a que Brugmann acabara de perceber, evolução surpreendente, já que uma consoante nasal, o n , transforma-se assim numa vogal oral a (nenhum dos dois, aliás, npm seus sucessores, se deu conta desse processo para o qual propusemos uma explicação há alguns anos):2 esclarecia-se, destarte, o tipo de alternâncias do grego tív-cjv / tóv-03 / t
57
teoria da raiz que iria servir de base a todos os estudos ulteriores. trata-se do esquema consoante + vogal + consoante (tipo * ten) que, graças ao jogo flexível das alternâncias vocálicas e consoninticas, pode assumir formas extremamente variadas, algumas delas, consideradas até então aberrantes, encontraram então uma explicação racional. Por fim, Saussure, colocado perante o caso aparentemente insolúvel de alternâncias que, em certas raí zes, pareciam encontrar-se fora do jogo normal f/o/zero (como o tipo latino fêt / /let u s ) , imaginava, por motivos puramente teóricos, a existência em indo-europeu de um fonema (que se chamou mais tarde hva, grafado ?) que se integrava no siste ma assaz flexível das soantes, mas que teria desaparecido nas línguas historicamente atestadas; ora, esta solução, que pareceu audaciosa para a época e só a custo foi admitida, não era, na realidade, senão uma genial presciência, como o mostrou o deciframento do hitita (que foi realizado só depois da morte de Saussure): nessa língua, que fez remontar nosso conhecimento do indo-europeu ao segundo milênio antes de nossa era, encon
tram-se
efetivamente atualizados esses fonemas natureza Saussure pressentira com rara felicidade.1
cujo
papel
e
O Mémoire teve uma ação decisiva no desenvolvimento da ciência lingüística e não 6 exagero dizer que a partir de
58
célebre foi Antoine Meillet (falecido cm 1936), Meillet espírito darividente e erudito de primeira linha] que durante cerca de quarenta anos foi considerado por seus colegas e alunos como um mestre incontestável e res peitado. Meillet é o autor de uma série de volumes predosos pela segurança da informação bem como por essa difícil arte de apresentar claramente fatos amiúde muito embaraçados; num formato mais modesto que o Grundriss, seu Introdution à Vétude omparative des langues indoeuropéennes, é outro livro mestre da Lingüística clássica. As pesquisas da escola dos neogramátiPapel da escola dos cos, nas quais a nitidez das deduções se neogramáticos aliava à mais avançada erudição, passa vam, com justiça, por um dos triunfos do método positivista do século XIX, a tal ponto que muitos espfritos sensatos pensavam então que, entre as dêndas histó ricas, a Lingüística não se achava longe de atingir o estádio de perfeição e estavam persuadidos de que o futuro só traria aperfeiçoamentos ou acomodações de pormenor. O próprio Antoine Meillet escrevia, em 1903, no histórico que se seguia ao seu Introdution: “Num sentido pelo menos, parece que há um limite impossível de ultrapassar”, 1 frase que deixava sub sistir na última edição publicada cm vida: “Num sentido, che gáramos, por volta de 1900, a um limite impossível de ultra passar*acrescentando mesmo que a descoberta de novas línguas não renovara nossa representação do indo-europeu: o hitita “não obriga a mudar nada de essencial nas doutrinas aqui expostas; ele esclarece numerosos fatos, mas não transforma a teoria gerar*.1 ■, Desde o fim do século XIX, entretanto — além do fato de que nossos conhecimentos se enriqueceram de modo singular —, os próprios fundamentos da Gramática comparada e a maneira pela qual encaramos esta disciplina mudaram sobremaneira; não diremos, é claro, que o Grundriss de Brugmann e o Introdution 1. 2.
P. 410. 7.“ <|J 1934, pp. 479-480.
}9
de Mc:'let tenham perdido toda a utilidade: longe disso, mas se nio podemos dispensar ainda hoje as coleções de fatos que nos apresentam e as classificações que nos propõem, somos levados, no entanto, a utilizar esses volumes com certa reserva no que concerne à exploração doutrinai dos documentos e à fisionomia’ que emprestam assim ao indo-curopcu comum.
Acontece que os neogramáticos brilharam sobretudo nos trabalhos eruditos da técnica comparativa; preocupados com assentar solidamente suas pesquisas e só adiantar aquilo que fosse imediata e materialmente controlável, deixaram-se levar amiúde por estudos de pormenor, a tal ponto que nos aparecem, por vezes, como eruditos de rígidas concepções, de exposições precisas mas secas, e dos quais se poderia perguntar se jamais consideraram as línguas que estudaram tão cuidadosamente outra coisa que não fossem poeirentos elementos de museu, sobre os quais se inclinaram com o prazer frio e calculado da dissecçio cientificamente conduzida. Não tentaram, em verdade, abordar os problemas de Lingüística Geral, contentando-se com referir-se a Hermann Paul que, em seu famoso Prinzifríen der Sprakgeshihte (1880), se fizera o teórico da escola e tivera o cuidado de proclamar bem claro que o único estudo científico da lin guagem era o histórico; todavia, apesar da riqueza de seu con teúdo, esse livro um pouco denso e nem sempre claramente composto exerceu pouca influência fora dos países de língua alemã. De um modo geral, aliás, os Junggrammatiker, por uma fidelidade demasiado exclusivista is concepções mecanidstas e pela excessiva importância dada ao desenrolar dos fatos cm seus pormenores, não perceberam o interesse do conjunto ou pelo menos se recusaram deliberadamente a meter-se pelo caminho que levava à edificação de uma teoria geral acerca da lingua gem, caminho julgado por eles insuficientemente preparado e por isso arriscado. Estas verificações de modo algum têm por objetivo dene grir a escola dos neogramáticos ou diminuir-lhe os méritos; isso seria profundamente injusto pois, no estado dos conhecimentos da época, a obra desses eruditos constituiu um esforço fecundo e preparou o futuro; é enorme a dívida de gratidão que temos para com eles.
60
Nos úlumos anos do século passado, apareceram, sem que sc suspeitasse de sua importância, os primeiros fermento* de uma total renovação da Gramática comparada e da Lingüística. Numa tese publicada em 1891, Ls modif iations
A fonética phonètiques du langage itudiées dans le patois d’une fam'dl de CeUefrouin, o padre P. Rousselot, que assim preparava os caminhos da Geografia lingüística, 1 publicava os resultados de uma investigação — coisa quase nova na época — que ele promovera em tomo de um falar vivo, notadamente graças a um exame tão preciso quanto pos sível do fonetismo dos falantes. Desde então, aplicando, ao estudo dos sons da linguagem, os métodos experimentais das ciências física e fisiológica, e criando, para este fim, uma téc nica instrumental de análise e de registro, Rousselot tornou-se o iniciador da Fonética moderna que, tanto no plano da história como no da estrutura, procura radonalmente tirar o fruto das experiências, desprezando o ensino, cm grande parte livresco, no qual se tinham baseado até então os lingüistas. Entre os alunos de Rousselot, cumpre citar Maurice Grammont, neogramático de estrita observância, 2 cuja tese sobre a dissimilaçio consonântica (1895) terminava por reforçar o conceito da regu laridade das leis fonéticas, e Antoine Grégoire; este último, depois de ter sido o primeiro a introduzir na Bélgica o ensino da Fonética, fez-se o promotor avisado da lingüística infantil, estudando sistematicamente a formação da linguagem desde os primeiros balbucios do bebê até o momento em que, ao fim do segundo ano ou no começo do terceiro, a criança adquiriu os elementos da estrutura lingüística.* 1. 2.
Cf. pp. 66-67. Os Prínipes de. phonitique experimental* de Pierre Rous8 blot, publicados em fasclculos de 1897 a 1908, e que constituem uma obra monumental, mas redigida sem um plano preciso; pelo contrário, o Traité de phonétique de Maurice Grammont, publicado em 1933, apresenta os fatos de forma sistemática, aliás, dogmática. 3. Antoine Gríooirk, V apprentissage du langage. Tomo T: Lei deux premUres années , Paris-Liège, 1937; Tomo II: Lt i troisiime année et let années sutu antes, Paris-Liège, 1947 ("Bibliothèque de la Faculte de Philosophic et Lettres de TUnivenité de Liège-, ímc. LXXIII e CVI).
61
O termo foi proposto cm 1883 por Michel
A semantic* Bréal, que justificava a introdução deste neologismo na linguagem científica pelas seguintes considerações: 4'O estudo para o qual convidamos O leitor a seguir-nos é de espécie tão nova que sequer recebeu nome ainda. Com efeito, é sobre o corpo e sobre a forma das palavras que a maioria dos lingüistas tem exercido sua sagacidade: as leis que presidem à transformação dos sentidos, à escolha de novas expressões, ao nascimento e morte das locuções, ficaram na obscuridade ou só foram indicadas de passagem. Como este estudo, tanto quanto a Fonética e a Morfologia, merece ter seu nome, denominá-lo-emos Semântica (do verbo cnr)|jia(vÊlV), isto é. a ciência das significações”.1 Se Bréal criou a palavra em 1883, a disciplina que ele assim designava nem por isso era tão nova; sem recordar as numerosas observações que os Antigos dedicaram às particula ridades do vocabulário, embora em ordem dispersa e sem preo cupação de método, é preciso lembrar que desde o início do século XIX, a Gramática comparada só se pudera construir com apoio num exame aprofundado das palavras comuns às diferentes línguas da família indo-européia, mas aí era a preocupação etimológica que prevalecia; se se propunham agrupamentos de ter mos, isto se dava unicamente por motivos de forma: relações no plano fonético ou morfológico. Nos Prinzipin der Sprab gesbible de Hermann Paul, dedicara-se um capítulo de umas trinta páginas às evoluções semânticas (“Wandel der Wortbedeutung”), as quais eram estudadas e classificadas segundo os princípios lógicos herdados da tradição aristotélica e que muito êxito tiveram: oposiçio do abstrato e do concreto, especializa ção, generalização, restrição, deslizamento e outros processos tomados de empréstimo ao ensino retórico: metáfora, eufemis mo, litotes, etc. Não nos esqueçamos, com efeito, de que se, depois de Bopp, os lingüistas do século XIX foram rcvolucioI. Michel Br£al, Les lois intelletuelles du langage; fragment de sámantique em Annuaire de Vassoiation pour Venouragement dei itudes greeques en Frane , t. XVII (1883), pp. 132-142. — mente, o termo semântia também foi empregado em outras acepções, cf. p. 206, n. 5.
62
Posterior
nários e inovadores de gênio no plano da comparação das línguas indo-européias, permaneceram discípulos fiéis da gramática tra dicional à Port-Royal; assim, as análises de Paul diziam respeito, numa perspectiva psicológica, antes aos conceitos do que is palavras. Embora retomando por sua conta certas distinções termi nológicas utilizadas por Paul (como especialidade, restrição, me táfora,—), Bréal teve a originalidade de partir das próprias palavras e de tentar dar conta dos processos semânticos, liber tando-se dos quadros preestabcleddos: seu livro, de que certas páginas constituíam uma polêmica vigorosa contra as concepções “naturalistas” à Schleicher, levava como subtítulo “Ciência das Significações”. Teve grande êxito não só junto ao público culto como também entre os filólogos e, de modo geral, entre os pro fessores, mas no campo dos especialistas, dos linguistas propria mente ditos, teve uma acolhida dividida, tendo suscitado até uma série de vivas polêmicas. Enquanto Schuchardt, sempre pronto a combater nas posições de vanguarda, não hesitava em proclamar a importância da Semântica para as pesquisas etimológicas, a maioria dos comparatistas, tais como os romanistas Gaston Paris e Antoine Thomas, atinham-se, ao contrário, ao dogma da infalibilidade das leis fonéticas e exprimiam sua des confiança para com uma “ciência” que lhes parecia fundamen talmente caprichosa e rebelde. E Bréal, no entanto, era bem um homem de seu tempo e seu Essai de símarttique (1897) se inscreve na linha geral dos trabalhos da época, quando mais não íosse pelos dois traços característicos seguintes: interessa-se unicamente pelas evolu ções de sentido e é assim fiel à concepção dos neogramáticos segundo a qual só o estudo histórico da linguagem é próprio de uma disciplina científica; por outro lado, as diferentes ten dências que pareciam dar conta das evoluções semânticas sio apresentadas sob forma de leis e o próprio titulo desse artigo dc 1883, em que aparece pela primeira vez a palavra semântia, é “As leis intelectuais da linguagem”: aqui também, pois., Bréal se conforma ao prestígio da Lautgesetz c à preocupação dos neogramáticos de construir a Lingüística conforme o modelo das ciências ditas “exatas”. Mas ele reage com muito bom senso contra o excesso de doutrinarismo ao declarar em seu 6)
prefácio: “Para pôr ordem neata pesquisa, dispus os fatos sob um certo número de leis; ver-se-á, mais adiante o que entendo por lei, expressão que não deve ser tomada no sentido imperarivo. Nào são tampouco leis sem exceção, leis cegas, como, sc se deve dai crédito a alguns de nossos colegas, as leis da Fonética/* Além disso, Bréal tira, dc suas pesquisas semânticas, a conclusão de que não se poderia encontrar na evolução lingüís tica “uma marcha cm linha reta, sem flutuação nem desvio”, o que implica conseqüências metodológicas graves para o edi fício inteiro, dc fachada aparentemente tão sólida, que os Jung grammatiker construíram, escolhendo — pois se trata exata mente, repetimos, do problema capital da esolha que se coloca para a Lingüística assim como para todas as ciências humanas — os dados que apoiavam suas teses, e reduzindo ao mínimo aqueles que se lhes opunham. É por isto tudo que o “inventor” da Semântica não esteve longe de ser considerado pelos fiéis das leis fonéticas como um autor falto de rigor e método. Não é bem característico o fato de que os cinco tomos em dez vo lumes do Grundriss de Brugmann e Delbrück não dêem o mínimo lugar à Wortbedeutung, malgrado o exemplo dos Prinzipien de Paul? E se Meiliet, em sua célebre Introdution, dedica um capítulo ao vocabulário, é unicamente no plano da comparação e mais particularmente a fim dc precisar o tipo de civilização do “mundo indo-europeu comum". Concebida por seu criador como um capítulo da Lingüística histórica, é essencialmente sob esse ângulo que, durante mais dc meio século, seria estudada a Semântica: 1 veremos, mais 1.
Cf. a obra clássica de Arsènc Darmesteter, La me dei mots étudiée dans leurs signifiations , Parif, 1886. — Ant. MeilLKT, QUC deixara de íalar da Semântica na sua Introdution , expôs luminosa mente as concepções da escola sociológica sobre essa disciplina na sua importante memória Comment let mots hangent de sens {Annie so iologique, t. IX, 1905-1906, pp. 1-38 = Linguistique historique et linguistique generate, t. I, Paris, 1921, pp. 230-271); Kr. NvitOP COnsagrou à Semântica o tomo IV (1913) de sua Grammaire historique de la langue française. E cumpriria citar também toda a corrente dos Witter ^nd Saehen (cf. p. 67), Gilliéron e a Geografia lingüística (cf. pp. 66-67), Bartoli e a neolingüistia (cf. pp. 166-168), sem rsíjucccr o Dilionnoire étymologique de la langue latine (1.* ed., 1932;
64
adiante, como, nestes últimos anos, da conheceu total reju venescimento.1 Na segunda metade do século XIX, a A teoria das ondas Stammhaumtheorie se impusera à aten ção dos lingüistas; era considerada tio evidente que não necessitava de demonstração. Foi um discí pulo de Schleicher, entretanto, Johannes Schmidt, que, desde 1872, em um trabalho de pouca extensão mas de considerável importância metodológica, 1 se opôs a essa concepção simplista das coisas. Inspirando-se em idéias emitidas um pouco antes, no tocante às línguas românicas, por Hugo Schuchardt — que ele talvez fez mal em não citar em sua exposição —, Schmidt propunha substituir a imagem da árvore genealógica pela ima gem das ondas propagadas na superfície da água pela queda de uma pedra, as quais se afastam progressiva e concentricamente de seu centro de irradiação para imbricar-se com as ondas provocadas pela queda de outras pedras: de igual modo, deve ríamos representar-nos a propagação das particularidades diale tais; as áreas de extensão de cada uma delas são limitadas por linhas (as isoglossas) que, longe de coincidir, se entrecruzam e formam uma grande complexidade de traços dialetais, pois assim é que o domínio indo-curopcu do período de unidade deu lugar a um domínio mais vasto, formigante dc isoglossas entremeadas. O rígido esquema schleicheriano, que repartia cm ramos independentes as línguas saídas de um tronco comum, Schmidt o substituía, no plano espacial, pelo conceito de conti nuidade lingüística; as áreas dialetais de um mesmo domínio original diferenciam-se à medida que se acentuam as distâncias que as separam e também por causa das condições políticas, religiosas e sociais. Esta Wlientbeorie, tentativa de imaginar 4.1 ed., 1959) de Alfr. Runout e Art. Meillet, que a inovou introdu zindo a história das palavras nas pesquisas etimológicas; em 1968, Pierre Chantraine deu inicio à publicação de um Ditionaire ityvnologique de la langue greeque, que também dá grande atenção às signi ficações, à sua classificação e evolução. 1. Pp. 204-215. 2.
J. Schmidt, Die VirwandtsehaftsverhBUnisst der indogermú•
nisehen Spraehen, Weimar, 1872.
65
devem ter-se passado, deixava certamente uma na obscuridade e também não previa a com das evoluções lingüísticas; os estudos poste porém, que numa parte nada desprezível, ela em todo caso, numa época cm que o pres tígio de Schleicher era muito grande, tal teoria teve o mérito dc constituir uma feliz reação contra suo dogmática ascendência.
como as coisas porção de fatos plexidade efetiva riores mostraram cr^ fundamentada;
A tese de Rousselot sobre o falar A «Geografia lingüística de Cellefrouin, bem como as pes quisas realizadas na Itália por As* coli, na Alemanha e na Áustria por Schuchardt tinham preludiado a criação da Geografia lingüística, cujos métodos seriam difundidos, por volta de 1900, pelos trabalhos do lingüista franco-suíço J. Gilliéron. Resultante dessa soma monumental de minuciosas e pacientes pesquisas que se condensaram no Atlas Lingüístio da França e tirando sua seiva do estudo dos dialetos vivos (uma crescente atenção será dada às noções de empréstimo, de substrato e, mais recentemente, de superes tra to ),1 a nova ciência estuda a repartição geográfica das formas e das palavras, bem como suas áreas de extensão, e procura traçar os limites dialetais. Embora tenha combatido, no início, o método histórico, ela contribuiu poderosamente, graças às numerosas formas recolhidas, que permitem reconstituir as eta pas intermediárias), para a história das palavras, consideran do-as não como entidades isoladas, mas como elementos de um todo; pôde-se dizer que se tratava de uma verdadeira geolo gia da linguagem, que reconstituiria, “por seus afloramentos atuais, as camadas sucessivas das palavras em grande parte enterradas.'* 1. Assim, para o francês do Norte, poder-se-á considerar um substrato céltico (língua dos habitantes no momento em que o latim foi implantado na Gilia) e um superestrato germânico (traços deixados pelas invasões germânicas); e as palavras de línguas vizinhas, como o inglês, o alemão, o italiano, etc. que, em épocas diversas, penetraram no francês, donde os empréstimos (ou a dst ratos). 2. A. Dauzat, La giographie linguistique (Paris, 1922), p. 30. Bncontrar-se-á um excelente apanhado dos métodos e dos desen volvimentos da Geografia lingüística na introdução ao estudo das línguas romlnicas que I. Iordan publicou em mmeno em 1932 (2.*
66
Renunciando ao conceito demasiado simplista da analogia freqüen temente invocado pelos neogramáticos como o supremo recurso para explicar o que eles consideravam como anomalias (Gilliéron falava na “falência da etimologia fonética"), a Geografia lingüística se aplica a considerar o meio em que a linguagem se banha: esta preocupação com etimologizar, colocando cm fntima relação as palavras e as coisas que elas representam — espécie de estudo biológico da linguagem —, traduzir-se-á no movimento das Wôrter und Saben.1 Comprova-se também a multiplicidade das linhas de isoglossas e o constante entrecruzamento de seus feixes; enfim, as observações feitas sobre a repartição dos falares contribuem para assestar um golpe mortal no dogma neogramático da infalibilidade das leis fonéticas. Mau grado as teses defendidas por Schmidt, Aa línguas a teoria schleicheriana da árvore genealógica em turn satdm encontrara, junto aos neogramiticos, uma consagração implícita na medida em que o esquema da filiação era invocado para a classificação dos diale tos, como o mostram as noções, admitidas por eles, de unidades intermediárias, tais como o “grego comum", o “germânico co mum” ou mesmo o "balto-eslavo” ou o "ítalo-céltico”; não se insistia quase nada, todavia, nas modalidades da repartiçio dialetal e a única isoglossa que encontrou lugar na obra de Brugmtnn era a famosa distinção entre as línguas entum e as línguas satdm, assim chamadas segundo a forma tomada pek> numeral “cem” respectivamente em latim e avéstico, pois estes dialetos foram escolhidos como tipos representativos dos dois grupos. Ora, o fenômeno fonético em que eles se baseavam cd«, 1962); esse volume, publicado em inglês por iniciativa de J. Ou, An Introdution to Romane Linguistis % (Londres, 1937) pode ser consultado agora na edição alemã de W. Bahner, Einführung in die Geshihte und Mtthoden der romanishen Sprhwissenshaft (Berlim, 1962) ou na edição espanhola de M. Alvar , Linguistie romániea. Evoluión. Corrientes. Métodos (Madri, 1967). 1. Ê o título do periódico fundado por Meringer em 1909; a fórmula, porém, já andava no ar havia vários anoa e houve mesmo toda uma polêmica a esse respeito entre Schuchardt e Meringer; cf. Kukbnheim, Es quis st historique (cf. p. 7, n. 2), pp. 90-91.
67
para firmar esta bipartição era, na realidade, apenas um fato banal da evolução fonética: oclusivas velares, sobretudo em (quando se encontram, por certas circunstâncias favoráveis exemplo, diante de uma vogal anterior) se palatalizaram e, con seqüentemente, tornam-se fricativas chiantes ou sibilantes (ao lado do lat. entum, gr. ê-xaTÓv, ir. ét, gpt. bund, temos av. satom, sânsc. çatâm, v. esl. süto, lit. sim ias); é um tipo se melhante que se encontra na Romania, onde o latim eruu (com inicial k) deu o italiano ervo (c-), o espanhol iervo (0-), o francês erf (i-), etc.1
Tal
repartição foi admitida tanto mais facilmente pelos Junggrammatiker quanto recobria uma distinção geográfica, pois as línguas ditas entum representavam, com efeito, um grupo ocidental (céltico, germânico, itálico e grego) por oposição às línguas ditas satdm, que formavam um grupo oriental (balto, eslavo, albanês, armênio e indo-iraniano). Mas novos fatos alar garam nosso conhecimento das antigas línguas indo-européias e modificaram o curso de nossos estudos: trata-se da descoberta do toca'rio e do hitita. No começo do século XX, uma missão francesa encontra no Turquestão chinês, em pleno coração do continente asiático, textos que são, em parte, traduções de obras religiosas sânscritas, mas em que figuram também documentos (cartas, contas de comerciantes, salvo-condutos de caravanas) que provam tratar-se, de fato, de uma língua corrente na época (segunda meta de do primeiro milênio de nossa era); é o tocário, cuja decifração foi fácil graças à existência de textos bilíngües. Alguns anos mais tarde, em 1906, escavações feitas por alemães revelavam, em Boghaz-Kõy, pequena aldeia a leste de Ankara, os arquivos de um império, cuja história ficara com pletamente desconhecida até então e da qual nem sequer se suspeitava; a língua da maioria desses textos, de conteúdo ex1.
O caso das línguas românicas nas quais a palatal ilação está, em geral, condicionada pela presença de vogais anteriores (embora no francês do Norte ela se produza também diante de a: ar ru^ har, c mesmo diante de consoante: faetu^fait) é, portanto, repitamos, similar e não idêntica à das línguas iat*m; ver a esse respeito a crítica construtiva de V. Pisaxi em Paideia, t. XXI (1966), pp. 306-308.
68
tremamente variado, era o hitiia, cuja leitura passou a ser em preendida a partir de 1916, graças à intuição do sábio checo Hrozny. Foi considerável a repercussão do conhecimento dessas duas línguas; antes de sua descoberta, ignorava-se que, entre os grupos de indo-europeus que partiram para a conquista de novas terras, alguns haviam fundado, no segundo milênio dc nossa era, um poderoso império na Ásia Menor, enquanto outros tinham penetrado a fundo rumo leste e criaram, na*Ásia Cen tral, uma civilização que deveria afundar-se nas areias de Turfan e dc Kutcha. Uma outra conseqüência desse enriquecimento do domínio indo-europeu foi a de perturbar a imagem que comumcntc se fazia das jrelações entre as línguas da família. Teria parecido natural que o hitita e o tocário, línguas indo-européias recente mente descobertas, entrassem no grupo dos dialetos orientais: ora, sua decifração mostra que elas eram, ao contrário, do tipo entum e apresentavam, pois, afinidades com as línguas que, geograficamente, mais afastadas estavam delas. Havia aí, pelo menos aparentemente, um paradoxo que se iria revelar rico de ensinamentos e encontrar sua explicação no seio de uma nova disciplina — a Dialetologia indo-européia 1 — de tal modo que, contrariamente à opinião de Meillet acima citada, 1 esses novos testemunhos subverteram perspectivas consideradas solidamente estabelecidas, bem como, por outro lado, possibilitaram a ela boração de novas teses sobre a estrutura do indo-europeu* Seria injusto, de outra parte, não Os conceitos de progresso assinalar que, na segunda geração e de perfeição dos neogramáticos, houvera mais de um espírito desejoso de elevar o debate lingüístico ao nível de uma especulação dc ordem filo sófica. Já assinalamos — e este é um assunto de que ainda iremos tratar — o papel eminente desempenhado por Meillet nesse sentido; prestemos também homenagem ao foneticista 1. 2. 3.
Ver. pp. 175-180. Ver. p. 59 Ver pp. 179-180.
69
dinjmjrqués Otto Jespcrsen, que, no plano restrito da evolução lirçüística, tentou fazer da noção de progresso o supremo prin cípio de explicação; 1 seduzido, ao que parece, pela filosofia evolucionista de Spenccr c Darwin, e ainda sob a influência de Schleicher, que considerava a linguagem como um organismo vivo, Jcspcrscn insurgiu-se contra a opinião, arraigada no espí rito dos primeiros separatistas, de que as línguas antigas, gra ças à riqueza de suas formas gramaticais, representavam um
estágio superior em comparação com o qual as línguas modernas não passavam de parentes pobres. Jespersen, que se abstinha de recorrer a hipotéticas e aventurosas reconstruções e limitava seu estudo ao exame de estados de língua atestados, pretendia que, no curso da história de uma língua, a soma de transfor mações mostra um excedente de mudanças “progressivas” rela tivamente às mudanças “retrogressivas” ou “indiferentes”; em outros termos, os ganhos seriam mais consideráveis que as per das. E invocava o fato de que as formas gramaticais, com sim plificarem-se, sobrecarregam menos a memória; que são em gera] mais curtas, o que exige menos esforço muscular; que sua formação e emprego sintático apresentam menos irregula ridades; que maior clareza resulta da fixação da ordem das palavras, etc.; enfim, trata-se de um conjunto de modificações que tornaria as línguas modernas mais práticas que as antigas e, conseqüentemente, mais aptas para traduzir todos os aspectos da civilização humana. Era, vê-se bem, um novo aspecto da eterna querela dos antigos e dos modernos. Mas, para “reabi litar” as línguas modernas — se é que tal necessidade ainda se fez sentir na época —, seria necessário arriscar um julga mento de valor em nome de princípios que são eminentemente contestáveis, pois repousam em fatos encarados de modo sub jetivo. Porque, no tocante aos argumentos invocados por Jes persen, seria cômodo — e igualmente vão — retomá-los em sentido contrário, mostrando, por exemplo, que a simplificação das formas gramaticais constitui um empobrecimento; que, se as formas são mais curtas, são também menos claras, etc. I. Otto Jespersen , Progress in Language, Londres, 1894. —
Cf. J. Bnobls, Y a-í-i/ du progris dans le langage? em Niophilologus, t. XL (1956), pp. 242-249.
70
Ao conccito dinâmico dc progresso, assim utilizado por
Jespersen, correspondeu, no plano estático, a convicção muito difundida dc que é possível classificar as línguas segundo certo ideal de perfeição: eis o que alimenta sem motivo as querelas entre comunidades lingüísticas vizinhas e é explorado sem es crúpulos por aqueles que têm interesse em excitar os sentimen tos particularistas ou nacionalistas. De fato, a mentalidade po pular é, por natureza, crítica com relação ao vizinho, cuji língua critica, tanto quanto os costumes; basta observar que os empréstimos assumem, de ordinário, um matiz pejorativo: a rosse do francês é bem diferente do nobre corcel que este termo designa cm alemão; um hâbleur é o que fala com gabolice, como um espanhol, mas o parlador espanhol é um indivíduo falador como um francês...; e assim poderíamos multiplicar os exemplos. Idêntica ilusão no que concerne à impressão acústica: um francês está persuadido de que a palavra alemã zwitsbern tem um pronúncia difícil, senão desgraciosa, mas ele nem suspeita que palavras como vin, bon, bane, un, que lhe parecem tão simples, exigem de estrangeiros, que não conhecem vogais nasais em seus idiomas, uma difícil ginástica articulatória. Na reali dade, essa noção de fácil ou difícil, gracioso ou desgracioso depende sobretudo dos hábitos articulatórios e acústicos adqui ridos na primeira idade da vida, por ocasião da aprendizagem da linguagem; daí por diante, o sentimento do menor esforço faz facilmcntc parecer pouco cômodo aquilo que é apenas insó lito. O mesmo acontece, ainda, no que respeita à morfologia ou à sintaxe ou ao vocabulário; que uma língua estrangeira nos pareça fácil ou difícil de ser adquirida conforme esteja próxima ou afastada de nosso próprio sistema lingüístico e exija de nós, por conseguinte, um esforço ligeiro ou considerável — eis aí um truísmo; mas que semelhantes considerações se tomem para nós um julgamento de valor, eis o que é injustificado. Nada mais dessemelhante que o grego homérico, caracte rizado por uma grande riqueza de formas flexivas, e o inglês, em que as palavras são, por assim dizer, invariáveis; nada, entretanto, nos autoriza a compará-los em nome de um ilusório critério de perfeição. Querer saber, por exemplo, se Homero (qualquer que seja a realidade que esconda esse nome), caso
vivesse na cpoca moderna na Inglaterra, poderia, servindo-se do inglês, criar uma lliada ou uma Odisséia com o mesmo cr. can to e o mesmo sopro épico, ou se Shakespeare, caso vivesse na Grécia uns dois mil anos mais cedo, teria podido, utilizando o grego, impregnar sua obra do mesmo poder dramático, eis questões perfeitamente ociosas. Na verdade, qualquer homem que tenha algo a dizer pode encontrar, em qualquer língua, a expressão adequada ao seu pensamento; os autores que impu tam à sua língua as fraquezas de suas próprias obras procuram simplesmente uma má desculpa. Descartes notara-o bem ao escrever: “Aqueles que têm o raciocínio mais sólido e que digerem melhor seus pensamentos, a fim de tomá-los mais claros e inteligíveis, podem sempre ser mais persuasivos no que propõem, ainda que falassem o baixo-bretão”. 1 Se não há, de fato, critérios internos que permitam decidir se tal língua é superior a tal outra, há fatores externos que criam, bem ou mal, uma hierarquia entre as línguas; porque o destino das línguas depende não de seu valor próprio mas antes da fortuna dos grupos de homens que as falam. Foi graças ao brilho de sua cultura, ao esplendor de seus escritores (muito mais do que ao papel político que desempenhara no século V) que Atenas conseguiu impor o seu falar, o qual se tornaria a base da língua comum do mundo helenísdco, a xoiWj. Ora, entre os dialetos gregos, nenhum fator propriamente lingüís tico predispunha o ático a exercer esse papel; ao contrário, enquanto o jònico e o lésbico da Ásia, bem como o dórico da Sicília, se haviam depurado, tomando-se línguas de civilização, o ático permanecera, até a sua súbita expansão no século V, o falar atrasado de um cantão rural da Grécia continental. Assim também, foi graças ao poderio econômico e militar de Roma, ao senso político de seus dirigentes e, sobretudo, graças ao prestígio da civilização a que servia de veículo que o latim, humilde falar de uma pequena região da Itália, conquistou fl península, e se estendeu depois por todo o Império Romano, em grande parte do qual conseguiu estabelecer-se de modo es tável, suplantando numerosos dialetos: o valor intrínseco do I. Disours dt la Méthode. Primeira parte (cd. Fr. Mizrachi. Ptris, 1965), p. 29.
72
latim tampouco tem a ver com essa prodigiosa expansão, Dc igual modo, na época moderna, as línguas dos povos coloniza dores desempenham o mesmo papel de línguas superiores em relação às dos indígenas. Cumpre também notar que o fato de apoiar-se em grandes religiões militantes traz, para uma lín gua, prestígio considerável: assim o Islamismo e o Cristianismo difundiram na África o árabe e as línguas dos missionários, o francês, o inglês, o português. Em sentido inverso, acontece entretanto que, no domínio da religião, uma língua insólita, de compreensão difícil ou mesmo impossível para o vulgo, goze de grande prestígio; línguas como o védico, o avéstico, o latim continuaram e continuam a ser empregadas como línguas sagra das muito depois de estarem fora de uso. É o efeito do pres tígio psicológico que, cm matéria dc fé — c a fé é uma forma eminente de força social — se vincula aos âados inverificáveis. 1 De qualquer modo, a hierarquia das -línguas é um fato social e não lingüístico, pois se estabelece por motivos estra nhos à própria língua. Se retomássemos a asserção de Descar tes, acima citada, diríamos que um filósofo poderia muito bem compor um tratado filosófico cm bretão, mas sua obra não seria nem lida nem compreendida: os bretões que falam bretão, camponeses e pescadores que são, não se interessam pela Filo sofia e os filósofos, que ignoram o bretão por não ser ele uma língua de cultura, não poderiam tomar conhecimento desse tratado.2 Esta digressão levou-nos a chamar a atenção para o fato social na linguagem, ao qual os ncogramáticos sc mostraram sensíveis; mais adiante3 diremos como, na aurora de nosso sé culo, os lingüistas franccses, alunos rigorosos dos ncogramáti cos, dedicaram-se à valorização desse aspecto de nossa disdpli1. Nesse caso, a técnica da escrita pôde desempenhar um papel importante: permitiu fixar os dogmas e as legendas e favorecer a exis tência de grupos de religiosos depositários da doutrina e superiores por seu saber à multidão ignorante. — Cf. E. Dupréel, SoilogU gJnJraU (Paris, 1948), p. 242. 2. Cf. J. VENDByes, Le Langage, 4* ed. (Paris, 1950), p. 407. 3. Pp. 149-155.
na; o esforço de um Meillet, de um Vendryes, para alargar o horizonte dos lingüistas e fazer com que tomassem consciência dos problemas dc conjunto, tem considerável repercussão. To davia, um mestre como Meillet, que certamente nada tinha do
especialista estreito, de visão bitolada, e de quem se conhece a inteligência límpida, o gosto das idéias, o gênio da síntese clara e evocadora, continuava de tal modo impregnado por sua formação estritamente positivista, que, ainda em 1923, acontecia-lhe escrever paradoxalmente (com uma intenção polêmica, em verdade):1 "A experiência mostra que um íato novo bem analisado contribui mais para o desenvolvimento da Ciência que dez volumes de princípios, ainda que bons.” Mas, nesse meio tempo, houvera Saussure.
1. Tratava-se do resumo de um trabalho de Bartoli (ver pp. 166-168), que Meillet combatia severa e asaaz injustamente: Bulletin dt U Soiité de Linguistique de Paris, t XXIV (1923), p. 85.
74
FERDINAND DE SAUSSURE
Vimos como, em 1878, o Mémoire de Saussure mostrara novos caminhos à Gramática comparada e, em grande pane, estivera nas fontes do notivel desenvolvimento imprimido a essa disciplina pelos neogramiticos; a quarenta anos de distân cia, será uma outra obra do mesmo sábio, mas publicada em condições bem diferentes, que irá exercer influência decisiva em outro campo de nossos estudos, aquele da Lingüística Geral. Saussure voltara a Genebra em 1891 para ocupar uma cadeira de “história e comparação de línguas indo-européias” que a Universidade de sua cidade acabava de criar para ele; a isso juntou-se, em 1906, o ensino de “Lingüística’* — curso que, desde sua criação, em 1877, havia sido dado, sem brilho, por J. Wertheimer — e é nesse quadro que o mestre ministrou três cursos de Lingüística Geral em 1907, cm 1908-1909 c em 1910-1911. Contudo, há muito que a elaboração dc uma teoria de conjunto constituía o tema essencial das reflexões dc Saus sure; já cm 1894 ele confiava a Meillet que estava preocupado com a classificação lógica dos pontos de vista sob o qual o tratamos e terminava sua carta escrevendo: “Isso, infelizmente para mim, irá acabar num livro em que, sem entusiasmo nem paixão, explicarei por que não existe um único termo usado em Lingüística ao qual eu atribua um sentido qualquer *’.1 1.
CahUrs Ferdinand Saussure , t. XXI (1964), p. 95 (publica ção, por Êmile Benveniste , das cartas escritas por Saunurv a A. Meillet, de 1894 a 1911).
77
Esse livro que ele tinha dentro de si nunca foi escrito; e mais, ele se recusara a publicar a matéria dc seu ensino de Lingüística Geral, por julgar que não exprimia seu pensamento definitivo. Por isso, quando morreu, em 1913, tinha cm seu ativo, além do Mémoire, apenas artigos de Gramática compara da e não publicara uma linha sequer a respeito desses proble mas que tinham absorvido grande parte de suas reflexões e dos últimos anos de sua atividade professoral. Foi então que dois de seus amigos, Charles Bally e Albert Sechehaye, empre enderam a piedosa c delicada tarefa de recriar a obra saussuriana; eles próprios não haviam sido alunos do mestre e, não dispondo dos rascunhos ou esquemas de suas conferências (só recentemente é que as notas pessoais de Siussure foram encon tradas e usadas), recorreram à colaboração dc Albert Riedingcr e aos cadernos de outros estudantes para redigir as exposições de modo coerente e apresentá-las depois numa ordem que melhor correspondesse às intenções do autor. Assim, foi pu blicado, em 1916, um Cours de linguistique gênérale que é portanto uma síntese reconstituída com base em lições dadas ao longo desses trés anos de ensino, 1 E essa obra, publicada em tão insólitas condições, iria seduzir por sua elegância geo métrica e impor-se desde a década de vinte (a Grande Guerra retardara um pouco sua difusão) para tornar-se o ponto central das reflexões a respeito da linguagem e ser a principal inspiradora (quer se perfilhassem ou se combatessem suas doutri nas) dos trabalhos de Lingüística Geral; tais eram o prestígio e o vigor de pensamento desse homem de quem Meillet dizia 1. Lausanne e Paris, 337 pp.; o Cours foi reeditado em 1922 com uma paginação ligeiramente diferente (331 pp.), que iria per manecer imutável nas edições posteriores (a quinta data de 1955). Nossas citações do curso referem-se is páginas da edição de 1955 (sim ples reimpressão, com pequenas correções de detalhe, da de 1922) mas comporiam também, entre parênteses, a indicação dos segmentos da edição crítica de R. Engler; sobre esta última e sobre os documentos que permitiram o estabelecimento do texto, cf. pp. 95-96. [Existe tra dução brasileira dessa edição de 1955: Curso d$ Lingüístia Girai , trad, por Antônio Chelini, Josl Paulo Paes e Izidoro Blikstein, pref. de Isaac Nicolau SaJum, Editora Cultrix — Editora da Universidade de São Paulo, S. Paulo, 1969).]
78
que “via as coisas científicas com olhos azuis de poeta e de visionário*'.1 A linguagem é um fenômeno de extrema complicaçío; a fim de dominar-lhe a complexidade e escapar às confusões, Saussure teve a audácia de libertar-se das pesquisas eruditas e minuciosas, em que se tinham confinado os comparadstas do século XIX e brilhado os neogramá ticos — tarefa paciente e, aliás, indispensável, em que ele próprio se distinguira — para tentar estabelecer leis gerais e fazer de untos trabalhos, notá veis pela precisão, mas faltos de envergadura, urna síntese inteligentemente concebida e solidamente construída. Espírito aberto, ávido de clareza, produziu uma obra que é sobretudo notável pela amplidão de horizontes que desvenda aos pesqui sadores; e o gênio de Saussure se reconhece melhor talvez pelo fato dc que muitas das proposições por ele emitidas nos parecem hoje truísmos, verificações de bom senso, que nío necessitam de demonstração alguma. É verdade que estas definições, em sua maioria, haviam sido entrevistas antes dele, e isso desde a Antiguidade, mas tais idéias, que estavam latentes e como que informes, Saussure teve o mérito excepcional de exprimi-las com clareza, preferindo recorrer a uma apresentação binária e apresentá-las em fórmulas bem cunhadas, de aspecto por vezes paradoxal ou excessivo (nelas se reconhece o estilo de ensino oral) e, sobretudo, de integrá-las * num sistema coerente* A mais bela homenagem que se possa prestar à originalidade e ao vigor do pensamento saussuriano é a simples verificação de que, desde então, foi muitas* vezes em discutir-lhe as teses — para aprová-las, modificá-las ou rejeitá-las — que os lin güistas empregaram o melhor de suas forças. 1. Les NouoelUs Littéraires , 8 de novembro de 1924. 2. Êra. Benveniste percebeu bem que, para Saussure, “a !«• guagem, sob qualquer ponto de vista que seja estudada, é sempre am objeto duplo, formado de duas partes, das quais uma só tem valor pda outra”: Saussure aprés un iemisièle em CahUrs Ferdinand de Som sure, t. XX (1963), p. 16. 3. Ê incontestável que Saunure tirou muitas idéias de seus predecessores, longínquos, como os estóicos (significante/significado, cf. p. 82) ou próximos, como Whitney, que ele cita no Cours, p. 1*0 79
E, sc quisermos tentar passar revista às principais cor rentes do pensamento lingüístico moderno, parece-nos pois in dispensável percorrer antes o Cours e dele tirar as conclusões essenciais, pelo menos aquelas de suas tomadas de posição que se tornaram como que idéias-forças cuja influência foi parti cularmente fecunda. A Lingüística, diz Saussure, é, na realidade, A arbitrariedade apenas parte de uma ciência geral mais vasta, do signo para a qual propôs o nome de Semiologia e que estudaria “a vida dos signos no seio da vida social”. 1 Importa então, no terreno lingüístico, proce der primeiramente à análise do signo. Saussure declara-o arbitrário, verificação de bom senso, sem dúvida, mas que ele formulou, com vigor, à guisa de princípio* A idéia de bouf [“boi”] não está ligada por nenhuma relação interior à seqüên cia de sons bof, que lhe serve de significantc; poderia muito bem ser representada por qualquer outra: “a prova está nas diferenças entre as línguas e na própria existência de línguas di ferentes: o significado ‘boeuf* tem por significantc bôf, de um lado da fronteira da França, e oks (Ochs) do outro”. 3 A palavra arbitrário não suscita a idéia de que o signifi cantc dependa de uma livre escolha do falante, mas quer dizer “que ele é imotivado, isto é, arbitrário com relação ao significa do*'.4 Saussure afasta imediatamente uma objeção: as onoma a propósito da arbitrariedade do signo (cf. p. 53) ou Durkheim (caráter social da língua, cf. pp. 153-154) ; Eugenio Cosekiu (Georg von der Gabelentz et la linguistique synhronique em Word, t. XXIII, 1967 = linguisti Studies presented to André Martinet, t. I, pp. 74-100) mostrou que era necessário também contar com a influência que p§de ter exercido sobre ele, notadamente no que respeita aos conceitos de Ungua e palavra e à oposição sincronia/diacronia, o volume, fre quentemente esquecido hoje em dia, de Georg von der Gabelentz , Die Sprahwisseruhaft. Ihre Aufgaben, Methoden und bisherigen Ergebnisse, Leipzig, 1891, 2.* ed., 1901. 1. Cours, p. 33 (283-291). 2. Sobre o emprego do termo “arbitrário" antes de Saussure, cf. Eugenio Coszriu, Uarbitraire du signe. Zur Spãtgeshihte eines aristo telishen Begriffes em Arhiv für das Studium der neueren Sptahen und Literaturen , t. CCIV (1967), pp. 81-112. 3. Cours, p. 100 (1967), pp. 81-112. 4. Cours, p. 101 (1139-1143). — Para esta passagem, ver pp. 115-117. (1264)
80
topiias pareceriam indicar que a escolha do signo nem sempre arbitrária,1 mas as onomatopéias nunca constituem elementos orgânicos de um sistema lingüístico; aliás, são pouco numerosas e sua escolha (cf. gluglu, tiquetaque,...) jé é, de algum modo, arbitrária, pois elas constituem, na realidade, apenas “a imitação aproximatíva e meio convencional de certos ruídos (compare-se o francês ouaoua com o alemão wauwau). Além disso, uma vez introduzidas na língua, são mais ou menos arrastadas na evolução fonética, morfológica, etc. que sofrem as outras palavras (cf. pigeon, do latim vulgar plpiò, ele próprio derivado de uma onomatopéia): prova evidente de que perde ram algo de seu caráter primeiro para assumir o do signo lingüístico cm geral, que é imotivado”.* é
Saussurc, todavia, atenuou o caráter absoluto de sua decla ração acerca da arbitrariedade do signo, admitindo que há no mecanismo da língua certos casos cm que “o signo pode sei relativamente motivado. Assim, vinte é motivado, mas dezenove não o é no mesmo grau, porque evoca os termos de que se compõe e outros que lhe são associados, por exemplo, dez, nove, vinte e nove , dezoito [...], etc.”;* assim também, o 1. Existe aqui. Km que seja ostensivãmente expressa, uma alusão àquilo que H. Schuchardt chamara de afinidade elementar ; trata-se de termos da linguagem expressiva, onomatopéias que evocam gritos, ruí dos da natureza e cujas evoluções não se explicam petos métodos normais de comparação. Atsim, nas línguas indo-européias como o sânseriio, o eslavo antigo, o grego, o latim ou o irlandês, o nome do uo é respectivamente kokilalj, kukavia , xfcxd-, uulus e uah; trata-se de formas semelhantes, mas que não provam nada quanto às relações entre essas diversas linguas. Notemos que cm francês, tendo sido o termo conservado somente com a acepção de “marido enganado" (ou), encontra-se, para designar o pássaro, uma forma refeita, de tipo onomatopaico: ouou. Cf. Hugo ShuthardtBrevier. Ein Vadi meum der aUgtmeinen Sprahwissenshaft , organizado por L. Spitxer, 2.* ed., Halle, 1928. 2. Cours, p. 102 (1152*1158). — Observe-se, além disso, que a ex pressividade onomatopaica é devida, em realidade, a uma motivação fôni ca a posteriori, tal como o demonstra o caso de homônimos; em fran cês, tinter , “tilintar", parece evocar a impressão acústica que designa, enquanto teinter, "pintar com tinta uniforme", permanece perfeita mente arbitrário; cf. S. Ullmanm, Préis de sémantique fmftUê , J.“ ed. (Bema, 1959), p. 110. S. Cours, p. 181 (2094). 81
sufixo eira dc pereira cm face dc peta faz pensar cm erejeira,
maieira, etc.; trata-se aqui dc uma motivação morfológica c
scmântica que aparece cm graus diversos segundo os sistemas lingüísticos: o francês moderno, por exemplo, aparece como particularmente “arbitrário" graças a diferentes fatores, como os empréstimos eruditos (vejam-se os pares aveugle/eité, eau/aqueux, etc.) ou a pobreza da composição ( ontinent , gant diante do alemão ErJtil, Handshub, etc.)-1 £ bom observar ainda que o emprego dt palavra signo conduziu por vezes a exposição dc Saussure, c, mais tarde, a dc seus comentadores2 a certa ambigüidade. Em realidade, após algumas hesitações, Saussure decidiu-se a substituir oneito por signifiado e imagem aústia por signifiante (encontra-se nisso eco dos termos dos estóicos cn^iaivó(icvov e CTHxatvov ) 3 e reservou o termo signo para designar o total resultante da associação de um significante a um significado; segundo sua fórmula, “o signo lingüístico c, pois, uma entidade psíquica de duas faces",4 isto é, composto de uma imagem acústica (o significante) e de um conceito (o significado). £ em virtude desta definição que Saussure declara que o signo lingüístico é arbitrário, vale dizer, imotivado. Pois, por um lado, os significados (conceitos) formam um dado que perce bemos pelos sentidos e, por outro, os significantcs (imagens fônicas) nos são impostos pela pressão social no interior de uma mesma comunidade lingüística e formam um sistema rela cionai entre si. A palavra é arbitrária com relação ao signifi cado, mas não há arbitrariedade com relação ao sistema. O significante, sendo de natureza fônica, deA linearidade senrola-se unicamente no tempo e, por consedo significante guinte, representa uma extensão mensurável numa só dimensão. O mecanismo inteiro da língua depende desse princípio, que é um dos fatores que per 1. Cf. Ullmann, Préis de lémantique française, pp. 115-120 e 125-131. 2. Ver p. 139. 3. Cf. R. H. R obins, Anient and Mediaeval Grammatial Theory in Europe (Londres, 1951), p. 26.
