UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ - UEM PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS ECONÔMICAS - PCE DISCIPLINA: MACROECONOMIA: KEYNES DOCENTE: PROF. DR. JOAQUIM MIGUEL COUTO DISCENTE: SAMUEL COSTA PERES, 46235 Resenha do Capítulo 2 de A Teori Teori a Geral Geral do Empr ego, do do Jur o e da M oeda oeda (John M. Keynes, 1936) Neste capítulo, Keynes discute os postulados da Economia Clássica1. Segundo o autor, a teoria clássica do emprego fundamentou-se, basicamente, em dois postulados, a saber: I.
O salário é igual ao produto marginal do trabalho.
II.
A utilidade do salário, quando se emprega determinado d eterminado volume de trabalho, trabal ho, 2 é igual à desutilidade marginal desse mesmo volume de emprego.
A concordância de Keynes com a teoria clássica no emprego limita-se ao primeiro postulado. Esse primeiro postulado significa dizer diz er que o salário de uma pessoa pes soa empregada é igual ao valor que seria perdido se o emprego fosse diminuído em uma unidade, já deduzidos os custos dessa operação. Com efeito, essa igualdade pode ser afetada pela imperfeição da concorrência e dos mercados. A análise de Keynes sobre o primeiro postulado: Significa esse postulado que, em certo estado de organização, equipamento e técnica, os salários reais e o volume de produção (e, portanto, do emprego) são correlacionados de uma única forma, de tal modo que, em termos gerais, um aumento do emprego só pode ocorrer simultaneamente com um decréscimo da taxa de salários reais. Com isso, não estou contestando este fato fundamental que os economistas clássicos (corretamente) declararam inatacável. Em certo estado de organização, equipamento e técnica, em cada nível de salário real ganho por unidade de trabalho há uma única correlação (inversa) com o volume de emprego. (KEYNES, 1985, p. 24).
Em relação ao segundo postulado, este significa que o salário real de determinado empregado é exatamente suficiente (na opinião do próprio empregado) para gerar o volume de mão-de-obra efetivamente ocupado, com a restrição de que a igualdade para cada 1
. Mill, Marshall e Pigou, lembrando que para o autor os neoclássicos marginalistas marginalistas são tidos como clássicos também. 2 Segundo a definição de Keynes, o que se entende por desutilidade é qualquer motivo que induza um homem ou grupo de homens a recusar trabalho, em vez de aceitar um salário que para eles representa uma utilidade inferior a certo limite mínimo (1985, p. 18). Em suma, s uma, é o famoso trade off trabalho/lazer. trabalho/lazer. Keynes (1936) chama de “economistas clássicos” os seguidores de Ricardo, como, por exemplo, J. S
unidade individual de trabalho pode ser alterada por combinações entre as unidades disponíveis para empregar-se. Para Keynes, este postulado é compatível com o chamado desemprego “friccional”, oriundo de uma desproporção temporária dos recursos especializados ou da proporção de recursos não empregados entre um e outro trabalho (quando se está na fase de transição entre um e outro trabalho). Além disso, o autor considera esse segundo postulado válido para o denominado desemprego “voluntário”, proposto pelos clássicos, e que remete-se a
recusa ou a incapacidade de determinada unidade de mão-de-obra em aceitar uma remuneração equivalente à sua produtividade marginal, que pode decorrer de questões burocráticas e legislativas, costumes sociais, e até mesmo da obstinação humana. Portanto, conforme a teoria clássica, o primeiro postulado refere-se a curva de demanda por emprego, e o segundo, a curva de oferta de emprego. Diante disso, haveria somente quatro possibilidades de se aumentar o emprego: i)
Melhora organizacional ou da previsão, a fim de diminuir o desemprego friccional;
ii)
Reduzir a desutilidade marginal do trabalho, isto é, subitamente eleva-se o salário real, e a mão-de-obra que estava disponível (desemprego voluntário) passa a ofertar trabalho, diminuindo o desemprego voluntário;
iii)
Aumento da produtividade marginal física do trabalho, nas indústrias produtoras de bens de consumo de assalariados (conforme Pigou: bens de cujos preços depende a utilidade dos salários nominais), de modo que esse aumento da produtividade reduz o preço desses bens, implicando um aumento dos salários reais e queda do desemprego voluntário (lógica do item ii)
iv)
