A REPRESENTAÇÃO DO ÍNDIO EM TERREIROS DE SÃO LUÍS-MA Mundicarmo Mundicarmo Ferretti Pesquisa em Foco, São Luís, v. 5, n. 5, p. 47-57, 1997.
A REPRESENTAÇÃO DO ÍNDIO EM TERREIROS DE SÃO LUÍS-MA 1 Mundicarmo M. R. Ferretti
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RESUMO: Análise da representação do índio em terreiros de Mina da capital maranhense. Mostra que, no Tambor de Mina, as entidades espirituais indígenas são “acabocladas mas que elas podem ser recebidas como “sel!agens, “sel!agens, no Tambor Tambor de "ndio, #orá ou $an%er&, reali'ados em terreiros que t&m linhas de Mina e de $ura ()a%elança*. $hama a atenção que, naqueles rituais, elas são associadas a santos cat+licos e in!ocadas para combater “orças negati!as. 1. INTRODUÇÃO -os terreiros da capital maranhense, especialmente nos que se deinem como Mina, as entidades espirituais caboclas raramente são caracteri'adas como índio (ao contrário do que acontece com os de outras maniestaçes religiosas aro/brasileiras*. aro/brasileiras*. 0, embora muitas tenham alguma ligação mitol+gica com índio e possam aparecer em alguns rituais como índio, insiste/se em airmar a dierença entre índios e caboclos. A partir partir de 1234 1234 tem sido reali reali'ad 'ado o anual anualmen mente, te, em algun algunss terrei terreiros ros de Mina Mina da capita capitall maranhense, um ritual denominado Tambor de "ndio ou #orá, para as entidades espirituais indígenas. -esse ritual, que geralmente acontece em tr&s noites consecuti!as, antecedidas e sucedidas por um toque de Mina para caboclo, “para mudança de corrente, as entidades indígenas maniestam/se com suas características características especiais. Ti!emos oportunidade de ou!ir um relato do ritual original entre!istando 0l'ita, mãe/de/santo mãe/de/santo que oi guia (mãe pequena* no Terreiro Terreiro de 5enhora 5antana (de 6enira Ferreira de 7esus, %á alecida*, onde ele surgiu, e que reali'a atualmente este ritual em sua casa. 8u!imos a descrição do Tambor de "ndio no terreiro de Maria'inha, tamb9m alecida (tal!e' o segundo a reali'ar aquele ritual*, eita por um de seus ilhos, e i'emos quator'e obser!açes de #orá em quatro te rreiros de 5ão :uís; na $asa Fanti/Ashanti em 12<= (>* e 12<> (>*? no Terreiro F9 em 6eus em 12<> (1*, 12<4 (1*, 122= (=* e 1223 (1*? no Terreiro Terreiro de Rem9dios em 1221 (1*? e em 122= no do inado 7os9 7oão (=*. @ preciso lembrar que esse ritual não ocorre na centenária $asa de -ag, apesar de se di'er que o primeiro caboclo a surgir ali oi $aboclo Belho, pai de Cta, entidade que comanda!a a corrente indígena no terreiro de 6enira, onde começou a ser reali'ado o Tambor Tambor de #orá. -os casos citados anteriormente, o Tambor de "ndio oi reali'ado em terreiros cu%os pais ou mães/de/santo começaram a atuar no campo religioso aro/brasileiro como curadoresDpa%9s ou onde que tinham linha de $ura, tamb9m denominada “pena e maracá maracá (conhecida (conhecida como de origem indígena*. Apesar de ha!er essa relação entre #orá e pa%elança, airma/se naqueles terreiros que #orá não tem nada a !er com a $uraD)a%elança, que 9 “Mina de pa%9 / eEpressão ou!ida da mãe/de/santo Maria dos Rem9dios e por n+s interpretada como; tambor para entidades não aricanas recebidas em terreiro aberto por curador que se tornou “mineiro. )artindo da airmação de que, na Mina maranhense, caboclo tem relação com índio mas, índio não 9 caboclo, e que Tambor Tambor de "ndio 9 Mina, procuramos analisar analisar como o índio 9 representado naquele ritual e comparar essa representação com a representação de caboclo no terreiros onde o ritual oi obser!ado. A importncia do índio no Tambor de Mina %á oi por n+s eEaminada em trabalho apresentado na 3GH Reuni eunião ão Anua Anuall da 5#)$ 5#)$*, *, onde onde ala alamo moss da $uraD uraD)a )a%e %ela lanç nçaa e tamb tamb9m 9m do Tambor mbor de "ndi "ndio o 1
Trabalho Trabalho apresentado na XX Reunião Brasileira de Antropologia - GT: GT: Etnologia Afro-Brasileira. Afro-Brasileira. Salvador, !-"#$!#%%& 2 'rofa Titular do (eparta)ento de *i+nias Soiais da EA - (ra e) Antropologia#S', %% 'ES/0SA E 12*2. v.3, n.3., 4an.#4un. %%5, p.!5-35.
