Carta do Amapá para a Rio + 20 Seção I: Princípios
Este documento é resultado da articulação de vários setores do Governo do Estado do Amapá com as principais representações da Sociedade Civil Organizada, dos Grupos Majoritários e do Movimento Negro, principalmente através dos Conselhos Estaduais e Movimentos da Juventude, para construir sua afirmação na “Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – CNUDS”. A Carta do Amapá para Rio+20 pauta-se nas Conferências e Tratados Internacionais pertinentes aos temas da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), a “ECO 92”, e seus desdobramentos, alicerces do processo de transição para um desenvolvimento socioeconômico sustentável, bem como, considerando os temas “Economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da Pobreza”, e “Quadro Institucional para o Desenvolvimento Sustentável” assim como: 1 – Nos documentos nacionais e internacionais balizadores das discussões da Conferência Rio+20, a exemplo, o Rascunho Zero (“draft zero”), a Carta da Coalizão dos Estados Brasileiros, a Carta da Amazônia, a Carta do Cerrado, entre outros documentos. 2 – Nas contribuições dos documentos apresentados durante o Seminário “Amapá na Rio + 20”, sendo eles a “Carta Socioambiental da Universidade do Estado do Amapá – UEAP”,as “Propostas dos Povos Indígenas do Estado do Amapá e Norte do Pará para a Carta do Amapá” e “A Guiana Francesa rumo a Rio+20: os caminhos do desenvolvimento sustentável do território” referendados e reconhecidos neste documento e pela plenária que o oficializou. 3 – Na participação social para a elaboração de políticas públicas, com justiça social, responsabilidade socioambiental e na equidade de gênero, raça, etnia, geração, credo e cultura. 4 – No reconhecimento das diferenças e semelhanças do estado do Amapá com os demais estados amazônicos, nacionais e internacionais, e das suas potencialidades e oportunidades frente às cooperações técnicas e financeiras com estes estados e países. 5 – Na urgência de serem elaborados novos rumos para o desenvolvimento socioeconômico, cultural e ético, frente à degradação do meio ambiente e do consumo insustentável dos recursos naturais, e suas conseqüências potenciais e efetivas1. 6 – No reconhecimento das comunidades tradicionais: os quilombolas, extrativistas, pescadores, ribeirinhos, e a população negra amapaense, como legítimos integrantes dos segmentos majoritários no âmbito da Rio+20. 7 – Na valorização do conhecimento tradicional e local, com reconhecimento de suas potencialidades e de suas contribuições para o crescimento econômico e para a ciência, sempre por meio da repartição justa e equitativa de seus benefícios. 8 – No reconhecimento do papel das florestas tropicais, especialmente na Amazônia, como o maior remanescente de florestas nativas do mundo, que mantêm importantes estoques de carbono, produz 18%
da água doce do planeta e é abrigo de uma vasta e única biodiversidade. 9 – No reconhecimento da importância dos serviços ambientais prestados pelos ecossistemas naturais preservados no estado do Amapá (serviços de regulação hídrica, fertilização natural dos solos, provimento de água, sumidouro de carbono, belezas cênicas, entre outros), necessários ao equilíbrio do clima global e manutenção da vida no planeta. Seção II: Propostas
O resultado das contribuições daqueles que construíram a Carta do Amapá para Rio+20 está afirmado no conjunto das seguintes proposições que demandam: EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA 1– A promoção da inovação e acesso à tecnologia no estado do Amapá, por meio de estudos e fomento a utilização de novas tecnologias para o aquecimento da economia e a ampliação da captação de recursos para pesquisas científicas, objetivando aumentar o conhecimento sobre os produtos amazônicos e a melhoria de sua capacidade de produção sustentável. 2 – A implantação de “polos tecnológicos” em parceria com os produtores familiares agroextrativistas, para a agregação de valores aos produtos regionais, desenvolvimento e incentivo aos estudos e tecnologias voltados para a produção e segurança alimentar, bem como, o fomento à mecanização de baixo impacto ambiental para humanizar as condições de trabalho no campo. 3– A valorização do etnoconhecimento a partir de políticas públicas de proteção e promoção do saber popular na comunidade e na sociedade, através de sua inserção na matriz do ensino básico, superior, nos cursos de pós-graduação e na educação ambiental. 4 – O incentivo às ações de educação ambiental em suas diversas formas, multi, inter, e transdisciplinar, através da capacitação das comunidades urbanas e rurais com a finalidade de promover a sensibilização para a identificação das problemáticas socioambientais bem como a busca de soluções. 5 – O fortalecimento e a implantação de novas escolas famílias ou escolas agrícolas nas comunidades rurais, ribeirinhas e terras indígenas, com o resgate do modelo da “Escola Bosque” na rede de ensino do estado até 2015. 6 – A criação de centros de vocação tecnológica para incubação de empreendimentos solidários com base no manejo e beneficiamento dos recursos naturais unindo o ensino, a pesquisa e a extensão florestal em torno de iniciativas produtivas das comunidades rurais. 7 – A capacitação dos recursos humanos e a criação de incentivos financeiros para a prospecção da biodiversidade amazônica, pautando-se sempre na repartição justa e equitativa dos benefícios para com aqueles que detêm o conhecimento e o território explorado, e atentando à necessidade da criação de leis disciplinares estaduais contra o tráfico de animais e a biopirataria. FLORESTAS, ÁGUA E SERVIÇOS AMBIENTAIS 8 – O desenvolvimento e a regulamentação dos instrumentos de valoração e compensação dos serviços ambientais prestados pelos ecossistemas naturais e áreas protegidas do Amapá, tendo em vista alternativas como o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), Mecanismos de Desenvolvimento Limpos (MDL) e da Redução de Emissão por Desmatamento e Degradação (REDD+), incluindo a conservação, manejo sustentável das florestas e aumento de seus estoques, para o benefício das populações tradicionais, e redução da dívida social verificada nas áreas urbanas da Amazônia.
