Genoma humano http://psitextos.blogspot.com.br/2010/04/proje http://psitextos.blogs pot.com.br/2010/04/projeto-genoma-humano-e-etica. to-genoma-humano-e-etica.html html http://www.terra.com.br/mundo/2000/06/27/009.htm http://www.ufrgs.br/bioetica/bancodn.htm
Dra. Lygia da Veiga Pereira é geneticista, professora da Universidade de São Paulo e autora dos livros Seqüenciaram o genoma humano. E agora?, e Clonagem, fatos e mitos p ublicados pela Editora Moderna.
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Cada um de nós é formado a partir das informações contidas nos genes que herdamos de nos sos pais. Esses genes nada mais são do que pequenas estruturas químicas, ou seja, mo léculas que reúnem quatro bases que se repetem em sequência. Essas quatro unidades lig adas umas às outras são responsáveis por tudo o que somos, por todas as proteínas do nos so corpo, estruturas que nos mantêm em pé e nos conferem características como altura, cor dos olhos e da pele, tipo sanguíneo, formato da molécula de insulina que o pâncrea s produz. Em 1990, teve início um grande esforço internacional com o objetivo de mapear e sequ enciar todos os genes que constituem os seres humanos. O registro da posição de cada gene nos 23 pares de cromossomos e a determinação da ordem de ocorrência dos neucleotíd eos que compõem cada um deles foi uma conquista que certamente causará grande impact o na prevenção e tratamento de muitas moléstias que afligem os homens desde os primórdio s da humanidade. INVESTIMENTO PÚBLICO E PRIVADO Drauzio O Projeto Genoma Humano (PGH) foi previsto para durar quinze anos, porta nto terminaria em 2005, um cronograma que muitos consideravam inviável na prática. N o entanto, ele terminou em 2003. O que permitiu que fosse concluído nesse tempo re corde? Lygia da Veiga Pereira Gosto muito de comparar o Genoma Humano a uma receita que a natureza segue para formar o ser humano e fazê-lo funcionar. Com a tecnologia d os anos 1990, caracterizar os elementos dessa receita era uma tarefa quase impos sível. No entanto, as perspectivas mudaram quando investiram pesado no desenvolvim ento de novas tecnologias e insistiu-se na discussão de questões éticas, sociais e leg ais, pois era previsível que a disponibilidade da sequência do Genoma Humano da rece ita de como fazer um ser humano iria causar enorme impacto. A entrada de uma empresa privada com o propósito de sequenciar o genoma mais depre ssa do que o faria o setor público e a intenção de cobrar pelo acesso de cientistas ao sequenciamento foi fator importante para acelerar o processo. Essa competição e a s oma dos esforços desses dois grupos, o público e o privado, mesmo que em paralelo, f ez com que o sequenciamento saísse mais rápido do que fora previsto. Drauzio A empresa privada que fez o sequenciamento do Genoma Humano conseguiu at ingir seus objetivos? Lygia da Veiga Pereira Eles não tiveram muito sucesso nessa empreitada, na medida em que geraram e estavam vendendo um produto ao qual qualquer um de nós tem acesso de graça na Internet. Diante disso, a empresa ficou meio perdida, trocou de presi dente, mas não se pode esquecer que desempenhou papel importante no sequenciamento do genoma humano. Drauzio Na época, a empresa era conduzida por Craig Venter, um homem muito ativo e de grande força.