(F0RR0TTC,M.R,.1224*. )retendemos retomar aqui nossa descrição do Tambor de "ndio ou #orá, alar de suas !ariaçes e analisar como o índio 9 representado naquele ritual e como se dierencia dos caboclos nos terreiros onde obser!amos aquele ritual. 2. O TAMBOR DE ÍNDIO EM TERREIROS DE MINA DE SÃO LUÍS 0m primeiro lugar, gostaríamos de inormar, ou de lembrar, que Mina 9 uma religião de origem aricana surgida na capital maranhense, onde 9 predominante e inluencia todas as maniestaçes religiosas aro/brasileiras. @ amplamente diundida na região -orte e tamb9m muito conhecida nos 0stados para onde oi grande a migração de “nortistas como; Rio de 7aneiro e 5ão )aulo. 8s terreiros de Mina mais antigos oram organi'ados em 5ão :uís, em meados do s9culo passado, por aricanas do 6ahom9 e outras conhecidas como nag e angola, continuam em uncionamento. 5ão eles; a $asa das Minas/7e%e, consagrada a Iomadonu, e $asa de -ag, consagrada a Jang (#ad9*. Tem/se noticia de pelo menos um terreiro antigo, de nação cambinda, em $od+, no interior do Maranhão. 0ste terreiro, ha muito desaparecido, tinha grande comunicação com a $asa das Minas/7e%e e, segundo relato de 6a. 6enil, !odunsi que está K rente da casa nos Lltimos anos, de lá !eio para a $asa das Minas o !odum Arrono!issa!á. Mas a religião aro/brasileira tradicional de $od+ 9 conhecida por Tambor da Mata, Terec ou #arbassu&ra (termo atualmente menos utili'ado* e apresenta muitas dierenças, tanto em relação K Mina 7e%e, quanto em relação K Mina -ag. -o Tambor de Mina as entidades aricanas cultuadas são mais conhecidas por !odum mas, o termo !odum ou !odunso 9 tamb9m utili'ado para designar entidades espirituais antigas e recebidas pelos m9diuns como “senhor ou senhora, patrão ou patroa / “donas da cabeça. Fora da $asa das Minas/7e%e são tamb9m recebidas em transe mediLnico, nos toques reali'ados nas estas de santo (5ão 5ebastião, 5ão #enedito, 5anta #árbara e outros*; gentisD nobres europeus (como 6.:uís e Rei 5ebastião*? gentilheiros / termo usado na $asa Fanti/Ashanti para designar nobres que !em na corrente de caboclo (como os turcos*? e caboclos (uns de origem nobre, geralmente ligados a $aboclo Belho, da #arra do $ariri, outros da mata, como 5urrupira do angá, e :9gua/#o%i/#oá, entidade angolana ou cambinda, da mata de $od+DMA*. Alguns terreiros de Mina recebem tamb9m índios em toques especiais, denominados Tambor de "ndio, #orá ou $an%er&, de que nos ocupamos, mais particularmente, neste trabalho. As entidades indígenas não incorporam nos toques de Mina, a não ser que se maniestem como caboclo (como ci!ili'adoN*. 8 Tambor de "ndio surgiu em terreiros de Mina de 5ão :uís por !olta de 1234, para entidades indígenas da linha de $aboclo Belho, que não costumam ser recebidas nos toques reali'ados nas estas de santo, ou que s+ podem se maniestar ali acabocladas (sem suas características especiais*. Oá unanimidade de que o #orá começou a ser reali'ado por 6enira / mãe/de/santo de B+ Miçã (-anã* iniciada por Iacarias, eE/alab& (tocador de cabaça* da $asa de -ag, preparado no Terreiro do 0gito com uma entidade da mata denominada Rei 5urrupira. 5egundo Mãe 0l'ita, na casa de 6enira ele era precedido por obrigação no mar e longo período de acampamento. 0ra reali'ado para a linha indígena de $aboclo Cta (ilho de $aboclo Belho / da “#arra do $ariri*, sem nenhuma relação com $uraD)a%elança e nem com 5urrupira / apesar de 6enira ter sido iniciada em terreiro de 5urrupira e de receber 6a. 5urrupira. A corrente !inha “no balanço, de 5ão Miguel para $aboclo Cta, passando pela balança carregada nas mãos por aquele. 8u!imos tamb9m alar da reali'ação ali, durante o #orá, de pro!as se!eras de coragem e de incorporação, como mergulhar a mão em panela de a'eite de dend& er!endo. -os anos 4P o #orá passou a ser reali'ado tamb9m por outros pais/de/santo de 5ão :uís como; Maria'inha, 7os9 7oão, 0uclides (a partir de 1243*, para índios e entidades da mata, especialmente 5urrupiras. Ap+s o alecimento de 6enira, em 12Q4, passou a ser reali'ado tamb9m em dois terreiros oriundos daquele; no de 0l'ita (guiaDmãe/pequena do terreiro de 6enira* e no de Rem9dios (ilha da casa que tornou/se esposa do !iu!o de 6enira*. -a maioria desses terreiros o #orá passou a ser conhecido tamb9m denominado $an%er& / termo que aparece no dicionário da língua portuguesa de Aur9lio (F0RR0CRA,A.12G4* associado a bruEaria e eitiçaria. )ai 0uclides parece conirmar aquela interpretação quando eEplicando o caráter secreto do $an%er& airma os toques são precedidos por rituais de “magia reali'ados no acampamento (troca de cabeça / transer&ncia de maleícios para animais* e a oerendas reali'adas para o “po!o da rua, tradicionalmente eEcluídos da Mina (F0RR0CRA,0. 12<3 e 12
