JEAN DELUMEAU
A CIVILIZACÃO DO ' RENASCIMENTO Volume 11
1984 Editorial Estampa Lisboa
íNDICE Volume Il
Cap. X - Os sonhos do Renascimento . . . . .. -Cruzada e Império: mitos moribundos - A miragem dos países maravilhosos . . . . . . . .. - O enfraquecimento das esperanças messiânicas - Sonhos de ricos: poesias pastoris e mitologia -Sonhos de pobres: o pafs da cocanha ... - Os pesadelos do Renascimento ... -Leonardo, Rabelais e Fausto . . . . . . . . . . . . . .. - A «Utopia» de Thomas More .............. . - De Te lema a Bensalém . . . . . . ... . . . . . . . . . .. . - As utopias: recusa do presente, premonição do futuro Titulo original: La Civilisation de la Renaissance Ilustração da capa: V énus e Marte (pormenor) de Sandro Botticelli. National Gallery, Londres. Capa de
Soares Rocha Tradução de
Manuel Ruas Copyright
B. Arthaud, Paris, 1964 Editorial Estampa, Lda., Lisboa, 1984 para a língua portUguesa
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Cap. XI - Indivíduo e liberdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..
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-As grandes personalidades e o seu meio natural -Personalidade fora de série . . . . .. -A Fama ................................... . - O romantismo do Renascimento . . . . . . . . . . . . . .. -Um pessimismo metafísico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. - Astrologia e destino individual. O homem mágico - O difícil nascimento da liberdade
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Cap. XII -A criança e a instrução . . . . . . . .. - O novo lugar da criança na iconografia - Crescente interesse pela criança . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. - Inexistência de ruptura entre o ensino medieval e o do Renascimento . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . .. .. . . . . . . . . .. - A abertura das faculdades das artes à corrente humanista ... - O declínio das universidades . . . . . . . . . . . . . .. - O ritmo novo da vida escolar . . . . . . .. . . . . . .. Cap. XIII - A educação, a mulher e o humanismo
- Uma reacção contra a anarquia medieval ... - A escolarização das classes superiores da sociedade
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- A preocupação da educação . . . . . . . . . . . . . .. - A lenta promoção da mulher . . . . . . . . . . . . . .. -Amor e beleza: a influência do neoplatonismo -Reabilitação do casamento . . . . .. Cap. XIV- Renascimento e paganismo - O erotismo . . . . . . . . . . . . . . . . . .. - Os «Paduanos» . . . . . . . . . . . . . .. - Um «século inspirado» . . . . . . . .. -Um sincretismo religioso e moral ... - O nu sagrado . . . . . . . . . . . . . .. - Espírito crítico e consciência cristã Cap. XV - Da feitiçaria à ciência ... - As feiticeiras . . . . . . . . . . . . . .. - As contradições do Renascimento - O peso do passado . . . . .. - O humanismo e a ciência ... -Da geografia à química . . . . .. - Progresso na .física . . . . . . . .. - Evolução decisiva em álgebra - Revolução em astronomia . . . . . . . . . - As componentes de uma mentalidade nova - Três mensagens do Renascimento
Quadros cronológicos . lndice documental . . .. Orientação bibliográfica lndice das gravuras ...
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OS SONHOS DO RENASCIMENTO
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CAPíTULO X
Os homens do Renascimento fizeram muitos projectos. Esse período, em muitos aspectos realista, que engendrou Commynes, Maquiavel e Guicciardini, que viu o saque de Roma e o desenvolvimento do tráfico de Negros, foi uma das idades de ouro da utopia. A necessidade de evasão era mais sentida talvez por haver uma medida mais exacta do mundo circundante e por se conhecer melhor a face quotidiana do homem. Mas era preciso abandonar certas miragens da Idade Média: daí a necessidade de novas construções imaginárias. O mito da cruzada estava moribundo, passara o tempo das grandes cavalgadas à Terra Santa e das peregrinações de «pastorinhos». A cruzada sobrevivera ainda depois do fim do século XIV, mudando de aspecto: era já defensiva. esforçando-se em vão -em Nicópolis em 1396 e em Varna em 1444- por travar o avanço turco. Só em Lepanto, em 1571, e, mais ainda. em Viena, em 1683, viria a sofrer o golpe final. Mas havia ainda alguns espíritos quiméricos que sonhavam com acções esplendorosas no Oriente e com a impossível reconquista de Constantinopla ou de Jerusalém: Pio II, Carlos VIII e, mais tarde, o Padre Joseph, confidente de Richelieu. Mas Pio II morreu desanimado em Ancona, em 1464, antes de embarcar; Carlos VIII, que tomara o título de «imperador de Constantinopla», teve dificuldades para se livrar do vespeiro italiano e voltar a França; e, quanto ao Padre Joseph, encontrou um chefe para a cruzada - o duque de Nevers- mas não achou tropas. Francisco I não hesitou em aliar-se aos Turcos, cujos barcos se acolheram a Toulon. Sisto V sonhou, muito prosaicamente, re5gatar ao sultão os lugares santos. Veneza, entre as guerras, comerciava com os Turcos e chegou a ter relações culturais com Constantinopla, onde Gentile Bellini, enviado em missão oficial ao Oriente em 1479, pintou o retrato de Maomé II. É certo que no Ocidente se receava o vizinho de leste, mas não se ignorava que no país dos Otomanos havia uma relativa tolerância religiosa, como se não ignorava que, em certos casos, os ministros do sultão eram cristãos rene-
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udnN e (IUC a admin i ·tração do G rão Turco não era mais injusta que
O século XVI vê também dissolver-se aos poucos esses países maravilhosos que, como miragens, tinham atrafdo os Europeus para fora da Europa: a «ilha das sete cidades» onde se podia apanhar areia repleta de ouro, essa Cipangu onde, segundo Marco Polo, que nunca lá foi, «O ouro abunda além de tudo quanto se possa imaginar» e onde «as casas têm telhado de ouro» , esses milhares de ilhas do mar de Cipangu, com
árvores de perfumado olor, e tantos outros reinos imaginários, tudo isso se diluiu. Era preciso reconhecer a evidência: as regiões longínquas não eram como antes se imaginara. O império do Preste João, onde se julgava correr um dos rios do paraíso terrestre, era afinal a modesta Etiópia, onde uma expedição portuguesa teve, nos anos de 1540, dificuldades para conter a pressão muçulmana. As Antilhas não eram as «ilhas afortunadas» e até causaram decepção. Em vão se buscou a norte do México as sete cidades de Cibola; e o Eldorado pôs-se em fuga, cada vez mais para o coração da Amazónia, perseguido pelos aventureiros espanhóis, alemães ou ingleses que se obstinavam em procurá-lo. Foi preciso corrigir os mapas e levar em linha de conta os descobrimentos. No início do século XV o «rio Oceano» passou a ser um mar aberto que rodeava a Índia. No primeiro decénio do século XVI a Amética -principalmente a do Sul - começou a figurar nos mapa~. Cem anos depc;>is já Cipangu e as cinco ou sete mil ilhas afortunadas se tinham afundado para sempre no Pacífico de Magalhães e de Drake. Os cartógrafos e os navegadores, porém, .iá conheciam o Japão, as Filipinas, as Malucas; e, no Índico, encontravam também Madagáscar. Evidentemente que não custa apontar a dedo todas as insuficiências de certo mapa desenhado cerca de 1600: os erros de longitude são vários e a América setentrional, para lá da Nova França e do Novo México, é uma terra incognita que ninguém sabe onde e como termina a norte. Continua-se a acreditar numa grande terra antárctica habitada; e será Cook a desmentir a sua existência. O interior dos continentes é ainda mal conhecido: atribui-se ao Nilo e ao Congo uma nascente comum. Mas nada disto impede que em cem anos tenham sido feitos imensos progressos que obrigaram o homem ocidental a um esforço de realismo sem precedentes. Os países lendários tinham cedido o lugar a um Novo Mundo que, é claro, tinha as suas riquezas mas que, com os seus desertos, as suas montanhas. o seu infindável espaço, opunha ao europeu uma resistência mais física que human,a. Fora já necessário corrigir os números de Ptolomeu para a medida da circunferência terrestre e aumentar os mapas para neles colocar um incomensurável Pacífico. Mas sabia-se, por outro lado, que o mar não entrava em ebulição nas regiões quentes e que o Equador era habitável. Entrara-se em contacto com civilizações cuia existência nunca fora suspeitada: a fecunda Iiçã~ americana. . É bem certo que a América, tal como se apresentava, podia dar lugar a sonhos. Os soldados de Cortez, ao aproximar-se do México e depois, ao entrar na cidade, ficaram estupefactos. Leia-se o testemunho de Berna! Diaz del Castillo, companheiro de Cortez: «Quando vimos [a 7 de Novembro de 1519] aquela bela estrada calcetada que ia direita ao México, e todas aquelas cidades e aldeias construídas umas na laguna, e em terra outras, ficámos admirados, dizendo que tudo aquilo se assemelhava às cidades encantadas de que fala o livro de Amadis. Torres, templos, edifícios de pedra e cal construídos em cima de. água: os nossos
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in i n11 gll~ tio lsh o. Consideremos um diálogo bem revelador, imaltllllldn por um an ni mo do fim do século XVI, entre dois pescadores ve tu::t.ia nos dt:st:on solados, nu m pe ríodo de fome, com o governo do doge l' da aristocracia local: Marino · ... Co mo Deus não quer que o domínio do tirano pese dt:musiado no mu ndo, preparou, para fazer justiça, o Turco e o grande sul ho.
Ve ttorc - Esse rapina o que eles já roubaram e prepara-lhes guerra t: sofrimentos pa.ra lhes dar uma boa trancada na cabeça. Marino- Seremos então seus irmãos muito queridos e hão-de vir a pa nha r connosco, de rabo ao léu, caranguejos moles, lavagantes e douradas . Ve ttore- Já não hão-de chamar aos pobres nem carnudos, nem ma ricas, nem ladrões nem cães, e não voltarão a cuspir-lhes na cara ... A cruzada, com tudo aquilo que tinha de êxodo messiânico, de entusiasmo sagrado, de desejo de exotismo e de ambições delirantes, é portanto um sonho do qual os homens do Renascimento estão a acordar, principalmente depois da conquista de Granada em 1492. «Quando, nos séculos XIV e XV, a cruzada ainda sobrevivia, a Cristandade estava decisivamente ferida na sua organicidade de carne» (P. Alphandéry). Com efeito, o Ocidente medieval sonhara um imperador sábio e poderoso, defensor do nome cristão, árbitro dos povos, governador do mundo em pleno acordo com o soberano pontífice Novo David, recebia do papa «a coroa de glória» que o punha «acima de todas as potências do mundO>>. Ora a realidade do Renascimento é absolutamente diferente: o imperador, quase sempre alemão, ora é receado e odiado ora é simplesmente desprezado. Na maior parte da Europa, as nações cristãs não param de fazer guerra umas às outras. O papa está muito entretido com o seu pequeno Estado peninsular. E, por fim, o século XVI assiste à conclusão lógica dos cismas anteriores e das cruzadas anti-hussitas; a Europa católica quebra-se ení duas metades de igual força : os cristãos que continuam fiéis a Roma e os cristãos reformados são, doravante, inimigos. É , realmente, o fim do messianismo imperial.
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soldados j11lguvam estar sonhando. E ninguém se espante por eu dizer isto, pois uinda estou a dizer pouco e não sei como exprimir-me: estávaIIIOS a ver uma coisa que nunca fora vista nem contada nem sonhada.» Cortez enviou a Carlos V os tesouros recebidos de Montezuma; Dürer viu-os em Antuérpia. E também Dürer julgou estar a sonhar: «Também vi - escreve - as coisas que do novo país do ouro foram enviadas ao r i: um sol todo de ouro, de uma toesa de largura; e, do mesmo modo, uma lua toda de prata do mesmo tamanho; e também duas salas cheias de armaduras do mesmo género; e ainda todos os tipos de armas deles, c~cudos, bombardas, espantosas armas de defesa, curiosos vestidos, indumentárias nocturnas e todos os géneros de coisas espantosas, para usos variados, muito mais dignas de admiração que quaisquer outras coisas de espantar .. . E nunca na minha vida vi nada que tanto me alegrasse o coração como estas coisas, pois vi admiráveis produtos do artifício humano e fiquei espantado com o subtil engenho dos homens dos países exóticos.» Em 1520 ainda se não suspeitava da existência do Peru, que reservava surpresas ainda maiores. Em Cuzco, no jardim anexo ao templo do Sol, tudo era de ouro e prata. «Ali se via (tudo feito com esses metais preciosos) todas as espéCies de plantas, flores, árvores, animais pequenos e grandes, bravos e mansos, bichos rastejantes como serpentes, lagartos, caracóis e ainda borboletas e aves de todos os tamanhos, estando cada uma de~sas maravilhas no lugar mais conforme à natureza daquilo que representava.» Mas, uma vez delapidados os tesouros dos Aztecas e dos Incas. ficou-se perante a América real, que se teve de atravessar, de colonizar, de converter, de explorar, e não sem grandes esforços. Nos meados do século XVI as índias Orientais e Ocidentais tinham já assumido o seu verdadeiro aspecto. Camões passou dezoito anos fora da Europa -viveu em Goa, em Macau, em Moçambique -, mas não o fez por gosto. Depois de numa rixa, no dia do Corpo de Deus de 1552, ter ferido um funcionário da corte, não pôde escapar a severo castigo senão embarcando para a índia' como soldado raso. Para Cervantes, no início do século XVII, a América já não era o paraíso. Chama-lhe, nas Novelas Exemplares, «refúgio ordinário dos espanhóis desesperados, igreja dos falidos, salvo-conduto dos homicidas, bipmbo desses tavolageiros que os conhecedores denominam de batoteiros, negaça das mulheres livres, salvação especial de uma minoria e engodo da maioria». Mas ao pessimismo de Cervantes opõe-se, de certo modo, o ·optimismo dos que, não podendo encontrar na América fabulosas riquezas, encontraram, ao menos, o «bom selvagem»- mito chamado a longa carreira. É conhecida a célebre passagem de Montaigne em que ele compara os índios e os Europeus: «No que respeita à devoção, à observância das leis, à bondade, à liberalidade, à lealdade e à franqueza, bem nos serviu não os igualar: perderam-se por essa vantagem e foram vendidos e atraiçoados oor si próprios». Um espanhol contemporâneo de Cervantes e de Mon-
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taigne, Maneio Serra não se cansava de louvar os Incas: «Governavam tão sabiamente os se~s domínios - escreve - que não havia lá ladrões, nem devassos, nem vadios, nem mulheres adúlteras, a imoralidade estava proscrita e todos tinham o seu ofício honesto.»
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O século XVI, que fez diss~lver-se a miragem das ilhas afortunadas, deu também um golpe muito severo nas tenazes esperanças messiânicas da Idade Média. Santo Agostinho, no fim da Antiguidade, tinha distinguido a cidade terrestre e a cidade celeste: esta estava sujeita a uma longa e difícil «peregrinação» neste mundo inferior, em cujo interior era cativa e estranha. Mas a distinção entre ambas essas cidades levantava um problema: quando viria a cidade onde «o amor-próprio (vai até) ao desprezo de Deus>> a dar lugar à cidade onde «o amor de Deus (vai até) ao desprezo de si próprio»? Joachim de Flore (que morreu em 1202) respondeu a isso. Dividia a história da Humanidade em três épocas. A primeira, a do Pai, do Antigo Testamento e da família, fora carnal; a segunda, do Filho, do Evangelho e do sacerdócio, era ao mesmo tempo carnal e espiritual; a terceira, do Espírito e das ordens religiosas, seria puramente espiritual. O ano de 1260 seria o início da terceira época. A esperança no derruir próximo de um mundo clerical ao mesmo tempo ímpio, racional e sensual foi ainda por muito tempo, depois da morte de Joachim de Flore, o esteio de monges mendicantes, suspeitos ou heréticos - recordemos Savonarola e, mais ainda, certos ramos descendentes da ordem franciscana-, e de gente pobre que deles recebia influência. O receio muito difundido entre os séculos XIV e XVI, de um iminente Juízo Fi~al impediu que esse estado de espírito se desvanecesse. Mas a Reforma orientou-o numa nova direcção, a do anabaptismo, e, mais exactamente; a do anabaptismo violento, pois que houve um anabaptismo pacífico e pacifista que sobreviveu às crises do século XVI. Thomas Müntzer entra em cena por volta de 1520. Nascido em 1485, foi estudante em Leipzig e assistiu à «disputa» célebre que em 1519 opôs nessa cidade Lutero a Johann Eck *. Aderiu a Lutero, mas não por muito tempo. Bem depressa começou a achar muito conservadora e muito efeminada a teologia da «menina Martinha», a quem censurava o mostrar um Cristo «doce como o mel». Em sua opinião, era preciso, pelo contrário, acentuar a rudeza da cruz e carácter heróico de uma fé que devia dar ao cristão «a coragem e a força de fazer o impossível». Engels achou que Müntzer tinha apenas «uma máscara bíblica». Apresentou-o, face ao «reformador burguês Luterm>, como o primeiro «revolucionário plebeu» dos tempos modernos. A realidade parece bem diferente. Müntzer pertence muito mais à Idade Média; a sua esperança era a mesma de Joachim de Flore. Tal como este - e isto é essencial-, acreditava na proximidade do fim \ dos tempos e no advento da época da· ceifa. Os
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«eleitos» tinham, então, de reunir-se, de romper com o mundo e com a Igreja corrompida. Era tempo de separar o trigo do joio. Essa comunidade de «santos», na qual se entrava livremente mediante o baptismo adulto, poderia contentar-se com ignorar, tanto quanto possível, o mundo dos pecadores. Mas Müntzer e os seus amigos, os «profetas de Zwickam>, achavam que os «ímpios» oprimiam os «eleitos» de uma forma intolerável e que os pobres, os preferidos do Senhor, viam barrado o caminho do Evangelho e da fé pela sua: condiÇão de miséria. Proclamando que «um ímpio não tem o direito de viver se levantar obstáculos aos homens pios», considerando-se «espada de Gedeão», Müntzer chamou os humildes à revolta. Confiou-lhes a tarefa de fazer triunfar a verdadeira fé e de exterminar os inimigos de Deus, isto é, os ricos e o clero. Teve assim um papel primacial na «guerra camponesa» que devastou uma parte da Alemanha, em especial a Saxónia e a Turingia, em 1525. Os camponeses foram esmagados e dizimados e Müntzer foi torturado e supliciado. Mas o anabaptismo voltou à violência em 1533-1535: foi a tragédia de Münster. Um peleiro da Suábia, Melchior Hoffmann, inicialmente ganho pelo luteranismo e depois convertido ao anabaptismo, refugiou-se em 1529 em Estrasburgo, onde começou a profetizar e a fazer-se passar por um segundo Elias. Anunciava o fim do mundo para o ano de 1533, dizendo que Estrasburgo seria a nova Jerusalém. Arriscando-se a ser preso, refugiou-se nos Países Baixos, onde, devido à sua pregação, se formaram os primeiros grupos de anabaptistas holandeses com o nome de «melchioritas». Chegado o ano de 1533, Melchior Hoffmann voltou a Estrasburgo para ali assistir ao fim do mundo: foi então preso e preso ficou até morrer em 1543. Hoffmann limitava-se a anunciar a iminente justiça divina, mas dois dos seus discípulos, Jan Matthijs, padeiro de Harlem, e Jan de Leyden, alfaiate, resolveram ajudar Deus nessa obra liquidando o mundo dos pecadores. Com o auxílio de anabaptistas expulsos dos Países Baixos, tomaram o poder em Münster, na Vestefália (1534) e pilharam conventos, igrejas e bibliotecas. O bispo e senhor da cidade rebelde pôs-lhe cerco e, depois de Jan Matthijs ter sido morto durante uma surtida, Jan de Leyden proclamou-se rei da nova Sião, dizendo-se investido da missão de conquistar todos os países do mundo. A poligamia bíblica e a comunhão geral de bens foram instituídas na cidade cercada, onde reinava uma indescritível atmosfera de terror e delírio. Depois de horríveis combates, as tropas do bispo entraram em Münste.r a 24 de Junho de 1535. Os chefes anabaptistas foram executados depois de sofrerem cruéis suplícios e os seus cadáveres foram metidos em gaiolas de ferro, suspensas, para aviso; do alto de uma torre. O milenarismo não desapareceu completamente depois destes dois dramáticos episódios. Viria a reaparecer como fenómeno colectivo, em modo menor, na Inglaterra de Cromwell e dos princípios da Restauração; e o «profetismo» que se apoderou da população reformada de Cévennes ná época da guerra··da liga de Augsburgo não deixa de ter certa relação
Os homens e as mulheres do Renascimento tiveram fome de romanesco: prova de que eram imperiosamente empurrados para os caminhos do sonho por uma realidade quotidiana bem menos atraente que o que por muito tempo se julgou. Em França, o Roman de la Rose foi reeditado catorze vezes nos quarenta primeiros anos do século XVI; e até 1550 foram ali impressos uns oitenta outros romances medievais. Só Les Quatre Fils Aymon teve vinte e cinco edições francesas durante o século XVI. Quanto ao Amadis de Gaula, foi, sem dúvida, no domínio da literatura profana, o maior êxito livreiro do tempo. No século XVI houve mais de sessenta edições espanholas do Amadis, romance que conheceu um sem-número de edições francesas e italianas além de ter sido ainda traduzido para inglês, alemão e neerlandês. Francisco I, protector do humanismo, não se envergonhou de encomendar também a sua tradução. A sorte do Orlando Furioso do ArÍosto, da Utopia de Thomas More, e até das obras de Rabelais, deve ser relacionada com o favor que a idade do humanismo, quase contra sua vontade, concedeu ao romanesco. E escrevemos «quase contra sua vontade» porque Cervantes dá boas provas de os fins do Renascimento se não separarem sem desgosto dos paladinos das epopeias. D. Quixote é um insensato, um herói ultrapassado pelo seu tempo; a sua panóplia está gasta; é um sobrevivente de um passado prescrito e já não tem lugar num mundo que liga mais ao dinheiro que .à aventura. Mas esse louco tem a sua grandeza, é um homem de sentimentos, todo ele rectidão.
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om ele. Por outro lado, pensadores isolados do Renascimento como Guillaume Postei, espírito irénico e sincrético, e, especialmente, Campanella, continuaram a crer na iminente realização do reino de Deus. Na Cidade do Sol, Campanella conciliou, curiosamente, as esperanças messiânicas e a utopia platónica. Mas, no fim de contas, a esperança no próximo advento da cidade celeste não se recompôs das duas grandes derrotas dos anabaptistas de 1525 e 1535. Foi preciso reconhecer -eis aqui outra lição de realismo comparável àquela que a América · deu aos Europeus do século XVI- que a cidade terrestre, apesar de todas as suas taras, tinha vida bastante resistente. As decepções dos anabaptistas violentos terão, talvez, contribuído para fazer dissipar o receio do Juízo Final, receio tão vivo no início dos tempos modernos e que tantos vestígios deixou na pintura da época. De qualquer maneira, é sintomático que David Joris, outro anabaptista célebre do século XVI (1501-1556), mas com carácter e doutrina pacíficos, proclamando-se o terceiro David da história- o segundo e o maior teria sido Jesus Cristo-, tenha espiritualizado e interiorizado a apocalíptica dos melchioritas. De então em dia.nte os anabaptistas não procurariam mais que fazer reinar o espírito da cidade celeste -espírito de caridade - nos seus pequenos grupos, separados das Igrejas oficiais.
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Querendo compor «uma invectiva contra os romances de cavalaria», Cervuntcs terá, talvez, sido apanhado por eles. D. Quixote nem sempre é 14rotes<.:o c, por vezes, chega a ser épico. O facto é que o seu autor, ao escrever esta paródia, não se curou do amor profundo que ainda tinha como toda a sua época- ao romanesco. A sua última obra foi um wmance de cavalaria, uma espécie de anti-D. Quixote: Os Trabalhos de Pérsiles e de Segismundo (1616). Cervantes achou por bem intercalar entremezes. pastoris entre várias proezas burlescas de D. Quixote. É que a Arcádia foi também uma evasão do Renascimento. Não se duvida de o género pastoril * não ter sido ignorado pela Idade Média, como no-lo testemunha o Jeu de Robin et Marion. Mas teve nova e duradoura fortuna depois do Ameto de Bocácio e, principalmente, quando o humanismo retomou os Idílios de Teócrito e as Bucólicas de Virgílio. O público apaixpnava-se cada vez mais pelos amores campestres e pelos folguedos das ninfas no seio de uma natureza acolhedora e harmoniosa. Foi na Arcádia - não naquele austero rincão do Peloponeso, mas num campo verdejante cujos encantos são realçados por árvores de «excessiva beleza» - que Sannazzaro pôs ·o seu pastor Sincero a consolar-se dos desgostos amorosos. L'Arcadia (1502), romance em prosa com versos intercalados, a mais notável peça pastoril italiana, teve um extraordinário futuro. Na segunda metade do século XVI e no século XVII, os romances e os dramas pastoris foram muitos: Diana de Montemayor (1559), Aminta de Tasso • (1573), Galateia de Cervantes (1585), Arcadia de Philip Sidney (1590), Pastor fido de Guarini (1590), Astrée de Honoré d'Urfé (1607-1627). Aquilo que se esconde nestas ficções campestres, nesta natureza que não sofre inverno, nesta eterna juventude de uma Arcádia fora do tempo e do espaço, é a teimosa aspiração à idade de ouro, é o desejo de crer -pelo tempo de uma leitura ou de um espectáculo- que existe um mundo luminoso e poético onde tudo é música, harmonia e amor. A Idade Média sonhara com o paraíso. Esse sonho perdeu vigor na época do Renascimento; mas, em contrapartida, o quadro As Almas do Purgatório, de Giovanni Bellini (Uffizi), oferece uma- imagem impressionante do que poderia ser uma terra, se não paradisíaca, pelo menos pacificada. A obra começa por nos desconcertar: que papel devemos atribuir a umas personagens que parecem S. Pedro, S. Paulo, S. Sebastião, a Virgem? É uma questão de pouca importância. O essencial é essa ilha harmoniosa e calma, separada de um mundo tumultuoso por um rio de águas azuis - o Letes? -, são essas crianças nuas e inocentes a brincar em redor de uma macieira anã, são essas jovens imóveis e recatadas, é esse terraço de mármore cujo ladrilhado geométrico simboliza ordem e serenidade. Herdeiro de duas tradições, uma cristã e outra pagã, o homem do Renascimento sonhou perdidamente com o paraíso terrestre.- Como eram belos Adão e Eva antes do pecado! Tantos artistas no~los recordaram
No plano psicológico, não se pode duvidar de o regresso à mitologia ter sido, em larga medida, depois do Renascimento, para a civilização ocidental, uma forma de sonhar com a idade de ouro. As inúmeras obras que representam os folguedos das ninfas e dos pastores, o triunfo de Baco, a glória de Vénus, os disfarces. de Júpiter -para melhor alcançar os seus objectivos - de cisne, de touro, de chuva~ de moedas de ouro,
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-:om amor e melancolia! E a natureza era doce e calma, o céu era azul, a folhagem verde, as águas límpidas, nos tempos da idade de ouro. O pincel de Hieronymus Bosch faz-se, por uma vez, tranquilo ao evocar, no Juízo Final de Viena -mas apenas a um canto do políptico - , o tempo bendito em que o homem, amigo de Deus, ainda se não deixara conquistar pelo pecado. Mas a tendência de uns sonhos cada vez mais sensuais conduzia à separação mútua da idade de ouro e do pecado original. .. Surge então o Jardim das Delícias Terrestres (Prado), cujo carácter impossível, porém, é mostrado por Bosch. Em primeiro plano, gulosos de ambos: os sexos deliciam-se com grandes melancias, cerejas e morangos. À esquerda do painel, os preguiçosos vagueiam; mais além, as vaidosas regalam-se com a sua beleza. Há aqui quem se divirta com fúteis folguedos; além casais que se entregam ao amor, isolados em conchas ou em bolas de cristal. Tantos prazeres só são psicologicamente verosímeis num mundo de eterna juventude: daí a fonte de Juventa onde belas mulheres -brancas e negras- se entregam a despreocupadas brincadeiras. Bosch pôs o Inferno ao .lado do Jardim das Delícias. Mas, num quadro que está hoje em Berlim, Lucas Cranach, o jovem, representou somente a fonte de Juventa. Ali são conduzidos doentes e aleijados que saem da maravilhosa piscina belos e felizes para entrar logo em festins, danças e risos. ( O Renascimento aplicou todos os recursos de uma técnica perfeita e de uma imaginação refulgente à evocação dos paraísos mitológicos, cujos habitantes, eternamente jovens, só pensam no amor. Poliziano bem afirmou que «nenhum mortal pode penetrar» na morada de Vénus, situada num «monte delicioso» que domina a ilha de Chipre; nem por isso deixa de procurar fazer entrar os humanos nesse local encantado:
Nunca o eterno jardim embranqueceu Sob macia geada ou neve fresca: Aqui não ousa entrar gelado inverno. Nenhum vento fustiga ervas ou arbustos; Os anos não desenrolam os anais das estações, Mas, com sua alegria, a Primavera, nunca ausente, Solta os louros cabelos ao sabor da brisa E, com mil flores, entrança uma grinalda. (Estâncias para o Torneio, 1475-1476)
recriam um país imaginário em que jovens desnudas e encantadoras arrebatam a vista sem nunca se fanar. Até nas epopeias romanescas, em que subsiste o «maravilhoso cristão», os poetas introduzem, tanto quanto lhes · é possível, um paraíso artificial que o leitor sabe de antemão que v~i desmoronar-se, pois é obra do demónio, mas que é sempre a parte ma1s bem conseguida da obra e aquela que lhe garante o êxito. Duas magas, a Alcina do Orlando Furioso e a Armida da Jerusalém Libertada, conseguem momentaneamente - mas este momento é a razão de ser de tais ficções poéticas- enfeitiçar os cavaleiros cristãos. O palácio de Alcina é «pela sua riqueza superior a todos os outros» e as formas da loura jovem são «as mais perfeitas que algum pintor jamais poderá imaginar». Os deliciosos jardins de Armida ficam nas ilhas afortunadas. A maga fez nascer neles águas cristalinas, ervas estranhas, árvores que têm sempre flores e frutos ao mesmo tempo. Num cenário como esse, Renato, levado para fora do tempo, saboreia sem se cansar os beijos de Armida.
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oposta ao seu sonho. A Itália dos séculos XVI e XVII deixou-nos um mapa do «país de cocanha» que mostra que todo o Ocidente necessitava desta evasão singularmente concreta. Ali podemos ver montanhas de queijo ralado banhadas por um mar de vinho grego, árvores todo o ano repletas de fruta verde, cristalizada e de conserva, carpas fritas e enguias de escabeche a saltar de rios de vinho moscatel. Chovem faisões assados e lebres bem lardeadas e as corujas, nas florestas, em vez de ovos põem mantos e vestidos. Mais além, um homem, entre dois sargentos, leva o seguinte dístico: «vai preso porque trabalhou». Em 1631 foi representada em Paris uma farsa de análogo teor, Des roulles-bontemps de la haute et basse Cocagne. E Rabelais já cem anos antes imaginara um país onde se ganhava cinco soldos por dia para dormir e sete soldos e meio para ressonar. O país de cocanha vinha à realidade, excepcionalmente, nos banquetes camponeses pintados por Bruegel ou naquela estranha festa napolitana que se chamava exactamente cucagna: levantava-se numa praça da cidade um Vesúvio artificial do qual saíam, em erupções sucessivas, salsichas, carnes cozinhadas, maccheroni que, ao cair, ficavam cobertos do queijo ralado com que o monte fora salpicado previamente. O povo batia-se para apanhar pedaços deste festim gratuito - realidade de um dia e sonho de todo o ano.
Mas a poesia pastoril, a mitologia e as feiticeiras só têm vida nos sonhos dos ricos. Os sonhos dos pobres são menos requintados. Na época do Renascimento, os humildes têm fome e sofrem duramente. Os paraísos artificiais são, portanto, para eles, principalmente, paraísos onde não é preciso trabalhar para encher a mesa de vitualhas. Assim se explica a duradoura fortuna dos «países de cocanha» *, como o que Bocácio descreve a um ingénuo no Decameron (8." jornada, 3.! novela). A região de Bigoudi é descrita do seguinte modo: «É um país onde as videiras são atadas com salsichas e onde por um dinheiro se compra uma pata e um patinho. Há lá um monte que é todo de puro queijo parmesão gratinado; e os seus habitantes passam o tempo a fazer maccheroni e ravioli ... Corre perto um ribeiro de vinho branco - do melhor que há - que não tem nem uma gota de água!» Já foi muito comentado, erradamente, o quadro de Bruegel, o Velho, O País de Cocanha, que está na pinacoteca de Munique. Quis-se ver nele «a epopeia da glutonaria flamenga». Mas a obra, na realidade, tem um significado mais geral e mais profundo que esse. Localiza na Flandres um sonho de toda uma civilização que, por esplendorosa que possa parecer, conhece frequentes fomes, epidemias e guerras. Será por acaso que esse quadro, datado de 1567, é contemporâneo da implacável repressão do duque de Alba? O ano de 1567, nos Países Baixos revoltados, foi um ano de miséria. Como se não havia então de imaginar bolos a cair dos telhados, sebes feitas de salsichas, leitõezinhos já assados e com a faca com que serão trinchados, belos gansos dourados prontinhos no prato, ovos cozidos a andar com perninhas próprias? Saciados e refastelados à volta de uma mesa onde ainda estão muitas vitualhas, um soldado, um camponês e um estudante esquecem por momentos uma realidade bem
Os paraísos artificiais são perigosos: esquecendo a alma, o homem corre o risco de neles se entregar aos prazeres dos sentidos. É esse um dos temas favoritos de Bosch, pintor moralizante que terá sido, e foi essa a razão pela qual ele pôs o Inferno ao lado do Jardim das Delícias Terrestres. No Juizo FJ.nal de Viena, atrás citado, a maior parte do polfptico não é dedicada à evocação da felicidade idílica na paz do Éden mas sim ao triunfo de Satã numa sinistra noite aqui e além iluminada por labaredas, É verdade que, no andar de cima, Deus, os anjos e alguns eleitos escapam ao desencadear do terror. Mas o mundo inferior está completamente mergulhado neste terror e é bem claro que há mais condenados às penas do Inferno do que eleitos. Um demónio, cuja cabeça parece pertencer a uma ave de bico comprido, leva um réprobo na alcofa. Outro leva ao orribro uma vara de onde pende, pelos pés e pelas mãos, um futuro habitante do inferno já atravessado por uma seta. Satã, de turbante~ tem olhos de fogo e feições de besta feroz. A roupa, entreaberta, mostra, em vez de ventre, as grelhas de um forno. Tem cauda e patas de rato e recebe os hóspedes à porta do inferno, rodeada de uma enfiada de repelentes sapos . .Deste modo, os paraísos artificiais têm, como contrapartida, horríveis pesadelos. No Triunfo da Morte, Bruegel, o Velho, retoma a inspiração de Bosch. Esta obra é um aviso ao pecador. Opõe à inanidade dos prazeres, das riquezas e do poder uma visão alucinante que pretende ser mais verdadeira que os gozos terrenos. Aqui, a gran(je ceifeira, montada numa pileca escan-
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lados de anatomia e dissecção da época. Quem abrir a pasta do fan-
zelada, precipita-se sobre os vivos. Além, conduz uma carroça cheia de cadáveres. Mais adiante, empurra os humanos, ainda de pé, para uma monstruosa ratoeira onde um esqueleto toca tímbalos. Essas imagens eram con~ebidas para impressionar imaginações simples e para fazer gelar de medo cristãos descuidados. Mas Bosch ao contrário disso, quer também por vezes ensinar que há que co~servar a calma perante os sortilégios do demónio por muito grande mágico que ele seja. As combinações monstruosas que Satã pode fazer-nos aparecer não têm, afinal, nenhuma consistência. Tal é a significação das várias Tentações de Santo Antão, que melhor seria chamar «tormentos de Santo Antão». O grande tríptico de Lisboa é, sem dúvida, a melhor das obras dedicadas pelo pintor a este tema já vulgarizado pela Lenda Dourada. O santo ~ê nascer mil formas alucinantes: bilhas de barro com pernas, \una velha CUJO manto é a casca de uma árvore morta e cujo corpo acaba em aipo, um velho a dar lição a um macaco e a um gnomo um mensa.. . . ' geiro a correr na areia com patms para gelo, uma mesa ricamente posta para um alegre festim, jovens de ambos os sexos que convidam Antão para nele participar. A tudo o eremita se mostra impassível: só Deus conta para ele. O diabólico prestidigitador não leva a melhor. Ao .dar uma rápida volta ao horizonte das obras pictóricas do Renascimento que representam pesadelos é impossível não dizer algumas palavras acerca de Dulle Griet, «A Margot enraivecida», de Bruegel (Antuérpia, museu Mayer Van den Bergh). Que significa, num fundo de ~cêndio, aquela megera armada de gládio, fora de si, a avançar para o mferno à frente de um exército de viragos delirantes? Será a medonha visão daquilo em que o mundo se transforma quando abandonado à maldade e à loucura? Há uma interpretação mais simples e mais prosaica que relaciona este quadro - o mais bem pintado pelo artista - com a~ fábulas e farsas da Idade Média. Teríamos então a sátira da mulher irascível e dominadora. Margot e as que a seguem atacam os homens a quem já por muito tempo obedeceram; agora livres, destroem tudo e enfren't am o próprio diabo. As recordações dos quadros de Bosch uma imaginação espantosa e uma fantasia escarninha estariam, assim, ;o serviço de uma obra marcada com o selo de um muito tradicional anti·feminismo. Esta hipótese é, provavelmente, de aceitar mas nada retira ao facto de a magistral piritura ser um pasadelo. E há ainda a acrescentar que o século XVI foi, até ao fim , assombrado por alucinações que não tinham, forçosamente, significado moral. Tocou brilhantemente no teclado d~s rp.etamorfoses. Gostou de ~onjugar o burlesco com o obsceno, a paródJa com a crueldade. Comprouve-se com o disparatado, o estranho, o disforme. Provam-no as «marcenarias fabulosas» de Lorenz Stoer, os autómatos .cubistas e as bizzarrie de Bracelli, as paisagens antropomorfas de um anónimo dos Países Baixos, em que as sobrancelhas são roços de mato, a barba um maciço de arvoredo, o nariz um . grupo de casas; provam-no ainda esses esfolados, qual deles mais alucinante, que . povoam os tra-
Fausto existiu. Astrólogo e médico alemão um tanto ou quanto suspeito, morreu antes de 1544 mas, no fim do século XVI, era já uma figura lendária. Surge-nos como uma espécie de super-homem num Volksbuch de 1587 e, principalmente, na peça de Marlowe • (cerca de 1589). Graças a Mefistófeles, tudo Ih~ é possível. Leva vida opulenta, servido por espíritos ;=-visíveis. No fipi da vida tem por companheira Helena da Grécia,
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1 1stico convencer-se-á facilmente de que o Renascimento foi um tempo
de pesquisa e inquietação, rico de muitas virtualidades e de desejos con1raditórios, mas que ainda não fizera a escolha nem encontrara o equilfbrio.
* Leonardo da Vinci e Rabelais exprimiram, cada um a seu modo, o poder e a diversidade das aspirações do Renascimento- aspirações demasiado numerosas para não serem utópicas. Leonardo foi um pimor admirável e um anatomista de primeira ordem. Mas, como engenheiro, não deu nenhuma contribuição técnica decisiva. E, quanto ao programa de estudos que Gargântua es~abelece para seu filho Pantagruel, ainda se não reconheceu bastante como era utópico. Tem-se esquecido que era um gigante a escrever a outro. Rabelais não ignorava que um só homem não pode conhecer «perfeitamente» e ao mesmo tempo o grego, o latim, o hebraico, o árabe e o «caldaico», «todos os cânones» da astronomia, todos os «belos textos» do direito civil e ter ainda por cima aprendido todas as ciências naturais e a medicina. O ensino humanista evitou perseguir tais quimeras, mas estas dão testemunho de uma época que, por vezes, teve mais ambições que razão. Terá sido por acaso que o Renascimento criou a personagem de Fausto?
69. «A TRÁGICA HISTóRIA DO DOUTOR FAUSTO~. (Edição de 1631 da peça de Marlowe.)
uma jovem encantadora de cabelos dourados e olhos negros que na realidade é um demónio súcubo. Mas o maior pecado de Fausto foi ter desejado, mediante um pacto com o diabo, saber quase tanto como Deus. «Abusou do dom glorioso do entendimento.» Deste modo, o tema de Fausto faz reviver o tema· de Prometeu. No Volksbuch, Mefistófeles, ao tentar Fausto, que ainda não assinara o pacto fatal, diz-lhe: «Aprende agora comigo a fazer o trovão, 'o relâmpago, o granizo, a neve e a chuva aprende a rasgar as nuvens, a sacudir' a terra e os escarpados rochedos,, a parti-los em dois, aprende a encrespar os mares, a fazê-los rugir e saltar do seu leito ... Aprende, ó Fausto, a voar como eu voo, rápido como o pensamento, de um reino para outro ... ». Na obra de Marlowe, o sonho de omnisciência e de todo-poderio tem novamente grande importância. Mefistófeles diz a Fausto:
As utopias*, «descrições (em tom sério) de mundos constituídos segundo princípios diferentes daqueles que vigoram no mundo real» (R. Ruyer), floresceram em grande número na época do Renascimento. São testemunhas do divórcio, muito duramente sentido por alguns, entre as aspirações dessa época e as suas realidades de todos os dias. O optimismo acerca do futuro - mas um futuro estranhamente longínquo - tinha por contrapartida uma visão pessimista do presente. A Utopia de Thomas More* (1516) é o melhor reflexo dessa dialéctica em que certo pensamento humanista se debateu. A obra, de facto, divide-se em duas partes antitéticas. A primeira descreve com cores sombrias a Inglaterra do Renascimento; a segunda opõe a esse quadro inquietante a visão radiosa de uma ilha sem problemas em que todas as dificuldades políticas, sociais, eç:onómicas e religiqsas foram definitivamente abolidas. Que . é a Inglaterra de Henrique VIII? Um país onde a desigualdade acarreta a pior
desordem. A mendicidade, a vadiagem e o roubo são realidades quotidianas. Os nobres ociosos arruínam as profissões honradas. Os grandes proprietários fundiários, substituindo as terras cultivadas por pastagens para o gado, expulsam da terra os camponeses e fazem aumentar o número dos desempregados. Toda a legislação reflecte «a conspiração dos ricos contra os pobres». A política externa das nações do século XVI é simultaneamente belicosa, dispendiosa e de má fé. Urge, pois, dar a conhecer aos Europeus a ilha espantosa e longínqua, descoberta por viajantes que «não quiseram deixá-la senão quando deixassem a vida»: Utopia. A Utopia tem a forma de um crescente, e nesse golfo natural há abrigo seguro para os navios. Tem cinquenta e quatro cidades, cada uma delas com seis mil famílias. Uma delas, Amaurota, é a capital. Os habitantes, que formam famílias com um mínimo de quarenta pessoas cada unia, vão cultivar os campos por turnos. Mas quem tiver especial interesse pela agricultura poderá viver no campo todo o ano. A vida económica é dirigida pelo Estado e a propriedade é colectiva. A igualdade é total e a nobreza foi suprimida. Para garantir o bem estar de todos bastam seis horas de trabalho diário. Mas não há ninguém ocioso. O deitar é às oito da noite e o levantar às quatro da manhã. O governo, que mantém em dia estatísticas muito exactas e guarda artigos e géneros alimentares em armazéns gerais, faz parar a produção quando surgem sinais de saturação. A partir desse momento, todos têm vagar para se cultivar. Na Utopia não há moeda para uso interno. Basta pedir aquilo de que se necessita. As cidades mais prósperas, naturalmente, dão ajuda às mais necessitadas; e, do mesmo modo, as famílias que têm muitas crianças cedem algumas às que têm menos. Os metais preciosos são desprezados. O ouro serve para fazer -correntes para os presos e vasos de noite. De dez em dez anos, os habitantes da Utopia procedem à mudança geral de casa~. que são tiradas à sorte. Cada casa tem o seu jardim. As refeições são tomadas em comum ao som de uma trombeta. Quando esta dá o sinal, a sufograncia -ou seja, trinta familias - dirige-se ao respectivo· edifício, onde jovens e velhos se sentam lado a lado, ficando os homens em frente das mulheres. São as crianças, que comem de pé, quem serve. As crianças de peito ficam numa sala anexa ao refeitório geral. No início da refeição faz-se a leitura de uma obra de moral; e depois todos se entregam a conversas agradáveis e decentes. Ao jantar há música sin- · fónica. O governo é de carácter familiar. Cada trinta famílias elegem um sufogrante e duzentos sufograntes escolhem um príncipe que é designado vitaliciamente mas pode ser destituído em caso de despotismo. Nada de importante é resolvido sem a aquiescência do senado dos sufograntes. Os habitantes da Utopia são valentes na guerra, mas são gente de paz. Só para se defender fazem guerra, ou então para socorrer aliados vítimas de alguma agressão ou para castigar a má fé dos negociantes de países vizinhos. Mas preferem sempre fazer. contra os adversários; guerras
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Um bom mago é um deus omnipotente! Portanto, Fausto, com o teu cérebro poderoso, faze-te um deus! Efectivamente, o demónio ensina a Fausto astronomia, astrologia, medicina e matemática; dá-lhe um carro puxado por dragões alados no qUal o doutor alemão voa sobre os continentes, e Fausto chega assim, na região do Cáucaso, à vista do paraíso terrestre, guardado pela espada flamejante de um querubim. Quando Helena lhe dá um filho, Justus Faustus, este já nasce omnisciente. Fausto personifica, assim, não só um intelectual preso pelo demónio ·da carne mas, mais, o homem sedento de absoluto que sonha dominar o mundo. É talvez um romântico avant la lettre; é, principalmente, o representante de um século ambicioso, embriagado pela liberdade, pela glória e pelo saber e cujos desejos foram, muitas vezes, bastante além das suas possibilidades.
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«económicas». Para abreviar ou evitar os conflitos armados, procuram conseguir o assassínio do rei inimigo; ou então compram cúmplices no campo adverso. Na Utopia, onde, de um modo geral, são evitadas condenações à morte, existe escravatura: os escravos são prisioneiros de guerra ou de direito comum. Como a Utopia é uma grande família, o casamento é objecto de especial atenção. O único crime de morte é o adultério. Na ilha de Thomas More, as raparigas só podem casar depois de fazer dezoito anos; os rapazes, depois de fazer vinte e dois. Os casamentos são feitos em perfeito conhecimento de causa: os noivos, sob diligente vigilância de uma honesta matrona e de um homem de bons costumes, observam-se um ao outro, antes do casamento, completamente nus. No entanto, se a vida conjugal, mais tarde, der lugar a incompatibilic;lades de temperamento entre os esposos, poderá haver divórcio, mas só depois de minucioso inquérito do senado. Na vida corrente, «O marido tem sobre a esposa a mesma autoridade que sobre os filhos». Os habitantes da Utopia não se mortificam. Apreciam a boa saúde e procuram os prazeres da natureza. Têm o direito de suicidar-se em caso de doença incurável. O cristianismo só ·há muito pouco tempo entrou na ilha, recentemente descoberta pelos marinheiros de Vespucci. Há, pois, várias religiões na Utopia, mas a maioria dos habitantes já abandonou «os deuses vulgares, filhos de uma imaginação desordenada, (e) apenas reconhecem uma única divindade eterna, imensa, incompreensível, cujos atributos são todos ·Infinitos, como infinitos são o seu poder e a sua glória». Esse ser supremo, chamado Mitra, recebe culto nacional. Além disso, são permitidos todos os cultos privados e a tolerância é geral. Há horror ao fanatismo e ao zelo indiscreto. Por outro lado, o ateísmo é proibido e os ateus são éxcluídos dos cargos públicos. Os sacerdotes encarregados do culto colectivo são poucos: treze em cada cidade; mas são hÓnestos e levam vida de santidade. Celebram nos templos cerimónias muito sóbrias, sem sacrifícios sangrentos. Não praticam magia e detestam as superstições. Celebram também cerimónias fúnebres, nas quais os cadáveres são queimados. Os funerais não são ocasião de lamentos: reza-se pelos mortos e dirige-se a Mitra cânticos alegres. A morte'; depois de uma vida feliz, é suave, pois é a partida para uma eternidade de bem-aventurança. Visto ser tão bom viver na Utopia, porque há-de alguém deixá-la? Para ir ao estrangeiro é preciso obter autorização, e o passaporte leva indicação da duração exacta da ausência. Se alguém partir furtivamente e for apanhado sofrerá castigo como desertor; e, se reincidir, será feito escravo. Para dar a volta à cidade ou para percorrer os campos próximos é preciso obter autorização do pai e da esposa. É verdade que, nas horas de recreio, é permitido passear; mas quem esquecer a hora do jantar ficará sem comer, pois não haverá comida nenhuma no refeitório público depois da hora própria.
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De certa maneira, Rabelais dedicou-se também ao r mhora seja difícil avaliar qual a sua dívida para com 1>t qualquer modo, retomou - mas quase exclusivamente livro, Pantagruel (1532)- os nomes que o humanista
gênero utópico, Thomas More. no seu primeiro inglês pusera a
70. A ABADIA DE TELEMA. (Segundo A. Blunt,
Philibert Delorme.)
circular: «Gargântua ... gerou seu filho Pantagruel de sua esposa chamada Badebec, filha do rei dos Amaurotas de Utopia». Mais tarde, Pantagruel, estudante em Paris, sai desta cidade «ao ouvir a nova de que os Dipsodos (isto é, os sedentos) estavam a invadir o país dos Amaurotas». A ilha de Utopia é situada por Rabelais algures além da índia. Pantagruel, depois de longa viagem - dobra o Cabo da Boa Esperança-, chega finalmente à ilha dos Amaurotas, que está cercada, intervém no combate e entra vitoriosamente na capital de Utopia. No início do terceiro livro, diz-se ainda que Pantagruel, depois de ter «conquistado completamente a Dipsodia», levou para lá uma colónia de Utopianos e Utopianas de rara fecundidade, que se multiplicaram como gafanhotos naquele país salubre. Depois disto, a ilha de Utopia desaparece da obra de Rabelais. Mas Pantagruel e seu companheiro Panurge não deixam de visitar países espantosos: a ilha dos Macraeons, a ilha dos Tapineses, a ilha Sonante e a ilha de Odes, «onde os caminhos caminham>>. Já alguém disse que são «invenções mais ubuescas que utópicas». É certo que a utopia, na medida em que procura seriamente fazer passar como real aquilo que . contraria a experiência quotidiana, está mais no uso do tempo de Gargântua, instruído e educado por Ponocrates, ou no louco programa de estudos dado por Gargântua a Pantagruel, que nas descrições paródicas e truculentas de regiões fantásticas. Também a abadia de Telema é, em certa medida, uma constrÚção utópica. A arquitectura e a decoração do estranho convento .;;ão, bem entendido, verdadeiramente romanescas, 25
já que o edifício é «cem vezes mais magnífico que Bonivet, Chambord ou Chantilly». Mas Rabelais exprime um ideal humanista e só entra no género utópico quando descreve o tipo de vida dos Telemitas, que é o exacto oposto de uma existência monacal. Não há muros a defender Telema das tentações do mundo exterior; não há relógios para coma~dar o emprego do tempo da comunidade («pois a maior ilusão do mundo está em governar-se pelo toque dos sinos e não pelos ditames do bom senso e do entendimento»); não há votos de castidade, de obediência.nem de pobreza, que são substituídos pela divisa «casamento, riqueza e liberdade». Como, vulgarmente, só são admitidas nos conventos mulheres «zarolhas, coxas~ marrecas, feias, disformes, loucas, insensatas, maleficiadas e taradas» e homens «encatarrados, mal nascidos, atrasados e empecilhos de casas (que só dão estorvo à família)», em Telema só serão recebidas raparigas «belas, bem feitas e de boa natureza» e rapazes «belos, bem feitos e de boa natureza». Como as mulheres são excluídas dos conventos masculinos e os homens são excluídos dos conventos femininos, Gargântua decide que a nova abadia seja mista. Como os religiosos e as religiosas, uma vez pronunciados os votos, já não podem voltar com a palavra atrás e voltar para o mundo, os Telemitas poderão sair quando lhes apetecer, «francamente e inteiramente». Em Telema triunfam a felicidade e a harmonia porque não há regra. A divisa «faz o que quiseres~ não é apenas um paradoxo de Rabelais: prova-o a explicação que dela dá, com seriedade evidente, ao afirmar que «pessoas livres, bem nascidas, bem instruídas, a conversar em companhias honestas, têm, naturalmente, um instinto e um aguilhão que as impele sempre a actos virtuosos e repele o vício». Telema é apenas um fragmento de utopia. Mas, pelo contrário, a Breve description de l'État d'Eudémoné, cité du pays de Macaria, composta em 1533 por Kaspar Stiblin, obscuro professor de Selestat, apresenta-se, tal como a de Thomas More, como uma utopia completa. Stiblin põe a ilha de Macaria no Oceano Índico; tem campos férteis e vinhas, nobres muralhas e os mais belos edifícios do mundo. Eudémoné, cidade circular e harmoniosa, é acolhedora para os estrangeiros. Os Eudemonitas têm elevado sentido cívico, mas não baseado na igualdade. De facto, os cidadãos repartem-se em patrícios e plebeus. Os humildes não invejam os poderosos, embora um pobre tenha dificuldade em chegar a um cargo público. É que a nobreza é austera e instruída e as decisões do seu senado trazem a marca de uma clarividente sabedoria. Como o povo é considerado inexperiente, versátil e ávido de lucros, a salvação do · Estado só pode obter-se com o governo dos nobres. O regime é patriarcal e conservador. Aquilo que mais se receia são as sedições e as conjuras, rigorosamente punidas. Mas, por outro lado, os cidadãos virtuosos são recompensados e cobertos de honrarias. O espírito cívico é reforçado por meio de banquetes, a um tempo sóbrios e alegres, durante os quais são discutidos os negócios públicos. Em geral, os Euçlemonitas não são nem
oa111ito ricos nem muito pobres. Desconfiam dos banqueiros e dos mercalh>rcs, gostam mais da agricultura do que do artesanato, só compram e só y,,ndcm aos preços fixados pelo Estado, contentam-se com muito pouco ,., portanto, não precisam de trabalhar muito. Têm bastante tempo para ,. cultivar. Os magistrados têm medo do contacto com os costumes pnvertidos dos outros povos e não gostam de que os seus súbditos saiam da ilha. De qualquer maneira, as modas estrangeiras são proibidas em Macaria. Cada classe e cada sexo tem o seu uniforme. O Estado dá espel'ial atenção à educação e instrução das crianças. Todas as escolas públicas da cidade feliz estão juntas num edifício magnífico, no qual se ensina llnguas antigas, filosofia, medicina, matemática e teologia. Os professores N o os cidadãos mais bem pagos da ilha. O programa de estudos é pesado, mas os alunos nem por isso esquecem as competições desportivas. Profundamente cristãos, os Eudemonitas repelem as superstições e baseiam-se, essencialmente, nas Escrituras. Mostram-se mais inclinados à devoção c às obras pias que às subtilezas dogmáticas. Neste aspecto, Stiblin situa-se na tradição do irenismo de Erasmo. A Cidade do Sol, de Campanella (1568-1639), dominicano calabrês oriundo de uma família pobre e ignorante, permite-nos verificar, mediante um exemplo típico, a síntese do milenarismo medieval e das tendências utópicas de um Renascimento que não esquecia Platão. Tal como Joachim de Flore, ele acreditara inicialmente no advento da cidade celeste, que predisse para 1600. O novo reino instalar-se-ia na Calábria e Campanella entrou numa conjura destinada a facilitar o facto. Metido numa prisão - onde esteve vinte e sete anos -, o dominicano escreveu então a Cidade do Sol. Essa cidade maravilhosa, formada por sete grandes anéis concêntricos, ficava algures nos mares equatoriais. Construída numa colina, era dominada pelo admirável templo do Sol, encimado por enorme cúpula. No interior desta estavam representados todos os astros do céu. O soberano era um sacerdote chamado «Metafísico», e era assistido por três chefes,. Pon, Sin e Mor, cujos nomes significavam «poder», «sabedoria» e «amor», pois estas três virtudes são atributos do Ser. Pon estava encarregado do exército, Sin da ciência, das artes e do ensino e Mor das relações entre os dois sexos, da educação, da medicina, da agricultura e dos abastecimentos. Os habitantes desta cidade possuíam tudo em comum, incluindo mulheres e filhos. Como o egoísmo desaparecera, eram desconhecidos os roubos, os assassínios, os adultérios, os incestos e a devassidão. Todas as crianças recebiam instrução, tão pouco livresca quanto possível, e baseada na observação da natureza. De seis em seis meses, as autoridades indicavam a cada um a casa em que viveria no semestre seguinte. Cada quarteirão da cidade tinha o seu celeiro, a sua cozinha e o seu refeitório colectivos. As refeições eram tomadas em comum, com os homens sentados em frente das mulheres, e em silêncio, pois havia leitura. Todos vestiam de branco. Os trabalhos agrícolas realizavam-se em grupo, nas épocas propícias. Os Solarianos não trabalhavam
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uorme que lhe fizera regredir a civilização. Em contrapartida, a ilha dt• .Hensalem fora poupada pelo cataclismo. Havia dezanove séculos que ,. conservava isol!ida para manter a originalidade e o alto nível da sua nvilização, mas de doze em doze anos enviava uma expedição secreta 10 resto do mundo para saber o que nele se ia passando. Bensalem não t•umerciava com o exterior e não utilizava moeda. No entanto, tinha comércio interno, realizado por ,empresas privadas por meio de trocas. O seu governo era monárquico e a vida familiar de tipo patriarcal. Em llcnsalem gostava-se dos tecidos de cores vivas e de turbantes à turca, mas os costumes eram puros e a prostituição não existia. A grande originalidade de Bensalem - e aqui passamos da ficção romanesca à utopia - era a «Casa de Salomão», ou Instituto das Ciências, uma espécie de «olho da nação». Para os sábios que dela faziam parte e eram os verdadeiros chefes de Bensalem, o que interessava não era tanto o aperfeiçoamento de técnicas utilitárias como o alcançar «a realização de tudo o que é possível». Ao rendimento económico preferia-se uma ciência entendida como arte. Possuidores de fornos de altas temperaturas, labotórios subterrâneos, lunetas astronômicas, microscópios, torres para o estudo do céu e das nuvens, praticando a vivissecção, os sábios de Bensalem eram verdadeiros taumaturgos. Criavam novas espécies vegetais e animais, aceleravam o crescimento das árvores, fabricavam produtos desconhecidos na Europa e preparavam conservas alimentares. Sabiam navegar debaixo de água e voar. Podiam, nos seus laboratórios, fazer aparecer fantasmas. Mas não se serviam desse espantoso poder para enganar o povo. A «Casa de Salomão>> era uma equipa de sábios entre os quais as várias tarefas eram minuciosamente distribuídas. Os «comerciantes de luz», mercatores lucis, faziam (secretamente) observações no estrangeiro; os depr{l!datores consultavam os livros, os venatores estudavam as técnicas artesanais. Havia ainda experimentadores, classificadores de experiências, analistas encarregados de delas extrair conclusões. As assembleias gerais compilavam a documentação e as conclusões e ordenavam as experiências decisivas. Todos os membros do Instituto juravam guardar segredo das verdades e descobertas cuja publicação pudesse ser perigosa. A Nova Atlântida tem um aspecto de ficção científica que nos espanta. Mas não devemos modernizar demasiado a obra de Bacon, que anuncia menos uma civilização transformada pela técnica que uma sociedade em que a ciência ocupasse o principal lugar: neste sentido, é um escalão intermédio entre o pensamento antigo e o pensamento moderno.
mais de quatro horas por dia, mas tudo abundava naquela cidade feliz onde não se sabia o que era parasitismo nem riqueza. O ouro servia só para adornos. As técnicas eram já muito aperfeiçoadas e os conhecimentos de meteorologia eram vastos. Havia charruas à vela, barcos de foles e rodas e máquinas de guerra. Mor era, naturalmente, o magistrado encarregado de superintender tudo o que dizia respeito à geração, sendo para isso auxiliado por astrônomos. Os habitantes da cidade do Sol iniciavam a vida sexual aqs vinte e um anos os rapazes e aos dezanove as raparigas. Homens e mulheres apresentavam-se nus nos jogos públicos, como em Esparta, para que as autoridades pudessem avaliar quais deles melhor se adequavam à procriação e como se adequavam reciprocamente. As mulheres grandes eram unidas a homens grandes, mas as gordas aos magros e inversamente. As uniões realizavam-se apenas de três em três noites e só depois de banhos e orações e de concluída a digestão. Enquanto aguardavam a hora apropriada, que era indicada por um médico e um astrólogo, o homem e a mulher dormiam em quartos separados. Chegado o momento do seu encontro, a porta de comunicação entre os quartos· era aberta por uma matrona. Estes quartos tinham belas estátuas de homens ilustres para que as mulheres, contemplando-as, pudessem conceber boa progenitura. As crianças, separadas das mães aos dois anos de idade, eràm educadas em comum. Campanella sempre afirmou a sua ortodoxia católica, e por esse motivo renunciou à comunidade das mulheres. É difícil dizer se a 'religião da cidade do Sol era um pré-cristianismo ou um cristianismo purificado. Digamos que, como no caso da Utopia de More, era uma religião natural muito depurada, com a intuição da Trindade, e que estimulava as confissões públicas, o jejum dos sacerdotes e o canto dos salmos, quatro vezes ao dia, no templo. Um cidadão, substituído de hora a hora perante o altar do Sol, elevava continuamente ao Eterno a oração da cidade «como entre nós se faz -escreve Campanella- com a solene oração das quarenta horas». Não há, portanto, oposição entre esta religião e a de Cristo. Mas, ainda como a da Utopia, esta não se orienta para a salvaÇão das almas e não acentua o drama da cruz: «Cristo - escreve Campanella- esteve na cruz apenas durante s.eis horas ... Porque havemos nós de o representar sempre no meio de dores e de sofrimentos, afinal bem leves quando comparados com as alegrias seguintes· ao suplício?». As cidades utópicas, por definição, são cidades felizes. A Nova Atlântida, publicada por Francis Bacon * (1561-1626) no mesmo ano que o Novum Organum (1620), é uma obra inacabada. Não é tanto uma cidade perfeita que nos mostra, mas, antes, um povo feliz graças à autoridade e actividade de uma academia científica. Bacon relaciona a sua ilha de Bensalem, que situa no Pacífico, com a Atlântida tle Platão. Esta, ao contrário do que julgava o filósofo grego, não fora engolida pelas águas: era, simplesmente, a América, devastada por um dilúvio
As utopias do Renascimento, ligando-se, para lã da Idade Média, a uma corrente de pensamento muito antiga e a uma tradição platônica, mo'stravam-se indiscutivelmente inadaptadas ao presente. De êerta maneira, os utopistas do século XVI e do início do século XVII estavam
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atrasados em relação ao seu tempo e não o compreendiam. Louvavam um estrito colectivismo na época em que se afirmava um individualismo que facilitava o erguer de nova civilização. Quando, no Ocidente, se desenvolvia o sentimento nacional, os utopistas construíam fora do tempo e do espaço estados sem tradição nem passado - estados que eram apenas cidades ou grupos de cidades. Ora não provava a história daquele tempo que só as cidades podiam fazer a história? As literaturas europeias iniciavam os seus voos, mas Thomas More aplicou-se à criação de uma lingua artificial. O capitalismo desenvolvia-se, mas os utopistas recusavam a propriedade privada e a moeda. As grandes viagens marítimas multiplicavam as trocas entre continentes e estabeleciam ligações mais estreitas entre os povos, mas Thomas More, Stiblin, Campanella e Bacon conservavam no isolamento os estados dos seus sonhos. Finalmente, o Renascimento foi, em muitos aspectos, a descoberta da natureza; mas as utopias, em contrapartida, desconfiavam irremediavelmente de tudo o que .é natural. Nelas, o homem remodela sempre a paisagem; e Bacon, que faz a apologia dos ersatze, dá pão sem trigo aos habitantes de Bensalem. Há caracteres comuns às utopias do Renascimento e às da Antiguidade, caracteres que mais tarde podemos encontrar nas utopias do século XIX. Estas utopias são estados isolados, autárcicos. Dão uma confiança total ao dirigismo e à planificação. Fazem das instituições causa e não efeito. Só conhecem o interesse geral, ignoram os indivíduos como tais e restringem o leque dos sentimentos humanos. Imaginam cidades uniformes, onde tudo é ordem e simetria e em que toda a vida da colectividade obedece a rígido horário. Dão uma grande importância à educação, mas esta, de Platão a Campanella, é sempre concebida em espírito resolutamente conservador. O seu objectivo consiste em formar cidadãos que conservem a cidade perfeita sem nada modificar. Em resumo: a atmosfera destas «cidades felizes>> parece asfixiante; a vida nessas cidades parece morna e cinzenta. O eudemonismo colectivo, engenoraoo por msmmçoes demasiado bem estudadas e pela perigosa lógtca: dos legisladores fechados numa sala, tem algo de assustador. E, do mesmo modo, a abadia de Telema, na qual dominam a graça e o sorriso, também não pode ser assimilada a uma cidade utópica. Em certos aspectos, porém, é-o. Faz gala em apresentar-se como «um mosteiro ao contrário, mas mesmo assim é um mosteiro, ou seja, uma comunidade, e uma comunidade muito estreita» (R. Ruyer), que não deixa de criar a uniformidade. Os Telemitas, escreve Rabelais, «com essa liberdade, entraram na louvável emulação de fazer todos o que a um só viam agradar. Se um deles, homem ou mulher, dissesse «bebamos», todos bebiam; se dissesse «brinquemos», todos brincavam; se dissesse «vamos passear pelos campos», todos iam. A abadia criada por Gargântua tem outra característica típica das utopias, na qual já insistimos: é, sob todos os aspectos, uma espécie de negativo da realidade quotidiana. E, finalmente, Rabelais não deixou, à maneira dos utopistas, de especificar com certo requinte de
IHlllllcnores a arquitectura da abadia nova. A construção tem a forma de ""' hexágono, com uma grande torre redonda em cada canto, e o rio , , u rc do lado norte. Trezentos e doze passos separam cada duas torres , 1111sccutivas. Há cinco andares habitados, mais as caves, etc. É que os fabricantes de utopias facilmente descambam em urbanistas , os urbanistas facilmente passam à utopia, tendendo a fazer-se Iegisla•llll'Cs. Uns e outros têm em comum a convicção de que o quadro da vida quotidiana actua profundamente no espírito dos habitantes e de que «se pode modificar os homens organizando o espaço. em que eles se movimentam». As cidades ideais, como são criações artificiais em que nenhum passado pesa, são sempre traçadas a régua e esquadro, vazadas l'lll formas perfeitamente geométricas. A colónia cujo plano Platão estabelece nas Leis divide-se em bairros que irradiam de um centro. O mesmo sucede com Sforzinda. Mas a geometria dos arquitectos de utopias corresponde a uma elevada missão: tem de fazer da cidade ideal uma imagem do cosmos e reflectir a sua soberana harmonia. Filareto pensa gravar no pavimento da catedral de Sforzinda um mapa da Terra rodeado dos doze meses; na cúpula, cuja forma é a própria imagem da perfeição divina, Deus ficará simbolizado por um sol radiante. Nos meados do século XVI, Doni, nos seus Mondi Celesti -outra utopia do Renascimento, pois não pudemos estudá-las a todas-, imagina uma cidade que no solo desenhasse o astro-rei, com um templo central, cem ruas radiais e muralha circular. A Cidade do Sol de Campanella também gravita em volta de um templo encimado por gigantesca cúpula pintada como o firmamento. Essa cúpula abre-se para o exterior por quatro portas, cada uma em seu ponto cardial, e divide-se em sete círculos concêntricos que correspondem aos sete planetas. Mas tudo isto são cidades irreais situadas em países artificiais. Os autores das utopias sabem-no bem. Os nomes utilizados por Thomas More são, quanto a isto, significativos. A ilha que se propõe descrever foi descoberta por Hythlodeus, cujo nome podemos traduzir como «vencedor de ninharias»; Utopia quer dizer «sítio nenhum»; Amaurota, a capital, é a «cidade fantasma>> ou, pelo menos, a «cidade des<>onhecida»; fica à beira do Anydris, «rio sem água», é governada por Ademus, o «príncipe sem povo», e habitada pelos Alaopolitas. «cidadãos sem cidade». E as arquitecturas utópicas também não procuram ser funcionais. A colónia de Platão (cf. as Leis) tinha casas pegadas à muralha exterior, formando contraforte, numa disposição tão pouco prática como impossível, já que nem se poderia circular pelas muralhas nem abastecer comodamente os seus defensores. Apesar disso, vamos encontrar este pormenor absurdo num desenho do princípio do século XVI do anónimo Destailleurs e vemo-lo retomado por Campanella, no início do século XVII, na Cidade do Sol. Também a planta radial imposta a muitas cidades ideais poderá ter sido sedutora para os olhos - e a planta de Sforzinda é, incontestavelmente, muito bela - , mas tem algo de paradoxal e de inverosímil.
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71. ANONIMO DESTAILLEURS: UTOPIA PLATONICA (INICIO DO SÉCULO XVI). (Segundo Les Utopies à la Renaissance.)
Em Sforzinda seria preciso andar muito para passar de lPlla rua a ~utra, pois só há uma avenida concêntrica no meio do ~glom~rado.. N.a cidade desenhada pelo anónimo Destailleurs até essa avemda fOI supnmida; para passar de uma rua radial para outra seria preciso voltar à praça central ou continuar até à primeira muralha. Além disso, as. ruas alargam-se de forma surpreendente no sentido da periferia, visto que, entre duas ruas adjacentes, só está prevista uma fiada de casas. ~stes diversos abs~rd.os estão presentes, também, na cidade solar de Dom. E, quanto à Cnstianópolis de Valentin Andrere, cujo aspecto de «quartel» nos. provoc.a alguma inquietação, apresenta-se com uma disposição !abirfnt~ca .mais engenhosa que prática. Esta é, talvez, de todas as cidades Ideais, ._a mais inumana: o trânsito é sempre subterrâneo porque as ruas .sao cobertas de abóbadas e andares habitados. Mas, repitamos, não estamos perante cidades habitáveis. Estamos perante jogos; jogos sérios, . pois é
,. tu a característica fundamental da construção utópica·. A partir do IIIDmento em que se procura imaginar que «as coisas podiam ser difet~ · n tcs>> , tudo é, teoricamente, possível. O caso de Filareto é extremault' nte revelador. Fingindo que o duque de Milão lhe encomendou uma 1 1dude, Filareto lança-se -no papel- a realizações completamente fantusticas: um hospital tão majestoso como, mais tarde, o será o palácio de Versalhes, um palácio portuário com quinze andares e centenas de <'Diunas e uma «torre dos vícios e das virtudes» exageradamente alta, cuja utilidade funcional se não descortina bem, pois é feita de uma intermiuuvel sucessão vertical de corredores circulares. Não são, porém, só os I' 1bricantes de cidades-milagres que deste modo constroem arquitecturas d sonho. Leonardo da Vinci nos seus cadernos, Jacopo Bellini ao desenhar um «palácio de Herodes», Altdorfer ao tirar pretexto do tema hlblico de «Susana no banho» e muitos outros artistas da época do Renascimento sentiram a necessidade de evadir-se por um instante para um mundo em que os demiurgos não deparam nem com a resistência dos materiais nem com as contingências da vida quotidiana nem com as Ncrvidões financeiras. Mas nem todas as construções teóricas dos arquitectos são forçosamente utópicas. Se, por vezes, assim parecem, é porque os hábitos, o passado urbano, a exiguidade dos meios financeiros se opõem à sua inser\f o completa no real. O possível é, então, sonho. Inversamente, o sonho pode ser .um dia realidade. Desde Alberti que os urbanistas pensavam n cidade em termos de ruas direitas, de casas da mesma altura perfeitamente alinhadas, de esquemas radio-concêntricos, de monumentos que faziam suspender o olhar aquém do ponto de fuga de avenidas propensas à perspectiva. Só raramente puderam realizar na prática esses projectos. l·icaram limitados ao teatro, e, por ocasião das festas urbanas, os arquitectos de nomeada eram, naquela época, encarregados de organizar os cenários teatrais e a decoração das cidades para as entradas principescas. Nada então ~e opunha às construções à maneira antiga, às vistas em perspectiva, às ruas regulares- estas eram o cenário )labitual das. comédias · e tragédias italianas do século XVI. Deste modo, por ocasião das festas do Renascimento, a cidade imaginária irrompia na realidade a ponto de a esconder completamente. Quando em Urbino, em 1513, se representou a Calandria, os espectadores - assevera Castiglione - tinham à sua frente uma cidade «transfigurada». Dois anos mais tarde, para a entrada de Leão X em Florença, houve muitos edifícios fingidos: fachadas falsas, arcos triunfais, pirâmides, etc. O caminho estava traçado. Durante todo esse século as entradas principescas, no Ocidente, deram pretexto à metamorfose das cidades, à perspectiva desenhada, à amplificação monumental, ao vestir à antiga das velhas cidades europeias. O sonho não será, por vezes, uma premonição do futuro? O cenário teatral actuou no cenário urbano e ligou a geometria ao urbanismo. Assim também as utopias não deixavam de conter indicações que os
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72. V. ANDREJE: CHRISTIANOPOLIS. (PRINCiPIO DO SÉCULO XVII.)
73. FILARETO: O PALACIO DO PORTO DE SFORZINDA .
séculos seguintes aproveitariam. Virando resolutamente as costas ao presente tinham duas faces: uma que olhava para o passado e outra que · olha~a para um futuro ainda distante. Apesar do seu aspecto quimérico, foram «como invólucros de bruma sob os quais (avançavam) ideias novas e realizáveis» (R. Ruyer). Chamaram as atenções para a sociologia, para as economias planificadas, para as cidades-jardins, para a importância do enquadramento urbano, para o eugenismo. Afirmaram que a natureza poderia um dia . ser inteiramente organizada e remodelada pelo homem. Insistiram na limitação da jornada de trabalho, na necessidade de instrução para todos e no lugar de capital importância a dar à cultura.
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época das guerras confessionais, tomaram postçao a favor da tole·ia •, da religião natural e da paz: ideias estas que estavam em total • untradição com a realidade quotidiana da época mas que foram uma •In mais nobres mensagens que o humanismo legou às gerações vindou' t • Neste plano, os utopistas integravam-se numa corrente de pensamento ntl o considerada como quimérica mas a que o nosso século ecuménico nl rlbui grande interesse. Nos meados do século XV, Nicolau de Cusa • escreveu um11 obra • pantosa- o De pace fidei. O doutor renano, que foi bispo e cardeal, trabalhara para a união das Igrejas grega e romana e tinha-se esforçado 110r reconciliar os hussitas com a Santa Sé. A seguir à queda de Constan1inopla, em vez de pregar mais uma cruzada, propôs uma discussão amiftvel entre os representantes das grandes confissões religiosas. Mas esta ldcia era tão ousada que a apresentou sob forma de uma «visãO>>. O «homem zeloso» -que era ele- via vir a Deus os delegados das várias nações, implorando o estabelecimento da unidade religiosa na terra mesmo tlue tivesse de subsistir a diversidade dos ritos. O Pai celeste chamava •mtão os anjos e estes convocavam à divina presença todos os sábios do universo. O Verbo de Deus, e depois S. Pedro e S. Paulo, explicavaQi-lhes os grandes mistérios cristãos. A discussão terminava por uma espécie de concordata: os sábios voltariam às suas respectivas nações para lhes ensinar a unidade do verdadeiro culto. Jerusalém s~ria a capital religiosa da humanidade. Deste modo, Nicolau de Cusa lançou a tese, tipicamente humanista, dos «artigos fundamentais» acerca dos quais todos os ·homens de boa vontade poderiam entrar em acordo - doutrina esta que havia de reaparecer um século mais tarde, no tempo dos conflitos entre católicos · e protestantes. Quase cem anos depois de Nicolau de Cusa, em 1544, Guillaume Postei publicou em Basileia um importante tratado, o De orbis terra! concordia, que é uma repetição do grande projecto de Nicolau de Cusa. Postei (1510-1581) passou, no seu tempo, por ser um espírito desequilibrado . e por duas vezes esteve nas prisões da Inquisição. As suas· obras foram postas no lndex. Inácio de Loyola, que o aceitara n?s Jesuítas, não o manteve. Postei foi, sem dúvida, um visionário, especialmente depois de 1547, quando encontrou uma religiosa exaltada, a Madre Jeanne, na qual passou a ver uma espécie de Messias feminino. Mas esse humanista tinha conhecimentos pouco vulgares e foi durante algum tempo professor de grego, hebraico e árabe no Colégio dos leitores reais. Conhecia bem o Império Otomano; elogiou a tolerância dos Turcos e insistiu nas crenças que os muçulmanos e os judeus tinham em comum com os cristãos. Como havia a sua época de compreendê-lo? «Que doravante não haja -escrevia ele - nem papistas nem luteranos; tomemos todos o nome de Jesus, de quem esperamos a salvação. Sejamos todos discípulos de Jesus. Desejaremos então ter como amigos os Judeus e os Ismaelitas, e até lhes daremos este nome, e, no fim de contas, toda a humanidade)). N
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Desse ideal ecumênico deslizou-se no século XVI para ,a apologia de uma religião puramente interior que, pela própria definição, excluía toda ·e qualquer intolerância. Passamos então do grupo dos católicos irénicos para o dos protestantes independentes, muitas vezes condenados, nesse tempo, a errar de cidade em cidade para fugir a sucessivas perseguições. Sebastião Franck (1499-1542) insistiu na «imparcialidade» de Deus, que «ainda hoje ama cordialmente, sem considerar pessoas, nomes ou povos, tanto os pagãos como os judeus». «São-lhe agradáveis, entre todos os povos, aqueles que o temem e realizam a sua justiça.» É por isso que «a Igreja não é nem um povo particular, nem uma seita que se possa apontar a dedo, seita essa ligada a um tempo, a uma pessoa ou a um lugar; é Igreja espiritual, invisível, composta por todos aqueles que · nasceram de Deus... É uma comunidade na qual nós cremos e que vemos exclusivamente com os olho8 espirituais do coração e do homem interior». Um século depois, o «sapateiro inspirado da Silésia», o grande filósofo Bohme • (1575-1624), veria na diversidade das religiões uma vantagem da humanidade. A variedade dos cultos viria a parecer-lhe comparável à variedade das flores da natureza: «Crescem e são vizinhas- na terra flores de todas as espécies. Não há entre elas disputas por causa das cores, do aroma ou do gosto. Deixam que a terra e o sol, a chuva :e o vento, o calor e frio operem sobre elas à sua maneira. E cada uma delas cresce conforme a sua essência e as qualidades que lhe são próprias. O mesmo se dá com os filhos de Deus». Nessas condições, a intolerância é nefasta e absurda. Vai contra as mais elementares leis naturais. «Quem pensaria - escreve ainda - em julgar as aves dos b·osques, que louvam C1 Senhor de todas as coisas na diversidade dos seus cantos? Irá o espírito de Deus castigá-las porque as suas vozes não formam uma harmonia perfeita? Pois que cantem com todas as suas forças e actuem na sua presença.» Depois disto, com que direito vêm os governos impor uma religião aos seus súbditos? Só Deus tem poder sobre as almas. A espada do Espírito não é uma espada carnal. Já em 1533 o «espiritualista místico» Caspar Schwenckfeld (1489-1561) enunciava a doutrina da separação · entre a Igreja e o Estado, que viria depois a ser retomada pelos anabaptistas e por todos ·os protestantes independentes: «enquanto a fé, a doutrina e as cerimónias ficam para Deus, o magistrado nada tem a ver com isso». Em 1549 Schwenckfeld escrevia novamente que «um Estado pode ser oficialmente cristão, mas daí não se segue que tenha algum poder sobre a Igreja ou que seja, necessariamente, cristão.».«Estado cris· tão»: esta expressão, de origem recente, não está mencionada em passagem nenhuma de Paulo. Tolerância religiosa, simpatia pelas crenças alheias, separação entre Igreja e Estado: outras tantas ideias quiméricas para os contemporâneos de Calvino e de Inácio de Loyola, outras tantas «garrafas deitadas ao mar» que as tempestades da história haviam de, paulatinamente, reconduzir às margens habitadas pelos ·homens.
Depois de Michelet, de Burckhardt e de Monnier, é clássico caracterizar-se o Renascimento pelo expandir do indivíduo. «Na Idade Média - escrevia Burckhardt - o homem não se conhecia senão como raça, povo, partido, corporação, família ou qualquer outra forma geral e colectiva.» Pelo contrário, no período seguinte, afirma Monnier, «todos os .. .,:._•:· :<:lo desfeitos, todas as correntes quebradas, todas as unidades destruídas. E dos escombros de tudo isso, saído do conjunto, arrancado à tradição, sacudidas as peias, estendidas para longe as velas, surge o homem moderno». Sem contradizer totalmente esta tese, há que matizá-la e aprofundá-la. Em primeiro lugar, a Idade Média clássica conhecera fortes personalidades, quantas mais não fossem senão as do Poverello de Assis, simultaneamente admirado e receado pelas autoridades religiosas do seu tempo, e de Frederico 11, príncipe cristão no nome mas, na realidade, atraído ora pelo Corão ora pelo cepticismo. Rep~tamos que não houve corte brutal e total entre a Idade Média e o Renascimento. Por outro lado, é uma simplificação demasiado fácil separar os homens eminentes do Renascimento do seu meio natural. Já de há muito se sabia que os humanistas venezianos do século XV pertenciam _ao patriciado urbano. Mas um estudo norte-americano recente -de L. Martines- chegou a conclusões semelhantes a respeito de Florença. Os dois chanceleres humanistas mais conhecidos da República, COluccio Salutati e Leonardo Bruni, estavam, ambos, entre os cem mais ricos habitantes da cidade. Poggio Bracciolini tinha em 1458 um capital que o guindava ao nível dos chefes de família aristocráticos. Quanto a Giannozzo Manetti, queixou-se um dia a Cosme, o Antigo, de ter pago 135 000 florins de impostos à República ,durante toda a sua vida. Nem todos estariam em condições de assim se .lamentar perante o Pater Patrice! Se agora, a título
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CAPíTULO XI
INDIVíDUO E LIBERDADE
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de sondagem, estudarmos os casos de 45 pessoas que estiveram ligadas aos principais humanistas florentinos do século XV, descobriremos que 36 pertenciam à grande burguesia ou à nobreza, 3 provinham de famílias ricas domiciliadas na região submetida a Florença e só 6 tinham nascido na pequena burguesia. Assim, os humanistas florentinos e os que atraíam para o seu círculo a nova cultura colocavam-se no sector privilegiado da sociedade. Sente-se até a tentação de afirmar que, pelo menos em Florença, a força do humanismo foi a própria força das classes dirigentes. Devemos fazer dos grandes mercadores-banqueiros do Renascimento homens «sós», que desprezavam abertamente as proibições da Igreja em matéria de usura e que só acreditavam e se interessavam pelas realidades deste mundo? Isso seria um contra-senso psicológico. No plano religioso, eram, geralmente, conservadores. Os Fugger mantiveram-se católicos numa cidade que adaptou o protestantismo. Há muitos factos que provam a sincera fidelidade de muitos homens de negócios desse tempo à fé cristã. Francesco Datini iniciou em 1399, cóm 64 anos de idade, . uma peregrinação de nove dias, comendo apenas pão, queijo e fruta e deitando-se em camas duras. Cosme, o Antigo, doou somas consideráveis para a construção da Igreja de S. Lorenzo, para a conclusão do Convento de S. Marco, para ampliar a Abadia de Fiesole e para remodelar a Igreja do Espírito Santo de Jerusalém. Dois representantes do banco Médicis na Europa do Norte, Angelo Tani e Tommaso Portinari, encomendaram a Memling um quadro sobre o Juízo Final. Vejamos agora os artistas e os literatos: logo descobrimos que Leonardo, Miguel Angelo, Ronsard, Shakespeare e tantos outros tiveram necessidade de mecenas, sem os quais as suas carreiras não teriam sido possíveis. Quanto aos protagonistas da Reforma ~ Lutero, Zwingli e Calvino -, foram, evidentemente, revoltados que «quebraram grilhetas»; mas foram levados por toda uma corrente religiosa que souberam exprimir e encarnaram certas aspirações, e das mais profundas, do seu tempo. De resto, dia a dia se analisa melhor tudo o que a sua doutrina continha ainda de medieval. Mesmo na época do Renascimento, quando muitas tradições e ideias transmitidas eram postas em causa, não era fácil estar só. Joana de Are, figura tão espantosa e tão tocante, só por dois anos conseguiu impor-se no meio de uma: sociedade ainda muito hostil à mulher. Fiel à sua vocação, morreu abandonada. João Huss, que não tinha em Constança os apoios de que gozava na Boêmia, Savonarola, «o profeta desarmado» e por este motivo criticado por Maquiavel; Michel Servet, que negava a Trindade, Giordano Bruno *, que se aproximou demasiado cedo do panteísmo, todos morreram na fogueira. Mais prudente, Copérnico * só fez imprimir o seu famoso livro De revolutionibus orbium crelestium ao sentir chegar a . m.orte. Sábia precaução, já que, . um século depois, a Inquisição obrigaria Galileu a abjurar dos seus <
' l1 scs dirigentes impuseram-se à admiração ou à atenção de todos. As pernunlidades fortes puderam expandir-se melhor e em maior número que 1111lrora. Guerras sangrentas, umas a seguir às outras, o pôr em causa tlu dogmas e da autoridade da Igreja Romana, o regresso em força, nas 11 1 t s e letras, dos ideais antigos, o progresso económico e o aumento do ln ~ ll , a urbanização, o crescente alastramento da cultura, o contacto • "111 mundos exóticos: todos estes factos exerceram influência no mesmo • ulido e deram aos temperamentos mais dotados ou mais empreendeolores oportunidades que uma sociedade menos móvel, mais hierarquizada, 11111is disciplinada e mais camponesa só parcimoniosamente oferecia danlc N. Há um seguro paralelismo entre o desenvolvimento da arte do retrato nPs séculos XV e XVI e a afirmação das personalidades individuais; e lc1 o se vê que este facto não é exclusivamente italiano. É verdade que a Itália do Quattrocento foi rica de brilhantes persounlldades e de esplendorosas carreiras. Condottieri, simples recém-chegadi>S, fizeram tremer príncipes e repúblicas. Carmagnola, a quem Filippo Maria Visconti deveu os seus êxitos na Lombardia, era filho de um l nmponês do Piemonte e andara a guardar porcos; Gattamelata, a quem Dooatello fez a célebre estátua equestre, era filho de um padeiro; Franrcsco Sforza, condottiere e filho de condottiere, tomou o lugar dos Vis·onti em Milão; os banqueiros Médicis, embora fazendo o possível por disl'urçar, impuseram a sua -autoridade em Florença; um espanhol, César Bórgia ·•, foi por algum tempo senhor da Itália Central e Maquiavel, no capítulo VII do Príncipe, apresenta-o «para modelo a todos os que, por t'ortuna ou pelas armas de outrem, chegaram à soberania». Muitos prínd pes italianos do Renascimento era):Il bastardos: Francesco Sforza, Alfonso Ferrante de Aragão, Sigismundo Malatesta, etc. Assim, o tirano de s6culo XV podia contar apenas consigo próprio e, de resto, só em si próprio pensava. Tais destinos só eram possíveis numa época em que o pensamento critico do Renascimento punha em causa os próprios fundamentos de toda a legitimidade. Maquiavel dedicou um capítulo do Príncipe aos «principados novos que são adquiridos com as forças e o auxílio de outrem ou que são devidos à boa sorte» e outro «àqueles que chegaram ao poder por meio de crimes». E Guicciardini •, com o seu habitual cepticismo, escreve: «Todos os Estados são violentos e não há poder que seja legítimo; nem o do imperador, que se baseia na autoridade dos Romanos, e que foi uma usurpação maior que todas as outras; nem o dos padres, cuja violência é dupla, pois .que, para nos ter na mão, utilizaram armas temporais e espirituais». Estas afirmações assinalam as conclusões de uma
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I !ma vez feitas estas observações, continua certo que o tempo do
nascimento assistiu ao afrouxamento dos vínculos sociais. Foram possívr i carreiras fora dos quadros antigos. Homens que não pertenciam às
corrente de pensamento que, de há muito, em Itália, se interrogava acerca do valor das hierarquias sociais e discutia a noção de nobreza. Dante afirmava no Convívio não querer conhecer outra nobreza que a da virtude. Petrarca escreveu: «Não se nasce nobre, a nobreza é adquirida.» E Palmieri, humanista e homem político florentino do Quattrocento, acrescentou: «Aquele que se glorifica com as realizações dos antepassados tira a si próprio mérito e honra. Se quiser merecer a honra, dê o seu próprio exemplo e não o alheio». O Renascimento italiano foi, assim, levado a exaltar a virtu. É «só ela -escreve Landíno, favorito de Lourenço, o Magnífico- que faz nobres os homens». Ê difícil definir este termo de virtu italiana. No contexto do tempo, significa principalmente a vontade de criar o seu próprio destino, o espírito de empreendimento, a audácia calculada, uma inteligência aguda. Não exclui crueldade nem astúcia desde que sejam necessárias - prova-o a virtu que Maquiavel louva em César Bórgia - , mas é necessariamente acompanhada de auto· domínio e de uma certa grandeza de alma. Portanto, o Renascimento italiano põe em causa a legitimidade dos chefes de estado e o valor da nobreza hereditária. Poderemos dizer que foi até ao extremo lógico? Não. Na segunda parte da sua história, no século XVI, retratou-se parcialmente e aceitou a estabilização das situações adquiridas. Deixou-se de contestar a legitimidade dos Gonzagas ou dos Médicis e os reis de França não desdenharam casar com princesas florentinas. Por outro lado, se bem que a Itália tenha dado o exemplo e tenha, talvez, ido mais longe que os outros países da Europa no que respeita à emancipação do indivíduo e à crítica das hierarquias sociais, seria errado limitar o fenómeno à península. Estudando apenas o caso italiano e ligando o desenvolvimento do indivíduo à vitória dos governos tirânicos que exaltavam o condottiere vitorioso e protegiam os talentos (dóceis), Burckhardt encurtou . perspectivas. Na realidade, os progressos do individualismo caracterizaram o conjunto da civilização ocidental e foram solidários do seu mais profundo dinamismo. Erasmo introduziu no Elogio da Loucura uma vigorosa sátira dos nobres, «essa gente que nada distingue de um ínfimo servente e cujo orgulho se acaricia com um vão título nobiliárquico. Um diz provir de Eneias, outro de Brutus ... E não faltam outros loucos que olhem para tais brutos como para deuses». Uma crítica destas só assume o seu verdadeiro sentido quando recolocada no respectivo contexto histórico, quando fortes personalidades se impunham ao5 seus contemporâneos a despeito ou ao lado das hierarquias tradicionais. Um Êtienne Mareei em Paris, os Van Artevelde na Flandres, fizeram estremecer os príncipes a quem deveriam obedecer. Na época áurea dos condottieri italianos, um homem da pequena nobreza bretã, Duguesclin, foi condestável de França. Foi enterrado em Saint-Denis ao lado dos reis. Poemas cantaram as suas façanhas. A sua carreira militar foi, no século XV, motivo de tapeçarias. Joana de Are era uma humilde camponesa que nem sabia escrever. Foi chefe
de um exército, restituiu a coragem aos soldados de Carlos VII, repeliu os Ingleses e fez coroar o seu rei. O tipo do homem de negócios do Renascimento, que, pela sua inteligência e pela sua actividade, ganha no seu país um lugar excepcional, passa a ser indispensável aos governos e acaba como protector das letras e das artes não é exclusivamente italiano. «Nada de essencial -escreve R . Klein- distingue um Jacques Creur do seu irmão mais novo Cosrne, o Antigo de Médicis». Tesoureiro em Bourges e depois em Paris, este mercador francês foi depois «argentário» de Carlos VII, enobrecido e admitido no conselho do rei em 1442. Foi a primeira pessoa de origem burguesa a alcançar tal honraria. Em 1448 foi enviado em missão ao papa. Uma fortuna demasiado rápida e as invejas por ela provocadas causaram a sua desgraça. Mas a sua ·divisa, «A vaillans cuers riens impossible» {'), podia servir para caracterizar todo o Renascimento. É uma definição francesa da virtu. Nos princípios do século XVI, o mais notável mercador-banqueiro do Ocidente não era italiano: era Jakob Fugger, «o rico», cuja intervenção foi decisiva por ocasião da eleição imperial de 1519. Feito conde palatino e titular de quatro senhorios, Jakob Fugger acolheu na sua residência de Augsburgo livros e obras de arte. Possuía, designadamente, frescos de Altdorfer. Deste modo, todas as grandes nações da Europa deram, por ocasião do nascimento dos tempos modernos, os seus respectivos contingentes de personalidades excepcionais. É impossível enumerá-las. Mesmo assim, como não haveremos de recordar Lutero e Cortez? O primeiro era de origem humilde. Não buscou a glória. Mas, convencido de não dever guardar para si a doutrina da justificação pela fé, recusou calar-se. Excomungado por Roma, banido do Império, provocou a ruptura da unidade cristã no Ocidente. Exclamara um dia: «Se Deus quiser, enquanto eu viver ninguém me afrontará.» Cortez -um nobre pobre da Estremadura - , ao queimar na costa mexicana, em 1519, os navios que o poderiam reconduzir a Cuba com os seus soldados espanhóis, tomou também uma decisão heróica. Condenava-se, com isso, a conquistar o império dos Aztecas com um punhado de homens, o que fez, e não sem dificuldades. A partir daí, e apesar dos seus defeitos, passou a ser urna figura de epopeia. Três quartos de século depois, Lope de Vega ·• pôr-lhe-ia na boca estas palavras:
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Eu sou Cortez ... Dei à Espanha as palmas do triunfo com as minhas ofuscantes vitórias, dei ao rei terras sem limites e a Deus almas sem conta.
(') «Nada é impossível para os corações valentes.» (N. do T.)
Carlos V recusou-se a dar a Cortez o título de vice-rei, pois lhe receava a ambição. Mas ninguém pôde disputar a Erasmo o título de «príncipe das letras». Esse bastardo, filho de um padre, foi na idade de ouro do humanismo uma verdadeira potência, cortejado sucessivamente por Lutero e pelo papa, por Francisco I e por Carlos V. Claro que teve necessidade de protectores, especialmente no início da carreira. Mas, «Proteu de cem rostos», «enguia que ninguém apanha» - é Lutero quem assim o classifica-, Erasmo conseguiu conservar a independência. Foi por isso que recusou a cadeira que, por incumbência de Francisco I, Guillaume Budé lhe ofereceu no Colégio real. Foi por isso, principalmente, que recusou aderir à Reforma e que recusou também o chapéu cardina·lício que Paulo III lhe ofereceu. Talvez nunca antes dele os literatos e artistas tivessem adquirido lugar tão importante na sociedade. Este fenómeno não pode ser explicado senão com a nova difusão da cultura e com a pressão de um público instruído cada vez mais numeroso. Assim, os escritores e os artistas, embora necessitando de mecenas, conseguiam, uma vez alcançada a glória, impor-se aos seus protectores. Nada é mais significativo que a carreira do Aretino *, que viveu apenas das pensões dos grandes e a todos desprezou. A sua vida foi uma contínua operação de chantagem. Francisco I enviou-lhe um dia, como prenda, uma corrente de ouro que figurava línguas envenenadas. Mas tanto Francisco I como Carlos V o disputaram; o rei de Inglaterra e a rainha da Polónia cumularam-no de presentes. Por pouco não foi nomeado cardeal. Ariosto chamou-lhe, com razão, «flagelo dos príncipes». Deste modo um homem odioso, que fugira de casa aos treze anos e não seguira estudos regulares, foi receado pelas mais altas autoridades por ter espírito e uma pena acerada e porque se conhecia o êxito das suas cartas. No seu tempo chamaram-lhe «secretário do mundo». A glória dos artistas ultrapassou a dos homens de letras. Vasari escreve, a respeito de Leonardo da Vinci: «Vemos as influências celestes fazer chover os maiores dons sobre seres humanos numa operação que parece menos natural que sobrenatural; acumulam-se ' então, sem medida, num só homem, a beleza, a graça, o talento, de tal modo que, para onde quer que ele se vire, cada um dos seus gestos é tão divino que faz esquecer todos os outros homens e revela claramente uma verdadeira origem que é divina e nada deve ao esforço humano. Foi isto que se viu em Leonardo da Vinci ... ». Vinte anos depois da morte do pintor da Gioconda, Cellini ouviu Francisco I dizer ao rei de Navarra e a muitos cardeais que «nunca tinha havido no mundo um homem tão sábio, não apenas em escultura, pintura e arquitectura, mas, principalmente, como· grande filósofo». Leonardo foi o primeiro artista a gozar, na Europa do Renascimento, de tão esplendoroso prestígio. Mas bem depressa outros astros se elevaram com brilho ainda mais intenso. Rafael, principalmente a partir de 1515, passou em Roma e no resto da península por uma espécie de
O Renascimento reencontrou a noção antiga de Fama, a Nomeada que desafia o tempo e atravessa os séculos. Ergueu estátuas equestres aos condottieri; fez ou projectou túmulos grandiosos para Júlio II, paraos Médicis, para o imperador Maximiliano; ressuscitou os triunfos da AD.tiguidade. Em 1443, Afonso de Aragão deu entrada triunfal em NápÔles num carro dourado e no meio de um cortejo em que as Virtudes se acotovelavam com figuras burlescas. O arco do Castel Nuovo de. Nápoles ficou como lembrança desse desfile. Alguns anos depois, o duque humanista de Urbino, Federico de Montefeltre, também por ocasião do seu casamento (1459) se fez representar como triunfador por Piero Della Francesca (Uffizi). Sentado num carro de quatro rodas, o príncipe é coroado pela Fama, de pé atrás dele. A celebração da glória foi, a partir dessa altura, uma das maiores preocupações do Renascimento, que a transmitiu à época de Luís XIV. Lourenço, o Magnífico, escreveu um dia a Frederico de Aragão: «0 que a Antiguidade conheceu de mais espantoso foi esta celebração da glória, que embriagava todos os espíritos; por isso foram criados os carros e os arcos de triunfo, os troféus de mármore, os teatros de sumptuosa decoração, as estátuas, as palmas, as coroas, as orações fúnebres e mil outras distinções admiráveis». Mantegna, artista apaixonado pela Antiguidade, fez, para o palácio ducal de Mântua, entre 1482 e 1492, nove grandes composições dedicadas ao Triunfo de Júlio César. Em 1491, Lourenço, o Magnífico, deu em Florença uma festa grandiosa que representava o «triunfo de Paulo Emídio». Durante as guerras de Itália, as «entradas» dos reis de França nas cidades italianas copiavam os triunfos antigos. Quando Luís XII foi recebido em Milão, em 1509, «fez-se-lhe uma entrada -diz um contemporâneo- conforme o antigo costume dos Romanos, trazendo à lembrança todas as cidades e castelos e })atalhas que já ganhara». Esta moda não podia deixar de alastrar a toda a Europa à medida que as inovações do Renascimento italiano
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herói, um semideus. De resto, levava uma vida principesca,. Quando morreu, na Sexta-Feira Santa de 1520, houve grande emoção na Cidade Eterna, e Leão X chorou. Mas não houve nomeada como a de Miguel Ângelo, cuja terribilità deixava estupefactos os seus contemporâneos. Na idade de ouro do mecenato, não hesitou em entrar várias vezes em atrito com o irascível Júlio li, que em todas as ocasiões tomou a iniciativa da reconciliação. A. Chastel acentua que Miguel Ângelo foi o primeiro artista a quem foi dedicada uma biografia em vida; o primeiro a .receber, depois de morto, uma espécie de culto; o primeiro a ter a honra de funerais oficiais. Vasari exprimiu uma opinião corrente em meados do século XVI quando escreveu: «Nenhum artista, por excepcional que seja, poderá alguma vez ultrapassar esta obra no desenho ou na graça ... Miguel Ângelo só por si próprio pode ser vencido».
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iam extravasando das fronteiras da península. A entrada de Henrique 11 em Rouen, em 1550, foi um triunfo à romana manifestamente inspirado nas telas de Mantegna. O excessivo e o hiperbólico não tardaram a ser lei do gênero, antes até da segunda metade do século XVI, que viu expandir-se a complicação maneirista. O grande carro que Dürer desenhou, cerca de 1515, para o Triunfo de Maximiliano vai além da imaginação. O abuso e a acumulação de motivos ornamentais extremamente heteróclitos (águias, cabeças de leão, cornucópias, volutas, etc.) parecem esmagar o pobre imperador, para o qual não há espaço e que mal se vê no meio de tão exuberante composição. Sempre o Renascimento, por onde passou, exaltou a Nomeada, deusa antiga novamente venerada. Lorenzo Costa representou-a, por volta de 1490, nas paredes da capéla Bentivoglio de Bolonha, num carro puxado por elefantes; rodeada de gueiTeiros, damas e homens ilustres. O tipo romano da Fama, jovem alada a tocar trombeta e com uma coroa de louros na mão, voltou a ser visto nos monumentos: em França, por exemplo, na capela de Anet e na fachada do Louvre de Pierre Lescot. Mas o que temos vindo a dizer acerca de literatos e de artistas proya que príncipes e capitães não foram os únicos a procurar a glória. No túmulo de Marco Antonio della Torre, de Andrea Riccio (Louvre), o an)o da fama proclama a vitória dos homens de letras sobre a morte, esqueleto que, por despeito, deixa cair a foice com um esgar. Dante, no Purgatório, tinha condenado «o grande desejo de glória». Mas Petrarca, no fim da vida, escreveu, não sem vaidade, uma «carta para a posteridade». Bem depressa se admitiu que o cristão tinha o direito de aspirar a sobreviver na memória dos homens. Ronsard teve a certeza de que a sua glória seria eterna:
Nem todo o Ronsard irá para o túmulo, Ficando dele a parte que é melhor. Voarei .bem vivo pelo universo ... Ora, pois, ó Musa, leva ao céu a glória Que eu ganhei, anunciando a vitória Que, bem justamente, me vejo gozar, E do Ronsard consagra a memória Ornando-lhe a fronte com verdejantes louros. f) (Odes, V, 36)
Um dos mestres de peH,amento do Renascimento, Marsilio Ficino, proclamara como evidência que «0 homem esforça-se por ficar na boca dos homens para todo o sempre». Até nos colégios se buscava a glória: nos jesuítas, o primeiro da turma era primus imperator. A promoção do indivíduo foi, pois, pelo menos ao nível mais elevado da sociedade, uma das características principais da civilização europeia no momento em que esta se afastava das margens da Idade Média. Muito significativo, a este respeito, é d acentuado gosto da época pela literatura pessoal, que os Romanos pouco tinham cultivado. O humanista Pontano disse uma vez: «Fiz-me a mim próprio» -fórmula que a seu próprio respeito poderiam retomar muitos homens do Renascimento- e Alberti fez também uma afirmação audaciosa: «Aquele que cultiva os seus dotes pessoais presta um grande serviço ao Estado». Mas, para um Lutero, o destino individual- até o destino de um miserável- era grandioso e trágico. Herdeiro dos místicos flamengos e renanos, contemporâneo de uma época que acentuava o pecado pessoal e, portanto, angustiado com o problema da salvação de cada cristão, Lutero privilegiou o diálogo do homem com Deus, rejeitou os intermediários entre o salvo e o Salvador, fez de cada fiel um sacerdote. Assim, a Reforma exprimiu no plano religioso a ascensão irresistível da pessoa embora, noutros aspectos, tenha recusado toda a liberdade ao homem pecador.
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A promoção da pessoa não se realizou sem dor. Por muito tempo se esqueceu a profunda e duradoura melancolia • do Renascimento - contrapartida necessária de uma evolução que separava o indivíduo das tradições e hierarquias do passado. Ronsard não foi sempre tão confiante na perenidade do seu nome como os versos anteriormente citados poderiam fazer crer. Já noutro local escrevera- é uma ninfa que se dirige ao poeta:
Antes de tempo tuas têmporas florirão, Em poucos dias se rematará teu fim, Antes da noite terminará teu dia E, traido pela esperança, teu pensar perecerá. Fanar-se-ão teus escritos sem tne comover, No teu desastre seguirá o meu destino, Tua morte será para mim o . fim do amor E os netos rir-se-ão dos teus suspiros.(') (Les Amours, I, 19)
(')·No original: «Sous le tombeau tout Ronsard n'ira pas I Restant de lui la part qui est meilleure. I Toujours, toujours, sans que jamais je meure. ·:1 Je volerai tout vif par l'univers ... I Sus doncque, Muse, em porte au ciel la gloire V Que j'ai gagnée annonçant la victoire I Dont à bon droit je me vois jouissant, I Et de Ronsard consacre · la mémoire, I I Omant son front d'un laurier verdissant.>} (N. do T.)
(') No original: «Avant le temps tes tempes fleuriront, 7 De peu de jours ta fin sera bornée, I A vant ton soir se clora ta journée, I Trahis d'espoir tes pensers ·périront. VI Sans me fléchir tes écrits flétriront, 1 En ton désastre ira ma destinée, 1 Ta mort sera pour m'amour terminée, I De tes soupirs tes lieveux se riront.» (N. do T.)
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Descobre-se hoje que .existiu um romantismo do Renascimento, eloquentemente testemunhado . por uma obra de Du Bellay, Les Regrets. Este poeta humanista, que :viveu por algum tempo na cidade mais rica do mundo em monumentos antigos e no seio de uma corte esplendorosa, nem por isso deixou de sentir-se infeliz:
Vagueio na planura' por entre lobos cruéis, Sinto chegar o inverno, cujo frio hálito Me faz arrepiar a pele com fremente horror. (') (Les Regrets, IX) Muitos grandes artistas e literatos do século XVI sentiram assim um .s entimento de solidão e se inclinaram para a tristeza. Raf;el diziJ de Miguel Ângelo que «estava só como um carrasco». Haverá necessidade de recordar com que força plástica as estátuas dos túmulos dos Médicis esculpidas por Miguel Ângelo, exprimem o cansaço, a dor e o desespero?' Mesmo que o poema que o artista escreveu sobre a Noite, «É-me grato dormir e mais ainda ser pedra ... », se tenha em parte inspirado em acontecimentos políticos de fresca data - a queda da República em Florença -, como não ver neles, antes de mais, a expressão de uma angústia muito mais profunda, que tinha raízes no próprio temperamento do «terrível» escultor? Mas o caso de Miguel Ângelo não é uni caso isolado. va·s~ri assevera que muitos pintores do seu tempo - Correggio, Piero di Cos1mo, Pontormo, Rosso- eram melancólicos. Ronsard definia-se a si próprio como «arisco, desconfiado, triste e melancólico». Camões mostrou-se igualmente como um ser hipersensível desde a infância e propenso às lágrimas. De qualquer modo, os acentos românticos são, efectivam:ente, numerosos na arte e na literatura do Renascimento- mas é um facto, mais no século XVI que no século XV. A Melancolia de Dü~er e a de Lucas Cranach são apenas as mais conhecidas obras pintadas ou desenhadas sobre este tema. Além disso, um estudo psicanalítico dos quadros da época -de Altdorfer, de Bruegel e de Tintoretto, por exemplo descobre-lhes, nos segundos-planos, «caminhos inúteis, bosques obscuros, montes repletos de recônditos esconderijos» que são outros tantos refúgios propícios à meditação. J. Bousquet acrescenta: «Ao gosto da tristeza correspondem (ainda) os efeitos de noite e de luar e a multiplicidade das imagens de ruínas>> e cita, como exemplos, Altdorfer e Mantegna.
(')~o ?r~ginal: -<
falt hénsser ma peau.» (N. do T.)
A literatura pastoril do Renascimento insistiu nos sofrimentos do amoroso cuja paixão não é cori:espondida e procura consolar-se na solidão. A repetição deste tema, desde Sannazzaro a Honoré d'Urfé, não poderia ser obra do acaso nem de uma pura e simples moda. Essa aspiração romântica correspondia, evidentemente, à inclinação melancólica da sociedade culta. Mas mais impressionante ainda é a presença da morte nas obras literárias e artísticas. Claro que já muitas vezes se observou a importância que o século XV dera às danças macabras, às artes moriendi e aos triunfos da morte. Mas o corte artificial que, especialmente em França, durante muito tempo se manteve entre os séculos XV e XVI fez com que se não tivesse dado bastante atenção à demorada sobrevivência dos temas macabros. A obra de Ronsard, no entanto, é reveladora a este respeito. Alguns dos seus poemas mais conhecidos e mais cativantesaqueles que os estudantes aprendem nas aulas: Quando se vê no ramo, no mês de Maio, a rosa ... , Quando fores muito velhinha, à noite, à luz da candeia ... , Pequenina, vamos ver se a rosa ... , etc. - centram-se na ideia da morte próxima ou já presente. Quando o poeta convida uma bela jovem para o amor, fá-lo lembrando-lhe que a juventude foge vertiginosamente:
O tempo foge, senhora, o tempo foge, Ai/ Não foge o tempo, somos nós quem vai, E cedo estaremos subjugados pela lâmina, E dos amores de que falamos,
Quando morrermos, ninguém mais saberá: Por isso amai-me enquanto sois bela. (') (Extractos de Amours, 17) No final do século XVI e no início do século XVII, a obsessão da morte era uma das . características da poesia barroéa francesa. Retomando a inspiração macabra do século XV, Chassignet (morto· em 1635) intitulou um dos seus sonetos Um corpo comido pelos vermes. Nele se lê:
Mortal, pensa como é, sob a tampa De um ossário, um corpo comido pelos vermes, Descarnado, já sem nervos, com os ossos a sair, Secos, desligados, desfeitas as junturas ... (') No original: «Le temps s'en va, le temps s'en va, ma dame, I I Las! Le temps non, mais nous nous en allons, I Et tôt seront étendus sous .la lame, /i/ Et des amours desquelles nous parlons I Quand serons morts, n'en sera plus nouvelle: I Pour ce aimez-moi, cependant qu'êtres belle.>> (N. do T.)
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O ventre já rasgado, todo apodrecido, lnfecta o ar vizinho com mau cheiro E o nariz, meio roído, deforma aquela face ... {')
O melhor comentário a· tal poema reside nas aproximações que ele sugere. Faz lembrar o Transi de Ligier Richier, o Triunfo da Morte de Heemskerck ou de Bruegel, o Velho, a cena do cemitério do Hamlet («quanto tempo pode um homem estar na terra sem apodrecer?»). Todas essas obras se inserem na grande corrente macabra que perpassou pela época do Renascimento. Dürer representou a morte muitas vezes. Baldung Grien * pintou um quadro (museu de Basileia) em que se vê uma morte ávida a beijar na boca uma gorda jovem nua. No fim do século XVI as gravuras de Blomaert e de Greuter simbolizaram a vaidade do mundo com um ser híbrido, meio bela mulher meio esqueleto. Como poderia o tempo das guerras religiosas, tão fértil em massacres e suplícios, desfazer-se dos medos da morte que lhe tinha legado a época anterior? Montaigne passou a vida a meditar sobre a morte: «Entre festas e alegrias - escrevia-, tenhamos sempre esta recordação da nossa condição e não nos deixemos levar tão fortemente pelo prazer que nos não passe, por vezes, pela mente, de quantos modos esta nossa alegria está exposta à morte e de quantas formas ela a ameaça» (Ensaios, 1). Montaigne dizia que não tinha temperamento «melancólico» mas confessava: «Não há nada com que eu, desde sempre, me tenha preocupado tanto como a imaginação da morte; até na fase mais licenciosa da minha vida .. . ». A morte foi um dos companheiros do Renascimento. Ph. Monnier caracterizou, há mais de um século, o Quattrocento como o «triunfo da vida» e a raridade dos suicídios. A investigação histórica terá de verificar este segundo ponto; mas já hoje mostra uma realidade diferente, se bem que, na verdade, referente a uma época posterior à que foi estudada por Monnier. Tanto Lutero, em 1542, como o arcebispo de Mainz, em 1548, atribuíram ao diabo a epidemia de suicídios então espalhada · na Alemanha. Em 1569 houve em Nuremberga catorze suicídios em três semanas. De qualquer modo, uma panorâmica, mesmo rápida, da literatura do século XVI faz realçar bem a importância dada nesse tempo ao tema do desespero. A ideia de a vida não valer a pena de ser vivida aparece frequentemente na obra dos escritores. O Renascimento conheceu, pois, tanto o medo da morte como o desejo da morte. Encontramos no Elogio da Loucura esta afirmação inesperada, a seguir a uma insist~ncia sobre a triste condição humana:
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«Não tenho de dizer-vos que erros fizeram merecer aos homens tal sorte nem que Deus irritado os condenou a nascer para tais misérias. Quem quiser reflectir nisso aprovará o exemplo das jovens de Mileto e o seu suicídio, apesar disso bem doloroso. Mas quem eram aqueles que se mataram, desgostosos da vida? Parentes da Sageza». E a Loucura conclui que faz a vida tlerável. Du Bellay compôs um dilacerante Lamento do Desespero, cuja tonalidade sincera não engana: Feliz a criatura Que fez sua sepultura No ventre materno! Feliz aquele cuja vida, Ao começar, se viu arrebatada Por um sono eterno! C) É realmente a morte o que deseja o pastor de Tasso, Aminta, quando, repelido pela ninfa Sílvia, se atira do alto de um rochedo - sem, na verdade, se matar. Quanto a Hamlet, lamenta que o cristianismo proíba o suicídio: «Ah! Se esta carne tão rija pudesse derreter-se, dissolvet-se, perder-se em orvalho! Se o Eterno não tivesse virado os seus canhões contra o suicida! Oh Deus! Oh Deus! Como me parecem pesados, gastos e estéreis todos os gozos deste mundo! Que nojo, a vida! Que nojo!». No famoso monólogo «ser ou não ser», Hamlet repete o pensamento do suicida: «Morrer... dormir, e nada mais... e dizer que, com esse sono, pomos fim aos males do coração e às mil torturas naturais que são a herança da carne: aí está um desfecho que se deve desejar com fervor ... ». Desespero de um intelectual, dir-se-á, e falar-se-á do suicídio do humanista Bonaventure Des Périers. Mas uma obra publicada em Lyon em 1538, Simulachres ... de la Mort (de M. e G. Trechsel), põe uma velha camponesa, representada no desenho encostada a uma bengala, entre dois esqueletos, a dizer:
A penar longamente VIVI, Tanto que mais não quero já. E tenho hoje segura convicção De ser melhor a morte que a vida. (')
Tantas declarações de desencanto levam-nos assim a descobrir nos complexos caminhos do Renascimento uma importante corrente pessi(') No original: · «Heureuse la créature I Qui a fait sa sépulture :/ I Dans le ventre maternel! V Heureux celui dont la vie, I En sortant s'est
(') No original: «Mortel, pense quel est dessous la couverture / ·D'un chamier mortuaire un cors mangé de vers, :/ Deschamé, desnervé, ou les os descouvers, I Depoupelz, desnouez, délaissent leurs jointures... I I lI Le ventre deschiré cornant de puanteur I Infecte l'air voisin de mauvaise senteur I Et le nez my-rongé difforme le visage ... » (N. do T.)
vue ravie I Par un sommeil éternel!» (N. do T.) {") No original: «En peine ay vescu longuement I Tant que n'ay plus àe vivre envie I Mais bien ie croy certainement :; Meilleure la· mort que la vie.» (N. do T.) ·
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hnum muitos os que •pi Hhms morais do homem.
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puseram em causa o valor da razão e das Escutemos, primeiramente, Ronsard:
... nós não somos nada. Apenas terra animada, uma sombra viva, Sujeita à dor, à miséria, aos dissabores. Olhai que em miseráveis males vamos além Do .resto, oh tristeza, dos outros animais/ Não é senão por isso que Homero nos iguala À folha de inverno que tomba da árvore, Tão fracos somos, tão pobres dia a dia, Sofrendo sem descanso males e males aos milhares. (') (Hymnes, II, 9) . Quanto à crítica da razão, pensamos, naturalmente, na célebre Apologia de R~ymond Sebonde que figura no livro II dos Ensaios de Montaigner «Quem Juntasse um molho bastante de fasquias de asneiras da humana sa~iência, diria maravilhas ... ». Ê menos conhecida, todavia uma dolorosa afirmação de Dürer: «Queremos saber muito e conhecer a ~erdade acerca de to~~s as coisas. Mas a nossa obtusa inteligência não pode alcançar a perfeiçao da arte, da verdade e da sabedoria. A mentira está no fundo dos nossos conhecimentos e as trevas rodeiam-nos tão impiedosamente que mes~o avanç~n~o com prudência, a cada passo nos enganamos». O Re~ nascimento fm amda mais severo no plano ético, e há uma legião de textos que o provam. A Loucura de Erasmo evoca «o mal que o homem faz ao homem: ~rruina-o, pr~nde-o, tortura-o, arma-lhe ciladas; atraiçoa-o. Contar tudo Isso, os ultraJes, os processos, a velhacaria seria o mesmo que contar g~ãos di? art?ia». Maquü~vel, seguido por GuiccÍardini, acha que os homens sao traiçoeiros e mentirosos e só com mentiras merecem ser levados. Ronsard afirma numa Mascarade que «na terra só se vê fraude e m~l~ade». Sha~espeare põe Hamlet a dizer. que o II)Undo é <
<:)
No ~riginal: «( ... ) nous ne sommes rien 1 Qu'une terre animée et qu une ytvante ombre, I Le sujet de douleur, de misere et d'encom~ bre, I Vou~, et que nou~ passons en misérables maux •,/ Le reste, ô creve-coeur! de tc:_>us lt;s .ammau.x! ;; Non pour autre raison Homere nous égalt? I A · Ia feulll~ d hiv~r qui des arbres dévale, 1 Tant notis sommes ch_ét!fs et pauvres JOUrnahers, I Recevant sans repos maux sur maux à mtlhers.» (N. do T.) ·
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abrigar-se sob o manto protector da Virgem, esconder-se atrás dos ;santos. Tinham-se agarrado às relíquias, às peregrinações, às missas votivas e a muitos outros talismãs contra o inferno. Julgar-se-á que o século XVI, que viu Miguel Angelo inspirar-se no Dies ir(E para pintar o Juízo .Final da Capela Sistina, não sentiu também uma aguda consciência do pecado? Esta consciência, pelo contrário, foi uma das características da mentalidade ocidental da época do Renascimento . no mais largo sentido do termo. Descobrindo-se mais só que outrora, o homem sentiu-se então, ao mesmo tempo, mais desarmado perante as intrigas de Satã. Na nossa civilização ocidental, e na época de crise fecunda que estudamos aqui, a promoção do indivíduo e o sentimento de culpabilidade pessoal foram · duas realidades inseparáveis. Dir-se-á que a Nau dos Loucos de Sebastião Brant (1494) e os Sete Pecados Mortais, a Cura da Loucura, o Prestidigitador .de Hieronymus Bosch, que proclamam que «todo o mundo é de loucos», isto é, pecadores, representam uma angústia medieval e cedem o lugar, no início do século XVI, à ironia de Erasmo. A loucura • perde então o seu carácter trágico e metafísico. Transforma-se no espírito crítico, na razão que de si própria troça. Convida os homens à reflexão; não é já a assustadora encarnação do pecado. Mas a angústia perante o mal continuou depois do Elogio da Loucura, que é de 1511. Alguns anos depois, Lutero descobriu a doutrina da justificação pela fé: solução radical para todos os cristãos que se sentiam incapazes de escapar doutra forma a Satã. O profundo pessimismo teve daí em diante por contrapartida na teologia reformada a confiança total no Salvador, . uma espécie de fuga em Deus. Lutero escrevia: «Ao fazer o que pode, o homem peca mortalmente ... Tem de desesperar inteiramente de si para ser capaz de receber a graça de Cristo». O Renascimento viu assim triunfar em metade da Europa uma doutrina baseada no desespero e na crença na absoluta incapacidade do homem para praticar, por si próprio, uma única boa acção. «Esta perversidade (consequência do pecado original) - e5creve Calvino 1;1a Instituição Cristã- nunca está ociosa em nós, antes engendra continuamente novos frutos a saber (às obras de carne) ... do mesmo modo que uma fornalha acesa larga incessantemente chamas e faíscas e uma fonte deita água». A.té hUIQanistas como Zwingli, Bucer, Margarida de Navarra optaram pela doutrina da justificação pela fé, cujas mais profundas implicações se opõem, no entanto, à filosofia . humanista.
