Escola Superior de Educação e Ciências Sociais de Leiria Comunicação Social e Educação Multimédia
CRITÉRIOS de NOTICIABILIDADE: O Factor Proximidade!
Eduardo Lino Nicole Francisco
Leiria, 16 de Dezembro 2010
Introdução Uma informação para ser notícia tem de ser recente, imediata e que circule (Fontcuberta, 1999, pg 18). Só que até se tornar notícia o acontecimento tem de passar por diversos crivos de classificação. O mais apertado será sempre o da selecção. Seja do jornalista ou do editor, o factor selectivo determinará sempre o destino da informação. Na cadeira de Teorias da Notícia observámos vários factores que influenciam os critérios de selecção da linha editorial. Com esta reflexão, avaliaremos o impacto do factor Proximidade na construção da informação nos Media Regionais e Locais. No presente momento de evolução tecnológica, com novos canais de distribuição de conteúdos e acesso a públicos mais variados, é importante saber se a notícia local continua a ter espaço no espectro informativo. Para obter um resultado mais concreto e abrangente procurámos a opinião e a prática de jornais, rádios e agências. As conclusões deste trabalho assentam na investigação da teoria de vários autores e especialistas internacionais, mas reflectem essencialmente a realidade no distrito de Leiria, Portugal.
Critérios de Noticiabilidade Para que um determinado acontecimento se torne notícia, é necessário usar conceitos que utilizem ideias na produção noticiosa. Com frequência, utilizam-se os conceitos de noticiabilidade, valor-notícia e selecção de notícias. Todo o processo envolve a caracterização dos factos, o julgamento pessoal do jornalista, as condições da empresa de media, a qualidade do material (texto e imagem), a relação com as fontes e com o público, os factores éticos e circunstâncias históricas, políticas, económicas e sociais. Temos então de considerar valor-notícia e selecção de notícias como conceitos exclusivos da noticiabilidade, porque o valor atribuído a determinado facto faz com que ele seja ou não seleccionado para ser notícia.
O jornal é considerado o protótipo dos meios de comunicação social. Procura factos junto das fontes de informação. Selecciona e publica as notícias, tratadas e escritas de 1
forma mais aprofundada por jornalistas, proporcionando aos leitores o relato dos acontecimentos vividos no dia-a-dia, de um país ou de uma localidade. Mas para isso, o jornalista tem de tratar a sua matéria-prima, ou seja, os acontecimentos. Tem de os trabalhar de forma a criar um produto de fácil compreensão e de interesse para o leitor. Aqui entra a relação amor/ódio da objectividade e da subjectividade. O jornalista tem de fazer uma escolha subjectiva do ângulo com que vai retratar a realidade, de maneira a representá-la com a maior objectividade possível. Essa escolha será sempre condicionada. Seja por elementos socioculturais ou por limitações de percepção, o modo como cada indivíduo assiste a um acontecimento é e será sempre único.
Aprofundemos a reflexão sobre o conceito valor-notícia, que visa transformar factos numa história interessante para o leitor. Já se efectuaram pesquisas para clarificar as qualidades dos acontecimentos, sendo no entanto difícil chegar a um consenso, na medida em que, o grau de previsão ou de exploração de qualquer tipo de selecção de notícia é muito vasto.
Os jornalistas e os editores decidem a que devem atribuir determinado valor (valornotícia). Alguns dos acontecimentos são demasiado complexos, outros de interesses humanos muito específicos, outros ainda de âmbito restrito ou focalizado, além de todos poderem ser variáveis. Um acontecimento pode ser, num momento exacto, uma notícia e deixar de o ser com o surgimento de um outro acontecimento com um maior valor (valor-notícia). A explicação sobre este conceito, valor-notícia, é-nos dada por Galtung1 e Ruge2 („The Structure of Foreign News‟,1965) quando afirmam que os factores contextuais dos factos influenciam a selecção, ou seja, que os acontecimentos se tornam mais notícia quanto mais se ajustarem a critérios culturais, organizacionais ou ideológicos. Os factores ideológicos das notícias focados por Galtung e Ruge inserem-se nos valores tradicionais da sociedade ocidental e essencialmente nos que derivam de uma filosofia materialista e individualista. Os mentores do estudo também defendem que as influências socioculturais derivantes da cultura do Norte da Europa, se baseiam numa 1
Johan Galtung, matemático e sociólogo norueguês.
