Seção I Infecção e inflamação do trato geniturinário
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Capítulo 1 Infecção do trato urinário – aspectos gerais Irineu Rubinstein Maurício Rubinstein
Introdução Infecção do trato urinário (ITU) é a infecção bacteriana mais comum no ser humano. É a segunda infecção mais freqüente, só sendo ultrapassada pela gripe, que é de origem virótica. As infecções urinárias são responsáveis por mais de sete milhões de consultas por ano nos Estados Unidos e por cerca de 100 mil hospitalizações. Embora as ITUs, em geral, sejam fáceis de diagnosticar e curar, uma série de fatores devem ser levados em conta para se conseguir a melhor forma de tratamento. As recomendações para o diagnóstico e para a terapia variam com a idade, sexo, comorbidades, risco de patógenos resistentes, prévia resposta ao tratamento, uso de cateter e gravidez. As opções de tratamento com agentes antimicrobianos têm aumentado nos últimos anos, assim como a utilização cada vez maior de probióticos. Por outro lado, como um fator negativo, a resistência bacteriana também está aumentando progressivamente.
Conceitos Conceitua-se infecção do trato urinário (ITU) quando ocorre colonização por agentes infecciosos, com invasão tecidual, em qualquer parte do trato urinário. Exceto pela parte distal da uretra, o trato geniturinário é estéril. A presença de bactérias dentro deste trato estéril constitui uma infecção.
Infecções urinárias não-complicadas
Caracterizam-se por não apresentar alterações anatômicas ou doenças associadas, sistêmicas ou não, que favoreçam ou potencializem a colonização ou a invasão infecciosa tecidual. t ecidual. A ITU não-complicada não é um problema grave, não ocorrendo implicações clínicas de maior gravidade, tais como formações de abscessos ou mesmo invasão do parênquima renal. Infecções urinárias complicadas
ITU complicada é uma infecção em um indivíduo com o trato geniturinário anormal, seja de maneira funcional ou de forma estrutural. De acordo com a sua localização anatômica, também t ambém podemos dividir a ITU em baixa e alta. A ITU baixa corresponde à cistite, uretrite, epididimite, orquite e prostatite (aguda e crônica), e a ITU alta corresponde às infecções que acometem os rins (pielonefrites). A classificação da ITU, em baixa e/ou alta, em assintomática ou sintomática, complicada ou nãocomplicada, e esporádica ou recorrente, é de fundamental importância, já que a etiologia, a escolha dos antibióticos a serem utilizados e o tempo de tratamento poderão variar consideravelmente. Bacteriúria assintomática corresponde ao achado de bactérias na urina (igual ou superior a 100 mil UFC/mL em duas amostras de jato médio), na ausência de piúria e sintomas clínicos. É comum em crianças do sexo feminino e ocorre em 1% a 7% das mulheres adultas. É muito importante o seu tratamento nas mulheres grávidas.
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Epidemiologia As variáveis que devem ser consideradas na epidemiologia da ITU incluem a idade, o sexo, presença de comorbidades, risco de patógenos resistentes, resposta prévia ao tratamento tratamento,, uso de cateter vesical, gravidez, se o trato urinário é nor mal ou não, se a infecção é sintomática ou assintomática. As ITUs ocorrem em todas as faixas etárias em ambos os sexos. Mais freqüentes nas mulheres, pois sabemos que 10% a 20% delas apresentarão uma infecção em algum período de suas vidas. A prevalência de bacteriúria assintomática em mulheres grávidas varia de 2% a 7%, pois se sabe que a gravidez modifica as manifestações e as seqüelas das infecções, tanto no trato urinário superior como no inferior. Consideradas as principais causas de hospitalização e morbidade em crianças, as ITUs também são as responsáveis por uma quantidade significativa de estados febris não-explicados, em crianças abaixo dos 3 anos de idade. Estudos retrospectivos estimaram que 0,3% a 1,2% dos bebês desenvolverão ITU sintomática durante o primeiro ano de vida. Relações entre determinadas enfermidades que poderão surgir durante a vida, como diabete, neuropatias, neoplasias, hipertrofia prostática, certamente deverão ser encaradas como fatores predisponentes às ITUs.
Etiologia As infecções inespecíficas do trato geniturinário são causadas principalmente por bactérias aeróbias Escherichia coli, Proteus mirabilis, Gram-negativo ( Escherichia Klebsiella sp, Enterobacter sp, Pseudomonas aeruginosa, Serratia sp, Morganella morganii, Providencia stuartii), cocos Staphylococci, Streptococci grupos D e Gram-positivo ( Staphylococci,
B) e, em menor extensão, por bactérias anaeróbias Bacteroides fragilis, Peptostreptococc Peptostreptococci), i), e por micror( Bacteroides ganismos que requerem técnicas especiais para serem C hlamydia trachomatis, Ureaplasma identificados ( Chlamydia ). urealyticum, Gardnerella vaginalis Em termos gerais, a freqüência de germes obser vados na ITU é universal e a predominância da Escherichia coli varia de 85% a 90%. As infecções adquiridas em hospitais freqüentemente Pseudomonas envolvem os patógenos mais resistentes ( Pseudomonas aeruginosa , Serratia marcescens ) e requerem terapia com agentes antimicrobianos parenterais. Devemos ressaltar as bactérias produtoras da enzima urease, sendo a espécie Proteus mirabilis a mais
relacionada à litíase por estruvita. Outras bactérias Haemophilus us influenzae , produtoras de urease são: Haemophil Staphylococcus aureus , Klebsiella pneumoniae , Serratia sp, Pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus epidermidis . As bactérias são as principais responsáveis pelas ITUs, embora fungos, leveduras e vírus também possam produzi-las produzi-las.. Devemos caracterizar o número de bactérias por mL de urina para que o diagnóstico seja mais preciso. Assim, para diferenciar uma infecção verdadeira de uma contaminação, devemos considerar bacteriúria significativa quando houver 100 mil UFC ou mais por mL de urina coletada em condições de assepsia. Estudos recentes têm sugerido que, especificamente para infecções urinárias relacionadas à Escherichia coli e ao Staphylococcus saprophyticus , 100 UFC/mL de urina já seria indicativo de processo infeccioso em mulheres sintomáticas. Para homens com processo sintomático, este número deveria ser pelo menos 1.000 UFC/mL, enquanto com o paciente com cateter urinário deve se aceitar 100 UFC/mL como indicador de infecção urinária. Na vigência de outras bactérias ou germes, sugere-se manter o critério de 100 mil UFC/mL ou mais.
Fisiopatologia As principais vias de entrada da infecção urinária no trato urinário são: via ascendente via hematogênica via linfática extensão direta de outros órgãos. Via ascendente
É a mais freqüente e importante via de infecção, sendo necessários vários fatores fundamentais para que ocorra a infecção vesical: colonização periuretral do patógeno proveniente da flora intestinal devido a fatores mecânicos, defecação, sudorese e higiene pessoal. A colonização do vestíbulo vaginal e da uretra distal dependerá da competição com a flora local e do pH vaginal, que é muito influenciado pelo nível de estrogênios. O nível de IgA local, bem como a existência de fatores de aderência bacteriana como fímbrias, adesinas e hemolisinas, participa dos mecanismos iniciais deste processo infeccioso. A uretra curta feminina é, sem dúvida, um dos fatores permissivos deste mecanismo. Para que a cistite se estabeleça, os fatores naturais de proteção (tais como a urina, como um inibidor
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natural pela elevada hipertonicidade, pelo pH baixo permanece como um forte preditivo de ITU ITU.. Também e presença de ácidos orgânicos; a presença de proteína a história de cirurgia no trato geniturinário e a presença de Tamm-Horsfall; o muco vesical; a secreção local de volume residual elevado são fatores importantes. de IgA e IgG; o esvaziamento normal da bexiga) Por estes dois últimos fatores, pode-se pensar que o deverão ser ultrapassados. Para que este processo trato urinário não esteja funcionalmente normal e, patológico se complete, devemos lembrar dos fatores conceitualmente, pode-se colocar a ITU nesta faixa relacionados à resistência bacteriana, principalmente etária como uma forma de ITU complicada. em relação à Escherichia coli (fatores de aderência das bactérias ao urotélio, polissacarídeos K na cápsula, Tabela 1: Fatores de risco para ITU sorotipos específicos O:K:H da E. coli ). Via hematogênica
Não é comum e ocorre especialmente em situações específicas, nas quais existem alterações da resistência do paciente, doenças sistêmicas infecciosas ou em situações em que ocorrem alterações anatômicas ou funcionais nos rins, favorecendo a permanência da bactéria. Via linfática
A ITU pelos canais linfáticos provavelmente ocorre, porém é rara. Existem condições em que poderia ocorrer por via ascendente, da bexiga para os rins, por meio de capilares linfáticos periureterais. Extensão direta por outros órgãos
Abscessos intraperitoneais, especialmente os associados às doenças inflamatórias intestinais, doença inflamatória pélvica em mulheres, abscessos perivesicais e fístulas do trato geniturinário podem proporcionar infecção do trato urinário por extensão direta destes órgãos.
Tipos de infecção ITU aguda não-complicada
Este é um problema comum em mulheres. A maior incidência é nas mulheres jovens, sexualmente ativas, entre 20 e 40 anos, e nas mulheres pós-menopausa. A incidência de ITU não-complicada tem sido estimada em 0,5/pessoa/ano, e 27% a 48% das mulheres sadias com episódio de uma infecção terão infecção recorrente. Nem todas as mulheres apresentam o mesmo risco para o desenvolvimento de infecções nãocomplicadas. As maiores determinantes de infecção são de ordem genética e comportamental (Tabela1). Os fatores do hospedeiro diferem entre mulheres jovens e pós-menopausa. A história de ITU no passado
Infecções urinárias complicadas
Esta forma de ITU acompanha-se por anormalidades que podem ser anatômicas, funcionais ou metabólicas e pode alterar o curso da infecção, tornando mais difícil a sua cura. Geralmente o agente infeccioso é bem mais resistente, levando mais facilmente a recidivas e/ou a recorrências. O perigo adicional de sepse está sempre presente, e a morbidade e a mortalidade são maiores, sobretudo nos pacientes idosos ou hospitalizados. A UTI pode ser, ainda, sintomática ou assintomática, e pode envolver o trato urinário inferior ou superior. ITU sintomática
A ITU sintomática é identificada quando existem sintomas clínicos atribuídos à presença de bactérias no trato urinário. Os sintomas podem variar dependendo do local de infecção (rim ou bexiga). A ITU sintomática pode se apresentar como uma ITU aguda não-complicada, tipo cistite aguda em mulheres, ou como uma pielonefrite aguda não-
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Seção I obstrutiva, que representa uma ITU sintomática do trato urinário superior, na mesma população. ITU assintomática
Esta forma representa o achado de bactérias em número apropriado na urina de pacientes que não apresentam nenhuma sintomatologia urinária. É muito importante o tratamento de bacteriúria assintomática em pacientes grávidas. Em pacientes idosas, é comum o achado de bacteriúria assintomática. Muitos pacientes com bacteriúria assintomática apresentam uma resposta de defesa imunitária no seu trato geniturinário, representada por piúria ou outras condições imunes ou inflamatórias inflamatórias.. O diagnóstico e o tratamento de pacientes com ITU, em geral, é bem-sucedido, mas em determinadas populações, tais como idosos e grávidas, a
terapia pode se tornar mais complexa. Deve-se levar em conta os fatores de risco e a apresentação clínica de cada caso, para se fazer um diagnóstico correto e um tratamento efetivo.
Literatura recomendada 1. Stamm WE, WE, McKevitt McKevitt M, Roberts Roberts PL, PL, et al. Natural Natural histo history ry of recurrent urinary tract infections in women. Rev Infect Dis. 3: 77-80, 1991. 2. Stamm WE, WE, Hooton Hooton TM. TM. Management Management of of urinary urinary tract tract infections in adults. N EnglJ Med . 329: 1328-32, 1993. 3. Hooton TM, Scholes Scholes D, D, Hughes JP JP, et al. A prospectiv prospectivee study of risk factors for asymptomatic urinary tract infection in young women. N Engl J Med . 335: 468-74, 1996. 4. Raz R, Gennen Gennen Y, Y, Wasser Wasser J, et al. al. Recurrent Recurrent urinary tract tract infection infection in postmenopausal women. Clin Infect Dis. 30: 152-6, 2000. 5. Anth Anthony ony Schaeffer Schaeffer.. Infections Infections of the Urinary Tract. Tract. In: In: Walsh Walsh PC et al. 8th ed. Campbell’s Urology. Saunders. 515-602, 2002.
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Capítulo 2 Cistite bacteriana aguda Roberto Kiehl
Introdução A cistite bacteriana é a síndrome clínica característica da resposta inflamatória do urotélio vesical à invasão bacteriana, e geralmente é acompanhada de disúria, polaciúria, urgência miccional e dor suprapúbica. É dita não-complicada quando ocorre na ausência de disfunção anatômica e/ou fisiológica. A infecção do trato urinário como um todo tem incidência de sete milhões de casos por ano nos EUA, sendo a cistite a maior responsável por eles. Exceto no período neonatal, a freqüência dessas infecções é maior em mulheres do que em homens, sendo que 1,2% das consultas femininas anuais tem como causa a cistite. A bacteriúria, contaminação da urina por bactérias, tem prevalência de 3,5% na população geral e em sua maioria é assintomática. A infecção propriamente dita se dá pela interação do patógeno ao hospedeiro com invasão tecidual em que o agente se sobrepõe às defesas do hospedeiro por sua alta virulência ou as defesas do paciente estão comprometidas por alguma patologia sistêmica ou local associada. As vias de infecção são: ascendente, hematogênica, linfática e extensão direta de órgãos vizinhos. A via ascendente é a mais freqüente e as bactérias Gramnegativo do reservatório fecal são as mais comumente responsáveis pela cistite, sendo que em 80% a 85% dos casos a Escherichia coli é o patógeno isolado. Outros patógenos Gram-negativo associados, são: Proteus e Klebsiella . Dentre os agentes Gram-positivo envolvidos nas cistites, o Staphylococcus saprophyticus é o mais
importante, sendo responsável por até 10% dos casos em adultos jovens com vida sexual ativa.
Diagnóstico A cistite provoca irritação da bexiga e da uretra; disúria, polaciúria, urgência, micções com pouco volume vo lume e dor suprapúbica são os sintomas clássicos e freqüentes. O diagnóstico presuntivo da cistite é baseado no quadro clínico associado à piúria, hematúria e bacteriúria encontradas na análise microscópica da urina (urina tipo 1). A confirmação do diagnóstico é realizada através de cultura da urina e é considerada positiva posit iva para infecção na presença de no mínimo 100 mil unidades formadoras de colônia (UFC) por mL. Porém, em pacientes sintomáticos, culturas com até 100 UFC são considerados positivos. Casos com quadro clínico e urinálise clássicos não necessitam de confirmação com urocultura. Entretanto, pacientes com quadro clínico atípico, crianças, gestantes, diabéticos, idosos e pacientes que tenham sido tratados recentemente com antibioticoterapia ou apresentem infecção urinária recorrente devem realizar urocultura para confirmação do diagnóstico e para guiar a terapia através de antibiograma. O diagnóstico diferencial da cistite bacteriana se dá com outras doenças inflamatórias e infecciosas em que os sintomas urinários irritativos estejam presentes. Uretrites por patógenos de transmissão sexual, vaginites, tumores de bexiga, cistite intersticial e litíase uretral e vesical são alguns exemplos exemplos..
