LIÇÕES DE DIREITO FISCAL
José de Campos Amorim
2007-2008
2
INTRODUÇÃO A natureza do Direito Fiscal A matéria dos impostos tem sido objecto de estudos que vêm desde os aut ores romanos e que consistiram, fundamentalmente, na análise do poder de tributar 1 . O estudo do imposto resumia-se à relação jurídica entre o ente público - o credor - e o cidadão - o devedor. Hoje, o Direito Fiscal compreende não só o poder de instituir impostos, que se exerce através da criação de leis fiscais, mas também o poder de exigir a prestação do imposto e os limites ao poder de tributar. O Direito Fiscal constitui um sector específico do ordenamento jurídico português, em que as normas fiscais são vastas e complexas, e são bem longe de apresentar uma perfeita unidade sistemática para os contribuintes que, como figura central do sistema tributário, aspiram a uma ordem jurídico-tributária segura e justa a todos os níveis das suas actividades. Sucede que os impostos são omnipresentes na vida dos cidadãos e afectam “praticamente todos os aspec aspe ctos da nossa vida por mais variados ou mesmo vulgares que se apresentem» 2 . Por isso, deve existir uma distribuição justa e equitativa dos encargos tributários entre as várias categorias de contribuintes: pessoa singular, pessoa colectiva, identificada, muitas vezes, através de grupos ou categorias, tais como a sociedade, o empresário, a família, o profissional liberal, etc. CAPÍTULO I O ÂMBITO DO DIREITO FISCAL 1. A definição do Direito Fiscal O Direito Fiscal pode ser definido como o «ramo do Direito que compreende a ordem jurídica criada pelas normas que criam e disciplinam as posições jurídicas de devedor e de credor de imposto e taxa» 3 . O Direito Fiscal comporta um conjunto de matérias ligadas à obrigação de pagar os impostos, ao direito de exigir o seu pagamento, à determinação do montante devido, à fiscalização do cumprimento pelo contribuinte das suas obrigações, às sanções aplicáveis ao contribuinte no caso de não cumprimento das suas obrigações, etc. Estas matérias estão também ligadas a outros ramos do Direito. 1
)”De collectis”, de Petrus de Ubaldis, de 1586, citado por Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 15. 2 ) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, Ed. Almedina, 2000, p. 32. 3 ) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 21.
3
2. O Direito Fiscal e os outros ramos do Direito O Direito Fiscal apresenta-se como um ramo autónomo do Direito, constituído por um conjunto de normas de carácter geral e especial, em relação directa com outros ramos do Direito. De facto, o Direito Fiscal Geral reparte-se pelo Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito Aduaneiro, Direito Internacional, Direito Comunitário, etc. 2.1. O Direito Fiscal e o Direito Administrativo Quer o Direito Administrativo, quer o Direito Fiscal visam «o exercício das funções dos órgãos de Estado ou dos outros entes públicos; tendo as normas de Direito Tributário o fim de obter para o Estado, ou outro ente público, os rendimentos necessários para sustentar as suas despesas» 4 . Uma das finalidades do Direito Fiscal é de recolher os fundos f undos para o Estado e outras entidades públicas. A vinculação do Direito Fiscal ao Direito Administrativo tem também a ver com o carácter administrativo do acto tributário, que não é nada mais do que um acto criador de obrigações fiscais para o contribuinte. 2.2. O Direito Fiscal e o Direito Privado Muitas das normas fiscais baseiam-se em conceitos de Direito Civil e de Direito Comercial, tais como a compra e venda, doação, herança, propriedade, prédio, comércio, pessoa colectiva, contrato de trabalho, contrato de prestação de serviços, estabelecimento individual de responsabilidade limitada, sociedade, sociedade comercial, sociedade civil, cooperativa, empresa pública, agrupamento complementar de empresas, agrupamento económico de interesse europeu, domicílio, sede, residência, etc. Por outro lado, a relação tributária tem a estrutura duma obrigação jurídica privada, uma vez que o credor do imposto pode exigir do contribuinte determinada prestação pecuniária. 2.3. O Direito Tributário e o Direito Financeiro O Direito Financeiro é «constituído pelos princípios, instituições e normas que presidem à Administração do património do Estado e dos demais entes públicos, ao lançamento e liquidação dos tributos, à elaboração do Orçamento e à realização das despesas » 5 . 4
) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 31. 5 ) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 34.
4
O Direito Financeiro disciplina a actividade financeira do Estado e demais entes públicos, com vista à obtenção de receitas e à realização de despesas públicas. O Direito Financeiro e o Direito Fiscal são dois ramos interdependentes do Direito que visam a satisfação das necessidades colectivas. 2.4. O Direito Fiscal e o Direito Tributário O Direito Fiscal pode ser visto como um Direito de Procedimento e de Processo Tributário. Para além do vínculo jurídico de imposto, que corresponde ao dever de pagar o tributo e o direito de o exigir, o Direito Fiscal incorpora regras de procedimento e de processo tributário. Por exemplo, no Direito Tributário, o contribuinte pode prestar garantias de pagamento da quantia exequenda e discutir judicialmente a legalidade do acto, através da impugnação do acto tributário. Os processos de impugnação judicial, de execução fiscal e de contra-ordenação fiscal estão regulados no CPPT e no RGIT. 2.5. O Direito Fiscal e o Direito Aduaneiro O Direito Aduaneiro ou Alfandegário disciplina os impostos de natureza extrafiscal, que são os impostos aduaneiros ou alfandegários. Esses imp ostos já não integram propriamente o Direito Fiscal mas o Direito Económico Fiscal 6 . É hoje a União Europeia que estabelece as regras jurídicas que disciplinam esses impostos. A União Europeia regula, através do Código Aduaneiro Comunitário de l de Janeiro de 1994, as transacções entre os países da União e os países terceiros, revogando, assim, as diversas legislações aduaneiras nacionais. Apenas resta aos Estados-membros regulamentar a liquidação e cobrança dos impostos aduaneiros. 2.6. O Direito Fiscal e o Direito Constitucional Na nossa Constituição encontram-se as bases constitucionais dos impostos, concretizadas fundamentalmente na ideia de soberania fiscal, no princípio da legalidade fiscal e no princípio da capacidade contributiva, mas também as finalidades do sistema fiscal e a delimitação dos principais impostos que integram o sistema fiscal. 2.7. O Direito Fiscal e o Direito Penal O Direito Fiscal integra no seu seio o Direito Penal Fiscal, que está hoje integrado no RGIT. O Direito Penal Fiscal divide-se em Direito Penal Fiscal, propriamente dito, e em Direito Contra-ordenacional Fiscal. No primeiro, estão previstos vários tipos de crimes (arts. 87 a 107 do RGIT). No segundo, estão previstas as contra-ordenações 6
) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, 2 a ed., Almedina, 2003, p. 78.
5
aduaneiras e fiscais (arts. 51 e segs. do RGIT). Um outro ponto de contacto entre o Direito Fiscal e o Direito Penal reside na tributação de rendimentos provenientes de actividades ilícitas (artigo 10.º da LGT). 2.8. O Direito Fiscal e o Direito Internacional O Direito Fiscal está vinculado ao Direito Internacional, nomeadamente às convenções internacionais de luta contra a dupla tributação e a evasão fiscal internacionais. Sempre que se verifique uma situação fiscal internacional, simultaneamente contemplada numa convenção internacional e numa norma de direito interno, por força do princípio da primazia do Direito Internacional Convencional sobre o direito interno, aplica-se naturalmente a norma convencional em detrimento da norma interna. 2.9. O Direito Fiscal e o Direito Comunitário O Direito Fiscal Comunitário disciplina, por um lado, os impostos comunitários propriamente dito e, por outro lado, alguns aspectos dos impostos estaduais, no caso de terem sido objecto de um processo de harmonização comunitária, como sucede com o IVA 7 . Como impostos comunitários propriamente dito temos os chamados impostos aduaneiros, concretizados na chamada pauta aduaneira comum e os direitos niveladores agrícolas, criados para a realização da PAC.
CAPÍTULO II O CONTEÚDO DO DIREITO FISCAL 1. A diversidade das normas fiscais O Direito Fiscal integra um conjunto de normas que disciplinam as relações de imposto e definem os meios pelos quais se realizam os direitos emergentes daquelas relações 8 . Podemos observar as seguintes categorias de normas: - As normas de soberania fiscal, que fixam os poderes gerais do Estado 7
) Ives Gandra da Silva Martins, “Aproximação dos sistemas tributários”, Scientia Iuridica, Tomo LIV, 2005, n.º 32, p. 246 e 251. O IVA é um tributo de natureza regulatória do mercado comunitário, e é também o mais relevante tributo de integração comunitária. 8 ) SOARES MARTÍNEZ, p. 59.
6
relativamente aos impostos; - As normas de incidência, que definem os pressupostos e os elementos da tributação; - As normas de lançamento, que fixam os processos de determinação dos elementos daquela relação de imposto; - As normas de liquidação, disciplinadoras da fixação do quantitativo da colecta ou do montante da prestação tributária; - As normas de cobrança, respeitantes à arrecadação dos impostos ou a cobrança da prestação tributária; - As normas de organização dos serviços, disciplinadoras dos serviços e dos agentes fiscais; - As normas de fiscalização, que visam a regularidade dos procedimentos de fiscalização dos contribuintes e que visam evitar ilegalidades e irregularidades em matéria fiscal; - As normas de sanção, que regulam as infracções às normas fiscais e consequentes penalidades; - As normas de procedimento e processo tributário, que dizem respeito, por um lado, à impugnação administrativa e, por outro lado, ao processo judicial. - e as normas extrafiscais, que constituem o Direito Económico Fiscal e regulam os impostos extrafiscais e os benefícios fiscais (Estatuto dos Benéficos Fiscais). 2. A natureza das normas 2.1. As normas de soberania fiscal São normas de soberania fiscal as que definem o poder de tributar. Têm essa natureza as normas contidas na Constituição, nomeadamente o artigo 106 n os l, 2 e 3 (normas relativas à elaboração do Orçamento, o qual pode prever a modificação de um certo número de leis fiscais 9 ) e o artigo 165, n° l, al. i (relativo à competência da Assembleia da República em matéria de criação de impostos). As normas de soberania fiscal são normas de carácter geral que, embora revogáveis e subordinadas às normas constitucionais 10 , podem definir os aspectos fundamentais dos poderes tributários do Estado em geral. Estas normas constituem a base dos impostos e do respectivo sistema fiscal. 2.2. As normas de incidência As normas de incidência determinam o sujeito activo da obrigação de imposto (Estado, autarquias, institutos públicos), os sujeitos passivos da mesma obrigação (contribuintes, responsáveis, substitutos, etc.), a matéria colectável, isto é, a riqueza, os valores económicos sobre que recai a tributação, a taxa do imposto, quota ou percentagem calculada sobre aquela matéria colectável, e o facto dinamizador ou gerador da obrigação de imposto. As normas de incidência podem ter um carácter negativo, quando determinam 9
) Lobo Xavier, A Concretização das Autorizações Legislativas Fiscais, FISCO, n.º67, 1994, p.21 ss. ) As normas constitucionais fixam os princípios da funcionalidade, da generalidade, da igualdade e da capacidade contributiva e têm um carácter preceptivo e impostivo. Ver Diogo Leite de Campos, Direito Tributário, 2ª edição, Coimbra, 2003, p. 106. 10
7
isenções, reduções de imposto e benefícios fiscais, que hão-de traduzir-se em isenções, reduções ou adiamentos no pagamento da prestação tributária. A incidência do imposto é subjectiva ou pessoal, quando respeita aos sujeitos, e objectiva ou real, quando respeita à matéria colectável e às taxas. São exemplos de normas de incidência subjectiva as contidas nos art. 13 e ss. do CIRS e artigo 2 do CIRC, e de incidência objectiva as contidas nos art. l a 12 do CIRS e artigo 3.º do CIRC. 2.3. As normas de lançamento O lançamento consiste na determinação pelos serviços da Administração Fiscal dos elementos da obrigação de imposto. Não se trata da definição legal desses elementos, que pertence às normas de incidência, mas sim da fixação em concreto desses elementos. Como exemplo de normas de lançamento podemos apontar as contidas nos artigos 22 e ss. do CIRS, no artigo 15 e ss. do CIRC. 2.4. As normas de liquidação São aquelas que disciplinam as operações de liquidação dos impostos. É o caso das normas contidas nos artigos 75 a 96 do CIRS e nos artigos 82 a 95 do CIRC. 2.5. As normas de cobrança As normas de cobrança ou de pagamento, conforme a operação seja considerada do ponto de vista do Fisco ou do contribuinte, são todas aquelas que disciplinam a cobrança ou o pagamento dos impostos. Elas estão incluídas nos art. 97 a 111 do CIRS e nos art. 96 a 108 do CIRC. 2.6. As normas de organização de serviços Estas correspondem às normas de organização de índole administrativa, como é o caso das leis orgânicas das DGCI (Direcção-Geral dos Impostos), DGAIEC (Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo) e DGITA (Direcção-Geral de Informática e de Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros). 2.7. As normas de fiscalização São relativas à fiscalização do cumprimento dos múltiplos deveres fiscais, nomeadamente o dever de pagar imposto e os deveres acessórios. Como exemplos, podemos citar os artigos 132 e seguintes do CIRS e os artigos 124 a 127 do CIRC. 2.8. As normas de sanção São normas do Direito Penal Fiscal destinadas a penalizar os contribuintes e por vezes os terceiros por actos ilícitos cometidos ou susceptíveis de comprometer as operações fiscais.
8
Este Direito Penal Fiscal desdobra-se em Direito Penal Fiscal em sentido estrito e em Direito Contra-ordenacional Fiscal. Por um lado, temos as infracções penais, qualificadas como crimes tributários e as correspondentes sanções penais, constituídas pelas penas de prisão e de multa, e, por outro lado, as infracções contra-ordenacionais e as correspondentes coimas, aplicáveis às ilicitudes menores pelas autoridades administrativas tributárias. 2.9. As normas de contencioso Estão concentradas, na quase totalidade, no CPPT aprovado pelo D-L n°433/99, de 26 de Outubro e no RGIT, aprovado pela Lei n°15/2001, de 5 de Junho. Trata-se de normas que disciplinam o procedimento e processo tributário, e o processo de contra-ordenação fiscal.
CAPÍTULO III A SOBERANIA FISCAL 1. O conceito Por soberania fiscal entende-se o poder de criar impostos, de extingui-los, de alargar ou restringir o seu âmbito, ou de estabelecer proibições de natureza fiscal. 2. O fundamento da soberania fiscal Segundo as concepções clássicas da soberania fiscal, o poder de tributar residiria na ideia de troca de utilidades, de « do ut des » (dou para que me dês), ou de « do ut facias » (dou para que me faças), defendida pela escola de List e de Adam Simth. Para List, o imposto é a remuneração dos serviços prestados pelo Estado em nome do desenvolvimento das forças produtivas. Para Adam Smith, o imposto seria a contrapartida dos serviços prestados pelo Estado para a protecção das actividades que tornam possível a obtenção e o gozo dos rendimentos dos particulares. No decurso do século XIX, alguns autores tentaram fundamentar a soberania fiscal em razões ético-sociais. O fundamento do poder de tributar residiria na exigência social de assegurar a cobertura financeira das despesas do Estado e na própria satisfação das necessidades públicas, como o ensino básico, os serviços de saúde, e a segurança social. Como outro fundamento da soberania fiscal, há ainda a concepção moderna baseada numa ideia de troca global. A totalidade dos impostos seria do interesse de toda a comunidade. Mas a totalidade das “utilidades” prestadas pelo Estado não é igual à soma dos impostos por ele exigidos. Pois, nem todas as receitas públicas são de natureza tributária e todas se destinam a financiar utilidades comuns. O Estado não pode criar impostos para satisfazer fins que não sejam o do interesse público.
9
CAPÍTULO IV AS FONTES DO DIREITO FISCAL As fontes de direito são os modos de criação ou de revelação das normas jurídicas. A Constituição é a primeira das fontes de Direito Fiscal. 1. A lei constitucional 1.1. Os princípios constitucionais da tributação Na nossa Constituição, muitas são as disposições fundamentais em matéria de tributação, desde o art. 67 al. f) do n° 2, que manda « regular os impostos e os benefícios sociais, de harmonia com os encargos familiares », passando pelo artigo 103 que estabelece o princípio da legalidade tributária e o princípio da igualdade tributária. 1.1.1. O princípio da legalidade tributária O princípio da legalidade tributária é um princípio que se desdobra em dois outros princípios: o da preeminência da lei e o da reserva da lei. De acordo com o primeiro princípio, os impostos só podem ser criados por lei (artigo 103, n.° 3 da CRP). Quanto à reserva da lei, a lei criadora dos impostos deve emanar necessariamente de um órgão com competência legislativa (art. 103, 165, n° 1, al. i da CRP). Sobre as matérias que são da sua exclusiva competência, a AR pode legislar ou autorizar o governo a legislar. As matérias sobre as quais só a AR pode legislar dizem-se de reserva absoluta de competência legislativa da AR (art. 164 da CRP). E as matérias sobre as quais a AR pode autorizar o governo a legislar são matérias de reserva relativa daquela competência (art. 165 da CRP). O princípio da reserva de lei (formal) implica que haja uma intervenção parlamentar autorizando o Governo, as assembleias legislativas regionais ou as assembleias das autarquias locais a estabelecer essa disciplina (arts. 165.°, n.° l, al. i), , 227.°, n.° l, al. i), e 238.°, n.° 3, da CRP). Por seu lado, o princípio da reserva material de lei exige que a lei (lei da AR, decreto-lei autorizado, decreto legislativo regional ou regulamento autárquico) contenha os elementos essenciais de cada imposto, ou seja, que defina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes. A lei deve abranger todas as normas relativas à incidência real, à incidência pessoal, à taxa, aos benefícios fiscais e às garantias dos contribuintes (artigo 103, nº
10
2 da CRP). E deve também contemplar a liquidação e cobrança dos impostos, que não deixam de estar sujeitas ao princípio da legalidade fiscal (al. a) do n.° 2 do art. 8 da LGT). Para garantir uma boa aplicação da lei, foi concedida uma margem de apreciação à Administração Fiscal, seja através da concessão de verdadeiras faculdades discricionárias, seja através da utilização de conceitos indeterminados, seja mesmo através da edição de preceitos mistos. Alguns exemplos de poderes discricionários encontram-se, por exemplo, no art. 29°, n.° 4 do CIRS, no art. 28.°, n.° 3 do CIRC, no art. 29. n.° 5, al. b) do CIRC), no art. 33.°, n.° l, al. d) do CRC) art. 58.° do CIRCe no art. 69.° do CIRC 11 . Como exemplos de conceitos indeterminados utilizados pelo legislador fiscal, podemos indicar o art. 2.°, n.° 4, do CIVA, o art. 30.º, n.° 2 CIRC, o art. 59.°, n.° 1 CIRC, o art. 61.°, nº 1 do CIRC. Finalmente, como conceitos mistos, em que se associam uma atribuição de discricionariedade e uma margem de livre apreciação na aplicação de conceitos indeterminados, podemos apontar as hipóteses previstas no art. 11.° do CIVA, que dispõe que o Ministro das Finanças poderá determinar a sujeição ao imposto de algumas das actividades isentas nos n. os 36) e 37) do art. 9.° do mesmo Código, sempre que as respectivas isenções ocasionem distorções significativas da concorrência. 1.1.2. O princípio da segurança jurídica O princípio da segurança jurídica permite aos cidadãos tomarem as suas decisões com a possibilidade de previsão das consequências que delas resultam 12 . O princípio da segurança jurídica impõe-se ao legislador, limitando-o na elaboração de normas retroactivas (desfavoráveis), e na revogabilidade das leis fiscais (favoráveis). Porém, pode acontecer que o princípio da segurança jurídica seja invocado para resolver os problemas que a retroactividade continua a colocar. Assim sucede, por exemplo, no caso de a administração ou de o próprio legislador pretender recuperar impostos não cobrados em virtude de a anterior interpretação ilegal da administração os excluir da zona de incidência ou os atirar para os benefícios fiscais 13 . 11
) É de acrescentar aqui o caso de atribuição de discricionariedade, embora relativa a obrigações fiscais acessórias, previsto no art. 28.º. n.º 11. do CIVA, em que se atribui ao Ministro das Finanças poder de dispensar a obrigação da apresentação dos mapas recapitulativos relativos a clientes e fornecedores no concernente a operações em que seja especialmente difícil o seu cumprimento. 12 ) José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 75. 13 ) V, a este respeito, o Ac. do STA, de 26-10-1997, Rec. n.° 17.626, anotado por Clotilde C. Palma, no Fisco, 70/71, Maio/Junho 1995, p. 109 e ss., em que a Administração Fiscal, interpretando erradamente a disposição legal contida na al. x) do n.° 2 do art. 1.° da Lei n.° 23/91, de 4-7, em que se concedia uma amnistia, induziu em erro o contribuinte. Com efeito, depois de este ter solicitado à Administração Fiscal a aplicação daquela amnistia, viu a mesma ser-lhe recusada pela
11
Sucede que o princípio da segurança jurídica nem sempre tem sido respeitado, como se pode verificar no caso de caducidade do direito à liquidação, previsto nos artigos 45.° e seguintes da LGT, cujo prazo era, antes da LGT, de cinco anos, e foi reduzido para quatro anos, enquanto a lei não fixar outro prazo, conforme dispõe o artigo 45.°, l, da LGT. Noutras situações, prevê-se um alargamento do prazo de caducidade, em caso de reporte de prejuízo (artigo 45.º, n.º 3 da LGT), que pode ser de seis anos no caso do IRC e de cinco anos para o IRS (artigo 47 do CIRC e 55 do CIRS). Alargou-se, igualmente, nos termos do artigo 46 da LGT, as causas de suspensão do prazo de caducidade, o que acaba por representar um grave atentado ao direito à segurança 14 . Resta que a única defesa para o contribuinte é a prescrição, tendo o prazo de caducidade subido, portanto, para o prazo da prescrição que é de oito anos (artigo 48.° da LGT). 1.1.3. O princípio da igualdade tributária O princípio da igualdade obriga a tratar de «forma desigual o que não é igual» (art. 104, n° 1 da CRP). A lei constitucional faz uma expressa referência ao princípio da igualdade e implicitamente ao princípio da capacidade contributiva. Enquanto critério da tributação, a capacidade contributiva vale apenas relativamente aos impostos fiscais e diz respeito somente aos contribuintes, sejam cidadãos ou estrangeiros, pessoas singulares ou colectivas. Exige do sistema fiscal uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza (art. 103, n.° 1 da CRP) e, ao imposto sobre o rendimento, a diminuição das desigualdades (art. 104.°, n.° 1 da CRP), excluindo da tributação, por conseguinte, o mínimo existencial. Este princípio determina que a cada categoria de rendimento sejam deduzidas as despesas específicas para a sua obtenção e imprescindíveis à própria existência do contribuinte (mínimo de existência) (Cf. art. 4.º, n.º 1 e 6.°, n.° l da LGT). 1.1.4. A proibição de discriminação entre os contribuintes casados e solteiros A consideração fiscal da família, requerida pela Constituição (arts. 67.°, n.° 2 e 104.°, n.° 1), implica a proibição de discriminações entre os contribuintes casados Administração Fiscal com o argumento de que afinal a lei da amnistia não era aplicável ao caso. O STA, justamente porque a amnistia era inaplicável ao caso, concluiu que, muito embora, em virtude do princípio da boa fé, se possa verificar aqui um caso de responsabilidade civil extracontratual da Administração Fiscal, nunca poderia anular o acto de recusa de aplicação da amnistia. 14 ) Diogo Leite de Campos, Direito Tributário, 2ª edição, Coimbra, 2003, p. 11 6.
12
ou com filhos e os contribuintes solteiros ou sem filhos. As pessoas não podem passar a pagar mais impostos pelo simples facto de constituírem família (art. 6.°, n.° 3 da LGT). O princípio do respeito pela família obriga, por outro lado, a não tributação do mínimo de existência conjugal ou familiar e a dedução à matéria colectável (e não à colecta) dos encargos com a educação dos dependentes. De salientar que o nosso ordenamento jurídico-fiscal mantém a discriminação entre os unidos de facto e os casados, uma vez que enquanto os primeiros podem optar pela tributação conjunta ou manterem-se na tributação separada, os segundos estão obrigados à tributação conjunta. Para que os casados não sejam prejudicados face aos solteiros ou unidos de facto, prevê-se a aplicação do princípio do splitting , apesar de não constituir uma imposição da nossa Constituição. O facto de o CIRS adoptar o sistema do quociente conjugal ( splitting ) em lugar do quociente familiar (divisão pelo número de membros do agregado familiar), desfavorece fiscalmente as famílias numerosas. 1.1.5. O princípio do Estado social Este princípio está expressamente consagrado na Constituição que manda "promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal" (art. 81.°, al. b)); e criar um sistema fiscal que vise uma justa repartição dos rendimentos e da riqueza (art. 103, n.° 1). 1.1.6. A base constitucional do sistema fiscal A Constituição da República Portuguesa fixa as finalidades do sistema fiscal, estabelecendo no art. 103.°, n.° l, que o sistema fiscal tem, em primeiro lugar, uma finalidade financeira, pois “visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas" e, em segundo lugar, visa igualmente "uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza" 15 . A Constituição também delimita os contornos do nosso sistema fiscal no art. 104.°, em que se prevê 1) um imposto único e progressivo sobre o rendimento pessoal, 2) a tributação real como regra da tributação do rendimento das empresas, 3) uma tributação do património que contribua para a igualdade dos cidadãos, ou melhor, para a atenuação das desigualdades, e 4) uma tributação do consumo adaptada ao desenvolvimento económico e à justiça social. Vejamos cada um destes preceitos. a) O imposto pessoal sobre o rendimento 15
) Nos termos art. 81.°, al. b), incumbe ao Estado "promover a justiça social, assegurar a igualdade de oportunidades e operar as necessárias correcções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento, nomeadamente através da política fiscal".
13
A Constituição exige que o imposto pessoal sobre o rendimento seja: 1) único, 2) progressivo e 3) tenha em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar (v.g. despesas de saúde, educação, habitação e segurança). b) A tributação das empresas A tributação das empresas está actualmente distribuída pelo IRS, em que são tributadas as empresas singulares, e pelo IRC, em que são tributadas as empresas colectivas. À haver tributação do rendimento das empresas 16 , ela assentará fundamentalmente no rendimento real, isto é, no rendimento contabilístico (art. 104, n.º 2 da CRP). A Constituição não impõe a forma de pessoa colectiva para o exercício de quaisquer actividades económicas ou sociais. Por outro lado, a separação entre as empresas singulares, tributadas em IRS e a tributação das empresas colectivas, tributadas em IRC é artificial 17 . Uma afirmação que tem diversas manifestações no art. 6.° e 12.° do CIRC, no art. 2.° do CIRC, no art. 25.° da LGT, no art. 29.° do CIRS18 . c) A tributação do património O i mposto muni cipal sobre imóveis (I M I )
Em lugar da contribuição autárquica foi criado o Imposto Municipal sobre Imóveis, o IMI 19 . O sistema fiscal passa a ser dotado de um quadro legal de avaliações assente em factores objectivos, e sem espaço para a subjectividade e discricionariedade do avaliador 20 . Criou-se, desde modo, um novo sistema de determinação do valor patrimonial dos imóveis de forma a repartir mais justamente a tributação da propriedade imobiliária. Procedeu-se a uma redução substancial dos limites das taxas, fixados em 0,4% e 0,8%, e o estabelecimento de limites ao aumento da colecta, por forma a que não ocorra nem um agravamento exagerado e abrupto do imposto a pagar, nem uma quebra na receita, competindo aos municípios determinar em concreto qual a taxa a aplicar. 16
) V. Xavier de Basto, «O imposto sobre as sociedades e o imposto pessoal de rendimento separação ou integração?». Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor J. J. Teixeira Ribeiro, n.° especial do BFDC. vol. IV. 1980. p. 390 e ss. 17 ) Pois, separam-se as sociedades civis, por via de regra desprovidas de personalidade jurídica, das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, dotadas de personalidade jurídica. 18 ) José Casalta Nabais, “Alguns Aspectos do Quadro Constitucional da Tributação das Empresas”, Fisco, nº 103/104, Junho 2002, p. 15. 19 ) Código do IMI aprovado pelo D-L nº 287/2003, de 12 de Novembro. 20 ) Preâmbulo do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis.