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Mari Holmboe Ruge, co-fundadora do Instituto Norueguês da Pesquisa pela Paz (PRIO). 2
perspectiva de que os valores-notícia tendem a favorecer acontecimentos que incidem sobre pessoas de elite, nações de elite e ocorrências negativas. Assim sendo, é natural que determinados acontecimentos sejam mais notícia do que outros, por terem mais procedimentos de recolha e de processamento. Por isso, noticias que obedecem a um conjunto de critérios relacionados com o tempo, lugar e interesse, são preferidos pelas agências noticiosas.
Esta é a primeira tentativa de identificar os valores-notícia segundo Galtung e Ruge (1965), e listá-los de forma arbitrária sem hierarquia: – 1) Frequência (semelhança com o tempo do veículo de comunicação) – 2) Amplitude – 3) Clareza (ou falta de ambiguidade) – 4) Significância (tradução cultural) – 5) Consonância (inserir o “novo” numa história “velha”) – 6) Inesperado – 7) Continuidade – 8) Composição (equilíbrio numa diversidade de assuntos) – 9) Referências a nações de elite – 10) Referências a pessoas de elite (proeminência) – 11) Personalização – 12) Negatividade (“bad news is good news”)
Galtung e Ruge escrevem que “um acontecimento será tanto mais noticiável quanto maior número de valores possuir, embora não seja uma regra absoluta.” Ou seja, eles admitem que “um único valor pode compensar a inexistência de outros valores”.
Há pesquisadores (Tabela 3) que defendem que o factor proximidade é um dos critérios mais importantes. Outros estudos realizados por vários autores, em diferentes épocas, explicam quais os factores determinantes na selecção da notícia pelos Gatekeepers. Os critérios de noticiabilidade não são rígidos nem universais e por vezes são contraditórios e mudam ao longo do tempo, alterando também consoante o contexto onde estão inseridos e a sua abrangência, público, etc.
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De acordo com diferentes estudiosos, eis um quadro com as diferentes categorias de noticiabilidade:
AUTOR
Categorias de noticiabilidade Elementos básicos da notícia: actualidade, proximidade, proeminência, curiosidade, conflito, suspense, emoção, Carrol Warren consequências Valor notícia: oportunidade, proximidade, tamanho, importância, Fraser Bond (1962) conflito, o incomum, culto do herói e da fama, expectativa, interesse humano, acontecimentos que afectam grande grupos organizados, disputa, descoberta e invenção, crime Atributos fundamentais: actualidade, veracidade, interesse humano, amplo raio de influência, proximidade, raridade, Luiz Amaral (1969) curiosidade. Critérios de noticiabilidade: momento do acontecimento, intensidade ou magnitude, inexistência de dúvidas sobre o seu significado, proeminência social dos envolvidos, proeminência das nações envolvidas, surpresa, composição tematicamente equilibrada do noticiário, proximidade, valores socioculturais, J.Galtun e M.Ruge (1965) continuidade Interesse do público: actualidade, proximidade, proeminência, Mar de Fontcuberta (1993) conflito, consequências. Critérios de notícia: proximidade, marco geográfico, impacto, proeminência (ou celebridade), aventura e conflito, consequências, humor, raridade, progresso, sexo e idade, interesse pessoal, interesse humano, importância, rivalidade, utilidade, política editorial do jornal, oportunidade, dinheiro, expectativa ou suspense, originalidade, culto do herói, descoberta e invenções, repercussão, Mario Erbolato (1978) confidências Valor notícia: interesse pessoal (dinheiro, sexo, solidariedade) interesse pelo próprio, proximidade, o incomum (conflito, crimes, Natalício Norberto (1969) expectativa, objectividade) tamanho, importância, oportunidade. Critérios de avaliação: proximidade, actualidade, identificação Nilson Lage (2001) social, intensidade, ineditismo, identificação humana Critérios de noticiabilidade: oportunidade, proximidade, importância, impacto ou consequências interesse, conflito ou controvérsia, negatividade, frequência, dramatização, crise, desvio, sensacionalismo, proeminência das pessoas envolvidas, novidade, P.J.Shoemaker (1991) excentricidade, singularidade Valores jornalísticos: novidade, actualidade, pressuposição, consonância, relevância, desvio e negatividade, proximidade Teun A.Van Dijk (1990)
Tabela 3
Fraser Bond (1962) justifica que o factor proximidade é informação local e a base com que os jornais americanos constroem as suas tiragens.
