LAUDO TÉCNICO SOBRE AS CAUSAS DO DESABAMENTO DO EDIFÍCIO AREIA BRANCA Local:
Av. Bernardo Bernardo Vieira Vieira de Melo, No. No. 2852 Bairro da Piedade, Jaboatão dos Guararapes, PE
Volume 1 – Texto e Documentário Fotográfico
APRESENTAÇÃO Após nove meses de trabalho, a comissão designada pelo Presidente do CREAPE para elucidar o acidente envolvendo o edifício Areia Branca entrega ao Conselho, à Comunidade Técnica e à Sociedade, o Laudo Técnico contendo todos os estudos, análises e diagnóstico sobre as causas do desabamento do referido edifício, ocorrido no dia 14 de outubro de 2004. Mesmo tratando-se de um documento estritamente técnico, cuja redação não deixa quaisquer dúvidas a esse respeito, o Laudo, no entender da Comissão, deve também, ter um caráter educativo, no sentido de alertar para os procedimentos relacionados ao projeto, aos processos construtivos, ao controle de qualidade e à manutenção de edificações no estado de Pernambuco. Dessa forma, além de concluir sobre as causas do desabamento que tirou a vida de quatro pessoas e privou famílias de seu mais importante patrimônio, este trabalho espera contribuir para a boa prática da engenharia em Pernambuco, na medida em que os ensinamentos tirados deste episódio possam contribuir para a melhoria dos
APRESENTAÇÃO Após nove meses de trabalho, a comissão designada pelo Presidente do CREAPE para elucidar o acidente envolvendo o edifício Areia Branca entrega ao Conselho, à Comunidade Técnica e à Sociedade, o Laudo Técnico contendo todos os estudos, análises e diagnóstico sobre as causas do desabamento do referido edifício, ocorrido no dia 14 de outubro de 2004. Mesmo tratando-se de um documento estritamente técnico, cuja redação não deixa quaisquer dúvidas a esse respeito, o Laudo, no entender da Comissão, deve também, ter um caráter educativo, no sentido de alertar para os procedimentos relacionados ao projeto, aos processos construtivos, ao controle de qualidade e à manutenção de edificações no estado de Pernambuco. Dessa forma, além de concluir sobre as causas do desabamento que tirou a vida de quatro pessoas e privou famílias de seu mais importante patrimônio, este trabalho espera contribuir para a boa prática da engenharia em Pernambuco, na medida em que os ensinamentos tirados deste episódio possam contribuir para a melhoria dos
modo a permitir identificar com antecedência os problemas existentes e solucionálos antes que constituam riscos à integridade da obra. É de fundamental importância que as atividades de manutenção e reparo sejam efetuadas por empresas e profissionais qualificados e habilitados, devendo incluir necessariamente necessariamente a inspeção de peças da infra-estrutura (cintas, pescoços dos pilares, sapatas e blocos de coroamento das estacas). •
•
A falta de mecanismos legais de controle e aferição da qualidade das edificações no Brasil se constitui em um grande problema que precisa ser enfrentado e resolvido com urgência. Algumas instituições que direta ou indiretamente tratam desta questão, como é o caso das prefeituras e outros órgãos de fiscalização, precisam rever e adequar seus procedimentos visando garantir a qualidade das edificações, bem como as suas manutenções ao longo do tempo. Isso evitará a lacuna legal atualmente existente que faz com que os usuários fiquem sem saber a quem recorrer quando se sentem prejudicados por alguma anomalia em seus imóveis. Torna-se necessário envolver também: os agentes financeiros, que financiam os imóveis sem avaliarem a qualidade dos mesmos; as empresas do setor imobiliário, no sentido de melhor qualificar a mão-de-obra da construção civil e aperfeiçoar os processos construtivos; as universidades e centros de pesquisa para melhorar a
ÍNDICE 1.
Introdução
2.
Objetivo
3.
O acidente
4.