* O Renascimento interrogou-se, pois, com angústia, sobre o problema da liberdade individual; e os melhores espíritos acusaram, por vezes, o destino - isto é, os astros - de os ter obrigado a uma existência dolorosa. Esta época de inquietação e de renovações continua incompreensível a quem não restitua à astrologia • o considerável .papel por ela então desempenhado. Du Bellay, que se definiu a si próprio como um
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. (') No .original: .«M<;mdite donc la !ur~iere I Qui m'éclaira la premiere, I .Pmsque le c~el ngoureu~ ./ Assu]ettlt ma natssance 1 A l'indomptable pmssance. I D un Astte SI malheureux... 1 O malheureuse innocence I Sur qm ont tant de licence I Les Astres injurieux!» (N. do T.)
na ciência das estrelas, associava intimamente os espíritos e os planetas e indicava os modos de orar a eles e de obter os seus favores. O interesse pela filosofia neoplatónica e pelas doutrinas esotéricas veio, na época de Ficino, reforçar a ·crença na astrologia, pois, na concepçao dos discípulos de Platão, o microcosmos e o macrocosmos- o homem e o universo- assemelham-se e correspondem-se. O mundo é um tecido de simpatias ou aversões ocultas, um jogo de espelhos virados uns para os outros. «Os astros- escreve E. Garin- fazem-nos sinais e fazem sinais uns aos outros, olham-se e olham-nos, ouvem-se e ouvem-nos .. . O universo é um diálogo imenso, múltiplo e variado, ora murmurado ora em voz alta, agora em tons secretos e logo em linguagem clara.» Nestas condições, toda a ciência, seja ela a medicina, a química ou a física, é impossível sem o conhecimento do movimento dos planetas no zodíaco, sem o conhecimento das suas personalidades, das suas preferências e das . suas aversões. Ao tratar mais adiante da ciência, encontraremos novamente este aspecto da astrologia. Insistamos, de momento, nas suas implicações morais e na relação qtie os homens do Renascim~nto frequentemente estabeleceram entre os planetas e o destino do indivíduo. Jt:in primeiro lugar, cada planeta governa uma parte do mundo, cujos habitantes estão, portanto, sob sua particular influência. Assim, a índia é posta sob o domínio de Saturno e Júpiter é soberano das regiões ocidentais e, portanto, dos cristãos. Daí o Júpiter vestido de frade, com a cruz e o cálice, que figura no ·campanário de Santa Maria dei Fiore. Júpiter aparece também vestido de frade na capela dos Espanhóis de Sant.a Maria Novella. Numa gravura de 1492 traz mitra. Mas os planetas também têm «filhos», pois engendram vocações especializadas. A partir do século XIV, com a renovação da astrologia no Ocidente, as representações dos planetas e dos seus «filhos» aparecem e multiplicam-se nos manuscritos ilustrados e nos conjuntos monumentais civis e religiosos. Na capela dos Espanhóis, os planetas estão acima das artes liberais e a intenção evidente do pintor era mostrar que há entre eles e estas artes uma relação de dependência. Num capitel do palácio dos Doges de Veneza, Mercúrio é um professor rodeado de alunos. É ele o protector das letras e das ciências, aquele que dá inteligência e sabedoria aos que nasceram sob o seu signo. Um documento particularmente interessante sobre as crenças astrológicas dos o s;identais do fim do século XV é um Hausbuch da família Wolfegg, que dedica uma página a cada um dos seguintes astros: Saturno, Júpiter, Marte, o Sol, Vênus, Mercúrio e a Lua. Montados em corcéis, galopam pelo céu. Por baixo deles, na Terra, vemos os seus «filhos». Assim, Marte engendra a guerra; e o Hausbuch representa cen~ ; de pilhagem e morticínio. Vênus, naturàlmente, faz nascer o amor e ·a terra fica então cheia de cantos, alegres folguedos, cenas galantes, etc. Mas, a partir do século XV, surge o hábito de representar .b s planetas em carros, como nos triunfos; abaixo deles, · os seus «filhos» entregam-se às suas ocupações favoritas. Assim
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ser de saúde frágil e dominado por uma «imutável>> e «profunda tristeza», dcusou formalmente os astros que tinham presidido ao seu nascimento:
Maldita, pois, a luz Que ao nascer me alumiou, Pois que o céu rigoroso Aprisionou meu nascimento Ao indomável poderio De um Astro tão infeliz ... Oh, desgraçada inocência Na qual tanto mandam Os astros malfazejos! (') (Lamento do Desesperado) A confissão de Camões numa das suas Canções, citada por J. Bousatesta a mesma crença na omnipotência dos astros: «Quando, fugmdo à prisão materna, vi o dia, logo a fatal influência dos astros me dominou. Recusaram-me a liberdade a que tinha direito. Mil vezes o destino me mostrou o melhor e, sem querer, segui o pior. E, para . que os meus tormentos se adequassem à minha idade, quando, ainda criança, abria suavemente os olhos, os astros quiseram que logo ali uma criança sem olhos [o Amor] me ferisse». Na época em que foram escritas estas afirmações, que não deixam de ter a sua tonalidade romântica, 'situavam-se num contexto astrológico que lhes era familiar. . Cícero es.:revera: «Há que atribuir divindade aos astros.» Esta opinião era corrente no final da Antiguidade pagã. Melhor, a absorção, pelos astros, dos deuses da mitologia permitiu a estes sobreviver de certo modo nominalmente, ao longo do Baixo Império cristão e d~ Idade Média. Inversamente, o Renascimento, reavivando o interesse pelas divindades pagãs, parecia conferir-lhe-s novos poderes, pois exaltava a virtude mágica dos planetas com os quais elas se confundiam. Apesar de reticências e, por . vezes, de anátemas, a Igreja não conseguiu expulsar a astrologia da civilização cristã, _e amba~ coabitaram. S. Tomás de Aquino admitiu, como Dante, que as estrelas determinam, pelo menos fisicamente, as características do indivíduo. No entanto, a difusão na Europa medieval de um manual de magia •, composto em árabe no século X com materiais helenísticos e orientais e traduzido para espanhol no século XIII contribuiu imenso para a nova voga da astrologia. Essa obra, cujo tít~lo latino é Picatrix -nome que parece ser uma deformação do de Hipócrates -, q~et,
baseava~se
os vemos nas paredes dos Bórgia, decoradas por Pinturicchio e seus alunos. Mercúrio atravessa o firmamento no seu carro e na terra, num aprazível vale, letrados e sábios lêem e conversam. A arte italiana do Renascimento gostava das grandes composiçÕes astrológicas. Num enorme fresco do palácio da Regione, em Pádua, podemos identificar de baixo para cima: 1.8) os planetas e os seus «filhos»; 2. ") os signos do zodíaco com ,os doze Apóstolos e os trabalhos dos doze meses do ano; 3.") no alto, umas personagens misteriosas, os decanos, ou seja, os génios que governam os compartimentos em que se subdividem as doze casas do zodíaco. A disposição do local é tal que o sol, ao levantar-se, vem iluminar, em cada mês, na parede;; da sala, a região zodiacal que realmente atravessa, nessa altura do ano, no céu. Os célebres frescos de Francesco del Cossa • e de Cosme Tura• (1469), no palácio Schifanoia de Ferrara, oferecem ao nosso olhar uma ordenação incomparável. Ao alto estão pintados os doze grandes deuses do OlimPo, «senhores dos meses». Cada um deles vai num carro, rodeado pelos seus «filhos». A zona do meio foi reservada aos signos do zodíaco e aos decanos que os regem. Em baixo está descrito, num cenário de festas, o calendário das actividades do duque Borso d'Este: partida para a caça, encontro com um bobo, etc. J. Seznec mostrou com muita minúcia que estas zonas sobrepostas são a projecção de um sistema esférico cuja região inferior é o núcleo central, isto é, a terra. Mas como não comparar, por outro lado, os frescos de Ferrara com as Tres riches heures du duc de Berry, que têm, de cima para baixo, os signos do zodíaco, o $<>1 num carro puxado por cavalos alados e, mês a mês, as actividades do duque? A astrologia dá conta, na época do Renascimento, de obras que poderiam parecer simplesmente belas mas que dissimulam uma significação mais profunda. É o que sucede na Farnesina de Roma, villa do mercador-banqueiro Agostino Chigi. A abóbada da grande sala em que Rafael pintou a Galatea foi decorada por Baldassare Peruzzí com imaginação e brio. O visitante começa por admirar, sem interrogações, Leda e os Gémeos, Vénus e as pombas, etc. Mas, se reparar que as duas cenas centrais da abóbada ocorrem num campo de estrelas, uma pergunta lhe surgirá no espírito: não estará ele a contemplar uma composição astrológica? E é realmente esse o caso. Peruzzi pretendeu reproduzir, mediante símbolos adequados, a carta do céu de Roma tal como este se apresentara a 1 de Dezembro de 1466, data do nascimento de Agostino Chigi. De facto, ao fazê-lo, Peruzzí não estava a praticar uma inovação. Na antiga sacristia de San Lorenzo, em Florença, vê-se, mesmo por cima do altar, uma cúpula pintada com figuras míticas que representam constelações. · As investigações efectuadas provaram que a posição das estrelas nessa cúpula corresponde ao estado do céu de Fiotença a 9 de Julho 'de i422, dia da consagração do altar. Esta associação da fé cristã com· a astrologia podia levar-nos longe. Houve já espírito~
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audaciosos que traçaram o horóscopo de Jesus Cristo, e o matemático Cardano consolidou a sua fidelidade ao cristianismo por motivos astrológicos: «Os cristãos- escreve- estão sob a conjunção de Júpiter e do Sol, cujo dia é o do Senhor. Ora o Sol significa justiça e verdade, e a lei cristã é aquela que mais verdade encerra e que mais capaz é de fazer os homens melhores ... ~úpiter anunciava a pureza de costumes, a probidade, a doçura aliada à eloquência e a uma grande sabedoria; por isso se viu Cristo, com doze anos, discutir no templo, visto que Júpiter dá sabedoria antes do tempo.» · Mesmo quando não impelia os homens do Renascimento a deduções tão espantosas como estas, a astrologia implicava, na mentalidade colectiva, uma subordina ção- feliz ou infeliz- dos destinos individuais às potências astrais. No tecto da Farnesina, a Fama, tocando a sua trombeta no meio do céu, anunciava a glória de Chigi. Isso significava que o banqueiro beneficiara, ao nascer, de um horóscopo favorável ·e qu~ a carreira desse homem de negócios, amigo de papas e mecenas esclarecido, correspondera às promessas dos astros. Mas nem todos têm esta sorte. A inquietação é o destino dos que nasceram sob o signo de Saturno. No Picatrix, Saturno é classificado de «frio, estéril, baço, pernicioso» . Chama-se-lhe também «sábio e solitário». É ele quem «tem maiores preocupações que ninguém» e que «não conhece o prazer nem a alegria». É o «astuto ancião que conhece todos os artifícios, enganador, sábio e sensato». No Hausbuch dos Wolfegg, os «filhos» de Saturno são, juntamente com os trabalhadores, um condenado conduzido à forca, um açougueiro a esquartejar um cav;ilo, uma feiticeira que se acerca de uma gruta onde estão dois homens presos de pés e mãos. Num desenho de Baldung Grien, de 1516, conservado na Albertina de Viena, Saturno surge-nos na figura de um magro ancião, despenteado, de olhar misantrópico perdido na distância. · Em tais condições, como não haviam de inquietar-se os nascidos sob o signo de Saturno? Foi esse o caso de Marsilio Ficino, cuja vida privada foi ensombrada pelo receio do triste velho que presidira ao seu nasci- . mento e o condenava à solidão e à melancolia. Dürer, que a si próprio se representou em 1522 no Cristo das Dores, já oito anos antes gravara a célebre Melancolia, obra «saturniana», mspirada por Marsilio Ficino, «primeira imagem moderna do artista», escreve A. Chastel, e que sugeriu a Nerval o seu famoso «sol negro da melª ncolia». A deusa sonhadora, que na mão direita segura um compasso, e que está rodeada de instrumentos próprios ·do matemático e do engenheiro - pois Dürer não foi apenas pintor e gravador -, simboliza a vida meditativa e aquela procura inquieta do verdadeiro e do belo a que estão condenados os «filhos» de Saturno. A ampulheta, por cima da deusa, e o sino anunciador da morte indicam que, numa existência por definição tão curta, não há lugar para um destino diferente. Mas se a sorte de homens como Dürer e Ficino é a tristeia ·e a solidão, também .está por eles o génio,
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represent ado no menino sentado ao lado da deusa- esse génio que no tecto da Sistina vamos encontrar ao lado dos profetas pintados por outro saturhian o do Renascimento: Miguel Angelo.
* Parecera- nos inicialmente que o Renascim ento, mais que qualquer outro período anterior, favoreceu a expansão de personalidades fortes - e esse facto é incontestável. Agora, porém, verificamos que os homens daquele tempo duvidaram da sua liberdade. Vejamos, por exemplo, Maquiavel, que, embora reconhece ndo o livre-arbítrio, assevera que «o acaso governa metade, ou um pouco mais de metade, dos nossos actos». Mas, se a margem de possibilidades deixada ao homem é muito estreita, o facto é que existe. Claro que a Fortuna é mutável e que todas as imagens da época a mostram com a roda, símbolo da alternânc ia dos êxitos e dos reveses. Guicciard ini insiste sem . cessar · na inconstân cia da Fortuna. Mas também os príncipe s- afirma Maquiav el- devem saber mudar com o tempo e as circunstâncias. E depois há que escolher as ocasiões: é esse um dos aspectos da virtu. Finalmen te, «a Fortuna é mulher só cede à violência e à ousadia». Ser IÍvre é portanto saber dar mostras' ao mesmo tempo, de maleabilidade e de a~dácia. ' ' Ainda mais que Maquiavel, Marsilio Ficino, tão marcado pelo receio de Saturno, defendia também a existência da liberdade. Retomav a assim o pensamen to de Lactâncio e de Santo Agostinho, que, sem duvidar da influência dos astros, acreditavam, ao mesmo tempo, na realidade do nosso livre-arbítrio; A alma, pelo caminho da interioriz ação e da consciência, eleva-se para Deus .e escapa à matéria: é a ascese neoplatónica. · Além disso, depende de nós · orientar da melhor maneira possível a nossa vida dentro do quadro traçado pelos astros. Estes «inclinam» o nosso destino mas não o «determinam». Quem tiver nascido sob o signo de Saturno poderá .utilizar - ou não - as indicações do horóscopo, que o aconselha m a orientar-se para o trabalho intelectua l e para a criação artística. Assim, o Renascim ento, especialmente o Renascim ento dos neoplatónicos, conciliou a liberdade com as influências astrais. E viq, muitas vezes, na astrologia uma espécie de estratagem a, um apertado jogo com a natureza. ·Como o microcosmos humano é .o lugar de encontro das múltiplas acções vindas de um macrocosmos que, por sua natureza, não é diferente dele,. é normal . que se vá consultar o astrólogo antes de tomar uma decisão importan te. Casar ou não casar? Iniciar ou não uma viagem? Ou, no caso de ser-se príncipe, fazer ou não guerra ao vizinho? Considerando o seu horóscopo, um homem não pode tomar qualquer iniciativa em qualquer dia. O astrólogo dir-lhe-á o que é possível e quando será possível. «0 ponto de vista do astrólogo - escreve E. Garin- é a necessidade de convencer, de persuadir as forças da natureza que nos ameaçam , aliando-se a umas para combater outras, jogando
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assim com todos os recursos disponíveis para vencer as forças adversas ... o sábio conhecendo os hábitos do céu, as zonas, os climas, os influxos, vai às ~aradas utilizando hábeis finuras tácticas e até orações, rituai~, talismãs. Opõe assim a astúcia à força, o exorcismo à ameaça, a habilidade às ciladas». De certo modo, a astrologia põe-nos em presença de um homem na defensiva face a um mundo que o penetra por todos os lados e em cujo interior lhe. é difícil criar o seu próprio lugar. Mas o Renasciment~, por vezes à custa de contradições, colou a esta imagem do homem mais actuado que actor a concepção do homem criador, senhor do mundo, mágico. Concep~ão comum a Pico de Mirandol a, ao próprio Ficino, a Lefevre d'Étaples e a Paracelso; concepção que vem, ao mesmo tempo, do árabe Avicena (980-1037) e das doutrinas de Hermes Trismegista:*, a que a escola neoplatón ica restituiu tanta importância. No Picatrix surge a ideia, fundamen tal na época do Renascim ento, de que o homem-microcosmos por ser um resumo do mundo, é capaz de agir sobre todo o universo o~erando novas combinações, ou seja, novas convergências de forças. A magia tem então por objectivo dar ao homem ~sse poder sobre os elementos que o pecado original lhe fizera perder. E evidente haver uma ligação entre a magia e a astrologia. A obra mágica será ineficaz se não for reaEzada num momento em que as conjunções dos astros a favoreçam. No meio de um universo em que terra e céu convergem um para o outro o optimismo dos neoplatónicos represent a, portanto, o homem como u~ dominado r que actua c que, para actuar, prevê. Grão de pó, poderá, se quiser, ser dono e senhor de um mundo que se lhe a~semelha e que ele resume. Nisto consiste a revelação de Hermes «tres vezes grande». No Pimandro, o mais conhecido dos Livros Hermétic os, tal ~~mo no Livro da Vida, a mais complexa e mais estranha obra de Fiemo, surge-nos esta forma de apresenta r o homem como criatura de excepção, imagem viva de Deus no mundo, capaz de fazer convergir para si e de utilizar em seu proveito todas as forças da natureza. , O homem mágico pode dominar os elementos: as forças do céu e mesi:no as do inferno. Transcende a imbecillitas corporis, que tem em comum com todos os seres vivos graças à inquietudo animi- essa sede de conhecim ento e de acção que 'lhe permite transform ar o mundo. Todos os manuais de astrologia e de magia da Idade Média e do Renascim ento retomara m a fórmula de Ptolomeu : «0 sábio vencerá as estrelas». Pico de Mirandol a, que, muito curiosam ente, se insurgiu contra a astrologia, apresento u no De dignitate hominis (1486) um vibrante elogio da «magia natural», ou «divina»: «Cheia dos mais altos mistérios, ela abarca a contempl ação mais profunda das coisas mais secretas e, por fim, o conhecim ento de toda a natureza ... Revela publicamente, como se fosse ela o seu autor, as maravilhas escondidas nos mais recônditos lugares do mundo, no seio da natureza, nas reservas e segredos de Deus; e, tal como o agriculto r
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~ne ? ulmei~o à videira, o mágico une a terra ao céu, isto é, 0 mundo mfenor às vutudes e às forças do mundo superior». Como se não há-de então, ampliar o mágico, ou seja, o homem? Com efeito declar~ Pico ~e !'1irandola, ele é «o ser mais .afortunado» da criação: Não só os ammats, mas ~ambém os astros e os espíritos de além-túmulo invejam a ~ua. alta posiÇao. Ele é um «grande milagre», um «ser admirável». Dai amda . e~ta afirmação, fundamental para a caracterização do humams~? optimtsta; «Que uma espécie de ambição sagrada invada o nosso espm to para que, insatisfeitos com a mediocridade, aspiremos aos cumes e com todas as nossas forças trabalhemos para os alcançar, visto que, se qmsermos, poderemos lá chegar.»
* As críticas à astrologia foram muito raras na época do Renascimento; mas houve-as. As de Pico de Mirandola e de Savonarola são quase contemporâneas uma da outra. Um pouco mais tarde, Erasmo repreendeu, ~o Elogio. d~ Loucura, os «felizes videntes do futuro» que t~mam «o ceu por btbhoteca e os astros por livros». Também o seu d~sc~pulo Rabelais rejeita a astrologia: «Nem Saturno, nem Marte, nem J~plter, ne~ n~nhum outro planeta... (tem sobre as coisas do mundo) VIrtudes, eftcáctas, poder ou influência alguma, se Deus, por sua vontad~, lhos não:,.der». Lutero, em certas ocasiões, também troçou da astrologia, que ora classificou como «alegre fantasia» ora como «arte malsã e desprezível». Mas outras afirmações do reformador provam que ele receava as conjunções dos astros. Calvino, embora reconhecendo «haver uma certa convergência entre as estrelas ou planetas e a disposição do corpo humano», opôs aos astrólogos argumentos bebidos nas melhores fontes do bom senso e do espírito crítico: «Já muitas vezes ficaram nuJ?a . batalha até sessenta mil homens... Eu pergunto se deveremos atnb.mr o_ mesmo h~róscopo a todos os que a morte assim iguala.>> Mas Calvmo nao conseguiU demover o seu tempo. É verdade que, no Rei Lear, uma das personagens, Edmundo, entra numa vigorosa diatribe · contra a astrologia: «Quando a nossa fortuna está doente, tantas vezes por causa dos excessos da nossa própria conduta, atribuímos a responsabilidade dos nossos desastres ao sol, à lua e às estrelas: como se fôssemos cele~ados po: necessid~de, imbecis por imposição · celeste, impostores, ladroes e tratdores devtdo à predominância das esferas, bêbados, mentirosos e adúlteros em obediência forçada à influência planetária e culpados de tudo por violência divina! Admirável subterfúgio de um devasso: culpar as estrelas pelos se'Qs instintos de bode». Mas, mesmo ainda antes dele, já seu pai, Gloucester, expusera a tese tradicional: «Estes últimos eclipses do Sol e da Lua não me pressagiam nada de bom. A sabedoria natural tem tentado explicá-los desta ou daquela maneira mas nem por isso a natureza deixou de perturbar-se com os seus inevitáveis efeitos:
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o amor arrefece, a amizade fraqueja, os irmãos dividem-se; motins nas cidades, discórdias nos campos; nos palácios há traições e todos os laços entre pai e filho se rompem». Shakespeare não parece ter escolhido entre estas duas opiniões contraditórias. Lutero e Calvino, ao rejeitar a astrologia, não o faziam para salvar a liberdade humana mas sim para salvar a liberdade divina. Realmente, a doutrina da jusiificação pela fé ensina que, na obra da salvação, os méritos humanos de nada contam. Há, pois, predestinação*. Já antes de Calvino tinha Lutero enunciado esta doutrina, à primeira vista paradoxal: «A vontade humana encontra-se entre Deus e Satã e deixa-se conduzir e empurrar como um cavalo. Quando é Deus que a guia, vai para onde Deus quer e como Deus quer, como diz o Salmo LXXIII, versículo 22: «Sou para ti como um animal estúpido». Quando é Satã a apoderar-se dela, vai para onde ele quer e como ele quer. Ora a vontade humana não. é, em tudo isto, livre de escolher o seu senhor: os dois cavaleiros combatem e disputam entre si para decidir qual deles tomará conta dela» (Tratado do Servo-Arbítrio, 1525). Escrevendo estas frases de maneira acerba, Lutero dava resposta à Diatribe sobre o Livre-Arbítrio de Erasmo. O conflito entre estes dois homens acerca da liberdade ficou célebre. Lutero, cobrindo de injúrias o interlocutor, não deixou de lhe fazer justiça: «Gabo-te e louvo-te por teres sido, de todos os meus adversários, o único que apanhou o ponto certo do debate.» Numa época que tomava aguda consciência do pecado pessoal, Lutero queria salvar o homem tirando-lhe a liberdade. E, ao contrário, Erasmo restituía-lha. Um punha a tónica no pecado original, o outro garantia que a falta de Adão e Eva tinha corrompido a vontade e a inteligência do homem mas não as extinguira. Uma vez perdoado o pecado pela Redenção, o homem pode novamente caminhar «para o · verdadeiro bem» mediante a razão, ajudada esta pela graça. Não é tão mau como julgam os teólogos pessimistas. Erasmo escrevia: «Há uma razão em todo e qualquer homem e em toda e qualquer razão há um esforço em direcção do bem.» E mais: «0 cão nasce para caçar, a ave para voar, o cavalo para correr e o boi para trabalhar; também o homem nasce para amar a sabedoria e as boas acções.» A natureza do homem é
gélicos. No século XVII, Descartes e Corneille viriam a exaltar a , «generosidade» quase estóica daquele que sabe vencer as suas paixões. O Renascimento viu, pois, afirmar-se uma filosofia da liberdade e, ao mesmo tempo, assistia ao expandir de personalidades mais fortes e mais numerosas que no passado. Mas · um movimento tão profundo e com tão grandes consequências não podia surgir na sociedade e na mentalidade do Ocidente sem provocar discussões e torvelinhos- as pessoas batiam-se pró ou contra a justificação pela fé -nem sem envolver de melancolia e de solidão os heróis da ascensão individual. Ao terminar o século XVI, duas grandes correntes se opunham a respeito da liberdade da pessoa humana. O sínodo reformado de Dordrecht (1619) e o · jansenismo continuaram na via de Lutero e de Calvino, rebaixando o home~ para exaltar Deus. A teologia optimista dos jesuítas, pelo contrário,. optou pela mensagem de Erasmo. Mas esta mensagem foi ainda mais adaptada pelos protestantes independentes: Servet, Coornhert, Sozzini * e, logo a seguir, por Barclay, o teólogo dos quakers- que negaram o pecado original, posição esta que salvava de modo radical a liberdade humana. Assim ·fazendo, abriam caminho ao «século das luzes», que só teve um dogma: o dogma do progresso da humanidade.
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CAPíTULO Xll
A CRIANÇA E A INSTRUÇÃO
Na civilização ocidental, a descoberta da criança acompanhou a afirmação do individualismo. Assim, operou-se lentamente. No século XIII ainda as esculturas e as miniaturas representavam a criança*, de um modo geral, como um adulto em ponto pequeno: prova de que se não reconhecia à primeira idade da vida humana uma originalidade própria. No entanto, a época de S. Luís assistiu à multiplicação de certas representações da juventude e da infância: o anjo adolescente, que depois se encontraria na arte do Renascimento sob o pincel de Fra Angelica * ou de Botticelli; o menino Jesus, esculpido ou pintado com frequência crescente à medida que se ia desenvolvendo o culto mariano; e, por fim, a criança nua, símbolo da alma no momento do nascimento ou da morte, ao penetrar no corpo ou ao abandoná-lo. Destes três temas, foi o segundo que, a partir do século XIV, teve maior aura; e foi graças a ele que o sentimento da infância chegou a exprimir-se na arte ocidental e a tomar consciência de si. A este respeito, a Madona com o filho nos joelhos que Fra Angelica pintou, por volta de 1450, na parede do convento de S. Marcos de Florença pode ser considerada como obra-charneira enti:e duas épocas. «0 mais belo dos filhos dos homens» tem ainda uma atitude rígida: abençoa-nos com a mão direita enquanto, na esquerda, segura o globo do universo; tem, como a mãe, a face rodeada de uma auréola e as suas feições exprimem uma serenidade e uma sabedoria que ultrapassam a sua idade. Mas o monge-artista sentiu, perante o Deus-menino, uma piedosa ternura: vestiu-o de roupas cor-de-rosa e brancas, cujos tons claros contrastam com o manto azul-escuro da mãe; enquadrou-lhe o rosto com encantadores caracóis louros, arredondou-lhe as faces e o queixo. Jesus não é aqui uma criança de peito, é já um rapazinho pequeno. Fra Angelico não ousou, portanto, representá-lo nu, pois essa nudez esteve por muito tempo, no caso do filho de Maria, reservada ao divino' recém-nascido, como se pode ver na Virgem de Autun de Jan Van Eyck, numa Natividade do próprio Fra Angelico e nas
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obras de muitos artistas da época. No fim do século XV e nos princípios do século XVI, porém, Leonardo, Rafael e Miguel Angelo puseram nu, ao lado da Virgem, um menino Jesus que já sabia andar. Assim, a pintura religiosa do Renascimento permitiu à sensibilidade ocidental exprimir finalmente a maravilha, hoje tão natural, das carnações tão novas da criança. Ao mesmo tempo que se produzia esta evolução, o filho de Maria ia perdendo o carácter hierático e irreal. Deixava de fazer o gesto da bênção e passava a ser uma criança como qualquer outra, aninhada ao colo materno (Virgem do Grão-Duque), ou a brincar com o pequeno João Baptista (Virgem dos Rochedos, A Bela Jardineira) ou então com uma flor ou uma avezinha (Virgem com o Pintassilgo). Correggio sabia dar admiravelmente a divertida ternura das pessoas crescidas que se prestavam às brincadeiras da divina criança. No Casamento de Santa Catarina, Jesus mete no dedo da santa o anel dos esponsais místicos. A santa, a Virgem e S. Sebastião seguem, sorrindo, o gesto da criança a um tempo desajeitado e conspícuo. Na Madona com S. Jerónimo, Correggio deu à atitude carinhosa de Madalena uma doçura indefinível: a sua cabeça roça o corpo rechonchudo do menino e este brinca com os caracóis louros da santa. Os artistas do Renascimento, portanto, estruturaram rapidamente o tema da infância religiosa. De resto, não se limitaram a Jesus. O nascimento da Virgem, a educação de ·Maria, a quem Santa Ana ensina a ler, as brincadeiras do pequeno João Baptista ou dos filhos das santas mulheres invadiram a iconografia no momento em que as histórias de crianças começavam a abundar em lendas e contos pios como os Miracles Notre-Dame. A arte religiosa passava a ser pretexto para a representação da criança. No Spedale degli Innocenti, de Florença, as crianças figuradas por volta de 1465 por Andrea Della Robbia ·• em medalhões de terracota não são as vítimas do cruel Herodes: são simplesmente belos pequerruchos de bochechas bem redondas, apertad~s, à moda do 'tempo, num cueiro que lhes sobe até ao peito. Mas o lugar concedido à criança nas cantorie esculpidas por Luca Della Robbia e por Donatello no interior da catedral de Florença é -atendendo à data (1432-1440)- excepcionalmente amplo. Os cantores e os tocadores de saltério, de cítara e de trombeta de Luca Della Robbia exprimem sentimentos cristãos que estão ausentes na ronda báquica dos bambini desgrenhados de Donatello. Mas ambas estas obras exaltam a descoberta da infância e a alegria dos primeiros anos de vida. Verdadeira antecipação, do ponto de vista que aqui tratamos. Porque, na realidade, a criança entrou de modo discreto na civilização moderna. Foi com passos silenciosos que ela deixou o quadro religioso onde inicialmente tinha sido fechada. A menina pintada por Crivelli * a um canto .da sua Anunciação (1493) é uma imagem simbólica desta evolução. Os ràlos do Espírito Santo vêm iluminar a Virgem, que reza num quarto de palácio ricamente decorado, enquanto o Anjo e Santo
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Emídio se preparam para entrar. Do outro lado da rua, no alto de uma escada, homens, entre os quais um religioso e uma figura vestida de vermelho, conversam, aparentemente indiferentes ao grande mistério que se passa em frente. Mas uma. menina de três ou quatro anos meteu-se entre as pessoas crescidas. Tímida, despercebida dos adultos, encostada ao parapeito no alto da escadaria, · olha para a rua. O espectador tem de fazer esforço para prestar atenção a esta criança, inquieta e como que amuada, que é a figura mais pequena de todo o quadro. Ela representa para nós a infância que, na época do Renascimento, h:esita ainda em afirmar-se como idade autónoma. O seu desenvolvimento definitivo dependia, evidentemente, da melhoria das condições económicas gerais. Ora, no Antigo Regime, os pais demasiado pobres não tinham tempo nem vagar para rodear de atenções os numerosos filhos. A este respeito é muito revelador o testemunho de Thomas Platter (1499-1582), humanista de Basileia e filho de uma humilde camponesa do Valais: «Minha mãe --escreve Platter- era uma mulher corajosa e viril, mas rude; quando lhe morreu o terceiro marido deixou-se ficar viúva e fazia todo o trabalho como um homem, para poder criar os {ilhos mais novos. Apanhava feno, malhava trigo e fazia outros trabalhos que são mais para homens que para mulheres. Também enterrou ela própria três filhos que lhe morreram numa grande epidemia de peste, visto que dá-los a enterrar ao coveiro era, em tempo de epidemia, muito caro. Era muito rude para os mais crescidos, e por isso raramente íamos ter com ela a casa ... Uma manhã, durante as vindimas, caíra sobre as vinhas uma forte geada branca; eu tive uma cólica que me fez ficar com os braços e as pernas estendidos e hirtos e julguei morrer. E ela, de pé, à minha frente, ria-se e dizia-me: "Pois rebenta para aí! Quem te mandou · comê-las?" ... A parte isso, era uma mulher honesta, recta e devota; todos lho reconheciam e a elogiavam.» Muitas mulheres do povo, nessa época, se deviam parecer com a mãe de Thomas Platter. Lutero, que sempre dedicou um profundo respeito a seus pais, queixou-se de que a mãe lhe batera muitas vezes por motivos fúteis. Assim se forças profundas impeliam a criança para primeiro plano, outras tentavam contê-la no mundo dos adultos, onde a sua fragilidade e a sua frescura não atraíam as atenções. Só no século XVII as crianças de mais alta condição social - das outras, naturalmente, não falamos vestiram roupas diferentes das das pessoas crescidas. O quadro de Bruegel Jogos de Crianças (1560) é também muito revelador quanto às dificuldades encontradas pela lenta promoção da criança na civilização ocidental. Crianças de ambos os sexos brincam numa praça e na rua com arcos, jogam o pião, o molinete, o eixo, etc. Uma trepou a uma~ andas, outras servem-se de uma trave como se fosse a barra fixa. Mmtas batem-se_ Primeira impressão: é a despreocupação da juventude incipiente, a incoercível necessidade que as crianças têm de brincar. Mas nota-se ainda outra coisa: estas brincadeiras não se passam num pátio de recreio, isto é,
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num local especialment e reservado a estudantes. De resto, quantos destes jovens tinham oportunidade de frequentar a escola? Além disso, tanto rapazes como raparigas não só têm vestuário como cara de pessoas crescidas, com uma fealdade quase simiesca. Serão realmente crianças? É de notar que o arco foi durante muito tempo uma brincadeira de adultos. Seja como for, é uma multidão anónima (assunto da especial estima de Bruegel) que se parece muito com a do Combate entre a Quaresma e o Carnaval, obra estranha onde crianças e adultos participam em conjunto nas mesmas actividades burlescas. A criança pobre ficará ainda por muito tempo sem rosto. Em contrapartida, a criança das classes ricas atraiu, logo no século XV, as atenções dos artistas. A arte do retrato, que se ia desenvolvendo, permitiu-lhe nessa época entrar na história. Hugo Van der Goes, no Tríptico Portinari dos Uffizi (1476-1478), colocou nos painéis laterais os filhos do banqueiro ao lado do pai e da mãe. As crianças olham, maravilhadas e enternecidas, o grande mistério do Natal. Quando as crianças aparecem assim acompanhadas dos pais, nesta época, é, frequentemente, em quadros ou vitrais, fazendo parte do grupo dos doadores- que iam ocupando um lugar cada vez mais importante em relação à cena religiosa. A tradição de tais ex-voto manteve-se por muito tempo na Alemanha e nos Países Baixos. Mas esta época, assinalada pela rápida laicização da vida quotidiana, deixou-nos quadros de família que se não destinavam a edifícios religiosos. É um exemplo o retrato dos esposos Van Gintertaelen (1559), sem dúvida oriundo da oficina de Ditck Jacobtz. O marido, cuja idade é precisada por uma inscrição -vinte e sete anos-, tem a mão no ombro da esposa, de vinte anos. Os dois filhos do casal brincam a seus pés.
* A iconografia da família ganhou, assim, na civilização europeia, uma nova importância. É que a família, no sentido estrito do termo, estava a ganhar maior autonomia. A desagregação do mundo carolíngio obrigara os pequenos grupos humanos a recorrer à solidariedade da linhagem. Em contrapartida , a consolidação da autoridade do Estado, a partir do século XIII e, ainda mais, nos séculos XV e XVI, libertou a família e permitiu-lhe uma vida privada mais íntima. Evolução significativa: a mulher * primeiro e depois a criança invadiram gradualmente as representações dos ofícios e os calt!ndários. As tapeçarias e os livros de horas passaram a apresentar a mulher compartilhan do com os homens trabalhos e alegrias. A mulher acompanha os homens na caça e conversa com eles nos jardins; no caso da vida campestre, a mulher auxilia os homens em ceifas e vindimas. Há gosto na figuração dos interiores domésticos, da intimidade do lar, da actividade das criadas. O tema das estações e o tema das idades da vida começam a 'servir para a história das famílias. Assim, num capitel do palácio dos Doges de Veneza, do fim do século XIV ou prin-
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clpio do século XV, c que, naquela data, é quase uma antecipação devido à sua modernidade, as oito faces narram a vida de um casal: o noivado, o casamento, o leito conjugal, o nascimento dos filhos, a morte de um deles, etc. Testemunhos variados e convergentes atestam perante nós o interesse que é cada vez mais suscitado pelas crianças. A época de Gerson chama-lhes «a esperança da Igreja» e o século seguinte redigirá para elas muitos catecismos; são acolhidas nas escolas de canto das igrejas, fundadas quase em· toda a parte Íio século XV, e contribuem para a voga dos «natais,. populares; entram: agora no santuário como «menin~s de coro», enquanto que, anteriorment e, o serviço litúrgico era, normalmente , feito pelos clérigos. Mas detenhamo-nos um instante nas primeiras efígies funerárias dedicadas à infância. Há poucas anteriores ao século XVI. Podemos, evidentemente, ter por certo que uma certa indiferença para com os mais pequenos ainda por muito tempo, e mesmo em lares abastados; atenuou a . dor provocada pela sua morte prematura~ Não escrevia Montaigne: «Perdi dois ou três filhos de peito, não sem desgosto, mas sem arrelia»? Mas muitos sinais deixam adivinhar como no século XVI recuou esta excessiva serenidade em face da morte das crianças de tenra idade. O museu de Gand conserva os dois painéis iaterais de um tríptico ·pintado por Gerhardt Horenbout (morto antes de 1541), que representam um conselheiro-recebedor de Carlos V, Liévin Van Pottelsberghe, sua esposa e seus filhos. As crianças são cinco, mas quatro têm pequenas cruzes entre as mãos postas: isso significa que já tinham morrido na altura · em que foi pintado o quadro. Estão representadas com a idade em que a grande ceifeira as levou. Os pais recusavam-se, portanto, a esquecer-lhe~ eis .rostos: esta atitude· parece-nos hoje bem natural, mas · não o era naquela época. Atesta que estava a surgir uma nova sensibilidade .. Com efeito, a partir do século XVI, a criança prematurame nte levada pela morte começa a aparecer nos túmulos ao lado da mãe ou aos pés dos jacentes. No século XVII, sendo de alta linhagem, já pode ter direito a um túmulo próprio. Jaime I* perdeu em 1606 e 1607 du~s filhas, , uma de três dias e outra de dois anos: o rei - observa Ph. Aries, que estudou de modo muito penetrante a história da infância- mandou representá-las nos seus túmulos de Westminster nas suas roupas próprias e quis que a mais pequena . repousasse num berço de alabastro onde tudo fosse fielmente · reproduzido para dar a ilusão da realidade, incluindo <
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evidente, e é ela que faz o valor das m . . h ais belas_ pass~gens, <
E, rosa, ela viveu o que vivem as rosas ' A duração de uma manhã... (') vamos encontrar uma afirmação gélida, vinda, como vem ' de um pai que perdera também dois filhos;
Qu~nto a mim, já por duas vezes esse raio Vezo também fulminar-me E duas vezes a· razão me /~vou a decidir Nunca mais recordar r). _ . Triste poderio da razão 1 Mas 0 • 1 X Tsecu o VII nao VIu, a este respeito, o triunfo da razão. De facto , ven Ic~-se que os quadros de família da época de Luís XIV tendi em volta da criança, e esta passou a ser o centro da ~:npaosoi~çga_aomz~rt-~e. PIC onca. . com ~u~o;oa:e;:s::s~~lts crianças. manife~tou-se também na predilecção liga-se menos à da ou os PUIII. Esta Iconografia Idade Média qu p . , e representava por meio d nua a alma fora cnança uma e do corpo - melhor por m . d ew e · um adulto em ponto ' · pequeno -, que . . a da escultura greco-romana A rede gran_de parte a voga até então desco:~ob.~rta da AntigUidade explica em partir do século XV na arte ocidental e~I a que o ~em~ do putto teve a 1, ' tnunfando pnmeiro em Itália para depois se espalhar além-Alpes vestido por Donatello inspirad e a em-mar. O Era~ Attis bizarramente Por Rafael em frent~ da Ga/~t;uma est~tueta antiga, o anjinho posto Triunfo de Baco e Ariana vem a, as .cnanças be~ carnudas que, no o cortejo, as crianças que ~om os ~ bnncar com tigres ou a sobrevoar graça aos baixos-relevos da font~o~~so~e corpos :echonchud os dão tanta s ocentes sao apenas alguns exempios, entre mil outros a ate t pequenos amores nus. Mas os sp:~t.o :t~gresso em. força do gosto pelos , l o Iveram rapidamen te lugar na arte . ~·. I ': ~ :··
. . . (') No original;;,1<;iBt rose elle P~se ~·un mat!n... ·:~~fN~ ftq T.) , , a _vec~ ce que VIvent les roses, 1 L'es, ,,. ~ . . .....d,O ~o ongm,il.l: ; ~<:Q.~ ,Jlloi ~jã ' d'''l'.' f0 . · , , !lle s~.IS ."VU perclus, 'l 'Et' \Je'n'X" f~ís'fJlfr~S 11~iJi~t-}J9}r 1 J?!I;l'eill~ ,fq,~<:f:r:e , ./ .,,{~
7~Qli'll ·rte ~m'en:·soo'Vient'tpiü§;~~·vtR> Jp_fl §,(j,
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religiosa. No início do século XV, Jacopo della Quercia pô-los no túmulo de Ilaria dei Caretto. Dentro de pouco tempo não se poderia já imaginar o paraíso sem a presença, entre santos e nuvens, de anjinhos de grandes bochechas e redondas nádegas. Vemo-los no andar superior da Disputa do Santo Sacramento e irão povoar todos os céus com que a arte barroca virá a cobrir abóbadas ou cúpulas de uma imensidão de templos. Ph. Aries faz, justamente , notar que «o gosto pelo puttó correspondia a algo de mais profundo que o gosto pela nudez à maneira antiga e é necessário relacioná-lo com um vasto movimento de interesse a favor da infância». Com efeito, quanto mais crescia o interesse pela criança de tenra idade mais se gostava de a representar nua: disso dão testemunho as inúmeras fotografias «de arte» dos séculos XIX e XX. Na época do Renascime nto ainda se hesitava em dar a crianças históricas a nudez dos amores da mitologia ou dos anjinhos. Mas o século XVI viu ·as primeiras audácias nesse sentido, de Holbein, P. Aertsen, Ticiano e Veronese. Nos quadros destes pintores, a criança nua assemelha-se ainda ao putto. Mas, quando, no século seguinte Rubens representou seu filho nu nos braços de Helena Fourment, não só não o tratou como putto com.o ainda lhe pôs na cabeça a boina com pluma que nessa época fazia parte, quase sempre, da indumentá ria dos meninos. Na segunda metade do século XVII, a situação, no que diz respeito à representação das crianças pequenas (das boas famílias), invertera-se em relação ao que se verificava cinquenta anos antes: mostrá-las nuas era já uma convenção do gênero.
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Pelo facto de descobrir a criança, o Renascime nto deu, naturalmen te, particular atenção ao problema da escola. Pode-se considerar como simbólico deste novo interesse o retrato de um Estudante pintado por Jan Van Scorel em 1531. O rapazinho, de doze anos, com uma boina vermelha, tem numa das níaos a pena e na outra uma folha de papel. Tem a fronte ampla e um rosto sereno e feliz. Adivinhamos que não terh dificuldades na aprendizagem e que lhe não batem muitas vezes. Bom aluno de mestres humanista~, jâ tem o seu latim, como sugere o texto que por sua mão escreveu na: folha de papel: Omnia dat Dominus non habet ergo minus (o Senhor dá tudo e nem por isso fica com menos). Esta máxima, reforçada com outra que estâ na parte de baixo do quadro, toma todo o seu sentido no contexto da época. A instrução só tem valor quando educa: deve formar homens e cristãos . Será este estudante dos novos tempos diferente dos da Idade Média? . Sim, sem dúvida; e mais adiante diremos porquê. No entanto, não há razão piua se julgar que tenha havido uma ruptura entre o ensino medieval e o ensino do Renascimento. Os programas dos colégios • clássicos, cãtólicoo ou protestantes, não· eram;· uma herança da escola antiga; em e-oht'l!âpartidàj 2pFOlon'gilt.amJ"Hrevisto ;;e;;;éorFigid'ri;.~ todaviit,: ~. pele1 h uma-
nismo - o ensino das escolas latinas medievais. Estas escolas tinham-se desenvolvido em função das necessidades da Igreja e formavam os clérigos de que a sociedade cristã tinha necessidade, que ' tinham de saber, principalmente, latim, então concebido como língua viva. Os pedagogos do Renascimento não só deram lugar ao grego no ensino como substituíram pelo latim de Ocero e de Virgílio o latim de Igreja. Ao fazê-lo, cavavam inconscientemente um fosso cada vez maior entre a cultura e a vida quotidiana. Rechaçaram o latim para o passado e contribuíram, ao contrário dos seus próprios desejos, para fazer dele uma língua morta. Todavia - e isto é o que aqui nos interessa-, mantiveram na escolaridade o essencial do ensino das faculdades das artes medievais, que se compunha do Trivium (gramática, retórica e dialéctica) e do Quadrivium · (geometria, aritmética, astronomia e música). Com efeito; encontrar-se-á, · do século XVI até ao século XIX, nos colégios, classes de «gramática» e 'uma classe de «retórica». É verdade que. a «dialéctica», como tal, desapareceu; mas foi para dar lugar à «lógica», cujo nome diz bastante sobre a origem aristotélica e tomista da disciplina, que passou a ser sinónimo de «filosofia». Ora, depois do estudo da gramática e das humanidades, os.· alunos, com excepção do caso da lnglaterrà, terminavam a carreira escolar no próprio colégio estudando a «lógica» e a «física», matérias que cobriam uma parte do Trivium e todo o Quadrivium. · Esta permanência dos programas explica-se facilmente quando se pensa que os colégios da época clássica saíram gradualmente, durante os séculos XV e XVI, das antigas faculdades das artes. Estas, apesar do seu nome, que parece enganar-nos, não ministravam ensino superior: davam o equivalente à actual formação secundária. Constituíam uma propedêutica que dava acesso às outras faculdades, de nível mais elevado, onde se aprendia direito, medicina ou teologia. A evolução, que se pode ,seguir no caso privilegiado de Paris, permite-nos compreender como os colégios operaram o desmantelamento das antigas faculdades das artes. Originalmente, os estudantes moravam em casas de habitantes da cidade, alugando, em caso de necessidade, .um só quarto para vários. Mas a indisciplina daí resultante e a pobreza de grande número de clérigós, cujos estÜdos ~ orien~vam p~r~ a carreira ec.lesiástica, ~provocaram a c~iação de colégios, que se multiplicaram, .a partrr do século XIII, em Pans; em .Toulouse, em Oxford, em Cambridge, em Bolonha. De um modo geral, eram fundações instituídas por pessoas ricas com o fim de permitir a estudantes pobres a frequência da universidade e a continuação dos estudos;. Antes de 1400 já tinham sido ~riados trinta colégios em Paris: o colégio da Sorbonne (para teólogos), o colégio de Harcourt (para estudantes da Normandia), o colégio de Navarra (que era a sede da «nação de França»), etc. As bolsas de internato eram dadas mais aos teólogos e aos «artistas» que aos «decretistas~ e aos médicos. Havia que preparar jovens para as carreiras eclesiásticas. Mas, muito naturalment~, os «artistas» foram os principais beneficiários dessas bolsas, pois eram mais jovens. Assim
os colégios se transformaram gradualmente em esqueleto interno da faculdade das artes. A princípio, os bolseiros foram obrigados · a seguir as lições dadas na rua Fouarre, em sítios cujo pavimento estava coberto de palha, por mestres habilitados ao ensino. Mas, muitas vezes, esses mestres · eram bolseiros mais velhos e houve, pois, tendência por parte destes para dar as lições nos colégios onde viviam. A obra Recherches de la France, de :Étienne Pasquier (1621), diz-nos que os primeiros cursos a desertar da rua Fouarre foram os de gramática e de humanidades. Os · de filosofia foram-lhe no encalço no século XV. «Mas, como as lições de humani.; dades -escreve E. Pasquier- se iam pouco a pouco instalando dentro dos colégios, o mesmo fizeram as de filosofia, coisa de que o cardeal d'Estouteville se queixava na reforma da nossa universidade . [1452] .. ~ Não nos ficou dessa ·longa antiguidade senão o ser lá que -ainda dão o barrete de mestre em artes». Esta evolução, muito generalizada rioOcidente, não se verificou, porém, em Inglaterra, onde subsistiu a distinção entre as grammar schools e os colégios universitários. Estes colégios continuaram a ser estabelecimentos de ensino superior onde se entrava depois de passar pelas escolas de gramática. Nos fins do século XIV, os vários colégios de Paris já não reuniam maiS de 450 bolseiros. Mas, nos séculos XV e XVI, eram muito mais numerosos os jovens que procuravam instrução sem pretender ser · teólogos, médicos ou mesmo juristas. Eram autorizados, contra pagamento, a assistir, lado a lado com os bolseiros, às aulas dadas nos colégios. Essa massa nova e turbulenta de candidatos à instrução não deixava de ser inquietante. É ela que explicà a introdução dos castigos corporais, em vez de multas, nos colégios de Oxford ou de Paris. Em 1503, Standonck esforçou-se em · Montaigu por proteger com regulamentos draconianos a devoção e o isolamento dos estudantes pobres e dos bolseiros. Mas esta~ va-se perante uma evolução irreversível. Os externos invadiram os çolégios, que tiveram de ampliar-se, de transformar-se, de adoptar uma nova . disciplina. Os jesuítas, atentos ao movimento do seu tempo, ajudaram professores .e alunos a passar esta fase decisiva. Na Idade Média, nem todo o ensino literário era ministrado nas . faculdades das artes. Muitas cidades desprovidas de universidade beneficiavam, apesar disso, da existência de escolàs a que se poderia cham~ «secundárias», onde se ensinava «gramática e artes». Pertenciam a este tipo de escolas as que foram fundadas pelos Irmãos da Vida Comum em Liêge, Deventer, Selestat, etc., verdadeiros alfobres de humanistas: Nicolau de Cusa e Erasmo lá estudaram. Durante às ·suceSsivas transforma· ções operadas no Renascimento, estas escolas, bem como outras, que u municipalidades não 8e eximii-am a criar - como, por exemplo, o colégio da Guiena, fundado . .em 1534 em Bordéus . pelo humanista {)Ortuguês André de · Gouveia __;.,' passaram a ser colégios semelhantes àqueles que provinham da derro~da das fàculdades das artes.
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* As faculdades das artes, contrariamente ao que durante muito tempo se julgou e escreveu, não se opuseram sistematicamente à penetração do espírito humanista. Na maior parte dos casos, a hostilidade não provinha delas mas sim das faculdades de teologia. Robert Gaguin tinha razão ao afirmar: «A nossa universidade tem duas cabeças», uma que olhava para o passado e outra que olhava para o futuro. Juízo exacto na globalidade mas que é necessário matizar nos pormenores, pois foi na Sorbonne que foi instalada em 1470 a primeira grande imprensa parisiense. Ora, entre as obras a sair em primeiro lugar dos prelos, encontramos os Discursos de Bessarion Os Dois Amantes e a Miséria dos Cortesãos de .fEnea Silvio Piccolomi~i, o futuro Pio 11, e um tratado de eloquência, a Retórica em que Fichet fazia a defesa do ensino humanista. Também poderíamo~ lembrar que a cadeira de hebraico que foi criada na Universidade de Basileia no fim do século XV dependia da faculdade de teologia e que Erasmo foi feito doutor em teologia em Cambridge em 1506. ~ verdade que, a despeito destes factos isolados, as faculdades de te~logia, no seu todo, se opuseram ao movimento humanista, no qual viam uma ameaça à ortodoxia. As de Lovaina, de Colónia e de Erfurt tomaram posição contra Reuchlin, que defendia a língua hebraica e ~. literatura rabínica. A de Paris tentou impedir a criação da «nobre e trihngue academia» fundada em 1530 por Francisco I a conselho de Guillaume Budé. Em contrapartida, o humanismo penetrou com bastante fa~ilidade nas faculdades das artes. Bessarion, que ensinara em Bolonha, f01 entre 1450 e 1455 o grande restaurador dos estudos dessa universidade célebre, onde, mais tarde, em 1515, foi criada uma cadeira de letras clássicas. Os mestres de pensamento do humanismo italiano, como Guarino, Filelfo, Vittorino da Feltre, ensinaram em Pádua, onde Demetrios Chalcondylas foi nomeado professor de grego em 1463 para mais tarde levar para Florença o seu saber. O Studio da cidade do Arno desempenhou um papel determinante na difusão deste novo interesse pela literatura grega, que foi uma das características do Renascimento. Mesmo depois de Lourenço, o Magnífico, ter constituído, em 1472, a Universidade de Pisa, .que daí em diante passou a ser a principal universidade da Toscana, contmuaram sábios gregos a ensinar em Florença. Na época de Leão X (1513-1521) a Sapienza de Roma era uma universidade considerável e de grande nomeada. Nela foi criado em 1515, sob direcção de Jean Lascaris, que fora mestre de Guillaúme Budé em Paris, um éolégio de estudos gregos. Fora de Itália verificava-se, também -embora com certo atraso no tempo--,--, a mesma abertura das faculdades das artes à corrente humanista. Em Espanha, a Universidade de Alcalá, fundada em .1509 pelo cardeal Cisneros,. tinha um colégio trilingue e publicou a célebre Bíblia poliglota, uma gramática hebraica e um dicionário hebraico-caldaico. Em
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~a~s, os estudantes acorriam em massa às lições dadas pelo helenista Itahano Aleandro -homem, de resto, de muitos interesses- em 1511 nos colégios de Cambrai e da Marche. Aleandro escrevia, nessa altura, talvez com certa gabarolice: «São calculados em dois mil os que assistem à~ mi~has lições. Realmente; por mim, nem em Itália nem em frança VI mais augusta ou mais numerosa assembleia de homens cultos». Lefevre d':Étaples, depois de regressar de Itália, onde encontrara Pico de Mirandola, estudou Aristóteles no texto original no colégio do cardeal Lemoine. Nesse mesmo colégio entraria dentro em breve, como aluno, Amyot. A «nobre e trilingue academia», onde a partir de 1530 ensinaram os «leito~es reais», não se situava, na sua origem, fora das estruturas tradicionaiS. Até 1540, os seus mestres tinham o título de «leitores na Universidade de Paris» - embora, na verdade, viessem depois a abandoná-lo. Mas o colégio criado por Francisco I não teve edifício próprio senão no século XVII, de modo que, durante muito tempo, os «leitores reais» ensinaram nos diversos colégios do monte de Santa Genoveva. Um dos centros do renascimento literário europeu foi a Universidade de Lovaina, criada no início do século XV. Ali foram ensinadas, a partir de· 1443, as literaturas clássicas. Rodolfo Agrícola, antigo aluno de Devender, que viria a ser um dos pais do humanismo alemão ali se fez mestre em artes. Em 1517, um ' amigo de Erasmo fundou e:U Lovaina um colégio onde seriam explicados os escritos «dos escritores cristãos, bem como d~s autores moralistas e outros julgados dignos de apreço, nas línguas latma, grega e hebraica». A irradiação deste instituto foi considerável. Em 1521, Erasmo escrevia: «Não sei se alguma vez em algum povo as belas letras foram mais fortalecidas que aqui». O ensino das «belas letras» também se desenvolveu nas universidades alemãs. Rodolfo Agrícol~, que traduziu Demóstenes, Isócrates e Luciano, foi professor em Heidel~rga. Teve ali como aluno o grande humanista Conrad Celtis, que descobnu as obras da poetisa Roswitha, falecida cerca do ano 1000, e o mapa do Império Romano dito de Peutinger. Celtis renovou, com a aprovação de Maximiliano •, os estudos clássicos da Universidade de Viena ' onde ensinou poesia e eloquência. Também as universidades inglesas se abriram ao humanismo. Erasmo ensinou em Cambridge entre 1511 e 1514. Linacre, médico humanista que traduziu Galena para latim, esteve na origem do Royal College of Physicians, a academia de medicina de Londres. O Christ's College e 0 St. John's College, criados em cambridge no início do século XVI pelo bispo John Fisher com o apoio da mãe de Henrique VII, o Corpus Christi College, fundado em 1517 em Oxford por outro bispo, Richard Fox, foram outros tantos focos de onde irradiava a cultura clássica tanto latina como grega. Finalmente, na Europa Central, em Buda e e~ Craa Mathias Corvin e aos Jagelões, foram graças cóvia,. as. universidades, ... . os pnncipaiS centros de difusão do humanismo. Todos estes· factos têm
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o valor de ~xemplos. Provam, contra uma visão demasiado simplista da história, que o Renascimento se insinuou gradualmente no interior das · estruturas medievais e que, pouco a pouco, as transformou. Ê claro que heuve resistências, vindas não só das faculdades de teologia mas também dos elementos conservadores das faculdades das artes. O colégio de Montaigu, tão criticado por Erasmo e por Rabelais, optou pela rejeição das novidades. Também em Lovaina e em OJI:ford .houve tensões muito agudas a opor «T~oianos» contra «Gregos» - estes· últimos eram os partidários da nova cultura. Combates de retaguarda que não modificaram uma evolução irreversfvel. De facto, a corrente inovadora também não atingia menos as escolas «secundárias», situadas fora das cidades universitárias, que adaptaram os programàs às exigências do humanismo. John Colet na escola de S. Paulo de Londres, Jean Sturm em Estrasburgo, . Badu,el em Nimes, André de Gouveia em Bordéus, Calvino e Théod~re de Beze em Genebra, Melanchton, o prtsceptor Germanü.e, consultado por cinquenta: e seis cidades alemãs para a reorganização das suas escolas, e, finalmente, os jesuftas, com os· seus numerosos colégios, ao abandonar o latim medieval, deram lugar de honra às letras clássicas, latinas e gregas, e fizeram dar nova atenção à história, mestra de moràl, e à retórica, arte de bem dizer. Pedagogos católicos e. pedagogos protestantes seguiram a mesma via numa civilização que, apesar das fronteiras confesSionais .nascidas da Reforma, continuava a ser-lhes comum.
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Visto que os cOlégios, com excepção do caso ingles, tomavam o lugar das faculdades das artes, não há .dúvida de que o Renascimento assistju, globalmente, ao declfnio das universidades, privadas assim dos seus mais dinâmicos elementos. Os colégios passaram a atrair a massa dos jovens que. não · necessitavam de uma tormaçlo estrit~~omente especialiZada. A idade clássica europeia foi, portanto, marcada, de modo bastante paradoxal, pelo eclipse das universida
mitiram, é certo, a contra-ofensiva romana; mas só tiveram irradiação teológica. · Nos pafses protestantes, a Reforma provocou .nas universidades, c especialmente nos teólogos, uma grande perturbação que só foi vencida ao cabo de longos anos. As expulsões de professores que não aderiram às novas idelas tiveram nisso o seu papel, como também o teve a diminuição, de que Lutero se queixou, do número de candidatos às funções pastorais. Eis a média, por períodos de cinco anos, do nlimero · de estudantes das un~versidades alemãs entre 1501 e 1560: 1501-1505: 1506-1510: 1511-1515: 1516-1.520: 1521-1525: 1526-1530:
3346 3687 4041 3850 1994 1135
1531-1535: 1536-1540: . 1541-1545: 1546-1550: 1551·1555: 1556-1560:
1645 2307 3121 3455 3670 . 4334
Foi, portanto, preciso cheg~r-se aos anos 1556-1560 para voltar a ter números comparáveis aos de 1511-1515. Em Oxford parece ter havido a mesma evolução: em média, 150 estudantes teriam ali adquirido por ano titulas universitários entre 1505 e 1509; entre 1520 e 1524, 116; entre 1540 e 1544, 70; entre 1555 e 1559, 67. Ê certo que houve recuperação na segunda metade do século XVI na Alemanha protestante, ·onde tinham surgido universidades durante o perlodo de crise (Marburgo, 1527; Kõnigsberga, 1544; lena, 1558). A melhoria foi ainda mais sensfvel em Inglaterra, pafs que c~mheceu entre 1560 e 1640 uma afluência nunca vista a Oxford, a Cambridge e às inna o/ court (escolas de direito), Mas 6 bom recordar que a evolução foi diferente do outro lado do canal e que em Inglaterra as. universidades continuavam a: dar ensino literário, de resto dado também nos anos terminais dos colégios. Pondo de lado o caso inglês, 6 pois verdadeiro que, em 1600, a:s upiversida4es europei~ já não tinham a irradiação que duzentos ou trezentos anos antes tinham tido. De internacionais, que outrora tinham sido, eram agora nacionais, tanto pelo corpo discente como pelos professores. ~ estavam, . ainda, estritamente .sujeitas às ._utoridades. Em Marburgo, os mestres podiam ser despedidos por ordem do . príncipe, juiZ da sua ortodoXia. Em Kõnigsberga, q_iler os professores quer os estudantes tinham de prestar juramento ao duque da Prússia. .Em Oxford e em Cambridge, o chanceler er~ praticamente, nomeado pelo soberano. Em Genebra, as autoridades municipais · vigiavam de perto a academia local. Nos pa1ses católicos, a evoluçlo foi ·a mesma .. Os reis de França procuraram limitar cada vez mais as veleidades de independencia da Sorbonne. Quanto ao «colégio dos leitores reaist, era, como o seu nome indica, uma criação do soberano que, antes do perlodo revolucionário, nlo concretizou· as esperanças que nele se basea-
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vam. O arquiduque Fernando da Áustria pôs em 1533 a Universidade de Viena sob a sua apertada vigilância; e o duque da Baviera fez o mesmo com a de lngolstadt. Não há vida intelectual intensa sem liberdade: as universidades da idade clássica tiveram . disso a prova. Outros factos, ainda, provam a menor vitalidade, na época do humanismo, do ensino superior proveniente da Idade Média. Lyon, Veneza e Antuérpia, q1,1e, por causa dos seus impressores, desempenharam . papel de capital importância na difusão da nova cultura, não eram cidades universitárias. Quanto a Basileia, tinha uma universidade, mas de pequena irradiação, e ~ imprensa da cidade, que foi de tão grande importância, pouco lhe deve. Erasmo, o mais célebre humanista não italiano do Renascimento, tomara grau universitário e ensinara em Inglaterra; no l.:Onjunto, porém, a sua carreira não foi de professor mas de letrado independente. A maior parte dos grandes intelectuais da Idade Média -Alberto Magno, Roger Bacon, S. Boaventura, S. Tomás de Aquinotinham sido professores. Pelo contrário, os mais eminentes representantes da literatura europeia do século XVI - Ariosto, Maquiavel, Ronsard, Montaigne, Santa Teresa de Ávila, Cervantes, Thomas More e Shakespeare- fizeram as suas carreiras fora da universidade. E é fora dos quadros tradicionais que se desenvolvem as academias *. Estes grupos de adultos, ligados não somente pela amizade mas também pela comunidade de preocupações culturais, não existiam na Idade Média. Ora as academias multiplicaram-se na época do Renascimento, primeiro em Itália e depois no resto da Europa. A mais conhecida de todas é, sem dúvida, aquela que se formou em volta de Ficino em Florença. Reviveu no século XVI nas assembleias elegantes, mas bastante inúteis, dos Orti oricellari. A «academia romana», fundada no século XV por Pomponio Leto e que por algum tempo inquietara Paulo I1 com a sua aparência de paganismo afectado, continuou a reunir até ao saque de 1527. A «academia napolitana», aberta por Pontano nos últimos anos do. século XV, sobreviveu até 1543. Mas, enquanto certas soda/iates desapareciam, outras, com nomes fantasistas, surgiam em maior número: Vignaioli, Padri, Sdegnati em Roma; Elevati em Ferrara; Accesi em Reggio Emitia; Sitibondi em Bolonha; Umidi e Accademia della Crusca em Florença. Esta última, criada em 1552 para velar pela pureza da bela língua toscana, ainda hoje existe. Resolveu em 1591 publicar um dicionário, e o exemplo oriundo de Itália passou além dos montes. Londres teve os seus Doctors'Commons, Annecy a sua «academia florimontana».· Evidentemente que estas academias, especialmente na Itália da segunda metade do século XVI, foram, muitas vezes, círculos de retoricantes onde se cultivava o verbalismo. Mas estavam destinadas a um belo futuro. Nos séculos XVII e XVITI, as sociedades literárias, e ainda mais as sociedades científicas deram m.aior impulso de progresso ao saber que as ' . . universidades. 74
Enquanto o ensino se transformava e os colégios ganhavam uma importância nova, a vida e a psicologia dos alunos também se transformavam. Na Idade Média não havia salas de aula, e a reforma da Universidade de Paris de 1452 ainda ignorava a coisa e a palavra. No princípio do século XVI, Thomas Platter, que, durante as suas longas peregrinações, se deteve um momento para seguir os cursos de uma escola de ·gramática de Breslau, assevera que «nove baccalaurii davam ali ao mesmo tempo lição na mesma sala». Também não havia gradação dos estudos. A gramática, que encaramos - desde o século XV - como ensino de base como ensino que se tem de assimilar antes de qualquer outro, era ante~ disso investida de funções «tanto de rudimento como de ciência». Não tinha ainda sido estabelecida uma relação de hierarquia entre a gramática e a lógica, isto é, a filosofia. Que há então de espantoso em que os professores ensinassem todas as «artes» ao mesmo tempo, à maneira dos actuais professores primários, apenas dando mais espaço nas lições às matérias que preferiam? «Os estudantes antigos distinguiam-se dos novos não pelos assuntos que estudavam- eram os mesmos - mas pelo número de vezes que os repetiam» (Ph. Aries). E também se encontrava ria população escolar uma espantosa mistura de idades que, porém, antigamente não era chocante, visto que o mundo das crianças cedo se inú~ grava no mundo dos adultos. No século XII, Robert de Salisbury viu numa escola de Paris «crianças, adolescentes, jovens e velhos» . .No século XV, no Doctrinal du temps présent (1466) de Pierre Michault, os regentes de curso falam para «os bons estudantes ... tanto ... velhos como jovens, maduros ou inexperientes». É verdade que, no princípio do século XVI, esta mistura começava a causar estranheza, precisamente na medida em que se esboçava já um plano de estudos. Em 1518, Thomas Platter foi parar à escola de Selestat, «a primeira onde eu tive a impressão de a coisa correr bem». «Quando lá entrei ~confessa ele- não sabia nada, nem sequer ler o Donat [gramática latina elementar], ~pesar de já ter dezoito anos. Sentei-me entre as crianças e parecia . uma galinha a chocar os pintos.». No entanto não era ainda invulgar ver-se. como se viu, um Inácio de Loyola inscrever-se em 1527, aos trinta e seis anos, na Universidade de Salamanca. O século XV viu aparecer, em estado ainda embrionário e em localidades privilegiadas, a gradação do ensino e a correspondente divisão em classes, que primeiro tiveram o nome de lectiones. Um contrato firmado em 1444 entre a municipalidade de Treviso e o mestre de uma escola latina permite reconhecer, nesse caso particular, a repartição dos alunos em quatro categorias, desde os principiantes até aos já habilitados a dedicar-se à retórica e à estilística. A remuneração atribuída ao grammaticus pelos alunos era tanto maior quanto mais elevada a categoria a que pertenciam. Na «École de Faulceté» àpresentada por Michault em
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1466, doze regentes de curso ensinam numa grande sala, cada ilin deles junto à um pilar rodeado de pequenos ban.cos. O isolamento entre as . diferentes classes era já maior na escola de S. Paulo, fundada em Londres em 1509 por John Colet. Sabemos, por ·Erasmo, que era uma Sala redonda com o chão em degraus. Estava dividida em quatro partes -uma capela e tres Salas de aula - por meio de cortinas móveis. Esta evolução precisou-se mais durante o século XVI. Baduel eJD Nimes, Stu_rm em Estrasburgo, Gouveia em Bordéus e depois os jesuítas nos seus muitos colégios repartiam os alunos por quatro, seis ou oito classes, oonforme os lugares, e iam-lhes dedicando cada vez mais um lugar particular. .e um regente especializado. Assim desapareceu a mistura de idades. A d~ra ção da escolaridade modificou-se e, muitas vezes, ficou reduzida~ Passou .a ser normal chegar-se ao colégio por volta dos sete anos e sair de lá com uns quinze ou dezassete. Recebia-se instrução mais rápida e de melhor qualidade, em primeiro lugar, porque os livros impressos tinham vindo facilitar a instrução e depois, porque o estudante .dos novos tempos já não andava a vagabundear e concentrava-se mais. Ao mesmo tempo, perdeu-se a independência dos mestres. Antigamente, os docentes or~a nizavam. o ensino onde queriam e como entendiam. A partir do Renas. cimento, foram. cada vez mais integrados na vida dos estabelecimentos escolares, submetidos a um «reitor». Os jesuítas levaram esta evolução ao limite, confiando os alunos a mestres que deviam aos seus superiores uma obediência rigorosa. Na época da monarquia absoluta, a noção de obediência era, assim, ~ dos valores fundamentais da sociedade europeia.
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CAPíTULO Xlll
A EDUCAÇÃO, A MULHER E O HUMANISMO
Na Idade Média, o professor, uma vez terminada a lição, desinteressava-se do aluno. A sua função consistia unicamente em instruí-lo, dar-lhe um certo número de mecanismos iiltelectuais desenvolver-lhe a me. - ler em latim os Salmos e a Bfblia ou,' a um nível superior, móna ser um canonista competente, um médico com alguns conhecimentos, · um teólogo dado à prática das discussões. Não procurava, porém, fazer dele um homem. O ensino era mais funcional e mais técnico que· moral: no princípio do século XVI tinha ainda, em muit9s casos, este aspecto. Saído da Sala de aula. o aluno -de qualquer grau do ensino- fazia aq~o que queria e era aquilo que podia ser. Ia de cidade em cidade e de escola em escola. Pantagruel, acompanhado de Epistemon. visitou · sucessivamente as universidades de Poitiers, Bordéus Toulouse Montpellier, Valeriça, Angers, Bourges, Orléans e Paris. Outro exem~lo este exterior a qualquer ficção romanesca: Thomas Platter, modesto 'estudante esfomeado de quem queriam fazer padre e que tinha de saber, portanto, um mínimo de latim, percorreu a Suíça e a Alemanha em ·companhia de um primo, Paulus, que lhe serVia de protector -um protector que batia frequentemente no protegido. O trabalho do protegido consistia principalmente em mendigar para si e para o protector, que guardava a parte melhor da receita obtida. Depois de muitos anos de peregrinação em comum, Thomas, já crescido, acabou ·por abandonar Paulus. Que dura adolescência! Em Breslau -escreve Platter -, «os estudantes dormiam no chão da escola ... De verão, quando fazia calor dormíamos no -cemitério; juntávamos erva, daquela que aos sábados, n~ verão, era espalhada para atapetar as ruas onde· viviam os grandes senhores; alguns amontoavam essa erva .a um canto do cemitério e aí se deitavam como porcos na palha. Mas quando começava a chover refugiávamo-nos na escola e, durante as trovoadas, cantávamos pela noite adiante». Os ·estudantes Que não fossem bolseiros internos - a maioria - estavam, assim, entregues a si próprios. Pantagruel, ao chegar a Paris, informou-se por 77
um «escolar>> do gênero de vida que ele e os seus companheiros costu· mavam levar. Soube que os estudantes parisienses passavam o tempo a vaguear pela cidade, a «captar a benevolência» do sexo feminino, a visitar os lupanares, a comer «em tabernas meritórias». Quando se encontravam «em penúria pecuniária» recorriam à familia ou empenhavam os livros e as roupas. Será exagero de Rabelais? O testemunho de Étienne Pasquier parece indicar que não., «Os quartos - escreve ele, falando de Paris- eram alugados a estudantes ou a raparigas de prazer; e havia assim debaixo do mesmo tecto uma escola de boa reputação e uma escola de maus costumes». Na época do Renascimento, a reorganização dos estudos e a nova preocupação com a protecção moral da juventude modificaram radicalmente a vida escolar e acabaram pouco a pouco com a anarquia medieval neste domínio. Se os docentes passaram a estar sujeitos a severa<; regras, com mais forte razão se deu o mesmo com os alunos. O estudante medieval aceitava uma certa disciplina corporativa e sofria a iniciação dada aos caloiros pelos seus protectores, os estudantes mais antigos. Mas não obedecia, nem tinha de obedecer, aos professores, que, principalmente no caso do ensino das «artes», eram simplesmente estudantes mais velhos, verdadeiros primi inter pares. Esta situação modificou-se completamente entre 1450 e 1600. Tomou-se consciência de _que a criança e o adolescente eram seres diferentes dos adultos, dos quais se quis protegê-los, à maneira pela qual os jesuítas dentro em pouco haviam de tentar separar os índios do Paraguai .dos colonos espanhóis. Pareceu aos pedagogos dos novos tempos que a disciplina era o único meio de isolar as crianças de um mundo corrupto e de lhes incutir hábitos virtuosos. Ao mesmo tempo, tomou-se consciência de que a tarefa dos mestres não era apenas instruir, mas também educar. Estavam encarregados das almas e eram responsáveis pela conduta moral dos futuros adultos. No início do século XV, Gerson é um dos primeiros representantes destas novas tendências. Estuda o comportamento sexual das crianças e escreve um tratado sobre a Confissão da Sodomia. Sabe que esta é frequente entre jovens penitentes de dez ou doze anos e interroga-se como dar-lhe remédio. O papel do confessor serâ, certamente, importante. Mas é a educação que tem o papel essencial. Em frente das crianças só se deve usar palavras castas. Nas suas brincadeiras, r.s crianças não devem beijar-se nem tocar-se com as mãos nuas. Evitar-se-á deitá-las na mesma cama com pessoas mais velhas . . Ao escrever um regulamento para a escola de Notre-Dame-de-Paris, Gerson recomenda que se não ensine aos alunos canções impudicas, que se dê luz ao dormitório com uma lanterna nocturna, que se não permita às crianças que mudem de'· canià duttanté !.a c.rtoite; 'que ·se •evite que elas comtactem-·com serviçais, oU:40"tm.t1'1li\Vio1:éi tão\,f tequentemente\·;p'eriüeio'se·.\Jleftem~eldeíiun'Ofal'{lOSl
distraiam a falar francês em vez de I . . . . pudor, que pronunciem obscenidade atim, que mfnn]am as regras do sd oud que cheguem tarde à igreja. O cardeal d'Éstouteville que em d~ Universidade de Par~, coloca-s::a ~s, o século ~V foi o reformador na de educação Pensava . Gam em entre os movadores em maté. · , como erson que l'b d d , cnanças, pois a aetas in/irma destas . ' a ~ ~r ~ e e nef,flsta às estritos princípios» A mi·ssa_o. d exige «uma diSClplma maior e mais os mestres dizia .. · · ; . ' nao. era apenas transmltlr conhecimentos mas sim for mestres devem pois escolhe mar espintos e ensmar a virtude. Os de bem e não' deve~ hesita; os seus . ~olaboradores entre as pessoas alunos, pelos quais são respo _em_ cornglr e fazer emendar-se os seus nsaveis perante Deus s Ih . . . s pode dar resultado com · eme ante disc1plma Ó Também este estabeleciment~~ee~pr~~o do _tempo _claramente definido. ao redigir minuciosamente em 1501o~anos foi uma movaçã?·. Standonck, studentium de Montaigu t regulamento da Famtlza pauperum , mos rou uma preocup os pedagogos da Idade M'd' . açao com o tempo que . e 1a Ignoravam o · comumdades monásticas a rit d. . . . smo passou, como nas pert~r; uma lição até sext~a~o;a. Ia m~eiro: à . quarta hora, o des~:tmal entre as oitava e décima h' d~p~ls, a missa; a grande lição hçao da tarde entre a hora de te oras, as onze o almoço; a grande Bárbara, frequentado por Iná . r~a ~a sexta, etc. N? colégio de Santa Os colégios protestantes e os ~~~é ie oy~l~, o horário era semelhante. durante o século XVI o r·t d~!afiO ?~ catohcos adoptaram gradualmente 1 mo e d. . I' Gerson, Estouteville e Stand k a ISClp ma preconizados por · , · · · onc -entre os col' · '1' ]esmtas tiveràm influ'ência d . . T , eg10s cato Icos, os dos eclSlva. ambem por tod . · . a a parte se muit Ip1Icaram os castigos corporais crescidos, de dezasseis ou deza' iue nao poupavam nem os alunos mais O chicote passou a ser a insíg~~a ed~nos, tem os filhos da alta nobreza. Inglaterra, em Genebra em F pro essor. Em toda a parte -em e ter . na mão a popula~ão esc~;:ça; - se recorreu . à delação para vigiar que os outros, . aqui denominadosr. cusst:studan~es tidos ~orno mais sérios tatores foram incumbidos d des, ah praeposttores, além exci'. . e exercer sobre os co d' í 1 nente vigilância e de relatar r·1e1mente aos regent n lSC pu os uma permaca eças mais rebeldes Excesso d, . es as extravagancias das b , . · , sem uvida· mas , necessano compreender. A Idade Médi ' um. excesso que e mundo de adultos repleto de im d' , _a lançara a _cnança para um operação inversa e na medi'da d pu I~ICia. O Renascimento realizou a os meios de que d · h · _a mfluencia, cujo carácter ori inal . . . Ispun a, tentou Isolar se estava reagindo contra a co!fusã e CUJa. fragi~Idade descobrira. Como vais, foi-se além dos limites .áo ~ o liberalismo pedagógicos mediechicote e, principalmente con~:od.v~Is: hu_mi~ho~-se a criança com o ~ ~ trato\1-~~-- rapazes de d~zasseis a~u se a mfanci~ com a adolescência Esses excessos tive'í-am poré os como s7 tivessem sete ou oito.
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jesuítas e oratorianos e pelas academias protestantes não terá contribuído mais que os éditos de Richelieu para a diminuição dos duelos.
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A estrita disciplina dos colégios clássicos e o sistema de del!lção neles instaurado explicam-se também -pelo súbito aumento do número de alunos- por. vezes centenas deles em cada estabelecimento a partir do fim do século XVI- e pelo facto de o externato 'ser o regime mais frequente. Realmente, os bolseiros do tipo medieval eram já ·então uma ínfima minoria. As crianças cuja família não vivia na cidade onde estava o colégio iam, muitas vezes, para quartos colectivos em casa de hospedeiros que.lhes !d avam cama e uma parte da alimentação. Esses martineta ou gãloêh~a. C) como então se lhes chamava, eram, assim, puros e simples alunos externos, que tinham· feriado nos dias de mercado para se abastecerem. Eràm eleS os mais numerosos e daí que as autoridades escolares tendessem a exercer sobre os próprios hospedeiros um controle crescente. As crianças de vida mais desafogada ou cujas famílias as rodeavam de maiores cuidados podiam, porém, na medida dos lugares disponíveis, alojãr-se em casa do principal do colégio ou de regentes que habitassem na cidade ou .no próprio colégio. O internato, tal como hoje é conhecido, só muito depois do século XVI foi aplicado a uma massa considerável de e~q_
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do século XVI aludem frequentemente ao preceptor. Mas é preciso atentar bem em que este termo designava então, as mais das vezes, ou um regente do colégio a quem se confiava o aluno como pensionista ou um companheiro mais velho que uma família rica dava ao filho para com ele compartilhar a vida, o vigiar, auxiliar e proteger. Em nenhum destes casos o preceptor substituía o colégio. É de notar que os humanistas, ao tratar dos problemas da instrução c da educação, não pensavam senão nos filhos de boas famílias. O ensino medieval, pelo contrário, dirigia-se mais espontaneamente a crianças oriundas de todas as ~!asses sociais; o importante eta dar à Igreja clérigos de suficiente competência. A época do Renascim~nto correspondeu, sem dúvida, à aristocratização da cultura e dos meios intelectuais. Muitos distintos letrados preferiam viver nas cortes a trabalhar no ensino. Com razão se opôs o professor da Idade Média, rodeado de alunos, assediado por eles, ao humanista, «sábio solitário, no seu tranquilo gabinete, à vontade no meio de um quarto livre, bem guarnecido, onde livremente têm curso as suas ideias» (J. Le Goff). Foi assim que Carpaccio * representou Santo Agostinho, patrono dos humanistas. Os eruditos -tenderam a interpor entre a sociedade e eles o biombo dos complicados -conhecimentos mitológicos e as subtilezas de um estilo demasiado rebuscado. Enfim, abandonando tantas vezes aos príncipes a direcção da vida civil preferindo o campo à cidade, certos intelectuais fizeram o elogio do otiu,;, e afastaram-se do negotium, isto é, de uma vida de acção, fonte de preocupações. Montaigne deixou cargos e honrarias para redigir tranquilamente os Ensaios numa torre de palácio. Mas seria errado esquematizar o retrato do humanista. No fim do século XIV e na primeira metade do século XV, quando Florença defendia zelosamente a sua independência contra os Visconti e contra o rei de Nápoles os humanistas da república - Salutati, Bruni, etc. - exaltavam o ho~em de acção e a educação que o forma. Bruni escrevia em 1433: «0 maior filósofo deve poder ser o maior capitão». Vittorino da Feltre, citando Cícero, afirmava, por . s_ua vez: «Toda a glória do homem reside na ;:tcção». Em Itália, especialmente em Florença, deu-se "'a partir da segunda metade do século XV, sem dúvida, uma retracção política do humanismo. Os governos tirânicos e as cortes principescas do Renascimento explicam, em grande parte, esta semiabdicação de intelectuais que ou gabavam o herói da ocasião oi!' se isolavam numa torre de marfim. Já se pôde representar o neoplatorusmo florentino como tradução filosófica de uma atitude de recolhimento político na época em que os Médicis haviam confiscado o gov:rno da República. Mas muitos humanistas foram homens comprometidos. Erasmo, depois de hesitar, acabou por tomar partido contra Lutero de uma forma brilhante. Thomas More, (;Stoicamente, submeteu-se à decapitação. Ronsard não ficou indiferente perante as guerras re~igiosas. Ochino, Vermigli, Sozzini tiveram de fugir de Itália para não cair nas malhas da .Inquisição.
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foram os maiores agentes de difusão do ensino humanista. A ordem tinha 125 colégios em 1574 e 521 em 1640. Calculou-se que, nesta segunda data,· os padres jesuítas tinham, pelo menos, cento e cinquenta mil alunos. Só o Col/egio romano tinha 2000 alunos em 1580; e o de Douai, o mais próspero dos Países Baixos, reunia em 1600 400 alunos de humanidades, 600 de filosofia e 100 de teologia. Os jesuítas ensinavam de graça. Além disso, a sua clientela situava-se, forçosamente, nas classes desafogadas da sociedade, especialmente entre as de funcionários. De facto, uma família pobre não podia dar-se ao luxo de não pôr os filhos a trabalhar bastante cedo. Como poderia, de resto, pagar-lhes um alojamento? Os números hoje disponíveis acerca das universidades de Oxford e de Cambridge · e sobre as inns of court dos fins do século XVI e primeira metade db século XVII mostram, sem sombra de dúvida, que para a época entrou naque~es estabelecimentos de ensino uma quantidade de jovens quase para a época anormalmente alta - mais alta, de resto, que no século XVIIli· Isso fora resultado das possibilidades criadas pela multiplicação das grammar schools. Cerca de 1630, 2,5 o/o dos jovens ingleses de dezassete anos iam para a universidade- o mesmo que em 1931. A Inglaterra seria, sob Carlos I, o país mais letrado da Europa. De que classes sociais provi-. nham esses estudantes? Os registos de matrículas de Oxford permitem, calcular que os jovens nobres eram 50%, os filhos de membros dei clero eram 9 o/o e os filhos de «plebeus» eram 41'%. Está bem de ver, porém, que eram «plebeus» de vida desafogada: comerciantes, homens de leis, intendentes de grandes propriedades, etc. A prova está no facto de que, em 737 estudantes «plebeus» matriculados entre 1622 e 1641 em Brasenose, Oriel, Wadham College e Magdalen Hall, só 172 (ou seja, 23 %) viviam numa cidade. Os outros vinham do campo. Salvo raras excepções, só podiam ser filhos de pequenos proprietários rurais. O Renascimento provocou, assim, uma revolução quantitativa no domínio da inst11,1ção, visto que a difusão de um ensino que hoje classificaríamos como secundário foi então considerável. Mas foram as classes ricas -uma nobreza que se renovava pela base e uma burguesia cada vez mais . importante- quem, principalmente, aproveitou desta vasta distribuição do saber.
Por a mensagem humanista não ter ficado confinada em círculos restritos é que impregnou, gradualmente, toda a civilização éuropeia. Assim, embora reconhecendo o facto, já assinalado, da aristocratização da cultura, convém prestar a esse respeito. certos esclarecimentos que se impõem. Na realidade, houve mais gente culta nos séculos XVI e XVII que entre 1200 e 1400. Se um pouco menos filhos de meios modestos tiveram acesso a um nível de instrução relativamente elevado, em contrapartida verificou-se a escolarização quase maciça das classes superiores da sociedade: a IÍobreza e a burguesia. Este facto é importante e ainda não foi bastante acentuado. Tanto em Inglaterra como em França, a partir do século XV, as famílias ricas açambarcaram as bolsas instituídas. Por vezes, também, estas bolsas eram adquiridas, como se fossem cargos, por clérigos não estudantes que beneficiavam então das vantagens oferecidas pelos colégios. Seja como for, estas bolsas, cujo carácter . original Standonck tentou conservar em Montaigu, foram cada vez mais desviadas do seu destino inicial, que era auxiliar os jovens pobres a prosseguir nos estudos. Há numerosas provas do novo interesse das classes ricas pela instrução. No colégio de Navan;a, em Paris, eram recebidos, a partir de meados do século XV, estudantes que pagavam; e, naturalmente, ali afluíram filhos de nobres e de burgueses. Quando Aleandro comentou Ausónio, em 1511, nos colégios de Cambrai e da Marche, teve perante si um público especialmente distinto: «Gerais das finanças, conselheiros, advogados reais, muitos reitores, teólogos, jurisconsultos, etc.». Florimond de Raemond assevera que, a exemplo de Francisco I, «pai e restaurador das letras», os grandes senhores apoderavam-se dos homens doutos de tal maneira que, em pouco tempo, esse século rude e selvagem se poliu». Na verdade, este desejo de cultura nem sempre era desinteressado. Mercadores ricos, médicos, advogados e legistas desejavam dar instrução a seus filhos para «deles fazer homens de veste comprida e pô-los aptos às dignidades». Daí em diante parecia necessário o diploma de latinidades a quem quisesse fazer carreira. Blaise de Montluc julgou útil avisar disso a nobreza, e este aviso é, a nossos olhos, um sinal dos tempos. «Aconselho-vos - escrevia ele -, se~hores que tendes meios e que quereis fazer avançar vossos filhos pelas armas, que em vez disso lhes deis as letras. Quando são chamados aos cargos, precisam delas muitas vezes, e elas servem-lhes de muito. E creio que um homem que leu e reteve é mais capaz de realizar belas empresas que outro.» Em meados do século XVII, um viajante francês, Sorbiere, ao voltar de além-Mancha, viria a escrever: «A nobreza de Inglaterra é quase toda sábia e muito esclarecida.» Deste modo, numa civilização cada vez mais laica e cada vez menos militar a instrução e a cultura profanas tomavam importância crescente. Compreendiam-no bem os corpos muniçi'pais, que, desde a primeira metade do século XVI, favoreCiam a criação de colégios - Angoulême (1516), Lyon (1 527), Dijon (1531 ), Bordéus (1534). Nos países católicos, os jesuítas
·O humanismo fez da instrução o principal meio da educação. Colocou-se resolutamente no plano moral e esta atitude, situada no centro das transformações radicais do Renascimento, de que já tanto se tem fa~ado, teve consequências incalculáveis. Foi ela uma das grandes opções cnadoras do mundo moderno. Vittorino da Feltre, que escreveu no século XV tratados de educação, afirmava: «Nem todos são chamados a ser legistas, físicos ou filósofos e a viver no primeiro plano da cena. Nem todos f~ram dotados pela natureza com qualidades · excepcionais. Mas todos, ta1s como somos, fomos criados para viver em sociedade e
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Por a mensagem humanist a não ter ficado confinada em círculos restritos é que impregnou, gradualmente, toda a civilização éuropei11. Assim, embora reconhecendo o facto, já assinalado, da aristocratização da cultura, convém prestar a esse respeito certos esclarecimentos que se impõem. Na realidade, houve mais gente culta nos séculos XVI e XVII que entre 1200 e 1400. Se um pouco menos filhos de meios modestos tiveram acesso a um nível de instrução relativam ente elevado, em contrapartida verificou-se a escolarização quase maciça das classes superiores da sociedade: a nobreza e a burguesia. Este facto é importan te e ainda não foi bastante ·acentuado. Tanto em Inglaterra como em França, a partir do século XV, as famílias ricas açambarc aram as bolsas instituídas. Por vezes, também, estas bolsas eram adquiridas, como se fossem cargos, por clérigos não estudantes que beneficiavam então das vantagens oferecidas pelos colégios. Seja como for, estas bolsas, cujo carácter _original Standonck tentou conservar em Montaigu, foram cada vez mais desviadas do seu destino inicial, que era auxiliar os jovens pobres a prosseguir nos estudos. Há numerosas provas do novo interesse das classes ricas pela instrução. No colégio de Navaq·a, em Paris, eram recebidos, a partir de meados do século X V, estudantes que pagavam; e, naturalm ente, ali afluíram filhos de nobres e de burgueses. Quando Aleandro comentou Ausónio, em 1511, nos colégios de Cambrai e da Marche, teve perante si um público especialmente distinto: «Gerais das finanças, conselheiros, advogados reais, muitos reitores, teólogos, jurisconsultos, etc.». Florimond de Raemond assevera que, a exemplo de Francisco I, «pai e restaurador das letras», os grandes senhores apoderavam-se dos homens doutos de tal maneira que, em pouco tempo, esse século rude e selvagem se poliu». Na verdade, este desejo de cultura nem sempre era desinteressado. Mercadores ricos, médicos, advogados e legistas desejavam dar instrução a seus filhos para «deles fazer homens de veste comprida e pô-los aptos às dignidades». Daí em diante parecia necessário o diploma de latinidades a quem quisesse fazer carreira. Blaise de Montluc julgou útil avisar disso a nobreza, e este aviso é, a nossos olhos, um sinal dos tempos. «Aconselho-vos - escrevia ele -, se~hores que tendes meios e que quereis fazer avànçar vossos filhos pelas armas, que em vez disso lhes deis as letras. Quando são chamados aos cargos, .precisam delas muitas vezes, e elas servem-lhes de muito. E creio que um homem que leu e reteve é mais capaz de realizar belas empresas que outro.» Em meados do século XVII, um viajante francês, Sorbiêre, ao voltar de além-Mancha, viria a escrever: «A nobreza de Inglaterra é quase toda sábia e muito esclarecida.» Deste modo, numa civilização cada vez mais laica e cada vez menos militar a instrução e a cultura profanas tomavam importân cia crescente. Compreendiam-no bem os corpos munic)pais, que, desde a primeira metade do século XVI, favoreciam a criação de colégios - Angoulêm e (1516), Lyon (1527), Dijon (1531), Bordéus (1534). Nos países católicos, os jesuítas
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foram os maiores agentes de difusão do ensino humanista. A ordem tinha i25 colégios em 1574 e 521 em 1640. Calculou-se que, nesta segunda data,· os padres jesuítas tinham, pelo menos, cento e cinquenta mil alunos. Só o Col/egio romano tinha 2000 alunos em 1580; e o de Douai, o mais próspero dos Países Baixos, reunia em 1600 400 alunos de humanidades, 600 de filosofia e 100 de teologia. Os jesuítas ensinavam de graça. Além disso, a sua clientela situava-se, forçosamente, nas classes desafogadas da sociedade, especialmente entre as de funcionários. De facto,. uma família pobre não podia dar-se ao luxo de não pôr os filhos a trabalhar bastante cedo. Como poderia, de resto, pagar-lhes um alojamen to? Os números hoje disponíveis acerca das universidades de Oxford e de Cambridge e sobre as inns of court dos fins do século XVI e primeira metade do século XVII mostram, sem sombra de dúvida, que para a época entrou naque~es estabelecimentos de ensino uma quantidad e de jovens quase para a época anormalm ente alta- mais alta, de resto, que no século XVIII• Isso fora resultado das possibilidades criadas pela multiplicação das gr(lmmar schools. Cerca de 1630, 2,5 'o/o dos jovens ingleses de dezassete anos iam para a universi dade- o mesmo que em 1931. A Inglaterra seria, soo Carlos I, o país mais letrado da Europa. De que classes sociais provi~ nham esses estudantes? Os registos de matrículas de Oxford permite~ calcular que os jovens nobres eram 50%, os filhos de membros do clero eram 9% e os filhos de «plebeus» eram 41 %. Está bem de ver, · porém, que eram «plebeus» de vida desafogada: comerciantes, homens de leis, intendentes de grandes propriedades, etc. A prova está no facto de que, em 737 estudantes «plebeus» matriculados entre 1622 e 1641 em Brasenose, Oriel, Wadham College e Magdalen Hall, só 172 (ou seja, 23 %) viviam numa cidade. Os outros vinham do campo. Salvo raras excepções, só podiam ser filhos de pequenos proprietários rurais. Rena.scimento provocou, assim, uma revolução quantitati va no ~om~mo da mstrução, visto que a difusão de um ensino que hoje classificanamo s como secundário foi então considerável. Mas foram as classes ricas -uma nobreza que se renovava pela base e uma burguesia cada vez mais . importan te - quem, principalmente aproveitou desta vasta ' distribuição 1do saber._
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·O humanismo fez da instrução o principal meio da educação. Colocou-se resolutamente no plano moral e esta atitude, situada no centro das transformações radicais do Renascimento, de que já tanto se tem fa~ado, teve consequências incalculáveis. Foi ela uma das grandes opções cnadoras do mundo moderno. Vittorino da Feltre, que escreveu no século XV tratados de educação, afirmava: «Nem todos são chamados a ser legistas, físicos ou filósofos e a viver no primeiro plano da cena. Nem todos f~ratn dotados pela natureza com qualidades· excepcionais. Mas todos, tais como somos, fomos criados para viver em sociedade e
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para os deveres que essa vida implica. Somos todos responsáveis pela influência pessoal que exercemos». Para Vittorino, que dera à sua escola de Mântua o nome simbólico de «casa alegre», a retórica e as «belas. letras» forneciam os meios · adequados à formação do cidadão. O latim, o belo latim clássico, conduz à virtude, pois forma personalidades equilibradas. Na época do humanismo tinha-se como certo que dizer bem subentendia pensar bem. A literatura adornava o espírito. Aquele que se alimentou nos bons autores e a quem são familiares as delicadas imagens .poéticas há-de ser melhor e mais civilizado que o infeliz aluno de pedantes escolásticos. Eis como Rabelais opõe o pajem Eudemon, que frequentou a boa escola, ao pequeno Gargântua, entregue até então às lições de um pedante à. moda antiga: logo que é introduzido, Eudemon faz um belo discurso «com gestos tão próprios, pronúncia tão distinta, voz tão eloquente e linguagem tão adornada e tão latina que mais parecia um Graco, um Ocero ou um Emílio de tempos idos que um jovem deste século. Mas toda a atitude de Gargântua se resumiu a chorar como uma vaca, escondendo · a cara com a boina; e não se lhe pôde arrancar uma só palavra, como · a um asno morto se não arranca um peido» (Gargdntua, I, xv). Antes de Rabelais, já Erasmo acentuara fortemente as virtudes morais da instrução, que deve dar à criança o conhecimento da Sagrada Escritura e da sabedoria antiga e, pela conjugação de ambas estas influêndas, o sentido do dever e a pureza de coração: bens tão necessários como a técnica profissional. O mestre - de preferência um preceptor ...,.- ensinará latim por métodos directos e pela conversação (daí, nessa época, a voga dos «colóquios» do próprio Erasmo, de Cordier, etc.). Mas terá, principalmente, de extrair dos textos estudados o ensino moral que contêm. Éncontramos no colóquio Convivium re/igiosum a seguinte confidência: · «Não posso ler o De amicitia, o De otficiis ou as Tusculanre qurestiones sem beijar de vez em quando o meu exemplar e sem venerar esta santa alma movida pelo sopro divino. Ao ler as obras de Cícero ou de Plutarco, sinto que fico melhor.» ·como o latim é o veículo' de toda a sabedoria, antiga e cristã, o aluno · terá de falar correntemente a língua de Cícero e de Santo Agostinho. Também lhe será ensinado grego, mas com um espírito diferente e sem procurar fazer-lhe adquirir um domínio dessa língua comparável ao que - no latim se lhe dá. O humanista de Roterdão recomendava,. todavia, uma certa familiaridade com o grego por causa da luz que ele projecta sobre a Bíblia, sobre a própria literatura latina e sobre os assuntos científicos. Com diferenças de pormenor, a maior parte dos pedagogos do Renascimento -Vives, Sadolet, Cordier, Sturm; etc.- conceberam a instrução com~ Erasmo e pensaram que ela devia conduzir à piedarie e à prática da vida cristã. Nestas condições, compreende-se que o ensino humanista não tenha hesitado em expurgar os autores postos nas mãos dos alunos. Compreende-se também o novo lugar dado à história, «serva
da eloquência», propedêutica para o conhecimento do coração do homem, tesouro donde tirar nobres exemplos. Uma instrução assim orientada no sentido educativo não tem de fazer erudição. E está-se a caracterizar mal o Renascimento quando se insiste na cultura enciclopédica de Alberti ou de Pico de Mirandola ou nas imensas ambições intelectuais de Gargântua para seu filho. -Montaigne estava mais na linha da pedagogja humanista quando escreveu o seu célebre tratado De l'institution des enfants (Ensaios, I, xxvi): «É grande simpleza ensinar a nossos filhos a ciência dos astros e o movimento da oitava esfera antes de ensinar-lhes os seus próprios movimentos .. . ». Só depois de ter dito ao aluno «aquilo que serve para o fazer mais sábio e melhor se poderá levá-lo a ocupar-se do que «é lógica, física, geometria, retórica e a ciência que ele escolher, depois de se lhe ter formado o juízo, bem depressa a absorverá... Ensinam-nos a viver depois de passada a vida; e já cem escolares apanharam bexigas antes de chegar à lição de Aristóteles sobre a temperança». O próprio Rabelais não perdia de vista os objectivos, essencialmente novos, da instrução. A carta de Gargântua a Pantagruel acabava com esta conclusão: «Mas como, segundo o sábio Salomão, a sapiência não entra nas almas malévolas e a ciência sem consciência é apenas ruína de alma, convém-te servir, amar e temer a Deus e nele pôr todos os teus pensamentos -e toda a tua esperança; e, pela fé formada de caridade, estar-lhe chegado de modo a nunca ficar sem seu amparo por causa do pecadO>>. Vemos assim que a instrução se integra sempre, na época do humanismo, num programa educativo. Erasmo não julgou deca,ir quando, no seu tratado A Civilidade Pueril, deu conselhos elementares- ou que, pelo menos, como tal nos parecem hoje - sobre boa conduta infantil: não ter ranho no nariz, assoar-se aq lenço virando-se para o lado, não encher as bochechas em sinal de arrogância, não se rir com palavras ou actos obscenos, não fazer batota nos jogos e saber, por vezes, deixar-se vencer «para fazer a partida mais dívertida>>. E, como havia que educar e arrancar a criança a uma instrução demasiado intelectual, demasiado da época escolástica, era poeirenta e demasiado fechada, como era também necessário atender ao desenvolvimento da personalidade física. Gargântua, ainda adolescente e excelente músico, sabia também montar «Um rocim, ·um ginete, Um cavalo selvagem, um cavalo ligeiro, e dava-lhes cem andamentos, fazendo-os voltear no ar, saltar a vala, saltar o obstáculo, andar à volta em círculo apertado quer para a direita quer ·para a esquerda ... No outro dia exercitava-se com a acha ... Depois brandia a lança, sacava da espada com mãos ambas ... corria ao cervo ... jogava com a bola grande e fazia-a saltar ao ar tanto com os pés como com os punhos». Um contemporâneo de Rabelais, o inglês Thomas Elyot, também pugnou, nüma obra milito difundida além-Mancha, The Boke ndmed the Gouvernour (1531), por uma educação completa. À maneira de Erasmo,
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recomendava o estudo vivo do latim clássico; mas, além disso, dava lugar importante no dia da criança à música, ao desenho e aos exercícios físicos. Montaigne, por motivos de ordem moral, insistiu igualmente na necessidade de fortalecer o corpo: «Não basta enrijar-lhe (à criança) a alma; é preciso que enrijeça também os músculos... É necessário habituá-la à dureza e aspereza dos exercícios para a treinar para a dureza e aspereza da calúnia, da cqlica, do cautério, da prisão e da tortura» (Ensaios, I, xxvi). Semelhantes recomendações iam além do quadro escolar. Dirigiam-se mais aos educadores - pais ou preceptores -, que tinham a seu cargo um pequeno número de crianças. Para as compreender bem é conveniente situá-las na sua época, em que a escola não tinha na vida social o lugar que hoje ocupa. Não havia ensino primário. As crianças de condição mais modesta iam cedo para o aprendizado e entravam no conhecimento dos ofícios por via prática. É verdade que «mestres de escrita e corporações organizavam uma espécie de cursos nocturnos e ensinavam a ler, escrever e contar a alunos. que, em certos casos, era~ já adultos. Mas ·esse ensino não estava mmto espalhado. Nessas condições, a oficina tinha na vida de todos os dias uma notável função formadora. Compreendê-lo-emos melhor vendo a questão no nível mais elevado. Leonardo da Vinci não recebera formação universitária; mas também não era um ignorante. Pudera adquirir, junto de Verrocchio, um conjunto de conhecimentos teóricos e _práticos que, mais que nalgum outro sitio, se tinham acumulado em Itália. Numa oficina como a de Verrocchio, os futuros artistas eram iniciados na geometria e nas leis da perspectiva -e, «fora da pintura propriamente dita, aprendia-se a arte de fundir bronze e de talhar a pedra, a arte ... de levantar plantas e de escavar canais, a arte de construir casas e fundar cidades» (R. Taton). A. Chastel insistiu justamente na importância que as várias «oficinas» de Itália tiveram para a expansão artística do Renascimento. Do mesmo modo, na época em que os pedagogos humanistas punham a circular ideias sobre a educação das crianças que não podiam ser adaptadas de uma só vez nas instituições escolares, muitos aprenderam a comportar-se na vida não na escola mas em tratados cujo êxito foi imenso porque correspondiam a uma real necessidade. Naturalmente, pensa-se em primeiro lugar no Livro do Cortesão (1528) de Baldassare Castiglione •, «código de polidez e de elegância» que só a nobres se dirigia. O seu autor era um diplomata originário de Mântua que vivera na corte, tão civilizada, de Urbino. Castiglione encama a distinção aristocrática do Renascimento: «Quero -lê-se numa velha tradução francesa- que o nosso cortesão nasça fidalgo e em boa casa, visto que não se pode censurar tanto um plebeu por deixar de fazer obras virtuosas como se pode censurar - um nobre, o qual, ao desviar-se do caminho que os seus antepassados seguiram, mancha. o nome e -a, honra da sua raça ... Quero além disso que a nobreza, ~ cortesão, tenha por natureza não só o espírito e o bom entendimento,
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a bela apresentação e forma de feições, mas também uma certa graça e, como se diz, uma propriedade que à primeira vista o faça agradável e amado por todos que o vejam ... Penso que a principal e verdadeira profissão do cortesão deve ser a das armas ... Que seja muito altivo e corajoso quando estiver perante· inimigos e que seja sempre dos primeiros; mas que em todo outro local seja humano, modesto e moderado, fugindo à jactância e à estúpida lisonja de si próprio». As qualidades físicas, porém, não bastam: o fidalgo do Renascimento necessita também dos ornamentos do espírito: «Censuro os franceses porque dizem que as letras preiuàicam a profissão das armas e julgo que a ninguém mais que a um homem de guerra convém possuir a ciência das letras ... A sua voz (do cortesão) deve ser boa, não demasiado delicada ou mole, semelhante à de uma mulher, nem tão austera ou áspera como a do camponês, mas sonante, clara, suave e bem composta, com a pronúncia franca e nítida, com atitudes e gestos convenientes ... Mas todas estas coisas de nada serviriam se as sentenças e palavras expressas não fossem belas, engenhosas, subtis, elegantes ou graves conforme as necessidades». São conhecidas, pelo menos, dezasseis edições italianas do Cortesão, de 1528 a 1587, e seis versões francesas de 1537 a 1592- em 1690 houve ainda outra. Traduzida para inglês em 1562, a obra de Castiglione marcou profundamente o período isabelino. Na Europa do século XVl tinha-se feito proverbial a expressão «saber o Cortesão». Este êxito testemunha de uma nobreza que conservava o ideal cavaleiresco mas levava uma vida menos militar que a de outrora. Os palácios abriam-se ao conforto e a conversação era uma ocupação importante. Era preciso intervir nela com distinção e daí a necessidade de um livro deste género para pessoas· que, nos princípios do século XVI, nem em todos os casos tinham ido à escola ou que, tendo-a frequentado, tinham lá recebido mais instrução que educação. As primeiras páginas do Galateo, «tratado de boas maneiras e de conversação distinta» redigido entre 1551 e 1555 pelo arcebispo Giovanni della Casa, revelam a modi-. ficação sofrida pelo estilo de vida da nobreza. Nem todos os dias -diz, em substância, della Casa- se tem oportunidade de dar provas de justiça, coragem e grandes virtudes, mas todos os dias é preciso comportar-se de modo a ser agradável .à sociedade, às outras pessoas. Os conselhos muito concretos de della Casa dirigem-se a um jovem fidalgo mas repetem, por vezes, os de Erasmo no seu tratado A Civilidade Pueril e também podem servir a uma crianÇa de condição menos elevada: não fazer as necessidades em público, não espirrar com força, não bocejar em frente das outras pessoas, não comer com sofreguidão, não usar o guardanapo para limpar o suor ou para se assoar, etc. O essencial do livro, porém, é dedicado à conversação, na qual é conveniente intervir, sim, com certo à-vontade mas também com modéstia. Todos estes ajuizados conselhos valem para qualquer jovem.' que, pela sua situação financeira, possa, em
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adulto, vir a conviver com as pessoas educadas e frequentar os seus salões. Compreende-se que os jesuítas tenham posto o Galateo nas mãos dos seus alunos, que não eram todos de origem fidalga. Este livro foi um dos guias do «homem honesto» do século xvn atrás de quem desapareceu gradualmente o «gentil-homem» do século anterior. ·.
Os rapazes das classes desafogadas encaminhavam-se, cada vez mais, para os colégios; mas as raparigas, em geral, permaneciam em casa. Nada dá melhor prova de ainda não haver, apesar da afirmação de Burckhardt, igualdade entre o homem e a mulher. Alcalá foi a primeira cidade da Europa a possuir, no início do século XVI, uma escola feminina. Iniciativa de vanguarda, pois seria preCiso esperar pelo ano de 1574 para se. ver as Ursulinas fundar em Avinhão um estabelecimento de ensino para meninas - o primeiro em cidades de língua francesa. Só no século XVII é que a instrução das raparigas fora de casa, graças, em especial, às Ursulinas e às Visitandinas, foi um facto de real importâ-ncia social. Mas, no século XVI, havia mais mulheres cultas que em nenhuma outra época anterior. No tempo de Carlos VI, Christine de Pisan queixava-se melancolicamente da injustiça cometida para com o sexo fraco em matéria de instrução: «Se houvesse -diz ela- o costume de enviar as meninas à escola e se lhes fizesse aprender as ciências como se faz aos rapazes, elas aprenderiam tão perfeitamente como eles e compreenderiam as . subtilezas de todas as artes e ciências como eles compreendem». A mesma queixa poderia ser formulada cento e cinquenta anos mais tarde. Se, no início do século XVI, nos é descrito um país onde a instrução é igual para as crianças de ambos os sexos, esse país é imaginário e chama-se «Utopia». Estava já demonstrado, porém, que mulheres de eleição, cujo espírito fora adornado em meio familiar, podiam ser tão instruídas e possuir sentido artístico como os homens. As filhas de Thomas More e as irmãs do humanista e matemático de Nuremberga Pirckheimer eram das pessoas mais sabedoras do seu tempo e até liam grego. A mulher do impressor Robert Estienne, Perrette Bade, que era filha de outro impressor, era boa latinista e ajudava o marido a corrigir provas. Os seus filhos, como Montaigne, falavam latim já em tenra idade. Vittoria Colonna *, a marquesa de Pescara cantada por Miguel Ângelo, foi poetisa de . talento. Margarida de Navarra * lia e compreendia italiano, espanhol e latim. Não parece que tenha escrito ou falado estas línguas, mas contribuiu muito para o conhecimento de Platão em França e a sua viva curiosidade intelectual esteve desperta até aos últimos düis da sua vida. Protectora dos homens de letras, ela própria escritora, foi, no mais nobre sentido do termo, uma mulher sábia. Diversos testemunhos nos mostram, pois, que uma fina-flor feminina tinha já acesso à cultura, facto que não deixou de causar admiração a
um velho jurista italiano do século XVI: «Eu nunca poderia imaginar -dizia ele- que as damas de Florença estavam tão a par da filosofia moral e natural, da lógica e da retórica.» E Rabelais, por sua vez, afirma no Pantagruel: «0 mundo está cheio de pessoas sábias, de doutos preceptores, de amplas bibliotecas... As mulheres e as raparigas aspiraram a este louvor e maná celestial de boa doutrina.» Em Lyon brilhava Louise Labé *, a «Belle Cordiere». O primeiro salão parisiense abriu em meados do século XVI no palácio de Jean Morei, oficial ao serviço de Catarina de Médicis. Morei vivera em Itália e correspondera-se com Erasmo; m~ts sua esposa, bela, inteligente e erudita, foi a alma desse círculo de deição. Ela e suas três filhas, C. Isabel, princesa inteligente e instruída, reinou em Inglaterra durante 45 anos e deixou criar-se em seu proveito um verdadeiro «culto da personalidade» que lhe sobreviveu. Isabel não era apenas a cabeça política do seu país, era também o seu chefe religioso, e foi ela quem deu ao anglicanismo a definição e os fundamentos. Outras mulheres tiveram também notável influência no plàno religioso. Margarida de Navai:ra favoreceu Briçonnet e o círculo de Meaux; mais tarde acolheu em Nérac muitos «mal-cheirosos da fé)). Renata de França, duquesa de Ferrara, era favorável à Reforma e recebeu Calvino na sua corte. Do outro lado da barreira confessional, Teresa de Ávila
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foi uma grande escritora mística e uma das figuras mais responsáveis pela renovação católica. O novo lugar dado à mulher, pelo menos no escalão superior da sociedade, explica-se, especialmente, pelo desenvolvimento da vida das cortes. Em França, o papel de Ana da Bretanha foi, a este respeito, decisivo. Brantôme dá-nos disso testemunho: «Foi ela a primeira - escreve - a instalar a grande corte das damas, que depois dela temos visto até agora; pois tinha um grande séquito de damas e jovens senhoras e nunca despediu nenhuma». Francisco I não deixou de seguir e ultrapassar este exemplo. É ainda a Brantôme que, quanto a isto, se tem de recorrer: «0 rei Francisco -escreve-, considerando que todo o enfeite da corte estava nas damas, quis povoá-la com elas mais que o próprio do costume antigo. Na verdade, uma corte sem damas é um jardim sem algumas belas flores e mais parece a corte de um sátrapa ou de um turco que a de um grande rei cristão». A partir daí, estava criado o costume. Catarina de Médicis, no tempo de Henrique 11, quando não havia caçada de tarde, reunia à sua volta o rei, os senhores e as damas e «mantinha um círculo» onde se conversava. Era, ainda segundo Brantôme, «um verdadeiro pâraíso de gente, e com toda a honestidade». A reabilitação da mulher operou-se a partir do momento em que se começou a ter tempo para conversar. Ora o Renascimento permitia aos grandes o prazer da conversa. Portanto, as damas que frequentavam as residências dos príncipes não eram menos obrigadas que os homens a «saber o Cortesão». De facto, o livro de Castiglione - que tinha a forma dialogal- dedica l<;mgos trechos à donna di palazzo. Os intervenientes que exprimem o pensamento do amigo de Rafael afirmam, tal como Bramante, que nenhuma corte pode passar sem o enfeite e a graça do elemento feminino. Nenhum fidalgo terá gosto pela vida ou coragem nos exercícios de cavalaria se não tiver as damas no pensamento. A sua conversa· será imperfeita sem as encantadoras respostas do sexo oposto. A donna di palazzo deve, sem dúvida, possuir certas qualidades do fidalgo; mas, màis, deve distinguir-se dele pela feminilidade. Cabe-lhe ser bela, doce, delicada e, naturalmente, graciosa. Cuidará da modéstia de conduta e da honestidade das palavras mais ainda que os homens; será discreta e bondosa. Não dará estímulo a maledicências nem calúnias. Para conservar o seu lugar na vida da corte terá de possuir aquela affabilità piacevole -um misto de graça, de gentileza e de cortesia - que lhe permite saber dizer a cada um palavras que especialmente lhe agradem. Se na sua presença alguém disser palavras um pouco mais livres não deverá afastar-se ostensivamente, atitude .que poderia parecer hipócrita; limitar-se-á a corar um pouco. E também não permitirá utilizar palavras impróprias para dar · mostras de espírito emancipado; do mesmo modo não tomará atitudes vulgares. Quando dançar, evitará movimentos excessivos ou desordenados. Quanto cantar ou tocar música, escolherá melodias harmoniosas. e moderadas
em vez de peças mais ousadas. De resto, far-se-á sempre um pouco rogada antes de aceder a dançar, cantar ou tocar música. Estabelecerá uma correspondência entre a sua beleza, o seu vestuário, as suas palavras e os seus gestos. Não só terá de saber dançar e receber visitas como terá conhecimentos de literatura, de pintura e de música; se os não tivesse, não poderia desempenhar o seu papel. A vida de corte, como valoriza o elemento feminino, permite educar e civilizar os fidalgos. Graças a ela, a civilização ocidental subiu um degrau. Claro que um certo refinamento escondia costumes que, muitas vezes, eram bastante livres. Mas Margarida de Navarra esforçou-se por impor aos cortesãos de Pau e de Nérac algum respeito pelas damas e pela sua reputação: «Tinha imposto a todos os seus servidores (isto é, familiares) -lê-se na sua Oração Fúnebre, composta por Charles de Sainte-Marthe - uma certa disciplina de regras e modos de vida, e quem quer que fosse que a desprezasse ou infringisse, se depois de uma ou duas vezes admoestado e advertido se não corrigisse,. era banido do seu estado e posto fora da sua casa ... A regra e modo de vida que ela levou continha-os nos seus deveres, embora tivessem corações depravados». Maior. d~licadeza de maneiras, uma importância crescente da êonversaçãq na vida quotidiana das classes dirigentes, um novo respeito pela mulher orientaram a gente de cortes e salões para a preciosidade, que teve os seus excessos; e Moliere, mais tarde, troçou destes excessos com razão. Mas, inseridos num largo fresco histórico, o aparecimento de mu{he~es sábias e o preciosismo, juntamente com a multiplicação dos colégios .,..-por muito dura que fosse a sua disciplina-, significaram evolução para uma sociedade menos grosseira, mais moral, mais atenta à Q1Ulher e à criança. Um costume que se espalhou na Europa na época do Renascimento dá testemunho tanto do aperfeiçoamento dos costumes como da nova consideração de que, pelo menos nos meios mais evoluídos, a mulher podia gozar. É o costume dos «amores de aliança», ou, dizendo de outra maneira, uma espécie de amizade superior entre um homem e uma mulher. Luís XII teve assim uma espécie de amor muito platónico por .uma genovesa, Tommasina Spinola. Havia entre eles uma «relação ho~rosa e amigável compreensão». Eram da mesma natureza os sentimenMiguel Ângelo p~r Vittoria Colonna, mulher «de uma ·energia e tos de uma vivacidade de certa maneira filosóficas», assevera um seu contemporâneo, mas de olhos desmesuradamente grandes, perfil severo, boca sem graça nem doçura. Para Miguel Ângelo, era um intermediário entre o céu e a terra. O leitor do Heptameron descobre nele vários destes «amores de aliança»; Mas -facto mais de admirar e ao mesmo tempo mais revelador da evolução que estamos a retratar - Montaigne, vulgarmente pouco meigo para com o sexo fraco, não hesitou em fazer uma aliança destas com Marie de Gournay, que foi sua herdeira espiritual e depois
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Çomo o neoplatonismo, posto em moda por Ficino, privilegiava a beleza e o amor, foi decisiva a sua contribuição para engrandecer a mulher na civilização ocidental. Reagindo contra o racionalismo seco dos aristotélicos, uma larga corrente mística tinha já posto a tónica no amor ainda antes da voga do neoplatonismo. Gerson escrevera: «É melhor amar que conhecer.» Tal era a inspiração profunda da Devotio moderna. seus amigos, partindo de Platão, juntaram-se às preocupações Ficino dos místicos do Norte. Quando muito, modificaram um pouco a fórmula de Gerson: para eles, «conhecer» significava «aman>. O filósofo floren. tino conservou, num quadw cristão, a doutrina platónica da reminiscência. A alma, novamente criada, vem de junto de Deus; traz, escondida no fundo de si própria, a recordação das coisas «essenciais». Cabe-lhe preencher o tempo da sua vida terrestre na libertação dessa recordação a fim de subir de novo a Deus, e isso só pode ser feito por meio da busca da beleza. Ficino expôs várias vezes a sua doutrina do amor, especialmente nos seus dois comentários ao Banquete de Platão, que apareceram em 1469 e 1475, e no seu comentário ao Pedro, que é de 1475. Ora o ponto fundamental dessa doutrina é que «o amor é desejo de beleza». «Nós não vemos a alma- lê-se numa tradução francesa de 1578- e [portanto]
não vemos a sua beleza; mas vemos o corpo, que é imagem e sombra da alma, de modo que, conjecturando sobre essa imagem, pensamos que num corpo belo há uma alma bela.>> A beleza é uma irradiação de Deus, sua «fonte perene». E a beleza é «flor da bondade». A primeira revela-nos a segunda: «Nós nunca entenderíamos nem apeteceríamos a bondade oculta no interior das coisas se a ela não fôssemos conduzidos pelos sinais e marcas da beleza exterior. E nisso se vê a admirável utilidade da beleza e do amor, que é seu companheiro>>. Castiglione, como fiel discípulo de Ficino, retomou este mesmo tema no êortesão: «A beleza que aparece nos corpos e nos rostos humanos e move esse ardente ·desejo a ·que chamamos . amor é uma influência da bondade divina, a qual, como a luz do Sol, adorna o sujeito no qual reluz e o ilumina COJ;D urna graça e um esplendor maravilhosos ... O bom e o belo são, em certa medida, a mesma coisa; e, principalmente, nos corpos humanos, de cuja beleza vejo a mais próxima causa na beleza da alma, a qual, assim, como . participante da verdadeira beleza divina, ilustra e faz belo aquilo em qd{ toca». Quando Platão tratava da beleza e do ' amor, pensavà, principalmente, nos jovens efebos. Mas o neoplatonismo do Renascimento actuava a favor da mulher. Facto significativo: Symphorien Champier, que quis pôr os comentários de Ficino ao Banquete ao alcance da boa sociedade francesa, intitulou a sua obra de Nef des dames vertueuses (1503). Declarou pegar na pena contra «essa porção de gente que, por malícia de uma língua venenosa, quis afirmar que os maiores e enormes pecados foram perpetrados por mulheres». Brantôme também tomou a defesa do sexo fraco. «Finalmente - escrevia - , essas pobres mulheres são criaturas mais semelhantes à divindade que nós por causa da sua beleza; pois o que é belo está mais próximo de Deus, que é todo belo, que o feio, que pertence ao diabo». Ficino, que teve uma vida privada irrepreensível e que parece ter conhecido mal as tentações da carne, era muito severo para com «os prazeres do gosto e do tacto». Segundo ele, a beleza pode ser a beleza da alma, a beleza dos corpos ou a beleza dos sons. A primeira provém da «correspondência» de várias virtudes; a segunda de uma mútua sim., patia entre cores e linhas; e a terceira de um subtil acordo entre as vozes dos homens ou dos instrumentos. Daí que o entendimento, a vista e o ouvido sejam «as únicas coisas com que nós podemos gozar» a beleza. Os outros prazeres dos sentidos não podem conduzir ao belo e a Deus. «A raiva venérea, a saber, a luxúria, leva os homens. à intemperança e. por conseguinte, à não-correspondência. Por este motivo, o apetite do amplexo e o Amor não são o mesmo movimento: e até se prova que são con,trários». Castiglione afirma, da mesma maneira, que «não se pode de modo algum gozar a beleza pelo tacto». A Délie de Maurice
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«irmã de aliança» de · Juste Lipse. Este costume era tão corrente no século XVI que Rabelais troçou dele no capítulo IX do Quarto · Livro. É para nós mais uma prova de que, pelo menos nos meios mais requintados, as relações entre os dois sexos estavam a modificar-se. Em tais condições, como é que a arte não havia de ter um interesse novo pela mulher? A canção francesa, que na primeira fase do Renascimento era quase sempre descritiva e, às vezes, humorística - pensemos na Bataille de Marignan, nos Cris de Paris, nas Chasses de Clément Janequin -, abriu-se plenamente para o tema do amor quando, a partir de 1552, os compositores musicaram os versos de Ronsard. A Itália conheceu, neste aspecto, uma evolução semelhante. A frottola popular e satírica desapareceu gradualmente perante o madrigal, mais aristocrá~ tico, que se inspirava em Petrarca e na poesia pastoril. É significativo que o primeiro madrigal tenha sido corpposto em 1510 na corte de Isabel d'Este. A predilecção com que 6 .Renascimento, rompendo com a austeridade medieval, representou o corpo feminino constitui um facto histórico importante. As Vénus de Botticelli e Ticiano, de Cranach e de Sprangler, a Leda de Leonardo, a Galateia de Rafael, as ninfas de Jean Goujon e mil outras obras testemunham, à sua maneira, uma reabilitação da mulher. Porquê e como se havia de manter o dogma da inferioridade do mais · belo ser da criação?
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Sceve *, obra em que é evidente a influência de Ficino, também faz a apologia do amor purificado (XXVIII): Melhor me é, ó Coração, ter sido casto Em tão pudico e alto contentamento: E aborrecer, como vil comportamento, Esse bem que Amor(') sugere.(') Mas era difícil aos leitores de Ficino e dos seus numerosos discípulos conservar-se sempre nesse nível etéreo. Para mais, a teoria neoplatónica do amor tinha ambiguidades. O próprio Ficino admitira que o desejo suscitado por um corpo. belo já é amor. Castiglione permitia que uma jovem beijásse um cortesão idoso «que deseje apenas coisas honestas» e desculpava o amor de jovens fora do casamento desde que ultrapassasse o «apetite venéreo» e fosse união de dois seres que se harmonizassem e completassem. Lê-se, num romance platónico de Caviceo, Il libra del peregrino, que foi traduzido para francês em 1527 e depois várias vezes reeditado, que «sendo o amor, em si, a boa essência, dele não pode proceder coisa má». A Parfaicte amye de Héroet, que é uma bela jovem mal casada, encontra, graças à «vontade divina», um amante em quem reluz «o esplendor da majestade suprema»:
cristão e uma aguda consc1encia da necessidade da graça, embora se interessasse pelo platonismo desconfiou da teoria ficiniana do amor e da crença muito espalhada segundo a qual «a porta do paraíso não é recusada aos verdadeiros amantes». Parlainente, na novela 35, exprimia a opinião da rainha ao dizer: «Não deixarei de ... desejar que cada uma se contente com o seu marido como eu me contento com o meu» .
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(') «Amor» é aqui usado no sentido de amor lascivo. (N. do A.) (') No original: «Meilleur, o Coeur, m'est d'avoir chaste esté '/ En si pudique et hault contentement: I Et abhorrir pour vil contemnement I I Ce bien qu'Amour conseille.» (N. do T.) (") No original: «Or semble amour, à qui vouldra, péché; I Puis que le ciel du mien s'est empesché [occupéJ !I Non seulement de luy je me contente I Mais d'avantage aux dames je me vente I Que, si dívin fut son commencement, I Entretenu je l'ay, divinement.» (N. do T.)
