposicionado). A preposição, no caso, como que atribui energia ou intensidade à ação. Sem tal preposicionamento e com a adaptação da frase aos usos correntes, ela seria: “Chegou a costureira, pegou o pano, pegou a agulha, pegou a linha e começou a costurar”.
66 –
RESOLUÇÃO: Se aprimorasse “seus defeitos”, o jogador estaria fazendo que seus defeitos se tornassem, por assim dizer, ainda mais defeituosos... Para evitar o equívoco, a redação poderia ser “costumava ficar horas corrigindo (ou tentando corrigir) seus defeitos”, ou então “costumava ficar horas aprimo rando suas defesas”.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 67
b) A expressão, “por outro lado”, no início do segundo período, contribui para tornar o trecho incoerente. Por quê? RESOLUÇÃO: A frase introduzida com a locução “por outro lado” não apresenta um outro aspecto da questão: ela apenas acres centa um exemplo comprobatório de uma afirmação anterior, referente ao “estilo... disciplinado” do jogador.
b) O final da sequência “seja por falta de vontade, de vocação ou de incapacidade...” apresenta um problema de coerência, que pode ser eliminado de duas maneiras. Quais são essas duas maneiras? RESOLUÇÃO: O problema de coerência se deve ao fato de a enu meração “de vontade, de vocação ou de incapacidade” se ligar ao substantivo “falta”, o que implica o sintagma “falta de incapacidade”, contraditório em relação ao que se afirma no texto. Para evitar o problema, pode-se 1) antecipar o substantivo “incapacidade”, fazendo-o iniciar a enumeração, e suprimir a preposição “de”, que indevidamente o antecede: “seja por incapacidade, seja por falta de vontade ou de vocação”; 2) simplesm ente substitu ir a preposiçã o “de” pela prep osição “po r” e acrescentar a conjunção alternativa entre os dois primeiros termos da enu meração: “seja por falta de vontade ou de vocação ou por incapacidade”.
c) Por que o emprego da palavra “racionalismo” é inadequado nessa passagem? RESOLUÇÃO: O “racionalismo” é dado como “típico da família” do jogador porque dois de seus irmãos são médicos: Ora, a justificativa não é pertinente, pois nem seguir a carreira médica é prova de racionalismo, nem, consequentemente, a presença de dois médicos numa família a caracteriza como “raciona lista”. O “racionalismo” aparece, no texto, impropriamente identifi cado com atitude cautelosa, refletida e premeditada.
c) Destaque uma passagem que indica que o texto é pessimis ta (ou crítico) em relação ao Partido. 4. (UNICAMP) – O Partido X dedica-se a essa atividade mais do que nunca. Ocorre que ainda está longe do desejado, seja por falta de vontade, de vocação ou de incapacidade do partido. Entre outras razões, é por esse motivo que o dólar sobe. (Fernando Rodrigues, Folha de S. Paulo, 25/9/2002 – parcialmente adaptado)
RESOLUÇÃO: No segundo período do texto, as razões aventadas para a insuficiência da atividade do Partido são todas “pessimistas” ou “críticas” em relação a ele, pois lhe atribuem defeitos essenciais, seja de conduta (“falta de vontade”), seja de natureza (“falta de vocação ou incapacidade”).
a) Na primeira oração ocorre uma palavra (um pronome) que permite concluir que o trecho acima não é o início do texto de Fernando Rodrigues. Qual é a palavra e por que sua ocorrência permite tal conclusão? RESOLUÇÃO: A palavra em questão é o pronome demonstrativoessa (“essa atividade”), que remete a um elemento anterior do texto, o que permite concluir que a “atividade” de que se trata já tenha sido mencionada.
– 67
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 68
P O R T U G U Ê S B
5. (UNICAMP) – MARCA-PASSO NATURAL – Uma alternativa menos invasiva pode substituir o implante do marca-passo eletrônico [...]. Cientistas do Hospital John Hopkins, nos EUA, conseguiram converter células cardíacas de porquinhos-da-índia em células especializadas, que atuam como um marca-passo, controlando o ritmo dos batimentos cardíacos. No experimento, o coração dos suínos recuperou a regularidade dos movimentos. A expectativa é que em alguns anos seja possível testar a técnica em humanos. (ISTOÉ, 1720, 18/9/2002.)
6. (UNICAMP) – Em setembro de 2003, uma universidade brasileira veiculou um convite-propaganda para a palestra “Desenvolvimento da saúde e seus principais problemas”, que seria proferida por José Serra, ex-ministro da saúde. Do convite-propaganda fazia parte uma foto de José Serra sobre a qual foi colocada uma tarja branca com o seguinte enunciado: A “Universidade X” ADVERTE: ESSA PALESTRA FAZ BEM À SAÚDE
a) Alguém que nunca tivesse ouvido falar de marca-passo poderia dar uma definição desse instrumento lendo este texto. Qual é essa defi nição? RESOLUÇÃO: Sim. A definição da atividade ou da função do marca -passo aparece no trecho: “… atuam como um marca-passo, controlando o ritmo dos batimentos cardíacos”.
a) Esse enunciado faz alusão a um outro. Qual? RESOLUÇÃO: O enunciado faz alusão à advertência impressa nos maços de cigarro: “Fumar faz mal à saúde”.
b) Compare os dois enunciados. b) A ocorrência da expressão “a técnica”, no final do texto, indica que ela foi explicada anteriormente. Em que consiste essa técnica?
RESOLUÇÃO: Os enunciados se contrapõem, pois enquanto a pa lestra “faz bem à saúde”, o cigarro “faz mal à saú de”, o que configura antítese.
RESOLUÇÃO: Trata-se da técnica de conversão de células cardíacas em células especializadas, “que atuam como um marca-passo”.
c) O convite-propaganda situa a “Uni versidade X” em um lugar de autoridade. Explique como isso acontece. c) Apesar do nome, o porquinho-da-índia é um roedor. Sendo assim, há uma forma equivocada de referir-se a ele no texto. Qual é essa forma e como se explica sua ocorrência? RESOLUÇÃO: A referência equivocada encontra-se no adjetivo “suínos”, aplicável a porcos, mas não a porquinhos-da-índia, que são roedores.
68 –
RESOLUÇÃO: O sujeito habitual dessa frase é o Ministério da Saúde; a tro ca por “Universidade X” atribui-lhe um “lugar de auto ridade”.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 69
MÓDULO
Interpretação de Textos (III)
INSTRUÇÃO: As questões de números 1 a 3 tomam por base uma passagem de um romance do escritor naturalista brasileiro Aluísio Azevedo (1857-1913).
Afinal conseguiram chegar. Mas, ah! quando a pobre Magdá, toda trêmula e exausta de forças já no tope da pedreira, defrontou com o pavoroso abismo que se precipitava debaixo de seus pés, soltou um grito rápido, fechou os olhos, e teria caído para trás, se o Conselheiro não lhe acode tão a tempo. — Magdá, minha filha! Então! então! Ela não aí! respondeu. — Está está aí o que eu receava! Lembrar-se de subir a estas alturas!... E agora a volta...? — Pode vossência ficar tranquilo por esse lado, arriscou um dos cavouqueiros, que se havia aproximado, a coçar a cabeça. — Se vossência quiser, eu cá estou para pôr esta senhora lá embaixo, sem que lhe aconteça a ela a menor lástima. — Ainda bem! respondeu S. Exa. com um suspiro de desabafo. O trabalhador que se ofereceu para conduzir Magdá era um moço de vinte e tantos anos, vigoroso e belo de força. Estava nu da cintura para cima e a riqueza dos seus músculos, bronzeados pelo sol, patenteava-se livremente com uma independência de estátua. Os cabelos, empastados de suor e pó de pedra, caíam-lhe em desordem sobre a testa e sobre o pescoço, dando-lhe à cabeça uma satírica feição de sensualidade ingênua. — Vamos! Vamos! apressou o Conselheiro, entre gando-lhe a filha. O rapaz passou um dos braços na cintura de Magdá e com o outro a suspendeu de mansinho pelas curvas dos joelhos, chamando-a toda contra o seu largo peito nu. Ela soltou um longo suspiro e, na incons ciência da síncope, deixou pender molemente a cabeça sobre o ombro do cavouqueiro. E, seguidos de perto pelo velho, lá se foram os dois, abraçados, descendo, pé antepé, a íngreme irregularidade do caminho. Era preciso toda atenção e muito cuidado para não rolarem juntos; o moço fazia prodígios de agilidade e de força para se equilibrar com Magdá nos braços. De vez em quando, nos solavancos mais fortes, o pálido e frio rosto da filha do Conselheiro roçava na cara esfogueada do trabalhador e tingia-se logo em cor-de-rosa, como se lhe houvera roubado das faces uma gota daquele sangue vermelho e quente. Ela afinal teve um dobrado respirar de quem acorda, e entreabriu com volúpia os olhos. Não perguntou onde estava, nem indagou quem a conduzia; apenas esticou nervosamente os músculos num espreguiçamento de gozo e estreitou-se em seguida ao peito do rapaz, unindo-se bem contra ele, cingindo-lhe os braços em volta do pescoço com a avidez de quem se apega nos travesseiros aquecidos para continuar um sono gostoso e reparador. E caiu depois num fundo entorpecimento, bambeando as pálpebras; os olhos em branco, as narinas e os seios ofegantes; os lábios secos e despregados, mostrando a brancura dos dentes. Achava-se muito bem no tépido aconchego daquele corpo de homem; toda ela se penetrava do calor vivificante que vinha dele; toda ela aspirava, até pelos poros, a vida forte daquela vigorosa e boa carnadura, criada ao ar livre e quotidianamente enriquecida pelo trabalho braçal e pelo pródigo sol americano. Aquele calor de carne sã era uma esmola atirada à fome do seu miserável sangue. E Magdá, sentindo no rosto o resfolegar ardente e acelerado do cavouqueiro, e nas carnes macias da garganta o roçagar das barbas
dele, ásperas e maltratadas, gemia e suspirava baixinho como se estivessem a acarinhá-la depois de longa e assanhada pugna de amor. Quando o moço, já embaixo, a depôs num banco de pedra que ali havia, a enferma abriu de todo os olhos, deixou escapar um grito e cobriu logo o rosto com as mãos. Agora não podia encarar com aquele homem de corpo nu que ali estava defronte dela, a tirar com os punhos o suor que lhe escorria em bagas pela testa. Chorou de pejo. O seu pudor e o seu orgulho revoltaram-se, sem que ela soubesse determinar a razão por quê. Uma cólera repentina, um sôfrego desejo de vingança, a garganta com um novelo de soluços. O pranto pareciaenchiam-lhe sufocá-la quando rebentou. — Eu magoei-a, ó patroazinha?... perguntou o trabalhador com humildade, quase sem poder vencer ainda o cansaço. E o imprudente tocou com a mão no ombro de Magdá, procurando, coitado, dar-lhe a perceber o quanto estava consumido por vê-la chorar daquele modo. Ela estremeceu toda e fugiu com o corpo, nem que se houvessem chegado um ferro em brasa; e abraçou-se ao pai, escondendo no peito deste os soluços que agora borbotavam sem intermitência. (Aluísio Azevedo. O homem. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1970. p. 94-97.) 1. (UNESP) – O homem se caracteriza como um romance naturalista, em que as decisões de caráter moral das personagens resultam de conflitos, porque estão condicionadas simultaneamente a suas condições físicas e psicológicas, ao confronto entre os instintos e a moral. De posse desta informação, demonstre que, no universo da narrativa naturalista, a atitude de Magdá em repudiar o trabalhador que acaba de prestar-lhe um grande auxílio, carregando-a ladeira abaixo, é perfeitamente explicável. RESOLUÇÃO: A atitude de Magdá em repudiar o trabalhador se justifica a partir do binômio “condições físicas” x “psicológicas” e “instinto” x “moral”. Num primeiro momento, Magdá, “trêmula e exausta”, fisicamente debilitada, rende-se, instintivamente, ao auxílio do cavouqueiro, “vigoroso e belo de força”, ao mesmo tempo bruto e viril, formado pelo meio em que vive. Assim, nesse instante inicial, o determinismo biológico modula as reações das personagens. Vale ressaltar que o trecho transcrito é carregado de sensualidade, recurso comum no naturalismo e que está ligado à zoomorfização humana. Após a travessia, ao ser colocada em segurança em um banco de pedra, o “pudor” e o “orgulho” a que Magdá fora condicionada (“sem que ela soubesse determinar a razão por quê”) fazem com que sua moral se sobreponha ao instinto. Justifica-se, pois, a reação de Magdá, que repudia o trabalhador que a tinha acabado de auxiliar.
– 69
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 70
2. (UNESP) – Embora, no fragmento apresentado, a personagem central seja Magdá, destaca-se bastante a figura do cavouqueiro pelos aspectos positivos que o narrador descreve. Releia o fragmento e, a seguir, aponte um aspecto positivo sob o ponto de vista físico e um aspecto positivo sob o ponto de vista psicológico dessa personagem.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: O texto é pródigo na descrição física do cavouqueiro e todos os aspectos são positivos: vigor e beleza física, riqueza de músculos, feição sensual, prodígios de agilidade e de força, vigorosa e boa carnadura, físico moldado pelo trabalho braçal e pelo sol. Do ponto de vista psicológico, as atitudes do cavouqueiro revelam sua índole e personalidade, pois foi prestativo ao se oferecer pa ra carreg ar a moça, su bservient e na obediência ao Conselheiro e humilde ao interrogar a “patroazinha”.
4. (UNICAMP) – O soneto a seguir, de Machado de Assis, intitula-se Suave mari magno, expressão usada pelo poeta latino Lucrécio, que passou a ser empregada para definir o prazer experimentado por alguém quando se percebe livre dos perigos a que outros estão expostos:
SUAVE MARI MAGNO Lembra-me que, em certo dia, Na rua, ao sol de verão, Envenenado morria Um pobre cão. Arfava, espumava e ria, De um riso espúrio* e bufão, Ventre e pernas sacudia Na convulsão. Nenhum, nenhum curioso Passava, sem se deter, Silencioso, Junto ao cão que ia morrer, Como se lhe desse gozo Ver padecer. *espúrio: não genuíno; ilegítimo, ilegal, falsificado. Em medicina, diz respeito a uma enfermidade falsa, não genuína, a que faltam os sintomas característicos. a) Que paradoxo o poema aponta nas reações do cão envenenado?
3. (UNESP) – No final do primeiro parágrafo, o narrador empregou “acode”, presente do indicativo, quando a correlação usual com as demais formas verbais exigiria o pretérito imperfeito do subjuntivo, “acudisse”. Essa quebra da correlação, todavia, é feita intencionalmente pelo narrador, com o objetivo de produzir um efeito expressivo. Releia o parágrafo e explique esse efeito expressivo causado pelo emprego do presente do indicativo. RESOLUÇÃO: A quebra da correlação verbal, com o presente do indicativo (chamado presente narrativo) empregado no lugar do pretérito imperfeito do subjuntivo, sugere que a intenção do narrador foi presentificar e atualizar a cena, tornando-a vívida para o leitor, intensificando a expressão do momento de medo e perigo por que passavam as personagens.
RESOLUÇÃO: O paradoxo nas reações do cão envenenado está na aproximação entre as imagens do animal que agonizava, mas que, no instante mesmo de sua morte, nos extertores de uma convulsão, parecia rir.
b) Por que se pode afirmar que os passantes, diante dele, também agem de forma paradoxal? RESOLUÇÃO: A reação paradoxal dos transeuntes é a atitude que se presume de gozo diante do padecimento do cão – “Como se lhe desse gozo / Ver padecer”.
c) Em vista dessas reações paradoxais, justifique o título do poema. RESOLUÇÃO: O título do poema se justifica em razão de o texto relatar uma situação em que o sofrimento de um ser (no caso, o cão) é razão de satisfação ou prazer para os que, livres do sofrimento, o contemplam. No texto de Lucrécio, a situação descrita é a daquele que, em terra firme e, pois, livre do perigo, contempla as aflições dos que lutam contra o naufrágio em meio ao mar revolto.
70 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 71
5. (FUVEST) – Sair a campo atrás de descobridores de espécies é uma expedição arriscada. Se você não é da área, vale treinar um “biologuês” de turista. Mas, mesmo quem não tem nada a ver com o pato-mergulhão ou a morfologia da semente da laurácea, pode voltar fascinado da aproximação com esses especialistas. De olhos nos livros e pés no mato, eles etiquetam a natureza, num trabalho de formiga. São minoria que dá nome aos bois — e a plantas, aves, mosquitos, vermes e outros bichos. (Heloisa Helvécia, Revista da Folha) a) Transcreva do texto as expressões que mais diretamente exemplificam o “biologuês” mencionado pela autora. RESOLUÇÃO: As expressões “pato-mergulhão”, “morfologia da se mente da laurácea” exemplificam o “biologuês” apontado no texto.
b) Tomada em seu sentido figurado, como se deve entender a expressão “dar nome aos bois”, utilizada no texto? RESOLUÇÃO: A expressão “dar nome aos bois” significa, no texto, “identificar, nomear, catalogar, classificar”.
a) A propaganda explora dois sentidos de “pagar caro”. Quais? RESOLUÇÃO: A propaganda explora o sentido denotativo, literal de “pagar caro”, ou seja, “desembolsar um valor alto”, e o sentido conotativo, figurado, que é, conforme o Dicionário Houaiss, “amargar severamente as c onsequências de um ato”.
b) A propaganda procura construir certas imagens para o jornal. Quais? RESOLUÇÃO: A propaganda sugere, para o jornal, a imagem de que é econo micamente acessível, já que não é caro, e confiável, pois veicula a verdade.
c) Para construir essas imagens, a propaganda torna natural uma imagem estereotipada do Brasil. Comente a importância da cons trução sintática “se (...), por que (...)” e do pronome ninguém nesse processo. RESOLUÇÃO: A “imagem estereotipada do Brasil” que a propaganda apresenta como natural é a de um país de mentirosos em que a mentira não é punida. A ora ção iniciada porse é apenas aparentemente condicional, pois traz implícita uma afirmação e vale como uma causal: “Como no Brasil ninguém paga caro por mentir...”. O pronome ninguém, nessa frase, opera uma generalização completa, de que nenhum brasileiro escapa.
6. (UNICAMP) – Em 26 de outubro de 2006, um jornal de S.Paulo veiculou a seguinte propaganda:
Se no Brasil ninguém paga caro por mentir, por que você vai pagar caro pela verdade? Assine o Jornal X a partir de R$ XX,XX.
MÓDULO
Interpretação de Textos (IV)
1. (FUVEST) – Ouvir alguém falar não é como tornar a ouvi-lo através de uma máquina: o que ouvimos, quando temos um rosto diante de nós, nunca é o que ouvimos, quando, diante de nós, há uma fita que gira. Um reluzir de olhos, um agitar de mãos, às vezes, torna aceitável a frase mais idiota. Mas sem aquelas mãos, sem aqueles olhos, a frase se desnuda em toda a sua desconcertante idiotice. (Oriana Fallaci, Os antipáticos)
A frase mais a) Complete, sentido doatexto, o seg idiota torna-se,mantendo às vezes,oaceitável, não ser quemento: .................. RESOLUÇÃO: A frase mais idiota torna-se, às vezes, aceitável, a não ser que, sem um reluzir de olhos ou um agitar de mãos, ela se desnude em toda a sua desconcertante idiotice.
b) Termine a frase: A presença física de nosso interlocutor ................ com uma conclusão que sintetize o texto. RESOLUÇÃO: A presença física de nosso interlocutor empresta a suas palavras um sentido que, caso o interlocutor esteja ausente, pode faltar intei ramente.
– 71
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 72
P O R T U G U Ê S B
2. (FUVEST-SP) – Reduit é leite puro e saboroso. Reduit é saudável, pois nele quase toda gordura é retirada, permanecendo todas as outras qualidades nutricionais. Reduit é bom para jovens, adultos e dietas de baixas calorias. (Texto em uma embalagem de leite em pó)
viajar para sua cidade ou hospedá-la em local secreto e sigiloso em São Paulo/Capital quando por aqui você estiver por passagem fazendo compras ou querendo me visitar CP1572. a) A linguagem do anúncio anterior faz pensar num tipo de autor. O produto oferecido seleciona um tipo de leitor. Considerando isso, caracterize o autor e o leitor representados pelo anúncio.
a) No texto acima, a gordura pode ser entendida também como uma qualidade nutricional? Justifique sua resposta, transcrevendo do texto a expressão mais pertinente.
RESOLUÇÃO: O autor do anúncio, um pretenso sedutor, esconde sua oferta de serviços sexuais atrás de uma linguagem forrada de pseudotecnicismos do mundo empresarial. Ele se apresenta, pois, como um empresá rio, dirigindo-se a interlocutores também do mundo e mpresarial.
RESOLUÇÃO: Sim, a gordura pode ser entendida também como uma qualidade nutricional, pois o texto afirma que, embora quase isento de gordura, o leite em questão conserva “todas as outras qualidades nutricionais”. A expressã o “outras qualidades nutriciona is” implica a ideia de que a gordura seja uma delas.
b) As qualidades nutricionais de um produto, segundo o texto, sempre fazem bem à saúde? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: O texto supõe a ideia de que há “qualidades nutricionais” que não são boas para a saúde, como seria o caso da gordura. Isso se infere da afirmação de que “Reduit é saudável, pois nele quase toda gordura é retirada”. A explicação de que o leite seja saudável é dada pela afirmação de que ele quase não contém gordura. Portanto, a gordura não seria saudável, embora, como se viu na resposta a, ela seja dada como uma das “qualidades nutricionais”.
3. (UNICAMP) Em uma de suas edições de 1998, o Classline Regional da Folha de S. Paulo, que circula nas regiões de Campinas, Ribeirão Preto e Vale do Paraíba, trazia este curioso anúncio:
Alguma Casada – Quando ele te conheceu ele fazia você sentir-se uma Empresa Multinacional como fêmea, e você recebia como o equivalente à um salário de Diretora Executiva no seu salário de sexo, amor e carinho! Hoje, p/ ele você é uma Microempresa, cujo ele só visita quando ele vai pagar o seu salário mínimo sempre atrasado de sexo e amor! Faça como as grandes empresas, terceirize a mão de obra c/ gente qualificada que quer entregar satisfação completa sem nenhum tipo de cobrança. Eu casado sigiloso, cor clara, 28 anos. Procuro você s/ preconceito de peso ou altura de 18 a 45 anos. Posso 72 –
b) Algumas passagens do anúncio impressionariam mal uma leitora pouco disposta a tolerar infrações à norma linguística culta. Transcreva três delas. RESOLUÇÃO: Mistura de pessoas pronominais diversas na referência ao interlocutor: “Quando ele te conheceu ele fazia você…”; uso de acento grave onde não há crase: “...equivalente à um salário…”; emprego descabido do pronome relativo: “...cujo ele só visita…”; pontuação absurda: “Eu casado sigiloso, cor clara, 28 anos. Procuro…” etc.
c) Que comportamento socialmente discutível é proposto pelo anúncio por meio da metáfora da terceirização? RESOLUÇÃO: O que se propõe é uma relação adulterina com mulher insatisfeita com o marido.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 73
4. (UNICAMP-SP) – L. F. Verissimo certamente ficaria satisfeito se você, mesmo nesta situação um pouco tensa, achasse graça na tira abaixo.
Eis o que eu queria dizer: — quando entrei, pela primeira vez, numa redação, acabava de fazer dez anos. Com a trágica inocência das calças curtas, tive a sensação de que entrava numa outra realidade. As pessoas, as mesas, as cadeiras e até as palavras tinham um halo intenso e lívido. Era, sim, uma paisagem tão fascinante e espectral como se redatores, mesas, cadeiras e contínuos fossem também submarinos. (Nélson Rodrigues, O Reacionário: Memórias e Confissões)
Para achar graça, você precisa perceber que a tira traz implícitas duas opiniões opostas relativas a uma prática institucional de nossa sociedade. a) Quais as duas opiniões contidas na tira?
5. (UFSCar) – Nesse trecho de crônica, Nélson Rodrigues compara, em sua visão infantil, a redação de um jornal com uma paisagem submarina. a) Destaque, desse texto, alguma palavra ou expressão empregada em
RESOLUÇÃO: As duas opiniões dizem respeito a casamento e felicidade. Deduz-se que há uma opinião favorável e outra contrária à instituição do casamento: no primeiro quadrinho o casamento é apresentado como desejável, mas no último ele é tido como incompatível com a felicidade.
sentido não literal. RESOLUÇÃO: Têm sentido figurado as seguintes palavras e ex pressões: subterrâneos (no sentido metafórico delocais ocultos), calças curtas(metonímia deinfância), halo intenso e lívido (metáfora para a forte impressão que as figuras do jornal causavam na criança), espectral (metáfora por ilusório, fantasmagórico) e submarinos (elemento de comparação).
b) Qual dessas dua s opiniões pode se r considerada um argumento favorável à manutenção dessa prática institucional? RESOLUÇÃO: No primeiro quadrinho, formula-se o voto de que a personagem se case, o que implica uma opinião favorável ao casamento, embora em seguida, paradoxalmente, casamento e felicidade sejam apresentados como excludentes.
b) A que classe pertence a palavra submarinos na última linha do texto? De que maneira se deriva dessa palavra o nome do veículo naval submersível? RESOLUÇÃO: Submarinos é adjetivo, do qual, por derivação imprópria, srcina-se o substantivo que designa o veículo. A “maneira” pela qual se faz essa derivação é sintática, pois um adjetivo se transfor ma em substantivo quando determinado por um elemento substantivador (artigo, pronome demonstrativo, adjetivo, numeral), ou quando empregado como núcleo de um sintagma nominal de função substantiva (por exem plo, empregado como sujeito: submarinos foram vistos).
As questões de números 5 e 6 referem-se ao texto seguinte.
Vocês, que não conhecem os subterrâneos de jornal, não imaginam como uma redação é povoada de seres misteriosíssimos. Procurem visualizar uma paisagem submarina. Há peixes azuis, escamas cintilantes, águas jamais sonhadas. De vez em quando, sai de uma caverna um monstro de movimentos lerdos, pacientes etc. E passa um peixe sem olhos, que emana uma luz própria.
– 73
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 74
6. (UFSCar) – A palavra até, no trecho — “...até as palavras tinham um halo intenso e lívido.” —, não está empregada em sua fun ção própria de preposição. a) Qual a função estilística dessa palavra no trecho? RESOLUÇÃO: A palavra até tem função intensificadora ou enfatizadora.
P O R T U G U Ê S B
a) No trecho transcrito, as aspas são utilizadas em dois mom entos diferentes. Transcreva as passagens entre aspas e explique seu uso em cada uma delas. RESOLUÇÃO: “Media Training”: expressão em língua estrangeira; “Corra que a Imprensa vem aí”: título de publicação.
b) Dê dois exemplos em que até seja empregado como preposição. RESOLUÇÃO: Vou até a praia. Amar-te-ei até o último sopro.
b) Podemos relacionar o título da cartilha com o título em português da comédia norte-americana “Corra que a polícia aí”, queconhecida trata de um inspetor de polícia atrapalhado. Explicite os vem sentidos da palavra ‘correr’ nos títulos do filme e do manual.
7. (UNICAMP) – Em matéria recentemente publicada no Caderno Sinapse da Folha de S. Paulo, é apresentada uma definição de media training: ensinar profissionais a lidarem com a imprensa e se saí rem bem nas entrevistas. Na parte final da reportagem, o jornalista faz a seguinte ressalva: O “media training” não se restringe a corporações. A Universidade X distribui para seus profissionais uma cartilha com dicas para que professores e médicos possam ter um bom relacionamento com a imprensa. Ironicamente intitulado de “Corra que a Imprensa vem aí”, o manual aponta gafes cometidas e dá dicas sobre a melhor forma de atender um repórter. (Adaptado de Vinícius Queiroz Galvão, “Treinamento antigafe”, Caderno Sinapse, 30/9/2003, p. 32).
MÓDULO
RESOLUÇÃO: No título do filme, “correr” significa “fugir”; trata-se, portanto, de “correr de”. No título do manual, depreende-se do contexto irônico que se trata do “correr” no sentido de “correr para”, referindo-se à preparação para “enfrentar” a imprensa.
Interpretação de Textos (V)
1. (FUVEST)
A tua saudade corta como aço de navaia... O coração fica aflito Bate uma, a outra faia... E os óio se enche d’água Que até a vista se atrapaia, ai, ai... (Fragmento de “Cuitelinho”, canção folclórica) a) Nos dois primeiros versos há uma comparação. Reconstrua esses versos numa frase iniciada por “Assim como (...)”, preservando os elementos comparados e o sentido da comparação. RESOLUÇÃO: “Assim como aço de navaia, a tua saudade corta.” (Os termos comparados são: (a) termo real: “a tua saudade”; (b) termo ideal: “aço de navaia”. A similaridade que sustenta a comparação está no fato de ambos cortarem.)
74 –
b) Se a forma do verbo atrapalhar estivesse flexionada de acordo com a norma-padrão, haveria prejuízo para o efeito de sonoridade explorado no final do último verso? Por quê? RESOLUÇÃO: Sim, haveria prejuízo para o sistema de rimas, pois atrapalha não mais rimaria com “navaia” e “faia”.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 75
2. (UNICAMP)
Mário Sérgio Cortella, em sua coluna mensal "Outras Ideias, escreve: (...) reconheça-se: a maior contribuição de Colombo não foi ter colocado um ovo em pé ou ter aportado por aqui depois de singrar mares nunca dantes navegados. Colombo precisa ser lembrado como a pessoa que permitiu a nós, falantes do inglês, do francês ou do português, que tivéssemos contato com uma língua que, do México até o extremo sul da América, é capaz de nos ensinar a dizer "nosotros" em vez de apenas "we", "nous", "nós", afastando a arrogante postura do "nós" de um lado e do "vocês" do outro. Pode parecer pouco, mas "nós' é quase barreira que separa, enquanto "nosotros" exige perceber uma visão de alteridade, isto é, ver o outro como um outro, e não como um estranho. Afinal, quem são os outros de nós mesmos? O mesmo que somos para os outros, ou seja, outros! (Mário Sérgio Cortella, Folha de S.Paulo, 9 de outubro de 2003) 3. (UNICAMP) – O texto acima nos faz pensar na distinção entre um nós inclusivo e um nós excludente. a) Segundo o excerto, nosotros apresenta um sentido inclusivo. Justifique pela morfologia dessa palavra.
a) O que produz a ironia nessa tira de Hagar? RESOLUÇÃO: A ironia é produzida pela justaposição da afirmação contundente estabelecida pela interjeição “claro” com o argumento absolutamente improvável que se segue. Afinal, não são muitos aqueles que fazem parte do conjunto de pessoas passíveis de serem convidadas para jantar com o rei da Inglaterra.
RESOLUÇÃO: Em nosotros associam-se o pronome de primeira pessoa (em Português, nós) e o pronome indefinido que costuma ser o oposto dele ( otros, “outros”). Assim, a oposição nós x outros parece ter sido substituída, nessa palavra composta, pela identificação entre os dois pronomes, com o implícito reconhecimento de que nós mesmos somos os ou tros em relação a eles, ou seja, aos outros. Em outras palavras, a relação de alteridade (“ser outro”) é assumida de forma, não a nos contrapor, mas sim a nos identificar com os outros.
b) Como você interpreta a resposta de Hagar, no segundo quadrinho da tira? Justifique. RESOLUÇÃO: A interpretação deve levar em conta, necessariamente, a relação entre o modalizador “talvez” e a sequência do enunciado de Hagar iniciada pela conjunção adversativa “ma”. Em “talvez”, afirma-se uma possibilidade que se confirma pela restrição estabelecida em “mas”, seguida de “não diga à sua mãe que eu falei isso”. Desse modo, podemos interpretar a resposta de Hagar como uma afirmação de que boas maneiras à mesa não são importantes, sem que ele diga isso diretamente, já que contraria o que socialmente se espera da figura paterna, assim como contraria também a posição da mãe, Helga.
b) "Nós brasileiros falamos português" apresenta um nós excludente. Explique. RESOLUÇÃO: O nós da frase em questão exclui, como outros, aqueles que não falam Português. A frase implica a contraposição nós (os que falamos o Português) x eles (os outros, que não falam a nossa língua).
– 75
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 76
4. (FUVEST) – Se, como diz o ditado, ter um é pouco e dois é que seria o bom, quando se trata do Trio Beaux Arts, os três são demais. No melhor sentido da palavra. (O Estado de S. Paulo, 12/4/96, D4) a) Qual é "o melhor sentido da palavra" a que o autor se refere? P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: O segundo quadrinho apresenta, de fato, alguns palavrões pronunciados pelo papagaio. Estes, porém, em vez de chocantes ou chulos, mostram-se apenas ridículos. Portanto, temos no segundo quadrinho os palavrões que são motivo de vergonha; o que se altera, porém, é a razão da vergonha, que se revela ser, num certo sentido, o oposto do que o primeiro quadrinho parecia anunciar.
RESOLUÇÃO: "Demais", na linguagem coloquial corrente entre os jovens, no Brasil, pelo menos no centro-sul do país, significa "muito bom", "excelente", equivalendo a uma qualificação positiva em grau superlativo.
6. (UNICAMP) – Em um jornal de circulação restrita, vemos, na b) Qual o contrassenso que ele evitou, ao acrescentar a ressalva "no melhor sentido da palavra"? RESOLUÇÃO: Tal como utilizado no ditado referido no texto, "demais" significa "excessivo", "demasiado". O contrassenso con sistiria em aplicar a palavra a algo que se quer elogiar. Ao ressalvar que usava o termo "no melhor sentido", o autor remeteu os leitores para o valor superlativamente positivo que o advérbio tem na linguagem coloquial.
capa, a seguinte chamada:
Inspire saúde! Sem fumar, respire aliviado! No interior do Jornal, a matéria começa da seguinte forma: Desperte o não fumante que há em você!, seguida logo adiante de: O fumante passivo – aquele que não fuma, mas frequenta ambientes poluídos pela fumaça do cigarro – também tem sua saúde prejudicada. (Jornal da Cassi – Publicação da Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, ano IX, n.o 40, junho/julho de 2004.)
5. (UNICAMP) Levando em consideração os trechos citados, obser vamos, na chamada da capa, um interessante jogo polissêmico. a) Apresente dois sentidos de Inspire em “Inspire saúde!”. Justifique. RESOLUÇÃO: Inspirar, em “Inspire saúde”, pode significar tanto 1) “sorver, absorver”, introduzindo (ar) nos pulmões, quanto 2) “infundir, incutir”. No sentido 1, o sujeito é o receptor ou bene ficiário da ação; no sentido 2, ele é o agente responsável pela disseminação da saúde.
(Fernando Gonsales, “Níquel Náusea”, Folha de S. Paulo on line, em www.uol.com.br/niquel) a) No primeiro quadrinho, a menção a ‘palavrões’ cons trói uma expectativa que é quebrada no segundo quadrinho. Mostre como ela é produzida, apontando uma expressão relacionada a ‘palavrões’, presente no primeiro quadrinho, que ajuda na construção dessa expectativa. RESOLUÇÃO: A expressão “passar vergonha” cria a expectativa de que os mencionados palavrões sejam muito grosseiros, chocantes, chulos.
b) No segundo quadrinho, o cômico se constrói justamente pela quebra da expectativa produzida no quadrinho anterior. Entretanto, embora a relação pressuposta no primeiro quadrinho se mantenha, ela passa a ser entendida num outro sentido, o que produz o riso. Explique o que se mantém e o que é alterado no segundo quadrinho em termos de pressupostos e relações entre as palavras.
76 –
b) Apresente dois sentidos de aliviado em “respire aliviado!”. Justifique. RESOLUÇÃO: Aliviado , em “Respire aliviado”, pode significar: 1) “livre dos males causados pelo fumo” e 2) “tranquilo em relação aos males que o fumo poderia causar nos outros”. O sentido 1 refere-se a alívio físico; o 2, a alívio moral.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 77
MÓDULO
Interpretação de Textos (VI)
1. (UNICAMP-SP) – Na sua coluna diária do Jornal Folha de S.Paulo de 17 de agosto de 2005, José Simão escreve: “No Brasil nem a esquerda é direita!”. a) Nessa afirmação, a polissemia da língua produz ironia. Em que palavras está ancorada essa ironia?
2. (UNICAMP-SP) – Na capa do caderno Aliás do jornal O Estado de S.Paulo de 10 de julho de 2005, encontramos o seguinte conjunto de afirmações que também fazem referência à crise política do Governo Lula:
RESOLUÇÃO: A ironia está presente nas palavras “esquerda” e “direita”.
Getúlio tanto sabia que preparou a carta-testamento. Juscelino sabia que seria absolvido pela História. Jânio sabia que sua renúncia embutia um projeto autoritário. Jango sabia o tamanho da conspiração ao seu redor. Médici ia ao futebol, mas sabia de tudo. Geisel sabia que Golbery entendera o projeto de abertura. (...) a) Em todas as afirmações, há um padrão que se repete. Qual é esse padrão e como ele estabelece a relação com a crise política do atual governo?
b) Quais os sentidos de cada uma das palavras envolvidas na polissemia acima referida? RESOLUÇÃO: Esquerda significa “tendência política ligada a reivindicações populares, trabalhistas, socialistas ou comunistas”. Direita designa, como substantivo, “tendência política conservadora ou reacionária em relação às reformas sociais” e, como adjetivo, significa “correta, honesta”. A polissemia criada pelo autor ironiza os partidos de esquerda que não agem com honestidade, integridade, probidade.
RESOLUÇÃO: O padrão repetido é o de predicar o verbo saber para os sujeitos que são os diversos Presidentes da República alinhados no enunciado, numa afirmação que se pode resumir como “todos os presidentes sempre souberam”. O objeto de saber , em todos os casos, é a situação que envolvia o presidente mencionado. A ilação é que, também no caso de Lula, o presidente sabe.
c) Comparando a afirmação “No Brasil nem a esquerda é direita” com “No Brasil a esquerda não é direita”, qual a diferença de sentido estabelecida pela substituição de “nem” por “não”? RESOLUÇÃO: Nem, no contexto, expressa a ideia de adição e significa “inclusive não”, “também não”, ou seja, implica a ideia de que todos não agem com honestidade, inclusive a esquerda. Já o sentido denão é apenas de negação e entende-se que a esquerda não é honesta.
b) Apresente, por meio de paráfrases, duas interpretações para a palavra “tanto” na frase “Getúlio tanto sabia que preparou a cartatestamento”. RESOLUÇÃO: 1) Getúlio sabia tão bem o que se passava, que, em consequência, preparou a carta-testamento. 2) É tão verdadeiro o fato de que Getúlio sabia, que…
– 77
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 78
3. (UNICAMP-SP) – Os quadrinhos a seguir fazem parte de um material publicado na Folha de S.Paulo em 17 de agosto de 2005, relativo à crise política brasileira, que teve início em maio do mesmo ano.
4. (UNICAMP-SP) – Alguém menos tolerante no que se refere a imprecisões de linguagem poderia dizer que a notícia abaixo (publicada no jornal Folha de S.Paulo de 26/5/2001) faz referência a alguma coisa impossível.
P O R T U G U Ê S B
Na tira de Angeli, observamos um jogo de associações entre a frasetítulo “O imundo animal” e a sequência de imagens. a) A frase-título “O imundo animal” nos reme te a uma outra frase. Indique-a eexplicite as relações de sentido entre as duas frases, fazendo referência ao conjunto da tira. RESOLUÇÃO: A frase-título remete à expressão “o mundo animal”, que designa o uni verso dos seres dotados de vida (animados). O trocadilho empregado como título da tira sugere que o “homem político”, confabulador e conspirador, é um animal imundo, ou seja, vicioso, moralmente condenável.
a) Que coisa é essa e por que é impossível? RESOLUÇÃO: Como o Everest é um monte do Himalaia, cordilheira situada na Ásia, não é possível “repetir o feito”, ou seja, escalar o dito monte, “em outros continentes”.
b) O que, provavelmente, a legenda da foto quer dizer?
b) A frase-título “O imundo animal” sugere um processo de prefixação. Explique. RESOLUÇÃO: A prefixação ocorre em imundo, cujo sentido é “sujo”. A palavra é formada com a adição do prefixo negativoi- a -mundo, cujo sentido é “limpo, puro”.
78 –
RESOLUÇÃO: A legenda deve querer dizer que o alpinista a que se refere a notícia pretende, em outros continentes, realizar proezas semelhantes, ou seja, escalar montes altíssimos.
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 79
5. (UNICAMP-SP) – Considere a tira abaixo:
6. (VUNESP-SP) – Esta questão toma por base uma ilustração do cartunista brasileiro Jaguar (Sérgio de Magalhães Gomes Jaguaribe, 1932) para o livro A Completa Lei de Murphy.
Nesta tira, a crítica ao “estrategista militar” não é explícita. Para compreender a tira, o leitor deve reconhecer uma alusão a um fato histórico e uma hipótese sobre transmissão genética. a) Qual é o fato histórico ao qual a tira faz alusão? RESOLUÇÃO: A tira faz alusão à Batalha de Waterloo, em queNapoleão foi vencido pelos ingleses.
Um atalho é a distância mais longa entre dois pontos. b) Qual é a explicação para as qualidades profissionais do estrategista? RESOLUÇÃO: Segundo a tirinha, as qualidades do estrategista teriam sido deter minadas pelo código genético.
(Arthur Bloch, A Completa Lei de Murphy. Traduzido e transubstanciado por Millôr Fernandes) Tomando por base que a ilustração de Jaguar se refere à chamada Lei de Murphy, cujo enunciado fundamental é “Se alguma coisa pode dar errado, dará”, a) estabeleça uma relação entre a Lei de Murphy, a legenda da ilustração e o princípio matemático que essa legenda parodia;
c) Explicite o raciocínio da personagem que critica o estrategista. RESOLUÇÃO: Para a personagem, a inépcia do estr ategista poderia explicar-se a partir da herança genética que lhe teria advindo de um antepassado, responsável por uma das mais notáveis derrotas militares da história. Assim, seu raciocínio é: se qualidades como as habilidades de um estrategista são determinadas pelo código genético, então a inépcia deste estrategista pode ser explicada pelo fato de ele descender do estrategista de Napoleão em Waterloo.
RESOLUÇÃO: O princípio em questão é o de que a reta é a menor distância entre dois pontos. Um atalho deveria ser um caminho mais curto — e o atalho em questão é uma escada, correspon dendo, portanto, a uma linha reta. Tal caminho, porém, é inviável para um automóvel. Daí que se possa invocar a “Lei de Murphy”, pois, embora haja atalho, ele é inútil: o que podia dar errado, deu.
– 79
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 80
b) demonstre em que medida os e lementos visuais da ilus tração reafirmam o conteúdo da legenda.
P O R T U G U Ê S B
RESOLUÇÃO: Os elementos visuais da ilustração indicam que o caminho desejado se situa próximo, mas separado por um muro do caminho em que se en contra o automobilista, sendo uma escada o atalho, ou seja, o meio mais curto de chegar ao caminho pretendido. Porém, como a escada é inviável para o automóvel, o atalho em questão torna-se inútil. Daí, contudo, não decorre a conclusão contida na legenda, segundo a qual “um atalho é a distância mais longa entre dois pontos”. Ou seja: os elementos visuais da ilustração não parecem “reafirmar” o conteúdo da legenda, a qual só seria de fato adequada se afirmasse que “o atalho em questão é, para um automóvel, um caminho impossível entre dois pontos” — o que eliminaria todo o humor que supostamente deveria haver na relação entre a situação representada e a legenda proposta.
MÓDULO
Interpretação de Textos (VII)
Textos para as questões de 1 a 4.
Texto 1
Este livro e o meu estilo são como os ébrios, guinam à direita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, ameaçam o céu, escorregam e caem... (Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas) Texto 2
Agora que expliquei o título, passo a escrever o livro. Antes disso, porém, digamos os motivos que me põem a pena na mão. Vivo só, com um criado. A casa em que moro é própria; fi-la construir de propósito, levado de um desejo tão particular que me vexa imprimi-lo, mas vá lá. Um dia, há bastantes anos, lembrou-me reproduzir no Engenho Novo a casa em que me criei na antiga Rua de Matacavalos, dando-lhe o mesmo aspecto e economia daquela outra, que desapareceu. (Machado de Assis, Dom Casmurro) 1. Por que se pode afirmar que os textos 1 e 2 são metalinguísticos? RESOLUÇÃO: Porque em ambos os 1,fragmentos falaSenão da obra que estáo escrevendo. No texto extraído doo narrador capítulo “O do Livro”, narrador, ao comentar seu estilo, faz referência às frequentes digressões que permeiam a narrativa. No texto 2, o narrador Bentinho, após haver explicado de que modo se srcinou o título do romance — Dom Casmurro —, faz referência à própria narrativa. Portanto, em ambos os fragmentos há metalinguagem.
80 –
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 81
2. O pronome demonstrativo ( este, esse, aquele e variações) é empregado para fazer referência a termos (pessoas, coisas etc.) já mencionados. Num texto escrito, o demonstrativo este retoma o termo mencionado por último, ao passo que o demonstrativo aquele retoma o termo mencionado primeiramente. O seguinte exemplo elucidará o que se acaba de dizer:
Texto para as questões 5 e 6.
Em relação ao texto 2, você diria que a explicação acima se aplica ao trecho: “Um dia, há bastantes anos, lembrou-me reproduzir no Engenho Novo a casa em que me criei na antiga Rua de Matacavalos, dando-lhe o mesmo aspecto e economia daquela”?
Estendeu o copo ao vinho que eu lhe oferecia, bebeu um gole e continuou a comer. Escobar comia assim também, com a cara metida no prato. Contou-me a vida na Europa, os estudos, particularmente os de arqueologia, que era a sua paixão. Falava da antiguidade com amor, contava o Egito e os seus milhares de séculos, sem se perder nos algarismos; tinha a cabeça aritmética do pai. Eu, posto que a ideia da paternidade do outro me estivesse já familiar, não gostava da ressurreição. Às vezes, fechava os olhos para não ver gestos nem nada, mas o diabrete falava e ria, e o defunto falava e ria por ele. (...) Se fosse vivo José Dias, acharia nele a minha própria pessoa. Prima Justina quis vê-lo, mas, estando enfer ma, pediu-me que o levasse lá. Conhecia aquela parenta.
RESOLUÇÃO: Não, pois no trecho de Machado de Assis, opronome demonstrativo aquela está se referindo à casa da Rua de Matacavalos, o último termo a ser mencionado. Nesse caso, o autor empregou o anafórico aquela para indicar uma distância no tempo.
(Machado de Assis, Dom Casmurro) 5. a) No trecho transcrito, o narrador nos fala de um reenco ntro. Com quem ele se reencontra?
Pedro e Paulo foram despedid os: este [Paulo], por incomp etência, aquele [Pedro] porque faltava muito ao trabalho.
RESOLUÇÃO: No trecho, o narrador, Bento Santiago — o “Dom Cas murro” — reencontra Ezequiel, o filho que “encarna” a suspeita do nar rador a respeito da infidelidade de Capitu e do amigo Escobar.
3. Na frase “Vivo só, com um criado”, há uma aparente contradição. Explique-a. RESOLUÇÃO: O narrador afirma viver só, mas na companhia de um cria do. Ou seja: ele não vive só, mas assim o considera por não contar com a companhia de parentes, amigos etc.
b) Extraia do texto uma frase em que haja ironia. RESOLUÇÃO: “Se fosse vivo José Dias, acharia nele a minha própria pessoa.”
4. “A casa em que moro é própria; fi-la construir de propósito, levado de um desejo tão particular que me vexa imprimi-lo.” No trecho acima, sem alterar o sentido srcinal, substitua as palavras própria e de, destacadas, por um pronome e por outra preposição, respectivamente. RESOLUÇÃO: A casa em que moro éminha; fi-la construir de propósito, levado por um desejo tão particular que me vexa imprimi-lo.
c) “...tinha a cabeça aritmética do pai.” – No contexto da fala do narrador, quem era o “pai”? RESOLUÇÃO: No contexto da fala do narrador, o pai era Escobar.
– 81
B S Ê U G U T R O P
B_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 29/09/10 16:17 Page 82
6. a) “Eu, posto que a ideia da paternidade do outro me estivesse já familiar, não gostava da ressurreição.” – Reescreva o período, substituindo tão somente a expressão destacada por outra que mantenha o sentido srcinal da frase. RESOLUÇÃO: Eu, embora (ainda que, mesmo que...) a ideia da pater nidade do outro me estivesse já familiar, não gostava da ressurreição. P O R T U G U Ê S B
b) “Prima Justina quis vê-lo, mas, estando enferma, pediu-me que o levasse lá.” – Substitua a oração reduzida destacada por uma desenvolvida, preservando o sentido srcinal. RESOLUÇÃO: Prima Justina quis vê-lo, mas, porque (visto que, já que, uma vez que...) estava enferma, pediu-me que o levasse lá.
82 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página I
D S Ê U G U T R O P
Português Curso Extensivo – D
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página II
P O R T U G U Ê S D
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 1
Revisão MÓDULO
PORTUGUÊS
Sintaxe (I)
1. (FUVEST-2010)
2. (UNICAMP-2010) D S Ê U G U T R O P
Uma nota diplomática* é semelhante a uma mulher da moda. Só depois de se despojar uma elegante de todas as fitas, rendas, joias, saias e corpetes, é que se encontra o exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher, conforme saiu dos prelos da natureza. É preciso desataviar uma nota diplomática de todas as frases, circunlocuções, desvios, adjetivos e advérbios, para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem.
