UNDAMENTOS DA C LÍNICA LÍNICA RESENHA Nº 2 F UNDAMENTOS
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EORGES C ANGUILHEM Q UE É A P SICOLOGIA? ? G EORGES
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NIVERSIDADE F EDERAL EDERAL F LUMINENSE LUMINENSE 11 U NIVERSIDADE
O texto Que é a psicologia de G. Canguilhem é originado de uma conferência realizada no ano de 1956 e visa a discussão em torno da unidade, da cientificidade, do seu método e do seu objeto de estudo. Logo no começo uma verdade intrínseca a todos os psicólogos, aspirantes e simpatizantes é apresentada: responder o que exatamente a psicologia é se torna incrivelmente mais difícil do que responder sobre o que ela faz. A questão sobre a sua existência e conceito envolvem, concomitantemente, concomitantemente, a dúvida sobre necessidade do psicólogo, justificando portanto, o incômodo que a pergunta precursora dessa conferência causa. E quando isso ocorre, automaticamente a eficácia do psicólogo também é coloca em xeque. Não que isso o torne ineficaz nem mesmo que essa eficácia seja ilusória, mas indica apenas que há uma falha na fundamentação. Esse paradigma, como defende Canguilhem, se perpetuará enquanto a psicologia não for vista como resultado de uma aplicação de uma ciência, como se fosse um empirismo completamente heterogêneo. Georges assume que vários trabalhos dessa área de conhecimento dão a impressão de misturar uma filosofia sem rigor, uma ética sem exigências e uma medicina sem controle. Logo, questionar o que seria a psicologia não é nem impertinente nem fútil. Apesar de toda essa heterogeneidade, Lagache tenta de forma louvável responder a essa questão ressaltando a unidade de seu domínio (que ele entendia enquanto teoria geral da conduta: síntese da psicologia experimental, da clínica, da psicanálise, da psicologia social e da etnologia), apesar da multiplicidade de projetos metodológicos com que podem ser tratados. Porém, uma psicologia só pode ser experimental por causa de seu método e não de seu objeto. Só que é mais através de seu objeto do que pelo seu método que se classifica a psicologia como clinica, psicanalítica, social ou etnológica uma vez que todos esses adjetivos tratam do mesmo objeto de estudo: o homem. Após fazer algumas ressalvas quanto à psicologia animal e principalmente ao fato da recorrência à filosofia para questões da PSI (o autor defende que a psicologia, em certo ponto, prejulga o que ela é chamada a julgar), Canguilhem convida seus ouvintes e leitores abordar a questão fundamental por uma via oposta, o que em outras palavras se refere a analisar historicamente a unidade do projeto que, de certa forma, pode resultar na casual unidade das disciplinas psicológicas.
Essa historicidade que Canguilhem se refere exige um retorno temporal, buscando a gênese de cada projeto, analisando seus domínios e seus sentidos. A busca se dá através de uma história acima de tudo teleológica, ou seja, pelos fins que aparentemente são destinados. y
A PSICLOGIA COMO CIÊNCIA NATURAL
Etimologicamente falando, a psicologia se traduziria pelo estudo da alma. Alma essa que na antiguidade era considerada como um aspecto fisiológico, ou seja, a psicologia se trataria de uma ciência natural. Contudo, os estudos sobre a psique são divididos entre a metafísica, a física e a lógica e a ciência da alma. No seu sentido original e universal de teoria da natureza e de forma até aristotélica (se assumirmos a fisiologia como parte da física) a ciência da alma é um domínio fisiológico. E é dessa concepção antiga que se cria, sem ruptura, um aspecto da psicologia moderna: a psicofisiologia e a psicopatologia. A esse ponto, é necessário engrandecer a teoria revolucionária de Galeno: a de que o cérebro é que seria o órgão das sensações de dos movimentos. Concluindo essa parte, a psicologia atual, excluindo a psicofisiologia e psicopatologia, sempre recua até o século II.