9– A criação de uma unidade monetária de referência para floresta em pé, como indicadora do desenvolvimento socioeconômico local, fortalecendo as tomadas de decisão sobre a gestão das áreas protegidas. 10 – A implementação do manejo florestal comunitário sustentável, a simplificação e harmonização dos mecanismos de incentivo econômico e social nas áreas rurais e a promoção do ecoturismo comunitário e outras formas de promoção da economia verde no nível local. 11 – A criação do “Superfácil Rural” agregando todas as instituições envolvidas no licenciamento, fiscalização e fomento do manejo florestal e das atividades rurais como forma de descentralização e desburocratização dos processos administrativos pertinentes. 12 – A promoção da utilização sustentável das Florestas de Produção, através de Concessões Florestais, como alternativa para redução da ilegalidade e o acesso aos produtos florestais, madeireiros e não madeireiros, e para a promoção da economia florestal de base sustentável com atração de empresas com responsabilidade socioambiental e com a valorização dos produtos locais através de sua certificação. 13 – Uma melhor gestão governamental da água, de forma descentralizada, e que envolva os usuários e a comunidade, com o fortalecimento das instituições responsáveis pelo gerenciamento de recursos hídricos, o combate a hidropirataria, a criação de um Instituto de Águas e a implantação no Amapá até 2017, dos instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos. DESENVOLVIMENTO RURAL E INCLUSÃO SOCIOPRODUTIVA 14 – O incentivo a produção, comercialização e inserção de plantas medicinais in natura, e fitoterápicos de matéria prima regional no âmbito do no Sistema Único de Saúde (SUS) e mercado interno estadual, assim como o reconhecimento legal e a certificação de seus usos e subprodutos. 15 – Uma mudança nos atuais padrões de produção e consumo, a partir do ordenamento racional da cadeia produtiva e pelo fomento e capacitação do produtor, empreendedor e comerciante, garantindo crédito e acesso a grandes mercados para produtos amazônicos obtidos num modelo mais sustentável. 16 – O desenvolvimento do mercado interno, visando o aperfeiçoamento e escoamento da produção local, apoiando propostas como a criação de uma “feira do produtor ribeirinho” e de outros setores de produção, e também de novas modalidades de apoio para as comunidades rurais e povos indígenas amapaenses, através principalmente da certificação e valorização de seus produtos e de políticas que facilitem o acesso ao crédito e o fomento para agricultura familiar. 17 – O estabelecimento das Políticas Públicas para o Desenvolvimento Rural Sustentável – PDRS até 2014, com o fortalecimento das instituições envolvidas na execução dessas políticas, incentivo financeiro, técnico, gerencial e organizacional à agricultura familiar, a extensão e o manejo florestal sustentável, os quais favorecem o emprego de práticas produtivas mais equilibradas, como a diversificação de cultivos, o incentivo e apoio a produção de alimentos orgânicos, do menor uso de insumos industriais e do uso sustentável dos recursos genéticos e naturais. 18 – O fomento do setor pesqueiro estadual, por meio de uma nova política pública buscando seu desenvolvimento, ordenamento (pesquisa e estatística), proporcionando infraestrutura adequada para a produção, comercialização e certificação da qualidade do pescado. 19 – A imediata conclusão do processo de transferência das terras da União para o estado do Amapá e promoção da regularização fundiária, para viabilizar o desenvolvimento e acesso dos produtores rurais aos incentivos financeiros federais e estaduais, garantindo até 2018 a titulação e o desenvolvimento social, econômico e cultural de todos os territórios do estado do Amapá.