Machado de Assis.
*Nota diplomática: comunicação escrita e oficial entre os governos de dois países, sobre assuntos do interesse de ambos. a) É correto afirmar que, segundo o texto, uma not a diplomática se parece com o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não. O texto estabelece semelhança entre o que seria a edição “aumentada e correta” da mulher e a nota diplomática, pois em ambas haveria excesso de adornos enganadores. Portanto, o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher” equivaleria à nota diplomática “desataviada” de seus excessos retóricos.
b) Tendo em vista o trecho “para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem”, indique um sinônimo da palavra “capital” que seja adequado ao contexto e identifique o referente do pronome “lhe”. RESOLUÇÃO: No contexto, capital significa “fundamental, principal, essencial”. O pronome pessoal oblíquo lhe retoma a expressão “nota diplomática”, funcionando como complemento nominal de “srcem” (“…dá srcem à nota diplomática”).
Retirada de www.eitapiula.net/2009/09/aurelio.jpg
Nessa propaganda do dicionário Aurélio, a expressão “bom pra burro” é polissêmica, e remete a uma representação de dicionário. a) Qual é essa representação? Ela é adequada ou inadequada? Justifique. RESOLUÇÃO: Trata-se da representação de dicionário contida na expressão “pai dos burros”. É evidente que se tra ta de uma representação inadequada, pois dicionários auxiliam quem deseja ou precisa co nhecer o sentido das palavras, não quem carece de inteligência, ou seja, quem é “burro”.
b) Explique como o uso da expressão “bom pra burro” produz humor nessa propaganda. RESOLUÇÃO: “Pra burro” é frequentemente associado à intensidade, quantidade, ao advérbio muito. Assim, a expressão “bom pra burro” significa “muito bom”. Ao vir junto à imagem de um dicionário, permite a associação à expressão “pai dos burros” (representação estabilizada de dicionário). O humor é provocado, portanto, pela convivência das duas associações no uso da expressão, colocando lado a lado a qualidade de ser muito bom e a imagem estereotipada de ser destinado a pessoas burras.
–1
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 2
Texto para a questão 3.
P O R T U G U Ê S D
A vida na fazenda se tornara difícil. Sinha Vitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desesperadas. Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a catinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos se torciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 3. (UNESP) – Certas expressões ganham sentidos diferentes, dependendo do contexto ou da situação em que ocor rem. Assim, os adjetivos secas ou torrados, de Vidas Secas, estão impregnados de uma conotação negativa, diferentemente de secas ou torrados em contextos como ameixas secas ou amendoins torrados, onde são positivos. Pensando nessas possibilidades, a) explique que sentido tem a expressão céu azul, para Fabiano, na frase: “No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido”. RESOLUÇÃO: A expressãocéu azul tem conotação negativa para Fabiano, pois indica que não haverá chuva e que a tão temida seca já é uma realidade inevitável.
b) construa uma frase em que o contexto atribua a essa mesma expressão uma conotação positiva. RESOLUÇÃO: “Após a tempestade, o céu azul brilhava com pro messa de bonança.”
Texto para a questão o4.cômico nasce de uma “percepção do contráPara Pirandello, rio”, como no famoso exemplo de uma velha já decrépita que se cobre de maquiagem, veste-se como uma moça e pinta os cabelos. Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso, que nasce da ruptura das expectativas, mas sobretudo do sentimento de superioridade. A “percepção do contrário” pode, porém, transformar-se num “sentimento do contrário” — quando aquele que ri procura entender as razões pelas quais a velha se mascara, na ilusão de reconquistar a juventude perdida. Nesse passo, a velha da anedota não mais está distante do sujeito que percebe, porque este pensa que também poderia estar no lugar da velha — e seu riso se mistura com a compreensão piedosa e se transforma num sorriso. Para passar da atitude cômica para a atitude humorística, é preciso renunciar ao distanciamento e ao sentimento de superioridade. (Adaptado de Elias Thomé Saliba, Raízes do riso)
ficação e à compaixão do observador, que geram humor e não propriamente comicidade.
b) “Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso (...).” Sem prejuízo para o sentido do trecho acima, rees creva-o, substituindo se perceber e produz-se por formas verbais cujo sujeito seja nós e é o oposto por não corresponde. Faça as adaptações necessárias. RESOLUÇÃO: Ao percebermos que aquela senhora velha não corresponde ao que uma respeitável velha senhora deveria ser, produzimos o riso (rimos).
Texto para a questão 5.
Em um piano distante, alguém estuda uma lição lenta, em notas graves. (...) Esses sons soltos, indecisos, teimosos e tristes, de uma lição elementar qualquer, têm uma grave monotonia. Deus sabe por que acordei hoje com tendência a filosofia de bairro; mas agora me ocorre que a vida de muita gente parece um pouco essa lição de piano. Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia. Começa a esboçar, com os pontos soltos de alguns sons, a curva de uma frase musical; mas logo se detém, e volta, e se perde numa incoerência monótona. Não tem ritmo nem cadência sensíveis. (Rubem Braga, O homem rouco) 5. (FUVEST) a) O autor estabelece uma associação poética entre a vida de muita gente e uma lição de piano. Esclareça o sentido que ganha, no contexto dessa associação, a frase: “Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia”.
RESOLUÇÃO: A frase, no contexto, significa que muitas pessoas não concluem aquilo a que se propõem ou não chegam a viver experiências que se integrem num conjunto articulado, como as palavras ou as notas musicais se integram no conjunto de uma frase linguística ou melódica, fazendo sentido ou compondo uma estrutura coerente.
4. (FUVEST)
b) “Deus sabe por que a cordei hoje com tendência a filosofia de bairro...” Reescreva a frase acima, substituindo a expressão sublinhada por outra de sentido equivalente.
a) Considerando que o atexto conceitua, qual a do diferença essencialo entre “percepção do explique contrário”brevemente e o “sentimento contrário”.
RESOLUÇÃO: Deus sabe por que acordei hoje com vontade de refletir sobre assuntos triviais (ou fatos prosaicos).
RESOLUÇÃO: A diferença essencial entre “percepção do contrário” e “sentimento do contrário” é que a primeira expressão sugere a ideia de distanciamento e superioridade do observador da cena cômica, e a segunda remete à identi-
2–
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 3
6. (FUVEST) – Considere as seguintes frases, extraídas de diferentes matérias jornalísticas, e responda ao que se pede. I. Nos últimos meses, o debate sobre o aquecimento global vem, com perdão do trocadilho, esquentando. II. Preso vigia acusado de matar empresário. a) Identifique, na frase I, o troc adilho a que se refere o redator e explique por que ele pede perdão por tê-lo produzido. RESOLUÇÃO: O trocadilho pelo qual o redator da frase se desculpa consiste no emprego do verbo esquentar no predicado de uma oração cujo sujeito é “o debate sobre o aquecimento global”. O tema em questão – o aquecimento global – associa-se, muito obviamente, à ideia de esquentar em sentido próprio (“aquecer-se”), daí derivando o emprego trocadilhesco desse verbo em
b) É correto afirmar que na frase II ocorre am biguidade? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Sim, é correto afirmar que a frase II é ambígua, porque ela pode ser entendida de duas formas, a saber: (1) foi preso o vigia acusado de matar empresário, e (2) um preso vigia o acusado de matar empresário.Vigia, na interpretação (1), é substantivo; na interpretação (2), é a terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo vigiar, complementado pelo objeto direto acusado. O par ticí pio preso tem força verbal em (1), funcionando, na fórmula sintética da manchete jornalística, como par te da locução da voz passiva “foi preso”; em (2), porém, o mesmo particípio tem sentido nominal, funcionando como adjetivo substantivado (o preso, um preso).
sentido figurado (“acirrar-se, A obviedade da associação aquecimento/esquentar – é queagravar-se”). seria responsável pelo retórico pedido de– desculpas.
MÓDULO
Sintaxe (II)
1. (UNICAMP-SP)
Matte a vontade. Matte Leão. Este enunciado faz parte de uma propaganda afixada em lugares nos quais se vende o chá Matte Leão. Observe as construções abaixo, feitas a partir do enunciado em questão: Matte à vontade. Mate a vontade. Mate à vontade. a) Complete cada uma das construções acima com palavras ou expressões que explicitem as leituras possíveisrelacionadas à propaganda. RESOLUÇÃO: Beba chá Matte (Leão) à vontade. Mate a vontade de tomar chá Matte (Leão). Beba (chá) mate à vontade. / Mate à vontade sua sede.
b) Retome a propaganda e explique o seu funcionamento, explicitando as relações morfológicas, sintáticas e semânticas envolvidas. RESOLUÇÃO: A propaganda explora justamente as diferentes possibilidades apresentadas no item a: • “Matte à vontade.” – O sentido é de haver chá da marca anunciada em grande quantidade, de forma a satisfazer quem desejar tomá-lo. Nessa frase, “à vontade” é locução adverbial e “Matte”, por seu duplo t, faz alusão à marca em questão. • “Mate a vontade.” – A frase, de teor conativo — imperativo ou exortativo —, conclama o receptor a satisfazer seu desejo. Aqui, “mate” é forma verbal do imperativo dematar, verbo usado como catacrese procedente de metáfora (matar = “satisfazer”); “a vontade” é um sintagma nominal que complementa o verbo (objeto direto). • “Mate à vontade”. Aqui a palavra “mate” é substantivo comum, e não se refere, portanto, à marca de chá. Poder-se-ia também entender “mate” como a forma verbal do imperativo do verbo matar (Mate sua sede à vontade com chá mate). Em ambas as interpretações, “à vontade” é locução adverbial.
–3
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 4
2. (UNICAMP-SP) – O Caderno “Aliás Debate” do Estado de S.Paulo, de 18/08/2006, apresenta uma matéria com o título: “Nas fres tas e brechas da segurança”. A matéria se inicia com o seguinte trecho:
3. (UFSCar) – Contemple a charge:
“Estamos nas frestas, procurando as brechas”. Esta boa frase, que circulou em manifesto atribuído ao PCC e ao seu líder (...), Marcola, resume bem o que pretende a organização criminosa que vem atacando a maior cidade brasileira. (p. 2) P O R T U G U Ê S D
a) Como você interpreta “frestas” e “brechas” em “Estamos nas frestas, procurando as brechas”? RESOLUÇÃO: As frestas, no contexto, sugerem o espaço “estreito” representado pela prisão ou mesmo pela situação de quem “está à es preita” buscando “brechas”, ou seja, aberturas para contornar ou burlar as restrições do sistema prisional e do próprio Poder Judiciário.
(Correio Popular, 10/10/2006.) Trata-se de uma charge publicada por um jornal brasileiro por ocasião da eleição do sul-coreano Ban Ki-Moon, como presidente da ONU, e da realização de um teste nuclear a mando do ditador norte-coreano Kim Jong-il. a) Como a diferença de emprego sintático do verbo vencer modifica o sentido das duas frases? RESOLUÇÃO: Na primeira frase, o verbovencer é intransitivo e vem acompanhado de um adjunto adverbial de lugar, “na ONU”. Na segunda frase, o verbo vencer é transitivo direto e tem como objeto direto “ONU”. Ou seja: no primeiro caso, a vitória ocorreu na ONU; no segundo, a ONU foi derrotada.
b) Levando em consideração que “Nas frestas e brechas da segurança” é o título da matéria, como você interpreta esse enun ciado comparandoo à frase atribuída a Marcola? RESOLUÇÃO: No título da matéria, as palavras “frestas” e “brechas” conotam a fragilidade, a ineficácia do sistema de segurança pública, o qual dá muito espaço à ação criminosa. No enunciado de Marcola, a palavra brecha conota o espaço de ação possível para um presidiário. Pode-se mencionar, ainda, que, no título da matéria, “frestas” e “brechas” são quase como sinônimos.
b) “Reconstrua” as duas frases, de maneira que os sentidos sugeridos pelas imagens fiquem, também, explícitos no texto escrito. RESOLUÇÃO: A primeira frase ficaria: “Sul-coreano vence eleição para presidência da ONU”. A segunda poderia ser apresentada desta forma: “Norte-coreano vence confronto com a ONU”.
4–
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 5
4. (UNICAMP-2010)
D S Ê U G U T R O P
5. (FUVEST)
Devemos misturar e alternar a solidão e a comunicação. Aquela nos incutirá o desejo do convívio social, esta, o desejo de nós mesmos; e uma será o remédio da outra: a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão. (Sêneca, Sobre a tranquilidade da alma, Trad. de J. R. Seabra Filho.) Quino, Toda Mafalda. São Paulo: Editora Martins Fontes, 6ª. Edição, 2003.
Nessa tirinha da famosa Mafalda do argentino Quino, o humor é construído fundamentalmente por um produtivo jogo de referência. a) Explicite como o termo ‘estrangeiro’ é entendido pela personagem Mafalda e pelo personagem Manolito. RESOLUÇÃO: Para Mafalda, estrangeiro é todo país que não seja o dela. Para Manolito, estrangeiro é todo país que não seja a pátria, ou seja, aquele em que a
a) Segundo Sêneca, a solidão e a comunicação devem ser vistas como complementares porque ambas satisfazem um mesmo desejo nosso. É correta essa interpretação do texto acima? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois solidão e comunicação correspondem a diferentes desejos do ser humano: a solidão supre a necessidade de isolamento, a comunicação satisfaz nossa carência de relacionamento social.
pessoa nasceu. O equívoco de Mafalda resulta em ela não entender que o seu país é estrangeiro para quem tenha nascido fora dele.
b) “(...) a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão.” Sem prejuízo para o sentido srcinal, reescreva o trecho acima, inician do-o com “Nossa aversão à multidão...” b) Identifique duas palavras que, nessa tirinha, contri buem para a construção desse jogo de referência, explicando o papel delas. RESOLUÇÃO: As palavras centrais no mencionado “jogo de referência” são os artigos o
RESOLUÇÃO: Nossa aversão à multidão será curada pela solidão; o tédio à solidão será curado pela multidão.
e um. Para sendo Mafalda, usa o estrangeiros. artigo definido, seu é o país estrangeiro, todosque os demais ParaoManolito, o paísnão de Mafalda é um país, estrangeiro para os que procedam de outros países. Há ainda outros referentes; para Manolito, “pátria dele” refere-se ao país de srcem de seu pai e cá (Argentina) indica o país de destino de seu pai. Para Mafalda, este refere-se à Argentina, sua pátria, que não é, portanto, um país estrangeiro.
–5
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 6
6. (FUVEST) a) “Se eu não tivesse atento e olhado o rótulo, o pa ciente teria morrido”, declarou o médico. Reescreva a frase acima, corrigindo a impropriedade gramatical que nela ocorre.
P O R T U G U Ê S D
RESOLUÇÃO: “Se eu não estivesse atento e não tivesse olhado o ró tulo, o paciente teria morrido”, declarou o médico. (A impropriedade estava no emprego do auxiliar ter, em vez de estar, com o particípio atento.)
MÓDULO
BRASI DE CIMA E BRASI DE BAXO
Inquanto o Brasi de Cima Fala de transformação, Industra, matéra prima, Descobertas e invenção, No Brasi de Baxo isiste O drama penoso e triste Da negra necissidade; É uma cousa sem jeito E o povo não tem dereito Nem de dizê a verdade. No Brasi de Baxo eu vejo Nas ponta das pobre rua O descontente cortejo De criança quage nua. Vai um grupo de garoto Faminto, doente e roto Mode caçá o que comê Onde os carro põe o lixo, Como se eles fosse bicho Sem direito de vivê.
6–
RESOLUÇÃO: “Os ambientalistas defendem a econologia – com binação de princípios da economia, sociologia e ecologia – como maneira de viabilizar as formas alternativas de desenvolvimento.” (Notar: 1. que há duas construções na voz passiva, uma analítica – “é defendida” –, outra sintética ou pronominal – “se viabilizarem”; 2. que é conveniente, na voz ativa, alternativa pontuação para separar o aposto – “combinação…” – e o predicativo do objeto – “como maneira…”).
Sintaxe (III)
Instrução: As questões de números 1 a 4 tomam por base um poema do repentista cearense Patativa do Assaré (1909-2002) e uma passagem do livro O discípulo de Emaús de Murilo Mendes (1901-1975):
[...]
b) “A econologia, combinação de princípios da economia, sociologia e ecologia, é defendida por ambientalistas como maneira de se viabilizarem formas alternativas de desenvolvimento.” Reescreva a frase acima, transpondo-a para a voz ativa.
Estas pequenas pessoa, Estes fio do abandono, Que veve vagando à toa Como objeto sem dono, De manêra que horroriza, Deitado pela marquiza, Dromindo aqui e aculá No mais penoso relaxo, É deste Brasi de Baxo A crasse dos marginá. Meu Brasi de Baxo, amigo, Pra onde é que você vai? Nesta vida do mendigo Que não tem mãe nem tem pai? Não se afrija, nem se afobe, O que com o tempo sobe, O tempo mesmo derruba; Tarvez ainda aconteça Que o Brasi de Cima desça E o Brasi de Baxo suba. Sofre o povo privação Mas não pode recramá, Ispondo suas razão Nas coluna do jorná. Mas, tudo na vida passa, Antes que a grande desgraça Deste povo que padece Se istenda, cresça e redrobe, O Brasi de Baxo sobe E o Brasi de Cima desce.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 7
Brasi de Baxo subindo, Vai havê transformação Para os que veve sintindo Abondono e sujeição. Se acaba a dura sentença E a liberdade de imprensa Vai sê legá e comum, Em vez deste grande apuro, Todos vão tê no futuro Um Brasi de cada um.
D S Ê U G U T R O P
Brasi de paz e prazê, De riqueza todo cheio, Mas, que o dono do podê
2. (UNESP-julho-2010) – Patativa do Assaré criou um discurso
Respeite o dereito aleio. Um grande e rico país Munto ditoso e feliz, Um Brasi dos brasilêro, Um Brasi de cada quá, Um Brasi nacioná Sem monopolo istrangêro.
poemático peculiar, fala próprias popular normas e rural. ortográficas, Por isso, ao escrever seus poemas,que usaestiliza tambéma suas bem como “regras” gramaticais desse linguajar do povo. Releia atentamente a terceira estrofe do poema e a reescreva em discurso considerado culto, sem se preocupar com a quebra do ritmo ou da rima.
(Patativa do Assaré [Antônio Gonçalves da Silva]. Cante lá que eu canto cá. 6.ª Ed. Crato: Vozes/Fundação Pe. Ibiapina/Instituto Cultural do Cariri. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1986.)
O DISCÍPULO DE EMAÚS
A harmonia da sociedade somente poderá ser atingida mediante a execução de um código espiritual e moral que atenda, não só ao bem coletivo, como ao bem de cada um. A conciliação da liberdade com a autoridade é, no plano político, um dos mais importantes problemas. A extensão das possibilidades de melhoria a todos os membros da sociedade, sem distinção de raças, credos religiosos, opiniões políticas, é um dos imperativos da justiça social, bem como a apropriação pelo Estado dos instrumentos de trabalho coletivo. (Murilo Mendes. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994.)
1. (UNESP-julho-2010)– Os dois fragmentos apresentados focalizam o mesmo tema de formas diferentes, em poesia e em prosa. Em seu poema, Patativa do Assaré reclama, entre outras coisas, da falta de liberdade sofrida pelo povo do Brasi de Baxo. No segundo período do fragmento de Murilo Mendes a mesma questão é abordada sob outro ponto de vista. Explique o que se fala nesse fragmento a respeito da liberdade. RESOLUÇÃO: A questão formulada em termos gerais, abstratos, por Murilo Mendes – “a conciliação da liberdade com a autoridade” – toca no problema nacional que motiva a indignação de Patativa do Assaré, seja nas recla mações sobre a falta de liberdade para o “Brasi de Baxo” exprimir suas justas reclamações e demandas, seja nas queixas sobre o abuso de quem detém a autoridade (o “dono do Podê”), que não respeita o “dereito aleio”. Murilo Mendes, no trecho referido, reconhece, em sentido amplo, que o problema é “dos mais importantes”, sem mais especificações e pare cendo associá-lo, em seguida, a um ideal amplo, coletivista e socializante de “justiça social”.
RESOLUÇÃO: Estas pequenas pessoas, Estes filhos do abandono, Que vivem vagando à toa Como objetos sem dono, Que causam horror Deitados sob marquises, Dormindo aqui e acolá No mais penoso abandono É deste Brasil de Baixo A classe dos marginais.
3. (UNESP-julho-2010) – Relendo o primeiro período do fragmento de Murilo, podemos até imaginá-lo como uma resposta à sexta estrofe do poema de Patativa. Compare ambas as passagens e, a seguir, explique o que Murilo sugere para que na sociedade se possa atingir, como diz um texto, Um Brasi de cada um, ou o outro texto, o bem de cada um. RESOLUÇÃO: Somente pode haver a transformação idealizada no texto de Patativa do Assaré (“Brasi de Baxo subindo”, “liberdade de imprensa”), ou seja, ascensão dos desfavorecidos e liberdade política, caso haja, segundo o texto de Murilo Mendes, a “execução de um código espiritual e moral” que atenda a todos os brasileiros, não apenas a um grupo de privilegiados.
–7
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 8
4. (UNESP-julho-2010) – Como Patativa imita o linguajar do povo, seu discurso poemático incorpora regras gramaticais desse linguajar, que não são as mesmas da norma culta. Estabeleça a diferença entre a concordância verbal utilizada pelo poeta nos versos Onde os carro põe o lixo, / Como se eles fosse bicho e a que se observa na norma culta.
P O R T U G U Ê S D
RESOLUÇÃO: Nesses versos, a concordância, conforme a variante popular, flexiona em número apenas o determinante (artigo) e o pronome, pois, segundo a gramática desse linguajar, a flexão de substantivos e verbos seria redundante. Trata-se de uma regra de economia linguística. Na norma culta, os verbos devem flexionar-se no plu ral, concordando com os sujeitos os carros e eles.
b) No trecho “...quando haviam no mundo mulheres como Vidinha”, ocorre uma construção tida como incorreta, pois está em desacordo com o uso culto da língua portuguesa. De que se trata? Corrija o erro. RESOLUÇÃO: O verbo haver, no sentido de “existir”, é impessoal, devendo permanecer na terceira pessoa do singular: “...quando havia no mundo...”.
6. (FUVEST) – Não tenho dúvidas de que a reportagem esteja à procura da verdade, mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita com base exclusivamente em documentos da polícia política. (O Estado de S.Paulo)
Texto para a questão 5.
[...] admirava-se ele de como é que havia podido incli nar-se por um só instante a Luisinha, menina sensaborona e esquisita, quando haviam no mundo mulheres como Vidinha. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 5. (FUVEST) a) Em “...admirava-se ele de como é que havia podido inclinar-se...”, o sujeito da locução verbal destacada é elíptico e está no singular ( ele). Se o sujeito fosse composto (com dois ou mais núcleos) ou plural, essa locução verbal sofreria uma alteração. Qual seria? Justifique. RESOLUÇÃO: O verbo haver deveria concordar com o sujeito plural:haviam podido. Nas locuções verbais, a flexão de número recai sobre o verbo auxiliar e, no trecho dado, o verbo haver foi empregado como auxiliar do verbopoder. Não se deve, portanto, confundir esse emprego com o caso em que tal verbo é usado na acepção de “existir”, o que obrigaria a concordância exclusiva com a terceira pessoa do singular.
8–
Das duas ocorrências de de que, no excerto acima, uma está correta e a outra não. a) Justifique a correta. RESOLUÇÃO: A primeira ocorrência é a correta. Em “Não tenho dúvidas de que a reportagem...”, o uso da preposiçãode, diante da conjunção subordinativa integrante que, é obrigatório, já que a aludida preposição é regida pelo substantivo dúvidas.
b) Corrija a incorreta, dizendo por quê. RESOLUÇÃO: “... mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita...” Está de. O verbo ressalvar incorreta porque não há termo regente de preposição é transitivo direto, não exigindo, pois, preposição em seu complemento.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 9
Sintaxe (IV)
MÓDULO 1. (UNICAMP-2010)
NÃO DIGA SANDICES, MEU JOVEM. PERCEBA A GRANDEZA DESSE MOMENTO.
SABIA QUE ACABA DE SER ASSINADO O
MAIS UM TROÇO INÚTIL, EMPURRADO GOELA ABAIXO!
ESTAMOS FALANDO DA UNIFICAÇÃO DO NOSSO IDIOMA ESCRITO. DA PADRONIZAÇÃO
DA LÍNGUA!
ESTE LIVRO, POR EXEMPLO,
HÚÚMM...
ESTÁ ADAPTADO. ..SAINDO DABICHA, ÉDE JÁPORTUGAL EPODE SER PUBLICADO POR AQUI FUI TOMAR UMABICA SEM MUDAR UMA ANTES DE IR COMPRAR UM PAR DE VÍRGULA PEÚGAS. ?! SEQUER. ´´
´´
BICA...? PEÚGAS...?
2. (UNICAMP) – Leia os seguintes artigos do Capítulo VIII do novo Código Civil (Lei no. 10.406, de 10 de janeiro de 2002): Art. 1.548. É nulo o casamento contraído: I. pelo enfermo mental sem o necessário discer nimento para os atos da vida civil; II. por infringência de im pedimento. (...) Art. 1.550. É anulável o casamento: I. de quem não completou a idade mínima para casar; (...) VI . por incompetência da autoridade celebrante.
ALÁ!! NÃO FALEI?! NÃO FALEI?!
Retirada de www.miriamsalles.info/wp/wp-content/uploads/acord
a) Os enunciados que introduzem os artigos 1.548 e 1.550 têm sentido diferente. Explique essa diferença, comparando, do ponto de vista morfológico, as palavras nulo e anulável. RESOLUÇÃO: Nulo significa, no contexto, “sem valor, sem efeito por falta de uma formalidade fundamental”; anulável significa “que pode ser tornado nulo”. Portanto, entende-se que, nos termos do artigo1.548,não tem efeito o casamento contraído por “enfermo mental sem discernimento para os atos da vida civil” ou por pessoa sob impedimento; nos termos do artigo 1.550, entende-se que podem ser anulados os casamentos contraídos por menores ou celebra dos por pessoa não autorizada. A diferença morfológica – e, em consequência, semântica – entre os adjetivos nulo e anulável está em que o último se forma por derivação sufixal, a partir do verbo anular – por isso com a raiz nul- acrescida do prefixo a-. O sufixo empregado, -vel , significa “passível de”.
a) Qual é o pressuposto da personagem que defende o acordo ortográfico entre os países de língua portuguesa? Por que esse pressuposto é inadequado? RESOLUÇÃO: O pressuposto é que o Acordo promoveria a uniformização do português escrito, permitindo que livros portugueses se publicassem no Brasil sem nenhuma alteração. Tal pressuposto é des mentido pela simples leitura de algumas linhas de um livro português, linhas nas quais avultam as diferenças entre o vocabulário português e o brasileiro.
b) Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), infringência vem de infringir (violar, transgredir, desrespeitar) +ência. Compare o processo de formação dessa palavra com o de incompetência, indicando eventuais diferenças e semelhanças.
b) Explique como, na tira acima, esse pressuposto é quebrado. RESOLUÇÃO: A grande diferença lexical, que a leiturarevela, entre o português lusitano e o brasileiro constitui, como sugere a historieta, um obstáculo muito mais grave à compreensão mútua do que as diferenças gráficas que o Acordo Ortográfico busca superar.
RESOLUÇÃO: Infringência significa “ato de infringir”; incompetência significa “falta de competência”. Em ambas as palavras encontram-se os mesmos pre fixo (in) e sufixo (-ência). Infringência , porém, forma-se por derivação sufixal, pois o prefixo faz parte do verbo, infringir (“desobedecer, descumprir”), a cujo radical se juntou o sufixo ência, formador de substantivo abstrato, ao passo que em incompetência ocorre derivação prefixal, pois o prefixo in-, de sentido negativo, se junta ao substantivo competência.
–9
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 10
3. (UNICAMP) – Reportagem da Folha de S. Paulo informa que o presidente do Brasil assinou decreto estabelecendo prazos para o País colocar em prática o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que unifica a ortografia nos países de língua portuguesa. Na matéria, o seguinte quadro comparativo mostra alterações na ortografia estabelecidas em diferentes datas: P O R T U G U Ê S D
Após as reformas de 1931 e Êles estão tranqüilos, porque prova1943: velmente não crêem em fantasmas. Após as alterações de 1971:
b) O excerto transcrito apresenta uma ironia. Em que con siste essa ironia? Justifique. RESOLUÇÃO: A ironia do articulista refere-se à suposição, que fundamenta o Acordo, de que pequenas alterações ortográficas sejam suficientes para promover ou facilitar de maneira significativa o intercâmbio cultural entre os países lusófonos. Ao referir-se a lugares remotos e ignorados, o articulista, além de dar expressão a preconceitos sociais e culturais, pretende sugerir que o “atraso” – econômico, social, cultural – presumível em tais cidades seja o principal problema a travar as relações culturais entre os países envolvidos.
Eles estão tranqüilos, porque provavelmente não crêem em fantasmas.
Após o novo acordo, a vigorar Eles estão tranquilos, porque provaa partir de janeiro de 2009 velmente não creem em fantasmas. Sobre o acordo, a reportagem ainda informa:
As regras do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entram em vigor no Brasil a partir de janeiro de 2009, vão afetar principalmente o uso dos acentos agudo e circunflexo, do trema e do hífen. Cuidado: segundo elas, você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia. (...) (Adaptado de E. Simões, “Que língua é essa?”. Folha de S.Paulo, Ilustrada, p. 1, 28/09/2008.) a) O excerto acima supõe que alterações ortográficas modifiquem o modo de falar uma língua. Mostre a palavra utilizada que permite essa interpretação. Levando em consideração o quadro comparativo das mudanças ortográficas e a suposição expressa no excerto, explique o equívoco dessa suposição. RESOLUÇÃO: Ao concluir que “você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia”, o jornalista usou o verbo dizer em lugar de
escrever, induzindo o leitor em erro, ao sugerir que a reforma afetaria o modo de falar das pessoas. O quadro comparativo apresentado seria suficiente para desmentir a sugestão do jornalista, pois nele se vê que não houve alteração na pronúncia das palavras, mas apenas na sua grafia.
4. (FUVEST) – Leia o seguinte texto, extraído de uma biografia do compositor Carlos Gomes.
No ano seguinte [1860], com o objetivo de consolidar sua formação musical, [Carlos Gomes] mudou-se para o Rio de Janeiro, contra a vontade do pai, para iniciar os estudos no conservatório da cidade. “Uma ideia fixa me acompanha como o meu destino! Tenho culpa, porventura, por tal cousa, se foi vossemecê que me deu o gosto pela arte a que me dediquei e se seus esforços e sacrifícios fizeram-me ganhar ambição de glórias futuras?”, escreveu ao pai, aflito e cheio de remorso por tê-lo contrariado. “Não me culpe pelo passo que dei hoje. [...] Nada mais lhe posso dizer nesta ocasião, mas afirmo que as minhas intenções são puras e espero desassossegado a sua bênção e o seu perdão”, completou. (http://musicaclassica.folha.com.br) a) Sobre o advérbio “porventura”, presente na carta do compositor, o dicionário Houaiss informa: usa-se em frases interrogativas, especialmente em perguntas delicadas ou retóricas. Aplica-se ao texto da carta essa informação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A pergunta modulada pelo advérbioporventura é claramente retórica, ou seja, é uma afirmação sob a forma de pergunta, pois nela o autor sugere ter sido o próprio pai o “culpado” de seu “gosto pela arte”, um gosto que então o levaria a contrariar determinações paternas.
Ainda sobre a reforma ortográfica, Diogo Mainardi escreveu o se guinte:
Eu sou um ardoroso defensor da reforma ortográfica. A perspectiva de ser lido em Bafatá, no interior da Guiné-Bissau, da mesma maneira que sou lido em Carinhanha, no interior da Bahia, me enche de entusiasmo. Eu sempre soube que a maior barreira para o meu sucesso em Bafatá era o C mudo [como em facto na ortografia de Portugal] (...) (D. Mainardi, “Uma reforma mais radical”. Revista VEJA, p. 129, 8/10/2008.)
10 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 11
b) Cite duas palavras, também empregadas pelo com positor, que atestem, de maneira mais evidente, que, daquela época para hoje, a língua portuguesa sofreu modificações. RESOLUÇÃO: As formas cousa e vossemecê, hoje desusadas no Brasil, atestam a evolução da língua. As formas hoje correntes dessas palavras são coisa e você. (O mesmo não seria verdade para Portugal, onde também a língua evoluiu, evidentemente, no último século e meio, e onde também as referidas pala vras se transformaram, mas onde ainda são cor rentes, em certos dialetos, as duas formas mais antigas.)
5. (UNICAMP)
a) A primeira tira é uma tradução portuguesa e a segunda, uma tradução brasileira. Dê um exemplo de uma diferença sintática entre a tradução do português europeu e a do português brasileiro. Descreva essa diferença. RESOLUÇÃO: A fala da mãe de Calvin, no último quadrinho, sem fugir ao coloquial lusitano, corresponde à norma culta quanto ao emprego do pronome oblíquo o como objeto direto depôr e sujeito de comer. No português do Brasil, a construção “fazer ele comer” corresponde à variante coloquial popular, que discrepa da norma culta, pois apresentao pronome retoele em função de objeto direto defazer. Outra diferença sintática significativa entre a tradução portuguesa e a brasileira se encontra nas construções “que te transformará”/“que irá te transformar”, no segundo quadrinho. Na versão portuguesa ocorre próclise do pronome oblíquo átono em construção com o futuro. Tal próclise seria justificada, nos termos da gramática normativa, pela “atração” exercida pronomebrasileira, relativo que, impeditiva da mesóclise transformar-te-á . Napelo tradução a construção “que irá te transformar” desrespeitaria tanto a “regra” da atração do pronome oblíquo (cuja observância resultaria em “que te irá transformar”) quanto, segundo a análise convencional, a interdição de ênclise com o futuro. Em “irá te transformar”, porém, não ocorre a ênclise condenada irá-te, mas sim, de acordo com a tendência geral da linguagem coloquial brasileira, a próclise “te transformará”. Ainda no segundo quadrinho, uma diferença sintática expressiva pode ser notada no confronto entre a uniformidade do tratamento em segunda pessoa, que se observa na versão portuguesa (te e comeres), e a falta de uniformidade presente na versão brasileira, com a mistura de segunda e terceira pessoa nos pronomes e na flexão verbal (te e você comer). A diferença entre as construções com o verbo ter, regendo preposição ou conjunção com função prepositiva – “tem de” (versão portuguesa) e “tem que” (versão brasileira) –, não chega a ser uma diferença propriamente sintática nem é significativa da diferença entre o português dos dois países, pois ter que também se usa em Portugal. Observe-se, porém, que gramáticos mais empedernidamente autoritários em sua “defesa” da tradição linguística (Napoleão Mendes de Almeida, por exemplo) consideram que as duas construções não se equivalem e devem ser usadas em contextos linguísticos diversos e com sentidos diferentes.
b) Explique a diferença de sentido entre os verbos ter e haver em “Tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!”, na segunda tirinha. RESOLUÇÃO: A frase “tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!” apresenta o verbo ter com sentido de “dever” e haver com significado de “existir”, como é corrente no coloquial brasileiro.
– 11
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 12
MÓDULO
P O R T U G U Ê S D
Sintaxe (V)
1. (UNICAMP) – As gramáticas costumam definir os tempos verbais de forma simplificada. C. Cunha e L. Cintra, por exemplo, em suaNova Gramática do Português Contemporâneo , dizem que “o futuro designa um fato ocorrido após o momento em que se fala” . Observe como Bastos Tigre joga com essa noção de futuro para dar uma interpretação engraçada do sétimo mandamento.
Não furtarás – prega o Decálogo e cada homem deixa para amanhã a observância do sétimo mandamento. (citado por Mendes Fradique em sua Grammatica
b) Tanto sou como é são formas de presente do indicativo. Apesar disso, a visão de tempo que elas transmitem não é a mesma em uma e outra. Em que consiste essa diferença? RESOLUÇÃO: Sou tem o valor de presente propriamente dito: enuncia um fato contemporâneo, algo que ocorre no mesmo momento em que se dá a enunciação. Quanto a é, em “O que é uma coisa bela?”, seu valor é atemporal, pois enuncia algo que não se limita ao momento da enunciação. É o que se chamapresente durativo ou universal, por indicar ações e estados permanentes, como, por exemplo, uma verdade científica, um dogma, um artigo de lei etc.
Portugueza pelo Methodo Confuso, 1928) a) Qual a interpretação usual (feita, por exemplo, por um rabino, um pastor ou um padre) desse mandamento? RESOLUÇÃO: O homem não deve furtar em tempo algum. O futuro tem valor de imperativo.
b) Qual a interpretação feita por Bastos Tigre? RESOLUÇÃO: A interpretação é literal. O homem furta a todo momento, deixando a aplicação do mandamento para os dias vin douros.
2. (FUVEST) (...) O antropólogo Claude Lévi-Strauss detestou a Baía de Guanabara Pareceu-lhe uma boca banguela. E eu, menos a conhecera mais a amara? Sou cego de tanto vê-la, de tanto tê-la estrela O que é uma coisa bela? (Caetano Veloso,O Estrangeiro) a) Na linguagemliterária, muitas vezes,o mais-que-perfeito doindicativo substitui outras formas verbais, como no verso: “E eu, menos a conhecera mais a amara?”. Reescreva-o, usando as formas que o maisque-perfeito substituiu. RESOLUÇÃO: “E eu, menos a conhecesse mais a amaria? As formas do mais-que-perfeito do indicativo conhecera e amara substituem o imperfeito do subjuntivo conhecesse e o futuro do pretérito do indicativo amaria, respectivamente.
12 –
Leia o texto seguinte.
Desculpe-nos pela demora em responder a sua reclamação sobre a sua TV de plasma. Precisávamos ter a certeza de que a nossa matriz aqui no Brasil estaria nos enviando a referida peça. Na próxima semana, estaremos fazendo uma revisão geral no aparelho e vamos estar enviando ele para o senhor. Atenciosamente... (Texto do e-mail de uma empresa, justificando o atraso em consertar um aparelho eletrônico.) 3. (UFSCar) – Observa-se, nesse texto, um problema de estilo comum nas correspondências comerciais e nas comunicações de telemarketing e também um desvio da norma padrão do português do Brasil. a) Identifique o problema de estilo e redija o trecho em que ele ocorre, corrigindo-o. RESOLUÇÃO: O “problema de estilo” consiste no hábito corrente de substituir formas verbais simples por locuções com o verbo auxiliar estar seguido do gerúndio do verbo principal. Assim, no texto transcrito, “es taria… enviando” substitui “enviaria”; “estaremos fazendo” substitui “faremos” e “vamos estar enviando” substitui “vamos enviar”. Reescrito e melhorado em alguns pontos, o trecho em questão poderia assumir a seguinte forma: “Precisávamos ter certeza de que a nossa matriz no Brasil nos enviaria a referida peça. Na próxima semana,faremos uma revisão geral no aparelho e o enviaremos ao senhor”.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 13
5. (FUVEST) – Leia o excerto, observando as diferentes formas verbais.
b) Identifique o desvio e redija o trecho em que ele ocorre, corrigido. RESOLUÇÃO: O “desvio da norma padrão” do Português, não ape nas do Brasil, está no emprego do pronome retoele em função de objeto, na qual seria de regra o pronome oblíquo o: “vamos enviá-lo”.
Chegou. Pôs a cuia no chão, escorou-a com pedras, matou a sede da família. Em seguida acocorou-se, remexeu o aió, tirou o fuzil, acendeu as raízes de macambira, soprou-as, inchando as bochechas cavadas. Uma labareda tremeu, elevou-se, tingiu-lhe o rosto queimado, a barba ruiva, os olhos azuis. Minutos depois o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim. Eram todos felizes. Sinha Vitória vestiria uma saia larga de ramagens. A cara murcha de sinha Vitória remoçaria (...). (...) A fazenda renasceria – e ele, Fabiano, seria o vaqueiro, para bem dizer seria dono daquele mundo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) a) Considerando que no primeiro parágrafo predomina o pretérito perfeito, justifique o emprego do imperfeito em “... o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim”.
Texto para a questão 4.
RESOLUÇÃO: As formas do pretérito perfeito indicam ações pontuais, concluídas no passado; o imperfeito indica ação em decurso no passado. O efeito narrativo do imperfeito, no caso, é atribuir vivacidade à ação, apresentando-a em seu desdobramento.
No dia em que o país dispor de uma moeda mais competitiva, poderá se transformar em potência comercial porque finalmente aprendeu a desenvolver inteligência comercial. (Luís Nassif, Agência Dinheiro Vivo, www.luisnassif.com.br, 7/7/2010) 4. a) O texto acima apresenta um ponto em que se afasta da norma culta. Aponte-o, comente-o e corrija-o. RESOLUÇÃO: A forma verbal dispor, que deveria estar no futuro do subjuntivo, pois enuncia uma possibilidade futura, foi confundida com o infinitivo. A forma correta seria dispuser.
b) Explique o efeito de sentido produzido no excerto pelo emprego do futuro do pretérito. RESOLUÇÃO: O perfeito e o imperfeito relatam fatos; o futuro do pretérito registra desejos, aspirações, fantasias da personagem (sinalizando, portanto, discurso indireto livre).
b) Tal como está redi gido, o texto pare ce afirmar que o pa ís já aprendeu a “desenvolver inteligência comercial”. O sentido sugerido pelo contexto é, porém, outro: que o desenvolvimento de “inteligência comercial” só se dará quando o país contar com “uma moeda mais competitiva”. Para que se explicite com precisão este último sentido, como ficaria a redação da frase a partir de “... porque finalmente...”? RESOLUÇÃO: ... porque finalmente terá aprendido a desenvolver inteligência comercial.
– 13
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 14
Texto para a questão 6.
P O R T U G U Ê S D
Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade. A obesidade não foge à regra. Na Idade Média, a sociedade considerava a hanseníase um castigo de Deus para punir os ímpios. No século 19, quando proliferaram os aglomerados urbanos e a tuberculose adquiriu características epidêmicas, dizia-se que a enfermidade acometia pessoas enfraqueci das pela vida devassa que levavam. Com a epidemia de Aids, a mesma história: apenas os promíscuos adquiririam o HIV. Coube à ciência demonstrar que são bactérias os agentes causadores de tuberculose e da hanseníase, que a Aids é transmitida por um vírus e que esses micro-organismos são alheios às virtudes e fraquezas humanas: infectam crianças, mulheres ou homens, não para puni-los ou vê-los sofrer, mas Tanto porquesepretendem e multiplicar-se como todos os seres vivos. lhes dá se crescer o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. (...) (Drauzio Varella,Folha de S.Paulo, 12/11/2005) 6. (FUVEST) a) Crie uma frase com a palavra “obesidade” que possa ser acres centada ao final do 2.° parágrafo sem quebra de coerência.
b) Fazendo as adaptações necessárias e respeitando a equivalência de sentido que a expressão “Tanto se lhes dá (...)” tem no texto, proponha uma frase, substituindo o pronome lhes pelo seu referente. RESOLUÇÃO: Pouco importa a esses micro-organismos se o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. A formulação deste quesito não é inteiramente precisa, pois não se esclarece se o pronome lhes deve ser substituído por seu referente em suas duas ocorrências na frase ou, o que parece mais razoável, apenas na primeira, na expressão cujo sentido se questiona. Outro defeito na formulação deste quesito se encontra no trecho “respeitando a equivalência de sentido que a expressão ‘Tanto se lhes dá (...)’ tem no texto”. Esse trecho deveria ser substituído por uma redação mais simples, direta e precisa: mantendo-se o sentido que a expressão “Tanto se lhes dá” tem no texto, pois não é a “equivalência de sentido que a expressão... tem no texto” que se quer respeitada.
RESOLUÇÃO: Nos nossos dias, é comum atribuir às pessoas obesas a culpa por sua obe sidade, como se sua condição fosse apenas resultado de seu descomedimento ao comer. A frase deve encaixar-se na série de exemplos contida no segundo pará grafo. Tais exemplos ilustram a primeira afirmação do texto: “Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade.” O caso da obesidade seria a ilustração da afirmação complementar do parágrafo inicial: “A obesidade não foge à regra.”
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (I)
1. (UNICAMP-SP) – Na seguinte cena do Auto da Barca do Inferno, o Corregedor e o Procurador dirigem-se à Barca da Glória, depois de se recusarem a entrar na Barca do Inferno.
Corregedor: Anjo:
Corregedor:
Ó arrais dos gloriosos, passai-nos neste batel! Ó pragas pera papel, pera as almas odiosos! Como vindes preciosos, sendo filhos da ciência! Ó! habeatis clemência e passai-nos como vossos!
para
tende
Hou, homens dos breviairos1, rapinastis coelhorum et pernis perdiguitorum2 e mijais nos campanairos! Corregedor: Ó! Não nos sejais contrairos, pois nom temos outra ponte! Joane (Parvo): Beleguinis ubi sunt3? Ego latinus macairos4. (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno. São Paulo, Ateliê Editorial, 1996, p. 107-109.) Joane (Parvo):
1 – Homens dos breviairos: homens de leis. 2 – Rapinastis coelhorum / et pernis perdiguitorum:Recebestes coelhos e pernas de perdiz como suborno. 3 – Beleguinis ubi sunt?: Onde estão os policiais? 4 – Ego latinus macairos: Eu falo latim macarrônico.
14 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 15
a) De que pecado o Parvo acusa o homem de leis (Corregedor)? Esse é o único pecado de que ele é acusado na peça? RESOLUÇÃO: Joane, o Parvo, acusa o Corregedor de se deixar subornar com as ofertas de coelhos e pernas de perdiz, sendo, desse modo, segundo o Diabo, um “santo descorregedor”, sentenciando com pouca honestidade (“ quia judicastis malitia”). Além disso, há referência ao desrespeito do Correge dor aos mortos, uma vez que urinara nas campas. Outro delito do qual o magistrado é acusado pelo Diabo é o de ter explorado os trabalhadores inocentes (“ignorantes do pecado”): “A largo modo adquiristis / sanguinis laboratorum, / ignorantes peccatorum”.
a) Por que o Cavaleiro chama a atenção do Diabo? RESOLUÇÃO: Porque o Cavaleiro sacrificou a vida para defender o Cristianismo e, assim, ter assegurado seu lugar na barca da Glória. O Diabo presume que o Cavaleiro é, como a maioria dos mortos chegados ao cais, um ser cheio de vícios e interpela-o. O Cavaleiro adverte o Diabo, distinguindo-se e evitando maior contato. D S Ê U G U T R O P
b) Onde e como morreram os dois Cavaleiros? b) Com que propósito o latim é empregado pelo Corregedor? E pelo Parvo? RESOLUÇÃO: O Corregedor emprega o latim de uso jurídico, que caracteriza o homem de leis, tipificando a personagem. O Parvo, por sua vez, vale-se do latim de maneira humorística e, consciente de seus erros, declara falar latim “macarrônico”, isto é, mistura de latim e português. Para o Corregedor, o latim é instrumento de autoridade; para o Parvo, ao contrário, é um meio de contestação da autoridade e de zombaria da pompa de que se reveste o discurso autoritário.
RESOLUÇÃO: Os Cavaleiros morreram numa Cruzada, em combate contra os “infiéis”. Observe-se que, na época da encenação do Auto da Barca do Inferno, as Cruzadas já eram coisa do passado.
c) Por que os dois passam pelo Diabo sem se dirigir a ele? 2. (UNICAMP-SP) – Leia o diálogo abaixo, do Auto da Barca do Inferno:
RESOLUÇÃO: Porque entendem que quem deu a vida numa Cruzada, em defesa do Cristianismo, tem assegurado um lugar na barca da Glória, estando livre da condenação ao inferno.
Diabo:
Cavaleiros, vós passais e não perguntais onde is? Cavaleiro 1: Vós, Satanás, presumis? Atentai com quem falais! Cavaleiro 2: Vós que nos demandais? Sequer conhece-nos bem. Morremos nas partes d’além, e não queirais saber mais. (Gil Vicente, “Auto da Barca do Inferno”, in Antologia do Teatro de Gil Vicente. Org. Cleonice Berardinelli, Rio de Janeiro, Nova Fronteira/Brasília, INL, 1984, p. 89.) – 15
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 16
3. (FUVEST-SP)
E, chegando à barca da Glória, diz ao Anjo:
Brísida:
P O R T U G U Ê S D
Anjo: Brísida:
Barqueiro, mano, meus olhos, prancha a Brísida Vaz! Eu não sei quem te cá traz... Peço-vo-lo de giolhos! Cuidais que trago piolhos, anjo de Deus, minha rosa? Eu sou Brísida, a preciosa, que dava as moças aos molhos.
4. Sobre o Auto da Barca do Inferno, afirmou Antônio José Saraiva:
O Parvo, que se convertera em uma espécie de comentador, independente da ação, punha à mostra, com os seus disparates, o ridículo das personagens convencidas do seu papel. Qual o motivo de o Anjo deixar o Parvo à espera para entrar no batel? RESOLUÇÃO: O Parvo observa os passageiros que pretendem embarcar para o Céu e comenta, jocosamente, a respeito deles.