14
O i mposto mu ni cipal sobre as tr ansmissões onerosas de imóveis (I M T)
O imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT), que substitui o imposto municipal de sisa, incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade sobre imóveis e das figuras parcelares desse direito, podendo estes direitos transmitir-se sob diversas formas. O Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosos de Imóveis (CIMT 21 ) continua também a ficcionar, como transmissões sujeitas a imposto, determinadas operações que directa ou indirectamente implicam a transmissão de bens imóveis. É o caso, por exemplo, das promessas de aquisição e alienação dos bens, do contrato de locação em que seja desde logo clausulada a posterior venda do imóvel, dos arrendamentos a longo prazo e da aquisição de partes sociais que confiram ao titular uma participação dominante em determinadas sociedades comerciais se o seu activo for constituído por bens imóveis. Em matéria de taxas, procedeu-se a uma descida muito significativa dos seus valores nominais, o que originou uma clara diminuição da carga fiscal relativa às aquisições de imóveis. d) A tributação do consumo A Constituição exige a adaptação da estrutura do consumo à evolução das necessidades do desenvolvimento económico e da justiça social e a oneração dos consumos de luxo, sendo proibido a existência de taxas agravadas de IVA na União Europeia. 2. O Direito Comunitário Devemos distingue dois níveis: o direito comunitário fiscal próprio e o direito comunitário fiscal interestadual. O primeiro - o direito comunitário fiscal próprio - é o que disciplina os impostos comunitários próprios, em que temos: 1) a pauta aduaneira comum, 2) os impostos niveladores agrícolas, a tributação antidumping e a tributação compensadora, e 3) os impostos sobre os funcionários europeus. O segundo - o direito comunitário fiscal interestadual – comporta: 1) a disciplina dos impostos indirectos - isto é, o IVA e os impostos especiais sobre o consumo respeitantes ao tabaco, bebidas alcoólicas e produtos petrolíferos -, arts. 92.° e 93.° do TCE; 2) a disciplina de alguns aspectos da tributação directa das empresas, baseada no agora art. 94.° do TCE e concretizada no regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permuta de acções entre sociedades de diferentes Estados membros 22 , no regime fiscal comum aplicável às 21
) Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003 de 12 de Novembro. ) V. a Directiva do Conselho 90/434/CEE, relativa ao regime fiscal comum das fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de diferentes Estados membros. 22
15
sociedades mãe e sociedades afiliadas de diferentes Estados membros 23 e na eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros de empresas associadas 24 . A respeito do direito comunitário fiscal interestadual, prevê-se uma harmonização das legislações fiscais dos Estados membros. Esta harmonização fiscal passa por vários meios: 1) harmonização jurídica, que é realizada através de regulamentos, directivas, recomendações, decisões, convenções, e decisões do TJCE; 2) harmonização política, quando é concretizada através de instrumentos políticos como são os códigos de conduta, de que é exemplo o Código de Conduta sobre a fiscalidade das empresas 25 . 3. As convenções internacionais As convenções internacionais são elaboradas para evitar a dupla tributação e lutar contra a evasão e fraude fiscais, bem como evitar o uso, pelos seus residentes, dos chamados paraísos fiscais em que os impostos são quase inexistentes 26 . A dupla tributação internacional é afastada pelos regimes internos, como o previsto em sede do IRC e do IRS, que consagram um crédito de imposto, relativamente às pessoas colectivas, igual ao imposto pago no estrangeiro ou à fracção correspondente do IRC (art. 85.° do CIRC); e um crédito de imposto, relativamente às pessoas singulares no respeitantes a todos os rendimentos, igual ao imposto pago no estrangeiro ou à fracção da colecta correspondente do IRS (art. 81.° do CIRS). 4. As leis ordinárias Além das leis e dos decretos-leis são também actos legislativos os decretos legislativos regionais, que versam sobre matérias de interesse específico para as respectivas regiões, não podendo tais decretos regionais dispor contra as leis gerais da República. 5. Regulamentos 5.1. Noção Os regulamentos são normas jurídicas dos órgãos administrativos elaboradas no 23
) V. a Directiva do Conselho 90/435/CEE, respeitante ao regime fiscal comum aplicável à distribuição de lucros entre sociedades afiliadas e sociedades-mães de diferentes Estados membros. 24 ) V. a Convenção 90/436/CEE, de 26-6-1990, em vigor desde 1-1-1995, uma convenção de arbitragem que tem por objectivo a eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros de empresas associadas, impondo aos Estados membros alguns procedimentos em sede de preços de transferência. 25 ) Temos dos tipos de harmonização fiscal baseados nas causas que levam os Estados a essa harmonização: 1) a harmonização fiscal espontânea ou harmonização fiscal pelo mercado, na qual há que distinguir ainda a causada pela concorrência fiscal benéfica da causada pela concorrência fiscal prejudicial; 2) a harmonização fiscal centralizada ou harmonização fiscal pelo Estado, que tem uma causa próxima política. 26 ) José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 63.
16
desempenho da função administrativa, e que não podem regular os elementos essenciais dos impostos. Compete ao governo elaborar os regulamentos tendentes à execução das leis fiscais. Também podem ser elaborados regulamentos regionais pelas regiões autónomas (art. 227 da CRP, n° l, al. a)) e regulamentos locais pelas autarquias locais em matéria de impostos locais (art. 238 da CRP). 5.2. O carácter vinculativo dos regulamentos Os regulamentos, sejam regulamentos do Governo, sejam os regulamentos das regiões autónomas, sejam os regulamentos das autarquias locais, não podem disciplinar os elementos essenciais dos impostos, nem versar sobre a liquidação (lato sensu ) ou a cobrança dos impostos (por força do art. 8.°, n.° 2, al. a), da LGT). De mencionar os regulamentos editados por entidades públicas e institutos públicos, a que a lei confere poderes de regulamentação e supervisão. É o caso, dos avisos do Banco de Portugal27 e das normas regulamentares do Instituto de Seguros de Portugal 28 que dispõem de um amplo poder regulamentar. Em relação às chamadas orientações administrativas, tradicionalmente apresentadas nas mais diversas formas como instruções, circulares, ofícioscirculares, ofícios circulados, despachos normativos, regulamentos, pareceres, etc., a administração tributária está vinculada às orientações gené ricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza 29 emitidas sobre a interpretação das normas tributárias que estiverem em vigor no momento do facto tributário (al. b) do n°4 do artigo 68 da LGT), muito embora essa vinculação cesse quando a administração actue em cumprimento de decisão judicial (n.°7) 30 . 6. O costume O costume poderá revelar-se em certos hábitos burocráticos, dos quais não resultam normas jurídicas com qualquer espécie de valor vinculativo. A formação de práticas burocráticas não assume, naturalmente, o valor de normas costumeiras. Mas o Direito Fiscal nada obsta, em teoria, à formação de normas 27
) V. o art. 102.° da Constituição, a Lei Orgânica do Banco de Portugal (aprovada pela Lei n.° 5/98, de 31 de Janeiro, e alterada pelo DL n.° 118/2001, de 17 de Abril) e o art. 115.° do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (aprovado pelo DL n.° 298/92, de 31 de Dezembro e alterado por diversos diplomas posteriores entre os quais o DL n.° 2001/12002, de 26 de Setembro que o republicou em anexo). 28 ) V. o art. 242.° do DL n.° 94-B/98, de 17 de Abril (diploma que regula as Condições de Acesso à Actividade Seguradora) e o art. 4.°, n.° 3, do DL n.° 289/2001, de 13 de Novembro (diploma que aprovou o actual Estatuto do Instituto de Seguros de Portugal). 29 ) Prescreve o art. 55.°, n.° 3, do CPPT que essas orientações "devem constar obrigatoriamente de circulares administrativas". 30 ) Acrescente-se que, nos termos do n.° 5 do referido art. 68.°. "não são invocáveis retroactivamente perante os contribuintes, que tenham agido com base numa interpretação plausível e de boa fé da lei os actos administrativos decorrentes de orientações genéricas emitidas pela administração tributária". A respeito desta disposição, não parece correcta a sua inserção no art. 68.° da LGT, que tem por epígrafe "informações vinculativas", pelo que estaria melhor localizada no artigo ou artigos relativos à interpretação das normas fiscais.
17
costumeiras. 7. A doutrina Por doutrina entende-se os estudos, trabalhos, opiniões, comentários, lições e pareceres produzidos pelos especialistas, juristas, economistas, altos funcionários do Ministério das Finanças e professores universitários especializados. A doutrina é um importante instrumento de diálogo entre a doutrina e a jurisprudência, tal como se pode ver nas anotações aos acórdãos do STA, TCA e (em sede do direito constitucional fiscal) do Tribunal Constitucional. O que significa que um parecer dum especialista de Direito Fiscal pode ter influência nas decisões dos tribunais. A doutrina não é fonte directa de Direito Fiscal, mas pode contribuir para a modificação do Direito Fiscal. 8. A jurisprudência As decisões dos tribunais estabelecem o direito para o caso concreto que foi julgado mas não vale automaticamente para outro caso, mesmo que esteja em tudo análogo ao primeiro, julgado no mesmo ou noutro tribunal. As decisões dos tribunais só valem para os casos em que foram proferidas. À semelhança do que tem sido tradicional relativamente ao STJ, também o STA pode pronunciar acórdãos de uniformização da jurisprudência, julgando a oposição de acórdãos 31 , ou até mesmo a oposição de sentenças dos tribunais tributários de l.ª instância - art. 280.°, n.° 5, do CPPT. Como acontece no direito em geral, as decisões dos tribunais administrativos e fiscais não constituem fonte formal de direito. 9. Os contratos Os contratos fiscais encontram-se previstos no art. 37 ° da LGT. Podemos distinguir, por um lado, os contratos fiscais stricto sensu em que intervêm a Administração Fiscal e o contribuinte, e se concretizam sobretudo na atribuição de benefícios fiscais, mormente de incentivos ou estímulos fiscais, e, por outro lado, os contratos em que se integram, para além dos referidos contratos fiscais stricto sensu , os contratos que têm por objecto o lançamento, a liquidação ou a cobrança do imposto, em que intervêm a Administração Fiscal e o próprio sujeito passivo, ou terceiros. Como exemplo do primeiro tipo de contratos fiscais, temos os benefícios fiscais contratuais, consagrados no art. 39.° do EBF. Como exemplo do segundo tipo de contratos fiscais, há ainda dois tipos: um, em 31
) Nos termos do art. 27.° do ETAF, e arts. 280.°, n.° 2, e 284.° do CPPT.
18
que a administração tributária contrata com o próprio contribuinte ou sujeito passivo aspectos da liquidação ou cobrança do respectivo imposto; outro em que a administração tributária contrata com certas entidades a prestação de serviços relativamente à liquidação e cobrança de impostos alheios. Como exemplo do primeiro tipo, existe o contrato de avença no imposto de jogo, previsto no art. 89.° do DL n.° 422/89, de 2 de Dezembro, entre as empresas concessionárias das zonas de jogo e a Inspecção Geral dos Jogos, e que tem por objecto a determinação, de forma sintética e por acordo, da matéria colectável do imposto de jogo. No respeitante aos contratos de prestação de serviços em sede da liquidação ou cobrança de impostos alheios, a administração tributária pode “contratar o serviço de quaisquer outras entidades para a colaboração em operações de entrega e recepção de declarações ou outros documentos ou de processamento da liquidação ou cobrança das obrigações tributárias" (estabelece o n.° l do art. 51.° do CPPT). 10. A hierarquia das fontes de Direito Fiscal Podemos estabelecer a seguinte hierarquização das fontes de Direito Fiscal: 1. Princípios tributários fundamentais (que integrarão as normas de direito internacional geral ou comum); 2. Constituição; 3. Normas internacionais convencionais; 4. Lei ordinária formal e decreto-lei; 5. Regulamento. As normas internacionais precedem as leis ordinárias formais e os decretos-leis. Enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português, as normas internacionais (art. 8 da CRP), não poderão ser derrogadas por uma lei ou um decreto-lei.
CAPÍTULO V INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DA LEI FISCAL 1. Interpretação da lei fiscal 1.1. A interpretação das normas jurídico-fiscais 32 As normas fiscais devem ser interpretadas como quaisquer outras jurídicas 33 . As normas relativas à soberania fiscal, ao lançamento, à organização de serviços, à fiscalização, ao contencioso, e à sanção devem ser interpretados nos termos comuns de Direito (n.° l do art. 11.° da LGT). 32
) V. J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, p. 175 e ss.; A. SANTOS JUSTO, Introdução ao Estudo do Direito, p. 313 e ss. 33 ) José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 103 e segs.
19
O n.º 1 do art. 11.° da LGT parece estar a contradizer o prescrito no n.° 3 do art. 11.° da LGT 34 , quando diz que "persistindo dúvidas sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários". Esta disposição parece consagrar a teoria da interpretação económica, contrariando o princípio de que na interpretação das normas jurídicas fiscais devem ser observadas as regras gerais da interpretação. Mas, na prática, a regra geral em matéria de interpretação tem sido a de proceder a uma interpretação literal ou interpretação restritiva das normas fiscais. 1.2. A interpretação das convenções de dupla tributação Importa aqui fazer uma referência especial à interpretação das convenções de dupla tributação (CDTs) em que Portugal é parte e ao Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património da OCDE no momento da interpretação das CDTs 35 . Particular alusão merece o art. 3, § 2. do Modelo OCDE que estabelece que, para a aplicação da convenção por um Estado contratante, qualquer expressão que nela não se encontre definida terá o significado que lhe é atribuído pela legislação desse Estado contratante relativa ao correspondente imposto, a menos que o contexto imponha interpretação diferente. 2. A integração das normas jurídico-físcais 2.1. Princípio O legislador da LGT decidiu que "as lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica" (n.° 4 do seu art. 11.°). Resulta desta disposição a proibição de colmatar lacunas, seja através do recurso à analogia, seja por qualquer outro modo de preenchimento de lacunas. Porém, algum sector da doutrina admite a integração das lac unas no domínio da reserva de lei fiscal, sempre que a lei especificamente o preveja 36 . 2.2. As cláusulas anti-abuso ou medidas contra a evasão internacional Os ordenamentos jurídicos fiscais consagram, frequentemente, cláusulas antiabuso gerais e especiais d estinadas a prevenir e a reprimir as crescentes práticas de evasão e fraude fiscais 37 . O CIRC introduziu toda uma série de cláusulas especiais anti-abuso, tais como as previstas nos art. 58.°, 59.°, 60.°, 61.°, e 67.°, n.° 10. 34
) O n.° 3 consagra a teoria da interpretação económica. V. MENEZES LEITÃO, «As tendências da reforma fiscal: mais ou menos garantias para os Contribuintes?», Fiscalidade, 4, Outubro 2000, p. 9 e s. 35 ) OCDE, Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa, 1995. 36 ) José Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos, cit., p. 385 e segs. 37 ) V. SALDANHA Sanches, Manual de Direito Fiscal, p. 120 e ss.
20
A LGT consagrou no art. 38.°, n.° 2 da LGT o princípio da cláusula geral antiabuso, considerando que "são ineficazes no âmbito tributário os actos ou negócios jurídicos essencial ou principalmente dirigidos, por meios artificiosos ou fraudulentos e com abuso das formas jurídicas, à redução, eliminação ou diferimento temporal de impostos que seriam devidos em resultados de factos, actos ou negócios jurídicos de idêntico fim económico, ou à obtenção de vantagens fiscais que não seriam alcançadas, total ou parcialmente, sem utilização desses meios, efectuando-se então a tributação de acordo com as normas aplicáveis na sua ausência e não se produzindo as vantagens fiscais referidas". A liquidação de qualquer imposto com base em disposições anti-abuso deve depender da abertura de um procedimento próprio que a administração tributária tem de seguir na aplicação das disposições anti-abuso (art. 63.° do CPPT).
CAPÍTULO VI A APLICAÇÃO DAS NORMAS FISCAIS 1. Aplicação das normas fiscais no tempo 1.1. Princípio Em regra geral, as leis fiscais fixam expressamente a data da sua entrada em vigor. No caso de não a fixarem, a entrada em vigor far-se-á de acordo com os prazos de . vocatio l egis Quanto à cessação da vigência das normas fiscais, esta verifica-se nos termos comuns pela revogação ou pela caducidade. A revogação pode ser expressa (quando a nova lei declara explicitamente que tal ou tais disposições legais são revogadas) ou tácita (quando as disposições da nova lei são incompatíveis com as da lei anterior, neste caso, a lei nova predomina sobre a lei antiga), total ou parcial (quando apenas algumas das disposições da lei anterior são afectadas pela nova lei, conservando-se as restantes em vigor). 1. 2. A não retroactividade das leis fiscais As normas fiscais não devem ser susceptíveis de aplicação retroactiva, conforme dispõem os artigos 103, n.º 3 da CRP - princípio da segurança jurídica -, e 12 da LGT. O princípio da aplicação imediata da lei nova aos procedimentos e processos em curso, comporta, contudo, duas importantes excepções: por uma lado, a lei nova não se aplica se afectar garantias, direitos ou interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes 38 e, por outro, a lei nova não se aplica se se tratar de 38
) O Tribunal excluiu a «retroactividade intolerável, que afecta de forma inadmissível e arbitrária os direitos e expectativas legitimamente fundados dos contribuintes» (Ac. de 2 de Março de 1988, in
21
normas que tenham por função o desenvolvimento de normas de incidência tributária. 2. Aplicação das normas fiscais no espaço 2.1. Princípio da territorialidade As normas fiscais aplicam-se dentro do território nacional, aos factos que ocorram em território nacional e abrange todos os rendimentos obtidos pelo sujeito passivo com domicílio, sede ou direcção efectiva em território português, independentemente do local onde sejam obtidos (art. 13 da LGT). Vejamos alguns dos elementos de conexão relevantes presentes em cada um dos diversos tipos de impostos. Pelo que respeita aos impostos sobre o rendimento e sobre o capital, os elementos de conexão legítimos são a residência do beneficiário do rendimento ou o local da produção do rendimento. Em relação aos impostos sobre o consumo, os elementos de conexão são a origem ou o destino dos bens transaccionados. Em regra, os impostos sobre o consumo devem ser lançados no país do consumidor. No país de origem se procede em geral à isenção com restituição ou isenção do imposto no momento da exportação, verificando-se a primeira modalidade, a isenção com restituição, em impostos do tipo IVA, e a segunda, a isenção, em impostos monofásicos como os IECs. Deste modo, evitam-se a dupla tributação e a ausência de tributação. Em matéria de tributação de prestações de serviços, os elementos de conexão são: a sede da actividade ou o estabelecimento estável, em alternativa; e, subsidiariamente, o domicílio do prestador de serviços (artigo 6.°, n.° 4 do CIVA). As prestações de serviços acessórios de transporte, de serviços de carácter artístico, científico, desportivo, recreativo, de ensino e similares, são tributáveis no território em que as prestações sejam realizadas (artigo 6.°, n. os 5 e 6 do CIVA). No domínio dos impostos sobre o património, aplica-se a lei do local da situação dos bens patrimoniais. 2.2. A eficácia das normas fiscais no espaço Para evitar conflitos positivos e negativos de tributação, isto é, para evitar duplas tributações ou ausência de tributação, têm vindo a ser celebrados convenções bilaterais entre os Estados e adoptados métodos para eliminar ou atenuar a dupla tributação do rendimento no Estado da residência: o método da isenção e o método da imputação ou do crédito de imposto. Pelo método da isenção, o Estado da residência não tem competência para tributar «Bol. Min. Justiça », n° 375, p. 89 e s.).
22
os rendimentos do contribuinte e, neste caso, exclui-os do lançamento do imposto. O método da isenção conhece duas modalidades: a isenção integral, em que o rendimento de fonte externa não é tido em consideração para efeitos de tributação dos rendimentos de fonte interna, e a isenção com progressividade, em que o rendimento de fonte externa é tido em conta, juntamente com os de fonte interna, para o efeito de determinação da taxa progressiva aplicável ao rendimento global (de fonte interna). Pelo método da imputação, o Estado residente, que não tenha poder para tributar certos rendimentos, calcula o imposto somando todos os rendimentos do contribuinte, deduzindo então o imposto pago no outro Estado correspondente a esse rendimento. O método da imputação ou do crédito de imposto (tax credit) conhece duas modalidades principais: a imputação integral, se o Estado da residência deduz o montante total do imposto efectivamente pago no país da origem do rendimento; e a imputação ordinária, se o Estado da residência limita a dedução à fracção do seu próprio imposto correspondente aos rendimentos provenientes do país da fonte. Por outras palavras, a imputação é ordinária “se apenas se abate o imposto até ao montant e a que tais rendimentos estariam sujeitos se fossem tributados no Estado residente” 39 (arts. 81.° CIRS e 85.° do CIRC). Para além dessas modalidades, o método da imputação ou do crédito de imposto conhece duas outras especificidades: por um lado, o chamado crédito de imposto fictício (tax spari ng credit), em que o Estado da residência não deduz o imposto efectivamente pago no país da origem dos rendimentos, mas o imposto que teria sido pago não fosse a circunstância de aí tais rendimentos serem objecto de isenção; e, por outro lado, o chamado crédito de imposto presumido, em que o Estado da residência deduz um montante superior ao do imposto efectivamente pago e retido na fonte no país da origem dos rendimentos, país este que, numa política de atracção do investimento estrangeiro, pratica uma tributação reduzida de tais rendimentos. A adopção dos métodos do crédito de imposto fictício e do crédito de imposto presumido justificam-se nas CDTs entre Portugal e os países com um nível de desenvolvimento económico inferior, como é o caso das CDTs com países africanos, nomeadamente, a CDT com Moçambique 40 .
CAPÍTULO VII OS IMPOSTOS 1. A noção de imposto 1.1. Definição O imposto apresenta-se como uma «prestação patrimonial, integrada numa 39
) A. Amorim Pereira, Noções de Direito Fiscal, Athena Editora, p 51. ) ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional, p. 51l e ss., Maria M. Cordeiro Mesquita, «A política convencional portuguesa em matéria de dupla tributação: contributos para uma redefinição», p. 387 e s. 40
23
relação obrigacional, imposta por lei a um sujeito, a favor de uma entidade que exerça funções públicas, com o fim de satisfazer os seus objectivos próprios, e sem carácter de sanção» 41 . Pode ser ainda definido como toda a “prestação pecuniária, singular ou reiterada, que não apresenta conexão com qualquer contra-prestação retributiva e de que é titular uma entidade pública que utiliza as receitas assim obtidas para a cobertura das suas despesas” 42 . O imposto apresenta três elementos constit utivos: um elemento objectivo, um elemento subjectivo e um elemento teleológico 43 . «Objectivamente o imposto é uma prestação pecuniária, unilateral, definitiva e coactiva. Por sua vez, subjectivamente, o imposto é uma prestação (...) exigida a (ou devida por) detentores (individuais ou colectivos) de capacidade contributiva a favor de entidades que exerçam funções ou tarefas públicas. Finalmente, em termos teleológicos, o imposto é exigido pelas entidades que exerçam funções públicas para a realização dessas funções, conquanto que não tenham carácter sancionatório»44 . Resulta do exposto que o imposto é uma prestação obrigatória, pecuniária, unilateral, coactiva, definitiva, com vista a financiar as despesas públicas, exigida a detentores individuais ou colectivos de capacidade contributiva, a favor de entidades que exerçam funções ou tarefas públicas, conquanto que não tem carácter sancionatório. 1.2. O carácter de prestação unilateral O imposto é uma prestação unilateral, não lhe correspondendo assim qualquer contraprestação específica a favor do contribuinte. “A exigência do imposto fundase unicamente no poder de tributar” 45 . É o que o distingue claramente dos tributos bilaterais, nomeadamente as taxas. 1.3. O carácter obrigacional do imposto Em geral, só é tributado quem compra, vende, aceita uma herança, exerce uma actividade, importa uma mercadoria, etc. Essa obrigação fiscal tem que ter origem na lei, conforme dispõe o artigo 103, n.º 2 da Constituição. 41
) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 22. 42 ) José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 9. 43 ) V., neste sentido, A. Braz Teixeira, Princípios de Direito Fiscal, vol. I, 3.ª ed., Coimbra. 1985, p. 36 e ss., e O Dever Fundamental de Pagar Impostos, p. 223 e ss. De referir que “ a interpretação teleológica pode conduzir a uma maior sistematicidade no Direito Fiscal, como uma técnica necessariamente estruturante e atribuidora de um sentido àquilo que será de outra forma um mero conglomerado de leis, obedecendo cada uma delas a um fim conjuntural, em potencial conflito com todos os outros objectivos e finalidades que levaram à publicação de outras leis igualmente marcadas pela prossecução de interesses conjunturais”, José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 111. 44 ) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, Ed. Almedina. 2000. p. 34. 45 ) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 26.
24
O imposto é geralmente considerado como o obj ecto mediato da obrigação, e a entrega da prestação pecuniária o objecto imediato 46 . 1.4. Prestação pecuniária O imposto é uma prestação pecuniária que se distingue «quer das prestações de bens ou serviços exigidas aos particulares, em certas circunstâncias excepcionais, através de requisição administrativa, quer ainda da prestação consubstanciada na expropriação por utilidade pública” 47 . O imposto como prestação pecuniária constitui a forma normal de financiamento do Estado contemporâneo. 1.5. Prestação coactiva O imposto é uma prestação que tem por fundamento a lei. «A noção de coactividade refere-se não à fonte de obrigação, à sua génese, mas ao cumprimento, à possibilidade que o credor tem de usar da força (pública) para obter o que não for espontaneamente cum prido. Nesta medida, todas as obrigações são coactivas, e não só a obrigação fiscal» 48 . A obrigação de imposto surge por força do encontro do facto tributário com a lei, independentemente portanto de qualquer manifestação de vontade do contribuinte (n° l e 2 do art. 36.° da LGT). 1.6. Prestação definitiva Normalmente, o imposto não dá lugar a qualquer reembolso, restituição ou indemnização. Só há reembolso quando é restituído o imposto, ou parte deste, por ter sido pago indevidamente. Também pode suceder que a liquidação do imposto seja anulada judicialmente, revogada em procedimento administrativo, ou o encargo fiscal tenha sido suprimido por ter sido declarado inconstitucional. Por exemplo, o IVA pode ser reembolsado quando é feita a compensação entre o imposto recebido e o imposto pago. 1.7. Um meio de financiamento das despesas públicas Para financiar as despesas públicas, o Estado necessita das receitas provenientes 46
) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Coimbra, 1997, p. 22. 47 ) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, Ed. Almedina. 2000. p. 34-35. Tanto a requisição administrativa como a expropriação por utilidade pública ainda se distinguem dos impostos por não constituírem prestações definitivas, pois dão lugar a indemnização. Sobre estas figuras, v. MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, tomo 11. 9.ª ed., reimp. de 1980, p. 1016 e ss.: GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed, Coimbra, 1993, p. 334 e ss.. 48 ) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 24.
25
dos impostos, das taxas, dos empréstimos, etc. Mas, o objectivo dos impostos não é só de cobrir as despesas públicas, mas também de servir de instrumento de política económica e social do país. Neste sentido, o imposto influencia o comportamento dos agentes económicos. O imposto influencia “a conjuntura (lutando contra a inflação, restringido o consumo), de ordenação do território (concedendo-se benefícios ou tributando-se mais pesadamente empresas com sede em certas regiões), de promover a exportação, etc. No plano social, a tributação tem sido utilizada como meio de redistribuir a riqueza entre os particulares, promovendo o nivelamento dos rendimentos e das fortunas” 49 . 1.8. Uma prestação exigida a detentores de capacidade contributiva O imposto é uma prestação exigida a detentores individuais ou colectivos de capacidade contributiva, a favor de entidades que exerçam funções ou tarefas públicas (art. 4.°, n° l, da LGT). A capacidade contributiva reporta-se “ao nível do bem-estar económico de que o contribuinte goza, sendo que o primeiro indicador de tal bem-estar é o rendimento” 50 . 1.9. Uma prestação a favor de entidades que exerçam funções ou tarefas públicas O imposto é uma prestação a favor de pessoas colectivas públicas e de pessoas privadas que exerçam funções públicas. É o que ocorre no caso, por exemplo, das empresas concessionárias de obras públicas, de serviços públicos ou de bens do domínio público. 1.10. O imposto sem carácter sancionatório O imposto não tem uma função sancionatória. Se assim fosse, estaríamos perante uma multa (sanção pecuniária penal), uma coima (sanção pecuniária contraordenacional), um confisco (sanção penal traduzida na apreensão e correspondente perda a favor do Estado do produto obtido e dos instrumentos utilizados na prática de acto ilícito), uma indemnização (reparação do prejuízo ou dano causado a outrem através de acto ilícito), etc., mas nunca perante um imposto. 2. Algumas figuras tributárias afins do imposto 2.1. A divisão dicotómica dos tributos 2.1.1. O imposto e a taxa A distinção entre taxas e impostos reside no carácter bilateral das primeiras, e no 49
) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, p. 25. 50 ) Clotilde Celorico Palma, “Da evolução do conceito de capacidade contributiva”, CTF, AbrilJunho 2001, nº 402, p. 137.