POLÍTICAS E PROGRAMAS 20 – A criação do Ministério das Florestas e do Ministério das Águas, em atenção à susceptibilidade destes bens naturais ao crescimento populacional e industrial, como forma de garantir a estes recursos naturais uma maior importância institucional e legal e a devida atenção nacional. 21 – A criação do Programa de Aceleração do Crescimento da Economia Florestal na Amazônia (PAC Florestal) como forma de incentivo ao crescimento do setor florestal, através da regularização fundiária e ambiental, do incentivo ao manejo florestal de uso múltiplo, recuperação de passivos ambientais e implantação de sistemas agroflorestais, a industrialização dos produtos florestais, a pesquisa tecnológica, a valoração e o pagamento por serviços ambientais, a criação de empregos verdes e a inclusão produtiva das famílias detentoras de florestas na Amazônia. 22 – A criação de secretarias estaduais e municipais de segurança alimentar e nutricional – como centros de referência – a fim de fortalecer os respectivos conselhos estaduais e municipais, a criação de Política Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional, e a criação de indicadores nutricionais que visem fortalecer e direcionar as políticas públicas de inclusão social. 23 – Uma política efetiva de garantia dos direitos humanos que seja orientada à redução dos índices elevados de violência, drogadição, prostituição, aborto, tráfico de mulheres bem como ao combate às drogas e controle das doenças decorrentes da falta de qualidade de vida, e que tenha como contrapartida socioambiental o investimento em educação, cultura, saúde, segurança pública e assistência social. 24 – A construção da Política de Planejamento Familiar, da Política de Mobilidade Urbana, da Política Habitacional do estado do Amapá e dos Planos de Saneamento Básico Municipais e Estadual até 2015. 25 – O fortalecimento da Defesa Civil estadual e dos municípios, para fazer frente aos desastres naturais e humanos, com a formulação de Políticas e Programas de Defesa Civil, voltados para a realidade amazônica, da inserção deste tema no âmbito da sociedade civil e da participação desta nos zoneamentos e reconhecimento das áreas críticas de ocorrência de desastres. 26 – O estabelecimento de políticas e de mecanismos de valorização e incentivo à cultura, com o desenvolvimento de instrumentos adequados para a formação sociocultural da comunidade educacional, tendo como meta a implantação e implementação dos Planos Estaduais e Municipais de Cultura até o ano de 2015. 27 – A valorização e o empoderamento das mulheres, por meio de uma política de auto-sustentabilidade de gênero e de sua proteção principalmente na periferia das cidades, e em casos como dos impactos sociais no entorno de grandes empreendimentos. 28 – A criação urgente de mecanismos estaduais e municipais de proteção e controle dos sítios arqueológicos, principalmente os localizados em áreas quilombolas. 29 – O reconhecimento da população negra como grupo majoritário no âmbito da classificação da Organização das Nações Unidas (ONU), o incentivo e a divulgação de suas tradições e cultura no estado do Amapá e a criação de uma política de ação afirmativa para a mulher negra urbana e quilombola, para que ela tenha melhor qualidade de vida na área da educação, saúde, cultura e outros. 30 – A conclusão de forma participativa do Zoneamento, Ecológico e Econômico – ZEE no Amapá até 2015 e que este seja reconhecido como política pública. 31 – A estruturação e informatização dos órgãos governamentais da gestão ambiental e a capacitação técnica e contínua dos agentes de meio ambiente, objetivando eficiência no enfrentamento das questões voltadas para a execução de todo o processo de gerenciamento e proteção ambiental, compreendendo o licenciamento, o monitoramento, a assistência, e a fiscalização.