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Tratamento O tratamento da cistite é feito através de antibioticoterapia e pode variar conforme a preferência do médico, a idade do paciente e o perfil de resistência dos patógenos da comunidade ou hospital em que o paciente adquiriu a doença. O sulfametoxazol associado à trimetoprima, que interfere no metabolismo de folato da bactéria, ou à trimetoprima isolada, que é tão efetiva quanto a associação das medicações e tem menos efeitos colaterais, pode ser usada em comunidades em que a taxa de resistência da E. coli seja inferior a 20%. É o antibiótico mais freqüentemente utilizado devido a seu baixo custo. Entretanto, reações adversas à medicação como alterações gastrointestinais e rashes cutâneos não são raros. Não deve ser usado em gestantes devido a hepatotoxicidade fetal. As fluoroquinolonas, que inibem a DNA-girase bacteriana, enzima necessária para replicação do DNA, e têm resistência inferior a 5% na maioria das comunidades, é boa opção terapêutica, especialmente em comunidades com alta taxa de resistência ao sulfametoxazol-trimetoprima. São praticamente ineficazes contra anaeróbios, o que altera pouco a flora intestinal. Classicamente, são contra-indicadas em crianças, gestantes e mulheres que estejam amamentando,, devido ao risco de lesão da cartilagem de mentando crescimento que foi comprovado em estudos experimentais, mas que não foi comprovado em humanos. A amoxicilina, cefalosporinas de primeira geração e sulfonamidas não são indicadas, porque um terço das bactérias são resistentes ao seu efeito, entretanto, para gestantes, cefalosporinas de primeira geração e amoxicilina são as drogas de escolha. O uso de aminoglicosídeos é indicado para pacientes com cistite complicada e que necessitem de antibioticoterapia intravenosa. A antibioticoterapia por três dias é o esquema mínimo mais efetivo para a maioria das medicações para tratamento da cistite bacteriana. O esquema tem
eficácia comparável ao de sete dias com menos efeitos colaterais e menor custo. O esquema de dose única pode ser adotado, mas tem taxa menor de cura e maior de recorrência.
Infecção urinária recorrente A recorrência da cistite pode se dar por reinfecção ou por persistência da bactéria. A reinfecção se dá por patógenos ou cepas diferentes e é o tipo de recorrência mais freqüente, responsável por 95% dessas; ocorre em pacientes com maior susceptibilidade à invasão tecidual ou com anormalidade que reduza a formação ou excreção da urina (exemplo: bexiga neurogênica) ou que facilite a introdução de patógenos no trato urinário (exemplo: fístula vesicovaginal). O tratamento visa à correção da anormalidade e, se essa não for possível, é indicada a profilaxia com antibiótico em baixa dose por tempo prolongado. A persistência bacteriana se dá pela reemergência da mesma bactéria e ocorre por cálculo infectado, prostatite crônica bacteriana, rim atrófico unilateral infectado, duplicação e ectopia ureteral, corpo estranho, divertículo uretral, rim esponja medular unilateral e outros que devem ser prontamente identificados e tratados.
Leitura Recomendada 1. Schapper Schappertt SM. Ambulatory Ambulatory care care visits to physicia physiciann offices, offices, hospital tal outpatient departments, and emergency departments. United States, 1997. Vital Health Stat 1999; 13 (143): I-IV, 1-39. 2. Lath Latham am RH, Running Running K, Stamm Stamm WE. Urinary Urinary tract tract infectio infections ns in Young adult women caused by Staphylococcus saprophyticus. JAMA . 1983; 250: 3036. 3. Stamm WE, WE, Counts Counts GW, GW, Running Running KR, e col. col. Diagnosis Diagnosis of of coliform infection in acutely dysuric women. N Engl J Méd. 1982; 307: 463. 4. Harb Harbord ord RG, RG, Gruenenberg Gruenenberg RN. RN. Treatmen Treatmentt of urin urinary ary tract infections with a single dose of amoxycillin, co-trimoxazole, or trimethoprim. Br Méd J. 1981; 238: 1301. 5. Christ W, Lehnert T, T, Ulbrich B: Specific Specific toxologic toxologic aspects to the quinolones. Rev Infect Dis. 1988; 10: 41.
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Seção I
Capítulo 3 Cistites de repetição Cláudio Luiz Martins Lima
Introdução
Ingestão hídrica
Faz parte dos mecanismos de defesa do aparelho O tratamento da infecção do trato urinário (ITU) tem seu alicerce no uso de antibióticos, tanto profi- urinário a presença de um fluxo urinário constante, láticos como curativos. No caso das cistites de repe- unidirecional e sob baixa pressão. A urina é armatição por reinfecção (variação do agente causal), diante zenada e eliminada pela bexiga sem que haja resíduo de uma aparente falha dos antibióticos, lança-se mão urinário pós-miccional. Uma ingesta significativa de de medidas não-farmacológicas na tentativa de eli- líquidos mantém esse processo e permite uma “lava ), impedindo que bactérias wash out minar os fatores predisponentes. Essas medidas gem” vesical ( wash penetrem na bexiga. Entretanto, a maioria dos antiassociadas aos antibióticos são desconsider desconsideradas adas por bióticos que atuam contra a ITU necessita de uma muitos autores e enfatizadas por outros que as utilizam concentração urinária suficiente para sua ação. Um independente se a ITU for de repetição ou não. Sua volume aumentado de urina diluiria a droga, impereal utilidade é, na maioria das vezes, de difícil avadindo sua atuação. liação. O problema é que alguns fatores predisponentes, como má higiene perineal, podem ser Higiene perineal e hábitos intestinais importantes para determinado indivíduo enquanto Como os uropatógenos são, na sua maioria, oriunque, para outro, não possuem qualquer significado. Muitas pessoas com péssimos hábitos de higiene dos da flora intestinal, uma higiene perineal adequada nunca tiveram ITU. Nas cistites de repetição, muitas é aconselhável na prevenção da ITU. A utilização de vezes, diante de um(a) paciente angustiado(a), somos líquidos, pomadas ou cremes antissépticos perineais induzidos a usar medidas que auxiliem os antibióticos. ant ibióticos. não se mostrou útil. Os trabalhos que mostram resultados favoráveis não avaliam as medidas higiênicas, talvez as verdadeiras responsáveis pelo sucesso, que acompanham a coloMedidas não-farmacológicas cação das substâncias perineais. O uso de duchas ou Como é aconselhado em qualquer falha de trata- banhos de assento devem ser eliminados pelo risco mento, uma revisão da história e exame físico são neces- de contaminação. Hábitos intestinais alterados (constipação intestinal, sários. Procurar erros no tratamento. Checar se o pacip aciente cumpriu a prescrição corretamente ou se houve diarréia) devem ser normalizados, pois aumentam a colonização de germes no períneo. algum problema de absorção da droga.
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Seção I Estrógenos
Mulheres na menopausa apresentam freqüentemente ITU e cistites de repetição. A estrogenoterapia de reposição é eficaz na restauração do trofismo vaginal, no restabelecimento da colonização pelos lactobacilos e elimina os uropatógenos. Espermicidas Espermic idas e tampões
Espermicidas encontrados nos diafragmas e os tampões vaginais propiciam as cistites de repetição por facilitarem a colonização de E. coli devido à eliminação de lactobacilos. Seu uso deve ser descontinuado. Atividade sexual
Em algumas mulheres, a atividade sexual é um fator de risco para cistites de repetição. Medidas como urinar antes e após as relações sexuais e o uso de antibióticos (nitrofurantoína,, sulfa, quinolonas, cefalexi (nitrofurantoína cefalexina) na) em dose única após reduzem significativamente os episódios de ITU.
Esquema de quimioprofilaxia A quimioprofilaxia visa diminuir a freqüência de cistites de repetição que ocorre principalmente em mulheres. Sua utilização reduz a reinfecção em 95% quando comparada ao placebo. O agente utilizado deve ter uma boa concentração urinária, ser efetivo contra uropatógenos localizados no intróito vaginal e nas fezes, bem como não induzir resistência bacteriana. Além disso, deve ter poucos paraefeitos e ter preço acessível. Os agentes agent es que mais se encaixam
nestes requisitos são: nitrofurantoína, sulfametoxazoltrimetoprima (SMX-TMP), cefalexina e as novas quinolonas. O uso de anti-sépticos urinários como o mandelato ou hipurato de metenamina e o ácido nalidíxico foram abandonados por terem menos eficácia que os antibióticos e por induzirem resistência mais rapidamente. Os mecanismos de ação diferem entre as drogas utilizadas. Enquanto o SMX-TMP erradica a flora aeróbica Gram-positivo Gram-positivo do intestino, a nitrofurantoína elimina as bactérias que penetram na urina. A cefalexina deve ser usada em doses baixas a fim de não criar resistência bacteriana. bacteriana. Ela e as fluoroquinolonas esterilizam a flora intestinal e vaginal. As fluoroquinolonas são caras e não devem ser utilizadas na gravidez. O tempo de utilização varia de dois a seis meses com a ingestão da droga à noite antes de dormir. As doses geralmente empregadas são: Nitr troofurantoína 100 mg SMX-TMP 400 mg + 80 mg Cefalexina 250 mg (ou menos) 200 mg Norfloxacina Em casos de cistites de repetição de baixa freqüência (dois episódios/ano), a paciente pode se automedicar com dose única de uma das drogas acima.
Leitura recomendada 1. Schaeffer Schaeffer AJ AJ. Infections Infections of of the urinary urinary tract In: In: Walsh Walsh PC et al 8th ed. Campbell’s Urology. Saunder 2002; 515-602. 2. Lenz LL. Infecção Infecção do do Trato Trato Urinário Urinário na Mulher Mulher.. In: Rubinstei Rubinsteinn I. Urologia Feminina 1999; 73-81. 3 . Ku ni nin CM Detection, Prevention and Management of Urinary Tract Tract Infection 4th ed 1987. 4. An Andr drio iole le V. V. Infecções do Trato urinário. 4th ed 1988.
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Seção I
Capítulo 4 Pielonefrite aguda Carlos Ary Vargas Souto
Introdução Pielonefrite aguda é uma síndrome clínica que consta de dor no flanco, febre maior que 38oC, náuseas ou vômitos. Ao exame físico, há dor à palpação e à punho-percussão lombar. A etiologia é a mesma das infecções urinárias baixas. Predomina a Escherichia coli de 70% a 95% dos casos, seguida de longe pelo Staphylococcus saprophyticus em cerca de 5%. Raramente aparecem outras enterobactérias como o Proteus , a Klebsiella e o enterococo.
Diagnóstico O exame comum de urina, usualmente, revela piúria (> 5 leucócitos) e hematúria h ematúria (> 3 hemácias por campo de 400 X). A coloração de Gram na bacterioscopia da urina ajuda a escolha do tratamento empírico. A urocultura do jato médio revela, em geral, mais de 100 mil bactérias/mL. Abaixo desse valor, eventualmente é possível tratar-se trat ar-se de contaminação. Toda via, o exame de um paciente com quadro clínico típico pode revelar pequeno número de bactérias. Neste contexto, o valor de mil bactérias/mL é significativo. Na cultura obtida por punção suprapúbica, qualquer número significa infecção. A hemocultura deve ser solicitada, pois existe risco de septicemia em alguns casos. O hemograma revela leucocitose com desvio à esquerda.
Uma ecografia deve ser realizada à procura de litíase, hidronefrose ou abscesso renal. Conforme o resultado do exame ultra-sonográfico, outros exames podem ser necessários, como os raios X simples de abdome, a cintilografia com DMSA/MAG3 e a tomografia computadorizada de abdome. A cintilografia renal com DMSA é particularmente útil na criança. A infecção impede a captação do radiomarcador pela célula tubular renal, resultando em áreas de baixa atividade ou falta de função. Se esta imagem de falta de captação for em forma de estrela, o quadro é compatível com pielonefrite aguda. Se a falha for focal, deve ser pielonefrite crônica. Este método é o mais sensível e precoce para o diagnóstico de pielonefrite aguda pediátrica. Assim, em crianças, devemos pedir o DMSA, como o primeiro exame de imagem. A pielonefrite pode ser simples ou complicada. A primeira responde rapidamente a antibióticos orais. A complicada tem uma evolução arrastada, requerendo tratamento mais agressivo. Pielonefrite aguda – diagnóstico EQU (exames físico, químico e do sedimento da função renal) Urocultura com antibiograma Hemograma Ecografia abdominal total Raios X simples do abdome Cintilografia renal com DMSA Tomografia computadorizada abdominal total
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Tratamento
rência bacteriana. bacteriana. Pode ocorrer uma forma grave de pielonefrite intersticial. intersticial. Não é rara a necrose papilar, e as papilas eliminadas obstruem o ureter. O tratamento empírico da pielonefrite aguda complicada, enquanto o exame bacteriológico ainda não está dispo nível, deve incluir drogas mais abrangentes capazes de combater organismos resistentes. Nesta situação, recomenda-se: Fluoroquinolonas Amoxicilina + clavulonato Ampicilina + sulbactan Aminoglicosídeos Cefalosporinas de 2ª ou 3ª geração Imipenem + cilastatina.
O tratamento deve ser iniciado logo após a coleta das amostras para cultura. A medicação de escolha para a pielonefrite não-complicada é a ciprofloxacina 500 mg de 12 em 12 horas por sete dias. Se for criança, mulher grávida ou mãe que está amamentando, é contraindicado o uso de quinolonas. As alternativas são aminopenicilinas (ampicilina ou amoxicilina mais) inibidor da betalactamase) ou uma cefalosporina de segunda ou terceira geração. Este último esquema é também recomendado se o Gram da urina inicial mostra bactérias Gram-positivo. O tratamento é modificado quando vem o teste de sensibilidade da urocultura. Uma série de fatores pode tornar a pielonefrite complicada: Pielonefrite aguda – tratamento gravidez, diabete, presença de cateteres, resíduo pósCiprofloxacina miccional, uropatia obstrutiva, refluxo vesicureteral, A minopen minopenicilinas icilinas (ampicilina ou amoxicilina derivação urinária, insuficiência renal e imunodeficiência imunodeficiência.. + inibidor da betalactamase) Aparecem então novas bactérias como Klebsiella , Aminoglicosídeos Pseudomonas , estafilococos e enterococos. Cefalosporinas de 2ª ou 3ª geração A pielonefrite pode aparecer durante a gravidez, Imipenem + cilastatina usualmente no último trimestre. Recomenda-se a cefalosporina de segunda ou terceira geração, aminoLeitura recomendada penicilina + inibidor da betalactamase ou aminoglicosídeo. Às cosídeo. Às vezes é preciso tratar a ureteroidronefrose 1. Sch Schaeffe aeffer, r, AJ. AJ. Infection Infectionss of the urinary urinary tract. In: Walsh Walsh,, PC com um cateter ureteral tipo duplo J que ficará in situ et al., Campbell’s Urology , Saunders – Philadelphia: 8 th ed. Elsivier Science, 2002, pp. 515-602. até o parto. 2. Naber, Nab er, KG KG et al. EAU EAU ideline ideliness for the manag managemen ementt of urin urinary ary A pielonefrite do diabético tem características próand male genital tract infections. Urinary Tract Infection prias. A Klebsiella é muito comum nestes pacientes. O (UTI) Working Group of the Health Care Office diabete leva a uma diminuição da resistência à infec(HCO) of the European Association of Urology (EAU). Eur Urol 2001 Nov; 40 (5): 576-88. ção. A glicosúria inibe a fagocitose e aumenta a ade-
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Capítulo 5 Infecção do trato urinário na gestação César Milton Marinelli Alexandre Oliveira Rodrigues
A infecção do trato urinário (ITU) é a infecção bacteriana mais comum da gestação. Graças às alterações fisiológicas decorrentes da gravidez (Tabela 1), as gestantes são mais suscetíveis a complicações e seqüelas graves decorrentes das ITU, com impacto importante na morbimortalidade materno-fetal no ciclo gravídico-puerperal. A bacteriúria assintomática é observada em cerca de 5% das gestantes, com taxas variando de 2,5% a 15%, sendo esta semelhante à incidência nas pacientes não-grávidas. Os agentes mais comumente associados são Escherichia coli, Staphylococcus coagulase-negativos e Citrobacter freundii . O aumento das taxas de bacteriúria está relacionado com o avanço da idade gestacional, idade materna avançada, baixo nível socioeconômico e
cultural, multiparidade, diabete melito, bexiga neurogênica e antecedente de ITU, de infecção genital, de abortamento e de infecção puerperal. Pielonefrite aguda é a complicação mais importante dos casos de bacteriúria, com taxas reportadas de 20% a 60% naqueles com bacteriúria não-tratada, sendo que 60% a 75% dos casos ocorrem no terceiro t erceiro trimestre e 5% desenvolvem choque séptico. Outras complicações maternas são o desenvolvimento de anemia e hipertensão gestacional, ITU pós-parto, pielonefrite crônica e insuficiência renal crônica. Em relação às complicações fetais, acredita-se que a bacteriúria é um fator predisponente para prematuridade e retardo do crescimento fetal intra-uterino, com conseqüente baixo peso ao nascer, promovendo assim aumento na morbimortalidade perinatal.
