Introdução ao estudo de direito técnica, decisão, dominação. Neste livro, Tercio Sampaio irá abordar o estudo do direito como um fenômeno decisório, valendo-se da dicotomia dogmática x zetética, a primeira tem aspecto de resposta e a segunda de pergunta de uma investigação. Obedece portanto uma dialética de implicação e polaridade estabelecendo assim uma tensão continua.
Na introdução, o autor faz reflexões acerca da compreensão do direito, compreensão esta que está além de conceitos lógicos e racionais, tornando-se uma atividade difícil. Há mistério no direito, mistério do princípio e do fim da sociabilidade humana. Há a exigência do rigor científico, mas também a abertura para o humano. O livro de introdução ao estudo ao direito se torna uma obra complexa, pois exige competências a quem está sendo introduzido, correndo o risco da superficialidade e da incompreensão por parte deste. Há de se lembrar, que a introdução é apenas uma abertura que nos leva a ampliar o nosso universo. Por ser o direito um fenômeno que possui vários aspectos, os liv ros de introdução geralmente apresentam alguma peculiaridade. No livro, o autor procurou explicar como se conhece o profissional jurídico e focalizar o direito em como ele se manifesta nos dias atuais. A percepção de que o direito não se encontra estático faz com que o autor mostre o direito como um fenômeno decisório, um instrumento de poder, e a ciência jurídica como uma tecnologia. O direito adquire essa característica de instrumento de poder há muito tempo, desde a antiguidade. Aristóteles dizia que todo cidadão pertence a duas ordens de existência, a sua vida privada e sua bio-politicós. A esfera privada na antiguidade se referia às necessidades da condição animal do homem, essa necessidade levava o homem a exercer um tipo de atividade para sua sobrevivência, o labor ou labor ou labuta. O labor diferenciava-se do trabalho, pois tinha relação com a produção de bens de consumo, que pereciam. A produção destes se confundia com o próprio corpo, por isso o homem que labuta podia ser chamado de animal laborans. laborans. Nesse espaço de vida privada (casa) não existiria liberdade, pois todos estariam sujeitos à essa necessidade de labor . Liberar-se dessa condição era privilégio de alguns, os cidadãos. Estes, exerciam suas atividades na polis na polis ou civitas, que faziam parte da esfera pública. Ao contrário do labor , a ação significava a dignificação do homem. O homem ao agir, exercitava sua atividade junto a outros homens que também eram cidadãos. O homem que age é o animal político ou politikon ou politikon zoon. Como se tratava de uma atividade espontânea, não havia como prever a ação. A única estabilidade possível era a da própria ação, e para que isto fosse alcançado, era necessário algumas condições. Portanto, a polis não era um limite físico, mas um conjunto de ações. Havia diferença entre lex e jus, na proporção da diferença entre trabalho e ação. ação. Já na Era Moderna, o sentido de ação se confunde cada vez mais com o de trabalho, tornandose um fazer, entendida como um processo que parte dos meios para atingir os fins. O trabalho faria do agir humano uma atividade produtora de bens de consumo e o direito reduzido à norma. Essa transição do homem como animal político do homem que trabalha, coloca o
direito dentro da chamada filosofia do homem faber . Este por sua vez, degrada o mundo de certa forma, pois coloca o significado das coisas numa relação pragmática. P ara resolver este problema, encontra-se uma ideia que é paradoxal, a ideia de um fim em si mesmo. A proposta de Kant para resolver esse paradoxo, é a de que alguma coisa só terá sentido se contiver trabalho humano, pois se instrumentaliza. Nessa sociedade dominada pelo homo faber , a troca de produtos se transforma em principal atividade política. Aos seus olhos, pela ideia da troca, o direito passa ser considerado como um bem que produz, se tornando mero objeto, que é encarado apenas como um conjunto abstrato de normas. No decorrer da Era Moderna, há a progressiva absorção da ideia de trabalho pela ideia de labor. Agora há uma nova concepção antropológica, a do animal laborans. Consequentemente, o direito, que na Antiguidade era ação, que na Era Moderna passa a ser trabalho produtor de normas, no mundo contemporâneo torna-se produto do labor. Para o mundo jurídico, o advento da sociedade do homo laborans criou-se a possibilidade de manipulação de estruturas contraditórias, sem que a contradição afetasse a condição normativa. Em suma, ocorre radical reestruturação do direito, pois passa a se basear na uniformidade da própria vida social. O direito torna-se objeto de consumo, o que não significa que ele é instrumento de permanente alienação humana. A consciência dessa circunstância deve ser entendida como ponto de partida.
O direito atua como um reconhecimento de ideias que muitas vezes representam o oposto da conduta social real. Ele contém ao mesmo tempo filosofias de obediência e de revolta, nos protege da arbitrariedade, nos dá oportunidades iguais, ampara os desfavorecidos; mas também é um instrumento manipulável. Não há definição rigorosa para o direito. Ele está vinculado à uma série de símbolos, que remontam a antiguidade clássica, nessa época a expressão jus designava direito. No decorrer dos séculos, esta expressão foi sendo substituída por derectum. A palavra direito, guardou tanto o sentido de jus (como aquilo que é consagrado pela justiça), quanto o de derectum (como um exame da retidão da balança). O direito é multifacetado e possui diversos significados que devem ser analisados separadamente.