32 – A criação de novos centros de reabilitação estadual de animais silvestres, e de incentivos fiscais e creditícios na contemplação de iniciativas solidárias que tenham essa finalidade. 33 – O combate efetivo e permanente à corrupção, através de uma ação mais efetiva do Poder Judiciário para o julgamento e punição dos crimes do colarinho branco. 34 – O incentivo financeiro às micro e pequenas empresas para adoção de práticas e projetos sustentáveis, e ao empreendedorismo em projetos voltados para o meio ambiente. GOVERNANÇA 35 – Uma maior participação do Estado nas discussões federais sobre meio ambiente, recursos naturais e sociobiodiversidade, solicitando-se para tanto o empenho das entidades governamentais no processo de educação para o desenvolvimento sustentável e no estabelecimento de mecanismos de monitoramento, fiscalização, fomento e difusão das políticas voltadas para sustentabilidade de seus recursos naturais. 36 – A priorização da participação da sociedade civil, objetivando construir políticas públicas de natureza coletiva, respeitando as lideranças e opiniões locais, seus costumes e valores, garantindo que as comunidades sejam chamadas e ouvidas antes da instalação dos grandes projetos de infraestrutura voltados para o Amapá e para a Amazônia. 37 – A criação de instrumentos e mecanismos mais eficazes de controle social e responsabilidade do poder público, para o fortalecimento da democracia participativa como real alternativa à representatividade, com o fortalecimento dos conselhos estaduais oportunizando a formação adequada, autonomia e transparência na gestão, e, a criação do fórum permanente dos conselhos. 38 – O fortalecimento da gestão das áreas protegidas no Estado do Amapá, minimizando os conflitos ambientais existentes, e com o estímulo as iniciativas de gestão integrada ao território, como mosaico de áreas protegidas, garantindo a participação social nos processos de criação e gestão destas áreas, com apoio de projetos de educação ambiental, com a implementação de políticas de economia solidária, e pela ampliação do instrumento “bolsa verde” para as populações das unidades de conservação estaduais. CIDADES SUSTENTÁVEIS 39 – Um desenvolvimento urbano sustentável, objetivando aumentar a atual porcentagem de apenas 2% do esgoto tratado, a contenção das invasões em áreas de ressaca, a implementação de um sistema de saneamento ambiental integrado com o ambiente, de forma a não considerar somente o abastecimento de água e o esgotamento sanitário, mas incluir os resíduos sólidos, o fomento para as iniciativas e cooperativas de reciclagem, redução e reutilização destes resíduos, e o direcionamento de maiores investimentos do PIB na saúde e no saneamento básico. 40 – A garantia de mobilidade urbana através do compromisso político para elaboração de planos e programas estatais, oferecendo a população entre outros direitos, vias trafegáveis e arborizadas, incluindo ciclovias, prioridade aos transportes coletivos, adaptados às pessoas com necessidades especiais, integrados e de baixo custo para os usuários, e, geradores de baixa emissão de carbono. 41 – A universalização da energia limpa, com o incentivo ao uso da energia alternativa – eólica e solar – a baixo custo, sendo que 50% da geração de energia deve ser eólica e solar nos projetos do Estado. 42 – A busca por cidades mais sustentáveis, amparada pela elaboração de planos, programas e projetos integrados e articulados entre si, com planejamento participativo de médio e longo prazo, pautando-se sempre pelos princípios do desenvolvimento sustentável.
Assim, tornamos público nosso manifesto, nossa vontade política e nos colocamos a disposição de todos os interessados na busca pela consolidação do desenvolvimento sustentável como política de desenvolvimento e pela melhoria da qualidade de vida para todos os cidadãos e cidadãs do mundo. Macapá – Amapá, 25 de Maio de 2012. Seção III: Moções
Propostas dos Povos Indígenas do Estado do Amapá e Norte do Pará para a Carta do Amapá, para a Conferência RIO+20 “A salvação do Planeta está na sabedoria ancestral e na mobilização dos povos”
Nós, povos indígenas do Estado do Amapá e Norte do Pará, representados no Seminário Amapá na Rio+20 pelas nossas lideranças indígenas, nos dias 24 e 25 de maio para discutir as nossas formas de mobilização em relação à Conferência RIO+20 e nossa inserção nos espaços legítimos de participação da sociedade como a Cúpula dos Povos e o Acampamento Terra Livre, queremos manifestar nossas preocupações e propostas em relação a este momento crítico que estamos vivendo para a história da humanidade e a vida do nosso planeta Terra. O atual modelo de desenvolvimento econômico se caracteriza por um aumento da pressão sobre os territórios, os recursos naturais e a Natureza. Trata-se de um modelo que não é sustentável e transforma os bens comuns da Natureza e o próprio ser humano em mercadoria. Ele não condiz com a realidade da maioria da população da