Tabela 1: Alterações fisiológicas durante a gestação
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Seção I Recomenda-se que testes de urocultura devam ser feitos no primeiro exame pré-natal, de preferência no primeiro trimestre. Se o resultado for negativo, novo exame deve ser realizado na 16 a semana de gestação. Na coleta de urina, é imprescindível rigoroso critério de antissepsia, entretanto a cateterizaçã cateterizaçãoo uretral deve ser evitada, pelo risco de contaminação ascendente da bexiga. Recomenda-se investigação do trato urinário, no período gestacional, somente na falha do primeiro curso de tratamento antibiótico e nos casos de infecções recorrentes recorrentes ou pielonefrite pielonefrite.. Bacteriúria assintomática raramente se resolve espontaneamente durante a gestação, sendo que o seu tratamento tem grande impacto na incidência de pielonefrite aguda, com incidência menor que 5% nas pacientes tratadas. O uso de antibióticos durante a gestação é muito peculiar. Medicamentos usados com segurança na prática clínica diária não devem ser usados nas gestantes, como cloranfenicol e sulfonamidas, além
de tetraciclinas, quinolonas e sulfas no primeiro trimestre. Recomenda-se que na escolha da terapia antimicrobiana deve ser respeitado o resultado da urocultura e do antibiograma, o estágio da gestação, os dados clínicos maternos (função renal e hepática, hipersensibilidade) e as características dos agentes antimicrobianos, com referência especialmente para a sua farmacocinética, toxicidade materna e fetal e o risco de teratogênese. A Tabela 2 lista os principais antibióticos e respectivas toxicidades se utilizados na gestação. A maioria dos autores demonstra preferência pelo tratamento antibiótico com amoxicilina, nitrofurantoína, cefalosporina ou penicilinas. Ainda é controversa, portanto não recomendada, a utilização de esquemas antibióticos de dose única ou de três dias, assim como o uso de quinolonas. antibioticoprofilaxia (com uso da metade da dose diária usual) deve ser reservada àquelas com falência no primeiro curso do tratamento, nos casos de infecções recorrentes e pielonefrite.
Tabela 2: Potencial toxicidade dos agentes antimicrobianos durante a gestação
Leitura recomendada 1. Schaeffer, AJ AJ.. Urinary tract infections infections during during pregnancy pregnancy.. In: Walsh, PC et al. Campbell’s Urology, Saunders. Philadelphia: 8th ed., Elsivier Science , 2002, 581-86. 2. Marin Marinelli elli,, CM; Rodrigues Rodrigues,, AO; Aragão Aragão,, AJ et al. Infecção do
Trato Urinário na gestação. Femina, 2002, 30 (5): 299-303. 3. Loughlin, Loughlin, KR. KR. Management Management of urologic urologic probl problems ems during during pregnancy. Urol, 1994, 44 (2): 159-169. 4. MacLe MacLean, an, AB. AB. Urinary Urinary infection infection in pregnan pregnancy cy.. Br J Urol , 1997, 80 (1): 10-13. 5. Patterson, TF; Andriole, Andriole, VT. VT. Bacteriuria in pregnancy pregnancy.. Infect. Dis. Clin. North Am , 1992, 19 (1): 149-54.
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Seção I
Capítulo 6 Infecção do trato urinário no idoso Antonio Carlos Pereira Martins Haylton Jorge Suaid
Introdução
Etiologia
A prevalência da bacteriúria aumenta com a idade, A Escherichia coli é a causa mais comum de infecção internações em clínicas ou hospitais e doenças asso- urinária em idosos da comunidade. Nos pacientes ciadas, podendo exceder 50% dos idosos (> 65 anos), internados aumenta a prevalência de Proteus , Klebsiella , sendo em algumas séries três vezes maior em mulheres Enterobacter , Serratia , Pseudomonas e enterococo. A que em homens. Estudos longitudinais mostram que importância do Staphylococcus saprophyticus é controa bacteriúria assintomática é muito mais comum que vertida. A infecção por agentes múltiplos é mais a revelada por estudos simples, simp les, e indicam que a maio- comum nos idosos. ria dos idosos terá episódios de bacteriúria no decorrer do tempo.
Diagnóstico
Fisiopatologia O aumento da suscetibilidade dos idosos à ITU (infecção do trato urinário) é de causa multifatorial. Alguns dos fatores apontados são: redução da imunidade celular, disfunção vesical neurogênica, hiperplasia prostática benigna, alterações da micro-estrutura do epitélio transicional e parede vesical, confusão mental ou demência, alteração da microflora perineal devido à incontinência fecal e urinária, aumento da incidência de cateterismo, redução das propriedades bactericidas da secreção prostática e mudanças do trofismo vaginal (com elevação do pH) e uretral em mulheres associadas à menopausa. A bacteriúria assintomática no idoso é mais freqüente naqueles que referem história pregressa de ITU.
A ITU no idoso nem sempre é evidente porque os sintomas urinários freqüentemente freqüentemente estão ausentes e doenças concomitantes podem mascarar ou mimetizar esta infecção. Mesmo infecções graves do trato urinário superior nem sempre se associam à febre ou à leucocitose. Nada obstante, mau odor ou turbidez da urina levantam suspeita de infecção. Entretanto, urina turva ou com depósito, às vezes de aspecto leitoso ou purulento, associada a pH urinário alcalino (dieta rica em vegetais), sugere precipitação de sais de fosfato e não, infecção. No exame físico dos homens com suspeita de bacteriúria, ênfase especial deve ser dada à palpação abdominal e ao toque retal para avaliação prostática. Em mulheres, deve-se observar o trofismo vaginal e a existência eventual de prolapso da bexiga (cistocele), reto (retocele) ou útero.
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O diagnóstico é firmado por meio da cultura de urina (jato médio) com contagem > 100 mil colônias/mL. Piúria isolada de jato médio (> 10 mil leucócitos/mL)) não é um bom indicador de infecção, leucócitos/mL pois há trabalhos mostrando que nestas n estas circunstâncias a urocultura é negativa em mais de 60% dos idosos. Mas a ausência de piúria é um bom indicador de ausência de bacteriúria. Como anormalidades do trato urinário predispõem ou favorecem complicações da bacteriúria, recomendase avaliação urológica criteriosa. Geralmente esta avaliação começa com os raios X simples de abdome e ultra-som transabdominal para visualização dos rins, bexiga e próstata. Exames adicionais podem estar indicados dependendo das circunstâncias.
Bacteriúria e morbidade O significado da bacteriúria assintomática não é claro, uma vez que não se demonstrou até agora causar insuficiência renal, ou piorar essa disfunção se preexistente. A infecção urinária é a segunda causa mais freqüente de febre em idosos e lidera as causas de bacteriemia por germes Gram-negativo. Alguns estudos epidemiológicos sugerem que a bacteriúria assintomática se associa a um aumento da incidência de mortalidade, mas não há comprovação da relação causal. Pelo contrário, estudos randômicos de mulheres com bacteriúria, sujeitas ou não ao tratamento, não mostraram diferença de sobrevida após um ano de seguimento, mas o tratamento se associou a uma proporção significativa de efeitos adversos dos antibióticos.
Tratamento Na maior parte dos casos, a bacteriúria no idoso é assintomática, o tratamento não reduz a incidência de reinfecções subseqüentes e muitas das infecções assintomáticas se resolvem espontaneamente. Devido a estes fatos, associados à preocupação com os efeitos colaterais das drogas, ao favorecimento da emergência de cepas bacterianas resistentes e à relação custo/benefício duvidosa, chegou-se ao consenso de que a bacteriúria assintomática no idoso não deve ser tratada. O tratamento da bacteriúria assintomática em busca da melhora da continência urinária em pacientes incontinentes não encontra apoio científico consistente. Pacientes com bacteriúria assintomática associada à urina com pH alcalino e cultura positiva para bacP. mirabilis térias produtoras de urease ( P. ) devem ser tratados preventivamente contra a formação de cálculos de estruvita. Mulheres em menopausa podem se beneficiar da reposição hormonal ao optar por selos dérmicos de estradiol ou estradiol/progestageno com benefícios não apenas para o trofismo uretral e vaginal (combatendo assim um fator de risco para a bacteriúria assintomática), mas também para os sintomas decorrentes do hipogonadismo. A reposição hormonal pode se associar ao aumento da incidência de câncer de mama, à hipertensão arterial e a acidentes vasculares. Já as infecções sintomáticas ou associadas a complicações devem ser tratadas rotineiramente com antimicrobianos e ações urológicas apropriadas em casos de alterações do trato urinário. A seleção do antimicrobiano e da dosagem deve levar em conta a sensibilidade bacteriana, as deficiências metabólicas ou funcionais comuns à idade, assim como as interações medicamentosas.
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Leitura recomendada 1. Fowler Fowler Jr. JE. Urinary Urinary tract infecti infection on and inflammat inflammation ion.. Ed. Year Book Medical Publishers Inc., Chicago, 1989, 339. 2. Schae Schaeffer ffer AJ. AJ. Urinary tract infection infections. s. In: Gillenwat Gillenwater er JY, JY, Grayhack JT, Howards SS, Duckett JW. Adult and Pediatric Urology. 3 rd Ed. Mosby, Saint Louis, 1996, pp. 289.
3. McCue, JD JD.. Gram-negative Gram-negative bacillary bacillary bacteremia bacteremia in the elderly: Incidence, ecology, etiology, and mortality. J Am Geriatr Soc., 1987, 35: 213. 4. Nico Nicolle lle LE, Mayhew Mayhew WJ, Bryan Bryan L. Prospectiv Prospective, e, randomize randomizedd comparison of therapy anssd no therapy for asymptomatic bacteriuria in institutionalized elderly women. Am j Med., 1987, 83: 27.
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Capítulo 7 Infecção do trato urinário na criança José Carnevale Eric Roger Wroclawski
A infecção do trato urinário (ITU) na criança apresenta características próprias. É a infecção sistêmica mais comum em crianças com menos de 2 anos de idade.
a) grave - febre alta e ≥ 39oC, vômito, desidratação
e queda do estado geral, não se recomenda tratamento por via oral; b) simples - febrícula, bom estado geral e sintomas de ITU, passível de tratamento por via oral.
Epidemiologia
A ITU responde por 13,6% dos quadros febris Diagnóstico em neonatos. Prevalece em meninos na proporção de 3,6:1 em relação às meninas no primeiro ano de Deve-se pensar em ITU frente a uma criança com vida. Este quadro se inverte inv erte e passa a ser quatro vezes febre de origem indeterminada. A urocultura define a mais comum em meninas após os 2 anos de idade. infecção e orienta o tratamento. A coleta deve ser feita Na idade escolar, 5% das meninas e 0,5% dos me- após antissepsia da genitália, a partir do jato urinário ninos apresentam algum episódio de ITU. Em nosso médio nas crianças com controle esfincteriano e por meio, 5% das crianças atendidas em serviços de cateterismo vesical ou punção suprapúbica nas demais demais.. pronto atendimento é em decorrência da ITU. A coleta por meio de bolsa coletora acompanha-se de elevado número de falsos positivos e somente deve ser feita com trocas freqüentes de coletor.
Quadro clínico
Varia com o grupo etário. Em neonatos, febre é o único sinal às vezes. A doença é sistêmica e se apresenta como um quadro séptico. São manifestações inespecíficas comuns em neonatos: vômito, diarréia, irritabilidade, anemia, convulsão, dificuldade de ganho de peso e icterícia – por toxicidade hepática ou efeito hemolítico de algumas espécies de Escherichia Escherichia coli coli . Crianças em fase de controle esfincteriano apresentam: febrícula, polaciúria, disúria, urgência miccional associada à incontinência urinária, constipação e, por vezes, encoprese. Do ponto de vista prático, a infecção pode ser classificada em:
Critério de positividad positividade e
No jato urinário médio, presença de 100 mil unidades formadoras de colônia/mL (UFC/mL); no cateterismo vesical, acima de mil a 5 mil UFC/mL e, na punção vesical, presença de 1 UFC/mL. Escherichia coli coli é o microorganismo mais freqüen A Escherichia temente envolvido (de 70% a 80%) e os Staphilococcus e enterococos são os microorganismos Gram-positivo mais prevalentes prevalentes.. Características próprias
Nas diferentes idades, observa-se peculiaridades – nos neonatos a infecção apresenta maior morbidade 19
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nos pacientes masculinos e, com freqüência, associase a malformações congênitas. As aderências labiais e o prepúcio fechado são fatores predisponentes à ITU ITU.. A constipação intestinal associa-se à disfunção vesical e conseqüente ITU. A bacteriúria assintomática é prevalente em meninas em idade escolar. Investigação por imagem
A investigação é altamente recomendável em todas as crianças abaixo de 2 anos de idade independente do sexo, e em meninos em qualquer idade (ver fluxograma). Figura 1: US Esquerda - Dilatação pielo-calicial com cortical preservada; Direita - bexiga com espessura da parede normal
Figura 2: US - Resíduo pós-miccional - Espessura da parede vesical de 5mm
Ultra-som (US)
Avalia a dimensão dos rins e a espessura da cortical renal, identifica possível dilatação do sistema coletor, da pelve (diâmetro AP) e do ureter. Detecta anomalias vesicais, a capacidade vesical, o resíduo pós-miccional e a espessura da parede vesical – se maior que 4 mm, sugere disfunção vesical. É um exame operador dependente (Fotos 1 e 2).
