Introdução Por que as táticas são importantes?
Estratégia, por outro lado, é a compreensão do que você (e o seu oponente) está tentando fazer a médio e a longo prazo. Ela envolve tais elementos como o planejamento e a compreensão da estrutura de peões e um entendimento das casas fortes e das casas fracas. Quando se pensa estrategicamente, não se considera necessariamente lances individuais. Você está pensando mais em termos de: “meu adversário tem um ponto fraco em f7, mas eu não posso atacá-la diretamente. Portanto, vou avançar meu peão até b4, depois b5 e depois capturar o peão dele em c6. Ele vai recuperar a casa com ... bxc6, mas aí eu vou abrir a coluna b para a minha torre até b7, onde ela vai pressionar a casa f7”.
Falando de modo geral (e, admito, isso se trata de uma simplificação um tanto brutal), o xadrez pode ser dividido em táticas e estratégia. Táticas são a luta, o mano a mano. São as coisas que os jogadores estão tentando resolver quando dizem: “se eu jogar aqui e ele lá... e aí eu capturo esse peão... aí, o que ele vai fazer... etc”.
Em um nível avançado, é possível que q ue partidas se decidam porque um jogador tem uma melhor compreensão estratégica de certa posição do que o seu adversário. Só que isso num nível muito avançado. Em níveis menos avançados, partidas são vencidas e perdidas – quase exclusivamente – por razões táticas. Um jogador não vê algo que o outro vê. Bum! – lá se vai uma peça, e com ela a partida.
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Aprendendo táticas Quando jogadores casuais jogam, quase 100% das partidas são decididas taticamente. Em um nível intermediário, a média que eu sugeriria é que 90-95% das partidas são decididas primariamente por razões táticas. É preciso chegar a níveis nacionais ou mesmo internacionais para que os jogadores sejam capazes de derrotar um ao outro de um ponto de vista estratégico. Ser bom em táticas é absolutamente fundamental para jogar um bom jogo de xadrez. Se você quer aprender a tocar piano, precisa conhecer as escalas; se quer aprender a jogar tênis, precisa conseguir rebater a bola por cima da rede consistentemente; se quer aprender outra língua, deve entender o vocabulário e a gramática básicos. Se quer aprender a jogar xadrez – tem que entender de táticas. É simples assim. Alguns jogadores realmente ficam muito bons e podem conseguir pontuações que os coloquem talvez entre os 1.000 melhores jogadores do mundo, sem nenhum conhecimento dos detalhes estratégicos do jogo. Como isso é possível? Eles são muito bons com táticas. Por outro lado, jogadores que têm grande compreensão estratégica, mas habilidades táticas ruins, jamais chegarão a esse nível. Grande visão estratégica não conta muito se você vive perdendo suas peças.
Para o propósito deste livro, vou fazer uma hipótese que pode ser bem ampla. Vou supor que você gostaria de ler um material que o ajudasse a imediatamente melhorar sua habilidade atual de jogar xadrez, em vez de aprimorar seu conhecimento teórico do jogo. Assim sendo, vamos nos concentrar puramente em táticas. Como explicado anteriormente, nos estágios iniciais de sua carreira de enxadrista, toda partida que você jogar será decidida quase exclusivamente pelas táticas. Portanto, vamos tentar entender algumas ideias táticas básicas para que você possa identi ficar o que o seu adversário está tentando fazer e, por sua vez, aproveitar as chances táticas que lhe são oferecidas. Uma grande parte da habilidade no xadrez (e especialmente no xadrez tático) se baseia no reconhecimento de padrões. Certas estruturas, temas e justaposições especí ficas de peças ocorrem repetidas vezes. Os jogadores ficam bons em táticas porque se familiarizam com esses padrões. Eles conseguem, portanto, olhar para uma posição e imediatamente saber que tipo de coisa deveriam fazer. Vejamos como tudo isso funciona na teoria e na prática.
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Reconhecimento de padrões Qual o próximo item da seguinte sequência?
E que tal esta aqui?
A, B, C, D, E, ?, ?, ?
H, He, Li, Be, ?, ?, ?
Não se trata de um “pega-ratão”, então espero que não tenha sido muito difícil. Vamos tentar outra...
Essa pode não ser tão fácil. Se você sabe a resposta, é porque você provavelmente se interessa por química. As primeiras letras correspondem a hidrogênio, hélio, lítio e berílio.
Rei, Dama, Torre, Bispo, ???, ??? Nota 10 se você optou por Cavalo e Peão, as duas peças faltantes. Contudo, você quase com certeza sabe como jogar xadrez, então isso não deve ter lhe causado muitas dificuldades também.
As próximas três letras são B, C e N, representando bromo, carbono e nitrogênio. Alguém com um bom conhecimento de química identificaria isso imediatamente, e o motivo é óbvio – esses são os primeiros sete elementos da tabela periódica – e esse é um padrão bem conhecido de qualquer um que esteja familiarizado com química. Algumas vezes podemos ser surpreendidos pelo quão fácil pode ser reconhecer padrões familiares – o cérebro humano é muito bom nisso. Eis aqui outro exemplo. O que está escrito?
VER PADRÕES É FÁCIL Apesar de metade da frase estar obscurecida, a maioria das pessoas lê isso com facilidade.
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Padrões no xadrez Grande parte da habilidade no xadrez se baseia no reconhecimento de padrões. Certas estruturas, temas e justaposições especí ficas de peças ocorrem repetidas vezes. Os jogadores ficam bons em táticas porque se familiarizam com esses padrões.