Descrição do sistema estrutural 4.1 Contexto em que a estrutura foi projetada e construída
10. Anexos 10.1 Entrevistas 10.2 Ensaios realizados 10.2.1 Sondagem a percussão 10.2.2 Análise físico-química da água 10.2.3 Análise química do solo 10.2.4 Resistência à compressão do concreto 10.2.5 Profundidade de carbonatação 10.2.6 Resistência à tração do aço 10.2.7 Reconstituição do traço
1. Introdução
O Edifício Areia Branca iniciou a sua construção em 1977 e foi concluído em 1979. Segundo registros existentes no CREA-PE, o referido edifício foi construído pela JB Construções Ltda, com responsabilidade técnica pelo projeto arquitetônico e construção do arquiteto Juarez Alves Batista, CREA 1568 -D. A referida construtora está com as suas atividades encerradas, e seu titular, o arquiteto e proprietário Juarez Alves Batista é falecido. O edifício teve ainda a empresa ENGEST, responsável pelo projeto estrutural. Não constam dos registros do CREA as responsabilidades técnicas pelas elaborações dos demais projetos complementares.A empresa ENSOLO foi responsável pelos serviços de sondagens à percussão, que conduziram ao projeto das fundações.
3.
O acidente
A descrição do acidente está respaldada nos depoimentos obtidos de alguns moradores, de operários e engenheiros que naquela ocasião executavam serviços emergenciais de reforço estrutural, de técnicos da CODECIPE, do síndico do edifício e da análise de grande quantidade de fotografias tiradas antes e após o acidente.
•
No domingo à noite, dia 10.10.2004, alguns moradores ouviram um estrondo no edifício e realizaram uma inspeção visual no pavimento térreo e garagem. No entanto, não identificaram a origem nem constataram anomalias na estrutura;
também por outros moradores que alegaram terem sentido o edifício balançar. O referido engenheiro ligou para a Jatobeton que ficou de comparecer ao local no início da manhã. Na ocasião o Síndico solicitou que os moradores deixassem o edifício; •
naquela mesma madrugada, às 01:20 h, o condomínio acionou o Centro de Atendimento da CODECIPE, sendo registrada a ocorrência No. 385/2004. Às 2:40 h, o Engenheiro Civil e Major PM Carlos Alberto D’Albuquerque, técnico da CODECIPE, se encontrava no local, encontrando os moradores reunidos na parte inferior do edifício;
•
no início da manhã da quinta-feira, dia 14.10.2004, compareceram ao local representantes da empresa Jatobeton e o engenheiro Gamal Asfura. Foram procedidas inspeções, inclusive no interior do reservatório inferior, constatandose rachadura em uma viga do teto do subsolo, próxima da escada, não sendo observadas, naquele instante, anomalias nos pilares. Às 10:20 h a equipe da
sucesso em outras oportunidades, tendo sido relatado o caso de um edifício na cidade de Belém, no estado Pará, em situação semelhante. Relatos dos técnicos da Jatobeton e do servente Cícero Tenório da Silva indicam que os materiais para o reforço dos pilares chegaram entre 19 e 20 h. Logo após o jantar dos operários (19:25 h aproximadamente), os serviços foram recomeçados com aprofundamento da escavação das duas sapatas, seguidos da aplicação de graute no pescoço do primeiro pilar. No instante em que o pescoço do segundo pilar foi descoberto, não foi observada qualquer anomalia de forma aparente. Logo após a colocação do primeiro balde de graute, ouviu-se um estrondo; •
aproximadamente às 20:20 h, uma moradora que estava observando os trabalhos de recuperação foi alertada pelo operário Cícero Tenório da Jatobeton, que o segundo pilar, próximo do anterior, igualmente junto ao reservatório inferior, estava soltando lascas de concreto e os ferros ficando retorcidos. Logo a seguir ocorreu um novo estrondo semelhante a um tiro abafado. Todos saíram correndo
As fundações eram superficiais diretas do tipo sapatas isoladas em concreto armado, assentadas na cota aproximada de – 1,80 m abaixo do nível do piso do subsolo. Todos os pescoços dos pilares eram contraventados por cintas de concreto armado com seção transversal de 10 cm x 40 cm.