Amazônia, viola os direitos e é conivente com as violências contra os povos indígenas. Hoje, o desenvolvimento econômico do Brasil, voltado à procura de um crescimento acelerado, passa pela Amazônia, e as consequências são pagas pelas pessoas que nela vivem. As políticas públicas para a Amazônia seguem a lógica do crescimento industrial e do agronegócio, consolidando uma grande aliança com as empresas transnacionais e as entidades financeiras multilaterais, em detrimento das políticas públicas demandadas pelas populações indígenas. A pressão dos interesses econômicos sobre os recursos naturais busca um maior controle sobre os territórios, de modo que possam servir para os grandes empreendimentos do agronegócio, a produção de agrocombustíveis, energia e extração de minérios para exportação. Nós, povos indígenas, não somos pequenos. Temos experiências acumuladas o suficiente para mostrar alternativas à idéia do crescimento a qualquer preço, sem limites. Nós somos guardiões da natureza e temos as principais estratégias para sua conservação. Mas ao mesmo tempo não queremos ser considerados como aqueles que vão resolver os problemas de poluição e destruição gerados por outros. Nossa preocupação é com a vida e a sustentabilidade de todos. Para nós o importante é ter nossas terras, trabalho, proteção dos direitos e procurar o bem viver dentro dos nossos territórios, dando condições para que as nossas gerações futuras cresçam em um mundo onde participem ativamente de sua construção. É necessário colocar limites no poder e uso dos recursos naturais. Por isso exigimos que o Código Florestal aprovado no Congresso Nacional seja integralmente vetado, reabrindo a discussão com o envolvimento de toda sociedade, e principalmente com os povos indígenas, em um processo realmente democrático e responsável. Hoje estamos vivendo um momento de mudanças do comportamento e da consciência, e queremos construir um novo mundo baseado na sabedoria ancestral e na mobilização dos povos. Queremos propor alternativas concretas e reais para procurarmos juntos um outro modo de vida, de produção e de convívio com a Natureza. A Cúpula dos Povos e o Acampamento Terra Livre são os espaços representativos da sociedade.
Percebemos a Rio+20 como um espaço distante da sociedade, que não considera seus verdadeiros
problemas e apresenta apenas soluções que não interfiram na estrutura de privilégios para uns poucos. Consideramos a Cúpula dos Povos e o Acampamento Terra Livre como os espaços legítimos para que os movimentos sociais busquem pontos comuns, construam convergências e apresentem suas alternativas, pressionando a Conferência oficial para que assuma compromissos com as transformações indispensáveis para garantir os direitos sociais, ambientais e a vida no planeta. Assim sendo, após uma ampla e experiências concretas envolvendo os representantes dos povos indígenas do Estado do Amapá e Norte do Pará, nos manifestamos: Os nossos direitos, como povos indígenas, crianças e jovens, mulheres, foram conquistados como direitos individuais e coletivos, mas ainda não estão plenamente garantidos, e precisam ser reafirmados e defendidos na Cúpula dos Povos e no contexto da temática central da RIO+20; Do mesmo modo, enfrentamos dificuldades em relação aos direitos específicos que temos ou reivindicamos como jovens, mulheres, crianças e idosos, assim como sobre nosso direito à água, à alimentação, energia e a um ambiente adequado; Proteção e fiscalização nas terras indígenas; Revisão de conduta das autoridades governamentais de modo a respeitar e efetivar os direitos indígenas previstos na Constituição Federal; Maior agilidade nos processos de demarcação de novas terras indígenas e ampliação das terras já demarcadas; Mobilização constante dos povos indígenas contra ações que os prejudiquem ou venham a lhes prejudicar; Aprovação imediata do Estatuto dos Povos Indígenas; Maior aporte de recursos para fiscalização e monitoramento das terras indígenas; Capacitação de agentes ambientais indígenas para vigilância das terras, com poder de polícia e aquisição dos equipamentos necessários; Garantir a vigilância permanente dos limites das terras indígenas; Implantação de postos de vigilância e fiscalização fixos nas entradas das terras indígenas; Facilitar o crédito social, eliminando o excesso de burocracia para financiamento de projetos; Regulamentação imediata do direito de consulta prévia aos povos indígenas, de forma que as decisões dos povos indígenas vinculem os atos do poder público, conforme previsto na Constituição Federal e na Convenção 169 da OIT; Garantir a participação dos povos indígenas nas instâncias de representação política, por meio de vagas reservadas em todas estas instâncias; Rejeitar a PEC 215 e leis que permitam a revisão que reduza os limites das terras indígenas; Fazer campanha pelo Veto ao novo Código Florestal; Capacitar as lideranças para poder encontrar meios de controle e gestão sobre os recursos; Discutir a