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PSICOLOGIA PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA DA SUBJETIVIDADE
A psicologia como ciência da subjetividade nasce com o declínio da física aristotélica que ocorre durante o século XVII. Esse declínio também demarca o fim da psicologia como parafísica e como uma ciência natural. O crédito dessa mudança pode de certa forma ser dado aos físicos mecanicistas do século XVII. Uma vez que a realidade não é mais confundida com o conteúdo da percepção, o resto qualitativo de toda a experiência envolve a responsabilidade do sujeito da experiência. Seu projeto agora é de uma ciência que explique o motivo do engano da razão em relação à realidade. A psicologia faz-se física do sentido externo para dar conta dos contra-sensos que a física mecanicista imputa ao exercício dos sentidos na função cognitiva. A. A FÍSICA DO SENTIDO EXTERNO Canguilhem a partir de agora passa a defender que a psicologia, como ciência da subjetividade, começa como psicofísica, primeiramente, porque ela não poderia ser menos que uma física para poder ser levada a sério, depois, porque deve-se procurar na natureza, no corpo humano, o porquê de existirem resíduos irreais na experiência humana. A psicologia tende a imitar a física e passa a procurar modos de determinar as constantes qualitativas das sensações e as relações entre essas constantes.
Descartes sugere que uma subtração de informações seja feita de um corpo por outro, assim como na geometria. Para ele, os sentidos externos informam um interno e a fantasia, que nada mais é que um corpo real e figurado. Esse pensamento se estende até chegar a Fechner apesar de Kant e então a Wundt, que amplia de vez as dimensões de uma psicologia experimental. Ao atingi-lo, a psicologia chega a um novo patamar de determinismo, do mesmo tipo que a mecânica e a física sugeriam como ciência de validade universal: a lei dos fatos da consciência. B.
A CIÊNCIA DO SENTIDO INTERNO
Seria de incomensurável injustiça afirmar que a ciência da subjetividade se reduz apenas à física do sentido externo, pois, afinal, ela se apresenta como a ciência do sentido interno. E mais uma vez ciência do eu, chegamos a Descartes para somente então pensarmos o termo psicologia no sentido de ciên como pensou Wolff. No livro As Meditações de Descartes, há a primeira citação sobre o Ego Coj i i t to , que seria o entendimento direto da alma sobre ela mesma. O próprio Descartes trata suas meditações como metafísica (por buscar sempre uma essência do E u penso na apreensão imediata da sua existência). Em contrapartida, a visão aristotélica sobre o interior nada tem a ver com a cartesiana. Enquanto Descartes diz que é possível conhecer a alma diretamente ele a considera como um aspecto do corpo , Aristóteles diz que o conhecimento da alma só se dá através da reflexão como em um espelho e pelo reconhecimento de seus efeitos, tendo em vista que a alma é similar a um olho que tudo vê. E é através dessa contradição que inúmeros outros cientistas e filósofos como Maine de Biran, Comte, Pierre-Paul Royer-Collard, Reid e Cournot participam direta ou indiretamente da mesma discussão. O ultimo, por exemplo, como cita Canguilhem, não desdenha o argumento cartesiano quando o retoma para apoiar a idéia de que a observação psicológica se refere mais à conduta do outro do que a do eu observador, de que a psicologia aparenta mais à sabedoria do que a uma ciência. Para finalizar essa parte do texto, Canguilhem continua citando mais cientistas e filósofos, encerrando com Kant. Esse defendia a tese de que, de um lado, o sentido interno do fenômeno é apenas uma forma de intuição empírica e que, de outro lado, o eu (sujeito da percepção) é uma função organizacional da experiência, da qual não se consegue fazer ciência haja vista que é a condição transcendental e toda ciência. Em Os Princípios Metafísicos da Ciência da Natureza Kant contesta que a psicologia possa ser uma ciência à imagem da matemática e da física. Não há psicologia matemática possível no sentido em que há uma física matemática. [...] Também não há psicologia experimental no sentido em que a química se constitui através do uso da análise e da síntese. Não podemos realizar experiências nem sobre nós mesmos nem sobre o outro. Afinal, querer surpreender a si mesmo ao se observar certamente uma alienação seria conduzida.