Ora toda urna corrente humanista e reformadora se . esforçou no século XVI por reabilitar o casamento, contra o qual se tinham encarniçado certos clérigos da Idade Média. O cristianismo medieval exaltara a existência contemplativa, a única capaz de preparar para a verdadeira vida de além-túmulo. «0 homem casado - lemos num Mirouer de humilité- que se ocupa de sua mulher é demasiado solicitado pelas coisas deste mundo e afoga-se nessa solicitude». Esta teologia teve corno consequência urna hostilidade virulenta - notada, especialmente, nos meios intelectuais- contra o casamento e contra a mulher. Disso dão testemunho a segunda parte do Roman de la rase, as Lamentations de Matheolus- um clérigo que lamenta ter abandonado a sua «clerezia» pela vida conjugal- e muitos fabulários. Essa hostilidade estava longe de ter desaparecido no século XVI embora, no plano literário, a «Querela das mulheres» tivesse redundado já em favor delas. Assim, a Idade Média tinha mostrado uma dupla aversão pelo casamento: a da literatura de corte, que frequentemente reputava impossível o amor no âmbito do lar, e a da corrente satírica, que confundia a mulher com o pecado e a vida matrimonial com o inferno ou, pelo menos, com o purgatório. Em contrapartida, a Reforma, ao proclamar o sacerdócio universal, ao suprimir os mosteiros e os votos religiosos, ao permitir que os pastores tivessem família, significou, por força das coisas, a revalorização do casamento. Claro que Lutero não tinha grande apreço pela união conjugal. O acto da procriação, pensava ele, foi intimamente viciado pelo pecado original. É, sem dúvida, urna necessidade universal e inelutável, como «beber, comer, escarrar ou ir à retrete». «Mas é um pecado; e, se Deus o não imputa aos esposos, é por pura misericórdia». Lutero, pois, casou-se para desafiar «os causadores de dificuldades - príncipes e bispos -, bastante loucos para proibir os padres de casar-se>> e também para «desafiar o diabo e as suas escamas». Frase bastante misteriosa cujo sentido parece ser o seguinte: Pecarei casando, pois o acto sexual é um pecado; mas, mesmo assim, escaparei ao demónio porque a graça de Deus me s~lvará . Seja como for, os três principais responsáveis pela Refor,ma - Lutero, Zwingli e Calvino - casaram, criando com isso precedentes de incomparável alcance. Calvino deixou-se casar por Bucer para dar o exemplo. Mas tinha do casamento urna concepção muito mais elevada que a d1! Lutero. «Quem ama sua esposa .:_ escrevia- ama-se a si
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Pois que amor pareça pecado a quem tal queira, Visto que o céu do meu se ocupou, Não só com ele me satisfaço Como, mais, às damas venho declarar Que, tão divino foi o seu começo, Que divinamente o tenho conservado. (") Evidentemente que ela está apaixonada, principalmente, no aspecto espiritual e, quando o amante morrer, continuará a amá-lo mais que nunca «com os olhos do entendimento». Mas, enquanto ele foi vivo, conheceram em comum o êxtase carnal. Um comportamento como este acabava por voltar, apesar do biombo das altas justificações filosóficas, ao amor de corte medieval, que só fora do casamento podia expandir-se. É por isso que Margarida de Navarra, que tinha um profundo sentido
l""'"h• ... H, pois, contrário t-
à natureza não amar a esposa ... O marido sua esposa estão ligados num só pelo laço do casamento, de tal modo
qu~.: são como uma só pessoa. Portanto, quem considerar santamente a lei e a condição do casamento terá . de amar sua esposa.» As palavras de Calvino, retomando as de S. Paulo, integravam-se num movimento mais vasto de inspiração humanista que tendia a enaltecer o casamento e a melhor entender a sua significação cristã. A partir do século XV surgiu em Itália uma literatura «.filógama» e, entre as obras que a compõem, encontra-se o tratado do grande arquitecto Alberti, Del/a famiglia (1437-1441). Mas é a um antigo monge dos Países Baixos, Erasmo, que, sem dúvida, devemos as mais belas e mais cristãs páginas jamais escritas sobre a união conjugal na época do Renascimento. Já no Enchiridion militis christiani (Manual do cavaleiro cristão, 1503) Erasmo tinha oportunamente recordado uma verdade elementar, apesar disso muito esquecida pelos clérigos medievais: «em todos os estados o homem se pode salvar». Em seguida, o humanista holandês fez-se defensor da vida matrimonial em muitas obras: o Elogio do Casamento (1518), os Colóquios (1523), O Casamento Cristão (1526). O colóquio da Mulher que se Queixa do Casamento está cheio de conselhos simples e sábios, de perene · actualidade. Eulália, que é feliz no casamento, não esconde à amiga, -embaraçada em disputas conjugais, que, nos primeiros tempos, pequenas. questões surgiram também no seu lar. Foram, porém, destituídas de gravidade e nunca houve tempestade. «Sucede, por vezes, a afeição mútua entre marido e mulher ser frágil até que os esposos acabem por aprender a conhecer-se. É preciso velar por isto, sem demora, pois o bom entendimento é difícil de restabelecer, especialmente quando a disputa degenerou em grande conflito. Há esposos que são como dois objectos colados um ao outro: se os puxarmos muito, acabam por separar-se com facilidade; mas, pulo contrário, nada de mais resistente quando a cola teve tempo de secar. Assim, nos primeiros tempos do casamento, nenhum esforço deve ser descurado para cimentar e fortificar a concordância do casal por meio da paciência e da docilidade de carácter. A ternura, unicamente baseada em aspectos físicos, teria poucas probabilidades de durar.» Portanto, quanto mais cristão for o amor mais profundo e duradouro ele será. Erasmo escrevia ainda, no colóquio Epicureus: «0 amor é o princípio de requintadas carícias. Mas, para bem amar, é preciso que façamos do nosso coração o coração de Cristo. Procurar apenas o simples prazer ilão é amar. Convencei-vos de que há ternura em respeitar a beleza de vossa esposa. A melhor alegria não está no leito, está na união profunda das almas, na confiança mútua, no mútuo culto das vossas virtudes. O amor nem sempre sobrevive aos primeiros beijos, mas, se for cristão, triunfará do declínio dos corpos: é uma palma eternamente verde».
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Desta maneira, o mais eminente representante do humanismo exaltou o casamento contra uma teologia medieval que o esquecera e uma literatura clerical que o aviltara. Um discípulo de Erasmo, o espanhol Vives, redigiu também uma Instituição da Mulher Cristã cujas primeiras linhas são, também, a reabilitação da vida conjugal em nome do cristianismo: «Quem negará -escreve- que o casamento é uma coisa sacratíssima que Deus instituiu no paraíso entre seres puros, livres de mácula e de iniquidade?- Escolheu-o para sua mãe; e ele próprio o ornou com o primeiro milagre da sua divindade [bodas de Caná] ». Se, no século seguinte, a Introdução à Vida Devota foi traduzida em apenas 57 anos para 17 línguas, foi porque pela primeira vez um membro da hierarquia católica escrevera uma obra de espiritualidade especialmente destinada a pessoas casadas. A mensagem do humanismo cristão sobre o casamento foi entendida por uma restrita camada privilegiada. A Contr'amye de court (1541), monólogo que dá resposta à Amye de court de La Borderie, traz à cena a filha de um mercador, que encontrou a felicidade no casamento e diz sem se envergonhar: Mais ninguém tomei nem me tomou A não ser um jovem mui valioso Que por marido e por amigo tenho. E, vendo-me mui humilde, amou-me tanto Que por amiga e esposa me tomou. (') Ter um único homem «por marido e por amigo>> era também .o ideal de Margarida de Navarra, a quem os dois sucessivos maridos não pagaram na mesma moeda. Mas os homens, no século XVI, faziam o elogio de suas esposas. Era uma novidade. La Boétie dizia ter casado com a sua «semelhança». O barão de La Moussaye, que perdeu a esposa depois de dezasseis anos · de casamento, desafiava os preconceitos em moda e ousou escrever estas frases comovidas: «Nunca um homem teve tanto prazer, tanto contentamento e tanta consolação, quer de corpo quer de espírito, como eu tive com a minha muito fiel e leal amiga. Se ·a Deus prouvera fazer-me a graça de deixar-nos terminar ao mesmo tempo os nossos dias, nunca um homem., teria sido mais feliz» . Ao evocar o Renascimento, é hábito esquecermo-nos que, a despeito de certo paganismo, ele cantou os casamentos de amor. Vittoria Colonna ficou inconsolável depois da morte do marido, morto aos 37 anos. A ele dedicou os seus mais belos versos. No fim do século XVI, Spenser * dedicou boa parte da sua (') No original: «Autruy n'ay pris, et autruy ne m'a prise ·I Sinon un seul jeune homme de hault pris I Que pour mary, et pour amy j'ay pris. I Et me voyant fort humble tant m'ayma I Que pour amye, et femme prise m'a.» (N. do T.)
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. . ue depois foi sua esposa. O seu obra poética a Ehsabeth Boy~e, a nota ~ es da literatura inglesa. Nessa Epitalámio é uma das gran es rea Jzaço · do seu casamento. ode de vinte e três estâncias, Spenser descre~e ~ dm o poeta polaco Alguns anos antes, no outro extremo a uropa, em casara Kochanowski descrevia assim a sua esrosa .Doroteia, c~m .qu por amor, pois, embora de família nobre, tmha fraco ote.
CAPíTULO XIV
RENASCIMENTO E PAGANISMO
Tua trança está bem penteada, . . Loura como uma bétula de casca Jovem, Teu rosto, semelhante às flores juntas Do li rio e da rosa ... Teus lábios são de coral Teus dentes pérolas verdadeiras; Teu colo é pleno e magnífico, Tua garganta cheia, tua mão branca.(')
. 'd t de versos e seu marido tinha Doroteia era bela e mstrm a, gos ava 1 osta' pronta . . h ·rtuosa - escreve e e - ,. nela toda a confiança. «Mm a esposa VI f A má sorte levou. d a sorte nos o erecer. >> a suportar comigo tu 0 .~ q~e e 0 oeta com isso. -lhes a filha, úrsula, e Ja dtssemd~ds q~e ~~~!~~~~a~:v da ~ida de família Mas tal desgosto estava na me 1 a a I daquele lar quase mo?erno. períodos anteriores para com a
cria:aost~a~~;~:r n:ai: ~!~~~~a~~e c~~jugal,
0
~enasciment~ in:r~!up~~
' d. f ntos de renovaçao de excepciOna na vida de todos os IaS erme - t' dt'sso certamente consciência , · d ssa época nao tveram , ' tancta. As pessoas e h . t da família só lentamente proclara e, de r~s~~· a _co~cepção umams atados os obstáculos económicos, grediu na opmmo ~ublica, por causa de h Mas a vida de família, tal sociais e intelectuais que a ela se opun am. d. na época de Erasmo. como hoje a compreendemos, começo~ a expan Ir-se de Margarida de Navarra e de Calvmo.
b' · · 1 Blonde comme un (') No original: «Ta tresse es.t Ien pel~fa~te aux fleurs mêlées I bouDu leau à la jeune écorce; I Ttên vtsage t sd~ corai! I Et tes dents sont de lis et de la rose ... !I Tes vrels. sonmagnifique I Ta gorge gonflée, ta vraies perles; I Ton cou est p em, ' main blanche.» (N . do T.) 98
·No tempo do Renascimento, a ·exaltação da mulher nem sempre conduziu à revalorização do casamento. Pois não deram durante muito tempo os historiadores a sua principal atenção à explosão de paganismo sensual que se manifestou em Itália no século XV e depois se propagou a:o resto da Europa? Segismundo Malatesta remodelou uma igreja de Rimini dedicada a S. Francisco mas - diz Pio li - «recheou-a de tal maneira de obras pagãs que o templo não parecia um templo de cristãos mas de pagãos adoradores de demónios. E pôs lá um túmulo para a sua cop.cubina, muito belo pelos materiais e pelo modo como estavam trabalhados, no qual, segundo o uso pagão, gravou o seguinte epitáfio: "Dedicado à divina Isotta".» Lourenço, o Magnífico, chamou a Roma «local' de encontro de todos os vícios». Cortesãs dançavam nuas para Alexl;lndre VI. Uma hetaira, Imperia, modelo de Rafael e amante do banqueiro Chigi, foi a mulher mais notável de Roma no tempo de Júlio li. Foi representada perante Leão X a peça licenciosa do seu amigo Bibbieua La Calandria, obra sensual e maliciosa, inspirada simultaneament e em Plautd e em Boccacio. O cardeal Bibbiena, fino letrado toscano, tinha um comportamento perfeitamente libertino. Mandara pintar na sua sala de banho A História de Vénus e do Amor. Mas era o melhor amigo do papa, qüe apreciava na sua pessoa um bom conhecedor da literatura antiga; um diplomata avisàdo, um conversador muito agradável e um notável · organizador de festas. Estaria Roma a voltar ao paganismo? Ainda nos fins do século XVI, um cardeal encomentou a Annibale Carracci as pinturas mitológicas que fizeram a glória do palácio Farnese e mostram a um visitante admirado o triunfo de Baco e Ariana, Céfalo raptado pela Aurora e uma nereide nos braços de um tritão. A recusa do ascetismo tomou a forma de maniftsto no De voluptate de Lcrenzo Valia (1431) e de insidioso convite à descoberta «da boa natureza venusina>> na Hypnerotomaqu ia, ou Sonho de Polífilo, do dominicano Francesco Colonna (1499). Polia, a amante de Polífilo, fizera
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inicialmente voto de castidade na austera presença de Diana. Depois, porém, libertou-se dele. Comeu então o fruto do amor, «apagou o archote» da continênc ia e converteu-se à religião de Vénus. Esta religião teve muitos adeptos na época do Rena~cimento. Nenhuma outra época passada represent ou e exaltou tanto como esta, sem dúvida, a beleza do corpo feminino. Marot gaba a «bela teta» de sua dama num poema que depois veio a servir de modelo a toda uma série de «brasões do corpo feminino». No Banho de Callira, Ronsard lamenta não poder espiar a amante no banho. Evoca-a também a dormir e vê em sonhos o seu «corpo», o seu «ventre» e o seu «seio colorido». Mesmo obras que se pretendem altamente morais deixam entrever, por trás das intenções declaradas, as tendência s sensuais do autor e da época. Tasso, na Jerusalém Libertada, deixa-se seduzir pela seminudez de Armida, cujo <>. Os pintores desta época espantosa mente «visual» exprimira m ainda melhor que os escritores a fervente admiraçã o pela beleza feminina. É essa uma das características da arte maneirist a depois de séculos de pudor como os da Idade Média. «A alegoria, a mitologia, a história, a Bíblia, os martírios de santas - escreve J. Bousquet num livro notável- , tudo era, . para o maneirismo, ocasião de despir a mulher. Vénus, Diana, as Músas, Eva, Betsabé, ·Judit, a casta Susana, Lucrécia, Santa Catarina na ' Sua roda de suplício, Santa Madalena no seu deserto, as Virtudes, as Artes liberais, eram simples pretextos para o tratamen to de um único assunto: o corpo feminino» . Esta exaltação erótica, que então foi geral na Europa - exceptuan do a Espanha -, não estava livre de certa perversidade. Cranach e Deutsch gostavam de represent ar Vénus envolvida em véus transpare ntes mas com largo chapéu ou barrocas plumas na cabeça. Os artistas apreciam as cenas indiscreta mente surpreendentes: ninfas brincando na água são surpreendidas por sátiros; Susana, fingidamente assustada, vê os velhos a aproximar-se; David contempl a com olhos concupiscentes Betsabé no · banho. Em tal clima de sensualidade, a homossexualidade era uma das variantes do erotismo. A Idade Média tinha lançado o anátema sobre o vício grego mas a época seguinte. pelo contrário , vestiu-o com os véus graciosos dos mitos helénicos. Foi corrente nos meios literários italianos, em Florença como ein Ferrara e em toda a península, e espalhou-se nas camadas inferiores da sociedade apesar das ameaças dos pregadores. Numa novela de Bandello, um moribund o diz com cinismo ao religioso que procura confessá-lo: «Divertir-me com rapazinhos era em mim tão
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natural como beber e comer, e ainda me perguntas se eu pecava contra a natureza! Vai-te, vai-te, que não sabes o que é bom.» Muitos historiadores acusaram Miguel Ângelo de pederastia: a acusação é, sem dúvida, exagerada e não apresenta provas. Mas é seguro que, aos cinquenta e sete anos de idade, ele se apaixono u pelo jovem Tommaso de Cavalieri, a quem çledicou alguns dos seus mais belos versos. Em contrapar tida, não há hesitações quanto a Leonardo , cujos quadros mostram, muitas vezes, rostos ambíguos e cuja Gioconda tem talvez - coisa recentem ente trazida a lume- vestuário masculino. Quanto a G. A. Bazzi, foi cognomin ado de Sodoma * e gabou-se disso. Diz-se do jovem Isaac que ele pintou para a catedral de Pisa que era «o verdadeir o tipo do mignon(')» (J. Bousquet). A homossexualidade masc_ulina esteve em moda_na corte de Henrique IH e na Inglaterra isabelina: disso nos dá testemun ho o Eduardo li de Marlowe ~ como, ainda, os sonetos de amor de Sha.kespeare dedicados a um homem. Outra perversão sexual do Renascim ento: os numeroso s quadros dedicados, na Alemanh a, na Itália e nos Países Baixos ao episódio de Loth e suas filhas não procurari am sugerir a imagem do incesto? Uma colecção de poesias manuscri tas do tempo de Alexandr e VI contém uma espantosa série de epigramas. As primeiras poesias cantam a Virgem e as santas mas, a seguir, passamos sem advertênc ia prévia ao elogio das mais célebres cortesãs da época. Esta ingénua mistura de paga~ nismo e cristianismo era uma das grandes caracterís ticas do Renascim ento. Sannazza ro, no seu poema De partu Virginis, chama a Deus-pai «senhor do trovão», a Cristo «pai dos deuses e dos homens» e à Virgem «deusa-mãe» e «rainha dos deuses». A Virgem é para Bembo *, secretário de Leão X, uma «ninfa radiante». O humanist a Paolo Cortese publicou em 1503 um Resumo de Dogmática -apresen tação das verdades cristãs ao gosto do tempo - no qual descreve o inferno à maneira pagã, chama a Santo Agostinho «profeta pítico da teologia» e diz que S. Tomás de Aquino é o «Apolo da Cristandade». O paganismo e o cristianismo não se fundiam apenas nos livros mas também nos espectáculos oferecidos ao povo em dias de festa. Em 1520, na festa de quinta-fe ira gorda de Roma, tudo foi organizad o à moda antiga: o cortejo, que desfilou perante o papa, levava um grupo de carros que represent avam a Itália, fsis, Neptuno, Hércules, Alexandr e Magno, a loba do Capitólio, etc. O último -uma esfera sobre a qual ia um anjo- simbolizava o triunfo da religião. Era esta a época em que um dominica no comparou Leão X ao deus-sol.
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Do ponto de vista cristão, havia coisas mais graves que a exaltação ade pagã e as vestes antigas com que, por vezes, era apresensualid da
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Rapaz que serve para prazeres menos lícitos. (N. do T.)
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se?t~da. a religião do crucificado. Havia pensadores que· se afastavam do cnsbamsm~. Segundo Vasari, Leonardo da Vinci formara «no seu espírito
uma doutnna tão herética que já não dependia de religião nenhuma p~eoc~pando-se mais em ser filósofo que cristão». Quanto a Maquiavel: nao so. a.~acou. os Padres como também o próprio espírito do Evangelho. «A r~hgiao c~Istã -afirmou ele- só ensina a sofrer, e parece que tal maneira de viver enfraquece u o mundo e o deixou à mercê dos maus.>l Toda uma corrente anticristã que culminou em Nietzsche provém da exaltação que Maquiavel faz do Estado e da vontade de poder. Opondo-se a murtos p1os humanistas, o pensador florentino ne3ou-se a tratar dos progressos do homem interior e da salvação individual. . No século XVI foram raros os ateus: L. Febvre demonstrou-o pertinentemen te. Mas as circunstâncias e as crenças daquele tempo forçavam a ~cultação de doutrinas demasiado audaciosas . Daí a ambiguidade de mmtas obras, acerca das quais ainda hoje não são unânimes os comentadores. O Cymbalum mundi de Bonaventu re Des Périers (1537) é uma dessas obras ..Dever-se-á ver no Mercúrio que ele faz intervir um «representante do mtervencio nismo em matéria de fé» (V. L. Saulnier), um prof~t.a ~ue falha face à hostilidade dos teólogos e se refugia por fim no silencio ou um Jesus acusado de enganar uma humanidad e demasiado crédula? ~m Itália, a <~escola de Pádua» professou um singular distanciam ento , ilo cnstJamsmo. Fiel a Aristóteles, não tentou conciliá-lo nem com Platão nem com os dogmas cristãos. Estudou-o durante muito tempo à luz dos Come~tários que no século XII lhe tecera o pensador árabe Averróis, traduzidos para latim no século XIII. Para Averróis, a matéria e o movimento são eternos e não foram criados. Há um «intelecto activo», «espírito da· terra e da humanidad e», de onde provém cada inteligência individual, e só esse é imortal. A alma pessoal, pelo contrário, é mortal. Para compreend er que tal filosofia tenha podido ~er ensinada na Europa cristã apesar das condenações que sobre ela recauam -em 1240, pronunciad a pela Universidade de Paris, e em 1513, por Leão X- é preciso juntar-lhe o seu indispensável complemento, a doutrina da «dupla verdade». Os «paduanos» tal como 0 próprio A v~r~óis, diziam que as opiniões racionais se opunham a certos dogmas rehgwsos mas que era necessário continuar a acreditar nestes porque provinham da revelação. As pesquisas dos humanistas provocaram a descoberta de outro com~ntador de Aristóteles, o grego Alexandre de Afrodisíade, que viveu no fim do século li e princípios do século III depois de Cristo. Ora Alexandre de Afrodisíade interpretav a Aristóteles de uma . forma ainda mais ~aterialista que Averróis, e foi principalm ente nele que se inspirou o mais celebre «paduano» do Renascime nto, Pietro Pomponazzi * (1462-1525). Na su~ .. o~~a mais conhecida o De immortalit ate animi (1.516), Pomponazzi cntJca, com efeito, vivamente a ideia de Averróis de um intelecto
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colectivo, espírito da humanidad e, do qual proviriam as almas individuais. Mas rejeita igualmente a concepção, que qualifica como tomista, e que é simplesmente a concepção cristã, de um intelecto, distinto da alma sensitiva, que se multiplica com os indivíduos e é imortal. Tal sistema, segundo Pomponazzi, destrói a unidade do composto humano. O filósofo de Pádua adopta, pois, na senda de Alexandre de Afrodisíade, a tese segundo a qual a alma é apenas a forma, ou «enteléquia», do corpo. O espírito humano depende do corpo tanto nas operações racionais como nas operações sensitivas. Poderá a inteligência pensar sem imagens? Não se gastam com a idade tanto as faculdades da alma como as do corpo? Todas estas afirmações estão muito longe da doutrina cristã. Mas Pomponazzi refugia-se atrás da teoria da «dupla verdade». Decla ra que «a tese do divino Tomás sobre a imortalidad e da alma ... (é) verdadeira· e muito sólida apesar de estar em contradição com os escritos de Aristóteles». Afirma que «a Escritura deve ser preferida a todo o raciocínio e até à experiência». Explica-se assim que o De immortalitate anim i, que deu escândalo, tenha sido condenado por Roma mas que o autor, que, diga-se, erà protegido por Bembo, não tenha sido ~eriamente incomodado. Outro aspecto notável da doutrina de Pomponazzi diz respeito aos milagres. No De incantation ibus -só publicado em 1556-, o filósofo paduano não só expõe uma concepção cíclica da história, que aparentemente aplica ao cristianismo, como nega os milagres, definidos por ele como factos raros mas não como acontecime ntos contrários às leis da' natureza ou situados fora delas. Depois de atribuir à imaginação «o principal crédito dos milagres, visões e encantame ntos», Pomponazzi propõe duas explicações possíveis para os factos realmente extraordiná rios. Em primeiro lugar, há certamente no universo uma reserva de forças que nós desconhecemos. Por outro lado, o homem é um microcosmos cuj a natureza participa, ao mesmo tempo, da dos seres superiores e da dos seres sublunares . Ora, se ervas e pedras podem operar curas, por que motivo certos homens não haveriam de possuir também esse poder? A influência de Pomponazzi foi duradoura, não só em Pádua, em Ferrara e em Bolonha como também em França. Um dos seus alunos italianos foi Gerolamo Cardano (1501-1576), matemático , médico, astrólogo e espírito dado às fantasias. O aluno tinha, sem dúvida, uma concepção da alma diferente da do mestre. Associando Averróis a Platão, Cardano cria que Deus criara mentes imortais mas em número limitado, e professava a metempsicose. Embora mais crente que Pomponazzi, sugeriu também uma crítica aos milagres. Só aceitava muito poucos, atribuindo os outros «às fábulas e astúcias dos homens». Finalmente , retomando o essencial da mensagem de Pomponazzi, opunha a razão à fé : esta estava para a al,ma como o sono está para o espírito. «Quanto mais forte é a razão de · uma pessoa -escreve u- menos . fé ela tem.» Em meados do século X VI, o médico italiano Francesco Vimercati - 0u Vicomercl ).to- (1500-1570 ) foi, sem dúvida, o melhor representan te
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do racionalismo paduano. Chamad o a França por Francis co I em 1530, foi médico do rei e professo r de filosofia no Colégio dos Leitore s Reais, onde defendeu Aristóteles contra o platónico Ramus. Afastava-se de Alexandre de Afrodis íade e de Pomponazzi e voltava a Averróis, que lhe parecia o melhor coment ador de Aristóteles. Negava , portant o, a . imortalidade das almas individuais mas afirmav a a do intelecto único. A antinomia radical que ele via entre a razão e a fé · levava-o a denunc iar, como os outros «paduanos», o acordo que o tom.ismo mediev al e o neoplatonismo do Renasc imento tinham procura do estabele cer entre a filosofia e a teología. Vimercati sustenta va com Aristóteles, contra Platão e contra a Bíblia, a eternida de do mundo, do movime nto dos globos celestes e do tempo dentro do qual esse movimento se inscreve . Deus não é o criador, é apenas o motor do qual todo o universo depende. Não é, assim, o objectivo da história do mundo. Imóvel, preside ao movime nto do primeir o céu. Entre ele e .os homens estão a acção e a influência dos astros, especialmente do Sol. Mas outra causa, ainda mais poderosa, explica o que se passa no mundo: a naturez a, o conjunt o das leis. que governam o crescimento, o equilíbrio e o movime nto dos seres. Vimerc ati inclina-se, portant o, para o determinismo. Assevera que a natureza faz tudo com ordem e em conform idade com leis e que, por outro lado, utiliza sempre a mesma quantid ade de matéria , por muito diferentes que sejam, superficialmente, os fenómenos. A naturez a «assemelha-se a um pai de família prudent e que não perde nada daquilo que pode utilizar» . Num mundo assim organizado não há lugar para os milagres. Vimerc ati afirma que «Deus não faz nada sem uma ordem fixa e estabelecida, fora da qual nada sucede». Represe nta, assim, de uma forma típica, a corrent e laica e racionalista do Renasc imento. Em cinco grossos volumes não mencio na o nome de Jesus a não ser uma só vez. O caso de Dolet * (1509-1546) é menos simples. L. Febvre pôde mesmo dizê-lo «desesperado». De muito cedo o futuro impressor se familiarizou com Plínio, Lucréci o e Cícero. Seguiu em Itália os cursos da Universidade de Pí.dua. No seu livro mais conhecido, Comme ntarii lingure latinre (1536-1538) surge-nos como livre-pensador. Mas, depois de 1542, publica uns a seguir aos outros um Novo Testamento em francês e umas quinze obras «evangélicas», ou seja, protestantes. Ter-seia convertido o Dolet «paduano» e descrente? Pode-se duvidar. Dolet trouxer a de Itália o culto do:} Antigos. Os seus livros predilectos eram o De divinatione de Cícero e o De natura rerum. A pretext o de purismo, recusava-se a usar as palavras «
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6 digno de admiraç ão, os Antigos reservavam a palavra às coisas feias, pois, pa"ra eles, os milagres eram coisas monstru osas e horríveis». Acreditaria Étienne Dolet na imortal idade da alma? No artigo Anima, depois de dar o sentido etimológico da palavra («sopro dos pulmões»), escreve : «Além desta significação, anima é utilizado para exprimir uma certa força celeste pela qual nós vivemo·s, nos movemos e somos seres raciona is. Uns atribue m esta força ao sangue e outros a outras partes do corpo. Uns crêem que é mdrtal e se extingue com o corpo; outros, pelo contrár io, assever aram que é imortal». Discípulo de Cícero, Dolet, ao pensar na imortalidade, pensa, principalmente, na glória póstum a: «É uma besta c não um homem -afirm a ele- quem vive como um animal, passa a vida em silêncio e não deixa uma obra que diga que ele viveu e não está morto para sempre». A que atribuir , então, as publicações «evangé licas» subsequentes a 1542? Segundo L. Febvre , Dolet teria sido um evemerista, ou seja, não veria nos deuses mais que simples idealiza ções do homem. Jean Bodin (1530-1596) foi, em França , no fim do século XVI, outro «acristo», discípulo dos «Paduanos>>. O homem é comple xo, muito crédulo sob certos aspect os- como o prova a sua obra dedicad a à Demonomania dos Feiticeiros; mas, por outro lado, é um livre-pe nsador no Teatro da Natureza e no Heptaplomeres (ou «colóquio dos sete sábios»). Tal como Pomponazzi e Vimercati, Bodin opõe a razão à fé: «Não há ninguém que tenha dado provas demons trativas de nenhum a religião, embora muitos o tenham tentado : em vão, porque tanto é preciso que a fé possa ser e subsistir onde há demons tração como, ao contrár io, a vire do avesso». Bodin interessa-se menos que os «Paduanos)> ·da primeira metade do século XVI pelos problemas da imortal idade da alma, da providência e dos milagres, mas ocupa-se dos dogmas fundam entais do cristianismo. O Heptaplomeres coloca em Veneza sete pessoas de diferentes confissões que acabam por conclui r da inutilidade das discussões religiosas e optam pela necessidade da tolerânc ia. Mas essa tolerân cia baseia-se num profund o cepticismo acerca das grandes crenças cristãs. Eis como fala da Encarn ação um dos interlocutores: «Pode-se persuad ir os cristãos e os ignorantes, mas não os filósofos, de que um Deu s eterno tenha estado, durante uma infinidade de milhões de anos, imutáv el e que esse mesmo Deus, há alguns séculos, tenha decaído dessa naturez a excelen te para tomar um corpo como o nosso, composto de sangue, carne, nervos e ossos, e tenha tomado uma nova figura para se expor aos tormentos de uma morte ignominiosa e ao poder infame dos carrasc os e depois ressusc itar e levar para o céu aquela massa corpóre a que nunca ali- entrara ». Como é que o Deus imutável de Bodin, que é o mesmo de Aristóteles, poderia tomar a naturez a humana sem abdicar da sua divindade? Embora reconhe cendo a grandeza de Jesus, Bodin acaba por colocá-lo no plano da humani dade. 105
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Apesar disto, o racionalism o está longe de representar todo o Rena~ cimento Os libertinos * foram raros no século XVI, mesmo depOis de 1550.· L. Febvre já notou com justeza: «Pretender fazer do século XY_I um século céptico, um século libertino, um século racionalista e glonficá-lo como tal é o pior dos erros e a pior das ilusões. Bem pelo .contrário, por vontade dos seus melhores representan tes, esse. século fm um século inspirado. Um século que, acima de todas as cmsas, procurava principalm ente um reflexo do divino». Artistas e poetas de~c.obn~a~ essa presença divinà no mundo graças, principa.lmente, .a Marsiilo . ~ICI~o. A filosofia do maior neoplatónic o do Renascime nto e, por oposiçao a dos «Paduanos » uma filosofia essencialm ente espiritualis ta. Põe o acento tónico na ~!ma individual e no destino da pessoa, ambos integrados num vasto movimento· que parte de Deus e a ele volta. Ficino. foi buscar a Platão e a Plotino a teoria dos intermediá rios - ou a teona da ~Il_la nação - , que dá a chave do seu sistema. Com efeito, a . sua metaflSlca baseia-se na ideia de uma escala de seres que emanam de ~~us-uno, fonte de sabedoria, de beleza e de bondade. Abaixo do. «sol _dlVI?o.», ~ o qual provém a sua existência, estão os espíritos angéilcos, mtehg~nci~ s puras, indivisíveis e imutáveis. O segundo grau é ? das almas racion~ts e imortais, que, «embora de certo modo submetidas a mudança, . ~ao admitem divisão num corpo». São, aqui, as almas humanas; mas Fiemo postula, além delas, a existência de uma alma ~o. m~ndo .e. doze almas dos elementos e das esferas. Abaixo das almas, Fiemo Identifica o mundo das «formas», princípios activos onde os corpos v~o busca~ a sua natureza e as respectivas leis. É o domínio da «quahdade efic~z>~, ~ue ~o entanto está sujeita à divisão e à mudança. Finalmente , o estagio mfenor da criação é o da «massa preguiçosa dos corpos». Distingue-se desde logo o lugar particular concedido ao homem nesta hierarquia, pois · a alma racional situa-se no centro dos graus do s~r, dominando o corpo e a quaJidade, capaz de passar ao grau dos anjos e de Deus. É ela o ponto de encontro do finito e do infinito, do tempo e da eternidade. «As coisas que estão acima da alma racional -escreve Ficino- são unicamente eternas; as que estão abaixo são unicamente temporais; e a alma racional é em parte eterna e eni parte temporal». Deste modo, Pascal virá a definir o homem como «um nada comparado com o infinito e um tudo comparado com o nada». Deus não se limitou a deixar emanar de si a série dos seres: não cessa de chamar a si as almas humanas. Aquelas que não ficam insensíveis a este apelo do amor divino operam, pela purificação moral, a «conversão » necessária e iniciam a ascensão - remeatio - que_ ~s colocará face a face com o Ser por excelência, aquele no qual residem as formas substanciai s, os exemplares e causas de todas as coisas. Claro. que as almas, unidas ao corpo, tem tendência para casar-se com a maténa, a
ganhar peso, a deixar-se levar em jogos de sombras, como os prisioneiros da caverna de Platão. Mas há que saber que «a vida corporal é uma doença da alma, que se tortura e sonha. Os nossos movimento s, as nossas acções e as nossas paixões são apenas atordoamen tos de doentes, pesadelos de insensatos». O mundo exterior é uma sombra. A beleza que, justamente , nos atrai só tem sentido quando nela vemos o reflexo de uma beleza mais elevada. A sombria caverna onde nos arriscamos a ficar presos é tudo aquilo que nos rodeia. Pelo contrário, a luz diyina está escondida dentro de nós e há que procurá-la pela ascese e pela meditação. Embora Ficino se tenha inspirado em S. Tomás de Aquino muito mais que o que durante muito tempo se pensou, e embora a sua Theologia platonica tenha muitos aspectos escolásticos, A. Renaudet tinha razão ao sublinhar as dificuldades que o filósofo florentino encontrou na sua tentativa de conciliação do cristianism o com o neoplatonis mo. Segundo a teoria da emanação, cada grau de criaruras recebe o ser de outras, situadas imediatame nte acima delas. Então as almas humanas deveriam. proceder de Deus por intermédio dos anjos. Ora Ficino conserva a crença cristã na criação imediata por Deus das almas individuais. Por outro lado, Ficino concede aos animais uma simples alma mortal e corruptível . Está muito mais perto da Antiguidad e que do cristianism o ao atribuir altnas racionais aos elementos c às esferas- almas racionais qúe são, portanto, imortais e incorruptív eis. Por aí poderia o neoplatonis mo conduzir ao panteísmo. A lógica do sistema devia levar Ficino a afirmar a definitiva mortalidad::: da carne, mas, para se manter nos limites do dogma cristão, Ficino aceita a ressurreiçã o dos corpos. A concepção do inferno por ele exposta no final da Theologia platonica está muito afastada da Igreja. O 'inferno é ali representad o como o pesadelo da alma impura, eternamente prisioneira de terrores e desejos imaginários. Já não são o horror do mal e o sentimento do pecado que torturam o danado mas sim a descoberta do vazio e do ilusório da existência carnal. Ficino procurou, assim, vazar numa forma cristã um espiritualis mo essencialm ente adogmático. Nem a doutrina do pecado original nem a vinda do Redentor são necessárias à sua filosofia: são-lhe artificialme nte acrescentad as. A filosofia de Pico de Mirandola, tal como pode ser deduzida das suas 900 Teses, do seu Discurso sobre a Dignidade do Homem e da sua principal obra, o Livro Séptuplo, Exposição dos Sete Aspectos da Criação, também não coincide totalmente com a doutrina cristã. Passa-se com Pico o mesmo q12e com Ficino. Ambos representam o sincretismo do Renascime nto, que tentava conciliar o pensament o antigo com a mensagem cristã. Ficino tinha retirado os elementos do seu sistema não só de Platão e dos neoplatónic os da Antiguidad e (Plotino, Proclo, Jâmblico) como também dos Livros Herméticos , de Zoroastro, de Dionísio, o Areopagita, etc., Pico, que sabia hebraico e árabe, juntou a tudo isso a Cabala. Daí uma filosofia compósita que por vezes entra em contradição com a Igreja. O conde da Mirandola parece preferir o monoteísm o judaico à
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trindade cristã; e não hesita quanto à questão da presen ça re;:tl. A sua concepção do homem, por muito exalta nte que seja, afasta-se da do Evangelho. Pico põe Deus a dizer ao homem : «Pus-t e no mundo para que daí possas ver melho r tudo o que .no mundo existe. Não te fiz celeste nem terrestre, nem morta l nem imortal, para que, livre e soberano artífic e de ti próprio, possas modelar-te e esculpir-te com a forma que escolheres. Serás capaz de regressar ao nível das coisas inferiores e dos animais mas serás també m capaz, media nte a tua vontade, de renasc er no nível das coisas mais elevadas, das coisas divina s». Deste modo, o homem pode fazer-se anjo ou besta. Portan to o infern o não existe e a punição suprem a consiste no rebaix ament o ao nível anima l e na aniquilação. Pico afirmo u també m nas 900 Teses que um pecado, cometido no tempo, não pode engen drar um castigo eterno . Pico de Miran dola, cujas doutri nas foram , a princíp io, conde nadas pela Igreja , veio a ser perdoado por Alexa ndre VI. Mas, um século depois, em 1600, o dominicano Giord ano Bruno foi queim ado vivo em Roma por ter professado uma filosofia que se distanciava consideravelmente do ensino evangélico. Bruno levou ao extrem o limite a hostilidade para ·com Aristóteles e para com a tese platón ica que faz do universo uma emana ção de Deus. Afirm ou que o mundo , infinit o, está «implicado» em Deus e que Deus é «explicado» nos corpos sensíve is. A tendên cia natura l do seu pensam ento conduzia-o, portan to, a uma doutri na da imanência e a concepções panteístas. Deus é o uno absoluto e perfeito, mas duas substâncias se manif estam no seio dessa unidad e: uma com o poder de fazer (natura naturans) e a outra com o poder de ser feita. A prime ira é a alma do mundo e a segunda é a matéri a. Bruno rejeita va inteira mente a ideia de um Deus situado acima da nature za, que tivesse criado o mundo a partir de si própri o e que, como o Yahvé do Génesis, tivesse depois disso contemplado com satisfação a sua obra. Mas os mais recentes comen tadore s do filósofo napoli tano descob rem nas suas obras, atravé s de uma linguagem ~ifícil e de fórmulas contra ditórias, uma certa afirma ção da transcendência. O universo está em toda a parte, mas Deus está, ao ·mesmo tempo, em toda a parte e para lá de toda a parte. Onde é esse «para lá»? Não à superfície do mundo, mas no centro , mim local misterioso que a alma inquie ta só pode alcanç ar pela aniquilação. Desta difícil conciliação da imanê ncia e da transc endên cia a um panteísmo plenamen te consciente de si ia apenas um passo, e seria Spinoza a dá-lo. Na verdade, ao declar ar que o transc enden te é incogn oscível e ao identificar o conhe cimen to com o conhecimento racional, Bruno foi um dos fundadores do racionalismo moderno. Antipa scalian o antes do tempo, excluía ·o conhe cimen to do coraçã o e rejeita va toda e qualqu er revelação. Para ele, a doutri na do pecado original não tinha sentido. Negava a divindade de Jesus e declarava-se hostil a todos os dogma s. Bruno estava hem para lá dos limites do cristianismo: ia a camin ho do livre-pensamento.
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No Sonho de Polífilo,. Vénus, depois de se mostr ar na sua radiosa nudez aos dois amant es partid os em busca de uma felicid ade unicam ente terrestre, concede-lhes um novo baptismo e a sua «graça e santa bênção». Os amant es abjura ram de toda a preten são de castida de e aband onaram todo o desejo de mortificação. Dorav ante farão uso do «resto da (sua) vida em inteira prosperidade sob (a) protecção e salvag uarda» da deusa. Baptismo simbólico este, assim dado por Vénus, e que assinala o indiscutível regresso em força à civilização ociden tal de tendên cias pagãs .de há muito mantid as em contenção. Igualm ente, noutro plano, a doutrm a dos «Paduanos» e as simpatias de Giord ano Bruno pela filosofia da imanência deram no século XVI novo impulso a concep ções anticristãs, ou pelo menos acristãs que a Idade Média não ignora ra compl etame nte mas soube ra dissimular. A libertinagem dos «déniaisés» e dos epicuristas franceses do século XVII - a de Théophile de Viau, Cyran o de Bergerac, e a dos «blasfemadores do Marais» que consti tuíam o círculo de Gasto n d'Orlé ans, não teria sido possível sem as audác ias filosóf icas e sensuais do período anteri or. . o poeta Luigi Pulei, favorito de Lourenço, o Magnífico, e a~tor do Morgante maggiore, pareci a a Ficino o tipo caract erístic o do diletan te ímpio que ridiculariza os dogmas, um «homem cuja malícia é tão gr~~de que seria mais difícil livrá-lo dela do que tirar toda a are~a ao mar». FI~I?o sabia que, à sua volta, havia quem se deleitasse na leitura das Faceczas de Poggio e de Herma frodita de Beccadelli, censur ando a estes aut~r~s o transf ormar «a doutri na cristã num instru mento de desreg ra e de IDIquidade». Inquietava-se, principalmente, por ver «a filosof ia, dom sagrad o de Deus nas mãos da impiedade», ou seja, dos peripatéticos. A seu amigo P~nnonius escrevia: «Toda a terra (entenda-se: os círculos eruditos italianos) está ocupa da pelos peripatéticos, que se dividem em duas seitas: os alexandristas e os averrofstas ... uns e outros arruín am igualmente, de alto a baixo, toda a religião, principalme nte porqu e parece m negar a Providência.» Erasm o, por seu lado, não poupo u críticas ao human ismo italiano. Era à Itália que se referia ao escrever, em 1517, a Capiton: «Sob a capa da literat ura antiga renascente, o paganismo tenta levant ar de novo a cabeça, assim como entre os cristão s há pessoas que só de nome conhecem Cristo e que interio rment e respir am o paganismo». Censurava, portan to, a Itália por se dedicar muito exclusivamente às bonce litterce e via-se levado a defini r por contra ste a sua própri a missão. Consistia esta em contri buir para que as bonce litterce, «que até ao presente foram, entre Italianos, quase pagãs, ganhe m o hábit~ de pensar cristãmente>>. Fazendo-se eco de Ficino e de Erasm o, Maqmavel confessava nos Discursos, generalizando a acusação: «Sim, nós, Italianos, somos profun damen te irreligiosos e depravados.» Nos fins do século XVI, a I\ália ainda tinha má reputa ção no plano moral e inte1ectual. Para o
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romancista inglês Thomas Nashe, contemporâneo de Isab~l, a Itália era «uma Sodoma», «a academia do assassínio, a farmácia onde são preparados os venenos destinados a todas as nações>>. Mas, entre esses venenos, já se contav~, para o anglicano Nashe, a reforma católica. De facto, foi de Itália que ela irradiou, a partir da segunda metade do século XVI. O seu êxito no país dos Borgia e de Pomponazzi convida-nos à reflexão. Vem provar que a impiedade tinha ficado, em Itália, limitada a círculos estreitos e nunca penetrara nas massas, que, na época do Renascimento, contint.:aram a ser profundamente cristãs, tanto em Itália como nos países vizinhos. Quanto aos que eram tidos por «ateus», sê-lo-iam sempre? É preciso retomar neste ponto as judiciosas precisões de L. Febvre e recordar, com ele, como era flutuante a terminologia da época. Castellion e Henrique II Estienne classificaram Rabelais como um dos que não acreditavam «nem em Deus nem em Cristo». Essa tese foi recuperada no início do século XX por A. Lefranc, que viu em Rabelais «um émulo de Luciano e de Lucrécio» um espírito forte que foi «mais além que todos os escritores seus co~tem porâneos na via da oposição filosófica e religiosa». Já em 1532- afirmava Lefranc- Rabelais «tinha deixado de ser cristão»; deixara de acreditar na imortalidade da alma; o seu riso aberto dissimulava intuitos «que ninguém ousara conceber durante longos séculos». Ora, contrariamente à opinião de Lefranc, Rabelais afirmou a sua crença na imortalidade da alma. Escreveu em 1535 um Almanach calculé sur la noble cité de Lyon que se perdeu mas do qual nos ficou um extracto, copiado por um seu contemporâneo. Sabendo que os seus leitores estavam «suspensos atentos e desejosos» de saber «o estado e disposição deste ano de 1535», Rabelais admoestava-os nos seguintes termos: «Se a este fervente dese_j~ quereis dar inteira satisfação, convém-nos desejar .. . que as vossas almas sejam postas fora deste tenebroso cárcere do corpo terreal e unidas a Jesus Cristo. Logo cessarão todas as paixões, afecções e imperfeições humanas pois, gozando dele, tereis plenitude de todo o bem, de todo o saber e perfeição, como outrora cantava o rei David... Predizer de outro modo seria leviandade minha, como seria ingenuidade vossa dar-lhe crédito». L. Febvre, que descobriu este trecho, reuniu e citou muitos textos dos quais ressalta que Rabelais, discípulo de Erasmo, era, indiscutivelmente, cristão do coração e que a sua fé era sincera. Cria em Deus pai, «que tudo o que é e se faz modera a seu franco arbítrio e gosto». Invocou muitas vezes «o caro filho de Deus», que gostava de classificar como «C:riador», «.Plasmador», «Preservador», «Dador de todos os bens», «Justo JuiZ». Mencionou no Pantagruel (cap. X) a transfiguração, a ressurreição e a ascensão de Jesus como um crente. Finalmente -diferença fundamental entre a atitude do antigo monge e a atitude de um Pomponazzi -, ora-se largamente no romance rabelaisiano. Tanto se ora em .circunstâncias excepcionais, por exemplo quando Grandgousier toma conheci-
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mento da agressão de Picrócolo, como se ora na vida corrente do dia a dia. A oração quotidiana é classificada como «louvável costume entre os santos cristãos». Haverá necessidade de recordar que todos os dias Gargântua e Ponocrates recolhidos «oravam a Deus criador, adorando-o e rectificando a sua' fé nele, gl~rificando-o pela sua imensa bondade»? É verdade que Rabelais desprezava os padres e os frades, que rejeitava as peregrinações, o culto dos santos e as indulgências. A sua religião era individualista mas queria ser cristã. Rabelais estava longe de ser ateu . O conselho de L. Febvre é sensato: «Desconfiemos das palavras de outros tempos.» O próprio Rabelais chamou ateu a Scalig~ro; Henrique II Estienne usou da mesma injúria para com Castellion, Farei para com Servet, R onsard para com todos os huguenotes. «Atem>, no século XVI, era o superlativo de «deísta», injúria esta já de si muito grave na boca e na pena da enorme maioria das pessoas da época. Estas incertezas no plano vocabular são reveladoras de uma mentalidade. Devem ser aproximadas do anarquismo que se introduzira nas crenças cristãs e do sincretismo filosófico-religioso que caracterizou o pensamento europeu dos séculos XV e XVI. Este sincretismo, fundamentalmente optimista e, de resto, baseado no ·insuficiente conhecimento da cronologia das obras antigas, descobria em todas as civilizações pré-cristãs premonições do cristianismo. Jesus viera completar uma revelação cujos elementos tinham sido recebidos não apenas pelos judeus mas por todos os povos da Antiguidade. Em suma, postulava-se a concordância de todas as religiões para além do dogma. Daí a presença de Hermes Trismegista no pavimento da Catedral de Siena; daí o interesse de Ficino pelos poemas homéricos e pelos cantos órficos; daí a aparição das sibilas pagãs, anunciadoras de Cristo, no campanário da Catedral de Florença ou no tecto da Capela Sistina. O crist ianismo, no pensamento de muitos humanistas, vinha assim iluminar a meditação filosófica e a fé religiosa dos Antigos e dar a muitos mitos pagãos o seu verdadeiro sentido. Trazia à sabedoria antiga o indispensável complemento da graça. Era esta a opinião de Pio li ao escrever ao sultão: «0 cristianismo não é mais que uma nova lição, mais completa, do soberano bem dos Antigos.» A principal obra de Ficino, ~ T heologia platonica, tem um título singularmente revelador e não fm por acaso que o autor a tenha redigido na ocasião em que, com cerca de quarenta anos de idade, era ordenado padre. Há uma analogia segura entre a intenção de Ficino e a de Pascal ao iniciar a escrita dos Pensamentos. Ambos procuravam convencer libertinos. Mas, no fim do século XV, os libertinos eram, essencialmente, os «Paduanos». Não se duvida de que Ficino tenha sido pessoalmente atraído pelo platonismo (no sentido lato);· foi ele quem, principalmente, com as suas traduções latinas, deu verdadeiramente a conhecer Platão ao Ocidente. Mas Ficino esperava também que certos espíritos que se tinham afastado do cristianismo a ele pudessem voltar se se conseguisse levá-los a considerar o platonismo como uma fase
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da revelação divina. Em suma, aproveitando o novo crédito dado aos temas platónicos, havia que demonstrar , como racionalme nte possível, aquilo que a fé declara como necessário. Nem Ficino nem Pico tiveram a impressão de propor d,outrinas heréticas, embora aquele tivesse de remodelar as suas obras e este de sofrer condenação pontificai. No fim da sua curta existência, Pico tomou figura de um asceta. Os últimos momentos de Sydney, morto em 1586 aos trinta e dois anos em consequência de um ferimento recebido no cerco çle Zutphen, fazem luz sobre a pesquisa intelectual de toda uma época: sentinüo aproximar-se o fim, pediu que lhe fosse lido o relato da morte de Sócrates, do Fédon, e alguns extractos do Evangelho. Por outro lado, é necessário reconhecer - embora isso possa espantar os nossos contemporâneos, cujas exigências morais são, realmente, muito grandes-; que os homens do Renascime nto conciliam, frequentem ente, sem dificuldade, um estilo de vida muito pagão e preocupações muito sensuais com uma fé sincera e até ardente. Marot, que fez o elogio da Bela Teta, também traduziu salmos para francês. Ronsard, que tantas vezes glosou o tema do carpe diem, escreveu acerca da religião cristã versos eloquentes que provinham, manifestam ente, do coração do poeta. Ambas as inspirações existiam nele a par uma da outra. Numa canção epicurista das Odes, Ronsard canta o prazer, o vinho a rodos e a boa comida:
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A bela rosa da primavera ... admoesta os homens A passar alegremente o tempo E, enquanto somos jovens, A gozar da flor dos anos. (') Mas, no Hino da Morte, o seu tom é grave e cristão: ... que te recordes De que tua alma não é pagã, mas cnsta, E de que nosso grande Senhor, na Cruz pregado, Ao morrer, o aguilhão da morte perdeu E dela fez agora apenas bela transição Para voltar ao céu ... (2)
(') No original: «La belle rose du printemps I ... admoneste les hommes ;I Passer joyeusenient le temps, 1 Et pendant que jeunes nous sommes I Ébattre la fleur de nos ans.» (N. do T.) (') No original: «( ... ) qu'il te souvienne -'1 Que ton âme n'est pas paienne; mais chrétienne, I Et que notre grand Maitre, en la Croix étendu I Et mourant, de la Mort l'aiguillon a perdu, I Et d'elle maintenant n'a fait qu'un beau passage :1 A retourner au Ciel.. .» (N. do T.)
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Tal como Ronsard e Marot, a maior parte dos artistas do Renascimento passou facilmente, e aparenteme nte sem grandes problemas, dos assuntos mais pagãos aos temas familiarmente cristãos. Este aspecto, que então parecia natural; seria, poré-n, impensável alguns séculos antes. Dos pintores que assim passavam alegremente de uma a outra inspiração citaremos apenas dois: Lucas Granach, o Velho e Ticiano. Temos, do primeiro, os subtilmcele cró~icos V é nus e Julgamen!o de Páris. Mas a sua obra religiosa é abundan!e; além disso, ele foi o pintor titular da casa de Lutero e o ilustrador da tradução alemã da Bíblia que o reformador publicou. Ticiano deixou muitos quadros destinados a igrejas: Virgens (com seus doadores), A Santa Conversa, a Apresentação da Virgem no Templo, etc. Mas também lhe agradava evocar a luminosa carne das belas raparigas de Veneza e a sua Bacanal do Prado é uma festa pagã nas margens de um rio de vinho. A Andriana nua, adormecida, em primeiro plano, é o mais saboroso fruto do festim.
* No entanto, a nudez esculpida ou pintada do Renascime nto já enganou muita gente. A obra que ela adorna pretendia-se, muitas vezes, esotérica. Um neoplatonismo (no sentido lato), entendido como premonição do cristianismo, e de elevada significação moral, estava frequentemente dissimulado por trás de cenas que, na intenção dos seus autores, não tinham de valer simplesmente pelo encanto das formas . Depois dos estudos de F. Saxl, E. Panofsky, J. Seznec e E. Wind, aprofundou-se muito o «paganismo» do Renascimento; abriu-se caminho até segredos que, nos séculos XV e XVI, só eram compreendidos por iniciados. Muitas obras desse tempo escapam, com efeito, a quem se não recordar de que, segundo a filosofia ficiniana, a beleza terrestre convida ao tre~passe. Essa beleza não é senão o primeiro degrau de uma «escada maravilhosa» que deve conduzir a Deus, «fonte perene de beleza» e de bondade. Penetrar as intenções dos artistas do Renascime nto é, pois, um jogo subtil, apaixonant e e rico de ensinamentos. Aquela época estimou muito o tema das três Graças. Um quadro de Rafael (que estâ em Chantilly) e um fresco de Correggio (em Parma), para citar apenas dois exemplos, são-lhe dedicados. Ora, porque é que as três jovens são representadas nuas? Claro que porque é agradável fazer surgir no esplendor da sua juventude tão encantador as belezas; mas também porque a ausência de véus indica lealdade, verdade, ausência de engano; esta interpretaç ão fora já dada por Servius no século IV. O grupo das Graças, além disso, é susceptível de duas significações diferentes -uma, moral e outra, metafísic a- que, de resto, se não excluem. No plano moral, as três deusas, muitas vezes representadas segurando-se pelo pescoço, exprimem os três momentos da liberalidade. Assim entend~a Séneca: dá-se, recebe-se e volta-se a dar. Mas, noutro plano, . as tres
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Graças, ligadas pelos laços de mútua caridade, dão também uma ima~em verdadeiramente perfeita do · ritmo dialéctico do universo neoplatómco. Significam, respectivamente, emanatio, raprio e remeatio, isto ~· a emanação dos seres a partir de Deus, a conversão da alma ao cnador que a chama - a deusa que exprime este momento da dialéctica vira as costas ao espectador e, portanto, ao mundo - e o regresso ao divino. As três Graças voltam a dançar na Primavera . de Botticelli, obra sedU'tora e complexa que durante muito tempo desarmou a crítica. O quadro contém, indubitavelmente, alusões a factos históricos: o torneio de 1475, celebrado por Poliziano, no qual se ilustrou Julião de Médicis: o regresso da paz a Florença depois do fracasso da conspiração dos Pazzi, que matou Julião e poupou Lourenço. O artista quis, sem dúvida, evocar também as «ninfas» Simonetta Vespucci e Lucrezia Danti, por quem os irmãos estavam apaixonados. «Mas, apesar disso, nada há de anedótico nestas figuras: um ar longínquo, uma ambiência irreal; estamos noutro mundo, num mundo que parece não ser o dos vivos ... os grandes enigmas da Natureza, da Morte e da Ressurreição flutuam em volta das formas sonhadoras da Juventude, do Amor e da Beleza, fantasmas de um Olimpo ideal» (J. Seznec). À direita, Zéfiro, o vento da Primavera, persegue a tema Clóris que deseja fugir aos seus amplexos. Mas, logo que ele a toca, flores perfumadas saem da boca da ninfa e ei-la transformada em Flora, radiosa mensageira da renovação: «Eu era Clóris, e agora é que me chamam Flora» escrevera Ovídio nas Metamorfoses. Mas esta transformação e as pr~gressões de Zéfiro a Clóris e desta a Flora exprimem, segundo a judiciosa interpretação de E. Wind, a dialéctica neoplatónica do amor. De facto, esta dialéctica faz nascer a beleza de uma discoldia concors entre a castidade e o amor. Clóris é a castidade e zéfiro o amor; a sua união engendra a beleza primaveril que cobre a terra de flores. Mas, no jardim de Vénus- pois Vasari reconheceu, justamente, esta deusa, por modesta e reservada que pareça, no centro da. composição-, nós assistimos apenas à primeira metamorfose do amor. De facto, por baixo de Vênus, um Cupido alveja com mão segura, apesar de ter os olhos vendados, uma das três Graças que dançam à esquerda, delicadamente seguras pelas mãos. A vítima próxima do divino arqueiro é, evidentemente, aquela que figura no meio do grupo das três irmãs. Não tem jóias, o seu rosto é melancólico e as suas tranças são um pouco severas. É a Castitas. A da direita, com o penteado adornado de pérolas, é a Pulchritudo (a beleza); a da esquerda, a mais atraente do grupo, é a V oluptas. Castitas é, portanto, a neófita iniciada no amor pelas duas companheiras, sob a protecção de Vênus, que conduz a dança das três deusas: uma dança que nada tem de nobre ou de comedido. É que não se trata da exaltação das felicidades sensuais terrenas. Castitas, propositadamente, vira as costas ao espectador e ao mundo. Olha Mercúrio, isto é, olha o além. Mercúrio é a personagem do quadro mais difícil de interpretar. Durante muito tempo se julgou que ele colhia pomos
dourados nás árvores do jardim; na realidade, porém, brinca com as nuvens. A Antiguidade dera a Mercúrio várias funções: fizera dele o mais rápido e mais astuto de todos os deuses. Mas via também nele o corifeu das Graças, e, melhor ainda, o mensageiro que ligava a terra ao céu, aquele que conduzia as almas para o além. Ora é de · notar que, no quadro de Botticelli, as vestes de Mercúrio estão semeadas de chamas invertidas, símbolos funerários. Finalmente, como patrono dos gramáticos e dos metafísicos, Mercúrio era o divino «mistagogo», o deus que iniciava nos segredos de além-túmulo. Na Primavera, Mercúrio, cujo. dedo aponta para o céu, que expulsa para longe, como nuvens, os desejos carnais, é bem o «mistagogo» que revela às almas de eleição a beleza oculta dos mistérios divinos. Portanto, a voluptuosidade à qual Castitas é convidada não é a da terra a que ela vira as costas. A flecha que a atinge é a flecha de um amor transcendente. A significação neoplatónica da obra de Botticelli revela-se-nos deste modo. O mov1mento geral do quadto deve ser entendido da esquerda. para a direita e não é por acaso que Zéfiro é simétrico de Mercúrio. A um lado -onde está Flora-, o pintor representou a emanaria, a descida do divino ao concreto terrestre. Mas, ao centro, o filho de Vénus fere a alma sedenta de verdade. Castitas, iniciada por Pulchritudo e por V oluptas, aceita um amor que a afasta da terra. Deixa-se levar (raptio) e volta-se para Deus. Mercúrio não deixará de guiá-la para a contemplação da divina beleza (remeatio). A Primavera e o Nascimento de V énus de Botticelli vêm ambos da vi/la de Castello, que pertencia ao ramo mais novo da fa~lia do~ M~dicis, foram, provavelmente, pintados para Lorenzo di Pierfrancesco, pnmo de Lourenço, o Magnífico. Ora há uma ligação entre ambas as obras. · A passagem de uma à outra está . no manto primaveril que vai cobri~ a deusa ao sair da onda. Vênus nasce da água, trazida para a margem pelos zefiri amorosi, que representam o «espírito do amor» a dar forma e a modelar a matéria. O mar fói, assim, fertilizado pelo céu; é isso que simboliza a mística chuva de rosas que sai das bocas dos zéfiros: imagem na qual os homens do Renascimento, designadamente Pico de Mirandola, viam uma tradução alegórica da frase bíblica «o espírito pairava sobre as águas». A comparação entre estes dois quadros de Botticelli convida-nos - e convidava, certamente os iniciados de Fio. rença- a fazer entre as duas Vénus a distinçã~ outrora sugerida por Platão, retomada e matizada por Pico. A deusa nua, que nos surge no puro esplendor da sua beleza, é a Venus Urania, inspiradora do «amor celeste». A outra, que preside aos ritos da Primavera, é a V énus Pandemos, que encarna o «amor humano». A sua veste primaveril, por muito bela que seja, é um véu por baixo do qual temos de adivinhar a verdadeira beleza. Ela é a sombra, a imagem terrestre, a representante da Vênus mais alta, à qual deve conduzir, afinal, os amantes. A V énus de Urbino, de Ticiano, ao contrário das de Botticelli, é simplesmente, apesar do gesto pudico, uma odalisca veneziana. O manto
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, "'"" .lt 1in tdo , no quadro do pintor florentino, a velar a nudez da
liul, é, no pincel de Ticiano, uma roupagem vulgar tirada de 11111 ct>lrc por duas servas. Mas a sensualidade de Ticiano não explica, J!l ovuvclmente, uma das suas maiores obras, O Amor Sagrado e o Amor l'rufano, «um dos mais belos quadros do mundo», que embaraçou os comentadores. Há desse quadro uma interpretação prosaica: a jovem do lado esquerdo seria a bela Violante, am~da de Ticiano; ao lado direito, uma Vénus desnuda, falando em nome do pintor, estaria convidando Violante ao amor. O título actual, que não é anterior a 1700, sugere, porém, embora seja parcialmente inadequado, que durante muito tempo se tinha atribuído ao artista intenções mais elevadas e mais secretas. Dissemos atrás que os neoplatónicos do Renascimento representavam nuà a Vénus celeste. Portanto seria ela, e não a jovem de amplas vestes, que aqui representaria o amor sagrado. De resto, ela é mais alta que a jovem, a quem se dirige com ar quase .protector. A figura feminina do lado esquerdo será; então, a encarnação do «amor profano»? É pouco provável. É significativo que não tenha jóias; em vez disso, está coroada cqm o myrthus conjugalis. A chave da enigmática obra de Ticiano está, sem dúvida, nos baixos-relevos que adornam a fonte do amor em cujo" rebordo se sentam as duas jovens. Ali vemos um homem a ser chicoteado e um cavalo sem arreio que é afastado puxando-se-lhe pelas crinas. Ora; para os platónicos, o cavalo representava o amor carnal, a libido, que aqui vemos, pois, a ser expulsa. Quanto à cena da punição,. evoca, evidentemente, os ritos de iniciação e de purificação dos mistérios pagãos; mas evoca também aquela castidade cristã que só com a mortificação pode · ser alcançada. Os baixos-relevos da fonte são, assim, um convite à exorcização das paixões impuras e à passagem aos «castos mistérios do amor» .. As personagens do quadro formariam então uma tríade platónica clássica: o Amor desempenhando o seu tradicional papel de mediador entre a Pulchritudo, à esquerda, e a Voluptas, à direita. Seria a iniciação da beleza ao amor, mas a um amor depurado, que só se alcança depois de se ter purificado das paixões da terra. 1 "' ' ,
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* A questão do paganismo do Renascimento exige, pois, nova análise, visto que, nessa época, imagens retiradas das fábulas antigas exprimiam, muitas vezes, lições que a Igreja estava longe de reprovar. Deste modo, o mesmo ensinamento podia ser traduzido para duas linguagens diferentes: a da Antiguidade greco-romana e a do cristianismo. Os seus contemporâneos - pelo menos aquele público instruído a que os artistas se dirigiam- faziam as comparações e transposições necessárias. É significativo que o Aretino tenha chamado ao S. Bartolomeu do Juízo Final de Miguel Ângelo «um Mársias sem pele». Comparava, decerto, a cena em que vemos o apóstolo esfolado, com a faca do martírio numa das mãos
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e os macabros despojos na outra, ao suplício de Mársias pintado por Rafael na Câmara da Assinatura. Ora o significado das duas obras é, efectivamente, o mesmo. Mársias, companheiro de Baco, que vai ser esfolado por um jovem efebo enquanto outro coroa Apolo, exprime a necessária dilaceração do homem carnal que deseja chegar à luz apo!ínea. Para alcançar essa pura claridade é preciso renunciar às paixões impuras e «esfolar o homem velho». Do mesmo modo S. Bartolomeu, que aceita o martírio, ressuscita forte, sereno e imortal no paraíso com o corpo terrestre reduzido a simples despojo. Das análises anteriores temos de concluir que a Europa do Renascimento se paganizou e descristianizou menos do que durante muito tempo se pensou. Clarq que uma sensualidade longamente contida pôde então exprimir-se em pleno dia e que uma corrente de pensamento «libertino», que mais tarde tomaria maior amplitude, estava já a esboçar-se. Não tocava, porém, ainda as massas; e só chegaria até elas muitos séculos depois. A sociedade europeia continuou profundamente cristã. Se a arte dava então um lugar considerável aos assuntos profanos, nem por isso diminuiu a produção de pinturas e esculturas religiosas. Mais: a época do Renascimento viu operar-se uma profunda e fecunda renovação da arte cristã. Além disso, essa época de costumes livres dedicou-se à reconstrução de muitas igrejas que ameaçavam ruir. A reconstrução de S. Pedro é apenas o exemplo mais conhecido da série. É igualmente· significativo que Roma tenha canonizado noventa pessoas que viveram entre 1400 e 1520. A intranquilidade religiosa que deu órigem às duas reformas - a protestante e a católica - é para nós o mais seguro testemunho sobre a fé ardente de uma época que, nos seus princípios, foi, sem dúvida, caracterizada por uma real anarquia no domínio das crenças mas, depois, ficou marcada pela nova disciplina e recristianização das massas de ambos os lados das fronteiras confessionais. Não se tem insistido bastante no facto de o Renascimento ter pensado de novo o cristianismo. E isso não apenas reformando as estruturas e clarificando a teologia mas também introduzindo no interior da civilização cristã valores até então olhados com desconfiança. A vida terrestre foi, assim, reabilitada e dai em diante o Ocidente fez sua a frase de Alberti: «As nossas almas regozijam-se por ver pintadas paisagens encantadoras, e portos, e pescas, e caçadas, e cenas de banho, e jogos de pastores e coisas floridas e cheias de folh~gens». O corpo humano, desprezado pela Idade Média, foi, pelo contrário, exaltado pela arte e pelo humanismo ·neoplatónicos. Pareceu aos homens do Renascimento «como a guarda avançada do. esplendor divino na natureza» (A. Chastel): nenhuma outra aparência sensível estava tão apta como ele a dar-nos a revelação da beleza~ Os artistas e os humanistas dos séculos XV e XVI pensaram, tal como Platão, Euclides e Vitrúvio, que «toda a medida deriva do corpo humano» e que neste, ' «graças aos segredos intrínsecos da natureza», «se encontram todas as espécies de proporções e propor-
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cionalidades». Admitiu-se, desde então, que o corpo humano resumia a harmonia do mundo e as igrejas não voltaram a levantar dificuldades à exaltação do nu na arte profana. Enquanto que, no século XI ou Xll, a maior parte da vida quot~ diana e, principalmente, da actividade cultural, era dominada pela rehgião esta aceitando daí em diante a crescente laicização da sociedade, deix~u de~envolver-se, a partir do Renascimento, um vasto sector neutro. Em 377 bibliotecas francesas de fins do século XV ou do século XVI, de que ternos dados, descobrimos que 105 pertenciam a eclesiásticos, mas que 126 pertenciam a fidalgos e que 66 pertenciam já a comerciantes. Em 1529, um rico mercador parisiense deixou, ao morrer, 170 volumes. Na mesma data um conselheiro do parlamento de Paris tinha 235. A análise da produçã~ impressa mostra, por outro lado, como crescia o número dos livros não religiosos. Em 1501 foram impressas em Paris 88 obras: 53 tinham carácter religioso e 25 eram edições de autores latinos e gregos ou trabalhos de humanistas. Em 1549, a produção foi de 332 obras, estando relacionadas 56 com a religião e 204 com a cultura humanista. Estas mudanças pareciam naturais até aos responsáveis das igrejas. A Reforma oriunda de Lutero, repudiando o rnonaquisrno e o celibato dos padres, contribuiu, mesmo fora dos países onde o protestantismo triunfou, para a vitória do negotium - a vida activa- sobre o otium a existência contemplativa, gabada pelos teólogos da Idade Média. Mas já havia muito que se punha em dúvida a superioridade da vida contemplativa. Wyclif declarou que o casamento era superior à virgindade e Coluccio Salutati escrevera: «Ocupar-se de assuntos honestos, honestamente, é são e será talvez mais santo que estar-se num local solitário numa beata rusticidade que só ao próprio serve». Um contemporâneo de Salutati, Guillaurne Saignet, futuro chanceler da Provença, dedicou a Martinho V um tratado contra o celibato dos padres. Nessa obra a Igreja era acusada de «parricídio contra a natureza», uma Igreja que «opõe as suas leis, que são leis das criaturas, às próprias leis do Criador, que instituiu o casamento cristão». A reabilitação do casamento e do «dever de Estado» foram, pois, na civilização do Renascimento, produto de urna mesma evolução combinada, decisiva, apesar de muito lenta na sua acção sobre a mentalidade das massas. A Reforma favoreceu esta evolução, e é importante que se recorde aqui que Calvino levantou à interdição de princípio que até então os teólogos tinham oposto ao empréstimo a juros. Mas como poderíamos esquecer o papel desempenhado pelos bancos junto do papado a partir. da época de Avinhão? E corno deixaríamos em silêncio que os principais «mercadores» do século XVI eram católicos? Toda urna corrente de pensamento medieval exaltara a pobreza. e enobrecera a mendicância. Mas no· século XVI um franciscano feito papa, Sisto V, tentou encerrar os mendigos de Roma num vasto hospício e obrigar os que fossem válidos a trabalhar. Num plano de maior generalidade, é significativo que o principal ágente da
renovação católica tenha sido urna ordem - a ordem dos jesuítas- que nem tinha claustros nem mendigava e que substituiu as mortificações do corpo pela ascese da obediência, esforçando-se por compreender e aceitar as novidades do seu tempo. Deste modo, na época em que escritores, artistas, navegadores, mercadores e chefes de estado criavam urna nova civilização, a religião não estava atrasada. O dinamismo do Ocidente foi também o dinamismo das suas Igrejas. Na idade do humanismo, o espírito crítico· desenvolveu-se de urna forma decisiva, mas, muitas vezes, a partir de autênticas exigências cristãs. O livre-exame, que tanto o luteranismo corno . o calvinismo Iriam dentro em breve repudiar, brotou, todavia, da fé ardente de Lutero e da crença deste na acção do Espírito Santo em cada cristão. Também o pôr em causa da Vulgata e a substituição dos seus contra-sensos por traduções mais exactas provinham do desejo, fundamentalmente cristão, de chegar a um mais estreito contacto e urna mais segura comunicação com o texto bíblico. Erasmo escrevia em 1515 a Dorpius: «Não há perigo de alguém se afastar subitamente de Cristo ao descobrir casualmente que se encontrou nos Livros santos urna passagem modificada por um copista ignorante ou cheio de sono ou dada com menor exactidão por não sei que tradutor». A mais profunda inspiração do Elogio da Loucura é, também, altamente cristã. Pois de facto esta obra, tão mordaz, apresenta-se, na conclusão, corno repetição da mensagem evangélica e paulina: a verdade está, muitas vezes, oculta para os grandes e os instruídos mas revela-se aos humildes e aos ignorantes. A sabedoria do mundo é louca e a loucura da cruz é sabedoria. «Não são, de todos os loucos, os mais extravagantes aqueles que o ardor da piedade cristã tornou por inteiro? Prodigalizam os seus bens, ignoram as injúrias, suportam a impostura, não distinguem os amigos dos inimgios... Como havemos de espantar-nos de que os Apóstolos tenham parecido ébrios de vinho doce e que o juiz tenha tornado S. Paulo por tonto?». Portanto, é necessário olhar para os bens, a glória e a sabedoria deste mundo com o olhar crítico da razão iluminada pela fé. Se o Renascimento se cornprouve tantas vezes no esoterisrno, se gostou de emblemas e de máscaras, também ao mesmo tempo, e não sem por vezes se contradizer, exaltou a «douta ignorância», cara a Nicolau de Cusa, daqueles que, na falta de ciência, têm a seu favor simplesmente a rectidão e a pureza de coração. Dai os. sábios discursos que D. Quixote por vezes faz; daí o lugar aos loucos na obra de Shakespeare. No Rei Lear, o verdadeiro louco é o soberano, que roeu o seu «bom senso de ambos os lados a ponto de nada ficar no meio», e o sábio é o bobo, um louco que não sabe mentir. O erro das Igrejas oficiais foi querer impedir, com o Index e com todos os tipos de inquisições, quer católicas quer protestantes, a irresistível ascensão do espírito crítico. Ao fazê-lo, tentaram inutilmente desfazer urna vaga que nascera, pelo menos em parte, nas profundezas do oceano cristão.
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Com efeito, o espírito crítico, na época do Renascimento, mani~ festou-se principalmente por um solene protesto, em nome do Evangelho, contra as taras da Igreja e contra a atitude de chefes. laicos ou eclesiásticos, que se proclamavam cristãos mas aplicavam muito mal os· preceitos de Jesus. Esse juízo lúcido, inspirado na mais autêntica caridade cristã, levou certos humanistas a apreoentar aos seus contemporâneos, espantados e incrédulos, uma e:oquente defesa da paz. Já na Utopia Thomas More repudiara toda e qualquer guerra que não fosse defensiva. Mas Erasmo, como há pouco demonstrou com tanta justeza J. C. Margolin, foi no seu tempo o maior arauto da não-violência. O Elogio da Loucura, os Colóquios, a Querella pacis (ou Lamento da Paz), a Instituição do Príncipe Cristão e o Projecto de Guerra contra os Turcos estão cheios de eloquentes páginas contra a guerra, contra todas as guerras. Também os Adágios contêm um significativo comentário ao provérbio Dulce bel/um inexpertis («a guerra é doce para os que a não fazem»): «Se entre os muitos assuntos de que se ocupa o homem um há que convém enfrentar com hesitação e que até se deva evitar, rodear pelas orações, rejeitar com todos os meios, esse é certamente o da guerra. Nada é mais ímpio, mais calamitoso, mais amplamente pernicioso, mais obstinadamente tenaz, em resumo, mais indigno do homem e, por maioria de razão, do cristão». Numa época em que Júlio II atacava Pico de Mirandola de elmo e armadura, em que o cardeal Schiner recrutava mercenários suíços para a Santa Liga e em que os escritos dos Padres da Igreja eram invocados para justificar a guerra, Erasmo pedia que se voltasse ao ensinamento de Jesus: «Alega-se que as leis pontificais não condenam todas as guerras; Agostinho aprova algumas e S. Bernardo louva certos soldados. A bem dizer, tanto Cristo como Pedro e Paulo ensinam sempre o contrário. Porque é que a sua autoridade será menos forte sobre nós que a de Agostinho ou a de Bernardo?». E aos que ainda falavam em cruzadas, Erasmo respondia: «Jesus pediu-nos que combatêssemos os nossos vícios e não os Turcos.» Mas reprovava ainda mais as guerras entre cristãos: «Para nós, que trazemos o nome de Cristo, que nunca nos ensinou, com o seu próprio exemplo, senão a bondade; para nós, que somos membros de um só corpo e uma só carne ... que aspiramos à comunhão suprema, que deve unir-nos a Cristo como ele próprio está unido ao Pai, poderá haver no mundo coisa de preço tão elevado que nos conduza a fazer guerra?» Esta veemente crítica da guerra em nome do Evangelho está também na obra de Rabelais, fiel discípulo de Erasmo. Quando as tropas de Picrócolo invadiram sem motivo válido as terras de Grandgousier, este exortou o general immigo nos seguintes termos: «Esta imitação dos antigos Hércules, Alexandre, Aníbal, Cipião, Cémr e outros que tais é contrária à,- profissão (de fé) do Evangelho, por meio do qual nos é mandado que cada um guarde, salve, governe e administre seu país e suas terras e não invadir hostilmente os dos outros; e aquilo que outrora os sarra-
cenos e os bárbaros chamavam proezas temos nós agora por banditismo e maldade )). Mensagem prematura que o tempo de Erasmo e de Rabelais não compreendeu mas que pequenos grupos anabaptistas conservaram e transmitiram aos séculos seguintes. A profissão de fé redigida .em 1527 em Schlatt por um desses grupos opunha a atitude do verdadeiro cristão à atitude da autoridade civil e concluía por um pacifismo radical: «0 governo secular actua em conformidade com a carne o cristão actua em conformidade com o espírito ... A luta e as armas do poder civil são carnais e são apenas contra a carne; as do cristão são espirituais e são contra as empresas dos demónios. Os homens deste mundo estão armados com o ferro, mas os cristãos estão armados com a armadura de Deus isto é, da verdade, da justiça, da fé e da palavra divina». Menno Simons: graças a quem o anabaptismo sobreviveu no século XVI nos Países Baixos, também repudiava a pena de morte e a guerra e exortava os seus discípulos a praticar a não-violência: «Os regenerados não vão à guerra e não combatem. São filhos da paz que transformaram as espadas em ferros de charrua, as lanças em foices e nada sabem de guerra». A consciência cristã não estava ainda suficientemente aguçada para se comover com o tráfico de Negros. Em contrapartida teve de enfrentar, por causa da descoberta da América, um problema novo, o da atitude que conviria adoptar perante os índios, e esta problemática contribuiu para criar a mentalidade moderna. De um lado, havia os partidários da atitude de dominação e de severidade para com os povos americanos; do outro, os que pretendiam considerar os índios como homens. Enciso, que devemos colocar entre os primeiros, escrevia em 1513: «É no seu pleno direito que o rei (de Espanha) pode enviar as suas gentes aos índios para exigir desses idólatras que lhe entreguem o seu território, visto que o recebeu do papa. Se os índios recusarem, poderá justamente combatê-los, matá-los e fazer dos cativos escravos exactamente como Josué pôs em servidão os habitantes de Canaã.» Afirmação singularmente pagã apesar do manto cristão com que se cobre. Pelo contrário, Paulo III declarou em 1537, segundo Las Casas: «Satã inspirou ... os seus satélites a proclamar que os índios do Oeste e do Sul, bem como outros povos recentemente descobertos, deviam ser tratados como pobres bestas criadas para servir-nos e eram incapazes de fazer-se cristãos. Nós.. . consideramos, todavia, que os índios são realmente homens, e não somente capazes de compreender a religião católica como, tanto quanto sabemos, extremamente desejosos de abraçá-Ia.>> As «Novas Leis» de 1542, promulgadas por Carlos V, fizeram-se eco das opiniões de Paulo III e constituem um dos mais nobres monumentos jurídicos do século XVI. Nelas se lê: «Doravante sob nenhum pretexto seja ele de guerra, de rebelião ou de resgate, poderá um índio ser feito escravo; é nosso desejo que os indígenas sejam tratados como aquilo que são, isto é, como vassalos da coroa de Castela.>> O papa e os reis de Espanha, na prática, foram mal obedecidos. No entanto, o problema
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do valor existencial do homem não cristão estava já definido, exactamente em consequência do Evangelho. Assim, o Renascimento foi, sem dúvida, mais pagão, mas igualmente mais cristão que o período que o precedera. Com o recuo dos tempos, não nos aparece ele como uma tentativa de nova reflexão sobre o cristianismo e de reconciliação da cidade terrestre com a cidade celeste? Graças ao regresso à Bíblia e ao regresso à Antiguidade, o Renascimento impeliu para diante a lenta e difícil descoberta da paz, da caridade e do homem.
CAPíTULO XV
DA FEITIÇARIA À CIÊNCIA
Apaixonado pela beleza, o Renascimento foi de uma dureza raramente igualada para com a mulher idosa. A Catin de Ronsard é uma «imagem desdourada». Tem os dentes «corroídos e negros», os cabelos «cinzentos», os «olhos remelosos» e o nariz «ranhoso». Sigogne assimila uma velha a uma «gralha negra»:
... respirante múmia Cuja anatomia se conhece A través do couro transparente E cujo corpo seco e descarnado Faria, numa botica, sábio Qualquer barbeiro (') ignorante r). · Na poesia satírica do século XVI e princípio do século XVII, a mulher ·de idade não só tem uma anatomia burlesca como, com a «boca desdentada», espalha «um odor infecto que faz espirrar os gatos» (Maynard). Parece mais velha que o Dilúvio e «fala mais antigo que Amadis». É já um esqueleto:
Retrato vivo da morte, retrato morto da vida, Carcaça descolorida, despojo do túmulo, Carcaça desenterrada debicada por um corvo ('). (Sigogae) (') Os barbeiros faziam então de cirurg10es. (N. do A.) (') No original: «( ... )respirande momie I Dont l'on congnoist l'anatomie I Au travers d'un cuir transparent I Bt dont le corps sec et étique I i Rendrait, dedans une boutique, I Savant un barbier ignorant.» (N. do T.) (') No original: «Portrait vif de la mort, portrait mort de la vie I I Charogne sans couleurs, dépouille du tombeau I Carcasse déterré, atteinte d'un corbeau.» (N. do T.)
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Como é que as velhas ainda ousam sonhar com o amor? A loucura de Erasmo troça delas, que «passam parte do dia em frente do espelho, procurando disfarçar por todos os meios os danos secretos que os anos fizeram à natureza. Ora mostram os · seios flácidos e repelentes ora procuram despertar vigor nos seus amantes com os latidos de uma voz tremebunda e desfeita». O espectáculo da decrepitude era tanto mais insuportável para os homens do Renascimento quanto mais eles descobriam, com novos olhos, a beleza do corpo feminino jovem, já desnudado pelos artistas. Daí, na sua pena, a frequente antítese que, na Antérotique de Du Bellay, opõe a fealdade repugnante de uma velha aos encantos de uma terna Vénus:
A sátira da velhice está ligada ao antifeminismo. Se, entre 1400 e 1650, foram queimadas tantas feiticeiras, foi porque se acreditava facilmente que a mulher era uma espécie de intermediário entre o homem e o diabo. Não fora essa a função de Eva no pecado original? Os autores de tratados sobre a feitiçaria * - Sprenger (fim do século XV) e Binsfeld (fim do século XVI)- diagnosticavam os sete motivos que impeliam a mulher para os ~ortilégios do Maligno: a sua credulidade, a sua curiosidade, a sua natureza, mais impressionável que a do homem, a sua maior maldade, a sua tendência para a vingança, a facilidade com que entra em desespero e, por fim, a tagarelice.
... Vê (ó velha e imunda, Velha, desonra deste mundo) Aquela que (se bem recordo) Aos quinze anos .mal chegou: Que até aos calcanhares deixa tombar Cabelos tão crespos e tão louros Que ao próprio sol causam vergonha (').
Promoção da mulher graças a pensadores cristãos (Erasmo, Calvino, etc.) e a humanistas marcados pelo neoplatonismo (Castiglione), mas também misoginia, herdada de tradições milenárias; nova exaltação do nu feminino mas repulsa pelo ser gasto, cuja beleza perdida se esquece, como se esquece quantas vezes deu à luz: estas contradições são o próprio tecido do Renascimento. Todas as épocas têm os seus contrastes, mas esta tem mais que as outras. Não. apresenta a unidade de cores nem a homogeneidade, pelo menos relativa, do século XVII. Por isso, não tentemos distinguir, com H . Haydn e E. Battisti, numa Europa em vias de renovação como a dos séculos XV e XVI, um «Renascimento» e um «Anti-Renascimento» que caminhassem a par, ten~o o segundo sido, segundo um, mais experimental e, segundo o outro, mais barroco que o primeiro. Digamos, em vez disso, que o Renascimento foi, ao mesmo tempo, razão e sem-razão, sombra e luz. Trouxe aos séculos seguintes uma imensa herança, na qual eles fizeram a sua escolha. O tempo de Savonarola e de Ariosto, de Santo Inácio e de Aretino, de Lutero e de Ticiano continua a espantar-nos com a violência das correntes contraditórias que nele se chocaram. Entusiasmou-se com a beleza mas deixou-nos uma extraordinária galeria de obras horríveis e malsãs. Pregou a paz mas dilacerou-se em guerras religiosas. Foi sorriso e ódio, delicadeza e grosseria, truculência e austeridade, audácia e medo. Comparável ao adolescente em que lutam fogosamente forças opostas. e que ainda não alcançou o equilíbrio, foi mais ambicioso que razoável, mais brilhante que profundo, mais tenso que eficaz. O Renascimento foi variedade, jogo de contrários, exploração ardente e, por vezes, apenas esboçada de um universo de novidades. A dialéctica do mistério e da clareza, da credulidade e do espírito crítico, da fantasia e do rigor, da vitalidade e do método é pois, nas mãos do historiador, o fio de Ariana que permite a este não se perder num labirinto onde encontra ora astrólogos ora sábios, ora condottieri ora santos, ora Vénus ora bruxas, e onde caminhos divergentes tanto conduzem ao parque de Bomarzo, cheio de «rostos horríveis, de elefantes,
Herdeira de Aristófanes, de Horácio, de Marcial e de Propércio, mas também da tradição medieval do retrato grotesco das velhas, a época do Renascimento insistiu nas alcoviteiras (a Celestina), nas cortesãs fanadas e, por força das circunstâncias, arrependidas (Jeux rustiques de Du Bellay), e, em especial, nas feiticeiras. A Catin de Ronsard vagueia Triste, pensativa e solitária Entre as cruzes do cemitério (").
e Du Bellay receia os malefícios da velha contra quem
e~..:reve;
Tu podes ensanguentar a lua Tu podes, à luz crepuscular, Tirar das sepulturas as sombfas E fazer força contra as leis da natureza (').
(') No original: «( ... ) Vois (ô vieille et immunde, I Vieille, déshonneur de ce monde) / Celle qui (si bien m'en souvient) I Sur l'an quin~ zieme à peine vient: I Qui envoye jusqu'aux talons I Des cheveux, sr crespes et blonds I Qu'ils font honte au beau solei! mesme.» (N. do T .) (') No original: «Triste, pensive et solitaire I Entre Ies croix du cimetiêre.» (N. do T.) (') No original: «Tu peux ensanglanter la !une I Tu peux tirer sous la nuit brune I Les ombres de leur sépulture I Et faire force à la nature.» (N. do T.)
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de leões, de bocas do inferno e de dragões», como a cidades e edifícios onde tudo é ordem e beleza. A tendência para a complicação atravessou todo o Renascimento, juntando a sobrecarga dos retábulos flamejantes e da decoração plateresca aos dourados ·do barroco, passando pela fachada de Pavia, pela moda dos «grotescos», pelo formigar de pormenores da obra gravada de Dürer e das muitas chaminés, torres e torreões de Chambord. A vontade de espantar e de assustar também se exprimiu ao longo de todo um período que vai da Duquesa Feia de Quentin Metsys até aos «caprichos» alegóricos de Arcimboldo *. A época de Alberti, de Bramante, de Rafael, de Philibert de L'Orme e de Palladio, que nos pode parecer tão apaixonada pela geometria e pela claridade, não estimou apenas «a ordem bem constituída>> e as proporções rigorosas. Foi não menos sensível à poética do informal e ao «amorfismo do sonho» ·(A. Chastel). Leonardo, que deixou pelo caminho tantos estudos inacabados, diluiu a paisagem na bruma dos longes. Miguel Ângelo deixou inacabados dois dos quatro Escravos destinados ao túmulo de Júlio II e a comovente Pietà Rondanini. Esses esboços simbolizavam, para ele e para os seus contemporâneos, o momento criador, aquele em que o artista, qual novo Deucalião, extrai o homem da pedra. Do inacabado ao esoterismo vai apenas um passo. Desde que · se orienta a pesquisa neste sentido, logo se descobre o grande lugar que o Renascimento deu ao esoterismo *. Pico de Mirando la proclamou bem alto que é preciso não ensinar tudo e que as mais altas verdades deviam ficar envolvidas no mistério. Também as portas dos templos egípcios eram guardadas por esfinges. O interesse por Pitágoras, pela Cabala, pelos Livros Herméticos proveio desta recusa do racional e deste apetite pelo inefável. Toda a escola ficiniana esteve persuadida de que Deus se exprimia por hieróglifos e de que os grandes iniciados da Antiguidade, a começar por Hermes Trismegista, tinham também encerrado em criptogramas as verdades essenciais: concepção aristocrática e, no fundo, radicalmente oposta à mensagem do Natal, que se dirigiu a pastores em primeiro lugar. Não só os filósofos, mas todas as pessoas cultas tiveram o gosto · das complicações iconográficas. Foi considerável o êxito das Hieroglífica, compostas por um obscuro alexandrino entre os séculos II e IV e descobertas em 1419 por um padre florentino. Inspiraram todo um capítulo do De re cedificatoria de Alberti, influenciaram a ilustração do Sonho de Polífilo e foram impressas em 1505 por Aldo Manuzio. Não bastando os hieróglifos do passado, foram inventados outros, novos - é o caso de Bramante, para Júlio II -, «povou-se com eles quadros, imprese e reversos de medalhas; foi-se até aos rebus com que se divertia o infatigável Leonardo» (A. Cha:stel). Houve curiosidade por charadas, acrósticos e versos retrógrados. Usou-se e abusou-se dos símbolos nas divisas alegóricas e nos . livros de emblemas* (imprese), e a moda da mitologia foi, ao mesmo tempo, a moda de um sistema simbólico: por convenção, Vénus
era o amor e Marte era a guerra. O simbolismo gera a ambiguidade: Um certo Renascimento -dito «maneirista»- entregou-se aos jogos de perspectivas pintadas, de portas falsas, falsos tectos, falsas colunas, varandas falsas . Apreciava os quadros «de duas entradas», as Metamorfoses de Ovídio, os bailes de másc.aras, esses falsos vivos que são os autômatos, as paisagens antropomórficas e as adivinhas dos «retratos compostos» de Arcimboldo. Estas predilecções convinham a um tempo que teve medo das bruxas e se divertiu com o ocultismo. Não são a astrologia e a alquimia «o símbolo feito eficaz» (J. Bousquet)? A arte do século XVI deixou-nos numerosas representações de astrólogos, alquimistas, magos e magas como a Circe de Dosso Dossi. Dürer, Manuel Deutsch e, principalmente, Baldung Grien representaram feiticeiras e cenas de sabbat. Dissemos atrás que Ronsard, Du Bellay e Sigogne não duvidavam da realidade da feitiçaria . Sannazzaro recorda, na sua «Prosa nona» da Arcádia, toda uma série de talismãs (a pedra que nos faz invisÍveis, o coração de toupeira, palpitante, que permite predizer o futuro, etc.) e, na «Prosa décima», as ~ncantações que provocam ou extinguem o amor. Conhecemos, por Aretino, que filtros davam as cortesãs romanas a seus amantes. Eram misturas de barrigas de recém-nascidos e pedaços de cadáveres com fluxo menstrual. A mais conhecida passagem das Memórias de Cellini é talvez aquela em que ele conta a cena de invocação de demónios em que participou, no Coliseu, com um padre siciliano «de espírito muito distinto e que era profundamente versado em letras gregas e latinas»: «0 padre -escreve ele --:- vestiu-se, no meio das ruínas do Coliseu; à maneira
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74. FEITICEIRAS COM CABEÇA DE ANIMAL. (Segundo U. Molitor, De Janiis et pitheonis mulieribus.)
Michelet e Burckhardt apresentaram o Renascimento como o tempo da renovação da ciência que se seguiu à noite da ldade Média. Esta tese
brilhante toi, depois, combatida. P. Duhem mostrou-nos em Leonardo um herdeiro da ciência medieval e relacionou a sua dinâmica com a do impetus dos escolásticos do século IV. Por seu lado L. Thorndyke afirmou que, por um lado, a ciência e a técnica e, por outro, o humanismo s
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75. DIABRURAS. (Segundo /. de Teramo, Das Buch Belial.)
76. CRIANÇA MONSTRUOSA. (Segundo A. Paré, Deux livres de chirurgie.)
dos antigos necromantes e pôs-se a desenhar no chão circunferências, com as mais belas cerimónias que se pode imaginar. Tinha trazido perfumes preciosos, drogas fétidas e fogo. Quando tudo ficou pronto, fez uma porta no círculo e nós entrámos pela sua mão ... começou finalmente com os ·esconjuras. Esta cerimónia durou mais de hora e meia. O Coliseu encheu-se de legiões de espíritos infernais.» Cellini tinha pedido aos demónios que o fizessem descobrir a amante, Angelica, que desaparecera de Roma. Assim lho prometeram. E, efectivamente, foi descobri-Ia em Nápoles exactamente um mês depois. Assim, a época que viu o desenvolvimento do espírito crítico foi, ao mesmo tempo, uma época de extraordinária credulidade. Jean Bodin, historiador de direito, economista, adversário dos dogmas religiosos, escreveu também uma desconcertante Demonomania dos Feiticeiros. Não digamos, portanto, que dois tipos de homens disputaram entre si a cena do Renascimento, aspirando uns ao racional e outros ao irracional. Os mesmos espíritos foram, muitas vezes, críticos e crédulos ao mesmo tempo. Cardano fez avançar a álgebra mas traçou o horóscopo de Jesus. Ambroise Paré • dedicou todo um capítulo do seu livro Dos Monstros à demonstração de que «os demónios vivem nas pedreiras».
que interpretou ou modificou com mais ambição que exactidão. O cristianismo abandonara -mas já vimos as reticências da «escola de Pádua» - a noção de um mundo não criado e eterno e substituía-a pelo dogma da criação. Mas; no resto, a . ciência do Renascimento conservou a teoria aristotélica dos quatro element0s ~terra, água, ar e fogo-, eles próprios em relação com as «qualidades elementares» -frio, húmido, seco e quente-, que se associavam aos pares para caracterizar cada um· deles. O universo e o homem explicavam-se, portanto, por meio destas quatro «qualidades» fundamentais. Distinguia-se quatro temperamentos, chamados, respectivamente, colérico, sanguíneo, linfático (ou fleumático) e melancólico. Resultavam eles da predominância no nosso organismo de um dos quatro humores essenciais. Os planetas, por sua vez, caracterizavam-se pela presença, em· cada um deles, de uma ou duas «qualidades elementares». Saturno era tido por frio e seco: daí a lentidão do seu movímento (a duração da sua revolução é a maior de todas). A Lua era dita húmida, etc. Mas a Idade Média, e, ainda mais, o Renascimento, faziam entrar no jogo da explicação dos movimentos planetários e da totalidade da existência uma quantidade de forças espirituais. Abaixo de Deus colocava-se uma alma do mundo, e Ficino afirmava a realidade de doze almas -ou «demónios» - dos elementos e dos planetas. A palavra «alma» era então susceptível de várias significações. Podia designar, como na filosofia dos neoplatónicos, um princípio de vida semimaterial ou, pelo contrário, a alma «intelectiva» do homem. Neste fazia-se muitas vezes distinção entre esta alma intelectiva e imortal e um spiritus, sede da imaginação, capaz de deixar o invólucro terrestre durante os sonhos, afectado pelos humores que no nosso corpo predominam, veículo do amor, da simpatia, das contaminações emotivas, uma parte do nosso ser essencialmente acessível à música e ao canto. Mas a penetração do material pelo espiritual não ficava por aqui. Dava-se importante lugar aos «espíritos ígneos, ou supra-aéreos, (aos) errantes do ar, fautores de prodígios e de borrascas, ' (aos) espíritos loucos que levam para o abismo o viajante perdido de noite, (aos) espíritos aquáticos, cujos clamores, levantando a tempestade, assustam Fr. Jean des Entomeures e, enfim, (à) turba infernal e subterrânea que é ofuscada pela luz do sol claro e se diverte a fazer partidas aos humanos» (P. Delaunay). Na concepção tradicional, a terra, assente no mundo sublunar, isto ·é, inferior, tinha o inferno nas entranhas. Os súbditos de Satã esgueiravam-se às vezes pelos respiradouros desse inferno para vir tentar, perturbar e torturar os pobres seres humanos. B. Palissy e Belon du Mans duvidavam da existência de gnomos, mas a crença nos «demónios das minas», que sopram o grisu, era geral. A época do Renascimento, portanto, contentou-se, de um modo geral, com quadros explicativos fornecidos por uma longa tradição antiga e medieval. Ora esta tradição assimilava a mitologia a um comentário figurado da física de Aristóteles. Neptuno era a alma do mar e Apolo
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a do sol. Tal ou tal fábula pagã, tal ou tal episódio mitológico tinham, pois, na realidade, um pano de fundo naturalista. Juno, castigada ~ suspensa entre o céu e a terra, era uma narrativa mística para dizer que ela era a deusa - a alma- do ar. Tocamos assim com o dedo na concepção «demoníaca» ou vitalista do mundo, que era a dos homens dos séculos XV e XVI. Atribuía-se aos astros e a todas as forças celestes um comportamento afectivo análogo ao do homem. Como qualquer pessoa que se sente feliz por voltar a casa e, cheia de ideias altruístas, se dispõe a ser prestável ao próximo, assim o astro que regressa ao ~eu «domicílio», ou seja, à constelação onde se encontrava no momento da criação, está também contente e envia então para a terra. raios benfazejos. «0 céu dos astrólogos reflecte, portanto, numa escala muito mais vasta · o mundo · humano com todas as suas paixões, vicissitudes, conflitos e' angústias. Os astros amam-se, odeiam-se, associam-se, combatem-se, perseguem-se, assediam-se e queimam-se reciprocamente» (E. Garin). A «natureza», «entidade re-exumada do pensamento antigo», é também. antropomorfizada. Natura naturata, intérprete do Todo-Poderoso, dá perenidade à ordem divina na criação. Diz Rabelais que ela deu à luz a beleza e a harmonia. Paracelso * crê que ela pôs o remédio junto ao mal, fazendo crescer em cada região do globo as plantas que combatem as doenças aí- vulgares. Ela multiplica as experiências no mundo mineral. Esboça na pedra as estrelas (astroites), os cérebros (cerebrites), as línguas (glossopetres). Belon du Mans recolhe nas margens de Suez uma pedra em que estão «naturalmente escritas algumas letras hebraicas». Cardano atribui às rochas uma alma vegetativa e todos nesta época crêem que os ratos nascem de trapos sujos. Mais ainda que a Idade Média, o Renascimento, especialmente pelo novo favor concedido ao neoplatonismo e às doutrinas esotéricas acentua o carácter de unidade viva do universo. O mundo é concebido como um tecido de correspondências secretas, de simpatias e aversões ocultas, como um jogo de espelhos que dão resposta uns aos outros, como um diálogo de estrela para estrela e entre as estrelas e o homem. Há assim uma relação entre as partes do corpo e os signos do zodíaco. «No indivíduo, cada víscera reage ao seu correspondente sideral. O coração é regido pelo Sol; o cérebro pela Lua; Saturno, que ·é frio, domina os atrabiliários ·e, como é seco, domina também os avarentos; a Lua, húmida, comanda a fisiologia feminina; Vénus incita os seus súbditos· à luxúria e Marte à valentia» (P. Delaunay). Pensa-se geralmente que as luas cheias e luas novas, bem como os eclipses do nosso satélite, provocam alterações no corpo humano e são prejudiciais aos doentes. Jacques Peletier ensina ·que a peste provém de uma conjunção de Saturno e Júpiter e a família, cujos danos, no século XVI, foram enormes, da de Saturno com Marte. «Pois -- escreve um médico em 1501 ~Saturno é causa da paixão do mal das pernas e outros membros. E Marte é causa da concepção ... Por isso digo que o efeito da dita conjunção é causa desta doença.»
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Sábios, artífices e camponeses juntam-se, assim, . na mesma crença no vitalismo difuso do universo. Considera-se as estações do ano e as lunações não apenas para os trabalhos do campo e a poda da vinha mas também para as sangrias, as purgas, os. banhos, o corte dos cabelos e da barba, visto que nada escapa ao olhar e à atenção das. estrelas. «Da entrada, da marcha e da saída destes VII planetas pelos XII signos - assevera Barthelémy 1' Anglais- se dispõe a geração e a corrupção e tudo o que por natureza se faz cá em baixo sob o céu». Como esquecer, também, que os planetas governam o mundo dos metais? Cada uin deles afecta um metal específico: o Sol, o ouro; Saturno, o chumbo; Mercúrio, o mercúrio, etc. Não é impunemente que se arrelia um astro, e precioso é o conselho de quem lhes conhece os segredos. Há quem venha consultar Ficino sobre a data mais propícia para dar início aos trabalhos do palácio Strozzi. Júlio li, Leão X e Paulo III preocupam-se com a posição dos planetas antes de marcar a data da coroação, da entrada numa cidade ou do início de um consistório. Luísa de Sabóia, mãe de Francisco I, toma como astrólogo Cornelius Agrippa, o mais célebre mago da época; e Catarina de Medieis ouve Nostradamus. Conhecido o jogo das estrelas, o homem consegue escutar a linguagem de Deus através da natureza e pode agir sobre esta. Daí o elogio do homem-mago, entoado em coro por Ficino e Pico de Mirandola. Claro que houve também uma «magia diabólica», que fazia o homem escravo das «potências do mal». O Renascimento acreditou profundamente na realidade dos pactos com o diabo e na existência dos doutores . Fausto. Mas todos aqueles que se referem aos grandes iniciados exaltam uma mqgia completamente diferente. Nessa época, escreve Ficino, «o nome de mago, favoravelmente acolhido pelo Evangelho, nada tem de pernicioso nem de maléfico; designa um sábio e um sacerdote». «Fazer surgir - escreve Pico - dos seus esconderijos para a plena luz as forças espalhadas e disseminadas no mundo pela benfeitoria de Deus (a verdadeira magia) não faz milagres, antes serve com assiduidade a natureza que os realiza.» «Sacúdote e intérprete da natureza», o mago perscruta aquela harmonia do universo a que os Gregos chamavam sumpatheia; possui a fundo o conhecimento das relações entre os elementos; aplica a cada coisa o encantamento que lhe convém e que mais adequado pareça. Assim, o Renascimento amplificou a confusão, herdada da Idade Média, entre a matéria e o espírito. Num universo totalmente vitalizado, no fundo nada é matéria. Ora não se vê diferença de natureza entre a causalidade material e a eficácia das forças espirituais. É-se impr~ssio nado pela imensidão do domínio oferecido à magia, mas vê-se mal com que meios práticos conseguirá ela dominar a natureza. Neste universo em que tudo é «simpatia» e correspondências, em que poderá consistir «O conhecimento das relações entre os elementos naturais» tão louvado por Pico de Mirandola? Qual é a receita para se aplicar «a cada coisa os seus encantamentos naturais»? Que «encantações» abrirão ao sacerdote
do saber a porta do local onde estão escondidos os segredo~ do mundo? O contraste é evidente, e o desfasamento enorme, entre as ambições da magia e os meios de que ela dispõe ou pensa dispor. De .tal programa não podia sair a ciência moderna. Ser-lhe~ia preciso separar as forças espirituais das forças materiais, fazer-se mais humilde, abandonar as ambições cósmicas para se dedicar ao estudo paciente, concreto e preciso de fenómenos tão correntes como a queda dos corpos, aprender a considerar o número como instrumento de medida e não como a chave de ouro de um mundo misterioso. Mas o humanismo, se de certo modo atrasou o advento da ciência moderna, também noutros aspectos favoreceu o seu avanço. Estas duas afirmações podem parecer contraditórias e, em certa medida, são-no. É, porém, próprio da vida ligar paradoxalmente os contrários. E, do mesmo modo, o verdadeiro e o falso estavam ainda misturados um com o outro no espírito dos maiores sábios que realizaram a passagem do Renascimento à época clássica. Kepler mergulhava na mística dos números, cria na harmonia musical do universo e privilegiava os cinco sólidos regulares platónicos: o cubo, o tetraedro, o octaedro, o dodecaedro e o icosaedro. Para ele, as órbitas planetárias correspondiam a estes cinco sólidos: cada órbita se inscrevia no sólido em que a órbita seguinte estava circunscrita. Quanto a Galileu, rejeitou as órbitas elípticas calculadas por Kepler e manteve-se agarrado à circularidade das revoluções planetárias. Na verdade, foi a história que separou da ganga as grandes descobertas . de Copérnico, de Kepler e d~ · Galileu.
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* O facto de ter havido uma relação estreita entre o humanismo e a ciência é provado, primeiramente, por a Itália ter sido, nos séculos XV e XVI, em ambos estes dois domínios da cultura, a escola da Europa. Foi ela que deu os mais eminentes matemáticos, de Luca Pacioli a Bombelli, passando por Tartaglia. e Cardano, o principal físico, Benedetti •, o primeiro grande anatomista, Leonardo da Vinci, o precursor da epidemiologia racional, Fracastoro, que redigiu (em verso) um importante tratado sobre a sífilis. Foi ela que abriu os primeiros jardins botânicos. Copérnico era polaco, mas esteve por duas vezes na :península, passou perto de três anos em Bolonha e ensinou matemática em Roma. Vesálio •, o mais célebre anatomista do Renascimento depois de Leonardo, era belga, mas foi professor em Pádua, em Bolonha e em Pisa e foi em Itália que preparou a sua grande ohra De humani rorporis fabrica (1543). Enfim, foi a Itália que engendrou Galileu. Do mesmo modo, os centros de difusão do humanismo italiano, Florença, Urbino, Milão, etc., foram igualmente lugares privilegiados onde progredia a pesquisa técnica e científica. A este respeito é significativo o quadro de Jacopo de' Barbari (museu de Capodimonte, Nápoles) que nos mostra Luca Pacioli com o seu iovem aluno, o príncipe Guidobaldo de Urbino. Vê-se ao alto, à
esquerda, um poliedro semi-regular e, na mesa, um dodecaedro regular e vários instrumentos matemáticos. Fora de Itália, vê-se também que as cidades mais profundamente ganhas para a cultura nova foram, .ao mesmo tempo, aquelas onde a ciência teve avanços mais notáveis. Pensamos em Cracóvia, onde Copérnico foi estudante, e onde era preponderante a influência italiana. Era, no fim do século XVI a única cidade europeia, juntamente com Bolonha, a manter uma cadeira exclusivamente dedicada à matemática •. Pensamos também em Nuremberga, centro de estudos helénicos, matemáticos e cartográficos. Os mesmos homens trabalhavam nestes diversos sectores, encorajados por um burguês mecenas, W. Pirckheimer, que comprou os manuscritos de Regiomontano e assim os salvou para a posteridade. Matemático e helenista, tradutor de Ptolomeu, Regiomontanus foi o primeiro a tratar a trigonometria como capítulo indepertdente da ciência, e os seus estudos trigonométricos foram preciosos para os cálculos astronómicos posteriores. Ao círculo de Pirckheimer se ligam também dois outros espíritos de grande classe: J. Werner e A. Dürer. O primeiro, geógrafo e cartógrafo, é conhecido principalmente pela sua obra matemática. Fez o primeiro estudo das cónicas no Ocidente e indicou, ainda, um método trigonométrico para substituir multiplicações por adições e subtracções. Esse método foi utilizado por Tycho Brahé • e pelos seus ·colaboradores e prestava serviços análogos aos que hoje são prestados pelas tábuas de logaritmos. Quanto a Dürer, publicou em 1525 uma Instrução para as Medições com Compasso e Régua, dirigida essencialmente aos pintores, arquitectos e artífices, que se propunha ensinar a desenhar figuras geométricas. Aí tratava, designadamente, das espirais e outras curvas complicadas, da construção dos polígonos regulares e da perspectiva. Muitas indicações de importância desigual poderiam ainda ser acrescentadas a este processo; elas provam, em sectores diversos, uma feliz aliança entre o humanismo e a ciência. O primeiro humanista alemão, Nicolau de Cusa, abriu caminho a Copérnico, a Giordano. Bruno e a Galileu. Rabelais foi inovador na cirurgia: inventou - ou reinventou aparelhos para a redução das fracturas do fémur e para o desbridamento da hérnia estrangulada. Como, por outro lado, não haveríamos de acentuar que os pintores e os gravadores contribuíram imenso, com os seus exactos desenhos, para melhor dar a conhecer o homem, as plantas e os animais? Dürer foi um notável animalista. O seu mais célebre desenho de um animal -datado de 1515- representa o rinoceronte que o rei de Portugal oferecera a Leão X. Finalmente, um impressor culto - e notavelmente apetrechado- da segunda metade do século XVI, Plantin, desempenhou, graças às obras saídas dos seus prelos, um papel de capital importância para o desenvolvimento da botânica. Somos, assim, levados a tirar conclusões matizadas: o humanismo e a ciência nem sempre se 134
afastaram um do outro. Em certos domínios, o humanismo foi cientificamente fecundo; noutros, não. Convém retomar aqui a demonstração do capítulo III: o Renascimento foi mais livre com respeito à Antiguidade do que muitas vezes se julga. O químico Paracelso, nomeado professor de medicina * em Basileia em 1526, atacou violentamente a terapêutica tradicional e queimou em público as obras de Galeno. Também Vesálio, na sua grande obra De humani corporis fabrica, criticou vivamente a ciência dos Antigos. Antes deles, Nicolau de Cusa, ao insistir na relatividade de todos os conhecimentos humanos, escrevera: «Se nos admiramos de ver que as regras enunciadas pelos Antigos não concordam com as posições reais dos astros como aparecem à observação, é porque julgamos que as suas doutrinas eram verdadeiras a respeito dos astros, dos pólos e das medições». Claro que nem sempre os humanistas raciocinaram como Nicolau de Cusa e que o excessivo respeito pelos Antigos travou ·mais de uma vez o progresso da ciência. Mas, em contrapartida, o Renascimento, dando dos textos científicos da Antiguidade lições mais correctas e mais .completas que aquelas que até então eram conhecidas, e difundindo esses textos por meio da imprensa, contribuiu seguramente para o desenvolvimento do interesse pelas matérias contidas nesses livros. Além disso, os tradutores de obras científicas antigas foram, por vezes, ao mesmo tempo, inovadores, especialmente no domínio da matemática. Finalmente, · o melhor conhecimento da ciência grega permitiu opor os Antigos uns. aos outros e garantir a derrota de Aristóteles. Os impressores e os humanistas difundiram, é facto, as obras científicas de Aristóteles, a Cosmografia de Ptolomeu, os tratados e os Aforismos de Hipócrates- trabalhos que tinham tido a sua validade mas que já não podiam fazer avançar a ciência. Mas publicaram também textos cujos autores, ou, pelo menos, cujo conteúdo tinha sido esquecido. Vale a pena assinalar aqui o êxito obtido pela obra de Euclides, que foi , entre 1505 e 1574, editada dez vezes em latim (uma das edições por obra de Lefevre d'Étaples), uma vez em grego, duas em italiano, uma em francês e uma em inglês. O século XVI descobriu, praticamente, a Aritmética de Diofanto, matemático da escola de Alexandria (325-410). Esta obra foi traduzida, designadamente, para italiano por Bombelli, o melhor algebrista do Renascimento. A obra de Diofanto serviu a Bombelli como que de catalisador. Marcou também o flamengo Stevin e o francês Viete, dois matemáticos da segunda metade do século XVI. O novo interesse prestado a Arquimedes foi também altamente positivo. Uma edição parcial de Arquimedes veio a lume em 1503; e, em 1543, houve outra, devida a Tartaglia. Duas traduções latinas completas apareceram em: 1544 e 1572, esta última devida a Commandino (1505-1590),: médico e matemático do duque de Urbino. Ora um físico como Benedetti (1530-1590), que exerceu uma grande . influência sobre Galileu, opôs Arquimedes a Aristóteles, rejeitando a física qualitafiva e empi·
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rista deste para tentar construir, com base na estática de Arquimedes, uma física ou, para usar as suas próprias palavras, >. Assim, o vitalismo confuso e excessivamente ;tmbicioso da filosofia humanista mais autêntica r.em sempre afastou os · 'homens da verdadeira ciência.
preciso, em todo o caso, recordar em que domínios a ciência progrediu na época do Renascimento. As descobertas geográficas e as explorações começaram por fazer aumentar de modo muito importante o inventário do mundo vivo, tanto na zoologia como na botânica. Os sábios daquele tempo. seguramente, não romperam brutalmente com as crença~ medievais. O licorne, cujo chifre possuiria virtudes maravilhosas, e o basilisco, de olhar mortal, que viveria nos desertos africanos, são acreditado~· por compiladores sérios. Paracelso, cuja imaginação não carecia de fantasia; desenvolveu a teoria da signatura plantarum, que postula analogias de forma entre os vegetais e os órgãos humanos que, diz-se. podem curar: assim, o lilás, que tem folhas cordiformes, curaria as cardiopatia~ Por outro lado, é Verdade, conforme o esquema que temos estado descrever, que os progressos foram realizados a partir das obras antigas mais bem conhecidas e difundidas pela imprensa. A História Natural de Plínio, impressa logo em 1469, foi reeditada dezoito vezes no século XV e cinquenta vezes no século XVI. Mas o estudo dos livros de Aristóteles, · de Teofrasto e de Plínio, suscitando nova curiosidade pela fauna e pela flora, favoreceu o despertar da zoologia e da botânica. Este avanço foi também facilitado pelos progressos da gravura em madeira e em cobre.
Não só se conheceu melhor os animais e as plantas da Europa temperada como também se teve interesse nos do Norte e do Próximo Oriente. Descreveu-se a Cosmografia do Le1·ante e as Singularitez de la Francc antarctique, as girafas e os Jlipopótamos do Egipto, os lamas dos Andes, as goiabeiras e os cacaueiros das índias Ocidentais. O francês Nicot e o italiano Benzoni deram a conhecer aos Europeus o tabaco e Charlcs de, Lécluse (1526-1609) foi quem no Velho Mundo primeiro cultivou tubérculos de batata trazidos da América em 1555. Lécluse anotou e representou com figuras, nas suas obras, uns 1585 vegetais. Gaspard Bauhin (15)0-1624). de Basilcia, estudou 6000 plantas nas obras que publicou em princípios do século XVII. Em meados do século XVIII, Lineu utilizava ainda a Planrarum seu stirpium historia de Mathias de Lobel, de Lille, publicada em 1576. Uma nova edição (1581), de Plantin, continha uma tradução para francês, um índice em sete línguas, um álbum com 2491 desenhos e a indicação de todas as citações anteriores relativas às diversas espécies. O inventário do mundo vivo vinha, evidentemente, acompanhado pelo alargamento e melhoramento dos conhecimentos geográficos. A descoberta do Novo Mundo não podia deixar de fazer com que a geografia desse um decisivo passo em frente . A Cosmographia universalis de Sebastian Münster, publicada em Basileia em . 1544, marca uma data importante. Teve 46 edições em seis línguas nos cem anos seguintes. Continha 26 mapas e 471 gravuras em madeira. O autor corrigia posições inexactas e apresentava ideias novas acerca da erosão, dos abalos de terra, dos ·ventos tropicais e das correntes marítimas. A Cosmographia de Münster foi seguida dos atlas de Ortelius e de Mercator, que surgiram no fim do século. O público culto já se interessava pela geografia. Antes de 1550, só 83 obras de geografia tinham sido publicadas em francês. Mas entre 1551 e 1560 foram impressas 48; entre 1561 e 1580, 70; entre 1581 e 1590, 76; entre 1591 e 1600, 54 (diminuição provocada, sem dúvida, pelas guerras religiosas); e, entre 1601 e 1610, 112. Os progressos da química* e da física foram menores que os da zoologia, da botânica e da geografia: o que não significa que tenham sido pequenos. As fórmulas de um químico - e astrólogo- do século XVI, Paracelso, figuraram nos livros da especialidade até à época de Lavoisier. Podemos considerar duas secções na química do Renascimento. Uma assemelha-se ao trabalho artesanal -de ourives, douradores, tintureiros e metalúrgicos- e já no século XVI possuía um certo número de receitas. A outra - a alquimia - perseguia uma velha quimera: transformar os metais vis em ouro, sendo agente dessa transmutação a «pedra filosofai». Artesãos e alquimistas procuraram integrar os seus conhecimentos sobre a matéria num único corpo doutrinai: utilizavam a linguagem esotérica do seu tempo, baseavam-se no sistema das correspondências entre as estrelas e os metais, aceite nessa altura pelos melhores espíritos cultos, e continuavam, na maior parte dos casos, a
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* É
fundamentar-se na velha teoria aristotélica dos quatro elementos incorruptíveis. Paracelso, porém, rejeitou os elementos, embora conservasse as «qualidades elementares» (frio, seco, quente e húmido) e lhes agregasse uma misteriosa «quintessência». Além disso, aceitava cinco «princípios» : o mercúrio, o enxofre, o sal, a «fleumr.» (uma espécie de humor aquoso) e o caput mortuum (resíduo da destilação alcoólica). Dizia que os «princípios>> eram formados pela união, em proporções diversas, das qualidades elementares: no mercúrio dominava a humidade, no enxofre o calor, etc. Esta complicada teoria conservava-se na linha das pseudo-explicações gerais tão estimada naquela época. Como todos os químicos dO seu tempo - e assim seria até Lavoisier-, Paracelso dava lugar de honra aos metais . .Ora nesse tempo eram conhecidos sete metais, que se pensava corresponderem aos sete planetas. O ·metal perfeito era o ouro. Vinham depois dele a prata, o !erro, o mercúrio, o estanho, o cobre e o chumbo. Paracelso julgava, como todos os seus contemporâneos, que os metais, com o tempo, se transformavam em ouro nas entranhas da terra. Mas -inovação importante- renunciou à esperança de acelerar essa evolução. Abandonou a pretensão fundamental dos alquimistas de realizar a «grande obra». A química e a metalurgia tinham de contentar-se com utilizar os metais tal como se nos apresentam ao ser extraídos das minas. Além disso, e por não ligar à ciência dos Antigos, Paracelso pôs o acento tônico na experiência e abriu, com isto, um fecundo caminho. Este químico, que era também médico, também procurou curar por meio de remédios em que entravam metais e compostos minerais. Utilizando medicamentos compostos com substâncias extraídas do mundo mineral, facilitou o desenvolvimento da quimioterapia. Portanto, Paracelso tem para nós a própria complexidade do Renascimento, cujas fraquezas, excessivas ambições e intuições geniais encarnou. Era um iluminado, um charlatão -pretendia ter composto um elixir de eterna juventude e ter fabricado o .homunculus- ou um precursor? Na realidade, foi tudo isso ao mesmo tempo ..
que existiam uma leveza e uma gravidade absolutas. Por esse motivo, dizia, os objectos caetn tanto mais depressa quanto mais pesam. Outro postulado da física aristotélica estabelecia uma diferença de natureza entre o movimento natural - o movimento de uma pedra que cai - e o movimento violento de um projéctil. Quanto a este, imaginava-se no fim do século XV que seguia uma trajectória rectilfnea no tiro horizontal e uma trajectória angular nos outros casos. Mas, já no século XIV, alguns escolásticos de Paris e de Oxford tinham feito certas objecções à física de Aristóteles. Este asseverara que, quando um objecto se desloca, isso se deve à existência de uma força motriz que mantém o movimento ao longo de toda a trajectória. Buridan (1300-1358) perguntou então: «Quando se dispara uma flecha, que força a impele durante o percurso?» e os aristotélicos respondiam: «0 ar, sacudido pelo arco.» Buridan achou mais simples admitir-se que era o arco que comunicava à flecha uma certa provisão de energia, provisão tanto maior quanto mais pesada fosse a flecha. Era a doutrina do impetus, admitida por Leonardo e ainda por Galileu no princípio da sua carreira. A revolução que afastou os principais erros que faziam atrasar-se a física só se deu no· século XVII. Mas o Renascimento · preparou· o terreno para a ciência de Galileu, de Descartes e de Newton. Leonardo da Vinci, ao contrário do que julgaram os historiadores que modernizaram excessivamente o seu pensamento, não descobriu o princípio da inércia nem a lei da queda dos graves. Entreviu, porém, a possibilidade das trajectórias curvilíneas. Aproximou-se, especialmente, da descoberta do princípio da igualdade da acção e da reacção no caso da percussão. Observou que, se um corpo chocar com um plano sob um ângulo qualquér, fará ricochete, sendo «o ângulo de r.ichochete ... igual ao ângulo de 'percussão». Subentendeu com isso o princípio da conservação da quantidade de movimento. A obra de Leonardo no campo da física parece ter sido ignorada pelo século XVI. De qualquer modo, não exerceu influência apreciável nessa época. Sucedeu, um pouco, o mesmo
* Em larga medida, o Renascimento foi uma revolta contra Aristóteles. Isso já foi dito a respeito do neoplatonismo, e a afirmação vale também quanto a Lutero. Apesar disso, os melhores espíritos tiveram dificuldade em separar-se da bagagem de ideias aristotélicas. A história da física * fornece-nos uma prova disso, embora neste domínio tenham sido feitos progressos sensíveis na época do humanismo. Para Aristóteles, a natureza tem horror ao vácuo. O filósofo tinha, certamente, reparado · no facto de um corpo que cai ir cada vez mais depressa. Mas isso sucedia, pensava ele, porque cada corpo móvel chega o mais depressa possível ao seu «lugar natural», e o lugar natural dos corpos pesados era em baixo, sendo em cima o dos corpos leves. Aristóteles afirmava
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77. CÃMARA ESCURA.
(Segundo G. B. Della Porta,
Magia naturalis.) Leonardo da Vinci, Cardano e Giovanni Battista Della Porta verificaram, segundo Arquimedes, que, fazendo-se um pequeno orifício na parede de um quarto escuro, as imagens de objectos exteriores fortemente iluminado~ aparecem, invertidas, na paredf oposta.
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a
78-79. PROGRESSOS DA BALíSTICA . (Segundo ·V. Eco e G. B. Zorzoli, Histoire illustrée des invcntions.)
Foi Tartaglia quem descobriu que, para dar a um canhão o seu máximo alcance, é necessário apontá-lo a 45• sobre a linha do horizonte (78). Tartaglia compreendeu, portanto, · que a força impri-
mida ao 'projéctil e a força da gravidade se compõem e lhe impõem um movimento parabólico (79), ou seja, uma trajectória desprovida de segmentos rectilíneos.
generalizar esta pendentemente dos seus pesos. Galileu vma depois proposição, estendendo-a a iodos os corpos, e a abandonar ainda a teoria do impetus, que Benedetti conservava. Quanto a Stevin, o «Arquimedes do século XVI», . foi também um físico inovador. Ao estudar o equilíbrio de um corpo num plano inclinado, estabeleceu como princípio da mecânica a impossibilidade do movimento perpétuo. Além disso, foi o primeiro, depois de Arquimedes, a fazer avançar a hidrostática. Examinando dois vasos çomunicantes - dois corpos de bomba com diâmetros na relação de 1 : 10-, concluiu que era necessário um peso de água de dez libras no cilindro maior para equilibrar uma só libra no menor. Daí demonstrou que a pressão da água no fundo de um vaso não depende da forma deste nem do volume de líquido nele contido, mas apenas da sua altura. Assim, um fluido pode exercer uma pressão muitas vezes maior que o seu peso. Continuando com os seus trabalhos, Stevin foi também quem primeiro calculou o valor da pressão exercida por um líquido nas paredes do recipiente que o contém. A despeito destes notáveis trabalhos, Stevin, que também era engenheiro, celebrizou-se no seu tempo por outros motivos: construiu para Maurício de Nassau, em 1600, um carro à vela que transportava vinte e oito pessoas a uma velocidade que nenhum cavalo podia igualar.