8 Tambor de "ndio ou de #orá 9 reali'ado geralmente em 5etembro, em torno do dia de 5ão Miguel Arcan%o (=2D2*, patrono dos índios que, segundo )ai 0uclides (da $asa Fanti/Ashanti*, 9 !encedor de batalha contra o demnio / inimigo combatido pelos espíritos indígenas na luta tra!ada durante o $an%er&. @ tamb9m reali'ado em 8utubro, pr+Eimo ao dia de 5ão 7os9 dos "ndios, no Terreiro das )ortas Berdes (do inado 7os9 7oão*. 5endo reali'ado para entidades indígenas apresenta características não encontradas nos rituais de Mina onde se recebem caboclos;
9 toque anual / para a linha de $aboclo Belho? acelerado e direto (com um inter!alo mas sem interrupção, pois nele não se doutrina*? com muitos instrumentos; abatas, tambores de crioula, cabaça, erro, gan'á, marimba, garraas com água e outros? com mLsica quase sem letra, com coros “gritados? com dança pulada, com as entidades bradando e gesticulando? com uso de borá para chamar as entidades / bu'ina eita de chire ou de bL'io? uso de lechas, adereços de pena e lutas de espada? precedido por acampamento na mata (sítio* para puriicação quando os m9diuns se alimentam apenas de mel, batata doce e rutas sil!estres? com obrigação dentro dágua (principalmente no mar*? com armação de tocaia no terreiro (abrigo de olhas de palmeira*? com procissão de 5ão Miguel (chee da corrente, no Terreiro F9 em 6eus* ou de 5ão 7os9 dos "ndios (patronos dos índios*? com bebida especial (Ks !e'es denominada “cauim* oerecida em cuia e obrigação (comida* especíica para o pessoal da casa? com roupas pr+prias (geralmente de seda e com brilho* / sem toalhas, panas (lenços de seda* e rosários (colares de !ários ios* usados por !oduns, gentis e caboclos nos toques de Mina? com entidades quase sem comunicação com a assist&ncia, sem alar ou com ala quase incompreensí!el (!ocabulário pr+prio e “língua do tr&*? com desconhecimento do nome de muitas das entidades incorporadas. com pro!as de coragem (mergulhar a mão no dend& er!endo, pisar em brasa*. 2.2 Ta&'#r "e Í("# c#& S$rr$)ras *(a Casa "e +#s, +## $omo %á nos reerimos anteriormente, o Tambor de "ndio ou #orá 9 organi'ado em alguns terreiros para índios (corrente de $aboclo Belho, tamb9m conhecida na $asa Fanti/Ashanti por 7urema #ranca* e para entidades da mata, como os 5urrupira. -o Terreiro das )ortas Berdes (de 7os9 7oão* 9 reali'ado para índios Srubu “da região do Ctapecuru (como ala a letra de uma das mLsicas recolhidas* e para 5urrupiras, conhecidos como da mata do angá, de locali'ação geográica por n+s desconhecida (mata aricanaN*. 5egundo Mãe 0l'ita, essa associação não eEistia na casa de 6enira e nem ocorre no seu terreiro, apesar dele ter 5urrupirinha como chee espiritual. Ali o tambor de 5urrupiras 9 reali'ado no 5ábado de Aleluia (ap+s QH eira de paiEão*, para eles e para os Fulupa, entidades comandadas por 5urrupirinha, de quem pretendemos nos ocupar em outro trabalho. -o Terreiro das )ortas Berdes (de 7os9 7oão* a %unção de índios e 5urrupiras no Tambor de #orá 9 eEplicada por um “mito contado pelo pai/de/santo incorporado pelo índio Aguncha (pai dos outros índios recebidos ali*, que nos oi reprodu'ido por 6a. Maria, !iu!a de 7os9 7oão; “Sm grupo de índios Srubu esta!a atra!essando a baia numa canoa, em busca de rem9dio para o seu pai, que encontra!a/se doente, quando em meio a uma tempestade a canoa nauragou e os índios oram encantados por Rei 5urrupira. )or essa ra'ão os índios do #orá são da mata mas, sua orça !em do mar, e na noite que antecede o #orá se a' uma obrigação no mar. -a casa do inado 7os9 7oão o Tambor de #orá apresenta algumas características especiais; o toque 9 anual mas, reali'ado para índios Srubu (miscigenadosN* encantados por Rei 5urrupira (negro*? a procissão 9 para 5ão 7os9 dos "ndios? alem de antecedido por acampamento, 9 precedido por ritual na praia?