4.
82
Court, p. 99 (1106).
mitem a classificação dos segmentos lingüísticos. “Por oposi ção aos significames visuais (sinais marítimos, etc.) que podem
oferecer complicações simultâneas em várias dimensões, os rignificantcs acústicos dispõem apenas da linha do tempo; teus elementos apresentam-se um após outro, formando uma cadeia. Esse caráter aparece imediatamente, tão logo sejam representa dos pela escrita e se substitua a linha espacial dos sinais grá ficos pela sucessão no tempo.” 1 £ assim que às solidariedade* de ordem sintagmática (isto é, linear) opõem-se solidariedades de ordem associativa: 2 “ Dixneuf (“dezenove”) é solidário, associativamente, de dixbuit (“dezoito”), soixanledix (“seten ta”), etc. e, sintagmaticamente, de seus elementos dix (“dez”) e neuf (“nove”)... Essa dupla relação lhe confere parte de seu valor.”* Uma distinção capital, e particularmente feA dualidade cunda, foi formulada pelo mestre de Genebra língua/fala entre a lingua e a fala: a língua é o conjunto de signos que serve de meio de compreensão entre os membros de uma mesma comunidade lingüística, en quanto a fala é o uso que cada membro dessa comunidade lingüística faz da língua para se fazer compreender; cm outras palavras, a língua é “um sistema cujos termos são todos soli dários e em que o valor de um não resulta senão da presença simultânea dos outros”, 4 ao passo que a fala £ o ato coocreto c individual das pessoas, quando utilizam o sistema numa situa ção determinada. Vê-se então que a língua, que i "um tesouro depositado pela prática da fala nos indivíduos pertencentes a uma mesma comunidade, um sistema gramatical que existe virtualmente em cada cérebro, ou, mais exatamente, nos cére bros de um conjunto de indivíduos”,* é concebida, ao mesmo tempo, como uma instituição social e como um sistema de valores.6 1. Court, p. 103 (1168-1171). 2. O termo “paradigmático” não aparece em Saussure. 3. Cours, p. 182 (2106-2107). 4. Cours, p. 159 (1864). 3. Cours, p. 30 (235-239). 6. Sobre essa dualidade, da qual os dois termos nio ocultam nem implicam nenhuma contradição, cf. H. Fan, Languê, paroU tt iiffi• rentiation em Journal da psyhologi, ano dc 1952, pp. 137-157.
83
1- inegável que esta definição implica certa superioridade da língua diante da fala, pois esta é considerada secundária com relação à primeira. Saussure exprimiu-se claramente a esse res peito: “Separando a língua da fala, separa-se ao mesmo tempo: 1.° o que é social do que é individual; 2.° o que 6 essencial do que c acessório e mais ou menos acidental.’* 1 E ainda: "O estudo da linguagem comporta, pois, duas partes: uma, essen cial, tem por objeto a língua, que é social em sua essência e independente do indivíduo; tal estudo é puramente psíquico; â outra, secundária, tem por objeto a parte individual da lin guagem, isto é, a fala, incluindo a fonação; é psicofísica.” Todavia, Saussure reconhece que “esses dois objetos estão estreitamente ligados e implicam-se mutuamente: a língua é ne cessária para que a fala seja inteligível e produza os seus efei tos; mas esta é necessária para que a língua se estabeleça”.* Por outro lado, é no momento da utilização da língua que o sujeito falante é levado a modificar ou a introduzir novos meios de expressão: a fala aparece, portanto, como a força motriz que faz a língua evoluir, como o elo que liga essa Lingüística diacrônica e essa Lingüística estática que Saussure, como se verá,3 declarava aliás totalmente independentes uma da outra. Inconseqüência proveniente, sem dúvida, dc certa intransigên cia da doutrina professada e também do desejo, assaz compre ensível nesse pioneiro que foi Saussure, de afirmar com força, se necessário contrariando, posições novas e mais ou menos re volucionárias. Por outro lado, quando Saussure afirma que a língua e a fala são “duas coisas absolutamente distintas” 4 tra ta-se dc uma afirmação que, tomada isoladamente, é demasiado categórica e necessita de ser temperada com uma proposição como a seguinte: “a linguagem tem um lado individual e um lado social e não se pode conceber um sem o outro”,* ou ainda por esca em que, após ter examinado as relações entre a língua 1. 2.
3. 4. 5.
Cours, p. Court, p. Pp. 85-89. Cours, p. Court, p.
30 (241-243). 37 (341-345). 38 (351). 24 (141-142).
C a fala (“esses dois objetos estão estreitamente ligados e im
plicam-se mutuamente"), conclui: “há, portanto, interdepen dência entre a língua e a fala; aquela é, ao mesmo tempo, o instrumento c o produto desta*’. 2
Assim, a língua, sistema abstrato que é um bem social, e a fala, conjunto de realizações concretas que são de tipo indi vidual, estão inseparavelmente unidas: elas nio aparecem senio — e Saussure o compreendia assim, de fato — como as duas faces de uma mesma identidade. Outro princípio saussuriano acha-te 0 valor distintivo dos resumido nesta fórmula de ar declementos da linguagem senvolto: "na língua, só há diferen ças”,* isto 6, os elementos da lin guagem só adquirem valor enquanto se opõem a outros, enquanto não se confundem com outros; não é, portanto, sua qualidade própria e positiva que os caracteriza mas, antes, sua qualidade opositiva c seu valor diferencial. Posição essencial, cujas con seqüências nio serão poucas, mas é preciso observar desde logo que, malgrado o aspecto absoluto e um tanto exagerado da afir mação, Saussure não desprezava o papel das semelhanças na língua, pois teve o cuidado de reconhecer a esse respeito que “o mecanismo lingüístico gira inteiramente em torno de iden tidades e diferenças, não sendo estas senão a contrapartida daquelas”.3 Os comparatistas do século XIX e, sin* A antinomia gularmente, os neogramáticos represen* sincronia/diocronia tavam uma escola essencialmente histó rica, embora, em oposição à tradição da “gramática geral”, só entendessem por ciência da linguagem o estudo da evolução e da comparação das línguas, sendo que a descrição dos fatos lingüísticos tinha para eles apenas um sim ples valor prático e pedagógico. Saussure se opôs energicamente a esta concepção, ao ressaltar que o estudo descritivo da língua 1. 2. 3.
Cours, p. 37 (342, 351). Court , p. 166 (1939). Cours, p. 151 (1769). n
é tio acessível aos métodos científicos quanto o estudo histó rico, donde sua distinção entre sinronia e diaronia c, conse qüentemente, a divisão da ciência da linguagem em duas partes: a Lingüística sinrônta (ou estátia ou desritiva) estuda a constituição da língua, seus sons, suas palavras, sua gramática, suas regras, etc. num dado momento, enquanto a Lingüística iiarònia (ou evolutiva ou história) estuda as transformações que se vêem produzir-se na língua através do tempo. Estas duas maneiras de tratar os fatos lingüísticos são simbolizadas no Cours por um sistema de eixos: A R é o da simultaneidade, C D o da sucessividade 1 e Saussure não somente nega o pri mado, comumcnte admitido antes dele, do eixo C D com re lação ao eixo A B, mas afirma mesmo: “é evidente que o aspecto sincrônico prima sobre o outro, pois para a massa falante, ele é a verdadeira e única realidade”.* C v
B D E vai mais longe: não contente em distinguir esses dois eixos, nega que possa haver uma relação direta entre eles e julga que está interdito estudar simultaneamente as relações no tempo e no sistema: “a oposição entre os dois pontos de vista — sincrônico e diacrônico — é absoluta e não admite compro misso”.3 E como prova da ausência de relação entre o eixo vertical e o eixo horizontal, alega uma série inteira de exemplos, dos quais o mais conhecido é talvez ò seguinte: em anglo-saxão, fõt, “pé”, forma, no plural, * fõti\ intervém então a metafonia (Umlaut), fenômeno puramente fonético que nada tem a ver com a formação do plural: o õ de * fõti se inflecte cm ê e, a 1. 2. 3.
86
Court , p. 115 (1319-1320) Cours, p. 128 (1496). Court, p 119 (1377-1378).
seguir, por uma segunda mudança fonética, o 4final cai. de modo tal que, no plural, a forma torna-se fit, enquanto o sin gular conservou sua primeira forma fôt (são as formas do irçlés moderno sing, foot / plur. feet). Obtém-se então o bem conhe cido esquema do “quadrado lingüístico’*: 1
1
fàt
fõti
Época B
fõí
t«
<
■
Enquanto, no sentido vertical, õ passou a i por um pro cesso que nada tem dc morfológico e que não efetuou modifica ção morfológica alguma, vê-se, ao contrário, que, nos dois mo mentos sincrônicos A e B, a formação do plural (fato morfo lógico) se faz segundo mecanismos diferentes: em A, adjunção de uma vogal; em B modificação do timbre da vogal radical, isto é, de um lado, por sufixação, e, de outro, por alternância vocálica. Verifica-se, portanto, que, no plano.da diacronia, o Umlaut 6 um fenômeno puramente fonético que se produz fora de qualquer intenção e só interessa a um termo, enquanto, no plano da sincronia, no momento B, é dado um estado fortuito e 11 apropria mo- nos dele para fazê-lo portador da distinção entre o singular e o plural”; além disso, recorre sempre a termos simultâneos.3 Daí, a conclusão de Saussure: "Querer reunir 1. A expressão não esti no Cours, mu aparece em notas de Saussure: R. Godbl, Les soures manusriles (cf. p. 95, n. 4), p. 47. 2. Da mesma maneira, dizer que o a de apio se toma i em peripio é uma formulação inexata: MA verdade é que jamais apio pôde dar o í de peripio, mas é-se obrigado a comiderar isto: houve, numa determinada época, ttpio e peripio...; depois, em outra época: apio e peripio...; e o que, com prolongar-se no tempo, deu peripie, foi perapio, não outra coisa." apio apio
perêpio peripio
87
na mesma disciplina fatos tão díspares seria, portanto, uma em presa quitnérica.’’1 Há enfim a afirmação que encerra o curso e 0 objeto da dele tira, de certo modo, a lição: “a Lingüística Lingüística tem por único c verdadeiro objeto a língua con siderada em si mesma e por si mesma". Como conclusão dessa longa meditação que constitui o Cours de lin guistíque gfnéral, o que se define como a Lingüística, por ex celência, é o que fora antes chamado Lingüística interna por oposição a Lingüística externa; para captar a diferença entre as duas, recorramos à comparação que Saussure sugerira com o jogo de xadrez: “o fato de ele ter passado da Pérsia à Europa é de ordem externa; interno, ao contrário, tudo o que concerne ao sistema e às regras. Se substituo peças de madeira por pe ças de marfim, a mudança é indiferente para o sistema; mas se diminuo ou aumento o número de peças, tal mudança atinge profundamente a ‘gramática’ do jogo”.3 A atenção atribuída por prioridade ao sistema levava-o a considerar como secundá rios os fenômenos externos. Esta maneira de ater-se aos fatores internos, para a explicação da linguagem, não era absolutamente nova; Bopp e os primeiros comparatistas, por exemplo, que riam estudar a gramática por ela própria, enquanto os filólogos a consideravam apenas como um meio de ter acesso aos textos. Mas é exato que o estudo da linguagem fora muito freqüentemente integrado em outras disciplinas e seu exame se empreendera com métodos próprios a elas; o filólogo, o filósofo, o historiador, o esteta, etc. dedicam uma parte impor tante de sua atividade à linguagem, é certo, mas, nem por isso, são lingüistas. Sabemos, sem dúvida, hoje, graças às precisões que nos foram trazidas rcccntcmente acerca da tradição manuscrita do F. de Saussurk, Introdution ou deuxiime Cours (cf. p. 95, n. 4)» p. 61. — Observe-se que H. Frei, estendendo este raciocínio ao domínio do sentido, falou de “quadrados semftnticoa"; Cahiers Ferdinand de Saussure, t. XVI (1958-1959), pp. 3-22. 1. Cours, pp. 121-122 (1392-1422). 2. Cours, p. 317 (3281). 3. Cours. p. 43 (418-421).
88
\Cours,' que essa fimosa frase, tantas vezes dtada não é Ar Saussure, mas constitui um* adição dos editores; tal rcvtkcfc ,"° en,an,0- 030 ”uda cm nada o papel programítíeo «T2 desempenhou, conforme iremos ver* na elaboração das doutr Lnas lingüísticas destes últimos quarenta anos.
I. n. ♦).
P. 181 do volume de R. Godbl, citado logo adiinte (p. 95,
A LINGÜÍSTICA NO SÉCULO XX
O Cours de linguistiqu générale teve, portanto, considedável repercussão e não é sem razão que se considera por vezes sua publicação como a certidão de nascimento da Lingüística moderna; entre os lingüistas que, fugindo às pesquisas de por menor (pesquisas indispensáveis, sem dúvida, mas absorventes), esforçaram-se por descobrir as leis gerais da linguagem com o apoio de um método filosófico, Ferdinand de Saussure foi o mais feliz e seu ensinamento o mais fecundo. E verifica-se assim que, tanto no plano da Gramática comparada {veja-se o Mimoire de 1878) como no da lingüística Geral, passou-se com ele “da observação empírica e da coleção de fatos ao estudo das relações que esses fatos mantêm no interior do sistema da língua”.1 Certas opiniões recolhidas no Cours tomaram-se tema de longas c fecundas discussões; outras, consideradas como axio mas, originaram toda uma série de desenvolvimentos e prolon gamentos; e, como é natural, mesmo os mais fervorosos discí pulos do mestre — discípulos diretos ou indiretos —, embora colhessem a substância de suas pesquisas no magistério de Saussure, foram levados, por vezes, a orientar seus passos por caminhos algo divergentes, até mesmo contraditórios. Desde o início de nosso século, entretanto, assistimos à elaboração de doutrinas acerca da linguagem bem antes de ter sido exposto o pensamento saussuriano; logo que este se tomou conhecido, tais teorias continuaram a se desenvolver referindo-se 1. G. Rxdard, Ferdinand dê Saussure, pionnitr d* la linguisti quê em Journal dt Gtniv$> 28-24 de novembro de 1957.
93
ao Cours, ou, ao contrário, de modo completamente indepen dente, até mesmo ignorando-o ou se lhe opondo de maneira ostensiva. De um lado, portanto, frutos diretos do ensinamento saus-
suriano ou, pelo menos, discussão de algumas das idéias-chaves do Cours e, de outro lado, movimentos sobre os quais esta influencia foi nula ou pouco sensível ou então tardia, eis o que nos sugere um plano no momento em que nos preparamos para passar revista às tendências da Lingüística moderna. De bom grado convimos em que, nessa apresentação, haja algo de arbi trário e pouco respeito por uma ordem cronológica estrita, mas poderia ser de outra maneira? Nas ciências humanas, às quais a Lingüística pertence, estamos no terreno do contínuo, e as rígidas divisões em capítulos e parágrafos têm valor apenas metodológico. De modo geral, os defensores dessa A escola de Genebra escola tomaram a peito permanecer o mais possível fiéis aos ensinamentos c ao espírito de Saussure; os dois chefes foram, por muito tempo, Charles Bally e Albert Sechehaye, os mesmos que se haviam encarregado da edição do Cours. Bally, atacando o difícil pro blema da relação entre o pensamento e sua expressão lingüística, renovou a Estilística, definindo-a como o estudo dos elementos afetivos da linguagem e dedicando sua atenção aos desvios que o uso individual (a fala) é levado a impor ao sistema (a língua) porque, como o demonstra sua teoria dos atualizadores; 1 ele acha que não há nenhum abismo intransponível entre esses dois aspectos da linguagem; a obra 2 que ele produziu nesse domí nio, situando-a resolutamente na sincronia (só as associações atuais têm valor em Estilística e cumpre fazer abstração da 1. Os atualizadores são os ligamentos tigo, os pronomes, as terminações, ...) que passar a língua para a palavra. 2. Préis de stylistique, Genebra, 1905; çaise, Heidelberg, 1904, 3.* ed., Genebra-Paris, brar também o volume Linguistique gánJraU (Berna, 1932, 3.* ed., 1950) que é como que formulara a esse propósito no decurso de sua carreira.
94
gramaticais (como o ar têm por função fazer Traiti de stylistique fran 1951; mas cumpre lem et linguistique française a súmula das idéias que
etimologia) é notável não só pelo rigor lógico que lhe dirige o plano como pelo cuidado em captar os mínimos mttizes dos processos empregados. Sechehaye, por seu turno, foi essencial mente o teorista do grupo de Genebra; ele aplicou-se a pro clamar sua dependência em relação a Saussure ao propor um mé todo gramatical (análise psicológica do pensamento) que tende a introduzir efetivamente no ensino as concepções do mestre, mas se notará que seu livro fundamental, Programme et métbodes de la linguistique théorique (Psyhologi du langage) é de 1908: isto é, que não é impossível que ele tenha sido uma das fontes de reflexões de Saussure.1 Quanto a Henri Frei, ele mostrou a que ponto os “erros” contra a gramática normativa (erros cometidos pelo falante, que assim responde tanto às “necessidades** dc comunicação — assimilação e diferenciação, brevidade e invariabilidade — quanto à da expressão) são ricos dc ensinamento para o lingüista, e se fez o promotor da Lin güística “funcionar*, que “procura explicar os fatos ligando-os às funções (necessidades, instintos, etc.) que se considera pos sam eles satisfazer **.1 Uma característica comum aos lingüistas dessa escola é sua constante preocupação de explicitar e fazer com que se com preendam melhor os princípios do Cours , aos quais, aliás, eles se guardam de considerar como dogmas admitidos sem discussão; a descoberta recente de notas manuscritas de Saussure* bem como de cadernos de estudantes que não foram utilizados pelos editores do Cours permitiu a R. Godel publicar, a respeito da “tradição manuscrita*’ do Cours, um importante trabalho 4 que 1.
Sobre as personalidades de Bally e de Sechehaye e suas re lações com Saussure, cí. o artigo penetrante de Rudolf Enoleb, Saus sure e la suola di Ginivra em Utíste, t. XI (1968), pp. 158-164. 2. H. F r e i , Lm grammars des fontes, Genebra, 1929. 3. Notes inidites de P. de Saussure publicadas por R. Godel em Cehiers Ferdinand de Saussure , t. XII (1954). pp. 49-71; Souvenirs de F. de Saussure onernant sa jeunesse et sts êtuies, ibid., t, XVII (1960), pp. 12-25. 4. Robert Godbl, Les soures manusrits du Cours de liuguis tique générale de F. de Saussure, Genebra-Paris, 1957; i ser completa do pelas seguintes publicações dõs Cahiert Ferdinand de Saussurt: Introdution du deuxiimt Cours de linguistique génirale (19081909),
constituiu o prelúdio à magistral edição crítica de Rudolf Engler. Trata-se, não dc um retoque da edição original, mas de um confronto do texto editado por Bally e Sechehaye com todas as fontes de que dispomos atualmente; desse modo, aos ca dernos de alunos, conhecidos e usados em 1916 (algumas partes dos quais, porém, então desprezadas, são publicadas pela pri meira vez) acrescentam-se outros cadernos ou extratos de cursos
registrados posteriormente, além de notas pessoais de Saussure. Engler também resolveu o problema complicado, trazido pela multiplicidade desses elementos, recorrendo a uma apresentação sinótica em seis colunas, reproduzindo a primeira o texto de 1916, ficando a sexta — quase sempre em branco — reservada às notas de Saussure, enquanto as demais colunas reproduzem as diferentes versões dos cursos e anotações. 1 Teremos oportunidade de voltar a falar da atividade de nossos colegas genebrinos; 2 digamos, entretanto, que se a ve neração em que, com razão, envolvem o fundador de sua escola t. XV (1957), pp. 3-103; Les ahiers E. Constantin, t. XVI (1958-1959), pp. 23-32 e o Inventaire des manusrits de F. de Saussure remis à la Bibliothèque Publique et Universitaire de Geniue, t. XVII (1960), pp. 5-11. Ferdinand de Saussure, Cours de linguútique gênérale , edi 1. ção crítica por Rudolf E ngler , Wiesbaden, 1967-1968; até agora só foram publicados os três primeiros fascículos: em 515 páginas duplas dc grande formato, eles nos dão o texto completo do Cours que, para facilidade de referenciação, foi dividido em 3281 segmentos; o quarto c último fascículo compreenderá, alem de alguns textos inéditos de Saussure que não se enquadraram na sinopse, um Sndice de nomes, um índice de palavras e um índice analítico das matérias; mas desde agora já nos podemos referir ao precioso Lexique de la terminologie saussurienne (Utrecht-Antuérpia, 1968) do mesmo autor que, graças às numerosas citações, tomou-se um léxico das idéias mais do que um léxico dos termos. — Entre as diversas traduções conhecidas pelo Cours, a versão italiana, Corso di linguistia generate, devida a Tullio de Mauro (Bari, 1968), é preciosa por seu comentário exegético e bibliográfico pormenorizado. 2. Pp. 126, 140, 143-144, 145, 203, 208-209. — Assinalamos que Robert Godel editou A Geneva Shool Reader in Linguistis (Bloomington-Londres, 1969) que, depois de ter citado dois inéditos de Saussure, publica passagens características tiradas dos trabalhos doi principais membros da escola de Genebra.
96
tem sido fonte de numerosas e preciosas publicações, o desvelo
zeloso com que lhe defendem a memória das críticas que lhes parecem injustificadas, conduziu-os, is vezes, na interpretação do texto, a certa intransigência 1 — não seria oportuno lembrar a expressão2 de d'Arbois de Jubainville: “Você se considera alu no meu e jamais me contradisse?” — e, convencidos de que o Cours representa bem o pensamento “autêntico” de Saussure, 1 a uma suscetibilidade por vezes excessiva, conforme o demons tram documentos recentes. 4 Ciência de observação, antigamente — domíA Fonologia nio no qual os hindus chegaram a surpreen dentes resultados — a Fonética, que estuda os sons da linguagem humana tanto sob o ponto de vista arriculatório (fonação) como sob o ponto de vista acústico (audi ção), aperfeiçoou-se consideravelmente desde que, no fim do último século, se lhe aplicaram métodos experimentais. 6 Ora, a partir dc 1926, nos meios do Círculo Lingüístico de Praga, um grupo de lingüistas, alegando o fato de que a Fonética, quando começou a servir-se de aparelhos e a ser estudada em laboratório, progrediu muito mas, ao mesmo tempo, afastou-se progressivamente da Lingüística, elaborou um método de todo diferente para o estudo dos sons da linguagem. Foi no pri meiro Congresso Internacional dc Lingüistas, realizado em Haia em 1928, que se apresentou a íamosa Proposição 22, redigida por Roman Jakobson e referendada por S. Karcevskij e N. S. Trubetzkoy;6 essa Proposição marcou o nascimento da nova 1. Veja-se por exemplo a polêmica entre H. Frei e Êr. Birirsa propósito da afirmação saussuriana “na lingua só há diferen ças”: Cahiers Ferdinand* df Saussure, t. VIII (1949), pp. 37-60; tIX (1950), pp. 7-28; t X (1952), pp. 47-50. 2. Relatado por J. Vendryes, Cahiers Ferdinend de Saussure, t VI (1946-1947), p. 48. 3. Assim H. Frei cm Cahiers Ferdinand de Saussure , t IX (1950), pp. 27-28. 4. Ver atrás, pp. 88-89, e mais adiante pp. 159-140. 5. Ver atrás, p. 61. 6. Cf. Roman Jakobson, Seleted Writings, t I (Haia, 1962), pp. 3-6. — Tem-se um bom resumo dos trabalhos da escola de P r a « a seks
97
disciplina para a qual se concordou cm reservar o nome de Fonologia;1 tratava-se de "diferenças significativas", que carac terizam os elementos de qualquer sistema fonológico, bem como de “correlações fonológicas", constituídas por séries de oposições binárias.
Partindo do princípio de que toda ciência, para ser válida, deve ser geral, os membros dessa escola quiseram introduzir a Fonética no quadro da Lingüística, desviando-a do exame dos fatos, individuais, de fala, para aplicá-la ao estudo, geral, da língua; assim, enquanto a Fonética é o estudo dos sons da fala, a Fonologia aparece como o estudo dos sons da língua 2 acentuando-se, sobretudo, a relação entre o som (ou o complexo de sons) e sua significação. Poder-se-ia dizer também que a Fo nética estuda o que se pronuncia na realidade, coisa variável de indivíduo para indivíduo e mesmo dentro do próprio uso individual, enquanto a Fonologia estuda aquilo que temos cons ciência de pronunciar ou de ouvir pronunciar, e isto é uma constante no interior de uma mesma comunidade lingüística. na coleção A Prague Shool Reader in Linguistis, publicado por Josef Vachek , Bloomington, 1964. 1. Empregados juntamente no século passado para designar a ciência dos sons da linguagem, os dois termos Fonétia e Fonologia tinham sido aplicados pelos neogramáticos a dois objetos diferentes: o primeiro ao estudo descritivo, o segundo ao estudo histórico dos sons; Saussure inverteu os valores, chamando Fonolojçia à fisiologia dos sons (acepção conservada por Maurice Grammont no seu Traité de phonitique) e Fonética ao estudo das evoluções dos sons; hoje, Fonologia só c usado no sentido preciso que lhe deu, por sugestão de Jakobson, a Escola de Praga. Fonologia
2.
lingua
Esta proporção -------------------- = ----------------é bem de Trubetzkoy Fonétia /ala (Prínipes de phonologi, p. 3). Pôde-se notar que o rigor da fórmula era pelo menos exagerado: há, com efeito, variações não-pertinentes que, devido à sua natureza imposta, pertencem igualmente à lingua (por exemplo, o fato de em francês as vogais serem normalmente breves no fim da palavra é “arbitrário*' e pertence portanto à língua, se bem que sua eventual pronúncia como longas não seja fonologicamente dis tintiva); cf. H. Frei, Langue, parole et dilférentiation em Journal de Psyhologi, ano de 1952, pp. 140-141; André Martinet, Êonomie des hangements phonétiques (cf. p. 107 e n. 1), p. 18 e n. 2-
98
Foi sem dúvida o lingüista polonês J.Baudouin de Courte nay quem, desde o último século, formulou primeiramente “• idéia de que deve haver duas fonéticas descritivas distintas uma da outra, conforme se queiram estudar os sons concretos como fenômenos físicos ou então como sinais fônicos empregados para fins de mútua compreensão no ihterior de uma comunida de lingüística". 1 Idéia fecunda, certamente, mas que não teve repercussão, na época, fora de um estreito círculo, 3 não mais que as posições inovadoras, mas que, escritas em sueco, tiveram pouca audiência, de Adolf Noreen: este distinguia entre as diferenças de sons que causavam uma diferença de sentido e as que não a causavam; além do mais, ele dividia a Lingüística numa parte sincrônico-descritiva c numa outra, etimológico•diacrônica. Dcssc modo, foi muito mais com o magistério saussuriano que puderam contar os promotores da Fonologia para apoio de suas teorias; a dualidade língua/fala tinha, de fato, preparado o terreno — Trubetzkoy, aliás, refere-se a ela desde a primeira página de seus Prinípios — e, mais ainda, a afir mação "na língua, só há diferenças": aí, com efeito, encontra-se em germe a Fonologia inteira, cujo elemento primário é a qua lidade diferencial. Para retomar os termos de Trubetzkoy, diremos que a Fonética é "a ciência da face material dos sons da linguagem humana" ao passo que a Fonologia só considera, “em matéria de som, aquilo que preenche uma determinada função na lín gua".4 Esta última definição indica o caminho que os fonolo1. N. S. Trubetzkoy, Prinipe í d Phonologi , trad, franc, dc J. Cantineau (Paris, 1949), p. 5. 2. Trata-se do que, às vezes, é chamado por “escola de Kazan" (do nome da Universidade onde lecionara Baudouin tie Courtenay) no teio da qual distinguiram-se, de modo especial M. Kruszewski e L. V. Chtcherba; cf. M. Ivic, Trends in Linguistis (Haia, 1965), pp. 97-100. 3. Cf. M. Malm berg, NouvelUs Tendanes (cf. p. 11, n. 1), PP-# 52-53. _— Anton Marty, do qual vários trabalhos relacionadoi com a língua tiveram publicação póstuma (ele morreu em 1914), também insistira sobre a necessidade de distinguir entre o aspecto descritivo e o aspecto genético da Lingüística; cf. T. de Mauro na tradução italiana do Cours (Bari, 1968), p. 351. 4. Trubetzkoy , Prínipes, pp. 11 e 12. — Ê a partir des»a oposição entre Fonética e Fonologia (ingl. phonetis/phonemies) que
gistas seguiram para sair do impasse no qual pareciam empe nhar-se suas pesquisas. Pois como estudar os "sons da língua*’? Os foneticistas, estes tem k sua disposição objetos tangíveis de experimentação: os atos concretos da fala, os sons emitidos por indivíduos, que eles analisam e medem, poderosamente ajuda dos nisso pela técnica aperfeiçoada dos laboratórios. Ora, nenhuma dessas comodidades se oferece aos fonologistas: de fato, como poderiam eles, com semelhante luxo de precauções, estudar os sons de algo que não existe ou, mais precisamente, de algo cuja materialidade é inexistente. Convi nha, destarte, atacar o problema indiretamente; diante da im possibilidade de se dedicar a um estudo positivo dos sons da língua, era preciso tentar proceder pela negativa e procurar descrever o que eles não são ou, mais exatamente, aquilo com que não se confundem; foi assim que os fonologistas recorreram ao critério das oposiçôes funionais (ou distintivas ou ainda pertinentes); no sistema constituído por uroa língua, eles só se interessam por um fonema na medida cm que este tenha um papel funcional cm tal sistema; pesquisam pois “quais diferen ças fônicas estão ligadas a diferenças de significação, na língua estudada'*.1 Mas, por um curioso paradoxo — sobretudo se pensarmos na intenção dos fundadores da Fonologia —, a ciência fônica, concebida dessa maneira, perdeu o caráter de universalidade, que possuía quando se limitava a estudar os fatos de fala. Com efeito, cada língua tem seu sistema fônico próprio e o jogo de oposiçôes que lhe formam a estrutura é diferente de uma língua para outra. Pode-se levantar um quadro fonético, dos sons da linguagem humana — quadro do qual cada língua tira os elementos que lhe formam o sistema —, mas devem-se construir tantos quadros fonológicos quantos são os falares diferentes no mundo. Vejamos o caso da oposição entre surda e sonora, por exemplo: a Fonética nos ensina que a diferença entre p e b provém do fato .de que o segundo fonema é pronunciado com uma corrente de ar que, antes de apresentar-se na boca, no Pike (cí. p. 119) fez a distinção entre os elementos étios (dados obje tivos) e elementos êmios (ponto de vista funcional) da linguagem. 1. T rubetzkoy , prínipes, pp. I M2.
100
ponto dc articulação da labial, provoca, em sua passagem, a
vibração dos músculos tiro-aritenoidianos, isto é, as cordas vo cais. A Fonologia não se prende a essas explicações e se admite que, na língua francesa, p t b são fonemas diferentes é por causa de sua função diferenciadora, é pelo fato de que essa opo sição permite a distinção entre conceitos, como no caso dc potde c boul, pierre c biire, pont c bond, etc.,1 daí a função dc ren dimento funcional da oposição fonológica p/b (ou, mais ge ralmente, da oposição surda/sonora) na língua francesa. Hi línguas, no entanto, como o grupo dos falares polinésios, em que a diferença entre surda e sonora não tem valor funcional algum, pois não permite distinguir nenhum par dc palavras. Para as vogais, Trubetzkoy havia invocado o exemplo curioso de certas línguas caucasianas, como o cherquesse ou o abkhaz (ou abaza), nas quais se encontra, dizia ele, três valores vocálicos, diferenciados por seu grau dc abertura, a saber: um primeiro tipo dc abertura mínima, que se realisa seja como i, seja como ü, seja como u; um segundo tipo de abertura média, que sc realiza ora como et ora como ar, então como o; e, finalmente, um terceiro tipo dc abertura máxima, que se realiza como um a, com os possíveis matizes dessa vogal. Essas variações — dentro de cada tipo — são condicionadas pela vizinhança fônica, mas o falante não tem consciência dessas diferenças dc timbre; um estrangeiro tem a impressão, justificada aliás, de estar ouvindo i, ut e c o, ctc. mas os autóctones só percebem um único ele mento importante da vogal: o grau de abertura; do ponto de vista funcional, é o único elemento que interessa, pois o timbre vocálico pode modificar-se, dentro de uma abertura constante, sem provocar diferenciação (na ortografia, três letras bastam para indicar esses três fonemas vocálicos).* Em resumo, tratar-se-ia de um sistema vocálico que com porta três graus de abertura, que formam uma oposição distin tiva (isto é, funcional) mas, dentro de cada abertura, as va riações de timbre são impermutáveis (porque condicionadas) c formam, portanto, uma oposição não-distintiva (ou, sc qui1. Exemplos equivalentes em português seriam pala e bala, parra e barra, pomba e bomba, etc. (N. do T.) 2. Cf. Trubetzkoy , Prínipes, p. 102. 101
sermos, uma oposição fonética mas não fonológica); a abertura é, pois, uma marca de correlação pertinente, enquanto o tim bre é uma característica não-pertinente. Se pensarmos no pa pel essencial que desempenha, cm indo-europeu, a alternância
f/o,1 poderemos medir a diferença inteira que vai de uma língua a outra. Todavia, essa apresentação dos fatos, devida a Trubetz koy, foi constatada; depois de numerosas pesquisas particular mente no que toca ao kabardi (forma oriental do cherquesse), pensou-se antes num sistema bivocálico (vogal alta e vogal baixa), ou seja, monovocálico (a vogal aparecendo em certos casos como a implosão de uma consoante); mas, seja qual for a interpretação adotada, o exemplo não se torna menos signi ficativo de um sistema de uma, duas ou três vogais fonológicas que se realiza num número mais considerável de timbres fonéticos.2 Sem nos demorarmos em aspectos mais técnicos como os processos utilizados pelos fonologistas para analisar, segundo a perspectiva que lhe é própria, os elementos fônicos da lingua gem,* vamos imediatamente à definição do fonema proposta 1. Ver p. 57. 2. Cf. Maurice Leroy, Les tribulations du uoalisme indo~euro• péen em Linguistique ontemporaine. Hommage à Êri Buyssens (Bru xelas, 1970), pp. 125-132. 3. É assim que a operação dita dc omutação permite distinguir sons permutáveis e sons impermutáveis, sendo que os primeiros podem encontrar-se na mesma vizinhança fônica (como eo em francês: sei / sol, ao passo que isso jamais acontece com os segundos (como e o , parece, em cherquesse, ou ainda como * e s* em alemão: doh / dih; o x só aparece após a c vogal anterior, enquanto apa rece em todas as outras posições, mas jamais após a ou vogal anterior); as oposições ditas neutralizáveis são aquelas que não só têm valor fun cional em certas posições (assim a oposição francesa entre f e { É pertinente em sílaba acentuada: j’irai / 'firais, mas neutralizada em sílaba não-acentuada onde, normalmente, é condicionada: tem-se ( em sílaba aberta e f em sílaba fechada; Uger / leteur); uma marca de orrelação é o elemento que caracteriza os membros de uma mesma serie e pode integrá-los em pares ou feixes correlativos (assim, a nasalidade nas parelhas de vogais francesas a/ã, /l, q/q e flf/#); de modo geral, diz-se que certos íonemas são mareados em relação a outros quando eles comportam um traço distintivo que os diferencia, como a
102
por Trubetzkoy: “o fonema é a soma das particularidade? fonológicas pertinentes que uma imagem íônica comporta”. 1 Vê-se assim que ele não coincide com uma imagem fônica concreta, mas somente com as particularidades desta que participem das o posições distintas; .de fato, para que os fonemas sejam reco nhecíveis, cumpre que se distingam por oposição a outros. £ evidente que uma oposição, uma vez reconhecida numa língua, basta para individualizar o fonema, mesmo quando não írcja oposição diferenciativa. 2 Convém dizer que essa nova maneira de encarar os sons da linguagem humana encontrava sua justificação fisiológica nos dados da Fonética tradicional; sabe-se, com efeito, que a lin guagem, para o homem, não é uma necessidade orgânica, já que ele se limita a utilizar órgãos que têm outras funções, res piração e nutrição, essenciais à vida do ser humano, mas sabe-se também que um indivíduo, privado de um dos órgãos fonatórios por causa de um acidente (mi-formação congênita, para lisia, ablação), pode constituir para si um órgão vicário pela utilização de partes do corpo que, normalmente, não intervém sonoridade no caso de d em relação a I; quanto à noção de arquifo nema, pela qual os fonologistas entendiam as particularidades distinti vas comuns a dois ou mais fonemas correlativos, abstração feita das propriedades de correlação (assim, em francês, o arquifonema E com preende as variedades f, ¢, ¢), ela tem sido mais discutida e a difi culdade de delimitar-lhe o campo de aplicação (em francês, deve-se juntar m a p e 6?) fez com que fosse abandonada. — Cf. Trubetzxov, prínipes, pp. 34, 80-82, 89; Martinet, Êonomie dei hangemrnts phonétiques, pp. 70, 72-73, 100-101. 1. Trubetzkoy , Prínipes, p. 40. — Elaborada primeiramente
por Baudouin de Courtenay, a teoria do fonema foi remanejada por diversas vezes, mas a definição fundamental ficou sempre a de uma entidade fônica discreta (diferencial) e combinável; cf. por último G. Bes, Phonème, em André Martinet . La Linguistique. Cuide alphabi tique (Paris, 1969), pp. 278-289. 2. Assim, para retomar o exemplo citado mais acima (p. 101», a qualidade surda dc p c a qualidade sonora de b, que, em francês ser vem para diferenciar os elementos das parelhas poule/boule, pierre/bière, etc. são igualmente preservadas em casos em que essa oposição não funciona, como • page, * pose de um lado, • base, • bihe de outm (não existem palavras como bage, bose ou pase, pihe), etc.; cf. André Martinet, Conerning the Preservation of Useful Sound Features cm Word, t. IX (1953), pp. 1-11.
10 )
substituem-se à glotc, por exemplo, cm caso dc extirpação da laringe): o resultado é uma fila diferente, sem dúvida, mas compreensível; tais dados expe rimentais corroboram o fato dc que o que importa na lingua gem não é a emissão rigorosamente precisa dos fonemas, mas a possibilidade de utilizar oposições, pois “não se exige de um fonema que seja estritamente conforme ao fonema mais comumente empregado pela coletividade lingüística: exige-se dele que seja suficientemente diferenciado dos outros fonemas em pregados por aquele que fala".1 r.a
íonasão
(as
dobras
esofágicas
Além do interesse que se vincula aos seus métodos e às regras que promulgou para o processo da descrição, a Fonologia — enriquecimento do pensamento saussuriano — teve o mérito insigne de suscitar uma renovação da reflexão lingüís tica: com efeito, veremos como dela saíram as correntes que se podem agrupar sob a etiqueta de “estruturalismo"; mas ela também renovou a ótica da Gramática comparada e história tradicional. A análise da cadeia falada da linguagem em unida des distintivas põe cm evidência, de modo mais sistemático, o papel funcional dos fonemas, por exemplo no princípio da alternância, que, tanto no plano semasiológico como no morfológico,2 desempenha um papel tão considerável na maioria das línguas; veja se a alternância de timbres vocálicos no grego Xéyw/Xó yoi, no alemão Mutter/Mutter, no francês }'irai/j’irais, 1. André Ombredane, L’aphasie et Vélaboration de Ia pensde expliite (Paris, 1951), pp. 282-283, que acrescenta: “Um marselhêi e um picardo não têm dificuldade de entender um ao outro, malgrado ;«« diferenças fonétias de seus respectivos falares." 2. Para designar o estudo do emprego, em Morfologia, dos meioi fonológicos de uma língua, Trubetzkoy criara a palavra Morfofonologia ou, por superposição silábica, Morfonologia (cf. Prínipes, pp. 337-341). A dificuldade de circunscrever o terreno de ação desse termo (pois toda a Morfologia c condicionada pela Fonologia) faz com que ele, hoje, seja empregado (sobretudo entre oa lingüistas de língua in glesa; morphophonemis ) com diferentes acepções; trata-se, o mais das vezes, da constituição fônica dos morfemas (sendo estes tomados no sentido anglo-saxão, cf. p. 128, n. 2) e das altem&ncias e neutra lizações que aí se constatam; cf. Maurice Leroy, Sur la earatárisation morphologique em Word, t. XXIII, 1967 — Linguisti Studies pre sented to André Martinet, t. I, pp. 362-368.
104
patte/pâte ou, para nos limitarmos ao francês, a formação do feminino de um grande número de adjetivos, seja ela pela alternância de sonoridade: neuf/neuve, seja pela altemâoda grau zero/grau pleno (adjunção de uma consoante): vert/verte, grand/grande, etc. Ao lado desse valor distintivo fundamental dos fonemas, seria preciso também assinalar seu emprego como signos demarcativos; a este respeito, é sugestiva a comparação do alemão e do francês: de um lado, coincidência da palavra fonética com a palavra gramatical e de outro, pelo contrário, emprego da ligação, mas com possibilidade — num restrito número de casos, na verdade — de marcar uma distinção: les béros c les zeros, um savant aveugle (sem ligação: “um sábio que perdeu a visão”) e um savant aveugle (com ligação: "um cego que se tomou sábio”). Até na estética da linguagem, não há quem tire algum proveito da aplicação de princípios que mostram a que ponto a fonologia da língua poética é diferente da língua falada contemporânea (veja-se, por exemplo, em francês moderno, a questão do {t e mudo”).1 Há, enfim, um aspecto mais recente da Fonologia que que remos sublinhar; no início, os fonologistas, muito preocupados com estabelecer a metodologia de sua disciplina e demonstrar•lhe a utilidade, aplicaram-se essencialmente, cm suas pesquisas, aos estados de língua e unicamente no quadro da sincronia. Mas depois de afirmarem sua posição e aperfeiçoarem sua técnica, compreenderam o interesse que haveria em aplicar os métodos da nova disciplina à Lingüística evolutiva; na verdade, esta pos sibilidade fora entrevista desde o início, 2 pois já na Proposição 22 do Congresso dc Haia podemos ler: “A antinomia da Fo nologia sincrônica e da Fonética diacrônica estaria suprimida no momento em que as mudanças fonéticas fossem conside 1. J. Vbndryes, La phonologi et la langue poé tique em Confétenets de 1'Insfitut de Linguistique de VUniversité de Paris, t. II (Pa ris, 1934), pp. 39-51. 2. Cumpre dizer que, já em 1890, Paul Passv havia “apresen tado em alguns parágrafos a mais lúcida exposição da teoria funcionalista das mudanças fonéticas" (Martinet , Êonomie des hangements phonéliques, pp. 42-43), mas não se compreendeu, na época, o inte resse dessa tese.
105
radas cm função do sistema fonológico que as sofre’* e, cm
R. Jakobson publicava Prinípios de Fonologia His tá ria1 Esse apelo foi ouvido: não se fará mais — à maneira dos inúmeros, e aliás necessários c deveras preciosos, trabalhos de pormenor empreendidos pelos ncogramáticos e seus discípulos a história de formas particulares sem referência ao sistema cm que se integram; os elementos de um sistema lingüístico são estreitamente solidários, a tal ponto que não temos possibili 1931,
dade alguma de explicar as evoluções particulares se não consi derarmos a evolução do sistema cm si mesmo. Assim se en contra colocada a noção dc equilíbrio que, no curso da evolução dc uma língua, regula as relações entre as diferentes tendências que se contrabalançam. Ainda aqui, a idéia remonta ao início da empresa fonológica; leiamos novamente a Proposição 22: “ü problema do objetivo com que se realizam essas mudanças deve ser posto. A Fonética histórica transforma-se assim numa história da evolução de um sistema fonológico." Lembremos, a respeito, que alguns julgaram poder dizer, assaz artificial mente, que a pesquisa dos fonologistas estava maculada dc teleologia, ao verificar que eles operavam, em matéria diacrAnica, postulando certa tendência à “harmonia'* dos sistemas fonológicos.2 Foi em data recente, entretanto, que a Fonética e a Fono logia começaram a ser consideradas como os “dois lados da mesma coisa", segundo a expressão de Malmberg;* a Fonologia diacrônica teve inído de fato nos anos que se seguiram à Se gunda Guerra Mundial; teve notadamente o mérito de se dirigir aos lingüistas tradicionalistas, fazendo com que compreendessem 1. Travaux iu Cerele Linguistique de Prague, t. IV (1931), pp. 247-267; esse texto foi retomado na tradução, por Cantineau, dos Prínipes de phonologie de Trubetzkoy, pp. 215-336. 2. Como o notou André Martinet , a “teleologia” eslá mais nos termos do que nos fatos: La linguistique synhronique (Paris, 1965), pp. 56-57. 3. O estudo de Bertil Malmberg sobre Le système onsonant i* que du françáis mo d eme (Lund-Copenhague, 1943), traz como sub título: Ètudes de phonologie et de phonétique; no ano seguinte, ele publi cou um ensaio intitulado Die Quantitai ais phonetishphonologisher Be grill l Lund-Leipzig, 1944).
106
ser indispensável recolocar a Fonética histórica cm seu quadro
funcional. Um dos principais promotores dessa “reconciliação” entre compara tis tas e fonologistas foi André Martinet, que, em numerosos trabalhos e num tratado geral intitulado Êonomie des bangements phonê tiques 1 — mais adiante 2 citaremos seus Elements de linguistique générale — expôs as bases e os moti vos da colaboração a estabelecer-se entre esses dois ramos da ciência lingüística. O cuidado com que os exemplos invocados são escolhidos e filologicamente discutidos, quando preciso, con tribui grandemente para granjear a confiança do compara tista. 2 Especifiquemos que, por eonomia, Martinet compreende não só o princípio do “menor esforço" ou, se quisermos, do “gasto menos grande" como também o do arranjo interno: é graças a este último que se equilibram as tendências antinômicas fundamentais que ele destaca entre as “necessidades comu nicativas e expressivas do homem*’ e “sua tendência a reduzir ao mínimo sua atividade mental e física*’. Martinet vê também, na inércia e na assimetria dos órgãos fonadores, uma razão decisiva por que o equilíbrio nunca chega a uma simetria com pleta; eis porque ele substitui, pela noção de tendência à esta bilidade do sistema obtida pela integração dos fonemas, a noção tclcológica de harmonia conccbida pelos primeiros fonologistas; de fato, os fonemas isolados, não integrados em correlações ou feixes, aparecem como pouco estáveis e estão expostos a desa parecer ou a encontrar-se um parceiro correlativo. Começar aqui outro capítulo é, na verdade, O estruturalismo um pouco artificial, pois já foi de estruturalismo que falamos quando expusemos certos aspectos da Fonologia, e as duas ordens de pesquisa estão intimamente ligadas; com efeito — e aqui temos uma nova 1. O subtitulo é Traiti de phonologie diaronique, Berna, 1955; cf. principalmente as pp. 94-104. 2.. P. 126 e n. 3 da p. 106. 3. Encòntrar-se-á uma boa exposição dos princípios e do método da Fonologia no volume de Emilio A lar cos Llorach, Fonologia esp* nola (4.1 ed., Madri, 1968) cuja primeira parte (pp. 23-140) é con sagrada à Fonologia geral, sincrônica e diacrônica.
107
etapa na exploração dos princípios saussurianos —, o método estabelecido pelos fonologistas para um exame, sob ângulo original, do sistema e do comportamento dos fonemas, método esse que evidenciava o paralelismo entre o plano do conteúdo (o conceito) e o plano da expressão (a forma), (oi aplicado ao conjunto dos aspectos da língua, esta considerada como uma estrutura constituída por uma rede de elementos, em que cada um tem um valor funcional determinado. 1 É que os estruturalistas (assim são chamados os que sustentam essa doutrina), ao porem em pritica a fórmula que encerra o Cours — a qual, embora não fosse do próprio mestre, nem por isso teve reper cussão menos profunda — "a Lingüística tem por único e ver dadeiro objeto a língua considerada em si mesma, e por si mesma’’, e ao sc referirem à noção dimensional dos segmentos lingüísticos, esforçaram-se por explicar a língua por ela pró pria; para tanto, dedicaram-se a um exame atento das relações (Nada está isolado e tudo partiipa de tudo, ji dizia Anaxigoras) que unem os elementos do discurso, e suas pesquisas se encaminharam no sentido de determinar o valor funcional desses diferentes tipos de relações. Pois não foi dos seus menores méritos ter percebido de modo claro que, quando se trata de linguagem, A + B é diferente de B + A e que o todo é mais que a soma das partes; 2 haja visto o modo desdenhoso com que Trubetzkoy ji falava dos partidirios da Lingüística histórica 1.