Aumento em relação aos preços dos bens de consumo de não assalariados comparativamente aos das outras categorias de bens e deslocamento das despesas dos indivíduos não assalariados dos bens salariais para os de outras categorias. Para Keynes, essas categorias não abrangem todo o problema, uma vez que, de
modo geral, a população raramente encontra tanto emprego quanto desejaria ao salário corrente. A falha da teoria clássica, para o autor, reside no segundo postulado. Keynes argumenta que as exigências da mão de obra tendem a um mínimo de salário nominal e não a um mínimo de salário real, como os clássicos pensavam. Para ele,
lógica ou ilógica, a experiência ensina que os trabalhadores, na prática, resistem, normalmente, a aceitar uma queda nos salários nominais, mas não abandonam o trabalho ao se verificar uma redução do poder de compra (queda dos salários reais). Além disso, não é verdade (como se verificou após a crise de 29) que o desemprego em um período de depressão se deve à recusa da mão de obra em aceitar uma diminuição dos salários nominais, ou de uma insistência em se conseguir um salário real superior ao permitido pela produtividade da economia. Amplas são as flutuações no nível de emprego, sem que haja nenhuma alteração nos salários reais mínimos exigidos pelo trabalhador ou em sua produtividade. Respaldado por uma análise estatística sobre as relações entre as mudanças nos salários nominais e reais, Keynes observa que, na realidade, no caso de uma variação no nível geral dos salários, a elevação nos salários nominais provoca queda nos salários reais e vice-versa, diminuindo o emprego. Ainda, supondo que o salário real esteja abaixo do qual não se contaria com mais mão-de-obra do que a já empregada, então, nenhum outro desemprego involuntário existiria além do “friccional”. Entretanto, argumenta Keynes,
seria absurdo imaginar que seja sempre assim, pois normalmente há uma quantidade de mão-de-obra superior à já empregada ao salário nominal vigente, mesmo quando se verifica uma queda no salário real. “Sendo isso verdadeiro, os bens de consumo de assalariados
equivalentes ao salário nominal vigente não representam a verdadeira medida da desutilidade marginal do trabalho e o segundo postulado deixa de ter validez” (KEYNES, 1985, p. 21). Além disso, “supor o contrário seria admitir que as pessoas no momento desempregadas, embora desejosas de trabalhar ao salário corrente, deixariam de oferecer os seus serviços no caso de uma pequena elevação do custo de vida” (KEYNES, 1985, p. 22).
No entanto, existe, para o autor, uma objeção capital, relacionada à ideia de que os salários reais dependem das negociações salariais entre trabalhadores e empresários. Ao supor que as negociações sobre salários determinam o salário real, a escola clássica descambou para uma hipótese arbitrária, pois os trabalhadores, em conjunto, não dispõem de nenhum meio de fazer coincidir o equivalente do nível geral de salários nominais expresso em bens de consumo com a desutilidade marginal do volume de emprego existente. Provavelmente não existe nenhum expediente por meio do qual a mão-de-obra, em conjunto, possa reduzir os seus salários reais a uma cifra determinada, revisando as cláusulas monetárias dos acordos celebrados com os empregadores (KEYNES, 1985, p. 22).
Na visão do autor, a competição em torno dos salários nominais influi, principalmente, sobre a distribuição do salário real agregado entre os diferentes grupos de trabalhadores e não sobre o montante médio por unidade de emprego, o qual depende de outros fatores. Assim, o resultado da união de um grupo de trabalhadores é a proteção de seu salário real relativo, mas o nível geral dos salários reais depende de outras forças do sistema econômico. Ora, isso significa que uma queda generalizada dos salários reais não aumentaria o nível de emprego; logo, a existência de pessoas que aceitariam trabalhar pelo salário atualmente pago não pode ser explicada pela rigidez causada pelos sindicatos; portanto, há outra categoria de desemprego, o desemprego “involuntário”. Nesse contexto, Keynes define o desemprego “involuntário”, não considerado pela teoria clássica (o autor cita que o Professor Pigou admite o desemprego involuntário mas não usa-o em seu argumento para simplificação), uma vez que a igualdade entre o salário real e a desutilidade marginal do emprego, presumida pelo segundo postulado, implica ausência do desemprego “involuntário”.
