Resumo de GOVERNANÇA SEM GOVERNO: Ordem e transformação na política mundial James N. Rosenau e Ernst-Otto Czempiel CAPÍTULO 3: OS PILARES EM RUÍNA DO TEMPLO DE VESTIFÁLIA: IMPLICAÇÕES PARA A GOVERNANÇA E A ORDEM INTERNACIONAL Mark W. Zacher O autor se propõe a analisar o enfraquecimento dos chamados pilares que sustentavam o “sistema de Vestifália” até o início do século XX, momento anterior à ocorrência da Primeira e Segunda Guerras Mundiais. Acredita que os estudiosos das Relações Internacionais tendem ao ceticismo e conservadorismo na análise da política internacional, o que diminui assim a possibilidade de abrangência na aplicação e mesmo criação de novas teorias capazes de explicar as mudanças vivadas por todo o sistema de Estados. Ressalta que em sua visão há atualmente “um sistema de Estados sujeitos à governança internacional mínima e que recorrem à guerra regularmente para atingir uma variedade var iedade de objetivos”. O fim da Primeira Guerra Mundial representou, para alguns autores/políticos “a guerra para p ara pôr fim a todas as guerras”. No entanto, hoje há razões para pensar que efetivamente ocorreram mudanças significativas nos regimes e no crescimento da cooperação internacional - em consequentemente, na força que tem a governança no sistema internacional. É só após a Segunda Guerra Mundial, todavia, que o mundo se viu em meio à uma “ordem” (conjunto de regime e regras aplicáveis ao sistema internacional). O autor ressalta em um ponto mínimo do texto o que exatamente foi a Paz de Vestifália: O sistema internacional clássico, nascido do Tratado de Vestifália,de 1648, reconheceu o Estado como poder supremo ou soberano dentro de suas fronteiras. Pautava-se em princípios como o respeito mútuo dos Estados pela sua soberania, a não intervenção nos assuntos internos, o consentimento como base da obrigação de cumprir leis internacional e a imunidade diplomática. “É importante observar que como forma de revisão territorial a guerra tem sido aceita, e já foi freqüente.” Zacher percebe que na melhor das hipótese o qu e o sistema procurou fazer nada mais foi que manter a existências dos outros Estados frente ao domínio de qualquer Estado em singular, mediante o funcionamento de um sistema FLEXÍVEL DE EQUILÍBRIO DE PODER ou de um grande concerto de poderes. O autor prefere prefere a visão de “sociedade anárquica”(Hedley Bull) à noção de anarquia (Waltz), pois acredita que na verdade os Estados tinham muita mobilidade pela falta de um verdadeira ordem capaz de controlá-los controlá-los na forma de leis internacionais. “Não só os Estados eram soberanos como guardava um alto nível de autonomia na sua conduta, estando livres do grande número de regimes internacionais hoje existentes; particularmente um sistema que restringisse sua capacidade de usar força.” Atualmente o que se percebe é que os Estados ainda detém essa autonomia em relação relaç ão às decisões majoritárias do sistema, entretanto é impossível não falar que os atores internacionais se encontram cada vez mais entranhados em um rede de interdependência e de arranjos regulatórios ou de colaboração, do qual geralmente não podem se livrar. Basicamente
não é mais correto conceitualizar os Estados como se tivessem o graude autonomia que tradicionalmente lhes é atribuído, devido à rede de regimes formais e informações em que se encontram crescentemente envolvidos. O ponto central do texto é compreender quais as condições que sustentavam as duas características fundamentais de Vestifália: a obrigatoriedade de respeito mútuo pela soberania e a forma principal de conduta representada por um alto grau de autonomia do Estados nos assuntos internos e externos. Ele pontua exatos 6 PILARES DE SUSTENAÇÃO DA SISTEMA DE VESTIFÁLIA: 1. O custo/benefício da guerra 2. As externalidades físicas internacionais 3. A interdependência econômica internacional 4. Os fluxos de informação 5. A difusão da democracia 6. A heterogeneidade cultural e social OBSERVAÇÃO: o autor alarma sobre a importância da tecnologia (desenvolvimento e alcance) como um dos grandes “culpados” das mudanças destes pilares, sendo eles substancialmente produtos da revolução tecnológica do século XX. “A primeira breve seção do capítulo proporciona algumas introduções sobre o aumento da colaboração internacional e algumas observações feitas pelos estudiosos das tendências atuais. A seção seguinte, com suas seis subseções, examina a decadência que tem havido nos seis pilares do sistema de Vestifália de Estados altamente autônomos, analisando como e por que essa decadência estimula e pode promover uma maior colaboração, ou seja, regimes mais fortes. A conclusão do estudo faz breves comentários sobre várias tendências observadas.” *Alguns dados e comentários sobre o crescimento da colaboração