26
carácter unilateral dos impostos. As primeiras implicam obrigações recíprocas para ambas as partes, enquanto que no imposto só há obrigações para o contribuinte. As taxas são contraprestações pagas ao Estado pelos particulares em contrapartida de serviços por aquele prestados a estes ou pela utilização de bens semi-públicos. A taxa é geralmente solicitada pelo particular. O que não significa que não há taxas independentes de qualquer solicitação, como é o caso das taxas judiciais exigidas aos réus, mesmo que não tenham solicitado os serviços prestados pelos tribunais. “Enquanto os impostos obedecem ao exigente princípio da legalidade fiscal e a sua medida tem por base o princípio da capacidade contributiva, as taxas (e demais tributos bilaterais) bastam-se com a reserva à lei parlamentar (ou decreto-lei parlamentarmente autorizado) do seu regime geral e a sua medida assenta no princípio da proporcionalidade taxa/prestação estadual propor cionada cionada ou taxa/custos específicos causados à comunidade (estadual ou local) » 51 . As taxas acabam também por estar sujeitas ao princípio da legalidade e à generalidade dos princípios que regulam os impostos. Como exemplos de taxas devidas por prestações de serviços, temos as taxas devidas pelos serviços de registo e notariado (emolumentos), pelos serviços de justiça (taxa de justiça), pelos serviços de educação pública (propinas), pelos serviços consulares, etc. O Estado cobra, igualmente, taxas pela utilização de bens do domínio público, pela utilização de espaços em feiras e mercados, pela ocupação de terrenos nos cemitérios, pela utilização de vias públicas (portagens), pela acostagem de navios nos portos e aterragem de aeronaves nos aeroportos, pela ocupação da via pública, pelas propinas universitárias pagas nas universidades públicas, pela recolha do lixo, pela realização de infra-estruturas urbanísticas, etc. 52 . 2.1.2. As contribuições especiais, as tarifas e as receitas parafiscais Para além dos impostos e das taxas, existem outras figuras como as contribuições especiais, as tarifas ou preços públicos, as receitas parafiscais. Em relação às contribuições especiais, é habitual distinguir-se as “contribuições de melhoria” das “contribuições por maiores despesa”. As contribuições de melhoria verificam-se naqueles casos em que é devida uma prestação, em virtude de uma vantagem económica particular, resultante do exercício de uma actividade administrativa. É assim que aos proprietários de terrenos valorizados por uma obra de urbanização é exigida uma contribuição de melhoria. O mesmo sucede quando o 51
) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, Ed. Almedina, 2000, p. 37-38. ) As taxas pela utilização do domínio público tanto se verificam em relação ao seu uso comum, como em relação ao seu uso privativo. Sobre a utilização do domínio público, v. Diogo Freitas do Amaral," A Utilização do Domínio Público pelos Particulares, Lisboa, 1965, e MARCELO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, tomo. II, 9ª ed., reimp. de 1980, p. 927 e ss.
52
27
Estado constrói uma estrada, ou crê infra-estruturas numa zona a urbanizar, dos quais resultam indirectamente benefícios inesperados para determinadas pessoas, que nenhum sacrifício suportaram para os obter. As contribuições por maiores despesas ocorrem naquelas situações em que é devida uma prestação em virtude de a actividade ex ercida ercida pelos particulares dar origem a uma maior despesa das autoridades públicas 53 . É o caso, por exemplo, dos proprietários de veículos muito pesados que naturalmente produzirão maior desgaste na via pública. Tais pessoas fiquem sujeitas a uma contribuição especial, o imposto de camionagem. No referente às tarifas, podemos considerar as tarifas exigidas pelos municípios, previstas no art. 20.° da LFL, pelas actividades de exploração dos sistemas públicos de distribuição de água, de drenagem de águas residuais, de recolha, depósito e tratamento de resíduos sólidos, de transportes colectivos de pessoas e mercadorias, de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão, etc. Relativamente às contribuições ou receitas parafiscais, trata-se de tributos (designação adoptada pela LGT – artigo 3.º - e pelo CPPT – artigo 1º) cobrados para a cobertura das despesas de pessoas colectivas públicas não territoriais, t erritoriais, como 54 é o caso das contribuições para a segurança social . Estas «prestações em causa aproximam-se dos impostos pelo facto de terem a sua origem na lei, de serem devidas a entidades que exercem funções públicas para a satisfação dos fins próprios destas, de terem carácter patrimonial e não constituírem uma sanção» 55 . A principal diferença resulta, fundamentalmente, do facto dos impostos serem instrumentos i nstrumentos de cobertura das despesas gerais do Estado, enquan enquanto que as contribuições sociais são instrumentos de cobertura do risco social 56 . 3. O âmbito do sistema fiscal português O sistema fiscal português articula um conjunto de impostos no plano horizontal e vertical. No plano horizontal, destaca-se os impostos sobre o rendimento, os impostos sobre o património e os impostos sobre o consumo, e no plano vertical, o sistema fiscal nacional, o sistema fiscal da União Europeia, e os (sub)sistemas fiscais que possam vir a constituir-se nas Regiões autónomas (art. 227. n.º 1. al. i da Constituição), ou mesmo os subsistemas fiscais autárquicos com as autarquias locais (nº 4 do art. 238.º da Constituição).
53
) A nossa LGT divide os tributos em impostos, taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas, destacando entre estas últimas as contribuições especiais - v. os arts. 3.º, n.º 2, e 4.°, n.° 3, da LGT. 54 ) Cf António SOUSA FRANCO, Finanças Públicas e Direito Financeiro, vol. II, 4.ª ed., Coimbra, 1992, p. 59 e s., e ALFREDO J. DE SOUSA/J. SILVA PAIXÃO, Código de Procedimento e de Processo Tributário Comentado e Anotado, Coimbra, 2000, p. 25 e ss. 55 ) Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 1997, 30. 56 ) José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 29.
28
4. Os elementos do imposto O imposto divide-se em dois momentos, o momento da criação e incidência do imposto, e o momento da sua aplicação e administração. No primeiro momento, registam-se vários elementos: 1) o facto tributário, actividade ou situação que dá origem ao imposto (o chamado facto gerador); 2) os sujeitos activos e passivos (contribuinte, responsáveis, substitutos, etc.) da obrigação de imposto; 3) os elementos da tributação (matéria colectável, taxa ou alíquota, deduções à colecta, etc.); 4) os benefícios fiscais. No segundo momento da vida dos impostos, procede-se ao lançamento, liquidação e cobrança dos impostos. Pelo lançamento identifica(m)-se o(s) contribuinte(s), e determina-se a matéria colectável e a taxa, mediante o lançamento objectivo. Pela liquidação, por seu turno, determina-se a colecta aplicando a taxa à matéria colectável, colecta que vem a coincidir com o imposto a pagar, a menos que haja lugar a deduções à colecta, caso em que a liquidação – no seu sentido amplo também abarca esta última operação. A liquidação do IRS desdobra-se nas seguintes operações: operações: 1) o apuramento do rendimento bruto por categoria; 2) a dedução relativamente a cada categoria de despesas realizadas para a obtenção do respectivo rendimento, tornando este uma categoria líquida; 3) o englobamento dos diversos rendimentos líquidos apurados, obtendo assim o rendimento líquido total; 4) os abatimentos por despesas com pensões a que o sujeito passivo esteja obrigado por sentença judicial ou por acordo judicialmente homologado, determinando-se, deste modo, o rendimento colectável; 5) a aplicação do quociente conjugal no caso de contribuintes casados ou em união de facto; 6) a determinação da taxa aplicável; 7) a aplicação desta ao rendimento colectável, apurando assim a colecta; 8) as deduções à colecta, entre as quais justamente se contam as despesas de carácter pessoal das famílias adstritas à realização dos direitos sociais à saúde, à educação, à habitação e à segurança social, deduções estas que, uma vez realizadas, nos dão o montante do imposto a pagar. Através da cobrança voluntária (pagamento espontâneo do montante liquidado) ou cobrança coerciva (se for preciso recorrer à apreensão dos bens necessários à solvência solvência do débito fiscal do devedor), o imposto vai dar entrada nos cofres do Estado 57 . 57
) Cf. J. M. CARDOSO DA COSTA, Curso, p. 21; A. L. SOUSA FRANCO, «Tributação», Dicionário Jurídico da Administração Pública, vol. VII, 1996, p. 491 e ss.
29
É cada vez mais frequente a administração total ou parcial de alguns impostos pelos próprios particulares, mormente pelas empresas, seja através da autoliquidação e do pagamento por conta, seja através de terceiros (casos de substituição fiscal e de cobrança contratual de impostos alheios). 5. Algumas classificações dos impostos Vejamos algumas das classificações tradicionais dos impostos que aparecem no quotidiano da actividade fiscal. 5.1. Impostos directos e impostos indirectos Diversos são os critérios económicos e jurídicos que têm servido de base a esta distinção. 1) O critério financeiro. Segundo este critério, são impostos directos aqueles que têm como pressuposto a existência de uma pessoa, de um património ou de um rendimento, e impostos indirectos aqueles que tributam a despesa, a transferência de bens ou outras manifestações indirectas da capacidade contributiva dos cidadãos 58 . São, por exemplo, impostos directos, o IRS, o IRC, o IMI, etc., e indirectos, o IVA e o imposto do selo. 2) O critério económico ou da contabilidade nacional. São impostos directos aqueles que não constituem custos de produção para as empresas e nos rendimentos nacionais, e impostos indirectos aqueles que representam custos de produção para as empresas e que são dedutíveis ao produto nacional bruto. 3) O critério da repercussão económica. Por repercussão entende-se a transferência da carga do imposto do sujeito passivo para outra ou outras pessoas. São repercutíveis os impostos sobre o consumo e irrepercutíveis os impostos sobre o rendimento e sobre o património. Por sua vez, quanto aos critérios jurídicos, podemos apresentar os seguintes: 1) O critério do lançamento administrativo. Segundo este critério, seriam impostos directos aqueles que são objecto de um acto administrativo de lançamento ou acto tributário, e impostos indirectos aqueles que não são objecto desse acto administrativo. 2) O critério do rol nominativo. De acordo com este critério, são directos os impostos cujo lançamento se baseia na existência de uma lista ou de um rol nominativo de contribuintes, e indirectos os impostos cujo lançamento não têm por base essa lista, por não ser possível conhecer previamente os contribuintes. Hoje em dia, é corrente o recurso a técnicas de autoliquidação, retenção na fonte e pagamentos por conta, o que acaba por limitar o papel da Administração Fiscal 58
) V. TEIXEIRA RIBEIRO, Lições de Finanças Públicas, 5."ed., Coimbra, 1995, p. 309..
30
mesmo naqueles casos em que há lugar a lançamento e liquidação administrativos com base numa lista nominativa de contribuintes. 3) O critério do tipo de relação jurídica do imposto. A distinção entre impostos directos e impostos indirectos coincide com a distinção entre impostos periódicos e impostos instantâneos ou de obrigação única. A distinção entre impostos directos e indirectos é utilizada em várias disposições legais vigentes no ordenamento português, a sa ber: (1) na classificação orçamental (e da contabilidade pública) das receitas fiscais 59 , (2) no art. 736.°. n.° 1. do CC 60 , (3) no art. 254.°, n.° 1. da CRP 61 , (4) nos arts. 92.° e 93.° do Tratado CE 62 e (5) no art. 6.°, n° l e 2 da LGT (onde se contrapõe a tributação directa à tributação indirecta). 5.2. Impostos periódicos e impostos de obrigação única São impostos periódicos os impostos que tendem a renovar-se periodicamente. É o caso do IRS, do IRC, do IMI e de quase todos os impostos directos. São impostos de obrigação única os impostos que respeitam a actos ou factos ocasionais, sem carácter repetitivo, como é o caso do IVA e do IMT, cuja cobrança não é previsível. Continua a haver hoje diversos impostos cobr ados com base em guias de pagamento, como acontece com o Imposto de Selo 63 e com os impostos pagos na fase da cobrança coerciva 64 . 5.3. Impostos reais e impostos pessoais Os impostos reais ou objectivos são os que atendem predominantemente à riqueza, sem ter em atenção a situação pessoal e familiar do contribuinte. Exemplos: IMI, 59
) A classificação das receitas fiscais está disciplinada, relativamente ao orçamento e contabilidade pública do Estado, no DL n.° 562/99, de 21 de Dezembro, que contém o chamado "classificador económico das receitas e despesas públicas" e, no respeitante ao orçamento e contabilidade das autarquias locais, no DL n.° 54-A/99, de 22 de J Fevereiro (que aprovou o POCAL). Sobre tal classificação, v. P. SOARES MARTÍNEZ, Direito Fiscal, p. 51. 60 ) O n.° 2 do art. 736.° do CC dispõe que: "1. O Estado e as autarquias locais têm privilégio mobiliário geral para garantia dos créditos por impostos indirectos, e também pelos impostos directos inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos dois anos anteriores. 2. Este privilégio não compreende a sisa ou o imposto sobre as sucessões e doações, nem quaisquer outros impostos que gozem de privilégio especial." 61 ) No que concerne ao art. 254.° n.° l, da CRP - que dispõe: «os municípios participam, por direito próprio e nos termos da lei, nas receitas provenientes dos im postos directos». 62 ) Relativamente aos arts. 92.° e 93.° do Tratado CE, é de assinalar que estes preceitos têm por objectivo a harmonização das legislações nacionais em matéria de tributação directa, sobretudo em sede de tributação das empresas, como de resto o demonstra a jurisprudência do TJCE fundada no princípio da não discriminação com base na nacionalidade e as diversas directivas já adoptadas neste sector. Quanto ao IVA, depois da adopção de um IVA intracomunitário, baseado no princípio da tributação do país destinatário, propõe-se um regime assente no país de origem, v. Arlindo N. M. Correia, «O sistema comum de IVA na União Europeia: um sistema de IVA adaptado às exigências do mercado único», Fisco, 80-81, Janeiro - Fevereiro de 1997, p. 41 e ss. 63 ) Art. 2.° do Código do Imposto do Selo, aprovado pela Lei n.° 150/99, de 11 de Setembro. 64 ) V. os arts. 93.°, 97.° e 162.° a 164.° do CPPT.
31
IMT, IRC, IVA, e outros impostos sobre o consumo, impostos de selo e impostos aduaneiros. Os impostos pessoais, ou subjectivos, são os que atendem predominantemente à pessoa do contribuinte, tendo em atenção a sua situação concreta, como é o caso do IRS. No respeitante ao IRS, as características de pessoalização residem na sua incidência sobre a globalidade dos rendimentos; na não tributação do mínimo de existência; na consideração dos encargos com a família do(s) contribuinte(s), designadamente as despesas com a saúde, a educação, a habitação e a segurança social realizadas com cada um dos membros do agregado familiar (sujeitos passivos, dependentes e ascendentes), o que anteriormente passava pelos abatimentos ao rendimento líquido total e agora passa quase exclusivamente pelas deduções à colecta; na divisão do rendimento colectável por 2 (quoc iente conjugal ou splitting), no caso de contribuintes casados ou em união de facto 65 para efeitos de apuramento da taxa a aplicar; e na progressividade da sua taxa. 5.4. Impostos de prestação fixa e impostos de prestação variável Para determinar o montante do imposto a pagar por cada contribuinte a lei utiliza dois métodos: ou determina que o montante do imposto seja para todos os contribuintes uma importância fixa (imposto de quota fixa) 66 , ou faz variar esse montante em função da matéria colectável, indicando neste caso o factor ou factores (taxa ou alíquota) que devem recair sobre o valor da matéria colectável para o apuramento da colecta. Nos impostos de prestação variável, o montante varia em função da variação da matéria colectável ou tributável, seja esta variação numa proporção ou taxa fixa, caso em que temos os impostos proporcionais, seja numa proporção ou taxa variável, caso em que temos impostos progressivos ou perante impostos regressivos 67 . O imposto é progressivo quando a taxa aumenta à medida que se eleva a matéria colectável, como é o caso do IRS. Divide-se, aqui, a matéria colectável por escalões, cujas taxas aumentam com o crescimento dos seus limites. O imposto é proporcional quando a colecta varia proporcionalmente à matéria colectável e que a taxa é constante, como sucede no caso do IRC. O imposto é regressivo quando a percentagem da taxa diminui à medida que a matéria colectável aumenta. Não existe no actual sistema fiscal qualquer imposto regressivo.
65
) V., quanto às uniões da facto, a Lei n.° 7/2001, de 11 de Maio. ) Assim acontecia, por exemplo, com o imposto designado por «taxa militar », cuja prestação anual era fixa. A «taxa militar» correspondia a um « quantum » por indivíduo e por ano. 67 ) Como imposto regressivo podemos citar o caso do imposto emolumentar incidente sobre certos actos de registo predial, comercial e de navios e certos actos notariais. 66
32
O imposto é degressivo quando se aplica uma percentagem (taxa normal) correspondente a determinado valor da matéria colectável e taxas menores para matérias colectáveis mais baixas. Tivemos o caso do imposto profissional. 5.5. Impostos estaduais e impostos não estaduais Os impostos podem ser estaduais ou não estaduais, consoante o seu titular activo seja o Estado, ou outros entes públicos territoriais, como as regiões autónomas e as autarquias locais, ou entes públicos não territoriais (impostos parafiscais, como a "taxa social única"). Mas, nem os impostos cobrados nas regiões autónomas 68 , nem os chamados impostos municipais 69 , constituem verdadeiros impostos regionais ou municipais, respectivamente. Enquanto o lançamento, a liquidação e a cobrança, ou seja, a gestão ou administração desses impostos couber à Administração Fiscal do Estado, não se pode estabelecer as relações jurídicas fiscais entre os contribuintes e a região autónoma ou o município respectivo. 5.6. Impostos gerais e impostos especiais Enquanto os primeiros aplicam-se a toda uma categoria de situações homogéneas, os segundos são objecto de uma disciplina jurídica especial. O IRS e o IRC constituem impostos gerais sobre o rendimento e o IVA um imposto geral sobre o consumo. É o caso do Imposto de Jogo face ao IRC (art. 7.° do CIRC), dos IECs face ao IVA. 5.7. Impostos principais e impostos acessórios Os impostos podem classificar-se em principais e acessórios, devendo os impostos acessórios seguir as vicissitudes dos impostos principais de que dependem. Os impostos acessórios incidem sobre a colecta dos impostos principais , como parece ser o caso das derramas municipais previstas no art. 18.° da LFL 70 , cuja taxa pode ir até 10% da colecta do IRC dos contribuintes que exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola. 5.8. Impostos sobre o rendimento, impostos sobre o património e impostos sobre o consumo Esta classificação tripartida é hoje a mais corrente, porque oferece a vantagem da extrema simplicidade, e está consagrada na Constituição, que a tem claramente subjacente no art. 104.°, onde se prevê e caracteriza o imposto sobre o rendimento pessoal (n.° 1), a tributação do rendimento empresarial (n.° 2), a tributação do património (n.° 3) e a tributação do consumo (n.° 4).
68
) V. o art. 229, n.°l, al. j), da CRP. ) IMT, IMI, Imposto sobre veículos, derramas, etc. 70 ) A LFL 1998, constante da Lei n.°42/98, de 6 de Agosto. 69
33
5.9. Impostos fiscais e impostos extrafiscais Os impostos extrafiscais porque prosseguem predominantemente objectivos de natureza económica e social, e não integram o Direito Fiscal (clássico), mas antes o direito económico fiscal, não se lhes aplicando, pelo menos integralmente, os princípios e preceitos constitucionais constantes da "constituição fiscal".
CAPITULO VII A RELAÇÃO JURÍDICA DE IMPOSTO 1. A natureza da relação jurídica do imposto A relação jurídica de imposto tem carácter obrigacional ou creditício e tem por fim a realização de uma receita pública. O objecto da relação jurídica de imposto é de natureza patrimonial. 2. O objecto da relação tributária O objecto da relação jurídica fiscal é a prestação pecuniária a que o devedor do imposto está adstrito para com o sujeito activo dessa relação. 2.1. Os pressupostos da tributação Como pressupostos tributários temos os subjectivos e os objectivos. Os subjectivos correspondem a aspectos pessoais e os objectivos correspondem a aspectos reais do plano da incidência fiscal, designadamente a matéria colectável. A matéria colectável, para além de ter natureza económica, apresenta aspectos muitos diversos segundo os impostos. Assim, no IMI, a matéria colectável é constituída pelo valor dos prédios. No IRS, ela é constituída por rendimentos globais do trabalho, do comércio, da indústria, da agricultura, de capitais, de prédios, de pensões, do jogo, e ainda por mais-valias, as quais serão dificilmente qualificáveis como rendimentos. 2.2. O objecto imediato da relação tributária O objecto imediato da relação tributária é constituído pelos direitos e deveres dessa relação. Para além do dever de realizar a prestação de imposto, existem deveres acessórios, que são estabelecidos a fim de permitir ou facilitar o lançamento e a liquidação dos impostos, tais como o dever de prestar declarações, e de suportar fiscalizações. Quanto aos direitos do contribuinte, podemos apontar o direito a restituição de
34
tributos indevidos, o direito de reclamação, o direito de impugnação, o direito de ser informado da sua situação fiscal (art. 268, n° l da Constituição). 2.3. O objecto mediato da relação tributária O objecto mediato da relação tributária consiste numa conduta, prestação positiva ou negativa de dar (v.g. prestação tributária principal), fazer (v.g. prestações de declarações, de apresentação de documentos) ou de não fazer (v.g. o contribuinte deve abster-se de impedir ou dificultar a realização de exames, avaliações e fiscalizações). 3. A obrigação fiscal 3.1. A obrigação principal A obrigação fiscal apresenta várias características que a diferenciam muito claramente das obrigações jurídicas privadas. Assim a obrigação fiscal caracteriza-se por ser uma obrigação: 1) legal, 2) pública, 3) exequível e executiva, 4) semi-executória, 5) indisponível e irrenunciável, 6) autotitulada e 7) especialmente garantida. Em primeiro lugar, é uma obrigação legal, porque tem por fonte a lei. Depois, constitui uma obrigação pública, dado a sua disciplina jurídica ser uma disciplina de direito público. Em terceiro lugar, trata-se duma obrigação exequível e executiva, na medida em que, por um lado, o acto tributário não é auto exequível, carecendo, portanto, de execução e, por outro lado, a sua execução não está dependente de qualquer outra pronúncia. É também uma obrigação semiexecutória, já que a sua execução corre, em part e, na administração tributária e, em parte, nos tribunais tributários de 1.ª instância 71 . É também uma obrigação indisponível e irrenunciável, uma vez que ao credor não cabe conceder moratórias (n.° 3 do art. 36.° da LGT), nem admitir o pagamento em prestações ou perdoar a dívida, salvo excepções (arts. 42.° da LGT, 86.°, n. os 2 e 3, e 196.º do CPPT). Finalmente, a obrigação fiscal é igualmente uma obrigação autotitulada, isto é, uma obrigação relativamente à qual a Administração Fiscal cria os seus próprios títulos executivos, a partir das certidões de dívida extraídas pelos serviços competentes para instaurar o correspondente processo de execução fiscal - art. 88.° do CPPT 72 . 3.2. As obrigações acessórias Distingam-se, por um lado, os deveres acessórios ou complementares da prestação principal, que se destinam a assegurar a execução da prestação, e, por outro lado, os deveres de conduta, que têm como objectivo o regular desenvolvimento da 71
) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, Ed. Almedina, 2003, p. 245-246. ) J. T. M. MENEZES LEITÃO, «A substituição e a responsabilidade fiscal no direito português», CTF, 388, Outubro-Dezembro de 1997, p. 93 e ss. (p. 98 e ss.). 72
35
relação de imposto e que se baseiam no princípio da boa fé 73 . Além disso, temos diversas outras obrigações ou deveres, quer sejam de natureza declarativa ou comunicativa, quer sejam de natureza contabilística, quer ainda outras obrigações ou deveres acessórios. Vejamos cada um destes tipos de obrigações, primeiro em relação ao IRS empresarial e profissional e ao IRC e, depois, em relação ao IVA. 3.2.1. O IRS empresarial e profissional e o IRC No IRS empresarial e profissional e no IRC, temos as seguintes obrigações: 3.2.1.1 - Obrigações declarativas Os sujeitos passivos de IRS e de IRC ou os seus representantes têm de apresentar as seguintes declarações: a) A declaração de início ou de cessação de actividade, a apresentar no serviço de finanças do domicílio fiscal (arts. 112.° a 114.° do CIRS), ou a declaração de inscrição, de alterações ou de cancelamento no registo de sujeitos passivos de IRC (arts. 109.°, n.º l, al. a), e 110.° do CIRC). b) A declaração periódica de rendimentos, a apresentar no respeitante ao IRS (arts. 57.°, 60.° e 61.° do CIRS), no respeitante ao IRC (arts. 109.°, n.ºl, al. b) e 112.° do CIRC). c) A declaração de substituição quando se verifiquem factos que impliquem alteração dos rendimentos declarados (art. 60.°, n.° 2, do CIRS), ou quando tiver sido liquidado imposto inferior ao devido ou declarado prejuízo fiscal superior ao efectivo (art. 114.° do CIRC). d) A declaração anual de informação contabilística e fiscal (arts. 113.° do CIRS e 113.° do CIRC) 74 . 3.2.1.2 - Obrigações contabilísticas e de escrituração Aqui, podemos apontar, entre outras, diversas obrigações: a) O dever de possuir contabilidade organizada, nos termos da lei comercial (nos termos do POC) e da lei fiscal, relativamente àqueles contribuintes que a ela estejam legalmente obrigados ou que por ela tenham optado (artigos 28, n.º 2, 28, n.º6 e 113.°, n.° l, do CIRS e art. 115, n.º 1. do CIRC). b) O dever de constituir e manter um processo de documentação fiscal, nos termos dos arts. 129.° do CIRS e 121 do CIRC. c) O dever de possuir um regime simplificado de escrituração para os sujeitos 73
) V. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, p. 70 e ss., e A. Branco Guimarães, «A estrutura da obrigação de imposto e os princípios constitucionais da legalidade, segurança e protecção da confiança», em Estudos em Homenagem à Dra. Maria de Lourdes Órfão de Maios Correia e Vale, p. 517 e ss. (539 e ss.). 74 ) Refira-se que, nos termos da Port. n.° 1214/2001, de 23-10, as empresas colectivas ou singulares que tenham um volume de negócios superior a € 1.250.000 estão obrigadas ao envio da declaração anual de rendimentos e da declaração anual de informação contabilística e fiscal por correio electrónico.
36
passivos de IRS (que obtenham rendimentos da categoria B) e de IRC que não estejam obrigadas a possuir contabilidade organizada ou que por ela não tenham optado (art. 116.°, n.° l, do CIRC, art. 116.°, n.° l, al. a), do CIRS e 50.°, n.º l, do CIVA). d) O dever de apresentar os livros de inventário e balanço e diário nos serviços periféricos locais da administração tributária (art. 115.°, n.º 2. do CIRC, aplicável também aos sujeitos de IRS). e) O dever de proceder aos lançamentos por ordem cronológica, nos diversos registos ou livros no máximo de 60 dias (art. 116.°, n.° 4, do CIRS) ou sem atrasos superiores a 90 dias (art. 115.°, n.° 4, do CIRC). f) Os deveres de passar recibo das importâncias recebidas e de emitir factura ou documento equivalente por cada transmissão de bens ou prestação de serviços (art. 115.° do CIRS). g) O dever de ter documentos de suporte, isto é, os documentos justificativos adequados dos diversos registos e livros (art. 115.°, n.° 3, do CIRC). h) O dever de centralização da contabilidade ou da escrituração em estabelecimento ou instalação situada em território português (art. 118.° do CIRS e 117.° do CIRC). 3.2.1.3 - Outras obrigações acessórias Há que ter em atenção os deveres de comunicação de rendimentos e retenções, os deveres de cooperação das entidades públicas e privadas (art. 119.° do CIRS e 119.° e 120° do CIRC). 3.2.2. No IVA Por seu turno, no respeitante ao IVA, são de mencionar, entre outras, as seguintes obrigações: I - Obrigações declarativas Neste domínio, os sujeitos passivos de IVA devem entregar as seguintes declarações (nos termos do art. 28. n.º 1. als. a), c), d), e) e f), do CIVA). II - Obrigações contabilísticas e de escrituração Vale aqui as obrigações do IRC e IRS, uma vez que tais obrigações resultam do POC, do CIRC ou do CIRS para que remete o CIVA. III - Outras obrigações acessórias Entre as muitas outras obrigações acessórias que recaem sobre o sujeito passivo do IVA, são de destacar as obrigações de emitir factura e de repercussão do imposto, previstas, respectivamente, na al. b) do n.° l do art. 28 e no art. 36 do CIVA.
37
As declarações periódicas devem ser assinadas pelo técnico oficial de contas nos casos em que respeitem a sujeitos passivos que possuam ou sejam obrigados a possuir contabilidade organizada para efeitos do IRC (art. 111, n.º 3 do CIRC) ou do IRS (art. 112, n.º 6 do CIRS). 4. As isenções A isenção é um facto impeditivo do imposto, cuja verificação impede a produção dos efeitos típicos do facto tributário previsto na norma tributária material. Como bem nota Alberto Xavier, "a isenção tem a natureza jurídica de um facto impeditivo, autónomo e originário e não de uma simples delimitação negativa do facto constitutivo (incidência)" 75 . Ao contrário da não tributação, a isenção é definida como uma excepção a uma determinada regra. Uma operação ou facto não está sujeito a imposto quando não está abrangido pelas normas de incidência ou quando exclui expressamente o facto do seu âmbito (casos de delimitação negativa de incidência). Como exemplos de isenções, podemos indicar as isenções relativas aos prédios destinados a habitação própria e permanente, as isenções respeitantes às maisvalias de acções, as isenções referentes aos juros de depósitos a prazo em moeda estrangeira, e as isenções ligadas ao mecenato cultural. Temos, neste aspecto, os donativos concedidos ao Estado, Regiões Autónomas e autarquias locais, associações de municípios e de freguesias, fundações em que o Estado, Regiões Autónomas ou autarquias locais participem no património inicial, fundações de iniciativa exclusivamente privada que prossigam fins de natureza social ou cultural (artigo 1.º, n.º 3 do Estatuto do Mecenato). Há ainda as isenções resultantes de investimentos em unidades produtivas realizados até 31 de Dezembro de 2010, de montante igual ou superior a 4.987.978,97 Euros nos “sectores considerados de interesse estratégico para a economia nacional e para a redução das assimetrias regionais, induzam à criação de postos de trabalho e contribuam para impulsionar a inovação tecnológica e a investigação científica nacional” (artigo 39.º do EBF). Há ainda as isenções relativas a uma coisa certa e determinada, como, por exemplo, um imóvel de interesse artístico, ou histórico (artigo 40, nº 1, al. n do EBF), e as isenções fiscais para a protecção de actividades especialmente úteis, para o cumprimento de regras internacionais, para a protecção de grupos sociais, etc. Essas isenções podem classificar-se em temporárias (ex.: art. 42 EBF) e permanentes (ex.: art. 40, nº l, al. c EBF); condicionais (art. 40, n° l, a EBF) e absolutas (são absolutas quase todas as isenções fiscais, por não dependerem da verificação de qualquer facto futuro ou de qualquer condição), gerais (ex.: artigo 9 do CIRC) e individuais (artigo 35 do EBF), totais e parciais (art. 56 do EBF). Quanto à formas das isenções tributárias, distingue-se as isenções pessoais (por 75
) Manual de Direito Fiscal, p. 282. Para este autor, a "isenção dá-se quando, não obstante se ter verificado o facto tributário em todos os seus elementos, a eficácia constitutiva deste é paralisada originariamente pela ocorrência de um outro facto a que a lei atribui assim eficácia impeditiva.