necessidade de adequação das políticas públicas sociais á diversidade cultural dos povos indígenas e o impacto destas políticas sobre os povos indígenas; Garantir condições por meio de capacitação e instrumentalização para as organizações indígenas administrarem os recursos financeiros repassados pelo governo brasileiro para desenvolver ações nas comunidades indígenas; Desenvolver manejo sustentável de peixes e animais silvestres em terras indígenas; Incentivo para projetos de produção a partir dos conhecimentos tradicionais e da forma de vida do povo; Apoio ao uso e à pesquisa de fontes de energia elétrica alternativas, de geração limpa e sustentável, e que não impactem o meio ambiente e a sociedade; Ampliação e facilitação do acesso aos fundos para financiamento de empreendimentos de economia solidária, garantindo a representatividade e a autonomia de toda a comunidade junto a esses empreendimentos; Garantir as comunidades indígenas cursos de formação em Agropecuária, Gestão e Manejo Ambiental;
Carta Socioambiental da Universidade do Estado do Amapá para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável - Rio +20
A Amazônia é considerada como um dos territórios mais ricos em sociobiodiversidade, entretanto, é uma das regiões com maiores índices de pobreza, desigualdade social, cobiça e ameaça crescente de destruição dos recursos naturais. Neste contexto, a Universidade do Estado do Amapá - UEAP, consciente do seu papel e comprometida com a causa ambiental, promoveu ampla discussão através do Fórum UEAP Rumo à Rio + 20 sobre o futuro sustentável das florestas, dos recursos naturais locais e das populações tradicionais, pautando-se nas políticas de desenvolvimento sustentável e sua repercussão na qualidade de vida da população local, considerando um dos principais pilares do desenvolvimento sustentável, a sustentabilidade social. Estas políticas vêm sendo discutidas desde a conferência de Estocolmo em dois pontos principais: a prioridade na satisfação das necessidades das camadas mais pobres da população e as limitações do atual modelo tecnológico e de organização social imposto sobre o meio ambiente. Estes pontos foram firmados na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento – Rio 92, através de seu documento oficial, a agenda 21. Todavia, duas décadas após o evento a população pobre da sociedade ainda não foi favorecida, e sim uma elite dominante na política mundial. O que tem restado aos menos favorecidos são apenas os problemas ambientais ocasionados pela exploração dos recursos naturais. Embora muitas políticas e legislações ambientais tenham sido criadas, a sua efetivação não tem sido colocada em prática para a preservação do meio ambiente, principalmente na Amazônia brasileira. O Plano Amazônia Sustentável (PAS), lançado em 8 de maio de 2008, é um plano do Governo Federal brasileiro em parceria com os governadores dos estados da região amazônica, que tem como objetivo definir as diretrizes para o desenvolvimento sustentável na Amazônia brasileira. Este Plano constituiu um marco nas políticas públicas para que a Amazônia alcance o desenvolvimento regional com sustentabilidade, visando construir uma produção sustentável, com inovação e competitividade, além de propor a gestão ambiental e o ordenamento territorial, com inclusão social e cidadania. Essa é mais uma tentativa de efetivação de propostas de sustentabilidade, mas para que de fato seja realizada é necessário compatibilizar a expansão da infraestrutura com o uso dos recursos naturais e o bem-estar da população regional. O Amapá é considerado um estado em processo de desenvolvimento econômico com base na utilização de recursos da biodiversidade, em especial os recursos hídricos e minerais. Entretanto, a crescente instalação de hidrelétricas e empresas de mineração na região até o momento não tem apresentado melhorias da qualidade de vida da população, acentuando as desigualdades sociais e os problemas ambientais oriundos desses investimentos. A economia verde foi um dos assuntos discutidos durante o Fórum UEAP Rumo à Rio +20, onde se percebeu que apesar de vivermos em um mundo capitalista, há necessidade de priorizar as questões ambientais, com distribuição de renda, medidas de combate ao desmatamento e conservação dos ecossistemas para as gerações futuras. Entretanto, é perceptível a contraposição entre as questões sociais e ambientais e o sistema capitalista que está mais preocupado com o lucro. Portanto, antes de falar em economia verde é necessário deixar claro que a natureza tem limites e precisa ser preservada e mantida para o bem-estar da humanidade. Com base nas problemáticas ambientais presentes no Estado do Amapá e as políticas de economia verde, a UEAP propõe que nesta Conferência das Nações Unidas, a Amazônia não seja vista apenas como uma reserva de extração de recursos naturais. Deve-se considerar também que o Amapá é um dos estados da federação com grande potencial de biodiversidade, isso se deve ao vasto território inserido na área da maior floresta tropical do mundo, a Amazônia. Utilizar as riquezas ambientais do Amapá de forma consciente e ecológica não só é inteligente como oportuno, pois o futuro perpassa pela utilização racional de recursos naturais. Pensando nisso, a UEAP destaca como fatores potenciais: a diversidade de produtos florestais, ambientes naturais para manejo