Existem desempregados involuntários quando, no caso de uma ligeira elevação dos preços dos bens de consumo de assalariados relativamente aos salários nominais, tanto a oferta agregada de mão-de-obra disposta a trabalhar pelo salário nominal corrente quanto a procura agregada da mesma ao dito salário são maiores que o volume de emprego existente (KEYNES, 1985, p. 23).
Refutado o segundo postulado (a curva de oferta de trabalho), o equilíbrio do mercado de trabalho fica indeterminado, o que resulta na indeterminação do produto no modelo clássico. Como solução, Keynes inverte o sentido da determinação emprego produto, afirmando que é o nível do produto que, por meio da função de oferta agregada, determina o nível de emprego. Mas então, o que explica a determinação do produto? (BIELSCHOWSKI; CUSTÓDIO, 2011). A partir daí, Keynes inicia uma crítica a Lei de Say3, a qual afirma que a oferta cria sua própria demanda, e, portanto, que o total dos custos de produção deve ser gasto totalmente, de forma direta ou indireta, na compra do produto. Com isso, a Lei de Say confunde a identidade contábil entre o valor da produção e a renda nacional com o erro teórico de que toda a renda é gasta na compra do valor da 3
Uma boa definição desta doutrina encontra-se na obra de J. S. Mill, Principles of Political Economy. Livro Terceiro, cap. XIV.
produção. Além disso, a Lei de Say confunde a identidade contábil entre investimento e poupança com o erro teórico de que a poupança determina o investimento (BIELSCHOWSKI; CUSTÓDIO, 2011). Keynes argumenta que como consequência desta verdade assumida, “qualquer ato individual de abstenção de consumir leva e equivale a um investimento na produção de riqueza sob a forma de capital resultante do trabalho e das mercadorias assim liberadas da necessidade de consumo" (KEYNES, 1985, p. 25-26). Este ponto de vista dos clássicos pode ser ilustrado por uma citação, contida em Keynes (1985, p. 26) da obra Pure Theory of Domestic Values de Marshall.
Para Keynes, os que assim pensam foram vítimas de uma ilusão de ótica. A ideia de que o ato de poupança individual conduz inevitavelmente a um ato paralelo de investimento é incorreta, pois, argumenta o autor, não há uma relação simples entre as decisões de abster-se de um consumo imediato e as decisões de prover a um consumo futuro, isto é, as familias podem poupar parte da poupança com outros objetivos que não seja o consumo próximo. Na realidade, como exposto por Keynes nos capítulos posteriores da Teoria Geral, são as decisões de gasto em consumo e investimento que determinam a renda, e este processo cria uma poupança (que pode ser igual ao investimento) como um resíduo, não o contrário. É a partir dessa análise, então, que Keynes formula o “Princípio da Demanda Efetiva” (cap. 3), afirmando ser essa demanda efetiva que determina o volume de produção
(a oferta agregada que os empresários decidem produzir) e, assim, o volume de emprego.
Referências BIELSCHOWSKI, P; CUSTÓDIO, M. Keynes: a crítica ao modelo clássico e a criação da Macroeconomia. Revista Eletrônica Novo Enfoque, v. 13, n. 13, p. 62 – 71, 2011. MIRANDA, L. Os postulados (neo)clássicos do emprego e a determinação dos salários em Keynes. Revista de Economia Política, vol. 11, n. 4 (44), out-dez/1991. KEYNES, J. M. A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda; Inflação e Deflação. 2ª ed. Nova Cultural: São Paulo, 1985.