Figura 3: CUM - Refluxo vesicureteral bilateral grau V
Cistouretrografia Cistouretrog rafia miccional (CUM)
Estudo radioisotópico renal
Investiga o refluxo vesicoureteral e anomalias infra vesicais. É indicada após o sétimo dia de tratamento, com urina estéril e ainda em vigência de tratamento terapêutico (Fotos 3 e 4).
a) DMSA: este radioisótopo se fixa na
membrana basal das células do túbulo proximal renal e permite a determinação da massa renal, a visibilidade de cicatriz(es) e de áreas de hipocaptação-
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fotopênicas. Apresenta 100% de especificidade e 80% de sensitividade, além de fornecer com segurança dados sobre a integridade do parênquima renal (Foto 5); b) DTPA-MAG3: por ser de eliminação renal rápida, mede a função glomerular de cada rim em separado e global, e indica o eventual local de obstrução do fluxo urinário, quando houver (Foto 6). Urografia excretora (UGE)
Ainda é uma ferramenta útil, porém subjetiva, na avaliação morfológica e funcional do trato urinário superior. Urodinâmica
Figura 4: CUM - Ureterocele bilateral causando obstrução ao esvaziamento vesical
Quando criteriosamente indicada, contribui para o diagnóstico e tratamento de casos de disfunção miccional neuropática ou não-neuropática não-neuropática.. A avaliação conjunta do fluxo urinário e da atividade da musculatura do assoalho perineal por meio de eletrodo de superfície, associada às informações do ultra-som como capacidade vesical, vesical, resíduo pósmiccional e espessura da parede vesical, constitui método indireto e não-invasivo de avaliação da dinâmica miccional (Foto 7).
Tratamento Objetivo
Tratar o surto agudo, prevenir infecções recorrentes e lesões renais, além de corrigir os hábitos miccional e intestinal.
Recém-nascidos e neonatos
Figura 5: DMSA - Rim esquerdo com menor dimensão e hipocaptante
Princípios gerais e antibioticoterapia parenteral com possível hospitalização em função do grau de comprometimento do estado geral. Opções e doses Cefalosporinas de 3ª geração - 50 a 100 mg/kg/dia; Aminoglicosídeos - 7,5 a 15 mg/kg/dia; Amoxicilina/Clavulinato - 60 a 100 mg/kg/dia; Duração do antibiótico - 10 a 14 dias;
Crianças acima de 2 anos de idade Princípios gerais e antibioticoterapia por via oral, exceto se houver vômitos e queda do estado geral.
Figura 6: MAG3 - Curva de excreção normal bilateral
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Seção I uma criança hígida e assintomática não há necessidade de tratamento. A maioria dos casos evolui com cura espontânea. Disfunção da micção
A correção se faz com treinamento miccionalAs drogas utilizadas são: a oxibutinina na dose de 0,4 mg/kg/dia e, quando indicado, o bloqueador alfa-adrenérgico na dose 0,5 mg a 2 mg/dia, dependendo da idade. biofeedback.
Constipação intestinal Figura 7: Estudo urodinâmico - Instabilidade vesical - pressões elevadas durante a fase de enchimento
O tratamento se faz com dieta laxativa e, quando necessário, usa-se lactulose 5 a 15 mL uma ou duas vezes ao dia. O sucesso do tratamento da infecção do trato urinário na infância requer conscientização, Opções e doses motivação familiar e aderência a uma conduta medicaCefalosporinas de 1a e 2a geração - 50 a 100 mentosa e comportamental com higiene adequada, mg/kg/dia; ingesta hídrica satisfatória e hábitos intestinais e Amoxicilina/ácido clavulônico - 60 a 100 mg/ miccionais regulares regulares.. kg/dia; Azitromicina - 50 a 100 mg/kg/dia; Sulfametoxazol + trimetropima - 40 mg/kg/dia Leitura recomendada + 6 mg/kg/dia; 1. Amer American ican Academ Academyy of Pediatric Pediatricss - Committee Committee on Qualit Quality y Nitrofurantoina - 6 a 7,5 mg/kg/dia; Improvement. Practice Parameter: The diagnosis, treatment and Duração do antibiótico - 14 dias; evaluation of the initial urinary tract infection in febrile infants Profilaxia - cefalosporinas de primeira e segunda and young children. Pediatrics, 1999, 103 (4): 843-52. geração ou amoxicilina/ácido clavulônico ou 2. Kass EJ, EJ, Kernen KM, Carey Carey JM. Pediat Pediatric ric urinary urinary tract tract sulfametoxazol sulfametoxa zol + trimetropima ou ácido nalidíinfection and the necessity of complete urological imaging. BJU Int., 2000, 86 (1): 94-96. xico ou nitrofurantoína - um terço da dose teraRushton,, HG., HG., Pohl, Pohl, HG. HG. Urinary tract infections infections in children children.. pêutica uma ou duas vezes ao dia, por período 3. Rushton In Belman, HB; King, LR; Kramer, SA. Clinical Pediatric variável. Levar em conta as malformações Urology. 4 th ed. London, Martin Dunitz Ltd, 2002, 261-329. subjacentes. 4. Toporo oporovski, vski, J.J. Infecção Infecção do Trato Trato Urinário Urinário.. Nefrologia Bacteriúria assintomática
Não há consenso sobre a necessidade ou não de tratamento antibacteriano. Entendemos que em
Urologia Clínica . Sarvier, 1998, 386-95 5. Wenne ennerstrum, rstrum, M; M; Hansson, Hansson, S; Jodal Jodal,, U; Sixt, R; Stoklan Stokland, d, E. Renal function 16 to 26 years after the first urinary tract infection in childhood. Arch. Pediatr. Adolesc. Med., 2000, 154 (4): 339-45.
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Seção I
Capítulo 8 Cistite intersticial Cássio Luís Zanettini Riccetto Paulo César Rodrigues Palma
Conceito
embora úteis para protocolos de pesquisa, se aplicam a apenas 30% dos pacientes na prática clínica É uma síndrome clínica de natureza multifatorial, diária. O achado mais sugestivo no exame físico é de início insidioso e de caráter progressivo, com qua- a palpação dolorosa da região do trígono (parede dro clínico complexo, no qual predominam polaciúria anterior da vagina) durante o toque vaginal, em (incluindo noctúria), urgência e dor pélvica ou perineal. oposição à palpação dolorosa da uretra, que sugere uretrite inespecífica.
Patogênese Considera-se que a influência de vários fatores, com predomínio da disfunção epitelial, que causaria alteração da barreira hematurinária, permitindo que pequenas moléculas e íons (em particular o potássio) contidos na urina se difundam para o interstício da parede vesical. Os íons difundidos induziriam a despolarização dos nervos sensitivos da bexiga, produzindo os sintomas. Outras teorias incluem a inflamatória, vasculogênica e deficiência da camada de glicoaminoglicanas que reveste o urotélio.
Diagnóstico É clínico e de exclusão, podendo ser úteis exames complementares como o teste do potássio, a avaliação urodinâmica e a cistoscopia. Deve-se excluir cistite bacteriana, medicamentosa, uretrites, carcinoma vesical in situ , bexiga hiperativa e obstrução infravesical. Avaliação clínica
Para fins de pesquisa, o Instituto Nacional de Saúde norte-americano criou critérios (Tabela 1) que,
Teste do potássio
A concentração média de potássio na urina é de 75 mEq/L. Na presença de disfunção epitelial, esta concentração não apenas é letal para as células, mas também é suficiente para despolariza despolarizarr as terminações nervosas sensitivas da bexiga, produzindo urgência e dor. O teste é realizado por meio da instilação inicial inici al de 45 mL de água destilada na bexiga, aguardandose, a seguir, de três a cinco minutos. A instilação de água não deve ser dolorosa. A seguir, após esvaziamento vesical, instila-se 20 mEq de cloreto de potássio diluído em 10 mL de água destilada. O teste é considerado positivo caso a paciente refira sintomas semelhantes aos habituais e identifica a presença de disfunção epitelial. Avaliação urodinâmica
A cistometria normal praticamente exclui o diagnóstico. O achado característico é a urgência sensitiva que, em geral, ocorre antes da infusão de 150 mL de solução fisiológica. A capacidade cistométrica máxima encontra-se reduzida em decorrência da hipersensibilidade vesical. 23
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Guia Prático de Urologia Tabela 1: Cistite intersticial: critérios diagnósticos
National Institute Institute of Health (EUA). (EUA).
Cistoscopia e biópsia vesical
Devem ser feitas sob anestesia. A presença p resença da úlcera de Hunner, embora pouco freqüente, é patognomônico. O surgimento de glomerulações (hemorragia petequial difusa da mucosa vesical) após a hidrodistensão é muito freqüente e sugestivo de cistite intersticial. A hidrodistensão é realizada com uma coluna de 80 cm de água de solução fisiológica por cerca de 15 minutos. A maioria das portadoras de cistite intersticial apresenta remissão temporária dos sintomas após a hidrodistensão. Durante a cistoscopia realiza-se, também, a biópsia vesical, para descartar carcinoma in situ vesical. A presença de mastócitos no material da biópsia é sugestiva de cistite intersticial, porém a ausência não exclui o seu diagnóstico.
Tratamento É empírico, com três tipos de abordagem terapêutica, e deverá ser individualizado (Figura 1). O início e a interrupção do tratamento devem ser considerados de forma particular, bem como a associação de duas ou mais modalidades de tratamento para a mesma paciente. Drogas neurotrópicas
Incluem os antidepressivos, anti-histamínicos, anticolinérgicos e a l-arginina (Tabela 2). Os antide-
pressivos (amitriptilina, fluoxetina, sertalina) são drogas extremamente úteis no tratamento, trata mento, quer como monoterapia, quer como tratamento adjuvante, e o médico deve ser muito claro e assertivo ao prescrever tais drogas, desfazendo preconceitos que acompanham estas pacientes. O anti-histamínico mais empregado é o hidroxizine que, além de evitar a degranulação dos mastócitos, possui propriedades sedativas e anestésicas, causando, entretanto, sonolência e aumento do apetite, que desaparecem no decorrer do tratamento, em virtude da taquifilaxia. O emprego de anticolinérgicos (oxibutinina e tolterodina) tem por finalidade aumentar a capacidade vesical, sendo úteis quando predominam a urgência e a polaciúria polaciúria.. A L-arginina determinaria relaxamento relaxamento da musculatura vesical por meio do aumento da produção de ácido nítrico. Por ser atóxica, pode ser recomendada isoladamente ou em associação com outras drogas. Técnicas citodestrutiv citodestrutivas as
Visam destruir o epitélio transicional, levando à regeneração de toda a superfície vesical e remissão temporária dos sintomas. Incluem: instilação vesical de DMSO (dimetil-sulfóxido) a 50% por quatro semanas; hidrodistensão vesical com solução fisiológica de NaCl 0,9% e BCG, que foi proposto mais recentemente. Um novo ciclo de tratamento pode ser repetido quando os sintomas reaparecerem. 24
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Figura 1: Cistite instersticial: algoritmo diagnóstico e terapêutico. K+: potássio; DMSO: dimetil-sulfóxido; PPS: pentosan-polisulfato Tabela 2: Cistite intersticial - tratamento clínico
intravesical de heparina, inclusive em nível domiciliar e prolongadamente, além do pentosan polisulfato, que São representadas por substâncias que, adminis- é administrado por via oral. Os alcalinizantes urinários, trados por via intravesical ou por via oral, restabelecem representados pelo policitrato de potássio, diminuem a camada de muco que recobre o urotélio. Assim, são os sintomas irritativos e promovem efeito quelante particularmente indicadas quando se verifica disfunção sobre o potássio urinário, que pode desempenhar epitelial (teste do K positivo), positivo) , e incluem a administração importante papel na fisiopatologia da síndrome. Drogas citoprotetoras
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Seção I Tratamento ratamento comportamental
Pode ser empregado de forma adjuvante, para tratamento da polaciúria. As técnicas empregadas incluem o treinamento vesical, a eletroestimulação endovaginal e técnicas de biofeedback. Tratamento cirúrgico
Corresponde a tratamento de exceção e deve ser empregado após criteriosa avaliação clínica e psicológica, quando todas as alternativas descritas anteriormente falharam. Os procedimentos cirúrgicos incluem as cistoplastias supratrigonais e as derivações urinárias.
Recomendações O médico-assistente deve deixar explícito para a paciente que a cistite intersticial é uma síndrome de evolução crônica na qual, geralmente, nenhum dos
tratamentos disponíveis será curativo. Desta forma, a relação médico-paciente será fortalecida, evitando a constante troca de médico e o eterno recomeçar do tratamento. Franqueza, atenção e orientação realista são fundamentais, não apenas à aderência da paciente ao tratamento, mas também para se obter a credibilidade necessária para conduzir essas pacientes fragilizadas emocionalmente pela doença.
Leitura recomendada 1. Hanno Hanno,, P; P Pontari, ontari, M. The interstitial cystitis syndrome syndrome.. Urology Int. 1995, 2: 7-9. 2. Parson Parsons, s, CL; Lilly Lilly,, JD; Stein, Stein, P. P. Epithelial Epithelial dysfunction dysfunction in nonnonbacterial cystitis (interstitial cystitis). J Urol, 1991, 145: 732-5. 3. Hann Hanno, o, P; Levin, Levin, RM; Monson Monson,, FC; Teuche Teucher, r, C; Zhou, Zhou, ZZ; Ruggieri, M; Whitmore, K; Wein, AJ. AJ. Diagnosis of interstitial cystitis. J Urol, 1990, 143: 278-81. 4. Pars Parsons, ons, CL; CL; Koprowski, Koprowski, P. P. Interstitial Interstitial cystitis: cystitis: successful successful management by a pattern of increasing urinary voiding interval. Urology, 1991, 37: 207-12.
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Seção I
Capítulo 9 Prostatite I – aspectos gerais Wagner Eduardo Matheus
Introdução
Categoria IIIA - (SDPC inflamatória)
Presença de leucócitos no esperma, na secreção A prostatite crônica é uma afecção que acomete de prostática após expressão (SPE) ou na amostra de 10% a 14% dos homens de todas as idades e raças. Existe urina após massagem prostática (VB3). uma estimativa de que 50% dos homens desenvolverão sintomas de prostatite em algum momento da sua vida.
Classificação
Tabela 1: Classificação e definição das categorias de prostatites (NIH)
As prostatites podem ser classificadas conforme a presença ou não de bactérias, recorrência e alterações detectadas em exames laboratoriais (Tabela 1). Categoria I - (prostatite bacteriana aguda)
É uma infecção prostática, caracterizada por quadro agudo de dores na região suprapúbica, flancos e períneo, acompanhado de febre, calafrios e sintomas urinários irritativos, principalmente disúria, polaciúria e urgência miccional. Categoria II - (prostatite bacteriana crônica)
É uma infecção recorrente da próstata que pode evoluir de um quadro agudo. Apresenta sintomatologia variável de dor perineal sem febre e calafrios, acompanhada de sintomas urinários irritativos, menos importantes do que na forma aguda. Categoria III - (prostati (prostatite te crônica abacteriana ou síndrome da dor pélvica crônica [SDPC])
Ocorre quando não existe a comprovação de infecção bacteriana.
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Categoria IIIB - (SDPC não-inflamatória)
Tabela 2: Sintomas clínicos
Ausência de leucócitos no esperma, SPE e VB3. Categoria IV - (prostatite inflamatória assintomática)
Em pacientes assintomáticos, com presença de leucócitos na secreção prostática ou nos tecidos prostáticos. A maior parte dos pacientes com prostatite se encontra na categoria III (prostatite crônica não-bacteriana), que é a forma clínica de maior dificuldade de tratamento, quando comparada às prostatites bacterianas. As bactérias mais freqüentes causadoras de prostatite são as Gram-negativo, Gram-nega tivo, semelhantes àquelas que causam infecção do trato urinário: Escherichia coli, Proteus, Klebsiella, Enterobacter, Pseudomonas e Serratia .