*
com obra de Tartaglia, que se compõe de dois livros de física bastante impOJ;tantes: a Nova scientia (1537) e, principalmente, os Quesiti e invenzioni diverse {1546). Até essa altura julgava-se que a bala atingia a velocidade máxima, não à saída do canhão, mas um pouco depois. Tartaglia foi o primeiro a repelir esta crença na aceleração inicial do projéctil. Abandonou o postulado de incompatibilidade entre movimentos naturais e movimentos violentos e demonstrou que a trajectória de uma bala não tinha segmento rectilíneo. Tartaglia não convenceu a maioria dos sábios do seu tempo. Foi, porém, professor de Benede"tti, que influenciou profundamente Galileu. Benedetti censurava Aristóteles por ter negado o movimento no vácuo, que o filósofo grego reputava absurdo porque, na ausência de resistência, se efectuaria, em sua opinião, com velocidade infinita. Benedetti provou, pelo contnhio, que a velocidade no vazio não devia aumentar indefinidamente. Rejeitou também as noções aristotélicas de gravidade e leveza absolutas. Declarou - afirmação fundamental- que todos os corpos têm peso mas são mais ou menos pesados que o meio em que se encontram. Fez ver, finalmente, apesar de uma tradição mais que milenária, que dois corpos de idêntica «homogeneidade» caem à mesma velocidade, inde-
Benedetti e Stevin prenunciam Galileu e . Descartes; ficaram, porém, «aquém da linha que separa a ciência do Renascimento da ctencia moderna» (A. Koyré). Benedetti, por exemplo, . partilhou com Aristóteles o mais grave erro deste a respeito do movimento- Aristóteles, e com ele, Benedetti, concebia o movimento como uma «mudança» e não como um «estado». Seja como for, ao pretender fundar a física em bases matemáticas, Benedetti apontava .o único caminho possível para o progresso da ciência, caminho que cento e cinquenta anos de meditações e progressos matemáticos tinham preparado. De facto, já Nicolau de Cusa tinha defendido, na sua principal obra, De docta ignorantia (1440), que só a . matemática permite ao homem alcançar a certeza e que é ela o fundamento da física. Teve ainda o mérito de afirmar o valor absoluto do princípio de continuidade e daí deduziu a identificação da circunferência com um polígono de uma infinidade de lados- identificação que viria a permitir, no século XVII, o aparecimento da «geometria dos indivisíveis». Já falámos do interesse dos humanistas alemães pela matemática: muitos deles foram discípulos de Nicolau de Cusa. Em especial, fizeram progredir a trigonometria. Dürer, que estudou as espirais, foi também um precursor da geometria descritiva de Monge. Um fervente luterano, amigo de Melanchton, Michael Stifel (morto em 1567), contribuiu para a simplificação da linguagem matemática com a iatrodução do· conceito de «expoente». Estudou também as relações entre as pro-
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a
senta as soluções da equação do terceiro grau atribuindo-as a del Ferro c a Tartaglia. Na realidade, Cardano alargou consideravelmente as descobertas dos seus antecessores. Embora se tenha recusado a considerar u~; números negativos como «verdadeiros», não hesitou em submetê-los ao cálculo. Provou, portanto, que a equação geral do terceiro grau admite soluções positivas, negativas e até imaginárias('). A Ars magna, que continha também um relato das pesquisas recentemente efectuadas por um jovem matemático, Ferrari, acerca da solução das equações do quarto grau, marcou uma data de capital importância na história da álgebra. . Bombelli continuou a percorrer o caminho traçado pelos seus antecessores. Deu a teoria das soluções imaginárias, aplicando às raízes quadradas dos. números negativos as regras já elaboradas para o cálculo das raízes dos números positivos. Também tratou com grande virtuosidade as equações do quarto grau, que classificou em 44 formas. Mas a álgebra, apesar dos progressos realizados em Itálüi. nos meados do século XVl ainda não era suficientemente abstracta e simbólica. Bombelli, por exem~ pio, encontrava, dificuldades porque não designava a incógnita por um ~fmbolo e não utilizava letras para representar as quantidades conhecidas. Não podia, portanto, escrever uma fórmula geritl. No fim do século XVI, o flamengo Stevin e o francês Viete trabalharam na simbolização . da álgebra, que lhe viria a permitir os grandes avanços do século XVII. Stevin trouxe duas inovações qtpitais no sentido da simplificação e da sistematização .da aritmética e da álgebra. Introduziu, de facto, o uso corrente das fracções decimiJ.is, já conhecidas antes dele mas pouco utilizadas por falta de um sistema de notação que permitisse operar com . 3451 elas como se opera com os números inteiros. Ora em vez de - -
gressões aritméticas e geométricas e foi o primeiro a prolongar a sucessão dos números no domínio negativo. No final do século XV e no século XVI, a Itália foi, com a Alemanha, o país mais aberto ao progresso matemático. Mas a Summa de arithmetica, geometria, proportioni et proportionalità de Luca Pacioli (1494) não representa uma inovação propriamente dita. É mais um «curso» completo, que dá o essencial dos conhecimentos aritméticos e geométricos da época. A outra obra de Pacioli, De divina proportione, também não nos traz uma contribuição verdadeiramente nova; mas reflecte as preocupações matemáticas dos artistas e filósofos humanistas. Inspirando-se num trabalho inédito de Piero della Francesca, estabelece a nobreza da «divina proporção» (grandeza dividida em média e extrema razão) sobre considerações extraídas de Platão· e da teologia cristã e encontra-a inscrita tanto na esfera do universo como no corpo humano. Leonardo, que adquirira a Summa de Pacioli logo que ela surgira, aí obteve, sem dúvida, o essencial dos seus conhecimentos matemáticos. Geómetra nato, Leonardo desprezou a álgebra. Mas, discípulo de Nicolau de Cusa, retomou as suas considerações infinitesimais e as suas passagens ao limite e fez estudos sobre a transformação de sólidos uns nos outros «sem diminuição nem acréscimo de matéria». A sua mais bela descoberta matemática é, porém, a do centro de gravidade da pirâmide. Também deixou nos seus cadernos de apontamentos muitas notas acerca das lúnulas, cujo aspecto estético o seduzia bastante, e demonstrou que a soma das lúnulas construídas sobre os lados de um triângulo rectângulo é rigorosamente igual à ·área desse triângulo. Apesar do prestígio ligado ao nome de Leonardo, foi fora dele que se deu em Itália o «arranque» que permitiu à ciência matemática ocidental chegar a um nível que nunca os Antigos ou os Árabes tinham alcançado. Esse progresso consistiu, primeiro, na descoberta da solução das equações dos terceiro e quarto graus. A história é célebre. No final do século XV, um professor de Bolonha, dei Ferro, encontrou a solução de uma forma particular da equação do terceiro grau mas não a publicou, limitando-se a confiá-la a alguns amigos em segredo. Em 1535, um destes amigos de dei Ferro desafiou Tartaglia para uma espécie de torneio algébrico .e pôs-lhe uma série de trinta problemas redutíveis à equação de del Ferro. Tartaglia resolveu os problemas e, além disso, generalizou a solução das equações do terceiro grau; rpas- novo mistério- também guardou segredo da descoperta. Entra então em cena Cardano, que prepara em 1538 um tratado de álgebra e pede a Tartaglia que lhe comunique a descoberta, prometendo publicá-la com o nome do autor. Tartaglia recusa e, no ano seguinte, Cardano publica a Practica arithmeticae generalis. É uma obra de hábil algebrista,· mas só resolve as equações do terceiro grau reduzindo-as ao segundo, e Cardano repete o pedido a Tartaglia, que acaba por comunicar-lhe o seu método em forma versificada. Em 1S45, Cardano publica a Ars magna, oride apre-
. (~).Contudo, a notfiÇ~o de Stevin estava ainda sobrecarregada, sendo simplificada por um Italiano, em 1592, tal como é indicada acima. (N. do A.) ·
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basta escrever 34,51 ('). No entanto, a notação de Stevin não era esta: era mnda bastante pesada para os efeitos práticos do cálculo, e só em 1592 foi simplificada por um italiano, tomando então a forma actual. Por outro lado, Stevin unificou a noção de número, admitindo como plenamente legítimo o número negativo. Pela primeira vez na história se declarou: «a subtracção de um número positivo é igual à adição de um número negativo>>. Stevin afirmou também que «qualquer raiz é um número», pois, até então, números comoy'You y'8eram tidos como «absurdos, irracionais, inexplicáveis». Estabelecendo assim uma distinção radical entre «absurdo» e «incomensurabilidade», Stevin abriu caminhos novos ao desenvolvimento da álgebra e da geometria analítica. (') A raiz quadrada de um número negativo diz-se «imaginária».
(N. do A.)
Quanto a Vit!te, ficou célebre no seu tempo por ter resolvido, em 1593, um problema que um matemático holandês propusera, em desafio, a toda a Europa e que envolvia uma equação do 45! grau. Viete compôs uma notável obra de trigonometria, o Canon mathematicus (1579), cuja impressão demorou oito anos. Inventou a aplicação da álgebra à geometria. Suspeitou da incomensurabilidade de 7T, que calculou com dez decimais, mas o seu maior mérito está em ter trazido, no In artem analyticam ísagoge (1591), um contributo decisivo para a simplificação e simbolização da álgebra, introduzindo nela o uso' sistemático de letras -vogais para as incógnitas e consoantes paraas quantidades dadas. Antes dele, a álgebra apresentava «exemplos>> e «regras» como as da gramática, mas não tinha «fórmulas». Yiete criou a possibilidade da «operação algébrica». Com ele, passa-se «do grau de abstracção do gramático ao do lógico puro» (A. Koyré). O século de Descartes podia começar.
80. O UNIVERSO DE ARISTóTELES E DE PTOLOMEU. (Segundo O. Finé, Théorique de la huitieme sphêre et sept ·planetes.)
No exterior, a esfera das estrelas fixas; no centro, o mundo sublunar, composto dos quatro elementos: fogo, ar, terra e água.
* Evolução decisiva na álgebra, revolução na astronomia. Ora é impossível separar o humanismo da astronomia . Ambos trabalharam junto? contra Aristóteles, que ensinava que o mundo, fechado e finito, estava todo contido na esfera envolvente das estrelas fixas e erà formado por duas partes fundamentalmente diferentes: o mundo celeste e o mundo sublunar. O mundo celeste era constituído por uma essência incorruptível. o éter, e os astros eram arrastados por esferas invisíveis, mas reais, que os faziam descrever eternamente, com movimento uniforme, trajectórias circulares. Ao contrário, o mundo sublunar era uma mistura instúvel de quatro elementos: terra, água, ar e fogo. Cabe a Nicolau de Cusa o imenso mérito de na sua famosa obra De docta ignorantia ter feito estoirar a presunçosa ciência dos aristotélicos. Recusou-se a crer num mundo fechado. e hierarquicamente ordenado e declarou que o universo, se não era infinito, era, pelo menos, ilimitado . e que «o seu centro está em toda a parte e a sua periferia em parte nenhuma». Por conseguinte, estava rejeitada a noção de uma Terra situada no local mais baixo do mundo por ser, nele, o corpo mais vil. Nicolau de Cusa proclamou a Terra como «estrela nobre». O humanista alemão foi incompreendido pelos do seu tempo, q1,1e. se entretinham a publicar as obras de Ptolomeu, mas é certa a influência por ele exercida sobre Leonardo da Vinci, que afirmou que a Lua era composta pelos mesmos elementos que ;:t terra: e isso parecia ser uma prova da nobreza desta. E também é provável que Leonardo tenl1a acreditado no movimento terrestre. É, porém, com Copérnico que começa a revolução científica moderna, qu.e virá a permitir a substituição do universo fechado e hierarquizado da Antiguidade e da Idade Média pelo rimndo infinito e homogêneo que hoje entendemos. Na dedicatória a Paulo JJI do seu De
revolutionibus orbium crelestium, Copérnico explica porque propõe uma nova teoria dos movimentos dos planetas. Notara- diz- os desacordos existentes entre os matemáticos e ficara chocado .com a multiplicidade dos sistemas astronómicos e com a sua comum incapacidade para explicar com exactidão os movimentos aparentes das estrelas. Procurou, assim, a maneira de preservar o movimento circular uniforme dos corpos celestes- ponto de partida erróneo que, todavia, iria conduzir a uma nova concepção do céu. Durante os séculos seguintes, muitos pontos da astronomia copernicana tiveram de ser abandonados. De facto, o sábio polaco manteve a esfera das estrelas fixas e os orbes cristalinos da cosmogonia medieval: os planetas estavam «engastados neles como as pedras preciosas numa jóia». Afirmando que a forma esférica é, geometricamente, a mais perfeita de todas e que ela podia ser, sem nenhum outro motor, causa natural do movimento, tomou para base da mecânica celeste o princípio do movimento circular uniforme. Um corpo redondo- planeta ou orbe-, colocado no espaço, roda automaticamente em volta de si próprio. Não trouxe à astronomia ptolomaica tantas simplificações como pensou, pois, conserv,a ndo os movimentos circulares, viu-se obrigado, «para salvar os fenóme~oS» e corresponder aos dados da observação, a fazer como Ptolomeu e combinar entre si esses movimentos circulares. Finalmente, se o sistema de Copérnico . é heliocêntrico, a sua astronomia não o é directamente. O centro das esferas planetárias não está, segundo ele, no Sol, mas à volta dele. Portanto, o Sol, astronomicamente falando, desem-
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81. SISTEMA DE COPÉRNJCO.
(Segundo o . De revoliltionibus orbium ccelestium.) Os sete planetas ·rodam agora em volta do· Sol mas o seu movimento, uniforme, é ainda considerado como circular.
não ao centro do mundo. Esta uniformização e esta sistematização do Cosmos são um ,1.,s mais importantes aspectos da revolução copernicana. Igualmente todo., os movimentos celestes eram sistematizados e explicados por uma única regra sendo a duração do percurso de cada planeta em redor do Sol função da distância que dele o separava. A obra de Copérnico foi rapidamente conhecida. O sábio polaco foi saudado com o título de >. Era um sol entre sóis, uma estrela entre as estrelas. Giordano Bruno, que não era físico nem matemático nem astrónomo, ultrapassava, .sem dúvida, as fronteiras da ciência e deslizava para o panteísmo, mas era um dos que estavam fazendo despedaçar-se o cosmos medieval, cujos limites fez recuar para muito longe. A natureza estava unificada e o espaço geometrizado. Vinte e três anos depois da morte de Giordano Bruno, Galileu enunciava a fórniula decisiva: «A natureza está escrita numa linguagem matemática».
penha um papel bastante apagado. É, porém, o grande dispensador de luz e vida em todo o universo. Em contrapartida, Copéinico deu resposta à velha objecçã,o contrá o movimento de rotação da Terra. Se a Terra se move- dizia-se vulgarmente-, os objectos atirados ao ar, ou lançados do alto de uma to rre, não devem cair no local onde foram atirados ou na base da torre; devem antes cair «mais atrás». Igualmente o · ar e as nuvens teriam também de ficar para trás, formando um permanente furacão que sopraria de oeste para leste. A isso Copérnico respondeu que o ar, as nuvens, as aves e todos os objectos são arrastados pelo próprio movimento da Terra. Sem conceber um espaço infinito, o sábio polaco postulou um universo muito mais vasto que o de Ptolomeu. Considerou que não só a Terra, mas o próprio orbe terrestre, era apenas «um ponto» em relação à esfera das estrelas fixas. Ampliou, assim, o . raio do universo pelo menos duas mil vezes. Copérnico viu na Terra, ainda com maior nitidez que ·Leonardo, um planeta como qualquer outro. ·Aristóteles e Ptolomeu invocavam, em favor da imobilidade da Terra, centro do mundo, a queda dos «graves» para baixo, para o «lugar natural>> de todos os corpos. Copérnico retorquiu que os graves não tendem para o centro do mundo e que a gravidade era apenas a tendência natural das partes de· um todo a reunir-se-lhe quando separadas dele. No nosso planeta, os graves procuram apenas, portanto, reunir-se ao seu «todo», que é a Terra. Partes da Lua que dela fossem separadas tenderiam, do mesmo modo, a reunir-se a ela
Procuremos então identificar as componentes de uma mentalidade que permitiu o nascimento da ciência. Uma delas foi a maior atenção -obediência- prestada ao concreto, o interesse pelo rosto, pela paisagem, pelas plantas, pela geografia. Outra foi o desejo de organizar e dominar o espaço. A partir do século XV, Veneza enviava as suas frotas mercantes em datas aproximadamente fixas: por volta de 15 de Fevereiro e de 15 de Agosto para o Levante, eni Março-Abril para a Barbária e para Aigues"Mortes e em Julho para a Flandres. Os navios voltavam da Síría e .do Egipto em Dezembro e Junho, da África do Norte e de
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Aigues-Mortes no fim do ano ou em Janeiro e os da Flandres em Maio ou Junho. O ritmo dos negócios de Veneza era totalmente comandado por este calendário, respeitado com grande empenho. Também os Espanhóis organizaram no século XVI o JllOVimento das suas frotas no Atlântico. A armada da Nova Espanha (México) partia de Cádis entre Março e Junho· a da Terra Firme (Nombre de Dios) partia entre Junho e Setembro. O ~egresso dava-se de Julho a Outubro do ano seguinte, a partir do ponto de encontro de Havana, onde ambas as frotas se reuniaffi: numa só. O ritmo de rotação dos comboios marítimos era, assim, em média, de catorze a quinze meses. A criação de serviços postais testemunha também esta preocupação dos homens do Renascimento pela ordenação do espaço e do tempo. No final do século XVI, Roma, que era a principal praça postal da época, recebia de Espanha todos os meses um correio ordinário; de Lyon, de dez em dez dias. A ligação com Veneza, Milão Génova, Florença e Nápoles era semanal e, com Bolonha, bi-semanal. À capital dos papas estava, normalmente, a 26 ou 28 dias do centro de Espanha, a 10 ou 12 de Lyon, a 8 de Milão, a 6 ou 7 de Génova, a 4 ou 5 de Veneza, a 3 ou 4 de Bolonha, de Florença e de Nápoles. Os homens do Renascimento não se contentaram com u medição do tempo por meio de relógios nem com o domínio dos mares e dos continentes por meio dos comboios e correios regulares. Não revelam as pesquisas dos artistas sobre a perspectiva uma vontade consciente d.e estruturar a visão do espaço? Em todos os domínios se procurou, assim, organizar. O Renascimento desenvolveu a burocracia, submeteu as cidades à geometria de plantas rigorosas, regulamentou a vida religiosa. As Ordenações Eclesiásticas adaptadas por Genebra em 1541 a pedido de Calvino, a multiplicação das congregações romanas sob Sisto V, que outra coisa provam a não ser a vontade de pôr fim ao anarquismo cristão? O século XVI foi, no domínio da fé, a grande época da clarificação doutrinária: clarificação nos catecismos e nas profissões de fé. Esse século deixou aos seguintes um modelo de meditação metódica, os Exercfcios Espirituais de Santo Inácio. Viu, ao mesmo tempo, o desenvolvim~nto do espírito de abstracção. Viu o triunfo da contabilidade por partidas dobradas; inventou os expoentes matemáticos; sujeitou ao cálculo os números negativos e os números imaginários; aprendeu a tratar as fracções decimais como tratava os números inteiros; criou a moderna álgebra simbólica.
*
moderna: experimentar e submeter ao cálculo os resultados da experiência; porque, dizia ele, «O Senhor tudo criou com conta, peso e medida». Propunha que se pesasse a terra, a água, o ar, os metais, que se medisse a profundidade do mar, a velocidade dos navios (ainda não fora inventado o loch), a humidade atmosférica, a temperatura, a força das balestras, o movimento dos corpos celestes, «a fim de que se possa chegar mais facilmente a muitas verdades que ainda desconhecemos». Já não havia apenas o número pitagórico, havia já a apreciação quantitativa dos fenómenos. Há uma segunda mensagem do Renascimento- mensagem largamente tributária do neoplatonismo - que o nosso tempo, que abandonou o ascetismo medieval e a austeridade . jansenista, compreende melhor que qualquer outra época: a saber, a convicção de que a beleza terrestre é boa constitui um reflexo de Deus. Miguel Ângelo exprimiu essa mensagem com muita força num dos seus poemas: «Meus olhos, apaixonados por coisas belas, e minha alma, apaixonada pela sua salvação, não têm outro meio para se elevar ao céu senão a contemplação de todas as belezas. Das mais altas estrelas desce um esplendor que para: elas atrai o nosso desejo: e é isso que cá em baixo se chama amor. E um coração nobre não tem mais nada que o cative, o inflame e o •.!onduza a não ser um rosto, que, a seus olhos, se lhes assemelhe». Uma terceira mensagem que o Renascimento continua a enviar-nos L a mensagem de Erasmo, o humanista simultaneamente respeitado e mcompreendido de quem tanto Lutero como Roma se afastaram, como ainda todos aqueles que não quiseram recordar que o mandamento da caridade constitui o essencial da boa nova. «Se eu não perdoar a meu irmão- escrevia Erasmo a Carondelet em 1523-, Deus não me perdoará... Não seremos condenados por ignorar se é único ou duplo o princípio do Espírito Santo; mas não evitaremos a danação se nos não esforçarmos por possuir os frutos do Espírito, que são o amor, a alegria, a paciência, a doçura, a fé, a modéstia, a continência. .. A essência da nossa religião está na paz e na concórdia: e só pode ser facilmente mantida sob condição de &,e definir um muito pequeno número de pontos dogmáticos, deixando a cada um a liberdade de formar o seu próprio juízo sobre a maior parte dos problemas. Matemática, beleza e caridade: as três condições do êxito dos empreendimentos humanos.
e
Les Houches, Natal de 1966.
A orientação para a matemática e para a ctencia quantitativa foi um dos maiores contributos do Renascimento para a criação da nossa civilização. Nicolau de Cusa compôs, em meados do século XV, um diálogo verdadeiramente profético sobre as «experiências ponderais» que, apesar de inevitáveis erros, delineava perfeitamente o programa da ciência
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14 9
QUADROS CRONOLÓGICOS
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualld••l
-
VIda intelectual, I tras e Ciências
1321
'"''
1324
1328
1331
1337
Eduardo III alia-se aos príncipes flamengos e rompe com Filipe VI. Luís da Baviera alia-se a Eduardo III contra Filipe VI.
1338
Revolta de Gand contra o conde da Flandres. Jaime Van Artevelde alia-se a Eduardo III.
1340
Batalha de L'Écluse. 1340-1375. Reinado de Valdemar IV da Dinamarca.
1343
Filipe VI adquire o Delfinado. Joana I sucede a Roberto de Nápoles.
1343-1344.
1324
Simone Martini: frescos do Palazzo publico de Siena.
I
1328
I
Estêvão Dusan chega a Salónica. Estêvão Dusan completa a conquista da Macedónia Ocidental.
Datas
1321
de Dante.
João XXII exc mufll ga e depõe Lul dl Baviera. Marsflio de Pádua : Dlt fensor pacis.
Morte de Carlos IV. Os barões franceses preferem Filipe VI a Eduardo III. Luís da Baviera em Roma: coroação laiCH do imperador.
1334
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
111 1- 1406.
11lutati.
Nascimento de Santa Catarina de Sienll,
1331
Col uccio
I fniversidade de Pa-
tl ~
condena o oca•nismo. 1117-1410. Jean Frois-
Giotto inicia a construção do camoaná· rio de Florença.
1334
Morte de Giotto. 1337-1340. A. Lorenzetti: O Bom e o Mau Governo.
1337.
llrt.
Os Otomanos chegam1 ao Bósforo.
1340-1382.
Groote.
Geert
1140-1400.
C'haucer.
Geoffrey
1340-1406. Claus Slu-
1338
1340
ter.
Falências dos Peruzzi e dos Acciaiuoli.
1343-1 3 4 6.
1343
~--~----~--- ------~-----------------~---------------.. ~~~------------~--------~----~--------------~~~ !5]
!53
Datas
História Política da Europa
1345
Revolta de Gand contra Jaime Van Artevelde , que morre. Estêvão Dusan anexa Valon·a e a Trácia Ocidental.
Economia-Sociedade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Datas
1345 1345-1438. Palácio dos Doges de Veneza.
1346
Batalha de Crécy.
Falência dos Bardi.
1347
Morte de Luís da Baviera. Cola di Rienzo, ditador em Roma, é obrigado a fugir por Bertrand de Dreux.
Os Genoveses criam a Mahona de Chio.
1348
Joana de Nápoles vende Avinhão a Clemente VI.
1348-1349. A Negra.
1349
Religião-Espiritualidado
Clemente VI depô Luís da Baviera.
Fundação da Univer· sidade de Praga.
1346 1347
Peste
Petrarca termina o Canzoniere. 134 8-1353. Boccacio compõe o l)ecameron.
Filipe VI adquire o Delfinado. 1 3 49-1387. Carlos o Mau , rei de Navarra.
Morte · de Guilherm de Occam. · Santa Brígida da Su6 cia instala-se em R m
1350
Morte de Filipe VI. João JI, o Bom.
Nascimento de S. VI cente Ferrer.
1354
Carlos IV imperador.
1356
João, o Bom, manda prender Carlos, o Mau. O Príncipe Negro invade Poitou. Batalha de Poitiers. Étienne Mareei: reunião dos Estados Gerais. «Bula de ouro» de Carlos IV.
1348 '
1349
. Nascimento de Pierre d'Ailly.
F . Traini: frescos do Triunfo da Morte no Campo Santo de Pisa.
Revolta geral da China do Sul contra a dinastia mongol.
1350
1354 1356-c.1450. Gemisthos Pléthon.
154
1356
155
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualldade
1357
Artes
Petrarca · começa os
A. Orcagna: retábulo Strozzi em Santa Maria Novena.
Trionfi.
1358
Étienne Mareei subleva Paris contra o delfim e alia-se aos «jacques», que são derrotados por Carlos o Mau. Étienne Mareei entrega Paris a Carlos, o Mau. · Revolta contra É. Mareei, que morre.
1359
Paz entre o delfim e Carlos, o Mau.
1360
Preliminares de Brétigny, tratado de Calais. Os «Routiers~ e) pedem resgate pelo papa.
Filipe, o Ousado, duque da Borgonha.
1364
Morte de João, o Bom. Carlos V. Carlos, o Mau, é derrotado .em Çocherel por Du Guesclin. Jean de Montfort derrota e mata Carlos de Blois em· Auray.
1365
Tratados de Avinhão e de Guérande.
Datas
1357
1358
Girard d'Orléans: Retrato de João , o Bom.
1359
1360
1362
Morte de Inocêncio VI. Urbano V.
1362 . Jean de Montfort conquista a Bretanha. A Hansa, aliada à Suécia e aos Teutões, declara guerra a Valdemar IV. 1363
Acontecimentos no resto do mundo
Vida in telcctual, Letras e Ciências
Instalação da «étape» das lãs em Calais.
1363-1429. Gerson.
13 6 3 -1431. de Pisan.
1363
Christine
1364
Fundação da Universidade de Cracóvia por Casimiro o Grande.
Andrea da Firenze: frescos da Capela dos Espanhóis em Santa Maria Novel-
Ia.
(') Routier- «que anda na estrada» - homem de guerra, pertencente aos bandos de sold aventureiros. (N. do T .)
157
1365
p
Datas
História Política da Europa
1366
Du Guesclin em Espanha com os «routiers». Henrique de Trastamara rei de Castela.
1366 ou 1376. Wyclif: Determinatio qúaedam de dominio.
1367
Morte
Urbano V sai de Avinhão para Roma.
de
Economia-Sociedade
Albornoz.
Religião-Espiritualidade
1369
Casamento da herdeira da Flandres com Filipe, o Ousado. Carlos V retoma o Rouergue.
Nascimento Huss.
1370
Du Guesclin é nomeado condestável. Carlos V reconquista o Limousin. Paz de Stralsund entre a Hansa e Valdemar IV.
Urbano V, que partira para Roma, volta para Avinhão e ali morre. Gregório XI.
1371
de
Vida intelectual, Letras e Ciências
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Datas
1366
1367
C.1367 - 1438. Jacopo Della Quercia. . ..
..
Jan
1369
Fundação da cidade do México (Tenoch-
13 70 - 1444. Leonardo Bruni.
1370
titia~).
·.
:
1371-1373. Carlos v reconquista Poitou, Aunis e Saintonge.
1371
1373
Morte de Santa Brígida da Suécia.
1373
Froissart: Chroniques (livro I). Boccacio: De genealogiis deorum gentili um.
1374
Morte de Petrarca.
1375
Morte de Boccacio.
Construção da sala do Capítulo de Tomar.
1375
Morte de Guillaume de Machaut.
1377-1381. Apocalipse de Angers. 1377-1446. Brunellesch i.
1377
1378-1455. Ghiberti.
1378
1377
Morte de Eduardo III. Ricardo Il. Jagelão, duque da Lituâ ilia.
1378
Carlos V· confisca as possessões de Carlos, o Mau, na Normandia. Não consegue, porém, apoderar-se das da Bretanha.
Gregório XI em Roma. 1377-1378. Wyclif 'é julgado e absolvido. Revolta dos ciompi em · Florença e motins em Roma.
158
Morte de Gregório XI. Eleições contraditórias de Urbano VI e Clemente VII. Início do Grande Cisma do Ocidente.
..
159
1374
,~ ---------------.----------- ------·~----------------,---Vida intelectual, Acontecimentos Artes Datas Letras e Ciências no resto do mundo
Datas
História Política da Europa
1379
Revolta da Flandres: Filipe Van Artevelde.
Clemente VII, vencido em Itália, instala-se em Avinhão e alia-se a Luís de Anjou. Wyclif: Speculum ecclesiO!.
1380
Clemente VII faz adoptar Luís de Anjou por Joana de Nápoles. Revolta de Carlos de Durazzo. Dimitri Donskoi esmaga a Horda de Ouro.
Criação da Companhia · Morte de Santa Cata· de Ravensburg. rina de Siena. Conrad de Gelnhausen expõe pela primeira vez as teorias conciliares. Wyclif: De eucharistia.
1381
Carlos de Durazzo toma Nápoles.
Ricardo 11 reprime a revolta de Wat Tyler.
1382
Batalha de Roosebeke. Morte de Joana de Nápoles. Luís de Anjou tenta conquistar o reino.
Motins em França: os «maillotins>> em Paris e os «tuchins» no Languedoc.
1384
Filipe, 0 Ousado, conde da Flandres. Morte de Lufs de Anjou.
1385
Carlos VI casa com · Isabel da Baviera. Gian Galeazzo Visconti senhor de Milão. Murad toma Sófia.
1385-1395. Claus Slu-
Morte de Carlos deDurazzo. Ladislau, rei de Nápoles. Ladislau Jagelão rei da Polónia.
1386?-1466. Donatello.
1386
1387
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
Piet Van Ost: edifício municipal de Bruges.
1379-1398.
1379
1380
A Universidade de Pa· ris pede a convoca· ção de um concílio ecumênico.
1381
1382
Morte de Wyclif.
1384
1385
ter: portal da cartuxa de Champmol.
Luís de Orléans casa com Valentina Visconti. Segismundo, rei da : Hungria. Murad toma Salonica.
Início da conversão da Lituânia. Fundação da abadia de Windesheim.
160
hau cer: Canterbury Tales. 1387 -1392? Froissart: Chroniques (livros 11 e III).
Início da construção da Catedral de Milão. 1387-1455. Fra AngeIico.
161
1386- 1387. Tamerlão
1326
toma Ispaban, Xiraz e Bagdad e atravessa o Azerbaijão, a Geórgia e a Armênia. 1387
I
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
-----~------------l---------------1--------------~
1389
Paz de Zurique entre os Suíços e a Áustria. Batalha de Kossovo.
í______________,_______________,_______________, Vida intelectual, Letras e Ciências
l' ierre d'Ailly, chanceler da Universidade de Paris. O wyclifismo expande· -se na Boémia.
1390 1391
Bajazet invade a Tessália e cerca Constantinopla.
Gerson pede a carlos VI que ponha fim ao Grande Cisma.
1394
Bajazet invade a Valáquia. · 1394-1395. Ricardo li subjuga a Irlanda. 1394-1440. Henrique, o Navegador.
A Universidade de Paris pede novamente o fim do cisma. Morte de Cleme·nt e VII. Bento XIII. 1395-1456. Jacques Cceur.
1395
1396
Início do conflito entre os duques da Borgonha e de OrJéans. Derrota dos cruzados cristãos em N:icópolis.
1397
União de Kalmar. Erice da Pomerânia, rei dos estados escandina vos.
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
1389
1390?-1441. Jan Van Eyck.
1391 1394-1429. Alain Chartier,
Gerson, chanceler da Universidade de Paris. 1395-1472. Bessarion.
1395-1402. Claus Sluter: O Poço de Moisés.
1395?-1455? Pisanello.
Giovanni di Bicci instala em Florença o banco Médicis.
1397-1419. Apostolado de S. Vicente Fer· rer.
1401
União da Polónia à Lituânia. Guerra entre a Polónia e os cavaleiros Teutónicos.
1394-1396. Tamerlão chega ao Cáucaso.
1394
Tamerlão destrói Astrakã. Fim do comércio por terra entre o Mar Negro e a China.
1395
1397-1475. Paolo Uccello.
carlos VI e Venceslau entendem-se para fazer acabar o cisma. Primeira subtracção de obediência. Gian Galeazzo Visconti toma Perugia, Assis e Spoleto.
1390
1396
1398
1400
Datas
Fundação da Taula de canvi de Barcelona, o primeiro banco público da história.
162
Chrysoloras, professor em Pavia.
1400-1471. Construção da cartuxa de Pavia.
1401-1464. Nicolau de Cusa.
1401-1428. Masaccio.
163
1397
1398-1399. Tamerlão na índia. Batalha de Panipat e tomada de Delhi.
1398
Tamerlão devasta a Síria.
1400
1401
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
1402
Morte de Gian Galeazzo Visconti. Desmembramento do seu estado.
Os Venezianos criam o «comboio» de Aigues-Mortes.
Jan Huss, reitor da Universidade de Pra· ga.
1403
1404
Bento XIII foge dt Avinhão. Restituição da obediência. Morte de Filipe, o Ousado. João, sem Medo. Veneza ocupa Pádua, Verona e Vicência.
AFies
Os Florentinos ocupam Pisa.
1407
João, sem Medo, mata o duque de Orléans.
1408
Datas
Batalha de Ankara. Tamerlão toma Esmirna e chega ao Bósforo.
1402
1403
1403-1452. Ghiberti: baixos-relevos do baptistério de Florença.
1404
Morte de Tamerlão e ruína do seu império.
Nascimento ae Lorenzo Valia.
1406
Acontecimentos no resto do mundo
Inocêncio VI sucede u Bonifácio IX.
1405
Gregório XII sucede u Inocêncio VII.
1406-1407. Jacopo Della Quercia: túmulo de Ilaria de! Caretto. 1406-1469. Filippo Lippi. 1406-1470. Alberti.
Fundação, em Génova, do banco San Giorgio.
Segismundo da Hun. gria, rei dos Romanos. Jagelão esmaga os Cavaleiros Teutónicos em Tannenberg.
164
1405
1406
1407
Criação da Casa di San Giorgio.
1409
1410
Vida intelectual, Letras e Ciências
Segunda subtracção de obediência ao tem· poral. Os dois papal e os cardeais reá· nem concílios dife· rentes. Fracasso doi concílios pontificais.
1408-1416. Pol de Limburgo: Tres riches heures du duc de Berry.
1408
Concílio de Pisa: 01 dois papas são de· postos e é eleito Ale· xandre V.
1409-1419. Jacopo Delta Quercia: fonte Gaia em Siena.
1409
Conflito entre o arce· bispo de Praga e Jan Huss. Revolta popu· lar a favor de Jan Huss.
C. 1410-1492. Piero Della Francesca.
1410
165
' lJUlUN
História Política da Europa .
Economia-Sociedade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Religião-Espiritualidado
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Datas
1411
Paz de Thorn entre Jagelão e os Teutões.
1411
1412
Nascimento de Joana. de Are. Filippo Maria Visconti reconstitui o Estado milanês.
1412
1414
«Guerra da fome» entre Jagelão e os Teutões.
Abre o concilio de Constança. A com~ nhão sob as duas ~ pécies é restabelecli da na Boémia. J an Huss em Constan• ça. Sua prisão.
1415
Batalha de Azincourt.. Formação da liga hussita na Boêmia.
João xxm tenta tranll< ferir o concílio part Itâlia e é deposto. Jan Huss é supliciado
1414
Os Portugueses tomam Ceuta.
ecclesiastica.
Aparecimento nos Países Baixos das primeiras impressões xilográficas.
1418
Os Borguinhões apoderam-se de Paris. Massacre dos Armagnacs.
1419
Henrique V senhor da Normandia. Assassínio de João, sem Medo. Filipe, o Bom, duque da Borgonha, alia-se a Henrique V.
Morte de S. Vicente Ferrier.
Tratado de Troyes. Segismundo, proclamado rei da Boêmia pelos príncipes alemães, é derrotado junto a Praga.
Cosme, o Antigo, toma' Martinho V prega cruzada contra a direcção do banco hussitas. PublicaçãO Médicis. dos «quatro artigos da fé hussita.
1420
1421
1417
1417-1435. Leonardo Bruni traduz Aristóteles.
Deposição de Bento XIII. Eleição de Marw tinho V. Gerson: De potestatf
1417
1415
Henrique, o Navegador, manda povoar a Madeira.
1418
1419
I Thomas a Kempis: Imitação de Jesus Cristo.
I
Os taboritas encabeçam a revolta checa.
Konrad von Soest: retábulo de Dortmund. C. 1420-c. 1481. Jean Fouquet. · ··- , 1420?-1495? Ockeg- 1 I hem.
Leonardo Bruni traduz o Pedro de Platão. I
1421-1434. Brunelleschi: cúpula da Catedral de Florença .
.!.
166
167
1420
1421
.---.-------------.-------------~------------~1 ? ------------~-------------.--------------~-. Vida intelectual, Acontecimentos História Política Datas Artes Datas Economia-Sociedade Religião-Espiritualidade Letras e Ciências no resto do mundo da Europa
1422
Morte de Henrique V. Henrique VI. Regência de Bedford. Morte de Carlos VI. Carlos VII. Murad II cerca Constantinopla.
1422-1435? Construção da Ca' d'Oro em Veneza.
1422
1425
A Bretanha alia-se a Carlos VII. Artur de Richemont é nomeado condestável.
1425-1431. J an Van Eyck: retábulo do Cordeiro mistico em Gand.
1425
li
1429
Joana de Are liberta Orléans cercada. Batalha de Patay. Sagração de Carlos VII.· Derrota .iunto a Paris.
Morte de Gerson.
1430
Joana de Are é presa em Compi
1430-1470? François Villon.
1430-1440. Brunelleschi: capela dos Pazzi em Santa Croce. 1430/40-1494. Hans Memling. 1430-1512. Michel Colombe. C. 1430-1516. Giovanni Bellini.
1431
Processo e suplicio de Joana de Are.
Convocação do concílio de Basileia. Morte de Martinho V. Eugênio IV.
l,orenzo Valla: De voluptate.
1431-1437. Luca Della Robbia: Cantoria de Santa Maria del Piore. 1431-1506. Mantegna.
1433
Exílio de Cosme de Médicis.
Conferência de Praga com os hussitàs. 'Reconhecimento dos «quatro artigos».
Nascimento de Guillaume Fichet. 1433-1494. Marsilio Ficino.
1434
Sublevação da Normandia contra os Ingleses. Derrota dos taboritas em Lipany. Cosme de Médicis toma o poder em Florença.
Jacques Creur em Damasco.
Os Portugueses dobram o Cabo Bojador.
1429
1430
Henrique, o Navegador, manda povoar os Açores.
1431
1433
Jan Van Eyck: Arnolfini e Esposa.
1434
~--~--~----------~--------------~--------------~~>-------------~---------------~--------------~~~
168
169
Datas
História Política da Europa
1435
Tratado de Arras entre Carlos VII e Filipe, o Bom. Carlos VII reconquista a · tle-de-France. «Paz perpétua entre a Polónia e os Teutões.
Jacques Cc.eur moedeiro-mor de Carlos VII.
1436
Carlos VII toma Paris.
Os Venezianos criam o «comboio da Barbaria)).
1437
Morte de Segismundo. Alberto VI de Habsburgo, rei da Hungria e da Boêmia.
Conflito entre o con. cflio e o papa quanto à união das Igrejas. Transferência do concílio para Ferrara.
1439
A Sérvia, turca.
1440
Processo de Gilles de Rais. Frederico de Habsburgo é eleito rei dos Romanos.
Em Florença: acta de união das Igrejas latina e grega. Os de Basileia depõem Eugênio IV. Eleição de Félix V.
Economia-Sociedade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Religião-Espiritualidade
Jacques Ca:ur, banqueiro real.
Compacta/a de Iihlava. Cisão do concílio quanto à reforma da Santa Sé. Eugênio IV pede apoio aos soberanos contra o concilio.
1437-14411 L. B. Alberti: Del!a famiglia .
1435-1488. Verrocchio.
143$
Van der Weyden: Des- Os Portugueses chegam ao rio do Ouro. cida da Cruz (Escoriai). Jan Van Eyck: Virgem · com o Cónego Van der Paele.
1436
1437-1541. Construção de Saint-Maclou em Rouen. ·
1437.
I
I
1439
Nicolau de . Cusa: De docta ignorantia.
,, ,.,
1441
1443
Datas
'
província
1442 Afonso V toma Nápoles. João Hunyadi expulsa os Turcos da Transilvânia.
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Jacques Cc.eur, membro do conselho do rei. I
Fundação do parlamento de Toulouse.
1440
Morte de Eyck.
Jan Van
1441
A nunciação de · Aix-en-Provence.
1442
1443-1451. Construção do palácio de Jacques Ca:ur em Bourges.
1443
I
Alberti: Della tranquillitate dell'anima.
170
Brunelleschi começa a construir o Palácio Pitti em Florença. 1440-1460. Construção do Palácio Médicis em Florença (Michelozzo).
171
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
1444 Batalha de Varna. Morte de Ladislau IH Jagelão. 1445
Carlos VII cria as companhias de ordenança.
1447
O delfim Luís retira-se para o Delfinado. Morte de Filippo Maria Visconti.
1448
Criação dos Archeiros Francos.
1449
Carlos VII reconquista a Normandia.
1450
Batalha de Formigny.
1451
Carlos VII reconquista e perde Bordéus e Bayonne. Fundaçã o do parlamento de Grenoble.
Religião-Espiritualidade
O utraquismo é doutrina oficial na Boêmia. Morte de S. Bernardino de Siena.
L. Valia : ElegantifE /ingufE /atinre.
1444-1512. Botticelli. 1444-1514. Braman te.
1444
J. Fouquet: Retrato de Carlos VII.
1445
L. B. Alberti começa a construir a Igreja de S. Francisco em Ri mini.
1447
Prisão de Jacques Creur. .1451-1506. Cristóvão Colombo.
1452 · Coroação imperial de Frederico III. Depois dele, nunca mais os imperadores germânicos serão coroados pelo papa.
1448
1449-1515. Aldo Manuzio.
1449-1494. daio.
Ghirlan -
1449
Gutenberg abre uma oficina de imprensa em Mainz. Nascimento de Lefêvre d'Étaples.
R. Van der Weyden: Juízo Final (Beaune). J. Fouquet : Livro de Horas de Étienn e Chevalier. 1450-1454. Construção do coro da abadia do Mont-Sa int-Michel. C. 1450-1516. Hieronymus Bosch. 1450?-1523. Signorelli.
1450
1452-1459. Piero Della Francesca: História da Invenção da V era Cruz (Arezzo).
1452
1451-1452. Nicolau de Cusa na Alemanha.
Jorge de Podieb rad destrói o taborismo. Nascimento de Savonarola.
172
de
Frederico III manda expulsar o concílio de Basileia.
Abdicação de Félix V. Nicolau de Cusa · é cardeal.
Uutllll
Artes ·
1447-1511. Filipe Commynes.
O genovês Francesco Draperio forma um cartel que domina a produção e exportação de todo o alúmen da Ásia Menor e da Grécia.
Acontecimentos no resto do mundo
Vida intelectual, Letras e Ciências
O cardeal d'Estouteville reforma a Universidade de Paris. Alberti: De re ledificatoria.
173
1451
Jll
-
l'olltlcn ,lu l!uropu
111 loiolo
Economia-Sociedade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Rellglllo-Esplrltuullc.Judo
14.53
Carlos VII reconquista a Gasconha. Maomé ll toma Constantinopla.
1454
Tratado de Lodi: Milão e Veneza reconciliam-se.
1455
Início da guerra das Duas Rosas.
Morte de Nicolau V. Calisto Ill.
1456
O delfim Luís refugia-se na Borgonha. Reabilitação de Joana de Are.
Marsilio Ficj.no: lnstitutiones p/atonicll!. 1456-1471. John Colet.
Nicolau de Cusa: De pacis fidei.
Jacques Cceur evade-se e refugia-se em Roma.
Fundação da comunidade dos Mínimos por. S. Francisco de Paula.
•.454-1493. Enilolao Barbaro. 1454-1494. Angelo Poliziano.
1456-1471. Argyropoulos ensina em Florença.
1454
c.
1455
Filareto: Spedale Maggiore (Milão). 1456-1458. Paolo Uccello: Batalha de San Romano.
Os Turcos destroem o Governo déspota da Moreia.
Morte de Santo Antonino de Florença.
Antoine de La Sale: Le petit Jehan de Saintré.
.(1.
I
Morte de Carlos VII. Luís XI. Queda do Império Grego de Trebizonda.
Descoberta das minas de alúmen de Tolfa · e de Mazarrón.
1459-1463. Benozzo Gozzoli: pinturas da capela dos Médicis. · J. Fouquet: Retrato de Juvéna/ des Ursins. Filippo Lippi termina os frescos da cúpula de Prato. Nascimento de Sansovino.
.I
~--~------------~~------------~--------------~
174
Os Portugueses chegam ao golfo da Guiné.
1456
1457 1458
,I 1461
C. 1454-1513. Pinturic. chio.
Morte de Calisto III. Pio ll.
1459-1525. Jakob Fugger, dito «O rico)).
1459
1460
1453
Donatello: S. João Baptista. Matias Corvin, rei da Hungria. Os Turcos entram em Atenas.
Datas
Donatelló: estátua do Gattamelata.
1455-1525. Carpaccio. Depois de 1455. Rossellino constrói em Roma o palácio de Veneza.
I
1457 1458
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
175
1459
1460
1461
~--~------------------~-----------------~--------~------~1 - ----------------~-------------------~,------------------~---, Datas
História Política da Europa
1462
Fundação do parlamento de Bordéus. 1462-1505. Reinado de Ivan III, grão-duque de Moscovo.
Biblia pauperum 1462-1525. Pomponaz(Bamberg). zi.
Van der Weyden: tríptico dos Reis Magos.
1462
1463
Filipe, o Bom, dá a Luís XI as cidades do Somme. Criação dos Estados Gerais dos Países Baixos.
1463-1477. Marsilio Ficino traduz Platão. 1463-'1494. Pico de Mirandola.
1463-1465. Benozzo Gozzoli: Vida de Santo Agostinho. 1463-1472. Construção do palácio de Plessis-lez-Tours.
1463
1464
Carlos, o Temerário, orgamza a Liga do Bem Público. Derrota dos últimos lancastrianos. Morte de Cosme de Médicis. Pedro de Médicis, dito «o Gotoso».
1467 carlos, o Temerário, sucede a Filipe, o Bom. 1468
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
Vida intelectual, Le tras e Ciências
.-\rtes
Acontecimentos no resto do mundo
Morte de Pio Il. Paulo II.
Revolta de Liege.
1464
1467-1540. Guillaume Budé.
Os nobres de castela impõem Isabel como herdeira de Henrique IV de Trastamara. Revolta e derrota do duque da Bretanha. Paz de Ancenis. Tratado de Péronne. Carlos, o Temerário, toma Liege.
1469 Isabel de castela casa com Fernando de Aragão. Morte de Pedro, o Gotoso.
Filippo Lippi: Coroação da Virgem.
1467
1468-1485. Benozzo Gozzoli: pinturas do Campo Santo de Pisa.
1468
Nascimento de Erasmo. Bessarion: In calumniatorem Platonis. 1469-14 74? Marsilio Ficino: Theo/ogia platonica. 1469-1527. Maquiavel.
176
Datas
1469
177
Datas
História Política da Europa
1470
Os Turcos tom::tm Negroponto (a Eubeia) aos Venezianos.
1471
Ocupação da Picardia por Luís XI. Carlos, o Temerário, cerca Beauvais. Ivan III toma Novgórod-a-Grande.
1472
Commynes ao st:rviço de Luís XI. Revolta do Rossilhão. Ivan III casa com Zoé Paleóloga.
1473
Economia -Sociedade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Religião-Espiritualidade
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Nascimento de Pietro Bembo. Guillaum.e Fichet introduz a imprensa na Sorbonne. Farce de Maltre Pathelin. Morte de Paulo 11 Sisto IV. Desaparecimento da Fraticelle.
Morte de Bessarion.
Datas
Alberti: fachada de Santa Maria Novena em Florença. Botticelli: Judite. C. 1470. Jean Fouquet: Antiquités juda'iques.
1470
14 71-15 2 8: Albrecht Dürer.
1471
Morte de Michelozzo. 1472-1553. Lucas Cranach, o Velho.
1472
Solari começa a fachada da cartuxa de Pavia. Martin Schongauer: Virgem da Roseira. Botticelli: S. Sebastião. 1473-1481. Construção da Capela Sistina.
1473
~'
Ocupação de Guéldria e invasão da Lorena por Carlos, o Temerário. Tratado de Nancy. O Temerário tenta obter o título real de Frederico III.
1473-1542. Copérnico.
1474
«Acordo perpétuo» entre a Suíça e a Áustria.
Os Pazzi substituem os Médicis como banqueiros da Igreja.
Marsilio Ficino: D 1474-1533. Ariosto. christiana religione
Aristotele Fioravanti vai para Moscovo.
1474
1475
Desembarque de Eduardo IV ~m Calais. Tratado de Picquigny. Carlos. o Temerário. invade a Lorena e toma Nancy. Os Turcos tomam Caffa. O cã da Crimeia tem de prest::tr-lhes vassalagem.
1475-1541. Pízarro.
Sisto IV abre. a<;> pú Demetrios Chalcondyblico a Btbliotec las começa a ensiVaticana. nar em Florença.
Fundação de San Juan de los Reyes em Toledo. Verrochio: ·David (Bargello). Construção da Catedral Dormition em Moscovo. C. 1475-1528. Mathias Grünewald. 1475-1564. Miguel Ângelo.
1475
178
I
179
.----.-----------------.----------------~--------------~~~ ~ Datas
História Política da Europa
Eéonomia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
VIda intelectual, I,otrus c Ciências
-------------------t----------------1-------------~ 1476 Os Suíços vencem Carlos, o Temerário, em Grandson e depois em Morat. Revolta da Lorena.
1477
Morte de Carlos, o Temerário. Maximiliano da Áustria casa com Maria da Borgonha.
1478
Conspiração dos Pazzi. Sisto IV excomunga Lourenço ie Médicis e declara-lhe guerra.
1479
Advento de Fernando o Católico. Ludovico, o Mouro, toma o poder em Milão.
1480
Morte do rei René. Ocupação do Barreis e de Anjou por Luís XI.
1481
Luís XI adquire o Maine e a Provença. Recomeço da guerra entre os muçulmanos de Granada e os Castelhanos. Os Turcos são expulsos de Otranto. 1481-1495. Reinado de João II de Portugal.
1476
Botticelli: Primavera. 1477-1483? Túmulo de Philippe Pot. 1477/78-1510. Giorgione.
1477
Bramante: Igreja de San Satiro em Milão.
1478
Memling: Casamento Mlstico de Santa Catarina.
1479
C. 1480-1538. Albrecht
1480
.t · - d In .. Sannazzaro: Arcadia. t mçao a I ns! qmsl 1481-1482. Luigi Pulçao em Espanha. ci: Morgante maggiore. Torquemada.
Palácio Vendramino em Veneza.
1481
S. Francisco de Paula em França. 1482-1531.
Morte de Luca Della Robbia. 1482-1490. Construção da Catedral da Anunciação em Moscovo.
Criação da Universidade de Uppsala.
Sisto IV põe o interdito a Florença.
Attdorfer.
1482
180
Datas
Van der Goes: tríptico da Adoração dos Pastores. Verrocchio: Criança com o Golfinho. Nicolas Froment: tríptico da Sarça Ardente.
;
Liquidação das filiais de Bruges e de Milão da casa Médicis.
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
181
Diogo Cão descobre a foz do Congo.
1482
~----~----------------~~ Datas
História Política da Europa
Economia-Soclcdado
L-
Vida intelectual, Le tras e Ciências
Rollgião-Espiritualidade
1483
Morte de Luís XI. Carlos VIII. Regência dos Beaujeu. Morte de Eduardo IV. Ricardo III, seu irmão, apodera-se da coroa depois de mandar matar os filhos de Eduardo. Veneza chama Carlos VIII a Itália.
1484
Estados Tours.
de
Morte de Sisto IV. l'ico de Mirandola encontra-se com FieiInocêncio VIII. no. Bula contra a feitiça 1484-1486. Marsilio Firia. cino traduz Plotino. 1484-1531. Zwingli.
1485
A «guerra louca» em França.
1486
Sujeição -!1: Guiena. Fernando c Isabel concluem a pacificação do seu reino. Maximiliano de Áustria é eleito · rei dos Romanos.
Gerais
1487
1488
Atulll•tllu 111" 110
u tu &lo •uundu
---------------------------------!-----------1483-1546. Martinho 14 83-15 40 . Guichardin. Lutero.
Batalha de Saint-Aubin-du-Cormier: fim da «guerra louca». Morte do duque Francisco li. Sua filha, Ana de Bretanha, sucede-lhe. Cruzada contra os Valdenses dos Alpes.
llu!ll
141!.1
1483-1520. Rafael.
1484
1485
1485-1540. Jean Clouet. C. 1485-1490. Ticiano. 1486-1489. Pregação de Pico de Mirandola esSavonarola em Itá- creve as Questiones. lia.
~ -
Botticelli: Nascimento de Vénus. 1486-1490. Ghirlandaio decora o coro de Santa Maria Novella em Florença.
Viagem de Covilhã e Paiva no Oceano Índico.
1486
11
Jakob Fugger, banqueiro de. Segismundo do Tirol. Começa o seu domínio da produção e venda de prata na região.
O papa condena Pico Landino: Camaldulenses disputationes. de Mirandola.
1487-1491. Construção do Palácio das Facetas de Moscovo.
Maximiliano passa para Antuérpia os privilégios comerciais de Bruges.
1488-1523. Ulrich von Hutten.
Memling: Relicário de Santa úrsula. Filippino Lippi: Triunfo de S. Tomás de Aquino. Verrocchio: Colleone.
183
182
I
1487
Bartolomeu Dias dobra o Cabo da Boa Esperança.
1488
----
------------------~------------------~----------------~ -
Vida intelectual, Letras e Ciências
Acontecimentos no resto do mundo
Datas
História Política da Europa
1489
Os Venezianos ocupam Chipre.
1489-1565. Guillaam Farei.
l'it:o de Mirandola: Heptaplus. 1489-1499. Commynes escreve os seis primeiros livros das Memórias.
1489-1490. Botticelli: Anunciação. C. 1489-1534. Correggio.
1489
1490
Morte de Matias Corvin.
Savonarola, prior d I .cfevre d'Étaples: Introduction à la «MéSan Marco em Fio taphysique )} d'Arisrença. to te. 1490-1525. Thoma Müntzer.
1490-1500. Carpaccio: Lenda de Santa Vrsula. 1490-1522. Construção do claustro da Batalha .
1490
1491
Os Franceses ocupam a Bretanha. É anulado o casamento de Ana e Maximiliano. Ana casa com Carlos VIII. Fernando e Isabel põem cerco a Granada.
Nascimento de Ináci de Loyola.
1492
Anexação de Granada pelos reis católicos. Édito contra os judeus espanhóis. Morte de Lourenço, o Magnífico.
Morte de Inocênci VIII. Alexandre V Borgia.
1493
Tratados de Barcelona e de Senlis.
Os Fugger criam uma sucursal em Antuérpia.
1494
Carlos VIII em Itália. Ludovico, o Mouro, duque de Milão. Queda dos Médicis em Florença.
Fundação da empresa mineira Fugger. Thurzo na Hungria. Fim do banco Médicis.
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidad~
Artes
1491
fravessia do Atlântico por Cristóvão Colombo, que desembarca nas Antilhas.
1492
Dürer: Auto-retrato (Louvre).
Partilha dos novos mundos· entre a Espanha e Portugal (Alexandre VI). Regresso de Cristóvão Colombo. Sua partida para a segunda viagem (1493-1496).
1493
Morte de Memling.
fratado das TordesiIhas.
1494
efevre d'Étaples: Paraphrase sur la «Physique)} d'Aristote. I 492-1550. Alciati. 1492-1556. Aretino.
Aldo Manuzio funda uma casa impressora em Veneza. I .uca Pacioli: Summa de A rithmetica. 1494- 1553 . François Rabelais.
li 184
Datas
185
~---.------------------.-----------------~----------------~1 Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
Vida intelectual, I ,ctras e Ciências
Ar t
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..,
1495
Manuel, o Venturoso, rei de Portugal. Tomada de Nápoles por Carlos VIII. Batalha de Fornua.
Criação das fábricas dos Fugger na Caríntia e em Hohenkirchen, na Turíngia.
1497
1498
Morte de Carlos VIII Luís XII.
1499
Luís XII Ana da Luís XII Tomada Génova.
1500
Ludovico, o Mouro, é feito prisioneiro. Cesar Borgia, duque da Romanha. Ivan III conquista a margem esquerda do Dniepre aos Polacos.
casa com Bretanha. em Itália. de Milão e
Constituição da Santa Liga.
Excomunhão de Savonarola. 1497-1560. Melanchthon.
Leonardo da Vinci: A Vitima Ceia. 1497-1543. Hans Holbein, o Moço.
Início da expedição de Vasco da Gama. J. Cabot no Labrador (?).
1497
Morte de Savonarola.
Pollaiuolo: túmulo de Inocêncio VIII. Dürer: Apocalipse. Tríptico de Moulins.
Vasco da Gama chega a Calicut. Segunda viagem de J. Cabot. Terceira viagem de Colombo (1498-1500).
1498
Miguel Ângelo: Pietà de S. Pedro. 1499-1500. Signorelli: frescos da Catedral de Orvieto.
Feitoria portuguesa em Antuérpia.
Era smo: primeiros A dágios.
Botticelli: Natividade Mística. Mosteiro dos Jerónimos (Lisboa). 1500-1571. Benvenuto Cellini. C. 1500. Bosch: Tentação de Santo Antão (Lisboa).
1501
1502
Bramante: Tempietto de San Pietro in Montorio. 1502-1507. Michel Colombe: túmulo de Francisco 11 em Nantes. 1502-1509. Construção do palácio de Gaillon.
Édito de expulsão de Espanha dos mouros não convertidos.
186
''"'"
187
1499
Regresso de Vasco da Gama a Portugal. Corte Real no Labrador e Cabral no Brasil.
1500
Primeira leva de escravos negros para a América.
1501
1502-1503. Segunda viagem de Vasco da Gama à índia. 1502-1504. última viagem de Colombo.
1502
-r-
, ~
Vida intelectual, Letras e Ciências
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
1503
Ruptura entre a França e Aragão.
Contrato entre Portugal e os Welser ~ara o comércio das tndias. Fundação da Casa de la Contratación.
Morte de Alexandre VI. Pio III e Júlio I I.
1504
Morte de Isabel de Castela. Os Franceses perdem Nápoles.
Datas
1505
Miguel Ângelo: A Sagrada Família. Construção da ala Luís XII do palácio de Blois. 1503-1519. Westminster: abóbada da capela Henrique VII. E ra smo: Enchiridion militis christiani.
I
Lutero entra para o convento.
Estados Gerais de Tours.
11
Filipe,
o
1506
Morte de Belo.
1507
Revolta contra os Franceses em Gênova. 1507-1573. Michel de !'Hospital.
1508
Tratado de Cambrai.
R euchlin: Rudimenta linguall! hebraica!.
Lutero é ordenado padre.
Os Fugger obtêm a concessão da moeda pontifícia.
188
Artes
Acontecimentos no resto do mundo
Datas
Albuquerque na índia. Ocupação de Co chim. Expedição normanda ao Brasil.
1503
Bramante: claustro de Santa Maria della Pace. Miguel Ângelo: David.
1504
1505-1572. Claude Goudimel. C. 1505. Giorgione: A Tempestade.
1505-1507. Expedição 1505 de Francisco de Almeida à índia.
Miguel Ângelo: Virgem com o Menino (Bruges). Bramante começa a trabalhar em S. Pedro de Roma. Leonardo da Vinci: La Gioconda. C. t:S06-1510: A Virgem e o Menino com Santa Ana.
Albuquerque toma Socotorá.
1506
Dürer: Adão e Eva (Prado).
Albuquerque apodera-se de Ormuz.
1507
Bourdichon: Horas de Ana da Bretanha. Michel Colombe: S. Jorge de Gaillon. 1508-1512. Miguel Ângelo: tecto da Capela Sistina. 1508-1580. Palladio.
189
1508
'.----~----------------~----------------~--------------~li;~----------------~----------------~-----------------~--~ Acontecimentos História Política Vida intelectual, Datas Datas Economia-Sociedade Artes Religião-Espiritualidade no resto do mundo da Europa Letras e Ciências
1509
Júlio II excomung I.cfe vre d' Étaples: Qu intuplex psalteVeneza. rium. Nascimento de Calvi no e de Michel Ser 1509-1546. Étienne Dolet. vet.
Sodoma: Cristo na Coluna. 1509-1511. Rafael: pinturas da Câmara da Assinatura.
Os Espanhóis ocupam Oran . .
1509
1510
Júlio H levanta a ex comunhão a VeneZl e toma partido con tra Luís XII. Luí XII e Maximiliano resolvem promover um concílio em Pisa. Lutero em Roma.
1510-1570. Philibert de l'Orme. 1510-1589/90. Bernard Palissy.
Albuquerque toma Goa.
1510
1511
Júlio H forma uma Er asmo: Elogio da Loucura. Santa Liga contra Reuchlin: AugenspieLuís XII. gel. Lutero, prior em Wittenberga.
1511 -1574. Vasari.
Albuquerque toma Malaca.
1511
1512
Henrique VIII sucede em Inglaterra a Henrique VII. Batalha de Agnadello. Júlio H reocupa a Romanha. Henrique VIII casa com Catarina de Aragão.
Fundação em Espanha do conselho das í ndias.
1512
Gaston de Foix em Itália. Maximiliano desliga-se de Luís XII. Os Franceses perdem a Itália.
Lefevre d'Étaples pu- 1512-1594. Mercator. blica as Epístolas de S. Paulo. 1512-1516. Concílio de Latrão.
1512-1516. Miguel Ângelo: Moisés.
É criado um bispado em S. Domingos. Leis de Burgos de protecção aos índios.
1513
Os Suíços na Borgo- . O banco Fugger, agênnha. Cerco de Dijon. · cia de distribuição Luís XII entende-se de indulgências na com Leão X e HenAlemanha. rique VIIl
Leão X sucede a Júlio 15 13-1593. Jacques Amyot. II. .Condenação de Reuchlin.
Dürer: O Cavaleiro e a Morte. Ticiano: O Amor Sagrado e o A mor Profano.
Balboa atravessa o is- 1513 tmo do Panamá e descobre o «mar do sul».
Rafael sucede a Bramante em S. Pedro e no Vaticano. Correggio : Madona com S. Francisco. 1514-1519. Rafael: tapeçarias dos Actos dos Apóstolos.
1514
1514 Morte de Luís XII.
11
Wolsey, arcebispo de Guillaume Budé: De asse. York.
190
191
Vida intelectual, Letras e Ciências
Re!igião-Espiritualidade
Acontecimentos no resto do mundo
Datas
Selim I conquista o Egipto.
1516
Os Espanhóis no Iucatão. Embaixada portuguesa a Cantão.
1517
1515-1582. Santa Tere-
1515 Advento de Francis-
sa de Ávila.
co I. Marignan. Wolsey, chanceler de Inglaterra. «Paz perpétua» entre a França e os cantões suíços. Leão X faz a paz com Francisco I. Morte de Fernando de Aragão. Carlos V. 1516 Tratado de Noyon.
1515-1595. S. Filipe Néri.
1517 Protestos do parlamen-
to e da Universidade de Paris contra a concordata de Bolonha. . Tratado de Cambra1.
Concordata de Bolonha. . Fundação do P:atóno do Amor Dtvmo. Briçonnet, bispo ele Meaux. Erasmo: edição do Novo Testamento.
Publicação do Príncipe de Maquiavel. Thomas More: Utopia. Ariosto: Orlando Furioso. Po mponazzi: Tractatus de immortalitate animi.
Publicação das 95 Teses de Lutero contra as indulgências.
1517-1590. Ambroise Paré.
Fundação de Saint-Étienne-d u-Mont em Paris.
1 1518· 1594; Tintoretto.
1518 1519
Artes
Carlos V é eleito rei dos Romanos. Início da revolta de Gustavo Vasa na Suécia.
Empréstimo dos Fugger a Carlos V I?ara a eleição impenal.
1520 Revolta da Espanha
contra os ministros flamengos de Carlos V (em Espanha, Carlos I). Acampamento e tratrado do Lençol de Ouro. Entrevista e tratado de Gravelines.
1518
«Disputa» de Leipzig. Zwingli proíb~ a P[egação das li)-dulgencias em Zunque.
Correggio: Casamento Místico de Santa Catarina.
Início da viagem de Fernão de Magalhães. Cortez no México.
1519
Lutero: Apelo à No- Pomponazzi: De fato. breza cristã; De captivitate babylonica; De libertate christiana. . Bula Exsurge Domme.
Construção do claustro de Santa Cruz de Coimbra. C. 1520. Janela do Convento de Cristo de Tomar
Descoberta do Estreito de Magalhães. Revolta do México contra Cortez. Embaixada portuguesa a Pequim.
1520
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192
l
,----.--------------~--------------~------------~~~ ~- ------------~---------------.----------------.---
Datas
História Política da Europa
1521
Os rebeldes espanhóis são esmagados. Dieta de Worms. Solimão toma Belgra· do.
1522
Os Franceses são expulsos do Milanês. Início do processo de sucessão do duque de Bourbon.
1523
«Traição» do condestável de Bourbon.
Religião-Espiritualidade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Excomunhão de Lutero e seu banimento do Império pela dieta de Worrns. Morte de Leão X. Reformas de Karlstadt em Wittenberg.
Mnquiavel: Diálogos sobre a Arte da G uerra. Mclanc hthon : Loci communes. I 21-1524. Lefêvre d'Étaples traduz os Salmos.
Primeiras rendas do município de Paris. Criação em Castela do Consejo de la Hacienda.
Eleição de Adriano VI. Ruptura entre Lutero e Müntzer. A Inquisição nos Países Baixos.
Erasmo: Colóquios. 1522-1561. Joachim du Bellay.
Processo de Semblançay em França. Fundação do Tesouro da Poupança.
Morte de Adriano VI. Clemente VII. Lutero: Da Autoridade Temporal. Zwingli: Kurze Einleitung. Aparecimentq_ do anabaptismo na Alemanha.
Economia-Sociedade
1524
Batalha de Sesia. Morte de Bayard. O condestável de Bourbon invade a Provença.
Início da revolta dos camponeses alemães, dirigida por Müntzer.
Lutero condena Karlstadt. Lutero: Carta aos Príncipes da Saxónia. Erasmo: De libero arbitrio.
1525
Morte de Frederico, o Sábio. Secularização do ducado da Prússia. Batalha de Pavia.
Esmagamento da revolta dos camponeses. Morte de Müntzer. Jakob Fugger obtém as minas de Almaden e a concessão dos maestragos.
Lutero: Contra as Hordas de Camponeses; De servo arbítrio. 1525-1562. Lelio Sozzini.
1526
Tratado de Madrid. Liga de Cognac. Baldados esforços imperiais para sublevar a Borgonha.
\
Dürer: Desconhecido. Holbein: Cristo Morto. Morte de Josquin des Prés.
Datas
Cortez conquista o México.
1521
Cortez, capitão-general da Nova Espanha. Regresso a Espanha da expedição Magalhães-Del Cano.
1522
Vives: De ratione studii.
Holbein: Retrato Erasmo.
1524-1585. Pierre de Ronsard. 1524-1590. François Hotman.
Início da construção do Palácio de Chambord. 1524-1594. Palestrina.
Primeira viagem de Pizarro a terras dos Incas. Verrazzano descobre a foz do Hudson.
1524
1525-1580. Luís de Camões.
Sodoma: S. Sebastião. 1525-1535. Palazzo de! Tê (Mântua). 1525/30-1569: Brueghel, o Velho.
Os Welser fundam uma agência em S. Domingos.
1525
Tiziano: Vergine dei Pesara. Altdorfer: Susana no Banho.
Segunda viagem de Pizarro a terras dos Incas. Angolanos no Brasil.
1526
de
1523
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I
'
Fundação da ordem dos Capuchinhos. Organização da Igreja Luterana. Inácio de Loyola: Exercfcios Espirituais.
194
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
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195
I
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Datas
História Política da Europa
1527
Margarida, rainha de Na varra. Saque de Roma pelos Imperiais. Henrique VIII e Francisco I fazem guerra a Carlos V. Derrota dos Franceses em Itália.
1528
Os Países Baixos anexam Utrecht.
1529
Clemente VII opõe-se ao divórcio de Henrique VIII. Wolsey cai em desgraça. Thomas More, chanceler. Paz de Cambrai ou «das damas».
1530
Abertura da Dieta de Augsburgo. Coroação imperial de Carlos V.
1531
Formação da liga de Schmalkalden. Os cantões católicos derrotam Zurique em Kappel. Morte de Zwingli.
1532
União administrativa de Bretanha à França. Demissão de Thomas More.
Economia-Sociedade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Religião-Espiritualidade
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Datas
Lucas de Leyden: Juízo Final.
1527
B. Castiglione: 11 Cor-
Correggio: Madona com S. Jerónimo. Jean Clouet, pintor do rei. 1528-1588. Veronese.
Desastre de Narvaez 1528 na Florida. Os Welser recebem a concessão da conquista do Eldorado. Tratado de demarcação de Saragoza. Barba Roxa derrota os Espanhóis perto áe Argel.
Dieta de Oldensee: o luteranismo passa a ser religião estatal na Dinamarca e na Suécia.
Tratado de comércio franco-turco. Bancarrota dos Hochstetter.
Reforma em Berna. Inácio de Loyola em Paris.
«Grande rebeine» em Lyon.
A Reforma triunfa .em Basileia, Sáint-Gall, Schaffhausen, Mülhausen. Conferência de Marburgo entre Lutero e Zwingli. O anabaptismo cresce nos Países Baixos,
Guillaume Budé: Commentarii /inguce grcecce.
Albrecht Altdorfer: A Batalha de Alexandre.
Confissão de Augsburgo. Reforma em Neuchâtel.
Francisco I cria ' O Colégio dos Leitores Reais.
Correggio: A Noite Santa. Construção do palácio de Sain t-Germain-en-Laye. Construção do palácio Farnese.
1530
Margarida de Navarra: Miroir de l'âme pécheresse. Henrique VIII proclama-se chefe da Igreja Inglesa.
1531-1598. Henri Estienne.
Miguel Ângelo: A Noite e A Aurora.
1531
Rabelais: Grandes et inestimables chroniques... de Gargantua. Faits et prouesses de Pantagruel. Robert Estienne: Thesaurus linguce latince.
Correggio: Madona com S. Jorge. O Primatício em França. 1532?-1594. Roland de Lassus.
Travessia dos Andes 1532 por Pizarro, que prende Atahualpa.
Abertura da nova Bolsa de Antuérpia. 1531-1578. Os «mercadores» genoveses obtêm a concessão do alúmen da Tolfa.
196
tegiano.
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197
1529
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Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
I
li11
Artes
Calvino adere à Reforma.
1533-1592. Michel de Montaigne.
Ticiano: Retrato de Carlos V (Prado). Holbein: Os Embaixadores.
Morte de Clemente VII. Paulo 111. Em França: a «questão dos cartazes» e a câmara ardente. Inácio de Loyola pronuncia votos em Montmartre.
Rabelais: Vie du grand Gargantua. Budé: De transitu.
1533
Jacques 'cartier no Canadá. O rei de Cambay entrega Diu aos Portugueses. 1534-1536. O Peru revolta-se contra Pizarro.
1534
Carlos V toma Tunes. Fundação do vice-reino do México. 1535-1536. Exploração do rio de S. Lourenço por Cartier.
1535
Sansovino: palácio Barba Roxa reconquisMorte de Erasmo. ta Bizerta. Correr em Veneza. 1536-1538. Étienne Do- . let: Commentarii lin- 1536-1541. Miguel Angelo: Juízo Final guce latince. (Capela Sistina).
1536
1537
Henrique VIII casa com Anne Boleyn. Nascimento de Isabel. Thomas Cromwell, chanceler.
1534
Os anabaptistas tomam o . poder em Münster. Khayr ai-Din (Barba Roxa) em França. Tratado de Augsburgo entre a França e a liga de Schmalkalden.
1535
Tomada de Münster e execução dos anabaptistas. Execução de Thomas More e de Fisher. Francisco I e Carlos V recomeçam a guerra.
A Reforma é adoptada em Genebra.
1535 ou 1536. Aretino: Ragionamenti.
1536
União do País de Gales à Inglaterra. Execução de Anne Boleyn. · Francisco I toma Turim . Carlos V invade a Provença.
Paulo 111 convoca o concílio. «Concórdia» de Wittenberg. Calvino: Institutio religionis christiance. Calvino em Genebra. 1536-1539. Supressão dos conventos em Inglaterra.
1535-1590. Germain Pilon. 1535?-1600? Tomás Luís de Victoria.
,,
1537
Lorenzaccio assassina Alexandre de Médicis.
A Igreja luterana dinamarquesa organi-· za-se definitivamente.
Bonaventure Des Périer s : Cymbalum mundi. Tartaglia: La nuova sciem:a.
1538
Trégua de Nice e encontro de Aigues-Mortes.
Calvino e Farei são exilados de Genebra. Henrique VIII é excomungado. 1538-1584. S. Carlos Borromeu.
A Sorbonne condena Bonaventure Des Périers.
198
Datas
Pizarro toma Cuzco.
11533
Criação das feiras «de Besançon».
Acontecimentos no resto do mundo
Vida intelectual, Letras c Ciências
Religião-Espiritualidade
Ticiano: Tténus de Urbino.
Os Espanhóis em Buenos Aires. 1538-1541. Hernando de Soto explora as regiões a oeste do Mississippi.
1538
1-.!---_ _ _ _ _____:._ _----'--_ 199
Artes
Acontecimentos no resto do mundo
Datas
1539-1545. Benvenuto Cellini em França.
Coronado na Califórnia.
1539
Datas
História Política da Europa
1539
Ordenações de Villers-Cotterêts. Os «Seis Artigos» em Inglaterra.
1540
Henrique VIII casa com Anne de Cleves, que depois repudia. ExecuÇão de Thomas Cromwell.
Calvino é chamado de novo a Genebra. Fundação dos Irmãos da Caridade por S. João de Deus.
s. Münster: edição de
Sansovino: Loggetta de Veneza. Ticiano: A Apresentação no Templo.
1541
Dieta e conferência de Ratisbona.
A Instituição Cristã de Calvino é traduzida para francês. Calvino volta a Genebra. Ordenações Eclesiásticas.
Marot traduz os Salmos.
1541-1614. Domenikos Theotokopoulos, «el Greco».
1542
Carlos V e Henrique VIII aHt:~n-se. Nova guerra contra Francisco I.
Criação da Inquisição em Roma sob direcção de Caraffa. 1542-1591. S. João da Cruz.
Guillaume Poste!: De orbis terrre concordia. Marot refugia-se em Genebra.
1543
Carlos V toma a Guéldria ao duque de Cley_es. Tomada de Nice por uma esquadra franco-turca.
1544
Francisco I liberta os servos do domínio real. Batalha de Cérisolles. Os Imperiais cercam Saint-Dizier e os ingleses Montreuil e Boulogne. Tratado de Crépy com Carlos V.
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidadc
1539-1540. Revolta de Gand. 1539-1541. Greve na imprensa de Lyon. Greve em Paris.
Organização definitiva da Companhia de Jesus. 1539-1604. Fausto Sozzini.
Criação das generalidades em França.
Vida intelectual, l.ctras e Ciências
Ptolomeu geógrafo. 1540-1609. Giuseppe G iusto Scaligero.
Copérnico: De revolutionibus orbium ccelestium. Vesálio: De corporis l!umani fabrica. E m Inglaterra: é escrito o King's book. Fundação do primetro colégio iesníta da Alemanha (Colónia)
200
Jubeu de Saint-Germain-1' Auxerrois (Paris), de J. Goujon e P. Lescot.
1540
Barba Roxa esmaga os Espanhóis.
1541
Nuevas Leyes a favor dos índios. Os Portugueses no Japão.
1542
1543
1544
S. Münster: Cosmografia. Maurice Sceve: Délie. 1544-1590. Robert Garnier. 1544-1 595. Torq uato Tasso.
201
Datas
História Política da Europa
1545
Massacre dos Valdenses do Luberon.
Abertura do concílio de Trento. S. Francisco Xavier na China. Lutero: Contra o Papado. Calvino: Contra a Seita dos Libertinos.
1546
Aliança entre Maurício da Saxónia e Ca rios V: guerra contra a . liga de Schmalkalden.
Morte de Lutero. A Inquisição em Nápoles. Execução de Étienne Dolet.
1547
Morte de Henrique VIII. Eduardo VI. Morte de Francisco I. Henrique II. Batalha de Mühlberg. Começo do reinado de Ivan, o Terrível.
1548
Votação do «Ínterim» da dieta de Augsburgo. Expedição francesa à Escócia. Maria Stuart casa com o delfim. Guerra franco-inglesa.
1549
Economia-Sociedade
Encerramento da feitoria portuguesa de Antuérpia.
1550 Tratado de paz franco-inglês. . Bolonha é restituída à França.
1551
Religião-Espiritualidade
Vida intelectual, Letras e Ciências
Artes
Serlio: Regras Gerais de Arquitectura. Cellini: Perseu.
202
Datas
Abertura das minas de Potosi.
1545
Criação de dois arce- 1546 bispados na América. Os jesuítas no Brasil.
Rabelais: Tiers livre. 1546-1601. Tycho-Brahé.
1547
Margarida de Navarra: Les marguerites de la marguerite des princesses. 1547-1616. Cervantes.
A direcção dos trabalhos de S. Pedro de Roma é confiada a Miguel Ângelo. Ticiano: Vénus e Adónis. Tintoretto: Apresentação no Templo.
Paulo 111 suspende o concílio. ·Carlos V nega-lhe apoio.
Rabelais: Quart livre.
Construção do palácio de Anet por Philibert de l'Orme. 1548-1549. Fonte dos Inocentes, de P. Lescot e J. Goujon.
Formação de nova liga protestante na Alemanha. Morte de Paulo III. Canisius na Alemanha. S. Francisco Xavier no Japão. Publicação do primeiro Prayer book.
J. Du Bellay: Défense e t illustration ... , L'Olive. Morte de Margarida de Navarra.
Palladio começa a basílica de Vicenza.
1549
Eleição de Júlio III. Fundação do colégio jesuíta de Roma. Calvino: Tratado dos Escândalos.
Ronsard: Odes.
Philibert de l'Orme e P . Bontemps: túmulo de Francisco I. J. Goujon: cariátides do Louvre.
1550
Os jesuítas em Marrocos e no Congo.
Criação da Universidade de Lima.
Petrus Ramus: Animaaverszones anstotelicll!.
Henrique li recomeça com as guerras de Itália contra o papa.
Acontecimentos no resto do mundo
203
1548
1551
Datas
História Política da Europa
Jodclle: Cléopâtre captive. !552-1553. Ronsard: Amours. 1552-1599. Edmund Spenser.
Fundação em Marselha da Companhia do coral dos mares de Bône. Os Ingleses em Arkhangelsk;
Execução de Michel Servet. Calvino: Defesa da Fé Ortodoxa. Canisius, pregador da corte de Viena.
1553-1557. Du Bellay: Antiquités de Rome.
Maria Tudor casa com Filipe II de Espanha. A Inglaterra reconcilia-se com o papado. Os Franceses perdem a Toscana.
Criação da Moscovy Company.
Castellion: De hrereticis. Théodore de Beze: De hrereticis.
1554-1586. Sir Philip Sidney.
Antoine de Bourbon converte-se ao calvinismo. Capitulação de Siena.
Grand party do cardeal de Tournon.
Henrique II cria os presidiais. Carlos V revoga o <<Ínterim». Trégua entre Henrique II e o papa. Henrique II ocupa os três bispados. Ivan, o Terrível, conquista Kazan.
1553
Morte de Eduardo VI. Maria Tudor, que entra em negociações com o papa para o regresso da Inglaterra ao catolicismo. François de Guise salva Metz.
1554
1556 Carlos V abdica. Os Espanhóis de Nápoles recomeçam a guerra contra o papa, oue tem o apoio da França.
1557
Vida intelectual, Letras e Ciência~
Religião-Espiritualidade
Morte de S. Francisco Xavier. O concílio é suspenso. Criação do Collegium germanicum de Roma e de um colégio jesuíta em Viena.
1552
1555
Economia-Sociedade
Campanha do duoue de Guise em Itália. A Espanha e a Inglaterra aliadas na guerra contra a França. Batalha de Saint-Quentin.
Bancarrota espanhola. Crise financeira em Antuérpia.
204
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Datas
1552
Criação da Universidade do México.
1553
1554
i
Morte de Júlio 111. Marcelo 11. A seguir, Caraffa toma o nome de Paulo IV.
Louise Labé: Sonnets. 1555-1628. Malherbe.
1555-1557. Miguel Ângelo: Deposição no Túmulo (Florença).
Pilhagem de Havana pelos Franceses, que tentam também instalar-se no Brasil.
1555
Morte de S. Inácio de Loyola. Abertura de colégios jesuítas em lngolstadt, em Praga e na Bélgica. John Knox é expulso da Escócia.
Publicação do livro de Pomponazzi De naturalium causis.
Palestrina: Missa Papa Marcelo.
do
Tomada de Astrakan por Ivan, o Terrível.
1556
Nova tentativa dos Franceses no· Brasil. Os Portugueses instalam-se em Macau.
1557
Édito de Compiegne. Incidentes do Pré-aux-Clercs. Coveiwnt dos protestantes escoceses.
205
Datas
1558
História Política da Europa
Morte de João III de Portugal. Sucede-lhe Sebastião. Morte de Carlos V. Fernando I, imperador. Morte de Maria Tudor. Sucede-lhe Isabel. François de Guise toma Calais.
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
Viela intulcctual, I .drus o Ciências
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
-----------1-------------------l-------------·------
Bancarrota francesa .
Cria~ão
da academia de Genebra. John Knox volta à Escócia.
1lu B ·l111y : Jeux rus ti-
Morte de Paulo IV. Pio IV. Primeiro Index vaticanus. Primeiro sínodo calvinista em Paris. Édito de Écouen.
i\ 111y0t: tradução das
Trabalhos de Pierre Lescot no Louvre.
1559
1560. Tintoretto: Susana no Banho. 1560?-1630. Gesualdo.
1560
Tratado de Cateau-Cambrésis. Morte de Henrique li. Francisco Il. Bill da uniformidade em Inglaterra.
1560
Michel de !'Hospital, chanceler. Isabel alia-se aos revoltosos escoceses. Morte de Francisco 11. Carlos IX.
1561
Estados Gerais de Orléans. Maria Stuart volta para a Escócia. Estados Gerais de Pontoise.
Sínodo dos reformados em Poitiers. Colóquio de Poissy. John Knox: Book of discipline. 1561-1562. Santa Teresa: O Livro da Minha Vida.
11ublicação
1562
Revolta dos protestantes. Cerco de Rouen. Batalha de Dreux. Os Ingleses ocupam o Havre.
Édito de Saint-Germain. Massacre de Vassy. Reabertura do concílio de Trento.
Ronsard: Discours des miseres de ce temps. 1562-1635. Lope de Vega.
Veronese: Bodas de Caná.
1563
François de Guise é assassinado. Édito de Amboise. Agitação anti-espanhola nos Países Baixos.
Fim do concílio de Trento. São publicados em Inglaterra os XXXIX articles. 1563-1641. Gomar.
Bcrnard Palissy: Recepte véritable ...
Início da construção do Escoriai.
Os Fugger em dificuldades. Pousada inglesa de lãs em Emden. Isabel publica o Statute of artificers.
206
1558
1/llt' S .
1559
Estabilização da libra esterlina em Inglaterra.
Datas
Vidas de Plutarco. Muntemayor: Diana.
C.
Os jesuítas na Polónia. «Tumulto» de Amboise. Édito de Romorantin.
1561
da Histoire d'Italie de Guichardin. 1561-1626. Sir Francis Bacon.
207
Expedição de John Hawkins à América.
1562
1563
---·----------------- -------,,.----------- ,-----, Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Vi d u intelec tual,
Religião-Espiritualidadc
I.ct ras c Ciências
- ----·-- -·- 1 - - - -·- -·- - - J - - - - - -.1564
1566
1567
Morte de Fernando I. Maximiliano li. Filipe 11 destitui Granvelle. 1564-1566. Viagem de Carlos IX pela França.
É
criado em França o lugar de superintendente de finanças.
Protesto dos «gueux» dos Países Baixos. Os Turcos tomam Chio aos Genoveses.
Os protestantes franceses novamente em armas. O duque de Alba nos Países Baixos. Assassínio de Darnley.
1568
Paz de Longjumeau e nova revolta dos protestantes franceses. O duque de Alba cria em Antuérpia um tribunal para os motins. Maria Stuart foge para Inglaterra. Isabel manda prendê-la.
1569
Batalhas de Jarnec e de Moncontour. Execução de Louis de Condé. União de Lublin entre a Polónia e a Lituânia.
1570
Paz de Saint-Germain. Os Turcos ocupam Chipre. Veneza, a Espanha e o papa aliam-se contra eles. Ivan, o Terrível, destrói Novgorod.
Ivan, o Terrível, dá liberdade de comércio à Moscovy Company.
A
indústria têxtil é proibida nas colónias espanholas.
Abre em Paris o colégio de Clermont. O catolicismo é restabelecido na Baviera. Morte de Calvino. Santa Teresa: O Caminho da Perfeição.
J'uhli cnção do Cinquie"' c livre de Rabelni s. 1 ', h4-16 16. William Shnkespeare. I 114- 1642. Galileu.
Eleição de Pio V. S. Carlos Borromeu: Catecismo do Concílio de Trento. Santa Teresa: Pensamentos sobre o A mor Divino.
.1.
1567-1622. S. Francisco
Nuscimento da Com· m edia del/'arte.
Fundação da ordem J . Dodin: Réponse aux dos Carmelitas des- . paradoxes de M. de calços por S. João Ma/estroit. da Cruz.
de Sales.
208
1564-1587. Tintoretto:
ciclo da Scuola di San Rocco. 1564? Brueghel: Dul/e Griet.
Uodin: Méthode la connaissance fncile de /'histoire. li ·nri Estienne: Apologie pour Hérodote.
Datas
I
Morte de Solimão, o Magnífico. Selim 11.
1566
Brueghel: O País de Cocanhú
Destruição das colónias francesas no Brasil.
1567
Brueghel: Jantar de Bodas e Dança dos Camponeses. 1568-1575. Construção da Igreja de Jesus em Roma (Vignola). 1568-1625. Brueghel de Velours. 1568-1639. Campanella. 1568-1643. Monteverdi.
Batalha de San Juan de Ulloa entre ·os Espanhóis e Hawkins.
1568
put11·
Mapa-múndi de Mercator (em projecção cilíndrica).
Bula Regnas in e:r:cel- Ortclius: Theatrum arbis terrarum. sis a excomungar Isabel.
I --·--~5641
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
1569
Veronese: Calvário.
209
1570
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
VIda intelectual, Lt'lrus e Ciências
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Datas
--------------l----------------·---1----------------------1571
1572
Batalha de Lepanto. Os Tártaros incendeiam Moscovo. Matança de S. Bartolomeu. Henrique de Navarra abjura. Revolta dos <
Greve de impressores em Paris e em Lyon. Bula de Pio V contra os câmbios ilícitos.
1 ~ /1 - 1630. Joha nnes I{ pler. 1~/1 - 1648 . Tirso de
Francis Drake captura o comboio espanhol das índias.
Morte de S. Pio V ltonsard: La FranciatJ, .. Gregório XIII. I knd Estienne: The.1•aurus linguO! grO!-
Palladio: Tratado de Arquitectura.
1571
Molina. Drake no Panamá.
1572
t'rc. I uls
de Camões: Os l.u.vladas.
1573
Catarina de Médicis faz a paz com os protestantes. O duque de Alba é chamado pelo rei. Paz entre Veneza e o~ Turcos. Eleição de Henrique de Anjou como rei da Polónia.
Santa Teresa: Consti llotman: Franco-Gallla. tuições. 'l'usso: Aminta. I 73-1613. Mathurin R6gnier. I. 73-1637. Ben Johns n.
Veronese: Jantar em Casa de Levi (Veneza). 1573-1610. Caravaggio.
1574
Morte de Carlos IX. Henrique III. Recomeçam as guerras religiosas. Henrique de Anjou abandona a Polónia.
Rnnsard: Sonnets pour Hélene.
Ticiano: Retrato de Filipe I/.
1575
Estêvão Bathory, voivoda da Transilvânia, é eleito rei da Polónia.
1576
Paz do «monsenhor». ·Hostilidades entre a Édito de Beaulieu. Hansa e os Merchant Formação da Liga. adventurers. D. Juan, governador dos Países Baixos. As guarnições espanholas revoltam-se. «Fúria de Antuérpia». Morte de Maximiliano 11. Sucede-lhe Rodolfo 11.
Bancarrota espanhola.
210
Tintoretto: Júpiter Dando a Veneza o Império do Mundo.
Bula de aprovação d1 fundação do Orató rio de S. Filipe Neri
1573
Reconquista de Tunes e Bizerta pelos Turcos.
1574
1575
1576
1575-1660. S. Vicente . Bodin: La République. de Paula.
rlir Humphrey Gilbert: Discurso sobre a Descoberta. V\,bre em Londres o primeiro teatro per· manente.
211
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
Religião-Espiritualidade
1577
Evasão de Henrique de Navarra. Recomeça a guerra civil até à paz de Bergerac. União de Bruxelas. <<Édito perpétuo». Guilherme de Orange em Bruxelas.
Reforma monetária em França.
Gregório XIII confia a Palestrina e Zoilo a remodelação do cantochão. Édito de Poitiers. Santa Teresa: As Moradas.
1578
Morte de D. Juan. Sucede-lhe Alexandre Farnese. Morte de Sebastião de Portugal.
Os Genoveses perdem a concessão do alumínio da Tolfa.
Fundação do semmário de lngolstadt.
1579
União de Arras. União de Utrecht. Formação das Províncias Unidas.
As feiras ditas «de Besançon» instalam-se em Placência.
Fausto Sozzini na Po·· lónia.
II 1580
Acontecimentos no resto do mundo
Datas
1577-1579. El Greco:
Início da viagem de Drake de volta ao mundo. . Martin Frobisher procura a passagem do noroeste.
1577
Veronese decora o pat.•hu Lilly: Euphues. lácio dos Doges de Jldmund Spenser: She-· fJhcrd's calendar. Veneza. Tintoretto: Vênus, Ariadne e Baco.
Os Portugueses, ao tentar conquistar Marrocos, são derrotados em Ksar-el-Kebir.
1578
Vldn Intelectual, 1 ••t.us c Ciências
Trindade (Prado). 1577-1640. Rubens.
Montaigne: primeira ·dição dos Essais. 11 ·rnanl Palissy: Disl'ours admirable. ( 1uarini: Pastor fido. 'l'nsso: Jerusalém Libertada.
Filipe II é reconhecido como rei de Portugal.
El Greco: Espolio.
1579
El Greco: Adoração do Nome de Jesus. 1580-1584. Teatro Olímpico de Vicenza. 1580-1666. Frans Hals.
1580
Regresso de Drake a Inglaterra.
Vicenzo Galilei: Diálogos da Música Antiga e Moderna. Sir Philip Sidney: Apofogie for poetrie.
Fundação da Levant company. Em França: édito sobre os corpos de ofícios.
1581
Os Estados da Haia proclamam a queda de Filipe II.
1582
A Liga é subvencionada por Filipe II.
Gregório XIII reforma o calendário.
Giordano Bruno: De umbris idearum.
1584
Morte de Ivan, o Terrível. Começo do «tempo das perturbações». Assassínio de Guilherme, o Taciturno. Tomada de Gand por -Alexandre Farnese.
1584-1585. Redacção
Ccrvantes: Numdncia.
da Ratio studiorum dos jesuítas.
212
Artes
1581
1582
Conclusão da construção do Escoriai.
213
1584
Datas
História Política da Europa
1585
Sisto V declara que o futuro Henriqu e IV perdeu o direito à coroa. Tomada de Antuérp ia por Alexand re Farnese. A Inglater ra alia-se às Províncias Unidas . Leicester nos Países Baixos.
1586
Morte de Estêvão Bathory.
1587
Execuç ão de Maria Stuart. Francis Drake pilha Cádis. Segismundo Vasa, re1 da Polónia.
Economia-Sociedade
Vldu lntclo ctual,
Religião-Espiritualidade
l.1 II'IS c C' ências
c •,., vantcs: Galate a.
Morte de Gregór io XIII. Sisto V. 1585-1638. Jansenius.
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
Datas
--1585-1672. Heinric h Schütz.
1585
1586-1588. El Greco:
1586
Enterro do Conde de Orgaz.
Criação do Banco di Ria/to de Veneza e da Tavola de Messina
I
1588
Dia das b
Molina: Acordo do Livre Arbitrio com a Graça.
1589
Morte de Catarina de Médicis. Henriqu e de Navarra e Henriqu e III reconcili am-se . Assassínio de Henrioue IH. Sucede-lhe . Henriqu e IV. A Liga faz rei o cardeal de Bourbo n. Batalha de Arques.
Criação do patrian ado de Moscovo.
1590
Batalha de Ivry. Henrique IV cerca Paris. Alexandre Farnese força-o a levantar o cerco.
Morte de Sisto V. Ur. bano VII, depois Gregório XIV.
Sir Walter Raleigh funda uma colónia inglesa na Virgínia.
Criução da Imprens a Vuticana. I SR7 -1588. M arlowe: Tamerlain.
Montaigne: te rceiro livro dos En saias.
Tintoret to: O Paraíso.
l588
Caravaggio: Baco.
1589
1590
Spenser: A R ainha das Fadas. Sidney: Arcadia. 159~1591. Sha:kespeare: Henrique VI.
215
214
J
1587
Datas
História Política da Europa
Economia-Sociedade
\Ida
Re!igião-Espiritualidade
intelectual, Ciências
Acontecimentos no resto do mundo
Artes
,.,,oiS c
-----------------------1------------------l------------------l 1591
Edicto de Nantes. A Liga cria o terror em Paris.
Morte de Gregório XIV e de Inocêncio IX.
1592
Morte de João 111 da Suécia. Scgismundo Vasa faz a união da Suécia com a Polónia.
Eleição de Clemente VIII. Edição definitiva da Vulgata sixtina.
1593
1594
1595
Estados Gerais do Louvre. Conferências de Sun sncs. O luteranismo é conservado como religião oficial na Suécia. 1593-1601. Guerra entre os Turcos e os Habsburgos.
Criação do Banco di Sant'Ambrogio em Milão.
Molina: Da Justiça e do Direito.
·--
Primeira expedição inglesa às índias Orientais.
I I
Datas
1591
Jacques
1592
I 594. Shakespea'f'itus Andronicus :1 Fera Amansa-
1593-1642. Georges de La Tour.
1593
\p1 rcce a Sátira Me'' p<'ia. I •11 - I 595. Shakespea-
1594-1665. Nicolas
111 lo w •: Eduardo li. l •'l 1593 . Shakespeali
1 •'' 11'
1
1592-1635.
Callot.
Nic·ardo li!.
""
Conversão de Henrique IV. -:ua entrada em Paris. Atentado de Jean Chastel.
Os jesuítas são banidos pelo parlamento de Paris.
Submissão do duque de Mayenne. Batalha de Fontaine-Française. Henrique IV reconquista a Barganha.
Clemente VIII absolve Henrique IV.
11594
Poussin.
Penas de Amor •rdidas, Romeu e lulieta. l l' :
I'
216
\parece o Atlas de M ·reator. 1 ,, ·1596. Shakespea'1 Ricardo I! e So!l!to de uma Noite ,(, Verão. I 'l 'i- 1650. Vaugelas.
1595-1600. El Greco: Vista de Toledo e Auto-retrato.
217
Sir Walter Raleigh na Venezuela. 1595-1597. Van Houtman na lnsulíndia.
1595
ÍNDICE DOCUMENTAL
O le itor encontrar á nel;te índice document al a maior parte das pala\ ras c expressões importan tes que figuram nesta obra, classificadas por m úcm alfabé tica e acompanhadas, conforme o programa da colecção, de desenvolvimento que o autor não achou necessário expor pormenohistória das riz ;~tl a m e n t e no texto: biografias de personagens important es, técnicas, das evolução es, instituiçõ de análise vas, significati mais cidades palavras-chave da civilização do Renascimento, etc. Muitas destas rubricas co mplementares relacionam-se com a história da arte e da literatura. As palavras em maiúsculas remetem para outra rubrica.
A ACADEM IAS Inovação do Renascim ento nascida em Itália. A importânc ia do cenáculo que se reunia à volta de Marsilio FICINO foi muito grande (v. II, p. 74). Mais modesto foi o papel das academias da segunda · metade do século XVI. Mas a nova fórmula estava destinada, na época do declínio das UNIVER SIDADES, à grande aura que conheceu no século XVII. ADRIAN O VI Um «bárbaro» no trono de S. Pedro. Adriaan Floriszoon, nascido em Utrecht em 1429, foi papa em 1522 por morte de LEÃO X. Morreu em Roma em 1523. Fora preceptor e ministro de CARLOS V, imperador.
cada em 1556, resume os conhecimentos da época quanto a geologia, minas (v. I, p. 176) e metalurgia (v. I, pp. 177-178). Deve-se a Herbert Hoover, que foi presidente dos Estados Unidos de 1929 a 1933, uma sua tradução para inglês. AGRICU LTURA As culturas regridem em muitos locais em benefício da CRIAÇÃ O DE GADO (v. I, pp. 78 e 249-250), mas na Flandres surge uma agricultur a de tipo quase moderno, com rendimen tos mais elevados que os do resto da Europa (v. I, pp. 251-252). De um modo geral, verifica-se um novo interesse pela fruta e pelos legumes (v. I, pp. 252-253), bem como pelas plantas de uso industrial (v. I, p. 252). A importân cia do contribut o das plantas originárias do continent e american o é discutível. (V. I, p. 253.)
AGRICO LA
AILLY, Pierre d'
Georg Bauer, dito Agricola. Nascido em 1494, morreu em 1555. Médico em Joachimstahl em 1527, interessou-se também pela mineralurgia e pela metalurgia. Pode-se considerar . que a sua obra De re metallica, escrita em 1530 e publi-
Prelado e teólogo nascido em Compiêgne em 1350 e falecido em Avinhão em 1420. Nomeado cardeal em 1412, procurou pôr fim ao Grande CISMA (v. I, p. 121), especialmente ao reclamar no CONCí-
221
Roma em 1503 depois de ter levado a vida dissoluta de tantos grandes senhores do seu tempo (v. li, p. 99). Teve vários filhos, entre os quais Lucrécia e César BóRGIA (v. I, p. 125). Excomungou SA VONAROLA, que denunciava a sua escandalosa conduta e a sua eleição simoníaca (v. I, p. 143).
LIO de Constança - onde atacou violentamente a heresia HUSSIT A - a reforma da cúria ·romana e a criação de um concílio geral a que o papa teria de submeter-se. Homem de letras, escreveu cerca de 170 obras. Na !mago mundi (V. I, p. 53) levantou o problema -nessa época de capital importância- da forma redonda da Terra e pressentiu, antes de ~opérnico, o movimento de rotação do nosso planeta em volta do próprio eixo. (V. I, p. 145.)
ALTDORFER, Albrecht Pintor, gravador e arquitecto, nasceu em Regensburgo pouco antes de 1480 e ali morreu em 1538. Nas suas obras poderíamos ver apenas uma pura pintura de paisagens animada pela narração de lendas: por exemplo, em Susana no Banho (Munique) o verdadeiro assunto do quadro é o fabuloso palácio, construção onírica cuja composição geométrica e cristalina se opõe às linhas curvas da paisagem; e, em S. Jorge e o Dragão (Munique), o santo dificilmente se destaca da minuciosa massa de arvoredo. Mas há em Altdorfer a noção, fundamental, de um indissolúvel laço entre a natureza e os acontecimentos humanos que nela se passam. Na Batalha de Alexandre (Munique), «a paisagem universal assume dimensões cósmicas: o drama terrestre encontra o seu eco no combate dos exércitos, das nuvens, do sol e da lua, da luz e da obscuridade» (Otto Benesch). Exprime-se nesta pintura inquieta uma nova representação do espaço «aberto» e nela a miniatura é uma arte monumental: é esta, provavelmente, a obra-prima do pintor. (V. I, pp. 94, 95; v. li, pp. 33, 41 e 46.)
ALBER TI, Leone Battista Eminente platônico do Renascimento e filósofo da ARQUITECTURA e do URBANISMO (v. I, pp. 116, 256, 261 e 266; v. li, p. 33). Nascido em Génova em 1404, numa antiga família de comerciantes florentinos, foi músico, pintor e escultor, mas, antes do mais, arquitecto (v. I, pp. 152, 153). Leitor atento de Vitrúvio, escreveu o seu célebre tratado De re redificatoria (impresso depois da sua morte, em 1485) tomando como base de referência a arte da Antiguidade. Baseava na música dos números a harmonia das proporções e concebia o edifício como um todo com o qual era solidário cada um dos seus elementos. Foi excelente na concepção de plantas e modelos. Deve-se-lhe a frontaria de Santa Maria Novena e o Palácio Rucellai em Florença, San Sebastiano e Sant' Andrea em Mântua e o templo Malatesta de Rimini: a Igreja San Francesco, à qual deu, por fachada, um arco de triunfo (v. I, p. 156). Morreu em Roma em 1472. (V. li, p. 96.)
ALúMEN
ALEXANDRE VI
Sulfato duplo de alumínio e potássio, hidrato: foi fundamental nas economias de tipo antigo', em que a indústria T"f:XTIL estava bastante à frente da metalurgia. De facto,
Rodrigo Borgia, sobrinho de Calisto III, nasceu em Espanha em 1431 e foi papa em 1492 por morte de INOC"f:NCIO VIII. Morreu em 222
o alúmen era utilizado como mordente na tinturaria dos tecidos. No a rtigo «alúmen» da Enciclopédia de D'Alembert e Diderot pode-se ler: «É um dos principais ingredientes das tintas e dos corantes que, para dar o devido resultado, não podem passar sem ele. Serve pata fixar a cor no tecido ... Também prepara os tecidos para receber as cores, dando a estas maior vida c delicadeza ... Este efeito do alúmen parece ser devido às suas propriedades adstringentes, graças às quais prende as mínimas partículas dos corantes, conservando-as unidas e impedindo a sua evaporação. É também assim que faz com que o papel, depois de por muito tempo mergulhado em água aluminosa, não borre ao escrever-se-lhe por cima». Na Idade Média, o alúmen utilizado no Ocidente vinha, principalmente, da Anatólia (Foceia). Depois de a região ter caído sob domínio dos Turcos, o alúmen foi procurado noutros sítios, tendo sido encontrado, cerca de 1461, em Tolfa, perto de Roma, e em Mazarron, perto de Cartagena (v. I, pp. 236, 243). Nos séculos XVII e XVIII o alúmen inglês, de Liêge, da Saxônia e da Suécia concorreu vitoriosamente com o dos paí~ ses meridionais. Os Genoveses tinham constituído nos séculos XIV e XV um verdadeiro «Carteb> do alúmen, a Mahona de Chio, que tinha o exclusivo da venda no Ocidente do mineral oriental (v. I, pp. 30, 243). Depois de 1461, os Médicis tentaram a mesma operação com o alúmen de Tolfa; mas só durante alguns anos tiveram êxito (v. I, pp. 223, 233). No século XVI, as minas de alúmen pontificais, em plena prosperidade, fizeram a fortuna de Agostino CHIGI e foram depois concessionadas ora a sociedades florentinas ora a companhias genovesas. : (Bibli.: J. Delumau, L'Alun de Rome, Paris, 1962).
AMÁLGAMA Este processo consiste em tratar o minério argentífero com mercúrio (v. I, pp. 178, 233). Permitiu o aumento da produção de prata: em primeiro lugar na Europa Central e depois na América (v. I, p. 68). AMYOT, Jacques Nascido em Melun em 1513, estudou na Universidade de Paris (v. li, p. 71) e depois em Bourges, onde ensinou grego e latim de 1536 a 1546. Tendo traduzido as Etiópias de Heliodoro, foi distinguido por Francisco I, que lhe deu a abadia de Bellozane e o encarregou de traduzir Plutarco para francês. Viveu então algum tempo em Itália, onde compulsou manuscritos gregos e latinos e onde participou no CONCíLIO de Trento. Ao voltar a França, foi nomeado preceptor dos futuros CARLOS IX e HENRIQUE III. Publicou em 1529 a tradução de Daphnis et Chloé de Longus e a das Vidas Paralelas de Plutarco, a sua obra-prima (v. I, pp. 86, 96). Capelão-mor de França em 1560 e bispo de Auxerre em 1570, dividiu o resto da sua vida entre a diocese, onde lutou contra o protestantismo, e a actividade literária (Obras Morais de Plutarco, 1572). Morreu em 1593. O Amyot escritor influenciou profundamente o espírito e a literatura do século XVI. Não só deu a conhecer à França a obra de Plutarco como a beleza da sua escrita e a clareza e vigor do seu estilo anunciavam já a prosa clássica. MONTAIGNE agradecia-lhe ter ensinado aos seus contemporâneos como se devia escrever e declarava: «É ele o nosso breviário». ANABAPTISMO A palavra «anabaptistas» designou, a partir dos primeiros tempos da 223
Reforma (1522-1523), aqueles cristãos que pediam aos «eleitos» que se reunissem, rompessem com o mundo pecador e constituíssem comunidades de «santos», nas quais se poderia entrar mediante um segundo baptismo. Os grupos anabaptistas formaram-se espontaneamente na Suíça, na Alemanha e nos Países Baixos. Desde muito cedo se desenharam neles duas tendências. Uma preconizava o uso da violência para fazer desaparecer os ímpios e as suas obras. Os seus adeptos conduziram a revolta dos camponeses alemães de 1525 (v. I, p. 133) e provocaram em 1535 a «tragédia de Münster (v. li, p. 14). Mas, mesmo ainda antes do fracasso destas revoltas, já um anabaptismo pacífico e pacifista (v. II, p. 121) se manifestara na Suíça, na Alemanha Setentrional e ·na Áustria. Em 1527 reuniu em Schlatt, na alta Alemanha, uma assembleia de anabaptistas que convidou os verdadeiros cristãos a formar comunidades sem outras armas senão a fé e a palavra divina e a rejeitar qualquer responsabilidade que envolvesse o «direito do gládio». O anabaptismo, quer de uma quer de outra destas duas tendências, propagou-se no seio do povo miúdo dos artesãos, em especial nos Países Baixos, onde os grupos heterodoxos eram, por volta de 1530, muito numerosos e muito activos. As sedições de 1525 e 1535 deixaram tais recordações aos príncipes e às oligarquias dirigentes que os anabaptistas - pacíficos ou não - foram perseguidos em toda a parte tanto pelos católicos como pelos px:otestantes. Dois holandeses, hostis à violência - David Joris, morto em 1556 (v. li, p. 14), e Menno Simons, morto em 1559-, foram apoiantes e propagadores clandestinos do anabaptismo na Europa Ocidental. O anabaptismo enxameou da Holanda para Inglaterra no fim do século XVI e prinCípio do século XVII, dando ali origem à seita dos bap-
tistas, que depois viria a desenvolver-se na América. Mas, e também a partir dos Países Baixos, contribuíra já, na primeira · metade do século XVI, para a difusão do inconformismo religioso na Polónia e na Lituânia, preparando o caminho para o antitrinitarismo dos SOCINIANOS. Os anabaptistas pacíficos, como desejavam formar «companhias de fiéis chamados pela palavra de Deus, separados do mundo e dos seus caminhos de perdição», foram dos primeiros a reclamar a separação da Igreja e do Estado e a preconizar a TOLERÂNCIA religiosa. (Bibl.: J. Lecler, Histoire de La tolérance au siecle de la Réfor·me, 2 vols., Paris 1955). ANTI CRISTO Esta personagem do Apocalipse foi um verdadeiro mito na história europeia da Pré-Reforma (v. I, p. 144). Na Alemanha jogou-se um Jogo do Anticristo e quase em toda a parte foram escritas Vidas do Anticristo. Pregadores como Vicente Ferrer e Manfred de Vercelli anunciavam a iminente chegada do inimigo de Deus e, para eles, a salvação resumia-se muitas vezes à defesa contra o diabo. WYCLIF via naqueles que não eram predestinados os adeptos do Anticristo. O tema do Anticristo, também presente no reformismo checo, alimentou o entusiasmo milenarista dos «taboritas». No início do século XVI, o receio do falso profeta cujo advento anunciaria o fim do mundo- ambos os receios estavam ligados entre si- continuava a preocupar os espíritos, como o testemunha o fresco de Luca SIGNORELLI da Catedral de Orvieto. Pouco tempo depois, LUTERO identificaria o papa com o Anticristo. Mas, depois de estalar o drama da Reforma, o enviado de Satã desapareceu gradualmente da cena.
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ANTO NELLO DA MESSINA Nascido em Messina cerca de 1430, ali morreu em 1479. A sua formação decorreu em Nápoles (v. I , p. 91) : seu mestre, Colantonio, na a união dos elementos flamengo, provençal e francês. Graças a 'o lantonio, Antonello descobriu V AN EYCK -por meio dos quadros das colecções napolitanas. É possível que tenha encontrado Pe1rus Christu:; em Milão e PIERO DELLA FRANCESCA em Roma: as influências de ambos estes pintores são visíveis na sua obra. Antoncllo da Messina soube, melhor que qualquer outro, adaptar as fórmulas flamengas à sensibilidade italiana. Por ocasião de uma viagem a Veneza em 1475, teria contribuído para divulgar nessa cidade a técnica da pintura a óleo. Entre as suas obras mais dignas de nota podemos citar o S. Sebastião de Dresden e a Crucifixão de Londres. ANTUÉRPIA «A excelente e famosa cidade de Antuérpia», para usar uma expressão de Ludovico Guicciardini na célebre Descrizione di tutti i Paesi Bassi (1567), foi uma das capitais económicas da Europa do século XVI (v. I, p. 68). Todo um conjunto de circunstâncias facilitou a subida de Antuérpia no fim do século XV e no século XVI: a decadência de BRUGES, a implantação (v. I, p. 71) dos ricos mercadores da Alemanha do Sul: Hochstetter, WELSER, FUGGER (v. I, pp. 225, 227), senhores das minas de prata e de cobre da Europa Central, que estavam em permanentes relações de negócios com VENEZA; a instalação de um feitor do rei de Portugal por cuja acção Antuérpia passou a ser o grande centro de distribuição das ESPECIARIAS para os países ribeirinhos do Mar do Norte
e do Báltico (v. I, p. 240); a confiscação -pelo menos intermitente pelo porto do Escalda do trânsito dos ALúMENES italianos e espanhóis; por fim, a importação, pelos Merchant adventurers, de quantidades cada vez maiores de panos ingleses destinados à Europa Central, a Itália ou mesmo ao Levante (por Veneza e Ancona). Possuindo poucos navios mas acolhendo muitos (no entanto é fantasioso o número de 500 por dia, por vezes citado), habitada por numerosas colónias estrangeiras, em especial de mercadores italianos, espanhóis e portugueses, e frequentada por marinheiros de todas as nações, entre os quais muitos franceses, célebre pela sua poderosa grua, orgulhosa da sua espaçosa e alta catedral e da BOLSA reconstruída em 1531 (v. I, p. 267), a cidade foi o verdadeiro coraÇão do império de CARLOS V e, a partir de 1525-1530, praça bancária de muita importância (v. -I, pp. 212, 215, 225). O governo dos Países Baixos _tinha ali, por conta do imperador, uma permanente dívida flutuante· a curto prazo que, em 1556, atingia 7 milhões de libras. Do mesmo modo, Carlos V tinha em Antuérpia feitores encarregados de acompanhar o movimento dessa dívida e de fazer os contratos de fornecimentos para os seus exércitos (Lazarus Tucher de 1529 a 1541, Gaspare Ducci de 1542 a 1550). Em 1568 Antuérpia era a maior cidade dos Países Baixos (v. I, p. 257). Tinha uma indú~ tria próspera de tapeçaria, IMPRENSA, etc. (v. I, p. 91; v. II, p. 74). Tinha acabado de erguer um majestoso edifício municipal de estilo renascentista (v. I, p. 115). Mas a infelicidade vinha a caminho. Antuérpia tinha de há muito uma considerável percentagem de protestantes. De resto, a Reforma tinha atingido fortemente toda a região. A «fúria iconoclasta» de 1566, a guerra re-
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ligiosa que começou em 1568. o saque de Antuérpia em 1576 por tropas espanholas não pagas e amotinadas, a crescente dificuldade das relações marítimas entre o Mar do Norte e a Península Ibérica por causa da pirataria inglesa (v. I, p. 227), a conquista da cidade por Al"exandre FARNESE em 1585 e, finalmente, o encerramento da foz do Escalda pelos Holandeses, instalados em ambas as margens, provocaram o declínio da metrópole econômica dos Países Baixos (v. I, p. 242). No século XVII, Antuérpia continuou a ser uma praça bancária de certa importância, mas muito inferior a Amsterdão ; cidade de arte - a cidade de Rubens e de Van Dyck - , perdeu a posição internacional que tivera no século anterior. (Bibl.: H. Van Werveke, Bruges et Anvers, Bruxelas, 1944; R. Ehrenberg, Le sii!Cle des Fugger, Paris, 1955; E. Coornaert, Les Français et !e commerce international à Anvers, 2 vols., Paris, 1961; H. Van der Wee, The growth of the Antwerp market and the european economy (XVIth and XVIlth centuries), 3 vols., Haia, 1963). ARCIMBOLDO , Giuseppe Nascido em Milão entre 1527 e 1530, ali morreu em 1593. Até 1587 foi pintor da corte dos Habsburgos em Viena. Os seus quadros alegóricos, em que a estrutura de um rosto é obtida por uma fantástica combinação de frutos, legumes, armas ou peixes - simbolizando as estações, a guerra ou os elementos - , foram largamente imitados: só se cónhece um pequeno número de obras que possam ser-lhe atribuídas sem margem para dúvidas. Essas estranhas «naturezas mortas» exprimem o aspecto fantástico do MANEIRISMO da Europa Central na segunda metade do século XVI. (V. li, pp. 126, 127.)
A RETINO Pietro Aretino, dito «o Aretino». A pior língua do século XVI. Nasceu em 1492 em Arezzo, de onde bem depressa o baniram por causa da sua pena mordaz e satírica. Foi então para ROMA, onde foi protegido de LEÃO X. Mas, depois de publicar uns sonetos obscenos, teve de refugiar-se na corte de João de MÉDICIS. Por morte deste, instalou-se em VENEZA, onde escreveu duas comédias licenciosas, a tragédia Orazia, muitos sonetos e as famosas Cartas, nas quais a lisonja alterna com a mais acerada zombaria. Escritor de talento, frequentemente grosseiro, viveu dos subsídios que lhe davam os con- . temporâneos receosos da sua maldade (v. li, p. 42). Grande conhecedor de pintura (v. li, p. 116), foi amigo de TICIANO. Morreu em 1556. ARIOSTO Ludovico Ariosto, dito «o Ariosto». Nascido em Reggio Emilia em 1474. A sua obra introduz-nos no ambiente humanista da corte de Ferrara onde, para auxiliar nove irmãos e irmãs depois .da morte do pai, teve de servir primeiro o cardeal Ippolito d'Este e depois o duque Alfonso d'Este. Acha, muitas vezes, ingratas as tarefas que lhe são confiadas e disso se queixa com espírito nas Sátiras. Amável, sonhador, pouco ambicioso, aspira a uma vida tranquila e ganha alguma liberdade em 1525 sem, porém, deixar Ferrara, onde vive com Alessandra Benucci Strozzi, que mais tarde desposará; ali morre em 1533. Além das Sátiras, é autor de comédias inspiradas em Plauto e Terêncio e, principalmente, do Orlando Furioso (v. I, p. 114), um dos maiores êxitos livreiros do século XVI (v. li, p. 15), que ainda em 1664 inspirou as «festas da ilha encantada» dadas em Versalhes por Luís XIV em honra de M. 11" de La Valliêre. (V. I, p. 187.)
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A RlSTóTELES Embora o Renascimento tenha si-
do largamente PLATóNICO, tam-
bém não desprezou Aristóteles. O patrício veneziano Ermolao Barbaro, abandonando as velhas traduções, procurou descobrir o pensamento do «Estagirita» nos textos originais. Aldo MANUZIO (v. I, p. 98) publicou em 1492, em Veneza, a edição princeps das obras de Aristóteles. LEF:EVRE D'ÉT APLES (v. I, p. 96), que em 1490 concluíra uma· lntroduction à la «Métaphysique» d'Aristote e que depois conheceu em Itália Ermolao Barbaro, também pretendeu libertar a obra do preceptor de Alexandre dos comentários medievais que a obscureciam. Tal como Ermolao Barbaro, interpretava Aristóteles em sentido cristão. Mas o Renascimento viu também o apogeu da «escola de Pádua» (v. li, pp. 102-103), cujos representantes mais conhecidos foram POMPONAZZI e, em França, Étienne Dolet e Vimercati, leitor de filosofia no colégio real. Ora os «paduanos» insistiam na eternidade do mundo e negavam a imortalidade da alma individual. A sobrevivência de Aristóteles na época do Renascimento é também visível no domínio científico. A FíSICA conservou a teoria dos quatro elementos (v. li, pp. 129-130, 139); a Botânica e a Zoologia, continuando no caminho traçado por Aristóteles, não eram mais que catálogos de seres vivos. Apesar de tudo, os séculos· XV e XVI -de Lorenzo VALLA a RAMUS e de Nicolau de CUSA a saldaram-se, de COPÉRNICO um modo global, pelo pôr em causa de Aristóteles (v. li, pp. 144-147). O Renascimento terminou com Giordano BRUNO e com Francis BACON, que rejeitavam Aristóteles: o primeiro em nome de uma espécie de panteísmo saído da tradição neoplatónica (v. li,
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p. 108) e o segundo com o primado da experiência. Estava chegado o tempo de Galileu. ARMAMENTO O armamento, quer defensivo quer ofensivo, foi profundamente transformado pela utilização da pólvora pela fabricação de canhões (v. pp. 181-183) e arcabuzes (v. I, pp. 185-186) e pelo aperfeiçoamento das fortificações abaluartadas (v. I, pp. 187-190). No mar, a artilharia trouxe consigo o triunfo dos navios de alto bordo sobre as galeras (v. I, pp. 184-185). (Gravuras 32, 47 e 48 do v. I.)
r:
ARQUEOLOG IA Foi em Itália, principalmente em Roma, que nos séculos XV e XVI se desenvolveram o gosto e o estudo das antiguidades (v. I, pp. 99~ -102). As escavações eram cada vez mais numerosas e começaram a aparecer as primeiras colecções de antiguidades: as dos p~ntífices (PAULO _li, SISTO IV, JULIO li) e depOis as da aristocracia romana (FARNESE della Valle, Médicis). As plant~s de Roma antiga, os catálogos, os estudos sobre monumentos antigos as cópias de estátuas deram a co~he cer, em Itália e fora dela, os vestígios da antiga capital do mundo. Esta redescoberta da Antiguidade estava destinada a influenciar muito profundamente a cultura e a arte europeias. (V. I, p. 113.) ARQUITECTU RA É indiscutível que a Idade Média edificou notáveis monumentos e teve técnicos de valor, como Villard de Honnecourt (v. I, p. 88). Mas a arquitectura medieval não estava isenta de um certo empi-
rismo. As naves góticas tinham de ser consolidadas com arcobotantes, e as da Catedral de Beauvais desmoronaram-se (v. I, p. 73). Na época do Renascimento, a arqui- · tectura foi objecto de reflexão teórica. Não só se imprimiu Vitrúvio (v. I, gravura 22) como também ALBER TI, SERLIO, Philibert de l'ORME escreveram tratados sobre a arte de construir (v. I, p. 155). Estudaram-se as proporções dos monumentos antigos (v. I, pp. 106-113) e LEONARDO DA VINCI procurou resolver matematicamen te os problemas das fendas das construções e da resistência dos arcos (v. I, p. 161). Espectaculares realizações, a mais célebre das quais é a cúpula de Santa Maria dei Piore (v. I, p. 163), atraíram as atenções gerais. No entanto, o regresso à estética greco-romana levou a que, de um modo geral, se desse preferência às linhas horizontais, em vez das verticais que a Idade Média tanto apreciara (v. I, gravura 20). A filosofia neoplatónica incitou os maiores arquitectos \BRAMANTE, MIGUEL ÂNGEI O, etc.) a edificar igrejas de planta radial encimadas por cúpulas (v. I, p. 115). (V. I, pp. 115-116.) A - do Renascimento em França (v. I, mapa 23). ASTROLOGIA A astrologia desempenhou, sem dúvida, um papel mais importante no Renascimento que na Idade Média, como provam muitos testemunhos iconográficos (v. II, pp. 54-55) e literários (v. II, pp. 51-53, 129). É consequência de uma concepção vitalista do universo, que vê nos astros seres providos de sentimentos humanos que eles transmitem a quem nasce sob o seu signo (v. II, p. 130). Além disso, cada planeta governa uma zona geográfica e impera numa parte do mundo mineral (v. II, p. 132). Naquela época parecia
impossível agir sem previamente consultar os astros; isto tanto para os magos e os chefes de estado como para os simples particulares. A astrologia conduzia, assim, a uma concepção muito estreita da liberdade do homem (v. II, pp. 56-60); mas o neoplatonismo ficiniano conseguiu conciliar a inquietação saturniana com a exaltação do ho· mem. ASTRONOMIA N~colau de Cusa foi o primeiro a afirmar que o mundo é ilimitado (v. II, p. 144). No século seguinte, a moda do PIT AGORISMO levou COPÉRNICO a examinar a concepção heliocêntrica outrora proposta por certos pitagóricos. Defendeu-a depois com revolucionária clareza (v. II, pp. 144-147), não sem ficar ele próprio prisioneiro, sob certos aspectos, da cosmogonia ARISTOTÉLIC A e medieval. Giordano BRUNO, por fim, viria a afír· mar a infinidade do universo (v. I, p. 147). (V. II, gravuras 80 e 81).