Natalício Norberto (1969) refere que os leitores preferem uma noticia que relata um acontecimento próximo do que um outro que tenha ocorrido a quilómetros de distância.
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Van Dijk (1990) diz que o facto de o acontecimento ser num determinado local cria interacção do leitor com a cidade onde vive.
Nilson Lage (2001) relativiza a valorização da proximidade consoante as trocas materiais (o comércio), as trocas culturais ou migrações locais. Está em causa o interesse da classe social e da sua relação com o mundo.
Para Mar de Fontcuberta (1993) a proximidade é um dos factores mais importantes na hora de escolher uma notícia.
Tabela 4
De acordo com o quadro anterior chega-se à conclusão de que o factor proximidade é unânime, liderando destacadamente os 12 critérios mais referenciados pelos diversos autores.
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O Factor Proximidade na Imprensa Regional Nesta Era da comunicação global, fomos investigar se o espaço editorial dos órgãos de comunicação social regional ainda continua a ter lugar para a notícia local. A orientação de qualquer projecto noticioso está assente na linha vital da sobrevivência. Só será viável se conseguir manter audiência que o sustente. É fundamental perceber o que deseja o leitor e oferecer-lho. E os leitores continuam a valorizar a proximidade, aquilo que conhecem. O Jornal de Leiria sabe que “uma notícia no jornal sobre um acontecimento que ocorreu na nossa rua é a primeira que iremos ler”. Assim, se este espaço, do local, desaparecesse da imprensa regional “corria-se o risco de formatar a informação e, mais grave, de ignorar acontecimentos importantes”. A certeza é partilhada pelo Região de Leiria, para quem “ na Era da comunicação global, o local ganhou uma nova dimensão. Fez-nos compreender e valorizar a especificidade local”. A Rádio Liz não hesita em afirmar que “a notícia local tem um interesse ainda maior que noutros tempos”. As pessoas têm acesso ao que se passa no mundo, quase na hora. Só que para saberem o que se passa ao pé de si socorrem-se dos meios locais de informação. É essa globalização e o desenvolvimento das tecnologias de informação que, para o Jornal da Marinha, pode eventualmente alterar hábitos futuros no comportamento da audiência, “a notícia local pode vir a perder importância numa lógica global, com o aumento alucinante da oferta de serviços e produtos”. É sabido que Portugal não dinamiza convenientemente hábitos de leitura, principalmente de jornais. A nova geração de indivíduos já nasce com o “Magalhães”, a internet e dois ou três telemóveis no bolso. Todos esses equipamentos têm acesso de forma livre, abundante e gratuita a conteúdos globais e formatados. Será que num país com dez milhões de habitantes3, em que apenas um diário nacional pago ultrapassa a circulação média de 100 mil exemplares4, conseguirá manter ou aumentar a circulação de jornais impressos em papel? A Agência Lusa acredita que sim, principalmente nas edições locais e regionais. Reforça a ideia que “os cidadãos necessitam de, cada vez mais, se sentirem parte de um mundo seu, que conhecem, com o qual convivem diariamente e que só lhes é dado pelo noticiário de proximidade”.
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Dados do Instituto Nacional de Estatística 2009.
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Dados da Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e Circulação em 2009. 6
A selecção das notícias no jornal local é hierarquizada com fundamentos nos critérios de proximidade. A notícia local é a grande preocupação. A notícia de fora só interessa no caso de sofrer alguma influência local, caso contrário, deixam que outros meios a divulguem. Atitude que elege o que é local como critério principal de selecção noticiosa. Quanto aos jornais de âmbito regional há outro nível de preocupação nos critérios de noticiabilidade, o perfil do leitor. Certos de que a maioria da audiência é urbana, abrem o espectro da informação principal ao nível do concelho, deixando o nível da freguesia para um plano mais secundário. No entanto, a proximidade é a regra de ouro. O media procura criar uma relação de cumplicidade, sabendo que quanto mais relevante for o tema para o leitor, mais o leitor se identificará com o título. As medições de audiência5 mostram claramente que as questões inseridas na proximidade psico-afectiva são aquelas que mais interessam às pessoas, com a circulação média de jornais no distrito de Leiria a ser liderada por jornais Regionais:
Tabela 1
A imprensa Regional no distrito de Leiria não tem dúvidas que o factor proximidade é o seu sustento. Comparando as linhas editoriais, atrás referidas, com os dados estatísticos de tiragem e audiência (Tabela 2), regista-se a influência exercida sobre o público.