“The National Institutes of Health Chronic Prostatitis Symptom Index (NIH-CPSI)”
Tornou-se obrigatória a realização de história clí Tornou-se nica, exame físico que deve incluir o toque t oque retal, desde que o paciente não esteja em vigência de prostatite Os sintomas clínicos mais importantes, incluídos no aguda, e também exame de urina I e urocultura. Ouíndice de sintomas de prostatite, estão relacionados à dor, tros exames complementares podem ser recomenalterações na micção e qualidade de vida (Tabela 2). dados ou opcionais, conforme a avaliação individual Avaliação da prostatite crônica ou SDPC de cada caso (Tabela 3). As amostras de urina seqüenciais (teste de Mears Ainda existe muita controvérsia com relação aos Stamey ou pré e pós-massagem prostática) são solicimelhores métodos de diagnóstico e avaliação das tadas por poucos urologistas. No entanto, em alguns prostatites.. Em 2000, durante o 3º Encontro Interna- casos de difícil tratamento, podem ser de grande prostatites cional de Prostatites, foram estabelecidos alguns utilidade, pois permitem a diferenciação e localização dos processos inflamatórios ou infecciosos. critérios para avaliação desses pacientes. Quadro clínico da prostatite crônica ou SDPC
Tabela 3: Graus de recomendação para avaliação de prostatite crônica
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Leitura recomendada
Diagnósticos diferenciais Os diagnósticos diferenciais mais importantes das prostatites são: hiperplasia benigna da próstata, adenocarcinoma da próstata, carcinoma urotelial de bexiga, infecção do trato urinário, orquiepididimites, orquiepididimites, uretrites e as doenças anais: hemorróidas, abcessos perianais, fístulas e fissuras.
1. Schaeffer Schaeffer AJ. AJ. Classification Classification (Traditi (Traditional onal and National National Institutes Institutes of Health) and demographics of prostatitis. Urology, 60 (suppl. 6A): 5-7, 2002. 2. Litwin MS. A review of the develo development pment and validatio validationn of the National Institutes of Health Chronic Prostatitis Symptom Index. Urology, 60 (suppl. 6A): 14-9, 2002. 3. Nickel JC. Clinical Clinical evaluatio evaluationn of the man man with chronic chronic prostatitis/ Chronic pelvic pain syndrome. Urology, 60 (suppl. 6A): 20-3, 2002. 4. Wei eiss ss RE, Fa Fair ir WR WR.. Prostatitis. Management of prostate diseases, Second edition: 19-32,1997.
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Capítulo 10 Prostatite II – tratamento Eduardo César C. de Gouvêa e Silva Antonio Corrêa Lopes Neto
Tratamento O tratamento das prostatites varia de acordo com a classificação. Categoria I - (prostatite bacteriana aguda)
Existe maior risco de septicemia e raramente ocorre resolução espontânea. Embora represente um quadro mais grave, apresenta maior índice de cura que os outros tipos. Muitos pacientes requerem internação. Analgésicos,, antitérmicos, hidratação e repouso devem Analgésicos ser instituídos. Se o paciente apresentar retenção urinária, deve-se ponderar entre o esvaziamento vesical através de cateterismo uretral ou de cistostomia suprapúbica. Laxativos podem ser administrados a fim de evitar esforço evacuatório e compressão prostática. Acredita-se que o processo inflamatório agudo permita a difusão de drogas que normalmente nor malmente não tenham penetração na próstata. Nos casos mais graves, três são as alternativas sugeridas: associação de aminoglicosídeo com ampicilina com o objetivo de combater também enterococos; cefalosporinas de terceira geração; e fluoroquinolonas endovenosas. Nos casos menos graves, o tratamento ambulatorial com medicação via oral com fluoroquinolonas é recomendado. Embora duas semanas de tratamento pareçam ser adequadas, prefere-se quatro semanas, para que o quadro infeccioso seja completamente erradicado. Caso o paciente não melhore clinicamente após 48
horas de antibioticoterapia de largo espectro, devese suspeitar de abscesso prostático, sendo adequada a realização de ultra-sonografia, tomografia computadorizada pélvica ou ressonância. Confirmando-se tal diagnóstico e esgotadas todas as formas de tratamento clínico, deve-se considerar a realização de drenagem por via transperineal, transuretral ou transretal em função da localização do abscesso. Categoria II - (prostatite bacteriana crônica)
Também há boas respostas aos antimicrobianos, porém o tratamento deve ser mais prolongado para erradicar a infecção. O antibiótico ideal deve ser lipossolúvel. As fluoroquinolonas são os antimicrobianos de escolha. Em casos de intolerância às quinolonas, pode-se utilizar tetraciclinas ou trimetoprimsulfametoxazol, porém com resultados inferiores. O tempo de tratamento recomendado varia de quatro a 12 semanas. Até o momento, não existe trabalho na literatura comparando terapia antimicrobiana com placebo no tratamento da prostatite crônica bacteriana. Categoria III - (prostatite crônica abacteriana ou síndrome da dor pélvica crônica [SDPC])
As prostatites não-bacterianas raramente apresentam complicações, e a resolução espontânea ocorre com certa freqüência, apesar de não conhecermos a etiologia e o tratamento ser empírico. Neste caso é fundamental separar os pacientes com sinais de inflamação prostática (categoria IIIA) daqueles sem sinais
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Seção I inflamatórios (categoria IIIB) e cuja sintomatologia Tabela 1: Classificação e definição das categorias de prostatites (NIH) extraprostática deve ser investigada.
Categoria IIIA - (SDPC inflamatória ) Estes pacientes devem receber um ciclo de quatro a seis semanas de antibioticoterapia com fluoroquinolonas ou TMP-SMX, já que 40% deles se beneficiam deste tratamento. Outro ciclo não deve ser instituído caso não ocorra melhora. Não recomendamos massagem prostática. Alfabloqueadores ou antiinflamatórios podem ser utilizados. O uso empírico de calor local tem mostrado alguns resultados.
Categoria IIIB - (SDPC não-Inflamatória ) Analgésicos, alfabloqueadores, relaxantes musculares e antidepressivos tricíclicos devem ser utilizados. O uso de alfabloqueadores para tratamento desta categoria pareceu ser efetivo, com 76% apresentando melhora clínica. Biofeedback e fisioterapia para assoalho pélvico parecem auxiliar no tratamento. Categoria IV - (prostatite inflamatória assintomática)
Não requer tratamento, exceto em pacientes que estejam sendo investigados por infertilidade ou com PSA elevado e deseja-se excluir a possibilidade de adenocarcinoma de próstata. Nestes casos, antibioticoterapia empírica e antiinflamatórios podem ser utilizados.
Leitura recomendada 1. Nickel JC. Prostatitis Prostatitis:: evo evolving lving managemen managementt strategies. strategies. Urol Clin North Am 1999; 26(4): 737-51. 2. Nicke Nickell JC. Prostatitis Prostatitis and related related condition conditions. s. In: Campbell Campbell’s ’s Urology, 8th ed. Philadelphia, WD Saunders; 2002. P. 603-26. 3. Sch Schaeffe aefferr AJ. AJ. Diagnosis Diagnosis and and Management Management of Pros Prostatiti tatitis. s. JBU 2000; 26(2): 122-31.
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Capítulo 11 Uretrites Sylvio Quadros Mercês Júnior
As uretrites representa representam m processos inflamatórios da uretra, de natureza bacteriana, fúngica, viral ou traumática.
Classificação Por finalidade didática, pode-se adotar a seguinte classificação (Italvar Rios, Cartagena, Colômbia – 1993): Gonocócicas; Chlamydianas ; Por germes conhecidos; Por germes desconhecidos.
Tratamento Tianfenicol granulado 2,5 g, VO em dose única. Repete-se a posologia com 24 horas; Ceftriaxona 250 mg, IM; Ciprofloxacino 500 mg, VO em dose única; Ofloxacino 400 mg, VO em dose única; Azitromicina 1000 mg VO dose única.
Uretrites chlamydianas
Definição Processo infeccioso e inflamatório inflamató rio da uretra causado pela Chlamydia tracomatis .
Uretrites gonocócicas
Definição Processo infeccioso e inflamatório da uretra causado pelo gonococo.
Quadro clínico Período de incubação médio maior que sete a dez dias. Praticamente assintomática no começo, posteriormente nota-se o surgimento de um fluxo uretral discreto e mucóide, persistente e mais evidente pela manhã.
Quadro clínico Período de incubação curto, média de três a cinco dias. Início dos sintomas com prurido uretral distal e, posteriormente, fluxo purulento quase sempre espesso e abundante.
Laboratório
Laboratório
Gram da secreção - presença de diplococos Gramnegativo intracelulares, reniformes, dispostos aos pares; Cultura de Thayer-Martin - específica, deve ser solicitada em casos de evolução clínica duvidosa e “arrastada”.
Imunofluorescência direta para Chlamydia tracomatis realizada a partir do raspado de mucosa do meato uretral, estendido até a fossa navicular (padrão ouro); Elisa - análise sérica: baixa especificidade, sobretudo quanto à localização da Chlamydia ; PCR e LCR: custo elevadíssimo, além da demora do resultado.
Observação Se o esfregaço uretral de um paciente com sintomas de uretrite tiver quatro ou cinco PMN/campo,
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sem diplococos Gram-negativo intracelulares aos pares, ou se houver mais de 20 leucócitos no sedimento do primeiro jato miccional, está justificado o tratamento para uretrite chlamydiana (nesse caso, também tamb ém chamada de uretrite não-gonocócica).
Tratamento
Staphylococcus sp
Fenoxibenzil penicilina (Pen-V oral) 500 mil UI, VO a cada seis horas por dez dias; Psicoterapia (coadjuvante).
Trichomonas vaginalis
Tinidazol 150 mg, VO a cada 12 horas por cinco dias; Nimorazol 250 mg, VO a cada 12 horas por cinco dias; Ornidazol 1,5 g, VO em dose única ao deitar; Secnidazol 2 g, VO em dose única ao deitar.
Azitromicina 2 g, VO em uma única tomada; Doxiciclina 100 mg, a cada 12 horas VO por 15 dias; Tianfenicol 500 mg, a cada 8 horas VO por dez dias; Cloridrato de tetraciclina 500 mg, a cada seis horas VO por dez dias.
Candida albicans
Uretrites por germes conhecidos
Uretrites por germes desconhecidos
Definição Processos inflamatórios ou infecciosos da uretra nos quais se define a ausência do gonococo ou da Chlamydia , porém com a identificação de um ou mais dos microrganismos abaixo relacionados: Trichomonas vaginalis; Ureaplasma urealyticum; Mycoplasma hominis; Staphylococcus sp; Candida albicans.
Definição Processos inflamatórios da uretra, nos quais não se consegue identificar microrganismos que devessem estar relacionados aos mesmos.
Tipos
Quadro clínico Muito semelhante ao da uretrite causada pela Chlamydia tracomatis – com a qual clinicamente se confunde: período de incubação entre uma e duas semanas, pouca sintomatologia uretral e fluxo escasso.
Laboratório exame direto “a fresco” da secreção uretral, onde rapidamente se identifica o protozoário; Ureaplasma urealyticum - cultura específica; específica;; Mycoplasma hominis - cultura específica Staphylococcus sp - cultura; Candida albicans - exame micológico direto (com tinta da China).
Trichomonas vaginalis :
Tratamento Ureaplasma urealyticum e Mycoplasma hominis
Azitromicina 2 g, VO em dose única; Doxiciclina 100 mg, VO a cada 12 horas por 14 dias; Tianfenicol 500 mg, VO a cada 8 horas por 10 dias; Cloridrato de tetraciclina (cápsulas) 500 mg, VO a cada seis horas por dez dias.
Fluconazol 150 mg, VO em dose única; Itraconazol 400 mg, VO em dose única.
Uretrite mecânica; Uretrite herpética; Uretrite associada à neoplasia uretral; Uretrite associada ao condiloma intra-uretral; Uretrite psicogênica.
Quadro clínico Muito variável, na dependência de cada situação mórbida, individualmente. Descreveremos a seguir os quadros mais comumente relacionados, com os seus respectivos diagnósticos e tratamentos.
Mecânica Raramente causada por trauma e freqüentemente por ordenha uretral compulsiva, pode apresentar-se exatamente como nas chlamydianas . A anamnese torna-se fundamental! O paciente deverá ser orientado a respeito.
Herpética O diagnóstico - presuntivo - geralmente é feito quando se associa história de inflamação uretral a herpes genital em atividade e/ou linfadenopatia inguinal concomitante. Via de regra responde bem à terapia farmacológica pertinente.
Neoplasia uretral e condiloma intra-uretral
São fenômenos raros que cursam quase sempre com obstruçã o uretral, a qual pode surgir de forma progressiva obstrução ou abrupta, com modificação da forma do jato miccional. Confirmação diagnóstica por uretroscopia.
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Nas lesões distais - meatotomia e fulguração ou o uso do 5-fluoracil tópico (citostático antimetabólico); Nas lesões proximais - fulguração endoscópica da lesão com probe utilizado para tratamento de válvula de uretra posterior.
Psicogênica Esgotadas todas as possibilidade possibilidadess clínicas, laboratoriais e instrumentais, torna-se diagnóstico de exclusão, havendo a necessidade em alguns casos de psicopsic oterapia concomitante.
Leitura recomendada 1. CDC-1998 CDC-1998.. Guideline Guideliness for Treatmen Treatmentt of Sexu Sexualy aly Transmited Diseases MMVR, Morb. Mortal. Wkly Red. 1998; 47: RR-1. 2. Black CM. CM. Current Current Methods Methods of of Laboratory Laboratory Diagnosi Diagnosiss of Chlamydia Tracomatis Infections, Clin. Microbiol . Ver. 1997, 10:160-84. 3. Diag Diagnosi nosiss and Managemen Managementt of Ureth Urethritis ritis,, Masatoshi Masatoshi Tanaka Tanaka.. Joichi Kumazawa, Department of Urology, Faculty of Medicine, Kyushu University, Fukuoka, Japan.
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Capítulo 12 Afecções balanoprepuciais Maurício Mota de Avelar Alchorne Mauricio Mendonça do Nascimento
Introdução As balanites e balanopostites são afecções comuns na prática clínica e a primeira abordagem quase sempre remete às doenças infecciosas de origem venérea. Outras afecções cutâneas do pênis de etiologia nãoinfecciosa também são freqüentes e muitas vezes são erroneamente tratadas por longo período como doenças infecciosas. infecciosas. O conhecimento destas entidades nosológicas e dos fundamentos de sua diagnose e tratamento permitem um melhor manejo das balanites e balanopostites balanopostites..
Conceito As balanites são inflamações agudas ou crônicas da glande, podendo também acometer o prepúcio, p repúcio, quando são denominadas balanopostites. As principais causas de balanites são infecciosas, traumáticas, neoplásicas, induzidas por drogas e auto-imunes.