AUGSBURGO Um dos principais centros económicos da · Europa na época do Renascimento e um dos locais de resistência preferidos de MAXIMILIANO. Situada perto das minas de prata e cobre da Europa Central, próxima também das regiões onde um activo artesanato fabricava os fustões (v. I, p. 71), unida a Veneza e ao Oriente pelo Brenner, a cidade conheceu o seu máximo de prosperidade no fim do século XV e no século XVI. Foi ela a cidade dos FUGGER e dos WELSER, cujas operações comerciais e bancárias se estendiam da Eslováquia à Espanha, de Roma a Antuérpia e a Lübeck, das Canárias à Venezuela. Augsburgo tinha 18 000 habitantes em 1475 e, -provavel-
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111cnte, 60 000 um século mais tarde. Os Fugger, a quem se deve o. coro da Igreja de Santa Ana (v. I, pp. R9, 108), construíram em Augsburgo uma pequena cidade para os seus operários, a Fuggerei, formada por 53 casas com 106 fogos. A cidade orgulha-se de ter sido berço dos HOLBEIN e do humanista Peutinger. Além disso, teve papel de primeiro plano na história da Reforma. Foi ali que Lutero se encontrou em 1518 com o legado do papa, Cajetano; foi ali que saiu a público o credo luterano e foi ali, também, que se concluiu a paz de 1555, que consagrava definitivamente a divisão religiosa da Alemanha. Em 1534, Augsburgo adoptara o protestantiSmo (mas não os Fugger), e tomou partido contra CARLOS V durante a guerra da liga de Schmalkalden. Conquistada pelas tropas imperialistas, foi severamente punida e voltou gradualmente ao ca~ tolicismo, especialmente sob a influência do bispo Otto Truchsess. A Guerra dos Trinta Anos foi desastrosa para Augsburgo, que em 1645 já só tinha uns 21 000 habitantes. AZTECA (império) Cobrindo no século XV a maior parte do México central (v. I, p. 62), o Império Azteca, estado militar e teocrático, era governado por uma religião cruel e pessimista. Socialmente, dividia-se em classes bem diferenciadas: nobreza feudal, povo livre (agricultores e artesãos), mercadores e escravos. A arte azteca - escultura, pintura e cerâmica era essencialmente religiosa. Algumas tribos mal dominadas pelos Aztecas sublevaram-se por ocasião da chegada de CORTEZ e facilitaram a conquista espanhola. (V. I, p. 61, gravura 9 e mapa 10; v. II, pp. 11-12 e gravura 71.)
B BACON, Francis Nasceu em 1561 e morreu em 1626. Tinha espírito superior ao carácter e a sua carreira pública não foi exemplar. Advogado, deputado nos Comuns em 1593, foi protegido do conde de Essex, favorito de Isabel I, mas depois voltou-se contra ele e obteve a sua condenação. Favorito, depois, de Jaime I e do duque de Buckingham, acumulou títulos e honrarias e foi nomeado grande chanceler em 1618. Mas a venalidade foi-lhe fatal. Acusado de concussão perante o Parlamento, perdeu o cargo e viu-se relegado da vida pública para a filosofia e a ciência. Havia já muito que combinava a carreira política com os trabalhos intelectuais. A sua fórmula, muitas vezes citada, «Só se triunfa da natureza quando se lhe obedece», pode ser interpretada como premonição da ciência moderna ou como aquiescência com as teorias vitalistas e ASTROLóGICA S do Renascimento. Por outro lado, e ao contrário de Galileu, Bacon não compreendeu todo o proveito que a pesquisa experimental podia tirar da MATEMÁTICA . Mas é difícil ver em Bacon apenas um homem do passado. Além das obras puramente literárias (Essays), é o seu interesse pela ciência que nos proíbe tal juízo. De facto, os seus principais trabalhos intitulam-se: Tratado do V alo r e do Avanço das Ciências (1605); Pensamentos e Opiniões sobre a Interpretação da Natureza (1607); Novum organum scientiarum (1620). Por outro lado, na sua Nova Atlântida (v. II, pp. 28-29), «UTOPIA» inacabada e publicada postumamente em 1627, Bacon imagina uma sociedáde dirigida por um «colégio universal» que agrupava laboratórios, bibliote-
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cas e observatórios e em que o trabalho de investigação científica era realizado por grupos de técnicos. O Novum organon, que até pelo título (a «nova lógica» opunha-se à lógica de ARISTóTELES) se apresentava como declaração de guerra ao aristotelismo, assim foi interpretado. O contributo de Francis Bacon para a criação do pensamento moderno pode ser esquematicamente sintetizado do seguinte modo: é preciso libertar a ciência de uma certa teologia, que fez a inteligência humana «estéril como uma freira»; é preciso submeter a natureza à experiência por meio de uma investigação a nível do solo: «Não é de asas que o nosso espírito necessita, mas sim de solas de chumbo»; é preciso destruir os obstáculos, os preconceitos, verdadeiros «ídolos» que o espírito humano pôs no seu próprio caminho; é preciso construir uma «ciência das causas»; é preciso tirar da experiência uma indução não simplesmente «totalizante», que se limite a constituir um C;u:ilogo dos dados adquiridos, mas «amplificante», que passe dos factos conhecidos aos que, racionalmente, se lhes possa assimilar levando em linha de conta o determinismo universal; é preciso, finalmente, promover uma ciência conquistadora que dê ao homem o domínio do mundo (Bibl.: A. Cresson, Francis Bacon, sa vie, son reuvre, Paris, 1956). BALBOA. Vasco Nuiiez de Conquistador espanhol nascido em Jerez em 1475. Partindo do golfo de Darien, na América Central, em 1513, em busca dos países do ouro, que pensava ir encontrar a sul, atravessou o istmo do Panamá e descobriu, portanto, o Oceano Pacífico (v. I, p. 58). Mas pouco depois, em 1517, foi decapitado por ordem do novo governador de Darien, Pedrarias.
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BALDUNG GRIEN, Hans Nascido em Schwãbisch-Gmünd em 1485 numa família de sábios, Hans Baldung, alcunhado de Grien viveu em Freiburg-im-Breisgau ~ em Es~rasburgo, onde morreu em 1540. F01 o mais importante e mais independente aluno de DüRER; os seus quadros, porém, são mais barrocos e mais fantásticos que os do mestre. Pintor, gravador e desenhador, Baldung pintou temas religiosos e retratos; mas o tema da morte (v. II, p. 48) e da decadência do corpo feminino - por vezes associado ao da FEITIÇARIA (v. II p. 127)- é, talvez, o mais fre: quente em toda a sua obra. (V. II, p. 55.) BANCOS Na Itália do início do século XV, especialmente em FLORENÇA havia vários tipos de bancos: ba'nchi di pegno, banchi a minuto, banchi in mercato, banchi grossi (v. I, p. 205). Os primeiros eram casas de empréstimos sobre penhores que exigiam juros de taxa muito elevada (20% ao ano), motivo pelo qual os franciscanos lançaram no século XV a fórmula dos «montepios». Os banchi a minuto são muito mal conhecidos. Mas, a ajuizar por alguns seus livros, ainda hoje conservados, a sua actividade consistia principalmente na venda de jóias a crédito, com pagamentos diferidos, e, em certos casos, empréstimos sobre penhor de jóias. Estes banchi a minuto, em Florença, faziam, por vezes, câmbios de mão a mão; mas nem aceitavam depósitos nem faziam transferências de dinheiro de uma conta para outra. Pelo contrário, a principal actividade dos banchi in mercato era o câmbio directo, realizado em algumas praças públicas importantes das cidades italianas e também de Barcelona, de.BRUGES e de outras cidades (v. I, pp. 213-215 e gráfico 53). Os cambistas ganharam muito depressa o cos-
lume de aceitar depósitos de dinheiro para o fazer render. De outro modo, seria difícil explicar o artigo da Arte dei cambio de Florença que previa que os cambistas poderiam operar transferências de conta para conta. à ordem oral do cliente, sob condição de as registar imediatamente nas escritas. Os banchi in mercato faliam com frequência. Bancos como os dos Bardi c dos MÉDICIS não eram, evidentemente, banchi in mercato mas sim banchi grossi. Um cronista florentino que escrevia em 1460 assevera que, nessa data, havia na cidade 33 banchi grossi «que trocam e comerciam em todos os lugares do mundo onde há câmbios e moeda» (v. I, pp. 218-220). Em 1464, Tomaso Portinari, representante dos Médicis em BRUGES, declarava: «A base da actividade da companhia é o comércio, no qual está investida a maior parte do nosso capital». Mas, no século XVI, os maiores bancos (v. I, mapa 54), especialmente os dos GENOVESES no tempo de FILIPE II, tiveram tendência para especializar-se na especulação cambial e nos empréstimos a particulares e aos soberanos (v. I, pp. 222-227). Os banchi grossi também eram vulneráveis. Epidemias de falências assinalaram os anos 1343-1348 e o fim do século XIV em Barcelona, o fim do século XV em Florença e o último quartel do século XVI em toda a Europa Ocidental (v. I, pp. 71-72, 73 228-229). Daí a criação dos bai:tcos públicos, que a princípio eram, principalmente, municipais. Era este ainda o caso do banco de Amsterdão (1609) no fim do período histórico que nos ocupa. Os depósitos de particulares estavam ali em local seguro mas não rendiam juro aos seus titulares. Estes bancos coibiam-se de especulações aventureiras mas prestavam aos depositantes os mesmos serviços que as actua.is caixas postais (Bibl.: J. C. Van Dillen, History of the principal public banks, Haia, 1934; R. de Roover, The Medici bank, New
York 1948; The rise and decline of the Medici bank, Cambridge (Mass., 1963). BANDITISMO O banditismo persistiu, de modo quase permanente, durante todo o longo p.eríodo do nosso estudo. Pensemos na França dos séculos XIV e XV, ensanguentada pelas tristes façanhas dos «gueux» e dos «écorcheurs», dos «chaperons blancs» da Normandia e dos «tuchins» do Languedoc, dos «coquillards» da Borgonha e dos «caimans» da íle-de-France. Os bandidos serão ainda muito numerosos no século XVII em Espanha e em Itália como também em França e, mais airida, na Alemanha da Guerra dos Trinta Anos. Os anos 1550-1600 assistiram, todavia, a um verdadeiro paroxismo deste fenómeno. F. Braudel insistiu fortemente no facto de este recrudescimento se ter dado ao mesmo tempo em todos os países mediterrânicos, fossem eles cristãos ou muçulmanos, e viu no banditismo o «irmão terrestre» do corso marítimo, então muito intenso. Além disso, as lutas confessionais deram cobertura, num país como a França, a excessos para os quais a religião, por vezes, era apenas um simples pretexto. A crise do banditismo europeu atingiu o auge em Itália entre 1570 e 1595 (v. I, p. 255). Os governos de Roma e de Nápoles tiveram de enviar verdadeiros exércitos contra os fuorusciti, dos quais só puderam livrar-se -parcialmente- concedendo-lhes 8alvo-condutos e autorizando-os a alistar-se nos exércitos oue combatiam contra os Turcos. São múltiplas as causas desta explosão de banditismo. As fomes da região mediterrânica dos anos 1578-1592 contribuíram para agudizar a crise, mas ha.via factores mais poderosos a agir em profundidade. Com efeito, é preciso ver-se no banditismo uma espécie de rejeição daquela centralização que todos os
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estados tentavam então acelerar. Daí a presença de grandes senhores feudais, como o conde Avogado e o duque de Montemarciano Alfonso Piccolomini, à frente d~ certos bandos de fora-da-lei. Esses homens representavam as forças centrífugas e rurais que procuravam entravar o advento do absolutismo. Mas o banditismo do fim do do século XVI tinha, ao mesmo te~po, ~m,tra. significação. Exprimia o divorcio crescente entre ricos e pobres (v. I, pp. 292-293) entre uma nobreza «vigorosamente reconstituída em famílias poderosas e combativas, escoradas em enormes bens fundiários, e uma massa de pobres cada vez mais numerosos e mais miseráveis lagartas e besouros, insectos h~ma nos infelizmente superabundantes . Uma fissura abre em duas as sociedades antigas e transforma-se em abismo» (F. Braudel) (Bibli.: F. Braudel, La Méditerranée et !e monde méditerranéen à l'époque de Philippe li, 2.• ed., Paris, 1967; S!J?re o banditismo no estado pontificai, J. Delumea .. , Vie économique et sacia/e de Rome dans la seconde moitié du xvr siecle t li ' · ' Paris, 1959).
Navegador holandês nascido cerca de 1550 que, procurando em vão uma passagem para a China pelo nordeste (v. I, p. 61), descobriu em 1594 a Novaia Zemliá e em 1596 o Spitzberg. No regress~ desta ex: pedição, foi obrigado a passar o mverno na Novaia Zemliá e aí morreu em 1597.
<
BELLINI
BEMBO, Pietro
:r:amília ~e pipto_res venezianos que tiveram mfluencia determinante sobre a pintura de VENEZA. Jacopo (cerca de 1400-1470), o primeiro dos Bellini está ainda ligado ao
Um dos humanistas mais notados da Itália nos fins do século XV e princípios do século XVI. Nascido em Veneza em 1470 e falecido em Roma em 1547. Notável latinista, estuda também grego com
BARENTS, Willem
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Lascaris. A sua admipelas línguas antigas não o l n lpl! d c de pensar que o italiano l!' lll de se r igual ao latim. Em I'> IJ , Leão X toma-o como secret 1rio (v. II, p. 101), mas Bembo ~< · tira-se em 1521 para Pádua. Em I ~ '9 é nomeado historiógrafo de Vt• ncza e bibliotecário de San Marro . Em 1539, PAULO III fá-lo ra rd ea l. Recebe então ordens de Piidrc e dedica-se ao estudo das 1\st; rituras e das obras dos Padres d:1 Igreja.
1 \11lsta ntin 1d\'lll>
11 1\NEDETTI, Giambattista Nnscido em Veneza em 1530 e fal ecido em Turim em 1590. Deve u a sua formação MATEMÁTI( 'A a Tartaglia. Opondo Arquimetlcs a ARISTóTELES , Benedetti, o mais notável FíSICO italiano do século XVI (v. II, pp. 135-136), pressentiu a importância da ciência quantitativa e desbravou o caminho a Galileu (v. II, pp. 140-141). BERRUGUETE Pai e filho, ambos nascidos em Paredes de Nava, Castela. Pedro (1450?-1503) era pintor. Tendo sido fortemente influenciado desde a aprendizagem pela escola flamenga, deu o melhor de si próprio entre 1474 e 1478 no palácio dos duques de URBINO, onde decorou, com Juste de Gand, o studiolo. Alonso (1490-1561) foi, antes do mais, um escultor. Também esteve em Itália, onde viveu uns quinze anos, tendo conhecido BRAMANTE e MIGUEL ÂNGELO (v. I, p. 119). Sofreu profunda influência deste último, a quem foi buscar o sentido dramático e dinâmico. As suas mais belas obras são os cadeirais do coro da Catedral de Toledo e o retábulo da Igreja de S. Bento de Valladolid.
BEZE, Théodore de Nascido em Vézelay em 1519, morto em Genebra em 1605. Abjurou do catolicismo em 1548 e ensinou grego em Lausanne e, depois, teologia em Genebra, onde se fez pastor. Discípulo e amigo de CALVINO (v. I, p. 134), substituiu-o, quando ele morreu, como reitor da academia de Genebra (v. II, p. 72) e moderador da companhia dos pastores. São muitas as suas obras, quer em latim quer em francês: poesias, panfletos, etc. Compôs uma tragédia bíblica, Abraão Sacrificando. É-lhe geralmente atribuída a Histoire ecclésiastique des Églises réformées du royaume de France (v. I, p. 98).
BíBLIA A crescente difusão da Bíblia na época da Pré-Reforma é atestada pelo testemunho de Sebastian BRANT na sua Nau dos Loucos (1494): «Toda a Alemanha regurgita de bíblias, de doutrinas sobre a salvação, de edições das obras dos santos padres e de livros semelhantes. Grandes abusos se infiltraram no nosso país. Vira-se e revira-se a Bíblia, faz-se-lhe dizer tudo aquilo que se quer que ela diga assim se pondo em perigo ao ri-tesmo tempo a fé e a Bíblia, que é o fundamento da fé... A sagrada escritura é, por assim dizer, posta do avesso e explicada completamente ao contrário daquilo que desejaria a boca da divina verdade». E. Delaruelle (Calloque d'histoire religieuse, Lyon, 1963, p. 17) fornece a seguinte estatística: «Número de impressões anteriores a 1520: da Bíblia alemã (quer em alto alemão quer em baixo alemão quer em holandês), 22; da Bíblia francesa, 23; italiana, 12; outras (catalã, checa, polaca, russa), 6; dos Salmos: em alemão, 37; em holandês, 17; em francês, 16; em italiano, 19; di-
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versos (dalmata, ruténico, sueco, etíope, etc.), 8; sem contar as edições especiais dos salmos da penitência e outros, diversos: 29 edições; dos Evangelhos, 5; das Epís~ tolas e Evangelhos dos domingos, 137>>. A tradução da Bíblia por Lutero (v. I, p. 126; v. II, p. 113), situa-se, pois, no interior ~e um mov1mento que começou mmto antes dele (v. I, pp. 139, 146). LUTERO, tal como os humanistas, abandonara a Vulgata pelo texto original. Rodeou-se de sábios. entre eles o humanista MELANCHTHON, e emendou a tradução diversas vezes. O seu alemão, a um tempo correcto e simples, era acessível à gente do povo. Daí o grande êxito da Bíblia luterana (v. I. p. 48): só no período da vida do reformador, foram feitas 84 impressões originais e, segundo estas, mais 253. BIRINGUCCIO, Vannoccio Nascido em 1480 e falecido em 1539. Foi, com AGRICOLA, o melhor especialista de assuntos metalúrgicos do século XVI (v. I, p. 153). ENGENHEIRO militar, serviu o papa PAULO III e interessou-se, especialmente, pela fundição de canhões e pelo fabrico da pólvora. Deixou-nos as suas observações na obra De la pirotechnia libri X, publicado postumamente em Veneza em 1540. (V. I, p. 180.) BOCCACIO Filho natural de um banqueiro florentino e de uma francesa, nasceu em Paris em 1313 e viveu depois em FLORENÇA e em NÁPOLES, onde frequentou a corte pouco severa mas requintada da filha do rei, que imortalizou na novela Fiammetta. Fixou-se em Florença em 1350 e aí compôs a sua obra-prima, o Decameron (v. li, p. 18), criando em prosa italiana (v. I, p. 47) o género da novela satírica e realista, cujo êxito viria a
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ser duradouro em toda a Europa. Convertido à austeridade, Boccacio chegou a pensar em destruir o Decameron. Dedicou-se aos estudos clássicos (v. I, p. 112) e escreveu em latim uma série de obras eruditas; a principal é, sem dúvida, o De genealogia deorum gentilium. A posteridade, porém, só tem conservado a sua obra escrita em italiano antes de 1350, principalmente o Decameron, a Fiammetta, o Ninfa/e fioselano, idílio mitológico, e o Ameto (v. II, p. 16), obra alegórica. Boccacio morreu em 1375 em Certaldo, na Toscana. BODIN, Jean Nascido em Angers em 1530, advogado e deputado, foi, a partir de 1584, tenente-general e depois procurador do rei em Laon, onde morreu em 1596. Espírito notável pela variedade das suas preocupações intelectuais e pela profundidade das suas análises. No seu Methodus ad facilem historiarum cognitionem (1566), insiste na necessidade de uma boa formação histórica dos juristas. Escritor político, mostra-se partidário, nos seis livros da République (1576) - a sua principal obra-, de uma monarquia sem dúvida absoluta mas mitigada pelos estados gerais e por um senado inamovível. Acentua a importância da família e o papel desempenhado na história pelo solo e pelo clima, prenunciando com isto Montesquieu. Economista, Jean Bodin é o autor da célebre Réponse aux paradoxes de M. de Malestroit (1568), na qual estabelece uma relação entre o afluxo dos METAIS PRECIOSOS oriundos da América e a subida de preços do século XVI (v. I, p. 69). Embora tenha justificado os processos contra a FEITIÇARIA na sua Démonomanie des sorciers (1580) (v. li, p. 128), foi defensor da TOLERÂNCIA religiosa - especialmente no Heptaplomeres (v. li, p. 105).
bolsas. Desta casa e desta família, por causa de tal brasão, teve nome essa praça. E, como os mercadores que transaccionavam em Bruges escolheram esta praça para seu abrigo, como ainda hoje costumam fazer, e iam depois para as feiras de Antuérpia e de Bergen, em relação e por semelhança com a de Bruges assim se acostumaram a chamar, aos locais e praças onde se juntavam nestas duas cidades, as Bolsas». Foi em 1485, quando muito, que os mercadores italianos transmitiram a ANTUÉRPIA (v. I, pp. 230 e 267) a usança de BRUGES. A bolsa tinha sobre as feiras uma superioridade: era permanente.
( Bibl. : P. Mesnard, L'essor de la philosophie politique au xvr sie,.,,., Paris 1936). IIOEUME, Jakob Nascido em 1575, Jakob Boehme 111orrcu em Goerlitz (Silésia), onde t' nt ·apateiro, em 1624. Fortemente lnl'lucnciado pelos MíSTICOS renanos do século XIII, muito espec ia Imente por Mestre Eckhart, as .~ 11as singulares opiniões teológicas (v. li, p. 36) puseram-no muitas ve'tl~s em conflito com a Igreja LU'1'1\RANA, a que pertencia. Os seus contemporâneos tomaram-no por 11111 visionário exaltado. A sua obra só teve verdadeira irradiação no s ·culo XIX, graças a Tieck e a Novalis na Alemanha e, em Françn, ao conde de Saint-Martin, que traduziu três dos seus livros. As s11as obras mais importantes são a Aurora Nascente ou a Raiz da Filnsofia, Os Três Princípios da Filo.WJ[ia e o Mysterium magnum. (13ibl.: A. Koyré, La Philosophie de Jakob Boehme, Paris, 1929). DOLSA Este nome tem origem na família de Bruges dos Van der Beurze, cujos membros eram, de pai para filho, corretores. O seu «hostel de Beurze» estava numa praça frequentada pelos mercadores estrangeiros, especialmente italianos. Ludovico Guicciardini, na sua Descrizione di tutti i Paesi Bassi, escreve (tradução francesa do século XVI): «É, portanto, preciso entender-se que há em Bruges uma praça muito limpa e cómoda .. . numa extremedidade dessa praça está uma grande e antiga casa, construída e fundada pela nobre família da Bolsa; assim se pode ver ainda nas armas da casa, gravadas numa pedra sobre o portal; e que são formadas por três
BóRGIA, César Nasceu em Roma em 1475. Filho dilecto de ALEXANDRE VI (v. I, p. 125). Bom soldado, político hábil mas ambicioso, traiçoeiro e desprovido de escrúpulos, pareceu a MAQUIAVEL o modelo do Príncipe (v. li, pp. 39-40). Nomeado cardeal pelo pai em 1493, e depois legado pontificai em França, renunciou ao cardinalato em 1498. Fez-se então duque do Valentinês, em consequência do seu casamento com Charlotte d'Albret, vigário de Imola e de Forli, gonfaloneiro da Igreja -funções que o levaram para a frente das tropas pontificais, que passaram daí em diante a servir os seus interesses - e, finalmente, duque da Romanha em 1499. O seu objectivo era criar um estado para si na Itália central. Afastou da cena, durante algum tempo, os Colonna e os Orsini. Mas, por morte de Alexandre VI, em 1503, não conseguiu evitar a eleição de JúLIO li, inimigo da família. Tendo fugido de Itália, morreu em Espanha numa emboscada ao serviço do sogro, Jean d'Albret, duque de Navarra (1507).
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BORGONHA (casa de)
sobre a «fantasia demoníaca» da época da Pré-Reforma. Mais profunda parece a interpretação de E. Castelli (Le démoniaque dans l'qrt, Paris, 1959, pp. 68-69): «As diversas Tentações de Santo Antão [v. 11, p. 20] que [Bosch] pintou mostram que as tentativas do Maligno para perder os homens são inumeráveis e tortuosas; e qUe a sedução dos artifícios não conhece limites. A história do homem é a história das suas repetidas quedas: a desgraça em oposição à graça. Há um convite forte... para a escolha entre o céu do artifício demoníaco e o céu que o sacrifício do Redentor abriu aos homens de boa vontade ... A arte de Bosch denuncia precisamente esse artifício demoníaco, como o provam o Inferno Musical do grande tríptico d~ J;>rado, a. Missa Sacrílega do triphco de Lisboa as florestas enfeitiçadas, os peixes voadores, as flores estranhas e perturbadoras nas suas cores e formas.» Os estudos destes último~ anos (J. Baltruisatis, Le Moyen Age fantastique, Paris, 1955) revelaram, de resto, que o Extremo Oriente marcara poderosamente o inferno do gótico final. Os globos cristalinos, tão caros a ~osch, seriam de importação asiática. Essas esferas representaram cada vez mais a prisão da qual o homem, escravo dos seus vícios não consegue evadir-se. O mund~ de vidro simboliza também a fragilidade das coisas terrestres. (V. I, pp. 51 e 144; v. 11, pp. 17, 19-20
JOÃO ll O BOM (1319-1364) rei de França do ramo directo dos'Valois, teve vários filhos do seu casamento com Bonne de Luxem~ burgo. Um deles, Carlos V foi rei de França em 1364. O quarto Filipe, o Ousado, herdou no mesm~ an9 o ducado da Borgonha, que Joao, o Bom, recebera por via de sua mãe Joana de Borgonha. Foi esse o tronco da segunda casa capetíngia de Borgonha. A Filipe, o Ousado, sucederam, de 1404 a 1419, seu filho João, sem Medo de 1419 a 1467 o filho deste Fi: Jipe, . o Bom, e de 1467 a 1477 o filho de Filipe, o Bom CARLOS o TEMERÁRIO. o Temerário te: ve uma filha, Maria de Borgonha (1457-1482), que casou com MAXIMILIANO de Habsburgo (imperador de 1493 a 1519). Seu filho Filipe, o Belo (1478-1506) casou com Joana, a Louca (1479-1555). Deste casamento nasceram CARLOS V (imperador. de 1519 a 1556), que teve um filho, FILIPE 11, rei de ~spanha (1527-1598), e Fernando I, rmperador de 1558 a 1564. (V. I, mapa . S.) BOSCH, Hieronymus Hieronymus Van Aeken, dito Hieronymus Bosch, nascido por volta de 1450, provavelmente em Hertogenbosch e falecido em 1516. Não se conhece bem a sua vida· muitas obras suas se perderam: Foi muito apreciado ainda em vida e ao longo de todo o século XVI. Filipe, o Belo, tinha um Juízo Final saído das suas mãos e Filipe 11 foi atraído pela sua graça b_urlesca. Mas será apenas bizar~ ria? Era essa a opinião de G. Papini (Le Diable, Paris, 1954). Ninguém negará que há nas obras de ~osch uma extravagância «infantil» e «carnavalesca». Mas a atitl!d~ negativa adoptada por Papim está em contradição com os resultados das recentes pesquisas
e 51.)
(Bibl.: L. Van Puyvelde, La peinture flamande au siecle de Bosch et de Breughel, Paris, 1962). BOTTICELLI Alessandro di Mariano Filipepi, dito Botticelli, nasceu em FLORENÇA em 1444. Ali morreu em 1510. Começou por trabalhar numa oficina de ourives e foi depois aluno de Fra Filippo Lippi. Toda a sua carreira decorreu na cidade natal,
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exccptuando uma viagem a Roma, t·rn 1481-1482, durante a qual pinlou três frescos na Capela Sistina. i\s suas preocupações humanistas t· a suas afinidades com o esoterismo neoplatónico, que saltam à vista nas duas obras maiores (v. I, p. 104; v. 11, pp. 114-115), inspiradas pelo círculo de Marsilio JiJCINO - A Primaver(l e O Nasl"imento de V é nus-, fazem dele um verdadeiro homem do Quattrocento. Mas, curiosamente, este pi nto r, que simboliza, em muitos aspectos, o Renascimento italiano, escapa em parte à sua época. Os problemas de volume, de PERSPECTIVA e de luz que obcecam os seus contemporâneos deixam-no quase indiferente; a PAISAGEM não lhe interessa; as suas figuras estão libertas de todos os laços com o espaço, por vezes tratado como um fundo de tapeçaria. A. Malraux define Botticelli como um pintor «que deforma quase tanto como El Greco e que é afastado do barroco principalmente pela sua indiferença à profundidade». O seu estilo agudo e a sua predilecção pelos contornos aparentam-no ao mesmo tempo com o linearismo gótico do fi m da Idade Média e com o MANEIRISMO nervoso e nevrótico do fim do Renascimento. Botticelli está muito longe da serenidade humanista: por trás da graciosidade das suas figuras sente-se uma inquietação ardente, «visível nos seus santos e nas suas madonas tantas vezes sofisticados, aturdidos, fantásticos, tristes, nas suas mulheres da vida real e do mito, cansadas de nascença, nascidas já maduras e ácidas ao mesmo tempo» (A. Ottino della Chiesa). Na sua obra não se vê um único sorriso, a não ser aquele sorriso incerto da Primavera: as suas Vénus estão acabrunhadas pela melancolia, as suas Virgens com o Menino são profundamente dolorosas. Nas suas duas Pietà (de Munique e de Milão), a tensão extrema das .linhas trai uma intensa angústia pictural, que é independente da
angústia do próprio assunto e a Natividade Mística de Londres, a despeito da exasperada claridade das cores e da perfeita mestria com que nela é dominada a expressão, revela, pelo seu lado convulsivo, o abandono a um sofrimento fechado sobre si próprio e sem descanso. Esta alma atormentada foi profundamente marcada pela pregação de SA VONAROLA: no fim da sua vida, a sua obra foi exclusivamente religiosa: Botticelli fez então admiráveis desenhos para ilustrar a Divina Comédia de Dante (v. I~ p. 194). Dos seus quadros profanos conhecemos apenas aqueles que ele não queimou. (V. 11, p. 61.) BRAMANTE Dona to d' Angelo Lazzari, dito Bramante. Nascido perto de URBINO em 1444. Foi, com Miguel Ângelo, o maior ARQUITECTO italiano do Renascimento. A sua vida pode ser dividida em três períodos diferentes. O primeiro corresponde à sua formação, como pintor e como arquitecto, em Urbino, onde foi aluno de Laurana. Em 1477- início da segunda fase-, foi para a Lombardia, onde ficou durante vinte e dois anos. Atraído a Milão por LUDOVICO, O MOURO, ergueu e decorou Santa Maria pressa San Satiro e o baptistério vizinho, fez o coro de Santa Maria delle Grazie e colaborou no projecto da Catedral de Pavia. Penetrado pelo HUMANISMO, inspirado pelo neoplatonismo, Bramante manifestava já predilecção pelas igrejas de planta central (v. I, p. 116). Mas não atingira ainda o classicismo e a simplicidade que caracterizam o seu terceiro período, o último e o mais importante da sua carreira. Chegado a Roma em 1499, criou aquela jóia que é o Tempietto do Janículo (San Pietro in Montorio), trabalhou no claustro della Pace e sem dúvida também no Palácio da Chancelaria, e foi encarregado
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por JúLIO II de realizar gigantescas obras: pretendia-se imitar e ultrapassar os Antigos (v. I, pp. 115, 116). Começou a juntar o Belvedere (v. I, p. 270) ao Palácio do VA TICANO e a edificar (1506) a· nova Basílica de S. PEDRO, para a qual estabeleceu a planta em cruz grega e que desejou encimar por uma cúpula (v. I, gravura 19) imitada da do panteão de Agrippa (v. I, p. 105). Para isso, tinha de começar por demolir a Basílica de Constantino: e não hesitou. Quando morreu, em 1514, os Romanos passaram a chamar-lhe ruinante. (V. I, pp. 103 e 109.) (Bibl.: O. Fõrster, Bramante, Munique, 1956). BRANT, Sebastian Nascido em 1458 e morto em 1521. Precursor do HUMANISMO na Alsácio e autor da Nau dos Loucos (v. II, p. 51), obra satírica (v. I, p. 125), em que se inspiraram ERASMO e BOSCH. Escrita em dialecto alsaciano, esta obra foi rapidamente traduzida para as principais línguas europeias. Tal êxito contribuiu para a importância que viria a tomar o tema da LOUCURA na literatura europeia do século XVI. Quando publicou este livro, em 1494, em Basileia, Brant era ali professor de direito e literatura latina. Depois disso, com o apoio de MAXIMILIAN O, foi síndico e chanceler de Estrasburgo. BRUEGEL, O VELHO, Pieter Nascido na àldeia de Bruegel entre 1525 e 1530, é a figura dominante da pintura flamenga do século XVI. Aluno em Antuérpia de Pieter Coeck d'Alost, com cuja filha casou. fez em 1553-1554 uma viagem a Itália que não exerceu influência nenhuma sobre a sua obra (v. I, p. 119). Voltou a Antuérpia e depois fixou-se em Bruxelas, onde morreu em 1569, dei-
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xando dois filhos: Pieter (Bruegel, o Moço, dito Bruegel do Inferno) e Jan (dito Bruegel de Veludo). Bruegel foi durante muito tempo considerado como um simples pintor de costumes camponeses (v. I, p. 290), o que lhe valeu o título de Bruegel dos Camponeses, ou Bruegel o Engraçado; mas a sua arte vai muito mais além da simples pintura de costumes. Bruegel soube renovar a pintura religiosa dando-lhe por enquadramento o ambiente rural flamengo (0 Recenseamento de Belém, de Bruxelas) e alargar a arte da PAISAGEM, especialmente na série dos Meses (Os Caçadores na Neve, de Viena, e A Colheita do Feno, de Praga). O seu estilo assemelha-se também ao dos primitivos, com o uso de cores saturadas e nitidamente separadas; mas também anuncia a paisagem moderna. Finalmente: toda uma parte da sua obra se situa na linha fantástica e inquietante de Bosch (Dulle Griet [v. II, p. 20] de Antuérpia, O Triunfo da Morte [v. II, p. 48] do Prado, A Queda dos Anjos Rebeldes de Bruxelas). (V. II, pp. 18-19, 63.) (Bibl.: L. Van Puyvelde, La peinture flamande au siecle de Bosch e de Brueghel, Paris, 1962). BRUGES Nos séculos XIV e XV, a Itália e a Flandres foram, na Europa, países de vanguarda, tanto na economia como na arte. Durante duzentos anos, e mesmo ainda no século XVI, foram esses países os dois pólos do principal eixo cultural e comercial do Ocidente. Bruges apagou-se no século XVI perante a ascensão de ANTUÉRPIA. Mas, antes disso, tinha brilhado vivamente, como o testemunham as obras dos pintores do «século de ouro» da pintura flamenga, que foi o século XV: os irmãos V AN EYCK, VAN DER GOES, Jean Provost, Gerard David, MEMLING, etc. Recentemente, foi posta
em dúvida a importância de Bruges no comércio internacio?al dos primeiros tempos do Renascimento. Na realidade, talvez se te?ha dado pouca importância, até hoJe, aos aspectos regionais do comércio daquela cidade. É um facto que a Hansa tinha em Bruges um dos seus principais pontos de apoio (v. I, p. 240). Os panos da Flandres foram, para os hanseatas, pelo menos no século XIV, a melhor moeda para uso nos países de leste. É verdade que, no século XV, a indústria e o co~ér cio dos panos fla~engos s~ VI~am arruinados por efeito da ':'Itonosa concorrência dos panos mgleses. É também verdade que o assoreamento do Zwin obrigou os grandes navios a ficar em L'Écluse ou mesmo em Middelburg. Mas Bruges foi até ao século XVI uma praça bancária (v. I, p. 215) e era o lugar privilegiado da Europa do Norte onde se travaram relações de negócio. Era em Bruges que estava instalada a principal filial da companhia (genovesa) de Chio, que, durante a primeira metade do século XV, distribuía o alúmen a todos os países do norte europeu. E era também para Bruges que, depois de 1461, os ~é4icis envü~ vam o alúmen das ]aztdas pontificais. Do mesmo modo, as grandes firmas italianas tinham, todas elas filiais ou correspondentes em Bruges. Era ali que residia Tommaso Portinari (v. I, pp. 211, 220), director da filial Médicis da Flandres que encomendou a Van Der Goe; a célebre Adoração dos Reis Magos (Uffizi) e a Memling o Juízo Final que foi enviado em 1473 de Brug~s para Florença mas foi parar a Dantzig, pois o navio que a levava foi apresado por uma embarcação deste porto. (V. I, pp. 108-109 e 201.)
entrou no concurso aberto em 1401 para a execução da segunda porta do baptistério da c1dade. Tendo estudado arte antiga em Roma (1404-1415), impôs-se a Florença como o maior ARQUITECTO do seu tempo erguendo a cúpula ovóide de Sa~ta Maria dei Fiore (v. I, gravura 36), assente num tambor octogonal (v. I, pp. 78, 162-163), e a da velha sacristia de San Lorenzo, sobre uma planta quadrada. Renovou as técnicas ·de construção de cúpulas (v. I, p. 114), . edificand~ -as por coroas sucessiVas, supnmindo estruturas, contrafortes e arcobotantes. Também se lhe deve a Capela dos Pazzi e o Palácio Pitti. Atento à PERSPECTIVA , à ?'!-rmonia dos volumes e das superftcJes e aos efeitos de luz nos interiores, influenciou profundamente os arquitectos dos séculos seguintes (v. I, p. 103). Morreu em Florença em 1446. (V. I, p. 155.) BRUNI, Leonardo Nascido em Arezzo cerca de 1370. Discípulo de Coluccio Salutati e, como ele, chanceler de FLORENÇA (v. II, p. 37), foi um dos primeiros florentinos a apaixonar-se pelo grego. Encarnando a tendência cívica do HUMANISMO (v. II, p. 81), via na cidade do _Arno uma segunda Roma republicana. De resto escreveu uma história de Flor;nça desde Sylla até 1402. Ali morreu em 1444. O monumento funerário que lhe construiu Rossellino em Santa Croce, pode ser consid~rado como o próprio tipo do túmulo do Renascimento (v. I, .. p. 103). (V. I, p. 85.) (Bibl.: H. Baron, The crzszs of the early italian Renaissance, 2. • ed., Princeton. 1966).
BR UNELLESCHI, Filippo
BRUNO, Giordano
Nascido em FLORENÇA em 1377, foi inicialmente ourives e escultor (v. I, p. 103) e, nessa qualidade,
Nascido em 1548 perto de Nola, na Campânia, foi para Nápoles em 1562 e entrou no convento San
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Domenico, onde professou em 1566. Foi ordenado padre em 1572 e doutorou-s e em teologia em 1575. Mas, acusado de heresia, quebrou os votos e fugiu de Itália, tendo daí em diante levado ·uma existência errante que o levou, sucessivamente, a Chambéry, a Genebra (1579), onde se ligou com os CALVINIS TAS para depois entrar em conflito com eles, a Toulouse, a Paris (1581-1583), a Londres (1583-1585) e a Wittenberg , onde ensinou filosofia de 1586 a 1588. Depois de ter estado em Helmstedt, Praga e Frankfurt, foi a Veneza, onde a Inquisição o prendeu em 1592. Entregue a Roma depois de um primeiro julgamento , foi submetido ao segundo, que durou sete anos. Foi por fim condenado à morte e queimado vivo a 17 de Fevereiro de 1600 no Campo de' Fiori (v. 11, p. 38). Giordano Bruno escreveu mais de cinquenta livros ou opúsculos, sendo os principais os seguintes: a) seis diálogos em italiano escritos e publicados em Inglaterra: La Cena de le ceneri; De la causa, principio et uno; De /'infinito universo et mondi; Spaccio de la bestia trionfante; Caballa dei cavallo pegaseo; Degl'heroici furori; b) três poemas filosóficos latinos, todos datados de 1591: De triplicis minimo et mensura; De monade, numero et figura; De immenso, innumerab ilibus et infigurabili. Giordano Bruno rejeitava categoricam ente a JUSTIFIC AÇÃO PELA FÉ e cria nas infinitas possibilidades do homem. Foi um dos primeiros racionalista s da história moderna. Mas a sua filosofia afastava-se do cristianism o propriamente dito (v. 11, p. 109). Bruno não se contentava com a rejeição do geocentrism o ARISTOT ÉLICO (v. I, p. 103) e com a defesa - apesar de ser um COPERNI CIANO convicto- do princípio da pluralidade dos mundos. Afirmava a eternidade da matéria e da alma do mundo que a enforma, sendo o princípio formal e o princípio material, no fim de contas, uma
umca realidade (v. 11, p. 147). Entende-se, assim, que ele tenha sido um dos predecessor es de Spinoza na via do panteísmo. Racionalist a - um dos primeiros da história moderna- , Bruno não .c onsiderava outro conhecime nto senão o conhecimento racional. (Bibl.: art. «Bruno» da Enciclopedia italiana, t. VII; Les fureurs héroiques, texto fixado, traduzido e apresentad o por P. H. Michel. Paris, 1954). BUDÉ, Guillaume Nascido em Paris em 1467, morto em 1540, erudito que foi, princi. palmente, o melhor helenista da sua geração (v. I, p. 96). Escreveu um livro muito sapiente sobre as moedas romanas, De asse, e dirigiu a biblioteca real de Fontainebleau, de onde saiu depois a Biblíoteca Nacional francesa. Foi ele quem aconselhou FRANCIS CO I a criar o Colégio dos Leitores Reais, que viria depois a chamar-se College de France (v. 11, pp. 42 e 70). Aberto às novas ideias, recusou-se, apesar disso - ao contrário de seu filho Jean-Louis - , a passar à Reforma. O seu HUMANIS MO conciliava a sabedoria grega com a revelação cristã: esta completava aquela, e daí o título de uma das suas obras, De transitu hellenismi in christianism um (Bibl.: J. Bohatec, Budé und Calvin. Studien zur Gedankenw elt des franzosischen Frühhuman ismus, Graz, 1950).
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c CABALA Esta palavra, de origem hebraica, significa literalment e «aquilo que é recebido». É, efectivame nte, uma interpretaç ão esotérica de certos livros da Bíblia (v. I, p. 97), transmitida de iniciado para iniciado. A
Cabala que lentamente se foi cons1itu indo em corpo de doutrina ao longo de muitos séculos (o Livro da ( 'ri ação é de 135 A. C., mais ou menos, e o Livro do Esplendor, ou /.ohar, é do sécu lo XIII), expõe as uiversas fases da criação divina. o texto bíblico, estudado nos seus elementos constituti vos- signos, sílabas-, revela esotericam ente, segundo ela, «no interior» da mensagem dirigida por Deus ao seu povo! uma espécie de monólogo 1ntenor que proporcwn a as própnas estruturas do ser divino ao criar-se a si próprio e ao realizar-se na sua criação. Esta teosofia mais ou menos panteísta, tev~ ade ptos célebres como Fílon de Alex andria, Avicena, Raymond Lulle e PARACEL SO. Esteve particularment e espalhada, durante a Idade Média, nos meios judaicos c~pa nhóis mas, noutros círculos, degenerou por vezes em vã magia. (V. 11, pp. 107, 126.) CABOT f-amília de navegadore s de origem genovesa. John (1450-1498) e seu rilho Sebastian (1476-1556) trabalha ram, sucessivam ente, por conta de HENRIQU E VII, HENRIQUE VIII e CARLOS V (v. I, pp. 59-60, 66). CABRAL, Pedro Álvares Nascido em 1460 perto de Santarém . Recebeu o comando da segunda frota portuguesa da índia em 1500 (v. I, p. 55 e mapa 38). Essa frota era composta por 13 navios que transportav am 1200 homens. Cabral seguiu uma rota muito a ocidente e tocou a parte oriental do Brasil, que declarou tomar em nome do rei de Portugal (v. I, p. 58) e a que deu o nome de Terra de Santa Cruz, nomenclatu ra fre quente, depois, nas cartas da América do século XVI. Ainda hoje se não sabe ao certo se Cabral chegou ao Brasil por acaso, por ter
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passado demasiado ao largo das correntes africanas, ou se tinha já algum conhecime nto da existência do continente americano. Retomando a rota do Cabo e da índia, a frota sofreu uma terrível tempestade mas chegou -embora reduzida- ao seu destino. Cabral voltou a Lisboa em 1502 e morreu em 1526. CALVINO Jean Cauvin, dito Calvino. «0 segundo patriarca da Reforma», na expressão de Bossuet. Nascido em 1509 em Noyon, onde seu pai era secretário do bispo e procurador do cabido da sé, começou por frequentar os colégios da cidade natal e foi depois para o sinistro colégio Montaigu de Paris (v. I, p. 135). Estudou direito nas UNIVERSIDA DES de Orléans e Bourges. Voltando a Paris em 1531 depois da morte do pai, recebe~ n-a «nobre e trilingue academia» (futuro College de France) lições de helenistas e hebraizante s é publicou em 1532 um Commenta ire du «De clementia» de Séneque em estilo perfeitame nte humanista. Iria Calvino suceder a ERASMO, já velho? A sua conversão à Reforma deu-se, ao que parece, em 1533-1534. As perseguiçõe s aos protestantes, que começaram em França na sequência da «questão dos placards>>, em Outubro de 1534, obrigaram-no a deixar o reino. Refugiado em Basileia, aí escreveu em 1535 a primeira versão da lnstitution de la religion chrétienne, obra que nunca mais deixou de aperfeiçoar durante vinte e cinco anos (v. 11, p. 51). Calvino não tencionava instalar-se em Genebra; mas, de passagem nesta cidade, foi retido por Farei, que tinha conseguido fazer vingar a Reforma na cidade de Léman (v. I, p. 130). A primeira estadia de Calvino em Genebra durou dois anos (1536-1538) e terminou pela expulsão, pois tanto ele como Farei foram
julgados pouco dóceis pela autoridade política. «Exceptuando a sua vocação», Calvino desejou então «viver em paz sem aceitar cargos públicos». Voltou a Basileia, mas · Bucer insistiu com ele de tal modo que acabou por instalar-se em Estrasburgo. Aí foi encarregado de cursos na escola superior da cidade e organizou . a paróquia dos reformados de língua francesa. Mas Genebra, onde os amigos de Calvino tinham voltado ao poder, chamou-o; Calvino só se resolveu a voltar à cidade de Léman depois de um ano de hesitação. A partir de 1541 em Genebra, o reformador nunca mais de lá saiu. Até 1555 a sua autoridade religiosa foi aÚ discutida, e só lhe foi concedida a cidadania genebrina em 1559, cinco anos antes da sua morte. A fábula histórica que faz de Calvino senhor incontestado e tirano de Genebra durante mais de vinte anos tem de ser posta de lado, pois é excessivamente simplista. Isso não quer dizer que a vigilância moral e religiosa exercida sobre a população pelo consistório não tenha parecido, por vezes, bastante pesada. A partir de 1541, Calvino participa na redacção das célebres Ordenações Eclesiásticas, que regularam, durante dois séculos, a vida religiosa da cidade. Contribui em 1553 para a acusação e condenação à morte de Michel Servet (v. L p. 134). Em 1559 reorganiza a ACADEMIA de Genebra, que viria depois a ser o grande seminário do calvinismo. Doente, «amargo e difícil», Calvino tinha, no fim da vida, um trabalho esmagador. Pregava todos os dias semana sim semana não; dava três conferências por semana sobre teologia; assistia às reuniões do consistório e às reuniões dos pastores; visitava doentes e escrevia a muitas pessoas, especialmente aos reformados franceses. Morreu em 1564. O seu corpo, envolvido numa tela grossa, foi levado para o cemitério por enorme multidão mas, conforme seu pedido, sem discursos
nem cantos. O local onde o enterraram não ficou assinalado. (V. I, pp. 137-138; v. li, pp. 58-60, 95-96, 118.)
(Bibl.: F. Wendel, Calvin, sources et évolution de la pensée religieuse, Paris, 1950; A. M. Schmidt, Jean Ca/vin et la tradition calviniste, Paris, 1957).
que alguns amigos lhe deram auxi lio pecuniário. Desembarcou finalmente em Lisboa, depois de dczassete anos de ausência, e aí viveu até morrer em 1580. Subsistiu apenas com uma módica pensão que o rei lhe concedeu pela dedicatória do poema. Camões · também autor de poemas líricos, muitos deles melancólicos (v. II, pp. 46 e 52) e de obras dramáticas.
CAMõES, Luís de O mais ilustre representante das letras portuguesas da época do Renascimento (v. I, p. 114). Nascido em Lisboa (?) em 1524, teve brilhante princípio na corte mas foi obrigado a sair de Portugal para Marrocos em 1547. Perdeu o olho· direito em Ceuta no decurso de uma escaramuça. Voltando a Lisboa, foi preso por causa de uma rixa no dia do Corpo de Deus e esteve encarcerado durante um ano. Condenado a cinco anos de serviço nas índias, deixou novamente o país como soldado raso (v. II, p. 12). Começou a escrever o seu poema épico, Os Lusíadas, no caminho para Goa. Nele conta as aventuras de Vasco da GAMA e os descobrimentos dos portugueses (v. I, pp. 56, 59). Dep?i~ de algum tempo em Goa, participou em acções contra os piratas nas costas do Malabar e da Arábia. Era, ao mesmo tempo, combatente e escritor - «numa mão a pena, na outra a espada». Nas índias Orientais, visitou Ternate, Banda, Amboíne e tomou parte na ocupação de Macau (China) em 1558 (v. I, p. 277). Ali se deixou ficar voluntariamente durante muitos meses a escrever o essencial dos Lusíadas. Novamente condenado, é como preso que volta a Goa depois de naufragar na costa cambojana. Pôde, porém, salvar o manuscrito conservando-o acima da cabeça enquanto nadava. Depois de passar três meses na cadeia, ficou mais seis anos em Goa e voltou ao Ocidente em 1567. Por falta de dinheiro, teve de estar dois anos em Moçambique até
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CAMP ANELLA, Tommaso Este dominicano calabrês nascido em 1568 pertence ao século XVII pelas datas das suas obras. A princi pal é a Cidade do Sol (v. II, pp. 27-28). No entanto, dado o seu conhecimento da CABALA, e devido à sua aversão a ARISTóTELES, às suas concepções ASTROLóGICAS e à sua fé numa cidade UTóPICA de tipo neoplatónico (v. II, p. 15), aparentada com as de Thomas MORE e de Stiblin (v. II, pp. 30, 31). Campanella pertence ao Renascimento Contemporâneo de Giordano BRUNO -que era também dominicano do reino de Nápoles -, teve como ele de enfrentar a Inquisição; mas foi absolvido da acusação de heresia depois de dois processos. No entanto, passou vinte e sete anos nos . cárceres de Nápoles, onde o levou uma conspiração, falhada, que pretendia abolir o feudalismo na Calábria para ali instituir um regime de total igualdade social. Libertado em 1626 a pedido de Urbano VIII, Campanella refugiou-se em França, onde Richelieu lhe mandou dar uma pensão. Morreu em Paris em 1639. As suas obras, oitenta e dois títulos, foram, na sua maior parte, escritas nas masmorras. (Bibl.: Le Solei! de la Renaissance, colóquio internacional, Bruxelas-Paris, 1955). CAPITALISMO Na época do Renascimento há um esboço de capitalismo industrial (v.
I, pp. 232-233) e um indiscutível capitalismo comercial (v. I, pp. 234-236). CARAVAGGIO Michelangelo Amerighi, ou Merisi, dito Caravaggio. O sobrenome provém-lhe da cidade onde se supõe que tenha nascido, em 1573. Caravaggio começou a sua formação como pintor em Milão, tendo seguido, depois, para Roma com a idade de dezasseis ou dezassete anos. Trabalhou na cidade dos papas e na região romana até 1606, tendo ali pintado uns cinquenta quadros que vão da Criança Descascando um Fruto (1591) até à Morte da Virgem (1605-1606). O essencial da sua obra foi, portanto, realizado em Roma: pinturas religiosas (Capela de S. Ma~ . teus para a Igreja de S. Luís dos Franceses: Conversão de S. Paulo e Crucifixão de S. Pedro para Santa Maria dei Popolo; Madona do Loretto para Sant' Agostino, etc.); e também pinturas profanas, especialmente Una musica, Baco e Narciso. Temperamento sombrio e violento, Caravaggio, tal como Cellini, viu-se muitas vezes metido em rixas e teve problemas com a polícia e com a justiça romanas. Em 1606 teve de fugir da cidade por causa de um assassínio, levando depois disso urna vida errante: esteve em Nápoles, em Malta e na Sicília e voltou finalmente à península. Morreu em 1610 de malária, em Porto Ercole, quando se preparava para voltar a Roma. A pintura de Caravaggio foi uma reacção decisiva auer contra o idealismo de RAFAEL quer contra a majestade do barroco, que já se mostrava, quer contra a atmosfera rebuscada da arte MANEIRISTA. A sua estética era franca e brutal. A sua preocupação realista - Caravaggio pintava directamente sem primeiro desenhar- explica que as suas obras religiosas tenham sido, muitas ve-
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zes, rejeitádas pelas igrejas e comunidades que as encomendavam. Achou-se que eram escandalosos o menino Jesus nu da Virgem dos Palafreneiros, o ventre inchado da Virgem morta, as caras patibulares de parentes e amigos que rodeavam o leito fúnebre. Mas Caravaggio nunca sentiu falta de protectores na alta sociedade romana, fossem eles o cardeal del Monte ou o marquês Vincenzo Giustiniani. A violência de Caravaggio exprimiu-se não só na escolha dos assuntos (muitas cenas de martírio) e nos escorços impressionantes mas também, e talvez principalmente, nos jogos de luz . e sombra, muito contrastados. Este pintor que não teve discípulos (v. I, p. 118) conheceu porém uma espantosa posteridade: em Espanha (Ribera, Zurbarán), em França (Simon Vouet e, principalmente, Georges de La Tour) e nos Países Baixos (Honthorst, Seghers, etc.). (Bibl.: R. Hinks, Michelangelo Merisi da Caravaggio, Londres, 1953). CARAVELA É difícil apontar com exactidão as origens da caravela, que apareceu, principalmente, nos estaleiros lusitanos (v. I, p. 50) por volta de 1420 (v. I, p. 54). Navio relativamente leve, bom corredor, era capaz de bolinar e foi o barco ideal dos descobridores (v. I, pp. 167-168 e gravuras 40 e 41).
CARDANO, Gerolamo (Cardan) Nascido em Pavia em 1501, morto em 1576, Cardano foi, a desperto de uma sua acentuada inclinação para a ASTROLOGIA, um estimável filósofo relacionado com a «escola de Pádua»; mas, antes de mais, foi um. notável matemático, que contribuiu para a descoberta da solução da equação do terceiro grau e deu a conhecer as fórmulas concebidas por Ferrari para a do
quarto grau (v. II, pp. 142-143). Considerado por Jean BODIN como um feiticeiro, Cardano foi louvado por Gérard de Nerval e por Balzac exactamente pelas suas concepções astrológicas (v. II, pp. 55, 103, 128) e pelo seu interesse pela MAGIA. Gui Patin, Bayle e Leibniz tiveram acerca do médico, matemático e filósofo italiano uma opinião mais matizada. Pata o primeiro, Cardano era «um grande homem que, por vezes, numa irregularidade de espírito nele tão natural, não deixou de dizer bastantes asneiras». O segundo considerava-o como um dos grandes espíritos do seu século mas lamentava que na sua obra houvesse digressões e obs. curidades que «muitas vezes embaraçam o leitor». Finalmente, para Leibniz, Cardano era «efectivamente um grande homem, com todos os seus defeitos, e teria sido incomparável sem eles». (V. I, p. 164 e desenho 37.) CARLOS V Nascido em Gand em 1500, teve o francês por língua materna e só aos poucos se hispanizou. Em 1506, por morte do pai, Filipe, o Belo, herdou os Países Baixos e o Franco-Condado. A morte de FERNANDO DE ARAGÃO em 1516 fez dele Carlos I de Espanha. Tomou então posse, em prejuízo de sua mãe, Joana a Louca (considerada incapaz de reinar), de Castela e suas dependências americanas, de Aragão, de Nápoles e da Sicília. Em 1519 foi eleito imperador (v. I, pp. 38, 226) - Carlos V. Forçado a abafar muitas revoltas (v. I, pp. 42, 200) no interior dos seus estados (os comuneros de Castela em 1520-1522, o povo de Gand em 1539-1540, os príncipes alemães favoráveis. à Reforma em 1546-1555), quase constantemente em estado de guerra com a França e com o Império OTOMANO, Carlos V foi um soberano itinerante.
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o abd icar em Bruxelas, lembrou reinado a Espanha, 4 a França, 2 a África,' 2 a In glaterra, 7 a Itália e 10 aos Paí, t·s Baixos. Obteve êxitos imporllllllcs: a vitória de Pavia (1525), qn · lhe deu o Milanês (v. I, pp. 39, IH6). a eleição de seu irmão l."e rnando como rei da Boémia da Hungria (1526), a conI' quista de Tunes (1535), a vitória de Mühlberg (1547), que pa,. ccu assinalar o desmoronamento d11 liga dos príncipes protestantes 11 lemães, e, principalmente, a conqu ista espanhola de imensos territórios americanos (v. I, p. 62; v. II, p. 12). Foi ele quem (' rio u os vice-reinos do México e de Lima (o primeiro em 1535 e o seg undo em 1542). Mas não conseguiu alcançar três metas fundamentais. Em primeiro lugar, não venceu a França, à qual não pôde reconquistar a Borgonha, tendo mesmo as suas tropas de abandona r os «três bispados». Em segundo lugar, as suas expedições contra os Turcos não causaram dano ao poderio otomano. A conquista de 'l'unes (1535) foi seguida em 1541 de um verdadeiro desastre na costa u rgelina. Finalmente, ·não conseguiu reconstituir a unidade religiosa da Alemanha. A paz de Augsburgo de 1555 assinalou a 11ceitação, pelos Habsburgos, da cisão confessional (v. I, p. 126). Gasto, desmoralizado, atormentado pela gota, Carlos V desapareceu pouco a pouco da cena política. Em Outubro de 1555 abdicou em Bruxelas de mestre da ordem do Tosão de Ouro e de soberano do país borgonhês a favo r de Filipe II. Em Janeiro de 1556 renunciou, também a favo r de Filipe II, às coroas espanholas e às suas dependências. E em Setembro seguinte, finalmente, entregou a seu irmão Fernando a coroa imperial- acto este crue os eleitores só em 1558 ratifi caram. Retirado no convento de San Yuste, na Estremadura, Carq n · fizera durante o seu 'l viagens à Alemanha, 6
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los V morreu a 21 de Setembro de 1558. Muitos artistas, o mais dotado dos quais TICIANO, nos deixaram retratos daquele que reinou no maior império que a história conheceu: neles vemos um corpo sem elegância, um rosto de grande palidez, um olhar sem vida, um queixo pendente que lhe dificultava a fala. Triste, pesado, lento e impassível, Carlos V não corresponde, de modo algum, à imagem convencional do príncipe brilhante e do mecenas do Renascimento. (V. II, pp. 121-122.). (Bibl.: C. Brandi, Charles Quint et son temps, Paris, 1939; J. Babelon, Charles Quint, Paris, 1947; R . Tyler, L'Empereur Char/es Quint, Paris, 1960). CARLOS V, O SÁBIO Filho de JOÃO II, O BOM, e de Bonne do Luxemburgo, nascido em Vincennes em 1338. Rei de França de 1364 a 1380. (V. I, p. 200.) CARLOS VI, O BEM-AMADO Filho de CARLOS V de França e de Joana de Bourbon, nascido em Paris em 1368. Rei de França de 1380 a 1422, só a partir de 1388 exerceu efectivamente o poder; e depressa o perdeu por causa das perturbações psíquicas de que começou a sofrer em 1392. (V. I, p. 42.) CARLOS VII Filho de CARLOS VI e de Isabel da Baviera, nascido em Paris em 1403. Rei de França de 1422 a 1461. O seu reinado viu o fim da dominação inglesa (v. I, pp. 42, 141), graças à intervenção de Joana de Are, cuja obra foi continuada por Dunnois, La Hire e Jean Bureau (v. I, p. 182) e pelo desenvolvimento do poder Teal em França (v. I, p. 124). (V. I, p. 38.)
CARLOS VIII Filho de LUíS XI e de Carlota de Sabóia, nascido em Amboise em 1470. Rei de França de 1483 a 1498. Anne de Beaujeu, sua irmã, foi regente durante a sua menoridade. Tendo resolvido fazer valer os direitos da França ao reino de Nápoles (v. I, p. 31), Carlos VIII entrou em Itália em 1494 (v. I, p. 39), apoderou-se de FLORENÇA e chegou perto de NÁPOLES (1495). Mas nesse mesmo ano, ameaçado pela liga de Veneza, teve de voltar para França (v. I, p. 39). Tinha começado a época das guerras de Itália. (V. li, p. 9.) CARLOS IX Terceiro filho de H ENRIQUE li e de CATARINA DE MÉDICIS, nascido em 1550 em Saint-Germain-en-Laye. Rei de França de 1560 a 1574. Até 1570, o poder foi exercido por sua mãe, que continuou a ter grande J; ·fluência sobre ele (v. li, p. 89) e foi a instigadora do massacre de S. Bartolomeu (24 de Agosto de 1572), que assinalou o recomeço das guerras religiosas em França. (V. I, p. 201:) CARLOS, O TEMERÁRIO Nascido em Dijon em 1433, filho de Filipe, o Bom, e de Isabel de Portugal, foi duque da Barganha de 1467 a 1477. Ambicioso, impulsivo e violento - o que explica o cognome -, quis criar para si um estado poderoso entre a França e o . Império e reconstituir uma grande Lotaríngia de Basileia até ao Mar do Norte (v. I, p. 42); daí as contínuas lutas que travou com os vizinhos, em especial com LUÍS XI. Senhor da Barganha e da Flandres, pôs-se à cabeça da «liga do bem público». Depois da batalha de Montlhéry_ em, 1465, fez assinar a Luís XI os tratados de Conflans
e de Saint-Maur, que lhe davam as cidades do Somme. Vencedor da insurreição de Liege, apoiada por Luís XI, atraiu-o a Péronne e obrigou-o a assinar ali um tratado humilhante. Mas em 1475, depois da derrota que sofreu em Beauvais e em Rouen, teve de aceitar uma trégua de nove anos. Vencido pelos Suíços em Grandson e em Morat (v. I, p. 182), atacou no ano seguinte o duque da Lorena mas sofreu em 1477, junto a Nancy, uma derrota onde encontrou a morte (v. I, p. 222). CARON, Antoine Nascido em Beauvais em 1521, trabalhou primeiro nesta cidade e depois em Fontainebleau, sob a direcção do PRIMATíCIO, num grupo comandado por Niccolõ dell' Abbate. Cerca de 1559 CATARINA DE MÉDICIS agregou-o à sua casa: a partir de então, Caron ocupou-se especialmente da organização de festas e entradas principescas. Nos seus quadros podemos ver arquitecturas muito minuciosas e irreais e os efeitos de perspectiva característicos dos modelos cenagráficos do teatro. «Um acordo, dificilmente imaginável a frio, entre a alegoria política, a descrição de festas sumptuosas, o cenário romano, que tende a ser obrigatório, e a mais inquieta imaginação, multiplica até ao infinito de sucessivos horizontes as personagens deste pintor oficial dos últimos Valois» (André Breton). Falecido em Paris, em 1599, Antoine Caron foi esquecido durante séculos e só recentemente «redescoberto». (V. I, pp. 109, 117.) CARP ACCIO, Vittore Pintor veneziano, nascido cerca de 1455 e falecido em 1525. A seguir a Gentile BELLINI, a quem tanto deveu, foi o pintor da crónica de Veneza, de que nos dá uma ima-
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pcm simultaneamente exacta e uuaginária, como ninguém voltaria a fazer depois dele, nem mesruo Canaletto. Deste modo, nos seus ciclos - a Lenda da Vida de S(lnta úrsula, a Vida de S. Jorge, a Vida de S. Jerónimo, inspiradas ua Lenda Dourada - a história rlui de acordo com uma planifit.:ução cinematográfica cujo cenário é, quase sempre, a cidade de Veneza. Carpaccio pintava aquilo t~ue via; mas a sua candura narralrva é constantemente subtensa pelos mais fortes meios pictóricos e poéticos: nele, o domínio poético exprime-se sempre por soluções plásticas perfeitas. Sabe animar as superfícies com imensa riqueza graças a inúmeros pormenores - arquitecturas, vegetação, silhuetas, animais. Tudo é minuciosa~ne nte narrativo e verdadeiro e, no entanto, o quadro é uma espécie de sonho de olhos abertos em que a imagem se imobiliza, esperando, um pouco como em Balthus, numa moleza silenciosa que há-de vir a fazer a glória da pittura metafisica. Pintor simultaneamente ingênuo e visionário, Carpaccio é autor de uma das obras mais originais de toda a pintura veneziana. CARRACCI Família de pintores bolonheses do fim do século XVI e princípio do século XVII, cujos principais representantes são Ludovico, os seus dois primos Agostino e Annibale c. Antonio, filho natural de Agostmo. Fundaram em 1585 em Bolonha a sociedade dos lncamminati- a primeira ACADEMIA de belas-artes da história. Ludovico (1555-1619) foi o principal animador desta academia. Esta escola holonhesa defendia uma arte comedida e harmoniosa e, aproveitando as lições do fim do século XVI, procurava temperar MIGUEL ÂNGELO com RAFAEL (v. I, p. 117). Ludovico. grande admirador de TICIANO e de VERONESE, foi autor de nume-
rasos quadro de inspiração religiosa, mas também de frisos decorativos, executados em palácios com os primos (especialmente no Palácio Magnani de Bolonha). Agostino (1557-1602) foi, ao mesmo tempo, pintor, gravador e teórico; compôs um tratado de PERSPECTIVA e de ARQUITECTURA. Trabalhou com seu irmão Annibale nas pinturas do Palácio F ARNESE e depois retirou-se para um convento de capuchinhos. Annibale (1560-1609) é o mais célebre dos Carracci. Era excelente em decorações de interiores palacianos (v. li, p. 99), fazendo alternar com grande felicidade os quadros mitológicos, os medalhões e os frisos, em que gostava de aplicar tonalidades alouradas e leves. CARTIER, Jacques Nascido em 1491 e falecido em 1557 em Saint-Malo. As suas três expedições à América, realizadas com a concordância ou por ordem de FRANCISCO I, são de 1534, 1535-1536 e 1541 (v. I, p. 60). O navegador maluíno procurava a noroeste uma passagem para a China mas não a encontrou. Por outro lado, especialmente aquando da terceira viagem, julgou ter descoberto ouro e diamantes, que trouxe cuidadosamente para França: não passavam de pedras vulgares. Tentou colonizar as margens do rio de S. Lourenço, mas a empresa era prematura. Estes fracassos não devem fazer-nos esquecer, porém, que Cartier demonstrou a insularidade da Terra Nova e descobriu o rio de S. Lourenço, pelo qual subiu até Hochelaga (onde hoje se encontra Montreal). CARTOGRAFIA A cartografia fez consideráveis progressos - dos portulanos de Maiorca (v. I, p. 166) até aos Atlas de MERCATOR e de Ortelius (v. I, p. 172). (V. li, p. 11.)
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CASA DE LA CONTRATACióN Foi criada em SEVILHA, em 1503, pelos reis católicos, segundo o modelo da Casa da india portuguesa .. As suas actividades consistiam na aplicação dos decretos relacionados com o comércio americano, reunir, armar, ABASTECER, inspeccionar e expedir as frotas para a América (v. I, p. 244), controlar a navegação entre a Espanha e o Novo Mundo e assegurar as relações postais com as índias Ocidentais. Tinha uma secção de hidrografia e uma escola de NAVEGAÇÃO para formação de pilotos. VESPUCCI foi por algum tempo piloto mayor da Casa de la Contratación. Posta sob a autoridade do conselho das índias (v. I, p. 274), tinha à frente um presidente, um «feitor» que .fazia as aquisições, um tesoureiro que recebia os METAIS PRECIOSOS e as pedrarias e um contador que controlava o trânsito de homens e mercadorias. (Bibl.: C. H. Haring, Trade and navigation between Spain and the Indies, Cambrü •.;e, Mass., 1918; E. J. Hamilton, American treasure and the price revolution in Spain, 1501-1650, Cambridge, Mass., 1934).
culos humanistas que gravitavam em volta de LEÃO X . Quando sua mulher morreu, em 1520, tomou ordens e foi núncio de CLEMENTE VII em Espanha. Morreu em Toledo em 1529, um ano depois da publicação do Cortesão. CATAI Nome dado à China por Marco Polo e, depois dele, pelos Ocidentais, até ao fim do século XVI (v. I, p. 51). Na época de Isabel I ainda foi constituída em Inglaterra uma «Companhia de Catai» (v. I, p. 59). CATARINA DE MÉDICIS Sobrinha de CLEMENTE VII e esposa de Henrique li, a quem deu seis filhos. Nascida em Florença em 1519 e falecida em Blois em 1589. Supersticiosa (v. li, p. 132) e desprovida de escrúpulos, teve menos génio político que o que tantas vezes já se disse. As suas permanentes mudanças de atitude e o massacre de S. Bartolomeu (v. li, p. 89), pelo qual é ela, em grande parte, responsável, fizeram renascer a guerra civil em França.
c ' llini voltou a Florença, onde trah,dhou para o duque Cosme de 1\1 1• I) ICLS. Como alguns incrédulos, Jl"l irrisão, lhe tivessem chamado ,, llltc)f· nuovo, ou seja, principiante ''' ' escultura, quis provar que podc.c ser um scultor vecchio da têm1'''' :c de DONATELLO ou de MIe :t JEL ÃNGELO e fez então a "dlll bra-prima, o Perseu. Cellini drixu u-nos também umas Memó' ttiS (v. li, p. 127), documento de 111 uncira ordem sobre a Itália do l
Nas transacções de moeda (v. I. p. 211) diz-se que a praça cuja
MOEDA serve de parâmetro às outras dá o «certo». Uma unidade dessa moeda é trocada contra quan1idades variáveis de moedas das outras praças. Estas dão o «ince rto». ( 'ERVANTES
CASTIGLIONE, Baldassare O autor do Cortesão marcou profundamente o seu tempo. Foi, por excelência, o educador das pessoas bem nascidas (v. li, pp. 86-87) e, mais que qualquer outro, ajudou a nobreza de Itália e do Ocidente a converter-se aos novos valores da civilização: a instrução, as boas maneiras, a vida de sociedade, o maior respeito pela MULHER (v. li, p. 90), etc. Este neoplatónico (v. li, p. 93) foi, pessoalmente, um homem completo, ao mesmo tempo brilhante militar, artista e diplomata. Nascido em Mântua em 1478, frequentou a corte requintada de URBINO, foi amigo, em Roma, de RAFAEL e frequentador dos cír-
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CELLINI, Benvenuto Nascido em Florença em 1500, partiu para Roma por causa de um duelo e ali trabalhou como ourives e medalhista no tempo de CLEMENTE VII. Voltou a Florença, esteve algum tempo em Mântua e instalou-se novamente em Roma sob o reinado de PAULO III. Acusado de mortes e desbragamentos, foi preso e ficou a dever a liberdade à intervenção de FRANCISCO I, que o fez ir para França, onde viveu cinco anos (1540-1545). É dessa época que datam o célei,re «saleiro de Francisco I» (v. I, p. 106) e a Ninfa de Fontainebleau. Caído em desgraça,
Miguel de Cervantes Saavedra, nascido em 1547, quarto filho de um modesto cirurgião de Alcalá (v. I, p. 293), teve uma existência movimentada. Em Roma, em 1569 - fazia então parte do séquito de um cardeal - , aprendeu italiano e leu o ARIOSTO no original. Participou em 1571 na batalha de Lepanto, onde ficou sem a mão esquerda (v. I, p. 277). Assistiu depois ao assalto a Tunes. A galera que o trazia de volta a Espanha foi capturada em 1575 por corsários turcos ao largo de Marselha e Cervantes foi escravo «em Argel» durante cinco anos. Resgatado por trinitários, voltou a Espanha e casou em 1584. Pouco
tempo depois, foi encarregado do fornecimento de trigo à . Invincible Armada e da cobrança de impostos na Andaluzia. Acusado de extorsão de bens da Igreja em 1589, foi preso e excomungado. Depois disso, iria ainda mais quatro vezes para a prisão. O êxito da primeira parte do D. Quixote, publicada em 1605, permitiu-lhe dedicar à literatura o resto da vida. Mas veio a morrer pobre em Madrid em 1616. no mesmo ano em que mo rreu SHAKESPEARE. A sua Galatea (v. li, p. 16) é de 1585 as Novelas Exemplares de 1613 ' a segunda parte do D. Quixo te' de 1615. Cervantes também escreveu para o TEATRO, mas só há hoje duas obras deste grupo: . Numancia e Vida em Argel, ambas escritas, ao que parece, antes de 1585. Antes de morrer, escreveu um romance de cavalaria, uma espécie de anti-D. Quixote: Os Trabalhos de Persiles e Segismundo. Embora, pelas suas obras maior_es, pertença ao século XVII (v. I, p. 48), Cervantes está ligado de muitas maneiras ao Renascimento. Em primeiro lugar, pela sua vida movimentada, que é do «estilo do século XVI»; depois pelas Novelas Exemplares, cujos quadros, muito livres, fazem lembrar o DECAMERON de BOCACCIO, o Heptameron de MARGARIDA DE NAVARRA e os Contos de Bandello; finalmente, pela riqueza e variedade de elementos que compõem a epopeia burlesca de D. QUIXOTE. Cervantes conserva, do Ariosto, cmma certa ternura pelo idealismo cavaleiresco dos arrasa-montanhas». Além disso, D. Quixote nem sempre é um louco (v. li, p. 15). A sua sem-razão é, por vezes, sábia e faz lembrar as falas d~ Loucura de Erasmo. Outra aproximação se impõe entre D. Quixote, por um lado, e Gargântua e Pantagruel por outro. Já por vezes se chamou a Cervantes o «Rabelais espanhol». Ambos optaram pelo riso. Respeitador da Inquisição, Cervantes deixa, porém, aqui e ali,
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que o seu espírito crítico se mostre com urna ou outra irreverência. Era, com certeza, na Espanha da Reforma católica, pela sua própria natureza, um não-conformista. (V. li, p. 12.) (Bibl.: J. Babelon, Cervantes, Paris, 1939; M. Daireaux, Cervanres, Tournai, 1947). CHIGI, Agostino Nascido em Siena em 1465, morreu em Roma em 1520. Este homem de negócios sienês, amigo de LEÃO X e de RAFAEL, e amante da mais célebre cortesã romana, Irnperia, passou por ser o mais rico «mercador» italiano do seu tempo. Em vão se procurou já avaliar-lhe a fortuna. É certo, porém, que deu novo ímpeto à produção das minas de ALúMEN de Tolfa (v. I, p. 236), das quais foi concessionário -quer directarnente quer por interpostas pessoas- desde 1501 até morrer (v. I, mapa 57). Para evitar a saturação do mercado dos Países Baixos, com a consequente queda dos preços do alúrnen, comprou em 1507 à cidade de Siena, endividada, a «castelania da terra de Porto Ercole», onde, com grandes despesas, construiu dois portos que eram, assim, propriedade sua: Orbetello e Talamone. Aí armazenava os cantares de alúrnen, só os enviando para a Flandres à medida da respectiva procura. Patrão «paternalista», corno Jakob FUGGER, Chigi tratou de alojar decentemente os seus operários. Assim surgiu a aldeia de Allumiere, perto de Tolfa. Baldassare Peruzzi construiu no Trastevere, para o «mercador» de Siena, a villa actualrnente denominada Farnesina, que foi decorada por Rafael (v. 11, p. 55). Este pintor fez também para Chigi os Planetas de Santa Maria de! Popolo e as Sibilas de Santa Maria della Pace. (Bibl.: J. Delurneau, L'alun de Rome, Paris, 1962).
CIPANGU
c
Nome dado por Marco Polo a urna ilha maravilhosa situada a leste da China (v. 11, p. 10). Depois de 1542 foi identificada com o Japão (v. I, p. 56).
II••IH.:rt de Geneve- Nascido em I 1·12. Foi o primeiro «antipapa» dt· Avinhão (1378-1394) por oca,1 ~~ a do Grande CISMA (v. I,
CISMA (Grande) GREGóRIO XI, de origem francesa, decidira, dois anos antes de morrer, sair de Avinhão para voltar a Roma (1376). Ao morrer o papa, os Romanos pressionaram o conclave para que elegesse um papa italiano, que foi URBANO VI (1378-1389). Mas este revelou-se insuportável e urna parte dos cardeais, argumentando que a escolha tinha sido feita sob coacção, procedeu a nova eleição e designou Robert de Geneve, que tornou o nome de CLEMENTE VII, instalando-se com os cardeais em Avinhão. A validade de qualquer destas duas eleições era igualmente controversa e cada um dos dois papas teve os seus partidários: enquanto a Itália, a Alemanha, a Inglaterra, etc. reconheciam definitivamente Urbano VI, a França, a Escócia e Castela reconheciam o seu concorrente (v. I, p. 121). O Ocidente cristão esteve, assim, cindido em dois durante perto de quarenta anos (1378-1417). O cisma teve por consequência o favorecimento das tendências nacionalistas no seio do clero, facilitou as intromissões de príncipes e governos nos assuntos da Igreja e chegou a pôr em causa a unidade dos cristãos, o primado do papa e, até, a uniformidade dos dogmas. O CONCíLIO de Constança (1414-1418) viria pôr fim ao cisma depondo os três papas rivais do momento (v. I, p. 122). Era urna afirmação de superioridade do concílio sobre o papa. Mas o novo eleito, Martinho V (cardeal Colonna) recusou-se a legitimar tal doutrina e, seguindo embora as directivas conciliares para a reforma da Igreja, restabeleceu a superioridade do papa.
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1.1 \MENTE VII
pela própria secura, afirma e pormenoriza» (A. Châtelet). Em pintura, François Clouet criou um novo tipo, o retrato de pé, em que a exacta tradução da realidade não exclui o refinamento do traço.
p . 121).
'ilttlio de'Medici - Nascido em l' lorcnça em 1478, foi papa de I ~Z3 a 1534. A sua aliança com I •R 1\ N CISCO I valeu-lhe a inirnizadr uc CARLOS V, imperador, 1 ujt\S tropas saquearam Roma em I ~27 (v. I, p. 39). O próprio Clemente VII foi feito prisioneiro. Em 1~JJ recusou a anulação do casa"' ·nto de Catarina de Aragão com IIHNRIQUE VIII e excomungou ·st..: provocando com isto o cisma dta Igreja anglicana.
COCANHA O paraíso dos pobres, onde se pode comer até fartar e viver sem trabalhar (v. II, pp. 18-19). CCEUR, Jacques Nascido em Bourges em 1395. Associou-se ao grupo que tinha o encargo de cunhar moeda na capital provisória do reino. Investiu o dinheiro que possuía no comércio levantino e foi a Damasco em 1433. A sua base de operações era em Montpellier e o seu porto era Aigues-Mortes. Credor da coroa, foi feito rnoedeiro-rnor em 1435 (v. I, p. 225), argentário real em 1440, membro do conselho do rei em 1442 (v. 11, p. 41). Mas o luxo de que se rodeou e a importância dos seus negócios granjearam-lhe invejas. Foi preso em 1451 e condenado a pesada multa, sendo-lhe confiscados os bens. Fugiu para Roma em 1454. O papa confiou-lhe o comando de urna frota com o encargo de proteger Rodes contra os Turcos. Morreu em Chio durante essa expedição (1456). Jacques Creur possuía «ricas casas em Bourges, em Saint-Pourçain, em Tours, em Lyon e em Montpellier. Aos bens imobiliários, corno todos os homens de negócios do seu tempo, juntava as mais variadas especulações, as concessões de cobrança de taxas e impostos e os resgates de prisioneiros ingleses. O comércio marítimo no Mediterrâneo foi, sem dúvida, a base da sua actividade; mas o Atlântico, o canal da Mancha, o Mar do Norte foram também sulcados pelos navios que o serviam. Também ne-
CLEMENTE VIII lppolito Aldobrandini, nascido em 1536, foi papa de 1592 a 1605 (v. l, p. 100). CLOUET Família de retratistas franceses do século XVI. Jean, dito Janet, nascido cerca de 1485, era de fora do reino: pensa-se que fosse flamengo e originário de Valenciennes. Poucas das suas obras pintadas se conservaram, mas pode ser considerado corno criador do retrato desenhado com os três lápis (pedra negra, sanguínea e giz branco). A concepção dos seus desenhos é mais pictórica que linear: o modelado suave, ligeiramente esfumado, não deixa de fazer lembrar LEONARDO DA VINCI. Quando morreu, em 1540, sucedeu-lhe seu filho François, também conhecido por Janet. Nascido em Tours em 1515. morreu em 1572 depois de ter sido pintor de. quatro reis: FRANCISCO I, HENRIQUE II, FRANCISCO 11 e CARLOS IX. O traço dos seus desenhos é diferente do de seu pai: «Mais exacto, mais seco, mas atraente
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gociou no Lo'ire, no Ródano e no Sena. Nenhum possível objecto de negócio lhe escapou; a Argenterie, com armazéns em Tours, era, certamente, além de verdadeiro guarda-mobiliário do rei, um entreposto dos mais diversos artigos. Mas Jacques Creur não negociava apenas para a Argenterie; esta era, na realidade, o seu melhor cliente ... A lã, os panos de todas as procedências, as telas, especialmente da Champagne, os couros e as peles, o sal do Midi, do Poitou e da Bretanha, o fabrico e fornecimento aos exércitos reais de arreios e .armas, tudo isso foi para ele motivo de lucro. A esta lista vêm juntar-se as ESPECTARTAS, a alma do negócio meridional. Objectos de arte de todos os géneros, jóias, tapeçarias, manuscritos iluminados, eram também formas de investimento dos seus capitais.» rY. Lanhers e M. C. Marinesco). Há oue insistir no lugar ocupado, no imenso consórcio que ele chefiava. nela exploração d~s minas de prata do Lyonnais e do Beauiolais. .Tacones Cc:~11r obtiv~ra a concessão da exnloração rles
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fessores a tomar consc1encia da sua função educativa (v. li, pp. 75-82). COLOMBO, Cristóvão Nascido em Génova ou Savona em 1451 de pai tecelão. Não há nenhuma prova da sua origem JUdaica. Em 1474-1475 foi na viagem de Chio como tripulante de um navio da frota fretada por mercadores genoveses. Em 1476 participou numa expedição comercial a Inglaterra, mas os navios foram atacados por corsários e vários deles arderam. Colombo, que se salvou a nado, chegou à costa portuguesa. Viveu em Portugal e na ilha da Madeira entre 1476 e 1485 e teve oportunidades de viajar para a Inglaterra, a Irlanda e, provavelmente, a Islândia (1477) e, depois disso, foi à região do golfo da Guiné. Casou (em 1479?) com uma viúva de Lisboa, per" tencente à classe nobre, mas não possuiu fortuna (a esposa morreu em 1483). Colombo instalou-se na ilha de Porto Santo, onde seu sogro, Perestrello, fora o primeiro capitão. Colombo teria recebido mapas e documentos deixados pelo sogro. Estimulado por seu irmão Diego, que era cartógrafo em Lisboa, o «Descobridor» sonhou desde muito cedo com uma grande viagem transoceânica. Leu a Historia rerum de Pio li, a !mago mundi de Pierre d' AILL Y e é verosímil, ainda que isso tenha iá sido posto em dúvida, que se haja correspondido com o geógrafo toscano Paolo Toscanelli. Das suas leituras, extraiu a convicção de a circunferência terrestre ser menor que aquilo que na realidade é (v. I, p. 53) e de a China estar relativamente perto da Europa a oeste. Como João li de Portugal se recusou a financiar-lhe a projectada expedição, Colombo foi para Espanha (1485) e ofereceu os seus serviços a FERNANDO e Isabel, que a princípio hesitaram. Foi a Inglaterra e a França (1491), voltou a Es-
COLONNA, Vittoria
'""' lta c obteve finalmente, a 17 '" ,\bril de 1492, as «capitulações» .1, Sii nta Fé (v. I, p. 54). A história d1 < 'o lombo, «almirante do mar ':1 11 o», confunde-se a partir de 111 1 1 11L•11 co m a das suas viagens (v. I, 1111 ~6-58, 169-171). A primeira (v. I tn apas 38 e 39), feita com três tluv iDs (v. I, gravuras 40 e 41), du'"'' de 3 de Agosto de 1492 a 4 de 1\ lurço de 1493 e proporcionou a .k~co bcrta de San Salvador, Cuba e I L1ili . A segunda (25 de Setembro dt· 1493 a 11 de Junho de 1496), com dezassete barcos, 1 l't•d uada lt-vo u os Europeus à Martinica, a I ;ll il dalupe, a Porto Rico, à Jant aica e à costa sudoeste de Cuba. I 111rante a terceira viagem (30 de Maio de 1498 a 25 de Novembro d · 1500), Colombo navegou ao longo da costa do continente ame' i('fi OO até ao delta do Orinoco e visitou as ilhas de Trinidad, Tobago e Granada. Mas quis proteJ', l'l' os Índios contra os maus tratos dus Espanhóis e foi enviado, com 1'1• rros, para Cádis. O seu crédito junto de Fernando desceu muito. Pôde ainda, apesar disso, organi zar uma quarta expedição (11 dL: Maio de 1502 a 7 de Novembro de 1504), que o levou às costas da América Central, designadamente 1\ região de Belém do Panamá. Tendo encalhado na Jamaica, Colombo foi remetido para S. Domingos e voltou a San Lucar de Ua rrameda. Morreu em Valladolid em 20 de Maio de 1506. Em 1500 escrevera: «Devo ser julgado como cavaleiro e não como administrador>>. Excelente navegador, não era um conquistador nem um co nstrutor. Além disso, parece não te r compreendido que tinha tocado num mundo novo. Simultaneamente místico (v. I, p. 51) e muito entendido em negócios, Colombo esperava trazer, dos países por si descobertos, ouro em quantidade suficiente para a reconquista de Jerusalém. (Bibl.: S. E. Morison, Admirai of the ocean sea, 2 vols., Boston, 1942; ed. francesa, Paris, 1958).
Nascida em 1492, morreu em 1547. Poetisa, filha de um condottiere (Fabrizio Colonna). Desde os quatro anos que fora prometida em casamento ao marquês de Pescara, com quem casou aos dezassete. O marido morreu em 1525 deixando-a inconsolável. Os mais belos versos de Vittoria foram dedicados ao esposo prematuramente desaparecido: um facto novo na civilização do Ocidente (v. Il, p. 97). Ligada à fina flor da sociedade italiana do seu tempo, foi cantada por MIGUEL ÂNGELO, que lhe dedicava uma espécie de culto (v. li, pp. 88, 91). Com MarGARIDA DE NA VARRA, Louise LABÉ e Teresa de Ávila, contribuiu para a promoção da MULHER na Europa do século XVI. COMMENDA Companhia de negócios surgida em Itália no século XII. O contrato de commenda, firmado entre um comanditário, que entrava com o capital, e um comerciante itinerante, era válido apenas para uma única viagem. Em certos casos, o mercador, muitas vezes dono de um navio, entrava também com algum capital (v. I, pp. 217-218). COMMYNES, Philippe de O autor das Memórias nasceu em 1447 perto de Hazebruck. Começou por servir Filipe, o Bom, e CARLOS, O TEMERÁRIO, mas foi ganho por Luís XI no encontro que tiveram em Peronne em 1468. Em 1472 fugiu da Borgonha para passar a ser o principal conselheiro do rei de França. Este nomeou-o em 1476 senescal de Poitou. Encarcerado no tempo dos Beaujeu, e metido numa gaiola de ferro, voltou a estar em graça sob CARLOS VIII e LUíS XII, que acom-
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panhou a Itália. Morreu no seu Palácio de Argenton em 1511 (v. I, p. 222). COMPANHIA MERCANTIL Da palavra italiana compagnia, que por sua vez deriva, sem dúvida, do latim cum panis. A partir do século XI, esta expressão designou uma sociedade oe responsabilidade ilimitada com total solidariedade dos contratantes. As compagnie deram origem às sociedades em nome colectivo (v. I, pp. 217-218). Eram, essencialmente, de dois tipos: um, de sucursais, e outro, de filiais (v. I, pp. 219-220, 223-225). Nas cidades marítimas, GÉNOV A e VENEZA, a palavra compagnia designava também uma commenda (v. I, pp. 231-232). CONCíLIOS O povo cristão da Europa Ocidental e Central viveu, desde o século XIV até meados do século XVI, na esperança de um concílio ecuménico que viesse dar ordem a uma Igreja que parecia andar à deriva e que, de qualquer modo, se encontrava em plena transformação. Daí a insistência com que se aderiu a esta fórmula, mesmo depois dos fracassos parciais de Constança (v. I, pp. 122-123) e de Basileia (v. I, p. 124). SA VONAROLA desejava que um concílio geral se reunisse e LUíS XII, em conflito com JúLIO II, tentou fazer condenar este papa belicoso por um concílio que reuniu em Pisa em 1511-1512 e que só contava padres favoráveis à causa francesa . Júlio II não podia responder senão com armas semelhantes e convocou, por sua vez, o V Concílio de Latrão, que só em 1517, sob LEÃO X, veio a acabar. Muitas das suas melhores resoluções acerca. da repressão dos abusos verificados no seio da Igreja viriam mais tarde a ser retomadas
pelo concílio de Trento. LUTERO, no cemitério de Wittenberg, perante notário, lançou também em 1518 um Apelo ao Futuro Concílio Geral. Mas, por ocasião da «disputa de Leipzig» (1519), frei Martinha pôs em causa a infalibilidade dos concílios ecumênicos. Continuou, porém, a apelar para a reunião de um «concílio livre», não convocado já pelo papa mas sim pelo imperador. «Se o papa - escrevia ele - usar o seu poderio para impedir a reunião de um concílio livre e se opuser à reforma da Igreja, nós não deveremos dar importância à sua pessoa nem ao seu poder ... ». Nesse concílio, que deveria realizar-se na Alemanha, os padres e até os simples leigos teriam voto deliberativo; as resoluções seriam tomadas apenas em função dos textos bíblicos. O «concílio livre» desejado por Lutero nunca se realizou e o reformador morreu ao redigir um violento panfleto Contra o papado fundado em Roma pelo diabo e contra o concílio que começara. Apesar disso, em 1552, delegados de príncipes protestantes foram a Trento; mas a ruptura entre católicos e protestantes estava já consumada. O concílio de Trento (1545-1563), embora tivesse trabalhado corajosamente para a reestruturação da Igreja católica (v. I, p. 129), não soube evitar cair, ao mesmo tempo, no antiprotestantismo (v. I, pp. 129-131). (Bibl.: Hefele-Hergenroether, Konziliengeschichte; trad. francesa: Histoire des concites por Dom H. Leclercq, P. Richard e A. Michel, 1907 & sg., especialmente os tt. IX e X; H. Jedin, Breve histoire des conciles, Bruxelas, 1960). CONSTANTINOPLA «0 aglomerado... reparte-se por três massas importantes, prolongadas por arrabaldes; na margem sul do Corno de ouro, limitada por muralhas, está a cidade de Istam-
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bul propriamente dita, a cidade , , ,,,dalmente muçulmana, embo' , ,,,uitos cristãos (gregos ou ar""'''os) ou judeus aí vivam. Na "'"·gem norte está Gaiata, dominlld:t pelo arrabalde, relativamente pollll:o povoado, de Pera: é a cid .de europeia. Finalmente a ter' 1 1m massa, Uskudar (Scutari) e ,, , .~~: us prolongamentos (Kadikoy: 1 ' 'lredónia), na margem asiática .!11 Bósforo e do mar de Marmara» t lt Mantran). As muralhas que lo-1 havam Istambul tinham 20,5 qu dómetros de comprimento. Meio · ru lo depois da conquista da cid 1d 1: pelos Turcos (v. I, pp. 49, I X , 2 15, 243, 273), a população de ''lO 000 almas (v. I. p. 27); e seria dt· 600 000 ou 700 000 no início do 'ru lo XVII, sendo 42% de crisi iiOS c judeus. A capital otomana foi, nos séculos XVI e XVII, a ··ul nde mais populosa da Europa. (llihl.: R. Mantran, La vie quoti,1/,•nne à Constantinople au temps ri•· Soliman le Magnifique et de ,1'1'.1' successeurs (XVZO et XVII" sie1'/1'.\'), Paris, 1965).
<'ONTABILIDADE POR PARTIDAS DOBRADAS Consiste em inscrever sempre, par·u registo de cada operação, dois lnnçamentos iguais e de sinais contrários: um crédito e um débito (v. I, pp. 204, 205). Mas a sua maior clif'iculdade, que provoca desânimo nos leigos, está na inversão dos siuuis. Em todas as contas diferentes dn de «ganhos e perdas», se nos ·a locarmos na posição do chefe da ·mpresa o «haver», que deveria designar um crédito, é na realidade um passivo; e o «deve» corresponde 11os créditos. Os motivos desta anomalia são de ordem psicológica. A inversão do sinal tradicional surfliu quando foi necessário manter ~.:ont as de terceiros, de correspondentes. A COMPANHIA MERCANTIL colocou-se, deliberadamente, no ponto de vista do client c, que não era, forçosamente,
técnico de contas, e que devia compreender com facilidade as contas que lhe eram apresentadas; era, assim, preciso que o <
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imóvel com o Sol no centro. Os planetas, entre os quais Copérnico contava a Terra, deslocavam-se em volta do Sol em orbes materiais cujos centros não coincidiam com o do astro central. A Igreja não se inquietou com as consequências da revolução cop e rnicana (v. li, p. 147), senão a partir do momento em que Giordano Bruno dela tirou consequências filosóficas de inspiração panteísta. (Bibl.: A Koyré, La révolution astronomique: Kepler, Copernic, Borelli, Paris, 1961).
ção da Virgem , A scensão) e para a Catedral de Parma (Assunção da Virgem). Chamado a Mântua cerca de 1530, pintou para o seu castelo os painéis de l o, Ganimedes, Leda e Danaé. Morreu em Pa rma em 1534. Correggio tinha aprendido com Mantegna a ciência do escorço, mas integrou-o numa arte terna e delicada (v. li, p. 62), sensual e encantadora, fluida e luminosa, que fugia à solenidade e apreciava as composições de linhas oblíquas. Uma das suas mais belas obras é a Natividade do museu de Dresden. (V. I, p. 111.)
CORPORAÇõES Agrupamentos de artesãos ou de comerciantes do mesmo mester que .tinham o monopólio da profissão numa determinada cidade. Compunham-se de mestres, companheiros e aprendizes. Uns e outros se comprometiam a cumprir os regulamentos da corporação e a respeitar a autoridade dos seus dirigentes, ou «jurados» (daí o nome de «jurandas»). Na época do Renascimento, o número das corporações aumentou (v. I, p. 200). A sua disciplina económica endureceu-se e o seu controlo da vida artesanal amplificou-se. Mas perderam a autoridade política e foram um dos meios de que se serviu o absolutismo (v. I, pp. 201-202). Fizeram-se conservadoras e travaram o progresso técnico (v. I, p. 199). (V. I, pp. 260-261 ; 290.) CORREGGIO Antonio Allegri, dito Correggio. Nascido em Correggio, perto de Parma, por volta de 1489, conheceu em Mãntua as obras de MANTEGNA. A sua carreira só começou, verdadeiramente, quando a abadessa Giovanna lhe pediu que decorasse a abóbada do Convento San Paolo de Parma. Fez depois frescos (v. 11, p. 113) para a Igreja San Giovanni Evangelista (Coroa-
CORREIOS Os primeiros serviços postais foram criados na época do Renascimento (v. I, p. 166). Os correios nasceram, por um lado, das necessidades políticas (Luís XI desejava «fazer saber diligentemente notícias de todos os lados e dar a saber, quando melhor lhe aprouvesse, as suas ... ») e, por outro lado, das necessidades do comércio, pois os «mercadores» tinham de pôr-se mutuamente ao corrente dos seus negócios (v. I, pp. 211-212), das chegadas das mercadorias e das taxas de câmbios das diversas praças. Em França, Luís XI formou a rede de mudas dos correios reais e estes, a partir de HENRIQUE 11, passaram a levar também correspondências privadas. Roma era, provavelmente, no fim do século XVI, a principal praça postal da Europa (v. I, p. 256; v. 11, p. 148). (Bibl.: E. Vaillé, H istoire générale des postes françaises, 8 vols., Paris, 1947-1953). CORTEZ, Hernan Capitão espanhol nascido em Medellin (Estremadura) em 1485. Participou, a partir de 1511, na ocupação de Cuba sob o comando de Diego Velazquez, com o qual depressa entrou em conflito. Ten-
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dp reunido 11 navios, 500 homens l' 16 cavalos, partm em 1519 à t'onquista do México (v. I, pp. 27, •I'IJ. destruindo o império que os ZTECAS ali tinham estabelecido drstle 1325 como sucessores dos Ma ias (v. I, p. 61). Esse império, ll lltável pela sua organização po111 i ca e pela sua cultura, era, por·ém, dominado por uma religião cr uel e desesperada que praticava SI H.:rifícios humanos na esperança d • com eles afastar a catástrofe Huprema - a destruição do unive rso. Em 1522, Cortez foi nomeado pelo imperador CARLOS V vovernador geral dessa «Nova Espanha» que conquistara (v. 11, p. 42). Quis então dar ao país uma urganização de tipo espanhol (v. I, p. 284), mas a brutalidade do conquistador para com os indígenas, hem como a sua ambição, valeram-lhe inimigos, tanto no México como em Espanha. Muito popular junto da população de Espanha, foi acolhido na corte madrilena com desconfiança. Convocado para omparecer perante o Conselho das Jndias em 1527, foi novamente enviado para a América com maiores honrarias mas com poderes diminuídos. Em 1541 voltou para Espanha e morreu retirado, perto de Sevilha, em Castillejo de la Cuesta, em 1547. (V. 11, pp. 11-12.)
tocrático mas voltou como vencedor no ano seguinte e daí em diante governou a cidade por interpostas pessoas. Foi o maior homem de negócios do seu tempo, inclinou-se para uma política externa de carácter pacífico e foi, também, um mecenas. Sensível à evolução dos espíritos para o HUMANISMO, estimulou FICINO a traduzir PLATÃO (v. I, p. 96) e a fazer-se rodear de uma ACADEMIA Ao mesmo tempo, começou a reunir os manuscritos que viriam depois a constituir a Biblioteca Laurenziana, ajudou a concluir a construção da catedral e das portas do baptistério de Florença, mandou erguer o Palácio Médicis da Via Larga e a vil/a de Careggi e contribuiu com dinheiro para se construir a Igreja San Lorenzo, para se completar o Convento San Marco e para se ampliar a Abadia de Fiesole. (V. 11, p. 37.) COZINHA uma arte na corte da BORGONHA e na corte papal (v. I, pp. 291-292), mas continua a sofrer da grande quantidade de pratos em cada refeição, do excesso de carnes de caça e do violento contraste entre as ESPECIARIAS e o açúcar. É
COSME, O ANTIGO Cosimo de'Medici. Nascido em F lorença em 1389, morreu em Careggi em 1464. Era o filho mais velho de Giovanni di Ricci. Por morte do pai, em 1429, tomou a direcção da firma. Sob a sua autoridade, e com o auxílio de Francesco lnghirami, director-geral instalado em Florença, a empresa MÉDICIS, dotada de uma estrutura mais maleável que a das comoanhias florentinas do século XIV, alcançou o apogeu (v. I, pp. 222, 237) e irradiou sobre todo o Ocidente. Cosme tinha sido expulso de Florença em 1433 pelo partido aris-
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CRANACH Lucas Cranach, dito Cranach o Velho. Nascido em Kronach, na Francónia, em 1472, passou os anos de juventude em Viena e fixou-se depois (1505) em Wittenberg. É de crer que tenha trabalhado durante algum tempo na oficina de Dürer. Pintor da corte da Saxónia, serviu três Eleitores: Frederico, o Sábio, João, o Constante e João Frederico, o Magnânimo, vindo depois a ser burgomestre de Wittenberg. Amigo de LUTERO (v. I, p. 126), a quem fez vários retratos, foi encarregado de
ilustrar a edição da BíBLIA feita pelo reformador (v: Il, .P· 113). Quando João Fredenco f01 venc1d~ em Mühlberg, Cranach compartilhou durante dois anos do cativeiro dele, acompanhando-o depois a Weimar, onde morreu em 1553. Já nas suas obras de encomenda - cenas religiosas, RETRATOS se descobre o gosto de Cranach pela expressão linear e o seu sentido, muito pessoal, da sinuosidade do desenho. Manifesta-se na sua obra um expressionismo por vezes veemente (por exemplo, na Crucifixão de Munique) em paralelo com um MANEIRISMO que lhe dá o encanto e que ele elevou ao nível de estilo nas suas numerosas cenas de nus femininos. No que a estas últimas obras respeita, parece que Cranach quis criar um padrão de beleza diferente do da estétic:t italiana. «Pode-se ver aí a criação de um tipo, em cuja definição o desejável leva a melhor ao belo e em que a forma é guiada pela expressão e não pelo cânone, em que a sensibilidade.. . requintada age em detrimento das noções recebidas» (E. Müller). A graciosa elegância desses nus femininos, tratados com
o Velho, pintor como o pai, cuja oficina tomou a seu cargo em 1553. Tem sido feita, por vezes, confusão entre a obra de um e a de outro. A Fonte de Juventa de Berlim (v. II, p. 17) é actualmente atribuída a Cranach, o Moço.
uuocral dos brocados e das pedras pensar em certas telas ok Uustave Moreau. Entre as suas , ohrus mais celebradas conta-se a lnunciação com Santo Emídio ( l ,ondres) (v. II, p. 62), a Coroação dn Virge m e a Virgem com a Vela, tombas de Milão. 1 o:t. ·m-nos
CRIAÇÃO DE GADO O rendimento da carne e o rendimento do leite eram, na época do Renascimento (v. I, pp. 253-255), muito pequeno~ no, Ocidente. Essa época teve a assmala-la o progresso do carneiro (v. I, pp. 249-250): para a carne, na campina romana; para a lã, em Inglaterra e em Espanha (v. I, pp. 284-285). (V. I, p. 254.)
CRIANÇA Dá-se-lhe, na época do Renascimento, uma importância nova, o que atesta a lenta mas profunda evolução da mentalidade ocidental. Os métodos de ensino e de educação modificaram-se (v. n, pp. 75-76 81-82), visto que, embora sujeit~ndo a criança a uma disciplina demasiado severa (v. II, pp. 79-80) ou confundindo-a com o adolescente, os educadores cuidaram de preservá-la da corrupção do mundo dos adultos. A criança, por outro lado, é agora objecto de maior atenção afectiva (v. II, pp. 64-65) e começa a aparecer em quadros (v. II, pp. 61-64) e esculturas (v. II, pp. 66-67).
CRIVELLI, Carlo Pintor veneziano nascido entre 1430 e 1435 e falecido em 1493 ou 1495. Pintou apenas assuntos religiosos. As suas figuras esguias, de mãos admiráveis, encontram-se, muitas vezes, em cenários ricamente ornamentados; a precisão dos pormenores, o refinamento da ornamentação, bizantina, o brilho
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'ROMWELL, Thomas
I{ formador inglês de simpatias lulcranas, nascido por volta de 14R5 em Putney. Depois de ter kvado vida aventurosa em Itália voltou em 1510, aproximadamente, pura Inglaterra e, dez anos depois, tm trou para o · serviço do cardeal Wolsey. A queda deste em des~~ rnça não prejudicou a carreira de Cromwell, que soube ganhar o fnvor de HENRIQUE VIII, tendo Nido nomeado, sucessivamente, l'hanceler do Tesouro (1532), guarda do Selo Privado (1536) e Lord Cham berlain (1539). A partir de 1532 foi agente da política religiosa ele Henrique VIII, tanto na sua luta contra os mosteiros como na sua vontade de subtrair-se à autoridade do papa (v. I, p. 127). Foi um dos que mais contribuíram para afastar de Roma a Igreja anglicana. Mas n desgraça de Anne de Cleves, cujo casamento negociara, levou-o à prisão, tendo sido executado em 1540.
USA, Nicolau de Nikolaus Krebs, dito Nicolau de Cusa. Nascido em Kues, na diocese de Trier (Trêves) em· 1401, doutorou-se em direito canónico em Pádua, foi ordenado padre e participou no concílio de Basileia (1431 ). Trabalhou para a reunião das Igrejas grega e latina e representou o papa na Alemanha. Ne~ociou a concordata de Viena (1448). Feito cardeal, bispo de Brixen e legado a latere nos países germânicos (1450), esforçou-se por restituir à disciplina a Igreja alemã. Chamado novamente a
Itália, foi governador de Roma e morreu em 1464 em Todi, na úmbria. Foi o primeiro HUMANISTA alemão e a historiografia contemporânea dá-lhe, com razão, grande importância (v. I, pp. 134, 135). Espírito ecuménico, tentou reconciliar gregos e hussistas com Roma (v. II, p. 35). Filósofo e sábio de opiniões profundas e novas, abandonou o tradicional geocentrismo, abrindo assim caminho a COPÉRNICO e Galileu (v. li, pp. 148-149); afirmou o valor absoluto do princípio de continuidad.e em matemática e declarou que a MA TEMA TICA era o fundamento da FíSICA. A obra em que expôs estas teses -De docta ignorantia (1440)- deve ser considerada como um dos principais livros do Renascimento. (V. II, p. 69.) (Bibl.: M. de Gandillac, La philosophie de Nicolas de Cues, Pa• ris, 1941).
D DAVIS, John Navegador inglês nascido em Sandridge cerca de 1550. Descobriu em 1585 a costa ocidental da Gronelândia (v. I, p. 60) e o estreito que tem hoje o seu nome, entre o Mar de Baffin e . o Atlântico; em 1587 descobriu as ilhas Cumberland e, em 1592, quando de uma expedição com Cavendi~h aos mares do sul, as ilhas Falkland. Autor de dois tratados de navegação, publicados depois de 1593, Davis foi também o inventor do «quadrante inglês», ou quadrante de Davis, instrumento de navegação aparentado com a balestilha que serve para a medição da altura do Sol. A partir de 1601, Davis fez muitas viagens às índias como piloto da companhia das índias Orientais. Foi morto por piratas japoneses no estreito de Malaca em 1q05.
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DE L'ORME, Philibert Nascido em Lyon entre 1510 e 1515, morreu em Paris em 1570. Seu pai, mestre pedreiro, mandou-o estudar latim, grego, matemática, ciências naturais, física e até astrologia, medicina e teologia, em Lyon. Uma estadia decisiva em Itália, especialmente em ROMA, em 1533, ganhou-o para as fórnmlas estéticas da Antiguidade (v. I, p. 115). Nomeado «superintendente das construções reais» em 1548, inspirou-se nessas fórmulas para os trabalhos que fez nas Tulherias (v. I, p. 267), em Fontainebleau e nos palácios de Saint-Germain, de Villers-Cotterêts, de Chenonceaux e, principalmente, de Anet (v. I, p. 111), cujo portal de entrada é, com o túmulo de FRANCISCO I, a sua obra-prima. Escreveu tratados de ARQUITECTURA: Nouvelles inventions pour bien bâtir et à petit frais (1561) e o Premier tome de l'architecture (1567). Foi capelão de HENRIQUE II e cónego de Notre-Dame. (Bibl. : A. Blunt, Philibert de L'Orme, Paris, 1963). DEL COSSA, Francesco Pintor da escola de Ferrara, nascido por volta de 1435 e falecido em Bolonha cerca de 1478. V ASARI fala-nos da sua «maneira terrível». São-lhe devidos três dos doze painéis pintados para Borso d'Este no «salão dos meses» do Palácio Schifanoia: Março, Abril e Maio (v. II, p. 54). Em 1470 exilou-se em Bolonha, onde fez vitrais, frescos e retábulos. DELLA QUERCIA, Jacopo Escultor italiano nascido cerca de 1367 em Siena, onde morreu em 1438. Foi um dos primeiros grandes imitadores da arte antiga, co-
mo no-lo atesta o túmulo de !laria dei Caretto em Lucca· (v. I, p. 103). «A obra parece ser de uma singular maturidade antes de se saber que é a primeira, anterior à de Angelica, à de Masaccio, à de Donatello ... Dir-se-ia que é um poderoso esboço da tragédia da Sistina e do túmulo dos Médicis ... o grito de um profeta irritado... O . espírito do artista e o espírito da própria pedra fundem-se no clarão da grande intuição lírica, em que as leis imóveis da harmonia universal se combinam com o mais ingénuo sentimento e a mais egoísta das nossas penas, dos nossos cuidados, dos nossos trabalhos de todos os dias (é o caso do baixo-relevo de S. Petrónio, que mostra Adão a cavar e Eva a fiar) . Habitava nas suas pedras esculpidas uma força terrível... Estava adian~ te de todo o seu século e chegava; num só fôlego, às conclusões de Miguel Ângelo, mas ninguém ci compreendeu (E. Faure). DELLA ROBBIA Família de escultores e ceramistas florentinos. Luca (1400?-1482) sofreu a influência de GHIBER TI e é autor de uma das duas cantorie (v. II, p. 62) da Catedral de Florença e da admirável Visitação de Pistoia. Foi ele quem, em 1442, introduziu a terracota esmaltada na escultura monumental e espalhou na Toscana a moda daqueles medalhões polícromos e rodeados de grinaldas de frutos e flores com que decorou a capela dos Pazzi. Solteiro, Luca associou-se muito cedo ao seu sobrinho Andrea, que por morte do tio passou a chefe da oficina e nela pôs a trabalhar vários filhos seus. Mas Andrea della Robbia, a quem se deve, designadamente, a série dos medalhões de recém-nascidos do Spedale degli Innocenti, tinha gosto menos firme que o tio e a arte da cerâmica envernizada esmaeceu pouco· a pouco
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I>I !PóSITO I!sta palavra é utilizada neste Uvro duas acepções diferentes. No 'll' ll sentido actual, designa o diuh ·iro colocado num banco por 11111 particular. A palavra italiana que exprime este facto, que era dissimulado por causa da proibi~·lh> dos EMPRÉSTIMOS A JUROS, era discrezione (v. I, p. 212). /1. outra significação da palavra de/IIÍsito é a do século XVI. Neste <' liSO, é um empréstimo contraído por um príncipe ou por um partindar, dissimulado sob a aparência d · um câmbio de feira para feira (v . r, p. 213). <' 111
lliNOTIO MODERNA Jlorma nova de espiritualidade, privilegiava a meditação pessoal em relação à liturgia (v. I, pp. 142143). Traduziu, no plano religioso, 11 subida do individualismo. Exprillliu-se na IMITAÇÃO DE CRISTO e nas obras de GERSON e inl'luenciou LUTERO e INÁCIO DE LOYOLA. DIAS, Bartolomeu Nascido por volta de 1450, morreu ·m 1500. Navegador português que descobriu o Cabo da Boa Esperança (v. I, pp. 50, 168 e mapa .l8), navegando ao longo da costa ufricana (1487-1488). DlSTÃNCIAS A tabela · feita entre 1442 e 1458, por um florentino, Giovanni da Uzzano, dá para os correios da época uma velocidade média de 50 a 60 quilómetros por dia. Por volta de 1600, baseando-se no estudo dos correios instalados em ROMA, vê-se que os CORREIOS <
correios «extraordüiários» podiam percorrer, em caso de necessidade, 250 a 300 quilómetros por dia (v. li, p. 148). (Bibl.: Y. Renouard, «lnformations et transmissions des nouvelles», in L'Histoíre et ses méthodes, Paris, 1961). DOLET, Étienne Um humanista enigmático. Nascido em Orléans em 1509, estudou em Paris, em Pádua, em Veneza e em Toulouse. Depois de ter sido revisor de provas na imprensa de Sébastien Gryphe, em Lyon, entre 1534 e 1538, montou uma oficina com a insígnia La doulouere d'or. Tendo publicado um Cato christíanus que pareceu marcado de ateísmo, foi preso uma primeira vez pela Inquisição em 1542. Em 1544 foi preso pela segunda vez por ter editado uma série de obras de tendência reformada juntamente com vários livros que pareciam negar a imortalidade da alma. Foi garrotado e queimado na praça Maubert, em Paris, em 1546. Dolet seria herético, livre-pensador ou, simplesmente, homem de negócios? Na sua principal obra, Commentarii linguce /atínce, obra de um erudito mas, também, de um filósofo muito pouco ortodoxo p~rece ~p~ar pelo evemerismo, qu~ ve na diVIndade uma extrapolação do homem; mas, depois, publicou diversas obras inspiradas pela doutrina de Genebra (Sommaire de la foi chrétienne, Nouveau Testament .. .). O caso de Dolet, que, de qualquer modo, era um «franco-atirador>> intelectual, ainda hoje é ~bjecto de estudos. (V. II, p. 104.) (Bibl.: L. Febvre, A u creur religieux du XVI" siecle, Paris, 1957). DONATELLO Donato di Berto Bardi, dito Donatello. Nasceu em Florença em 1386, tendo começado a trabalhar
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como marmorista nos estaleiros de construção da catedral. Fez as suas primeiras obras-primas entre os vinte e cinco e os trinta anos de idade: o S. João Baptista do Duomo e o S. Jorge de Or San Michele -esculturas que revelam um temperamento vigoroso mas que continuam fiéis à busca da beleza ideal. Donatello acabou por volta de 1425 o Festim de Herodes, baixo-relevo para as pias baptismais de Siena. A sua força dramática já é outra. Além disso, o escultor aproveitou a ciência do seu amigo BRUNELLESCHI, apaixonado pelos problemas da PERSPECTIVA. Dos anos 1433-1440 datam obras tão diferentes como o Zuccone (v. I, p. 43) e a cantoria de Santa Maria dei Fiore (v. I, p. 103; v. li, p. 62): uma de um realismo violento e a outra transbordante de alegria pagã. A evolução do artista é, por vezes, difícil de acompanhar; quanto ao David, que não tem data, hesita-se entre 1430 e 1454. De 1443 a 1453, Donatello trabalhou em Pár' .., , onde fez a primeira estátua t-'*uestre erguida depois da Antiguidade - a estátua do Gattamelata (v. I, p. 152; v. li, p. 39) - e o altar da basílica Sant'Antonio, onde está a Virgem Sentada, parecida com um ídolo arcaico (v. I, p. 103). De volta a Florença, esculpiu ainda a Crucifixão do Bargello, o grupo Judite e Holofernes (cerca de 1455), a célebre Madalena, imagem impressionante da velhice (cerca de 1455, também) e o painel da Descida da Cruz do púlpito de San Lorenzo (1461-1464). Tendo ficado paralítico, veio ~ morrer em 1466 na sua cidade natal. Donatello esculpiu mármore, bronze e madeira. Situado na confluência das tradições góticas com o Renascimento, apaixonou-se pela arte antiga; mas o seu génio ultrapassou todas as lições que recebeu . «Em toda a parte, nessas grandes estátuas equestres, em que a força militar tem o seu peso, ressoando no solo. esses rostos seh<:-.::-~s que ele cavou I
até ao coração, todos esses corpos feitos de chamas e de nervos ... o conflito dos novos sentimentos e das antigas certezas alcança o seu momento mais trágico... Donatello, por . . . estar a meio caminho entre um equilíbrio perdido e um equilíbrio ainda só pressentido, reviveu a humanidade ardente, fanátic;a e excessiva desse tempo» (Élie Faure). DRAKE, Sir Francis Nascido por volta de 1540 no Devonshire. Viajou primeiro sob o comando de Hawkins, no Mar das Caraíbas. Tendo recebido da rainha carta de corso, atacou os espanhóis nas suas colónias da América Central em 1570-1572. Depois disso, realizou a segunda grande volta ao mundo (v. I, p. 59), pilhando, de passagem, as costas do Chile e do Peru, chegando à Califórnia e escalando as ilhas de Sonda. Em 1587 destruiu no próprio porto de Cádis uma esquadra espanhola e, no ano seguinte, participou no desbaratamento da Invicible Armada. Morreu em 1596 ao largo de Porto Bello. DU BELLAY, Joachim Nascido em 1522, foi um dos «saturnianos» (v. li, p. 51) do século . XVI, de poesia frequentemente amarga e melancólica (v. li, pp. 46, 49). Amigo de Ronsard, pora-voz da Pléiade, autor da célebre éfense et illustration de la Zangue ançaise, que se sabe hoje ser cópia parcial de um escrito de Sperone Speroni (v. I, p. 47), foi excelente tanto na poesia latina como na poesia francesa. Em 1533 acompanhou a Roma o primo, o cardeal Jean Du Bellay. Trouxe, dessa estadia em Roma, obras notáveis, ora satíricas ora nostálgicas- Les antiauítés de Rome e Regrets. Contribuiu imenso para o êxito do soneto, forma literária tipicamente
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tiu para Itália, onde descobriu a representação dos assuntos antigos e dos grupos compostos em profundidade: sentiu-se fascinado pela monumentalidade dos nus plasticamente concebidos por MANTEGNA e Pollaiuolo. Dürer foi o primeiro artista alemão a estudar verdadeiramente a arte italiana (v. I, p. 109). «A sua arte é uma luta incessante, cheia de uma surda paixão e de uma aguda tenacidade: é a eterna luta dos artistas do Norte para alcançar a forma clara, harmoniosa, do Sul» (G. Jedlicka). «Artista erudito, curioso de todas as coisas, teve da Idade Média a fé, a força confusa, o simbolismo obscuro e rico e do Renascimento á inquietação, o sentido das perspectivas sem fim que se rasgam perante os espíritos superiores, a infatigável vontade de saber ... Se assinou retratos todo-poderosos, de um modelado cerrado e duro ... vamos encontrar numa casca de árvore, numa cepa de vinha, o mesmo vigor nodoso, a mesma preocupação pela vida total e densa, o mesmo espírito meticuloso» (E. Faure). A arte e a natureza (v. li, p. 134) são para ele uma só e mesma coisa: daí aquela curiosidade insaciável pela diversidade do mundo visível. Dürer foi um dos primeiros pintores-gravadores (v. I, pp. 155, 193) - um desses artistas que dominam por igual ambas as técnicas e que enriquecem a arte da gravura com a sua experiência pictórica, coisa nunca vista antes do Renascimento. Mas foi mais desenhador que pintor: na grande obra teórica que planeava escrever no fim da vida que devia constar de dez partes, só uma destas seria dedicada à pintura. As suas primeiras gravuras são em madeira, principalmente, entre elas, a série do Apocalipse, pela qual perpassa um surdo tumulto de tempestade: «Cada desenho nasceu da escuridão, sai dela por um momento para a ela voltar» (G. Jedlicka). Mas é nas suas gravuras em cobre, no lento ·trabalho do buril e da
humanista, em França. Tendo reRfCSsado à pátria em 1555, morreu rm Paris com trinta e oito anos . (V . H, p. 124.)
DUFA Y, Guillaume Aquele a quem chamaram «a luz do século XV>> nasceu cerca de 1400 e morreu em Cambrai em 1474. Eclesiástico, teve
ponta seca (que Dürer foi um dos primeiros a utilizar), que melhor se revela a personalidade do artista. «Engenheiro militar» (v. I, p. 189), Dürer escreveu também um tratado sobre as fortificações (v. I, pp. 259, 261); o seu Tratado das Proporções do Corpo Humano foi publicado no ano em que ele morreu, 1528. (V. I, p. 126 e gravura 62; v. li, pp. 44, 46, 50, 55, 141.)
pp. 38, 42). O fim do seu reinado, porém, ficou ensombrado por uma crise económica (v. I, p. 222) e social- e, em França, por uma sé. rie de derrotas que tiveram por consequência a perda dos territórios conquistados. EDUARDO VI Nascido em 1537. Filho de HENRIQUE VIII e de Jean Seymour. Rei de Inglaterra e da Irlanda de 1547 a 1553. (V. I, p. 129.)
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EL GRECO
ECK, Johann Johann Mai:er, dito Johann Eck. Nasceu em 1486 em Eck, na Suá. bia. Vice-chanceler da Universidade de Ingo!dstadt, foi o principal antagonista católico de LUTERO, que atacou nos seus Obelisci (1518). Tendo Lutero ripostado com os Asterisci, os dois adversários enfrentaram-se em 1519 durante a «disputa» de Leit;~lg, que teve por consequência a ruptura definitiva de Lutero com Roma (v. li, p. 13). Eck foi encarregado de reunir a argumentação para a bula Exsurge Domine, de 1520, com a qual LEÃO X condenou as teses de Lutero, e de a publicar na Alemanha. Em seguida, dirigiu também muitas polêmicas contra MELANCHTON e
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Domenikos Theotokopoulos, dito E! Greco, nasceu em Candia, Creta, em 1541. Depois de viver em Veneza, onde encontrou Tintoretto, e em Roma, fixou-se em 1574 em Toledo, onde morreu em 1614. A sua familiaridade com os ícones ensinara-lhe que «a deformação coerente é um meio de criação» (A. Malraux). Nada, porém, está mais longe dele que o rígido e petrificado formalismo das obras bizantinas: «No Greco tudo é movimento, exaltação e vida das formas em constante evolução. E nisso está, sem dúvida, a contribuição da Itália para a sua obra» (J. Lassaigne). A sua profunda singularidade, porém, está noutro aspecto. «Já muito se falou no esguio das suas figuras... O que ele procura não é, principalmente, o alongamento a que os maneiristas... tinham já sacrificado mais que ele: era um sistema de volumes sem precedentes, que seria difícil definir se Cézanne no-lo não tivesse feito familiar. El Greco procura atingi-lo por meio de uma luz barroca, lancada sobre as partes iluminadas dos seus quadros e também por meio de uma ~quívoca transformação das suas personagens em personagens esculpidas. Se. apesar disso, escapam à escultura, é poroue nascem menos do desenho que da pintura - e às ve-
forma geral, um tipo de paisagem agrária que se desenvolveu a partir do fim do século XIII. O nascimento do individualismo agrário e os progressos da criação de gado foram as principais causas da substituição dos campos lavrados e abertos pela pastagem fechada (para carneiros). Uma das consequências da multiplicação dos enclosures, especialmente sensível nos arrabaldes das cidades inglesas (v. I, p. 249), foi a expulsão de numerosos camponeses pobres.
zes da pasta ... Todo o seu problema parece residir em conservar o desenho barroco do movimento suprimindo aquilo que lhe deu origem: a busca da profundidade ... A cor não é aqui serva da represen' tação, mas sim de uma representação específica: não é pvr acaso que ele faz cessar tão decididamente o traço para impor às suas obras «O seu aspecto de esboços cruéis» (Pacheco): é que nem o sagrado nem o seu espaço sem lonjuras podem já exprimir-se com a fusão italiana» (A. Malraux). Desenho e cor, longe de perseguir o real, como em SIGNORELLI, rejeitam-no. «A história da pintura antes de Cézanne e do cubismo não nos mostra um esforço de edificação plástica mais coerente» (J. Lassaigne). (Bibl.: P. Guinard, Greco, Skira, 1956).
ENGENHEIROS A feliz fórmula de B. Gille, «OS engenheiros do Renascimento», deve ser conservada para caracterizar toda uma família de espíritos, entre os quais se contam ALBER TI, AGRICOLA, Ramelli, LEONARDO DA VINCI, Kyeser, Taccola, Francesco di GIORGIO MARTINI - principalmente italianos e alemães-, que naquela época se interessaram pela técnica e a fizeram avançar (v. I, pp. 154 e segs.).