A que criava as meninas para os cônegos da Sé... Passai-me, por vossa fé, meu amor, minhas boninas, olhos de perlinhas finas! (...) (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno – texto fixado por Segismundo Spina) a) No excerto, a maneira de tratar o Anjo empregada por Brísida Vaz relaciona-se à atividade que ela exercera em vida? Explique resumidamente. RESOLUÇÃO: Brísida Vaz, em vida, era alcoviteira, ou seja, agenciava mulheres para a prostituição. Assim, sua linguagem revela sua atividade, pois ela se utiliza de termos que procuram seduzir o Anjo, como “anjo de Deus”, “minha rosa”, “meu amor”, “minhas boninas”, “olhos de perlinhas finas”.
5. (PUC-SP) – Diabo, Companheiro do Diabo, Anjo, Fidalgo, Onzeneiro, Parvo, Sapateiro, Frade, Florença, Brísida Vaz, Judeu, Corregedor, Procurador, Enforcado e Quatro Cavaleiros são personagens do Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente. Analise as informações abaixo e selecione a alternativa incorreta, cujas características não descrevem adequadamente a personagem. a) O Onzeneiro idolatra o dinheiro; é agiota e usurário; de tudo o que juntara, nada leva para a morte, ou melhor, leva a bolsa vazia. b) O Frade representa o clero decadente e é subjugado por suas fraquezas: mulher e esporte; leva a amante e as armas de esgrima. c) O Diabo, capitão da barca do Inferno, é quem apressa o embarque dos condenados; é dissimulado e irônico. d) O Anjo, capitão da barca do Céu, é quem elogia a morte pela fé; é austero e inflexível. e) O Corregedor representa a justiça e luta pela apl icação íntegra e exata das leis; carrega papéis e processos.
b) No excerto, o trata mento que Brísid a Vaz dispensa ao Anjo é adequado à obtenção do que eladeseja —isto é, levar oAnjo a permitir que ela embarque? Por quê?
RESOLUÇÃO: O Auto da Barca do Inf erno apresenta personagens representativas da sociedade medieval portuguesa. Suas atitudes em vida as credenciam ao embarque para o Céu ou para o Inferno. O Corregedor aceitava “as peitas dos judeus”, propinas e suborno, convertendo-se no símbolo da justiça corrupta e da utilização do poder judiciário em proveito próprio e no de alguns privilegiados, em detrimento dos humildes e desvalidos. Vai para o Inferno, apesar de toda a retórica latinizante da vida forense, que o dramaturgo explora cômica e satiricamente, para compor os tipos carica tos do juiz venal e do procurador subserviente. Resposta: E
RESOLUÇÃO: O tratamento que Brísida Vaz dispensa ao Anjo é inadequado, pois revela apego ao universo pecaminoso da sedução e prostituição, ou seja, justamente àquilo que justifica sua condenação ao inferno.
16 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 17
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (II)
1. (UNICAMP-SP-2010) – No excerto abaixo, o romance Iracema é aproximado da narrativa bíblica:
Em Iracema, (...) a paisagem do Ceará fornece o cenário edênico para uma adaptação do mito da Gênese. Alencar aproveitou até o máximo as similaridades entre as tradições indígenas e a mitologia bíblica (...). Seu romance indianista (...) resumia a narrativa do casamento inter-racial, porém (...) dentro de um quadro estrutural pseudohistórico mais sofisticado, derivado de todo um complexo de mitos bíblicos, desde a Queda Edênica ao nascimento de um novo redentor. Exilados, Aliados, Rebeldes: (David Treece,indigenista o movimento indianista, a política e o Estado-Nação imperial. São Paulo, Nankin/Edusp, 2008, p. 226, 258-259.) Partindo desse comentário, responda às questões: a) Que associação se pode esta belecer entre os protagoni stas do romance e o mito da Queda com a consequente expulsão do Paraíso? RESOLUÇÃO: O mito da Queda, central na tradição judaico-cristã, corresponde à narrativa segundo a qual Adão e Eva, habitantes do Éden (Paraíso), teriam comido o fruto proibido. Por causa dessa falta, teriam tido como castigo a expulsão da morada paradisíaca e o mergulho de seus descendentes, o gênero humano, na dor e sofrimento (multiplicação da dor do parto, necessidade de “ganhar o pão com o suor do rosto”). Iracema aproveita vários elementos desse mito: o vinho da jurema assemelha-se ao fruto proibido; a perda da inocência de Adão e Eva equivale à união carnal entre Martim e Iracema; a descida que a protagonista faz do território tabajara para o pitiguara identifica-se com a perda do Paraíso. O caminho para baixo é percorrido após o sexto dia, que lembra o dia da criação do homem; a dor da heroína ao ver seus conterrâneos mortos em combate e, mais adiante, durante o seu parto, estabelece proximidade com os sofrimentos profetizados por Deus à espécie humana.
2. (UNICAMP-SP) – Leia, abaixo, a letra de uma canção de Chico Buarque inspirada no romance de José de Alencar, Iracema, lenda do Ceará: IRACEMA VOOU Iracema voou Para a América Leva roupa de lã E anda lépida Vê um filme de quando em vez Não domina o idioma inglês
Lavasaído chão ao numa Tem luarcasa de chá Com um mímico Ambiciona estudar Canto lírico Não dá mole pra polícia
Se puder, vai ficando por lá Tem saudade do Ceará Mas não muita Uns dias, afoita Me liga a cobrar: — É Iracema da América (Chico Buarque, As Cidades. Rio de Janeiro, Marola Edições Musicais Ltda.,1998.) a) Que papel desempenha Iracema no romance de José de Alencar? E na canção de Chico Buarque? RESOLUÇÃO: Iracema desempenha, no romance de Alencar, o papel de heroína romântica, mártir do amor. Ela é a sacerdotisa ou vestal dos Tabajaras, que detém o segredo da jurema. Além disso, ela pode ser considerada a própria representação da natureza virgem dos trópicos, que será possuída pelo colonizador europeu, o português Martim, com quem terá um filho. Na canção de Chico Buarque, Iracema desempenha o papel da brasileira exilada que, com astúcia “malandra”, consegue “se virar”, procurando “se dar bem” na América do Norte e preferindo viver lá , apesar das dificuldades e da saudade da terra natal.
b) Qual personagem poderia ser associada ao “novo redentor”? Por quê? RESOLUÇÃO: O “novo redentor” é Moacir, filho de Iracema com Martim. Assim como Cristo teria vindo ao mundo para redimir o gênero humano do pecado srcinal, levando-o a uma nova condição, o jovem mestiço daria srcem a um novo povo, o brasileiro, que, na visão de Alencar, ficaria no lugar do indígena.
– 17
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 18
b) Uma das interpretações para o nome da heroína do romance de José de Alencar é de que seja um anagrama de América. Isto é, o nome da heroína possui as mesmas letras deAmérica dispostas em outra ordem. Partindo dessa interpretação, explique o que distingue a referência à América no romance daquela que é feita na canção.
P O R T U G U Ê S D
RESOLUÇÃO: No romance Iracema, lenda do Ceará, o jogo anagramático com o nome da heroína é, evidentemente, uma referência ao Brasil ou, genericamente, à América do Sul. Já em Iracema voou, o anagrama funciona como refe rência à América do Norte ou, mais especificamente, aos Estados Unidos.
No trecho, Machado de Assis afirma que a narração de Iracema não parece ter sido feita por um “poeta moderno”, mas, sim, por um “bardo indígena”. Essa afirmação se justifica? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: A afirmação é pertinente, pois o estilo de Iracema procura incorporar a linguagem e a cosmovisão indígenas. A tentativa de simular a c osmovisão indígena é visível, por exemplo, na marcação temporal, que toma como parâmetro os ciclos da natureza. A apropriação da linguagem aborígine ocorre nos nomes próprios, nas aglutinações lexicais, nas perífrases e nas comparações com elementos da natureza.
3. (FUVEST-SP) – Considere os dois trechos de Machado de Assis, relacionados a Iracema e publicados na época em que apareceu esse romance de Alencar, e responda ao que se pede. a) A poesia americana está completamente nobilitada; os maus poetas já não podem conseguir o descrédito desse movimento, que venceu com o autor de “I-Juca-Pirama” e acaba de vencer com o autor de Iracema. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) Machado de Assis refere-se, nesse trecho, a um movimento literário chamado, na época, de “poesiaamericana”ou “escola americana”. Sob que outro nome veio a ser conhecido esse movimento? Quais eram seus principais objetivos? RESOLUÇÃO: Machado de Assis refere-se ao Indianismo, tendência romântica brasileira cujo objetivo central era nobilitar o passado nacional, associando-o a mitos heroicos elaborados por meio da idealização dos indígenas e de sua cultura, assimilados a padrões europeus de excelência física e moral.
b) Tudo em Iracema nos parece primitivo; a ingenuidade dos sentimentos, o pitoresco da linguagem, tudo, até a parte narrativa do livro, que nem parece obra de um poeta moderno, mas uma história de bardo1 indígena, contada aos irmãos, à porta da cabana, aos últimos raios do sol que se entristece. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) 1 – Bardo: poeta heroico, entre os celtas e gálios; por extensão, qualquer poeta, trovador etc.
18 –
4. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo foi extraído de Iracema. Ele reproduz a reação e as últimas palavras de Batuiretê antes de morrer:
O velho soabriu as pesadas pálpebras e passou do neto ao estrangeiro um olhar baço. Depois o peito arquejou e os lábios murmuraram: — Tupã quisque estes olhos vissem, antes de se apagarem, o gavião branco junto da narceja. O abaeté derrubou a fronte aos peitos e não falou mais, nem mais se moveu. (José de Alencar,Iracema: lenda do Ceará. Rio de Janeiro, MEC/INL, 1965, p. 171-172.) a) Quem é Batuiretê? RESOLUÇÃO: Batuiretê fora grande guerreiro e líder dos pitiguaras. Em razão da idade, deixa de guerrear e transfere a liderança do grupo ao filho Jatobá, pai de Poti. Batuiretê torna-se então uma espécie de conse lheiro, sábio ou, melhor, oráculo de guerra para os de sua tribo. Daí o nome tupi com que a perso nagem é denominada: Maranguab, que, nas palavras do neto Poti (nesse mesmo capítulo), significa “o grande sabedor da guerra”.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 19
b) Identifique as personagens a quem ele se dirige e indique os papéis que desempenham no romance. RESOLUÇÃO: O “neto” referido no texto é o guerreir o pitiguara Poti , que é amigo e aliado do coprotagonista (Martim Soares Moreno) e o auxilia tanto no estabelecimento da civilização portuguesa no Ceará, como no episódio romanesco entre o guerreiro português e a virgem tabajara. Sob o nome de batismo de Antônio Felipe Camarão, transforma-se de personagem ficcional em personagem histórica, participante da luta pela expulsão dos holandeses. É o índio assimilado à civilização: Antônio (santo da devoção), Felipe (rei de Espanha, Felipe III, à época da União Ibérica, em que ocorre o romance, 1604-1611). O “estrangeiro”, referido em seguida, é Martim Soares Moreno, representante do Estado português, guerreiro branco e agente da civilização cristã na colonização do Ceará. É o elemento que, ao se introduzir no universo indígena e consorciar-se com a “virgem de Tupã”, contribui para a destruição da América primitiva.
MÓDULO
c) Explique o sentido da metá fora empregada por Batuiretê em sua fala. RESOLUÇÃO: Batuiretê refere-se, por meio da expressão “o gavião branco junto da narceja”, à dominação branca e à submissão do índio, numa premonição trágica do destino de seu povo.
Literatura e Análise de Textos Literários (III)
1. (FUVEST-SP) – Leia o trecho de abertura de Memórias de um Sargento de Milícias e responda ao que se pede.
Era no tempo do rei. Uma das quatro esquinas que formam as ruas do Ouvidor e da Quitanda, cortando-s e mutuamente, chamava-se nesse tempo — O canto dos meirinhos —; e bem lhe assentava o nome, porque era aí o lugar de encontro favorito de todos os indivíduos dessa classe (que gozava então de não pequena consideração). Os meirinhos de hoje não são mais do que a sombra caricata dos meirinhos do tempo do rei; esses eram gente temível e temida, respeitável e respeitada; formavam um dos extremos da formidável cadeia judiciária que envolvia todo o Rio de Janeiro no tempo em que a demanda era entre nós um elemento de vida: o extremo oposto eram os desembargadores. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) a) A frase “Era no tempo do rei” refere-se a um período histórico determinado e possui, também, uma conotação marcada pela indeterminação temporal. Identifique tanto o período histórico a que se refere a frase quanto a mencionada conotação que ela também apresenta.
b) No trecho aqui reproduzido, o narrador c ompara duas épocas diferentes: o seu próprio tempo e o tempo do rei. Esse procedimento é raro ou frequente no livro? Com que objetivo o narrador o adota? RESOLUÇÃO: Esse procedimento é frequente no livro, pois um dos objetivos do narrador é confrontar duas épocas — a sua (tempo da enunciação) e aquela em que ocorrem os fatos narrados (tempo do enunciado).
RESOLUÇÃO: O período histórico a que se refere a frase é o que se inicia com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808, sendo D. João VI o rei referido. A frase “Era no tempo do rei”, para além dessa referência histórica, associa-se à abertura formular de contos de fadas e semelhantes — “Era uma vez...” — e, nesse sentido, conota tempo e espaço indeterminados.
– 19
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 20
As questões de números 2 a 4 tomam por base um fragmento do livro Memórias de um Sargento de Milícias, escrito por Manuel Antônio de Almeida (1831-1861).
P O R T U G U Ê S D
Era a comadre uma mulher baixa, excessivamente gorda, bonachona, ingênua ou tola até um certo ponto, e finória até outro; vivia do ofício de parteira, que adotara por curiosidade, e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade. Era a folhinha mais exata de todas as festas religiosas que aqui se faziam; sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até o nome do padre; era pontual à ladainha, ao terço, à novena, ao setenário; não lhe escapava via-sacra, procissão, nem sermão; trazia o tempo habilmente distribuído e as horas combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e
3. (VUNESP-SP) – Ao referir-se ao fato de a comadre procurar o compadre, a fim de conversar sobre o afilhado, o enunciador fornece
achar já a missa no altar. De madrugada missa da aIdentifique mesma explicação dada à razão de ela abraçar de parteira. Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, e começava daí saindopela pilhava ainda essa explicação, relacionando-a com oosofício costumes da época, a das nove em Santo Antônio. O seu traje habitual era, como o de todas especialmente com o uso da mantilha pelas mulheres. RESOLUÇÃO: as mulheres da sua condição e esfera, uma saia de lila preta, que se Tanto o ofício de parteira que a Comadre adotara quanto a sua ida à casa vestia sobre um vestido qualquer, um lenço branco muito teso e do Compadre tinham o mesmo motivo: a curiosidade, ou seja, a engomado ao pescoço, outro na cabeça, um rosário pendurado no cós preocupação em buscar todos os detalhes sobre a vida alheia. Para isso, a da saia, um raminho de arruda atrás da orelha, tudo isto coberto por mantilha, peça do vestuário muito comum no tempo da narrativa e que uma clássica mantilha, junto à renda da qual se pregava uma pequena consistia em uma faixa de tecido que cobria como um véu o rosto das mulheres, permitia que elas vissem os outros sem serem vistas. É o que figa de ouro ou de osso. (...) (...) a mantilha era o traje mais conveniente aos costumes da época; pode ser confirmado no segundo parágrafo: “a mantilha era o traje mais sendo as ações dos outros o principal cuidado de quase todos, era muito conveniente aos costumes da época; sendo as ações dos outros o principal cuidado [preocupação] de quase todos, era muito necessário ver sem ser necessário ver sem ser visto. A mantilha para as mulheres estava na razão visto.” das rótulas para as casas; eram o observatório da vida alheia. (...) (...) Nesta ocasião levantava-se a Deus, e as duas beatas interromperam a conversa [sobre o afilhado da comadre] para bater nos peitos. Era uma delas a vizinha do compadre, que prognosticava mau fim ao menino e com quem ele prometera fazer uma estralada; a outra era uma das que tinham estado na função do batizado. A comadre, apenas ouviu isso, foi procurar o compadre; não se pense, porém, que a levara a isso outro interesse que não fosse a curio sidade; queria saber o caso com todos os menores detalhes; isso lhe dava longa matéria para a conversa na igreja e para entreter as partu rientes que se confiavam aos seus cuidados. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 4. (VUNESP-SP) – A comadre é apresentada, entre várias características, como uma mulher que cumpria rigorosamente os horários. 2. (VUNESP-SP) – O sincretismo religioso, isto é, a “fusão de Transcreva duas passagens do fragmento em que essa qualidade está diferentes cultos ou doutrinas religiosas” (cf. Dicionário Houaiss) era explícita, referindo-se à participação da personagem nas missas. RESOLUÇÃO: comum em nossa cultura, na época retratada na obra de Manuel Os trechos que comprovam a pontualidade da Comadre em relação a Antônio de Almeida. A descrição da comadre, feita com vivacidade pelo enunciador do texto, permite afirmar que ela é dada a essa prática? missas são os seguintes (todos retirados do primeiro parágrafo): (1) “sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até Justifique sua resposta, com base em uma passagem do texto. o nome do padre”; (2) “trazia o tempo habilmente distribuído e as horas RESOLUÇÃO: No trecho “...e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade” (primeiro parágrafo), percebe-se, na caracterização da Comadre, o sincretismo religioso, ou seja, a fusão de práticas religiosas diferentes, pois a personagem tanto fazia rezas para afastar supostas influências de espíritos malignos (“benzia de quebranto”), uma atividade que a ligava à feitiçaria, quanto frequentava com grande assiduidade as festas e os rituais ligados à Igreja Católica (missas, ladainhas, terços, novenas, via-sacra, procissão, sermão).
20 –
combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e achar já a missa no altar. De madrugada começava pela missa da Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, e daí saindo pilhava ainda a das nove em Santo Antônio.”
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 21
5. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo pertence ao capítulo XLV (“Empenhos”), de Memórias de um Sargento de Milícias.
Isto tudo vem para dizermos que Maria-Regalada tinha um verdadeiro amor ao Major Vidigal; o Major pagava-lho na mesma moeda. Ora, D. Maria era uma das camaradas mais do coração de MariaRegalada. Eis aí por que falando dela D. Maria e a comadre se mostraram tão esperançadas a respeito da sorte do Leonardo. Já naquele tempo (e dizem que é defeito do nosso) o empenho, o compadresco, era uma mola real de todo o movimento social. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias. Cotia, Ateliê Editorial, 2000, p. 319.)
b) Relacione o “defeito” com esse episódio, que envolveu o Major Vidigal e as três mulheres. RESOLUÇÃO: Preso pelo terrível Major Vidigal, chefe dos milicianos no Rio de Janeiro, Leonardo deveria ser, nos termos das leis e regulamentos, severamente punido. Intercedem em seu favor D. Maria, a Comadre e Maria-Regalada. As esperanças da tia de Luisinha e da madrinha estavam assentadas na percepção de que o Major Vidigal seria vulnerável ao apelo sensual de Maria-Regalada e ao “verdadeiro amor” que havia entre ambos. E, mais que isso, de que seria capaz de transgredir os seus deveres funcionais, não punindo Leonardo e, mais tarde, promovendo-o a sargento, para atender ao pleito da mulher qu e desejava. O “defeito ” que nisso se revela é a diluição da ordem, o “jeitinho”, a superposição da vida e dos interesses pessoais aos deveres e obrigações legais. O diálogo (no capítulo XLVI) que se abre com o trecho “—Ora, a lei... O que é a lei, se o Sr. Majorquiser?...” ilustra cabalmente o “defeito” em questão.
a) Explique o “defeito” a que o narrador se refere. RESOLUÇÃO: O “defeito” referido pelo narrador é a ausência de fronteiras nítidas entre o interesse público e a vida privada, é a “dialética da malandragem”, expressão que o crítico Antonio Candido consagrou como caracterizadora da diluição dos limites que separam o “mundo da ordem” e o “mundo da desordem”, a lei e a contravenção, o dever funcional e o interesse pessoal. Por “empenho”, pode-se entender a troca de favores, o clientelismo, e por “compadresco”, o nepotismo que era “uma mola real de todo o movimento social”, como diz o narrador.
MÓDULOS
E
Literatura e Análise de Textos Literários (IV) e ( V)
1. (UNICAMP-SP-2010) – Leia a seguir um trecho de A Cidade e as Serras:
— Sabes o que eu estava pensando, Jacinto?... Que te aconteceu aquela lenda de Santo Ambrósio... Não, não era Santo Ambrósio... Não me lembra o santo. Ainda não era mesmo santo, apenas um cavaleiro pecador, que se enamorara de uma mulher, pusera toda a sua alma nessa mulher, só por a avistar a distância na rua. Depois, uma tarde que a seguia, enlevado, ela entrou num portal de igreja, e aí, de repente, ergueu o véu, entreabriu o vestido e mostrou ao pobre cavaleiro o seio roído por uma chaga! Tu também andavas namorado da serra, sem a conhecer, só pela sua beleza de verão. E a serra, hoje, zás! de repente, descobre a sua grande chaga... É talvez a tua preparação para S. Jacinto. (Eça de Queirós, A Cidade e as Serras. São Paulo, Ateliê Editorial, 2007, p. 252.)
a) Explique a comparação feita por Zé Fernandes. Especifique a que chaga ele se refere. RESOLUÇÃO: Zé Fernandes compara a visão que Jacinto tem da serra à imagem que o santo ou cavaleiro pecador tem de uma mulher: há em ambas as situações o enlevo inicial e o choque com a descoberta de uma chaga. Deve-se entender, no caso de Jacinto, que chaga é uma metáfora que representa a fome, as doenças e a miséria que existiam na serra.
– 21
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 22
P O R T U G U Ê S D
b) Que significado a descoberta dessa chaga tem para Jacinto e para a compreensão do romance?
Texto para as questões 3 e 4.
RESOLUÇÃO: A chaga é metáfora da pobreza, da má situação de vida dos camponeses lusos. Jacinto, ao descobrir essa “chaga”, procura resolver paternalistamente a situação social dos camponeses, torna-se o “pai dos pobres”, um “Dom Sebastião”, segundo João Torrado. Para a compreensão do romance, a descoberta dessa “chaga” indica a necessidade de melhorar as condições de vida no campo, mas sem afrontar a harmonia e a vitalidade da natureza.
No entanto Jacinto, desesperado com tantos desastres humilhadores — as torneiras que dessoldavam, os elevadores que emperravam, o vapor que se encolhia, a eletricidade que sumia, decidiu valorosamente vencer as resistências finais da matéria e da força por novas e mais poderosas acumulações de mecanismos. E nessas semanas de abril, enquanto as rosas desabrochavam, a nossa agitada casa, entre aquelas quietas casas dos Campos Elísios que preguiçavam ao sol, incessantemente tremeu, envolta num pó de caliça e de empreitada, com o bruto picar de pedra, o retininte martelar de ferro. 3. O trecho transcrito foi extraído do quinto ca pítulo de A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós, e se associa à crença que tem o protagonista, Jacinto, nos avanços técnicos como chave paranoa trecho felicidade. relação que a visão queirosiana apresentada tem Qual com oa famoso ideal humanista (já presente, por exemplo, no episódio de “O Gigante Adamastor”, em Os Lusíadas, de Camões), segundo o qual o Homem existe para dominar a Natureza?
2. (FUVEST-SP) – Os romances de Eça de Queirós costumam apresentar críticas a aspectos importantes da sociedade portuguesa, frequentemente acompanhadas de propostas (explícitas ou implícitas) de reforma social. Em A Cidade e as Serras, a) qual o aspecto que se critica nas elites portuguesas?
RESOLUÇÃO: Eça de Queirós mostra de maneira irônica o fracasso da civilização do século XIX, pois esta não conseguiu realizar o ideal humanista de domínio da Natureza, como fica evidente no trecho transcrito, em que se alude à ineficiência de alguns artefatos.
RESOLUÇÃO: Critica-se o abandono da terra natal, visto que essas elites se deixavam seduzir pela cultura francesa, pelo ócio endinheirado e por uma ideia de civilização como “armazenamento” de comodidades, para seu exclusivo benefício. Pode-se dizer que a crítica se dirige à alienação das elites portuguesas perante os problemas sociais em seu país.
b) qual é a relação, segundo preco niza o romance, que essas elites deveriam estabelecer com as classes subalternas? RESOLUÇÃO: A proposta do romance é uma reforma social, encabeçada pelos mais privilegiados, que promovesse a assistência social por meio do amparo e proteção aos menos favorecidos. Quando Jacinto, o protagonista do romance, teve seu apelido mudado de “Príncipe da Grã-Ventura” para “Pai dos Pobres”, esse caráter paternalista fica evidenciado, como se viu na resposta à questão 1, item b.
22 –
4. Na passagem transcrita, apesar de ela fazer parte da fase urbana da narrativa, a Natureza não deixa de, discretamente, estar presente, como em vários outros momentos do livro. Com base no excerto apresentado, explique como tal fato ocorre. RESOLUÇÃO: A Natureza está presente tanto na primeira parte (tese) como na segunda parte (antítese) de A Cidade e as Serras, nas descrições de ambientes, como se percebe, no trecho, em “enquanto as rosas desabrochavam”.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 23
Textos para as questões 5 e 6.
Texto I
Desde o berço, onde a avó espalhava funcho e âmbar para afugentar a Sorte-Ruim, Jacinto medrou com segurança, a rijeza, a seiva rica dum pinheiro das dunas. Não teve sarampo e não teve lombrigas. As letras, a Tabuada, o Latim entraram por ele tão facilmente como o sol por uma vidraça. Entre os camaradas, nos pátios dos colégios, erguendo a sua espada de lata e lançando um brado de comando, foi logo o vencedor, o rei que se adula e a quem se cede a fruta das merendas.
As questões de números 7 a 10 tomam por base um soneto do poeta neoclássico português Bocage (Manuel Maria Barbosa du Bocage, 1765-1805) e uma tira da escritora e quadrinista brasileira Ciça (Cecília Whitaker Vicente de Azevedo Alves Pinto).
LXIV CONTRASTE ENTRE A VIDA CAMPESTRE E A DAS CIDADES D S Ê U G U T R O P
Nos campos o vilão sem sustos passa, Inquieto na corte o nobre mora; O que é ser infeliz aquele ignora, Este encontra nas pompas a desgraça:
Texto II
E nunca o meu Príncipe (que eu contemplava esticando os suspensórios) me pareceu tão corcovado, tão minguado, como gasto por uma lima que desde muito andasse fundamente limando. Assim viera findar, desfeita em Civilização, naquele super-requintado magricela sem músculo e sem energia, a raça fortíssima dos Jacintos! 5. É bastante conhecida a tese de Rousseau de que o Homem nasce bom, sendo a sociedade responsável por sua corrupção. Como essa afirmação pode ser associada aos excertos transcritos, extraídos de A Cidade e as Serras? RESOLUÇÃO: Os trechos mostram como Jacinto era em sua infância, fase mais próxima de sua essência primitiva, cheio de energia, de vida. Civilizando-se, ou seja, em contato mais intenso com a sociedade, perdeu sua vitalidade.
quele canta e ri;vãs nãoque se embaraça A Com essas coisas o mundo adora: Este (oh cega ambição!) mil vezes chora, Porque não acha bem que o satisfaça:
Aquele dorme em paz no chão deitado, Este no ebúrneo leito precioso Nutre, exaspera velador cuidado: Triste, sai do palácio majestoso; Se hás de ser cortesão, mas desgraçado, Antes ser camponês, e venturoso. (Bocage, Obras de Bocage. Porto, Lello & Irmão Editores, 1968.)
(Ciça, Tira. In Pagando o Pato. Porto Alegre, LP & M, 2006.)
6. Tendo em mente que a civilização, a sociedade, corrompe o que o Homem possui de mais puro, explique de que modo esse fenômeno ocorre em Iracema. RESOLUÇÃO: Enquanto vivia entre os tabajaras, Iracema tinha preservados, como numa situação edênica, seus valores primitivos. O contato com Martim, com a civilização (no caso, a europeia), provocou a corrupção, a “queda” da protagonista.
7. (VUNESP-SP-2010) – O tema do soneto apresentado, do neoclássico português Bocage, enquadra-se numa das linhas temáticas características do período literário denominado Neoclassicismo ou Arcadismo. Aponte essa linha temática, comprovando com elementos do próprio poema. RESOLUÇÃO: O soneto de Bocage desenvolve o tema do contraste entre a vida na cidade, vista como negativa, e a vida no campo, descrita como positiva. A depreciação da primeira é evidente em expressões como “inquieto na corte o nobre mora” e “este [o homem urbano] (...) mil vezes chora / porque não acha bem que o satisfaça”. A valorização da segunda encontra-se em expressões como “nos campos o vilão sem sustos passa”, “o que é ser infeliz aquele [o vilão] ignora” e “aquele canta e ri”.
– 23
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 24
8. (VUNESP-SP-2010) – A palavra vilão pode apresentar diferentes significados na Língua Portuguesa, alguns bastante distintos entre si. No soneto de Bocage, a própria sequência da leitura permite descobrir, em função do contexto, o significado que assume tal palavra, empregada no primeiro verso. Releia o poema e aponte esse significado.
P O R T U G U Ê S D
RESOLUÇÃO: In-qui-e-to-na-cor-teo-no-bre-mo(ra). (As sílabas fortes estão sublinhadas; a sílaba entre parênteses, a última postônica [= pós-tônica], não se conta.)
RESOLUÇÃO: No poema de Bocage, vilão é empregado no sentido inicial da palavra: “habitante de vila”, ou seja, morador de pequeno povoado rural, em oposição à corte, situada na cidade, a grande aglomeração urbana.
10. (VUNESP-SP-2010) – Na tira de Ciça, a troca de ser por ter ironiza uma das tendências do comportamento humano na sociedade moderna, altamente consumista. Isso considerado, releia a tira e o poema de Bocage e aponte em que consiste essa ironia e em que medida o soneto Bocage representa, com maistroca de dois séculos antecedência, umadedas possíveis respostas a essa de ser por terde. RESOLUÇÃO: A ironia está em considerar como mera atualização, ou seja, adaptação aos tempos atuais, a troca de ser por ter na célebre expressão shakespeariana. O soneto de Bocage pode ser tomado como “resposta” a essa perversão contemporânea, por exaltar a vida simples e feliz ser (o ), em oposição à vida de apego aos bens materiais e às aparências (o ter).
9. (VUNESP-SP-2010) – O soneto de Bocage apresenta-se de acordo com o modelo tradicional, com versos de dez sílabas métricas (decassílabos) distribuídos em duas quadras e dois tercetos. De posse dessa informação, apresente como resposta a divisão em sílabas métricas do segundo verso do poema, levando em conta que as sílabas tônicas são a terceira, a sexta, a oitava e a décima.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VI)
1. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte capítulo do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis:
CAPÍTULO XL UMA ÉGUA
Ficando só, refleti algum tempo e tive uma fantasia. Já conheceis as minhas fantasias. Contei-vos a da visita imperial; disse-vos a desta casa do Engenho Novo, reproduzindo a de Matacavalos... A imaginação foi a companheira de toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de empacar, as mais delas capaz de engolir campanhas e campanhas, correndo. Creio haver lido em Tácito que as éguas iberas concebiam pelo vento; se não foi nele, foi noutro autor antigo, que entendeu guardar essa crendice nos seus livros. Neste particular, a minha imaginação era uma grande égua ibera; a menor brisa lhe dava um potro, que saía logo cavalo de Alexandre; mas deixemos de metáforas atrevidas e impróprias dos meus quinze anos. Digamos o caso simplesmente. A fantasia daquela hora foi confessar a minha mãe os meus amores para lhe dizer que não tinha vocação eclesiástica. A conversa sobre vocação tornava-me agora toda inteira e, ao passo que me assustava, abria-me uma porta de saída. “Sim, é isto”, pensei; “vou dizer a mamãe que não tenho vocação e confesso o nosso namoro; se ela duvidar, conto-lhe o que se passou outro dia, o penteado e o resto...” (Dom Casmurro, in Machado de Assis, Obra Completa em Quatro Volumes.Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 2008, p. 975.) 24 –
a) Explique a metáfora empregada pelo narrador, nesse capítulo, para caracterizar sua imaginação. RESOLUÇÃO: A imaginação de Bentinho era muito fecunda, rápida e audaciosa, embora às vezes se mostrasse mais recolhida. A imagem das éguas iberas oferece diversos pontos de semelhança para sustentar a metáfora, sobretudo fertilidade, velocidade e arrojo.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 25
b) De que maneira a imaginação de Bentinho, assim caracterizada, se relaciona com a temática amorosa nesse capítulo? E no romance?
c) O episódio da xícara de café está diretamente relacionado com a redação do livro de memórias de Bento Santiago. Por quê?
RESOLUÇÃO: Nesse capítulo, Bentinho lembra que, quando adolescente, imaginou confessar à austera mãe, Dona Glória, o amor que ele tinha por Capitu, as primeiras carícias que trocara com ela e a falta de vocação que sentia em si para a vida eclesiástica. No romance, o fato de o narrador-personagem ter uma imaginação fértil coloca sob suspeita a sua versão dos fatos, fundada na crença de que Escobar se tornara amante de Capitu e que Ezequiel seria fruto desse adultério.
RESOLUÇÃO: As memórias de Bento Santiago, a sua autobiografia, configuram a modalidade do romance de confissão, na qual o eu-narrador recompõe o passado e o reinterpreta. Esta é, de início, a intenção do memorialista: “atar as duas pontas da vida”. Nesse sentido, a “procura do tempo perdido”, os atos falhos de suicídio e homicídio, a que se referem o texto e os quesitos anteriores, são instantes cruciais da tragédia emocional e conjugal do narrador, momento-limite entre o ser e o não ser, como ele confessa no início do parágrafo, e que condensam quase todos os recursos narrativos do vasto repertório de Dom Casmurro: a narração, a reflexão digressiva, o apelo ao leitor, o estilo ziguezagueante (“deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo”), característico de um narrador problemático e indeciso.
2. (UNICAMP-SP) – Leia a passagem abaixo, de Dom Casmurro:
Se eu não olhasse para Ezequiel, é provável que não estivesse aqui escrevendo este livro, porque o meu primeiro ímpeto foi correr ao café e bebê-lo. Cheguei a pegar na xícara, mas o pequeno beijava-me a mão, como de costume, e a vista dele, como o gesto, deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo. Chamem-me embora assassino; não serei eu que os desdiga ou contradiga; o meu segundo impulso foi criminoso. Inclinei-me e perguntei a Ezequiel se já tomara café. (Machado de Assis, Dom Casmurro, in Obra Completa. vol. 1, Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1979, p. 936.) a) Explique o “primeiro ímpeto” mencionado pelo narrador. RESOLUÇÃO: O “primeiro ímpeto” mencionado corresponde à sua vontade de suicidarse, bebendo o café envenenado.
b) Por que o narrador admite que seu “segundo impulso” foi cri minoso? RESOLUÇÃO: O “segundo impulso” foi criminoso porque o narrador, desistindo de suicidar-se, pensou em sugerir ao filho que tomasse o café envenenado, o que poderia justificar a sua designação de assassino.
3. (FUVEST-SP)
— Você janta comigo, Escobar? — Vim para isto mesmo. Minha mãe agradeceu-lhe a amizade que me tinha e ele respondeu com muita polidez, ainda que um tanto atado, como se carecesse de palavra pronta. (...) Todos ficaram gostando dele. Eu estava tão contente como se Escobar fosse invenção minha. José Dias desfechou-lhe dois superlativos, tio Cosme dois capotes e prima Justina não achou tacha que lhe pôr; depois, sim, no segundo ou terceiro domingo, veio ela confessarnos que o meu amigo Escobar era um tanto metediço e tinha uns olhos policiais a que não escapava nada. — São os olhos dele, expliquei. — Nem eu digo que sejam de outro. — São olhos refletidos, opinou tio Cosme. — Seguramente, acu diu José Dias; entr etanto, pode ser q ue a senhora D. Justina tenha alguma razão. A verdade é que uma coisa não impede outra, e a reflexão casa-se muito bem à curiosidade natural. Parece curioso, isso parece, mas... — A mim parece-me um mocinho muito sério, disse minha mãe. — Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela. Quando eu referi a Escobar aquela opinião de minha mãe (sem lhe contar as outras, naturalmente), vi que o prazer dele foi extraordinário. Agradeceu, dizendo que eram bondades, e elogiou também minha mãe, senhora grave, distinta e moça, muito moça... Que idade teria? (Machado de Assis, Dom Casmurro)
– 25
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 26
a) Um crítico afirma que, “examinada em suas relações, a população de Dom Casmurro compõe uma parentela, uma dessas grandes moléculas sociais do Brasil tradicional, no centro da qual está um proprietário mais considerável, cercado de figuras que podem incluir, entre outros, um ou mais agregados, vizinhos com obrigações, comensais, parentes pobres em graus diversos, conhecidos que aspiram à proteção (...).” (Adaptado de Roberto Schwarz, Duas Meninas) P O R T U G U Ê S D
Identifique o papel que cada uma das personagens que aparecem no trecho de Dom Casmurro desempenha na composição da referida “parentela”. RESOLUÇÃO: Escobar: representa a categoria dos “conhecidos que aspiram à proteção (...)”. O fragmento deixa patente a intenção da personagem de agradar e bajular o amigo que fez no seminário e, especialmente, a mãe deste, como se observa no último parágrafo. D. Glória (mãe de Bentinho): representa o que Roberto Schwarz denomina o centro da parentela, o “proprietário mais considerável”. Era uma viúva rica, cujo patrimônio provinha de rendimentos das propriedades e de escravos, arrendados ou alugados. Na visão do crítico, D. Glória compõe, com o círculo de parentes, agregados e dependentes em diversos graus, um microcosmo da sociedade brasileira no Segundo Reinado. José Dias: é o agregado, figura característica da estrutura patriarcal. É o homem que, não sendo escravo nem empregado, não era também parente, mas vivia sob a proteção do “senhor”, ao qual devia obediência e favores, retribuídos com trabalhos diversos e uma subserviência constante. Personagem das mais interessantes da galeria machadiana, é o “homem dos superlativos”, que “sabia opinar, obedecendo” e que foi agregado à família pelo falecido pai de Bentinho, a quem se apresentou como “médico homeopata”, atribuindo a si mesmo algumas curas. Vivendo desde então com a família, faz da esperteza, da dissimulação, da perspicácia na observação das relações de poder e conveniência, uma forma de sobreviver, da maneira mais favorável, num meio ao qual não pertence propriamente. Tio Cosme: é, também viúvo, o parente que se coloca sob o teto e a proteção da matriarca. Prima Justina: representa uma situação semelhante à de tio Cosme, e cabe observar que a agregação de ambos à estrutura familiar de Dona Glória se prende à convenção de que, viúva, a matriarca não deveria viver sob o
b) Na conversação apresentada no trecho, as falas de José Dias refletem a posição social que ele ocupa nessa “parentela”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “— Seguramente, acudiu José Dias; entretanto, pode ser que a senhora D. Justina tenha alguma razão” e “— Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela.” Essas duas intervenções do agregado são exemplares de sua posição subserviente e sua habilidade em “opinar obedecendo”. No primeiro instante, parece dar razão à Prima Justina, que identifica o caráter “um tanto metediço” e os “olhos policiais” de Escobar. No instante seguinte, contradiz-se e concorda também com D. Glória, a quem Escobar parecia “um mocinho muito sério”.
mesmo teto com um homem solteiro, o agregado José Dias. Assim, convocados a se abrigar sob a proteção da viúva Santiago, serviam como “biombo”, que preservava o decoro e as aparências.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VII)
1. (FUVEST-SP-2010)
Gente que mamou leite romântico pode meter o dente no rosbife* naturalista; mas em lhe cheirando a teta gótica e oriental, deixa logo o melhor pedaço de carne para correr à bebida da infância. Oh! meu doce leite romântico! (Machado de Assis, Crônicas) *Rosbife: tipo de assado ou fritura de alcatra ou filé bovinos, bem tostado externamente e sangrante na parte central, servido em fatias.
a) A imagem do “rosbife naturalista” — empregada, com humor, por Machado de Assis, para evocar determinadas características do Naturalismo — poderia ser utilizada também para se referir a certos aspectos do romance O Cortiço? Justifique sua resposta.
26 –
RESOLUÇÃO: O Cortiço, como é de esperar de uma obra naturalista, apresenta preocupa ção de exibir, sem eufemismo, rodeio ou censura, os aspectos mais degradantes do ser humano, o que é compatível com a imagem do rosbife, que é sangrento.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 27
b) A imagem do “doce leite romântico”, que se refere a certos traços do Romantismo, pode remeter também a alguns aspectos do romance Iracema? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A expressão “doce leite romântico” refere-se à idealização da realidade, característica do Romantismo e presente em diversos aspectos de Iracema: a fidelidade extrema a um ideal de amor, a nobreza e a bravura dos guerreiros indígenas (que mais parecem cavaleiros medievais), o enaltecimento da natureza brasileira, o engrandecimento da amizade entre Martim e Poti, o convívio harmonioso entre portugueses e pitiguaras.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o seguinte comentário a respeito de O Cortiço, de Aluísio Azevedo:
Com efeito, o que há n’O Cortiço são formas primitivas de amealhamento*, a partir de muito pouco ou quase nada, exigindo uma espécie de rigoroso ascetismo inicial e a aceitação de modalidades diretas e brutais de exploração, incluindo o furto (...) como forma de ganho e a transformação da mulher escrava em companheiramáquina. (...) Aluísio foi, salvo erro meu, o primeiro dos nossos romancistas a descrever minuciosamente o mecanismo de formação da riqueza individual. (...) N’O Cortiço [o dinheiro] se torna implicitamente objeto central da narrativa, cujo ritmo acaba se ajustando ao ritmo da sua acumulação, tomada pela primeira vez no Brasil como eixo da composição ficcional. (Antonio Candido, “De Cortiço a Cortiço”, in O Discurso e a Cidade. São Paulo, Duas Cidades, 1993, p. 129-30.)
D S Ê U G U T R O P
b) Identifique a “mulher escrava” e o modo como se dá sua transformação em “companheira-máquina”. RESOLUÇÃO: A “mulher escrava” é Bertoleza, que se torna “companheira-máquina” ao viver como amante de João Romão e como instrumento das vontades do vendeiro, já que ela não só trabalha durante o dia na venda, como sai à noite com o patrão para roubar materiais de construção.
Considere o trecho de O Cortiço, de Aluísio Azevedo: *Amealhar: acumular (riqueza), juntar (dinheiro) aos poucos.
a) Explique a que se referem o “rigoroso ascetismo inicial” da personagem em questão e as “modalidades diretas e brutais de exploração” que ela emprega. RESOLUÇÃO: O ascetismo a que se refere Antonio Candido é o esforço austero de acúmulo de dinheiro a que João Romão se entrega, deixando de lado veleidades de prazer, conforto e bem-estar. Em seu afã de enriquecimento, ele chegou a dormir no mesmo balcão em que atendia clientes, comia os piores legumes de sua horta para vender os melhores, não se preocupava com vestuário, aparência e amenidades da vida. Essa “febre de acumular”, como diz o narrador do romance, determinará no dono do cortiço um comportamento brutal deTalexploração da massamais animalizada dos moradores da estalagem. atitude se mostrará cruel em três momentos: quando rouba a garrafa cheia de dinheiro do velho Libório, quando lucra com a indenização do seguro por causa do incêndio que prejudicou imensamente os inquilinos e, o mais extremo, quando engana Bertoleza, usurpando suas economias, e mais tarde a descarta sem remorso em nome de um casamento de conveniência com Zulmira.
Uma aluvião de cenas, que ela [Pombinha] jamais tentara explicar e que até ali jaziam esquecidas nos meandros do seu passado, apresen tavam-se agora nítidas e transparentes. Compreendeu como era que certos velhos respeitáveis, cujas fotografias Léonie lhe mostrara no dia que passaram juntas, deixavam-se vilmente cavalgar pela loureira, cativos e submissos, pagando a escravidão com a honra, os bens e até com a própria vida, se a prostituta, depois de os ter esgotado, fechavalhes o corpo. E continuou a sorrir, desvanecida na sua superioridade sobre esse outro sexo, vaidoso e fanfarrão, que se julgava senhor e que, no entanto, fora posto no mundo simplesmente para servir ao feminino; escravo ridículo que, para gozar um pouco, precisava tirar da sua mesma ilusão a substância do seu gozo; ao passo que a mulher, a senhora, a dona dele, ia tranquilamente desfrutando o seu império, endeusada e querida, prodigalizando martírios que os miseráveis aceitavam contritos, a beijar os pés que os deprimiam e as implacáveis mãos que os estrangulavam. — Ah! homens! homens!... sussurrou ela de envolta com um suspiro. – 27
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 28
P O R T U G U Ê S D
3. (UNIFESP-SP-2010 – modificado) – No texto, os pensamentos da personagem a) recuperam o princípio daprosa naturalista, que condenaos assuntos repulsivos e bestiais — sem amparo em teorias científicas — ligados ao homem, que põe em primeiro plano seus instintos animalescos. b) elucidam o princípiodo determinismo presente naprosa naturalista, revelando os homens e as mulheres conscientes dos seus instintos em função do meio em que vivem e, sobretudo, capazes de controlá-los. c) trazem uma crítica aos aspectos animalescos próprios dos homens, mas, por outro lado, revelam uma forma de Pombinha submeter-se a muitos deles para obter vantagens: eis aí um princípio do Realismo rechaçado no Naturalismo. d) constroem uma visão de mundo e do homem idealizada, o que, em certa medida, afronta o referencial em que se baseia a prosa naturalista,
4. “Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas.” Que figura de linguagem foi empregada no trecho acima? Explique. RESOLUÇÃO: Prosopopeia (personificação), pois foram atribuídas a um ser inanimado (o cortiço) características de um ser animado (a ação de acordar, abrir os olhos).
que define o homem como fruto do meio, marcado pelo apelo dos seus sentidos. e) consubstanciam a concepção naturalista de que o homem é um animal, preso aos instintos, e, no que diz respeito à sexualidade, vê-se que Pombinha considera a mulher superior ao homem; para ela, ter consciência dessa superioridade é uma forma de obter vantagens. RESOLUÇÃO: A alternativa e interpreta corretamente os pensamentos da personagem Pombinha, que reconhece no sexo uma força degradante, como é próprio do Naturalismo, capaz de subjugar “velhos respeitáveis”. Resposta: E
5. “No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas.”
Grasnar e cacarejar são palavras de sonoridade expressiva, chamadas onomatopeias. Por quê? Texto para as questões de 4 a 6.
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de chumbo. Como que se sentiam ainda na indolência 1 de neblina as derradeiras notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à luz loura e tenra2 da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia. A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros3, umedecia o ar e punha-lhe um farto acre4 de sabão ordinário. As pedras do chão, esbranquiçadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil, mostravam uma palidez grisalha e triste, feita de acumulações de espumas secas. Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar 5 das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os bons-dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de crianças que ainda não andam. No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam6, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas. De alguns quartos saíam mulheres que vinham pendurar cá fora, na parede, a gaiola do papagaio, e os louros, à semelhança dos donos, cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se7 à luz nova do dia. (Aluísio Azevedo, O Cortiço, cap. III) 1 – Indolência: preguiça. 2 – Tenro: brando. 3 – Coradouro: lugar onde se põe roupa a corar ao Sol. 4 – Farto acre: cheiro ácido. 5 – Marulhar: agitar. 6 – Altercar: debater. 7 –Espanejar-se: sacudir-se.
28 –
RESOLUÇÃO: Essas palavras são chamadas onomatopeias porque seus sons imitam ou sugerem os sons reais que representam.