4.1 Contexto em que a estrutura foi projetada e construída Pelo fato de ter a sua construção iniciada em 1977, a data de elaboração do projeto estrutural foi naturalmente anterior, provavelmente em 1975, e, por conseqüência, efetuado de acordo com a norma da ABNT NB1/1960 – Cálculo e Execução de Obras de Concreto Armado. Observe-se que a NB1/1960 esteve em vigor até 1978, sendo substituída pela NBR 6118/1978 – Projeto e execução de obras de concreto armado – Procedimento. Por sua vez, foi substituída recentemente pela NBR
portanto em praticamente todas as obras, limitavam-se a 22 MPa. Havia recomendações para o emprego de concretos com resistência característica mínima de 13,5 MPa para os casos em fossem utilizados aços CA-T-50, os considerados “aços especiais” para a época. No caso dos aços 37-CA, correspondentes aos atuais CA-25, os limites inferiores ficavam reduzidos a 10 MPa, resistência mínima para um concreto dito estrutural. A evolução do conhecimento do comportamento do concreto permitiu que a NBR6118/2003 especificasse que a resistência característica mínima à compressão fosse 20 MPa, limitando-se, no entanto a 50 MPa que, mutatis mutandi, passou a ter em menor escala o papel dos 22 MPa da NB1/1960. Na Região Metropolitana do Recife e, praticamente em todo território nacional, é bem conhecido que a predominância das resistências adotadas foi de 13,5 a 18 MPa, tendo valores mais próximos de 15 MPa a maior incidência de uso. Ensaios realizados em testemunhos retirados dos escombros do Edifício Areia Branca revelaram que o concreto tinha resistência característica à compressão de 15
5. Metodologia adotada 5.1 Visitas e inspeções no local do acidente Logo após ser constituída em 15.10.2004 através de portaria da Presidência do CREA, a Comissão iniciou as suas atividades definindo um calendário de visitas e inspeções no local do acidente, com o objetivo de analisar os escombros, bem como selecionar e coletar amostras para a realização de ensaios laboratoriais. A Comissão solicitou do CREA-PE a colocação de um engenheiro no local, em tempo integral, visando orientar a retirada dos escombros de forma racional e também o controle da coleta de amostras definidas pela Comissão.
5.2 Entrevistas com pessoas relacionadas ao acidente
22.11.2004 – O Sr. Cícero Tenório da Silva, funcionário da empresa JATOBETON, que apareceu acompanhado do advogado Aluízio Freitas de Almeida Júnior; 22.11.2004 – O engenheiro civil Alexandre Whatley Dias, da Impertex, empresa que efetuou serviços de recuperação estrutural, (pontos atingidos por corrosão de armadura), há aproximadamente 5 anos anos no Edifício Areia Branca; 29.11.2004 – O engenheiro civil Rinaldo Soares de Azevedo, da empresa Soares Azevedo Ltda, que realizou serviços de substituição de revestimento cerâmico de fachada, entre novembro de 2003 e agosto de 2004; 03.12.2004 – O engenheiro Sérgio Gonçalves Bertão, da empresa JATOBETON hado do advogado Aluízio Freitas de Almeida Júnior;
Verificou-se que na base do pilar, ou seja, o ponto de encontro do pilar com a sapata, não foi previsto patamar para apoio da forma sobre a sapata com a finalidade de garantir a correta ligação pilar-sapata. Observam-se nesta região pontos em que ocorreu forte corrosão com redução da seção da armadura (Foto 19), além de fuga do concreto, através da interface forma/tronco de pirâmide. A região resultante tem seção reduzida e armadura exposta que, juntamente com outros fatores que serão aqui analisados, reduziram consideravelmente a capacidade de carga do pilar naquela região, e, conseqüentemente puseram em risco a sua estabilidade.
5.3.2 - Análise de uma seção típica de pilar Seja um pilar com dimensões 20cm x 50cm, armadura constituída de 12 barras longitudinais de 5/8” (16mm) e estribos de 4.2 cada 15cm. Na época, estando em vigor a NB 1/60 e a EB 3/67, era comum considerar as barras de aço CA-50 com os diâmetros
5.3.3 – Cintas de fundação As cintas, em geral, tinham seções de 10 cm x 40 cm e estavam armadas com duas barras de 1/2” (12,5 mm) e estribos de 4.2 a cada 25 cm. Observou-se na cinta CA (Leste-Oeste) que: (a) a armadura de ligação com o pilar rompeu por tração com a formação de estricção, separando-se do pilar. Vários estribos romperam e uma das barras longitudinais soltou-se deixando a cavidade limpa e polida, mostrando a insuficiência da aderência. Os trechos das cintas próximos dos pilares romperam por flexão expondo rachaduras típicas; (b) Na cinta CB (norte-sul) havia uma barra de 8mm que mostrava uma parte saliente da face superior da viga, com cerca de 30cm e atravessava toda a altura da viga, passando pelo fundo e mergulhando cerca de 1m no solo arenoso. A
5.3.4 – Grandes espessuras dos revestimentos de paredes e lajes As análises dos escombros revelaram grandes espessuras de revestimentos das alvenarias. Em certos pontos estas espessuras atingiram 18 cm. Fato idêntico ocorreu com os revestimentos das lajes de piso. Neste último caso, foram verificados revestimentos com espessuras de até 11cm. Geralmente nos projetos estruturais são considerados 2,5 cm de revestimento em cada face das peças estruturais. Estes valores constados do revestimento conduzem a um incremento nas ações permanentes sobre as vigas e, conseqüentemente, sobre os pilares e elementos de fundação.