durante o ritual as entidades deitam em cama de espinho (característicos da mata dos 5urrupiras* e apagam brasa com os p9s? as entidades espirituais são agressi!as (%ogam tição e m incr9dulo, a'em eEig&ncias e ameaças* e anti/sociais (icam isoladas em tucueiros, al9m da segregação em acampamento e tocaia*. -o Terreiro das )ortas Berdes o Tambor de #orá 9 tamb9m denominado $an%er& e os índios aparecem como guerreiros da mata (“o primeiro eE9rcito brasileiro, como nos eEplicou uma pessoa ligada a casa* mas tamb9m como eiticeiros, como pudemos constatar analisando letras de mLsicas recolhidas durante o ritual ou cantadas para n+s, depois do #orá, por 6a. Maria (!iu!a de 7os9 7oão*; “Marimba, 9 chegado o índio eiticeiro da mata quando eu chego no terreiro eu quero guia “-+s somos índios guerreiros ilho do índio Srubu e lá na mata onde eu moro, 9 perto de Ctapecuru 2./ Ta&'#r "e Ca(0er *(a Casa a(t-As3a(t 8 $an%er& começou a ser reali'ado na $asa Fanti/Ashanti em 1243, quatro anos antes da inauguração do seu barracão de Mina, para pagar uma promessa de )ai 0uclides a Taba%ara, chee espiritual de terreiro, de a'er aquele ritual durante sete anos. Mas oi reali'ado ali durante =2 anos consecuti!os (1243/12<>* e, em 12<< por uma noite, dentro da programação de comemoração do >P ani!ersário do terreiro. $onorme )ai 0uclides, o $an%er& 9 uma batalha de espíritos da mata contra espíritos “pouco e!oluídos (0Eus e Uiubas* e se undamenta em inormação recebida de sua mãe/de/santo, no Terreiro do 0gito, e em ritual reali'ado ali por Rei 5urrupira, incorporado em Iacarias, pai/de/santo de 6enira. 5egundo conta; “Oou!e um tempo em que os espíritos pouco e!oluídos esta!am ameaçando dominar a terra e Rei 5urrupira !eio para controlá/los. )ara reali'ar sua missão, con!ocou os espíritos da mata e, incorporado em Iacarias, reali'ou um ritual desconhecido, tocando em cabaças emborcadas dentro dágua... -a $asa Fanti/Ashanti, a ligação do #orá com 5urrupira s+ aparece em seu “mito de origem. -as seis obser!açes de $an%er& que reali'amos ali não registramos a presença de olha de tucum (palmeira dos 5urrupiras* e nem a alusão a espinhos (símbolos do 5urrupiras* nas letras das mLsicas cantadas ou nas alas ou!idas no $an%er&. As reer&ncias a rituais de eitiçaria durante o #orá (apresentado como religião ou como obrigação ligada a entidade indígena*, que aparecem mais claramente no discurso do pai/de/santo daquele terreiro, são associadas não a entidades da mata (índios e 5urrupiras* mas, a “po!o de rua. 5egundo )ai 0uclides estes, não s+ recebem oerenda (para deiEarem de aligir as pessoasN*, como tamb9m, Ks !e'es, se aproEimam dos m9diuns (quando icam de olhos !idrados e parecem desalecer* para mostrar que receberam o presente e estão ali. -a $asa Fanti/Ashanti o #orá ou $an%er& eEibe as seguintes características especiais; 9 reali'ado com índios comandados(N* por Taba%ara, turco que entrou na aldeia de $aboclo Belho e que lutou na uerra do )araguai (de onde se origina a índia #artira, com quem se casou, e #alanço, ilho de #arão de uar9, que oi por ele adotado como ilho*? com oerenda para “po!o de rua e possibilidade de in!asão desses espíritos (o que se airma acontecer quando um m9dium ica de olhos !idrados e parece desalecer durante o toque*? com rituais de eitiçaria (troca de cabeça*? com ritual iniciado dentro de rio (tocando em cabaças emborcadas na água* e toque em garraas com água? com batalha de índios, comandados por turco, contra espíritos “não e!oluídos (nos primeiros le!a!am em procissão 5ão 7orge que 9 representado “pisando o demnio*? com demonstração de sel!a%aria (a!ançar contra pintos querendo com&/los cru, perseguir criança*? e coragem (mergulhar a mão no a'eite er!endo e deitar em espinho*?