6. Sinestesia é um tipo de metáfora em que se misturam sensações de diferentes órgãos dos sentidos. Exemplo: em “Avistava-se o grito das araras” (Guimarães Rosa), estabeleceu-se relação entre a percepção auditiva (“grito”) e a visual (“avistava-se”). É um tipo de metáfora por que, no caso, há comparação implícita entre um grito e um objeto visível. Considerando-se a explicação dada, há sinestesia em a) “um acordar alegre e farto”. b) “sete horas de chumbo”. c) “a roupa lavada (...) umedecia o ar”. d) “o cheiro quente do café”. e) “os louros (...) cumprimentavam-se ruidosamente”. RESOLUÇÃO: Há mistura das sensações olfativa e tátil em “o cheiro quente do café”. Resposta: D
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 29
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VIII)
1. (FUVEST-SP-2010) – Considere a seguinte relação de obras: Auto da Barca do Inferno, Memórias de um Sargento de Milícias, Dom Casmurro e Capitães da Areia. Entre elas, indique as duas que, de modo mais visível, apresentam intenção de doutrinar, ou seja, o propósito de transmitir princípios e diretivas que integram doutrinas determinadas. Divida sua resposta em duas partes: a), para a primeira obra escolhida, e b), para a segunda obra escolhida. Justifique sucintamente cada uma de suas escolhas. RESOLUÇÃO: a) O Auto da Barca do Inferno é informado por princípios da moral cristã, pelos quais são julgados os comportamentos dos mortos prestes a embarcar, no “cais das almas”, para o mundopost-mortem, em que serão punidos ou recompensados. b) Capitães da Areia é um romance em que se faz a apologia da revolução socialista como panaceia para as injustiças sociais decorrentes do regime capitalista. É uma obra que busca o engajamento na luta social, tendo sido por isso proibida durante o Estado Novo. A intenção de doutrinar politicamente o leitor é recorrente, como exemplifica o final: “E, apesar de que lá fora era o terror, qualquer daqueles lares era um lar que se abriria para Pedro Bala, fugitivo da polícia. Porque a revolução é uma pátria e uma família.”
todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música. Volta Seca não pensava com certeza em Lampião neste momento. Pedro Bala não pensava em ser um dia o chefe de todos os malandros da cidade. O Sem-Pernas em se jogar no mar, onde os sonhos são todos belos. Porque a música saía do bojo do velho carrossel só para eles e para o operário que parara. E era uma valsa velha e triste, já esquecida por todos os homens da cidade. (Jorge Amado, Capitães da Areia. São Paulo, Companhia das Letras, 2008, p. 68.) a) De que modo esse estabelece contraste com os demais do romance? Quais sãocapítulo os elementos desseumcontraste? RESOLUÇÃO: O contraste notável é entre a plenitude desse momento de enlevo e a situação de precariedade, carência e insatisfação da vida dos Capitães da Areia. Os elementos desse contraste são visíveis, por exemplo, no “rosto sombrio de Volta Seca”, que se “abria num sorriso”, e em “todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música”.
b) Qual a relação de tal contraste com o tema do livro? RESOLUÇÃO: O tema do livro é a delinquência de menores abandonados. No capítulo de que se extraiu o texto, relata-se um momento de êxtase dessas crianças, ao brincarem num velho carrossel. Depreende-se que, por mais marginali zados que sejam, aos Capitães da Areia resta ainda a condição essencial de crianças que se encantam. São crianças, ainda que castigadas pela injustiça social que as c onduz à marginalidade.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o trecho seguinte, do capítulo “As Luzes do Carrossel”, de Capitães da Areia:
(...) O sertanejo trepou no carrossel, deu corda na pianola e começou a música de uma valsa antiga. O rosto sombrio de Volta Seca se abria num sorriso. Espiava a pianola, espiava os meninos envoltos em alegria. Escutavam religiosamente aquela música que saía do bojo do carrossel na magia da noite da cidade da Bahia só para os ouvidos aventureiros e pobres dos Capitães da Areia. Todos estavam silenciosos. Um operário que vinha pela rua, vendo a aglomeração de meninos na praça, veio para o lado deles. E ficou também parado, escutando a velha música. Então a luz da lua se estendeu sobre todos, as estrelas brilharam ainda mais no céu, o mar ficou de todo manso (talvez que Iemanjá tivesse vindo também ouvir a música) e a cidade era como que um grande carrossel onde giravam em invisíveis cavalos os Capitães da Areia. Neste momento de música, eles sentiram-se donos da cidade. E amaram-se uns aos outros, se sentiram irmãos porque eram – 29
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 30
Texto para o teste 3.
Todos reconheceram os direitos de Pedro Bala à chefia, e foi desta época que a cidade começou a ouvir falar nos Capitães da Areia, crianças abandonadas que viviam do furto. Nunca ninguém soube o número exato de meninos que assim viviam. Eram bem uns cem e destes mais de quarenta dormiam nas ruínas do velho trapiche. P O R T U G U Ê S D
3. (PUC-SP-2010) – O trecho transcrito é do romance Capitães da Areia, que, escrito em 1937, se inscreve entre os “romances proletários” de Jorge Amado. Considerando-o como um todo, é correto afirmar que a) destaca e exalta o tema da infância abandonada e delinquente, incentivada pelos interesses da imprensa local e admitida pelas autoridades caracterizando cotidiano de ações marginais capazes policiais, de transtornar a sociedade um baiana da época. b) consubstancia o percurso de aprendizagem do herói que supera a condição de srcem e eleva o protagonista ao plano histórico do con fronto social e político. c) a mãe de santo e o padre progressista, personagens do romance, ainda que pudessem representar a convergência sincrética de forças protetoras e elementos capazes de minimizar a orfandade dos Capitães, nada conseguem porque não têm influência sobre o bando. d) a prisão e a tortura de Pedro Bala no reformatório, confinado no cubículo escuro da cafua, apenas intensificam seu instinto de violência e a necessidade de vingança contra a sociedade. e) Pedro Bala, líder dos Capitães, no final, se vê derrotado no intento de realizar seu sonho de transformação social e é abandonado pelos demais, pois Volta Seca se junta ao bando de Lampião, Professor vai ser artista na capital, Pirulito ingressa na vida religiosa, Boa-Vida se torna sambista e Gato adere à marginalidade em Ilhéus. RESOLUÇÃO: Na obra de Jorge Amado, principalmente nos “romances proletários”, é recorrente a transformação do protagonista, que, ao ganhar consciência política, supera a condição marginal de srcem e passa a lutar no plano histórico do confronto social e político. EmCapitães da Areia, o delinquente juvenil Pedro Bala e o grupo comandado por ele dei xam de ser apenas seres marginalizados para, no final da narrativa, participar da luta contra a sociedade de classes capitalista. Resposta: B
conheça. Quando se incorporou aos Capitães da Areia (o cais recémconstruído atraiu para as suas areias todas as crianças abandonadas da cidade), o chefe era Raimundo, o Caboclo, mulato avermelhado e forte. Não durou muito na chefia o caboclo Raimundo. Pedro Bala era muito mais ativo, sabia planejar os trabalhos, sabia tratar com os outros, trazia nos olhos e na voz a autoridade de chefe. Um dia brigaram. A desgraça de Raimundo foi puxar uma navalha e cortar o rosto de Pedro, um talho que ficou para o resto da vida. Os outros se meteram e como Pedro estava desarmado deram razão a ele e ficaram esperando a revanche, que não tardou. Uma noite, quando Raimundo quis surrar Barandão, Pedro tomou as dores do negrinho e rolaram na luta mais sensacional a que as areias do cais jamais assistiram. Raimundo era mais alto e mais velho. Porém Pedro Bala, o cabelo loiro a cicatriz vermelhadeixou no rosto, uma agilidade espan tosa evoando, desde esse dia Raimundo nãoera só de a chefia dos Capitães da Areia, como o próprio areal. Engajou tempos depois num navio. (Jorge Amado, Capitães da Areia. 50.a ed. Rio de Janeiro, Record, 1980, p. 26-27.) 4. (FAFICP-SP – modificado) – Pela leitura do texto, pode-se concluir que o romance pretende denunciar um problema a) cultural, a hierarquia nos grupos sociais. b) de identidade nacional. c) social, o desemprego na cidade de Sal vador. d) educacional, o alto índice de crianças analfabetas. e) social, a questão do menor abandonado. RESOLUÇÃO: Resposta: E
5. (FAFICP-SP – modificado) – Que características de Pedro Bala fizeram dele o líder do grupo? a) Sabia planejar e, por ser branco, as pessoas da cidade não o viam como um marginal, fato que o ajudava em seus furtos. b) Era ativo, sabia planejar e lidar com os outros; trazia na voz e nos olhos autoridade de chefe. c) Era mais novo que Raimundo, e o grupo precisava de alguém com mais vigor e com novas ideias. d) Era autoritário, rude, ativo, inteligente, características que convêm a um verdadeiro líder. e) Por ter físico avantajado, era mais ativo e mais ágil que Raimundo; essa característica era útil nas fugas do grupo. RESOLUÇÃO: Resposta: B
Texto para os testes de 4 a 6. O romance Capitães da Areia, de Jorge Amado, teve sua primeira edição (1937) apreendida e queimada em praça pública pouco depois de implantada a ditadura de Getúlio Vargas. No trecho a seguir, o narrador nos conta como Pedro Bala, aos quinze anos, assumiu a liderança de um grupo que dormia num velho armazém abandonado do cais do porto.
É aqui também que mora o chefe dos Capitães da Areia: Pedro Bala. Desde cedo foi chamado assim, desde seus cinco anos. Hoje tem quinze anos. Há dez que vagabundeia nas ruas da Bahia. Nunca soube de sua mãe, seu pai morrera de um balaço. Ele ficou sozinho e empregou anos em conhecer a cidade. Hoje sabe de todas as suas ruas e de todos os seus becos. Não há venda, quitanda, botequim que ele não 30 –
6. A exemplo do nome Pedro Bala, outras personagens também são nomeadas de acordo com um de seus traços físicos ou psicológicos, ou, ainda, de acordo com algo que lhes seja peculiar. É o que se vê em nomes como Sem-Pernas , Professor, Boa-Vida etc. A esse recurso usado pelo autor corresponde uma figura de linguagem. Trata-se da(o): a) comparação. b) eufemismo. c) ironia. d) metonímia. e) personificação. RESOLUÇÃO: O autor faz uso da metonímia, visto que se vale de uma parte (de algo que representa o todo) do aspecto físico ou psicológico das personagens para nomeá-las. Resposta: D
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 31
Para responder aos testes de números 7 e 8, leia o trecho extraído de Gabriela, Cravo e Canela, obra de Jorge Amado.
(...) O marinheiro sueco, um loiro de quase dois metros, entrou no bar, soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib e apontou com o dedo as garrafas de “Cana de Ilhéus”. Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível. Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão, servira cachaça de graça aos marinheiros. Passou o dedo indicador no polegar, a perguntar pelo dinheiro. Vasculhou os bolsos o loiro sueco, nem sinal de dinheiro. Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada. No balcão colocou a nórdica mãed’água, Iemanjá de Estocolmo. Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina por detrás da Igreja. Mirou a sereia, seu rabo de peixe. Assim era a anca de Gabriela. Mulher tão de fogo no mundo não havia, com aquele calor, aquela aqueles suspiros, aquele langor. Quanto mais dormia com ela,ternura, mais tinha vontade. Parecia feita de canto e dança, de sol e luar, era de cravo e canela. Nunca mais lhe dera um presente, uma tolice de feira. Tomou da garrafa de cachaça, encheu um copo grosso de vidro, o marinheiro suspendeu o braço, saudou em sueco, emborcou em dois tragos, cuspiu. Nacib guardou no bolso a sereia dourada, sorrindo. Gabriela riria contente, diria a gemer: “precisava não, moço bonito...” E aqui termina a história de Nacib e Gabriela, quando renasce a chama do amor de uma brasa dormida nas cinzas do peito. 7. (UFSCar-SP) – No texto, o autor relaciona a cultura nacional à estrangeira, buscando, por meio da comparação, estabelecer equiva lências entre elas. O trecho do texto que indica esse tipo de comparação é
MÓDULO
a) b) c) d) e)
“Passou o dedo indicador no polegar...” “...servira cachaça de graça aos marinheiros.” “No balcão colocou a nórdica mãe-d’água...” “...e apontou com o dedo as garrafas de ‘Cana de Ilhéus’.” “Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível.”
RESOLUÇÃO: No trecho transcrito, duas mitologias são aproximadas através das figuras da “sereia nórdica” representada no broche e da divindade afro-brasileira Iemanjá. Resposta: C
8. (UFSCar-SP) – Assinale a alternativa que contém um trecho em que o autor apresenta as informações numa linguagem altamente conotativa. a) “...soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib...” b) “Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina...” c) “Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão...” d) “Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada.” e) “Parecia feita de canto edança, de sol eluar, era decravo e canela.” RESOLUÇÃO: No trecho transcrito na alternativa a, “pesado”, em “bafo pesado”, é uma metáfora sinestésica, mas tal figura não faz que a linguagem da frase possa ser considerada “altamente conotativa”. A descrição contida na alternativa e é inteiramente vazada em linguagem figurada, conotativa, pois são metafóricos todos os predicados atribuídos a Gabriela. Resposta: E
Literatura e Análise de Textos Literários (IX)
Texto para a questão 1.
O pequeno sentou-se, acomodou nas pernas a cabeça da cachorra, pôs-se a contar-lhe baixinho uma história. Tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio que morrera no tempo da seca. Valia-se, pois, de exclamações e de gestos, e Baleia respondia com o rabo, com a língua, com movimentos fáceis de entender. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 1. (FUVEST-SP-2010) – Considere as seguintes afirmações sobre esse trecho de Vidas Secas, entendido no contexto da obra, e responda ao que se pede. a) No trecho, torna-se claro que a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para ampliar as diferenças que distinguem homens de animais. Você concorda com essa afirmação? Justifique, com base no trecho, sua resposta. RESOLUÇÃO: Essa afirmação não é procedente, pois, ao contrário, a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para diminuir as diferenças que distinguem homens de animais, como se evidencia tanto na passagem
b) Nesse trecho, como em outros do mesmo livro, é por exprimir suas emoções e sentimentos pessoais a respeito da pobreza sertaneja que o narrador obtém o efeito de contagiar o leitor, fazendo com que ele também se emocione. Você concorda com a afirmação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois o narrador de Vidas Secas não se envolve emocionalmente com as realidades que representa. Seu relato, conforme aos princípios realistas (o romance de Graciliano Ramos filia-se ao Neorrealismo que substituiu o experimentalismo modernista), é objetivo e explora uma neutralidade que, cedendo a palavra às personagens e — por assim dizer — aos fatos, em vez de diminuir, intensifica a reação do leitor ao quadro representado.
“tinha vocabulário quase tão como o do papagaio”, como fato de um o menino se comunicar porminguado meio de “exclamações e de gestos”, talno como a cadela que lhe abana o rabo.
– 31
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 32
P O R T U G U Ê S D
2. (UNICAMP-SP-2010) – O excerto abaixo, de Vidas Secas, trata da personagem sinha Vitória:
b) Tendo em vista a condição e a trajetória de sinha Vitória, justifique a ironia contida no nome da personagem. Que outra personagem referida no excerto também revela uma ironia no nome?
(...) Calçada naquilo, trôpega, mexia-se como um papagaio, era ridícula. Sinha Vitória ofendera-se gravemente com a comparação, e se não fosse o respeito que Fabiano lhe inspirava, teria despropositado. Efetivamente os sapatos apertavam-lhe os dedos, faziam-lhe calos. Equilibrava-se mal, tropeçava, manquejava, trepada nos saltos de meio palmo. Devia ser ridícula, mas a opinião de Fabiano entristecera-a muito. Desfeitas essas nuvens, curtidos os dissabores, a cama de novo lhe aparecera no horizonte acanhado. Agora pensava nela de mau humor. Julgava-a inatingível e misturava-a às obrigações da casa.
RESOLUÇÃO: É irônico que uma personagem massacrada pela seca e pelas condições sociais injustas tenha como nome Vitória. E há também ironia no nome de Baleia, pois essa cachorra é extremamente magra e habita uma região carente de água, o que contraria radicalmente as ideias associadas ao mamífero de que seu nome fora emprestado.
(...) Um mormaço levantava-se da terra queimada. Estremeceu lembrando-se da seca (...). Diligenciou afastar a recordação, temendo que ela virasse realidade. (...) Agachou-se, atiçou o fogo, apanhou uma brasa com a colher, acendeu o cachimbo, pôs-se a chupar o canudo de taquari cheio de sarro. Jogou longe uma cusparada, que passou por cima da janela e foi cair no terreiro. Preparou-se para cuspir nova mente. Por uma extravagante associação, relacionou esse ato com a lembrança da cama. Se o cuspo alcançasse o terreiro, a cama seria comprada antes do fim do ano. Encheu a boca de saliva, inclinou-se — e não conseguiu o que esperava. Fez várias tentativas, inutilmente. (...) Olhou de novo os pés espalmados. Efetivamente não se acostumava a calçar sapatos, mas o remoque de Fabiano molestara-a. Pés de papagaio. Isso mesmo, sem dúvida, matuto anda assim. Para que fazer vergonha à gente? Arreliava-se com a comparação. Pobre do papagaio. Viajar com ela, na gaiola que balançava em cima do baú de folha. Gaguejava: — “Meu louro.” Era o que sabia dizer. Fora isso, aboiava arremedando Fabiano e latia como Baleia. Coitado. Sinha Vitória nem queria lembrar-se daquilo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. Rio de Janeiro/São Paulo, Record, 2007, p. 41-43.) a) Por que a comparação feita por Fabiano incomoda tanto sinha Vitória? Que lembrança evoca? RESOLUÇÃO: Sinha Vitória sente-se incomodada com a comparação feita por Fabiano — o andar dela, quando usava sapatos, assemelhava-se ao de um papagaio — porque, ridicularizando-a, fere a sua vaidade feminina. Além disso, traz à mente da mulher a lembrança do papagaio, o que a faz reviver um remorso, pois fora dela a ideia de usar a ave como alimento. O mal-estar é ainda maior, pois a lembrança desse episódio evoca o sofrimento que ela e sua família tiveram durante a seca.
32 –
3. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte trecho do capítulo “Contas”, de Vidas Secas:
(...) Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. Bem. Nascera com esse destino, ninguém tinha culpa de ele haver nascido com um destino ruim. Que fazer? Podia mudar a sorte? Se lhe dissessem que era possível melhorar de situação, espantar-se-ia. (...) Era sina. O pai vivera assim, o avô também. E para trás não existia família. Cortar mandacaru, ensebar látegos — aquilo estava no sangue. Conformava-se, não pretendia mais nada. Se lhe dessem o que era dele, estava certo. Não davam. Era um desgraçado, era como um cachorro, só recebia ossos. Por que seria que os homens ricos ainda lhe tomavam uma parte dos ossos? Fazia até nojo pessoas importantes se ocuparem com semelhantes porcarias. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. 103.a ed. Rio de Janeiro, Editora Record, 2007, p. 97.) a) Que visão Fabiano tem de sua própria condição? Justifique. RESOLUÇÃO: Fabiano é um dos “heróis problemá ticos” de Gracilian o Ramos, em permanente revolta contra si e c ontra o mundo. É personagem típica dos romances de tensão crítica (Lucien Goldman), nos quais se exibem as sequelas irreversíveis que as injustiças sociais, a opressão e a brutalidade impõem ao ser humano. Fabiano, fatalista a princípio — “Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. (…) Nascera com esse destino (…) Podia mudar a sorte? (…) Era sina. O pai vivera assim (…)” —, parece resignado com a condição de vaqueiro, de empregado, de homem permanentemente brutalizado pelo clima e pela sociedade. Sua revolta nasce da constatação de que, ainda assim, era roubado, prejudicado pelos “homens ricos”, que lhe tomavam até parte dos “ossos” que lhe cabiam pelo trabalho.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 33
b) Explique a referência que ele faz aos “homens ricos”, com base no enredo do livro. RESOLUÇÃO: Os “homens ricos” a que Fabiano se refere são os seus opressores, especialmente o “patrão”, latifundiário, que o oprime, impondo-lhe uma “meação” já em si injusta (ao patrão cabiam três de cada quatro bezerros e dois de cada três caprinos que Fabiano criasse), além da aplicação da tabela “price” aos débitos que o sertanejo ia acumulando. Não bastasse isso, o patrão ainda roubava nas contas. É o retrato brutal de uma sociedade arcaica, pré-capitalista, que acrescenta a onipotência do patronato coronelesco à prepotência do Estado e de seus órgãos policiais (o Soldado Amarelo) e fiscais (a prefeitura).
Texto para a questão 5.
Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras, clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados. De quando em quando estes se mexiam, porque o lume era fraco e apenas aquecia pedaços deles. Outros pedaços esfriavam recebendo o ar que entrava pelas rachaduras das paredes e pelas gretas da janela. Por isso não podiam dormir. Quando iam pegando no sono, arrepiavamse, tinhamdos precisão de era virar-se, chegavam-se à trempe ouviam a conversa pais. Não propriamente conversa: eramefrases soltas, espaçadas, com repetições e incongruências. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. São Paulo, Livraria Martins Editora, s/d., p. 66.)
a) Você concorda com essa afirmação? Justifique sucintamente sua resposta.
5. (FGV-SP) – “Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras, clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados.” a) As ações de Fabiano nesse primeiro trecho desencadearam outras ações com efeitos plásticos e semânticos no contexto. Partindo dessa afirmação, analise, nas orações destacadas em itálico, os sentidos criados pela sequência dos verbos, tanto sob o ponto de vista físico, quanto sob o ponto de vista simbólico, denunciando o estado das personagens.
RESOLUÇÃO: Não, pois a seca é apenas um dos fatores que afligem Fabiano e sua família e não explica todos os dramas da personagem. A secura em Vidas Secas
RESOLUÇÃO: No trecho em itálico, as orações, coordenadas assindéticas, articulam uma sucessão de imagens, especialmente no campo visual, que aludem a alguma
não se restringe ao clima e à paisagem; é, ainda, uma “secura” existencial, linguística e social, advinda de fatores políticos, econômicos e culturais. As aflições de Fabiano também derivam, por exemplo, da violência que sofre por parte do Soldado Amarelo (símbolo da autoridade opressora), assim como de sua incapacidade de comunicação.
luz, pouca e precária, mas que ilumina, afastando o medo e aquecendo. É a luz da madeira queimada que indicia a miséria dos que não têm nem mesmo um lampião a óleo ou querosene.
4. (FUVEST-SP) – Leia as afirmações seguintes e responda ao que se pede. I. A dureza do clima, que se manifesta principalmente nas grandes secas periódicas, explica todas as aflições de Fabiano, ao longo da narrativa de Vidas Secas, de Graciliano Ramos.
II. Apesar de quase atrofiadas na sua rusticidade, as personagens de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, conservam um filete de investigação da interioridade: cada uma delas se perscruta, reflete, tenta compre ender a si e ao mundo, ajustando-o à sua visão. b) Você considera essa afirmação correta? Justifique brevemente sua resposta.
b) Em “clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados”, Graciliano Ramos se vale de técnicas que se assemelham às do cinema, como se se tratasse do “olhar” de uma câmera. Explique esse mecanismo e contextualize seu efeito de sentido com base na obra lida. RESOLUÇÃO: travelling As imagens, justapostas por coordenação, movem-se como num cinematográfico: como se uma câmera se movesse e, emdireção da precária luminosidade, embig close, pusesse em foco as imagens sobre as quais incide a luz: pés, joelhos e os meninos deitados. O “efeito de sentido” refere-se, de novo, à pobreza e precariedade da vida representadas na obra.
RESOLUÇÃO: A afirmação pode ser considerada correta, pois esse “filete de investigação da interioridade” é um recurso de que se vale o narrador, por meio do uso do discurso indireto livre, para trazer à tona os dramas internos de Fabiano e de sua família.
– 33
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 34
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (X)
1. (FUVEST-SP-2010) – Leia este trecho do poema de Vinícius de Moraes:
MENSAGEM À POESIA P O R T U G U Ê S D
Não posso Não é possível Digam-lhe que é totalmente impossível Agora não pode ser É impossível Não posso. que estou tristíssimo, mas não posso ir esta noite ao seu Digam-lhe [encontro. 2. (UNICAMP-SP-2010) – O poeta Vinícius de Moraes, apesar de Contem-lhe que há milhões de corpos a enterrar modernista, explorou formas clássicas, como o soneto abaixo, em Muitas cidades a reerguer, muita pobreza pelo mundo. versos alexandrinos (12 sílabas) rimados: Contem-lhe que há uma criança chorando em alguma parte do mundo E as mulheres estão ficando loucas, e há legiões delas carpindo SONETO DE INTIMIDADE A saudade de seus homens; contem-lhe que há um vácuo Nos olhos dos párias, e sua magreza é extrema; contem-lhe Nas tardes de fazenda há muito azul demais. Que a vergonha, a desonra, o suicídio rondam os lares, e é preciso Eu saio às vezes, sigo pelo pasto, agora [reconquistar a vida. Mastigando um capim, o peito nu de fora Façam-lhe ver que é preciso eu estar alerta, voltado para todos os No pijama irreal de há três anos atrás. [caminhos Pronto a socorrer, a amar, a mentir, a morrer se for preciso. Desço o rio no vau dos pequenos canais (...) Para ir beber na fonte a água fria e sonora (Vinícius de Moraes,Antologia Poética) E se encontro no mato o rubro de uma amora Vou cuspindo-lhe o sangue em torno dos currais. a) No trecho, o poeta expõe alguns dos motivos que o impedem de ir Fico ali respirando o cheiro bom do estrume ao encontro da poesia. A partir da observação desses motivos, procure Entre as vacas e os bois que me olham sem ciúme deduzir a concepção dessa poesia ao encontro da qual o poeta não E quando por acaso uma mijada ferve poderá ir: como se define essa poesia? quais suas características principais? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: Seguida de um olhar não sem malícia e verve O poeta exprime rejeição à poesia que fuja do contato imediato com o Nós todos, animais, sem comoção nenhuma mundo e os seus problemas. Mijamos em comum numa festa de espuma. (Vinícius de Moraes,Antologia Poética. São Paulo, Companhia das Letras, 2001, p. 86.) a) Essa forma clássica tradicionalmente exigiu tema e linguagem elevados. O “Soneto de Intimidade” atende a essa exigência? Justifique. b) Na “Advertência”, que abre sua Antologia Poética, Vinícius de Moraes declarou haver “dois períodos distintos”, ou duas fases, em sua obra. Considerando-se as características dominantes do trecho, a qual desses períodos ele pertence? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “Mensagem à Poesia” pertence à segunda fase da obra de Vinícius de Moraes, pois há no texto a preocupação em fazer a poesia abandonar o inefávela eenterrar”, buscar o “criança cotidianochorando”, e as preocupações doreconquistar mundo (“milhões de corpos “é preciso a vida”).
34 –
RESOLUÇÃO: Nem o tema, nem a linguagem desse soneto são “elevados”. Com efeito, o tema é “baixo” (o congraçamento “fisiológico” com os animais) e a linguagem não evita o vulgar (“cheiro bom do estrume”) e chega a beirar o chulo (“uma mijada ferve”, “mijamos em comum numa festa de espuma”).
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 35
b) Como os quartetos anunciam a identificação do eu lírico com os animais? Como os tercetos a confirmam?
3. Destaque, no poema deVinícius de Moraes, otrecho que indica que ele teria sido influenciado pela poesia de Manuel Bandeira.
RESOLUÇÃO: Os quartetos exprimem a identificação do eu lírico com os animais, apresentando-o em ações mais comumente esperadas deles: mastigar capim (v. 3), andar sem roupa (v. 3), beber água na fonte dos rios (v. 6), comer amoras direto das árvores e cuspi-las em torno dos currais (vv. 78). A confirmação dessa identificação vem nos tercetos de forma inusitada, na menção ao congraçamento do eu lírico com os bois e as vacas na satisfação de uma necessidade fisiológica comum.
RESOLUÇÃO: “Não foste apenas um segredo / De poesia e de emoção / Foste uma estrela em meu degredo.”
4. Qual o refrão do poema de Vinícius? Comente as transformações que esse refrão sofre em suas repetições ao longo do poema. RESOLUÇÃO: O refrão é “Poeta, pai, áspero irmão”. Em cada uma das três vezes que esse refrão se repete no poema, destaca-se uma das três qualificações que Vinícius atribui a Bandeira: primeiro, pai vem seguido de ponto de exclamação; na segunda ocorrência, o ponto de exclamação vem depois de poeta; na terceira ocorrência, há um ponto de interrogação no fim do verso, ficando os três vocativos igualados na pergunta final.
Texto para as questões de 3 a 7.
SAUDADE DE MANUEL BANDEIRA
Não foste apenas um segredo De poesia e de emoção Foste uma estrela em meu degredo Poeta, pai! áspero irmão. Não me abraçaste só no peito Puseste a mão na minha mão Eu, pequenino — tu, eleito Poeta! pai, áspero irmão.
5. Explique por que o verso “Eu, pequenino — tu, eleito” contém uma antítese. RESOLUÇÃO: A antítese ocorre entrepequenino e eleito. Pequenino, no contexto, significa “poeta de pequeno valor”, ao passo que eleito significa o oposto: “grande poeta”, porque “eleito”, “escolhido” (na Antiguidade se imaginava que o poeta — o grande poeta — fosse o eleito dos deuses).
Lúcido, alto e ascético amigo De triste e claro coração Que sonhas tanto a sós contigo Poeta, pai, áspero irmão? (Vinícius de Moraes)
RESPOSTA A VINÍCIUS
Poeta sou; pai, pouco; irmão, mais. Lúcido, sim; eleito, não. E bem triste de tantos ais Que me enchem a imaginação. 6. Qual a outra expressão do poema de Vinícius cujo sentido pode ser aproximado de “áspero irmão”?
Com que sonho? Não sei bem não. Talvez com me bastar, feliz — Ah feliz como jamais fui! —, Arrancando do coração — Arrancando pela raiz — Este anseio infinito e vão De possuir o que me possui.
RESOLUÇÃO: “Ascético amigo.”
(Manuel Bandeira)
– 35
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 36
7. Explique o sentido da resposta de Bandeira à pergunta de Vinícius. RESOLUÇÃO: Bandeira responde que não sabe bem com o que sonha — sonharia talvez com a felicidade autossuficiente (“...talvez com me bastar, feliz”) e com a supressão do grande e inútil desejo (“anseio infinito e vão”) de assenhorear-se daquilo que o encanta e domina o seu desejo (“possuir o que me possui”). P O R T U G U Ê S D
8. (UFSCar-SP) – Nos dois primeiros quartetos do soneto de Vinícius de Moraes, delineia-se a ideia de que o poeta a) não acredita no amor como entrega total entre duas pessoas. b) acredita que, mesmo amando muito uma pessoa, é possível apaixonar-se por outra e trocar de amor. c) entende que somente a morte é capaz de findar com o amor de duas pessoas. d) concebe o amor como um sentimento intenso a ser compartilhado, tanto na alegria quanto na tristeza. e) vê, na angústia causada pela ideia da morte, o impedimento para as pessoas se entregarem ao amor. RESOLUÇÃO: A ideia de que o amor deve ser compartilhado tanto na alegria como na tristeza depreende-se dos dois últimos versos da segunda estrofe: “E rir meu riso e derramar meu pranto / Ao seu pesar ou seu contentamento.” Resposta: D
Textos para os testes 8 e 9.
SONETO DE FIDELIDADE
De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.
9. (UFSCar-SP) – Em “Por enquanto”, Renato Russo diz que “...o pra sempre / sempre acaba”. Essa ideia, no poema de Vinícius de Moraes, aparece no seguinte verso: a) “Mas que seja infinito enquanto dure.” b) “Quero vivê-lo em cada vão momento.” c) “Quem sabe a morte, angústia de quem vive.” d) “Quem sabe a solidão, fim de quem ama.” e) “Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto.”
Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento.
RESOLUÇÃO: O verso “Mas que seja infinito enquanto dure” implica a ideia de fim, de término (“enquanto dure” quer dizer que não durará sempre), e postula que, dentro de tal limite, o amor não conheça limites (“seja infinito”, isto é, não seja contido por nenhuma restrição). Os versos de Renato Russo — “o pra sempre / sempre acaba” — também afirmam a ideia de fim, em contraste com um projeto sem limite, sem fim (“o pra sempre”). O ponto comum entre os dois textos é, portanto, a ideia de que algo que se quer sem limites também está destinado a terminar. Resposta: A
E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa lhe dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. (Vinícius de Moraes)
POR ENQUANTO Mudaram as estações Nada mudou Mas eu sei que alguma coisa aconteceu Tá tudo assim, tão diferente Se lembra quando a gente Chegou um dia a acreditar Que tudo era pra sempre Sem saber Que o pra sempre Sempre acaba. (Renato Russo)
36 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 37
MÓDULO
Análise de Textos (I)
Textos para as questões de 1 a 6.
Texto 1
Como sempre acontece a quem tem muito onde escolher, o pequeno, a quem o padrinho queria fazer clérigo mandando-o a Coimbra, a quem a madrinha queria fazer artista metendo-o na Conceição, a quem D. Maria queria fazer rábula arranjando-o em algum cartório e a quem enfim cada conhecido ou amigo queria dar um destino que julgava mais conveniente às inclinações que nele descobria, o
3. No primeiro excerto, o narrador repete o sujeito “o pequeno”. Entre as duas ocorrências do termo, há intercalada uma série de orações sintaticamente semelhantes. Considerando essa informação, responda ao que se pede: a) O que há de comum en tre todas essas orações? RESOLUÇÃO: O que há de comum a todas as orações adjetivas que acom panham o termo “o pequeno” é o desejo ou a intenção que cada uma das personagens mencionadas (o padrinho, a madrinha, D. Maria etc.) tem em relação ao futuro do protagonista Leonardo.
pequeno, dizemos, tendo nem tantaspara coisas boas, escolheu pior possível; nem foi para Coimbra, a Conceição, nemapara cartório algum; não fez nenhuma destas coisas, nem também outra qualquer: constituiu-se um completo vadio, vadio-mestre, vadio-tipo. Texto 2
Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça: era alta, magra, pálida; andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo, cortado, dava-lhe apenas até o pescoço e, como andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, como uma viseira. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 1. No primeiro excerto, quem é o “pequeno”? RESOLUÇÃO: O “pequeno” é Leonardinho, o protagonista dasMemórias de um Sargento de Milícias.
b) Por que o narrador, no trecho 1, após a segunda ocorrência de “o pequeno”, utiliza o verbo “dizemos”? Qual é o sentido dessa forma verbal na passagem? RESOLUÇÃO: O narrador utiliza a forma “dizemos”, intercalada, porque, depois de apresentar pela primeira vez o sujeito — “o pequeno” —, interrompe o que dizia com a série de orações adjetivas, perdendo assim a sequência de seu pensamento. Para retomá-la, depois de repetir o sujeito, utiliza a forma verbal “dizemos”, que, na passagem, significa “como estávamos dizendo”, “como dizíamos” etc.
2. Como se chama a personagem descrita na segunda passagem? RESOLUÇÃO: Luisinha, sobrinha de D. Maria.
– 37
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 38
c) Em que consiste a ironia presente no trecho 1? RESOLUÇÃO: Consiste em que todos alimentavam pretensiosas expectativas quanto ao futuro de Leonardo (ser clérigo, artista, rábula...), porém ele frustrou a todos, constituindo-se um “completo vadio”.
P O R T U G U Ê S D
5. Na descrição da sobrinha de D. Maria, perce bem-se duas partes: uma em que o narrador a caracteriza sinteticamente e outra em que particulariza analiticamente seus traços e atitudes. Identifiquecada uma dessas partes, apontando as respectivas passagens. RESOLUÇÃO: Descrição sintética: “Era a sobrinha de D. Maria já muito desenvolvida, porém que, tendo perdido as graças de menina, ainda não tinha adquirido a beleza de moça”; Descrição analítica: “era alta, magra, pálida; andava com o queixo enterrado no peito, trazia as pálpebras sempre baixas e olhava a furto; tinha os braços finos e compridos; o cabelo cortado dava-lhe apenas até o pescoço e, como andava mal penteada e trazia a cabeça sempre baixa, uma grande porção lhe caía sobre a testa e olhos, como uma viseira.”
4. (PUC-SP) – Tomando como ponto de partida a descrição das personagens a que se referem os trechos transcritos, e considerando o romance como um todo, justifique a afirmação do crítico Antonio Candido de que Memórias de um Sargento de Milícias, obra escrita no Romantismo, estava meio em descompasso com os padrões e o tom daquele momento. RESOLUÇÃO: A caracterização de Leonardo e Luisinha, nos fragmentos transcritos, evidencia que a obra de Manuel Antônio de Almeida se afasta da idealização e linearidade com quem os autores românticos brasileiros concebiam seus heróis e heroínas. Na caracterização de Leonardo, o autor constrói um anti-herói (“um completo vadio, vadio-mestre, vadio-tipo”); constrói um típico “malandro”, ancestral de Macunaíma, da obra homônima de Mário de Andrade, na linhagem do “herói sem nenhum caráter”, motivado mais pelo prazer, pelo medo, pela oportunidade do que por qualquer fundamento ético e qualquer ideal. Nesse mesmo sentido, toda a descrição de Luisinha aproxima-se da atitude realista, pela ênfase que dá aos aspectos banais e sem encantos da figura feminina, isto é, pela ausência de qualquer idealização: “andava com o queixo enterrado no peito”, “trazia a cabeça sempre baixa”.
Texto para a questão 6.
Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da carnaúba; Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros; Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas. Onde vai a afouta jangada, que deixa rápida a costa cearense, aberta ao fresco terral a grande vela? Onde vai como branca alcíone, buscando o rochedo pátrio nas solidões do oceano? (José de Alencar,Iracema) 6. Releia os trechos de Memórias de um Sargento de Milícias e, comparando-os ao fragmento de Iracema acima transcrito, discorra sobre o estilo da linguagem de ambas as obras. RESOLUÇÃO: Em Memórias de um Sargento de Milícias , o estilo é irônico, coloquial e irreverente, ao passo que, em Iracema, ao contrário, o estilo é reverente, poético, mítico.
38 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 39
Análise de Textos (II)
MÓDULO Textos para as questões de 1 a 6.
LXXII UMA REFORMA DRAMÁTICA
Bentinho/D. Casmurro é Otelo, Capitu é Desdêmona, Escobar é Cássio, e a consciência atormentada do narrador é Iago, a espicaçar-lhe o mórbido ciúme. Como admitia o narrador, ele primeiro constituiu, como numa montagem operística, um duo terníssimo, depois um trio, depois um quatuor.
Nem eu, nem tu, nem ela, nem qualquer outra pessoa desta história poderia responder mais, tão certo é que o destino, como todos os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho. Eles chegam a seu tempo, até que o pano cai, apagam-se as luzes e os espectadores vão dormir. Nesse gênero há porventura alguma coisa que reformar, e eu proporia, como ensaio, que as peças começassem pelo fim. Otelo mataria a si e a Desdêmona no primeiro ato, os três seguintes seriam dados à ação lenta e decrescente do ciúme e o último ficaria só com as cenas iniciais da ameaça dos turcos, as explicações de Otelo e Desdêmona, e o bom conselho do fino Iago: “Mete dinheiro na bolsa.” Desta maneira, o espectador, por um lado, acharia no teatro a charada habitual que os periódicos lhe dão, porque os últimos atos explicariam o desfecho do primeiro, espécie de conceito, e, por outro lado, ia para a cama com uma boa impressão de ternura e de amor. CXXXV OTELO
Jantei fora. De noite fui ao teatro. Representava-se justamente Otelo, que eu não vira nem lera nunca; sabia apenas o assunto e estimei a coincidência. Vi as grandes raivas do mouro, por causa de um lenço — um simples lenço! —, e aqui dou matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros continentes, pois não me pude furtar à observação de que um lenço bastou a acender os ciúmes de Otelo e compor mais sublime tragédialençóis; deste mundo. lenços hoje sãoaprecisos os próprios algumaOsvez nem perderam-se, lençóis há, e valem só as camisas. Tais eram as ideias que me iam passando pela cabeça, vagas e turvas, à medida que o mouro rolava convulso, e Iago destilava a sua calúnia. Nos intervalos não me levantava da cadeira; não queria expor-me a encontrar algum conhecido. As senhoras ficavam quase todas nos camarotes, enquanto os homens iam fumar. Então eu perguntava a mim mesmo se alguma daquelas não teria amado alguém que jazesse agora no cemitério, e vinham outras incoerências, até que o pano subia e continuava a peça. O último ato mostrou-me que não eu, mas Capitu devia morrer. Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este lhe deu entre aplausos frenéticos do público.
b) Ele já tornara a peça assunto do capítulo LXXII, mas apenas agora tem ocasião de vê-la. Do ponto de vista da estrutura do romance, isso implicaria alguma contradição? Justificar, se for o caso. RESOLUÇÃO: Não há contradição. A ordem cronológica da ação do roman ce é truncada pelas digressões do narrador, que, posicionado no presente da narração, da escrita de suas memórias, interfere livremente no passado e na ação para comentá-los. A técnica impressionista de recompor o passado através de “manchas” de recordação permite, pela imposição do tempo psicológico, a fusão de presente e passado. O capítulo LXXII, de caráter metalin guístico, é uma reflexão do memorialista que interrompe e elucida a ação romanesca. O capítulo CXXXV integra a própria ação do romance, recapitulando o passado. Não há, portanto, qualquer contradição estrutural no fato de, no capítulo LXXII, o narrador revelar o conhecimento de uma peça que a personagem, na sequência da ação, só veria no capítulo CXXXV. Basta não confundir narrador e personagem.
1. (FUVEST-SP) – O narrador afirma, no capítulo CXXXV, que “não vira nem lera nunca” Otelo e que estimou a coincidência, ao chegar ao teatro. a) A que coincidência está se referindo? RESOLUÇÃO: Bentinho alude à coincidência entre o seu drama pessoal, centrado no ciúme doentio e na suposta traição de sua esposa, e o núcleo dramático de Otelo, de Shakespeare, tragédia que se desenvolve em torno do mesmo tema. O romance machadiano estabelece com a peça clássica uma constante relação de intertextualidade. Já a partir da teoria do velho tenor Marcolini, exposta no capítulo IX, de que “a vida é uma ópera”, e endossada pelo narrador no capítulo seguinte, evidencia-se o paralelo, às vezes desdobrado em paródia, entre o romance e a encenação dramática.
– 39
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 40
P O R T U G U Ê S D
2. (FUVEST-SP) – “Os lenços perderam-se, hoje são precisos os próprios lençóis; alguma vez nem lençóis há, e valem só as camisas.” Por que o narrador contrapõe lençóis e camisas, de seu tempo, a lenços, do tempo da tragédia?
4. (FUVEST-SP) – “Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este lhe deu entre aplausos frenéticos do público.” O modo como o narrador vê a reação do público revela algo. De que se trata?
RESOLUÇÃO: Há, na contraposição entre os lenços do passado e os lençóis e camisas do presente, uma crítica à decadência dos costumes do tempo de enunciação de Dom Casmurro. Na época retratada por Shakespeare, bastavam indícios materiais para configurar o adultério; hoje (o presente da narração, da enunciação) são necessárias provas mais contun dentes: a exibição da intimidade dos amantes, dos “lençóis”, das “camisas” (= peças íntimas).
RESOLUÇÃO: O narrador, equivocadamente, interpreta os aplausos do público como aplausos ao ato de vingança de Otelo, como se o público estivesse assumindo o papel do príncipe mouro, solidário com sua ira. Na verdade, o público aplaudia o espetáculo, o desempenho dos atores, não a atitude do marido “traído”. É mais uma evidência da importância do foco narrativo na construção de Dom Casmurro.
3. (FUVEST-SP) – Como bom espectador, o narrador sabia que Desdêmona era inocente. Por que ele não se compadece da morte dela?
5. (FUVEST-SP) – Quando o narrador propõe a reforma dramática, no capítulo LXXII, ele compara o destino aos dramaturgos. a) O que seria de uma trag édia, caso o dramaturgo lhe invertesse a trama?
RESOLUÇÃO: A tragédia de Shakespeare deixa patente a inocência de Desdêmona, e a prova incriminatória, o fatídico lenço, não passou de um ardil de Iago, que materializou, na consciência atormentada de Otelo, a convicção do adultério. Bentinho, contudo, está tão envolvido nas teias do ciúme, e o narrador é tão solidário com Otelo, que a inocência de Desdêmona é irrelevante. O narrador-personagem identifica-se com Otelo e, como ele, assume o papel do marido que, supondo-se traído, exerce sua “justa” vingança. É um indício da subjetividade do ponto de vista.
40 –
RESOLUÇÃO: A solução ou a reforma aventada pelo narrador, invertendo-se o curso dos acontecimentos para que a ação desabasse em anticlímax, transfor maria a tragédia de Otelo em comédia, ou em ópera-bufa, e a ação homicida e suicida da personagem descam baria no prosaico conselho pecuniário de Iago: “Mete dinheiro na bolsa”, numa velada crítica ao pragmatismo contemporâneo.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 41
b) Na verdade, o que Bentinho buscaria reformar? RESOLUÇÃO: Ao propor sua reforma dramática, na qual a tragédia, satí rica e parodisticamente, terminasse emhappy end, o narrador-personagem, “pressentindo” sua tragédia pessoal, procuraria inver ter o curso dos acontecimentos, interferindo no próprio destino, no curso da vida. Continua, portanto, fiel ao princípio que acatou, a partir da teoria do velho tenor Marcolini: “A vida é uma ópera.” A reforma que propõe o narrador é uma premonição do desfecho, que ele já conhece, e imagina reverter pelo discurso, pela encenação.
Texto para a questão 7.
— Você é um grande prosa — disse tio Cosme, quando ele acabou. José Dias sorriu sem vexame. Padre Cabral confirmou os louvores do agregado, sem os seus superlativos; ao que este acrescentou que o Cardeal Mastai evidentemente fora talhado para a tiara desde o princípio dos tempos. E, piscando-me o olho, concluiu: — A vocação é tudo. O estado eclesiástico é perfeitíssimo, contanto que o sacerdote venha já destinado do berço. Não havendo vocação, falo de vocação sincera e real, um jovem pode muito bem estudar as letras humanas, que também são úteis e honradas. Padre Cabral retorquia: — A vocação é muito, mas o poder de Deus é soberano. Um homem pode não ter gosto à igreja e até persegui-la, e um dia a voz de Deus lhe— fala, sai apóstolo; vejaeuSão Paulo. Nãoe ele contesto, mas o que digo é outra coisa. O que eu digo é que se pode muito bem servir a Deus sem ser padre, cá fora; pode-se ou não se pode? — Pode-se. — Pois então! exclamou José Dias triunfalmente, olhando em volta de si. Sem vocação é que não há bom padre, e em qualquer profissão liberal se serve a Deus, como todos devemos. — Perfeitamente, mas vocação não é só do berço que se traz. (Machado de Assis, Dom Casmurro) 7) a) A discussão entre José Dias e Padre Cabral gira em torno de que tema?
6. (FUVEST-SP) – Ao comparar o destino humano ao destino das personagens de uma peça teatral, Machado retoma o tópos (lugarcomum literário) do Theatrum Mundi (o “teatro do mundo”, ou seja, o mundo como um teatro). Explique. RESOLUÇÃO: O tópos do mundo como um teatro é recorrente na literatura e remonta a Platão, que comparou o homem a um fantoche nas mãos de Deus. O mundo como um teatro significa que o homem não possui o controle total de seu próprio destino, assim como as personagens, manipuladas pelo dramaturgo, não podem alterar o desfecho a que são submetidas: “tão certo é que o destino, como todos os dramaturgos, não anuncia as peripécias nem o desfecho.”
RESOLUÇÃO: A discussão gira em torno da vocação para a vida reli giosa. (O que está em jogo é a ida ou não de Bentinho para o seminário.)
b) Qual a posição defendida por um e por outro? RESOLUÇÃO: José Dias defende que a vocação é condiçãosine qua non para o ingresso no sacerdócio e que ela deve vir do berço. Padre Cabral concorda que deve haver vocação, mas discorda de que ela deva ser uma condição dada desde o nascimento; segu ndo ele, alguém pode receber o chamado de Deus, mesmo depois de ter levado uma vida contrária à Igreja, como ocorreu com São Paulo.
– 41
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 42
MÓDULO
Análise de Textos (III)
As questões de números 1 a 4 tomam por base um fragmento do romance O Ateneu, de Raul Pompeia (1863-1895), em que o narrador comenta suas reações ao ensino que recebia no colégio: P O R T U G U Ê S D
O ATENEU
A doutrina cristã, anotada pela proficiência do explicador, foi ocasião de dobrado ensino que muito me interessou. Era o céu aberto, rodeado de altares, para todas as criações consagradas da fé. Curioso encarar a grandeza do Altíssimo; mas havia janelas para o purgatório aE que o Sanchestinha se debruçava comigo, cuja vista muito seduzia. o preceptor um tempero de unção na voz e nomais modo, uma sobranceria de diretor espiritual, que fala do pecado sem macular a boca. Expunha quase compungido, fincando o olhar no teto, fazendo estalar os dedos, num enlevo de abstração religiosa; expunha, demorando os incidentes, as mais cabeludas manifestações de Satanás no mundo. Nem ao menos dourava os chifres, que me não fizessem medo; pelo contrário, havia como que o capricho de surpreender com as fantasias do Mal e da Tentação, e, segundo o lineamento do Sanches, a cauda do demônio tinha talvez dois metros mais que na realidade. Insinuou-me, é certo, uma vez, que não é tão feio o dito, como o pintam. O catecismo começou a infundir-me o temor apavorado dos oráculos obscuros. Eu não acreditava inteiramente. Bem pensando, achava que metade daquilo era invenção malvada do Sanches. E quando ele se punha a contar histórias de castidade, sem atenção à parvidade da matéria do preceito teológico, mulher do próximo, Conceição da Virgem, terceiro-luxúria, brados ao céu pela sensualidade contra a natureza, vantagens morais do matrimônio, e porque a carne, a inocente carne, que eu só conhecia condenada pela quaresma e pelos monopolistas do bacalhau, a pobre carne do beef, era inimiga da alma; quando retificava o meu engano, que era outra a carne e guisada de modo especial e muito especialmente trinchada, eu mordia um pedacinho de indignação contra as calúnias à santa cartilha do meu devoto credo. Mas a coisa interessava e eu ia colhendo as informações para julgar por mim oportunamente. Na tabuada e no desenho linear, eu prescindia do colega mais velho; no desenho, porque achava graça em percorrer os caprichosos traços, divertindo-me a geometria miúda como um brinquedo; na tabuada e no sistema métrico, porque perdera as esperanças de passar de medíocre como ginasta de cálculos e resolvera deixar a Maurílio ou a quem quer que fosse o primado das cifras. Em dois meses tínhamos vencido por alto a matéria toda do curso; e, com este preparo, sorria-me o agouro de magnífico futuro, quando veio a fatalidade desandar a roda. (Raul Pompeia, O Ateneu. Rio de Janeiro, Biblioteca Universal Popular, 1963.) 1. (VUNESP-SP-2010) – Nesta passagem de O Ateneu, romance que a crítica literária ainda hesita em classificar dentro de um único estilo literário, a personagem narradora se refere ao ensino de religião cristã, desenho e matemática, mostrando atitudes diferentes com relação aos conteúdos de cada disciplina. Releia o texto e, a seguir, explique a razão de a personagem narradora declarar, no penúltimo parágrafo, que prescindia do colega mais velho no aprendizado de desenho.