5.3.5 - Sumidouros
5.4.2 – Análise física e química da água do subsolo Tem-se dois grupos de ensaios relativos à água do lençol freático no local do edifício. São eles: Grupo 1: efetuados por SM – Controle de Qualidade Ltda. Foram realizados quatro ensaios para análise físico-química, cujos resultados foram classificados de acordo com norma CETESB L1007, revisada em dezembro de 1988, como reação de agressividade de Grau 1 e agressividade ao concreto como fraca. Porém, o tipo de ação agressiva da água é lixiviação, “ação que caracteriza a progressiva solubilização do aglomerante”. Este efeito pode ser observado nas fotos Nos. 15, 16 e 17. Grupo 2: Foram analisadas duas amostras pelo ITEP – Associação Instituto de Tecnologia de Pernambuco que caracterizaram a água como ácida e de agressividade
5.4.5 – Resistência à tração do aço Com o objetivo de identificar os tipos de aço utilizados, bem como as caracterizações de suas resistências mecânicas e de dobramento, foram coletadas doze amostras de aço proveniente de diversas peças retiradas dos escombros. Foram identificados dois tipos de aço: CA-50 A e um aço do tipo B de especificação não identificada.
5.4.6 – Ensaios de reconstituição do traço do concreto Com o objetivo de verificar as diferenças de composições dos concretos existentes nas sapatas, pescoços de pilares, trechos de pilares do subsolo, elementos da superestrutura retirados dos escombros, foram coletadas amostras para ensaios de reconstituição do traço do concreto. Estes ensaios foram efetuados na ABCP –
Foram efetuados ensaios para verificação da existência de reações álcaliagregado. Este tipo de reação foi recentemente identificada em sapatas e blocos de estacas de fundações em alguns edifícios situados na Região Metropolitana do Recife. Trata-se de fenômeno descoberto pela primeira vez no Brasil para o caso de fundações de edifícios, embora já se tivesse amplo conhecimento em obras de barragens, túneis, pavimentos rodoviários e pela primeira vez em pontes no caso recifense da Ponte Paulo Guerra. Vale ressaltar que a descoberta deste fenômeno foi motivada pelo colapso do Edifício Areia Branca, devido à forma como se deu o acidente, a partir da ruptura dos pescoços de pilares no trecho enterrado da estrutura. Isto motivou vistorias que inicialmente revelaram em edifícios análogos ao prédio objeto deste Laudo, graves patologias capazes de colocar em risco aquela edificações. Dentro deste quadro patológico surgiu o conhecimento das reações expansivas no concreto. Formações características de reações álcali-sílica foram identificadas através do microscópio eletrônico de varredura conjuntamente com análise química por dispersão
procedimento, gretas no gel produzido pela reação álcali-sílica e microfissuras aleatoriamente orientadas na argamasssa.
5.4.9 – Análise química por dispersão de raios X As análises por dispersão de raios-X permitiram a identificação dos componentes químicos que interferem na reação álcali-sílica (Na, K, Ca, Si).
5.5 – Análise estrutural Inicialmente foi efetuado um levantamento das seções e posições dos pilares, bem como das dimensões das respectivas sapatas e das cotas de fundações (Figura 5.6.4). Foram efetuadas estimativas das cargas atuantes sobre os pilares na cota de
Cerca de trinta anos atrás, esta região era muito pouco habitada, havendo na grande maioria residências de veraneio. Com os programas do BNH – Banco Nacional da Habitação, na cidade do Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes, foram estimulados diversos tipos de construções. As faixas mais próximas às praias foram ocupadas por edifícios altos, enquanto nas faixas mais interiores foram construídos conjuntos residenciais com edifícios com quatro pavimentos tipo “Caixão”. O estímulo do Governo do Estado na implantação de mais indústrias no Cabo de Santo Agostinho, o incremento do Porto de Suape e a ligação com a BR-101, demandavam habitações mais próximas a estas instalações, no sentido de fixar todo o contingente de trabalhadores e suas famílias. Por outro lado, face ao grande número de construções em Recife, especialmente no bairro de Boa Viagem, e, pelos altos preços dos terrenos nesta região, a praia de Piedade tornou-se uma opção das mais viáveis e rentáveis para a construção civil, no litoral sul.