Seguindo-o, Saussure e Meillet falavam do sistema das lín guas; foi em 1929, no t. I dos Trauaux du Cerle Linguistique de Prague (pp. 5-29, texto reproduzido em J. Vachek,M Prague Shool Reader in Linguistis, Bloomington, 1964, pp. 33-58), que o tcrmo estrutura aparece pela primeira vez nas teses redigidas em lingua francesa: sabe-se a voga que, na Lingüística, primeiro, e depois em tantas outras ciências (cf. p. 127, n. 6), iriam conhecer essa palavra e seus derivados estruturalismo, estruturalista; cf. Êm. Benveniste, "Struture m en linguistique em R. Basttdc, Sens et usages du terme struture Jans les eienes humaines et soiales (Haia, 1962), pp. 31-39. ___ Sobre um uso diferente, feito pela “escola de Londres”, dos termos sistemeu e estrutura, cf. p. 159. 2. Durkheim, aplicando esse princípio à Sociologia, dele dedu zira a existência da "consciência coletiva”; cf. por ex. R. AftON, La soiologie em Les Sienes Soiales en Frane. Enseignement et Reher hts (Paris, 1937), pp. 13-48.
108
c da Fonética do tipo neogramático, de “atomistas e individualistas ".1
os
quais
ele
qualificava
a
Sabe-se que Saussure, numa imagem cérebre, havia com parado a língua ao jogo de xadrez: "de um lado e de outro lado estamos cm presença dc um sistema dc valores c assistimos às suas modificações’*:2 com efeito, no jogo de xadrez, o desloca mento de uma peça modifica o equilíbrio da rede inteira; do mesmo modo, "a língua não é um conglomerado de elementos heterogêneos; é um sistema articulado, onde tudo está ligado, onde tudo é solidário e onde cada elemento tira seu valor de sua posição estrutural*'.3 Os estruturalistas, dc modo geral, ao se desinteressarem dos (atos de evolução, refugiaram-se decididamente na sincro nia, mas enquanto uns continuam fiéis a conceitos herdado* da
Gramática geral, outros separam nitidamente forma e substância, e outros ainda levam tão longe a abstração que só se interessam pelo sistema independentemente de sua manifestação concreta. Limitar-nos-emos a assinalar, cm seguida, dentre as teorias que foram elaboradas nes:a corrente de pensamento, as que tiveram maior repercussão e que mais dignas de interesse nos parecem. 4 O dinamarquês V. Brindai (falecido em 1942), reatando com a antiga tradição, tentou "achar na linguagem os conceitos da Lógica, tal como foram elaborados pela Filosofia, desde Aris tóteles até os lógicos modernos**; 5 com este objetivo, esfor 1.
Cf. por ex. Lã phonologi aluelle em Journal de Psyhologi,
t. XXX (1933), pp. 227-246.
2. Cours, p. 125 (1462). — Em realidfde, o que é modificado é a rede de forcas e não, como me fez observar E. Buyssems, o sistema propriamente dito, de vez que todas as peças conservam seu valor. 3. S. Ullmann, Préis d simantique jrançaise, 2.a ed. (Berna, 1959), p. 26. 4. Encontrar-se-á uma boa introdução teórica ao estruturaliuno no volume Strutural linguistis and Human Communiation dr Bertll Malhbero (Berlim-Heidelberg-Nova Iorque, 1967). 5. Viggo Br<í»ndal, Etsais i linguistique générale (Copenhague, 1943), p. X.
çou-se, por exemplo, em explicar os grandes fatos de estrutura morfológica, alinhando as categorias que são sua expressão nas relações fundamentais, ordenadas em quadros bem determina dos. Partindo do princípio da binaridade funcional, ele distinguia um negativo e um positivo — termos polares que desig nam quaisquer contrários —, tal como o par singular/plural ou ainda aquele constituído pelo pretérito c o presente; a estes viria acrescentar-se um terceiro termo, chamado neutro ou zero, que não é nem negativo nem positivo (assim, o indicativo, que é uma forma amodal, ou ainda a terceira pessoa, que se define pelo fato de não ser nem a primeira nem a segunda); além destes três termos — negativo, positivo e neutro — haveria um quarto: o omplexo, o qual é, ao mesmo tempo, negativo e positivo, por exemplo, o dual, que é um singular-plural, ou ainda o optativo, modo que reúne as características do subjuntivo e do imperativo. 1 O jogo de termos assim definido permite combinações múltiplas, nas quais Brindai entrevia a base dos sistemas morfológicos.
O rigor lógico que levou Brindai a construir sua teoria, fazendo os fatos entrarem em quadros prestabelecidos do tipo binário, seduziu também outros pesquisadores; a sintagmática de Mikus, por exemplo, repousa na análise de um enunciado talhado de modo mais ou menos artificial para obter estruturas binárias.2 Por outro lado, R. Jakobson, um dos pais da Fono logia (e, se voltamos à Fonologia, nem por isso deixamos o estrutural ismo) e chefe da “escola de Harvard", concebe as unidades distintivas da linguagem como combinações de traços 1.
A inclusão do imperativo nu agrupamento dos modos mostra bem, no nosso entender, o caráter forçado da operação; consideramos, realmente, o imperativo à parte, como uma forma de linguagem afetiva ou expressiva que se situa fora do jogo normal dos termos da categoria modal, da mesma forma por que o vocativo não faz parte do sistema casual da flexão nominal (como o demonstra, no plano genético, a própria forma — tema puro — de um e de outro). 2. Francis Mikus, Quelle est en fin de ompte Ia struturètype du langage? em Uugua, t. III (1953), pp. 340-370; En marge du Sixième Congris International des Linguistes^ (a propósito da Sintagmiiica) em Miselânea Homenaje a André Martinet, t. I (La Laguna, 1957), pp. 159-221.
110
cm relação estritamente binárias. 1 pois as oposições pertinentes marcadas nas línguas do mundo es tio reduzidas a doze opoaições binárias, que se encontrariam, em número mais ou menos elevado, em cada sistema lingüístico. 8 Assim, ao sistema fle xível de Trubetzkoy, que distinguia oposições correia tivas c disjuntivas, Jakobson o|>õc um binarismo radical; mu cumpre reconhecer que só se chega a tal apresentação de fatos quando se considera que certas características são essenciais e devem ser levadas em conta para o estabelecimento do esquema e se negligenciam outras por secundárias ou “redundantes**. 3 Somos assim levados à questão primordial que se coloca para o lin güista no seu esforço dc classificação, qualquer que seja o plano de sua pesquisa: o da escolha e da medida dos critérios; que fatos se devem reter, quais os que se podem desprezar legitimamente,4 como se poderá avaliar-lhes a importância, por que método se evitaria o arbitrário? Digamos com Martinet: "É preciso repetir, uma vez mais, que não cabe à língua con formar-se aos decretos dos lingüistas, mas aos lingüistas adaptar seus métodos se estes não fazem plena justiça à língua estudada**.1 Preliminaries to Speeh Analysis . The distintive Features and their Correlates, Cambridge, Mass., 1952. 2. Roman Jakobson c Morris Halle, Fundamentals of Lan guage (Haia, 1956), pp. 28-32 ■ Seleted Writings, t. I (Haia, 1962), pp. 484-486 (versão francesa nos Essais de linguistique ginirtde, trad, de N. Ruwet, Paris, 1963, pp. 127-131). Nove desses traços distintivoc dizem respeito à sonoridade (como compacto/difuso: a/i\ sonora/sur b/p; m/bt trét k tonalidade (romn esuro/laro: da: nasal/oral: u/i), 3. Ver a critica construtiva de Martinet, Êonomie des hange ments phoné tiques, pp. 73-77. Em seu relatório ao Congresso de Bucarest de 1967, Bertil 4. Malk &ero (Synehronie et diaehronie nas Aetes du X* Congris Inter • national des Linguistas, t.' I, Bucarest, 1969, pp. 13-25) insistiu na importância do fator "escolha" em Lingüística, lembrando a esse pro pósito a constatação de Saussure: ''estudar um estado da língua resulta praticamente em desprezar as mudanças pouco importantes, do mesmo modo como os matemáticos desprezam ai quantidades infinitesimais em certas operações, tais como o cálculo dos logaritmos", Cours, p. 142 (1677). 5. Êonomie, pp. 125-126. 1.
Roman
Jakobsok ,
Gunnar
Fast
c
Morris
Halls.
Ill
Dentro de uma corrente de pensamento semelhante à que inspirou Brindai, o lingüista francês G. Guillaume se destacou por penetrantes estudos a respeito da categoria do verbo assim como sobre o problema do artigo na língua francesa; valendò-se expressamente da lição saussuriana, 1 ele tentou criar o que chama a psico-sistemática, nova parte da Lingüística que seria reservada ao estudo dos sistemas. Embora pretendesse que sua doutrina fosse rigorosamente ortodoxa, na linha de Meillet, Guillaume ligou-se energicamente à Lingüística tradicional po sitiva, a qual, por querer fixar o real de muito perto, “priva-se ipso fato de vê-lo em seu todo, pois o real se estende bem para além daquilo que é captado pela observação direta”; a psico-sistemática estuda, de fato, as integrações de séries de inorfemas; ora, se os morfemas podem ser estudados no prag matismo do discurso, já não é o caso dos sistemas aos quais só se chega por uma operação de pensamento que desborda do campo dos fatos diretamente verificáveis; com efeito, os siste mas não têm significantes, pelo menos significantcs que os representariam em seu todo: isto quer dizer que ficam fora da observação direta c que só podem ser atingidos, conforme os próprios termos do autor, por uma aliança “da fina observação do concreto e da reflexão abstrata profunda'*; daí o fato para doxal de que um livro consagrado pelo autor ao estudo de formas gramaticais gregas e latinas (tratava-se da formação da imagem-tempo nas línguas clássicas) se apresentasse como uma exposição sem exemplos, “pois o fenômeno que ele des creve é, no pensamento, um fenômeno antecedente à formação de qualquer exemplo". 2 Encontraremos uma continuação fiel da obra de Guillaume (falecido em 1960) nos trabalhos de R. Valin, 3 o qual também nega a concepção “abusivamente posi tivista” da Lingüística clássica e recorre a uma linguagem 1. Cf. por exemplo Gustave Guillaume , La langue estellt ou n’st elle pas un systime? (Quebec, 1952), p. 4. 2. G. Guillaume , Uarhltetonique du temps dans Us langues lassiques (Copenhage, 1945), particularmente nas pp. 11-15, 17 e 65, n. U 3. Roch Valin, Petite introdution â la psyhomfanique du langage, Quebec, 1954.
112
lógico-geométrica (transcrição das operações de pensamento em
esquemas figurativos) para expor as sutis posições da “psico* mecânica*’. Na Europa, a mais vigorosa teoria estruturalista, a mais
avançada nos pormenores, aquela também que mais repercussão teve, embora suscitasse mais reticências, é, incontestavelmente, a glossemátia do lingüista dinamarquês L. Hjelmslev; se o termo data de 1936, a teoria, esboçada desde 1928 e aprofundada em numerosos trabalhos de pormenor, 1 ainda não foi objeto dc uma completa exposição de conjunto,* e o autor faleceu (em 1965) antes de haver terminado sua obra. A própria escolha desta palavra nova mostra bem que o autor, ao construir sua teoria, quis, até certo ponto, fazer tabula rasa das especulações 1, Uma introdução publicada em dinamarquês, em 1943, apa receu em tradução inglesa Prolegomena to a Theory of Language (Bal timore, 1953; 2.* ed., Madison, 1963) e francesa ( Prolégomines à une ihéorie du langage, Paris, 1968), mas serio feitas referências sobre tudo a seus Essais linguistiques, Copenhague, 1969 (*= Travaux du Cerle Linguistique de Copenhague, t. XII), coletânea de 15 artigos escolhidos entre os que refletem melhor o pensamento do autor e sua evolução em matéria de Lingüística geral. 2. Da série Outline of Glossematis. A Study in the Methodology of the Humanities with Speial Referene to Linguistis que, de vida i colaboração de Louis Hjelmslev e H. J. Uldall (este último, porém, morreu prematuramente em 1957), se destinava a expor os fundamento» e as aplicações da nova disciplina, apareceu apenas o tomo I redigido por Uldall (com exceção do prefácio, que é de Hjelmslev): General Theory (= Travaux du Cerle Linguistique de Copenhague , t. X). — Abordar-se-i melhor o estudo da glossemática remetendo-se ao volume de B. Siertsema , A Study of Glossematis. Critial Suriy of its Fundamentals Conepts (Haia, 1955), ao informe (com bibliografia) de Henning Spako-Hanssen, Glossematis , que figura nas pp. 128-164 do volume Trends in European and Amerian linguistis {19301960), f. p. 8, n. 1) c sobretudo à exposição notavelmente clara de Bertil Malmberg, Les nouvdles tendanes de la linguistique (Paris, 1966), pp. 207-226; cf. também Emilio Alulcos Llokach, Gramátia estrutural (segun la esuela de Copenhague y on espeial atenión a la lengua espanola , Madri, 1951. — A pro posito da influência profunda que a teoria de Hjelmslev exerce sobre a Lingüística dinamarquesa, ver a coletânea La glostfmatique. Vhéritage de Hjelmsleo au Danemark, publicado por Knud Tooeby em Langages, n.° 6 (junho de 1967).
11}
preexistentes, exceto, é claro, as de Saussure; a glossemática, que tende a subtrair a ciência lingüística de qualquer apreciação subjetiva, esforça-se por estabelecer uma espécie de álgebra da linguagem, isto é, uma trama de definições que formaria um sistema capaz dc servir de modelo à descrição de idiomas particulares. Hjelmslev, ao considerar a língua como uma totalidade que se basta a si própria e possuidora de uma estrutura sui generis, insiste muito na distinção saussuriana: “a língua é uma forma e não uma substância”;1 mas, a exemplo do par saussuriano sig nificado/ significante, ele fala de dois planos na língua: o con teúdo e a expressão que, ambos, têm forma e substância pró prias. Hjelmslev prccisa ainda: “a forma lingüística é inde pendente da substância na qual ela se manifesta. A forma só pode ser reconhecida e definida se nos colocarmos no terreno da função”,2 por outras palavras, a substância, enquanto não foi ainda estruturalizadaL permanece uma massa amorfa, uma ne bulosa, teria dito Saussure.3 Quanto à estrutura de uma língua, Hjelmslev a define como uma “trama de dependências ou, para dizê-lo de modo mais exato, mais técnico e mais simples, uma trama de funções”;4 ele propôs também a seguinte definição: “É estrutura uma entidade autônoma de dependências inter nas.” 5 É evidente a intenção de “reduzir o sistema da Lógica formal e o da língua a um princípio comum que poderia receber o nome de sistema sublógico ”.6 1.
Cours, p. 169 (1976). 2. Bulletin du Cerle Linguistique de Copenhague, t. IV (1939),
pp. 3-4. 3. Ver p. 145. 4. La notion de retion em Ata Lingüístia, t. I (1939), p. U (= Essais linguistiques| p. 140). 5. Ates du Huitième Congrès International des Linguistes (Oslo, 1958), p. 641. 6. Sobre tais relações entre língua e lógica, cf. Leo Apostel, Logique et langage onsidéris du point de vue de la pré orretion des erreurs em L. Apostel, B. Mandelbrot e A. Morf, Logique, langage et thiorie de Vinformation (Paris, 1957), principalmente nas pp. 135-151: L. Apostel, Êpistimologie ie la linguistique em Logique et onnaissane sientifique (“La Pléiade”, Paris, 1967), pp. 1056*1096.
114
Desnecessário dissimular o lado perigoso dc tais teorias ou subestimar os erros dc julgamento que elas podem provocar. A atenção dada ao sistema em si mesmo, sem referência k sua rea lização concreta, leva a construções abstratas que, ao menor passo em falso no raciocínio, podem transformar-se em espe culações artificiais sem relação com as bases tangíveis de nossos conhecimentos. Por outro lado, Hjelmslev, levado pelo louvável objetivo de precisar melhor suas concepções e dar delas uma imagem o quanto possível (iel, acabou criando uma terminologia parti cular, que lhe dá às pesquisas um aspecto hermético e torna desconcertante a leitura de seus trabalhos para os não-iniciados; sua compreensão só sc torna de fato possível após a assimilação de todo um vocabulário esotérico ou de termos novos, como pleremas e enemas (os primeiros são os elementos no plano do conteúdo, e os segundos no plano da expressão )1 ou ainda funtivo (que qualifica os dois termos de uma função), ao lado de palavras conhecidas mas empregadas num sentido pouco habitual, como função, para a qual se reserva o sentido de “relação entre dois termos 1’ (isto é, entre dois jüntivos), ou ainda relação (— função e e)t orrelação (— função o u o u ) , et. O entrave de tais procedimentos é que tende a favorecer certo verbalismo, que poderia lamentavelmente substituir os conhecimentos adquiridos pelo contato direto com as realidades. Decerto que o perigo é nulo para um Hjelmslev, que só se aven turou a emitir considerações teóricas a propósito da linguagem depois de ter-lhe aprofundado os diferentes aspectos 2 e ter-se tomado mestre da técnica filológica e lingüística (ele havia sido aluno do comparatista Holger Pedersen); assim também, Guil laume, ao colocar a estrutura como imanente à língua realizada e ao definir seu método como uma aliança da observação do concreto e da reflexão abstrata, tem o cuidado de especificar 1. Não se trata, pois, dc "palavras vazias” c "palavras cheias', no sentido em que o entendem os gramáticos chineses (cf. atrás, p. 39). 2. O volume Le langage, redigido para um grande público (tra dução francesa de M. Olten. Paris, 1966), mostra bem a verdade dos interesses do autor.
tjue. ness* aliança, a última palavra pertence, bem entendido, à observação, “a única qualificada para decidir, em última ins tância, da verdadeira natureza das coisas, pois o. papel da re flexão, na aliança que contrai com a observação, não é absolu tamente o de concluir cm seu lugar, mas dc guiá-la, torná-la mais aguda, mais penetrante e, para dizer tudo numa só palavra, conferir-lhe um poder que a observação não teria, se deixada entregue a suas próprias forças”. 1 Mas o que há a temer — temor que os fatos vem confirmar — é que discípulos por demais zelosos, incunscicntcmcntc entusiasmados por fórmulas que não foram nem elaboradas e nem controladas por eles pró prios, sejam levados levados a substituir uma reflexão lingüística sólida c fecunda por uma enxurrada de especulações puramente artifi ciais, porque desprovidas de fundamentos tangíveis. Não foi sem inquietude que vimos assim certos lingüistas americanos falarem dc uma metalingüístia — ou ainda de uma exolingüis tia — que, ocupando-se unicamente de relações, abandonaria a Fone tica aos físicos c a Semântica aos sociólogos .2 Outru construções
perigo, este sistemáticas
muito mais real e mais grave: nessas elaboradas com o rigor das teorias lógico-matcmáticas c, muitos vezes, por meio de fórmulas dc tipo algébrico, há uma tendência a considerar a língua como 1. Uarhitetoniqut du lemps (cf. p. 112, n. 2), p. 17. Linguistis 2. Cf. por ex. Einar Haugen, Diretions in modem Linguistis em Language, t. XXVII (1951), pp. 221-222; J. B. Carroll, Tht Study of Language. A Survey of linguistis and related disiplines in Ameria (Cambridge, Mass., 1953), p. 29. — Em Lingüística apli cada, metalinguisti %r diz da formulação dos quadros gramaticail (de línguas naturais ou artificiais) com vistas à sua utilização pelai "máquinas de traduzir*' (ver mais adiante, p. 123s); vê-se, pois, que também aqui se coloca o lingüista num nível dc abstração tal que perde qualquer contato com o concreto. — Mas a terminologia è móvel; seguindo George L. Tracks (The Field of Linguistis, Norman, 1949), dá-se às vezes ao estudo da linguagem no sentido mais amplo o nome de marolingülstia, que se subdividiria em pré-lingüíftica (base material da linguagem), mirolingülstia (que corresponde quase à Lingüística estrutural) e metalingüístia, a qual diz respeito, desta vez, às relações da língua com o ambiente cultural; cf. Eric P. Hamp, A Glossary of Amerian Tehnial Linguisti Usage 1925*1950 (Utrecht-Antuérpia, 1957), pp. 37, 38, 48.
116
um dado, como um ser em si, desligado das contigcncias hu manas (Hjelmslev chega até a pretender que, sendo a lingua uma entidade abstrata, o sistema é independente de sua mani festação concreta)1 e, por um retorno a concepções muito pres tigiadas no último século e que se acreditaria estivessem caducas,2 a Lingüística é de novo assimilada às ciências naturais ou ditas exatas. Chega-se ao ponto de pensar e de especular não mais acerca dos fatos e dos diversos aspectos que oferecem à observação direta, mas antes acerca das deduções tiradas de sua existência, dos esquemas que se julgou poder estabelecer segundo sua relação recíproca no sistema. Em outras palavras, a Lin güística, concebida de tal maneira, afasta-se singularmente desse fato humano por essência, vivo e multiforme, que é a linguagem, c sc arrisca a tornar-se um conccptualismo formalista, acanto nado no campo da especulação intelectual; não foi sem razão que se pôde censurar aos estruturalistas pairarem amiúde na estratosfera sem se preocupar com as realidades concretas, que são a própria substância de nossa ciência .9 E chegamos assim à verificação paradoxal de que teorias lingüísticas elaboradas de início dentro de um espírito socioló gico e atentas às estreitas relações que unem a linguagem e a sociedade, levaram certos pesquisadores a um estádio singular mente afastado da concepção inicial. Porque- Saussure estava imbuído, sem dúvida alguma, do espírito sociológico. “Todas as avenidas de sua doutrina levam, de fato, à consideração da linguagem como um fato social... Da leitura de seu livro, ficamos com a forte impressão de que* a Lingüística é essencial mente uma ciência sociológica.” Sem dúvida, o ponto de vista psicológico marca de modo igualmente profundo o pensamento saussuriano, mas esse julgamento acerca da direção sociológica do Cours, emitido em 1921 por J. Vendryes ,4 continua válido, 1. Cf. por ex. B. Malmbero, em Studia lingüístia, t. III (1949), p. 132; V. Kopal em Lingua, t. II (1950), pp. 231-232. 2. Ver pp. 36-37. 3. J. Orr em Ates du sixième sixième Congrèt Congrèt International International des lÀn guistes (Paris, 1949), pp. LXIII-LXV. 4. Le aratère aratère soial du langage langage et la dotrine dotrine de F. de Soui Soui sure em Journal de Psyhologi Psyhologi, t. XVIII (1941), p. 624 (= Choix d’itudes linguistiques et eltiques, Paris, 1952, p. 25).
117
no essencial. Ora, não é possível, parece-nos, imaginar teorias mais afastadas das realidades sociais que as especulações pu ramente abstratas — pensamos,, bem entendido, nas posições extremas defendidas nesse domínio — nas quais se comprazem certos adeptos fervorosos das doutrinas estruturalistas. No entanto, se a sistematização, enaltecida por certos es truturalistas, pode parecer excessiva, reconhecer que é justo uma sistematização se tornara necessária, até mesmo indispen sável, e não é de admirar que tais correntes de pensamento tenham vindo à luz em nossos estudos. A complexidade e a imensidade de uma matéria tão rica, tão fugitiva quanto a lin guagem humana, haviam provocado a eclosão de um número considerável de pesquisas acerca de pontos particulares e frag mentários, mas esses trabalhos, que evidenciavam a amplitude das investigações a levar a cabo e dos domínios a explorar, realizavam-se na diversidade e na dispersão e testemunhavam muito freqüentemente singular indigência no campo das idéias gerais. Por conseguinte, compreende-se que os teóricos, na es perança de facilitar a tarefa dos pesquisadores propondo-lhes linhas diretrizes, tenham cedido à necessidade imperiosa de sintetizar, de modo às vezes prematuro, os múltiplos aspectos da linguagem, de esclarecer os pontos em que parecia reinar a confusão e tenham sido levados, assim, a prender-se a concep ções de um porte metafísico ou ainda a tomar emprestado os processos da lógica simbólica para descrever com maior rigor o objetivo de sua ciência; a Psicossistemática de Guillaume entrava por esse caminho, mas viu-se que o autor se apoiava em um fundo sólido de conhecimentos precisos dos fatos lin güísticos. Do mesmo modo, foi partindo de provas filológicas provadas que lingüistas como A. W. Dc Groot e L. Tesnière intro duziram os pontos de vista estruturais no estudo da sintaxe .1
Ora, nos Estados Unidos, alguns lingüistas foram mais longe, entregando-se a especulações que às vezes parecem cortadas da realidade; citemos, por exemplo, Z. S. Harris, cujo 1. A. W. Groot, Struturele Syntaxis , Haia, 1949; Lucien Tes N!&re, ÊUments de syntaxe struturale, struturale, Paris, 1959.
118
método de análise é uma construção lógico-ma temática sem fundamento estável;1 ele restringe k voluntariamente suas pes quisas às questões dc distribuição, isto é, à liberdade de ocor rência das partes do enunciado, umas com relação às outras, e o faz sucessivamente para os elementos fônicos e para os elementos morfológicos, eliminando pois a significação das pa lavras, como o tinham feito antes B. Bloch e G. L. Trager ;2 aliás, diante desse processo puramente mecânico — só o critério de distribuição é considerado pertinente —, que será das variantes expressivas, estilísticas e outras, que são dc importância pri mordial na comunicação entre seres humanos? O método é tanto menos convincente quanto os fatos filológicos a que Harris se refere nem sempre parecem bem estabelecidos e dão a impres são de que o autor os adapta ao gosto de seu raciocínio .2 Esse método está condenado também pelo fato de que Harris e os colegas que o utilizam, aplicando-o a diversos campos, mas notadamente a um domínio tão bem conhecido e estudado como é o inglês contemporâneo, chegam a resultados divergentes, além de mudarem, eles próprios, suas conclusões de uma expe riência a outra !4 Ao contrário, K. L. Pike, partindo igualmente do princi pio da distribuição, conservou o contato com o concreto; exce lente conhecedor das línguas ameríndias (ele foi aluno dc Sa pir) e convencido da importância do ambiente cultural, Pike propôs, sob o nome de tagmêmica,® uma análise lingüística que une a Fonologia à função e à significação .6 Diferentes tipos de 1. Zellig S. Harris, Strutural Linguistis, 2-* ed.s Chicago, 1960 (a 1.” edição aparecera em 1951 com o titulo de Methods in Strutural Linguistis). — Ver agora a coletânea de artigos Papers in Strutural and Transformational Linguistis , Dordrechts, 1970. 2. Bernard Bloch e George L. Tracer, Outline of Linguisti Analysis, Baltimore, 1942. 3. Ver a critica severa de J. Cantikf.au em Bulletin de la la So iiti de Linguistique de Paris , t. L, fasc. 2 (1954), pp. 4-9. 4. Cf. a esse respeito as observações de Einar Haugen, Diretions tions in in modem modem Linguist Linguistis is ( f . p. 116, n. 2), p. 219 e n. 29. 5. Cf. p. 99, n. 5. Theory of the 6. K. L. Pike, Language in Relation to a unified Theory Struture of human Behavior , 2.* ed., Haia, 1967. — Cf. Eddy Rouut,
gramática estrutural desenvolveram-se na mesma corrente de idéias como a teoria neofirthiana, à qual aludiremos mais adiante.1 Contudo, nesses últimos anos, é Noam Chomsky, cuja ati vidade situou-se no seio do M.I.T., que desempenhou um papel dc primeira plana, procedendo, no sentido de uma for malização dos níveis lingüísticos — de acordo com os métodos da Lógica formal —, a uma análise muito penetrante da estruturã-gramatical? Transcendendo o distribucionalismo, que se funda sobre a propriedade que os elementos do discurso têm de combinar entre si,4 mas que, atendo-se unicamente à forma pode acabar propondo como esquemas lingüísticos frases de valor ambíguo e até de significação absurda, ele elaborou uma teoria transformadonal que tenta eliminar esse defeito apelando para o sentido; com efeito, Chomsky considera que duas estru turas sintáticas formalmente idênticas são diferentes se não admitem as mesmas transformações. Foi Chomsky quem, fletindo uma vez mais o curso de seu raciocínio, fez-se promotor da gramática gerativa:5 trata-se aqui de descobrir os princípios a partir dos quais, graças a transformações sucessivas, pode-se não só prestar contas dos fatos realizados no discurso, mas ainda construir modelos hipotéticos dc todas as frases de uma língua, modelos que seriam enunciados-chave estáveis impos-
Syntaxe d la proposition nultaire en français parll (Bruxelas, 1969), pp. 11-43.
1. P. 159. 2. Massachusetts Institute of Technology. 3. Noam Chomsky, The Logial Basis of Linguistis Theory em Proeedings oj the Ninth International Congress of Linguists (Cambridge, Mass., 1962), Haia, 1964, pp. 914-978; Aspets of the Theory of Syntax, Cambridge, Mass., 1965; cf. Emmom Bach, An Introdution to Transformational Grammars, Nova Iorque, 1964. 4. Esses princípios de comutação foram apresentados por seus autores em "figuras” diferentes; cf. por ex. o Manual of Phonology dc C. F. Hogkett, Baltimore, 1955. 5. N. Chomsky, Topis in the Theory of Generative Grammar, Haia, 1966. — Cf. N. R itwet, Introdution à la grammair génirative, Paris, 1967.
120
tos pela nossa constituição mental e que devem ser atribuídos à “estrutura profunda" da língua, de que procede a “estrutura superficial” obtida pelo jogo das transformações. É portanto uma concepção teórica da Lingüística que se opõe àquela por vezes chamada de taxinômica (trata-se, com efeito, da Lingüística científica), que consiste essencialmente em classificar os dados observados cm sua atualização. Ora, é excitante constatar que o novo chomskysmo, que admite as re gras gramaticais como algo inato, está de volta às reflexões filosòfico-gramaticais que têm sua fonte no pensamento sofis tico e em Aristóteles e que, no século XVII, encontraram sua* expressão na cartesiana Grammaire gênitde et raiionnte de PortRoyal; o autor, aliás, não o esconde, 1 embora seus traba lhos tenham-se beneficiado de todo o trabalho feito hi um século e meio pela Lingüística "tradicional". Por outro lado, podemos perguntar em que medida regras editadas a partir de esquemas sintiticos próprios das línguas européias* poderiam aplicar-se a sistemas de outro tipo, tais como as línguas — e elas slo muitas no mundo — que não conhecem a distinção entre nome e verbo* Seja como for, e correndo o risco de desgostar os entu siastas do estruturalismo, tornaremos a expressar aqui nossa inquietação diante dos métodos que testemunham uma incon testável engenhosidade — embora freqüentemente tenha-se a impressão de que eles apenas complicam por gosto as coisas mais simples — 4 mas que, sobretudo quando manipulados por teóricos pouco familiarizados com os fatos concretos ensinados pela Lingüística histórica, correm o risco de degenerar num 1. N. Chomsky, Cartesian Linguistis, Nova Iorque, 1966. 2. Entre os ensaios de aplicação do método de Chomsky a ou tras línguas além do inglês, citamos a Grammaire struturale du fran jais : le vtrbe (Paris, 1967) de Jean Dubois. 3. Ver a esse respeito p. 148, n. 3 c pp. 195-197. 4. Cí. a critica dc Witold Ma£czac, Quelques réflexions sur lê dotrine de Noam Chomsky em Linguistis, n.° 49 (junho de 1969), pp. 18-27.
121
jogo^ gratuito de combinações dogmáticas.1 Na tendência para certo dogmatismo não é apanágio tanto isso é verdade que o espírito de sistema todos os domínios da ciência. Nós o encontramos
verdade, essa da Lingüística, insinua-se em de novo não apenas nas disciplinas conexas, como a Filologia, a História, a Arqueologia, a História das Religiões, etc., mas ainda em outras que, baseadas em princípio sobre a experimentação, poderiam à primeira vista parecer menos sujeitas a tais acidentes. É assim que a sistemática de um Cuvier dominou toda a Zoologia fran cesa do início do século XIX, apesar das ásperas críticas de espíritos clarividentes, como Geoffroy-Saint-Hilaire; a esse propósito, notou-se, judiciosamente, que o fato de a “escolástica readquirir vigor cada vez que uma escola científica tenta impor suas teorias pela força de uma lógica formal antes que pela experiência sensível, é a prova de que o conceitualismo continua como um dos motores mais humanamente atuantes do pensamento, e que o homem de ciência deve esforçar-se continuamente para mantê-lo em seu lugar.2 A teoria da informação e os estudos de Lingüística mate mática (estatística, cálculo das probabilidades)3 forneceram às 1. Recentemente, no prefácio do volume Le langage, publicado na “Encyclopedic de la Pléiade” (Paris, 1968), André Martinet insurgiu-se em termos severos contra essas “construções que não se apóiam sobre nenhuma observação objetiva do comportamento lingüístico dos falantes, que se fundam sobre a prioris que nem sequer se procura justificar, e que são o fato de pessoas que crêem que o uso de trata mentos matemáticos basta para assegurar o caráter científico de um tipo de operações” (p. XII). Ver também as reflexões desabusadas de Êr. Buyssens, La Grammaire gênárative selon Chomsky em Reuue Beige de Philologie et d’Histo ire, t. XL VII (1969), pp. 840-857. et let sienes d?observation em Revue de VUniversité de Bruxelles, t. II (1949-1950), p. 266. 2.
Êm. Janssens, Platon
Cf. Warren Plath, Mathematial Linguistis em Trends in European and Amerian Linguistis 19301960 (Utrecht-Antuérpia, 1961), pp. 21-57; Charles F. Hockett, Language, Mathematis and Linguistis em Th. A. S ebeok , Current Trends in Linguistis, t. Ill (Haia, 1966), pp. 155-304; para uma informação rápida sobre os dife rentes aspectos da Lingüística matemática, poder-se-á também repor tar-se ao volume publicado sob a direção de A. R. Meethem e R. A. Hudson, Enylopaedia of Linguistis, Information and Control 3.
122
pesquisas sobre o vocabulário indicações interessantes; 1 é assim que G. K. Zipf (falecido cm 1950) mostrou que, se se classi fica as palavras de um texto por ordem decrescente, o produto da classe (ocupada por uma palavra na lista) por sua frequência <í aproximadamente constante (é a “equação de Zipf*' r X /), o que significa que a freqüência de uma palavra é inversamente proporcional à sua ordem na lista;2 estudos ulteriores parecem indicar que essa equação não deixa de se relacionar com a estrutura fônica e com os sentidos das palavras. 2 É desse modo, partindo de bases estatísticas, que Greenberg tenta descobrir, sob o nome de “universais lingüísticos”, as constantes da lin guagem humana, seja qual for a diversidade de suas manifesta ções,4 teoria que poderia prestar grandes serviços nos estudos da tipologia.8 A Lingüística aplicada tirou grande proveito das pesquisas estruturalistas, dc um lado para a elaboração dos mltodos de (Oxford, 1969) no fim da qual (pp. 635-718) figura notadàmente um (ndex-glossário muito útil. Ê preciso lembrar que, com uma finalidade prática (esteno 1. grafia, datilografia, criptografia), hi muito tempo haviam-ae estabele cido quadros da frequência das letras (senio dos fonemas) que cons tituíam como que embriões dessa Lingüística quantitativa, que se de senvolveu consideravelmente nestes últimos decênios. 2. George Kingsley Ziff, The PsyhoBiology of Language, Cambridge, Mass., 1935 (reed. 1968), Human Behavior and the priniple of Least Effort, Cambridge, Mass., 1959. 3. Cf. P. Guiraud, Langage et théorie de la ommuniation cm Le Langage ("La Plciadc”, Paris, 1968), pp. 152-157; Ch. Mullir, !nidation à la statistique linguistique, Paris, 1968 (volume redigido para os lingUistas nio-matemáticos). — Como, com razio, nota G. C. Lkfschy ( La linguistique struturale, Paris, 1968, p. 206), a equaçSo de Zipf e os estudos que lhe dio continuidade apenas confirmam as conclusões às quais Martinet chegara, raciocinando em termos pura mente lingüísticos, sem recorrer ao aparato matemático; cf. acima, p. 107. 4. Joseph Grbbnbero, Language Universais em Th. A. Siasox, Current Trends in Linguistis, t. Ill (Haia, 1966), pp. 61-112; Synhroni Universais — cap. VIII de seu livro Anthropologial Linguistis (Nova Iorque, 1968), pp. 137-154. 5. Cf. p. 201 e n. 3.
12)
ensino usados nos
laboratórios de línguas ,1 por outro lado para a tradução mecânica: essa técnica, devida à colaboração dc lingüistas, de matemáticos e de eletrônicos, e muito adiantada sobretudo na Rússia c nos países anglo-saxões, hayia suscitado grandes esperanças; temos de reconhecer que os resultados são ainda muito imperfeitos 2 e que é pouco verossímil que algum dia ela possa ultrapassar o nível das línguas técnicas; contudo, as exigências das máquinas de traduzir deram um impulso não desprezível a algumas correntes teóricas que assinalamos acima, como a gramática gerativa. É preciso assinalar ainda a do
cumentação automática: o uso, cada vez mais vulgarizado, de cartões perfurados facilita grandemente a confecção dc índices, dc concordâncias, de repertórios, que podem dar matéria a pesquisas de natureza lingüística. O lamentável é que o emprego desses métodos matemá ticos, cuja legitimidade e utilidade são incontestáveis, traz, uma vez mais, ilusões acerca da verdadeira natureza da Lin güística; o Language de J. Whatmough, livro vivo e original, que mistura, curiosamente, reminiscências humanísticas a uma indisfarçada admiração pelas conquistas da técnica científica, como os computadores eletrônicos, 3 queria mostrar, ao que parece, que a Lingüística deve ser alinhada entre as ciências da natureza; e não vemos também B. Mandelbrot, ao concluir um artigo-programa, muito bem feito aliás, acerca da possibi lidade de aplicar os conceitos da teoria da comunicação ao estudo da linguagem, manifestar a esperança dc ver aproxi mar-se o dia "em que o estudo da língua passará definitiva mente a barreira fictícia que a separou, até aqui, das ciências exatas": o velho mito schleicheriano não está morto! 4
1. Cf. p. 188. 2. Cf. G. Mounin, La mahine à traduire\ Haia» 1964. 3. Joshua Whatmough, Language, A modem Synthesis Lon dres, 1956. 4. Benoit Mandelbrot, Struture formeUe des textes et ommuniation em Word, t. X (1954), pp. 1-27. — E esse» modo» de ver fizeram escola: "Linguistics, at least in several aipects, is evolving from a humanity into a science. There is a growing recognition of
124
Foi-se mais longe ainda: essa estatística lingüística, cujo campo de ação era primeiramente a descrição sincrônica das línguas — c, mesmo nesse domínio as flutuações são considerá veis e os resultados submetidos a muitos fatores subjetivos 1 —, estendeu-se à diacronis; trata-se da glotoronologja, enaltecida principalmente por Morris Swadesh* e rebatizada, em seguida, como léxiostatislia, que tem por ambição calcular, segundo o exame do léxico (a substituição de significantes por outros, no curso da História, se faria de acordo com um ritmo cons tante, que se traduz por uma determinada porcentagem por períodos de mil anos), a data dc separação dc duas ou várias línguas aparentadas mas o número, a natureza c a escolha das noções que, consideradas como simples e fundamentais, consti tuem as listas de cuja comparação se deduz uma constante sob forma de fórmula, são fatores variáveis que prejudicam o rigor do cálculo;3 ora, em todo caso, é decepcionante verificar que esse método, concebido, é verdade, sobretudo para o estudo e classificação das línguas ameríndias, vale dizer, de línguas sem história, revela-se absolutamente falso quando aplicado a lín guas de história, como as romftnicas; obtêm-se, neste caso, com languages as natural phenomena whose secrets may yield to methods of analysis and description akin to those that have proved fruitful in the physical sciences” = começo do artigo Linguistis and Mathematis, de Anthony G. Oettinoer cm Studies presented to Joshua Whatmeugh (HaSa, 1957), p. 179. O manual de estatística lingüística que constitui o volume de 1. G. Herdan, Language as Choie and Chane (Groningue, 1956) foi acolhido com reserva, dada a insuficiência da informação; encontram-se entretanto indicações interessantes, tais como a diferença entre a estatística da língua, submetida à circunstância fortuita {hame = aca so) que é a coerção social, e a estatística do estilo, em que intervém a escolha do falante. 2. Cf. por ex. S. C. Gudschinsky, The ABC's of Lexiostatis tis (Glottohronology) em Word , t. XII (1956), pp. 175-210; A. neue Datiergunsmethode der vergleihen • Dall'iona R odrigues, Eine den Sprahwissenshaft em Kratylos, t. II (1957), pp. 1-13. 3. Robert B. Lees, Tht Basis of Glottohronolgy em Language, t. XXIX (1953), pp. 113-127; cf. Thomas Pbmchoen, La glottokr*. nologit em Le Langage (“La Pléiaíe”, Paris, 1968), pp. 665-884.
125
efeito, resultados os fatos.1
inaceitáveis
c
cm
contradição
flagrante
com
Todavia, a preocupação de não sc deixar levar pelos jogos estéreis de um intelectualisino gratuito provocou salutares rea ções nos lingüistas que participam da corrente estruturalista; já dissemos3 como Martinet, graças ao realismo com que im pregnou a Fonologia diacrônica, realizou de maneira feliz a ponte entre a Gramática comparada tradicional c as novas con cepções c c bom repetir com ele que “é tempo dc os lingüistas tomarem consciência da autonomia dc sua disciplina e sc de sembaraçarem do complexo de inferioridade que os incita a filiar cada uma dc suas diligencias a um grande princípio filosófico qualquer, o que só consegue ensombrar os contornos da realidade cm vez dc endurecê-los/' 3 Nos Êlintenls de lin guistique gênérale,4 insiste ele, com justa razão, na necessidade dc fazcr-sc a ligação entre a especulação pura e a exploração dos dados, de modo a estabelecer um equilíbrio — “mais rea lismo c menos formalismo" — entre a teoria e a prática. É justo, todavia, insistir também no fato de que Hjelmslev, ressaltando a função, mostrou bem o que havia de mais fecundo em suas pesquisas; desde 1929, aliás, H. Frei havia falado de Ungüístia funional , opondo-a à Lingüística histórica bem como à Gramática normativa,5 c muitos, atualmente, preferem empre gar esta expressão. Éric Buyssens, num trabalho* que é um esforço para integrar a Lingüística na Semiologia, tal como o 1. Cf. Eugenio Coseriü, Critique de la glottohronologie appli* quée aux tongues romanes em Ates du X 9 Congrès International de Linguistique et Philologie Romanes (Strasbourg , 1962), t. I (Pari», 1965), pp. 87-96. 3.
Eonomi dei hangments phonétiques, p. 18.
4.
Paris, 1960.
H. Frei, La grammaire des fautes (Genebra, 1929), pp. 17-31. 6. Éric Buyssens, Les langages ei te disours . Essai de linguistique Iontionelle dans le adre de la sémiologie , Bruxelas, 1943, ediçSo revista e aumentada sob o título La ommuniation et Vartiulation linguistique, Bruxelas-Paris, 1967; cf. La oneption fontionnelU des laits linguistis em Journal de psyhologi, ano de 1950, pp. 37-53; o 5.
126
concebera Saussure 1 e no qual estima que essa designação ••in dica perfeitamente o ponto de vista da Lingüística chamada estrutural”, ressalta que aqui, como em todas as ciências, a idéia de função é a idéia fundamental e, conseqüentemente, ele estuda o discurso como “a parte funcional da fala"; é claro que se trata dc "função" no sentido amplo, dc “maneira a empregar os elementos lingüísticos" e é assim também que o entendem Martinet, para quem a Fonologia é uma disciplina essencialmente funcional,3 ou o lingüista americano L. Bloomfield, que não é fora de propósito citar aqui, embora ele não se refira explicita mente a Saussure — cujo esforço de sistematização ele havia apreciado, expressando a opinião dc que havia fornecido a base teórica indispensável ao estudo da linguagem humana —* e seus discípulos cheguem mesmo a negar tal influência; 4 seu Language, a que voltaremos,9 embora continue fiel às concep ções positivistas do tipo neogramático, insiste, dentro do campo da descrição estática — único por que se interessa de modo especial — na importância das funções. Vê-se então que as diligências feitas para atingir o conhe cimento da estrutura lingüística variaram e que a etiqueta estruturalismo, hoje empregada correntemente, encobre em realida de, na Europa e no Novo Mundo, tendências às vezes profunda mente divergentes;6 é que, como o disse Benveniste, "estrutumesmo autor também se preocupou com as relações a serem estabele cida* entre Psicologia « Lingüística, entre pensamento e língua, cf. por ex. Revue de Ylrutitut de Soiologie de VUniversitd Libre de Bru xelles, ano de 1960, pp. 269-294 e, logo adiante, p. 148. 1. Ver pp. 130-133. 2. Cf. por ex. Oú en est la phonologi? em Lingua, t. I (1948), pp. 34-58. 3. Numa apreciação do Cours publicado em The Modem Lan guage Journal , t. VIII (1923-1924), pp. 317-319. 4. Cf. André Martinet, Strutural Linguistis em A. L. Knot* sxa. Anthropology Today (Chicago, 1953), p. 577. 5. Pp. 156 e 181-182. Duas exposições lúcidas dessas diferentes tendências foram 6. apresentadas por Êmile Benveniste: 1) Tendanes rienles en lin guistique ginirale em Journal de psyhologi, ano de 1954, pp. 130•145; 2) Coup d’oril sur U dévloppement de la linguistique em
127
ri c um dos termos essenciais da Lingüística moderna, um dos que ainda tem valor programático”,1 a tal ponto que os pes quisadores empregam a palavra era diferentes acepções (ou se trata de um sistema que explica o arranjo do todo cm partes, as quais são solidárias, ou então a disposição, num todo organi zado, dos elementos da substância concreta) e dela tiram, no plano metodológico, conclusões igualmente diferentes; de uma parte, os estruturalistas europeus, e principalmente os glossemá ticos, consideram a forma como essencial, como a única pertinente do ponto de vista lingüístico, de sorte que a subs tância se explica em relação com ela c segundo um método dedutivo; de outra parte, os estruturalistas americanos analisam os elementos da substância concreta e, definindo-o pela relação com o todo no qual se organizam, tentam descobrir a estrutura por via de um método indutivo* Comptes rtndus dt stanes dt VAademi des Insriptions ti Belles| j - Lttrts, ano dc 1962, pp. 369-380; esses dois artigos foram republica dos na coletânea Problèmes de linguistique ginêrale (Paris, 1966), nas pp. 3-17 e 18-31; ver também, a propósito da estrutura e dos níveis da análise lingüística, nas pp. 91-98 e 119-131 da mesma coletânea. Reportar-se-á ainda com proveito à visão de conjunto, rápida mas clara, de André Martinet, Strutural Linguistis (já mencionada à j p. 127, n. 4) c, para os anos recentes, à exposição bem documentada de G. C. Lepsciiy, La linguistique struturale , Paris, 1968. Assinale mos ainda o pequeno volume de Jean Piaget, Le struturalism* (Pam, 1968) onde o estruturalismo lingüístico é situado com pertinência flffl conjunto das teses estruturalistas que se desenvolveram tanto na Ma temática e na Lógica como na Psicologia, tanto na Biologia e na Eg|B como na Filosofia — ou ainda na Antropologia social e cultural; ncai último domínio, a obra de Claude Lévi-Strauss impôs-se à atençipd
combatendo o totemismo, que os etnólogos consideraram por muitfl tempo como a explicação-chave dos grupos humanos, e proclamando, ao contrário de Durkheim, a primazia do intelecto sopre o social, ete~ colocou em paralelo, entre as populações primitivas, a estrutura lin güística e a social, esforçando-se por interpretar a sociedade em B conjunto (regras de parentesco e de casamento, regras econômicas para intercâmbio dos bens e dós serviços, regras lingüísticas para I transmissão das mensagens) em função de uma teoria da comunicação; cf. por ex. Anthropologie struturale, Paris, 1958, particularmente nas pp. 37-110. 1. Tendanes réentes, p. 136 = Problèmes, p. 8. Notar-se-á também que, de ambos os lados, as palavras nem 2. sempre são empregadas com o mesmo valor; morfema, por exempt.
Í28
Seja como for, é inegável que, dcide a
1. Vede a esse propósito a excelente observação de Jean Pkaost* Li struturalisms (Paris, 1968), p. 123: “o estruturalismo é mais um método que uma doutrina, ou, na medida em que se toma doutrinai, ele leva a uma multiplicidade de doutrinas**. 2.
André Martinet, ÈUmnts dê linguistiqu* géniraU (Pari»,
1960), p. 6. 3. Ver pp. 204-215. 4. Ver pp. 188-202.