42 –
RESOLUÇÃO: Diferentemente do que ocorria com o estudo da tabuada e do sistema métrico, matérias que já não seduziam o narrador, visto que ele se diz, nelas, um “medíocre” sem esperanças, o trabalho com o desenho o atraía e entretinha: “achava graça em percorrer os caprichosos traços, divertindo-me a geometria miúda como um brinquedo”. Este o motivo pelo qual, no caso, ele “prescindia do colega mais velho”, cujo auxílio lhe valia no estudo de religião e seria inútil no de matemática.
2. (VUNESP-SP-2010) – No primeiro parágrafo, a personagem Sanches, aluno mais velho que atuava como espécie de preceptor para os estudos de Sérgio, o mais novo, refere-se a duas entidades da religião cristã, contextualizando valores opostos a cada uma delas. Identifique as duas entidades e os valores a que estão respectivamente associadas. RESOLUÇÃO: As entidades referidas são Deus (“o Altíssimo”) e Satanás. Os valores a que estão associadas tais entidades são o Bem (a virtude), no caso de Deus, e o Mal, a Tentação (o pecado), no caso de Satanás.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 43
3. (VUNESP-SP-2010) – Embora no uso popular a palavra agouro apresente muitas vezes a acepção de “previsão ruim”, seu significado srcinal não tem essa marca pejorativa, mas, simplesmente, o de prognóstico, previsão, predição, augúrio. Leia atentamente o último parágrafo do fragmento de O Ateneu e, a seguir, explique, comprovando com base em elementos do contexto, em que sentido o narrador empre gou a palavra agouro. RESOLUÇÃO: O contexto em que se encontra a palavra agouro, núcleo do sujeito da oração, é enfaticamente positivo, seja no verbo metafórico — “sorria-me” — que constitui o seu predicado —, seja no complemento nominal que a acompanha — “de magnífico futuro”. Portanto, o sentido de agouro só pode ser “prognóstico, previsão”, sem qualquer traço negativo.
As questões de números 5 e 6 referem-se ao texto seguinte, de José de Alencar.
O trocano1 ribombou, derramando longe pela amplidão dos vales e pelos ecos das montanhas a pocema2 do triunfo. Os tacapes, vibrados pela mão pujante dos guerreiros, bateram nos largos escudos retinindo. Mas a voz possante da multidão dos guerreiros cobriu o imenso rumor, clamando: — Tu és Ubirajara, o senhor da lança, o vencedor de Pojucã, o maior guerreiro da nação tocantim. (...) Quando parou o estrondo da festa e cessou o canto dos guerreiros, avançou Camacã, o grande chefe dos araguaias. (...) falou o ancião: Assim — Ubirajara, senhor da lança, é tempo de empunhares o grande arco da nação araguaia, que deve estar na mão do mais possante. Camacã o conquistou no dia em que escolheu por esposa Jaçanã, a virgem dos olhos de fogo, em cujo seio te gerou seu primeiro sangue. Ainda hoje, apesar da velhice que lhe mirrou o corpo, nenhum guerreiro ousaria disputar o grande arco ao velho chefe, que não sofresse logo o castigo de sua audácia. Mas Tupã ordena que o ancião se curve para a terra, até desabar como o tronco carcomido; e que o mancebo se eleve para o céu como a árvore altaneira. Camacã revive em ti; a glória de ser o maior guerreiro cresce com a glória de ter gerado um guerreiro ainda maior do que ele. (José de Alencar, Ubirajara. 8.a ed. São Paulo, Ática, 1984, p. 31-32.)
4. (VUNESP-SP-2010) – Ao focalizar os pecados contra as virtudes estipuladas pela religião, no segundo parágrafo, o narrador de certo modo se diverte e faz um jogo de palavras com duas diferentes acepções de carne. Releia atentamente o parágrafo e explique esse jogo de palavras. RESOLUÇÃO: Quando se falava em “pecados da carne”, a ingenui dade do narrador o levava a pensar em carne bovina, que era a referência única da palavra em seu repertório infantil. Seu instrutor em matéria religiosa, que se enlevava na exposição das “mais cabeludas manifestações de Satanás no mundo”, corrigia-o pressurosamente, esclarecendo tratar-se de outra “carne”, que se prepara e come de outra maneira... Tais esclareci mentos eram para o menino, ao mesmo tempo, motivo de indignação e interesse.
1 – Trocano: espécie de tambor dos índios, feito de um pedaço de tronco oco com tampos de tábua furados ao meio, posto horizontalmente sobre forquilhas. 2 – Pocema: canto selvagem, clamor.
5. (UFSCar-SP) – Apresenta-se, no fragmento de Ubirajara , um cenário de exaltação ao herói. Logo, trata-se de um ritual grandiloquente para aquele que simboliza o poder na tribo, em valores que expressam o ideário romântico do qual participou Alencar. a) Por que se pode dizer que a oração “Tu és Ubirajara” sintetiza o discurso de exaltação ao herói? RESOLUÇÃO: A palavra indígenaUbirajara significa “senhor da lança” (Ubira = vara, lança; jara = senhor), sintetizando o discurso de exaltação, porque só o mais possante dos guerreiros poderia ser o chefe da tribo araguaia, empunhar o grande arco e ser chamado Ubirajara. O grande arco é a insígnia do chefe guerreiro.
– 43
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 44
b) Comente a visão romântica do índio brasileiro, expressa em Alencar, comparando-a com a visão do índio no Modernismo, valendo-se da figura de Macunaíma, de Mário de Andrade:
P O R T U G U Ê S D
No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma. (Mário de Andrade, Macunaíma, o herói sem nenhum caráter.
6. (UFSCar-SP) – O texto apresenta o índio num ritual, exaltando-se o guerreiro Ubirajara por vencer o rival, Pojucã. a) O que representa o discurso de Camacã para a vida na tribo? RESOLUÇÃO: O discurso de Camacã representa a troca de chefe. O guerreiro ancião Camacã passa o comando da tribo araguaia a seu filho, o jovem, forte, corajoso Ubirajara.
31.a ed. Belo Horizonte/Rio de Janeiro, Garnier, 2000, p. 13.) RESOLUÇÃO: A visão romântica do índio brasileiro, expressa em Alencar e autores dessa escola, é bastante idealizada. O código ético do aborígine aproxima-o da figura do cavaleiro das novelas medievalistas do Romantismo europeu: a honra acima de tudo. Já no Modernismo, não existe a idealização da personagem indígena, pois a “índia tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma”. Na visão antropofágica do Modernismo, o índio é o “mau selvagem”.
b) Quais as expressões, de sentido figurado, empregadas por Alencar para referir-se à velhice de Camacã? Que figura de linguagem está contida nessas expressões? RESOLUÇÃO: “Mas Tupã ordena que o ancião se curve para a terra, até desabar como o tronco carcomido.” A figura de linguagem que aparece nessa passagem é a comparação ou símile (“como o tronco carcomido”).
Análise de Textos (IV)
MÓDULO
As questões de números 1 a 4 tomam por base uma passagem da comédia As Casadas Solteiras , de Martins Pena (1815-1848), e uma passagem do romance Dona Flor e seus Dois Maridos, de Jorge Amado (1912-2001).
AS CASADAS SOLTEIRAS Cena IX Henriqueta e depois Jeremias
solteiro, ou, se é casado, viver bem longe da mulher.enquanto ( fala, Henriqueta vem-se aproximando dele pouco a pouco) Vivo como um lindo amor! Ora, já não posso aturar a minha cara-metade... O que me vale é Henriqueta, que a este tempo estar ela há mais de duzentas léguas de mim. ( está junto dele,agarra-lhe pela gola da casaca. Jeremias, assus tando-se) Quem é? (Henriqueta dá-lhe uma bofetada e o deixa. Jeremias, gritando) Ai, tragam luzes! São ladrões!aqui ( entra o criado com luzes)
Henriqueta É outra girândola, patife!
(sóalegre... ) Henriqueta Vens muito Mal sabes tu o que te espera. Canta, canta, que logo chiarás! (apaga a vela) Ah, meu tratante!
Jeremias Minha mulher!
Jeremias (entrando) Que diabo! É noite fechada e ainda não acenderam as velas!cha( mando) Tomás, Tomás, traze luz! Não há nada como estar o homem
Henriqueta Pensavas que te não havia de encontrar?
44 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 45
Jeremias Mulher do diabo!
Criado (entrando) Uma carta da Corte para o Sr. Jeremias.
Henriqueta Agora não te perderei de vista um só instante.
Jeremias Dá cá. (o criado entrega a carta e sai. Jeremias para Henriqueta) Não ter eu a fortuna, peste, que esta carta fosse a de convite para teu enterro...
Jeremias (para o criado) Vai-te embora. (o criado sai) Henriqueta Ah, não queres testemunhas? Jeremias Não, porque quero te matar!
Henriqueta Não terá esse gostinho. Pode ler, não faça cerimônia. Jeremias Não preciso da sua permissão. ( abre a carta e a lê em silêncio) Estou perdido! (deixa cair a carta no chão) Desgraçado de mim! (vai
cair sentado na cadeira)
Henriqueta Ah, ah, ah! Disso me rio eu.
Henriqueta O que é?
Jeremias (furioso) Ah, tens vontade de rir? Melhor; a morte será alegre. (tomando-a pelo braço) Tu és uma peste, e a peste se cura; és um demônio, e os demônios se exorcizam; és uma víbora, e as víboras se matam!
Jeremias Que infelicidade, ai!
Henriqueta E aos desavergonhados se ensinam! (levanta a mão para dar-lhe uma bofetada, e ele, deixando-a, recua) Ah, foges? Jeremias Fujo sim, porque da peste, dos demônios e das víboras se foge... Não quero mais te ver! ( fecha os olhos) Henriqueta
Henriqueta Jeremias! Jeremias Arruinado! Perdido! Henriqueta (corre e apanha a carta e a lê) “Sr. Jeremias, muito sinto dar-lhe tão desagradável notícia. O negociante a quem o senhor emprestou o resto de sua fortuna acaba de falir. Os credores não puderam haver nem 2 por cento do rateio. Tenha resignação...” — Que desgraça! Pobre Jeremias! (chegando-se para ele) Tende coragem.
Hás de ver-me e ouvir-me!
Jeremias Não quero mais te ouvir! (tapa os ouvidos com a mão) Henriqueta (tomando-o pelo braço) Pois hás de me sentir! Jeremias (saltando) Arreda! Henriqueta Agora não me arredarei mais do pé de ti, até o dia do Juízo...
Jeremias (chorando) Ter coragem! É bem fácil de dizer-se... Pobre, miserável... Ah! (levantando-se ) Henriqueta, tu que sempre me amaste, não me abandones agora... Mas não, tu me abandonarás; eu estou pobre... Henriqueta Injusto que tu és. Acaso amava eu o teu dinheiro, ou a ti? Jeremias Minha boa Henriqueta, minha querida mulher, agora que tudo perdi, só tu és o meu tesouro; só tu serás a consolação do pobre Jeremias.
Jeremias Pois agora também faço eu protesto solene a todas as nações, declaração formalíssima à face do universo inteiro, que hei de fugir de ti como o diabo foge da cruz; que hei de evitar-te como o devedor ao credor; que hei de odiar-te como as oposições odeiam as maiorias.
Henriqueta Abençoada seja a desgraça que me faz recobrar o teu amor! Trabalharemos para viver, e a vida junto de ti será para mim um paraíso...
Henriqueta E eu declaro que te hei de seguir como a sombra segue o corpo...
Jeremias Oh, nunca mais te deixarei! (Martins Pena, Comédias (1844-1845). As Casadas Solteiras: comédia em 3 atos. São Paulo, WMF Martins Fontes, 2007.)
Jeremias (com exclamação) Meu Deus, quem me livrará deste diabo encarnado?
– 45
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 46
DONA FLOR E SEUS DOIS MARIDOS
P O R T U G U Ê S D
Sempre fora considerada e se considerara dona Flor boa dona de casa, ordeira e pontual, cuidadosa. Boa dona de casa e boa diretora de sua Escola de Culinária, onde acumulava todos os cargos, contando apenas com a ajuda da empregada broca e esmorecida e a assistência amiga da pequena Marilda, curiosa de pratos e temperos. Nunca lhe ocorrera reclamação de aluna, incidente a toldar o sossego das aulas. A não ser, é claro, os acontecidos quando do primeiro esposo, pois o finado, como se está farto de saber, não era de ter consideração por horário, por trabalho alheio ou por melindres de alfenim; seus deboches com alunas por mais de uma vez criaram dificuldades e problemas para dona Flor, dores de cabeça, quando não enfeites de duro corno. Ah! Em verdade, Flor,em nãocasa possuía método, andava longeela, de dona ter ordem e na noção Escoladee, regra em suae existência, medida e pauta, como devera! Foi-lhe necessário viver com doutor Teodoro para dar-se conta de como sua ordem era anarquia, seus cuidados tacanhos e insuficientes, de como ia tudo mais ou menos ao deus-dará, a la vontê, sem lei e sem controle. Não decretou doutor Teodoro lei e controle de imediato e com severidade; nem sequer falou em tal. Sendo homem tranquilo e suspicaz, de educação cutuba, nada sabia impor e não impunha; no entanto tudo obtinha sem estardalhaço, sem que os demais se sentissem violentados; um fode-mansinho o nosso caro farmacêutico. Era preciso ver-se a casa um mês e meio depois da lua-de-mel, que diferença! Também dona Flor fazia diferença, buscando adaptar-se a seu marido, seu senhor, caber justa e certa em sua medida exata. Se nela a mudança era por dentro, mais sutil, menos visível, na casa fizera-se evidente, bastava olhar. (Jorge Amado, Dona Flor e seus Dois Maridos. São Paulo, Livraria Martins Editora, 1966.) 1. (VUNESP-SP-2010) – Nos dois fragmentos de texto citados, em que se colocam aspectos da relação entre marido e mulher no casamento, percebe-se que as esposas amam seus respectivos maridos, mas o modo de relacionamento é diferente. Tomando por base esse comentário, releia os dois fragmentos apresentados e demonstre que a atitude de Henriqueta diante de Jeremias é bastante diferente da que se percebe entre dona Flor e o doutor Teodoro. RESOLUÇÃO: Henriqueta suspeita, justificadamente, de Jeremias e o vigia; mostra-se agressiva quando se sabe enganada, parece impositiva, mas revela-se amorosa, fiel e desapegada quando o infortúnio se abate sobre seu marido. Dona Flor, ao contrário, não encara Teodoro com suspeita, mas com a admiração e o respeito que a levam a tomá-lo como modelo de ordenação da vida, procurando adaptar-se a ele, seja na organização da casa, seja em si mesma, “por dentro”, revelando-se dócil e submissa.
46 –
2. (VUNESP-SP-2010) – No terceiro parágrafo do texto de Jorge Amado, a expressão coloquialfode-mansinho, que poderia assumir um sentido de ordem sensual, é na verdade utilizada como metáfora que caracteriza outro aspecto da personalidade do doutor Teodoro. Releia o parágrafo e explique o que quer dizer o narrador ao afirmar que o doutor era um fode-mansinho. RESOLUÇÃO: A expressãofode-mansinho descreve a atitude dissimulada, manipuladora e sutil de Teodoro, que obtém das pessoas aquilo que deseja, sem que elas se sintam constrangidas ou forçadas.
3. (VUNESP-SP-2010) – No fragmento da peça de Martins Pena há palavras, expressões e frases que aparecem escritas em itálico e quase sempre entre parênteses. Trata-se de um recurso formal utilizado pelos autores em textos destinados a teatro, cinema e televisão. Partindo desse comentário, releia o texto e, a seguir, explique a função que apresenta esse recurso formal no fragmento apresentado. RESOLUÇÃO: Os trechos em itálico, as mais das vezes entre parênteses, não fazem parte do diálogo e sãorubricas teatrais, ou seja, instruções do autor para os atores e encenadores da peça, indicando detalhes de como e le concebe o com portamento das personagens, o cenário etc.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 47
4. (VUNESP-SP-2010) – Na peça de Martins Pena, Jeremias e Henriqueta usam em quase todo o diálogo o tratamento de segunda pessoa do singular (tu, te, ti, contigo e verbos com flexão correspon dente). Em certo momento, porém, há uma rápida troca de palavras em que os dois alteram a forma de tratamento, para em seguida voltarem ao de segunda pessoa. Localize a passagem que contém essa rápida troca de palavras e identifique a forma de tratamento que nela assumem marido e esposa. RESOLUÇÃO: Henriqueta e Jeremias passam a se tratar na terceira pessoa, de forma afetadamente mais distante e cerimoniosa, depois que ele, ao receber uma carta, exprime o desejo de que ela contivesse o convite para o enterro da esposa. Tal tratamento ocorre apenas em duas falas contíguas, uma de Henriqueta (“Não terá esse gostinho. Pode ler, não faça cerimônia.”) e outra de Jeremias (“Não preciso dasua permissão.”). Quando o infortúnio os reaproxima, o tratamento volta à segunda pessoa.
RESOLUÇÃO: O argumento da Farsa de Inês Pereira consiste no desenvolvimento do refrão popular “Mais quero asno que me carregue que cavalo que me derrube”. Inês, num primeiro momento, escolhe por marido Brás da Mata, um sujeito de boa aparência e bem-falante, que se pode associar à figura do cavalo. Porém, ela não é feliz com ele e, assim que possível, com a morte do marido, Inês reconsidera seus critérios de escolha (“Meu desejo eu retempero”) e opta por casar-se com o ingênuo — o asno — Pero Marques, que faz tudo para agradar à esposa. Desse modo, ela consegue tudo o que quer, tendo a seu lado um “asno” que a carrega, em vez de um “cavalo” que a derruba. O segundo marido, de tão tolo e servil, chega a carregar Inês nas costas, quando ela vai visitar um amante que se faz passar por um ermitão: — “Marido cuco [enganado] me levades. E mais duas lousas [chapas de pedra].” Pero — Pois assi se fazem as cousas. Inês
sabedes — “Bemvos quanto amo: vós, marido, sempre fostes percebido pera gamo [animal de chifres]. Carregado ides, noss’amo com duas lousas.” Pero — Pois assi se fazem as cousas. Inês — “Bem sabedes vós, marido, quanto vos quero. Sempre fostes percebido pera cervo. Agora vos tomou o demo com duas lousas.” Inês
Texto para a questão 5.
Inês
— Andar! Pero Marques seja! Quero tomar por esposo quem se tenha por ditoso de cada vez que me veja. Meu desejo eu retempero: asno que me leve quero, não cavalo valentão: antes lebre que leão, antes lavrador que Nero. (Gil Vicente, Farsa de Inês Pereira)
5. Os versos transcritos pertencem à Farsa de Inês Pereira (1523), de Gil Vicente. Nessa comédia de costumes, a protagonista Inês Pereira, moça leviana e namoradeira, para fugir da rígida disciplina que a mãe lhe impõe e ansiosa para livrar-se dos afazeres domésticos, casa-se com o galanteador e malandro Brás da Mata, que fingia ser escudeiro. Maltratada pelo marido, Inês tem seu caminho livre quando ele morre, ao fugir de uma batalha. A rapariga casa-se, então, com um antigo pretendente, Pero Marques, homem tolo e ingênuo, porém honesto e servil. Considerando-se o trecho transcrito e o que se acaba de afirmar a respeito da peça, explique de que modo o refrão popular “Mais quero asno que me carregue que cavalo que me derrube”, que motivou a criação da peça, se relaciona com seu enredo.
– 47
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 48
Análise de Textos (V)
MÓDULO
P O R T U G U Ê S D
As questões de números 1 a 3 tomam por base um poema de Cecília Meireles (1901-1964), cujo tema é a natação, e um poema de Joaquim Cardozo (1897-1978) sobre as vitórias do atleta brasileiro Ademar Ferreira da Silva no salto tríplice (medalha de ouro nas Olimpíadas de Helsinque, em 1952, e de Melbourne, em 1956, entre outras vitórias).
NADADOR
Cecília e duas palavras ou expressões da primeira estrofe (primeiros quatro versos) do poema de Cardozo que exprimem noções relacionadas com o plano do ar. RESOLUÇÃO: As imagens aéreas, na primeira estrofe do poema de Cecília Meireles, são “linha alada” e “pássaro da água”; na primeira estrofe do poema de Joaquim Cardozo, são “curvas aéreas”, “voo abandonado” e “ asas de um pássaro”.
O que me encanta é a linha alada das tuas espáduas, e a curva que descreves, pássaro da água! É a tua fina, ágil cintura, e esse adeus da tua garganta para cemitérios de espuma!
É a despedida, que me encanta, quando te desprendes ao vento, fiel à queda, rápida e branda. E apenas por estar prevendo, longe, na eternidade da água, sobreviver teu movimento... (Cecília Meireles, “Jogos Olímpicos”, in Poesias Completas de Cecília Meireles – vol. IV. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1973, p. 44.)
O SALTO TRIPARTIDO
Havia um arco projetado no solo Para ser recomposto em três curvas aéreas, Havia um voo abandonado no chão À espera das asas de um pássaro; Havia três pontos incertos na pista Que seriam contatos de pés instantâneos. Três jatos de fonte, contudo, ainda secos, Três impulsos plantados querendo nascer. Era tudo assim expectativo e plano Tudo além somente perspectivo e inerte; Quando Ademar Ferreira, com perfeição olímpica, Executou, em relevo, o mais alto, — Em notas de arpejo — Em ritmo iâmbico O tripartido salto. (Joaquim Cardozo, Poesias Completas. Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, 1971, p. 108.) 1. (VUNESP-SP) – Embora a natação seja um esporte da água e o salto tríplice um esporte do solo, envolvem também manobras no plano do ar (o salto de partida, na natação, e os três saltos seguidos, no salto tríplice), o que permite entender, nos poemas apresentados, a utilização de imagens que podem ser consideradas “aéreas”. Aponte duas palavras ou expressões da primeira estrofe (primeiros três versos) do poema de
48 –
2. (VUNESP-SP) – Os dois poemas divergem no que diz respeito ao ponto de vista utilizado pelo eu poemático para focalizar o tema. No poema de Joaquim Cardozo, as formas verbais surgem na terceira pessoa, o que cria um distanciamento entre o eu poemático e o evento narrado liricamente. Já no poema de Cecília Meireles, o eu poemático assume a primeira pessoa do singular. Aponte o efeito, em termos narrativos, dessa escolha de Cecília. RESOLUÇÃO: Admitindo-se que também no poema de Cecília Meireles se trate de narrativ a — como propõ e a questão —, a escolha da primeira pesso a intensifica a carga lírica texto por uma presença, e mesmo a participação , do do narrador — oimplicar eu lírico — na maior narrativa, pois em todas as estrofes há envolvimento entre a primeira e a segunda pessoa. Diferentemente do poema de Joaquim Cardozo, que celebra apenas a proeza do atleta, no de Cecília a beleza da performance do nadador celebrado é apresentada através das, e de permeio com, as emoções do eu lírico.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 49
3. (VUNESP-SP) – A abordagem da natação e do salto tríplice nos poemas apresentados se faz por meio de imagens e metáforas que nos apresentam de modo lírico os aspectos objetivos dos esportes focalizados. Com base nesse comentário, esclareça o que quer dizer o eu poemático no poema de Joaquim Cardozo, ao dizer que na pista havia “três pontos incertos”, “três jatos de fonte ainda secos” e “três impulsos plantados querendo nascer”. RESOLUÇÃO: As três imagens em questão descrevem as três etapas do salto como se fossem potencialidades à disposição ou à espera do grande atleta capaz de realizá-las, de levá-las à efetivação. Portanto, o feito do herói celebrado consistiria em explorar e tornar efetivas algumas virtualidades extremas da realidade, virtualidades que sem ele não chegariam à realização.
Porém o coração, feito valente Na escola da tortura repetida, E no uso do penar tornado crente, Respondeu: Desta altura vejo o Amor! Viver não foi em vão, se é isto a vida, Nem foi demais o desengano e a dor. (Antero de Quental, Os Sonetos Completos de Antero de Quental. Porto, Livraria Portuense de Lopes, 1886, p. 119; primeira edição, disponível na internet em: http://purl.pt/122/1/P160.html.) 1 – Solemnia verba: palavras solenes.
4. – de Os vista dois distintos, textos apresentados (VUNESP-SP) expressar, sob pontos a decepção identificam-se e o pessimismopor do homem com relação à vida e ao mundo. Diferenciam-se, todavia, na atitude final que apresentam ante essa decepção. Releia-os, atentamente, e explique essa diferença de atitude.
As questões de números 4 a 7 baseiam-se numa fala de personagem de uma peça de Millôr Fernandes (1923) e num soneto de Antero de Quental (1842-1891). ATRIZ (Rindo forçosamente depois que os atores saem.)
Tem gente que continua achando que a vida é uma piada. Ainda bem que tem gente que pensa que a vida é uma piada. Pior é a gente que pensa que o homem é o rei da criação. Rei da criação, eu, hein? Um assassino nato, usufruidor da miséria geral — se você come, alguém está deixando de comer, a comida não dá para todos, não — de que é que ele se ri? De que se ri a hiena? Se não for atropelado ficará no desemprego, se não ficar desempregado vai pegar um enfisema, será abandonado pela mulher que ama — mas ama, hein? —, arrebentado pelos filhos — pelos pais, se for filho —, mordido de cobra ou ficará impotente. E se escapar de tudo ficará velho, senil, babando num asilo. Piada, é? Pode ser que haja vida inteligente em outro planeta, neste, positivamente, não. O homem é o câncer da Terra. Estou me repetindo? Pois é: corrompe a natureza, fura túneis, empesta o ar, emporcalha as águas, apodrece tudo onde pisa. Fique tranquilo, amigo: o desaparecimento do ser humano não fará a mínima diferença à economia do cosmos. (Millôr Fernandes, Computa, Computador, Computa. 3.a ed. Rio de Janeiro, Nórdica, 1972, p. 85.) SOLEMNIA VERBA1
RESOLUÇÃO: No primeiro texto, Millôr Fernandes expressa uma atitude niilista, pois conclui que a espécie humana, extremamente agressiva, canalha e miserável, “não fará a mínima diferença à economia do cosmos” quando desaparecer. No segundo texto, Antero de Quental exprime uma postura orientada pela esperança, pois acredita que a dor constante da vida e a devastação gerada pelo homem são compensadas pela perspectiva final da existência, da qual se divisa o grande ideal do Amor.
5. (VUNESP-SP) – O soneto “Solemnia Verba” desenvolve-se como um diálogo entre duas personagens: o eu poemático e seu “coração”. O que simboliza, no poema, a personagem “coração”? RESOLUÇÃO: Em “Solemnia Verba”, o “coração” tem a função de servir como contraponto ao desencanto amargo do eu lírico. É, portanto, símbolo forte da esperança no amo r — o Amor mai usculiza do e entendido como força universal e esteio da existência, que consegue sobreviver até mesmo às situações mais inóspitas.
Disse ao meu coração: Olha por quantos Caminhos vãos andamos! Considera Agora, desta altura fria e austera, Os ermos que regaram nossos prantos... Pó e cinzas, onde houve flor e encantos! E noite, onde foi luz de primavera! Olha a teus pés o mundo e desespera, Semeador de sombras e quebrantos! — – 49
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 50
6. (VUNESP-SP) – Se um estudante emprega, numa dissertação, o verbo ter no sentido de “existir”, numa frase como “Tem muitos alunos na escola”, é penalizado na correção pelo professor, que recomenda nesse caso o emprego do verbo haver. O mesmo professor considerará perfeitamente normal que a personagem feminina da peça de Millôr Fernandes empregue, por duas vezes: “Tem gente”. Justifique por que essas atitudes do professor não são contraditórias. P O R T U G U Ê S D
RESOLUÇÃO: As atitudes do professor não são contraditórias, pois se referem a contextos linguísticos diferentes. Quando, numa dissertação ou outro trabalho escolar, o professor condena o emprego do verboter no lugar de haver, ele está chamando a atenção do aluno para o fato de que o uso de ter, no sentido de “existir”, é popular e coloquial, só devendo ocorrer com propriedade em situações informais. Portanto, é perfeitamente aceitável, num contexto como o da peça teatral de Millôr Fernandes, que a personagem empregue a variante popular, porque esta condiz com o ambiente e a situação representados.
MÓDULO
7. (VUNESP-SP) – Ao focalizar as ações dos homens na Terra, a personagem da peça de Millôr Fernandes conclui: “Pode ser que haja vida inteligente em outro planeta, neste, positivamente, não.” Explique o que quer dizer a personagem, com essa afirmação, sobre a natureza do ser humano. RESOLUÇÃO: Ao afirmar que não há vida inteligente neste planeta, a personagem de Millôr Fernandes permite que se infira que o Homem é um ser tolo. Segundo ela, o ser humano — assassino, explorador, massacrado pelo sistema social , pela família e pelas próprias forças bioló gicas — erra grosseiramente ao se considerar “o rei da criação”.
Redação e Morfologia (I)
1. (FUVEST-SP) – Observe este anúncio.
a) Na composição do anúncio, qual é a relação de sentido existente entre a imagem e o trecho “quem é e o que pensa”, que faz parte da mensagem verbal? RESOLUÇÃO: A imagem apresenta um rosto alegre que se forma a partir de linhas da impressão digital em que se inscreve, como a sugerir a definição do sujeito e do objeto representados linguisticamente pelos pronomes indefini dos/interrogativos quem e que. Em outras palavras, a imagem promete a resposta às interrogações introduzidas por aqueles pronomes, pois o rosto que se forma com as linhas da impressão digital sugere a identificação do sujeito pelo qual se pergunta, assim c omo daquilo que ele pensa, uma vez que o rosto é representado com uma expressão denunciadora de seu estado de espírito.
b) Se os sujeitos dos verbos “descubra” e “pensa” estivessem no plural, como deveria ser redigida a frase utilizada no anúncio? RESOLUÇÃO: Descubram quem são e o que pensam os moradores de São Paulo.
(Folha de S. Paulo, 26/09/2008. Adaptado.)
50 –
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 51
2. (UNIFESP) – Leia o texto e responda.
No tocante à relação entre a ética, a ciência e a tecnologia, duas são as dificuldades. Do lado da ética, a dificuldade é ela gerar uma moral conforme as necessidades da ciência e da tecnologia, na medida em que toda ética implica sanções e interdições, e a ciência e a tecnologia em si mesmas, em sua lógica interna, não estão, de saída, dispostas a aceitar proibições e a sacrificar a liberdade de conhecer e de engenhar. Do lado da ciência e da tecno logia, a dificuldade, como viu Tolstói a respeito da primeira, é que elas são impotentes para gerar valores, os quais deverão ser buscados e gerados alhures, em outras esferas da sociedade e da cultura. Não bastasse, ao contrário do que imaginava Bacon, que acreditava que o conhecimento, ou melhor, a ciência, além de gerar a técnica, deveria ser a norma da ação moral, ahaja ciência tecnologia não têmdea capacidade de instaurar tal norma, vistae asua incapacidade responder às duas questões que, segundo Tolstói, mais interessam em nos sas vidas: o que devemos fazer e como devemos viver? — talvez porque essas questões não tenham a ver com fatos, mas com valores, e os valores são algo mais do que uma cognição, dependendo de tradições, afetos e sentimentos. Daí não ser nada fácil a tarefa de ajustar a ética, a ciência e a tecnologia. Daí nosso temor de a grande e insistente reivindicação de mais ética, de pôr ética em tudo, gerar uma enorme e irremediável frustração. (Revista Kriterion, vol. 45, n.º 109, Belo Horizonte, Jan/Jun 2004.) a) De que tipo de argumento se vale o autor para fun damentar seu ponto de vista? RESOLUÇÃO: A pergunta é vaga, pois não é claro o sentido da expressão “tipo de argumento”. Os argumentos podem ser classificados de muitas maneiras, conforme tipologias diversas. Portanto, os candidados ficam sem saber o que de fato se pede numa questão formulada tão imprecisamente. O que se pode responder, tentando-se adivinhar a intenção do examinador, é que o autor argumenta de formadialética, pois contrapõe perspectivas opostas (de um lado a ética, do outro a ciência e a tecnologia) e também recorre a
3. (UNICAMP-2010) – A propaganda abaixo explora a expressão idiomática ‘não leve gato por lebre’ para construir a imagem de seu produto:
NÃO LEVE GATO POR LEBRE SÓ BOM BRIL É BOM BRIL a) Explique a expressão idiomática por meio de duas paráfrases. RESOLUÇÃO: “Não aceite um produto inferior em lugar do superior.” “Não se deixe enganar por produtos falsificados.” A resposta admite várias possibilidades de redação.
b) Mostre como a dupla ocorrência de BOM BRIL no slogan ‘SÓ BOM BRIL É BOM BRIL’, aliada à expressão idiomática, constrói a imagem do produto anunciado. RESOLUÇÃO: A tautologia “Só Bom Bril é Bom Bril” corres ponde à atribuição de uma qualidade única a um produto único. Todos os demais, ainda que apa rentemente similares, seriam meros “gatos” que rendo passar por “lebres”. Na primeira ocorrência, “Bom Bril” é nome próprio e significa “palha de aço”, ou seja, usa-se a marca pelo produto, o que configura uma meto nímia.
4. (FUVEST) – Examine a tirinha e responda ao que se pede.
argumentos de autoridade (ao invocar Tolstói e Bacon).
b) Qual a posição de Tolstói, quando analisa comparativamente ciência e ética? RESOLUÇÃO: Tolstói considera que a ciência gera conhecimento, mas não gera valores. Estes dependem de “tradições, afetos e sentimentos” e são decisivos na orientação de nossas vidas. Portanto, as normas éticas que funcionem como reguladoras do exercício da ciência (e do emprego da tecnologia por ela gerada) devem ser buscadas fora da ciência.
(Quino, Mafalda 2. São Paulo: Martins Fontes, 2002.)
– 51
D S Ê U G U T R O P
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 52
a) O sentido do texto se faz com base na polissemia de uma palavra. Identifique essa palavra e explique por que a indicou.
b) O que leva Odorico a empregar a expressão “por que não dizer”, para introduzir o substantivo “sagração”?
RESOLUÇÃO: Trata-se da palavraveículo, que pode significar (1) “qualquer meio usado para transportar ou conduzir pessoas, animais ou coisas, de um lugar para outro” ou (2) “qualquer coisa capaz de transmitir, propagar, difundir algo”. Na expressão “veículo de cultura”, o sentido de veículo é, claramente, (2). O humor da tirinha está em que Mafalda toma a palavra no seu sentido (1).
RESOLUÇÃO: O substantivo sagração pode ser entendido como “ato ou efeito de sagrar rei, bispo etc. em cerimônia religiosa”. Ao empregar a expressão “por que não dizer” para introduzir tal substantivo, Odorico inten sifica a expressão de sua pretensão de homem público que se julga digno de receber todas as honras de seu povo.
P O R T U G U Ê S D
6. (UNIFESP) – Leia a charge.
b) A tirinha visa produzir não só efeito humorístico mas também efeito crítico. Você concorda com essa afirmação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: O sentido crítico depreensível da tirinha provém da associação entre os ruídos emanados do televisor, que sugerem o conteúdo violento e “ape lativo” da programação, e a ideia de cultura, não no sentido antropológico da palavra (“conjunto de padrões de comportamento, crenças, conheci mentos, costumes etc. que distinguem um grupo social”), mas como sinônimo de “ilustração”, “cabedal de conhecimentos”. Longe de ser “veículo de cultura”, a televisão seria – sugere a tirinha – um veículo de barbárie.
(www.chargeonline.com.br. Adaptado.) a) As personagens são vítimas de preconceitos e os expressam em suas falas. Explique quais são eles.
5. (FUVEST) – Leia a seguinte fala, extraída de uma peça teatral, e responda ao que se pede.
RESOLUÇÃO: Segundo as personagens, a polícia trata pobres e ricos de maneiras diferentes. Para os pobres, como eles, não se usam os nomes pomposos das “operações” voltadas para ricos. Além disso, como indicam os desenhos e o próprio nome da “operação” destinada aos pobres, estes são também vítimas de maus-tratos.
Odorico — Povo sucupirano! Agoramente já investido no cargo de Prefeito, aqui estou para receber a confirmação, ratificação, a autenticação e, por que não dizer, a sagração do povo que me elegeu. (Dias Gomes, O Bem-Amado: farsa sociopolítico-patológica em 9 quadros) a) A linguagem utilizada por Odorico produz e feitos humorísticos. Aponte um exemplo que comprove essa afirmação. Justifique sua escolha. RESOLUÇÃO: O emprego do neologismoagoramente produz efeito humorístico, já que, ao acrescentar o sufixo -mente ao vocábulo agora, Odorico cria outro advérbio, com a intenção de reforçar o tom persuasivo de seu discurso pretensamente solene. Outro exemplo pertinente seria a produção de eco por meio da repetição do sufixo -ção presente na enumeração “confirmação, satisfação, a autenticação e (…) a sagração”.
52 –
b) Reescreva as falas das personagens, valendo-se da norma padrão da Língua Portuguesa. RESOLUÇÃO: Para prender ricos, a polícia cria nomes muito belos — não é verdade? Quando se trata de nós, o nome que dão é mesmo “operação tapa na orelha”.
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 53
Redação e Morfologia (II)
MÓDULO
1. (FUVEST-2010) – Leia o seguinte excerto de um artigo sobre o teólogo João Calvino.
Foi preciso o destemor conceitual de um teólogo exigente feito ele para dar o passo racional necessário. Ousou: para salvar a onipotência de Deus, não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina. Antônio Flávio Pierucci, Folha de S. Paulo, 12/7/2009.
D S Ê U G U T R O P
a) O excerto está redigido em lin guagem que apresenta traços de informalidade. RESOLUÇÃO: Identifique dois exemplos dessa informalidade. São coloquialismos empregados no texto: “feito”, por como; “não dá”, por não é possível, e “um quê”, por algo ou uma pequena parcela.
b) Mantendo o seu sentido, reescreva o trecho “não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina”, sem empregar duas vezes a palavra “não”. RESOLUÇÃO: Não é possível deixar de sacrificar algo da bon dade divina.
Texto para a questão 2.
CAPITULAÇÃO Delivery Até pra telepizza É um exagero. Há quem negue? Um povo com vergonha Da própria língua Já está entregue. (Luis Fernando Verissimo) 2. (FUVEST) a) O título dado pelo autor está adequado, tendo em vista o conteúdo do poema? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: O título “Capitulação” é inteiramente adequado ao conteúdo do poema, que se refere à “invasão” de anglicismos (americanismos) na língua portuguesa corrente no Brasil.
b) O exagero que o autor vê no emprego da palavra “delivery” se aplicaria também a “telepizza”? Justifique sua resposta.
3. (UNICAMP) – Jogos de imagens e palavras são característicos da linguagem de história em quadrinhos. Alguns desses jogos podem remeter a domínios específicos da linguagem a que temos acesso em nosso cotidiano, tais como a linguagem dos médicos, a linguagem dos economistas, a linguagem dos locutores de futebol, a linguagem dos surfistas, dentre outras. É o que ocorre na tira de Laerte, acima apresentada. a) Transcreva as passagens da tira que remetem a domínios específicos e explicite que domínios são esses. RESOLUÇÃO: As passagens são “perda total”, “reconstruíram meu corpo a partir do DNA” e “molar cariado”. O primeiro segmento refere-se à linguagem usada por companhias de seguros, o segundo, à biogenética, e o terceiro, à odontologia.
b) Levando em consideração as relações entre ima gens e palavras, identifique um momento de humor na tira e explique como é produzido. RESOLUÇÃO: O momento de humor instaura-se no último qua drinho, em que se estabelece uma relação de semelhança entre cárie e pedaços que faltam no corpo da personagem.
RESOLUÇÃO: “Telepizza” é um neologismo formado com um empréstimo linguístico já
pizza muito incorporado ao português o prefixo (grego)tele,hácorrente na língua. Portanto, não(italiano se trata do) emesmo fenômeno de “capitulação” que se vê em delivery, pois aqui se substituiu uma palavra corrente na língua (“entrega”) por um es trangeirismo da moda.
– 53
D_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 13/10/10 15:16 Página 54
Texto para a questão 4.
P O R T U G U Ê S D
Foi no tempo em que a Bandeirantes recém-inaugurara suas novas instalações no Morumbi. Não havia transporte público até o nosso local de trabalho, e a direção da casa organizou um serviço com viaturas próprias. (...) Paraná era um dos motoristas. (...) Numa das subidas para o Morumbi “fechou” sem nenhuma maldade um automóvel. O cidadão que o dirigia estava com os filhos, era diretor do São Paulo F.C., e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura. Logo depois que a perua chegou ao Morumbi, todo mundo de ponto batido, o automóvel para em frente da porta dos funcionários, e o seu condutor desce bufando: “Onde está o motorista dessa perua? (e lá vinha chegando o Paraná). Você me ofendeu na frente dos meus filhos. Não tem o direito de agir dessa forma, me amigo!” chamar do nome que me chamou. Vou falar ao João Saad, que é meu E o Paraná, já fuzilando, dedo em riste, tonitruou em seu sotaque mais que explícito: “Le” chamei e “le” chamo de novo... veado ... veado ... Não houve reação da parte ofendida. (ARAÚJO, Flávio. O rádio, o futebol e a vida. São Paulo: Editora Senac, 2001. pp. 50-1.)
RESOLUÇÃO: As duas possibilidades de paráfrase são: 1) Não e xiste uma única medida que o gove rno pos sa tomar, ou seja, o governo não poderá tomar nenhuma medida. 2) Não existe somente uma medida que o governo possa tomar, ou seja, há várias medidas que o governo poderia tomar.
b) Compare o enunciado citado com: Não há uma medida que só o governo possa tomar . O termo ‘só’ tem papel fundamental na interpretação de um e outro enunciado. Descreva como funciona o termo em cada um dos enunciados. Explique. RESOLUÇÃO: Em “Não há uma só medida que o governo possa tomar”, o adjetivo só tanto pode significar “única” quanto valer pelo advérbio apenas. Por isso, a frase pode significar que o governo não pode tomar nenhuma medida ou então que o governo tem a sua disposição diversas medidas. Quanto à frase “Não há uma medida que só o governo possa tomar”, nela o termo só significa somente ou sozinho, referindo-se a “governo”, e o sentido é que a medida não depende apenas do governo, não podendo ser tomada apenas por ele.
4. (UNICAMP) a) Na sequência: “(...) e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura”, se trocarmos o ponto final que aparece depois de ‘Paraná’ por uma vírgula, ocorrem mudanças na leitura? Justifique. RESOLUÇÃO: A vírgula, no caso, seria mais adequada que o ponto final, pois na verdade não ocorre o encerramento do período, visto que a última palavra da frase limitada pelo ponto (Paraná) é retomada pelo pronome relativo que, introdutor de uma oração adjetiva explicativa subordinada à oração anterior.
b) O trecho da resposta de Para ná: “...‘Le’ chamei e ‘le’ cha mo de novo ...” chama a atenção do leitor para a sintaxe da língua. Explique. RESOLUÇÃO: O le da fala de Paraná é uma variante (corrup tela) do pronome lhe, adequadamente empregado com o verbo chamar no sentido de “qualifi car, tachar”. A construção admitiria também o ob jeto direto, que corresponderia, no caso, ao pronome o: chamei-o/lhe (de) veado.
Ontem, hoje, amanhã: a vida inteira Teu nome é para nós, Manuel, bandeira. (Carlos Drummond de Andrade) 6. (UNICAMP) – Levando em consideração o poema de Drummond, em que é feita uma homenagem a um poeta brasileiro, responda às seguintes questões: a) Há um duplo sentido trabalhado no poema. Em que palavra isso ocorre? RESOLUÇÃO: A ambiguidade ocorre na palavra “bandeira”.
b) Quais recursos linguísticos são utilizados na construção desse jogo de palavras? RESOLUÇÃO: O emprego de “nome” no início doverso provoca a ambiguidade, pois pode ser o sobrenome do poeta ou referir-se a um emblema, já que está em letra minúscula.
c) Substitua tonitruou por outra palavra ou expressão. RESOLUÇÃO: Vociferou, gritou, clamou em altos brados, ou, em sentido figurado,trovejou.
c) Que interpretação resulta desse jogo de palavra s? 5. (UNICAMP) – Em transmissão de um jornal noturno televisivo (RedeTV, 7/10/2008), um jornalista afirmou: “Não há uma só medida que o governo possa tomar.” a) Considerando que há duas possibilidades de interpretação do enunciado acima, construa uma paráfrase para cada sentido possível de modo a explicitá-los.
54 –
RESOLUÇÃO: O termo “bandeira” configura um metáfora que significa “modelo a ser imitado por um grupo”, no caso, os escritores.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page I
E S Ê U G U T R O P
Português Curso Extensivo – E
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page II
P O R T U G U Ê S E
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 1
Revisão MÓDULO
PORTUGUÊS
Sintaxe (I)
1. (FUVEST-2010)
2. (UNICAMP-2010) E S Ê U G U T R O P
Uma nota diplomática* é semelhante a uma mulher da moda. Só depois de se despojar uma elegante de todas as fitas, rendas, joias, saias e corpetes, é que se encontra o exemplar não correto nem aumentado da edição damulher, conforme saiu dos prelos da natureza. É preciso desataviar uma nota diplomática de todas as frases, circunlocuções, desvios, adjetivos e advérbios, para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem.
Machado de Assis.
*Nota diplomática: comunicação escrita e oficial entre os governos de dois países, sobre assuntos do interesse de ambos. a) É correto afirmar que, segundo o texto, uma not a diplomática se parece com o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não. O texto estabelece semelhança entre o que seria a edição “aumentada e correta” da mulher e a nota diplomática, pois em ambas haveria excesso de adornos enganadores. Portanto, o “exemplar não correto nem aumentado da edição da mulher” equivaleria à nota diplomática “desataviada” de seus excessos retóricos.
b) Tendo em vista o trecho “para tocar a ideia capital e a intenção que lhe dá srcem”, indique um sinônimo da palavra “capital” que seja adequado ao contexto e identifique o referente do pronome “lhe”. RESOLUÇÃO: No contexto, capital significa “fundamental, principal, essencial”. O pronome pessoal oblíquo lhe retoma a expressão “nota diplomática”, funcionando como complemento nominal de “srcem” (“…dá srcem à nota diplomática”).
Retirada de www.eitapiula.net/2009/09/aurelio.jpg
Nessa propaganda do dicionário Aurélio, a expressão “bom pra burro” é polissêmica, e remete a uma representação de dicionário. a) Qual é essa representação? Ela é adequada ou inadequada? Justifique. RESOLUÇÃO: Trata-se da representação de dicionário contida na expressão “pai dos burros”. É evidente que se tra ta de uma representação inadequada, pois dicionários auxiliam quem deseja ou precisa co nhecer o sentido das palavras, não quem carece de inteligência, ou seja, quem é “burro”.
b) Explique como o uso da expressão “bom pra burro” produz humor nessa propaganda. RESOLUÇÃO: “Pra burro” é frequentemente associado à intensidade, quantidade, ao advérbio muito. Assim, a expressão “bom pra burro” significa “muito bom”. Ao vir junto à imagem de um dicionário, permite a associação à expressão “pai dos burros” (representação estabilizada de dicionário). O humor é provocado, portanto, pela convivência das duas associações no uso da expressão, colocando lado a lado a qualidade de ser muito bom e a imagem estereotipada de ser destinado a pessoas burras.
–1
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 2
Texto para a questão 3.
P O R T U G U Ê S E
A vida na fazenda se tornara difícil. Sinha Vitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desesperadas. Encolhido no banco do copiar, Fabiano espiava a catinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos redemoinhos, e os garranchos se torciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabiano resistia, pedindo a Deus um milagre. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 3. (UNESP) – Certas expressões ganham sentidos diferentes, dependendo do contexto ou da situação em que ocor rem. Assim, os adjetivos secas ou torrados, de Vidas Secas, estão impregnados de uma conotação negativa, diferentemente de secas ou torrados em contextos como ameixas secas ou amendoins torrados, onde são positivos. Pensando nessas possibilidades, a) explique que sentido tem a expressão céu azul, para Fabiano, na frase: “No céu azul as últimas arribações tinham desaparecido”. RESOLUÇÃO: A expressãocéu azul tem conotação negativa para Fabiano, pois indica que não haverá chuva e que a tão temida seca já é uma realidade inevitável.
b) construa uma frase em que o contexto atribua a essa mesma expressão uma conotação positiva. RESOLUÇÃO: “Após a tempestade, o céu azul brilhava com pro messa de bonança.”
Texto para a questãoo4.cômico nasce de uma “percepção do contráPara Pirandello, rio”, como no famoso exemplo de uma velha já decrépita que se cobre de maquiagem, veste-se como uma moça e pinta os cabelos. Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso, que nasce da ruptura das expectativas, mas sobretudo do sentimento de superioridade. A “percepção do contrário” pode, porém, transformar-se num “sentimento do contrário” — quando aquele que ri procura entender as razões pelas quais a velha se mascara, na ilusão de reconquistar a juventude perdida. Nesse passo, a velha da anedota não mais está distante do sujeito que percebe, porque este pensa que também poderia estar no lugar da velha — e seu riso se mistura com a compreensão piedosa e se transforma num sorriso. Para passar da atitude cômica para a atitude humorística, é preciso renunciar ao distanciamento e ao sentimento de superioridade. (Adaptado de Elias Thomé Saliba, Raízes do riso)
ficação e à compaixão do observador, que geram humor e não propriamente comicidade.
b) “Ao se perceber que aquela senhora velha é o oposto do que uma respeitável velha senhora deveria ser, produz-se o riso (...).” Sem prejuízo para o sentido do trecho acima, rees creva-o, substituindo se perceber e produz-se por formas verbais cujo sujeito seja nós e é o oposto por não corresponde. Faça as adaptações necessárias. RESOLUÇÃO: Ao percebermos que aquela senhora velha não corresponde ao que uma respeitável velha senhora deveria ser, produzimos o riso (rimos).