38
exemplo, estão isentos de pagamento de imposto sobre mais-valias os investidores não residentes) e as isenções reais (por exemplo, os rendimentos de direitos de autor têm uma redução parcial de IRS). Com a primeira das técnicas atende-se ao elemento pessoal ou subjectivo e com a segunda ao seu elemento real ou material. Por exemplo, num plano poupança reforma, a vantagem atribuída a cada sujeito passivo depende, na realidade, directamente da sua taxa efectiva de imposto. Se ele estiver sujeito a uma taxa de IRS de 42%, o benefício será igual a 42% do rendimento deduzido. 5. A extinção da obrigação tributária A obrigação tributária pode se extinguir por cumprimento, dação em cumprimento, prescrição, compensação, confusão, remissão, insolvência. 5.1. O cumprimento da obrigação tributária O pagamento do imposto pelo sujeito passivo é a forma normal de extinção da obrigação fiscal, que pode ser voluntário ou coercivo (arts. 78 e segs. do CPPT). Também se admite que a prestação tributária possa ser realizada por um terceiro (art. 41, n° l da LGT). O contribuinte tem a possibilidade, desde que não possa cumprir integralmente e de uma só vez uma dívida tributária, requerer o pagamento desta em prestações, como é o caso, em sede do IRS e IRC (art. 42 da LGT e 86.° do CPPT). Decorrido o prazo para o pagamento voluntário, começam a contar-se juros de mora. Os juros de mora são devidos pelo sujeito passivo quando não pague o imposto no prazo legal, sendo a sua taxa a definida para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas (44.°, n. os l e 3, da LGT), a qual, nos termos do n.º l do art. 3.° do DL n.° 73/99, de 3 de Março, é presentemente e para as situações regra de l% ao mês 76 . Também podem ser aplicados juros compensatórios. Mas, os juros compensatórios são uma penalização distinta ou complementar dos juros de mora. Os juros compensatórios são devidos "quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária", sendo a sua taxa equivalente à taxa dos juros legais fixados nos termos do n.° l do art. 559° do Código Civil (art. 35, nº 1 e 10 da LGT), a qual, nos termos da Portaria n.° 158/99, de 18 de Fe vereiro, é de 7% ao ano até 30 de Abril de 2003 e 4% a partir de 1 de Maio de 2003 77 . 76
) A taxa de juros de mora é de l % se o pagamento se fizer dentro do mês de calendário em que se verificou a sujeição aos mesmos juros, aumentando-se uma unidade por cada mês ou fracção se o pagamento se fizer posteriormente. 77 ) Os juros compensatórios não devem confundir-se com os juros indemnizatórios, que são juros devidos ao contribuinte pelo excesso de imposto pago, por causa de um erro imputável à administração tributária, cuja taxa é igual à dos juros compensatórios (art. 43 da LGT), nem devem confundir-se com os juros moratórios a favor do contribuinte, previstos no n.° 2 do art. 102 da LGT.
39
Porém, não são de aplicar juros compensatórios quando o retardamento da liquidação tenha na sua origem uma mera divergência de critérios ente a Administração Fiscal e o contribuinte 78 . 5.2. A dação em cumprimento da obrigação tributária O Estado aceita receber, em vez da prestação pecuniária correspondente ao imposto em dívida, outra prestação de valor equivalente, bens móveis ou imóveis, designada por dação em cumprimento, prevista nos artigos 837 a 840 do Código Civil. Dispõe o art. 40.°, n.° 2, da LGT que a dação em cumprimento e a compensação são admitidas nos casos expressamente previstos na lei: antes da instauração da execução fiscal, (art. 87.° do CPPT), no próprio processo de execução fiscal (arts. 201 e segs do CPPT), ou após a instauração da execução fiscal (n° l do artigo 203 do CPPT). 5.3. Prescrição da obrigação tributária As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu (art. 48, n° l da LGT). O prazo da prescrição interrompe-se em virtude de citação, reclamação, recurso hierárquico, impugnação e pedido de revisão oficiosa da liquidação do imposto, e suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas ou de reclamação, impugnação ou recurso (art. 49.°, n. os l e 3 da LGT). 5.4. A extinção por compensação A legislação tributária portuguesa previu a compensação como forma de extinção de obrigações de imposto (artigo 40, n.º 2 da LGT). A compensação de dívidas tributárias pode ser efectuada a pedido da administração tributária ou do contribuinte (artigo 89, n.º 1 do CPPT e artigo 90 do CPPT). 5.5. A extinção por confusão A confusão, figura jurídica prevista nos art. 868 a 873 do Código Civil, prevê que «quando na mesma pessoa se reúnam as qualidades de credor e devedor da mesma obrigação, extinguem-se o crédito e a dívida». A doutrina mais generalizada se opôs a que a confusão constituísse um facto extintivo das obrigações fiscais. Mas, recentemente, acabou por admiti-la.
78
) José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 144.
40
5.6. A extinção por remissão O Estado pode declarar como extintas ou não constituídas determinadas categorias de impostos ou decidir a suspensão da execução fiscal. O Estado pode, por exemplo, no caso de um evento catastrófico, como o dos fogos florestais, renunciar à cobrança dos impostos devidos pelos contribuintes de determinada região atingida por aquela catástrofe. Advirta-se que só é permitido à Administração Fiscal conceder moratórios, ou suspender a execução fiscal dentro dos casos previstos na lei (CPPT, art. 85, nº 3). Por exemplo, a suspensão da execução fiscal é possível no caso de não ser possível determinar a suficiência dos bens penhorados (art. 23, n° 3 da LGT), de pagamento em prestações, reclamações, impugnação, recurso ou execução fiscal (arts 52, n° l da LGT e 169 do CPPT), em virtude de acção judicial sobre os bens penhorados (art. 172 do CPPT), dos bens penhorados serem objecto de embargos de terceiros (arts 166, n° l, al. a) e 237 do CPPT), do executado não possuir outros bens penhoráveis, nos casos de litigiosidade do crédito penhorado (art. 224, n° 2 do CPPT), de proceder à verificação e graduação de créditos após a venda dos bens (art. 245, n° l do CPPT), e de estar a decorrer o pagamento das prestações, no caso de terem sido autorizadas (arts 49, n° 3 da LGT e 189, n° 6 e 200, n° l, do CPPT). 5.7. A extinção por insolvência Uma declaração em falhas, a que se referem os artigos 272 e segs. do CPPT, baseada na verificação da falta de bens penhoráveis dos executados, seus sucessores e responsáveis solidários ou subsidiários suspende a instância, mas não extingue a obrigação tributária, a qual se manterá até à prescrição, se, entretanto, não houver conhecimento de que os executados, ou algum deles, possuem bens penhoráveis, em cujo caso poderá novamente ser-lhes exigida a dívida tributária. 6. As garantias de cumprimento da obrigação fiscal 6.1. As garantias tributárias em geral O património do sujeito tributário passivo constitui a garantia geral das obrigações fiscais (n.° l do art. 50.° da LGT). O processo executivo garante ao Estado a satisfação dos seus interesses de credor, quer se trate de créditos tributários, quer de créditos de outra natureza (CPPT, art. 148, 204 e 237). 6.2. As garantias tributárias em especial O cumprimento das obrigações tributárias pode ser assegurado através de garantias especiais, quer de carácter pessoal, quer de carácter real.
41
As garantias pessoais visam assegurar o cumprimento da obrigação tributária pela vinculação de outras pessoas à obrigação tributária. As garantias reais consistem nos privilégios creditórios, hipotecas legais e penhores à favor da Administração fiscal (al. b) do n.° 2 e o n.° 3 do art. 50.° da LGT), no direito de retenção de quaisquer mercadorias, e ainda na prestação de caução pelos contribuintes que queiram exercer determinados direitos, sem o pagamento prévio de impostos que, em princípio, seria exigível (arts 169, 170, 183 e art. 199.°, n.° l do CPPT). Além disso, a Administração tributária pode tomar providências cautelares para garantia dos créditos tributários em caso de receio de frustração da sua cobrança ou de destruição ou extravio de documentos ou outros elementos necessários ao apuramento da situação tributária dos contribuintes (art. 51.°, n.º 1 da LGT). Tais providências consistem na apreensão de bens, direitos, documentos ou na retenção, até à satisfação dos créditos tributários, de prestações tributárias a que o contribuinte tenha direito (art. 51, nº 3 da LGT). 6.3. Juros de mora e compensatórios como garantias tributárias Os juros de mora têm em vista dissuadir o contribuinte de pagar a prestação tributária devida ainda na fase da cobrança voluntária, ou então na fase da cobrança coerciva, e assim compensar a Fazenda Nacional do atraso no pagamento de quantias liquidadas. Os juros de mora são devidos a partir do momento em que termina o prazo legal para o pagamento voluntário de um tributo e não podem ser superior a metade do capital da dívida a amortizar, incluindo os juros compensatórios (n.° 3 do artigo 262 do CPPT). No caso do pagamento dos juros ter sido retardado por se ter procedido tardiamente às operações de lançamento e liquidação e esse atraso não ser imputável ao contribuinte, então este só terá que realizar a prestação tributária, não acrescida de quaisquer juros. Mas, se tal atraso lhe for atribuível, a prestação a pagar será acrescida de juros compensatórios, sem prejuízo das multas e outras penas aplicáveis (CIRS, art. 83).
CAPÍTULO VIII OS SUJEITOS DA RELAÇÃO JURÍDICA DE IMPOSTO Como qualquer relação jurídica, a relação jurídica fiscal é constituída por quatro elementos: os sujeitos, o objecto, o facto jurídico e a garantia.
42
1. A noção de sujeito activo O sujeito activo é o credor do imposto. Ele tem a titularidade do direito a exigir, do contribuinte ou de terceiros responsáveis, o cumprimento da prestação tributária correspondente. São sujeitos activos, além do Estado, as autarquias territoriais, as regiões autónomas, e alguns institutos ou entidades públicos (ex: bancos emissores). 2. O Estado 2.1. Os órgãos da Administração Fiscal do Estado Para arrecadar as receitas do Estado, o Estado dispõe de um sistema administrativo centralizado no Ministério das Finanças. Na Administração Fiscal, integra-se organicamente o Ministério das Finanças, que é constituído por múltiplos e diversificados serviços. Entre os diversos serviços, temos diversos serviços de administração directa, como a Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (DGAIEC), a Direcção-Geral de Informática e de Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros (DGITA) e a Inspecção-Geral de Finanças; o Conselho Superior de Finanças (CSF), em que se integram, entre outros, a conhecida Comissão de Normalização Contabilística (CNC) e a Unidade de Coordenação da Luta contra a Evasão e a Fraude Fiscal e Aduaneira (UCLEFA), o Conselho de Directores Gerais (CDG) e outros serviços sob tutela. 2.2. A DGCI À Direcção-Geral de Impostos cabe proceder ao lançamento e à liquidação da generalidade dos impostos portugueses, mas não à cobrança, que pertence à Direcção-Geral do Tesouro. 2.3. A Direcção-Geral do Tesouro A Direcção-Geral do Tesouro, anteriormente Direcção-Geral da Fazenda Pública, tem por funções administrar o património e realizar as operações de cobrança dos impostos lançados e liquidados pela Direcção-Geral de Impostos. Esta cobrança é realizada através dos serviços concelhios da Direcção-Geral do Tesouro, que são as tesourarias da Fazenda Pública, as quais funcionam junto das repartições de finanças, nos diversos concelhos ou bairros fiscais. 2.4. A DGAIEC A DGAIEC exerce o controlo da fronteira externa da União Europeia e do território aduaneiro nacional em termos fiscais, económicos e de protecção da sociedade, e administra os impostos especiais sobre o consumo.
43
Às Alfândegas - repartidas por Lisboa, Porto, Funchal e Ponte Delgada – compete, entre outros, impedir o contrabando e o descaminho de direitos, mas também liquidar e cobrar os impostos aduaneiros. Compete às Alfândegas, através das suas delegações e postos fiscais, assegurar as funções de fiscalização e de vigilância, e de proceder ao despacho aduaneiro. Para o efeito, as autoridades aduaneiras são apoiadas, na prevenção dos delitos aduaneiros, por uma força policial designada por Brigada-Fiscal, que veio substituir a antiga Guarda Fiscal (extinta pelo D/L n° 230/93, de 26 de Junho). 3. A personalidade tributária activa das autarquias territoriais Os municípios participam nas receitas provenientes dos impostos directos, dispondo de receitas tributárias próprias (art. 254 da CRP). Os impostos cuja receita se destina aos municípios são o IMI, o imposto municipal sobre veículos, o imposto para o serviço de incêndios, a taxa municipal de transportes, as derramas, o IMT e as licenças. Os municípios podem lançar e cobrar esses impostos, embora seja na prática a Administração Fiscal que o faça, mediante uma certa compensação (artigo 17º, nº 2 da LFL). 4. A personalidade tributária activa dos institutos públicos Gozam também de personalidade tributária activa os institutos públicos, tais como a Caixa Geral de Depósitos, a Radiodifusão Portuguesa e as AdministraçõesGerais do Porto de Lisboa e dos Portos do Douro e Leixões, o Fundo do Teatro, o Instituto Português de Cinema, o Fundo de Turismo, etc. 5. Os sujeitos passivos da relação tributária 5.1. O contribuinte O sujeito passivo da relação de imposto é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável (n. o 3 do art. 18.° da LGT). São sujeitos passivos de IRC as entidades referidas no art. 2.° do CIRC. 5.2. A personalidade tributária passiva das entidades públicas A personalidade tributária é um dos aspectos da personalidade jurídica. Ela consiste na imputação de direitos e deveres tributários ao sujeito passivo, pessoa singular ou colectiva, a quem a lei impõe a obrigação de efectuar a prestação tributária e outros obrigações acessórias. De acordo com os arts. 15.° e 16.°, n° 2, da LGT, a personalidade tributária
44
traduz-se na susceptibilidade de ser sujeito (activo ou passivo) de relações tributárias, sendo inerente a esta a capacidade tributária (de gozo), o u seja, a qualidade de ser titular dos direitos e deveres tributários correspondentes 79 . Às entidades públicas é reconhecida uma personalidade tributária activa e também uma personalidade tributária passiva. O Estado pode estar na posição de devedor de imposto, e tributar-se a si próprio, relativamente às suas propriedades, indústrias privadas, e outras entidades públicas, autarquias territoriais ou institutos públicos, quando exercem determinadas actividades não isentas de IVA (CIVA, art. 2, n° 3). 5.3. A representação legal, o mandato tributário e a gestão de negócios No que diz respeito à representação legal, devemos ter em conta o disposto no n.° l do art. 16.° da LGT, e o n.° l do art. 5° do CPPT que dispõe que: "os interessados ou os seus representantes legais podem conferir mandato, sob a forma prevista na lei, para a prática de actos de natureza procedimental ou processual tributária que não tenham natureza pessoal". No caso de incapacidade de exercício ou de agir, isto é, no caso de menores, interditos e inabilitados, essa incapacidade é suprida, também no direito dos impostos, pelos representantes legais - pais, tutores ou curadores. A lei fiscal previu a figura da representação voluntária concretizada no mandato fiscal, que pode ser celebrado pelos próprios contribuintes e demais sujeitos passivos ou pelos seus representantes legais (n.° 2 do art. 5.° do CPPT), e que “só pode ser exercido, nos termos da lei, por advogados, advogados estagiários e solicitadores quando se suscitem questões de direito perante a administração tributária em quaisquer petições, reclamações ou recursos". Quanto à gestão de negócios, prescreve o art 17.° da LGT que: l - Os actos em matéria tributária que não sejam de natureza puramente pessoal podem ser praticados por gestor de negócios, produzindo efeitos em relação ao dono do negócio nos termos da lei civil. 2 - Enquanto a gestão de negócios não for ratificada, o gestor de negócios assume os direitos e deveres do sujeito passivo da relação tributária. 3 - Em caso de cumprimento de obrigações acessórias ou de pagamento, a gestão de negócios presume-se ratificada após o termo do prazo legal do cumprimento". 5.4. O domicílio fiscal Nos termos dos arts. 19.°, n.° l, da LGT, 16.° do CIRS e 4.°, 1.° 3, do CIRC, o domicílio do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário: a) para as pessoas singulares, o local da residência habitual; b) para as pessoas colectivas, o local da sede ou direcção efectiva ou, na falta destas, do seu estabelecimento estável em Portugal. O domicílio fiscal das pessoas colectivas é normalmente o da sua sede. Mas, para evitar a adopção de sedes fictícias em «paraísos fiscais», o preceito foi substituído 79
) Diogo Leite de Campos e Teresa Nogueira, “Notas sobre a capacidade jurídico-fiscal do cabeça de casal (artigo 91 e segs da LGT)”, CTF, Jan.-Junho 2003, nº 409-410, p. 142.
45
pelo local de «direcção efectiva». O conceito de estabelecimento estável é utilizado para qualquer instalação fixa, ou representação representação permanente, através das quais se exerça uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola (art. 5, n° 1 e 2 do CIRC). Por exemplo, suponha-se que a sociedade X tenha por objecto social a elaboração de estudos jurídico-económicos, e esteja sediada em Espanha e com estabelecimento estável em Lisboa. Em Maio de 2007, a sociedade X elaborou em Portugal um estudo de mercado para uma entidade com sede em Lisboa cuja facturação se processou directamente entre a sede e a cliente. Os rendimentos obtidos com este serviço, embora não tendo sido prestados pelo estabelecimento estável situado em Portugal, consideram-se imputáveis ao estabelecimento situado em Lisboa. No caso de filiais, procede-se à tributação dos lucros da filial e dos dividendos distribuídos à sociedade mãe. Em relação às sucursais, não há, ao contrário do que sucede com as filiais, uma verdadeira verdadeir a tributação, dado que tudo se passa dentro da mesma entidade jurídico-económica 80 . 6. A substituição tributária A substituição tributária baseia-se no princípio da retenção na fonte, isto é na dedução do imposto do montante que um devedor tem de pagar a um credor (art. 20 n.º 2 da LGT). A Administração Fiscal exige das entidades patronais as colectas dos impostos devidos pelos trabalhadores, dos Bancos as colectas do imposto sobre lucros e os juros distribuídos a accionistas, accionistas, a obrigacionistas, obrigacionistas, etc. Mas na falta de pagamento do imposto pelo substituto, é contra este que será instaurado a execução fiscal (art. 21.º do CIRS, art. 28.º da LGT, arts. 153, 159 e 160 do CPPT). No IRS, temos vários exemplos de retenção na fonte: artigos 98 a 101 do IRS, e art. 72 do CIRS. No IRC, temos o art. 88 do CIRC. 7. A responsabilidade tributária 7.1. A solidariedade tributária A solidariedade tributária verifica-se quando várias pessoas assumem, conjuntamente, a qualidade de sujeitos passivos de um mesmo vínculo tributário (art. 21.° da LGT), isto é, quando o credor do imposto exige o cumprimento integral da dívida tributária (incluindo os juros e demais encargos legais), quer ao devedor, quer ao responsável ou responsáveis responsáveis da divida tributária. 80
) Diogo Leite de Campos, Direito Tributário, 2ª edição, Coimbra, 2003, p. 32 1.
46
No processo de responsabilização dos gestores, o ónus da prova recai sobre a Administração Fisca Fisc al, ao contrário da lei anterior que transferia o ónus da prova para o contribuinte 81 . No caso, por exemplo, do IVA ter sido cobrado ou o IRS retido e não entregues ao Estado no dia previsto, e que nesse mesmo dia tenha sido nomeado um novo gerente da empresa, o antigo gerente só pode ser responsabilizado se a Administração Fiscal provar a sua culpa, isto é, que fez algo que impediu a posterior entrega. Mas se, por exemplo, o IRC do exercício de há dois anos não foi entregue no ano seguinte porque foi ocultado pela prática de fraude fiscal posteriormente descoberta e o gerente do ano em que esta liquidação foi feita não pode pagar o IRC devido pela insuficiência do património da empresa, ente ndemos aqui que a culpa reverte sobre o gerente do ano em que a fraude teve lugar 82 . 7.2. As formas de responsabilidade responsabilidade tributária A responsabilidade tributária pode ser subjectiva ou real. A responsabilidade tributária é subjectiva quando ela assenta numa posição pessoal, como é o caso, por exemplo, de um funcionário que pela omissão de um dever impediu o lançamento ou a cobrança de um imposto ou de um funcionário que impossibilitou a cobrança de qualquer colecta (CPPT, art. 161). A responsabilidade tributária é real quando resulta de direitos adquiridos sobre bens, que constituíam a matéria colectável de um imposto não pago. É o caso de uma pessoa que tenha estado na posse ou fruição dos bens que deram origem à dívida. As leis fiscais fazem também uma distinção entre a responsabilidade tributária subsidiária e a responsabilidade tributária solidária. No caso de responsabilidade solidária, o pagamento da totalidade da dívida pode ser exigível de um só responsável. Cada um responde pela totalidade da dívida e demais obrigações acessórias. Pelo contrário, no caso da responsabilidade subsidiária (art. 159 e 160 do CPPT), só é exigível a cada um dos responsáveis a sua parte de dívida tributária. Aqui, torna-se necessário fixar as quantias exigíveis a cada um. A responsabilidade tributária é, de acordo com o disposto nos 22.°, n.° 3, e 23.° da LGT e 159.° e 160.° do CPPT, por via de regra, de natureza subsidiária face ao devedor originário, embora possa ser subsidiária ou solidária na relação entre os diversos responsáveis no caso de pluralidade de responsáveis tributários.
81
) O ónus da prova recai, em processo tributário, e em caso de dúvida sobre a existência dos factos tributários, sobre a Fazenda Pública. Cf. Diogo Leite de Campos e Mônica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, Almedina, Coimbra, 2ª ed., 2000, p. 43. 82 ) José Luís Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2002, p. 159.
47
8. A transmissão da obrigação fiscal O art. 29.° da LGT estabelece, nos seus n. os l e 3, o princípio da intransmissibilidade dos créditos e das dívidas tributárias. Salvo nos casos previstos no n.° 2 do citado art. 29.°, respeitante à transmissão pelo lado passivo ou sucessão legal, e no art. 41.°, n.° 2, da LGT, respeitante à transmissão pelo lado activo ou sub-rogação nos direitos da Fazenda Pública. Vejamos, então, cada uma dessas situações. 8.1. A sub-rogação nos direitos da Fazenda Pública A figura da sub-rogação nos direitos da Fazenda Pública está consagrada no art. 41.° da LGT, que prevê que um terceiro pode pagar as dívidas fiscais de outrem, “desde que tenha previamente requerido a declaração de sub-rogação e obtido autorização do devedor ou prove interesse legítimo". Efectua-se, assim, uma transmissão da obrigação fiscal pelo lado activo. O terceiro acaba por assumir o lugar que cabia à Fazenda Pública, podendo, por exemplo, requerer a instauração ou o prosseguimento da execução fiscal para cobrar do executado o que ele tiver pago (art. 92.° do CPPT). 8.2. A sucessão legal A sucessão tributária vem prevista no n.° 2 do art. 29.º da LGT, que prescreve que "as obrigações tributárias originárias e subsidiárias transmitem-se, mesmo que não tenham sido ainda liquidadas, em caso de sucessão universal por morte, sem prejuízo do benefício do inventário". No processo de execução fiscal, podem ser executados os devedores originários e seus sucessores (art. 153 e 155 do CPPT). Na hipótese de se verificar uma partilha entre os sucessores, será mandado citar cada um dos herdeiros para pagar o que proporcionalmente lhe competir na dívida exequenda. No caso de impostos de prestação periódica, como o IMI, o IRS, IRC, o herdeiro apenas responde nessa qualidade pelas dívidas constituídas antes do falecimento cuj us do de cujus e e não das dívidas nascidas após aquele momento. 9. A tributação de actividades ilícitas A lei fiscal tributa qualquer actividade económica e não tem que se preocupar com a natureza, moral e jurídica, da actividade em questão. É o que se verifica, por exemplo, com a tributação dos rendimentos de jogos proibidos, dos lucros baseados em especulações, e de outras práticas ilícitas. 10. A tributação de sociedades 10.1. Sociedades sujeitas à tributação São sujeitos passivos de IRC as sociedades ou entidades contempladas no art. 2.º
48
do CIRC. O CIRC exclui do regime de tributação as sociedades civis que não estão constituídas sob forma comercial, e atribui os rendimentos dessas sociedades aos sócios. É o caso igualmente das sociedades de profissionais (ex: sociedade de advogados), das sociedades de simples administração de bens (ex: condomínio), dos agrupamentos complementares de empresas (ACE) e dos agrupamentos europeus de interesse económico (AEIE) (artigo 6 do CIRC). No que se refere às sociedades civis constituídas sob forma comercial, foi-lhes reconhecida uma individualidade jurídica diferente da dos associados. A essa individualidade corresponde a atribuição de personalidade tributária passiva (CIRC, arts. 2, n° l, a), 5 e 12). 10.2. Os agrupamentos complementares de empresas (ACE) Pela Lei n° 4/73, de 4 de Junho, regulamentada pelo D/L n° 430/73, de 25 de Agosto, alterado pelo D/L 157/81, de 11 de Junho e pelo D/L 36/2000, de 14 de Março, foi introduzido no direito português a figura dos «agrupamentos complementares de empresas». Segundo a Base I, n.° l, da citada Lei, « as pessoas singulares ou colectivas e as sociedades podem agrupar-se sem prejuízo da sua personalidade jurídica, a fim de melhorar as condições de exercício ou de resultado das suas actividades económicas ». Mas, de acordo com o disposto na Base II, n° l, « os agrupamentos complementares de empresas não podem ter por fim principal a realização e partilha de lucros e constituir-se-ão com ou sem capital próprio », mas podem ter por fim acessório a realização e partilha de lucros apenas quando autorizado expressamente pelo contrato constitutivo. Resulta igualmente da lei que a «capacidade do agrupamento não compreende: a) a aquisição do direito de propriedade ou de outros direitos reais sobre coisas imóveis, salvo se o imóvel se destinar a instalação da sua sede, delegação ou serviço próprio; b) a participação em sociedades civis ou comerciais ou ainda em outros agrupamentos complementares de empresas; c) o exercício de cargos sociais em quaisquer sociedades, associações ou agrupamentos complementares de empresas» (art. 5 do D/L n.° 430/73). 10.3. Os agrupamentos europeus de interesse económico (AEIE) A finalidade do AEIE é “facilitar e desenvolver a actividade económica dos seus membros, melhorar ou aumentar os resultados desta actividade; não é seu objectivo realizar lucros para si próprio. A sua actividade deve estar ligada actividade económica dos seus membros e apenas pode consti tuir um complemento a esta última”(artigo 3, nº1 do Regulamento CEE n° 2137/85) 83 . Mas o agrupamento não pode a) exercer, directa ou indirectamente, um poder de 83
) Regulamento CEE n° 2137/85, relativo à instituição de «agrupamentos europeus de interesse económico» (AEIEs), aprovado em 25 de Julho de 1985, e aplicado a partir de l de Julho de 1989.
49
direcção ou de controlo das actividades próprias dos seus membros ou das actividades de uma outra empresa, nomeadamente nos domínios relativos ao pessoal, às finanças e aos investimentos; b) deter, directa ou indirectamente, a qualquer título, qualquer parte ou acção de uma empresa-membro; c) empregar mais de 500 assalariados; d) ser utilizado por uma sociedade para conceder um empréstimo a um dirigente de uma sociedade, ou a qualquer pessoa a ele ligada, quando tais empréstimos estejam sujeitos a restrições ou a controlos; e) ser membro de um outro agrupamento europeu de interesse económico (artigo 3, nº 2 do Regulamento). Nos termos do n.º 2 do artigo 4 do Regulamento, um agrupamento deve ser composto, no mínimo a) por duas sociedades ou outras entidades jurídicas que tenham a sua administração central em Estados-membros diferentes; b) por duas pessoas singulares que exerçam a sua actividade principal em Estados-membros diferentes; c) por uma sociedade ou outra entidade jurídica e uma pessoa singular, tendo a primeira a sua administração central num Estado-membro e exercendo a segunda a sua actividade principal num Estado-membro diferente. Segundo o art. 6 do CIRC, os ACE e os AEIE estão hoje sujeitos ao regime de transparência fiscal. Os lucros e prejuízos dos ACE e dos AEIE, com sede ou direcção efectiva em território português, são imputáveis directamente aos respectivos membros.