Além destes problemas, enfrentavam-se ainda os tradicionais casos de compressibilidade das camadas menos resistentes, e, em especial as camadas constituídas por fragmentos de conchas, de comportamento então desconhecido, e que nas praias da zona Norte, além da cidade de Olinda, já haviam demonstrado instabilidade acentuada, com ocorrência de danos severos em cinco edifícios com 15 pavimentos. Como na maioria da faixa costeira de Pernambuco, as praias de Piedade, Candeias e Barra de Jangadas, na estreita faixa das habitações de maior porte, têm topografia plana com variações pouco significativas, estando em média na cota 5,00 m em relação ao nível médio dos mares. No trecho mais interior, a topografia é também bastante plana, estando em média com cota 2,00 m ocorrendo vários canais naturais e várias lagoas, que nas épocas invernosas provocam alagamentos na região. As construções nesta área requerem sempre a execução de aterros complementares.
No caso das fundações profundas, quando necessárias, houve no passado, na ultrapassagem das camadas do arenito, muitas interferências danosas em residências e mesmo edifícios, quando da trepanação. Na prática atual, com o uso de equipamentos rotativos, tornou-se viável novamente, a solução em fundações profundas. Sobre este arenito está apoiada a maioria das fundações para edifícios com até 25 pavimentos.
b) As camadas compressíveis que tanto ocorrem na faixa litorânea como no trecho mais interior, trazem a preocupação com as deformações a longo prazo. Mesmo as camadas de fragmentos de conchas, cujas deformações não são regidas pelo modelo do adensamento, têm sido motivo de preocupações, pois têm apresentado em algumas obras, indícios de dependência temporal a curto e médio prazo.
5.6.3 Caracterização do perfil geotécnico no Edifício Areia Branca Foi efetuada uma campanha de sondagem tanto pelo processo de simples reconhecimento a percussão, como através de sondagem rotativa (NBR 6484 – ABNT). Os resultados destas sondagens estão contidos no Relatório Nº 680/2005 – Civilsonda – Janeiro/2005 (ver Volume 2), contendo seis furos de sondagem mista onde, apenas dois (SM-01 e SM-05) alcançaram profundidades entre 26 e 28 m, dado o bom conhecimento local deste subsolo, hoje. Os furos restantes (SM-02, SM-03, SM-04 e SM-06) foram interrompidos após a ultrapassagem do arenito e tiveram a finalidade de verificar a variação de espessura do mesmo. Com base nas sondagens citadas, foi traçado o perfil geotécnico do subsolo para o Edifício Areia Branca (Figura 5.6.3).
Figura 5.6.3 – Perfil Geotécnico do Terreno do Edifício Areia Branca
Um aspecto relevante que foi observado nas visitas técnicas de inspeção e levantamento de dados foi a existência de vários elementos do sistema de esgotamento sanitário (sumidouros) no entorno próximo das fundações (Foto 5.6.1), o que favorece o contato de agentes agressivos com os elementos estruturais enterrados (sapata, pescoço do pilar e cintas).