entidades com comportamento ora semelhante ao caboclo (umando, tomando chá*, ora dierente dele (doutrinando pouco, sem toalha e rosário*. cantos com elementos do catolicismo, da “cultura banto e em “língua indígena(N*; “Vuem tá em cima de n+s 9 o que Iambi mandou... “W & & #obo%ira assobiou / & & & #ombo%ira dd / & & & “7á !im de orar a 6eus Bim saudar santo primeiro... @ ele, 9 ele, da balança do iel X, mas 9 ele, lá nos p9s de 5ão Miguel “TatuUuap9 tapira taEaruá, taEaruá, miEará “Satumã tarumá açu Uu%eira )erY Uamaná uru “Jetin batatatá, tin, tin
2.4 Ta&'#r "e Í("#s #$ B#r5 (# Terrer# , e& De$s 8 Terreiro F9 em 6eus, de Mãe 0l'ita, se originou de di!isão do Terreiro 5enhora 5antana ap+s o alecimento de sua undadora, Mãe 6enira. $omo 0l'ita oi mãe/pequena do terreiro de 6enira e, ao abrir sua casa, oi acompanhada por 1G irmãs/de/santo, o Terreiro F9 em 6eus 9 apresentado por esta como um prolongamento da casa de sua mãe/de/santo. 8 Tambor de "ndio reali'ado no Terreiro de Rem9dios, sua irmã de santo 9 muito dierente e merece um estudo K parte pois, apresenta muitos elementos que ogem ao padrão aqui apresentado. -ele são encontrados 5aci, $abeça de $uia, e outros elementos do olclore de origem indígena? mão santa, cru' e coroa de espinho e outros elementos do catolicismo popular? e a aranha, que segundo )ai 0uclides, quem a conirmou na Mina, 9 o totem dos Fanti/Ashanti. $omo Mãe 0l'ita pertence a $aboclo Belho mas, tem 5urrupirinha como guia (principal entidade cabocla*, no Tambor de "ndio reali'ado em sua casa se homenageia $aboclo Belho e se recebe a corrente indígena. -o Tambor de #orá, se homenageia 5urrupira. 0l'ita tem ainda como senhora de $uraD)a%elança, 6ona Troirinha / a princesa 6oralice, ilha do Rei da #andeira (nobre portugu&s*. Mas, como %á oi airmado mais de uma !e', o Tambor de #orá 9 um ritual da Mina para entidades indígenas e não tem ligação com a $uraD)a%elança, a qual se liga o #aião, ritual reali'ado na $asa Fanti/Ashanti pr+Eimo ao dia de 5anta :u'ia (1>D1=*, para moças e princesas encantadas. -o Terreiro F9 em 6eus as entidades do Tambor de "ndio usam roupa de cetim e uma aiEa onde se l&; Rei #alança, em alusão a 5ão Miguel, representado na iconograia cat+lica com uma balança nas mãos, “por ser o encarregado de pesar as almas no %uí'o inal e separar as que merecem o c9u das que !ão para o inerno. A mesma iconograia eEplica o porque do uso de espada pelos índios do #orá, nos combates representados durante o ritual. 2.6 A(5%se "#s "a"#s et(#!r57c#s Analisando os dados aqui apresentados obser!amos, em primeiro lugar, que na Mina maranhense “nem todo dia 9 dia de índio e que, enquanto os caboclos podem se maniestar em quase todos os toques, os índios s+ são recebidos uma !e' por ano (no #orá*, em alguns terreiros, e são comandados por 5ão Miguel ou tutelados por caboclo (turco ou 5urrupira*. )ara se maniestarem nos toques de Mina t&m que !ir como caboclos (a eEemplo do índio 5apequara, que oi integrado K Mina como $aboclo Belho*, reprimindo seus traços de sel!ageria. 8 índio aparece primeiro nos terreiros de Mina como caboclo, ora da mata. $aboclo Belho (o índio 5apequara*, apresentado como a “primeira entidade cabocla a bradar no tambor de Mina, 9 “da barra do $ariri. -o “mito do #orá, contado por )ai 0uclides, os índios oram chamados por 5urrupira (caboclo*, no Terreiro do 0gito, batendo em cabaça emborcada dentro dágua / orma descrita na mitologia tenetehara de chamada da di!indade da água, Z[án (\A:0Z,$ e A:B]8,0. 12Q1;1>4*. 5e pensarmos em “barra como; banco ou croa de areia ormado no mar ou lagoa por rios que ali desembocam (F0RR0CRA,A. 12G4*, podemos entender porque o caboclo da Mina maranhense 9 mais ligado ao !odum A!erequete (do mar* do