50
51
CAPÍTULO X OS IMPOSTOS PORTUGUESES
I. O IRS 1.1. Incidência 1.1.1. A incidência pessoal De acordo com os artigos 13 e segs. do CIRS, são sujeitos passivos do IRS as pessoas singulares residentes ou não em território nacional. As pessoas singulares (incluindo as empresas individuais, os EIRL e os membros das pessoas colectivas sujeitas ao regime de transparência fiscal, nos termos do art. 6.° do CIRC) residentes em território nacional são tributadas pela totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território nacional. As pessoas singulares não residentes em território nacional são tributadas apenas pelos rendimentos obtidos em Portugal, segundo o princípio da territorialidade. Tratando-se de residentes, e existindo agregado familiar, o imposto é devido pelo conjunto dos rendimentos das pessoas que constituem o agregado familiar, o qual é constituído, no caso de agregados familiares biparentais, pelos cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens e pelos seus dependentes, e, no caso de agregados monoparentais, por cada um dos cônjuges, ex-cônjuges, pai ou mãe solteiros ou adoptante solteiro e seus dependentes. 1.1.2. A incidência real Segundo os artigos 1.° a 11.° do CIRS, o IRS incide sobre o valor anual dos seguintes rendimentos, mesmo quando provenientes de actos ilícitos: - Categoria A - "rendimentos do trabalho dependente". Nesta categoria integramse os rendimentos provenientes das remunerações pagas ao trabalhador por conta de outrem no âmbito de uma relação jurídica de trabalho subordinado; as remunerações recebidas a título de pré-reforma; as remunerações auferidas pelos membros dos órgãos estatutários das pessoas colectivas, os abonos para falhas, as ajudas de custo, quaisquer indemnizações resultantes da constituiçã o, extinção ou modificação da relação jurídica de trabalho, as gratificações, etc 84 (art. 2.º do CIRS). - Categoria B - "rendimentos empresariais e profissionais". Esta integra os rendimentos: 1) decorrentes do exercício de qualquer actividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária; 2) auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer actividade de prestação de serviços; 3) os provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou das prestação de informações respeitantes 84
) Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, “A tributação dos rendimentos de trabalho dependente em IRS”, CTF, Out.-Dez. 2002, nº 408, p. 9 e segs.
52
a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico (artigo 3.º do CIRS). São consideradas actividades comerciais e industriais, designadamente, as seguintes: compra e venda; fabricação; pesca; explorações mineiras e outras indústrias extractivas; transportes; construção civil; actividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas; agências de viagens e turismo; artesanato; actividades agrícolas, silvícolas e pecuárias integradas noutras de natureza comercial ou industrial, etc. - Categoria E - "rendimentos de capitais". Trata-se dos rendimentos resultantes da aplicação de capitais, em que se compreendem, nomeadamente, os juros provenientes de contratos de mútuo e de abertura de crédito, os juros derivados de depósitos à ordem ou a prazo, os rendimentos de títulos de dívida pública, os lucros das entidades sujeitas ao IRC colocados à disposição dos respectivos associados ou titulares, os rendimentos decorrentes do uso ou concessão do uso de equipamento agrícola e industrial, comercial ou científico, quando não constituam rendimentos prediais, etc. - Categoria F - "rendimentos prediais". Estes integram as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagos ou colocados à disposição dos respectivos titulares e decorrentes da locação de tais prédios ou de cessões de exploração de estabelecimentos comerciais ou industriais, incluindo as dos bens móveis que aí se encontrem, e bem assim a diferença de rendas obtidas pelo sublocador. - Categoria G - "incrementos patrimoniais". Esta categoria abrange não apenas as mais-valias, mas também outros incrementos patrimoniais. A título de mais-valias, integram esta categoria os ganhos que resultem da alienação onerosa de direitos reais, de partes sociais e da propriedade intelectual ou industrial, da cessação de posições contratuais ou outros direitos relativos a imóveis, operações relativas a instrumentos financeiros derivados e operações relativas a warrants autónomos. A título de outros incrementos patrimoniais, temos as indemnizações que visem a reparação de danos não patrimoniais, de danos emergentes não comprovados e de lucros cessantes, considerando-se como tais apenas os destinados a ressarcir os benefícios líquidos deixados de obter em consequência da lesão, as importâncias auferidas em virtude de obrigações de não concorrência e os acréscimos patrimoniais não justificados determinados nos termos dos arts. 87.°, 88.° e 89.°-A da LGT (artigo 9.º, n.º 1 do CIRS). - Categoria H - "pensões". Consideram-se como tais as prestações devidas a título de pensões de aposentação ou de reforma, velhice, invalidez, ou de sobrevivência e ainda as pensões de alimentos; as prestações a cargo das seguradoras, fundos de pensões, ou quaisquer outras entidades, devidas no âmbito de regime complementar de segurança social, e que não sejam considerados rendimentos do trabalho dependente; as rendas temporárias ou vitalícias, e outras pensões ou subvenções.
53
1.2. Delimitação negativa da incidência Nos termos do art. 12.° do CIRS, a incidência do IRS encontra-se também delimitada negativamente pela exclusão tributária, o que significa que não haja assim verdadeiras isenções em IRS. Entre as exclusões da incidência do IRS, é de mencionar as seguintes modalidades: a) as indemnizações recebidas ao abrigo do contrato de seguro ou outro título; b) os prémios literários, artísticos ou científicos, quando não envolvam a cedência temporária ou definitiva dos direitos de autor; c) os rendimentos do exercício da actividade de profissionais de espectáculos quando tributados em IRC, nos termos da al. d) do n.° 3 do art. 4.° do CIRC; d) as quantias necessárias à cobertura de despesas relativas à saúde e educação, pagas ou atribuídas pelas instituições de solidariedade social pública ou particular no âmbito do acolhimento e apoio a idosos, deficientes, crianças e jovens; e) os prémios atribuídos aos praticantes de alta competição por resultados relevantes obtidos em provas internacionais, nos termos da legislação aplicável. f) os incrementos patrimoniais sujeitos a imposto sobre as sucessões e doações. Para além destas exclusões da incidência do IRS de carácter geral, temos outras exclusões de carácter especial. É o caso, por exemplo, dos rendimentos resultantes de actividades agrícolas, silvícolas e pecuárias, constante do n.° 4 do art. 3.° do CIRS. Pois bem, nos termos do n.° 4 do art. 3.° do CIRS, "são excluídos da tributação os rendimentos resultantes de actividades agrícolas, silvícolas e pecuárias, quando o valor dos proveitos ou das receitas, isoladamente, ou em cumulação com o valor dos rendimentos ilíquidos sujeitos, ainda que isentos, desta ou doutras categorias que devam ser ou tenham sido englobados, não exceda por agregado familiar cinco vezes o valor anual do salário mínimo nacional mais elevado" 85 . 1.3. A determinação da matéria colectável 1.3.1. As diversas fases relativas à determinação da matéria colectável A determinação da matéria colectável passa por diversas fases, que convém distinguir: a) Em primeiro lugar, apura-se o rendimento líquido de cada categoria através da subtracção ao rendimento ilíquido de cada categoria das deduções específicas dessa mesma categoria. Relativamente ao trabalho dependente essa dedução corresponde a 72% de doze vezes o salário mínimo nacional mais elevado, sendo certo que, se o montante das contribuições obrigatórias para os regimes de protecção social e para subsistemas de saúde for superior aquele montante, a dedução será igual ao montante total dessas contribuições (art. 25.°). No tocante aos pensionistas, a dedução específica aos rendimentos da Categoria H foi objecto de uma redução de € 8.283 para € 7.500 na lei do Orçamento do Estado para 85
) Na Lei n.° 30-G/2000, essa exclusão era igual ao valor anual do um salário mínimo nacional. Todavia a LOE/2002 veio aumentá-la para cinco salários mínimos, aplicando este limite retroactivamente ao ano de 2001.
54
2006 86 . Nas categorias E e G não há lugar a qualquer dedução específica (a não ser, em relação à categoria G, as respeitantes às menos valias e à dupla tributação económica) – arts. 40.º e 40.º- A e 42.º a 52.º. Na categoria F a dedução específica está limitada às despesas de manutenção e de conservação suportadas pelo sujeito passivo e devidamente documentadas, e ao IMI que incide sobre o valor dos prédios cujo rendimento tenha sido englobado (art. 41.º). b) Em segundo lugar, apura-se o chamado rendimento global líquido ou rendimento líquido total através do englobamento dos rendimentos das diversas categorias. O n.° l do art. 55.° do CIRS prevê que “é dedutível ao conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria de rendimentos”. Prin cípio da intercomunicabilidade dos custos das diversas categorias de rendimento 87 . c) Em terceiro lugar, efectua-se a dedução ao rendimento líquido total dos abatimentos (respeitantes aos encargos com pensões a que o sujeito passivo esteja obrigado por sentença judicial ou acordo judicialmente homologado), apurando-se assim o rendimento colectável (art. 56.°). d) Finalmente, apura-se o quociente conjugal, no caso de cônjuges casados e não separados judicialmente de pessoas e bens e dos unidos de facto que tenham optado pela tributação conjunta, que se determine através da divisão por 2 do rendimento colectável, de modo a encontrar a taxa aplicável a todo o rendimento colectável (art. 69.°). 1.3.2. A determinação dos rendimentos empresariais e profissionais Relativamente à determinação do lucro tributável das actividades empresariais e profissionais, temos duas modalidades: o regime simplificado e o regime da contabilidade organizada. O regime simplificado de tributação ocorre efectivamente tanto em sede do IRS como do IRC, mas com diferentes pressupostos e obrigações, verificando-se, porém, o mesmo facto: a não relevância dos custos ou despesas para o apuramento da matéria colectável. No IRS, segundo o art. 28.°, n.° 2 do CIRS, ficam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, não tendo optado pelo regime de contabilidade organizada, não tenham ultrapassado na sua actividade, no período imediatamente anterior, € 149.639,37 do volume de vendas ou € 99.759,58 do valor ilíquido dos restantes rendimentos empresariais e profissionais, com um prazo mínimo de três anos prorrogável automaticamente por iguais períodos, excepto se 86
) O Lei do OE para 2006 penaliza os pensionistas. De facto, a dedução específica aos rendimentos da Categoria H foi objecto de uma redução de € 8.283 para € 7.500. 87 ) V. André Salgado de Matos, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares Anotado, Instituto Superior de Gestão, Lisboa, 1999, p. 329 e s.
55
o sujeito passivo optar pelo regime de contabilidade organizada. Por ser aplicável apenas aos proveitos anuais inferiores a €149.639,37, o regime simplificado de tributação visa essencialmente às micro-empresas. Existindo, assim, um período de permanência no regime simplificado, já tal não ocorre no de contabilidade organizada, daqui r esultando que, caso se pretenda a opção por este, terá de ser exercida todos os anos 88 . No regime simplificado - de acordo com o art. 31.° do CIRS -, a determinação do rendimento colectável resulta da aplicação dos indicadores objectivos de base técnico-científica a aprovar pelo Ministro das Finanças para os diferentes sectores da actividade económica. Mas, até à aprovação desses indicadores, o rendimento colectável é o resultante da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e, bem assim, do valor dos serviços prestados no âmbito das actividades de hotelaria, restauração e bebidas, e do coeficiente de 0,70 aos restantes rendimentos, com o montante mínimo igual a metade do valor anual da retribuição mínima mensal. Com o regime simplificado, pretende-se dispensar a apresentação de documentos de despesa por parte dos pequenos contribuintes, uma vez que se presume a existência de custos no valor de 80% e de 30% respectivamente. É assumir como custos, sem necessidade de qualquer prova documental, o correspondente a 80% nas vendas de mercadorias ou de produtos e 30% nos restantes proveitos. O outro problema que se coloca é de estabelecer uma presunção de rendimento mínimo, ao nível de metade do valor anual da retribuição mínima mensal. Ao nível do IRC, também aqui, até serem aprovados os "indicadores de base técnico-científica", o lucro tributável é o resultante da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor das vendas de mercadorias ou de produtos e de 0,45 aos restantes proveitos, com o montante mínimo igual ao valor anual do salário mínimo nacional mais elevado, sendo a taxa de IRC aplicável de 25% (art° 80° do CIRC), pelo que o imposto liquidado será pelo menos de 1.250 €, equivalente portanto ao do Pagamento Especial por Conta (PEC), pese embora seja este dedutível nos lucros futuros (art. 87.º do CIRC). Cessa assim a aplicação do regime simplificado quando o limite do total anual de proveitos for ultrapassado em dois períodos de tributação consecutivos ou num único exercício em montante superior a 25% (artigo 53, nº 10 do CIRC). A opção pelo "regime geral" de determinação do lucro tributável é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de a renovar nos primeiros três meses seguintes (artigo 53.º 9). Quanto à determinação dos rendimentos empresariais e profissionais com base no regime da contabilidade organizada, o art. 32.° do CIRS manda aplicar as regras estabelecidas no CIRC para a determinação do lucro tributável, com as adaptações 88
) Luís Cupertino, “O Regime Simplificado no Imposto sobre o Rendimento: Enquadramento e Questões”, Fisco, nº 119/121, Setembro de 2005, p. 146.
56
resultantes do CIRS, nomeadamente as adaptações resultantes do art. 33.°, do qual consta uma lista de encargos da actividade empresarial ou profissional que não são dedutíveis para efeitos do IRS, e que assim acrescem aos encargos não dedutíveis previstos para o IRC 89 . O que significa que, em sede do IRS empresarial e profissional, temos os encargos não dedutíveis do CIRS e do CIRC. Pode ocorrer o facto de um contribuinte passar a estar sujeito ao regime simplificado, não por exercer tal opção mas por não ter comunicado que pretendia dispor do enquadramento geral. Ora, não podemos admitir que um contribuinte que não entregou uma declaração fiscal (IES) ou contabilística (anual) no prazo legal, não possa proceder à sua correcção à posteriori, liquidando apenas adicionalmente a respectiva coima e juros. 1.4. A taxa. 1.4.1. As taxas gerais As taxas gerais do IRS, previstas no art. 68.° do CIRS, permitem determinar o montante do rendimento colectável. Mas, da aplicação das taxas não pode resultar, para os titulares de rendimentos de trabalho dependente, a disponibilidade de um rendimento líquido de imposto inferior ao valor anual do salário mínima nacional mais elevado acrescido de 20%, nem resultar qualquer imposto para os mesmos rendimentos, cuja matéria colectável, após a aplicação do quociente conjugal, seja igual ou inferior a 1812 Euros (Redacção dada pelo artigo 46º da Lei n.º 53-A/2006 de 29/12) (artigo 70.º do CIRS). 1.4.2. Taxas especiais Para além das taxas de carácter geral, temos taxas liberatórias (art.71.°), e taxas de tributação autónoma (art. 72.° e 73.º). A aplicação de taxas liberatórias constitui uma situação normal relativamente aos rendimentos dos não residentes; mas não podem deixar de constituir uma situação de carácter excepcional no respeitante aos rendimentos dos residentes. 1.5. A liquidação e cobrança A liquidação do IRS compete aos serviços centrais da DGCI, e deve ser levada a cabo nos termos dos artigos 75.° a 77.° do CIRS. No que se refere às operações da liquidação, uma vez apurado o rendimento colectável, há que proceder à aplicação da taxa ao rendimento colectável para determinar a colecta. No caso de se tratar de contribuintes casados ou unidos de facto (no caso de terem optado pela tributação conjunta), procede-se ao apuramento do quociente conjugal, dividindo o rendimento colectável por 2 a fim 89
) Entre os quais temos os da lista constante do art. 42.° do CIRC.
57
de seleccionarmos a taxa aplicável a este quociente, muito embora esta taxa se aplique, depois, a todo o rendimento colectável e não apenas a este quociente, ou ao produto deste quociente por 2. Apurada a colecta do IRS, procede-se às numerosas deduções - as deduções constantes dos arts. 78.° a 88.° do CIRS, entre as quais se salientam, por constituírem deduções à colecta por natureza, os pagamentos por conta efectuados relativamente aos rendimentos da categoria B. No caso destes pagamentos serem superiores ao imposto devido, cria-se um direito ao reembolso da diferença para o contribuinte (Cf. os n. os 2 e 3 do art. 78.°). Quanto às demais deduções à colecta, constantes dos arts. 78.° a 88.°, temos: 1) os montantes relativos a cada sujeito passivo do agregado familiar (art. 79.°); 2) o crédito de imposto por dupla tributação internacional dos titulares de rendimentos das diferentes categorias obtidos no estrangeiro (art. 81.°); 3) 30% das despesas com a saúde (art. 82.°); 4) 30% das despesas com a educação, até aos limites previstos no art. 83.° do CIRS; 5) 25% das despesas com lares e outras instituições de apoio à terceira idade, até ao limite previsto no art. 84.º do CIRS; 6) 30% dos encargos com imóveis, situados em território português, nos termos do art. 85.° do CIRS; 7) 25% dos prémios de seguros de acidentes pessoais e seguros de vida, nas condições previstas no artigo art. 86.°; 8) 30% dos prémios de seguro de doença, segundo o estipulado no mesmo artigo; 9) 20% dos valores aplicados em PPR, fundos de pensões e outros regimes complementares de segurança social, nos termos do artigo 21 do EBF; 10) 50% do montante despendido na aquisição de computadores, software e aparelhos de terminal, com o limite de € 250, sendo apenas aplicável uma vez durante os anos de 2006 a 2008. Subtraídas à colecta as deduções, obtém-se o montante do imposto a pagar. O IRS é pago, regra geral, antecipadamente, seja através da retenção na fonte, seja através dos pagamentos por conta. É objecto de retenção na fonte o IRS devido pelos rendimentos do trabalho dependente (com excepção de alguns deles) e das pensões (com excepção das de alimentos) e, bem assim, pelos rendimentos das outras categorias nos termos dos arts. 99.° a 101.°. O imposto retido deve ser pago mensalmente, até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que as retenções tiverem sido efectuadas (n. os 3 e 4 do art. 98.° do CIRS).
58
No respeitante aos pagamentos por conta, esta forma antecipada de pagamento aplica-se apenas aos rendimentos da categoria B, e vêm regulados no art. 102.° do CIRS. A totalidade dos pagamentos por conta é igual a 85% do montante calculado com base na seguinte fórmula: C x RLB _ R RLT em que as siglas utilizadas têm o seguinte significado: C = colecta do penúltimo ano, líquida das deduções a que se refere o n.° l do art. 78.°, com excepção da relativa à dupla tributação internacional; R = total das retenções efectuadas no penúltimo ano nos rendimentos da categ. B; RLB = rendimento líquido positivo do penúltimo ano da categoria B; RLT = rendimento líquido total do penúltimo ano. O IRS pode ser pago em qualquer serviço de finanças, na respectiva tesouraria da Fazenda Pública, nas estações dos CTT, nas instituições de crédito autorizadas e nos postos servidos por máquinas ATM (postos "multibanco"). Quanto ao prazo do pagamento normal do IRS liquidado, dispõe o art. 97.° (em articulação com os arts. 60.°, 76.° e 77.°) que esse prazo é até 31 de Maio do ano da liquidação no caso dos rendimentos serem apenas rendimentos das ca tegorias A e H, e até 30 de Julho no caso de haver rendimentos de outras categorias 90 . 1.6. Esquema das operações de determinação do IRS Vejamos a sequência das operações de determinação do IRS: Determinação do rendimento bruto p/categoria Deduções específicas p/cada categoria (arts. 25.° e segs.) = Rendimento líquido p/cada categoria Soma dos rendimentos líquidos p/cada categoria ou englobamento (art. 22.°) = Rendimento englobado Algumas perdas (art. 55.°) = Rendimento global líquido Abatimentos (art. 56.°) = Rendimento colectável (art. 56.°) 90
) Prazo que será até 31 de Agosto, caso o IRS respeite a rendimentos da categoria B e tenha sido liquidado nos termos da al. b) do n.° l do art. 76.°.
59
Sendo contribuintes casados ou em união de facto: splitting ou divisão p/2 (art. 69.°, n.° 1) x Taxa (arts. 68.° e 70.° - 73.°) = Colecta Sendo contribuintes casados ou em união de facto: x 2 (art. 69.°, n.° 2) = Colecta Deduções à colecta (p/sujeitos passivos e dependentes - art. 79.°, p/despesas sociais - arts. 82.° - 84.°e 87.°, p/impostos já suportados art. 81.°, e p/benefícios fiscais - arts. 85.°, 86.° e 88.°) = Imposto a pagar
II. O IRC 2.1. A incidência 2.1.1. A incidência pessoal Segundo o art. 2.° do CIRC, constituem sujeitos passivos do IRC: - as pessoas colectivas (sociedades comerciais, sociedades civis sob forma comercial, cooperativas, empresas públicas e demais pessoas colectivas de direito público ou privado) com sede ou direcção efectiva em território português (consideradas residentes); - as entidades desprovidas de personalidade jurídica com sede ou direcção efectiva em território português (consideradas residentes), cujos rendimentos não sejam tributáveis em IRS ou em IRC directamente na titularidade das pessoas singulares ou colectivas, em que se incluem, designadamente as heranças jacentes, as sociedades e associações sem personalidade jurídica, as pessoas colectivas em relação às quais tenha sido declarada a invalidade e as sociedades comerciais ou civis sob forma comercial anteriormente ao registo; - as entidades com ou sem personalidade jurídica que não tenham a sede nem a direcção efectiva em território português (consideradas não residentes) e cujos rendimentos nele obtidos não estejam sujeitos a IRS. 2.1.2. A incidência real O IRC incide sobre os rendimentos obtidos, mesmo quando provenientes de actos ilícitos, pelas entidades residentes e não residentes nos termos do art. 3.° do CIRC. Relativamente às entidades residentes, a base do imposto é a seguinte: - se exercerem, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial
60
ou agrícola, a base do imposto é o lucro, definido como a diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas na lei; - se não exercerem, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, então a base do imposto é o rendimento global das várias categorias. Relativamente às entidades não residentes, a base do imposto é a seguinte: - se dispuserem em território português de estabelecimento estável, a base do imposto é o lucro imputável ao estabelecimento estável; - se não tiverem estabelecimento estável em território português, ou, tendo-o, esses rendimentos não sejam imputáveis ao mesmo, a base do imposto é constituída por cada um dos rendimentos das diferentes categorias consideradas para efeitos do IRS. 2.1.3. A obrigação de imposto As entidades residentes estão sujeitas a uma obrigação pessoal, pelo que pagam IRC pela totalidade dos seus rendimentos, quer sejam obtidos no território português, quer sejam obtidos no estrangeiro, e as entidades não residentes estão sujeitas a uma obrigação real, pelo que pagam IRC apenas relativamente aos rendimentos obtidos em território português. 2.l.4. O regime de transparência fiscal O regime de transparência fiscal caracteriza-se pelo facto de os rendimentos obtidos pelas entidades a ele sujeitas serem imputados aos respectivos sócios. As entidades sujeitas ao regime de transparência fiscal estão assim isentas de pagamento do IRC (art.º 12.º), excepto quanto ao IRC devido em sede de tributação autónoma, mas não ficam desobrigadas do cumprimento das obrigações acessórias, nomeadamente as obrigações declarativas previstas no n.° 7 do art. 109.° do CIRC. O regime de transparência fiscal, previsto no art. 6.° do CIRC, aplica-se a certas sociedades: sociedades simples (n. os l, 3 e 4 do art. 6.°), e agrupamentos de sociedades (n. os 2 e 3 do art. 6.°). Na primeira situação, o regime de transparência fiscal aplica-se a: 1) sociedades civis não constituídas sob forma comercial, 2) sociedades de profissionais e 3) sociedades de administração de bens cujo capital social pertence maioritariamente a um grupo familiar ou a um pequeno número de sócios em determinadas condições. O que significa que estas sociedades não são tributadas em IRC (art. 12.°). Quanto aos agrupamentos complementares de empresas (ACE) e os agrupamentos europeus de interesse económico (AEIE), também a estes agrupamentos é aplicado o regime de transparência fiscal. Assim o estabelece o n.° 2 do art. 6.°, ao dispor que "os lucros ou prejuízos do exercício, apurados nos termos deste Código, dos agrupamentos complementares de empresas e dos agrupamentos europeus de inte-
61
resse económico, com sede ou direcção efectiva em território português, que se constituam e funcionem nos termos legais são também imputáveis directamente aos respectivos membros, integrando-se no seu rendimento tributável". O lucro tributável é assim imputado aos sócios na proporção da respectiva quota, integrando-se assim na categoria B de rendimento do IRS no respeitante aos sócios singulares (art. 20.° do CIRS) ou no IRC da sociedade agrupada. O regime de transparência fiscal, previsto no art. 6.° do CIRC, visa garantir a neutralidade fiscal entre a tributação das pessoas singulares e a tributação das pessoas colectivas, eliminar a dupla tributação económica dos lucros distribuídos, e combater a evasão fiscal através da criação artificial de sociedades. Em caso de prejuízo, pode ser este reportado em sede do IRC da sociedade ou entidade transparente no lucro dos seis anos seguintes, mas nunca repercutido nos demais rendimentos dos sócios em sede do IRS ou do IRC desse ano ou de anos posteriores (n. os l e 7 do art. 47.° do CIRC). 2.2. Isenções O IRC prevê um conjunto de isenções, que podem ser de natureza automática, como os artigos 9.° e 11.º do CIRC e 52.º, 53.º e 56.°-A do EBF, ou podem ser dependentes de reconhecimento, como é o caso das pessoas colectivas de utilidade pública e de solidariedade social (artigo 10.º do CIRC). 2.3. A determinação da matéria colectável 2.3.1. A competência para a determinação da matéria colectável A determinação da matéria colectável do IRC, segundo o art. 16.° do CIRC, pode ser efectuada pelo próprio contribuinte ou pela DGCI ou pelo director das finanças ou ainda pelo director dos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária ou por funcionário em que por qualquer deles seja delegada competência. A matéria colectável do IRC é determinada pelo próprio contribuinte na declaração-liquidação, pois no IRC há lugar a autoliquidação. A Administração Fiscal limita-se a fiscalizar, a posteriori, a correcção das referidas declarações. Na falta de apresentação da declaração de rendimentos por parte do contribuinte, compete à DGCI a determinação da matéria colectável à partir de métodos indirectos, conforme regulados nos artigos 87.° a 90.º da LGT. 2.3.2. As modalidades de determinação da matéria colectável A determinação da matéria colectável do IRC difere consoante se trate 1) de entidades residentes que exerçam a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola ou de estabelecimentos estáveis de entidades não residentes, ou 2) de entidades residentes que não exerçam a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola ou de entidades não
62
residentes sem estabelecimento estável em território português. No primeiro caso, a determinação da matéria colectável das primeiras tem na base ou o lucro contabilístico corrigido nos termos do CIRC (regime da contabilidade organizada) ou um lucro normal baseado em determinados indicadores ou coeficientes (regime simplificado). No segundo caso, a matéria colectável das entidades residentes que não exerçam a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola é formada pela soma algébrica dos rendimentos líquidos das várias categorias consideradas para efeito do IRS determinados nos termos do CIRS. 2.3.3. O lucro contabilístico 2.3.3.1. A determinação do lucro contabilístico O lucro tributável das entidades residentes que exerçam a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e dos estabelecimentos estáveis de entidades não residentes tem por base o lucro contabilístico. O lucro tributável depende da variação do activo líquido entre dois exercícios sucessivos, isto é, da diferença entre o activo (ou valores patrimoniais) líquido no fim do período e o activo (ou valores patrimoniais) líquido no início do período da tributação. Compete à contabilidade apurar o volume dos lucros ou prejuízos empresariais ocorridos num determinado espaço temporal, através do balanço e da demonstração de resultados. A finalidade da contabilidade da empresa é de conhecer a situação patrimonial e os resul tados das entidades a que respeita para efeitos de determinação do lucro tributável 91 . Nos termos do art. 17.°, n.° l, do CIRC, o lucro tributável é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício (proveitos e ganhos menos custos e perdas) e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinado com base na contabilidade organizada e eventualmente corrigido nos termos do CIRC. No que respeita à contabilidade das empresas, importa salientar alguns princípios de contabilidade 92 , tais como os princípios da continuidade da empresa 93 , da consistência da empresa 94 , da especialização dos exercícios 95 , da prudência 96 , da 91
) Manuel Henrique de Freitas Pereira, “A periodização do lucro tributável”, CTF, 1988, p. 52. ) Princípios que também são objecto de definição por parte do IASB = International Accounting Standards Board (durante muito tempo conhecido por IASC = International Accounting Standards Committee) na sua célebre NIC l (Norma Internacional de Contabilidade 1). 93 ) O princípio da continuidade traduz a ideia de que a empresa opera continuamente, e não tem a necessidade de entrar em liquidação ou de reduzir significativamente o seu volum e de negócios. 94 ) O princípio da consistência exige que a empresa não altera as suas políticas contabilísticas de um exercício para o outro, devendo dar conta disso quando ocorrer uma tal situação. 95 ) O principio da especialização dos exercícios estabelece que os proveitos e os custos devem ser tomados em consideração quando obtidos ou incorridos e não quando recebidos ou pagos, integrando-se os recebimentos e os pagamentos nas demonstrações financeiras dos períodos a que respeitam (art. 18.° do CIRC). 96 ) O princípio da prudência prevê que seja integrado nas contas um grau de precaução ao fazer as estimativas, mas sem constituir reservas ocultas ou provisões excessivas. 92
63
prevalência da substância sobre a forma 97 , da materialidade 98 , do custo histórico 99 , da não compensação dos saldos 100 e da correspondência de balanços sucessivos101 . Nota-se que estes dois últimos princípios não figuram no POC. Os conceitos de proveitos ou ganhos e de custos ou perdas estão definidos, respectivamente, no n.° l do art. 20.° do CIRC e no n.° l do art. 23.° do CIRC. Só devem ser considerados custos ou perdas, para efeitos fiscais, todos os que se revelem estritamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora. O problema é que só se aceitam os custos que afectam directa e negativamente um proveito e não os custos ligados a operações que não deram origem a proveitos. Ora, tem-se de reconhecer o direito ao erro de gestão por parte do dono do negóc io, e admitir que o custo não esteja necessariamente ligado a obtenção de proveitos 102 . 2.3.3.2. A dedutibilidade dos custos em IRC O princípio geral estabelecido no art. 23° do CIRC é o de que determinados custos fiscais são dedutíveis desde que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. Os motivos de não dedutibilidade podem ser de quatro ordens: - Um motivo de cariz técnico-prático, em que se prevê a não dedutibilidade do imposto sobre sociedades e a derrama (o art. 42°, n° l, al. a) do CIRC); - Um motivo que se prende com a exigência de separação entre o património societário e o património pessoal dos sócios, por forma a evitar que a empresa venha a suportar, por exemplo, os gastos pessoais dos seus administradores. Por isso, o legislador português optou, nalguns casos, por limitar a dedução das despesas a uma determinada percentagem 103 e, noutros, resolveu condicionar a 97
) O princípio da prevalência da substância sobre a forma determina que as operações financeiras devem ser contabilizadas atendendo à realidade financeira e não apenas à sua forma legal. V., sobre este assunto, A. Lobo Xavier, «O princípio da prevalência da substância sobre a forma e o princípio da consideração económica dos factos tributários. A classificação contabilística dos bens do activo. Significado e critério das imobilizações. O relevo do objecto social», RDES, XXVII, 1995, p. 159 e ss. 98 ) O princípio da materialidade dispõe que as demonstrações financeiras devem evidenciar todos os elementos que sejam relevantes e possam afectar as avaliações ou as decisões dos utentes interessados. 99 ) O princípio dos custos históricos concretiza-se na ideia de que os registos contabilísticos devem basear-se nos custos de aquisição ou de produção e não noutros. 100 ) O princípio da não compensação de saldos prevê que os elementos das rubricas do activo e do passivo devem ser valorizados separadamente. 101 ) O princípio da correspondência de balanços sucessivos deve ser entendido no sentido de que o balanço de abertura de cada exercício deve corresponder ao balanço de encerramento do exercício anterior. 102 ) Tomás Castro Tavares, “A dedutibilidade dos custos em sede de IRC”, Fisco, n.º 101/102, Janeiro 2002, p. 40. 103 ) Cf. art. 42º, nº l, al. f) do CIRC para as despesas com ajudas de custos e compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador.