129
algum proveito a nâo ser de conformidade com as linhas de um pensamento diretor, mas, *ob pena de cair no apriorismo e na arbitrariedade, o método deVe ser controlado sem cessar C even tualmente revisto em função de dados tangíveis fornecidos pela contribuição vivificante da experiência c pela observação dos fatos. Vimos que Saussure havia proposto a criação A Semiologia de uma ciência, a Semiologia, “que nos ensi naria em que consistem os signos, quais as leis que os regem”;1 e acrescentava: “A Lingüística 6 apenas uma parte dessa ciência geral; as leis que a Semiologia desco brir serão aplicáveis à Lingüística, e esta se encontrará assim delimitada dentro de um domínio bem % definido no conjunto dos fatos humanos.” 2 Se, há cerca de cinqüenta anos, o estudo da Lingüística progrediu tanto em todos os seus aspectos, a Semiologia, pelo contrário, não encontrou ainda sua forma definitiva; de fato, é sobretudo a propósito da teoria da infor mação e sob o ângulo de preocupações lógicas que seu estudo foi abordado, o que não deixou de provocar uma distorção n?JJuc toca. * idéia primeira de Saussure e a eclosão de defi nições do tipo “uma língua é um sistema de signos com as regras de seu uso” (é a formulação de Camap) na qual re conhecemos sem dificuldade a preocupação maior dos lógi cos. Contudo, a partir de 1943, Buyssens havia criado as bases de uma teoria coerente3 e, nestes últimos anos, o pro blema foi retomado por vários autores,4 principalmente por 1. Court , p. 33 (288). 2. Jb. (290-291). J 3. Ver atrás, pp. 126-127 e n. 6. 4. O estudo de R. Barthes, Êlémentt de témiologie (em Communiation, t. IV, 1964, pp. 91-135 e retomado cm L degré zito de Vériture, Paris, 1964, pp. 77-176) é antes consagrado à Semiologia da "manifestação**, enquanto que Buyssens se interessa pela “comuni cação” (que é, portanto, querida pelo “emissor”); entretanto, um artigo de C. Mounin havia feito uro útil inventário dos Syitèmet de ommuniation nonlinguistiques et leur plae dans la vie du XX • tièle (em Bulletin de la Soiiti de Linguitlique de Parit, t. LIV, 1959, pp. 176-200). Assinalemos enfim os dois volumes de Jacques Fohl, Symbolet et langaget, t. I: Le symble, lef de I’humain e t. II: La
Prieto, que escreveu a respeito um resumo sistemático muito claro.1 É a própria definição dc linguagem que, antes de maif nada, traz à baila um problema. Os homens, na verdade, têm à sua disposição uma forma dc linguagem notável pela riqueza 1 e a variedade de seus meios de expressão e cujas possibilidades de combinação são cm número infinito: aquele que utiliza a fala vale-se dos sons articulados produzidos pelo aparelho vocal c recebidos pelo sentido auditivo; essa linguagem tem sua base nos centros auditivo-motores do cérebro. Ora, é a esse tipo de meio de expressão que atualmente se tem a tendência de restringir a aplicação da palavra "linguagem”. Benveniste diz textualmente: "aplicada ao mundo animal, a noção de lingua* gem não tem curso a não ser por abuso de termos" e tem o cuidado de distinguir entre linguagem humana e omuniação animal.2 Martinet vai mais longe: "não temos nenhum interesse, diz ele, cm chamar de lingua não importa qual sistema de sinais arbitrários”, e aqui se trata evidentemente de sistemas de sinais em uso nas sociedades humanas e que dependem, por conse qüência, da Semiologia. Trata-se portanto de uma restrição de sentido no que respeita a Saussure, que chamava de língua "um sistema de sinais distintos que corresponde a idéias distintas'*. Seja como for e embora seja incontestável que é à lingua gem falada que as sociedades humanas reservaram a maior extensão, não é inútil, fosse embora apenas para valorizar me lhor a especificidade da linguagem propriamente dita, dedicar alguma atenção a esses outros sistemas semiológicos que, por oposição à linguagem falada, chamaremos de não-lingüísticos. Em primeiro lugar, existem aqueles que são independentes da linguagem falada, tais como os sinais das estradas de roda gem, as siglas dos guias turísticos ou dos horários das estradas de ferro, as convenções do desenho industrial ou da cartografia, as cifras c símbolos da linguagem matemática, etc. Todos esses dioersitê des langages (Faris-Bnixdas, 1968): ricos em observações ins trutivas, eles constituem de (ato uma boa iniciação aos problemas atuais da Semiologia. 1. Luis J. Prieto, La simiologie em Li Langage (“La Pléiade", Paris, 1968), pp. 93-144. 2. Sobre esse último ponto, cí. logo adiante, pp. 133-136.
1)1
sistemas oferecem duas particularidades importantes: 1.° têm um sentido único, isto é, não exigem resposta; em outras pa. lavras, constituem ordens ou indicações, mas não formam um diálogo; 2.° des são interpretados globalmente e não de acordo com a ordem linear, isto 6, não são ligados pelo princípio da seqüência, princípio cuja importância Saussure havia esclare cido muito beni ao falar da cadeia falada ou da cadeia acústica dâ linguagem.1 Há depois os sistemas semiológicos que são substitutos da linguagem falada e que, por conseguinte, não são compreensí veis e explicáveis a não ser por si mesmos. O mais aperfeiçoa do desses sistemas é evidentemente a escritura alfabética: tra ta-se, de fato, de uma técnica que permite a reprodução, de um modo mais ou menos perfeito, da linguagem articulada e que é utilizado para a comunicação das idéias entre pessoas que se encontram separadas umas das outras seja pelo espaço, seja pelo tempo. Enquanto sistema substitutivo, a escritura, pro priamente falando, não faz parte da Lingüística — a não ser como ciência auxiliar, já que constitui o elemento graças ao qual reconstituímos a história das línguas. Contudo, não se deve subestimar o importantíssimo papel que a escritura repre senta em nosso tipo moderno de civilÍ 2ação e, por isso, na própria Lingüística, pois para muitas pessoas e em muitas oca siões — notadamente nos meios intelectuais — a escritura surge às vezes como a forma essencial da linguagem. E é baseando-se na escritura muito mais do que na forma falada da linguagem que se desenvolveram sistemas substitutivos, como o de Morse, que reproduz as letras por seqüências de pontos e de traços, e o de BrailJe, onde combinações de pontos em relevo transcre vem as letras ou o antigo alfabeto datilológico usado pelos surdos-mudos.2 1. Cours, pp. 66-64 ( 720-755); cf. acima, p. 83. 2. A * linguagem mimica dos surdos-mudos, ensinada no século XVII pelos padres 1’Épée e Sicard, combina gestos que valem por um conceito e outros que representam uma noção gramatical (D. Mandin, Lmí sourdsmuets em U langage, MLa Pléiade”, Paris, 1968, pp. 424-425); esse método inspirava-se no sistema em uso em certas ordens religiosas nos lugares e nos momentos em que, à maneira de ascese, a linguagem oral estava proibida e que consistia em combinações gestua»
132
A distinção que fizemos, no interior da Semiologia, entre sistemas lingüísticos e sistemas não-lingüísticos é, antes de tudo, dc ordem metodológica, porque, como acontece muitas vezes e normalmente nas ciências humanas, as fronteiras nem sempre são traçadas com nitidez e acontece freqüentemente que os sis temas se combinam. É assim que um grande número de infor mações, como os guias turísticos, os horários das estradas dc ferro, os painéis dos balls dos aeroportos, etc., utilizam simul taneamente desenhos facilmente reconhecíveis e indicações escri tas. Por outro lado, toda a história da escritura — e eis mais um capítulo importante no estudo das técnicas que contribuí ram para o desenvolvimento intelectual da humanidade — é a história de uma evolução que, do uso dos signos pictográficos, e, depois, dos signos ideográficos concretos ou mais ou menos concretos, levou ao uso de um alfabeto puramente fonético, isto é, convencional — ou arbitrário, se usarmos a fórmula saussuriana. Sabe-se que, como os homens, os animais A “linguagem” usam alguns de seus órgãos para se comudos animais nicar entre si; seus gritos e gestos (uns e outros freqüentemente combinados) tradu zem estados psíquicos de desejo, de alegria, de medo, ou for necem indicações essenciais à vida do grupo ou do casal, mas a “linguagem animal** — resignemo-nos, por ora, a reunir esses dois termos — limita-se a cena gama de significantes apropria dos às necessidades particulares e que os sujeitos nio são ca pazes de fazer variar. Para os animais, o signo nio se distingue da coisa significada; a expressão é global, não analisada: a dis tinção no que toca à linguagem humana continua fundamental Alguns casos chegaram a iludir, como o das abelhas, cuja organização social é objeto de espanto para os observadores e a propósito das quais se falou de “linguagem**. Com efeito, uma abelha que, durante o vôo, encontra uma tohiçio de açócar, se abastece e volta imediatamente para a colmeia, de onde vemos sair pouco depois outras abelhas que, nio acompanhadas que traduziam semantemas e, portanto, noções, concretas ou abstratas, nlo-analitadas:
G.
Van
R ijnbbbo,
moims, Amsterdio, 195S.
Lê
lãmgag #
P*r
signs*
eket
Ui
w
dâ primeira, se dirigem sem hesitação para o local onde o néctar foi encontrado. Houve portanto transmissão de infor mação. Foi o biólogo de Munique, Karl von Frisch quem, depois de milhares dc experiências pacientemente anotadas e constan temente verificadas, deu a explicação do fenômeno.1 Ao aspirar o néctar das flores, a operária impregna-se de seu perfume, que adere a seu corpo, o que dá às suas compa nheiras uma primeira indicação sobre a natureza da flor visita da; ao voltar à colmeia, ela é descarregada do pólen que trouxe consigo, para imediatamente depois dar início a uma dança que constituirá a sua mensagem. Por um lado, a direção a ser seguida é assinalada pelo eixo da dança em relação ao sol (gra ças à sua sensibilidade à luz polarizada, as abelhas podem orien tar-se mesmo com céu coberto); por outro lado, a distância | materializada pelo número de voltas efetuadas (e na razão inversa de sua frequência, por exemplo, dois por seis quilô metros, mas dez por cem metros). Na realidade, não é pre cisamente a distância que é indicada mas o tempo de vôo; com efeito, constata-se que uma distância igual 6 assinalada como mais longa se, para percorrê-la, a abelha deve, por exemplo, voar contra o vento; é, portanto, claro que o que é indicado com precisão surpreendente é a apreciação do dispêndio de energia neccssário para chegar ao local desejado. Por esse modo, a abelha é capaz dc simbolizar por meio de gestos os elementos de uma realidade e as abelhas que fazem parte da mesma comunidade (porque parece que o uso desses meios gestuais não é igual entre todas as abelhas!) são capazes de interpretar a mensagem assim transmitida; há, portanto, como na linguagem humana, codificação e descodificação. Pri1. Em 1952, Karl Von Frisch concretizou o multado de suai pesquisas num volume, Aus dem Leben der Bienen, que teve um êxito considerável (foi reeditado em 7.* edição, Berlim, 1964) e que foi traduzido em francês por André Dalcq: Vie et moeurs des abeiUes (Paris, 1955). Mais recentemente, von Frisch retomou o problema, in tegrando nele o resultado das novas pesquisas e fornecendo todos os dados e todos os meios de prova desejáveis: é um grosso volume de perto de 600 páginas, intitulado: Tanzprahe und Orientierung der Bienen (Berlim, 1965). Num artigo notável, publicado em 1952, Êm* Bknveniste havia tirado das experiências de von Frisch, cujos pn-
1)4
melro, “a mensagem da abelha dançarina não exige resposta das que a cercam, as quais se limitam a adotar uma conduta; a coniunicção não d um diálogo. Depois, essa mensagem é constante em seus dados básicos, é pessoal, e não poderia ser comunicada por uma abelha que não tivesse visto pessoalmente a fonte do néctar. Ora, o homem constrói uma mensagem a partir de outra mensagem, de acordo com um jogo livie c infi nito, muitas vezes fora de toda experiência vivida. Nossa lin guagem proporciona um substituto da experiência apta a ser transmitido sem fim no tempo e no espaço, o que é próprio de nosso simbolismo e constitui o fundamento da tradição lingüística. Consideremos, ainda, o conteúdo da mensagem: ele se refere sempre a um único e mesmo dado, a alimentação — o conteúdo da linguagem humana é ilimitado, a linguagem humana está capacitada para dizer tudo. Enfim, a mensagem da abelha é rebelde à análise: seria impossível decompô-la em diversos elementos, que seria impossível combinar depois de modo diferente — enquanto possuímos uma latitude dc com binação extremamente extensa. Bem mais do que uma lingua gem, vê-se que se trata aí de um código de sinais, de conteúdo fixo, de mensagem invariável, de transmissão unilateral e de natureza indecomponlvel”. Conclusões semelhantes constituem o resultado das pes quisas feitas entre outras espécies, escolhidas entre as dc inte ligência mais viva, como os chimpanzés ou os delfins;* estes últimos, em data recente, atraíram a atenção pelo seu compor tamento social, seu apelo no que respeita ao homem e suas espantosas possibilidades de detecção de ultra-sons; mas as numerosas experiências de que foram objeto não conseguiram provar que o "idioma" de que se servem não repousava sobre bases tão elementares quanto as das outras espécies de animeiros resultados já haviam sido expostos em 1923, as conclusões essenciais no plano lingüístico: Communiation animaU et langage humain , em Dioglne, t. I (1952), p. 1-8 = ProbUmes (cf. p. 127, n. 6), pp. 56-62. 1. Retomamos aqui os termos de Georges Rxxuio, Langue et soiété cm Vom Wesen der Sprahe (Bema-Munique, 1967), p. 60. 2. Konrad Lorinz, Er redete mit dem Viek, den VSgeln mnd den Fishen, 2.* cd., Viena, 1960.
1)5
mais.1 Parece, portanto que, mesmo nos casos de animais so cial c intelectualmente mais desenvolvidos, a “palavra" não vai além dc um simples meio de comunicação e que cm nenhum caso o estádio capital da verbalização, conseguida pela facul dade de dar ao signo um valor convencional, é ultrapassado.
Sabe-se que, entre os homens, o centro da linguagem (cha mado centro de Broca) localiza-se num lobo frontal (o esquer do, entre os destros, e vice-versa); ora, Busnel fez a esse pro pósito uma constatação interessante: o fato de que os dois hemisférios não têm as mesmas funções parece bem um caráter especifico do ser humano.2 Há, portanto, como manter uma distinção entre a linguagem humana e a omuniação animal;3 a barreira que os separa é o que Bachelard chamou de “limiar da linguagem", movimento rumo ao inteligível, que se situa | um nfvel muito superior àquele que pode ser atingido pelos animais, mesmo os mais evoluídos. 4 Essas observações permitem que definamos meA dupla lhor outro caráter específico da linguagem huarticulação mana, que Saussure havia percebido muito bem lingüística mas que Martinet teve o mérito de esclarecer com uma nitidez particular: 5 á o que ele chamou de dupla artiulação lingüístia* 1. Cf. por ex. Vitus B. Drõscher, Die freundlihe Bestie, Oldendurgo-Hamburgo, 1968 (tiad. fr. de D. Meunier: Le lengage seret des animaux, Paris, 1969). 2. R. G. Ru*nei., Las ommuniations dans It règne animal em Bulletin de la Soiité Zoologique dê Frane, t. XC (1965), p. 22. 3. São os termos usados por Êm. Benveniste no artigo citado acima, p. 134, n. 1. 4. Gaston Bachelard, Pensée et langage cm Revue de Synthhe, t. VIII (1934), p. 238 (a propósito de um artigo de H. Delacroix). 5. Primeiro num artigo intitulado La double artiulation lit guistique e publicado not Travaux du Cerle Linguistique de Coft nhage, t. V (1949), pp. 30-37; reeditado numa forma revista e au mentada em Linguistique synhronique (Paris, 1965), pp, 1-35. 6. A expressão “dupla articulação" já pode ser lida em 1930 num eniaio publicado (em russo) por D. Duwux; cf. R* Jakobsom, Linguistis in its Relation to other Sienes nas Aetes du X • Congrès International des Linguistes (Bucansste, 1967), t. I (Bucareste, 1969),
1)6
Um enunciado pode, com efeito, recortar-se por um em unidades significances chamadas monemas ("um monema é o menor segmento do discurso ao qual se pode atribuir um sentido")1 e, por outro lado, cm unidades menores e não-significantes (não se excluindo a coincidência) que são os fonemas. Vejamos uma frase elementar, como le train siffle [o trem apita]; esse enunciado é composto de três segmentos te, train , siffle [o, trem, apita]; mas foneticamente nós enumeramos aí nove articulações distintas: / + p + / + r+í + j + / + / + /. No exemplo dado, as palavras e os monémas se confundem, mas não é raro o fato de uma palavra corresponder a vários monemas: encontram-se por exemplo dois monemas em autor out e (auto- c route) ou çm par tom ( part - e -o/w), três em parti rons ( part - -#r- e om). Ora, essa dupla articulação é um traço específico e exclu sivo da linguagem humana, próprio portanto para colocá-la em oposição a todos os demais sistemas de signos e para caracte rizá-la por diferenciação. Assim — para retomar alguns exemplos entre os que enumeramos ao falar da Semiologia — 2 os sinais do tráfego rodoviário, as siglas dos horários das estradas de ferro ou dos guias turísticos, as convenções cartográficas, as escrituras hie roglíficas (pictogramas e. ideogramas), a linguagem* gestual dos monges, o sistema das cifras, os símbolos algébricos, lógicos, químicos, como os gritos dos animais ou as danças das abelhas, todas essas "linguagens" valem-se apenas da primeira articula ção; ou, por outra, suas mensagens se decompõem em uni dades significantes, e nunca em unidades não-significantes. Pelo contrário, a linguagem humana — e só a linguagem humana — utiliza a dupla articulação lingüística, e reside aí, sem dúvida, um dos segredos de sua complexidade, mas tam bém de sua riqueza e de sua infinita disponibilidade em relação aos outros sistemas; nesses últimos, o número dos signos deve, em princípio, eqüivaler ao número dos significados (vejam-se os oito ou nove mil signos — para citar uma cifra média — da 1. Ve-ie, pois, que o monema de Martinet corresponde ao mor fema da terminologia anglo-saxã; cf. acima. p. 128. n. 2. 2. Pp- 130-133.
escritura chinesa), enquanto um tipo corrcntc e ótimo dc qua dro fonológico compreende de trinta a quarenta fonemas, sis tema muito simples, mas que permite um número praticamente infinito de combinações, sobretudo se acrescentarmos a elas os jogos muito sutis da duração, da entonação, da intensidade. Desse modo, portanto, verifica-se uma vez mais a lógica de uma posição-chave de Saussure, a que ele enunciava sob esta forma: "o signo lingüístico é arbitrário’*. Todavia, entre as idéias de Saussure, essa 0 signo e seu afirmação foi sem dúvida uma das que caráter arbitrário suscitaram maiores controvérsias. Com pletemos o que dissemos mais acima, ci ta n to por extenso uma passagem essencial do Cours: "A palavra arbitrário exige um reparo. Não deve dar a idéia de que o significance depende do livre arbítrio do falante (ver-se^á mais adiante que não está ao alcance do indivíduo mudar o que quer que seja num signo uma vez estabelecido este num grupo lin güístico); queremos dizer que ele é \motivado, isto é, arbitrário em relação ao significado, com o qual não tem nenhum vínculo natural na realidade.” 1 Foi um artigo publicado em 1939 por Benveniste2 que acendeu, a propósito dessa definição, uma discussão de que participaram numerosos lingüistas 3 e que se 1. Cours, p. 101 (1139 1145). 2. Nature du signe linguistique em Ata Lingüístia, t. I (1939), pp. 23-29 = Problèmes (cf. p. 127, n. 6), pp. 49-55. 3.
Eng. Lerch, Alb. Sechehaye, Ch. Bally, H. Êr. Al. H. P. Naert... Encontra Frei, Buyssens , Gardiner , um bom apanhado da questão no artigo de N. Eoe, Le signe linguistique est arbitraire em Reherhes Struturales (Copenhague, 1949 =* I Travaux du Cerle Linguistique de Copenhague, t. V), pp. 11-29; era data mais recente, cf. ainda Andrc Martinet, Arbitraire linguistique et double artiulation em Cahiers Ferdinand de Saussure, t. XV (1957), pp. 105-116; Êr. Buyssens, Le struturalism* et l P arbitraire du signe em Studii si Ceretãri Lingvistie, t. XI, 1960 (= Omagiu lui Al. Grau), pp. 403-416; a excelente discussão crítica de Rudolf Enolm, Théorie et ritique d’un prínipe saussurien: Varbitraire du signe em Cahiert Ferdinand de Saussure, t. XIX (1962), pp. 5-66, assun como a exegese, particularmente notável no plano filosófico, de Giorgio De* Segno e struttura linguistii nel pensiero di Ferdinand de Sausrossi. sure (Udine, 1965), pp. 51-129.
1)8
Notadamente
tornou por vezes confusa devido às dificuldades de vocabulário: as divergências terminológicas foram, em suma, mais graves que os desacordos quanto aos princípios. Benveniste fazia notar que o raciocínio de Saussure “é falseado pelo recurso inconsciente e sub-reptício a um terceiro termo, que não estava compreendido na definição inicial. Este terceiro termo é a própria coisa, a realidade”; ora, é mister referir-se à definição da língua: “se se estabelece em princípio — e com razão — que a língua é forma, não substânia} cumpre admitir — e Saussure o afirmou claramente — que a Lingüística é ciência exclusivamente das formas... Há pois uma contradição entre a mineira por que Saussure define o signo lingüístico e a na tureza fundamental que lhe atribui". 1 A isso objetou N. Ege que emprestar ao termo signifiado o valor de oisa signifiada é algo manifestamente alheio às intenções do Cours, visto que Saussure “não se ocupou do problema, que pertence à teoria do conhecimento, da relação entre o signo lingüístico e o mundo circundante’'3 e, para dar conta da inconseqüênda ressaltada por Benveniste, tentou uma explicação de uma apresentação um tanto sutil: "A meu ver, a passagem só poderia ser com preendida da seguinte maneira: * queremos dizer que o signify ante é imotivado, isto é, arbitrário em relação ao significado, coro o qual ele' — o significante — 'não tem nenhum vínculo natural na realidade', de modo que 'ele* remete a ‘o signifi cante* do contexto precedente (4 linhas mais acima, a bem dizer)”.4 Talvez pudéssemos dizer mais simplesmente que a oposição signifiado/signifiante já é uma “lingüistização" da oposição oneito/imagem aústia. Mas se nos estendemos no tocante a esta controvérsia, é porque se sabe, há pouco tempo, que ela apresenta um caráter perturbador. O que autorizava e justificava a crítica de Ben veniste e o que incomodava seus contraditores é essencialmente o fim do parágrafo do Cours, onde se diz que o significante é “arbitrário em relação ao significado, com o qual não tem ne1.
Court, pp. 157 (1837), 169 (1976).
2. Nature du signe linguistique, p. 24 — Problèmes, p. 50. 3. Le signe linguistique est arbitraire, p. 19. 4. ibid., p. 13.
1)9
escritura chinesa), enquanto um tipo corrente e ótimo de qua dro fonológico compreende de trinta a quarenta fonemas, sis tema muito simples, mas que permite um número praticamente infinito de combinações, sobretudo se acrescentarmos a elas os jogos muito sutis da duração, da entonação, da intensidade. Desse modo, portanto, verifica-se uma vez mais a lógica de uma posição-chave de Saussure, a que ele enunciava sob esta forma: “o signo lingüistico é arbitrário". Todavia, entre as idéias de Saussure, essa 0 signo e seu afirmação foi sem dúvida uma das que caráter arbitrário suscitaram maiores controvérsias. Com pletemos o que dissemos mais acima, citanto por extenso uma passagem essencial do Cours: "A palavra arbitrário exige um reparo. Não deve dar a idéia de que o significante depende do livre arbítrio do falante (ver-se-á mais adiante que não está ao alcance do indivíduo mudar o que quer que seja num signo uma vez estabelecido este num grupo lin güístico); queremos dizer que ele é imotivado, isto é, arbitrário em relação ao significado, com o qual não tem nenhum vínculo natural na realidade.”1 Foi um artigo publicado em 1939 por Benveniste2 que acendeu, a propósito dessa definição, uma discussão de que participaram numerosos lingüistas3 e que se 1. Cours, p. 101 (1139-1145). 2. Nature du signe linguistique cm Ata Lingüístia, t. I (1939), pp. 23-29 = Problimes (cí. p. 127, n. 6), pp. 49-55. 3.
Notadamente Eng. Lerch, Alb. Sechehaye, Ch. Bally, H. Frei, Êr. Buyssens, Al. H. Gardiner, P. Naert. .. Encontrar-se-á um bom apanhado da questão no artigo de N. Eoe, Le signe linguistique esi arbilraire em Reherhes Struturales (Copcnhague, 1949 = Travaux du Cerle Linguistique de Copenhague, t. V), pp. 11-29; em data mais recente, cf. ainda André Martinet, Arbitraire linguistique et double artiulation em Cahiers Ferdinand de Saussure , t. XV (1957), pp. 105-116; Êr. Buyssens, Le struluralisme et Varbitraire du signe cin Studii si Ceretâri Linguistie, t. XI, 1960 (= Onxagiu lui Al. Grau), pp. 403-416; a excelente discussão crítica de Rudolf Enolek, Théorie et ritique d*un prinipe saussurien : Varbitraire du signe em Cahien Ferdinand de Saussure , t. XIX (1962), pp. 5-66, assim como a exegese, particularmente notável no plano filosófico, de Giorgio Detossi, Segno e struttura linguistii nel pensiro di Ferdinand de Saus sure (Udine, 1965), pp. 51-129.
1)8
tornou por vezes confusa devido às dificuldades de vocabulário: as divergências terminológicas foram, em suma, mais graves que os desacordos quanto aos princípios. Benveniste fazia notar que o raciocínio de Saussure “é falseado pdo recurso inconsciente e sub-reptício a um terceiro termo, que não estava compreendido na definição inicial. Este terceiro termo é • própria coisa, a realidade"; ora, é mister referir-se à definição da língua: “se se estabelece em princípio — e com razio — que a língua é forma, nio substânia} cumpre admitir — e Saussure o afirmou claramente — que a Lingüística é ciência exclusivamente das formas... Há pois uma contradição entte a maneira por que Saussure define o signo lingüístico e a na tureza fundamental que lhe atribui". 1 A isso objetou N. Ege que emprestar ao termo signifiado o valor de oisa signifiada 6 algo manifestamente alheio às intenções do Cours, visto que Saussure “não sc ocupou do problema, que pertence à teoria do conhecimento, da relação entre o signo lingüístico e o mundo circundante”3 e, para dar conta da inconseqüênda ressaltada por Benveniste, tentou uma explicação de uma apresentação um tanto sutil: “A meu ver, a passagem só poderia ser com preendida da seguinte maneira: ‘queremos dizer que o signifi ante é imotivado, isto é, arbitrário em relação ao significado, com o qual ele* — o significante — ‘não tem nenhum vínculo natural na realidade', de modo que ‘ele’ remete a ‘o signifi cante’ do contexto precedente (4 linhas mais acima, a bem dizer)".4 Talvez pudéssemos dizer mais simplesmente que a oposição signifiado/signifiant já é uma “lingüistização" da oposição oneitoIimagem aústia. Mas se nos estendemos no tocante a esta controvérsia, é porque se sabe, há pouco tempo, que ela apresenta um caráter perturbador. O que autorizava e justificava a crítica de Ben veniste e o que incomodava seus contraditores é essencialmente o fim do parágrafo do Cours, onde se diz que o significante é “arbitrário em relação ao significado, com o qual não tem ne Court . pp. 157 (1837), 169 (1976). 2. Nature du signt linguistique, p. 24 ■ Problinus, p. 50. 3. Le signe linguistique est arbitrate, p. 19. 4. Ibid., p. 15.
1.
139
nhum vínculo natural na realidade" (o grifo é nosso); ora, o estudo, recentemente levado a cabo, das fontes manuscritas do Cours mostra claramente que, na passagem incriminada: 1.°) se o adjetivo natural não aparece como epiteto de vinulo (um texto traz: “com o qual não tem nenhum vinculo primário”), ele é encontrado num caderno de notas, mas num contexto muito diferente: “Mas a linguagem e a escrita não se fundam numa relação natural das coisas'*; 2.°) a expressão na realidade não é atestada em nenhuma cópia do curso: trata-se, pois, de uma dessas adições introduzidas no Cours pelo zelo de editores ciosos de “explicitar” o pensamento do mestre. 1 Assim, esta longa discussão, por instrutiva e enriquecedora que tenha sido, era, de qualquer maneira, um falso problema desde o início; não é menos verdade que as hesitações, mesmo as contradições dos cadernos de notas recentemente descobertos, mostram em certos pontos um pensamento ainda não decidido, conceitos flutuantes; para o caso aqui assinalado, é preciso admitir "que uma certa ambigüidade subsiste nas noções fundamentais de signo, de caráter arbitrário, dc valor. Cumpre aos lingüistas saussurianos procurar discernir, a exemplo de Bally e Sechehaye, o pensamento do mestre em sua forraa, sc não definitiva, pelo menos mais profunda”.2 Esta distinção fundamental estabelecida por Língua e fala Saussure se tomou clássica, pois entrou na axiomática e na terminologia de nossa ciência; os termos língua e fala (langue et parole ) são normalmente empregados hoje no sentido definido pelo mestre de Genebra; entretanto, ela encontrou também adversários, de tal maneira que alguns não hesitam em falar dos “pseudoproblemas criados pela fatal dicotomia saussuriana entre a fala e a língua'*. 1.
A coisa pode ser vista claramente na apresentação dessa pas sagem na página dupla 155 da edição crítica do Cours (cf. p. 96, n. 1); cf. ainda R. Godel Les soures mnusrites (cf. p. 95, n. 4), p. 125; R. E ngler em Kratylos, t. IV (1959), pp. 130*131. R. Godel, Nouveaux douments saurruriens, Les ahiers S 2. Constantin em Cahiers Ferdinand de Saussure, t. XVI (1958-1959) , p. 32.
3.
140
L. R. Palmer , The Latin Language (Londres, 1954), p. 195.
De fato, o que incomodou foi a separação demasiado níti da que Saussure parecia estabelecer entre esses dois aspectos da linguagem, quando ele próprio, conforme o sublinhamos na devida altura 1 — mas perdeu-se por vezes a coisa de vista ____________, havia atenuado esse ponto de vista reconhecendo que os dois objetos estão estreitamente ligados c que a fala é a força que faz a língua avançar. De diferentes lados, propôs-se fazer inter vir um terceiro elemento, que seria o uso ou a norma, mas cumpre ter cuidado com as dificuldades terminológicas que suscitam as palavras empregadas em acepções diferentes, con forme os autores. Hjelmslev, por exemplo, acredita poder conceber a língua de três maneiras diferentes: o esquema seria a forma pura dela, cujos elementos se definem por seu valor opositivo, relativo e negativo; o uso ou conjunto de hábitos se concretiza em atos; ao passo que a norma, forma material, é uma abstração tirada do uso por um artifício de método; negligenciando este último, ele chega a propor uma distinção essencial entre esquema e uso, que substitui assim k oposição língua e fala.2 Em contraposição, Coscriu fala da norma como que de sempenhando um papel intermediário entre a língua e a fala; a norma, que representa um primeiro grau dc abstração, com preende a fala menos as variantes individuais e ocasionais que se encontram nela, enquanto a língua (a que chama sistema# representa um segundo grau de abstração, que retém as normas indispensáveis, as oposições funcionais, e elimina o que é sim ples tradição não-disdntiva, 3 seja em francês o caso da quanti dade vocálica: não tem valor no sistema (nenhuma parelha de palavras se diferencia pela duração da vogal), é um fato de norma (assim a vogal é “longa'* antes de sonora final e “breve** antes de surda final: mère/mette) e pode realizar-se de manei ras muito diversas nos usos individuais que caracterizam a fala.
1.
P. 83.
2. L. Hjelmslev, Langue et paroU em Cakiers Ferdinand de Scunirf, t. II (1942), pp. 29-44 (■ Esiais Linguistiques, pp. 69-81). Sistema, Norma y habla, Montevidéu, 1932 3* Eug. Coscriu, # (reimpresso em Teoria dei lenguaje y lingüística general , Madri. 1962,
cí. 158.
pp.
11-113).
—
Para
uma
tripartiçio
semelhante
em
Weisgerber,
141
Seja como for, resta, nesse problema das relações entre a língua c a fala tais como as havia definido o Cours, uma con tribuição fundamental cuja solução parece estar fora do alcance dos lingüistas. A língua, com efeito, não é um dado ao qual possamos accder de maneira sensível; somente considerando os fatos de fala como atualizações da língua é que chegamos a representar-nos essa abstração; por outro lado, a fala só é com preensível na medida em que possamos referir-nos à língua, fato que Saussure punha bem em evidência ao dizer que a língua é, a uma só vez, o instrumento e o produto da fala. 1 Vê-se pois que, de um lado, têm-se atos concretos de comunica ção, e de outro, um sistema de sinais não concreto, obtido por inferência a partir dos atos concretos de comunicação; é ape lando para a teoria da comunicação 2 e para os processos de codificação e descodificação utilizados no estabelecimento de línguas artificiais, assim como na construção de máquinas de traduzir, que L. Apostei se propõe a buscar um caminho para uma síntese a ser interpretada conforme as leis da lógica e que possa dar conta das relações entre língua e fala;3 é de temer-se, porém, que um método assim, vinculando-se, por razões evi dentes de técnica descritiva, aos caracteres formais dos sistemas estudados, deixe na sombra grande número de aspectos, e dos mais característicos, da linguagem humana. Esta antinomia, que desempenhava um grande Sincronia e papel na doutrina do Cours e que exerceu indiacronia fluência decisiva sobre a constituição de disci plinas como a Fonologia e o estruturalismo, nos parece seguramente hoje um dos pontos mais fracos do ensino saussuriano. Para compreender a importância que o mestre de Genebra lhe atribuía, é mister remontar à época em que ele professava os seus cursos e na qual toda a pesquisa lingüística 1. Ver pp. 84-85. 2. Cf. por ex. George A. Miller , Language and Communiation Nova Iorque, 1951, trad. fr. de C. Thomas: Langage et ommuniation, Paris, 1956. 3. L. Apostel, Linguistique, thiorie de la ommuniation et logique, em Ata OtoRhinoLaryngologia Belgia, ano 1954, pp. 167•189.
142
mm
— vale dizer, cm suma, a Gramática comparada1 — estava centrada no aspecto histórico. De parte do inovador que era então Saussure, semelhante declaração acerca da incompatibili* dade dos estudos diacrónico e sincrònico deve antes ser com preendida, parece-nos, como uma afirmação dc combate, apre sentada sob uma forma extremamente destinada a sacudir a indiferença e provocar uma reação salutar. Outrossim, não resta dela mais grande coisa; foi um suíço, o romanista W. von Wortburg, que sc levantou com maior energia contra essa concepção e afirmou que a Lingüística deve desfazer o hiato entre ciência descritiva e ciência histórica; “a futura ciência da linguagem", escreve ele, “deve procurar atin gir um estádio que una os dois métodos numa comunidade orgânica e faça sobressair com toda a nitidez desejada c inter dependência do sistema e do movimento". 2 É que a distinção preconizada por Saussure é essencialmente um problema meto dológico, estando a oposição no ponto de vista do observador c não na própria matéria; um fato não é em si mesmo sincrônico ou diacrónico, mas pode ser encarado do ponto de vista sincrònico ou do ponto dc vista diacrónico. De acordo com a fórmula feliz de Coseriu, a língua funciona sincronicamente e se constitui diacronicamente.9 Sechehaye, por sua vez, considera uma outra repartição da tarefa, que, embora partindo do Cours, completa as concepções saussurianas no tocante a esse tema;4 ao lado da Lingüística sincrònica, que estuda estados de língua, e da Lingüística diacrônica, que estuda as evoluções da língua, de entrevê uma Lingüística da fala organizada, que seria, em suma, a ciência do funcionamento da língua: ela tentaria surpreender a fala 1. O capítulo primeiro do Cours, pp. 13-19 (1-101), se intitula “Visão geral da história da Lingüística": em realidade, trata-te antes da Gramática comparada, e não se podia tratar senio dela. 2. W. von Wartburo, Problèmes et méthodes de la linguistique (Paris, 1946), p. 123 (2.* ed. revista por St. Ulmann, Paris, 1969, p. 205). cf. ibid., pp. 7-11 (2.* ed., pp. 20-25). 3. E. Coseriu, Sinronia, dirorda $ historia, Montevidéu, 1958. 4. A. Skchrhayk, Léi trots linguistiquei sausturiennts em Vos Romaniea, t. V. (1940), pp. 1-4&
14)
cm vias dc produzir-se, isto é, determinar como os falantes, utilizando os recursos da língua, são levados a nela introduzir certas particularidades geradoras de transformações. Mas — e nisso está a contribuição original de Sechehaye — ele considera que essas três lingüísticas se encaixam num quadro mais amplo o da fala propriamente dita ou ciência da expressão natural, pré-gramatical; o falante, levado pelo seu instinto de expressão .1 utilizar os recursos da língua (a da comunidade lingüística a que pertence), se exterioriza por meio da fala organizada, em cujas manifestações a evolução da língua encontra sua origem. Cumpre lembrar aqui o que dizíamos mais acima da Fo nologia diacrônica c dc como essa disciplina superou, de ma neira feliz, a antinomia entre sincronia e diacronia. 1 Ora, tal modo dc conceber as coisas é aplicável ao conjunto dos elemen tos da língua. Sabe-se como Saussure — recorrendo notada mente à comparação com o jogo dc xadrez — insistira no fato de que toda mudança lingüística, mesmo isolada, tem reper cussão em todo o sistema;* é que o equilíbrio alcançado pelos elementos de uma estrutura depende da solidariedade desses elementos, e sendo um deles atingido, modificam-se as relações entre as partes do sistema, que ele põe dessarte em perigo e cuja modificação provoca. Assim, já é tempo de conceber o estudo evolutivo de uma língua sob a forma de um funionalismo diarônio ; trata-se de utilizar as inumeráveis e valiosas pesquisas levadas a cabo pelos neogramáticos substituindo os elementos estudados no sistema de que fazem parte* c deter minando como a modificação de suas relações altera concomitantemente a própria estrutura cm que se inserem. É, em suma, o programa esboçado por Benveniste para o que chama de análise diacrônica: ela “consiste em tomar duas estruturas su cessivas e distinguir suas relações, mostrando quais partes do sistema anterior foram atingidas ou ameaçadas e como se pre parava a solução realizada no sistema ulterior”, e ele acrescenta 1.
Pp. 105-107.
2.
Cf. por ex. Court, pp. 125-126 (1461-1478). 3.
pp. 105-106.
144
Veja-se o que dissemos mais acima a propósito da Fonologia,
com pertinencia: Com isso, ficn resolvido o conflito tio viva mente afirmado por Saussure entre diacronia e sincronia." 1 Alguns continuam, entretanto, a considerar válida essa an tinomia, pelo menos como princípio dc método, como Henri Frei, que utiliza com finura o processo do “quadradp semân tico” * para dar conta de evoluções de sentido aparentemente a berrantes;3 como Stephan Ullmann, que considera sempre co mo evidente o contraste entre os pontos de vista sincrónico e diacrônico e julga que há razões de conceber, para a Semântica, duas subdivisões complementarcs: descritiva e histórica, 4 afir mando que age assim por motivos puramente metodológicos e reconhecendo “que existem casos onde uma combinação dos dois métodos é mais frutuosa que sua separação rigorosa". 5 Sob este título, poder-se-ia retomar toda a A Lingüística Lingüística, pois qual lingüística, qual escola, psicológica mesmo as mais positivistas, não se preocupa ram de início com o problema fundamental da adequação da linguagem ao pensamento, do signo ao con ceito? Desde a Antiguidade, tudo gira cm tomo dessas rela1. E. Benvenistb, Tendanes réenles, pp. 136-137 ■ ProbU mes (cf. p. 127, n. 6), p. 9. 2. Conforme o "quadrado lingüístico” de Sauswre; ver man acima, p. 87 e nota 1. 3. Veja-se, por exemplo, como ele dá conta da relaçio entre os verbos vcdicos pi, “beber** e utpã, “ser orgulhoso, revoltar-se”, atri buindo a põ um sentido trais antigo, “fluir”, sendo que o verbo se especializou depois no* sentido de “beber**. põ •“fluir” põ “beber”
ul-f pa- •“inchar, desbordar” utpõ “ser orgulhoso**
H. Frei, Carrés simantiques em Cahiers Ferdinand de Saussure, t. XVI (1959), pp. 3-22, 4. St. Ullmann, The priniples of Semantis , 2.a ed., Glaseow, 1957 (ver principalmente pp. 139-152). 5. Pré eis ie sémantique française, 2.1 ed., Berna, 195¾ (ver notadamente pp. 38-41). — Mais adiante (pp. 209 ss.) voltaremos ao problema sincronia-diacronia em Semântica.
141
ções, questão a que Humboldt deu lugar de honra nos prünórdio* da reflexão lingüística moderna; e Saussure declarará que ‘considerado em si mesmo, o pensamento é como uma nebu losa onde nada está necessariamente delimitado”. 1 Todavia, reserva*se habitualmente esta etiqueta para uma escola que teve como um dos seus promotores, desde o fim do século passado, o dinamarquês Otto Jespersen, mas que encon trou sua expressão mais acabada nos Prinípios de Lingüístia Psiológia publicados por J. van Ginneken em 1907; rejeitan do a História para o segundo plano e utilizando com notável erudição os dados de um grande número de idiomas, o autor tenta penetrar o comportamento psíquico do sujeito falante e ver como a linguagem reage às suas disposições pessoais (ade são, apreciação, vontade, automatismo, . . . ) ; encontra-se nisso a influência da Võlkerpsyhologi, que W. Wundt, fundador da Psicologia experimental, começava então (1900) a publicar. As relações entre o pensamento e a língua serão objeto de numerosos estudos; os trabalhos de Karl Bühler sobre as rela ções do enunciado com o locutor e com o auditor (são os três termos símbolo, sintoma, sinal) 2 e os mais recentes, dc Fricdrich Kainz, sobre a expressão, interna e externa, do pensa mento5 constituíram uma preciosa contribuição à teoria lin güística. Mais duas contribuições importantes devem ser assina ladas : no plano psicológico, Le langage et la pnsé, de H. Delacroix (1924), no plano lingüístico, e mais particularmente, para o domínio francês, Ld pnsé t la langu, de F. Brunot (1922). Depois, os estudos sobre o assunto se multiplicaram c é característico que o Journal de psyhologi normal et 1.
Cours, p. 155 (1823). 2. JCarl Bühler, Sprahtheorie. Die Darstettungsfunktion der Sprahe , Iena, 1934. 3.
Friedrich K ainz, Einführung in die S prahpsyhologie, Viena, 1946; paralelamente, o autor empreendeu a publicação de uma mo numental Psyhologi der Sprahe, 5 vol., Stuttgart, 1941-1965 (mai do t. V só apareceu a primeira parte). — A obra recente de Bruno Liebrucks, Sprahe und Bewusstsein (5 vol. publicados, Frankfurt, 1964-1970), é essencialmente centrada sobre o aspecto filosófico do problema.
146
pathologique tenha, cm diversas ocasiões, consagrado fascículos inteiros a questões de Lingüística. 1 Entre os problemas mais instrutivos, sublinhemos, antes de mais nada, o da aquisição da linguagem pela criança, ao qual Jespersen havia reservado uma parte importante dc seu volume Language,2 e que depois foi estudado com profundidade por Antoine Grégoire, cujos trabalhos já assinalamos, 1 e por R. Jakobson.4 Os fatos de bilingüismo dão indicações preciosas sobre a estrutura lingüística, quer se trate do bilingüismo desenvolvido na criança durante o aprendizado da linguagem 5 ou do que aparece entre as populações aloglossas. 6 É Jakobson ainda 7 1. Ver por último uma boa apreciação crítica dos principais problemas colocados pelas relações entre a Psicologia e a Lingüística em La Funtion symbolique et le langage (Bruxelas, 1969), de Jean Paulus.
2. 3.
I
147
quem. ao chamar a atenção sobre um caso patológico, dedicou-se i classificar os fenômenos de afasia para daí tirar conclusões sobre o papel principal representado na língua pelas operações dc combinação e de seleção. Outro problema importante é o de saber se o pensamento pode existir independentemente de uma forma estruturada da linguagem; se <5 possível raciocinar sem apelar para os esque mas lingüísticos de nossa língua materna. Alguns respondem afirmativamente, e Buyssens, por exemplo, chega mesmo a dizer que “nunca se pensa numa língua"; 1 de nossa partè, acha mos, com Benveniste, que “ não poderia existir pensamento sem linguagem*’;1 mais, ainda, parece-nos legítimo concluir por uma iníluer.cia da forma lingüística sobre o próprio andamento de nosso raciocínio.3 Em suma, como o leitor poderá perceber, o ponto de vista psicológico, mais ou menos proclamado ou mais ou menos la tente, está presente em toda parte na pesquisa lingüística, qual quer que seja a maneira por que esta conceba seu papel e mes mo — 6 o caso, por exemplo, dos bloomfieldianos — quando ela se recusa deliberadamente a tomá-lo em consideração; a própria natureza da linguagem não permitiria que fosse de outra maneira, de onde o termo da psicolingüfstica sob o qual às vezes se alinham estudos que tentam construir uma ponte entre as duas disciplinas. 4 Reconheçamos, todavia, que a ela1. Erie Buyssens, Le langage et la logique. Le langage et lê pende ("La Pléiade”, Paris, 1968), p. 87. 2.
25).
Coup d*oeil ... (cf. p. 127, n. 6), p. 373 (= ProbUmas, p.
3. O fato, por indo-européias, fazem pôde fizer crer numa ora, trata-se mais de
exemplo, de que certas línguas, entre as quais ai uma distinção nítida entre o nome e o verbo distinção natural entre “objeto” e “processo” j uma projeção de um quadro lingüístico sobre a natureza, como o mostram, com evidência, as línguas que ignoram a distinção entre o nome e o verbo; ê nesse sentido que Antonino PaoLusto pôde dizer que se Aristóteles tivesse falado chinês, sua Lógica teria sido bem diferente da que escreveu (cf. Paideia, t. XVII, 1962,
p. 107).
4.