que ao oriEá 8Eossi (da mata* e porque o Tambor de "ndio 9 precedido por obrigaçes no mar e acampamento / longe da cidade e pr+Eimo K mata (onde !i!em os índios não transormados em caboclo*. 8s índios do #orá aparecem ligados aos santos (5ão Miguel e 5ão 7os9* e, Ks !e'es, comandados por 5ão Miguel. A associação de índios a 5ão Miguel 9 muito antiga e parece ter a !er com a catequese dos %esuítas (:0CT0,5 1243*. Tanto 5ão Miguel, este%ado em =2D2, quanto 5ão 7os9 dos "ndios, este%ado em 8utubro (no dia ==D1P / dia das MissesN* oram patronos de índios maranhenses, como se pode !er na denominação de alguns po!oados; 5ão 7os9 dos "ndios (município de Ribamar* e 5ão Miguel dos "ndios (município de Rosário*, ambos pr+Eimos K capital. Mas a presença de 5ão Miguel nos oi eEplicada em um terreiro de 5ão :uís, durante um #orá, como sendo de!ido índio gostar de pena e 5ão Miguel ter asas, pois 9 um an%o... -o #orá o acampamento surge como um espaço intermediário entre a cidade e o terreiro (ci!ili'ação* e a mata ou aldeia (sel!ageria*, onde os índios podem eEibir comportamentos considerados subumanos, como atacar a!es para de!ora/las... A segregação do acampamento parece a!orecer a prática de ati!idades de eitiçaria, temidas pela população aro/brasileira e reprimida pela classe dominante (e pela polícia*. Mas a eitiçaria dos índios s+ aparece mais claramente no #orá deinido como $an%er&, quando os índios são comandados por turcos (!istos no olclore como inimigos dos cristãos* ou 5urrupiras (negros !istos req^entemente como eiticeiros*. )or causa de 5ão Miguel, o índio do #orá luta de espada, usa saiote que lembra soldado romano e tem balança (símbolos de 5ão Miguel na iconograia cat+lica*. A relação dos índios do #orá com santos, especialmente com 5ão Miguel, desencora%a a interpretação das entidades indígenas como espíritos pagãos, ligados K “magia negra ou a trabalhos “para a esquerda (como são !istas muitas entidades aro/ brasileiras*. @ preciso lembrar que no $an%er& eles aparecem como uma orça quase incontrolá!el, perigosos e pr+Eimos, ou misturados, ao “po!o de rua mas, lutando contra os espíritos ineriores (“eEus e Uiubas*. Sm certo nLmero de características apresentadas pelas entidades indígenas no #orá parece responder a eEig&ncias do conteEto em que ele se reali'a / o terreiro de Mina. @ deste modo que interpretamos o uso de roupa de cetim pelas entidades indígenas / tecido usado tradicionalmente na Mina por !oduns e caboclos. -o ritual de $uraD)a%elança 9 cantada uma toada onde um encantado di' “quando eu chego em terra de branco, eu boto o meu cordão de ouro. $olocando essa mensagem na boca do índio do #orá poderíamos interpretá/la; “quando eu chego em terreiro de Mina, tiro minha tanga e !isto roupa de cetim... Vuem conhece o Tambor de Mina sabe que diicilmente um m9dium incorporado com entidade indigena poderia dançar em um terreiro de Mina !estido como índio; nu ou seminu (aos olhos do “branco* e com roupa mais pobre do que a usada no cotidiano pela população do terreiro. Algumas características do #orá acentuam sua distinção da Mina; pluralidade de instrumentos musicais e presença entre eles de instrumentos rLsticos ou ligados K mLsica olcl+rica tradicional (garraas com água, tambores de crioula*? aus&ncia de rosários (colares rituais*, toalhas e panas usados por !oduns e caboclos nos toques de Mina, etc.. 0 algumas características apresentadas pelas entidades indígenas no #orá marcam as dierenças eEistentes nos terreiros de Mina entre elas e entidades espirituais de outras categorias que são ali recebidas. “Mineiro em transe com !odum ou caboclo dança e doutrina (puEa mLsicas nos rituais*, em transe com índio pula e grita... )arece que na Mina a grande distinção entre índios e caboclos reside na linguagem. 