Dermatite de contato As dermatites de contato são causa freqüente de balanite. Podem ser de origem irritativa primária, associadas ao uso de produtos de higiene de maneira intensa e seguida, levando ao desengorduramento (xerose) e prurido. A instalação do quadro é progressiva e, em geral, o episódio de balanite é único e freqüentemente
precedido de uma relação sexual suspeita que leva o paciente a efetuar a limpeza do pênis com muito vigor e a usar produtos tais como álcool, sabões, infusões de plantas. A evolução com balanite irritativa aumenta o medo de ter adquirido alguma doença infecto-contagiosaa e intensifica a higiene acentuando infecto-contagios ainda mais o processo. Pode também envolver sensibilização imunológica ao agente causador. Nestes casos, os sintomas são, em geral, abruptos e os episódios de balanite podem ser recorrentes e sempre se seguem à exposição ao agente para o qual o paciente está sensibilizado. As causas mais comuns são o uso de medicações tópicas como antibióticos, preservativos e seus lubrificantes, lubrificantes, peças do vestuário impregnadas com amaciantes de roupas, óleos lubrificantes e cimento para profissionais que usem tais materiais. Deve ser lembrado que todos os produtos industriais podem ser levados ao pênis no ato de urinar se o paciente não lava as mãos antes da micção. O diagnóstico é feito com base na história e no levantamento de possíveis agentes causais. Os testes cutâneos de contato podem auxiliar na constatação de sensibilidade a produtos. O diagnóstico diferencial pode ser feito com a dermatite seborréica, psoríase e balanite fúngica. O tratamento depende do tipo de eczema. Nos casos de eczemas úmidos ou agudos, devem ser usados secantes e antipruriginosos, tais como água boricada a 3% em compressas três a cinco vezes por dia, de preferência geladas. 37
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Psoríase
Após a melhora inicial ou nos casos de eczema seco ou crônico, podemos lançar mão de antiflogísticos tradicionais como a pasta d’água (água, talco de Veneza, óxido de zinco e glicerina em partes iguais). O uso visa diminuir o edema, permitir a perspiração cutânea, regular a oleosidade da pele e prevenir a perda excessiva de água transepidérmica. O uso de corticosteróides é indicado em casos mais intensos, porém devemos ter alguns cuidados. Quando prescritos em veículos gordurosos sobre uma pele edemaciada, impedem a perda do excesso de água e provocam maceração, fissuras, prurido e piora do processo. O tempo máximo de uso é de sete a dez dias, pois a pele da região genital absorve cerca de 40 vezes mais intensamente, produtos de uso tópico, o que pode levar à atrofia da pele e atrasar a recuperação do tegumento. Os principais corticosteróides usados são a hidrocortisona a 1% e a desonida a 0,1%, em loção ou creme.
Doença com eritema e descamação na glande. Pode acometer também o prepúcio, bem como as outras localizações típicas no tegumento (face extensora dos membros, tronco, unhas e couro cabeludo). Ocorre com instalação lenta e gradual, em geral sem prurido ou infecções. Em geral a confirmação do diagnóstico se dá por exame anatomopatológico. O diagnóstico diferencial pode ser feito com a dermatite de contato, dermatite seborréica e balanite fúngica. O tratamento pode ser feito com corticosteróides mais potentes do que os referidos no item dermatite de contato, coaltar e calcitriol. Mais modernamente, o uso tópico de imunomoduladores como o tacrolimus e pimecrolimus tem se mostrado bastante promissor. Sistemicamente pode-se usar etretinato e imunossupressores sistêmicos, nos casos mais graves g raves e extensos.
Figura 1: Dermatite de contato. Edema e eritema intensos. Contato com preparação contendo ipê-roxo
Figura 2: Psoríase. Lesões eritêmato-escamosas isoladas ou coalescentes
Dermatite seborréica Doença com eritema e descamação da glande, com diagnóstico clínico. Pode acometer também as regiões pubiana, pré-esternal, couro cabeludo e face. Ocorre em surtos com piora e melhora, às vezes espontânea e a principal queixa é o prurido. O diagnóstico diferencial pode ser feito com a dermatite de contato, contat o, psoríase e balanite fúngica. Para afastar tais hipóteses podem ser necessários exame micológico direto e biópsia. O tratamento pode ser feito com aplicação de hidrocortisona ou desonida por breves períodos conforme explicado no item dermatite de contato.
Figura 3: Psoríase. Lesões eritêmato-escamosas com escamas branco-prateadas estratificadas difusas
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Balanite fúngica Infecção por Candida sp. de instalação aguda ou subaguda. É causa freqüente de balanite e balanopostite e pode estar associada ao diabete melito. O quadro clínico é típico e apresenta-se com eritema e edema da epiderme, que fica de cor vermelho-viva e friável, às vezes com induto branco facilmente removível na área mucosa. Pode acometer a glande, o prepúcio, e as pregas inguinais. Uma localização bem-sugestiva é a da região perimeatal e da área do prepúcio em contato com a mesma. A suspeita de candidíase deve levar à indagação de sintomas na parceira, que deve ser tratada concomitantemente. Deve ser lembrada a associação com diabete melito. O diagnóstico diferencial pode ser feito com a dermatite de contato, dermatite seborréica, a psoríase e a balanite plasmocitária. O tratamento envolve as medidas gerais para pele inflamada enumeradas no item dermatite de contato, com exceção dos corticosteróides, para melhoria do território cutâneo, mais o uso de antifúngicos tópicos os sistêmicos. É preferível o fluconazol, 150 mg em dose única, tratando-se também a parceira.
sob a forma for ma anular, bolhosa ou a das clássicas pápulas poligonais violáceas. Sua etiologia é desconhecida. O quadro clínico é o de aparecimento lento de lesões penianas, em geral pruriginosas, esbranquiçadas ou violáceas que podem se tornar anéis de 0,5 cm ou 1 cm com pele normal nor mal ou hipercrômica no centro e que evoluem centrifugamente. O diagnóstico pode ser confirmado por exame anatomopatológico. O diagnóstico diferencial deve ser com líquen escleroso e atrófico, erupções por drogas, psoríase e escabiose. O tratamento pode ser feito com corticoster corticosteróides óides tópicos e sistêmicos, sedação do prurido com antihistamínicos e nos casos mais graves retinóides sitêmicos e imunossupressores.
Figura 5: Líquen Plano. Lesões pápulo-anulares com a parte central violácea, isoladas ou coalescentes
Figura 4: Balanite Fúngica. Lesões branco-leitosas e lesões de cor vermelho-vivo, úmidas, de formas e tamanhos variados (Candidíase em doente com diabete melito)
Líquen plano O líquen plano é uma doença inflamatória nãoinfecciosa do tegumento que pode acometer também Figura 6: Líquen Plano. Lesões anulares com a parte central as mucosas e quando acomete a glande, apresenta-se violácea, isoladas ou coalescentes
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Líquen esclero-atrófico O líquen escleroso e atrófico é uma doença inflamatória não-infecciosa do tegumento que acomete geralmente os genitais, mas que pode po de acometer também o restante da pele. Sua etiologia é desconhecida. O quadro clínico caracteriza-se caracteriza-se pelo aparecime aparecimento nto lento de lesões penianas, esbranquiçadas e endurecidas, de um ou vários centímetros, que possuem espículas córneas palpáveis com pele normal ao redor. Pode haver lesões penianas e extra-genitais concomitantemente. As lesões se localizam na glande, sulcos balanoprepuciais e prepúcio. As lesões podem evoluir para o quadro de balanite xerótica obliterante, quadro de esclerose completa da área acometida que pode levar a estenose meatal, fimose, e dor ao ato sexual com fissuras e sangramentos. O diagnóstico diferencial pode ser feito com líquen plano, vitiligo e hipopigmentação pós-inflamatória. pós-inflamatória. O tratamento pode ser feito com corticosteróides tópicos potentes, e a postectomia pode ser recomendável em casos onde apenas o prepúcio for acometido para parar a progressão da doença, ou nos casos de estenose e fimose, para atenuar seus efeitos. A evolução é errática e não há exames prognósticos.
Figura 7: Balanite xerótica obliterante. Lesão esclero-atrófica, hipocrômica, hipocrômi ca, causando constrição
Balanite plasmocitária Também chamada de balanite de Zoon. É uma doença inflamatória da glande, de etiologia desconhecida e com evolução lenta e pouco sintomática. Tipicamente Tip icamente ocorrem placas bem-delimitadas, vermelho-alaranjadas Figura 8: Balanite circinada erosiva. Erosões pequenas, de formas e brilhantes com múltiplos pontos mais avermelhados. variadas, isoladas, sobre base levemente eritêmato-edematosa O diagnóstico se faz pelo exame anatomopatológico. O diagnóstico diferencial se faz com a candidíase, a eritroplasia de Queyrat , esta última uma condição pré-maligna que exige biópsia. O tratamento é feito com corticosteróides leves como os do item dermatite de contato, sendo freqüentes as recidivas. O diagnóstico diferencial pode ser feito com a dermatite de contato, dermatite seborréica e psoríase. Balanite circinada erosiva O tratamento é o da doença de Reiter, com corticosteróides sistêmicos ou imunosupressores. Balanite que ocorre em um quarto dos homens com a síndrome de Reiter, que é doença da imunidade com Eritema pigmentar fixo artrite, conjuntivite, uretrite e balanite, além de lesões cutâneas chamadas de queratoderma blenorrágico. Erupção cutânea a drogas que tem por característica As lesões penianas são vermelho-brilhantes cercadas voltar a ocorrer no mesmo local em caso de re-expopor pápulas que coalescem em arranjo circinado, na sição ao medicamento. A glande é sede freqüente desta glande e corpo do pênis. O diagnóstico é clínico. 40
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Figura 9: Eritema pigmentado fixo (fase aguda). Lesão eritematosa, violácea sobre base edematosa
Figura 12: Eritroplasia de Queyrat. ùlcera arredondada, de borda regular, fundo vermelho aveludado, com discreta infiltração na base
Edema traumático Edema e fissuras com nexo causal e temporal a atividade sexual ou masturbação mecanicamente traumática. O diagnóstico diferencial pode ser feito com as dermatites de contato e reações a drogas.
Carcinoma espino-celular
Figura 10: Eritema pigmentado fixo (fase aguda). Lesão eritêmato-edematosa, difusa
afecção e as principais drogas causadoras são os antiinant iinflamatórios não-hormonais, griseofulvina, anti-helmínticos e as sulfas. O quadro clínico é o de mancha vermelho-vio vermelho-violácea lácea bem delimitada, cerca de dois centímetros, pruriginosa e por vezes bolhosa, que ocorre tão cedo quanto duas a quatro horas após a exposição à droga. O tratamento pode ser com corticosteróides corticosteróides leves como mencionado no item dermatite de contato ou sistemicamente, mas é auto-limitado.
O carcinoma espino-celular é afecção tumoral de instalação lenta e assintomática, e se apresenta sob diversas formas clínicas sendo que algumas delas podem simular as balanites. A mais comum é a eritroplasia de Queyrat (ou carcinoma espino-celular in situ ).
Figura 11: Edema traumático. Edema causado por masturbação
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Seção I No quadro clínico da eritroplasia de Queyrat, observa-se uma placa ou pápula indolor avermelhada de evolução lenta com bordas mal-delimitadas e com infiltração à palpação, e por isso se confunde com as balanites. Seu diagnóstico é feito pelo exame anatomopatológico, que mostra atipias intra-epiteliais. Clinicamente,, o carcinoma espinocelular Clinicamente espinocelular do pênis é representado por uma placa infiltrada indolor, às vezes ulcerada e infiltrada, em homens acima da quinta década de vida, podendo ter correlação com a nãocircuncisão. Seu aspecto dificilmente faz diagnóstico diferecial com as balanites. O diagnóstico é sempre histopatológico, e o tratamento dependerá de fatores mencionados em outro capítulo.
Leitura recomendada 1. Alchorne Alchorne MMA, Alchorn Alchornee AOA. AOA. Doenças Doenças Tegumentares Tegumentares dos Genitais. São Paulo: Pancast; 1994. 2. Worko orkowski wski KA,Levine KA,Levine WC. WC. MMWR-Sexua MMWR-Sexually lly Transmi Transmited ted Diseases Treatment Guidelines 2002-Recommendations & Reports. Atlanta: CDC; maio 2002 (51-RR06) pp. 1-80. 3. Edwar Edwards ds SK. Europea Europeann Guideline Guideline for for the managemen managementt of balanoposthitis. Int J STD AIDS 2001;12 (suppl.3): 68-72. 4. Fitz Fitzpatri patrick ck TB, TB, editor. editor. Dermatology Dermatology in General General Medecine. Medecine. New York: McGraw-Hill. 4 th Ed. 1993. pp. 1419-25. 5. Sampai Sampaioo SAP SAP, Rivitti Rivitti EA, EA, editores editores.. Dermatologia. São Paulo: Ed Artes Médicas. 2 a Ed. 2001. pp. 971-4.
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Capítulo 13 Abscesso renal e perinefrético José Maurício Frehse
Introdução Os abscessos perinefréticos são coleções purulentas localizadas entre a cápsula renal e a fáscia de Gerota. São geralmente originados por infecções ascendentes do trato urinário, a partir de processos obstrutivos, de pielonefrites ou de progressão por contigüidade de abscessos corticais renais; podem também surgir por via hematogênica, secundária a infecções da pele e trato respiratório superior. O quadro é semelhante ao da pielonefrite aguda: clinicamente apresenta-se com um quadro de dor lombar, dor à palpação e à punho-percussão em região lombar, febre e sinais laboratoriais de infecção, como leucocitose, piúria, bacteriúria e urocultura positiva. Pode ocorrer bacteremia e hematúria e infecção bacteriana com inflamação aguda tanto do parênquima como da pelve renal. Na pielonefrite aguda complicada, ocorre a formação de microabscessos intraparenquimatosos, que podem estender-se formando abscessos macroscópicos, chamados de abscesso ou carbúnculo renal. Entretanto, se a coleção perirrenal estende-se além da fáscia de Gerota, trata-se de um abscesso pararrenal. Os pacientes portadores de abscessos perinefréticos correspondem a menos de 1% das admissões hospitalares de pacientes urológicos. A alta mortalidade, de 23% a 56% dos casos, deve-se em parte à demora até o diagnóstico e o início do tratamento. Podem progredir invadindo tecidos vizi-
nhos, produzindo peritonite, perfuração colônica, abscessos subfrênicos, coleções pélvicas junto ao psoas com destruição do tecido muscular e subcutâneo da região lombar, empiemas pulmonares e sepse. As bactérias Gram-negativo, principalmente Escherichia coli e Proteus sp, predominam. Os Staphylococcus são os principais responsáveis pelas infecções por via hematogênica, ao redor de 6%.
Diagnóstico Na apresentação clínica, os pacientes apresentam febre alta e persistente (de sete a 14 dias) e com história de infecções anteriores do trato urinário ou de pele, dores abdominais ou flanco, piora do estado geral, calafrios e disúria. À palpação, por vezes dolorosa, podemos encontrar massas palpáveis em flancos em até 47% dos casos. Pacientes portadores de litíase urinária, diabete melito e imunodeprimidos são freqüentemente acometidos. Os principais fatores predisponentes estão citados na Tabela 1. Devemos ter em mente que até um terço desses pacientes pode apresentar-se afebril e sem os sintomas habituais; nem sempre os achados de exames identificam o germe causador, como mostra a Tabela 2. Os exames a serem solicitados, com as indicações e achados nos métodos de imagem, são demonstrados na Tabela 3.