Lygia da Veiga Pereira Craig Venter é o tipo de pessoa que faz diferença na história, porque propõe ideias novas, às vezes polêmicas, mas que mexem com a comunidade e fazem as coisas acontecerem. CONQUISTAS Drauzio O impacto provocado pelo Projeto Genoma foi de tal ordem que não conseguim os sequer projetar as repercussões que terá no futuro. Na sua opinião, esse esforço inte rnacional para sequenciar os genes humanos pode trazer que resultados? Lygia da Veiga Pereira Ele vai nos permitir conhecer a fundo a biologia humana, o funcionamento do ser humano. Conhecer isso nos mínimos detalhes vai ter impacto na melhora da qualidade de vida e na saúde. Embora muita coisa ainda esteja no cam po da promessa, há aplicações imediatas do conhecimento do genoma humano no estudo das doenças genéticas, uma vez que esse conhecimento permite identificar os genes que c ausam essas doenças e fazer diagnóstico pré-sintomático, ou até mesmo pré-natal, porque esta rá escrito no genoma que há um defeito na instrução daquela receita da natureza. Conhece ndo exatamente qual é o gene defeituoso, qual proteína está faltando, será possível desenv olver uma terapia específica para a doença que se instalou. Gosto de dar o exemplo da hemofilia. Há muitos anos se sabe que a hemofilia é um def eito de coagulação do sangue, mas não se sabia exatamente qual era. Os pacientes eram tratados com transfusão de sangue que continha a proteína ausente, mas que podia est ar infectado pelo HIV ou pelo vírus da hepatite C, por exemplo. Descobrir qual é o g ene e que está faltando o fator 8 ou o fator 9 de coagulação permite construir exatame nte essa proteína em laboratório e infundi-la no paciente, uma forma de terapia efic az para essa doença genética. Drauzio Você deu exemplo da hemofilia. Que outras doenças que podem utilizar-se do e studo do genoma? Lygia da Veiga Pereira Existe a fibrose cística, uma doença frequente dentro do univ erso das doenças genéticas. Depois de muita pesquisa, o gene responsável foi identific ado em 1989. Trata-se de uma proteína situada na membrana das células, um canal de íon s que está defeituoso. Embora seja um grande passo descobrir o gene associado a um a doença, até hoje não se conseguiu desenvolver uma terapia mais eficiente para a fibr ose cística. Já para a doença de Gauchet, doença provocada pela ausência de uma enzima, fo ram desenvolvidas terapias e o paciente recebe injeções da enzima que lhe falta e su pre suas necessidades. As pessoas que dizem Já que as doenças genéticas são tão raras, que benefícios trará o seq amento do genoma humano para a população em geral? -, precisam lembrar que os genes não determinam só as doenças genéticas. Determinam tudo na gente. Drauzio Determinam quem nós somos Lygia da Veiga Pereira Exatamente. Para um corte cicatrizar, genes estão sendo lig ados e desligados a fim de que as células se multipliquem. Dependendo da evolução dess e processo, a cicatrização será normal, ou haverá formação de queloides ou até mesmo os tecid s não se cicatrizarão. Quando nos lembramos ou esquecemos de alguma coisa, genes tam bém estão sendo ligados e desligados. À medida que formos conhecendo os fatores dos ge nes envolvidos em cada um desses processos normais que acontecem com todo o mund o, poderemos alterá-los para melhorar a qualidade da vida humana. Dou aula para o segundo ano de medicina e sinto, às vezes, que os alunos não consegu em avaliar a extensão da influência da genética. Vou ser cirurgião. Para que preciso sabe r genética, se para resolver os problemas estarei usando o bisturi? é a pergunta que alguns me fazem e eu lhes digo que, daqui a alguns anos, certamente teremos desc oberto, por exemplo, o gene que faz com que a cicatrização seja perfeita ou, então, fo rme um queloide e que existirá uma pomadinha para garantir o sucesso do resultado. Na verdade, chegará o dia em que vamos lembrar da era pré-genoma como lembramos da m edicina medieval. Quebrar um osso e passar meses engessado será uma conduta ultrap assada que deixará a todos pasmos, porque bastará pincelar um fator de crescimento óss