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Dados da Associação Portuguesa para o Controlo de Tiragem e Circulação. (Tabela 1) 7
Tabela 26
Também na questão da importância atribuída à selectividade da linha editorial, as opiniões foram unânimes. O mais importante para o editor é aquilo a que o leitor der mais importância. O interesse do leitor comanda a linha editorial. Isto é, o editor tenta a todo o custo perceber as necessidades do leitor e preenchê-las de forma a conquistar a sua confiança e fealdade. Aqui entra também a questão da prioridade às informações úteis para as populações. Esse continuará a ser o papel fundamental da imprensa Regional. Com o acesso privilegiado à informação, ser jornalista passa por prestar um serviço. Mas um serviço que não é fácil nem mecanizado. È humano, por isso, com falhas. O saber seleccionar o conteúdo e excluir o acessório com que a informação é servida, tem por objectivo facilitar a recepção da notícia e tornar mais fácil a sua compreensão. Já sabemos que o factor proximidade comanda a linha editorial. Mas o que será que acontece quando se trata da manchete. Pois, aí também há unanimidade que coloca a intensidade e a surpresa do facto em primeiro e segundo lugar, respectivamente. Só depois aparece a proximidade geográfica a meio da tabela, seguida dos actores enquanto figuras públicas. No final dos seis factores alvo de interrogação, aparecem a proximidade afectiva e o momento do acontecimento, que vem demonstrar o encaixe de qualquer facto que ocorra entre o fecho de edições.
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(+) Fonte Bareme Imprensa Regional 2010 – Base (000) Milhares de Leitores.
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Naturalmente que nenhum dos factores se pode dissociar dos outros. Não trabalham a influência de modo isolado, pelo contrário, completam-se. Um facto para ser notícia tem de ser novidade, mas pode ser intenso sem ser surpresa e vice-versa. Durante o período de dois meses, de Outubro a Dezembro, analisámos as capas das publicações inquiridas e concluímos que a proximidade dominou a 100%. Já a selecção do tema alternou entre a intensidade, os actores e a surpresa.
Conclusão A selecção do que é notícia está assente no pilar da subjectividade, mas seguindo critérios objectivos e bem definidos. A intervenção humana faz com que a linha de produção noticiosa Regional possa não ser uniforme, apresentando-se, no entanto, de forma coerente relativamente ao factor proximidade. Com a Proximidade, seja geográfica ou afectiva, determina-se o conteúdo informativo Regional no distrito de Leiria. Já a hierarquização é elaborada em associação a outros factores como a intensidade, a surpresa ou os actores envolvidos no acontecimento. É a notícia local que predomina em detrimento do nacional ou do internacional, a não ser quando factores locais lhes estão associados. O interesse principal do leitor é saber o que se passa com o mundo que conhece e que lhe diz respeito. Bibliografia: FONTCUBERTA, Mar de (1999) A Noticia, Editorial Notícias McQUAIL, Denis (2003) Teoria da Comunicação de Massas, Fundação Calouste Gulbenkian LAGARDETTE, Jean-Luc Martin (1998) Manual da Escrita Jornalística-Escrevo-Informo-Convenço, Editora Pergaminho Webgrafia: http://teoriadanoticia.blogspot.com/2009/05/os-criterios-de-noticiabilidade.html, consultado em 1012-2010(19h) http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:-AGOBXeohUEJ:www.sc.es, consultado em 212-2010(17h) http://utad0708epm.wikispaces.com/Crit%C3%rios+de+Noticiabilidade, consultado em 20-11-2010(11h) http://www.meioregional.pt/index.php?content=32&concelho=0&distrito=10, consultado em 15-122010(10h) http://www.apct.pt/analisesimples_00.aspx?publicacaosegmentoid=2&segselecionado=13, consultado em 15-12-2010(10h) http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_indicadores&indOcorrCod=0000611&contexto= pi&selTab=tab0, consultado em 15-12-2010(11h)
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