ELDORADO País maravilhoso e lendário que, na época do Renascimento, se situava não já em África (v. I, p. 52) nem na Ásia mas na América (v. I, p. 63; v. 11, p. 11). EMBLEMAS Equivalente humanista dos hieroglyphica antigos (v. li, pp. 126-127). Alciati deu o protótipo numa compilação surgida em 1531. O «emblema» (impresa) é a representação gráfica de um preceito moral ou de uma ideia filosófica, mas a imagem é voluntariamente enigmática e só se pode encontrar-lhe o sentido com o auxílio do comentário que a acompanha: o comentário e o emblema nada significam isolados um do outro. ENCLOSURES A palavra inglesa, que significa «recinto fechado», designa, de uma
ERASMO, Didier Nascido em Roterdão cerca de 1469. Filho de um padre (v. li, p. 42), educado durante cinco anos (1478-1483) na célebre escola dos Irmãos da Vida em Comum de Deventer (v. li, p. 69), entrou em 1487 para a comunidade dos cónegos regulares de Santo Agostinho de Steyn e aí pronunciou votos em 1488; foi depois ordenado padre. Mais tarde, viria a ser dispensado desses votos por JúLIO li. Em 1493 foi secretário do bispo de Cambrai, que, dois anos depois, o autorizou a ir estudar para a Universidade de Paris. Nesta cidade, entrou para a comunidade dos estudantes pobres do colégio de Montaigu. A sua primeira estadia em Inglaterra data de 1499. Encontrou-se com Thomas MORE e com John Colet, que exerceram sobre
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Inglaterra. A priAdágios (800 provérbios) é de 1500; a do Enchiridion militis christiani é de 1504 (v. li, p. 96); e a publicação das Annotationes in Novum Testamentum de Lorenzo Valia é de 1505. De 1506 a 1509, Erasmo viveu em Itália, tendo estado em VENEZA e em ROMA. Estudou grego e publicou na oficina de Aldo MANUZIO uma nova edição dos Adágios (4251 provérbios) em 1508 (v. li, p. 120). Seguiu de Itália para Inglaterra, escrevendo durante a viagem o Elogio da Loucura (v. I, p. 134; v. li, p. 119), que terminou em Londres junto de Thomas More. Esta obra apareceu em 1511. Entre 1509 e 1514, Erasmo viveu, essencialmen te, em Inglaterra, onde durante algum tempo ensinou grego e teologia em Cambridge (v. I, p. 277; v. li, pp. 72, 76). Concluída a paz entre a França e a Inglaterra, voltou ao continente em 1514 e foi para Basileia, onde conheceu Froben, que passou a ser o seu editor. Durante os anos de 1516 a 1521, esteve quase sempre nos Países Baixos. Nomeado conselheiro de Carlos I de Espanha (o futuro CARLOS V), escreveu nessa altura a lnstitutio principis christiani (1516). Nesse mesmo ano, publicou o Novum Testamentum , dedicado a LEÃO X, que teve um extraordinário êxito (v. I, p. 98). A primeira edição dos Colóquios é de 1518 (v. li, p. 84). Em 1521, Erasmo deixou os Países Baixos para lá não voltar. Instalou-se em Basileia na ocasião em que começavam a estalar as querelas entre católicos e reformados em toda a Europa. LUTERO pediu-lhe que se mantivesse neutro, mas HENRIQUE VIII e ADRIANO VI pressionaram-no para que interviesse: daí o De libero arbítrio de 1524 (v. I, p. 130; v. li, p. 59) em que o humanista rejeita a PREDESTINAÇÃO. Lutero respondeu-lh e
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em 1525 com o De servo arbítrio. Doente de há muito, Erasmo nem por isso deixa de trabalhar; nos últimos anos de vida editou e comentou quase todos os Padres da Igreja. Estes trabalhos não o impediram de publicar em 1526 a lnstitutio christiani matrimonii, dedicada a Catarina de Aragão, nem de aumentar os Colóquios e de troçar, no Ciceronianus (1527), dos imitadores excessivamen te servis dos Antigos. Em 1530, Erasmo deixou Basileia para ir para Freiburg, cidade católica, onde escreveu uril tratado sobre a Concórdia da Igreja, o Ecclesiastes (ou «arte de pregar>)) e a Preparação para a Morte. Tendo voltado a Bàsileia em 1535, aí recebeu de PAULO III a oferta -que rejeitoude um chapéu cardinalício. Morreu na noite de 11 para 12 de Julho de 1536 depois de ter feito numerosas doações à família Froben, aos pobres e aos doentes. (V. I, pp. 86, 125, 145 e gravura 28; v. II, PP- 85, 109.) (Bibli.: J. C. Margolin, Érasme par lui-memê, Paris, 1965). ESCORIAL A 50 quilómetros de Madrid, nos primeiros contrafortes da serra de Guadarrama. O nome desta localidade vem das escórias de uma antiga mina. O palácio-moste iro-necrópole, de gigantescas dimensões (v. I, pp. 72, 274), foi começado a construir por Juan Bautista de Toledo e ficou concluído em 1584 por obra de Juan de Herrera. Ao mesmo estilo, austero e despojado, dito herreriano, que reage contra a ornamentaçã o PLATERESC A, pertencem também os palácios de Simancas, a Lonja de Sevilha e a Catedral de Valladolid. A planta da igreja, em cruz grega, inspira-se no projecto de Bramante para S. PEDRO de Roma. A traça geral do complicado monumento faz lembrar, talvez, a grelha do martírio de S. Lourenço; e a vitória de
foram objecto de comércio crescente entre o Oriente e o Ocidente. O desejo de chegar aos próprios locais da sua produção explica, em grande parte, as viagens e a _implantação dos Portugueses, pnmeiro1 _e depois dos Holandeses, na Asta (v. I, pp. 240-243 e ma_Pa 7). No século XVI a rota tradicional das especiarias ~ por Trípolis da. Síria ou por Alexandria, Mediten:âneo e VENEZA - sofreu concorrência de outras mas não foi suprimida pela dos Portugueses, que contornava a África (v. I, p. 55). O seu declínio definitivo foi provocado no século XVII pelas actividades dos Holandeses.
Saint-Quentin , por causa da qual FILIPE II prometeu mandar construir o mosteiro, deu-se no dia de S. Lourenço (10 de Agosto de 1557). Residência de Filipe li, o Escoriai foi também um centro administrativ o, próximo da. nova capital, Madrid (v. I, p. 275). (Bibli.: J. de Contreras de Lozoya, L'Escurial et la Granja, Paris, 1966). ESCULTUR A O seu desenvolvime nto durante o Renasciment o é, talvez, menos espectacular que o da pintura, pois a estatuária já tinha realizado, ao longo de toda a Idade Média, obras muito notáveis. Mas a escultura medieval era, principalmen te, religiosa. A do período seguinte foi ora religiosa (Profetas de SLUTER, S. Jorge de DONATELL O, Moisés e Pietà de MIGUEL ÂNGELO), ora mitológica e profana ·(Eros Attis de Donatello, Co!leone de VERROCCH IO, fonte dos Inocentes de J. Goujon). Acima de tudo, diversificou-se (v. I, pp. 102-106): os túmulos dos grandes eram arcos de triunfo: Donatello deu nova aura à estátua equestre; R. Aleman, em Toledo, esculpiu em madeira os episódios da conquista do reino de Granada. Na Península Ibérica (v. I, p. 108) expandiram-s e as artes PLATERESC A e MANUELINA. A escultura, tal como a pintura, assimilou as regras da PERSPECTI VA, que utilizou especialmente nos baixos-relevos .. Soube, também, destacar a estátua do conjunto, no qual, durante a Idade Média, era apenas um elemento, dando-lhe a importância que perdera. Também como a pintura, aplicou-se ao estudo do corpo humano, que reabilitou. ESPECIARI AS As especiarias, necessárias na cozinha e na farmacopeia (v. I, p. 54),
ESTIENNE Família de IMPRESSOR ES e livreiros franceses (v. I, p. 279; v. 11, p. 88). Henrique I, fundador da dinastia (1470-1520), trabalhou por sua conta em Paris a partir de 1504, tendo impresso cerca de 12~ livros. Roberto I, seu segundo filho (1503-1559), que era, _como ~ pai, um ~xcelente huma~Ista, fm nomeado Impressor do rei para o hebraico e o latim e depois também para o grego. Publicou numerosas BíBLIAS, um dicionário latim-francês e um dicionário francês-latim. Mas, atacado pela Sorbonne, aliou-se à Reforma e foi para Genebra em 1551. Henrique II, seu filho mais velho (1531-1598), helenista de muito valor, trabalhou primeiramen te em Paris, mas teve de sair desta cidade depois da publicação de Apologie pour Hérodote (1566), que era um panfleto anticatólico. Fundou então em Genebra uma oficina que reuniu à do pai quando este morreu. O seu Thesaurus lingure grrecre, publicado em 1572 testemunha da sua vasta erudiçã~. Em 1579, por ocasião de uma estadia em Paris, publicou um Projet du livre intitulé «De la ç.récellence du langage trançaiS>), que o fez entrar em conflito com Genebra e lhe valeu ser preso ao vol-
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Uauriele Condulmer, nascido em 1383. Monge agostinho e sobrinho de GREGORIO XII. Foi papa de 1431 a 1447. Triunfando dos seus a.dv.ersários do CONCíLIO de BaSilem (v. I, p~. 123-124), restabeleceu a autondade pontificai na Igreja católica.
F FAREL, Guillaume Nobre do Delfinado, nascido perto d7 qap em 1489, começou por ser dtscipulo de LEF:EVRE D'ÉTAPLES em Paris e Meaux. Ganho pela causa da Reforma refugiou-se em Basileia em 1523, junto de
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1\stc foi cardeal e, depois, papa, com o nome de PAULO III (1534-1549). Mandou construir o Palácio Farnese de Roma e foi o promotor do CONCILIO de Trento. Em 1545 deu investidura hereditária, como duque de Parma e de Plasenza a seu filho Pierluigi, nascido an'tes da sua ordenação. Um sobrinho de Paulo III (v. I, p. 283) foi o cardeal Alessandro Farnese . ((1520-1589), que mandou constrUir a Igreja de J7sus, em Roma, e decorar o PaláCIO Caprarola (v. I, p. 270 e gravura 68). Quanto ao duque de Parrna Alessandro Farnese (1545-1592) era, por Pierluigi, bisneto de Paul~ III; e, por sua mãe, Margherita, neto de CAR~OS V. Bom diplomata, consegum com a união de Arras, de 1579, desviar os católicos dos Países Baixos da revolta . contra FILIPE li. Grande capitão, com" bateu em Lepanto, reconquistou aos Holandeses Gand Bruxelas e Antuérpia (1585) (v. r,' p. 33), e for~ çou HENRIQUE IV a levantar os cercos de Paris (1590) e de Roma
nistração, com tribunais eleitos pelos mercadores, polícia privativa e selo. As mercadorias compradas. só eram pagas no fim da feira. Os pagamentos faziam-se por entregas e compensações. FEITIÇARIA É a «magia diabólica», na medida em que procura mobilizar forças sobrenaturais para prejudicar outrem. A crença nos feiticeiros e, principalmente, nas feiticeiras, e a sua caça, nunca, provavelmente, foram tão generalizadas na Europa corno entre 1400 e 1650 (v. I, p. 126). Provam-no a condenação de Joana de Are, a bula Summis desiderantes de Inocêncio VIII (1484), certos poemas de RONSARD e de DU BELLAY (v. li, p. 124), urna das Novelas Exemplares de CER VANTES e inúmeros quadros (v. li, pp. 127-128).
os mouros. O casal real recebera em 1494, de ALEXANDRE VI, o título de «Reis católicos». Fora da Península Fernando conquistou o reino de NÁPOLES em 1504 (v. I, p. 39), ocupou por algum tempo o · Milanês (1513) e instalou guarnições nos «presídios» africanos de Oran, Bougie e Trípolis. Morreu em 1516, sucedendo-lhe o neto, CARLOS V. FERRARA Um dos principais focos do Renascimento italiano (v. I, p. 35). Os duques da família d'Este protegeram, no século XV, os pintores Cosrne dei TURA e Francesco DEL COSSA (Palácio Schifanoia) (v. li, p. 54). No século XVI protegeram BEMBO, ARIOSTO (v. I, p. 187) e TASSO. Foi anexada ao Estado pontificai em 1598 (v. I, pp. 128, 267).
FERNANDO li DE ARAGÃO Nascido em 1452, foi um dos criadores da grandeza de Espanha. Rei enérgico e astuto, admirado por MAQUIAVEL. Tendo casado em 1469 com Isabel de Castela, reuniu assim os dois grandes reinos ibéricos e concluiu a unidade de Espanha com a conquista dos reinos de Granada (1492) e de Navarra (1512) (v. I, p. 31). A sua obra interna caracteriza-se, por um lado, pela centralização política e, por outro, pela inflexível defesa da fé católica. Humilhou a alta nobreza, enviou os nobres de menor condição para teatros de operações fora deEspanha, reforçou a justiça real, dominou as ordens militares, convocou poucas vezes as cortes e organizou conselhos de governo, chancelarias e audiencias. Encarregou o cardeal Cisrieros de reorganizar a vida religiosa do país (v. I, pp. 135-136), apoiou a Inquisição, expulsou os JUDEUS mal convertidos, escorraçou de Castela
FERRO O Renascimento viu crescer o papel do ferro na civilização ocidental (v. I, p. 178). Os altos fornos (v. I, gravura 46) permitiram a fabricação de gusa (v. I, pp. 179-180), cada vez mais utilizada pela artilharia. A necessidade de ferro, de resto, fazia-se sentir em todos os sectores da vida quotidiana, tanto para MAQUINISMOS, em constante processo de aperfeiçoamento, como para objectos utilitários. FESTAS As festas eram cada vez mais inspiradas nos triunfos da Antiguidade (v. I, pp. 285-286; v. li, p. 101). Davam motivo a transformações passageiras da paisagem urbana (v. li, pp. 33-34) e exaltavam a glória dos príncipes, contribuindo assim para a consolidação do absolutismo (v. li, pp. 43-44).
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FICINO, Marsilio Nasceu perto de Florença em 1433 e morreu em 1499. Era filho de um médico (v. I, p. 86) e foi padre e helenista, a alma do círculo platónico de Careggi (v. li, p. 74), no tempo de LOURENÇ O, O MAGNíFICO, seu protector e discípulo. Tradutor (para latim) dos Diálogos de Platão, das Enéadas de Plotino, dos LIVROS HERMETICOS (v. I, p. 113), das obras de Pórfiro, de Proclo e de Dionísio, o Areopagita autor da Theologia platonica e do De religione christiana. Foi um dos mestres do pensament o do Renascimento (v. li, pp. 106-107, 109) e o grande responsável pelo reavivar do platonismo (v. li, pp. 55-57, 92, 93, 112). (Bibl.: R. Mareei, Marsile Ficin, Paris, 1958). FILARETO Antonio A verlino, dito Filareto, nascido em Florença em 1400, morreu em Roma depois de 1465. Escultor e fundidor, realizou a porta de bronze de S. PEDRO de Roma (v. I, p. 103). Arquitecto , construiu a torre central do Palácio Sforza de Milão e escreveu um Tratado de Arquitectu ra em que a UTOPIA ombreia com um URBANISMO funcional (v. I, pp. 262, 263 e gravura 64; v. li, p. 31 e gravura 73). FILIPE li Nascido em Valladolid em 1527, morreu no Escoriai em 1598. Rei do conjunto das possessões espanholas a partir de 1556 (v. I, p. 38) e do reino de Portugal a partir de 1580. Marido, sucessivam ente de Maria de Portugal (morta ' em 1545), de Maria Tudor (morta em 1558), de Isabel de Valois (morta em 1568) e de Ana de Habsburg (morta em 1580). Sob o seu reina-
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do, a Espanha implantou- se nas Filipinas (v. I, p. 66), triunfou sobre os Turcos em Lepanto e consolidou as suas possessões na América. Mas não pôde fazer frente com eficácia à revolta das Províncias Unidas (1568-1648) (v. I, pp. 42, 129), falhou em França ao querer ajudar a Liga e sofreu pesada derrota na costa inglesa (lnvincible Armada) em 1588 (v. I, p. 31). Consciente da sua inferioridade perante CARLOS V, burocrata, o «rei prudente» criou uma poderosa máquina burocrática (v. I, p. 275) ao mesmo tempo que fazia erguer o Palácio do ESCORIAL. Os aumentos de impostos e os tesouros da América não evitaram as semibancar rotas que repetidament e afectaram a monarquia espanhola (v. I, pp. 225 e segs.). Mas o reinado deste rei sem génio é um momento eminente da história religiosa (v. I, pp. 132, 135), artística e intelectual de Espanha (EL GRECO, Santa Teresa de Ávila, início da obra de CERVANTES e de LOPE DE VEGA). (Bibl.: M. Devêze, L'Espagne au temps de Philippe 11 (le roi tres catholique), Paris, 1965). FILIPE VI Nascido em 1293 e falecido em 1350. Filho de Carlos de Valois e de Margarida da Sicília. Neto de Filipe III, o Ousado, e sobrinho de Filipe, o Belo. Regente e depois rei de França (v. I, pp. 28, 37, 42) por morte do último Capeto directo, Carlos IV, em 1328, por EDUARD O III de Inglaterra ter sido excluído em virtude da lei sálica. FíSICA A «revolução» da física só se deu no século XVII mas o Renascimento criou a possibilidade das experiências de Galileu e ·de Descartes. Às geniais intuições de
Nicolau de CUSA (v. li, p. 144) seguiram-se as investigações de LEONARD O DA VINCI, Tartaglia BENEDET TI (v. li, p. 135) e STEVIN: a física desligou-se aos poucos de ARISTóTE LES. e fez-se mais experiment al e mais quantitativa (v. li, pp. 138-141). De facto, o regresso a ArqUimedes provocou a ultrapa.s~agem dos conhecimento s adqumdos. (V. li, gravuras 77, 78 e 79.) FLORENÇ A Tinha, talvez, 110 000 habitantes antes da Peste Negra, 50 000 depois dela (v. I, p. 77) e apenas 66 000 em 1622. Apesar desta deflacção demográfic.a, foi a çapi~al intelectual e arhstlca do pnmeiro Renascime nto (v. I, pp. 86, 90, 103) e a principal praça bancária da Europa dos séculos XIV e XV (v. I, pp. 29, 74, 215, 219,. 222). O HUMANIS MO tomou ah tonalidades de orgulho cívico no início do Quattrocen to, no tempo de Salutati e de BRUNI (v. li, pp. 37-38) fazendo-se filosófico e recatad~ com Marsilio FICINO (v. I, p. 96; v. li, pp. 70, 74) quando os MÉDICIS a partir de 1434, tomaram cont~ da República. Esta só ressuscitará de 1494 a 1512 (v. I, p. 222) e de 1527 a 1530, para se apagar definitivam ente perante os Médicis feitos duques da Toscana. Pátria de um extraordiná rio número de grandes artistas (v. I, p. 92) de MASACCI O e BRUNELLESCHI a MIGUEL ÂNGELO, e de escritores notáveis (Dante, MAQUIAVEL, GUICCIAR DINI), rica em monument os nobres e harmoniosos (catedral [v. I, gravura 36] , Palácio Strozzi, Paláci9 .M~ dicis, etc.), de frescos adm1rave1s (no claustro San Marco, na Capela dos Espanhóis) , a cidade do «lírio vermelho» cidade de arte e de ne~ócios (v. i, pp. 79, 17~) •. ~oi ~mais Importante foco de civihzaçao de uma Europa em vias de renovação. (V. I, pp, 73, 200.)
(Bibl.: A. Chastel, Art et humanisme à Florence au temps qe Laurent te Magnifiq ue, Pans, 1959). FONTAIN EBLEAU (escola de) Era formada por decoradore s,. pintores e especialistas do mosaico e do estuque, de origem. italiana, a quem Francisco I pedm que trabalhassem no seu Palácio de Fontainebleau: o Primatício, Rosso, Pellegrini, Niccolõ dell' Abbate, e~c. (v. I, p. 118). Estes artistas, mfen~ res aos artistas maiores do Renascimento italiano, aclimatara m à França o MANEIRI SMO .com .a sua predilecção por uma mJtologi~ sensual, pelas esguias fig_uras femininas nuas e enlanguesc idas, pelas decorações florais e pelas estátuas de estuque. Nesse mesmo estilo trabalharam depois Jean qmpq_N, Antoine CARON, os dms 1rmaos Jean Cousin e toda uma c<:mstelação de artistas flamen~os, mgleses e até boémios, que assim aprenderam em França as subtis e estranhas receitas do maneirismo. tr~n salpino (v. I, p. 111). Esta pnmeua escola de Fontainebl au, dos anos 1530-1550, não deve ser conf~n dida com aqueloutra que tambe~ trabalhou no palácio sob Hennque IV e que foi influenciad a, principalm ente, pela Flandres. FOUQUET , Jean Nascido em Tours entre 1420 e 1425 trabalhou para Carlos VII e para' Luís XI e morreu por v~lta de 1480. Entre 1445 e 144_7 .. fm 9 primeiro artista francês a viaJar ate Roma (v. I, p. 90). «Lon~e de estudar a oposição entre a pmtura do Norte e a do Sul, defrontou-<~: e resolveu-a associando as qualidades de ambas em subtil equilíbrio» (A. Châtelet) (v. I, p . 106). Nas suas miniaturas (Livro de Ho_ras de Étienne Chevalier, Antz-
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guidaàes Judaicas, Grandes Crónicas de França), só pertence à Idade Média fmal pela técnica que utiliza. «Expulsa da pintura francesa as longas silhuetas amaneiradas, de sorriso e gesto corteses, e põe a andar com passo seguro personagens robustas, pesadas como estátuas, densas, de uma gravidade toda ela humana>> (C. Sterling). Fouquet abandonou as variações das proporções dos diversos. elementos da composição, que amda marcavam as Tres rich~s "!eures du duc de Berry: pela pnmeira vez o espaço era concebido à escala humana. As paisagens deixavam de ser puras convenções. «Está à frente dos pintores do seu tempo, que pintavam a naturez~ po; si própria, e pô-la, como nmguem, em acordo com a humanidade que nela colocava» (C. Sterling). Encontramos o mesmo desenho poderoso, em oposição a todo o preciosismo, nos quadros deste «pai e senhor do grande retrato sóbrio, probo, pleno como um bloco» (É. Faure) (v. I, p. 93). «Em pleno s~culo XV, numa época em que, aquem"Alpes, de Van der Weyden a Grünewald, a pintura era ainda gótica, ossuda e angulosa,. Fo~quet ( .. .) é o mensageiro, o_ pnm_eu:o fora de Itália, do espínto classiCO» (C. Sterling).
FRA ANGELICO Guido di Pietro, em religião Fra Giovanni da Fiesole dito Fra Angelico. Nasceu em '1387 e entrou aos vinte anos para o convento dos dominicanos de Fiesole vivendo depois em FLORENÇA' onde decorou com frescos o Con: vento San Marco. Foi depois para · ROMA, onde pintou a capela de NICOLAU V e a Capela do Santo Sacramento. Angelico teve, provavelmente, formação de miniaturista e: iluminista; mas, nele, a finura dos contornos, segundo A. Chastel, não exclui a atenção aos volumes e à amplidão. «Constru-
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tor vigoroso, transmite, intacta, aos grandes clássicos, a grandiosa lógica arquitectónica de Giotto» (Ê. Faure). Mas o princípio essenCial da sua visão é a luz: numa perspectiva tomista, a 11lz é de origem celeste; não act!la sobre a «quantidade» das cores, fazendo-as passar dos tons claros aos tons carregados, mas sim sobre a sua «qualidade». Modifica-as, transfor.nando-as em qualquer coisa de diferente; à cor sucede a síntese cor-luz, ou seja, a tonalidade. A pintura de Angelica nunca é decorativa, é ensinamento e base de meditação: daí o seu carácter abertamente teatral, de representação sagrada. O pintor não procura, de modo algum criar a ilusão de um facto qu~ se passa p_erante os nossos olhos: quer, simplesmente, recordar uma cena da história sagrada. Fra Angelica morreu em Roma em 1455. Teve numerosos discípulos, entre os quais Benozzo GOZZOLI e Fra Filippo Lippi. (V. li, pp. 61-62.) FRANCISCO I Nascido em 1494, filho de Carlos de Orléans, conde de Angoulême, e de Luísa de Sabóia, casou com Cláudia de França e reinou de 1515 a 1547 (v. I, p. 39). O vencedor de Marignan (1515) e vencido d_e Pavil!- (1525) (v. I, pp. 184, 186) tmha sido uma criança mimada. Foi um soberano simultaneamente cavaleiresco e autoritário, sedutor superficial e leviano. Os aconteci: 11]-~ntos obrigaram-no a opções deCISivas para o futuro da França e a aliar-se aos Turcos e aos protestantes da Alemanha. Teve de evacuar o Milanês, o Piemonte e a Sabóia, viu-se obrigado a deixar a coroa imperial para CARLOS V em 1519 (v. I, p. 38) e a renunciar às pretensões que tinha sobre a Flandres, o Artois e NÁPOLES. Mas, com repetidas guerras, conseguiu defender o seu reino contra as ambições do adversário Habsburgo.
l)c resto, é do seu reinado que datam a concordata de Bolonha ( 1516) e as ordenações de Villers-
-Cotterêts, que são o primeiro texto que regulamenta o registo civil da população (v. I, pp. 48, 201). O príncipe que mandou construir os PALA CIOS de Chambord, de Fonta inebleau e de Madrid tinha gosto c espírito. Admirava LEONARDO, l:hamou a França o PRIMA TíCIO, Rosso e CELLINI, criou o Colégio dos Leitores Reais (v. Il, p. 70), confiou a Guillaurne BUDE a direl:~ao da bibJioteca real. lnclinado durante muito tempo, a conselho de sua irmã Marganda, à tolerância religiosa, adaptou uma política religiosa mais severa na sequência da «questão dos placards» (v. 1, pp. 127, 132). Morreu em Ramoouillet em 1547. (V. I, pp. 60, g6, 14(), 228; v. Il, pp. 9, 9U.J FRANCISCO Il Nascido em 1544. Filho mais velho de HENRIQUE TI e de CATARINA DE MEDICIS, marido de Maria Stuart, foi rei de França durante um ano (1559-1560). FRANCISCO XAVIER, S. Francisco de Jassu, dito S. Francisco Xavier, nasceu no Palácio de Xavier, perto de Pamplona, em 1506. Conheceu em 1528, no colégio de Santa Bárbara, Inácio de Loyola. Foi um dos seis jesuítas que, em 1534, fizeram em Montmartre a promessa de dedicar-se ao serviço de Deus e da Igreja católica. Ordenado padre em 1537, partiu para Roma e embarcou depois em Lisboa para as índias Orientais. Chegou a Goa em 1542 depois de uma estadia muito difícil em Moçambique. Começou então um extraordinário apostolado de dez anos (v. I, pp. 55, 56) que o levou às costas do Decão, a Malaca, ao coração das Malucas, ao Japão e, por fim, a uma ilha pró-
xima de Cantão. Foi aí, quando se preparava para penetrar na China, que morreu, em 1552, de esgotamento e de febres (v. I, p. 277). O «apóstolo das índias» procurou constantemente adaptar-se às populações e aos países que evangelizava. Foi canonizado em 1622, ao mesmo tempo que Inácio de Loyola. FUGGER Família. de mercadores-banqueiros de Augsburgo no fim do século XV e no século XVI. Na origem da dinastia está Ulrich, fabricante de fustões . Seu filho Johannes, que morreu em 1409, era comerciante de tecidos. O segundo filho de Johannes, Jakob I (falecido em 1469), fundou o ramo do lis, que eclipsou o outro ramo da família, do veado. Dos filhos de Jakob I, o mais célebre foi Jakob II «o rico» (1459-1525), cuja fortuna (v. I, pp. 71-72, 232) começou com os empréstimos feitos ao governo do Tiro!, que eram pagáveis em prata metálica. A sua associação ao polaco Jean Thurzo permitiu-lhe explorar o cobre e a prata de Neusohl, na Eslováquia (v. I, pp. 236, 239). Credor de MAXIMILIANO, e depois de CARLOS V (v. I, p. 279), principal produtor de prata e cobre da Europa, agente do papado para a cobrança das indulgências tnais tarde concessionário dos madstragos e das minas de mercúrio de Almadén (v. I, p. 178), Jakob Fugger foi o maior homem de negócios do seu tempo (v. I, pp. 223-224, 233 e mapa 56). Não teve filhos, sucedendo-lhe seu sobrinho Anton (1493-1560) (v. I, pp. 225, 237). Por morte deste (v. I, p. 283), a firma, que tinha feito empréstimos excessivos aos Habsburgos, estava já. em dificuldades por causa da semtbancarrota espanhola de 1557 (v. I, pp. 226. 227). Continuou ainda sob a direcçlto de Markus (1529-1597) mas, cudu vez mais comprometida com n.
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bancarrotas dos reis de Espanha, desapareceu em 1607. (V. I, p. 108; v. II, pp. 38, 41.) (Bibl.: R. Ehrenberg, Le siecle des Fugger, trad. franc., Paris, 1959; L. Schick, Un grand homme d'affaires au début du xvr siecle, Jakob Fugger, Paris, 1957).
G GAMA, Vasco da Nascido no Alentejo por volta de 1469, foi o primeiro a chegar à índia pela rota do Cabo, em 1497 (v. I, pp. 55, 56). Navegou ao longo da costa oriental da África até Melinde, de onde um piloto árabe o conduziu a Calecut (v. I, p. 50), na costa do Malabar. Aí fez um tratado de comércio com o rei local. Regressando a LISBOA com um importante carregamento de ESPECIARIAS (v. I, pp. 241, 252), foi nomeado «almirante das índias». Numa segunda expedição, em 1502, com 21 navios, fundou em África as possessões portuguesas de Moçambique e Sofala, confirmou na índia a aliança já negociada por CABRAL com o rei de Cananor, bombardeou Calecut, onde os Portugueses tinham sido dizimados, e assinou um tratado com o rei de Cochim. Voltou a Lisboa em 1503. João III mandou-o ainda outra vez à índia, já no fim da vida. Morreu em Cochim em 1524. (V . . I, p. 169.) GÉNOVA Tinha cerca de 50 000 habitantes na segunda metade do século XVI. Uma cidade de fraca vida política mas que exerceu considerável influência .económica e financeira no tempo e no espaço. Guelfa nos séculos XII e XIII, ofereceu-se periodicamente ao estrangeiro no
século XV- aos duques de Milão, aos reis de França - e, a partir de 1528, aceitou a protecção espanhola. Designou em 1339 o seu primeiro doge vitalício e teve, no século XVI, governo aristocrático. A primeira cruzada deu-lhe acesso ao Oriente, onde teve de enfrentar VENEZA. A destruição do império latino, em 1261, permitira-lhe o acesso ao Mar Negro. No século XIV, os estabelecimentos genoveses iam de Tana e Caffa a Famagusta, passando por Pera, Foceia e Chio. Os homens de negócios (v. I, pp. 202-204, 215) da cidade de S. Jorge eram senhores da produção e distribuição do ALúMEN (v. I, p. 30), que dirigiam para Bruges e para Southampton. Cidadãos enriquecidos numa cidade endividada, os credores do Estado agruparam-se na Casa di San Giorgio (1408) (v. I, p. 206) que administrou a dívida pública e obteve a concessão da exploração das colónias do Mar Negro, de Chipre e da Córsega, juntamente com a concessão da cobrança de impostos. O avanço dos Turcos no século XV impeliu Génova para o Ocidente (v. I, pp. 242), onde, a partir de 1440, participou nas expedições portuguesas à costa africana. Os «mercadores» genoveses, instalados em Sevilha, em Lisboa, na Madeira e nas Canárias, financiaram as primeiras expedições ao Novo Mundo e à índia e insinuaram-se, assim, nos negócios e depois nas finanças ibéricas. Aproveitando o apagamento dos FUGGER, depois da semibancarrota espanhola de 1557, passaram a ser, durante a segunda metade do século XVI e até 1630, os principais credores da coroa de Espanha e do papado (v. I, pp. 226-227). Génova, que dominava as feiras ditas «de Besançom>, foi, durante todo esse período, a primeira praça bancária da Europa. Mas a sua fortuna, assente na prata americana, decaiu quando em Sevilha diminuíram as chegadas de metais preciosos. (V. I, p. 74 e mapa 1.)
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(Bibl.: J. Heers, siecle, Paris, 1961; nes et /es foires Lyon à Besançon,
Gênes au xv· D. Gioffre, Gêde change, de Paris, 1960).
GERSON, Jean Jean Charlier. dito Gerson, nascido em 1363. Pregador (v. I, p. 137), teólogo, educador (v. II, pp. 78-79). Representante da Universidade de Paris no concílio de Constança, tentou pôr fim ao Grande CISMA e defendeu a tese da superioridade dos CONCíLIOS sobre o papa (v. I, p. 142). A sua espiritualidade exprime as tendências da Devotio moderna (v. I, p. 142; v. 11, p. 92). (V. I, p. 145.)
GHIBERTI, Lorenzo Nascido em 1378 e falecido em 1455. Este escultor florentino trabalhou em Santa Maria dei Fiore, em Or San Michele, nas pias baptismais de Siena, etc. Mas, para a posteridade, ficou, principalmente, como autor de duas portas de bronze do baptistério de Florença (v. I, p. 93). Os seus Comentários reflectem os pensamentos sobre arte de um admirador das obras antigas mas que continua, porém, fiel à cultura medieval (v. I, p. 102). GHIRLANDAIO Domenico di Tommaso Bigordi, dito Ghirlandaio. Nasceu em Florença em 1449, ali morreu em 1494. MIGUEL ÂNGELO começou a sua carreira na oficina de Ghirlandaio, que «está muito afas- ·· tado das inquietações dos seus con-· temporâneos ... e dai o aspecto sere- . no das suas cenas bem equilibradas. Falta, todavia, a unidade íntima que justifica tudo, a invenção poética que convence. E só podemos admirar-nos ... do excessivo apreço de que tem gozado» (A. Chastel). (V. I, p. 93.)
GESUALDO, Carlo Príncipe de Venosa, nascido cer~a de 1540 e falecido em 1613, Gesualdo descendia de uma das mais antigas e mais nobres famílias das Duas Sicílias. Personagem fora do comum - matou por suas próprias mãos a esposa infiel e o cúmplice e, embora profundamente religioso, levou uma vida tão dissoluta que até escandalizou os seus contemporâneos - , foi, sem dúvida, o maior compositor amador de todos os tempos. Leva, nos seu~ madrigais, ao extremo as audácias do cromatismo, que é «a expres· são, a um tempo real e convencional, do pecado e do drama da sua vida» (R. Craft). A sua linguagem soa-nos, hoje, como estranhamente «moderna». «Se o compositor gosta de uma certa instabilidade harmónica ... não se lhe pode negar um poder de emoção que nurt-ca foi ultrapassado, uma finura extrema para penetrar em todas as cambiantes do coração ... Todos os meios expressivos são aaui utilizados até ao extremo -limite, e compreende-se que, na história do madrigal, Gesualdo represente o ponto final: iá se não podia ir mais além» (N. Bridgman).
GIORGIO MARTINI, Francesco di Nasceu em 1439 e morreu em 1502. Arquitecto (v. I, pp. 258-259, 261, 263, 270), escultor e pintor de Siena, foi, principalmente, um dos grandes ENGENHEIROS do Renascimento (v. I, pp. 156-158 e gravuras 31, 61 e 66). GIORGIONE Nasceu em Castelfranco em 1477 ou 1478. Giorgio Barbarelli, dito Giorgione, foi aluno de BELLINI e mestre de TICIANO e morreu de peste em Veneza em 1510. «Foi ele quem precisou e por muito tempo orientou as inclinações dos pintores da Laguna para a tonalidade
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e a atmosfera» (A. Cha~tel). Giorgione é um dos raros pmtores que desprezaram a história contada oelo quadro - atitude emin~ntemente original na sua época. Nao se sabe ao certo qual é o tema ~a Tempestade (Veneza). Pouco _1mporta: a paisagem é o verdade1ro assun!o do quadro, é talvez até a traduçao directa do estado de alma do pmtor (v. I, p. 95). As suas telas podem ser concebidas co~o poema_s líricos dirigidos ao espínto pelo veiculo sensual da cor e da forf!l~ · Giorgione junta, ao espaço, ?~flm do por UCCELLO e estab1hzad? por PIERO, a atmosfera da reahdade tangível dos reflexos que o preenc~em e o pe~correm, tecendo no vaz10 geometnco uma co~res pondência de. vibrações colondas. Inaugura aqmlo a que se tem chamado «princípio do tom». Antes dele tanto em Piero como em MIGUEL ÂNGELO, a forro~ ~ra plástica: as figuras erall? delimitadas por . um contorno linear e os volumes eram dados por uma g~a dação do claro a? ~scuro. O pnncípio do tom ehmma. o desenho, pelo menos no sent1do do g~a fismo; .as silhuetas, o t?spaço e a_te a arquitectura são sugendos pelo JOgo das cores, que criam <lvi mento da pintura europeta f1cou marcado para sempre por ele. GOUJON, Jean Nasceu na Normandia por volta de 1510 e morreu cerca de 1565. Trabalhou, sucessivamente; na tribuna
do órgão de Saint-Maclou, no j~ beu de Saint-Germain-1' Au,xerr01s, nos palácios de Écouen e de Anet (v. II, p. 89), na fonte dos Inocentes (v. I, p. 110) no LOUVRE (v. I, p. 267). Era protestante e teve de sair de França em 15?2. Escultor notável que sofreu a mfluência da escola de FONT AINEBLEAU. (Bibl.: P. Du Colombier, Jean ·Goujon, Paris, 1949).
rREGóRIO XII Angelo Correr, nascido em Veneza em 1325. Foi papa (de Roma) de 1406 a 1415. A pedido do concílio de Pisa, abdicou em 1415 (v. I, p. 122), por ocasião do concílio de C:onstança (v. I, p. 122). GREGóRIO XIII Ugo Boncompagni, nascido em Bolonha em 1502. Foi papa de 1572 a 1585. Ordenou a reforma do calendário (v. I, p. 35).
GOZZOLI, Benozzo Renozzo di Lese, dito Benozzo Gozzoli nascido em Florença em 1420 e falecido em Pistoia em 1497. Começou por ser aprendiz de ourives - trabalhou com GHIBERTI nas portas do baptistério Je Florença - e foi, depois disso, colabora: dor de FRA ANGELICO. Gozzoll pintou muitos quadros de cavalete, mas celebrizou-se, principalmente; pelos seus frescos (v. I, p. 81): o Cortejo dos Reis Magos da Capela Médicis a História de Santo Agostinho d~ San Geminiano, as cenas do Antigo Testamento do Campo Santo de Pisa. A sua arte faz ponte entre a escola de Giotto e a de Fra Angelico e dos pintores dos fins do Quattrocento: enquanto, nos seus retratos, se exprime uma sensível vontade de realismo, o cenário é 't ratado com total ignorância das recentes descobertas da PERSPECTIVA. A despeito das suas grandes qualidades de decora: dor e fresquista, Gozzoli não f01 um verdadeiro criador pictórico. (Bibl.: L. Cuppini, Benozzo Gozzoli, Paris, 1952). GREGóRIO XI Pierre Roger de Beauport, nasceu no Limousin em 1329. Foi papa de 1370 a 1378. Deixou Avinhão em 1376 para restabelecer em Roma a sede do papado (v. I, p. 121).
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GRÜNEWALD Mathis Gothardt Neithart, dito Grünewald. Aquele que, com DüRER, foi o maior pintor alemão caíra em completo esquecimento quando há uns cem anos foi descoberto. Nascido, sem dúvida, em Wurzburgo por volta de 1475, acabou os seus dias como fabricante de sabão e engenheiro hidráulico depois de ter sido pintor oficial dos arcebispos eleitores de Mainz. Na sua obra, pouco abundante, avulta principalmente o incomparável retábulo que pintou em 1515 para o Convento dos Antonitas de Issenheim. Grünewald exprime todas as aspirações da Idade Média cristã; mas anuncia, igualmente, as possibilidades de uma arte moderna que no século XX se expandiu com o expressionismo. A noção de dor física e moral, característica da época medieval, encontra nele a sua mais intensa representação. Para Grünewald, a noção de «forma correcta» - a ratio de Dürer é desprovida de sentido: aquilo que se busca é, antes de mais, o efeito expressivo. Grünewald não receia o exagero nem a fealdade. Mas esta abundância de elementos expressionistas baseia-se numa observação anatómica precisa: por exemplo, o aspecto embrutecido da face de Cristo, que é característico da asfixia, já pudera ser observado nos doentes de peste ou de epilepsia que eram tratados pelos Antonitas.
Mas não se pode ficar pelo aspecto expressionista da arte de Grünewald: há nele uma sensibilidade pictórica que lhe permite revelar, como poeta e como artista plástico, a natureza e a paisagem e ultrapassar a observação do real (v. I, p. 95), para atingir por vezes a abstracção, o puro símbolo: por exemplo, na Ressurreição (painel interior do retábulo) a mortalha arrasta Cristo como uma chama e o corpo de Cristo é pura luz, enquanto que, para lá do túmulo, 9 real se transfigura na noite - o rochedo parece flutuar e o soldado, de armadura, parece um insecto submetido a novas leis da gravidade. Ultrapassando o expressionismo, a obra é símbolo de outra realidade, é um dos cumes da linguagem visionária. Grünewald morreu em 1528, no mesmo ano em que morreu Dürer: termina nessa data a maior época que a pintura alemã conheceu. GUERRAS RELIGIOSAS Continuando as guerras hussitas da primeira metade do século XV (v. I, p. 38), estenderam-se por um longo período, de 1546 (luta contra a liga de Schmalkalden) à paz da Vestefália (1648), que pôs fim à Guerra dos Trinta Anos. Na Alemanha, a luta de CARLOS V cone tra as cidades e os príncipes protestantes (v. I, pp. 126, 127) terminou em 1555 com a .paz religiosa de Augsburgo, que consagrou a divisão religiosa do país (v. I, mapa 27). Em França, começaram sete anos depois disso as oito guerras civis (v. I, pp. 1321 281) a que o edito de Nantes pôs ftm provisório, já que a luta armada recomeçou no princípio do reinado de Luís XIII para só acabar com a paz de Ales (1629). Nos Países Baixos (v. I, p. 42), as perturbações religiosas, que tinham começado pela «fúria iconoclasta» de 1566, prosseguiram com a Guerra dos Oitenta Anos (1568-1648) (v. I, p. 132). A revolta das pro
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víncias calvinistas, que fizeram a sua secessão em 1579 (união de Utrecht), terminou pela independência das Províncias Unidas (1648) (v. I, mapa 29). GUICCIARD INI, Francesco Nasceu em FLORENÇA em 1483 e morreu em 1540. Foi, com MAQUIAVEL, o maior historiador da Itália do século XVI. Fora, em 1512 embaixador da República de Flor~nça junto de FERNANDO , o Católico. Mas, a partir de 1514, ligou-se aos Médicis, especialmente aos dois papas desta família, LEÃO X e CLEMENTE VII, que governaram a Igreja católica entre 1513 e 1534, o que não o impediu: porém, de ter profundo desprezo pelo «governo dos padres». Apesar disso, foi governador da Romanha (exceptuando Bolonha). Cijamado a Roma por. Clemente VII, aconselhou-o a ahar-se a França contra CARLOS V e foi feito tenente-gera1 das tropas da Santa Sé. O saque de Roma e a queda dos Médicis em Florença assinalaram o fracasso da sua política. Guicciardini sentiu-se feliz ao ver os lansquenetes imperiais restabelecer nas margens do Arno a autoridade da família a ql}e tinha ligado a sua sorte. Nas suas duas grandes obras, Ricordi politici e civili e Storia d'Italia, Guicciardini mostra-se-nos como um observador já sem ilusões e lúcido (v. II, pp. 39 50) e como um penetrante analista das causas e consequências dos acontecimentos. GUTENBER G Nascido cerca de 1394 em Mainz e falecido por volta de 1468. O seu verdadeiro nome era Johannes Gensfleisch. Lapidador de diamantes e depois fabricante de espelhos, Gutenberg instalou-se em Estrasburgo em 1434. Foi nessa cidade. por volta de 1440, que aperfeiçoou, no maior segredo, uma invenção
que ma revolucionar a IMPRENSA: a sua originalidade ~onsistia em fundir caracteres móveis a par. tir de matrizes gravadas em metal (v. I, p. 192). Este processo p~r mitiu obter caracteres de mmto fina gravura e multiplicá-los indefinidamente sem lhes alterar o desenho. O aperfeiçoame nto deste processo levou uns dez anos (de 1438 a 1448, mais ou menos) e exigiu importantes recursos pecuniários. O financiador de Gut.enberg Johannes Fust, de Mamz, mov~u- lhe um processo judicial por falta de pagamento de juros sobre as quantias que lhe emprestara (1455). Gutenberg perdeu o processo e, ao mesmo tempo, o material e teve .de entregar a Fust os exemplares da Bíblia que estava a imprimir. Foi substituído por um seu colaborador, Peter Schãffer, que viria depois :;t imprimi: o Saltério dito de Mamz. Arrumado, o inventor levou uma vida difícil até ser recolhido e enobrecido por Adolfo de Nassau, bispo de Mainz A Biblioteca Nacional francesa e a Biblioteca Mazzarino têm, cada uma, um exemplar da Bíblia de Gutenberg. (V. I, p. 98.)
H HANSA A Hansa, na sua origem, era um grupo, uma associação; no s~culo XII esta palavra passou a designar COMPANHI AS de mercadores que se associavam para melhor lutar contra os riscos do comércio: «Hansa de Londres», «Hansa das 17 cidades» (associação de mercadores de panos dos Países Baixos que desapareceu no século XIV) ~· principalmente, a «Hansa teutómca», a Hansa por exce~ência, cujo centro foi Lübeck. A Ltga Hanseática açambarcou no século XIV o comércio do Báltico e conseguiu em 1370 obter a liberdade de comércio e a isenção de direitos alfandegá-
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rios nos estreitos dinamarqueses. No seu apogeu, em fins do século XIV, a Liga, com a força de mais de 70 cidades, dividia-se por quatro scctores: Vestefália (Colónia), Saxónia (Braunschweig), Wende (Lübeck) e Prússia (Dantzig); Hamburgo e Lübeck eram as suas prinl: ipais cidades; Bruges e Novgorod os seus pilares a oeste e a leste (v. I, p. 28 e mapa 1). A Hansa, (Jue dominava as pescas do Bálliw, baseara a sua prosperidade em dois aspectos de negócio. Trazia para o Ocidente madeiras, alcatrão, cereais e peles e levava para leste dos estreitos dinamarqueses a lã inglesa, os panos da Flandres, o sal de Bourgneuf, os produtos do Sul e do Extremo Oriente. A partir do século XV e, mais ainda, no século XVI, os Holandeses e os rngleses fizeram concorrência vitoriosa à Hansa, que desapareceu aos poucos (v. I, pp. 33, 239-240). (Mapa 59.) (Bibl.: Ph. Dollinger, La Hanse, X ll"-XVIII" siecle, Paris, 1964). HENRIQUE 11 Nascido em 1519. Filho de Francisco I e de Cláudia de França. Foi rei de 1547 a 1559. Teve por esposa Catarina de Médicis e por amante Diana de Poitiers .. (V. I, pp. 40, 72, 229, 267, 273.) HENRIQUE III Nascido em 1555. Filho de Henrique II e de Cá.tarina de Médicis. Foi rei de França de 1574 a 1589: o último Valois. (V. I, pp. 201, 286, 289.) HENRIQUE IV Nasceu em Pau em 1553. Filho de Antoine de Bourbon e Jeanne d'Albret. Foi o primeiro Bourbon rei de França. Casou em 1572 com Margarida de Valois (a rainha Margot), filha de HENRIQUE 11 e de
CATARINA DE MÉDICIS. Abjurando do protestantismo, escapou ao massacre de S. Bartolomeu. Mas logo fugiu da corte para se pôr à cabeça da união protestante. Rei de França em 1589, só entrou em PARIS, em 1594, depois de ter voltado ao catolicismo. O seu primeiro casamento é anulado por Roma e casa com Maria de Médicis. A capital francesa, sob o seu reinado, opta deliberadamente pelas fórmulas arquitectónicas e urbanísticas vindas de Itália. (Pont Neuf, Place Dauphine, LOUVRE, etc.). Foi assassinado em 1610 (v. I, p. 164). (V. I, pp. 31, 132, 201.) CBibl.: M. Reinhard, Henri IV ou laFrance sauvée, Paris, 1943). HENRIQUE VII Nascido em 1457. Filho de Edmund Tudor, conde de Richmond, e de Marguerite Beaufort. Rei de Inglaterra de 1485 a 1509. (V. I, pp. 47, 59.) HENRIQUE VIII Segundo filho de HENRIQUE VII, nascido em Greenwich em 1491 e falecido em 1547. Herdeiro da coroa por morte do irmão mais velho, casou com a sua viúva, Cá.tarina de Aragão, e reinou de 1509 a 1547. Em política externa, foi, principalmente, o aliado de CARLOS V (até 1527) e depois da França, contra a qual se voltou em 1545-1546. Nas ilhas britânicas (v. I, p. 28), venceu os Escoceses, anexou o país de Gales e fez-se proclamar rei da Irlanda (1541). As suas inquietações dinásticas e o seu temperamento apaixonado fizeram-no contrair cinco casamentos sucessivos depois de ter repudiado catarina de Aragão (1533). A recusa de CLEMENTE VII ao divórcio conduziu ao cisma um rei que anteriormente tinha entrado em polêmica contra Lutero e a quem o papa, em 1521, tinha concedido o elogioso título de áefensor fidei. Mas o eis-
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ma anglicano de 1531-1534 e a atitude do soberano explicam-se por uma longa tradição de quase-independência da Igreja inglesa em relação a Roma (v. I, pp. 128, 141). (V. 11, p. 22.) (Bibl.: G. Constant, La Réforme en Angleterre, t. 1: Le schisme anglicain, Paris, 1930; L. Cahen e M. Braure, L'Évolution politique de l'Angleterre moderne, Paris ' 1960). HENRIQUE , O Navegador Nascido em 1394, falecido em 1460. Terceiro filho de João I de Portugal. Sob o reinado de seu pai (falecido em 1443), participou na tomada de Ceuta, que assinalou o início da expansão portuguesa (1415). Foi na sequência dessa expedição que o infante, feito duque de Viseu, se instalou perto de Sagres, na província meridional do Algarve para se dedicar ao estudo da NA: VEGAÇÃO e à preparação de expedições marítima~ a regiões muito distantes (v. I, p. •,.J ). Em 1415, as Canárias, que já tinham sido alcançadas pelos marinheiros espanhóis e franceses, foram ocupadas. Em 1431 foi a vez dos Açores, explorados em 1417 por Diogo de Sevilha e depois por Gonçalo Velho Cabral. Em 1445, o Senegal foi reconhecido por Bartolomeu Dias e subido, numa parte do seu curso, por Ca'da M'osto (1456). Desde 1441 que os navios de Gonçalves traziam escravos e ouro da Guiné, e este êxito deu impulso decisivo ao comércio marítimo. Os progressos técnicos realizados para estas expedições (N. I, pp. 167-168) e a experiência que elas permitiram reunir acerca da navegação de longo curso preparam o caminho para os grandes descobriment os do fim do século. HERMES TRISMEGIS TA Trismegista: três vezes grande. O deus Thot dos Egípcios era identi-
ficado , desde Heródoto, com o Hermes dos Gregos e eram-lhe atribuídos numerosos escritos sagrados que os sacerdotes guardavam zelosamente. Mas, por outro lado, Platão, no Pedro e no Filebo, falara do egípcio Theuth inventor do alfabeto e da escrita. Os círculos alexandrinos dos séculos 11 e 111 d. C. manifestaram novo interesse por Platão e procuraram justificar a sua filosofia com uma espécie de revelação (v. li, p. 57). Certamente de boa-fé, atribuíram a Thot-Hermes, e redigiram, sob o seu nome, livros herméticos que continham uma doutrina coincidente com a sua. Também os neopitagórico s .atribuíram as suas obras a Pitágoras ou aos seus discípulos imediatos. (V. li, pp. 111, 126.) (Bibl.: A. J. Festugiêre, La révélation d'Hermes Trismégiste, 4 vol. . Paris, 1950). HOLBEIN, Hans Nascido em Augsburgo no Inverno 1497-1498, Hans Holbein foi aluno de seu pai, Hans Holbein, o Velho, e de BALDUNG GRIEN. Fixado primeiramen te em Basileia - aí pintou, principalmen te, obras religiosas-, viajou depois por Itália e França, onde terá descoberto o desenho com os três lápis (v. CLOUET). Em 1526 .foi para Inglaterra onde foi pintor da corte de HENRIQUE VIII; ali morreu de peste em 1543. A sua pintura religiosa é mal conhecida: são os seus retratos que lhe fazem a glória. «Holbein nada tem do misticismo que adorna as obras de Grünewald e de Altdorfer com um ardor intenso e, por vezes, estranho: não tem a fé profunda de um Dürer e não se preocupa com os conflitos religiosos do seu tempo. Habituado pelo pai a observar a natureza de muito perto, é com a mais estrita objectividade que ele se faz senhor da forma das coisas e . dos seres>> (P. Ganz). «Muito alemão pela sua escrupu-
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pela sua força de reconstrução , é o 11 11 ico dos alemães a ter sabido neo lh er, o único a nunca, prati1'11 111 Cnte , ter confundido aquilo que ,. belo com aquilo que é estranho, .1 qui lo que é essencial com aquilo que é exacto, aquilo que é pro-· l' und o com aquilo que é complil'i ld o; foi o úníco a procurar liberl a r uo pormenor e do acidental, nu própria real idade concreta e fora dl: toda a idealização, a lógica sene ta dessa realidade... É natural que ele seja, ao mesmo tempo, a co nclusão da pintura alemã e a ·xcc pção que demonstra a sua habitual impotência para dar ao 111undo visível o seu sentido arqui1 ·c tónico» (É. Faure). (V. T, p. 126: v. li, p. 67.) lo~n precisão , o~n(tli sc e de
llORDA DE OURO Tri~os mongólicas que, na sequêncw das conquistas de Djuchi l'ilho de Gengis Khan, constituí: ram no século XIII, sob direcção de Batu, filho segundo de Djuéhi, um reino feudo-militar cuja autoridad.e ~e 1 estendia pela Sibéria Setcntnonal e pelo Sul da Rússia (v . I p. 3l). A influência mongol mn'r: cou profundamen te os espíritos e as instituições eslavas. O reino islamizou-se gradualmente e passou a sofrer a influência dos Turcos de' sa parecendo em 1502.
HUMANISM O Cícero e Quintiliano entendiam por hur:zanitas a cultura espiritual, a polidez dos costumes e, mais geralmente, a civilização. Quando os intelectuais italianos, a partir de PETRARCA , se voltaram novamente para os grandes escritores da Antiguidade, faziam-no no desejo de recuperar os valores da cultura que eles tinham exaltado (v. I, pp. 46, 97-99). Essa «recuperação » exigia a pesquisa de manuscritos, a eliminação das leituras defeituosas e a crítica filológica dos textos,
bem como o estudo de línguas antigas esquecidas como o grego e o hebraico. Portanto, certos humanistas foram, principalmen te, gramáticos e puristas. Mas era impossível que a redescoberta do pensamento dos Antigos não influenciasse a filosofia da época que operava tal descoberta. Daí o desenvolvimento de um sincretismo humanista (v. 11, pp. 101 e segs.) que se esforçou por conciliar o Evangelho cristão com a sabedoria de PLATÃO reencontrada e com a de Cícero, e a austeridade do cristianismo com o epicurismo ou, ao contrário, com o estoicismo. Este esforço de síntese caracteriza a época do Renasciment o de Lorenzo VALLA a MONT AIGNE. O humanismo foi mais pagão em Itália que além-Alpes; sofreu uma tentação de cepticismo com os «paduanos.» e com DOLET. Mas, no seu todo, com FICINO, Thomas MORE e ERASMO, foi principalmen te uma tentativa - parcialmente bem sucedida - de integração no cristianismo do amor à vida e à beleza que tinha marcado a cultura antiga. (V. 11, pp. 70-72, 81-82, 83-84.) (Bibl.: A. Chastel, L'Âge de l'humanisme, Paris, 1963). HUSS, João Nascido em Husinec, na Boémia, cerca de 1369. Padre em 1400 e deão e a seguir reitor da Universidade de Praga (1402). Estudou as obras de Wyclif e, sem compartilhar completamen te das ideias do r~formador in~lês Cy. I, p. 139), ensmou que «nmguem é representante de Cristo nem de Pedro se não imitar os seus costumes .. . » e exigiu para os fiéis a comunhão sob as duas espécies (v. I, p. 140). Os seus veementes sermões contra os escândalos da hierarquia acarretaram-lhe a excomunhão. Convocado a Constança pelo concílio (v. I, p. 122), foi queimado vivo em 1415 (v. I, p. 126; 11, p. 38) apesar do
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salvo-conduto que lhe dera Segismundo. A sua execução deu origem às guerras ditas hussitas (v. I. pp. 39, 74). (V. I, mapa 24.) (Bibl.: J. Boulier, Jean Huss, Paris, 1958.)
I IMITAÇÃO DE CRISTO Atribuída actualmente a Thomas a Kempis, reflecte a espiritualidade da Devotio moderna. Um exemplar desta obra, do punho de Thomas a Kempis, tem a data de 1441 (v. I, p. 142). IMPRENSA O aperfeiçoamento da fabricação do papel, invenção chinesa (cerca de 200 d. C.) revelada ao Ocidente pelos Árabes, a pressão cada vez maior de um público que aspirava à difusão dos escritos (v. I, p. 152), o crescente êxito de uma literatura laica e popular (romances de cavalaria) e o desenvolvimento das técnicas da xilotipia e, depois., da metalografia, prepararam o caminho para a invenção da imprensa (v. I, pp. 191-193). Os processos antigos, caros e pouco rendosos, foram substituídos por GUTENBERG pelo processo tipográfico, baseado na utilização de caracteres separados, metálicos, obtidos por fundição a partir de matrizes. Muitas oficinas foram logo abertas em toda a Europa, especialmente na Holanda, em Itália e em França, procurando cada um dos vários mestres-fundidores ou impressores criar caracteres de tipo original: os mais célebres são devidos aos Elzevier, da Haia, a Froben, de Basileia, a Claude Garamond, de Paris, fundidor titular do impressor Robert Estienne, a Aldo MANUZIO, de Veneza, criador do itálico, e a Christophe Plantin, de Antuérpia. Artistas, sábios e técnicos ao mes-
mo tempo, foram, à sua maneira, HUMANISTAS (v. I, pp.98-99, 279-280), conscientes do papel cultural da sua actividade; muitas vezes agiam simultaneamente como fundidores de tipos, impressores e livreiros, só depois se dissociando estas actividades umas das outras. O seu conhecimento dos textos e das escritas antigas, em que livremente se inspiraram, permitiu-lhes criar de uma só vez toda uma gama de caracteres cujas perfeição e variedade são ainda hoje modelares e cujo uso ainda hoje é corrente. INÁCIO DE LOYOLA (S.) Nascido em 1491, levou vida mundana até 1521. Ferido no cerco de Pamplona, renunciou ao mundo e, depois de um retiro em Manresa, resolveu dedicar-se ao apostolado Suspeito de iluminismo em Alcalá e em Salamanca (v. 11, p. 75), terminou os estudos em Paris. O «voto de Montmartre» data de 1534. Inácio e os seus companheiros põem-se à disposição do papa. PAULO III concede ao novo agrupamento, em 1540, uma constituição própria. Inácio, padre desde 1537, é eleito superior da Companhia de Jesus. Morre em Roma em 1556. Além da correspondência, escreveu as Constituições, o Diário Espiritual, que revela o seu temperamento místico e, especialmente, os Exercícios Espirituais, em que por vezes transparece a influência da DEVOT/0 MODERNA (v. I, p. 142). (V. I, p. 286 e JESUíTAS.) (Bibl.: A. Gtiillermou, Saint I gnace de Loyola, Paris, 1957). INCA (império) Quando, em 1530, Francisco PIZARRO começou, apenas com uns cem homens e alguns cavalos, a conquista do Império Inca (império quíchua do Peru), esse império estendia-se pelos planaltos e vales dos Andes e abarcava também uma
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parte do act.ual Chile (v. I, p. 27 e mapa 10). A casta dos Incas domilla va a sociedade. Era dessa casta que saía o supremo Inca, chefe religioso e «filho do sol», senhor dectivo das terras, que tinha para si um terço delas. Um segundo lcrço era a parte do sol; o resto na distribuído pelos cidadãos. Emhora respeitando as religiões locais, o I ncas tinham instituído em toda a parte o culto do sol. O grande templo estava em Cuzco, a capital, cuj as construções ciclópicas decoradas a ouro encheram de admiração O!> conquistadores espanhóis (v. II, pp. 12-13). Quando eles ali chegaram, o Império Inca era teatro de uma guerra de sucessão entre dois ·Incas rivais, Huascar e Atahualpa (v. I, p. 62), e isso facilitou a conquista. INOCÊNCIO VIII Giovanni Battista Cibó. Nascido em 1432, papa de 1484 a 1492 (v. I, p. 125). lSABEL I Filha de HENRIQUE VIII e de Anne Boleyn, nascida em 1533, sucedeu em 1558 (v. I, p. 129) a sua meia-irmã Maria, filha de Catarina de Aragão. Morreu em 1603 sem ter casado; a dinastia dos Tudor acabou com ela. No plano político, o seu reinado caracterizou-se por uma dupla reacção contra as tendências pró-católicas do reinado anterior · (v. I, p. 132): no interior, o anglicanismo voltou a ser religião de Estado (v. II, p. 89), por efeito da nova vigência do Acto de Supremacia; e a ortodoxia anglicana foi fixada pelos XXXIX Articles, promulgados em 1563. Maria Stuart, rainha da Escócia e católica, que podia com legitimidade pretender a coroa, como sobrinha-neta de Henrique VIII, não fora estranha a essa nova orientação. De resto, Isabel tomou como pretexto ai-
gumas intrigas inabilmente criadas pela rival, expulsa da Escócia e refugiada na sua cort«, para a mandar executar. No exterior, outra rivalidade, esta de ordem econômica, veio precipitar a ruptura com a Espanha, culminando na estrondosa vitória inglesa sobre a Invincible Armada (1588) (v. I, p. 31). Daí em diante, a Inglaterra teve campo livre, tanto na Europa como no resto do mundo (a Virgínia fora ocupada em 1583), para a expansão da sua jovem indústria. No plano social e econômico (v. I, o. 201 ), a rainha, aconselhada J?Or William Cecil, tentou remediar os desequilíbrios financeiros criados pelas guerras e as perturbações rurais provocadas pelo brusco desenvolvimento do CAPITALISMO e pela monopolização dos negócios e das terras em proveito dos novos privilegiados (monopólios, ENCLOSURES). No plano artístico, o reinado de Isabel assistiu à expansão em todos os domínios da ARQUITECTURA, da MúSICA, da ooesia e, principalmente, do TEATRO - renascimento tardio mas excepcionalmente brilhante que se prolongou no reinado do seu sucessor, JAIME I Stuart. (V. I , p. 290.)
J JAGELÃO Família de origem lituana que deu, do século XIV ao século XVI, soberal}os. da Polônia (v. I, p. 35), da Boemia e da Hungria. (V. 11, p. 71.) JAIME I Nascido em 1566. Filho de Maria Stuart e do barão Darnley. Rei da Escócia de 1567 a 1625 com o nome de Jaime VI. Rei da Inglaterra e da Irlanda de 1603 a 1625. (V. li, p. 65.)
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JARD INS
Né!- Idade Média, os jardins -do
rei ou de burgueses ricos - estavam dentr o das cidades, protegi- · dos por muralhas. O Renascimento, que descobriu simul tanea ment e a ci~ade e o campo, junto u o cenán o dos jardins aos palácios de ~ra~er e às mora dias, que se multiplic aram fora das cidades (v. I, P: 270 e gravu ra 68). Esses jardms estavam sujeitos à estrit a orgamzação e às regras da PERS PECT IVA que o URB ANIS MO quis nesse temp o impo r às cidades novas o!! renovadas (v. I, p. 269). O novo mteresse pela PAIS AGE M e o refina ment o da civilização fizeram nascer, no século XV o «jardim de amores» - jardim cheio de sonho e de música, regado por uma fonte, onde iam encon trar-se os pares amorosos. JESU íTAS A ordem funda da por Ináci o de Loyola foi autor izada por Paulo IIJ em Setem bro de 1540 (v. I, p. 129). As .sua~ Constituições, redigidas provi sonam ente em 1551, toma ram forma definitiva em 1558, depois da m?rte de Santo Ináci o (1556). «Cléngos .regulares», os jesuítas, longe de viver em mosteiros, eram m<;)veis e perpe tuam ente disponíveis. Larga ram os ofícios no coro pela oraçã o ment al, as mortificações da carne pelas mortificações da vontade (v. 11, p. 119). A regra por excelência era a regra dà obediência. O «preposto geral» e os assistentes nacionais são eleitos pela «congregação geral» dos deput ados das «províncias». Essa congregação é o poder legislativo da ordem e pode depor o geral. De resto, este faz as nomeações para todos os cargos e governa toda a Comp anhia - daí a enorm e correspondência de Santo Inácio. Os jesuítas, uma vez orden ados padres e termi nado o noviciado, ou são «professas»
-e, nesse caso, o funda dor impôs-lhes um voto especial de obediência ao papa - ou são coadj utores espirituais» (distinção que sem dúvid a, vai desaparecer). A ordem teve «coadjutores temp orais» (irmãos leigos), mas Santo Ináci o não quis ramo feminino nem ordem terceira. Missionários pela sua vocação primitiva, os jesuítas assim conti nuara m (FRA NCIS CO XAV IER, Matte o Ricci). Mas a partir de 1548, funda ram COL ÉGIOS . (v. 11, pp. 71, 72, 75, 83) que tivera m grand e êxito. Mais instruídos que a maio r parte dos padre s e religiosos do século XVII teólogos muito escutados (especial: ment e no CON CíLI O de Trent o) astrón omos apreciados pelo impe: radar da China, notáveis educadores, os jesuítas não só estive ram na fren~e do comba~e contr a o protestantis mo como tivera m, na civilização da época mode rna, um lugar excepcional que a historiografia recente, ultrap assan do as críticas de Pascal, de Quin et e de Michelet procu ra restit uir-lhes (v. I, p. 140): Em 1556, a ordem tinha mil mem bros e cem casas, repar tidas por doze províncias. Em 1615 tinha já 13 000 memb ros. Os pjepostos gerais, duran te o período que estudamos, foram , a seguir a Santo Inácio: Laine z, de 1558 a 1565· S. Franc isco Borgia, de 1565 ~ 1572; Merc urian , de 1573 a 1580 · Aquaviva, de 1581 a 1615 (v. p. 60). (Bibl.: F. de Dainville, Les Jésuites et l'éducation de la société française, 2 vols., Paris 1960· A. Guillermou, Les Jésuite~, Paris ', 1961).
n:
JOÃO 11, O BOM Filho de Filipe de Valois e de Joana de Barg anha. Foi rei de Franç a de 1350 a 1364. Vencido em Poitie rs (1356) pelo Prínc ipe Negr o e posto a ferros em Londres, teve de assin ar o tratad o de
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llrétigny, que deixava para a In!date rra o Sudoeste da Franç a. cati(v .. f, p. 38). Dura nte o seu Vl'Jro, os Estad os Gerais sublevarum-se, conduzidos por Étien ne M~rcel, que se aliou aos «jacques». .Joao, o Bom, morr eu em Lond res <:m 1364. .JOSQUIN DES PRÉS Músico franco-flamengo nascido por vol!a de 1450, provavelmente no Hama ult; viajou muito em Itália, (v. I, p. 91) e morr eu em onde em 1521. O essencial da sua prod uç~o é const ituído por músic a de IgreJa -são conhecidas 22 mis~as de sua ~utoria, de inesgotável riqueza escnt ural e arqui tectón ica, e a mda 129 mote tos -, mas deixou-nos tamb~m 8~ obras profa nas, entre as ql!ais mais de 70 canções. «0 bom pai Josqu in foi o prime iro a esf;>o.çar . o duro e rude corpo da ml!-sica mforme», escreveu J. Meign!er. Embo ra, com efeito Josqum. ~dop!e, a princípio, as forma s tradicionais,. não tarda a afastar-se delas., .Segu!n~o o exemplo vindo de .Itaha, da Impo rtânc ia cada vez maiOr a uma harm onia essencialment~ tot:ta_I e ao texto , cuja articulaçao Ira deter mina r a estrutura do edifício musical. «Uma noy~ relaçã o. entre as palav ras e a o mus~ca suscita uma modi ficaçã da l~nha melódica, que ganh a em brevidade e em fot:ça, adqui rindo novo P?der expressivo... Pela sua vasta difusão (foi impressa em Veneza desde 1502), a sua obra agiu de !orm a exem plar sobre a produçao dos outro s músicos e fez dele o grand e mestr e que nenh um dos seus conte mpor âneos ultrap assou nem seque r igualou» (P. ChailJon). JUDE US
f\s perseguições (intermitentes) aos JUdeus (v. I, pp. 80, 131, 143) co-
meça ram na época· da I Cruza da e agrav aram -se no temp o da PESTE NEG RA, mas mais em Franç a e na Alem anha que em Itália A península itálica foi para eles ~ma ter.ra de refúgio, especialmente dePOIS da sua expulsão de Espa nha (1492) (v. I, p. 272). Dura nte muito tempo beneficiaram, tanto em Roma como, antes, em Avin hão da prote cção pontificai. Martinh~ V Eugé nio IV, Pio 11 Júlio n' L.eão X, Paulo III, Júlio III - ~ Sisto V recor reram a médicos judeu,s. Este últim o papa, em pleno peno do da· refor ma católica fez de um ~ar~ano portu guês, Lopes, o seu prmCipal conselheiro de finanças. A cultu ra judai ca ignoré!-da p~los cristãos da Idade Média, fm, no século XV, uma componen te do HUM ANIS MO (v I p. 97 e CAB ALA ). Por o~tr~ lado! os Israelitas, que eram essenci almen te presta mista s sobre penhores, desem penha ram um papel económic;o aJ?reciável. Por volta de 1600 havia amda em Itália uns 500 BAN COS ou escrit órios de pres!amistas judeus. As grand es dinastias de <~mercadores» israelitas que transa~cwnavam entre 0 Oriente, e o Ocidente, como a dos Nasi (seculo. XVI) , .são ainda hoje mal conhecidas. Tmha m as sedes em VEN EZA, FER RAR A Anco na e CON STAN TINO PLA. 'Nest e último porto , em 1552, - havia mais de 70 merc adore s judeus. Mas nenh uma família israelita desempenh ?u . no Ocide nte um papel economico comp aráve l ao dos MÉDICIS, dos FUG GER ou dos \YELSER. A criaçã o dos mont ePIOS, a parti r de mead os do século XV, troux e uma conco rrênc ia cada vez maio r aos escritórios de empr éstim os dos judeus. O declínio económico dos Israel itas foi acelerado pela organ izaçã o dos «ghettos» (v. I, p. 287) de Roma , Bolonha, Anco na, etc., depois da bula Cu!"~ nimis absur dum (1555). (Bibl.: C. Roth , The Jews in the Renaissance, Filadélfia, 19S9).
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JúLIO li Giuliano della Rovere. Nasceu em Albissola em 1443 e morreu em Roma em 1513. Sobrinho de SIS- . TO IV. Cardeal de Ostia, foi adversário de ALEXANDRE VI e teve de fugir de Roma. Eleito papa em 1503, Júlio li foi o criador do estado pontificai moderno. Lutou contra os feudais, retomou as terras que tinham sido concedidas a César BóRGIA e formou, contra VENEZA, que tomara Ravena, a liga de Cambrai. Altivo e guerreiro -ERASMO estigmatizou-lhe o ardor belicoso (v. I. p. 125) - , este papa, depois de fazer a paz com Veneza, formou contra LUíS XII uma Santa Liga (1511) que expulsou (provisoriamente) os «Bárbaros» de Itália (v. I, pp. 39, 40). Este conflito político teve repercussões religiosas. Ao CONCíLIO reunido por Luís XII, que depôs Júlio II, opôs este o concílio de Latrão. Mecenas, o pontífice ordenou a reconstrução de S. Pedro (v. I, pp. 114, 116), chamou BRAMANTE a Roma, confiou a MIGUEL ÂNGELO a construção do seu túmulo - monumento gigantesco só em parte realizado (v. II, p. 43). Sob o seu reinado, PINTURICCHIO, SIGNORELLI, RAFAEL, etc. trabalharam também no VA TI CANO, e as obras antigas recentemente encontradas, especialmente o Laocoonte, foram reunidas na galeria do Belvedere. JúLIO III Giovanni Maria de' Ciocchi dei Monte. Nascido em 1487, foi papa de 1550 a 1555. (V. I, p. 40.)
os jurados» (H . Sée). Os ofícios livres também tinham os seus regulamentos, mas estes eram menos estritos que os estatutos das jurandas. «A sua aplicação era controlada, não pelos jurados do ofício mas pela autoridade municipal ou senhorial.» (V. I, pp. 201-202.) JUROS (empréstimos a) A interdição da «usura» dificultou, de modo incontestável, a prática do empréstimo a juros na época do Renascimento (v. I, pp. 203 e segs.). A Igreja condenava o «depósito». Mas esta dificuldade foi superada por meio das letras de câmbio e de recâmbio (v. I, pp. 209-211), da ricorsa e das «rendas constituídas» (v. I, pp. 212-215). Todos estes meios se desenvolveram muito no século XVI. Lutero é mais hostil ao empréstimo a juros que o seu adversário católico Johann Eck. Mas Calvino, evidentemente pouco favorável aos jogos de dinheiro e aos prestamistas profissionais, introduziu, todavia, pela primeira vez, a distinção entre o empréstimo de consumo, que rejeitava, e o empréstimo de empresa, que aceitava (v. li, p. 118). «Calvino -escreve H. Lüthy- não fez saltar as barreiras levantadas contra o espírito do lucro, fez saltar uma barreira levantada contra a inteligência dos factos económicos.» (Bibl.: J. T. Noonan, The scholastic analysis of usury, Cambridge, Mass. 1957). JUROS (instituição) Títulos de rendas sobre a divida consolidada do Estado espanhol. Multiplicaram-se na segunda metade do século XVI. (V. I, p. 229.)
JURANDAS A transformação do ofício livre em juranda, ou ofício jurado, tinha por efeito «determinar as regras da aprendizagem; criar a obrigatoriedade da «obra-prima»; fixar as relações entre mestres; criar
JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ Artigo fundamental da teologia reformada, enunciado por LUTERO
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(v. li, p. 59), só sendo li vre o arbítrio de Deus.
K KNOX, John Nascido em 1505, morreu em 1572. Fundador do presbiterianismo escocês. Padre, e leitor assíduo de Santo Agostinho, aderiu à Reforma. Mandado para as galés em 1547, esteve depois preso em Rouen e no Mont-Saint-Michel e viveu exilado até 1559. Viveu em Genebra, onde foi amigo e discípulo de CALVINO (v. I, p. 129). Chamado pelos seus compatriotas, revoltados contra a regente da Escócia, desembarcou em Edimburgo em 1559, escreveu a confissão de fé escocesa e inspirou o Livro de Disciplina estabelecido pela Igreja presbiteriana. (Bibl.: J. D. Mackie, John Knox, Londres, 1951).
L LABÉ, Louise Nascida em 1523 e falecida em 1566. Poetisa de Lyon que, com Heroet e SC:EVE, ilustra a renovação literária muito cedo manifestada em Lyon sob a influência italiana. A sua obra, que testemunha uma cultura muito rara nas mulheres daquela época (v. II, p. 89), distingue-se, paradoxalmente , pela sua espontaneidade e pela sua total independência tanto em relação ao esteticismo um pouco didáctico da Pléiade como em relação às convenções sociais e aos preconceitos ideológicos. O seu lirismo, ligeiramente colorido pela alegoria no Débat de Folie et d'Amour (1552), corre livremente nos Sonetos e nas Elegias, que Sainte-Beuve viria a comparar ao intimismo de Safo. Os seus sonetos vêm juntar ao esquisito sensualismo de Ronsard aquele toque, já romântico, de poeta exilado que, com os Regrets, inaugura o lirismo numa poesia definitivamente emancipada das regras da Escola. LAICIZAÇÃO Fenómeno de capital importância e significado entre os séculos XIV e XVII (v. I, p. 80). É sensível em todos os domínios. Os livros dedicados à cultura profana multiplicam-se (v. li, p. 118); a arte dá um lugar cada vez maior à vida quotidiana e às fábulas antigas; os leigos tomam ·na Igreja uma importância crescente desde os tempos da Pré-Reforma. Mas laicização não significa, forçosamente, descristianização, pelo menos na época do Renascimento. LASSUS, Roland de Nascido em Mons cerca de 1532, o «divino Orlando» passou os anos
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de juventude e de formação em Itália e ocupou depois, até morrer (1594), o lugar de mestre de capela em Munique (v. I, pp. 91-92). «É o músico que com mais verdade representa o homem do Renasciment o, profundamen te humano, curioso de tudo ... Praticou todas as formas, aliou-se a todos os estilos para exprimir todas as cambiantes do seu pensamento» (N. Bridgman). Se nas missas, em que se sente entravado pelo texto imposto, o seu génio se não pode expandir livremente, o motete, dados os seus aspectos mais variados e a sua ausência de tradição litúrgica, convém-lhe admiravelmente: os seus rnotetes são dos mais belos da polifonia holandesa. A diversidade do seu talento exprime-se tanto por canções em que fervilham os achados técnicos, nas quais utiliza por vezes o mais avançado cromatismo, corno por madrigais, de que ele faz, como ninguém antes fizera, verdadeiros poemas musicais. Muito admirado em vida, Lassus «obterá, até ao início do século seguinte, mais êxitos e exercerá mais influência que nenhum compositor natural de França» (F. Lesure). LEÃO X Giovanni de'Medici, nascido em Florença em 1475. Papa de 1513 a 1521. Filho de LOURENÇO , O MAGNíFICO , cardeal aos catorze anos, papa aos trinta e oito. Temperamento pacífico, Leão X deixou-se, no entanto, arrastar para as guerras de Itália e g~tou quantias consideráveis para pôr um Médicis no ducado de Urbino. Era culto e rodeou-se de belos espíritos - BEMBO, Bibbiena (v. II, p. 99), Sadoleto- e criou na Universidade de Roma urna cadeira de estudos gregos. Como amador de arte, protegeu RAFAEL e encarregou-o: de decorar as «logge» do Vaticano, fazendo-o arquitecto de S. PEDRO. Em Florença, confiou
a MIGUEL ÂNGELO a construção da fachada de San Lorenzo e as esculturas do túmulo dos Médicis. A sua vida privada não foi escandalosa, mas gostava de festas e, principalmente, de teatro (v. l , p. 125). Medíocre homem de Igreja, não fez aplicar as decisões reformadoras do V concílio de Latrão, que terminou em 1517, e assistiu, impotente, à revolta luterana- cuja gravidade, certamente, não compreendia . Reforçou, com a concordata de 1516, a autoridade do rei de França sobre a Igreja galicana. (V. I, p. 250.) LEONARDO DA VINCI Nascido em Vinci (perto de Florença) em 1442 e falecido em Cloux (Clos-Lucé) em 1519. Era filho natural de um notário. O seu primeiro período florentino vai até 1481. Começou por ser aluno de VERROCCH IO (v. II, p. 89), pintando depois a Anunciação, o Retrato de Ginevra Benci e a Adoração dos Magos. Os anos 1482-1499 assinalam o grande período milanês. Engenheiro de LUDOVICO , O MOURO (v. I, pp. 154-155, 260-261), trabalhou na estátua de Francesco Sforza, que nunca chegou a ser fundida, estudou mecânica (v. I, pp. 164, 173), perspectiva e anatomia e pintou a Virgem dos Rochedos (v. II, p. 62) e a Vitima Ceia. Voltou a Florença depois da queda do ducado de Milão. Fez em Florença a Gioconda (v. II, p. 101), a Batalha de Anghiari, o Baco, a Leda e duas Madonas. Viveu novamente em Milão, passou dois anos em Roma e partiu para França em 1515, aí morrendo quatro anos depois. Inimitável executante do sfumato (v. I, pp. 94, 116), anatomista (v. II, p. 133), engenheiro (v. I, pp. 158-161 e gravuras 32, 33, 34 e 35) e desenhador, mas também filósofo (v. II, pp. 42, 102), escreveu um Tratado da Pintura (editado em 1651) e apontamento s que demonstram
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a imensa curiosidade que o caracterizava (v. I, p. 152; v. Il , pp. 21 ,
139-1 40, 142). (13ibl.: M. Brion Vinci, Paris, 1960).'
Léonard
de
l .ESCOT, Pierre Nascido em 1515 e falecido em 1578. Senhor de Clagny, cónego de Notre-Dame e conselheiro no parlamento, mas acima de tudo um grapde arquitecto. Trabalhou em Pans com Jean GOUJON no JU\Je u de Saint-Germai n-l'Auxerrois_, no Palácio Caniavalet e, especialmente, no LOUVRE, a partir de 1546 (ala sudoeste do pátio quadrado). (V. I , pp. 111 , 115; v. li, p. 44.) I.ETRA DE CÂMBIO S_ucedendo ao contrato de câmbio (mstrumentu m ex causa cambii) a letr~ de câmbio movimentava: na rnawr parte dos casos, quatro pessoas: um dador, um sacador u~. sacado e um beneficiário. Foi U!Ilizada pelos Florentinos e pelos S!eneses talvez antes do final do sec:ulo XIII. Rápida, evitando manejo de 111:oed~ e riscos de transp~rte de. dmheiro, foi, logo no iní~ ro . do se~ulo XV, um instrumento mdrspensavel ao grande comércio (v _I, pp. 208 e segs.) na área da C~Istandade latina. Revelou-se tarnbe;n. corno notável instrumento de cr~dito. (V. I, gravura 52.) (Bibl.: R. de Roover, L 'évolution d~ la lettre. de change, X/V'-XVJII• Slecle, Pans, 1953).
de Wittenberg, de Genebra ou de Londres. Os «iluminados» e os «entusiastas» das seitas ANABAPTIST AS são, portanto classificados ~orno «libertinos», bem como os mdependen.tes como Servet, Ochino, Castelhon, etc. Católicos e reformados daquele tempo estavam de acor~o em ver nos «libertinos» verdadeiros anarquistas. LISBOA Tinha 65 000 habitantes em meados do século XVI e mais de 100 000 no dealbar do século XVII (~ . . I, p. 257). Lisboa sofreu três senos abalos de terra no século XVI (1531, 1551, 1597) -menos graves, to?a~ia , que o de 1755. O o~ro. de Afnca, as especiarias das India.s Orientais (v. I, p. 242), as madeir~s de cor e, depois, a cana-de:açuc ar do Brasil explicam o crescimento desta cidade onde em fins do século XV foi f~ndada a ~asa da {ndia e da Guiné. Depois da retirada do feitor português de. ANTUÉRPI A (1549), Lisbo_a fOI, durante meio século, o pnnc~pa~ centro de distribuição de especia~Ias da Europa. A época do Re~ascimento _viu ali triunfar, primeiro, o «estilo MANUELIN O» (":. _1, p. 91), que associa tradições goticas, dt:coração italiana e elen:~ntos retirados do repertório mar!timo ou ex~tico: a Torre de Belem,_ o ~osteir dos Jerónimos; a segu!r:. foi a afirmação purista na tradiçao de Alberti (Igreja de Santo Amaro). LIVRE-ARB íTRIO
LIBERTINO S
O livre-arbítrio é definido por ERASMO do seguinte modo: «0 poder qu~ a vontade humana tem de . se aplicar a tudo aquilo que é exigido. pela s~lvação eterna». Erasmo af1nn~ _amda: «Deus imputa-nos o mento de não desviar o noss? espírit? da sua graça». O De libero arbltrio de Erasmo (1524)
Os libertinos do século XVI (v. II pp. 106, 111) não são os agnóstico~ a. quem se dirigia Pascal em Pensees nem os gozadores da .vida do tempo da Regência. Na época de CALVINO eram cristãos à margem das grandes ortodoxias -de Roma,
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suscitou por parte de LUTERO uma resposta brutal e contundente: o De servo arbitrio (1525) (v. I, p. 130). A polémica entre Erasm? e Lutero acerca do problema cap1- · tal da liberdade e do pecado original assinalou a fractura entre o HUMANISMO e a Reforma. Repetiu-se no século XVII no s.eio do mundo católico com o conflito entre jesuítas e jansenistas acerca da graça. . . (Bibl.: Erasmo, Essai sur [e lzbre arbitre, trad. P. Mesnard, Argel, 1945).
LIVROS HERMÉTICOS Parecem datar, essencialmente, do século Ill D. C. (v. I, p. 113) e foram, provavelmente, na sua or~ gem, apontamentos tom~do~ em hções ou cursos de coloqmos dos restritos círculos filosóficos de Alexandria. Exprimem um ;p~A TONISMO tingido de estmc1smo e pretendem revelar a doutrina pela qual HERMES, de homem se pode fazer deus - um exemplo que poderia ser seguido pelos iniciados nessa doutrina. Ao mesmo tempo, apresentam a divindade como ,«um-todo» e tendem para o pante1smo. A influência cristã não é sensível nos livros herméticos. Às obras propriamente filosóficas juntam-s~, depois, escritos mágicos, astrológicos e alquímicos, que também _foram atribuídos a Hermes; dai a tradição hermética ou hermeto-a!química descoberta pelo Renascimento (v. li, pp. 57, 107, 126). Os livros herméticos dividem-se em quatro grupos: o Corpus her'!'eticum, cujo primeiro tratado fm traduzido por FICINO com o título. de Pimandro (em 1471), o Ascléplf!S, que foi conhecido de Ladânci, uma antologia de quarenta e dms curtos capítulos e alguns fragment0s. (Bibl.: A. J. Festugiere, He_rmes Trismégiste. Corpus hermetzcum. Paris, 1945).
LOIRE (castelos do) Fronteira entre a França do Norte e a França do Sul, e ao mesmo tempo via de comunicação entre o Leste e o Oeste, o rio Loire teve importância estratégica essencial até à Guerra dos Cem Anos. Refúgio da monarquia sob CARLOS VII foi um dos locais de residência p~eferidos dos Valois depois da anexação da Borgonha e da Bretanha. Foulques Nerra, S. Luís e LUíS XI ali construíram ou reconstruíram fortalezas: designadamente o castelo de Angers. Mas, do fim do século XV até aos primeiros anos do século XVI, as margens do Loire e dos seus afluentes - o Indre, o Cher, o Cosson, etc. - encheram-se de «castelos» de prazer: velhas fortalezas adaptadas, como Langeais ou Loches, ou arrasadas para dar lugar a novas residências, como Amboise, ou, enfim, erguidos de novo como Chambord. Casas reais (v. I: pp. 271-272) ou residências de novos príncipes da finança, como Chenonceaux ou · Azay-le-Rideau estes palácios são, de Gien a Ang~rs, o mais belo conjunto de construções civis do Renascimento francês -conjunto tanto mais notável para a história quanto é certo que reflecte todas as fases da evolução que vai, em parte sob influência italiana (desde CARLOS VIII, em Blois), do castelo feudal (v. I p. 115) e do estilo gótico ao novo tipo arquitectónico do Renascimento inicial (v. I, pp. 106-108).
LONDRES Tinha 60 000 habitantes no final do século XV e 225 000 em 1600. (v. I p. 257). A instalação dos han~atas desde 1281, o declínio das feiras da Champagne no século XIV a ascensão da indústria de panos ilo século XV explicam o desenvolvimento de Londres. onde surgiu uma burguesia rica. Dos 88
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«mayors» do século XV, 61 eram mercadores ou industriais de panos. No século XVI, este desenvolvimento prosseguiu em paralelo com o crescimento da marinha inglesa. Não só os Merchant adventurers substituíram nas margens do Tamisa os hanseatas como quase todas as companhias privilegiadas que nessa altura se fundaram eram londrinas (v. I, p. 215). Em 1571, Thomas Gresham construiu a bolsa de Londres ( Royal Exc·hange). Por alturas de 1400, a cidade - city - ia apenas da Torre de Londres ao local onde está hoje o Palácio de Justiça. Mas em 1600 as casas de habitação já ligavam de modo praticamente ininterrupto a city ao arrabalde de Westminster, especialmente ao longo do Strand. O aglomerado transborda abundantemente para a outra margem do Tamisa e enxameia em arrabaldes para leste e para norte (v. I, p. 278). A supressão dos conventos desempenhou um importante papel na história desta cidade no século XVI, já que perto de um quarto da city lhes pertencia. Os edifícios monásticos forneceram materiais de construção em abundância. Foram suprimidos jardins, agora atravessados por estreitos arr uamentos ladeados de casas quase sempre sórdidas, onde a PESTE (v. I, p. 79) e o fogo haviam de fazer grandes devastações em 1665- 1666. O Renascimento começou de forma brilhante em Londres, com a capela de Henrique VII em Westminster. Mas a influência italiana só triunfou verdadeiramente na arquitectura londrina no século XVII, com lnigo Jones. (V. I, pp. 73, 247, 269, 272.) (Bibl.: J. Matrat, Histoire de Londres, Paris, 1959).
suas peças - comédias, tragicomédias e autos sacrameniales data do extremo final do Renascimento (primeira metade do século XVII). Partidário da arte nova, Lope de Vega não hesitou em romper com as sacrossantas regras de ARISTóTELES, conservando apenas a unidade de acção. O seu teatro é nacional e realista: reflecte melhor que qualquer outro a sociedade do seu tempo em todos os seus aspectos e em todos os seus contrastes. A sua graça e o seu enorme engenho para montar enredos, bem como o seu sentido da diversidade de meios e de sentimentos dariam, mais tarde, a alguns clássicos franceses o rico material de onde deduziram construções mais rigorosas. O teatro espanhol, directamente virado para a história da ocasião, mas sem romc per com o passado, magnificou à Reconquista e enriqueceu-se com todas as aventuras e todas as pai. xões nascidas das recentes conquistas coloniais. Daí as suas liberdades e também as suas servidões; daí o seu carácter mais dramático que estético, mais próximo da vitalidade renascentista que da ordem clássica. A própria vida de Lope de Vega, actor, autor, viajante militar, aventureiro de todas as ~ven turas, é tão fértil em peripécias como o. seu teatro. Além de uns quarenta autos sacramentales, dispõe-se ainda hoje, da sua enorme produção, de mais de seiscentas peças; as mais célebres são O Castigo sem Vingança, O Melhor Alcaide é o Rei, A Estrela de Sevilha, Peribáfíez, e o Comandante de Ocafía, etc. (V. li, p. 41.) LOUCURA Na idade de ouro dos bobos, a loucura e os loucos preocupavam os melhores espíritos. Hieronymus BOSCH e Sebastian BRANT identificaram a loucura com o pecado (v. li, p. 51). Mas a loucura, muitas vezes, era sabedoria. A de Eras-
LOPE DE VEGA Nascido em 1562, morreu em 1635. Foi o mais fecundo e popular dramaturgo espanhol do <
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mo fala às vezes, como _S. ~aula e 0 se.l espírito crítico msp1ra-se no Evangelho (v. li, p. 119).
construção que COSMÉ. Só a vi/la de Poggio a Cajano (v. I, gr~v~ra 20 ) foi uma realização artisttca digna do avô. (V. li, P· 43.)
LOURENÇO, O Magnífico
LOUVRE
Lourenço I de ·~ÉDICIS, dito o Magnífico. Nascido em Flo~ença em 1449, faleceu em Çareggi em 1492. Sucedeu a seu pa~, ~e~ro,_ 0 Gotoso, em 146~, e a pnncipio nao mostrou a autondade e 9s. dotes políticos que ma!s tar_d~ yma a revelar. Nesse penado micml de~ mostras de violência por ocasia~ da insurreição dt! Berna~do Nard!, em Prato, e ao cons~ntir o saque de Volterra. Só depms do fraca.sso da conjura dos Pazzi (1478) e que, maduro antes de tempo, conseguindo fazer frente ao P!l)Ja SISTO IV e obtendo a reconciliação com 0 rei de Nápolt:s. se mo~ trou como o homem s~b10 da política italiana, aquele CUJOS conselhos esclarecidos procurava~ a conservação da paz na perunsula. No plano dos negóci~s nem ele nerp. Francesco Sassetti soubera:n ~I rigir o BANCO com mao firme (v.I, p. 222): as filiais fec~aram umas a seguir às outras. Tmham emprestado demasiado aos SFORZA a Eduardo IV e a CARLOS, 0 TEMERÁRIO. É verda~e que Lourenço teve numerosas cucunstâncias a seu desfavor: a Guerra das Duas Rosas, a morte premat~ra do duque da Borgonha, o confht<;>. com Roma, que fez pe~der aos Medieis o quase-monopólio da venda de ALúMEN (v. I, pp. 222-223), a queda do preço do ouro, o cr~s cente deficit da balança comerci~l dos Países Baixos para com a lt<'-: lia. Escritor e poeta, Lourenço fm protector das letras (v. li, p. 70) e das artes mas menos que o que por muito t~mpo se dis~e .• A: Chastel pôs em dúvida a exi~tencta da f~ mosa «escola do Jardim de S. Maicos». Além disso, é evidente _que Lourenço, por evidentes motivos financeiros, promoveu menos a
A fortaleza feudal construída po_r Filipe Augusto passou a ser residência real sob CARLOS _v, que ali instalou a sua famosa «hvrana» e lá introduziu obras ~e arte. Depois disso, o Louvre fm de~prezado pelos reis durante cento e cmquenta anos. Mas, em 1527, FRANCISCO I anunciou ao prebos!e dos mercadores e aos almotaces que passava a residir no Louvre. Mandou demolir a grande torre de menagem, da qual dependi_am todas as torres de França, que tmh~ 30. ~e tros de altura. Esse gesto Simboh~o marcou a passagem da conc~pçao feudal do poder para a noç!lo de «Estado» monárquico. Nos fms do seu reinado, Fra~cisco I mandou iniciar a construçao (por P. LESCOT e J. GOUJON) d_a~ alas oeste e sul, que prossegmna sob HENRIQUE li e HENRIQUE III (v I pp 111 267; v. li, p. 44). P~r outr~ lad'o, CA_T ARINA DE MÉDICIS, ao enymvar, . pretendeu uma residência particular e pediu a Philibert de 1'9RME, em 1563, que lhe constrmsse um palácio no local a que cp.~mava':ll «as Tulherias». Esse palac10 sena depois ligado ao Louvre pela «pequena galeria» (à saída do Louvre e na perpendicular .ao , rio), e em seguida pela «galena a borda de água», cuja construç~~ começo~ sob Catarina de Médicls e terminou sob HENRIQUE IV, o qual acrescentou mais um andar às construções anteriores (v. I, p. 274). Assim começa, na época do Renascimento, a realização de UIJ?a vasta cidadela real que ia de Samt-Ge~ main-1' Auxerrois até aos actuais Campos Elísios. (Bibl.: L. Hautecreur, Histoire du Louvre, Paris, 1953). 292
I.UDOVICO, O Mouro I.udovico SFORZA, dito o Mouro, nasceu em 1452 e era o filho mais IIOVO de Francesco Sforza, condolliere que sucedera em MILÃO aos VISCONTI depois de casar com Bianca Maria, filha natural de Filippo Maria. Depois do assassínio do irmão mais velho, Galeazzo Maria, Ludovico afastou a regente, a sua cunhada Bonne de Sabóia, e K<>vernou em nome do sobrinho, Uian Galeazzo, casado com Isabel de Aragão. Apoiado a princípio nos l•ranceses, que então se encontravam em Itália, fez com que lhe mubesse, por morte do sobrinho - talvez envenenado (1494) - , a wroa ducal do Milanês. Mecenas c protector das artes (v. I, pp. 261, 266), desempenhou de boa vontade o papel de árbitro da política ita1iana. Quando o duque de Orléans quis reivindicar a herança dos Visconti, Ludovico entrou na liga formada contra CARLOS VIII, mas deixou-a bem depressa, depois da batalha de Fornua (Julho de 1495). · Com o advento de Luís XII, a França voltou a fazer valer os ReuR direitos sobre o ducado de Milão. Capturado em Novara em Abril de 1500, Ludovico foi internado em Loches, onde faleceu em 1508 (v. I, p. 39). LUiS XI Nascido em 1423, foi rei de França de 1461 a 1483. Impulsivo e circunspecto ao mesmo tempo, autoritário e familiar, subtil e realista, Luís XI, soberano medieval e moderno, é · uma das personalidades reais mais complexas da história de França. A obra que realizou, tanto no plano político como no plano económico, é, porém, considerável. O seu reinado foi dominado, no interior, pela luta contra os grandes, cujas intrigas e alianças levaram as peripécias para o plano internacional. ·· Mais diplomata que guerreiro, Luís XI conseguiu, na
maior parte dos casos, impedir ou desfazer as colisões; livrou-se, um a um, do duque de Berry, seu irmão, e do duque da Borgonha. Afastou o perigo inglês, apoderando-se ao mesmo tempo de territórios que ampliaram o reino: o Artois, o Franco-Condado, o Rossilhão (v. I, p. 31), etc. Acentuou a centralização política (v. I, p. 281) e administrativa (v. I, pp. 201, 202), levou até ao fim a reorganização do exército e aplicou-se principalmente, ao desenvolvimento . da produção e das trocas numa Europa em plena expansão económica, nas vésperas da Guerra dos Cem Anos. (V. I, p. 163.) LUiS XII Nasceu em 1462. Filho de Carlos de Orléans e de Maria de Cleves. Foi rei de França de 1498 a 1515. Continuou as campanhas de Itália (v. I, pp. 39, 184), apoderou-se do Milanês mas foi por fim expulso da península pela Santa Liga (1513).
LUTERO, Martinho Nascido em Eisleben, na Saxónia, em 1483. Estudou em Magdeburgo, Eisenach e na Universidade de Erfurt . Entrou para o eremitério de Santo Agostinho na ocasião em que ia começar o curso de direito (1505). Em 1510-1511 foi a Roma. Deixou depois 'Õ Convento de Erfurt pelo de Wittenberg (1512), onde foi superior. Ao mesmo tempo, ensinava na universidade. A partir de 1515, comentou ali as Epístolas de S. Paulo e descobriu, sem dúvida, nessa altura a doutrina da JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ (v. I, pp. 126 e segs.). A 31 de Outubro de 1517, afixou as suas 95 Teses (escritas em latim). As teses são difundidas por toda a Alemanha. Lutero reforça-às com 97 justificações ( Resolutiones).
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Chamado a Roma, recusa ir e lança o Apelo para um Futuro Concílio (1518). No ano seguinte dá-se, em Leipzig, a célebn: «disputa>> de Lutero com Johann ECK, seguida; em 1520, da formulação da doutrina do «sacerdócio universal». As principais obras teológicas de Lutero são, precisamente, de 1520. A sua doutrina foi condenada por LEÃO X; Lutero foi excomungado e banido do Império em 1521 (v. 11, p. 41). Refugiado no Wartburgo entre 1521 e 1522, começou a traduzir a BíBLIA. Voltou depois a Wittenberg. O ano de 1525 ficou assinalado pela tomada de posição de Lutero contra os camponeses revoltados (v. I, p. 132), pelo seu casamento (v. 11, p. 95) e pela ruptura com Erasmo por causa da questão do «servo-arbítrio (v. 11, p. 59). Lutero morreu em Eisleben em 1546, mas viveu quase permanentemente em Wittenberg. O fim da sua vida foi dedicado à tradução da Bíblia (1.ª edição, 1534), à redacção de dois catecismos e à composiç 'lo de numerosos tratados, sermões e comentários de Salmos, Epístolas e Profetas. Lutero não foi apenas teólogo, mas também um notável escritor, um dos primeiros a fazer do alemão uma língua literária (v. I, p. 48). (V. 11, p. 45.) (Bibl.: H. Strohl, Luther, sa vie et sa pensée, Estrasburgo, 1953.)
M MACHAUT, Guillaume de Poeta e músico francês, nascido na Champagne por volta de 1300. Morreu como cónego de Reims em 1377 depois de ter percorrido grande parte da Europa. A sua obra musical não é menos importante que a sua obra literária: motetesem francês e sobre temas amorosos, enquanto que, depois dele, os
motetes seriam em· latim e sobre assuntos religiosos-, baladas, que leva a um alto grau de refinamento, rondós, vire/ais, e, principalmente, a Messe Notre-Dame, erradamente chamada durante muito tempo «missa de Carlos V», «O primeiro exemplo de missa composta de maneira homogénea por um só músico» (J. Chailley). Homem de síntese, que soube encontrar formas novas sem renegar as antigas, Machaut exerceu profunda influência sobre os músicos do seu tempo c das gerações seguintes. MAGALHÃES, Fernão de Nasceu em 1480 e serviu primeiramente na marinha portuguesa, tendo combatido em Malaca. Mas, tendo caído em desgraça, pôs-se ao serviço de CARLOS V. A sua viagem de circum-navegação (v. I, p. 59) é notável pelo espírito científico que presidiu à sua organização. Magalhães, que passara a 21 de Outubro o estreito que hoje tem o seu nome, foi morto nas Filipinas em 1521 num combate contra indígenas. MAGIA A magia e a astrologia conheceram, na época do Renascimento, uma aura excepcional (v. 11, pp. 52, 57, 127-128). FICINO E PICO DE MIRANDOLA fizeram o elogio da magia, cuidando, porém, de rejeitar a «magia diabólica» (v. 11, p. 132). A magia é inseparável de uma concepção que vê no universo uma unidade viva e no homem um microcosmos. MALA TESTA, dolfo
Sigismondo Pan-
Nasceu em 1417 e morreu em 1468. Condottiere cruel, amoral e inteligente, era de uma família que se tinha instalado em Rimini no
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século XII. Aliado aos ESTE e aos SFORZA por casamentos, combateu com êxito vário em Itália e mesmo na Moreia contra os Turcos. Mecenas, rodeou-se de sábios, de filósofos e de artistas, que pôs u trabalhar, designadamente, na Igreja San Francesco de Rimini («o templo Malatesta»), reconstruída por Alberti. (V. 11, p. 39.) MANEIRISMO É uma dimensão do Renascimento
que durante muito tempo passou despercebida. No plano da arte (v. L, pp. 117-118), o maneirismo é uma via original entre a busca da beleza serena e da harmonia própria de BRAMANTE, de LEONARDO e de RAFAEL e a tendência para a grandeza barroca, que se manifesta a partir de MIGUEL ANGELO. O maneirismo é excessivo, paradoxal, anticlássico e antinatural. Alonga as formas (v. I, p. 290), adopta cores ácidas, procura enquadramentos estranhos. No plano de uma mentalidade mais geral, esta palavra exprime a inquietação e, por vezes, a sensualidade de uma época que não encontrou o equilíbrio (v. 11, p. 100). Associa os desejos requintados ao gosto do horrível (v. 11, p. 127); aprecia a feitiçaria, o macabro e as cenas equívocas ou malsãs. (Bibl.: J. Bousquet, La peinture maniériste, Neuchâtel, 1964.)
principalmente - o Cristo Morto (Brera), a Crucificação (Louvre), a Agonia no Horto das Oliveiras e a Ressurreição (Tours); mas foi também escultor, arquitecto e gravador. Este pintor apaixonado pelas coisas antigas (v. I, p. 104; v. 11, p. 44), talvez o único no seu tempo a inspirar-se directamente nos mármores trazidos da Grécia ou encontrados em . Itália, foi perseguido pela preocupação da verdade histórica e do pormenor verídico mas invulgar. O pormenor não é um elemento decorativo, é um elemento puramente plástico que corresponde às necessidades da composição. Élie Faure fala-nos do «desenho de Mantegna, um bocadinho pedante, carregado de influências alemãs... mas severo, másculo, atento, a dar o peso do bronze aos grupos escultóricos enquanto uma transparência adamantina abre as profundidades das suas paisagens, com árvores, palácios, cidades nas alturas, de uma dureza como de cristal». Em Mantegna, a dramatização do assunto não provém da atitude nem da expressão das personagens, mas da criação de um espaço dramático, um espaço metafísico em que o vazio é tão expressivo como o cheio e que, cinco séculos mais tarde, se voltará a encontrar na «pintura metafísica>> de Chirico. (V. I, p. 116.) MANUELINO (estilo)
MANTEGNA, Andrea
Estilo simultaneamente arquitectónico e decorativo que apareceu em Portugal durante a dinastia de Avis, .especialmente no reinado de Manuel I, o Venturoso, que viveu de 1469 a 1521, e ao qual deve o nome. Coincide com o mais belo período da expansão portuguesa além-mar; daí o lugar importante dado aos elementos marítimos neste estilo compósito, que aplica a um fundo gótico elementos retirados das estéticas romana, mourisca e oriental (v. I, p. 115). Depois de
Nasceu perto de Vicenza em 1431 e morreu em Mântua em 1506. Foi casado com a filha de Jacopo BELU NI. Pintor oficial dos Gonzaga de Mântua durante muito tempo, trabalhou também em ROMA e em FERRARA para Isabel d'Este (v. li, p. 89). Foi pintor de frescos - o Quarto dos Esposos (Mântua), a Vida· de S. Tiago (Igreja dos Eremitani di Sant' Agostino de Pádua)- e de obras religiosas,
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1530, a arte manuelina apagou-se pouco a pouco perante os estilos vindos de Itália : uma estética primeiramente purista e depois barroca. MANUZIO, Aldo Teobaldo Mannucci, dito Aldo Manuzio, o Velho. Nasceu em 1450 e, depois de estudar em ROMA e em FERRARA, viveu em 1482 junto de PICO DE MIRANDOLA. O sobrinho de Pico, Alberto Pico, ajudou-o a estabelecer-se como impressor em Veneza em 1490. A partir de 1494, Aldo Manuzio editou os maiores clássicos gregos e latinos (v. I, p. 98) e autores contemporâneos (BEMBO, POLIZIANO, ERASMO ... ). Ele próprio também humanista, escre. veu diversos tratados entre os quais uma Gramática Grega e uma Vida de Horácio, e fundou em 1500 uma academia helenista, a «Nova academia». Depois da sua morte (1515), a oficina aldina foi dirigida pelos cunhados de ! ;anuzio e, mais tarde, por seu filho Paolo (1512-1574) e pelo filho deste, Aldo Manuzio, o Jovem (1547-1597). MAQUIAVEL Niccolo Machiavelli, nascido e falecido em Florença (1469-1527). Patriota, inquieto com as dissensões florentinas, procurou extrair da sua própria experiência política e do estudo dos historiadores da Antiguidade os princípios de uma arte de governar capaz de dar remédio àquela situação instável (v. I, p. 39). Pensa poder classificar os diversos governos por meio de um pequeno número de tipos, ou regimes, que em definitivo resume em duas ordens fundamentais: a monarquia e a república. Dá extrema importância às circunstâncias particulares em que estes regimes funcionam' ou se alteram. Mais que pelos princípios, é pelas situações concretas que ele se interessa, pois
a essas situações, variáveis com o tempo e o lugar, é que os regimes têm de adaptar-se para se instalar e para se conservar. Daí o carác:cr prático das suas reflexões., que são apresentadas como outtos tantos conselhos dados ao «Príncipe» nas circunstâncias mutáveis em que este tem de garantir e perpetuar o seu êxito. Decerto que a fatalidade governa, em larga medida, os assuntos humanos (v. II, p. 56). Mas nem por isso deixa de haver uma margem de manobra, suficiente, 1~a maioria dos casos, para influenciar o curso dos acontecimentos. O mérito essencial de Maquiavel consiste em ter sido ele o primeiro a tentar definir uma «ciência» - a expressão é de A. Renaudet - da criação e conservação dos estados. Mas Maq uiavel, expondo os meios adequados para manter os regimes, quaisquer que eles sejam, independentemente de toda e qualquer ética (v. II, pp. 39, 102), parece todavia manifestar preferência pela república, como testemunha o seu estudo sobre Tito Lívio. (V. II, p. 50.) MAQUINISMO Os progressos do maquinismo na época do Renascimento são indiscutíveis e importantes: isso é-nos atestado pelos desenhos dos «ENGENHEIROS», pelas obras de AGRICOLA e de BIRINGUCCIO e pelos Teatros de máquinas de fins do século XVI (v. I, pp. 151 e segs., 173-174, 179 e segs. e gravuras 45 e 46). A imprensa correspondeu, .neste aspecto, à curiosidade cada vez maior do público a respeito das técnicas. MARGARIDA DE NA VARRA Nascida em 1492, morreu em 1549. Filha de Carlos de Orléans e de Luísa de Sabóia, irmã mais velha de FRANCISCO I. Casou em 1509 com o duque de Alençon; falecido este em 1525, casou novamente,
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dois anos depois, com Henrique d'Albret, rei de Navarra. A sua inJiuên:::ia política na corte de Fran, · i ~c o I foi muito sensível nos priJnciros anos do reinado deste. Mas, acima de tudo, o seu mecenato em I' a vor de escritores e artistas é que lhe valeu a celebridade emre os seus contemporâneos (v. II, pp. 88, ~!9). Rabelais · dedicou-lhe o Ter('eiro Livro. Margarida também esTevia, em estilo muitas vezes grar icso e não ·rebuscado. As suas obras atestam a sua curiosidade inle lectual, o seu amor à vida e a ~ u a espiritualidade, que transparece mesmo nos contos ligeiros do Heptameron , publicado ein 1558 (v. li, rp. 51, 94). As suas últimas obras poéticas. compostas depois da morte elo irmão, trazem um certo desencanto ao misticismo da maturidade (Miroir de l'âme pécheresse, 1531). MARLOWE, Christopher Nasceu em 1564. Dominou a primeira geração teatral do reinado de Isabel (1558-1603). Na juventude de Marlowe, o teatro sofria duas influências: a da tradição medieval (interlúdios de John Heywood) e a da renovação humanista (teatro universitário). Mas, sob a pressão dos acontecimentos, desordens e perturbações que então transformavam a vida e a sociedade inglesas, a actualidade ou o passado próximo nacionais forneciam aos homens de teatro uma nova fonte de assuntos, especialmente mais acessível ao grande público que a do repertório antigo. Mas o estudo dos Antigos ensinou-lhes a aperfeiçoar a técnica e a construir, sobre uma ética mais moderna, vinda de MAQUIA VEL, peças mais bem arquitectadas cujos protótipos são dados por Marlowe com Tamerlão (1587), Doutor Fausto (1588) (v. Il, pp. 21-22 e gravura 69) e, principalmente, Eduardo li (v. II p. 101), já muito próximo do drama shakespeareano. 297
Infelizmente, Marlowe morreu novo (1593), apenas com vinte e nove anos, depois de uma existência agitada, passada em grande parte nos albergues da periferia de Londres, onde aos grupos de teatro ambulante se misturavam vagabundos e espiões, e também aventureiros, a quem, a pretexto de rixas, a polícia do lord Mayor dava incessante caça. MAROT, Clément Nasceu em Cahors em 1494. Filho de um poeta «cortesão», ocupou, por morte do pai, o lugar de criado de quarto de FRANCISCO I. Favorito dos grandes e do rei, nem por isso deixa de conservar em relação a eles uma liberdade que nos aparece nas Épitres e, em outro registo, se manifesta nas suas traduções de obras sacras (Salmos) para língua vulgar (v. II, p. 112). Suspeito de simpatizar com a Reforma foi encarcerado no Châtelet eni. 1534. Obteve um perdão mas teve ele refugiar-se em Néraé e depois em Ferrara, em Veneza, em Genebra, em Chambéry e, finalmente, em Turim, onde morreu em 1544. Autor de rondós e baladas, de uma écloga e de sátiras, é principalmente um compositor espirituoso e sensível de epístolas, epigramas e elegias de estilo maleável e rápido que, em certos momentos prenuncia La Fontaine. (V. I,' p. 117; v. li, p. 100.)
MARTINHO V Oddone Colonna. Nasceu em 1368. Foi papa de 1417 a 1431. A sua eleição pôs fim ao Grande Cisma (v. I, pp. 122-123). MASACCIO Tommaso di Ser Giovanni, dito Masaccio. Este pintor de génio nasceu em 1401 e morreu em Roma em 1428 (v. I, p. 78), apenas com
vinte e sete anos. Foi influenciado, não pelos pintores do seu tempo , mas pelos escultores: GHIBER TI, DONATELLO, e, principalmente, Jacopo DELLA QUERCIA. Tra- . balhou em ROMA e em FLORENÇA mas da sua obra só ficaram nov~ frescos e uns dez quadros. «0 elemento dominante da pintura de Masacci6 - escreve Enrico Somaré é a sua substância dramática : a plasticidade que dela resulta não é um modo de representação, como nos seus predecessores, mas um modo de expressão ... ». «Parece que, antes dessa obra ninguém, nem mesmo Giotto, susp~itara ainda do mistério da pintura: o poder de substituir o espaço real pelo espaço sensual do espírito... Dois terços de século mais tarde, Leonardo, já idoso, e Miguel Ângelo e Rafael, ainda crianças, estavam ao pé daquelas paredes para lhes pedir lições» (É. Faure). (V. I, pp. 93 , 116.) MATEMÁTICA A tradição pitagórica e platónica privilegiava o número: um mito simultaneamente perigoso e fecundo. O Renascimento, herdeiro dessa tradição, manifestou desde o tempo de Nicolau de Cusa um verdadeiro fervor pela matemática (v. II, pp. 133-135), que evoluiu no sentido da simplificação, da sistematização e da simbolização. Este& progressos deram-se, primeiro, em Itália e na Alemanha (v. II, pp. 142-144) e, depois, em França e nos Países Baixos no fim do século XVI. Tartaglia, CARDANO, Bombelli, Stevin e Viete desbravaram o caminho a Descartes; e a descoberta da solução da equação do terceiro grau ficou célebre.
realista e quimérico (queria ser papa e fazer-se canonizar), cavaleiresco e humanista (v. II, p. 71). Unificou os estados hereditários da casa dos Habsburgos: essencialmente, a Áustria, o Tirol, a Estíria, a Caríntia e a Carníola. Obteve o eficaz auxílio do banco FUGGER (v. I p. 226) e, graças a ele, procuro~ criar uma organização financeira imperial. A sua política matrimonial foi hábil e teve consequências importantes. Casara primeiramente com Maria da Borgonha, filha do Temerário. Seu filho, Filipe, o Belo, casou com Joana filha de Fernando de Aragão e' de Isabel de Castela. Daí a impressionante herança que coube ao filho mais velho de Joana, CARLOS V. Além disso, Maximiliano casou o seu outro neto, Fernando com a filha do rei da Boémia e' da Hungria. A Boémia e aquilo que ficou da Hungria depois do desastre de Mohacs (1526) deram a coroa a Fernando. Deste modo, os casamentos organizados por Maximiliano deram aos Habsburgos territórios que eles depois governaram durante vários séculos. Viúvo de Maria da Borgonha, Maximiliano, não podendo casar com Ana da Bretanha, casou com Bianca Sforza, facto que explica as suas intervenções no Milanês. MEDICINA Os progressos da medicina na época do Renascimento foram fracos. Se certas doenças, como a lepra, tendiam a desaparecer, outras, novas, surgiam (escorbuto, sífilis, etc.). Todas as doenças eram designadas ainda com o termo genérico de «febres» e o grande remédio continuava a ser a sangria. Mas são de notar alguns progressos em farmacologia, devidos a PARACELSO (v. II, pp. 137-138). Algumas doenças, como a sífilis, dão lugar a boas descrições. A anatomia avança com LEONARDO DA VINCI e com VESÁLIO (v. li,
MAXIMILIANO I Nasceu em 1459 e morreu em 1519. «Rei dos Romanos» em 1486, imperador em 1493. Ao mesmo tempo
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p. 133) e a cirurgia com Ambroise PARÉ, que a faz mais eficaz e menos bárbara. Finalmente, Paracelso, Paré e Vesálio não hesitaram em libertar-se da ciência dos Antigos e esta ruptura, juntamente com a sede de saber, viria, a longo prazo, a mostrar-se fecunda. (V. 11, gravura 76.) (Bibli.: A. Castiglioni, A history of medicine, 2! ed., Nova Iorque, 1947.) M ÉDICIS Família de banqueiros que surge em FLORENÇA no século XIII (v. I, pp. 218 e segs.). É com Giovanni di Bicci (1360-1429) que começa o poderio da família . Giovanni di Bicci toma o partido do povo e seu filho COSME, O ANTIGO (1389-1464) aumenta habilmente a fortuna e a rede do banco (v. I, gravura 55). Faz de Florença a capital do HUMANISMO. Seu filho Pedro, o Gotoso (1416-1469) governa a firma .e a cidade apenas durante cinco anos. A morte de Pedro dá o primeiro lugar a LOURENÇO I, dito o Magnífico (1449-1492) e ao seu irmão mais novo, Giu1iano, que é assassinado em 1478 quando da conjura dos Pazzi. Lourenço foi, também, um mecenas, mas, com as suas excessivas despesas, provocou a bancarrota do Monte dei doti, que tinha o encargo dos empréstimos da cidade. Seu filho Pietro foi expulso pelos Florentinos em 1494 com a chegada do rei de . França, CARLOS VIII. A grande história do BANCO Médicis terminara. Mas a família voltou a Florença. Giovanni, o futuro papa Leão X, voltou à cidade em 1512. Lourenço li, pai de Catarina, futura rainha de França, recebeu do papa o título de capitão-geral da Igreja e o ducado de Urbino. do qual se apodera. Florença foi então governada pelo cardeal Giulio (1 478-1534), que seria depois o papa CLEMENTE VII e viria a entrar em conflito com CAR-
LOS V. Depois do saque de Roma, em 1527, os Florentinos expulsaram os Médicis e proclamaram a república -que foi efémera (1527-1530). Depois da reconciliação do papa com Carlos V, Alexandre I foi feito duque de Florença. Assassinado por Lorenzino em 1537, foi substituído por Cosme I. Duque de Florença e depois grão-duque da Toscana em 1569 (v. I, p. 33), Cosme I estendeu o seu domínio a toda a Toscana. Sucedeu-lhe seu filho Francesco, que não teve herdeiro varão ; por sua morte, o trono coube ao irmão de Cosme, Ferdinando I (1549-1609), fundador do porto de Livorno e cuja sobrinha, Maria, casou em 1601 com HENRIQUE IV. Seguiu-se o reinado de Cosme II (1590-1621) e o início da decadência da família Médicis (v. I, p. 100). (Bibl.: M. Andrieux, Les Médicis, Paris, 1958.) MELANCHTHON Philipp Schwarzerd, dito Melanchthon, nascido em 1497. Professor de grego na Universidade de Wittenberg, foi amigo e o principal discípulo de LUTERO, que acompanhou a Leipzig em 1519 quando da «disputa» com Johann ECK. Os seus Loci communes theologire (1521) são a primeira dogmática protestante. Foi ele quem redigiu a Confissão de Augsburgo em 1530 e a Apologia dessa confissão (1531). Mas, humanista e amigo de ERASMO (v. I, p. 146), Melanchton nunca aceitou completamente a doutrina luterana do servo-arbítrio e inclinou-se cada vez mais para o «sinergismo», concepção teológica que admite a colaboração do fiel na sua salvação. Espírito irénico, Melanchthon procurou apaziguar as divergências entre os protestantes e trabalhou para a sua reconciliação com os católicos. A sua doutrina da Ceia afastava-o, porém, de Roma e aproximava-o dos zwinglianos. Depois da morte do
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pai da Reforma, os luteranos dividiram-se em discípulos e adversários de Melanchthon ; só em 1580 se reconciliaram mediante a Fórmula de Concórdia. (V. li, p. 72. ) . (Bibl.: R. Stupperich, Melanchthon , Berlim, 1960.) MELANCOL IA É preciso sublinhar o romantismo do Renascimento . É evidente o pes-
simismo de LUTERO, de DU BELLAY, de DÜRER e de MIGUEL ÂNGELO (v. li, pp. 45-47). Naquela época, a melancolia e a crença no poder dos astros estavam ligadas. Em profundidade , esta melancolia exprime, no indivíduo que emerge do anonimato medieval, a consciência da sua fragilidade (v. li, pp. 48-49, 55). MEMLING, Hans «0 pintor mais brugês de todos» nasceu perto de Mainz entre 1430 e 1440 e morreu em 1494 em BRUGES, onde se fixara em 1466. Memling não é um inovador, mas levou ·a técnica flamenga ao seu mais alto ponto de perfeição. Se, como se supõe, foi aluno de V AN DER WEYDEN em Bruxelas, não se lhe encontra nem o patético nem a grandiosa plasticidade do mestre. Brilhante e delicado, é bastante impassível. Da sua obra estão excluídos toda a violência e quase todo o movimento: em certas telas, como o Martírio de Santa Vrsula, «o tumulto é constituído pela desajeitada agregação de formas calmas» (L. Van Puyvelde). Memling deixou obras religiosas (v. li, p. 38) de uma tranquila devoção e retratos muito belos que «vivem de uma existência meio carnal meio espiritual, em que a expressão da personagem corresponde em certo sentido à moralidade, à piedade e ao orgulho do tempo: verdades corteses, exemplares, persuasivas» (P. Fierens).
MERCATOR Gerhard Kremer, dito Gerhard Mercator. nascido em 1512 e falecido em 1594. Matemático e cartógrafo flamengo instalado em Duisburg. Em 1541 fabricou para CARLOS V dois globos: um da Terra e outro do Céu. Fez um mapa da Europa em 1552 e trabalhou na projecção que tem o seu · nome (v. I, p. 172): ela lhe permitiu publicar em 1569 o primeiro mapa-múndi. O Atlas apareceu em 1585 (v. li , p. 137). METAIS PRECIOSOS A maior ou menor produção de ouro e, principalmen te, de prata na Europa Central e na América influenciou, evidentement e, a economia europeia (v. I, p. 67 e segs. e gravura 13). Mas a conjuntura não foi influenciada apenas pela quantidade de metais preciosos disponíveis. Os processos de «ressudaçãm> e do amálgama, juntamente com os progressos mecânicos da bombagem da água que inundava as minas, permitiram que a produção aumentasse nos séculos XV e XVI (v. I, p. 177). MIGUEL ÂNGELO Es.c ultor, pintor, arquitecto, poeta, Michelangelo Buonarroti nasceu perto de Arezzo em 1475 e repartiu a sua vida com bastante regularidade entre FLORENÇA e ROMA, onde morreu em 1564. Isolado dos seus contemporân eos, que o consideravam como um super-homem (v. I, p. 114) devido ao seu enorme génio - «só como um carrasco» (v. li. p. 46) - , a sua «obra toda inteira, de pintura, de escultura, de arquitectura, mesmo de poesia, revela um poder único para precipitar o movimento e o sentido da vida nos quadros inflexíveis de uma ciência e uma ra-
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zão que não podem abdicar, apesar do desdém que a si próprias inspiram, e a ascensão de uma grande alma para uma religiosidade que aumenta sem cessar» (É. Faure). Daí a intensidade da sua angústia, que ele exprime de forma quase insustentável em esculturas inacabadas e, principalmen te, nos frescos da Capela Sistina (v. I, p. 94): os da abóbada, que ele pintou de 1508 lt 1512, «essas imensas figuras em que tudo é coerente e definido até à dobra do vestido e ao pormenor do gesto (e que) são a mais alta real ização do desenho linear flore ntino, amplificado pela monumentalidade romana» (A. Chastel), c, mais ainda, os do Juízo Final ( !536-1541). «Três papas ordenaram a destruição do Juízo Final» , escreve Malraux. No entanto, esta obra é
ser o fresco - . que· tinha por trabalho infantil, indigno de um homem, é mais escultor na sua pintura que quando talha a pedra. «De cada vez que toma o cinzel, é vítima da sua ciência quase absoluta da anatomia muscular ... Sabia bem demais como eram feitos os músculos... quase nunca ousava permitir-se juntá-los a todos em massas sintéticas, que dão o pensamento com tanto maior vigor quanto mais participam na definição da arquitectura do corpo a que pertencem... Mas a pintura liberta-o ... A brocha e o pincel obedecem à vertigem do espírito, em relação ao qual a matéria do mármore ... estava sempre atrasada. Quando tinha já feito metade de um colosso, o colosso estava ultrapassado e outros tormentos, outras vitórias, outras derrotas exigiam a sua vez. Quase nunca terminava as estátuas ... Terminará a Sistina, o mais vasto conjunto decorativo do mundo... Ali, a sua ciência serve-o. Pode fazer sair da parede os volumes que quer, enterrar os outros, encandear-no s com a audácia e a força dos escorços, segurar ou deixar à vontade a escuridão e a luz ... » (É. Faure). É também lá que ele exprime e ultrapassa a sua época: «Se a abóbada da Sistina representa o momento soberano da densidade clássica, com o Juízo Final entra-se na pulsação do barroco ... [v. I, p. 117] . A arte de Miguel Ângelo domina, pois, igualmente, todos os estilos e escapa à sua definição» (A. Chastel). (V. I, pp. 104-105, 116, 266; v. li, pp. 43, 56.)