64
dedutibilidade de certas despesas a um formalismo acrescido 104 . Também se exige a emissão de um suporte documental e de registo contabilístico da operação, como prova da efectivação da despesa (art. 42°, n° l, h) do CIRC), para que o custo seja fiscalmente admissível. - Um motivo moral, em que não se deduzam multas, coimas e despesas ilícitas (art. 42°, nº l, d) e o 23°, n° 2 do CIRC), para além de que também existem certas limitações à dedutibilidade de certas despesas consideradas como sumptuosas, como é o caso das limitações às amortizações de aviões, helicópteros ou viaturas acima de determinado valor (Cf. art. 32°, n° l, al. f) do CIRC). - Um outro motivo que se prende com a ideia de que só perante normas expressas se poderá afastar a dedutibilidade de certos custos. Decorre expressamente do princípio geral do art. 23° do CIRC que as despesas realizadas pelo contribuinte, para serem fiscalmente dedutíveis, devem estar adstritas ou à obtenção dos ganhos sujeitos a imposto, ou à manutenção da fonte produtora. 2.3.3.3. A valorimetria das existências e o regime das reintegrações, amortizações e provisões Para apurar os proveitos e os custos é necessário proceder à medição do valor das existências e às reintegrações e amortizações do activo imobilizado, sendo de excluir, desde logo, as provisões. Relativamente às existências, o CIRC prevê os critérios da sua valor imetria no artigo 26.° do CIRC, ao contrário do que acontece com os outros activos 105 . No tocante às as reintegrações e amortizações, essas destinam-s e a registar, em cada exercício, a depreciação sofrida pelos activos imobilizados 106 , isto é, pelos activos imobilizados corpóreos, activos imobilizados incorpóreos e investimentos financeiros em imóveis. O cálculo das reintegrações e amortizações do exercício deve fazer-se, segundo o artigo 29.º do CIRC, pelo método das quotas constantes ou das quotas degressivas, das unidades produzidas (numa fábrica), dos quilómetros percorridos (numa empresa de transportes), das horas de voo (numa empresa de aviação), etc. De acordo com o n.° 3 do art. 29.°, podem, ainda, ser utilizados métodos de amor104
) Como por exemplo, na alínea j) do art. 42° do CIRC, referente às despesas com combustíveis e ao regime de prova a que submetem o sujeito passivo. 105 ) Segundo o IASB, os activos são recursos controlados pela empresa como resultado de acontecimentos passados, dos quais se espera que para a mesma fluam benefícios económicos, e dividem-se em: activos imobilizados (em que temos: as imobilizações corpóreas, as imobilizações incorpóreas e os investimentos financeiros) e activos circulantes (em que temos: as existências, as dívidas de terceiros e as disponibilidades). Sublinhe-se que as existências são constituídas sobretudo pelos stocks: as matérias primas e produtos acabados. C. Baptista da Costa/G. Correia Alves, Contabilidade Financeira, p. 85 e ss. 106 ) Nos termos do art. 28.° do CIRC, são aceites como custos as reintegrações e amortizações de elementos do activo sujeitos a deperecimento, considerando-se como tais os elementos do activo imobilizado que, com carácter repetitivo, sofrerem perdas de valor resultantes da sua utilização, do decurso do tempo, do progresso técnico ou quaisquer outras causas. Mas não integram esse deperecimento as meras flutuações de ordem económica que afectem os valores patrimoniais.
65
tização e reintegração diferentes dos indicados anteriormente quando a natureza do deperecimento ou a actividade económica das empresas o justifiquem, após reconhecimento prévio da DGCI. De notar que os elementos do activo imobilizado sujeitos a deperecimento de reduzido valor são aceites como custos num só exercício, no exercício da sua aquisição ou produção (art. 32.°). Já não são aceites como custo, nos termos do artigo 33, as reintegrações e amortizações de elementos do activo não sujeitos a deperecimento e de imóveis na parte correspondente ao valor dos terrenos, as reintegrações e amortizações que excedam os limites estabelecidos nos artigos 29.° a 32.° ou praticadas para além do período máximo de vida útil dos elementos do activo, as reintegrações das viaturas ligeiras de passageiros na parte excedente a 29 927, 87 Euros, bem como dos barcos de recreio e aviões de turismo, desd e que tais bens não estejam afectados à exploração de serviço público de transportes 107 . Consideremos agora a situação das provisões. As empresas devem constituir provisões para cobrir os riscos relacionados com os elementos do activo ou do passivo. Neste aspecto, o CIRC, nos seus arts. 34.° a 38.°, contém uma série de disposições sobre as provisões fiscalmente dedutíveis. Mas, a lei fiscal, contrariamente à prática contabilística, não admite grande amplitude às provisões sob pena de diminuição das receitas tributárias. 2.3.4. O lucro tributável Uma vez apurado o lucro contabilístico, é necessário determinar o lucro tributável a partir do resultado líquido do exercício da empresa. O lucro tributável das empresas tem por base o lucro contabilístico e as variações patrimoniais positivas e negativas não reflectidas no lucro contabilístico. O lucro tributável é constituído pela soma algébrica do resultado líquido de exercício (proveitos e ganhos subtraídos dos respectivos custos e perdas) e das variações patrimoniais positivas e negativas – previstas nos artigos 21 e 24 do CIRC - verificadas no mesmo período e não reflectivas naquele resultado, determinado com base na contabilidade organizada e eventualmente corrigida nos termos do CIRC (artigo 17º, nº 1 do CIRC). Proveitos e ganhos são, na acepção da definição de lucro tributável, todas as variações patrimoniais positivas reflectidas no resultado líquido do exercício a que digam respeito (artigo 18 do CIRC), determinadas com base nas regras contabilísticas aplicáveis, e eventualmente corrigidas nos termos do próprio Código. Exclui-se do conceito de proveitos e ganhos, as variações patrimoniais positivas não reflectidas no resultado líquido do exercício, ainda que concorrerem para o 107
) Segundo o art. 31.°, as despesas de investigação e desenvolvimento (I&D) podem ser consideradas custo no exercício em que são suportadas. Consideram-se despesas de investigação as realizadas com vista à aquisição de novos conhecimentos científicos ou técnicos. Consideram-se despesas de desenvolvimento as realizadas com vista à descoberta ou melhoria substancial de matérias-primas, produtos, serviços ou processs de fabrico.
66
lucro tributável (cf. art.º 21º). Para apurar o lucro tributável das empresas, há que averiguar se todos os proveitos e ganhos relevados na demonstração de resultados são ou não tributáveis. O lucro fiscal pode não integrar determinados proveitos ou custos contabilísticos, como é o caso dos custos ou perdas constantes do art. 42.°do CIRC ou dos proveitos e custos previstos no n.° 7 do artigo 18 do CIRC. O que significa que o proveito ou ganho não tributável não é susceptível de gerar obrigação de imposto. 2.3.5. O apuramento da matéria colectável Apurado o lucro tributável, efectua-se ainda diversas deduções para obter a matéria colectável, entre as quais: a) a dedução de lucros anteriormente tributados para efeitos de eliminação da dupla tributação económica (art. 46.° do CIRC), b) o reporte de prejuízos (arts. 47.° e 65.° do CIRC), e c) os benefícios fiscais dedutíveis ao lucro tributável a que haja lugar. Vejamos cada uma destas hipóteses. Na determinação do lucro tributável das sociedades comerciais ou civis sob forma comercial, cooperativas e empresas públicas, com sede ou direcção efectiva em território português, são deduzidos os rendimentos correspondentes a lucros distribuídos por entidades com sede ou direcção efectiva no mesmo território, sujeitas e não isentas de IRC ou sujeitas ao imposto especial de jogo, nas quais o sujeito passivo detenha directamente uma participação no capital não inferior a 10% ou com um valor de aquisição não inferior a € 20.000 e esta participação tenha permanecido na sua titularidade durante o ano anterior à data da colocação à disposição dos lucros ou, se detida há menos tempo, desde que a participação seja mantida durante o tempo necessário para completar aquele período (artigo 46, nº. 1 do CIRC). O reporte de prejuízos, previsto no art. 47.° do CIRC 108 , traduz-se na dedução dos prejuízos verificados nos seis exercícios seguintes, o u seja, os prejuízos de 2006 podem ser reportados nos exercícios de 2007 a 2012 109 . Este reporte de prejuízos também se aplica às sociedades transparentes (n.° 7 do art. 47.°). Quanto aos benefícios fiscais a deduzir ao lucro tributável, são os previstos sobretudo no EBF (artigo 15, nº1, al. b, nº 2 do CIRC). Feitas estas deduções, obtém-se a matéria colectável, à qual se aplicará, a seguir, a respectiva taxa, apurando-se, deste modo, a correspondente colecta. 2.3.6. O regime simplificado 108
) Não deve confundir-se com o reporte de rendimentos previsto no art. 24.° do CIRS, que visa, aliás, os anos anteriores. Com efeito, dispõe o n.° l do referido art. 24.°: "Se os rendimentos tiverem sido produzidos nos cinco anos anteriores àquele em que foram postos à disposição do sujeito passivo, poderá este fazer reportar os referidos rendimentos ao ano ou anos em que foram produzidos na base dos valores reais auferidos em cada um ou em parcelas iguais se não for possível a determinação daqueles valores". 109 ) V. M. H. Freitas Pereira, «Regime fiscal do reporte de prejuízos - princípios fundamentais», em Estudos em Homenagem à Dra. Maria de Lourdes Órfão de Matos Correia e Vale, p. 2123 e ss.
67
Ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável, conforme dispõe o art. 53.° do CIRC, os sujeitos passivos de IRC que exerçam a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, não isentos nem sujeitos a algum regime especial de tributação, e cujo volume total anual de proveitos seja inferior a € 149.639,37 e que não optem pelo regime de determinação do lucro tributável. Este regime simplificado aplica-se automaticamente por um período mínimo de três exercícios, prorrogável automaticamente por períodos iguais, salvo se o sujeito passivo optar, nos termos antes referidos, pela aplicação do regime geral. Cessa a aplicação do regime simplificado quando o volume de proveitos total anual, durante dois anos consecutivos, exceder € 149.639,37, ou num único exercício o volume de proveitos total anual ultrapassar o limite de € 149.639,37, em montante superior a 25%. As entidades abrangidas pelo regime simplificado são tributadas com base num lucro normal, que será o resultante da aplicação de indicadores de base técnicocientífica definidos para os diferentes sectores da actividade económica. Mas, enquanto esses indicadores não forem aprovados, o rendimento colectável será o resultante da aplicação do coeficiente de 0,20% ao valor das vendas de mercadorias e de produtos, e do coeficiente de 0,45% ao valor dos restantes proveitos, com exclusão da variação da produção e dos trabalhos para a própria empresa, com o montante mínimo igual ao valor anual do salário mínimo nacional mais elevado. Essa é a forma de apuramento do lucro tributável com base no regime simplificado. As sociedades de profissionais, sujeitas ao regime de transparência fiscal - art.º 6.º do Código do IRC -, são tributadas pelo regime simplificado, o qual prevê a aplicação dos coeficientes previstos no n.º 2 do art.º 31.º do Código do IRS (0,20 ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e 0,70 aos restantes rendimentos provenientes desta categoria, excluindo a variação de produção, com o montante mínimo igual a metade do valor anual da retribuição mínima mensal). 2.4. As correcções para efeitos de determinação da matéria colectável 2.4.1. Os preços de transferência Por preços de transferência entende-se os preços pagos pelos bens, serviços, transacções financeiras, direitos e activos incorpóreos transferidos entre as empresas associadas ou pertencentes a um mesmo grupo. Os grupos de sociedades efectuam, frequentemente, transferências indirectas de lucros por forma a obter uma economia de impostos. Por exemplo, aumenta-se ou diminui-se o preço de compra das mercadorias ou dos serviços para beneficiar uma das empresas; fazem-se mútuos sem juros ou fornecem-se serviços gratuitamente; aumentam-se os lucros de uma sociedade que tenha prejuízos, enquanto que uma outra, que tem lucros, vê esses lucros diminuídos em benefício da outra. Hoje em dia, é com relativa facilidade que as empresas transferem lucros para
68
jurisdições de baixa tributação, com vista à fuga aos impostos, o que tem levado os Estados a tomar medidas para combater a diminuição das receitas fiscais. As medidas legislativas de reacção contra os preços de transferência consistem assim na atribuição à Administração Fiscal do poder de efectuar a correcção do valor dos preços de transferência para aquele que teria sido aplicado se as transacções tivessem ocorrido entre partes independentes em condições económicas e contratuais iguais ou similares (critério do preço de plena concorrência). O artigo 58.° do CIRC pretende assim evitar, através dos preços, transferências de resultados entre entidades que mantenham entre si relações especiais e, bem assim, transferências internas de resultados entre sectores da mesma entidade sujeitos a regimes fiscais diferentes. Nas operações comerciais efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual tenha relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites ou praticados entre entidades independentes em operações comparáveis. O CIRC impõe a adopção de um método apropriado para cada operação ou conjunto de operações. Para assegurar o mais elevado grau de comparabilidade entre as operações, devem entrar em linha de conta um conjunto diferenciado de factores, nomeadamente: as características dos bens, direitos ou serviços, as funções desempenhadas pelas entidades consideradas, os activos utilizados e a repartição do risco, os termos e as condições contratuais acordadas, as circunstâncias económicas e posição do mercado, a situação económica e financeira e estratégica de negócio e outras características relevantes das entidades envolvidas. Os métodos utilizados encontram-se elencados no artigo 58, n.º 3 do CIRC e são os seguintes: . O método do preço comparável de mercado 110 , que consiste na comparação entre o preço pago por um bem, serviço ou direito numa transacção com uma entidade relacionada, com o preço pago por um bem, serviço ou direito em transacções efectuadas entre entidades independentes; . O método do preço de revenda minorado 111 , nos termos do qual o preço de plena concorrência é calculado deduzindo uma margem bruta, considerada apropriada, ao preço de revenda praticado pela empresa com entidades independentes; . O método do custo majorado 112 , segundo o qual o preço de plena concorrência é calculado pela adição de uma margem bruta, considerada apropriada, aos custos de produção ou realização; . O método do fraccionamento do lucro 113 , que compara o lucro de duas entidades relacionadas entre si, e divide esse lucro entre as várias entidades intervenientes, com base no valor da contribuição relativa de cada uma delas nos lucros 110
) A aplicação deste método está regulada no artigo 6 da Portaria nº 1446-C/2001, de 21 de Dezembro. 111 ) Artigo 7 da Portaria nº 1446-C/2001, de 21 de Dezembro. 112 ) Artigo 8 da Portaria nº 1446-C/2001, de 21 de Dezembro. 113 ) Artigo 9 da Portaria nº 1446-C/2001, de 21 de Dezembro.
69
operacionais totais; . O método da margem líquida da operação 114 , que compara as margens operacionais líquidas entre empresas independentes, para tipos de transacções semelhantes com referência a uma determinada base, por exemplo, custos, vendas ou activos; e . Outro método, quando os métodos referidos não possam ser aplicados ou, podendo sê-lo, não permitam obter a medida mais fiável das condições que seriam normalmente praticadas entre entidades independentes. O método do preço comparável de mercado consiste na comparação de preços e é adaptável a qualquer tipo de unidade de negócio, desde que haja informação comparável. Às vezes, os bens ou serviços têm caracteres tão específicos que não é possível determinar o preço de mercado. Os restantes métodos baseiam-se na comparação de margens de lucros, embora cada um deles seja mais indicado para determinadas actividades. O método do preço de revenda minorado adapta-se melhor, às situações em que as entidades em estudo exercem actividades de distribuição. O método do custo majorado é mais utilizado no caso de empresas de produção ou prestadores de serviços, pelo facto de terem uma estrutura de custos relativamente previsível e estável. Por fim, o método da margem líquida da operação é adaptável a, praticamente, qualquer unidade de negócio 115 . Cada um dos métodos adoptados tem em vista evitar, através dos preços, transferências de resultados entre entidades que mantenham entre si relações especiais. O n.° 4 do art. 58.° do CIRC, enumera, a título exemplificativo, toda uma série de situações em que esse poder se considera verificado a existência de relações especiais. O tratamento fiscal dos preços de transferência tem sido objecto de acordo prévio entre o Fisco e as empresas - os chamados “advance pricing arrangements” 116 – tal como prevê a Portaria de preços de transferência 117 , que veio regulamentar os acordos celebrados entre entidades relacionadas, nomeadamente os acordos de partilha de custos e os acordos de prestação de serviços intragrupo, bom como os requisitos documentais específicos a este tipo de acordos. Os acordos de partilha de custos são frequentes em empresas que suportam custos elevados com investigação e desenvolvimento, como é o caso das empresas farmacêuticas ou de software. Nestes acordos, as empresas acordam em repartir entre si os custos e os riscos de produção, desenvolvimento ou aquisição de bens, direitos ou serviços. Este tipo de acordo é frequente nas Sociedades Gestoras de Participções Sociais (SGPS). 114
) Artigo 10 da Portaria nº 1446-C/2001, de 21 de Dezembro. ) Eduardo Goldszal, “As novas regras de preços de transferência em análise”, Fisco, n.º 105/106, Nov. 2002, p. 92 e segs. 116 ) Paula Rosado Pereira, «O novo regime dos preços de transferência», Fiscalidade, 5, Janeiro de 2001, p. 23 e ss.; Chris Adams, «Transfer pricing - the international context», Fisco, 101/102, Janeiro de 2002, p. 45 e ss.; Duarte Barros, «As obrigações acessórias no âmbito dos preços de transferência», Fisco, 103/104, Julho de 2002, p. 85 e ss. 117 ) Portaria n.º 1446-C/2001, de 21 de Dezembro. 115
70
2.4.2. A subcapitalização O regime da subcapitalização visa os preços dos empréstimos e dos juros pagos por um sujeito passivo, considerando que o endividamento e os juros suportados não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável. De acordo com o art. 61.° do CIRC, “quando o endividamento de um sujeito passivo para com entidade não residente em território português (…) com a qual existam relações especiais, nos termos do n.° 4 do art. 58.° (…) for excessivo, os juros suportados relativamente à parte considerada em excesso não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável”. É considerado excessivo o endividamento quando o valor das dívidas em relação a cada uma das entidades com os quais existam relações especiais seja superior ao dobro do valor da participação no capital próprio do sujeito passivo, durante o período de tributação em questão. Como o regime fiscal aplicável ao pagamento de juros é mais favorável do que a distribuição de lucros, há tendência em substituir o reforço dos capitais próprios das sociedades residentes pelo seu financiamento através de empréstimos. Por este motivo, o legislador português optou por limitar – no art. 61.º do CIRC - o nível de endividamento das empresas residentes a um limite máximo (o dobro do valor da participação no capital próprio), admitindo-se, porém, a possibilidade de esse coeficiente ser excedido se o sujeito passivo apresentar razões justificativas para esse efeito. O contribuinte pode afastar a aplicação das regras da subcapitalização, isto é, a não dedução como custos ao lucro tributável dos juros resultante do endividamento considerado excessivo, se conseguir provar que chegaria a idêntico endividamento no caso deste resultar de negociação com uma entidade independente 118 . 2.4.3. As regras anti-abuso dos artigos 59° e 60° do CIRC Os artigos 59° e 60° integram um conjunto de regras, ditas anti-abuso, que visam os países com um regime fiscal claramente mais favorável. Os n.os 2 do art. 59.° e 3 do art. 60.° do CIRC apresentam uma definição geral dos sujeitos que beneficiam de um regime fiscal claramente mais favorável, uma definição aliás suportada por uma lista de paraísos fiscais aprovada pelo Ministro das Finanças 119 , sendo certo que as regras anti-abuso se aplicam mesmo a países que, não figurando nesta lista, tenham um regime fiscal claramente mais favorável. O CIRC distingue, aqui, duas situações: a) a relativa aos pagamentos a entidades 118
) V. Alexandre Mota Pinto, Do Contrato de Suprimento. O Financiamento da Sociedade entre Capital Próprio e Capital Alheio, Coimbra, 2002, p. 97 e ss. e 158 e ss. 119 ) Port. n.° 150/2004, de 13 de Fevereiro apresenta uma lista de 83 países, territórios e regiões qualificadas como off-shores.
71
residentes em países com regime fiscal privilegiado, e b) a relativa à imputação de lucros de sociedades residentes em países com regime fiscal privilegiado. No primeiro caso, não são dedutíveis, para efeitos do apuramento do lucro tributável, as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí sujeitas a um regime fiscal claramente mais favorável, conforme consta da lista, ou quando nesse território não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC ou, em relação àquelas importâncias pagas ou devidas, o montante do imposto pago for igual ou inferior a 60% do imposto que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português (artigo 59.° do CIRC). Esta medida não se aplica se o contribuinte provar que as importâncias em causa se referem a encargos decorrentes de operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado. Assiste-se, aqui, a uma inversão do ónus da prova quando uma empresa portuguesa suporta encargos qu e se traduzem em dívidas ou pagamentos a entidades instaladas em paraísos fiscais 120 . O contribuinte deve demonstrar a importância das vantagens conferidas pelo contrato e provar que os encargos estabelecidos constituem a justa remuneração dessas vantagens, nomeadamente por comparação com os custos de serviços análogos no mercado 121 . No caso de lucros obtidos por sociedades não residentes sujeitas a um regime fiscal claramente mais favorável, determina-se a imputação dos lucros aos sócios residentes em território português, na proporção da respectiva participação no capital social e independentemente da sua distribuição, conforme dispõe o art. 60.°, n.º 1 do CIRC. A aplicação destas regras não ocorre para todas as sociedades estrangeiras, mas apenas para as sociedades sedeadas em paraísos fiscais, definidos no artigo 60, nº 3 do CIRC, e desde que o sócio detém, directa ou indirectamente, uma participação social de, pelo menos, 25%, ou, no caso de a sociedade não residente ser detida, directa ou indirectamente, em mais de 50%, por sócios residentes, uma participação social de, pelo menos, 10% (artigo 60, nº 1 do CIRC). O grande problema na aplicação das normas constantes do artigo 60 do CIRC reside, na realidade, na definição do conceito de paraíso fiscal. A solução consagrada no nº 3 do artigo 60 do CIRC foi a de adoptar três critérios alternativos. Assim, considera-se que uma sociedade está submetida a um regime fiscal claramente mais favorável quando: a) o território da residência constar da lista aprovada por portaria do Ministério das Finanças; 120
) A introdução da solução da inversão do ónus da prova no artigo 59º do CIRC foi adoptada por inspiração do artigo 238-A do Code Gé Francês, e do artigo 46º do Code des I mpôts né ral des I mpôts Belga. 121 ) Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, “Aplicação de Medidas Anti-abuso na Luta Con tra a Evasão Fiscal”, Fisco 107/108, Março 2003, p. 38.
72
b) ou a entidade residente no território não ser tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou IRC; c) ou o montante de imposto pago for igual ou inferior a 60% do IRC que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português. No tocante ao primeiro critério, a lista corre o risco de ficar desactualizada a qualquer momento, como também se restringem as possibilidades de contestação judicial dessa qualificação pelo contribuinte. O segundo critério dá a entender que o legislador quer considerar paraísos fiscais todos os Estados que não adoptaram o modelo português dos impostos sobre o rendimento. Relativamente ao último critério, os sujeitos passivos devem fornecer os elementos comprovativos do imposto pago pela entidade não residente e dos cálculos efectuados para o apuramento do imposto que seria devido se a entidade fosse residente em território português, nos casos em que o território não conste da lista aprovada pelo Ministério das Finanças. Assim, os não residentes têm que provar que o imposto pago não é inferior ao que seria pago em Portugal. Devemos ter assim atingido um estatuto único no mundo em matéria deste tipo de disposições anti-abuso 122 . 2.5. Outras situações especiais 2.5.1. As medidas contra a utilização abusiva de convenções para evitar a dupla tributação A utilização abusiva das convenções fiscais constitui uma hipótese muito comum de evasão fiscal internacional. Basta para isso que o contribuinte se insira num país que tenha um vantajoso tratado fiscal, através da interposição de uma pessoa colectiva, e que d aí possa retirar os benefícios que, normalmente, não lhe deveriam ser concedidas 123 . Esta aquisição ilegítima de benefícios previstos nos tratados fiscais foi designada pelos Estados Unidos e a OCDE de « tr eaty shoppin g ». Este fenómeno do treaty shoppin g aproxima-se do conceito de fraude à lei, nos termos do artigo 21° do Código Civil Português124 . Uma das formas de reagir contra esta prática é de prever nos tratados ou na legislação interna disposições específicas que impeça este tipo de prática abusiva. Ao nível de tratados internacionais, certos Estados têm procurado introduzir nessas convenções disposições específicas destinadas a impedir que essas 122
) Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, “Aplicação de Medidas Anti-abuso na Luta Con tra a Evasão Fiscal”, Fisco 107/108, Março 2003, p. 41. 123 ) MAURICE H. COLLINS, «Evasion and avoidance of tax at the international level», em European taxation, vol. 28 - 1988, n.° 9, p. 296 e M. A. WISELINK, «Abuse of tax treaties», em AAVV, International Tax Avoidance, Vol. A: General and conceptual material, Roterdão, Kluwer, 14979, pp. 311 e ss. 124 ) Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, “O controlo e combate às práticas tributárias nocivas”, CTF, Jan.-Junho de 2003, nº 409-410, p. 131.
73
convenções sejam precisamente utilizadas por pessoas que delas não deveriam beneficiar. Entre outras medidas para reagir contra a utilização abusiva de convenções encontra-se o estímulo à troca de informação. A OCDE recomenda que as partes estabeleçam um maior uso da troca de informações previstas nos tratados fiscais ou através da Convenção para a Assistência Mútua em Matéria Fiscal, desenvolvida pela OCDE e pelo Conselho da Europa 125 . A nível de direito interno, poucos Estados procuraram reagir contra este fenómeno. Regista-se, todavia, os casos da Suíça e dos Estados Unidos, que produziram uma legislação interna destinada a reagir contra o tr eaty shoppin g . Em Portugal, não existe qualquer legislação destinada a restringir a prática de treaty shopping.