Cf. Ch. E. Osoooo, Langage Universais and Psyholinguist
lies em J. H. Crrenbrro, l/niuersals of Language (Cambridge, Mass., 1963), pp. 299-322; R. Titone, La pneolinguistia oggi, Zurique,
148
boração e exploração dos dados psicológicos que têm relação com a linguagem formam um capítulo importante de uma ciência na qual não é de nossa competência insistir. 1 Que a língua seja um fato social (fala A escola sociológica mos porque vivemos cm sociedade), eis o que pode parecer um truísmo cujo enunciado não carece absolutamente • de longas justificativas; todos os que se debruçam sobre o estudo dos grupos sociais, de qualquer aspecto que seja, sabem que o conhecimento da linguagem é uma das condições de base de suas investigações e um dos meios essenciais de que dispõem para levar a bom termo sua tarefa, para aprofundar-lhe os dados, para verificar•lhe os resultados. Pareceria que os lingüistas, aos quais a linguagem não aparece como um intérprete, mas antes como o próprio objeto de sua ciência, devessem mostrar-se todos de acordo acerca de evidência da proposição; todavia, na realidade, conquanto o caráter sociológico do fato lingüístico não tenha sido jamais negado, interveio de maneiras assaz diversas na elaboração das doutrinas lingüísticas. Foi particularmente na França que surgiu uma teoria que se apóia nessa verificação de bom senso que constitui o caráter social do fato lingüístico. Teoria assaz flexível, na verdade (uma língua é o espelho da atividade dos homens que a falam) e distanciada de qualquer dogmatismo,2 mas que, fundada no estudo de relações socio lógicas — as quais formam a essência das comunidades lingüís ticas —, se vivifica e se atualiza em contato com realidades 1964; J.-M. Peterfalvi, Introdution à la psyholinguistique, Paris, 1970. 1. Para os problemas relacionados com a apreensão filosófica da linguagem, será proveitoso consultar as contribuições reunidas nos dois volumes langage que formam as Ates du XIII * Congris des Sodé tis de philosophi de langve française , Neuchitel, 1966. 2. No prefácio da coletânea de Marcel Cohen, Cinquante annies de reeherhes linguistiques, ethnologiques, soiologiques, ritiques et p4 dagogiques (Paris, 1955), J. Vbndryes escrevia: “Sem que haja uma escola lingüística francesa, que pretenda exercer um privilégio «cju* tivo, existe entre os discípulos de Meillet um espírito comum de bom entendimento e de colaboração amistosa na aplicaçio, à Lingüística, de regras da razão esclarecida.**
149
cndâií- encontra-se um bom testemunho do espírito sodoló* #ico que animou os mestres da escola francesa no belo livro de Joseph Vendryes, Le langage/ ' Sem dúvida, o apelo à “consciência social”, não era mais desde Jean-Jacques Rousseau e sua visão présociologizante da “vontade geral” uma novidade do pensamento científico, 2 mas, em torno do postulado: “a linguagem é eminentemente um fato social”3 os lingüistas franceses tiveram o mérito de orde nar os princípios que lhes pareciam dar conta dos fatos de linguagem; no plano histórico, em particular, procuraram eluci dar as evoluções de uma língua determinada considerando-as como reflexos das transformações da sociedade humana à qual a língua serve de expressão. Sendo a atividade lingüística função do instinto de imita ção — instinto que os sociólogos concordam cm considerar como um dos mais fortemente inscritos na hereditariedade dos seres sociais —, segue-se que imitamos aqueles a quem admira mos e amamos porque tendemos a parecer-nos com eles; a 1. Terminado em 1914, mas publicado somente em 1921. 2. Lembre-se aqui o que ele escrevia a Du Peyron: “Que uma expressão seja ou não seja o que se chama de francesa ou de bom uso, não é disso que se trata; as pessoas só falam e escrevem para fazer-se entender; desde que sejamos inteligíveis, alcançamos nosso objetivo; mas quando se é claro, melhor ainda. Falai, pois, com clareza paru quem quer que entenda o francês; essa a regra e estai certo de que, mesmo cometendo uma demasia de cento e cinqüenta barbansmos, não tereis escrito menos bem. Vou ainda mais longe e sustento que é mister, às vezes, cometer erros de gramática para ser claro; é nisso e não em todas as pedant ices do purismo que consiste a verdadeira arte de escrever.** ( Correspor.dane générale , t. XIII, pp. 220*221). Cf. C. Redard, Langur françise et patois em IV* Cahier de VInstitUt neuhÃtelais , 1954, p. 14. 3. Assim se exprimia Meillet na aula inaugural que pronunciou no Colégio de França em 17 de fevereiro de 1906; ela se intitulava Létat aiuil dei itudei de linguiitique générale, mas é preciso nlo entender esse termo no sentido que hoje lhe conhecemos; na época tratava-se da Gramática comparada e da Gramática histórica. O texto foi republicado em Linguistique histortque et linguistique générale, t. I (Paris, 1921), pp. 1-18; o postulado, retomado aqui, se encontra na página 16; ler*se-á ainda mais adiante (p. 18): “O objeto deste curso será pois pesquisar em que medida é possível reconhecer desde agora as relações entre o desenvolvimento lingüístico e os outros fatos sociais."
150
criança aprende a falar tentando reproduzir a linguagem de seus pais e dos adultos que a circundam; é levada a isso pelo instinto de imitação e também pelo instinto de atração: a ne cessidade de se fazer compreender, a precisão dc se agregar mais intimamente ao grupo social de que faz parte. Os adultos são levados a modificar sua linguagem para sc porem dc acordo com a das pessoas às quais consideram seus guias. De modo geral, diremos que os falantes imitam aqueles que têm prestigio, vale dizer, aqueles que suscitam a propensão a serem imitados. 1 Que essa imitação seja inconsciente ou deliberada, pouco im porta: é nela que encontraremos a solução de numerosos pro blemas que coloca a evolução lingüística. Quais são esses “chefes” cujo prestígio impõe a toda uma população a maneira de exprimir-se, a maneira de pronunciar, a escolha das palavras e das formas, até mesmo os tiques ou as excentricidades? Em primeiro lugar, as classes dirigentes, cujo papel é considerável em toda sociedade organizada. Na França é, sob o Antigo Regime, a corte e os salões que regem a lin guagem, assim como os costumes, e só é reputada correta a língua dessa minoria; a Revolução coloca no poder uma classe social cuja língua, até então tida por vulgar e defeituosa, logo se reveste do prestigio que lhe conferem as responsabilidades políticas recém-adquiridas; é assim que pronúncias atestadas pelo menos desde o século XVII, mas reputadas até então vul gares (como roi pronunciado rtoa em lugar de rwè, ou bataÜlon pronunciado com um y: batayon, em vez do antigo / molhado) adquirem de pronto direito dc cidadania c sc fazem rapida mente de uso comum. O prestígio dos grupos culturais e artísticos não é menos poderoso; os círculos de escritores, sobretudo quando estão agrupados em academias mantidas pelo poder político, exercem sobre a língua oficial, proposta como modelo ao conjunto da comunidade lingüística, uma ação moderadora de caráter con servador, que está longe de ser desprezível. E sabe-se o quão profunda pode ser a influência do mestre-escola; os romanistas 1. Cf. Eugene Dupríel, Soiology géniraU (Paris, 1948), pp. 59-68, 286-287.
gostam de citar o exemplo do s latino que, em posição final, era de pronúncia débil, se não evanescentc, sc bem que não tenha deixado traço em italiano (latim tnurus: italiano muro), ao passo que na Gália e na península ibérica, onde o latim foi desde o princípio uma língua importada e ensinada aos autóc tones, esse s foi conservado ou antes restabelecido pela influên cia (talvez favorecida por hábitos de pronúncia indígena) das escolas (por exemplo, francês antigo murs, caso sujeito, oposto ao caso regime mur < murum). Em nossos dias, a ação da escola foi consideravelmente reforçada pela instauração da esco laridade obrigatória, da mesma maneira por que a facilidade de comunicações multiplicou os contatos; e não será preciso insistir no papel importante que desempenham em nossa forma de civilização as emissões de rádio e de televisão.
Uma manifestação característica dessa “pressão social" 1 que pesa sobre a linguagem é a questão da ortografia: o papel representado pela escritura em nossa época não permite que ela seja desprezada num trabalho de Lingüística. Entre as línguas da Europa, o francês e o inglês, por motivos históricos, têm uma ortografia particularmente mal adaptada à forma oral da linguagem: uma mesma letra pode ter valores diferentes, um mesmo som pode ser representado por grafias diferentes. Ora, sejam quais forem os inconvenientes que essa situação repre sente para o aprendizado e para a difusão da língua, o conhe cimento da ortografia é exigido de todo membro da comuni dade social, com mais ou menos rigor, de acordo com o posto que ele ocupe;2 ela é, pelo menos, uma convenção que se evita transgredir na medida em que se evita usar uma linguagem não conforme is regras admitidas. 1. Quando Saubsure declara que “a língua é de todas as ins tituições sociais a que oferece menos tomadas de iniciativa”, Court, pp. 107-108 (1230), ele se refere implicitamente a Émile Durkhbim, para quem um fato social é “toda maneira de fazer, fixada ou nlo, suscetível de exerter sobre o indivíduo uma pressão exterior” ( Les rJ gles de la methode soiologique, Paris, 1895, fim do cap. I). 2. Pierre Gviraud diz, fazendo graça: “decoram-se os particípios para receber o diploma, ou ganhar um extra na sobremesa, ou a apro vação da porteira'*, Langage et théorie de la ommuniation em Le langage (“La Pléiade”, Paris, 1968), p. 166.
152
O método seguido pelos defensores da escola sociológica consiste, pois, cm explicar os dados lingüísticos por fatores extralingüísticos, e vê-se que a solução do problema depende da escolha levada a cabo pelo lingüista entre os fatores capazes de exercer uma ação; o resultado será função da insistência com que ele considerará qual deles como preponderante ou decisivo. A história do pensamento lingüístico não é mais, aliás — aqui como em todas as ciências humanas —, que a história dos esforços empreendidos com vistas a classificar os fatos; somos sempre conduzidos à questão prévia da escolha e da avaliação dos critérios — tivemos já ocasião de sublinhá-lo. 1 Desde os primeiros anos de nosso século, que assinalam também os primórdios do seu período de esplendor e do seu prestígio, a escola francesa de Lingüística traz inevitavelmente a marca do espírito sociológico (“as ciências sociais se consti tuem agora, e a Lingüística deve tomar entre elas o lugar que lhe aponta sua natureza”)* e Meillet não se esquece de prestar homenagem, mais de uma vez, à lição de um Durkhcim* “Uma língua ”, dizia ele, “é um sistema rigorosamente en cadeado de meios de expressão comuns a um conjunto de falan tes; de não tem existência fora dos indivíduos que falam (ou que escrevem) a língua; não obstante, tem uma existência inde pendente de cada um deles, pois se impõe a eles; sua realidade 1. Cf. acima, p. 110. 2. Meillet, na sua Liçio já citada (p. 150, n. 3), frits no Colégio de França em 1906 (= Linguistique historique et linguistique gênirale, t. I, p. 18). Trinta anos mais tarde, J. Vbndrybs continuava a proclamar o valor eminentemente social da linguagem ao pubucar um capítulo intitulado La linguistique na obra coletiva Let sienes iodales en Frane . Enseignement et Rekerhes (Paris, 1937), pp. 100-117. 3. Na sua liçio de introdução ao curso “Prindpes généraux dc revolution du langage", que deu em 1901 (Rtvue de FUuiversiti de Bruxelles, t. VII, 1901-1902, pp. 257-280), P. de Ravi, apresentava como novidade o recurso ao social para a explicação dos fatos lin güísticos e falava “Do ponto de vista sociológico na história da lingua gem” (tal era o título da sua lição) como de “um aspecto da lin guagem que não tem sido suficientemente observado"; cf. Br. Büyssekí, Du point de tme soiologique en linguistique, em Notts et Conférenes, vol. V (Bruxelas, 1947), pp. 29-64.
15)
e a dc uma instituição social, imanente aos indivíduos, mas ao mesmo tempo independente de cada um deles”.1 O perigo, logo se vê, é o de ressuscitar o mito da linguagem considerada como uma entidade independente supra-individual, organismo nio mais natural, desta vez, mas social, cuja sede está na “cons ciência coletiva” (a expressão é de Durkheim e pode ser mesmo considerada como o ponto capital das teorias do grande soció logo francês )* dos falantes. Perigo que se agravará quando se impuser a distinção saussuriana entre a língua e a fala, distinção que iria reforçar singularmente as teses da escola sociológica; com efeito, ela punha a ênfase na língua, “social em sua essên cia e independente do indivíduo”, 3 concebida como um sistema de signos que serve de meio de comunicação aos membros de uma mesma comunidade lingüística ("Ela é o conjunto dos hábitos lingüísticos que permitem a uma pessoa compreender c fazer-se compreender”) ,4 ao passo que a fala é um ato indi vidual: é o uso que cada um, no afi de compreender ou de se fazer comprccnder, faz do sistema (a língua) da comunidade lingüística à qual pertence. Notar-se-á, todavia, que em razão mesmo da ênfase que punha no fator social, Meillet, fervoroso discípulo de Saussure, foi dos primeiros a censurar à Lingüística saussuriana o ser muito abstrata; em numerosas ocasiões, 6 chamou ele a atenção M eillet 1. num artigo (Le développement des longues') pu blicado cm 1929 no volume Continu et disontinu e republicado em Linguistique historique et linguistique générale, t. II (Paris, 1936), p. 72. — Ver também a definição de Ferdinand Brunot: a linguagem c “um fato sociológico, que se produz, se desenvolve, se altera, se aperfeiçoa em função da sociedade à qual pertence, que reflete o seu pensamento coletivo, com os matizes que lhe podem trazer, consciente mente ou nio, os grupos e os indivíduos” (La pensie et lã longue. S.* ed.. Paris, 1953, p. XXI). 2. Cf. por ex. W. Doroszewski, Quelques remarques sur le rapports de la soiologie et de la linguistique : Durkheim e F. de Sautture em Journal de Psyhologie, t. XXX (1933), pp. 82-91. 3. Cours, p. 37 (340). 4. Cours, p. 112 (1284). 5. Cf. os dois volumes da colet&nea Linguistique historique et linguistique générale. Paris, L I, 1921 (reeditado em 1948) e t II» 1936.
154
para a realidade humana cm que se banha a linguagem, essa linguagem que, enquanto criação dos homens, participa dc todas as condições e de todas as vicissitudes da existência dos homens. Tudo na língua, dizia Vendryes, 1 “é dominado pelas condições sociais, pois o fato lingüístico é o fato social por excelência, c é o social que fornece ao estudo da linguagem um método geral de pesquisa e de explicação". Essa preocupação de enfo car a Lingüística, qualificada por ele de “primogênita das ciên cias humanas" estudar os fatos tia língua de acordo com o espí rito da dialética marxista, rejeitando tudo o que não se adapta intimamente à realidade 3 domina a rica e variada produção de outro aluno de Meillet: Marcel Cohen. 3 Assinalemos aqui a atividade de Georges Dumézil: lin güista, teve o cuidado, tal como os eruditos da escola italiana aos quais poderia ser comparado em mais de um ponto, 4 de combinar o método comparativo com os dados da história das civilizações, procurando, por trás das palavras e das estruturas, atingir os conceitos, analisar as crenças, delimitar as configu rações sociais e religiosas; logrou dessarte reabilitar a "mito logia comparada", que as concepções primitivistas c apriorísticas de um Max Müller tinham feito soçobrar. 5 Outros, ultrapassando os dados históricos, retomaram o velho problema da origem da linguagem,9 mas desta vez em 1. Bulletin de la Soiété de Linguistique de Paris , t XLVII,
fase. 2 (1951), p. 49.
2.
Ver p. 187. 3. Ver especialmente seu volumoso livro Pour une soiologie du langage, Paris, 1956. 4. Yer p. 169. 5. O leitor que desejar orientar-se na obra considerável de G. Dumézil se remeterá ao volume em que ele resume iuu teses: Uiiio logie tripartie des IndoEuropéens, Bruxelas, 1958; sabe-se, com efeito, como o autor distinguiu o que, na estrutura das antigas sociedades indo-européias, lhe parecia ser uma tomada essencial de consciência, a saber, uma concepção tripartida do mundo: soberania (administra ção do mundo), força (vigor físico) e fecundidade, correspondente às três classes sociais: sacerdotes, guerreiros, agricultores, e consubstanciada num sistema que funcionava no espaço, no tempo e na atividade hu mana. 6. Ver pp. 46-49.
1»
bases «o mesmo tempo mais modestas e mais seguras, cientifi camente aceitáveis; trata-se, de um lado, da contribuiçio que pode trazer a Pré-História à elucidação dos problemas da lin guagem,1 dc outro lado, das relações do homo sapiens com o seu meio c o seu grupo; 1 a esse respeito, a colaboração que tende a se estabelecer entre lingüistas, geógrafos, etnólogos e pré-historiadores só pode ser motivo de felicitações? Contudo, é-nos difícil partilhar do otimismo de Malmberg 4 quando, confiando nos trabalhos da psicologia lingüística e da sociologia cultural, ele julga que, graças aos métodos desenvol vidos pelas concepções estruturalistas, seria possível aceitar a declaração dc Renan.5 Os primeiros testemunhos do grafismo humano (série de pontos de bastõezinhos e depois de pictogramas) levam-nos ao redor dos anos 30 000 enquanto que as mais antigas descrições lingüisticamente interpretáveis, as de Sumer são do quarto milênio; e só a partir de cerca de dois mil e quinhentos anos que temos escritos numerosos e diversi ficados. Ora, se se julga que "há possibilidade de linguagem a partir do momento em que a pré-história nos fornece as ferra mentas, já que ferramenta e linguagem estão ligadas neurologicamentc e já que uma e outra são indissociáveis na estrutura da humanidade”,* pode-sc concluir que existem homens e que eles falam há pelo menos seiscentos mil anos: é dizer que o que conhecemos em fato de linguagem (pois, para os tempos 1.
Cf. A. Tovar , Linguistis and Prehistory em Word, t. X
(1954), pp. 333-350.
2. Cf. H. Hoijbr , Anthropologial Linguistis em Trends in European and Amerien Linguistis 19301960 (f. p. 8, n. 1), pp. 110-127. 3. Queremos falar em especial da revista VHomme, criada em 1961 por B. Benveniste, P. Gotraou e C. Lévi-Strauss (aos quais, depois, se juntaram André Leroi-Gourhan e G.-H. Riviàaa). — A International Anthropologial and Linguistis Review t que aparece des de 1953, malgrado seu título, reserva pouco lugar para a Lingüística e suas colaborações neste domínio são sempre muito seguras. 4. Les nouuelles tendanes de le linguistique , Paris, 1966, pp. 330-331. 5. Reproduzida acima, p. 49. André Lrroi-Gouhan, Le geste et la parole, t. Z (Paris, 6. 1964). p. 163.
156
passados a Lingüística dcvc atci-sc aos testemunhos escritos) não representa mais do que uma parte ínfima da história do homo loquens só nos permite ter acesso a um estádio lingüís tico que já é o resultado de uma longa, longuíssima evolução. Cumpre acentuar, por fim, que o ponto de vista socioló gico se difundiu largamente fora dos círculos franceses. Foi, por exemplo, uma das fontes da obra de L. Bloomfield, cujo volume Language (1933 )1 fez época nos Estados Unidos, onde desfruta de extraordinário prestígio; Bloomfield não deixou todavia de chocar muitos de seus compatriotas ao defender uma teoria de tipo claramente materialista (deixando de parte a consciência, que é inacessível, ele explica o mecanismo da comunicação pelo jogo de estímulos e reações) 2 por outro lado, Edward Sapir, embora tenha sido um adversário decidido das concepções materialistas de Bloomfield,* nem por isso foi me nos influenciado, como ele, pelas teorias sociológicas; para ele, uma língua parece constituir, antes de mais nada, uma lterança cultural e, para aqueles que a falam, um símbolo pode roso de solidariedade. É a filosofia desta etnolingüísticadisci plina já esboçada por Humboldt4 e que põe em relação as lín guas com as culturas de que elas são suporte, que um discípulo de Sapir, Benjamin Lee Whorf, tentou estabelecer; numa obra que, por uma boa parte, só foi conhecida depois de sua morte, em 1941* ele insistiu sobre as estruturas lógicas próprias das 1. Trata-se, na verdade, da segunda ediçio, consideravelmente transformada, do volume publicado em 1914 sob o título An Introdution to the Study of Language; uma tradução francesa, devida a J. Gazio e precedida de um prefácio de Frédéric François acaba de ser publicada com o título Le langage. Paris, 1970. 2. Cf. Ch. Fries, The Bloomfield 'Shool* em Trends in Euro pean and Amerian Linguistis 19301960 (cf. p. 8, n. 1), pp. 196-224, Erw. A. Espek , Mentalism and Objetivism in Linguistis’, the Souret of Leonard Bloomfield 1 s Psyhology of Language. Nova Iorque, 1968. — Ver também aqui, pp 126-127 e, adiante, pp. 181-1B2. 3. Ver p. 182. 4. Cf. pp. 50-51. — Encontrar-se-á no n.° 18 (junho 1970) de Langages um resumo, apresentado por Bernard Poms*, dos proble mas atuais da etnolingüística. 5. J. B. Carroll publicou em 1956 uma coletânea Language, Thought and Reality. Seleted Writings (Cambridge, Mass.) que, pelot
157
línguas ameríndias e pôs os lingüistas em guarda contra a tentação de aplicar-lhes os métodos gramaticais tirados do estudo das línguas indo-européias. 1 Talvez seja este o lugar para assinalar que as teorias de Humboldt, deixadas durante muito tempo na sombra, nestes últimos anos voltaram à evidência, embora, ès vezes, se tenha íalado de um grupo, aliás muito amplo, de neohumboldtianos", tais como Ernst Cassirer que, no quadro de uma Gestdt tbeorie, estudou o papel da língua em nossa apreensão do mundo exterior, Jost Trier, cuja importante contribuição para a Semântica citamos mais adiante,2 Hans Glinz que remodelou o conceito de uma innere Sprabform, tal como, sobretudo, Leo Weisgerber, preocupado em definir o papel de intermediário (sprahlihe Mitteltielt) representado pela língua entre a reali dade e sua conceituaiização e que faz a ponte entre Sprahe e Sprehett (isco é, entre a língua c a palavra) graças ao Sprab organismus, que é o sistema lingüístico ajustado ao meio dos signos.3 Combinando os ensinamentos do Estruturalismo com a preocupação de considerar a linguagem como uma atividade social da vida humana, J. R. Firth — que foi o primeiro a ocupar na Grã-Bretanha uma cadeira de Lingüística geral4 — cuidados de Cl. Carme, apareceu recentemente em tradução francesa sob o título Linguistique et anthropologie, Paris, 1969. 1. O cuidado de Whorf de não depreciar as chamadas línguas "primitivas" levou-o às vezes a alardear para as línguas indo-européias um desprezo algo exagerado: O. Mounin, A propos de “Language* Thought and Reality” de Benjamin Lee Whorf em Bulletin ie la So• eiiti de linguistique de Paris , t. LVI (1961), pp. 122-138. 2. Pp. 207-208. . 3. Cf. por ex. Harold Babiuus, NeoHumboldtian Ethnolinguis tis em Word , t. VIII (1952), pp. 95-105; Robert L. M iller , The Linguisti Relativity Priniple and Humboldtian Ethnolinguistis, Haia, 1968. 4. Todavia, já em 1932, uma tentativa de criar uma teoria ge ral havia sido empreendida pelo egiptólogo Alan Gakexnui que, num volume de título significativo, The Theory of Speeh and Language (2.* ed., Oxford, 1951), havia retomado a distinção saussuriana e, considerando que a forma è um fato da língua e que a função é um fato da palavra, havia tentado definir a palavra como uma unidade da língua e a frase como uma unidade da palavra.
158
e os lingüistas da “escola dc Londres’ 1 colocaram como princí pio uma distinção entre a estrutura o sistema, tendo a primeira a combinação de elementos em relação sintagmática e i segun da o agrupamento em paradigmas de elementos permutáveis.1 E baseado em Firth que M. A. K. Halliday e os membros do grupo “neofirthiano” construíram uma teoria das categorias gramaticais de acordo com uma apresentação que tende a pres tar serviço ao ensino prático das línguas;* essa apresentação combina quatro categorias: unidade e classe, que se juntam & estrutura e ao sistema de Firth, e três “escalas”: ordem, expo sitor e nível. 3 Houve também numerosos eruditos, tais como o etnólogo inglês Bronislaw Malinowski e o lingüista norueguês Alf Sommerfelt, que tentaram — não sem grandes dificuldades, em razão, por vezes, da qualidade medíocre das informações — colocar em relação a estrutura dialética dc determinado dialeto com a organização social e o comportamento psicológico da população a que serve de expressão.4 É curioso também lem brar como, de maneira assaz diferente e toda pragmática, o foneticista inglês Daniel Joncs concebe a missão social do lin güista: “Em contraste com os trabalhadores de certos outros domínios científicos, os lingüistas podem ter constantemente em vista, ao longo de suas investigações, um objetivo humano determinado, para o qual podem dirigir sua atenção, a saber, a melhoria dos meios orais e escritos de comunicação entre os 1. J. R. Firth, A Synopsis of Linguisti Theory, 193055 em F. R. Palmer, Seleted Papers of J. R. Firth 195259 (Londres, 1968), pp. 168-205; cf. D. Terence Lanobndoen, The London Shool of lin guistis: a Study of the Linguisti Theories of B. Malinowski and J. R. Firth, Cambridge, Mass., 1968. 2. M. A. K. Halliday, Ang. Me I ntosh, Peter Strevens, The Linguisti Sienes and Language Teahing , Londres, 1964; f. R. H. R obins, A Short History of Linguistis (Londres, 1967), pp. 220-221. 3. Traduzimos por "nível" o termo inglês deliay que o texto francês de G. C. Lrpschy, La linguistique struturale (Paris, 1968), pp. 143-149, traduz estranhamente por "délicateise". P»ra Malinowski, remeter-se-á ao volume de Langendoen que acabamos de citar (acima, n. 1). A coletânea Diahroni end Synhroni Aspets of Language (Haia, 1962). traz uma boa visfto de conjunto dos trabalhos de Som merfelt.
homens. As descobertas da ciência fonética peritas em comunicar-se eficazmente entre si.” 1
tornam
as
pessoas
Numa ordem de idéias semelhante, lembremos os esforços, que parecem estar hoje perdidos, 2 dos membros da I.A.L.A. (International Auxiliary Language Assoiation ), para criar uma “língua auxiliar internacional", concebida como uma língua construída, que se poderia sobrepor — ou até mesmo, para os mais otimistas, substituir — aos idiomas nacionais; idéia ge nerosa, sem dúvida, e que está na origem de uma porção das tentativas (a mais conhecida das quais é o esperanto), mas que permanece ilusória, pelo menos na medida em que se tenha a ambição de criar outra coisa que nio seja uma simbólica que, à maneira das fórmulas matemáticas, possa servir como meio de comunicação, num plano forçosamente restrito, aos técnicos desta ou daquela ciência. No restante, a unidade de uma linguagem artificial que tal seria logo ameaçada e arruina da pelas diferenças fundamentais de estrutura que separam as línguas daqueles que nela se iniciassem, e sobretudo pela ausên cia total de um plano cultural atrás de si cm que pudesse apoiar-se.3 O exame, que agora levaremos a cabo, dos diferentes as pectos que fez assumir a pesquisa lingüística a consideração do fator individual, nos oferecerá ainda ocasião de falar novamente das retóricas sociológicas. 4
1. The Phoneme (Cambridge, 1950, p. 218. 2. Cf. André Martinet no Bulletin ie la SoeUti de Linguisti que de Paris , t. LVI1, 2 (1962), pp. 30-34. 3. Foi no Congresso de Paris de 1948 que este problema da interlingüística foi tratado pela última vez com alguma amplitude: Ates du Sixième Congrit International des Linguistes (Paria, 1949)» pp. 93-112, 409-416 e 383-600. Ver a esse propósito as reflexSea de Manfred Zur Problematik künstliher Welthiljssprahi* MayrhOfer , (Ptanspraehen) em Anzeiger der phil^hist. Klasst der Oesterreinehit ehen Akademie der Wiuanshaften , t. CVI (1969), pp. 263-274. 4. Pp. 170-171.
160
No volume XXX das Atas da Aademia Port | As teses taniana dc Nápoles, Benedetto Croce publiindividualistas cava cm 1900 as notas de três exposições que havia feito por ocasião das sessões dos meses de fevereiro, março e maio: são as Test fondamentali di un'Estétia ome sienza deli es pressione e lingüístia generate. Mo vido do desejo de definir a diferença entre a História e a Arte, formulava ele nessas teses as bases de uma doutrina que pro clamava a especificidade artística e transpunha o estudo dos fatos da linguagem para o domínio da Estética. Dois anos mais tarde, com o título de Estétia ome sienza deW'es pressione e lingüístia generate , Croce retomava o mesmo texto fazendo-o seguir de uma parte histórica, Storia deli Estétia , da qual alguns capítulos tinham sido publicados no ano precedente na revista napolitana Flegrea. Nascia assim o primeiro dos quatro grandes volumes (Estétia — Lógia — Prátia — Historiografia) que iam ser agrupados sob o título comum de Filosofia do Espirito. Na produção extraordinariamente rica do grande filósofo ita liano, a Estétia permanece como uma obra mestra; "trabalho árido e árduo" acerca do qual ele próprio nos diz o quanto lhe custou de cuidados, de remorsos, de refundições, foi conside rado pelo mestre como um programa, como o esboço de uma obra que faltava realizar, pois “eu reconheço", diz ele, "que este livro, no qual pensava ter colocado toda a filosofia acumu lada no meu cérebro, muito ao contrário, enchera este de uma nova filosofia".1 "Lingüística Geral": a expressão figura no título completo do volume dedicado à Estética; o estudante ingênuo que, de sejoso de aperfeiçoar seus conhecimentos de Lingüística ou dc aprofundar as noções aprendidas no curso, abrisse o livro de Croce, ficaria sem dúvida frustrado, ou pelo menos confun dido, pois nele nada encontraria dos quadros tradicionais aos quais se submetem as exposições de Lingüística Geral, nada sequer que lhe fizesse lembrar bem exatamente essa disciplina, a não ser talvez uma critica feroz dos manuais cm uso no alvo recer do século — no caso os tratados à Brugmann —, manuais 1. Contribuição à minha própria rítia, trad, franc, de J. Chaix-
•Ruy (Pari*, 1949), pp. 54-58.
cm quc “sc encontra um pouco de tudo: desde a descrição, do aparelho fonador e das máquinas artificiais que podem imitá-lo (fonógrafos), até o resumo dos resultados mais importantes du Filologia indo-européia, semítica, copta, chinesa ou outra qualquer que seja; desde generalidades filosóficas sobre a ori gem ou natureza da linguagem até conselhos sobre os caracte res impressos, a caligrafia e a classificação de fichas sobre os despojos filológicos.” 1 Para a época, tratava-se de uma crítico assaz irreverente. Na verdade, após ter exprimido na Estétia suas concep ções acerca da linguagem, só raramente voltara Croce ao assunto, e assim mesmo para ater se às mesmas concepções, para pre cisar certos pontos, para retificar certas interpretações que tinham sido feitas a respeito delas c quc lhe pareciam pouco corretas; por outro lado, ele jamais se interessou pelo aspecto técnico das pesquisas científicas. E, no entanto, as idéias que então formulou tiveram uma repercussão profunda sobre a natureza c a orientação dos estudos levados por diante por duas escolas de Lingüística particularmente ativas e originais: os defensores da escola idealista e os pesquisadores quc se agru param sob a bandeira da neolingüistia, puderam, com justa razão, reivindicar-lhe o patronato, associando-lhe ao nome o de Vico, cuja obra, publicada cerca de cento e setenta e cinco anos antes e quc ficara longo tempo no esquecimento (salvo na Itália, à época do Risorgimento), só se tornou verdadeiramente ativa e só veio a ser apreciada graças à crítica penetrante c aos estudos do próprio Croce. Dissemos mais acima quais eram as linhas diretrizes da Sienztt tiuoya: 2 compreender-se-á então o partido que Croce pôde dela tirar e como se apoiou no seu ilustre antecessor para edificar sua filosofia do espírito e construir sua teoria da ex pressão. Pois é efetivamente o problema da expressão que está no centro das preocupações estéticas — e lingüísticas — de Croce. Ele identifica intuição e expressão; o conhecimento intuitivo é o conhecimento expressivo e toda intuição é ao 1. 'Estétia, 4.» cd. (Bari, 1912), p. 174. 2. Pp. 25-26.
162
mesmo tempo expressão, ü pensamento nio pode existir inde pendentemente da expressão: é um erro acreditar que a lingua gem seja um instrumento que o homem tenha forjado para comunicar-se com seus semelhantes: a linguagem, que é toda de natureza intuitiva, nasce dc modo espontâneo com a repre sentação que ela exprime, pois se o homem não fala, não pensa. Acerca do problema da origem da linguagem, Crocc sc une a Vico ao declarar que, nascida como poesia, a linguagem se sujeitou logo depois a servir de signo. 1 A doutrina de Croce subtrai o estudo dos fatos lingüísticos concretos tanto ã descrição das gramáticas normativas quanto à elaboração dos comparatistas e a transporta para a esfera da Estética. A Gramática lhe parece ser, com efeito, uma disci plina unicamente informativa2 ou, sc sc quisfcr, um expediente pedagógico, um esquematismo mnemotécnico útil e necessário na prática mas que, de modo algum, é uma ciência; quanto ao estudo comparativo e evolutivo, insere-se na história das línguas em sua realidade viva, vale dizer, principalmente na história das produções literárias, e aqui se percebe a confusão propo sital entre o estudo da linguagem e a crítica literária. Por outro lado, os signos lingüísticos só têm sentido sc os considerarmos unidos inseparavelmente ao movimento expressivo, o qual vive um instante, morre e não se repete jamais dc maneira idêntica a si mesmo. Pois a linguagem é expressão; com efeito, uma
série de sons que não exprimisse nada não seria linguagem: a linguagem é o som articulado e delimitado com vistas à expres são. E Croce conclui que Estética e Lingüística nio sio duas ciências distintas, mas uma única e mesma ciência, e acrescenta que as línguas não têm existência fora das proposições real mente pronunciadas ou escritas em certos povos, em períodos 1.
Cf. J. L a m e e r e , L'Esthiiique de Benedetto Croe, Paris, 1956, principalmente nas pp. 117-137; cf. Antonino Paguaro, Lingua e poe sia seondo C. B. Vio em Altri saggi di ritia semantie (Florença, 1961). pp. 297-444. 2. Croce. lembrando o tant pis pour la grammaire de Voltaire, considera inclusive que uma "gramática normativa** é uma impouiWlidade; a linguagem, com efeito, não é um fato arbitrário ou volun tário, e escrever bem (Croce pensa sobretudo na lingua literária) não sc aprende por meio de regras e sim através de leituras e de exemplos.
16y
determinados, ou, dito dc outra maneira, fora das obras dc arte nus quais das existem dc maneira concreta. No campo dos lingüistas, ou pelo menos, da grande maio ria deles, esta doutrina, fosse por desdém, fosse por ignorância, permaneceu longos anos sem eco. É verdade que aparecia numa época em que eram admitidos, quase sem contestação, os prin cípios rígidos dos neogramáticos. Dissemos 1 como estes, agin do em reação contra a falta de rigor e o entusiasmo um tanto fantasista dos primeiros comparatistas, tinham apurado um mé todo rigoroso c proclamado o dogma da infalibilidade das leis fonéticas e sua aplicação mecânica c cega; a ingênua confiança que nutriam na perfeição do instrumento que tinham forjado fê-los desdenhar as teses heréticas defendidas pelo pensador ita liano, dc tal forma que não se encontra qualquer menção, qual quer alusão a ela, mesmo na célebre Introdution de Meillet, tampouco em outros manuais da escola neogramática. E quando o Cours de linguistique ginirale vier a ser conhecido, ver-se-á a incompatibilidade substancial que separa a concepção crônica da criação espontânea e perpétua, da afirmação saussuriana sobre o constrangimento social (emprego obrigado dos signos). Contrastando com a incompreensão manifestada quase una nimemente em relação às concepções crocianas, houve desde o princípio um lingüista que lhes tomou a defesa e tentou apli cá-las com entusiasmo ao estudo prático e concreto dos fatos da língua: trata-se do romanista de Munique, Karl Vossler, cuja amizaae por Croce não se desmentiu jamais ao longo de cin qüenta anos de comunidade de ideal intelectual, malgrado ^for tunas políticas diversas e divergentes. 3 Não seria sem erronias que Vossler iria tentar transpor o elemento filosófico — o único com que se preocupou Croce — para o plano puramente lingüístico. Sem dúvida, proclama ele também que a verdadeira l7 Pp. 53-56. 2. O Carteggio CroVosslr , publicado cm Bari em 1951 * contendo o essencial da correspondência trocada entre os dois amigos, de novembro de 1899 a fins de 1948, pouco antes da morte de Vossler, ocorrida a 18 de maio de 1949, é um testemunho precioso para o conhecimento do movimento intelectual durante a primeira metade do xx' maf lcm também um comovente valor humano.
164
Lingüística 6 a Estética c que é cm suma a Estilística — o estudo dos processos de expressão — que deve ser colocada no próprio centro da Lingüística; todavia, desde seus primeiro» trabalhos (veja-se seu volume, de título característico, Posiíi vismus und Ideal is mus in der Sprahwissenshaft, 1904), ele se vê forçado, pelo menos a título "provisório” e de modo empírico, a conservar as divisões tradicionais do estudo da linguagem e romper o quadro estreito da equação: Lingüísti ca — Estética, passando do estudo da Estilística e da Sintaxe para o da Morfologia e da Fonética. Ele afirma que toda evolução lingüística é, cm última análise, questão de gosto, isto é, do sentimento estético do falante, e que toda expressão lingüística é uma criação individual; entretanto, para explicar que essas inumeráveis iniciativas individuais não levem è anar quia, ele se vê constrangido a apelar para uma certa passivi dade do sistema lingüístico que limitaria as possibilidades da invenção criadora. Quanto às inovações lingüísticas, convém encará-las sob dois aspectos diferentes; quando uma inovação ocorre na linguagem, há um “progresso absoluto”, cujo estudo pertence à Estética; quando uma inovação se difunde, há um “progresso relativo", pois não se trata mais de uma criação, mas de uma extensão que deve ser estudada simultaneamente do ponto de vista estético e do ponto de vista da Gramática histórica tradicional. De outra parte, Vossler e a escola idealista de que foi o inspirador (entre os membros mais ativos, citemos Eugênio Lerch e L. Spitzer) se manifestaram vivamente — e nisso está talvez a parte mais fecunda de sua obra — contra a afirmação que forma a frase final do Cours: “A Lingüística tem por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma e por si mesma.” Não, responde Vossler, o estudo da língua é inseparável do da civilização, de que é expressão; a própria Gramática histórica, com todo o seu aparelho técnico, faz parte da Kulturgesbibte, já que é um dos critérios que podem servir para o conhecimento e apreciação da civilização de um povo; a história da língua abarca, em realidade, a totalidade da vida do espírito. E compreende-se facilmente que os defensores da escola idealista tenham sido levados a enfocar sua atenção nas línguas literárias, com maior predileção que nos falares popu-
165
lares, o que fazia dizer a Schuchardt — aliás simpatizante da escola idealista — que Vossler se preocupava cora o homo sapientissimus ao passo que de próprio se interessava pelo homo sapiens ainda próximo do bom o aíalus} Quanto ao italiano G. Bertoni, cujo nome foi amiúde as sociado ao de Vossler — se bem que este o tenha mais de uma vez desaprovado —, ele também segue Croce quando afirma que a única realidade lingüfstica é a linguagem individual e que não existe pensamento sem expressão (esta não é a “vestimenta” c sim “o próprio corpo” do pensamento); todavia, seus esfor ços para combinar o espírito (a expressão estética) e a natureza (o fato), em outros termos, as teses da escola idealista e os metodos do naturalismo positivista, chegaram a uma síntese que ele pretendia eclética, mas que aparece antes como contra ditória, conquanto se tivesse podido dizer dele quê, no campo das pesquisas inspiradas pela estética crociana, fora o símbolo do bom combatente a quem a fortuna não sorriu. 2 De igual modo, a distinção que estabelecera entre linguagem e língua — a primeira era a atividade (individual) do espírito, a se gunda o produto (coletivo) dessa atividade (“11 linguaggio e ranima della lingua”) — não recebeu a aprovação de Croce, que via no caso uma contaminação de sua doutrina pelo atualismo “anestético e anti-estético" dc Gentile. Em contraposição, uma corrente extremamente fecunda que se dizia de inspiração crociana desenvolveu-se na Itália; trata va-se da neolingüistia, cujo promotor e animador foi Matteo Bartoli; ele publicou em 1925 a Introduzione alia neolingüistia, 1.
Hugo Schuchardt (1842-1927), outro franco-atirador da época dos neogramáticos, opunha ao dogma do parentesco histórico tua concepção da “afinidade lingüística'* (cf. p. 190) e apresentava a evolução lingüística como a resultante de duas forças: o individualis mo centrífugo e (para empregar um termo saussuriano antes de Saus sure) a coação social, tentando assim conciliar os dados positivistas com a interpretação idealista: “nascida da necessidade, a linguagem atinge seu apogeu na Arte’ 1: ShuhardtBrevier (cf. p. 81, n. 1)» p. 265.
2. G. Devoto em Cinquant’anni di pila intelletuale italiana, t. I (Nápoles, 1950), p. 375.
166
manifesto da nova escola, mas já em 1910 lhe havia exposto os princípios,1 tendo sido em 1902 que a leitura da Estétia lhe semeara os primeiros germes no espírito. 1 De fato, Bartoli, que se fizera conhecido por trabalhos sólidos e bem documen tados acerca do latim vulgar e dos dialetos romanos, ia acompa nhar as incitações crocianas muito menos cegamente que Vossler, a quem não deixa de censurar a falta dc sentido das realidades lingüísticas, e de maneira infinitamente mais fecunda que Bertoni, o qual, se bem que associado a Bartoli na publicação, em 1928, do Breviario di neolinguistia, se extraviara, como vimos, em especulações assaz confusas. O que Bartoli reteve sobretudo de Croce foi uma indepen dência total cm face do doutrinarismo esquemático dos neogramá ticos e uma aversão sensata às explicações materialistas dos processos de evolução; ele se insurge contra a idéia dc que as “leis fonéticas" — cavalo de batalha dos Junggrammatiker — agiriam cegamente como uma força fisiológica inelutável; re cusa*sc a conceder à divislo tradicional entre "gramática" e “vocabulário*' outro valor que não seja um interesse prático e considera que ela não leva a dois métodos diferentes de inter pretação; está convencido de que a difusão das inovações lin güísticas, quer estas sejam dc natureza léxica ou gramatical (fonética, morfológica, sintática, . . . ) se opera da mesma ma neira, e de que, para dar conta disso,. cumpre atentar para a imitação, o prestígio de modelos como o da "fantasia" criadora, dc natureza mais ou menos estética, dos falantes, e aqui depa ramos as equações caras a Croce: "fantasia" — poesia, poe sia — linguagem, donde linguagem — "fantasia". Em suma, Bartoli proclama que a Lingüística deve ser uma ciência humana, ciência que abarca a linguagem no seu todo, liga-a às outras criações do espírito (como a literatura, as artes, etc.) e a encara como uma das faces da História do Homem. 1. No seu estudo Alie fonti del neolatino; cf. G. Bonfante, The neoünguisti position em Language, t. XXIII (1947), p. 364. 2. Cf. a anedota contada por Croce (QuaJemi delia Critia, vol. V, caderno 15, novembro de 1949, pp. 119-120) segundo a qual Bartoli, mostrando aos seus alunos a Estétia que acabara de ler, de clarou-lhes com um tom de voz acabrunhado: “Giovaní miei, abbiamo ibagliato, dobbiamo rifarei da capo: questo libro lo prova.”
167
Deve-se acentuar aqui quc — Bartoli c os neolingüistas sempre se comprazem cin rcconhcce-la — uina outra influência preponderante, paralela à de Croce, marcou o desenvolvimento dos princípios c dos métodos dc sua “escola*' (colocamos a palavra entre aspas porque a neolingüística jamais existiu como unidade orgânica c aparece antes, em certa medida, como um ecletismo): a da Geografia lingüística, que Gilliéron acabava de constituir an disciplina independente. A transposição para o plano das antigas línguas indo-européias de métodos elabo rados e comprovados cm contato com falares vivos permite estabelecer princípios segundo os quais é possível caracterizar os dialetos indo-curopcus c perceber as relações quc os unem: assim nasceu a Dialetologia indo-européia, acerca da qual dire mos mais adiante algumas palavras.1 Deixando de parte as precisões técnicas, tentaremos carac terizar a neolingüístia em sentido lato e determinar assim a parte de influência que as idéias semeadas por Croce puderam exercer sobre o desenvolvimento e o progresso da ciência da linguagem; com efeito, existe hoje um certo número de con cepções e modos de considerar nossa disciplina que fazem parte do patrimônio comum de todos os lingüistas c quc os neolin güistas, em parte não desprezível e paralelamente à ação de pesquisadores vindos de outros horizontes, contribuíram para estabelecer; porque a preocupação de combinar, no estudo da linguagem, o aspecto cultural e o aspecto lingüístico encontra-se em numerosos meios fora da Itália; isso ocorre notadamente entre os lingüistas da escola espanhola que, particularmente no campo dos estudos romanos e no exame dos dialetos hispânicos, empreenderam um esforço considerável;2 o mais célebre dentre eles foi Ramon Menéndez Pidal, falecido em 1968 quando completava cem anos.3 1. Pp. 175-179. 2. Limitemo-nos a citar, entre numerosos trabalhos, os Estúdios lingüístios , 2 vol. (I. Temas espanoles, II. Temas Hispanoamerianos) de Amado Alonso, Madri, 1961. 3. Ver notadamente as suas Origines dei espanol, Madri, 1926, 4.» ed., 1956.
168
Intenção declarada de dar à Lingüística sua dignidade dc ciência humana, eis o primeiro mérito — e não dos menores __________ da nolingtilstia. Foi-se o tempo em que um curso de Gramá tica comparada se podia reduzir a uma exposição árida de cor respondências apresentadas à força de asteriscos; a essa esquematização rígida — e aliás bem cômoda do ponto de viata didático! — deve substituir-se agora um quadro mais matizado, mais flexível, mas também mais complexo, c que testemunhe melhor a simpatia humana com a qual convém debruçar-se sobre os problemas da linguagem. Outro traço da Lingüística italiana é o esforço que fazem seus mestres de dar-lhe aquilo que G. Devoto — que acaba de fornecer uma nova ilustração magistral desse método em seu recente volume Origini Indeuropee 1 — chama uma organiza ção horizontal, desenvolvendo, no exame de cada problema, a colaboração com as ciências paralelas, tais como a História, o Direito, a Arqueologia; e à noção genebrina de sistema. Devoto e Nencioni substituem a de instituição, que dá conta do duplo aspecto, social e individual, dos fatos da linguagem. 1 Mas o que permanece como caráter dominante das pesqui sas de nossos confrades italianos é o cuidado de levar em conta o fator estético e a atenção concedida aos valores individuais. Compreende-se desde logo o vigor com que a neolingüística rea giu contra o dogmatismo neogramático, dando relevo ao valor humano da linguagem e insistindo no fato de que é uma criação contínua ou antes uma recriação, de vez que é imitação: ora, a imitação não é nunca uma reprodução mecanicamente exata: existe, pois, uma elaboração constante dos dados, que resulta em criações cujo êxito depende de diferentes fatores, tais como o prestígio dos imitados ou seu poder criador, mas entre os quais o valor eltético da inovação desempenha papel impor tante; a aceitação, pelos falantes, de uma inovação lingüística pressupõe amiúde, com efeito, uma escolha, isto é, um julga1.
Florença, 1962. 2.
Cf. por ex. G. Devoto, I Fondamenti delia storia lingüístia,
Florença, 1951; II metodo omparativo lássio e le orrenti tíngvis tihe atuali em Ates du X 9 Congrès International des Linguistes (Buareste, 1967), t. I (Bucareste, 1969), pp. 123-135; G. Nencioni, Idealismo e realismo nella sienza dei linguaggio, Florença, 1946.
169
mento
dc
natureza estética. Contrariamente à opinião que pro fessavam os ncogramáticos sobre a inelutabilidade das forças evolutivas agindo quase mecanicamente sobre a linguagem c como que na ignorância dos falantes, os neolingüistas conside ram que o elemento individual é primordial e que a ação cons ciente dos artistas, dos escritores, dos poetas desempenha papel considerável nos fenômenos lingüísticos em geral. Em suma, os neolingüistas lograram uma síntese feliz ao combinar a Gramática comparada mais rigorosa e os métodos clássicos da Lingüística tradicional com o respeito testemu nhado pelo espírito criador e o sentido estético da personali dade humana. Veja-se, por exemplo, o problema das inovações e de sua difusão na língua; eis bem o caso em que o papel da fala, ato individual, parece ser preponderante. Ora, esta inter venção do indivíduo, os lingüistas da escola sociológica, de acordo com a lição saussuriana (“a língua é, de todas as ins tituições sociais, a que oferece menor ocasião para as iniciati vas"),1 tentaram interpretá-la num sentido social. Assim, J. Vendryes, sem desconhecer o papel do indivíduo, proclamava em 1921 que “ele não pode ser admitido sem restrições” e se insurgia contra a idéia de que uma inovação fosse compreendida como “um fato individual generalizado pela imitação”. E con tinuava: “É certo que toda mudança lingüística resulta unica mente do uso que cada indivíduo faz da língua. Mas que é que introduz na língua a mudança criada na fala, a não ser uma causa social? Pode-se admitir que um novo uso comece sem pre por uma série de atos individuais, contanto que se acres cente que esses atos individuais só criam um novo uso porque respondem a uma tendência coletiva. Os fatos que pertencem à fala não passam de maneiras particulares e ocasionais que têm os indivíduos de utilizar o sistema estabelecido; mas disso só resulta algo dc geral e permanente em virtude de um acordo tácito entre todos os que falam. Cumpre pois não falar de inovações individuais generalizadas, mas antes de inovações ge rais manifestando-se nos indivíduos isolados.” 2 Em 1937 ainda, 1. Court, pp. 107-108 (1230). 2. Le aratire soial du langage et la dotrine de F. de Saus mu em Journal de Psyhologi, t. XVIII (1921), pp. 622-623 (« Choix deludes linguistiques et eUiques, p. 23).