Texto para a questão 5.
Em um piano distante, alguém estuda uma lição lenta, em notas graves. (...) Esses sons soltos, indecisos, teimosos e tristes, de uma lição elementar qualquer, têm uma grave monotonia. Deus sabe por que acordei hoje com tendência a filosofia de bairro; mas agora me ocorre que a vida de muita gente parece um pouco essa lição de piano. Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia. Começa a esboçar, com os pontos soltos de alguns sons, a curva de uma frase musical; mas logo se detém, e volta, e se perde numa incoerência monótona. Não tem ritmo nem cadência sensíveis. (Rubem Braga, O homem rouco) 5. (FUVEST) a) O autor estabelece uma associação poética entre a vida de muita gente e uma lição de piano. Esclareça o sentido que ganha, no contexto dessa associação, a frase: “Nunca chega a formar a linha de uma certa melodia”.
RESOLUÇÃO: A frase, no contexto, significa que muitas pessoas não concluem aquilo a que se propõem ou não chegam a viver experiências que se integrem num conjunto articulado, como as palavras ou as notas musicais se integram no conjunto de uma frase linguística ou melódica, fazendo sentido ou compondo uma estrutura coerente.
4. (FUVEST)
b) “Deus sabe por que a cordei hoje com tendência a filosofia de bairro...” Reescreva a frase acima, substituindo a expressão sublinhada por outra de sentido equivalente.
a) Considerando que o atexto conceitua, qual a do diferença essencialo entre “percepção do explique contrário”brevemente e o “sentimento contrário”.
RESOLUÇÃO: Deus sabe por que acordei hoje com vontade de refletir sobre assuntos triviais (ou fatos prosaicos).
RESOLUÇÃO: A diferença essencial entre “percepção do contrário” e “sentimento do contrário” é que a primeira expressão sugere a ideia de distanciamento e superioridade do observador da cena cômica, e a segunda remete à identi-
2–
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 3
6. (FUVEST) – Considere as seguintes frases, extraídas de diferentes matérias jornalísticas, e responda ao que se pede. I. Nos últimos meses, o debate sobre o aquecimento global vem, com perdão do trocadilho, esquentando. II. Preso vigia acusado de matar empresário. a) Identifique, na frase I, o troc adilho a que se refere o redator e explique por que ele pede perdão por tê-lo produzido. RESOLUÇÃO: O trocadilho pelo qual o redator da frase se desculpa consiste no emprego do verbo esquentar no predicado de uma oração cujo sujeito é “o debate sobre o aquecimento global”. O tema em questão – o aquecimento global – associa-se, muito obviamente, à ideia de esquentar em sentido próprio (“aquecer-se”), daí derivando o emprego trocadilhesco desse verbo em
b) É correto afirmar que na frase II ocorre am biguidade? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Sim, é correto afirmar que a frase II é ambígua, porque ela pode ser entendida de duas formas, a saber: (1) foi preso o vigia acusado de matar empresário, e (2) um preso vigia o acusado de matar empresário.Vigia, na interpretação (1), é substantivo; na interpretação (2), é a terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo vigiar, complementado pelo objeto direto acusado. O par ticí pio preso tem força verbal em (1), funcionando, na fórmula sintética da manchete jornalística, como par te da locução da voz passiva “foi preso”; em (2), porém, o mesmo particípio tem sentido nominal, funcionando como adjetivo substantivado (o preso, um preso).
sentido figurado (“acirrar-se, A obviedade da associação aquecimento/esquentar – é queagravar-se”). seria responsável pelo retórico pedido de– desculpas.
MÓDULO
Sintaxe (II)
1. (UNICAMP-SP)
Matte a vontade. Matte Leão. Este enunciado faz parte de uma propaganda afixada em lugares nos quais se vende o chá Matte Leão. Observe as construções abaixo, feitas a partir do enunciado em questão: Matte à vontade. Mate a vontade. Mate à vontade. a) Complete cada uma das construções acima com palavras ou expressões que explicitem as leituras possíveisrelacionadas à propaganda. RESOLUÇÃO: Beba chá Matte (Leão) à vontade. Mate a vontade de tomar chá Matte (Leão). Beba (chá) mate à vontade. / Mate à vontade sua sede.
b) Retome a propaganda e explique o seu funcionamento, explicitando as relações morfológicas, sintáticas e semânticas envolvidas. RESOLUÇÃO: A propaganda explora justamente as diferentes possibilidades apresentadas no item a: • “Matte à vontade.” – O sentido é de haver chá da marca anunciada em grande quantidade, de forma a satisfazer quem desejar tomá-lo. Nessa frase, “à vontade” é locução adverbial e “Matte”, por seu duplo t, faz alusão à marca em questão. • “Mate a vontade.” – A frase, de teor conativo — imperativo ou exortativo —, conclama o receptor a satisfazer seu desejo. Aqui, “mate” é forma verbal do imperativo dematar, verbo usado como catacrese procedente de metáfora (matar = “satisfazer”); “a vontade” é um sintagma nominal que complementa o verbo (objeto direto). • “Mate à vontade”. Aqui a palavra “mate” é substantivo comum, e não se refere, portanto, à marca de chá. Poder-se-ia também entender “mate” como a forma verbal do imperativo do verbo matar (Mate sua sede à vontade com chá mate). Em ambas as interpretações, “à vontade” é locução adverbial.
–3
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 4
2. (UNICAMP-SP) – O Caderno “Aliás Debate” do Estado de S.Paulo, de 18/08/2006, apresenta uma matéria com o título: “Nas fres tas e brechas da segurança”. A matéria se inicia com o seguinte trecho:
3. (UFSCar) – Contemple a charge:
“Estamos nas frestas, procurando as brechas”. Esta boa frase, que circulou em manifesto atribuído ao PCC e ao seu líder (...), Marcola, resume bem o que pretende a organização criminosa que vem atacando a maior cidade brasileira. (p. 2) P O R T U G U Ê S E
a) Como você interpreta “frestas” e “brechas” em “Estamos nas frestas, procurando as brechas”? RESOLUÇÃO: As frestas, no contexto, sugerem o espaço “estreito” representado pela prisão ou mesmo pela situação de quem “está à es preita” buscando “brechas”, ou seja, aberturas para contornar ou burlar as restrições do sistema prisional e do próprio Poder Judiciário.
(Correio Popular, 10/10/2006.) Trata-se de uma charge publicada por um jornal brasileiro por ocasião da eleição do sul-coreano Ban Ki-Moon, como presidente da ONU, e da realização de um teste nuclear a mando do ditador norte-coreano Kim Jong-il. a) Como a diferença de emprego sintático do verbo vencer modifica o sentido das duas frases? RESOLUÇÃO: Na primeira frase, o verbovencer é intransitivo e vem acompanhado de um adjunto adverbial de lugar, “na ONU”. Na segunda frase, o verbo vencer é transitivo direto e tem como objeto direto “ONU”. Ou seja: no primeiro caso, a vitória ocorreu na ONU; no segundo, a ONU foi derrotada.
b) Levando em consideração que “Nas frestas e brechas da segurança” é o título da matéria, como você interpreta esse enun ciado comparandoo à frase atribuída a Marcola? RESOLUÇÃO: No título da matéria, as palavras “frestas” e “brechas” conotam a fragilidade, a ineficácia do sistema de segurança pública, o qual dá muito espaço à ação criminosa. No enunciado de Marcola, a palavra brecha conota o espaço de ação possível para um presidiário. Pode-se mencionar, ainda, que, no título da matéria, “frestas” e “brechas” são quase como sinônimos.
b) “Reconstrua” as duas frases, de maneira que os sentidos sugeridos pelas imagens fiquem, também, explícitos no texto escrito. RESOLUÇÃO: A primeira frase ficaria: “Sul-coreano vence eleição para presidência da ONU”. A segunda poderia ser apresentada desta forma: “Norte-coreano vence confronto com a ONU”.
4–
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 5
4. (UNICAMP-2010)
E S Ê U G U T R O P
5. (FUVEST)
Devemos misturar e alternar a solidão e a comunicação. Aquela nos incutirá o desejo do convívio social, esta, o desejo de nós mesmos; e uma será o remédio da outra: a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão. (Sêneca, Sobre a tranquilidade da alma, Trad. de J. R. Seabra Filho.) Quino, Toda Mafalda. São Paulo: Editora Martins Fontes, 6ª. Edição, 2003.
Nessa tirinha da famosa Mafalda do argentino Quino, o humor é construído fundamentalmente por um produtivo jogo de referência. a) Explicite como o termo ‘estrangeiro’ é entendido pela personagem Mafalda e pelo personagem Manolito. RESOLUÇÃO: Para Mafalda, estrangeiro é todo país que não seja o dela. Para Manolito, estrangeiro é todo país que não seja a pátria, ou seja, aquele em que a
a) Segundo Sêneca, a solidão e a comunicação devem ser vistas como complementares porque ambas satisfazem um mesmo desejo nosso. É correta essa interpretação do texto acima? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois solidão e comunicação correspondem a diferentes desejos do ser humano: a solidão supre a necessidade de isolamento, a comunicação satisfaz nossa carência de relacionamento social.
pessoa nasceu. O equívoco de Mafalda resulta em ela não entender que o seu país é estrangeiro para quem tenha nascido fora dele.
b) “(...) a solidão curará nossa aversão à multidão, a multidão, nosso tédio à solidão.” Sem prejuízo para o sentido srcinal, reescreva o trecho acima, inician do-o com “Nossa aversão à multidão...” b) Identifique duas palavras que, nessa tirinha, contri buem para a construção desse jogo de referência, explicando o papel delas. RESOLUÇÃO: As palavras centrais no mencionado “jogo de referência” são os artigos o
RESOLUÇÃO: Nossa aversão à multidão será curada pela solidão; o tédio à solidão será curado pela multidão.
e um. Para sendo Mafalda, usa o estrangeiros. artigo definido, seu é o país estrangeiro, todosque os demais ParaoManolito, o paísnão de Mafalda é um país, estrangeiro para os que procedam de outros países. Há ainda outros referentes; para Manolito, “pátria dele” refere-se ao país de srcem de seu pai e cá (Argentina) indica o país de destino de seu pai. Para Mafalda, este refere-se à Argentina, sua pátria, que não é, portanto, um país estrangeiro.
–5
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 6
6. (FUVEST) a) “Se eu não tivesse atento e olhado o rótulo, o pa ciente teria morrido”, declarou o médico. Reescreva a frase acima, corrigindo a impropriedade gramatical que nela ocorre.
P O R T U G U Ê S E
RESOLUÇÃO: “Se eu não estivesse atento e não tivesse olhado o ró tulo, o paciente teria morrido”, declarou o médico. (A impropriedade estava no emprego do auxiliar ter, em vez de estar, com o particípio atento.)
MÓDULO
BRASI DE CIMA E BRASI DE BAXO
Inquanto o Brasi de Cima Fala de transformação, Industra, matéra prima, Descobertas e invenção, No Brasi de Baxo isiste O drama penoso e triste Da negra necissidade; É uma cousa sem jeito E o povo não tem dereito Nem de dizê a verdade. No Brasi de Baxo eu vejo Nas ponta das pobre rua O descontente cortejo De criança quage nua. Vai um grupo de garoto Faminto, doente e roto Mode caçá o que comê Onde os carro põe o lixo, Como se eles fosse bicho Sem direito de vivê.
6–
RESOLUÇÃO: “Os ambientalistas defendem a econologia – com binação de princípios da economia, sociologia e ecologia – como maneira de viabilizar as formas alternativas de desenvolvimento.” (Notar: 1. que há duas construções na voz passiva, uma analítica – “é defendida” –, outra sintética ou pronominal – “se viabilizarem”; 2. que é conveniente, na voz ativa, alternativa pontuação para separar o aposto – “combinação…” – e o predicativo do objeto – “como maneira…”).
Sintaxe (III)
Instrução: As questões de números 1 a 4 tomam por base um poema do repentista cearense Patativa do Assaré (1909-2002) e uma passagem do livro O discípulo de Emaús de Murilo Mendes (1901-1975):
[...]
b) “A econologia, combinação de princípios da economia, sociologia e ecologia, é defendida por ambientalistas como maneira de se viabilizarem formas alternativas de desenvolvimento.” Reescreva a frase acima, transpondo-a para a voz ativa.
Estas pequenas pessoa, Estes fio do abandono, Que veve vagando à toa Como objeto sem dono, De manêra que horroriza, Deitado pela marquiza, Dromindo aqui e aculá No mais penoso relaxo, É deste Brasi de Baxo A crasse dos marginá. Meu Brasi de Baxo, amigo, Pra onde é que você vai? Nesta vida do mendigo Que não tem mãe nem tem pai? Não se afrija, nem se afobe, O que com o tempo sobe, O tempo mesmo derruba; Tarvez ainda aconteça Que o Brasi de Cima desça E o Brasi de Baxo suba. Sofre o povo privação Mas não pode recramá, Ispondo suas razão Nas coluna do jorná. Mas, tudo na vida passa, Antes que a grande desgraça Deste povo que padece Se istenda, cresça e redrobe, O Brasi de Baxo sobe E o Brasi de Cima desce.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 7
Brasi de Baxo subindo, Vai havê transformação Para os que veve sintindo Abondono e sujeição. Se acaba a dura sentença E a liberdade de imprensa Vai sê legá e comum, Em vez deste grande apuro, Todos vão tê no futuro Um Brasi de cada um.
E S Ê U G U T R O P
Brasi de paz e prazê, De riqueza todo cheio, Mas, que o dono do podê
2. (UNESP-julho-2010) – Patativa do Assaré criou um discurso
Respeite o dereito aleio. Um grande e rico país Munto ditoso e feliz, Um Brasi dos brasilêro, Um Brasi de cada quá, Um Brasi nacioná Sem monopolo istrangêro.
poemático peculiar, fala próprias popular normas e rural. ortográficas, Por isso, ao escrever seus poemas,que usaestiliza tambéma suas bem como “regras” gramaticais desse linguajar do povo. Releia atentamente a terceira estrofe do poema e a reescreva em discurso considerado culto, sem se preocupar com a quebra do ritmo ou da rima.
(Patativa do Assaré [Antônio Gonçalves da Silva]. Cante lá que eu canto cá. 6.ª Ed. Crato: Vozes/Fundação Pe. Ibiapina/Instituto Cultural do Cariri. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1986.)
O DISCÍPULO DE EMAÚS
A harmonia da sociedade somente poderá ser atingida mediante a execução de um código espiritual e moral que atenda, não só ao bem coletivo, como ao bem de cada um. A conciliação da liberdade com a autoridade é, no plano político, um dos mais importantes problemas. A extensão das possibilidades de melhoria a todos os membros da sociedade, sem distinção de raças, credos religiosos, opiniões políticas, é um dos imperativos da justiça social, bem como a apropriação pelo Estado dos instrumentos de trabalho coletivo. (Murilo Mendes. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Editora Nova Aguilar, 1994.)
1. (UNESP-julho-2010)– Os dois fragmentos apresentados focalizam o mesmo tema de formas diferentes, em poesia e em prosa. Em seu poema, Patativa do Assaré reclama, entre outras coisas, da falta de liberdade sofrida pelo povo do Brasi de Baxo. No segundo período do fragmento de Murilo Mendes a mesma questão é abordada sob outro ponto de vista. Explique o que se fala nesse fragmento a respeito da liberdade. RESOLUÇÃO: A questão formulada em termos gerais, abstratos, por Murilo Mendes – “a conciliação da liberdade com a autoridade” – toca no problema nacional que motiva a indignação de Patativa do Assaré, seja nas recla mações sobre a falta de liberdade para o “Brasi de Baxo” exprimir suas justas reclamações e demandas, seja nas queixas sobre o abuso de quem detém a autoridade (o “dono do Podê”), que não respeita o “dereito aleio”. Murilo Mendes, no trecho referido, reconhece, em sentido amplo, que o problema é “dos mais importantes”, sem mais especificações e pare cendo associá-lo, em seguida, a um ideal amplo, coletivista e socializante de “justiça social”.
RESOLUÇÃO: Estas pequenas pessoas, Estes filhos do abandono, Que vivem vagando à toa Como objetos sem dono, Que causam horror Deitados sob marquises, Dormindo aqui e acolá No mais penoso abandono É deste Brasil de Baixo A classe dos marginais.
3. (UNESP-julho-2010) – Relendo o primeiro período do fragmento de Murilo, podemos até imaginá-lo como uma resposta à sexta estrofe do poema de Patativa. Compare ambas as passagens e, a seguir, explique o que Murilo sugere para que na sociedade se possa atingir, como diz um texto, Um Brasi de cada um, ou o outro texto, o bem de cada um. RESOLUÇÃO: Somente pode haver a transformação idealizada no texto de Patativa do Assaré (“Brasi de Baxo subindo”, “liberdade de imprensa”), ou seja, ascensão dos desfavorecidos e liberdade política, caso haja, segundo o texto de Murilo Mendes, a “execução de um código espiritual e moral” que atenda a todos os brasileiros, não apenas a um grupo de privilegiados.
–7
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 8
4. (UNESP-julho-2010) – Como Patativa imita o linguajar do povo, seu discurso poemático incorpora regras gramaticais desse linguajar, que não são as mesmas da norma culta. Estabeleça a diferença entre a concordância verbal utilizada pelo poeta nos versos Onde os carro põe o lixo, / Como se eles fosse bicho e a que se observa na norma culta.
P O R T U G U Ê S E
RESOLUÇÃO: Nesses versos, a concordância, conforme a variante popular, flexiona em número apenas o determinante (artigo) e o pronome, pois, segundo a gramática desse linguajar, a flexão de substantivos e verbos seria redundante. Trata-se de uma regra de economia linguística. Na norma culta, os verbos devem flexionar-se no plu ral, concordando com os sujeitos os carros e eles.
b) No trecho “...quando haviam no mundo mulheres como Vidinha”, ocorre uma construção tida como incorreta, pois está em desacordo com o uso culto da língua portuguesa. De que se trata? Corrija o erro. RESOLUÇÃO: O verbo haver, no sentido de “existir”, é impessoal, devendo permanecer na terceira pessoa do singular: “...quando havia no mundo...”.
6. (FUVEST) – Não tenho dúvidas de que a reportagem esteja à procura da verdade, mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita com base exclusivamente em documentos da polícia política. (O Estado de S.Paulo)
Texto para a questão 5.
[...] admirava-se ele de como é que havia podido inclinar-se por um só instante a Luisinha, menina sensaborona e esquisita, quando haviam no mundo mulheres como Vidinha. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 5. (FUVEST) a) Em “...admirava-se ele de como é que havia podido inclinar-se...”, o sujeito da locução verbal destacada é elíptico e está no singular ( ele). Se o sujeito fosse composto (com dois ou mais núcleos) ou plural, essa locução verbal sofreria uma alteração. Qual seria? Justifique. RESOLUÇÃO: O verbo haver deveria concordar com o sujeito plural:haviam podido. Nas locuções verbais, a flexão de número recai sobre o verbo auxiliar e, no trecho dado, o verbo haver foi empregado como auxiliar do verbopoder. Não se deve, portanto, confundir esse emprego com o caso em que tal verbo é usado na acepção de “existir”, o que obrigaria a concordância exclusiva com a terceira pessoa do singular.
8–
Das duas ocorrências de de que, no excerto acima, uma está correta e a outra não. a) Justifique a correta. RESOLUÇÃO: A primeira ocorrência é a correta. Em “Não tenho dúvidas de que a reportagem...”, o uso da preposiçãode, diante da conjunção subordinativa integrante que, é obrigatório, já que a aludida preposição é regida pelo substantivo dúvidas.
b) Corrija a incorreta, dizendo por quê. RESOLUÇÃO: “... mas é preciso ressalvar de que a história não pode ser escrita...” Está de. O verbo ressalvar incorreta porque não há termo regente de preposição é transitivo direto, não exigindo, pois, preposição em seu complemento.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 9
Sintaxe (IV)
MÓDULO 1. (UNICAMP-2010)
NÃO DIGA SANDICES, MEU JOVEM. PERCEBA A GRANDEZA DESSE MOMENTO.
SABIA QUE ACABA DE SER ASSINADO O
MAIS UM TROÇO INÚTIL, EMPURRADO GOELA ABAIXO!
ESTAMOS FALANDO DA UNIFICAÇÃO DO NOSSO IDIOMA ESCRITO. DA PADRONIZAÇÃO
DA LÍNGUA!
ESTE LIVRO, POR EXEMPLO,
HÚÚMM...
ESTÁ ADAPTADO. ..SAINDO DABICHA, ÉDE JÁPORTUGAL EPODE SER PUBLICADO POR AQUI FUI TOMAR UMABICA SEM MUDAR UMA ANTES DE IR COMPRAR UM PAR DE VÍRGULA PEÚGAS. ?! SEQUER. ´´
´´
BICA...? PEÚGAS...?
2. (UNICAMP) – Leia os seguintes artigos do Capítulo VIII do novo Código Civil (Lei no. 10.406, de 10 de janeiro de 2002): Art. 1.548. É nulo o casamento contraído: I. pelo enfermo mental sem o necessário discer nimento para os atos da vida civil; II. por infringência de im pedimento. (...) Art. 1.550. É anulável o casamento: I. de quem não completou a idade mínima para casar; (...) VI . por incompetência da autoridade celebrante.
ALÁ!! NÃO FALEI?! NÃO FALEI?!
Retirada de www.miriamsalles.info/wp/wp-content/uploads/acord
a) Os enunciados que introduzem os artigos 1.548 e 1.550 têm sentido diferente. Explique essa diferença, comparando, do ponto de vista morfológico, as palavras nulo e anulável. RESOLUÇÃO: Nulo significa, no contexto, “sem valor, sem efeito por falta de uma formalidade fundamental”; anulável significa “que pode ser tornado nulo”. Portanto, entende-se que, nos termos do artigo1.548,não tem efeito o casamento contraído por “enfermo mental sem discernimento para os atos da vida civil” ou por pessoa sob impedimento; nos termos do artigo 1.550, entende-se que podem ser anulados os casamentos contraídos por menores ou celebra dos por pessoa não autorizada. A diferença morfológica – e, em consequência, semântica – entre os adjetivos nulo e anulável está em que o último se forma por derivação sufixal, a partir do verbo anular – por isso com a raiz nul- acrescida do prefixo a-. O sufixo empregado, -vel , significa “passível de”.
a) Qual é o pressuposto da personagem que defende o acordo ortográfico entre os países de língua portuguesa? Por que esse pressuposto é inadequado? RESOLUÇÃO: O pressuposto é que o Acordo promoveria a uniformização do português escrito, permitindo que livros portugueses se publicassem no Brasil sem nenhuma alteração. Tal pressuposto é des mentido pela simples leitura de algumas linhas de um livro português, linhas nas quais avultam as diferenças entre o vocabulário português e o brasileiro.
b) Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2001), infringência vem de infringir (violar, transgredir, desrespeitar) +ência. Compare o processo de formação dessa palavra com o de incompetência, indicando eventuais diferenças e semelhanças.
b) Explique como, na tira acima, esse pressuposto é quebrado. RESOLUÇÃO: A grande diferença lexical, que a leiturarevela, entre o português lusitano e o brasileiro constitui, como sugere a historieta, um obstáculo muito mais grave à compreensão mútua do que as diferenças gráficas que o Acordo Ortográfico busca superar.
RESOLUÇÃO: Infringência significa “ato de infringir”; incompetência significa “falta de competência”. Em ambas as palavras encontram-se os mesmos pre fixo (in) e sufixo (-ência). Infringência , porém, forma-se por derivação sufixal, pois o prefixo faz parte do verbo, infringir (“desobedecer, descumprir”), a cujo radical se juntou o sufixo ência, formador de substantivo abstrato, ao passo que em incompetência ocorre derivação prefixal, pois o prefixo in-, de sentido negativo, se junta ao substantivo competência.
–9
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 10
3. (UNICAMP) – Reportagem da Folha de S. Paulo informa que o presidente do Brasil assinou decreto estabelecendo prazos para o País colocar em prática o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que unifica a ortografia nos países de língua portuguesa. Na matéria, o seguinte quadro comparativo mostra alterações na ortografia estabelecidas em diferentes datas: P O R T U G U Ê S E
Após as reformas de 1931 e Êles estão tranqüilos, porque prova1943: velmente não crêem em fantasmas. Após as alterações de 1971:
b) O excerto transcrito apresenta uma ironia. Em que con siste essa ironia? Justifique. RESOLUÇÃO: A ironia do articulista refere-se à suposição, que fundamenta o Acordo, de que pequenas alterações ortográficas sejam suficientes para promover ou facilitar de maneira significativa o intercâmbio cultural entre os países lusófonos. Ao referir-se a lugares remotos e ignorados, o articulista, além de dar expressão a preconceitos sociais e culturais, pretende sugerir que o “atraso” – econômico, social, cultural – presumível em tais cidades seja o principal problema a travar as relações culturais entre os países envolvidos.
Eles estão tranqüilos, porque provavelmente não crêem em fantasmas.
Após o novo acordo, a vigorar Eles estão tranquilos, porque provaa partir de janeiro de 2009 velmente não creem em fantasmas. Sobre o acordo, a reportagem ainda informa:
As regras do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entram em vigor no Brasil a partir de janeiro de 2009, vão afetar principalmente o uso dos acentos agudo e circunflexo, do trema e do hífen. Cuidado: segundo elas, você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia. (...) (Adaptado de E. Simões, “Que língua é essa?”. Folha de S.Paulo, Ilustrada, p. 1, 28/09/2008.) a) O excerto acima supõe que alterações ortográficas modifiquem o modo de falar uma língua. Mostre a palavra utilizada que permite essa interpretação. Levando em consideração o quadro comparativo das mudanças ortográficas e a suposição expressa no excerto, explique o equívoco dessa suposição. RESOLUÇÃO: Ao concluir que “você não poderá mais dizer que foi mordido por uma jibóia, e sim por uma jiboia”, o jornalista usou o verbo dizer em lugar de escrever, induzindo o leitor em erro, ao sugerir que a reforma afetaria o modo de falar das pessoas. O quadro comparativo apresentado seria suficiente para desmentir a sugestão do jornalista, pois nele se vê que não houve alteração na pronúncia das palavras, mas apenas na sua grafia.
4. (FUVEST) – Leia o seguinte texto, extraído de uma biografia do compositor Carlos Gomes.
No ano seguinte [1860], com o objetivo de consolidar sua formação musical, [Carlos Gomes] mudou-se para o Rio de Janeiro, contra a vontade do pai, para iniciar os estudos no conservatório da cidade. “Uma ideia fixa me acompanha como o meu destino! Tenho culpa, porventura, por tal cousa, se foi vossemecê que me deu o gosto pela arte a que me dediquei e se seus esforços e sacrifícios fizeram-me ganhar ambição de glórias futuras?”, escreveu ao pai, aflito e cheio de remorso por tê-lo contrariado. “Não me culpe pelo passo que dei hoje. [...] Nada mais lhe posso dizer nesta ocasião, mas afirmo que as minhas intenções são puras e espero desassossegado a sua bênção e o seu perdão”, completou. (http://musicaclassica.folha.com.br) a) Sobre o advérbio “porventura”, presente na carta do compositor, o dicionário Houaiss informa: usa-se em frases interrogativas, especial mente em perguntas delicadas ou retóricas . Aplica-se ao texto da carta essa informação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A pergunta modulada pelo advérbioporventura é claramente retórica, ou seja, é uma afirmação sob a forma de pergunta, pois nela o autor sugere ter sido o próprio pai o “culpado” de seu “gosto pela arte”, um gosto que então o levaria a contrariar determinações paternas.
Ainda sobre a reforma ortográfica, Diogo Mainardi escreveu o se guinte:
Eu sou um ardoroso defensor da reforma ortográfica. A perspectiva de ser lido em Bafatá, no interior da Guiné-Bissau, da mesma maneira que sou lido em Carinhanha, no interior da Bahia, me enche de entusiasmo. Eu sempre soube que a maior barreira para o meu sucesso em Bafatá era o C mudo [como emfacto na ortografia de Portugal] (...) (D. Mainardi, “Uma reforma mais radical”. Revista VEJA, p. 129, 8/10/2008.)
10 –
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 11
b) Cite duas palavras, também empregadas pelo com positor, que atestem, de maneira mais evidente, que, daquela época para hoje, a língua portuguesa sofreu modificações. RESOLUÇÃO: As formas cousa e vossemecê, hoje desusadas no Brasil, atestam a evolução da língua. As formas hoje correntes dessas palavras são coisa e você. (O mesmo não seria verdade para Portugal, onde também a língua evoluiu, evidentemente, no último século e meio, e onde também as referidas pala vras se transformaram, mas onde ainda são cor rentes, em certos dialetos, as duas formas mais antigas.)
5. (UNICAMP)
a) A primeira tira é uma tradução portuguesa e a segunda, uma tradução brasileira. Dê um exemplo de uma diferença sintática entre a tradução do português europeu e a do português brasileiro. Descreva essa diferença. RESOLUÇÃO: A fala da mãe de Calvin, no último quadrinho, sem fugir ao coloquial lusitano, corresponde à norma culta quanto ao emprego do pronome oblíquo o como objeto direto depôr e sujeito de comer. No português do Brasil, a construção “fazer ele comer” corresponde à variante coloquial popular, que discrepa da norma culta, pois apresentao pronome retoele em função de objeto direto defazer. Outra diferença sintática significativa entre a tradução portuguesa e a brasileira se encontra nas construções “que te transformará”/“que irá te transformar”, no segundo quadrinho. Na versão portuguesa ocorre próclise do pronome oblíquo átono em construção com o futuro. Tal próclise seria justificada, nos termos da gramática normativa, pela “atração” exercida pronomebrasileira, relativo que, impeditiva da mesóclise transformar-te-á . Napelo tradução a construção “que irá te transformar” desrespeitaria tanto a “regra” da atração do pronome oblíquo (cuja observância resultaria em “que te irá transformar”) quanto, segundo a análise convencional, a interdição de ênclise com o futuro. Em “irá te transformar”, porém, não ocorre a ênclise condenada irá-te, mas sim, de acordo com a tendência geral da linguagem coloquial brasileira, a próclise “te transformará”. Ainda no segundo quadrinho, uma diferença sintática expressiva pode ser notada no confronto entre a uniformidade do tratamento em segunda pessoa, que se observa na versão portuguesa (te e comeres), e a falta de uniformidade presente na versão brasileira, com a mistura de segunda e terceira pessoa nos pronomes e na flexão verbal (te e você comer). A diferença entre as construções com o verbo ter, regendo preposição ou conjunção com função prepositiva – “tem de” (versão portuguesa) e “tem que” (versão brasileira) –, não chega a ser uma diferença propriamente sintática nem é significativa da diferença entre o português dos dois países, pois ter que também se usa em Portugal. Observe-se, porém, que gramáticos mais empedernidamente autoritários em sua “defesa” da tradição linguística (Napoleão Mendes de Almeida, por exemplo) consideram que as duas construções não se equivalem e devem ser usadas em contextos linguísticos diversos e com sentidos diferentes.
b) Explique a diferença de sentido entre os verbos ter e haver em “Tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!”, na segunda tirinha. RESOLUÇÃO: A frase “tem que haver um jeito melhor de fazer ele comer!” apresenta o verbo ter com sentido de “dever” e haver com significado de “existir”, como é corrente no coloquial brasileiro.
– 11
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 12
MÓDULO
P O R T U G U Ê S E
Sintaxe (V)
1. (UNICAMP) – As gramáticas costumam definir os tempos verbais de forma simplificada. C. Cunha e L. Cintra, por exemplo, em suaNova Gramática do Português Contemporâneo, dizem que “o futuro designa um fato ocorrido após o momento em que se fala” . Observe como Bastos Tigre joga com essa noção de futuro para dar uma interpretação engraçada do sétimo mandamento.
Não furtarás – prega o Decálogo e cada homem deixa para amanhã a observância do sétimo mandamento. (citado por Mendes Fradique em sua Grammatica
b) Tanto sou como é são formas de presente do indicativo. Apesar disso, a visão de tempo que elas transmitem não é a mesma em uma e outra. Em que consiste essa diferença? RESOLUÇÃO: Sou tem o valor de presente propriamente dito: enuncia um fato contemporâneo, algo que ocorre no mesmo momento em que se dá a enunciação. Quanto a é, em “O que é uma coisa bela?”, seu valor é atemporal, pois enuncia algo que não se limita ao momento da enunciação. É o que se chamapresente durativo ou universal, por indicar ações e estados permanentes, como, por exemplo, uma verdade científica, um dogma, um artigo de lei etc.
Portugueza pelo Methodo Confuso, 1928) a) Qual a interpretação usual (feita, por exemplo, por um rabino, um pastor ou um padre) desse mandamento? RESOLUÇÃO: O homem não deve furtar em tempo algum. O futuro tem valor de imperativo.
b) Qual a interpretação feita por Bastos Tigre? RESOLUÇÃO: A interpretação é literal. O homem furta a todo momento, deixando a aplicação do mandamento para os dias vin douros.
2. (FUVEST) (...) O antropólogo Claude Lévi-Strauss detestou a Baía de Guanabara Pareceu-lhe uma boca banguela. E eu, menos a conhecera mais a amara? Sou cego de tanto vê-la, de tanto tê-la estrela O que é uma coisa bela? (Caetano Veloso,O Estrangeiro) a) Na linguagemliterária, muitas vezes,o mais-que-perfeito doindicativo substitui outras formas verbais, como no verso: “E eu, menos a conhecera mais a amara?”. Reescreva-o, usando as formas que o maisque-perfeito substituiu. RESOLUÇÃO: “E eu, menos a conhecesse mais a amaria? As formas do mais-que-perfeito do indicativo conhecera e amara substituem o imperfeito do subjuntivo conhecesse e o futuro do pretérito do indicativo amaria, respectivamente.
12 –
Leia o texto seguinte.
Desculpe-nos pela demora em responder a sua reclamação sobre a sua TV de plasma. Precisávamos ter a certeza de que a nossa matriz aqui no Brasil estaria nos enviando a referida peça. Na próxima semana, estaremos fazendo uma revisão geral no apa relho e vamos estar enviando ele para o senhor. Atenciosamente... (Texto do e-mail de uma empresa, justificando o atraso em consertar um aparelho eletrônico.) 3. (UFSCar) – Observa-se, nesse texto, um problema de estilo comum nas correspondências comerciais e nas comunicações de telemarketing e também um desvio da norma padrão do português do Brasil. a) Identifique o problema de estilo e redija o trecho em que ele ocorre, corrigindo-o. RESOLUÇÃO: O “problema de estilo” consiste no hábito corrente de substituir formas verbais simples por locuções com o verbo auxiliar estar seguido do gerúndio do verbo principal. Assim, no texto transcrito, “es taria… enviando” substitui “enviaria”; “estaremos fazendo” substitui “faremos” e “vamos estar enviando” substitui “vamos enviar”. Reescrito e melhorado em alguns pontos, o trecho em questão poderia assumir a seguinte forma: “Precisávamos ter certeza de que a nossa matriz no Brasil nos enviaria a referida peça. Na próxima semana,faremos uma revisão geral no aparelho e o enviaremos ao senhor”.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 13
5. (FUVEST) – Leia o excerto, observando as diferentes formas verbais.
b) Identifique o desvio e redija o trecho em que ele ocorre, corrigido. RESOLUÇÃO: O “desvio da norma padrão” do Português, não ape nas do Brasil, está no emprego do pronome retoele em função de objeto, na qual seria de regra o pronome oblíquo o: “vamos enviá-lo”.
Chegou. Pôs a cuia no chão, escorou-a com pedras, matou a sede da família. Em seguida acocorou-se, remexeu o aió, tirou o fuzil, acendeu as raízes de macambira, soprou-as, inchando as bochechas cavadas. Uma labareda tremeu, elevou-se, tingiu-lhe o rosto queimado, a barba ruiva, os olhos azuis. Minutos depois o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim. Eram todos felizes. Sinha Vitória vestiria uma saia larga de ramagens. A cara murcha de sinha Vitória remoçaria (...). (...) A fazenda renasceria – e ele, Fabiano, seria o vaqueiro, para bem dizer seria dono daquele mundo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) a) Considerando que no primeiro parágrafo predomina o pretérito perfeito, justifique o emprego do imperfeito em “... o preá torcia-se e chiava no espeto de alecrim”.
Texto para a questão 4.
RESOLUÇÃO: As formas do pretérito perfeito indicam ações pontuais, concluídas no passado; o imperfeito indica ação em decurso no passado. O efeito narrativo do imperfeito, no caso, é atribuir vivacidade à ação, apresentando-a em seu desdobramento.
No dia em que o país dispor de uma moeda mais competitiva, poderá se transformar em potência comercial porque finalmente aprendeu a desenvolver inteligência comercial. (Luís Nassif, Agência Dinheiro Vivo, www.luisnassif.com.br, 7/7/2010) 4. a) O texto acima apresenta um ponto em que se afasta da norma culta. Aponte-o, comente-o e corrija-o. RESOLUÇÃO: A forma verbal dispor, que deveria estar no futuro do subjuntivo, pois enuncia uma possibilidade futura, foi confundida com o infinitivo. A forma correta seria dispuser.
b) Explique o efeito de sentido produzido no excerto pelo emprego do futuro do pretérito. RESOLUÇÃO: O perfeito e o imperfeito relatam fatos; o futuro do pretérito registra desejos, aspirações, fantasias da personagem (sinalizando, portanto, discurso indireto livre).
b) Tal como está redi gido, o texto pare ce afirmar que o pa ís já aprendeu a “desenvolver inteligência comercial”. O sentido sugerido pelo contexto é, porém, outro: que o desenvolvimento de “inteligência comercial” só se dará quando o país contar com “uma moeda mais competitiva”. Para que se explicite com precisão este último sentido, como ficaria a redação da frase a partir de “... porque finalmente...”? RESOLUÇÃO: ... porque finalmente terá aprendido a desenvolver inteligência comercial.
– 13
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 14
Texto para a questão 6.
P O R T U G U Ê S E
Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade. A obesidade não foge à regra. Na Idade Média, a sociedade considerava a hanseníase um castigo de Deus para punir os ímpios. No século 19, quando proliferaram os aglomerados urbanos e a tuberculose adquiriu características epidêmicas, dizia-se que a enfermidade acometia pessoas enfraquecidas pela vida devassa que levavam. Com a epidemia de Aids, a mesma história: apenas os promíscuos adquiririam o HIV. Coube à ciência demonstrar que são bactérias os agentes causadores de tuberculose e da hanseníase, que a Aids é transmitida por um vírus e que esses micro-organismos são alheios às virtudes e fraquezas humanas: infectam crianças, mulheres ou homens, não para puni-los ou vê-los sofrer, mas Tanto porquesepretendem e multiplicar-se como todos os seres vivos. lhes dá se crescer o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. (...) (Drauzio Varella,Folha de S.Paulo, 12/11/2005) 6. (FUVEST) a) Crie uma frase com a palavra “obesidade” que possa ser acres centada ao final do 2.° parágrafo sem quebra de coerência.
b) Fazendo as adaptações necessárias e respeitando a equivalência de sentido que a expressão “Tanto se lhes dá (...)” tem no texto, proponha uma frase, substituindo o pronome lhes pelo seu referente. RESOLUÇÃO: Pouco importa a esses micro-organismos se o organismo que lhes oferece condições de sobrevivência pertence à vestal ou ao pecador contumaz. A formulação deste quesito não é inteiramente precisa, pois não se esclarece se o pronome lhes deve ser substituído por seu referente em suas duas ocorrências na frase ou, o que parece mais razoável, apenas na primeira, na expressão cujo sentido se questiona. Outro defeito na formulação deste quesito se encontra no trecho “respeitando a equivalência de sentido que a expressão ‘Tanto se lhes dá (...)’ tem no texto”. Esse trecho deveria ser substituído por uma redação mais simples, direta e precisa: mantendo-se o sentido que a expressão “Tanto se lhes dá” tem no texto, pois não é a “equivalência de sentido que a expressão... tem no texto” que se quer respeitada.
RESOLUÇÃO: Nos nossos dias, é comum atribuir às pessoas obesas a culpa por sua obe sidade, como se sua condição fosse apenas resultado de seu descomedimento ao comer. A frase deve encaixar-se na série de exemplos contida no segundo pará grafo. Tais exemplos ilustram a primeira afirmação do texto: “Atribuir ao doente a culpa dos males que o afligem é procedimento tradicional na história da humanidade.” O caso da obesidade seria a ilustração da afirmação complementar do parágrafo inicial: “A obesidade não foge à regra.”
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (I)
1. (UNICAMP-SP) – Na seguinte cena do Auto da Barca do Inferno, o Corregedor e o Procurador dirigem-se à Barca da Glória, depois de se recusarem a entrar na Barca do Inferno.
Corregedor: Anjo:
Corregedor:
Ó arrais dos gloriosos, passai-nos neste batel! Ó pragas pera papel, pera as almas odiosos! Como vindes preciosos, sendo filhos da ciência! Ó! habeatis clemência e passai-nos como vossos!
para
tende
Hou, homens dos breviairos1, rapinastis coelhorum et pernis perdiguitorum2 e mijais nos campanairos! Corregedor: Ó! Não nos sejais contrairos, pois nom temos outra ponte! Joane (Parvo): Beleguinis ubi sunt3? Ego latinus macairos4. (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno. São Paulo, Ateliê Editorial, 1996, p. 107-109.) Joane (Parvo):
1 – Homens dos breviairos: homens de leis. 2 – Rapinastis coelhorum / et pernis perdiguitorum: Recebestes coelhos e pernas de perdiz como suborno. 3 – Beleguinis ubi sunt?: Onde estão os policiais? 4 – Ego latinus macairos: Eu falo latim macarrônico.
14 –
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 15
a) De que pecado o Parvo acusa o homem de leis (Corregedor)? Esse é o único pecado de que ele é acusado na peça? RESOLUÇÃO: Joane, o Parvo, acusa o Corregedor de se deixar subornar com as ofertas de coelhos e pernas de perdiz, sendo, desse modo, segundo o Diabo, um “santo descorregedor”, sentenciando com pouca honestidade (“ quia judicastis malitia”). Além disso, há referência ao desrespeito do Correge dor aos mortos, uma vez que urinara nas campas. Outro delito do qual o magistrado é acusado pelo Diabo é o de ter explorado os trabalhadores inocentes (“ignorantes do pecado”): “A largo modo adquiristis / sanguinis laboratorum, / ignorantes peccatorum”.
a) Por que o Cavaleiro chama a atenção do Diabo? RESOLUÇÃO: Porque o Cavaleiro sacrificou a vida para defender o Cristianismo e, assim, ter assegurado seu lugar na barca da Glória. O Diabo presume que o Cavaleiro é, como a maioria dos mortos chegados ao cais, um ser cheio de vícios e interpela-o. O Cavaleiro adverte o Diabo, distinguindo-se e evitando maior contato. E S Ê U G U T R O P
b) Onde e como morreram os dois Cavaleiros? b) Com que propósito o latim é empregado pelo Corregedor? E pelo Parvo? RESOLUÇÃO: O Corregedor emprega o latim de uso jurídico, que caracteriza o homem de leis, tipificando a personagem. O Parvo, por sua vez, vale-se do latim de maneira humorística e, consciente de seus erros, declara falar latim “macarrônico”, isto é, mistura de latim e português. Para o Corregedor, o latim é instrumento de autoridade; para o Parvo, ao contrário, é um meio de contestação da autoridade e de zombaria da pompa de que se reveste o discurso autoritário.
RESOLUÇÃO: Os Cavaleiros morreram numa Cruzada, em combate contra os “infiéis”. Observe-se que, na época da encenação do Auto da Barca do Inferno, as Cruzadas já eram coisa do passado.
c) Por que os dois passam pelo Diabo sem se dirigir a ele? 2. (UNICAMP-SP) – Leia o diálogo abaixo, do Auto da Barca do Inferno:
RESOLUÇÃO: Porque entendem que quem deu a vida numa Cruzada, em defesa do Cristianismo, tem assegurado um lugar na barca da Glória, estando livre da condenação ao inferno.
Cavaleiros, vós passais e não perguntais onde is? Cavaleiro 1: Vós, Satanás, presumis? Atentai com quem falais! Cavaleiro 2: Vós que nos demandais? Sequer conhece-nos bem. Morremos nas partes d’além, e não queirais saber mais. (Gil Vicente, “Auto da Barca do Inferno”, in Antologia do Teatro de Gil Vicente. Org. Cleonice Berardinelli, Rio de Janeiro, Nova Fronteira/Brasília, INL, 1984, p. 89.) Diabo:
– 15
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 16
3. (FUVEST-SP)
E, chegando à barca da Glória, diz ao Anjo: Brísida: Anjo: Brísida: P O R T U G U Ê S E
Barqueiro, mano, meus olhos, prancha a Brísida Vaz! Eu não sei quem te cá traz... Peço-vo-lo de giolhos! Cuidais que trago piolhos, anjo de Deus, minha rosa? Eu sou Brísida, a preciosa, que dava as moças aos molhos.
4. Sobre o Auto da Barca do Inferno, afirmou Antônio José Saraiva:
O Parvo, que se convertera em uma espécie de comentador, inde pendente da ação, punha à mostra, com os seus disparates, o ridículo das personagens convencidas do seu papel. Qual o motivo de o Anjo deixar o Parvo à espera para entrar no batel? RESOLUÇÃO: O Parvo observa os passageiros que pretendem embarcar para o Céu e comenta, jocosamente, a respeito deles.
A que criava as meninas
para os cônegos da Sé... Passai-me, por vossa fé, meu amor, minhas boninas, olhos de perlinhas finas! (...) (Gil Vicente, Auto da Barca do Inferno – texto fixado por Segismundo Spina) a) No excerto, a maneira de tratar o Anjo empregada por Brísida Vaz relaciona-se à atividade que ela exercera em vida? Explique resumidamente. RESOLUÇÃO: Brísida Vaz, em vida, era alcoviteira, ou seja, agenciava mulheres para a prostituição. Assim, sua linguagem revela sua atividade, pois ela se utiliza de termos que procuram seduzir o Anjo, como “anjo de Deus”, “minha rosa”, “meu amor”, “minhas boninas”, “olhos de perlinhas finas”.
5. (PUC-SP) – Diabo, Companheiro do Diabo, Anjo, Fidalgo, Onzeneiro, Parvo, Sapateiro, Frade, Florença, Brísida Vaz, Judeu, Corregedor, Procurador, Enforcado e Quatro Cavaleiros são personagens do Auto da Barca do Inferno , de Gil Vicente. Analise as informações abaixo e selecione a alternativa incorreta, cujas características não descrevem adequadamente a personagem. a) O Onzeneiro idolatra o dinheiro; é agiota e usurário; de tudo o que juntara, nada leva para a morte, ou melhor, leva a bolsa vazia. b) O Frade representa o clero decadente e é subjugado por suas fraquezas: mulher e esporte; leva a amante e as armas de esgrima. c) O Diabo, capitão da barca do Inferno, é quem apressa o embarque dos condenados; é dissimulado e irônico. d) O Anjo, capitão da barca do Céu, é quem elogia a morte pela fé; é austero e inflexível. e) O Corregedor representa a justiça e luta pela apl icação íntegra e exata das leis; carrega papéis e processos.
b) No excerto, o trata mento que Brísid a Vaz dispensa ao Anjo é adequado à obtenção do que eladeseja —isto é, levar oAnjo a permitir que ela embarque? Por quê?
RESOLUÇÃO: O Auto da Barca do Inferno apresenta personagens representativas da sociedade medieval portuguesa. Suas atitudes em vida as credenciam ao embarque para o Céu ou para o Inferno. O Corregedor aceitava “as peitas dos judeus”, propinas e suborno, convertendo-se no símbolo da justiça corrupta e da utilização do poder judiciário em proveito próprio e no de alguns privilegiados, em detrimento dos humildes e desvalidos. Vai para o Inferno, apesar de toda a retórica latinizante da vida forense, que o dramaturgo explora cômica e satiricamente, para compor os tipos carica tos do juiz venal e do procurador subserviente. Resposta: E
RESOLUÇÃO: O tratamento que Brísida Vaz dispensa ao Anjo é inadequado, pois revela apego ao universo pecaminoso da sedução e prostituição, ou seja, justamente àquilo que justifica sua condenação ao inferno.