internacional Baseadoem dados estatísticos, o autor demonstra o crescimento do alcance e influência das OI no meio internacional: Em 1909, havia 37 OI baseadas em convenções e 176 de caráter não governamental; em 1986, 337 e 4649. “Tal crescimento sugere que em uma vasta gama de temas os estadistas estão hoje mais desejosos de enfatizar a abordagem coletiva, em vez da simplesmente unilateral.” Conclui assim que o que está acontecendo no mundo não é o desaparecimento dos Estados como principais atores do sistema, mas sim sua aceitação do fato de que precisam trabalhar em conjunto para poder controlar uma variedade de interdependências. *Os pilares da autonomia do Estado no sistema de Vestifália 1. O custo/benefício da guerra Prevalecia na Europa, ainda com a criação do sistema de Vestifália a idéia de que a guerra, quando para o alcance de interesses nacionais, e desde que locais, seriam totalmente legítimas. Não havia ainda a percepção de uma interligação de ações entre cada um dos Estados que compõem o sistema internacional. Entretanto o século XX trouxe AS ARMAS NUCLEARES (é muito importante durante todo o texto!) e suas consequências desastrosas, o
que mudou a concepção de que as guerras chamadas locais não eram mais possíveis. A causa da mudança estrutural de um sistema antes isolacionista quando em se tratando de interesses internacionais, não foi é por conta da mera existência de armas nucleares, mas sim por sua “difusão”.”Muitos outros já notaram: o que é importante nas aramas nucleares não é o overkill, a natureza excessiva de sua capacidade de destruição, mas sim o mutualkill, a potencialidade de destruição mútua.” Atualmente, as armas nucleares representam sim um breakthrough, uma mudança intelectual crítica no estudo contemporâneo das RI. Um ator não pode usar essas armas no sentido clausewitziano de guerra...(esse cara é doidão e gosta de ver o circo pegar fogoooo) Não faz sentido afirmar que qualquer valor político justifica a auto-imolação nacional e provavelmente a destruição da civilização moderna. É nessa hora que autor deixa claro que WALTZ foi o único capaz de entender com clareza a mudança que as armas de poder nuclear criaram no sistema. Waltz diz que: “o resultado de uma guerra convencional entre potências nucleares poderá ser ainda pior do que a guerra que começa com o uso de armas nucleares, devido à utilização de armas nucleares pelo país derrotado, em um momento de desespero. Por isso, essas guerras são improváveis.” / “Embora a guerra continue a ser possível, as armas nucleares diminuem drasticamente a probabilidade de que seja feito pelos Estados que possuam essas armas, assim a guerra tornou-se cada vez mais privilégio dos Estados pobres e fracos!” Tanto na visão do autor quanto para Waltz, os países do terceiro mundo estão mais propensos ao uso nuclear para fins militares, seja pela falta de coesão política, econômica, religiosa, social e cultural. Por outro lado, por disporem de grande independência, as grandes potências também dissipam o controle da produção nuclear, afim de evitar de forma mais clara qualquer tipo de confronto real ou político, que possam abalar sua estabilidade econômica e seu acesso aos bens primáriosvindos dos terceiro-mundistas! Ele também alerta sobre o perigo TERRORISTA, e seu crescente alcance resultante do desenvolvimento de uma sociedade tecnológica mais conectada, porém mais frágil aos ataques em massa. Assim, há uma tendência natural ao aumento de cooperação internacional / policial que obejetiva combater de maneira mais ágil a ação terrorista. É uma verdadeira “era da segurança comum”. “Os realistas têm razão no modo como entendem a importância fundamental das preocupações como segurança em todos os aspectos das RI, mas equivocam-se na sua concepção de que os Estados não estariam dispostos a comprometer sua autonomia de modo significativo para evitar o extermínio de uma grande porcentagem da sua população.” 2. As externalidades físicas internacionais Essas externalidades têm a ver com determinadas atividades, dentro dos Estados, com efeitos colaterais negativos sobre a população de outros países. As mais sérias dentre elas resultam dos efeitos das atividades econômicas sobre a saúde e o bem-estar do povo de outros países, e de modo geral, podem ser classificadas como danos ambientais. Outro problema é a propagação de doenças através das fronteiras internacionais, devido à movimentação das pessoas. O aquecimento global é um inimigo comum, mas o prejuízo que causa a todos os Estados é