170
numa importante contribuição cm que punha particularmente em relevo o valor eminentemente social da linguagem, 1 o mesmo autor, depois de ter dito que “a história de toda língua é uma sucessão de acidentes, mas de acidentes coletivos”, era no en tanto levado a atribuir uma certa influência aos “acidentes in dividuais”, desde que estes sejam sancionados pela comunidade; c acrescentava: "O aparecimento de Victor Hugo ou de Vol taire não i senão um desses inumeráveis acidentes que surgem na vida dc uma língua c para os quais contribuem todos os que a falam, cada um com sua parte. A parte dos grandes escritores é certamente preponderante. A ação dc cada uxo de pende de sua autoridade pessoal, do prestígio de que desfruta, da ascendência que exerce no meio em que vive.” Citamos estas passagens porque nos parecem característi cas do esforço consciente feito pelo autor para explicar os fatos lingüísticos como sendo a priori fatos sociais. Ora, os neolingüistas não hesitaram em admitir e reconhecer a capacidade dc invenção do indivíduo ou, melhor, de certas individualidades, pois quando comparam a difusão das inovações lingüísticas à difusão da literatura, das artes ou, por exemplo ainda, da moda feminina, insistem no fato de que a personalidade do inovador é preponderante e atribuem ao fator estético uma importância que seus predecessores estavam longe de atribuir; à ação mecâ nica e cega de forças evolutivas que respondessem a uma "ten dência coletiva", eles substituem o influxo meditado de uma força consciente. Para os lingüistas inspirados por Crocc, era uma razão a mais para estudar com predileção as obras literá rias, que são o reflexo dos esforços individuais de artistas e dc escritores; segundo o dito de Devoto, as línguas literárias nio são anormalitâ, mas são tio naturais quanto outras. Será mister acrescentar que a proclamação e a formulação dos princípios lingüísticos de Croce estavam bem na linha da tradição intelectual e cultural da Itália? E não foi por acaso, sem dúvida, que as teses individualistas sobre a língua foram desenvolvidas e defendidas com maior êxito na Itália e na Alemanha. Pois, ao contrário do que ocorreu com maior fie1.
Ê o estudo La linguistique que assinalamos mais acima, p.
153, n. 2.
171
qüéncia — tal (oí notadamente o caso da França, em que a unificação política precedeu e em grande medida impôs a unificação lingüística (recordemo-nos da Constituição de Villers•Cotterêts e da centralização do Estado francês, sob todos os regimes, desde o século XVII) — naqueles dois países, ao contrário, foi a unidade de língua ou, mais exatamente, a esco lha de uma forma de língua entre outras, como forma prepon derante, que precedeu, e até mesmo preparou, a unidade polí tica. Basta pensar em Dante e na sua prodigiosa Divina Comédia, graças aos quais o dialeto toscano forneceu o modelo da língua italiana, idioma literário que se tomou bem mais tarde a língua administrativa de toda a Península; basta pensar nessa norma complexa do médio-alto alemão que Lutero usou para a sua traduçáo da Bíblia e que depois foi tomada como modelo em todos os países de língua alemã. E é isso que explica também a posição particular da obra saussuriana na Itália. Falamos do papel eminente desempe nhado por Ferdinand de Saussure c de como ele surgiu como inidador da Lingüística moderna e o inspirador de algumas escolas que estão hoje entre as mais ativas e combativas. Mas há, nessa situação, uma exceção: malgrado um prestígio consi derável, que se assinalou e se assinala ainda numa posteridade notavelmente rica, a obra saussuriana penetrou na Itália menos profundamente que na maioria dos outros países; sem dúvida, alguns linguistas como G. Devoto ou Tr. Bolclli podem dizer-se influenciados por ela, ainda que de maneira assaz independente e, em todo caso. “anticonformista"; sem dúvida também, as doutrinas do Cours são expostas e estudadas, mas antes, ao que parece, por respeito à informação científica que por um senti mento de adesão ou aprovação. Em todo caso, nos grandes debates que foram travados a respeito dos princípios formu lados por Saussure (tais como a arbitrariedade do signo, a qualidade diferencial, . . . ) , não vimos nunca intervirem os eruditos da ncolingüística, e encontramos, outrossim, bem pou cos deles que estejam prontos a embarcar nas especulações abstratas nas quais nos tentam engajar hoje em dia algumas escolas saídas da lição saussuriana. Ademais, para os linguistas convencidos da importância do fator individual nos fatos da linguagem e do papel que nesta desempenha o sentimento esté
172
tico do falante, que podem representar a antinomia língua/fala 1 c a importância atribuída ao sistema concebido fora doa indi víduos e acima deles? Quanto à outra famosa distinção, sin cronia/ diacronia, da qual já dissemos como, após voa Wart burg, fora batida em brecha * observemos que não encontrara na Itália mais que um débil eco; recordar-se-á, aliás, que Croce, de acordo, uma vez ao menos. com os neogra mi ticos, insistiu sempre no fato de que a verdadeira natureza da Lingüística é a de ser uma disciplina histórica. Esse estado de espírito “sausstiriano” aparece-nos como uma das características marcantes da escola italiana de Lingüís tica. Para tomar menos operantes a força de persuasão e o incontestável encanto intelectual que distinguem a obra de Ferdinand de Saussure, eram indispensáveis o pensamento pres tigioso, a autoridade espiritual, a força expressiva que foram os dons de Benedetto Croce; pois seu destino foi tal que mesmo em Lingüística, domínio que se limitou a aflorar e a cujo aspecto técnico sempre permaneceu alheio, o impulso que ele lhe havia imprimido deu origem a novas maneiras de encarar os fatoa que fizeram seu país, nestes últimos cinqüenta anos, ocupar um lugar dc destaque na história das pesquisas. Todavia, há cerca de vinte anos, a Lingüística italiana tomou uma posição mais independente no que respeita às teses de Croce e se abriu amplamente às posições saussurianas 1 assim como às diversas correntes, entre as quais o estrutura* lismo, que se desenvolveram na Europa e na América. Já cita mos os nomes de G. Devoto c de G. Nendoni, de Tr. Bolelli, dc T. De Mauro, dc G. Lcpschy c dc outros; assinalemos ainda a atenção dada à Fonologia e ao Estruturalismo por W. Belardi e L. Heilmann, à Semântica c à Estilística por L. Rosiello c su blinhemos sobretudo a atividade notável de Antonino Pagliaro 1. Cumpre notar que a antinomia — à qual fizemos alusão mais acima (p. teu autor independentemente da teoria de sentido. 2. Ver pp. 142-143. Ver notadamente a importante 3. acima (p. 138, n. 3).
lingua/linguaggio de Bertoni 166) — fora formulada por Sausture e, aliás, num outro
obra de G. Dkrosbi citada
quc, aplicando sua experiência dc comparatista aos problema Jevantados por Saussure c pela Lingüística psicológica, ‘pôs cm evidencia as relações da linguagem com as outras atividades humanas.1 Realmente, nesse debate que se instituiu entre o social c o individual, cumpre reconhecer que, mais uma vez, posições ex cessivas foram às vezes assumidas dc uma c outra parte, quando uma solução de justa eqüidistância poderia intervir sensatamen te, como de fato interveio, para desfazer as antinomias saussurianas entre sincronia e diacronia, entre língua e fala. Conviria talvez apelar aqui para a noção de progresso, não concebida, como o fizera um tanto ingenuamente Jespersen, 2 como a expli cação suprema da evolução lingüística, mas como representativa da aspiração dos seres humanos a uma certa perfeição; essa preocupação do progresso não é, com efeito, um móvel notável da atividade humana, e não nos devemos inclinar perante o esforço feito pelo poeta ou prosador para melhor se aproximar do Belo por intermédio de sua língua? Certamente, a lingua gem é obra comum c contínua de todos os membros do grupo social; cada um dc nós c levado, conscientemente ou não, a nela introduzir certas inovações, mas estas só podem tornar-se regra quando süo aceitas e adotadas por todos os membros da comunidade lingüística; para realizar tal condição, faz-se mister não somente que o inovador tenha prestígio, mas também que a mudança que propõe responda ao sentimento geral dos falantes. Isso quer dizer que as possibilidades de êxito dc uma trans formação — acidental ou voluntária — são ínfimas; cumpre ainda sublinhar que nessa obra dc criação permanente quc é a linguagem, certas individualidades, os artistas, têm um papel muito mais amplo que outras. O escritor utiliza a linguagem comum ( t a l condição é indispensável, pois o poeta que só seja compreendido por si próprio não é, do ponto de vista dc sua Cí. por ex. Lm parola e Vimmagine (Nápoles, 1957) e três 1. volumes de Saggi di ritia semanti a (Mcuiua-Florcnça, 1953, 2.* 6Qq 1961; Nuovi Saggi..1956; Altri Saggi..., 1961).
produção artística, um ser social), ma» diwxmc-lhc, melhor que as outras pessoas, os recursos; alcança criar combinações fô nicas, morfológicas, semânticas que exercem sobre o ouvinte (ou o leitor) uma impressão estética c que susdtaa no seu espírito a representação desejada. Há uma restrição a fazer: a receptividade da obra literária é maior ou menor conforme o grau de compreensão e o nível de sentimento estético que ela exige, pois a comunhão de um grupo de indivíduos num mesmo sentimento da beleza reclama deles um conhecimento mais ou menos aprofundado dos meios de atingir a beleza. Entretanto, a matéria básica do escritor é a linguagem de seu grupo social, mas seu gênio é reconhecível pelo (ato de, na utilização dessa linguagem comum, lograr tirar um efeito esté tico, tal como o músico que comunica seus estados de alma pela disposição original de uma gama de sons; tal como o escultor ou o pintor, que recorrem à exploração das cores e das Unhas para traduzir seu sentimento do bek); tal ainda como Eupalinoa, o arquiteto, que construirá cm Megara um pequeno templo dc quatro colunas e de estilo muito simples, imagem matemática de uma donzela dc Corinto que ele ditosamente amara. De par com a participação considerável que A Dialetologia Bartoli e os neolingüistas tiveram na constiindo-europcia tuição e no aprofundamento da Dialetologia indo-européia, cumpre reconhecer o papel eminente de Antoine Meillet; foi ele, com efeito, que, em 1908, sob o título de Lts dudets indouropéens, publicou o primeiro trabalho de conjunto consagrado à questão: ao cabo de um es tudo em que examinava uma série de traços de concordância tomados de empréstimo à fonética, à morfologia e ao vocabu lário, ele concluiu pela existência de um grupo oriental e dc um grupo ocidental, isto é, voltou a repartição clássica entre as línguas Sút9m e as línguas entum. Por outro lado, o conceito de unidades intermediárias — estados de língua presumidos entre o indo-europeu comum c as línguas atestadas na época histórica — foi batido em brecha pela publicação, cm 1916, dc um artigo cm que um lingüista alemão, Walde, tentava demonstrar que os dialetos agrupados geralmente sob a rubrica Ualoéltia pertenciam cm realidade
d dois grupos diferentes, dos quais um comprccndia o latim e o ir landes o outro osco-umbro e o britônico: tese excessiva, sem dúvida, mas que teve no entanto como resultado mostrar a precariedade dessas noções de “línguas comuns”, herdadas, cm suma, dc Stammbaumtheorie de Schleicher. Bartoli e os lingüistas italianos que laboraram no mesmo sentido — os trabalhos dc Devoto, de Bonfante (que aparece hoje como o sucessor mais fiel de Bartoli), de Pisani, de Terracíni têm autoridade neste domínio, assim como aqueles cm que Bertoldi tratou magistralmente os problemas de substrato — propuseram um método flexível de investigação, procurando determinar, graças à consideração do maior número possível de exemplos escolhidos em todos os aspectos da estrutura lingüís tica, os critérios que permitissem classificar os dialetos. Havia certamente alguma audácia em transpor para o campo das lín guas européias antigas os métodos da Geografia lingüística, que tinham sido primeiramente aplicados ao estudo de dialetos vivos, isto é, a um domínio onde é possível fazer inquirições e proceder a constantes verificações. O indo-europeísta, com efei to, tem, sobre o estado antigo das línguas que estuda, apenas dados imperfeitos; certos dialetos só nos foram transmitidos sob a forma de miseráveis fragmentos ou de glosas de compi ladores, de tal forma que a raridade dos documentos torna pouco significativos os dados que nos oferecem; outros, conhecidos unicamente por textos sagrados ou por inscrições, oferecem-nos apenas uma literatura de fórmulas, pouco instrutiva para o lin güista; mesmo considerando línguas que nos parecem ricas de textos, tais como o grego ou o latim, verifica-se que uma parte importante nos escapa, como também, às vezes, o vocabulário mais corrente ou os torneios da língua popular. Assim, convinha agir com prudência; eis porque, reagindo por sua vez contra o dogmatismo neogramático, Bartoli, pelo menos na parte fecunda de suas pesquisas, 1 não considerava 1. Pois, após ter combatido com tamanha energia o doutrinarismo dos neogramiticos, Bartoli, noi últimos anos de sua carreira, deixa ra-se levar por uma confiança de tal modo cega nos princípios que estabelecera a título de guias da investigação lingüística que chegou a
176
suas “normas espaciais" como leis que atuassem dc maneira mecânica e cega; eram, bem ao contrário, guias da pesquisa, pontos de referência do método a seguir. Importa portanto, antes de tudo, analisar corretamente as correspondências reveladas entre os dialetos e procurar detenninar-lhes a natureza. Algumas, de (ato, não fazem mais que atestar a conservação de um estado antigo e são por conseguinte arcaísmos; outras podem resultar de desenvolvimentos inde pendentes mas paralelos; outras, por fim, são inovações que, num grupo determinado de dialetos, demonstram uma evolução em comum (por exemplo, na famosa questão do tratamento das guturais, as línguas Sã&m estão unidas por uma tendência co mum à palatização das guturais, ao passo que as línguas entum, que conservam o estado antigo do fonetismo, não estão unidas por nenhum traço particular). É evidente que são as inovações que devem ser essencial mente tomadas em consideração para a definição das relações dialetais, e que será referindo-se às suas isoglossas numa carta lingüística que se poderá ter melhor noção das relações entre os dialetos e tentar descrever-lhes a história. A primeira tarefa consiste, pois, cm recolher correspondências, mu o ponto deli cado é interpretá-las corretamente e decidir sc constituem traços probantes de parentesco. Evitar-se-tf, por exemplo, considerar como inovações o que seria o efeito de desenvolvimentos para lelos — a separação entre essas duas espécies de relações nem sempre é fácil de fazer-se — ou ainda, mais simplesmente, a conseqüência de influências recíprocas, e tocamos aqui os pro blemas deveras importantes do substrato, do superes trato e do empréstimo (ou adstrato), problemas que, na verdade, se colo cam principalmente para o estudo do vocabulário. Será mister evitar, finalmente, perder dc vista o papel da quilo a que poderíamos chamar fatores negativos: não se de verá com efeito, cm proveito dc similitudes frisantes bem postas conslderá-kn como um conjunto de dogmas constitutivos de um quadro rígido. Esse drama de uma vida intelectual foi esclarecido por G. Da* voto num artigo que consagrou (Word, t. 111, 1947, pp. 206-216) à memória do mestre da neolingüistica.
m evidência, negligenciar divergências profundas capazes tornar pouco provável o agrupamento, numa mesma área, dois ou mais dialetos determinados.
de de
•
Uma outra posição fecunda da “teoria das áreas” (como é freqüentemente chamada, de acordo com a formulação de alguns princípios essenciais que lhe constituem a armadura) é a combinação do fator tempo com o fator espaço. A inter venção dessa terceira dimensão no quadro geográfico itia dar conta de uma comprovação aparentemente paradoxal, feita ________________ já lhe fizemos alusão 1 — por ocasião da deci(ração do tocário e do hitita; este, com efeito, em vez de confirmar, como geral mente se esperava, a divisão simplista em dois grupos: ociden tal (línguas entum) e oriental (línguas satdm), revelou simi litudes surpreendentes com a extremidade oeste do domínio indo-europeu e confirmou observações isoladas que já haviam sido feitas, mas sem que fossem tiradas as conseqüências, acerca das concordâncias entre o itálico e o céltico, de um lado, e o indo-iraniano, de outro 2 Patenteou-se que se trata, no caso, de fatos de conservação, sendo que os traços dialetais que apare cem nas “áreas laterais” (Meillet falará mais tarde de "línguas marginais”) pertencem em geral a um estrato lingüístico mais antigo que os da área mediana; em outros termos, os traços de concordância que se destacam entre línguas geograficamente muito afastadas entre si, são arcaísmos e não inovações, tais como as formas verbais cm -r do impessoal que se encontram em latim (tipo itur, estendido a seguir depois ao médio-passivo: fertur) e em céltico, mas também em hitita, em tocário, cm ar mênio e cm frígio, o subjuntivo em -
Pp. 68.
2. J. Vendryes, Let orrespondanes de voabulaire entre hndoiranien et Viteloeltique em Mémoiret de Ia Soiété de Linguist iqu€ de Ports, t. XX (1918), pp. 265-285.
178
com relação ao indo-europeu comum pôde mudar de valor; con sidere-se o caso das línguas clássicas: o latim aparece doravante como uma língua conservadora, da qual muitos doa traço», con siderados anteriormente como inovações, se explicam ao con trário como vestígios de um estágio arcaico do indo-europeu, ao passo que o grego faz parte de um grupo mais inovador; compreende-se que tal fato tenha importância para a própria concepção do indo-europeu. Pois o que é esse indo-europeu original ( Urindogermanisb) que os neogramáticos tinham paciente e eruditamente recons truído e de cuja estrutura — fonetismo, morfologia, sintaxe, vocabulário — Brugmann e seus discípulos haviam traçado qua dros tão precisos quanto possível, se não um estado de língua estabelecido por uma comparação que abrangia, em princípio, o conjunto das línguas indo-européias conhecidas, mas que, de fato, se baseava essencialmente no sânscrito e no grego, sendo essas duas línguas consideradas como as mais arcaicas no con junto das línguas indo-européias. E o erro de método — que tem sido cometido tão amiúde nestes últimos trinta anos — logo se evidencia, erro que consiste em comparar línguas recen temente decifradas com esse indo-europeu reconstituído segun do o conjunto das línguas, exceto das próprias, quando nío, pari certos traços pelo menos, com duas ou três línguas somente, consideradas arbitrariamente como particularmente típicas. Será de espantar, então, que traços próprios do hitita, por exemplo, não figurem no caso, e que crédito convirá dar às hipóteses de um Sturtevant, que coloca o hitita no mesmo plano do indo-europeu tradicional e que considera esses dois estados de língua como dois ramos saídos do que ele chama de "indo-hitita”? É evidente que se o hitita e o tocário houvessem sido decifrados cinqüenta anos mais cedo, o indo-europeu de Brugmann teria apresentado uma fisionomia muito diferente daquela que nos é familiar.1
1. E novas descobertas ainda podem enriquecer nosso conhe cimento das línguas indo-européias e modificar o quadro que boje traçamos de sua história e de suas relsçõet: o deciframcnto, rcalisado em 1953, do linear B no qual M. Ventris e J. Chadwick reconheceram um dialeto grego, o miccnio, é disso um eloqüente testemunho.
Talvez seja este também o lugar de recordar resumidamente que foi graças ao conhecimento do hitita que puderam ser ela boradas, simultaneamente mas independentemente uma da ou tra, as teses de J. Kurylowicz e Émile Benveniste sobre a estru tura do indo-europeu antigo, teses cujos resultados concordavam no essencial. As Origines de Benveniste 1 constituem uma obra capital na história da gramática comparada das línguas indo-curopéias; é, depois do Conjugationssystem dc Bopp dc 1816 c do revolucionário Mémoire de Saussure de 1878, o terceiro passo decisivo na história da gramática comparada das línguas indo-européias; a raiz é aí definida de uitia maneira mais estrita quc na construção saussuriana: composta de três elementos se guindo-se sempre na mesma ordem, a saber: consoante (isto é, consoante propriamente dita ou soante consoante) + vogal (isto é, a vogal fundamental e com seu grau apocopado o) -f consoante,2 ela aparece doravante como um elemento indivisível de conteúdo significativo e natureza produtiva. Se, em certos pontos, essa teoria modifica a concepção clássica da morfologia indo-européia (não se trata mais, por exemplo, nem de infixo nasal, nem de raízes dissilábicas) acaba também, no geral e no tocante a pontos importantes (assim no que concerne ao jogo das soantes e à intervenção dos fonemas dc tipo hua), por con firmar as concepções verdadeiramente proféticas sustentadas cm 1878, a título de hipótese de trabalho, por esse homem espan tosamente lúcido quc foi o mestre de Genebra. As concepções estruturalistas e seu rigor cartesiano desempenharam manifesta mente um papel nessa renovação dos estudos referentes ao indo-europeu antigo; cumpre ainda citar aqui Benveniste que, numa série de escritos brilhantes, 3 mostrou como os fatos particulares devem explicar-se por sua integração no sistema. 4 1.
E. Benveniste, Origines de la formation des noms en indo
-uro pé en, Paris, 1935. 2. Convem evitar o tempo triliiera, que é empregado num outro *entido (esquema conson&ntico) para a descrição das lfnguas icmiticas. 3. Como seus Noms á’agent et noms fation en indo^europien, # Paris, 1948; ver também, do mesmo autor, os estudos, consagrados ao léxico indo-europeu, que foram recolhidos em Le voabulaire das institutions indoeuiopéennes, 2 vol., Paris, 1969. 4. Oi indo-europeístas tomaram consciência do interesse que oferecem para seus estudas 01 métodos estruturalistas; a Indogermanishe
180
Pôde-se ver, cm virus ocasiões ,1 que o» linMecanismo e güistas norte-americanos tinham tomado parte mentalismo ativa no desenvolvimento de nossa disciplina e que ocupavam mesmo posições de vanguar da em certos pontos, tal como no estabelecimento das estruturalistas; pois é sobretudo no plano da sincronia que mul tiplicaram as pesquisas, levados a esse caminho notadamente pela tarefa enorme que constitui a notação do avultado número de línguas ameríndias ainda em uso no continente americano, tareia urgente também, porque muitas delas estão em vias de desaparecer contudo; nesse domínio,8 a obra de Franz Boas havia sido, desde o início de nosso século, particularmente
importante.9 Seria arbitririo falar de uma “lingüística norte-america na" como de uma escola em si, dotada dc independência, ainda que, em mais dc um ponto, os lingüistas norte-americanos professem opiniões e usem métodos um tanto diferentes dos que têm curso na Europa; houve, sem dúvida, a ccsura pro vocada pela última guerra, mas, além desta circunstância for tuita, há também o fato dc que a estrutura sui generis das línguas indígenas, que são línguas sem história 4 e às quais não se aplica o esquema gramatical herdado da Antiguidade disCesellsshaft, notadamente, consagrou um colóquio a esse tema, cm Munster, 1965, e as exposições que ai se fizeram foram publicadas nos tomos X, 2 (1965) e XI (1966) de Kratylos; cf. também Fr. R. Rekonstruktbn des Indogermanishan em Indogerma Adrados, DU nishe Forshungen, t. LXXIII (1968), pp. 1-47, mas C. J. Ruijoh demonstrou a prudência que convém ter com essa matéria: A propos d'une nouvelle appliation tie mithodes strueturalistes è la longue ho* márique em Mnemosyne, t. XXI (1968), pp. 113-131. 1. Notadamente nas pp. 53, 118-130, 157-158; ver mail adiante pp. 191-192, 198-202, 214-213. 2. Cf. pp. 191 ss. 3. Ver notadamente os três volumes, publicados sob sua dire* çio, do Handbook of Amerian Indian Languages, 1933-1938 e a coletânea Rae, Language and Culture, Nova Iorqme, 1940. 4. O que explica que, como diz, com conhecimento de causa, B. Malmbbbo, Les nouoeUes tendanes de la tmguktiqua (Paris, 1966, p. 236, n. 1), a Antropologia pode ser considerada “corno uma espécie de equivalente, no que ietpeita às culturas sem literatura escrita, do que foi a Filologia no tocante às tradições escritas das culturas antigas”. 181
sica, suscita problemas dc ordem particular; quando colocados diante de uma língua desconhecida, os pesquisadores, privados dc qualquer recorrência a um sistema preestabelecido, vêem-se com efeito forçados a identificar e a classificar os segmentos que conseguem isolar, de onde a importância dada à estrutura dc preferência à função. 1 Há entretanto um aspecto da reflexão lingüística que, nas cido além Atlântico, não ultrapassou todavia as fronteiras dos Estados Unidos: referimo-nos à polêmica que, na primeira me tade do século XX, opôs os partidários das teorias mecanista e mentalista (as duas revistas Language e Word respondem, no geral, por essas duas tendências divergentes). O meanismo,2 que se atribui a autoridade de Bloomfield (existe uma ortodoxia bloomfieldiana que defende o que se chama por vezes a "Escola de Yale”: Bernard Bloch, Robert A. Hall, Z. S. Harris e outros), se apresentava como um sistema positivista que considera a linguagem, a exemplo das outras atividades humanas, uma conseqüência natural das ações e reações dos diferentes elementos que constituem o corpo humano; esti mando seja a significação a situação na qual o falante emite uma forma lingüística, Bloomfield a afasta para estudar unica mente o aspecto formal da linguagem.3 O mentalismo, ao contrário, que tinha as preferências dc Edward Sapir c conquistara as simpatias de Roman Jakobson, era uma doutrina de natureza psicológica que julgava ser a variabilidade da linguagem o efeito da ação sobre fatores físicos, de uma força espiritual (vontade, reflexão, emotividade, etc.) 1. Cf. R. A. Hall, Amerian linguistis 1925*1950 em Arhi vum Linguistium , t. III (1951), pp. 101-125 e t. IV (1952), pp. 1-16; Seme reent Developments in Amerian Linguistis em Nuphilologishe Mitteilungn , t. LXX (1969), pp. 192-227. — Ver também rientes. pp. 137-140 [=ProbUmes , pp. fcm. Brnvbniste , Tendanes 9-13).
2.
A palavra inglesa c behavio( u) risnt às vezes adaptada ao fran co sob a forma bhauiorume\ L. II. Gray (Ata lingüístia, t. V,’ 1945-1949, p. 67)^ tentara o termo pouco feliz onduitisme; o diz omportamentismo. , ?• ^er ac*ma, pp. 118-119, como levaram ao extremo o desprezo pela significação.
182
os
bloomfieldianos,
como
italiano Harris,
que comanda nossos centros nervosos; ao contrário dos behavioristas, Sapir, que fizera experiências lingüísticas sobre os índios da América, achava que cumpre tomar em conta « "cons ciência lingüística” dos falantes; num artigo publicado cm 1925 e que prefigura a Fonologia, 1 ele havia chamado a atenção para as diferentes interpretações que podem dar, dc uma mesma estrutura fonética, um observador que reflete sobre sua língua materna e um observador estrangeiro, o que o levava a con cluir que “é preciso ir além dos dados sensíveis para captar as formas tais como elas são apreendidas e comunicadas intui tivamente"; mais adiante veremos 3 como, no seu esforço de classificar as línguas do mundo, ele se havia mostrado estruturalista por antecipação. Uma confrontação que tal teria podido fecundar a pes quisa retendo, dos dois pontos de vista, as posições que parecem mais bem firmadas; teria bastado recordar os ensinamentos do psicólogo francês Henri Delacroix: “Sendo cm grande parte mecânica, a evolução de uma língua é todavia sub tendida pelas exigências da significação*' e ainda: a linguagem “é obra do homem inteiro”. 3 Em realidade, as discussões sc revelaram decepcionantes e amiúde estéreis por causa da intolerânciâ e do espírito polêmico que impregnaram mais de uma vez os debates, fazendo lembrar, aqueles que se opuseram de maneira assim inconciliável, os realistas e nominalistas da Escolástica medieval. Ademais, o interesse dessa controvérsia se embotou sobrema neira depois que as teorias estruturalistas passaram a solicitar com fervor, e amiúde com sucesso, a atenção de nossos confra des norte-americanos; será de desejar, entretanto, que se apa guem ainda melhor as intransigências que subsistem.
1. Sound Patterns in Language em Language, t. I (1925), pp. 37-51; esse estudo foi recentcmcntc retomado na colct&nca de artigo* de Sapir, Linguistique (Paris, 1968, pp. 143-164) publicado em versão francesa por J.-EL Boltanski e N. Soulé-Susbielles. 2. Pp. 198-201. ... 9 1 3. H. Delacroix, Le langage et la pensie, 2. ed.. Paris, 1930, pp. 608-609.
Os eruditos russos, que tinham tomado parte A Lingüística ativa nos diferentes movimentos de Grama* soviética tica comparada e de Lingüística — no início do século, a “Escola de Moscou'*, sob o im pulso de F. F. Fortunatov, havia emitido opiniões paralelas às de Saussure, notadamente no que respeita à forma lingüística ou à distinção diacronia/sincronia 1 — se viram, no momento da Revolução, brutalmente separados do mundo exterior | viveram desde então, e durante numerosos anos, em vaso fecha do. Um deles, Nicolas Marr, foi encarregado de pôr no devido ponto, no domínio lingüístico, a doutrina do regime ao qual ele aderira. Ora, Marr que, não obstante, se tornara conhecido por trabalhos bem documentados referentes notadamente às línguas caucasianas, se afundou no problema insolúvel 2 da origem da linguagem (a linguagem articulada, por iniciativa dos feiticeiros que reinavam sobre as tribos, teria substituído pouco a pouco a linguagem por gestos) e se pôs a pregar, 1 semelhança do italiano Alfredo Trombetti, 3 mas em bases ainda muito mais aventurosas e sem poder alegar qualquer funda mento científico, a doutrina da monogênese das línguas do mundo; o mais espantoso é que, durante cerca de trinta anos, tais concepções aberrantes tenham podido constituir o ensino doutrinai de base da Lingüística soviética. Rejeitando o mé todo histórico comparado, Marr preconiza sua teoria "jafética" que, sobre uma base puramente semântica, edificava uma estra nha paleontologia lingüística: na origem, ter-sc-iam encontrado quatro elementos, espécies de palavras-totens, sal. ber. yon e ras. que, graças ao jogo das variantes ( sal / zal J isal / dal / gal / ...), teriam dado nascimento a todas as línguas. Alcrn disso. Mart insistia no caráter de classe da língua, indo ao 1. Sobre Fortunatov. assim como sobre seu que teve um papel importante na Iugoslávia, cf. Trends in Linguistis (Haia, 1955), pp. 100-102. 2.
3.
discípulo Al. Belié. por ex. M. Ivic.
Ver pp. 46-49 e 155-156:
Já em 1905, Alf. Trombetti esboçava um quadro de repar tição fundado na divisão em dois grandes ramos: austral (África e Oceania) e boreal (Eurisia e América): sistema sugestixo, sem dú vida, mas perfeitamente indemonstrável, dada a pouca precisão das concordâncias morfológicas e lexicais invocadas; cf., em último lugar, teus EUmenti di glottolgia, Bolonha, 1922.
184
ponto dc declarar que o» falares das mesmas classes sodâis cm regiões diferentes mostravam entre si um parentesco tipologico maior que os falares das diferentes classes sodais numa só e mesma nação. Por fim, ele considerava a língua coroo uma atividade de superestrutura, podendo modificar-K brus camente após mudanças da infra-estrutura econômica, donde U noção de “saltos revolucionários” c a de correspondências simplistas entre “estádios lingüísticos” e estádios sociais. Ora, em junho de 1950 (Marr falecera cm 1934), numa entrevista famosa dada ao Pravda, Stálin condenou formal mente as teses marristas que estão, dizia ele, cm contradição com toda a marcha dos povos e das línguas; ele reabilitava o estudo clássico do parantesco lingüístico, o qual “pode ser de grande utilidade para o estudo das leis do desenvolvimento na língua" e insistia no parentesco das “nações" eslavas; declarava, por fim, que a linguagem está estreitamente ligada ao conjunto das atividades humanas, de sorte que uma língua se desenvolve e evolui muito lentamente no seio de uma sociedade. 1 Dessa brusca mudança de orientação, que constitui um arrepia-caminho, puderam-se dar diversas interpretações: rea ção de bom senso perante uma posiçio cientificamente insuatentável, influência dos meios universitários georgianos, noa quais parece que as teses pseudomarxistas de Marr nio tinham podido penetrar, por motivação política talvez, pois a comu nidade lingüística eslava devia servir para fortalecer a uniio dos povos eslavos em tomo da Rússia. Como quer que seja, os resultados não se fizeram esperar: vimos nossos confrades russos esforçar-se por diminuir o atraso evidente e tomar pane ativa nos trabalhos de Lingüística e de Gramática comparada, prova clara de que a tradição não havia sido rompida e de que os universitários soviéticos tinham continuado a trabalhar de conformidade com sadias normas científicas, que eles transmi tiam aos seus alunos. Outro sinal encorajador: a informação se ampliara e surgiu o cuidado de dar a conhecer, sem desna1. A bibliografia consagrada a este acontecimento pooco oethnário é considerável; o leitor te pode referir, ainda, para o «agraciai, ao estudo dc conjunto dc L L Thomas, The linguutu tkevriei êf S. ]a. Mart, Berkeley, 1957.
w
tura-los pela polêmica, os resultados aos quais, após mais dc trinca anos, chegara a pesquisa lingüística fora das fronteiras da União Soviética. Se as fantasias marristas foram a princípio substituídas, não menos dogmaticamente, pelas teses defendidas por Stálin, depois do XX Congresso do Partido Comunista (1956) no tou-se que se deu maior liberdade à pesquisa e que renasceu o interesse pela Lingüística geral. Pois, por estarem na van guarda nas pesquisas de Lingüística aplicada (como o problema da tradução automática), aos quais o progresso registrado nos processos eletrônicos, a técnica das comunicações e a cibernética deram um impulso considerável, 1 os russos não perderam o gosto pela filosofia da linguagem. I. I. Mechtchaninov e, mais claramente ainda, V. VI. Vi nogradov tomaram suas distâncias no que tocava a Marr e a Stálin c as teses da Lingüística ocidental provocaram discussões às vezes muito animadas. Se alguns eruditos soviéticos criticam o Estruturalismo por perder de vista a realidade social era que mergulha a língua, tornando-se desse modo um conceptualismo abstrato, idealismo que está contra o materialismo histórico cuja autoridade se atribuem — é o caso de V. I. Abaev que acusa o “modernismo" lingüístico, acusando-o de desumanizar a ciência — outros, pelo contrário, mostram ura vivo interesse pelo desenvolvimento dos métodos estruturalistas, como S. K. Chaumjan, que se fez defensor da Fonologia e da Glossemática e se interessou pelo transformacionismo e por Chomsky, insis tindo sobre o fato de que o estudo da linguagem deve afastar-se de preocupações doutrinais e fazer-se num espírito científico, como ainda I. I. Revzin, que acha que é preciso combinar os métodos estruturalistas com os métodos tradicionalistas; recen temente ainda, Olga S. Akhmanova chamou a atenção cpntra os excessos possíveis da Lingüística quantitativa. 2 De modo geral, aliás, a lingüística marxista, que considera a língua en quanto expressão do pensamento e produto de um grupo cole 1.
Cf. pp. 123-125. 2.
Olga Akhmanova, Linguistis and the Quantitative Approah
du X * Con*ris International
t. I (Bucareste, 1969), pp. 151-174. 186
da Unguuies (Bucareate. 1967),
tivo, julga que ela deve ser estudada em concordância com esses dois aspectos e insiste na complexidade do fenômeno lingüístico. 1 As teses marxistas também foram defendidas fora da Rússia, como na Polônia, onde Adam Shaff publicou vários trabalhos, 1 cm especial sobre as relações entre a teoria do conhecimento e a filosofia da linguagem, assim como sobre a Semântica no sentido mais amplo;3 assinalemos também a atividade de nocso confrade Mareei Cohen, autor de numerosos trabalhos, muito bem feitos, de divulgação; na verdade, porém, salvo alguns matizes de voca bulário, as concepções que neles preconiza sâo, em resumo, is teses clássicas francesas, que consideram ser o fato lingüístico antes de tudo um fato social. 4 Por iniciativa de Rousselot,* a Fonética experiA Fonética mental se constituíra c se desenvolvera graças ao emprego, cm laboratório, dc instrumentos sem pre mais bem adaptados a seus fins: análise c registro do jogo das cordas vocais, do papel das cavidades buco-nasais, do fun cionamento dos diversos órgios da fonaçio, o emprego de raios•X, etc.; ela pôde, dessa maneira, estabelecer sua universalidade, tendo as experiências confirmado de maneira irrefutável que os 1. Para se orientar na bibliografia muito rica que dis respeito à história da Lingüística soviética, o leitor poderá reportar-te ao artigo de G. G. Lepschy, Sota suUo strutturalismo e sulla linguistis teente, em Studi e Saggi Linguistii, L VII (1967), pp. 1-22, assim como ao voL 15 (setembro 1969) de Langget onde, após uma introdução de R. L'Hermitte, encontra-se a traduçlo francesa de alguns textos particular mente significativos devidos aos lingüistas soviéticos mais em evidência. Notemos ainda que a revista Voproty jazykoznanija ("Questões de Lin güística”, publicada desde 1952 pela Academia das Ciências de Mascou, traz regularmente um bom resumo das diversas opiniSes defen didas na Rússia; R. L'Huufrm dá a cada ano uma relação dopes volumes, assim como de outros trabalhos soviéticos, no fasciculo "cosaptes rendus” do BulUtin de la Soiáti de Linguistique de Pans (a par tir do t. XUX, 1953). 2. Entre os publicados em tradução francesa, d temo» Lm*g*g* it onnaissane, Paris, 1969 e Introdution è la sdmsntiqne. Paris, 1968. S. Cf. p. 206, n. 5. 4. Ver pp. 154-155. 5. Ver pp. 61-62.
187
caracteres somáticos dos indivíduos não intervém cm nada na diferenciação do material fônico. Mas foi nestes últimos anos sobretudo que a Fonética tomou um impulso prodigioso; en quanto, durante o primeiro meio século de sua existência, ela se havia consagrado sobretudo ao estudo da articulação (ponto de vista do falante), ela se volta agora para a análise da audição (ponto de vista do ouvinte). Partindo dos dados da Física acústi ca e utilizando as técnicas mais aperfeiçoadas, a Fonética apurou aparelhos de análise, de medição e de registro de uma grande precisão: alguns como o sonagrafo (do tipo Visible Speeh), permitem decompor o som em harmônico e formantes; outros se esforçam até, e o processo é interessante a título de controle, por fazer a síntese da palavra; os resultados obtidos, sobretudo no que concerne às vogais, são já notáveis e são de esperar-se grandes progressos. Vé-se, destarte, que a Fonética se constituiu numa discipli na autônoma cujo raio de ação é considerável; os ensinamentos que traz à Lingüística são numerosos e de valor: precisão na análise dos elementos de base da linguagem, mecanismo das oposições funcionais, papel do acento e do tom, análise do ritmo, etc. Em outro terreno, o da Lingüística aplicada, da alcançou também resultados espetaculares, tais como a criação das técnicas ditas audiovisuais: nestas, os princípios da análise estrutural e o recurso a progressos da Fonologia (tal como o jogo das comuta ções) foram decisivos para a elaboração de métodos que visam a um ensino acelerado das línguas vivas. 1 Quando, nos primórdios da idade rooA tipologia lingüística derna, foi despertado o interesse pela diversidade dos falares humanos, apa receram manuais de classificação das línguas, conhecidas em número sempre mais elevado, de acordo com sua repartição geo gráfica. Mas cedo interveio outro critério: o da classificação genética (ou genealógica), que se esforçou, com êxitos diversos, 1. Ter-se-á um bom apanhado das tendências da Fonética atual e dot resultados obtidos nos diversos domínios que ela cobre, folheando ° excelente Manual of Phonetis (Amsterdão, 1968) editado sob • direção de Bertil Malmbf.ro.
188
por estabelecer famílias de línguas; vimos como esta noçio, apli cada ao indo-europeu e servida por um método rigoroso, deter minara no século passado o nascimento da Gramática comparada e deu impulso à ciência lingüística. Os êxitos obtidos no estudo das línguas índo-curopéias pelos eruditos da escola neogramitica haviam infundido nestes tal confiança no método histórico que eles acreditavam poder aplicá-lo um dia ao conjunto das línguas. No prefácio do im portante volume Les langues du Monde, publicado em 1924 sob a direção de Antoine Meillet e de Marcel Cohen, o primeiro, depois de, com sua lucidez costumeira, ter tido o cuidado de assinalar os limites do método mostrando que, desde que o inves tigador deixe o terreno dos documentos históricos para aventu rar-se no das reconstruções de comunidades lingüísticas anterio res a estes, toda demonstraçio se toma ilusória, acrescentava que estava convencido dc que a gramática comparada das línguas indo-curopéias fornecia o modelo a imitar c persuadido dc que o único critério válido de parentesco é o "das continuidade* das formas gramaticais”; e ele calculava que se chegaria a demons trar que a maior parte das línguas se vinculam a um pequeno número de famílias definidas, pelo que afirmava, no início de seu prefácio: “A única classificação lingüística que tem valor e utilidade é a classificação genealógica, fundada na história das línguas**.1 Ora, fatos novos, tal como um conhecimento mais amplo e mais aprofundado das línguas indígenas da América ou da Áfri ca, assim como novos princípios de investigaçio, evidenciaram que se o método genético dá resultados brilhantes e convincen tes quando aplicado ao indo-europeu e, embora em menor me dida, a outros grupos de línguas, tal como o camito-semítico, sua utilização com vistas à classificação do conjunto das línguas do mundo, que sáo, em sua maioria, línguas sem história, se de monstra, ao contrário, um malogro. Ademais, mesmo no caso favorável de línguas conhecidas desde uma época mais ou menos recuada, o método genético só tem valor entre duas datas; tudo quanto seja pré-história só pode ser, no terreno lingüístico. 1. Texto republicado en Meillst, Lmguistiqui kàtoripu et linguistique ginérale, t II (Paris, 1936), pp. 33-69.
189
objeto de especulações temerárias, pois é sempre lícito aos espíritos imaginativos — e alguns deles não fizeram cerimônia! ^ j reconstituir hipotéticos estados de língua comuns a diversas famílias historicamente atestadas (indo-europeu e semítico, por exemplo)1; tanto que, levado ao extremo, o método genético acaba por demonstrar, paradoxalmente, que é impossível esta- í belecer que duas línguas não sejam parentes. 2 Outra fonte de complicação: no curso de sua história, as | línguas se influenciam mutuamente e modificam seu vocabuU-l rio, até mesmo sua estrutura, por empréstimo de elementos e»3 trangeiros. Consideremos o latim: se o estudamos cm sua forma i antiga, chamamos de empréstimos elementos etruscos, gregos, gauleses, ilírios, mediterrâneos, etc., que nele se introduziram I e os levamos em conta, quando tentamos, por exemplo, deter minar as relações do latim com os outros dialetos indo-europeus; entretanto, quando estudamos o latim chamado vulgar, na alvo rada das línguas românicas, esses elementos estão nele integit* dos de modo perfeito e' não temos mais nenhuma razão de considerá los à parte. Dc sorte que o próprio conceito de parentesco lingüístico é coisa flutuante e sujeita a interpretações diversas; a noção de afinidade lingüística, Sprabvrwandtsbajt , defendida por Schuchardt, se revelou ademais uma das mais fe-| cundas da pesquisa lingüística nestes últimos decênios; cuidi de estudar com maior precisão as influências recíprocas de diale- 1 tos vizinhos, de determinar o que pode unir, num mesmo con-| texto geográfico e social, línguas que são por vezes bastante diversas, em suma, de distinguir os diferentes aspectos do pa rentesco por vizinhança, por osmose: o Sprabbund} 1.
Os esforços, nesse sentido, de um H. Mõllkr ou de um Cuny, não alcançaram êxito ; a preocupação da reconstrução chegara, neles, a um grau que, deixada de parte a preocupação dos asteriscos (assinalando que se tratava de formas não-a tentadas), lembra a atin gida por Schleicher. Graças a um jogo arriscado de raízes e de sufixoi, chegou-se a propor à perplexidade do leitor formas de aspecto algé brico, as mais das vezes impronunciáveis, e que passam por simbolizações da língua comum, da qual se tenta demonstrar a existência. 2. A. Mxn.t.ET, Linguistique historique et linguistique ginárelt, t. II (Paris, 1936), p. 55. ' 1
Sobre este auunto, poder-ie-i ler, por ex., V. Pisani, tf HSPB «• HI = (1952), pp. 3-16 Satti Tunn u, a onea PP. 29-42, e referir.* , 0. iníoitne. * “' “ < >3. "*}*. 190
W
Tudo isso explica que o prefácio de Meillet nio tenha «do colocado no pórtico da segunda edição, aparecida em 1952 das Ungues du Monde: ele teria sido, com efeito, desmentido'pelo próprio conteúdo do volume; é que, ao lado do agrupamento por famílias, o qual continua a ser o ideal confesso da obra; ao lado da apresentação geográfica à qual recorreu todas as vezes que o método genealógico não era aplicável, vê-se apa recer timidamente, aqui e ali, por exemplo para as línguas da América do Norte, um outro princípio de agrupamento: a classificação tipologica. Entende-se por isso um método que, sem levar em conta a situação geográfica' das línguas conside radas, sem atentar para o parentesco dc natureza genealógica estabelecido pela evidência histórica, tenta agrupar as línguas segundo suas características dc estrutura. É, pois, a análise dos meios de expressão das línguas, nos diversos planos — fonético, morfológico, sintagma tico, semântico, rítmico ou outro — que, fora de toda idéia preconcebida, vale dizer, sem preocupar-se com as classificações já propostas, orientará o lingüista na tareia particularmente árdua da classificação dos milhares de dialetos falados sobre a Terra. Estamos, sem dúvida alguma, longe de ter distinguido os critérios que, por seus caracteres universalmente válidos, con gregariam a unanimidade dos pesquisadores empenhados nesse caminho, e não se negará que, ao lado da bela arrumação e das (// onetto di "leg* lin la sua appliazione aV "indeuropeo”) e de Maurice Lkaoy (Stratifieazioni ronoligihe ni rapporti fra le lingue indeuropte ) nas Atti del III Convegno Internationale di Linguisti (Milano, 1958), Milão, 1961, pp. 39-79, assim como ao de Emil Petrovici, Interpretation des systèmes linguistiques nas Ates du X 9 Congris International des Linguistas (Buareste , 1967), t. I (Bucareste, 1969), pp. 37-56. — Para a Sprahuerwandshaft, cf. o Hugo ShuhardtBrevier orga nizado por L. Spitzcr (cf. p. 81, n. 1), pp. 189-204; o termo Sprahbund foi proposto por N. S. Trubetzkoy ao Congresso dos Lingüistas de Haia em 1928, cf. Ed. . Schwyzer em Zeitshrift für vergleikenda Sprahforshung, t. LXVIII (1944), p. 98; R. Jakobson o aplica aliás às semelhanças de estrutura, distinguindo a Sprahbünda du Sprah/amiliin: Sur la tkiorie des affinités phonologiques entre les langus, comunicação ao 1V.° Congresso dos Lingüistas (Copenhague, 1936), reproduzido em apêndice aos Prinípios da Fonologia de Tru betzkoy, trad, franc, dc J. Cantineau (Paris, 1949), pp. 351-365 dc
Giuliano
güístia11
P onfante
c
Giacomo
D evoto
garantias científicas que oferccc o estudo da gramática com parada das línguas indo-européias, a tipologia lingüística faz ainda pobre figura; todavia, isso talvez não passe de uma ilu são ou, antes, de uma falta de perspectiva, pois os objetos de uma e de outra são totalmente diferentes e seria difícil compa rá-las com serenidade. Não haveria razão tampouco de espanto pelo fato de os lingüistas do Novo Mundo se terem preocupado particularmente com valorizar esse método de trabalho e utili zá-lo em suas pesquisas: é que nossos confrades americanos estão a braços com uma situação extremamente complicada para a qual os métodos da Lingüística clássica se revelam insuficien tes, quando não praticamente inaplicáveis; quero referir-me ao quadro extraordinariamente variado e rico das línguas indígenas das três Américas, que somam um milheiro, diz-se, tanto quanto os números tenham qualquer valor nessa matéria. Pode-se dizer que, em larga escala, a Lingüística americana, levada mui tas vezes pelas circunstâncias a se valer dos dados da Antro pologia, tomou-se o que é por ter feito da descrição desse ma terial enorme a primeira de suas tarefas. 1 E os mesmos proble mas se colocam tanto para os africanistas como para os que se debruçam sobre as línguas “primitivas" da Oceania.