5.6.4. Caracterização da fundação do Edifício Areia Branca Além da campanha de sondagens de reconhecimento do terreno (percussão e rotativa), foi feita uma escavação geral no terreno, para inspeção das condições atuais das fundações do edifício. Trata-se de fundações superficiais tipo sapatas isoladas, assentes em torno da cota +2,200 m , sendo que o nível do meio-fio na Av. Bernardo Vieira de Melo foi tomado como cota +5,000 m. Isso corresponde a uma profundidade de cerca de 1,80 m
Foto 5.6.1 – Detalhe da Presença de Sumidouro Próximo às Sapatas
FUNDO
P22
P17 P 10
P 31 P15
P 26
P16
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P 25 P35 P4
IA C Ú L A M LI V . D E
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P1
P22A
A V . B E R N A R D O V I E IR A D E M E L O
Figura 5.6.4 – Detalhe Esquemático da Planta das Sapatas
P27 P32
E D A D IE P A D R A L O S . D E
Sondagem SM-01 SM-02 SM-03 SM-04 SM-05 SM-06
Tabela 5.6.1 – Espessura da Camada de Arenito Camada de Arenito Cota Inicial (m) Cota Final (m) Espessura (m) +0,57 -1,66 2,23 +0,87 -1,23 2,10 +1,08 -1,02 2,10 +1,15 -0,60 1,75 +1,00 -0,75 1,75 +1,07 -0,81 1,88
As sapatas têm dimensões variando de 1,63 a 4,62 m (Figura 5.6.6), como mostra a Tabela 5.6.3. A pressão média transmitida pelas sapatas varia de 120 a 240 kPa. Essa pressão pode ser considerada adequada para as características do terreno local, tanto do ponto de vista da estabilidade das fundações, quanto das características de deformação do terreno.
LX1
a i c ú L a m l i V . f d E
LY1
LY2
Y
e d a d e i P a d r a l o S . f d E
LX2
Av. B ern ard o Vi eir a de Mel o X
Figura 5.6.5 – Detalhe Esquemático das Dimensões das Sapatas
P26 P27 P28 P29 P30 P31 P32 P33 P34 P35 P36
2,80 2,30 3,00 3,02 2,41 2,60 1,64 2,60 2,27 2,53 2,90
2,81 2,31 2,99 3,02 2,40 2,58 1,63 2,64 2,36 2,57 2,94
3,70 2,51 3,44 3,35 2,67 2,31 1,80 2,99 2,69 2,29 2,60
3,71 2,54 3,44 3,36 2,69 2,35 1,80 3,01 2,69 2,29 2,56
Além disso, em todos os depoimentos junto aos moradores, não foram relatados danos na superestrutura que pudessem estar associados a movimentos da fundação (fissuras nas paredes e vigas, maior incidência de danos nos primeiros pavimentos, etc). A única exceção foi o fissuramento do reservatório inferior de água que ocorreu 48 horas antes da queda do prédio, que foi relatado por alguns moradores, mas que já era
Sapata P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 P9 P10 P11 P12 P13 P14 P15 P16
Tabela 5.6.3 – Cota de Assentamento das Sapatas Cota de Assentamento da Sapata (m) Ponto C1 Ponto C2 Ponto C3 Ponto C4 --------------------2,122 2,170 2,198 2,165 2,148 2,177 2,157 2,133 2,245 2,270 2,212 2,223 2,253 2,248 2,231 2,281 2,176 2,253 2,062 2,148 2,253 2,258 2,280 2,318 2,290 2,239 2,328 2,288 2,245 2,240 2,246 2,239 2,250 2,225 2,275 2,223 2,040 2,047 1,991 2,045 2,182 2,167 2,199 2,186
6.1 Sapatas De modo geral, as sapatas caracterizam-se pelas seguintes condições:
6.1.1 Má qualidade de execução Observa-se que não houve controle de execução das sapatas. Isto fica evidente pelas simples observações realizadas durante as inspeções dos escombros e que estão apresentadas na documentação fotográfica anexa (Foto 16). Foram constatadas armaduras expostas (Foto 17), indícios da ausência de vibração do concreto, forma geométrica indefinida, desníveis e falta de uniformidade da espessura da camada de concreto magro, indícios de lixiviação provocada pela agressão à argamassa componente do concreto por águas agressivas. Foi verificado que o tronco de pirâmide
A hipótese de ruptura da camada de arenito foi descartada pelo fato da camada ser contínua e possuir espessura compatível com o porte do prédio.
6.1.3 Pescoços dos pilares Foram dadas atenções especiais aos pescoços dos pilares, pela importância que estas regiões tiveram no colapso do edifício. Neste sentido, foram priorizados ensaios de caracterização destes elementos, tais como: ensaios de reconstituição do traço, teste de reação álcali-agregado, porosidade, carbonatação, resistência mecânica dos aços. A retirada de testemunhos objetivando ensaios de resistência à compressão dos pescoços dos pilares, só foi possível em um deles (Pilar P20), em virtude da insuficiência de integridade dos demais após o colapso. Mesmo assim, o resultado obtido mostrou-se atípico e não representativo, pelo fato deste pilar ter sido o único que revelou características estruturais adequadas, considerando que a resistência obtida foi
do concreto. Isto se torna mais relevante considerando-se que os corpos de prova ensaiados foram predominantemente da superestrutura. Os ensaios de reconstituição do traço em amostras extraídas dos pescoços dos pilares forneceram o índice de vazios médio de 16,31 %.