eo para o osso soldar em duas semanas. Utilizar um roto-rooter para desentupir u ma veia será sinônimo de tratamento primário, porque existirão medicamentos para impedir que coágulos se formem ou para dissolvê-los. Tudo isso são previsões, são promessas para o futuro. O livro do genoma humano está aber to e é preciso entender profundamente cada um dos fatores para transformar essas p romessas em realidade. BIODIVERSIDADE HUMANA Drauzio O conhecimento do genoma humano permite a identificação do que chamamos de b iodiversidade humana. Entendemos facilmente que nossos rostos sejam diferentes e únicos, pois não há duas pessoas idênticas. O que vale para a aparência externa vale também para os processos bioquímicos. Provavelmente, não existirão duas moléculas de insulina idênticas nem duas que consigam metabolizar da mesma forma o açúcar. Lygia da Veiga Pereira Essa variabilidade do ser humano está criando uma área nova n a genética, a farmacogenética. Hoje, a única forma de o médico saber como o paciente rea girá a determinado medicamento, é prescrevê-lo e observar os efeitos. Só depois de algum tempo, será possível dizer se a resposta foi boa ou não. O que se espera para daqui a algum tempo é pegar uma gotinha de sangue do paciente e, baseado em seu genoma, e scolher o melhor remédio para seu caso. Conhecer as pequenas variações do genoma de cada indivíduo possibilitará criar uma medic ina muito mais individualizada e eficiente. Por exemplo: será possível determinar a proteína que determinado câncer produz e saber qual quimioterápico funcionará melhor, ex atamente o contrário do que ainda acontece, quando se testa o quimioterápico para ve r se funciona ou não naquela pessoa, com o inconveniente de estar perdendo tempo p recioso ou expondo o doente a efeitos colaterais que poderiam ser evitados. MEDICINA PREVENTIVA Drauzio Você não acha que vai haver uma revolução na medicina preventiva que se resume, hoje, basicamente em vacinas e engenharia sanitária? Se tirarmos um fragmento do c ordão umbilical da criança quando nasce para sequenciar o seu genoma, poderemos sabe r quais serão os riscos maiores de saúde a que estará exposta. Lygia da Veiga Pereira A medicina preventiva baseada na nossa genética é uma área fantás tica e instigante na fase pós-genoma. Retirar um pouquinho de sangue de um adulto ou do bebê ao nascer e seqüenciar-lhes o genoma pode demonstrar que a pessoa tem ten dência a desenvolver hipertensão ou asma, doenças bastante comuns e não raras como a hem ofilia e a fibrose cística. Saber que existe uma tendência genética, permite alterar o estilo de vida de forma a evitar ou adiar o desenvolvimento da doença. Conhecendo sua predisposição genética para hipertensão, por exemplo, a pessoa pode alimentar-se ad equadamente, fazer exercícios, comer menos sal e não fumar sob nenhum pretexto. GENÉTICA E COMPORTAMENTO Drauzio Quando surgiu o Projeto Genoma, o medo era que, com o conhecimento da es trutura dos genes, pudéssemos interferir no comportamento humano e criar hordas de pessoas obedientes e despersonalizadas. Como você vê essa possibilidade de intervenção no comportamento por meio da genética? Lygia da Veiga Pereira Hoje, tomo muito cuidado em dizer que não imagino que isso possa acontecer. Muitas coisas que acreditávamos impossíveis estão aí, provando nosso en gano. No entanto, acho que tal hipótese está longe de concretizar-se, apesar do inte resse no estudo dos genes por causa das doenças de comportamento. É preciso tomar cuidado, porém, para não se deixar levar pela pretensão de controlar ou prever o comportamento das pessoas. A genética não é uma bola de cristal. Ao olhar o D NA de uma pessoa, classificá-la como agressiva ou deprimida, é um risco muito grande . O comportamento resulta de uma interação muito forte entre meio ambiente e genética. Existem genes que influenciam certos comportamentos, mas as pessoas não são escrava
s deles e muito podem fazer para atenuar sua influência. Em termos de usá-los para c riar seres dóceis que obedecem sem discutir, acho que é uma possibilidade remota, po rque se dominássemos o conhecimento a esse ponto, já teríamos descoberto como curar mu itas doenças genéticas. Drauzio Experiências com animais de laboratório mostraram que por trás de determinado comportamento está uma constelação de genes e é praticamente impossível prever como cada u m interage com os outros. Além disso, não se pode desprezar a influência do ambiente, você não acha? Lygia da Veiga Pereira O aspecto genético é constituído por uma rede complexa de fator es que interagem uns com os outros e não sei se é possível descobrir qual deles é o prin cipal. São dezenas, quem sabe centenas de genes, que interagem e modulam o comport amento. SEQUENCIAMENTO DE VÁRIAS ESPÉCIES Drauzio Os genes de todos os seres vivos têm a mesma estrutura química. Na bactéria ma is reles, passando por todo o reino animal e vegetal, a estrutura química é exatamen te a mesma. Na verdade, todos descendemos de um mesmo ancestral. A pesquisa do G enoma Humano permitiu o sequenciamento do genoma de vários organismos. Hoje temos o sequenciamento do tomate, do arroz, da cana-de-açúcar, do boi e o Brasil tem-se de stacado nessa área, como prova o sequenciamento