A bem dizer, este método tipológico — deixando de lado o vocábulo pelo qual o designamos hoje — não é assim tão re cente ou revolucionário. Podcr-se-ia mesmo sus tentar, conforme notou Benveniste, que uma classificação genética é também tipológica:3 com efeito, as identificações materiais entre as for mas e os elementos das formas — identificações que são o objeto da Lingüística histórica — conduzem à distinção de uma estrutura formal e gramatical própria da família definida. PÔde-se mesmo perguntar se, cm sentido contrário, uma classifica ção genética não se poderia fundar apenas nos critérios tipológicos; a questão, particularmente importante no plano do mé todo, foi colocada por Trubetzkoy num artigo que apareceu em 1. Bcrtil Malmbero, Lei nouvelles tendanes de Ia linguistique I (Paris, 1966), p. 236; cf. acima, p. 181, n. 4. 2. E. Benvrniste, La La lassifiation des langues cm Confêrtnes de Vlnstitut de Linguistique dt VUniversiti de Paris , t. XI (1932-1953), p. 40 (= ProbUmes, p. 107). 192
1939, um ano após * morte desse grande mestre do Circulo dc Fraga. A resposta se deve matizar; parece anas evidente que os a>nceitos de parentesco genético e de parentesco tipológico são independentes, se bem quc, na realidade, sejam en contrados amiúde superpostos; cm outros termo», o parentesco dc estrutura pode resultar dc uma origem comum, mas pode também encontrar-se realizado independentemente por diversas línguas, fora dc toda relação genética. 1 Por outro lado, as diferenças de tipo aparecem de modo tão distinto que, desde os primórdios da pesquisa lingüística, pensou-se cm utilizar definições “tipológicas” para caracterizar certos grandes grupos dc línguas. Assim aconteceu com o pa ralelo estabelecido por Humboldt entre uma determinada língua e a mentalidade do povo que a fala; assim aconteceu com a famosa tripartiçâo imaginada por Schlegel e aperfeiçoada por Schleicher; já mencionamos o enorme êxito alcançado por esta última teoria, assim como o pouco crédito que convinha, cm definitivo, conccdcr-lhc. 3 Todavia, cumpre reconhecer quc havia nessa utilização de critérios morfológicos (isolante / aglutinante / flexiva) uma idéia fecunda que permitiu a elaboração de alguns dos sistemas tipológicos mais bem construídos que tenham sido propostos no curso de nosso século, consistindo a linha de conduta em definir tipos príndpais, em número mais ou menos elevado, aos quais se poderiam vincular os sistemas efe tivamente realizados. Entre as tentativas feitas nesse sentido, uma das mais in teressantes, das mais próprias para servir dc ponto de partida às pesquisas posteriores, foi a que Finck expôs em W09\4 ele propõe um esquema de classificação que comporta oito tipos, definidos cada um deles por uma língua característica (quc indicamos entre parênteses) e que se repartem em três grandes 1.
N. S. Trubetzkoy, Gedanken úber das IndogirmantnprobUm
em Ata Lingüístia Lingüístia, t. I (1939), pp. 81-89. 2. Cf. R. Jakobson , Sur la thiorie des a/finitis phpnologiqw* entre Us laiigues (cf. p. 190, n. 3), pp. 352-35S. 3. Ver pp. 38-45, Haupttypen des SpraHaut, SpraHaut, Leip 4. Franz Nikolaus Finck , Die Haupttypen zig, 1909, 3.* ed. (sem modificações), 1936.
11
19}
grupos: «I) isolante, compreendendo dois tipos: isolanteradial (chinês: monossilabismo das palavras, relações expressas prin cipalmente pela ordem das palavras e por “palavras vazias") e isolantetemátio (samoano, língua poÜnésica: emprego dc su fixos c afixos e papel dominante das partículas); b) flexivo, compreendendo três tipos: flexivoradial (árabe: (árabe: modificações da raiz), flexivo temátio (grego: modificações do tema) e fle xivo de grupo (georgiano: as formas fletidas podem elas pró prias ser afetadas por afixos); c) a a fixa fite, compreendendo três tipos: subordinante (turco: elementos sufixados na raiz), inorporate (groenlandês, falar esquimó: conglomerado de ele mentos sufixados no radical, donde um sintetismo muito acen tuado e a formação de palavras longas que representam uma frase completa) e seriante ("soubiya”, dialeto banto: língua de classes). Esta exposição de Finck, por pormenorizada e rica de pos sibilidades que possa parecer, está longe, entretanto, dc ser completa: não se vê como, por exemplo, nela acomodar as inúmeras línguas ameríndias dc estrutura tão original; e 6 pelo menos significativo que o mesmo autor, publicando simulta neamente um repertório das línguas do mundo, 1 as apresentasse não segundo o esquema tipológico que acabava de definir, mas referindo-se a um agrupamento dc tipo etnográfico;* nesse se gundo volume, as línguas são com efeito classificadas, conforme a raça dus povos que as falam, cm quatro tipos: caucásico (por tanto o indo-europeu), mongol, americano e etiópico (isto é, África e Oceania). Entretanto, o sistema tipológico imaginado por Finck pro vocou observações úteis: Lohmann discutiu-lhe as relações com 1. Die Sprahii&mme Sprahii&mme des Erdkreises, Erdkreises, Leipzig, 1909, 3.a ed. (sem modificações), 1923. 2. Ele se inspirava, quanto a esse ponto, nos esforços feitos no século passado por F. Muller para pôr em concordAncia a Etnografia e a Lingüística; com efeito, depois de ter elaborado uma classifi cação das raças humanas na qual o aspecto dos cabelos desempenhava papel determinante (Ali geme in Ethnographi, Viena, 1873), Mfiller publicara um volumoso tratado de Lingüfitica (Grundriss der Sprah wissenshaft . 7 vols., Viena, 1876-1888) onde o mesmo critério somá tico servia para classificar as linguas I
194
a teoria das categoria», por um lado, 1 e com a Geografia lin güística, por outro. Scherer propôs uma repartição em 4 tipos segundo a construção da frase, mas sua exposição é muito breve e não entra nos pormenores da justificação: ela mereceria con tudo ser posta à prova. 3 Foi ainda esta tipologia à Finck que foi retomada, com certas acomodações, por Ernst Lewy, mas aplicada desta vez às línguas modernas da Europa, mais exatamente a dezoito delas escolhidas como particularmente significativas; 4 nesse quadro restrito, ele obteve resultados de grande interesse. Tal agrupamento, que o autor chama de “geográfico-tipológico”, apela para critérios estruturais e não genéticos, vale dizer, apa rece desligado da História e contribui ao mesmo tempo para pôr em evidência a noção de Sprahbund à qual fizemos alusão mais acima.6 Lewy reparte as línguas européias em cinco zonas, cada uma delas sendo caracterizada por um tipo diferente, a saber: atlântio: isolante-flexivo (basco, espanhol, francês, ita liano, irlandês, inglês, sueco), entral'. ílexivo de palavra (ale mão, húngaro), balânio: “demonstrativo” ou seriante (albanês, romeno, grego), oriental: flexivo-temático e subordinate (letão, russo, finês, tcheremisso e erza, um dialeto mordoviano) e ártio: subordinante (iurac, um dialeto samoiedo). É mister convir que nenhuma dessas classificações tipológicas nos pode satisfazer plenamente; o quadro de Finck, por exemplo, com as oito classes que ele propõe, não é suficiente mente rigoroso e apresenta graves lacunas; seria difícil, notadamente, de nele fazer entrar dialetos como os do Sudão ou 1. J. Lormann, M. Heideggers Heideggers ontologishe ontologishe Different und die Sprahe em Lexis, t. I (1948), pp. 49-106; Sein und Zeit, Sein und in der Form der Sprahe, ibid., t. II (1959), pp. 104-143. Wahrhelt in 2. Sprahgeographie und Sprahtypologie em Lexis, t. IV (1953) pp. 87-98. 3- H. Güntrrt, Grundfragen der Sprahwissenshaft, 2.* ed. por A. Scherer (Heidelberg, 1956), pp. 116-117. 4. Emit Lewy, Der Bau der europiishen europiishen Sprahen em Proeedings of the Royal Irish Aademy, vol. XLV1II, Scçflo C (Dublin, 1942-1943), pp. 15.117. 5. P. 190.
195
ainda as línguas indígenas das Américas, que nos parecem cer tamente das mais singulares. É que nós as abordamos com grande freqüência com concepções válidas somente para as línguas indo-européias; não sc deve perder de vista, com efeito, o fato de que c a partir do estudo dessas línguas que se de senvolveu a Lingüística científica: desde logo, o perigo que espreita o pesquisador é o dc aplicar ao conjunto das línguas do mundo princípios de método válido para as línguas indo-européias, mas que nem por isso tem valor universal. Ex pliquemo-nos. Que a distinção do nome e do verbo seja um dos traços que definem o indo-europeu e as línguas indo-européias, eis o que evidencia o estudo dessa família de línguas em todas as épocas de sua história e sob todas as formas por que se mani festa (ainda que o inglês seja até certo ponto um escândalo, nesse ponto de vista) 1 e quis-se ver, na dicotomia objeto / pro cesso, que recobriria a oposição nome / verbo, um dos funda mentos lógicos do espírito humano; ora, em numerosas línguas, não há demarcação nítida entre nome e verbo; em outros casos, esta distinção não se realiza: as línguas ameríndias, por exemplo, empregam como “nomes” formas verbais ativas ou passivas e “conjugam” partículas. É que, para retomar os termos de Benveniste, “a distinção entre processo e objeto só se impõe àquele que raciocina a partir das classificações de sua língua nativa e que ele transpõe em dados universais; e essa mesma pessoa, interrogada acerca dos fundamentos de tal distinção, viria cedo a reconhecer que, se ‘cavalo’ é um objeto e ‘correr* um processo, é porque um é um nome e o outro um verbo. Uma definição que busque uma justificação ‘natural’ na ma neira por que um idioma particular organiza suas noções está condenada a andar em círculo’*. 1 Outro exemplo: sempre se admitiu que um dos critérios decisivos para estabelecer uma família de línguas era a perma nência de nomes de números e esse caráter se afirma de maneira 1. Ver p. 44. 2. Em E. Benveniste, La phrase nominate em Bulletin de la SoUté de Linguistique de Paris, t. XLVI (1950), p. 20 = Problimes (cf. p. 127, n. 6), p. 152.
196
patente nas línguas indo-européias, no curso dos três mil c qui nhentos anos de sua história e sob todos os seus mais diversos aspectos dialetais; os casos de substituição, o emprego de ou tros enunciados, o empréstimo a outro dialeto eram de (ato extremamente raros ou isolados (como o francês soixanteãix suplantando septante, quatrevingts substituindo otant ou o romeno tomando de empréstimo, provavelmente ao eslavo» o nome do número "cem”: sutã, cf. v. esl. süto). Ora, pôde-se comprovar que, em outros tipos dc línguas, os nomes de número, até mesmo séries inteiras de numerais, haviam sido tomados de empréstimo por motivos que nem sempre estamos em con dições de determinar. 1 Assim, a estabilidade dos nomes de número em indo-europeu nio é um fato de caráter universal, que seria imanente à numeração, mas parece antes dever-se a causas particulares, tal como a comprovaçio que se pôde fazer, para o mundo indo-europeu, de que a técnica das trocas eco nômicas se desenvolveu bastante cedo. 2 À insuficiência e a inadequação do quadro gramatical con cebido para o indo-europeu — e mesmo nesses limites a termi nologia tradicional é amiúde defeituosa 3 — sc mostram evi dentes quando pretendemos considerá-lo como válido para a totalidade do globo. Seja o caso das partes do discurso ou das categorias gramaticais: aplicando a terminologia clássica a certas línguas ameríndias, verificamos que há pronomes que se con jugam ou ainda formas verbais pessoais que entram no jogo da dedinaçio — o que é um contra-senso apenas em aparência. 1. Cf. M. Swadesh, Mosan I: A problem of remote ommon origin em International Journal of Amerian Linguistis , t. XIX, t. (1953), pp. 31-35. 2. Cf. E. Benveniste, La lassifiation des langues , p. 36 = Problimes, p. 102. Veja-se, por exemplo, na categoria do gênero, onde o dis 3. parate é evidente; vejam-se duas línguas tão próximas uma da outra, histórica e geograficamente, como o alemão e o inglês: de um lado, três gêneros ainda muito vivos, do outro, nenhum gênero (ou nada mais do que relíquias); mesmo a distinção entre masculino e feminino, onde existe, tomou-se em geral puramente formal (pode-se pensar no casamento de uma sentinela que esposa um manequim ...); cf. nono artigo La lassifiation en linguistique (citado p. 10, n. 1), pp. 147-150.
sendo nosso ciro o de dar aos conceitos de "nome" c “verbo” tais como aparecem em indo-europeu (e também em outras línguas, bein entendido) um valor universal que eles não têm. De fato, continuamos com muita freqüência a estudar as línguas do mundo partindo de noções adquiridas ao contato com línguas que nos são familiares; ora, como o assinalou Émile Benve niste, desde quc o horizonte dos lingüistas se alargou, desde que a análise das línguas ditas “primitivas” revelou “uma or ganização altamente diferenciada e sistemática*', o tipo indo-europeu, “longe de constituir uma norma, parece ser antes excepcional”.1 Este é o momento de nos referirmos ao belo livro Langua ge (aparecido em 1921) do grande lingüista norte-americano Edward Sapir.2 Erudito de espírito lúcido, servido por um conhecimento aprofundado das línguas ameríndias — ele foi aluno dc Boas — Sapir (falecido cm 1939) permanecera tam bém sempre atento ao valor humano dos fatos da linguagem, assim como ao seu aspecto estético 3 (lembremos, dc passagem, que ele é igualmente o autor de numerosos poemas). No ca pítulo VI desse tratado, escrito por uma pena alerta c comumente irônica e humorística, ele propõe uma classificação dos tipos lingüísticos quc marca incontestavclmcnte um grande pro gresso sobre o que tinha sido proposto antes dele e mesmo, poder-se-ia dizer paradoxalmente, sobre sistemas que foram elaborados depois dessa data. Ele se refere a um triplo crité rio: primeiramente, os tipos dc oneitos expressos (essas noções foram examinadas por ele no capítulo V); pode tratar-se: I. dc oneitos de bases, de natureza concreta (como objetos, atos. 1. Tendanes réentes en linguiste ginirale, p. 133 = Pro blèmet, p. 102. 2. Edward Sapir, Language, An Introdution to the Study of Speeh. Oxford, 1921. Cumpre utilizar com precaução a tradução francesa de S. M. Guilleraixi: Le langage. Introdution à Vá tu de de la parole (Paris, 1953, reimpresso em 1967), pois ela não é sempre absolutamente fiel. 3. Característica é esta frase dc seu prefácio (p. Ill): “Among contemporary writers of influence on liberal thought Croce is one of the very few who have gained an understanding of the fundamental significante of language.”
198
qualidades), II. dc oneitos àerivaionais, dc caráter menos concreto que os precedentes e formados por afixação de ele mentos não-radicais, III. de oneit or relaionais onretos, ainda mais abstratos mas não desprovidos, numa certa medida de caráter concreto (como os nomes de número, o gênero) ou IV. oneitos puramente relaionais, de todo abstratos (dando a forma sintáxica). É de notar que, normalmente, os primeiros são expressos por palavras independentes, ao passo que os tipos II e III o são ou por processo de afixação (sufixos, prefixos, infixos) ou por modificação interna dos elementos radicais (tal como o princípio de alternância); o tipo IV utiliza estas diver sas possibilidades, às quais se acrescenta a ordem das palavras. Isto nos leva a considerar o segundo critério, o da ténia: trata-se de determinar a natureza das combinações moríológicas que, segundo o autor, podem ser isolante, aglutinante, jusional ou ainda simbólia (vale dizer, comportando alternâncias fôni cas, tônicas, acentuais, ...). Por fim, terceiro elemento, o tipo de estrutura1 realizado nas unidades da língua e que permite qualificar esta última de analitia (podem-se distinguir aí as línguas que não combinam os conceitos e conservam as palavras isoladas, como o chinês, e outras que os combinam moderada mente, como o francês), de sintétia (tal como o latim) ou de polissintétia (isto é, sintética num grau maior, donde a com plicação extrema da palavra, como nos dialetos do grupo algonquino ). Pareceria, à primeira vista, que reencontramos aqui o ve lho conceito de tripanição libertado da intransigência que o caracterizava no século passado e repensado em função de co nhecimentos adquiridos a partir dc então. Na realidade, Sapir teve em conta a complexidade — que conhecia tão bem — 1. Sapir emprega o termo synthesis, tendo em vista, com efeito, o grau de "síntese” realizado, podendo este ser aero no caso de uma lingua analítica isolante como o chinês; parece-no» todavia difícil falar, em francês, de uma “síntese analítica” ou mesmo de uma “síntese sintética" e acreditámos não trair o pensamento do mestre norte-americano servindo-nos do termo estrutura. Benveniste, no estudo que citamos'acima (p. 179, n. 1), conserva o termo “síntese-, mas colocando-o entre aspas; a tradução francesa de Ouillemin se serve da palavra “caráter", o que nos parece por demais vago.
dos fatos lingüísticos, c os tipos fundamentais (A, B, C, D) que ensaia finalmente distinguir são o resultado da combinação de diversos critérios que acabamos de enumerar: assim, o chinês, numa técnica isolante e uma estrutura analítica, aparece como uma combinação dos tipos de conceitos I c IV, a qual carac teriza de modo geral o grupo A; o turco faz parte do grupo B, porque combina os tipos I, II e IV, sendo ademais caracteri zado por uma técnica aglutinante e uma estrutura sintética; etc. O quadro assim obtido nada tem de absoluto, os compar timentos nada têm de estanques (freqüentemente, os dados entre parênteses indicam formas atenuadas dos processos em causa, características secundárias que se enxertam nas principais) e, se cada língua do mundo deva nele encontrar um lugar, será sempre independentemente de qualquer consideração geográ fica ou genética (verificar-se-á, por exemplo, que o latim e o francês se situam em graus diferentes). Sapir tinha plena e nítida consciência das insuficiências e lacunas de sua teoria para nela ver outra coisa que não fosse um ensaio provisório e sujeito a revisão. Cumpre reconhecer que o manejo desses diversos índices é delicado; a qualificação que convém atribuir a este ou àquele fenômeno lingüístico depende amiúde da apre ciação mais ou menos subjetiva do lingüista; por outro lado, grande número de línguas, que dependem ao mesmo tempo dc diversas características, estão a cavalo sobre várias casas do quadro. O próprio Sapir registra dúvidas e hesitações; sc situa, por exemplo, o latim, o grego e o sânscrito entre as línguas sintéticas, faz uma reserva quanto à técnica: fusional, mas com um matiz alternante (“symbolic tinge”). E é com muito bom senso que escreve: “As línguas, cm fim de contas, são estru turas históricas extremamente complexas. Tem menor impor tância alojar cada uma delas num pequeno compartimento bem definido que ter desenvolvido um método flexível que permita situar cada uma, dc dois ou três pontos de vista independentes, relativamente a uma outra língua”. 1 Seja como for, esta classificação, malgrado seus aspectos subjetivos e as hesitações que autoriza, é certamente a mais bem pensada e a mais pragmática que tenha sido proposta 1. Language, p. 149.
200
nesta ordem de id&js, isto 6, segundo um método que poderiamos chamar método lingüístio puro ou, se se quker, eUru lural:' Sapir examina, com efeito, o* fatos de acordo com criténos unicamente lingüístico», sendo a linguagem considerada tanto no seu fundamento semântico quanto na tua maneira de exprimi-lo (substância e forma), de acordo, em suma __________ te bem que o nome de Saussure não apareça em Languãgf — com a famosa proposição apócrifa do Cours: “A Lingüística tem por único e verdadeiro objeto a língua considerada em si mesma e por si mesma.** £, no entanto, tal método parece ter alcançado seus limi tes e não permite esperar resultados mais concretos; desde logo, convém voltarmo-nos para as perspectivas que descortina o caminho indicado há alguns anos por Émile Benveniste na exposição em que examina o problema da classificação das línguas;2 estas, nota ele, “são conjuntos tio complexos que podemos classificá-las em função de um grande número de critérios. Uma tipologia consistente e compreensiva deverá levar em conta diversas ordens de distinções e hierarquizar os traços morfológicos que delas dependem”. 3 Notando as difi culdades com as quais se chocam todas as classificações tipológicas que tenham sido propostas, o lingüista francês se per gunta se não conviria, antes de tudo, reconhecer que a forma é apenas a possibilidade da estrutura; por conseguinte, a tarefa mais urgente consistiria em elaborar uma teoria geral da estru1. Empregamos o termo [em francês] strutural e não strutural. pois este último está reservado boje cotno qualificação das escolas agrupadas, como se viu (pp. 119-136), sob a etiqueta comum de strn turalisme. [N. du T.; Esta distinção Dão existe cm português; cm am bos os casos, usa-se estrutural.] 2. Cf. p. 192, n. 2. 3. Foi para responder a essa exigência que Joseph H. Greenberg retomou e remanejou, diversificando-os, os critérios usados por Sapir e, pelo menos para as línguas africanas, ele chegou a resultados inte ressantes: The languages of Afria, Haia, 1963; do mesmo autor, cf. Anthropologial Linguistis (Nova Iorque, 1968), particularmente nas pp. 119-135 e ver acima, p. 123. — Sobre o estado dot estudos tipológicos, ver Bernard Pornaa, La typologie em Le langege (“La Pléiadc”, Pari», 1968), pp. 300-322.
201
cura lingüística e o esforço dc classificação deveria, nesse caso, aplicar-se aos elementos dessa estrutura; ele precisa: “A con dição inicial de uma empresa que tal seria de abandonar esse princípio, não formulado e que pesa sobre grande parte da Lingüística atual tanto mais quanto parece confundir-se com a evidência de que só há lingüística do dado, de que a lingua gem se contém integralmente nas suas manifestações efetuadas**; e acrescenta: “o dado lingüístico é um resultado e cumpre investigar aquilo de que ele resulta". Parece, pois, que não se poderá chegar a tal classificação racional recorrendo, para uma formulação adequada das definições e uma determinação correta das relações, aos processos da Lógica simbólica. E é interessante notar que, no Congresso de Oslo dc 1957, a dis cussão sobre a tipologia fez ressaltar esta necessidade de apelar, para além do inventário dos fatos, para o sistema. 1 Dito de outro modo, e empregando o vocabulário da Lin güística estrutural, da qual encontramos aqui um dos aspectos mais inteligentemente amadurecidos, trata-se de, transcendendo a forma, apelar para a função. Acrescentemos — recordando o que dissemos mais adma 2 ao falar do estruturalismo — que semelhante método lógioAingüístio só deveria ser manejado por pesquisadores experimentados e bem informados acerca dos métodos clássicos da comparação; seria mister, com efeito, que as pesquisas sobre a classificação das línguas não fizessem surgir mais uma vez o mito da linguagem considerada como um ser em si, desligado das contingências humanas; convém manter o contato com o real: a esse preço, o método deve dar frutos. Se bem que se trate de uma disciplina que se A Estilística situa um pouco à margem da Lingüística, de vemos aqui citá-la brevemente, devido ao lugar importante que ela ocupa na história desta ciência (aliás, por diversas vezes, já tivemos ocasião de falar a respeito), tanto pelos impulsos que dela recebeu como pelos ensinamentos que 1.
AetiS du huitiime Congrès International dei Linguist es (Oslo,
1958), pp. 17-35.
2.
202
Pp. 115-117.
lhe traz. Em realidade, o termo se aplica a tipos de pesquisai assaz diferentes. Se deixarmos de lado o estudo tradicional
203
Na verdade, estas duas concepções da Estilística não são inconciliáveis; pode-se, com efeito, estudar como os recurso* expressivos da linguagem são utilizados quando da elaboração de uma obra de arte, 1 e a separação entre fatos da língua e processos dc estilo é algo difícil dc se fazer; digamos antes com Albert Henry que “não existem barreiras entre Lingüística, crítica de textos e estética literária”; 2 é também neste sentido que concluía Terracini, ao término de análises muito atiladas sobre a questão de saber se a Estilística é uma parte da Lin güística geral ou uma forma particular da crítica literária. 9 Gostaríamos por fim de assinalar aquele que A Semântica nos parece ser um dos episódios mais notáveis da atividade lingüística nestes últimos anos, a saber, a renovação da Semântica. 4 Trata-se também do último prolongamento, e não o menos fecundo, da obra saussuriana. Criada por Bréal, a Semântica se desenvolveu como uma ciência histórica cujo objetivo essencial era estudar as evoluções das significações: como as palavras mudam de sentido, como as noções mudam de designação; 5 concebida dessa maneira, ela susdtou numerosos e valiosos trabalhos consagrados a este ou àquele processo de evolução ou a esta ou àquela língua. 6 O coroamento de tais pesquisas de ordem histórica foi a publi cação em 1952 do llandbuh der Semasiólogie de Heinz Kro1. Cí. por ex., St. Ullsiann, Style in the Frenh Novel (Cam bridge, 1957, pp. 1-37; 2.1 ed., Oxford, 1964). 2. Albert Henry, Êtudes de syntaxe expressive. Anien français et français moierne (Bruxelas-Paris, 1960), p. 65. 3. O último livro de Benvenuto Terracini, Analisi stiUstiea. Teoria, i t ona, problemi (Milão, 1966), constitui ao mesmo tempo um bom enfoque, com uma rica bibliografia dos problemas colocados pela Estilística. 4. Limitamo-no*, aqui, a abordar a Semântica no sentido lin güístico estrito; cf. a este respeito, a p. 206 e n. 5. 5. Ver pp. 62-65. — Mas a definição mesma da palavra é outro problema, ainda não resolvido de modo satisfatório; cf. Al. Roseto, Le mot. Esquisse d'une theorie génirale, 2.* ed., Bucareste-Copenhague, 1947 = Lingüístia (Haia, 1965), pp. 11-46. 6. Cf. p. 64, n. 1.
204
nasser; cssc volume dc vasta informação sc insere, com efeito, na tradição clássica, pois cnfoca essencialmente a evolução do sentido; quanto às motivações psicológicas que tentam dar coou dos diferentes processos dc mudança de sentido — pois o autor se declara convencido de que uma separação nítida entre a Psi cologia e a Lingüística seria coisa nociva —, das tio evidente mente de natureza algo subjetiva e em todo caso devem ser consideradas com maior cautela; nio fazem mais, aliás, que trazer à memória o ponto de vista lógico herdado da Retórica antiga por intermédio da Escolástica medieval e dos ensina mentos da gramática geral de espírito cartesiano. Viu-se, por outro lado, como, após as análises propostas no Cours, nasceram as teorias de tipo estruturalista que, apli cadas inicialmente ao estudo dos sons, cedo alargaram seu âmbito para abranger cada vez mais o campo da Morfologia c o das relações sintáticas e se aplicar em definitivo ao conjunto da estrutura lingüística — com exceção, todavia, da Semântica, que permanecerá à parte desses desenvolvimentos. “Esse apar tamento, para retomar as palavras de Ullman, sc explica pela natureza particular dos fatos lexicais. O sistema fonológico e o sistema gramatical de uma língua são compostos de ele mentos pouco numerosos; o vocabulário dispõe, ao contrário, de recursos tão vastos que são virtualmente incontáveis. [... ] A esse contraste quantitativo se acrescentam importantes dife renças de qualidade. Os elementos fônicos e gramaticais são, na maioria dos casos, organizados de modo estrito e se de monstram relativamente estáveis num estado de língua dado. O léxico, cm contraposição, é essencialmente instável: enri quece-se constantemente de palavras novas, ao passo que outras caem em desuso e outras ainda se vêem revestidas de novas significações."1 E essa natureza peculiar dos elementos signifi cativos da linguagem, que os torna aparentemente rebeldes a toda classificação rígida, fez com que certas manifestações extremas, digamos sobretudo doutrinárias, do estruturalismo norte-americano — descobre-se, no caso, a ação de um antimentalismo ainda vivo —, deliberadamente escolheram, a pretexto 1. S. Ullmann , Orientations nouvelUs en simantique em /»*rtal de Psyehologie , t. LV (1938), p. 541.
205
dc exatidão científica, não faze-los intervir em suas pesquisas; tal é o caso principalmente dos manuais de Lingüística estru tural dc Bloch-Trager e dc Harris, dc que falamos antes. 1 Em 1951, St. Ullmann publicou os Priniples of Semantis, cujo mérito essencial é o de aplicar à Semântica os processos da investigação estrutural e de apresentar os fatos apurados num manual redigido com grande clareza. 2 Pois esse novo caminho tinha sido entrevisto e preparado por alguns precursores cujos trabalhos não haviam merecido, na época, a necessária atenção, pelo menos por parte parte dos lingüistas. lingüistas. É que, na verdade, o problema da significação — relação entre os conceitos e as palavras que os designam, portanto entre o significado e o significante 3 — foi abordado no plano da Psicologia, 4 no plano da Filosofia, onde aplica-se a um estudo geral dos signos, e particularmente em Lógica, com o cuidado de criar um instrumento de comunicação que trans cendesse a variedade das línguas naturais; 5 assim o pensador vienense Wittgenstein que, sob a forma de aforismos, preocupara-se com as relações entre o mundo e a linguagem (“os limites de minha linguagem significam os limites de meu pró prio mundo”), havia falado da “incomunicabilidade” “incomunicabilidade” do dis curso 6 e os filósofos ingleses Ogden e Richards haviam intro* 1. P. 119 e n. 1 c 2. — Vcju-se a desconfiança lógica que ma nifesta ainda Martinet com relação à Semântica no* icui Êlements de linguistique générale (cf. aqui, p. 126), pp. 40-41. 2. Stephen Ullmann , The priniples of Semantis, Glasgow-Oxford, 1951, 2.» ed., 1957. 3. Cl. pp. 138-142. 4. Cf. pp. 145-149. 5. Encontrar-se-á uma boa introdução a esses problemas no volume de Tullio de Mauro, Intrduzione Intrduzione alia semantia, Bari, tra duzido em francês por L.-J. Calvet sob o título Une introdution i Q semantique, semantique, Paris, 1969. — Sobre as diversas acepções do termo "iemântica”, cf. Luigi Rosiello, La semantia: semantia: Note terminologihe terminologihe ed epistemologihe no Arhivio glottologio glottologio italiano, italiano, t. XLVII (1962), pp. 32-53. Ludwig Wittgenstein, Trat at logi o- p h Ho so phius, Leip 6. zig, 1921; Philosophise Philosophise he Untersuhungen Untersuhungen (obra póstuma), Oxford, 1953. — Cf. Tullio de M a into, Ludwig Wittgenstein. Wittgenstein. His Plae in tht Development Development of Semantis, Dordrecht, 1967; Gilles-Gaston GraNOBR* Ludwig Wittgenstein, Wittgenstein, Paris, 1969. u s
206
duzido a noção dc um “triângulo semântko” materializando a conexão cntrc a coisa, o pensamento e o símbolo (ou seja, a realidade, o sentido e a palavra). 1 Todavia, a partir de 1905, Adolf Noreen, que havia criado o termo semema (para designar o que será quase o significado de Saussure), propunha que se estabelecesse, ao lado da Se mântica etimológica (isto é, histórica), uma Semintica descri tiva, cuja tarefa seria classificar os diversos tipos de sememas, mas esse trabalho foi pouco conhecido fora da Suécia. 1 Em 1921, L. Roudet, trabalhando sob a influência da Lingüística psicológica, distinguia, nas evoluções dos sentidos, as que afe tam as significações (uma palavra muda de sentido, por ex.: fr. plume) e as que afetam as palavras (uma significaçio passa de uma palavra a outra, ex.: fr. pass)»s dez anos mais tarde, num estudo versando o inglês, G. Stern fazia uma distinçio semelhante entre as “mudanças externas" e as “mudanças lin güísticas" e propunha para as últimas um quadro assaz com plexo de deslocação deslocação de sentido. sentido. 4 Entretanto, o esforço mais lúcido foi o de Jost Trier, que concebeu a idéia de “campo semântico", a qual, estabelecendo ligação entre o plano dos conceitos e o da expressão, aparece como uma espécie de “sprachliche Zwischenwelt" e ajuda a compreender melhor tais relações entre significante e signifi cado, que também preocuparam bastante filósofos como Cas sirer ou Carnap. Trier desenvolveu sua concepção de “campo semântico" a partir de um exemplo característico tomado de empréstimo ao vocabulário alemão;* mostrou como, por volta 1. C. K. Ogdbn e I. A. R ichards ichards , The Meaning of Meaning. A Study of the Influene of language upon Thought and of the Siene of Symbolism, Londres, 1923. nouvelles tendanes de de la linguis2. Cf. Bertil Malm biro, Les nouvelles tique, Paris, 1966, pp. 184-186. 3. L. R oudet oudet, Sur la lassifiation psyhologique des hange ments simantxques cm Journal de Psyhologie, Psyhologie, t. XVII (1921), pp. 676-692. 4. C. S t e r n , Meaning and Change of Meaning. With Speial Referene to the English Language, Gõteborg, 1931, reed. Blooming ton, 1965. 5. Joit Trier , Det deutshe deutshe Wortshati im Sinnbetirk des des Vers tandes , Heidelberg, 1931.
207
dc 1200, as duas palavras Kuns, “arte”, c List, ‘'artifício”, opunham socicdadc cortes e sociedade não-cortês, referindo-se a primeira às qualidades cavaleirescas (como o código de honra no combate, a polidez para com as damas, as “artes libe rais*’), e a segunda aos conhecimentos plebeus (como os ofí cios, a Medicina, a Astronomia), são elas próprias abrangida^ pelo conceito de Wisheit, “sabedoria”, termo geral que se tplica tanto às atitudes morais ou religiosas como às capacidades téc nicas; cem anos mais tarde, Wizzen “o saber”, substituiu List, mas as relações entre os três termos são diferentes: Kunst e Wizzen se opõem quase como se opunham anteriormente Kunst e List, mas com a conotação social a menos, pois estamos no crepúsculo das concepções cavaleirescas e a distinção assina lada tornou-se inútil: Kunst designa agora a “arte** no sentido mais elevado e Wizzen o saber material; quanto a Wisheit não cobre mais essas acepções e ficou reservado ao domínio religioso e espiritual. 1 Descobre-se, no caso, a concepção saussuriana da delimitação recíproca dos valores: toda mudança do valor de um conceito acarreta uma modificação do valor dos conceitos vizinhos e, bem entendido, são em definitivo as palavras que refletem tais modificações do conteúdo dos conceitos. Acres centemos ainda que não se podiam consorciar melhor ou mais harmoniosamente sincronia e diacronia. Esta teoria de Trier — da qual não se poderia dizer o quanto é notável, pelo menos no que tange à sua aplicação ao vocabulário intelectual (negli genciado o lado afetivo, técnico, etc. — era, em suma, antes mesmo que o estruturalismo se houvesse constituído em bases sólidas, uma aplicação de seus métodos à Semântica e uma prefiguração da subversão que esta iria conhecer vinte anos mais tarde. Menos revolucionária, porque se aplica ao vocabulário mais que à estrutura e se limita a relações de ordem semântica, é I noção de ampo assoiativo, que foi desenvolvida por Charles Bally,* a palavra boi, por exemplo, faz pensar: 1.°) era Introdution to the th e 1. Cf. Stephen Ullmann, Semantis, An Introdution (Oxford, 1962), pp. 248-249. Siene of Meaning (Oxford, 2. Varbitraire du signe em Le français moderne moderne, t. VIII (1940),
p. 195.
208
vaca, touro bezerro", etc.; 2.°) em “labor, chama”, etc.; 3.-) evoca as idéias de força, de resistência, de lentidão, etc. (v* ja-sc uma expressão proverbial como “ trabalha como um boi” ou um torneio como “ruminar uma idéia”). Bally nio fazia mais, assim, que explicar, mas restringindo-lhe o alcance, a idéia saussuriana de “constelações” ou “relações associativas": o Cours fazia, com efeito, distinção entre os diversos tipos de associação conforme o elemento comum fosse o radical (ensine men to / ensinar / ensinemos, ...) o sufixo (ensinamento / armamento / res resi ime ment nto, o, . . . ) ou ainda conforme a associação se fundasse na analogia dos significados (ensinamento / instrução / aprendizagem, ...) ou na comunidade de imagens acústi cas (ensinamento / lento, ... ). 1 Inspirando-se em considerações desse tipo é que St. Ullmann, com fazer primeiramente distinção entre as mudan ças devidas ao conservantismo lingüístico (as quais são as “mudanças externas” de Stern) e as devidas à inovação lin güística, verifica que, para as últimas, pode ter ocorrido aeja transferência do nome, seja transferência de sentido, e que tal transferência sc opera ou por similaridade ou por contigüidade; ele constrói, por conseguinte, um esquema que leva em conta todos os tipos possíveis de associações; verifica-se assim que, pelo desvio de tais combinações, o semanticista es trutur alista de hoje estabelece, às vezes, figuras que lembram curiosamente as subdivisões da Retórica antiga. Isso no capítulo consagrado à Semântica histórica, dc vez que os Prinipies oferecem uma parte descritiva e uma parte histórica, pois o autor pertence ao número daqueles que, como H. Frei, se mantêm fiéis à antinomia saussuriana entre sincronia e diacronia. Consideran do como evidente o contraste entre essas duas perspectivas, ele as declara igualmente legítimas e acrescenta: “o que não é legítimo é a combinação dos dois pontos dc vista, a introdução de dados históricos na descrição de uma língua"; cabe citar a fórmula espirituosa de Bally segundo a qual isso daria no mesmo que fazer um retrato com base em fotografias tomadas cm diferentes idades, nele colocando uma boca de bebê, uma II
Coun, pp. 173-174 (2025-2036).
209
Urba de adulto e as rugas de um andão. 1 E se Ullmann entrevê a possibilidade de ediíicar uma Semântica panrônia — este último termo é também de Saussure —, que teria por tarefa determinar o que é comum a todas as línguas e a todas as épocas, tal seria feito, conforme sugestão de Sommerfch, sob a forma binária pansicronia / pandiacronia. 2 Quc a distinção sincronia / diacronia seja útil como pro cesso didático de descrição e exploração dos dados 3 é coisa evidente, mas fazer disso condição rígida do estudo semântico é certamente abusivo. Apressemo-nos a acrescentar que, aliás, o própriu Ullmann atenuou sua posição reconhecendo que, se a distinção defendida por Saussure é sempre válida, a antinomia é uma tese insustentável e, no plano metodológico, ele admite que, se a separação dos dois métodos continua neces sária cm ccrtos casos, sua combinação (mas “combinação" não quer dizer ‘confusão”) é proveitosa em outros. 4 ü que toda estrutura, qualquer que seja o nível ou época em que se pratique o corte na língua, é o resultado de desen volvimentos históricos cujo conhecimento contribui sobrema-
340.
1.
Orientations nouvelles en sémantique (cf. p. 205, n. 1), p.
St. Ullmann, The Priniples of Semantis (cf. p. 206, n. 2), 2. pp. 264-266. 3. Observar-se-á igualmente a pertinência da observação de J. Vendryes que, ao lado da etimologia clássica, que é essencialmente diarrônira (fazer a etimologia de uma palavra é descrever-lhe a his tória pesquisando-lhe as formas antigas e remontando tão longe quanto o permitam os documentos), ao lado também da etimologia popular que explica as modificações sobre vindas a esta ou aquela palavra pela atração de palavras semelhantes, julga existir lugar para uma etimolo gia estátua, que apelaria, no tocante ao agrupamento das palavras,
para o seu valor evocativo, assim como para outros indices, tais como o grau de freqüência, o nivel social, técnico, intelectual, etc.: Pour une itymologie statique em Bulletin de la Soiété de Linguistique de Paris, t XLIX (1953), pp. 1-19. Pierre Chantraink retomou recen temente esse problema; Êtimologie historique et étymologie statique em Bulletin de la lasse des Lettres et des Sienes Morales et Politiques de VAadêmie Royale de Belgique, t. LVI (1970), pp. 80-95. 4. Préis de sémantique française, 2.* ed. (Berna, 1959), p. 41; Synhronie et diahronie en sémantique em Ates du X 9 Contris International de Linguistique et Philologie Romanes (Estrasburgo, 1962), Paris, 1965, pp. 55-69. 210
ncira para elucidar-lhe a configuração atual; por outro l*do, « menos que se volte a incidir nos erros “atoenistas” dot neogramáticos, a história das significações não pode ler feita por via dc palavras isoladas; cumpre, ao contrário, ver como evolui a própria estrutura (o “campo semântico") em que elas es tio integradas. Consideremos o exemplo clássico: o latim oxêt “anca”, torna-se em francês uisse [e em português oxa]; classificar esta evolução entre os "deslizamentos de sentido", como o faz Kronasser, 1 (assim também bua, “face”, que se toma em francês bouebe [ou boa em português] é uma ve rificação que não dá conta do processo; cumpre, na realidade — Wartburg desenredou muito bem este caso complicado 2 e o próprio Ullmann o retomou num estudo que modifica impli citamente sua posição anterior quanto a esse ponto 1 — subs tituir a palavra no grupo de que faz parte, e então se perceberá que a renovação de termos se aplica is três denominações de anca, coxa e perna, sendo que cada uma dessas mutações só é explicável por referência is mutações vizinhas; portanto, a mu dança não atinge somente oxa, mas todo o campo semântico de que faz parte, e a evolução oxa > uisse não se explica, por uma simples associação de contigüidade, como uma me tonímia e sim graças ao estudo de todo o sistema lexical a que pertence. Haverá necessidade de sublinhar que, em casos si milares, essa interpenetração dos elementos do sistema já havia sido indicada por Gilliéron, de quem se pode dizer que fazia assim estruturalismo por antecipação? O número e o valor dos trabalhos consagrados de uns dez anos para cá i Semântica mostram o quanto se justificava o recurso aos métodos estru tu ralis tas para tornar a dar vida a essa parte de nossa disciplina; semelhante tomada de consciência ocorria no momento adequado e o problema foi abordado sob diferentes aspectos. 1. Handbueh der Semasiologie, p. 85. 2. W. von Wartburo, Problimes et mJtodes de U Snguutíqma (Paris, 1946), p. 106, 2* ed. (Paris, 1969), pp. 175-176. 3. Historial Semantis and the Struture of the VoeMary em Miselânea Homenaje a André Martinet, t. I (La Lipini, 1957), PP* 289-303.
211
É particularmente significativo que tenha sido o próprio L. Hjelmslev quem, no Congresso de Oslo de 1957, 1 redigiu o informe sobre a questão “Em que medida as significações das palavras podem ser consideradas como constituindo uma estrutura?”; ao definir o programa de uma Semântica estrutural, dizia ele: “introduzir a noção de estrutura no estudo dos fatos semânticos é neles introduzir a noção de valor a par da de signifiaçãoe, por meio de alguns exemplos, mostrava como as noções de comutação e substituição, familiares ao raciocínio dos glossematistas, podiam intervir na análise semântica. 1 É precisamente colocando-se no plano do conteúdo, • no sentido hjelmsleviano3 que Coseriu tentou criar os princípios de uma Semântica diacrônica estrutural, que se aplica ao mesmo tempo à forma e à substância do conteúdo. P. Guiraud, por sua vez, deu excelentes exemplos do que pode trazer para a explicação de termos considerados obscuros um método que substitua a palavra no sistema de que faz parte, no conjunto das formas e dos sentidos que constimem o que ele chama seu ampo morfosemântio.5 Justifica-se igual1.
Ê de se notar — sinal do pouco interesse manifestado du rante longo tempo pelos linguistas por esta disciplina — que o» Con gressos de Lingüística, desde o primeiro (Haia,^ 1928) até o sexto (Paria, 1948), não deram lugar algum à Semântica. O Congresso de Londres (1952), que precedeu o de Oslo, tinha assinalado a virada: uma das sessões plenárias era consagrada ao problema da significaç&o: Proeedings of the Seventh International Congress of Linguists (Lon dres, 1956), pp. 3-17 e 179-233. 2. Ates du huitiime Congres International des Linguistes (Oslo, 1958), pp. 636-654 (republicado em L. Hjelmslev, Essais Linguist* ques, Copenhague, 1959. pp. 96-112, com o título de Pour une simantique struturale ). 3. Cf. p. 114. 4. Eugenio Coseriu, Pour une simantique diahronique strue turale em Travaux de linguistique et de littérature publiés par le entre d philologie et de littjratures romanes de VlJniversité de Strasbourg, t. II, 1 (Estrasburgo, 1964), pp. 139-186. 5. Pierre Guiraud. Les hamps morphosdmantiques (Critères externes et ritères internes en étymologie) em Bulletin de la SoUtè de Linguistique de Paris, t. LII (1956}, pp. 265-288; cf. também ibid., i. XVII (1962), p. 103, n. 1. — Em seu pequeno volume La sémantique (Paris, 1955, 4.* ed., 1964), o mesmo autor expôs com clareza, sob uma forma talvez, por vezes, demasiado esquematizada, os dife-
212
mente fazer na Semântica uma distinção entre a Semasiology propriamente dita, que parte da forma para as significações (graças ao processo da polissemia) e a Onomasiologia, que parte do conceito para as designações (trata-se, nesse caio, de sinonímia), de onde o interesse por estabelecer para cada língua dois tipos de dicionários, um formal ou fonológico (praticamente, tratar-se-á de uma lista alfabética) e outro ideo lógico;1 aqui também o estudo dos ampos oneituais se íarl com mais proveito se abordado do duplo ponto de vista estru tural c histórico. 3 Quanto à Lexicologia de G. Matoré 3 — que, embora re cente, já provocou o surgimento de alguns trabalhos notáveis acerca do vocabulário francês —, ela se situa na Unha da escola sociológica francesa, pois seu autor a define como "uma disci plina sociológica que utiliza o material lingüístico que são as palavras*’; sua originalidade, porém, consiste em abordar o problema aproveitando os recursos do método estrutural e em estudar as palavras enquanto partes de um conjunto: é a pesrentes aspectos dessa ciência. Também ac encontra uma boa documen tação na brochura de Kurt Baldinger , Die Semaiiologie (Berlim, 1957), c uma introdução geral aos problemas da Semântica no volume Se manties .. An Introdution to the Siene o\ Meaning (Oxford, 1962) no qual St. Ullmann fez o balanço da pesquisa. 1. Cf. K. Baldinoer, Simasiologie et onomasiologi em Revue de Linguistique romane , t. XXVIII (1964), pp 249-272. 2. Ver, p. ex. Otto Duchácsk, Êludt omparative d*un ehamp eoneptuel em Êtudes romanes de Brno , t. 1 (1965), pp. 107-169. Cf. St. Ullmann, Ou en sont les ktudes de sémantique historique em Li réel dans la littérature et dans la langue (=* Ates du X * Congris de la Fédération Internationale des Langues et Litténtures Modemet, Estrasburgo, 1966), Paris, 1967, pp. 105-122. 3. La mithode en lexiologie. Domaine français , Paris, 1953. — Matoré considera que a Lcxicologia. disciplina lociológica, "enfoca os grupos de palavras consideradas estatisticamente do ponto de vista nocional" e se opõe dessa maneira à Semântica que, "estudando os valores sucessivos das palavras, consideradas individualmente, ê uma disciplina que pertence à Lingüística histórica”; posição aasax com preensível na época (1953) em que Matoré publicava seu trabalho, mas que está ultrapassada; nada nos impede de falar de Semântica estru tural, «o lado de Semântica história, e é deveras assim, pois retomamos, de tal modo, ao valor geral da definição primeira propocta por Bréal: "ciência das significações".
21 )
quisa de palavrastestemunhos e palavrashaves característica* de uma determinada sociedade (assim, em francês, magasin que, por volta dc 1820-1825, tende a substituir boutique; bourgeois que é mister, para os anos da década de 1830, estu’ dar em relação a seus corolários prolêtaire c artiste, etc.). Tal estudo dos ampos noionais está próximo, em suma, das preo cupações de Trier, e Guiraud caracterizou muito bem. os dois
pesquisadores, um em relação ao outro: “O Sr. Trier estuda, antes de tudo, a vida espiritual e moral com vistas a reconsti tuir o espírito de uma nação e de uma época, ao passo que o Sr. Matoré se interessa principalmente pelo substrato material,! econômico, técnico, político do léxico”.1 Quanto a Luis J. Prieto, é como prolongamento da Fonologia que ele, sob o nome de Noologia, tomando como ponto de partida não as palavras mas os enunciados (que, constituindo as entidades de base da linguagem, são mais facilmente defi níveis ), propôs uma teoria funcional do significado, isto é, uma teoria “que parte do fato concreto, que é o sentido, e o estuda do ponto de vista da contribuição da fonia para seu estabelecimento**: trata-se, portanto, de estudar as duas faces do signo (significante e significado) uma em relação | outra* Vimos também o Estruturalismo penetrar as pesquisas sobre a forma do conteúdo tentando edificar, em face de estudos que visam a ser exaustivos e são por isso cada vez mais mo numentais, modelos de análise lexicológica, tais como os de Greimas3 que, à imagem dos sistemas fonológicos, tentam — mas não sem sacrificar a um esquematismo um tanto simplista — classificar os semas cm sistemas de oposições. Notemos ainda o esforço feito por Weinreich — embora tenha ficado em estado de esboço tcórico, cm virtude da morte prematura do autor — para fazer a ligação entre a significação e a sintaxe e integrar em suma a Semântica à Gramática gerativa.4 1. 2.