16 –
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 17
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (II)
1. (UNICAMP-SP-2010) – No excerto abaixo, o romance Iracema é aproximado da narrativa bíblica:
Em Iracema, (...) a paisagem do Ceará fornece o cenário edênico para uma adaptação do mito da Gênese. Alencar aproveitou até o máximo as similaridades entre as tradições indígenas e a mitologia bíblica (...). Seu romance indianista (...) resumia a narrativa do casamento inter-racial, porém (...) dentro de um quadro estrutural pseudohistórico mais sofisticado, derivado de todo um complexo de mitos bíblicos, desde a Queda Edênica ao nascimento de um novo redentor. Exilados, Aliados, Rebeldes: (David Treece,indigenista o movimento indianista, a política e o Estado-Nação imperial. São Paulo, Nankin/Edusp, 2008, p. 226, 258-259.) Partindo desse comentário, responda às questões: a) Que associação se pode esta belecer entre os protagoni stas do romance e o mito da Queda com a consequente expulsão do Paraíso? RESOLUÇÃO: O mito da Queda, central na tradição judaico-cristã, corresponde à narrativa segundo a qual Adão e Eva, habitantes do Éden (Paraíso), teriam comido o fruto proibido. Por causa dessa falta, teriam tido como castigo a expulsão da morada paradisíaca e o mergulho de seus descendentes, o gênero humano, na dor e sofrimento (multiplicação da dor do parto, necessidade de “ganhar o pão com o suor do rosto”). Iracema aproveita vários elementos desse mito: o vinho da jurema assemelha-se ao fruto proibido; a perda da inocência de Adão e Eva equivale à união carnal entre Martim e Iracema; a descida que a protagonista faz do território tabajara para o pitiguara identifica-se com a perda do Paraíso. O caminho para baixo é percorrido após o sexto dia, que lembra o dia da criação do homem; a dor da heroína ao ver seus conterrâneos mortos em combate e, mais adiante, durante o seu parto, estabelece proximidade com os sofrimentos profetizados por Deus à espécie humana.
2. (UNICAMP-SP) – Leia, abaixo, a letra de uma canção de Chico Buarque inspirada no romance de José de Alencar, Iracema, lenda do Ceará: IRACEMA VOOU Iracema voou Para a América Leva roupa de lã E anda lépida Vê um filme de quando em vez Não domina o idioma inglês
Lavasaído chão numa Tem ao luarcasa de chá Com um mímico Ambiciona estudar Canto lírico Não dá mole pra polícia Se puder, vai ficando por lá Tem saudade do Ceará Mas não muita Uns dias, afoita Me liga a cobrar: — É Iracema da América (Chico Buarque, As Cidades. Rio de Janeiro, Marola Edições Musicais Ltda.,1998.) a) Que papel desempenha Iracema no romance de José de Alencar? E na canção de Chico Buarque? RESOLUÇÃO: Iracema desempenha, no romance de Alencar, o papel de heroína romântica, mártir do amor. Ela é a sacerdotisa ou vestal dos Tabajaras, que detém o segredo da jurema. Além disso, ela pode ser considerada a própria representação da natureza virgem dos trópicos, que será possuída pelo colonizador europeu, o português Martim, com quem terá um filho. Na canção de Chico Buarque, Iracema desempenha o papel da brasileira exilada que, com astúcia “malandra”, consegue “se virar”, procurando “se dar bem” na América do Norte e preferindo viver lá , apesar das dificuldades e da saudade da terra natal.
b) Qual personagem poderia ser associada ao “novo redentor”? Por quê? RESOLUÇÃO: O “novo redentor” é Moacir, filho de Iracema com Martim. Assim como Cristo teria vindo ao mundo para redimir o gênero humano do pecado srcinal, levando-o a uma nova condição, o jovem mestiço daria srcem a um novo povo, o brasileiro, que, na visão de Alencar, ficaria no lugar do indígena.
– 17
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 18
b) Uma das interpretações para o nome da heroína do romance de José de Alencar é de que seja um anagrama de América. Isto é, o nome da heroína possui as mesmas letras deAmérica dispostas em outra ordem. Partindo dessa interpretação, explique o que distingue a referência à América no romance daquela que é feita na canção.
P O R T U G U Ê S E
RESOLUÇÃO: No romance Iracema, lenda do Ceará, o jogo anagramático com o nome da heroína é, evidentemente, uma referência ao Brasil ou, genericamente, à América do Sul. Já em Iracema voou, o anagrama funciona como refe rência à América do Norte ou, mais especificamente, aos Estados Unidos.
No trecho, Machado de Assis afirma que a narração de Iracema não parece ter sido feita por um “poeta moderno”, mas, sim, por um “bardo indígena”. Essa afirmação se justifica? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: A afirmação é pertinente, pois o estilo de Iracema procura incorporar a linguagem e a cosmovisão indígenas. A tentativa de simular a c osmovisão indígena é visível, por exemplo, na marcação temporal, que toma como parâmetro os ciclos da natureza. A apropriação da linguagem aborígine ocorre nos nomes próprios, nas aglutinações lexicais, nas perífrases e nas comparações com elementos da natureza.
3. (FUVEST-SP) – Considere os dois trechos de Machado de Assis, relacionados a Iracema e publicados na época em que apareceu esse romance de Alencar, e responda ao que se pede. a) A poesia americana está completamente nobilitada; os maus poetas já não podem conseguir o descrédito desse movimento, que venceu com o autor de “I-Juca-Pirama” e acaba de vencer com o autor de Iracema. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) Machado de Assis refere-se, nesse trecho, a um movimento literário chamado, na época, de “poesiaamericana”ou “escola americana”. Sob que outro nome veio a ser conhecido esse movimento? Quais eram seus principais objetivos? RESOLUÇÃO: Machado de Assis refere-se ao Indianismo, tendência romântica brasileira cujo objetivo central era nobilitar o passado nacional, associando-o a mitos heroicos elaborados por meio da idealização dos indígenas e de sua cultura, assimilados a padrões europeus de excelência física e moral.
b) Tudo em Iracema nos parece primitivo; a ingenuidade dos sentimentos, o pitoresco da linguagem, tudo, até a parte narrativa do livro, que nem parece obra de um poeta moderno, mas uma história de bardo1 indígena, contada aos irmãos, à porta da cabana, aos últimos raios do sol que se entristece. (Adaptado de Machado de Assis, Crítica Literária) 1 – Bardo: poeta heroico, entre os celtas e gálios; por extensão, qualquer poeta, trovador etc.
18 –
4. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo foi extraído de Iracema. Ele reproduz a reação e as últimas palavras de Batuiretê antes de morrer:
O velho soabriu as pesadas pálpebras e passou do neto ao estrangeiro um olhar baço. Depois o peito arquejou e os lábios murmuraram: — Tupã quis que estes olhos vissem, antes dese apagarem, o gavião branco junto da narceja. O abaeté derrubou a fronte aos peitos e não falou mais, nem mais se moveu. (José de Alencar,Iracema: lenda do Ceará. Rio de Janeiro, MEC/INL, 1965, p. 171-172.) a) Quem é Batuiretê? RESOLUÇÃO: Batuiretê fora grande guerreiro e líder dos pitiguaras. Em razão da idade, deixa de guerrear e transfere a liderança do grupo ao filho Jatobá, pai de Poti. Batuiretê torna-se então uma espécie de conse lheiro, sábio ou, melhor, oráculo de guerra para os de sua tribo. Daí o nome tupi com que a perso nagem é denominada: Maranguab, que, nas palavras do neto Poti (nesse mesmo capítulo), significa “o grande sabedor da guerra”.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 19
b) Identifique as personagens a quem ele se dirige e indique os papéis que desempenham no romance. RESOLUÇÃO: O “neto” referido no texto é o guerreir o pitiguara Poti , que é amigo e aliado do coprotagonista (Martim Soares Moreno) e o auxilia tanto no estabelecimento da civilização portuguesa no Ceará, como no episódio romanesco entre o guerreiro português e a virgem tabajara. Sob o nome de batismo de Antônio Felipe Camarão, transforma-se de personagem ficcional em personagem histórica, participante da luta pela expulsão dos holandeses. É o índio assimilado à civilização: Antônio (santo da devoção), Felipe (rei de Espanha, Felipe III, à época da União Ibérica, em que ocorre o romance, 1604-1611). O “estrangeiro”, referido em seguida, é Martim Soares Moreno, representante do Estado português, guerreiro branco e agente da civilização cristã na colonização do Ceará. É o elemento que, ao se introduzir no universo indígena e consorciar-se com a “virgem de Tupã”, contribui para a destruição da América primitiva.
MÓDULO
c) Explique o sentido da metá fora empregada por Batuiretê em sua fala. RESOLUÇÃO: Batuiretê refere-se, por meio da expressão “o gavião branco junto da narceja”, à dominação branca e à submissão do índio, numa premonição trágica do destino de seu povo.
Literatura e Análise de Textos Literários (III)
1. (FUVEST-SP) – Leia o trecho de abertura de Memórias de um Sargento de Milíciase responda ao que se pede.
Era no tempo do rei. Uma das quatro esquinas que formam as ruas do Ouvidor e da Quitanda, cortando-se mutuamente, chamava-se nesse tempo — O canto dos meirinhos —; e bem lhe assentava o nome, porque era aí o lugar de encontro favorito de todos os indivíduos dessa classe (que gozava então de não pequena consideração). Os meirinhos de hoje não são mais do que a sombra caricata dos meirinhos do tempo do rei; esses eram gente temível e temida, respeitável e respeitada; formavam um dos extremos da formidável cadeia judiciária que envolvia todo o Rio de Janeiro no tempo em que a demanda era entre nós um elemento de vida: o extremo oposto eram os desembargadores. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) a) A frase “Era no tempo do rei” refere-se a um período histórico determinado e possui, também, uma conotação marcada pela indeterminação temporal. Identifique tanto o período histórico a que se refere a frase quanto a mencionada conotação que ela também apresenta.
b) No trecho aqui reproduzido, o narrador c ompara duas épocas diferentes: o seu próprio tempo e o tempo do rei. Esse procedimento é raro ou frequente no livro? Com que objetivo o narrador o adota? RESOLUÇÃO: Esse procedimento é frequente no livro, pois um dos objetivos do narrador é confrontar duas épocas — a sua (tempo da enunciação) e aquela em que ocorrem os fatos narrados (tempo do enunciado).
RESOLUÇÃO: O período histórico a que se refere a frase é o que se inicia com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808, sendo D. João VI o rei referido. A frase “Era no tempo do rei”, para além dessa referência histórica, associa-se à abertura formular de contos de fadas e semelhantes — “Era uma vez...” — e, nesse sentido, conota tempo e espaço indeterminados.
– 19
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 20
As questões de números 2 a 4 tomam por base um fragmento do livro Memórias de um Sargento de Milícias, escrito por Manuel Antônio de Almeida (1831-1861).
P O R T U G U Ê S E
Era a comadre uma mulher baixa, excessivamente gorda, bonachona, ingênua ou tola até um certo ponto, e finória até outro; vivia do ofício de parteira, que adotara por curiosidade, e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade. Era a folhinha mais exata de todas as festas religiosas que aqui se faziam; sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até o nome do padre; era pontual à ladainha, ao terço, à novena, ao setenário; não lhe escapava via-sacra, procissão, nem sermão; trazia o tempo habilmente distribuído e as horas combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e
achar já a missa no altar. De madrugada missa da Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, ecomeçava daí saindopela pilhava ainda a das nove em Santo Antônio. O seu traje habitual era, como o de todas as mulheres da sua condição e esfera, uma saia de lila preta, que se vestia sobre um vestido qualquer, um lenço branco muito teso e engomado ao pescoço, outro na cabeça, um rosário pendurado no cós da saia, um raminho de arruda atrás da orelha, tudo isto coberto por uma clássica mantilha, junto à renda da qual se pregava uma pequena figa de ouro ou de osso. (...) (...) a mantilha era o traje mais conveniente aos costumes da época; sendo as ações dos outros o principal cuidado de quase todos, era muito necessário ver sem ser visto. A mantilha para as mulheres estava na razão das rótulas para as casas;eram o observatório da vida alheia. (...) (...) Nesta ocasião levantava-se a Deus, e as duas beatas interromperam a conversa [sobre o afilhado da comadre] para bater nos peitos. Era uma delas a vizinha do compadre, que prognosticava mau fim ao menino e com quem ele prometera fazer uma estralada; a outra era uma das que tinham estado na função do batizado. A comadre, apenas ouviu isso, foi procurar o compadre; não se pense, porém, que a levara a isso outro interesse que não fosse a curio sidade; queria saber o caso com todos os menores detalhes; isso lhe dava longa matéria para a conversa na igreja e para entreter as partu rientes que se confiavam aos seus cuidados. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias) 2. (VUNESP-SP) – O sincretismo religioso, isto é, a “fusão de diferentes cultos ou doutrinas religiosas” (cf. Dicionário Houaiss) era comum em nossa cultura, na época retratada na obra de Manuel Antônio de Almeida. A descrição da comadre, feita com vivacidade pelo enunciador do texto, permite afirmar que ela é dada a essa prática? Justifique sua resposta, com base em uma passagem do texto. RESOLUÇÃO: No trecho “...e benzia de quebranto; todos a conheciam por muito beata e pela mais desabrida papa-missas da cidade” (primeiro parágrafo), percebe-se, na caracterização da Comadre, o sincretismo religioso, ou seja, a fusão de práticas religiosas diferentes, pois a personagem tanto fazia rezas para afastar supostas influências de espíritos malignos (“benzia de quebranto”), uma atividade que a ligava à feitiçaria, quanto frequentava com grande assiduidade as festas e os rituais ligados à Igreja Católica (missas, ladainhas, terços, novenas, via-sacra, procissão, sermão).
20 –
3. (VUNESP-SP) – Ao referir-se ao fato de a comadre procurar o compadre, a fim de conversar sobre o afilhado, o enunciador fornece aIdentifique mesma explicação dada à razão de ela abraçar de parteira. essa explicação, relacionando-a com oosofício costumes da época, especialmente com o uso da mantilha pelas mulheres. RESOLUÇÃO: Tanto o ofício de parteira que a Comadre adotara quanto a sua ida à casa do Compadre tinham o mesmo motivo: a curiosidade, ou seja, a preocupação em buscar todos os detalhes sobre a vida alheia. Para isso, a mantilha, peça do vestuário muito comum no tempo da narrativa e que consistia em uma faixa de tecido que cobria como um véu o rosto das mulheres, permitia que elas vissem os outros sem serem vistas. É o que pode ser confirmado no segundo parágrafo: “a mantilha era o traje mais conveniente aos costumes da época; sendo as ações dos outros o principal cuidado [preocupação] de quase todos, era muito necessário ver sem ser visto.”
4. (VUNESP-SP) – A comadre é apresentada, entre várias características, como uma mulher que cumpria rigorosamente os horários. Transcreva duas passagens do fragmento em que essa qualidade está explícita, referindo-se à participação da personagem nas missas. RESOLUÇÃO: Os trechos que comprovam a pontualidade da Comadre em relação a missas são os seguintes (todos retirados do primeiro parágrafo): (1) “sabia de cor os dias em que se dizia missa em tal ou tal igreja, como a hora e até o nome do padre”; (2) “trazia o tempo habilmente distribuído e as horas combinadas, de maneira que nunca lhe aconteceu chegar à igreja e achar já a missa no altar. De madrugada começava pela missa da Lapa; apenas acabava ia à das oito na Sé, e daí saindo pilhava ainda a das nove em Santo Antônio.”
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 21
5. (UNICAMP-SP) – O trecho abaixo pertence ao capítulo XLV (“Empenhos”), de Memórias de um Sargento de Milícias.
b) Relacione o “defeito” com esse episódio, que envolveu o Major Vidigal e as três mulheres.
Isto tudo vem para dizermos que Maria-Regalada tinha um verdadeiro amor ao Major Vidigal; o Major pagava-lho na mesma moeda. Ora, D. Maria era uma das camaradas mais do coração de MariaRegalada. Eis aí por que falando dela D. Maria e a comadre se mostraram tão esperançadas a respeito da sorte do Leonardo. Já naquele tempo (e dizem que é defeito do nosso) o empenho, o compadresco, era uma mola real de todo o movimento social. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias. Cotia, Ateliê Editorial, 2000, p. 319.)
RESOLUÇÃO: Preso pelo terrível Major Vidigal, chefe dos milicianos no Rio de Janeiro, Leonardo deveria ser, nos termos das leis e regulamentos, severamente punido. Intercedem em seu favor D. Maria, a Comadre e Maria-Regalada. As esperanças da tia de Luisinha e da madrinha estavam assentadas na percepção de que o Major Vidigal seria vulnerável ao apelo sensual de Maria-Regalada e ao “verdadeiro amor” que havia entre ambos. E, mais que isso, de que seria capaz de transgredir os seus deveres funcionais, não punindo Leonardo e, mais tarde, promovendo-o a sargento, para atender ao pleito da mulher qu e desejava. O “defeito ” que nisso se revela é a diluição da ordem, o “jeitinho”, a superposição da vida e dos interesses pessoais aos deveres e obrigações legais. O diálogo (no capítulo XLVI) que se abre com o trecho “—Ora, a lei... O que é a lei, se o Sr. Majorquiser?...” ilustra cabalmente o “defeito” em questão.
a) Explique o “defeito” a que o narrador se refere. RESOLUÇÃO: O “defeito” referido pelo narrador é a ausência de fronteiras nítidas entre o interesse público e a vida privada, é a “dialética da malandragem”, expressão que o crítico Antonio Candido consagrou como caracterizadora da diluição dos limites que separam o “mundo da ordem” e o “mundo da desordem”, a lei e a contravenção, o dever funcional e o interesse pessoal. Por “empenho”, pode-se entender a troca de favores, o clientelismo, e por “compadresco”, o nepotismo que era “uma mola real de todo o movimento social”, como diz o narrador.
MÓDULOS
E
Literatura e Análise de Textos Literários (IV) e ( V)
1. (UNICAMP-SP-2010) – Leia a seguir um trecho de A Cidade e as Serras:
— Sabes o que eu estava pensando, Jacinto?... Que te aconteceu aquela lenda de Santo Ambrósio... Não, não era Santo Ambrósio... Não me lembra o santo. Ainda não era mesmo santo, apenas um cavaleiro pecador, que se enamorara de uma mulher, pusera toda a sua alma nessa mulher, só por a avistar a distância na rua. Depois, uma tarde que a seguia, enlevado, ela entrou num portal de igreja, e aí, de repente, ergueu o véu, entreabriu o vestido e mostrou ao pobre cavaleiro o seio roído por uma chaga! Tu também andavas namorado da serra, sem a conhecer, só pela sua beleza de verão. E a serra, hoje, zás! de repente, descobre a sua grande chaga... É talvez a tua preparação para S. Jacinto. (Eça de Queirós, A Cidade e as Serras. São Paulo, Ateliê Editorial, 2007, p. 252.)
a) Explique a comparação feita por Zé Fernandes. Especifique a que chaga ele se refere. RESOLUÇÃO: Zé Fernandes compara a visão que Jacinto tem da serra à imagem que o santo ou cavaleiro pecador tem de uma mulher: há em ambas as situações o enlevo inicial e o choque com a descoberta de uma chaga. Deve-se entender, no caso de Jacinto, que chaga é uma metáfora que representa a fome, as doenças e a miséria que existiam na serra.
– 21
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 22
P O R T U G U Ê S E
b) Que significado a descoberta dessa chaga tem para Jacinto e para a compreensão do romance?
Texto para as questões 3 e 4.
RESOLUÇÃO: A chaga é metáfora da pobreza, da má situação de vida dos camponeses lusos. Jacinto, ao descobrir essa “chaga”, procura resolver paternalistamente a situação social dos camponeses, torna-se o “pai dos pobres”, um “Dom Sebastião”, segundo João Torrado. Para a compreensão do romance, a descoberta dessa “chaga” indica a necessidade de melhorar as condições de vida no campo, mas sem afrontar a harmonia e a vitalidade da natureza.
No entanto Jacinto, desesperado com tantos desastres humilhadores — as torneiras que dessoldavam, os elevadores que emperravam, o vapor que se encolhia, a eletricidade que sumia, decidiu valorosamente vencer as resistências finais da matéria e da força por novas e mais poderosas acumulações de mecanismos. E nessas semanas de abril, enquanto as rosas desabrochavam, a nossa agitada casa, entre aquelas quietas casas dos Campos Elísios que preguiçavam ao sol, incessantemente tremeu, envolta num pó de caliça e de empreitada, com o bruto picar de pedra, o retininte martelar de ferro. 3. O trecho transcrito foi extraído do quinto ca pítulo de A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós, e se associa à crença que tem o protagonista, Jacinto, nos avanços técnicos como chave paranoa trecho felicidade. relação que a visão queirosiana apresentada tem Qual com oa famoso ideal humanista (já presente, por exemplo, no episódio de “O Gigante Adamastor”, em Os Lusíadas, de Camões), segundo o qual o Homem existe para dominar a Natureza?
2. (FUVEST-SP) – Os romances de Eça de Queirós costumam apresentar críticas a aspectos importantes da sociedade portuguesa, frequentemente acompanhadas de propostas (explícitas ou implícitas) de reforma social. Em A Cidade e as Serras, a) qual o aspecto que se critica nas elites portuguesas?
RESOLUÇÃO: Eça de Queirós mostra de maneira irônica o fracasso da civilização do século XIX, pois esta não conseguiu realizar o ideal humanista de domínio da Natureza, como fica evidente no trecho transcrito, em que se alude à ineficiência de alguns artefatos.
RESOLUÇÃO: Critica-se o abandono da terra natal, visto que essas elites se deixavam seduzir pela cultura francesa, pelo ócio endinheirado e por uma ideia de civilização como “armazenamento” de comodidades, para seu exclusivo benefício. Pode-se dizer que a crítica se dirige à alienação das elites portuguesas perante os problemas sociais em seu país.
b) qual é a relação, segundo preco niza o romance, que essas elites deveriam estabelecer com as classes subalternas? RESOLUÇÃO: A proposta do romance é uma reforma social, encabeçada pelos mais privilegiados, que promovesse a assistência social por meio do amparo e proteção aos menos favorecidos. Quando Jacinto, o protagonista do romance, teve seu apelido mudado de “Príncipe da Grã-Ventura” para “Pai dos Pobres”, esse caráter paternalista fica evidenciado, como se viu na resposta à questão 1, item b.
22 –
4. Na passagem transcrita, apesar de ela fazer parte da fase urbana da narrativa, a Natureza não deixa de, discretamente, estar presente, como em vários outros momentos do livro. Com base no excerto apresentado, explique como tal fato ocorre. RESOLUÇÃO: A Natureza está presente tanto na primeira parte (tese) como na segunda parte (antítese) de A Cidade e as Serras, nas descrições de ambientes, como se percebe, no trecho, em “enquanto as rosas desabrochavam”.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 23
Textos para as questões 5 e 6.
Texto I
Desde o berço, onde a avó espalhava funcho e âmbar para afugentar a Sorte-Ruim, Jacinto medrou com segurança, a rijeza, a seiva rica dum pinheiro das dunas. Não teve sarampo e não teve lombrigas. As letras, a Tabuada, o Latim entraram por ele tão facilmente como o sol por uma vidraça. Entre os camaradas, nos pátios dos colégios, erguendo a sua espada de lata e lançando um bradode comando, foi logo o vencedor, o rei que se adula e a quem se cede a fruta das merendas.
As questões de números 7 a 10 tomam por base um soneto do poeta neoclássico português Bocage (Manuel Maria Barbosa du Bocage, 1765-1805) e uma tira da escritora e quadrinista brasileira Ciça (Cecília Whitaker Vicente de Azevedo Alves Pinto).
LXIV CONTRASTE ENTRE A VIDA CAMPESTRE E A DAS CIDADES
E S Ê U G U T R O P
Nos campos o vilão sem sustos passa, Inquieto na corte o nobre mora; O que é ser infeliz aquele ignora, Este encontra nas pompas a desgraça:
Texto II
E nunca o meu Príncipe (que eu contemplava esticando os suspensórios) me pareceu tão corcovado, tão minguado, como gasto por uma lima que desde muito andasse fundamente limando. Assim viera findar, desfeita em Civilização, naquele super-requintado magricela sem músculo e sem energia, a raça fortíssima dos Jacintos! 5. É bastante conhecida a tese de Rousseau de que o Homem nasce bom, sendo a sociedade responsável por sua corrupção. Como essa afirmação pode ser associada aos excertos transcritos, extraídos de A Cidade e as Serras? RESOLUÇÃO: Os trechos mostram como Jacinto era em sua infância, fase mais próxima de sua essência primitiva, cheio de energia, de vida. Civilizando-se, ou seja, em contato mais intenso com a sociedade, perdeu sua vitalidade.
canta e ri;vãs nãoque se embaraça Aquele Com essas coisas o mundo adora: Este (oh cega ambição!) mil vezes chora, Porque não acha bem que o satisfaça: Aquele dorme em paz no chão deitado, Este no ebúrneo leito precioso Nutre, exaspera velador cuidado: Triste, sai do palácio majestoso; Se hás de ser cortesão, mas desgraçado, Antes ser camponês, e venturoso. (Bocage, Obras de Bocage. Porto, Lello & Irmão Editores, 1968.)
(Ciça, Tira. In Pagando o Pato. Porto Alegre, LP & M, 2006.)
6. Tendo em mente que a civilização, a sociedade, corrompe o que o Homem possui de mais puro, explique de que modo esse fenômeno ocorre em Iracema. RESOLUÇÃO: Enquanto vivia entre os tabajaras, Iracema tinha preservados, como numa situação edênica, seus valores primitivos. O contato com Martim, com a civilização (no caso, a europeia), provocou a corrupção, a “queda” da protagonista.
7. (VUNESP-SP-2010) – O tema do soneto apresentado, do neoclássico português Bocage, enquadra-se numa das linhas temáticas características do período literário denominado Neoclassicismo ou Arcadismo. Aponte essa linha temática, comprovando com elementos do próprio poema. RESOLUÇÃO: O soneto de Bocage desenvolve o tema do contraste entre a vida na cidade, vista como negativa, e a vida no campo, descrita como positiva. A depreciação da primeira é evidente em expressões como “inquieto na corte o nobre mora” e “este [o homem urbano] (...) mil vezes chora / porque não acha bem que o satisfaça”. A valorização da segunda encontra-se em expressões como “nos campos o vilão sem sustos passa”, “o que é ser infeliz aquele [o vilão] ignora” e “aquele canta e ri”.
– 23
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 24
8. (VUNESP-SP-2010) – A palavra vilão pode apresentar diferentes significados na Língua Portuguesa, alguns bastante distintos entre si. No soneto de Bocage, a própria sequência da leitura permite descobrir, em função do contexto, o significado que assume tal palavra, empregada no primeiro verso. Releia o poema e aponte esse significado.
P O R T U G U Ê S E
RESOLUÇÃO: In-qui-e-to-na-cor-teo-no-bre-mo(ra). (As sílabas fortes estão sublinhadas; a sílaba entre parênteses, a última postônica [= pós-tônica], não se conta.)
RESOLUÇÃO: No poema de Bocage, vilão é empregado no sentido inicial da palavra: “habitante de vila”, ou seja, morador de pequeno povoado rural, em oposição à corte, situada na cidade, a grande aglomeração urbana.
10. (VUNESP-SP-2010) – Na tira de Ciça, a troca de ser por ter ironiza uma das tendências do comportamento humano na sociedade moderna, altamente consumista. Isso considerado, releia a tira e o poema de Bocage e aponte em que consiste essa ironia e em que medida o soneto Bocage representa, com maistroca de dois séculos antecedência, umadedas possíveis respostas a essa de ser por terde. RESOLUÇÃO: A ironia está em considerar como mera atualização, ou seja, adaptação aos tempos atuais, a troca de ser por ter na célebre expressão shakespeariana. O soneto de Bocage pode ser tomado como “resposta” a ser), em essa perversão contemporânea, por exaltar a vida simples e feliz (o oposição à vida de apego aos bens materiais e às aparências (o ter).
9. (VUNESP-SP-2010) – O soneto de Bocage apresenta-se de acordo com o modelo tradicional, com versos de dez sílabas métricas (decassílabos) distribuídos em duas quadras e dois tercetos. De posse dessa informação, apresente como resposta a divisão em sílabas métricas do segundo verso do poema, levando em conta que as sílabas tônicas são a terceira, a sexta, a oitava e a décima.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VI)
1. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte capítulo do romance Dom Casmurro, de Machado de Assis:
CAPÍTULO XL UMA ÉGUA Ficando só, refleti algum tempo e tive uma fantasia. Já conheceis as minhas fantasias. Contei-vos a da visita imperial; disse-vos a desta casa do Engenho Novo, reproduzindo a de Matacavalos... A imaginação foi a companheira de toda a minha existência, viva, rápida, inquieta, alguma vez tímida e amiga de empacar, as mais delas capaz de engolir campanhas e campanhas,correndo. Creio haver lido em Tácito que as éguas iberas concebiam pelo vento; se não foi nele, foi noutro autor antigo, que entendeu guardar essa crendice nos seus livros. Neste particular, a minha imaginação era uma grande égua ibera; a menor brisa lhe dava um potro, que saía logo cavalo de Alexandre; mas deixemos de metáforas atrevidas e impróprias dos meus quinze anos. Digamos o caso simplesmente. A fantasia daquela hora foi confessar a minha mãe os meus amores para lhe dizer que não tinha vocação eclesiástica. A conversa sobre vocação tornava-me agora toda inteira e, ao passo que me assustava, abria-me uma porta de saída. “Sim, é isto”, pensei; “vou dizer a mamãe que não tenho vocação e confesso o nosso namoro; se ela duvidar, conto-lhe o que se passou outro dia, o penteado e o resto...” (Dom Casmurro, in Machado de Assis, Obra Completa em Quatro Volumes.Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 2008, p. 975.)
24 –
a) Explique a metáfora empregada pelo narrador, nesse capítulo, para caracterizar sua imaginação. RESOLUÇÃO: A imaginação de Bentinho era muito fecunda, rápida e audaciosa, embora às vezes se mostrasse mais recolhida. A imagem das éguas iberas oferece diversos pontos de semelhança para sustentar a metáfora, sobretudo fertilidade, velocidade e arrojo.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 25
b) De que maneira a imaginação de Bentinho, assim caracterizada, se relaciona com a temática amorosa nesse capítulo? E no romance?
c) O episódio da xícara de café está diretamente relacionado com a redação do livro de memórias de Bento Santiago. Por quê?
RESOLUÇÃO: Nesse capítulo, Bentinho lembra que, quando adolescente, imaginou confessar à austera mãe, Dona Glória, o amor que ele tinha por Capitu, as primeiras carícias que trocara com ela e a falta de vocação que sentia em si para a vida eclesiástica. No romance, o fato de o narrador-personagem ter uma imaginação fértil coloca sob suspeita a sua versão dos fatos, fundada na crença de que Escobar se tornara amante de Capitu e que Ezequiel seria fruto desse adultério.
RESOLUÇÃO: As memórias de Bento Santiago, a sua autobiografia, configuram a modalidade do romance de confissão, na qual o eu-narrador recompõe o passado e o reinterpreta. Esta é, de início, a intenção do memorialista: “atar as duas pontas da vida”. Nesse sentido, a “procura do tempo perdido”, os atos falhos de suicídio e homicídio, a que se referem o texto e os quesitos anteriores, são instantes cruciais da tragédia emocional e conjugal do narrador, momento-limite entre o ser e o não ser, como ele confessa no início do parágrafo, e que condensam quase todos os recursos narrativos do vasto repertório de Dom Casmurro: a narração, a reflexão digressiva, o apelo ao leitor, o estilo ziguezagueante (“deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo”), característico de um narrador problemático e indeciso.
2. (UNICAMP-SP) – Leia a passagem abaixo, de Dom Casmurro:
Se eu não olhasse para Ezequiel, é provável que não estivesse aqui escrevendo este livro, porque o meu primeiro ímpeto foi correr ao café e bebê-lo. Cheguei a pegar na xícara, mas o pequeno beijava-me a mão, como de costume, e a vista dele, como o gesto, deu-me outro impulso que me custa dizer aqui; mas vá lá, diga-se tudo. Chamem-me embora assassino; não serei eu que os desdiga ou contradiga; o meu segundo impulso foi criminoso. Inclinei-me e perguntei a Ezequiel se já tomara café. (Machado de Assis, Dom Casmurro, in Obra Completa. vol. 1, Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1979, p. 936.) a) Explique o “primeiro ímpeto” mencionado pelo narrador. RESOLUÇÃO: O “primeiro ímpeto” mencionado corresponde à sua vontade de suicidarse, bebendo o café envenenado.
b) Por que o narrador admite que seu “segundo impulso” foi cri minoso? RESOLUÇÃO: O “segundo impulso” foi criminoso porque o narrador, desistindo de suicidar-se, pensou em sugerir ao filho que tomasse o café envenenado, o que poderia justificar a sua designação de assassino.
3. (FUVEST-SP)
— Você janta comigo, Escobar? — Vim para isto mesmo. Minha mãe agradeceu-lhe a amizade que me tinha e ele respondeu com muita polidez, ainda que um tanto atado, como se carecesse de palavra pronta. (...) Todos ficaram gostando dele. Eu estava tão contente como se Escobar fosse invenção minha. José Dias desfechou-lhe dois superlativos, tio Cosme dois capotes e prima Justina não achou tacha que lhe pôr; depois, sim, no segundo ou terceiro domingo, veio ela confessarnos que o meu amigo Escobar era um tanto metediço e tinha uns olhos policiais a que não escapava nada. — São os olhos dele, expliquei. — Nem eu digo que sejam de outro. — São olhos refletidos, opinou tio Cosme. — Seguramente, acudiu José Dia s; entretanto, pode ser que a senhora D. Justina tenha alguma razão. A verdade é que uma coisa não impede outra, e a reflexão casa-se muito bem à curiosidade natural. Parece curioso, isso parece, mas... — A mim parece-me um mocinho muito sério, disse minha mãe. — Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela. Quando eu referi a Escobar aquela opinião de minha mãe (sem lhe contar as outras, naturalmente), vi que o prazer dele foi extraordinário. Agradeceu, dizendo que eram bondades, e elogiou também minha mãe, senhora grave, distinta e moça, muito moça... Que idade teria? (Machado de Assis, Dom Casmurro)
– 25
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 26
a) Um crítico afirma que, “examinada em suas relações, a população de Dom Casmurro compõe uma parentela, uma dessas grandes moléculas sociais do Brasil tradicional, no centro da qual está um proprietário mais considerável, cercado de figuras que podem incluir, entre outros, um ou mais agregados, vizinhos com obrigações, comensais, parentes pobres em graus diversos, conhecidos que aspiram à proteção (...).” (Adaptado de Roberto Schwarz, Duas Meninas) P O R T U G U Ê S E
Identifique o papel que cada uma das personagens que aparecem no trecho de Dom Casmurro desempenha na composição da referida “parentela”. RESOLUÇÃO: Escobar: representa a categoria dos “conhecidos que aspiram à proteção (...)”. O fragmento deixa patente a intenção da personagem de agradar e bajular o amigo que fez no seminário e, especialmente, a mãe deste, como se observa no último parágrafo. D. Glória (mãe de Bentinho): representa o que Roberto Schwarz denomina o centro da parentela, o “proprietário mais considerável”. Era uma viúva rica, cujo patrimônio provinha de rendimentos das propriedades e de escravos, arrendados ou alugados. Na visão do crítico, D. Glória compõe, com o círculo de parentes, agregados e dependentes em diversos graus, um microcosmo da sociedade brasileira no Segundo Reinado. José Dias: é o agregado, figura característica da estrutura patriarcal. É o homem que, não sendo escravo nem empregado, não era também parente, mas vivia sob a proteção do “senhor”, ao qual devia obediência e favores, retribuídos com trabalhos diversos e uma subserviência constante. Personagem das mais interessantes da galeria machadiana, é o “homem dos superlativos”, que “sabia opinar, obedecendo” e que foi agregado à família pelo falecido pai de Bentinho, a quem se apresentou como “médico homeopata”, atribuindo a si mesmo algumas curas. Vivendo desde então com a família, faz da esperteza, da dissimulação, da perspicácia na observação das relações de poder e conveniência, uma forma de sobreviver, da maneira mais favorável, num meio ao qual não pertence propriamente. Tio Cosme: é, também viúvo, o parente que se coloca sob o teto e a proteção da matriarca. Prima Justina: representa uma situação semelhante à de tio Cosme, e cabe observar que a agregação de ambos à estrutura familiar de Dona Glória se prende à convenção de que, viúva, a matriarca não deveria viver sob o
b) Na conversação apresentada no trecho, as falas de José Dias refletem a posição social que ele ocupa nessa “parentela”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “— Seguramente, acudiu José Dias; entretanto, pode ser que a senhora D. Justina tenha alguma razão” e “— Justamente! confirmou José Dias para não discordar dela.” Essas duas intervenções do agregado são exemplares de sua posição subserviente e sua habilidade em “opinar obedecendo”. No primeiro instante, parece dar razão à Prima Justina, que identifica o caráter “um tanto metediço” e os “olhos policiais” de Escobar. No instante seguinte, contradiz-se e concorda também com D. Glória, a quem Escobar parecia “um mocinho muito sério”.
mesmo teto com um homem solteiro, o agregado José Dias. Assim, convocados a se abrigar sob a proteção da viúva Santiago, serviam como “biombo”, que preservava o decoro e as aparências.
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VII)
1. (FUVEST-SP-2010)
Gente que mamou leite romântico pode meter o dente no rosbife* naturalista; mas em lhe cheirando a teta gótica e oriental, deixa logo o melhor pedaço de carne para correr à bebida da infância. Oh! meu doce leite romântico! (Machado de Assis, Crônicas) *Rosbife: tipo de assado ou fritura de alcatra ou filé bovinos, bem tostado externamente e sangrante na parte central, servido em fatias.
a) A imagem do “rosbife naturalista” — empregada, com humor, por Machado de Assis, para evocar determinadas características do Naturalismo — poderia ser utilizada também para se referir a certos aspectos do romance O Cortiço? Justifique sua resposta.
26 –
RESOLUÇÃO: O Cortiço, como é de esperar de uma obra naturalista, apresenta preocupa ção de exibir, sem eufemismo, rodeio ou censura, os aspectos mais degradantes do ser humano, o que é compatível com a imagem do rosbife, que é sangrento.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:27 Page 27
b) A imagem do “doce leite romântico”, que se refere a certos traços do Romantismo, pode remeter também a alguns aspectos do romance Iracema? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: A expressão “doce leite romântico” refere-se à idealização da realidade, característica do Romantismo e presente em diversos aspectos de Iracema: a fidelidade extrema a um ideal de amor, a nobreza e a bravura dos guerreiros indígenas (que mais parecem cavaleiros medievais), o enaltecimento da natureza brasileira, o engrandecimento da amizade entre Martim e Poti, o convívio harmonioso entre portugueses e pitiguaras.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o seguinte comentário a respeito de O Cortiço, de Aluísio Azevedo:
Com efeito, o que há n’ O Cortiço são formas primitivas de amealhamento*, a partir de muito pouco ou quase nada, exigindo uma espécie de rigoroso ascetismo inicial e a aceitação de modalidades diretas e brutais de exploração, incluindo o furto (...) como forma de ganho e a transformação da mulher escrava em companheiramáquina. (...) Aluísio foi, salvo erro meu, o primeiro dos nossos romancistas a descrever minuciosamente o mecanismo de formação da riqueza individual. (...) N’O Cortiço [o dinheiro] se torna implicitamente objeto central da narrativa, cujo ritmo acaba se ajustando ao ritmo da sua acumulação, tomada pela primeira vez no Brasil como eixo da composição ficcional. (Antonio Candido, “De Cortiço a Cortiço”, in O Discurso e a Cidade. São Paulo, Duas Cidades, 1993, p. 129-30.)
E S Ê U G U T R O P
b) Identifique a “mulher escrava” e o modo como se dá sua transformação em “companheira-máquina”. RESOLUÇÃO: A “mulher escrava” é Bertoleza, que se torna “companheira-máquina” ao viver como amante de João Romão e como instrumento das vontades do vendeiro, já que ela não só trabalha durante o dia na venda, como sai à noite com o patrão para roubar materiais de construção.
Considere o trecho de O Cortiço, de Aluísio Azevedo: *Amealhar: acumular (riqueza), juntar (dinheiro) aos poucos.
a) Explique a que se referem o “rigoroso ascetismo inicial” da personagem em questão e as “modalidades diretas e brutais de exploração” que ela emprega. RESOLUÇÃO: O ascetismo a que se refere Antonio Candido é o esforço austero de acúmulo de dinheiro a que João Romão se entrega, deixando de lado veleidades de prazer, conforto e bem-estar. Em seu afã de enriquecimento, ele chegou a dormir no mesmo balcão em que atendia clientes, comia os piores legumes de sua horta para vender os melhores, não se preocupava com vestuário, aparência e amenidades da vida. Essa “febre de acumular”, como diz o narrador do romance, determinará no dono do cortiço um comportamento brutal deTalexploração da massamais animalizada dos moradores da estalagem. atitude se mostrará cruel em três momentos: quando rouba a garrafa cheia de dinheiro do velho Libório, quando lucra com a indenização do seguro por causa do incêndio que prejudicou imensamente os inquilinos e, o mais extremo, quando engana Bertoleza, usurpando suas economias, e mais tarde a descarta sem remorso em nome de um casamento de conveniência com Zulmira.
Uma aluvião de cenas, que ela [Pombinha] jamais tentara explicar e que até ali jaziam esquecidas nos meandros do seu passado, apresen tavam-se agora nítidas e transparentes. Compreendeu como era que certos velhos respeitáveis, cujas fotografias Léonie lhe mostrara no dia que passaram juntas, deixavam-se vilmente cavalgar pela loureira, cativos e submissos, pagando a escravidão com a honra, os bens e até com a própria vida, se a prostituta, depois de os ter esgotado, fechavalhes o corpo. E continuou a sorrir, desvanecida na sua superioridade sobre esse outro sexo, vaidoso e fanfarrão, que se julgava senhor e que, no entanto, fora posto no mundo simplesmente para servir ao feminino; escravo ridículo que, para gozar um pouco, precisava tirar da sua mesma ilusão a substância do seu gozo; ao passo que a mulher, a senhora, a dona dele, ia tranquilamente desfrutando o seu império, endeusada e querida, prodigalizando martírios que os miseráveis aceitavam contritos, a beijar os pés que os deprimiam e as implacáveis mãos que os estrangulavam. — Ah! homens! homens!... sussurrou ela de envolta com um suspiro.
– 27
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 28
P O R T U G U Ê S E
3. (UNIFESP-SP-2010 – modificado) – No texto, os pensamentos da personagem a) recuperam o princípio daprosa naturalista, que condenaos assuntos repulsivos e bestiais — sem amparo em teorias científicas — ligados ao homem, que põe em primeiro plano seus instintos animalescos. b) elucidam o princípiodo determinismo presente naprosa naturalista, revelando os homens e as mulheres conscientes dos seus instintos em função do meio em que vivem e, sobretudo, capazes de controlá-los. c) trazem uma crítica aos aspectos animalescos próprios dos homens, mas, por outro lado, revelam uma forma de Pombinha submeter-se a muitos deles para obter vantagens: eis aí um princípio do Realismo rechaçado no Naturalismo. d) constroem uma visão de mundo e do homem idealizada, o que, em certa medida, afronta o referencial em que se baseia a prosa naturalista,
4. “Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas.” Que figura de linguagem foi empregada no trecho acima? Explique. RESOLUÇÃO: Prosopopeia (personificação), pois foram atribuídas a um ser inanimado (o cortiço) características de um ser animado (a ação de acordar, abrir os olhos).
que define o homem como fruto do meio, marcado pelo apelo dos seus sentidos. e) consubstanciam a concepção naturalista de que o homem é um animal, preso aos instintos, e, no que diz respeito à sexualidade, vê-se que Pombinha considera a mulher superior ao homem; para ela, ter consciência dessa superioridade é uma forma de obter vantagens. RESOLUÇÃO: A alternativa e interpreta corretamente os pensamentos da personagem Pombinha, que reconhece no sexo uma força degradante, como é próprio do Naturalismo, capaz de subjugar “velhos respeitáveis”. Resposta: E
5. “No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas.”
Grasnar e cacarejar são palavras de sonoridade expressiva, chamadas onomatopeias. Por quê? Texto para as questões de 4 a 6.
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua infinidade de portas e janelas alinhadas. Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada sete horas de chumbo. Como que se sentiam ainda na indolência 1 de neblina as derradeiras notas da última guitarra da noite antecedente, dissolvendo-se à luz loura e tenra2 da aurora, que nem um suspiro de saudade perdido em terra alheia. A roupa lavada, que ficara de véspera nos coradouros3, umedecia o ar e punha-lhe um farto acre4 de sabão ordinário. As pedras do chão, esbranquiçadas no lugar da lavagem e em alguns pontos azuladas pelo anil, mostravam uma palidez grisalha e triste, feita de acumulações de espumas secas. Entretanto, das portas surgiam cabeças congestionadas de sono; ouviam-se amplos bocejos, fortes como o marulhar5 das ondas; pigarreava-se grosso por toda a parte; começavam as xícaras a tilintar; o cheiro quente do café aquecia, suplantando todos os outros; trocavam-se de janela para janela as primeiras palavras, os bons-dias; reatavam-se conversas interrompidas à noite; a pequenada cá fora traquinava já, e lá dentro das casas vinham choros abafados de crianças que ainda não andam. No confuso rumor que se formava, destacavam-se risos, sons de vozes que altercavam 6, sem se saber onde, grasnar de marrecos, cantar de galos, cacarejar de galinhas. De alguns quartos saíam mulheres que vinham pendurar cá fora, na parede, a gaiola do papagaio, e os louros, à semelhança dos donos, 7 à luz nova do dia. cumprimentavam-se ruidosamente, espanejando-se (Aluísio Azevedo, O Cortiço, cap. III)
1 – Indolência: preguiça. 2 – Tenro: brando. 3 – Coradouro: lugar onde se põe roupa a corar ao Sol. 4 – Farto acre: cheiro ácido. 5 – Marulhar: agitar. 6 – Altercar: debater. 7 –Espanejar-se: sacudir-se.
28 –
RESOLUÇÃO: Essas palavras são chamadas onomatopeias porque seus sons imitam ou sugerem os sons reais que representam.
6. Sinestesia é um tipo de metáfora em que se misturam sensações de diferentes órgãos dos sentidos. Exemplo: em “Avistava-se o grito das araras” (Guimarães Rosa), estabeleceu-se relação entre a percepção auditiva (“grito”) e a visual (“avistava-se”). É um tipo de metáfora por que, no caso, há comparação implícita entre um grito e um objeto visível. Considerando-se a explicação dada, há sinestesia em a) “um acordar alegre e farto”. b) “sete horas de chumbo”. c) “a roupa lavada (...) umedecia o ar”. d) “o cheiro quente do café”. e) “os louros (...) cumprimentavam-se ruidosamente”. RESOLUÇÃO: Há mistura das sensações olfativa e tátil em “o cheiro quente do café”. Resposta: D
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 29
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (VIII)
1. (FUVEST-SP-2010) – Considere a seguinte relação de obras: Auto da Barca do Inferno, Memórias de um Sargento de Milícias, Dom Casmurro e Capitães da Areia. Entre elas, indique as duas que, de modo mais visível, apresentam intenção de doutrinar, ou seja, o propósito de transmitir princípios e diretivas que integram doutrinas determinadas. Divida sua resposta em duas partes: a), para a primeira obra escolhida, e b), para a segunda obra escolhida. Justifique sucintamente cada uma de suas escolhas. RESOLUÇÃO: a) O Auto da Barca do Inferno é informado por princípios da moral cristã, pelos quais são julgados os comportamentos dos mortos prestes a embarcar, no “cais das almas”, para o mundopost-mortem, em que serão punidos ou recompensados. b) Capitães da Areia é um romance em que se faz a apologia da revolução socialista como panaceia para as injustiças sociais decorrentes do regime capitalista. É uma obra que busca o engajamento na luta social, tendo sido por isso proibida durante o Estado Novo. A intenção de doutrinar politicamente o leitor é recorrente, como exemplifica o final: “E, apesar de que lá fora era o terror, qualquer daqueles lares era um lar que se abriria para Pedro Bala, fugitivo da polícia. Porque a revolução é uma pátria e uma família.”
todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música. Volta Seca não pensava com certeza em Lampião neste momento. Pedro Bala não pensava em ser um dia o chefe de todos os malandros da cidade. O Sem-Pernas em se jogarno mar, onde os sonhos são todos belos. Porque a música saía do bojo do velho carrossel só para eles e para o operário que parara. E era uma valsa velha e triste, já esquecida por todos os homens da cidade. (Jorge Amado, Capitães da Areia. São Paulo, Companhia das Letras, 2008, p. 68.) a) De que modo esse estabelece contraste com os demais do romance? Quais sãocapítulo os elementos desseumcontraste? RESOLUÇÃO: O contraste notável é entre a plenitude desse momento de enlevo e a situação de precariedade, carência e insatisfação da vida dos Capitães da Areia. Os elementos desse contraste são visíveis, por exemplo, no “rosto sombrio de Volta Seca”, que se “abria num sorriso”, e em “todos eles sem carinho e sem conforto e agora tinham o carinho e conforto da música”.
b) Qual a relação de tal contraste com o tema do livro? RESOLUÇÃO: O tema do livro é a delinquência de menores abandonados. No capítulo de que se extraiu o texto, relata-se um momento de êxtase dessas crianças, ao brincarem num velho carrossel. Depreende-se que, por mais marginali zados que sejam, aos Capitães da Areia resta ainda a condição essencial de crianças que se encantam. São crianças, ainda que castigadas pela injustiça social que as c onduz à marginalidade.