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Existe um experimento famoso. Um jogador experiente de xadrez e um iniciante veem o tabuleiro 1 por um período bem curto de tempo. Digamos que de 2 a 3 segundos. A seguir, eles precisam reconstruir a posição. O jogador experiente quase com certeza irá acertar 100% da posição. Se cometer algum erro, será algo menor, como colocar a torre branca em f1, em vez de e1. O iniciante, contudo, vai ter problemas para acertar o lugar de mais do que algumas peças.
No entanto, quando o tabuleiro 2 é mostrado de maneira similar, então a discrepância de habilidade para recordar a posição é muito menor. O jogador experiente provavelmente se sairá um pouco melhor, mas a diferença entre eles provavelmente será pequena.
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O motivo disso é que a posição no tabuleiro 1 é uma situação bem típica do jogo, e o jogador experiente não precisa se preocupar em lembrar onde fica cada peça especificamente. Basta olhar para perceber que ambos os lados rocaram, as Brancas fizeram um fianchetto com o bispo e todas as peças estão em casas bastante naturais. As Brancas estão pressionando o centro das Pretas com o peão em c , e todos os peões na ala da dama preta estão em casas brancas. Essa informação provavelmente será o bastante para reconstruir a posição. A posição no tabuleiro 2, contudo, não tem quase nada a ver com xadrez. Para início de conversa, é ilegal, já que há peões na fileira de trás, os reis estão adjacentes e as Brancas têm dois bispos em casas pretas. É quase como se alguém tivesse jogado algumas peças aleatoriamente no tabuleiro. Quase não há padrões que o jogador experiente possa reconhecer (torres geralmente se dão apoio, então a configuração de torres brancas em h4 e h6 e de torres pretas em c5 e c6 já é algo, mas não há muito mais do que isso). Reconhecimento de padrões é fundamental para o jogador experiente, mas isso não está presente aqui.
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Torre e cavalo Exemplo 1
Caso você precise de mais provas acerca da importância do reconhecimento de padrões, então considere o seguinte. Sabe-se bem que a torre e o cavalo são uma combinação muito poderosa quando se aproximam do rei adversário. As posições à direita mostram o quão eficiente essa configuração em particular pode ser. As duas primeiras são bem simples, ao passo que as outras duas apresentam mais algumas peças. Contudo, em todos os casos está claro que a torre e o cavalo podem dar cabo de um rei praticamente sozinhas. Todos o bons jogadores de xadrez estão familiarizados com esse tema, e esse fato lhes permite encontrar combinações como as seguintes – todas ocorreram em jogos de mestres.
As Brancas veem que o seu cavalo está muito próximo do rei preto e querem mandar a torre para ajudar. Essa ideia naturalmente leva a: 1 Dh6+! Rxh6 2 Th5+ Rg7 3 Th7 mate.
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Exemplo 2
Exemplo 3
Exemplo 4
As Pretas concluem seu ataque com um belo sacrifício da dama para abrir linhas pelas quais a torre e o cavalo possam se combinar:
O rei preto está sem espaço, e a torre branca já está muito próxima. Tudo de que precisamos é fazer o cavalo trabalhar...
1 ... Dxf2! 2 Txf2 Cg3+ 3 Rxh2 Th6+ 4 Rg1 Th1 mate.
1 Dxd7+! Cxd7 2 Ce6 mate.
De novo, o rei preto está com pouco espaço, e as torres e o cavalo brancos pairam ameaçadoramente. A chave é tirar o cavalo preto em f7 do caminho. 1 Tg5+! Cxg5 2 Tg7 mate.
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Agora veja a seguinte posição.
Eis aqui uma posição que ocorreu no Campeonato Mundial, na partida entre Tigran Petrosian (jogando com as Brancas) e Boris Spassky (jogando com as Pretas), em 1966.
Petrosian encontrou uma bela tática para acabar com a partida: 1 Bxf7+ Txf7 2 Dh8+! Rxh8 3 Cxf7+ e 4 Cxg5
deixando as Brancas com uma peça a mais. Essa não é uma ideia tática “padrão” no mesmo sentido em que as combinações entre torre e cavalo são. Mesmo assim, é uma bela ideia e, como foi usada em uma partida famosa do Campeonato Mundial, tornou-se muito conhecida.
Essa posição ocorreu muito recentemente, na partida Viswanathan Anand – Peter Leko, em Nice, 2009. Você consegue ver o que vem a seguir? Anand (que sem dúvida tem a posição de Petrosian – Spassky alojada em sua coleção mental de ideias táticas) acabou com: 1 Bxf7+! Txf7 2 Dh8+! Rxh8 3 Cxf7+
com uma vantagem material vencedora.
Quanto mais padrões você souber, melhor.
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Nossa posição final surgiu em uma partida importante, também jogada no Campeonato Mundial, entre Alexander Alekhine e Max Euwe. Essa partida foi jogada em 1937.
Alekhine deveria ter jogado 1 Dh8+! Rxh8 2 Cxf7+ e 3 Cxe5
Aqui, Alekhine usou a calma 1 a3. Apesar de as Brancas terem um peão a mais, as Pretas estão bem ativas. Alekhine não conseguiu vencer, e a partida terminou em empate após mais 38 lances. Você pode melhorar o jogo de um dos maiores enxadristas de todos os tempos?
quando ele tem então dois peões a mais.
Contudo, é interessante notar que essa partida foi jogada antes da partida entre Petrosian – Spassky, quando a ideia de sacrificar uma dama em h8 para dar um garfo com o cavalo ficou estabelecida. Se essa partida tivesse sido jogada antes e já fosse famosa em 1937, então esse tema tático teria sido familiar a Alekhine e seria praticamente inconcebível que ele não o tivesse visto. Dito isso, Alekhine foi um dos melhores táticos que já existiram, então ainda assim é surpreendente que ele tenha deixado de ver essa simples chance.