C. A CIÊNCIA DO SENTIDO ÍNTIMO Após uma longa dissertação ao redor da história passando por Maine de Biran, Gestalt a Bonald, Pinel e Charcot, Canguilhem reforça a idéia de psicopatologia não se desenvolveu sozinha nem isolada de outras matérias psicológicas. Ela seria paralelamente juiz e participante do debate ininterrupto que a metafísica trouxe à psicologia. No mesmo contexto, a metafísica nunca renunciou a dizer sua palavra sobre as relações entre o psíquico e o físico, que seria somatopsíquica antes de se tornar psicossomática. Tal inversão se repete com os termos psiquismo e consciência recorrendo de certo modo a Descartes. Agora, se se pode identificar o psiquismo e a consciência, o inconsciente é de ordem física. Caso o psiquismo possa ser inconsciente, a psicologia jamais poderia se reduzir à ciência da consciência. O psíquico, como diz Georges, não é apenas o que está escondido, mas o que está além do íntimo: no abissal (termo retirado de Bossuet) A psicologia não é apenas a ciência da intimidade, mas a ciência das profundezas da alma.
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A PSICOLOGIA COMO CIÊNCIA DAS REAÇÕES E DO COMPORTAMENTO
É chegada então a discussão sobre a psicologia do século XIX através de Maine de Biran. Ele propunha que o homem se definia como uma organização viva provida de inteligência baseado indiretamente em Lelut (O homem não é mais uma inteligência, porem uma vontade servida de órgãos), e ao mesmo tempo coloca limites tendo em vista a sua A sua Antr opolog opologia, que situa a vida humana entre a vida animal e a espiritual. A partir desse pensamento é possível prever o rumo que a psicologia estava prestes a tomar: uma mistura de tudo que já foi apresentado até então uma biologia do comportamento humano. As razões desse evento, de acordo com Georges, parecem ser inicialmente razões cientificas tais como quando a biologia passa a ser tratada como uma teoria geral das relações entre os organismos e os meios (o que marca o fim de uma crença de que existia um reino humano separado). Em seguida, razões técnicas e econômicas impostas pelo novo sistema industrial. E por fim, razões políticas, que visam o igualitarismo e a especialização (nas sociedades sociedades mais modernas). Essa nova psicologia ao aceitar que se torne uma ciência de aptidões, de reações e do comportamento, Canguilhem critica que ela e seus psicólogos esquecem de situar seu comportamento em relação à historia e aos meios sociais que os levaram a compor esse novo método. Já Nietzsche, crê que nós, psicólogos do futuro [...] somos os instrumentos do conhecimento e precisamos ter toda a ingenuidade e precisão de um instrumento. Ou seja, psicólogo não poderia analisar a si mesmo nem se conhecer. Ele quer ser apenas um instrumento, sem se preocupar com o de quem e o do que é instrumento. Depois em outra ocasião, Nietzsche renuncia a todo cinismo face aos utilitaristas ingleses.
Utilitarismo esse, que apresenta o homem como instrumento, como juiz da utilidade. A inteligência troca seu conceito de ser aquilo que fez os órgãos e serve-se deles, mas sim o que serve aos órgãos. Nietzsche, portanto, tem razão ao afirmar que os homens querem ser instrumentos ingênuos e precisos desse estudo do homem, visto seus esforços através de pesquisas sobre as leis de adaptação, aprendizagem, detecção e mensuração de aptidões, condição de rendimento e produtividade, entre outras. Pesquisas que, em outras palavras, querem chegar a um conhecimento objetivo e determinista. (Vale ressaltar que seria um determinismo estático, estático, baseado nos resultados da biometria). A eficácia dada aos testes psicológicos deveria ter sido repensada nessa época, afinal o testado tem medo de que alguma ação possa ser tomada quanto a ele, fazendo com que ele consiga mudar o resultado. Existe uma repugnância em se ver tratado como um inseto por um homem em que ele não vê uma autoridade que tenta lhe dizer o que ele deve ou não fazer. Outra questão levantada é Em nome de quem se declaram psicólogos?. Quem lhes fornece autoridade e competência para selecionar pessoas, por exemplo? Afinal, para se selecionar um selecionador seria preciso transcender os planos de procedimentos e técnicas de seleção. O que se pode concluir, então, da psicologia da reação e do comportamento do século XIX e XX por Georges Canguilhem, é que ela acreditou que se tornaria independente ao se separar da filosofia como um todo. Porém ela não pode a recorrência de seus resultados sobre o comportamento daqueles que os obtêm. Por fim, a questão Que é psicologia? transita e se altera de acordo com o contexto encontrado, passando até a questionar Onde querem chegar os psicólogos?, Quem tem não a competência, mas a missão de ser psicólogo? e, como dito anteriormente, Em nome de quem se declaram psicólogos?. Questões delicadas e com respostas i nsaciáveis.