Teor de cimento – Conforme exposto no item 5.4.6, o valor médio do teor de cimento encontrado nos ensaio de reconstituição do traço foi de 234,3 kg/m 3 enquanto que as amostras provenientes dos trechos situados no subsolo tiveram valor médio de 291,8 kg/m3. Para os padrões da época em que foi construído o edifício, um concreto estrutural geralmente tinha um consumo mínimo de 300 kg/m 3. O valor mínimo encontrado nas amostras ensaiadas foi 194 kg/m 3. Admitindo-se a hipótese do traço do concreto ser o mesmo, tais valores indicam que houve um processo de deterioração do concreto provocado por agentes químicos identificados nos ensaios, além da ação da umidade atuando permanentemente sobre um concreto de elevada porosidade. Os
mesmo tempo expondo as armaduras e o concreto daquela região às ações deletérias dos agentes agressivos.
Colapsos das armaduras – Foram verificadas rupturas dos estribos em decorrência da oxidação favorecida pelo pequeno cobrimento, presença de umidade, elevada porosidade, tudo isto agravado pelo pequeno diâmetro da armadura (4.2 mm). Em decorrência da ruptura dos estribos e das falhas construtivas das bases dos pilares, anteriormente referidas, houve sistemáticas flambagens das armaduras longitudinais (Fotos 31 e 40). Estas flambagens, por sua vez, foram acentuadas pela baixa aderência da armadura com o concreto, contribuindo decisivamente para a transferência de cargas verticais para a seção estrangulada do concreto.
Concreto friável – O concreto, em vários pescoços de pilares se mostrou quebradiço, decompondo-se facilmente com o simples manuseio. Este comportamento não foi
a oxidação das armaduras e a degradação dos pilares a ele justapostos, que por sua vez desencadearam o processo de colapso.
7. CONCLUSÕES
Os estudos efetuados, ensaios realizados e as análises daí decorrentes, conduziram às seguintes conclusões: •
O desabamento do Edifício Areia Branca se deu em decorrência da ruptura dos pilares, nos trecho dos pescoços, ou seja, na região compreendida entre os topos das sapatas e o piso do subsolo;
•
a seqüência de ruptura dos pilares se iniciou com o pilar P22, seguido pelo pilar P21, ambos servindo de suporte do reservatório inferior. O desenvolvimento da seqüência se deu partindo da região central para os bordos, conduzindo os destroços para a própria projeção da edificação, aproximadamente, com pequeno desvio rotacional para noroeste, atingindo os cinco primeiros andares do Edifício
argamassa constituinte do concreto, vazios de formas e dimensões diversas, resultando em redução da seção resistente do pilar no trecho mais solicitado, além de favorecer a oxidação das armaduras e ataques ao concreto com a conseqüente deterioração; - sapatas com os troncos de pirâmide que compõem a suas partes superiores com geometria incompleta e disforme, além de haver evidências de o concreto ter sido executado sem vibração; - os ensaios de reconstituição do traço do concreto revelaram que os pilares P22 e P21, a partir dos quais iniciou o processo de colapso, sofreram degradação nos pescoços e na região situada acima do nível do subsolo, ou seja, ao longo de todo o espaço compreendido pelo reservatório inferior. Também foi constatada oxidação da armadura em intensidades maiores do que nos demais pilares. Estes efeitos foram provocados pela presença constante de umidade proveniente de vazamentos do reservatório ao longo do tempo. Foram detectadas duas camadas
compreendida pelas fundações; - Não foi identificada carbonatação do concreto.