integrado de produtos economicamente viáveis para aproveitamento e comercialização e a efetivação de políticas públicas com o envolvimento das populações tradicionais e os setores tomadores de decisões. Nesta perspectiva, o incentivo às cadeias produtivas de manejo e venda de produtos locais pode gerar novas ocupações e rendas alternativas, possibilitando melhorias na qualidade de vida da população local. Logo, parte representativa do recurso e financiamento do capital estadual deve ser revertida na criação de cooperativas que viabilizem a produção de produtos madeireiros e não-madeireiros derivados da floresta. Assim, para que a economia verde seja realmente sustentável é necessária a criação de uma agenda intersetorial para o uso racional dos recursos naturais, incentivo à agricultura familiar, disponibilidade de linhas de crédito, maior financiamento da ciência e tecnologia e valorização dos arranjos produtivos locais. Além disso, é imprescindível a efetivação de políticas públicas que considerem os aspectos políticos, econômicos, sociais e ambientais, uma vez que as populações amazônicas, em sua maioria, não têm acesso à educação, saúde, transporte, serviços e infraestrutura que possibilitem condições mínimas de sobrevivência, pois vivem basicamente dos recursos naturais e muitas dessas comunidades acabam recebendo apenas os problemas ambientais gerados pelas empresas que aqui se instalam. Além disso, o Estado conta com uma gama de belezas cênicas naturais incomparáveis que podem ser utilizadas para o ecoturismo, o que garantiria alternativas de renda ao caboclo amazônida. Atrelado a isso, temos o etnoconhecimento dos recursos naturais, como, por exemplo, o conhecimento sobre o manejo de cipós por populações tradicionais e locais e o uso de plantas medicinais utilizadas para sanar as deficiências do Estado no atendimento à saúde, consideradas de grande importância para os avanços da medicina, principalmente como produtos fitoterápicos. Por outro lado, não se pode deixar de enfatizar as áreas de preservações permanentes existentes no Amapá, que possui mais de 72% de seu território em áreas de preservação, a exemplo do Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, que se localiza às margens do maior rio do mundo em extensão e volume de água, e atrelado a isso uma diversidade de bacias hidrográficas em torno de todo o Estado. Apesar de todas estas vantagens, o Amapá apresenta algumas problemáticas que envolvem o desenvolvimento e a garantia da geração de emprego e renda na região, dentre as quais se destaca a não efetivação de políticas educacionais nos currículos escolares das populações amazônicas. Diante do exposto, percebe-se a necessidade que se estabeleça no Amapá a efetivação de políticas públicas de incentivo econômico sustentável, bem como a fiscalização eficaz da biopirataria. Providências como essas são fundamentais para o desenvolvimento local de forma equilibrada. O novo código florestal, na forma como foi aprovado no Congresso Nacional, se implementado, afeta diretamente o estado do Amapá, uma vez que propõe a redução da área de Reserva Legal nas propriedades rurais da Amazônia – hoje fixada em 80% – para até 50%, quando o Estado tiver Zoneamento Ecológico-Econômico aprovado e mais de 65% do seu território ocupado por unidades de conservação de domínio público, devidamente regularizadas, e terras indígenas homologadas, representando, dessa forma, uma punição ao Amapá, que foi um dos pioneiros em implementar uma política de sustentabilidade do uso dos seus recursos naturais. Em toda a Federação, apenas o Amapá se encontra nesta condição, o que significa que o novo código florestal fere a Constituição Federal Brasileira, que garante a isonomia entre os estados da federação, colocando em risco as florestas, rios e toda a nossa sociobiodiversidade, o que agravará ainda mais os problemas socioambientais amapaenses. Considerando que vivemos em um dos maiores biomas do planeta, na maior bacia hidrográfica do mundo, com reservas naturais de água potável e com uma das mais espetaculares fauna e flora existentes no mundo, não podemos admitir o uso deste patrimônio como se fosse algo inesgotável. Neste sentido, a UEAP tem um papel fundamental na formação de profissionais preocupados com o meio em que vivemos, e deverá contribuir para dialogar com o conhecimento local, mediando as relações ambientais, tendo a sustentabilidade como um dos pilares para o ensino, a pesquisa e a extensão, assumindo o compromisso de promover uma educação voltada para a cidadania e ética ambiental.