8 índio 9 apresentando como destituído de linguagem compleEa, alando portugu&s errado e comunicando/se mais por gritos do que por pala!ras, o que o impede de doutrinar e, em Lltima análise, de dançar Mina (onde !oduns e caboclos $antam*. )or essa ra'ão ningu9m indaga por que os terreiros não dispem de um repert+rio musical em língua indígena, quando tem um repert+rio tão !asto em línguas aricanas (no #orá da $asa de Fanti/Ashanti são cantadas algumas mLsicas “ensinadas pelas entidades espirituais que se acredita serem em tupi mas a Antrop+loga e :ing^ista baiana Z&da )essoa de $astro constatou que uma delas era em Uibundo e ala!a; “os tambores %á começaram a tocar...*. A ineEist&ncia de cançes indígenas tradicionais (dos Srubu/_aapor, dos ua%a%aras ou de outros grupos do Maranhão* reorça nossa tese de que o #orá 9 uma produção cultural aro/brasileira e não uma perpetuação de tradição indígena. 8 que se chama ali de “ala de índio 9 mais uma deturpação do portugu&s (“língua do tr&* ou um pequeno !ocabulário aro/brasileiro que tal!e' pouco tem a !er com a língua dos grupos sociais representados pelas entidades espirituais indígenas recebidas no ritual (dos Srubu/_aapor, por eEemplo*. @ bom tamb9m lembrar que a denominação grupal das entidades indígenas recebidas no #orá, não corresponde K autodenominação dos grupos indígenas por elas representados. 8s índios do #orá do Terreiro das )ortas Berdes são Srubu e não _aapor, do mesmo modo que as entidades espirituais ciganas recebidas em terreiros de 5ão :uís não são denominadas calen (calon, no
singular, e cali, no eminino / RC#0CR8,R. 122=*. -o caso das entidades indígenas, alem da categoria Srubu ser eEterna, o termo usado tem um sentido pe%orati!o entre “os brasileiros ci!ili'ados. 5e a pala!ra _aapor, para o grupo indígena de mesmo nome, signiica “moradores da mata (RC#0CR8, 6. 12G3*, a pala!ra Srubu signiica para os “brasileiros ci!ili'ados; su%o, comedor de carniça, e de!e ter alguma coisa a !er com a sua associação K eitiçaria (“linha negra* encontrada no #orá. A locali'ação da mata das entidades espirituais indígenas classiicadas como Srubu recebidos no #orá, no CtapecurL, parece tamb9m não corresponder K dos _aapor, que !i!em na região do )indar9 (RC#0CR8, 6. 12G3*. )elas ra'es apresentadas, o índio do #orá parece representar mais a população aro/brasileira maranhense (miscigenada biol+gica e culturalmente* do que o índio propriamente dito. -este sentido, o índio Srubu pode ser encarado tanto como um índio negro (“talhado K moda aro/brasileira* como um símbolo do lado indígena da população aro/brasileira, lado este reconhecido com orgulho por uns (segundo estrat9gia de branqueamento* e negado por outros (numa estrat9gia de aricani'ação*. /. CONCLUSÃO 0m trabalhos anteriores (F0RR0TTC, M.R. 122>? 1223* mostramos que a classiicação de entidades espirituais no Tambor de Mina 9 elaborada le!ando/se em consideração !ários crit9rios e que apresenta grande maleabilidade. 0mbora ha%a enquadramentos em categorias %ulgadas erradas ou impossí!eis, uma entidade pode ser classiicada em categorias dierentes, em um mesmo terreiro. A constatação de que entidades espirituais como $aboclo Belho, que 9 apresentado como o primeiro caboclo da Mina, como o índio 5apequara e como !odunso no Terreiro F9 em 6eus (onde 9 o dono da cabeça da mãe/de/santo*, longe de nos le!ar K conclusão de que o po!o/de/santo maranhense não a' distinção entre !oduns aricanos, índios e caboclos, nos mostra a necessidade de compreender o signiicado que cada termo classiicat+rio tem em um terreiro e os crit9rios por ele adotados na classiicação de suas entidades espirituais. Tentamos demostrar em 6esceu na uma (F0RR0TTC,M.R.1221* que no Tambor de Mina caboclo não 9 uma categoria 9tnica e que 9 deinido mais pela posição da entidade espiritual no terreiro ou `na cabeça` do ilho/de/santo e pela sua relação com outras entidades recebidas nos terreiros. Sm dos crit9rios deinidores da identidade e classiicação de uma entidade no Tambor de Mina 9 o momento e o ritual em que se maniesta. 