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Guia Prático de Urologia Tabela 1: Abcesso perinefrético - fatores predisponentes
Tabela 2: Abcesso perinefrético - achados laboratoriais
Tabela 3: Abcesso perinefrético - achados de imagem
Tratamento
muito semelhantes. A ciprofloxacina é um pouco maior contra a P. aeruginosa , enquanto a gatifloxacina apresenta O uso de antimicrobianos para prevenir e controlar maior eficácia contra estafilococos e enterococos. Para a disseminação da infecção é importante, porém o estes últimos, utiliza-se também a ampicilina. Para as tratamento clínico comumente não promove a cura cepas resistentes, temos a opção dos carbapenêmios e total a não ser em pequenos abscessos e que devem outras penicilinas com inibidores de betalactamases, ser monitorados cuidadosamente. como a piperacilina associada ao tazobactam. Não Escherichia coli, Proteus, Klebsiella, Enterobacter e Pseudomonas devemos esquecer dos germes anaeróbios freqüensão normalmente sensíveis a fluorquinolonas, amino- temente presentes e devemos associar metronidazol a glicosídeos e cefalosporinas de terceira e quarta gerações outro agente microbiano. e são utilizados conforme antibiograma sempre que Em resumo, sempre que possível devemos utilizar possível. Para as enterobactérias, a potência e o espectro antibióticos indicados no antibiograma levando-se característi cas das ciprofloxacinas, levofloxacinas e gatifloxacinas são em conta o espectro de ação, potência e características 44
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farmacológicas (farmacocinética e farmacodinâmic farmacodinâmica) a) e o custo para cada tratamento. A drenagem percutânea de abscessos renais e perirrenais é o tratamento de escolha inicial e potencialmente definitivo nos dias de hoje. Trata-se de um procedimento simples e seguro e pode ser realizado com anestesia local ou peridural em pacientes graves e sépticos. Pode evitar a retirada desnecessária de um rim funcionante. Facilita uma nefrectomi nefrectomiaa a posteriori , após a melhora das condições gerais do doente. O procedimento realizado é acompanhado por tomografia e/ou ultra-som. Nos casos de abscessos de grande volume e com múltiplas cavidades e em rins não-funcionantes, requer-se a nefrectomia e a drenagem aberta do retroperitônio. Nesses casos, o procedimento deve ser realizado por via extraperitonial e vários drenos podem ser utilizados. Portanto, o tratamento ideal requer experiência e necessita ser individualizado para cada paciente.
Figura 1: Paciente L. O., Fem., diabética, 58 anos, internou-se em sepse, extenso abscesso renal, pararrenal, retroperitônio até coxa esquerda, como mostra a ressonância magnética de 12/12/2002
Conclusões Para que tenhamos menor morbidade e mortalidade, devemos agir rapidamente com o diagnóstico e tratamento correto, o que muitas vezes torna-se difícil pela disparidade que encontramos entre o quadro clínico e os exames laboratoriais. Exames de imagem devem ser realizados nos pacientes com quadros de pielonefrites, infecções de pele e com história de litíase ou obstrução do trato urinário que não evoluem clinicamente bem e continuam febris, após iniciado o uso adequado de antibióticos. A tomografia computadorizada do abdome é o exame mais importante para determinar determin ar o tamanho, a localização e a relação com estruturas vizinhas; na impossibilidade deste, o ultra-som também pode ser utilizado. O tratamento consiste na prescrição precoce de antimicrobianos e na drenagem do abscesso. Para a decisão do tipo de procedimento cirúrgico cirúrgico (percutânea ou aberta), deve ser levado em conta o estado clínico do paciente, localização e extensão do abscesso, função renal e a experiência do cirurgião. O acompanhamento com exame clínico, exames laboratoriais e de imagem e reintervenções precoces, quando necessárias, conduzem estes casos com segurança e minimizam as complicações.
Figura 2: Tomografia computadorizada em 23/12/2002 drenagem percutânea
Figura 3: Tomografia computadorizada 06/01/2003. A paciente, após melhora do estado geral, foi submetida à nefrectomia e à drenagem no dia 07/01/2003. Evolução satisfatória tendo alta curada
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Leitura recomendada 1. Elvino B, B, Henrique Henrique B, B, et al. al. Antimicrobianos Antimicrobianos consulta rápida . 3 ed. Porto Alegre, Arte med, 2001. 2. Mallkou Mallkouhi hi A, Schock Schockee M, Judmaier W, et al. Radiology. 2002; 223: 509-16 3. Sch Schaeffer aeffer AJ AJ. Infection Infectionss of the urinary urinary tract. tract. In: Walsh Walsh PC, PC,
et al. Campbell’s Urology , Saunders – Philadelphia, 8 th ed. Elsivier Science, 2002, pp. 551-63. 4. Sobel JD, Kaye D. D. Urinay tract infections. infections. In: Mandel GL, Bennett JE, Dolin R. Mandell, Douglas, and Bennett’s. Principles and practice of infections diseases . 5th ed, 2000; pp. 773-805. 5. Tuf ufiik BJ BJ. Doença inflamatória renal: Urologia Diagnóstico por imagem. 1a ed. São Paulo: Sarvier, 1997 (08) 126-33.
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Capítulo 14 Infecção por HPV João Luiz Schiavini
Introdução O papilomavírus humano (HPV), um microrganismo da família Papovavirídae, é o agente causador da papilomatose humana, uma denominação patológica na qual podem ser agrupadas praticamente todas as lesões vegetantes cutâneo-mucosas cutâneo-muc osas de aspecto verrucoso e muitas outras mais. Aí estão incluídas as verrugas anogenitais, a manifestação clínica mais comumente conhecida da infecção genital por HPV. A infecção pelo HPV ganhou importância pela sua grande incidência, elevada prevalência, alta infectividade, facilidade de contágio e estreita relação com o câncer de colo do útero, ao qual está associada em até 95% dos casos, e com o câncer do pênis.
Sinonímia
Prevalência e incidência da infecção genital por HPV No mundo inteiro, a infecção por HPV vem alcançando proporções epidêmicas (Tabela 1), tornando-se a doença sexualmente transmissível (DST) mais freqüente na população sexualmente ativa; chega a atingir, nos Estados Unidos, de 5% a 20% da população na faixa etária de 15 a 49 anos – cerca de oito vezes mais freqüente que há 20 anos, numa prevalência de 106 casos por 100 mil habitantes. Projetando para o Brasil, estima-se a existência de seis a 12 milhões de homens infectados pelo HPV. A despeito da grande prevalência da infecção, somente 1% dos infectados apresentam o condiloma clássico e apenas 2% das lesões podem ser visíveis com o ácido acético.. Isto a torna uma doença particularmente difícil acético de manipular e controlar.
Condiloma acuminado, condiloma, condiloma venéreo,, verruga peniana, verruga venérea, papiloma Tabela 1: Casos de DST novos por ano, segundo o CDC em 2000 venéreo venéreo, vegetações venéreas, crista de galo eram as maneiras mais comuns como se conhecia as manifestações desta doença. No entanto, dada à multiplicidade das formas de apresentação – e mesmo ao fato de que, na quase totalidade dos casos da infecção pelo HPV, as lesões sejam inaparentes –, tornou-se inadequado denominá-la denominá-la como antes, por não serem abrangentes e ocultarem a real dimensão e o alcance da doença. A denominação adequada, atualmente, atualmente, é: (CDC – Center for Disease Control – Estados Unidos) infecção pelo HPV.
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Características do HPV O vírus HPV tem formato icosaédrico com 55 nm e se constitui num pequeno capsídeo sem envelope, de uma única molécula circular dupla hélice de DNA, com, aproximadamente, oito mil pares de base. O capsídeo é composto por pelo menos duas proteínas, correspondendo a maior cerca de 80% da sua superfície. O vírus tem tropismo pelo epitélio cutâneo mucoso, especialmente as células com maior metabolismo, como as da camada basal. Já foram identificados por volta de 120 diferentes sorotipos so rotipos do HPV. Cerca de 45 infectam o trato genital. Os sorotipos com maior tropismo pelo tegumento cutâneo-mucoso genital têm sido classificados em dois grupos: A) HPV de baixo risco (tipos 6, 11, 42, 43 e 44), relacionados às lesões de baixo grau, principalmente verrugas anogenitais e neoplasia intraepitelial grau I. Sua relação com degeneração carcinogenética é rara. B) HPV de alto risco (tipos 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59, 66 e 68), poucas vezes encontrados nas verrugas genitais, mas relacionados com alta freqüência à neoplasia intra-epitelial de alto grau e ao carcioma invasivo, com destaque para os sorotipos 16 (presente em até 60% das lesões genitais malignas) e 18 (presente em até 20% das lesões genitais malignas). Aproximadamente 90% das verrugas anugenitais contêm HPV 6 ou 11, podendo-se encontrar também, com menor freqüência, os tipos 16, 18, 31, 33 e 35. Embora haja associação entre alguns tipos de HPV e a carcinogênese, apenas uma pequena quantidade de indivíduos com HPV de alto risco evoluem evolu em para câncer de células escamosas. A carcinogênese está associada à inibição, pelo vírus, do antioncogen p53, com impedimento da apoptose e surgimento da aneuploidia.
Fatores de risco A relação sexual é a principal forma de contágio, sendo, portanto, o comportamento sexual o maior determinante da infecção genital pelo HPV, com grande influência da multiplicidade de parcerias sexuais. A infecção é mais comum em indivíduos sexualmente ativos dos 20 aos 24 anos, entrando em declínio gradativo daí em diante. Tabagismo, uso feminino de contraceptivos orais, outras DST e imunossupressão adquirida também aumentam o risco do contágio.
Contágio A transmissão pelo contato sexual é a regra na infecção pelo HPV. No entanto, pode-se adquiri-lo com poucos ou somente após muitos contatos e mesmo não adquiri-lo apesar de grande número de relações. Além da carga viral, o tipo de vírus e as condições imunológicas do hospedeiro, duração e freqüência da exposição interferirão no contágio. Devido ao tropismo pelas células da camada basal do epitélio, é necessário que haja solução de continuidade na superfície para que o vírus atinja a profundidade do tecido, por meio de microtraumatismos na superfície, o que acontece nos coitos mais vigorosos. Após contato sexual, estabelece-se um reservatório viral. Os vírus são, dessa forma, carreados para o interior da célula, perdendo o seu capsídeo. O DNA viral atinge o núcleo da célula, onde permanece por algum tempo na forma epissomal (circular, sem se integrar ao DNA do hospedeiro). Em algum momento, vai haver a integração com o genoma hospedeiro, a tradução, a transcrição do DNA em RNA e modificações fenotípicas características do HPV na célula hospedeira. Surgem os vacúolos citoplasmáticos perinucleares, os coilócitos, característicos da infecção pelo HPV. HPV. Outros fenômenos citopáticos citop áticos são: acantose, atipia e multinucleação multinucleação..
Patogênese e manifestações clínicas As verrugas genitais causadas pelo HPV se comportam, habitualmente, como tumores benignos autolimitados, macios, sésseis ou pedunculados. Pouco se conhece sobre a infectividade das verrugas e não se sabe se a sua eliminação efetivamente reduz o risco de contágio. Acredita-se que o longo período de latência seja comum aos dois sexos. Quando ocorre o contágio, pode haver três possíveis evoluções: 1) O organismo elimina o vírus, o que acontece na maioria dos casos em 12 meses, chegando a 92% em dois anos. 2) O vírus fica latente, com o DNA presente no núcleo, multiplicando-se junto com a célula hospedeira, que tem aparência normal. Infecção latente pode tornar-se ativa por causa ainda desconhecida e, enquanto está latente, só pode ser detectada por po r métodos de biologia molecular, pois não há alteração histológica. Trata-se da incubação, que pode durar desde três a oito meses e até vários anos. 48
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Guia Prático de Urologia 3) Surgir
infecção clínica ou subclínica (fase produtiva). A forma clínica pode ser vista a olho nu -as verrugas ou condilomas acuminados. A forma subclínica só pode ser evidenciada com o uso de lentes de grande aumento após o emprego de ácido acético a 5% (genitoscopia/peniscopia). É comum haver infecção subclínica nas cercanias das verrugas genitais. Até 65% das lesões regridem espontaneamente, 14% progridem para lesões displásicas, 45% podem ficar latentes após tratamento. As lesões podem evoluir para neoplasia intra-epitelial, carcinoma in situ e carcinoma escamoso. No homem, as localizações mais comuns são: prepúcio e sulco, 60% a 90%; corpo, 8% a 55%; glande, 1% a 20%; uretra, 9% a 21%; escroto, 5% a 20%.
coagula e precipita as proteínas intracelulares formadas pela infecção viral, tornando as lesões relevadas, brancas e evidentes, numa reação transitória, reversível e facilmente reprodutível. O azul de toluidina, um corante vital que se fixa em regiões ricas em DNA, também pode ser utilizado com o objetivo de aumentar a sensibilidade do método. Desta maneira, as lesões são identificadas e mapeadas para orientar o tratamento. Uma câmera digital com função macro ajuda muito no registro e mapeamento. Uma vez identificadas as lesões, amostras devem ser colhidas para a tipagem sorológica do vírus, por meio de um dos métodos disponíveis, dentre os quais, a captura híbrida é o mais eficaz conforme a Tabela 2. Uretroscopia não é um exame rotineiro para diagnóstico do HPV, sendo reservado para lesão uretral com base inacessível ao exame físico, recidivas uretrais e persistência de sintomas uretrais após o tratamento adequado.
Diagnóstico Nas infecções clínicas, as lesões são evidentes evide ntes e facilmente identificáveis. Nas infecções subclínicas, com lesões inaparentes, necessita-se utilizar artifícios que possibilitem o diagnóstico, como a genitoscopia, também conhecida por peniscopia. Já que não avistam as lesões, os pacientes não procuram o médico por este motivo. Em geral comparecem obrigados, apenas quando o resultado do exame preventivo ginecológico de sua parceira sugere a infecção pelo HPV. Havendo ou não lesões aparentes, todos devem ser submetidos à genitoscopia com lente de magnificação que permita per mita aumentos superiores a 16 vezes. O ácido acético a 5%
Diagnóstico diferencial Uma gama variada de afecções cutâneo-mucosas genitais, inflamatórias, infecciosas infecciosas e tumorais, como se pode ver na Tabela 3, precisa ser diferenciada.
Tratamento Dentre os tratamentos exibidos na Tabela 4, os mais eficazes são os que aumentam a imunidade local, como o interferon, o imiquimod, os citostáticos (creme de 5-fluoruracil)l) e os abrasivos químicos (podofilotoxina). 5-fluoruraci
Tabela 2: Comparação entre os métodos diagnósticos laboratoriais
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Seção I Tabela 3: Diagnóstico diferencial
Tabela 4: Opções de tratamento (em itálico os mais eficazes)
Pode-se ainda utilizar: eletro-cauterização, sob anestesia local ou bloqueio loco-regional, dependendo do tamanho da lesão, pois causa ulcerações, expõe as infecções e ocasiona dor no pós-operatório; criocirurgia, que necessita anestesia, provoca dor no pósoperatório, ulceração e expõe as infecções; laser , método dispendioso, necessita anestesia, pode cursar com infecção e dor no pós-operatório.
Seguimento Os pacientes devem ser acompanhados, repetindo-se a peniscopia após seis meses e dentro de um
ano, observados os períodos de latência e incubação, ou a qualquer momento, quando surjam lesões suspeitas de recidiva.
Leitura recomendada 1. I Consenso Consenso Brasileiro Brasileiro de HPV HPV.. São Roque, Roque, SP, SP, 1: 1999/ 2000, BG Cultural. 2. Center Centerss for Disease Disease Control Control and Preven Prevention, tion, Division Division of STD/HIV Prevention. Annual Report. Atlanta, 2000, GA: Department of Health and Human Services. 3. Wisdom A. Atlas Atlas Colorido Colorido de Doenças Doenças Sexualmente Sexualmente Transmissíveis. Artes Médicas, 1992. 4. Morse SA, Moreland Moreland AA, AA, Thompson Thompson SE. Atlas Atlas of Sexualy Transmitted Diseases. J.B. Lippincot Company, 1990, Philadelphia.