2.5.2. A constituição de sociedades de base para evitar a tributação de rendimentos As sociedades de base («Base companies» ou «sociétés écran») ou desenvolvem uma parte do processo produtivo global (parte do processo de fabrico, comercialização de produtos, a prestação de serviços, controlo de marcas e patentes, ou outros), ou centralizam os resultados obtidos por outra ou outras pertencentes ao mesmo grupo. «[T]rata-se de sociedades estrangeiras, ou seja, instaladas em país diverso do da sociedade mãe, o país de domicílio é um país de tributação inferior, são controladas por pessoas singulares ou colectivas domiciliadas noutro país, e exercem a sua actividade operacional num terceiro país» 126 . Qualificam-se de típicas aquelas em que a sociedade mãe e a sociedade operacional se localizam em diferentes países e atípicas quando a empresa operadora funciona no Estado da sociedade mãe a que pertence. Geralmente estas sociedades acumulam rendimentos (juros, rendas e lucros), que não são tributados no país de residência do contribuinte, mas que são reinvestidos noutros países, ou transferidos por via de empréstimos, pagamento de salários, ou por outro meio, num momento em que a entidade receptora apresenta prejuízos ou então mantêm-se até ao momento da liquidação da sociedade em que os sócios poderão ser tributados por mais valias geralmente a taxas mais reduzidas 127 . A OCDE 128 apresenta as várias modalidades das sociedades de base: - Sociedades de administração de bens. São as mais frequentes. O contribuinte transfere para a sociedade bens geradores de rendimentos como acções, obrigações, patentes, marcas, etc. - Sociedades que servem de «pivot financeiro», isto é, de suporte a actividades ) OECD, Harmful tax competition: an emerging global issue, Paris, OECD, 1998, pp. 46 e ss. ) Ibidem. 127 ) Ibidem, cf. Maria Teresa Veiga de Faria, « Paraísos fiscais: formas de utilização e medidas de combate à evasão fiscal”, CTF, Jan-Junho de 2003, nº 409-410, p. 96-98. 128 ) OCDE, L’évasion et la fraude fiscales internacionales, Paris, 1987, p. 27 e 66. 125 126
74
internacionais de grande dimensão. Podem ser sociedades “holding”, centros regionais de empresas multinacionais e sociedades constituídas para emitir empréstimos ou para reagrupar outras actividades. Por exemplo, estabelece-se uma "holding" num país de menor tributação a fim de recolher os lucros de um grupo de sociedades espalhadas por todo o mundo, e transmiti-los aos seus sócios, sujeitos a menor tributação. A localização em paraísos fiscais visa evitar a tributação dos rendimentos das participações sociais (dividendos e mais valias), quer na sociedade, quer aquando da sua distribuição. - Sociedades operacionais. A sua actividade está associada a actividades industriais ou comerciais exercidas noutro país. É o caso de uma empresa que exerce funções de venda e facturação ou de uma sociedade que recebe os rendimentos da actividade profissional de um artista que se constitui como seu assalariado (rent a star company). - Outras sociedades. 2.5.3. O regime especial de tributação dos grupos de sociedades Os artigos 63.° a 65.° do CIRC contêm o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, que resultou da Lei n.° 30-G/2000, de 29 de Dezembro. Com efeito, esta lei operou uma profunda alteração na tributação dos grupos de sociedades, tendo eliminado o anterior regime de tributação pelo lucro consolidado 129 . Dispõe o art. 63.° que, existindo um grupo de sociedades, a sociedade dominante pode optar pela aplicação do regime especial de determinação da matéria colectável em relação a todas as sociedades do grupo. Considera-se existir um grupo de sociedades quando a sociedade dominante detém, directa ou indirectamente, pelo menos 90% do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto. A opção pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades só pode ser formulado se se verificarem cumulativamente os requisitos do art. 63, n.º 3 do CIRC. Resulta do disposto na alínea a) do nº 3 do artigo 63° do Código IRC que as sociedades que não tenham sede ou residência em território português não poderão fazer parte de um grupo fiscal para efeitos de aplicação deste regime especial. As entidades públicas empresariais, que preencham os requisitos enunciados, podem também optar por esse regime especial, cuja aplicação não depende, como dependia o regime de tributação pelo lucro consolidado, de qualquer autorização. 129
) Os grupos de sociedades deixaram de estar sujeitas a dupla consolidação - contabilística e fiscal. Por isso, os grupos de sociedades estão obrigadas a apresentar contas consolidadas nos termos do DL n.° 238/91, de 2 de Julho (DL n.° 36/92, de 28 de Março, no caso de empresas financeiras, e DL n.° 14/94, de 25 de Maio, no caso de empresas seguradoras). Sobre o regime de consolidação fiscal, v. Gonçalo Avelãs Nunes, A Tributação dos Grupos de Sociedades pelo Lucro Consolidado em Sede do IRC. Contributo para um Novo Enquadramento Dogmático e Legal do seu Regime, Coimbra, 2001.
75
No respeitante à determinação do lucro tributável dos grupos de sociedades, o apuramento do lucro tributável do grupo é feito a partir do resultado individual de cada sociedade, não sendo, deste modo, eliminados quaisquer resultados decorrentes de transacções entre empresas do grupo. O lucro assim apurado é depois corrigido da parte dos lucros distribuídos entre as sociedades do grupo incluída na base tributável das respectivas sociedades, consideradas individualmente. Ao lucro tributável do grupo serão deduzidos os prejuízos fiscais, nos termos previstos no art. 65.º 130 . 2.5.4. O regime especial aplicável às fusões, cisões, entrada de activos e permutas de partes sociais O regime especial aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de partes sociais de sociedades residentes está previsto nos arts. 67.° a 72.° do CIRC. Trata-se dum regime especial, exigido pela Directiva n.° 90/434/CEE, quando nestas operações intervenham sociedades de diferentes Estados membros da União Europeia, que tem por objectivo assegurar a neutralidade fiscal dessas operações de reorganização das unidades produtivas. Este regime aplica-se apenas a sociedades com sede ou direcção efectiva em território português e unicamente quando reunidas as seguintes condições: a) a sociedade para a qual é transmitido o património das sociedades fundidas ou cindidas tenha sede ou direcção efectiva em território português; b) os elementos patrimoniais objecto de transmissão sejam inscritos como valores na contabilidade das sociedades fundidas ou cindidas; e c) estes valores sejam os que resultam das disposições do CIRC ou de reavaliações feitas ao abrigo de legislação fiscal. O legislador refere exemplificadamente os casos em que as sociedades intervenientes não tenham a totalidade dos seus rendimentos sujeitos ao mesmo regime da tributação em IRC ou quando as operações não tenham sido realizadas por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou a racionalização das actividades das sociedades que nelas participam (artigo 67, nº 10 do CIRC). O regime consagrado para as fusões e para as cisões assenta numa lógica de continuidade da actividade das empresas que sucedem na fusão ou cisão. 2.6. A taxa Nos termos do art. 80.°, n.º 1, a taxa é, em geral, de 25%, mesmo tratando-se de rendimentos de entidades não residentes e sem um estabelecimento estável, com excepção das entidades que não exerçam, a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como os sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado, que estão sujeitas à taxa de 20% (n. os 3 e 4). Relativamente às entidades sujeitas a um regime simplificado de tributação, a taxa aplicável é de 20% sobre 20% das vendas de mercadorias e produtos, das 130
) V. sobre a tributação dos grupos de sociedades, LUÍS BELO, «Algumas reflexões ao nível do impacto sobre os grupos económicos da designada reforma fiscal», Fisco, 99/100, Outubro de 2001, p. 67 e ss.
76
prestações de serviços nas actividades hoteleiras e similares, restauração e bebidas e dos subsídios destinados à exploração com objectivo de compensar a redução de preços e 45% dos restantes proveitos, com o montante mínimo igual ao valor anual do salário mínimo nacional mais elevado. 2.7. A liquidação e cobrança 2.7.1. A liquidação A liquidação do IRC pode ser efectuada de duas formas: a) pelo próprio contribuinte na declaração periódica anual que deve apresentar até 31 de Maio do ano seguinte àquele a que os rendimentos dizem respeito, caso em que temos a autoliquidação (al. a) do art. 82.° do CIRC); b) pelos serviços centrais da DGCI, quando o contribuinte não apresente a sua declaração periódica, ou quando haja lugar a liquidação adicional (al. b) art. 82.° do CIRC). Para apurar o montante do imposto a pagar, é necessário ter em conta as seguintes deduções à colecta: a) a relativa à dupla tributação internacional (artigos 83.°, n.° 2 e 85.º do CIRC); b) a correspondente aos benefícios fiscais que se traduzam em deduções à colecta, como é o caso do "crédito fiscal por investimento" (artigo 39 do EBF); c) a relativa ao pagamento especial por conta (artigo 87 do CIRC); d) a relativa a retenções na fonte não susceptíveis de compensação ou de reembolso nos termos da legislação aplicável (artigos 83, n.º 2 e 88.º do CIRC). De referir aqui que quando seja aplicado o regime simplificado de determinação do lucro tributável, não é deduzido à colecta do IRC o crédito de imposto por dupla tributação internacional. As três primeiras deduções efectuam-se até ao montante da colecta, o que significa que da sua dedução não pode resultar um valor negativo. Deduz-se à colecta do IRC o crédito de imposto por dupla tributação internacional quando na matéria colectável do IRC tenham sido incluídos rendimentos ilíquidos obtidos no estrangeiro e corresponde à menor das seguintes importâncias: a) o imposto pago no estrangeiro; b) a fracção do IRC, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados. Aplica-se aqui o método da imputação ordinária ou do crédito de imposto ordinário. Se existir convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efectuar não pode ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos na convenção (artigo 85.º, n.º 2 do CIRC). Prevê-se, porém, um reporte de prejuízos importados no caso de o crédito de imposto não poder ser totalmente utilizado por insuficiência de colecta no exercício em que os rendimentos obtidos foram incluídos na base tributável, o remanescente podendo ser deduzido até ao fim dos cinco exercícios seguintes (n.° 3 do artigo 85). Em todo o caso, o montante da colecta do IRC, após a dedução de determinados benefícios fiscais e do crédito de imposto por dupla tributação internacional, não poderá ser inferior a 60% daquele que seria apurado se o sujeito passivo não
77
usufruísse destes benefícios (artigo 86.º, n.º 1 do CIRC). Como benefícios fiscais dedutíveis à colecta, temos o crédito fiscal ao investimento em investigação e desenvolvimento tecnológico (art.º 60.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril) e o crédito fiscal ao investimento em bens do activo imobilizado corpóreo para protecção ambiental (Decreto-Lei n.º 477/99, de 9 de Novembro). Além dessas deduções, deduz-se também à colecta do IRC o crédito relativo ao pagamento especial por conta até ao respectivo montante apurado na declaração do próprio exercício a que respeita ou, se insuficiente, à colecta dos exercícios seguintes, até ao quarto, depois de efectuadas as deduções anteriores, não podendo da sua dedução resultar valor negativo (art.º 87.º, nº 1 do CIRC). A parte do pagamento especial por conta que não for deduzida à colecta nos termos referidos, pode ser objecto de reembolso, desde que reunidas as seguintes condições: • Os sujeitos passivos não se afastem, em relação ao exercício a que diz respeito o pagamento especial por conta, em mais de 10%, para menos, da média dos rácios de rentabilidade, a publicar em Portaria do Ministro das Finanças, das empresas do respectivo sector de actividade; • A situação que originou o pedido de reembolso seja considerada justificada por acção de inspecção a solicitar pelo sujeito passivo, no prazo de 90 dias seguintes ao termo do prazo da declaração periódica de rendimentos relativa ao mesmo exercício (art. 87, n.º 3 do CIRC). No que se refere à dedução à colecta relativa a retenções na fonte (art. os 88.º a 90.º), alguns dos rendimentos obtidos em território português estão, de facto, sujeitos a retenção na fonte, e, por conseguinte, levados em consideração no apuramento final do imposto devido. Porém, há casos em que a retenção na fonte tem um carácter definitivo quando, relativamente às entidades isentas nos termos dos artigos 9º e 10º do CIRC ou a outras situações previstas no EBF, se excluam, total ou parcialmente, os rendimentos de capitais. É o que acontece, por exemplo, com os rendimentos de capitais obtidos pelo Estado, Regiões Autónomas e autarquias locais. 2.7.2. A cobrança Em matéria de cobrança, distingue-se as seguintes situações: 1) os pagamentos por conta e o imposto autoliquidado, 2) o pagamento especial por conta, 3) as retenções na fonte, e 4) o pagamento do imposto liquidado pelos serviços tributários. No casos dos pagamentos por conta, as entidades residentes que exerçam a título principal actividades de natureza comercial, industrial ou agrícola e as entidades não residentes com estabelecimento estável, devem efectuar três pagamentos por conta nos meses de Julho, Setembro e Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável quando se trate de entidades com o período de tributação coincidente com o ano civil (art. 96.°, n.° 1).
78
Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado no exercício imediatamente anterior àquele em que devem efectuar-se os pagamentos, líquido da dedução relativa a retenções na fonte não susceptíveis de compensação nos termos da legislação aplicável (artigo 97, n.º 1 do CIRC). Os pagamentos por conta dos contribuintes cujo volume de negócios seja igual ou inferior a € 498.797,90 corresponderão a 75% do montante do imposto liquidado no exercício anterior, repartido por três montantes iguais. Por seu lado, os pagamentos por conta dos contribuintes cujo volume de negócios seja superior a € 498.797,90, corresponderão a 85% do montante do imposto liquidado no exercício anterior, repartido igualmente por três montantes iguais (artigo 97, n. os 2 e 3 do CIRC). Quanto ao pagamento especial por conta, nos termos do art. 98.°, as entidades residentes que exerçam a título principal actividades de natureza comercial, industrial ou agrícola e as entidades não residentes com estabelecimento estável em território português, não abrangidas pelo regime simplificado, ficam sujeitas a um pagamento especial por conta, a efectuar durante o mês de Março ou em duas prestações durante os meses de Março e Outubro do ano a que respeita. Este pagamento não é aplicável no exercício em que se inicia a actividade. O montante do pagamento especial por conta é igual a l % do volume de negócios relativo ao exercício do ano anterior, com o limite mínimo de € 1.250, e, quando superior, será igual a este limite acrescido de 20% da parte excedente, com o limite máximo de € 70.000 (artigo 98, n.º 2 do CIRC) 131 . Neste sentido, o pagamento especial por conta representa uma colecta mínima. Ao contrário dos pagamentos por conta normais (que segundo o art. 96.° dão lugar ao imediato reembolso caso sejam superiores ao imposto devido), o pagamento especial por conta será deduzido, nos termos do art. 87.°, ao montante apurado na declaração periódica de rendimentos do exercício a que respeita ou, se insuficiente, até ao quarto exercício seguinte. Admite-se, assim, a possibilidade de recuperação do PEC através da dedução à colecta até ao final do quarto exercício seguinte. Contudo, findo este prazo, e não tendo sido possível a recuperação da totalidade ou de parte do montante entregue, admite-se a possibilidade de reembolso, sob determinadas condições, da parcela não deduzida. O pagamento especial por conta que excede a colecta líquida apurada nas declarações de rendimentos do próprio exercício a que respeita e dos quatro exercícios seguintes, apenas poderá ser restituída se o sujeito passivo preencher os seguintes requisitos (n.° 3 do art.° 87 do Código do IRC): a) O sujeito passivo não seja susceptível de ser abrangido pelo regime simplificado de tributação previsto no artigo 53 do CIRC; b) No exercício a que respeita o PEC, a rentabilidade obtida pelo sujeito passivo não pode ter sido inferior em mais de 10% à da média dos rácios de rentabilidade das empresas do sector de actividade em que está inserido, sendo que estes rácios 131
) Assinala-se que o pagamento especial por conta não é aplicável às sociedades sujeitas à transparência fiscal dado elas não serem tributadas em IRC - cf. o Ofício Circulado n.° 82/98, de 18 de Março.
79
serão publicados em portaria do Ministro das Finanças; c) O sujeito passivo justifique perante a administração tributária a razão pela qual o excesso do pagamento especial por conta efectuado não pode ser deduzido ao longo dos quatro exercícios anteriores; d) A situação que deu origem ao reembolso (insuficiência da colecta do IRC) deve ser justificada por acção de inspecção, feita a pedido do sujeito passivo, apresentado nos 90 dias seguintes ao termo do prazo de apresentação da declaração periódica relativa ao quarto exercício seguinte àquele a que o PEC respeita. De salientar que os efeitos do PEC fazem-se sentir com particular gravidade em determinados sectores de actividade, designadamente naqueles em que o volume da facturação é muito elevado e as margens muito reduzidas (como é o caso, por exemplo, do sector automóvel, das agências de viagens, e das empresas revendedoras de produtos com reduzidas margens de comercialização). O PEC acaba por tratar de forma desigual empresas com a mesma capacidade contributiva, mas com diferente volume de negócios, desinteressando-se totalmente da capacidade contributiva das empresas, princípio constitucionalmente consagrado no n.º 2 do artigo 104, o qual determina que a tribu tação das empresas incide fundamentalmente sobre o rendimento real das empresas 132 . Na realidade, o PEC foi criado para lutar contra as práticas de evasão e de fraude fiscal, resultantes do número elevadíssimo de empresas que declaram, de forma continuada, prejuízos fiscais, e que apresentam uma divergência entre os lucros efectivamente obtidos e aqueles que são declarados pelas empresas e, portanto, objecto de tributação. 2.8. Esquema de determinação do IRC Vejamos, num quadro, a sequência das operações de determinação do IRC: Proveitos e ganhos (art. 20.°) Custos e perdas (art. 23.°) = Resultado líquido + Variações patrimoniais positivas não reflectidos no resultado (art. 21.°) Variações patrimoniais negativas não reflectidos no resultado (art. 24.°) +/Correcções fiscais (arts. 58.° - 62.°) Deduções para eliminação da dupla tributação económica (art. 46.°) 132
) “A tributação pelo rendimetno real, baseada na contabilidade organizada do contribuinte ou nos elementos e documentos que suportam a sua declaração de rendimentos, ou a tributação pelo rendimento normal, assente em indicadores de natureza estritamente objectiva e independente da situação concreta ou efectiva do contribuinte”. Cf. José Casalta Nabais, “Alguns Aspectos do Quadro Constitucional da Tributação das Empresas”, Fisco, nº 103/104, Junho 2002, p. 26.
80
= Lucro tributável Prejuízos fiscais (art. 47.°) Benef. fiscais, se forem deduções ao lucro tributável (art. 15.°, n.° l, al. b), 2) = Matéria colectável (art. 15.°, n.° 1) x Taxa (art. 80.°) = Colecta Deduções à colecta (crédito de imposto por dupla trib. interna., benef. fiscais, PEC, retenção na fonte - arts. 83 e segs) = IRC a pagar 3. A tributação autónoma de certas despesas em sede de IRS ou IRC 3.1. A tributação das despesas confidenciais ou não documentadas As despesas confidenciais ou não documentadas efectuadas por sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade organizada no âmbito do exercício de actividades empresariais e profissionais, ou por sujeitos de IRC, são objecto de tributação autónoma em IRS ou IRC à taxa de 50%, conforme previstos nos arts. 73.°, n.° l do CIRS e 81.°, n. os l e 2 do CIRC. Uma tributação destas despesas a uma taxa de 50% não prejudica a sua sujeição a IRC, quando realizadas por empresas colectivas, ou a IRS, quando realizadas por empresas singulares. Pois, nos termos do art. 42.°, n.° l, al. g), do CIRC, também aplicável ao IRS por força do art. 32.° do CIRS, tais despesas não são dedutíveis na determinação do lucro tributável em IRC. Acresce que a taxa de tributação pode ser elevada para 70%, nos termos do art. 81.°, n.° 2, do CIRC, nos casos em que tais despesas sejam efectuadas por sujeitos passivos de IRC total ou parcialmente isentos ou que não exerçam, a título principal, uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola. 3.2. A tributação das despesas de representação e com viaturas A tributação autónoma das despesas de representação, despesas com viaturas ligeiras e despesas com ajudas de custo e compensação pela deslocação em viatura própria não se aplica aos sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado de tributação. A tributação autónoma das despesas de representação e das despesas com viaturas ligeiras de passageiros está consagrada nos artigos 73.°, n. os 2 a 5 e 7 do CIRS e 81.°, n.os 3 a 7 e 9, do CIRC.
81
Por exemplo, são tributados em sede de IRS os encargos dedutíveis relativos às despesas de representação e de viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos efectuadas por sujeitos passivos que possuam ou devam possuir contabilidade organizada no âmbito do exercício de actividades empresariais e profissionais, à taxa correspondente a 20% da taxa normal mais elevada de IRC, isto é, à taxa de 5% 133 . Em sede de IRC, são também tributadas autonomamente, à taxa de 5%, os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação e os relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, efectuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos e que exerçam, a titulo principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola. Ainda em sede de IRC, são tributadas autonomamente à taxa de 15% os encargos dedutíveis respeitantes a viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo custo de aquisição seja superior a € 40.000, quando suportadas pelos sujeitos passivos que apresentem prejuízos fiscais nos dois exercícios anteriores àquele a que os referidos encargos digam respeito. Consideram-se encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros, motos e motociclos, nomeadamente, as reintegrações, rendas ou alugueres, seguros, despesas com manutenção e conservação, combustíveis e impostos incidentes sobre a sua posse ou utilização (artigo 81, n os 4 e 5 do CIRC).
III - O IVA134 3.1. Introdução O IVA é um imposto geral sobre o consumo de bens e serviços, que incide sobre as transmissões de bens, a prestação de serviços, as importações e a aquisição intracomunitária de bens. O IVA é também um imposto plurifásico, porque incide em todas as fases do circuito económico, desde a produção/importação/aquisição intracomunitária até consumidor/utilizador final dos bens e serviços. O IVA é ainda um imposto indirecto, o que significa que o imposto a entregar ao Estado resulta da diferença entre o imposto facturado ou recebido dos clientes e o imposto debitado ou pago aos fornecedores. O IVA comporta um regime geral e diversos regimes especiais. No regime geral, o montante do IVA é apurado através do chamado método do crédito do imposto. O imposto a pagar pelos sujeitos passivos nem sempre corresponde à totalidade do imposto por eles liquidado, pois a este será deduzida a totalidade ou parte do imposto por eles suportado. No respeitante aos regimes especiais, temos: - o regime especial de isenção (em que se isentam de IVA os sujeitos passivos que, 133
) 20% de 25% (taxa normal de IRC) é igual a 5%. ) Xavier de Basto, A Tributação do Consumo e a sua Coordenação Internacional. Lições sobre a Harmonização Fiscal na Comunidade Económica Europeia, Cadernos de CTF, Lisboa, 1991; Emanuel Vidal Lima, Imposto sobre o Valor Acrescentado Comentado e Anotado, Porto, 2000. 134
82
não possuindo nem sendo obrigados a possuir contabilidade organizada para efeitos de IRS ou de IRC, o seu volume de negócios não ultrapasse o montante de € 10.000 ou, no caso dos pequenos retalhistas, o montante de € 12.500) - arts. 53.° do CIVA; - o regime especial dos pequenos retalhistas (a que estão sujeitos as pessoas singulares que, não possuindo nem sendo obrigadas a possuir contabilidade organizada, têm um volume de negócios que, embora superior ao do regime de isenção, não ultrapasse o montante de € 49.879,79), os quais pagam, sem qualquer direito a dedução, o IVA correspondente a 25% do imposto suportado nas aquisições de bens destinados a vendas sem transformação - arts. 60.° do CIVA; - regimes especiais aplicáveis, por um lado, às transmissões de bens em segunda mão ou de objectos de arte e, por outro, às agências de viagens e aos organizadores de circuitos turísticos, casos em que o montante de IVA é determinado aplicando a taxa do imposto à diferença entre o valor das aquisições ou compras e o valor das vendas. 3.2. Incidência 3.2.1. A incidência pessoal Segundo o art. 2.° do CIVA, constituem sujeitos passivos de IVA: a) as pessoas singulares ou colectivas que, de modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços; b) as pessoas singulares ou colectivas que, de modo independente, pratiquem uma só operação que esteja sujeita a IRS ou IRC; c) as pessoas singulares ou colectivas que, segundo a legislação aduaneira, realizem importação de bens e as pessoas singulares ou colectivas que efectuem operações intracomunitárias; d) as pessoas singulares ou colectivas que, em factura ou documento equivalente, mencionem indevidamente IVA; e) o Estado e as demais entidades de direito público relativamente a actividades que não respeitem ao exercício de poderes de autoridade; f) e as pessoas singulares ou colectivas que exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços e que sejam adquirentes em transmissões de bens ou prestações de serviços efectuadas no território nacional por sujeitos passivos que aqui não tenham sede, estabelecimento estável ou domicílio nem disponham de representante. A importância do imposto liquidado deverá ser adicionada ao valor da factura ou documento equivalente ou, no caso de a emissão desta não ser obrigatória, incluído no valor do preço, para efeitos da sua exigência aos adquirentes das mercadorias ou aos utilizadores dos serviços (n. os l e 2 do art. 36.° do CIVA). 3.2.2. A incidência real De acordo com o art. 1.° do CIVA, o IVA incide sobre as transmissões de bens e prestações de serviços, efectuadas a título oneroso (e as gratuitas assimiladas às onerosas) em Portugal e, ainda, as importações de bens e as operações intracomunitárias efectuadas em Portugal.
83
O CIVA, nos seus artigos 3.° e segs., definem cada uma das operações tributáveis. a) As transmissões de bens incluem a transferência onerosa de bens corpóreos, como a energia eléctrica, o gás, o calor, o frio e similares, desde que o transmitente actue como um proprietário, não se exigindo que o transmitente seja mesmo o proprietário do bem transferido (art. 3.° do CIVA). São também consideradas como transmissões de bens as situações resultantes de um contrato de locação com cláusula de transferência da propriedade, o contrato de venda com reserva de propriedade, a transferência de bens entre comitente e comissário, a não devolução no prazo de um ano das mercadorias enviadas à consignação, a entrega de bens móveis produzidos ou montados sob encomenda, a afectação permanente de bens da empresa a fins alheios à actividade da própria empresa, etc. Embora não existem aqui verdadeiras transmissões do ponto de vista jurídico, estas situações podem ser assimiladas a transmissões, uma vez que proporcionam resultados equivalentes (art. 3º, nº 3 do CIVA). Mas, já não são consideradas transmissões tributáveis as cessões a título oneroso ou gratuito do estabelecimento comercial, da totalidade de um património ou de parte dele, que seja susceptível de constituir um ramo de actividade independente, quando, em qualquer dos casos, o adquirente seja ou venha a ser por essa aquisição um sujeito passivo de IVA (artigo 3º, nº 4 do CIVA). É o que pode acontecer nas situações de trespasse, fusão, incorporação ou cisão de sociedades. b) Quanto às prestações de serviços, trata-se, nos termos do n.° l do art. 4.° do CIVA, de todas as operações de carácter oneroso, ou seja, decorrentes da actividade económica, que não sejam definidas como transmissões de bens, como importação de bens ou como aquisição intracomunitária de bens. c) Relativamente à importação, é de considerar, nos termos do n.° l do art. 5.° do CIVA, a entrada em território nacional de: a) bens originários ou procedentes de países terceiros e que não se encontrem em livre prática ou que tenham sido colocados em livre prática no âmbito de acordos de união aduanei ra; b) bens procedentes de territórios terceiros e que se encontrem em livre prática 135 . De assinalar que, ao contrário do que acontece em sede do IRS e do IRC, o IVA não pode incidir sobre actividades ilícitas, e isto sobretudo porque o direito comunitário não permite uma tal tributação. 3.2.3. A tributação das transmissões de bens e prestações de serviços Nas transmissões de bens, só são tributados os bens que estiverem situados no território nacional, no momento em que se inicia o transporte ou a expedição para o adquirente. No caso de não haver expedição ou transporte, os bens serão tributados no momento em que são colocados à disposição do adquirente (artigo 6, 135
) Trata-se de bens que já foram objecto de desembaraço aduaneiro e do pagamento dos correspondentes direitos aduaneiros num outro Estado membro da União Europeia, não havendo, nesse caso, importação para efeitos de IVA em Portugal.