desigual, e o custo da solução é muito diferente para os países que se encontram em diferentes níveis de desenvolvimento. Os Estados deverão preocupar-se não apenas com o s efeitos ambiente e, portanto, econômicos, em seu próprio território, mas também com as preocupaçõespolíticas causadas pela falta de apoio a medidas relevantes de controle. Se o desenvolvimento de prejuízos ambientais, ultrapassando as fronteiras dos Estados, é externalidade internacional mais importante que poderia produzir uma cooperação significativa entre os países, a difusão de doenças, devido ao fluxo internacional de comercio e viajantes, também estimulam a cooperação internacional. Obs.: O exemplo da propagação de projetos de prevenção e tratamento da AIDS. 3. Interdependência econômica internacional O período posterior a 1945 testemunhou um aumento marcante tanto dos laços econômicos internacionais como da ordenação regulatória e cooperativa destina da a administrá-los. Um efeito desta tendência é o fato de que os Estados estão perdendo o seu grau de autonomia na condução da política econômica interna e internacional, devido tanto a intensidade das interdependências como ao desenvolvimento de regimes implícitos e explíc itos. O comercio internacional é a atividade que a maioria das pessoas associa a interdependência econômica. Importante destacar que um aspecto notável do aumento do comercio nas duas ultimas décadas é o fato de que ele ocorreu ao mesmo tempo em que os Estados violam, pelo menos em espírito, muitas regras e normas do GAAT. A interdependência progrediu nos mercados financeiros em um ritmo muito superior ao do setor real (comercial). Outra característica importante é o crescimento das empresas multinacionais. É possível que venha a ocorrer uma intervenção dessas tendências globais de hoje e um aumento da vinculação regional, em comparação a umainter-regional, mas se não houver guerras importantes não teremos quaisquer mudanças radicais. 4. Os fluxos de informação Dada a tendência do aumento da velocidade e do volume dos fluxos de informação é fácil concordar que o principal fator de perturbação da nossa época é a revolução nas comunicações. Os efeitos dessa revolução nas comunicações têm sido também cruciais para a expansão dos negócios internacionais, tendo como consequência uma maior estabilidade e inclinações para participar de acordos internacionais. A autonomia dos Estados e até mesmo a identidade política e cultural dos povos têm também sofrido impactos. 5. A difusão da democracia O crescimento das normas democráticas, em todo o mundo, fica evidente na medida em que os regimes autoritários sentem a necessidade de proteger-se com a retórica e com a forma constitucional da democracia. A importância da expansão da democracia para a expansão da ordem internacional baseia-se em certas condições: as democracias tendem a favorecer o capitalismo liberal, e por isso inclinam-se a apoiar os vínculos econômicos entre as nações; estão predispostas a apoiar o livre fluxo da informação o livre transito das pessoas através das fronteiras, provocando um certa homogeneização dos valores e dos costumes.
Indubitavelmente as responsabilidades crescentes dos Estados, ao garantir o bem-estar econômico e o caráter democrático de muitos deles, estão afetando a qualidade das interações internacionais; e essas mudanças, inspiradas por tra nsformações ocorridas no próprio Estado, provavelmente aumentarão no futuro. 6. Aheterogeneidade cultural e social Há diferenças culturais consideráveis entre os Estados, e essas variações são, de modo geral, maiores que as que existiam no século XVIII. A atual forma da globalização nada mais é que um processo de homogeneização cultural emanado dos centros do poder mundial, difundido pelos meios de divulgação de todo o mundo e sustentado pela convergência da maneira de pensar e das práticas entre as elites políticas e empresariais. O mundo ainda é tão heterogêneo que não seria cabível uma modalidade muito centralizada de governança entre as nações; ao mesmo tempo, está se tornando suficientemente homogêneo para que um nível mais elevado de coordenação se torne mais praticável. CONCLUSÃO No centro da transformação internacional em curso, está o fato que para as grandes potencias o custo da guerra se tornou tão grande, nesta era nuclear, que elas não só procuram evitar hostilidades entre si como cooperam, de várias formas, para evitar serem envolvidas inadvertidamente por um conflito armado. Poderá haver um movimento marcante em favor de vínculos e regimes nacionais, em oposição aos de caráter global, o que pode ser resultado da considerável tensão existente entre agrupamentos regionais. Mas é provável que continuem a existir redes fortes de regimes e interdependências globais, desde que a violência militar não volte a ser um traço importante na cena internacional. Os Estados ainda são os principais atores políticos nas relações internacionais e, na verdade, têm enorme importância na consolidação da ordem em progresso que examinamos anteriormente.