2. (UNICAMP-SP-2010) – Leia o trecho seguinte, do capítulo “As Luzes do Carrossel”, de Capitães da Areia:
(...) O sertanejo trepou no carrossel, deu corda na pianola e começou a música de uma valsa antiga. O rosto sombrio de Volta Seca se abria num sorriso. Espiava a pianola, espiava os meninos envoltos em alegria. Escutavam religiosamente aquela música que saía do bojo do carrossel na magia da noite da cidade da Bahia só para os ouvidos aventureiros e pobres dos Capitães da Areia. Todos estavam silencio sos. Um operário que vinha pela rua, vendo a aglomeração de meninos na praça, veio para o lado deles. E ficou também parado, escutando a velha música. Então a luz da lua se estendeu sobre todos, as estrelas brilharam ainda mais no céu, o mar ficou de todo manso (talvez que Iemanjá tivesse vindo também ouvir a música) e a cidade era como que um grande carrossel onde giravam em invisíveis cavalos os Capitães da Areia. Neste momento de música, eles sentiram-se donos da cidade. E amaram-se uns aos outros, se sentiram irmãos porque eram
– 29
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 30
P O R T U G U Ê S E
Texto para o teste 3.
Texto para os testes de 4 a 6.
Todos reconheceram os direitos de Pedro Bala à chefia, e foi desta época que a cidade começou a ouvir falar nos Capitães da Areia, crianças abandonadas que viviam do furto. Nunca ninguém soube o número exato de meninos que assim viviam. Eram bem uns cem e destes mais de quarenta dormiam nas ruínas do velho trapiche.
O romance Capitães da Areia, de Jorge Amado, teve sua primeira edição (1937) apreendida e queimada em praça pública pouco depois de implantada a ditadura de Getúlio Vargas. No trecho a seguir, o narrador nos conta como Pedro Bala, aos quinze anos, assumiu a liderança de um grupo que dormia num velho armazém abandonado do cais do porto.
3. (PUC-SP-2010) – O trecho transcrito é do romance Capitães da Areia, que, escrito em 1937, se inscreve entre os “romances proletários” de Jorge Amado. Considerando-o como um todo, é correto afirmar que a) destaca e exalta o tema da infância abandonada e delinquente, incentivada pelos interesses da imprensa local e admitida pelas autoridades caracterizando cotidiano de ações marginais capazes policiais, de transtornar a sociedade um baiana da época. b) consubstancia o percurso de aprendizagem do herói que supera a condição de srcem e eleva o protagonista ao plano histórico do con fronto social e político. c) a mãe de santo e o padre progressista, personagens do romance, ainda que pudessem representar a convergência sincrética de forças protetoras e elementos capazes de minimizar a orfandade dos Capitães, nada conseguem porque não têm influência sobre o bando. d) a prisão e a tortura de Pedro Bala no reformatório, confinado no cubículo escuro da cafua, apenas intensificam seu instinto de violência e a necessidade de vingança contra a sociedade. e) Pedro Bala, líder dos Capitães, no final, se vê derrotado no intento de realizar seu sonho de transformação social e é abandonado pelos demais, pois Volta Seca se junta ao bando de Lampião, Professor vai ser artista na capital, Pirulito ingressa na vida religiosa, Boa-Vida se torna sambista e Gato adere à marginalidade em Ilhéus. RESOLUÇÃO: Na obra de Jorge Amado, principalmente nos “romances proletários”, é recorrente a transformação do protagonista, que, ao ganhar consciência política, supera a condição marginal de srcem e passa a lutar no plano histórico do confronto social e político. EmCapitães da Areia, o delinquente juvenil Pedro Bala e o grupo comandado por ele dei xam de ser apenas seres marginalizados para, no final da narrativa, participar da luta contra a sociedade de classes capitalista. Resposta: B
É aqui também que mora o chefe dos Capitães da Areia: Pedro Bala. Desde cedo foi chamado assim, desde seus cinco anos. Hoje tem quinze anos. Há dez que vagabundeia nas ruas da Bahia. Nunca soube de sua mãe, seu pai morrera de um balaço. Ele ficou sozinho e empregou anos em conhecer a cidade. Hoje sabe de todas as suas ruas e de
todos os seus becos. Não há venda, quitanda,dabotequim não conheça. Quando se incorporou aos Capitães Areia (o que caisele recémconstruído atraiu para as suas areias todas as crianças abandonadas da cidade), o chefe era Raimundo, o Caboclo, mulato avermelhado e forte. Não durou muito na chefia o caboclo Raimundo. Pedro Bala era muito mais ativo, sabia planejar os trabalhos, sabia tratar com os outros, trazia nos olhos e na voz a autoridade de chefe. Um dia brigaram. A desgraça de Raimundo foi puxar uma navalha e cortar o rosto de Pedro, um talho que ficou para o resto da vida. Os outros se meteram e como Pedro estava desarmado deram razão a ele e ficaram esperando a revanche, que não tardou. Uma noite, quando Raimundo quis surrar Barandão, Pedro tomou as dores do negrinho e rolaram na luta mais sensacional a que as areias do cais jamais assistiram. Raimundo era mais alto e mais velho. Porém Pedro Bala, o cabelo loiro voando, a cicatriz vermelha no rosto, era de uma agilidade espan tosa e desde esse dia Raimundo deixou não só a chefia dos Capitães da Areia, como o próprio areal. Engajou tempos depois num navio. (Jorge Amado, Capitães da Areia. 50.a ed. Rio de Janeiro, Record, 1980, p. 26-27.) 4. (FAFICP-SP – modificado) – Pela leitura do texto, pode-se concluir que o romance pretende denunciar um problema a) cultural, a hierarquia nos grupos sociais. b) de identidade nacional. c) social, o desemprego na cidade de Sal vador. d) educacional, o alto índice de crianças analfabetas. e) social, a questão do menor abandonado. RESOLUÇÃO: Resposta: E
5. (FAFICP-SP – modificado) – Que características de Pedro Bala fizeram dele o líder do grupo? a) Sabia planejar e, por ser branco, as pessoas da cidade não o viam como um marginal, fato que o ajudava em seus furtos. b) Era ativo, sabia planejar e lidar com os outros; trazia na voz e nos olhos autoridade de chefe. c) Era mais novo que Raimundo, e o grupo precisava de alguém com mais vigor e com novas ideias. d) Era autoritário, rude, ativo, inteligente, características que convêm a um verdadeiro líder. e) Por ter físico avantajado, era mais ativo e mais ágil que Raimundo; essa característica era útil nas fugas do grupo. RESOLUÇÃO: Resposta: B
30 –
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 31
6. A exemplo do nome Pedro Bala, outras personagens também são nomeadas de acordo com um de seus traços físicos ou psicológicos, ou, ainda, de acordo com algo que lhes seja peculiar. É o que se vê em nomes como Sem-Pernas , Professor, Boa-Vida etc. A esse recurso usado pelo autor corresponde uma figura de linguagem. Trata-se da(o): a) comparação. b) eufemismo. c) ironia. d) metonímia. e) personificação. RESOLUÇÃO: O autor faz uso da metonímia, visto que se vale de uma parte (de algo que representa o todo) do aspecto físico ou psicológico das personagens para nomeá-las. Resposta: D
Para responder aos testes de números 7 e 8, leia o trecho extraído de Gabriela, Cravo e Canela, obra de Jorge Amado.
(...) O marinheiro sueco, um loiro de quase dois metros, entrou no bar, soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib e apontou com o dedo as garrafas de “Cana de Ilhéus”. Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível. Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão, servira cachaça de graça aos marinheiros. Passou o dedo indicador no polegar, a perguntar pelo dinheiro. Vasculhou os bolsos o loiro sueco, nem sinal de dinheiro. Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada. No balcão colocou a nórdica mãed’água, Iemanjá de Estocolmo. Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina por detrás da Igreja. Mirou a sereia, seu rabo de peixe. Assim era a anca de Gabriela. Mulher tão de fogo no mundo não havia, com aquele calor, aquela ternura, aqueles suspiros, aquele langor. Quanto mais dormia com ela, mais tinha vontade. Parecia feita de canto e dança, de sol e luar, era de cravo e canela. Nunca mais lhe dera um presente, uma tolice de feira. Tomou da garrafa de cachaça, encheu um copo grosso de vidro, o marinheiro suspendeu o braço, saudou em sueco, emborcou em dois tragos, cuspiu. Nacib guardou no bolso a sereia dourada, sorrindo. Gabriela riria contente, diria a gemer: “precisava não, moço bonito...” E aqui termina a história de Nacib e Gabriela, quando renasce a chama do amor de uma brasa dormida nas cinzas do peito.
a) b) c) d) e)
“Passou o dedo indicador no polegar...” “...servira cachaça de graça aos marinheiros.” “No balcão colocou a nórdica mãe-d’água...” “...e apontou com o dedo as garrafas de ‘Cana de Ilhéus’.” “Um olhar suplicante, umas palavras em língua impossível.”
RESOLUÇÃO: No trecho transcrito, duas mitologias são aproximadas através das figuras da “sereia nórdica” representada no broche e da divindade afro-brasileira Iemanjá. Resposta: C
8. (UFSCar-SP) – Assinale a alternativa que contém um trecho em que o autor apresenta as informações numa linguagem altamente conotativa. a) “...soltou um bafo pesado de álcool na cara de Nacib...” b) “Os olhos do árabe fitavam Gabriela a dobrar a esquina...” c) “Já cumprira Nacib, na véspera, seu dever de cidadão...” d) “Mas descobriu um broche engraçado, uma sereia dourada.” e) “Parecia feita de canto edança, de sol eluar, era decravo e canela.” RESOLUÇÃO: No trecho transcrito na alternativa a, “pesado”, em “bafo pesado”, é uma metáfora sinestésica, mas tal figura não faz que a linguagem da frase possa ser considerada “altamente conotativa”. A descrição contida na alternativa e é inteiramente vazada em linguagem figurada, conotativa, pois são metafóricos todos os predicados atribuídos a Gabriela. Resposta: E
7. (UFSCar-SP) – No texto, o autor relaciona a cultura nacional à estrangeira, buscando, por meio da comparação, estabelecer equiva lências entre elas. O trecho do texto que indica esse tipo de comparação é
– 31
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 32
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (IX)
Texto para a questão 1.
P O R T U G U Ê S E
O pequeno sentou-se, acomodou nas pernas a cabeça da cachorra, pôs-se a contar-lhe baixinho uma história. Tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio que morrera no tempo da seca. Valia-se, pois, de exclamações e de gestos, e Baleia respondia com o rabo, com a língua, com movimentos fáceis de entender. (Graciliano Ramos, Vidas Secas) 1. (FUVEST-SP-2010) – Considere as seguintes afirmações sobre esse trecho de Vidas Secas, entendido no contexto da obra, e responda ao que se pede. a) No trecho, torna-se claro que a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para ampliar as diferenças que distinguem homens de animais. Você concorda com essa afirmação? Justifique, com base no trecho, sua resposta. RESOLUÇÃO: Essa afirmação não é procedente, pois, ao contrário, a escassez vocabular do menino contribui de modo decisivo para diminuir as diferenças que distinguem homens de animais, como se evidencia tanto na passagem “tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio”, como no fato de o menino se comunicar por meio de “exclamações e de gestos”, tal como a cadela que lhe abana o rabo.
b) Nesse trecho, como em outros do mesmo livro, é por exprimir suas emoções e sentimentos pessoais a respeito da pobreza sertaneja que o narrador obtém o efeito de contagiar o leitor, fazendo com que ele também se emocione. Você concorda com a afirmação? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois o narrador de Vidas Secas não se envolve e mocionalmente com as realidades que representa. Seu relato, conforme aos princípios realistas (o romance de Graciliano Ramos filia-se ao Neorrealismo que substituiu o experimentalismo modernista), é objetivo e explora uma neutralidade que, cedendo a palavra às personagens e — por assim dizer — aos fatos, em vez de diminuir, intensifica a reação do leitor ao quadro representado.
32 –
2. (UNICAMP-SP-2010) – O excerto abaixo, de Vidas Secas, trata da personagem sinha Vitória:
(...) Calçada naquilo, trôpega, mexia-se como um papagaio, era ridícula. Sinha Vitória ofendera-se gravemente com a comparação, e se não fosse o respeito que Fabiano lhe inspirava, teria despropositado. Efetivamente os sapatos apertavam-lhe os dedos, faziam-lhe calos. Equilibrava-se mal, tropeçava, manquejava, trepada nos saltos de meio palmo. Devia ser ridícula, mas a opinião de Fabiano entriste cera-a muito.
Desfeitas nuvens, curtidos os dissabores, a cama de novo lhe aparecera noessas horizonte acanhado. Agora pensava nela de mau humor. Julgava-a inatingível e misturava-a às obrigações da casa. (...) Um mormaço levantava-se da terra queimada. Estremeceu lembrando-se da seca (...). Diligenciou afastar a recordação, temendo que ela virasse realidade. (...) Agachou-se, atiçou o fogo, apanhou uma brasa com a colher, acendeu o cachimbo, pôs-se a chupar o canudo de taquari cheio de sarro. Jogou longe uma cusparada, que passou por cima da janela e foi cair no terreiro. Preparou-se para cuspir novamente. Por uma extravagante associação, relacionou esse ato com a lembrança da cama. Se o cuspo alcançasse o terreiro, a cama seria comprada antes do fim do ano. Encheu a boca de saliva, inclinou-se — e não conseguiu o que esperava. Fez várias tentativas, inutilmente. (...) Olhou de novo os pés espalmados. Efetivamente não se acostumava a calçar sapatos, mas o remoque de Fabiano molestara-a. Pés de papagaio. Isso mesmo, sem dúvida, matuto anda assim. Para que fazer vergonha à gente? Arreliava-se com a comparação. Pobre do papagaio. Viajar com ela, na gaiola que balançava em cima do baú de folha. Gaguejava: — “Meu louro.” Era o que sabia dizer. Fora isso, aboiava arremedando Fabiano e latia como Baleia. Coitado. Sinha Vitória nem queria lembrar-se daquilo. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. Rio de Janeiro/São Paulo, Record, 2007, p. 41-43.) a) Por que a comparação feita por Fabiano incomoda tanto sinha Vitória? Que lembrança evoca? RESOLUÇÃO: Sinha Vitória sente-se incomodada com a comparação feita por Fabiano — o andar dela, quando usava sapatos, assemelhava-se ao de um papagaio — porque, ridicularizando-a, fere a sua vaidade feminina. Além disso, traz à mente da mulher a lembrança do papagaio, o que a faz reviver um remorso, pois fora dela a ideia de usar a ave como alimento. O mal-estar é ainda maior, pois a lembrança desse episódio evoca o sofrimento que ela e sua família tiveram durante a seca.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 33
b) Tendo em vista a condição e a trajetória de sinha Vitória, justifique a ironia contida no nome da personagem. Que outra personagem referida no excerto também revela uma ironia no nome? RESOLUÇÃO: É irônico que uma personagem massacrada pela seca e pelas condições sociais injustas tenha como nome Vitória. E há também ironia no nome de Baleia, pois essa cachorra é extremamente magra e habita uma região carente de água, o que contraria radicalmente as ideias associadas ao mamífero de que seu nome fora emprestado.
b) Explique a referência que ele faz aos “homens ricos”, com base no enredo do livro. RESOLUÇÃO: Os “homens ricos” a que Fabiano se refere são os seus opressores, especialmente o “patrão”, latifundiário, que o oprime, impondo-lhe uma “meação” já em si injusta (ao patrão cabiam três de cada quatro bezerros e dois de cada três caprinos que Fabiano criasse), além da aplicação da tabela “price” aos débitos que o sertanejo ia acumulando. Não bastasse isso, o patrão ainda roubava nas contas. É o retrato brutal de uma sociedade arcaica, pré-capitalista, que acrescenta a onipotência do patronato coronelesco à prepotência do Estado e de seus órgãos policiais (o Soldado Amarelo) e fiscais (a prefeitura).
3. (UNICAMP-SP) – Leia o seguinte trecho do capítulo “Contas”, de Vidas Secas:
(...) Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. Bem. Nascera com esse destino, ninguém tinha culpa de ele haver nascido com um destino ruim. Que fazer? Podia mudar a sorte? Se lhe dissessem que era possível melhorar de situ ação, espantar-se-ia. (...) Era sina. O pai vivera assim, o avô também. E para trás não existia família. Cortar mandacaru, ensebar látegos — aquilo estava no sangue. Conformava-se, não pretendia mais nada. Se lhe dessem o que era dele, estava certo. Não davam. Era um desgraçado, era como um cachorro, só recebia ossos. Por que seria que os homens ricos ainda lhe tomavam uma parte dos ossos? Fazia até nojo pessoas importantes se ocuparem com semelhantes porcarias. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. 103.a ed. Rio de Janeiro, Editora Record, 2007, p. 97.) a) Que visão Fabiano tem de sua própria condição? Justifique. RESOLUÇÃO: Fabiano é um dos “heróis problem áticos” de Gracilia no Ramos, em permanente revolta contra si e contra o mundo. É personagem típica dos romances de tensão crítica (Lucien Goldman), nos quais se exibem as sequelas irreversíveis que as injustiças sociais, a opressão e a brutalidade impõem ao ser humano. Fabiano, fatalista a princípio — “Tinha a obrigação de trabalhar para os outros, naturalmente, conhecia o seu lugar. (…) Nascera com esse destino (…) Podia mudar a sorte? (…) Era sina. O pai vivera assim (…)” —, parece resignado com a condição de vaqueiro, de empregado, de homem permanentemente brutalizado pelo clima e pela sociedade. Sua revolta nasce da constatação de que, ainda assim, era roubado, prejudicado pelos “homens ricos”, que lhe tomavam até parte dos “ossos” que lhe cabiam pelo trabalho.
4. (FUVEST-SP) – Leia as afirmações seguintes e responda ao que se pede. I. A dureza do clima, que se manifesta principalmente nas grandes secas periódicas, explica todas as aflições de Fabiano, ao longo da narrativa de Vidas Secas, de Graciliano Ramos. a) Você concorda com essa afirmação? Justifique sucintamente sua resposta. RESOLUÇÃO: Não, pois a seca é apenas um dos fatores que afligem Fabiano e sua família e não explica todos os dramas da personagem. A secura em Vidas Secas não se restringe ao clima e à paisagem; é, ainda, uma “secura” existencial, linguística e social, advinda de fatores políticos, econômicos e culturais. As aflições de Fabiano também derivam, por exemplo, da violência que sofre por parte do Soldado Amarelo (símbolo da autoridade opressora), assim como de sua incapacidade de comunicação.
– 33
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 34
II. Apesar de quase atrofiadas na sua rusticidade, as personagens de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, conservam um filete de investigação da interioridade: cada uma delas se perscruta, reflete, tenta compre ender a si e ao mundo, ajustando-o à sua visão.
RESOLUÇÃO: No trecho em itálico, as orações, coordenadas assindéticas, articulam uma sucessão de imagens, especialmente no campo visual, que aludem a alguma luz, pouca e precária, mas que ilumina, afastando o medo e aquecendo. É a luz da madeira queimada que indicia a miséria dos que não têm nem mesmo um lampião a óleo ou querosene.
b) Você considera essa afirmação correta? Justifique brevemente sua resposta. P O R T U G U Ê S E
RESOLUÇÃO: A afirmação pode ser considerada correta, pois esse “filete de investigação da interioridade” é um recurso de que se vale o narrador, por meio do uso do discurso indireto livre, para trazer à tona os dramas internos de Fabiano e de sua família.
Texto para a questão 5.
Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras, clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados. De quando em quando estes se mexiam, porque o lume era fraco e apenas aquecia pedaços deles. Outros pedaços esfriavam recebendo o ar que entrava pelas rachaduras das paredes e pelas gretas da janela. Por isso não podiam dormir. Quando iam pegando no sono, arrepiavamse, tinham precisão de virar-se, chegavam-se à trempe e ouviam a conversa dos pais. Não era propriamente conversa: eram frases soltas, espaçadas, com repetições e incongruências. (Graciliano Ramos, Vidas Secas. São Paulo, Livraria Martins Editora, s/d., p. 66.) 5. (FGV-SP) – “Fabiano esfregou as mãos satisfeito e empurrou os tições com a ponta da alpercata. As brasas estalaram, a cinza caiu, um círculo de luz espalhou-se em redor da trempe de pedras , clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados.” a) As ações de Fabiano nesse primeiro trecho desencadearam outras ações com efeitos plásticos e semânticos no contexto. Partindo dessa afirmação, analise, nas orações destacadas em itálico, os sentidos criados pela sequência dos verbos, tanto sob o ponto de vista físico, quanto sob o ponto de vista simbólico, denunciando o estado das personagens.
34 –
b) Em “clareando vagamente os pés do vaqueiro, os joelhos da mulher e os meninos deitados”, Graciliano Ramos se vale de técnicas que se assemelham às do cinema, como se se tratasse do “olhar” de uma câmera. Explique esse mecanismo e contextualize seu efeito de sentido com base na obra lida. RESOLUÇÃO: travelling As imagens, justapostas por coordenação, movem-se como num cinematográfico: como se uma câmera se movesse e,em direção da precária luminosidade, embig close, pusesse em foco as imagens sobre as quais incide a luz: pés, joelhos e os meninos deitados. O “efeito de sentido” refere-se, de novo, à pobreza e precariedade da vida representadas na obra.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 35
MÓDULO
Literatura e Análise de Textos Literários (X)
1. (FUVEST-SP-2010) – Leia este trecho do poema de Vinícius de Moraes:
MENSAGEM À POESIA E S Ê U G U T R O P
Não posso Não é possível Digam-lhe que é totalmente impossível Agora não pode ser É impossível
Não posso.que estou tristíssimo, mas não posso ir esta noite ao seu Digam-lhe [encontro. 2. (UNICAMP-SP-2010) – O poeta Vinícius de Moraes, apesar de Contem-lhe que há milhões de corpos a enterrar modernista, explorou formas clássicas, como o soneto abaixo, em Muitas cidades a reerguer, muita pobreza pelo mundo. versos alexandrinos (12 sílabas) rimados: Contem-lhe que há uma criança chorando em alguma parte do mundo E as mulheres estão ficando loucas, e há legiões delas carpindo SONETO DE INTIMIDADE A saudade de seus homens; contem-lhe que há um vácuo Nos olhos dos párias, e sua magreza é extrema; contem-lhe Nas tardes de fazenda há muito azul demais. Que a vergonha, a desonra, o suicídio rondam os lares, e é preciso Eu saio às vezes, sigo pelo pasto, agora [reconquistar a vida. Mastigando um capim, o peito nu de fora Façam-lhe ver que é preciso eu estar alerta, voltado para todos os No pijama irreal de há três anos atrás. [caminhos Desço o rio no vau dos pequenos canais Pronto a socorrer, a amar, a mentir, a morrer se for preciso. (...) Para ir beber na fonte a água fria e sonora (Vinícius de Moraes,Antologia Poética) E se encontro no mato o rubro de uma amora Vou cuspindo-lhe o sangue em torno dos currais. a) No trecho, o poeta expõe alguns dos motivos que o impedem de ir Fico ali respirando o cheiro bom do estrume ao encontro da poesia. A partir da observação desses motivos, procure deduzir a concepção dessa poesia ao encontro da qual o poeta não Entre as vacas e os bois que me olham sem ciúme E quando por acaso uma mijada ferve poderá ir: como se define essa poesia? quais suas características principais? Explique sucintamente. RESOLUÇÃO: Seguida de um olhar não sem malícia e verve O poeta exprime rejeição à poesia que fuja do contato imediato com o Nós todos, animais, sem comoção nenhuma mundo e os seus problemas. Mijamos em comum numa festa de espuma. (Vinícius de Moraes,Antologia Poética. São Paulo, Companhia das Letras, 2001, p. 86.) a) Essa forma clássica tradicionalmente exigiu tema e linguagem elevados. O “Soneto de Intimidade” atende a essa exigência? Justifique. b) Na “Advertência”, que abre sua Antologia Poética, Vinícius de Moraes declarou haver “dois períodos distintos”, ou duas fases, em sua obra. Considerando-se as características dominantes do trecho, a qual desses períodos ele pertence? Justifique sua resposta.
RESOLUÇÃO: Nem o tema, nem a linguagem desse soneto são “elevados”. Com efeito, o tema é “baixo” (o congraçamento “fisiológico” com os animais) e a linguagem não evita o vulgar (“cheiro bom do estrume”) e chega a beirar o chulo (“uma mijada ferve”, “mijamos em comum numa festa de espuma”).
RESOLUÇÃO: “Mensagem à Poesia” pertence à segunda fase da obra de Vinícius de Moraes, pois há no texto a preocupação em fazer a poesia abandonar o inefávela eenterrar”, buscar o “criança cotidianochorando”, e as preocupações doreconquistar mundo (“milhões de corpos “é preciso a vida”).
– 35
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 36
P O R T U G U Ê S E
b) Como os quartetos anunciam a identificação do eu lírico com os animais? Como os tercetos a confirmam?
3. Destaque, no poema deVinícius de Moraes,o trecho que indica que ele teria sido influenciado pela poesia de Manuel Bandeira.
RESOLUÇÃO: Os quartetos exprimem a identificação do eu lírico com os animais, apresentando-o em ações mais comumente esperadas deles: mastigar capim (v. 3), andar sem roupa (v. 3), beber água na fonte dos rios (v. 6), comer amoras direto das árvores e cuspi-las em torno dos currais (vv. 78). A confirmação dessa identificação vem nos tercetos de forma inusitada, na menção ao congraçamento do eu lírico com os bois e as vacas na satisfação de uma necessidade fisiológica comum.
RESOLUÇÃO: “Não foste apenas um segredo / De poesia e de emoção / Foste uma estrela em meu degredo.”
4. Qual o refrão do poema de Vinícius? Comente as transformações que esse refrão sofre em suas repetições ao longo do poema. RESOLUÇÃO: O refrão é “Poeta, pai, áspero irmão”. Em cada uma das três vezes que esse refrão se repete no poema, destaca-se uma das três qualificações que Vinícius atribui a Bandeira: primeiro, pai vem seguido de ponto de exclamação; na segunda ocorrência, o ponto de exclamação vem depois de poeta; na terceira ocorrência, há um ponto de interrogação no fim do verso, ficando os três vocativos igualados na pergunta final.
Texto para as questões de 3 a 7.
SAUDADE DE MANUEL BANDEIRA Não foste apenas um segredo De poesia e de emoção Foste uma estrela em meu degredo Poeta, pai! áspero irmão. Não me abraçaste só no peito Puseste a mão na minha mão Eu, pequenino — tu, eleito Poeta! pai, áspero irmão.
5. Explique por que o verso “Eu, pequenino — tu, eleito” contém uma antítese. RESOLUÇÃO: A antítese ocorre entrepequenino e eleito. Pequenino, no contexto, significa “poeta de pequeno valor”, ao passo que eleito significa o oposto: “grande poeta”, porque “eleito”, “escolhido” (na Antiguidade se imaginava que o poeta — o grande poeta — fosse o eleito dos deuses).
Lúcido, alto e ascético amigo De triste e claro coração Que sonhas tanto a sós contigo Poeta, pai, áspero irmão? (Vinícius de Moraes)
RESPOSTA A VINÍCIUS Poeta sou; pai, pouco; irmão, mais. Lúcido, sim; eleito, não. E bem triste de tantos ais Que me enchem a imaginação. 6. Qual a outra expressão do poema de Vinícius cujo sentido pode ser aproximado de “áspero irmão”?
Com que sonho? Não sei bem não. Talvez com me bastar, feliz — Ah feliz como jamais fui! —, Arrancando do coração — Arrancando pela raiz — Este anseio infinito e vão De possuir o que me possui.
RESOLUÇÃO: “Ascético amigo.”
(Manuel Bandeira)
36 –
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 37
7. Explique o sentido da resposta de Bandeira à pergunta de Vinícius. RESOLUÇÃO: Bandeira responde que não sabe bem com o que sonha — sonharia talvez com a felicidade autossuficiente (“...talvez com me bastar, feliz”) e com a supressão do grande e inútil desejo (“anseio infinito e vão”) de assenhorear-se daquilo que o encanta e domina o seu desejo (“possuir o que me possui”).
8. (UFSCar-SP) – Nos dois primeiros quartetos do soneto de Vinícius de Moraes, delineia-se a ideia de que o poeta a) não acredita no amor como entrega total entre duas pessoas. b) acredita que, mesmo amando muito uma pessoa, é possível apaixonar-se por outra e trocar de amor. c) entende que somente a morte é capaz de findar com o amor de duas pessoas. d) concebe o amor como um sentimento intenso a ser compartilhado, tanto na alegria quanto na tristeza. e) vê, na angústia causada pela ideia da morte, o impedimento para as pessoas se entregarem ao amor. RESOLUÇÃO: A ideia de que o amor deve ser compartilhado tanto na alegria como na tristeza depreende-se dos dois últimos versos da segunda estrofe: “E rir meu riso e derramar meu pranto / Ao seu pesar ou seu contentamento.” Resposta: D
Textos para os testes 8 e 9.
SONETO DE FIDELIDADE 9. (UFSCar-SP) – Em “Por enquanto”, Renato Russo diz que “...o pra sempre / sempre acaba”. Essa ideia, no poema de Vinícius de Moraes, aparece no seguinte verso: a) “Mas que seja infinito enquanto dure.” b) “Quero vivê-lo em cada vão momento.” c) “Quem sabe a morte, angústia de quem vive.” d) “Quem sabe a solidão, fim de quem ama.” e) “Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto.”
De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento. Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento.
RESOLUÇÃO: O verso “Mas que seja infinito enquanto dure” implica a ideia de fim, de término (“enquanto dure” quer dizer que não durará sempre), e postula que, dentro de tal limite, o amor não conheça limites (“seja infinito”, isto é, não seja contido por nenhuma restrição). Os versos de Renato Russo — “o pra sempre / sempre acaba” — também afirmam a ideia de fim, em contraste com um projeto sem limite, sem fim (“o pra sempre”). O ponto comum entre os dois textos é, portanto, a ideia de que algo que se quer sem limites também está destinado a terminar. Resposta: A
E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa lhe dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure. (Vinícius de Moraes)
POR ENQUANTO Mudaram as estações Nada mudou Mas eu sei que alguma coisa aconteceu Tá tudo assim, tão diferente Se lembra quando a gente Chegou um dia a acreditar Que tudo era pra sempre Sem saber Que o pra sempre Sempre acaba. (Renato Russo)
– 37
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 38
MÓDULO
Redação e Morfologia (I)
1. (FUVEST-SP) – Observe este anúncio.
2. (UNIFESP) – Leia o texto e responda.
No tocante à relação entre a ética, a ciência e a tecnologia, duas são as dificuldades. Do lado da ética, a dificuldade é ela gerar uma moral conforme as necessidades da ciência e da tecnologia, na medida em que toda ética implica sanções e interdições, e a ciência e a tecnologia em si mesmas, em sua lógica interna, não estão, de saída, dispostas a aceitar proibições e a sacrificar a liberdade de conhecer e de engenhar. Do lado da ciênciae da tecnologia, a dificuldade, como viu Tolstói a respeito da primeira, é que elas são impotentes para gerar
P O R T U G U Ê S E
valores, ossociedade quais deverão buscados e geradosaoalhures, em do outras esferas da e da ser cultura. Não bastasse, contrário que imaginava Bacon, que acreditava que o conhecimento, ou melhor, a ciência, além de gerar a técnica, deveria ser a norma da ação moral, a ciência e a tecnologia não têm a capacidade de instaurar tal norma, haja vista sua incapacidade de responder às duas questões que, segundo Tolstói, mais interessam em nossas vidas: o que devemos fazer e como devemos viver? — talvez porque essas questões não tenham a ver com fatos, mas com valores, e os valores são algo mais do que uma cognição, dependendo de tradições, afetos e sentimentos. Daí não ser nada fácil a tarefa de ajustar a ética, a ciência e a tecnologia. Daí nosso temor de a grande e insistente reivindicação de mais ética, de pôr ética em tudo, gerar uma enorme e irremediável frustração. (Revista Kriterion, vol. 45, n.º 109, Belo Horizonte, Jan/Jun 2004.) (Folha de S. Paulo, 26/09/2008. Adaptado.) a) Na composição do anúncio, qual é a relação de sentido existente entre a imagem e o trecho “quem é e o que pensa”, que faz parte da mensagem verbal?
a) De que tipo de argumento se vale o autor para fund amentar seu ponto de vista?
RESOLUÇÃO: A imagem apresenta um rosto alegre que se forma a partir de linhas da impressão digital em que se inscreve, como a sugerir a definição do sujeito e do objeto representados linguisticamente pelos pronomes indefini dos/interrogativos quem e que. Em outras palavras, a imagem promete a resposta às interrogações introduzidas por aqueles pronomes, pois o rosto que se forma com as linhas da impressão digital sugere a identificação do sujeito pelo qual se pergunta, assim c omo daquilo que ele pensa, uma vez que o rosto é representado com uma expressão denunciadora de seu estado de espírito.
con diversas. Portanto, os candidados ficam sem saber queforme de fatotipologias se pede numa questão formulada tão imprecisamente. O queo se pode responder, tentando-se adivinhar a intenção do examinador, é que o autor argumenta de formadialética, pois contrapõe perspectivas opostas (de um lado a ética, do outro a ciência e a tecnologia) e também recorre a argumentos de autoridade (ao invocar Tolstói e Bacon).
RESOLUÇÃO: A pergunta é vaga, pois não é claro o sentido da expressão “tipo de argumento”. Os argumentos podem ser classificados de muitas maneiras,
b) Qual a posição de Tolstói, quando analisa comparativamente ciência e ética?
b) Se os sujeitos dos verbos “descubra” e “pensa” estivessem no plural, como deveria ser redigida a frase utilizada no anúncio? RESOLUÇÃO: Descubram quem são e o que pensam os moradores de São Paulo.
38 –
RESOLUÇÃO: Tolstói considera que a ciência gera conhecimento, mas não gera valores. Estes dependem de “tradições, afetos e sentimentos” e são decisivos na orientação de nossas vidas. Portanto, as normas éticas que funcionem como reguladoras do exercício da ciência (e do emprego da tecnologia por ela gerada) devem ser buscadas fora da ciência.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 39
3. (UNICAMP-2010) – A propaganda abaixo explora a expressão idiomática ‘não leve gato por lebre’ para construir a imagem de seu produto:
NÃO LEVE GATO POR LEBRE SÓ BOM BRIL É BOM BRIL
a) O sentido do texto se faz com base na polissemia de uma palavra. Identifique essa palavra e explique por que a indicou. RESOLUÇÃO: Trata-se da palavraveículo, que pode significar (1) “qualquer meio usado para transportar ou conduzir pessoas, animais ou coisas, de um lugar para outro” ou (2) “qualquer coisa capaz de transmitir, propagar, difundir algo”. Na expressão “veículo de cultura”, o sentido de veículo é, claramente, (2). O humor da tirinha está em que Mafalda toma a palavra no seu sentido (1). E S Ê U G U T R O P
a) Explique a expressão idiomática por meio de duas paráfrases. RESOLUÇÃO: “Não aceite um produto inferior em lugar do superior.” “Não se deixe enganar por produtos falsificados.” A resposta admite várias possibilidades de redação.
b) Mostre como a dupla ocorrência de BOM BRIL no slogan ‘SÓ BOM BRIL É BOM BRIL’, aliada à expressão idiomática, constrói a imagem do produto anunciado. RESOLUÇÃO: A tautologia “Só Bom Bril é Bom Bril” corres ponde à atribuição de uma qualidade única a um produto único. Todos os demais, ainda que apa rentemente similares, seriam meros “gatos” que rendo passar por “lebres”. Na primeira ocorrência, “Bom Bril” é nome próprio e significa “palha de aço”, ou seja, usa-se a marca pelo produto, o que configura uma meto nímia.
b) A tirinha visa produzir não só efeito humorístico mas também efeito crítico. Você concorda com essa afirmação? Justifique sua resposta. 4. (FUVEST) – Examine a tirinha e responda ao que se pede.
RESOLUÇÃO: O sentido crítico depreensível da tirinha provém da associação entre os ruídos emanados do televisor, que sugerem o conteúdo violento e “apelativo” da programação, e a ideia de cultura, não no sentido antropológico da palavra (“conjunto de comportamento, crenças, conheci mentos, costumes etc. de quepadrões distinguem um grupo social”), mas comosinônimo de “ilustração”, “cabedal de conhecimentos”. Longe de ser “veículo de cultura”, a televisão seria – sugere a tirinha – um veículo de barbárie.
(Quino, Mafalda 2. São Paulo: Martins Fontes, 2002.)
– 39
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 40
5. (FUVEST) – Leia a seguinte fala, extraída de uma peça teatral, e responda ao que se pede.
6. (UNIFESP) – Leia a charge.
Odorico — Povo sucupirano! Agoramente já investido no cargo de Prefeito, aqui estou para receber a confirmação, ratificação, a autenticação e, por que não dizer, a sagração do povo que me elegeu. (Dias Gomes, O Bem-Amado: farsa sociopolítico-patológica em 9 quadros) P O R T U G U Ê S E
a) A linguagem utilizada por Odorico produz e feitos humorísticos. Aponte um exemplo que comprove essa afirmação. Justifique sua escolha. RESOLUÇÃO: O emprego do neologismoagoramente produz efeito humorístico, já que, ao acrescentar o sufixo -mente ao vocábulo agora, Odorico cria outro advérbio, com a intenção de reforçar o tom persuasivo de seu discurso pretensamente solene. Outro exemplo pertinente seria a produção de eco por meio da repetição do sufixo -ção presente na enumeração “confirmação, satisfação, a autenticação e (…) a sagração”.
(www.chargeonline.com.br. Adaptado.) a) As personagens são vítimas de preconceitos e os expressam em suas falas. Explique quais são eles. RESOLUÇÃO: Segundo as personagens, a polícia trata pobres e ricos de maneiras diferentes. Para os pobres, como eles, não se usam os nomes pomposos das “operações” voltadas para ricos. Além disso, como indicam os desenhos e o próprio nome da “operação” destinada aos pobres, estes são também vítimas de maus-tratos.
b) O que leva Odorico a empregar a expressão “por que não dizer”, para introduzir o substantivo “sagração”? RESOLUÇÃO: O substantivo sagração pode ser entendido como “ato ou efeito de sagrar rei, bispo etc. em cerimônia religiosa”. Ao empregar a expressão “por que não dizer” para introduzir tal substantivo, Odorico inten sifica a expressão de sua pretensão de homem público que se julga digno de receber todas as honras de seu povo.
40 –
b) Reescreva as falas das personagens, valendo-se da norma padrão da Língua Portuguesa. RESOLUÇÃO: Para prender ricos, a polícia cria nomes muito belos — não é verdade? Quando se trata de nós, o nome que dão é mesmo “operação tapa na orelha”.
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 41
MÓDULO
Redação e Morfologia (II)
1. (FUVEST) – Conta-me Claúdio Mello e Souza. Estando em um café de Lisboa a conversar com dois amigos brasileiros, foram eles interrompidos pelo garçom, que perguntou, intrigado: — Que raio de língua é essa que estão aí a falar, que eu percebo (*) tudo? ______________________ (*) percebo = compreendo (Rubem Braga)
RESOLUÇÃO: O verbo acompanhar é responsável pelo efeito de humor, pois pode ser entendido de duas maneiras: o guarda o utilizou com o sentido de “ir junto”; já o músico ambulante, com o sentido de “tocar junto”. E S Ê U G U T R O P
a) A graça da fala do garçom reside num paradoxo. Destaque dessa fala as expressões que constituem esse paradoxo. Justifique. RESOLUÇÃO: As expressões são: “– Que raio de língua é essa... que eu percebo tudo?”. A interrogação “Que raio de língua é essa” indica que a personagem não entende a afirmação do interlocutor. Já a expressão “que eu percebo tudo” indica que ele compreende inteiramente o que lhe está sendo dito.
b) Reescreva o diálogo que compõe o texto, usando o discurso indireto. Comece com: O fiscal do “rapa” perguntou ao músico ... RESOLUÇÃO: O fiscal do “rapa” perguntou ao músico se ele tinha licença. O músico respondeu negativamente ao policial. Então, o policial pediu ao músico que o acompanhasse. O músico ambulante respondeu afirmativamente e perguntou que música o policial iria cantar.
b) Transponha a fala do garçom para o discurso indireto. Comece com: O garçom lhes perguntou, intrigado, que raio de língua.... RESOLUÇÃO: “... era aquela que estavam então a falar, que ele percebia tudo”.
2. (FUVEST-2010) – Leia o seguinte texto:
Um músico ambulante toca sua sanfoninha no viaduto do Chá, em São Paulo. Chega o “rapa”* e o interrompe: — Você tem licença? — Não, senhor. — Então me acompanhe. — Sim, senhor. E que música o senhor vai cantar?
3. (FUVEST) – Os trechos abaixo encontram-se em discurso indireto e discurso direto, respectivamente. Transforme em discurso direto o primeiro trecho e, em discurso indireto, o segundo. I. “(...) um cangaceiro encontrou uma Kodak e entregou ao chefe, que perguntou a quem ela pertencia.” II. “Quero que o senhor tire o meu retrato”, disparou o “rei do cangaço” (...). RESOLUÇÃO: I. … um cangaceiro encontrou uma Kodak e entregou ao chefe, que perguntou: – A quem ela pertence? II. O “rei do cangaço” disparou (disse) que queria que o homem tirasse o seu retrato.
*rapa: carro de prefeitura municipal que conduz fiscais e policiais para apreender mercadorias de vendedores ambulantes não licenciados. Por extensão, o fiscal ou o policial do rapa. a) Para o efeito de humor dessa anedota, contribui, de maneira decisiva, um dos verbos do texto. De que verbo se trata? Justifique sua resposta.
– 41
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 43
Redação e Morfologia (III)
MÓDULO
1. (FUVEST-2010) – Leia o seguinte excerto de um artigo sobre o teólogo João Calvino.
Foi preciso o destemor conceitual de um teólogo exigente feito ele para dar o passo racional necessário. Ousou: para salvar a onipotência de Deus, não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina. Antônio Flávio Pierucci, Folha de S. Paulo, 12/7/2009.
RESOLUÇÃO: O título “Capitulação” é inteiramente adequado ao conteúdo do poema, que se refere à “invasão” de anglicismos (americanismos) na língua portuguesa corrente no Brasil. E S Ê U G U T R O P
a) O excerto está redigido em lin guagem que apresenta traços de informalidade. RESOLUÇÃO: Identifique dois exemplos dessa informalidade. São coloquialismos empregados no texto: “feito”, por como; “não dá”, por não é possível, e “um quê”, por algo ou uma pequena parcela.
b) Mantendo o seu sentido, reescreva o trecho “não dá para não sacrificar pelo menos um quê da bondade divina”, sem empregar duas vezes a palavra “não”. RESOLUÇÃO: Não é possível deixar de sacrificar algo da bon dade divina.
b) O exagero que o autor vê no emprego da palavra “delivery” se aplicaria também a “telepizza”? Justifique sua resposta. RESOLUÇÃO: “Telepizza” é um neologismo formado com um empréstimo linguístico já há muito incorporado ao português (italianopizza) e o prefixo (grego)tele, corrente na língua. Portanto, não se trata do mesmo fenômeno de “capitulação” que (“entrega”) se vê em delivery , pois aquigeirismo se substituiu uma palavra corrente na língua por um es tran da moda.
Texto para a questão 2.
CAPITULAÇÃO Delivery Até pra telepizza É um exagero. Há quem negue? Um povo com vergonha Da própria língua Já está entregue. (Luis Fernando Verissimo) 2. (FUVEST) a) O título dado pelo autor está adequado, tendo em vista o conteúdo do poema? Justifique sua resposta.
– 43
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 44
b) Levando em consideração as relações entre ima gens e palavras, identifique um momento de humor na tira e explique como é produzido. RESOLUÇÃO: O momento de humor instaura-se no último qua drinho, em que se estabelece uma relação de semelhança entre cárie e pedaços que faltam no corpo da personagem. P O R T U G U Ê S E
Texto para a questão 4.
3. (UNICAMP) – Jogos de imagens e palavras são característicos da linguagem de história em quadrinhos. Alguns desses jogos podem remeter a domínios específicos da linguagem a que temos acesso em nosso cotidiano, tais como a linguagem dos médicos, a linguagem dos economistas, a linguagem dos locutores de futebol, a linguagem dos surfistas, dentre outras. É o que ocorre na tira de Laerte, acima apresentada. a) Transcreva as passagens da tira que remetem a domínios específicos e explicite que domínios são esses. RESOLUÇÃO: As passagens são “perda total”, “reconstruíram meu corpo a partir do DNA” e “molar cariado”. O primeiro segmento refere-se à linguagem usada por companhias de seguros, o segundo, à biogenética, e o terceiro, à odontologia.
Foi no tempo em que a Bandeirantes recém-inaugurara suas novas instalações no Morumbi. Não havia transporte público até o nosso local de trabalho, e a direção da casa organizou um serviço com viaturas próprias. (...) Paraná era um dos motoristas. (...) Numa das subidas para o Morumbi “fechou” sem nenhuma maldade um automóvel. O cidadão que o dirigia estava com os filhos, era diretor do São Paulo F.C., e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura. Logo depois que a perua chegou ao Morumbi, todo mundo de ponto batido, o automóvel para em frente da porta dos funcionários, e o seu condutor desce bufando: “Onde está o motorista dessa perua? (e lá vinha chegando o Paraná). Você me ofendeu na frente dos meus filhos. Não tem o direito de agir dessa forma, me chamar do nome que me chamou. Vou falar ao João Saad, que é meu amigo!” E o Paraná, já fuzilando, dedo em riste, tonitruou em seu sotaque mais que explícito: “Le” chamei e “le” chamo de novo... veado ... veado ... Não houve reação da parte ofendida. (ARAÚJO, Flávio. O rádio, o futebol e a vida. São Paulo: Editora Senac, 2001. pp. 50-1.) 4. (UNICAMP) a) Na sequência: “(...) e largou o verbo em cima do pobre do Paraná. Que respondeu à altura”, se trocarmos o ponto final que aparece depois de ‘Paraná’ por uma vírgula, ocorrem mudanças na leitura? Justifique. RESOLUÇÃO: A vírgula, no caso, seria mais adequada que o ponto final, pois na verdade não ocorre o encerramento do período, visto que a última palavra da frase limitada pelo ponto (Paraná) é retomada pelo pronome relativo que, introdutor de uma oração adjetiva explicativa subordinada à oração anterior.
44 –
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 45
b) O trecho da resposta de Para ná: “...‘Le’ chamei e ‘le’ cha mo de novo ...” chama a atenção do leitor para a sintaxe da língua. Explique. RESOLUÇÃO: O le da fala de Paraná é uma variante (corruptela) do pronome lhe, adequadamente empregado com o verbo chamar no sentido de “qualifi car, tachar”. A construção admitiria também o objeto direto, que corresponderia, no caso, ao pronome o: chamei-o/lhe (de) veado.
5. (UNICAMP) – Em transmissão de um jornal noturno televisivo (RedeTV, 7/10/2008), um jornalista afirmou: “Não há uma só medida que o governo possa tomar.” a) Considerando que há duas possibilidades de interpretação do enunciado acima, construa uma paráfrase para cada sentido possível de modo a explicitá-los. RESOLUÇÃO: As duas possibilidades de paráfrase são: 1) Não existe uma única medida que o governo possa tomar, ou seja, o governo não poderá tomar nenhuma medida. 2) Não existe somente uma medida que o governo possa tomar, ou seja, há várias medidas que o governo poderia tomar.
c) Substitua tonitruou por outra palavra ou expressão. RESOLUÇÃO: Vociferou, gritou, clamou em altos brados, ou, em sentido figurado,trovejou.
b) Compare o enunciado citado com: Não há uma medida que só o governo possa tomar. O termo ‘só’ tem papel fundamental na interpretação de um e outro enunciado. Descreva como funciona o termo em cada um dos enunciados. Explique. RESOLUÇÃO: Em “Não há uma só medida que o governo possa tomar”, o adjetivo só tanto pode significar “única” quanto valer pelo advérbio apenas. Por isso, a frase pode significar que o governo não pode tomar nenhuma medida ou então que o governo tem a sua disposição diversas medidas. Quanto à frase “Não há uma medida que só o governo possa tomar”, nela o termo só significa somente ou sozinho, referindo-se a “governo”, e o sentido é que a medida não depende apenas do governo, não podendo ser tomada apenas por ele.
– 45
E S Ê U G U T R O P
E_C2_REVISAO FINAL_PORT_PROF 14/10/10 10:28 Page 46
Ontem, hoje, amanhã: a vida inteira Teu nome é para nós, Manuel, bandeira. (Carlos Drummond de Andrade)
P O R T U G U Ê S E
6. (UNICAMP) – Levando em consideração o poema de Drummond, em que é feita uma homenagem a um poeta brasileiro, responda às seguintes questões: a) Há um duplo sentido trabalhado no poema. Em que palavra isso ocorre? RESOLUÇÃO: A ambiguidade ocorre na palavra “bandeira”.
c) Que interpretação resulta desse jogo de palavra s? RESOLUÇÃO: O termo “bandeira” configura um metáfora que significa “modelo a ser imitado por um grupo”, no caso, os escritores.
b) Quais recursos linguísticos são utilizados na construção desse jogo de palavras? RESOLUÇÃO: O emprego de “nome” no início doverso provoca a ambiguidade, pois pode ser o sobrenome do poeta ou referir-se a um emblema, já que está em letra minúscula.
46 –