do genoma da bactéria Xillela fastid iosa responsável pela praga do amarelinho, por exemplo. Qual vai ser o impacto no futuro dessa explosão de sequenciamentos? Lygia da Veiga Pereira O sequenciamento do genoma de várias espécies diferentes nos ajuda também a compreender o Genoma Humano. Aprendemos muito da genética humana ao e studar a genética da bactéria ou da drosófila (mosquinha das frutas), porque temos gen es que são primos distantes dos genes desses organismos. Descobrimos genes envolvi dos em alguns tipos de câncer humano analisando genes já conhecidos na bactéria. Como você vê, estudando um organismo muito mais simples do que o ser humano, como é a bactéri a, pode-se aprender muito sobre o genoma humano. Por isso, quanto mais genomas t ivermos em mão, melhor será o entendimento da função de cada um dos genes humanos. TRANSGÊNICOS Drauzio A manipulação dos genes no homem está sujeita a discussões éticas intermináveis. No animais e vegetais, ela está disponível e podemos ter alimentos transgênicos, assunto cercado de polêmica politizada demais para o gosto de qualquer cientista. Qual é su a opinião a respeito disso? Lygia da Veiga Pereira As pessoas têm medo crônico do novo. Acho interessante quando os ambientalistas se colocam numa posição xiita contra os transgênicos. Para eles, os transgênicos são culpados até que se prove ao contrário. É claro que precisa ter precaução, as tudo tem limite, que parece não existir quando o assunto é transgênicos, embora até h oje não tenha sido demonstrado nenhum efeito adverso dos alimentos transgênicos no s er humano ou no meio ambiente. Drauzio Você poderia explicar essa última frase? Lygia da Veiga Pereira É importante as pessoas saberem que não existe nenhum trabalh o científico sério documentando um efeito adverso dos alimentos transgênicos. O argume nto é que eles podem fazer mal à saúde. Tem gente que é alérgica a amendoim; quando come, fecha a glote, mas nem por isso amendoim é prejudicial à saúde. O mesmo pode acontecer com os alimentos transgênicos. Não discuto que é preciso testá-los, experimentá-los antes de os colocá-los à disposição das pessoas. A partir de determinado ponto, porém, teremos de admitir que são seguros. E tem mais: as pessoas não podem esquecer que há bilhões de indivíduos no mundo para ali mentar. Com a tecnologia de que dispomos hoje para produzir alimentos, teremos d
e escolher o terço da população que deixaremos morrer de fome. Como será possível produzir mais comida? Podemos aumentar a área de plantio, desmatand o, acabando com as florestas, o que é considerado ruim pelos ambientalistas. A out ra opção é aumentar a produtividade da área já cultivada. Isso pode ser feito aplicando ag rotóxicos, dos quais conhecemos os efeitos adversos, ou com os transgênicos. Não enten do essa posição radical contra os transgênicos enquanto comemos tomates pulverizados c om substâncias tóxicas. É preciso abrir nossas cabeça e confiar que os cientistas não são malucos que querem cri ar comida Frankenstein. Eles estão procurando um caminho para obter alimentos mais nutritivos, e plantas que resistam às pragas e produzam mais. De certa forma, os agrotóxicos aumentaram a produtividade da terra, mas pagamos um preço alto por isso. PREVISÕES PARA O FUTURO Drauzio Como você vê o futuro depois do sequenciamento do genoma humano? Lygia da Veiga Pereira Vejo com muito otimismo. Acho que só temos a ganhar com o c onhecimento da nossa biologia, do nosso genoma. O importante é que as pessoas seja m bem informadas. Toda nova tecnologia ou conhecimento podem ser utilizados cons trutiva ou destrutivamente. O exame feito no bebezinho ao nascer não pode servir p ara negar-lhe uma apólice de seguro por causa de sua tendência genética para desenvolv er certas doenças, nem negar a matrícula numa escola para uma criança porque ela tem o gene da agressividade. Essas questões precisam ser discutidas para que se possa tirar o melhor proveito d o conhecimento do genoma humano. Para isso, os cientistas devem traduzir clarame nte o que está acontecendo para a população participar do debate. Drauzio No Brasil, essa discussão sobre os genes está sendo bem encaminhada? Lygia da Veiga Pereira O Brasil começou a destacar-se muito nessa área com o sequenc iamento do genoma de uma bactéria e do genoma do câncer e isso levantou o assunto pa ra ser discutido pelas pessoas. Dentro do meio científico, a preocupação é comunicar bem o que está sendo feito à população. A grande arma contra o mau uso do conhecimento é ter uma população bem informada. As pessoas precisam entender o que é o genoma, o que são pr omessas e o que é realidade possível no momento.