Portanto, o desafio que se impõe à UEAP no mundo da sustentabilidade e da necessidade de uma nova ética ambiental, é o de procurar ser elemento articulador da indissociabilidade entre a teoria-prática e universidade-sociedade, buscando construir a teoria da reciprocidade, integração do pensar, fazer e viver a partir do rompimento da dimensão dicotômica, dualista e fragmentada que tem sido implementada no cotidiano Universitário. Assim, a grande tarefa da UEAP e da Sociedade Amapaense é a de procurar mudar o sistema de valores que está por traz da economia global, de modo que passe a respeitar a dignidade humana e atenda às exigências da sustentabilidade Amazônica. Essa nova perspectiva que se forma, de Universidade Sustentável, não pode permitir que se abra mão da identidade histórica, como instituição produtora de conhecimentos, sendo fundamental na Conferência RIO+20 a formulação de novas abordagens teóricas focadas no respeito aos valores da dignidade humana, que atenda aos interesses e necessidades de castanheiros, seringueiros, ribeirinhos, pescadores, agricultores familiares, extrativistas, artesãos, ilhéus, construtores navais, parteiras tradicionais, indígenas e demais povos da Amazônia que estão excluídos, caso contrário, a Universidade corre o risco de tornarse passiva diante dos constantes desafios de produzir conhecimentos voltados às nossas necessidades socioambientais. A UEAP reafirma o compromisso de se comportar de maneira a não reproduzir as práticas insustentáveis vigentes na sociedade e procurar definir conceitos, procedimentos e atitudes que busquem construir uma comunidade e economia sustentáveis e contribuir para que a mudança de valores detenha e reverta os estragos que foram causados ao planeta e à espécie humana. O papel da universidade é despertar nos acadêmicos a reflexão necessária para a compreensão da configuração da sociedade vigente, de forma que o conhecimento não possa ser fragmentado, mas multi, inter e transdisciplinar para a compreensão das relações sociais estabelecidas no contexto atual. Macapá (AP), 25/05/2012.
A Guiana Francesa rumo a Rio+20 «Os caminhos do Desenvolvimento Sustentável do Território» Nota síntese para a Carta do Amapá Rumo a Rio+20 em contribuição aos estados da Amazônia
A Região da Guiana Francesa, sempre afirmando a dupla identidade européia e amazônica, compartilha com os 9 estados brasileiros da Amazônia caracteristicas comuns e o mesmo destino, e vem apresentar sua proposições ao esforço empreendido pelo Amapá para levar sua mensagem aos setores responsáveis por assegurar o desenvolvimento econômico e social sustentável de nosso planeta durante a “Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – CNUDS”. Destaca que dispõe no seu território do Centro Espacial Guianense (CSG) que consegue integrar as atividades espaciais dentro de áreas de conservação dos biotipos (habitats) naturais para sua preservação, e neste contexto se posiciona apoiada em três (03) pilares: o desenvolvimento sustentavél, a atividade espacial e a biodiversidade. Entende assim que deve assumir plenamente o papel de «vitrine do desenvolvimento sustentavél na Amazônia através do setor espacial». A Região da Guiana Francesa escolheu inscrever a sua politica de desenvolvimento dentro da sustentabilidade através de uma «economia endógena», que trata concretamente de desenvolver as profissões ligadas com exploração de recursos naturais e as pontecialidades dos territórios. Entende que as atuais disposições das áreas protegidas como «fronteiras dos estados» num cenário onde os rios são canais de comunicação, são ineficientes como «fronteiras», e trazem para a comunidade regional uma profunda reflexão sobre as políticas de proteção integral normalmente adotadas. Quando excluem as atividades endógenas extrativistas, deixam livres as atividades ilegais sobre importante partes do território, especialmente dos recursos auríferos. No que se refere as cidades, propõe o desenvolvimento econômico e social solidário, apoiando-se nos avanços sociais e no saber-fazer comunitários , e entende que a criação de «aglomerados comunitários» poderá conter o crescimento urbano dentro do limite razoavél para evitar a saturação fundiária, o que é prejudicial para a estabilidade dos equilíbrios entre a natureza e o homem dentro destes frágeis ambientes. Essa vontade é confirmada pela politica atual de manter a natureza dentro da cidade, notadamente com pequenos espaços florestais, intra e peri-urbanos, ao redor das colinas e da valorização dos sitios naturais. Por fim afirma que a estratégia global de planejamento do espaço guianense, com a criação de novas atividades e da especialização das atividades regionais, deve estar integrada numa dinamica em que todos os territórios tem caracteristicas e destinos comuns. Para a comunidade regional, temos que passar «das politicas de espaços protegidos» ao «desenvolvimento endógenos dos territórios». Isso traduz a necessidade da Amazônia Guianense adaptar a visão global às especificidades locais das comunidades que compõe este espaço, levando em consideração as potencialidades dos territórios, resultando na vontade de «especialização dos territórios» para o desenvolvimento econômico endógeno e sustentável.