P. Guiraud, La sémantique, p. 81. Lui* J. Prieto, prínipes de noologie, Haia, 1964. 3. A. J. Greimas, Sémantique struturale. Reherhe de râf| thode, Pari», 1966. 4. Uriel WrinReich, Explorations in Semanti Theory m Th. 395*77*°*' *** Trgnds in Linguistis, t. Ill (Haia, 1966), PP*
214
Perguntemos, por fim, o que podem trazer à Semântica os métodos estatísticos. A constituição de listas de palavras e os cálculos de freqüência têm sido largamente usados pelos filósofos e linguistas, sobretudo para a exegese de obras lite rárias, e isso desde a Antiguidade (basta pensar nos yXQaai dos gramáticos alexandrinos); todavia, foi só em data recente que tais métodos foram aplicados sistematicamente is línguas, notadamente após os trabalhos de G. K. Zipf, cujo interesse lembramos acima.1 Por certo, o rigor das fórmulas propostas (como a que indica a relação cntxc polissemia c freqüência de emprego: "os diversos sentidos de uma palavra tendem a ser proporcionais à raiz quadrada de sua frequência relativa”) nio deixa às vezes de inquietar o lingüista, sobretudo quando ele não tem uma formação técnica bastante ampla para seguir e controlar os raciocínios dos estatísticos; assim, devemos o que sabemos àqueles dentre nossos colegas que, tendo feito o esfor ço de se iniciar nos arcanos da Estatística, empenham-se em extrair dela os ensinamentos numa linguagem inteligível a todo lingüista de boa vonude, como Muller, cujo volume de inicia ção à Estatística lingüística e léxica já foi por nós assinalado, 1 como Guiraud, que se interessou muito pela estatística do voca bulário, assim como pela teoria da informação, cuja ambição seria fornecer um método geral aplicável tanto à Semântica quanto à Fonologia e è Morfologia* Mas não será aventuroso aplicar ao estudo do valor significativo das palavras um método lógico que está essencialmente ligado aos caracteres formais dos elementos da linguagem? As reservas que formulamos mais acima,4 a propósito do recurso à teoria da comunicação para dar conta da relaçlo entre a língua e a fala, são aplicáveis aqui e com maior razão ainda.
1. Cf. p. 123. — Ver também Pierre Guulaud, Langage et thiorie de la ommuniation em Lê Langage (MLa Pléiade", Paris, 1968), pp. 152-160. 2. P. 123, n. 3. .rá 3. Pierre Guiraud, Problèmes et mithodes dê la stalistiqui lin guistique, Dordrecht, 1959; Strutures itymologlques du lexique fran . %uis. Paris, 1967 (notadamente nas pp. 181-186). 4. P. 142.
213
CONCLUS O
O exame, de acordo com um esquema sensivelmente cro nológico , das etapas que assinalaram o curso da ciência lingüís tica desde os primórdios do século passado, faz-nos assistir a um enriquecimento constante dos dados e à elaboração de um método científico que responde aos critérios mais rigorosos. Mas, ao longo dessa marcha aparentemente retilínea e harmo niosa, quantos acidentes, quantos choques! Edificada sobre uma ilusão romântica: remontar às origens da Humanidade, a Lingüística ia, nos meados do século XIX, ser assimilada às ciências da Natureza, sendo o seu objeto tratado como um organismo vivo. A seguir, veio o mito da linguagem conside rada como um bem social supra-individual, localizado na cons ciência coletiva de uma comunidade lingüística. Depois, no segundo quarto de nosso século, posições estruturais demasia do categóricas fizeram da língua, sistema de formas desligado de contingências, uma entidade supra-humana, metalingüística. Ainda recentemente, manifestou-se a esperança dc ver nossa ciência reintegrar-se, graças ao uso de um método lógico-ma te mático, no seio das ciências exatas. Ilusões sucedendo-se de geração a geração, mas que nem por isso deixaram de ser os motores poderosos de uma pesquisa cada vez mais arrojada, cada vez mais rica de resultados. Postos de parte tais exageros doutrinários, que são como que manifestações extremas de uma ciência em pleno cresci mento e permanentemente em estado de alerta, a Lingüística, em um século e meio, assumiu uma aparência inteiramente nova; enquanto, no século passado, o lingüista se via colocado diante de uma poeira de fatos, hoje se encontra diante de uma estru tura, pois cumpre dizê-lo de novo, estrutura é a idéia-força da Lingüística atual. Ontem, a Lingüística era obra de erudição; hoje, tornou-se uma ciência. 219
Essa clara oposição entre duas maneiras dc encarar o estu do da linguagem constitui a própria justificação do plano que adotamos em nosso livro. De um lado (Primeira Parte), o sé culo XIX como a tomada de consciência das realidades lingüís ticas, a classificação e a ordenação de uma massa inumerável de fatos, a formação de um método científico sólido; dc outro lado (Tereira Parte), nossa época, caracterizada pelo empenho lan cinante de integrar na estrutura os dados divergentes fornecidos pela observação; entre as duas (Segunda Parte), formando a charneira e dispensando o clarão que permitirá a renovação: Ferdinand de Saussure.
E as perspectivas do futuro? Para uma ciência assim tão jovem e dinâmica, são fecundas, sem dúvida alguma; podem-se esperar novas aquisições, que poderão nutrir a reflexão {tais como a decifração de documentos antigos ou a notação de falares ainda desconhecidos); deve-se sobretudo entrever uma renova ção dos métodos de análise, de classificação, de comparação; basta pensar, para citar este único exemplo, no quanto resta a fazer no domínio da tipologia. As ciências humanas são ciências de interpretação, e múl tiplas interpretações são sempre possíveis: é isso que torna tão forte, para o pesquisador, a tentação de se apegar aos métodos das ciência naturais, até à certcza matemática. Ciência humana, a Lingüística deve furtar-se a tal recurso ilusório; a renovação constante das teses e a incerteza das conclusões nada têm que nos deva espantar: pois o humano não é um campo extrema mente movediço e sempre por ser descoberto?
220
INDEX NOMINUM A Abaev, V. I. 186 Adelung, J. C. 24 Adrados, F. R. 180 n. 4 Akhmanova, Olga S. 186 Alarcos Llorach, E. 107 n. 3, 113 n. 2, 147 ií. 4 Alonso, A. 168 n. 2 Alvar, M. 66 n. 2 Anaxágoras 108
Apostel, L. 114 n. 6, 142 Axens, H. 12 Arisióielês 1920, 27, 80 n. 2, 109,
121
Amauld, A. 27 Aron, R. 108 n. 2 Aicoli, G. J. 66 Aubignac 26 n. 1
B Bes, G. 103 n. 1 Bloch, B. 119, 182, 206 Bachelard, G. 136 Bloch, J. 54 n. 1 Bahner, "W. 66 n. 2 Bloomfield, L. 127, 148, 157, 182 Balclinger, K. 212 n. 5, 213 n. 1 Ball y, C. 78, 94, 95 n. 1, 96, 138 Boas, F. 181, 198 Bolelli, T. 12, 172, 173 n. 3. 140, 203, 208-209 Barthes, R. 130 n. 4 Boltanski, J.-E. 183 n. 1 Bartoli,* M. 64 n. 1, 74 n. 1, 166Bonfante, G. 167 n. 1, 176. 193 n. 3 -168, 175-176 Basilius, H. 158 n. 3 Bopp, F. 3236, 37, 47, 49, 58, Bastide, R. 108 n. 1 62, 180 Baudouin de Courtenay 99, 103 Bréal, M. 58, 6264, 204, 213 n. 3 Bredsdorff, J. H. 34 Belardi, W. 173 Brindai. V., 109410, 112 Belid, A. J84 n. 1 Brown, R. L. 50 n. I Benveniste, E. 77 n. 1, 79 n. 2, Brugmann, K. 54, 57, 59, 64, 67, 108 n. 1, 127, 131, 134 n. 1, 161, 179 136 n. 3, 138139, 144, 145 n. Brunoc, F. 146, 154 n. 1 1, 148, 156 n. 3, 180, 182 n. 1, BQhler, K. 146 192, 196, 197 n. 2, 198, 199 Busnel, R. G. 136 n. 1, 201 Buyssens, E. 47 n. 3, 97 n. I, Bertoldi, V. 176 109 n. 2, 122 n. 1, 126. 130. Bcrtoni, G. 166167, 173 n. 1 138 n. 3, 148, 153 n. 3 Bach, E. 120 n. 3
c Calcpino, A. 23
Calvei, L.-J. 206 n. 5 Cantineau, J. 99 n. 1, 106 n. 1, 119 n. 3, 191 n. 3 Carme, C. 157 n. 5 Carnap, R. 130, 207 Carroll, J. B. 116 n. 2, 157 n. 5 Cassirer, E. 158, 207
Chadwick, J. 179 n. 1 ChaiX'Ruy, J. 161 n. I Chontraine, P_ 64 n. 1, 210 n. 3 Chaumjan, S. K. 186
Chomsky, N. 120122 , 186 Chtcherba 99 n. 2 Coeurdoux, G.-L. 31 Cohen, M. 149 n. 2, 155, 187, 189 Condillac, E. de 27 Cordemoy, G. de 27 n. 2 Cose riu, E. 79 n. 3, 80 n. 2, 126 n. 1, 141, 143, 212 Crocc, B. 161164 , 166, 167, 168, 171, 173, 198 n. 3, 203 Cuny, A. 54 n. 1, 190 n. 1 Cuvier, G. 122
D Dalcq, A. 134 n. 1 Dairigna Rodrigues, A. 125 n. 2 Dante 22, 172 Darmesteter, A. 64 n. 1 Darwin, C. 37, 70 Dauzat, A. 52 n. 1, 66 n. 2 De Groot, A. W. 118 Delacroix, H. 136 n. 4, 146, 183 Delbrück, B. 54, 64 De Mauro, T. 96 n. 1, 99 n. 3, 173, 206 n. 5 e 6 Derossi, G. 138 n. 3, 173 n. 3 Descartes, R. 27, 73, 180, 205 De Stefano, A. 47 n. 1 Devoto, G. 166 n. 2, 169, 171,
Ege, N. 138 n. 3, 139 Engeli, J. 70 n. 1 Engler, R. 78 n. 1, 95 138 n. 3, 140 n. 1
172, 173, 176, 190 n. 3 Dicz, F. 54 Dinneen, F. P. 11 n. 4 Dionísio da Trácia 20, 21 Donzé, R. 27 n. 1 Doroszewski, W. 154 n. 2 Drõschcr, V. B. 136 n. 1
Dubois, J. 121 n. 2 Dubrix. D. 136 n. 6 DucháÒek, O. 213 n. 2 Duhamel, G. 52 Dumézil, G. 46 n. 1, 155 Dupréel, E. 73 n. 1, 151 n. 1 Durkheim, D. 79 n. 3, 108 n. 2, 127 n. 3, 152 n. 1, 153, 154
Emout, A. 54 n. 1, 64 n. 1 Escalígero, J. J. 24 n. 1, 96, 8 ’ J J Ejper, E. A. 157 n. 2
F Fant, G. Ill n. 1 Finck, F. N. 193195 Firth, J. R. 120, 158-159 Fishman, J. A. 12 n. 2
222
Fort una tov, F. F, 184 Francescato, G. 13 n. 3, 48 n. 1 François, F. 157 n. 1 Frederico II 47
Frei, H. 83 n. 6, 87 n. 2, 95, Fries, C. C. 157 n. 2 97 n. 1 c 3, 98 n. 2, 126, 138 Frisch, K. von 134 n. 3, 145, 209
G Gabelentz, G. von der 79 *»• 3 Gardiner, A. H. 138 n. 3, 158 n. 4 Gauthiot, R. '45 n. 1, 54 n. 1 Gazio, J. 157 n. 1 Gentile, G. 166 Geoííroy-Saint-Hilaire, E. 122 Gesner, C. 23 Gilliéron, J. 64 n. 1, 6667, 168, 211
Ginneken, J. van 146 Glinz, H. 158 Gobineau, J. de 50 Godel, R. 87 n. 1, 89 n. 1, 95, 96 n. 2, 140 n. 1 e 2 Gourou, P. 156 n. 3
Grammont, M. 61, 98 n. 1 Granger, G.-G. 206 n. 6 Graur, A. 11 n. 4 Gray, L. H. 47 n. 2, 182 n. 2 Greenberg, J. H. 123, 148 n. 4, 201 n. 3 Grégoire, A. 61, 147 Greimas, A. J. 214 Grimm, J. 33, 49, 54, 55 Gudschinsky, S. C. 125 n. 2 Güntert, H. 195 n. 3 Guillaume, G. //2, 115, 118 Guillemin, S. M. 198 n. 2, 199 n. 1
Guiraud, P. 123 n. 3, 152 n. 2, 203 I 1, 212, 214, 215
H Herder, J. G. 50 n. 1 Heródoto 18, 46 Hjelmslev, L. 113117 , 126, 141,
Hall, R. A. 44 n. 5, 182 Halle, M. Ill n. 1 e 2 Halbday, M. A. K. 159 Hamp, E. P. 116 n. 2 Harris, Z. S. 118119 , 182, 206 Haudricourt, A. G. 42 n. 2 Haugen, E. 116 n. 2, 119 n. 4, 147 n. 5 c 6 Hecaen, H. 147 n. 7 Hegel, G. 41, 57 Heihnann, L. 173 Heinimann, S. 35 n. 2 Henry, A. 204 Herdan, G. 125 n. 1
212
Hockett, C. F. 120 n. 4, 122 n. 3 Hoijier, H. 156 n. 2 Hrozny, B. 69 Hudson, R. A. 122 n. 3 Hübschmann, H. 33 Hugo, V. 37, 171 Humboldt, W. von 49*53, 146, 157-158, 193 Hymes, D. 12 n. 2
I Iordan, I. 66 n. 2 Isidoro de Sevilha 24
IviC, M. 11, 99 n. 2, 184 n. 1
22?
j*kobK>n, R. 97, 98 n. 1, 106, //0-///, 136 n. 6, 147, 182, 190 n. 3, 193 n. 2 James IV 47 Janssens, E. 122 n. 2
Jerônimo (São) 24 Jespersen, O. 70-71, 146-147, 174 Jones, D. 159 Jones, W. 31 Jubainville, d’Arbois de 97
K Kainz, F. 146 Karcevskij, S. 97 KopaJ, V. 117 n. 1 Kroeber, A. L. 127 n. 4
Kronasser, H. 204-205, 211 K\;uszewski, M. 99 n. 2 Kukenheim, L. 7, 67 n. 1 Kurylowitz 180
Lameere, J. 163 n. 1 Langdon, M. 13 n. 3 Langendocn, D. T. 159 n. 1 e 4 Lee, D. W. 44 n. 2 Lees, R. B. 125 n. 3 Leibniz, G. 25 Leopold, W. F. 147 n. 5 Lcpschy, G. C. 123 n. 3, 127 n. 6, 159 n. 3, 173, 187 n. 1 Lerch, E. 138 n. 3, 165 Leroi-Gourhan, A. 156 n. 3 e 6
Leroy, M. 102 n. 2, 104 n. 2, 190 n. 3 Lévi-Strauss, C. 127 n. 6, 156 n. 3 Lewy, E. 195 L'Hennitte, R. 187 n. 1 Liebrucks, B. 146 n. 3 Lineu, C. dc 36, 40 Llorcnte Maldonado de Guevara, A. 11 n. 4 Lohmann, J. 194, 195 n. 1 Lorenz, K. 135 n. 2 Lutero, M. 172
M Malinowski, B. 159 Malkiel, Y. 13 n. 3 Malmberg, B. 7, 11, 99 n. 3, 106 n. 3, 109 n. 4, 111 n. 4, 113 n. 2, 117 n. 1, 156, 181, 188 n. 1, 192 n. 1, 207 n. 2 Martczak, W. 121 n. 4 Mandelbrot, B. 114 n. 6, 124 Mandin, D. 132 n. 2 Marouzeau, J. 203 Marr, N. 184-185, 186 Martinet, A. 98 n. 2, 102 n. 3, 103 n. 1 e 2, 105 n. 2, 106 n. 2,
224
107 , 111, 122 n. 1, 123 n. 3, 725-/27, 128 n. 2, 129 n. 2, 131, 136, 137 n. 1, 138 n. 3, 160 n. 2, 206 n. 1 Marty, A. 99 n. 3 Maspero, H. 42 n. 2 Matoré, G. 213-214 Mayrhofer, M. 160 n. 3 Me Intosh, A. 159 n. 2 Mechtchaninov, I. I. 186 Meet hem, A. R. 122 n. 3 Megiser, J. 23 Meillet, A. 35, 55, 56, 5960, 64,
69, 74, 77-78, 108 n. I, 112, 150 n. 3, 153, 154, 155, 164, 175, 178, 189, 190 n. 2, 191 Mcncndez Picíal, R. 158
Miller, R. L. 158 n. 3 Mõller, H. 190 n. I Mohrmann, C. 8 n. I Morf, A. 114 n. 6 Mounin, G. 11, 124 n. 2, 130 4, J58 n. 1 Muller, .R 194 n. 2 Muller, F. Max 42, 46, 155 Muller, C. 123 n. 3, 215
Meringer, R. 67 n. 1 Meunier, D. 136 n. 1 Mikloshich, F. 54
Milui, p. no
Miller, G. A. 142 n. 1
N Nacrt, P. 138 n. 3 Nencioni, G. 169, 173
Noreen, A. 99, 207 Nytop, K. 64 n. I
o Oetiingcr, A. G. 124 n. 4 Orr, J. 66 n. 2, 117 n. 3 Ogden, C. K. 206, 207 n. 1 r F Uft n 4 Olsen, M. 115 n. 2 °*good' C' E' 148 n' 4 Ombredane, A. 104 n. 1, 147 n. 7 Osthoff, H. 54
p Pagliaro, A. 148 n. 3, 163 n. 1, 173 Palmer, F. R. 159 n. 1 Palmer, L. R. 140 n. 3 panini 18 Paris, G. 63 Paisy. P. 105 n. 2 Paul, H. 60, 62-64 Paulino de São Bartolomeu 32 Paulus; J. 147 Pedersen, H. 34 n. 1, 115 Penchoen, T. 125 n. 3 Perrot, J. 48 n. 2 Peterfalvi, J.-M. 148 n. 4
Petrovici, E. 190 n. 3 Piaget, J. 127 n. 6, 129 n. 1 Pike, K. L. 99 n. 4, 119 Pisani, V. 13 n. 3, 68 n. 1, 176, 190 n. 3 Platao 19, 25, 35 Plaih, W. 122 n. 2 Pohl, J. 130 n. 4 Pôrfel, G. 23, 24, 25 Pbtt, F. 34 Pottier, B. 157 n. 4, 201 n. 3 Prieto, L. J. 131, 214 Psamético 46-47
R R«k, R. 33-34, 55 Redard, G. 93 n. I, 135 n. 1, 150
Regula, M. 13 n. 3 Renan, E. 48-49, 156 Reul, P. de 153 n. 3
225
Roscai, A. 204 n. 5 Rosiello, I,. 173, 206 n. 3 Roudet, L. 207 Roulct, E. 119 n. 6 Rousseau, J.-J. 150 Roussclot, P. 61, 66, 187 Ruijgh, G. J. 180 n. 4 Ruwet, N. 111 n. 2, 120 n. 5
RcvcM, C. 47 n. 3 Revzin, I. I. 186 Rkhards, I. A. 206, 207 n. I Riedinger, A. 78 Rivière, G. H. 156 n. 3 Robins. R. H. U, 82 n. 3, 159 n. 2 Rochcr, L. 32 n. 1, 35 n. 1 Rochcr, R. 32 n. 2
s Sapir, E. 119, 157, 182, 183, 198« Sassetti, F. 31 Saussure, F. de 56*58, 74, 7789, 93-96, 98 n. 1, 108 n. 1, 109, 111 n. 4, 114, 117, 127, 130, 131 132, 136, 138-146, 152, 154, 164. 172-174. 180, 184, 201, 207, 210, 212’ n. 5, 220 Schafí, A. 187 Scherer, A. 195 Schlegel, F. 32, 40 Schlcgel, G. 39, 193 Schleicher, A. 36-46, 54, 56, 65-66, 67, 70, 124, 176, 190 n. 1, 193 Schinidt, J. 39, 65, 67
Schuchardt, H. 63, 65, 66, 67 n. 1, 81 n. 1, 166, 190, 203 Schwyxer, E. 190 n. 3 Sebeok, T. 12, 122 n. 3, 123 n. 4, 214 n. 4 Sechehaye, A. 78, 94-96, 138 n. 3, 140, 143-144 Siertsema, B. 113 n. 2 Sommerfelt, A. 8 n. I, 159, 210 Soulé-Susbielles, N. 183 n. 1 Spang-Hansscn, H. 113 n. 2 Spencer, H. 70 Spitzer, L. 81 n. I, 165, 203 Stâlin, J. 185-186 Stem, G. 207, 209 Screvens, P. 159 n. 2 Sturtevan, E. 179 Swadesh, M. 125, 197 n. I
Tagliavini, C. 11 n. 4 Taine, H. 50 Terracini, B. 4 76, 204 Tesnière, L. 118 Thomas, A. 63 Thomas, L. L. 185 n. 1 Titone, R. 148 n. 4 Togeby, K. 113 n. 2
Tovar, A. 156 n. 1 Trager, G. L. 116 n. 2, 119, 206 Trier, J. 158, 207208, 214 Trombctti, A. 184 Trubetzkoy, N. S. 97, 98 n. 2, 99, 100 n. 1, 101-103, 104 n. 2, 106 n. I, 108, 111, 190 n. 1 192, 193 n. 1
-201
.
Ujd.ll, H. J. 113 n. 2
u
Ullmann, S. 13 n. 3, 81 n. 2 82 21¾ n 0
n. I, 109 n. 3, 1*3 | 2, 144,
m
204 n. I, 205-206, 208 n. 1, 211,
V Vachek, J. 97 n. 6, 108 n. I Vaillant, A. 36 n. 1 Valin, R. 112 Vallini, C. 58 n. 1 Van Rijnbcrg, G. 132 n. 2 Varrão 21 Vatcr, J. S. 24 Vaugelas, C. de 27 Vendryes, J. 44 n. 4, 73 n. 2, 74,
97 n. 2, 105 n. I, 117, 149 n. 2, 150, 153 n. 2, 155, 170, 178 n_ 2. 210 n. 3 Ventris, M. 179 n. 1 Vemer, K, 55, 56 Vico, G. 2526, 162-163 Vinogradov. V. V. 186 Voltaire 163 n. 2, 171 Vossler, K. /64-166, 167, 203
w Wald, L. 11 n. 4 Waldc, A. 175
Wartburg, W. von 143, 173, 211 Waterman, J. T. 11 n. 4 Weinrcich, U. 147 n. 6, 214 Weisgerber, L. 141 n. 3, 158 Wertheimer, J. 77
Zeuts, J. K. 54
Whatxnough, J. 8 n. 1, 124 Whitney, W. D. 53, 79 a. 3 Whorf, B. L. 157, 158 n. 1 Wittgenstein, L. 206 Wolf, F.-A. 26 n. 1 Wundt, W. 146
ZipC, G. K. 123, 215
—
INDEX RERUM
A Abertura 101-102 Abkhaz (ou abaza) 101 Acento 188 Acentuai, alternância 199 Adi trato v. Empréstimo Afasia 148 Afetivo 94. 110 n. 1, 203, 208; v. também Expressivo Afinidade 81 n. 1, 166 n. !, 190 Afixantes, línguas 194 Afixo 40, 194, 199 Africanas, línguas 25, 189, 192, 201 n. 3 Aglutinantes, línguas 39-45, 193; técnica 199-200 Albanês 68, 195 Alexandrinos, gramáticos 20, 215 Algonquino 199 Alemão, empréstimos 66 n. 1; exemplos 71, 80-82, 102 n. 3, 104, 207-208; médio-alto 172; lugar na gramática comparada 33; estrutura 44, 51-52, 104. 195, 197 n. 1; unificação 172; antigo alto 55 Alternância 104, 199; acentuai 199; grau zero/grau pleno 57, 105; fônica 199; sonântica 57; de sonoridade 101, 105; tônica 199; vocálica 43; 57-58, 86, 101, 104; consonântica 57 Altemante, técnica 199 Américanos, lingüistas 53, 118-128, 157-158, 181-183, 191-192, 198-201, 206, 214-215
Ameríndias, línguas 23, 25, 50, 119. 125, 147 n. 6, 157-158, 181, 189-201 Análise diacxônica 144 Analíticas, línguas 51-52, 199-200 Analogistas 20 Anglo-saxão 86 Animal, linguagem 47, 131, 133-136 A noma listas 20 Antigos e modernos, querela dos 70 Antropologia e Lingüística 127 n. 6
Aplicada, Lingüística 116 n. 2, 123, 186 Aprendizagem da linguagem 47-48, 50-51, 61, 71, 147, 152 Anbe 33. 73, 194 Arbitrariedade 98 n. 2; do signo 19, 25, 53, 79 n. 3, 80*2, 131, 133, 138-140, 172 Arcaica, língua concebida como 56, 179 Arcaísmo 177-179 ^rea 66; teoria das 178-179 Ariano 38; v. também lndo-iraniano Ario-greco-ítak>-célttco 38 Armênio 21, 33, 68, 178 Arquifonema 102 n. 3 Ártica, to na 195 Artigo 112 , Arvore genealógica, teona da 65, 67 Associação auditiva 47
A&aociativo, taiupo, 208; relações 208; solidariedade 83 Aspecto verbal 21 Ático 72 Atlântica, zona 193
Atlas lingüístico 66-67 Atualizadores 94 Audiovisuais, técnicas 188 Austrais, linguas 184 n. 3 Avésiico 33, 67, 73
B Babel, torre de 21-22 Balcânica, zona 195 Balto 33, 38, 68 Balto-eslavo 38, 68 Banto 45 n. 1, 194 Bárbaras, linguas 18-21 Basco 50, 195 Base, conceito de 198-199
Behaviorism v. Mecanismo Bilingüismo 147 Binária, oposição 98, 110-111 Binaridade funcional 1lQ-frll Boreais, línguas 184 n. 3 Bretão 72-73 Britônico 176
c Cadeia da linguagem 83, 132 Camito-semitico 189 Campo associativo 208; conceituai 213; morfo-semântico 212; nocional 214; semântico 207, 211 Caráter, synthesis traduzida por 199 n. 1 Categorias gramaticais 20, 110, 159, 197; teoria das 194-195 Caucasiano 101, 184 Céltico 32, 38, 54, 66 n. 1, 68, 178 Cenema 115 Central, zona 195 Centum, linguas 67-68, 175, 177-178 Cherquesse 101-102 Chinês 50; estrutura 39, 42-44, 194, 199, 200; gramáticos 39, 115 n. 1 Chva 58, 180 Ciclica, teoria 25, 40-41 Civilização e língua 165 Classe 159 Classe social e língua 184-185 Classificação das linguas, v. Dialetologia indo-europãa; Genealo gia; Geográfico-tipológica; Geo gráfica; Hierarquia; Léxicos tatistica; Psicológica; Tipológica
2)0
Complexo 110 Composição 43, 82 Comunicação 124, 127 n. 6, 130 n. 4, 142, 215; animal 131, 133•136 Comutação 102 n. 3, 188, 212 Conceito 63, 82, 108, 139, 145, 155, 158, 198, 206, 207, 208 Conccptualismo 117, 122 Condicionado 101 Conduitisme, Behaviorism traduzi do por 182 n. 2; v. também Mecanismo Consciência coletiva 108 n. 2; 154, 219; lingüística 183; social 150 Conservação 177-178 Conservantisnio 209 Consonantismo do indo-europeu 57 Constelação 209 Conteúdo 108, 114, 115 Contínua, criação da linguagem 49, 165, 169, 174 Convenção, linguagem criada por 19, 53 Conversão 44 Correlação 115; fonológica 97-107 Correlativa, oposição 111 Crátilo, diálogo de Platão 19 Crioulos, falares 147 n. 6
D Decadência, degradação das línguas 26, 36, 37-38, 41, 57, 70 Deliay 159 n. 4 Demarcativo, signo 105 Demonstrativo, tipo 195 Dcrivacional, conceito 199 Descritiva, Lingüística 85-86, 99, 104, 114, 127, 142,143, 209-211; fonética 98 n. 1, 99; semânti ca 145, 207, 209-211; v. tam bém Estática; Sincrônica Desenvolvimento independente ou paralelo 177-178 Dcsin£ncias 43, 44 Diacrónica, análise 144; funciona lismo 144; Lingüística 8, 79 n.
3, 84, 85-87, 99, 126, 142-145, 173, 174, 184, 206, 209-210; Fonologia 105-106. 144; v. tam bém Evolutiva; Histórica Dialetologia grega 72; indo-euco péia 38, 65-66, 69, 168, 175•180; romana 21-22, 66-67, 167 Diferenças 84-85, 97-107, 172 Disjuntiva, oposição 111 Dissimilação consonintka 61 Distintivo 84-86, 97-107, 110, 141 Distribuição 119-120 Dó rico 72 Dual 110 Dupla articubçáo 136-138
Êole Pratique des Hautes Êtudes 58 Economia 107 Eixos 86 Êmicns, elementos 99 n. 4 Empirismo 27 Empréstimo 66, 71, 82, 177, 190, 197 Entonaçfto 39, 42, 138, 188 Enunciado 214 Erros 95 Erza 195 Escandinavo 35 Escola Nacional das Línguas Orientais Vivas 32 Escolástica 19, 21, 122, 183, 205 Eicoliastas 18 Escritura 132-133, 137 Eslavo 21, 24, 33, 38, 54, 68, 185, 197; antigo 33, 68, 81 n. 1 Espanhol 51, 68, 71, 168, 195 Espanhola, escola 168 Esperanto 160 Espontânea, criação da lingua gem 47, 164 Esquema 141 Esquimó 194
Estática, Lingüística 18, 84, 86, 127; v. também Descritiva; Sincrônica Estatística, Lingüística 122-124, 215 Estética 19, 105, 161-175, 196, 204 Estilística 94, 119, 165, 173, 202-204; da expressão e do indiví duo 203 Estóicos 79 n. 3, 82 Estrutura 61, 107-130, 144, 155, 160, 182, 192, 199, 201, 205, 210-211, 212, 214, 219-220; op. a sistema 159; universal 21 Estrutural, método 201 Estrutural ismo 12, 104, 107-130, 142, 156, 158, 173, 180, 183, 186, 188, 201 n. I, 202, 205, 208, 211, 213, 214; norte-ame ricano 127, 181-183, 205; euto pcu 127 Éticos, elementos 99 n. 4 Etimologia 19, 34, 62, 64 n. 1, 67, 94-95, 99, 207, 210 n. 3; foné tica 67; popular 210 n. 3; está tica 210 n. 3
231
Evoluctonismo 70 Evolutiva, Lingüística 86, 105, 144; v. cambem Diacrônica; Histórica Etnolingiiística 157
Etrusco 190 Exatas, Lingüística e Ciências; v. Naturais
Fala oposta a língua 79 n. 3, 83-85, 94, 98-99, 139, 140-144, 153-154, 157, 170, 173, 174, 203, 215; organizada 143-144; propriamente dita 144 Faladas, línguas 105 Fantasia 167 Filologia clássica c gramática com parada 34-35 Filosofia e Lingüística 19, 69-70, 93, 121, 126, 127 n. 6, 146 n. 3, 149 n. 1, 164, 187 Finês 195 Flexivas, línguas 39-44, 71, 193; tipo fl. de grupo 194-195; tipo fl. de palavra 195; tipo fl.-radical 194; tipo fl.-temático 194, 195; tipo isolante-fl. 195 Fonema, definição 102-103, 137 Fonética 18, 31, 34, 61, 62, 67, 68, 86-87, 109, 116, 160, 165, 187-188; articulatória e auditiva 187-188; experimental 60-61, 187; leis 34, 54-56, 61, 63, 67, 164, 167; e Fonologia 97-107 Fônica, alternância 199 Fonologia 97-107, 110, 119, 127, 142, 173, 183, 186, 188, 205, 214, 215; diacrônica 104-107, 126, 144; da língua poética 105 Formação das palavras 31
Exolingüística 116 Expositor 159 Expressão 107, 114, 115, 203, 207; teoria da 162-163, 165; estilís tica da 203-204. Expressivo 81 n. 1, 110 n, 1, 119, 163; v. também Afetivo Externa, Lingüística 88; mudanças 207, 208
Forma oposta a conceito 108; op. a substância 19, 109, 114, 128, 139, 201, 202-203, 212, 219; f. pura e f. material 141; op. a função 158 n. 4 Francês, exemplos 68, 71, 80, 81, 102 n. 3, 103 n. 2, 104-105, 197, 211, 214; história 66 n. 1, 151-152, 172; prestígio 73; es trutura 43, 45 n. 1, 51, 82, 98 n. 2, 101, 104-105, 112, 120 n. 2, 141-142, 146-147, 195, 199, 200, 213-214; ortografia 152 Francesa, escola 58, 73, 149-156, 187, 213 Frase, teoria da 20 Freqüência de empiego 123, 215 Frígio 47, 178 Função 95, 114, 115, 119, 126, 127, 128 n. 2, 158 n. 4, 182, 202
Funcional, binaridade 110-111; Lingüística 95-126, 129, 214; oposição 100-107, 141, 188; va lor 108 Funcionalismo diacrônico 144; v. também Estruturalismo; Fonologia Funtivo 115 Fusional, técnica 199-200
Gaulês 190 v. também Parentesco das lio* Genealogia, genética das línguas guas indo-etiropéias; Arvore Ge23-25, 38, 45, 53, 188-193, 200; nealógica
232
Genebra, escola dc 77, 94-97, 169, 203 Gênero 197 n. 3, 199 Genitivo 178 Geografia lingüística 61. 64 n. 1, 66-67, 168, 176, 194-195 Geográfica, classificação 22-23,. 188, 191, 200 Geográfico-tipológica, classificação 195 Georgiano 194 Gerativa, gramática 120, 124, 214 Germânico 24, 32, 33, 34, 36, 38, 44, 55, 66 n. 1, 67; comum 67 Gestalttheorie 158 Gestos acústicos 47 Gestual, linguagem 132 n. 2. 137
Glossemática 113-116, 128, 186, 212
Gbto-cronologia 125 Gótico 21, 32, 33, 55-56 Gramática geral 19-20, 27, 85, 109, 121, 205 Grau zero/grau pleno, alternân cia 57, 105 Greco-ltakxélüco 38 Grego op. a bárbaro 19, 20; co mum 39, 67; dialetos 72; emprés timos 190; exemplos 56, 57, 68, 81 n. I, 104; moderno 35; lu gar na gramática comparada 24, 31, 33, 34-36, 39, 56, 57, 68, 176, 179; preocupações lin güística» 19-20; estrutura 44-45, 71-72, 112, 194, 195. 200 Groenlandés 194
H 126, 143, 150, 163, 165, 173, 184, 189, 192, 209-211, 213 n. 3; período 41; fonética 105-107; semântica 64-65, 145, 204, 207, 209-211, 213; v. tamhém Diacrònica; Evolutiva Hitita 58, 59, 68, 69, 178, 179 Hom6nimos 81 n. 2 Horizontal, organização 169 Humana, Lingüística como ciência 8, 42, 49, 53, 64, 94, 117, 130, 154-155, 157, 167-170, 186, 198, 202 220 Húngaro 195
Harmonia 106 Harvard, escola de 110 Haia, congresso de 97, 05-106 Hebrcus 22, 33; preeminência 24, 47 Herero 45 n. I Hierarquia dai línguas 39-40, 72-74 Hindu 32, 35, 38; gramáticos 18, 31 Histórica, Lingüística 8, 27-28, 33-34, 54, 59, 60, 63-64, 66, 85-86, 98 n. 1, 104, 108, 121,
,
I Idade Média v. Medieval Idealista, escola 51 n. 1, 162, 165, 166, 203 Identidades 85 Ilirio 190 Imagem acústica 82-83, 139, 209; fônica 103 Imitaçio 48, 150-151, 167, 169 Imotivado, signo 80-82, 138-139; significante 139
Imperativo 43, 110 Impermutável 101 Impessoal, 178 Inanimado, gênero 43 Incorporante, tipo 194 Indicativo 110 Individual 160-174; linguagem 166; fala 83-85, 94, 98, 154, 170; uso 141, 170 Individualistas 161-175
2)1
ludivíduo, f%ti!í\tica do 203*204 fndo-europeu 9. 41, 47, 54-60, 69, 102, 189, 190, 194-198; comum 32, 38-39, 60, 65, 175, 179; dialetologia 38, 65-66, 69, 168, 175-180: línguas 9, 17, 32-39, 62, 68-69, 81 n. 1, 148 n. 3, 158, 168, 176, 180, 189, 190, 192, 196, 197; mundo i.-e. co mum 64; primitivo 34, 35-37, 38. 53-54, 17B-179; estrutura das línguas 39, 44, 45 Indo-hitita 179 Indo-iraniano 56, 68, 178; v. tam bém Ariano Infantil, linguagem v. Aprendiza gem da linguagem Infixo 45 n. 1, 180, 199 Informação, teoria da 122, 130-133 Informativa 163 Inglaterra, Lingüística na 46 Ingleses, empréstimos 66 n. 1 exemplos 86*87; ortografia 152 prestígio 73; estrutura 41-42 44, 71-72, 119, 121 n.2, 196, 197 n. 3 Inner e Sprahjorm 158
J aí ética, teoria 184 Jônico 72
Inovação 167, 169-171, 174; op. a arcaísmo 177-179; natureza 165; cm semântica 209 Instituição 53, 83, 154, 169 Interjeição 47 Interlingüística 160 n. 3 Intermediário 158 Interna, Lingüística 88 International Auxiliary Language Assoiation 160 Intuição 162 Invariável 43, 44, 71 Iraniano 32, 33, 38 Irlandês 68, 81 n. 1, 176, 195 Islandês 33 Isoglossa 65, 67, 177 Isolante-flexivo 195 Isolante-radical 194 I solante-temát ico 194 Isolantes, línguas 39-45, 47; téc nica 199-200 Italiana, escola 155-174, 176 Italiano 22, 31, 66 n. 1, 68, 152, 171-172, 195 Itálico 38, 68, 178 ltalo-céltico 38, 67, 175 Iurac 195
Junggrammatiker v. Neogramáticos
K Kabardi 102
XOlWj liclcnistica 72
Kuan, escola de 99 n. 2
Kulturgeshihte 165
L Laboratórios de línguas 124 Laterais, áreas 178 Latim na Espanha 152; exem plos 36, 43, 55, 56, 58, 68, 81 n. 1, 87 n. 2, 178; na Gá234
lia 66 n. 1, 152; gramáticos 20; literário 26; lugar na gra mática comparada 20, 31, 33, 34-36, 67-68, 176. 178-179; prestigio 72-73; estrutura 44,
112, 190, 199, 200, 203; univcraalidade 22, 52 n. 2; vulgar 35/ 81, 167, 190; velho 178 Lautgesetse v. Lei* fonéticas Lautuers hit bung v. Mutação conssonântica Leipzig, Universidade de 54 Leis em dialetologia 176*177; fonéticas 34, 54-56, 61, 63, 67, 164, 167; era Semântica 62, 63 Lésbico 72 Letão 195 Lexicógrafos 18 Lexicologia 213-214 Lcxicostatística 125 Ligação 105 Limiar da linguagem 136 Linearidade do significance 82-83 Lingua, linguaggio 173 n. 1
Lingua, op. a linguagem 166; objeto da Lingüística 88-89, 108. 165. 201; op. a fala 79 n. 1, 83-85, 94, 98-99, 139, 140-144, 153-154, 157, 170, 173, 174, 203, 215; op. a es tilo 125 n. 1 Língua-mãe 25 Linguagem, definição 131-133, 135-137, 167; op. a lingua 166 Literária, língua 21-22, 165, 171-172, 174-175, 203 Lituano 33, 35, 37, 68 Lógica e Lingüística 20, 27-28, 45, 62, 109, 113, 114, 116, 118* 120, 122, 127 n. 6, 130. 142. 157, 196, 202, 205, 206,215, 219 Londres, escola de 108 n. 1, 159 Lugar das palavras v. Ordem das palavras
M MacrolingüUtica 116 n. 2 Malaio 50 Máquinas de traduzir 116 n. 2, 124; v. também tradução auto mática Marcados, fonemas 102 n. 3 Marginais, linguas 178 Marxismo 155, 184-187 Matemática, Lingüística 112-113, 116, 119, 122-124, 127 n. 6, 215, 219, 220 Materialismo 157, 167; histórico '186 Matries, línguas 24 Mecanismo 60, 157, 181-183 Média, Idade v. Medieval Medieval, Gramática 19, 21-22, 183, 205 Mediterrâneas, linguas 190 Mentalismo 181-183; antimentalismo 205 Mctafonia 86 Metalingüistica 116, 219 Metamorfose regressiva 41 Micênio 179 n. 1
Miciolingüistica 116 n. 2 Mímica, linguagem v. Gestual Mithridutes 23, 24 Mitologia comparada 46, 155 Modernos, querela dos antigos e dos 70 Modistae 21 Modo 110 Monemas 128 n. 2, 137 Monogênese das línguas 24-26, 184-185; v. também Primitiva, lingua Monossilabos 42, 43, 194 Mordoviano 195 Morfema, definição 128 n. 2 Morfologia 39-45, 57, 62, 87, 104, 110, 165, 180, 193, 215 Morfonologia e Morfofonologia 104 n. 2 Morfo-semlntico, campo 212 Moscou, escola de 184 Motivado 81 Mudanças externai 207, 209; lin güísticas 207 Mutação consonântica 34, 55-3o
N Neutralização 104 n. 2 Neutralicável, oposição 102 n. 3 Neutro 100 Nível 159 Nacional, campo 214 Nome, op. a verbo 44, 121, 148 n. 3, 196-198 Nome de número 196, 199 Nominalistas 21, 183 Noologia 214 Norma 141; espaciais 177 Normativa, gramática 20, 95, 126, 163 Norueguesa, antiga língua 33 Novo-alto-aíemão v. Alemão
Xação c lingua 51 Naturais. Lingüística e ciências 36-37, 45, 54, 63, 64, 117, 124, 219, 220 Natureza, linguagem criada pela 19 Nebulosa 114, 146 Negativo 110 Neogramiticos 37, 39, 53-60, 61, 63, 67, 69, 73, 77, 79, 85, 98 n. 1, 106. 109, 127, 144, 164, 166 n. 1, 167, 170, 173, 176, 179, 189, 211 Neolingüistíca 64 n. 1, 162, 166-174, 175, 176 n. 1
O Objeto op. a processo 148 n. 3,
Ordem 159 Ordem das palavras 39, 43, 194, 199, 203 Órgãos fonatóiios 103 Oriental, zona 195 Origem da linguagem 25-26, 27, 46-49, 155-156, 163, 184, 219; v. também Primitiva, língua Osco-unibro 176
196 Oceania, línguas da 192 Ondas, teoria das 65-66 Onomasiologia 213 Onomatopéias 47, 80-81 Oposição 85, 86, 97-109, 111, 141, 188, 214 Optativo 110
p Palavra, definição 204 n. 5; gra matical e fonética 105; gráfica e fonética 43, 44 n. 3, 45 n. I; cheia e vazia 39, 115, n. 1, 194; síntese da 188 Palavra-chave e palavra-testemunho 214 Pancrônica, semântica 210 Pandiacronia e Pansincronia 210 Paradigmático 83 n. 2 Parentesco das línguas indo-euro péias 31-39, 177, 185, 188-193, 196-197; v. também Arvore ge nealógica ; Genealogia, genctica das línguas
236
Partes do discurso 20, 197 Partículas 194, 196 Passividade do sistema lingüístico 165 Fartgr noster 23 Pensamento e expressão 19, 94, 126 n. 6, 145-149, 166, 186 Perfeição das línguas 40, 69-74 Períodos histórico e pré-histórico 41 Permutável 102 n. 3, 159 Persa 33, 35, 36 Pertinente, oposição 100-107, lU Pessoas verbais 44, 110 Pidginenglish 44
■ Pretérito 44, 110 Primitivo, índo-europeu 34, 35-36, 37, 53; língua primitiva 24-26, 36, 38, 40, 46-48, 178-179; línguas dos povos chamados, 48, 158 n. 1, 192, 198; v. também Monogênese; Origem da linguagem Probabilidades, cálculo das 122 Processo op. a objeto 148 n. 3, 196 Progresso absoluto e relativo 165; das línguas 40-41, 70-71, 174 Pronome 44, 197 Propagines, línguas 24 Psicolingüística 148 Psicologia c Lingüística 50, 52, 53, 63, 95, 117, 126 n. 6, 127 n. 6, 156, 174, 205, 206 Psicológica, classificação das lin guas 52; Lingüística 145-149, 159, 182, 206 Psicomecânica 113 Psicossistemática 112, 118
Herein» 115 Plural 86-87, 110 Poética, linguagem 26, 163, 167; lingua, 105 Poliglota, dicionário 23-24 Polinésicas, línguas 101, 194 Polissemia 213, 215 Polissintética, língua 199 Port-Royal 27, 63, 121 Português 73 Positivista, Lingüística 54, 59, 74, 112-113, 127, 145, 166, 182 Positivo 110 Praga, escola de 97, 108 n. 1, 192*193 Prefixo 42, 44, 199 Pré-histórico, período 41 Pré-lingüística 116 n. 2 Presente 44, 110 Pressão social 73, 82, 125 n. 1, 152, 164, 166 n. 1 Prestígio 151, 167, 169, 171, 174; das línguas 72-73
Q Quantidade vocálica 141 Quantitativa, Lingüística 186
Quadrado lingüístico 87, 145 n. 2; semântico 87 n. 2, 145
R Raça e língua 50 Raiz, teoria da 31, 57-58, 180 Realistas 21, 183 Redundante 111 Relação 108, 115 Relacionai, conceito r. concreto 199; conceito puramente r. 199 Relações associativas 209
Samoano 194 Samoiedo 195 Sânscrito, exemplos 55-56, 68, 81 n. 1, 178; língua original 34«
Retórica antiga 62, 205, 209 Ritmo 188 Românticas, línguas 22, 24, 54, 65, 68, 125, 151-152, 167, 168, 190 Romantismo 35 Romeno 195, 197 Russo 195
56; lugar na gramática compa rada 17-18, 31-32, 33, 34, 35, 55-56, 178-179; estrutura 200 Sat9m. línguas 67-68, 175, 177*178
237
Sistema 82, 83, 86, 88, 93, 100, 106, 107, 109, 111, 112, 114, Semin t ica 62-65, 116, 129, 145, 116-117, 128, 141, 142, 143, 158, 173, 184, 187, 201, 204144, 153, 154, 158, 170, 173, -215; campo 207, 211; descri 180, 202, 211, 212, 219; op. tiva 145, 207, 209; diacrônica a estrutura 159 estrutural 212; estrutural 208, Soantes 57-58, 180 211-212, 213 n. 3; histórica 63-64, 145, 204, 207, 209-211, Social, pressão 73, 82, 125 n. 1, 213 n. 3; pancrônica 210; qua 152, 164, 166 n. 1; linguagem drado 87 n. 2, 145 19, 52, 73, 79 n. 3, 80, 84, 117, 135, 149-160, 168, 170Seniasiologia 104, 213 -171, 174, 186-187, 219; lín Semelhança v. Identidades gua 83-85 Semema 207 Sociedade Asiitica dc Calcutá 31Semiologia 12, 80, 126, 130-133, -32 137 Sociedade de Lingüística de Pa Semttico 22, 24, 45 n. 1, 49, 50, ris 48 180 n. 2, 190 Sociológica, escola 52, 64 n. 1, Scriante 194, 195 149-160, 170, 213 Significação 100, 119, 128 n. 2, Sofistas 19, 121 182, 204*215 Son&ntica, alternância 57-58 Significado 19, 79 n. 3 Sonoridade, alternância de 101, Significantc 19, 79 n. 3, 80-82, 105, 111 n. 2 112, 114, 125, 133-136, 138Soubiya 194 -140, 206, 207, 214; linearida de do 82-83 Soviético», lingüistas 184-187 Significativas, diferenças 98 Sprahbund 190, 195 Signo 81-82, 130, 133, 136, 137, Sprah* 158 138-139, 145, 163, 164, 206, Sprahjarnilk 190 n. 3 214; arbitrariedade do 19, 25, Sprahorganismus 158 53, 79 n. 3, 80-82, 131, 133, SprahverwandUhajt v. Afini 138-140, 172; demarcativo 105 dade lingüística Simbólica, técnica 199 Sprehen 158 Simbolismo lingüístico 26 Stammbaumtheorie v. Arvore ge Símbolo 146 nealógica Simultaneidade v. Sincrônica Subjuntivo 110, 178 Sinal 146 Sincrônica, Lingüística 8, 79 n. 3, Sublógico 114 85-87, 94, 99, 105-106, 109, Subordinante, tipo 194, 195 125, 129, 142-145, 173, 174, Substância op. a forma 19, 109, 184, 203, 208, 209-210 114, 128, 139, 201, 202-203, Singular 87, 110 212, 219 Sinonlmia 213 Substituição 212 Sintagmitica 83, 110, 159 Substrato 66, 176, 177 Sintaxe 118-120, 165, 214 Sucessividade v. Diacrônica Sintete da palavra 188; syntheSudanês 195 sis traduzida por 199 n. 1 Sueco 195 Sintética 199-200 Sufixo 42, 87, 194, 199, 209 Sintoma 146 Supereitrato 66, [77 Segmentos lingüísticos 108
2)8