Recife, 25 de julho de 2005
ALEXANDRE DUARTE GUSMÃO Engenheiro Civil, D.Sc., CREA 17403-D/PE
DÍLSON CORRÊA LIMA TEIXEIRA
8. – Bibliografia ABNT - NB1/1960 – Cálculo e Execução de Obras de Concreto Armado. ABNT - NBR 6118/1978 – Projeto e execução de obras de concreto armado – Procedimento. ABNT - NBR 6118/2003 – Projeto de estruturas de concreto – Procedimentos. ABNT – NB51/1978 – Projeto e Execução de Fundações – Procedimento. ABNT – MB4/1953 – Ensaio de tração dos materiais metálicos – Método Brasileiro. ABNT – MB4/1977 – Determinação das propriedades mecânicas à tração de materiais metálicos – Método de ensaio. ABNT - EB3/1967 – Barras e fios de aço destinados a armaduras de peças de concreto armado. ABNT – Anexo da EB3/1967 (Modifica dispositivos da NB1 e NB2) – Condições de
01 - FACHADA PRINCIPAL DO EDIFÍCIO AREIA BRANCA
02 - VISTA GERAL DO SUBSOLO
03 - TRINCA NA VIGA DO TETO DO SUBSOLO JUNTO JUNTO AO RES. INFERIOR INFERIOR
04 - TRINCA NA PAREDE DO RESERVATÓRIO INFERIOR INFERIOR COM VAZAMENTO VAZAMENTO
05 - VISTA GERAL DO RESERVATÓRIO RESERVATÓRIO INFERIOR E ALAGAMENTO ALAGAMENTO
06 - ESMAGAMENTO DA ALVENARIA SITUADA SOB A ESCADA NO SUBSOLO
07 - VISTA DOS PILARES P21 E P22, A PARTIR DOS QUAIS FOI INICIADO PROCESSO DE COLAPSO DO EDIFÍCIO
08 - ALVENARIA PRÓXIMA DO RESERVATÓRIO INFERIOR, ROMPIDA
09 - PARTE POSTERIOR DO EDIFÍCIO NA OCASIÃO DA VISTORIA DA CODECIPE
10 - MORADORES ACOMPANHAM A VISTORIA EFETUADA PELA CODECIPE
11. ESCOMBROS, NA MANHÃ SEGUINTE AO DESABAMENTO
12. ESCOMBROS, INSTANTES APÓS O DESABAMENTO E AVARIAS CAUSADAS NO ED. SOLAR DA PIEDADE.
13. ESCOMBROS EM FORMA PULVERIZADA
14. DETALHE DOS DANOS PROVOCADOS NO PAVIMENTO TÉRREO DO ED. SOLAR DA PIEDADE.
15. LIXIVIAÇÃO DO CONCRETO DAS SAPATAS E LIGAÇÕES COM OS PILARES
16. GRUPO DE SAPATAS - I
17. GRUPO DE SAPATAS - ARMADURAS EXPOSTAS
18. FORMAS INDEFINIDAS DAS SAPATAS - DETALHE
19. LIGAÇÃO PILAR SAPATA COM REDUÇÃO DA SEÇÃO TRANSVERSAL DO PILAR
20. CONCRETO APRESENTANDO SINAIS DE DEGRADAÇÃO IRREGULARIDADE DA BORDA DA SAPATA
21. SAPATA COM FORMA INDEFINIDA
22. LIXIVIAÇÃO DO CONCRETO DA SAPATA E LIGAÇÃO COM O PILAR.
24. VESTÍGIOS DA INJEÇÃO DE EPOXY NA PARTE IFEERIOR DO PILAR P22
26. ESCOMBROS – GRANDES ESPESSURAS DOS REVESTIMENTOS.
27. ESCOMBROS – GRANDES ESPESSURAS DOS REVESTIMENTOS DAS PAREDES E DAS LAJES DE PISOS.
28. RESERVATÓRIO RESERVATÓRIO INFERIOR COM DUAS CÂMARAS. CÂMARAS.
29. RESERVATÓRIO INFERIORCOM DUAS CAMADAS DE REVESTIMENTOS MOSTRANDO QUE HOUVE PROBLEMAS PROBLEMAS COM VAZAMENTOS. VAZAMENTOS.
35. PESCOÇOS DE PILARES COM SINAIS DE DEGRADAÇÃO.
37. MÁ QUALIDADE DO CONCRETO E DESAGREGAÇÃO
38. FALHAS DO CONCRETO DO PESCOÇO DO PILAR E NA LIGAÇÃO COM A SAPATA.
42. FALHA NA LIGAÇÃO PILAR – SAPATA COM REDUÇÃO DA SEÇÃO TRANSVERSAL DO PILAR E ARMADURA OXIDADA
45. CINTA E PAREDE DO RESERVATÓRIO INFERIOR
47. RETIRADA DE TESTEMUNHOS DAS SAPATAS.
48. RETIRADA DE TESTEMUNHOS DE PILAR