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MILÃO Tinha cerca de 100 000 habitantes no fim do século XV e não mais de 120 000 no IniCIO do século XVII (v. I, p. 257), por causa das guerras de Itália e, depois, da peste de 1574. Cidade industrial - a sua indústria de armaduras e a sua manufactura de tecidos eram
prósperas-, Milão domina um território fértil onde, no século XVI, se estendiam campos de arroz. A cidade é também uma das capitais do Renascimento: BRAMANTE e LEONARDO (v. I, pp. 158, . 261) lá trabalharam no fim do século XV. Também tinha, desde 1470, uma notável instituição musical, a «capela da corte». Os dois momentos de apogeu de Milão durante o período que estudamos, situam-se no tempo de Gian Galeazzo VISCONTI, duque da Lombardia desde 1397 e sob Francesco SFORZA (1450-1466). O primeiro mandou começar a construção da catedral (e também a cartuxa de Pavia); o segundo reconstruiu o castelo e edificou o Spedale Maggiore, o primeiro hospital laico do mundo. Em mãos francesas entre 1499 e 1512, e depois novamente entre 1515 e 1521, Milão e o Milanês foram restituídos aos filhos de LUDOVICO, O MOURO (v. I, p. 39). Mas Francesco li Sforza morreu em 1535 e o Estado milanês passou oficialmente para a posse da Espanha. MISTICISMO Cresceu a partir do século XIV e constituiu um dos aspectos da ascensão do individualismo religioso no Ocidente, de Mestre Eckhart a S. João da Cruz, passando por Joana de Are, LUTERO e Teresa de Ávila (v. I, 142-143). É um dos grandes · factos desta época. MOEDA A diminuição da produção das minas de ouro e prata da Europa no século XIV (v. I, pp. 69-70) levou os príncipes a fazer manipulações monetárias. Mas o recrudescimento da actividade das minas de prata europeias a partir de meados do século XV (v. I, pp. 72 e segs.) grraças a melhoramentos técnicos,
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e depois a chegada·do metal branco da América provocaram, no século XVI, uma subida do preço do ouro. Durante muito tempo, com ~arl J. Hamilton, atribuiu-se a subida dos preços do século XVI (v. I, gravuras 17 e 18) exclusivamente à injecção do circuito económico europeu (v. I, pp. 67 e segs.) dos METAIS PRECIOSOS americanos. As coisas não parecem hoje assim tão simples: as crises c~realí: feras, o custo cada vez maior das guerras, a urbanização, o aumento ~a P?IJUla~ão, a subida do luxo, a ImobJIIzaçao de metais preciosos na ourivesaria religiosa ou laica contribuíram muito, com certeza, para a subida geral dos preços. Em todo o caso, porém, a economia europeia viveu muitas vezes, no século XVI, do ponto de vista monetário, mais em «apertos» que em «largueza». Havia então um contraste, no qual convém insistir, entre o sector da moeda «pesada» - peças de ouro e prata de liga rica - e o sector da moeda «ligeira», de fraco !eo! de prata. A primeira servi_a , pnnc~palJ!lente, para as trocas mternacmna1s, o comércio por grosso e as mais avultadas transacções entre retalhistas. A segunda, pelo contrário, fraccionária e subsidiária, era utilizada no .comér- _ cio a retalho. ·Para fazeTfrenteàssuas dificuldades f.i nanceiras, os soberanos lançaram ao mercado moedas de «mistura» - cobre coberto de prata - que se degradavam pouco a pouco. A invasão da moeda de «mistura» contribuiu, decerto, quer para fazer subir o valor das boas peças de ouro e de prata quer para acelerar a subida dos preços. Além disso nasceu entre os dois sectores monetários um verdadeiro sistema de câmbios com cambistas- os bancherotti d~ Roma- que ganhavam uma comissão quando alguém recorria aos seus serviços para trocar moeda fraca por moeda forte. O remédio para esta desordem consistiu tanto em Itália como em Espanh~ e em França, no início do século XVII,
nn substituir as moedas de «mislu ra», pequenas, por grandes moedas de cobre e em diminuir depois disso a emissão de moeda fraccionária. (V. I, gravura 53 e 111 'l pa 58.) (Bibl.: C. Cipolla, Mouvements monétaires dans l'état de Milan, 1580-1700, Paris, 1952; F. Spooner, l.es frappes monétaires em France de 1490 à 1680, Paris, 1956; J. Delumeau, Vie économique et sociale tle Rome dans la seconde moitié du XVI' siecle, t. 11, Paris, 1959). MONGóiS O Império Mongol, fundado por Gengis Khan (1206-1227), foi partilhado pelos seus descendentes e .dividido em vários estados, dos quais o mais importante era o da HORDA DE OURO (v. I, p. 31). Destruído, foi reconstituído uma primeira vez por T AMERLÃO (Timur Lang) em 1369 e, depois, por um seu descendente, Baber (1505-1530). Tomou então o nome de Império do Grão-Mongol e atingiu o apogeu sob .o reinado de Aurangzeb (1659-1707). MONTAIGNE Nasceu em 1533 e morreu em 1592. Oriundo de duas ricas dinastias de mercadores, os Eyquem pelo lado paterno e os Lopes (de origem portuguesa) pelo lado materno, Michel Eyquem tirou o seu nome, Montaigne, do pequeno terreno que um bisavô seu comprara no Périgord (1477). Seu pai fora «maire» de Bordéus em 1554 e ele próprio devia ocupar esse lugar em 1583 depois dos estudos de direito que lhe deram oportunidade de ser conselheiro na corte de Périgueux e depois no Parlamento de Bordéus. Mas, em 1571, com trinta e nove ·anos, vendeu o cargo a fim de retirar-se para a mansão de Montaigne. Casado com uma her-
deira rica, teve dela sete filhas, das quais apenas uma sobreviveu (v. li, p. 65) e com quem se não preocupou, tal como fez com a esposa. Quando La Boétie morreu, em 1563, Montaigne perdeu o único ser a quem esteve realmente ligado por laços afectivos. Passou desde então o tempo a ier, a meditar acerca de si próprio e a escrever também, mas sem o propósito de escrever um livro: apenas para os parentes e amigos que, depois de ele morrer, «pudessem ter prazer» em reencontrá-lo por inteiro, verídico até à evidência, nessa soma de si próprio a que se dedicou como a uma espécie de procura do absoluto (v. li, p. 81). Mas a primeira edição dos Ensaios teve audiência de mais vasto público. Em 1582 apareceu uma segunda edição, aumentada, em Bordéus e depois em Paris uma terceira, em 1587, por obra de sua filha espiritual, M."c de Gournay (v. li, p. 91). Nada nesta figura pouco dada a paixões, nem à acção conquistadora, nem à embriaguez da libertação, outrora celebrada por RABELAIS, aproxima de modo típico Montaigne dos homens do seu tempo. Montaigne ocupa, na literatura e no pensamento francês, um lugar claramente à parte. Nem homem do Renascimento nem clássico - o classicismo tinha horror ao «eu»-, é um espírito solitário. Mas o seu humanismo céptico e tolerante, a sua pesquisa de uma sabedoria extraída da experiência pessoal das coisas e dos homens (o seu Diário de Viagem a Itália [v. I, pp. 101, 164, 173, 250] é ainda hoje uma mina para o historiador) irão exercer sobre muitos escritores dos séculos seguintes uma influência que neles deixará marcas, mesmo quando, como no caso de Pascal, originar aversão. Montaigne recebera de seu pai uma educação particularmente cuidada, cujos métodos lhe foram caros e lhe inspiraram um dos melhores capítulos dos Ensaios (v. li, pp. 85 e segs.). A sua língua é um modelo de simplicidade e
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naturalidade: abunda em expressões e imagens pitorescas, ao mesmo tempo concisas e figuradas, familiares e insólitas, por vezes extraídas, por este intelectual. da fala . popular. (V. I, p. 46; v. II, pp. 12-13, 48 .) MONTEVERDI, Claudio Nasceu em 1567 em Cremona, onde passou os anos da infância e da juventude. Aos vinte e três ,anos foi para a corte de Mântua como cantor e tocador de viola; ali passaria mais de vinte anos para depois ser, desde 1613 até morrer (1643), mestre de capela em San Marco de Veneza. Não há género de composição que ele não tenha praticado: nove volumes de madrigais, nume·rosas obras vocais, perto de vinte óperas ou obras líricas, cinco dúzias de obras sacras, cantatas profanas e muita música instrumental. «Novo Miguel Ângelo, com a- sua imaginação fogosa, a sua alma heróica e revoltada, a sua fé religiosa e a sua incrível faculdade de sofrer» (H. Prunieres), levou ao apogeu o madrigal, em que o seu lirismo dramático se exprime livremente, mas foi também, não o verdadeiro «inventor» da ópera (v. I, p. 11l), mas «o primeiro compositor de génio que realizou, com esta forma nascente, obras-primas» (Cl. Samuel). O seu primeiro melodrama, o Orfeu, foi representado em 1607 mas a sua ópera mais digna de nota é, sem dúvida, L'incoronazione di Poppea, que escreveu aos setenta e cinco anos, «último lanço de uma · evolução magistral» e «ponto de partida de todo o teatro lírico europeu dos séculos seguintes» (M. Le Roux). «Sem nada rejeitar às tradições já confirma. das nem às audácias oportunas ... (Monteverdi é) um dos cinco ou seis criadores que souberam realizar uma síntese única entre a tradição de: que saíram, o futuro que pressentiram e a sua própria personalidade» (CL Samuel).
MONTI Quer o nome quer a fórmula provêm, sem dúvida, de FLORENÇA, onde inicialmente designavam empréstimos municipais. Monte significava, então, uma acumulação de numerário - acepção esta que se encontra ainda hoje na expressão «montepio», surgida no século XV. Os monti pontificais do século XVI (v. I, p. 230) eram empréstimos contraídos pelo · papado e garantidos por uma renda anual claramente estabelecida. Os títulos, ou parcelas, destes empréstimos (luoghi di monti) podiam ser «vacantes» ou «não vacantes». Os primeiros revertiam para o Estado por morte do seu proprietário ou em caso de promoção importante na hierarquia eclesiástica e, em geral, rendiam 10 ~o. Os segundos eram indefinidamente transmissíveis aos herdeiros e rendiam 5 ou 6 o/o. As «rendas sobre a câmara municipal» de Paris, os Juros espanhóis e os luoghi di monti dão testemunho do crescente apelo a um vasto público pelos governantes do século XVI por intermédio dos banqueiros. (Bibl.: J. Delumeau, Vie économique et sociale de Rome dans la seconde moitié du xvr siecle, t. Il, Paris, 1959). MORE, Thomas Nasceu em 1478 e morreu em 1535. Jurista e homem de Estado inglês. Foi membro da oposição no tempo de HENRIQUE VII, que criticava pelas suas simpatias pela França e que acusava de ser cruel para com os adversários. Chamado ao poder por HENRIQUE VIII, foi chanceler do reino em 1519. Mas, sendo católico e opondo-se, por isso, ao divórcio do rei, demitiu-se e foi depois preso e executado por alta traição em 1535. Amigo de ERASMO e grande leitor dos Antigos (v. I, p. 96), em especial de PLATÃO, escreveu em 1516 um livro
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(IWbre a melhor constituição de uma república>; a que .deu o nome d..: Uto pia (v. H , pp. 22 e segs., 30J I , 120). Esse livro, juntamente <.:o m uma severa crítica dos costumes do seu tempo (v. Il, p. 59). contém uma descrição da cidade 1dcal - idealismo que, de resto, não tem ilusões c ao qual se sobrepõe um nacionalismo apaixonado e par<.:ial. Algumas das teses de Th. More (especialmente a da bondade original do homem), bem como o ~c u estilo e o próprio género - a viagem literária e filosófica - , viriam depois a ser bastantes vezes retomados, desde RABELAIS a Montesquieu e a Rousseau. (V. II, p. 81.) MóVEIS Os progressos da civilização ocidental e a necessidade de luxo e de conforto cada vez mais sentida na vida quotidiana provocaram, a partir do século XIV, a diversificação do mobiliário, que gradualmente se fez mais prático mas, também, mais volumoso (v. I, p. 197).
MULHER A igualdade do homem e da mulher na época do Renascimento é urna lenda que a história da socied?de desmente (v. Il, p. 88). Todavm, apesar de a sociedade desse tempo ter continuado a ser largamente antifeminista (v. II, p. 125), é certo que deu à mulher (v. II, pp. 64, 88-92) um lugar cada vez mais importante -como, de resto, o deu também ao casamento (v. II, pp. 95-98) e à criança. (V. II, p. 123.)
MÜNTZER, Thomas Nasceu cerca de 1489. Foi ele o chefe anabaptista dos camponeses revoltados (v. I, pp. 132, 247), uma
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das mais . controversas figuras da hi:.tória alemã do século XVI. A historiografia marxista viu nele o primeiro revolucionário da era moderna (v. II, pp. 13-14), mas há hoje quem, em vez disso, o ligue aos «milenaristas» da Idade Média. Foi feito prisioneiro na batalha de Frankenhausen (1525) e executado pouco tempo depois. (Bibl.: A. M. Lohmann, Zur geistigen Entwicklung Thomas Müntzers, Leipzig, 1931). MúSICA Na época do Renascimento, a música ocupou um lugar cada vez mais . importante na civilização ocidental. Os Flamengos e os Italianos tomaram a dianteira do movimento musical (v. I, p. 91). Guillaume DUFA Y (1400-1474), Johannes OCKEGHEM (1420-1495) e JOSQUIN DES PRÉS (1450-1521) realizaram, depois de Guillaume de MACHAUT (c. 1300-1377), a expansão da polifonia (v. I, p. 277) e da arte do contraponto, que sobrepõe várias melodias umas às outras. Mas foi PALESTRINA (1526-1594) quem levou à perfeição o ideal polifónico e a ciência contrapontística dos Flamengos. A música religiosa evoluiu simultaneamente com a criação de muitas escolas de cantores junto das igrejas e de muitas «capelas» de príncipes. Roland de LASSUS compôs cinquenta missas e setecentos motetes ou responsos. A música sacra espanhola alcançou o apogeu com Tomás Luís de Victoria (c. 1535-c. 1608). LUTERO, por outro lado, lançou a fórmula dos «corais» (v. I, p. 136)- cânticos a uma ou mais vozes, em língua vulgar, cantados pelos fiéis. Mas a novidade está no enorme desenvolvimento da música profana, expressão de uma civilização mais requintada e mais laicizada que a anterior. A «canção francesa», com Clément Janequin as pesquisas antiquizantes da Acàdemia de música e poesia fundada
em 1571 por Jean-Antoine de. Bai:f e, principalmente, o «madngal», em que refulgiram GESUALDO e MONTEVERDI , atestam, a par de muitos documentos iconográficos, . a crescente importância da música profana. Nos fins do século XVI precisou-se em Florença a fórm~la do drama lírico e do novo estilo recitativo, qúe depois substituiu a polifonia. A ópera nasce por volta de 1600 (v. I,. p. 111). As vozes, na época do Renascimento, deixaram de ter um papel exclusivo e a n:úsica instrumental ganhou a sua Independência. O grande órgão começou a tocar a solo e o alaúde teve grande voga. As violas e os violinos receberam aperfeiçoamento s (v. I, p. 198). . (Bibl.: F. Michel, Encyc!opéd1e de la musique, 3 vol., Pans, 1958-1961.)
N
Foi a mais populosa cidade
NAVEGAÇÃO As grandes viagens dos descobrimentos (v. I, mapas 38 e 39) só foram possíveis com os progressos da construção naval, acompanhados ou seguidos dos da CARTOGRAFIA e dos instrumentos (v. I, gravura 42) de medição de latitudes e da velocidade dos navios (v. I, pp. 166-172). (V. I, mapas 7 e 12.) NlCOLAU V Tommaso Parentucelli, nascido em 1398. Foi papa de 1447 a 1455 (v. I, p. 124) e fundou <> Biblioteca Vaticana (v. I, pp. 96, 97). Quis fazer de ROMA a capital do Renascimento, preocupando-se mais com as artes e as letras que com o seu papel de chefe da Igreja. NUREMBERG A
NÁPOLES
?e
Itá-
lia durante todo o Renascimento (v. I, pp. 27, 256), tendo nessa
época conhecido certo esplendor artístico (v. I; p. 92)- o arco de triunfo do Castel Nuovo (meados do século XV) e o palácio real (1600) - e literário com Pontano, que fundou uma ACADEMIA, e com Sannazzaro. Mas não pode, nestes aspectos, rivalizar com FLORENÇA, VENEZA, MILÃO. ou ROMA. O seu papel económico, apesar da prosperidade da indústria da lã e da seda, também foi muito menos importante que o de Florença, Veneza e Livorno. Nas mãos de uma dinastia aragonesa desde 1442 (v. I, p. 33), Nápoles viu a chegada das tropas francesas em 1495 e esteve sujeita aos Espanhóis a partir de 1504. Os vice-reis do século XVI atraíram a Nápoles as grandes famílias da nobreza- o que dá mais
o
uma prova do fenómeno ge~l da urbanização desta classe social.
Tinha 40 000 habitantes no início do século XVII (v. I, p. 257). Foi, com Augsburgo, o principal foco do Renascimento na Alemanha (v. I p. 71). A sua prosperidade econ'ómica, devida à sua situação entre o Mediterrâneo e o Báltico e à proximidade das minas de prata, um notável artesanato (v. I, pp. 180, 191, 196) -relojoaria. (v. l p. 175), gravura em madeira, ~te.- e um patriciado esclarecido explicam o seu desenvolvimento intelectual e artístico dos fins do século XV e princípios do século XVI. Alguns nomes ilustram essa evolução (v. li, p. 134): o humanista Pirckheimer, o matemático REGIOMONT ANUS, o cartógrafo Martin Behaim, artistas como Pcter Vischer e, principalmente, DüRER (v. I, p. 155). A Reforma foi introduzida em Nuremberga em em 1525.
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Ceia: e daí a tenaz hostilidade que lhe moveu LUTERO. (Bibl.: E. Staehelin, Das theo/ogische Lebenswerk Johannes (Ekolampads, Leipzig, 1939).
OCKEGHEM, Johannes «0 pilar da música», «o tesouro c a luz da alma», nasceu cerca de 1420 no Hainaut. Entrou em 1452 para a capela real onde, até à morte (1496), serviu sucessivamente três soberanos: CARLOS VII, LUfS XI e CARLOS VIII (v. I, p. 91). «Homem de Igreja, foi na música sacra que deu o melhor de si próprio"; foi aí que as suas profundas qualidades - o seu misticismo, o seu sentido do rigoroso equilíbrio na grandeza- puderam exprimir-se com mais liberdade» (G. Thibault). Mas foi, igualmente, apreciado como compositor de música profana: as suas canções espalharam-se por · toda a Europa. A sua incrível habilidade tér . nica, que deslumbrava os coutemporâneos, esteve sempre subordinada à preocupação da expressão artística: «Mesmo quando leva ao mais alto grau de complexidade a sua ciência da escrita ... Ockeghem comove-nos sempre com o colorido da harmonia, com a vida que sabe imprimir a cada parte do contraponto ... » (N. Bridgman). E, com o compositor Krenek, pode-se pensar que, se a música de Ockeghem está viva ainda nos nossos dias, isso se deve a essa faculdade de provocar no auditor moderno não só um interesse intelectual mas também um~ emoção imediata - apesar da completa diferença de condições psiqológicas e sociais.
OTOMANOS Em 1302, com a queda do Império Turco dos Seljúcidas, que tinham criado na Anatólia Central o sultanato de Rum, Osman I (1281-1326) fundou a dinastia osmanlita ou otomana, que de 1354 a 1453 completou a conquista dos Balcãs (v. I, p. 30). Em 1354, Solimão I tomou Gallipoli; em 1366, Murad I fez de Andrinopla a sua capital. Depois disso, Bayazid I (Bajazet) apoderou-se da Macedónia, da Bulgária e da Tessália, mas foi vencido pelo mongol T AMERLÃO em Ancara (1402). Algum tempo depois, em 1428, Murad II chegou a Saio- · nica e venceu os Polacos em Varna . (1444) e os Húngaros em Kossovo (1448). Em 1453, CONSTANTINOPLA é tomada por Maomé II (v. I, p. 35), seguindo-se-lhe a Mareia, a Sérvia e a Bósnia. O poderio otomano alcançou nessa altura o apogeu. Solimão, o Magnífico (1520-1566) conquistou ainda metade da Hungria, mas debalde cercou Viena em 1529. Na Ásia, apoderou-se de Bagdade; em África, os Barbarroxa conquistaram-lh e a Argélia e a Tunísia. Depois disto, os Otomanos obtiveram ainda algumas vitórias, mas a sua capacidade de expansão estava já a diminuir e a regressão começou junto a Viena em 1683. (V. II, pp. 9, 35 e v. I, mapa I.)
ffiCOLAMPJ\D Johannes Hausschein, dito fficolampad, nasceu em 1482 e morreu em 1531. Brigitino humanista que ajudara ERASMO na edição do Novo Testamento, foi o reformador de Basileia (v. I, p. 127). A sua teologia aproximava-se da de Zwingli, especialmeJlte quanto à última
P ACIOLI, Luca Nasceu em Borgo San Sepolcro em 1445 e morreu em Roma por volta de 1510. Franciscano e amigo
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de LEONARDO (v. I, p. 158), ensinou rpatemática na maior parte das universidades italianas (Perugia, Nápoles, Milão, Pisa, Bolonha, Veneza e Roma). A sua Summa de arithmetica, geometria, proportione et proportionalità, publicada em Veneza em 1494, expõe os conhecimentos matemáticos do seu tempo (v. li, p. 142). Dois anos depois, no De divina proportione (publicado em 1496), Luca Pacioli estudou o papel desempenhado pela «secção de ouro» na geometria e na natureza. Contribuiu também para dar a conhecer à Europa a CONTABILIDA DE POR PARTIDAS DOBRADAS (v. I, p. 205). PAISAGEM Os pintores do Renascimento, muito mais sensíveis ao real que os seus antecessores (v. I, pp. 80, 153), deram nas suas obras um lugar cada vez maior à natureza, especialmente à paisagem, que passou a ser cenário e, mais que cenário, atmosfera, e até, pela primeira vez, o assunto exclusivo do quadro (v. I, pp. 94-95). PALESTRINA Giovanni Pierluigi, dito Palestrina, do local onde nasceu em 1525 - a antiga Prenesta - , passou quase toda a vida em Roma, onde foi cantor na Capela Sistina e, depois, mestre de capela em S. J.oão de Latrão, sucedendo neste cargo a Roland de LASSUS; foi também mestre de capela em Santa Maria Maggiore. Falecido em 1594, foi inumado na Basílica de S. Pedro. Embora formado pelas lições da retórica profana, e tendo composto vários livros de madrigais, Falestrina foi, acima de tudo, músico de igreja: escreveu 103 missas e mais de 300 motetes, tendo sido, com Lassus, o maior mestre da música religiosa da segunda meta-
Substituiu a cauterização com ferro em brasa pela laqueação das artérias. As suas Obras Completas foram publicadas em 1575 e tiveram traduções em muitas línguas. (V. II, gravura 76.)
de do século XVI. «Emanação da velha arte eclesiástica tradicional, filha directa dos pré-renascentista s, cujos esforços conclui (a sua obra) desemboca naquela arte nova que encontraria em Bach a perfeita realização ... Ê motivo de espanto que haja um século a separar Falestrina de Bach, sendo tão evidente que as intuições daquele o encaminham para as perspectivas . tonais deste ... No fundo, talvez não haja entre eles senão uma única diferença: aquela que separa a clara intuição da clara consciência» (J. Samson). (V. I, p. 280.)
no século XVI, o maior sucessor de ALBER TI e de BRAMANTE. Enrarnou o purismo arquitectónico (v . I, p. 106) na época do Renasrimento e foi um dos fundadores do classicismo. Deve-se-lhe, em Vircnza, diversos palácios, a «basílica de Palladio» e o teatro olímpico, por ele concebido e realizado depois da sua morte por Scamozzi; ,., em Veneza, três igrejas, entre :ts quais San Giorgio Maggiore; na Terra Firme veneziana deixou admiráveis villas à antiga, com fron tões, pórticos e átrios. (V. I, p. 265.)
PALISSY, Bernard
PARACELSO
«0 inventor das rústicas figurinhas do Rei e do Monsenhor CondestáveJ de Montmorency» nasceu numa família pobre (v. I, p. 287) por volta de 1510, casou em Saintes e foi primeiramente vidreiro e, depois, oleiro, dedicando-se teimosamente, durante dezasseis anos, à descoberta do segredo das faianças esmaltadas italianas. Apesar de ser huguenote, o êxito (v. I, p. 197) valeu-lhe a protecção de Catarina de Médicis e do Condestável de Montmorency. Celebrizado, especialmente, pelos esmaltes jaspeados das suas peças, tem também o mérito de poder ser considerado como o pai da paleogeografia, pois foi ele quem primeiro propôs a correcta interpretação dos fósseis. Encarcerado na Bastilha como herético, ali morreu em 1589 ou 1590.
Theophrast Bombast von Hohenheim, dito Paracelso, nascido em Einsiedeln em 1493. Seu pai era médico e professor na escola das minas de Villach, na Caríntia. O próprio Paracelso trabalhou por algum tempo nessas minas. Como médico, teve vida itinerante. Em 1526 foi nomeado professor de . MEDICINA em Basileia (v. II, p. 137), onde provocou escândalo por falar em alemão e por ter queimado os livros de Galeno e de Avicena. Morreu em 1541 em Salzhurgo em circunstâncias obscuras. Contribuiu para o progresso da QUíMICA (v. II, p. 138). (V. li, pp. 131, 136.) (Bibl.: R. H. Blaser, Paracelse et .l'a conception de la nature, Genebra, 1950).
PALLADIO
Nascido nas cercanias de Lavai por volta de 1509 e falecido em Paris ·m 1590. Aceite como mestre barbeiro-cirurgião em Paris em 1536, foi cirurgião do exército e da corte de HENRIQUE li, CARLOS IX e IIENRIQUE III. Compartilhou de muitas crenças ingénuas do seu tempo (v. li, p. 128). Mas este prático, que conhecia mal os Antigos, l'oi o criador da cirurgia moderna.
Andrea di Pietro, dito Palladio, nasceu em Pádua em 1508 e morreu em Vicenza em 1580. Foi canteiro e protegido de um poeta humanista que lhe deu o sobrenome de Palladio. Apaixonado pelas ruínas da Antiguidade, editor de Vitrúvio e teórico, também ele, de ARQUITECTU RA, Palladio foi,
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I' ARE,
Ambroise
PARIS A população de Paris entre os séculos XIV e XVII é mal conhecida. No tempo de Filipe, o Belo, a cidade teria, segundo Ph. Dollinger, 80 000 habitantes; segundo F. Lot, teria 200 000. Este segundo número, que tinha sido posto de parte, foi recentemente objecto de nova consideração, mas parece exagerado (v. I, p. 257). A primeira estimativa séria data de 1637: Paris e os seus faubourgs teriam então 415 000 habitantes. O desenvolvimento urbano de Paris recomeçou logo a seguir ao fim da Guerra dos Cem Anos; o estilo flamejante espalhou-se por Saint Séverin, Saint-Germain-l 'Auxerrois, Saint-Médard, etc. A cidade cresceu muito no século XVI (exceptuando a recessão demográfica provocada pelas guerras da Liga), mas, com as suas ruas estreitas e sinuosas e as suas pontes atravancadas de casas, continuava medieval (v. I, pp. 266-267). Os loteamentos eram feitos anarquicamente. Apesar disso, a influência italiana aumentou; as casas da ponte de Nôtre-Dame, que foi reconstruída em 1500, são uniformes; Jean GOUJON concluiu a fonte dos · Inocentes para a entrada «triunfal» de HENRIQUE 11 (1549); Pierre LESCOT trabalhou no LOUVRE de 1546 a 1571: e CATARINA DE MÊDICIS confiou, em 1563, a Philibert DE L'ORME a construção das Tulherias. A Ponte-Nova ficaria pronta em 1604. Cidade caótica mas capital centralizadora (v. I, pp. 269, 273-275), onde aumentava de importância a nobreza. Paris era no século ·XVI, importante locai de actividade intelectual, · apesar do
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declínio da UNIVERSIDADE (v. 11. pp. 68-70). LEF.EVRE D'ÉTAPLES deu ali a conhecer o HUMANISMO. FRANCISCO I, a conselho de Guillaume BUDÉ, fundou o colégio dos Leitores Reais. RAMUS ali atacou Aristóteles. A «brigada poétique», transformada em «Pléiade», formou-se em volta de Dorat e RONSARD. Surgiram os primeiros salões (v. 11, p. 89). (V. I, pp. 73, 199-200.) (Bibl.: Paris, croissance d'une capital c (colóquio), Paris, 1961.) PASTORIL (género) Conheceu extraordinário êxito na época do Renascimento. Correspendia a uma necessidade de evasão (v. II. pp. 16-18), ao recrudescimento do gosto pelo romanesco, à moda da mitologia (já que, nas peças ou romances, é, muitas vezes, mitológico) e ao refinamento de uma sociedade que ia deslizando para o preciosismo. PAULO III Alessandro Farnese, nascido em 1468. Foi papa de 15~4 a 1549 (v. I, p. 129; v. II, p. 121). PAULO IV Gian Pietro Caraffa, nascido em 1476. Foi papa de 1555 a 1559 (v. I. p. 40).
em Itália e na Flandres, pelos VAN EYCK e por MASACCIO. Mas, durante o Quattrocento, os artistas e matemáticos italianos (PIERO DELLA FRANCESCA, Paolo UCCELLO, Luca PACIOLI) intensificaram as pesquisas neste campo. Assim se pôde chegar, no século XVI, aos escorços de MANTEGNA e às proezas dos MANEIRISTAS e, tempos depois, da arte barroca (v. I, p. 116). Mas a perspectiva não é unicamente linear: também pode ser «aérea»; e foi LEONARDO DA VINCI quem soube, melhor que nenhum outro, dar o esbatimento das cores - o sfumato. PERUGINO Pietro Vannucci, dito o Perugino. Nasceu perto de Perugia por volta de 1445 e morreu em 1523. Foi aluno de VEROCCHIO e mestre de PINTURICCHIO e de RAFAEL. Pintor de muita facilidade, da qual por vezes abusou, encarna bem uma das tendências do Renascimento: a aspiração à clareza, à harmonia e à simetria, que Rafael havia depois de exprimir de modo genial. Os melhores testemunhos da arte «bem temperada» do Perugino estão na Capela Sistina (Entrega das Chaves a S. Pedro), no museu de Caen (Casamento da Virgem), no Collegio dei Cambio de Perugia e no Louvre (Combate entre o Amor e a Castidade). (V. II, p. 89.)
PERSPECTIVA PERUZZI, Baldassare
O Renascimento ia ao encontro do mundo exterior e daí o interesse que teve pela PAISAGEM, pelos rostos, pela representação de casas e de vestuários. Ao mesmo tempo, procurou situar com maior exactidão os seres e as coisas em relação à vista do espectador e uns em relação aos outros. Nos princípios do século XV, foram feitos estudos sobre a perspectiva, conjuntamente
Nascido em Siena em 1481, foi pintor e arquitecto. Foi em 1504 para ROMA, onde morreu em 1536. A Farnesina, o primeiro palácio suburbano da Roma · moderna, construído para o mercador-banqueiro Agostino CHIGI (v. II, p. 54) e que depois passou para a família FARNESE, é a sua obra ·mais célebre.
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PESTE
gar: o toscano (v. I, p. 47). Os sonetos (v. I, p. 117) - a sua par" te essencial- glosam o amor de Petrarca por Laura de Noves, que ele encontrou em 1327 na Igreja de Santa Clara de Avinhão. Mais que os episódios reais de uma aventura amorosa, o que estes poemas reflectem é aquilo a que o romantismo chamaria mais tarde «estados de alma». Mais uma egéria que uma amante, Laura é para Petrarca a mensageira dos pensamentos e sentimentos dele próprio: é ela que faz comunicar o amante e o amor, o poeta e a poesia, a natureza e o mundo interior, com todas as vicissitudes - êxitos, fracassos, aproximações, traições, etc. - que éxistem no amor pela inteligência ou pela arte como no amor por uma mulher. Daí essa poesia toda de gradações, de variações, ora espontânea ora sábia, ora inspirada ora amaneirada, mas sempre complexa e subtil, cujas riquezas e virtuosidades fascinaram, em Itália e no estrangeiro, tantos poetas - de BEMBO a SCEVE e a RONSARD. (Bibl.: H. Cochin, François Pétrarque, Paris, 1962.) (V. I, p. 89.)
A Peste Negra, vinda do Oriente, llevastou a Europa nos meados do século XIV (v. I, p. 77). Subsistiu depois no estado endémico, mostrando bruscas e violentas acometidas que afectavam, especialmente, as cidades (v. I, pp. 255-256, 278). A MEDICINA estava praticamente desarmada perante este flagelo. O único remédio era o isolamento - de uma pessoa, de um quarteirão de casas ou de toda uma cidade. (V. I, mapa 16.) PETRARCA, Francesco Francesco Petrarca nasceu em Arezzo em 1304 e morreu em Arqua (perto de Pádua) em 1374. É o mais conhecido de todos os promotores do movimento. humanista. Tendo seu pai sido exilado de Florença, Francesco passou uma parte da vida a viajar no estrangeiro; encontramo-lo, sucessivamente, em Arezzo, em Pisa, em Montpellier, em Bolonha e, principalmente, na Provença (Avinhão). Depois de sólidos estudos, feitos, à moda do tempo, em diversas UNIVERSIDADES, frequentou os meios mundanos e cultos de Avinhão e de Roma. Em 1341 foi consagrado como poeta no Capitólio. Esta distinção dirigia-se, principalmente, ao humanista, ao poeta épico, imitador de Virgílio, e ao epistológrafo elegante, aluno de Cícero. Era grande leitor e reunira na sua biblioteca muitos manuscritos antigos, que mandara copiar ou copiara ele próprio (v. I, p. 95). Foi ele que mais contribuiu para a criação das noções -se não, mesmo, das palavras - de Idade Média e RENASCIMENTO (v. I, p. 85). Mas não é o escritor de língua latina, admirado pelos seus contemporâneos, que hoje mais conta para nós: é o poeta -muito mais pessoal e: original- do Canzoniere, das Rime e dos Trionji, recolhas de poemas escritos em língua vul-
PICO DE MIRANDOLA Giovanni Pico della Mirandola nasceu em 1463 e morreu em Florença em 1494. Aquele a quem chamaram «príncipe dos eruditos» (v. II, p. 85) era filho do soberano do pequeno principado de Mirandola, na Itália do Norte. O israelita Elia di Medigo ensinou-lhe, na Universidade de Pádua, hebraico, árabe e caldaico e iniciou-o na tradição esotérica judaica (v. I, pp. 97, 113). Viveu em PARIS no Inverno de 1482-1483 e esteve em 1484 em FLORENÇA, onde conheceu FICINO, que o encaminhou para o estudo de Plotino, dos LIVROS HERMÉTICOS e dos escritos de Dionísio Areopagita. Em 1486, Pico encontrou em Perugia Flávio Mitrídates, outro especialista da CABALA. Nesse mesmo ano, de·
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clarou na Universidade de Roma que a Cabala é um fragmento da Revelação, negou o inferno como punição do pecado mortal e condenou o culto das imagens. Declarado herético, refugiou-se em Fran; ça e instalou-se depois em Florença, pátria do neoplatonismo. Estimulado por Ficino e protegido por LOURENÇO, O MAGNíFICO, concluiu em 1489 a sua principal obra, o Heptaplus («livro séptuplo, exposição dos sete aspectos da criaçãm>). Acabou em 1491 o De ente et uno, onde retomou e desenvolveu a interpretação da Bíblia feita pelos adeptos da Cabala (v. II pp. 107-108). Tocado pela pregação de SAVONAROLA , Pico passou à renúncia e ao ascetismo, em que viveu os últimos tempos de vida, (v. I, p. 112), e morreu, sem dúvida envenenado por um servo, a 17 de Novembro de 1494 - no dia em que CARLOS VIII entrou em Florença. (V. li, pp. 57-59, 115, 132.) (Bibl.: P. M. Cordier, Pie de la Mirando/e ou la p 1!4 S pure figure de l'humanisme chrétien, Paris, 1962). PIERO DELLA FRANCESCA O maior pintor do Quattrocento esteve esquecido desde o século XVI e só recentemente foi redescoberto. Nasceu por volta de 1410 em Borgo San Sepolcro, onde morreu em 1492. Trabalhou em URBINO (v. I, p. 93; v. II, p. 43), FERRARA, Rimini, Arezzo e ROMA. «Moldado pelo estudo metódico e tenaz de todaSJ as ciências exactas aue então eram conhecidas» (É. Faure), foi amigo de ALBER TI, cujo ideal MA TEMÁTICO e racional compartilhou com ele, e escreveu, já no fim da vida, um tratado de PERSPECTIVA (v. I, p. 156) e um Tratado de Aritmética e de Geometria (v. I, p. 158; v. II, p. 142). É com ele que. pela primeira vez, uma linguagem puramente sensual - a linguagem
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das formas e das cores- traduz um pensamento puramente intelectual. ((A fusão do elemento vivo, que a nossa sensibilidade nos revela, com o elemento matemático, ao qual a nossa inteligência nos conduz, realizava-se, assim, na sua obra, que constitui a mais forte expressão da insistência com que os Italianos procuraram obter a concordância da ciência com a arte ... Foi Piero quem conquistou definitivamente o espaço para a .pintura, o espaço geométrico e não o espaço material ... A extensão passou a ser, a título igual ao da expressão moral dos gestos e dos rostos ... um dos actores da tragédia ... » (É. Faure). Para André Malraux, «Piero é o prónrio símbolo da sensibilidade moderna, que quer que a expressão do pintor provenha da sua pintura». Entre as suas principais obras, pode-se citar a Flagelação de Cristo (Urbino), a Ressurreição de Cristo (Borgo), a Natividade (Londres), o Triunfo dos Duques de Urbino (Florença) e, em especial, a História da Invenção da Vera Cruz, que se encontra em Arezzo, «esses frescos que parecem uma assembleia de gigantes que desceram até aos homens para lhes dar um exemplo de decisão, de força, de dignidade nas atitudes, de grandeza nos sentimentos... Esses crâ· nios redondos, essas faces calmas esses pescoços, esses braços que parecem colunas, esses onibros cheios, o majestoso do ajoelhar, os movimentos lentos e soberbos dessas figuras tranquilas até na guerra, pois levam consigo e em si a segurança, parecem ter sido determinados pelo cálculo e traçados . pela geometria. E, apesar disso, emana deles uma vida ex traordinária e sobrenatural». «F aí que se encontra aquela admirável síntese da perspectiva e da luz, do volume e da cor, das vibra ções imperceptíveis em que pa·. pita o tempo e a solene, eterna e clássica extratemporali dade que Piero alcançou reduzindo o dualismo da figura e do espaço, da at-
lllosfera e da personagem, a uma maravilhosa e clara unidade que pode a muitos parecer apenas n.:sultado de uma contemplação l'ria e desprendida mas significa u si lêncio de uma intensa e arrebatada estupefacção do criador, .:onsciente do sentido huma no e universal da sua criação» (Virgílio \ lilardoni). (V. I, p. 116.) I'INTURA Nunca houve tantos pintores notá\ eis como nos séculos XV e XVI, 1.: o Renascimento foi uma extraordinária promoção , entre outras coisas, da pintura na parte mais evoluída da Europa (v. I, pp. 86-87). As etiquetas não conseguem dar conta da variedade das escolas nem do prodigioso fervilhar dos talentos. A técnica melhorou com a utilização do óleo (v. L p. 92), a busca da PERSPECTIVA (v. I, pp. 116-117), os efeitos de luz (v. I, pp. 94-95). Surgiu a pintura de cavalete .e, ao mesmo tempo, as gigantescas composições, como as da Capela Sistina e do palácio dos Doges. A pintura europeia, em primeiro lugar, ganhou em verdade: daí o particular encanto dos minuciosos quadros flamengos do século XV e o desenvolvimento da arte do RETRATO (v. I, p. 93). Mas, tendo passado bem depressa a interessar·-se pelo nu, soube também arrancar aos casos particulares uma beleza ideal - com LEONARDO DA VINCI, RAFAEL, DÜRER (v. I, p. 109). Insatisfeita, sempre em busca de progresso e de inédito, a pintura foi, depois, estranha com o MANEIRISMO, hiperbólica e sobre-humana com MIGUEL ÂNGELO, criador do barroco, espantosamente luminosa com os Venezianos, despojada e dura com CARAV AGGIO (v. I, pp. 117-118). A pintura é o mais firme testemunho do Ocidente no tempo do Renascimento. (V. II, pp. 16 e seg., 100-101. 113 e seg.)
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PINTURICCHI O Bernardino di Betto, dito o Pinturicchio, nasceu em Perugia cerca de 1454 e morreu em Siena em 1513. Foi o colaborador do Perugino e trabalhou em Roma (Capela Sistina, aposentos dos Borgia no Vaticano) (v. II, p. 54), em Pcrugia e em Siena (Libreria Piccolomini). Este pintor precioso «prolongará até ao século XVI o gosto por uma arte faustosa, dourada, pitoresca» (A. Chastel). (V. 1, p. 93.) PIO li !Enea Silvio Piccolomini, nascido em 1405. Humanista e papa de 1458 a 1464. (V. I, p. 49; v. IL pp. 9, 70.) PIO IV Giovanni Angelo de'MEDICI, nascido em 1499. Foi papa de 1559 a 1565. (V. I, pp. 130, 138.) PIO V (S.) Antonio Ghislieri, nascido em 1504. Foi papa de 1566 a 1572. (V. I, pp. 213, 286.) PITAGORISMO Para o Renascimento, a mensagem pitagórica fazia parte da vasta tradição esotérica que foi uma sua paixão (v. II, p. 126). A fórmula «tudo é número» vem de Pitágoras e foi repetida por Nicolau de CUSA, por LEONARDO, etc. O pitagorismo, portanto, orientou a civilização ocidental dos séculos XV e XVI para a MATEMÁTICA , para a MúSICA, para uma ARQUITECTURA mais musical - a de ALBER TI e de BRAMANTE. Também incitou COPÉRNICO a abandonar o geocentrismo de Ptolomeu. (V. II, p. 136.)
PIZARRO Família de conquistadores espanhóis. O mais conhecido é Francisco, fundador de Lima, que nas- . ceu em Trujillo, perto de Cácercs, por volta de 1474. Bastardo iletrado de Gonzalo Pizarro, participou com BALBOA nas difíceis campanhas do golfo de Darien, interessando-se depois pelo misterioso império dos INCAS. Partindo do Panamá, dirigiu-se para ali em 1524 e 1526 em duas expedições falhadas. Estimulado por CARLOS V (v. I, pp. 62-63), volta ao Peru em fins de 1530. Ali se lhe foi juntar seu filho Hernando (v. I, mapa 11). A vitória de Cajamarca (1532) e a captura de Atahualpa provocam o desmoronar do domínio inca. Mas surgem dissenções entre os vencedores. Almagro é vencido, preso e executado em 1537 por Pizarro, que, por sua vez, é assassinado em Lima em 1541. Gonzalo Pizarro, meio-irmão de Francisco e governador de Quito, levou a expedição além dos Andes; e Orellana levou-a ainda até à foz do Amazonas (v. I, p. 63). Gonzalo Pizarro vingou a morte do irmão, conquistou Lima e foi por algum tempo senhor do Peru, mas depois foi executado como rebelde (1548). PLATÃO Novamente descoberto na época do Renascimento (v. I, p. 96), marcou profundamente a civilização ocidental. Inspirou a filosofia de Marsilio FICINO, especialmente a sua Theologia platonica (v. 11, pp. 53, 74, 106, 111). Modificou a linguagem do amor (v. 11, pp. 92-93), contribuiu para a renovação das UTOPIAS (v. I, p. 264; v. 11, p. 30 e gravura 71), para o surto do URBANISMO (v. I, p. 263), para a moda das igrejas em forma de cruz grega e com cúpula (v. I, p. 104 e gravura 36) e para uma ARQUITECTURA inteiramente
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governada pela razão matemática (v. I, gravura 19). A filosofia neoplatónica dá-nos a chave de numerosos quadros (v. 11, pp. 113-115). Contraposto a ARISTóTELES e aos «paduanos» por Ficino, RAMUS, etc., Platão ajudou o Renascimento a libertar-se da Idade Média. Mas é evidente que o Platão dos séculos XV e XVI nem sempre é o autêntico. Reformulado através de Plotino e de Santo Agostinho, foi integrado em toda uma corrente esotérica que inclui Zoroastro, os LIVROS HERMÉTICOS e a CABALA (v. II, pp. 57, 103). (Bibl.: P. O. Kristeller, Studies in in Renaissance thought and letters, Roma, 1956).
tos- o caso da custódia de Medi na de Rioseco, obra de Antonio de Arfe. POLIZIANO, Angelo Nasceu em Montepulciano, perto de Siena, em 1454 e morreu em Florença em 1494. Poeta (v. I, p. 112; v. Il, p. 17) e humanista, aluno de Marsilio FICINO, foi, em Florença, preceptor dos filhos de LOURENÇO, O MAGNíFICO. Compôs muitos poemas, tanto em grego e latim como em toscano, como La Giostra e a Favola di Orfeo, em que Monteverdi se inspirou. POMPONAZZI, Pietro
PLATERESCO (estilo) Foi a primeira manifestação do Renascimento em Espanha (v. I, p. 108). Próximo ainda do estilo gótico no reinado de Isabel, só se libertou totalmente dele sob CARLOS V. Caracteriza-se pela riqueza e exuberância dos pormenores, que não deixam nenhuma superfície sem decoração, e pelo seu fraco relevo, que lembra os cinzelados, tão frequentes na ourivesaria: e daí o nome (em castelhano, platero significa ourives). Enrique Egas é um dos mais característicos arquitectos deste estilo. Deve-se-lhe o Hospital Real de Compostela, a Capela Real de Granada e, provavelmente, também o Hospital de Santa Cruz de Toledo e a fachada da Universidade de Salamanca. A arte plateresca assemelha-se muito ao estilo francês de origem lombarda que esteve na moda no tempo de FRANCISCO I. E as obras executadas em Espanha no século XVI por franceses como Étienne Obray ou Jean de Talavera não diferem em nada das obras platerescas dos Espanhóis. Na ourivesaria, a arte plateresca deixou, nos tesouros das catedrais, peças que, por vezes, constituem verdadeiros monumen-
Nasceu em Mântua em 1462 e morreu em Bolonha em 1525. Foi filósofo e professor, tendo ensinado, designadamente, em Pádua, onde foi o mais notável representante da escola neo-aristotélica dita «paduana» (v. II, pp. 102-103). Foi mais influenciado por Alexandre de Afrodísias que por Averróis. Pomponazzi, com a doutrina da «dupla verdade», conciliava a doutrina materialista com a adesão aos dogmas católicos. Seria prudência ou sinceridade? Foi protegido por BEMBO, mas o seu Tractatus de immortalitate animO! (1516) foi condenado por Roma. Nas suas outras obras, De fato e De incantationibus, publicadas postumamente, Pomponazzi sustentou que a moral é possível sem o receio do inferno, criticou os milagres combateu a oração de pedido. Exerceu profunda influência sobre CARDANO e DOLET. (Bibl.: P. O. Kristeller, «Pietro Pomponazzi», in Revue internationale de philosophie, Paris, 1951).
e
POSTEL, Guillaume
que chegou a ser jesuítá e conheceu as prisões da Inquisição (v. II, p. 35). Foi também o melhor orientalista francês do século XVI, que ensinou grego, árabe e hebraico no Colégio dos Leitores Reais. A sua principal obra, De orbis ferrO! concordia (1544) diz muito sobre o espírito pacífico e irénico deste UTOPISTA cristão que não podia ser compreendido no tempo das guerras religiosas (v. II, p. 15). (Bibl. : W. J. Bouwsna, «Concordia mundi»: the career and thought of Guillaume Pastel, Cambridge (Mass.), 1957). PRAGMÃ TICA SANÇÃO Foi promulgada por CARLOS VII depois de uma assembleia do clero de França realizada em Bourges em 1438. Ratificando as princi~ pais decisões do CONCíLIO de Basileia (v. I, p. 124), a Pragmática Sanção restabeleceu no reino a eleição de bispos e abades, contestou o princípio da anuidade e limitou as chamadas a Roma e a prática das excomunhões. Na realidade, a recomendação da autoridade laica passava a ser preponderante para efeitos de concessão dos maiores benefícios eclesiásticos - podendo essa autoridade ser o soberano ou algum dos grandes senhores feudais. Abolida por LUíS XI em 1461 a pedido de Roma, restaurada de facto em 1463, substituída pela concordata de Tours de 1472, novamente posta em vigor em 1484, a Pragmática Sanção sobreviveu até à concordata de 1516, que, porém, confirmou o seu espírito galicano e pôs a Igreja de França, mais que nunca, sob a autoridade do rei (v. I, p. 141). PREDESTINAÇÃO A doutrina da predestinação decorre logicamente da doutrina da JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ (v. li, p. 59). Se os méritos do homem não
Nasceu em 1510 e faleceu em 1581. Foi um visionário, um padre
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contam para a obra da salvação, se há «servo-arbítrio», só Deus decide quem vai salvar e quem não vai salvar. Por isso a predestinação foi afirmada com tanta força por LU- . TERO como por CALVINO. Mas, no caso do pecado original, Deus simplesmente tolerou a falta de Adão? Ou não a terá desejado? No início da carreira, Calvino parece ter-~e inclinado para a primeira hipótese. No seu tratado da predestinação, porém, em 1552, orientou-se resolutamente para a segunda: «Os fiéis compreenderão bem estas duas coisas juntas: por um lado, ao tropeçar e cair voluntariamente, (Adão) causou a sua ruína; e, também, que isso tinha sido assim determinado pela admirável vontade de Deus, para que a voluntária ruína de Adão fosse motivo de humildade para toda a sua raça». PRESTE JOÃO Figura mítica, um Cresus que teria alma de apóstolo e cujo lendário reino foi primeiramente situado . na Ásia e depois em África (v. I, pp. 51, 54; v. li, p. 11). Confundiram-no, por fim, com o Négus da Abissínia.
livros à fogueira e criara na Alemanha uma censura eclesiástica para todos os livros a im.p rimir de futuro . Esse édito, não levado à prática, foi novamente promulgado pela dieta de Speyer em 1529 (v. I, p. 126). Seis príncipes e catorze cidades se juntaram então, a 19 de Abril, para protestar solenemente contra essa decisão. Logo foram chamados «protestantes». Mas há quem proponha outra etimologia para esta palavra: «protestanteS)) viria do latim pro testari, ou seja, «testemunhar a favor de)).
Q QUíMICA As mais das vezes, foi uma alquimia, destinada a transmutar em ouro os metais vis. Baseada na velha teoria dos quatro elementos, ou na dos cinco «princípioS)) de PARACELSO, continuava a ser qualitativa. Mas Paracelso acentuou a função da experiência e utilizou medicamentos em cuja compos1çao entravam metais e compostos minerais (v. li, p. 137).
PRIMATíCIO
R
Francesco Primaticcio . nasceu em Bolonha em 1505. Foi escultor, arquitecto e pintor MANEIRISTA, aluno de Júlio Romano. Foi chamado a França por FRANCISCO I em 1531 para dar o seu contributo à decoração dos palácios de FONTAINEBLEAU (v. I, p. 119) e de Chambord. Morreu em Paris em 1570.
RABELAIS, François Rabelais era originário da regiao de Chinon. Seu pai, licenciado em direito e advogado, tinha ali diversas propriedades, uma delas mesmo em Chinon e outra na vizinha aldeia de La Deviniêre, onde François, seu último filho, parece ter nascido em 1494. São bem conhecidos os episódios da vida de Rabelais; o seu gosto pelo estudo orientou-o para o estado religioso. Monge franciscano, e depois beneditino, apaixonou-se pelo grego,
PROTESTANTES O édito de Worms (1521) tinha banido do Império LUTERO e os seus discípulos, condenara os seus
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era ainda uma língua pouco praticada. Deixou o convento pela universidade e esteve sucessivalllcnte em Paris, Toulouse, Bordéus e Montpellier. Aí contraiu nova paixão, desta vez pela MEDI< 'INA, que era, nesse tempo, uma questão mais de erudição que de ciência e experiência. A medicina, ·m que dentro de pouco tempo se distinguiu (v. II, p. 134), levou-o a I .yo n, que era então o mais importante centro comercial, intelectual t~ diplomático de França a seguir a l'aris. Nomeado médico do HôtelDieu, ali publicou alguns tratados de muita sabedoria; depois, impressionado com as tiragens de obras populares, vendidas na feira de Outono, entregou ao editor Nourry um Pantagruel em 1532: tinha-se inspirado nas Grandes et inestimables chroniques du grand et énorme géant Gargantua, recentemente surgidas, que eram o «best-sellen) do género. A medicina pô•·lo também em contacto com importantes personalidades encarregadas de missões oficiais em Itália: o cardeal Du Bellay e o seu irmão Langey. Daí as suas muitas estadias em Roma. Como as aventuras de Pantagruel tivessem tido um muito vivo êxito, Rabelais juntou-lhes as de Gargantua, seguidas de um Tiers livre e, mais tarde, de um Quart livre, com outras aventuras. O quinto livro, que já não conseguiu terminar, foi publicado depois da sua morte. Estas obras, porém, embora apresentadas pelo autor como puro divertimento destinado a «distrair os seus doenteS)), foram consideradas como libertinas e perigosas. A Sorbonne condenou-as e Rabelais, que largara o hábito monacal para euvergar os trajes seculares, foi acusado de apostasia e suspeito de ateísmo. Os seus protectores fizeram grandes esforços para o livrar de um processo, mas parece que lhe foi bastante difícil escapar à perseguição. Os seus últimos anos ·· ainda hoje não estão bem esclarecidos e a data da sua q uc
morte é incerta (m.as, sem dúvida, à volta de 1553). Rabelais foi buscar às recordações de infância, e das viagens que fez, uma parte das narrativas a que, na sua epopeia cômica, deu dimensões à escala das dos seus protagonistas, irmãos dos gigantes e dos santos do folclore. O corriqueiro eleva-se à altura do mito, mas esse mito é, mi. realidade, uma colossal e enciclopédica tentativa de desmistificação. Literatura militante sob a capa da bonomia e da vulgaridade, por vezes maquiavélica, tem por objectivo cobrir de ridículo a sociedade e o mundo anteriores ao Renascimento: a sociedade e o mundo dos fins da Idade Média (v. I, p. 87). Ao passo que um Thomas MORE antecedia a sua Utopia de uma indignada crítica aos costumes do tempo, Rabelais usava outra arma, a paródia. Aproximar-se-ão mais um do outro estes dois autores no campo da UTOPIA? Já muito se falou naquilo que Rabelais teria ido beber no humanista inglês (v. li, p. 25); mas a utopia, no francês, parece, paradoxalmente, menos raciocinada e mais calorosa. Também aí é sensível o contributo autobiográfico: Pantagruel e os seus companheiros são, simplesmente, gigantescas cópias de Rabelais e dos seus amigos. Se o utopismo de More parece mais disciplinado e como que fechado, o de Rabelais é injustamente julgado anárquico. O «enciclopedismQ)> de Rabelais, cujo sentido alegórico foi durante muito tempo ignorado, deve ser interpretado, ao invés, como uma maneira de descrição do mundo aberto do Renascimento (v. II, p. 21). Esse campo ilimitado que então se oferecia -ou parecia oferecer-se - à actividade do homem .é aqui simplesmente o testemunho da liberdade reconquistada. Mas Rabelais não renuncia a conciliar a liberdade com a comunidade (v. II, pp. 25, 30 e gravura 70). Nesta perspectiva, a fé na amizade, tão característica do Renascimento (Gargantua, ao escrever ao filho,
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assina «teu pai c amigo»), é talvez o que de mais profundo e emocionante existe no humanismo de Rabelais. RAFAEL Raffaello Sanzio, dito Rafael, nasceu em URBINO em 1483 e morreu em Roma em 1520. Foi discípulo do PERUGINO mas sofreu, durante a sua carreira, a influência de LEONARDO (sfumato da Madona do Grão-Duque), de MIGUEL ÂNGELO (nus do Incêndio do Borgo) e da pintura veneziana (Missa de Bolsena). Chamado a ROMA por JúLIO 11, decorou as câmaras da residência pontificai (stanze). Em 1514 sucedeu a BRAMANTE como arquitecto-chefe de S. PEDRO e do VATICANO e concluiu as logge, que decorou com «grotescos>> imitados dos que tinham sido recentemente descobertos sob o Esquilino (v. I, p. 104). Solicitado de toda a parte, auxiliado por alunos cada vez mais numerosos, Rafael deixou uma obra considerável. As suas madonas (v. Il, p. 62) e os seus retratos parecem hoje mais atraentes que as grandes composições. Também trabalhou na Farnesina (v. 11, p. 54), concebeu a villa Madame e fez plantas de igrejas em cruz grega (Sant'Eiigio degli Orefici, a capela Chigi em Santa Maria dei Popolo, etc.). Rafael, que mesmo em vida teve imensa glória (v. I, p. 101; v. 11, pp. 42-43), representa no Renascimento a tendência clássica, que acentuava a composiçã,o, o equilíbrio, a serenidade e a distribuição harmoniosa das cores (v. I, pp. 116, 117). Foi um apolíneo. Amigo de HUMANISTAS (CASTIGLIONE, Bibbiena), exprimiu em muitas das suas obras o optimismo filosófico do seu tempo, especialmente na Escola de A te nas, e também a certeza de que a mensagem pagã e a mensagem cristã concordam e se completam. (Bibl. : F. Bérence, Raphael, Paris, 1962).
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RALEIGH, Sir Walter Nascido em 1552, foi uma figura característica do Renascimento inglês. Foi navegador e explorador e participou em muitas expedições ao Novo Mundo, tendo fundado em 1585, na ilha Roanoke, uma colónia a que deu o nome de «Virgínia». Depois disso, foi procurar o ELDORADO (v. I, p. 66) entre o Orenoco e a Guiana. Como escritor, foi autor, espirituoso, de poesias, de narrativas de viagem e de uma História do Mundo que não pôde concluir. Favorito de Isabel I, caiu em desgraça no reinado de JAIME I depois dos fracassos sofridos na Guiana, tendo sido executado em Londres em 1618. RAMUS Pierre de La Ramée, dito Petrus Ramus. Nasceu em Cuts em 1512. Foi matemático e humanista, feroz adversário de ARISTóTELES (v. Il, p. 129). Os seus livros Dia/ectic~.e partitiones e A ristotelicce animadversiones (1543) foram condenados pela Sorbonne. Apesar disso obteve em 1551 uma cátedra no Colégio dos Leitores Reais, onde foi o primeiro professor de MA TEMÁTICA. Convertido ao protestantismo, foi morto na noite de S. Bartolomeu (1572). REFORMA Ver CALVINO, JUSTIFICAÇÃO PELA FÉ, LUTERO, PREDESTINAÇÃO, PROTESTANTES e V. I, pp. 121 a 147. REGIOMONT ANUS Johann Müller, dito Regiomontanus, nasceu em 1436 em Kõnigsberga, tendo estudado primeiramente em Leipzig e depois em Viena. Acompanhou a Itália o car-
deal Bessarion para se aperfeiçoar na língua grega. Foi ali que escreveu a sua obra sobre trigonometria plana e esférica, De triangulis omnimodis libri V, peça de primeira plana pelo seu valor intrínseco e pela influência que exerceu e que só em 1533 foi impressa (em NUREMBERGA) (v. 11, p. 134) Regiomontanus instalou-se em Nuremberga em 1471. Chamado por SISTO IV, foi nomeado bispo de Ratisbona em 1475, tendo falecido no ano seguinte.
transição da Idade Média para os tempos modernos. Alargada às dimensões de uma história total, a noção de «Renascimento» perde interesse e veracidade. Mais vale falar de «promoção do Ocidente» (v. I, pp. 19-20) para se caracterizar o período histórico (1320-1620) durante o qual a civilização da Europa ultrapassou em muito o nível que fora atingido pela da Antiguidade e pelas outras civilizações paralelas. RENDAS
RELOJOARIA A relojoaria mecânica, só possível depois da invenção do escape, foi uma importante inovação da primeira metade do século XIV (v. I, pp. 152, 175 e gravura 43). Nos fins do século XV, o motor de mola permitiu a construção de relógios portáteis (v. I, p. 175). (V. I , p. 160.) RENASCIMENTO
Rinascità: a palavra é de VASARI. Mas os HUMANISTAS italianos falaram, a partir do início do século XV, de ressurreição das letras e das artes por meio do contacto novo com a Antiguidade (v. I, pp. 85-86). Na realidade, esse contacto nunca fora interrompido (v. I, p. 87). No século XIX, Burckhardt e Michelet deram à palavra «Renascimento» uma acepção muito mais larga que a dos humanistas. Para eles, significava a ruptura com o espírito religioso e retrógrado da Idade Média, a vitória da razão e da natureza, a reabilitação do espírito pagão e, ao mesmo tempo, a «descoberta do homem e do mundo». Esta maneira de ver as coisas, demasiado rígida e parcial, já hoje não é aceite. Ao contrário dela, este livro procura encarar a história na sua continuidade e mostrar a lenta
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No sentido lato, renda é o direito de receber todos os anos um crédito a que no Antigo Regime francês se chamava «arrérage». Distinguiam-se as «rendas de foro hereditário», enfiteuses a que depois se chamou «rendas fundiárias», e as «rendas constituídas». As primeiras consistiam em um proprietário alienar um imóvel reservando-se o direito de receber certa verba anual. Não abandonava todos os seus direitos de propriedade e a operação, por isso, não dava lugar ao pagamento das sisas senhoriais de alódios e vendas. Era a alienação da posse útil do imóvel. As rendas constituídas (v. I, p. 212), ou «rendas a preço de dinheiro», consistiam em o proprietário alienar, contra certa quantia em dinheiro, as receitas de um imóvel. A princípio, pelo menos em teoria, estavam sujeitas às sisas de alódios e vendas, visto que o credor passava a ser co-proprietário com o devedor. A consideração deste facto, por um lado, e, por outro, a cláusula do resgate, que estava sempre ao alcance do devedor, permitem compreender que se não tratava, exactamente, de um EMPRÊSTIMO A JUROS. De resto, a Igreja exigia que o imóvel fosse mencionado no contrato notarial. Mas as rendas constituídas, na realidade, foram outra modalidade -especialmente fora do circuito comercial .:.._ do empréstimo a ju-
ros. A maior flexibilidade ganha pela legislação no século XVI contribuiu para esta evolução. O parlamento de Paris decidiu em 1557 que os direitos de alódios e vendas . e outros proventos senhoriais deixavam de ser aplicáveis à construção ou ao resgate das rendas. Além disso, a designação de um imóvel transformou-se em garantia por hipoteca especial. Em caso de falta de pagamento da renda e de venda forçada, o imóvel penhorado, no sistema antigo, era adjudicado com o encargo de pagamento perpétuo da dívida; no sistema novo, a venda do imóvel acarretava a remissão da hipoteca. Deste modo se criou no século XVI a «renda volante» ou «hipotecária». A taxa das rendas constituídas era de 8 a 1OOfo. Em França, a curva de cons. tuição de rendas mostra que estas sofreram a concorrência das rendas sobre a Câmara Municipal de Paris. Por outro lado, a proporção de grandes rendas aumentou em relação à das rendas pequenas. (V. I, p. 229.) (Bibl.: B. Schnapper, Les rentes au XVI' siecle: histoire d'un instrument de crédit, Paris, 1957). RETRATO A arte do retrato surge em França na segunda metade do século XIV e depois, simultaneamente, em Itália e na Flandres (v. I, pp. 9293; v. 11, p. 64). Graças à pintura de cavalete, bem depressa gerou um género autónomo, cujo extraordinário desenvolvimento, nos séculos XV e XVI, se explica, em parte, pela atenção cada vez maior que os pintores e até os escultores iam passando a prestar à realidade quotidiana e à diversidade dos rostos. ROMA Tinha, sem dúvida, apenas uns 30 000 habitantes em fins do sé-
culo XV e cerca de 100 000 em 1600 (v. I , p. 257). Em Itália, o Quattrocento foi o século de FLORENÇA; o Cinquecento foi o século de Roma, que então atraiu a si os melhores artistas da península, com excepção dos venezianos, e muitos artistas estrangeiros (v. I , p. 277). Não só peregrinos, mas também -numerosos «turistas» afluem à capital do catolicismo, que dispõe de uma organização hoteleira digna de nota (v. I, pp. 277-278). No fim do Renascimento, Roma era a mais bela e admirada cidade da Europa. Ali nasceu a arte barroca, com MIGUEL ÂNGELO, Vignola, etc. Ao findar o sé·culo XVI, o cômputo das realiza. ções urbanas de cem anos é impressionante (v. I, pp. 264-266, 268, 287). Os imigrantes instalados na cidade eram cada vez mais originários do «Estado eclesiástico», cuja capital real só então Roma foi (v. I, pp. 273, 275). No tempo de Montaigne, Roma parecia uma ilhota próspera no meio do deserto da campina romana, abandonada aos carneiros (v. I, p. 250) e até aos bandidos (v. I, p. 255). Para embelezar Roma e para poder combater Turcos e protestantes, os pontífices agravaram os impostos nos domínios temporais da Igreja. Assim, um modesto estado peninsular teve o encargo . de sustentar uma larga política artística (v. I, p. 72) e uma política religiosa mundial. Mas criou-se uma administração moderna, e os papas foram dos primeiros a utilizar em grande escala a fórmula dos empréstimos públicos (MONTI), que podiam ser subscritos por vasto público (v. I, pp. 229-230). Em definitivo: Roma, no século XVI, era uma cidade-piloto e um dos elementos motores da civilização ocidental (V. I, pp. 99-102 e gravura 67.) (Bibl.: J. Delumeau, La vie économique et sociale de Rome dans la seconde moitié du XVI' siecle, 2 vols., Paris, 1957-1959).
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RO NSARD , Pierre de Nasceu em 1524 em Couture-sur-Loire e morreu em Saint-Cosme em 1585. A vida de Ronsard não só explica a sua obra como também ilustra um aspecto interessante da civilização do Renascimento: a consideração da existência, da função e mesm·o da importância do escritor. Em Itália, o escritor como o artista, reconquistou, ~ pa rtir do século · XIV, a sua emi· nente posição social: a «coroação» de PETRARCA no Capitólio é apenas um exemplo entre cem outros. No início do século XVI, o escritor não era, as mais das vezes, se não um agente de divertimento do público: era autor de narrati vas populares e fornecedor de fei ras ou, então, cortesão. Mas a difusão do livro deu-lhe nova importância: o escritor traduzia as obras antigas e adaptava-as à língua do país ou do tempo. Ainda se não insistiu bastante no papel que esses primeiros tradutores tiveram na formação das línguas e das literaturas nacionais. Se a Pléiade ficou célebre, foi por ter conscientemente posto esse fenómeno em evidência. Ronsard, como DU BELLA Y, ambos descendentes de famílias nobres, fizeram nas letras as carreiras que, por motivos diferentes, não poderiam ter feito nas armas ou na diplomacia (Ronsard estava disso impedido por ser surdo). Mas essa carreira tomou aspectos novos em comparação com as de MAROT ou deRABELAIS. Em 1550, o escritor aspirava a ser uma personagem, a fazer das suas actividades uma ocupação nobre. Mas a corte de F RANCISCO I, apesar das aspirações do rei, não era a corte de L OURENÇO, O MAGNíFICO, ou de JúLIO li. Marot, plebeu, não se sentiu humilhado por ali desempenhar as funções .de um Scapin literário; Ronsard, antigo pajem do delfim, filho de um fun-
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cionário do rei, hesitou muito antes de aceitar as servidões de poeta da corte. Fazia da literatura uma iucia muito elevada (v. II, p. 44), conduzido e mantido nesse culto pelos seus mestres: Peletier du Mans e, principalmente, o grande humanista Dorat, que seguiu, com Baif e Du Bellay, a Paris, onde em 1547 foi chamado para dirigir o colégio de Coqueret. Tal como ERASMO, esses mestres criam na preeminência do pensamento e da arte, numa palavra, da cultura, sobre todas as outras actividades do homem: sonhavam com um rei humanista e até com um humanista rei. Mas os cortesãos interessavam-se mais pelas festas que pela glória nacional ou pelas meditações filosóficas. Saint-Gelais, o poeta oficial, achava as Odes de Ronsard obscuras, pomposas e pretensiosas. O mérito de Ronsard esteve em descobrir o que esse desprezo continha de crítica útil c aproveitável. A Itália, mais próxima dos Antigos, que ali eram antepassados, tinha por eles um culto mais familiar. PETRARCA, embora admirando PLATÃO ou Cícero, cantava os seus amores em toscano. Os amores de Ronsard iriam inspirar-lhe o melhor e mais perfeito da sua obra: Amours de Cassandra (1552), Amours de Marie (1556), Amours diversos- o soneto a Helena, etc. (v. 11, p. 47)(1578). A corte foi, enfim, conquistada. A morte de Saint-Gelais (1558) e a amizade do rei HENRIQUE li depressa fizeram de Ronsard uma figura oficial. As grandes ambições da juventude mostraram-se então de novo com os Discours, mas a própria gravidade das circunstâncias que os inspiravam permitiu a Ronsard dar mais autenticamente a medida do seu génio. Os seus êxitos, intermitentes, é verdade, mas em domínios poéticos muito variados, fazem dele o maior poeta francês do Renascimento. Criticado depois de morrer, desdenhado pela
época clássica, só vm a a ser reabilitado pe lo século XIX. É um dos mais autênticos representantes do espírito do Re nascimento, com a sua sensualidade - conciliada com uma fé sincera (v. II, p. 112) - -, com o seu pessimismo astrológico (v. II, p. 50 - equilibrado por um grande amor à vida-, com o seu entusiasmo pela literatura antiga (v. I, p. 111) - aliado ao veemente desejo de elevar ao mesmo nível a língua nacional (v. I. p. 47)- e pela pouco vulgar mistura de excessiva erudição com a frescura poética. (Bibl. : R . Lebégue, Ronsard, /'hom e er !'Cl'uvre, Paris, '1950.) RUYSBROEK, O Admirável Nasceu em 1293 no Brabante e foi recolhido aos onze anos por um cónego de Santa Gúdula de Bruxelas, onde foi ordenado padre. F undou em 1343 o Convento de Gnrenandael (Brabante), onde morreu em 1385. Prolongando a corrente MíSTICA que se espalhara nas margens do Reno com Mestre Eckhart (1260-1327), João Tauler (m. 1361) e Henrique Suso (m. 1366), escreveu em língua flamenga diversos livros: o Ornamento das Núpcias Espirituais, o Reino dos Amantes de Deus, o Tabernáculo da Alma, que só depois de publicados em latim, no século XVI, viriam a exercer uma imensa e verdadeira influência. Neles descreve «O duplo movimento no qual Deus aparece perante a alma através dos dons que lhe confere e no qual, por sua vez, a alma parte ao encontro de Deus... O cume da vida contemplativa fica alcançado quando o contemplativo se une em Deus ao seu eterno modelo, a cuja ima· gem foi criado, e contempla assim todas as coisas com uma visãc simples, na unidade da luz divina >l (E. Gilson). (V. I, p. 142.) 322
s S. PEDR O DE ROMA Nos meados do século XV, NICOLAU V, a conselho de ALBERTI, quisera já reconstruir a velha b;:~.sílic<>. vaticana, que fora erguida entre 324 e 344. Mas os trabalhos só mmeçaram em 1506, sob JúLIO li. Foram concluídos em 1626. Os principais arquitectos da basílica foram, sucessivamente, BRAMANTE (v, I, pp. 104, 114 e gravura 19), Giuliano de SAN GALLO e RAFAEL, Antonio da San Gallo, o Jovem, MIGUEL ÂNGELO, Vignola, Giacomo della Porta (que tez a cúpula [v. I, pp. 162-163]) e Maderno. Bramante, António da San Gallo e Miguel Ângelo pretendiam realizar uma planta em cruz grega; Rafael e Giuliano da San Gallo e, depois, Maderno optaram pela planta oblonga, em cruz latina. Os trabalhos, que custaram enormes quantias (v. I, pp. 135, -237), estiveram praticamente interrompidos desde a morte de LEÃO X (1521 ) até ao advento de PAULO III (1534). A superfície de S. Pedro de Bramante excedia em 9000 m' aquela que a igreja existente realmente cobre (tem 211 ,5 m de comprimento). As dimensões de S. Pedro excedem as de S. Paulo de Londres, que mede 158,11 m , de Santa Maria del Fiare, que mede 149,28 m, da Catedral de Milão, que mede 139,94 m, de S. Paulo-fora-de-portas, que mede 127,36 m, e de Santa Sofia de Istambul, que mede 109,57 m. A altura da abóbada da nave central é de 44 metros, e a cúpula ergue-se a 142 metros, de modo que facilmente caberia dentro dela a mais alta flecha da Catedral de Milão (108 metros). A superfície total coberta pela basílica é de 15 160m'. (Bibl. : P. Le Tarouilly, Le Vatican et la basilique Saint-Pierre , Paris. 1882.)
SAN GALLO
IJ?-ais espiritual que político, da c1dade. A sua pregação, q_ue comoveu BOTTICELLI e PICO DE MIRANDOLA, provocou modificações constitucionais, melhoramentos fiscais, leis contra a usura, abandono das festas profanas e organização de fogueiras de vaidade (v. I, p. 136). Mas formou-se na cidade um partido de descontentes, os arrabbiati (os· «enraivecidos»), e houve recontros cada vez mais frequentes, entre ele~ e os piagnoni (os «chorões»), que ap01avam Savonarola. Este, por outro lado, atacara ALEX ANDRE VI (v. I, pp. 125, 143). Convocado a Roma, Savonarola não compareceu e procurou obter a reunião de um CONCíLIO geral. O papa respondeu lançando uma interdição sobre Florença. Um franciscano propôs ao «profeta desarmadO>) a prova do fogo, mas Savonarola es-· cusou-se. Logo depois, a multidão assaltou o Convento San Marco:. o prior foi preso, condenado à morte, enforcado e queimado (1498). (Bibl.: R. Klein, Le proces de Savonarole, Paris, 1957.) ·
Família de arquitectos florentinos. Giu.liano (1445-1516), arquitecto apmxonado pela Antiguidade (v. I, p. 99), fez muitos desenhos arqueológicos (v. I, p. 104). Foi o autor da_ villa de LOURENÇO, O MAGNIFICO, de Poggio a Cajano e · da sacristia de San Spirito de Florença. ENGENHEIRO militar influenciado por Francesco di GIORGIO MAR TINI, fortificou o Borgo (VA TI CANO) e desenhou a planta das defesas de Ostia. Em 1514 sucedeu a BRAMANTE como arquitecto de S. PEDRO d~ Roma. Antonio, seu irmão, dito San Gallo o Antigo (1455-1535), discípulo de Bramante celebrizou-se principalmente pelos edifícios -igrejas e palácios- que e rr;ueu em Montepulciano e Monte San Savino. Era também engenhe;ro mili~a_r, tendo feito, em especial, as fort1f1cações de Civitacastellana (v. I, p. 156) e o Sant' Angelo. Antonio II q483-1546), dito o Jovem, era sobrmho deles. Fez o Palácio Farneoe .de Roma. Também trabalhou em S. Pedro a partir de 1520. Fortificou Civitavecchia (v. I, p. 189), fez a planta da cidadela de Ancona e construiu o célebre poço de Orvieto.
SC:EVE, Maurice Nasceu em Lyon em 1500 e ali morreu .em 1560. A experiência lionesa, imitada e criticada, a um tempo, por RONSARD e DU BELLA Y, contribuiu muito para que estes tomassem consciência dos problemas que, nessa altbra, eram postos pela criação literária, face à geral ignorância e à esmagadora herança antiga. Sceve é o mais ilustre representante dessa escola, na qual encontramos ainda Louise LABÉ Heroet, Pontus de Tyard, etc., ~ que, sofrendo a influência do neoplatonismo flore_ntino (FICINO), era também dornmada pela de PETRARCA. Essa dupla influência é sensível em Délie, object de plus haute vertu (1544). (V. II, p. 94.)
SAVONAROLA Girolamo Savonarola nasceu em Ferrara em 1452 e entrou por volta de 1475 para os dominicanos de Bolonha, tendo sido pregador austero e, a princípio, pouco escutado. Feito prior do Convento San Marco de Florença (1491), imediatamente se impôs ao público. Exortou FLORENÇA - nova Nínive - ao arrependimento e anunciou a vinda a Itália de um Ciro dos tempos mode~nos: CARLOS VIII (1494). DepOis da proclamação de Cristo com<;> «rei de Florença», Savonarola fOI, durante quatro anos, o guia, 323
havia seguros de vida a curto prazo. Um mercador, obrigadp a fazer uma viagem para longe, segurava-se durante o período de ausênna maior parte dos casos cia por quatro ou cinco meses. O custo de um seguro de vida, lealmente contraído por um homem de boa saúde era, em geral, de 1 '% ao mês. Mas havia muitos contratos fraudulentos, feitos no desconhecimento do segurado em benefício de detentores de direitos que não tinham escrúpulos de lhe apressar o fim. (Bibl.: J. A. Goris, Les colonies marchandes méridionales à Anvers de 1488 à 1567, Lovaina, 1925; H. Lapeyre,Une famille de marchands: les Ruiz, Paris, 1955; A. Tenenti, Naufrages, corsaires et assurances maritimes à Venise, 1592-1609, Paris, 1959.)
SEGUROS O uso do contrato de seguro (especialmente do contrato de seguro marítimo) desenvolveu-se no século XV (v. I, pp. 202-204). Em geral, os seguros marítimos não cobriam a totalidade dos riscos. As ordenações de Burgos de 1538 obrigavam os segurados a assumir 10% dos riscos; e as de Bilbau, de 1560, a assumir 25%. Não só se podia segurar as mercadorias como também o casco do navio. As ordenações de Burgos excluíam os aprestos, mas o Guidon de la mer (publicado em Rouen em 1608) admitia .q ue eles fossem também · seguros. Cidades do interior que eram também importantes praças bancárias, como Lyon e Burgos, eram, no século XVI, mercados seguradores. Em Lyon, os seguros eram feitos, principalmente, para o Mediterrâneo. Em Burgos, entre 17 de Abril de 1567 e 28 de Janeiro de 1569, foram assinadas mais de 1000 apólices de seguro; o pagamento dos prêmios vencidos de I de Outubro a 1 de Abril era feito na FEIRA de Maio de Medina dei Campo, e o pagamento dos do outro semestre era feito na feira de Outubro da mesma cidade. Os seguros marítimos davam lugar à especulação - designadamente em ANTUÉRPIA. Nesta cidade, onde, em 1564, mais de 600 pessoas - especialmente os corretores - viviam da actividade seguradora, havia queixas acerca da instabilidade das fórmulas que serviam de base à redacção das apólices. Daí a necessidade ·de ordenações como as de Burgos e de Bilbau. Os seguradores, para diminuir os riscos, agrupavam-se. Em 1543, dois navios que seguiram de França para Antuérpia estavam co" bertos por mais de 50 seguradores. Em 1531, o navio Dar Schwan, que seguiu de Lübeck para Arnemuyden, foi seguro em 1883 libras da Flandres por 42 pessoas ou COM~ANHIAS. No século XVI, espe·· c1almente em Antuérpia, também
SERLIO, Sebastiano Nasceu em Bolonha em 1475 e morreu em Fontainebleau em 1554. Foi arquitecto e escultor, tendo vivido em ROMA e em VEN EZA e depois, a pedido de FRANCISCO I, em França (a partir de 1541). Trabalhou em Fontainebleau e ergueu o Palácio de Ancy-le-Franc. O seu tratado Tutte le opere d'architettura contribuiu para espalhar fora de Itália a estética horizontal cara a Vitrúvio (v. I, pp. 109-110). SEVILHA Encontra-se a 100 quilómetros do mar. No fim do século XVI (v. I, p. 157), era a cidade mais populosa e mais cosmopolita da Esoanha. A antiga Hispalis, que sob domínio ár~be con~ecera nova prosperidade, fm conqmstada pelos Castelhanos em 1248. O seu comércio desenvol veu-se nos séculos XIV e XV graças à exportação de fruta e cereais da Andaluzia e à importação dos produtos da pesca portuguesa, das ESPECIARIAS do Oriente e dos
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panos do Norte. Os capitais dos Genoveses e Florentinos, com o seu espírito empreendedor, a descoberta da América, a instalàção em Sevilha da CASA DE LA CONTRATACI6N, o crescente número dos barcos que circulavam entre a Espanha e o Novo Mundo (v. I, pp. 243-245) e a chegada, entre 1570 e 1630, de grandes quantidades de METAIS PRECIOSOS americanos (v. I, pp. 68, 72 e gravura 13) explicam a ascensão económica do porto do Guadalquivir. O surto artístico também foi notável. A catedral foi construída a partir .do século XV; a câmara municipal e a bolsa (Lonja) são do século XVI. Esta época assistiu, também, às transformações do Alcazar e à construção de belas residências de particulares, como a Casa de Pilatos. (Bibl.: P. Chaunu, Séville et l'Atlantique (1504-1650), II vol., Paris, 1956-1961.) SFORZA A dinastia ducal dos Sforza, que reinou em MILÃO de 1450 a 1535, provinha de dois condottieri: Muzio Attendo1o (1369-1424), que foi quem primeiro teve o nome de Sforza, e seu filho Francesco (1401-1466), que foi o primeiro duque (1450) por ter casado com a filha de Filippo Maria VISCONTI (v. II, p. 39). Os condottieri serviram, sucessivamente, Milão contra FLORENÇA, Florença ou VENEZA contra Milão, Milão contra Veneza, etc. Francesco, uma vez instalado no trono, mostrou ser tão hábil na diplomada como valente na guerra; embelezou Milão e acolheu ali os sábios gregos expulsos de CONSTANTINOPLA (1453). O seu sucessor, Galeazzo Maria, seu filho mais velho (1444-1476), foi, como o pai, grande protector das artes; morreu assassinado em 1476. Sucedeu-lhe no título o filho mais velho, mas, na realidade, quem teve o poder foi o irmão,
LUDOVICO, O MOURO, Ludovico baptizado Mauro mas que nada tinha de africano faz-nos pensar no Ricardo III de SHAKESPEARE: o fratricídio, os assassínios, as intrigas, tudo lhe servia para governar; mas era um grande político, e isto apesar da sua derrota final por mãos de LUíS XII (foi aprisionado em Novara em 1500 e veio a morrer em França, no Palácio de Loches): foi também um grande mecenas (LEONARDO DA VINCI) (v. I, pp. 154, 158). A dinastia extinguiu-se com o segundo filho de Ludovico, Francesco, que foi destituído e depois reposto por CARLOS V em troca da cedência do ducado por sua morte. SHAKESPEARE, William N~sceu em 1564 e morreu em 1616. A relativa obscuridade em que ainda hoje está envolta a sua vida contrasta com o esplendor da sua , obra. Este fenómeno era ainda frequente na época do Renascimento, especialmente nos meios de TEATRO, que desde a Antiguidade estavam votados a uma espécie de ostracismo social a despeito da glória de certos autores, do entusiasmo do público e da protecção dos grandes. O teatro era, antes do mais, considerado como um divertimento, um disfarce, uma ilusória cópia da realidade. Se a gente do povo não compartilhava de tais preconceitos, os homens cultos (como, antes, os da religião) e os poderosos que governavam o mundo, por orgulho, apegavam-se-lhes. Shakespeare seria longamente atormentado pela máscara que punha como actor. Toda a sua obra seria elaborada em volta de um tema trágico: não será tudo teatro? E não terão os mais lúcidos de reconhecer, com ele, que na sua obra perscrutou todos os espelhos, que toda a acção não passa de representação, todo o rosto não é senão uma máscara, toda a realidade é ilusão? «Nós somos o tecido de que são fejtos
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os sonhos>>, concluirá Próspero e «as nossas vidas pequeninas estão encerradas num sono ... ». Da vida de Shakespeare, daquela vida que, fora da sua obra, ele levou, relativamente pouco se sabe hoje em dia. Mas há um facto exacto: nasceu a 22 de Abril de 1564 no burgo de Stratford-on-A von, de pai negociante desafogado que aspirava a ser gentil-homem. Mas, entre o nascimento de Shakespeare e o seu casamento precoce, em 1582, com uma mulher oito anos mais velha, quase nada se conhece. Parece ter recebido uma instrução muito sumári<;i, completada, porém, por vastas leituras (v. I, pp. 113, 114). Ignora-se como foi conduzido ao teatro. Por volta de 1587, foi para Londres em busca de emprego. Aí_ o encontramos, cinco anos depois, como membro de um grupo teatral protegido pelo Lord Chamberlain. Shakespeare travou então relações com grandes senhores: Southampton e Essex, que era favorito da rainha. Mau actor mas poeta subtil (a da ., em que compôs os Sonetos [v. Il, p. 101] é porém, muito incerta) revelou-s~ como hábil encenador. 'A partir de 1592, impôs-se e passou a dominar todo o teatro contemporâneo no qual, todavia, brilhavam outro~ talentos. Kyd, autor de um melodrama de êxito - a Tragédia Espanhola-, e especialmente Marlowe, o verdadeiro criador da tragédia -Eduardo l i - vão desaparecer, mas já outros brilhantes dramaturgos lhes tomam o testemunho das mãos: Ben Johnson, Dekker, Heywood, etc. A primeira grande ·tragédia de Shakespeare Ricardo III. inspirou-se em Mar~ lowe. Também compôs comédias· era preciso satisfazer todos os gos: tos, pois o público era extremamente diversificado. Os teatros onde estas peças eram representadas eram ainda simples armações de madeira que faziam lembrar as formas dos pátios das estalagens onde as companhias ambulantes
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FRANCESCA, depressa se distinguiu do mestre pelo movimento que dava às figuras. Mais que nos quadros de cavalete - que fez em grande número, as mais das vezes com assunto religioso-, foi nos cenários monumentais que mostrou a sua medida: na Capela Sistina, onde pintou o Testamento e Morte de Moisés (1481) e, principalmente, na capela San Brizio de Orvieto, a primeira capela inteiramente dedicada à evocação dos fins últimos. «0 que ele conservou de Piero não foi o largo tratamento do espaço mas sim o estilo escultórico das figuras e o sentido dramático... O corpo nu é para ele o elemento principal de uma linguagem que anuncia directamente Miguel Ângelo» (A. Chastel). Na Ressurreição dos Mortos e no Juízo Final estalam
das ruínas antigas (v. I, pp. 114, 153), foi um dos principais introtrodutores do URBANISMO em ROMA (v. I, pp. 262, 264, 268) e, também, o criador da nova organização a.dministrativa da Igreja católica e do Estado pontificai (v. I , p. 40) . (V. li, p. 118.)
davam, anteriorniente, os espectáculos primitivos. Estes teatros permanentes começaram a enxamear em Londres na época de Shakes.peare: o teatro das Chaves Cruzadas, o teatro do Cisne, o teatro da Cortina, o Globe Theatre, onde a maior parte das suas peças será representada entre 1600 e 1610, e, finalmente, a sala coberta do refeitório dos Irmãos Negros. Em 1601 deu A Noite dos Reis em Whitehall, na presença da rainha. Entre 1604 e 1605 apresentou oito peças ao. novo rei, JAIME I. O êxito enriqueceu-o e tem já um prestígio excepcional. Compra casas em Stratford e em Londres (1613), depois de obter o enobrecimento do pai. Em seguida retira-se para a terra natal, ali casa sua filha Judith (1616) e morre alguns meses depois, ao que se diz em consequência de uma bebedeira tomada na companhia de Ben Johnson. Por trás de tão mal conhecida figura, ergue-se uma obra gigantesca: uma obra que comunga de toda a vida de uma nação e de uma época. Comunga também, pela sua técnica e pela sua poesia, de todas as fontes da arte. Mas tão prodigiosa riqueza não conseguiu distrair o seu criador da solidão em que viveu. No entardecer do Renascimento, a neces~idade de absoluto, de evidência e de certeza -essas palavras que tão frequentemente se encontrarão mais tarde na pena de um Descartes e de um Pascal - ressurge a seguir aos primeiros espantos da descoberta. (Bibl.: J. Kott, Shakespeare notre cnntemporain, Paris, 1962; J. J. Mayoux. W. Shakespeare, Paris, 1966: H. Fluchêre. Shakespeare, dramaturge élisabéthain, Paris 1966.) '
Francesco della Rovere, nascido em Celle Ligure em 1414. Foi papa de 1471 a 1484. Tio de JúLIO ll esteve · implicado na conspiração dos Pazzi (v. I, pp. 125, 223). Foi ele quem mandou construir a Capela Sistina. (V. I, pp. 100, 262.)
Lelio Sozzini. Nasceu em Siena em 1525 e morreu em Zurique em 1562. Humanista que aderiu à Reforma e se refugiou na Suíça (v. li, p. 82), partiu depois para a Polônia para ali propagar as suas ideias antitrinitárias. Voltou depois para Zurique. Fausto Sozzini. Sobrinho do anterior, nascido em Siena em 1539 e falecido nos arredores de Cracóvia em 1604. Foi ele quem criou o chamado socinismo (v. II. p. 60). Forçado a abandonar a Suíça, fixou-se na Polónia, onde foi conselheiro muito escutado de uma igreja unitarista cujos membros, de espírito adogmático, eram adeptos da não-violência.
SIGNORELLI, Luca
SISTO V
SODOMA
Nascido por volta de 1450 em Cortona, onde morreu em 1523. Formado na escola de PIERO DELLA
Felice Peretti, nascido em 1520. Foi papa de 1585 a 1590. Franciscano enérgico, pouco respeitado!
Giovanni Antonio Bazzi, dito o Sodoma, nasceu em Vercelli cerca de 1477 e morreu em Siena em
SLUTER, Oaus Nasceu em Haarlem entre 1340 e 1350 e morreu em Dijon em 1405 ou 1406. Tinha-se instalado, por volta de 1383, nesta última cidade, onde trabalhou na cartuxa de Champmol (Poço de Moisés, túmulo de Filipe, o Ousado, etc.). Preocupado com o realismo, estudara os rostos dos Israelitas de Dijon para esculpir os célebres Profetas (v. I, p. 90). Embora tenha conservado profunda ligação com a arte gótica. o seu estilo poderoso prenuncia já o de MIGUEL ÂNGELO. SOCINO
SISTO IV
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1549. Orgulhava-se do apodo (v . li, p. 101). Deve-se-lhe, especialmente, os frescos do claustro de Mont.e Oliveto, perto de Siena, c as Bodas de Alexandre e Roxana da Farnesina. STEVIN, Simon Nasceu em Bruges em 1548 e morreu em 1620 na Haia. ENGENHEIRO ao serviço dos príncipes de Orange, aperfeiçoou fortificações (v. I, p. 189); mas foi também um excelente físico, que prolongou a obra de Arquimedes (v. 141) e, principalmente, MA TEM TICO notável (v. 11, p. 143), que sistematizou e simplificou a aritmética e a álgebra, introduziu as fracÇões decimais e unificou a noção . de número.
11,1.
Transoxiana c, vencendo-o, fezcse proclamar rei em 1370. Depois de destruir o reino de Khoresm (1379), atacou a Pérsia, cujos territórios passaram totalmente para o seu domínio em sete anos. · Em 1398 devastou o sultanato de Delhi e, dois anos depois, resolveu invadir o Egipto e o Império OTOMANO. Derrotou o sultão turco Bayazid I em Ankar'a em 1402 e voltou para Samarkand (v. I, p. 30). Em 1404 iniciou nova campanha, desta vez contra a China, mas morreu no ano seguinte. R. Grousset diz do império do grande conquistador muçulmano o seguinte: «É turco-persa pela cultura, turco-gengis-khânida ,pela formação jurídica, mongolo-ára be pela disciplina político-religiosa.» TEATRO
STWOSZ, Wit
O Renascimento é a idade de ouro do teatro europeu. Na Idade Média, o teatro não era mais que uma preparação para a cerimónia sacra, para o acto religioso; e, se por vezes o cómico (entremezes ou farsas) se misturava ao drama (mistérios e milagres), era porque permitia «purgar» os instintos populares, dando-lhes primeiramente livre curso extra muros. O que iria subsistir de tais origens era a ligação entre o teatro e a colectividade: tal como o teatro da Idade Média, o teatro renascente era, em conjunto, um teatro popular. Mas vai-se diferenciando dele, gradualmente, e em todos os planos, no seguimento de uma evolução iniciada no século XV: acentua-se o carácter laico, a comédia separa-se da tragédia, os actores deixam de ser amadores e passam a formar companhias de profissionais, os autores ganham importância e autonomia até então desconhecidas. Esta evolução teve, conforme os países, numerosas variantes. Em Espanha, onde as tradições medievais seriam conservadas durante muito tempo, o teatro sacro manteve-se demoradamente
Nascido por volta de 1440, foi chamado em 1477 (' Nuremberga a Cracóvia. A IgreJa de Nossa Senhora, que era a paróquia alemã desta cidade, conserva ainda a sua maior obra, um retábulo com mais de 5 metros de altura e com 7,25 m de largura, no qual trabalhou até 1486. As esculturas deste retábulo exprimem o espírito de pesquisa, a vontade de renovação e a preocupação de realismo da arte gótica do período final (v. I, p. 90). Wit Stwosz regressou a Nuremberga em 1496 e aí morreu em 1533. Bibl.: · Wit Stwosz, te retable de Cracovie, Paris, 1964.)
T TAMERLÃO Timur Lang, fundador do segundo Império Mongol, nasceu perto de Samarkand em 1336. Em 1363 revoltou-se contra o governador de
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sob a forma dos autos sacramenta/es. Em Itália, onde o folclore conservara, aqui e além, a viva recordação dos costumes antigos, a comédia ressuscitou a antiga atellana e retomou, modernizando-o, o sistema dos «tipos fixos». Aos Maccus, Pappus, Dossenus, etc. das atellane sucedem-se então os Pulcinella e Pantalone da commedia dell'arte (v. I, p. 293), aquela comédia das «gentes de ofício» ilustrada por Ruzzante. A commedia de!!' arte iria exercer longa influência sobre o teatro cómico, e o próprio Moliêre viria a colocar-se na sua escola. Em Inglaterra e em Espanha (neste segundo caso paralelamente ao teatro sacro), desenvolveu-se em teatro nacional: é que a colectividade comungava por inteiro da exaltação das recordações da história nacional ou da evocacão de uma actualidade que reveíava o novo poderio das nações. O teatro de SHAKESPEARE, que reflecte muitas outras profundezas, é assim o fiel espelho dos tempos, e mais ainda, de uma nação - e até se pode dizer que de um nacionalismo. Mais que os adros das igrejas, eram daí em diante as praças públicas, os pátios das estalagens e, mais tarde, edifícios especiais que serviam de moldura aos espectáculos; e, mais que as festas litúrgicas, eram as festas profanas, as feiras, as recepções reais, que lhes davam ocasião. O teatro renascente, laicizando-se é organizando-se no plano profissional, tomou nova importância económica: as companhias multiplicavam-se, tinham cada vez maior número de elementos, o guarda-roupa era mais variado e mais mutável, os cenários eram mais originais e mais sumptuosos; a construção e manutenção das salas, o arsenal dos adereços, a montagem de novas peças exigiam investimentos cada vez mais importantes e, quando os actores não eram «gente» de algum rei ou príncipe, tinham de encontrar «mecenas», preocupados principalmente
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com a rentabilidade. V. tb. LOPE DE VEGA, MARLOWE, SHAKESPEARE, (V. 11, p. 33.) TÊXTEIS O trabalho dos têxteis constituía, na economia de tipo antigo, a mais importante de todas as actividades industriais. O aperfeiçoamento técnico, neste sector, foi muito pequeno do século XIV até ao século XVII (v. I, pp. 172-174). Mas o algodão e a seda foram trabalhados cada vez em maiores quantidades na Europa ocidental; e, ao mesmo tempo, o cultivo e tratamento do linho e do cânhamo desenvolviam-se também. O crescimento dos negócios de tecidos é uma das características económicas deste período (v. I, p. 202). (V. I, p. 160.) TINTORETTO Jacopo Robusti, dito o Tintoretto, nasceu em Veneza em 1518 e morreu nessa mesma cidade em 1594: «só em Veneza viveu e só Veneza quis conhecer» (A Chastel). A sua produção foi imensa: retratos, telas mitológicas, quadros bíblicos (o mais célebre é a Susana no Banho, de Viena), frescos; é dominada pelo ciclo imenso da Scuola di San Rocco, no qual ele traba .. lhou de 1564 a 1587, e que representa o seu apogeu, a sua bíblia de visionário (v. I, p. 116). Efeitos de perspectiva, gestos, iluminações, tudo concorre para fazer das suas grandes composições extraordinárias peças de encenação. Com habilidade um pouco demasiado consumada, a luz incide, como se de um projector bem apontado proviesse, no mais dramático pormenor do quadro. A sua primordial preocupação parece ser a valorização dos efeitos propriamente cênicos: as personagens, de atitudes teatrais, movem-se em cenários que lembram, muitas vezes, arquitecturas
uma sene impressionante de quadros. Retratista titular dos príncipes, dos pontífices e das grandes figuras do seu tempo - CARLOS V, . PAULO III, Isabel d'Este -, deve-se-lhe igualmente grande número de obras religiosas (v. II, p. 113), que igrejas e conventos encomendavam à compita àquele que era tido como pintor oficial de Veneza (v. I, p. 118), e composições profanas ou mitológicas em que livremente se exprime uma sensualidade serena (v. I, p. 291; v. Il, p. 89): Baco e Ariana, a Vénus de Urbino, Vénus, o Amor e a Música, etc. «A sua obra trouxe a todos (os pintores)- escreve A. Malrauxum ensinamento e uma libertação. Soltava-lhes as mãos, como já a arte antiga tinha feito ao Renascimento romano». E A. Chastel: «Tudo ele dominou em Veneza, e · depois em Itália e até no Ocidente, e assim marcou para sempre o desenvolvimento da pintura». (V. I, p. 116.)
de palco. Mas o Tir.toretto não se limita a esses grandes efeitos decorativos, que estão longe da nossa actual sensibilidade pictórica. Chega, por exemplo, a fazer desse efeito luminoso uma escrita simpática que se decifra nas personagens de segundo plano, criando grupos abstractos e fantasmáticos de um espantoso modernismo - escrita que, mesmo nas figuras de primeiro plano, se transfo:rma numa poderosa maneira aureolante. Inventa então esquemas totalmente plásticos, como os turbilhões solares, as volutas de nuvens, os ritmos das asas dos anjos... Arte do espaço pelos seus diversos efeitos de perspectiva, sugere também o tempo com a acentuação das linhas de força , do movimento: a massa transforma-se em vibração. Todas as características do barroco e do expressionismo estão já em germe no Tintoretto: lá está o movimento em profundidade, que permite a materialização do terrestre por meio · do esforço ou da perspectiva, ou o movimento em volta de um eixo fictício, que faz rodar todos os elementos do quadro, que então parece elevar-se nos ares. O espectador é, antes de tudo, arrebatado pelo ímpeto e pela força que emanam desse mundo móvel e violento e pela extraordinária síntese - que ninguém tão bem conseguira antes dele- da força plástica, da cor e da luz.
TOLERÂNCIA RELIGIOSA um legado do HUMANISMO às gerações seguintes. Nicolau de CUSA, ERASMO, RABELAIS, Guillaume POSTEL e os protestantes independentes procuraram fazer compreender aos seus contemporâneos que a tolerância religiosa era parte integrante da mensagem de caridade do Evangelho (v. II, pp. 35-36). Mas não foram ouvidos. (V. li, p. 105.) (Bibl.: J. Lecler, Histoire de la tolérance au siikle de la Réforme, 2 vols., Paris, 1955). É
TICIANO Nascido em Pieve di Cadore por volta de 1485, Tiziano Vecellio morreu de peste em VENEZA em 1576. Depois de ter sido aluno de GIOVANNI BELLINI, foi aluno de GIORGIONE, com quem colaborou nos frescos do Fondaco dei tedeschi. Afirmou-se em 1513 com O Amor Sagrado e o Amor Profano (v. li, pp. 115-116), obra humanista explicável pelo · neoplatonismo então em voga. Já em plena posse do seu talento, Ticiano criou
TURA, Cosme Nasceu em FERRARA cerca de 1430 e ali morreu em 1495 depois de ter sido, ao longo de toda a sua vida, o pintor oficial dos soberanos locais - primeiro o duque Borso d'Este e depois o seu sucessor Ercole (v. II, p. 54). M.
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Laclotte definiu admiravelmente a singularidade deste artista estranho: «Tura cria um estilo profundamente original, no qual se fundem a acuidade gráfica e a fantasia romanesca do gótico cortês, a força plástica do meio donatelliano de Pádua e na claridade monumental de Piero de lia Francesca ... A intensidade do seu expressionismo, ora feroz ... ora terno, sempre febril e crispado», alia-se a uma extraordinária mestria do estilo. «Implanta as personagens com uma autoridade escultural digna dos inovadores florentinos... e sabe construir as suas mais elaboradas composições com uma ciência, toda moderna, da coesão espacial... Tura surge como fundador da escola de Ferrara, que lhe deve boa parte da sua singularidade e da sua poesia um pouco inquietante». TYCHO BRAHÉ Nascido em 1546 de família nobre mas pouco culta, Tycho Brahé tomou contacto com a ASTRONOMIA por meio dos textos antigos e também mediante os recentes trabalhos de Copérnico. O seu sistema, que consiste em pôr os planetas a girar em volta do Sol e o Sol em volta da Terra, já fora concebido como uma possibilidade por Copérnico. Aos olhos dos astrónomos da primeira metade do século XVII, este sistema parecia ainda reunir as vantagens do sistema de Copérnico às do de Ptolomeu (v. li, p. 147). Mas Tycho Brahé foi, principalmente, um observador e um técnico de génio. Graças à construção de novos instrumentos- quadrantes e sextantes gigantescos-. corrigiu um certo número de erros, calculou a posição de várias estrelas importantes com uma aproximação notável para a época, determinou a duração do ano trópico, a inclinação da eclíptica, etc. As suas observações do cometa de 1577 ficaram célebres. Foi o primeiro a compreender que,
para ser frutuosa, a observação astronómica tinha de ser permanente. Graças à largueza do rei Frederico da Dinamarca, construiu no Palácio de Uraniborg, na ilha de Hveen , um vasto observatório, poderosamente apetrechado e servido por todo um conjunto de colaboradores cuidadosamente formados c seleccionados por si. Mas Tycho Brahé, muito gastador e mau administrador, endividou-se a tal ponto que Cristiano IV, por morte de Frederico, decidiu retirar-lhe os benefícios concedidos pelo seu antecessor. Tycho Brahé deixou a Dinamarca e foi para a Alemanha, onde publicou o relato dos seus trabalhos e das suas reflexões (Astronomia! instauratre mechanica, 1598). Acolhido pelo imperador Rodolfo II, reconstituiu, graças a ele, o seu observatório em Praga. Quando ele mor- · reu, a 22 de Outubro de 1601, já: um recém-chegado ao grupo ia. prosseguir a sua obra: Johannes Kepler. (V. II, p. 134.)
u UCCELLO, Paolo Paolo di Dono, dito Paolo Uccello, nasceu em 1397 em Florença e aí morreu em 1475. Uccello foi não 'só pintor- autor dos frescos do claustro verde de Santa Maria Novella, da Profanação da Hóstia de Urbino, dos três painéis da Batalha de San Romano (Florença, Paris, Londres)- mas também especialista do mosaico, da marchetaria e da decoração. Este pintor apaixonado pela geometria (v. I, pp. 116, 156), amigo do matemático Manetti, escandalizou os seus contemporâneos: «Estas composições estão longe de estar harmoniosamente coloridas -escreve VASARI-. pois ele queria fazer paisagens azuis, construções e casas ver-
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melhas e de outras cores». Abandonando deliberadamente toda e qualquer preocupação que não fosse plástica, Uccelio conduz a pintura ao seu objecto específico: a pintura é um meio de expressão fora :de qualquer referência ao real, uma arte que se basta a si própria. «Uccello pintou as primeiras batalhas, talvez, cujo autor parece desinteressar-se delas: batalhas estilizadas como os baixos-relevos egípcios ... » (A. Malraux). A sua vontade de composição pictórica é tão forte que a sua pintura resulta, por isso, quase abstracta: a verosimilhança é desprezada em proveito da experiência da perspectiva ou das necessidades rítmicas da composição. Assim, no canto esquerdo da Batalha de San Romano (Londres), aparecem duas pernas de um cavalo branco que não pertencem a animal algum: estão ali só para equilibrar, para sustentar, como arcobotantes, a pesada massa do cavalo negro ajaezado. Do mesmo modo, no canto direito, perante a leveza do cavalo branco empinado, & massividade do cavalo negro é reforçada por uma perna supleRedescoberto na nossa me~aT. época, Paolo Uccello é um dos artistas do Renascimento que mais fascinaram os pintores modernos. UNIVERSIDADES As;,UJliversidades multiplicam-se na Europa do século XIV até ao século XVII (v. 1, pp. 46, 99). Passam a ser menos internacionais (v. II, p. 73) e, em definitivo, a sua irradiação diminui - em parte por causa da Reforma (v. II, pp. 72-73). Por outro lado, as «faculdades · das artes» desintegram-se numa multidão de COLÉGIOS. que, · praticamente, lhes sucedem (v. II, pp. 69-71). Dentro de algum tempo, as ACADEMIAS tomariam na vida cultural da Europa o lugar deixado vago pela decadência das universidades.
rum (que seria publicado por Eras-
URBANISMO
UTOPIAS
Na Idade Média tinham · smgido cidades de planta geométrica na Alemanha Oriental, no Sul da França e em Espanha (v. I, p.259). Mas a maioria das cidades medievais tinha sofrido um desenvolvimento anárquico. O Renascimento, que estudou as ruínas antigas e o e~quema PLA TóNICO da cidade ideal, descobriu o urbanismo (v. I, pp. 258-259). ENGENHEIROS, filósofos e homens de estado procuraram «pensar» as cidades (v. I; pp. 261-262), auxiliados nisso pelas antecipações futuristas dos UTOPISTAS (v. II, pp. 31-34 e gravuras 60, 61 e 72). Uns optaram pela planta em tabuleiro de xadrez (v. I, gravuras 62. 63); outros, principalmente os militares e os filósofos, optaram pelo esquema radial (v. I, pp. 263-264 e gravuras 64, 65, 66 e 71 ). Deu-se especial atenção às praças, centros das cidades, às suas dimensões e à sua decoração (v. I, pp. 264-266). (V. I, pp. 267-269.)
Estas «brincadeiras senas» floresceram no século XVI e nos princípios do século XVII, de Thomas MORE a Françis BACON (v. II, pp. 22-29). Reatam uma tradição PLATóNICA (v. I, pp. 262, 264) e são uma curiosa mistura de antecipação (v. II, p. 34), e de mau conhecimento do seu tempo (v. 11, pp. 29-33). (V. II, gravuras 70, 71 , 72 e 73.)
URBINO
V ALLA, Lorenzo
Local de alta importância no Renascimento italiano graças ao duque Federico da Montefeltre, letrado eminente que protegeu humanistas e homens de ciência (v. I, p. 155). imortalizado por PIERO DELLA FRANCESCA (v. II, p. 43). Seu filho Guidobaldo foi aluno do matemático P ACIOLI (v. II, p. 133). Capital artística, pátria de RAFAEL e de BRAMANTE, a cidade conserva ainda hoje o palácio ducal, no qual trabalharam Laurana, Francesco di GIORGIO MARTINI, Melozzo da Forli, Juste de Gand (v. I, p. 91), etc. As marchetarias de falsa perspectiva do studiolo são justamente célebres. A corte requintada dos duques de Urbino pareceu a Baldassare CASTIGLIONE uma escola de boas maneiras e um ponto de encontro dos cortesãos humanistas (v. II, p. 86).
Nasceu em 1407 e morreu em 1457, tendo sido um dos fundadores do HUMANISMO europeu (v. I, p. 46) e um precursor de ERASMO. tanto pelo seu método de abordagem dos textos como pela sua doutrina. Depois de viver em diversas cidades italianas, Valia fixou-se em NÁPOLES em 1437. Em seguida, em 1448, instalou-se em ROMA, onde o papa lhe deu um posto de secretário apostólico. Hostil a ARISTóTELES e censurando a S. Tomás de Aquino a sua ignorância do grego {v. I, p. 96), Valia preconiza o estudo filológico dos textos e o regresso à pureza clássica. As suas Elegantice linguce latince (1444) foram estudadas, no século XVI, pelos alunos dos COLÉGIOS. Apontando certos erros da Vulgata . .. pugna, no seu livro Annotationes in Novum T estamen-
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UTRAQUIST AS Eram HUSSIT AS moderados que pediam - e obtiveram do CONCíLIO de Basileia- a comunhão do pão e do vinho (v. I, p. 124). Esse privilégio foi-lhes retirado pelo concílio de Trento (v. I, pp. 129-130). (V. I, p. 136.)
v
mo em 1505), por uma revisão da tradução latina da BíBLIA. Espírito crítico sempre desperto, Lorenzo Valia demonstrou, por outro lado, a falsidade da doação de Constantino, sapando desse modo os fundamentos jurídicos do poder temporal dos papas (1440). No plano filosófico e religioso, o seu livro mais importante é o De voluptate (1431), no qual rejeita. em JBqme do próprio cristianismo, o ascetismo medieval (v. II, pp. 99-100)f~ atitude reveladora de uma ruptura entre as duas épocas e as duas concepções da vida. (Bibl. : F . Gaeta, Lorem:o Valia. Filologia e st01·ia nell'umanesimo italiano, Nápoles, 1955). V AN DER GOES, Hugo Nasceu em Gand cerca de 1440. Atacado de demência em 1481, morreu no ano seguinte no mosteiro dos Agostinhos de Rouge-Cloitre, perto de Bruxelas, ·onde era frade converso desde 1475. «0 que nele é dominante é a extraordinária eloquência do traço, o carácter tão incisivo dos contornos que dá aos volumes, a preocupação com que os individualiza» (R. Rey). Para Jean Lemaire, seu contemporâneo, ele é «Hugues de Gand, que tinha os traços tão nítidos». O realismo e a estilização casam-se na obra deste pintor de alma inquieta e muito religiosa cuja obra-prima é a Adoração dos Pastores (Uffizi), um tríptico encomendado por Tommaso Portinari (v. 11, p. 64). (V. I, p. 91.) VAN DER WEYDEN, Rogier Nascido em Tournai em 1399 ou 1400, faleceu em ·Bruxelas em 1464. Foi discípulo do mestre de Flémalle. A Descida da Cruz, do Prado, o Tríptico Braque, do Louvre, e o grande retábulo do Juízo Final, do hospício de Beaune,
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exprimem o fervor espiritual deste pintor. Testemunham também o ardente sentimento religioso do século XV e a importância que essa época dava ao receio do Juízo (v. I, pp. 90, 144) e ao problema da salvação. Muito celebrizado no seu tempo e pintor oficial da cidade de Bruxelas. Van der Weyden viajou por Itália por volta de 1450, tendo estado algum tempo em Roma, Florença e Ferrara (v. I, p. 91). Nesta última cidade, exerceu influência bastante sensível sobre Cosme dei TURA e Francesco dei Cossa. VAN EYCK Dois irmãos, Hubert e Jan, provavelmente originários do Limburg belga. Sabe-se pouco a respeito dt: Hubert Van Eyck. Pintor reputado, começou o retábulo do Cordeiro Místico e morreu antes de 1432, visto que Jan lhe terminou o trabalho (v. I, p. 78). Pode-se dizer que Hubert difere do irmão «por um poder de imaginação criadora capaz de inspirar amplas concepções (como no Juízo Final), uma visão menos plástica das formas e uma execução mais impressionista» (L. Van Puyvelde). Jan Van Eyck, cuja data de nascimento se desconhece, foi pintor de Filipe, o Bom (v. I. pp. 90-91), a partir de 1425. Residiu em Lille c depois em BRUGES, onde morreu em 1441. Van Eyck ultrapassa no políptico do Cordeiro Místico o idealismo imperioso que, na Idade Média, determinava a forma; olha para a terra, para os homens: sabe dar à ideia abstracta a forma concreta da realidade. Com ele a pintura começa a ser uma linguagem autónoma: sabe criar formas que sugerem ideias e sentimentos. Mas também os objectos, a sua densidade, o seu volume, prendem o olhar do pintor. que encontra no jogo pictórico a mais fiel (mas não a mais realista) transcrição da realidade (v. I, p. 93). Uma espécie de
impassibilidade ob]ectiva, sem concessões, permite-lhe recriar, com acuidade nunca igualada, tanto a realidade exterior como a realidade interior das personagens. «Conquistador do palpável e do espiritual», tacteia a textura da epid~rme, mede os volumes. estuda a luz dos rostos, entra neles, e assim encontra a poesia: é o que sucede no Retrato do Casal Arnolfini. Antes dele, a forma era desenhada primeiro e depois preenchida com um modelado superficial colorido; mas ele começa a utilizar todos os recursos pictóricos. Manipula as tintas, que se opõem e cujas gradações nos dão as sensações, eminentemente plásticas, do volume, do longínquo, do espaço. Nos pormenores das suas PAISAGENS, ou do Cordeiro Místico, ou da Virgem com o Chanceler Rollin (v. I, p. 93), estão em germe todas as características da pintura da Europa Ocidental. (V . I, p. 92.) VASA Dinastia sueca originária do Uppland cujo fundador, Gustavo I, reinou na Suécia de 1523 a 1560 (v. I, pp. 35-36). Nascido em Lindholm em 1496, desfez a união de Kalmar, que desde 1397 unia a Dinamarca. a Suécia e a Noruega, tendo sido proclamado rei em 1523. Favorável à Reforma, confiscou os bens do clero. Protegeu o comércio e a indústria e aliou-se a FRANCISCO I de França. Os Vasa reinaram na Polónia de 1587 a 1668. No século XVII, Gustavo Adolfo e Cristina foram os mais ilustres representantes desta dinastia na Suécia. VASARI, Giorgio Nasceu em Arezzo em 1511 e e morreu em Florença em 1574.. O artista - pintor e escultor·é de valor mediano. Pintou no VA TI CANO grandes frescos dedicados à Vida de Paulo 111, à Bata-
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lha de Lepanto e à Matança de S. Bartolomeu. Em FLORENÇA, pintou o Palazzo Vecchio e concluiu o Palácio Uffizi. A sua obra Vidas dos Mais Excelentes Pintores, Escultores e Arquitectos (1550) influenciou, até aos nossos dias, a historiografia do Renascimento. (V. I, p. 87.)
VATICANO (Palácio do) É o maior palácio europeu do fim do século XVI (v. I, p. 268). GREGóRIO XI, ao voltar de Avinhão em 1377, resolveu instalar-se num modesto palácio que existia ao pé de S. PEDRO desde a época de Constantino. Nos meados do século XV, NICOLAU V mandou pintar a fresco a sua capela privada e deu início à construção do novo palácio. Entre 1473 e 1480, SISTO IV mandou construir a capela «Sistina», cujas paredes foram decoradas, entre 1480 e 1483, por uma plêiade de ilustres pintores. INOCÊNCIO VIII (1484- 1492) quis ter uma villa na parte mais alta do Belvedere (v. I, p. 116). Esse pequeno palácio foi depois integrado nas construções de BRAMANTE. ALEXANDRE VI recorreu a PINTURICCHI O para a decoração das seis salas dos aposentos dos Borgia e acrescentou uma torre ao palácio de Nicolau V. Sob JúLIO 11, Bramante ligou o palazetto de Inocêncio VIII ao palácio de Nicolau V por um comprido corredor no lado oriental do vasto pátio do Belvedere. Ao mesmo tempo, MIGUEL ÂNGELO pintou (1508-1512) a abóbada da Capela Sistina. LEÃO X resolveu ornamentar a fachada do palácio com três logge a fim de disfarçar as visíveis disparidades; essas logge foram decoradas com grotteschi (~. I, p. 104) por RAFAEL. que pmtou também as famosas stanze. CLEMENTE VII terminou o pátio de S. Dâmaso, continuando em dois outros ·lados do palácio o dispositivo de galerias cobertas (logge) anteriormente iniciado. O fresco do
Juízo Final (v. I, p. 144), pintado por Miguel Ângelo na parede do altar da Capela Sistina, foi executado sob PAULO III entre 1536 e 1541. Paulo ITI mandou também arranjar a «sala reah> e a «capela paulina»- é nesta que estão as últimas pinturas de Miguel Ângelo. Em 1558, PAULO IV mandou construir um casino nos jardins. É ·a PIO IV (1559-1564) que se deve a fachada de dois andares e o grandioso nicho do Belvedere, bem como o corredor ocidental entre este e o palácio - corredor que tinha sido planeado, mas não realizado, por Bramante. SISTO V cortou este grandioso anfiteatro, feito para torneios (v. I. p. 286) e corridas de touros, com a biblioteca - que se instalou na perpendicular aos corredores (1587-1589)- e mandou construir um novo palácio do Vaticano, mais claro e arejado, a dominar a Praça de S. Pedro, apoiado, a um lado, nas logge orientais do pátio de S. Dâmaso e, a outro, numa torre militar do tempo de Nicolau V. Os trabalhos iniciaram-se em 1589 e terminaram sob CLEMENTE VIII (1592-1605). (Bibl.: P. Le Tarouilly, Les bâtiments du Vatican, 3 vols., Londres, 1964).
VENEZA Tinha cerca de 100 000 habitantes por volta de 1500 e 140 000 um século depois, apesar da peste de 1575 (v. I, p. 257). Com o seu império marítimo ameaçado (v. 1, pp. 30, 34) pelos Turcos a cidade da laguna teve de achar soluções novas: a formação do domínio da Terra Firme (v. I, pp. 34, 250), o envio de comboios regulares de navios à Barbaria, a Aigues-Mortes e ao Ocidente (v. I, p. 243). Nos séculos XV e XVI, a cidade desenvolveu as suas actividades industriais: vidros (v. I, p. 195) e têxteis. Apesar dos diversos inimigos que teve de defrontar entre os sé-
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cuJos XIV e XVII (Génova, os Turcos os Franceses, etc.), Veneza soube, 'pois, ac~uar com inte~igência e coragem. Fm, durante mmto tempo, o elo de união entre a Alemanha (Fondaco dei tedeschi) e o Oriente· e o seu arsenal (v. I, p. 233) foi a n~aior empresa industrial do RenasCimento. A descoberta da rota do Cabo teve consequências negativas, inicialmente, nas remessas de ESPECIARI AS que chegavam a Veneza (v. J, p. 241); mas a situação ficou r~ cuperada pelos meados do secuia XVI. Na realidade, aquilo que deu o ~olpe de ~isericór dia no comerciO veneziano de especiarias foi a instalação dos Holandeses no Extremo Oriente. De resto, nos princípios do . século XVII, a frota veneziana ·estava em declínio e Livorno (v. I, p. 242), novo porto, ~onc.orria vitoriosamente, no Mediterraneo , com Génova NÁPOLES e Veneza. Seja como for, Veneza brilhou durante o Renasciment o com grande esplendor. O cenário urbano ~rans forrnou-se e embelezou-se: foi concluída a Piazza San Marco (v. I, p. 266), ficou pronto o Palácio dos Doges, surgiram muitos outros palácios ao longo do Grande Canal, foi construída a Libreria Vecchia, fez-se a ponte do Rialto ergueram-se igrejas de novo estilo ~San Zaccaria, San Giorgio Magg10re, etc.). Refúgio dos emigrados bizantinos cidade de Aldo MANUZIO, cent;o de cultura grega, Veneza foi também uma das capitais da pintura europeia desde a época dos BELLINI à de VERONESE (v. I, p. 118). VERONESE
admirador de CORREGGI O e de Julio Romano, foi seduzido em Roma aonde fez em 1560 a única grand~ viagem da sua vida, pela obra de RAFAEL e de MIGUEL ÂNGELO. Como TINTORETT O, seu contemporân eo, Veronese secularizou o fresco, que até então tinha estado praticamente reservado a claustros e igrejas. Mas o «seu universo luxuoso e inesgotavelmente sereno» (A. . Chastel) opunha~se aos conjuntos atormentados ~e Tmtoretto. Pintor do luxo, nao fm, todavia um simples pintor mundano: ;<0 luxo é, para ele, um objecto como as árvores, o céu, uma mulher nua>> (É. Faure). Um .raro dom de encenador permite-lhe organizar imensas composições, perfeitamente ordenadas apesar da multiplicidade das figu!as e das, c~ nas tratadas nas quais o cenano antigo e a ~itologia se associam à vida quotidiana da _alta ~ociedade veneziana· o seu virtuosismo expande-se 'em monumentais falsas perspectivas como as da vil/a Maser. As pinturas de Veronese não contam histórias e não têm a preocupação da verosimilha nça- e daí que na Ceia figurem os anões, os bobos e os alemães bêbedos que tanto chocaram a Inquisição. Antes de tudo o mms, na expressão de Florisoone, são decorações no espaço, criações de espaços. «Veronese transmitiu uma herança imensa: Poussin e Claude Lorrain haviam de aprender com ele o valor arquitectónic o dos monumentos na paisagem, Rubens e Le Brun o segredo da composição. Depois de ter influenciado o século XVII francês, preparou todo o século XVIII das festas galantes e das voluptuosidades mitológicas» (A. Chastel). (V. I, p. 118.)
· Paolo Caliari, dito Veronese. Era filho de um escultor e nasceu em Verona em 1528. A sua carreira, iniciada na cidade natal, prosseguiu a partir de 1553 em VENEZA, onde o artista morreu em 1588. Herdeiro da tradição dos BELLINI,
VERROCCH IO Andrea di Michele Cioni, dito Verrocchio, nasceu em Florença em 1435 e morreu em Veneza em 1488. As suas múltiplas aptidões
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prefiguravam , em 1460, a universalidade de LEONARDO : foi pintor, escultor, ourives e até organizador de festas: interessou-se pela geometria, pela música, pela arquitectura e, decerto, também pela filosofia. «Na escultura monumental, reinterpretou com mais pesquisa e complexidade os dois grandes temas que já Donatello tratara: o nu adolescente, no bronze de David, e a estátua equestre, como o Colleone. (A sua ambição) era ser um Donatello mais completo. A sua carreira não foi tão longa como a dele, a sua obra foi mais dispersa e a sua atitude perante o antigo foi menos firme, mas sentimo-nos impressionados pela sua força de decisão... Com o impressionante bronze de S. Tomé incrédulo... a escultura é, antes do mais, massa e peso: ocupa o espaço ... e procura nos relevos e nas concavidades profundas uma nova colaboração da luz» (A. Chastel). A sua importância como chefe de oficina é atestada pelo número e pela qualidade dos artistas que formou: contam-se entre eles PERUGINO , Lorenzo di Credi e, principalmen te, Leonardo da Vinci (v. I, p. 156; v. li, p. 86), que durante catorze anos foi seu discípulo e colaborador.