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Seção I
Capítulo 15 Tuberculose urogenital Jorge Sabaneeff Renato Tambara Filho
Introdução
lipídico, conferindo-lhe a característica de ser álcoolacidorresistente. Outras microbactérias, como M. A tuberculose é a doença que causa mais mortes bovis, M. avi, M.marinum , são destituídas de importância no mundo do que qualquer outra afecção infecciosa. infecciosa. em patologia humana. É um problema de saúde pública, principalmente A transmissão se faz de pessoas contaminadas contamin adas para nas regiões pouco desenvolvidas desenvolvidas,, onde existem con- outras, através de gotículas contendo bacilos, elimidições socioeconômicas desfavoráveis. Sua preva- nadas pela fala, tosse e espirro, as quais permanecem lência vem aumentando nos últimos anos, principal- em suspensão no ar. Quando inaladas, tais gotículas mente devido à proliferação da Aids e do surgimento chegam aos bronquíolos e alvéolos, onde inicia-se o de cepas do Mycobacterium tuberculosis resistentes. A processo de multiplicação bacteriana seguida de Organização Mundial da Saúde estima que ocorram intensa reação inflamatória, observando-se ativa cerca de oito milhões de casos novos e três milhões mobilização de células de defesa com a participação de macrófagos e linfócitos T. de óbitos por ano em todo o mundo. A resposta tecidual que limita este processo é a A tuberculose urogenital quase sempre é conseqüência da disseminação hematogênica da tuberculose formação do granuloma; porém, podem subsistir pulmonar para os rins, próstata ou epidídimo, consti- bacilos na forma latente em macrófagos não-lesados, tuindo até 40% das formas extrapulmonares. O pe- que alcançam a via linfo-hematogênica e acometem ríodo de latência entre a infecção pulmonar e o apare- outros órgãos, inclusive os rins. cimento dos sintomas urinários pode variar de cinco a 20 anos, razão pela qual o grupo etário mais atingido Fisiopatologia pela tuberculose urogenital é o adulto jovem, entre 20 e 50 anos, atingindo mais homens que mulheres, Os bacilos que alcançaram os rins pela via hematorepercutindo socialmente por afetar indivíduos em gênica instalam-se inicialmente de forma bilateral no plena atividade laborativa. córtex renal e as lesões primárias ocorrem nos glomérulos. Mesmo com o desenvolvimento de granulomas na região cortical, esta fase precoce da Causas doença mostra-se clinicamente silenciosa e tende a A tuberculose humana é causada pelo Mycobacterium evoluir para a cicatrização. Ao penetrar na medular, os bacilos passam a se tuberculosis, denominado bacilo de Koch (BK), em alusão a Robert Koch, que identificou este agente multiplicar e expandir devido ao fluxo sangüíneo lento etiológico em 1882. Trata-se de um bastonete estrita- e à diminuição dos mecanismos de defesa desta camente aeróbio, que possui um elevado conteúdo mada, verificando-se a cronificação e a evolução do 51
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processo em apenas um rim. Permanece desconhecida a razão pela qual o desenvolvimento da tuberculose renal ocorre em apenas um lado, tendo em vista o comprometimento bilateral inicial. No interstício medular, os granulomas progridem e se ulceram, com a sua área central apresentando necrose caseosa. Em seguida, esses granulomas se coalescem direcionando-se para as papilas e ulceramse em contato com os cálices, propiciando a primeira lesão radiologicamente visível. A partir desta fase, em que o processo tuberculoso abre-se para o sistema pielocalicial, a bacilúria persistente desencade desencadeia ia novas disseminações, através da pelve renal, para outros cálices. Os episódios sucessivos de necrose, caseificação e fibrose ocasionam calcificações, distorções pielocaliciais e atrofia do parênquima, chegando-se nos casos mais graves à completa destruição renal. Por via canalicular, os bacilos chegam ao ureter, onde ocorre a mesma reação inflamatória, com formação de granulomas seguidos de ulceração e necrose caseosa que evoluem para a fibrose cicatricial. As áreas de fibrose correspondem às estenoses, verificadass mais freqüentemente no terço inferior do verificada ureter, mas que podem comprometer o terço superior ou mais raramente sua porção média. Pelo fluxo de urina, os bacilos instalam-se na bexiga, iniciando-se as lesões granulomatosas próximas ao meato ureteral, observando-se a presença de edema, hiperemia e pequenas úlceras. Nesta fase, torna-se possível o diagnóstico de cistite tuberculosa através da biópsia endoscópica. Gradativamente toda a bexiga é tomada pelas lesões ulcerativas e necróticas, que conduzem à retração cicatricial e à redução progressiva da capacidade vesical às vezes tão intensa que tal t al capacidade limita-se a 20mL ou 30 mL. As reações inflamatórias também alteram a junção vesicureteral e o refluxo pode, por via ascendente, levar ao comprometimento renal do outro lado. A próstata envolve-se pela tuberculose por via canalicular ou por via hematogênica e os granulomas inflamatórios encaminham-se para a abscedação ou para a fibrose com a formação de nódulos. Da próstata, os bacilos seguem para as vesículas seminais reproduzindo novos granulomas e para o canal deferente que se torna espessado e ocupado por nódulos. O epidídimo é atingido por extensão retrógrada geralmente ou por via retrógrada, aumentando de volume e evoluindo cronicamente com o desenvol vimento de nódulos, mormente na cauda, podendo eclodir em abscesso e fístula escrotal.
No sexo feminino, pode ocorrer salpingite, com obstrução da trompa de Falópio acompanhada pelo envolvimento do útero e dos ovários.
Quadro clínico Manifestações sistêmicas
A sintomatologia sistêmica, composta por febre, anorexia, perda de peso e sudorese noturna, é infreqüente infreqüe nte e de pequena intensidade, devido ao prolongado período de incubação. Os sintomas podem ser mínimos mesmo na presença de doença extensa. Manifestações renais
Dor lombar e em flanco, acessos febris e calafrios traduzem a tuberculose renal, podendo ocorrer obstrução ureteral pela passagem de coágulos sangüíneos ou fragmentos de tecidos necróticos, fazendo que a dor assuma o caráter de cólica. A hematúria total silenciosa pode significar a fase inicial da doença e deve ser exaustivamente investigada. Hematúria macroscópica é observada em 10% dos casos e microscópica em 50% dos casos. A hipertensão arterial ocorre em menos de 5% dos casos e é relacionada à perda de função renal. Manifestações vesicais
Os sintomas vesicais são os mais freqüentes, mais exuberantes e mais importantes denunciadores da tuberculose urinária. A polaciúria é persistente e progressiva à medida que a bexiga se contrai, acompanhando-se de dor suprapúbica, piúria e hematúria. Muitas vezes interpretada como infecção urinária inespecífica, podendo até mesmo com ela coexistir, a polaciúria não responde aos antimicrobianos comuns, fato que gera suspeita da presença da tuberculose. Manifestações genitais
As manifestações prostáticas são constituídas por diminuição do volume seminal, hemospermia e ejaculação dolorosa. No epidídimo encontram-se nódulos endurecid endurecidos os na cabeça ou na cauda, que podem abscedar e fistulizar. A fístula escrotal é muito sugestiva de epididimite e pididimite tuberculosa. Nas mulheres, as manifestações variam desde dor pélvica, corrimento vaginal, dispareunia e massa abdominal até a esterilidad esterilidade. e. 52
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Diagnóstico A suspeita clínica da doença toma por base a presença das manifestações renais, vesicais e genitais. No entanto deve-se ressaltar que, pelo seu caráter insidioso e multiforme, a tuberculose urogenital pode simular várias condições patológicas urológicas, tornando difícil o seu diagnóstico em fase precoce. Por esta razão, os pacientes que apresentam alterações clínicas do trato urinário, para as quais não se encontre uma explicação satisfatória, devem ser exaustivamente investigados. O diagnóstico de certeza da tuberculose é obtido de duas maneiras: pela identificação do bacilo na urina ou secreções e pelas alterações histopatológicas típicas de granuloma tuberculoso em material obtido através de biópsia ou peça cirúrgica. Exames laboratorias
Urina I – redução do pH urinário, proteinúria variável, hematúria e piúria estéril; Bacterioscopia do sedimento urinário pelo método de coloração de Ziehl-Neelsen – é conveniente o recolhimento de três amostras de jato médio da primeira urina da manhã por três dias consecutivos e, se possível, até seis amostras em seis dias consecutivos. Existe o risco de contaminação do material por microbactérias saprófitas, como o M. smegmatis , M. xenopi e outras; Cultura em meio de Lowenstein-Jensen – com índice de positividade entre 80% e 90%, é considerado o procedimento fundamental para o diagnóstico, muito mais sensível que a microscopia direta, sendo completado pelo antibiograma; Exame anatomopatológico – algumas vezes o diagnóstico da tuberculose é feito pelas alterações histopatológicas de material proveniente de biópsia endoscópica ou peça cirúrgica cirúrgica..
alterações da silhueta renal, lesões ósseas, presença p resença de calcificações renais e eventual associação com litíase; Urografia excretora – a despeito das novas técnicas de imagem, este exame continua sendo fundamental na avaliação e evolução da tuberculose, mostrando as seguintes alterações: Renais - erosões mínimas papilocaliciais, em fase precoce e assintomática. Em escala crescente, encontra-se dilatação calicial, de grupos caliciais caliciai s ou de todo o sistema pielocalicial, amputações caliciais, cavidades únicas ou múltiplas, graves deformações e retrações do parênquima com calcificações, retardo de excreção e exclusão funcional radiológica; Ureterais - áreas de estenose, principalmente no terço inferior e retificação; Vesicais - bexiga contraída, de paredes irregulares. ascendente como Pielografia – tanto a pielografia ascendente a translombar atualmente são pouco empregada empregadas; s; Uretrocistografia – bexiga contraída e quando presente refluxo vesicureter vesicureteral; al; Ultra-som – auxilia no controle evolutivo das dilatações pielocaliciais, cavitações e comprometimento do parênquima; Tomografia computadorizada – fornece melhor exatidão na localização e extensão das lesões renais, processos fibróticos e cicatriciai cicatriciais; s; Cistoscopia – sob anestesia, fornece visão direta das diversas fases da cistite tuberculosa com possibilidade de biópsia.
Tratamento
O tratamento clínico em dosagens e tempo adequados propicia a cura em quase todos os casos, sendo de fundamental importância a compreensão e colaboração do paciente. Atualmente, o tempo de duração do esquema tríplice varia de seis a nove meses, podendo prolongar-se para um ano ou mais, Outros métodos diagnósticos dependendo da evolução. Outrora mais valorizadas, a inoculação em cobaia As características das principais drogas utilizadas e as provas cutâneas de sensibilidade à tuberculina são as seguintes: atualmente são exames pouco utilizados por dificul- Rifampicina (RMP) – bactericida, atua elimidades de acessibilidade e de interpretação. nando bacilos persistentes e de multiplicação lenta, Avaliação radiológica – permite delimitar o intra e extracelularmente nos focos caseosos. Docomprometimento do trato urinário e o controle se: 10 mg/kg até o máximo de 600 mg/dia. Efeievolutivo da doença durante e após o tratamento; tos colaterais: urticária, hepatite medicamentosa, Raios X de tórax – em 25% dos casos, confirma dispepsia, anemia hemolítica e púrpura; a existência de foco primário pulmonar ou ainda Pirazinamida (PZA) – bactericida, atua intracelua presença de lesões em atividade; larmente em bacilos fagocitados, por macrófagos, Raios X simples de abdome – podem revelar de multiplicação intermediária. intermediária. Dose: 15 a 30 mg/ 53
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kg até 2 mil mg/dia. Apresenta hepatotoxicidade dose-dependente dose-depende nte e os seguintes efeitos colaterais: prurido, eritema, artralgia e síndrome dispéptica; Isoniazida (INH) – bactericida, atua intra e extracelularmente em bacilos de multiplicação rápida. Dose: 5 mg/kg até 400 mg/dia, devendo ser suplementada com piridoxina, 60 mg/dia. Efeitos colaterais: polineuropatia periférica, síndrome dispéptica e hepatite medicamentosa; Estreptomicina (SM) – bactericida, atua extracelularmente, sendo disponível somente para administração intramuscular. Dose: 15 mg/kg até mil mg/dia. Efeitos colaterais: nefro e ototoxicidade ot otoxicidade;; Etambutol (EMB) – Bacteriostático, atua intra e extracelularmente. Dose: 15 a 25 mg/kg até 1.200 mg/ dia. Efeitos colaterais: náuseas, vômitos, e alterações visuais (perda da visão periférica, perturbação das cores, perda da acuidade visual e até cegueira); Etionamida (Et) – bacteriostático, mais útil no tratamento da tuberculose multiresistente, náuseas, vômitos, diarréia e icterícia. Outras drogas e outros esquemas são empregados com menor freqüência em casos especiais de resistência. Entre estes citamos kanamicina, ofloxacina, clofazimina, cicloserina, capreomicina, ciprofloxacina, claritromicina, amicacina e metronidazol. A resposta ao tratamento é avaliada pela remissão dos sintomas e pelas culturas de urina, repetidas mensalmente até sua negativação.
Nefrectomia parcial – pouco usada, tem indicações restritas para lesões localizadas, sem resposta ao tratamento clínico; Reimplantes e plastias ureterais – nos casos de estenose ureteral pode-se optar por técnicas de reimplante com ou sem interposição de alças intestinais. Procedimentos endoscópicos para dilatação ureteral mostram resultados temporários; Ampliações vesicais – indicadas nas bexigas contraídas, com aplicação de segmentos intestinais isolados e destubulizados, são operações que melho
Tratamento cirúrgico O tratamento cirúrgic cirúrgicoo da tuberculose urogenital é enfocado sob duas perspectivas: as intervenções extirpativas, que englobam a nefrectomia total ou parcial e a epididimectomia, e as intervenções reconstrutivas, representadas pelas plastias plast ias ureterais e as ampliações vesicais, com utilização de segmentos intestinais isolados. Deve-se ressaltar que as derivações urinárias atualmente são pouco empregadas, sendo reservadas para casos especiais. Recomenda-se pelo menos um mês e se possível três meses de esquema tríplice antes de se realizarem as intervenções cirúrgicas, com a finalidade de se evitar disseminações hematogênicas. Nefrectomia – reservada para os casos de lesões extensas e avançadas, com sintomatologia dolorosa ou hipertensão arterial, sua indicação em rim excluso assintomático, após o esquema tríplice e com justificativa preventiva, é controvertida; 54
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ram substancialmente o desconforto vesical e a qualidade de vida dos pacientes; Epididimectomia e orquiectomia – devem ser realizadas nos casos de espessamentos dolorosos crônicos e nos abcessos caseosos que evoluem para a fistulação.
Conclusões A tuberculose vem aumentando no mundo inteiro devido à deficiência imunológica proporcionada pela proliferação da AIDS. Da mesma forma, a sua localização urogenital também se torna mais freqüente e a atenção médica, especialmente do urologista, deve estar voltada para o diagnóstico precoce e a pronta instituição do tratamento tratamento.. Quanto antes se inicia o esquema tríplice, maior a chance de cura ou, pelo menos, de menores seqüelas. Esta é a melhor maneira de se evitar as complicações renais graves, que podem levar à insuficiência renal crônica e à necessidade de tratamento dialítico, lembrando que para o paciente com tuberculose as possibilidades de transplante são limitadas.
Leitura recomendada 1. Barros M, Jacobin Jacobinoo M. Tubercul Tuberculose ose Genitouri Genitourinária nária em pacientes autopsiados num hospital geral. J. Br Urol. 1982; 8:22-6. 2. Gando Gandolph lphoo L, Schor N. N. In: Schor Schor N, Srougi Srougi M. Nefrolog Nefrologia ia urologia clínica. São Paulo, 1998, 160-6.
Esquemas de orientação diagnóstica e de orientação terapêutica.
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