5egundo esse crit9rio, índio, por eEemplo, 9 quem dança #orá, o que não signiica que se um !odum aricano osse recebido nesse ritual passaria a ser classiicado como índio brasileiro. Bimos, por eEemplo, que há “mistura de correntes no #orá, que caboclos da mata, como 5urrupira, e turcos podem participar do ritual e que, no $an%er&, pode ha!er in!asão do “po!o da rua. 8 índio representado nos rituais obser!ados e analisados neste trabalho, embora apresentem dierenças em relação ao caboclo e este%am abaiEo dele em termos de ci!ili'ação (em sociabilidade, linguagem, autodeterminação*, são moldados a partir de !alores dos “mineiros; usam roupas de cetim, dierentes das usadas nos toques de Mina (em !e' de tanga de palha ou algodão rLstico*? adotam denominaçes a eles atribuídas pelos “brancos (Srubu, em !e' de _aapor, como nos lembrou 6idier de :a!eleYe*? aceitam 5ão Miguel e combatem com as armas dele (espada em !e' de lecha*? são organi'ados em amília mas subordinam/se a um caboclo, ilho de $aboclo Belho ou ligado a ele (Cta, Taba%ara*, ou chee de outra mata (5urrupira*. A análise dos #orás obser!ados mostra a diiculdade de identiicação da concepção de índio nos terreiros de Mina obser!ados uma !e' que, na maioria dos casos, eles são recebidos em rituais onde há participação de não índios (caboclos, 5urrupiras* e não há, pelo menos para n+s, uma caracteri'ação clara dessas entidades que nos permita identiicar seus traços deinidores. Csso mostra a necessidade de prosseguimento do trabalho etnográico, nos terreiros obser!ados e em outros onde se reali'a Tambor de "ndio. $omo no Terreiro F9 em 6eus eEiste uma separação mais nítida entre as entidades da mata da corrente de $aboclo Belho ou de 5ão Miguel / indígenas /, e entidades caboclas de outras matas, pretendemos tornar nossas obser!açes ali mais sistemáticas e direcionadas para as duas comparaçes; uma de índio com 5urrupira e Fulupa (comparando #orá e Tambor de Fulupa* e outra entre caboclo e índio (comparando o toque da primeira e da Lltima noites da esta de 5ão Miguel (que são para caboclos*, com o reali'ado nas tr&s outras noites, no #orá (para índio*.
0m nossa pesquisa sobre caboclo temos utili'ado a analise das letras das musicas cantadas nos terreiros para aquelas entidades espirituais como complementado dos dados de obser!ação e das entre!istas. -o caso do Tambor de #orá esse recurso apresenta/se ainda mais escasso. Sma das características da mLsica do Tambor de "ndio 9 o ritmo muito acelerado, os longos períodos sem inter!alo (o primeiro no mínimo com 2P minutos de ritual* e a quase aus&ncia de letras. 8utros atores contribuem para a diiculdade do canto. -a Mina este ou 9 puEado pelo pai, mãe/de/santo, “guia ou mãe pequena, ou 9 puEado por um m9dium em transe e a musica 9 repetida por todos os que estão na roda, incorporados ou não. -o #orá as entidades espirituais pouco alam ou t&m uma linguagem quase incompreensí!el e a dança pulada, alem de cansati!a, diiculta a respiração e o canto. )elas ra'es apresentadas, consideramos que a pr+Eima etapa da nossa pesquisa sobre entidades espirituais indígenas do Tambor de Mina de!e se apoiar mais na análise de rituais. $omo essa análise não pode prescindir da interpretação das pessoas que dele participam e como os “mineiros alam pouco a respeito de suas entidades espirituais, o trabalho de análise de letras de mLsicas de!e prosseguir, tanto das mLsicas do Tambor de "ndio, quanto nas cantadas para entidades indígenas em outros rituais reali'ados nos terreiros pesquisados (ligados K Mina, K $ura ou a outra corrente mediLnica*. BIBLIO8RAIA CONSULTADA
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