VESPUCCI, AMERIGO Nasceu em Florença em 1454 e morreu em Sevilha em 1512. Do seu apelido tirou o monge Waldseemuller a palavra «América» (Cosmographia! introductio ... in super quatuor Americi Vespucii navigationes, Saint-Dié, 1507). Mas as quatro viagens de Vespúcio estão sujeitas a certas dúvidas (v. I, p. 58). Chegado a Sevilha em 1490, encarregou-se do equipamento das segunda e terceira expedições de COLOMBO e depois navegou ele próprio· ao longo da costa americana por conta de ' Espanha ou de Portugal. Foi um d,os descobridores do Brasil. Depois de 1508, foi piloto may"ot > da CASA DE LA CONTRATA CióN. .. VESTUA,RIO Duas in(;lvações capitais podemos notar li partir do século XIV: o nascimento da moda (v. I, p. 288) e a diversificação dos vestuários masculino e feminino, que passaram a seguir linhas de evolução separadas (v. I, pp. 288-290). VICTORIA, Tomás Luís de
VESÁLIO Nasceu em 1514 e morreu em 1564. Andrea Vesal, dito Vesálio, originário de Bruxelas, começou os estudos em Lovaina e depois, atraído pela MEDICINA, foi para Montpellier. Depois de uma estadia em Paris, voltou a Lovaina, onde foi nomeado professor de anatomia (v. li, p. 133). Partidário do método experimental , foi um dos primeiros a praticar correntement e a dissecção, que estava autorizada havia já um século, mas se resumia a algumas demonstrações anuais nas universidades. No seu famoso livro De corporis humani fabrica libri VII (1543), não hesitou em atacar as concepções dos Antigos (v. li, p. 135) e denunciar-lhes os erros.
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A obra deste músico castelhano, nascido por volta de 1535 e falecido cerca de 1608, constitui o mais importante monumento da grande polifonia espanhola; consta de 20 missas, 44 motetes, 34 hinos e os admiráveis ofícios da Semana Santa e dos mortos. Victoria «sabe exprimir-se sem recorrer ao difícil e complicado contraponto da escola holandesa ... Formado em Roma junto de Palestrina, seguiu, ao mesmo tempo, a simplicidade e a naturalidade do estilo musical da tradição espanhola e a esteira ... do «Príncipe da música» da escola romana; em resultado disso, a sua obra ultrapassa em pureza e qualidade a dos mestres da Península Ibérica e aproxima-se da do génio
de Itália ... Tal como os escritores, os místicos e os pintores do século XVI espanhol, soube combinar o rigor artístico com a graça da sua estética musical» . O seu propósito consiste em comover e elevar o auditório e as suas obras-primas «reflectem a sua alma sacerdotal tão espanhola, orientada naturalmente para a adoração e a compaixão» (H. Angles). VIDRO A técnica do vitral enriqueceu-se no século XIV com a descoberta do «amarelo de prata»; e, no século XV, com o aperfeiçoamento dos «forrados» (v. I, p. 195). O Renascimento, por outro lado, assistiu à expansão das vidraças (v. l. p. 152), do «vidro branco» de Murano (v. I, p. 196), e dos óculos (v. I, p. 196). VILLON, Françms Nascido cerca de 1431, morreu depois de 1463. Proveniente de meio muito modesto, François adaptou, depois de lhe morrer o pai, o nome do padre que então se encarregou da sua instrução. Prosseguindo sólidos estudos na Sorbonne, entregava-se também à vagabundagem e a uma vida de devassidão que haveria depois de levá-lo ao crime e ao cárcere. Várias vezes perdoado, acabou por ser expulso de Paris em 1463, data a partir da qual se lhe perde o rasto. Escreveu os Lais (ou «Legado», conhecidos também como Petit Testament) aos vinte e cinco anos e o Testament, ou Grand Testament, aos trinta, em momentos de arrependimento em que nele se misturavam o horror ao mal e a maravilha da fé reencontrada: é uma poesia patética, cujo realismo por vezes macabro deixa visível a obsessão da morte, tão característica de uma época dominada pelo tema do pecado, pelo medo do inferno e pela experiência da fraqueza humana.
VlSCONTI Família de Itália que dominou MILÃO e a Lombardia de 1277 até 1447. Originariamente eram pequenos senhores feudais que tinham obtido o título de visconde (viscomi). Os Visconti mais célebres foram, primeiro, Otão, nomeado arcebispo de Milão por Urbano IV em 1262; depois, Gian Galeazzo (1331 -1402), cuja filha Valentina casou com o duque de Orléans, irmão de CARLOS VI (v. I, p. 289). Jean Galeazzo queria dominar toda a Itália (v. I, p. 29). Apoderou-se de Vicenza, de Verena e de Pádua e fez com que o imperador Wenceslau lhe desse os títulos de duque de Milão e de duque da Lombardia. Vencendo os Florentinos, ocupou Pisa, Perugia e Bolonha e já pensava em fazer-se rei quando, em 1402, morreu. O seu filho mais velho, Giovanni Maria, foi rapidamente suplantado pelo irmão mais novo, Filippo Maria (1391-1447), que não teve filhos mas cuja filha natural Bianca Maria casou com Francesco Sforza, que assim se fez senhor do Milanês. VIVES, Juan Luis Foi o principal HUMANISTA espanhol do século XVI. Nasceu em Valência em 1492 e foi professor em Lovaina (1519). Criou laços de amizade com ERASMO (v. II, p. 80). Chamado a Oxford por Wolsey, foi depois preceptor de Maria Tudor. Tendo tomado o partido de Catarina de Aragão contra HENRIQUE VIII, chegou a estar preso. Uma vez solto, voltou para os Países Baixos, morrendo em BRUGES em 1540. Editou o De civitate Dei de Santo Agostinho (1522), foi defensor das Novas fórmulas de educação e instrução (De ratione studii puerilis, 1531) (v. II, p. 84) e apologista do casamento cristão (v. II, p. 97). (Bibl.: M. Bataillon. Erasme et l'Espagne, Paris, 1937.)
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16~4 Matthias Welser declarou-se falido. (Bibl.: R. Ehrenberg Le si~c/e des Fugger, Paris, 1956).'
WELSER Em 1476, quatro irmãos Welser de Augsbu_rgo, criaram uma sociedade comercial (~. I, p. 223) que trabalhou, espe_cialmente, com a Itália e, a partir de 1490, fez o tráfego. da prata do Tiro!. A grande epoca dos Welser começa em 1498, no momento em que Anton Welser fundou, com o cunhado, .u.m_a COMPANHIA que teve filiaiS nas principais praças da ~u~opa. O seu comércio incidia na la mglesa, nos panos da Flandres nos fustões da Alemanha do Sul n~ prata da Saxónia e nas ESPECIARIAS. _Os Welser, que tinham plantaçoes de cana-de-açúcar na Ilha da Madeira (mais tarde viriam a mstalar-se nas Canárias), formaram eJ.!l. 1505 um consórcio para o encammhamento das especiarias desde Goa até LISBOA (v. I , pp. 225-226). Em 1519 contribuíram (mas menos que os FUGG~R) ~ara o financiamento da eleiçao Imperial de CARLOS V. Em 1531 receberam títulos de nobreza; e, em 1557, uma Welser casou com o filho do imperador Fernando I (v. I, p. 279). Carl~s . V concedera aos Wclser o dtretto de explorar as minas de cobre de S. Domingos e de coloniz~r a Venezuela (1528). A expediçao que eles dirigiram nessa zona da América redundou em fracasso (v. I, p. 63). Por outro lado, o contrato de S. Domingos foi rescindido em 1556. Nos fins do século XVI tentando recuperar uma parte d~ que lhes devia a coroa espanhola, parte essa que estava comprometida· p~la semtbancarrota de 1575, participaram nos contratos feitos com FILIPE em 1586-1591 para a importação das especiarias do Oriente. Mas nem com isso puderam restabelecer a antiga posição. Em
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WYCLIF, John Nasceu em Hipswell por volta de 1320. Doutorado por Oxford con~elheiro eclesiástico da coroa 'rez-se campeão da hostilidade à ctlria romana, ao poder temporal dos papas e à suserania pontificai sobre as auto_ri~ades la~cas (v. I, p. 139). A_dversat:IO das mdulgências e da hi_erarqm3:, pondo em dúvida a doutn~a tradiCt?nal d~ eucaristia, quis basear a. vida cnstã unicamente nas Escnturas (v. I, p. 146). Os «padres pobres», ou lollards (v. I, p. 137),_ que enviou para os campos, as~tm pregavam. Wyclif tomou o partido dos camponeses revolta~ dos de 1381 sob o comando de Wat Tyler; passou a ser suspeito aos. olhos do governo e teve de retirar-se para a sua paróquia de Lutterworth, onde morreu em 1384 (Y I, p. 146.) .
z ZWINGLI, Ulrich Nasceu na Suíça, em Wildhaus (1~84) e estudou em Viena e dePOis, em Basileia. Foi nom'eado cura de, ~laris em 1506 mas as s~as predtcas contra o mercenanado (v. I, p. 46) obrigaram-no a largar o_ cargo em 1516. Capelão da peregnnação de Einsiedeln de 1516 a . 1518, levantou-se contra as , práticas supersticiosas. Eleito pregador da colegial de Zurique aderiu . à Reforma com os seu~ paroqUianos (v. I, p. 127). Escreveu em 1525 o De vera et fals~ re!igione commentarius, obra mUito Importante que dedicou a FRANCISCO I e na qual expôs a
da Igreja e do Estado, e daí as duas campanhas que organizou contra os cantões católicos. Foi morto na batalha de Cappel em 1531. (V. 11, p. 51.) (Bibl.: J. V. Pollet, Huldriych Zwingli et la Réforme en Suisse, Paris, 1963.)
sua doutrina. Mas havia muitas divergências a separá-lo de LUTERO - especialmente a respeito da eucaristia -, e, em certos aspectos, podemos considerá-lo adepto de ERASMO, com quem entabulara relações. Inspirador da política de Zurique, não aceitou a separação
ORIENTAÇÃO BIBLIOGRÁFICA
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I. Obras gerais. Problemática do Renasc1mento li. Relações internacionais. Diplomacia. Exércit.) I.II. Histórias nacionais IV. Doutrinas políticas. O Estado. V. Problemas de navegação e viagens de descobrimentos VI. Economia. Conjuntura. Moeda VII. Campo e cidades VIII. Técnicas. Artesanato. Indústrias IX. «Mercadores» e mercadorias X. História social. Demografia XI. Estudo das mentalidades. A vida quotidiana XII. O Humanismo XIII. Artistas e obras de arte XIV. Pré-reforma. Reforma protestante e Reforma católica XV. A Ciência
I. OBRAS GERAIS. PROBLEMÁTICA DO RENASCIMENTO 1. Obras gerais
Em francês: em Histoire du Moyen Age, sob a direcção de G. Glotz, ver J. Calmette, E. Deprez, L'Europe occidentale de la !in du XIV• siecle aux guerres d'ltalie, 2 vols., Paris, 1937-1939. Colecção «Clio», t. V, J. Calmette, L'Élaboration du monde moderne, 3.! ed., Paris, 1949; t. VI, H. Sée, A. Rébillon, A. Préclin, Le XVI" siecle, Paris, 1950. Co1ecção «Peuples et civilisations», t. VII, H. Pirenne, A. Renaudet, E. Perroy, M. Handelsman e L. Halphen, La Fin du Moyen Age, 2 vols., Paris, 1931; t. VIII;' H. Hauser, A. Renaudet, Les Débuts de !'Age moderne: la Renaissance et la Réforme, 4.! ed., Paris, 1956; t. IX, H. Hauser, La Prépondérance espagnole (1559-1660) , 3." ed., Paris, 1948. Colecção «Histoire
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des civilisations>> t. llil E. Perroy, J. Auboyer, C. Cahen, G. Duby, M. Mollat, Le Moyen Age, 4.• ed., P~ris, 1965; t. IV, R . M~usnier, L es XVI" et XVII" siecles, 4.! ed., Pans, 1965. H. G. Koemgsberger e G. Mosse, L'Europe au XVI" siecle, trad. S. Chassagne, Paris, 1970. Importante: M. Morineau, Le XVI" siecle, Paris, 1968. Em inglês: ver Medieval Cambridge history, obra publicada entre 1911 e 1936 sob a direcção de J. B. Bury, em especial os tt. VII e VIII. Em Cambridge modern history há que ver os tt. I e II, mas deye preferir-se-lhe a New Cambridge modern history, em que há, essencialmente, a ver: G. R. Potter, The Renaissance, 1493-1520, C:ambridge, 195~. e G. R. Elton, The Reformation era, 1520-1559, Cambndge, 1958. O byro de M. P. Gilmore The world of humanism, Nova Iorque, 1952, que ~xiste também em trad~ção francesa, é importante. Outras obras notáveis em língua inglesa: H. J. Grimm, The Reformation era, 1500-1650, ~ova Iorque, 1954, e D. Weinstein, The Renaissance and the Reformatwn, 1300-1600, Nova Iorque, 1965. Um bom atlas: Atlas of world history, 1957. Em alemão: em W eltgeschichte, .t. III, K. Lamprecht, ..;tllgemeine Staatengeschichte, Berlim, 1936. Em Neue Propyliien-Weltgeschzchte, r.e~d. de Berlim, 1950, t. ll e, principalmente, t. III: Das Ze~talter der reltgwsen Umwiilzung ... , 1450-1650, por W. Goetz, P. Joachimsen, etc. Obras recentes: G. Ritter, Die Neugestaltung Europas im }(_VI. Jahrhunderr, Berlim, 1950 H. Rossler, Europa im Zeitalter der Renazssance, Reform_ation und Gegenreformation ( 1450-1630), Munique, 1956; H. Hubschm1d, Die Neuzeit von der Renaissance bis zum Beginn der Aufkliirung, Erlenbach-Zurique, 1959; E. Hassinger, Das Werden des neuz_e~tlicher' E!fropa ( 1300-1600), Braunschweig, 1959. Um atlas sempre utll: Hzstomcher Schulatlas, 63. 4 e,{ . 1954. Em italiano: C. Barbagallo, Età moderna, t. VI (1) e t. VI (2), Turim, 1958. Ver também G. Spini, Storia de/l'età moderna dall'impero di Carlo Quinto a/l'illuminismo, Roma, 1960; na série La Civi/tà, tt. IV e V: 1/ medioevo e Rinascimento e Riforma, Milão, 1964. 2. Problemática do Renascimento
J. Michelet foi quem primeiro considerou o Renascimento como um período da história geral da Europa (no vol. VII da sua Histoire de France, que saiu em 1855). Essa concepção marcou uma data. Três teses dominaram, desde então, durante muito tempo, a historiografia dos séculos XIV-XV-XVI: o Renascimento começou em Itália; o seu factor dominante foi o despertar da Antiguidade; o Renascimento assinala o fim da civilização medieval e o início da idade moderna. Dois autores contribuíram imenso par& a difusão destas teses: G. Voigt, Die Wiederbelebung des klassischen Altertums oder das erste Jahrhundert des Human ismus, Berlim, 1859, e, principalmente, J. J. Burckhardt, Die Kultur der Renaissance in Italien. Ein Versuch, Base!, 1860, trad. franc. de H. Schmitt e R. Klein, Paris, 1958. A concepção de Burckhardt, ampliada e matizada, influenciou muitíssimos historiadores, em especial: H. Taine, Histoire de la littérature anglaise, 5 vols., Paris, 1863-1864, e L a Philosophie de l'art en ltalie, Paris, 1866; F. de Sanctis, Storia de/la letteratura italiana, 2 vols., Nápoles, 1870-1871 ; A. Symonds, Renaissance in /taly, 7 vols., Londres, 1875-1876; E. Müntz, Histoire de l'art pendant la Renaissance, 3 vols., Paris, 1889-1895; K. Lamprecht, Deutsche Geschichte, 12 vols., Berlim, 1891-1909; P. Monnier, Le Quatirocento. Essai sur l'histoire littéraire du XV' siecle italien, 2 vols., Paris, 1900; W. Goetz, «Mittelalter und Renaissance», in Historische Zeitschrift, XCVIII, 1907; .T. Joachimsen, Geschichtsauffassung und Geschichtschreibung in Deutschiand unter dem Einfluss des Humanismus, Leipzig, 1910, e «Vom Mittelalter zur Reformation», in Historische Vierteljahrsschrift, XX , 1920-1921: G. Gentile, I problemi della scolastica e il pensiero italiano, Bari, 1912; Giordano Bruno e il pensiero dei Rinascimento, Florença, 1920; Gi01·dano Bruno e il pensiero dei Rinascimento, Florença, 1920; Studi sul Rinascimento, Florença, 1923, e «La concezione umanistica dei mondo», in Nuova antologia, CCLXVII, 1931; W. Dilthey, Gesammelte Schriften, 11 vols., Leipzig, 1921-1936; e, por fim, o grande estudo de E . Cassirer, lndividuum und Kosmos in der Philosophie der Renaissance, Leipzig, 1927. Houve, porém, uma reacção contra a concepção burckhardtiana. Alguns historiadores procuraram encontrar as origens do Renascimento antes de Petrarca e fazer esbater-se a linha divisória entre a Idade Média e o Renascimento. E. Renan, Nouvelles études d'histoire religieuse, Paris, 1884; H . Thode, Franz von Assisi und die Anfiinge der Kunst der Renaissance in Italien, Berlim, 1885, e E. Gebhart. «La Renaissance italienne et la philosophie de l'histoire», in Revue des deux mondes, LXXII, 1885, viram em S. Francisco de Assis o promotor do Renascimento, aquele que «fez despertar o espírito humano». K. Burdach, «Sinn und Ursprung des Wortes Renaissance in der neusten Forschung», in Sitzungsberichte der preussischen Akademie der Wissenschaften, 1910, e Reformation, Renaissance, Humanismus: zwei Abhandlungen über die Grundlage moderner Bildung und Sprachkunst, 2. • ed., Berlim-Leipzig, 1926 procurou conservar a continuidade entre o pensamento medieval e ~ pensamento renascente descrevendo este como, fundamentalmente espiritual e irracional. K. Brandi, «Renaissance und Reformation. W~rtung und Umwertung», in Preussische Jahrbücher, CC, 1925, criticou a tese de K. Burdach, mas já desde 1908 notava o carácter subjectivo e relativo de toda e qualquer definição do Renascimento (Das W erden der Renaissance, Gottingen, 1908). ·
Esta problemática está notavelmente exposta no livro de W. K. Ferguson, The Renaissance in historical though~, B?ston, 19~8, trad. franc. com o título La Renaissance dans la pensée hzstorzque, Pans, 1950. A obra de Ferguson pode ser completada com I. D. e A. S. Tuberville, <~C:han ging views of the Renaissance», in History, n. s., XVI, 1932; J. Hmzmga, «Le probleme de la Renaissance», in Revue des cours et conférences, XL 1938-1939· C. Carbonara, «Il secolo XV», in Storia de/la filosofia itatlana de F. M. Sciacca, t. t. VI, Milão, 1943; Pensée ~umanis~e et tradition chrétienne aux XV" et XVI" siecles (colóqmo), Pans, 1950; W. K . Ferguson «The Church in a changing world». A contribution to the interpretaÚon of the Renaissance», in American historical review, . XLI, 1953-1954; L. Trenard, «Un colloque sur la Renaissance», in. Information historique, XVIII, 1956; Actes du co/loque s!-lr la Re'}azssan~e, Paris 1958· E. F. Jacob, «An approach to the Renaissance», m Italwn Rendissanc; studies, Londres, 1960 (uma das investigações sobre o Renascimento desde 1900); E. Garin, Moyen Âge et Renaissance, Paris, 1969, e La Renaissance, Verviers, 1970.
Mas a reacção contra Burckhardt foi, principalmente, obra de medievalistas, que não só reabilitaram a Idade Média em relação ao Renas-
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cimento como ainda tentaram mostrar que este devia à Idade Média o que tinha de melhor. Esta tendência foi representada, principalmente, por E. Gilson, La philosophie au Moyen Âge, des origines patristiques à la !in du XIV' siixle, Paris, 1922 (reed. 1947); G. Ritter, «Die Geschichtliche Bedeutung des deutschen Humanismus», in Historische Zeitschrift, CXXVII, 1923; J. Nordstrom, Moyen Âge et Renaissance, Paris, 1933. Além disso, o Renascimento foi visto por historiadores da ciência como um período de declínio nesse particular domínio da actividade· humana: P. Duhem, Études sur Léonard de Vinci, Paris, 1906-1913, e Le Systeme du monde, histoire des doctrines cosmologiques de Platon à Copernic, 5 vols., Paris, 1913-1917; L. Thorndyke, A history of magic and experimental science, 6 vols., New York, 1923-1941. Muitos historiadores, enfim, tentaram demonstrar, contra a tradição proveniente de Burckhardt, que o humanismo foi uma defesa do cristianismo ortodoxo contra o individualismo heterodoxo ou contra as filosofias irreligiosas. Por um lado, são eles: G. Toffanin, Che cosa fu l'umanesimo, Florença, 1919; La fine dell'umanesimo, Milano, 1920; ll Cinquecento, Milano, 1928; Storia dell'umanesimo dai XIII al XVI secolo, Napoli, 1933; por outro lado, D. Bush, Mythology and the Renaissance tradition in english poetry, Minneapolis, 1932, e The Renaissance and english humanism, Toronto, 1939. Nestes últimos anos, graças aos trabalhos de H. Haydn, The Counter-Renaissance, New York, 1950 (o termo é calcado no de «Contra-Reforma»), e de E. Battisti, L'Antirinascimento, Milano, 1962, surgiu uma nova opinião: teria havido, paralelamente, um Renascimento e um anti-Renascimento. A obra de A. Chastel e R. Klein, L'Ãge de l'humanisme, Paris, 1963, recomenda-se não apenas pela originalidade e variedade das ilustrações mas também por um texto que recolhe o essencial das recentes aquisições da ciência histórica acerca da época do Renascimento. A terminar, assinalamos uma síntese inspirada pelo marxismo: J. Macek, ltalska Renesance, Praga, 1965. '
li. RELAÇõES INTERNACIONAIS. DIPLOMACIA. EXÉRCITO
A Histoire des relations internationales, dirigida por P. Renouvin, reatou o estudo deste sector da história: t. I, F. L. Ganshof, Le Moyen Âge, Paris, 1953; t. li (1), G. Zeller, Les temps modernes, de Christophe Colomb à Cromwell, Paris, 1953. A. G. Zeller são também devidos três artigos iJ?lportantes: «Les relations internationales au temps de la Renaissance», m Revue des cours et conférences, XXXVII, 1935-1936; «Les relations internationales au temps des guerres de religion», ibid., XXXIX, 1937-1938; «Aux origines de notre systême douanier. Les premieres taxes à l'importation (XVI" siêcle)>>, in Mélanges 1945 (t. III, Études historiques), publ. da Faculdade de Letras de Estrasburgo, 1947. Igualmente fundamental é G. Mattingly, Renaissance diplomacy, Londres, 1955. Há obras mais antigas que ainda têm importância: R. de Maulde La Claviere, La diplomatie au temps de Machiavel, 3 vols., Paris, 1892-1893; E. Nys, Les origines de la diplomatie et le droit d'ambassade jusqu'à Grotius, Bruxelas, 1884; Les origines du droit international, Bruxelas, 1894; Études du droit international, 2 vols., Bruxelas, 1896; D. J. Hill, A history of diplomacy in the international development of Europe, 3 vols., London, 1921. Um aspecto que durante muito tempo esteve esquecido nesta área das rela346
ções internacionais foi estudado por B. Cialdea: La formazione dell'ordinamento marítimo nelle relazioni internazionali (secoli XIV-XVIII), 2 vols., Milão, 1959.
III. HISTóRIAS NACIONAIS (Trabalhos de carácter nacional sobre os vários países isoladamente considerados)
Quanto à França, a notável Histoire de France (Larousse), dirigida por G. Duby; no nosso caso, t. 11, Paris, 1971. Quanto à Inglaterra, ver principalmente a Oxford History o/ England, dirigida por G. N. Clark, para o período 1400-1603, 4 vols., publicados entre 1952 e 1961. De leitura fácil: G. M. Trevelyan, History of England, Cambridge, 1926. Quanto à Alemanha. K. Lamprecht, Deutsche Geschichte, Berlim, 1920-1922. Há, de resto, a obra clássica de B. Gebhardt, Handbuch der deutschen Geschichte (no nosso caso, os vols. I e 11), 8. • ed., Estugarda, 1954-1960. Existe, com o mesmo título, uma colecção dirigida por L. Just (aqui, especialmente o t. IV). Sobre o imperador Carlos V há um clássiCo: K. Brandi, Kaiser Karl V. Werden und Schicksal einer Personlichkeit und eines Weltreiches, Munique, 1937. Quanto à Áustria, H. Halitsch, Die Geschichte Oesterreichs, t. I (até 1648), Viena-Graz, 1959. Quanto aos Países Baixos, a obra basilar é ainda a monumental Histoire de Belgique de H. Pirenne, na edição de 1948-1951. A história das Províncias Unidas foi renovada por uma grande obra colectiva, Algemene Geschiedenis der Nederlanden, 12 vols., Haia, 1949-1958. Existe em língua inglesa o livro bem informado de P. Geyl, The revolt of the Nederlands (1555-1609), 2.• ed., Londres, 1958; e em francês, H. E. Enno Van Gelder, Histoire des Pays-Bas, Paris 1933, e M. Braure, Histoire des Pays-Bas, Paris, s. d. Quanto à Suíça, pode-se utilizar, em tradução francesa, J. Dierauer, Histoire de la Confédération Suisse, Lausanne, 1918-1919. Em alemão, H. Nabholz, L. V. Muralt, R. Treller, E. Bonjour, Geschichte der Schweiz, Zurique, 1930; G. Guggenbühl, Geschichte der Schweizerischen Eidgenossenschaft, Zurique, 1947. · · Quanto à Itália, há três colecções essenciais: Storia d'ltalia illustrata, que dedica dois volumes ao período que nos ocupa; Storia política d'ltalia, também com dois volumes; Storia d'lta!ia, especialmente o t. li; e, naturalmente, E. Garin, ll Rinascimento italiano, Milão, 1941. Quanto à Espanha: R. Altamira Y Crevea, Historia de Espana y de la civilización espano/a, 3." ed., 4 vols., Barcelona, 1930; A. Ballesteros Y Beretta, Historia de Espaíía y su influencia en la historia universal. 2." ed., 9 vols., Barcelona, 1941; e a grande Historia de Espana fundada por R. Menéndez Pidal: os últimos tomos publicados são o XIV (sé347
c~lo ~ XIV), ó XV (século XV) e os XIX (1) e (2) (Filipe li). Outra obra classica acerca de Espanha e do seu império é a de R. B. Merriman The rise of the Spanish Empire in the Old World and the New, 4 vols.: Nova Iorque, 1918-1934.
Quanto a Portugal, há, principalmente, D. Peres, História de Portugal, 8 vols., Barcelos, 1929-1935. .Quanto à Es~andinávia e aos países do Báltico, há vári0s livros escntos o~ traduzidos para francês: J. Meuvret, Histoire des pays baltiques, Pans, 1933; J . .Jaé:!kkola, Histoire du peuple !in/andais, Lausanne, 1942; L. Krabbe, Hzstozre du Danemark Paris 1950· L. Musset Les peuples scandinaves au Moyen Âge, Paris' 1951· 'p. Jea~nin Histoi;e des ' ' ' pays scandinaves, Paris, 1956. . Quant à Hungria, há três obras de carácter geral: A. Domanovski, Dze Geschzchte Ungarns, Munique 1923· F. Eckhart Introduction à l'histoire hongroise, Paris, 1928; O. Zar~k The History of Hungary · ' ' Londres, 1939~ _ Quanto à Bls., Pans, 195~; ~· Pascal, Histoire de la Russie, des origines à 1917, Pans, 1961; e, prmcipalmen te, um trabalho aplicado a todos os países eslavos: Les Slaves, peuples et nations, Paris, 1965.
IV. DOUTRINA S POLíTICAS. O ESTADO
l'esprit politique de la Réforme, Paris, 1926, La naissance de l'esprit lalque au déclin du Moyen Âge, 6 vol., Paris, 1942-1948; a tese fundamental de P. Mesnard, L'essor de la philosophie politique au XVI" siecle, Paris, 1936. Acerca dos progressos da reflexão política em Inglaterra, temos uma obra clássica, S. B. Chrimes, English constitutiona l ideas in the XVth century, Cambridge, 1936, a completar com F. Le Van Baumer, The early Tudor theory of kingship, New Haven, 1940. Importante: F. Chabod, De Machiavel à Benedetto Croce, Genebra, 1970. Uma exposição excelente é a de A. Tenenti, Les Médicis, Paris, 1970. Quanto às concepções políticas e sociais de Thomas More: K. Kautsky, Thomas More and his Utopia, London-New York, 1927, e R. W. Chambers, Thomas More, Lopdres, 1935, expõem opiniões opostas entre as quais se situa o compromisso de R. Ames, Citizen Thomas More and his Utopia, Princeton, 1949. A utopia da época do Renasciment o foi obiecto de duas teses de doutoramento : R. Ruyer, L'Utopie et les utopies, Paris, 1950, e R. Mucchielli, Le mythe de la cité idéale, Paris, 1960. Por outro lado, o tema. da utopia foi já estudado em dois colóquios organizados pelo «Centre Niitional de la Recherche Scientifique»: Les utopies à la Renaissance, Pans-Bruxela s, 1963, e Le Solei! à la Renaissance Paris-Bruxelas. ' 1965. O pensamento político de Erasmo foi examinado por K. L. Born, «Erasmus on political ethics: the Institutio principis christiani>>, in Political science quarterly, XLIIT, 1928, e também no livro, já citado de P. Mesnard, nos estudos de A. Renaudet, especialmente Érasme, sa pe'nsée relil{ieuse et son action d'apres sa corrf!sp_ondance (1518-1521), Paris 1926, e, fmalmente, o recente e excelente hvnnho de J. C. Margolin Erasme ' par lui-même, Paris, 1965. O pensa~ento político de Maquia,vel é objecto de extensa literatura. As obras clássicas são as de P. Villani, Niccolà Machiavelli e i suoi tempi, 3 vols., Milão, 1877-1882, e de O. Tommasini, La vita e gli scritti di Nicco~à Machiavelli, 2 vol., Roma, 1899-1911. A melhor biografia de Maqmavel é a d~ R. Ridolri, Vita di Niccolà Machiavelli, Roma, 1954. Outros trabalhos Importantes: F. Chabod, Opere, vo!. I: Scritti su Machial;'ellf, Turim, 1964 (nova publicação dos textos que o grande historiador ttahan_o dedicara a Maquiavel,
Sobre a eyolução da reflexão política na época do Renasciment o devemos menciOnar, em inglês: J. Neville Figgis Studies of politicai thought from Gerson to Grotius, 1414-1625, 2.• ~d., Cambridge 1916· J. W. Allen, A history of political tholfght in the XVIth century, '2.• ed.: ~ova Iorque, 1928 C. H. W. Mac Ilwam, The growth of political thought m ~he .West, Nova Iorque, 1932. Mas há também, em francês, trabalhos multo Importantes que requerem atenção: G. de Lagarde, Recherches sur
A evolução geral das instituições poderá ser apreciada por meio de F. Hartung e R. Mousnier, «De quelques problemes concernant la monarchie absolue», in x• Congres international des sciences historiques. Rapports, Roma, 1955. Para os diversos países, utilizar: R. Doucet Les institutions de la France au XVI" siecle; R. Mousnier Études s~r la Fr'!nce_ de.14?2 à _1559, I.parte, Paris, 1957; J. Russel Major, Representatzve znstztutzons m Renazssance France, 1421-1559, Madison (Wisconsin), 1960, e The Deputies to the Estales General in Renaissance France Madis~m. (Wi~consin), 19~0; D. L. Keir, The Constitutional history of modem Brztazn, 1485-1937, 3.- ed., Londres, 1947; C. Barraclough, The origins o!
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mo_dern Ge~many, Oxford, 1947; F. Hartung, _Deutsche Verfassungs Gesnt chtc~t~. 17.- ed., ~t~ttgart, 1959; H. K. Koemgsberger, The Governme of Slcz!y under Phtlzppe li of Spain, Londres 1951· G Coniglio [[ Regno
di Napoli ai tempo di Carla Quinto, Nápoles' 1951: R: Von Albertin Das Flc:re'}tinische Staatsbewusstsein im Überg/:mg v~n der Republik' zum Prmztpat, Berna, 1955; F. Chabod, Lo Stato di Milano nella prima metà dei ~~colo XVI, .Roma, 1955; J. C. Davis, The decline of the venetian nobtltty as a rulmg class, Baltimore, 1962; N. Rubinstein , The government of Florence un1er the Medici, 1434 to 1494, Oxford, 1966; P. Vilar, La Catalogne dans I Espagne moderne, t. I, Paris, 1962.
V. PROBLEM AS DE NAVEGA ÇÃO E VIAGENS DE DESCOBR IMENTOS
chusetts), 1940, e D. Peres, História dos descobrimentos portugueses, 3 vol., Porto, 1943-1946. Algumas monografia s sobre «descobridores» e ?rganizado res de vi
As viagens de descobrimentos são estudadas em muitas obras recentes por exemplo:. B. Penrose, Trave! and discovery in the Renaissance, 1420~ -1620, Camb~Idge _(Massachusetts), 1952, qu~ é um manual muito cómodo; G. Le Genti_l, Decouv.erte du m01;de, Pans, 1954; a Histoire universelle des exploratiOns, publicada sob d1recção de L. H. Parias, especialmente os vols. li e III; J. H. Parry, The age of Renaissance. Discovery exploitat/0!1 and settlement, 1500 to 1650, Londres, 1963. A respeito dos descobnmento s dos Portugueses, há dois livros principais: S. E. Morison Portuguese voyages to America in the XVth century, Cambridge CM:assa-
A implantaçã o dos Europeus fora da Europa poderá ser estud3:da mediante V. de Lannoy e H. Van Der Linden, Histo~re de /'expan~wn des peuples européens, 2 vol.s., B~~xelas~ 1907; R. ~ot~:smer, Le~ europe.ens hors de l'Europe de 1492 JUSqu a, la fzn .du XVll, szecle, Par!s, 1957, .~' principalm ente, em P. Cha~mu, L exp~su;m europeenne (XIII , XIV SI.ecles), Paris, 1968, e Conquete et exploztatwn des nouveau~ mo_ndes, Pans, 1969. Estudos especializados: quanto aos portugueses, a Hzstó!za ~a exP_ansão portuguesa no mundo, 3 vol., Lisboa, 1937-19~2; as pubhcaçoes said.as Hen~Ique, '? Na':egador (LI~ por ocasião do V Centenário do Infante boa, 1960) e V. Magalhães Godinho, L economze de I E,mptre portugazs aux xv· et XVI' siecles. L'or et /e poivre. Rou~e de Gumee et route d~ Cap, 2 vol., Paris, 1956 (há um exemplar dacti!ografado na Sorbonne), C. R. Boxer, Four centuries of I?~rtug!lese expanszc:!', !415-1825, Johannesburg, 1961; quanto aos Espanhms, al.em da o.bra ]a citada d R. B. Merriman, The rise o! the Spanish Empzre .. ., ve)a-~e C. FJ;. Hanng, Th~ SPCf- . nish Empire in America, Ne;v York, _1~47; J. V1cens VIves e col., Hzston~ económica y social de Espana y A"!e.rzc~, 4 vol:, Barcelona, 1957 ~ segs:, P. Chaunu, L'Amériqu e et /es Amerzcams , Pans, 1~64 .. Obras mais est~I tamente económicas: C. H. Haring, Trade and navlgatlon between Spam and the Indies in the time of the Habsburgs, New York, 1918; J. H. Hamilton American treasure and price revo/ution in Spain, 1501-1650, Çambridge' (Massachusetts), 1934; P. e H. Chaunu, Séville et l'Atlantzqu e, 1504-1650, 12 vol. com um atlas, Paris, 1955-196q _(o mundo esp,a nhol estt~: dado pelos documentos da Casa de la Contr_atacwn); P. Chaunu, f:es Phzlippines et !e Pacifique des lbériques,. Pans, 1960; ql!~nto aos. mgleses, veja-se, principalm ente, a Cambridge htstory of the Bn~zsf! Empzre, Carobridge 1929 e segs. (no nosso caso, o t. I) e J. A. Wilhamson, A short history of British expansion, 2 vols., London,,1943-194~. Qll;anto ~o~ Franceses, J. Saintoyant , La colonisation françazse sous .1 Anczen Regzm~ du XVI' siecle à 1789, 2 vol., Paris, 1929; Ch.-A .. Juhen, Les Fra'!çazs en Amérique pendant la premiere moitié du XVI' szecle (textos), Pans, 19.46; Les Français en Amérique. Les voyages de découvertes ~t les prem.zers établissements (xv·-xvr siecles), Paris, 1948; Les Françazs er; .-1-ménque pendant la seconde moitié du XVI' siecle. Le Brésil et les B~eszlzens (te.xtos), Paris, 1953. A respeito dos Holandeses, consultar ~s cai?Itulos de história marítima e colonial da grande Algemene Gesc.hz~de!lzs der Nederlanden já citada. Quanto aos problemas criados ao cnstlam.sm pela colonização do século XVI, há um belo livro: L. H~nke , Colomsatw n e_t conscience chrétienne, Paris, 1957. Uma obra notavel sobre. ~s reacçoe~ dos índios perante a colonização espanhola: N. Wachtel, La vzswn des vamcus, Paris, 1971.
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351
. 9 Glos~a~rt;
Y!autique de A. Jal, Paris, 1848, está a ser objecto de revisao por IniCiativa de M. Mollat. Este historiador publicou além disso os t!~balhos de t~da uma série de colóquios internacion ais' de histórià ma~Itima: Le navtre et l'économie maritime du XV' au XVIII' siede P~ns, 19~9; .Le navire et l'économie maritime du Moyen Âge au XVIII~ ste.cle, pr~n.ctpalement en Méditerranée, Paris, 1958; Le navire et l'économ1e "!ar~~tme dan! les mers du nord de l'Europe, du Moyen Âge au XVIII steclff_, Pans, 1960i L_~s source_s de l'histoire maritime en Europe du Moyen Age au XVIII stecle, Pans, 1962; Les aspects internation aux de la découverte océanique aux XV' et XVI' siecles, Paris, 1966.
;Acerca de construção naval há uma boa síntese: G. La Roerie Navtres et marins. De la rame à !'hélice, Paris, 1946, a completar coni F. Mauro, L_e [>ortu[Jal et l'Atlantiqu e au XVII' siecle, Paris, 1960 (com a~mndante bibliografi~), com F. .c. Lane,. Navires et constructeu rs à Vemse pendant !a ~enat~sa_nce, Pans, 196?, e com os capítulos especializados da .grande. HIS!otre generale des ~echmqu.es, t. li, obra de primeira categona publicada em 1964 em Pans sob direcção de M. Daumas.
S~bre a arte. náutica: a bib~iografia da Histoire des sciences et des techmques ?o P. P. ~usso, Pans, 1954, R. de Loture, La navigation à trav_ers les ages. É~ol!ftwn d~ la technique nautique et de ses applications, Pans, 1952, e a H1st01re génerale des techniques de M. Daumas, já citada. . Quanto à cartografia , pode-se escolher entre L. Bagrow Die Geschtchte der Kartographie, Berlim, 1951 e G. R. Crone, Map; and their ma[cers, I:ondon,, 1953 (qut: é ffil;liS breve). A revista !mago mundi (da Haia) dedica-se a cartografia antiga. Não esquecer L. Gallois Les géo, Paris, 1890, e F. de Da'inville, La g~aphes a_llemands de ~a Renais~ance geograph1e des humamstes , Pans, 1940.
p.
.
VI. ECONOMIA. CONJUNTURA. MOEDA (Obras de carácter geral)
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Dois guias recentes e cómodos: J. Heers, L'Occident aux XIV' et XV' siecles, aspects économiques et sociaux, 2.! ed. Paris 1966 e F. Mauro, Le XVI' siecle européen, aspects économique;, Paris: 1966.
Sobre a moeda e os fenómenos monetários, ver J. Y. Le Branchu, Écrits notables sur la monnaie, de Copernic à Davanzati, Paris, 1934 e «La théorie quantitative de la monnaie au XVI" siecle», in Revue d'écoozamie politique, XLVIII, 1934. O livro de F. Spooner, L'économie mondia/e et les frappes monétaires en France, Paris, 1956, como o próprio título indica, não se. limita à França.
. Depoi~ da .Publicação das ?~ras de Karl Marx, tali~mo fo1 O~J~cto de uma sene de estudos e de
o nascimento do capicomparações com os fenomenos religiosos: M. Weber, Die Protestantische Ethik und der Geist -de.s J(apitalismus, Tübingen, 1904-1905 (trad. franc., 1964); G. Troeltsch, D1e Bedeu~ung des Protestantismus für die Entstehung der modernen ~elt, Mumque, 1911; L. Brentano, Die Anfiinge des modernen Kapitallsn:u~, Munique, 1916, W. Sombart, Der Modem Kapitalismus, 6 vols., LelpZig, 1921-1926; H. Sée, Les origines du capitalisme moderne, Paris 1926; R. H. Taw1:1ey, Religion and the rise of capitalism, Londres, 1926 · (trad. fran<;: .• Pans, 1951); H. Hauser, Les débuts du capitalisme Paris 1927. J. Stneder, Studien Geschichte kapitalistischer OrganisationsÍormen: Berlim, 1926 e Zur Genesis des modernen Kapitalismus, Berlim, 1937; H ...~· Robertson, Aspects of the rise of economical individualism: a crltlcl~m ?f Max Weber and his school, Cambridge, 1933; A. Fanfani, · Ca,ttollcesLmo e protestantesimo nella formazione storica de/ capitalismo, Milano, 1934; M. Doobs, Studies in the development of capitalism Londres, 1946 (de orientação marxista). ' Histórias ~conómicas gerais: Cambridge economic history of Europe, 3 vol., ptmbn~ge, 194f-1962 (fundamental); A. Sapori, Studi di storia econom1ca med1evale, Fuenze, 1946; G. Luzzatto, Storia economica dell'età moderna e contemporanea, t. I, Pádua, 1950· H. Pirenne Histoire économique de l'f?ccident mé~iéval, Paris, 1950; i. Külicher, Àllgemeine Wirtsphaftsgeschlchte des Mlftelalters und der Neuzeit, 2 vols., Munique-Berlim, 1954; M. Mollat, P. Johansen, M. M. Postan, A. Sapori C Verlinden «L'économie européenne aux deus derniers siecles du M~ye'n Âge}> ui X' Congres international des sciences historiques. Rapports Roma Í955 (importante); M. Mollat, «Y a-t-il une économie de la Renaissance'?}>, in Actes du Çolloque sur la Renaissance da «Société d'bistoire modeme» (1956), Pans, 1958; H. Haussherr, Wirtschaftsgeschichte der Neuzeit vom Ende des XIV. bis zur Hohe des XIX. Jahrhunderts Colónia '1960· Otsuka, K •. ~akahashi e.T. ~atsuda, Économci history,' 5 vols., Tóquio; 1960; Sfut:{l m onore d1 Ammtore Fanfani, vols. I a V, Milão, 1962. Obras uteis para a abordagem do estudo económico do Renascimento: F. Edl~r de Roover, Glossary of medieval terms of business (1200-I600), Cambr1dge (Massachusetts), 1934; O. H. Taylor, A history of economic thought, New York, 1960; J. Schumpeter, History of economic analysis Londres, 1954-1955. ' A evolução dos preços e o estudo da conjuntura foram nestes últimos l!-nos, objecto de muitas pesquisas locais, publicadas ou a~alisadas em especial ,nos Anrz.ales, E. S. C. No plano geral: G. Wiebe, Zur Geschichte der .Pr71srevolutwn des XVI. und XVII. Jahrhunderts, Leipzig, 1895; F. Simiand, Recherches anciennes et nouvelles sur le mouvement généra/ de.s prix du XVI' C?U XIX' ~iecle, Paris, 1932; R. Lopez e H. A. Miskimm1 «The e<;:onomic depress10n of the Renaissance}>, in Economic history rev1ew, Abnl de 1962, pp. 408-426; M. Malowist, «Un essai d'histoire comparée: les mouvements d'expans10n en Europe aux xv• et XVI" siê-
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und Sozialgeschichte,
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VIL CAMPO E CIDADES
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Estudos por países
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354
355
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Portug'!-1: Rau, <
As cidades Urbani.smo e obras gerais: P. Lavedan, Histoire de i'urbanisme, 3_ vols., P
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VIII. TÉCNICAS. ARTESANA TO. INDúSTRIA S Obras de conjunto sobre as técnicas e ~ist~ria~ g.~rais d trabalho: E Molinier Histoire générale des arts appliques_ a lzf!dustne, ~ vols., P~ris, 1896-l911; A. Fanfani, Storia deZ. Iavoro ~~ Jtalla dalla fm e de/ seco/o XV agli inizi de/ Sf!COlo XVIII, :Mllao, 1943, J. U. Nef, La guerre et te progres humain, Pans, 1954; G. Smger, E. J. Holmyard, A. R: Hall , T. 1. Williams, A history o! technology, vol. III: From ~he R ena1ssance to the industrial revolution .(1500-1!50), Oxf?r.?, 1957; ~h. Wolff . e F. Mauro, Histoire générale du travazl, t. I~: L Age de J artzsa~at, ~ar.I S, 1960· B. Gille Les ingénieurs de la Renazssance, Pans, 1964, Hzstoz:..e génÚale des tdchniques (sob direcção de M . .Daumas), .t. II: Les P,re:nzeres é tapes du machin_isme ( 1450-1730), Pans, 1965 (estas duas ultimas obras são fundamentais). Artesanato: além dos trabalhos citad~s atrás, ver, para. a França: H. Hauser, Ouvriers du temps passé, Pa!IS, 1898 e Les métzers d'!ns _la littérature française du XV~: siecle: P~ns, 1934; E . Levassem, .HzstOir~ des classes ouvrieres et de l mdustne en France avant 17~9, Pans, 1901, E . Coornaert, Les corporations en F rance ava.nt 1789, .Par_Is, 19~1.- Para a Inglaterra: S. Kramer, The english craft !JUllds: stud1es m the1r progr~ss and decline, Nova Iorque, 1927; ~- G. Davie~ •.The enforcement o! en~llsh apprenticeship. A study in applzed mercant1lzsr_n: , 1563-1642, ,cambridge, 1956. - Para a Itália: E . Levassem, Le travazl a F_lor~nce a la /l.n du. Moyen Ãge, Paris, 1910; G. Morelli, Le corporazwm romane d1 .art.' e mestieri dal XIV al XIX secolo, Roma, 1937; I. M : Sacco, Professwm! arti e mestieri in Torino dal secolo XIV al XIX, Tunm, 194~; E. Nasalh Rocca, Statuti di corporazioni artigiane piancentine, secolz XV-XVIII, Milão, 1955. Indústria: G. Unwin, The industrial organization ~n the XV~th .and XVlth centuries Londres 1904· J. Lejeune La formatwn du cap1tal!sme dans la principduté de Llege a~ XVI" siecfe, Liege, ~939; R. Forberger, Die Manufaktur in Sachsen vom Ende des XVI. b1s. zu~ Anfan~ des XIX. Jahrhunderts, Berlim, 1958; P. Romeva Ferrer, Hzstorza de la mdustria catalana, Barcelona, 1952. Pesca: N. de Lalaing, Histoire des pêc;hes maritimes ·et fluviales~ Paris, 1889; R. Degryse, «Le convoi de la peche à Dunkerque au~ XVI et XVII" siêcles» in Revue du Nord, XXXIII, 1951; H. A. Inms, The cod fisheries. Th~ history of an international economy, Toront• 1940; J. Bemard, «Les anciennes pêcheries de Ia Garonne en Bordelais et en Bazadais», in Revue d'histoire de Bordeaux, 1961.
IX. «MERCADO RES» E MERCADOR IAS
«Mercadores»
América: P. W. Powell, Soldiers, Indians and silver Berke1ey, 1952 (estudo das cidades mineiras do México). '
Duas obras gerais de pequeno tamanh~ mas CÇJm qualidade: J. ~e Goff Marchands et banquiers du Moyen Age, Pans, 1956; P. Jeannm, Les 'marchands au XVI siecle, Paris, 1957. ·
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«Mercadores» italianos. Os agrupamentos de mercadores: Y. Renouard, Les relations des papes d'Avignon et des compagnies commerciales et bancaires de 1316 a 1378, Paris, 1942; Recherches sur les compagnies commerciales et bancaires utilisées par les papes d'A vignon avant !e_ Grand Schisme, Paris, 1942; Les hommes d'affaires ita/iens au Moyen Age, Paris, 1950; A. Sapori, Le marchand italien au Moyen .Ãge, Paris, 1950; A. Sapori, Le marchand italien au Moyen .Ãge, Paris, 1952; A. A. Ruddock, Jtalian merchants and shipping in Southampton (1270-1600), Southampton, 1951; J. F. Bergier, «Marchands italiens à Genêve au début du XVI" siecle (1480-1540)», in Studi in onore di A. Sapori, 1957; C. Verlinden, «La colonie italienne de Lisbonne et l'économie portugaise», ibid.; R. Gascon, «Les italiens dans la renaissance économique lyonnaise au XVI" siecle», in Revue d'études italiennes, V, 1958 e «Quelques aspects du rôle des Italiens dans la crise des foires de Lyon du dernier tiers du XVI" siêcle», in Cahiers d'histoire, V, 1960.- Famílias de mercadores, personalidades notáveis neste campo: J. Denuce, L'inventaire des Affaitadi, banquiers à Anvers, Anvers, 1934; R. Doucet, La banque Capponi à Lyon en 1556, Lyon, 1939; F. C. Lane, Andrea Barbarigo, merchant of Venice, Baltimore, 1944; A. Sapori, La compagnia dei Frescobaldi in lnghilterra, Florença, 1947; P. Norsa, 1 Norsa: contributo alia storia di una famiglia di banchieri, Milão, 1959; R. De Roover, The rise and decline of the Medici bank ( 1394-1494), Cambridge (Massachusetts), 1963. «Mercadores» não italianos (ou italianos e não italianos estudados em conjunto): A. Schulte, Geschichte der grossen Ravensburger Hande/sgesel/schaft (1380-1530), 3 vols., Estugarda-Berlim, 1923; J. A. Garis Les colonies marchandes méridionales à Anvers de 1488 à 1567 Louvain' 1925; R. De Roov, :, Gresham on foreign exchange: an essay on early eng_lish mt;rcantilism, Harvard, 1949; G. F . Von Põlnitz, Jakob Fugger, Kazser, Kzrche und Kapital in der oberdeutschen Renaissance, Tübingen 1949; R. Ehrenberg, Le siecle des Fugger, Paris, 1955 (trad. franc. resu: mida, da obra publicada em 1896); S. L. Thrupp, The merchant ciass of medieval London, 1300-1500, Chicago, 1950; L. Schick, Un grand homme d'affaires au début du XVI" siecle, Jakob Fugger, Paris, 1957; M. Mollat & col., Le~ affaires de Jacques Creur. Journal du procureur Dauvet, 2 vais., Pans, 1952-1953; H. Lapeyre, Une famille de marchands: les Ruiz, Paris, 1955; F. Melis, Aspetti de/la vita economica medievale (Studi neU:A.rchivio Datini di Prato), t. I, Siena, 1962 (os negócios de Francesco Datmt); P. Dollinger, La Hanse, XVI-XVII" siecle, Paris, 1964; W. Brulez, Marchands flammands à Venise, vol. 1: 1568-1'605, Bruxelas-Roma. 1965.
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sop te . er
~~;~on:fite 1a;~~toHil;CY
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m!rtte::/~~d ;::~~l~~;, t;~n~h~~~i:::f:~·d~~~~;,d c1m~!r%:1 ,o~~i!~c1.
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Quanto à Alemanha, as pesquisas de h~stória social incidiram, principalmente, até hoje, na revolta dos cavaleuos e na guerra dos camponeses. Sobre a primeira, veja-se R. Hi~chcock, The background of the Knight's revolt, Berkeley, 1958. Depms de Engels, que escr~veu um livro sobre A Guerra dos Camponeses (trad. franc. Bracke, Pans, 1952), os historiadores marxistas têm vindo a aprofundar incessantemente o estudo da grande crise social alemã de 1524-1525- especialmente R. Pa~ cal Social basis of the German Reformation: Martin Luther and hzs tinies, London, 1933, e M. Smirin: Die Volksreformation. von Thon:as Müntzer und der grosse Bauernkrzeg (trad. do russo), 2.- ed., Berhm, 1956 (a principal obra de orientação marxista acerca da Guerra dos camponeses). Fora da historiografia marxista, há a assinalar: .A.. M. Lohmann, Zur geistigen Entwicklung Thomas Mün~zers, Letpztg, 1931; W. Zimmermann, Geschichte des grossen Bauern~rzegs, 2 vol., Naunhof, 1939· em francês há essencialmente, a este respetto: L. G. Walter, Thomas 'Münzer (14B9-1525) et les luttes sociales à l'époque de la Réforme, Paris, 1927, e M. Pianzola, Thomas Müntzer ou la Guerre des paysans, Paris, 1958. Quanto ao resto da Europa, exceptuando a Itália e a Espanha: 1) Países Baixos, sem contar com os numerosos est~;~dos mais. de carácter económic~)á citados, L. Dech~sne, H!sto~re éco'!omzque ~.t socza~e de la Belgique, Liege, 1932; J. Mathieu, .Hzstozre soczale de I zndu,strze textile de Verviers Dison 1946; T. Wittmann, Quelques problemes relatifs à la dictatu;e révolzltionnaire des grandes villes de Flandre (1577-1579); Budapeste, 1960). 2) Suécia: S. A. Nilsson, The struggle for the privileges of the nobility in Sweden (1526-1594), Lund, 1952. 3) Balcans: J. V. Bromley, La révolte des paysans ~n Croatie_ e~ 1573. Les relations agraires et la lutte des classes en C~oatze l!u XVI. szecle,. Moscovo, 195?. 4) Hungria: F. Maksay, Paysannerze et economze allo.dzale. en Hongrze au xvr siecle, Budapeste, 1~58; c. D'E,sz!ar~, «;-a Situ:;ttion des s.erfs en Hongrie de 1514 à 1848» m Revue d hzstozre economzque et soczale, 1960. pp.387-417; Z. P. Pa~h, «Seigneurs hongrois au XVI" siecle et éconornie paysanne», in Annales, E. S. C.: Novembro-Dezemb.ro de 1966. 5) Checoslováquia: J. Macurek, Les Tcheques et les Polona!s .de la seconde moitié du XVI" siecle (1573-1589), Praga, 1.948. 6) Poloma: S. A~ nold «Les idées politiques et sociales de la Renaissance en Pologne», m La Pologne au x· Congres international des sciences historiques à .Rome, Varsóvia 1955· 7) Rússia: B. Gille, Histoire économique et soczale de la Russi~ du Moyen Âge au XX' siecle, Paris, 1949; J. Kaufmann, Recherches sur les origines d'une bourgeoisie russe aux XVI" et XVII" siecles, Paris, 1966 {ex. dact., Sorbonne). Itália: há numerosas indicações de carácter social no. grande livro de J. Burckhardt, Die Kultur der Renaissance... Veja-se também C. E. Trinkaus, Adversity's noblemen, Nova Iorque-Londres, 1940; F. F. Crane, Italian social customs in the XVlth century, Nova Iorque, 1942· A. von Martin Sociology of the Renaissance, Oxford, 1944; H. Baron 'rhe crisis of th~ early italian Renaissance, 2.! ed., Princeton, 1966, e «The social background of política! liberty in the early italian Renaissance» . in Comparative studies in society and history, 11, Julho de 19~0; G. Ba;ni «Mutamenti di ideali sociali dal secolo XVI al secolo XVIII; ~m risti nobilità e mercatura>> in Rivista internazionale di filosofia e dmtto, 1957, pp. 766-787.- Mono'grafias e estudC?s P:;trtic~larizados: .B. Caizz!, Il Comasco sotto il domínio spagnuolo. Saggzo dz storza economzca e soczale,
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Como, ~955;. J:... Tene?ti,. «C!li schavi di Venezia alia fíne dei Cinquecento», m R_zvzsta storzcq ztalzana, 1955, pp. 52-69; J. Alazard, La Venise de la Renazssance, Pans, 1956; J. Delumeau, Histoire économique et sociale de Rome ... ; L. Martines, The social world of the florentine humanists, 1390-1460, Princeton, 1963. Esp.anha: além da grande Historia económica y social de Espana ... de J. Vtce~s Yives, e ~a obra de P. Vilar, La Catalogne dans l'Espagne mode_rne, ]a citadas, veJa-se, também: R. Del Arco Y Garay, La sociedad espano/a en las obras dramaticas de Lope de Vega, Madrid, 1942; J. Arago?eses, Los moyimientos y luchas sociales en la baja Edad Media, Madnd, 1948; P. VIllar, «Le temps du Quichotte» in Europe, 1956 n:• 121-121; A. Castillo, «Population et richesse en 'castille durant 1~ seconde moitié du XVI" siecle», in Annales, E. S. C., 1965, pp. 745-759. Sobre os mouros de Espanha e sua expulsão, veja-se . o notável trabalho de H. Lapeyre, Géographie de l'Espagne morisque, Paris, 1959. Sobre os judeus da época do Renascimento, a obra basilar é a de
C. Roth, T~e Jews in the Renaissance, Philadelphia, 1959, a completar
com L. Pohakov, Histoire de l'antisémitisme 2 vols. Paris 1961. Há uma PC?rmenorizad
Demografia A bas~ de todos os cálculos . demográficos é muito frágil no . caso do Renascimento ou mesmo do século XVII. Os trabalhos de carácter ge~al são os. de J. Beloch, «Die Bevõlkerung Europas zur Zeit der Renaissance», m Zeitschrift für Sozialwissenschaft, III, 1900; C. Cipolla, J. Dhondt, M. M. Postan, Ph. Wolff «Démographie Moyen-Âge» in 1X' Congres international des sciences 'historiques Paris 1950· R. Mols lntroduction à la démographie historique des viÍ!es d'Europ; du XIV; au JÇVIII' siecle, 3 .. vols., Louvain, 1954-1956; E. W. Bucholz, E . Kirsten, W. W. Kollmann, Raum und Bevolkerung in der Weltge~ch~chte,, 2, vols. Wurzburg, _1956; M. Reinhardt e A. Armengaud, !Jzstozre general!! de .lq, popul~tzon mondiale, Paris, 1961. Um inquérito a escala europeia fm ]a publicado sob o título Villages désertés, Paris 1965. Quanto ao método a utilizar nos levantamentos demográficos, ~ obra de ~· Fleury ~ L. Henry, Des registres paroissiaux à l'histoire de la populatzon .. ., Pans, 1965, completa a de P. Goubert Beauvais et [e Beauvaisis de 1600 à 1730, Paris, 1960. Veja-se ainda as 'Actes do Co/loque international de démographie historique de Liege, 18-20 avril 1963, ed. de P. Marsin e E. Melin, Liege-Paris, 1965 e Population in history. Essays in historical demography, ed. de D. V. Glass e D. E. C. Eversley, Londres, 1966. Acerca das formas antigas de contracepção: P. Aries, H. ~ergues, E. _Helin, L. Henry, P.". Riquet, A. Sauvy, J. Sutter, La préventzon des. nazssances dans la famzlle, ses origines dans les temps modernes, Pans, 1959. Quanto à população de França, ainda é útil o velho livro de E. Levasseur, La p~pulation française._.., Paris, 1889-1892. Monografias recentes: E. Baratier, La démographze provençale du XIII" au XVI' siecle. Avec chiffres de comparaison pour le XVIII" siecle, Paris, 1961; R. Collier,
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«La population bas alpine du XIII• au XVI" siêcle», in Annales de haute Provence, 1962; E. Le Roy Ladurie, Les paysans de Languedoc, já citado.
siglo XVI», in Estudios de historia social de Espana, vol. li; finulm ·•llc, 0 artigo, já mencionado, de A. Castlllo, «PopulatiOn et richcssc cn t '11N tille .. . >>.
Quanto à população de Inglaterra: C. Creighton, «The population of old Londom>, in Blackwood's Magazine, CXLIX, Edimburgo, 1891; E. E. Rich, «The population of elizabethan England», in Eccnomic history review, 2.• série, II, n.• 3, 1950; L. Owen, «The population of Wales in the XVIth and XVIIth centuries», in Transactions of the Cymenrodorion Society, 1959; J. F. Pound, «An elizabethan census of the poor», in Univ. of Birmingham Hist. Journal, VIII, 1962; D. E. C. Eversley, P. Laslett, E. A. Wrigley, An introduction to english historical demography /rom the XVlth to the XIXth century, Londres, 1966. Quanto à população dos Países Baixos (e das Províncias Unidas em vias de formação): H. Van Der Linden, «Le dépeuplement de Ia ville de Louvain au XVI" siêcle», in Mélanges Paul Frédericq, Bruxelas, 1904; M. Arnould, Ath et Avesnes en I594. État démographiq ue de deux villes hennuyeres, Bruxelas, 1943; R. Boumans, «Le dépeuplemen t d'Anvers dans Ie premier quart du XVI" siêcle», in Revue du Nord, 1947; J. A. Faber, H. R. Roessingh, B. H. Slicher Van Bath, A. M. Van Der Woude, H . J. Van Xanten, «Population changes and economic developments in the Netherlands. A historical survey», in A. A. G. Bijdragen, XII, 1965. Quanto à Alemanha, temos a obra já citada de W. Abel, Die Wüstung_en ... , que é fundamental. A título de exemplo, citamos uma monografia: W. Kronshage, Die Bevolkerung Gottingens. E in · demographischer Beitrag zur Sozial- und Wirtschaftsge schichte vom XIV. bis XVII. Jahrhunderts, Gõttingen, 1960.
Quanto à população da América pré-colo!ll_bia_na, <;:onsulte-se dois artigos de P. Chaunu, «Une histoire J:tispano-ame~Icai~e pilote. En !Dargc de I'reuvre de l'école de Berkeley», m Revue h1stonque, 196~, n. ~. e «La population de I'Amérique i??ienne», ib!d., 1964, n . ~ 3. VeJa-se amda H. F . Dobyns, Estimating abongmal Amencan populatwn, Ithaca, 1964.
Quanto à Suíça: L. Henry, Anciennes familles genevoises, étude démographique, XVr-xx• siecle, Paris, 1956. Acerca da população de Itália, a obra fundamental é ainda hoje a de J. Beloch, Bevolkerungs geschichte Italiens, publicada em 1937-1939 (tt. I e li) e depois reeditada em 1961 (3 vols.) em Berlim. Também se pode encontrar informes demográficos em G. Prato, Censimenti da popolazione nei secoli XVI, XVII, XVIII, Roma, 1908 e em F. Braudel La Méditerranée ... , já citado. Informes sobre a populaÇão de várias cida: des italianas em G. Coniglio, li Regno di Napoli ... , já citado e /i Viceregno di Napoli nel secolo XVII, Roma, 1953; J. Delumeau, 'vie économique et sociale de Rome ... , já citado; G. Aleati, La popolazione di Pavia durante il domínio spagnuolo, Milão, 1957; A. Belletini, La popolazione di Bologna dai secolo XV all'unificazio ne italiana, Bolonha 1961 · E. Carpentier, Une vil/e devant la peste: Orvieto et la Peste N~ire d~ I348, Paris, 1962.
Quanto à China: Ping Ti-Ho, Studies on the population of China, 1368-1953, Cambridge (Massachusetts), 1959. XI. ESTUDOS DAS MENTALID ADES. A VIDA QUOTIDIAN A Além de diversas obras já mencionadas nas ~ubri<;:as «Histór!a socia~» e «Mercadores e mercadorias», e de outras a m~lmr na rubnca. «Pre~ -Reforma. Reforma protestante e Reforma catóhca», há a considerar. No plano geral: J. Huizinga, Le déclin dl! Moyen ::fge, trad. de . 1932, Paris, reed. 1948; L. Febvre, L~ probleme de l mcroyance au XVI' siecle: la religion de Rabelais, Pans, 1947;. A. Dupront, Le mythe de croisade, étude de sociologie religieuse, Pans, 19~6 .(ex. dact., Sorbonne) e, deste mesmo autor, um artigo em, que se. de~me1a um progra~a de pesquisas: «Problemes et méthodes d une histmre de psycholo~1e collective», in Annales, E. S. C., 1961, n.• 1; L. Febvrt: e H. J. ~a~m, L'apparition du livre, Paris, 1958; J. Bousque~, La pemtl!re. mamenste, Neuchâtel, 1964; F. Braudel, Civilisation maténelle et capuallsme, vol. I, Paris. 1967.
Estudos particulares
H. Sancho de Soprams, «Estructura y perfil demográfico de Cádiz en el
Por países.- França: R. Dion, Les frontieres de la F rance, Paris, 1947· M Defourneaux La vie quotidienne en France au temps de Jeanne d'Ar~. Paris, 1952; A. Lefranc, La vie qu~ti.d_ienr:e au tem_Ps de la Renaissance Paris 1956· J. Bablon, La CIVIilsatwn frança~se de la Renaissance: Paris, '1961; R. ·M androu, Introductio'! à la Frc:nce moderne. Éssai de psychologie collective, Paris, 1961; A. Demeul-Corme!, La Fra'!ce. de la Renaissance, Paris, 1962.- Inglaten:a: C. HC?le, En!fl~sh home[lfe. 1500 to I800, Londres, 1947; L.- Lemonmer, La v1e quotldzenne. en Angleterre sous Élisabeth, Paris, 1950; M. T. J~nes-Davies, Un p~mtre d~ ta vie londonienne: Thomas D~kker, I572-I632, 2 vols., Pans, 1958: M. S. C. Byrne, Elizabeth life m town and country, Ne:w York, !9~!· P. Voisin, Les truands et les gueux de Londres et de Parzs a~ XVI ~~e ele et au début du XVII" siecle, Rennes, 1961.- Alemanha. essencu~l mente, a obra de J. Janssen, L'Allemagne et ZC! Réfor_me, 9 yols., P~ns, 1887-1914, que ainda hoje é fun?amenta l.- Pa1s~s Batx?s: alem d~ livro de J. Huizinga, dedicado espectalmentf? ao~, Pmses Ba1xosl .J: Le]eune, Liege et son pays. Naissance d'une patne, L1ege, 19.48. - Italia. A. Graf, Attraver.so il Cinquecento, Turim, 1888; P .. Mo1_1mer, Le Quattroce_nto, 2 vols., Paris. 1901; La vita i~aliana !'lei Rmascz"!ento (obra colectiva), Milão, 1931; F. F. Crane, Italwn socwl customs zn the XVIth century,
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_Quanto. à população espanhola, além dos trabalhos já citados de J. VIcens VIves, de F. Braudel e de H. Lapeyre (Géographie de /'Espagne morisque): J. Ruiz Almansa, La poblacion de Galicia (l508-I945) Madrid, 1948; J. lglesias, «Distribucio comarca! de Ia poblacio cataláne a Ia preimera meitat dei siglo XVI», in Inst. Esst. Barcelona 1957· J. Nadai e E. Giralt, La population catalane de I553 à I7I7. L'immi~ gration /rançaise et le~ autres facteurs de son développeme nt, Paris, 1960;
New York, 1942 M. Vaussard, La vie quotidienne en Jtalie au temps de la Renaissance, Paris, 1959; J. Lucas-Dubreton, La vie quotidienne à Florence au temps des Médicis, Paris, 1959.- Espanha: Charles Quint et son temps (obra colectiva), Paris, 1959.- Portugal: A. J. Saraiva, História da Cultura em Portugal, Lisboa, 1952. Por temas de pesquisa: A mulher: A. Richter, Deutsche Frauen, Kulturgeschichtliche Lebensbilder, Leipzig, 1905; E. Rodocanachi, La femme italienne à l'époque de la Renaissance, Paris, 1907; K. Bucher, Die Frauenfrage im Mittela/ter, Tübingen, 1910; K A. Wieth-Knudsen, Frauenfrage und Feminismus. Vom Altertum bis zur Gegenwart, Stuttgart, 1926; G. E. Diller, La rache des dames, Paris, 1936; E . V. Telle, L'(Euvre de Marguerite d'Angoulême, reine de Navaire, et la querelle des femmes, Toulouse, 1937; Érasme de Rotterdam et /e septieme sacrement, Geneve, 1954; L. Febvre, Autour de l'«Heptaméron»: amour sacré, amour profane, Paris, 1944; W. Bomli, La femme dans /'Espagne du siecle d'or, Haia, 1950; C. Camoen, The elizabethan woman, Londres, 1952; G. E. e K. R. Fussell, The english country-woman, Londres, 1953; R. Kelso, Doctrine for the lady of the Renaissance, Urbana, 1956; V. L. Saulnier, Le dessein de Rabe/ais, Paris, 1957 (com um estudo sobre a «querela das mulheres»); M. Bataillon, La Célestine selon F. de Rojas, Paris, 1961; Recueils de la Société Jean-Bodin pour l'histoire comparative des institutions, t. XI: La femme, 11 parte, Bruxelas, 1962; J. Bailbe, «Le theme de la vieille femme dans la poésie satirique du XVI' et du début du XVII' siecle», in Bibliotheque d'humanisme et Renaissance, XXVI, 1964; L Loesh, So war es Sitte in der Renaissance, Hanau, 1965; Histoire mondia/e de la femme (obra colectiva sob direcção de P. Grimal), t. Il, Paris, 1966. A criança e a vida familiar: V. Lugli, I trattatisti del/a famiglia nel Quattrocento, Bolonha, 1909; N. Tamassia, La famiglia italiana nei secoli XV e XVI, Milão, 1910; C. L. Powell, English domestic relations, 1487-1653, Nova Iorque, 1917; W. H. Woodward, La pedagogia del Rinascimento, 1400-I600, Florença, 1923; P. Petot, La jamil/e en France sous l'Ancien Régime, Paris, 1955; E. Garin, Il pensiero pedagogico dell'umanesimo, Florença, 1958; Ph. Aries, L'enfant et la vie familiale dans l'Ancien Régime, Paris, 1960 (obra muito notável). O vestuário: F. Boucher, Histoire du costume en Occident, de l'Antiquité à nos jours, Paris, 1965. Culinária e alimentação: há duas obras de carácter geral: G. Blond, Histoire pittoresque de notre alimentation, Paris, 1960, e J. Bourgeat, Les plaisirs de la table en France, Pari~, 1963. Uma investigação particularizada: B. Bennàssar, «L'alimentation d'une ville espagnole au XVI' siecle. Quelques données sur les approvisionnements et la consommation de Valladolid», in Annales, E. S. C., 1961, pp. 728-740. A vida da corte e as festas: as obras de E. Rodocanachi, nas quais se pode encontrar úteis informes: Histoire de Rome. Une cour princiere pendant la Renaissance. Sixte IV, Innocent VIII, Alexandre VI, Paris, 1925; Le pontificat de Jules li, Paris, 1928; Le pontificai de Léon X, Paris, 1931; Les pontificats d'Adrien VI et de Clément VII, Paris, 1933; L. H. Murray, The ideal of the court lady, I56I-1625, Chicago, 1938; O. Cartellieri, La cour des ducs de Bourgogne, Paris, 1946; A. M. Laffitte,
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La vie à la cour de Lorraine sous le duc Antoine ( 1508-1544), tese da «Ecole des Chartes>>, 1955 (ex. dact.); Les jêtes de la Renaissance (colóquio do C. N. R. S.), estudos apresentados por J. Jacquot, 2 vol., Paris, 1956-1960; D. M. Bergeron, Engiish civic pageantry, 1558-1642, Londres, 1971; N. Z. Davis, «The reasons of misrule: youth groups and charivaris in sixteenth century France», in Past and present, Fevereiro de 1971.
A casa: J. Salvini, «La vie d'un manoir du bas Poitou pendant un siecle: Laroche-Jacquelin, 1566-1665», in Bulletin de la Société des Antiquaires de l'Ouest, 1929; S. O. Addy, The evolution of the English house, 4! ed., Londres, 1933; M. Jurgens e P. Couperie, «Le logement à Paris aux XVI" et XVII' siecles», in Annales, E. S. C., 1962, pp. 488-500. Sentimentos e moralidade: J. Galabert, «Les mreurs chrétiennes au XV' siecle», in Bulletin de la Société archéologique de Tarn-et-Garonne, 1884; A. Desjardins, Les sentiments moraux au XVI' siecle, Paris, 1887; C. Petit-Dutaillis, Documents nouveaux sur les mreurs populaires et /e droit de vengeance dims les Pays-Bas au XV' siecle, Paris, 1908 («Bibliotheque du XV' siecle»); G. Maugain, Mreurs italiennes de la Renaissance: la vengeance, Paris, 1925; M. Enriquez, «La vendetta nella vita e nella legislazione fiorentina», in Archivio storico italiano, 1933; P. Renucci, «Filie ou garçon? Jeu de hasard florentin du XVI' siecle», in Annales de la Faculté des lettres de Toulouse, 1952; L. Febvre, «Pour l'histoire d'un sentiment: le besoin de sécurité», in Annales, E. S. C., 1956, n." 2; Th. Platter, Autobiographie (trad. M. Helmer, Paris, 1964). O folclore : P. Sébillot, Le fo/klore de France, 4 vol., Paris, 1904-1907; A. Van Gennep, Manuel de folklore trançais contemporain, 12 vol., Paris, 1938-1958; A. Aarne e J. Thompson, The types of the folktale, 2.' revisão, Helsínquia, 1964; V. J. Propp, Morphologie du conte, trad. franc., Paris, 1970 (Seuil e Gallimard). A morte, a feitiçaria, o demoníaco, a loucura: J. Hansen, Quellen und Untersuchungen zur Geschichte des Hexenwahns und Hexenverfolgung im Mittelalter, Bonna, 1901; H. Ch. Lea, A history of the lnquisition of Spain, 4 vols., Nova Iorque, 1907; J. Schacher, Das Hexenwesen im Kanton Luzem, 1400-1675, Freiburg, 1947; E. Brouette, «La civilisation chrétienne du XVI' siecle devant le probleme satanique», in Études carmélitaines, 1948; Satan; E. Delcambre, Le concept de la sorcellerie dans le duché de Lorraine aux XVI" et XVII' siécles, 3 vol., Nancy, 1948; A. Tenenti, La vie et la mort dans l'art du xv· siecle, Paris, 1952; J. Baltrusaitis, Le Moyen Âge fantastique, Paris, 1955; F. Bavoux, Hantise et diableries dans la terre abbatiale de Luxeuil, Mónaco, 1956; E. Castelli, Le démoniaque dans l'art, Paris, 1959; M. Foucault, Histoire de la folie à l'âge classique, Paris, 1961 (o início do livro trata do Renascimento). Uma série de obras recentes fundamentais: N. Cohn, Les fanatiques de l'Apocalypse, Paris, 1962; C. Ginsburg, I Benandanti, Turim, 1956; R. Mandrou, Magistrats et sorciers en France au XV/r siscle, Pàris, 1968; M. Bakhtin, Le monde de Rabelais, Paris, 1970; A. Mac Farlane, Witchcraft in Tudor and Stuart England, Londres, 1971; K. Thomas, Religion and the decline of magic, Londres, 1971; J. C. Baroja, Les sorcieres et leur monde, Paris, 1972. A aptidão para os negócios e o desenvolvimento do sentido do cálculo na vida comercial: além das obras assinaladas na rubrica «Mercadores e mercadorias», veja-se B. Groethuysen, Origine de l'esprit bourgeois
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ciales à en France, Paris, !927; ~- E. Sayous, «Les méthode s commer , étranger et trançais droit du e d'histo_ir ~evue m Barc~lone au xv· Slecle», 1936, H .. ~auser 1 La moder_mté cfu XVI sli'!cle, Paris, 1930; R. de Roover, ion «Aux ongmes . ~ l!n~ tec~mque mtell~ctuelle: la formatio n et l'expans que et de !a comptab thte a partle double», m Annales d'histoire économil'introsocw_le, IX, 193_7, pp. 171-193 .e 270-296; J. B. de Carvalho , «Sur », in Bulletin des ~uctwn et la <;hffuswn des chtffres arabes au Portugal s économi ques «Réalité Silva, J. e Braudel F. 1958; _XX, ses, etude~ portugat in et pnse de consctence: quelques témoignages sur le XVI" siêcle» French Ar:nales•. E. S. C., 1959,_ pp. ~32-737; N. Davis, «XVIth century XXI, anthmeti~s on !he. b?smess hfe.», m ~ournal. of history of ideas, Bolonha , pp. ~8-48, ~- ~Icohm, Lettre dt negozt deZ pteno Cinquecento,Affaires et 1965, ~· pru~ctpalmente, Ch. Bec, Les marchands écrivains. humams me a Florence, 1375-1434, Paris-Ha ia, 1967. . Sobre o problem a da usura, além das obras de R. de Roover L'évo-· lutwn de la lettre de change ... e de R. Mandich Le < ~rttgo «Usure» d? DLCtwnnatre de théologie catholique· B Nelson The c analy~is of 1dea ot usury,_Pnnceto n, 1949; J. T. Noonan , The sch~lasÍi et /e L'Ég/ise , Flandrin L. J. 1957; l!setts), (Massach ~e Cambnd usury,_ controle des natssances, Pans, 1970 (excelente). XII. O HUMAN ISMO
Obras gerais . _Sobre a origem da palavra «humani smo», veja-se A. Campan a «The ani Courongm of ~he word Humanis t», in The Journal of the Warburg desta início no citadas já gerais obras das Além 1946. IX, tqulçlins tftutes, philosophie btbWgraf!a~ poder-se-á ainda con~ultar a grande Histoire de la de · Brehter, ~ vo_l., reed., Pa_ns, 1950-1955. Mais sucinto e mais claro,F. ~opleston, Htstmre de la ph1losophie, t. III: La Renaissance Tournai -Pans, 1958. Pode-se acres~entar-lhe P. Imbart de la Tour, L~s origines a em de la Réforme , 4 vol., Pans, 1905-1935, obra parcialm ente reeditad 1944 e 1948 (o volume Évangélis_me é excelente); E. Cassirer, P. o. Kris1948 teller e J. H.:. Randall, The ~ena1ssance philosophy of man, Chicago,ento); (com traduçao de pass~gens tmportai}tes dos pensado res do Renascim r, A. R~naudet, Humam sme et ~enatssanc~, Paris, 1958; P. O. Kristelle Nova Renatssance thought: the class1c, scholast1c, and humanis tic strains Iorque, 1961; J .. H. Randall, The career of philosophy from the Middle nts A,ges to the Enllghte_nment, Nova Iorque, 1962; G. Duby, Les fondeme L'ideale Weise, . G 1966; , Genebra 0, 1280-144 me, .hum~nzs nouvel d ur; colóerl?Ico del Rmasctm ento, 2 vols., Nápoles, 1965; Individu et société Renaissance, obra colecti~a sob qut? do _C. N. R. S. de 1965; Late italian · a d1recçao de E. Cochran e, Londres , 1970.
Aspecto s filosóficos Sobre o humanis mo em tal ou tal país, consulta r, principa lmente:s A. Renau,d et,. Préréforme et humanis me à Paris pendant les premiere livro de guerres d I~'!lle (m~a tese célebre), reed. de 1953; o grande s de trabalho os ; Réforme le et agne L'Allem ado, menciOn ]a J. Janssen
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C Saitta IZ. pensiero italiano nell'umanesimo e nel Rinascimento, 3 vol., Bolonha ,' 1949-1951, e de E. Garin, especialmente Il Rinascim ento .ital!ano, Milão, 1941; Medioevo e Rinascim ento, Bari, 195~, e La cultura ftlosoD. Bush, fica dei Rinascim ento italiano, Florença , ~96.1; e, fm alm_ent~, departe The Renaissance and english humanis m, mdtcado na pnme1raRenai~sadesta nce, bibliografia. P. O. Kristeller, Eight philosophers of the italíc:n hy m ~e Stanford (Califórnia), 1964; J. S. Seigel, Rhetoric and phrlosop Actwn naissance humanis m, Princeto n, 1968; Th. K. Rabb e J. E. Setgel, and conviction in early modem Europe, Princeto n, 1969; P. Burke, The Renaissance sense of the past, Londres , 1970. Acerca da corrente neopitag órica e neoplató nica, o livro de ~· Cassided1cad ao rer, Individu um und Kosmos, Leipzig, 1927, .Pri~cipalmente 1963). Amda estudo de Nicolau de Cusa foi reeditad o em mg1es (Oxford, c a sobre Nicolau de Cusa, vdr também a introduç ão de M. de Gandilla (Euvres choisies de Nicolas de Cues; Paris, 1954; P. E. Sigmund, Nicho/as 196_3, of Cusa and medieval política[ thought, Camb~dge (Massac~u.setts), Pans, tude, f!m la de stque métaphy la ou Cues de e G. Bufo, Nicolas além dos 1964:- Sobre Marsilio Ficino e o neoplato nismo florentm o : N. R~bb, trabalho s de A. Chastel de que tratarem os mais adiante: A. Festu.giêre, Neoplatonism of the italían Renaissance, Florença , 1935; A. J. La philosophie de l'amour de Marsile Ficin et son influence sur la lzttéra~y ture française au XVI' siecle, Paris, 1941; P .. 0. Kristeller, The philosop Marslle Marc7l, R. 19~3; 1t., trad. 1935, York, New of Marsilio Ficino, espeFicin 1433-1499 Paris 1958.- Sc>bre Pico de M1randola, veja-se, sforia I?ella cialn{ente, L'op~ra e ti pensiero di G. Pico .del/a Mir~dola d1 stud1 suldell'umanesimo, 2 vols., Florença , 1965 (Istituto N!_lZlo~aJe E .. R~nan, Rinascim ento). ~Sobre a corrente «paduan a» e anstoteh ca: ztalzenne Averroe s et l'averroisme, Paris, 1866; R . Charbon nel, La pensée au XVI' siecle et le courant libertin, Paris, 1917; R. Busson, Les sources fra,nçc:ise d~ la et le développem_ent du rationalisme dans la lit!ératur~ sul! artstotellsmo_ Renaissance, Pans, 1922, reed. de 1957; B. Nardt, Sagg1 autor, Studz padovano dai seco/o XIV ai XVI, Florença , 1958;_ do mesmo . Gensu Pietro Pomponazzi, Florença , 1965. -Sobre Gwrdan o Bruno:, G1920; o tile Giordano Bruno e il pensiero deZ Rinascim ento, Florença nce atrás artigo de A. Renaude t na Biblíotheque d'human isme et Renaissa tradução de citada· a introduç ão colocada por P. H. Michel antes da sua and the Bruno o Giordan Yates, A. F. e 1954; Paris, s, héroique Fureu~s filC?sofico pensiero_ dei Storia col. Na 1964. , Chicago , hermetic tradition , e scientifico, é excelent e o t. II: L. Geymon at, ll Cinquecento e tl Setcento Milão, 1970. AlgUns estudos sobre os principais humanis tas (exceptu ando Maquiavel, sobre quem se deve ver a rubrica IV): Ersamo: a pequena mas excelent e obra de J. C. Margoli n já foi citada. vie et A. Renaude t demorou~e muito no estudo de Erasmo: Érasme, sa e et son son reuvre jusqu'en 1517, Paris, 1913; Érasme, sa pensée religieus érasaction d'apres sa correspondance, 1518-1521, Paris, 1926; Études no grande miennes Paris 1939. Mas também se fala muito de Erasmo .. . Atenlivro de 'L. Febvre, Le probleme de l'incroyance au XVI' siecle S. der-se-á .ainda ao especialista da correspo ndência de Erasmo, P. J.Allen, HuiThe age of Erasm, Oxford, 1914; ao grande historiad or holandês Há 1955). (Paris, .francês para o traduzid já Érasme um zinga, que tem citações muito bem seleccionadas em J. B. Pmeau, Érasme, safml!ensée estureligieuse, Paris, 1923. O tema do casamen to na obra de Erasmo
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dad~ por E. V. Telle, Érasme de RottenJam et le septieme sacrement, Pans, 1954. W. H. Woodward, Desiderius Erasmus concerning the time and method of education, New York, 1964; J.-M. Margolin, Recherches érasmiennes. Genebra, 1969; Çh. Bene, Érasme et saint Augustin, Genebra, 1969; R. H. Bainton, Erasmus of Christendom, New York, 1969; L. E. Halkin, Érasme et l'humanisme chrétien, Paris, 1969; P. Mesnard, Érasme ou le christianisme critique, Paris, 1969; J. M. de Buranda, Érasme de Rotterdam: /íberté et unité dans l'Église, Sherbrook 1971. Sobre a irradiação do pensamento de Erasmo, há o trabalho ~lássico de M. Bataillon, Érasme et l'Éspagne, Paris, 1936.- A filosofia humanista ~e. Rabelais po~erá ser aprofundada graças a um livro de um dos mais qualificados especialistas franceses do século XVI: V. L. Saulnier, Le dessein de ~abelais, Paris, 1957, que completa a obra de L. Febvre.- Sobre Marganda de Navarra, consulte-se a tese de P. Jourda, Marguerite d'Angoulê.rrz.e, Paris, 1930. -Sobre T~omas More, há o trabalho, um pouco apologe~Ico, ~e_ H. Bremond, Le b1enheureux Th. More, Paris, 1904, que ainda hoje é utii. E. E. Reynolds, The tría/ of Thomas More, Londres, 1964, e Th. More and Erasmus, Londres, 1965; A. Prévost, Th. More et la crise de la pensée européenne, Tours, 1969. -Acerca das relações de Guillaume .Budé e de Calvino com o humanismo foi já escrita uma obra de capital importância: J. Bohatec, Budé und Calvin. Studien zur Gedankenwe/t des franzosischen Frühhumanismus, Graz, 1950.- Sobre Jean Bodin, além da grande tese de P. Mesnard, L'essor de la phi/osophie politique ... veja-se R . Chauvire, Jean Bodin, auteur de «la République», Paris, 1914. A penetração das culturas grega e hebraica na civilização do Renascimento foi obje~to de doi~ estudos recentes: D. J. Geanakoplos, Greek scholars: in Vemce, Cambndge (Massachusetts), 1962, e F. Secret, Les kabbalistes de la Renaissance, Paris, 1964. -Na esteira de J. Burckhardt muito se estudou já o paganismo do Renascimento, relacionado com o recrudescimento da astrolçgi~. Estes aspectos da arte e da psicologia da época serão estudados, pnnc1palmente, em E. Panofsky, Studies in iconology. Humanistic themes in the art of the Renaissance, Oxford, 1939 (trad. franc., 1967); J. Seznec, La survivance des dieux antíques, essais sur le rô/e de la tradition mytho/ogique dans l'humanisme et dans lart de · la Renaissance, Londres, 1939; P. P. Walker, Spiritual and demoniac magic from Ficino to Campanel/a, Londres, 1958; E. Wind, Pagan mysteries in the Renaissance, Londres, 1958; R. Klibansky, E. Panofsky e F. Saxl, Saturn and melancholy. Studies in the history of natural philosophy, religion and art, Londres, 1964.
A literatura e o ensino . A ú_nprensa fa':ore~eri o regresso às letras antigas. ~ este respeito, ha um hvro de mmto mteresse: L. Febvre e H. J. Martm, L'apparition du livre, Paris, 1958. -Acerca das universidades, dispõe-se de J. Bonnerot L'ancienne université de Paris, Paris 1928, de um livro cómodo ma~ rápido de . S. D'lrsay, Histoire des u'niversités françaises et étrangeres, 2 vol., Pans, 1933-1935, do excelente livrinho de J. Le Goff Les intel/ectuels au Moyen Âge, Paris, 1957, e do recente trabalho (~om abudante qibliografia) de S. Stelling-Michaud, «L'histoire des universités au Moyen Age et à la Renaissance au cours des vingt-cinq demiêres années» in XI• Congres intarnational des sciences historiques. Rapports, vol: I, pp. 97-143, Estocolmo, 1960. A obra de F. de Dainville, La naissance de l'humanisme, Paris, 1940, trata, designadamente dos novos métodos de ' ensino dos jesuítas nos séculos XVI e XVII.
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Pode-se obter uma visão de conjunto da produção humanista em França no século XVI por meio das obras clássicas de A. Lefranc, Grands écrivains trançais de la Renaissance, Paris, 1914, e de J. Bédier e P. ~a zard, Histoire de la littérature française , nova edição por P. Martmo, 2 vol. Paris, 1948 (aquilo que respeita ao século XVI foi revisto e actualizado' por P. Jourda). Sínteses mais concisas mas úteis: J. Plattard, La Renaissance des lettres en France de Louis XI à Henri IV, 3." ed., 1952, e V. L. Saulnier, La /ittérature française de la Renaissance, Paris, 1962. Sobre Rabelais, além do já citado estudo de V. L. Saulnier e do trabalho equilibrado e sempre válido de P. Villey, Les grands écrivains du XVr siecle: Marot et Rabelais, Paris, 1923, veja-se J . Plattard, La vie et l'reuvre de Rabelais, Paris, 1939. - V. L. Saulnier dedicou ao Prince de la Rena~s sance lyonnaise ... , Maurice Sceve os dois volumes da sua tese (PariS, 1948). - Montaigne foi objecto de numerosos trabalhos muito apreciáveis: J. Plattard, Montaigne et son temps, Paris, 1933; P. Moreau, Montaigne, Paris 1938. A publicação da obra póstuma de A. Thibaudet, Montaigne, foi s~udada como «acontecimento bibliográfico» do ano de 1963. H. Chamard procurara, no seu livro sobre Les origines de la poésie française de la Renaissance (Paris, 1932), as origens medievais e nacionais da poética francesa do século XVI. Essa obra matizada poderá ser completada com R. Lebêgue, La poésie française de 1560 à 1630, Paris, 1947. Um colóquio recente foi dedicado ao teatro: Les tragédies de Séneque !!f le théâtre de la Renaissance, estudos apresentados por J. Jacquot, Pans, 1964. As obras literárias italianas poderão ser abordadas com base na obra clássica e sedutora - apesar de um tanto ou quanto ultrapassada- de P. Monnier, Le Quattrocento, já citada. O manual indispensável em francês é de H. Hauvette, Littérature italienne, 8.• ed., Paris, 1932. Em italiano há duas obras de maior importância: V. Rossi, 11 Quattrocento, Milão Í949, e G. Toffanin, 11 Cinquecento, já anteriormente citada. - Sobr~ Maquiavel, veja-se a rubrica IV.- Sobre Guicciardini, consulte-se A. Oteta François Guichardin, sa vie politique et sa pensée politique, Paris, 1926, e a obra recente, atrás citada, de F. Gilbert, Machiavelli and Guicciardini ... -Há uma excelente edição crítica do Cortigiano de! conte B. Castiglione devida a V. Cian, Florença, 1908. Quanto à actividade literária de Espanha, devemos aconselhar J. Fitz-Maurice-Kelly, History of spanish literature, Londres, 1904, que existe também em tradução francesa. Mas haverá também que considerar as introduções postas por M. Bataillon à cabeça do Roman picaresque, Paris, 1931, e de E/ Enquiridion o Manual del cabal/ero cristiano, Madrid, 1932. Citemos ainda A. Castro, Cervantes, trad. franc., Paris, 1931, A. Villanova Erasmo y Cervantes, Barcelona, 1949 e L. Rosales, Cervantes y la /iberfad, 2 vol., Madrid, 1960. Em Portugal, Camões foi um dos grandes representantes do humanismo europeu. Foi objecto de um estudo de P. Le Gentil, Camoens, /'reuvres épique et lyrique, Paris, 1954. Recordemos, ainda, uma obra já anteriormente citada: A. J. Saraiva, História da Cultura em Portugal, Lisboa, 1952. Quanto à Inglaterra, convém recordar a importância do livro de H . Taine Histoire de là /ittérature anglaise. Além dele, o manual "clássico, em francês, sobre a produção literária inglesa é o de E. Legouis e L. Caza-
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~ian, Littératu_re a.nglaise, reed. de 1951. Em inglês, há uma Cambridge hzstory of engllsh llterature (especialmente os vols. III e IV, 1908). Sobre
Shakespeare, . podemos . recomendar, principalmente, a reedição de P. Dreyer, Essa~ sur les zdées dans l'reuvre de Shakespeare, Paris 1947· H. Fluchere, Shak~spe_are, dra'!laturge élisabéthain, Paris, 1966; i Paris: Shakespeare par lw-meme, PariS, 1954; R. Sanvic, Le théâtre élisabéthain, Bruxelas, 1955; J. Axelrad, Shakespeare et /e théâtre élisabéthain Paris 1.964; J. Kott, Shakespeare, notre contemporain, trad. franc., Paris, 196Z (Interessante mas multo tendencioso). A produção literária alemã, tanto em latim como na língua nacional, , e fraca- apesar de Reuchlin, Lutero e Melanchthon. Além da obra fun?amental de J. _Ja~ssen, L'A.Jiemagne et la Réforme, poder-se-á recorrer a~· Bo~se~t, li1St01re .de la llttérature allemande, Paris, 1913, e a G. Bianqms, Hzst01re de la lzttérature allemande, Paris,. 1936. O livro de J. E. Spenle, La pensét; allemande de Luther à Nietzsche, Paris 1934 é uma ' ' smtese densa e nca. Uma rápi.da vista. de olhos p~los horizontes europeus do século XVI leva-nos a assmalar amda as segumtes obras: 1) Par'!- os Países-Baixos: A. Roersch, L'humanisme belge à f'époque de .ZC! Renazssanct;. Bruxelas, 1910; H. de Vogth, History of the Collegium Trzlmf!u._e Lovamense! I5.J7-?550, 3, vo~., L.ol!vain, 1951-1954; 2) Para a P_olóma. !- Morawskt, Hzstozre de I umverslte de Cracovie, trad. P. Rougter, Pans, 1904; J. Langlade, Kochanowski l'homme le poete Paris 19?2; e ~· Kot, .«L'humanis~e et la Renaiss~nce en Po'togne», in' Biblio'.. theque d h~mamsme et Rena_zs~ance, X~V, 1952, pp. 34?-373, e XV, 1953, J?P: 233-238, 3) Para a Hungna. T. Klamczay «La Renatssance hongroise» ' ' zbzd., XXV, 1963, pp. 439-475.
XIII. ARTISTAS E OBRAS DE ARTE Obras gerais
. O livro de J?-· .Müntz,. Hfs~oire de /'art pendant la Renaissance, já foi cttad~. ~o. donumo da ht.stona geral da arte, a mais importante continuaç~o e ~mda .~de A. Mtchel, lfistoire de l'art depuis les premiers temps chrétzens Jusqu a nos 1ours, Pans, 1905 e segs., especialmente no nosso caso, os t. III. IV e V. De menores dimensões mas pennitind~ uma boa abordagem dç>s problemas, são as sínteses de L.' Réau, Histoir'e universelle des arts, Pans, 1936-1940, especialmente no nosso caso 0 t 11 e (mais rec~nte) de L. Hautec_reur, H_istoire de l'~rt, t. II: De la' réallté d beauté, ~ans, 1959. A~ colecçoes «Sktra» devem, evidentemente, ser também mencionadas. P!lrttcularmente os volumes de G. C. Argan, Le xv• siecle Genêve-P~ns, 1955, e de L. Venturi, Le XVI" siecle, Geneve-Paris 1956:
As J?esqmsas de ~· e G. Francastel em matéria de sociologia da arte são pa~tlcularmente. !t~as e .novas: Histoire de la peinture, 2 vol., Paris, 1955· Pemt~re et soczete. !"azssance et destruction d'un espace plastique. De z/t Renazssance au cubzsme, Lyon, 1951, reed. 1965 e La réalité figurative É_l~rr~;ents struct!lrels de la so~iologie tf.e l'art, P~ris, 1965. P. Francastei dmg~u, além dtsso, a colecçao que mclui Les peintures céleõres Les archztectes célebres, Les sculpteurs célebres, Paris, 1953 e segs. SÓbre a
arte dos jardins, consulte-se: M. Gothein, Geschichte der Garten Kun.vt, Iena, 1914, trad. ingl.; M. Charageat, L'art des jardins, Paris, 1962. lmp rtantes: A. Chastel, Le mythe de la Renaissance, 1420-I520, Genebra, 1969, e La crise de la Renaissance, Genebra, 1968. Itália
Tem, evidentemente, posição de destaque na produção artística do Renascimento. A principal obra sobre a arte italiana é a de A. Venturi, Storia dell'arte italiana 23 vols., Milão, 1901-1941. Também é importante M. Dvorak, Geschichte der italienischen Kunst im Zeitalder der Renaissance, 1: XIV-XV; II: XVI, Munique, 1927-1929. Há muitos trabalhos de grande qualidade em língua francesa, especialmente os de J. Alazard, L'art italien au xv• siecle, Paris, 1951, L'art italien au XVI' siecle, Paris, 1955, e de A. Chastel, L'art italien, 2 vol.. Paris, 1956 e Les arts de l'Italie, 2 vol., Paris, 1963. Este autor dedicou as suas teses de doutoramento ao estudo das relações da arte com o humanismo platónico. São elas: Marsile Ficin et l'art, Paris, 1954, e Art et humanisme à Florence au temps de Laurent !e Magnifique, Paris, 1961. A. Chastel publica regularmente, desde 1945, na revista Biblitheque d'humanisme et Renaissance, relatórios e crónicas sobre a arte italiana dos séculos XV e XVI. · Quanto à arquitectura italiana, juntamente com o livro já antigo, mas ainda útil, de M. Reymond, Bramante et l'architecture italienne au XVI' siêcle, Paris, 1913, há três trabalhos mais recentes: G. Giovannoni, Saggi sull'archittetura de! Rinascimento, Milão, 1931; R. Wittkower, Architectural principies in the age of humanism, 2.! ed., Londres, 1952; G. Chierici, 11 palazzo italiano dai seco/o XI al secolo XIX, 3 vols., Milão, 1952 e segs. Quanto à pintura, o livro fundamental é ainda o de B. Berenson, Italian painters of the Renaissance, 4 vols., Londres-Nova Iorque, 18941907, trad. franc., 1935. Algumas das teses de Berenson não recebem geral aceitação. Apesar disso, a obra é clássica. Estudos recentes vieram renovar o conhecimento e a interpretação da pintura italiana: L. Venturi e R. Skira-Venturi, La peinture italienne: les créateurs de la Renaissance, Genebra, 1950 e La peinture italienne: la Renaissance, Genebra, 1951; G. Francastel, Du byzantin à la Renaissance, Paris, 1955, Le style de Florence, Paris, 1958 e L'art de Venise, Paris, 1963; A. Chastel, Le grand atelier d'ltalie, 1460-I500, Paris, 1965 e La Renaissance méridionale, 1460-1500, Paris, 1965. A historiografia contemporânea dá importância cada vez maior ao maneirismo, que se poderá estudar, designadamente, nas obras de G. Briganti, 11 manierismo italiano, Dresden, 1931, trad. franc., 1962; W. Fridelander, Mannerism and antimannerism in italian painting, two essays, New York, 1957; e, principalmente, J. Bousquet, La peinture maniériste, Neuchâtel, 1962, jâ mencionado. A escultura italiana poderá ser abordada a partir de M. Reymond, La sculpture florentine, 4 vols., Florença, 1897-1900, para o caso da escultura toscana; ou então por meio de um estudo mais geral e mais recente: J. Pope · Hennessy, An introduction to italian sculpture, Londres, 1955-1963.
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ar~istas italianos. ~i~ ~f:~m~~.n~rau,as Jobre os principais Prmceton , 1952; E. Tietze . anson,. Donatello, Conrat, Mante n~ . 5 1908, e R. Sch~eide~o~g~~~e/}j5 • ?· Hor~e, Sa'}dro Botticelli, Londres, Leonardo da Vinci, Estocolmo, 1911 trad franc ·1~2as!st 19Ô1,ldO.hSI_ren, ' ·, .O se e1der, Léonard de Vinci, Paris, 1948 (ace; d · L · ., theque d'humanisca e eon~rdo da Vmc~. será bom consultar a Bibliotel XVI 1954 ':xe.Jofe1c:jssa~ce, espec:~almente os artigos de A. Chas1926; c. Gàmba, Rapha~l Pari •19 ~O), H. Foc!llon, ~aphael, Paris, 33, Ç. de To!nay, Mtchelange!o, 5 vol. Princeton 1953 e sé s . l; W. S~ida Titien gÚ~d .f Hourt~q'· La Jeunesse du Titien, Paris,' 1919· à Titien, hrtist:e' le p~bÍi~n~t laa~~· 1935;. pl: Francaste l, «De Giorgioné m~ercia Is~twn de l'reuvre d'art», in Annales, E. S. c.,' 1960 L e degs., C. Ynarte, Paul Véronese, Paris, pp. 1060 1888; A. Bell Paolo 1929; R. Par{e, Andre:~':t;~dio~nT~~f:U. 1~~?t· Fosca, Le Tintoret, Paris,
v;
França , d O melhor livro de carácter geral · b na época do Renascimento é sem d, ~o re0 a pro uçao arttstica francesa de A. Blunt, .Art and architecture in France, 1500-l700' 2 ! d uRda, ~d~t~ ~~~d dleXseVx) , 19d57. r:;:;,od~s ~ ·~ a~-~e prolong~r góticas ttradições A~ . 0 1 ."'. , e aí · ecu o L' o m eresse do livro de E ·. M'l 1 la fin du Moyen Âge de tgteux re art e, a en France 4 ! ed F. Gebelin; L~s chdte~~~Isde 1fa3 iot Para .a arquitectu ra, acrescente-se: 19~7, e Les châteaux de la Renaissance, Paris 192 7 . p L ~{' PaLn~,archltectu re française, Paris , H' , . . a~e an_. . 1944; L. Haute I: La formatio/, classique, tu~e l.CfrchzRtec e •·ISfLatrepdre 1 , classfq~~r l'idéal de d mtere enazssance 1495-1540 ·· . p · 1963· •. 2' e F. Herert, Fontamebleau, Paris 1937 é excel~nte À b . de IyoA · . du Cer? ra · ceau, Les plus excel!ents b~stime~t d F ;rancei Pans,.1576-15_79, existe em fac-simile. Acerca dos Du Cercea~ amda hoJe .a obra de H. Von Geymuller, Les Du Cercea~ lelmp~r alnte ' ur Vle, eur reuvre, Pans, 1910 _ · Para a abordage d r;nt~~~~ ~ranceses .do século. XVI, dispõe-se. de L. Dimier, HistoV:.e orzgin~s au retour de Sim~m Vouet, 1300-1627, Pfris t9z/rBnç Dse. djs. La P~mt.ure française, Pans, 1942, e P. e G. Francast~l p ' . · onva de la peinr;zsto~re ..t'I~:aex, e TWJt5 xel~s Paris-Bru vols., 2 tur_e française S bso re pmtura: S. Bégum, L'école de Fontainebleau Paris 1960 escultores: M. Aubert La sculpture Íran 1l d · - o r~ esculturala eRenaisMoyep Age et de sance, Paris-Bruxelas 1926. D Ja{b s:"t a ~ , . a seu P_ture /rançaise, Paris, 1931, um trabalho ex~elenté e .i çaise, Paris, 1945· P. Denis Li;i!te~~th_o. Lp B.enoist, La sculpture franmain Pilon Pari~ 1927· p d r lc te;, ans, 1911: J. Babelon Gerbier: Jeanh9ou jon, .Paris,, 1949; P. Pradel, Michel 'cotombe · .!e der~~on;t l r rmagrer got zque, Pans. 1953. •
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~~r;:iunt, P~3tbef~~eR1~3~Z:,::,nf~d~fr~~/~:~s Lf9á3 XJ~~· ~~l~t943;
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A adctivida~e art~stica f
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l'Ancien, Paris 1953; C. de Tolnay, Brueghel, Bruxelas, 1955; e Bruxelas-Paris, 1962. Um colóquio do «Centre National de la Recherch Scjentifique» teve por tema La Renaissance dans les provinces du Norde (Picardie, Artois, Flandres, Brabant, Hainaut), com estudos reunidos apresentados por F. Lescure, Paris, 1956. Quanto à Alemanha , graças a G. Glück, Die Kunst der Renaissance der in Deutschland, Berlim, 1928, e a W . Pinder, Die deutsche Kunst in junDürerzeit, Leipzig, 1940, tem-se já bastante material, mas pode-se-lhe tar as seguintes monografias: A. Marguillier, Albert Dürer, biographie critique, Paris, 1902; M. Brion, Dürer, l'homme et son reuvre, Paris, 1960; a principal obra sobre Dürer ainda é a de E. Panofsky, Albrecht Dürer,e reed. Princeton , 1955. Considere-se ainda P. Gauthier, Holbein , biographi · critique, Paris, 1907. Brue~:hel
L. Van Puyvelde, La peinture flamande au siecle de Bosch et de Brueghel,
A arte inglesa pode ser estudada mediante duas obras já antigas mas , sólidas: Gotch, Architect ure of the Renaissance in England, 1560-1635 painEnglish , Constable C. . W e Baker C. H. C. e 1894, Londres, vols., 2 ters of the XV1th and XVllth centuries, Paris, 1930. E. Bertaux, que escreveu na Histoire de l'art de A. Michel a parte respeitante ao Renascim ento espanhol, fez neste âmbito pesquisas pesder soais. Aos seus trabalhos há que acrescentar: A. Haupt, Geschichte PaRenaissance in Spanien und Portugal, 1927; C. Mauclair , Le Greco, que ris, 1931; E . Dabit, Les maítres de la peinture espagnole, Paris, 1937, Lasé um trabalho com originalidade e qualidade; e, naturalme nte, J. saigne, La ·peinture espagnole, des fresques romanes au Greco, Genebra, 1952 e La peinture espagnole, de Vélasquez à Picasso, Genebra, 1952. A arte· portuguesa é uma das mais originais criações do Renascim ento dispor causa da riqueza dos seus elementos exóticos. A seu respeito,Paris, põe-se de um bom livro de Reynaldo dos Santos, L'art portugais. «L'art 1938, que poderá ser completado com um artigo de J. Barreira, manuélin, ses éléments, son évolutiom>, in Gazette des beaux-art•, II. 1934.
A música Muitas histórias da mus1ca vieram já juntar-se à obra clássica de a a colaboração de R. Dumesnil, 5 vols., 1953-1960. Citamos, assim, ed. enciclopédia alemã Die Musik in Geschichte und Gegenwart, and F. Blume, 13 vols., Kassel, 1949 ... ; M. Bukotzer, Studies in Medieval Renaissance music, Nova Iorque, 1950; G. Reese, Music in the Renaissance, Nova Iorque, 1954; P. Collaer e A. Van Der Linden, Atlas histori-3 que de la musique. Paris, 1960; F. Michel, Encyclopédie de la musique, vols., Paris, 1958-1961; R. Bernard, Histoire de la musique, com 2 vols. publicados, Paris, 1962; R. Goldron, Histoire de la musique, no nosso caso os tt. III e IV, Lausanne , 1966. N. Bridgman n publicou em 1964, numa colecção dirigida por Roland-Manuel, um estudo intitulado La vie musicale au Quattroce nto que vai até ao ano de 1530. A música desempenhou importan te papel na actividade poética e na vida de corte do Renascimento. Alguns colóquios internacionais organizados pelo C. N. R. S. abordaram especialmente este aspecto do século XVI: Musique et poé-
J. Combarieu, Histoire de la musique, 3 vols., Paris, 1918-1919, reed. com
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sie au ~vr. siecle, estudos apresentados por J. Jacquot, Paris, 1954; L~ muszque znstr_um entale de la Renaissance, por J. Jacquot, Paris, 1955; L art du bal!e~ a la cour. de F rance 1581-1643, por Mac Gowan, Paris, 1963. -A~ edttoras de discos tentam actualmente ressuscitar a música do RenasCiment o. A este respeito, a mais interessante iniciativa é a da «Deut.sche Gra~mophon Gesellschaft», que, dos seus 12 «domínios de pesqmsas», dedicou 2 a'? período que estamos estudando: III domínio, A alvorada dÇJ Renasc_zmento, 1350-1500 (cinco séries); IV domínio O alto Renasczmento (seculo XVI) (doze séries). '
XIV. PRÉ-REFOR MA. REFORMA PROTESTA NTE E REFORMA CATóLICA
História da igreja . ~m. francês: A:, Dufourcq, L'avenir du chrislianisme, t. VII· Le chmlz~msme e~ lq d.esorganisalion individualiste (1294-1527), Paris, Í925; t. V~II. _Le chrzst~amsme et la réorganisaton absolutiste, 3 vols., cobrindo o pnm~u:o ? penodo de 1527 a 1622, Paris, 1933; P. Fargues, Histoire d!f ~hrzstzanzs;ne,. tt. II! e IV, Paris, .1936-1938 (protestante); a Histoire
generale de I E:glzse, cnada por A. Fhche e V. ~art~ e continuada por J. B. Duroselle e E. Jarry, tt. XIV a XVIII, mclusiVe (a contribuição de E: Delaruelle, no t . XIV, de 1964, é especialmente notável) Mais espectalmente. sobre o protestantism o: E. G. Léonard, Histoire Únérale du protestan!zsme: t. 1: La Réformation, Paris, 1961; J. Delumeau, Naissance et affzrmatzon de la Réforme, Paris, 1965. Em inglês: P. Schaff, History of the christian church 7 vols
Nova
~~~g~e, 1916-1923 P. Hughes, History of the church, 3 'vols., ibndres, Em alemão: W. Moeller, Lehrbuch der Kirchengeschichte Freiburg 1889; L. Von Pastor,, Gescf:zichle. der Papste seit dem Ausgang des Mittel~ alte_r~, 16 vols., Freib'!lrg-Im-Bnsgau, 1886-1933 (a tradução francesa é deftctente; deve prefenr-lhe a edição italiana de P. Cenci ·e A. Mercaii 16 vo!s., RoJ?:la, ree~. de 1942 & sg); G. Krüger, Handbuch der Kirchen~ gt;schzchte fur St.udzerende, ~.! ed., 4 vols., Tübingen, 1923-1931, especialment~ o t. reformatzon. TIL H. Hermelmck e W. Maurer' Reformation und Gegen. _Em italiano: E. Bonaiuti, Storia dei cristianesimo, 2.! ed., 3 vols., MII"!-o, 1943-1944; L. Todesco, Corso di storia della Chiesa 4 & ed 5 vols Tunm-Roma , 1944-1948. ' · ., .,
Pré-reforma e época da Reforma Estudos de carácter geral excluindo biografias Há !Imitas obras, entre elas ~~ de J . M!chelet, de A. Renaudet, de M. Batalllon, de L. Febvre, que ]a foram citadas anteriorment e. Acrescentasmos-lhes agora E. Troeltsch, Die Soziallehren der christlichen Kir-
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chen und Gruppen, Tübingen, 1912; A. Hyma, The christian Renài~sance. A history of lhe «Devotio moderna», Nova Iorque, 1924, e Renazssc;nce to Reformation. A critica! review of th.e spiritual infll;l~nces on medzeval Europe, Grand Rapids, 1951; J. Mac~mnon, .The orzg_ms of lhe Reformation Londres-Toro nto 1939; G . Ritter, Dze Weltwzrkung der Reformaiion: Leipzig, 1941, 2/ ed., Munique, 1959, ~ Die Ne_ugestaltung Eu~o pas im XVI. Jahrhundert, Berlim, 1950; H. Jedm, ~atolzsche Refor'!latwn ode r Gegenreformation?, Luzem, 1946, e Geschzchte qes K~mzzls von Trient, 2 vols., Freiburg-im-Brisgau, 1949-1957, trad. mg. , It., fr.anc.; R. H. Bainton, The age of the Reformation, Boston, 1956; H. J. Gnmm, The Reformation era, 1500-1650, Nova Iorque, 1954; L. Febvre, Au creur religieux du XVI' siecle, Paris, 1957; H . Bornkam, Das Jah;hundert der Reformation. Gestalten und Krafte, Gõttingen, 1961; e, enfim, Co/loque d'histoire religieuse, Lyon, Outubro de 1963. França: P. Imbart de La Tour, Les or!gines d~ la Réforme, já ~itado; H Hauser E:tudes sur la Ré/arme françazse, Pans, 1909; e La nazssance d~ protest~ntisme, Paris, 1940; .L. Romier, Les origines politiques 4es guerres de religion, 2 vols., Pans, 1913-1914; Le ro~a_ume de Catherz'!e de Médicis: la France à la veille des guerres de relzgwn, 2 vol~.• Pans, 1922, e Catholiques et huguenots à la cc:ur de Ch_a~les 1!,, _P~ns, 1924; J. Vienot, Histoire de la Réforme françazse des ongmes. a I ~dzt de Na~ tes, Paris, 1926; E. G. Léonard, Le protestant françazs, 2.- ed., Pans, 1955; P. F. Geisendorf, Liste des habitants de Geneve (1549-15~0), t. I, Genebra, 1957 t. II, Genebra, 1963; S. Mours, Le protestantzsme en F rance au XV r siecle, Paris, 1959; A. Latreille, E. Del~ruelle e J. R.. Palanque, Histoire du catholicisme en France, t. II,. Pans, .1~60; G. Livet, Les guerres de relig(on, Paris, 1962; P. Adam, La vze parozsszale en France au x1v• siecle, Paris, 1964. ' Ilhas britânicas: F. Gasquet, The era of Reformation, Londoh, 1900, trad. franc., Louvain, 1914; J. Gairdner, The English Church in the XV!th century from the accesion of Henry VIII to lhe death o! Mary, Londres, 1904; t. IV da Hislory of the English Church dirigida por W. R. W. Stephens e W. Hunt; G. Constant, La Réforme en An~leterrt;: !e schisme anglican, Henri VIII (1509-1547); P. Janelle, Obedzence zn Church and State, Cambridge, 1930, e L 'Angleterre à ~a. veflle du sc~ismt;. Paris, 1935; W. K. Jordan, The development o! relzgwn s toleratwn zn England 4 vols. Londres 1932-1940; H. Maynard Smith, Prereformation in Engl~nd, Lo~dres, 1938; E. G. ~upp, Studies in the making of the English protestant tradition, Cambndge, 1947; A. H. Thompson, The english clergy and their organization in the !ater Middle Ages, Oxford, 1947; J. H. S. Burligh, A c,hurch history of Scotland, Londres, 1960; G Donaldson The scottish Reformation, Cambridge, 1960; Ph. Hughes, The Reformalion in England, Londres, 1963; A. G. Dickens, The english Reformation, Londres, 1967. Países Baixos e Províncias Unidas: L. Van Der Essen, Alexandre Farnese ... gouverneur général des Pays-Bas (especialmente o t. V), Bruxelas, 1937; H. Van Der Zee, Vaderlandsche Kerke~eschiedenis, t. III: Van de Hervorming tot heden, Kampen, 1940; J. Lmdeboom, De Confessioneele ontwilkkcling der Reformatie in de Nederlanden, Haia, 1946; R. Collinet, La Réformation en Belgique au XVI' siecle, Verviers, 1947; R. G. Short Stories o.f the Reformation in the Netherlands, Wa .. shington, 194S; E. de Moreau, Histoire de l'J!:glise en Belgique, tt. IV e V, Louvain-Bruxelas, 1949-1952; L. E. Halkm, «Les martyrologes et la
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XV. A CI:BNCIA ke (ru. Além das obras fundame ntais de P. Duhem e L. ThorndyTaton e R. bnca 1), o melhor trabalho recente sobre a ciência é a decaso o t. 11 colabora dores: Histoire générale des sciences, no nosso history La science moderne , Paris, 1958. Acrescente-se-lhe: A Wolf, Acenturies , of science, technology and philosophy in the XV/th and XV/lth 1960; Paris ), colectiva (obra siecle XVI' au science La 1950; , Londres ge, A E. Mac Kenzie, The major achievem ents of science, 2 vol., ,Cam'brid in Studies 1960; H. Brown, «The Renaissa nce and historians of science» ce in the Renaissance, VII, 1960; The school of Padua and the emergen ek A of modern science (obra colectiva), Pádua, 1961; A J. Panneko Science ~nd history of astronom y, Nova Iorque, 1961; W. P. Wightm an, fundame ntal the Rena1ssance, Aberdee n, 1962. Recorde mos ainda a obra de L. Geymon at, Storia dei pensiero filosofico e scientifico, t. Il, Milão, de la 1970 (que está para ser publicad a em francês sob o título Histoire obra uma há medicina a -Sobre ). Arthaud ed. pensée et des sciences, comclássica: A Castiglioni, A history of medicine Nova Iorque 1941 a 1960; pletar com: H. E. Sigerist, On the history of r:-zedicine, Nova' Iorq~e., C. J . Singer, A short history of medicine, 2." ed., Oxford, 1962; L., S.háKing, uma The growth of medicai thought, Chicago, .1963. -Sobre zoologia As obra notável: P. Delauna y, La zoologie au XVl' siecle, Paris, 1962.por as publicad foram o Paracels ta alquimis e químico do s obras completa ParaC. Sudhoff ·e W. Matthies en: Theophr ast von Hohenhe im genanntas rel~ Sobre celsus. Siimmtli che Werke, 14 vols., Munique 1922-19 31.ções entre a ciência e a alquimia , veja-se também C. G. Navert, Agrippa and the crisis of Renaissance thought, Urbana (Dlinois), 1965.
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í NDICE DAS GRAVURAS
VOLUME I 29 1. A Europa no início do século XIV ... 32 2. A Europa cerca de 1620 . . . . . . . . . . .. 34 3. A França em 1328, 1360, 1380 e 1429 .:. 36 4. Os cinco grandes Estados italianos eni 1494-1515 41 5. O poderio da Borgonha no século XV ... ... ... , 6. Naufrágio provocádo pelas pedras-íman que estão no fundo do 52 mar ... · ............... .. ... .-. . ... ... .. . ... ... ... .... ..~. 55 · 7. Os Portugueses no Oceano Índico no século XVI .. . 57 8. Ó Mundo segundo a carta de Yale ... ·..... . ..... . . 62 9. A situação do México ... ........ .. ... ~ .. ........ · 64 10. Os Impérios pré-colombianos · . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 65 11. A América do Sul na época da penetração ibérica ... 67 12. Espanhóis e Portugueses .na bacia atlântica cerca de 1580 · ~ · 13. Chegada dos metais preciosos a Sevilha e alta de preços em Espanha (1500-1650) ... ... .... ................. ......... , .. . 68 14. Fortaleza de S. Jorge da Miná, fundada em 1481 na Costa do 71 Ouro ......... .. ... ... .............. ··· ··· ·... ··· ··· .. . · .. . 15. As aldeias abandonadas na Alemanha dos séculos XIV e XV .. . · 15 16. Difusão da Peste Negra de 1347 a 1350 . . . . . . . .. 76 82 17. Preços do trigo em Paris de 1520-1521 a 1630-1631 82 18. A alta dos preços em Roma de 1500 a 1630 .... .. 19. Projecto de Bramante para a cúpula de S. Pedro 105 20. Villa de Poggio em Cajano: esquema da fachada .. . 105 21. Leonardo da Vinci: figura humana num círculo .. . 107 ' 107 22: As proporções do homem segundo Vitrúvio . . . . . . . .. 23. Principais realizações arquitectónicas do Renascimento em França ........ .. .... . ... ... ... ...... ·... ...... . .... . . 110 24. O Grande Cisma: situação cerca de 1390 .. ... . ... .... . . 123 25. Passagens à Reforma na Europa Central e Setentrional . . . . .. 127 26. O protestantismo na Suíça aquando da morte de Calvino . . . . :. 128 27. Ca~ólicos e protestantes no Império ilas vésperâs da Guen::a dos Tnnta Anos . . . . . . .. ,. . . .. . . . . . . . :. . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 130
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28. Erasmo censurado pela Congregação do Index .. . ... .. . .. . .. . 29. Refugiados franceses em Genebra e Estrasburgo entre 1549 e 1560 . ... .. . ... ... ... ... ... .. . ... .. . .. . ... ... ... ... .. . ... 30. Anónimo da guerra hussita: moinho braçal com sistema de biela e manivela .. . ... ... .. . . .. ... ... ... ... 31. Francesco di Giorgio: veículo automóvel 32. Leonardo da Vinci : carro de guerra ... ... 33. Leonard<;> da Vinci: máquina de tosar lã 34. Leonardo da Vinci: asa articulada pela máquina voadora 35. Leonardo da Vinci: macaco . .. . .. .. . . .. . .. .. . .. . .. . 36. Brunelleschi: cúpula de Santa Maria dei Fiore . . . . . . . . . 37. Veículo com suspensão de cardan de branca (séc. XVI) 38. Rotas para o Atlântico Sul .. ...... . ...... .. .... ... ·... 39. Descoberta dos Açores .. . . .. .. , . .. . .. . . . .. . . .. . .. . .. .. . 40. A «Santa Maria·» de Colombo: velame calculado especialmente para os ventos portantes . . . .. . . . . . .. .. . . . . .. . . .. · 41. A transformação da «Nifia» na escala nas Canárias 42. Quadrante. astrolábio e «Bengala de Jacob» ... ... ... 43. Relógio de Dondi ............ ,.. ... ... ... ... ... ... 44. Parafuso de Arquimedes para levar âgua a Augsburgo (antes de 1550) . .. . .. . . . . . . . . . . .. . . . . . . . .. .. . . .. 45. Máquina de âgua de Juanelo (cerca de 1573) 46. Alto forno do século XVI . .. . . . .. . .. . .. . . . . 47. Neroni: canhão de cremalheira (século XV) 48. Valturio: máquina de guerra em forma de tartaruga 49. Valturio: máquina de guerra em forma de coelho . . . 50. Valturio: disparo de uma peça de artilharia de duplo efeito 51. Palmanova, cidade-fortaleza veneziana do fim do século XVI 52. Letra de câmbio . .. . . . . . . . .. .. . .. . . . . .. . .. . 53. Os câmbios em Lyon no fim do século XVI . . . 54. As praças bancárias da Europa .. . . . . . .. . .. 55. Organização da Companhia Médicis cerca de 1455 . . . 56. A organização da firma Fugger cerca de 1525 . . . . . . 57. O comércio do alúmen da Tolfa no tempo de Agostino Ghigi 58. Cunhagem de móeda em França em 1581-1590 ... 59. O comércio hanseático na Europa no século XV .. . . .. . . . 60. Francesco de Marchi: cidade à beira de um rio .. . . .. . . . 61. Francesco de Giorgio Martini: cidades situadas em colinas 62. Dürer: a cidade ideal . . . . . . . . . 63. Planta de La Valetta, em Malta .. . ... ... ... ... ... ... ... 64. Filareto: planta de Sforzinda . .. . . . . . . . .. . . . .. . . . . .. . .. . 65. Planta de Coeworden (Províncias Unidas) antes da destruição (por volta de 1570) e depois da reconstrução (a partir de 1597) 66. Francesco di Giorgio Martini: planta de cidade ideal . . . 67. Ruas novas de Roma nos séculos XV e XVI .. . ... ... 68. Planta dos jardins de Caprarola desenhados por Vignola
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69. A Trágica Histórica do Doutor Fausto ... .. . .. . ... ... ... ... 70. A Abadia de Telema .. . . . . .. . . . . . . . .. . .. . .. . . . . . .. . . . .. . 71. Anónimo Destailleurs: utopia platónica (início do século XVI) 72. V. Andreae: Christianopolis (princípio do século XVII) 73. Filareto: o Palácio do porto de Sforzinda 14. Feiticeiras com cabeça de animal . . . 75. Diabruras .. . . . . . . . 76. Criança monstruosa .. . ... 77. Câmara escura .. . .. . ... 78-79. Progressos da balística 80. O Universo de Aristóteles e de Ptolomeu 81. Sistema de Copérnico ... .. . ... .. . ... .. .
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