84
n.º1). Em matéria de prestações de serviços, a regra geral é a de tributar em Portugal as prestações de serviços quando o seu prestador aqui tiver a sede, estabelecimento estável ou o seu domicílio a partir dos quais os serviços sejam prestados (art.º6, n.º4). Contudo, há prestações de serviços que não são tributadas em Portugal, embora o prestador tenha aqui a sua sede, domicílio ou estabelecimento estável (artigo 6, n.º 5), tais como as prestações relacionadas com imóveis situados fora do território nacional, os trabalhos efectuados sobre bens móveis executados fora do território nacional, as prestações de serviços acessórias de transporte que não tenham lugar em Portugal, as prestações de serviços de carácter artístico, científico, desportivo, recreativo, de ensino e similares e prestações de serviço acessórias que não tenham lugar no território nacional. Mas se, ao contrário, as prestações de serviço acima referidas forem executadas em Portugal elas serão aqui tributadas, independentemente da sede, domicílio ou estabelecimento estável do prestador (art.º 6, n.º 6). As prestações de serviços de transporte intracomunitário de bens são tributáveis sempre que o lugar de partida se situe em território nacional (art.º 6, n.º 7). As prestações de serviços, cujo prestador não tenha no território nacional sede, estabelecimento estável ou domicílio a partir do qual o serviço seja prestado, são aqui tributadas desde que o adquirente seja um sujeito passivo do imposto, e cujas prestações dizem respeito à cessão ou concessão de direitos de autor, licenças, marcas e direitos análogos, aos serviços de publicidade, aos serviços de consultores, tratamento e fornecimento de informação, às operações bancárias, financeiras, de seguro e resseguro, à colocação de pessoal à disposição, à locação de bens móveis corpóreos, com excepção dos meios de transporte, etc. (artigo 6, n.º 8 do CIVA). Mas, as mesmas prestações de serviço não serão tributadas em Portugal, ainda que o prestador aqui seja localizado, se o adquirente for um sujeito passivo num Estado-membro comunitário e fizer prova dessa qualidade ou se for alguém com sede num país terceiro (artigo 6, n.º 9). As prestações de serviço de transporte intracomunitário de bens são tributadas em Portugal sempre que o lugar de partida ocorra em território nacional (art.º 6, n.º7). Mesmo que o lugar de partida não se situe em Portugal, este transporte será aqui tributado se o seu adquirente for um sujeito passivo nacional e este fornecer ao transportador o seu número de contribuinte (artigo 6, n.º 11). Será assim tributado em Portugal, à taxa de IVA em vigor, um transportador de mercadorias partindo de Paris com destino ao Porto, correndo por conta de um sujeito passivo português que deu ao prestador do serviço o seu número de contribuinte. Se o prestador do serviço de transporte não se encontrar estabelecido em território nacional, caberá ao sujeito passivo de IVA português a responsabilidade pela entrega do imposto devido. A entrega será efectuada mediante a sua menção na declaração periódica a favor do Estado, podendo o
85
contribuinte, se tiver direito a dedução, mencioná-lo simultaneamente a seu favor, o que implicará um efeito fiscal nulo se o direito à dedução for integral. Mas, se o prestador de serviço for estabelecido em Portugal, é ele que deve liquidar o IVA à taxa portuguesa e proceder à sua entrega nos cofres do Estado. Ao contrário, as mesmas prestações não serão aqui tributáveis, ainda que o lugar de partida ocorra em Portugal, se o adquirente for um sujeito passivo estabelecido noutro país comunitário que forneça ao transportador o seu número de contribuinte (art. 6, n.º12). No caso de prestações de serviço acessórias de transporte intracomunitário de bens, a regra é a de tributar em Portugal este tipo de serviços que aqui forem executados, e de não tributar em caso contrário (art.º 6, n.º 5, alínea d) e n.º 6, alínea d)). Porém, se se tratar de serviços acessórios de um transporte intracomunitário de bens haverá ou não lugar a tributação em Portugal consoante o adquirente seja sujeito passivo nacional ou estabelecido noutro estado-membro (art.º 6, n.º13 e n.º14), isto é, ainda que o local da execução material do serviço não seja território nacional, este será tributado em Portugal se o seu cliente for um sujeito passivo de IVA nacional que tenha dado ao prestador do serviço o seu número de contribuinte. Existem, também, regras específicas para os serviços de intermediação nos serviços de transporte intracomunitário e nas prestações acessórias. Estes serviços de intermediação são tributados em Portugal quando aqui ocorra o início do transporte ou sejam executadas as prestações acessórias independentemente da localização do intermediário, se o adquirente não indicar o número de sujeito passivo noutro estado-membro (art.º 6, n.º 15). Mas já não haverá lugar à tributação se o adquirente for um sujeito passivo registado noutro Estado-membro que utilize o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição. Neste caso, a tributação dos serviços em causa efectuarse-á no Estado-membro onde o adquirente se encontra registado e identificado para efeitos do imposto (art.º 6, n.º 18). Por exemplo, no caso de um serviço efectuado por um intermediário em nome e por conta de outrem, relativo a um transporte intracomunitário de bens, que saia do Porto em direcção a Roterdão, prestado por um intermediário português por conta de um cliente holandês que lhe forneceu o respectivo número de identificação fiscal, a localização do serviço não se fará em Portugal, mas na Holanda. Os mesmos serviços de intermediação serão também tributadas em Portugal, ainda que não se inicie aqui o transporte ou a execução das prestações acessórias ocorra noutro Estado-membro, se o adquirente da intermediação for um sujeito passivo nacional que indique o seu número de identificação (art.º 6, n.º16). A intermediação noutros serviços é objecto de regras específicas (artigo 6, n.º 17 do CIVA). Estão aqui em causa, nomeadamente, serviços de intermediários agindo em nome e por conta de outrem em aquisições ou transmissões intracomunitárias de
86
bens, vendas à distância, vendas com instalação ou montagem, aquisição de meios de transporte novos, operações sobre imóveis, operações sobre bens móveis corpóreos, transporte não intracomunitário de bens, serviços de carácter artístico, científico, desportivo, recreativo, de ensino e outros serviços que não aqueles excepcionados atrás; Nestes casos, também, se afasta a regra geral da localização, considerando-se tributados em Portugal os serviços de intermediação desde que a operação sobre a qual incide a intermediação se localize em Portugal e o adquirente não indique um número de identificação como sujeito passivo noutro estado-membro (art. 6, n.º17, alínea a)). Mas, já não haverá lugar a tributação se o adquirente for um sujeito passivo registado noutro Estado-membro que utilize o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição. Assim, se o adquirente da intermediação for um sujeito passivo nacional que indique ao seu cliente o respectivo número de identificação, os serviços de intermediação serão tributados em Portugal, ainda que a operação sobre aqueles serviços seja localizada noutro Estado-membro (art.º6, n.º17, alínea b). Em relação às prestações de serviços sobre bens móveis corpóreos (art.º6, n. os 19, 20 e 21), os trabalhos e peritagens respeitantes a bens móveis corpóreos (incluemse as empreitadas quando qualificadas como prestações de serviços) serão tributados em Portugal, ainda que a sua execução material tenha lugar noutro estado-membro, se o adquirente for um sujeito passivo nacional. Inversamente, não haverá lugar a tributação destas prestações de serviços, ainda que materialmente executadas em Portugal, se o seu adquirente for um sujeito passivo registado noutro estado-membro, excepto se os bens não forem objecto de expedição ou transporte para fora do território nacional. 3.3. Isenções Em matéria de isenções, distinguem-se duas situações: a isenção simples ou incompleta e a isenção completa. A isenção simples concretiza-se na não liquidação de imposto na venda ou na prestação de serviços e na não permissão de dedução do imposto suportado nas aquisições. É o que acontece nas operações internas e nas operações do regime especial de isenção, previstas no artigo 9 do CIVA. Contudo, podem renunciar à isenção os sujeitos passivos que desenvolvam, por exemplo, operações de prestações de serviço que tenham por objecto a formação profissional; serviços de alimentação e bebidas fornecidas pela entidade patronal aos seus empregados; prestações de serviços médicos e sanitários e operações conexas efectuadas por estabelecimentos hospitalares privados que efectuem; a locação e transmissão de bens imóveis; as explorações agrícolas, silvícolas e pecuárias; e os grupos autónomos de pessoas que exerçam uma actividade isenta, nas condições previstas no artigo 9.º, n os 23.º e 23.º A do CIVA. A renúncia à isenção é feita através da entrega, na repartição de finanças competente, de uma declaração de início ou de alterações (art.º 12, n.º2). Uma vez
87
feita essa opção, o sujeito passivo é obrigado a permanecer nesse regime durante pelo menos 5 anos (art. 12, nº 3). A isenção completa constitui uma isenção com direito a dedução, também designada por IVA à taxa zero. Neste caso, o imposto não é liquidado na venda ou na prestação de serviço, mas mantém-se o direito à dedução do imposto suportado na aquisição de bens ou serviços, o que faz com que a carga fiscal suportada nas fases económicas anteriores seja totalmente anulada. Não havendo imposto a pagar, a dedução não poderá concretizar-se, devendo ser restituído o imposto suportado a montante. É o que se verifica na isenção relativa às exportações (artigos 14.°, n.° l e 20.°, n.° l, al. b), do CIVA) e na isenção respeitante às transmissões de bens para outros Estados membros da União Europeia. Nesta situação excepcional, temos, uma isenção concretizada, não junto do sujeito passivo do IVA, mas junto do consumidor final ou do destinatário das prestações de serviços, concretizada na restituição do imposto suportado por certos adquirentes de bens e serviços. Esta restituição é processada pelo Serviço de Administração do IVA a requerimento dos interessados e com base em facturas que atinjam um certo montante incluído o próprio IVA. É o que ocorre na restituição do IVA aos serviços diplomáticos e consulares, relativamente ao IVA suportado nas aquisições de bens ou serviços (DL n.° 143/86, de 16 de Julho); às igrejas e demais comunidades religiosas, relativamente ao IVA suportado na aquisição de objectos destinados ao culto (DL n.° 20/90, de 13 de Janeiro, que estabeleceu esse benefício para a Igreja Católica, e o art. 65.° da Lei da Liberdade Religiosa, Lei n.° 16/2001, que o estendeu às demais religiões e comunidades religiosas); às Instituições Particulares de Solidariedade Social, relativamente ao IVA suportado na aquisição de bens e serviços respeitantes à construção, manutenção e conservação de imóveis destinados aos seus fins estatutários (DL n.° 20/90, de 13 de Janeiro); às forças armadas, serviços de segurança e bombeiros, relativamente ao IVA suportado na aquisição de certos bens e equipamentos, (DL n.° 113/93, de 5 de Abril) 136 . Os requisitos de que dependem as isenções previstas no artigo 14 do CIVA devem ser comprovados através de documentos alfandegários ou declarações emitidas pelos adquirentes dos bens ou dos serviços, sem o que o transmitente ou prestador não poderá deixar de liquidar o imposto (art.º 28, n. os 8 e 12). Ficam também isentos do IVA os sujeitos passivos que preencham os seguintes requisitos cumulativos (artigos 53 a 59 do CIVA) : • Não tenham nem sejam obrigados a possuir contabilidade organizada para efeitos de IRS e IRC; • Não pratiquem operações de importação, exportação ou actividades conexas; • Não tenham atingido, no ano civil anterior, um volume de negócios superior a 10.000 € ou, no caso de pequenos retalhistas, o volume de negócios seja inferior a 12.500 € no mesmo período. Não tendo os sujeitos passivos que liquidar imposto pelas suas operações, não podem, por conseguinte, deduzir o IVA suportado nas suas aquisições. Para tal, 136
) Cf. A. Carlos Santos/M. Silva Pinto, Legislação do IVA Anotada. Comentários ao Regime das Operações Intracomunitárias, p. 637 e ss.
88
torna-se necessária a opção pelo regime normal de tributação, devendo ser entregue na repartição de finanças competente uma declaração de início de actividade ou de alterações. Os contribuintes pertencentes ao regime especial de isenção não liquidam nem entregam imposto, e não têm direito à dedução do imposto suportado nas aquisições. Estes contribuintes apenas são obrigados ao cumprimento das obrigações de declaração e de facturação. 3.4. A determinação da matéria colectável A matéria colectável no IVA é constituída pelo valor tributável das transmissões onerosas de bens e das prestações de serviços efectuadas no território nacional, pelas importações de bens e “operações intracomunitárias". No caso das operações internas, o valor tributável é o valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente ou destinatário do serviço, incluindo os impostos directos, taxas e outras imposições (com excepção do IVA), as despesas acessórias e as subvenções ou subsídios directamente relacionados com o preço de cada operação (art. 16.° do CIVA) 137 . Em relação às importações intracomunitárias de bens, o valor tributável é constituído pelo valor aduaneiro, determinado de acordo com as disposições comunitárias em vigor, e inclui os direitos de importação e quaisquer outros impostos ou taxas (com excepção do próprio IVA) e as despesas acessórias, como as comissões, a embalagem, o transporte e os seguros (art. 17.° do CIVA). O valor tributável nas aquisições intracomunitárias de bens é idêntico ao das transmissões de bens efectuadas em território nacional, não se incluindo nele as despesas relacionadas com o transporte dos bens e outros serviços, que são objecto de tributação autónoma. 3.5. A taxa De acordo com o art. 18.° do CIVA, o IVA tem: - uma taxa normal de 21% aplicável à generalidade das importações e transmissões de bens e às prestações de serviços, sempre que se não trate de bens incluídos nas listas I e II anexas ao CIVA sujeitos à taxa intermédia ou reduzida ; - uma taxa intermédia de 12% aplicável às importações e transmissões de bens e às prestações de serviços constantes da lista II anexa ao CIVA, em que se incluem certos produtos para a alimentação humana (como as conservas de carne, conservas de peixes e de moluscos, frutas e frutos, produtos hortícolas, óleos comestíveis, café e refrigerantes, sumos e néctares) e as prestações de serviços de alimentação e bebidas; - uma taxa reduzida de 5% para as importações e transmissões de bens e as prestações de serviços constantes da lista I anexa ao CIVA, em que se integram 137
) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, Ed. Almedina, 2003, p. 578.
89
produtos alimentares (como os cereais, peixes e moluscos, leite e lacticínios, ovos e aves, gorduras e óleos gordos, água, vinhos comuns, mel, sal e batatas), outros produtos (como livros, produtos farmacêuticos, electricidade, transporte de passageiros, espectáculos, gás de cidade, alojamento em estabelecimentos do tipo hoteleiro, etc.) e bens de produção da agricultura (como adubos, animais vivos, farinhas, sementes, plantas vivas, utensílios e alfaias agrícolas, etc.). Acrescente-se que as taxas do IVA são, para as regiões autónomas dos Açores e da Madeira, respectivamente de 15%, 8% e 4%. 3.6. A liquidação e cobrança A determinação da matéria colectável faz-se através do método de dedução imposto do imposto, de crédito do imposto ou método indirecto subtractivo. O método subtractivo indirecto consiste na liquidação e dedução do imposto em cada uma das fases do circuito económico e nas transacções entre sujeitos passivos do imposto, dado os consumidores finais não terem direito à dedução do imposto suportado. Isto é, um sujeito passivo deve entregar ao Estado a diferença entre o IVA liquidado e o deduzido. Através deste método, o IVA vai incidir apenas sobre o valor acrescentado em cada uma das diversas fases da cadeia de produção e comercialização dos bens e serviços, sendo o preço final do bem equivalente à soma dos valores acrescentados. A técnica do método subtractivo indirecto permite tributar apenas o valor acrescentado em cada uma das fases do circuito económico, repartindo o encargo fiscal pelos sujeitos passivos; produzir um efeito de anestesia fiscal; instituir um controlo cruzado entre os sujeitos passivos; e assegurar a neu tralidade do imposto, evitando efeitos cumulativos ou em cascata de IVA sobre IVA 138 . Para que a dedução seja admissível, é necessário que as aquisições consistem na realização de operações tributáveis, com excepção das que gozem de isenção com direito 139 . Há, todavia, algumas despesas que, embora destinadas a uma actividade tributável, não conferem direito à dedução do IVA, como é o caso das despesas relativas à aquisição de veículos ligeiros, de barcos de recreio, aviões, motos e motociclos, despesas de divertimento e de luxo, etc. (art. 21.° do CIVA). O imposto dedutível pode ser determinado pela aplicação de dois métodos: o método da percentagem de dedução ou da dedução pró rata, e o método da afectação real. - o método da percentagem de dedução ou da dedução pró rata prevê que o imposto suportado nas aquisições confere o direito à dedução proporcional ao valor anual das operações tributáveis, com direito a dedução relativamente ao volume total de negócios; 138
) Clotilde Celorico Palma, “IVA – Algumas Notas sobre os Limites das Exclusões do Direito à Dedução”, Fisco nº 115/116, Setembro de 2004, p. 62. 139 ) José Casalta Nabais, Direito Fiscal, 2ª ed., Almedina, 2003, p. 581.
90
- o método da afectação real consiste na separação contabilística das aquisições de bens afectos ao sector dedutível das aquisições afectas ao sector isento, deduzindo apenas o imposto suportado pelas aquisições de bens afectos ao sector dedutível. O artigo 23. n.º 2 do CIVA admite que o sujeito passivo possa efectuar a dedução segundo a afectação real de todos ou parte dos bens e serviços utilizados, sem prejuízo da a Administração fiscal lhe vir a impor condições especiais ou a fazer cessar esse procedimento no caso de se verificar distorções significativas na tributação. Todavia, resulta dos n. os l e 2 do referido art. 23.° que, em princípio, aplica-se o método da percentagem de dedução ou pró rata, excepto se o sujeito passivo optar pelo método da afectação real, sem prejuízo da a DGCI vir a impor condições especiais ou cessar esse procedimento no caso de se verificarem distorções significativas na tributação. Feitas as deduções e apurado o imposto, o sujeito passivo deve proceder à sua cobrança e pagamento, e, simultaneamente, entregar a declaração na Direcção de Serviços de Cobrança do IVA. O prazo de pagamento do IVA varia consoante a dimensão da empresa. Nos termos dos arts. 26.°, n.° l, e 40.° do CIVA, se a empresa tiver um volume de negócios (em relação ao ano anterior) igual ou superior a € 498.797,89, a declaração e o respectivo meio de pagamento devem ser enviados até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele a que respeitem as operações. Se o volume de negócios for inferior àquele montante o envio da declaração e do respectivo meio de pagamento deverá efectuar-se até ao dia 15 do segundo mês seguinte ao trimestre do ano civil a que respeitem as operações. O sujeito passivo de IVA tem o direito à compensação ou mesmo ao reembolso do imposto pago no caso do imposto liquidado nas vendas, num dado período, ser inferior ao imposto pago e suportado nas aquisições desse mesmo período. É que está previsto no art. 22.°, cujos n. os 4 e 5 respectivamente dispõem que: "Sempre que a dedução de imposto a que haja lugar supere o montante devido pelas operações tributáveis, no período correspondente, o excesso será deduzido nos períodos de imposto seguintes". "Se, passados 12 meses relativos ao período em que se iniciou o excesso, persistir crédito a favor do contribuinte superior a € 249,40, este poderá solicitar o seu reembolso". No que se refere através ao método de dedução imposto do imposto, o direito à dedução do imposto nasce no momento em que o imposto dedutível se torna exigível, conforme as regras definidas nos art.º 7 e 8, e deve ser efectivado na declaração do período de imposto em que são recebidas as facturas ou documentos equivalentes e/ou o recibo de pagamento do IVA devido pela importação de bens (art.º 22, n.os1, 2 e 3). Estabelece o art.º 22, n.º1 que o exercício do direito à dedução é feito subtraindo ao valor do imposto liquidado pelo sujeito passivo o valor do imposto por ele suportado, relativamente ao mesmo período.
91
Na prática, nem sempre é possível, o que faz com que o direito à dedução seja efectuado através do reporte para o período seguinte quando o imposto a deduzir seja superior ao imposto liquidado pelo sujeito passivo no mesmo período, isto é, quando haja crédito de imposto a favor do contribuinte. A dedução do imposto suportado efectua-se mediante uma operação de subtracção, podendo em cada período de imposto verificar-se uma das seguintes situações: IVA liquidado > IVA dedutível -> Há imposto a entregar ao Estado. IVA liquidado = IVA dedutível -> Não há imposto a entregar nem há crédito de imposto. IVA liquidado < IVA dedutível -> Há crédito de imposto a favor do sujeito passivo. Poderá ainda o direito à dedução ser efectuado através do pedido de reembolso sempre que: • O crédito a favor do sujeito passivo persista durante 12 meses consecutivos e o seu montante seja superior a 249,40 € (art.º22, n.º 5); • O crédito a favor do sujeito passivo exceda 25 vezes o salário mínimo nacional mais elevado, arredondando para a centena de euros, sendo este o valor reduzido para metade nos seis primeiros meses após o início da actividade e em situações de investimento com recurso ao crédito devidamente comprovadas (art.º 22, n. º 6); • Haja cessação de actividade, ou passagem a uma situação de prática exclusiva de operações isentas sem direito a dedução, passagem ao regime especial de isenção ou passagem ao regime especial dos pequenos retalhistas, qualquer que seja o montante do crédito (art. 22, n.º 6). Quando o montante a reembolsar ultrapasse 1000,00 €, poderá a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos exigir caução, fiança bancária ou outra garantia adequada, que determinará a suspensão do prazo de contagem dos juros indemnizatórios referidos no n.º 8 do presente artigo, até à prestação da mesma, a qual deverá ser mantida pelo prazo de um ano (art. 22, n.º 7). Os reembolsos devidos terão de ser efectuados pela D.G.C.l. até ao fim do terceiro mês seguinte ao da apresentação do pedido (art.º 22, n.º 8). No caso de atraso no reembolso imputável à administração fiscal, serão devidos juros indemnizatórios, contados dia a dia, desde o termo do prazo para o pagamento do reembolso até à data da emissão do respectivo meio de pagamento ou da efectivação da transferência bancária (art.º 22, n.º 8). Os sujeitos passivos que efectuem predominantemente operações isentas com direito à dedução beneficiam, em matéria de reembolsos, de condições mais favoráveis conforme estabelece o Despacho Normativo n.º 342/93, de 18/10, publicado em conformidade com o disposto do art.º 22, n.º 9. IV - REGIME DO IVA NAS TRANSACÇÕES INTRACOMUNITÁRIAS 4.1. Introdução
92
Desde a criação de uma união aduaneira em l.º de Janeiro de 1993, adoptou-se um regime transitório de IVA para as transacções intracomunitárias, em que as figuras da "importação" e da "exportação" foram substituídas pelas de "aquisição" e de "transmissão" intracomunitária de bens. Este regime, inicialmente destinado a vigorar até final de 1996 e automaticamente prorrogado até à entrada em vigor do regime definitivo que terá por base a tributação do consumo na origem, caracteriza-se pela tributação no país do destino quando se trate de operações comerciais e no país de origem quando se trate de aquisições para fins privados. Os particulares que efectuam aquisições de bens em qualquer país da Comunidade são tributados no Estado membro do fornecedor, à taxa e nas condições aí vigentes. As operações comerciais efectuadas entre sujeitos passivos estabelecidos em diferentes países da Comunidade são tributadas no Estado membro onde o adquirente se encontrar estabelecido e registado para efeitos de IVA. A "transmissão intracomunitária" de bens está isenta de IVA, no país do fornecedor dos bens. 4.2. Incidência do IVA nas transacções intracomunitárias Estão sujeitos a imposto em Portugal as aquisições intracomunitárias, ef ectuadas a título oneroso, que preencham os seguintes requisitos (artigo 1.° do RITI 140 ): - o adquirente dos bens seja um sujeito passivo de IVA, estabelecido em Portugal, agindo nessa qualidade, que tenha fornecido ao vendedor o seu número de identificação fiscal para efectuar a aquisição; - o fornecedor seja um sujeito passivo de IVA, registado para efeitos de IVA no Estado membro onde tenha início a expedição ou o transporte dos bens com destino ao adquirente, e que não se encontre aí abrangido por um regime especial de tributação de pequenas empresas; - os bens não estejam sujeitos a instalação ou montagem, nem sujeitos ao regime das vendas à distância, e sejam transportados de um estado-membro para outro, podendo o transporte ser feito pelo comprador, pelo vendedor ou por terceiro agindo por conta de um deles ou ambos. Estão também sujeitas a imposto: • As aquisições intracomunitárias de meios de transporte novos, efectuadas no território nacional a título oneroso (art. 1.º, al. b); • As aquisições intracomunitárias de bens sujeitos a impostos especiais de consumo (artigo 1.º, al. c); • As operações assimiladas a aquisições intracomunitárias de bens previstas no n.º1 do art.º 4 ou seja: - A transferência por um sujeito passivo de bens a partir de outro Estado-membro, no qual o bem tenha sido produzido, extraído, transformado, adquirido ou importado pelo sujeito passivo, para afectação às necessidades da sua empresa em 140
) Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias, aprovado pelo Decreto-lei n.º 290/92, de 28 de Dezembro.
93
território nacional; - A aquisição de bens expedidos ou transportados a partir de um país terceiro e importados noutro Estado-membro, quando, ambas as operações forem efectuadas pelo Estado ou pelas demais pessoas de direito público. • As transmissões de meios de transporte novos, a título oneroso, por qualquer pessoa a partir de Portugal para outro Estado-membro, desde que expedidos ou transportados pelo vendedor pelo adquirente ou por conta destes (art. 1, al. e). Relativamente à incidência pessoal, dispõe o art. 2.° que são sujeitos passivos de IVA pela aquisição intracomunitária de bens: 1) as pessoas singulares ou colectivas já assim qualificados no art. 2.° do CIVA que realizem transmissões de bens ou prestações de serviços que conferem direito à dedução total ou parcial do imposto; 2) os sujeitos passivos isentos sem direito à dedução (enquadrados nos arts. 9.° e 53.° do CIVA); 3) o Estado e demais pessoas colectivas de direito público, bem como quais quer pessoas singulares ou colectivas que realizem exclusivamente operações isentas 141 . E aqui é de salientar que, nas aquisições intracomunitárias de bens, o imposto é devido no momento em que os bens são colocados à disposição do adquirente (arts. 12.° e 13.° do RITI). Em regra a exigibilidade do imposto ocorre na data da emissão da factura, só se a factura for emitida após o dia 15 do mês seguinte àquele em que o bem foi posto à disposição do adquirente. 4.3. Isenções Estão previstas três grupos de isenções: as isenções nas transmissões de bens (art. 14.° do RITI), as isenções nas aquisições intracomunitárias de bens (art. 15.° do RITI) e as isenções nas importações (art. 16.° do RITI). Referindo-nos ao primeiro grupo, estão isentas de imposto: - as transmissões de bens efectuadas por um sujeito passivo para outros Estados membros desde que o adquirente reúna as seguintes condições: 1) seja um sujeito passivo devidamente registado para efeitos de IVA em outro Estado membro; 2) tenha utilizado o respectivo número de identificação fiscal para efectuar a aquisição; e 3) esteja abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias nesse outro Estado membro; - as transmissões intracomunitárias de meios de transporte novos qualquer que seja a qualidade do vendedor; - as transmissões de bens que consistam na transferência de bens de um sujeito passivo, com destino a outro Estado membro, para as necessidades da sua empresa; - as transmissões de bens sujeitos a impostos especiais de consumo quando o adquirente seja sujeito passivo isento ou uma pessoa colectiva estabelecida ou domiciliada noutro Estado membro que não se encontre registada para efeitos de 141
) Bem como quaisquer pessoas, singulares ou colectivas, incluindo os particulares, que ocasionalmente efectuem aquisições ou transmissões intracomunitárias de meios de transporte novos (art. 5, n.º1 do RITI).
94
IVA. De salientar que as isenções acabadas de referir constituem isenções completas, pois o imposto que o sujeito passivo tenha suportado nas aquisições d e bens ou serviços para a realização das transmissões intracomunitárias é dedutível 142 . Referindo-nos ao segundo grupo, estão isentas de imposto as aquisições intracomunitárias de bens: • Cuja transmissão no território nacional seja isenta; • Importações isentas nos termos do art.º13º do CIVA; • Efectuadas por um sujeito passivo em condições de beneficiar do reembolso do imposto previsto no Decreto-Lei 408/87, de 31 de Dezembro, em aplicação do disposto na alínea b) do n.º1 do art.° 20 do CIVA e no n.º 2 do art.º 19º do CIVA. Estão ainda isentas as aquisições intracomunitárias de bens cujo lugar de chegada ou transporte se situe em território nacional, desde que se verifiquem em simultâneo as seguintes condições: • Efectuadas por sujeito passivo não residente, sem estabelecimento estável em território nacional e que não se encontre registado para efeitos de IVA em Portugal; • Os bens tenham sido expedidos ou transportados a partir de um estado-membro diferente daquele que emitiu o número de identificação fiscal ao abrigo do qual o sujeito passivo efectuou a aquisição intracomunitária de bens; • Os bens tenham sido adquiridos para serem objecto de uma transmissão subsequente a efectuar no território nacional, por esse sujeito passivo; • A transmissão seja efectuada por um sujeito passivo registado para efeitos de IVA em território nacional; • O sujeito passivo adquirente seja expressamente designado, na factura emitida pelo vendedor, como devedor do imposto, pela transmissão de bens efectuada no território nacional. 4.4. A determinação da matéria colectável e a taxa De acordo com o disposto no art. 17.°, o valor tributável das aquisições intracomunitárias deve ser determinado de harmonia com as normas que definem a matéria colectável nas operações internas, isto é, efectuadas no país. O valor tributável das aquisições intracomunitárias acaba por ser constituído pelos mesmos elementos que aqueles que estão previstos no art. 16.° do ClVA. Mas se os bens estiverem sujeitos a impostos especiais sobre o consumo ou a imposto automóvel, o valor tributável será determinado com a inclusão desses impostos, ainda que não liquidados simultaneamente. No que respeita à taxa, não há qualquer especificidade no IVA das transacções intracomunitárias. São de aplicar as taxas constantes do art. 18.° do CIVA. 4.5. A liquidação e cobrança 142
) Tal não acontece com as isenções nas aquisições intracomunitárias e as isenções nas importações, que constituem isenções simples.